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ISSN 1413-7097

REVISTA DIALÉTICA
DE DIREITO TRIBUTÁRIO
(RDDT)

Repositório autorizado de jurisprudência dos seguintes tribunais:

- do Supremo Tribunal Federal (Despacho do Exmo. Sr. Presidente no Processo nº 304743,


publicado no DJU 1 de 18 de maio de 1998, página 1; inscrição sob nº 23/98, em 24 de junho de 1998,
conforme Ofício 2434/98-SD);

- do Superior Tribunal de Justiça (sob nº 36 - Portaria nº 1, de 16 de junho de 1997, do Exmo.


Sr. Ministro Diretor da Revista do STJ, publicada no DJU I de 23 de junho de 1997, página 29422);

- do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Portaria nº 12, de 13 de agosto de 1997, do Exmo.


Sr. Juiz Diretor do Gabinete da Revista do TRF da 1ª Região, publicada no DJU II de 21 de agosto de
1997, página 65574);

- do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Processo nº 97.02.16454-0, autuado em 30 de


maio de 1997 e julgado em 5 de junho de 1997);

- do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (sob nº de inscrição 8 - Portaria nº 2, de 30 de


maio de 1997, da Exma. Sra. Juíza Diretora da Revista do TRF da 4ª Região, publicada no DJU II de
5 de junho de 1997, página 41344); e

- do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (sob nº 7 - Despacho do Exmo. Sr. Juiz Diretor
da Revista do TRF da 5ª Região, publicado no DJU II de 9 de setembro de 1997, página 72372).

171
DEZEMBRO - 2009
REVISTA DIALÉTICA
DE DIREITO TRIBUTÁRIO
(RDDT)
ISSN 1413-7097

171
(DEZEMBRO - 2009) Nelson Screnci
é o autor da obra reproduzida em
destaque na capa desta edição.
Diretor da Revista
Valdir de Oliveira Rocha

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“100% Azul ou Quase”, Os acórdãos estampados na íntegra
de Marola Omartem correspondem às cópias obtidas nas
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de publicações oficiais de seus julgados.
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SUMÁRIO
Doutrina
Angelina Mariz de Oliveira - Exercício abusivo do poder de tributar
1. Invalidade, abusividade e arbitrariedade. 2. Abusividade na tributação. 3. Elementos que
caracterizam o ato administrativo não abusivo. 4. Enfrentando atos administrativos abusi-
vos no âmbito tributário. 5. Conclusão. 7

Célio Armando Janczeski - Da duração razoável do processo administrativo fis-


cal e seus reflexos na prescrição intercorrente e na fluência dos juros de mora
1. Introdução. 2. Princípio da efetividade. 3. O art. 24 da Lei n. 11.257/07. 4. A prescri-
ção intercorrente no processo administrativo fiscal. 5. Os juros de mora e o art. 24 da Lei
n. 11.257/07. 6. Considerações finais. 18

Douglas Yamashita - Serviços gráficos para livros, jornais e periódicos: imuni-


dade tributária?
I. Delimitação do tema. II. A imunidade tributária de livros, de jornais e de periódicos (ar-
tigo 150, inciso VI, letra “d”, da Constituição Federal de 1988). III. Conclusão. 28

Fabiana Carsoni A. Fernandes da Silva - A prescrição da ação judicial voltada à


restituição de indébito tem fluência desde o pagamento indevido, mesmo quan-
do o sujeito passivo apresenta pedido administrativo de restituição? Análise do
tema à luz de decisões do Superior Tribunal de Justiça
1. Considerações iniciais. 2. A restituição do indébito, o prazo para sua realização e a op-
ção pelo requerimento administrativo. 3. As decisões do Superior Tribunal de Justiça. 4.
Conclusões. 35

Fernando Facury Scaff e Edson Benassuly Arruda - A não-incidência de contribui-


ção previdenciária sobre verbas trabalhistas de natureza indenizatória e eventual
1 - Apresentação do tema. 2 - A incidência de contribuição previdenciária patronal calcu-
lada sobre a folha de salários. 3 - Da natureza jurídica das verbas trabalhistas a título de:
hora extra, adicional noturno, adicional de insalubridade, adicional de periculosidade,
salário-maternidade, terço constitucional de férias e férias indenizadas, salário-família,
aviso prévio, auxílio-educação, auxílio-doença e auxílio-creche. 4 - O princípio da reser-
va legal em matéria tributária. 5 - Conclusão. 48

Hugo de Brito Machado - A nova Lei do mandado de segurança e as restrições à


garantia de jurisdição em matéria tributária
1. Introdução. 2. Garantia constitucional de jurisdição. 3. Direito ao crédito e direito de
compensar. 4. Direito à liberação de mercadorias importadas. 5. Flagrante inconstitucio-
nalidade. 61

Luciano Marinho de Barros e Souza Filho - Da prescrição e da decadência na


cobrança de contribuições previdenciárias decorrentes de reclamatórias e consig-
natórias trabalhistas
1. Decadência e prescrição no ordenamento pátrio. 2. Decadência e prescrição aplicadas
ao subsistema de arrecadação contributivo-trabalhista. 71

Marcos Rogério Lyrio Pimenta - A Súmula Vinculante nº 08 e o parcelamento


1. Introdução. 2. Créditos parcelados pendentes de pagamento. 3. Pagamentos realizados
e a restituição. 4. Conclusão. 79

Miquerlam Chaves Cavalcante - A repercussão de decisões de órgãos da Admi-


nistração no contencioso administrativo tributário
1. Delimitação do tema. 2. Legislação de regência. 3. Aspectos jurídicos relevantes. 4.
Conclusões. 83
Renato Lopes Becho - Direitos e deveres da Administração Tributária à luz dos
direitos humanos
I - Colocação do tema. II - Situações contrapostas: rapidez no recolhimento de informa-
ções e demora na análise de informações prestadas pelo contribuinte. III - Os direitos hu-
manos aplicados à tributação. IV - A Constituição Federal de 1988 e os direitos humanos.
V - A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. VI - Correlação entre
direitos e deveres. VII - A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969). VIII -
Violação ao devido processo legal. IX - A demora da Administração Tributária em respon-
der ao contribuinte diante dos direitos humanos. X - Conclusão. 93

Sacha Calmon Navarro Coêlho e Misabel Abreu Machado Derzi - Dos regimes
fiscais de reconhecimento das variações monetárias cambiais nas bases de cálcu-
lo do IRPJ e da CSLL. O momento de exercício do direito
1. A natureza jurídica das estimativas de IRPJ e CSLL. Da imputação das receitas e das
despesas no período. 2. Escrituração contábil e obrigatoriedade de adoção do regime de
competência. Para a apuração do imposto, não porém para apurar as variações cambiais.
3. Tratamento contábil e tributário das receitas com variação cambial. 110

Sergio André Rocha - Aplicação dos incentivos à inovação tecnológica previstos


na Lei nº 11.196/05
1. Introdução. 2. Comentários gerais sobre os benefícios para inovação tecnológica da Lei
nº 11.196/05. 3. Procedimento para fruição dos benefícios. 4. O conceito de inovação tec-
nológica na Lei nº 11.196/05 e sua interpretação. 5. A quem cabe identificar a existência
de pesquisa e desenvolvimento para inovação tecnológica? 6. Qual o papel da Receita
Federal? 7. Conclusão. 132

Wladimir Novaes Martinez - Aspectos institucionais do FAP - Fator Acidentário


de Prevenção
Introdução. I. Taxa do seguro de acidentes do trabalho. II. Sinistralidade laboral. III. Cál-
culo do FAP. IV. Acidentes do trabalho. V. Trabalhadores envolvidos. VI. Tipos de empre-
sas. VII. Benefícios previstos. VIII. Rotatividade das empresas. IX. Contestação empresa-
rial. X. Constitucionalidade do FAP. 143

Pareceres
Humberto Ávila - IPI. Furto e roubo de mercadoria. Exame da existência de com-
petência e de exercício de competência. Intributabilidade das meras saídas físi-
cas a título de IPI
1. A consulta. 2. O parecer. 3. Conclusões. 156

Ives Gandra da Silva Martins - Processo administrativo: decisão que anula outra
anterior, com base na lei complementar - irretroatividade da lei ordinária
Consulta. Resposta. 165

Jurisprudência

Íntegras de Acórdãos • ITR - imóvel invadido - movimento “sem-ter-


• Execução fiscal - fraude - alienação de imó- ra” - perda do domínio e dos direitos inerentes
vel - LC 118 - CTN art. 185 - presunção de- à propriedade - insubsistência da exação (STJ
pendente de prévio registro da penhora (STJ - 2ª T.) 192
- 1ª T.) 186 • ITR - incidência sobre imóvel, localizado na
• IPI - crédito - resistência ilegítima do Estado área urbana, utilizado em exploração extrativa,
- incidência de correção monetária (STF - 1ª vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial -
T.) 189 não-incidência do IPTU (STJ - 1ª S.) 195
Decisões petência da Justiça do Trabalho (TRF da 4ª R.
• Cofins e PIS - receita bruta - art. 3º, § 1º da Lei - 5ª T.) 214
9.718 - aportes financeiros estranhos - propos- • Contribuição previdenciária - execução na Jus-
ta de súmula vinculante (Min. Ellen Gracie, tiça do Trabalho - empresa em recuperação ju-
Pres. do STF) 199 dicial - competência (STJ - 2ª S.) 215
• Cofins - isenção - sociedades civis de profissão • Contribuição previdenciária - litígio entre ex-
regulamentada - revogação pela Lei 9.430 - empregado e ex-empregador - competência da
necessidade de sobrestamento de proposta de Justiça do Trabalho (STJ - 2ª S.) 215
súmula vinculante (Min. Ellen Gracie, Pres. do • Contribuição previdenciária - restituição do in-
STF) 199 débito - exercício, pelo segurado, de duas ati-
• Crime contra a ordem tributária - tipificação vidades simultâneas, com vínculo empregatício
dependente do anterior lançamento definitivo - (STJ - 2ª T.) 216
proposta de súmula vinculante (Min. Ellen Gra- • Contribuição previdenciária - servidor público
cie, Pres. do STF) 200 - adicional de insalubridade - incidência (STJ -
• ICMS - mercadorias advindas de outros estados 1ª T.) 216
- exigência de pagamento antecipado da dife- • Contribuição sindical rural - legitimidade ativa
rença entre alíquotas estadual e interna - possi- da CNA para cobrança (Súmula nº 396, do STJ
bilidade (Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, - 1ª S.) 217
do TJRGS) 201 • Contribuição social sobre o lucro - cooperativa
• ISS - locação de bens móveis - distinção da de consumo - venda de bens a terceiros não
prestação ou locação de serviços - proposta de cooperados - incidência (STJ - 2ª T.) 218
súmula vinculante (Min. Ellen Gracie, Pres. do • Embargos à execução fiscal - compensação de
STF) 204 valores do imposto de renda retidos com resti-
• ITBI - base de cálculo - valor real de mercado
tuídos apurados na declaração (Súmula nº 394,
- lançamento por arbitramento - possibilida-
do STJ - 1ª S.) 218
de (Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, do
• Embargos à execução fiscal - valor da causa
TJRGS) 205
(STJ - 1ª T.) 218
Ementário de Acórdãos • Execução fiscal - certidão de dívida ativa -
• Ação de indenização - emissão em duplicidade
substituição até a prolação da sentença de em-
do mesmo número de CPF - inscrição indevida bargos - hipóteses (Súmula nº 392, do STJ - 1ª
em cadastros de proteção ao crédito (STJ - 2ª S.) 219
T.) 211 • Execução fiscal - exceção de pré-executividade
• CNPJ - cancelamento - declaração de inaptidão - matérias conhecíveis de ofício - admissibili-
da pessoa jurídica inexistente de fato (TRF da dade (Súmula nº 393, do STJ - 1ª S.) 219
4ª R. - 2ª T.) 211 • Execução fiscal - falência - responsabilidade da
• CNPJ - inscrição - empecilhos criados por ins- empresa falida, sem ônus para os sócios (STJ -
truções normativas - ilegalidade (STJ - 2ª T.) 212 2ª T.) 220
• Cofins e PIS - receitas de vendas de produtos • Execução fiscal - massa falida - encargo de 20%
destinados à Zona Franca de Manaus - abran- do DL 1.025 - exigibilidade (Súmula nº 400, do
gência dos valores de vendas de empresa da STJ - 1ª S.) 220
ZFM para outra da mesma localidade (TRF da • Execução fiscal - parcelamento - manutenção
1ª R. - 8ª T.) 212 das garantias prestadas - excesso de penhora -
• Compensação de débitos do ICMS, adquiridos adequação (TRF da 4ª R. - 1ª T.) 220
por terceiro, com crédito de precatório devido • Execução fiscal - penhora - oferecimento de
por autarquia estadual - ausência de direito lí- precatório havido por cessão de crédito - ausên-
quido e certo (STJ - 1ª T.) 213 cia de homologação judicial - possibilidade de
• Contribuição de melhoria - base de cálculo - recusa (STJ - 2ª T.) 221
valorização do imóvel - diferença entre os va- • Execução fiscal - redirecionamento contra só-
lores inicial e final - demonstração pelo ente cio - dissolução irregular da empresa - razão da
tributante (STJ - 2ª T.) 213 possibilidade (TRF da 4ª R. - 3ª T.) 222
• Contribuição previdenciária - agente político - • Execução fiscal - responsabilização do síndico
prefeito - espólio - excesso de mandato ou co- de massa falida (STJ - 2ª T.) 222
metimento de infração com dolo ou culpa - ne- • Execução fiscal - substituição de penhora por
cessidade de demonstração da culpabilidade precatório, sem anuência do exequente - impos-
(STJ - 2ª T.) 214 sibilidade (STJ - 1ª S.) 222
• Contribuição previdenciária - contrato de loca- • Honorários advocatícios - execução fiscal - só-
ção civil de serviços com município - pedido de cio - citação por equívoco - procedência dos
reconhecimento de vínculo de emprego - com- embargos (STJ - 1ª T.) 223
• ICMS - base de cálculo - selo de controle do IPI • ITCMD - imposto direto real - alíquotas pro-
- reflexo pecuniário no custo de produção - in- gressivas - descabimento - tributo devido pela
clusão (STJ - 1ª T.) 223 alíquota mínima (TJRS - 21ª Câm. Cív.) 231
• ICMS - base de cálculo - valor da venda a pra- • ITR - base de cálculo - exclusão de área de pro-
zo constante da nota fiscal (Súmula nº 395, do teção ambiental - desnecessidade de ato decla-
STJ - 1ª S.) 224 ratório (STJ - 1ª T.) 232
• ICMS - energia elétrica - demanda de potência • Lista de devedores de Fazenda estadual - situa-
- incidência sobre efetiva utilização (Súmula nº ções de discussão judicial com apresentação
391, do STJ - 1ª S.) 224 de garantia - segurança concedida (STJ - 2ª
• ICMS - Sesi - imunidade - inaplicabilidade às T.) 233
hipóteses de responsabilidade ou substituição • Mandado de segurança - desistência após pro-
tributária - diferimento (STF - 2ª T.) 224 lação de sentença de mérito - impossibilidade
• ICMS - transporte de mercadoria para estado (STJ - 1ª S.) 233
diverso - apreensão para efeito de pagamento • PAES - adesão - totalidade dos débitos - PIS -
do tributo - vedação (STJ - Corte Esp.) 225 omissão de receitas - arbitramento - nulidade
• Imposto de renda - cessão de direito sobre passe (TRF da 4ª R. - 2ª T.) 234
de atleta - ganho de capital (STJ - 2ª T.) 226 • PIS - base de cálculo - receita estranha ao fatu-
• Imposto de renda - conceito de acréscimo pa- ramento - seguro, taxas de terminais e pedágios
trimonial - correção monetária de imóveis em (TRF da 4ª R. - 2ª T.) 234
estoque - ausência de fato gerador (STJ - 2ª • Quebra de sigilo magnético - apreensão de
T.) 226 computadores por suspeita de sonegação fiscal
• Imposto de renda - omissão de receita - escrita - impossibilidade de análise da legislação infra-
constitucional e reexame de provas pelo STF
organizada - base de cálculo (STJ - 2ª T.) 226
(STF - 1ª T.) 235
• Imposto de renda - operações financeiras no
• Recurso especial representativo de controvérsia
mercado exterior (bolsa de mercadorias) - apu- - execução fiscal - extinção - cancelamento de
ração do lucro real - art. 5º do DL 1.418 - va- débito pela exequente - erro no preenchimento
riação monetário-cambial - riqueza nova - aqui- da DCTF - honorários advocatícios - princípio
sição de disponibilidade econômica (STJ - 1ª da causalidade (STJ - 1ª S.) 235
T.) 227 • Recurso especial representativo de controvérsia
• IOF - imunidade - entidades assistenciais sem - imposto de renda - rescisão de contrato de tra-
fins lucrativos - abrangência (STF - 2ª T.) 228 balho - indenização por liberalidade e no âmbi-
• IPI - crédito - exercício do direito postergado to de PDV (STJ - 1ª S.) 236
pelo Fisco - correção monetária (STJ - 1ª S.)228 • Recurso especial representativo de controvérsia
• IPI - crédito - matéria-prima - beneficiamento - IPI - crédito - aquisição de bens para o ativo
por terceiros (STJ - 1ª T.) 228 imobilizado, uso e consumo - impossibilidade
• IPI - demandas ajuizadas pela matriz e pelas fi- (STJ - 1ª S.) 237
liais - empresas distintas - litispendência inexis- • Recurso representativo da controvérsia - ICMS
tente (STJ - 2ª T.) 229 - base de cálculo - vendas financiada e a prazo
• IPI - selo de controle - natureza jurídica - obri- (STJ - 1ª S.) 238
gação acessória - reflexo pecuniário no custo de • Recurso representativo de controvérsia - Cofins
produção - inclusão na base de cálculo do - locação de bens móveis - incidência (STJ - 1ª
ICMS (STJ - 1ª T.) 230 S.) 239
• IPTU - envio do carnê ao endereço do contri- • Repercussão geral - ausência - contribuição
buinte - notificação do lançamento (Súmula nº previdenciária - servidor - condições imple-
397, do STJ - 1ª S.) 230 mentadas para aposentadoria - matéria infra-
• IPTU - permissão de uso de imóvel pertencen- constitucional (STF - Pleno) 239
te ao Estado - imunidade (STJ - 2ª T.) 230 • Repercussão geral - ausência - contribuição sin-
• IPTU - sujeito passivo - estabelecimento pela dical rural - publicação de editais - imprensa
legislação municipal (Súmula nº 399, do STJ - oficial - exigibilidade - matéria infraconstitu-
1ª S.) 231 cional (STF - Pleno) 240
• IPVA - alienação do veículo - responsabilidade • Repetição de indébito - prescrição - ação resci-
- não-aplicação do art. 134 do CTB (STJ - 1ª sória - tema controvertido - incidência da Sú-
T.) 231 mula 343 do STF (STJ - 2ª T.) 240
DOUTRINA
Exercício Abusivo do Poder de tributar
Angelina Mariz de Oliveira

1. Invalidade, Abusividade e Arbitrariedade


O poder que a Administração Pública tem para instituir
e cobrar tributos dos cidadãos é limitado nos Estados de
Direito pelas Cartas Constitucionais. No Brasil, o direito dos
entes políticos de exigirem tributos está previsto no caput do
art. 145 da Constituição Federal. Este direito, porém, pode
ser exercido de forma abusiva ou arbitrária, em desacordo
com as “cercas de proteção” que integram o Sistema Tribu-
tário Nacional para contenção do Estado e para garantia das
liberdades e direitos fundamentais do cidadão.
Não se está tratando de aspectos de inconstitucionalida-
de ou ilegalidade da norma de incidência tributária, mas sim
de atos administrativos, de natureza infralegal, que formu-
lam exigências fiscais em desconformidade com os textos
legais tributários. Ou seja, trata-se de atos administrativos
individuais e concretos que são ilegais e muitas vezes, por
conseqüência, também são inconstitucionais. Exclui-se, nes-
ta abordagem, a exigência de cumprimento de obrigações
acessórias não instituídas em lei.
Desse modo, adotam-se no presente trabalho os seguin-
tes conceitos:
a) invalidade: refere-se à inadequação ao Ordenamen-
to Jurídico de comandos de determinado texto norma-
tivo geral e abstrato, seja por inconstitucionalidade, seja
por ilegalidade; também são inválidos os atos adminis-
trativos concretos que não se adequem às normas de
hierarquia superior que pretendem regular ou executar;
b) abusividade: refere-se a ato administrativo indivi-
dual e concreto, que aplica legislação válida: (a) de
modo diferente do nela previsto; (b) a pessoa ou fato di-
ferentes dos nela previstos; e (c) irrazoavelmente ou
desproporcionalmente.
c) arbitrariedade: refere-se a ato administrativo indi-
Angelina Mariz de
vidual e concreto que impõe obrigação ou penalidade Oliveira
sem a existência de legislação (ainda que inválida) que é Advogada em
fundamente a exigência administrativa. São Paulo e Mestra
Não são objeto deste texto as questões relativas às inva- em Processo Civil
lidades das leis, mas sim à abusividade dos atos administra- pela PUC/SP.
tivos, dentro do âmbito tributário. Tratam-se de situações nas quais o servidor pú-
blico, a pretexto de fazer cumprir a legislação fiscal, faz exigências que excedem
aquelas previstas em lei - abusivamente. Saliente-se que não serão analisados aqueles
atos que formulam exigências que sequer são previstas nas normas gerais - caso em
que se configura a arbitrariedade.
São exemplares os casos (a) em que se condiciona a efetivação de atualizações
cadastrais ao pagamento de tributos vencidos; (b) em que se recusa a fornecer cer-
tidão de débitos, ainda que positiva; (c) em que se recusa a cumprir ordem judicial
que determina a inaplicabilidade de determinada norma; (d) em que se inscreve em
dívida ativa valores apurados sem a instauração ou término do procedimento admi-
nistrativo de lançamento; (e) em que durante processo de fiscalização é exigida a
apresentação de grande quantidade de documentos em prazo legal, mas exíguo; e
(f) ajuizamento de processo penal por crime de sonegação sem que tenha sido instau-
rado ou terminado o correspondente procedimento administrativo de lançamento.
Pode-se argumentar que atos abusivos, e mesmo os arbitrários, por serem ile-
gais, estariam fora do campo de incidência do Direito Tributário. Isto porque, den-
tro de uma interpretação literal e estrita da legislação, tributo é tão-somente “pres-
tação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que
não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada”1. Obrigação acessória tributária, por sua vez,
é definida pelo Direito positivo como aquela que “decorre da legislação tributária e
tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da
arrecadação ou da fiscalização dos tributos”2.
Nos aspectos teórico e lógico tal raciocínio é coerente. Não se adequa, no en-
tanto, à sistemática adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro que engloba den-
tro do Sistema Tributário Nacional todas as formas pelas quais o Estado, bem como
seus representantes e servidores, - a título de tributação -, busca retirar a proprieda-
de do patrimônio do cidadão em desconformidade com os limites objetivos estabe-
lecidos pela Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional; ou quando
incorpora regras que regulam o descumprimento destas normas por seus servidores.
Tal conclusão é verificável pela análise de inúmeros dispositivos normativos.
Como ilustração cita-se as proibições aos entes políticos de exigirem tributos sem
lei prévia que os estabeleça ou de “utilizar tributo com efeito de confisco”3. Ainda
existem previsões de aplicação de penalidades para os servidores que exijam o pa-
gamento de tributos indevidos ou por meios vexatórios4, bem como a possibilidade
de ser consignado judicialmente o tributo cujo recebimento foi condicionado pela
fiscalização ao cumprimento de outras obrigações tributárias5.
Esses são exemplos de situações de abuso do direito de exigir tributo ou o cum-
primento de deveres instrumentais. Ou seja, existe norma válida de instituição e

1
Código Tributário Nacional, art. 3º.
2
Código Tributário Nacional, art. 113, parágrafo 2º.
3
Constituição Federal, art. 150, incisos I e IV.
4
Código Penal, art. 316.
5
Código Tributário Nacional, art. 164, inciso I.
regulamentação de determinado tributo ou obrigação acessória, mas o servidor da
fiscalização aplica de forma excessiva, desproporcional, a norma geral e abstrata ao
caso concreto.
Analisemos com maior profundidade essas questões.

2. Abusividade na Tributação
Dentro da Teoria Geral do Direito é classificado como ato ilícito o exercício
desmesurado de um direito. A Lei nº 10.406/2002 inovou o Código Civil em seu
art. 187 ao classificar como ato ilícito “o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes”.
Esta norma não está regulando condutas realizadas contra legem, mas sim con-
dutas efetivadas de acordo com normas instituidoras de direitos, as quais são apli-
cadas de forma imoderada, de maneira que o resultado final seja diferente daquele
pretendido pela legislação. Está se afirmando que todos os direitos têm limites, não
basta a alegação de existência de direito positivado para que qualquer ato dele de-
corrente seja válido.
Esclareça-se que esta definição de abuso de direito está inserida no Código Ci-
vil, que é conjunto de normas destinado basicamente a regular relações de Direito
privado. A despeito disso, deve ser utilizada no âmbito tributário para definir o con-
teúdo legal deste instituto, por força do art. 109 do Código Tributário Nacional: “Os
princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do con-
teúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição
dos respectivos efeitos tributários.”
“É detectado um abuso”, define Marco Aurélio Greco, “quando o agente ultra-
passa (...) o destino social do direito e a proporção que deve existir entre a conduta
realizada em cotejo com o interesse do titular e o perfil do direito exercido. Há abuso
quando ocorre um desvio no perfil daquele direito. Quando o agente utiliza um di-
reito fora de sua função objetiva; ou seja, fora daquilo para o qual existe e serve.”6
Na lição de Moreira Alves, “o abuso de direito se caracteriza pelo exercício
egoístico, anormal do direito, sem motivos legítimos, com excessos intencionais ou
voluntários, dolosos ou culposos, nocivos a outrem, contrário ao critério econômi-
co e social do direito em geral”7. Completando sua análise com a observação de que
por tais atos serem caracterizados como ilícitos pelo Código Civil em vigor, é im-
posta responsabilidade ao autor pelas conseqüências produzidas pelo ato abusivo.
Marcelo Hermes Huck identifica a ocorrência de abuso de direito quando o exer-
cício de um direito fere bem ao qual é conferido maior valor jurídico. Em suas pa-
lavras: “o exercício abusivo de um direito caracterizar-se-ia quando houvesse coli-
são com outro direito que, sob a perspectiva do interesse social, merecesse uma
maior proteção”8.

6
Planejamento Fiscal e Interpretação da Lei Tributária, São Paulo, Dialética, 1998, p. 79.
7
“As Figuras Correlatas da Elisão Fiscal”, Revista Fórum de Direito Tributário nº 1, v. 1, jan/fev-2003, pp. 11-20.
8
Evasão e Elisão Fiscal, São Paulo, Saraiva, 1997, p. 146.
O direito de propriedade ilustra bem esta questão. A propriedade é direito fun-
damental citado no caput do art. 5º da Constituição Federal, não pode ser abolido
nem mesmo por emenda constitucional. Tal garantia tem por finalidade conferir
segurança jurídica à aquisição de bens que fornecem sustento, abrigo, amparo e
mesmo conforto aos seus proprietários, familiares, empregados etc.
Caso, porém, a propriedade seja utilizada de forma que retire segurança, susten-
to, abrigo, amparo a outros cidadãos, o direito a ela pode ser reduzido, chegando
mesmo à desapropriação. No âmbito tributário é prevista tributação mais onerosa
para as propriedades que não são usadas conforme sua função social9.
O abuso do exercício de direito pelo Estado, na utilização abusiva de seu poder,
é previsto já há algumas décadas no âmbito tributário. O Código Tributário Nacio-
nal, Lei nº 5.172/1966, no parágrafo único do art. 78 determina: “Considera-se re-
gular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competen-
te nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de
atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.”
Ao comentar tal dispositivo legal, Aliomar Baleeiro conclui que “o exercício do
poder de polícia cabe só à autoridade competente, restrito aos limites da lei, obser-
vado o processo, isto é, a forma legal. Isso nos casos de forma vinculada por lei.
Silente esta, de modo que se possa deduzir a competência discricionária, isto é, a
faculdade livre de a autoridade agir ou não agir, quando e como agir, ficará ela ads-
trita àquele exercício só para o fim público e do interesse social, sem desgarrar para
o abuso ou desvio de poder.”10
Na Ementa do Acórdão proferido no julgamento do Recurso Ordinário em Man-
dado de Segurança nº 19.820/SP, relatado pelo Ministro Luiz Fux e julgado pela
Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, consta a seguinte citação:
“O objeto do poder de polícia deve ser não somente lícito, mas idôneo e proporcional
à ameaça da ordem jurídica. Importando, via de regra, o poder de polícia em não res-
trições a direitos individuais, a sua utilização não deve ser excessiva ou desnecessá-
ria, de modo a não configurar um abuso de poder. Não basta a lei possibilitar a ação
coercitiva da autoridade para justificação do ato de polícia. É necessário, ainda, que
se objetivem as condições materiais que solicitem ou recomendem a sua invocação.”
(DJU I de 08/11/2007, p. 163)
A figura do abuso de poder é típico caso de abuso de direito. Isto porque o po-
der de agir, de determinado modo, é conferido ao órgão público pela lei, é legítima
a ação; no entanto, a atuação desproporcional ou em desacordo com a norma que
instituiu tal poder tem por conseqüência a invalidade do ato.

3. Elementos que caracterizam o Ato Administrativo não Abusivo


Da análise do Direito positivo acima transcrito (Código Tributário Nacional e
Código Civil), da doutrina citada e das decisões judiciais reproduzidas é possível
extrair os seguintes elementos necessários para aferir-se que determinado ato admi-
nistrativo não seja abusivo:

9
Constituição Federal, art. 182, parágrafo 4º, inciso II.
10
Direito Tributário Brasileiro, 11ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2007, p. 362.
I. Direito Positivo II. Doutrina e Jurisprudência
Adequação ao seu fim econômico Exercido dentro dos limites legais
Adequação ao seu fim social Exercido por autoridade competente
Adequação à boa-fé Exercido de acordo com a forma legal
Adequação aos bons costumes Respeito à função objetiva da norma
Respeito à finalidade pública da norma
Exercido conforme o interesse social
Exercido com idoneidade
Exercido com proporcionalidade
Estes elementos necessariamente devem ser observados pelo servidor ou admi-
nistrador público quando estipular deveres ao cidadão por meio de ato administra-
tivo proferido sem abuso de direito. Em outras palavras, para restringir a liberdade
total do cidadão - liberdade esta que é direito incluído como sobreprincípio no
preâmbulo da Constituição Federal11 -, é necessário que inúmeros requisitos sejam
cumpridos.
Analisemos, brevemente, as definições dos elementos em questão.

3.1. Adequação do ato administrativo a seu fim econômico


A tributação tem duas finalidades constitucionais: arrecadar recursos que per-
mitam a Administração Pública realizar as atividades de sua competência; e utili-
zar o ônus fiscal, ou a desoneração fiscal, como instrumento para implementação e
reforço às políticas públicas que visem a realização dos objetivos constitucionalmen-
te estipulados para a sociedade brasileira. São exemplos destas finalidades tributá-
rias os arts. 148, inciso I, e 146-A da Constituição Federal12.
Deste modo, todo ato administrativo - relativo à arrecadação, ao cumprimento
de obrigações acessórias, proferido em procedimentos administrativos ou no curso
de ações judiciais relacionadas a tributos - deve ser capaz de produzir ao seu final a
entrada de recursos nos cofres públicos. O ato que esteja desvinculado deste resul-
tado não preenche o requisito de estar adequado ao fim econômico que lhe foi dado
pela legislação, como, por exemplo, a arrecadação de recursos que são aplicados em
proveito pessoal do servidor ou do administrador público ou, o que é mais comum,
a arrecadação de contribuições sociais e destinação dos recursos a fins diferentes
daqueles determinados em lei.
Por último, cabe observar que a adequação do ato administrativo ao fim econô-
mico da norma que ele pretende executar está vinculada aos elementos identifica-
dos pela doutrina e jurisprudência tributárias como de respeito à função objetiva da
norma e de respeito à finalidade pública da norma.

11
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado
Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-
estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos (...).”
12
CF, art. 148: “A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender des-
pesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência.”
CF, art. 146-A: “Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir
desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objeti-
vo.”
3.2. Adequação do ato administrativo a seu fim e interesse social
A função social da tributação - o interesse social que a fundamenta - está vin-
culada aos princípios constitucionais da solidariedade e da capacidade contributi-
va. Ou seja, todos são responsáveis pela realização dos princípios fundamentais da
República do Brasil (segurança, erradicação da pobreza, educação, saúde etc.) de-
vendo contribuir com recursos para que o Estado possa coordenar e instituir ações
neste sentido. No entanto, a tributação não pode afetar de tal forma o patrimônio do
cidadão que o impeça de desenvolver com liberdade sua vida privada, profissional
e empresarial.
Quando se trata de capacidade contributiva, são elementos chaves a análise da
proporcionalidade entre os recursos auferidos pelo contribuinte e as despesas que
ele necessita assumir não apenas para se manter, mas que se destinem ao desenvol-
vimento de seu crescimento pessoal bem como das pessoas que dele dependem.
Neste aspecto, difere-se do confisco, pois pode haver tributação que não se adeque
ao conceito de confisco13, mas que atinja a capacidade contributiva do cidadão, im-
pedindo seu desenvolvimento e mesmo colocando em risco sua existência.
O ato administrativo cujo resultado não favoreça a função social da tributação
e que afete desmesuradamente a capacidade contributiva do contribuinte será abu-
sivo. Exemplares são os casos de lançamento de inúmeras multas pelo descumpri-
mento de uma mesma obrigação acessória, a despeito de o tributo vinculado à obri-
gação principal ter sido corretamente recolhido.

3.3. Adequação do ato administrativo à boa-fé e à idoneidade


Na esfera do Direito Tributário, a boa-fé se manifesta na relação entre servidor
público e contribuinte. Esta relacionada à previsibilidade dos atos administrativos,
o que significa que a fiscalização não pode adotar atos contraditórios, que surpreen-
dam o contribuinte, impedindo-o de agir adequadamente e com segurança. Ademais,
a boa-fé sempre se presume a favor do contribuinte, cabendo à fiscalização fazer
prova em contrário14.
A exigência de respeito à boa-fé no curso dos processos administrativos federais
está positivada no art. 2º, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 9.784/1999. Esta Lei
aplica-se aos processos fiscais federais subsidiariamente ao Decreto nº 70.235/1972.
O ato administrativo de lançamento de tributo, a despeito de anteriormente a
fiscalização ter sido encerrada formalmente informando o contribuinte de que sua
escrituração está correta, enquadra-se no conceito de abusivo por inadequação à boa-
fé que deve reger as atitudes da fiscalização. Outra situação recorrente é a descon-
sideração de informações e documentos apresentados pelo contribuinte sem emba-
samento em provas concretas.

13
“Resulta configurado o caráter confiscatório de determinado tributo, sempre que o efeito cumulativo - resultante das
múltiplas incidências tributárias estabelecidas pela mesma entidade estatal - afetar, substancialmente, de maneira ir-
razoável, o patrimônio e/ou os rendimentos do contribuinte.” (ADC-MC nº 8/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno,
DJU I de 04/04/2003)
14
“A boa-fé se presume em favor da contribuinte e a má-fé deste se prova.” (Acórdão nº 102-49093, Primeiro Conse-
lho de Contribuintes)
3.4. Adequação do ato administrativo aos bons costumes
A questão dos chamados “bons costumes” trata da forma como o servidor pú-
blico se dirige ao contribuinte. A Lei nº 9.784/1999 define como direito do cidadão
“ser tratado com respeito pelas autoridades e servidores” (art. 3º, inciso I), e esti-
pula como dever dos integrantes da Administração Pública “atuação segundo pa-
drões éticos de probidade, decoro e boa-fé” (art. 2º, parágrafo único, inciso IV).
Diz respeito a atos truculentos durante a fiscalização ou ao atendimento ríspido
ao contribuinte. Tais atitudes, ainda que visem apurar irregularidades, são abusivas,
mas não são atos administrativos propriamente ditos, a menos que sejam formali-
zadas por escrito ou provada sua ocorrência pelo cidadão lesado.

3.5. Respeito aos limites legais


É da essência do Direito Tributário o respeito à estrita legalidade, ou seja, o ci-
dadão só pode ser compelido a recolher quantia a título de tributo caso haja previ-
são legal perfeitamente adequada à competência tributária delimitada na Constitui-
ção Federal. Por outro lado, todos os atos administrativos - sem exceção - só podem
ser realizados se houver autorização legal, por força do art. 37 da Constituição Fe-
deral15. Desse modo, o ato concreto de cobrança de tributo ou de penalidade, bem
como de exigência de cumprimento de obrigação acessória, deve estar adequado aos
limites e elementos que integram as normas jurídicas tributárias.
Ato de lançamento de tributo apenas contra sócios de pessoa jurídica ativa, por
exemplo, é abusivo. Isto porque, se por um lado existe lei que determina o lança-
mento de tributo inadimplido, e norma que autoriza a cobrança de pessoas defini-
das como co-responsáveis pela legislação, por outro é preciso que primeiro sejam
esgotados os meios de cobrança contra o real devedor, que é a pessoa jurídica. Não
existe solidariedade legal imediata entre sociedade e seus quotistas para fins de tri-
butação. Assim, o lançamento tributário dirigido inicialmente somente contra os
sócios é abusivo, pois exerce o direito de cobrança fiscal de forma irregular.

3.6. Exercido por autoridade competente


O ato administrativo deve ser efetivado não apenas por autoridade competente
para realizá-lo, mas também dentro de sua competência material e territorial. Em
outras palavras, não basta apenas ser agente da fiscalização, é preciso que o servidor
esteja atuando nas funções para as quais foi designado e na área de sua jurisdição.
É abusivo o lançamento pelo fiscal aduaneiro de imposto de importação, exem-
plificativamente, em face de pessoa física sem prova de sua vinculação aos fatos
tributáveis. Apesar de haver lei válida regulando o tributo, a competência do servi-
dor é restrita às pessoas que comprovadamente estejam relacionadas ao comércio
exterior. Outro exemplo é a exigência de imposto predial do condomínio ou de par-
te dos condôminos, pela parcela inadimplida pelo incorporador ou por apenas um
dos condôminos16.

15
Constituição Federal: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Es-
tados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade (...).”
16
Neste sentido, vide os julgamentos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça nos Recursos Especiais nos 892.543/SC
e 1.056.719/DF.
3.7. Exercido de acordo com a forma legal
Todos os atos administrativos que têm o objetivo de exigir determinada atitude
do cidadão devem ser realizados nos formatos estipulados em lei. Normalmente
adota-se a forma escrita como meio para formalizar e comunicar a instituição de
obrigação individual e concreta.
A maioria dos atos administrativos, especialmente na esfera tributária, devem
preencher requisitos estabelecidos normativamente. As comunicações, por sua vez,
como intimações ou notificações, podem ser efetivadas por entrega de documento
escrito diretamente ao contribuinte ou a seu representante, por entrega através de
meio eletrônico, ou por publicação na imprensa oficial.
O Código Tributário Nacional, por exemplo, institui algumas formalidades que
devem ser seguidas pela autoridade administrativa relativas à fiscalização (art. 196),
à solicitação de informações (art. 197), e à inscrição em dívida ativa (art. 202). Já o
Decreto nº 70.235/1972, que regula o processo administrativo fiscal federal, estipula
em seu art. 2º as seguintes regras:
“Art. 2º Os atos e termos processuais, quando a lei não prescrever forma determinada,
conterão somente o indispensável à sua finalidade, sem espaço em branco, e sem en-
trelinhas, rasuras ou emendas não ressalvadas. Parágrafo único. Os atos e termos pro-
cessuais a que se refere o caput deste artigo poderão ser encaminhados de forma ele-
trônica ou apresentados em meio magnético ou equivalente, conforme disciplinado em
ato da administração tributária.”
Assim, é inválido um ato proferido em formato que não respeita a forma legal,
ou comunicado de modo não previsto pela lei. Neste sentido, o Código Tributário
Nacional, em seu art. 203, determina ser nula a inscrição em dívida ativa que não
respeite a forma e os requisitos determinados em lei.
Isso permite a conclusão de que, mesmo que seja devido tributo por contribuin-
te inadimplente, os atos de fiscalização e cobrança só podem ser realizados dentro
dos estritos limites e formas previstas na legislação. Por isso, exemplificativamen-
te, são abusivos os pedidos meramente verbais de apresentação de documentos ou
de prestação de esclarecimentos; bem como a quantificação de tributo e expedição
de guia de pagamento sem processo administrativo regular de apuração e lançamen-
to.

3.8. Exercido de acordo com proporcionalidade


Será proporcional o ato administrativo que impuser deveres, ônus ou sanções
adequados e necessários ao cumprimento das normas que pretende buscar o cum-
primento. Conforme conceito de Ricardo Mariz de Oliveira, o princípio da propor-
cionalidade está relacionado à “adequação da medida prevista em relação ao obje-
to visado, de maneira a evitar excessos e rigores desnecessários ao fim”17. Na ava-
liação da adequação de determinado ato ao princípio da proporcionalidade, afere-
se de que forma este atinge o direito do cidadão em comparação com o direito do
Estado de fiscalizar e tributar.

17
“Repetição do Indébito, Compensação e Ação Declaratória”, Repetição do Indébito e Compensação no Direito Tri-
butário, São Paulo, Dialética/Instituto Cearense de Estudos Tributários - Icet, 1999, pp. 355 e seg., sob coordenação
de Hugo de Brito Machado.
Durante o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.551, o Ple-
no do Supremo Tribunal Federal julgou questão de ordem na medida cautelar iden-
tificando em seu acórdão o fundamento constitucional do princípio da proporcio-
nalidade no art. 5º, inciso LIV, da Constituição Federal, e decidido que:
“Tributação e Ofensa ao Princípio da Proporcionalidade. (...) O princípio da proporcio-
nalidade, nesse contexto, acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do
Poder Público no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferi-
ção da própria constitucionalidade material dos atos estatais. A prerrogativa institucio-
nal de tributar, que o ordenamento positivo reconhece ao Estado, não lhe outorga o
poder de suprimir (ou de inviabilizar) direitos de caráter fundamental constitucional-
mente assegurados ao contribuinte. É que este dispõe, nos termos da própria Carta
Política, de um sistema de proteção destinado a ampará-lo contra eventuais excessos
cometidos pelo poder tributante ou, ainda, contra exigências irrazoáveis veiculadas em
diplomas normativos editados pelo Estado.”
(ADI nº 2.551 MC-QO, Rel. Min. Celso de Mello, DJU I de 20/04/2006)
A identificação da positivação do princípio da proporcionalidade no inciso LIV
do art. 5º da Constituição Federal decorre do devido processo legal material. Ao
analisar esta garantia constitucional, Nelson Nery Junior lembra que “já se identifi-
cou a garantia dos cidadãos contra os abusos do poder governamental, notadamen-
te pelo exercício do poder de polícia, como sendo manifestação do devido processo
legal”18.
Assim, quando o ato administrativo requer o cumprimento de determinado re-
quisito que é factualmente impossível ou que impede ao cidadão o exercício de seus
direitos fundamentais, ele é desproporcional. São casos concretos, já julgados pe-
las Cortes Superiores como atos desproporcionais, a exigência de depósito prévio
ou arrolamento de bens como condição de admissibilidade de recursos administra-
tivos de contribuintes19, e o lançamento de contribuição previdenciária sobre remu-
neração de função comissionada20.
Pode-se incluir também exemplos de casos envolvendo atos administrativos,
como aplicação de pena de exclusão de cadastro de contribuinte pelo inadimplemen-
to de tributos - com a conseqüente impossibilidade de exercer atividades econômi-
cas -; bem como a exigência de apresentação de duas cópias de toda a documenta-
ção contábil e de comprovantes de despesas e de recolhimento de tributos, dos últi-
mos cinco anos, no prazo de duas horas.
Saliente-se que todos os requisitos acima analisados devem estar contidos no ato
administrativo individual e concreto. A ausência de apenas um deles confere ao ato
a natureza de abusivo.

4. Enfrentando Atos Administrativos Abusivos no Âmbito Tributário


Estabelecidos os requisitos identificados pelo Direito positivo, pela jurisprudên-
cia e pela doutrina como necessários para que um ato administrativo não seja abu-
sivo, e expostos inúmeros exemplos de descumprimento destes elementos, passa-

18
Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 5ª ed., São Paulo, RT, 1999, p. 36.
19
ADI nº 1.976/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Pleno do STF, DJe de 17/05/2007.
20
RMS nº 21.842/GO, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma do STJ, DJe de 03/11/2008.
se à breve análise dos recursos legais que o cidadão dispõe para se defender do exer-
cício abusivo pelos integrantes da Administração Pública do direito estatal de tri-
butar.
Atos administrativos abusivos são nulos e passíveis de questionamento por meio
de reclamações e recursos na própria esfera administrativa. Caso o ato esteja con-
substanciado em lançamento tributário, a apresentação de defesa, via de regra, sus-
pende a exigibilidade do crédito até o julgamento da questão, por força do art. 151,
inciso III, do Código Tributário Nacional.
Ocorre que nem sempre as defesas do contribuinte são regularmente processa-
das, não sendo incomuns casos de prosseguimento dos atos de cobrança a despeito
de estar pendente de julgamento manifestação do cidadão autuado. Ademais, os atos
abusivos relativos ao cumprimento de obrigações diferentes do pagamento de im-
portâncias ao Estado não estão amparados pelo Código Tributário Nacional. Nes-
tas hipóteses, para se combater a abusividade com rapidez, antes mesmo de qual-
quer lançamento tributário ou da ocorrência de maiores prejuízos, é preciso recor-
rer ao amparo do Poder Judiciário.
No âmbito judicial, o instrumento processual específico para combater atos abu-
sivos, e justamente por isso o mais utilizado, é o mandado de segurança. A nature-
za desta ação constitucional é proteger o cidadão do “abuso de poder” praticado por
“autoridade pública”, de acordo com o art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Fede-
ral e com o art. 1º da Lei nº 1.533/1951. Esta ferramenta, porém, é limitada ao can-
celamento da força impositiva do ato abusivo, não admitindo que por meio dela tam-
bém seja requerido o ressarcimento dos prejuízos sofridos e a penalização da auto-
ridade coatora.
Deste modo, além da obtenção de ordem judicial determinando a suspensão dos
efeitos do ato abusivo, tem o cidadão direito reconhecido pelo art. 927 do Código
Civil de obter indenização pelos danos materiais - e mesmo por danos morais - que
tenha sofrido em decorrência do ato administrativo abusivo. Os danos devem ser
passíveis de comprovação documental, sendo possível inclusive que as despesas com
honorários advocatícios integrem o pedido de indenização por dano material.
Já para a responsabilização pessoal do agente público que agiu abusivamente ou
expediu atos normativos individuais e concretos abusivos, existe a possibilidade de
cominação de pena de multa e reclusão. Nesse sentido, o Decreto-lei nº 2.848/1940
- Código Penal -, tipifica como crime a utilização de “meio vexatório ou gravoso,
que a lei não autoriza” para a cobrança de tributos (art. 316, parágrafo 1º), forne-
cendo fundamento legal para o oferecimento de representação ao Ministério Públi-
co ou de apresentação de queixa.

5. Conclusão
O ato administrativo tributário, individual e concreto, não apenas está sujeito ao
princípio da estrita legalidade como também deve respeitar requisitos legais, dou-
trinários e jurisprudenciais para não ser abusivo. Assim, os atos relativos a procedi-
mentos de fiscalização, de lançamento, de cobrança, de exigência de cumprimento
de obrigações acessórias, de prestação de informações sobre o contribuinte, dentre
outros, deve estar adequado aos seguintes parâmetros:
- adequação ao seu fim econômico;
- adequação ao seu fim e interesse social;
- adequação à boa-fé e idoneidade;
- adequação aos bons costumes;
- exercido dentro dos limites legais;
- exercido por autoridade competente;
- exercido de acordo com a forma legal;
- exercido com proporcionalidade.
Caso o ato administrativo concreto, direcionado a determinado contribuinte não
se adeque simultaneamente a todos os requisitos ora analisados, ele se mostra abu-
sivo. Nesta hipótese, o contribuinte lesado tem os seguintes instrumentos para se
defender:
- recurso administrativo para obter a anulação do ato abusivo;
- mandado de segurança para impedir os efeitos do ato abusivo;
- ação indenizatória para obter ressarcimento pelos prejuízos sofridos;
- ação penal para obter a penalização pessoal do agente público.
A utilização de todos estes recursos pelo contribuinte lesado por ato abusivo não
apenas é seu direito - constitucionalmente garantido - como também é um dever. Isto
porque, para se obter a plena eficácia e vigor das garantias constitucionais, é preci-
so que o cidadão participe ativamente da defesa do Estado de Direito. A concreti-
zação na realidade dos direitos conquistados em 1988, com a Constituição Cidadã,
depende de cada um fazer sua parte, buscando a responsabilização daqueles que
abusam do poder estatal que lhes foi confiado, desviando-se das funções dos nobres
cargos nos quais foram investidos.
Da Duração Razoável do Processo
Administrativo Fiscal e seus Reflexos
na Prescrição Intercorrente e na
Fluência dos Juros de Mora
Célio Armando Janczeski

1. Introdução
Com a edição da Emenda Constitucional n. 45, de 8 de
dezembro de 2004, erigiu-se à garantia constitucional a ra-
zoável duração do processo judicial ou administrativo, pre-
conizando o inciso LXXVIII do art. 5º, que “a todos, no
âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade
de sua tramitação”.1 Assegurou-se ao cidadão a razoável du-
ração do processo administrativo, bem como a celeridade de
sua tramitação, de forma que qualquer violação ao seu pre-
ceito implica em conduta inconstitucional.
Para Sérgio André Rocha, o dispositivo constitucional
“estabelece tanto um direito fundamental a um processo ra-
zoável, que pode ser exercido em situações concretas em que
a desídia do julgador causar danos à parte, isso sem interme-
diação de qualquer ato legislativo ou administrativo, até
mesmo suscitando a responsabilização do Estado no caso de
seu descumprimento, como é também um princípio, a ser
concretizado pelo Legislativo e pelo Executivo”.2
É o que o autor denomina de natureza multidimensional
da norma constitucional.
Apesar da indeterminação e incerteza que decorre da
expressão razoável duração do processo, sua aplicação ao
processo administrativo fiscal diz respeito à inércia do jul-
gador administrativo em dar uma solução ao problema tra-
Célio Armando zido para deslinde. Como regra aplicável ao caso concreto,
Janczeski
é Advogado em
Santa Catarina,
Mestre em Direito e 1
Neste mesmo diapasão se colhe a orientação presente no item 1º do art. 8º da Con-
Professor de Direito venção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), que
Tributário da consigna que “toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e
dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e
Faculdade Mater Dei, imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação
da Escola Superior da penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de
OAB e da Escola caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza”.
2
Superior da ROCHA, Sérgio André. “Duração Razoável do Processo Administrativo Fiscal”.
Revista Dialética de Direito Tributário n. 142. São Paulo: Dialética, julho/2007,
Magistratura
p. 76. Explicita o autor sobre o inciso LXXVIII do art. 5º: “de um lado, trata-se de
do Estado de uma regra, passível de ser aplicada em dado caso concreto; de outro, é um princí-
Santa Catarina. pio, indicando um estado de coisas a ser alcançado”.
a interpretação e concretização do inciso LXXVIII do art. 5º da CF fica sob a alça-
da do Poder Judiciário, quando provocado para reparação de danos causados pela
inércia e, como princípio, indicando um estado de coisas a ser alcançado, fica su-
bordinado ao regramento a ser levado a efeito pelo Poder Legislativo.

2. Princípio da Efetividade
Mesmo sem a existência de um ato legislativo, o inciso LXXVIII do art. 5º não
estaria impedido de ser utilizado para a solução de controvérsias, aonde após a ava-
liação das condições do caso concreto pelo julgador, se emprestasse efetividade para
a norma maior. Não se pode olvidar, como lembra Canotilho, que o direito funda-
mental tem irradiação sobre o procedimento, devendo este ser conformado de for-
ma a assegurar a efetividade ótima do direito protegido.3
Ao intérprete, ao dar sentido à norma constitucional, na visão da jurisdição cons-
titucional contemporânea, volvida mais para a compreensão do que para a razão
lógica, de sentido formal, na aplicação da lei, não fica impedido de manusear os
princípios de forma a dar solução justa para o caso concreto.
O Princípio da Efetividade, também denominado Princípio da Eficiência ou da
Interpretação Efetiva, deve ser entendido como aquele em que entre as interpreta-
ções possíveis, deve se preferir aquela em que se reconheça maior efetividade à
norma constitucional, especialmente quando em discussão direitos fundamentais.
Toda norma constitucional, como norma jurídica superior, desempenha uma
função útil no ordenamento, razão pela qual sua interpretação não pode relevar à
mesma o destino de uma inutilidade ou diminuição de sua razão de ser. “A uma
norma fundamental tem de ser atribuído o sentido que mais eficácia lhe dê; a cada
norma constitucional é preciso conferir, ligada a todas as outras normas, o máximo
de capacidade de regulamentação.”4
O Princípio da Efetividade, segundo alguns, confunde-se com o Princípio da
Força Normativa da Constituição que, ao prestigiar sua máxima eficiência, deter-
mina influência à realidade fática do Estado que governa. Há que se ter em mente
também, que toda atividade de interpretação contempla algum grau de criação, ad-
mitindo-se alguma margem de criatividade ao intérprete, suprindo as lacunas da
norma como meio de garantir a plenitude do ordenamento.

3. O art. 24 da Lei n. 11.257/07


Em compasso com o inciso LXXVIII do art. 5º da CF, o art. 24 da Lei n. 11.257/07
estabeleceu que “é obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo
máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defe-
sas ou recursos administrativos do contribuinte”.
Apesar da previsão de um prazo certo para que a autoridade julgadora conclua
o julgamento, proferindo decisão administrativa, a lei deixou de realizar previsão
expressa acerca das conseqüências decorrentes do descumprimento do prazo legal.

3
CANOTILHO, J. J. Gomes. Tópicos sobre um Curso de Mestrado sobre Efeitos Fundamentais: Procedimentos, Pro-
cesso e Organização. Coimbra: Almedina, 1990, tópico 2.2.
4
MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo II. Coimbra: Editora Coimbra Ltda., 1983, p. 229.
Em sua redação original, o art. 24 tinha dois parágrafos que foram vetados, mas em
nenhum deles havia previsão de uma conseqüência jurídica expressa para a ultra-
passagem do prazo sem a decisão.5
Alguns entendem que, por não ter estipulado sanção expressa para o descum-
primento do prazo, o dispositivo seria inócuo e a sua inobservância não poderia gerar
conseqüências jurídicas. Ou seja, a regra não seria “bastante para a garantia de um
processo administrativo fiscal com uma duração razoável, sendo necessário que se
regulamente as conseqüências do descumprimento do prazo de 360 dias lá previsto
para que seja proferida a decisão administrativa”.6 Seria uma norma de mínima efi-
cácia, dependente de regulamentação para surtir efeitos.
Outros emprestam ao art. 24 da Lei n. 11.457/07 máxima eficácia, entendendo
que “a injustificada inobservância, nesta espécie de processo, da garantia da dura-
ção razoável, não pode deixar de gerar conseqüências para o Estado, a quem cabe
assegurar o seu andamento. Tal conseqüência há de traduzir-se na perda do direito
de arrecadar o crédito.”7
Há também aqueles que, inadmitindo a prescrição intercorrente no processo
administrativo fiscal, defendem com inspiração no parágrafo 2º do art. 161 do CTN
(que prevê a suspensão da fluência de juros de mora na pendência de consulta for-
mulada pelo devedor) que, ultrapassado o prazo do art. 24 da Lei n. 11.457/07, a
incidência de juros de mora seria suspensa desde o dia seguinte ao fim do prazo de
360 dias até o dia em que proferida a decisão cabível. Adiante o assunto é detalha-
do.
A visão que se propõe do inciso LXXVIII do art. 5º da CF em sintonia com o
art. 24 da Lei n. 11.257/07 vai além da mera reconstrução da vontade objetiva da
norma, para dar lugar a uma máxima eficiência dos dispositivos, inclusive integran-
do-se carências e lacunas, considerando-se os resultados a que se destina.

4. A Prescrição Intercorrente no Processo Administrativo Fiscal


A doutrina e a jurisprudência pátrias, de forma pacífica, admitem e reconhecem
a prescrição intercorrente na execução fiscal, sempre que o processo ficar paralisado
por mais de cinco anos, sem culpa do executado. Com a edição da Lei n. 11.051/04,
acrescentou-se o parágrafo 4º no art. 40 da Lei de Execuções Fiscais, que determi-
na que “se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescri-
cional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a
prescrição intercorrente e decretá-la de imediato”.
Como lembra Leonardo de Faria Galiano,
“a inspiração doutrinária da prescrição intercorrente remonta aos ensinamentos do
processualista Carnelutti, que já antevia as denominadas crises do procedimento, fe-

5
Previa o parágrafo 2º do art. 24, que restou vetado pelo Presidente da República, que haveria interrupção do prazo,
pelo período máximo de 120 dias, quando necessárias diligências administrativas e que não realizadas as diligências
neste prazo, o resultado delas presumiria-se favoráveis ao contribuinte.
6
ROCHA, Sérgio André. “Duração Razoável do Processo Administrativo Fiscal”. Op. cit., p. 80.
7
BOTTALLO, Eduardo Domingos. “Notas sobre a Aplicação do Princípio da Duração Razoável ao Processo Admi-
nistrativo Tributário”. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes Questões Atuais do Direito Tributário - 12º
volume. São Paulo: Dialética, 2008, p. 59. Defende o autor que o desrespeito à garantia da duração razoável permite
a ocorrência da prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal.
nômenos anormais que surgem no curso do procedimento e que lhe alteram a habitual
tramitação. E como o direito não tolera a incerteza no âmago das relações jurídicas,
com a perenização de conflitos insolúveis (o que atenta à própria razão de ser do di-
reito), a prática judiciária demandou a criação de mecanismos paliativos e de acomo-
dação para tais situações indesejadas.”8
É a punição da inércia dentro do processo.
A decretação da prescrição intercorrente no seio da execução fiscal, além de estar
harmônica com o sistema jurídico que não admite que a ação para a cobrança do
crédito tributário tenha prazo perpétuo, prestigia os princípios da segurança jurídi-
ca, da paz social e da prescritibilidade dos direitos patrimoniais. Igual raciocínio não
tem sido aplicado quando se trate de paralisação do processo administrativo fiscal,
mesmo que paralisado por mais de cinco anos, ainda que, para tanto, não tenha con-
corrido o sujeito passivo.
O fulcro para o não-reconhecimento da prescrição intercorrente no processo
administrativo fiscal decorre de antiga orientação do Supremo Tribunal Federal, que
decidiu que no intervalo entre a lavratura do auto de infração e a decisão definitiva
de recurso administrativo de que tenha se valido o contribuinte, não corre ainda o
prazo de prescrição.9 Não se enfrentou no precedente da Corte Maior, ao menos não
expressamente, se haveria ou não conseqüência a paralisação do processo adminis-
trativo por mais de cinco anos, nem havia na época da decisão dispositivo expresso
em determinar prazo para a decisão ser implementada. De qualquer maneira, os tri-
bunais fazendários têm repudiado a alegação de prescrição intercorrente no proces-
so administrativo.10
A matéria, como já se anunciou, tem gerado controvérsia na doutrina e tem re-
cebido tratamento divergente na jurisprudência, apesar de ainda se apresentar ma-

8
“Decadência e Prescrição”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Pesquisas Tributárias, Nova Série - 13.
São Paulo: RT, 2007, p. 467. No que diz respeito à prescrição intercorrente na esfera administrativa, o autor entende
que “em face da suspensão da exigibilidade do crédito tributário pela impugnação administrativa, não podendo o Fisco
demandar judicialmente o contribuinte por aquele crédito, eventual demora na análise da insurgência poderá ter qual-
quer repercussão, menos a decretação da prescrição intercorrente administrativa”.
9
STF, AgRAg n. 96.616/RJ, Rel. Min. Francisco Rezek, 2ª T., DJ 25.5.1984, p. 8.228, RTJ 110-02, p. 707. Na mesma
trilha segue o Superior tribunal de Justiça: “O recurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário,
enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, II, do CTN, desde o lançamento (efetuado
concomitantemente com o auto de infração), momento em que não se cogita do prazo decadencial, até seu julgamen-
to ou a revisão ex officio, sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão,
tem inicio a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência da prescrição intercorrente em sede de pro-
cesso administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica.” (REsp n. 840.111/RJ, Rel. Min. Luiz
Fux, 1ª T., DJe 1º.7.2009)
10
Determinam a Súmula n. 004/2003 do TIT/SP e a Súmula n. 11 do antigo Conselho de Contribuintes que “não é admis-
sível a prescrição intercorrente no Processo Administrativo Fiscal”. Neste sentido: “Processo Administrativo Fiscal -
Preliminar - Prescrição Intercorrente - No processo administrativo fiscal, não se configura a prescrição intercorrente.
Se o crédito está suspenso nos termos do inciso III do art. 151 do Código Tributário Nacional, não há de se falar em
prescrição. O prazo prescricional conta-se da constituição definitiva do crédito tributário, e esta só ocorre quando não
cabe recurso ou pelo transcurso do prazo.” (1º CC - Proc. n. 10882.000463/95-91 - Rec. 131.336 - (Ac. 104-19.410)
- 4ª C. - Relª Vera Cecília Mattos Vieira de Moraes - DOU 27.11.2003, p. 39)
“Normas Gerais de Direito Tributário - Extinção do Crédito Tributário - Prescrição Intercorrente - No processo ad-
ministrativo fiscal a prescrição intercorrente é matéria estranha. Enquanto pendente de recurso, nele não se fala em
prescrição. A contagem do prazo prescricional tem início com a ciência do contribuinte do encerramento do processo
administrativo. Precedentes do STJ e do STF.” (3º CC - Proc. n. 10825.001318/96-38 - Rec. n. 121.336 - (Ac. 303-32564)
- 3ª C. - Rel. Zenaldo Loibman - DOU 12.1.2006, p. 24)
joritárias as decisões negando o reconhecimento da prescrição intercorrente no pro-
cesso administrativo fiscal, que adota a orientação de precedentes conservadores,
negando qualquer conseqüência jurídica ao disposto no art. 24 da Lei n. 11.257/07.
Uma parte da doutrina apenas repete a antiga orientação do Supremo Tribunal
Federal, dando conta de que não há previsão expressa da possibilidade de decreta-
ção da prescrição intercorrente no processo administrativo, bem como que entre o
lançamento e a decisão definitiva administrativa não corre o prazo prescricional.11
Outra parte, em sentido oposto, entende que, independentemente de lei que conce-
da prazo para a decisão do processo administrativo, a aplicação do art. 5º, inciso
LXXXVIII, da CF e art. 155, parágrafo único, do CTN, autorizaria o reconhecimento
da prescrição intercorrente no processo administrativo, em vista da garantia de se-
gurança jurídica e como meio de assegurar a observância do princípio da oficiali-
dade.12
Também de se salientar a doutrina que considera inadequado se falar de um pra-
zo fixo e predeterminado para a conclusão de um processo administrativo, mas que
entende aplicável a prescrição intercorrente, sempre que entre um ato e outro, o pro-
cesso ficar paralisado por mais de cincos anos, afinal “se o fisco abandona o pro-
cesso por mais de cincos anos, já não se pode dizer que é o simples oferecimento
de uma impugnação que o está impedindo de propor a execução fiscal: é o abando-
no do processo - que implica a indevida não-apreciação da impugnação - que ense-
ja a demora na propositura da execução”.13
Curioso que, além daqueles que defendem a prescrição intercorrente no processo
administrativo fiscal e daqueles que clamam pela não-aplicação, há também aque-
les que reconhecem a dúvida, dando conta que a matéria deve ser repensada. Hum-
berto Martins, por exemplo, expressamente assevera que “por enquanto, nem somos
contra sua existência; nem a seu favor”.14 Vittorio Cassone não reconhece situações
em que seria possível a prescrição intercorrente no processo administrativo, mas

11
TORRES, Ricardo Lobo. “Decadência e Prescrição”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Pesquisas Tri-
butárias, Nova Série - 13. São Paulo: RT, 2007, p. 60. O artigo pode ter sido escrito antes da edição do art. 24 da Lei
n. 11.257/07, eis que o dispositivo não é citado. Neste contexto, o autor consigna que “inexistem no direito brasilei-
ro instrumentos para limitar em, no máximo, cinco anos o prazo para encerrar o processo administrativo tributário”.
12
SOUZA, Fátima Fernandes Rodrigues de. “Decadência e Prescrição”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.).
Pesquisas Tributárias, Nova Série - 13. São Paulo: RT, 2007, p. 141. É também o que defende Marilene Talarico
Martins Rodrigues: “Quanto à prescrição intercorrente no processo administrativo, pensamos que o art. 174 do CTN
permite a fluência do prazo prescricional no processo administrativo, que deverá ser solucionado no prazo de cinco
anos para constituição definitiva do crédito tributário, independetemente de estar suspensa a exigibilidade do crédi-
to tributário (art. 151, III, do CTN).” (Op. cit., p. 180)
13
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. “Decadência e Prescrição”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.).
Pesquisas Tributárias, Nova Série - 13. São Paulo: RT, 2007, p. 330. Neste sentido também a manifestação de Jorge
de Oliveira Vargas: “se o processo administrativo tributário ficar paralisado por mais de cinco anos, exclusivamente
por omissão injustificada do órgão julgador, ocorrerá a prescrição intercorrente, porém isto não significa dizer que
exista um prazo máximo de cinco anos para que o processo administrativo venha a ser encerrado” (Op. cit., p. 443).
14
MARTINS, Humberto. “Decadência e Prescrição”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Pesquisas Tribu-
tárias, Nova Série - 13. São Paulo: RT, 2007, p. 47. O autor, ministro do Superior Tribunal de Justiça, aduz: “Na
nossa atividade judicante, especialmente no STJ, ainda não deparamos com tal matéria; daí por que acreditamos que,
depois de acentuada meditação, poderemos formar um convencimento sólido que aponte uma solução satisfatória da
questão. Por enquanto, nada obstante as observações acima, ainda não temos opinião formada.” (Op. cit., p. 46)
consigna, por outro lado, que “não seria absurdo uma decisão que, em determinado
caso concreto, decretasse a prescrição intercorrente”. Registra na seqüência, ainda,
que não pode ser esquecido o princípio da legalidade, a impedir que o intérprete
substitua o legislador.15
Na jurisprudência, majoritariamente, as decisões negam o reconhecimento da
prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal, adotando a antiga orien-
tação de precedentes conservadores. Walmir Luiz Becker, em pesquisa realizada
antes da aparição no cenário nacional de norma que prevê prazo máximo para a
decisão administrativa, listava vários precedentes que, diante do princípio da mo-
ralidade administrativa consagrado no art. 37 da Constituição, aplicavam a prescri-
ção intercorrente no processo administrativo, ao enfoque de que mesmo se reconhe-
cendo que “durante a reclamação ou recurso administrativo, está suspensa a exigi-
bilidade do crédito administrativo, não correndo prescrição, quando se está diante
de incomum inércia, com a paralisação incompreensível do procedimento durante
sete anos, sob pena de aceitar a própria imprescritibilidade, não há como deixar de
reconhecer a prescrição”. 16 Após a introdução no cenário nacional do inciso
LXXVIII do art. 5º da CF e do art. 24 da Lei n. 11.257/07, não se conhecem prece-
dentes que tenham apreciado a matéria e expressamente inserido referidos disposi-
tivos em suas fundamentações.17

4.1. Os reflexos do art. 24 da Lei n. 11.257/07 na prescrição intercorrente do


Processo Administrativo Fiscal
Não se coaduna com o Direito a presença de direito patrimonial perpétuo, nem
se tolera a incerteza no âmago das relações jurídicas, com a perenização de confli-
tos insolúveis, como aduz Carnelutti, eis que contrário aos princípios da segurança
jurídica e da paz social. O art. 24 da Lei n. 11.257/07 tem reflexos na prescrição
intercorrente no Processo Administrativo Fiscal?
A prescrição tem por efeito direto e imediato extinguir ações, em virtude do seu
não-exercício durante um certo lapso de tempo, possuindo como causa eficiente a

15
CASSONE, Vittorio. “Decadência e Prescrição”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Pesquisas Tributá-
rias, Nova Série - 13. São Paulo: RT, 2007, p. 219. No artigo, referido autor anuncia a edição do art. 24, da Lei
n. 11.457/07, mas não retira dele nenhuma conseqüência jurídica prática.
16
TJRS, Apelação Cível n. 597200054, Rel. Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa. In: BECKER, Walmir Luiz. “A
Prescrição Intercorrente no Processo Administrativo Fiscal”. Revista de Estudos Tributários n. 18. Porto Alegre:
Síntese, ano III, março-abril de 2001, p. 22. Antigos precedentes já reconheciam a prescrição intercorrente no pro-
cesso administrativo: AC n. 89.0115715/MG, Rel. Eliana Calmon, TRF da 1ª Região, 4ª T., DJ 5.3.1990; AC
n. 950104474/MG, Rel. Eustáquio da Silveira, TRF da 1ª Região, 4ª T., DJ 9.10.1997; AC n. 940132383-6, Rel. Luiz
Airton de Carvalho, TRF da 1ª Região, 3ª T., j. 16.10.1998.
17
A jurisprudência atual segue apenas reprisando a idéia de que entre a lavratura do auto de infração e a decisão defini-
tiva de recurso administrativo de que tenha se valido o contribuinte, não corre ainda o prazo de prescrição, sem ex-
trair conseqüências práticas do disposto no inciso LXXVIII do art. 5º da CF e do art. 24 da Lei n. 11.257/07, os quais
sequer são lembrados. Neste sentido: “Prazo Prescricional. Pendência de recurso administrativo. Início do prazo ape-
nas com a notificação do contribuinte do resultado do recurso. Prescrição intercorrente. Inaplicabilidade em proces-
so administrativo fiscal. Recurso Especial a que se dá provimento.” (STJ, REsp n. 1.006.027/RS, Rel. Teori Albino
Zavascki, DJe 4.2.2009). No mesmo sentido: REsp n. 239.106/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi; REsp n. 32.843/SP,
Rel. Min. Adhemar Maciel; REsp n. 173.284/SP, Rel. Min. Franciulli Netto; REsp n. 784.353/RS, Rel. Min. Denise
Arruda, entre outros.
inércia do titular da ação, e seu fato perante o tempo.18 A prescrição é um castigo à
negligência do titular do direito que, devendo agir, permanece inerte.
Não há dúvida de que o direito sujeito a uma condição suspensiva (art. 151, in-
ciso III, do CTN) não tem existência atual e não é exigível, não podendo, portanto,
servir de fundamento de uma ação, razão pela qual não seria passível de prescrição,
uma vez que esta supõe, como condição elementar, uma ação exercitável: actioni
nondum natae non praescribitur. É sabido, no entanto, que não é toda causa de im-
possibilidade de agir que impede a prescrição, mas somente aquelas causas que se
fundam em um motivo de ordem jurídica, porque o Direito não pode contrapor-se
ao Direito, dando e tirando ao mesmo tempo.19
Se a condição suspensiva somente pudesse ser removida por ato de terceiro, não
se poderia exigir que o titular agisse antes da remoção da causa suspensiva mas,
naquelas hipóteses em que a condição suspensiva se mantém por ato do próprio ti-
tular do direito, o mesmo raciocínio não é aplicável.
Havendo como há, prazo definido para que o julgador profira decisão adminis-
trativa, enquanto o mesmo não estiver exaurido, não haverá mora da Administração
Fazendária, nem haverá inércia apta a dar início a contagem do prazo da prescrição
intercorrente. Ultrapassado aquele prazo, o julgador estará deixando de cumprir com
sua obrigação legal de proferir decisão, incorrendo em mora e inércia, já que a exis-
tência de uma ação exercitável e a remoção da causa que a impedia, dependem ex-
clusivamente da própria Fazenda, que não está nem acima, nem à margem da lei.
A eventual inércia da Administração Pública decorre da negligência desta, que
deve estar preparada para proferir decisão no processo administrativo no prazo da
lei, independente da complexidade da matéria abordada ou qualquer outro fato que
possa justificar a mora do julgador. Nem eventual culpa do sujeito passivo pode elas-
tecer o prazo de 360 dias estipulado no art. 24 da Lei n. 11.257/07, eis que, como
cabe à Administração a condução do processo, também a ela caberá regulamentar
os procedimentos e diligências necessários ao deslinde da causa, sem ultrapassar o
prazo legal.
Ultrapassado o prazo de 360 dias previsto para a prolação da decisão (art. 24 da
Lei n. 11.257/07), contados do “protocolo de petições, defesas ou recursos admi-
nistrativos do contribuinte”, inicia-se a contagem do prazo de cinco anos para a pres-
crição intercorrente no Processo Administrativo Fiscal. A razoabilidade preconiza-
da pelo disposto no inciso LXXVIII do art. 5º da CF, no entanto, deve orientar a
interpretação na contagem deste prazo de 360 dias, a fim de se alcançar novos 360
dias para o julgamento do processo, tanto em caso de recurso manejado pelo con-
tribuinte, como em caso de recurso de ofício ao Conselho Administrativo de Recur-
sos Fiscais. O mesmo raciocínio, de se estender mais 360 dias, deve ser implemen-

18
LEAL, Antonio Luis da Câmara. Da Prescrição e da Decadência. 4ª ed. atualizada por José de Aguiar Dias. Rio de
Janeiro: Forense, p. 8. Como esclarece o autor, “todo direito tem duas fontes: a lei, que o reconhece em tese; e o fato
que lhe dá nascimento. Uma vez adquirido pela verificação do fato, a que a lei atribui o efeito de gerá-lo, ele entra
para o poder de seu titular como faculdade de agir ( facultas agendi), podendo este exercê-lo segundo as normas e
dentro dos limites, traçados pela lei.” (Op. cit., pp. 20/21)
19
LEAL, Antonio Luis da Câmara. Da Prescrição e da Decadência. Op. cit., pp. 153/155.
tado caso a decisão do Conselho seja levada para apreciação da Câmara Superior
de Recursos Fiscais.20 Cada esfera deve obediência ao prazo de 360 dias trazidos pela
Lei, de modo que entre suspensões,21 com a paralisação do curso da prescrição e
prosseguimento quando cessada a causa que a determinou e retomada do curso an-
terior, haverá a contagem do prazo da prescrição intercorrente.

5. Os Juros de Mora e o art. 24 da Lei n. 11.257/07


É sabido que “se o devedor foi posto em mora, começaram desde esse momen-
to de correr os juros moratórios”,22 que são cumuláveis com a penalidade pecuniá-
ria, que possui cunho exclusivamente punitivo. Uma leitura apressada do caput do
art. 161 do CTN poderia levar o intérprete a concluir que independente do motivo
do não-pagamento do tributo no vencimento (“seja qual for o motivo determinante
da falta”), acarretaria no acréscimo de juros de mora. A regra prevista no parágrafo
2º do art. 161, no entanto, dá conta que a fluência de juros de mora “não se aplica
na pendência de consulta formulada pelo devedor dentro do prazo legal para paga-
mento do débito”, ou seja, naquelas hipóteses em que o sujeito passivo, em vista de
uma dúvida legítima sobre a legislação tributária, formula seu questionamento à
Fazenda Pública, não estará sujeito aos juros de mora caso a consulta seja desfavo-
rável.
Reconhece o CTN que havendo dúvida legítima sobre a legislação tributária,
proposta a consulta fiscal, haverá mora da Administração em vista de não ter sana-
do, por intermédio de algum diploma normativo, a omissão ou a falta de clareza da
norma aplicável. Como acertadamente observa Gabriel Lacerda Troianelli, a mora
objetiva do sujeito passivo em não pagar o tributo no prazo do vencimento é anula-
da pela mora da Administração por não sanar a dúvida legítima existente na legis-
lação, de forma que “as moras opostas, relativamente a um mesmo fato tributável,
anulam-se mutuamente”.23 E conclui o mesmo autor:
“Conquanto o contribuinte, em razão do não-pagamento do crédito impugnado, encon-
tre-se em mora, também o julgador administrativo, ao não decidir no prazo de 360 dias
legalmente estipulado, entrará em mora. Como a mora do sujeito passivo refere-se ao
crédito impugnado e a mora do julgador refere-se ao julgamento da contestação quanto
à certeza e liquidez desse mesmo crédito, existindo, portanto, mora recíproca sobre o
mesmo fato tributável, a mora do julgador tributário, enquanto persistir, anulará os

20
Eventual resolução do Conselho ou da Câmara Superior, determinando a baixa do processo para diligência não tem
o condão de fazer iniciar o prazo de 360 dias, eis que o prazo legal deve ser utilizado pelo julgador administrativo de
modo que a decisão seja proferida, independente dos incidentes processuais, previsíveis ou imprevisíveis, sob pena
de incorrer em mora.
21
“A suspensão paralisa, apenas, o curso da prescrição, de modo que, cessada a causa que a determinou, o seu curso
anterior prossegue; ao passo que a interrupção faz cessar o curso já iniciado e em andamento, não o paralisando,
apenas, de maneira que, cessada a causa interruptiva, o seu curso anterior não prossegue, mas se inicia um novo cur-
so, começando a correr novamente a prescrição.” (LEAL, Antonio Luis da Câmara. Da Prescrição e da Decadência.
Op. cit., p. 173)
22
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Tomo 24. Campinas: Bookseller, atualizado por Vilson Rodri-
gues Alves, 2003, p. 55.
23
TROIANELLI, Gabriel Lacerda. “O artigo 24 da Lei n. 11.457/07 como Causa Suspensiva da Fluência de Juros
Moratórios”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 161, São Paulo: Dialética, fevereiro/2009, p. 23.
efeitos da mora do sujeito passivo, ou seja, suspenderá a sua fluência até que seja pro-
ferida a decisão cabível.”24
Apesar do caráter compensatório dos juros de mora e que eles ordinariamente
são exigíveis e devidos no período que o crédito tributário estiver com sua exigibi-
lidade suspensa pela impugnação administrativa e mesmo sendo sabido que a co-
brança dos juros moratórios objetiva indenizar a Fazenda Pública (credora) pela
indisponibilidade do dinheiro na data prevista pela lei para o pagamento do tributo,
não se pode olvidar que a sua incidência por longa data pode acarretar, além da ins-
tabilidade dos negócios jurídicos do sujeito passivo,25 máculas aos princípios da
segurança jurídica e da paz social.
Extrapolando-se a mera reconstrução da vontade objetiva do inciso LXXVIII do
art. 5º da CF e do art. 24 da Lei n. 11.257/07 para dar lugar a uma máxima eficiên-
cia dos dispositivos, inclusive integrando-se carências e lacunas, considerando-se os
resultados a que se destina, não há dúvidas que com o afastamento da mora do su-
jeito passivo pela mora do julgador administrativo (na medida que as moras opos-
tas, decorrentes de um mesmo fato tributável, anulam-se mutuamente), não haverá
espaço para a fluência dos juros moratórios ultrapassados 360 dias sem que se pro-
fira decisão no Processo Administrativo Fiscal.
O mesmo raciocínio que se adota na contagem da prescrição intercorrente no
processo administrativo, também é aplicável na suspensão da fluência dos juros de
mora, ou seja, decorrido o prazo de 360 dias previsto para a prolação da decisão (art. 24
da Lei n. 11.257/07), contados do “protocolo de petições, defesas ou recursos ad-
ministrativos do contribuinte”, cessa a incidência dos juros de mora. Outros 360 dias
serão computados para o julgamento do processo, tanto em caso de recurso inter-
posto pelo contribuinte, como em caso de recurso de ofício ao Conselho Adminis-
trativo de Recursos Fiscais. Igualmente, de se estender mais 360 dias, caso a deci-
são do Conselho seja levada para apreciação da Câmara Superior de Recursos Fis-
cais. Cada esfera deve obediência ao prazo de 360 dias trazidos pela lei, suspenden-
do-se sua fluência a cada mora do julgador administrativo.26

24
TROIANELLI, Gabriel Lacerda. “O artigo 24 da Lei n. 11.457/07 como Causa Suspensiva da Fluência de Juros
Moratórios”. Op. cit., p. 24. Para o autor tal conseqüência de um lado preserva “o crédito tributário em sua integrida-
de; por outro, impede-se que a mora do julgador administrativo inflija ao sujeito passivo um ônus por fato do qual
não tem culpa, livrando o contribuinte da injusta situação de ver acumular contra si, anos a fio, altíssimos juros mo-
ratórios gerados pela demora no julgamento administrativo”.
25
Eventuais diligências requeridas pelo contribuinte ou complexidade na impugnação ao débito tributário não justifi-
cam prorrogação do prazo legal, nem podem ser consideradas como atitudes para protelar o feito, caso autorizadas
pela legislação processual, eis que como cabe a Administração a condução do processo, também a ela caberá regula-
mentar os procedimentos e diligências necessárias ao deslinde da causa, sem ultrapassar o prazo legal.
26
Sobre os efeitos da suspensão da fluência dos juros de mora, Gabriel Lacerda Troianelli apresenta situação prática
exemplificando: “depois da impugnação, a Delegacia de Julgamento decide em dezoito meses. Mantido o lançamento,
o sujeito passivo apresenta recurso voluntário, que é julgado quinze meses depois pelo Conselho de Contribuintes.
Nesse caso, os juros moratórios serão suspensos nos seis meses imediatamente anteriores ao julgamento de primeira
instância e nos três meses imediatamente anteriores ao julgamento de segunda instância, fluindo normalmente nos
outros períodos.” (“O artigo 24 da Lei n. 11.457/07 como Causa Suspensiva da Fluência de Juros Moratórios”. Op.
cit., p. 25)
6. Considerações Finais
Pelas razões despendidas acima, diante do disposto no inciso LXXVIII do art. 5º
da CF e do art. 24 da Lei n. 11.257/07, escudado pelo Princípio da Efetividade, que
orienta pela máxima eficiência dos dispositivos, inclusive autorizando a integração
de carências e lacunas, é possível se concluir que a prescrição intercorrente pode e
deve ser reconhecida no Processo Administrativo Fiscal, iniciando contagem após
ultrapassado o prazo de 360 dias, quando o julgador administrativo estará em mora
ao deixar de cumprir com sua obrigação legal de proferir decisão. A mesma mora
do julgador administrativo em proferir decisão no prazo legalmente determinado
também afasta a mora do sujeito passivo, que é anulada pela primeira, impedindo a
fluência dos juros moratórios e prestigiando-se, desta forma, o Princípio da Segu-
rança Jurídica e a paz social.
Serviços Gráficos para Livros, Jornais e
Periódicos: Imunidade Tributária?
Douglas Yamashita

I. Delimitação do Tema
Questão de enorme relevância à liberdade de expressão
é se os serviços gráficos de produção dos jornais, dos livros
e dos periódicos estão abrangidos pela respectiva imunida-
de descrita na Constituição Federal de 1988.
A liberdade de expressão é algo muito caro às socieda-
des democráticas. Para se constituir uma verdadeira demo-
cracia é necessário que a população possa se manifestar da
maneira que lhe aprouver sobre os fatos que impressionam,
comovem ou mobilizam.
Na história recente brasileira, viu-se o estrago que a cen-
sura fez. Sem informação, as pessoas não são capazes de
formar opinião. Um povo sem opinião e sem informação não
exerce seus direitos de forma íntegra e acaba deixando os
governos agirem como bem entenderem. Com os olhos ven-
dados, a população aplaudiu os feitos da ditadura militar,
apesar de toda tortura contra aqueles que, entre outras coi-
sas, queriam exercer o direito de se expressarem.
Diante deste histórico, o Constituinte de 1988, no intui-
to de proteger o direito à liberdade de expressão, deu aos li-
vros, aos jornais, aos periódicos e ao papel destinado à sua
impressão a imunidade tributária. Porém, tal norma pode ser
interpretada de várias maneiras, já que para a constituição de
um jornal, por exemplo, são necessários diversos insumos
além do papel destinado a sua impressão.
É bom dizer que o tema não pode ser dirimido com o
espírito instável do poeta Fernando Pessoa, que dizia: “tudo
é incerto e derradeiro/tudo é disperso, nada é inteiro/... hoje
és nevoeiro”.
Portanto, a solução jurídica não será respondida se a
Douglas Yamashita análise se pautar pelo nevoeiro do poeta português, mas sim
é Doutor em Direito
Econômico-Financeiro
invocar a concretude e clareza da escritora amada por nós
pela Universidade de brasileiros Cecília Meirelles, que aqui é pertinente trazer à
São Paulo, Master of baila a sua narração:
Laws (LL.M.) pela “Ou isto ou aquilo/ou se tem chuva ou não se tem sol/ou se
Universidade de tem sol ou não se tem chuva/ou se calça a luva e não se põe
Colônia, Alemanha, e o anel/ou se põe o anel e não se calça a luva!/quem sobe nos
Advogado. ares não fica no chão e quem fica no chão não sobe nos ares.”
II. A Imunidade Tributária de Livros, de Jornais e de Periódicos (artigo 150,
inciso VI, letra “d”, da Constituição Federal de 1988)
II.1. Previsão constitucional
Em apertada síntese, teceremos algumas considerações sobre o instituto da imu-
nidade tributária e que corroboram para um melhor entendimento acerca da aplica-
ção ou não à hipótese da imunidade tributária contida no inciso VI, letra “d”, do
artigo 150 da Constituição Federal, in verbis:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
(...)
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.”
A imunidade tributária é uma limitação constitucional ao poder de tributar e da
sua aplicação decorre que os bens descritos pela norma constitucional acima disposta
não podem sofrer tributação por qualquer daqueles entes (União, Estados, Distrito
Federal e Municípios).
Neste sentido, como assevera a doutrina1, apesar de o tributo ser elemento es-
sencial para a movimentação da máquina estatal, nosso ordenamento jurídico pre-
vê o instituto da imunidade consagrado em fundamentos extrajurídicos, atendendo
a orientação do poder constituinte em função das idéias políticas vigentes, preser-
vando, dessa forma, os valores políticos, religiosos, educacionais, sociais, culturais
e econômicos, todos eles fundamentais à sociedade brasileira. Logo, não se deve
considerar a imunidade tributária como um benefício ou como um favor fiscal, uma
renúncia à competência tributária ou um privilégio, mas, sim, uma forma de resguar-
dar e garantir os valores da comunidade e do indivíduo.
Desse modo, preceitua-se que, apesar da necessidade que o Estado tem de co-
brar impostos, o legislador entendeu que os objetos protegidos pelo instituto da
imunidade devem merecer um tratamento diferenciado em relação àqueles suscetí-
veis à tributação, pelos valores que aqueles disseminam numa sociedade política e
democraticamente organizada.
A imunidade tributária dos livros, dos jornais, dos periódicos e do papel desti-
nado a sua impressão foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro através do
artigo 31, letra “c”, da Magna Carta de 1946.
Na Constituição Federal de 1967, tanto em sua redação original, como na de-
corrente da Emenda Constitucional nº 1, de 1969, foram considerados imunes os
livros e os periódicos, assim como o papel destinado a sua impressão, em seu arti-
go 19, inciso III, letra “d”.
Por fim, a Constituição Federal de 1988 manteve, nos mesmos moldes anterio-
res, a imunidade tributária dos livros, dos jornais, dos periódicos e do papel desti-
nado a sua impressão no inciso VI, letra “d”, do artigo 150 supra transcrito.

1
TORRES, Ricardo Lobo. “Imunidades Tributárias”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Imunidades Tri-
butárias. Pesquisas Tributárias: Nova Série 4. São Paulo: RT, 1998, p. 209.
II.2. Tributos abrangidos pela imunidade
Nos estritos termos da redação do artigo 150, inciso VI, letra “d”, da CF/88 já
se pode reparar que sua vedação prevalece apenas em relação aos impostos, dela se
excluindo, portanto, as taxas e contribuições.
Desse modo, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS), por
serem impostos objetivos, têm a sua incidência barrada pela imunidade aplicável aos
jornais, aos livros, aos periódicos e ao papel ora examinada.
Em contrapartida, inexiste imunidade para os tributos subjetivamente inciden-
tes, como o Imposto de Renda, que recai sobre as disponibilidades financeiras de
autores, de editores, de empresas jornalísticas e de outras pessoas envolvidas com
o mundo das publicações.
Aliás, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou contra a extensão às con-
tribuições sociais da imunidade em questão tanto na Primeira quanto na Segunda
Turma:
“Agravo Regimental em Recurso Extraordinário. Tributário. Imunidade. Letra ‘d’ do
inciso VI do artigo 150 da Carta Magna. Pretendida Extensão à Cofins. Dispositivo
constitucional que, nos termos da jurisprudência desta excelsa Corte, diz respeito, uni-
camente, a impostos. Agravo desprovido.” (RE-AgR nº 325.302/RS de 20/06/2006, da
Primeira Turma - grifo nosso)

“Agravo Regimental no Recurso Extraordinário. Cofins. Imunidade. Livros. 1. A imu-


nidade tributária prevista na alínea ‘d’ do inciso VI do artigo 150 da Constituição do
Brasil não alcança as contribuições para a seguridade social, não obstante sua natu-
reza tributária, vez que imunidade diz respeito apenas a impostos. Precedentes. 2.
Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE-AgR nº 342.336/RS de 20/03/2007,
da Segunda Turma - grifo nosso)
Portanto, não há dúvida de que a imunidade tributária prevista na letra “d” do
inciso VI do artigo 150 da Constituição Federal de 1988 não alcança as contribui-
ções para a seguridade social, como o PIS ou a Cofins.

II.3. Alcance da expressão “livros, jornais, periódicos e do papel destinado a


impressão”
II.3.1. Considerações gerais
Entende-se que o artigo 150, inciso VI, letra “d”, da CF/88 visa proteger, atra-
vés da desoneração de todos os impostos, a livre manifestação do pensamento, a
divulgação da cultura e da informação e sua acessibilidade ao maior número possí-
vel de indivíduos, devendo considerar que a norma teve em vista universalizar o
conhecimento, o que serviria de parâmetro para a interpretação da regra inscrita na
Constituição.
As imunidades tributárias, previstas no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Cons-
tituição Federal, fundam-se no aspecto teleológico ou finalístico, pois a finalidade
da dispensa constitucional de impostos é a proteção da cultura e a divulgação de
informações em todo o território brasileiro, protegendo de forma peculiar, a livre
expressão do pensamento.
O saudoso Ministro Aliomar Baleeiro2 dispôs de forma brilhante acerca do tema,
preceituando que a imunidade tributária, constitucionalmente assegurada aos livros,
aos jornais, aos periódicos e ao papel destinado a sua impressão, nada mais é que
uma forma de viabilização de outros direitos e garantias fundamentais expressos
no artigo 5º da Constituição Federal, como a livre manifestação do pensamento, a
livre manifestação da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação.
Mais do que isso, essa imunidade, segundo o ilustre mestre, há de ser invocada como
instrumento imprescindível à realização do Estado Democrático de Direito, do qual
o pluralismo político, a crítica e a oposição são requisitos essenciais.
Logo, pode-se afirmar que, a imunidade aplicável aos livros, aos jornais, aos
periódicos e ao papel destinado a sua impressão, é instituto jurídico que protege
valores superiores e se traduz, nas lições de Baleeiro, em verdadeiro alicerce utili-
zado na construção de um autêntico regime democrático de um Estado de Direito,
cuja inobservância acarreta violação à própria liberdade de expressão.
Neste cenário que se encontra inserida a imunidade consignada no mencionado
artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal, proibindo-se, destarte, as
pessoas jurídicas de direito público de instituírem impostos sobre os livros, os jor-
nais, os periódicos e o papel destinado à sua impressão.
Então, qual o alcance desta imunidade? Restringe-se ao papel destinado à im-
pressão dos livros, dos jornais e dos periódicos ou amplia-se aos insumos utiliza-
dos na produção destes veículos de comunicação? É o que trataremos nos tópicos
que seguem.

II.3.2. Posição da doutrina


A doutrina e a jurisprudência divergem acerca do assunto em tela, no que se
refere ao alcance dessa imunidade tributária.
Alguns afirmam que a interpretação das imunidades tributárias dos livros, dos
jornais, dos periódicos e do papel destinado a sua impressão, deve ser feita de for-
ma objetiva e literal, diferentemente de outros que defendem a tese de que tal insti-
tuto deve ser interpretado de maneira ampla, segundo sua finalidade.
A corrente doutrinária literalista entende que a imunidade é objetiva, ou seja, o
livro, o jornal, o periódico e o papel destinado a sua impressão estão livres de tribu-
tação, independentemente do assunto, da moralidade do assunto ou da finalidade
perseguida dos objetos imunes, mediante a desoneração de impostos, pois o princí-
pio da isonomia não consente qualquer efeito discriminatório.
Intrigante questão diz respeito ao alcance da imunidade, ou seja, se estaria ela
jungida aos livros, aos jornais, aos periódicos e o papel destinado à sua impressão
ou se seria extensiva aos insumos utilizados na confecção dos mesmos, como tin-
tas para impressão e serviços gráficos.
Para a corrente finalística, deve-se adotar uma interpretação ampla, de modo que
a imunidade de periódicos livre da tributação de impostos qualquer insumo indis-

2
Direito Tributário Brasileiro. 11ª edição atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2007,
p. 149.
pensável à produção dos objetos imunes, abrangendo todo o material necessário a
sua confecção, sejam estes bens de uso ou consumo, bens do ativo fixo ou serviços
intrínsecos a sua confecção.
Intermediando as linhas de pensamento citadas, entendemos que as imunidades
tributárias previstas no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição Federal, de-
vem ser interpretadas extensivamente, mas balizadas pelo princípio da razoabilida-
de, analisando a substância e os interesses protegidos pela Constituição Federal.
Nosso entendimento também é no sentido de que se interpretará equivocadamen-
te o artigo 150, inciso VI, letra “d”, da CF/88 se ao invés de valorizar os direitos e
garantias constitucionais que a imunidade protege, se der ênfase à literalidade des-
se preceito, restringindo radicalmente a imunidade ao livro, ao jornal e aos periódi-
cos impressos em papel. A imunidade, para ser efetiva, abrange todo o material ne-
cessário à confecção do livro, do jornal ou do periódico. Não apenas o material con-
siderado, mas o conjunto e, devido a isso, nenhum imposto pode incidir sobre ser-
viços gráficos de produção desses objetos, que, latentemente, são insumos essen-
ciais a esses objetos da imunidade.
Neste contexto, a norma imunizadora deve ser interpretada amplamente, prin-
cipalmente se considerarmos que, do ponto de vista histórico, captado pela doutri-
na mencionada, a imunidade cada vez mais se afasta do suporte do livro, em papel,
para se fundamentar em sua função, qual seja, a de veículo de mídia escrita e a de
difusão do pensamento humano, como instrumento indispensável à realização do
Estado Democrático de Direito.

II.4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em torno da questão


Quanto à extensão da imunidade aos insumos utilizados na confecção dos livros,
jornais e periódicos, o STF, ainda sob a égide da antiga Constituição Federal, havia
pacificado entendimento de que a imunidade alcança também os serviços despen-
didos para a obtenção do resultado final da obra (livro, jornal e periódico), confor-
me consta da ementa do acórdão abaixo transcrito (RE nº 102.141/RJ de 18/10/1985,
Rel. Min. Carlos Madeira):
“Imunidade Tributária. Livro. Constituição, artigo 19, III, alínea d.
Em se tratando de norma constitucional relativa às imunidades tributárias genéricas,
admite-se a interpretação ampla, de modo a transparecerem os princípios e postulados
nela consagrados.
O livro, como objeto da imunidade tributária, não é apenas o produto acabado, mas
o conjunto de serviços que o realiza, desde a redação, até a revisão da obra, sem res-
trição dos valores que o formam e que a Constituição protege.” (Grifos nossos)
Seguindo essa linha jurisprudencial, o STF, no RE nº 174.476, no qual o Minis-
tro Marco Aurélio foi o relator para o acórdão (DJ de 12/12/1997), decidiu que:
“A razão de ser da imunidade prevista no texto constitucional, e nada surge sem uma
causa, uma razão suficiente, uma necessidade, está no interesse da sociedade em ver
afastados procedimentos, ainda que normatizados, capazes de inibir a produção ma-
terial e intelectual de livros, jornais e periódicos. O benefício constitucional alcança
não só o papel utilizado diretamente na confecção dos bens referidos como também
insumos nela consumidos como são os filmes e papéis fotográficos.” (Grifos nossos)
No mesmo RE nº 174.476, o Ministro Celso de Mello, em seu voto, diz ser in-
censurável a doutrina que em precisa abordagem do tema salienta, em síntese, que
a imunidade, para ser efetiva, abrange todos os meios necessários à confecção do
livro, do jornal ou do periódico.
Nesse diapasão, em 2003, o STF editou a Súmula nº 657 (não vinculante), se-
gundo a qual “a imunidade prevista no art. 150, VI, ‘d’, da Constituição Federal
abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à publicação de jornais e perió-
dicos”.
Lamentavelmente, decisões recentes do Supremo Tribunal Federal albergaram
entendimento restritivo desta Súmula e dessa imunidade, negando a extensão desta
aos serviços de composição gráfica, conforme se depreende das seguintes ementas
dos acórdãos:
“Não há de ser estendida a imunidade de impostos prevista no dispositivo constitu-
cional sob referência, concedida ao papel destinado exclusivamente à impressão de li-
vros, jornais e periódicos, aos serviços de composição gráfica necessários à confecção
do produto final.” (RE nº 230.782, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 13/06/2000,
DJ de 10/11/2000)

“Imunidade conferida pelo art. 150, VI, d da Constituição. Impossibilidade de ser es-
tendida a outros insumos não compreendidos no significado da expressão ‘papel des-
tinado à sua impressão’. Precedentes do Tribunal.” (RE nº 324.600-AgR, Rel. Min.
Ellen Gracie, julgamento em 03/09/2002, DJ de 25/10/2002)

“Esta Corte já firmou o entendimento (a título exemplificativo, nos RREE 190.761,


174.476, 203.859, 204.234, 178.863) de que apenas os materiais relacionados com o
papel - assim, papel fotográfico, inclusive para fotocomposição por laser, filmes foto-
gráficos, sensibilizados, não impressionados, para imagens monocromáticas e papel
para telefoto - estão abrangidos pela imunidade tributária prevista no artigo 150, VI,
‘d’, da Constituição. - No caso, trata-se de prestação de serviços de composição grá-
fica (confecção de fotolitos) (fls. 103) pela recorrida a editoras, razão por que o acór-
dão recorrido, por ter essa atividade como abrangida pela referida imunidade, e, por-
tanto, ser ela imune ao ISS, divergiu da jurisprudência desta Corte. Nesse sentido, em
caso análogo ao presente, o decidido por esta 1ª Turma no RE 230.782. Recurso ex-
traordinário conhecido e provido.” (RE nº 229.703, Rel. Min. Moreira Alves, julgamen-
to em 16/04/2002)
Corroboram também esse entendimento restrito (negativa de imunidade a insu-
mos distintos do papel), a Ministra Cármen Lúcia (AI nº 700.857/RJ, publicado no
DJ de 16/5/2008), o Ministro Menezes Direito (AI nº 711.846/RJ, publicado no DJ de
23/09/2008), Ministro Eros Grau (RE nº 285.870/SP, publicado no DJ de 03/02/2005),
Ministro Gilmar Mendes (AI nº 468.900 AgR/RS, publicado no DJ de 24/03/2006)
e o Ministro Cezar Peluso (RE nº 524.262/RJ, publicado no DJ de 20/03/2007).
Vale salientar que, da análise dos acórdãos mencionados, conclui-se que, dos 11
Ministros que atualmente compõem o Supremo Tribunal Federal, dois (Ministros
Marco Aurélio e Celso de Mello) entendem que a imunidade alcançaria os serviços
de composição gráfica, três não se manifestaram claramente sobre a questão e seis
Ministros adotam o entendimento restritivo, contrário à imunidade dos serviços de
composição gráfica de periódicos.
Nesse contexto, no STF o prognóstico de perda ou contingenciamento fiscal
relativo à tese da imunidade dos serviços gráficos de revistas é, atualmente, prová-
vel. Porém, a confirmação favorável dos três votos desconhecidos e a mudança de
convencimento de apenas um Ministro poderia inverter essa previsão.
Assim, na contramão da doutrina e de sua própria jurisprudência, a corrente
majoritária na Suprema Corte brasileira tem entendido que os serviços de impres-
são e composição que as empresas gráficas realizam sob encomenda de livros, jor-
nais e periódicos não estão inseridos na imunidade, sendo somente tocado pela
imunidade o papel destinado à impressão. Nessas decisões, portanto, o entendimento
do Supremo Tribunal Federal foi pela impossibilidade de uma interpretação exten-
siva ao preceito constitucional, consagrando o entendimento restritivo sobre a ma-
téria.
A conseqüência destes julgados é altamente prejudicial ao instituto da imuni-
dade, tendo em vista que o instituto não comporta restrição, em face de seu caráter
objetivo e incondicionado e, principalmente, em razão do bem maior que visa pro-
teger: a liberdade de expressão e a cultura.
Entendemos que os posicionamentos restritivos do Supremo Tribunal Federal,
a toda evidência, não tornam a questão pacífica naquela Corte, tendo em vista, in-
clusive, as várias decisões divergentes, como a extensão da imunidade à impressão
e à composição gráfica, que, prolatadas à luz da Constituição Federal anterior, de-
bruçaram-se sobre texto absolutamente idêntico ao da Constituição Federal ora vi-
gente.
Por tal razão, entendemos que a matéria ainda comporta discussão e que atra-
vés da atuação combativa da doutrina, poderá ser restabelecida a plenitude da ga-
rantia constitucional retratada na imunidade veiculada no artigo 150, inciso VI, le-
tra “d”, da Constituição vigente.

III. Conclusão
Por tudo quanto até aqui exposto e demonstrado, conclui-se que:
i) a imunidade artigo 150, inciso VI, letra “d”, da CF/88, refere-se apenas a im-
postos, ou seja, não se aplica taxas ou contribuições sociais como a CSLL, o
PIS e a Cofins. Os impostos abrangidos são o IPI, o ISS e o ICMS por serem
impostos objetivos, inexistindo imunidade para os tributos subjetivos, tal como
o Imposto de Renda;
ii) apesar de a corrente majoritária no Supremo Tribunal Federal ser contrária
à imunidade dos serviços gráficos para revistas com base no artigo 150, inci-
so VI, letra “d”, da CF/88, decisões divergentes desse entendimento ainda per-
mitem concluir que a questão não tem interpretação unânime nessa Suprema
Corte, havendo margem para sua reversão no futuro.
A Prescrição da Ação Judicial Voltada
à Restituição de Indébito tem Fluência
desde o Pagamento Indevido, mesmo
quando o Sujeito Passivo apresenta
Pedido Administrativo de Restituição?
Análise do Tema à Luz de Decisões do
Superior Tribunal de Justiça
Fabiana Carsoni A. Fernandes da Silva

1. Considerações Iniciais
O sujeito passivo que efetua o recolhimento de tributo
indevido, ou a maior que o devido, faz jus à sua restituição,
podendo exercer tal direito por um dos seguintes meios: ou
ingressar com medida judicial tendente a resguardar a resti-
tuição tributária e, sendo possível, ainda assegurar o direito
à compensação do indébito, ou requerer administrativamen-
te, perante a autoridade competente, a restituição dos valo-
res recolhidos a maior ou indevidamente, seja em espécie,
seja mediante compensação, neste caso, quando a legislação
tributária o permitir.
No que atine à segunda opção apontada acima, há uma
série de decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Jus-
tiça no sentido de que “o pedido administrativo não inter-
rompe o prazo prescricional”.
E é por conta da existência destas decisões que será ana-
lisado, por meio do presente estudo, se o pedido administra-
tivo de restituição é meio apto ao exercício do direito de rea-
ver indébitos tributários, ou se tal assertiva teria sofrido tem-
peros quando submetida à apreciação daquele Tribunal.
Mais do que isto, o escopo do presente trabalho é tam-
bém examinar se o indeferimento do direito creditório, ocor-
rido administrativamente após decorrido o prazo para a re-
petição do indébito, obsta a propositura de ação judicial com
tal mister, em virtude da ocorrência de prescrição. Esta, vale
dizer, é a conclusão que, a uma primeira vista, resulta da
análise de ementas de acórdãos do Superior Tribunal de Jus-
tiça, das quais consta que “o pedido administrativo não in-
terrompe o prazo prescricional”, como dito acima, embora, Fabiana Carsoni A.
para se ter a exata dimensão do entendimento deste Tribu- Fernandes da Silva
nal sobre a questão, faz-se necessário perscrutar o inteiro é Advogada em
teor de cada uma delas, o que será realizado adiante. São Paulo.
Iniciarei este estudo a partir de apontamentos necessários à condução do tema,
relativos à repetição de indébitos tributários, após o que serão analisadas as deci-
sões do Superior Tribunal de Justiça, acima mencionadas. Vejamos.

2. A Restituição do Indébito, o Prazo para sua Realização e a Opção pelo


Requerimento Administrativo
O direito à restituição do tributo pago indevidamente vem estampado no “ca-
put”, do artigo 165, do Código Tributário Nacional, consoante o qual “O sujeito
passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou
parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento (...)”, mas não se
origina daí, encontrando, antes, respaldo no próprio texto constitucional, em espe-
cial quando trata do princípio da legalidade, que, dentre outras coisas, somente per-
mite a exigência de tributo quando tal decorrer da subsunção do fato à norma legal
tributária, de modo que a exação paga pelo sujeito passivo além dos limites quanti-
tativos estatuídos na legislação tributária, ou com base em norma inválida, por exem-
plo, torna-se passível de restituição.
De acordo com o artigo 168, inciso I, do Código Tributário Nacional, o prazo
para que o sujeito passivo pleiteie a restituição do indébito tributário é de cinco anos,
contados da extinção do crédito tributário, quando se tratar de pagamento indevido
ou maior que o devido.
Embora não seja objeto deste trabalho, cabe dizer que, no que atine aos tributos
sujeitos ao lançamento por homologação, o Superior Tribunal de Justiça consagrou
o entendimento de que o sujeito passivo possui 10 anos para requerer sua restitui-
ção, na hipótese de haver pagamento indevido ou a maior, porque, neste caso, o prazo
do mencionado artigo 168, inciso I, somente tem fluência uma vez decorrido o pra-
zo qüinqüenal previsto no artigo 150, parágrafo 4º, do Código Tributário Nacional,
desde que não ocorrida homologação expressa do lançamento por parte das autori-
dades fiscais, tampouco dolo, fraude ou simulação do sujeito passivo.
No entanto, essa sistemática foi alterada com a edição da Lei Complementar
n. 118, de 8 de fevereiro de 2005, que, em seu artigo 3º, em contraposição ao en-
tendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, e com nítido propósito de re-
verter, pela via legislativa, tal posicionamento jurisprudencial, estabeleceu que:
“Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172, de 25 de
outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre,
no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento
antecipado de que trata o parágrafo 1º do art. 150 da referida Lei.”
Pior do que prever uma regra em tal sentindo, contrariando a firme orientação
do Superior Tribunal de Justiça, a quem incumbe a uniformização da interpretação
da legislação federal, foi ter a Lei Complementar n. 118, em seu artigo 4º, segunda
parte, atribuído ao seu artigo 3º foros de norma interpretativa e, ainda, determina-
do, expressamente, a aplicação do artigo 106, inciso I, do Código Tributário Nacio-
nal, que permite a retroatividade da lei “em qualquer caso, quando seja expressa-
mente interpretativa”.
Não obstante isso, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça julgou o
artigo 4º, segunda parte, da Lei Complementar n. 118, inconstitucional e, pois, im-
pediu a retroação do artigo 3º da mesma Lei Complementar n. 118, sob o fundamen-
to de que houve ofensa aos princípios da autonomia, da independência dos poderes
e da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada, em
razão, de um modo geral, de se tratar de norma nova, que inovou no ordenamento
jurídico, e não norma de cunho interpretativo, ainda que a Lei Complementar as-
sim o tenha declarado1 (AI nos EREsp n. 644.736/PE)2.
Firmadas essas premissas em relação ao prazo de que dispõe o sujeito passivo
para pleitear a restituição do indébito, é importante dizer que o artigo 168 do Códi-
go Tributário Nacional, assim como o artigo 150, parágrafo 4º, do mesmo “Codex”,
em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação - mas, neste caso,
obedecida a regra de transição firmada pelo Superior Tribunal de Justiça - norteiam
a restituição do indébito tributário, tenha ela se iniciado na esfera administrativa, ou
na judicial.
Significa dizer que o contribuinte deve requerer a restituição do tributo pago
indevidamente por uma ou por outra via no prazo assinalado pela legislação tribu-
tária, sob pena de perda deste direito.
Realmente, o prazo, que é decadencial3, para que o sujeito passivo manifeste seu
intento de reaver tributo pago indevidamente, seja na esfera administrativa, seja na
judicial, é o do artigo 168 do Código Tributário Nacional, sem prejuízo de sua apli-
cação conjunta com o artigo 150, parágrafo 4º, quando for o caso, não havendo ne-
nhuma regra que imponha a escolha de uma dessas vias, em detrimento da outra.
E nem poderia haver regra obstando a opção pela via administrativa, ou pela
judicial, na medida em que o direito ao acesso a uma, ou a outra via, decorre do
próprio texto constitucional que, de um lado, assegura em seu artigo 5º, inciso
XXXV, a inafastabilidade da jurisdição, ao estatuir que “a lei não excluirá da apre-

1
A questão afeta à inconstitucionalidade do artigo 4º, segunda parte, da Lei Complementar n. 118 foi submetida à
apreciação do Supremo Tribunal Federal, perante o qual ainda aguarda julgamento.
2
A partir da manifestação da Corte Especial, foi também estabelecida uma regra de transição para a aplicação da nova
norma de contagem do prazo de restituição dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, nos seguintes ter-
mos: “com o advento da LC 118/05, a prescrição, do ponto de vista prático, deve ser contada da seguinte forma: re-
lativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a ação de
repetição de indébito é de cinco anos a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a
prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar
da vigência da lei nova”, conforme extraído do voto do Relator Ministro Teori Albino Zavascki (AI nos EREsp
n. 644.736/PE - destaquei).
3
Não há consenso na doutrina acerca da natureza, se prescricional, ou decadencial, do referido prazo. José Eduardo
Soares de Melo, por exemplo, entende que tal prazo é prescricional (“Repetição do Indébito e Compensação”, Repe-
tição do Indébito e Compensação no Direito Tributário. Coordenador: Hugo de Brito Machado, co-edição de Dialé-
tica e ICET, São Paulo e Fortaleza, 1999, p. 238).
Existem várias decisões dos Tribunais Regionais Federais do País dizendo que o prazo do artigo 168 do Código Tri-
butário Nacional é decadencial. O Superior Tribunal de Justiça, na atualidade, tem se inclinado a dizer que tal prazo
é prescricional (AgRg no REsp n. 1.089.646-RS, julgado em 5.3.2009; e REsp n. 963.352-PR, julgado em 21.10.2008),
embora haja várias decisões deste Tribunal, de anos anteriores, aludindo à decadência (REsp n. 174.743-MG, julga-
do em 18.8.1998 e REsp n. 44265-6-RS, julgado em 8.6.1994, por exemplo).
Já na seara administrativa, há uma série de decisões do antigo Conselho de Contribuintes, atual Conselho Adminis-
trativo de Recursos Fiscais, dizendo que o prazo para se pleitear a restituição do indébito é de natureza decadencial,
valendo citar, a título exemplificativo, os Acórdãos ns. 104-21922, de 21.9.2006, da 4ª Câmara do 1º Conselho;
203-12592, de 21.11.2007, da 3ª Câmara do 2º Conselho; 303-35575, de 13.8.2008, da 3ª Câmara do 3º Conselho; e
106-14316, de 11.11.2004, da 6ª Câmara do 1º Conselho.
ciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, e que, de outro, assegura ao
sujeito passivo tributário, também no artigo 5º, agora em seu inciso LV, o conten-
cioso administrativo, cujo esgotamento não é condição para a propositura de ação
judicial.
Paulo Cesar Conrado disse haver três possibilidades de o contribuinte postular
a restituição de tributo pago indevidamente: a via judicial, a via administrativa e uma
via que ele chamou de “extra-estatal”, que nada mais é do que o registro contábil
do pagamento indevido, com a subseqüente compensação do crédito daí oriundo
com débito do contribuinte. A propósito das duas primeiras vias, que interessam ao
presente trabalho, disse o magistrado federal:
“No primeiro caso (da via judicial), a constituição do fato do pagamento indevido e
da respectiva relação de débito do fisco depende da formulação, pelo contribuinte, de
pretensão perante o Judiciário, aplicando-se, aqui, o conceito de petição inicial (ins-
trumento que esgota a atividade enunciativa inaugural a que antes aludimos).

No segundo caso (da via administrativa), a constituição daquele mesmo fato e da cor-
relata relação depende da formulação, também pelo contribuinte, de pretensão peran-
te a Administração, funcionando o respectivo requerimento como instrumento que
esgota a mesma atividade enunciativa inaugural já referida.”4
Ricardo Mariz de Oliveira, em estudo a respeito da repetição do indébito tribu-
tário, ao falar da natureza decadencial do prazo para reaver tributo pago indevida-
mente, originada do artigo 168 do Código Tributário Nacional, tratou da possibili-
dade de o sujeito passivo optar pela via administrativa, ou judicial, com vistas à res-
tituição do indébito, não tendo esta ou aquela opção o condão de transmudar a na-
tureza daquele prazo, consoante se infere da leitura do seguinte trecho daquele es-
tudo:
“(...) verifica-se que o CTN está estabelecendo um prazo de decadência para o exercí-
cio do próprio direito à restituição, inclusive ao tratá-lo como ‘direito de pleitear a res-
tituição’, e não como prescrição do direito de ação para torná-lo efetivo. Sendo assim,
o prazo decadencial operar-se-ia quer para o pleito administrativo, quer para o ingres-
so direto em juízo, e neste último caso, decaído o direito, não haveria mais que falar
em prescrição para obter a satisfação de um direito já inexistente, e, portanto, inexigí-
vel. E o art. 169 trataria de prazo de prescrição de ação em tendo havido prévio pedi-
do administrativo, este exercido antes de se extinguir o direito pela decadência.”5
A propósito do artigo 169 do Código Tributário Nacional, citado no excerto
acima transcrito, e cujo “caput” diz prescrever “em dois anos a ação anulatória da
decisão administrativa que denegar a restituição”, há duas considerações importan-
tes a serem feitas.
A primeira delas é que o Código Tributário Nacional, ao prever prazo prescri-
cional para a ação anulatória da decisão que indeferir a restituição administrativa-
mente, não estabeleceu como condição de acesso ao Poder Judiciário o prévio es-

4
“Repetição do Indébito Tributário: Definição, Condições e Efeitos”, Repetição do Indébito Tributário. Coordena-
dor: Guilherme Cezaroti, Quartier Latin, São Paulo, 2005, p. 15.
5
“Repetição do Indébito, Compensação e Ação Declaratória”, Repetição do Indébito e Compensação no Direito Tri-
butário. Coordenador: Hugo de Brito Machado, co-edição de Dialética e ICET, São Paulo e Fortaleza, 1999, p. 364.
gotamento da via administrativa. E seria no mínimo estranho se o tivesse feito. É
que o sujeito passivo não está vinculado à apresentação de pedido administrativo de
restituição, sendo, isto sim, uma faculdade sua o ingresso na esfera administrativa,
como, de resto, há muito se firmou a jurisprudência de nossos Tribunais sobre o
tema.
Daí que, e é daqui que advém a segunda consideração a ser feita, somente quan-
do o sujeito passivo tiver, espontaneamente, apresentado pedido administrativo de
restituição, e negada esta, também na esfera administrativa, é que se poderá cogitar
da aplicação do artigo 169 do Código Tributário Nacional. Não só: o artigo 169
apenas tem lugar na hipótese de o sujeito passivo intentar ação anulatória em face
da decisão que denegar o direito creditório, de tal sorte que qualquer outra modali-
dade de ação judicial, ou eventual ação judicial com diferente mister, não terá sua
prescrição regida pelo mencionado dispositivo legal, porque ele trata de uma situa-
ção específica, própria dos casos em que há negativa, por parte das autoridades fis-
cais, do pedido administrativo de restituição, por meio de decisão cuja anulação
constitui o objeto da ação judicial referida no artigo 169.
Exemplificando para melhor compreensão do que foi dito, suponha-se que cer-
to contribuinte, observado o prazo decadencial do artigo 168 do Código Tributário
Nacional - e, quando for o caso, o prazo deste dispositivo somado àquele do artigo
150, parágrafo 4º, do mesmo diploma legal - tenha apresentado pedido administra-
tivo de restituição e, após decisão administrativa final, o direito creditório não lhe
tenha sido assegurado.
Se, em até dois anos da intimação desta decisão denegatória6 e, ainda, nos ter-
mos do prazo prescricional estatuído no artigo 169 do Código Tributário Nacional,
o contribuinte propuser ação anulatória desta mesma decisão, resguardado estará o
seu direito de ação (artigo 169), precisamente o seu direito de intentar ação anula-
tória com vistas à anulação da decisão administrativa denegatória da restituição,
assim como resguardado estará seu direito creditório contra a decadência, porque
apresentado pedido administrativo dentro do prazo legal para a tomada de tal me-
dida (artigo 168 e, eventualmente, artigo 150, parágrafo 4º).
Mas, se antes ou depois da prolação de decisão administrativa denegando a res-
tituição pleiteada mediante requerimento dirigido à Administração Fazendária, esse
mesmo contribuinte vier a intentar ação judicial visando à repetição do indébito, ele
o deverá fazer com observância do artigo 168 do Código Tributário Nacional - e, a
depender da circunstância, observando também o artigo 150, parágrafo 4º. Isto por-
que, nesta situação, o requerimento administrativo de restituição não terá o condão
de resguardar o direito creditório contra a decadência, pois, ao ingressar com ação
de repetição de indébito, o contribuinte pratica um ato incompatível com o proce-
dimento anterior, de apresentação de pedido administrativo de restituição, isto é, um
ato do qual redunda o abandono de tal procedimento, já que esta medida judicial

6
O esgotamento da via administrativa não é condição para o ajuizamento da ação. É possível a propositura desta em
face de decisão contra a qual ainda caiba recurso administrativamente. Mas, uma vez intentada a ação, a discussão
administrativa fica superada, havendo renúncia a esta esfera.
visará ao reconhecimento da existência, inclusive pela não caducidade, do direito
creditório, não se prestando, dita medida, a reconhecer a validade do procedimento
adotado na seara administrativa, muito menos à anulação de eventual decisão ad-
ministrativa denegatória do crédito cuja restituição se pretende.
De igual modo, na hipótese de o contribuinte, também abandonando o procedi-
mento consubstanciado na apresentação de pedidos administrativos de restituição,
impetrar mandado de segurança com um pedido fixo7, consistente na restituição do
indébito, independentemente das medidas tomadas administrativamente ou das de-
cisões proferidas nesta esfera, o mandado de segurança igualmente não obstará o
acometimento do crédito pela decadência8.
Diversa será a situação se o contribuinte impetrar ação mandamental cujo pedi-
do mediato consista na restituição do crédito decorrente de pagamento indevido, mas
cujo pedido imediato corresponda à anulação da decisão proferida administrativa-
mente denegando a restituição buscada pelo contribuinte. Neste caso, apresentado
requerimento administrativo em obediência ao artigo 168 do Código Tributário
Nacional - e ao artigo 150, parágrafo 4º, quando assim permitir a situação concreta
- tal requerimento de restituição terá o condão de obstar a fluência do prazo deca-
dencial, pelo exercício do direito à restituição, mas é fundamental que o mandado
de segurança seja intentado no prazo de 120 dias a que alude o artigo 18 da Lei
n. 1.533, de 31 de dezembro de 1951 (“Art. 18. O direito de requerer mandado de
segurança extinguir-se-á decorridos cento e vinte dias contados da ciência, pelo in-
teressado, do ato impugnado”), a fim de que não haja perda do direito de lançar mão
da via mandamental9.
Do que se vê, é possível concluir que a coerência do procedimento assumido
pelo contribuinte (de optar pela via administrativa, e nela prosseguir, partindo para
a via judicial apenas na hipótese da denegação, na primeira esfera, da restituição
pretendida e, ainda, desde que na segunda esfera seja pleiteada a anulação da deci-
são administrativa denegatória do crédito) é importantíssima para que o requerimen-
to administrativo de restituição constitua instrumento assecuratório do direito do
contribuinte de reaver indébitos tributários e, mais do que isto, represente meio apto
a obstar a fluência do prazo decadencial pelo exercício do direito de restituição.
A seguir, será visto que, a não ser por duas decisões, que considero isoladas e
atécnicas, o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça não destoa das con-
siderações feitas até aqui.

7
Consoante leciona Humberto Theodoro Júnior, “o pedido é fixo quando visa a um só resultado imediato e mediato,
como a condenação a pagar certa indenização ou restituir determinado bem” (Curso de Direito Processual Civil, vol. I,
Forense, Rio de Janeiro, p. 328). O pedido imediato representa a modalidade de tutela perseguida na ação judicial
(condenação, anulação, declaração etc.), ao passo que o pedido mediato se traduz no “próprio bem jurídico que o
autor procura proteger com a sentença (o valor do crédito cobrado, a entrega da coisa reivindicada, o fato a ser pres-
tado etc.)” (ob. cit., p. 325).
8
O mandado de segurança, neste caso, teria natureza preventiva, na medida em que não objetivaria afastar nenhuma
coação já perpetrada, mas, sim, uma coação a ser praticada pela autoridade coatora, a exemplo da não homologação
de futura compensação, pautada na suposta inexistência do direito creditório.
9
O mandado de segurança, nesta hipótese, diferente da situação anterior, é de natureza repressiva, porquanto tem por
mister afastar ato ilegal ou abusivo já praticado pelas autoridades fiscais, consistente no indeferimento do direito
creditório.
3. As Decisões do Superior Tribunal de Justiça
Há uma série de decisões do Superior Tribunal de Justiça, de suas 1ª e 2ª Tur-
mas e de sua 1ª Seção, de cuja ementa se lê: “o pedido administrativo não interrompe
o prazo prescricional”.
À primeira vista, o excerto dessas ementas confere ao seu leitor a idéia de que
o pedido administrativo de restituição, em nenhuma hipótese, constitui instrumen-
to apto a assegurar contra a decadência o direito do contribuinte de reaver tributos
pagos indevidamente.
Todavia, isto seria um contra-senso e, mais, deflagraria uma inconstitucionali-
dade, na medida em que, consoante dito acima, tal direito emana do próprio texto
constitucional, assegurador do contencioso administrativo. Daí que admitir que o
pedido administrativo, em nenhuma circunstância, é capaz de frear o curso do pra-
zo para restituição tributária, pelo exercício deste direito, é o mesmo que ceifar a
garantia constitucional do contencioso administrativo.
Mas não só: tal idéia também é atentatória às noções basilares de prescrição e
decadência. Não obstante possuírem traços distintivos, ambos institutos foram cria-
dos levando em conta, fundamentalmente, dois fatores: o tempo e a inércia. É que,
por uma questão de segurança jurídica, o direito não pode dar guarida àqueles que
ficaram inertes durante certo lapso temporal, deixando de reivindicar aquilo que
julgavam ser-lhes de direito10. Daí o brocardo “dormientibus non sucurrit jus” (o
direito não socorre aos que dormem), que traduz a idéia de que o credor inerte tem
seu direito fulminado pela prescrição ou pela decadência uma vez decorrido deter-
minado prazo.
Ora, se o contribuinte, sabedor de sua prerrogativa de se valer do pedido admi-
nistrativo de restituição, e dentro do prazo legal para o exercício de tal prerrogati-
va, apresentar requerimento com vistas a reaver o que pagou a maior ou indevida-
mente, é certo que não haverá inércia ou omissão de sua parte, a reclamar a aplica-
ção das normas regentes daqueles institutos.
Portanto, também sob esse enfoque, é condenável qualquer entendimento de que
o pedido administrativo nunca obsta a fluência do prazo para a restituição do indé-
bito tributário.
Pois bem. Embora o detalhamento do objeto de cada ação judicial que deu ori-
gem às decisões do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que “o pedido ad-
ministrativo não interrompe o prazo prescricional”, dependa da análise das respec-
tivas petições iniciais, após examinar tais acórdãos e as decisões de Tribunais locais
que lhes deram origem, constata-se que, exceto por duas decisões, todas elas foram
proferidas, não em ações anulatórias propostas nos termos do artigo 169 do Código
Tributário Nacional, mas, sim, em mandados de segurança, aparentemente de natu-
reza preventiva, já que, ao que tudo indica, foram impetrados tão-somente com o
fito de obter provimento jurisdicional assegurando a restituição, mediante compen-

10
A despeito de tratar da prescrição e da decadência no Direito Civil, Sílvio de Salvo Venosa bem pontuou que: “O
decurso de tempo, em lapso maior ou menor, deve colocar uma pedra sobre a relação jurídica cujo direito não foi
exercido. É com fundamento na paz social, na tranqüilidade da ordem jurídica que devemos buscar o fenômeno da
prescrição e da decadência.” (Direito Civil, Parte Geral, Atlas, São Paulo, p. 535)
sação, independentemente da anulação de decisão proferida na esfera administrati-
va. Confira-se:
- EREsp n. 669.139-SE, julgado em 23.5.2007, pela 1ª Seção: trata-se de man-
dado de segurança impetrado em 11.7.2001 para pleitear a restituição de cré-
ditos do período de outubro de 1989 a maio de 1991, referentes a tributo su-
jeito a lançamento por homologação, tendo havido, em 16.7.1996, a apresen-
tação de pedido administrativo de restituição; entendeu o Superior Tribunal de
Justiça que “o pedido administrativo não interrompe o prazo prescricional”;
- EDcl no REsp n. 811.282-MG, julgado em 3.10.2006, pela 2ª Turma: trata-
se de Mandado de Segurança impetrado em 29.8.2000, para assegurar a resti-
tuição de créditos de abril de 1990 a março de 1992, referentes a tributo sujei-
to a lançamento por homologação, sendo que o pedido administrativo foi apre-
sentado em 24.4.2000; o Superior Tribunal de Justiça declarou prescritos to-
dos os valores recolhidos antes de agosto de 1990, afirmando que “o simples
pedido administrativo de compensação tributária não é motivo apto para inter-
romper o prazo prescricional”;
- REsp n. 749.593-RJ, julgado em 18.9.2007, pela 1ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança impetrado em 1º.10.2002, com vistas a assegurar a restitui-
ção de créditos do período de janeiro de 1991 a abril de 1992, referentes a tri-
buto sujeito a lançamento por homologação; o Superior Tribunal de Justiça
afirmou que “o pedido administrativo de compensação não interrompe o pra-
zo prescricional”, tendo constado do voto do Relator, Ministro Teori Albino
Zavascki, a propósito do objeto da ação mandamental, ser “ausente, portanto,
qualquer pedido de anulação do ato da autoridade impetrada, fundado em in-
devido reconhecimento do prazo prescricional”, já que “o pedido da impetrante
busca seja declarada a possibilidade de compensação das parcelas indevida-
mente recolhidas”;
- REsp n. 840.666-PA, julgado em 15.8.2006, pela 1ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança impetrado em outubro de 2001, visando à restituição de
créditos do período de 1988 a 1995, referentes a tributo sujeito a lançamento
por homologação, e, mais do que isto, visando assegurar o direito da impetrante
de compensar estes valores. Foi apresentado pedido administrativo de restitui-
ção em 26.7.1999, o qual, segundo informações extraídas das decisões profe-
ridas no processo, não foi apreciação na esfera administrativa. Entendeu o
Superior Tribunal de Justiça que “o pedido administrativo não interrompe o
curso da prescrição”;
- EDcl no REsp n. 635.856-SC, julgado em 12.6.2007, pela 2ª Turma: trata-se
de mandado de segurança impetrado em 29.5.2001; o Superior Tribunal de
Justiça entendeu que “o pedido administrativo não interrompe o curso da pres-
crição”;
- REsp n. 653.655-PR, julgado em 15.9.2005, pela 1ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança impetrado em 9.8.2000; o Superior Tribunal de Justiça afir-
mou que “o pedido administrativo de compensação não interrompe o prazo
prescricional”;
- REsp n. 815.738-SP, julgado em 28.3.2008, pela 1ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança ajuizado em 12.5.2000, com o objetivo de reconhecer cré-
dito atinente ao período de setembro de 1989 a outubro de 1991; o Superior
Tribunal de Justiça entendeu que “o pedido administrativo de compensação não
interrompe o prazo prescricional”;
- REsp n. 584.372-MG, julgado em 17.3.2005, pela 2ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança, visando à restituição de crédito do período de agosto de
1990 a novembro de 1991; o Superior Tribunal de Justiça entendeu que “o sim-
ples pedido administrativo de compensação tributária não é motivo apto para
interromper o prazo prescricional”;
- REsp n. 531.352-MG, julgado em 6.12.2005, pela 2ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança objetivando o reconhecimento do direito à compensação de
indébito tributário. Houve a apresentação de pedido administrativo de restitui-
ção, em 21.12.1999. O Superior Tribunal de Justiça entendeu que “o simples
pedido administrativo de compensação tributária não é motivo apto para inter-
romper o prazo prescricional”; e
- AgRg no Agravo de Instrumento n. 629.184-MG, julgado em 3.5.2005, pela
1ª Turma: trata-se de mandado de segurança ajuizado em 27.6.2000, visando
à declaração incidental da inconstitucionalidade de dado tributo sujeito a lan-
çamento por homologação, bem como ao reconhecimento do direito à compen-
sação desses valores, recolhidos indevidamente no período de fevereiro de 1990
a novembro de 1991. Foram apresentados pedidos administrativos em
30.11.1999 e em 12.1.2000. O Superior Tribunal de Justiça decidiu que “o pra-
zo prescricional, para fins de restituição de indébito de tributo indevidamente
recolhido, não se interrompe e/ou suspende em face de pedido formulado na
esfera administrativa”.
Diante disso, e admitindo que, de fato, em todos os casos analisados acima pelo
Superior Tribunal de Justiça os contribuintes tenham impetrado mandado de segu-
rança de índole preventiva, no mais das vezes, com vistas a resguardar futura com-
pensação a ser realizada com crédito decorrente de pagamento indevido, não se pode
taxar as decisões acima listadas de incorretas, ou de indicativas de uma mudança na
orientação daquele Tribunal acerca da condição do pedido administrativo de evitar
a decadência do direito à restituição.
Isso porque, aparentemente, os mandados de segurança então analisados não
tiveram por objeto a anulação de decisão administrativa denegatória da restituição,
donde, a despeito da apresentação, pelos contribuintes, de pedidos administrativos
de restituição, estes não impediram a fluência do prazo prescricional para o ajuiza-
mento de ação judicial tendente a resguardar o direito creditório, na linha do quan-
to visto anteriormente.
Há duas decisões, no entanto, que contrariam aquilo que foi dito no tópico an-
tecedente a propósito da restituição tributária.
A primeira delas for proferida pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no
AgRg no REsp n. 1.062.447-SP, em 14.10.2008, em ação de rito ordinário, em cujo
bojo foi requerida, dentre outras coisas, a anulação de decisão proferida na esfera
administrativa indeferindo a restituição de indébito tributário, da qual a autora da
demanda teve ciência em 8 de novembro de 2002.
A ação judicial foi ajuizada em 20.7.2004, observado, portanto, o prazo pres-
cricional de dois anos previsto no artigo 169 do Código Tributário Nacional, assim
como também foi atendido o prazo decadencial para a apresentação de pedido de
restituição, pois que, tratando-se de tributo sujeito a homologação referente ao pe-
ríodo de setembro de 1989 a março de 1992, o pedido apresentado em 28.6.1999
atendeu ao prazo decenal (artigo 150, parágrafo 4º, cumulado com o artigo 168,
inciso I, ambos do Código Tributário Nacional) para a tomada da medida.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça foi lacônica, limitando-se a dizer que
“o pedido administrativo não interrompe o prazo prescricional”, após o que foram
citadas ementas de julgado do Tribunal no mesmo sentido, sem, contudo, haver aná-
lise das regras legais atinentes à restituição tributária, muito menos daquela conti-
da no artigo 169 do Código Tributário Nacional.
Situação semelhante é aferível em relação ao acórdão proferido em 15.2.2007,
pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no AgRg no REsp n. 879.258-SP, pois,
do relatório de tal decisão, consta que o impetrante se valeu da ação mandamental,
aparentemente de índole repressiva, já que impetrado com vistas ao cancelamento
de ato ilegal perpetrado pela autoridade apontada como coatora, consistente no in-
deferimento, administrativamente, de pedido de restituição apresentado em
28.12.199911, objetivando reaver créditos de janeiro de 1990 a outubro de 1991, re-
lativos a tributos sujeitos a lançamento por homologação.
Vale dizer, o mandado de segurança foi impetrado em 16.5.2001, antes do de-
curso do prazo estatuído no artigo 18 da Lei n. 1.533, uma vez que o indeferimento
do pedido administrativo de restituição ocorreu em 28.12.1999.
Ou seja, ao que tudo indica, o direito creditório não fora alcançado pela deca-
dência, tampouco o direito de ação fora fulminado pela prescrição. Não obstante isto,
o Superior Tribunal de Justiça entendeu que, não sendo a apresentação de pedido
administrativo de restituição hipótese de interrupção da prescrição, as parcelas de
dado tributo, sujeito a lançamento por homologação, recolhidas nos dez anos ante-
riores à impetração, estavam prescritas.
Essas duas decisões do Superior Tribunal de Justiça são isoladas e pecam pela
análise, ao que tudo indica, superficial dos casos postos à discussão, não se poden-
do afirmar, ao menos não categoricamente, que elas refletem a orientação deste Tri-
bunal acerca do direito de os contribuintes se valerem de pedido administrativo de
restituição com o mister de resguardar seu direito contra a decadência.
Tanto isso é verdade que há ao menos cinco decisões da 2ª Turma daquele Tri-
bunal dizendo, ainda que “obter dictum”, que os pedidos administrativos apresen-
tados até 9.7.2005, data imediatamente anterior a de entrada em vigor do artigo 3º
da Lei Complementar n. 118, têm o condão de preservar o direito de restituição do
contribuinte quanto a tributos sujeitos a lançamento por homologação. É o que re-
tratam as seguintes ementas:

11
A ação, ao que parece, realmente é de natureza repressiva, pois, no relatório da decisão proferida pelo Superior Tri-
bunal de Justiça, fala-se que o contribuinte requereu o cancelamento de “ato abusivo e ilegal da autoridade coatora,
determinando-se seja dado normal seguimento ao processo administrativo formado pelo pedido de compensação”.
“Tributo. Lançamento por Homologação. Prescrição. Art. 3º da Lei Complementar
n. 118/2005. Inaplicabilidade.
1. A Primeira Seção do STJ, no julgamento dos EREsp n. 327.043/DF, firmou enten-
dimento de que a tese do ‘cinco mais cinco’, relativa à prescrição dos indébitos tribu-
tários, não restou derrogada pela Lei Complementar n. 118, de 9 de fevereiro de 2005,
no que se refere aos casos já ajuizados ou pleiteados pela via administrativa até a data
de 9 de julho de 2005.
2. Agravo regimental não-provido.” (2ª Turma do STJ, AgRg no Ag n. 717.599, Rel.
Ministro João Otávio de Noronha, DJ 20.03.2006, p. 245)

“Tributo. Lançamento por Homologação. Prescrição. Art. 3º da Lei Complementar


n. 118/2005. Inaplicabilidade. Complementação de Aposentadoria. Previdência Priva-
da. Leis ns. 7.713/88 e 9.250/95. Imposto de Renda. Restituição.
1. A Primeira Seção do STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso
Especial n. 327.043/DF, firmou entendimento de que a tese dos ‘cinco mais cinco’,
relativa à prescrição dos indébitos tributários, não restou derrogada pela Lei Comple-
mentar n. 118, de 9/2/2005, no que se refere aos casos já ajuizados ou pleiteados pela
via administrativa até 9 de julho de 2005 (...).” (2ª Turma do STJ, REsp n. 766.973,
Rel. Ministro João Otávio de Noronha, DJ 23.05.2006, p. 145)
Ainda, cabe mencionar outras três decisões do Superior Tribunal de Justiça, de
cujos acórdãos se lê que o prazo do artigo 169 do Código Tributário Nacional é apli-
cável tão-somente às ações de rito ordinário que, precedidas de pedidos administra-
tivos de restituição, visam à anulação de decisão administrativa denegatória do di-
reito creditório, como seja:
- REsp n. 963.352-PR, julgado em 21.10.2008, pela 1ª Turma: trata-se de man-
dado de segurança objetivando tutela jurisdicional que obrigue a autoridade ad-
ministrativa a restituir quantias indevidamente recolhidas e objeto de pedido
de restituição indeferido administrativamente, sob a alegação de decurso de
prazo; o Superior Tribunal de Justiça afirmou que “In casu, o pedido adminis-
trativo foi protocolado em 12/11/2002, com o objetivo de obter o direito à com-
pensação de valores indevidamente recolhidos a título de imposto sobre a ren-
da, ressoando inequívoca a inocorrência da prescrição quanto aos créditos fis-
cais relativos aos anos-base de 1992 a 1996, em virtude do fato gerador do
imposto de renda retido na fonte aperfeiçoar-se no final do ano-base, nos ter-
mos da fundamentação expendida” e, quanto ao artigo 169, foi dito que “a
norma jurídica supratranscrita não se aplica ao caso sub judice, porquanto versa
sobre o prazo prescricional de ação judicial que sucede pedido administrativo
indeferido, visando a anulação do respectivo processo. In casu, discute-se a
ocorrência de prescrição do direito do contribuinte na via administrativa, hi-
pótese absolutamente diversa”;
- EDcl no REsp n. 858.816-SP, julgado em 27.2.2007, da 1ª Turma: trata-se de
mandado de segurança impetrado com vistas à restituição de crédito referente
a tributo sujeito a lançamento por homologação; o Superior Tribunal de Justi-
ça afirmou que “No que se refere à assertiva de que a compensação deve se dar
nos 10 anos anteriores ao pedido administrativo outrora indeferido, e não do
ajuizamento da ação, os dispositivos legais considerados violados (arts. 1º da
Lei 1.533/51 e 169 do CTN), não guardam qualquer relação com a temática
do prazo de prescrição para a repetição do indébito, tendo em vista que se re-
ferem, respectivamente, ao cabimento do mandado de segurança e ao prazo
prescricional da ação anulatória da decisão administrativa que denegar a resti-
tuição, que não se confunde com o prazo para a restituição em si”; e
- REsp n. 799.564-PE, julgado em 18.10.2007, pela 1ª Turma: trata-se de ação
de repetição de indébito ajuizada em 24.11.2000, objetivando a restituição de
tributo sujeito a lançamento por homologação do período de fevereiro de 1990
a janeiro de 1996. A decisão administrativa indeferindo a restituição foi pro-
ferida em junho de 1998. O Superior Tribunal de Justiça afirmou que “O pra-
zo de dois anos previsto no artigo 169 do CTN é aplicável às ações anulató-
rias de ato administrativo que denega a restituição, que não se confundem com
as demandas em que se postula a restituição do indébito, regidas pelo art. 168
do CTN”, arrematando que “No caso dos autos, a ação proposta, indubitavel-
mente, é de repetição de indébito e não anulatória de decisão administrativa.
Objetiva o autor a restituição de valores relativos a imposto de renda retido na
fonte que entende indevidos, nada postulando quanto ao ato que rejeitou o
mesmo requerimento na esfera administrativa. Inaplicável ao caso, portanto,
a disposição do artigo 169 do CTN.”
Por derradeiro, vale citar o acórdão proferido no AgRg no REsp n. 525.706-MG,
julgado em 7.8.2007, pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, oportunidade
em que restou assentada a possibilidade de o contribuinte se valer do pedido admi-
nistrativo de restituição como instrumento apto a preservar seu direito creditório
contra a decadência e, mais do que isto, a possibilidade de o contribuinte impetrar
mandado de segurança com o objetivo de afastar ato ilegal consubstanciado na ne-
gativa administrativa do crédito cuja restituição se requerer. É o que se infere do
seguinte excerto de tal decisão:
“Observe-se que a empresa requereu administrativamente, em 30/08/2000, a compen-
sação daquilo que pagou indevidamente a título de PIS no período de 09/02/90 a
15/12/95 (fl. 47) e, diante do indeferimento do pleito, socorreu-se do Judiciário para
reverter a decisão administrativa que, no seu entender, violava direito líquido e certo à
compensação tributária. Por tais razões, equivocada a contagem do prazo prescricio-
nal nos dez anos anteriores à propositura da ação e não do protocolo do requerimento
administrativo.”
Em vista do exposto, entendo que, exceto pelas duas decisões mencionadas acima,
proferidas no AgRg no REsp n. 1.062.447-SP e no AgRg no REsp n. 879.258-SP,
que julgo isoladas, atécnicas e decorrentes de análise superficial das situações fáti-
cas então apresentadas, consistindo, pois, em erro de julgamento, não se pode dizer
que a posição do Superior Tribunal de Justiça seja contrária à preservação do direi-
to de reaver tributo pago indevidamente mediante a apresentação de pedido de res-
tituição.
Na verdade, salvo estas duas decisões, os demais acórdãos existentes acerca da
matéria são consentâneos com aquilo que foi dito no tópico anterior, no sentido de
que o pedido administrativo tem o condão de obstar a perda do direito à restituição,
mas desde que o procedimento do contribuinte seja coerente, isto é, desde que ele
não abandone os atos praticados da esfera administrativa, mediante o ingresso no
Poder Judiciário com objetivo de assegurar aquele mesmo direito, via ação de re-
petição de indébito, ou mandado de segurança de natureza preventiva, independen-
temente da anulação de eventual decisão administrativa denegatória do crédito plei-
teado.
Ou seja, a ação anulatória proposta nas condições do artigo 169 do Código Tri-
butário Nacional, assim como o mandado de segurança de índole repressiva impe-
trado no prazo do artigo 18 da Lei n. 1.533, não são atingidos pela prescrição do
direito de ação, como também os créditos cuja restituição se pleiteia não são alcan-
çados pela decadência, se o pedido administrativo que antecedeu ditas ações judi-
ciais tiver sido apresentado no prazo legal para tanto.

4. Conclusões
Feitas as considerações acima, conclui-se que:
- o direito de pleitear, na esfera administrativa, a restituição de indébito tribu-
tário, mais do que aferível pela interpretação do artigo 169 do Código Tribu-
tário Nacional, é decorrente do artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal,
que assegura o direito ao contencioso administrativo;
- não havendo inércia do contribuinte, tampouco decurso do lapso temporal de-
terminado na legislação tributária, não mais terá curso o prazo decadencial para
restituição tributária por ocasião da apresentação do pedido administrativo de
restituição, o que é decorrência do próprio sistema legal de restituição, o qual
estabeleceu prazo decadencial para o exercício do direito de reaver o indébito
tributário, de tal sorte a evitar a insegurança jurídica oriunda da inércia do con-
tribuinte, que não ocorre quando se lança mão daquele requerimento, confor-
me visto anteriormente;
- exceto por duas decisões isoladas e atécnicas, consistentes em erro de julga-
mento, inconsciente, as decisões existentes no âmbito do Superior Tribunal de
Justiça sobre a matéria não são contrárias ao entendimento ora manifestado; e
- após o término da tramitação do processo administrativo, é garantido ao con-
tribuinte o direito de discutir judicialmente o indeferimento do direito credi-
tório, desde que observado o prazo prescricional para o ajuizamento da ação,
que será: (a) o do artigo 168 do Código Tributário Nacional - cumulado com o
artigo 150, parágrafo 4º, quando for o caso - na hipótese de ajuizamento de ação
de repetição de indébito, ou de mandado de segurança de índole preventiva; (b)
o do artigo 18 da Lei n. 1.533 quando impetrado mandado de segurança visando
à anulação de decisão administrativa denegatória do crédito cuja restituição se
pleiteia; e (c) o do artigo 169 do Código Tributário Nacional se ajuizada ação
anulatória desta mesma decisão denegatória.
A Não-incidência de Contribuição
Previdenciária sobre Verbas Trabalhistas
de Natureza Indenizatória e Eventual
Fernando Facury Scaff
Edson Benassuly Arruda

1 - Apresentação do Tema
A Constituição Federal prevê contribuições sociais de
natureza previdenciária, em seu art. 195, I, “a”, sobre deter-
minadas verbas trabalhistas. Assim, a contribuição é devida
pelo empregador, da empresa e da entidade a ela equipara-
da na forma da lei, incidentes sobre folha de salários e de-
mais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qual-
quer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo
sem vínculo empregatício.
Ocorre que nem todas as verbas recebidas pelos empre-
gados ou prestadores de serviço sofrem a incidência da con-
Fernando Facury tribuição previdenciária, entre elas destacamos as verbas tra-
Scaff
balhistas de natureza indenizatória e/ou eventual, como por
é Professor da
Faculdade de Direito exemplo, o adicional noturno, insalubridade, hora extra, sa-
da Universidade de lário-maternidade, terço constitucional de férias e férias in-
São Paulo - USP e da denizadas, adicional de periculosidade, salário-família, avi-
Universidade Federal so prévio, salário-educação, auxílio-doença e auxílio-creche.
do Pará - UFPA A cobrança de contribuição social sobre estas parcelas
(Licenciado), traz sérios prejuízos aos contribuintes, uma vez que oneram
Advogado e Doutor
em demasia sua folha de pagamento (estima-se em 20% o
em Direito pela USP.
recolhimento a maior da contribuição previdenciária), oca-
sionando enriquecimento ilícito para a União e pagamento
indevido pelos sujeitos passivos.

2 - A Incidência de Contribuição Previdenciária


Patronal Calculada sobre a Folha de Salários
De acordo com o CTN, para que surja a obrigação tribu-
tária de pagar tributos, é necessária a ocorrência do respec-
tivo fato gerador1. Ou seja, somente quando ocorrer no mun-
do fenomênico a hipótese descrita na norma, realizada pelo
sujeito passivo, é que surgirá o dever jurídico de pagar o tri-
Edson Benassuly
Arruda
é Professor da 1
“Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
Faculdade Ideal,
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto
Mestre em Direito pela o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o
UFPA e Advogado. crédito dela decorrente.”
buto2. Ressalte-se que, pela regra da tipicidade fechada, o Fisco não poderá esten-
der a interpretação sobre a materialidade do fato gerador, a fim de abranger fatos
além do que os previstos na norma de incidência, sendo, também, vedado o empre-
go da analogia para fins de imposição tributária3.
Qual é a regra de incidência tributária para fins da contribuição previdenciária
patronal calculada sobre a folha de salários? O art. 195, I, “a”, da CRFB definiu que
a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta,
nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, destacando a contribuição social a
cargo do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei,
incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou cre-
ditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem víncu-
lo empregatício4.
Pela análise preliminar deste dispositivo, podemos concluir que esta contribui-
ção social incide sobre a folha de salários, tendo como:
a) sujeito passivo o empregador (empresa/entidade equiparada);
b) sujeito ativo a União Federal;
c) o aspecto temporal o momento do pagamento da remuneração dos empre-
gados;
d) o elemento espacial o local da prestação do serviço;
e) o elemento quantitativo - a base de cálculo o total da remuneração de cada
empregado, sobre o qual incide uma alíquota de 20% (vinte por cento).
Neste diapasão, “folha de salários” significa a soma da remuneração paga ao
empregado, em determinado período; deste modo, o critério material do fato gera-
dor desta contribuição social consiste na realização de despesa com salários, pro-
venientes de uma relação de trabalho.
O art. 22, I, da Lei 8.212/91 veio regular o referido dispositivo constitucional.
Esta norma dispõe que a contribuição a cargo da empresa destinada à Seguridade
Social é de 20% sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qual-
quer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que
lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua for-
ma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adian-
tamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente presta-
dos, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos ter-

2
“Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocor-
rência.”
3
“Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará
sucessivamente, na ordem indicada:
§ 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.”
4
“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei,
mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das
seguintes contribuições sociais: I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, inci-
dentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) a) a folha de salários e demais rendimen-
tos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998).”
mos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho
ou sentença normativa5.
A expressão “remuneração paga ao empregado”, nada mais é que o próprio sa-
lário devido a eles.
Forçoso concluir que as contribuições do art. 22, I, da Lei 8.212/91 incidem,
unicamente, sobre o salário. Para Amauri Mascaro Nascimento, “salário é a totali-
dade das percepções econômicas dos trabalhadores, qualquer que seja a forma ou
meio de pagamento, quer retribuam o trabalho efetivo, os períodos de interrupção
do contrato e os descansos computáveis na jornada de trabalho”6.
O autor destaca que não integram o salário as indenizações, pois estas se dife-
renciam daquele por terem como finalidade a reparação de danos ou o ressarcimento
de gastos do empregado. Segundo Amauri Mascaro:
“existem várias obrigações trabalhistas de natureza não salarial. O título exemplifica-
tivo enumere-se, dentre as obrigações não salariais, indenizações, ressarcimento de
gastos para exercício da atividade, diárias e ajuda de custos próprias, verbas de quilo-
metragem e representação, participação nos lucros ou resultados desvinculada do sa-
lário, programas de alimentação e transporte, treinamento profissional, abono de fé-
rias não excedente de 20 dias, clubes de lazer (...).”7
Com isso, resta evidente que os valores percebidos pelos empregados de natu-
reza indenizatória, assim como os encargos sociais, não possuem natureza jurídica
de salário/remuneração, logo, não constituem fato gerador da contribuição previden-
ciária patronal calculada sobre a folha de salários, tampouco há que se falar na obri-
gação tributária das empresas recolherem o aludido tributo sobre estas parcelas.
O parágrafo 9º do art. 214 do Decreto 3.048/99 traz um rol exemplificativo das
verbas que não possuem natureza salarial. Entre elas destacamos:
a) os benefícios da previdência social;
b) a ajuda de custo;
c) as férias indenizadas,
d) o abono e respectivo terço constitucional;
e) aviso prévio indenizado;
f) participação nos lucros e resultados,
g) auxílio-doença etc.
Apesar da utilidade desta lista, não podemos esquecer que todas as verbas de
caráter não salarial, indenizatória ou encargo social, assim como as verbas percebi-
das de forma eventual, estão fora do âmbito de incidência da contribuição previden-
ciária, independente de expressa previsão legal.

5
“Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: I -
vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos
segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer
que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decor-
rentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador
ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou
sentença normativa.”
6
Curso de Direito do Trabalho. 17ª ed. São Paulo: Saraiva. 2001. p. 629.
7
Op. cit., p. 630.
O STF em vários julgados8 já se manifestou no sentido de que a contribuição
previdenciária só incide sobre o salário (espécie) e não sobre o total da remunera-
ção (gênero) e expressamente exclui do seu âmbito de incidência as parcelas cuja
natureza jurídica sejam indenizatórias e não habituais. De acordo com o posiciona-
mento do STF9, as parcelas que tenham um caráter indenizatório e não habitual es-
tão fora do alcance do conceito de salário e, conseqüentemente, do âmbito de inci-
dência das contribuições previdenciárias. Deste modo, as verbas recebidas a título
de adicional noturno, insalubridade, hora extra, salário-maternidade, terço consti-
tucional de férias e férias indenizadas, adicional de periculosidade, salário-família,
aviso prévio, salário-educação, auxílio-doença e auxílio-creche, por terem nature-
za jurídica indenizatória e/ou não habitual, não podem ser consideradas como salá-
rio em sentido estrito, tampouco seu pagamento enseja a obrigação tributária pre-
vista no art. 195, I, “a”, da CRFB c/c art. 22, I, da Lei 8.212/91.
A seguir analisaremos cada uma destas verbas trabalhistas, destacando suas res-
pectivas naturezas jurídicas, a fim de verificar se sobre elas incide ou não contribui-
ção previdenciária patronal calculada sobre a folha de salários.

3 - Da Natureza Jurídica das Verbas Trabalhistas a Título de: Hora Extra,


Adicional Noturno, Adicional de Insalubridade, Adicional de Periculosidade,
Salário-maternidade, Terço Constitucional de Férias e Férias Indenizadas,
Salário-família, Aviso Prévio, Auxílio-educação, Auxílio-doença e
Auxílio-creche
Os adicionais legais, assim como determinadas verbas trabalhistas, constituem
acréscimos na remuneração dos empregados submetidos a condições de trabalho

8
RE 166.172, ADI 1.659-6.
9
O Ministro Marco Aurélio, relator do RE 166.772-2 RS, nas folhas de nos 722 e seguintes dos autos, assim se posicio-
nou quanto à natureza jurídico-constitucional do salário: “Descabe dar a uma mesma expressão - salário - utilizada
pela carta relativamente a matérias diversas, sentidos diferentes, conforme os interesses em questão. Salário, tal como
mencionado no inciso I do artigo 195, não se pode configurar em algo que discrepe do conceito que se lhe atribui
quando cogita, por exemplo, da irredutibilidade salarial - inciso VI do artigo 7º da Carta, considera-se que, na verda-
de, a lei ordinária mesclou institutos diversos ao prever a contribuição. Após alusão, no caput do artigo 3º, à expres-
são utilizada na própria carta federal - folha de salário - ao versar sobre o que pago aos administradores avulsos e
autônomos, refere a remuneração, talvez mesmo pelo fato de o preceito a que se atribui a pecha de constitucional
englobar, também, os segurados empregados. Desconheceu-se que salário e remuneração não são expressões sinôni-
mas. Uma coisa é a remuneração, gênero do qual salário, vencimentos, soldo, subsídios, pró-labore e honorários são
espécies. Seria fácil dar-se à previsão constitucional em questão o alcance dado pelo Instituto, no que se fugiria até
mesmo da necessidade de balizar-se, de maneira precisa e clara, as bases de incidências das contribuições sociais.
Suficiente seria, ao invés de utilizar-se a expressão ‘folha de salários’, a expressão ‘empregador’, aludir-se ao toma-
dor de serviços e à remuneração por estes satisfeita. Com acerto, enquadraram à matéria constitucionalistas e tribu-
taristas, dentre os quais destaco Ives Gandra, Geraldo Ataliba, Ruy Barbosa Nogueira e a também professora Misa-
bel Abreu Machado Dersi. Esta última emitiu parecer sobre a contribuição social incidente sobre a remuneração e o
pró-labore pagos a autônomos e administradores. De forma proficiente, apontou as diferenças entre o vocábulo ‘em-
presa’ e o vocábulo ‘empregador’, afirmando que o uso das expressões ‘empregador’ e ‘folha de salários’, contidas
na Carta de 1988, exclui as relações de trabalho não subordinado, como as que envolvem autônomos em geral e ad-
ministradores. Aduziu ainda que as constituições brasileiras sempre usaram os termos empregador e salário no sen-
tido próprio e técnico em que encontrados no direito do trabalho, o que, aliás, está consagrado jurisprudencialmente.
Já disse linhas atrás, que está em tela uma ciência. Assim enquadrado o direito, o meio justifica o fim, mas não este
aquele. Compreendo as grandes dificuldades de caixa que decorrem do sistema de seguridade social pátrio. Contudo,
estas não podem ser potencializadas, a ponto de colocar-se em segundo plano a segurança, que é o objetivo maior de
uma Lei Básica, especialmente no embate cidadão/Estado, quando as forças em jogo exsurgem em descompasso.”
mais gravosa. Em razão de situações de risco, jornadas de trabalho mais extenuan-
tes, contato com agentes nocivos para a saúde, entre outros, o Direito pátrio deter-
mina uma compensação financeira ao trabalhador. Em virtude disso, algumas ver-
bas trabalhistas têm caráter indenizatório e/ou eventual, uma vez que visam com-
pensar o empregado pelos prejuízos causados a sua vida pessoal e integridade físi-
ca, decorrente de uma jornada de trabalho mais penosa.

A - Hora extra
A jornada normal de trabalho é o espaço de tempo durante o qual o empregado
deverá prestar serviço ou permanecer à disposição do empregador, com habituali-
dade; nos termos da CF, art. 7º, XIII, sua duração deverá ser de até 8 horas diárias,
e 44 semanais; em se tratando de empregados que trabalhem em turnos ininterrup-
tos de revezamento, a jornada deverá ser de 6 horas, salvo negociação coletiva. Horas
extras são aquelas que ultrapassam a jornada normal fixada por lei, convenção co-
letiva, sentença normativa ou contrato individual de trabalho, e de acordo com o
mandamento constitucional, art. 7º, XVI10, o pagamento da hora extra é de no mí-
nimo 50%.
O corpo e a mente humana possuem capacidade limitada para a atividade labo-
ral, após determinado período perdemos produtividade e nosso organismo começa
e ficar deficitário. Além dos prejuízos físicos e mentais, a jornada prolongada de
trabalho limita a convivência familiar, diminui nossa participação social e impede
o desenvolvimento de outras atividades de cultura, lazer e esporte.
Não foi por outro motivo que o constituinte originário determinou o pagamen-
to de um adicional pela hora extra trabalhada, a fim de compensar o trabalhador pela
jornada extenuante de trabalho. Ademais, essas verbas são recebidas em caráter
eventual, podendo ser suprimidas a qualquer tempo e não são consideradas para o
cálculo do benefício previdenciário.
Ora, se tais verbas possuem caráter indenizatório, eventual e não são auferidas
para o cálculo do benefício previdenciário; não há que se falar no recolhimento de
contribuições sociais sobre elas. Apesar do STJ possuir decisões divergentes sobre
o tema11, o STF tem firmado orientação no sentido de não haver incidência da con-
tribuição previdenciária sobre hora extra, face sua natureza jurídica indenizatória12.

B - Adicional noturno
O trabalho noturno consiste no labor realizado no período das 22 horas até às 5
horas da manhã do dia seguinte. A jornada noturna urbana abrange 8 horas jurídi-
cas de trabalho, pois a hora noturna corresponde a 52 minutos e 30 segundos. Há,
portanto, uma redução de 7 minutos e 30 segundos, que multiplicados por 8 horas

10
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal.”
11
Favorável: AgRg no Ag 1.031.515/DF, RMS 22.239/PR; contra: REsp 972.451.
12
“(...) Contribuição Previdenciária sobre as Horas Extras e o Terço de Férias. Impossibilidade. Precedentes. Esta Corte
fixou entendimento no sentido que somente as parcelas incorporáveis ao salário do servidor sofrem a incidência da
contribuição previdenciária. Agravo Regimental a que se nega provimento.” (AI 727.958-7 AgR/MG. Relator(a):
Min. Eros Grau. Julgamento: 16/12/2008. Órgão Julgador: Segunda Turma - grifo nosso)
constitui uma redução de 1 hora. Com isto, a jornada de trabalho está estabelecida
em 7 horas.
Quanto à remuneração do adicional noturno, a CRFB, em seu art. 7º, IX, garante
que o trabalho noturno será superior ao diurno13. O art. 73 da CLT dispõe que terá
um acréscimo de 20% (vinte por cento), pelo menos, sobre a hora diurna.
O trabalho noturno possui remuneração e cômputo de horas diferenciado do tra-
balho diurno em razão do desgaste físico imposto ao trabalhador. O relógio bioló-
gico do ser humano é estruturado para funcionar durante o dia. À noite, há desace-
leração de nosso metabolismo e queda de nossa capacidade cognitiva, pois o corpo
se prepara para o descanso e o sono.
Augusto Cezar Ferreira de Baraúna expõe: “nossa legislação protege o trabalho
noturno, estabelecendo padrões e limites de atuação empresarial, inclusive, crian-
do um acréscimo salarial de natureza compensatória, ao qual se convencionou cha-
mar de adicional noturno”14.
O Decreto 5.005/04 promulgou a Convenção nº 171 da Organização Interna-
cional do Trabalho relativa ao Trabalho Noturno, a qual reconhece em vários dis-
positivos a natureza compensatória dessas verbas recebidas, senão vejamos:
“Artigo 3
1. Deverão ser adotadas, em benefício dos trabalhadores noturnos, as medidas especí-
ficas exigidas pela natureza do trabalho noturno, que abrangerão, no mínimo, aquelas
mencionadas nos artigos 4 a 10, a fim de proteger a sua saúde, ajudá-los a cumprirem
com suas responsabilidades familiares e sociais, proporcionar aos mesmos possibili-
dades de melhoria na sua carreira e compensá-los de forma adequada. Essas medidas
deverão também ser adotadas no âmbito da segurança e da proteção da maternidade, a
favor de todos os trabalhadores que realizam trabalho noturno.
(...)
Artigo 8
A compensação aos trabalhadores noturnos em termos de duração do trabalho, remu-
neração ou benefícios similares deverá reconhecer a natureza do trabalho noturno.”
Pelo exposto, resta evidente a natureza indenizatória do adicional noturno, onde
se busca compensar financeiramente uma jornada de trabalho em horário impróprio
ao trabalhador, não constituindo, assim, fato gerador das contribuições previden-
ciárias e sequer são levadas em conta para a concessão do benefício da aposentado-
ria. Vale a pena registrar que o STJ e o TRF da 1ª Região chegaram a corroborar este
posicionamento em algumas decisões15.

C - Adicional de insalubridade
O adicional de insalubridade constitui uma compensação financeira ao trabalho
prestado em condições vulneráveis à atuação de agentes nocivos à saúde do traba-
lhador. Ele possui diferentes percentuais dependendo do grau de insalubridade (grau
mínimo - 10%; grau médio - 20%; grau máximo - 40%). Em razão do risco emi-

13
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
IX - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno.”
14
Curso de Direito do Trabalho. 1ª ed. Rio de Janeiro, Forense. 2009. p. 345.
15
AgRg no Ag 1.031.515/DF - STJ; RMS 22.239/PR - STJ; AMS 2001.37.00.000492-3/MA - TRF1.
nente à saúde do trabalhador e a necessidade de compensação à exposição do risco,
a matéria mereceu tratamento constitucional, em seu art. 7º, XXIII.
A CLT considera como insalubres as atividades ou operações que, por sua na-
tureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes no-
civos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da
intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos16.
Desta feita, o adicional de insalubridade possui natureza indenizatória em razão
dos riscos de contração de moléstias pelos trabalhadores; de modo que não há inci-
dência de contribuições previdenciárias sobre as verbas recebidas a este título. Ape-
sar do STJ entender pela incidência da contribuição, o TRF da 4ª Região possui
decisão favorável a esta tese17.

D - Adicional de periculosidade
O adicional de periculosidade é devido àquelas funções que, por sua natureza
ou método de trabalho, implicam contato constante com material inflamável, explo-
sivos, energia elétrica, atividades com operações com radiação ionizantes ou subs-
tâncias radioativas, ou ainda, em face de contato constante com bomba de gasolina.
Face o risco de morte em manipular ou estar em contato com estes produtos é
assegurado ao trabalhador um adicional de 30% sobre sua remuneração, como for-
ma de compensação pelo risco sofrido. Estas regras estão reguladas pelo art. 7º,
XXIII, da CRFB18 e pelo art. 193 da CLT19.
Assim como o adicional de insalubridade, o adicional de periculosidade possui
natureza indenizatória em razão do risco de morte sofrido pelos trabalhadores; de
modo que não há incidência de contribuições previdenciárias sobre as verbas rece-
bidas a este título, conforme orientação do TRF da 1ª Região20.

E - Salário-maternidade
De acordo com a Carta Magna, a empregada gestante passou a ter direito a 120
dias de repouso sem prejuízo do emprego e do salário21. A CLT faz a previsão deste
benefício nos arts. 39222 e seguintes. Trata-se, na verdade, de benefício de caráter

16
“Art. 189. Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou méto-
dos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão
da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.”
17
Apelação Cível nº 2001.72.00.003379-0/SC.
18
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei.”
19
“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministé-
rio do Trabalho, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com infla-
máveis ou explosivos em condições de risco acentuado.
§ 1º O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) so-
bre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.”
20
AG 2005.01.00.056488-5/DF; AC 2001.34.00.029097-5/DF.
21
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias.”
22
“Art. 392. A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do em-
prego e do salário.
§ 1º A empregada deve, mediante atestado médico, notificar o seu empregador da data do início do afastamento do
emprego, que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto e ocorrência deste.
previdenciário e, como tal, não pode ser considerado salário. Marcelo Leonardo
Tavares23 o define como:
“O salário-maternidade, juntamente com o salário família, é um dos benefícios que
visam à cobertura dos encargos familiares. Tem por objetivo a substituição da remu-
neração da segurada gestante durante os cento e vinte dias de repouso, referentes à li-
cença maternidade.”
O salário-maternidade não corresponde a uma forma de salário, pois não remu-
nera o empregado pelo exercício de uma atividade laboral. Possui natureza jurídica
previdenciária; ou seja, o salário-maternidade está fora do âmbito de incidência da
contribuição previdenciária, prevista no art. 195, I, “a”, da CRFB24.
F - Férias
As férias constituem um período de interrupção do contrato de trabalho, havendo
a obrigatoriedade do pagamento de salário e a contagem do tempo de serviço con-
cedido ao empregado no decurso do seu período aquisitivo de 12 meses, objetivan-
do a recuperação do trabalhador a fim de combater o cansaço físico e psicológico,
assim como meio de socialização do trabalhador.
A Constituição determina que o pagamento da remuneração (férias) seja acres-
cido de gratificação compulsória, onde o empregado tem direito a um terço a mais
no salário normal, conforme o art. 7º, XVII25. A jurisprudência pacífica do STF con-
sidera que este abono possui a finalidade de permitir um “reforço financeiro neste
período (férias)”26. Com isso, a Colenda Corte concluiu que esta verba possui natu-
reza jurídica compensatória/indenizatória27. Ademais, por constituir um ganho even-
tual, o terço constitucional de férias não é incorporado ao salário para efeito de con-
tribuição previdenciária e tampouco integra a base de cálculo do benefício, confor-
me o disposto no parágrafo 11 do art. 201 da CRFB28.

§ 2º Os períodos de repouso, antes e depois do parto, poderão ser aumentados de 2 (duas) semanas cada um, median-
te atestado médico.
§ 3º Em caso de parto antecipado, a mulher terá direito aos 120 (cento e vinte) dias previstos neste artigo.
§ 4º É garantido à empregada, durante a gravidez, sem prejuízo do salário e demais direitos:
I - transferência de função, quando as condições de saúde o exigirem, assegurada a retomada da função anteriormen-
te exercida, logo após o retorno ao trabalho;
II - dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e
demais exames complementares.”
23
Direito Previdenciário, Regime Geral de Previdência Social e Regimes Próprios de Previdência Social. 9ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris. 2007. p. 168.
24
No TRF da 1ª Região, encontramos precedente neste sentido: AG 2005.01.00.056488-5/DF.
25
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.”
26
“Ementa: Agravo Regimental no Agravo de Instrumento. Processual Civil e Previdenciário. Ausência de Preques-
tionamento (Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal). Impossibilidade da Incidência de Contribuição Pre-
videnciária sobre o Terço Constitucional de Férias. Agravo Regimental ao qual se nega Provimento. (...) 2. A juris-
prudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que somente as parcelas que podem ser incorpora-
das à remuneração do servidor para fins de aposentadoria podem sofrer a incidência da contribuição previdenciária.”
(AI 710361-4 AgR/MG. Relator(a): Min. Cármen Lúcia. Julgamento: 07/04/2009. Órgão Julgador: Primeira Turma
- grifo nosso)
27
AI 603.537-AgR/DF.
28
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação
obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
§ 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição
previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.”
No mesmo sentido, não incide contribuição previdenciária sobre as férias inde-
nizadas. A natureza jurídica do abono pecuniário é indenizatória e objetiva resguar-
dar um acréscimo na remuneração do empregado, após seu período aquisitivo. Neste
mister, pode o empregado converter parte do seu período de férias em valor com-
pensatório pela continuidade relativa à prestação de serviço.
O art. 143 da CLT29 faculta ao trabalhador a conversão de 1/3 de suas férias em
abono pecuniário. O valor do abono será aquele da remuneração que faz jus a título
de férias, acrescido de um terço compensatório pelo período que a lei permite para
sua conversibilidade. A jurisprudência do STJ é unânime ao conferir natureza inde-
nizatória dessas verbas, abaixo30.
Destarte, resta evidente o caráter indenizatório do terço constitucional de férias
e do abono de férias e a conseqüente não obrigatoriedade do recolhimento da con-
tribuição previdenciária sobre estas parcelas.

G - Salário-família
O salário-família constitui um direito assegurado aos trabalhadores e será pago
mensalmente ao empregado pela empresa. Fazem jus ao benefício os trabalhadores
de baixa renda que possuírem renda entre R$ 472,00 e R$ 710,08 (Portaria nº 77,
de 12 março de 2008), além de dependentes. Trata-se de benefício de natureza pre-
videnciária e está previsto no art. 7º, XII, CRFB31 e no Decreto 3.048/9932.
O próprio Decreto 3.048/99 determina que o salário-família não poderá integrar
o salário-de-benefício para cálculo de renda mensal dos benefícios de prestação
continuada33. No mesmo sentido, o art. 9234 adverte que as cotas do salário-família
não serão incorporadas, para qualquer efeito, ao salário ou ao benefício.

29
“Art. 143. É facultado ao empregado converter 1/3 (um terço) do período de férias a que tiver direito em abono pe-
cuniário, no valor da remuneração que lhe seria devida nos dias correspondentes.”
30
REsp 863.244; REsp 898.142, AgRg no REsp 801.884; AgRg no REsp 859.423
“Tributário - Verbas Indenizatórias - Adicional de 1/3 de Férias Convertidas em Pecúnia - Não-incidência de Im-
posto de Renda - Repetição de Indébito - Dedução da Base da [sic] Cálculo do IR - Faculdade do Contribuinte - Lei
n. 8.383/91 - Ônus da Prova - Art. 333, I e II, do CPC.
1. Na hipótese dos autos, como as férias não gozadas foram indenizadas, mediante a sua conversão em pecúnia, não
há incidência do imposto de renda e, sendo o adicional de 1/3 um acessório, segue ele a sorte do principal, não estan-
do, também, sujeito à referida exação.
2. Uma vez julgada procedente a demanda, e por se tratar a presente de ‘Ação de Repetição de Indébito’, imperioso
que se declare o direito dos contribuinte [sic] à restituição das importâncias indevidamente recolhidas, nos termos
do pedido, conforme apurado em liquidação de sentença, sob pena de afronta ao comando insculpido no art. 66, § 2º,
da Lei n. 8.383/91. Recurso especial provido, para reconhecer a não-incidência do imposto de renda sobre o adicio-
nal de 1/3 de férias convertidas em pecúnia, bem como o direito do contribuinte à restituição das importâncias in-
devidamente recolhidas, nos termos do pedido, conforme apurado em liquidação de sentença.” (REsp 858.821-RS.
Relator(a): Min. Humberto Martins. Julgamento: 10/10/2006. Órgão Julgador: Segunda Turma - grifo nosso)
31
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei.”
32
“Art. 81. O salário-família será devido, mensalmente, ao segurado empregado, exceto o doméstico, e ao trabalhador
avulso que tenham salário-de-contribuição inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), na proporção
do respectivo número de filhos ou equiparados, nos termos do art. 16, observado o disposto no art. 83.”
33
“Art. 31. Salário-de-benefício é o valor básico utilizado para cálculo da renda mensal dos benefícios de prestação
continuada, inclusive os regidos por normas especiais, exceto o salário-família, a pensão por morte, o salário-mater-
nidade e os demais benefícios de legislação especial.”
34
“Art. 92. As cotas do salário-família não serão incorporadas, para qualquer efeito, ao salário ou ao benefício.”
Tratando-se de benefício previdenciário, não incorporável ao computo dos ren-
dimentos que integrarão a aposentadoria do trabalhador, não resta dúvida que o sa-
lário-família não constitui salário, não podendo incidir sobre ele, a contribuição
previdenciária patronal calculada sobre a folha de salários.

H - Aviso prévio
O aviso prévio tem como finalidade comunicar a outra parte do contrato de tra-
balho que não há mais interesse na continuidade do pacto laboral. Para isso, deve
haver um período mínimo de tempo previsto em lei, onde uma parte comunica a
outra que, no prazo de 30 dias, o contrato de trabalho será rescindido. Esta sistemá-
tica visa tanto dar ao empregado tempo hábil para procurar outro emprego, quanto
ao empregador repor a mão-de-obra.
O aviso prévio está regulado no art. 7º, XXI35, da CRFB e nos arts. 48736 e se-
guintes da CLT. O parágrafo 1º do art. 487 da CLT determina que rescindido o con-
trato antes de findo o prazo do aviso, o empregado tem direito ao pagamento do valor
relativo ao salário correspondente aquele período. Cumpre frisar que estas parcelas
não possuem natureza jurídica salarial, em virtude de constituir indenização pela
perda repentina do emprego. Além disso, o aviso prévio indenizado não pode ser
considerado como rendimentos de qualquer natureza, pois não decorre de prestação
de trabalho; assim, não há que se falar em incidência de contribuição previdenciá-
ria sobre tais verbas.
Em razão disso, não poderia o Decreto 6.727/0937 revogar a alínea “f” do inciso
V do parágrafo 9º do art. 214 do Decreto 3.048/99, o qual dispunha que o aviso pré-
vio não integrava o salário de contribuição. É sabido que as verbas indenizatórias
não compõem parcela do salário do empregado, posto que não têm caráter de habi-
tualidade, têm natureza meramente ressarcitória, pagas com a finalidade de recom-
por o patrimônio do empregado desligado sem justa causa, não incidindo sobre elas
a contribuição.

35
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei.”
36
“Art. 487. Não havendo prazo estipulado, a parte que, sem justo motivo, quiser rescindir o contrato deverá avisar a
outra da sua resolução com a antecedência mínima de:
I - oito dias, se o pagamento for efetuado por semana ou tempo inferior;
II - trinta dias aos que perceberem por quinzena ou mês, ou que tenham mais de 12 (doze) meses de serviço na em-
presa.
§ 1º A falta do aviso prévio por parte do empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao pra-
zo do aviso, garantida sempre a integração desse período no seu tempo de serviço.
§ 2º A falta de aviso prévio por parte do empregado dá ao empregador o direito de descontar os salários correspon-
dentes ao prazo respectivo.
§ 3º Em se tratando de salário pago na base de tarefa, o cálculo, para os efeitos dos parágrafos anteriores, será feito
de acordo com a média dos últimos 12 (doze) meses de serviço.
§ 4º É devido o aviso prévio na despedida indireta.
§ 5º O valor das horas extraordinárias habituais integra o aviso prévio indenizado.
§ 6º O reajustamento salarial coletivo, determinado no curso do aviso prévio, beneficia o empregado pré-avisado da
despedida, mesmo que tenha recebido antecipadamente os salários correspondentes ao período do aviso, que integra
seu tempo de serviço para todos os efeitos legais.”
37
“§ 9º Não integram o salário-de-contribuição, exclusivamente:”
A jurisprudência do STJ38 e do TRF da 1ª Região39 sempre se posicionou pela
impossibilidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o aviso prévio
indenizado. Além disso, a Justiça Federal em vários Estados tem concedido limi-
nares e proferido sentenças40, no sentido de conceder a segurança para suspender os
efeitos do Decreto 6.727/09.

I - Auxílio-educação
O auxílio-educação é um subsídio pago pelo empregador em benefício do em-
pregado, a fim de qualificá-lo e elevar seu grau de escolaridade. Sendo assim, o
auxílio-educação compreende todos os níveis de educação (fundamental, médio,
superior e pós-graduação).
Salta aos olhos que apesar da Lei 8.212/91, em seu art. 28, parágrafo 9º, “t”41,
dispor expressamente que estas verbas não integram o salário-contribuição; a Re-
ceita Federal do Brasil, por meio de uma interpretação restritiva, entende que so-
mente as verbas despendidas para o ensino fundamental estão isentas da contribui-
ção previdenciária.
O entendimento do órgão fazendário, além de antijurídico, causa enorme pre-
juízo aos empregados uma vez que desestimula os empregadores a investir na qua-
lificação técnica de seus profissionais, limitando a possibilidade de promoções e
acesso a remunerações maiores. Teleologicamente, o legislador, ao conceder a isen-
ção do art. 28, parágrafo 9º, “t”, da Lei 8.212/91, buscou dar maior possibilidade
de ingresso aos trabalhadores em cursos de nível superior e pós-graduação. Este tipo
de formação acadêmica ainda é inacessível à maior parte da população brasileira e
o Estado não consegue suprir satisfatoriamente esta demanda. Por esta razão, criou
inúmeras políticas públicas em parceria com a iniciativa privada, visando o aumen-
to de vagas no ensino superior, a exemplo do Prouni e do Fies. Desta forma, não pode
o Fisco desnaturar estes incentivos, desfigurando o benefício fiscal concedido.
Ressalte-se que o art. 458, parágrafo 2º, II, da CLT42 é categórico ao determinar
que os pagamentos efetuados para a educação dos empregados não constitui salá-
rio. Ora, se nem a CLT, nem a Lei 8.212/91 faz qualquer restrição ao ensino supe-
rior, não cabe à Receita Federal do Brasil fazê-la. Ademais, o art. 28 da Lei 8.212/91
prevê que o salário-educação será devido sob as importâncias pagas, decorrentes do
trabalho realizado. Ora, o auxílio-educação é uma liberalidade do empregador, não
vinculada à remuneração da atividade laboral43.

38
REsp 3.794/PE.
39
AC 199738000616751; AC 200001000153456.
40
20096100013885-3 JF/SP; MS 20096110001796-8 JF/SP.
41
“§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: t) o valor relativo a plano edu-
cacional que vise à educação básica, nos termos do art. 21 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e a cursos de
capacitação e qualificação profissionais vinculados às atividades desenvolvidas pela empresa, desde que não seja
utilizado em substituição de parcela salarial e que todos os empregados e dirigentes tenham acesso ao mesmo.”
42
“§ 2º Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas
pelo empregador: II - educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo os valores
relativos a matrícula, mensalidade, anuidade, livros e material didático.”
43
A jurisprudência do STJ corrobora o entendimento aqui exposto - REsp 767.726/PE.
J - Auxílio-doença
O auxílio-doença, previsto no art. 60 da Lei 8.213/9144, é o benefício concedi-
do em razão da incapacidade temporária do trabalhador, obrigando-o a se afastar da
atividade laboral por um período superior a 15 dias. Neste período inicial, o paga-
mento do salário é de responsabilidade do empregador, após esse prazo caberá à
Previdência Social arcar com estes custos.
O auxílio-doença é um benefício de natureza previdenciária que não se sujeita
ao pagamento da contribuição, pelo simples fato de que, nos primeiros 15 dias, não
há prestação de efetivo serviço, então não há que se falar em salário. Nunca é de-
mais repetir que o salário-contribuição previsto no art. 28, I, da Lei 8.212/91 tem
como fato gerador o salário, fruto de uma relação de trabalho. No presente caso, em
razão de uma enfermidade, o trabalhador fica impedido de exercer sua atividade
laboral, mas ainda assim, recebe pela empresa verba equivalente ao valor do seu
salário. Forçoso concluir que sobre esta parcela não pode haver recolhimento da
contribuição previdenciária45.

L - Auxílio-creche
O auxílio-creche é um benefício pecuniário concedido pelo empregador aos
empregados que possuam dependentes em idade pré-escolar. O pagamento deste
auxílio tem por objetivo garantir a formação educacional dos filhos dos trabalhado-
res e mantê-los em lugar seguro, enquanto os pais estão realizando a jornada de tra-
balho.
Este benefício está previsto no art. 7º, XXV, da CRFB46. Destaca-se que o art.
458, parágrafo 2º, II, da CLT47 é categórico ao determinar que o pagamento efetua-
do a título de auxílio-creche não constitui salário. No mesmo sentido, o art. 28, pa-
rágrafo 9º, “t”48 da Lei 8.212/91, exclui da incidência do salário-de-contribuição as
importâncias creditadas a este título.
Ora se nem a CLT, nem a Lei 8.212/91 faz expressa referência sobre a incidên-
cia de contribuição previdenciária sobre o auxílio-creche, não pode a Receita Fede-
ral do Brasil estender sua interpretação para realizar a cobrança, sob pena de ofen-

44
“Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da ati-
vidade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer inca-
paz.
§ 3º Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá
à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral.”
45
Mais uma vez, colacionamos jurisprudência favorável do STJ sobre o tema no AgRg no REsp 1.087.216/RS.
46
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-
escolas.”
47
“§ 2º Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas
pelo empregador: II - educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo os valores
relativos a matrícula, mensalidade, anuidade, livros e material didático.”
48
“§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: t) o valor relativo a plano edu-
cacional que vise à educação básica, nos termos do art. 21 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e a cursos de
capacitação e qualificação profissionais vinculados às atividades desenvolvidas pela empresa, desde que não seja
utilizado em substituição de parcela salarial e que todos os empregados e dirigentes tenham acesso ao mesmo.”
sa à regra da tipicidade fechada em matéria tributária, de acordo como art. 150, I,
da CRFB. Ademais, o auxílio-creche possui caráter indenizatório, pelo fato de a
empresa não manter em funcionamento uma creche em seu próprio estabelecimen-
to e, conseqüentemente, não integra a base de cálculo da contribuição previdenciária,
em razão de sua natureza49.

4 - O Princípio da Reserva Legal em Matéria Tributária


Corolário do Direito Tributário, a regra da reserva legal dispõe que somente a
lei em sentido estrito é apta para criação e majoração dos tributos e; dependendo da
matéria, somente a lei complementar será meio hábil para esse mister. A Constitui-
ção discriminou taxativamente os casos reservados a lei complementar; nestas si-
tuações não poderá o legislador infraconstitucional regular a matéria por meio de
lei ordinária, sob pena de inconstitucionalidade da norma.
Entre as hipóteses previstas pela CF destacamos o art. 195, parágrafo 4º50, onde
cabe (exclusivamente) à lei complementar o exercício da competência tributária
residual da União para a instituição de novas fontes de custeio para a Previdência
Social. O Fisco Federal, ao exigir o pagamento de contribuições previdenciárias não
sujeitas ao âmbito de incidência do art. 195, I, da CF, elencadas neste mandamus,
está inovando em matéria tributária, pois o fato gerador destas exigências não está
adstrito ao conceito de salário perfilhado pela Constituição e pela jurisprudência.
Há vício de constitucionalidade na exigência da contribuição social incidente
sobre a folha de salários sobre as verbas trabalhistas supra elencadas, em razão de
invadir a competência reservada à lei complementar.

5 - Conclusão
Pode-se mencionar de forma simplificada a tese aqui exposta dizendo: toda vez
que a verba paga pelo empregador não se constituir em salário, ou seja, contrapres-
tação pelo trabalho, com caráter remuneratório e periódico, não deverá haver a in-
cidência de contribuição previdenciária.
Nesse sentido, as verbas referentes a adicional noturno, insalubridade, hora
extra, salário-maternidade, terço constitucional de férias e férias indenizadas, adi-
cional de periculosidade, salário-família, aviso prévio, auxílio-educação, auxílio-
doença e auxílio-creche, por não se caracterizarem como remuneração pelo traba-
lho, mas sim como indenização, e também pelo seu caráter periódico, não devem
sofrer incidência previdenciária.

49
No mesmo sentido, o STJ já se manifestou em diversos julgados: AgRg no REsp 1.079.212/SP; AgRg no REsp
1.079.212/SP. Este entendimento já está, inclusive, sumulado, vejamos: “Súmula 310: O Auxílio-creche não integra
o salário-de-contribuição.”
50
“§ 4º A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obe-
decido o disposto no art. 154, I.”
A Nova Lei do Mandado de Segurança
e as Restrições à Garantia de Jurisdição
em Matéria Tributária
Hugo de Brito Machado

1. Introdução
A Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, disciplina o
mandado de segurança antes regulado pela Lei nº 1.533, de
31 de dezembro de 1951. Segundo os que defendem a nova
Lei, teria havido apenas a consolidação em texto único do
que já estava em leis anteriores ou no entendimento jurispru-
dencial pacificado. Não nos parece, porém, que seja assim,
pois na verdade algumas inovações foram introduzidas, en-
tre elas a proibição pura e simples da concessão de medida
liminar e da execução provisória da sentença que concede o
mandado de segurança, quando a proteção pleiteada pelo
impetrante seja para o direito de compensar crédito tributá-
rio ou obter a liberação de mercadoria importada.1
Não desconhecemos a existência do art. 170-A, do Có-
digo Tributário Nacional, albergando norma segundo a qual
é vedada a compensação mediante o aproveitamento de tri-
buto, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo,
antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial.
Nem desconhecemos o que estabelecia a Lei nº 2.770, de
4 de maio de 1956, quanto à liminar e quanto à execução pro-
visória de sentença que determinasse a liberação de merca-
doria procedente do exterior.
Entretanto, não concordamos com o alcance atribuído ao
citado artigo do Código Tributário Nacional em decorrência
da confusão que tem sido feita entre duas situações distin-
tas. Uma, a situação na qual se discuta o direito à compen-
sação mediante a utilização, pelo contribuinte, de um crédi-
to seu contra a Fazenda Pública, crédito sobre o qual não
exista nenhuma pendência. E a outra, aquela situação na qual
se discuta o direito à compensação mediante a utilização,
pelo contribuinte, como crédito seu, do valor de um tributo
cujo pagamento o contribuinte considera indevido, mas es-
teja ainda pendente de decisão judicial definitiva a questão Hugo de Brito
Machado
de saber se realmente ocorreu pagamento indevido. E quan-
é Professor Titular de
to à Lei nº 2.770/56 lembramos que se vinha entendendo ser Direito Tributário da
UFC e Presidente do
Instituto Cearense de
1
Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, art. 7º, parágrafo 2º. Estudos Tributários.
a restrição na mesma contida aplicável apenas a mercadorias objeto de contraban-
do ou descaminho. Entendimento, aliás, inteiramente compatível com a norma de
seu art. 2º, que se refere a entrega ou vinda do exterior de mercadorias, bens ou
coisas de qualquer natureza, a indicar que o provimento judicial em questão seria
referente à autorização para importar mercadoria proibida.
Neste pequeno estudo pretendemos demonstrar a distinção essencial entre aque-
las duas situações nas quais se cogita de compensação, para deixar claro que a nova
Lei do mandado de segurança realmente inovou. E quanto à liberação de mercado-
rias importadas vamos demonstrar que a nova Lei do mandado de segurança tam-
bém inovou e suscitou questão praticamente superada. Em ambos os casos, ao ino-
var, incorreu em flagrante inconstitucionalidade porque violou a garantia de juris-
dição, retirando-a tanto do contribuinte que pretenda proteção para o seu direito à
compensação, como daquele que tenha contra si exigência arbitrária relacionada
com a importação regular de qualquer mercadoria.
Começaremos pelo exame da garantia constitucional de jurisdição, para deixar
claro que a mesma abrange o direito aos provimentos judiciais de urgência quando
estes sejam necessários, assim como o direito à execução das decisões judiciais, que
não podem servir apenas como peças de adorno da ordem jurídica. Depois vamos
demonstrar que realmente existe uma diferença essencial, da maior importância,
entre o direito ao crédito contra a Fazenda Pública e o direito de extinguir um cré-
dito tributário quando o contribuinte tenha contra a Fazenda Pública um crédito lí-
quido e certo, seja porque já por esta reconhecido, seja porque objeto de decisão
judicial definitiva. E finalmente examinaremos o alcance dos dispositivos da nova
Lei do mandado de segurança que albergam restrições relativas ao direito à com-
pensação, assim como ao direito à liberação de mercadorias, buscando demonstrar
que eles realmente inovaram e, nessa parte, consubstanciam flagrante inconstitu-
cionalidade.

2. Garantia Constitucional de Jurisdição


Ao cuidar Dos Direitos e Garantias Fundamentais, a vigente Constituição Fe-
deral assegura que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito.2 Resta-nos então examinar o alcance dessa garantia constitucio-
nal para vermos se ela foi, ou não foi, contrariada pelos dispositivos da Lei nº 12.016,
de 7 de agosto de 2009, que impõem restrições ao mandado de segurança como ins-
trumento para a proteção do direito do contribuinte de compensar, assim como ao
direito de obter a liberação de mercadorias importadas.
Sobre o alcance do dispositivo constitucional que garante o direito à jurisdição
já escrevemos:3
“Ao dizer que a lei não pode excluir da apreciação judicial lesão ou ameaça a direito,
a Constituição Federal está proibindo a edição de lei que exclua, quer direta quer indi-
retamente, a apreciação judicial de pretensões à proteção contra lesões e contra amea-

2
Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso XXXV.
3
Hugo de Brito Machado, Comentários ao Código Tributário Nacional, vol. III, 2ª edição, Atlas, São Paulo, 2009,
p. 431.
ças a direitos. A adequada interpretação do preceito constitucional, que impede se faça
dele letra morta, não pode ser outra. O dispositivo constitucional há de ser interpreta-
do de modo a que não reste amesquinhado o seu conteúdo. A não ser assim não estará
sendo assegurada a máxima efetividade à norma da Constituição.
Segundo a moderna doutrina do Direito Constitucional, as normas de uma Constitui-
ção devem ser interpretadas com observância de alguns princípios, entre os quais se
destaca o da máxima efetividade. Como assevera Canotilho, ‘a uma norma constitu-
cional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê’.”4
A garantia de jurisdição, portanto, há de ser entendida como garantia a uma pres-
tação jurisdicional efetiva, isto é, uma prestação jurisdicional capaz de garantir os
direitos, evitando o perecimento ou a deterioração destes pelo decurso do tempo,
com os provimentos de urgência, quantos sejam necessários, como a efetividade dos
direitos, com a execução do julgado. No dizer de Ricardo Perlingeiro, “não assegu-
rar o direito à execução é o mesmo que negar o direito de ação, não sendo admissí-
vel, no atual estágio da sociedade, interpretar o princípio do Estado democrático de
Direito de modo a concluir que não há execução contra a Fazenda Pública”.5 E não
assegurar os provimentos de urgência, quando sejam necessários para evitar o pe-
recimento do direito, é também, indiscutivelmente, negar a jurisdição.
É importante, pois, entendermos o alcance da norma albergada no art. 170-A,
do Código Tributário Nacional, para que possamos entender a inconstitucionalida-
de do dispositivo da nova Lei do mandado de segurança, que veda pura e simples-
mente o deferimento de medida liminar que tenha por objeto o direito à compensa-
ção de créditos tributários.

3. Direito ao Crédito e Direito de compensar


3.1. Duas situações essencialmente distintas
Para que se possa entender o alcance da norma albergada pelo art. 170-A, do
Código Tributário Nacional, é importante que se tenha em vista a distinção essen-
cial que existe entre as duas situações, a saber: na primeira, o que se questiona é o
direito do contribuinte de extinguir um crédito tributário, mediante compensação,
utilizando um crédito seu contra a Fazenda Pública decorrente de um pagamento de
tributo que considera indevido e sobre o qual está questionando em juízo. Na segun-
da, o que se questiona é apenas o direito do contribuinte de extinguir um crédito tri-
butário, mediante compensação, utilizando um crédito seu contra a Fazenda Públi-
ca que se opõe à compensação sem negar a existência do crédito, já reconhecida
administrativa ou judicialmente.
Porque consideramos essencial essa distinção, já escrevemos:
“Questão da maior importância reside em saber se o art. 170-A do Código Tributário
Nacional, ao dizer que é vedada a compensação antes do trânsito em julgado da deci-
são que reconhece o direito do contribuinte, proíbe o deferimento de provimento cau-
telar, ou antecipatório, para garantir desde logo o direito de compensar.

4
José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional, Almedina, Coimbra, 1996, p. 227.
5
Ricardo Perlingeiro, “Redefinição de Papéis na Execução de Quantia Certa Contra a Fazenda Pública”, Revista CEJ
vol. 31, CJF, Brasília, dezembro de 2005, p. 69.
Resposta afirmativa a essa questão não se pode admitir sem menosprezo à garantia
constitucional de jurisdição, posto que, nos casos em que os provimentos cautelares
ou antecipatórios são cabíveis, sua denegação implica denegação da própria jurisdição,
que para ser efetiva há de ter útil e não apenas formal. A melhor interpretação do
art. 170-A do Código Tributário Nacional, inclusive porque o coloca de acordo com a
Constituição, é aquela segundo a qual dita norma não exclui a possibilidade de provi-
mentos cautelares ou antecipatórios.”
Realmente, a norma albergada pelo art. 170-A, do Código Tributário Nacional,
não exclui de modo nenhum os provimentos judiciais liminares ou antecipatórios,
quando se esteja a discutir na ação apenas o direito à compensação. Essa norma só
abrange as situações nas quais exista litígio sobre a existência do crédito contra a
Fazenda. E mesmo nessa situação, por ela abrangida, temos de considerar que se
trata de norma dirigida apenas à autoridade administrativa. Entendê-la como regra
dirigida ao juiz implica colocá-la em aberto conflito com a Constituição, como já
tivemos oportunidade de demonstrar.6
Vejamos cada uma dessas duas situações.

3.2. Direito ao crédito contra a Fazenda Pública


A norma do art. 170-A, do Código Tributário Nacional, veda “a compensação
mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito
passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial”. Não é preciso
que se tenha extraordinária acuidade para perceber que a disputa judicial à qual se
refere essa norma é em torno do aproveitamento de tributo que o contribuinte en-
tende haver pago indevidamente. Em outras palavras, a disputa é em torno do direi-
to ao crédito contra a Fazenda Pública. Sobre este ponto já escrevemos:
“O objeto da contestação judicial, e da decisão com trânsito em julgado, nos termos e
para os fins do art. 170-A do CTN é o tributo cujo valor pretende o contribuinte haver
como crédito seu à consideração de que o pagou indevidamente.
Pago um tributo indevidamente, a Administração tem o dever de devolver de ofício a
quantia indevidamente recebida. Na prática, porém, não o faz, por razões tão eviden-
tes quanto lamentáveis. Seja como for, feito o pagamento indevido, o contribuinte pode
requerer administrativamente a respectiva restituição. E pode pedir a restituição na via
judicial, com a ação de repetição do indébito.
Se prefere promover ação judicial pedindo a restituição do valor que entende haver
pago indevidamente, e a Fazenda Pública contesta a ação, como geralmente acontece,
aí então só poderá fazer a compensação depois do trânsito em julgado da sentença que
julgar a ação procedente. É este o sentido da norma albergada pelo art. 170-A do Có-
digo Tributário Nacional.”7
Havendo questionamento judicial a respeito do crédito contra a Fazenda Públi-
ca que o contribuinte quer utilizar para extinguir, por compensação, um crédito tri-
butário, é razoável a restrição estabelecida pela norma do art. 170-A, do Código
Tributário Nacional. O crédito tributário regularmente constituído pelo lançamento

6
Hugo de Brito Machado, Comentários ao Código Tributário Nacional, vol. III, 2ª edição, Atlas, São Paulo, 2009,
pp. 468 a 473.
7
Hugo de Brito Machado, Comentários ao Código Tributário Nacional, vol. III, 2ª edição, Atlas, São Paulo, 2009,
p. 465.
presume-se líquido e certo. É razoável, portanto, que não se admita a sua extinção
por compensação com um crédito sobre o qual existe um litígio. Entretanto, é razoá-
vel entender-se que a restrição feita pela norma do art. 170-A, do Código Tributá-
rio Nacional, dirige-se à autoridade administrativa, conforme demonstramos em
comentário a essa norma.8 Não nos parece que a referida norma constitua obstácu-
lo ao deferimento de provimento judicial de urgência, quando este seja cabível. A
interpretação que atribui a essa norma tamanho alcance a coloca decididamente em
conflito com a Constituição, como adiante será demonstrado.

3.3. Direito de compensar como objeto da disputa judicial


Na segunda das situações em exame, repita-se, o que se questiona é apenas o
direito do contribuinte de extinguir um crédito tributário, mediante compensação,
utilizando um crédito seu contra a Fazenda Pública que se opõe à compensação sem
negar a existência do crédito, já reconhecida administrativa ou judicialmente.
Como não existe disputa sobre o crédito contra a Fazenda Pública, trata-se nes-
te caso de um crédito líquido e certo, tanto quanto o crédito tributário. E pode até
tratar-se de um crédito sobre o qual não se pode mais questionar, pois em se tratan-
do de precatório, por exemplo, o crédito já passou por todos os questionamentos
judiciais possíveis. Não é razoável, pois, negar-se ao contribuinte o direito à com-
pensação.
Em casos assim, quando o contribuinte impetra mandado de segurança contra a
negação, pela autoridade administrativa, do seu direito à compensação, não se ques-
tiona o seu direito ao crédito contra a Fazenda, mas, simplesmente, o seu direito à
compensação. Em outras palavras, o objeto da disputa é o direito do contribuinte de
ver extinta a sua dívida perante a Fazenda, pelo fato de não ser apenas devedor, mas
também ser credor desta. A Fazenda admite ser devedora, mas pretende mesmo as-
sim impedir a extinção do crédito tributário mediante compensação.
Esse direito à compensação, além de ter fundamento constitucional, é daqueles
direitos que não precisam estar expressos em nenhuma regra jurídica, porque na
verdade decorrem da própria relação jurídica obrigacional.

4. Direito à Liberação de Mercadorias Importadas


4.1. Importação clandestina ou fraudulenta
Denominamos, aqui, importação clandestina aquela que seja realizada por vias
que não são as legalmente estabelecidas para esse fim. E fraudulenta aquela que,
embora realizada pelas vias ordinariamente admitidas para tanto, se faça com indi-
cação fraudulenta do objeto, vale dizer, da mercadoria efetivamente importada, ou
do seu preço.
Importante, porém, é a distinção que deve ser considerada entre uma importa-
ção fraudulenta e a importação com possível erro de direito, vale dizer, erro na clas-
sificação fiscal da mercadoria. Neste caso, em que a descrição das mercadorias nos

8
Hugo de Brito Machado, Comentários ao Código Tributário Nacional, vol. III, 2ª edição, Atlas, São Paulo, 2009,
pp. 470 e 471.
respectivos documentos é feita com exatidão, e a inexatidão consiste apenas na clas-
sificação fiscal correspondente, não de pode considerar a importação fraudulenta.
A divergência entre o importador e a Fazenda residirá em questão simplesmente de
direito. Questão cujo deslinde independe da produção de provas e por isto mesmo
pode dar-se no âmbito do mandado de segurança, a cuja impetração o contribuinte
tem inegável direito, inclusive com os efeitos ordinariamente a tal impetração ine-
rentes, sem ressalvas de qualquer natureza.

4.2. Exigência arbitrária na importação regular


Restando os direitos do importador desprovidos da garantia de jurisdição de
urgência, ou ao menos a ser prestada em prazo razoável, a autoridade da Adminis-
tração Tributária restará estimulada a formular exigências inteiramente arbitrárias
na importação regular de mercadorias.
Admita-se, para demonstrar o que estamos afirmando, que a autoridade adua-
neira exija o pagamento de tributos em valor indiscutivelmente superior ao valor
efetivamente devido. Em tal situação, ou o contribuinte atende a essa exigência in-
discutivelmente ilegal ou não obterá a liberação da mercadoria, pois não dispõe de
instrumento jurídico processual que possa utilizar para a proteção do seu direito.
Nem o mandado de segurança, nem o procedimento ordinário, pois em ambos está
proibida a tutela de urgência, bem como a execução provisória da sentença.

4.3. Exigência de garantia para a liberação da mercadoria


A concessão de um provimento de natureza cautelar ou antecipatória pode, em
certos casos, ser condicionado, pelo juiz, à prestação de contracautela. Dependen-
do das circunstâncias do caso concreto, tal exigência pode ser razoável, porque a
reparação do dano eventualmente decorrente de um provimento judicial de urgên-
cia, quando a decisão final não o confirma, é indiscutivelmente justa.
A Lei nº 2.770/56, aliás, admitia expressamente a execução provisória de sen-
tença ou acórdão que determinasse a entrega de mercadoria importada, ou autori-
zasse a correspondente importação. Neste ponto, portanto, a nova Lei do mandado
de segurança não se limitou a consolidar, mas realmente inovou a disciplina desse
importante instrumento processual.
Realmente, a nova Lei do mandado de segurança proíbe expressamente a con-
cessão de liminar, e de execução provisória de sentença ou acórdão, que tenha por
objeto a compensação de crédito tributário ou a liberação de mercadoria importa-
da, embora em outros casos permita o provimento de urgência mediante contracau-
tela.

5. Flagrante Inconstitucionalidade
5.1. Fundamento constitucional do direito à compensação
Não temos dúvida de que o direito de compensar, em se tratando de crédito re-
conhecido pela Fazenda, ou já afirmado definitivamente pelo Judiciário, como é o
caso do crédito consubstanciado em precatório, é um direito que tem fundamento
na Constituição Federal, que alberga princípios inteiramente incompatíveis com a
idéia de lei que possa impor restrições ao direito de compensar.
Realmente, nossa Constituição Federal alberga, entre os objetivos fundamentais
de nossa República, construir uma sociedade livre, justa e solidária.9 E assegura que
a Administração Pública submete-se aos princípios que indica, entre os quais o prin-
cípio da moralidade.10 Está absolutamente claro, portanto, que justiça e moralidade
estão presentes nas relações do Estado com os cidadãos.
Aliás, o Direito só será justo se tiver fundamento moral. E só terá fundamento
moral, se for justo. Moral e justiça são idéias inseparáveis, com implicações recí-
procas. Sem elas o ordenamento jurídico é inútil, até porque sua eficácia restará de
tal forma comprometida que, ao menos nas relações entre o indivíduo e o Estado,
sobrarão espaços imensos para o arbítrio. Assim, ao examinarmos os fundamentos
do direito à compensação temos de começar confrontando esse direito com o prin-
cípio da moralidade.
A moralidade, hoje, repele a idéia de um Estado autoritário, irresponsável, so-
berano senhor do bem e do mal. O Estado de hoje há de ser tratado como um sujei-
to de direitos e de deveres, como qualquer outro, ressalvadas apenas e tão-somente
aquelas situações nas quais a Constituição estabelece limitações aos direitos dos
cidadãos. Assim, por exemplo, a Constituição atribui ao Estado o poder de tributar,
mas traça rigorosos limites ao exercício desse poder. O Estado tributa, mas o faz nos
termos da lei. Há de tratar a relação obrigacional tributária como relação jurídica
que é. Perante a relação tributária, há de colocar-se em condições de igualdade com
os cidadãos que da mesma participam, afastada toda e qualquer supremacia do Es-
tado, posto que a supremacia não pode ir além do próprio poder de instituir o tribu-
to.
Nem se venha dizer que as limitações do Estado se resumem no princípio da
legalidade e, por isto mesmo, uma vez estabelecidas pela lei, as restrições aos di-
reitos dos cidadãos seriam legítimas. Se essa tese, de clara inspiração autoritária,
fosse aceitável, chegaríamos à inevitável conseqüência de ter de admitir como vá-
lida uma lei que extinguisse, pura e simplesmente, créditos contra a Fazenda.
Imagine-se uma lei ordinária que, aprovada pela unanimidade dos membros do
Parlamento, dissesse expressamente que ficam extintas as dívidas da União. Essa
lei, não obstante aprovada pelo órgão competente - tendo-se assim atendido plena-
mente o princípio da estrita legalidade -, seria flagrantemente contrária aos direitos
que a Constituição assegura ao cidadão. Seria verdadeiramente teratológica, e sua
invalidade seria da maior evidência.
Da mesma forma e pelas mesmas razões, desprovida de validade, porque con-
trária à Constituição, é a lei que impõe restrições aos direitos do cidadão, entre eles
o direito à compensação, de sorte a extinguir por via oblíqua esses direitos que fi-
cam reduzidos a meras expressões retóricas.
A exclusão da compensação diretamente ou por via oblíqua consubstanciada na
exigência de formalidades descabidas, de tão absurda, é desprovida não só do am-
paro jurídico, mas também e especialmente do amparo na moralidade. Qualquer que

9
Constituição Federal de 1988, art. 3º, inciso I.
10
Constituição Federal de 1988, art. 37.
seja a concepção de moral que se adote entre as vigentes no mundo civilizado, nin-
guém encontrará apoio para a pretensão de receber seus créditos sem pagar os seus
débitos.
Além do princípio da moralidade, a vigente Constituição assegura o direito de
propriedade. Os créditos contra a Fazenda Pública constituem, sem dúvida, direi-
tos de propriedade, posto que integram o patrimônio do credor. Assim, admitir que
inexiste o direito à compensação contra a Fazenda Pública é admitir que esta não é
obrigada a respeitar o direito de propriedade de seu credor, ou então, em outras pa-
lavras, admitir que não existe o direito de propriedade ou que este não pode ser exer-
cido contra a Fazenda Pública, o que consubstancia evidente absurdo.
Os créditos do contribuinte, inclusive o crédito contra a Fazenda Pública, são
parcelas de seu patrimônio e estão, portanto, protegidos pelo denominado direito de
propriedade, que não se restringe, como podem pensar os menos avisados, aos di-
reitos sobre bens imóveis.
Nem se venha argumentar com as limitações ao direito de propriedade. Como
assevera com inteira razão Gabriel Lacerda Troianelli, as limitações ao direito de
propriedade são somente as previstas na própria Constituição,11 e entre estas não se
encontra a possibilidade de desconsideração, na cobrança dos tributos, dos créditos
que o contribuinte tenha contra a Fazenda Pública. Por isto mesmo afirma Cleide
Previtalli Cais, com toda razão, que:
“O princípio de proteção ao direito de propriedade tem larga aplicação nas normas
relativas ao exercício do direito de compensação de créditos tributários, visando evi-
tar a colocação de empecilhos ao seu exercício, e, com isso, afastando a ocorrência de
confisco e de enriquecimento sem causa por parte da Administração.”12
Restrições substanciais ao direito do contribuinte à compensação implicam, sem
dúvida alguma, confisco de seu crédito perante a Fazenda Pública, absolutamente
inadmissível.
A Constituição Federal, por outro lado, também alberga o princípio da isono-
mia, que consubstancia, aliás, idéia que é da própria essência do Direito. E o direi-
to à compensação tem também, inegavelmente, fundamento no princípio da isono-
mia. Tanto o direito à compensação como categoria geral, ou categoria da Teoria
Geral do Direito, como o direito à compensação no âmbito da relação tributária. O
crédito de um dos sujeitos da relação jurídica obrigacional não pode ser privilegia-
do em relação ao crédito do outro daqueles sujeitos.
Evidentemente o direito de crédito que a Fazenda Pública tem contra o contri-
buinte não é merecedor de maior proteção do que o direito de crédito que este tem
contra aquela. Coloca-se, então, o princípio da isonomia, como um fundamento do
direito que tem o contribuinte à compensação contra a Fazenda Pública.
Aliás, é sabido que a Fazenda Pública, quando tem de fazer algum pagamento,
e aquele a quem vai pagar é seu devedor, efetua a compensação correspondente e
paga apenas o saldo, se houver. Assim, mais evidente fica o direito do contribuinte
à compensação, fundado no princípio da isonomia.

11
Gabriel Lacerda Troianelli, Compensação do Indébito Tributário, Dialética, São Paulo, 1998, pp. 19/21.
12
Cleide Previtalli Cais, O Processo Tributário, 4ª edição, RT, São Paulo, 2004, p. 438.
Registre-se, ainda, que também o princípio da razoabilidade ampara o direito do
contribuinte de compensar seus créditos contra a Fazenda Pública com as dívidas
que tenha para com a mesma, na medida em que impede as vedações feitas por via
oblíqua. Se a lei estabelece condições ou requisitos a serem atendidos, que não se-
jam razoáveis, porque desnecessários para evitar fraudes e permitir o controle das
compensações por parte da Administração, ofende o princípio da razoabilidade e,
assim, resulta inconstitucional.
Ressalte-se que as restrições à compensação, mesmo não envolvendo a Fazen-
da Pública, já tiveram fundamento no interesse do Fisco. Como assevera Uelze, uma
causa dessas restrições já foi o interesse que o senhor feudal tinha na solução das
pendências, pois, de direito, auferia uma parcela da prestação em litígio.13 Isto, po-
rém, está hoje superado, porque inteiramente incompatível com a idéia de Estado
de Direito Democrático.

5.2. Fundamento constitucional do direito à liberação de mercadoria importada


É indiscutível também o fundamento constitucional do direito à liberação de
mercadoria importada. Esse fundamento está no direito de propriedade, expressa-
mente assegurado em dispositivo segundo o qual é garantido o direito de proprie-
dade.14
Certamente aqui não estamos nos referindo à mercadoria objeto de importação
clandestina ou fraudulenta. Entretanto, excluída a hipótese de crime, posto que é
constitucionalmente permitida a pena de perda de bens, negar o direito à jurisdição
destinada a garantir a propriedade da mercadoria ou qualquer outro bem importado
equivale a negar o direito de propriedade, pondo-se desta forma a lei que o fizer em
conflito com a Constituição.

5.3. Ainda a garantia de jurisdição


Registre-se que em face da garantia de jurisdição, assegurada pelo art. 5º, inci-
so XXXV, da vigente Constituição, o dever de prestar a jurisdição independe de um
prévio exame da existência do direito que se diz lesionado ou ameaçado, e abrange
as medidas de urgência necessárias à sua efetiva preservação.
A questão de saber se está presente lesão ou ameaça a direito, e se estão pre-
sentes os requisitos para a prestação jurisdicional de urgência, deve ser enfrentada
na própria prestação jurisdicional, vale dizer, é uma questão que deve ser resolvida
pelo próprio juiz do caso, no desempenho regular de sua função.

5.4. A flagrante inconstitucionalidade


Nada justifica, portanto, a proibição pura e simples da concessão da liminar,
muito menos essa proibição somada à proibição de execução provisória da senten-

13
Hugo Barroso Uelze, “Compensação Tributária: uma Proposta de Conceituação à Luz das ‘Categorias Gerais de Di-
reito’ e do Novo Código Civil”, Revista Tributária e de Finanças Públicas nº 57, RT, São Paulo, julho/agosto de
2004, p. 154.
14
Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso XXII.
ça concessiva da segurança. Ao conceder a medida liminar, o juiz deve ter observa-
do a presença dos requisitos legalmente exigidos para esse fim, e ao prolatar a sen-
tença o juiz já conhece as razões que levaram a autoridade a praticar o ato impug-
nado como ilegal ou abusivo. Por outro lado, o Poder Público dispõe, além do agra-
vo contra a concessão da liminar e da apelação contra a sentença, de um meio ex-
pedito para impedir a execução, tanto da liminar, como da sentença, que é o pedido
ao presidente do tribunal, de suspensão da liminar, e da sentença, nos casos em que
tal suspensão de algum modo pode ser justificável.
Não obstante, a Lei nº 12.016/09 estabelece que não será concedida medida li-
minar que tenha por objeto, entre outros, a compensação de créditos tributários e
a entrega de mercadorias ou bens provenientes do exterior.15 E estabelece também
que a sentença concessiva da segurança poderá ser executada provisoriamente, sal-
vo nos casos em que for vedada a concessão de medida liminar.16 E ainda, estabe-
lece também que as vedações quanto à medida liminar se estendem à tutela anteci-
pada a que se referem os arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil. Como se vê,
essa Lei proíbe a prestação jurisdicional efetiva e útil ao contribuinte, quando tenha
lesionado o seu direito à compensação. E o faz do modo mais amplo e absoluto,
incluindo na vedação até aqueles casos nos quais o crédito do contribuinte contra a
Fazenda não seja objeto de qualquer questionamento. Por isto mesmo, já afirmamos
serem esses dispositivos incompatíveis com a garantia de jurisdição e, assim, incons-
titucionais.17
É sabido que o trânsito em julgado da sentença que concede o mandado de se-
gurança geralmente demora demasiadamente, sobretudo quando a Fazenda quer
protelar, pois a possibilidade de interposição de recursos é praticamente inesgotá-
vel. Não temos dúvida, pois, de que os dispositivos legais em questão, ao vedarem
a concessão de medida liminar e a execução provisória da sentença em mandados
de segurança destinados a proteger o direito do contribuinte à compensação tribu-
tária ou à liberação de mercadorias importadas são flagrantemente inconstitucionais.

15
Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, art. 7º, parágrafo 2º.
16
Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, art. 14, parágrafo 3º.
17
Hugo de Brito Machado, Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 8ª edição, Dialética, São Paulo, 2009,
p. 142.
Da Prescrição e da Decadência na
Cobrança de Contribuições Previdenciárias
Decorrentes de Reclamatórias e
Consignatórias Trabalhistas
Luciano Marinho de Barros e Souza Filho

1. Decadência e Prescrição no Ordenamento Pátrio


De antemão, devemos afirmar que o decurso do tempo
é inafastável ao estudo do tema objeto deste texto. Isto por-
que a dimensão do tempo revela-se ou manifesta-se no Di-
reito sob a forma de diversos institutos, tanto no campo ma-
terial como processual. No campo substantivo se apresenta,
sobretudo, pelos institutos da prescrição e decadência.
Esse, o ponto a ser enfrentado no presente artigo. A po-
lêmica configuração da decadência e da prescrição das con-
tribuições sociais decorrentes de reclamatórias trabalhistas.
Antes, no entanto, cabe refletir sobre tais institutos no pla-
no normativo geral.
Sabe-se que a prescrição promove a consecução de um
interesse jurídico-social, a saber: proporcionar segurança às Luciano Marinho de
relações jurídicas. É instituto de ordem pública. Nesta dire- Barros e Souza Filho
ção, aliás, citamos o recente art. 219, parágrafo 5º, da Lei nº é Mestrando em
Direito Processual
11.280/06 (alteração do Código de Processo Civil) no qual Civil pela
se demonstra a repercussão e a interferência estatal genera- Universidade Católica
lizada também quando da ocorrência da prescrição nas rela- de Pernambuco
ções jurídicas. Nesta direção, uniformiza prescrição e deca- (Unicap), Professor da
dência que passam, neste particular, a ter o mesmo tratamen- Pós-graduação em
to. Direito Previdenciário
O fenômeno prescritivo ocorre quando há perda da exi- da Faculdade Boa
Viagem e da Escola da
gência da pretensão. Ou noutros termos, de acordo com Ser-
Magistratura do
pa Lopes, “o que se perde com a prescrição é o direito sub- Trabalho VI (Esmatra
jetivo de deduzir a pretensão em juízo, uma vez que a pres- VI) e da Graduação
crição atinge a ação e não o direito”. O titular do direito le- em Direito da
sionado possui em mãos a faculdade de movimentar a má- Faculdade Barros
quina judiciária a fim de recompor seus interesses. Contu- Melo (Aeso - Olinda) e
do, a situação de tutela de pretensão não se perpetua no tem- Procurador Federal -
Chefe do Setor de
po, mas com ele se degenera, ou seja, existe prazo para seu
Cobrança Trabalhista
exercício sob pena de incidir a prescrição, que surge como da Procuradoria
instituto cujo propósito é o de consolidar as relações inter- Regional Federal da
pessoais de cunho jurídico. 5ª Região - Órgão da
Dizer que a prescrição não atinge o direito em si, mas sua Advocacia Geral da
pretensão é dizer que seu titular pode vir a satisfazê-lo por União (AGU).
outro meio. É admitir a preservação do direito, que pode ser recomposto, por exem-
plo, através da satisfação espontânea da pretensão. Por ser instituto de ordem pú-
blica é formado por algumas características basilares, a saber:
a) a renúncia da prescrição só pode ser efetuada após decorrido todo seu prazo
e se não houver prejuízo de terceiros;
b) as prescrições eventualmente imprescritíveis devem ser declaradas por lei;
c) seus prazos são peremptórios.
A consubstanciação do fenômeno da prescrição, por outro lado, cinge-se a al-
guns requisitos subseqüentes: a violação de um direito subjetivo; o surgimento da
pretensão do titular do direito agredido - a ser exercida por uma ação adequada; o
escoamento do prazo prescricional sem causa suspensiva, interruptiva ou impediti-
va de seu curso; e, a inércia no curso temporal do titular da ação.
Há, de certo modo, uma particularidade “invertida” nos efeitos do instituto da
prescrição. Referimo-nos à prescrição aquisitiva - que se revela quando os fatores
de inércia e tempo vêm acompanhados de aquisição de direito real, embora não seja
o caso do presente estudo.
Os prazos prescricionais bifurcam-se em ramos: ordinários (prazos gerais esta-
belecidos no Código Civil - arts. 205 e 206 do Código Civil) e especiais (estabele-
cidos casuisticamente). Existem ainda as ações imprescritíveis, aquelas que, por
natureza, não se submetem a prazos para serem propostas ou exercidas. Denomi-
nam-se “ações imprescritíveis”.
A doutrina clássica consagrou dois critérios científicos para análise dos insti-
tutos de prescrição e decadência: o critério de Câmara Leal e o de Agnelo Amorim
Filho.
Até a promulgação da Lei nº 10.406/02 (Novo Código Civil) foi indispensável
o entendimento e a adoção de tais critérios porque nosso ordenamento, salvo no
Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), não trazia diferen-
ciação segura ou taxativa entre os dois institutos.
Em lacônica síntese, podemos externar que o critério de Câmara Leal se baseia
na distinção da origem da ação. Cita-se para isso o professor Sílvio Rodrigues quan-
do afirma:
“I. a prescrição supõe uma ação cuja origem é distinta da origem do direito, tendo, por
isso, um nascimento posterior ao nascimento do direito;
II. a decadência supõe uma ação, cuja origem é idêntica à origem do direito, sendo,
por isso, simultâneo o nascimento de ambas.”1
Já pelo segundo o doutrinador, isto é, Agnelo Amorim Filho2, conclui-se, basi-
camente, que a prescrição só inicia seu curso a partir da violação do direito, o qual
se atrela, por sua vez, a uma respectiva ação. Donde se extrai o corolário de que toda
ação de cunho condenatório estaria sujeita à prescrição; a de natureza declaratória
seria imprescritível; e, por fim, a constitutiva, que teria prazo definido em lei, e es-
taria sujeita à decadência.

1
Direito Civil: Direito das Coisas. São Paulo: Saraiva, 1995, pp. 320 e ss.
2
“Critério Científico para distinguir a Prescrição da Decadência e identificar as Ações Imprescritíveis”. Revista dos
Tribunais 300/7.
No que compete especificamente à decadência vale ressaltar que também pos-
sui origem do fato jurídico ordinário - tempo. Entretanto, na decadência, o fator
tempo extingue o próprio direito do titular, caso ele não o exerça no lapso temporal
determinado. É a perda do próprio direito em decorrência do decurso do tempo so-
mado à inércia do titular que não o exerceu oportunamente.
Ao contrário da prescrição, o prazo decadencial pode ser estabelecido também
pela vontade das partes. Explique-se: caso a decadência de um determinado direito
decorra de lei, o interessado não pode renunciá-la; porém, se decorrer da vontade
das partes, torna-se renunciável, quando decorrido o prazo estabelecido.
Poderíamos, doravante, aqui enumerar uma série de distinções entre os institu-
tos tratados, posto que a doutrina se mostra abundante, mas haveremos de nos limi-
tar apenas a algumas que julgamos principais: o direito caduca e a pretensão pres-
creve; a decadência supõe um direito em potência, a prescrição requer um direito
já exercido pelo titular, mas que tenha sofrido uma obstaculização, dando origem à
violação daquele.
Outra diferença tradicional, balizada nas escolas italianas e francesas, embora
hoje, senão superada decerto mitigada pelo Código Consumerista, é a admissão de
suspensão e interrupção dos prazos apenas para a prescrição, negando-as à decadên-
cia. Afirmamos enfraquecida devido à flexibilização promovida pelas novas corren-
tes doutrinárias acerca desta característica e adotada entre nós, ilustrativamente, na
citada Lei nº 8.078/90.
Por derradeiro, a nosso ver, a postura adotada pelo legislador na nova consoli-
dação civil (Lei nº 10.406/02) demonstrou maturidade senão doutrinária, pragmá-
tica, ultimando quaisquer dúvidas sobre os institutos na medida em que foi expres-
so (ou taxativo) na apresentação das idéias e características que os circunscrevem
de sorte a tornar seu posicionamento no ordenamento mais objetivo, categorizando
situações que num passado próximo, ainda promoviam bastante insegurança entre
os jurisdicionados.

2. Decadência e Prescrição Aplicadas ao Subsistema de Arrecadação


Contributivo-trabalhista
A partir de agora, o tema se volta para a aplicação dos institutos da caducidade
e da prescrição ao subsistema de arrecadação de contribuição social de alçada tra-
balhista. Frente ao texto legal interdisciplinar processual-previdenciário-tributário
(art. 28, I, e arts. 35 e 43 da Lei nº 8.212/91), a remuneração paga, devida ou credi-
tada correspondente à prestação de serviço, gera a obrigação de recolher a contri-
buição social, a partir de determinada data, sob pena de, não se fazendo no prazo
estabelecido, ser exigida coercitivamente. Só que nem sempre o ente encarregado
de cobrar o tributo vem a saber (ou tem como saber) que foi praticado o ato previs-
to como hábil a ser submetido à exação. Por isso, o Direito Tributário vislumbra dois
momentos distintos e correlativos nesse fenômeno: primeiro, nasce a obrigação; se-
gundo, nasce o crédito do ente fiscal. Como se trata de um evento de natureza tri-
butária, não basta que o comportamento do sujeito passivo se enquadre na hipótese
de incidência, configurando o fato gerador, mas que também alguém competente ins-
taure procedimento capaz de submetê-lo ao constrangimento da cobrança, através
do lançamento, que, conforme vimos, cria o crédito tributário respectivo à obriga-
ção tributária do contribuinte. Constata-se, portanto, que, entre a ocorrência do fato
gerador e o lançamento do crédito tributário há um interstício, que é limitado no
tempo. Se a autoridade responsável não pratica o lançamento do crédito tributário
no espaço temporal previsto, caduca seu direito, pois precluiu seu prazo.
Nas palavras de Paulo de Barros Carvalho3:
“A decadência ou caducidade é tida como fato jurídico que faz perecer um direito pelo
seu não-exercício durante certo lapso de tempo. Para que as relações jurídicas não
permaneçam indefinidamente, o sistema positivo estipula certo período a fim de que
os titulares de direitos subjetivos realizem os atos necessários à sua preservação, e pe-
rante à inércia manifestada pelo interessado, deixando fluir o tempo, fulmina a exis-
tência do direito, decretando-lhe a extinção. Paralelamente, somos levados a concluir
que a Fazenda Pública, que tem o dever-poder de formalizar o crédito, ver-se-ia libe-
rada desse encargo com o decurso do tempo, isto é, acontecendo o fato jurídico da
caducidade.O paradoxo é incontornável.”
Sacha Calmon Navarro Coêlho4, assim situa o instituto da decadência:
“Os atos jurídicos sujeitados a tempo certo, se não praticados, precluem. Os direitos,
se não exercidos no prazo assinalado aos seus titulares pela lei, caducam ou decaem.
As ações judiciais quando não propostas no espaço de tempo prefixado legalmente,
prescrevem. Se um direito, para aperfeiçoar-se, depende de um ato jurídico que não é
praticado (preclusão), acaba por perecer (caducidade ou decadência) (...).”
O instituto da decadência não se baseia numa renúncia da Fazenda Pública -
porquanto a obrigação tributária seja indisponível - mas na necessidade de se res-
guardar o contribuinte da incerteza e instabilidade das relações econômicas. Assim,
há um prazo máximo para o Fisco agir contra seus devedores, praticando o ato jurí-
dico do lançamento, ou, em outras palavras, para a constituição do crédito. Passado
o prazo, a Fazenda decai de seu direito, operando-se a extinção do crédito tributá-
rio.
Para a observância e correta aplicação dos prazos da decadência e da prescri-
ção, no caso das execuções fiscais trabalhistas, mister se faz a compreensão da
modalidade de lançamento por homologação (art. 150, CTN), já que as contribui-
ções sociais arrecadadas pelo INSS se sujeitam a essa modalidade.
Por homologação é o lançamento feito quanto aos tributos cuja legislação con-
fia ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame. A cons-
tatação do crédito é imposição de iniciativa do contribuinte, que se denunciou e já
adiantou o tributo que entendeu devido. Assim, justamente porque a pessoa obrigada
a recolher o tributo pode descumprir o dever de antecipar o seu pagamento, o art. 150
do CTN determina que a autoridade administrativa deverá tomar “conhecimento da
atividade assim exercida pelo obrigado”. Como os particulares não podem ficar in-
definidamente à mercê da atuação estatal, impôs ao Fisco um prazo limitado para
proceder ao exame da conduta do sujeito passivo. Por tal razão, o parágrafo 4º do
art. 150 determina que, se a Lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco

3
Curso de Direito Tributário. 13ª edição. São Paulo: Saraiva, 2000, pp. 459-460.
4
Curso de Direito Tributário Brasileiro. 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2001, pp. 719-720.
anos, a contar da ocorrência do fato gerador. Uma vez expirado tal prazo sem que a
Fazenda Pública tenha se pronunciado, considera-se homologado o lançamento e
definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, frau-
de ou simulação. Para melhor visualização do tema, destacamos o art. 150, caput e
parágrafo 4º, do Código Tributário Nacional que impõe:
“O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atri-
bua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autori-
dade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhe-
cimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
(...)
§ 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da
ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha
pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o cré-
dito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.”
Dessa forma, a decadência do poder-dever de constituir o crédito tributário se
rege pelo art. 150, parágrafo 4º, do CTN, que estabelece como termo inicial para a
fluência de prazo a ocorrência do fato gerador. A incidência dessa regra supõe, evi-
dentemente como se explicou, hipótese típica de lançamento por homologação, isto
é, situação em que ocorre o pagamento antecipado do tributo. Se o pagamento do
tributo não for antecipado, ou seja, constatada a sua omissão, já não será caso de
lançamento por homologação, hipótese em que a constituição do crédito tributário
deverá observar o disposto no art. 173, inciso I, do CTN, no qual o termo inicial do
prazo será o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento pode-
ria ter sido efetuado. Resta, pois, a indagação: quando é que o lançamento poderia
ter sido efetuado?
Registre-se que a ressalva disposta na parte final do parágrafo 4º do art. 150 do
CTN constitui objeto de dissensão entre os doutrinadores pátrios. No entanto, des-
taca-se o entendimento dominante e acolhido pela doutrina perfilhada por Paulo de
Barros Carvalho, Fábio Fanucchi, Schubert de Farias Machado, entre outros, na
forma expressa a seguir por Sacha Calmon Navarro Coêlho, que tomamos por pa-
radigma:
“Então fica assentado que o qüinqüênio decadencial para homologar, com o dies a quo
fixado na data da ocorrência do fato gerador da obrigação, só opera quando houver
pagamento de boa-fé, certo ou errado. Quando ocorre dolo, com a meta optata de frau-
dar ou simular, o dies a quo se desloca para o primeiro dia do exercício seguinte àque-
le que o lançamento ex officio poderia ter sido efetuado.”5
Considera-se inadmissível, diante da interpretação sistemática do CTN, enten-
der-se que esse lançamento poderia ser feito a qualquer tempo. Resta consolidada,
pois, a tese da necessidade de prévio conhecimento do fato pela Fazenda Pública,
em face do princípio geral de direito, segundo o qual o prazo não corre contra quem
ignora o fato que dá origem ao direito de agir. Para fluência do tempo indaga-se:
houve inércia do Fisco? Se a resposta for positiva, como corolário, ocorrerá o de-
curso da caducidade. A fluência do prazo, por conseguinte, apenas ocorre com a

5
Liminares e Depósitos antes do Lançamento por Homologação - Decadência e Prescrição. São Paulo: Dialética, 2000,
p. 52.
disponibilização ao Fisco dos elementos que lhe possibilitem ter o conhecimento do
fato. Não nos parece razoável transferir condutas lesa-pátria à assunção do Estado,
condutas fraudulentas carreando danos sociais, sobretudo aos hipossuficientes vin-
culados e que deveriam ser tutelados, além de inúmeros efeitos econômicos e jurí-
dicos indesejáveis, tais como a concorrência desleal ou a litigiosidade intencional.
Compreensão mais ortodoxa que propale o poder-dever do Estado na fiscalização
como responsável pela omissão, reconhecendo a decadência desde o fato gerador
(ocultado) é optar, na prática, pela transferência de riscos socioeconômicos e acen-
tuar a evasão fiscal. Ainda se admitindo hipoteticamente possível ou viável a fisca-
lização (genérica) do ente público sobre empresas formalizadas - o que dizer, só para
citar alguns exemplos, sobre a responsabilidade fiscalizadora geral a ser emprega-
da aos autônomos (contratantes e contratados) e, melhor ainda, aos empregados
domésticos? Por absurdo, portanto, exclui-se tal interpretação.
Ante o exposto, um detalhe deve ser pontuado: a atividade de formalização do
crédito tributário exercida pelo Juízo Trabalhista é meramente declaratória de obri-
gação tributária preexistente que se originou com a ocorrência do fato gerador, ou
seja, com a aquisição do direito subjetivo à remuneração, em decorrência da pres-
tação do serviço e cujo cumprimento, pagamento da contribuição previdenciária
devida, não foi efetuado pelo sujeito passivo (empregador) na época própria. Em tais
hipóteses, não se poderá açodadamente afirmar, com fito evasivo, então, que a inci-
dência de contribuição social sobre a prestação de serviço ora reconhecida judicial-
mente (vínculo empregatício), propiciado pelo ajuizamento de reclamação trabalhis-
ta, pudesse restar total ou parcialmente deteriorada pelo tempo, porquanto contata
da realização do labor até a declaração judicial. Essa compreensão, como se viu,
rompe com a estrutura contributiva da previdência social e se equipara, no mínimo,
à omissão ou, mais precisamente, à situação descrita e ressalvada no parágrafo 4º
(parte final) do art. 150 do Código Tributário Nacional: dolo, fraude ou simulação.
Em circunstâncias tais, contrariamente, não há falha ou inércia da Administração,
mas manifesta conduta omissivo-fraudulenta do contribuinte ou responsável tribu-
tário.
Diante de uma relação entre empregado e patrão que até a decisão trabalhista
era obscurecida pela conduta do empregador faltoso, a Fazenda Pública não tinha
como efetuar o lançamento, pois os próprios sujeitos passivos por motivações di-
versas, utilizaram-se de artifícios para omitir, ou seja, tornar desconhecida pela Fa-
zenda Pública a situação fática. Nesse contexto e de qualquer forma, em se consi-
derando a hipótese de omissão, erro ou prática de algum ato ilícito por parte da pes-
soa obrigada a prestar declarações ou a proceder ao recolhimento antecipado do tri-
buto, a conseqüência legal será a mesma, na forma da argumentação legal e doutri-
nária expendida, ou seja, o termo inicial do prazo desloca-se para o primeiro dia do
exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Após, pois,
o conhecimento do fato jurídico pelo sujeito ativo da tributação.
Note-se que o próprio regulamento da Previdência Social, em seu art. 348, pa-
rágrafo 2º, assim determina, verbis: “Na hipótese de ocorrência de dolo, fraude ou
simulação, a seguridade social pode, a qualquer tempo, apurar e constituir seus cré-
ditos.”
Tratando-se de crédito tributário, decorrente de uma lide trabalhista, deve-se
considerar o termo inicial de fluência do prazo decadencial de constituição do cré-
dito tributário (lançamento) a notificação válida à União, enquanto o prazo prescri-
tivo escoa do trânsito em julgado da decisão judicial trabalhista, cognitiva ou ho-
mologatória de acordo, líquida ou liquidada, ou seja, a partir da circunscrição do
crédito do reclamante, oportunidade na qual serão conhecidos os títulos ou direitos
definitivos do autor (reclamante) e estarão reunidos e disponibilizados nos autos
judiciais com todos os elementos necessários à apuração do crédito, dando-se co-
nhecimento ao credor.
Constituindo a prescrição a perda do direito de ação do Fisco em virtude do
decurso do tempo, somente a partir da constituição definitiva do crédito tributário
fluiria o prazo prescricional de sua pretensão. Ocorre que no caso de execução fis-
cal trabalhista, haja vista a competência de ofício constitucionalmente atribuída ao
juiz do trabalho para executar as contribuições decorrentes de suas decisões, a apli-
cação prática do instituto da prescrição é praticamente inexistente, já que, lançada
a contribuição previdenciária devida, uma vez não satisfeita a obrigação pelo em-
pregador (reclamado), instaura-se de ofício a execução fiscal nos próprios autos
judiciais da lide trabalhista, através de simples comando judicial de expedição de
mandado de citação e penhora. O crédito tributário (contribuição social ou previ-
denciária) decorrente de decisão proferida em processo judicial trabalhista, portan-
to, não necessita de inscrição em Dívida Ativa e ajuizamento de ação de execução
fiscal, como outrora era proposto na Justiça Federal, antes do advento da Emenda
Constitucional nº 20/98. Desnecessário, portanto, descrever aqui a evolução legis-
lativa dos prazos de prescrição das contribuições previdenciárias, de acordo com a
variação de entendimento de sua natureza jurídica ou da própria natureza jurídica
do instituto do lançamento.
Deve-se pontuar, inclusive por recentes dispositivos normativos, a exemplo da
nova redação do art. 43 da Lei de custeio, alterado pela Lei nº 11.941/09, que cris-
taliza aplicação do regime de cômputo contributivo por competência indistintamente
às verbas rescisórias e às decorrentes de vínculos clandestinos porventura reconhe-
cidos e declarados devidos, garantindo, deste modo, a manutenção sistemático-in-
terpretativa (unitária) do subsistema arrecadatório específico e, aqui, fragmentado
à óptica da prescrição e da decadência, a configurar convergência às conseqüências
do subsistema já dogmatizado e instrumentalizado, como se depreende.
Pelo exposto, conclui-se que sempre que o empregador omitir-se ou praticar
qualquer artifício para obscurecer os direitos do empregado ou embaraçar a Fazen-
da Pública, não cumprindo obrigações principais ou acessórias, deixando, por exem-
plo, de reconhecer o vínculo empregatício existente pela ausência da anotação em
Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, ou pelo não registro em fichas
ou livros apropriados, ou, pela não contabilização dos fatos jurídico-tributários,
descumprindo obrigações intrínsecas da atividade exercida como, ainda, a não-apre-
sentação da GFIP - Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Ser-
viço e Informações à Previdência Social, o termo inicial da decadência é diferido
para o momento em que ocorrer ciência à União do fato gerador ocultado. Isso por-
que a conduta praticada pelos contratantes (empregadores e/ou empregados) enqua-
dra-se como omissão, ou mais precisamente como ocultação dolosa e fraudulenta
ou simulada (parágrafo 4º do art. 150 do CTN), e, nessa circunstância, o sujeito ati-
vo do crédito tributário somente poderá exercer o seu direito potestativo de consti-
tuir o título jurídico de exigência do tributo - lançamento - a partir do momento em
que a situação que deu causa à sonegação tornar-se definitivamente conhecida.
Registre-se que tal interpretação consolida convergência ao subsistema de arre-
cadação aqui sumariamente modelado, sem interferir na Súmula 08/20086 do C. STF
na medida em que continua absolutamente válida e aplicável em todo seu conteúdo
e alcance. O motivo é simples e traz consigo verdadeiro trocadilho: a discussão per-
passa ao seu largo. Noutras palavras: a questão é responder “quando” se inicia a
consumação do tempo e não “quanto” é o tempo de consumação.

6
A Súmula Vinculante 8/2008 do Supremo Tribunal Federal define que são inconstitucionais o parágrafo único do
art. 5º do Decreto-Lei nº 1.569/1977 e os arts. 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência
de créditos tributários. Tal Súmula cristaliza-se em função dos precedentes: RE 560.626; RE 556.664; RE 559.882;
RE 559.943; RE 106.217 e RE 138.284. Rege-se por conseqüência também às contribuições sociais o tempo de cin-
co anos para fulminar o direito e outros cinco do lançamento para sua efetiva cobrança.
A Súmula Vinculante nº 08
e o Parcelamento
Marcos Rogério Lyrio Pimenta

1. Introdução
Em 11 de junho de 2008, o Supremo Tribunal Federal no
julgamento do Recurso Extraordinário nº 559.882-9, que
resultou na edição da Súmula Vinculante nº 08, pacificou o
entendimento de que o prazo de decadência e prescrição
aplicável às contribuições previdenciárias é de cinco anos,
tal como nos demais créditos de natureza tributária, como
determina o Código Tributário Nacional.
Além da declaração de inconstitucionalidade, o Pretório
Excelso resolveu modular os efeitos dessa decisão estabele-
cendo que: (i) os créditos tributários pendentes de pagamen-
to não poderão ser cobrados, em nenhuma hipótese, após o
lapso temporal quinquenal; e (ii) os pagamentos já realiza-
dos só podem ser restituídos, compensados ou de qualquer
forma aproveitados, caso o contribuinte tenha assim pleitea-
do até a mesma data pela via administrativa ou judicial.
Sendo assim, indaga-se: os débitos previdenciários pen-
dentes de pagamento no parcelamento em curso poderão ser
cobrados após o lapso temporal previsto no CTN? E os va-
lores das contribuições previdenciárias referentes às parce-
las já pagas poderão ser restituídos?
O presente trabalho busca responder às indagações aci-
ma, ou seja, examinar os reflexos da Súmula Vinculante nº 08
no parcelamento do crédito tributário.

2. Créditos Parcelados Pendentes de Pagamento


Parece-nos que, em relação aos créditos previdenciários
pendentes de pagamento no parcelamento em curso, a deci-
são do STF é clara no sentido de que esses jamais poderão
ser cobrados após o lapso temporal previsto no CTN, segun- Marcos Rogério Lyrio
Pimenta
do se depreende do trecho do voto do Ministro Gilmar Men- é Mestre e Doutor em
des no RE nº 559.882-9: Direito Tributário pela
“Nesse sentido, o Fisco resta impedido de exigir fora dos PUC/SP, Professor em
prazos de decadência e prescrição previstos no CTN as con- Direito Tributário nos
tribuições da Seguridade Social. Cursos de Graduação
(...) da Unifacs e
Em outras palavras, créditos pendentes de pagamento não Pós-graduação
podem ser cobrados, em nenhuma hipótese, após o lapso Latu Sensu do IBET e
temporal qüinqüenal.” Advogado na Bahia.
Não bastasse isso, a Súmula nº 08 tem efeito vinculante em relação aos órgãos
do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, o que impede, ain-
da mais, a exigência dos créditos parcelados pendentes de pagamento, após o prazo
quinquenal.
A sua inobservância pela autoridade, a nosso ver, implica violação ao seu de-
ver funcional, acarretando sanções nas esferas administrativa (infração administra-
tiva), penal (crime contra a Administração Pública e crime de responsabilidade), e
civil (responsabilidade civil do Estado). Deveras, as penalidades advindas do des-
cumprimento do efeito vinculante devem recair sobre a decisão judicial ou o ato
administrativo que violou ou deturpou o conteúdo da súmula, bem como sobre a
autoridade que o produziu.
Logo, se o contribuinte parcelou débitos de contribuições previdenciárias e na
vigência do parcelamento ainda existem créditos pendentes de pagamento, após 11
de junho de 2008, estes não poderão mais ser exigidos pelo Fisco, se decorrido o
prazo quinquenal, sob pena de incorrer nas sanções supra.
Por outro lado, se o contribuinte romper com o parcelamento antes ou após a
referida data, o Fisco poderá realizar a cobrança, com os devidos acréscimos, dos
créditos previdenciários parcelados não atingidos pelo lapso temporal de cinco anos,
desde que não tenha transcorrido o prazo do seu direito de ação.

3. Pagamentos Realizados e a Restituição


Em relação aos pagamentos efetuados de créditos previdenciários e a possibili-
dade de sua restituição, o Pretório Excelso, no julgamento supra, decidiu que: (i) os
pagamentos realizados e não discutidos administrativa ou judicialmente, antes da
conclusão do julgamento, não poderão ser restituídos; e (ii) os recolhimentos reali-
zados e impugnados administrativa ou judicialmente, antes da conclusão do julga-
mento, poderão ser restituídos.
Verifica-se, pois, que o contribuinte somente poderá reaver os pagamentos rea-
lizados se existir litígio administrativo ou judicial acerca do tema antes da conclu-
são desse julgamento (11 de junho de 2008).
Todavia, se os pagamentos forem feitos em parcelas, há quem1 entenda que es-
tas somente poderão ser recuperadas na hipótese da existência de discussão admi-
nistrativa ou judicial, conjugada com o rompimento do contribuinte do parcelamento
antes da referida data, uma vez que o “direito positivo brasileiro não prevê a hipó-
tese de existência de parcelamento de créditos tributários objetos de discussão ju-
dicial ou administrativa”2.
Dessa forma, a restituição dos recolhimentos feitos no parcelamento deveria
atender aos “seguintes requisitos: (i) rompimento do parcelamento antes de 11 de
junho de 2008; (ii) decurso do lapso temporal de cinco anos em alguns períodos
demarcados; e (iii) existência de lide administrativa ou judicial acerca do tema”3.

1
Tiago Cappi Janini, “Os Efeitos Produzidos pela Modulação da Declaração de Inconstitucionalidade do Prazo Pres-
cricional de Dez Anos para a Cobrança dos Créditos Previdenciários na Hipótese de Parcelamento”, Revista Dialéti-
ca de Direito Tributário nº 159, Dialética, São Paulo, 2008, p. 129.
2
Idem.
3
Ibidem, p. 130.
Não obstante o entendimento externado no julgamento acima, sustentamos que
os pagamentos realizados no parcelamento, referentes aos créditos previdenciários
atingidos pelo lapso temporal de cinco anos, devem ser recuperados pelo contri-
buinte, mesmo com o rompimento do parcelamento após a data do julgamento, e in-
dependentemente de discussão nas esferas administrativa ou judicial, sob pena de
violação aos princípios mais comezinhos do Direito, senão vejamos.
A restrição imposta pelo Supremo Tribunal Federal à recuperação dos referidos
créditos previdenciários (existência de lide administrativa ou judicial acerca do tema
antes da conclusão desse julgamento), no nosso entender, viola o princípio geral da
proibição do enriquecimento sem causa.
Segundo Paulo Pimenta4 “Enriquecimento sem causa significa o acréscimo pa-
trimonial de um dos sujeitos de determinada relação jurídica em detrimento de ou-
tro, sem que exista uma causa que justifique esse acontecimento.”5 Dessa definição,
conclui o autor, “extrai-se os requisitos necessários à aplicação do princípio: (1)
enriquecimento; (2) empobrecimento; (3) ausência de causa que justifique o empo-
brecimento; (4) relação de pertinência lógica entre o enriquecimento e o empobre-
cimento”6.
No caso em tela, é notória a presença desses elementos. O primeiro e o segun-
do requisito nós encontramos na ocorrência do pagamento dos créditos previden-
ciários atingidos pelo prazo quinquenal e na vedação a sua restituição. O terceiro
requisito se verifica na ausência de uma situação protegida pelo direito que justifi-
que o enriquecimento do Fisco. E o último requisito se constata na relação implica-
cional existente entre o empobrecimento do contribuinte, decorrente de um paga-
mento indevido, e o enriquecimento do Fisco, oriundo da restrição à recuperação
dos pagamentos anteriormente realizados e reconhecidos como indevidos pela Sú-
mula nº 08.
Outro princípio violado pela decisão da Suprema Corte é o princípio da boa-fé7.
A aplicação deste permite ao particular, como assinala Jesus Gonzalez Perez, “re-
cobrar la confianza en que la Administración no va a exigirle más de lo que estric-
tamente sea necessário para la realización de los fines públicos que en cada caso
concreto persiga”8. Já para o Fisco, significa que o contribuinte deve agir com ho-
nestidade em todas as fases da relação jurídica.

4
Efeitos da Declaração de Inconstitucionalidade em Direito Tributário, Dialética, São Paulo, 2002, p. 61.
5
No mesmo sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma: “enriquecimento sem causa é o incremento do pa-
trimônio de alguém em detrimento do patrimônio de outrem, sem que, para supeditar tal evento, exista uma causa
juridicamente idônea” (“O Princípio do Enriquecimento sem Causa em Direito Administrativo”, Revista Diálogo
Jurídico v. I, nº 2, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, Salvador, maio de 2001. Disponível em:
www.direitopublico.com.br, p. 4).
6
Idem.
7
Como pontifica Jesus Gonzales Perez “El principio general de buena fe, que juega, como se ha señalado, no solo en
el ámbito del ejercicio de derechos y potestades, sino en el de la constitución de las relaciones y en el cumplimiento
de los deberes, comporta la necesidad de una conducta leal, honesta, aquella conducta que, según la estimación de la
gente, puede esperarse de uma persona.” (El Principio General de la Buena Fe en el Derecho Adminitrativo, 2ª ed.,
Civitas, Madrid, 1989, p. 49)
8
Ibidem, p. 69.
Ora, a partir do momento em que o sujeito passivo cumpre com as condições
do parcelamento e o Fisco, por outro lado, ultrapassa os limites necessários ao al-
cance do interesse público, mediante a não-restituição dos pagamentos anteriormen-
te realizados dos créditos tributários atingidos pelo lapso temporal de cinco anos,
restará clara a violação ao princípio da boa-fé.
Pensamos, ainda, que a referida restrição fere também o princípio da moralidade.
De fato, o Fisco, ao manter em seus cofres os valores atingidos pelo prazo quinque-
nal, estará agindo em conformidade com norma declarada e reconhecida como in-
constitucional pela Súmula Vinculante nº 08. É o que pontifica Paulo Pimenta9:
“Em matéria tributária, é inegável a sua aplicação, mormente em fase de cobrança do
tributo. Na prática de atos administrativos visando fazer com que o sujeito passivo
cumpra a obrigação tributária, a Administração deve obedecer esse princípio, não po-
dendo, por exemplo, praticar atos cujos motivos legais estejam previstos em normas
declaradas inconstitucionais pelo STF.”
E nem se diga que a irretratabilidade e irrevogabilidade da confissão da dívida
parcelada configura óbice à sua restituição, uma vez que estas não são absolutas,
podendo ser desconstituídas pelo contribuinte no âmbito administrativo ou judicial,
independentemente da adesão ao parcelamento. Entender o contrário importa em
vilipêndio à Constituição, sobretudo ao direito de ação (inafastabilidade do Poder
Judiciário), encampado no art. 5º, XXXV, da CF.
Nesse contexto, sustentamos que a Súmula em epígrafe permite a restituição das
parcelas do crédito previdenciário alcançado pelo lapso temporal de cinco anos,
mesmo com o rompimento do parcelamento após 11 de junho de 2008 e indepen-
dentemente da existência de lide administrativa ou judicial.

4. Conclusão
Ante o exposto, podemos apresentar as seguintes conclusões:
1. Os débitos previdenciários pendentes de pagamento no parcelamento em cur-
so jamais poderão ser cobrados após o lapso temporal previsto no Código Tri-
butário Nacional.
2. Os valores das contribuições previdenciárias referentes às parcelas já pagas,
não obstante a decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal no RE nº
559.882-9, poderão ser restituídos, independentemente da existência de lide
administrativa ou judicial.

9
Op. cit., p. 58.
A Repercussão de Decisões de Órgãos
da Administração no Contencioso
Administrativo Tributário
Miquerlam Chaves Cavalcante

1. Delimitação do Tema
Temos observado repetidas vezes no âmbito do Conse-
lho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf1 a análise de
casos em que os contribuintes pleiteiam o reconhecimento
da regularidade ou da licitude de operações societárias e
transações comerciais sob o argumento de que as mesmas já
foram objeto de manifestação prévia e favorável de outros
órgãos da Administração Pública.
São corriqueiras alegações tendentes a afastar o lança-
mento tributário valendo-se de assertivas no sentido de que
operações societárias gozariam de veracidade e regularida-
de pelo fato de terem recebido aval de agências reguladoras
ou outros órgãos públicos; ou ainda, por exemplo, assertivas
de que operações envolvendo remessas internacionais de
recursos seriam idôneas pelo simples fato de terem sido re-
gistradas perante o Banco Central do Brasil - Bacen.
Pretendemos, nas próximas linhas, enunciar alguns pon-
tos que entendemos relevantes para se determinar em que
extensão as decisões de outros órgãos da Administração Pú-
blica podem influenciar o lançamento tributário, bem como
a fase do contencioso administrativo que, via de regra, se
segue àquele.
Para tanto, faz-se necessário enveredarmos por alguns
conceitos e dispositivos legais, sobretudo de Direito Adminis-
trativo, de forma a nos auxiliar nas conclusões acerca das im-
plicações do tema no contencioso administrativo tributário.

2. Legislação de Regência
O Brasil observou recentemente, sobretudo a partir de
1995, importantes e profundas modificações no que tange à
condução da máquina estatal. Em outras palavras, o Estado
passou de uma função de prestador direto de determinados
serviços públicos para uma função eminentemente geren-
cial2.

1
Trata-se do antigo Conselho de Contribuintes, cujos novos contornos foram dados
pela Portaria MF nº 256, de 22 de junho 2009. Miquerlam Chaves
2
Importante histórico sobre o tema nos fornece CARVALHO FILHO, José dos San-
Cavalcante
tos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 308
e segs., bem como DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São é Procurador da
Paulo: Atlas, 2005. Fazenda Nacional.
Neste período, assistimos a privatizações da execução de vários serviços públi-
cos, sobretudo na área de energia elétrica, telecomunicações, mineração etc. Para-
lelamente ao processo de desestatização, observou-se a criação de diversas autar-
quias em regime especial, denominadas agências reguladoras, a fim de gerenciar,
fiscalizar e nortear os diversos serviços públicos cuja prestação estava passando para
a iniciativa privada.
Como consequência da adoção deste modelo, vimos a criação de agências re-
guladoras como a Aneel, Anatel, ANTT, Antaq, ANA, ANP, com atribuições e com-
petências distribuídas conforme as atividades e os serviços que gerenciam.
Não nos deteremos na análise pormenorizada das leis instituidoras de cada uma
das agências, uma vez que não constitui o objeto do presente trabalho, mas é preci-
so deixar claro, desde já, que a nenhuma destas agências compete manifestar-se
sobre os efeitos tributários decorrentes da atuação de empresas submetidas a sua
gerência.
Com efeito, a execução das atividades de arrecadação, lançamento, cobrança
administrativa, fiscalização, pesquisa e investigação fiscal e controle da arrecada-
ção relativamente a tributos internos da União e do comércio exterior são de com-
petência3 da Receita Federal do Brasil, cujas atribuições, inclusive, sofreram consi-
derável acréscimo através da Lei nº 11.457/2007.
O que gera celeuma, no entanto, é a exigência de submissão de determinadas
operações das empresas ao crivo das agências reguladoras (Administração Indire-
ta). Isso porque uma mesma operação pode receber manifestação favorável por parte
destas agências, ao mesmo tempo em que são tidas por fraudulentas ou simuladas
pela Administração Tributária.
Exemplo disso, no que respeita às concessões e permissões de serviços públi-
cos, é a exigência feita no art. 27 da Lei nº 8.987/1995, verbis:
“Art. 27. A transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem
prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão.
Parágrafo único. Para fins de obtenção da anuência de que trata o caput deste artigo o
pretendente deverá:
I - atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade
jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço; e
II - comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor.”
As manifestações divergentes entre órgãos da Administração se devem ao fato
de que, não raro, operações societárias são engendradas sem qualquer suporte fáti-
co-econômico que as justifiquem. São operações que visam somente evitar o reco-
lhimento de tributos. Em casos como este, o Fisco atua realizando o lançamento fis-
cal pertinente, muitas vezes desconsiderando tais operações societárias ou simples-
mente vedando-lhes os efeitos tributários almejados.
Os contribuintes alegam, por outro lado, que tais operações (v.g., incorporações,
fusões, alienações de ações) são hígidas e válidas, e que, inclusive, foram submeti-
das e aprovadas pela correspondente agência reguladora (poder concedente).

3
Entenda-se competência no sentido de competência administrativa, ou seja, atribuições legais (art. 2º da Lei nº
4.717/1965).
Esse embate não ocorre somente no que se refere a empresas e operações sub-
metidas ao crivo de agências reguladoras.
A mesma discussão acima relatada se verifica relativamente a empresas contra-
tantes com o Poder Público. Isso porque, tal como a Lei de concessões e permis-
sões de serviços públicos, a Lei de Licitações e Contratos (Lei nº 8.666/1993) pune
com rescisão unilateral do contrato determinadas operações societárias não admiti-
das no edital de licitação.
É oportuna a transcrição do dispositivo citado da Lei nº 8.666/1993:
“Art. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato:
(...)
VI - a subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratado com
outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou incor-
poração, não admitidas no edital e no contrato;
(...)
XI - a alteração social ou a modificação da finalidade ou da estrutura da empresa, que
prejudique a execução do contrato (...).”
Assim, empresas que conseguem a anuência do Poder Público licitante para rea-
lizar determinadas alterações societárias se insurgem contra eventuais lançamentos
tributários sob a alegação de que a Administração já concordara com as mesmas.
O mesmo imbróglio se verifica com relação a outros casos em que a legislação
exige determinado tipo de manifestação do Poder Público, a exemplo do art. 54,
parágrafos 3º e 4º, da Lei nº 8.884/1994, que exige a manifestação do Cade em ma-
téria de defesa da livre concorrência; do art. 222 da CF/88 e da Lei nº 10.610/2002,
no que se refere à propriedade de empresa jornalística; do art. 176, parágrafo 1º, da
CF/88, que trata da lavra de recursos minerais.
Não podemos deixar de mencionar, ante a recorrente análise de casos concre-
tos pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf, que a mesma celeu-
ma ocorre com relação ao registro de operações financeiras e de investimento es-
trangeiro perante o Banco Central do Brasil - Bacen.

3. Aspectos Jurídicos Relevantes


Não há dúvidas de que a solução da celeuma acima exposta, entre contribuintes
e o Fisco, passa inexoravelmente pela delimitação e pela compreensão das atribui-
ções legais dos órgãos envolvidos. Não podemos olvidar que algumas considerações
acerca da segurança jurídica, da produção probatória e dos direitos constitucionais
dos contribuintes são de extrema relevância.
Os contribuintes prejudicados com o que, segundo eles, constituiria uma incoe-
rência dentro da própria Administração Pública afirmam que uma segunda opinião
da Administração acerca de uma mesma operação societária ou negocial represen-
ta uma afronta à segurança jurídica.
Afirmam que a Administração Tributária não poderia reputar como fraudulen-
tas operações feitas com toda a publicidade e que foram devidamente oferecidas ao
aval de órgãos da mesma Administração Pública.
As alegações de ofensa à segurança jurídica ou aos direitos constitucionais dos
contribuintes devem ser tomadas com o devido cuidado. Isso porque, no contencio-
so administrativo tributário, é amplamente assegurado o devido processo legal, com
ampla possibilidade de exercício do contraditório e da ampla defesa.
Isso para não mencionar a ampla aceitação do princípio da verdade material4 no
contencioso administrativo tributário, como nos revelam diversos julgados do Carf.
Por todos, citamos:
“PAF - Regras de Interpretação - Princípios Constitucionais - Verdade Material/For-
malismo Moderado - Comprovação - Confirmada, em diligência, que houve realiza-
ção do lucro inflacionário em 1993, embora não conste tal informação na DIRPJ/1994,
pelos princípios elementares que regem o processo administrativo (legalidade objeti-
va, oficialidade, informalidade e verdade material) respeitados os direitos e garantias
individuais emanados da CF: art. 5º, XXXIV ‘a’, LIV e LV, é lícito rever o lançamen-
to.” (Data da Sessão: 13/09/2005; Relatora: Ivete Malaquias Pessoa Monteiro; Deci-
são: Acórdão 108-08481)5
É preciso mencionar, por outro lado, que o Carf vem reiteradamente decidindo,
em nosso entender de forma acertada, por não atribuir higidez a atos societários fir-
mados com o exclusivo propósito de obstaculizar, de forma direta ou indireta, o re-
colhimento de tributos.
Citem-se alguns julgados proferidos neste sentido:
“Incorporação de Sociedade. Amortização de Ágio na Aquisição de Ações. Simulação.
A reorganização societária, para ser legítima, deve decorrer de atos efetivamente exis-
tentes, e não apenas artificial e formalmente revelados em documentação ou na escri-
turação mercantil ou fiscal. A caracterização dos atos como simulados, e não reais,
autoriza a glosa da amortização do ágio contabilizado.” (Data da Sessão: 28/05/2008;
Relatora: Sandra Maria Faroni; Decisão: Acórdão 101-96724)6

“Incorporação de Empresa. Amortização de Ágio. Necessidade de Propósito Negocial.


Utilização de ‘Empresa Veículo’. Não produz o efeito tributário almejado pelo sujeito
passivo a incorporação de pessoa jurídica, em cujo patrimônio constava registro de ágio
com fundamento em expectativa de rentabilidade futura, sem qualquer finalidade ne-
gocial ou societária, especialmente quando a incorporada teve o seu capital integrali-
zado com o investimento originário de aquisição de participação societária da incor-
poradora (ágio) e, ato contínuo, o evento da incorporação ocorreu no dia seguinte.
Nestes casos, resta caracterizada a utilização da incorporada como mera ‘empresa veí-
culo’ para transferência do ágio à incorporadora.” (Data da Sessão: 05/12/2007; Rela-
tor: Aloysio José Percínio da Silva; Decisão: Acórdão 103-23290)7
Acreditamos que esta tendência do Carf vai amplamente ao encontro dos man-
damentos constitucionais insculpidos no art. 5º, XXIII, e art. 170, que devem nor-
tear toda a atividade econômica.

4
Também amplamente reconhecido em sede doutrinária, conforme nos ensina CAIS, Cleide Previtalli. O Processo
Tributário. São Paulo: RT, 2007, p. 285.
5
Disponível em: https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudencia.jsf.
Acesso em: 02/09/2009.
6
Disponível em: https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudencia.jsf.
Acesso em: 02/09/2009.
7
Disponível em: https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudencia.jsf.
Acesso em 02/09/2009.
É preciso mencionar, ainda, que as operações societárias realizadas em total
ausência de propósito negocial, ofendem inclusive os arts. 421 e 422 do Código
Civil, na medida em que não contam com qualquer função social. Transcrevemos
tais artigos:
“Título V
Dos Contratos em Geral
Capítulo I
Disposições Gerais
Seção I
Preliminares
Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função so-
cial do contrato.
Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato,
como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Não vemos como se admitirem contratos ou estatutos sociais de empresas cuja
única função é a de, por via oblíqua, obstar a tributação devida. Isso porque são os
tributos quem financiam a promoção dos direitos fundamentais dos cidadãos em um
Estado Democrático de Direito.
Entendemos, nesta esteira, ser inadiável a análise de atos e contratos privados
dos contribuintes com os olhos do Direito Constitucional contemporâneo8.
Passemos a apontar nosso entendimento acerca deste aparente conflito de ma-
nifestações entre órgãos da Administração Pública.
Com efeito, a submissão de operações societárias às agências reguladoras e a
outros órgão da Administração Direta ou Indireta decorre de expressa determinação
legal e, de forma alguma, pode representar uma decisão definitiva em matéria tri-
butária. Tais agências e autarquias carecem deste poder, como vimos acima ao de-
limitar as atribuições da Receita Federal do Brasil.
A obrigatoriedade de submissão das operações societárias aos referidos órgãos,
mormente às agências reguladoras, diz mais com o Direito Administrativo do que
propriamente com o Direito Tributário.
Isso porque as sociedades que contratam com o Poder Público, mais precisamen-
te as sociedades empresárias que figuram como partes em contratos administrati-
vos (do qual são espécies os contratos de concessão e permissão de serviços públi-
cos), estão submetidas à disciplina jurídica diferente, no que tange às alterações e
operações societárias ocorridas no bojo da sociedade.
Tal disciplina diferenciada é exigida em razão da supremacia do Poder Público
nos contratos administrativos, que se manifesta através das chamadas cláusulas exor-
bitantes. Neste sentido, alterações societárias (v.g., alteração da sede social, aumento
do capital social, ingresso de sócios, alteração dos administradores etc.) ou opera-
ções societárias (transformação, incorporação, fusão e cisão) ganham contornos
especiais quando realizadas por sociedade contratante com a Administração.

8
A este respeito, os ensinamentos de SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2008; e SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, são de leitura obrigatória.
Assim, enquanto no dia a dia empresarial uma alteração da sede social de deter-
minada sociedade não traz maiores consequências, a mesma alteração poderá en-
sejar a rescisão do contrato administrativo se for prejudicial à execução do mesmo.
É por isso que a legislação administrativista prevê uma série de mecanismos para
amparar e garantir a execução dos contratos administrativos, tendo em vista que o
licitante escolhido para firmar o contrato administrativo submete-se, em regra, a
rigoroso procedimento licitatório, no qual são escolhidos a melhor proposta e o li-
citante mais idôneo e capacitado à sua consecução.
Nasce aí o caráter intuitu personae nos contratos administrativos. Neste senti-
do, a legislação, visando proteger a execução contratual de alterações inoportunas
na estrutura jurídica de uma das partes, limita a incidência destas alterações, sob
pena de rescisão contratual.
Esta é a razão das exigências previstas no art. 27 da Lei nº 8.987/1995; no art. 78,
VI e XI, da Lei nº 8.666/1993, acima transcritos, bem como no art. 9º da Lei de
Parcerias Público-Privadas (Lei nº 11.079/2004).
Assim, qualquer anuência das agências reguladoras - ou do Poder Público na
qualidade de parte em um contrato administrativo - relativamente às operações so-
cietárias de empresas submetidas a sua área de atuação diz respeito à capacidade de
estas empresas permanecerem na prestação dos serviços públicos.
Como se observa, qualquer ilação acerca da licitude de operações societárias sob
o ponto de vista tributário pelo simples fato de prévia anuência de agências regula-
doras deve ser rechaçada.
É preciso ressaltar, em outra seara, que a submissão de determinadas operações
societárias a órgãos da Administração pode dizer respeito a valores outros que o
governo brasileiro busca preservar.
Isso se verifica, por exemplo, na exigência de comunicação de alterações de
controle societário de empresas jornalísticas ao órgão competente do Poder Execu-
tivo (no caso, o Ministério das Comunicações). Com isso, quer o governo brasilei-
ro preservar a cultura nacional, evitando que o capital estrangeiro dite a geração de
conteúdo das rádios e TV’s brasileiras.
O mesmo raciocínio é procedente no que se refere à pesquisa e lavra de recur-
sos minerais (art. 176 da CF/88). Aqui, o interesse da Administração diz mais com
aspectos referentes à soberania nacional e com a reserva de mercado a nacionais do
que com qualquer aspecto tributário.
Ante a sua finalidade mais restrita, acrescente-se, a anuência do Poder Público
nos casos acima citados se baseia, não raro, na simples análise de documentos so-
cietários (estatutos, contratos sociais, aditivos).
Ao contrário, os lançamentos tributários decorrentes de operações societárias
sem propósito jurídico-negocial são fruto de profundas e minuciosas auditorias. Isso,
pelo menos, é o que se constata nos processos submetidos ao Carf.
Como se observa, a análise de determinadas operações societárias pela Admi-
nistração Pública não pode, de forma alguma, constituir óbice ao trabalho das au-
toridades fiscais. A anuência ou a reprovação das referidas operações sequer tangen-
cia - e nem poderia fazê-lo - qualquer conteúdo tributário.
Faz-se necessário, ainda, tecermos algumas linhas adicionais sobre as conse-
quências dos registros de operações perante o Banco Central do Brasil - Bacen, tendo
em vista a importância e a regularidade com que o tema se apresenta no Carf.
O monitoramento do fluxo de capitais “do” e “para” o Brasil é feito pelo Ba-
cen9, que se utiliza de vários mecanismos para gerenciamento destes recursos.
A partir de 1996, através da Resolução nº 2.237, de 28 de novembro de 1996, o
Bacen instituiu, gradativamente, o registro eletrônico como mecanismo de acom-
panhamento dos estoques de capitais que ingressam no Brasil ou saem do País.
Ocorre que o Carf, com a devida vênia, equivocadamente, tem atribuído valor
probatório demasiadamente elevado aos registros realizados perante o Banco Cen-
tral.
A então Quarta Câmara do Primeiro Conselho chegou a afirmar10, por exemplo,
que determinadas operações de mútuo internacional seriam lícitas pelo simples fato
de terem sido submetidas ao Banco Central, tendo sido nele registradas, e que, em
nenhum momento, o Bacen teria exigido qualquer tributo sobre tais operações,
mesmo sendo delas conhecedor.
Convém esclarecer, de pronto, que não cabe ao Bacen exigir tributo algum. Esta
atribuição, como afirmamos acima, é conferida única e exclusivamente à Receita
Federal do Brasil.
Ademais, o registro de operações no Banco Central é meramente declaratório.
Este é o teor dos próprios esclarecimentos e textos técnicos do Bacen sobre o tema11.
Isso significa que o Bacen realiza primeiramente um controle meramente quantita-
tivo e para fins estatísticos, ou seja, para simples avaliação de estoques e acompa-
nhamento do fluxo de ingressos e saídas de capitais estrangeiros.
Como se vê, nada impede que posteriormente o próprio Bacen ou outros órgãos
da Administração Pública exijam a documentação comprobatória das operações
registradas em seus sistemas ou que, até mesmo, questione a correição ou efetivi-
dade das mesmas12.
Verificando inconsistências em operações a ele submetidas, o Bacen deve co-
municar às autoridades competentes ou interessadas no fato, seja o Ministério Pú-
blico, a Receita Federal, a CVM etc. Não cabe ao Bacen a adoção de medidas que
não estejam dentre suas atribuições.
Acrescente-se neste contexto o fato de que os fechamentos de câmbio para qui-
tar obrigações do/para o exterior fazem parte da rotina diária (e dinâmica, diga-se
de passagem) das instituições financeiras.

9
Aplica-se o Decreto nº 55.762/1965, com a ressalva de que cabe ao Bacen as atribuições ali conferidas à extinta Su-
perintendência da Moeda e do Crédito - Sumoc.
10
Essa foi a conclusão do voto vencedor proferido nos Autos do Processo nº 10730.003110/2005-55, cuja ementa e
inteiro teor ainda não se encontram disponíveis, nesta data, no site do Carf: https://carf.fazenda.gov.br/sincon/pu-
blic/pages/index.jsf. Acesso em: 02/09/2009.
11
Essas são as conclusões extraídas de publicação oficial intitulada “Capitais Internacionais e Mercados de Câmbio no
Brasil”, disponível em: http://www.bcb.gov.br/rex/LegCE/Port/Ftp/Capitais_Internacionais_Mercado_Cambio_
Brasil.pdf. Acesso em: 02/09/2009.
12
Corrobora nosso entendimento o fato de a estrutura regulatória do capital estrangeiro e do mercado de câmbio ser
pautada pelos princípios da legalidade, fundamentação econômica e do respaldo documental. Idem.
Assim, a verificação da higidez e da licitude de operações declaradas, sob as
penas da lei, ao Banco Central não faz parte da rotina das instituições financeiras.
Isso apenas reforça o caráter declaratório destes registros prévios e torna as opera-
ções financeiras correspondentes plenamente passíveis de serem auditadas por ou-
tras autoridades administrativas.
A natureza declaratória somada às finalidades do registro de capitais no Bacen
são fatores impeditivos de que se atribua um exacerbado valor probatório a opera-
ções registradas em seus sistemas.
Entendemos ser possível, mesmo em casos em que há manifestações aparente-
mente conflitantes, traçar uma linha divisória suficientemente nítida no que se re-
fere às atribuições de cada autoridade.
Peço vênia, neste ponto, para narrar o entrave ocorrido entre Bacen e Fisco, sub-
metido à mesma Quarta Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes e decidido
no Acórdão nº 104-21.95313.
Em apertada síntese, determinado contribuinte, empresa concessionária do ser-
viço de energia elétrica, visando à aquisição de empresa estatal submetida a leilão
de privatização, buscou recursos financeiros no exterior para viabilizar a referida
compra.
Para tanto, o contribuinte constituiu duas empresas subsidiárias integrais no
exterior. Ato contínuo, a captação de recursos se deu através da emissão de títulos
de crédito internacionais, os chamado Fixed Rate Notes, com a devida e necessária
autorização do Bacen. Os títulos foram, em sua totalidade, adquiridos pelas empre-
sas subsidiárias criadas pelo contribuinte.
Vale mencionar que a legislação brasileira, visando promover a manutenção de
recursos estrangeiros no País, confere um benefício fiscal no pagamento de juros
decorrentes da colocação de títulos de crédito no exterior.
Contudo, para se beneficiar da alíquota zero do imposto de renda na fonte, a lei
exige que os títulos de crédito internacionais tenham, no mínimo, 96 meses de prazo
médio para amortização dos mesmos. Este é o teor do art. 1º, IX, da Lei nº 9.481/1997.
No caso concreto, os títulos efetivamente foram emitidos com prazo superior ao
mínimo exigido, mas antes do transcurso de 96 meses o contribuinte promoveu um
aumento de capital nas referidas subsidiárias.
O Bacen, em um primeiro momento, entendeu que as remessas internacionais
de recursos destinadas ao aumento de capital das empresas subsidiárias configura-
riam, em verdade, antecipação de amortização dos Fixed Rate Notes. Por esta ra-
zão, o Bacen cancelou os certificados de registro para emissão dos títulos de crédi-
tos internacionais.
Em um segundo momento, o Bacen reviu o seu próprio posicionamento e afir-
mou faltar respaldo legal e regulamentar para cancelar os certificados de registro.
Cerrou, assim, o entendimento de que não houve qualquer irregularidade cam-
bial, embora tenha também reconhecido não haver norma que autorize o Banco
Central a glosar os certificados quando identificado artifício para obter benefício
fiscal supostamente indevido.

13
Disponível em: https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/index.jsf. Acesso em: 02/09/2009.
A despeito de discordar das conclusões adotadas, ao final e por maioria, pela
então Quarta Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes14, com base em inter-
pretação errônea, a nosso ver, do parecer do Banco Central, entendemos correto este
segundo posicionamento do Bacen, em alguns aspectos.
Em primeiro lugar, não havia impedimento legal à colocação dos títulos de cré-
dito no exterior, vez que observados os requisitos regulamentares exigidos pelo
Bacen.
Em segundo lugar, se houve alguma ilicitude, ela ocorreu quando das remessas
para aumento de capital das subsidiárias, e não na emissão de títulos de longo pra-
zo. Assim, o cancelamento dos certificados que amparavam a emissão dos Fixed
Rate Notes em nada obstaria ou reverteria eventual irregularidade.
Em terceiro lugar, corroborando o fato de o registro no Sisbacen, como vimos,
ser meramente declaratório e para fins quantitativos e estatísticos, o Banco Central
ressalvou que a licitude das operações se limitava ao aspecto cambial. É oportuna a
transcrição do referido trecho do parecer do Bacen:
“Do lado legal e regulamentar, não há qualquer indicação de que a [empresa], suas
subsidiárias ou os bancos intervenientes nas operações tenham deixado de cumprir ou
ferido qualquer norma específica na área de câmbio e de capitais estrangeiros.”
A regularidade sob a ótica cambial não vincula ou interfere nas repercussões
tributárias das operações. O próprio parecer manifestou expressamente este enten-
dimento:
“d) não se praticaram ilícitos afetos à matéria de câmbio e capital estrangeiro, de modo
que falta respaldo legal e regulamentar para o cancelamento dos ROF’s, embora reste
aos órgão públicos competentes, já comunicados, formar sua própria opinião acerca
da prática de ilícitos fiscais e penais.” (Destaque nosso)
Entendemos que, no caso concreto citado, o limite de atribuições entre Bacen e
Fisco foi suficientemente delineado. Não obstante, a maioria dos conselheiros en-
tendeu, em nosso sentir equivocadamente, pela extensão da regularidade das ope-
rações em matéria cambial também para fins tributários.
Considerar a manifestação favorável do Banco Central como definitiva e incon-
testável, é o mesmo que admitir, em se constatando ilícitos penais, que o Banco
deveria apresentar denúncia-crime diretamente, dispensando a atuação do Ministé-
rio Público. Não vemos como ser defensável nenhuma das posições.

4. Conclusões
Cremos, portanto, competir apenas ao Fisco conferir os devidos efeitos tributá-
rios às operações societárias ou negociais submetidas a outros órgãos da Adminis-
tração Pública.
Isso porque a submissão e análise das referidas operações por agências regula-
doras, pelo Banco Central ou outros órgãos públicos tem objetivos próprios, espe-
cíficos e mais limitados, que não podem, de forma alguma, determinar os efeitos
tributários delas decorrentes.

14
Foi dado provimento, por maioria de votos, ao recurso do contribuinte.
É preciso ponderar, contudo, que eventuais manifestações prévias de órgãos da
Administração podem servir como indício probatório em favor dos contribuintes,
mas, de forma alguma, pode ser atribuído às mesmas um valor probatório exacer-
bado no âmbito do processo administrativo-tributário15.
A auditoria fiscal, como visto, tem-se mostrado mais aprofundada que a análi-
se por parte de outros órgãos da Administração, sobretudo se considerarmos os ob-
jetivos mais amplos e os mecanismos de fiscalização que o Fisco dispõe.
Isso, ou seja, a profundidade da ação fiscal, somada à ampla defesa, ao contra-
ditório e à verdade material que regem o processo administrativo tributário, garan-
te que operações realmente hígidas, lícitas e com reais motivações empresariais não
sofram manifestações desfavoráveis pelo Fisco.
Ao contrário, para operações que não guardam qualquer verossimilhança nem
justificativa societário-negocial, entendemos, como igualmente vem entendendo o
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf, não ser possível atribuir-lhes
os efeitos tributários almejados, ainda que tenha recebido prévio aval de outros ór-
gão da Administração Pública.
Coibir as operações que não contam com qualquer suporte fático é, em última
análise, privilegiar as operações efetivamente reais e que geram riquezas e empre-
gos ao País.
Dessa forma, não há, e nem pode haver, vinculação da autoridade tributária (fis-
calização ou órgãos de julgamento) às manifestações prévias da Administração Pú-
blica, aqui incluídas as agências reguladoras, o Banco Central, a CVM, a Adene, a
ADA etc.

15
Isso se revela mais nítido se tivermos em mente o fato de que até mesmo o processo judicial pode ser usado como
veículo para fraudar a lei, por meio de colusão entre as partes (art. 485, III, do CPC).
Direitos e Deveres da Administração
Tributária à Luz dos Direitos Humanos
Renato Lopes Becho

I - Colocação do Tema
Os direitos humanos vêm crescendo em importância e
em reconhecimento desde a metade do século passado. Di-
versos campos tradicionais do Direito são por eles fortemen-
te influenciados, com destaque para o Direito Internacional,
o Direito Penal e o Direito Trabalhista. Porém, compreen-
dendo os direitos humanos como intrinsecamente direitos
fundamentais constitucionais, como ocorre no Brasil, eles
exercerão efeitos em todos os quadrantes do jurídico, in-
cluindo o Direito Tributário. A dimensão dos efeitos dos di-
reitos humanos no Direito Tributário é insipiente na cultura
jurídica brasileira e é o objeto de nossa atenção neste artigo.
Para tratarmos dos direitos humanos aplicados à tribu-
tação, optamos por apresentar situações reais da vivência
fiscal atual, para que possamos avaliar, com maior facilida-
de, o quadro teórico principal. Em outras palavras, ao invés
de realizarmos uma razoável divagação teórica sobre os di-
reitos humanos aplicados à tributação, sem que o leitor pos-
sa identificar, claramente, onde a teoria pode ser aplicada,
optamos aqui por apresentarmos situações práticas, viven-
ciadas no dia-a-dia forense, e confrontá-las com a teoria dos
direitos humanos.
Para alcançar nosso intuito, pretendemos levantar a ques-
tão do desequilíbrio que há, atualmente, entre os direitos e
deveres da Administração Tributária (Receita Federal do
Brasil e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) à luz dos
direitos humanos. Serão apresentadas duas situações fáticas:
o Sistema Público de Escrituração Digital - Sped, como di-
reito do Fisco, e o prazo necessário para que o mesmo órgão
da Administração Pública informe, ao contribuinte e ao Po-
der Judiciário Federal (em processos de execução fiscal), a
decisão exarada em processo administrativo onde houve ale-
gações de extinção do crédito tributário, como pagamento, Renato Lopes Becho
é Mestre, Doutor e
compensação ou retificação de dados, ponto levantado como Professor de Direito
dever do Estado. Tributário na PUC/SP,
Inicialmente, iremos expor os dois aspectos fáticos. Em Livre-docente em
seguida, abordaremos a relação entre o Direito Tributário e Direito Tributário pela
os direitos humanos para, no terceiro momento, unirmos os USP e Juiz Federal em
pontos levantados, focando o desequilíbrio entre os direitos São Paulo/SP.
e os deveres da Administração Tributária à luz dos direitos humanos. O aspecto prin-
cipal deste texto, portanto, são os direitos humanos aplicados à tributação. Os da-
dos fáticos servem apenas como força argumentativa e devem ser lidos como exem-
plo hipotético, como argumentos de retórica, para a obtenção do objetivo principal:
o foco tributário nos direitos humanos.

II - Situações Contrapostas: Rapidez no Recolhimento de Informações e


Demora na Análise de Informações Prestadas pelo Contribuinte
Nos termos em que foram postos no parágrafo anterior, atentemos ao Sistema
Público de Escrituração Digital - Sped, instituído pelo Decreto Federal n. 6.022, de
22 de janeiro de 2007. Por ele, a entrega de dados à Fiscalização Tributária será on-
line, em tempo real. Todos os dados que o Fisco quiser serão, com a implantação
do Sistema, repassados a ele imediatamente. Os primeiros artigos do indicado De-
creto, que comprovam a assertiva, possuem a seguinte redação:
“Art. 1º Fica instituído o Sistema Público de Escrituração Digital - Sped.
Art. 2º O Sped é instrumento que unifica as atividades de recepção, validação, arma-
zenamento e autenticação de livros e documentos que integram a escrituração comer-
cial e fiscal dos empresários e das sociedades empresárias, mediante fluxo único, com-
putadorizado, de informações.
§ 1º Os livros e documentos de que trata o caput serão emitidos em forma eletrônica,
observado o disposto na Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001.
§ 2º O disposto no caput não dispensa o empresário e a sociedade empresária de man-
ter sob sua guarda e responsabilidade os livros e documentos na forma e prazos pre-
vistos na legislação aplicável.”
O Sped é apresentado, pela Receita Federal do Brasil, como “mais um avanço
na informatização da relação entre o fisco e os contribuintes”.1 A justificativa ofi-
cial para tal sistema pode ser verificada nos seguintes termos:
“Na mesma linha das ações constantes do PAC que se destinam a remover obstáculos
administrativos e burocráticos ao crescimento econômico, pretende-se que o Sped
possa proporcionar melhor ambiente de negócios para o País e a redução do ‘custo
Brasil’, promovendo a modernização dos processos de interação entre a administra-
ção pública e as empresas em geral, ao contrário do pragmatismo pela busca de resul-
tados, muito comum nos projetos que têm como finalidade apenas o incremento da
arrecadação.”2
O Sped, ao que parece, é efetivamente um avanço na informatização da relação
entre o Fisco e o contribuinte, provavelmente constituindo uma ferramenta que irá
ampliar a eficiência administrativa da Máquina Arrecadatória, cumprindo um dos
princípios insculpidos pelo constituinte derivado (Emenda Constitucional n. 19, de
4 de junho de 1998) no art. 37 da Constituição Federal de 1988.
O segundo dado concreto que gostaríamos de levantar é o tempo necessário,
atualmente, no Fórum Federal das Execuções Fiscais de São Paulo, para que um
contribuinte e o magistrado tenham a resposta da Administração Tributária às peti-
ções com alegações de extinção do crédito tributário (como pagamento e compen-

1
Conforme “Apresentação” do Sped, extraído do sítio www.receita.fazenda.gov.br, em 23/07/2009.
2
Conforme “Histórico” do Sped, extraído do sítio www.receita.fazenda.gov.br, em 23/07/2009.
sação), bem como de retificação de dados fiscais, apresentadas em Juízo como com-
probatórias de ausência de dívidas fiscais. O contribuinte informa ao Poder Judiciá-
rio que há pedido administrativo de extinção do crédito tributário, ainda pendente
de decisão. Se o contribuinte, executado, se defende em exceção de pré-executivi-
dade (sem ter bens penhorados), comprovando que requereu administrativamente,
junto à Receita Federal do Brasil, a regularização do feito, a prática demonstra que
a manifestação objetiva da Administração Tributária (pela extinção do feito, por
cancelamento da Certidão de Dívida Ativa - CDA, pela ratificação ou substituição
da CDA ou pelo prosseguimento do processo executivo fiscal, se o pedido do exe-
cutado foi considerado, administrativamente, improcedente) leva, em média, qua-
tro anos para ser apresentada.3 Infelizmente, não se apresenta uma solução imedia-
ta para esse problema. Do ponto de vista processual, em algumas decisões, enten-
demos por extinguir o processo executivo, por ausência de certeza do título execu-
tivo, ou ao menos suspender os efeitos das execuções fiscais, até que houvesse ma-
nifestação objetiva por parte da Procuradoria da Fazenda Nacional. O Egrégio Tri-
bunal Regional Federal da 3ª Região, contudo, diante da ausência de previsão ex-
pressa no art. 151 do Código Tributário Nacional, reformou as decisões, como se
comprova com os seguintes julgados:
“De fato, diante da propositura da execução fiscal, a suspensão, seja da exigibilidade
do crédito tributário ou da liquidez e da certeza do título executivo, somente pode ser
alcançada em situações específicas, legal ou jurisprudencialmente delineadas, assim,
por exemplo, em caso de embargos com garantia da dívida (Súmula 38, TFR), mas não
de forma indiscriminada.
Desse modo, ainda que a Fazenda Nacional não se manifeste sobre a defesa do deve-
dor no prazo fixado, a suspensão da execução - enquanto fenômeno processual -, não
acarreta o efeito material de afetar a exigibilidade do crédito tributário, dotado de li-
quidez e certeza, sem que estejam presentes as condições legais próprias para tal efei-
to jurídico.
Na espécie, o Juízo ‘a quo’, diante apenas da falta de manifestação da exequente a
pedido formulado pelo devedor contra a execução fiscal, extraiu causa jurídica para
afastar a exigibilidade do crédito tributário, permitindo, inclusive, a expedição de cer-

3
Referida informação pode ser comprovada por centenas de processos. Não vamos apresentar, aqui, seus números.
Todavia, caso a comunidade acadêmica considere importante, poderemos publicá-los em outra oportunidade. Apre-
sentamos, contudo, alguns indicativos. No Processo n. 2002.61.82.016223-0, a Fazenda Nacional requereu, em 18
de outubro de 2002, a suspensão do feito por 180 dias para análise, pela Receita Federal, do processo administrativo
(fls. 75); em 22 de novembro de 2002 requereu novamente o prazo de 180 dias (fls. 82); em 7 de julho de 2003
requereu prazo de 120 dias (fls. 107); em 13 de abril de 2005 requereu novo prazo de 120 dias (fls. 119), assim
como em 9 de fevereiro de 2007 (fls. 126). Em 27 de junho de 2007 o magistrado extinguiu o feito, por ausência
de certeza do débito (fls. 134-136). Em 15 de janeiro de 2009, a sentença foi reformada (fls. 209-212). E em 7 de
julho de 2009, a Fazenda Nacional requereu a extinção do feito (fls. 220), por cancelamento do débito. No Processo
n. 2002.61.82.050962-9, foi dada vista à exequente, para manifestação, em 30 de junho de 2003 (e em pedidos su-
cessivos, sendo que até hoje não há manifestação objetiva à petição do executado); no Processo n. 2003.61.82.015736-5,
a primeira vista para manifestação objetiva foi em 21 de julho de 2003 (também há pedidos posteriores, ainda es-
tando em aberto); no Processo n. 2002.61.82.056250-4, a primeira vista foi em 17 de maio de 2004; no Processo
n. 2004.61.82.019070-1, a primeira vista é de 19 de julho de 2004; no Processo n. 2004.61.82.023836-9, a primeira
vista é de 4 de outubro de 2004; no Processo n. 2003.61.82.050324-3, a primeira vista é de 2 de março de 2005; e no
Processo n. 2002.61.82.053395-4, a primeira vista para manifestação sobre o processo administrativo é de 11 de abril
de 2005. Em todos os casos, exceto o primeiro, ainda não há manifestação objetiva da exequente à exceção de pré-
executividade.
tidão de regularidade fiscal, o que se revela prematuro, mesmo porque não houve se-
quer decisão judicial, indicativa da iliquidez e da incerteza do título executivo.” (AG
n. 2006.03.00.093280-2, Rel. Des. Federal Carlos Muta, 3ª Turma, data da decisão:
29/09/2006)

“Processual Civil. Agravo de instrumento. Execução Fiscal. Alegação de pagamento.


Exceção de pré-executividade. Suspensão da exigibilidade do crédito. Inocorrência das
hipóteses previstas no art. 151, do CTN.
I - A alegação de pagamento, oposta via exceção de pré-executividade, ainda que pen-
dente de análise do pedido de revisão do contribuinte, não tem o condão de acarretar a
suspensão da exigibilidade do crédito em questão.
II - A suspensão da exigibilidade do crédito tributário ocorre quando configurada qual-
quer uma das hipóteses previstas no art. 151, do Código Tributário Nacional.
III - Precedentes desta Corte.
IV - Agravo de instrumento provido.” (AG n. 2006.03.00.057216-0, Rel. Des. Federal
Regina Costa, 6ª Turma, data do julgamento: 28/03/2007, DJ 07/05/2007)

“A Certidão de Dívida Ativa goza de presunção de liquidez e certeza. Nesse sentido, a


suspensão da exigibilidade do crédito tributário apenas se dá quando da presença de
uma das hipóteses previstas no art. 151 do Código Tributário Nacional, o que não ocor-
re em virtude da alegação de pagamento em sede de exceção de pré-executividade,
conforme entendimento da 6ª Turma deste Tribunal.” (AG n. 2007.03.00.047882-2,
Rel. Des. Federal Lazarano Neto, 6ª Turma, data da decisão: 18/05/2007)

“A decisão impugnada teve por fundamento na demora da Fazenda em se manifestar


conclusivamente acerca das questões aduzidas pela executada no que tange à alega-
ção de pagamento e parcelamento dos débitos executados.
Do exame da documentação acostada aos autos, verifico que os pedidos de revisão,
fundamentados em pagamento (fls. 70/71), bem como o pedido de suspensão da exi-
gibilidade do crédito com fulcro em parcelamento se consubstanciam em providências
adotadas pela executada após o ajuizamento do executivo fiscal.
Dessa forma, ante a inexistência de causas que mitiguem os pressupostos de certeza,
liquidez e exigibilidade das CDA’s, que embasaram o executivo fiscal no momento de
sua propositura, ao menos nesta sede de cognição sumária, verifico presente a plausi-
bilidade de direito nas alegações da agravante a justificar a suspensão da decisão agra-
vada.
Ante o exposto, concedo o efeito suspensivo e determino o regular prosseguimento do
feito.” (AG n. 2007.03.00.047883-4, Rel. Des. Federal Alda Basto, 4ª Turma, data da
decisão: 18/06/2007)
Tais decisões estão em consonância com a jurisprudência do Egrégio Superior
Tribunal de Justiça, como se infere dos seguintes julgados:
“Processual civil e tributário - Suspensão da inscrição do devedor no Cadin - Requisi-
tos - Lei n. 10.522/02, art. 7º: suspensão da execução para aferição da existência de
pagamento - Impossibilidade - Interpretação estrita das hipóteses de suspensão da exi-
gibilidade do crédito tributário.
(omissis)
A suspensão da execução para possibilitar a aferição da exatidão do pagamento é ine-
ficaz para se obter a suspensão da inscrição do contribuinte do Cadin.” (REsp
n. 979.617/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, data da decisão: 12/08/2008, DJe
05/09/2008)
“Processual civil. Recurso especial. Tributário. Inscrição no Cadin. Poder de cautela.
Proteção de terceiro de boa-fé.
1. A suspensão da exigibilidade do crédito tributário é tema de norma específica e re-
clama obediência ao princípio da legalidade.
(omissis)
5. Deveras, a decisão do juiz de primeiro grau que determinou a suspensão da inscri-
ção no Cadin, com fulcro no art. 798 do CPC (Poder Geral de Cautela), em razão da
incerteza quanto à existência do débito, confronta-se com a previsão constante no art. 3º
da Lei 6.830, de 24 de setembro de 1980, que estabelece a presunção de liquidez e
certeza da Certidão de Dívida Ativa - CDA, somente elidida por prova inequívoca.”
(REsp n. 980.732/SP, Rel. Min. Teoria Zavascki, 1ª Turma, data da decisão: 02/12/2008,
DJe 17/12/2008)
Por tais decisões, há muito tempo acatadas, levam o magistrado a compreender
que não há prazo para manifestação do Poder Executivo, em exceção de pré-execu-
tividade. Não há o que o juiz de Primeiro Grau possa fazer a não ser esperar pela
decisão administrativa. É dizer: se um contribuinte se defender, perante um juiz fe-
deral, em um processo de execução fiscal na cidade de São Paulo, apresentando in-
dicação de que há pedido administrativo pendente de decisão, o Poder Judiciário tem
que aguardar, em média, por quatro anos, pela resposta da Receita Federal. A mes-
ma instituição que exige informações on-line dos contribuintes lhes responde - via
Poder Judiciário Federal - após diversos anos!
Com os dados apresentados neste tópico, o quadro fático está, portanto, apre-
sentado e pode ser assim resumido: o Fisco exige - ou pode exigir - informações
imediatas. A Administração Tributária, por outro lado, pode demorar o tempo que
ela mesma considerar necessário para informar o contribuinte (ainda que a pedido
do Poder Judiciário) sobre uma guia de recolhimento de tributo ou sobre uma com-
pensação realizada. O juiz não pode suspender os efeitos do processo (muito me-
nos poderia extinguir o feito), cabendo ao contribuinte suportar o processo pelo tem-
po que a Administração quiser. Sua única opção é, inclusive se estiver alegando
pagamento do tributo, ver seus bens penhorados e discutir em embargos à execu-
ção fiscal a ausência de débito tributário. Pode ser que em embargos è execução fis-
cal a sentença seja exarada entre seis meses e um ano após o protocolo da petição
inicial.
São esses os fatos.
Como os leitores deste artigo devem estar percebendo, estamos conscientes de
que fazemos uma comparação entre duas situações fáticas diferentes (o Sped e a
solução de processos administrativos simples, com alegações de pagamento, por
exemplo). Fizemos a escolha para mantermos o foco: verificarmos os prazos dados
pela lei a uma mesma instituição em situações distintas: quando interessa à arreca-
dação e quando não interessa à arrecadação. Poderíamos discutir o prazo de solu-
ção de embargos à execução fiscal e dos processos administrativos fiscais (que, como
apontado acima, estaria favorável à Justiça Federal), mas nosso objetivo não é com-
parar as duas instituições, de dois Poderes distintos.
Ao trazermos à baila o princípio da legalidade, como fizemos acima, nos pra-
zos ao Poder Executivo, é importante destacar que o mero socorro ao argumento de
lei não basta para satisfazer os direitos humanos. A lei pode servir para retirar a
dignidade da pessoa humana, como o direito nazista funcionou a qualquer prova, até
mesmo para Hans Kelsen. As considerações juspositivistas, por exemplo, de que a
personalidade humana é um atributo do Direito, levam à possibilidade de que o
Direito não atribua a personalidade humana a todas as pessoas. Não nos satisfaz,
portanto, uma clássica resposta juspositivista que pode ser dada ao quadro fático aqui
apresentado: um decreto dá direito ao Fisco de exigir informações imediatas dos
contribuintes e não há lei que obrigue a Administração Tributária a apresentar ma-
nifestação conclusiva, nos executivos fiscais, em prazo razoável. Assim, há lei a
favor do Estado, mas não há lei a favor do contribuinte. Portanto, o Direito aceita
as coisas como estão. Uma resposta como essa, tipicamente da concepção positivista
do Direito, não coloca um ponto final na discussão do ponto de vista dos direitos
humanos. Essa resposta técnica, embora incompatível com a dignidade do contri-
buinte, pode satisfazer ao positivismo jurídico, mas não é aceita pelo jushumanista.
Vejamos, agora, o que a concepção dos direitos humanos tem a nos oferecer
sobre esse quadro fático.

III - Os Direitos Humanos Aplicados à Tributação


Um dado pressuposto para o presente trabalho é a afirmação de que os direitos
humanos estão relacionados com o Direito Tributário. É a partir desse dado prévio,
posto antes do seu desenvolvimento, que nos permite tratar de um sistema de infor-
mação do contribuinte para o Fisco e do tempo necessário para a informação ao
contrário (do Fisco para o contribuinte) à luz dos direitos humanos. Mas será que
em uma área tão técnica como a tributação há espaço para discussões humanistas?
A resposta é sim!
Por direitos humanos temos a concepção jurídico-filosófica que privilegia o res-
peito aos valores e coloca novamente o homem no centro do Direito. O positivismo
jurídico (mero respeito às leis) dá lugar, de forma prudente e moderada, à finalida-
de do sistema jurídico: a proteção do homem. Para alcançar seu objetivo de prote-
ção do ser humano, notadamente frente ao Estado, o direito volta sua atenção a va-
lores como a dignidade da pessoa humana, o respeito à individualidade, à privaci-
dade e tantos outros.
A discussão dos direitos humanos, aplicada à tributação, é uma ferramenta de
defesa do contribuinte contra os Poderes Públicos. O Estado pode ser opressor pela
Polícia (comum e política), pela Censura, por obrigar nacionais a viverem no exí-
lio, mas também pode sê-lo pelo Fisco. Se não houver limites, além dos legais, para
a Administração Tributária, não haverá aplicação dos direitos humanos à tributação.
Significa dizer que os contribuintes estarão sujeitos a toda sorte de desrespeito e
opressão pelo Estado fiscal, ainda que sob o manto da lei.
A afirmação (direitos humanos aplicados à tributação) pode soar estranha em
um primeiro momento, mas é afastada por importante doutrina. Há uma verdadeira
escola nesse assunto, capitaneada por Ricardo Lobo Torres, que ensina:
“O poder de tributar nasce no espaço aberto pelos direitos humanos e por eles é total-
mente limitado. O Estado exerce o seu poder tributário sob a permanente limitação dos
direitos fundamentais de suas garantias constitucionais.”4

4
Os Direitos Humanos e a Tributação: Imunidades e Isonomia. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 13.
E ainda:
“Característica importante dos direitos fundamentais é a de se expressarem por prin-
cípios, como acontece no catálogo do art. 5º da CF, que proclama, entre outros, os prin-
cípios da igualdade, da liberdade de manifestação do pensamento, da inviolabilidade
da casa.”5
Alberto Nogueira, seguindo a trilha de Ricardo Lobo Torres, demonstra a inar-
redável relação atual entre os direitos humanos e a tributação, bem como a estrita
relação entre direitos e deveres. A citação abaixo serve, ao nosso sentir, como bom
resumo de seu pensamento, no ponto que interessa ao presente estudo:
“a) que no âmbito da tributação os ‘direitos’ se harmonizam com os ‘deveres’ integran-
do-se no esquema ‘direitos/deveres’, à semelhança de outras categorias de direitos da
terceira geração, em especial da ecologia; b) que existe uma dimensão individual do
tributo e outra coletiva; c) que o contribuinte é ao mesmo tempo devedor (na perspec-
tiva individual) e credor (enquanto inserido no grupo e na sociedade); d) não se pode
deixar de reconhecer-lhe, em qualquer hipótese, o legítimo interesse (e o direito) de
sofrer o impacto da tributação dentro dos cânones previstos na Constituição, com to-
das as garantias correspondentes) e, ainda, de ver aplicados os mesmos princípios e
critérios aos outros membros da sociedade; e, por último, de que é cada indivíduo - e
não o Estado - o titular do poder (limitado) de tributar.”6
José Souto Maior Borges publicou artigo sobre os direitos humanos e a tributa-
ção, de onde colhemos o ensinamento:
“Os vínculos entre a tributação e os direitos humanos não se manifestam ao primeiro
e superficial exame exegético. Mas se ocultam nas dobras do ordenamento constitu-
cional brasileiro, ao longo dos princípios e normas que o integram.”7
Outros autores também já trabalham em questões tributárias sob a ótica dos di-
reitos humanos, como Fernando Facury Scaff8 e Agostinho Toffoli Tavolaro.9
O tema, ainda novo, é tratado em congressos científicos, como no XXI Congres-
so Brasileiro de Direito Tributário, organizado de 17 a 19 de outubro de 2007 pelo
Instituto Geraldo Ataliba - IGA-Idepe (Instituto Internacional de Direito Público e
Empresarial). Nele foi proferida palestra pelo Ministro Luiz Fux, intitulada “Direi-
tos Humanos e Tributação”.10 Diversos princípios foram levantados como demons-
trações de direitos fundamentais (direitos humanos) na tributação: capacidade con-
tributiva, proibição de tributação confiscatória, tipicidade fechada, contraditório e
devido processo legal. Quanto a este último, destacamos, por sua vinculação ao ar-
gumento do presente artigo, a seguinte afirmação de Luiz Fux:
“O comum é exatamente o contribuinte se defender no bojo da execução fiscal. E aí
surgem vários direitos fundamentais do executado-cidadão, como, por exemplo, cita-

5
Os Direitos Humanos e a Tributação: Imunidades e Isonomia. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 13.
6
A Reconstrução dos Direitos Humanos da Tributação. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, pp. 178-179.
7
Constitucionalismo, Tributação e Direitos Humanos. Fernando Facury Scaff (organizador). Rio de Janeiro: Reno-
var, 2007, p. 327 e “Direitos Humanos e Tributação”. Revista Tributária e de Finanças Públicas v. 40, ano 9. São
Paulo: RT, set./out. de 2001, p. 189.
8
“Direitos Humanos e a Desvinculação das Receitas da União - DRU”. Revista de Direito Administrativo v. 236, Rio
de Janeiro: Renovar, abr./jun. de 2004, pp. 33-50.
9
“Estatuto do Contribuinte”. Revista Tributária e de Finanças Públicas v. 58, ano 12. São Paulo: RT, set./out. de 2004,
pp. 82-104.
10
Anais publicados na Revista de Direito Tributário v. 101. São Paulo: Malheiros, [2008], pp. 179-187.
do aqui, o redirecionamento da execução para os sócios, só naqueles casos específi-
cos que a Professora mencionou. A inteirabilidade [sic, provavelmente impenhorabi-
lidade] do faturamento, que evita, que conjura, o capital de giro do empresário. A im-
penhorabilidade do bem de família. A prescrição, que retira do contribuinte aquela
‘espada de Dâmocles’. Além, evidentemente, de inúmeros processos judiciais ofere-
cidos ao contribuinte, na medida em que nenhuma lesão ou ameaça de lesão está fora
da apreciação do Poder Judiciário.”11
Com os exemplos acima indicados, resta configurado que não é novidade, tam-
bém no Brasil, focar o Direito Tributário sob os holofotes dos direitos humanos.
Reconhecida essa possibilidade, apresentemos nossa linha de raciocínio. Natural-
mente, ela parte do texto da Constituição Federal.

IV - A Constituição Federal de 1988 e os Direitos Humanos


A Constituição Federal de 1988 é um marco na redemocratização e no reconhe-
cimento dos direitos humanos em nosso País. Logo na abertura do texto, o consti-
tuinte deixou assentado que:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Esta-
dos e dos Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de
Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana (...).”
Ao situar o Brasil diante dos demais povos (no chamado concerto das nações),
fixou o constituinte os parâmetros da atuação nacional na ordem internacional:
“Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pe-
los seguintes princípios:
I - independência nacional;
II - prevalência dos direitos humanos (...).”
O constituinte originário brasileiro esteve atento, como se vê pelos artigos já
citados, aos direitos humanos. São eles que irão conferir a dignidade da pessoa hu-
mana, superando a fase histórica do positivismo jurídico e sua obediência cega à lei,
não importando o que a lei estivesse prescrevendo.
Preocupado com a dignidade da pessoa humana e com os direitos humanos, o
constituinte construiu um importante arcabouço protetivo desses valores, no exten-
so - mas não exaustivo - rol dos direitos e deveres individuais e coletivos escritos
no art. 5º da Carta Constitucional, de onde destacamos:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantin-
do-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(omissis)
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorren-
tes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que
a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem apro-
vados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos vo-

11
Op. cit., p. 186.
tos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais (§ 3º acres-
centado pela Emenda Constitucional n. 45, de 8 de dezembro de 2004).”
A Constituição Federal, como se vê, destaca os direitos humanos e os documen-
tos internacionais firmados pelo Poder Executivo e aprovados pelo Poder Legisla-
tivo federal.
Não disse o constituinte - e nem era necessário - que os direitos humanos pro-
tegem os contribuintes. A extensão desses direitos é a todas as pessoas, que mante-
rão a dignidade da pessoa humana e o quadro protetivo humanista em todas as suas
relações, sem exclusão de nenhuma. Assim, por imperativo lógico, os direitos hu-
manos protegem o homem na sua qualidade de contribuinte, sem necessidade de o
constituinte - quer originário, quer derivado - ter escrito essa relação.
Porém, em ao menos um pacto internacional firmado pelo Brasil, diretamente
relacionado aos direitos humanos, há menção expressa à tributação, como é expos-
to na sequência.

V - A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem


Em abril de 1948, por ocasião da IX Conferência Internacional Americana, rea-
lizada em Bogotá, na Colômbia, foi firmada a Declaração Americana dos Direitos
e Deveres do Homem. Nela estão reconhecidos importantes componentes dos direi-
tos humanos, alguns deles que implicam efeitos tributários, como o direito de pro-
priedade, assim vazado:
“Artigo XXIII - Toda pessoa tem direito à propriedade particular correspondente às
necessidades essenciais de uma vida decente, e que contribua a manter a dignidade da
pessoa e do lar.”12
O direito de propriedade tem amplos efeitos, tanto no terreno do Direito Priva-
do quanto do Direito Público. Neste último insere-se uma limitação à tributação, que
não pode ser expropriatória (tributação que signifique, em verdade, confisco ou ex-
propriação do bem). Ao reconhecimento do direito à propriedade equipara-se a proi-
bição do confisco tributário, estipulando limites à atuação do legislador, o que já
significava uma relação entre a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do
Homem e o Direito Tributário.
Mas não somente há o direito à propriedade a nos interessar diretamente na refe-
rida Declaração. Há, notadamente, o reconhecimento de que pagar tributos é um
dever de todo cidadão. Assim consta expressamente na Declaração Americana dos
Direitos e Deveres do Homem:
“Artigo XXXVI - Toda pessoa tem o dever de pagar os impostos estabelecidos pela lei
para a manutenção dos serviços públicos.”13
Ainda que não houvesse menção expressa à tributação em um documento inter-
nacional do porte da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, a
reflexão ponderada sobre os dois campos - direitos humanos e Direito Tributário -

12
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, p. 787.
13
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, p. 789.
deixaria clara a vinculação. Afinal, a tributação é uma das expressões do Estado, e
todo Estado pode se tornar um ente opressor. Os direitos humanos expressam o de-
sejo e veiculam os mecanismos nacionais e internacionais de proteção da pessoa
humana em face do Estado. Este pode ferir os valores humanos que acompanham
as pessoas em situações de fragilidade, relacionados aos direitos civis (notadamen-
te de crianças, mães, idosos, inválidos etc.), eleitorais (defesa da democracia), tra-
balhistas (proteção das condições de trabalho, por exemplo), penais (devido processo
legal e tratamento humanitário dos presos, para citar apenas dois exemplos). Não
teriam relação com o Direito Tributário? Por quê?
O Estado Fiscal tem uma notável capacidade destrutiva, bem acentuada na afir-
mação clássica (de 1819) de Marshall: “o poder de tributar envolve o poder de des-
truir”.14 Conforme Aliomar Baleeiro, a afirmação de Marshall foi posta em autori-
zação ao poder de destruir, via tributação. Esse ponto levou ao contraponto: outra
posição célebre, mas contrária, de Oliver Holmes Jr. (afirmada em 1928), ao esta-
belecer que cabe ao Poder Judiciário impedir que os demais poderes usem a tribu-
tação para destruir, afirmando que “o poder de tributar não implicará no poder de
destruir, enquanto existir esta Corte”.15 Diante da nefasta possibilidade de destruir
que há no exercício do poder de tributar, não poderiam os instrumentos protetivos
da pessoa humana serem negados aos contribuintes. E não o são, como a Declara-
ção Americana dos Direitos e Deveres do Homem deixou claro.
Há uma possível objeção à afirmação de que a Declaração Americana dos Di-
reitos e Deveres do Homem eleva a tributação ao patamar dos direitos humanos.
Como o texto da Declaração fixa o “dever de pagar os impostos”, ela protege o Fis-
co, não o contribuinte. Há, assim, a defesa do direito estatal à cobrança dos tribu-
tos, não a deveres do Estado em matéria fiscal, deveres que incluam, por exemplo,
o de informar, rapidamente, o contribuinte. A objeção não se sustenta, como explo-
raremos no próximo item.

VI - Correlação entre Direitos e Deveres


É tecnicamente possível fazer distinção entre direitos e deveres. Eles constitui-
riam elementos diferentes, ainda que componentes do universo jurídico. Não have-
ria correlação entre eles. Assim, é razoável supor que não há um dever de proprie-
dade que leve as pessoas a serem proprietárias de bens. Nessa linha, há dentro da
Declaração Americana o dever das pessoas em recolher tributos, o que não lhes con-
fere, todavia, nenhum tipo de direito.
Essa assertiva - hipotética - não seria razoavelmente sustentável, pois não en-
contraria guarida, por exemplo, nas lições de teoria geral do Direito. Autores clás-
sicos nessa disciplina lecionam o contrário, é dizer: afirmam a correlação entre di-
reitos e deveres. Nessa linha, atentemos para o escrito por Paulo Dourado de Gus-
mão:

14
Apud Aliomar Baleeiro, Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7ª ed. atualizada por Misabel Abreu Ma-
chado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 566.
15
Ibidem, p. 568.
“O lado oposto do direito subjetivo é o dever jurídico, que consiste na situação em que
se encontra uma pessoa (sujeito passivo) de ter de praticar uma ação ou omissão, em
vantagem de outra, sob pena de sofrer uma sanção. Supõe, assim, vínculo que enlaça
o titular do direito ao devedor. É, pois, a sujeição jurídica de uma pessoa (devedor) a
outra (titular), que obriga aquela a uma prestação em favor desta.”16
Também A. Machado Paupério, que ensina o dever jurídico como:
“nada mais, nada menos que a obrigação, por parte de cada pessoa, de observar deter-
minado comportamento, ativo ou omissivo, sob pena de se ver compelida a fazê-lo pela
força da ordem jurídica.
Vê-se, assim, que o objeto do dever jurídico é o próprio comportamento do obrigado.”17
No campo próprio dos direitos humanos, Antônio Augusto Cançado Trindade
fixa a correlação entre os direitos e os deveres como uma das grandes contribuições
da Declaração que estamos examinando ao sistema protetivo humanista, in verbis:
“Em perspectiva histórica, são as seguintes, resumidamente, as principais contribuições
da Declaração Americana de 1948 ao desenvolvimento do sistema interamericano de
proteção: a) a já mencionada concepção dos direitos humanos como inerentes à pes-
soa humana; b) a concepção integral dos direitos humanos (abarcando os direitos ci-
vis, políticos, econômicos, sociais e culturais); c) a base normativa vis-à-vis Estados
não-partes na Convenção Americana sobre Direitos Humanos; d) a correlação entre
direitos e deveres.”18
Diante da correlação entre direitos e deveres, assim como os cidadãos das na-
ções americanas têm deveres em relação ao Fisco de seus países, esses órgãos têm
deveres frente aos contribuintes, destacando-se as obrigações de conferir-lhes tra-
tamento digno e igualitário. Compõe as obrigações do Estado o dever de informar,
com a presteza possível, a situação do contribuinte e a qualidade de seus documen-
tos fiscais, comprobatórios da prática de atos e de situações de fato, não apenas no
interesse da Administração Pública, mas também no interesse da pessoa humana do
contribuinte.
Registramos que o tema dever de pagar tributo é objeto de importantes consi-
derações doutrinárias, como de José Casalta Nabais19 e Maria Luiza Vianna Pessoa
de Mendonça,20 mas que, jamais, pode ser visto isoladamente.
A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de 1948, é um
importante documento que almeja proteger os direitos humanos no continente ameri-
cano. Mas, se houver - o que não nos parece - alguma perspectiva para se colocar
em dúvida a dimensão protetiva dos direitos humanistas dos contribuintes na indi-
gitada Declaração, outro Documento afasta, segundo nossa leitura, definitivamen-

16
Introdução à Ciência do Direito. 4ª ed. revisada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense, 1969, p. 196.
17
Introdução à Ciência do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1969, p. 44.
18
“O Sistema Interamericano de Direitos Humanos no Limiar do Novo Século: Recomendações para o Fortalecimento
de seu Mecanismo de Proteção”. Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Juris-
prudência. São Paulo: Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001,
p. 27.
19
O Dever Fundamental de pagar Impostos: Contributo para a Compreensão Constitucional do Estado Fiscal Con-
temporâneo. Coimbra: Almedina, 2004, p. 746.
20
Os Direitos Fundamentais e o Dever Fundamental de pagar Impostos: a Igualdade e o Imposto. Tese (doutorado).
Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2002. p. 581.
te, a separação entre esses campos (tributação e direitos humanos). O sistema pro-
tetivo continental experimentou notáveis avanços com a Convenção Americana so-
bre Direitos Humanos, de 1969. Ela prevê, inclusive, órgãos supranacionais e me-
canismos que ofereçam efetiva proteção humanista, para além das importantes de-
clarações de direitos, que não veiculam as formas de solução para os conflitos que
envolvam as violações aos direitos humanos. Centremo-nos, pois, na Convenção
Americana.

VII - A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969)


Além da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem de 1948, o
sistema continental de proteção dos direitos humanos evoluiu com a Convenção
Americana sobre os Direitos Humanos, firmada em 22 de novembro de 1969 em San
José de Costa Rica e ratificada pelo Brasil em 25 de setembro de 1992.
O avanço da Convenção Americana é destacado por Alexandre de Moraes21 pela
previsão e atuação dos órgãos de efetiva proteção dos direitos humanos no Conti-
nente: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana
de Direitos Humanos.
Os primeiros artigos da Convenção Americana não deixam dúvida sobre a di-
mensão protetiva que ela pretende. Confira-se:
“Artigo 1º Obrigação de respeitar os direitos.
1. Os Estados-partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e liber-
dades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que es-
teja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma, por motivo de raça, cor, sexo,
idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou
social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social.
2. Para efeitos desta Convenção, pessoa é todo ser humano.”22
Segundo Flávia Piovesan, a Convenção Americana é “o instrumento de maior
importância no sistema interamericano” de proteção aos direitos humanos, anotan-
do:
“Substancialmente, a Convenção Americana reconhece e assegura um catálogo de di-
reitos civis e políticos similar ao previsto pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e
Políticos. Dentro desse universo de direitos, destacam-se: o direito à personalidade
jurídica, o direito à vida, o direito a não ser submetido à escravidão, o direito à liber-
dade, o direito a um julgamento justo, o direito à compensação em caso de erro judi-
ciário, o direito à privacidade, o direito à liberdade de consciência e religião, o direito
à liberdade de pensamento e expressão, o direito à resposta, o direito à liberdade de
associação, o direito ao nome, o direito à nacionalidade, o direito à liberdade de mo-
vimento e residência, o direito de participar do governo, o direito à igualdade perante
a lei e o direito à proteção judicial.”23

21
Direitos Humanos Fundamentais: Comentários aos artigos 1º a 5º da Constituição da República Federativa do
Brasil, Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Atlas, 1997, p. 39.
22
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, p. 792.
23
“Introdução ao Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos”. Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo:
Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, pp. 84-85.
Destaca-se, dentre os primeiros dispositivos da Convenção Americana, o dever
dos Estados pactuantes de dotar seus respectivos ordenamentos jurídicos internos
com dispositivos legais que permitam a concretização dos direitos humanos, como
se confere:
“Artigo 2º Dever de adotar disposições de direito interno.
Se o exercício dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1º ainda não estiver
garantido por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados-partes compro-
metem-se a adotar, de acordo com as suas normas constitucionais e com as disposi-
ções desta Convenção, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem neces-
sárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades.”24
Uma das garantias aos direitos humanos dada pela Convenção Americana está
a de jurisdição fiscal, estipulada expressamente no seguinte dispositivo:
“Artigo 8º Garantias judiciais.
1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um
prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, esta-
belecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada
contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhis-
ta, fiscal ou de qualquer outra natureza.”25
Há o reconhecimento, no Continente Americano, de que os contribuintes têm
direito de serem ouvidos judicialmente, “com as devidas garantias e dentro de um
prazo razoável (...) na determinação de seus direitos e obrigações de caráter (...) fis-
cal”. Se não o forem, haverá violação aos direitos humanos, podendo ser acionados
os mecanismos protetivos que compõem a Convenção Americana. De fato, estipula
o art. 33 da Convenção dois órgãos que são competentes para conhecer de assuntos
relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-par-
tes nesta Convenção: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte
Interamericana de Direitos Humanos.
O Brasil se submete às decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos,
por decisão legislativa federal, qual seja, o Decreto Legislativo n. 89, de 3 de de-
zembro de 1998, nos seguintes termos:
“Artigo 1º É aprovada a solicitação de reconhecimento da competência obrigatória da
Corte Interamericana de Direitos Humanos em todos os casos relativos à interpreta-
ção ou aplicação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos para fatos ocorri-
dos a partir do reconhecimento, de acordo com o previsto no parágrafo primeiro do
artigo 62 daquele instrumento internacional.”
Significa dizer que as lesões aos direitos humanos dos contribuintes brasileiros,
praticados após 3 de dezembro de 1998, podem ser levadas à Corte Interamericana
de Direitos Humanos.
Desconhecemos a existência de precedente em matéria tributária na Corte Inte-
ramericana. Situação distinta ocorre na Corte Européia de Direitos Humanos. Con-
forme Philip Baker: “Foi possível identificar mais de 240 casos relativos a questões
tributárias nos quais decisões foram exaradas entre maio de 1959 e abril de 2000.”26

24
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, p. 792.
25
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, p. 796.
26
“A Tributação e a Convenção Européia de Direitos Humanos”. Tradução de João Dácio Rolim, inédito. Original
publicado in: British Tax Review n. 4, 2000, pp. 211-377. O trecho citado está na p. 1 da tradução.
Os principais temas foram assim listados por Baker: proteção à propriedade, direi-
to a um processo justo, proibição de discriminação, direito ao respeito, à privacida-
de e à vida humana e liberdade de pensamento, consciência e religião.
Parece-nos razoável supor, pois, que em algum momento a Corte Interamerica-
na de Direitos Humanos poderá ser chamada a decidir violações aos direitos huma-
nos em matéria tributária. Uma decisão em Direito fiscal poderia vir a alterar o or-
denamento jurídico brasileiro, ainda que o Brasil não fosse parte litigante perante a
Corte, pois suas decisões valem em todos os Estados que a reconhecem.
Há um importante precedente, ainda que apenas indiretamente em matéria tri-
butária, mas que nos permite vislumbrar, no futuro, não aceitações de violações aos
direitos humanos em matéria tributária. O Supremo Tribunal Federal brasileiro não
mais aceita a prisão do depositário infiel, ainda que o depósito tenha sido determi-
nado judicialmente, o que tem implicações nos processos executivos fiscais. No
Recurso Extraordinário n. 349.703/RS, relator para o acórdão Min. Gilmar Mendes;
no RE n. 466.343/SP, relator Min. Cezar Peluso; no Habeas Corpus n. 87.585/TO,
relator Min. Marco Aurélio e no Habeas Corpus n. 92.566/SP, relator Min. Marco
Aurélio, o Supremo Tribunal Federal, por seu Pleno, aplicou a Convenção Ameri-
cana sobre Direitos Humanos, art. 7º, parágrafo 7º (além do Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos, art. 11). Em decorrência dessas decisões, o Tribu-
nal declarou expressamente revogada a Súmula n. 619/STF, que autorizava a decre-
tação da prisão civil do depositário judicial no próprio processo em que se consti-
tuiu o encargo, independentemente do prévio ajuizamento da ação de depósito, as-
sim como tem concedido diversos habeas corpus, como a Medida Cautelar em
Habeas Corpus n. 98.893-8/SP, relator Min. Celso de Mello (decisão de 09/06/2009),
que possui a seguinte ementa:
“‘Habeas Corpus’. Prisão Civil. Depositário Judicial. A Questão da Infidelidade De-
positária. Tratados Internacionais de Direitos Humanos. A Jurisprudência Constitucio-
nal do Supremo Tribunal Federal. Ilegitimidade Jurídica da Decretação da Prisão Ci-
vil do Depositário Infiel. Medida Cautelar Deferida.
- Não mais subsiste, no modelo normativo brasileiro, a prisão civil por infidelidade
depositária, independentemente da modalidade de depósito, trate-se de depósito volun-
tário (convencional) ou cuide-se de depósito necessário, como o é o depósito judicial.
Incabível, desse modo, no sistema constitucional vigente no Brasil, a decretação de pri-
são civil do depositário infiel. Doutrina. Precedentes.”
É claro que nas demandas envolvendo a prisão do depositário infiel o ponto
nuclear é a prisão, um instrumento que somente indiretamente interessa ao Direito
Tributário. Mas acreditamos que sirva de indício para a dimensão que as decisões
da Corte Interamericana de Direitos Humanos poderão ter no Direito interno brasi-
leiro, também em matéria tributária.
Voltando, agora, ao assunto prático levantado neste texto, apresentemos o últi-
mo ponto que pode estar em discussão: a demora desproporcional da Administra-
ção Tributária para se manifestar sobre as alegações dos contribuintes. É essencial
para a compreensão do problema posto o reconhecimento de que o contribuinte tem
direito de petição (e de resposta) em tempo razoável, inclusive na esfera de atuação
do Poder Executivo, pois que o aspecto fático colocado não envolve o acesso ao
Poder Judiciário. Envolve a atuação do Poder Executivo Federal brasileiro, que não
tem respondido ao chamado judicial “dentro de um prazo razoável”, quando a de-
manda interessa ao contribuinte. Age, contudo, de forma oposta quando o seu inte-
resse é prevalente.
Ao que nos parece, estamos diante de uma violação ao devido processo legal,
pelos motivos a seguir apresentados.

VIII - Violação ao Devido Processo Legal


A Constituição Federal estipula como princípio fundamental dos brasileiros e
dos estrangeiros sujeitos à sua jurisdição o direito ao devido processo legal, garan-
tido nos seguintes termos:
“Art. 5º (...)
Inciso LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes.”
Também foi insculpido, como direito fundamental, a duração razoável dos pro-
cessos em mandamento determinado pela Emenda Constitucional n. 45, de 8 de
dezembro de 2004, nos seguintes termos:
“Art. 5º (...)
Inciso LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a ra-
zoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
O Texto Constitucional brasileiro está de acordo com o estabelecido na Decla-
ração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, como se confere:
“Artigo XVIII - Toda pessoa pode recorrer aos tribunais para fazer respeitar os seus
direitos. Deve poder contar, outrossim, com processo simples e breve, mediante o qual
a justiça a proteja contra atos de autoridade que violem, em seu prejuízo, qualquer dos
direitos fundamentais consagrados constitucionalmente.
(omissis)
Artigo XXIV - Toda pessoa tem o direito de apresentar petições respeitosas a qualquer
autoridade competente, quer por motivo de interesse geral, quer de interesse particu-
lar, assim como o de obter uma solução rápida.”27
Não basta, pois, o direito ao devido processo legal. Já em 1948, os signatários
da Declaração reconhecem que uma solução demorada é uma solução que viola os
direitos humanos. Por isso, a Declaração reconhece como direito uma solução rá-
pida.
Também a Convenção Americana protege a dignidade da pessoa humana dos
processos demorados, como resta claro no seguinte dispositivo:
“Artigo 25 - Proteção judicial.
1. Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso
efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que vio-
lem seus direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição, pela lei ou pela pre-
sente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam
atuando no exercício de suas funções oficiais.”28

27
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, pp. 786 e 787.
28
Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Legislação e Jurisprudência. São Paulo: Centro de
Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (Série Estudos n. 13), 2001, p. 804.
Como visto, na dimensão principiológica há farto aparato protetivo contra a
demora nos feitos judiciais e administrativos de natureza contenciosa, em tema que
sempre interessou à dogmática tributária brasileira, como prova Antônio Roberto
Sampaio Dória29 e Lucia Valle Figueiredo.30
Voltemos, agora, ao quadro fático proposto, procurando verificar seus efeitos
diante dos dispositivos legais constitucionais e internacionais aplicáveis ao Brasil.

IX - A Demora da Administração Tributária em responder ao Contribuinte


Diante dos Direitos Humanos
Conforme afirmado no início deste artigo, pretendemos focar os direitos e os
deveres da Administração Tributária brasileira (Receita Federal do Brasil e Procu-
radoria Geral da Fazenda Nacional) diante dos direitos humanos. Levantamos dois
pontos fáticos: o Sistema Público de Escrituração Digital - Sped e a demora da
Administração Tributária na resposta, ao Poder Judiciário e ao contribuinte, às ale-
gações de pagamento. Não nos faltam processos judiciais federais em que é neces-
sário aguardar por quatro anos pela resposta.
Em relação ao Sped, levantamos referido sistema no intuito de demonstrar a
capacidade, diante dos avanços tecnológicos, para o pronto fluxo de informações
entre o Fisco e os contribuintes. Tecnologia, equipamentos e vontade política foram
plenamente utilizados para que a Receita Federal tenha, imediatamente, em tempo
real e on-line, todas as informações que quiser que o contribuinte lhe preste. Con-
tudo, podemos supor que haja uma negativa de uso dos mesmos instrumentos quan-
do seja o contribuinte - e o Poder Judiciário - o interessado na informação. Vejamos,
agora, a demora da Administração Tributária diante dos direitos humanos e os ca-
minhos que existem para alterar o quadro fático apresentado.
Quer a Constituição Federal, quer a Declaração Americana dos Direitos e De-
veres do Homem ou a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos rechaçam
a demora da Administração Tributária em responder as demandas dos contribuin-
tes brasileiros, tanto em feitos administrativos quanto judiciais.
A Constituição Federal estipula, a respeito, a atenção aos princípios do devido
processo legal, da duração razoável dos processos e da eficiência administrativa, o
que tem sido descumprido nas situações fáticas descritas no início deste trabalho.
Como se observa, o Estado pode agir, no campo da tributação, sem respeitar o
contribuinte, reduzindo-lhe a dignidade, a individualidade e a privacidade. Para atin-
gir os seguidos recordes de arrecadação, sempre superiores ao crescimento da eco-
nomia, o Governo brasileiro pode estar arranhando a Constituição Federal de 1988,
por exemplo, nos princípios da igualdade, do devido processo legal, da moralidade
e da razoabilidade - todos eles instrumentos dos direitos humanos.
A alcançada eficiência na arrecadação, muito bem vinda e imprescindível para
o avanço social, a redução das desigualdades econômicas, a manutenção da máqui-
na pública e o pagamento da pesada dívida pública, tem que ser acompanhada pelo

29
Direito Constitucional Tributário e Due Process of Law. 2ª ed. revisada. Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 215.
30
Estudos de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 1996, pp. 87-100.
tratamento digno e eficiente às demandas daqueles que suportam o peso dos tribu-
tos. Sobre eles não deve pesar, também, excessos burocráticos sem importância e
inúteis para o Estado, assim como a eficiência em atendê-los tem que ser exemplar,
como exemplar é a arrecadação.
Acreditamos que a Administração Tributária tenha condições, por conta própria,
de melhorar os mecanismos de respeito aos contribuintes, equilibrando os bônus e
os ônus do Estado Fiscal. Caso contrário, as hierarquias superiores do Poder Exe-
cutivo (Ministério da Fazenda e Presidência da República), assim como os demais
Poderes, devem promover os ajustes para que os direitos humanos dos contribuin-
tes sejam plenamente respeitados.

X - Conclusão
As justificativas da Administração Tributária para o Sped, citadas no início deste
artigo, servem muito bem contra a manutenção da inércia da mesma Administração
em informar sobre as guias de pagamento apresentadas em juízo. Imagine-se um
advogado brasileiro, diante de seu cliente estrangeiro, administrador de uma multi-
nacional com atividades em nosso País, dizendo que aquela guia de pagamento que
eles têm em mãos demorará quatro anos para ser reconhecida e que é melhor depo-
sitar o valor (que já foi pago) em juízo para se defender em embargos à execução?
Confronte-se essa situação hipotética com as explicações da Receita Federal para
vermos como a Administração Tributária em juízo atua contra os interesses econô-
micos do País. Todavia, a economia não é nosso campo de atuação. Juridicamente,
confrontemos a atuação da Administração Tributária em juízo, nas situações levan-
tadas aqui, diante do Texto Constitucional (notadamente os princípios do devido
processo legal, da duração razoável dos processos e da eficiência administrativa) e
dos documentos legais internacionais, protetivos dos direitos humanos, para iden-
tificarmos uma significativa falha do Estado brasileiro em matéria de tributação.
Dos Regimes Fiscais de Reconhecimento
das Variações Monetárias Cambiais nas
Bases de Cálculo do IRPJ e da CSLL.
O Momento de Exercício do Direito
Sacha Calmon Navarro Coêlho
Misabel Abreu Machado Derzi

Preâmbulo - Várias empresas brasileiras durante a crise


internacional mudaram os regimes de competência para cai-
xa com vistas a apurar as variações cambiais. Este estudo
visa a dizer legítimos tais procederes.

1. A Natureza Jurídica das Estimativas de IRPJ e


CSLL. Da Imputação das Receitas e das Despesas no
Período
Coloquem-se as premissas:
a) a empresa apura e declara o seu imposto sobre a ren-
da e a contribuição social sobre o lucro com base no
Sacha Calmon Lucro Real;
Navarro Coêlho b) acresce ainda que a empresa segue a regra da perio-
é Coordenador da dização anual da renda, que é aquela universalmente
Pós-graduação em adotada, de tal forma que os pagamentos mensais a que
Direito Empresarial
está obrigada configuram mera antecipação do impos-
da Faculdade Milton
Campos, Presidente
to, que somente poderá ser efetivamente calculado ao
Honorário da final do ano-base, quando se consumar o fato gerador.
Associação Brasileira O regime de competência, como critério de imputação
de Direito Tributário e das receitas e das despesas dentro do período, via de regra,
Advogado. poderá ter caráter antecipatório. Em obediência aos princí-
pios da legalidade e da tipicidade, a obrigação de pagar tri-
butos só surge quando ocorrido, na prática, o fato descrito na
hipótese da norma de tributação, a ensejar o nascimento da
obrigação tributária. É dizer, a norma impositiva tributária
somente incide quando ocorrido, no mundo fenomênico, o
aspecto material da hipótese de incidência. Entretanto, há
exceções ao direito subjetivo dos contribuintes de só reco-
lher tributos após a ocorrência do fato gerador, como se in-
fere do art. 150, parágrafo 7º, da Constituição.
No âmbito da legislação do imposto de renda das pessoas
Misabel Abreu físicas e jurídicas e da contribuição social sobre o lucro, há
Machado Derzi previsão de uma série de recolhimentos antecipados daque-
é Professora Titular de les tributos, como é o caso das retenções na fonte sobre ren-
Direito Tributário da dimentos do capital e do trabalho ou da combinação de am-
UFMG. bos, além das antecipações mensais a título de estimativas,
em se tratando do regime de tributação anual pelo Lucro Real. As regras que im-
põem o recolhimento mensal das estimativas do imposto de renda, próprias do re-
gime de tributação do IRPJ pelo Lucro Real Anual, referem-se a meras antecipações
mensais do imposto (que sequer se sabe será devido), que deixam de subsistir com
o término do exercício, quando ocorre o fato gerador dos tributos, permitindo-se,
então, inferir o valor efetivo do eventual imposto apurado em base anual. Portanto,
a exigência das estimativas mensais se dá antes que tenha ocorrido o fato tributá-
vel, ou seja, antes de ocorrido o fato descrito no antecedente da norma impositiva
tributária, apto a fazer surgir a obrigação tributária. Ao contrário, os optantes pelo
Lucro Real Trimestral ou Lucro Presumido sujeitam-se ao período trimestral de
apuração do tributo e reconhecem o fato gerador ao final de cada trimestre do ano,
sem que lhes sejam exigidas as antecipações mensais a título de estimativas.
A respeito da norma tributária, escrevemos no Curso de Direito Tributário Bra-
sileiro ( passim)1:
“As hipóteses de incidência das normas tributárias contêm descrição de fatos. É im-
portante, assim, repisar quais os aspectos mais salientes da descrição. Em primeiro
lugar há o aspecto material, a descrição do fato mesmo. Depois o fato ou fatos são
devidamente enquadrados nas coordenadas de tempo e lugar. Daí advirão os aspectos
temporal e espacial da hipótese de incidência.”
Além do aspecto material, que é o núcleo da hipótese de incidência, de realçar
os aspectos pessoal, temporal e espacial. Para nós, tem especial importância o as-
pecto temporal, ou seja, o momento em que, no caso concreto, ocorre o fato tribu-
tável, a renda, surgindo então, como conseqüência jurídica, a obrigação de se pa-
gar o tributo. O núcleo do mandamento (consequente) da norma impositiva tributá-
ria é a base de cálculo, que integra o aspecto quantitativo da norma de tributação.
Ao lado da base de cálculo, tem-se, como aspecto quantitativo da conseqüência, a
alíquota, ademais de outros fatores quantitativos, dependendo das circunstâncias e
das características de cada imposto.
Integram, ainda, a conseqüência da norma tributária, o aspecto pessoal, as con-
dições de tempo e de lugar e o modo de cumprir a prestação. O aspecto pessoal da
conseqüência contrasta com o aspecto pessoal (aspecto subjetivo) do antecedente,
na medida em que, muitas vezes, como no caso de sujeição passiva indireta, o su-
jeito passivo, que deve cumprir a obrigação, é diferente da pessoa que pratica o fato
gerador do tributo.
O gráfico abaixo expressa a estrutura da norma impositiva tributária:
Norma Tributária
Hipótese de incidência - fato previsto Conseqüência jurídica - dever tributário
como jurígeno decorrente
Aspecto material - o fato em si A quem pagar (sujeito ativo)
Aspecto temporal - condições de tempo Quem deve pagar (sujeito passivo)
Aspecto espacial - condições de lugar Quanto se deve pagar (base de cálculo e
Aspecto pessoal - condições e alíquotas ou valor fixo, adições e subtrações)
qualificações relativas às pessoas Como pagar
envolvidas com o fato Quando pagar
Onde pagar

1
Sacha Calmon Navarro Coêlho. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 6ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 2001, p. 384.
Ora, renda não é receita bruta ou singelo rendimento. Aliás, a União, no exercí-
cio de sua competência privativa, expressa ou residual, à luz da Constituição de
1988, não poderá, de modo algum, miscigenar os conceitos de renda e capital (ou
patrimônio). Esse imperativo já se impunha anteriormente, com a Carta Magna de
1967 e Emenda Constitucional nº 1, de 1969, como registram as melhores obras
jurídicas da especialidade2. Na Constituição da República falece competência à
União para criar imposto, por meio de lei ordinária, sobre o faturamento, a receita
bruta ou o rendimento. E, em todas as teorias econômicas ou jurídicas, consideran-
do a dogmática brasileira e a jurisprudência consolidada, renda será sempre o ex-
cedente, a riqueza nova, o acréscimo de patrimônio apurado em certo período de
tempo3, como já observamos no Curso de Direito Tributário Brasileiro, na parte das
Atualizações.
Que tempo? Houve época em que os resultados de uma atividade empresarial
somente eram apurados ao final de uma série de operações idênticas, necessariamen-
te se aguardando o seu término. Tornando-se cada vez mais intensas e complexas
tais operações com o desenvolvimento do comércio, a partir do século XVII, come-
çam os usos a introduzir a periodização. Sobre o assunto já pontuamos:
“Sendo a continuidade da atividade um princípio comercial e contábil básico, a perio-
dização é uma ficção, cujos efeitos devem ser atenuados, mas é inafastável.
Explica Freitas Pereira que a regra anual foi universalmente adotada em razão dos se-
guintes fatores:
- o período não pode ser tão curto que seus resultados não sejam significativos, nem
tão longo que impeça sua renovação;
- a duração do período deve permitir a comparação entre exercícios sucessivos;
- o período deve integrar um ciclo completo de estações de modo a neutralizar influên-
cias sazonais. E conclui:
‘A adoção de uma base anual para a elaboração das contas preenche estes requisitos e
reflete o juízo de uma longa experiência segundo a qual o ano nem é demasiado longo
nem demasiado curto e, além disso, projeta o ritmo normal em que se desenvolve a vida
econômica e social, toda ela marcada pelo ciclo das estações’. (Cf. Freitas Pereira, A
Periodização do Lucro Tributável, Lisboa, Centro de Estudos Fiscais, 1988).”4
Muitas conseqüências advêm da dimensão temporal da renda, artificialmente
posta pelo legislador, ainda que ele se conserve dentro desses critérios de razoabili-
dade. São dela resultantes, como lembra ainda Freitas Pereira: a regra da anualida-
de do imposto; o princípio da anterioridade para a vigência da lei tributária que

2
Ver J. L. Bulhões Pedreira. Imposto de Renda, Rio de Janeiro, Justea, 1971; Gilberto de Ulhôa Canto. Temas de Di-
reito Tributário, vols. I, II e III, Rio de Janeiro, Alba, 1971; Rubens Gomes de Sousa. “A Evolução do Conceito de
Rendimento Tributável”, Revista de Direito Público vol. 4, São Paulo, p. 339; Henry Tilbery. A Tributação dos
Ganhos de Capital, São Paulo, Resenha Tributária e IBDT, 1977 et alii.
3
Ver, além dos autores citados na nota de rodapé nº 2, os seguintes: Modesto Carvalhosa. “Imposto de Renda. Con-
ceituação no Sistema Tributário da Carta Constitucional”, Revista de Direito Público vol. I, São Paulo; García Bel-
sunce. El Concepto de Redito en la Doctrina y en el Derecho Tributário, Buenos Aires, Depalma, 1967; Musgrave.
“In Defense of an Income Concept”, Tax Law vol. I. P. White. Darthmouth. Pub. Livr. England, 1995; George Shwanz.
Archiv I, 1896; Aliomar Baleeiro. Direito Tributário Brasileiro, atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi, 11ª
edição, Rio de Janeiro, Forense, 2000; Klaus Tipke. Steuerrecht. Ein Systematicher Grundriss. 9. Koln, 1983.
4
Cf. Aliomar Baleeiro. Direito Tributário Brasileiro, atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi, 11a edição, Rio
de Janeiro, Forense, 2000, p. 325.
majora o imposto; a independência dos exercícios; a importância do período-base,
como marco na irretroatividade da lei; as dificuldades do regime de imputação das
receitas e das despesas, etc.
Como se constata, a periodização é um corte, feito no tempo, sobre os frutos da
atividade produtiva, em princípio contínua, corte que tem como efeito imediato a
delimitação temporal do pressuposto tributário, que se renova, a cada decurso de
novo período. Sendo a regra da continuidade da exploração um princípio contábil e
de Direito Comercial universal, dela resultam ainda outras regras tecnicamente ne-
cessárias e reconhecidas pelos ordenamentos jurídicos em geral, tais como a uni-
formidade ou permanência de métodos utilizados; a especialização dos exercícios;
a identidade entre o balanço de abertura de um exercício e o balanço de encerramen-
to do exercício anterior; a cautela ou não-paridade de tratamento entre lucro e pre-
juízo5.
Enfim, a regra da anualidade do imposto, sendo artificialmente posta, acarreta
outras, que atenuam eventuais efeitos nocivos da periodização. Assim é que surgem
problemas, tanto do lado da imputação dos rendimentos a determinados exercícios,
como do lado da imputação dos gastos e das perdas. Do ponto de vista dos custos,
cria-se a figura da provisão, que serve para antecipar uma perda apenas provável,
mas futura, que ainda não se realizou ou a figura da amortização ou depreciação,
que serve para adiar ou repartir um custo por vários exercícios, entre outras técni-
cas. Ademais, o legislador brasileiro, como pode ocorrer em outros países, também
atenua os efeitos que a periodização anual acarreta para a arrecadação. Em lugar de
aguardar o decurso do período-base, as necessidades do Tesouro impuseram a cria-
ção de antecipações obrigatórias, “estimadas” e provisórias, do imposto que somente
será apurado ao fim do período.
Mais ainda, deixe-se consignado que a periodização anual, embora seja um ar-
tifício jurídico, razoável, para a apuração da renda, está implicitamente adotado pela
Constituição da República. Como corte, o período anual se repete como aspecto
temporal do pressuposto do tributo, fato-signo de riqueza, ano a ano. Por isso, o
princípio da anterioridade, constante do art. 150, proíbe “cobrar tributos no mesmo
exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou”.
Quando os tributos têm por pressuposto não um ato ou negócio jurídico isolados,
mas a renda ou o patrimônio que, por definição, são resultado de situações contí-
nuas, a arrecadação, necessariamente, renova-se ano a ano, para compor o orçamento
estatal, por imposição da Constituição. O corte no tempo, artificialmente imposto,
é dado antes pela Constituição Federal e passa a integrar os direitos e garantias do
contribuinte. Se for concedido ao legislador o arbítrio de estabelecer periodizações
de duração menor, contra os princípios constitucionais e a prática brasileira, ele re-
novará, com a frequência que quiser, os fatos geradores do imposto de renda, assim

5
V. autores alemães como Plückebaum-Wendt-Ehmck-Niemeier. Einkommensteuer, 16A. Achim: Fleischer, 1991;
Blümich/Falk. Einkommensteuergesetz Kommentar, München, Verlag Vahlen, 1987; K. Tipke. Steuerrecht, Ein Sys-
tematicher Grundriss. Koln, 1983, pp. 224-226; ver ainda sobre as regras contábeis adotadas pelos legisladores eu-
ropeus, Montesinos Juve, Las Normas de Contabilidad en la Comunidad Economica Europea, Madrid, Instituto de
Planificación Contable, 1980, pp. 356 e ss.; Sidney Davidson, Modern Accounting Theory, New Jersey, Prentice Hall;
Eldon S. Hendriksen e Michael F. Van Breda, Teoria da Contabilidade, tradução da 5ª edição por Antonio Zoratto
Sanvincente. São Paulo, Atlas, 2007.
como daqueles incidentes sobre o patrimônio. As conseqüências são graves do ponto
de vista da igualdade, capacidade contributiva, unicidade do tributo e proibição do
confisco.
Assim, apenas o período anual bitola razoavelmente a atividade produtiva da
pessoa (física ou jurídica), pois a capacidade econômica de contribuir inicia-se após
a dedução dos gastos necessários à aquisição, produção e manutenção da renda e do
patrimônio. Haverá certos dias ou meses do ano, especialmente em atividades sa-
zonais, rurais e silvícolas, em que os rendimentos são elevados, as entradas ou flu-
xos são altos, mas não significam renda nem lucro. Devem apenas estar à disposi-
ção do contribuinte para gastos e despesas previsíveis ou imprevisíveis, que logo
anularão o superávit. O contribuinte, especialmente a pessoa empresarial, não pode
ser chamada a pagar imposto em período curtíssimo, de 30 dias, porque o fato com-
promete, muitas vezes, o patrimônio da pessoa ou seu capital, impondo-lhe sacrifí-
cios superiores aos de sua capacidade econômica de contribuir, em afronta aos arti-
gos 145, parágrafo 1º, e 150, IV, da Constituição.
Portanto, ao manter o regime anual de apuração da renda, a empresa não está,
de forma alguma, no exercício de um privilégio, ou de uma exceção. Ao contrário
ela está adotando a regra-padrão básica, constitucional e logicamente incorporada
à legislação nacional. Outra periodização menor, que lhe fosse imposta pelo legis-
lador, seria inconstitucional. Em contrapartida, a lei brasileira determina pagamen-
tos mensais antecipatórios do imposto, sujeitos a ajuste e acerto final, uma vez ocor-
rido o fato gerador com o encerramento do balanço.
É verdade que a lei ordinária também admite a periodização mais curta, a tri-
mestral, que somente não é inconstitucional porque não é obrigatória, é opção aberta
ao contribuinte. Feita a opção, ele não terá o dever de antecipar o imposto “estima-
do” mês a mês ao Fisco (essa a vantagem), mas em contrapartida, verá reduzido o
ano-base de apuração para três meses.
Assim é que as normas que impõem o cumprimento das estimativas, em verda-
de, atuam tão-somente sobre o mandamento da norma impositiva tributária, pois a
lei reconhece que o fato gerador do imposto só ocorre em 31 de dezembro. Ou seja,
impõe-se ao contribuinte o dever de pagar o tributo antes mesmo de ocorrido o fato
gerador, sem qualquer influência sobre a hipótese de incidência (situada no antece-
dente da norma de tributação), mantendo-se o aspecto temporal da hipótese de in-
cidência, no regime de Lucro Real Anual, em 31 de dezembro do exercício. Toda-
via, o momento dos pagamentos (circunstância temporal, situada no conseqüente da
norma impositiva) é antecipado para o mês seguinte ao período de apuração men-
sal de cada estimativa e o quantum devido a título de tais estimativas obedece aos
critérios legais de apuração a seguir expostos.
A Lei nº 8.383, de 30 de dezembro de 1991, alterou os prazos e formas de pa-
gamento do imposto de renda das pessoas jurídicas. A alteração mais significativa
ficou por conta da base de cálculo do imposto que passou a ser apurada mensal-
mente, de forma antecipada sujeita a ajuste ao final do exercício, quando se apura o
imposto efetivamente devido. Na prática, a União recebe parcelas mensais do im-
posto, antes mesmo da ocorrência do fato gerador, o que é muito cômodo para o
Tesouro Público. Mas, como diziam os romanos, nossos prógonos em matéria jurí-
dica, “ubi comodo, ibi incomodo”, ou em vernáculo: toda comodidade implica al-
gum incômodo!
Dito isso, prossigamos na exposição dos critérios legais regentes das antecipa-
ções mensais do imposto de renda anual.
Com efeito, as empresas brasileiras tributadas segundo a sistemática do Lucro
Real entraram efetivamente no sistema de pagamentos em bases correntes. Assim,
já no ano-calendário de 1992, o pagamento do imposto de renda das pessoas jurí-
dicas passou a ser devido mensalmente, à medida que os lucros fossem auferidos
e, portanto, com a obrigatoriedade dessas empresas apurarem a base de cálculo do
imposto e o imposto devido a cada mês (art. 38, parágrafo 1º):
“Art. 38. A partir do mês de janeiro de 1992, o imposto de renda das pessoas jurídicas
será devido mensalmente, à medida em que os lucros forem auferidos.
§ 1º Para efeito do disposto neste artigo, as pessoas jurídicas deverão apurar, mensal-
mente, a base de cálculo do imposto e o imposto devido.”
A Lei nº 8.981/95 veio consolidar a exigência mensal do IRPJ, nos termos do
seu art. 27, a saber:
“Art. 27. Para efeito de apuração do Imposto de Renda, relativo aos fatos geradores
ocorridos em cada mês, a pessoa jurídica determinará a base de cálculo mensalmente,
de acordo com as regras previstas nesta seção, sem prejuízo do ajuste previsto no art. 37.”
Segundo o art. 35 da Lei nº 8.981/95, com as alterações introduzidas pela Lei
nº 9.065/95, a pessoa jurídica tributada pelo Lucro Real Anual, pode suspender ou
reduzir os pagamentos mensais estimados do imposto de renda, desde que o mon-
tante acumulado no ano supere aquele que seria devido, inclusive adicional, com
base no Lucro Real até então apurado. É conferir:
“Art. 35. A pessoa jurídica poderá suspender ou reduzir o pagamento do imposto de-
vido em cada mês, desde que demonstre, através de balanços ou balancetes mensais,
que o valor acumulado já pago excede o valor do imposto, inclusive adicional, calcu-
lado com base no lucro real do período em curso.
§ 1º Os balanços ou balancetes de que trata este artigo:
a) deverão ser levantados com observância das leis comerciais e fiscais e transcrito no
livro Diário;
b) somente produzirão efeitos para determinação da parcela do imposto de renda e
da contribuição social sobre o lucro devidos no decorrer do ano-calendário.” (Grifos
nossos)
Assim é que os contribuintes sujeitos ao Lucro Real Anual estão obrigados ao
pagamento mensal do imposto e da contribuição social sobre o lucro de duas for-
mas: ou calculando-o com base na receita bruta mensal (art. 2º da Lei nº 9.430/96 -
forma presumida de pagamento) ou nos balanços de suspensão/redução (art. 35 da
Lei nº 8.981/95, com base no acréscimo patrimonial verificado até o mês em que
se pretende reduzir/suspender o pagamento mensal dos tributos), podendo alternar
as formas de apuração a cada mês. Evidente, portanto, que o dever de pagamento
mensal do imposto de renda com base em estimativa não infirma o caráter anual do
tributo, o que de resto se confirma pela necessidade de ajuste ao final de cada ano-
base, como previsto pelo art. 37 da Lei nº 8.981/95, in verbis:
“Art. 37. Sem prejuízo dos pagamentos mensais do imposto, as pessoas jurídicas obri-
gadas ao regime de tributação com base no lucro real (art. 36) e as pessoas jurídicas
que não optarem pelo regime de tributação com base no lucro presumido (art. 44) de-
verão, para efeito de determinação do saldo do imposto a pagar ou a ser compensa-
do, apurar o lucro real em 31 de dezembro de cada ano-calendário ou na data da ex-
tinção.
(...)
§ 5º O disposto no caput somente alcança as pessoas jurídicas que:
a) efetuaram o pagamento do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro,
devidos no curso do ano-calendário, com base nas regras previstas nos arts. 27 a 34;
b) demonstrarem, através de balanços ou balancetes mensais (art. 35):
b. 1) que o valor pago a menor decorreu da apuração do lucro real e da base de cálculo
da contribuição social sobre o lucro, na forma da legislação comercial e fiscal; ou
b. 2) a existência de prejuízos fiscais, a partir do mês de janeiro do referido ano-ca-
lendário.” (Grifamos)
O lucro apurado no ajuste final, feito em 31 de dezembro de cada ano, é a ver-
dadeira base de cálculo do imposto de renda, tendo a estimativa caráter precário e
provisório. É o que mais uma vez se vê do parágrafo 3º do art. 2º da Lei nº 9.430/96:
“Art. 2º A pessoa jurídica sujeita a tributação com base no lucro real poderá optar pelo
pagamento do imposto, em cada mês, determinado sobre base de cálculo estimada,
mediante a aplicação, sobre a receita bruta auferida mensalmente, dos percentuais de
que trata o art. 15 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, observado o disposto
nos §§ 1º e 2º do art. 29 e nos arts. 30 a 32, 34 e 35 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro
de 1995, com as alterações da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995.
(omissis)
§ 3º A pessoa jurídica que optar pelo pagamento do imposto na forma deste artigo
deverá apurar o lucro real em 31 de dezembro de cada ano, exceto nas hipóteses de
que tratam os §§ 1º e 2º do artigo anterior.
§ 4º Para efeito da determinação do saldo de imposto a pagar ou a ser compensado, a
pessoa jurídica poderá deduzir do imposto devido o valor:
(...);
IV. do imposto de renda pago na forma deste artigo.” (Grifamos)
A diferença entre os valores recolhidos das estimativas e demais antecipações
ao longo do ano e o IRPJ apurado pelo Lucro Real Anual no fim do ano-base, devi-
do com base no efetivo acréscimo patrimonial verificado no ano será: (a) recolhida
em quota única, se negativa (débito residual a pagar); ou (b) se positiva (crédito do
contribuinte, denominado saldo negativo a pagar de IRPJ), compensada com o im-
posto a ser pago a partir do ano subseqüente, se favorável ao contribuinte, assegu-
rada a este a alternativa de requerer, após a entrega da declaração de rendimentos, a
restituição do montante pago a maior (parágrafo 1º do art. 6º da Lei nº 9.430/96).
Quanto à compensação do crédito de saldo negativo de IRPJ e CSLL, o art. 29 da
Medida Provisória nº 449/2008 a vedou, em se tratando de débitos de estimativas
daqueles mesmos tributos, mantendo-se a possibilidade de compensação com os de-
mais tributos administrados pela RFB. Essa proibição, embora inconstitucional,
impossibilitou a compensação dos créditos das empresas brasileiras - real excres-
cência autoritária - com o IRPJ e CSLL, levando-a a utilizar os mesmos créditos para
pagamento da CIDE, alternativa que lhe é legalmente facultada6, nem sempre sufi-
ciente para observar o excesso de tributação...

6
A inconstitucionalidade do dispositivo é patente e a manutenção da vedação está a depender da manifestação do
Congresso Nacional no processo de conversão em lei, já tendo sido afastado o dispositivo pela Câmara.
A apuração das estimativas e do saldo negativo se dá, em relação à CSLL, de
forma idêntica ao IRPJ, na conformidade dos arts. 28 e 30 da Lei nº 9.430/96, a sa-
ber:
“Art. 28. Aplicam-se à apuração da base de cálculo e ao pagamento da contribuição
social sobre o lucro líquido as normas da legislação vigente e as correspondentes aos
arts. 1º a 3º, 5º a 14, 17 a 24, 26, 55 e 71, desta Lei.
(...).
Art. 30. A pessoa jurídica que houver optado pelo pagamento do imposto de renda na
forma do art. 2º fica, também, sujeita ao pagamento mensal da contribuição social so-
bre o lucro líquido, determinada mediante a aplicação da alíquota a que estiver sujeita
sobre a base de cálculo apurada na forma dos incisos I e II do artigo anterior.”
Tem-se assim, no regime de tributação pelo Lucro Real Anual, a ocorrência de
fato gerador, apurado com base no efetivo acréscimo patrimonial anual, coexistin-
do com o dever de se efetuarem pagamentos estimados mensais, donde se infere que:
(a) o fato gerador do IRPJ e da CSLL não se confunde com os fatos que ensejam o
pagamento das estimativas, sendo também diversos os períodos de apuração da
matéria tributável; e (b) que as estimativas constituem meramente um regime tri-
butário de pagamento antecipado de IRPJ e CSLL, sem qualquer efeito sobre a hi-
pótese de incidência de tais tributos e o valor devido dos mesmos, que têm por base
o Lucro Real verificado no ano, e não em cada um dos meses que formaram o ano-
base. As antecipações correm a favor do Tesouro, subjugando os contribuintes ao
querer estatal de receber imposto ainda incerto, por receitas supostamente tribu-
táveis no futuro.
De se notar, ademais, que o não recolhimento de uma estimativa ou o seu reco-
lhimento a menor, no curso do ano-calendário, não autoriza o Fisco a exigir a dife-
rença, trazendo como conseqüência jurídica tão-somente a aplicação da multa iso-
lada de 50% prevista no art. 44, II, b, da Lei nº 9.430/96, reconhecendo-se a ino-
corrência do fato gerador do IRPJ e CSLL antes do término do ano-calendário, a
suscitar a exigência das estimativas eventualmente em aberto. É dizer, as estimati-
vas de IRPJ são precárias, não havendo que se falar, uma vez findo o exercício fis-
cal, em relação jurídica tributária que obrigue ao seu pagamento, faltando-lhes as-
sim o elemento essencial de validade e eficácia. Ao cabo do exercício, passam o IRPJ
e a CSLL a ser devidos unicamente em função de sua apuração anual, a qual reflete
o quantum debeatur efetivamente devido.
Assim, encerrado o ano-calendário, não há falar em estimativa. O imposto
apurado é o final. E bem pode haver, não obstante a apuração de estimativas devi-
das, a apuração de prejuízo fiscal no ano, a afastar a incidência do IRPJ e CSLL,
confirmando-se, mais uma vez, que as estimativas não afetam a obrigação tributá-
ria a título de IRPJ e CSLL. Na medida em que a apuração de bases de cálculo po-
sitivas em determinados meses pode ser revertida pela apuração de prejuízos em
outros meses, resultando em prejuízo fiscal ao término do ano-calendário, a adoção
do regime de caixa ou competência ao longo do ano, para fins de cálculo das esti-
mativas, em nada afeta o valor apurado do imposto em bases anuais. A base tribu-
tável definitiva dos tributos só sofrerá alteração pela adoção de um regime ou outro
na apuração dos tributos na DIPJ, em base anual, quando se consolidam todos os
eventos que permitem se inferir a ocorrência ou não de matéria tributável.
Confirmando o caráter precário e transitório das estimativas de CSLL, o que vale
também para o IRPJ, e a prevalência da apuração do tributo com base no resultado
anual, consolidou-se a jurisprudência. É de ver o acórdão do STJ:
“Recurso Especial. Tributário. Imposto de Renda Pessoa Jurídica. Contribuição Social
sobre o Lucro. Antecipação por Estimativa. Cessação de Recolhimento. Pagamento
Suficiente. Multa. Decreto-Lei n. 2.354/87. Impossibilidade de Aplicação da Penali-
dade Prevista para a Falta ou Insuficiência do Pagamento.
Acertadas as decisões de primeiro grau e da Corte de origem de afastar a aplicação
da multa de 50%, prevista no art. 16 do citado Decreto-Lei n. 1.967/82, sobre a falta
de recolhimento, tendo em vista que, muito embora tenha havido a cessação do reco-
lhimento das antecipações devidas, o pagamento restou ao final do balanço suficien-
te para suprir a totalidade do imposto devido para o período, o que a acarreta a im-
possibilidade de aplicação da penalidade prevista para a falta ou insuficiência do pa-
gamento, o que, in casu, não ocorreu.
Recurso especial improvido.” (STJ, REsp nº 371.178/RS, Rel. Min. Franciulli Netto,
Segunda Turma, DJ 23.05.2005, p. 189)
Corroborando o posicionamento esposado, reitera a jurisprudência administra-
tiva. Confiram-se, interplures, os acórdãos a seguir:
“IRPJ. Recolhimento por estimativa. Multa isolada. Encerrado o período de apuração
do imposto de renda, a exigência de recolhimentos por estimativa deixa de ter sua efi-
cácia, uma vez que prevalece a exigência do imposto efetivamente devido apurado, com
base no lucro real, em declaração de rendimentos apresentada tempestivamente, reve-
lando-se improcedente a cominação de multa sobre eventuais diferenças, se o impos-
to recolhido superou, largamente, o efetivamente devido.” (Ac. 1º C.C. nº 103-20.572)

“IRPJ. CSLL. Recolhimento por estimativa. Multa isolada. Encerrado o período de


apuração do imposto de renda, a exigência de recolhimentos por estimativa deixa de
ter sua eficácia, uma vez que prevalece a exigência do imposto efetivamente devido
apurado, com base no lucro real, em declaração de rendimentos apresentada tempesti-
vamente, revelando-se improcedente e cominação de multa sobre eventuais diferenças,
mormente quando verificado o prejuízo no ano-calendário.” (Ac. 1º C.C. nº 103-21.030,
de 18.09.2002)
Na mesma linha de idéias, o entendimento da Câmara Superior de Recursos
Fiscais. É ver:
“Multa Isolada. Inexistência de Tributo a recolher. Descumprimento de Obrigação
Acessória (art. 44, § 1º, inciso IV da Lei nº 9.430/96). A exigência da multa isolada pre-
vista na legislação de regência não tem cabimento se o descumprimento versa sobre de-
satendimento de mera obrigação acessória apurada após o encerramento do ano ca-
lendário sem repercussão na órbita do tributo.” (Ac. CSRF/01-04.263, de 02.12.2002)

2. Escrituração Contábil e Obrigatoriedade de Adoção do Regime de


Competência. Para a Apuração do Imposto, não porém para apurar as
Variações Cambiais
Como já registramos, a periodização anual, embora seja um artifício jurídico,
razoável, para a apuração da renda, está implicitamente adotado pela Constituição
da República. Trata-se de um corte, o ano de apuração que é marco temporal do
pressuposto do tributo, fato-signo de riqueza nova, ou acréscimo patrimonial. Mas
a periodização da renda acarreta conseqüências importantes e uma delas será deci-
dir qual deverá ser o regime de imputação, naquele período, das receitas e das des-
pesas.
Em termos contábeis, por excelência, o único regime adequado para reconheci-
mento das receitas e despesas é o de competência7. Esta premissa deve ser desde já
fixada, pois foi acolhida na ordem jurídica positiva nacional.
De plano, deve-se deixar claro que o regime de competência contábil não se
confunde com a adoção de regime diverso (caixa), ainda que o legislador tributário
crie exceções ao regime de competência. Em outros termos, mesmo que a opção do
ponto de vista fiscal seja pelo regime de caixa, a contabilização deverá adotar o re-
gime de competência, eis que em consonância com os princípios contábeis geral-
mente aceitos.
A distinção entre os regimes de caixa e competência foi objeto de análise de
Modesto Carvalhosa8:
“O conceito de competência decorre da necessidade de enquadrar as demonstrações
financeiras aos fatos econômicos e financeiros ocorridos no espaço de tempo que elas
reportam.
(...)
Contabilmente, há dois critérios para determinar o momento em que devem ser conta-
bilizadas as receitas, custos e encargos. Esses critérios são denominados Regime de
Competência e Regime de Caixa.
(...)
Os fatos que originam os acréscimos patrimoniais podem ser registrados em dois mo-
mentos, a saber: a) no momento em que se considera jurídica e economicamente au-
ferida a receita, isto é, quando o bem ou direito correspondente tiver integrado defi-
nitivamente o patrimônio social; ou b) no momento em que a receita é efetivamente
recebida.
O primeiro dos critérios acima é contabilmente conhecido como regime de competên-
cia, denominação que se explica pelo fato de que a sua observância conduz à inclusão
do acréscimo patrimonial no competente exercício social.
O segundo critério baseia-se no elemento essencialmente financeiro, sendo conheci-
do por regime de caixa.” (Destaque nosso)
A obrigatória adoção do regime de competência é objeto de prescrição taxativa
pela Lei de Sociedades por Ações, em seu art. 177, abaixo transcrito:
“Art. 177. A escrituração da companhia será mantida em registros permanentes, com
obediência aos preceitos da legislação comercial e desta lei e aos princípios de conta-
bilidade geralmente aceitos, devendo observar métodos ou critérios contábeis unifor-
mes no tempo e registrar as mutações patrimoniais segundo o regime de competência.”
Sendo certo que a legislação tributária pode permitir, e de fato permite, a crité-
rio do sujeito passivo, a adoção do regime de caixa para situações específicas (op-

7
É evidente, sob o ponto de vista conceitual, que o regime de competência (regime econômico, accrual basis) tem
qualidade incomensuravelmente superior ao regime de caixa (cash basis) e, por isso, não é à toa que este último so-
mente seja adotado pela legislação do IRPJ em situações especialíssimas, relacionadas taxativamente na lei, além de
ser empregado para a tributação da renda das pessoas físicas por razões de facilidade de cumprimento da obrigação
tributária e da respectiva fiscalização (Ricardo Mariz de Oliveira. Fundamentos do Imposto de Renda, São Paulo,
Quartier Latin, 2008, p. 316).
8
Comentários à Lei de Sociedades por Ações, 3º volume, São Paulo, Saraiva, p. 643.
ção pelo lucro presumido ou tributação das receitas com variação cambial, p. ex.),
o registro contábil (competência) e o fiscal excepcional (caixa) devem coexistir de
forma harmoniosa9.
É o que dispõe o parágrafo 2º do já citado art. 177 da Lei das Sociedades Anô-
nimas:
“Art. 177. (...)
§ 2º A companhia observará exclusivamente em livros ou registros auxiliares, sem
qualquer modificação da escrituração mercantil e das demonstrações reguladas nesta
Lei, as disposições da lei tributária, ou de legislação especial sobre a atividade que
constitui seu objeto, que prescrevam, conduzam ou incentivem a utilização de méto-
dos ou critérios contábeis diferentes ou determinem registros, lançamentos ou ajustes
ou a elaboração de outras demonstrações financeiras.” (Grifos nossos)
Tais exceções da lei tributária ao regime de competência (caixa), geram reper-
cussões apenas sobre o aspecto temporal, pois exigem que o ganho (ou perda) te-
nha sido efetivamente recebido em dinheiro para que seja considerado base de in-
cidência (ou dedução) do imposto sobre a renda.
Em algumas hipóteses, como no caso das variações cambiais, o regime fiscal
mais adequado é o de caixa, pois antes da liquidação o ganho (ou perda) é mera-
mente potencial, verdadeira ficção jurídica. O resultado efetivo somente poderá ser
conhecido no momento do encerramento do contrato, e de sua efetiva execução.
Em se verificando a necessidade de adoção do regime de caixa para fins de aten-
dimento ao disposto na legislação tributária, a sua evidência deverá ser realizada em
registros auxiliares, sem qualquer modificação da escrituração contábil.
Novamente ensina Modesto Carvalhosa10:
“A lei institui o controle em registros auxiliares, que completarão a escrituração dos
registros permanentes. Estes serão escriturados conforme determinações legais e sua
escrituração será denominada mercantil. Nos registros auxiliares, as informações ex-
traídas da escrituração mercantil serão adaptadas às disposições da lei tributária ou de
legislação especial sobre determinadas atividades (...).”
Isso deixa ainda mais nítido que as demonstrações e registros contábeis devem
atender apenas ao regime de competência, mesmo que a legislação tributária pres-
creva tratamento diverso. É clara a separação entre o regime contábil e eventual
regime diverso do ponto de vista fiscal. Estabelecida tal diferença, no que tange ao
regime de competência para fins contábeis, deve a empresa apresentar critérios
uniformes e consistentes ao longo de todo um exercício. É o que se chama de prin-
cípio ou postulado contábil da consistência, amplamente difundido pela doutrina
contábil.
“(...) a consistência está relacionada com a utilização dos mesmos procedimentos con-
tábeis ao longo do tempo para permitir a formação de séries de tempo adequadas para
o trabalho de previsão e análise. (...) A consistência é um meio para a obtenção da re-
levância da informação contábil, e esse fato não pode ser esquecido.”11

9
Equipe de professores da FEA/USP. Contabilidade Introdutória, 10a edição, São Paulo, Atlas, p. 73.
10
Op. cit., p. 649.
11
Alexsandro Broedel Lopes e Eliseu Martins. Teoria da Contabilidade: uma Nova Abordagem, São Paulo, Atlas, 2007,
p. 117.
“Assim, a convenção da consistência diz-nos que, uma vez adotado determinado pro-
cesso, entre os vários possíveis que podem atender a um mesmo princípio geral, ele
não deverá ser mudado com demasiada freqüência, pois assim estaria sendo prejudi-
cada a comparabilidade dos relatórios contábeis.”12
A seriedade com que a questão é tratada é tamanha, que a LSA possui referên-
cia explícita ao dever de informação quando houver modificação de determinado
procedimento.
“Art. 177. (...)
§ 1º As demonstrações financeiras do exercício em que houver modificação de méto-
dos ou critérios contábeis, de efeitos relevantes, deverão indicá-la em nota e ressaltar
esses efeitos.”
Contudo, deve-se atentar que o dever de informação diz respeito aos critérios
contábeis apenas. E não poderia ser diferente, uma vez que os critérios de apuração
de tributos, caso divergentes da escrituração contábil, devem estar registrados em
controles auxiliares e não em registros permanentes. Novamente, tais considerações
são ratificadas pela melhor doutrina contábil, nas palavras de Alexsandro Broedel
e Eliseu Martins:
“Se o regime de competência fornece números mais próximos dos fluxos futuros de
caixas futuros do que o próprio fluxo de caixa passado, podemos concluir que a rele-
vância da informação contábil reside no regime de competência. Mais especificamen-
te, podemos dizer que o conteúdo informativo da contabilidade está no regime de com-
petência. (...) Consideramos como conteúdo informativo a capacidade da contabilidade
de fornecer informações que possuam relevância econômica ao usuário. A relevância
econômica se refere à capacidade da informação de alterar as crenças e percepções dos
observadores.”13
No caso da empresa hipotética que nos move, tal dever sequer se aplica ao caso
concreto, eis que a operação se restringe a critérios de ordem tributária e não con-
tábil. Não houve qualquer modificação no conteúdo informativo das demonstrações
que pudesse alterar a interpretação do mercado e de seus observadores (CVM, in-
vestidores, etc.). A questão surge em função da contabilização das receitas e despe-
sas pelo regime de competência, e a possibilidade de tributá-las pelo regime de cai-
xa (ou competência).

3. Tratamento Contábil e Tributário das Receitas com Variação Cambial


3.1. O regime de competência para apuração e tributação das receitas
decorrentes de variação cambial
A Contabilidade produz informações sobre os bens e direitos das empresas, e
sobre o resultado apurado. São as chamadas Demonstrações Contábeis. Para pro-
duzir tais resultados, a Contabilidade utiliza-se de Princípios14, os quais devem ser

12
Equipe de Professores da FEA/USP. Contabilidade Introdutória. São Paulo, Atlas, 2008, p. 271.
13
Alexsandro Broedel Lopes e Eliseu Martins. Teoria da Contabilidade: uma Nova Abordagem, São Paulo, Atlas, 2007,
pp. 68-69.
14
Princípios de contabilidade são normas que, por convenção, decide-se adotar como apropriadas para demonstrar o
patrimônio de uma empresa e seus resultados (demonstrações financeiras). Princípios de contabilidade são, portan-
to, normas convencionais que variam no tempo e no espaço (Modesto Carvalhosa. Comentários à Lei de Sociedades
Anônimas, 3º volume, São Paulo, Saraiva, p. 634).
aplicados por expressa determinação da Lei nº 6.404/76. Dentre os mencionados
princípios geralmente aceitos, tem-se o já citado princípio da competência.
A variação cambial abrange as oscilações (valorização e desvalorização) da
moeda nacional em relação ao valor contratado em moeda estrangeira. No caso dos
contratos internacionais, as operações são convertidas em moeda nacional no mo-
mento em que assumidas as respectivas obrigações. Todavia, mensalmente, a de-
monstração financeira deverá reproduzir o efeito patrimonial das variações cambiais.
Contudo, tal reprodução do efeito das variações é um registro eminentemente
contábil. A repercussão, do ponto de vista tributário, ficará a critério da legislação
e por um motivo singelo: a variação registrada contabilmente representa uma infor-
mação relevante, mas não necessariamente se amolda ao conceito de ganho ou per-
da fixado para fins de imposto, conforme estipular a legislação tributária. O ganho
apurado em um mês pode ser totalmente revertido pela perda do mês subseqüente,
tudo isso antes da liquidação do contrato. Essa é inclusive uma tendência quando
se trabalha com variações cambiais. A oscilação da taxa de cambio é verificada quase
que diariamente. A função precípua da contabilidade, novamente, é informar e per-
mitir a tomada de decisões por parte de seus usuários. E é por isso que o controle
das variações por competência, considerando cada contrato de forma individual, é
relevante.
Mas as receitas e despesas ocorridas ao longo do contrato nada mais represen-
tam do que ganhos ou perdas potenciais. O resultado efetivo do contrato será conhe-
cido no ato de sua execução e liquidação e pode diferir bastante dos resultados in-
termediários. Qualquer evento econômico externo relevante pode mudar, substan-
cialmente, os resultados apurados.
Em contratos de mútuo celebrado em dólar, por exemplo, a valorização do real
frente à moeda estrangeira implica diminuição do saldo devedor. A diferença, por
conseqüência, é tratada como receita financeira, geralmente contabilizada como
resultado positivo em conta de variação cambial. Exemplifique-se:
Ao realizar uma venda de US$ 1.000.000,00 (um milhão de dólares), com o
dólar avaliado a R$ 2,50 (dois reais e cinqüenta centavos) para ser paga em parcela
única no 12º mês, a empresa registra, no momento em que firmado o contrato, um
direito de receber R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais). Neste
momento, a empresa registra uma receita com vendas de mercadorias no mesmo
valor.
Contudo, o valor desta obrigação será mensalmente ajustado em função da va-
riação do dólar, até o momento em que for realizado o pagamento. Se, no mês se-
guinte, o dólar sofrer variação positiva para R$ 2,60 (dois reais e sessenta centavos),
o total do valor a receber registrado no ativo será aumentado para R$ 2.600.000,00
(que representa a multiplicação do valor em dólares fixado no contrato pela cota-
ção da moeda norte-americana).
Neste segundo momento, a empresa passa a registrar em seu ativo o direito de
receber R$ 2.600.000,00. A diferença apurada entre o valor do ativo no primeiro mês
e seu valor reajustado no segundo (R$ 100.000,00) será registrado como uma receita
de variação cambial. Mas isto não significa que a empresa irá necessariamente re-
ceber os R$ 2.600.000,00, já que o contrato só será liquidado ao final do décimo
segundo mês. Contudo, no regime de competência, aquela receita de variação cam-
bial, embora incerta, será levada à tributação no mês em que se registrar, de forma
antecipatória.
Da mesma maneira, caso no mês seguinte o dólar apresente desvalorização para
o patamar de R$ 2,40, a empresa deverá contabilizar em seu ativo o direito de rece-
ber R$ 2.400.000,00. A diferença apurada entre o valor do ativo no segundo mês e
seu valor reajustado no terceiro (R$ 200.000,00 negativos) será registrada como uma
despesa com variação cambial. No regime de competência, tal despesa, embora tam-
bém incerta, será dedutível no mês em que for registrada, para fins de antecipação.
Disto decorre que a flutuação do câmbio irá gerar uma receita ou uma despesa,
a cada mês, mas o efeito econômico efetivo e real desta variação só será verificado
em definitivo no momento em que quitado o contrato. Só então a empresa terá a
noção exata da diferença causada pela variação do câmbio entre o momento da as-
sunção da obrigação e o momento da sua realização. Esta é a regra de contabiliza-
ção das variações cambiais determinada pela lei aplicável. No regime de caixa,
utilizável apenas para fins tributários, os ganhos e as perdas decorrentes da varia-
ção cambial somente interferirão no imposto a pagar, quando efetivamente embol-
sados os ganhos ou desembolsadas as perdas, ou seja, no momento da liquidação
do contrato.
Do ponto de vista tributário, excepcionalmente, como já registramos, a despei-
to de se tratar de receita financeira (ou despesa), a lei prevê dois diferentes critérios
para reconhecimento e oferecimento à tributação de tais valores, a saber: (i) o regi-
me de caixa, segundo o qual somente integrarão a base de cálculo do imposto os
valores realizados com o efetivo recebimento, ou liquidação do contrato; ou (ii) re-
gime de competência, em que não se dá discrepância entre a escrituração contábil-
comercial e a fiscal, oferecendo-se à tributação, mesmo antes da liquidação do con-
trato, valores potenciais de ganho, com base em variações aferidas a cada mês, ou
no final do ano-base.
Lado outro, adotado o regime de caixa para fins fiscais, a escrituração contábil
não se altera, permanecem os ganhos e perdas escriturados segundo o regime de
competência, mas tais efeitos, provocados ao longo do contrato pelo princípio con-
tábil da competência devem ser anulados, por meio de estratégias externas (regis-
tros auxiliares), via adição ou exclusão da base de cálculo, no ato da apuração do
imposto de renda.
Mas não se deve jamais esquecer que o resultado real, ainda que estejamos fa-
lando do regime de competência, decorrente da valorização ou desvalorização da
moeda somente será verificado no ato da liquidação do contrato, ocasião em que se
verificará um acertamento.

3.2. As antecipações de imposto por meio de “estimativas” na apuração do IRPJ


e da CSLL, apurados ao encerramento do balanço, conjugadas as antecipações
inerentes ao regime de competência. As especificidades das variações cambiais
O Imposto sobre a Renda e a Contribuição Social sobre o Lucro incidem sobre
o acréscimo real ao patrimônio líquido da pessoa jurídica, apurado em 31 de dezem-
bro, data do encerramento do balanço. O regime padrão para isso, será o de compe-
tência. Os pagamentos mensais do imposto, feitos ao longo do ano, com base em
balancetes de suspensão/redução, configuram mera “aproximação” ou estimativa do
Lucro Real, apurado ao fim do período, e devem ser levados em consideração para
gerar débitos do imposto, em caso de insuficiência, ou créditos do contribuinte, em
caso de excesso. Em tudo isso, está o contribuinte amparado pela Constituição da
República que lhe estabelece o direito de pagar tributos segundo a sua capacidade
econômica real (art. 145, parágrafo 1º, da CR/88); que lhe garante a apuração do
Lucro Real e não fictício ou somente presumido; que lhe assegura o direito de apu-
ração do Lucro Real, segundo o período de tempo de pelo menos um ano, duração
mínima na qual ganhos e perdas são comparados, e compensados em contas, que
buscam os resultados positivos ou negativos da atividade.
O regime de competência, adotado na ordem jurídica nacional, para as demons-
trações financeiras-contábeis, norteia também em regra, a apuração do IRPJ e da
CSLL. É da natureza desse regime antecipar ganhos e perdas, meramente prováveis
oferecendo-se à tributação a renda que tenha sido adquirida juridicamente pelo con-
tribuinte, mas que não tenha sido ainda transformada em dinheiro e disponibilizada
no caixa da empresa. Em se tratando de variações cambiais, as oscilações das taxas
podem ser tão intensas (fazendo variar continuamente, para cima e para baixo o valor
das obrigações e direito de crédito dos contribuintes, advindos de contratos firma-
dos com terceiros, atrelados ao dólar) que os ganhos e perdas decorrentes de tais
variações, antes da liquidação dos contratos, podem ser chamados de meramente
“possíveis”, com concretização futura muito mais incerta. O regime de competên-
cia, então, em situação de crise econômica, geradora de forte instabilidade da moe-
da, desencadeará deveres de antecipação de imposto elevadíssimos, assentados em
meras possibilidades ou “quimeras” fiscais. A descapitalização das empresas, em
tais circunstâncias, torna-se provável e poderá ser notada.
Então, se os contratos do contribuinte ainda não estiverem liquidados ou exe-
cutados em 31 de dezembro, o regime de competência oferecerá à tributação tais
“quimeras” de ganhos, que podem não se consolidar. Seja como for, no regime de
competência, liquidado o contrato, no exercício em que foi contraído, ou nos exer-
cícios seguintes, e não consolidados os ganhos estimados ou possíveis, decorrentes
da variação cambial surgirá crédito para o contribuinte em face da Fazenda Públi-
ca. Tudo mais - recolhimentos mensais por estimativa ou diferenças recolhidas com
o encerramento do balanço -, mas antes da liquidação dos contratos, terão sido an-
tecipações dedutíveis do IRPJ e da CSLL.
Não obstante, para a apuração do lucro decorrente das variações cambiais, a
jurisprudência assentou que, em face das flutuações do câmbio, especialmente em
período de alta flutuação, o regime de caixa é o mais adequado, porque ele não
obriga o contribuinte a pagar imposto antecipatório sobre ganhos oscilantes e im-
prováveis, em afronta à sua capacidade econômica. O legislador tributário, acolherá,
como veremos, a posição da jurisprudência e os reclamos dos contribuintes. Adota-
do o regime de caixa, conforme autorização do legislador tributário para apuração
das variações cambiais, a escrituração contábil prosseguirá fazendo os seus regis-
tros permanentes conforme o regime de competência. Do ponto de vista tributário,
no entanto, os ganhos ainda incertos, apenas possíveis, não serão levados à tributa-
ção e serão excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, em registros auxilia-
res no Lalur. O regime de caixa funciona, então, como um adiamento do imposto a
pagar em face do regime de competência que o antecipa. Evidente que o regime de
caixa não adia a dedução das perdas nem a tributação dos ganhos à luz do fato ge-
rador do imposto. Ele tão-somente possibilita a incidência do tributo no momento
certo, ou seja, no momento em que há um efetivo acréscimo ao patrimônio líquido
do contribuinte, no momento em que a renda se torna firme, adquirida e disponível
financeiramente.
O regime de caixa não é, então, fuga ao tributo ou manipulação contábil. Se os
ganhos cambiais, no regime de caixa, se consolidam na execução ou liquidação do
contrato, então a incidência do imposto será inexorável e infalível. O contribuinte
tornar-se-á devedor do IRPJ e da CSLL.
Em fase de grande estabilidade cambial em que os ganhos e as perdas são mí-
nimos a adoção do regime de competência ou do regime de caixa, qualquer um de-
les, terá pouca interferência, mínima, no IRPJ e na CSLL. Exatamente por essa ra-
zão, o regime anterior de competência, poderia prosperar sem grandes perturbações
em relação à capacidade econômica do contribuinte.
Para as situações de crise e de alta instabilidade cambial, é que veio a Medida
Provisória nº 2.158-35/2001 invertendo o regime padrão de competência para cai-
xa, mas oferecendo uma opção a ser exercida a qualquer momento. Enfrentar cri-
ses econômicas, com opções irretratáveis para o regime de competência ou de cai-
xa no início de cada ano, seria inviável e atentaria contra a mens legis, vero “non
sense”.

3.3. Regime anterior à Medida Provisória nº 2.158-35/2001. Competência como


regra e as razões da inversão para caixa no caso das variações cambiais
Anteriormente à edição da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, a regra para
reconhecimento do resultado de variação cambial, para fins de imposto, seguia o
padrão geral, ou seja, era o regime de competência, conforme vazado no art. 375 do
RIR/99.
“Art. 375. Na determinação do lucro operacional deverão ser incluídas, de acordo com
o regime de competência, as contrapartidas das variações monetárias, em função da
taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicáveis, por disposição legal ou con-
tratual, dos direitos de crédito do contribuinte, assim como os ganhos cambais e mo-
netários realizados no pagamento de obrigações.
Parágrafo único. As variações monetárias de que trata este artigo serão consideradas,
para efeito da legislação do imposto, como receitas ou despesas financeiras, confor-
me o caso.”
Veja-se que a apuração do resultado ocorre em função da oscilação da taxa de
câmbio, de acordo com o período de competência. Entretanto, o Poder Judiciário
vinha decidindo no sentido de que apenas o regime de caixa é compatível com a
natureza do imposto sobre a renda, em se tratando das variações cambiais.
“Tributário. Imposto de Renda. Variações Cambiais Consideradas como Rendas antes
do Pagamento da Obrigação. Momento da Disponibilidade Econômica. Incidência do
Tributo.
O imposto de renda só incide sobre os ganhos decorrentes de variações cambiais quan-
do realizado o pagamento das obrigações financeiras relativas àquelas variações, por-
que é a partir daí que serão incluídos na receita e na apuração do lucro real obtido.
Recurso improvido.”15

“(...)
3. A matéria já foi objeto de discussão nesta Casa Julgadora, culminando-se com o
entendimento firmado na linha de que a exigibilidade do PIS e da Cofins, decorrente
da variação cambial dos contratos de mútuo, firmados em moeda estrangeira, só ocor-
re por ocasião de sua liqüidação. Precedentes: REsp 640.069/CE, Rel. Min. Franciulli
Netto, DJ 08/11/04; REsp 872.492/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 14/12/06.
4. Recurso especial não-provido.” (REsp nº 898.372/CE, Rel. Min. José Delgado, Pri-
meira Turma, julgado em 03.05.2007, DJ 28.05.2007, p. 299)

3.4. O regime da Medida Provisória nº 2.158-35/01. Normas protetoras da esfera


patrimonial dos contribuintes contra as oscilações do câmbio. Natureza e
momento da opção
A Medida Provisória nº 1.858-10, de 26 de outubro de 1999 (após várias reedi-
ções, convertida na MP nº 2.158-35/2001), introduziu o regime de caixa para apu-
ração das variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações, em função
do câmbio, para fins de apuração do IRPJ a CSLL pelos contribuintes sujeitos ao
Lucro Real (trimestral ou anual).
Com a edição da MP nº 1.191-14, de 11 de fevereiro de 2000, houve o acrésci-
mo dos parágrafos ao art. 30, resultando na atual redação da Medida Provisória nº
2.158-35/2001. Assim, consolidou-se a adoção do regime fiscal de caixa para o re-
conhecimento das variações monetárias, que já era facultada aos optantes pelo
Lucro Presumido para a apuração de todas as suas receitas. Com a edição da MP
nº 1.858-6, de 26 de julho de 1999, estendeu-se o regime fiscal de caixa para o
PIS/Cofins, em relação aos contribuintes optantes pelo lucro presumido, desde que
adotado o mesmo regime para o IRPJ e a CSLL (art. 18 da atual MP nº 2.158-35).
De se notar que a extensão do regime fiscal de caixa aos optantes do Lucro Real
deu-se em um período de forte desvalorização do real frente ao dólar. Foi exatamen-
te imbuído do objetivo de proteger as pessoas jurídicas contra a desvalorização
cambial que o legislador determinou o reconhecimento das variações cambiais so-
mente na liquidação dos contratos atrelados ao câmbio.
Deveras, o reconhecimento das receitas e despesas decorrentes da variação cam-
bial ao longo dos contratos, pelo regime de competência, não reflete o efetivo efei-
to sobre o patrimônio de tais oscilações, pois, somente com o término do contrato,
é que, de fato, haverá um acréscimo ou redução do valor da obrigação ou do direi-
to, atrelado ao câmbio, com o impacto real sobre o caixa das empresas. Antes dis-
so, serão meros registros provisórios, incapazes de refletir o resultado definitivo
decorrente das variações cambiais sobre o patrimônio dos contribuintes. Induvido-

15
REsp nº 320.455/RJ, DJU 20.08.2001.
so que, no caso em apreço, a mens legis é evitar a incidência de tributos sobre valo-
res virtuais, que não refletem o impacto sobre o patrimônio e tampouco sobre a
materialidade tributada pelo IRPJ e CSLL, o que, de resto, se dessume da exposi-
ção de motivos da MP nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001:
“9. Os art. 30 e 31 da proposta têm por objetivo permitir que as receitas e despesa fi-
nanceiras decorrentes de variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações
do contribuinte, em função da taxa de câmbio, sejam consideradas na determinação
da base de cálculo do imposto de renda, da contribuição social sobre o lucro líquido,
da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, bem assim da determinação do lucro da
exploração, quando de sua efetiva realização.
10. Justifica-se tal proposição, tendo em vista que o reconhecimento, para fins tributá-
rios, pelo regime de competência, de receita decorrente de variações cambiais nem
sempre representa um resultado definitivo para o beneficiário, vez que a taxa de câm-
bio pode oscilar em função de diversos fatores econômicos. Assim, uma receita pro-
duzida por um determinado ativo ou passivo em um primeiro momento pode ser ab-
sorvida total ou parcialmente, em um momento posterior, pelo mesmo ativo ou passi-
vo, em razão da oscilação da taxa de câmbio. Na verdade, em um sistema de taxas flu-
tuantes como o atualmente vigente, o resultado decorrente de variação cambial só será
efetivo quando do encerramento da operação que lhe deu origem.” (Grifos nossos)
Ora, não haveria nenhum sentido em se antecipar para o início do exercício a
opção pelo regime de caixa, tornando-a irretratável, se a finalidade da MP é pre-
cisamente proteger o patrimônio do particular da intercadência cambial, como ocor-
reu nos anos de 1999 e 2008, em um contexto de crise econômica que levou à varia-
ção abrupta do câmbio. Para que o dispositivo se concretize em sua plenitude, su-
põe-se que seja facultado ao contribuinte ter conhecimento prévio das oscilações
cambiais, para então poder optar por um ou outro critério de cálculo das variações,
como pressuposto à apuração do IRPJ e da CSLL, que se dá, como visto, no caso
da empresa, em 31 de dezembro. Postular que a opção deve ser exercida com o cál-
culo da primeira estimativa, antes que ocorram as oscilações das quais a lei preten-
deu proteger os particulares, contraria o espírito e a finalidade das normas em co-
mento, tornando-as inócuas. É uma interpretação “a la diable” de uma norma sen-
sata. Tão-somente a cupidez do Fisco a explica, se tanto.
De mais a mais, o efeito das variações cambiais sobre o IRPJ e a CSLL só pode
ser conhecido ao término do exercício, quando se tem a base de cálculo dos tribu-
tos, objeto de apuração anual e definitiva. Por pertinência lógica, e em prestígio à
boa-fé que informa a relação Fisco-contribuinte, aquele também o momento em que
o contribuinte está autorizado a fazer a opção, já que a adoção de um ou outro cri-
tério só faz sentido por integrar a metodologia de apuração da base de cálculo dos
tributos. Pensar de forma diversa seria privilegiar a alea, em detrimento da segurança
jurídica, amesquinhando-se o direito dos contribuintes, em prol de uma assimetria
intolerável nas relações entre o Estado e o particular, em prejuízo dos princípios da
boa-fé e da proteção da confiança na lei. O Fisco quer o regime de caixa nas varia-
ções cambiais.
Não se trata de falha, mas de deliberada intenção, como examinaremos mais
adiante, o tratamento dado pelo Fisco a outros regimes opcionais, em que ele se
mostrou atento e vigilante.
Ora, o art. 30 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, em face das motivações
e dos fundamentos expostos acima, inverteu a regra, das variações cambiais esta-
belecendo como padrão, para todos os contribuintes, o regime de caixa (liquidação
do contrato) e, opcionalmente, para o contribuinte, o reconhecimento via regime de
competência.
Confira-se:
“Art. 30. A partir de 1º de janeiro de 2000, as variações monetárias dos direitos de cré-
dito e das obrigações do contribuinte, em função da taxa de câmbio, serão considera-
das, para efeito de determinação da base de cálculo do imposto de renda, da contri-
buição social sobre o lucro líquido, da contribuição para o PIS/Pasep e Cofins, bem
assim da determinação do lucro da exploração, quando da liquidação da correspondente
operação.
§ 1º À opção da pessoa jurídica, as variações monetárias poderão ser consideradas na
determinação da base de cálculo de todos os tributos e contribuições referidos no ca-
put deste artigo, segundo o regime de competência.
§ 2º A opção prevista no § 1º aplicar-se-á a todo o ano-calendário.”
A mudança é substancial. A partir de 1º de janeiro de 2000, o reconhecimento
da receita ou despesa será feito pelo regime de (i) caixa, na liquidação do contrato;
(ii) competência, mediante atualização do saldo credor de direitos ou saldo deve-
dor de obrigações. Como exigência, tem-se que a opção adotada pelo Contribuinte
seja para todo o ano-calendário.
O resultado da conta de variação cambial (variação ativa ou passiva) será con-
siderado receita ou despesa financeira, lançada diretamente contra conta de resul-
tado, nos termos da Lei nº 9.718/98:
“Art. 9º As variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contri-
buinte, em função da taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicáveis por dis-
posição legal ou contratual serão consideradas, para efeitos da legislação do imposto
de renda, da contribuição social sobre o lucro líquido, da contribuição PIS/Pasep e da
Cofins, como receitas ou despesas financeiras, conforme o caso.”
Como afirmado, com a publicação da MP nº 2.158-35/2001, as variações cam-
biais passam a ser tributadas, à escolha do contribuinte, pelo regime de caixa ou
competência, desde que a opção exercida se refira a todo o exercício. Nesse con-
texto, deve o contribuinte optar livremente, desde que a opção abranja todo um exer-
cício. Foi exatamente como procederam as empresas brasileiras.
Deve-se insistir no fato de que a edição da referida Medida Provisória trouxe
alterações (opção) sobre o regime fiscal, nada dispondo sobre normas contábeis, que
quanto a esse aspecto permanecem inalteradas na Lei nº 6.404/76.
Importante destacar que a Receita Federal veda, inclusive, a realização de Redarf
para mudança no regime de tributação do imposto de renda das pessoas jurídicas.
Confira-se:
“Instrução Normativa RFB 672/06.
Art. 11. Serão indeferidos os pedidos de retificação que versem sobre:
V - alteração de código de receita que corresponda à mudança no regime de tributa-
ção do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, quando contrariar o disposto na legis-
lação específica.” (Grifos nossos)
A IN nº 093/97, ao regulamentar a forma de pagamento do imposto de renda,
traz dispositivo semelhante. Abaixo:
“Art. 17. A adoção do pagamento trimestral do imposto, a que se refere o § 1º do art. 2º,
pelas pessoas jurídicas que apurarem o imposto pelo lucro real, ou a opção pela forma
de pagamento por estimativa, a que se referem os arts. 3º a 10, será irretratável para
todo o ano-calendário.
§ 1º A opção pelo pagamento por estimativa será efetuada com o pagamento do im-
posto correspondente ao mês de janeiro do ano-calendário, ainda que intempestivo, ou
com o levantamento do respectivo balanço ou balancete de suspensão.
§ 2º No caso de início de atividades, a opção de que trata o parágrafo anterior será
manifestada com o pagamento do imposto correspondente ao primeiro mês de ativi-
dade da pessoa jurídica.”
Em síntese, nas ocasiões em que a opção por determinado regime deve obser-
var o critério de irretratabilidade, a Receita Federal tratou de regulamentar expres-
samente a questão, fixando o momento da opção e seu caráter.
Situação diversa ocorre na opção da tributação das receitas com variação cam-
bial. A única ressalva veiculada pela MP é que a opção seja uniforme para todo um
ano-calendário. Nada mais. Essa foi também a interpretação dada pela Receita Fe-
deral, pelo menos aquela espelhada em seus atos normativos e instruções de proce-
dimento.
E não poderia ser diferente. Uma norma voltada à proteção do contribuinte con-
tra a distorção que se poderia gerar na tributação de acréscimos patrimoniais fictí-
cios, em virtude da volatilidade das taxas de câmbio, não poderia fixar o momento
da opção para o início do ano e tratar a pretensa escolha como irretratável, pois tal
comando estaria em desacordo com o próprio fundamento da norma.
A exigência da adoção de um critério uniforme é razoável, muito embora não
seja regra em todas as opções estabelecidas pela legislação tributária pátria. Basta
dizer que o contribuinte pode flutuar livremente entre apurar o imposto de renda com
base no Lucro Real por meio de receita bruta ou balancetes de suspensão e redu-
ção, na modalidade do Lucro Real Anual.
Enfim, a Medida Provisória nº 2.158-35/2001 não fixa o momento em que deve
se dar validamente a opção pela tributação pelo regime de caixa ou de competên-
cia, nem afirma ser essa escolha irretratável. Em consonância com o momento da
ocorrência do fato gerador do imposto de renda sobre o Lucro Real (último átimo
do dia 31 de dezembro), a opção do contribuinte no que concerne à tributação das
receitas com variação cambial somente ocorrerá com a entrega da DPIJ, no mês de
junho do ano subseqüente ao encerramento do ano-calendário. Esta é a única data
possível e plausível.
E não é outro o entendimento da Receita Federal. Para fins de regulamentação
da mudança de opção pelo regime de tributação das receitas com variação cambial,
foi editada a Instrução Normativa nº 345/2003. Confira-se:
“Art. 2º As variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contribuin-
te, em função de taxa de câmbio, serão consideradas, para efeito de determinação da
base de cálculo do imposto de renda (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL), bem assim da determinação do lucro da exploração, quando da liqui-
dação da correspondente operação.
§ 1º À opção da pessoa jurídica, as variações monetárias de que trata o caput poderão
ser consideradas, na determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, segundo o
regime de competência.
§ 2º A opção prevista no § 1º aplicar-se-á a todo o ano-calendário.
§ 3º Na hipótese de alteração do critério de reconhecimento das variações monetá-
rias previsto no caput para o regime de competência, deverão ser computadas na base
de cálculo do IRPJ e da CSLL, em 31 de dezembro do período de encerramento do ano
precedente ao da opção, as variações monetárias incorridas até essa data, inclusive
as de períodos anteriores.
§ 4º Na hipótese de alteração do critério de reconhecimento das variações monetárias
pelo regime de competência para o regime previsto no caput, no período de apuração
em que ocorrer a liquidação da operação, deverão ser computadas na base de cálculo
do IRPJ e da CSLL as variações monetárias relativas ao período de 1º de janeiro do
ano-calendário da opção até a data da liquidação.
§ 5º As variações monetárias relativas a anos-calendário anteriores ainda não com-
putadas em virtude de mudança de critério de reconhecimento em data anterior à da
publicação desta Instrução Normativa deverão ser computadas na base de cálculo do
IRPJ e da CSLL até 31 de dezembro de 2003.” (Grifos nossos)
Os trechos grafados deixam clara a intenção do ato normativo em fixar uma
opção anual. Este é o único requisito. As disposições que regulamentam a mudança
de regime fazem referência à opção do ano precedente. Se existe mecanismo pró-
prio de informação à Receita Federal, não se pode admitir que esta se dê de forma
tácita, com o primeiro recolhimento de estimativa mensal...
Admitir o contrário seria induzir o contribuinte a erro. No que diz respeito ao
imposto de renda, a regra é pela opção anual, formalizada sempre com a entrega da
DIPJ. Quando se fez necessária regulamentação diversa, o legislador e a autorida-
de administrativa o fizeram de forma expressa, restringindo ou apenas regulamen-
tando o direito de opção do contribuinte.

3.5. O momento da formalização da opção é definido pela anualidade do IRPJ e


da CSLL
Pelo exposto nos tópicos anteriores, a mudança de apuração das variações cam-
biais pelo regime de competência para o de caixa no curso do ano-calendário, em-
bora afete o valor apurado das estimativas anteriores à mudança do critério adota-
do, afigura-se autorizado em lei, e legítimo. E mais, como o aspecto temporal do
IRPJ e da CSLL só se dá ao cabo do ano calendário, em 31 de dezembro, o que a
lei determina é a harmonização de todo o período de acordo com o regime escolhi-
do. Somente nesse momento, nasce a obrigação tributária principal e se podem iden-
tificar os efeitos das oscilações do câmbio sobre os tributos e sobre a esfera patri-
monial dos contribuintes, esfera que a MP nº 2.158-35/2001 quis proteger. A DIPJ,
formulada após o fechamento do exercício - cujo prazo de entrega é até o mês ju-
nho do ano subseqüente ao do ano base -, retratando o efetivo tributo devido em
bases anuais, é documento hábil para demonstrar a adoção de um regime ou de ou-
tro (caixa ou competência), conforme reiteradas decisões do Conselho de Contri-
buintes. Confira-se:
“Para os períodos de apuração do ano de 1999 o reconhecimento das receitas decor-
rentes de variações cambiais ativas era efetuado pelo regime de competência. O reco-
nhecimento das receitas relativas à variação cambial ativa pelo regime de competên-
cia, assim demonstrado por meio das DIPJ relativas aos anos de 2000 a 2002, desau-
toriza a contestação do lançamento de ofício sob a alegação do direito de fazê-lo pelo
regime de caixa.” (Acórdão nº 201-78683 - Recurso Voluntário nº 126.498 - Primeira
Câmara, Sessão 13.09.2005)

“IRPJ - Receitas de Variações Cambiais Postergação de Pagamento de Imposto - Reti-


ficadas as declarações de rendimentos, espontaneamente, com inclusão de receitas de
variações cambiais no primeiro ano e exclusão de receitas já tributadas no ano subse-
qüente, e admitida a hipótese de postergação de pagamento de imposto, por inobser-
vância no regime de competência para reconhecimento de receitas pelas autoridades
julgadora de 1º grau, o crédito tributário devido deveria ter apurado na forma do Pare-
cer Normativo Cosit nº 02/96. Recurso voluntário provido.” (Recurso Voluntário nº
123.086 - Primeira Câmara, Sessão 23.01.2001)
Como se vê das ementas transcritas, a DIPJ é apta a fazer prova do regime fis-
cal adotado para reconhecimento das receitas e despesas no tempo, em função do
câmbio. A contrario sensu, o mero registro em DCTF (documento fiscal de entrega
mensal, onde se declaram os valores das estimativas de IRPJ e CSLL para pagamen-
to antecipado) não é, de per se, oponível ao contribuinte, para contestar o regime
adotado na DIPJ. A MP nº 2.158-35/2001, art. 30, parágrafo 3º, ao se referir a “anos-
calendário subseqüentes”, quando remete à Receita Federal a regulamentação da
alteração dos critérios de reconhecimento das variações monetárias ao longo do tem-
po, evidencia que a opção pelos regimes de caixa ou competência se dá em bases
anuais, passível de demonstração na DIPJ, e não em bases mensais, mediante a
entrega da primeira DCTF.
Como não há qualquer vedação legal à mudança de regime de competência para
caixa ao longo do ano, afigura-se lícita a manifestação pela adoção do regime de
caixa na DIPJ, desde que efetuados os devidos ajustes nos cálculos das estimati-
vas mensais, visando à adoção de um mesmo regime para todo o ano-calendário, e
respeitados os procedimentos estabelecidos pela IN nº 345/2003, em relação às va-
riações monetárias cambiais que compuseram a base de cálculo do IRPJ e da CSLL
de exercícios anteriores. Não há se falar em tentativa de ocultar a ocorrência do fato
gerador, ou qualquer ilação de evasão fiscal, fundada na mudança do regime de re-
conhecimento das receitas e despesas (competência/caixa) para fins de cálculo das
estimativas, se sequer fato gerador existe antes do término do ano-calendário.
Aplicação dos Incentivos à Inovação
Tecnológica Previstos na Lei nº 11.196/05
Sergio André Rocha

1. Introdução
A Lei nº 11.196/05, conhecida como “Lei do Bem”, já
que a maioria de seus dispositivos cuida de benefícios fis-
cais, traz, em seus artigos 17 a 26, diversas regras aplicáveis
à fruição de incentivos à pesquisa e desenvolvimento de ino-
vação tecnológica.
A finalidade de tais incentivos, conforme se infere da
exposição de motivos da Medida Provisória nº 66/02, con-
vertida na Lei nº 10.637/02, que antecedeu a Lei nº 11.196/05,
é o “estímulo à pesquisa e à inovação tecnológica, indispen-
sáveis à construção do projeto de desenvolvimento brasilei-
ro”.
A maioria dos benefícios fiscais à inovação tecnológica
estabelecidos pela Lei nº 11.196/05 refere-se à apuração do
Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas e da Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido, embora haja também benefí-
cios relacionados ao Imposto sobre Produtos Industrializa-
dos e ao Imposto de Renda Retido na Fonte. Tais incentivos,
contudo, gravitam em torno da definição do que seria ino-
vação tecnológica, conceito trazido no parágrafo 1º do arti-
go 17 da Lei em questão.
Passados alguns anos da entrada em vigor da Lei nº
11.196/05, verifica-se que em poucas ocasiões a Receita
Federal do Brasil se manifestou sobre a matéria, sendo a
identificação da existência de um projeto de pesquisa e de-
senvolvimento de inovação tecnológica tarefa em princípio
a cargo do Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT.
A sistemática declaratória da fruição de tais benefícios
fiscais, contudo, faz com que caiba, em primeiro lugar, ao
contribuinte determinar se o mesmo cumpre ou não os requi-
sitos previstos na legislação, de modo que, com vistas a evi-
tar futuras contingências fiscais, deve-se ter o máximo cui-
Sergio André Rocha dado na interpretação da Lei nº 11.196/05.
é Mestre e Doutor em O objetivo do presente artigo consiste na análise do con-
Direito pela UGF,
ceito de inovação tecnológica previsto na Lei nº 11.196/05,
Professor de Direito
Tributário da
examinando-o a partir do Manual de Oslo, o qual contém
Faculdade de Direito uma “proposta de diretrizes para coleta e interpretação de
da FGV-RJ e dados sobre inovação tecnológica”, analisando-se os relató-
Advogado. rios publicados pelo MCT referentes à fruição dos benefícios
de inovação tecnológica nos anos de 2006 e 2007 e as decisões da Receita Federal
sobre o tema. Para uma melhor contextualização de nossos comentários, apresen-
taremos inicialmente uma visão geral dos benefícios da Lei do Bem.

2. Comentários Gerais sobre os Benefícios para Inovação Tecnológica da


Lei nº 11.196/05
Como mencionado, a maioria dos benefícios da Lei do Bem se refere ao Imposto
de Renda e à Contribuição Social sobre o Lucro.
De acordo com o artigo 17, I, combinado com os parágrafos 2º e 6º do mesmo
artigo, a pessoa jurídica pode deduzir, para efeito de apuração da base de cálculo
do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro:
- o valor correspondente à soma dos dispêndios realizados no período de apu-
ração com pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica
classificáveis como despesas operacionais pela legislação do Imposto sobre a
Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ; assim como,
- os dispêndios com pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tec-
nológica contratados no País com universidade, instituição de pesquisa ou in-
ventor independente de que trata o inciso IX do artigo 2º da Lei nº 10.973, de
2 de dezembro de 2004, desde que a pessoa jurídica que efetuou o dispêndio
fique com a responsabilidade, o risco empresarial, a gestão e o controle da uti-
lização dos resultados dos dispêndios.
Além da dedutibilidade prevista no mencionado dispositivo, o artigo 19 da Lei
do Bem estabelece que
“sem prejuízo do disposto no art. 17 desta Lei, a partir do ano-calendário de 2006, a
pessoa jurídica poderá excluir do lucro líquido, na determinação do lucro real e da base
de cálculo da CSLL, o valor correspondente a até 60% (sessenta por cento) da soma
dos dispêndios realizados no período de apuração com pesquisa tecnológica e desen-
volvimento de inovação tecnológica, classificáveis como despesa pela legislação do
IRPJ, na forma do inciso I do caput do art. 17 desta Lei”.
Assim, além da dedução normal da despesa, a empresa pode utilizar um bene-
fício adicional de 60% da soma de tais dispêndios para apuração do Imposto de
Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro.
De acordo com o parágrafo 1º deste mesmo artigo “a exclusão de que trata o
caput deste artigo poderá chegar a até 80% (oitenta por cento) dos dispêndios em
função do número de empregados pesquisadores contratados pela pessoa jurídica,
na forma a ser definida em regulamento”. Segundo o inciso I do parágrafo 1º do
artigo 8º do Decreto nº 5.798/06, o percentual de 60% passa para 70%, “no caso de
a pessoa jurídica incrementar o número de pesquisadores contratados no ano-calen-
dário de gozo do incentivo até cinco por cento, em relação à média de pesquisado-
res com contratos em vigor no ano-calendário anterior ao de gozo do incentivo”,
chegando a 80% “no caso de a pessoa jurídica incrementar o número de pesquisa-
dores contratados no ano-calendário de gozo do incentivo em percentual acima de
cinco por cento, em relação à média de pesquisadores com contratos em vigor no
ano-calendário anterior ao de gozo do incentivo” (inciso II).
Na hipótese de a pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnoló-
gica resultar na concessão de patente ou registro de cultivar, a empresa faz jus a um
benefício adicional de exclusão de 20% a mais dos dispêndios correspondentes (ar-
tigo 17, parágrafo 3º, da Lei nº 11.196/05).
Outros benefícios, estes aplicáveis apenas ao Imposto de Renda (artigo 20, pa-
rágrafo 3º), são os seguintes:
- “depreciação integral, no próprio ano da aquisição, de máquinas, equipamen-
tos, aparelhos e instrumentos, novos, destinados à utilização nas atividades de
pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica, para efeito
de apuração do IRPJ e da CSLL” (artigo 17, III);
- “amortização acelerada, mediante dedução como custo ou despesa operacio-
nal, no período de apuração em que forem efetuados, dos dispêndios relativos
à aquisição de bens intangíveis, vinculados exclusivamente às atividades de
pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica, classificáveis
no ativo diferido do beneficiário, para efeito de apuração do IRPJ” (artigo 17,
IV); e
- depreciação ou amortização, na forma da legislação vigente, podendo o sal-
do não depreciado ou não amortizado ser excluído na determinação do lucro
real, no período de apuração em que for concluída sua utilização, no caso de
“dispêndios incorridos em instalações fixas e na aquisição de aparelhos, má-
quinas e equipamentos, destinados à utilização em projetos de pesquisa e de-
senvolvimento tecnológico, metrologia, normalização técnica e avaliação da
conformidade, aplicáveis a produtos, processos, sistemas e pessoal, procedi-
mentos de autorização de registros, licenças, homologações e suas formas cor-
relatas, bem como relativos a procedimentos de proteção de propriedade inte-
lectual” (artigo 20).
Conforme determina o parágrafo 2º do artigo 20 da Lei nº 11.196/05, “a pessoa
jurídica beneficiária de depreciação ou amortização acelerada nos termos dos inci-
sos III e IV do caput do artigo 17 desta Lei não poderá utilizar-se do benefício de
que trata o caput deste artigo relativamente aos mesmos ativos”.
Além desses benefícios referentes ao Imposto de Renda e à Contribuição Social
sobre o Lucro, a Lei do Bem prevê também “a redução de 50% (cinqüenta por cen-
to) do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI incidente sobre equipamentos,
máquinas, aparelhos e instrumentos, bem como os acessórios sobressalentes e fer-
ramentas que acompanhem esses bens, destinados à pesquisa e ao desenvolvimen-
to tecnológico”.
O artigo 5º do Decreto nº 5.798/06 determina que
“a redução de cinqüenta por cento do IPI de que trata o inciso II do caput do art. 3º
será aplicada automaticamente pelo estabelecimento industrial ou equiparado a indus-
trial, à vista de pedido, ordem de compra ou documento de adjudicação da encomen-
da, emitido pelo adquirente, que ficará arquivado à disposição da fiscalização, deven-
do constar da nota fiscal a finalidade a que se destina o produto e a indicação do ato
legal que concedeu o incentivo fiscal”.
A Lei nº 11.196/05 traz, ainda, alguns benefícios relacionados ao Imposto de
Renda Retido na Fonte:
- “redução a 0 (zero) da alíquota do imposto de renda retido na fonte nas re-
messas efetuadas para o exterior destinadas ao registro e manutenção de mar-
cas, patentes e cultivares” (artigo 17, inciso V); e
- “crédito do imposto sobre a renda retido na fonte incidente sobre os valores
pagos, remetidos ou creditados a beneficiários residentes ou domiciliados no
exterior, a título de royalties, de assistência técnica ou científica e de serviços
especializados, previstos em contratos de transferência de tecnologia averba-
dos ou registrados nos termos da Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, nos se-
guintes percentuais (artigo 17, inciso VI):
a) 20% (vinte por cento), relativamente aos períodos de apuração encerrados
a partir de 1º de janeiro de 2006 até 31 de dezembro de 2008;
b) 10% (dez por cento), relativamente aos períodos de apuração encerrados a
partir de 1º de janeiro de 2009 até 31 de dezembro de 2013”.
O benefício referente ao crédito presumido do Imposto de Renda Retido na
Fonte
“somente poderá ser usufruído por pessoa jurídica que assuma o compromisso de rea-
lizar dispêndios em pesquisa no País, em montante equivalente a, no mínimo:
- uma vez e meia o valor do benefício, para pessoas jurídicas nas áreas de atuação das
extintas Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - Sudene e Superintendên-
cia de Desenvolvimento da Amazônia - Sudam; e
- o dobro do valor do benefício, nas demais regiões” (artigo 17, parágrafo 5º).

3. Procedimento para Fruição dos Benefícios


Uma das características dos benefícios fiscais à inovação tecnológica da Lei do
Bem consiste em sua natureza declaratória. De acordo com o artigo 14 do Decreto
nº 5.798/06, que regulamenta a fruição de tais benefícios, “a pessoa jurídica bene-
ficiária dos incentivos de que trata este Decreto fica obrigada a prestar ao Ministé-
rio da Ciência e Tecnologia, em meio eletrônico, conforme instruções por este es-
tabelecidas, informações sobre seus programas de pesquisa tecnológica e desenvol-
vimento de inovação tecnológica, até 31 de julho de cada ano”.
Segundo o parágrafo 1º deste mesmo artigo “a documentação relativa à utiliza-
ção dos incentivos de que trata este Decreto deverá ser mantida pela pessoa jurídi-
ca beneficiária à disposição da fiscalização da Secretaria da Receita Federal, durante
o prazo prescricional”, enquanto que o parágrafo 2º estabelece que “o Ministério da
Ciência e Tecnologia remeterá à Secretaria da Receita Federal as informações rela-
tivas aos incentivos fiscais”.
Outro aspecto relevante para a utilização dos benefícios fiscais em comento
consiste em sua contabilização. Segundo o artigo 22, I, da Lei nº 11.196/05, “os
dispêndios e pagamentos de que tratam os arts. 17 a 20 desta Lei: serão controla-
dos contabilmente em contas específicas”.

4. O Conceito de Inovação Tecnológica na Lei nº 11.196/05 e sua


Interpretação
Segundo o parágrafo 1º do artigo 17 da Lei do Bem, inovação tecnológica con-
siste na “concepção de novo produto ou processo de fabricação, bem como a agre-
gação de novas funcionalidades ou características ao produto ou processo que im-
plique melhorias incrementais e efetivo ganho de qualidade ou produtividade, re-
sultando maior competitividade no mercado”.
Da análise deste dispositivo pode-se aferir que o conceito legal de inovação tec-
nológica encontra-se vinculado a um produto ou processo de fabricação. Interpre-
tando este dispositivo, a Receita Federal, em processo de consulta, já decidiu que
“o incentivo à inovação tecnológica de que trata o capítulo III da Lei nº 11.196, de
2005, não é aplicável ao desenvolvimento de projetos relacionados à comercializa-
ção, gestão e distribuição de produtos” (Solução de Consulta nº 372, de 19 de outu-
bro de 2007).
Esta decisão de consulta foi uma das raras situações em que a Receita Federal
do Brasil se manifestou sobre o tema. Em outra decisão, mais recente, as autorida-
des fiscais deixaram claro que não pretendem, via consulta, chancelar se em cada
caso concreto verificou-se ou não uma inovação tecnológica (Solução de Consulta
nº 138, de 2008).
Em tal caso, uma empresa questionou à Receita Federal se o projeto de pesqui-
sa e desenvolvimento implementado pela mesma caracterizaria inovação para fins
da legislação dos benefícios. A resposta foi no sentido de que
“o instituto da consulta não se afigura o meio adequado para se confirmar, ou não, se
determinada empresa operacionalmente de fato cumpre programas de pesquisa tecno-
lógica e de desenvolvimento de inovação tecnológica, tendo em vista que, além de não
se tratar de interpretação da legislação tributária, mas, sim, de sua aplicação, cabe ao
beneficiário dos incentivos fiscais prestar as informações sobre os seus programas na
forma da Portaria MCT nº 943, de 2006, e atender às demais normas estabelecidas nos
atos que regulamentam o incentivo”.
Estas decisões ilustram um dos problemas da atual legislação de incentivo à
inovação tecnológica que, na verdade, é um paradoxo: as regras de incentivo em
vigor foram elogiadas exatamente por desburocratizarem o processo, na medida em
que o contribuinte não teria que ter uma aprovação prévia de seu programa de pes-
quisa e desenvolvimento para usufruir os benefícios. Por outro lado, se tal flexibili-
dade é boa para a dinâmica das atividades empresariais, por outro traz alguma in-
segurança ao contribuinte, já que não está afastada completamente a possibilidade
de a Receita Federal, posteriormente à fruição do benefício, questionar se houve ou
não uma inovação tecnológica incentivável pelos benefícios fiscais.
Examinando-se o conceito de inovação tecnológica previsto na Lei nº 11.196/05,
nota-se que o mesmo está centrado na noção de produto, sendo que para a sua elu-
cidação é útil a análise do Manual de Oslo sobre inovação tecnológica.

4.1. Inovação tecnológica no Manual de Oslo


O Manual de Oslo, editado pela OCDE - Organização para Cooperação e De-
senvolvimento Econômico, “foi elaborado no início da década de 1990 em coope-
ração com o Nordic Industrial Fund (Fundo Industrial Nórdico) em resposta às re-
comendações feitas pelo National Experts on Science and Technology - Nesti (Grupo
de Especialistas Nacionais em Ciência e Tecnologia) da OCDE”1.

1
OCDE. Manual de Oslo: Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação Tecnológi-
ca. Tradução Finep - Financiadora de Estudos e Projetos. Disponível na Internet em: http://www.finep.gov.br/im-
prensa/sala_imprensa/manual_de_oslo.pdf, p. 12.
Segundo o Manual de Oslo,
“inovações Tecnológicas em Produtos e Processos (TPP) compreendem as implanta-
ções de produtos e processos tecnologicamente novos e substanciais melhorias tecno-
lógicas em produtos e processos. Uma inovação TPP é considerada implantada se ti-
ver sido introduzida no mercado (inovação de produto) ou usada no processo de pro-
dução (inovação de processo). Uma inovação TPP envolve uma série de atividades
científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais. Uma empresa ino-
vadora em TPP é uma empresa que tenha implantado produtos ou processos tecnolo-
gicamente novos ou com substancial melhoria tecnológica durante o período em aná-
lise.”2
Percebe-se que, assim como o parágrafo 1º do artigo 17 da Lei nº 11.196/05, o
conceito de inovação tecnológica apresentado pelo Manual de Oslo também se cen-
tra no produto, sendo que, segundo o Manual, “o termo ‘produto’ é usado para co-
brir tanto bens como serviços”3.
Os produtos se dividem em produtos tecnologicamente novos e produtos tecno-
logicamente aprimorados. De acordo com o Manual “um produto tecnologicamen-
te novo é um produto cujas características tecnológicas ou usos pretendidos dife-
rem daqueles dos produtos produzidos anteriormente”, enquanto que um “produto
tecnologicamente aprimorado é um produto existente cujo desempenho tenha sido
significativamente aprimorado ou elevado”4.
Além da inovação tecnológica de produto, o Manual de Oslo cuida também da
inovação tecnológica de processos, a qual
“é a adoção de métodos de produção novos ou significativamente melhorados, incluin-
do métodos de entrega dos produtos. Tais métodos podem envolver mudanças no equi-
pamento ou na organização da produção, ou uma combinação dessas mudanças, e
podem derivar do uso de novo conhecimento. Os métodos podem ter por objetivo pro-
duzir ou entregar produtos tecnologicamente novos ou aprimorados, que não possam
ser produzidos ou entregues com os métodos convencionais de produção, ou preten-
der aumentar a produção ou eficiência na entrega de produtos existentes.”5
O Manual reconhece que em algumas indústrias, como a de serviços, a distin-
ção de inovação de produto e de processo é mais difícil e apresenta uma série de
exemplos de atividades que configuram inovação tecnológica no caso de empresas
prestadoras de serviços6. Tais exemplos encontram-se listados abaixo:
Atacadistas de máquinas, equipamentos e suprimentos
- Criação de websites na Internet onde novos serviços como informações so-
bre produtos e várias funções de apoio podem ser entregues aos clientes gra-
tuitamente.

2
OCDE. Manual de Oslo: Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação Tecnológi-
ca, p. 54.
3
OCDE. Manual de Oslo: Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação Tecnológi-
ca, p. 55.
4
OCDE. Manual de Oslo: Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação Tecnológi-
ca, pp. 55-56.
5
OCDE. Manual de Oslo: Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação Tecnológi-
ca, p. 56.
6
OCDE. Manual de Oslo: Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação Tecnológi-
ca, pp. 57-58.
- Publicação de um novo catálogo para clientes em CD compacto. As imagens
podem ser escaneadas digitalmente e gravadas diretamente no CD, onde po-
dem ser editadas e vinculadas a um sistema administrativo que dê informações
sobre o produto e os preços.
- Novos sistemas de processamento de dados.

Empresas de transporte rodoviário


- Uso de telefones celulares para redirecionar os motoristas ao longo do dia.
Permite aos clientes maior flexibilidade nos destinos das entregas.
- Novo sistema de mapeamento por computador, usado pelos motoristas para
descobrir a rota de entrega mais recente (isto é, de um destino para outro). Isto
permite oferecer aos clientes entregas mais rápidas.
- Introdução de reboques com oito contêineres em forma de globo, em vez dos
quatro habituais.

Empresas de correio e telecomunicações


- Introdução de sistemas de transmissão digital.
- Simplificação da rede de telecomunicações. O número de níveis da rede foi
reduzido com o uso de menos centrais de comutação que tenham nível de au-
tomação mais alto.

Bancos
- Introdução de cartões inteligentes e cartões de múltiplos propósitos em plás-
tico.
- Nova agência bancária sem qualquer pessoal onde os clientes “fazem normal-
mente seus negócios” através de terminais de computadores à sua disposição.
- Banco via telefone, que permite aos clientes realizar muitas de suas transa-
ções bancárias por telefone, no conforto de seus lares.
- Mudança de escaneamento de imagem para OCR’s (Optical Character Rea-
ders - Leitoras Óticas de Caracteres) no manuseio de formulários/documentos.
- Escritório de apoio paperless (sem papéis - todos os documentos são esca-
neados para registro em computadores).

Empresas de consultoria e fornecimento de software


- Desenvolvimento de toda uma linha nova de pacotes distintos para os clien-
tes, oferecendo-lhes graus variáveis de assistência/apoio.
- Introdução de novos aplicativos de multimídia que podem ser usados para fins
educativos, eliminando-se a necessidade da presença real de um instrutor hu-
mano.
- Utilização de técnicas de programação orientadas pelo objeto no desenvol-
vimento de sistemas de processamento automático de dados.
- Desenvolvimento de novos métodos de gerenciamento de projetos.
- Desenvolvimento de aplicativos de software através de computer-aided de-
sign (CAD).
Empresas de consultoria técnica
- Novo método de purificação de água extraída de lagos para uso doméstico
como água potável.
- Oferecimento aos clientes de novo “sistema de controle de suprimento” que
lhes permita verificar se as entregas dos fornecedores estão de acordo com as
especificações.
- Desenvolvimento de uma norma para obras de construção em áreas já den-
samente povoadas (onde é preciso ter cuidado para não danificar qualquer das
edificações adjacentes).

Empresas de propaganda e marketing


- Entrega de relações de clientes potenciais em disquetes junto com um siste-
ma de preenchimento de lista (programa) que permita às empresas clientes
analisar, elas próprias, e extrair amostras das relações.
- Capacidade de assistir os clientes em campanhas de marketing direto, ofere-
cendo-se para distribuir folhetos de propaganda previamente etiquetados etc.,
endereçados a domicílios selecionados.
- Iniciar um processo de controle para verificar através do telefone, com do-
micílios aleatoriamente selecionados, se estão de fato recebendo os folhetos/
anúncios que deveriam estar recebendo.
- Entrega de aplicativos de software necessários para que os clientes possam,
eles mesmos, analisar os dados junto com bases de dados estatísticos.

5. A quem cabe identificar a Existência de Pesquisa e Desenvolvimento para


Inovação Tecnológica?
Nem a Lei nº 11.196/05, nem o Decreto nº 5.798/06 que a regulamentou, esta-
belecem claramente de quem seria a competência para a identificação de se deter-
minado contribuinte está desenvolvendo atividades de pesquisa e desenvolvimento
para inovação tecnológica que sejam passíveis de incentivo através dos benefícios
fiscais. Contudo, parece-nos decorrer da natureza do processo previsto nos aludi-
dos diplomas legais, conforme descrito no item 3, acima, que tal competência seja
do MCT.
Este parece ter sido também o entendimento acolhido na Solução de Consulta
nº 138, de 2008, cuja ementa foi transcrita anteriormente, quando se afirmou que
“cabe ao beneficiário dos incentivos fiscais prestar as informações sobre os seus
programas na forma da Portaria MCT nº 943, de 2006, e atender às demais normas
estabelecidas nos atos que regulamentam o incentivo”.
Em dezembro de 20077, o MCT publicou o Relatório Anual da Utilização dos
Benefícios Fiscais, ano-base 2006. Na conclusão deste relatório, afirmou-se que
“apesar das claras dificuldades no preenchimento do formulário para o envio dos da-
dos de seus programas de pesquisa e desenvolvimento, as informações enviadas pelas
empresas mostraram que há uma grande quantidade de atividades sendo realizadas e

7
Todas as informações sobre os relatórios encontram-se disponíveis no sítio do MCT, www.mct.gov.br.
com aproveitamento dos incentivos previstos na Lei 11.196/05 - Lei de Bem, o que
confirma a necessidade que havia de um marco legal deste nível para o estímulo às
atividades inovativas dentro das empresas”.
Embora o MCT tenha apontado dificuldades com a documentação apresentada,
não foi feita qualquer ressalva quanto ao atendimento ou não dos requisitos para a
fruição dos benefícios fiscais, sendo apresentada em anexo ao relatório a lista das
empresas beneficiárias. O relatório também apresentou informações a respeito da
utilização dos benefícios fiscais por setor, conforme a tabela abaixo:

Empresas Setor
30 Mecânica e Transportes
22 Química
22 Metalurgia
13 Eletroeletrônica
11 Farmacêutica
5 Papel e Celulose
4 Alimentos
4 Software
3 Construção
2 Mineração
2 Bens de Consumo
1 Têxtil
11 Outros

Em novembro de 2008, foi editado o Relatório Anual da Utilização dos Benefí-


cios Fiscais, ano-base 2007. Na conclusão deste relatório afirmou-se que
“apesar dos avanços registrados ao longo do ano fiscal de 2007, observou-se que as
empresas continuam apresentando dificuldades e/ou cometendo falhas por ocasião do
envio dos dados de seus programas de atividades de pesquisa tecnológica e desenvol-
vimento de inovação tecnológica, de que tratam os arts. 17 a 26 da Lei nº 11.196, de
21 de novembro de 2005 (Lei do Bem). Conforme comentado no item 4 deste docu-
mento, do total de 320 formulários apresentados pelas empresas (número total dos
formulários 12 recebidos no MCT), 46 apresentaram alguma modalidade de incorre-
ção no registro dos dispêndios do programa bem como nos valores dos incentivos plei-
teados pelas mesmas, ou seja, cerca de 14%.”
A principal novidade, portanto, foi a identificação, neste relatório, de empresas
que não teriam cumprido corretamente os requisitos da Lei do Bem para a fruição
dos benefícios, apresentando-se em anexo uma lista das “empresas que apresenta-
ram informações imprecisas e/ou incompatíveis ao atendimento dos dispositivos da
Lei nº 11.196/05”.
Também foram apresentadas informações sobre a utilização dos benefícios fis-
cais, por setor, conforme a tabela abaixo:
Empresas Setor
1 Mineração
1 Software
3 Telecomunicação
4 Têxtil
7 Construção Civil
7 Papel e Celulose
8 Moveleira
11 Química
13 Alimentos
13 Farmacêutica
14 Petroquímica
14 Agroindústria
21 Bens de Consumo
24 Metalurgia
44 Eletroeletrônica
79 Mecânica e Transportes
27 Outras Indústrias

Não há uma previsão expressa na legislação de qual seria a consequência de o


contribuinte figurar nesta lista do MCT de empresas que não cumpriram corretamen-
te os benefícios para a fruição dos benefícios fiscais, mas é possível especular que
a descaracterização do direito à fruição dos benefícios fiscais da Lei do Bem. Aqui,
então, cogita-se de qual seria o papel efetivo das autoridades fiscais na auditoria de
tais incentivos.

6. Qual o Papel da Receita Federal?


Conforme destacado no item anterior, deve caber ao MCT, e apenas ao MCT,
analisar se determinada atividade desenvolvida pelo contribuinte consiste em pes-
quisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica. Não é competência
da Receita Federal do Brasil rever a posição do MCT a respeito do cumprimento dos
requisitos da Lei nº 11.196/05.
Assim, posições como a adotada na Solução de Consulta nº 372, de 19 de outu-
bro de 2007, no sentido de que “o incentivo à inovação tecnológica de que trata o
capítulo III da Lei nº 11.196, de 2005, não é aplicável ao desenvolvimento de pro-
jetos relacionados à comercialização, gestão e distribuição de produtos”, em prin-
cípio extrapolam a competência da Receita Federal, na medida em que adentram na
definição do que é ou não inovação tecnológica.
Contudo, podem e devem as autoridades fiscais rever a correção da aplicação
dos benefícios fiscais, auditando as bases e os cálculos feitos pelos contribuintes,
verificando se a contabilização foi feita corretamente e também se a documentação-
suporte está em ordem. Não se pode perder de vista que, de acordo com o parágra-
fo 1º do artigo 14 do Decreto nº 5.798/06, “a documentação relativa à utilização dos
incentivos de que trata este Decreto deverá ser mantida pela pessoa jurídica benefi-
ciária à disposição da fiscalização da Secretaria da Receita Federal, durante o pra-
zo prescricional”.
Por outro lado, naquelas situações em que o MCT tenha se manifestado no sen-
tido de que os requisitos da Lei do Bem para a fruição dos incentivos não teriam sido
atendidos, é possível que as autoridades fiscais venham a se posicionar pela glosa
dos benefícios utilizados pelo contribuinte.

7. Conclusão
Os benefícios fiscais da Lei nº 11.196/05 são um importante incentivo para o
desenvolvimento de projetos de pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnoló-
gica. Contudo, embora a legislação aplicável não seja nova, ainda testemunhamos
um processo de conhecimento dos procedimentos de sua aplicação.
A análise das poucas decisões da Receita Federal sobre o assunto, assim como
o exame dos relatórios do MCT referentes à fruição dos benefícios fiscais dos anos
base 2006 e 2007 mostra a necessidade de que as empresas tenham um grande cui-
dado no fornecimento das informações para o MCT, com vistas a evitar sua inclu-
são na lista de empresas que não cumpriram corretamente os requisitos da Lei do
Bem. Além disso, importantíssimo também a manutenção de documentação-suporte,
com o atendimento do previsto no parágrafo 1º do artigo 14 do Decreto nº 5.798/06,
assim como a contabilização das despesas em contas separadas, como determina o
inciso I do artigo 22 da Lei nº 11.196/05.
Aspectos Institucionais do FAP -
Fator Acidentário de Prevenção
Wladimir Novaes Martinez

Introdução
Sempre se tentou estabelecer uma correlação entre o ní-
vel de acidentalidade de uma empresa e sua contribuição
social destinada ao Seguro de Acidentes do Trabalho, esti-
muladora das prevenções infortunísticas. Tal disposição fez
parte dos programas do Governo Federal há mais de 20 anos.
Rigorosamente, a existência de alíquotas distintas da patro-
nal (20%) é um anacronismo histórico, mas se presta, de al-
guma forma, para incentivar o cumprimento das NR’s da Lei
n. 6.514/77. A Lei n. 7.787/89 já dispunha sobre uma tarifa-
ção individual para as empresas com número de acidente
menor do que a média do setor, mas tal programa governa-
mental não prosperou.
FAP é o Fator Acidentário de Prevenção, que já foi cha-
mado de Fator Acidentário Previdenciário. Compreende a
norma jurídica instituidora, certo reflexo dos procedimentos
preventivos das empresas e informações prestadas pelo Mi-
nistério da Previdência Social conducentes ao estabeleci-
mento de um determinante de ordem fiscal.
Basicamente ele é um número, menor ou maior que um,
a ser multiplicado pela alíquota de contribuição do Seguro
de Acidentes do Trabalho da empresa vigente em 1º de ju-
nho de 2007 (1%, 2% ou 3%).
Por exemplo, se o FAP for 1,50 e a taxa do Seguro de
Acidentes do Trabalho igual a 2,0%, a alíquota resultante
será: 2,0% x 1,50 = 3,0%
As taxas de contribuição previstas no art. 28, I, do Pla-
no de Custeio e Organização da Seguridade Social, a partir
de 2010, variarão todos os anos, a partir do mês de compe-
tência janeiro de cada exercício, com base num período an-
terior de apuração, de dois anos. Em 2011 serão considera-
dos os anos 2008/2009, identificados pelo Ministério da Pre-
vidência Social em 2010.
Embora as normas não especifiquem com clareza, cada
empresa apurará os dados informadores individualizados do
cálculo a partir de cada um dos seus estabelecimentos, as- Wladimir Novaes
sim entendidos aqueles com CNPJ próprio. O Ministério da Martinez
Previdência Social armazenará os dados de cada atividade é Advogado
econômica por código principal e secundário da Classifica- Especialista em
ção Nacional de Atividades Econômicas (CNAE). Direito Previdenciário.
A variação do intervalo contínuo das taxas de contribuições após a conversão
operada pelo FAP será:
Grau de risco SAT original Variação do FAP Mínimo Máximo
Leve 1,0% 0,5% a 2,0% 0,5% 2,0%
Médio 2,0% 1,0% a 4,0% 1,0% 4,0%
Grave 3,0% 1,5% a 6,0% 1,5% 6,0%
Excepcionalmente, como determina o último parágrafo do subitem 2.5 - Perio-
dicidade e Divulgação dos Resultados, constante da Resolução CNPS n. 1.308/09,
no primeiro ano de aplicação (2010), se majorada a alíquota, o FAP será multipli-
cado por 0,75%, quando o índice exceder a 1 (um). Entende-se que se for igual ou
inferior a 1, ele se manterá sem esse bônus.
Exemplo: FAP: 1,80. Alíquota da empresa: 3,0%
1,80 x 3,00% = 5,40%
5,40 x 0,75% = 4,05%
Já na sua 10ª edição, o CID é uma lista do Código de Internacional de Doenças,
incapacitantes ou não, que fornece números indicativos das moléstias humanas.
Esses códigos devem ser apresentados em diferentes documentos que envolvam as
doenças ocupacionais.
O manejo do FAP, tanto quanto o do Nexo Técnico Epidemiológico Previden-
ciário (NTEP) (um elemento indicador), não pode se olvidar dos direitos humanos,
em particular aqueles referentes à privacidade de cada um. Trata-se de um direito
constitucional garantido nas leis trabalhistas e previdenciárias, que precisa ser ob-
servado nos seus limites legais.
Desde a contratação, durante a vigência do contrato de trabalho, em face dos
sucessivos exames internos, por ocasião do pedido de benefícios (e no seio da pró-
pria Administração Pública), o aplicador da norma somente pode agir nos termos
que a lei, em cada caso, determinar. O tema é polêmico e não coincide a política do
Conselho Federal de Medicina com a atribuição das empresas cometidas pela CLT.
Enquanto a lei não disciplinar em melhores condições essas relações, o mais
adequado é a empresa instituir rotinas trabalhistas de admissão e acompanhamento
e elaborar um Regulamento de Pessoal, preparado pelo setor jurídico em colabora-
ção com o setor de recursos humanos, nos estritos termos da norma, e que explicite
o que é possível e o que não é.
Tem-se entendido que a colaboração de um assistente social, consoante a disci-
plina legal dessa função, é uma solução para muitos dos problemas que se apresen-
tam. O assistente social tem maiores poderes que o do exame admissional.

I. Taxa do Seguro de Acidentes do Trabalho


Até 31 de maio de 2007 as taxas básicas de acidentes do trabalho eram três: 1,0%
(risco leve); 2,0% (risco médio); e 3,0% (risco grave).
A primeira nova taxa entrará em vigor em 1º de janeiro de 2010. Logo, na Guia
da Previdência Social do mês de competência janeiro/2010 deverá fazer parte da
obrigação exacional da empresa, a ser recolhida no mês seguinte (fevereiro/2010).
Em cada ano ela será modificada com base em elementos de exercícios anterio-
res (índices de sinistralidade da empresa comparados com os índices de sinistrali-
dade do segmento econômico nacional), do mesmo período.
Quando uma empresa tem matriz e outras unidades produtivas, a taxa de segu-
ro de acidentes do trabalho deve ser considerada em função de cada um dos seus
estabelecimentos (CNPJ). O tema é polêmico e o INSS às vezes entendia que o cri-
tério é por empresa e não por estabelecimento. Possivelmente a Receita Federal do
Brasil vai compreender da mesma forma, instalando-se divergência fiscal.
A Justiça Federal acolhe a ideia de que a taxa é a de cada unidade e não a da
empresa considerada como um todo. Até porque os acidentes ocorrem nos estabe-
lecimentos e não dentro de uma concepção meramente jurídica que é a empresa.
Em diversas oportunidades as resoluções do Conselho Nacional de Previdência
Social fazem referência aos estabelecimentos ou ao CNPJ das unidades, sinalizan-
do para a concepção de que elege essa política de enquadramento das taxas do Se-
guro de Acidentes do Trabalho.
Essas normas dão conta de que o FAP a ser informado pelo Ministério da Pre-
vidência Social em setembro de 2009 dirá respeito a cada uma das unidades e as-
sim deve ser entendido. A empresa que estiver contestando administrativa ou judi-
cialmente um enquadramento que tenha sopesado os empregados da empresa e en-
tão fixada a proporcionalidade deve considerar tal fato e contestar, além do FAP
propriamente dito, se os números não coincidem com os seus registros, também esse
enquadramento.

II. Sinistralidade Laboral


Para a compreensão da metodologia da flexibilização do FAT importa assimi-
lar o que significam o risco e o sinistro. Há uma diferença relevante para a aposen-
tadoria especial, que cobre o risco e não o sinistro; o benefício próprio da consu-
mação é a aposentadoria por invalidez.
Um sinistro parcial, como a perda auditiva apurada nos exames que se seguem
à admissão, dá conta de que o ambiente laboral, com ou sem o uso de Equipamen-
tos de Proteção Individual ou Equipamentos de Proteção Coletiva, está propician-
do a disacusia do trabalhador, isto é, aumentando o risco de que ele fique inapto para
o trabalho e requeira um auxílio-doença.
Risco é a probabilidade de ocorrência de determinado evento, previsível ou não,
um fato normalmente incerto, futuro, traumático ou não, capaz de produzir efeitos
sopesados pela técnica considerada (Wladimir Novaes Martinez, Curso de Direito
Previdenciário, tomo IV - Previdência Complementar, São Paulo: LTr, 2002, p. 265).
Sinistro é a realização material da ocorrência, um infortúnio danoso do traba-
lhador. Isto é, o evento previsto ou não, então consumado.
Fora do seguro privado, na órbita da previdência social, é designado também
como contingência protegida (Wladimir Novaes Martinez, ob. cit., p. 265).
Sinistralidade quer dizer relação entre o número de empregados e o número de
acidentes acontecidos num certo tempo.
Ela pode ser alta, normal ou elevada (avaliações que dependem de comparação
com o passado da mesma empresa, de outra empresa igual ou com a média do mes-
mo segmento econômico nacional).
Exemplo: se a média das empresas que exercem a mesma atividade soma 10
acidentes a cada 12 meses e a empresa “A” teve 2 acidentes e a empresa “B” teve
20 acidentes, tem-se que comparativamente a primeira delas experimentou baixa
sinistralidade e a segunda, uma alta sinistralidade.
Mas, note-se: são avaliações comparativas porque dois, dez ou vinte ocorrên-
cias, dependendo da atividade, sempre são inadequadas ou indesejáveis em termos
de prevenção infortunística.

III. Cálculo do FAP


Diante da complexidade matemática do cálculo do FAP são expostos apenas os
elementos básicos do seu encaminhamento. Nesse sentido, se não dispuser de re-
cursos para promover a própria determinação do seu FAP e até que isso lhe seja
oferecido por terceiros, no mínimo a empresa deve confrontar os seus dados numé-
ricos com os ofertados pelo Ministério da Previdência Social.
Com certeza, a despeito da delegação da Lei n. 10.666/03 ao Conselho Nacio-
nal de Previdência Social, os tributaristas questionarão a validade de critérios que
extrapolarem a norma legal.
O FAP é aferido a partir de vários elementos próprios da sinistralidade da em-
presa (Direito Previdenciário) e do índice de rotatividade dos trabalhadores (Direi-
to do Trabalho), da empresa (CNPJ), comparado com os mesmos índices do segmen-
to econômico da atividade (CNAE).
Poder-se-ia tomar o número de acidentes dentro de um período-base de cálcu-
lo, multiplicá-lo pelo número de diárias das prestações acidentárias, e o resultado
encontrado pelo multiplicado pelo valor do salário de benefício das prestações en-
volvidas.
Exemplo da empresa “A” (CNPJ): 20 acidentes, com um total de 300 diárias e
um salário de benefício médio de R$ 1.000,00.
Exemplo do segmento econômico nacional (CNAE): 10 acidentes, com um to-
tal de 200 diárias e um salário de benefício médio de R$ 2.000,00.
Teríamos:
Empresa “A” - 20 x 300 x R$ 1.000,00 = R$ 600.000,00
Segmento nacional - 10 x 200 x R$ 3.000,00 = R$ 600.000,00
Os dois resultados coincidem apenas para evidenciar que a despeito do custo
para o INSS ter sido igual, a sinistralidade das empresas não é idêntica. A empresa
“A” tem o dobro de eventos e precisa ampliar os cuidados com a prevenção. A dife-
rença salarial não é apenas numérica, representa clientela distinta.
Por isso, o mecanismo legal leva em conta aspectos ponderados da frequência,
da gravidade e do custo dos benefícios acidentários, e mais alguns elementos da
empresa e do segmento. Logo, o cálculo restou complexo (possivelmente dependen-
do de ser elaborado por programa de computador).
Frequência é o número de acidentes do trabalho ocorridos dentro do período-
base de cálculo, que demandaram a Comunicação de Acidentes do Trabalho (CAT)
ou não, e que redundaram em benefícios acidentários. NB-92 antecedido por NB-32
ou concedido diretamente ou NB-94 sem NB-32 ou NB-92. No cálculo esse núme-
ro é multiplicado por 1.000 (para poder operacionalizar).
Gravidade representa a duração do benefício previdenciário, ou seja, DCB - DIB,
o tempo passado em dias desde a Data do Início do Benefício (DIB) até a Data da
Cessação do Benefício (DCB). Cada um dos quatro benefícios tem um peso:
Auxílio-doença ....................... 0,10
Aposentadoria por invalidez ... 0,30
Auxílio-acidente ..................... 0,10
Pensão por morte .................... 0,50
Seu cálculo é o número de acidentes, depois da aplicação dos pesos acima indi-
cados, dividido pelo número de vínculos empregatícios e multiplicado por 1.000.
Exemplo: 30 auxílios-doença + 20 mortes numa empresa com 100 empregados
30 x 0,1 + 20 x 0,50 13,1
1.000 1.000 0,013
Custo é o total de despesas que o INSS consumiu com os benefícios acidentá-
rios, que depende dos salários de contribuição dos segurados que requereram e ob-
tiveram auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
A fórmula regulamentar de cálculo é valor total dos benefícios dividido pelo total
da remuneração dos segurados, por sua vez dividido por 1.000.
Exemplo: R$ 600.000,00 = 0,5 x 1.000 = 500
R$ 1.200.000,00
Depois de apurados os índices de frequência, gravidade e custo, esses números
são afetados por percentis, que dependem do número de acidentes, variando de 1%
a 100%.
Cada um dos percentis é afetado por outros índices. A gravidade tem um peso
de 0,5. O da frequência é 0,35. O do custo, de 0,15. O resultado é ainda multiplica-
do por 0,02.
Finalmente, de acordo com o subitem 2.4 da Resolução CNPS n. 1.308/09, a
fórmula determinante é:
IC = (0,50 x percentil de gravidade + 0,35 x percentil de frequência + 0,35 e
percentil de custo) x 0,02.
Aquele subitem dá ensejo a um exemplo prático:
IC = (0,50 x 30 + 0,35 x 80 + 0,15 x 44) x 0,02 = 0,9920
Derradeiramente, a taxa vigente (por exemplo, de 2,0%) será:
2,0% x 0,9920 = 1,984%
Depois da Resolução CNPS n. 1.308/09 o período-base de cálculo deixou de ser
de cinco anos e passou a ser de 24 meses.
O FAP será anual. Significa que todo mês de janeiro o setor fiscal terá de veri-
ficar a nova alíquota do Seguro de Acidentes do Trabalho.
Repete-se. O período de cinco anos anterior foi substituído por um de dois anos,
mas o primeiro deles será de 1º de abril de 2007 até 31 de dezembro de 2008. Em 2011,
ele considerará 1º de janeiro de 2008 a 31 de dezembro de 2009, e assim por diante.

IV. Acidentes do Trabalho


A preocupação central do Ministério da Previdência Social é estimular a pre-
venção acidentária, reduzir o elevado número de ocorrências a partir da flexibiliza-
ção das alíquotas.
Define-se o acidente do trabalho como o infortúnio laboral que possa ser atri-
buído juridicamente ao empregador e que implique um afastamento do trabalho por
mais de 15 dias.
Acidente fatal, aplicando-se certo percentual próprio, é aquele que determinou
o falecimento do segurado. Que pode determinar a fruição de um auxílio-doença ou
aposentadoria por invalidez antecedente e, depois, a pensão por morte para os de-
pendentes do segurado.
No caso de acidente de qualquer natureza ou causa, que não é acidente do tra-
balho, não há direito a benefício acidentário nem fará parte das estatísticas do FAP.
Acidente de trajeto é acidente do trabalho, embora a culpa jurídica da empresa
seja limitadíssima ou nenhuma.
Ocorrência incidental que não determine incapacidade por mais de 15 dias não
é tido como acidente do trabalho, ela dispensa a CAT, não gera benefício nem pro-
duz o NTEP.
Entende-se como doença profissional aquela que tem ligação direta com o exer-
cício da ocupação do profissional. Doença do trabalho é a produzida pelo ambiente
laboral.
Até mesmo após a concessão do benefício acidentário, se a empresa provar que
não deu causa ao infortúnio, que não há nexo causal entre o CID e o ambiente de
trabalho, o evento terá de ser eliminado das estatísticas que determinam o FAP.
Se uma empresa está vinculada ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS)
e presta serviços no exterior, um acidente ocorrido fora do Brasil é acidente do tra-
balho.
A lei previdenciária prevê a exclusão das doenças ocupacionais quando a inca-
pacidade possa ser atribuída a causas genéticas, da faixa etária, degenerativas, en-
dêmicas ou pregressas. Quase todas elas discutíveis em sua materialização.
Se o ambiente laboral contribuiu para a consumação das doenças ocupacional,
o evento será considerando acidente do trabalho.
Inicialmente, os atos normativos falavam em benefícios acidentários e comuns.
Como a Lei n. 10.666/03 não dizia isso, o equívoco foi corrigido e só interessam os
decorrentes de doenças ocupacionais.
Inicialmente não estabelecido o NTEP, a perícia médica do INSS não entendeu
estar presente má doença ocupacional. Se mais tarde, administrativa ou judicialmen-
te sobrevier transformação do NB-31 em NB-91 ou NB-32 em NB-92, afetará o
período-base em que ocorreu o evento determinante do benefício. Se ele estiver fora
desse período, doutrinariamente entende-se que será como se fosse na data da defi-
nição.
Inicialmente, as normas administrativas ignoraram a CAT como fonte de informa-
ção do acidente do trabalho. A sua importância foi restabelecida pela Resolução CNPS
n. 1.308/09 de sorte que as informações por ela prestadas serão tabuladas pelo INSS.
Foi escolhida a data de 1º de abril de 2007 possivelmente porque nesse dia en-
trou em vigor o NTEP (Lei n.11.430/06).

V. Trabalhadores Envolvidos
Não são todos os colaboradores que operam numa empresa que deflagram in-
formações para o FAP. De regra, apenas os empregados regidos pela CLT.
Empregados celetistas são trabalhadores registrados ou não. Contratos por pra-
zo determinado ou não, contrato de experiência ou períodos de aprendizagem pre-
vistos na CLT.
Os servidores filiados ao RGPS, que contribuem e se beneficiam do plano de
benefícios do INSS, estão incluídos, obrigando os entes públicos aos ônus do FAP.
Obreiros deficientes admitidos ex vi do art. 93 do Plano de Benefícios da Previ-
dência Social (PBPS) são empregados eficientes (Os Deficientes no Direito Previ-
denciário, São Paulo: LTr, 2009).
Desde 24 de julho de 1991, os trabalhadores rurícolas estão compreendidos no
RGPS.
Os aposentados que voltaram ao trabalho não fazem jus às prestações acidentá-
rias e as consequências reduzem-se ao âmbito da relação entre empregado e empre-
gador.
Rigorosamente, eles também denunciam a presença de agentes nocivos e deve-
riam fazer parte das estatísticas, mas isso não foi previsto nas normas administrati-
vas.
Estagiários da Lei n. 11.788/08 não estão incluídos porque não são empregados
e sua proteção social se dá com o seguro privado obrigatório ou caso filiados como
contribuintes individuais (O Estágio Profissional em 1420 Perguntas e Respostas,
São Paulo: LTr, 2009).
Autorizados a trabalhar pela Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) ainda as-
sim, os presidiários não estão incluídos, porque não são empregados das empresas
para as quais eventualmente prestem serviços.
Temporários que prestam serviços nos estabelecimentos da contratante de mão
de obra; não são seus empregados. Embora a culpa pelo sinistro possa ser atribuída
materialmente à contratante, o fato induzirá a taxa de seguro da fornecedora de mão
de obra.
Excetuados os empregados da cooperativa que trabalham na sua administração,
os cooperados são contribuintes individuais e não têm proteção acidentária (embo-
ra possam fazer jus à aposentadoria especial).
Os autônomos e os eventuais são contribuintes individuais e somente fazem jus
aos benefícios comuns.
Trabalhadores avulsos constituem uma categoria atípica de segurados obrigató-
rios, não são empregados dos Orgãos Gestores de Mão de Obra (OGMO), mas têm
a cobertura acidentária.
Os empresários que prestam serviços em nome de pessoas jurídicas contratadas
não são empregados das contratantes.
Até que perca a qualidade de segurado, que vai até o prazo máximo em 37 me-
ses + 15 dias a contar da resilição contratual, o ex-empregado poderá requerer um
beneficio acidentário e tal fato constará das estatísticas.
O número de pessoas que contesta o vínculo empregatício, até que seja dirimi-
da a dúvida na Justiça do Trabalho, não faz parte do FAP.

VI. Tipos de Empresas


Praticamente todos os empreendimentos econômicos, lucrativos ou não, descri-
tos no art. 15 do Plano de Custeio da Seguridade Social, são considerados empre-
sas para efeito do FAP. Como os domésticos estão excluídos da proteção acidentá-
ria, os empregadores domésticos estão arredados do FAP.
Empresas postadas sob o Direito Privado, quando admitem colaboradores sob
o regime da CLT, se inserem nesse sistema do FAP.
As cooperativas têm empregados em sua administração e associados (os coope-
rados), fazendo parte deste instituto técnico em relação aos seus empregados.
Os OGMO não são empregadores, mas tidos como administradores de mão
de obra, especialmente portuária, e nessa condição sujeitos aos deveres da Lei
n. 10.666/03.
A empresa de trabalho temporário contribui para o Seguro de Acidentes do Tra-
balho e os seus colaboradores sujeitam-se aos riscos das empresas contratantes dos
seus serviços. Os elementos de sua taxa do Seguro de Acidentes do Trabalho depen-
derão de ocorrências sucedidas em tais ambientes laborais.
Os segurados especiais, que contratem os serviços de empregados, tornam-se
produtores rurais pessoas físicas para os efeitos da flexibilização do Seguro de Aci-
dentes do Trabalho. Da mesma forma, como os segurados especiais os consórcios
rurais, quando contratam empregados, ficam obrigados.
O Microempresário individual pode contratar um único empregado que receba
o salário mínimo. A Lei não fala em Seguro de Acidentes do Trabalho, entenden-
do-se que os 3,0% patronais cobrem eventuais acidentes do trabalho desse trabalha-
dor. O autônomo que contrata um empregado (e até outro autônomo) não perde a
condição de contribuinte individual, logo é equiparado à empresa (Resolução
CD/DNPS n. 120/72).
Embora dispensadas da contribuição patronal, as entidades filantrópicas estão
sujeitas ao Seguro de Acidentes do Trabalho e, em consequência, sujeitos ao FAP.
As Igrejas, exceto em relação a empregados administrativos, não são emprega-
dores nem contratantes de mão de obra de contribuintes individuais (os eclesiásti-
cos), logo não contribuem para o Seguro de Acidentes do Trabalho e não há flexi-
bilização da alíquota.
Tanto quanto a chácara de lazer, a república de estudantes é tida como empre-
gador doméstico, portanto sem obrigações em relação ao FAP.
Os condomínios são empresas comuns e além do síndico, que é segurado obri-
gatório como contribuinte individual, eles têm empregados a seu serviço.

VII. Benefícios Previstos


Pelo menos quatro benefícios acidentários estão diretamente envolvidos com o
FAP.
O auxílio-doença é o devido após 15 dias de afastamento do trabalho que dis-
pensa a carência e no valor de 91% do salário de benefício.
Em sequência ou não do auxílio-doença, a aposentadoria por invalidez corres-
pondente a 100% do salário de benefício.
Cessado o auxílio-doença, com um segurado portador de incapacidade parcial
e permanente, é concedido um benefício no valor de 50% do salário de benefício.
Benefício dos dependentes do segurado que recebia benefício acidentário ou
sofreu acidente fatal é a pensão por morte.
A majoração da taxa de seguro de acidentes do trabalho determinada pela fle-
xibilização do Seguro de Acidentes do Trabalho, máxime se continuada, revela que
a empresa não está cuidando da prevenção. Logo, esse ambiente pode deflagrar o
direito à aposentadoria especial.

VIII. Rotatividade das Empresas


As Resoluções CNPS ns. 1.308/09 e 1.309/09 alteraram as Resoluções ns.
1.236/04 e 1.269/06. A primeira tratou explicitamente do cálculo do FAP e a segunda
da rotatividade.
A doutrina estatística consagra várias fórmulas de rotatividade. Para Idalberto
Chiavenato é a soma do número das admissões com as demissões, dividida por 2 e
multiplicada por 100, o resultado, por sua vez, dividido pelo número de emprega-
dos (Gestão de Pessoal: o Novo Papel dos Recursos Humanos nas Organizações,
Rio de Janeiro: Campos, 1999, p. 180).
O percentual de 75% aplicado ao FAP, que foi adotado pela Resolução CNPS
n. 1.308/09, não é aplicado para a empresa que tiver uma rotatividade superior a
75%. Um índice elevado; seria preciso que uma empresa de 1.000 empregados ti-
vesse demitido e admitido em média mais de 750 empregados.
O período-base em que são tomadas as informações determinantes da rotativi-
dade é de dois anos.
O conceito regulamentar é a “razão entre o número de admissões ou de resci-
sões (considerando-se sempre o menor), sobre o número de vínculos na empresa no
início de cada ano de apuração”.
São excluídas “as admissões que representarem apenas o crescimento e as res-
cisões que representarem diminuição do número de trabalhador do CNPJ”.
A fórmula do cálculo é:
TRA = “mínimo (número de rescisões ocorridas no ano ou número de demis-
sões ocorridas no ano)/número de vínculos no início do ano x 100 (cem)”.
Exemplo de uma empresa com 200 empregados que teve 100 admissões e 120
demissões: 100/200 x 100 = 0,50%.
E a da taxa média de rotatividade:
TRM = “Média das taxas de rotatividade anuais nos últimos dois anos/Apli-
cação da taxa média de rotatividade.”
Se as taxas de rotatividade foram de 40% em 2008 e 50% em 2009, a taxa mé-
dia anual: 40% + 50% = 90% -:- 2 = 45%.
A empresa que tenha rotatividade acima de 75% e comprova que “tenham sido
observadas as normas de saúde e segurança do trabalho em caso de demissões vo-
luntárias ou término de obra” terão o bônus de 75% do FAP.
Em disposição destinada à respeitável polêmica, diz o item 3.7 da Resolução
CNPS n. 1.309/09 que a empresa fará jus ao bônus de 75%, logrando comprovar o
cumprimento das Normas Regulamentadoras. Isso é juridicamente impossível, caso
se pense nos resultados alcançados (o cumprimento das Normas Regulamentado-
ras não significa necessariamente acidentes zerados). Essa demonstração ou é in-
terna ou externa, com laudos declaratórios de terceiros. À míngua de regulamenta-
ção, não dispondo o Ministério do Trabalho e do Emprego de condições materiais
de promover essa verificação em todas as empresas, a Receita Federal do Brasil terá
de acolher a afirmação feita por terceiros.

IX. Contestação Empresarial


Assim que tomar conhecimento dos dados fornecidos pelo Ministério da Previ-
dência Social, a serem divulgados em setembro/2009, se dispuser dos elementos do
CNAE, a empresa simulará o seu FAP, depois verificar se coincidem as informações
prestadas pela Receita Federal do Brasil ou INSS com as do seu banco de dados.
Grosso modo, elas dizem respeito ao número de benefícios acidentários decorren-
tes de doenças ocupacionais e acidentes do trabalho propriamente ditos.
Além de afirmado textualmente no Decreto n. 6.042/07, matéria disciplinada na
Lei n. 9.784/99 e Decreto n. 70.235/72, a empresa tem o direito de contestar o FAP
que lhe foi atribuído, quando com ele não concordar; logo que tomar ciência do
número correspondente. Sabendo que não há efeito suspensivo e a resposta demo-
rará.
O FAP será comunicado à empresa na internet e, conforme o caso, por escrito.
Para isso bastará digitar o CNPJ do estabelecimento no site da Previdência Social,
possivelmente a partir do dia 1º de setembro de 2009. Podem ser contestados dos
dados oficiais do Ministério da Previdência Social relativos aos três coeficientes
básicos da frequência, gravidade e custo de cada CNPJ e CNAE.
Crê-se que o Ministério da Previdência Social não irá calcular e divulgar a ro-
tatividade de cada empresa.
Tendo em vista que se trata de uma contribuição previdenciária, a impugnação,
na forma de um Recurso Ordinário, será dirigida ao Carf, do Ministério da Fazenda
(Resolução MF n. 256/09) e, em ultima instância, quando não se conformar com a
decisão do Ministério da Fazenda, à CSRF, em Brasília.
Não satisfeita com a última decisão da Câmara Superior de Recursos Fiscais a
empresa poderá recorrer à Justiça Federal, contra a União. A decisão final produzi-
rá efeitos desde o mês de competência janeiro/2010. Como sucedeu num passado
recente, crê-se que serão muitas as contestações, devendo-se esperar a consolida-
ção do entendimento judicial.
Para que o setor jurídico possa impugnar os números utilizados na definição
oficial do FAP é absolutamente necessário que os setores de recursos humanos e
medicina do trabalho previamente tenham armazenado organizadamente as provas:
dados, estatísticas, atas da Cipa, documentos trabalhistas de monitoramento indica-
dos nas Normas Regulamentadoras, curriculum vitae, prontuários médicos, exames
admissionais, demissionais e sequenciais etc. De acordo com o art. 15 do Decreto
n. 70.235/72, o prazo para a impugnação é de 30 dias.
O ramo jurídico que informa a composição do conflito entre o contribuinte e a
Receita Federal do Brasil é o Direito Previdenciário Procedimental (Curso de Di-
reito Previdenciário, tomo III, São Paulo: LTr, 2008). Cada empresa deverá elabo-
rar um dossiê completo reunindo material de contraprova para municiar o setor ju-
rídico em matéria de higiene, medicina e segurança do trabalho.
No seu art. 20, parágrafo 1º, o PBPS elenca hipóteses circunstanciais que arre-
dam a responsabilidade em relação à doença do trabalho:
a) doença degenerativa: conclusões técnicas, conclusões de eventos científicos,
publicações, pareceres de geriatras ou gerontólogos.
b) faixa etária: idade do trabalhador e a função exercida na sua ocupação, si-
tuação que, combinada com a concausa, assume relevância; muitos anos de
vida tornam mais difíceis executar trabalhos braçais. Algumas doenças não
incapacitantes agravam-se com o passar dos anos.
c) ausência de incapacidade: quando o acontecimento não obsta o trabalho de-
vido a sua pequena gravidade ou porque sobrevém a aptidão antes de 15 dias.
Mas, é bom lembrar que número elevado de incidentes revela descuido na pre-
venção acidentária.
d) moléstia endêmica: buscar dados apurados na mídia, nos órgãos governa-
mentais (Ministério da Saúde), ONG e outros meios médicos estatísticos. A
gripe A (H1N1) que acometeu um trabalhador pode não ter sido causada pelo
ambiente de trabalho, mesmo se tratando de um frigorífico.
Mais do que um rastreamento das áreas de riscos, o acompanhamento sistemá-
tico da consumação das contingências, não só aquelas que geram incapacidade como
também, em especial, aquelas que implicam as prestações acidentárias, é um con-
trole importante para convencer terceiros da não ocorrência acidentária, do baixo
nível de sinistralidade ou da total ausência de agentes nocivos incapacitantes no
estabelecimento da empresa.
O controle da incidência de auxílios-doenças em relação à atividade econômi-
ca e região servem para demonstrar a presença ou ausência dos agentes nocivos. Os
odontólogos empregados (e autônomos) têm dificuldades para obter aposentadoria
especial, provavelmente porque são raros os casos de incapacidade ou eles não pro-
curam o INSS.
A doença às vezes é um processo mais ou menos lento, insidioso; ela vai se es-
tabelecendo no organismo humano, de forma que tende a ser progressiva. Quando
o dano emerge é que houve a instalação da enfermidade no corpo do obreiro. Para
Ionas Deda Gonçalves essa patologia pode atingir o segurado em virtude do exer-
cício laboral especifico ou resultar de condições agressivas do seu meio ambiente
de trabalho. Logo, ter-se-á que os exames médicos internos podem caracterizar ou
não a doença ocupacional (“Acidentes do Trabalho”, Revista de Direito Social n. 3,
Sapucaia do Sul, 2001, pp. 75/101).
Verificações periódicas promovidas pelo Ministério do Trabalho e do Empre-
go, requeridas pela empresa ou exigidas pelo art. 160 da CLT, quando sistematica-
mente não registram a presença dos agentes nocivos, serão meios persuasórios de
convencimento a serem cogitados pela empresa defendente. Ausência de embargo
ou interdição é também significativa nesse sentido. Os relatórios e atas da Cipa são
relevantes para demonstrar a eficácia da tecnologia de proteção adotada pela em-
presa.
A ação trabalhista, previdenciária ou civil, quando o tema for o tratado, é uma
faca de dois gumes. Serve de meio de persuasão dos dois polos da reclamação. Um
conjunto de discussões favoráveis ou contrárias, ainda que não constitua a figura
jurídica da jurisprudência, conforme o caso, será relevante para quem a trouxer aos
autos da impugnação.
Os diversos programas trabalhistas são bastante indicativos: cada um deles com-
preende relatórios, sínteses, levantamentos e estudos que marcam o sucesso ou não
das políticas prevencionistas da empresa.
O comportamento pessoal hodierno fora do ambiente de trabalho e até mesmo
o profissional pretérito, chamado de vida pregressa referente distintamente às pro-
fissões, ocupações e funções do obreiro antes da admissão, às vezes colhidos a par-
tir do curriculum vitae apresentado quando da admissão ou apurado por ocasião do
exame admissional, são decisivos. Um empregado que se dedica ao tênis nos fins
de semana pode ter adquirido a LER praticando o esporte.
Uma perícia judicial ocorre quando de reclamações trabalhistas, realizada por
expert judicial, um auxiliar da justiça designado pelo juiz em cada caso (Lei n. 5.584/70).
Um profissional que não se confunde com o assistente técnico a ser contratado e
remunerado pelo empregador.
Nos termos do art. 195 da CLT, o Ministério do Trabalho e do Emprego tam-
bém promove essas perícias em matéria de insalubridade e periculosidade, sendo
certo que a perícia judicial não dispensa o enquadramento da atividade, “que é ato
de competência do Ministro do Trabalho e Previdência Social”.
A seguir, são relacionadas 50 notas inspiradoras sobre possíveis meios de con-
traprova do empregador:
1. Prontuário clínico individual;
2. Atestado de Saúde Ocupacional;
3. Declaração de médico do trabalho;
4. Exame admissional, sequencial ou demissional;
5. Perícia de retorno ao trabalho ou mudança de função;
6. Resultado de exames complementares;
7. Audiometria operada regulamente;
8. PPP;
9. LTCAT;
10. SB 40 e Dises SB 5.235;
11. Perfil profissiográfico;
12. DSS 8.030 e Dirben 8.030;
13. Laudo técnico em reclamações trabalhistas;
14. Ficha de acidente do Trabalho (NR-18);
15. Cópia do PPRA e do PCMSO;
16. Cópia do PPEOB, Pcmat e Sesmt;
17. Ata da Cipa e da Cipanim;
18. Certificado de Avaliação de Instalações (CAI);
19. Sentença judicial em pedido de indenização;
20. Avaliação de clínicas particulares;
21. Registro de ambulatório da empresa;
22. Mapeamento de sinistros;
23. Gerenciamento de riscos;
24. Atestado de médico particular;
25. Relatório de necrópsia;
26. Causa mortis constante de certidão óbito;
27. Declaração do plano de saúde;
28. Pesquisa sobre a doença;
29. Busca na internet;
30. Bibliografia médica;
31. Estudo sobre casos concretos;
32. Declaração do INSS sobre auxílio-doença;
33. Perícia médica in loco;
34. Ação na Justiça Federal;
35. Reclamação trabalhista;
36. Súmula sobre a matéria;
37. Laudo de perícia judicial;
38. Artigo técnico em revista médica especializada;
39. Tese, monografia ou dissertação acadêmica de pós-graduação;
40. Livro de medicina;
41. Depoimento de parentes ou vizinhos;
42. Notícias de jornais;
43. Resultado de inspeção pericial externa;
44. Resposta à consulta fiscal;
45. Redução do Seguro de Acidentes do Trabalho;
46. Comissão de arbitragem;
47. Carta de Concessão negativa de benefício;
48. Diligência fiscal;
49. Inquérito administrativo;
50. Admissão posterior em outra empresa.

X. Constitucionalidade do FAP
Em virtude do modelo técnico protetivo do País (seguro social), da história da
Previdência Social e da convenção institucional acolhida no ordenamento jurídico
de todo o mundo - uma seguradora que assume os riscos de pagar a indenização tem
a seu favor o poder de estabelecer regras. O interessado, forçado ou não, adere a elas.
No seguro social, em virtude de se submeter à norma pública, o INSS tinha e
tem o poder-dever de submeter o segurado à perícia médica para verificar a incapa-
cidade do segurado. Isso é indiscutível e jamais um tribunal poderá subtrair esse
poder de império da Administração Pública.
A Lei n. 10.666/03 seria inconstitucional se ela vedasse o direito à impugnação
por parte do contribuinte; como não fez isso nem poderia fazer, o FAP é constitucio-
nal. O que talvez não seja legal é a rotatividade das empresas (ausente na lei, mas
tida como um favor fiscal).
PA R E C E R E S
IPI. Furto e Roubo de Mercadoria.
Exame da Existência de Competência
e de Exercício de Competência.
Intributabilidade das Meras Saídas
Físicas a Título de IPI
Humberto Ávila

1. A Consulta
1.1. A Consulente, porque produz cigarros, é contribuinte do
Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI.
1.2. Em algumas situações, os cigarros produzidos são rouba-
dos após saírem do estabelecimento industrial com destino ao
mercado interno ou externo, surgindo a questão de saber se o men-
cionado imposto, mesmo assim, deve ser pago.
1.3. A Receita Federal, de um lado, entende que o imposto
seria devido, porque o fato gerador, legalmente definido como sen-
do a saída do produto do estabelecimento industrial, ocorreria, e a
circunstância posterior de o produto ter sido roubado não seria
definida em lei como causa de extinção ou de exclusão do crédito
tributário; de outro, sustenta que a hipótese de imunidade também
não se verificaria, tendo em vista que a remessa do produto ao
exterior, no caso de roubo, não se concretizaria.
1.4. Tendo sido autuada pela falta de recolhimento do impos-
to supostamente devido nesses casos, a Consulente ingressou com
uma ação judicial perante o Poder Judiciário, ainda não concluí-
da, destinada a anular os créditos tributários correspondentes.
1.5. Diante desse quadro, honra-me a Consulente com pedido
de parecer, com o objetivo de saber se, na hipótese de roubo dos
produtos industrializados, o mencionado imposto incide e a imu-
nidade é aplicável.

2. O Parecer
2.1. Plano constitucional
2.1.1. Normas jurídicas não são dispositivos, mas sentidos
Humberto Ávila normativos construídos a partir de um ou mais dispositivos.1 Os
é Livre-docente em dispositivos não são normas, mas meros fragmentos de normas.2
Direito Tributário Tanto é assim que há dispositivos sem norma (dispositivos redun-
pela USP, Doutor em dantes ou cujo sentido já é conotado por um ou outro dispositivo),
Direito pela normas sem dispositivo (os princípios da proporcionalidade e da
Universidade de razoabilidade são normas, embora não tenham nenhum dispositi-
Munique, Professor da vo que lhes dê suporte direto), dispositivos que geram mais de uma
Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, 1
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 30.
Advogado e 2
GUASTINI, Riccardo. Teoria e Dogmatica delle Fonti. Milano: Giuffrè, 1998,
Parecerista. p. 33; Le Fonti del Diritto e L’interpretazione. Milano: Giuffrè, 1993, p. 25.
norma (o dispositivo segundo o qual só se pode instituir tributo mediante lei gera o princí-
pio da legalidade, o princípio da tipicidade, a proibição de delegação normativa, o dever de
instituição de regulamentos executivos e a vedação de interpretação analógica) e normas que
dependem de mais de um dispositivo (o princípio da segurança jurídica é construído com
base nos dispositivos que vedam retroatividade e impõem o Estado de Direito, a legalidade
e a anterioridade). E tanto é assim, igualmente, que há a técnica da interpretação conforme
a Constituição, devendo o intérprete escolher, dentre os vários sentidos atribuíveis a um dis-
positivo, aquele que seja compatível com o ordenamento constitucional. Em suma, não se
podem identificar normas com dispositivos.
2.1.2. Essas considerações gerais também valem para a regra de competência do IPI: ela
não pode ser buscada num único dispositivo constitucional, devendo ser, em vez disso, cons-
truída a partir do conjunto de dispositivos referentes ao mencionado imposto.
2.1.3. Nesse aspecto, dois dispositivos são preliminarmente importantes: o inciso IV do
artigo 153, que atribui poder à União Federal para instituir o imposto sobre “produtos in-
dustrializados”; e o inciso II do parágrafo 3º do mesmo artigo, que estabelece que o referi-
do imposto “será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com
o montante cobrado nas anteriores”.
2.1.4. Se o inciso II do parágrafo 3º do artigo 153 visa afastar o efeito cumulativo da
carga tributária incidente em “cada operação” relativa a produtos industrializados, desde a
sua produção até o seu consumo, claro está que a Constituição não só estabeleceu que a car-
ga tributária devesse ser suportada pelos consumidores finais, como também previu que o
imposto só poderá incidir quando efetivamente ocorrerem as operações a eles destinadas. Isso
porque, se o imposto incidir também nos casos em que o produto não se destinar ao consu-
mo, o industrial será responsável por uma carga tributária superior àquela incidente na ope-
ração que deu causa, fazendo não apenas com que o imposto seja cumulativo, mas que ele
também seja suportado economicamente pelo industrial em vez do consumidor.
2.1.5. Sendo assim, o termo “operação” só pode conotar o negócio jurídico por meio do
qual os produtos industrializados sejam efetivamente destinados ao consumo. Eles só têm,
porém, esse destino, quando a sua propriedade é transferida pelo industrial a quem irá re-
vendê-lo ou consumi-lo. Assim, se o imposto incidir mesmo quando o produto não for ven-
dido, a carga tributária agregada pelo industrial irá recair sobre ele, fazendo não só com que
o imposto deixe de ser sobre o consumo, como, da mesma forma, que a sua carga seja acu-
mulada durante o ciclo econômico. Mas, se o imposto deixar de ser sobre o consumo e a sua
carga for acumulada, não se estará respeitando aquilo mesmo que a Constituição determi-
nou - que o contribuinte seja responsável pela carga tributária incidente na sua própria ope-
ração.
2.1.6. Não por outro motivo que o próprio Supremo Tribunal Federal tem interpretado
o termo “operação” como conotando negócios jurídicos: em decisão relativa ao imposto sobre
circulação de mercadorias, mas totalmente aplicável ao imposto ora analisado, decidiu que
o “emprego da expressão ‘operações’, bem como a designação do imposto, no que consa-
grado o vocábulo ‘mercadoria’, são conducentes à premissa de que deve haver o envolvi-
mento de ato mercantil...” (Agravo de Instrumento nº 131.941, relator Ministro Marco Au-
rélio, DJ 19.04.91); em decisão relativa ao mesmo imposto, definiu que “o termo operação
exsurge na acepção de ato mercantil” (Recurso Extraordinário nº 203.075-9, relator Minis-
tro Maurício Corrêa, DJ 29.10.99).
2.1.7. Por conseguinte, a Constituição Federal só permite a incidência do IPI quando o
produto industrializado for vendido pelo industrial ao varejista ou ao consumidor. Isso, con-
tudo, só ocorre quando o produto for entregue pelo vendedor ao comprador (artigos 1.122
do Código Civil e 191 do Código Comercial, hoje previstos no artigo 481 do Novo Código
Civil). Tanto é assim que, enquanto isso não ocorrer, os riscos correm por conta do vende-
dor (artigo 620 do Código Civil, atualmente no artigo 1.267 do Novo Código Civil).
2.1.8. As considerações anteriores deixam claro que a Constituição, quando utilizou o
termo “cada operação”, fez referência aos negócios jurídicos translativos de propriedade, tal
como regulados pelo Direito Privado. Esses conceitos, em virtude disso, passaram a fazer
parte da própria Constituição, não podendo ser alterados pelo legislador tributário, em vir-
tude do postulado da supremacia da Constituição, meramente explicitado pelo disposto no
artigo 110 do Código Tributário Nacional.3
2.1.9. A regra de competência em comento, conseqüentemente, somente atribui poder à
União Federal para cobrar o mencionado imposto quando houver negócio jurídico transla-
tivo da propriedade de produto industrializado e a carga tributária agregada possa ser trans-
ferida para o consumidor. Entender que o referido imposto possa incidir sobre fatos que não
importem na transferência de propriedade implica violação à regra de competência construída
com base na leitura integral do artigo 153 da Constituição Federal.
2.1.10. Ressalte-se, todavia, que defender a incidência do referido imposto sobre fatos
que não envolvam mudança de propriedade, não apenas implica violação à referida regra de
competência, mas tem por conseqüência, também, a ofensa a dois princípios constitucionais:
o princípio da capacidade contributiva e o princípio da neutralidade tributária.
2.1.11. O princípio da capacidade contributiva tem duas dimensões: a objetiva e a sub-
jetiva.4 A dimensão objetiva é decorrente da aplicação objetiva do princípio da igualdade,
que veda a distinção entre pessoas com base em medidas de comparação inexistentes ou que
não mantenham relação de pertinência com a finalidade da diferenciação. No Direito Tri-
butário, ela funciona como parâmetro para a instituição de qualquer imposto, de maneira que
eles só sejam cobrados sobre situações indicativas de capacidade econômica. Ela veda, por
exemplo, a cobrança de impostos sobre o ato de respirar. A dimensão subjetiva é consectá-
ria da aplicação subjetiva do princípio da igualdade, que impõe a distinção entre pessoas com
base em elementos nelas residentes. No âmbito tributário, ela serve de critério de gradua-
ção dos impostos cuja finalidade seja a distribuição isonômica da carga tributária, de modo
que seu montante seja tanto maior quanto maior for a capacidade econômica do sujeito pas-
sivo. Ela obriga o legislador, por exemplo, a cobrar mais imposto de renda de quem aufere
mais renda.
2.1.12. Sustentar que o imposto sobre produtos industrializados também possa incidir
sobre a mera saída física do estabelecimento industrial, sem que ela envolva a transferência
da sua propriedade, implica admitir que ele possa recair sobre situações que não são indica-
tivas de capacidade econômica alguma, a exemplo do que ocorre no caso do deslocamento
físico de produtos em razão da força das águas, como numa enchente, ou dos ventos, como
num tufão, ou da ação dolosa de terceiros, como no caso de roubo.5 Desse modo, sustentar
que o imposto incida igualmente sobre a simples saída física é aceitar a violação à dimen-
são objetiva do princípio da capacidade contributiva.
2.1.13. O princípio da neutralidade tributária, também corolário do princípio da igual-
dade, proíbe que os entes federados criem desvantagens competitivas injustificadas a con-
tribuintes que exerçam atividades equivalentes.6 Ele veda, por exemplo, que um contribuin-
te seja mais onerado quando estiver na mesma situação relativamente ao fato gerador de um
imposto, ou não deixe de ser menos onerado ou até desonerado, quando não estiver na mes-
ma situação.

3
ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 209.
4
ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 88.
5
BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11ª ed. DERZI, Misabel Abreu Machado (atual.). Rio de Janei-
ro: Forense, 1999, p. 385.
6
ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 99.
2.1.14. Argüir que o imposto sobre produtos industrializados possa igualmente incidir
tanto no caso de venda quanto no de roubo, importa consentir que os entes federados pos-
sam incluir, no âmbito da mesma regra, quem age voluntariamente e tem como objetivo trans-
ferir o ônus tributário para a operação seguinte, e quem é atingido involuntariamente por fato
externo ou comportamento alheio e não tem como deslocar a carga tributária para a opera-
ção posterior. Tal entendimento implica tratar igualmente dois contribuintes que estão em
situação desigual relativamente ao fato gerador do imposto. Portanto, defender que o imposto
incida sobre a simples saída física é conformar-se com a ofensa ao princípio da neutralida-
de da tributação.
2.1.15. Como o poder de tributar, atribuído aos entes federados pelas regras de compe-
tência, deve ser exercido de acordo com os princípios constitucionais, não se pode interpre-
tar a regra de competência para instituir o imposto sobre produtos industrializados sem que
ela seja uma concretização dos princípios que lhe são axiologicamente sobrejacentes.
2.1.16. À vista disso, todas as considerações anteriores, relativas ao plano normativo
constitucional, conduzem à tranqüila conclusão de que a União Federal só tem competên-
cia para tributar os negócios jurídicos translativos de propriedade de produtos industrializa-
dos, indicativos de capacidade econômica e capazes de fazer com que o sujeito passivo seja
responsável pela carga tributária gerada na operação que deu causa e possa repassá-la ao
consumidor. Não há dúvida alguma, portanto, de que a União Federal não pode exercer a
sua competência sobre saídas de produtos que não envolvam a transferência voluntária da
propriedade, que não sejam indicativas de capacidade econômica e que não permitam com
que o sujeito passivo possa transferir ônus tributário para o consumidor. Entender de modo
contrário é violar, manifestamente, o disposto nos artigos 5º, 145, 153, IV, e parágrafo 3º da
Constituição Federal.
2.1.17. Não causa surpresa a constatação de que a posição da Receita Federal, a favor
da tributação das meras saídas físicas pelo imposto sobre produtos industrializados, foi con-
cebida há muito tempo, antes mesmo do advento da Constituição de 1988: os Pareceres
Normativos que representam esse entendimento datam de 1971 (CST nº 209) e de 1977 (CST
nº 95).

2.2. Plano geral


2.2.1. A Constituição Federal, no inciso III do artigo 146, outorga competência à lei
complementar para definir normas gerais de Direito Tributário. Essas normas gerais foram
instituídas pelo Código Tributário Nacional, editado por lei ordinária recepcionada como lei
complementar pela nova ordem constitucional.7
2.2.2. O Código Tributário Nacional contém tanto dispositivos concernentes à institui-
ção e cobrança de tributos, quanto textos normativos relativos ao próprio imposto sobre pro-
dutos industrializados. É a sua análise conjunta que irá revelar as normas gerais de acordo
com as quais deverá ser exercida, por lei ordinária, a competência da União Federal para
instituir o mencionado imposto.
2.2.3. No que se refere aos dispositivos concernentes à instituição e cobrança de tribu-
tos, o referido Código tem dois textos normativos pertinentes ao caso em exame: o artigo
114 e o artigo 116. O primeiro artigo estabelece que “o fato gerador da obrigação principal
é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”. Assim, não bas-
ta que ocorra um fato que seja necessário ao surgimento da obrigação tributária; é preciso,
também, que o fato seja “suficiente” ao seu nascimento.

7
ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 140.
2.2.4. O artigo 116 do mesmo Código prevê que o fato gerador considera-se ocorrido,
“tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituí-
da nos termos do direito aplicável”. Desse modo, se o fato gerador envolver um negócio
jurídico, ele somente ocorrerá quando os seus requisitos, de acordo com o Direito Privado,
forem concretizados, não antes.
2.2.5. Ora, considerando que, no plano constitucional, ficou assentado que a União Fe-
deral só tem competência para tributar os negócios jurídicos translativos da propriedade de
produtos industrializados, indicativos de capacidade econômica e capazes de fazer com que
o sujeito passivo seja responsável pela carga tributária gerada na operação que deu causa e
possa repassá-la ao consumidor, e se é preciso, de acordo com o Código Tributário Nacio-
nal, que o fato ocorrido seja suficiente ao nascimento da obrigação tributária, e o fato gera-
dor, quando envolver um negócio jurídico, somente ocorre quando os seus requisitos legais
estiverem presentes, só surgirá o fato gerador do imposto sobre produtos industrializados
quando se perfectibilizar o negócio jurídico bilateral e oneroso.
2.2.6. Como já visto, a transferência da propriedade só ocorre quando o produto for
entregue pelo vendedor ao comprador (artigo 1.122 do Código Civil, hoje no artigo 481 do
Novo Código Civil), não antes. Por conseqüência, de acordo com a parte geral do Código
Tributário Nacional, a lei ordinária federal só poderá considerar como momento da ocorrên-
cia do fato gerador do produto industrializado o momento da translação da propriedade do
bem.
2.2.7. No tocante aos dispositivos especificamente relativos ao próprio imposto sobre
produtos industrializados, o mencionado Código contém dois dispositivos: o inciso II do
artigo 46, que estabelece que o fato gerador do imposto é a “saída dos estabelecimentos”; e
o inciso II do artigo 47, que prevê a sua base de cálculo como sendo “o valor da operação
de que decorrer a saída da mercadoria”.
2.2.8. Bem, se a base de cálculo do imposto é o “valor” da “operação” de que “decor-
rer” a saída da mercadoria, o seu fato gerador não é a saída, mas a conclusão do negócio
jurídico de que resulte a saída, o que é algo distinto. Lembre-se, sempre, que é a base de
cálculo que revela o fato gerador.8 Logo, não apenas a Constituição Federal como também,
o próprio Código Tributário Nacional condiciona a ocorrência do fato gerador do imposto à
conclusão de um negócio jurídico subjacente à operação de industrialização.
2.2.9. Como a norma geral, dentro de cujos contornos deverá ser legalmente exercida a
competência tributária da União Federal para instituir o imposto sobre produtos industriali-
zados, estabelece que somente poderá ser considerado como fato gerador do referido imposto
o momento translativo da propriedade do produto industrializado, a lei federal deve insti-
tuí-lo dentro desses limites, sob pena de flagrante ilegalidade.
2.2.10. Pois bem, todas as ponderações precedentes, referentes ao plano das normas
gerais, igualmente conduzem à mansa conclusão de que a União Federal só pode exercer a
sua competência tributária definindo, na lei, o fato gerador como sendo o momento transla-
tivo da propriedade do produto industrializado. Assim sendo, do mesmo modo que a Cons-
tituição Federal, também o Código Tributário Nacional não deixa a menor margem de dúvi-
da quanto à ausência de poder para a União Federal fixar as meras saídas físicas, que não
envolvam transferência de propriedade destinada ao consumo, como fato gerador do referi-
do imposto. Entender de modo contrário é violar, patentemente, o disposto nos artigos 46,
II, 47, II, 114 e 116 do Código Tributário Nacional.

8
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1963, p. 338.
2.3. Plano legal
2.3.1. Em caráter geral, a União Federal exerceu a sua competência constitucional para
instituir o imposto sobre produtos industrializados por meio do disposto no inciso II do arti-
go 14 da Lei nº 7.798/89, segundo o qual “constitui valor tributável, quanto aos produtos
nacionais, o valor total da operação de que decorrer a saída do estabelecimento industrial
ou equiparado a industrial”.
2.3.2. A singela leitura do referido dispositivo não deixa qualquer espaço para a incer-
teza no que se refere à base de cálculo do imposto sobre produtos industrializados: ela será
“o valor total da operação de que decorrer a saída do estabelecimento industrial. Insista-se,
uma vez mais: o fato gerador não é a simples saída; ele é a operação da qual irá decorrer
uma posterior saída, sendo a base de cálculo o seu valor. Em termos legais, por conseguin-
te, o fato gerador do mencionado imposto não é a mera saída, mas a operação da qual ela irá
resultar. A lei é clara.
2.3.3. Em caráter específico, importa registrar que, para as operações envolvendo a venda
de cigarros, a União Federal exerceu, primeiramente, a sua competência para instituir o im-
posto em comento por meio do disposto no artigo 4º do Decreto-Lei nº 1.593/77, segundo o
qual o “valor tributável, na saída do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial,
será obtido mediante aplicação de uma percentagem, fixada pelo Poder Executivo, sobre o
preço de venda no varejo”. Posteriormente, tal legislação foi alterada pela Lei nº 7.798/89,
cujos artigos 2º e 3º estabeleceram um mecanismo de tributação sobre o “preço normal da
operação de venda”, de acordo com critérios específicos.
2.3.4. A mera leitura dos artigos em comento não deixa espaço para dúvida de que essa
percentagem será aplicada sobre o “preço de venda no varejo”, ou “preço normal da opera-
ção de venda”. Ora, se o próprio legislador fala em “preço” e “venda”, é indubitável que ele
definiu o fato gerador do imposto como sendo o negócio jurídico por meio do qual seja trans-
ferida a propriedade do produto industrializado e seja fixado um valor de remuneração. In-
disputável, à vista disso, que o legislador não fixou como fato gerador do imposto em exa-
me qualquer outro fato que não tenha sido objeto de negócio jurídico ou de pagamento.
2.3.5. Tanto é assim, que o próprio Regulamento do IPI, de 1998, estabelece, no inciso
V do artigo 174, que “Será anulado, mediante estorno na escrita fiscal, o crédito do imposto
relativo a matérias-primas, produtos intermediários, material de embalagem e quaisquer
outros produtos que hajam sido furtados ou roubados...”, e, no artigo 284, que “Ressalvadas
as quebras apuradas pelos Auditores Fiscais e as faltas comprovadamente resultantes de furto,
roubo, incêndio ou avaria”, a diferença de estoque do tabaco em folha será considerada, nas
quantidades correspondentes, falta, como saída de produto beneficiado pelo estabelecimen-
to sem emissão de nota fiscal, ou excesso, como aquisição do tabaco em folha ao produtor
sem comprovação da origem. Esses dispositivos encontram-se previstos no atual Regulamen-
to do IPI, de 2002, nos artigos 193 e 306, respectivamente.
2.3.6. Ora, se o próprio Regulamento do imposto prevê que o crédito deverá ser estor-
nado quando houver roubo, e que as quebras decorrentes de roubo não serão consideradas
como vendas sem emissão de nota, é indiscutível que não surge o fato gerador quando o
produto for roubado antes da sua entrega ao destinatário. Entender que só o roubo ocorrido
antes da saída da mercadoria permitiria o estorno seria diferenciar os contribuintes em ra-
zão de um curioso critério de diferenciação, o momento do roubo, em vez de distingui-los
em razão da medida de comparação implicada pela regra de tributação, a atividade de in-
dustrialização, em patente violação ao princípio da igualdade.
2.3.7. Todas as reflexões anteriores, referentes ao plano legal, conduzem à incontrover-
sa conclusão de que a União Federal definiu, na lei, o fato gerador como sendo o momento
translativo da propriedade do produto industrializado. Da mesma forma que a Constituição
Federal e o Código Tributário Nacional, também a legislação aplicável não deixa qualquer
espaço para entender que as saídas físicas, sem transferência de propriedade destinada ao
consumo, teriam sido definidas como fato gerador do referido imposto. Compreender de
maneira diversa é infringir, patentemente, o disposto nos artigos 4º do Decreto-Lei nº 1.593/77,
2º, 3º e 14, II, da Lei nº 7.798/89.
2.3.8. Pois bem, se nem a Constituição Federal, nem o Código Tributário Nacional, nem
a legislação autorizam a tributação das meras saídas físicas de produtos industrializados do
estabelecimento, inquestionável que, nos casos de roubo de produtos após a sua saída do
estabelecimento, não há competência para a tributação, não há normas gerais permitindo o
exercício da tributação, nem há lei concretizando essa tributação. As razões são quase sin-
gelas: no caso de roubo, não se aperfeiçoa o negócio jurídico translativo da propriedade de
produto industrializado, a carga tributária agregada não pode ser transferida para o consu-
midor, e não há valor da operação.
2.3.9. Mas mesmo que assim não fosse, ainda assim nada seria devido, pois a Consti-
tuição Federal prevê, no inciso III do parágrafo 3º do artigo 153, que o imposto “não incidi-
rá sobre produtos industrializados destinados ao exterior”. Como há uma norma constitucio-
nal excludente de competência, tem-se é uma regra de imunidade que, como tal, não pode
ser ampliada nem restringida por obra do legislador infraconstitucional.
2.3.10. Ora, se a Constituição tornou imunes as operações que destinam produtos indus-
trializados para o exterior, se houvesse - o que se conjectura, apenas para argumentar - com-
petência para instituir o imposto inclusive sobre as saídas físicas de produtos, objeto de rou-
bo, em decorrência da regra de competência, ela não existiria quando esses produtos fossem
destinados ao exterior, em razão da regra de imunidade.
2.3.11. Registre-se que a Constituição em nenhum momento condiciona a imunidade ao
efetivo destino do produto ao exterior. Independente, porém, de saber se o direito à imuni-
dade só surge com o destino efetivo, é, no mínimo, contraditório entender, de um lado, que,
para verificar a competência tributária, é relevante a mera saída e irrelevante o efetivo desti-
no, mas para constatar a imunidade tributária, é irrelevante a mera saída e relevante o efeti-
vo destino. Essa compreensão, além de contraditória, é parcial, por valorizar um elemento
quando é para prejudicar, e desvalorizar o mesmo elemento quando é para favorecer.
2.3.12. Diante desse quadro, resta claro que, com relação a meras saídas de produtos
roubados, não há competência para tributar, não há normas gerais permitindo a tributação,
nem mesmo há legislação instituindo o imposto sobre produtos industrializados.
2.3.13. Para aceitar a cobrança do imposto sobre produtos industrializados sobre as meras
saídas de produtos roubados é preciso vencer uma verdadeira corrida de obstáculos. Primeiro,
é necessário interpretar, isoladamente, o inciso IV do artigo 153 da Constituição Federal, que
menciona “produtos industrializados”, sem atribuir, porém, qualquer importância nem ao
previsto no inciso II do parágrafo 3º do mesmo artigo, que faz referência à expressão “cada
operação”, e nem ao fixado nos artigos 5º e 145, que estabelecem os princípios da igualda-
de e da capacidade contributiva. Segundo, é indispensável interpretar, apartadamente, o dis-
posto no inciso II do artigo 46 do Código Tributário Nacional, que menciona a “saída dos
estabelecimentos”, sem, contudo, atribuir qualquer consideração ao disposto no inciso II do
artigo 47, que se refere ao “valor da operação”, e o previsto nos artigos 114 e 116, que con-
dicionam o surgimento da obrigação tributária à concretização dos requisitos de validade dos
negócios jurídicos. Terceiro, é ainda essencial interpretar, destacadamente, o disposto no
parágrafo 2º do artigo 2º da Lei nº 4.502/64, para o qual o fato gerador do imposto é a saída
do produto do estabelecimento, sem, todavia, atribuir qualquer relevância às modificações
trazidas pelos artigos 2º e 3º e pelo inciso II do artigo 14 da Lei nº 7.798/89, que se referem
ao “preço normal da operação de venda” e ao “valor total da operação”, ao disposto no arti-
go 4º do Decreto-Lei nº 1.593/77, que menciona o “preço total de venda” do produto, e ao
previsto nos artigos 193 e 303 do Regulamento do IPI/2002, que determinam o estorno das
operações em que haja roubo.
2.3.14. Em suma, para aceitar a cobrança do imposto sobre produtos industrializados
sobre as meras saídas de produtos roubados é preciso fazer uma interpretação deliberada-
mente fragmentada de alguns dispositivos legais, sem atenção para o sistema do qual eles
fazem parte e dentro do qual adquirem sentido normativo. É interpretar o Direito “em tiras”,
em suma.9 Com a permissão para o uso de uma ilustrativa metáfora já incorporada ao uso, a
interpretação que conduz à admissão da cobrança do imposto também nos casos em que o
produto é roubado, não somente olha para as árvores, sem considerar a floresta da qual elas
fazem parte, como ainda olha para as árvores erradas.
2.3.15. Mais, tal interpretação, além de desconsiderar os elementos jurídicos pertinen-
tes, ainda negligencia os pressupostos ontológicos sobre os quais esses mesmos elementos
se assentam. As normas jurídicas veiculam os modais deônticos relativos a condutas “obri-
gatórias, proibidas e permitidas”. Esses ditos “modais do dever ser”, contudo, só podem in-
cidir sobre o universo das condutas humanas possíveis onde reinem os denominados “mo-
dais do ser” referentes às condutas “possíveis”, nunca podendo verter nem sobre as condu-
tas impossíveis, nem sobre os comportamentos necessários.10 Tanto à norma que obrigasse
o indivíduo a tocar a lua com o dedo, quanto à norma que o proibisse de respirar faltariam
os pressupostos ontológicos para a operabilidade das normas jurídicas: a possibilidade de
observância e de inobservância pelos destinatários.
2.3.16. Pois bem, a interpretação que admite a instituição e cobrança do imposto sobre
produtos industrializados nos casos de produtos roubados não apenas flagrantemente ladeia
os numerosos limites constitucionais, gerais e legais antes mencionados, como, igualmente,
rodeia os pressupostos ontológicos para sua aplicação, colocando, par a par, o contribuinte
que concretiza, voluntariamente, um negócio jurídico bilateral de compra e venda, com o
contribuinte que, involuntariamente, tem frustrada, por ato ilícito, a sua vontade de finalizar
o negócio jurídico anteriormente celebrado.
2.3.17. Portanto, mais do que inválida, a referida interpretação é irrazoável, tanto por
deixar de atentar para a singularidade do caso concreto (razoabilidade-eqüidade), quanto por
desatentar para a realidade que as normas visam regular (razoabilidade-congruência).11

3. Conclusões
3.1. As considerações precedentes permitem chegar às seguintes conclusões:
1) O exame do plano constitucional evidencia que a União Federal só tem competên-
cia para tributar os negócios jurídicos translativos de propriedade de produtos indus-
trializados, indicativos de capacidade econômica e capazes de fazer com que o sujeito
passivo seja responsável pela carga tributária gerada na operação que deu causa e pos-
sa repassá-la ao consumidor, inexistindo, por conseqüência, poder para tributar meras
saídas físicas de produtos que não envolvam a transferência voluntária da proprieda-
de, que não sejam indicativas de capacidade econômica e que não permitam com que
o sujeito passivo possa transferir ônus tributário para o consumidor, sob pena de, as-
sim entendendo, haver violação manifesta do disposto nos artigos 5º, 145, 153, IV, e
parágrafo 3º da Constituição Federal.

9
GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. 5ª ed. São Paulo: Malheiros,
2009, p. 44.
10
VILANOVA, Lourival. As Estruturas Lógicas e o Sistema do Direito Positivo. São Paulo: RT, 1977, p. 33.
11
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, pp. 152 e 155.
2) A investigação do plano das normas gerais patenteia que a União Federal só pode
exercer a sua competência tributária definindo, na lei, o fato gerador como sendo o mo-
mento translativo da propriedade do produto industrializado, não havendo, por conse-
guinte, poder para a fixação das meras saídas físicas, que não envolvam transferência
de propriedade destinada ao consumo, como fato gerador do referido imposto, sob pena
de, assim interpretando, infringir-se o disposto nos artigos 46, II, 47, II, 114 e 116 do
Código Tributário Nacional.
3) A análise do plano legal demonstra que meras saídas físicas, que não envolvem trans-
ferência de propriedade destinada ao consumo, nem possuem valor, não são legalmente
tributadas, consubstanciando o entendimento contrário infração patente do disposto nos
artigos 2º, 3º, 14, II, da Lei nº 7.798/89 e 4º do anterior Decreto-Lei nº 1.593/77.
4) Como no caso de furto ou roubo de produto industrializado não se aperfeiçoa o ne-
gócio jurídico translativo da sua propriedade, não pode a carga tributária agregada ser
transferida para o consumidor, nem há propriamente um preço recebido em razão da
operação, é inválida, por inconstitucional e ilegal, a cobrança do imposto sobre pro-
dutos industrializados.
Este é meu parecer, s. m. j.
Processo Administrativo: Decisão que
anula Outra Anterior, com Base na
Lei Complementar - Irretroatividade
da Lei Ordinária
Ives Gandra da Silva Martins

Consulta
Formula-me, a empresa, por seus eminentes advogados Pio
Cervo e Vinicius Nadler Cervo, a consulta que se segue:
“A Consulente, originariamente uma sociedade civil, hoje denomi-
nada ‘sociedade simples’, com sede em Uruguaiana (RS), foi cons-
tituída em 1992 por sócios exclusivamente despachantes aduanei-
ros.
Amparada no § 4º do art. 31, do Código Tributário do Município
de Uruguaiana, promulgado pela Lei Municipal nº 2.413/93, de 20
de dezembro de 1993, e sendo uma sociedade civil constituída por
profissionais liberais, a empresa recolhia o ISSQN com base em
alíquota fixa, em guias que inclusive eram previamente submetidas
à seção de arrecadação da Prefeitura.
Entretanto, em 1999 a empresa sofreu autuação fiscal, onde lhe foi
lançado referido imposto com base na alíquota de 4% sobre seu
faturamento.
A exigência foi oportunamente impugnada. Posteriormente, a Lei
Municipal nº 3.023, de 13.12.2000, alterou o mencionado § 4º do
referido dispositivo, para acrescentar-lhe a expressão ‘conforme
classificados nos itens 1, 4, 8, 24, 88, 90, 91 e 92 do Anexo 1’, que
vinha a ser a antiga lista de serviços do DL nº 406/1968, onde não
constavam os despachantes aduaneiros.
No processo administrativo do contencioso fiscal municipal, o re-
curso voluntário do contribuinte foi provido pelo órgão de julga-
mento, que, no caso, era o senhor Prefeito Municipal. O fisco mu-
nicipal e o contribuinte foram notificados da decisão e os créditos
tributários foram baixados na dívida ativa. Dois anos depois, ao
argumento de que houve alteração na legislação tributária alteran-
do a alíquota do imposto em relação às atividades exercidas pelo
contribuinte, e, com apelo à predominância do interesse público
sobre o privado, o senhor Prefeito Municipal ‘revisou’ a decisão de
procedência do recurso voluntário e, com base nas Súmulas 346 e
473 do STF, deu efeito retroativo às normas da lei nova, e julgou
improcedente o recurso, aviventando os créditos tributários. Impe-
trado Mandado de Segurança, nas razões de decidir, o relator aco-
lheu o entendimento do Prefeito Municipal, mas, no ‘decisum’, in-
deferiu a ordem porque o direito líquido e certo não estava presen- Ives Gandra da
te a demandar dilação probatória. Apresentada exceção de pré-exe-
Silva Martins
cutividade (objeção à execução), foi ela sumariamente rejeitada,
nestes termos: é Professor Emérito
‘2. Quanto ao mérito da presente exceção de pré-executividade, da Universidade
convém salientar que o pedido de nulidade da decisão do Chefe Mackenzie, em cuja
do Poder Executivo Municipal, consistente na ‘revisão’ da de- Faculdade de Direito
cisão que extinguiu o crédito tributário em comento, já foi ob- foi Professor Titular de
jeto de decisão transitada em julgado nos autos do Mandado de Direito Constitucional.
Segurança proposto pela ora excipiente, cujo trâmite deu-se perante o juízo da 3ª Vara Cível
desta Comarca, cuja ementa do acórdão segue transcrita para o fim de refutar-se a presente
exceção, ‘verbis’:
Apelação Cível. Mandado de Segurança. ISS. Ato do Prefeito Municipal que reconsiderou
Decisão Anterior Lançada em Recurso Administrativo Fiscal. 1. Desde que ainda não decor-
rido o prazo decadencial, nada obsta ao Administrador Público, com base no princípio da
legalidade estrita, reconsiderar seu próprio ato (CF, art. 37, ‘caput’; STF, Súmula 473). 2. Não-
demonstração de existência de direito líquido e certo. Questões que demandam dilação pro-
batória. 3. Apelação desprovida.’ (Apelação Cível nº 70014292106, Primeira Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, julgado em 13.12.2006 - grifei)
Apesar de o Mandado de Segurança configurar via estreita de cognição em que se refutou
unicamente a existência de direito líquido e certo do então impetrante, e não se declarou a
ausência de seu direito, a verdade é que os argumentos, aqui, se repetem, no sentido de que
ao Administrador Público é dado reformar seus próprios atos quando elevados de vícios que
os tornem ilegais, havendo, como única barreira, o prazo decadencial.
No caso em comento, não se cogita do decurso do apontado prazo e, ainda, enfatiza-se a pos-
sibilidade de revisão, de forma que não há nulidade alguma na decisão que, revisando deci-
são proferida em processo administrativo, reconheceu sua nulidade e, portanto, elidiu a nela
declarada extinção do crédito tributário.
Nesse sentido, excertos do acórdão mencionado:
‘É que o administrador público está jungido ao princípio da legalidade estrita, hoje expres-
samente previsto no ‘caput’ do art. 37 da CF. Assim sendo, pode, e até deve, sem que seja
provocado, revisar seus próprios atos, quando entendê-los em desacordo com a lei a única
barreira é o prazo decadencial.
Diga-se de passagem, a autoridade coatora invocou a Súmula 473 do STF (fls. 24 6-8), a qual
diz o seguinte: A administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que
os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de con-
veniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os ca-
sos, a apreciação judicial.
Ora, se o Administrador Público pode anular os próprios atos, quando entendê-los eivados
de vícios que os tornam ilegais, não se pode entender que o exercício desse poder-dever vio-
le direito líquido e certo.’
Assim, em não havendo nulidade na decisão que revisou a decisão extintiva do crédito tribu-
tário e que, pois, culminou na CDA que ora se executa, a exceção merece ser de plano recha-
çada.
Do exposto, julgo improcedente a exceção de pré-executividade.
2. Considerando que não se trata de incidente que implique suspensão do processo executi-
vo, foi deferido o pedido de penhora ‘on line’, no entanto, os valores encontrados são infe-
riores ao crédito executado, conforme documentos que seguem e que servem de termo de pe-
nhora (...) Intimem- se.’
O agravo de instrumento, tempestivamente apresentado, não mereceu antecipação da pretensão
recursal com o singelo despacho de que, ‘pela mesma fundamentação do juízo agravado, não
lhe deu efeito suspensivo’. O agravo regimental não foi conhecido ao argumento da E. 1ª T. do
TJRS de que incabível qualquer recurso contra decisão que concede ou indefere efeito suspen-
sivo ou antecipatório de tutela em agravo de instrumento.
Quesitos:
1. Mesmo considerando a ‘lista de serviços’ do DL nº 406/1968 como ‘numerus clausus’, esta-
va facultado - segundo a legislação vigente à época - à Prefeitura Municipal de Uruguaiana es-
tender a tributação ‘privilegiada’ a todas as sociedades civis de profissionais liberais, como fa-
zia seu Código Tributário? No caso de ter estendido, por lei municipal, a alteração posterior pode
ser considerada como modificação dos critérios jurídicos do lançamento, nos termos do art. 146
do CTN?
2. O mandado de segurança que não apreciou o mérito nele posto, ao argumento de não ter sido
comprovado o direito líquido e certo impede a renovação da alegação do contribuinte em obje-
ção à execução ou em embargos à execução fiscal?
3. A jurisprudência do STF que admite a revisão dos atos administrativos se aplica, ou não, às
decisões proferidas dentro do processo do contencioso fiscal, especialmente quando não há pre-
visão dessa revisão superior no próprio procedimento do contencioso?
4. É possível dar efeito retroativo à norma de lei nova tributária que altera a alíquota e a base de
cálculo de imposto (ISSQN) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da sua vi-
gência, mesmo ao argumento de que a lei posterior, por mais benéfica ao erário municipal, deva
ser aplicada pelo princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, como alegado
na revisão da decisão proferida em segundo grau no contencioso fiscal, envolvendo as leis mu-
nicipais de Uruguaiana, RS, de nº 2.413/1993; nº 3.023/2000 e nº 3.313/2003?
5. A decisão de segundo grau, transitada em julgado, com ciência de ambas as partes, com bai-
xa na dívida ativa, no processo administrativo do contencioso fiscal e favorável ao contribuinte
é definitiva, no sentido de extinguir o crédito tributário ali discutido e gera direito ao contribuinte
de alegar essa extinção?
6. A norma municipal (Lei 2.413/93) que concedia tributação minorada do ISSQN a todas as
sociedades civis prestadoras de serviço em amplitude maior que aquela prevista na legislação
nacional vigorante à época (DL 406/68 e tabela anexa) pode ser afastada para aplicar diretamente
sobre a prestadora de serviços a norma tributária nacional? Ou, de outra forma, é possível exi-
gir ISSQN de prestadora de serviços com fulcro no DL 406/68 e tabela anexa e na CF 88, sem
a existência de lei municipal específica do tributo ou contra ela?
7. A ciência do cumprimento da ordem de bloqueio de valores em conta corrente ou de investi-
mentos financeiros do executado tem valor de termo de penhora para efeitos de início do prazo
de embargos, execução fiscal ou necessidade de lavratura de termo específico de penhora com a
formal intimação do representante da executada?”

Resposta
A primeira questão envolve duas indagações, a saber: o poder de legislar dos Municí-
pios em face dos limites estabelecidos pelas normas gerais do CTN e a aplicabilidade do ar-
tigo 146 daquela Lei com eficácia de complementar, no caso de alteração de critérios jurídi-
cos, em relação a um mesmo contribuinte1.
A primeira dessas questões diz respeito à força cogente da lei complementar.
Como determina a Constituição - e já o fazia à luz do texto anterior - a lei complemen-
tar objetiva apenas explicitar o texto constitucional, que, em matéria tributária, apenas defi-
ne competências dos entes tributantes e o regime jurídico do sistema.
Há dois tipos de leis complementares tributárias. Aquelas auto-aplicáveis, que instituem
tributo, como a que impõe um empréstimo compulsório, e aquelas outras que definem nor-
mas gerais, dependendo, portanto, neste caso, a criação do tributo da legislação ordinária2.
O Decreto-lei nº 406/68, por força do princípio de recepção em Direito Constitucional,
ganhou eficácia de lei complementar, pois, à época de sua edição, estando o Congresso Na-

1
Luciano da Silva Amaro lembra que: “É correta a conclusão a que chegou a doutrina pátria, no sentido que o CTN
vigora plenamente após a Constituição de 1967, e tem eficácia de lei complementar.” (Direito Tributário 5, Comen-
tários ao Código Tributário Nacional, vol. 3, coordenação minha com Hamilton Dias de Souza e Henry Tilbery, São
Paulo: José Bushatsky, 1977, p. 287)
2
Escrevi: “Em direito tributário, como, de resto, na grande maioria das hipóteses em que a lei complementar é exigida
pela Constituição, tal veículo legislativo é explicitador da Carta Magna. Não inova, porque senão seria inconstitu-
cional, mas complementa, tornando clara a intenção do constituinte, assim como o produto de seu trabalho, que é o
princípio plasmado no Texto Supremo.
É, portanto, a lei complementar norma de integração entre os princípios gerais da Constituição e os comandos de apli-
cação da legislação ordinária, razão pela qual, na hierarquia das leis, posta-se acima destes e abaixo daqueles. Nada
obstante alguns autores entendam que tenha campo próprio de atuação - no que têm razão -, tal esfera própria de atua-
ção não pode, à evidência, nivelar-se àquela outra pertinente à legislação ordinária. A lei complementar é superior à
lei ordinária, servindo de teto naquilo que é de sua particular área mandamental.” (O Sistema Tributário na Consti-
tuição, 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 123/125)
cional fechado, os decretos-leis tanto veiculavam matérias próprias de legislação ordinária
quanto de legislação complementar. É, todavia, materialmente, um diploma legal comple-
mentar, porque veio estabelecer normas gerais para o ISS, mas não é auto-aplicável, caben-
do a cada município a instituição de tributos, mediante lei ordinária.
No caso especificado pela consulente, a Lei Municipal nº 2.413/93, implementadora do
ISS no Município de Uruguaiana, dispôs, em seu artigo 31:
“Art. 31 (...)
§ 4º As sociedades civis constituídas exclusivamente por profissionais liberais, terão seu imposto
calculado com base na alíquota de 250% da UPRM, multiplicada pelo número de profissionais
habilitados que sejam sócios, empregados ou não, mas que prestem serviço em nome da socie-
dade.”
Como se vê, a lei ordinária estabeleceu que, no concernente às categorias de profissio-
nais liberais, todas elas poderiam pagar o ISS calculado com base em alíquotas fixas. Não
as discriminou, dispondo que todas as sociedades de profissionais prestadores de serviços
pessoais estariam sujeitas a esse regime.
Ao tempo em que essa Lei foi editada, o DL nº 406/68 vigorava com a redação da Lei
Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987. Embora o diploma não incluísse a ativi-
dade exercida pela Consulente entre aquelas em que a tributação deveria seguir o mesmo
regime - alíquotas fixas - quer prestados quando por sociedades, quer sob a forma de traba-
lho pessoal do próprio contribuinte, na verdade não vedava expressamente que o legislador
adotasse essa prática com relação a outras atividades. Por essa razão, a Lei nº 2.413/93 as-
sim dispôs.
A limitação desse regime a determinadas categorias profissionais só veio a ocorrer, no
âmbito da legislação municipal, quando a Lei nº 3.023/2000, modificando a legislação an-
terior, definiu claramente que as categorias mencionadas no DL nº 406/68 - posteriormente
complementado pelo DL nº 834/69 e pelas Leis Complementares nos 56/87 e 116/2003 -
seriam as únicas a estar sujeitas às alíquotas fixas3.
Ora, tal Lei modificadora da anterior, à evidência, não pode retroagir, por força do arti-
go 150, inciso III, letra “a”, da Constituição Federal, assim redigido:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver insti-
tuído ou aumentado; (...).”
Não há, por outro lado, qualquer nulidade na decisão administrativa mencionada na
consulta, considerando legítima a legislação anterior, que submetia a sociedade consulente
ao recolhimento do ISS com base em alíquotas fixas. É que a ilegalidade da Lei nº 2.413/93
leva a uma situação bem mais desfavorável ao Município, pois impõe concluir pela não-in-
cidência do imposto no período então analisado, por falta e um dos elementos essenciais para
conformar a obrigação tributária, que é a alíquota.
À luz do Direito Tributário, a teor do que estabelece o artigo 97 do CTN, a Lei deve
definir, por inteiro, todos os elementos que conformam as hipóteses de imposição4. Vale di-

3
As categorias mencionadas na nova Lei foram apenas as dos itens 1, 4, 8, 24, 88, 90, 91, 92 correspondente ao DL nº
406/68, o que vale dizer com exclusão das atividades da empresa consulente constituída de profissionais liberais
dedicados ao despacho aduaneiro.
4
Reza o artigo 97 do CTN: “Art. 97. A falta ou insuficiência de pagamento do imposto de renda e da contribuição
social sobre o lucro está sujeita aos acréscimos legais previstos na legislação tributária federal.
Parágrafo único: No caso de lançamento de ofício, no decorrer do ano-calendário, será observada a forma de apura-
ção da base de cálculo do imposto adotada pela pessoa jurídica.”
zer, o que na lei não estiver, não pode ser exigido. Assim, se anteriormente à Lei nº 3.023/2000,
a tributação com base em alíquotas fixas nos moldes previstos na Lei nº 2.413/93 for consi-
derada ilegal por violar o DL nº 406/68, então, durante toda a vigência desse diploma muni-
cipal não houve a incidência do ISS, por falta do elemento quantitativo - alíquota - da hipó-
tese de incidência.
Por outro lado, não pode a Administração Municipal dar aplicação retroativa à Lei nº
3.023/2000 para fazer com que alcance fatos geradores ocorridos anteriormente à sua pro-
mulgação, porque a hipótese de imposição, tal como nela conformada, não havia no passa-
do, além do impedimento representado pelo artigo 150, III, “a”, da CF.
Considerando que o DL nº 408/68 com as alterações da legislação posterior, não auto-
rizava a Lei Ordinária nº 2.413/93 a estabelecer alíquotas fixas para a atividade da consu-
lente, o contribuinte que recolheu o ISS com base nesse regime o terá feito indevidamente,
pois não estava obrigado a submeter-se a essa imposição, por ilegal, nem à incidência sob
outro regime (alíquota variável), por inexistir tal previsão na lei ordinária. Sendo leis de
diretrizes tributárias, as leis complementares de normas gerais não são auto-aplicáveis5.
O caso da consulente, a meu ver, situa-se, portanto, em dois planos distintos. Se a Lei
nº 2.413/93, ao estender para todas as sociedades de prestação de serviços o regime de alí-
quotas fixas, agiu contra o Decreto-lei nº 406/68, recolheu o tributo indevidamente; por outro
lado, como, ao prever a alíquota fixa, o diploma municipal deixou de definir alíquotas espe-
cíficas e forma de calcular o tributo devido pelas empresas prestadoras de serviço não en-
quadradas nas hipóteses do DL nº 406/68 - o que só veio a ocorrer em 2000 e 2003, com a
promulgação das Leis nos 3.023 e 3.313 - também recolheu indevidamente, pois faltaram à
norma elementos essenciais para criar validamente a incidência.
Assim, a Municipalidade,
1) ao cobrar tributo por alíquota fixa que não poderia cobrar, deveria devolver o tribu-
to arrecadado;
e
2) não poderia cobrar o tributo, no período, por alíquotas variáveis de acordo com o
valor de prestação de serviços, por não haver previsão legal na legislação ordinária
instituidora do imposto no seu território - já que a lei complementar, ao estabelecer
normas gerais, não obriga o poder tributante a criar o tributo, cujos contornos explici-
ta6.

5
Juan José Soler escreve sobre o princípio da irretroatividade: “I. El principio de la irretroactividad. La irretroactivi-
dad de la ley es una medida técnica escogitada para dar seguridad al ordenamiento jurídico. Su zona ontológica no
está, pues, en la filosofía jurídica sino en la jurisprudencia o ciencia del Derecho.
Las disquisiciones de los canonistas, que consideraban la irretroactividad como de Derecho divino y a la retroactivi-
dad de Derecho humano, así como las de los jusnaturalistas, que entendian que la irretroactividad es de Derecho na-
tural y la retroactividad de Derecho positivo, están hoy superadas. Se acepta, unánimemente, que la irretroactividad
no es uno de los llamados principios generales del Derecho, un prius del ordenamiento jurídico, sino un posterius
encaminado a evitar los trastornos económicos y sociales emergentes de toda regresión al pasado.
La irretroactividad es, dentro de la técnica jurídica, un principio de aplicación más que de interpretación de la ley,
por lo mismo que no busca desentrañar el sentido de la ley sino medir sus efectos en el tiempo. Pero no hay aplica-
ción sin interpretación previa. La interpretación y la aplicación son operaciones de tracto sucesivo.” (Enciclopédia
Jurídica Omeba, vol. 14, p. 881)
6
Hamilton Dias de Souza e eu, inclusive, na Constituição defendemos a necessidade de lei complementar prévia para
introdução no sistema de qualquer tributo, cuja vinculação, à evidência, far-se-ia por lei ordinária. Escrevi: “Nos
debates com constituintes e nos contactos não só com os membros da Comissão, mas também com o denominado
grupo ‘Centrão’, que pediu a Hamilton Dias de Souza e a mim a preparação de um anteprojeto articulado, concorda-
ram conosco e colocaram, por decorrência, no Texto o princípio de que nenhum tributo, qualquer que fosse a sua
espécie, poderia ingressar no cenário jurídico sem que houvesse, antes, sua definição em lei complementar.
Lembro-me, quando de minha audiência pública na Constituinte em 1987, que o presi-
dente Dornelles, da Subcomissão de Tributo, indagou-me a razão pela qual tão poucos mu-
nicípios cobravam o ISS. Respondi que isso se devia à complexidade do tributo, que torna-
va, para os pequenos municípios, mais onerosa a cobrança que a arrecadação. E os Decre-
tos-lei nos 406/68 e 834/68 já dispunham, à época, das normas gerais daquele imposto (1987).
Ora, na hipótese, como não houve, na legislação municipal, menção às alíquotas variá-
veis para as sociedades de prestação de serviços, nitidamente, tornou-se não-incidível o tri-
buto para tais empresas. Apenas em 2000 e 2003, ou seja, muito além do período objeto da
consulta (1994-1999), o tributo passou a ser perfeitamente regulado e exigível, no Municí-
pio de Uruguaiana.
Antes disso, configura-se típico caso de não-incidência, pois, se a hipótese não estava
prevista na lei complementar e não poderia ser exigida no regime jurídico adotado pela lei
ordinária, a hipótese não foi regularmente criada; por outro lado, essa falha não pode ser
suprida pela legislação posterior, à qual a Constituição veda efeitos retroativos.
À primeira sub-questão respondo, pois, que:
a) não podem as Leis nos 3.023/2000 e 3.313/2003 gerar efeitos retroativos, por veda-
ção da CF e da Lei Complementar;
b) poderia a consulente, dentro do lapso prescricional, ter pedido de volta o que pagou,
incorretamente, por ter a lei municipal exigido hipótese não prevista no DL nº 406/68;
c) o fato de não ter definido o regime jurídico correto para todas as sociedades presta-
doras de serviço pessoal não mencionadas no DL nº 406/68, leva a nítido caso “de não
Incidência Tributária”, caso se repute ilegal a Lei nº 2.413/937.
Passo, agora, a responder a segunda parte da primeira questão.
Reza o artigo 146 do CTN que:
“Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa
ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lan-
çamento, somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato
gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.”8
O artigo merece ser examinado por dois prismas.
O primeiro diz respeito ao perfil jurídico próprio da imposição tributária.
É certo que o ato administrativo nulo, eivado de ilegalidade, pode ser revisto. No direi-
to administrativo, se a Administração atribui a determinada norma legal interpretação que
depois se revela inconsistente, poderá rever o seu ato, e adotar outra interpretação mais con-
sentânea com o conteúdo legal. Aquilo que a Administração Pública anteriormente consi-
derava legal, pode revelar-se ilegal. É bem verdade que o ato administrativo goza de pre-
sunção de legalidade até ser considerado ilegal pela própria Administração ou pelo Poder

A letra a, portanto, diz que a lei complementar cuidará: da definição dos tributos e suas espécies, mas em relação aos
impostos, além da definição, faz menção à necessidade de previsão dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo
e contribuintes. À evidência, dever-se-ia falar em ‘tributo’ e não ‘tributos’, posto que o tributo é gênero do qual pen-
dem as cinco espécies tributárias hospedadas pelo sistema.” (O Sistema Tributário na Constituição, 7ª ed., São Pau-
lo: Saraiva, 2007, pp. 140/1)
7
A Súmula nº 473 do STF assim redigida: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios
que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportu-
nidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”, não é aplicável à
hipótese pela inexistência de qualquer ato nulo.
8
Américo Masset Lacombe comenta-o: “Confirma este artigo o princípio geral da imutabilidade do lançamento. Se
houver mudança na valoração jurídica dos dados ou elementos de fato que informam a autoridade administrativa no
exercício da atividade do lançamento, tal mudança só poderá ser considerada quanto a fatos geradores ocorridos após
a introdução dessa modificação.” (Comentários ao Código Tributário Nacional, vol. 2, 5ª ed., São Paulo: Saraiva,
2008, p. 317)
Judiciário, o que significa, em outras palavras, que aquilo que era tido por legal, passa a ser
ilegal e considera-se nulo o ato expedido à luz da pretérita exegese, por contrário à lei9.
O que não tem sido objeto de exame acurado pela doutrina e pela Administração Públi-
ca, nas diversas esferas e até mesmo, algumas vezes, pelo Poder Judiciário, é o conteúdo do
artigo 146 e seus efeitos, para o Direito Tributário10.
Ao declarar, o legislador complementar, que:
“A modificação introduzida de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial,
nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento so-
mente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorri-
do posteriormente à sua introdução.”
Deixa claro que o Direito Tributário tem forma de enfrentar a questão da ilegalidade
diversa do Direito Administrativo, objetivando garantir a segurança jurídica, como determi-
na a Constituição, no “caput” do artigo 5º, que torna este direito inviolável11.
Em termos diversos: se houver alteração da exegese oficial e o que era legal no passa-
do, passa a ser ilegal no presente, para o mesmo contribuinte e em relação ao mesmo fato
gerador, a Administração não poderá adotar a nova inteligência. Tal exegese valerá apenas
para o futuro e não para o passado12.
Antecipou o legislador do CTN a adoção de um critério, ou mesmo um princípio, que
veio a ser abraçado nas Leis nos 9.868/99 e 9.882/99 - esta última contou com a participa-

9
A Lei Federal nº 9.784/99, que regula o processo administrativo, estabelece que esse direito não é ilimitado, como se
vê de seu artigo 54, “verbis”: “Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decor-
ram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo
comprovada má-fé. § 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção
do primeiro pagamento. § 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administra-
tiva que importe impugnação à validade do ato.”
10
Zuudi Sakakihara ensina: “No entanto, se o crédito tributário já tiver sido constituído segundo os critérios anterior-
mente adotados, ter-se-á uma situação jurídica consolidada, cuja estabilidade deve ser preservada e, por isso, impe-
de a aplicação retroativa do novo entendimento.
É por isso que este art. 146, ao dispor que a modificação introduzida nos critérios jurídicos adotados no exercício do
lançamento só pode ser efetivada quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução, traz a regra implí-
cita da irretroatividade da nova interpretação decorrente da modificação dos mencionados critérios, apenas em rela-
ção a um mesmo sujeito passivo, querendo dizer que, se o crédito tributário referente a um sujeito passivo já foi cons-
tituído pelo lançamento, de acordo com determinados critérios, a modificação destes não mais poderá afetar a situa-
ção jurídica que se criou para esse mesmo sujeito passivo.” (Código Tributário Nacional Comentado, coordenador
Vladimir Passos de Freitas, São Paulo: RT, 1999, p. 574)
11
O “caput” do artigo 5º está assim redigido: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, ga-
rantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igual-
dade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)”, tendo merecido o princípio da segurança de Cretella
o seguinte comentário: “Comentamos, neste livro, o ideal dos constituintes, expresso no Preâmbulo, de ‘assegurar o
exercício dos direitos, sociais e individuais, como a segurança’, repetindo-se, agora, no art. 6º, que ‘a Constituição
assegura a inviolabilidade dos direitos concernentes à segurança’. Nos dois passos da Constituição, podemos obser-
var os vocábulos ‘assegurar a segurança’, o que reflete a falta de cuidado com a linguagem e o estilo do diploma mais
importante e significativo da Nação Brasileira. Garantir a segurança é, de fato, garantir o exercício das demais li-
berdades, porque a vis inquietativa impede o homem de agir.” (Comentários à Constituição 1988, vol. I, Rio de Ja-
neiro: Forense Universitária, 1989, p. 185 - grifos meus)
12
Neste sentido, leia-se acórdão do STJ: “ICMS - Armazéns Gerais. 1. Os armazéns gerais, por serem estabelecimen-
tos destinados, unicamente, a receberem como fiéis depositários mercadorias de terceiros, são neutros em relação aos
fenômenos tributários decorrentes do ICMS. 2. Precedente da 1ª Turma: REsp 239.360, Paraná, Rel. Min. Garcia
Vieira. 3. No caso, há, também, de se aplicar a regra do art. 146, do CTN, em face de consulta respondida pelo Fisco
sobre o assunto, na linha da pretensão da recorrente. 4. Recurso provido para afastar a obrigação da recorrente, ar-
mazém geral, de recolher diferença de alíquota de ICMS que lhe está sendo cobrada, em face da empresa depositante
ter comercializado a mercadoria depositada para o Estado de São Paulo, onde a alíquota é maior do que a praticada
pelo Estado onde a vendedora está situada.” (REsp nº 278.178/SP, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, j. 28.11.2000, DJ
01.04.2002, p. 170)
ção, na sua redação, do autor do presente parecer -, ao determinarem, em seus artigos 27 e
11, respectivamente, que:
“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões
de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal,
por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir
que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a
ser fixado.”

“Art. 11. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no processo de argüição


de descumprimento de preceito fundamental, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou
de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços
de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia
a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.”13
É o que se lê, por exemplo, no Acórdão nº 14-5697 de 5 de julho de 2004, decisão trans-
crita:
“Ministério da Fazenda - Secretaria da Receita Federal - Delegacia da Receita Federal de Julga-
mento em Ribeirão Preto.
Acórdão nº 14-5697, de 05 de Julho de 2004.
Assunto: Processo Administrativo Fiscal
Ementa: Exclusão do Simples. Coisa Julgada Administrativa. Sob pena de ofensa à coisa jul-
gada administrativa, não pode a autoridade julgadora reapreciar questão relativa à exclusão
do Simples, em razão da sua definitividade na esfera administrativa (grifos meus).
Data do fato gerador: 31/01/1999, 28/02/1999, 31/03/1999, 30/04/1999, 31/05/1999, 30/06/1999,
31/07/1999, 31/08/1999, 30/09/1999, 31/10/1999, 30/11/1999, 31/12/1999, 31/01/2000, 29/02/2000,
31/03/2000, 30/04/2000, 31/05/2000, 30/06/2000, 31/07/2000, 31/08/2000, 30/09/2000, 31/10/2000,
30/11/2000, 31/12/2000.”14
No caso da consulente, a questão é mais grave, pois somente em 2000 e 2003 a legisla-
ção ordinária determinou a mudança de critério para limitar a imposição de alíquotas fixas
para o cálculo do tributo devido pelas empresas de serviço nela mencionadas.
Como já disse na resposta a primeira parte da primeira questão, o fato de a hipótese de
imposição, nos termos da legislação complementar, só ter sido definida pela Lei de 2000,

13
Gilmar Mendes assim explica o artigo 27: “Nos termos do art. 27 da Lei n. 9.868/99, o STF poderá proferir, em tese,
tanto quanto já se pode vislumbrar, uma das seguintes decisões:
a) declarar a inconstitucionalidade apenas a partir do trânsito em julgado da decisão (declaração de inconstituciona-
lidade ‘ex nunc’), com ou sem repristinação da lei anterior;
b) declarar a inconstitucionalidade com a suspensão dos efeitos por algum tempo a ser fixado na sentença (declara-
ção de inconstitucionalidade com efeito pro futuro), com ou sem repristinação da lei anterior;
c) declarar a inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade, permitindo que se opere a suspensão de aplicação
da lei e dos processos em curso até que o legislador, dentro de prazo razoável, venha a se manifestar sobre a situação
inconstitucional (declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia da nulidade = restrição de efeitos); e, eventual-
mente,
d) declarar a inconstitucionalidade dotada de efeito retroativo, com a preservação de determinadas situações.
Assim, tendo em vista razões de segurança jurídica, o Tribunal poderá afirmar a inconstitucionalidade com eficácia
‘ex nunc’. Nessa hipótese, a decisão de inconstitucionalidade eliminará a lei do ordenamento jurídico a partir do trân-
sito em julgado da decisão (cessação da ultra-atividade da lei) (hipótese ‘a’).
Outra hipótese (hipótese ‘b’) expressamente prevista no art. 27 diz respeito à declaração de inconstitucionalidade com
eficácia a partir de um dado momento no futuro (declaração de inconstitucionalidade com efeito pro futuro). Nesse
caso a lei reconhecida como inconstitucional, tendo em vista fortes razões de segurança jurídica ou de interesse so-
cial, continuará a ser aplicada dentro do prazo fixado pelo Tribunal. A eliminação da lei declarada inconstitucional
do ordenamento submete-se a um termo pré-fixo. Considerando que o legislador não fixou o limite temporal para a
aplicação excepcional da lei inconstitucional, caberá ao próprio Tribunal essa definição.” (Controle Concentrado de
Constitucionalidade, 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 565/566)
14
Ementário DRJ, Receita Federal.
representou, a meu ver, um não exercício do direito de exigir o tributo antes de seu advento,
pois:
a) a lei instituidora do tributo não obrigava as sociedades de prestação de serviços pro-
fissionais não mencionadas no DL nº 406/68, a recolhê-lo com base em alíquotas vin-
culadas à movimentação;
b) à falta de descrição de todos os elementos essenciais ao surgimento da obrigação
tributária, a consulente não deveria ter recolhido o tributo com base em alíquotas fixas.
Assim, se não tivesse prescrito seu direito, poderia a Consulente - e todas as sociedades
não especificadas no DL nº 406/68 às quais foi aplicado o regime - repetir o indébito, pois
pagaram por um tributo que não foi regularmente instituído15.
Desta forma, respondo, positivamente, a questão. O artigo 146 determina que, qualquer
modificação de critério exegético, vale dizer, qualquer nova interpretação que torna ilegal a
interpretação que antes era considerada legal, só poderá ser aplicado para o futuro em rela-
ção ao mesmo contribuinte e aos mesmos fatos geradores apurados no procedimento fiscal
de lançamento.
No caso concreto, inclusive, a revisão da decisão administrativa, no processo lançamento
transitado em julgado, não poderia ser aplicada a fatos passados. É de se ressaltar que, no
caso da atividade da consulente, os novos critérios só foram introduzidos na legislação, a
partir de 2000. Ora, a legislação posterior não pode ser aplicada a fatos geradores pretéri-
tos, risco de ferir-se gravemente o disposto no artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição
Federal, assim redigido:
“XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
(...).”16
A decisão administrativa que anulou, com base em Lei posterior, a decisão administra-
tiva anterior, transitada em julgado e lastreada na Lei nº 2.413/93, é manifestamente ilegal e
inconstitucional, ferindo, inclusive, a meu ver, o princípio da moralidade pública (artigo 37
“caput” da CF)17.
Passo, agora, à segunda questão.
Se o mandado de segurança não julgara o mérito da impetração, todas as vias proces-
suais ordinárias permanecem abertas. É pacífica a jurisprudência a respeito e decorre da pró-
pria natureza do remédio heróico.

15
A Súmula Vinculante nº 8 do STF está assim redigida: “São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do De-
creto-lei 1.569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário.”
16
Celso Bastos lembra que: “Nossa Lei Maior, ao contrário do que muitas vezes somos levados a crer, não consagra o
princípio da irretroatividade, nem de forma implícita, nem explícita. Poder-se-ia dizer que esse princípio transcende
o direito posto para fazer parte dos princípios gerais de direito. Não cremos, contudo, que haja necessidade de apelar
para um aprofundamento do tema por esse caminho. Isso porque a Constituição não é omissa ou lacunosa na maté-
ria. Ela simplesmente preferiu outra modalidade de proteção das situações pretéritas, que nos parece de alcance téc-
nico muito mais alto.” (Comentários à Constituição do Brasil, 2º vol., São Paulo: Saraiva, p. 209)
17
Hely Lopes Meirelles lembra que: “A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de
todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, “caput”). Não se trata - diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito
- da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como ‘o conjunto de regras de conduta tiradas da dis-
ciplina interior da Administração’. Desenvolvendo sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrati-
vo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do
desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente
entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também
entre o honesto e o desonesto. Por considerações de Direito e de Moral, o ato administrativo não terá que obedecer
somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, confor-
me já proclamavam os romanos: ‘non omne quod licet honestum est’. A moral comum, remata Hauriou, é imposta
ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao agente público para sua conduta interna,
segundo as exigências da instituição a que serve e a finalidade de sua ação: o bem comum.” (Direito Administrativo
Brasileiro, 21ª ed., São Paulo: Malheiros, 1990, p. 83)
O mandado de segurança, assim como o “habeas corpus”, são instrumentos processuais
e garantias constitucionais da maior relevância no direito, pois objetivam dar imediata pro-
teção judicial a quem tenha sua liberdade ou direito líquido e certo postos em risco.
São, como o denominam os processualistas, remédios heróicos. O pedido de liminar
decorre da urgência na proteção plasmada na Constituição por violação do direito de ir e vir
ou do direito líquido e certo.
O mandado de segurança, inclusive, não tem fase probatória. O direito líquido e certo a
ser protegido há de ser demonstrado, de imediato e por inteiro, ou seja, gerando no julgador
a convicção, de um lado, da relevância da pretensão (“fumus bonni iuris”), e, de outro lado,
da urgência de sua concessão (“periculum in mora”), conformando para a concessão da li-
minar, a convicção de que a falta do provimento pode acarretar prejuízos ao direito questio-
nado ou até seu perecimento18.
Ora, não havendo fase probatória, uma vez prestadas as informações sobre seu procedi-
mento pela autoridade impetrada e ouvido o Ministério Público, já está preparado o magis-
trado para decidir.
E decidirá, à luz de sua convicção, podendo adotar um de dois critérios, a saber:
a) entender que a matéria de direito e de fato é suficientemente clara, independente-
mente de qualquer outra prova, concedendo ou não a ordem;
e
b) entender que não há direito líquido e certo porque os fatos não estão devidamente
provados, deixando de julgar o mérito da questão e indeferindo a ordem por carência
da ação.
Nesta hipótese, à evidência, todas as vias ordinárias processuais restam abertas, poden-
do a questão ser, por outros instrumentos processuais, levada à apreciação do Poder Judi-
ciário.
É o que decorre da Súmula nº 304 do STF:
“Decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetran-
te, não impede o uso da ação própria.”19
No caso concreto, à evidência, as vias processuais ordinárias foram preservadas, pois a
decisão judicial concluiu pela ausência de direito líquido e certo.

18
Alfredo Buzaid lembra que: “A ação de mandado de segurança se distingue das duas precedentes. Tem por pressu-
posto não um título líquido e certo senão um direito líquido e certo. A sua apreciação é feita em um tipo de processo
mais abreviado, porque independe de prova testemunhal ou pericial. O mandado de segurança tem forma e figura de
juízo. A circunstância de não admitir a produção de prova testemunhal ou pericial não lhe tira o caráter de processo
contencioso; ele se constitui pelo pedido do impetrante, desenvolve-se com a audiência da autoridade coatora e ter-
mina pela sentença judicial. Tratando-se de processo preordenado à tutela de determinada categoria de direitos, se o
juiz verificar que não estão preenchidos os pressupostos de sua procedência, dirá simplesmente ‘non liquet’, sem en-
trar no mérito. A nota marcante do instituto não está propriamente na inexistência de discussão em torno do direito
afirmado pelo impetrante, mas na existência de um direito líquido e certo insuscetível de discussão judicial.” (Do
Mandado de Segurança, vol. I, São Paulo: Saraiva, 1989, São Paulo, p. 83)
19
“O Min. Luiz Gallotti dá as dimensões desse enunciado: “A ação ordinária cabe ao impetrante do mandado de segu-
rança, quando este é denegado, por não lhe reconhecer direito líquido e certo; não, porém, se o julgado conclui pela
inexistência do direito reclamado, como na espécie ocorreu.
Esse o verdadeiro sentido da Súmula 304, como se depreende dos seus termos: ‘Decisão denegatória de mandado de
segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria’.
Quer dizer: quando a decisão denegatória de segurança não faz coisa julgada contra o impetrante (‘não fazendo coi-
sa julgada’ diz a Súmula), facultado estará o uso da ação própria.
Diz o despacho, que admitiu o recurso extraordinário, que o Supremo Tribunal, para o efeito da ação rescisória, não
tem atribuído força de coisa julgada a decisões denegatórias de mandado de segurança.
Mas isso quando a denegação desta ocorre por não assistir direito líquido e certo ao impetrante, caso em que lhe fica
aberta a via ordinária, donde não caber ação rescisória (RE 6.352, RTJ 52/344; RT 415/400).” (Roberto Rosas, Di-
reito Sumular, 9ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998, pp. 119/120)
Há, entretanto, outros aspectos que envolvem a questão, principalmente:
a) a não auto-aplicabilidade da lei complementar (DL nº 406/68), que apenas dispõe
sobre o perfil do ISS;
b) a inexistência de lei ordinária excluindo os serviços prestados pela consulente do
regime jurídico das alíquotas fixas e submetendo-a ao regime das alíquotas variáveis,
no período objeto indicado na consulta, o que apenas ocorreu com a lei posterior20;
c) ter a lei que excluiu a categoria da consulente do regime de alíquotas fixas, sido pro-
mulgada depois dos fatos objetos do auto de infração.
A matéria, portanto, pode ser reaberta, visto que o mandado de segurança não abordou
as questões acima mencionadas, não tendo, pois, enfrentado e dirimido o mérito da “quaes-
tio juris”21.
Passo à terceira questão.
Como já acima examinado, é inquestionável o direito da Administração de rever seus
próprios atos administrativos, para anulá-los, no caso de ilegalidade, dentro dos limites le-
gais, remanescendo a responsabilidade civil do Estado e, no caso de culpa ou dolo, o direito
de regresso contra a autoridade, pelas lesões que seu ato tiver causado ao administrado, nos
termos do artigo 37, parágrafo 6º, da CF assim redigido:
“§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços pú-
blicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, asse-
gurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”22
O direito de regresso é imprescritível (artigo 37, parágrafo 5º).
Diferente é, todavia, o caso de decisão proferida no processo administrativo tributário
decorrente do ato de lançamento, em que tenham sido exauridos todos os recursos cabíveis,
configurando-se como que o “trânsito em julgado administrativo”.
Nessa hipótese, embora alguns admitam que a matéria possa ser pelo Estado submetida
à revisão judicial, a esmagadora maioria da doutrina e a jurisprudência administrativa e ju-
dicial, inclusive do STF, é no sentido de que a decisão consolidada a favor do contribuinte,
no processo administrativo, não pode ser alterada. Há, em matéria tributária, efetivo trânsi-
to em julgado.
Leia-se, neste sentido:
“Ministério da Fazenda - Secretaria da Receita Federal - Delegacia da Receita Federal de Julga-
mento em Ribeirão Preto.
Acórdão nº 14-6528, de 12 de novembro de 2004.

20
Roberto Rosas ao examinar a Súmula nº 304, escreve: “Muita cautela deve haver na consideração do exame do mé-
rito. Só pode ser considerado quando a decisão expressamente decidiu em razão do mérito, e não simples apreciação
da questão de fundo, para denegar o mandado por outro fundamento, ou então a liquidez, ou o não conhecimento
pela decadência, apesar de observar, de passagem, a falta de liquidez pelo exame do mérito (RTJ 67/876 e 58/737 -
v. o expressivo esclarecimento do Min. Xavier de Albuquerque).” (Direito Sumular, ob. cit., p. 120)
21
A nova Lei do mandado de segurança (nº 12.016/09) não alterou - até porque princípio processual constitucional - a
exegese consagrada sobre a matéria.
22
Carlos Mário da Silva Pereira ensina: “E a Constituição Federal assenta que as pessoas jurídicas de direito público
responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causaram a terceiros, cabendo ação regressiva con-
tra o funcionário responsável, nos casos de culpa ou dolo (Emenda Constitucional nº 1, de 1969, art. 107 e seu pará-
grafo único; Constituição Federal de 5 de outubro de 1988, art. 37, nº XXI), segundo o qual a teoria do risco integral
compreende as pessoas jurídicas de direito público, bem como as de direito privado prestadoras de serviços públi-
cos.
É pacífico, e já requer maior explanação, que os vocábulos, ‘representantes’ e ‘funcionários’ não são usados em ac-
cepção estrita, porém ampla, naquele sentido acima assentado, de quem no momento exercia uma atribuição ligada à
sua atividade ou à sua função.
É de se entender, igualmente, que no vocábulo ‘estado’ compreende-se as pessoas jurídicas de direito público e as
de direito privado prestadoras de serviços públicos.” (Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 139)
Assunto: Processo Administrativo Fiscal.
Ementa: Direito Creditório. Coisa Julgada Administrativa. Sob pena de ofensa à coisa julgada
administrativa, não pode a autoridade julgadora reapreciar questão relativa ao direito credi-
tório postulado, em razão da existência de decisão definitiva na esfera administrativa (grifos
meus).
Data do fato gerador: 30/09/1998, 31/10/1998, 30/11/1998, 31/12/1998, 31/01/1999, 28/02/1999,
31/03/1999, 30/04/1999, 31/05/1999, 30/06/1999, 31/07/1999, 31/08/1999, 30/09/1999.”23

“Ministério da Fazenda - Secretaria da Receita Federal - Delegacia da Receita Federal de Julga-


mento no Rio de Janeiro.
Acórdão nº 12-6773, de 18 de fevereiro de 2005.
Assunto: Processo Administrativo Fiscal.
Ementa: Coisa Julgada Administrativa. Se a questão que desencadeou a autuação já foi aprecia-
da em outro processo, tendo a decisão se tornado definitiva na esfera administrativa, não cabe
mais à autoridade julgadora reexaminá-la, haja vista os efeitos preclusivos da coisa julgada
administrativa (grifos meus).
Ano-calendário: 1996.”24

“Ministério da Fazenda - Secretaria da Receita Federal - Delegacia da Receita Federal de Julga-


mento em Florianópolis.
Acórdão nº 07-697, de 11 de abril de 2002.
Assunto: Processo Administrativo Fiscal.
Ementa: Lançamentos Decorrentes. CSLL. PIS. Cofins. O decidido no lançamento principal
(IRPJ) faz coisa julgada nos lançamentos ditos decorrentes, tendo em vista que ambos possuem
a mesma matéria tributável (grifos meus).
Ano-calendário: 1996, 1997, 1998, 1999.”25

“Ministério da Fazenda - Secretaria da Receita Federal - Delegacia da Receita Federal de Julga-


mento em Curitiba.
3ª Turma - Acórdão nº 06-15022, de 15 de agosto de 2007.
Assunto: Processo Administrativo Fiscal.
Ementa: Coisa Julgada Material. Declaração de Inconstitucionalidade. Resolução do Senado.
Segurança Jurídica. Inafastabilidade. A segurança jurídica, como direito fundamental é limite
que não permite a nulação do julgado, sobretudo na esfera administrativa, ainda que a norma
legal que serviu de pressuposto à decisão judicial tenha sido posteriormente acoimada de in-
constitucionalidade, em decisão do STF (grifos meus).
Período de apuração: 01/03/1993 a 28/02/1996.”26

“Recurso Extraordinário nº 23.830-DF


Marca Industrial - Decisão do Ministro de Estado nos recursos interpostos dos julgamentos do
Conselho de Recursos da Propriedade Industrial - Coisa Julgada administrativa.
Ementa - Recurso Extraordinário conhecido e não provido.
O ato administrativo é, em geral, revogável. Mas a decisão do Ministro, prevendo ou confirman-
do julgamento do Conselho de Recursos da Propriedade Industrial, é irrevogável, pela sua
natureza judicante (grifos meus).
Conceito de coisa julgada administrativa.
Acórdão: Relatados e discutidos estes autos de recurso extraordinário nº 23.830 do Distrito Fe-
deral, recorrente Indústrias Alimentícias Carlos de Britto S.A. e recorrida Empresa Brasileira de
Produtos de Pesca.

23
Decisões - Ementário DRJ da Receita Federal.
24
Receita Federal, Decisões (Ementário DRJ).
25
Receita Federal, Decisões (Ementário DRJ).
26
Receita Federal, Decisões (Ementário DRJ).
Resolve o Supremo Tribunal Federal, pela sua 2ª Turma, não conhecer do recurso. Notas taqui-
gráficas.
Custas ‘ex lege’.
Rio de Janeiro, 17 de setembro de 1957.
L. de Andrade - presidente
A. Vilas Boas - Relator.”27

“Ação Rescisória nº 950-9-São Paulo.


Autora: Massey-Ferguson do Brasil S/A Ind. e Comércio
Ré: União Federal
Ementa: 1ª) Ação rescisória. Competência. Agravo regimental desprovido. - Embora se trate de
inadmissão de recurso extraordinário, a questão federal foi apreciada de modo a firmar a com-
petência do STF.
2ª) Imposto de renda. Multa. Dívida confessada. Retroatividade benéfica do D-Lei 401/68. -
Indeferimento do pedido de redução, não só por ter sido requerido a destempo, como por se
tratar de situação definitivamente julgada no âmbito administrativo. Inocorrência de violação
a literal disposição da lei. Ação rescisória improcedente.
Acórdão:
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal,
em Sessão Plena, na conformidade da ata de julgamentos e notas taquigráficas, à unanimidade,
julgar improcedente a rescisória.
Brasília, 26 de março de 1980.
Antonio Neder - Presidente
Rafael Mayer - Relator.” (DJ 25.04.1980)28

“RE 68.253/PR
Recurso Extraordinário
Relator(a): Min. Barros Monteiro
Julgamento: 02/12/1969 - Orgão Julgador: Primeira Turma
Publicação: DJ 08-05-1970
Ementa:
Coisa julgada fiscal e direito subjetivo. A decisão proferida pela autoridade fiscal, embora de
instância administrativa, tem, em relação ao fisco, força vinculatória, equivalente à da coisa
julgada, principalmente quando gerou aquela decisão direito subjetivo para o contribuinte (gri-
fos meus).
Recurso Extraordinário Conhecido e Provido.
Indexação
Coisa Julgada Fiscal. Direito Subjetivo. Decisão Administrativa:
Força Vinculatória.
Direito Tributário
Coisa Julgada Fiscal
Observação: Documento Incluído sem Revisão do STF
Ano: 1970 Aud: 06-05-1970.”29

“MS 7.853/GB
Mandado de Segurança
Relator(a): Min. Henrique D’Avila - Convocado
Julgamento: 19/10/1960 - Órgão Julgador: Tribunal Pleno
ADJ Data 17-07-1961, pp. 161.

27
Site do Supremo Tribunal Federal.
28
Site STF, Ementário nº 1.168-1.
29
DJ 08.05.1970.
Ementa:
A jurisdição administrativa se processa em escala ascendente, sem hiatos, por via de recursos
hierárquicos pré-determinados - A autoridade de grau superior não pode, estribada apenas em
sua preeminência, sem forma, nem figura de juízo, desfazer o ato de grau inferior, mormente,
quando este já produziu seus efeitos de direito e foi editado em consonância com a lei - man-
dado de segurança - sua concessão (grifos meus).
Indexação
Ato Administrativo, Revogação, Impossibilidade, Coisa Julgada, Natureza Administrativa, Ocor-
rência, Direito Subjetivo, Legalidade, Ato (AD).
AD 2.099, Ato Administrativo
Revogação
Coisa Julgada
Observação:
Votação: Unânime. Resultado: Concedido. PRV 08.
Ano: 1960. AUD: 21-12-1960.”30

“Acórdão 8.810
O Ministro da Fazenda não pode reformar decisão final dos Conselhos de Contribuintes, quan-
do não se verificar nulidade da decisão.
Mandado de Segurança nº 8.810-DF (2002)
Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros
Impetrante: (...)
Advogado: (...) José Roberto Pisani e Outros
Impetrado: Ministro de Estado da Fazenda
Ementa: Administrativo - Mandado de Segurança - Conselho de Contribuintes - Decisão Irre-
corrida - Recurso Hierárquico - Controle Ministerial - Erro de Hermenêutica - I - A competên-
cia ministerial para controlar os atos da administração pressupõe a existência de algo descon-
trolado, não incide nas hipóteses em que o órgão controlado se conteve no âmbito de sua com-
petência e do devido processo legal. II - O controle do Ministro da Fazenda (arts. 19 e 20 do
DL 200), sobre os acórdãos dos conselhos de contribuintes tem como escopo e limite o reparo
de nulidades. Não é lícito ao Ministro cassar tais decisões, sob o argumento de que o colegia-
do errou na interpretação da Lei. III - As decisões do conselho de contribuintes, quando não
recorridas, tornam-se definitivas, cumprindo à Administração, de ofício, exonerar o sujeito
passivo ‘dos gravames decorrentes do litígio’ (Dec. 70.235/72, art. 45). IV - Ao dar curso a apelo
contra decisão definitiva de conselho de contribuintes, o Ministro da Fazenda põe em risco di-
reito líquido e certo do beneficiário da decisão recorrida (grifos meus).
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
tros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, por unanimidade, conceder a segurança, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Francisco Falcão,
Franciulli Netto, Luiz Fux, João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castra Meira e Fran-
cisco Peçanha Martins (voto-vista) votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento
o Sr. Ministro José Delgado. Brasília (DF), 13 de agosto de 2003 (Data do Julgamento).
Ministro Humberto Gomes de Barros - Relator.”31
Como se percebe, a orientação é no sentido de distinguir a possibilidade de a Adminis-
tração rever seus próprios atos, da impossibilidade de revisão das decisões decorrentes do
denominado “contencioso administrativo tributário”, quando esgotados todos os recursos
para alteração do lançamento.

30
DJ 21.12.1960.
31
Site do STJ - jurisprudência.
Tenho para mim, como já me manifestei, na segunda parte da primeira questão, que a
invalidação dos atos administrativos, em matéria tributária, por serem considerados ilegais
em virtude de uma nova exegese, por força do artigo 146 do CTN é apenas aplicável a fatos
futuros, e não a fatos passados praticados pelo mesmo contribuinte.
Assim, para mim, os atos administrativos que, por nova interpretação adotada pela Ad-
ministração, são considerados ilegais, podem ser revogados com efeitos pretéritos, dentro
dos limites legais; já os atos administrativos tributários, só podem ser revistos e anulados em
virtude de mudança de exegese, em relação ao mesmo contribuinte, para alcançar fatos ge-
radores futuros. Não há a possibilidade Administrativa ou Judicial de anular a decisão final
proferida em processo administrativo tributário a favor do contribuinte. Principalmente, no
presente caso, em que não houve nenhum ato nulo, pois a Lei nº 2.413/93 não continha pre-
visão legal submetendo da atividade exercida pela consulente a outro regime que não o de
alíquota fixa, não sendo possível constitucionalmente dar efeito retroativo à Lei posterior32.
Enquanto não encerrado o processo administrativo, o recurso hierárquico é admissível.
Não será, todavia, possível qualquer tipo de recurso ou revisão administrativa, após o trân-
sito em julgado de decisão administrativa, como decorre da leitura do acórdão abaixo:
“RMS 12.386/RJ
Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 2000/0092265-0
Relator(a): Ministro Franciulli Netto (1.117)
Órgão Julgador: Segunda Turma
Data do Julgamento: 19/02/2004
Data da Publicação/Fonte: DJ 19/04/2004, p. 168.
Ementa: Recurso Ordinário - Mandado de Segurança - Conselho de Contribuintes do Estado do
Rio de Janeiro - Recurso Hierárquico - Secretário de Estado da Fazenda do Estado - Expressa
Previsão Legal - Legalidade - Precedentes.
A previsão de recurso hierárquico para o Secretário de Estado da Fazenda quando a decisão do
Conselho de Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro for prejudicial ao ente público não fere
os princípios constitucionais da isonomia processual, da ampla defesa e do devido processo
legal, porque é estabelecida por lei e, ao possibilitar a revisão de decisão desfavorável à Fa-
zenda, consagra a supremacia do interesse público, mantido o contraditório.
Nesse sentido, assevera Hely Lopes Meirelles que os recursos hierárquicos impróprios ‘são per-
feitamente admissíveis, desde que estabelecidos em lei ou no regulamento da instituição, uma
vez que tramitam sempre no âmbito do Executivo que cria e controla essa atividade. O que não
se permite é o recurso de um Poder a outro, porque isto confundiria as funções e compromete-
ria a independência que a Constituição da República quer preservar.’
Além disso, o contribuinte vencido na esfera administrativa sempre poderá recorrer ao Poder
Judiciário para que seja reexaminada a decisão administrativa. Já a Fazenda Pública não poderá
se insurgir caso seu recurso hierárquico não prospere, uma vez que não é possível a Adminis-
tração propor ação contra ato de um de seus órgãos.

32
Ricardo Lobo Torres ensina, hospedando idêntica tese que: “O lançamento definitivamente constituído é insuscetí-
vel de revisão, por erro de direito, na órbita administrativa. A irreversibilidade do lançamento por erro de interpreta-
ção decorre da leitura, a ‘contrario sensu’, do art. 149, que a não prevê, e dos termos do art. 146, que adiante analisa-
remos.
De feito, a autoridade administrativa, depois de efetivado o lançamento, não pode alterá-lo, de ofício, sob o argu-
mento de que a interpretação jurídica adotada não era a correta, a melhor ou a mais justa. Nem mesmo se os Tribu-
nais Superiores do país firmarem orientação jurisprudencial em sentido diverso daquela que prevaleceu no lançamento,
com o que se teria robustecida a convicção da presença do erro de direito, poderá o agente fazendário modificar o
ato para agravar a situação dos contribuintes.
Se o contribuinte acreditou na palavra da Administração, firmada no lançamento notificado, não poderá ficar a mer-
cê de eventuais alterações de critérios jurídicos, a pretexto de erro na interpretação. Pelo menos no Estado de Direi-
to.” (Limitações ao Poder Impositivo e Segurança Jurídica, Pesquisas Tributárias - Nova Série 11, São Paulo: CEU/RT,
2005, São Paulo, p. 70)
Recurso não provido.
Acórdão:
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, em negar provimen-
to ao recurso ordinário, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros João Otá-
vio de Noronha, Castro Meira, Francisco Peçanha Martins e Eliana Calmon votaram com o Sr.
Ministro Relator”33.
A distinção é, portanto, clara, no excelente acórdão relatado pelo saudoso Ministro Fran-
ciulli Neto, pois permite sempre a revisão, enquanto não transitada em julgado a decisão
administrativa, mas não permite que a decisão administrativa julgada favoravelmente ao
contribuinte seja rediscutida em juízo, para que a Fazenda anule, judicialmente, o seu pró-
prio entendimento consagrado na decisão administrativa.
No caso da consulente, a questão é de gravidade maior, pois:
a) não consta de legislação municipal o tipo de revisão aplicado à decisão transitada em julgado
a favor da consulente, revisão esta que contrariando a decisão do STJ, relatada pelo Ministro João
Otávio Noronha, está assim redigida:
“Processo Administrativo. Revisão. Segurança Jurídica.
Extinto o crédito tributário por decisão não mais passível de recurso, não pode a Adminis-
tração aproveitar o mesmo processo para rever tal ato. Somente com o início de novo pro-
cesso, desde que não consumada a decadência, é que a Administração poderá anular a deci-
são transitada em julgado do anterior processo já findo, isso em razão do princípio da seguran-
ça jurídica. REsp 572.358-CE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10/10/2006.”
(grifos meus)34
b) A revisão foi fundamentada em lei posterior aos fatos mencionados no processo;
c) a decisão deu à nova lei efeitos pretéritos, tornando-a retroativa e violando os artigos 5º, inci-
so XXXVI, e 150, inciso XXX, letra “a”, da Lei Suprema, além dos artigos 106 e 146 do CTN35.
A resposta, portanto, ao quesito, é que não pode a autoridade administrativa rever, no
próprio processo administrativo tributário, decisão terminativa desse processo, por falta de
previsão legal, por contrariar a jurisprudência e por violentar os artigos 106 e 146 do CTN,
como os artigos 5º, inciso XXXVI, e 150, inciso VII, letra “a”, da Carta Máxima.
Passo a responder a quarta questão.
A resposta é, manifestamente, não.
Não há interesse público maior do que o respeito à Lei Suprema.
É interessante notar que, entre os cinco princípios fundamentais da lei suprema brasi-
leira, não está o “interesse público”, cujo atendimento é mera decorrência do bem maior que
uma Constituição deve preservar, que é o cidadão.
Não sem razão, o presidente da Constituinte chamou a Lei Maior de 88 de “Constitui-
ção cidadã”, isto porque seu mais relevante título é, indiscutivelmente, o Título II, dedicado
aos direitos e garantias individuais e coletivos, sociais, à nacionalidade e entes políticos (ar-
tigos 5º e 17)36.

33
Site do STJ - jurisprudência.
34
Site do STJ - jurisprudência.
35
O artigo 106 do CTN só permite a retroatividade para beneficiar o contrato. Está assim redigido: “Art. 106. A lei aplica-
se a ato ou fato pretérito:
I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos
dispositivos interpretados;
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado: a) quando deixe de defini-lo como infração; b) quando deixe de
tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha
implicado em falta de pagamento de tributo; c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei
vigente ao tempo da sua prática.”
36
Sobre o respeito ao lançamento transitado em julgado e irreformável, assim escreve Sacha Calmon: “O lançamento
tributário já definitivamente constituído é irrevisível pela Administração em caso de erro de direito ou de valoração
Com efeito, reza o “caput” do artigo 5º que são invioláveis cinco princípios fundamen-
tais, a saber:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...).”
Toda a Constituição é endereçada ao povo e o interesse público deve ser entendido aquele
interesse público voltado ao cidadão. Jamais à conveniência dos detentores do poder, que
podem ser responsabilizados civil e criminalmente, se lesarem o “cidadão”, nos termos do
artigo 37, parágrafo 6º, da CF, sendo inclusive imprescritível sua responsabilidade (artigo
37, parágrafo 5º).
Não há interesse público que supere a cláusula pétrea do artigo 5º, inciso XXXVI, que
não permite a retroatividade da lei.
Não há interesse público que justifique a retroatividade à lei tributária contra o contri-
buinte, ou seja, apenas porque permitirá um aumento de arrecadação, se aplicada a fatos
pretéritos, regidos por outra lei. Tal atitude é, nitidamente, imoral37, além de pôr em xeque o
interesse público primário, que é a segurança jurídica, em prol do interesse público secun-
dário (interesse da arrecadação) - ilegítimo por contrariar o primeiro38.
O artigo 150, inciso III, letra “a”, claramente fulmina tal inteligência, permitindo-me
repetir o seu teor:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver insti-
tuído ou aumentado; (...).”39

jurídica dos fatos. Entre nós ganhou foros de cidade a irrevisibilidade por erro na interpretação da lei ou por altera-
ção nos critérios de sua aplicação, quando com erronia agiu a própria Administração. O Código Tributário Nacional
diz que tais critérios jurídicos podem ser alterados pela Administração ao produzir lançamentos, mas relativamente
a fatos geradores posteriores à alteração. E agrega: no concernente a um mesmo contribuinte.” (Pesquisas Tributá-
rias - Nova Série 11, p. 87)
37
Aristides Junqueira lembra que: “Assim também, quando o Estado-Juiz, pelos seus órgãos jurisdicionais, máximo e
superiores, já disse o direito, dando interpretação acabada a normas constitucionais e legais, por meio de decisões
reiteradas e transitadas em julgado, não pode o Estado Administração, personificado em servidor fazendário, se re-
belar contra elas, editando normas de hierarquia inferior, contrárias aos julgamentos jurisdicionais, sob pena de afronta
aos princípios da legalidade e da moralidade administrativas”, continuando: “Assim agindo, o agente estatal trans-
gride o princípio da moralidade administrativa, usando ‘de artifício para procrastinar ou dificultar o exercício regu-
lar de direito do contribuinte, causando-lhe dano moral e material’, incidindo tal comportamento funcional na veda-
ção expressa no Código de Ética, já antes referida e agora repetida.” (“O Princípio da Moralidade no Direito Tributá-
rio”. Pesquisas Tributárias - Nova Série 2, 2ª ed., São Paulo: CEU/RT, 1998, São Paulo, pp. 49/50)
38
Fátima Fernandes Rodrigues de Souza ensina que: “o interesse primário a ser perseguido pelo administrador público
há de ser sempre o interesse público consistente em exigir do sujeito passivo da obrigação tributária apenas e exclu-
sivamente aquilo que a lei autoriza. Interesses secundários, como, por exemplo, os de obter o máximo de receitas ou
acelerar a arrecadação, só são legítimos na medida em que se compatibilizem com o primário, o que não ocorrerá
sempre que a Administração busque aumentar seus recursos exigindo do contribuinte mais do que a lei lhe autori-
za”, e cita Renato Alessi que faz distinção, baseada em Carnelutti, entre interesses primários e secundários: “Esses
interesses públicos, coletivos, cuja satisfação está a cargo da Administração, não são simplesmente o interesse da
Administração entendida como ‘aparato organizativo’, mas o que se chamou de interesse coletivo primário, forma-
do pelo conjunto de interesses individuais preponderantes em uma determinada organização jurídica da coletivida-
de, enquanto o interesse do aparelhamento (se é que se pode conceber um interesse de aparelhamento unitariamente
considerado) seria simplesmente um dos interesses secundários que se fazem sentir na coletividade, e que podem ser
realizados somente em caso de coincidência com o interesse coletivo primário e dentro dos limites de dita coinci-
dência. A peculiaridade da posição da Administração Pública reside precisamente nisto, em que sua função consiste
na realização do interesse coletivo, público, primário.” (Instituciones de Derecho Administrativo, t. 1, Buenos Aires:
Bosch Casa Editorial, 1970, pp. 184-185)
39
Manoel Gonçalves Ferreira Filho assim o comenta: “Irretroatividade. Tem-se aqui uma projeção do princípio de ir-
retroatividade, que é essencial para a segurança individual. Decorre do texto em exame que a lei instituidora do tri-
As Leis nos 3.023/2000 e 3.313/2003, que conformaram alíquotas variáveis para as hi-
póteses de imposição do ISS, no tocante aos serviços prestados pela consulente, não podem
ser aplicadas retroativamente ao período do Auto lavrado 1994/1999. A Lei nº 2.413/93, por
outro lado, dava o tratamento rigorosamente seguido pela consulente, visto que aplicável a
todas as sociedades de prestação de serviço com profissionais de uma mesma especialida-
de. Como já mostrei anteriormente, por não prevista no DL nº 406/68 a hipótese, e por não
haver outro regime para tais sociedades, o caso era de “não-incidência” do ISS.
A revisão procedida fere, portanto, a Lei Suprema em seus artigos 150, inciso III, letra
“a”, e 5º, inciso XXXVI, ensejando, inclusive, a responsabilização do Município pelas le-
sões causadas ao contribuinte, visto que a responsabilidade do Estado é objetiva, vale dizer,
independentemente de dolo ou culpa.
A resposta, portanto, é no sentido de não ser possível dar-se o efeito retroativo preten-
dido.
A resposta à quarta questão, que passo a proceder, já, de certa forma, respondida foi,
anteriormente.
A decisão é definitiva e - conforme mostrou o Ministro João Noronha do STJ, em texto
que reproduzi, além de outras autoridades e Tribunais relacionados na resposta ao quesito 3
- não pode ser revista no próprio processo administrativo encerrado, definitivamente, nem
em processo judicial.
Vale, para esta resposta, o elenco de decisões assinaladas no quesito 3.
A decisão final do processo administrativo tributário que beneficia o contribuinte é de-
finitiva, acarretando, a meu ver, a responsabilização civil do Estado, a pretendida revisão da
decisão “transitada em julgado” administrativamente40.
As Súmulas nos 346 e 473, do STF, assim redigidas:
“STF Súmula nº 346 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tri-
bunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 151.
Administração Pública - Declaração da Nulidade dos seus Próprios Atos
A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.”

“STF Súmula nº 473 - 03/12/1969 - DJ de 10/12/1969, p. 5.929; DJ de 11/12/1969, p. 5.945;


DJ de 12/12/1969, p. 5.993. Republicação: DJ de 11/6/1970, p. 2.381; DJ de 12/6/1970,
p. 2.405; DJ de 15/6/1970, p. 2.437.
Administração Pública - Anulação ou Revogação dos seus Próprios Atos
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ile-
gais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou opor-
tunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judi-
cial”,
são inaplicáveis para a espécie, pois dizem respeito a atos administrativos, não sujeitos ao
regime jurídico do artigo 146 do CTN, que proíbe aplicação retroativa de exegese nova que
torne tributável relação jurídica antes tida por não incidida41.

buto não pode colher senão fato gerador posterior à sua vigência (v., sobre a problemática da irretroatividade v. 1
destes Comentários, p. 7 e s.).” (Comentários à Constituição Brasileira de 1988, vol. 2, São Paulo: Saraiva, 1999, p. 106)
40
Hugo de Brito Machado afirma: “A lei é forma de manifestação do Estado, que não pode retroagir em prejuízo do
cidadão, mas pode alcançar fatos do passado para favorecê-lo. O princípio da irretroatividade é garantia do cidadão.
Não do Estado. E não apenas o princípio da irretroatividade. Todos os princípios constitucionais foram elaborados,
ao longo do tempo, como instrumentos jurídicos contra o arbítrio. Garantias do cidadão contra os abusos de poder
dos governantes.” (Pesquisas Tributárias - Nova Série 11, p. 136)
41
Helenilson Cunha Pontes escreve, ao falar sobre o artigo 146 do CTN, que: “O princípio da irretroatividade tem o
condão de resgatar um dado do/passado e mantê-lo no futuro, garantindo em face da lei nova as expectativas legiti-
mamente construídas no passado diante da lei então vigente. Assim, o sentido de um evento passado adquire um
É fundamental lembrar que a aplicação retroativa da nova inteligência, no mesmo pro-
cesso, deu-se por força de Lei posterior aos fatos, que incluiu na hipótese de imposição ele-
mentos antes nela não constantes.
O interesse público, no caso das súmulas, é, para a presente consulta, preservar a or-
dem jurídica, não violentar os artigos 150, inciso III, “a”, e 5º, inciso XXXVI, da Lei Su-
prema, respeitar o artigo 146 do CTN e não exigir tributo sem lei que o autorize (artigo 150,
inciso I, da CF).
Volto ao tema inicial para responder ao presente quinto quesito.
O pretendido crédito tributário, inexistente à época dos fatos objetos do lançamento, e
assim considerado na decisão administrativa, não pode ser considerado extinto, pois o que
nunca existiu, não pode ser extinto. O que a decisão administrativa definitivamente consoli-
dou foi sua inexistência, razão pela qual - risco de responsabilização civil do Estado - o
mesmo processo não poderia ser reaberto, de acordo com mansa e pacífica jurisprudência,
quando havendo trânsito em julgado de processo administrativo42.
A resposta é, portanto, positiva. A decisão é definitiva.
A sexta questão, também já abordada na resposta ao primeiro quesito, tem como res-
posta que não pode a Prefeitura exigir tributo exclusivamente aplicando - sem lei municipal
- a lei com eficácia de complementar, que é o DL nº 406/68.
É elementar que a lei complementar, como seu próprio nome está dizendo, apenas com-
plementa a constituição.
Sobre ela escrevi:
“A utilização no campo do direito das normas de integração, em escala intermédia, permite que
o sistema plasmado na Constituição tenha contextura capaz de dar estabilidade à exação dos
diversos poderes tributantes.
É, pois, a lei complementar uma garantia de estabilidade do sistema, não permitindo que cinco
mil Municípios, vinte e seis Estados e a União tenham sistemas próprios, assim como do paga-
dor de tributos, que na Federação pode livremente viajar ou alterar seu domicílio, à luz dos
mesmos princípios gerais que regem o sistema.”43
Da mesma forma que a lei suprema não cria imposições, mas apenas defere competên-
cias, a lei complementar, que a explicita, não é auto-aplicável, dependendo de lei ordinária
do poder competente para criar tributos44.

contorno próprio, na forma do direito então vigente, tornando-se imune ao sentido que a lei posterior eventualmente
lhe atribua, ressalvadas as alterações ‘in bonam partem’.
Antonio Roberto Sampaio Dória assim sintetizou os princípios do direito intertemporal brasileiro, observando-se,
desde logo, que onde o autor se refere a ‘lei’ deve-se contemplar também a norma jurídica decisional (resultado da
interpretação da lei pela autoridade administrativa):
‘a) a lei nova não pode retroagir, expressa ou implicitamente, para atingir direitos adquiridos, a coisa julgada e o ato
jurídico perfeito, bem como seus efeitos, já inteiramente consumados no regime legal anterior’.” (Pesquisas Tribu-
tárias - Nova Série 11, p. 277)
42
Yoshiaki Ichihara assim se manifesta: “A regra geral de todas as regras e princípios deve ser aplicada sempre para o
futuro e nunca retroativamente.
A segurança jurídica, o princípio da boa-fé, entre outros, direcionam o entendimento neste sentido.
No nosso entender, os deveres éticos devem ser observados principalmente pelo Estado, que pela própria finalidade
e justificação da existência deve buscar o interesse coletivo e, por conseqüência, a segurança jurídica e a estabilida-
de do sistema.” (Pesquisas Tributárias - Nova Série 11, p. 409)
43
O Sistema Tributário na Constituição, 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, 126.
44
Sobre a matéria escrevi: “Nossa resposta à questão é a seguinte: ‘Não é possível os Municípios legislarem sobre campo
reservado no exercício da competência concorrente às normas gerais. Portanto, não é possível os 5.500 Municípios
legislarem sobre limitações constitucionais ao poder de tributar ou em relação às imunidades tributárias, alterando o
conceito constitucional a pretexto de que objetiva estabelecer critério especial de tributação e prevenir desequilíbrios
da concorrência’.” (Pesquisas Tributárias - Nova Série 11, p. 408)
A Lei Complementar nº 87/95, por exemplo, definiu as normas gerais do ICMS, mas
todos os estados geraram as leis ordinárias para aplicá-la.
O próprio Município de Uruguaiana produziu a Lei nº 2.413/93 e esta impôs às socie-
dades de prestação de serviços o mesmo regime daquelas sociedades expressamente men-
cionadas no DL nº 406/68. Para mim, como a hipótese era ilegal e não havia outra forma de
imposição possível, caracterizou-se nítida hipótese de não-incidência, tendo a consulente
recolhido indevidamente o tributo.
É evidente que a partir das Leis de 2000 e 2003, com a expressa inclusão daquelas socie-
dades não mencionadas no DL nº 406/68 sob o regime de alíquotas variadas, passou a con-
sulente a ter de seguir o novo regime, rigorosamente irretroativo em relação a todas as ope-
rações passadas, praticadas pela consulente.
À primeira parte desta questão respondo, pois, que lei complementar, que explicita a
Constituição, define apenas competências e não pode ser auto-aplicável, pois dependente de
lei ordinária, inexistente à época dos fatos objetos do auto de infração lavrado em processo
administrativo, que transitou em julgado de forma definitiva45.
A segunda parte da questão é rigorosamente igual à primeira, pois, formulada “a con-
trario sensu”, tem por resposta, com os fundamentos da primeira, que não é possível exigir
ISS apenas com base na lei com eficácia de complementar (DL nº 406/68), à falta de lei or-
dinária - implantadora da exigência46.
Por fim, em relação à última questão, é de se lembrar que a Lei de Execução Fiscal
(6.830/80) é clara ao determinar que a execução principia com o termo de penhora, a partir
do qual começa a fluir o prazo para embargos à execução.

45
Neste sentido, Hamilton Dias de Souza preleciona: “Assim explica Amilcar de Araújo Falcão tal função da lei nacio-
nal, ao comentar o dispositivo contido no artigo 59, inciso XV, letra b da Constituição Federal de 1946: ‘Está claro
que, tendo o legislador constituinte pretendido, em princípio sob um critério de rigidez, segregar as diferentes áreas
de competência tributária, de modo a atribuir exclusividade ao exercício de cada uma delas e incomunicabilidade às
categorias de receitas fiscais respectivas, não se poderia conceber tivessem os diferentes titulares do poder de tribu-
tar ampla faculdade de definir os pressupostos de sua própria competência, o que equivale a definir os limites entre
as suas e as demais esferas de competência tributária.
A norma geral de direito financeiro, para cuja decretação é competente a União, evidentemente poderá ditar os prin-
cípios de regulamentação e de atuação, para que a discriminação de rendas opere em toda a sua plenitude, para o que
é necessário fixar-se de modo uniforme o conceito de cada um dos impostos especificamente discriminados, como
aliás do mesmo passo se impõe a precisa distinção ‘in genere’ dos tributos em imposto, taxa e contribuição de me-
lhoria, coisa que, bem ou mal, o legislador federal já fez através do Decreto-lei nº 2.416, de 17 de julho de 1940, e da
Lei nº 854, de 10 de outubro de 1.949.’
As observações do ilustre e saudoso professor, mostram que as normais gerais da Constituição de 1946 (cujo campo
abrangia a regulação de conflitos de competência) tinham por finalidade a correta atuação dos dispositivos relativos
à discriminação de rendas e não a desobediência a esses mesmos dispositivos.
Por tais razões, a lei complementar não cria tributos, pois só a lei ordinária do nível de governo competente poderá
criá-los. A função mais relevante da lei complementar prevista no art. 18, § 1º consiste em delimitar o campo de atua-
ção das competências impositivas, já previsto na Constituição. Tal delimitação, contudo, não exclui a competência
legislativa dos Estados para definir hipóteses de incidência, instituindo tributos, pois delimitar é fixar os limites dentro
dos quais a competência poderá ser exercida.” (Direito Tributário 2, São Paulo: José Bushatsky, 1973, pp. 34 a 36)
46
Gilberto de Ulhôa Canto explica, inclusive, a razão da lei complementar, ele que foi um dos autores do anteprojeto
do CTN: “matérias que a Carta de 1988 mandou regular, em que pesem suas muitas deficiências, o CTN tem presta-
do ao Brasil o relevantíssimo serviço de amparar os contribuintes contra a arbitrariedade e a prepotência fiscais, jus-
tamente porque formula diversos princípios e regras que submetem a administração tributária da União, dos Estados
e do Distrito Federal, e dos Municípios, à observância de critérios uniformes em matéria que tem a ver com as nor-
mas constitucionais, que dificilmente se poderia impor a mais de 5.000 entes públicos diferentes, se a cada um deles
fosse lícito entender e aplicar certas normas básicas como lhe aprouvesse. É indispensável a preservação da unidade
e da abrangência do CTN numa só lei, organicamente elaborada e compreensiva de todas as regras que asseguram ao
contribuinte o tratamento prescrito na Constituição.” (“Lei Complementar Tributária”, Caderno de Pesquisas Tri-
butárias vol. 15, São Paulo: CEU/Resenha Tributária, 1989, p. 15/16)
O bloqueio de valores em conta-corrente tem em vista a penhora de dinheiro para ga-
rantir a execução. Sem que haja a lavratura um termo de penhora e a respectiva intimação
do contribuinte, não começa a fluir o prazo para o oferecimento de embargos.
É o que dispõe o artigo 16 da Lei nº 6.830/80, assim redigido:
“Art. 16. O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:
I - do depósito;
II - da juntada da prova da fiança bancária;
III - da intimação da penhora.
§ 1º Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.
§ 2º No prazo dos embargos, o executado deverá alegar toda matéria útil à defesa, requerer pro-
vas e juntar aos autos os documentos e rol de testemunhas, até três, ou, a critério do juiz, até o
dobro desse limite.
§ 3º Não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo as de suspeição,
incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria preliminar e serão processadas e
julgadas com os embargos”,
que, neste particular, por ser lei especial, não pode, a meu ver, ser alterado, na nova lei pro-
cessual por falta de expressa menção47.
Remanescem opiniões contrárias, principalmente dos advogados do Fisco, que lutam por
reduzir o prazo de defesa dos contribuintes, nada obstante a Constituição assegurar a ampla
defesa no artigo 5º, inciso IV. Tal prazo não poderia ser reduzido, após 5 de outubro de 1988,
sem que tal ampla defesa fosse também reduzida48.
De qualquer forma, a própria lei processual civil exige, para a fluência do prazo de
embargos, a realização da penhora para garantia do Juízo e a intimação do executado (arti-
gos 736 e 738 do CPC)49.
A resposta, portanto, lastreada exclusivamente na Lei, é de que não serve o mero blo-
queio de termo de penhora. O prazo para embargos somente fluirá se o dinheiro bloqueado
for penhorado e desse ato intimado, formalmente, o contribuinte para apresentação de sua
defesa.
É esta a minha opinião.

47
O parágrafo 2º do artigo 2º da Lei de Introdução do Código Civil está assim redigido “Art. 2º (...)
§ 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei
anterior.”
48
O artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal está assim redigido: “LV - aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes.”
49
Estão os respectivos artigos do CPC assim redigidos:
“Art. 736. O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá opor-se à execução por meio de
embargos (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
(...)
Art. 738. Os embargos serão oferecidos no prazo de 15 (quinze) dias, contados da data da juntada aos autos do man-
dado de citação. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).”
JURISPRUDÊNCIA
Íntegras de Acórdãos
EXECUÇÃO FISCAL - FRAUDE - ALIENAÇÃO DE IMÓVEL - LC 118 - CTN ART. 185 -
PRESUNÇÃO DEPENDENTE DE PRÉVIO REGISTRO DA PENHORA

EDcl no AgRg no Agravo de Instrumento nº 1.019.882 - PR (2008/0037631-5)

Relator: Ministro Benedito Gonçalves


Embargante: Fazenda Nacional
Embargado: Dupla Propaganda e Marketing S/C Ltda
Embargado: Marelaine Wittes Bolsan
Embargado: Newton Amorim da Silva Júnior
Advogado: s/ Representação nos Autos

Ementa
Processual Civil e Tributário. Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo de Ins-
trumento. Execução Fiscal. Fraude em Execução. Ausência de Registro da Penhora. Súmula 375/STJ.
Violação ao art. 535 do CPC. Contradição e Obscuridade. Vícios não Evidenciados.
1. Os embargos de declaração são cabíveis quando o provimento jurisdicional padece de omis-
são, contradição ou obscuridade nos ditames do art. 535, I e II, do CPC, bem como para sanar a
ocorrência de erro material, vícios inexistentes na espécie.
2. O acórdão embargado, considerando que não é possível aplicar a nova redação do art. 185 do
CTN (LC 118/05) à hipótese em apreço (tempus regit actum), respaldou-se na interpretação da
redação original desse dispositivo legal adotada pela jurisprudência do STJ. Tal entendimento é
no sentido de que, para resguardar o direito de terceiro de boa-fé, a constatação de fraude em
execução decorrente da alienação de imóvel exige, além do ajuizamento da ação e a citação do
devedor, o registro da penhora no ofício de imóveis (para que a indisponibilidade do bem gere
efeitos de eficácia erga omnes), salvo se evidenciada a má-fé dos particulares (consilium frau-
dis), o que, conforme consignado pela Corte de origem, não ficou demonstrado nos autos.
3. A presunção de fraude de que trata o art. 185 do CTN depende do prévio registro da penhora
do bem imóvel alienado, preservando-se, assim, os interesses dos adquirentes de boa-fé. Essa é
a inteligência da recente Súmula 375/STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do
registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.
4. Contradição e obscuridade não evidenciados.
5. Embargos de declaração rejeitados.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, rejeitar os embargos de declara-
ção, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Luiz Fux
votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki.
Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília (DF), 06 de outubro de 2009 (Data do Julgamento).
Ministro Benedito Gonçalves
Relator

Relatório
O Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Trata-se de embargos de declaração opostos
pela Fazenda Nacional em face de acórdão prolatado pela Primeira Turma, assim ementado (fl. 173):
Processual Civil e Tributário. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento. Fraude à Execu-
ção. Art. 185 do CTN. Terceiro de Boa-fé. Ausência de Registro da Penhora. Súmula 375 do STJ.
1. Hipótese em que a Fazenda Nacional busca a penhora de bem imóvel alienado pelo devedor
no curso da execução fiscal.
2. Tendo em vista que o registro da alienação em apreço no Ofício de Imóveis ocorreu em data
anterior (17/8/2004) ao início da vigência da LC 118/05, deve ser aplicada a redação original do
art. 185 do CTN, em conformidade com o princípio tempus regit actum.
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a fim de resguardar o direito de terceiro de
boa-fé, consolidou o entendimento de que a constatação de fraude em execução decorrente de
alienação de imóvel exige, além do ajuizamento da ação executiva e a citação do devedor, o re-
gistro da penhora no ofício de imóveis (para que a indisponibilidade do bem gere efeitos de efi-
cácia erga omnes), salvo se evidenciada a má-fé dos particulares (consilium fraudis), o que, con-
forme consignado pelo [sic] Corte de origem, não ficou demonstrado neste feito.
4. Rever as conclusões do Tribunal a quo a respeito da falta de comprovação pelo exequente acerca
da má-fé do adquirente implica reexame do conjunto fático-probatório, inviável ante o óbice da
Súmula 7/STJ.
5. Agravo regimental não provido.
A embargante sustenta que há contradição no acórdão impugnado. Para tanto, aduz (fl. 178):
Ora, considerando que o próprio acórdão embargado consignou que seria pertinente ao caso o
art. 185 em sua redação original e consignou, ainda, que estariam presentes os requisitos para
aplicação desse dispositivo legal - quais sejam, a existência de execução fiscal, com a citação do
devedor, afigura-se contraditório afirmar que a Fazenda Nacional não comprovou a má-fé do
devedor. Isso porque a aplicação do art. 185 do CTN, atendidos os requisitos de sua antiga ou
nova redação conforme o caso - reiterando que nestes casos, foram atendidos os requisitos mais
rigorosos da redação pretérita - implica que se tenha como presumidamente fraudulenta a alie-
nação, não se podendo exigir, pois, qualquer prova nesse sentido por parte do credor tributário.
É relatório.

Voto
O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Como cediço, os embargos de declaração são
cabíveis quando o provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade nos dita-
mes do art. 535, I e II, do CPC, bem como para sanar a ocorrência de erro material, vícios inexistentes
na espécie.
Com efeito, o acórdão embargado, considerando que não é possível aplicar a nova redação do
art. 185 do CTN (LC 118/05) à hipótese em apreço (tempus regit actum), respaldou-se na interpreta-
ção da redação original desse dispositivo legal adotada pela jurisprudência do STJ. Tal entendimento
é no sentido de que, para resguardar o direito de terceiro de boa-fé, a constatação de fraude em execu-
ção decorrente da alienação de imóvel exige, além do ajuizamento da ação e a citação do devedor, o
registro da penhora no ofício de imóveis (para que a indisponibilidade do bem gere efeitos de eficácia
erga omnes), salvo se evidenciada a má-fé dos particulares (consilium fraudis), o que, conforme con-
signado pela Corte de origem, não ficou demonstrado nos autos.
Verifica-se, portanto, que o entendimento desta Corte é no sentido de que a presunção de fraude de
que trata o art. 185 do CTN depende do prévio registro da constrição do bem imóvel alienado, preser-
vando-se, assim, os interesse [sic] do adquirente de boa-fé. Essa é a inteligência da recente Súmula
375/STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado
ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.
Sobre a matéria em comento, confiram-se os seguintes precedentes:
Tributário e Processual Civil. Execução Fiscal. Embargos de Terceiro. Ausência de Registro de
Penhora. Fraude. Não Configuração. Embargos de Declaração. Omissão e Erro Material Ine-
xistentes.
I - Os embargos de declaração constituem recurso de rígidos contornos processuais, exigindo-
se, para seu acolhimento, que estejam presentes os pressupostos legais de cabimento.
II - As alegadas omissões quanto à ausência de prequestionamento do art. 659, § 4º, do CPC;
ausência de juntada de cópia integral do acórdão paradigma e incidência do verbete sumular
nº 07/STJ, não foram aventadas anteriormente pela embargante, configurando-se, em verdade,
inovação à lide, incabível nesta sede recursal. Ademais, diante de tal constatação, também se pode
concluir que o acórdão não pode ser tachado de omisso, bem como que se operou a preclusão
lógica de tais matérias.
III - A nova redação do art. 185 do CTN, aviada pela LC nº 118/05, deve ser balizada pelo prin-
cípio do “tempus regit actum”, somente podendo ser aplicada às ações propostas após o início
de sua vigência, o que não ocorre no presente caso, no qual a ação foi proposta em 20.05.2004.
IV - Inexistentes, assim, omissão e erro material no aresto embargado, que adotou o entendi-
mento firmado nesta Corte, segundo o qual é válida a alienação a terceiro que adquiriu o bem
sem conhecimento da constrição judicial, anteriormente ao registro da penhora do imóvel, am-
parado pela boa-fé, afastando, neste caso, a fraude à execução. Precedentes: AgRg no REsp nº
854.778/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 30/10/2006; AgRg no Ag nº 480.706/MG,
Relator Ministro João Otávio de Noronha, DJ de 26/10/2006 e REsp nº 670.958/PR, Relator
Ministro Castro Meira, DJ de 15/09/2006.
V - Não houve a declaração de inconstitucionalidade, a ensejar a aplicação do art. 97 da CF/88,
o qual cuida da reserva de plenário, mas sim a adequação da lei ao caso concreto. Precedentes:
AgRg no REsp nº 924.327/RS, Rel. Ministro José Delgado, DJ de 13/08/2007 e REsp nº 446.393/PB,
Rel. Ministro João Otávio de Noronha, DJ de 03/08/2006.
VI - Embargos de declaração rejeitados (EDcl no AgRg no REsp 1.035.146/PB, Rel. Ministro
Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 5/8/2008, DJe 27/8/2008 - grifo nosso).

Processual Civil e Tributário. Agravo Regimental. Execução Fiscal. Embargos de Terceiro. Alie-
nação de Veículo. Ausência de Registro. Adquirente de Boa-fé. Não-ocorrência de Fraude. Pre-
cedentes. Desnecessidade de Declaração de Inconstitucionalidade da Norma Legal.
1. Agravo regimental contra decisão que negou seguimento a recurso especial.
2. O acórdão a quo considerou inexistente a fraude à execução, visto que, mesmo ocorrendo a
tradição do veículo após a citação da devedora, quando do registro no Detran, não havia nenhu-
ma anotação de cláusula de intransferibilidade no referido órgão, caracterizando, assim, a boa-
fé quando da aquisição do bem.
3. “O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alfor-
riado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não cons-
titui ônus ‘erga omnes’, efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstra-
ção do ‘consilium’ ‘fraudis’ não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressu-
põe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imó-
vel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação
a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à
publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorri-
da antes da citação do executado alienante” (EREsp nº 31.321/SP, Rel. Min. Milton Luiz Perei-
ra, DJ de 16/11/1999).
4. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que o terceiro que adquire veículo de pessoa
diversa da executada, de boa-fé, diante da ausência do registro da penhora junto ao Detran, não
pode ser prejudicada pelo reconhecimento da fraude à execução.
5. Desnecessidade de apreciação da constitucionalidade da norma legal discutida (art. 185 do
CTN), mas, sim, adequá-la ao caso concreto. Decisão tomada com base em inúmeros preceden-
tes desta Corte.
6. Agravo regimental não-provido (AgRg no REsp 924.327/RS, Rel. Ministro José Delgado, Pri-
meira Turma, julgado em 26/06/2007, DJ 13/08/2007, p. 351).
Não vislumbro, pois, a contradição apontada.
Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.
É como voto.

Certidão de Julgamento
Primeira Turma
Número Registro: 2008/0037631-5 EDcl no AgRg no Ag 1.019.882/PR
Números Origem: 200070060012240 200704000085279 200804000003991
Em Mesa Julgado: 06/10/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Ivaldo Olímpio de Lima

Secretária
Bela. Bárbara Amorim Sousa Camuña
Autuação
Agravante: Fazenda Nacional
Agravado: Dupla Propaganda e Marketing S/C Ltda
Agravado: Marelaine Wittes Bolsan
Agravado: Newton Amorim da Silva Júnior
Advogado: s/ Representação nos Autos
Assunto: Direito Tributário

Embargos de Declaração
Embargante: Fazenda Nacional
Embargado: Dupla Propaganda e Marketing S/C Ltda
Embargado: Marelaine Wittes Bolsan
Embargado: Newton Amorim da Silva Júnior
Advogado: s/ Representação nos Autos

Certidão
Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Minis-
tro Relator.
Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki.
Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília, 06 de outubro de 2009.
Bárbara Amorim Sousa Camuña
Secretária

NOTAS DA DIALÉTICA
1) A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 14.10.2009.
2) Vide Íntegras de Acórdãos do STJ - 2ª Turma (RDDT 102:174 e 169:181), e Acórdãos do STJ - 2ª
Turma (RDDT 101:231, 109:226 e 135:222) e do TRF da 1ª Região - 3ª Turma (RDDT 89:229).

IPI - CRÉDITO - RESISTÊNCIA ILEGÍTIMA DO ESTADO - INCIDÊNCIA


DE CORREÇÃO MONETÁRIA

Ag. Reg. no Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 372.124-1 Rio Grande do Sul

Relator: Min. Ricardo Lewandowski


Agravante(s): União
Advogado(a/s): Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Agravado(a/s): American Tool do Brasil Ltda.
Advogado(a/s): Marcos Leandro Pereira e Outro(a/s)

Ementa: Agravo Regimental em Recurso Extraordinário. IPI. Correção Monetária. Resistência


Ilegítima do Estado. Incidência. Agravo Improvido.
I - Incide correção monetária no período em que se reconheceu ilegítima a resistência do Estado
em possibilitar o aproveitamento dos créditos mencionados. Precedentes.
lI - Agravo regimental improvido.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo
Tribunal Federal, sob a Presidência do Senhor Ministro Carlos Ayres Britto, na conformidade da ata
de julgamentos e das notas taquigráficas, por decisão unânime, negar provimento ao agravo regimen-
tal no agravo regimental no recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 8 de setembro de 2009.
Ricardo Lewandowski - Relator
Relatório
O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão que
deu parcial provimento a recurso extraordinário da União.
A agravante insurgiu-se contra decisão que entendeu pela incidência de correção monetária sobre
créditos escriturais de IPI no período em que se reconheceu a ilegítima resistência do Fisco.
Alegou-se, em suma, que conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não é possível a
correção monetária de créditos escriturais.
É o relatório.

Voto
O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Eis o teor da decisão agravada:
“Em 27/2/2003, o então Relator, Ministro Carlos Velloso, negou seguimento ao presente recur-
so extraordinário ao entendimento de que há direito do contribuinte de creditar-se do IPI na aqui-
sição de insumos sujeitos à alíquota zero (fl. 305).
Contra essa decisão foi interposto agravo regimental, no qual se sustentou, em suma, que não
foi examinada a questão do aproveitamento de créditos na aquisição de insumos não-tributa-
dos e que não há decisão definitiva desta Corte acerca daqueles sujeitos à alíquota zero. Ale-
gou-se, ainda, ser indevida a correção monetária dos créditos escriturais do IPI.
Assiste razão à agravante, em parte. Reconsidero a decisão de fl. 305 e passo a apreciar o re-
curso extraordinário.
O acórdão recorrido reconheceu o direito do contribuinte de creditar-se do IPI na aquisição de
insumos sob o regime de isenção, não-tributação ou sujeitos à alíquota zero.
No RE, fundado no art. 102, III, a, da Constituição, sustentou-se apenas a inconstitucionalida-
de do crédito de IPI na aquisição de insumos sob o regime de não-tributação e alíquota zero,
bem como o descabimento de correção monetária sobre créditos escriturais do IPI.
A pretensão recursal merece acolhida, em parte.
Observe-se inicialmente, que o direito aos créditos de IPI na aquisição de produtos isentos não
foi objeto do recurso extraordinário e, dessa forma, a matéria ficou preclusa.
Quanto às outras situações atacadas no apelo, verifico que o Plenário desta Corte, no julga-
mento do RE 353.657/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, e do RE 370.682/SC, Rel. Min. Ilmar Gal-
vão, deu provimento aos recursos por entender que, nas hipóteses de não-tributação ou de alí-
quota zero do IPI, a admissão do creditamento implica ofensa ao art. 153, § 3º, II, da Consti-
tuição, não havendo falar em direito a crédito presumido, ante a inexistência de parâmetro nor-
mativo para se definir a quantia a ser compensada, não competindo tal tarefa ao Judiciário, que
não possui função de legislador positivo.
Ademais, ‘esclareceu-se que a Lei 9.779/99 não confere direito a crédito na hipótese de alíquo-
ta zero ou de não-tributação e sim naquela em que as operações anteriores foram tributadas,
mas a final não o foi, evitando-se, com isso, tornar inócuo o benefício fiscal’ (Informativo 456
do STF).
No mesmo sentido, cito as seguintes decisões, entre outras: RE 459. 553/SC, Rel. Min. Eros Grau;
RE 539. 821/MG, Rel. Min. Carlos Britto; RE 396.371/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 407.823/MG,
Rel. Min. Marco Aurélio; RE 352.424/PR, Rei. Min. Cezar Peluso.
Com relação à discussão sobre a incidência de correção monetária aos créditos reconhecidos
nos autos, não é de se aplicar a jurisprudência do Tribunal que, ressalvada a previsão em le-
gislação local, entende indevida a correção monetária dos créditos regularmente escriturados.
É que a Corte admite a incidência da correção monetária referente ao período em que se reco-
nheceu ilegítima a resistência do Estado em possibilitar o aproveitamento dos créditos mencio-
nados, a exemplo do que ocorreu no julgamento do RE 282.120/PR, Rel. Min. Maurício Cor-
rêa, cuja ementa transcrevo a seguir:
‘Recurso Extraordinário. Prequestionamento. Exportação. Produtos Industrializados. ICMS.
Matéria-prima e Outros Insumos. Compensação. Autorização Legal. Suspensão Liminar. Cré-
dito Impossibilitado. Constitucionalidade Reconhecida posteriormente. Retorno da Situação
ao Status Quo Ante. Correção Monetária. Cabimento.
1. Prequestionamento. Ausente o interesse de recorrer, por falta de sucumbência, basta para
o atendimento do requisito que a tese jurídica suscitada como causa de pedir tenha sido ob-
jeto das contra-razões apresentadas pela parte por ocasião dos recursos de apelação e extraor-
dinário, e também tratada nos embargos de declaração.
2. ICMS. Compensação autorizada pelo artigo 3º da Lei Complementar federal 65/91. Regra
legal suspensa liminarmente. Julgamento de mérito superveniente que reconheceu a constitu-
cionalidade do dispositivo (ADI 600, DJ 30/06/95). Efeitos ex-tunc da decisão.
3. Créditos escriturais não realizados no momento adequado por óbice do Fisco, em obser-
vância à suspensão cautelar da norma autorizadora. Retorno da situação ao status quo ante-
rior. Garantia de eficácia da lei, desde sua edição. Correção monetária devida, sob pena de
enriquecimento sem causa da Fazenda Pública.
4. Atualização monetária que não advém da permissão legal de compensação, mas do impe-
dimento causado pelo Estado para o lançamento na época própria. Hipótese diversa da mera
pretensão, de corrigir-se, sem previsão legal, créditos escriturais do ICMS.
Acórdão mantido por fundamentos diversos.
Recurso extraordinário não conhecido.’
Nessa mesma, esteira de pensamento, anoto, ainda, os seguintes precedentes: RE 200.379-ED-
ED-EDv/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; RE 301.753-AgR/PR, Rel. Min. Ellen Gracie.
Isso posto, reconsidero a decisão agravada, conheço do recurso extraordinário e dou-lhe par-
cial provimento apenas para negar o direito ao crédito de IPI decorrente da aquisição de pro-
dutos não tributados ou sujeitos à alíquota zero e limitar a correção monetária dos créditos
devidos ao período compreendido entre a ilegítima resistência do Fisco em permitir seu apro-
veitamento e o trânsito em julgado da decisão que possibilitou esse direito” (fls. 327-329).
Bem reexaminada a questão, verifica-se que a decisão ora atacada não merece reforma, visto que a
recorrente não aduz novos argumentos capazes de afastar as razões nela expendidas.
No caso dos autos, não é de se aplicar a jurisprudência do Tribunal que, ressalvada a previsão em
legislação local, entende indevida a correção monetária dos créditos regularmente escriturados.
É que a Corte admite a incidência da correção monetária referente ao período em que se reconhe-
ceu ilegítima a resistência do Estado em possibilitar o aproveitamento dos créditos mencionados, a
exemplo do que ocorreu no julgamento do RE 200.379-ED-ED-EDv/SP, ReI. Min. Sepúlveda Pertence,
cuja ementa transcrevo a seguir:
“ICMS: direito de crédito do imposto pago na aquisição de bens para o ativo fixo, com correção
monetária: embargos de divergência: não conhecimento: não aplicação ao caso da jurisprudên-
cia invocada pelo embargante. 1. É assente a jurisprudência do Supremo Tribunal que, em se tra-
tando de regular lançamento de crédito tributário em decorrência de recolhimento de ICMS, não
haverá incidência de correção monetária no momento da compensação com o tributo devido na
saída da mercadoria do estabelecimento. Precedentes. 2. O caso, contudo, é de crédito tributário
- reconhecido pelo acórdão embargado e não contestado pelo embargante -, cuja escrituração não
ocorrera por óbice imposto pelo Estado, hipótese em que é devida a correção monetária e não se
aplica a jurisprudência citada, cujo pressuposto é a regularidade da escrituração. Precedente: RE
282.120, Maurício Corrêa, RTJ 184/332.”
Nessa mesma esteira de pensamento, anoto, ainda, os seguintes precedentes: RE 282.120/PR, Rel.
Min. Maurício Corrêa; RE 301.753-AgR/PR, Rel. Min. Ellen Gracie.
Isso posto, nego provimento ao agravo regimental.

Extrato de Ata
Ag. Reg. no Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 372.124-1
Proced.: Rio Grande do Sul
Relator: Min. Ricardo Lewandowski
Agte(s).: União
Adv(a/s).: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Agdo(a/s).: American Tool do Brasil Ltda.
Adv(a/s).: Marcos Leandro Pereira e Outro(a/s)

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no agravo regimental no recurso extraor-
dinário, nos termos do voto do Relator. Unânime. 1ª Turma, 08.09.2009.
Presidência do Ministro Carlos Ayres Britto. Presentes à Sessão os Ministros Marco Aurélio, Ri-
cardo Lewandowski e a Ministra Cármen Lúcia.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas.
Ricardo Dias Duarte
Coordenador

NOTAS DA DIALÉTICA
1) A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 24.9.2009, p. 54.
2) Vide Íntegra de Acórdão do STF - 1ª Turma (RDDT 169:190).
ITR - IMÓVEL INVADIDO - MOVIMENTO “SEM-TERRA” - PERDA DO DOMÍNIO E
DOS DIREITOS INERENTES À PROPRIEDADE - INSUBSISTÊNCIA DA EXAÇÃO

Recurso Especial nº 1.144.982 - PR (2009/0114749-3)

Relator: Ministro Mauro Campbell Marques


Recorrente: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Recorrido: Gelza Regina de Abreu Moresco
Advogado: Irineu Palma Pereira e Outro(s)

Ementa
Tributário. ITR. Incidência sobre Imóvel. Invasão do Movimento “Sem Terra”. Perda do Domí-
nio e dos Direitos Inerentes à Propriedade. Impossibilidade da Subsistência da Exação Tribu-
tária. Princípio da Proporcionalidade. Recurso Especial não Provido.
1. Conforme salientado no acórdão recorrido, o Tribunal a quo, no exame da matéria fática e pro-
batória constante nos autos, explicitou que a recorrida não se encontraria na posse dos bens de
sua propriedade desde 1987.
2. Verifica-se que houve a efetiva violação ao dever constitucional do Estado em garantir a pro-
priedade da impetrante, configurando-se uma grave omissão do seu dever de garantir a observân-
cia dos direitos fundamentais da Constituição.
3. Ofende os princípios básicos da razoabilidade e da justiça o fato do Estado violar o direito de
garantia de propriedade e, concomitantemente, exercer a sua prerrogativa de constituir ônus tri-
butário sobre imóvel expropriado por particulares (proibição do venire contra factum proprium).
4. A propriedade plena pressupõe o domínio, que se subdivide nos poderes de usar, gozar, dis-
por e reinvidicar [sic] a coisa. Em que pese ser a propriedade um dos fatos geradores do ITR,
essa propriedade não é plena quando o imóvel encontra-se invadido, pois o proprietário é tolhi-
do das faculdades inerentes ao domínio sobre o imóvel.
5. Com a invasão do movimento “sem terra”, o direito da recorrida ficou tolhido de praticamen-
te todos seus elementos: não há mais posse, possibilidade de uso ou fruição do bem; consequen-
temente, não havendo a exploração do imóvel, não há, a partir dele, qualquer tipo de geração de
renda ou de benefícios para a proprietária.
6. Ocorre que a função social da propriedade se caracteriza pelo fato do proprietário condicio-
nar o uso e a exploração do imóvel não só de acordo com os seus interesses particulares e egoís-
ticos, mas pressupõe o condicionamento do direito de propriedade à satisfação de objetivos para
com a sociedade, tais como a obtenção de um grau de produtividade, o respeito ao meio ambiente,
o pagamento de impostos etc.
7. Sobreleva nesse ponto, desde o advento da Emenda Constitucional n. 42/2003, o pagamento
do ITR como questão inerente à função social da propriedade. O proprietário, por possuir o do-
mínio sobre o imóvel, deve atender aos objetivos da função social da propriedade; por conseguin-
te, se não há um efetivo exercício de domínio, não seria razoável exigir desse proprietário o cum-
primento da sua função social, o que se inclui aí a exigência de pagamento dos impostos reais.
8. Na peculiar situação dos autos, ao considerar-se a privação antecipada da posse e o esvazia-
mento dos elementos de propriedade sem o devido êxito do processo de desapropriação, é inexi-
gível o ITR diante do desaparecimento da base material do fato gerador e da violação dos referi-
dos princípios da propriedade, da função social e da proporcionalidade.
9. Recurso especial não provido.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taqui-
gráficas, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto Martins.
Brasília (DF), 13 de outubro de 2009.
Ministro Mauro Campbell Marques, Relator
Relatório
O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator):
Trata-se de recurso especial interposto pela União, com fulcro na alínea “a” do permissivo consti-
tucional, contra acórdão prolatado pelo TRF da 4ª Região que, por unanimidade, negou provimento a
remessa oficial e a recurso de apelação interposto contra sentença exarada nos autos de mandado de
segurança, em que se pleiteia o afastamento da exigência tributária relativa ao Imposto Territorial Ru-
ral (ITR) incidente sobre dois imóveis da propriedade da impetrante.
O Tribunal recorrido consignou que “restando incontroverso que, desde 1987 o proprietário não
detém o direito de usar, gozar e dispor do imóvel, em decorrência de sua invasão por integrantes do
movimento “sem terra”, e o direito de reavê-lo não é assegurado pelo Estado, a propriedade se man-
tém na mera formalidade e não configura fato gerador do ITR”.
Nas razões do recurso especial, sustenta a recorrente violação ao artigo 29 do Código Tributário
Nacional (CTN) e ao artigo 535 do Código de Processo Civil. Aduz, em síntese, ser devida a cobrança
relativa [a]o ITR, tendo em vista constituir a propriedade fato gerador da referida exação.
Nas contra-razões recursais, pugna a recorrida pelo não conhecimento do recurso especial - ante a
incidência do enunciado das Súmulas 282 e 356 do STF. No mérito, sustenta o seu não provimento.
É o relatório.

Voto
O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator):
Cinge-se a controvérsia em verificar se é devido o ITR pelo proprietário que tem a sua propriedade
esbulhada pelo movimento dos “sem terra”.
Conforme salientado no acórdão recorrido, o Tribunal a quo, no exame da matéria fática e proba-
tória constante nos autos, explicitou que a recorrida não se encontraria na posse dos bens de sua pro-
priedade desde 1987 (fl. 381):
(...) a farta documentação acostada à inicial deixa antever que, de fato, a impetrante não mais se
encontra na posse dos imóveis acima mencionados há quase vinte anos, eis que foram ocupados
por integrantes do movimento dos “sem-terra” em 1987.
Da análise das fotocópias das inúmeras decisões judiciais já proferidas com relação aos imóveis
em questão, conclui-se também que a impetrante envidou todos os esforços na defesa de sua posse
que, no entanto, não mais detém.
O inciso XXII da Constituição, norma de direito fundamental, garante o direito à propriedade, que
se desdobra na necessidade da prestação de uma obrigação negativa e de uma obrigação positiva por
parte do Estado. A obrigação negativa possui eficácia vertical, por meio da qual o Estado não pode, ao
seu livre talante, violar a propriedade particular, salvo nos casos previstos na Constituição e mediante
a devida indenização. A obrigação positiva, por outro lado, possui eficácia horizontal, no sentido de
que o Estado deve garantir que os demais particulares não violem o direito de propriedade de deter-
minado cidadão.
No caso ora tratado, verifica-se que houve a efetiva violação ao dever constitucional do Estado em
garantir a propriedade da impetrante, configurando-se uma grave omissão do seu dever de garantir a
observância dos direitos fundamentais da Constituição.
Ofende os princípios básicos da razoabilidade e da justiça o fato do Estado violar o direito de ga-
rantia de propriedade e, concomitantemente, exercer a sua prerrogativa de constituir ônus tributário
sobre imóvel expropriado por particulares (proibição do venire contra factum proprium).
Há uma verdadeira iniquidade no caso em tela, consubstanciada na possibilidade do Estado, apro-
veitando-se da sua própria inércia, tributar propriedade que, devido à sua própria omissão em prover
segurança, ocasionou a perda das faculdades inerentes ao direito de propriedade da ora recorrida.
A propriedade plena pressupõe o domínio, que se subdivide nos poderes de usar, gozar, dispor e
reinvidicar [sic] a coisa. Em que pese ser a propriedade um dos fatos geradores do ITR, essa proprie-
dade não é plena quando o imóvel encontra-se invadido, pois o proprietário é tolhido das faculdades
inerentes ao direito de domínio sobre o imóvel. Assim giza o artigo 1.228 do Código Civil:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de rea-
vê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econô-
micas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei
especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e
artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
§ 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e se-
jam animados pela intenção de prejudicar outrem.
§ 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou
utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público
iminente.
§ 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em ex-
tensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de
pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços con-
siderados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.
§ 5º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário;
pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
Com a invasão do movimento “sem terra”, o direito da recorrida ficou tolhido de praticamente to-
dos seus elementos: não há mais posse, possibilidade de uso ou fruição do bem; consequentemente,
não havendo a exploração do imóvel, não há, a partir dele, qualquer tipo de geração de renda ou de
benefícios para a proprietária.
Ocorre que a função social da propriedade se caracteriza pelo fato do proprietário condicionar o
uso e a exploração do imóvel não só de acordo com os seus interesses particulares e egoísticos, mas
pressupõe o condicionamento do direito de propriedade à satisfação de objetivos para com a socieda-
de, tais como a obtenção de um grau de produtividade, o respeito ao meio ambiente, o pagamento de
impostos etc.
Sobreleva nesse ponto, desde o advento da Emenda Constitucional n. 42/2003, o pagamento de
impostos como questão inerente à função social da propriedade. O proprietário, por possuir o domí-
nio sobre o imóvel, deve atender aos objetivos da função social da propriedade; por conseguinte, se
não há um efetivo exercício de domínio, não seria razoável exigir desse proprietário o cumprimento
da sua função social, o que se inclui aí a exigência de pagamento dos impostos reais.
Diante [d]o exposto, espera-se, no mínimo, que o Estado reconheça que, diante da sua própria omis-
são e da dramaticidade dos conflitos agrários no País, aquele que não tem mais direito algum não pos-
sa ser tributado por algo que, somente em razão de uma ficção jurídica, detém sobre o bem o título de
propriedade. Ofende o princípio da razoabilidade, o da boa-fé objetiva e o próprio bom senso o Esta-
do utilizar-se da aparência desse direito ou do resquício que ele deixou, para cobrar tributos que pres-
supõem a incolumidade e a existência nos planos jurídicos (formal) e fáticos (material) dos direitos
inerentes à propriedade.
Insta salientar ser irrelevante que a omissão estatal limite-se a esferas diversas da Administração
Pública, pois seus entes são partes de um todo maior que é o Estado brasileiro: ao final, é esse que
responde pela garantia dos direitos individuais e sociais e pela razoabilidade da conduta de seus entes
(em que se divide e organiza), aí se incluindo a própria autoridade tributária.
Dessa feita, na peculiar situação dos autos, ao considerar-se a privação antecipada da posse e o es-
vaziamento dos elementos de propriedade sem o devido êxito do processo de desapropriação, é inexi-
gível o ITR diante do desaparecimento da base material do fato gerador e da violação dos referidos
princípios da propriedade, da função social e da proporcionalidade.
Ante o exposto, entendo pelo não provimento do recurso especial.
É como voto.

Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2009/0114749-3 REsp 1.144.982/PR
Número Origem: 200770000116084
Pauta: 13/10/2009 Julgado: 13/10/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Eugênio José Guilherme de Aragão

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi
Autuação
Recorrente: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Recorrido: Gelza Regina de Abreu Moresco
Advogado: Irineu Palma Pereira e Outro(s)
Assunto: Direito Tributário - Impostos - ITR/Imposto Territorial Rural

Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Minis-
tro(a) Relator(a).”
Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 13 de outubro de 2009.
Valéria Alvim Dusi
Secretária

NOTAS DA DIALÉTICA
1) A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 15.10.2009.
2) Vide Acórdão do TRF da 3ª Região - 6ª Turma (RDDT 17:206).

ITR - INCIDÊNCIA SOBRE IMÓVEL, LOCALIZADO NA ÁREA URBANA,


UTILIZADO EM EXPLORAÇÃO EXTRATIVA, VEGETAL, AGRÍCOLA,
PECUÁRIA OU AGROINDUSTRIAL - NÃO-INCIDÊNCIA DO IPTU

Recurso Especial nº 1.112.646 - SP (2009/0051088-6)

Relator: Ministro Herman Benjamin


Recorrente: Mário Yokoya
Advogado: Fernando Dias Júnior e Outro(s)
Recorrido: Município de São Bernardo do Campo
Procurador: Andrea Alionis Banzatto e Outro(s)

Ementa
Tributário. Imóvel na Área Urbana. Destinação Rural. IPTU. Não-incidência. Art. 15 do DL
57/1966. Recurso Repetitivo. Art. 543-C do CPC.
1. Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que
comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindus-
trial (art. 15 do DL 57/1966).
2. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução
8/2008 do STJ.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça: “A Seção, por unanimidade, deu provimento ao
recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.” Os Srs. Ministros Mauro Campbell
Marques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon, Luiz Fux, Castro Meira e Hum-
berto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília, 26 de agosto de 2009 (data do julgamento).
Ministro Herman Benjamin
Relator

Relatório
O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Trata-se de Recurso Especial interposto, com
fundamento no art. 105, III, “a”, da Constituição da República, contra acórdão assim ementado (fl. 170):
Apelação - Mandado de Segurança - IPTU x ITR - Imóvel situado em zona urbana - Alegação
de produção agrícola - Cobrança de IPTU devida - Competência do ente Municipal para fixar as
diretrizes visando o desenvolvimento das funções sociais da cidade - Somente o Município pode
definir critérios de cobrança do imposto sobre a propiiedade [sic] existente na zona urbana -
Recurso provido.
Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fl. 193).
O recorrente aponta ofensa ao art. 15 do Decreto[-lei] 57/1966, pois submete-se ao ITR o imóvel
“que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuário ou agro-
industrial” (fl. 219).
O Recurso foi admitido na origem (fl. 271).
Reconheci o Recurso como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C do CPC, e
determinei as providências cabíveis, além de intimação da Fazenda Nacional (fl. 278), que deixou de
se manifestar (fl. 283).
O MPF opinou pelo não conhecimento do Recurso (fl. 284).
É o relatório.

Voto
O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Discute-se a aplicação do art. 15 do DL 57/1966
como critério para afastamento da incidência do IPTU.
Inicialmente, analiso a questão levantada pelo MPF em seu parecer, ao opinar pelo não conheci-
mento do Recurso, pois “o recorrente não fez demonstração cabal de que sua propriedade destina-se a
atividades rurais”, o que atrairia o disposto na Súmula 7/STJ (fl. 284).
Ocorre que a destinação do imóvel para atividades agrícolas é incontroversa. Transcrevo trecho da
sentença (fl. 126):
Observa-se, a despeito dessa situação, não poder ser descartado o critério de utilização e desti-
nação do imóvel, que no caso dos autos resta devidamente comprova[do] no sentido de utiliza-
ção para o cultivo de hortaliças e eucalipto, portanto de natureza rural, a despeito de inserido em
zona qualificada como urbana pelo Município.
Essa realidade não foi impugnada na Apelação do Município (fls. 129-139), razão pela qual não
foi reexaminada pelo Tribunal de Justiça.
A análise do Recurso Especial, portanto, parte de premissa fática incontroversa (destinação rural
do imóvel), o que afasta o disposto na Súmula 7/STJ.
No mérito, a discussão a respeito da incidência do IPTU ou do ITR é caso clássico de conflito de
competência a ser dirimido pela legislação complementar, nos termos do art. 146, I, da CF.
O art. 32, § 1º, do CTN adota o critério da localização do imóvel e considera urbana a área defini-
da na lei municipal, desde que observadas pelo menos duas das melhorias listadas em seus incisos.
Ademais, considera-se também nessa situação o imóvel localizado em área de expansão urbana, cons-
tante de loteamento aprovado, nos termos do § 2º, do mesmo dispositivo.
Ocorre que o critério espacial do art. 32 do CTN não é o único a ser considerado. O DL 57/1966,
recepcionado pela atual Constituição como lei complementar (assim como o próprio CTN), acrescen-
tou o critério da destinação do imóvel, para delimitação das competências municipal (IPTU) e federal
(ITR):
Art 15. O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel
de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou
agro-industrial, incidindo assim, sôbre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobra-
dos.
Destaco que o STF reconhece a vigência do dispositivo legal no sistema tributário contemporâneo:
Ementa: - Direito Constitucional, Tributário e Processual Civil. Imposto Predial e Territorial Ur-
bano (I.P.T.U.). Imposto Territorial Rural (I.T.R.). Taxa de Conservação de Vias. Recurso Extraor-
dinário.
(...)
2. R.E. conhecido, pela letra “b”, mas improvido, mantida a declaração de inconstitucionalidade
do art. 12 da Lei federal n. 5.868, de 12.12.1972, no ponto em que revogou o art. 15 do Decreto-
lei n. 57, de 18.11.1966.
3. Plenário. Votação unânime.
(RE 140.773/SP, Relator: Min. Sydney Sanches, Tribunal Pleno, julgado em 08/10/1998, DJ
04-06-1999, pp-00017, Ement Vol-01953-01, pp-00127)
Nesse sentido, a jurisprudência do STJ é pacífica ao reconhecer a aplicabilidade do art. 15 do DL
57/1966 como critério delimitador da incidência tributária sobre imóveis:
Tributário. IPTU. ITR. Imóvel. Exploração Extrativa Vegetal. Art. 32 do CTN, 15 do Decreto-
Lei nº 57/66.
1. O artigo 15 do Decreto-Lei nº 57/66 exclui da incidência do IPTU os imóveis cuja destinação
seja, comprovadamente a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, sobre os quais incide o
Imposto Territorial Rural - ITR, de competência da União.
2. Tratando-se de imóvel cuja finalidade é a exploração extrativa vegetal, ilegítima é a cobrança,
pelo Município, do IPTU, cujo fato gerador se dá em razão da localização do imóvel e não da
destinação econômica. Precedente.
3. Recurso especial improvido.
(REsp 738.628/SP, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 12/05/2005, DJ
20/06/2005, p. 259)
Tributário. IPTU. ITR. Fato Gerador. Imóvel Situado na Zona Urbana. Localização. Destinação.
CTN, art. 32. Decreto-Lei n. 57/66. Vigência.
1. Ao ser promulgado, o Código Tributário Nacional valeu-se do critério topográfico para deli-
mitar o fato gerador do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e o
Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR): se o imóvel estivesse situado na zona urba-
na, incidiria o IPTU; se na zona rural, incidiria o ITR.
2. Antes mesmo da entrada em vigor do CTN, o Decreto-Lei nº 57/66 alterou esse critério, esta-
belecendo estarem sujeitos à incidência do ITR os imóveis situados na zona rural quando utili-
zados em exploração vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.
3. A jurisprudência reconheceu validade ao DL 57/66, o qual, assim como o CTN, passou a ter o
status de lei complementar em face da superveniente Constituição de 1967. Assim, o critério to-
pográfico previsto no art. 32 do CTN deve ser analisado em face do comando do art. 15 do DL
57/66, de modo que não incide o IPTU quando o imóvel situado na zona urbana receber quais-
quer das destinações previstas nesse diploma legal.
4. Recurso especial provido.
(REsp 492.869/PR, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 15/02/2005,
DJ 07/03/2005, p. 141)
Assim, não incide IPTU, mas sim o ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município,
desde que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou
agroindustrial.
Ao lado do critério espacial previsto no art. 32 do CTN, deve ser aferida a destinação do imóvel,
nos termos do art. 15 do DL 57/1966.
Por fim, por se tratar de recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC, determino a adoção
das providências relativas à Resolução 8/2008 do STJ.
Diante do exposto, dou provimento ao Recurso Especial.
É como voto.

Certidão de Julgamento
Primeira Seção
Número Registro: 2009/0051088-6 REsp 1.112.646/SP
Números Origem: 16752004 4391495 4391495601
Pauta: 26/08/2009 Julgado: 26/08/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Teori Albino Zavascki

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Flavio Giron

Secretária
Bela. Carolina Véras

Autuação
Recorrente: Mário Yokoya
Advogado: Fernando Dias Júnior e Outro(s)
Recorrido: Município de São Bernardo do Campo
Procurador: Andrea Alionis Banzatto e Outro(s)
Assunto: Direito Tributário - Impostos - ITR/Imposto Territorial Rural

Certidão
Certifico que a egrégia Primeira Seção, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nes-
ta data, proferiu a seguinte decisão:
“A Seção, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Minis-
tro Relator.”
Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido, Eliana
Calmon, Luiz Fux, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília, 26 de agosto de 2009.
Carolina Véras
Secretária

NOTAS DA DIALÉTICA
1) A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 28.8.2009 e antecipada na RDDT
170:231.
2) Vide Acórdãos do STJ - 1ª Seção (RDDT 170:231) e do TRF da 3ª Região - 3ª Turma (RDDT
10:199).
Decisões
COFINS E PIS - RECEITA BRUTA - ART. 3º, § 1º DA LEI 9.718 - APORTES
FINANCEIROS ESTRANHOS - PROPOSTA DE SÚMULA VINCULANTE
(Ministra Ellen Gracie, Presidente da Comissão de Jurisprudência, do STF)
Proposta de Súmula Vinculante 22
Origem: PSV - 40820 - Supremo Tribunal Federal
Proced.: Distrito Federal
Propte(s).: Supremo Tribunal Federal

1. Trata-se de proposta interna de edição de súmula vinculante que enuncie a inconstitucionalida-


de da definição de receita bruta contida no art. 3º, § 1º, da Lei 9.718, de 27.11.1998, que, ao conside-
rar nela compreendidos os aportes financeiros estranhos às receitas oriundas do estrito exercício das
atividades empresariais de venda de mercadorias e de prestação de serviços de qualquer natureza,
ampliou a base de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e da Contribui-
ção para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Publicado edital para ciência de eventuais interessados (fls. 16-18), manifestaram-se tempestiva-
mente escritórios de advocacia (fls. 20-22, 106-110, 112-114, 249-253, 311-312, 338-346 e 357-359),
a União, representada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (fls. 48-51), a Confederação Na-
cional da Indústria (fls. 53 e 81-83), além de empresas privadas (fls. 142-144, 155-156, 166-167, 179-180
e 352-355).
Por força do despacho de fl. 350, determinei que a Secretaria submetesse os autos, sucessivamen-
te, aos demais integrantes desta Comissão para que pudessem se manifestar sobre a adequação formal
da presente proposta, tudo conforme o art. 1º da Resolução STF 388, de 05.12.2008.
Os eminentes Ministros Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa, respectivamente às fls. 363-364
e 381-383, consideraram a proposição ora em exame formalmente adequada.
2. Verifico que a presente proposta interna está suficientemente fundamentada e devidamente ins-
truída com a indicação dos precedentes em que este Supremo Tribunal Federal examinou e decidiu a
questão constitucional em tela.
3. Ante o exposto, também eu manifesto-me pela formal adequação da proposta.
Encerrada a atuação desta Comissão de Jurisprudência, encaminhe a Secretaria os presentes autos
ao Senhor Presidente, o eminente Ministro Gilmar Mendes, após o cumprimento das providências
previstas no art. 2º da Resolução STF 388/2008.
Publique-se.
Brasília, 13 de outubro de 2009.
Ministra Ellen Gracie
Presidente da Comissão de Jurisprudência
(DJe de 19.10.2009, p. 24)

NOTA DA DIALÉTICA
Vide Íntegras de Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT 144:119 e 152:156) e do TRF da 4ª Região - 1ª
Turma (RDDT 114:147), e Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT 143:209 e 165:203).

COFINS - ISENÇÃO - SOCIEDADES CIVIS DE PROFISSÃO REGULAMENTADA -


REVOGAÇÃO PELA LEI 9.430 - NECESSIDADE DE SOBRESTAMENTO DE
PROPOSTA DE SÚMULA VINCULANTE
(Ministra Ellen Gracie, Presidente da Comissão de Jurisprudência, do STF)
Proposta de Súmula Vinculante 27
Origem: PSV - 40806 - Supremo Tribunal Federal
Proced.: Distrito Federal
Propte(s).: Supremo Tribunal Federal

1. Trata-se de proposta interna de edição de súmula vinculante que enuncie a constitucionalidade


da revogação, prevista no art. 56 da Lei 9.430/96, da isenção no recolhimento da Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social devida pelas sociedades civis de prestação de serviços de profis-
são legalmente regulamentada, ante a inexistência de invasão, pela lei ordinária, de assunto de regula-
mentação reservada à lei complementar.
Logo após a autuação da presente proposta, foi a ela juntada manifestações de escritórios de advo-
cacia (fls. 15-18, 130-139), do Partido da Social Democracia Brasileiro (fls. 65-68) e do Centro de
Estudos das Sociedades de Advogados (fls. 93-98).
Publicado edital para ciência de eventuais interessados (fls. 150-151), manifestaram-se o Conse-
lho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (fls. 153-162), a União, representada pela Procurado-
ria-Geral da Fazenda Nacional (fls. 176-179), além de escritórios de advocacia (fls. 189-193, 252, 267-
286 e 306-309).
Por força do despacho de fl. 304, determinei que a Secretaria submetesse os autos, sucessivamen-
te, aos demais integrantes desta Comissão para que pudessem se manifestar sobre a adequação formal
da presente proposta, tudo conforme o art. 1º da Resolução STF 388, de 05.12.2008.
Os eminentes Ministros Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa, respectivamente às fls. 370 e
373-374, consideraram a proposição ora em exame formalmente adequada.
2. Os processos em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento conjunto finali-
zado em 17.09.2008, apreciou e decidiu a questão constitucional em tela foram os Recursos Extraor-
dinários 377.457 e 381.964, ambos de relatoria do eminente Ministro Gilmar Mendes.
Verifico no andamento processual dos feitos acima indicados que, após a publicação dos acórdãos
nos Diários da Justiça Eletrônicos de 19.12.2008 e 13.03.2009, foram opostos embargos de declara-
ção pelos escritórios de advocacia recorrentes e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil. Tendo sido a mim atribuída, por substituição regimental, a relatoria desses declaratórios, neles
detectei a existência de pretensão modificativa, circunstância que me levou a abrir prazo para que a
parte recorrida, a União, oferecesse contra-razões, que já foram devidamente juntadas aos autos. Am-
bos os feitos encontram-se, no momento, na Procuradoria-Geral da República para elaboração de pa-
recer.
3. Entendo, portanto, com a devida vênia, que tudo recomenda a cautela de se aguardar o julga-
mento plenário dos referidos embargos de declaração opostos nos Recursos Extraordinários 377.457
e 381.964 que pode, eventualmente, provocar alguma alteração no que foi anteriormente julgado.
Em suma, a apreciação da presente proposta interna neste momento em que ainda pende de aprecia-
ção definitiva dos feitos representativos do entendimento que se pretende sumular desatenderia o re-
quisito formal da comprovação da existência de reiteradas decisões na matéria ora tratada.
4. Ante todo o exposto, considerando a pendência de julgamento, no Plenário, dos embargos de
declaração opostos nos autos dos Recursos Extraordinários 377.457 e 381.964, ambos de minha rela-
toria, manifesto-me pela necessidade do sobrestamento da presente proposta interna de edição de
súmula vinculante até que aqueles recursos sejam apreciados pelo Plenário do Supremo Tribunal Fe-
deral.
Encerrada a atuação desta Comissão de Jurisprudência, encaminhem-se os presentes autos à Presi-
dência do Supremo Tribunal Federal.
Encaminhe-se cópia da presente manifestação ao Senhor Procurador-Geral da República.
Publique-se.
Brasília, 14 de outubro de 2009.
Ministra Ellen Gracie
Presidente da Comissão de Jurisprudência
(DJe de 19.10.2009, pp. 24/5)

CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - TIPIFICAÇÃO DEPENDENTE DO


ANTERIOR LANÇAMENTO DEFINITIVO - PROPOSTA DE SÚMULA VINCULANTE
(Ministra Ellen Gracie, Presidente da Comissão de Jurisprudência, do STF)
Proposta de Súmula Vinculante 29
Origem: PSV - 40801 - Supremo Tribunal Federal
Proced.: Distrito Federal
Propte(s).: Supremo Tribunal Federal
1. Trata-se de proposta interna de edição de súmula vinculante que enuncie que a tipificação dos
crimes materiais contra a ordem tributária, previstos no art. 1º da Lei 8.137, de 27.12.1990, depende
do anterior lançamento definitivo do tributo.
Publicado edital para ciência de eventuais interessados (fls. 36-37), foram juntadas aos autos, tem-
pestivamente, as manifestações de fls. 22-26 e 66-78, ambas apresentadas por advogados.
Por força do despacho de fl. 64, determinei que a Secretaria submetesse os autos, sucessivamente,
aos demais integrantes desta Comissão para que pudessem se manifestar sobre a adequação formal da
presente proposta, tudo conforme o art. 1º da Resolução STF 388, de 05.12.2008.
Os eminentes Ministros Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa, respectivamente às fls. 92-93 e
96-97, consideraram a proposição ora em exame formalmente adequada.
2. Verifico que a presente proposta interna está suficientemente fundamentada e devidamente ins-
truída com a indicação dos precedentes em que este Supremo Tribunal Federal examinou e decidiu a
questão constitucional em tela.
3. Ante o exposto, também eu, sem adiantar qualquer juízo quanto à possibilidade de edição de
súmula vinculante nesta matéria, manifesto-me pela formal adequação da proposta.
Encerrada a atuação desta Comissão de Jurisprudência, encaminhe a Secretaria os presentes autos
ao Senhor Presidente, o eminente Ministro Gilmar Mendes, após o cumprimento das providências
previstas no art. 2º da Resolução STF 388/2008.
Publique-se.
Brasília, 13 de outubro de 2009.
Ministra Ellen Gracie
Presidente da Comissão de Jurisprudência
(DJe de 19.10.2009, p. 25)

NOTA DA DIALÉTICA
Vide Íntegras de Acórdãos do STF - 1ª Turma (RDDT 106:159 e 109:139), e Acórdãos do STF - Ple-
no (RDDT 118:205) e do STF - 1ª Turma (RDDT 108:218, 110:222 e 151:208).

ICMS - MERCADORIAS ADVINDAS DE OUTROS ESTADOS - EXIGÊNCIA DE


PAGAMENTO ANTECIPADO DA DIFERENÇA ENTRE ALÍQUOTAS
ESTADUAL E INTERNA - POSSIBILIDADE
(Desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro, do TJRGS)

Agravo de Instrumento nº 70032178170

Vigésima Segunda Câmara Cível - Comarca de Porto Alegre


Agravante: CDL - Câmara de Dirigentes Lojistas de Igrejinha e Três Coroas
Agravado: Diretor do Departamento da Receita Pública Estadual

Agravo de Instrumento. Direito Tributário. Mandado de Segurança. ICMS. Mercadorias Advin-


das de Outros Estados. Exigência Antecipada pelo Fisco Estadual do Pagamento da Diferença
de ICMS entre a Alíquota Interestadual e a Interna no Momento do Ingresso no Estado. Possi-
bilidade porque Existente Previsão Legal Autorizadora.
A exigência do pagamento da diferença de alíquota do ICMS entre a alíquota interestadual e a
interna é possível porque houve a edição da Lei Estadual nº 12.741/07, que deu nova redação
ao artigo 24 da Lei nº 8.820/89, permitindo o recolhimento antecipado do imposto, sendo, pois,
perfeitamente legal o procedimento adotado pelo fisco estadual.
Precedentes do TJRGS e STJ.
Agravo de instrumento com seguimento negado.

Decisão Monocrática
Vistos etc.
Nego seguimento ao presente agravo de instrumento, forte no art. 557, “caput”, do CPC, porque se
trata de recurso manifestamente improcedente.
Ressalvo o posicionamento que até então vinha adotando em casos análogos, e modifico minha
posição, passando a adotar o posicionamento da 22ª Câmara Cível, bem como do 11º Grupo Cível, do
qual a 22ª Câmara Cível faz parte, no sentido da ausência de irregularidade na exigência antecipada
da diferença de alíquota interestadual do ICMS quando do ingresso no Estado do Rio Grande do Sul
de mercadorias oriundas de outros Estados.
Isto porque não há qualquer sentido prático na manutenção da posição antes adotada quando a
mesma será fatalmente revertida no Órgão Fracionário, bem como no Grupo, apenas gerando falsas
expectativas aos contribuintes que, ao final, não terão êxito na demanda, apenas ocorrendo, de forma
desnecessária, a proliferação de ações, quando o resultado final é certo e contrário às pretensões do
contribuinte.
Por estas razões, e observando que uma das funções do Tribunal de Justiça é a uniformização de
jurisprudência, gerando a tranqüilidade jurídica, passo a adotar o novo posicionamento, embora, rei-
tero, ressalvando minha posição anterior.
Em conseqüência deste novo posicionamento, não há que se falar em violação ao princípio da le-
galidade no tocante à exigência antecipada da diferença de alíquota interestadual do ICMS quando do
ingresso de mercadorias oriundas de outros Estados porque houve a edição da Lei Estadual nº 12.741/07,
que deu nova redação ao artigo 24 da Lei nº 8.820/89:
“Art. 24 - O imposto será pago em estabelecimento bancário credenciado, na forma e nos pra-
zos previstos em regulamento. (...)
§ 6º - Na hipótese de estabelecimento comercial adquirir, sem substituição tributária, as merca-
dorias relacionadas no Apêndice II, Seção II, item I, o imposto decorrente do débito próprio re-
lativo à operação subseqüente é devido: a) na entrada das mercadorias no território deste Es-
tado, se adquiridas de outra unidade da Federação ou importadas e não desembaraçadas neste
Estado; b) no desembaraço das mercadorias, se importadas e desembaraçadas neste Estado;
c) na aquisição, em licitação pública, das mercadorias, se importadas do exterior e apreendi-
das ou abandonadas.
§ 7º - Além das hipóteses previstas no parágrafo anterior, sempre que houver necessidade ou con-
veniência, poderá ser exigido o pagamento antecipado do imposto, com a fixação, se for o caso,
do valor da operação ou da prestação subseqüente, a ser realizada pelo próprio contribuinte,
exceto nas saídas de couro e de pele, classificados no Capítulo 41 da NBM/SH-NCM.
§ 8º - O imposto será pago antecipadamente, total ou parcialmente, no momento da entrada das
mercadorias relacionadas em regulamento no território deste Estado, se recebidas de outra uni-
dade da Federação por estabelecimento que comercialize mercadorias.
§ 9º - Relativamente ao imposto devido conforme disposto no § 8º, o Poder Executivo poderá,
nas condições previstas em regulamento, autorizar que o pagamento seja efetuado em prazo pos-
terior.”
Logo, foi sanada a irregularidade anteriormente existente porque agora a determinação de recolhi-
mento antecipado do imposto não decorre mais por força de Decreto, mas por força de lei, sendo, pois,
perfeitamente legal o procedimento adotado pelo Fisco Estadual.
Neste sentido:
Tributário. ICMS. Operação Interestadual. Diferença de Alíquota. Ilegitimidade Ativa ad Cau-
sam. Contribuinte. Estado Destinatário. 1. Nas operações interestaduais de ICMS destinadas a
contribuinte do imposto, é devido ao Estado da localização do destinatário a diferença entre a
alíquota interna e a interestadual. O ICMS relativo à saída de mercadorias adquiridas de outras
Unidades da Federação deve ser pago, antecipadamente, por ocasião da entrada da mercadoria
no território, nos termos do artigo 24 da lei nº 8.820/89. 2. O contribuinte localizado no Estado
exportador não tem legitimidade ativa ad causam para impugnar a cobrança antecipada da dife-
rença entre as alíquotas por não ser o sujeito ativo da obrigação tributária. Incumbe ao contri-
buinte destinatário da mercadoria a obrigação de pagar, antecipadamente, a diferença entre as alí-
quotas. Recurso provido por ato do Relator. Art. 557 do Código de Processo Civil. (Apelação
Cível nº 70029046489, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em 31/03/2009)

Apelação Cível/Reexame Necessário. Tributário. Mandado de Segurança. ICMS. Hipótese de In-


cidência. Mercadorias Oriundas de Outra Unidade da Federação. Diferença entre as Alíquotas
Interna e Interestadual quando do Ingresso das Mercadorias no Estado. Possibilidade. A partir
da edição da Lei nº 12.741/2007, que introduziu a alínea ‘c’ ao inciso II do art. 15 da Lei nº 8.820/89,
é possível a cobrança antecipada de ICMS quando da entrada no território do Estado do Rio
Grande do Sul, de mercadoria oriunda de outra unidade da Federação. Apelação provida, preju-
dicado o reexame necessário. Voto vencido. (Apelação e Reexame Necessário nº 70025279951,
Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Jul-
gado em 10/12/2008)
Com o mesmo entendimento o STJ, consoante decisão monocrática:
Recurso Especial nº 1.081.180 - RS (2008/0179510-9)
Relator: Ministro Herman Benjamin
Recorrente: Estado do Rio Grande do Sul
Procurador: Maria Beatriz de Oliveira e Outro(s)
Recorrido: S/A Fósforos Gaboardi
Advogado: Carlos Francisco Camilotti Monteiro e Outro(s)
Decisão
Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, “c”, da Constituição
da República, contra acórdão assim ementado (fl. 165):
Apelação Cível. Tributário. Mandado de Segurança. ICMS. Hipótese de Incidência. Mercadorias
Oriundas de Outra Unidade da Federação. Diferença entre as Alíquotas Interna e Interestadual
quando do Ingresso das Mercadorias no Estado. Ilegalidade da Exigência.
Não pode o Fisco exigir, com base em Decreto, a diferença entre as alíquotas interna e interesta-
dual de ICMS quando do ingresso das mercadorias no Estado, uma vez que ainda não ocorrido
o fato gerador.
Inaplicável o disposto na Lei Estadual n. 12.741/2007 que deu nova redação ao art. 15 da Lei
n. 8.820/89 porque definiu nova hipótese de incidência de ICMS sobre a entrada de mercadoria
no estabelecimento, oriunda de outra Unidade da Federação (art. 104, II e art. 150, III, letra ‘a’
da CF).
Apelação desprovida.
Sentença mantida em reexame necessário.
Voto vencido.
O recorrente aponta dissídio com precedentes do STJ que admitem a antecipação do ICMS, na
hipótese (fl. 183).
A recorrida não apresentou contra-razões (fl. 200).
O Recurso foi admitido na origem (fl. 203, verso).
É o relatório.
Decido.
Os autos foram remetidos a este Gabinete em 7.10.2008.
A questão tratada nos autos refere-se à exigência antecipada, pelo Estado do Rio Grande do Sul,
de parcela do ICMS relativo à comercialização de determinadas mercadorias. Esse montante, equi-
valente à diferença entre a alíquota interestadual e a interna, é cobrado na entrada do bem no ter-
ritório estadual.
O Tribunal de origem afastou a exigência, entendendo tratar-se de cobrança anterior ao fato ge-
rador, o que seria inviável. A única hipótese de antecipação do recolhimento seria a da substitui-
ção tributária, que não é o caso discutido aqui.
Há notório dissídio com a jurisprudência do STJ.
De fato, conforme sustenta o recorrente, há diversos precedentes desta Corte que reconheceram
a possibilidade de cobrança antecipada do ICMS, ainda que não se trate de substituição tributá-
ria “para frente”, especificamente no caso dos Estados do Rio Grande do Sul (hipótese dos au-
tos) e de Sergipe:
Tributário e Constitucional - ICMS - Mandado de Segurança - Antecipação Tributária - Legali-
dade - Suspensão da Exigibilidade do Tributo - Impossibilidade.
1. A controvérsia essencial dos autos restringe-se à legalidade da incidência do ICMS, na forma
do art. 8º, XV, da Lei do Estado de Sergipe n. 3.796/1996, que estabelece a antecipação tributá-
ria de mercadorias ou de bens provenientes de outros Estados da Federação.
2. Ao contrário do alegado pelo recorrente, inexiste ilegalidade ou arbitrariedade na adoção do
regime de antecipação tributária, nos moldes eleitos pela recorrida; não havendo, outrossim, com-
provação de que a imposição do aludido regime viola qualquer direito líquido e certo do impe-
trante.
Recurso em mandado de segurança improvido.
(RMS 19.885/SE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 28.11.2006, DJ
11.12.2006 p. 334).
Tributário. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. RICMS. Inclusão de Empresa no Re-
gime Especial de Tributação (art. 150, § 7º, da CF). Lei Estadual n. 3.796/96. Legalidade. Ine-
xistência de Direito Líquido e Certo.
1. Os atos perpetrados pelos agentes fiscais, em cumprimento ao regime do sistema de fiscaliza-
ção especial previsto na Lei Estadual n. 3.796/96, a que foi submetido o contribuinte inadimplente,
são legítimos se realizados dentro dos limites estabelecidos na lei.
2. “O artigo 150, § 7º, acrescido pela Emenda Constitucional n. 03/93, legitima a cobrança an-
tecipada do ICMS através do regime de [sic] normal de tributação, ou seja, sem substituição tri-
butária, na forma determinada pela Lei Estadual n. 3.796/96, do Estado de Sergipe, e regulamenta-
da pelo Decreto n. 17.037/97, com alterações procedidas pelos Decretos ns. 18.536/99 e 20.471/02”
(RMS n. 17511/SE, relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 22.8.2005).
3. A inclusão do contribuinte no sistema especial de controle e fiscalização, desde que prevista
em lei, não implica violação de direito líquido e certo, estando comprovadas irregularidades fis-
cais referentes à sonegação de tributos.
4. Recurso ordinário não-provido.
(RMS 20.520/SE, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em
02.02.2006, DJ 21.03.2006 p. 107).
Tributário. ICMS. Regime de Pagamento Antecipado sem Substituição Tributária. Decreto Esta-
dual 39.820/99. Lei Estadual 8.820/89.
1. É legítima a cobrança antecipada do ICMS através do regime normal de tributação, vale di-
zer, sem substituição tributária, na forma preconizada pela Lei Estadual 8.820/89 e pelo Decreto
Estadual nº 39.820/99.
2. Precedentes jurisprudenciais do STJ: RMS 17.511/SE, Relator Ministro Teori Zavascki, DJ
de 22.08.2005; RMS 17303/SE, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 13.09.2004 e EDcl no
RMS 16098/SE, Relator Ministro José Delgado, DJ de 17.11.2003.
3. Recurso especial provido.
(REsp 722.207/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 28.11.2006, DJ
14.12.2006, p. 258)
É possível, conforme a jurisprudência pacífica do STJ, o recolhimento antecipado do ICMS (par-
cela dele, no caso dos autos), no regime normal de tributação, ou seja, sem substituição tributá-
ria.
Diante do exposto, nos termos do art. 557, § 1º-A, do CPC, dou provimento ao Recurso Espe-
cial.
Publique-se.
Intimem-se.
Brasília (DF), 15 de outubro de 2008.
Ministro Herman Benjamin
Relator
Diante do exposto, nego seguimento ao presente agravo de instrumento.
Comunique-se à eminente Magistrada.
Intimem-se.
Porto Alegre, 11 de setembro de 2009.
Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro,
Relator.

ISS - LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS - DISTINÇÃO DA PRESTAÇÃO OU


LOCAÇÃO DE SERVIÇOS - PROPOSTA DE SÚMULA VINCULANTE
(Ministra Ellen Gracie, Presidente do STF)

Proposta de Súmula Vinculante 35

Origem: PSV - 40811 - Supremo Tribunal Federal


Proced.: Distrito Federal
Propte(s).: Supremo Tribunal Federal

1. Trata-se de proposta interna de edição de súmula vinculante que enuncie a inconstitucionalida-


de da incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre as operações de loca-
ção de bens móveis, que não se confundem com a prestação ou a locação de serviços.
Publicado edital para ciência de eventuais interessados (fls. 9-10), manifestaram-se tempestivamente
a Confederação Nacional da Indústria (fls. 12 e 46), escritórios de advocacia (fls. 61, 142-147 e 286-289),
além de empresa privada (fls. 255-260).
Por força do despacho de fl. 284, determinei que a Secretaria submetesse os autos, sucessivamen-
te, aos demais integrantes desta Comissão para que pudessem se manifestar sobre a adequação formal
da presente proposta, tudo conforme o art. 1º da Resolução STF 388, de 05.12.2008.
Os eminentes Ministros Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa, respectivamente às fls. 300 e
303-304, consideraram a proposição ora em exame formalmente adequada.
2. Verifico que a presente proposta interna está suficientemente fundamentada e devidamente ins-
truída com a indicação dos precedentes em que este Supremo Tribunal Federal examinou e decidiu a
questão constitucional em tela.
3. Ante o exposto, também eu manifesto-me pela formal adequação da proposta.
Encerrada a atuação desta Comissão de Jurisprudência, encaminhe a Secretaria os presentes autos
ao Senhor Presidente, o eminente Ministro Gilmar Mendes, após o cumprimento das providências
previstas no art. 2º da Resolução STF 388/2008.
Publique-se.
Brasília, 13 de outubro de 2009.
Ministra Ellen Gracie
Presidente da Comissão de Jurisprudência
(DJe de 19.10.2009, p. 25)

ITBI - BASE DE CÁLCULO - VALOR REAL DE MERCADO -


LANÇAMENTO POR ARBITRAMENTO - POSSIBILIDADE
(Desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro, do TJRGS)

Apelação Cível nº 70031946189

Vigésima Segunda Câmara Cível - Comarca de Porto Alegre


Apelante: Município de Porto Alegre
Apelado: Juliano Rauber

Apelação Cível. Direito Tributário. Ação Declaratória. ITBI. Base de Cálculo. O IPTU tem por
Base a Planta Genérica de Valores para o Cálculo do Respectivo Imposto, ao Passo que o ITBI
observa o Valor Real de Mercado. Lançamento por Arbitramento. Possibilidade. Presunção de
Legalidade Relativa. Ônus da Prova. Descumprimento.
Não há direito do contribuinte em recolher o ITBI utilizando como base de cálculo o valor venal
do imóvel observado pela Municipalidade para incidência do IPTU, que tem como parâmetro
planta genérica para o respectivo cálculo, ao passo que o ITBI tem por base o valor venal do
imóvel, passível de arbitramento, na forma do artigo 148 do CTN, inexistindo demonstração de
qualquer excesso praticado pelo fisco municipal no arbitramento efetuado.
Descumprimento do ônus probatório que incumbia ao contribuinte, que não desfez a presunção
de legalidade que se reveste o ato administrativo.
Inteligência dos artigos 146, inciso III, alínea a, e 156, incisos I e II, da CF; 33, 38 e 148, do
CTN; 5º da LC nº 07/73 e 11, da LC nº 197/89, legislação esta do Município de Porto Alegre.
Precedentes do STJ e do TJRGS.
Apelação do réu provida liminarmente.
Recurso adesivo a que se nega provimento.

Decisão Monocrática
Vistos etc.
Juliano Rauber ajuizou ação declaratória contra o Município de Porto Alegre, objetivando ver re-
conhecido o direito de recolher ITBI com base de cálculo no valor venal atribuído pelo réu para efeito
de incidência do IPTU, sobrevindo a prolação de sentença com o seguinte dispositivo:
“Diante do exposto, julgo procedente em parte o pedido ajuizado por Juliano Rauber contra o
Município de Porto Alegre para declarar que a base de cálculo para fins de ITBI deverá ser o valor
da transação realizada.
Em virtude da sucumbência recíproca, as custas processuais serão suportadas por metade por cada
parte, sendo que cada litigante arcará com os honorários advocatícios de seus patronos.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se, inclusive o Ministério Público.”
Inconformado, apela o réu. Assevera que não existe identidade de base de cálculo entre o ITBI e o
IPTU, procedendo em análise comparativa da legislação pertinente. Argumenta que inexiste direito
subjetivo do contribuinte de calcular e recolher o ITBI pelo valor que entende “correto”, uma vez que
este, de regra, é diverso (menor) do real valor de mercado do imóvel. Aduz que a matéria demanda
produção de prova pericial, que foi negligenciada pela parte autora. Destaca a presunção de legalida-
de e legitimidade que se reveste o ato administrativo, razão pela qual cumpre ao demandante o ônus
de provar suas alegações, nos termos do art. 333, I, do CPC. Colaciona doutrina e jurisprudência, dis-
correndo sobre a legislação municipal sobre a matéria. Requer o provimento do recurso, para que seja
reformada a sentença hostilizada, julgando-se totalmente improcedente a ação, com a condenação do
autor nos ônus de sucumbência.
O autor apresentou contra-razões à apelação, fls. 153-158, interpondo na oportunidade recurso
adesivo. Em suas razões recursais, afirma que a sentença é extra petita pois, ao declarar que a base de
cálculo do ITBI seria o valor da transação, decidiu-se fora do pedido inicial, que postula tão-somente
a identidade de base de cálculo de ITBI e IPTU para os imóveis de sua propriedade. Reitera argumen-
tação anteriormente despendida na inicial, tecendo considerações sobre a legislação pertinente aos tri-
butos em comento, aduzindo possuírem a mesma base de cálculo, qual seja, o valor venal do imóvel,
que não pode ser diverso quando cobrado pelo mesmo ente. Colaciona doutrina e jurisprudência, des-
tacando os valores utilizados para o lançamento do IPTU e os pretendidos para fins de cálculo do ITBI.
Requer a total procedência da ação, para que seja reconhecido o direito de recolher o ITBI conside-
rando como base de cálculo o valor venal fixado e utilizado pelo Município na cobrança de IPTU dos
imóveis.
Contra-razões do Município às fls. 168-169.
Nesta instância, o Ministério Público opina pelo conhecimento e provimento da apelação do réu,
restando prejudicado o recurso adesivo do autor, fls. 177-194.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.

Dou provimento liminarmente à presente apelação, negando provimento ao recurso adesivo, forte
no art. 557, § 1º-A, do CPC, admitido o julgamento singular, observada a posição desta Câmara e de
outros órgãos fracionários deste Tribunal de Justiça sobre o tema.
Inicialmente, afasto a prefacial de nulidade da sentença, suscitada no recurso adesivo interposto
porque a sentença em questão não é nula, tendo a eminente Magistrada decidido a questão de acordo
com seu convencimento, fixando o valor do imposto de acordo com o valor da transação efetuada pelo
autor, observada a incidência de norma legal que determina que o imposto será calculado de acordo
com o valor venal praticado, não podendo desbordar de tal texto legal, por este motivo, desacolhendo
parcialmente a pretensão do demandante que era a coincidência de valores do ITBI e IPTU, isto é,
pretensão de cálculo do imposto em valor inferior ao valor venal, o que não é admissível, como será
visto no mérito do recurso.
Não fosse isto, a solução final da lide autoriza, de igual forma, o afastamento da prefacial de nuli-
dade da sentença.
Passo a análise de mérito da ação.
Com efeito, o ponto nodal da lide cinge-se na diferença de valores utilizados pelo demandado para
o cálculo de IPTU e do ITBI, no caso, a avaliação fiscal municipal para efeito do cálculo do IPTU atin-
giu o montante de R$ 75.396 (Apartamento nº 902), fls. 24-25, e de R$ 7.394,14 (Box nº 03), ao passo
que a avaliação para efeito de incidência de ITBI chegou à quantia de, respectivamente, R$ 98.500,00;
e R$ 14.000,00, conforme guias de fls. 22-23.
Primeiramente, sobre o IPTU e o ITBI, deve-se observar os termos dos artigos 33 e 38 do CTN, in
verbis:
“Seção II
Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana
(...)
Art. 33. A base do cálculo do imposto é o valor venal do imóvel.”
(...)
Seção III
Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a eles Relativos.
(...)
Art. 38. A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos.”
A Constituição Federal, por sua vez, trata da matéria nos artigos 146, inciso III, alínea a, e 156,
incisos I e II:
“Art. 146. Cabe à lei complementar:
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados
nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
I - propriedade predial e territorial urbana
II- transmissão ‘inter vivos’, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza
ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de
direitos a sua aquisição.”
Em relação à legislação do Município de Porto Alegre, os tributos mencionados são regulados em
parte pelos artigos 5º da LC nº 07/73, que trata do IPTU, e 11, da LC nº 197/89, que institui e discipli-
na o ITBI:
“LC 07/73:
(...)
Art. 5º - A base de calculo do imposto é o valor venal do imóvel”.

“LC 197/89:
(...)
Art. 11 - A base de cálculo do imposto é o valor venal do imóvel objeto da transmissão ou da
cessão de direitos reais a ele relativos, no momento da estimativa fiscal efetuada pelo Agente
Fiscal da Receita Municipal.”
O termo “valor venal”, segundo ensinamento de Aires Fernandino Barreto, in Curso de Direito
Tributário, coordenado por Ives Gandra Martins, 8ª ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 739 e 753, “(...)
é o preço provável que o imóvel alcançará para compra e venda à vista, diante de mercado estável e
quando comprador e vendedor têm plena consciência do potencial de uso e ocupação que ao imóvel
pode ser dado.”
Todavia, o valor venal do imóvel “(...) não corresponde necessariamente ao valor pelo qual se
efetuou a transação”, ressalvando-se que “(...) caso se tenha efetivado uma transação imobiliária por
valor inferior àquele estabelecido pela Municipalidade para o cálculo do IPTU, devidamente atuali-
zado, este último prevalecerá. (...) na falta de outros elementos, utilize-se como base de cálculo do
ITBI o mesmo valor previsto pela Municipalidade para o imóvel para fins de tributação pelo IPTU,
devidamente atualizado.” (José Mauricio Conti, in imposto de transmissão de bens imóveis (ITBI):
principais questões, artigo publicado na Revista de Direito Tributário, São Paulo, Malheiros, 1996,
v. 74, p. 188-189).
Isto porque a “fixação do elemento temporal do fato gerador do IPTU é incumbência de lei ordi-
nária municipal. A data normalmente eleita é o dia 1º de janeiro de cada exercício, momento em que
se identifica o contribuinte e a base de calculo e demais aspectos do imposto, sem qualquer interfe-
rência de ulteriores modificações inclusive quando à condição do imóvel”, sendo que “(...) o momento
para se determinar a base de cálculo [do ITBI] é o dia da transmissão, que se considera como data
da ocorrência do fato gerador. Assim, posterior alteração do valor do bem (para mais ou para me-
nos) implicando a modificação do valor venal (terreno em que tenham sido feitas edificações, prédio
que tenha sido reformado ou demolido), não enseja tributação sobre a nova valoração, mais sim deve
ser observado o objeto da transmissão tributada quando da realização do respectivo negócio”, lição
de José Jayme de Macedo, in Impostos Municipais: ISS, ITBI, IPTU: comentários, doutrina e juris-
prudência, p. 273 e 243, Saraiva, São Paulo, 2009.
Na mesma obra, o autor registra que “(...) os valores de compra e venda de qualquer bem variam
entre o ponto mínimo e um ponto ótimo, todos constituindo valores venais. Sendo assim, tal definição
legal, para o IPTU, deve funcionar como limite, e não como montante que necessariamente é de ser
base de cálculo. De enfatizar que a própria determinação do valor do imóvel para fins de cálculo desse
imposto reveste condição de presunção relativa, plenamente mutável no tempo em virtude de circuns-
tâncias alheias ou não à vontade de seu proprietário”, obra citada, fl. 287.
Em relação à controvérsia posta nos autos, sobre a identidade entre a base de cálculo do IPTU e a
do ITBI, aduz que “(...) soa no mínimo estranha a existência de diferença na quantificação da base
imponível do IPTU e do ITBI (base calculada), por implicar desarmonia e incompatibilidade no sis-
tema tributário. Esse modo de ver a quaestio busca amparo no fato de que, quando a administração
tributária do Município determina o valor venal do IPTU por via de lançamento direto (sem qualquer
participação dos contribuintes), vincula-se, por conseqüência, para fins do ITBI, considerando que a
base legal para cálculo desses impostos é a mesma, obra citada, fl. 313.
Contudo, conclui às fls. 313-314 que “(...) cabe aos legisladores ordinários estabelecer os crité-
rios de valoração dos tributos, funcionando a lei complementar como indicativa dos limites de tal mis-
ter. Daí, quer para um, quer para outro imposto, o CTN fixa valor venal do bem como parâmetro,
incumbindo as leis ordinárias próprias estabelecerem a forma de quantificar-se cada um, segundo
métodos que podem ser distintos. E tanto isso é verdade que a maioria delas começa por definir para
o IPTU o lançamento direto e para o ITBI, o por declaração, além de determinar para o primeiro a
adoção de plantas e valores (estimativa) e para o segundo, a verificação do preço de mercado, caso
a caso. Ressalta-se, logo, que a questão se transfere para o plano normativo, e não prático, pelo que
se explica divergirem base impositivas concretas para tais impostos, ainda que relativamente a um
mesmo imóvel.”
Desta forma, não há que se falar em direito do contribuinte em recolher o ITBI utilizando como
base de cálculo o valor venal do imóvel atribuído pela Municipalidade para efeito de incidência do
IPTU, que tem como parâmetro planta genérica para o respectivo cálculo, tendo em vista as particula-
ridades de cada tributo, que ocasionam a diversidade de valores, principalmente levando-se em conta
o aspecto temporal dos seus fatos geradores e a sua forma de lançamento.
Neste sentido, precedente desta Câmara, em caso análogo ao presente feito, na Apelação Cível nº
70028964161, de minha Relatoria, julgado em 30/04/2009:
Apelação Cível. Direito Tributário. Ação Declaratória. ITBI. Base de Cálculo. O IPTU tem por
Base a Planta Genérica de Valores para o Cálculo do Respectivo Imposto, ao Passo que o ITBI
observa o Valor Real de Mercado. Lançamento por Arbitramento. Possibilidade. Presunção de
Legalidade Relativa. Ônus da Prova. Descumprimento. Não há direito do contribuinte em reco-
lher o ITBI utilizando como base de cálculo o valor venal do imóvel observado pela Municipali-
dade para incidência do IPTU, que tem como parâmetro planta genérica para o respectivo cálcu-
lo, ao passo que o ITBI tem por base o valor venal do imóvel, passível de arbitramento, na for-
ma do artigo 148 do CTN, inexistindo demonstração de qualquer excesso praticado pelo fisco
municipal no arbitramento efetuado. Descumprimento do ônus probatório que incumbia ao con-
tribuinte, que não desfez a presunção de legalidade que se reveste o ato administrativo. Inteligência
dos artigos 146, inciso III, alínea a, e 156, incisos I e II, da CF; 33, 38 e 148, do CTN; 5º da LC
nº 07/73 e 11, da LC nº 197/89, legislação esta do Município de Porto Alegre. Precedentes do
STJ e do TJRGS. Apelação conhecida em parte e, no ponto, provida. (Apelação Cível nº
70028964161, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos
Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 30/04/2009)
De igual sorte, preclara jurisprudência deste Tribunal de Justiça, citando-se:
Apelação Cível. Direito Tributário. ITBI. Base de Cálculo. Valor da Avaliação. Ausência de Pro-
vas a demonstrar Excesso na Avaliação Realizada pelo Município. 1 - À autoridade fiscal é dado
arbitrar a base de cálculo do imposto, sempre que as informações fornecidas pelo sujeito passi-
vo levantarem suspeitas. Inteligência do art. 148 do CTN. 2 - Caso concreto em que não há pro-
vas a demonstrar o excesso na avaliação realizada pelo Município. 3 - A base de cálculo do ITBI
não deve necessariamente ser a mesma do IPTU, tendo em vista que, embora em ambos os ca-
sos, a previsão legal seja o ‘valor venal’ do imóvel, eles são apurados em momentos distintos.
Apelação Desprovida. (Apelação Cível nº 70024684888, Segunda Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 26/11/2008)

Tributário. Valor Venal. O art. 38 do CTN, refere que a base de cálculo do imposto de transmis-
são será ‘o valor venal dos bens ou direitos transmitidos’, pressupondo que se leve em conta, para
efeito de recolhimento do tributo, o valor constante da estimativa fiscal ou de negócio entabula-
do entre as partes, não cabendo usar o mesmo cálculo do IPTU para o pagamento do ITBI. De-
ram provimento ao apelo, prejudicado o reexame necessário. Unânime. (Apelação e Reexame
Necessário nº 599495348, Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 23/11/2000)
De outra parte, não concordando a Municipalidade com o valor declarado pelo contribuinte, possí-
vel a realização de arbitramento, nos termos do artigo 148 do CTN, porque a base de cálculo não é o
preço de venda, mas o valor venal, sendo que sua diferença é relevante, pois o preço é determinado
pelas partes, que são livres para contratar, e o valor dos bens é determinado pelas condições do merca-
do, em razão da oferta e da procura, conforme adverte Hugo de Brito Machado, in Curso de Direito
Tributário, 29ª Edição, Malheiros, São Paulo, p. 397, que também preleciona sobre o arbitramento no
caso do ITBI, consignando que “(...), tem-se como ponto de partida para a determinação de sua base
de cálculo na hipótese mais geral, que é a compra e venda, o preço. Este funciona no caso como uma
declaração de valor feita pelo contribuinte, que pode ser aceita, ou não, pelo fisco, aplicando-se na
hipótese de divergência, a disposição do art. 148 do CTN”, p. 398.
Neste sentido, precedentes do STJ:
Tributário. ITBI. Base de Cálculo. Lançamento pelo Fisco. Base de Cálculo. Valor de Mercado.
Art. 38 do CTN. Aplicação de Multa. Súmula 284/STF.
1. Na hipótese em que o contribuinte não recolhe o ITBI, afigura-se legítimo o lançamento efe-
tuado pelo Fisco que arbitre, como base de cálculo, o valor de mercado dos bens transmitidos.
2. A falta de indicação do dispositivo legal supostamente contrariado, por não permitir a com-
preensão de questão infraconstitucional hábil para viabilizar o trânsito do recurso especial, atrai
o óbice previsto na Súmula n. 284/STF.
2. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido.
(REsp 210.620/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 03/05/2005,
DJ 27/06/2005 p. 308)

Tributário. ITBI. Base de Cálculo. Possibilidade de Arbitramento pelo Fisco.


1. Constituindo o valor venal do bem transmitido a base de cálculo do ITBI, caso a importância
declarada pelo contribuinte se mostre nitidamente inferior ao valor de mercado, pode o Fisco
arbitrar a base de cálculo do referido imposto, desde que atendida a determinação do art. 148,
do CTN.
2. Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido.
(REsp 261.166/SP, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, julgado em 12/09/2000, DJ
06/11/2000, p. 192)
Com efeito, o arbitramento se trata de forma de tributação com base em valores estimados ou pre-
sumidos, caracterizado por possuir presunção relativa, que pode ser desfeita por prova em sentido con-
trário a cargo do contribuinte, situação inocorrente no caso, pois o autor não trouxe qualquer elemen-
to concreto capaz de demonstrar a apontada irregularidade dos cálculos apresentados, salientando-se
que declinou da produção de prova pericial, fl. 95, prova esta competente para a demonstração do real
valor do imóvel.
Neste diapasão, precedente desta 22ª Câmara Cível, na Apelação Cível nº 70011206604, em
05/05/2005, Acórdão do qual fui Relator:
Tributário. Ação Anulatória de Débito Fiscal. ICMS. Requerimento de Prova. Intempestividade.
Julgamento do Feito. Cerceamento de Defesa. Inocorrência. Desnecessidade de Instrução Pro-
batória. Inocorre cerceamento de defesa se a parte, instada a manifestar-se acerca da produção
de provas, o faz de forma intempestiva, ocorrendo o julgamento do feito, sobretudo se o exame
da matéria prescinde das provas requeridas. Autos de Lançamento Lavrados fora do Estabeleci-
mento Comercial da Autora. Agentes Lotados em Unidades Operacionais Diversas da Sede da
Autora. Nulidade. Inocorrência. O auto de lançamento é atividade vinculada e obrigatória, con-
forme art. 142, parágrafo único, do CTN, não dispondo de natureza contenciosa, não havendo
violação ao art. 5º, LV, da Constituição Federal a circunstância de ter sido efetuado o lançamen-
to fora do estabelecimento da empresa autora. Não se configura nulidade pelo fato de os lança-
mentos terem sido lavrados por agentes fiscais lotados em unidades operacionais diversas daquela
onde tem sede a requerente, porque a competência decorre da função exercida, ao passo que a
lotação do funcionário decorre do interesse da Administração. Auto de Lançamento. Presunção
de Legalidade. Arbitramento do ICMS com Base em Documentos. Possibilidade. Presunção
Relativa. Ônus da Prova. Descumprimento. O auto de lançamento é ato administrativo que goza
de presunção de legalidade, cabendo à parte que busca desconstituir tal presunção o ônus da prova.
Possível o arbitramento do ICMS com base nos documentos retidos pela Fazenda Estadual, na
forma do artigo 148 do CTN e do artigo 5º do Livro V do Decreto Estadual nº 37.699/97. Des-
cumprimento do ônus da prova, deixando a parte de produzir qualquer prova no sentido de des-
fazer a presunção de legalidade. Redução da Multa. Descabimento. Não Incidência do Código
de Defesa do Consumidor. Por não se estar diante de relação de consumo, não cabe a redução da
multa fiscal com base no CDC. A multa incide pelo inadimplemento da obrigação tributária. Ju-
ros Moratórios. Taxa Selic. Não Utilização. Incidência à Razão de 1% ao Mês. Ausência de In-
teresse da Autora. Juros moratórios que incidiram no percentual de 1% ao mês, estando de acor-
do com o art. 162, § 1º, do CTN, e do art. 69 da Lei Estadual nº 6.537/73. Ausência de interesse
da parte autora, uma vez que não foi utilizada a taxa Selic no cálculo dos juros. Prequestiona-
mento. A apresentação de questões para fins de prequestionamento não induz à resposta de to-
dos os artigos referidos pela parte, mormente porque foram analisadas todas as questões enten-
didas pertinentes para solucionar a controvérsia posta na apelação. Apelação desprovida.
De igual sorte:
Tributário. Lançamento por Arbitramento. Possibilidade. (...) Lançamento por Arbitramento. Se-
gundo regra inserta no art. 148, do CTN, pode a Administração não aceitar as declarações do con-
tribuinte e, mediante processo regular, arbitrar o valor da base de cálculo do tributo. Para instau-
ração do procedimento, basta que a autoridade fiscal detecte Indícios de irregularidades nas de-
clarações prestadas pelo contribuinte. Por outro lado, não incidiu o Fisco em erro grosseiro ou
arbitrariedade na apuração do montante devido, na medida em que efetuou o arbitramento com
base em dados constantes nos Livros e Documentos fiscais que lhes foi apresentado pelo contri-
buinte. É dever deste guardar todos os seus documentos fiscais no próprio estabelecimento, for-
necendo-os, quando solicitado, à Fiscalização, sob pena de submeter-se ao procedimento previsto
no art. 148, do CTN, presentes indícios de irregularidade na escrita fiscal a indicar sonegação de
imposto. Na ausência de documentação fiscal completa, hábil a comprovar a efetiva movimenta-
ção contábil da empresa, admissível o critério adotado consistente em considerar como custo da
mercadoria o valor total das compras respectivas, máxime porquanto calcado na documentação
existente na empresa. (...) Preliminares Rejeitadas. Apelação Parcialmente Provida. (Apelação
Cível nº 70006112056, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Henri-
que Osvaldo Poeta Roenick, Julgado em 03/09/2003)

Apelação Cível. Execução Fiscal. ICMS. Lançamento por Arbitramento. Legalidade. Presunção
de Certeza e Liquidez da CDA não Elidida pela Prova dos Autos. Condenação por Crime de
Sonegação Fiscal que confirma o Proceder Faltoso do Contribuinte. À Unanimidade, negaram
Provimento. (Apelação Cível nº 70005529912, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Des. Francisco José Moesch, Julgado em 03/09/2003)
Outrossim, o valor atribuído no arbitramento não se mostra dissociado ou desarrazoado do valor
do imóvel, observada a quantia negociada pelo autor, R$ 85.000,00 pelo apartamento e R$ 10.000,00
pelo box, conforme destacado pelo Douto Procurador de Justiça, Dr. Paulo Valério Dal Pai Moraes,
fl. 192.
Diante do exposto, forte no art. 557, § 1º-A, do CPC, dou provimento liminarmente à apelação in-
terposta pelo Município de Porto Alegre, para efeito de julgar improcedente ação ajuizada por Juliano
Raube, invertidos os ônus de sucumbência e negando provimento ao recurso adesivo do autor.
Intimem-se.
Porto Alegre, 09 de setembro de 2009.
Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro,
Relator.

NOTA DA DIALÉTICA
Vide Íntegras de Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT 158:186) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 170:194).
Ementário de Acórdãos
Observação: a Equipe Técnica da Revista Dialética de Direito Tributário
não fornece cópias de íntegras de acórdãos publicados neste Ementário.
Quando os reputa muito relevantes, publica-os na íntegra.

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - EMISSÃO EM qual não é suscetível de reexame na instância


DUPLICIDADE DO MESMO NÚMERO DE especial.
CPF - INSCRIÇÃO INDEVIDA EM 5. De fato, para alterar-se o entendimento de
CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO que a emissão em duplicidade do mesmo nú-
mero de CPF adveio de flagrante falha nos ser-
AgRg no Recurso Especial nº 1.074.476 - RJ viços prestados pela União e gerou profundo
(2008/0153705-7) constrangimento e desgaste à parte adversa
seria indispensável revolvimento dos fatos e
Relator: Ministro Castro Meira provas carreados aos autos. Ademais, a indeni-
Agravante: União zação fixada em R$ 6.000,00 (seis mil reais)
Agravado: Isabel Cristina Alexandre da Silva não se revela absurda ou destituída de razoabi-
Advogado: Rosemary Nascimento Rosa e Ou- lidade, de forma que sua diminuição também
tro(s) esbarra no óbice inscrito na Súmula 07/STJ.
6. Agravo regimental não provido.
Ementa
Administrativo e Processual Civil. Responsa- Acórdão
bilidade Civil do Estado. Emissão em Duplici- Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
dade do mesmo Número de CPF. Inscrição In- partes as acima indicadas, acordam os Ministros
devida em Cadastros de Proteção ao Crédito. da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
Prescrição. Termo Inicial. Princípio da Actio ça, por unanimidade, negar provimento ao agra-
Nata. Nexo Causal. Montante Indenizatório. vo regimental nos termos do voto do Sr. Ministro
Súmula 07/STJ. Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins,
1. Foi ajuizada ação indenizatória contra a Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e
Caixa Econômica Federal-CEF e a União em Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Rela-
decorrência da equivocada emissão em dupli- tor.
cidade do número de CPF, o que teria ocasio- Brasília, 04 de agosto de 2009 (data do julgamen-
nado danos morais à ora agravada na medida to).
em que foi irregularmente inscrita em cadas- (DJe de 2.10.2009)
tros de restrição de crédito em razão da inadim-
plência de terceira pessoa que possuía idênti-
co número de identificação. CNPJ - CANCELAMENTO - DECLARAÇÃO
2. Conforme pacífica jurisprudência desta Cor- DE INAPTIDÃO DA PESSOA JURÍDICA
te, a fixação do termo inicial da prescrição INEXISTENTE DE FATO
deve observar o princípio da actio nata. Prece-
dentes: AgREsp 1.060.334/RS, Rel. Min. Apelação Cível nº 2003.71.07.008183-3/RS
Humberto Martins, DJe 23.04.09; REsp
735.377/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU Relatora: Juíza Eloy Bernst Justo
02.06.05; REsp 718.269/MA, Rel. Min. Teori Apelante: Icaro Artefatos de Metais Ltda
Albino Zavascki, DJU 29.03.05. Advogado: Angelo Arruda e Outros
3. A autora não teve ciência da irregularidade Apelado: União Federal (Fazenda Nacional)
na emissão do CPF em momento anterior à Advogado: José Diogo Cyrillo da Silva
constatação do dano, o que ficou caracteriza-
do tão-somente na ocasião em que tomou co- Ementa
nhecimento de sua errônea inscrição em cadas- Tributário. Cancelamento de CNPJ. Violação
tros de proteção ao crédito, decorrente de con- aos Princípios da Ampla Defesa, Contraditório
tumaz inadimplência da terceira pessoa com e da Legalidade.
quem compartilhava o mesmo número de iden- Não existe previsão legal para que o contri-
tificação. buinte possa se manifestar durante as diligên-
4. O Tribunal a quo aferiu a existência de nexo cias do Mandado de Procedimento Fiscal.
causal entre a conduta da Administração e o Finalizadas as averiguações e concluindo o
evento danoso e fixou a indenização com las- Fisco pela inexistência de fato da pessoa jurí-
tro no acervo fático-probatório dos autos, o dica, publicando ato declaratório de cancela-
mento do CNPJ por “vício de inscrição”, inti- Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJU
mando pessoalmente o contribuinte sobre os de 5.10.06; REsp 411.949/PR, Rel. Min. João
atos e conclusões, descabe alegar violação ao Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJU de
princípio da ampla defesa quando a empresa 14.8.06.
opta por discutir o ato jurídico na via judicial, 2. Agravo regimental não provido.
deixando de promover administrativo recurso
pertinente. Acórdão
Não há violação ao princípio da legalidade o Vistos, relatados e discutidos estes autos em que
[sic] cancelamento do CNPJ com base no pa- são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
rágrafo único do art. 116 do CTN, além de tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
outras normas de hierarquia inferior, que remete Justiça, na conformidade dos votos e das notas
à necessidade [de] lei ordinária para estabele- taquigráficas, por unanimidade, negar provimen-
cer os devidos procedimentos, quando está em to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
vigor o disposto no art. 81 da Lei nº 9.430/96, Ministro Relator.
que permite ao Fisco declarar a inaptidão da Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Castro Meira,
pessoa jurídica quando ela não existir de fato, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram
o que dá respaldo às instruções normativas que com o Sr. Ministro Relator.
disciplinam a matéria. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto
Martins.
Acórdão Brasília (DF), 08 de setembro de 2009.
Vistos e relatados estes autos em que são partes as (DJe de 24.9.2009)
acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una-
nimidade, negar provimento à apelação, nos ter- COFINS E PIS - RECEITAS DE VENDAS DE
mos do relatório, votos e notas taquigráficas que PRODUTOS DESTINADOS À ZONA
ficam fazendo parte integrante do presente julga- FRANCA DE MANAUS - ABRANGÊNCIA
do. DOS VALORES DE VENDAS DE EMPRESA
Porto Alegre/RS, 30 de junho de 2009. DA ZFM PARA OUTRA DA MESMA
(DEJF da 4ª R. de 15.7.2009, pp. 246/7) LOCALIDADE

Apelação Cível n. 2002.32.00.004113-3/AM


CNPJ - INSCRIÇÃO - EMPECILHOS
CRIADOS POR INSTRUÇÕES Processo na Origem: 200232000041133
NORMATIVAS - ILEGALIDADE Relator(a): Desembargador Federal Leomar Bar-
ros Amorim de Sousa
AgRg no Recurso Especial nº 854.515 - SC Apelante: Fazenda Nacional
(2006/0123929-6) Procurador: Jose Luiz Gomes Rolo
Apelado: Samsung SDI Brasil Ltda
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques Advogado: Valerio Tancredo e Outros(as)
Agravante: Fazenda Nacional Remetente: Juizo Federal da 2ª Vara - AM
Procuradores: Claudio Xavier Seefelder Filho
Ricardo Py Gomes da Silveira e Ementa
Outro(s) Tributário. Mandado de Segurança. Contribui-
Agravado: Olivia Imóveis Ltda ção para o PIS e para a Cofins. Prescrição.
Advogado: Francisco Oscar Magalhães Receitas de Vendas de Produtos Destinados à
Zona Franca de Manaus. Isenção. Decreto-lei
Ementa n. 288/67. Art. 40 do ADCT. Compensação.
Tributário. Agravo Regimental. CNPJ. Inscri- 1. O art. 40 do ADCT da Constituição Federal
ção. Condições Impostas por Instruções Nor- de 1988 preservou a Zona Franca de Manaus
mativas da SRF. Regularização de Pendências como área de livre comércio recepcionando o
Fiscais. Ilegalidade. Decreto-lei n. 288/67, que prevê expressamen-
1. Esta Corte já se pronunciou no sentido de te que a exportação de mercadorias de origem
que é ilegítima a criação de empecilhos por nacional para a Zona Franca de Manaus, ou
instruções normativas da SRF para a inscrição reexportação para o estrangeiro, será, para to-
e alteração dos dados cadastrais no CNPJ, por dos os efeitos fiscais, equivalente a uma expor-
contrariar o princípio do livre exercício da ativi- tação brasileira para o exterior.
dade econômica. Precedentes: REsp 760.320/RS, 2. A legislação referente ao PIS e à Cofins pre-
Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, vê expressamente que as mencionadas contri-
DJU de 1.2.07; REsp. 662.972/RS, Rel. Min. buições não incidirão sobre as receitas decor-
rentes das operações de exportação de merca- 2. O mandado de segurança se presta à defesa
dorias para o exterior, razão por que se aplica de direito líquido e certo e, se de natureza pre-
àquelas destinadas à Zona Franca de Manaus, ventiva, necessita da demonstração de que tal
por força do disposto no Decreto-lei n. 288/67 direito encontra-se na iminência de ser viola-
e no art. 40 do ADCT. do. No caso, não se constata direito líquido e
3. No benefício da exclusão da base de cálcu- certo da impetrante.
lo do PIS e da Cofins devem ser incluídos os 3. A ausência do direito líquido e certo decor-
valores resultantes de vendas de produtos por re tanto da natureza do precatório indicado à
empresa localizada na Zona Franca de Manaus compensação, nos quais o devedor originário
para outra da mesma localidade, sob pena de é uma autarquia estadual, quanto do fato de
ofensa ao disposto no Decreto-lei n. 288/67, não haver legislação estadual autorizando a
aos arts. 40 e 92 do ACDT da CF/88, bem compensação de débitos de ICMS do Estado
como ao princípio da isonomia. com precatório proveniente de ação movida
4. Apelação e remessa oficial improvidas. contra entidade da administração estadual in-
direta (DER-PR).
Acórdão
4. Isso, porque o art. 78, § 2º, do ADCT é cla-
Decide a Turma, por unanimidade, negar provi-
mento à apelação e à remessa oficial. ro ao referir-se ao poder liberatório do paga-
8ª Turma do TRF da 1ª Região - 18/11/2008. mento de tributos da entidade devedora; e, se
Desembargador Federal Leomar Amorim assim o é, diante do princípio tributário da le-
Relator galidade estrita, à míngua de legislação tribu-
(e-DJF1 de 16.10.2009) tária específica autorizando a compensação de
créditos tributários do Estado do Paraná com
precatórios provenientes de ações movidas
COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS DO contra as entidades da administração indireta,
ICMS, ADQUIRIDOS POR TERCEIRO, COM não pode o Poder Judiciário determinar tal
CRÉDITO DE PRECATÓRIO DEVIDO POR operação.
AUTARQUIA ESTADUAL - AUSÊNCIA DE 5. Recurso ordinário não provido.
DIREITO LÍQUIDO E CERTO
Acórdão
Recurso em Mandado de Segurança Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
nº 28.500 - PR (2008/0279645-4) partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi-
Relator: Ministro Benedito Gonçalves ça, por unanimidade, negar provimento ao recur-
Recorrente: Baden Automotores Ltda so ordinário em mandado de segurança, nos ter-
Advogado: Lucius Marcus Oliveira e Outro(s) mos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Mi-
Recorrido: Estado do Paraná nistros Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram
Procurador: Cesar Augusto Binder e Outro(s) com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Hamil-
Ementa ton Carvalhido.
Processual Civil. Tributário. Recurso Ordiná- Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda.
rio em Mandado de Segurança. Decreto Esta- Brasília (DF), 17 de setembro de 2009 (Data do
dual n. 418/2007. Compensação de Débitos de Julgamento).
ICMS com Crédito de Precatórios Provenien- (DJe de 23.9.2009)
te de Ação Movida contra o Departamento de
Estradas de Rodagem do Estado. Art. 78, § 2º, NOTA DA DIALÉTICA
do ADCT. Inexistência de Legislação Estadual
Vide Acórdão do STJ - 2ª Turma (RDDT 167:239).
autorizando a Compensação de Crédito Tribu-
tário do Estado com Precatório de Autarquia
Estadual. Ausência de Direito Líquido e Cer-
to. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - BASE
1. Trata-se de ação mandamental em que se ob- DE CÁLCULO - VALORIZAÇÃO DO
jetiva a compensação, com base no art. 78, § 2º, IMÓVEL - DIFERENÇA ENTRE OS
do ADCT, de débitos de ICMS com crédito de VALORES INICIAL E FINAL -
precatório judicial vencido, e não pago, prove- DEMONSTRAÇÃO PELO ENTE
niente de ação movida contra entidade da ad- TRIBUTANTE
ministração estadual indireta (DER-PR), ad-
quirido de terceiro por meio de cessão de Recurso Especial nº 1.137.794 - RS
direitos. (2009/0082430-6)
Relator: Ministro Castro Meira Repr. por: Dinoral Ramos Duarte Ribeiro - Inven-
Recorrente: Muncípio [sic] de Santa Cruz do Sul tariante e Outro
Procurador: Ercio Andre Weizenmann e Outro(s) Advogado: Mauro César Hermann e Outro(s)
Recorrido: Alberto Sehn
Advogado: Alessandra Gruendling Ementa
Tributário. Execução Fiscal. Contribuições
Ementa Previdenciárias. Agente Político. Prefeito.
Processual Civil e Tributário. Contribuição de Espólio. Responsabilidade Pessoal. Demons-
Melhoria. Base de Cálculo. Valorização do tração da Culpabilidade. Necessidade. Art. 41
Imóvel. da Lei nº 8.212/91. Posterior Anistia. Lei nº
1. O tema inserto nos arts. 2º, §§ 1º e 3º, da 9.476/97.
LICC não foi alvo de debate pelo aresto recor- 1. Cinge-se a controvérsia à possibilidade de
rido; tampouco, foram opostos embargos de responsabilização de espólio de ex-prefeito
declaração a fim de sanar eventual omissão. pelo débito relativo às contribuições previden-
Ausente o prequestionamento da matéria, tor- ciárias devidas pelo Município.
na-se inviável a abertura da via eleita, a teor do 2. A multa de que trata o art. 41 da Lei 8.212/91
disposto nas Súmulas 282 e 356 do STF. somente deve ser imputada pessoalmente ao
2. O fato gerador da contribuição de melhoria agente público se demonstrado o excesso de
não é a realização da obra, mas sim a decorren- mandato ou o cometimento da infração com
te valorização imobiliária. Dessa forma, a base dolo ou culpa, já que essa regra deve ser inter-
de cálculo para cobrança da contribuição de pretada em harmonia com o disposto no art.
melhoria é a diferença entre os valores inicial 137, I, do CTN, que expressamente exclui a
e final do imóvel beneficiado. responsabilidade pessoal daqueles que agem
3. Esta Corte é uníssona no entendimento de no exercício regular do mandato. Precedentes
que cabe ao ente tributante a demonstração da da Primeira Turma.
real valorização do bem. 3. A Lei nº 9.476/97 concedeu anistia aos
4. Recurso especial conhecido em parte e não agentes políticos e aos dirigentes de órgãos
provido. públicos estaduais, do Distrito Federal e mu-
nicipais a quem, porventura, tenham sido im-
Acórdão postas penalidades pecuniárias decorrentes do
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são art. 41 da Lei 8.212/91.
partes as acima indicadas, acordam os Ministros 4. Recurso especial não provido.
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
ça, por unanimidade, conhecer em parte do recur- Acórdão
so e, nessa parte, negar-lhe provimento nos termos Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros partes as acima indicadas, acordam os Ministros
Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
Campbell Marques e Eliana Calmon votaram com ça, por unanimidade, negar provimento ao recur-
o Sr. Ministro Relator. so nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os
Brasília, 06 de outubro de 2009 (data do julga- Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benja-
mento). min, Mauro Campbell Marques e Eliana Calmon
(DJe de 15.10.2009) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 06 de outubro de 2009 (data do julga-
mento).
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - (DJe de 15.10.2009)
AGENTE POLÍTICO - PREFEITO - ESPÓLIO
- EXCESSO DE MANDATO OU
COMETIMENTO DE INFRAÇÃO COM CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -
DOLO OU CULPA - NECESSIDADE DE CONTRATO DE LOCAÇÃO CIVIL DE
DEMONSTRAÇÃO DA CULPABILIDADE SERVIÇOS COM MUNICÍPIO - PEDIDO DE
RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE
Recurso Especial nº 1.143.880 - SC EMPREGO - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
(2009/0109027-0) DO TRABALHO

Relator: Ministro Castro Meira Apelação Cível nº 2005.71.04.002298-7/RS


Recorrente: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Relator: Juiz Federal José Francisco Andreotti
cional Spizzirri
Recorrido: João Luzia Duarte Ribeiro - Espólio Apelante: Jorge Antonio Gerhardt
Advogado: Felipe Augusto de Marchi Suscitado: Juízo da 4ª Vara do Trabalho de São
Apelado: Instituto Nacional do Seguro Social - José do Rio Preto - SP
INSS
Advogado: Solange Dias Campos Preussler Ementa
Conflito Positivo de Competência. Inexistên-
Ementa cia. Empresa em Recuperação Judicial. Execu-
Natureza do Contrato Mantido com Prefeitura ção de Contribuição Previdenciária na Justiça
Municipal. Prestação de Serviços ou Vínculo do Trabalho. Possibilidade.
de Emprego. Incompetência da Justiça Federal. - Nos termos do art. 6º, § 7º, da Lei nº 11.101/05,
Competência da Justiça do Trabalho. as execuções de natureza fiscal não serão sus-
É da competência da Justiça do Trabalho ação pensas pelo deferimento da recuperação judi-
que diz respeito à natureza de contrato manti- cial. Assim, tendo as contribuições previden-
do com Prefeitura Municipal. ciárias inegável natureza fiscal, sua execução
Hipótese em que o autor, inobstante possuísse não é alcançada pela vis attractiva da recupe-
contrato de locação civil de serviços com o ração judicial.
município de Passo Fundo, requer o reconhe- - O fato da execução fiscal se processar frente
cimento do vínculo de emprego, a fim de isen- à Justiça do Trabalho não altera a natureza ju-
tar-se da responsabilidade pelo recolhimento rídica da contribuição previdenciária. Trata-
das contribuições. se apenas de competência material extraordi-
nária, conferida à Justiça Laboral pelo art.
Acórdão 114, VIII, da CF, para executar às contribui-
Vistos e relatados estes autos em que são partes as ções sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e
acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do seus acréscimos legais, decorrentes das sen-
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una- tenças que ela própria proferir.
nimidade, negar provimento à apelação, nos ter- Conflito não conhecido.
mos do relatório, votos e notas taquigráficas que Acórdão
ficam fazendo parte integrante do presente julga- Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam
do. os Ministros da Segunda Seção do Superior Tri-
Porto Alegre, 23 de junho de 2009. bunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
(DEJF da 4ª R. de 6.7.2009, p. 647) notas taquigráficas constantes dos autos, por una-
nimidade, não conhecer do Conflito de Competên-
NOTA DA DIALÉTICA cia, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
Vide Íntegras de Acórdãos do STJ - 2ª Turma Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei
(RDDT 159:164) e do TRF da 4ª Região - 1ª Se- Beneti, Luis Felipe Salomão, Vasco Della Giusti-
ção (RDDT 113:151), e Acórdãos do STJ - 2ª na, Paulo Furtado, Honildo Amaral de Mello Cas-
Turma (RDDT 129:201) e do TRF da 4ª Região - tro, Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior
1ª Turma (RDDT 133:220). votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 23 de setembro de 2009 (data do
julgamento).
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - (DJe de 30.9.2009)
EXECUÇÃO NA JUSTIÇA DO TRABALHO -
EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL -
COMPETÊNCIA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -
LITÍGIO ENTRE EX-EMPREGADO E
Conflito de Competência nº 107.213 - SP EX-EMPREGADOR - COMPETÊNCIA DA
(2009/0165370-6) JUSTIÇA DO TRABALHO
AgRg no Conflito de Competência
Relatora: Ministra Nancy Andrighi
nº 103.297 - AM (2009/0029807-1)
Autor: Maria Aparecida de Brito Souza
Advogado: Antônio Rocha Rúbio Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior
Réu: Indústria de Doces Mirassol Ltda - em Re- Agravante: Ministério Público Federal
cuperação Judicial Autor: Osvaldo Barbosa de Brito
Suscitante: Indústria de Doces Mirassol Ltda - em Réu: Saul Rogério Ramos de Athayde
Recuperação Judicial Advogado: Marco Lúcio de Atayde
Advogado: Cleunice Maria de Lima Guimarães Suscitante: Juízo Federal da 5ª Vara da Seção Ju-
Corrêa diciária do Estado do Amazonas
Suscitado: Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Suscitado: Tribunal Regional do Trabalho da 11ª
Mirassol - SP Região
Ementa tulo de contribuição previdenciária prevista no
Processual Civil. Conflito Negativo. Agravo art. 20 da Lei n. 8.212/91, por segurado que
Regimental. Ação de Conhecimento que pos- exerce, concomitantemente, mais de uma ati-
tula Recolhimento de Contribuições Previden- vidade remunerada sujeita ao RGPS.
ciárias. Litígio entre Ex-empregado e Ex-em- 2. O salário de contribuição de segurado com
pregador. Competência da Justiça Especializa- mais de um vínculo empregatício corresponde
da. Formação de Título Executivo Judicial. à soma de todas as remunerações recebidas no
Constituição Federal, art. 114, VIII. CLT, art. mês, observado o limite máximo do salário de
876, parágrafo único. Súmula n. 368-I-TST. contribuição.
I. Compete à Justiça do Trabalho o processa- 3. Definido em lei o salário de contribuição, a
mento e o julgamento de ação de conhecimen- alíquota prevista no art. 20, da Lei n. 8.212/91
to em que ex-empregado pretende que o anti- deve ser calculada sobre o total das remunera-
go empregador recolha as contribuições previ- ções recebidas, e não sobre cada uma das re-
denciárias relativas ao período em que esteve munerações individualmente, devendo o valor
vigente o vínculo empregatício. Precedentes da contribuição ser limitado ao teto do salário-
do STJ. de-contribuição, de acordo com o § 5º do art.
II. Agravo regimental do Ministério Público 28, da referida Lei.
Federal (CPC, art. 499, § 2º) improvido. Recurso especial parcialmente conhecido e im-
provido.
Acórdão
Vistos e relatados estes autos, em que são partes Acórdão
as acima indicadas, decide a Segunda Seção [do Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Superior Tribunal de Justiça], por unanimidade, partes as acima indicadas, acordam os Ministros
negar provimento ao Agravo Regimental, nos ter- da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
mos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Mi- ça “A Turma, por unanimidade, conheceu em par-
nistros Nancy Andrighi, João Otávio de Noronha, te do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimen-
Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão, Vasco Della to, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)
Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), Relator(a).” Os Srs. Ministros Herman Benjamin,
Paulo Furtado (Desembargador convocado do Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon e Cas-
TJ/BA), Honildo Amaral de Mello Castro (De- tro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.
sembargador convocado do TJ/AP) e Fernando Brasília (DF), 22 de setembro de 2009 (Data do
Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator. Julgamento).
Brasília (DF), 23 de setembro de 2009 (Data do (DJe de 5.10.2009)
Julgamento).
(DJe de 6.10.2009)
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -
SERVIDOR PÚBLICO - ADICIONAL DE
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - INSALUBRIDADE - INCIDÊNCIA
RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO -
EXERCÍCIO, PELO SEGURADO, DE DUAS Recurso Especial nº 809.370 - SC
ATIVIDADES SIMULTÂNEAS, COM (2006/0002424-0)
VÍNCULO EMPREGATÍCIO
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki
Recurso Especial nº 1.135.946 - SP
Recorrente: União
(2009/0073269-0)
Recorrente: Universidade Federal de Santa Cata-
Relator: Ministro Humberto Martins rina
Recorrente: Fazenda Nacional Procurador: Márcia Maria Bozzetto e Outro(s)
Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Recorrido: Almir Juppe e Outros
cional Advogado: Luiz Fernando Kremer e Outro(s)
Recorrido: Tereza Cristina Samico Cavalcanti
Advogado: Mauro Ellwanger Junior e Outro(s) Ementa
Tributário. Recurso Especial. Servidor Públi-
Ementa co Civil. Contribuição Previdenciária. Base de
Tributário - Restituição de Indébito - Contri- Cálculo. Lei 9.783/99 e Lei 10.887/2004. In-
buições Previdenciárias - Segurado que exer- cidência, salvo em Caso de Inconstitucionali-
ceu Simultaneamente Duas Atividades Remu- dade (Súmula Vinculante 10/STF), o que não
neradas com Vínculo Empregatício. é o Caso. Precedente: REsp 731.132, 1ª Seção,
1. A questão debatida nos autos diz respeito à DJ de 20/10/08. Incidência sobre Adicional de
restituição de valores recolhidos a maior a tí- Insalubridade.
1. O art. 1º e seu parágrafo da Lei 9.783/99 es- solidariedade. Por força desse princípio, o fi-
tabeleceu como base de cálculo da contribui- nanciamento da previdência não tem como
ção social do servidor público para a manuten- contrapartida necessária a previsão de presta-
ção do seu regime de previdência “a totalida- ções específicas ou proporcionais em favor do
de da sua remuneração”, na qual se compreen- contribuinte. A manifestação mais evidente do
dem, para esse efeito, “o vencimento do cargo enunciado é a sujeição à contribuição dos pró-
efetivo, acrescido de vantagens pecuniárias prios inativos e pensionistas.
permanentes estabelecidas em lei, os adicio- 5. O adicional de insalubridade assegurado aos
nais de caráter individual, ou quaisquer vanta- servidores ocupantes de cargos públicos (art.
gens, (...) excluídas: I - as diárias para viagens, 68, Lei 8.112/90), por integrar o conceito de
desde que não excedam a cinqüenta por cento remuneração, fica sujeito à incidência da con-
da remuneração mensal; II - a ajuda de custo tribuição previdenciária.
em razão de mudança de sede; III - a indeni- 6. Recursos Especiais providos.
zação de transporte; IV - o salário família”.
2. Critério semelhante foi adotado pelo art. 4º Acórdão
da Lei 10.887/2004, segundo o qual “A contri- Vistos e relatados estes autos em que são partes as
buição social do servidor público ativo de acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma
qualquer dos Poderes da União, incluídas suas do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
autarquias e fundações, para a manutenção do dar provimento aos recursos especiais, nos termos
respectivo regime próprio de previdência so- do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
cial, será de 11% (onze por cento), incidente Benedito Gonçalves (Presidente), Hamilton Car-
sobre a totalidade da base de contribuição”, valhido e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro
assim entendido, nos termos do § 1º, “(...) o Relator.
vencimento do cargo efetivo, acrescido das Ausente, por motivo de licença, a Sra. Ministra
vantagens pecuniárias permanentes estabeleci- Denise Arruda.
das em lei, os adicionais de caráter individual Brasília, 03 de setembro de 2009.
ou quaisquer outras vantagens, excluídas: I - as (DJe de 23.9.2009)
diárias para viagens; II - a ajuda de custo em
razão de mudança de sede; III - a indenização
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL -
de transporte; IV - o salário-família; V - o au-
LEGITIMIDADE ATIVA DA CNA PARA
xílio-alimentação; VI - o auxílio-creche; VII -
COBRANÇA
as parcelas remuneratórias pagas em decorrên-
cia de local de trabalho; VIII - a parcela perce- Súmula n. 396
bida em decorrência do exercício de cargo em A Confederação Nacional da Agricultura tem
comissão ou de função de confiança; e IX - o legitimidade ativa para a cobrança da contri-
abono de permanência de que tratam o §º 19 do buição sindical rural.
art. 40 da Constituição Federal, o § 5º do art. 2º
e o § 1º do art. 3º da Emenda Constitucional nº Referência:
41, de 19 de dezembro de 2003”. CF/1988, art. 8º, IV.
3. Não há dúvida, portanto, de que o legislador CLT, art. 578.
adotou, para efeito da base de cálculo (ou de Lei n. 9.701, de 17/11/1998.
contribuição), o critério da remuneração total REsp 649.997-MG (1ª T 28/09/2004 -
do servidor público, com exclusão apenas das DJ 08/11/2004).
parcelas por ele indicadas. A adoção de outro REsp 712.965-PR (1ª T 12/04/2005 -
critério (considerando como base de cálculo as DJ 06/06/2005).
parcelas que serão incorporadas aos proventos REsp 820.826-MS (1ª T 06/04/2006 -
de aposentadoria), significa negar vigência à DJ 24/04/2006).
norma legal estabelecida, o que somente será REsp 677.242-MS (2ª T 21/09/2006 -
viável se tal norma for declarada inconstitu- DJ 02/10/2006).
cional, na forma do art. 97 da Constituição REsp 972.029-MG (2ª T 18/10/2007 -
(Súmula vinculante 10/STF). DJ 05/11/2007).
4. Não há razão para declarar a inconstituciona- REsp 704.506-PR (2ª T 17/04/2008 -
lidade do art. 1º da Lei 9.783/99 ou do art. 4º DJe 06/05/2008).
da Lei 10.887/2004. O regime previdenciário (DJe de 7.10.2009)
hoje consagrado na Constituição, especialmen-
te após a EC 41/2003, que alterou o art. 40, § 3º, NOTA DA DIALÉTICA
da CF, tem caráter contributivo, mas traz incor- A Súmula nº 396, acima, foi aprovada pela Pri-
porado um princípio antes previsto apenas para meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
o regime geral da previdência: o princípio da setembro de 2009.
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO dos indevidamente na fonte com os valores
- COOPERATIVA DE CONSUMO - VENDA restituídos apurados na declaração anual.
DE BENS A TERCEIROS NÃO
COOPERADOS - INCIDÊNCIA Referência:
CPC, arts. 543-C e 741, VI.
AgRg no Recurso Especial nº 653.489 - RS Res. n. 8-STJ, de 07/08/2008, art. 2º, § 1º.
(2004/0058309-8) EREsp 779.917-DF (1ª S 14/06/2006 -
Relator: Ministro Herman Benjamin DJ 01/08/2006).
Agravante: Fazenda Nacional EREsp 848.669-DF (1ª S 28/03/2007 -
Procuradores: Claudio Xavier Seefelder Filho DJe 01/09/2008).
Ricardo Py Gomes da Silveira e EREsp 829.182-DF (1ª S 25/04/2007 -
Outro(s) DJ 14/05/2007).
Agravado: Cooperativa de Consumo dos Condu- EDcl nos EREsp 963.216-DF (1ª S 27/08/2008
tores Autônomos de Veículos Rodoviários de Ca- - DJe 08/09/2008).
xias do Sul - Coocaver EREsp 786.888-SC (1ª S 27/08/2008 -
Advogado: Laércio Marcio Laner e Outro DJe 09/09/2008).
REsp 1.001.655-DF (1ª S 11/03/2009 -
Ementa DJe 30/03/2009).
Processual Civil e Tributário. Cooperativa de AgRg no REsp 980.107-DF (1ª T 18/10/2007 -
Consumo. Operação de Venda de Bens a Ter- DJ 13/12/2007).
ceiros Não-cooperados. Ato Mercantil. CSLL. REsp 778.110-DF (2ª T 11/04/2006 -
Incidência.
1. O ato cooperativo típico, nos termos do art. DJ 25/04/2006).
79, parágrafo único, da Lei 5.764/1971, não REsp 854.957-DF (2ª T 23/10/2007 -
implica operação de mercado nem contrato de DJ 26/11/2007).
compra e venda de produto ou mercadoria, o (DJe de 7.10.2009)
que afasta a incidência do PIS e da Cofins so-
bre o resultado de tal atividade. NOTA DA DIALÉTICA
2. A operação de venda de bens a terceiros por A Súmula nº 394, acima, foi aprovada pela Pri-
sociedade cooperativa de consumo se reveste de meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
natureza mercantilista. O resultado positivo ad- setembro de 2009.
vindo dessa atividade, por conseguinte, subme-
te-se à incidência da CSLL. Precedentes do STJ.
4. [sic] Agravo Regimental parcialmente pro- EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL -
vido. VALOR DA CAUSA
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são Recurso Especial nº 993.274 - MG
partes as acima indicadas, acordam os Ministros (2007/0231624-3)
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
ça: “A Turma, por unanimidade, deu parcial pro- Relator: Ministro Luiz Fux
vimento ao agravo regimental, nos termos do voto Recorrente: Cachoeira Velonorte SA e Outros
do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a).” Os Srs. Mi- Advogado: Jose Anchieta da Silva e Outro(s)
nistros Mauro Campbell Marques, Eliana Cal- Recorrido: Estado de Minas Gerais
mon, Castro Meira e Humberto Martins votaram Procurador: Célio Lopes Kalume e Outro(s)
com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 15 de setembro de 2009 (data do julga- Ementa
mento). Processual Civil. Embargos à Execução Fis-
(DJe de 24.9.2009) cal. Valor da Causa.
1. O valor da causa na ação de embargos à exe-
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - cução, quando a impugnação volta-se contra a
COMPENSAÇÃO DE VALORES DO totalidade do débito, deve ser o valor atribuí-
IMPOSTO DE RENDA RETIDOS COM do à própria execução. Precedentes: AgRg no
RESTITUÍDOS APURADOS NA REsp 749.949/RS, DJ 09/10/2006; AgRg no
DECLARAÇÃO Ag 694.369/RJ, DJ 13/02/2006; AgRg no Ag
1.051.745/MG, DJ 30/03/2009.
Súmula n. 394 2. O valor da causa da causa [sic] deve corres-
É admissível, em embargos à execução fiscal, ponder ao benefício patrimonial pretendido
compensar os valores de imposto de renda reti- com a execução do título de dívida ativa.
3. In casu, o embargante pretende desconstituir AgRg no Ag 815.732-BA (1ª T 27/03/2007 -
o próprio título executivo e o crédito exequen- DJ 03/05/2007).
do deduzido ao firmar suas pretensões no sen- REsp 750.248-BA (1ª T 19/06/2007 -
tido de que: “o título que instrui a execução DJ 29/06/2007).
não é título legítimo, porquanto absolutamente AgRg no Ag 888.479-BA (1ª T 11/09/2007 -
desprovido de liquidez, certeza e exigibilidade, DJ 01/10/2007).
requisitos indispensáveis a qualquer ação de REsp 829.455-BA (2ª T 27/06/2006 -
execução; se o título que embasa a execução DJ 07/08/2006).
é viciado e ilíquido, o valor unilateralmente REsp 837.364-RS (2ª T 15/08/2006 -
apontado não tem como prevalecer, devendo DJ 31/08/2006).
ser efetivamente apurado mediante a realiza- EDcl no REsp 820.249-RS (2ª T 10/10/2006 -
ção de provas, sobretudo através de perícia DJ 26/10/2006).
técnica. REsp 837.250-RS (2ª T 27/02/2007 -
4. Recurso especial a que se nega provimento. DJ 14/03/2007).
(DJe de 7.10.2009)
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Mi- NOTA DA DIALÉTICA
nistros da Primeira Turma do Superior Tribunal de A Súmula nº 392, acima, foi aprovada pela Pri-
Justiça acordam, na conformidade dos votos e das meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, setembro de 2009.
negar provimento ao recurso especial, nos termos
do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Benedi- EXECUÇÃO FISCAL - EXCEÇÃO DE
to Gonçalves e Hamilton Carvalhido votaram com PRÉ-EXECUTIVIDADE - MATÉRIAS
o Sr. Ministro Relator. CONHECÍVEIS DE OFÍCIO -
Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda. ADMISSIBILIDADE
Brasília (DF), 22 de setembro de 2009 (Data do
Julgamento). Súmula n. 393
(DJe de 7.10.2009) A exceção de pré-executividade é admissível
na execução fiscal relativamente às matérias
conhecíveis de ofício que não demandem dila-
EXECUÇÃO FISCAL - CERTIDÃO DE
ção probatória.
DÍVIDA ATIVA - SUBSTITUIÇÃO ATÉ A
PROLAÇÃO DA SENTENÇA DE
Referência:
EMBARGOS - HIPÓTESES
CPC, art. 543-C.
Súmula n. 392 Res. n. 8-STJ, de 07/08/2008, art. 2º, § 1º.
A Fazenda Pública pode substituir a certidão EREsp 866.632-MG (1ª S 12/12/2007 -
de dívida ativa (CDA) até a prolação da senten- DJ 25/02/2008).
ça de embargos, quando se tratar de correção REsp 1.104.900-ES (1ª S 25/03/2009 -
de erro material ou formal, vedada a modifica- DJe 01/04/2009).
ção do sujeito passivo da execução. REsp 1.110.925-SP (1ª S 22/04/2009 -
DJe 04/05/2009).
Referência: AgRg no REsp 536.505-RJ (1ª T 09/03/2004 -
CTN, art. 202. DJ 17/05/2004).
Lei n. 6.830, de 22/09/1980, art. 2º, § 8º. AgRg no REsp 448.268-RS (1ª T 10/08/2004 -
EREsp 823.011-RS (1ª S 14/02/2007 - DJ 23/08/2004).
DJ 05/03/2007). AgRg no Ag 1.060.318-SC (1ª T 02/12/2008 -
EREsp 839.824-RS (1ª S 28/02/2007 - DJe 17/12/2008).
DJ 19/03/2007). REsp 287.515-SP (2ª T 19/03/2002 -
AgRg no Ag 771.386-BA (1ª T 12/12/2006 - DJ 29/04/2002).
DJ 01/02/2007). REsp 541.811-PR (2ª T 22/06/2004 -
REsp 897.357-RS (1ª T 06/02/2007 - DJ 16/08/2004).
DJ 22/02/2007). AgRg no REsp 778.467-SP (2ª T 16/12/2008 -
REsp 902.357-RS (1ª T 13/03/2007 - DJe 06/02/2009).
DJ 09/04/2007). AgRg no REsp 987.231-SP (2ª T 05/02/2009 -
REsp 904.475-RS (1ª T 20/03/2007 - DJe 26/02/2009).
DJ 12/04/2007). (DJe de 7.10.2009)
NOTA DA DIALÉTICA EXECUÇÃO FISCAL - MASSA FALIDA -
A Súmula nº 393, acima, foi aprovada pela Pri- ENCARGO DE 20% DO DL 1.025 -
meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de EXIGIBILIDADE
setembro de 2009.
Súmula n. 400
O encargo de 20% previsto no DL n. 1.025/1969
EXECUÇÃO FISCAL - FALÊNCIA - é exigível na execução fiscal proposta contra a
RESPONSABILIDADE DA EMPRESA massa falida.
FALIDA, SEM ÔNUS PARA OS SÓCIOS
Referência:
AgRg no AgRg no Recurso Especial CPC, art. 543-C.
nº 638.765 - RS (2004/0021576-5) Lei n. 7.711, de 22/12/1988.
Dec.-lei n. 1.205, de 21/10/1969, art. 1º.
Relator: Ministro Humberto Martins Res. n. 8-STJ, de 07/08/2008, art. 2º, § 1º.
Agravante: Fazenda Nacional EREsp 448.115-PR (1ª S 09/11/2005 -
Procurador: Gustavo Alcides da Costa DJ 05/12/2005).
Agravado: Luiz Nazareno Constantin e Outros EREsp 637.943-PR (1ª S 22/03/2006 -
Advogado: Vilson Ceolan DJ 03/04/2006).
EREsp 466.301-PR (1ª S 09/08/2006 -
Ementa DJ 28/08/2006).
Tributário - Execução Fiscal - Falência - Res- EREsp 668.253-PR (1ª S 25/10/2006 -
ponsabilidade da Empresa Falida - Preceden- DJ 24/09/2007).
tes. REsp 1.110.924-SP (1ª S 10/06/2009 -
1. Em caso de decretação de falência da empre- DJe 19/06/2009).
sa, a responsabilidade é inteiramente da pessoa AgRg no REsp 1.006.243-PR (1ª T 24/03/2009
jurídica extinta com o aval da Justiça, sem - DJe 23/04/2009).
ônus para os sócios, exceto em casos de com-
AgRg no REsp 641.610-PR (2ª T 18/12/2008 -
portamento fraudulento, fato não constatado
DJe 13/02/2009).
pelo Tribunal de origem.
2. “Na hipótese dos autos, surge uma terceira (DJe de 7.10.2009)
regra: quando a empresa se extingue por fa-
lência, depois de exaurido o seu patrimônio. NOTA DA DIALÉTICA
Aqui, a responsabilidade é inteiramente da A Súmula nº 400, acima, foi aprovada pela Pri-
empresa extinta com o aval da Justiça, sem meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
ônus para os sócios, exceto quando houver com- setembro de 2009.
portamento fraudulento.” (REsp 882.474/RS,
Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, jul-
gado em 17.6.2008, DJe 22.8.2008). EXECUÇÃO FISCAL - PARCELAMENTO -
Agravo regimental improvido. MANUTENÇÃO DAS GARANTIAS
PRESTADAS - EXCESSO DE PENHORA -
Acórdão ADEQUAÇÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
partes as acima indicadas, acordam os Ministros Agravo de Instrumento
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi- nº 2009.04.00.015384-1/PR
ça “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
to ao agravo regimental, nos termos do voto do(a) Relator: Des. Federal Joel Ilan Paciornik
Sr(a). Ministro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros Agravante: Perfipar Manufaturados de Aco Ltda
Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Advogado: Luiz Daniel Felippe e Outros
Eliana Calmon e Castro Meira votaram com o Sr. Agravado: União Federal (Fazenda Nacional)
Ministro Relator. Procurador: José Diogo Cyrillo da Silva
Brasília (DF), 15 de setembro de 2009 (Data do
Julgamento). Ementa
(DJe de 30.9.2009) Processual Civil. Execução Fiscal. Adesão a
Parcelamento. Manutenção das Garantias Pres-
NOTA DA DIALÉTICA tadas. Excesso de Penhora. Liberação da Pe-
Vide Acórdãos do STJ - 2ª Turma (RDDT nhora de Dinheiro. Inaptidão dos demais Bens.
128:203), do TRF da 4ª Região - 1ª Turma (RDDT 1. A superveniência de adesão da executada a
157:215 e 170:217) e do TRF da 4ª Região - 2ª parcelamento, sem que haja a extinção do dé-
Turma (RDDT 115:224). bito, não acarreta o levantamento das garantias
até então prestadas. Tal consideração não veda, quigráficas que ficam fazendo parte integrante do
contudo, a adequação da penhora ao valor do presente julgado.
débito, tendo em conta que a redução da pe- Porto Alegre, 17 de junho de 2009.
nhora é medida cabível a qualquer tempo no (DEJF da 4ª R. de 7.7.2009, pp. 156/7)
processo executivo, mesmo que se encontre ele
suspenso em virtude de parcelamento.
2. A controvérsia posta no recurso, contudo, EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA -
não gira unicamente em torno da possibilidade OFERECIMENTO DE PRECATÓRIO
de liberação dos bens penhorados, acaso veri- HAVIDO POR CESSÃO DE CRÉDITO -
ficado excesso de penhora, na pendência de AUSÊNCIA DE HOMOLOGAÇÃO
parcelamento do débito. A insurgência recur- JUDICIAL - POSSIBILIDADE DE RECUSA
sal vai mais além, pois se trata de saber se, di-
ante da existência de constrição sobre bens AgRg no Agravo de Instrumento
móveis, imóveis e dinheiro, pode a liberação nº 1.152.727 - SP (2009/0020628-3)
da penhora se dar sobre este último, manten-
do-se a penhora apenas sobre os demais bens, Relator: Ministro Herman Benjamin
suficientes à garantia integral da dívida rema- Agravante: Set Point Comércio e Indústria Ltda
nescente. Advogado: Rogério Mauro D’Avola e Outro(s)
3. Na hipótese, contudo, os bens móveis (tubos Agravado: Fazenda do Estado de São Paulo
de aço) integrantes do estoque da empresa exe- Procurador: Maria Amélia Santiago da Silva Maio
cutada, levados à hasta pública por diversas e Outro(s)
vezes sem sucesso, já demonstraram a sua in-
capacidade de garantia do débito, ante a difi- Ementa
culdade de alienação. Processual Civil e Tributário. Execução Fiscal.
4. Ainda que o crédito esteja sendo quitado no Penhora. Oferecimento de Precatório havido
bojo do parcelamento administrativo, não se por Cessão de Crédito. Ausência de Homolo-
pode olvidar que as garantias existentes devem gação Judicial. Recusa do Ente Público. Art.
permanecer vinculadas ao processo de manei- 656 do CPC. Possibilidade. Súmula 7/STJ.
1. De acordo com pacífica jurisprudência do
ra a propiciar a plena satisfação do débito re-
STJ, muito embora o crédito representado por
manescente, em caso de inadimplência do par-
precatório constitua bem penhorável, a recusa,
celamento e necessidade de prosseguimento da pelo exeqüente, pode ser justificada por qual-
execução forçada. Assim, a escolha de quais quer uma das causas previstas no art. 656 do
bens deverão ser objeto de liberação em caso CPC.
de penhora excessiva, ainda que suspensa a 2. O Tribunal de origem consignou não ter ha-
exigibilidade do crédito, não prescinde da rea- vido homologação judicial da cessão de crédi-
lização de juízo sobre a aptidão dos bens em to. A revisão desse entendimento é inviável nos
relação aos quais deverá ser mantida a constri- termos da Súmula 7/STJ.
ção. 3. A superveniência da decisão homologatória
5. Ademais, deve-se considerar que o dinhei- não tem o condão de infirmar as premissas fá-
ro ocupa posição privilegiada na ordem de ticas adotadas pelo acórdão recorrido. Serve,
preferência estipulada pelo artigo 11 da Lei nº quando muito, a embasar novo pedido de subs-
6.830/80, de modo que a sua liberação, em tituição de bens penhorados, em primeira ins-
detrimento da liberação de bens que estejam tância, no juízo da Execução Fiscal em curso.
situados em patamar inferior, apenas será 4. Agravo Regimental não provido.
admitida em circunstâncias específicas, sob
pena admitir-se o “retrocesso da atividade exe- Acórdão
cutiva, impulsionando-a para sentido inverso Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
ao da sua natural finalidade” (STJ, REsp nº partes as acima indicadas, acordam os Ministros
1.089.888/SC, Relator Min. Teori Albino Za- da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
vascki, DJe 21.05.2009). ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
6. Agravo de instrumento improvido. to ao agravo regimental, nos termos do voto do(a)
Sr(a). Ministro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros
Acórdão Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon, Cas-
Vistos e relatados estes autos em que são partes as tro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr.
acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Ministro Relator.
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una- Brasília, 22 de setembro de 2009 (data do julga-
nimidade, negar provimento ao agravo de instru- mento).
mento, nos termos do relatório, votos e notas ta- (DJe de 30.9.2009)
EXECUÇÃO FISCAL - Advogado: Rafael Pordeus Costa Lima Filho e
REDIRECIONAMENTO CONTRA SÓCIO - Outro(s)
DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA -
RAZÃO DA POSSIBILIDADE Ementa
Agravo Regimental. Responsabilização do Sín-
Agravo de Instrumento dico de Massa Falida. Art. 134, V, do Código
nº 2009.04.00.009305-4/PR Tributário Nacional, Conjugado com art. 4º,
§ 1º da Lei de Execução Fiscal. Agravo Regi-
Relator: Juiz Federal Nicolau Konkel Junior mental não Provido.
Agravante: Instituto Nacional de Metrologia Nor- 1. A responsabilidade dos síndicos deve ficar
malização e Qualidade INDL - Inmetro limitada aos casos em que “antes de garantidos
Advogado: Procuradoria-Regional Federal da 4ª os créditos da Fazenda Pública, alienarem ou
Região derem em garantia quaisquer dos bens admi-
Agravado: G. L. David Com/ME nistrados”. Aplicação conjugada do art. 4º, § 1º
da Lei de Execução Fiscal, ao art. 134, V, do
Ementa CTN.
Processual Civil. Agravo de Instrumento. Exe- 2. Ressalvados os ilícitos praticados no exercí-
cução Fiscal. Multa Administrativa. Redire- cio da função.
cionamento. Citação de Titular da Empresa. 3. Agravo regimental não provido.
. É possível a responsabilização do sócio admi-
nistrador no caso de dissolução irregular da Acórdão
empresa, consoante precedentes do STJ e des- Vistos, relatados e discutidos estes autos em que
ta Corte. Isto porque é seu dever, diante da são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
paralisação definitiva das atividades da pessoa tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
jurídica, promover-lhe a regular liquidação, Justiça, na conformidade dos votos e das notas
realizando o ativo, pagando o passivo e ratean- taquigráficas, por unanimidade, negar provimen-
do o remanescente entre os sócios ou os acio- to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
nistas (art. 1.103 do Código Civil e arts. 344 e Ministro Relator.
345 do Código Comercial). Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Mar-
. Não cumprido tal mister, nasce a presunção tins e Herman Benjamin votaram com o Sr. Minis-
de apropriação indevida dos bens da socieda- tro Relator.
de (art. 10, Decreto nº 3.078/19). Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Eliana
. Prequestionamento quanto à legislação invo- Calmon.
cada estabelecido pelas razões de decidir. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto
. Agravo de instrumento provido. Martins.
Brasília (DF), 1º de outubro de 2009.
Acórdão (DJe de 15.10.2009)
Vistos e relatados estes autos em que são partes as
acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una- EXECUÇÃO FISCAL - SUBSTITUIÇÃO DE
nimidade, dar provimento ao agravo de instru- PENHORA POR PRECATÓRIO, SEM
mento, nos termos do relatório, votos e notas ta- ANUÊNCIA DO EXEQUENTE -
quigráficas que ficam fazendo parte integrante do IMPOSSIBILIDADE
presente julgado.
Porto Alegre, 01 de setembro de 2009. AgRg nos Embargos de Divergência em
(DEJF da 4ª R. de 7.10.2009, p. 351) REsp nº 948.187 - SP (2009/0024980-8)

Relator: Ministro Benedito Gonçalves


EXECUÇÃO FISCAL - Agravante: Novex Ltda
RESPONSABILIZAÇÃO DO SÍNDICO DE Advogado: Rogério Mauro D’Avola e Outro(s)
MASSA FALIDA Agravado: Fazenda do Estado de São Paulo
Procurador: Ana Lucia Ikeda Oba e Outro(s)
AgRg nos EDcl no AgRg no Recurso Especial
nº 653.686 - CE (2004/0058635-8) Ementa
Tributário. Embargos de Divergência. Agravo
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques Regimental. Execução Fiscal. Substituição de
Agravante: Fazenda Nacional Penhora por Precatório sem Anuência do Exe-
Procurador: André Antônio Souza Santos quente. Impossibilidade. Matéria Pacificada
Agravado: Carlos Alberto Mendes Forte no Âmbito da Primeira Seção.
1. Agravo regimental contra decisão que inde- 1. À exequente que sucumbe nos embargos,
feriu liminarmente os embargos de divergência cumpre pagar os honorários.
ante o óbice da Súmula 168/STJ. 2. A citação de executado constante da CDA
2. A Primeira Seção, por ocasião do julgamen- impõe à exequente o ônus decorrente do in-
to do REsp 1.090.898/SP (Rel. Min. Castro gresso do legitimado passivo em juízo.
Meira, DJ 31/8/2009), submetido ao regime 3. In casu, assevera a recorrente que, sem
preconizado no art. 543-C do CPC, consolidou qualquer requerimento expresso, o cartório
o entendimento de que, “Não se equiparando procedeu à citação do sócio da empresa exe-
o precatório a dinheiro ou fiança bancária, mas cutada - cujo nome constava da inicial e da
a direito de crédito, pode a Fazenda Pública CDA, em hipótese de responsabilidade subsi-
recusar a substituição por quaisquer das causas diária, ausente qualquer causa de redireciona-
previstas no art. 656 do CPC ou nos arts. 11 e mento da execução - razão pela qual pretende
15 da LEF”. escusar-se de pagar honorários resultantes de
3. “Não cabem embargos de divergência, embargos procedentes, sob a alegação de que
quando a jurisprudência do Tribunal se firmou outro órgão da Administração Pública, sem
no mesmo sentido do acórdão embargado” personalidade jurídica própria, procedera ao
(Súmula 168/STJ). ato processual equivocado.
4. Agravo regimental não provido. 4. Deveras, a autarquia não providenciou a ex-
clusão do sócio da relação processual nem im-
Acórdão pugnou a sua citação.
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são 5. Recurso Especial desprovido.
partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justi- Acórdão
ça, por unanimidade, negar provimento ao agra- Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Mi-
vo regimental, nos termos do voto do Sr. Minis- nistros da Primeira Turma do Superior Tribunal de
tro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhi- Justiça acordam, na conformidade dos votos e das
do, Eliana Calmon, Luiz Fux, Castro Meira, Hum- notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
berto Martins, Herman Benjamin e Mauro Camp- negar provimento ao recurso especial, nos termos
bell Marques votaram com o Sr. Ministro Relator. do voto do Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Deni- Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki e Bene-
se Arruda. dito Gonçalves (Presidente) votaram com o Sr.
Brasília (DF), 23 de setembro de 2009 (Data do Ministro Relator.
Julgamento). Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Hamil-
(DJe de 1º.10.2009) ton Carvalhido.
Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília (DF), 17 de setembro de 2009 (Data do
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - Julgamento).
EXECUÇÃO FISCAL - SÓCIO - CITAÇÃO (DJe de 8.10.2009)
POR EQUÍVOCO - PROCEDÊNCIA DOS
EMBARGOS
ICMS - BASE DE CÁLCULO - SELO DE
Recurso Especial nº 970.086 - PR CONTROLE DO IPI - REFLEXO
(2007/0173156-3) PECUNIÁRIO NO CUSTO DE PRODUÇÃO -
INCLUSÃO
Relator: Ministro Luiz Fux
Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social - Recurso Especial nº 732.617 - MG
INSS (2005/0041354-0)
Repr. por: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacio-
nal Relator: Ministro Teori Albino Zavascki
Recorrido: Paulo César Ximenes Alves Ferreira Recorrente: Companhia Müller de Bebidas
Advogado: Valter Carlos Marques Advogado: Fernando Loeser e Outro(s)
Recorrido: Estado de Minas Gerais
Ementa Procurador: Elcio Reis e Outro(s)
Processo Civil. Execução Fiscal. Sócio. Ilegi-
timidade Passiva. Citação Realizada por Equí- Ementa
voco Cartorário. Procedência dos Embargos Processual Civil e Tributário. Selo de Contro-
à Execução. Honorários Advocatícios contra le de IPI. Natureza Jurídica. Obrigação Aces-
a Autarquia Previdenciária Exeqüente. Cabi- sória. Reflexo Pecuniário no Custo de Produ-
mento. ção. Inclusão na Base de Cálculo do ICMS.
1. A ausência de debate, na instância recorri- EREsp 215.849-SP (1ª S 11/06/2008 -
da, dos dispositivos legais cuja violação se ale- DJe 13/08/2008).
ga no recurso especial atrai a incidência da EREsp 826.817-MG(1ª S 24/09/2008 -
Súmula 282/STF. DJe 13/10/2008).
2. A aquisição de selo para controle do IPI tem AgRg no REsp 195.812-SP (1ª T 06/08/2002 -
natureza jurídica de obrigação acessória, por- DJ 21/10/2002).
quanto visa a facilitar a fiscalização e arreca- (DJe de 7.10.2009)
dação do tributo principal, conforme previsão
contida no artigo 113, § 2º, do CTN. A co- NOTA DA DIALÉTICA
brança pela confecção e fornecimento dos A Súmula nº 395, acima, foi aprovada pela Pri-
selos, amparada pelo Decreto-Lei 1.437/75, meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
nada mais é do que o ressarcimento aos cofres setembro de 2009.
públicos do seu custo, não configurando taxa
ou preço público. Precedente: REsp 836.277,
1ª Turma, Min. Francisco Falcão, DJ de ICMS - ENERGIA ELÉTRICA - DEMANDA
20.09.07. DE POTÊNCIA - INCIDÊNCIA SOBRE
3. O custo com a aquisição dos selos de con- EFETIVA UTILIZAÇÃO
trole de IPI, portanto, integra o preço final da
mercadoria comercializada e, dessa forma, está Súmula n. 391
compreendido no “valor da operação”, que O ICMS incide sobre o valor da tarifa de ener-
vem a ser a base de cálculo do ICMS, nos ter- gia elétrica correspondente à demanda de po-
mos do art. 13, § 1º, da LC 87/96. tência efetivamente utilizada.
4. Recurso especial parcialmente conhecido e,
nessa parte, desprovido. Referência:
CPC, art. 543-C.
Acórdão Res. n. 8-STJ, de 07/08/2008, art. 2º, § 1º.
Vistos e relatados estes autos em que são partes as REsp 960.476-SC (1ª S 11/03/2009 -
acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma DJe 13/05/2009).
do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, REsp 222.810-MG (1ª T 14/03/2000 -
conhecer parcialmente do recurso especial e, nes- DJ 15/05/2000).
sa parte, negar-lhe provimento, nos termos do REsp 647.553-ES (1ª T 05/04/2005 -
voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros DJ 23/05/2005).
Denise Arruda, Benedito Gonçalves, Francisco AgRg no REsp 855.929-SC (1ª T 19/09/2006 -
Falcão e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro DJ 16/10/2006).
Relator. REsp 579.416-ES (1ª T 01/03/2007 -
Sustentou oralmente o Dr. Fabiano Meireles de DJ 29/03/2007).
Angelis, pela parte Recorrente: Companhia Müller AgRg no REsp 797.826-MT (1ª T 03/05/2007 -
de Bebidas e Dra. Patricia Pinheiro Martins, pela DJ 21/06/2007).
parte Recorrida: Estado de Minas Gerais. REsp 343.952-MG (2ª T 05/02/2002 -
Brasília, 14 de abril de 2009. DJ 17/06/2002).
(DJe de 28.9.2009) AgRg no Ag 707.491-SC (2ª T 17/11/2005 -
DJ 28/11/2005).
(DJe de 7.10.2009)
ICMS - BASE DE CÁLCULO - VALOR DA
VENDA A PRAZO CONSTANTE DA NOTA NOTA DA DIALÉTICA
FISCAL A Súmula nº 391, acima, foi aprovada pela Pri-
meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
Súmula n. 395 setembro de 2009.
O ICMS incide sobre o valor da venda a prazo
constante da nota fiscal.
ICMS - SESI - IMUNIDADE -
Referência: INAPLICABILIDADE ÀS HIPÓTESES DE
Dec.-lei n. 406, de 31/12/1968, art. 2º, I. RESPONSABILIDADE OU SUBSTITUIÇÃO
EREsp 550.382-SP (1ª S 11/05/2005 - TRIBUTÁRIA - DIFERIMENTO
DJ 01/08/2005).
EREsp 234.500-SP (1ª S 09/11/2005 - Recurso Extraordinário 202.987-4
DJ 05/12/2005).
EREsp 421.781-SP (1ª S 13/12/2006 - Proced.: São Paulo
DJ 12/02/2007). Relator: Min. Joaquim Barbosa
Recte.: Serviço Social da Indústria - Sesi Agravante: Distribuidora de Alimentos e Raízes
Adv.: Luiz Antonio Collaco Domingues e Outros Ltda ME
Recdo.: Estado de São Paulo Advogado: Jamilson de Morais Veras e Outro(s)
Adv.: Carla Pedroza de Andrade Agravado: os Mesmos
Requerido: Desembargador Presidente do Tribu-
Decisão: A Turma, por votação unânime, conhe- nal de Justiça do Estado do Ceará
ceu do recurso extraordinário, mas lhe negou pro- Requerido: Desembargador Relator do Agravo de
vimento, nos termos do voto do Relator. Ausen- Instrumento nr. 2007001415946 do Tribunal de
tes, justificadamente, neste julgamento, a Senho- Justiça do Estado do Ceará
ra Ministra Ellen Gracie e o Senhor Ministro Eros Requerido: Desembargador Relator do Agravo de
Grau. Presidiu, este julgamento, o Senhor Minis- Instrumento nr. 2008001060119 do Tribunal de
tro Celso de Mello. 2ª Turma, 30.06.2009. Justiça do Estado do Ceará
Ementa:
Constitucional. Tributário. Imunidade. Enti- Ementa
dade de Assistência Social e Educação sem Agravos Regimentais. Suspensão de Liminar e
Fins Lucrativos. Inaplicabilidade às Hipóteses de Sentença. Deferimento Parcial. ICMS.
de Responsabilidade ou Substituição Tributá- Transporte de Mercadoria para Estado Diver-
ria. so. Vedada a Apreensão de Mercadorias para
Imposto sobre Operação de Circulação de Efeito de Pagamento do Tributo.
Mercadorias - ICM/ICMS. Lançamento Fun- - O indeferimento de pedido de suspensão e o
dado na Responsabilidade do Serviço Social improvimento do respectivo agravo regimental
da Indústria - Sesi pelo Recolhimento de Tri- pelo Tribunal local não impedem que o ente
buto Incidente sobre a Venda de Mercadoria público, posteriormente, ingresse com novo
Adquirida pela Entidade. Produtor-vendedor pedido perante os Tribunais Superiores, con-
Contribuinte do Tributo. Tributação sujeita a forme dispõe a norma do art. 4º, § 4º, da Lei
Diferimento. n. 8.437/1992.
Recurso extraordinário interposto de acórdão - O tema de mérito da ação principal, a respei-
que considerou válida a responsabilização tri- to da possibilidade de se escolher a forma pela
butária do Serviço Social da Indústria - Sesi qual o imposto será recolhido, não pode ser
pelo recolhimento de ICMS devido em opera- examinado com profundidade na suspensão de
ção de circulação de mercadoria, sob o regime liminar e de sentença, cujos contornos, defini-
de diferimento. dos na lei de regência, diferem substancial-
Alegada violação do art. 150, IV, c da Consti- mente dos recursais.
tuição, que dispõe sobre a imunidade das en- - A questão posta pelo Estado requerente rela-
tidades assistenciais sem fins lucrativos. tiva à impossibilidade de apreensão de merca-
A responsabilidade ou a substituição tributária dorias como forma coercitiva de pagamento de
não alteram as premissas centrais da tributa- tributos, além de não ter amparo na jurisprudên-
ção, cuja regra-matriz continua a incidir sobre cia consolidada pelo STF (enunciado n. 323),
a operação realizada pelo contribuinte. Portan- não revela a possibilidade de lesão grave lesão
to, a imunidade tributária não afeta, tão-so- [sic] à ordem, à segurança, à saúde e à econo-
mente por si, a relação de responsabilidade tri- mia públicas. Mantém-se, por isso, o deferi-
butária ou de substituição e não exonera o res- mento parcial do pedido de suspensão.
ponsável tributário ou o substituto. Agravos regimentais improvidos.
Recurso extraordinário conhecido, mas ao qual
se nega provimento. Acórdão
(DJe de 24.9.2009, p. 92) Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Corte Especial do Superior Tribunal de Justi-
ICMS - TRANSPORTE DE MERCADORIA ça, na conformidade dos votos e das notas taqui-
PARA ESTADO DIVERSO - APREENSÃO gráficas a seguir, por unanimidade, negar provi-
PARA EFEITO DE PAGAMENTO DO mento aos agravos regimentais, nos termos do
TRIBUTO - VEDAÇÃO voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
AgRg na Suspensão de Liminar e de Nilson Naves, Fernando Gonçalves, Felix Fischer,
Sentença nº 971 - CE (2008/0245503-0) Aldir Passarinho Junior, Gilson Dipp, Hamilton
Carvalhido, Eliana Calmon, Francisco Falcão,
Agravante: Estado do Ceará Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Luiz Fux, João Otá-
Procurador: Fernando Antônio Costa de Oliveira vio de Noronha e Teori Albino Zavascki votaram
e Outro(s) com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Ari Pargen- IMPOSTO DE RENDA - CONCEITO DE
dler. ACRÉSCIMO PATRIMONIAL - CORREÇÃO
Brasília, 02 de setembro de 2009 (data do julga- MONETÁRIA DE IMÓVEIS EM ESTOQUE -
mento). AUSÊNCIA DE FATO GERADOR
(DJe de 28.9.2009)
Recurso Especial nº 1.079.313 - SP
(2008/0172228-9)
IMPOSTO DE RENDA - CESSÃO DE
DIREITO SOBRE PASSE DE ATLETA - Relatora: Ministra Eliana Calmon
GANHO DE CAPITAL Recorrente: Seman Serviços Empreendimentos e
Administração Ltda
Recurso Especial nº 383.196 - RS Advogado: Alexandre Pires Martins e Outro(s)
(2001/0152037-3) Recorrido: Fazenda Nacional
Advogado: Procurador-Geral da Fazenda Nacio-
Relator: Ministro Herman Benjamin nal
Recorrente: Fazenda Nacional
Procuradores: Marcelo Coletto Pohlmann e Ou- Ementa
tro(s) Tributário - Imposto sobre a Renda - Art. 43 do
Claudio Xavier Seefelder Filho CTN - Conceito de Acréscimo Patrimonial -
Recorrido: Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense Correção Monetária de Imóveis em Estoque -
Advogado: Cláudio Leite Pimentel e Outro(s) Inexistência de Renda - Ausência de Fato Ge-
rador.
Ementa 1. Não se confunde lucro inflacionário com
Tributário. Imposto de Renda. Cessão de Direi- lucro real. O primeiro engloba no seu quanti-
to sobre Passe de Atleta. Ganho de Capital Con- tativo os ganhos reais da empresa devidamen-
figurado. Arts. 554, I, do Decreto 85.450/1980 te atualizados. O ganho real, diferentemente, é
e arts. 682 e 685 do Decreto 3.000/1999. Inci- unicamente o resultado da atividade econômi-
dência. ca.
1. Cinge-se a questão à incidência de Imposto 2. Segundo a jurisprudência das Turmas de Di-
de Renda sobre operação de remessa de valor reito Público, a correção monetária dos imó-
à Espanha em decorrência da aquisição de pas- veis em estoque não é passível de incidência
se de atleta profissional de futebol. do imposto sobre a renda. Precedentes.
2. Incide Imposto de Renda na fonte sobre ren- 3. Recurso especial provido.
dimentos e ganhos de capital provenientes de
contribuintes situados no Brasil, quando rece- Acórdão
bidos por pessoas físicas ou jurídicas residen- Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
tes ou domiciliadas no exterior (art. 554, I, do partes as acima indicadas, acordam os Ministros
Decreto 85.450/1980 e arts. 682 e 685 do De- da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
creto 3.000/1999). ça “A Turma, por unanimidade, deu provimento
3. Na hipótese em tela, houve ganho de capi- ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Minis-
tal do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense com tro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros Castro Mei-
a aquisição de direitos sobre o passe do joga- ra, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mau-
dor. ro Campbell Marques votaram com a Sra. Minis-
4. Recurso Especial provido. tra Relatora.
Brasília-DF, 17 de setembro de 2009 (Data do
Acórdão Julgamento).
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são (DJe de 30.9.2009)
partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
ça: “A Turma, por unanimidade, deu provimento IMPOSTO DE RENDA - OMISSÃO DE
ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Minis- RECEITA - ESCRITA ORGANIZADA - BASE
tro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros Mauro Camp- DE CÁLCULO
bell Marques, Eliana Calmon, Castro Meira e
Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Recurso Especial nº 660.598 - PE
Relator. (2004/0064282-1)
Brasília, 15 de setembro de 2009 (data do julga-
mento). Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
(DJe de 24.9.2009) Recorrente: Clementina Duarte Joias Ltda
Advogado: Fernando de Oliveira Barros IMPOSTO DE RENDA - OPERAÇÕES
Recorrido: Fazenda Nacional FINANCEIRAS NO MERCADO EXTERIOR
Procuradores: Danilo Augusto Barboza de Aguiar (BOLSA DE MERCADORIAS) - APURAÇÃO
e Outro(s) DO LUCRO REAL - ART. 5º DO DL 1.418 -
Claudio Xavier Seefelder Filho VARIAÇÃO MONETÁRIO-CAMBIAL -
RIQUEZA NOVA - AQUISIÇÃO
Ementa DE DISPONIBILIDADE ECONÔMICA
Tributário. Imposto de Renda Pessoa Jurídica. Recurso Especial nº 1.041.022 - RS
Omissão de Receita. Escrita Organizada. Base (2008/0059694-3)
de Cálculo. Interpretação dos arts. 8º, § 6º, do
Decreto-lei nº 1.648/78, e 400, § 6º, do RIR/80. Relator: Ministro Benedito Gonçalves
1. A mera colagem de ementas não supre a de- Recorrente: Olvebra S/A
monstração do dissídio jurisprudencial. Prece- Advogado: Ricardo Mariz de Oliveira e Outro(s)
dentes: AEREsp nº 337.883/SP, Rel. Min. Ha- Recorrido: Fazenda Nacional
milton Carvalhido, DJ de 22/03/2004, REsp nº Procuradores: José Carlos Costa Loch e Outro(s)
Claudio Xavier Seefelder Filho
466.526/DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves,
DJ de 25/08/2003 e AGREsp nº 493.456/RS, Ementa
Rel. Min. Felix Fischer, DJ de 23/06/2003. Tributário. Recurso Especial. Ação Anulatória
2. Existindo omissão de receita, conforme o de Débito Fiscal. Imposto de Renda. Opera-
art. 8º, § 6º, do Decreto-Lei nº 1.648/78, o lu- ções Financeiras no Mercado Exterior (Bolsa
cro líquido a ser arbitrado, para efeito de cál- de Mercadorias). Apuração do Lucro Real.
culo do imposto de renda devido, corresponde- Decreto-Lei n. 1.418/75, art. 5º. Variação Mo-
rá a 50% (cinqüenta por cento) dos valores netário-Cambial dos Valores Investidos e do
omitidos, ainda que o contribuinte tenha escrita Lucro Decorrente. Fato Autônomo. Riqueza
organizada. Precedentes: Primeira Turma, Nova. Aquisição de Disponibilidade Econômi-
REsp 639.057/MG, Rel. Min. José Delgado, ca. Art. 43 do CTN. Incidência do Imposto de
DJ de 13.09.04; REsp nº 643.550 - CE, Pri- Renda.
meira Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, julga- 1. Caso em que se discute a inclusão dos ga-
nhos decorrentes da variação monetário-cam-
do em 12.09.2006; AgRg no REsp nº 640.007 bial na apuração do lucro real a ser tributado
- PE, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Ben- pelo imposto de renda, na hipótese do Decre-
jamin, julgado em 28.04.2009; REsp nº to-Lei n. 1.418/75, que excluiu do cômputo do
628.184 - AL, Segunda Turma, Rel. Min. Cas- lucro real o resultado proveniente de investi-
tro Meira, julgado em 12.12.2006; REsp nº mento em bolsa de mercadorias no exterior.
328.762 - PR, Segunda Turma, Rel. Min. João 2. A variação positiva no preço da moeda es-
Otávio de Noronha, julgado em 16.03.2006. trangeira é efetivo ganho de capital e, por isso,
Em sentido contrário: REsp nº 549.921 - CE, está sujeita à tributação pelo imposto de renda,
Primeira Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, jul- nos termos do art. 43 do Código Tributário
gado em 21.06.2007. Nacional.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, 3. O fato de o montante de moeda estrangeira
nessa parte, provido. que gerou o lucro auferido na bolsa de merca-
dorias no exterior dar origem, total ou parcial-
Acórdão mente, ao montante de moeda estrangeira que
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que será, na internação, convertida em moeda na-
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- cional, ou que será declarada ao Fisco, não ili-
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de de o fato gerador do imposto de renda, quanto
Justiça, na conformidade dos votos e das notas aos ganhos decorrentes da variação monetário-
cambial. Inteligência do art. 43 do CTN.
taquigráficas, por unanimidade, conhecer em par-
4. Não há como conferir interpretação ao art. 5º
te do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, do DL n. 1.418/75 que exclua os ganhos com
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. a variação monetário-cambial da incidência do
Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Castro Meira, imposto de renda, uma vez que o consequente
Humberto Martins e Herman Benjamin votaram acréscimo financeiro, no patrimônio material
com o Sr. Ministro Relator. do contribuinte, é fato autônomo que não guar-
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto da correlação com o lucro auferido na bolsa de
Martins. mercadorias.
Brasília (DF), 06 de outubro de 2009. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e,
(DJe de 15.10.2009) nessa parte, não provido.
Acórdão Relator: Ministro Hamilton Carvalhido
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são Agravante: Fazenda Nacional
partes as acima indicadas, acordam os Ministros Procurador: Procuradoria Geral da Fazenda Na-
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi- cional - PGFN
ça, por unanimidade, conhecer parcialmente do Agravado: Michelato Alimentos Ltda
recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provi- Agravado: Indústria e Comércio de Milho Três
mento, nos termos do voto do Sr. Ministro Rela- Marias Ltda
tor. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Luiz Advogado: Antônio Carlos Rocha Pires de Olivei-
Fux e Teori Albino Zavascki votaram com o Sr. ra e Outro(s)
Ministro Relator. Agravado: M R Bondezan e Cia Ltda
Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda. Advogado: Luís Felipe Cavalcante Sarmento de
Brasília (DF), 1º de outubro de 2009 (Data do Azevedo e Outro(s)
Julgamento). Ementa
(DJe de 8.10.2009) Agravo Regimental em Embargos de Diver-
gência em Recurso Especial. Tributário. IPI.
Exercício do Direito de Crédito Postergado
IOF - IMUNIDADE - ENTIDADES pelo Fisco. Descaracterização do Crédito Es-
ASSISTENCIAIS SEM FINS LUCRATIVOS - critural. Correção Monetária. Incidência.
ABRANGÊNCIA 1. A Primeira Seção deste Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº
Ag. Reg. no Agravo de Instrumento 508.567-6 1.035.847/RS, submetido ao regime do artigo
543-C do Código de Processo Civil, consoli-
Proced.: Amazonas dou o entendimento de que, pena de enrique-
Relatora: Min. Ellen Gracie cimento sem causa para o Fisco, é devida a
Agte(s).: União correção monetária de créditos de IPI referen-
Adv(a/s).: PFN - Cinara Ribeiro Silva Kichel tes a operações de matérias-primas e insumos
Agdo(a/s).: Serviço Nacional de Aprendizagem empregados na fabricação de produto isento ou
Comercial - Senac beneficiado com alíquota zero, quando admi-
Adv(a/s).: Carlos Fausto Ventura Gonçalves tidos extemporaneamente pelo Fisco, porque
resta descaracterizado, nessa hipótese, o crédi-
Decisão: A Turma, à unanimidade, negou provi- to como escritural.
mento ao agravo regimental, nos termos do voto 2. Agravo regimental improvido.
da Relatora. 2ª Turma, 04.08.2009.
Acórdão
Constitucional. Tributário. Imunidade. IOF. Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
1. A imunidade tributária, prevista no art. 150, partes as acima indicadas, acordam os Ministros
VI, c, da Constituição, concernente às entida- da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justi-
des assistenciais sem fins lucrativos, incide ça, por unanimidade, negar provimento ao agra-
também sobre o IOF. Precedentes. vo regimental, nos termos do voto do Sr. Minis-
tro Relator. A Sra. Ministra Eliana Calmon e os
2. Improcedência do pedido de sobrestamento Srs. Ministros Luiz Fux, Castro Meira, Humber-
do feito, tendo em vista o decidido na ADI to Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell
1.802-MC/DF. Marques e Benedito Gonçalves votaram com o Sr.
3. Agravo regimental improvido. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, a Sra.
(DJe de 27.8.2009, p. 91) Ministra Denise Arruda.
Brasília, 23 de setembro de 2009 (data do julga-
NOTA DA DIALÉTICA mento).
Vide Decisões do Ministro Marco Aurélio, do (DJe de 1º.10.2009)
STF (RDDT 14:181 e 107:217), e Acórdãos do
TRF da 2ª Região - 4ª Turma (RDDT 98:232) e do NOTA DA DIALÉTICA
TRF da 4ª Região - 2ª Turma (RDDT 81:232). Vide Íntegras de Acórdãos do STF - 1ª Turma
(RDDT 169:190 e nesta edição, p. 189).
IPI - CRÉDITO - EXERCÍCIO DO DIREITO
POSTERGADO PELO FISCO - CORREÇÃO IPI - CRÉDITO - MATÉRIA-PRIMA -
MONETÁRIA BENEFICIAMENTO POR TERCEIROS

AgRg nos Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 752.888 - RS


REsp nº 546.350 - DF (2008/0049790-8) (2005/0084579-4)
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki conhecer parcialmente do recurso especial e, nes-
Recorrente: Fazenda Nacional sa parte, negar-lhe provimento, nos termos do
Procuradores: José Carlos Costa Loch e Outro(s) voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
Claudio Xavier Seefelder Filho Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido e Luiz
Recorrido: Sadesa Brasil Indústria e Comércio de Fux votaram com o Sr. Ministro Relator.
Couros Ltda Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda.
Advogado: Gilberto Libório Barros Brasília, 15 de setembro de 2009.
(DJe de 25.9.2009)
Ementa
Processual Civil e Tributário. Recurso Espe-
cial. Ausência de Prequestionamento. Crédito IPI - DEMANDAS AJUIZADAS PELA
Presumido do IPI. Matéria-prima. Beneficia- MATRIZ E PELAS FILIAIS - EMPRESAS
mento por Terceiros. Créditos Escriturais. Cor- DISTINTAS - LITISPENDÊNCIA
reção Monetária. Incidência. Matéria Decidida INEXISTENTE
pela 1ª Seção, no REsp 1.035.847/RS, DJE
03.08.2009, sob o Regime do art. 543-C do AgRg no Recurso Especial nº 591.595 - BA
CPC. Especial Eficácia Vinculativa desse Pre- (2003/0163708-0)
cedente (CPC, art. 543-C, § 7º), que impõe sua
Adoção em Casos Análogos. Honorários Ad- Relator: Ministro Herman Benjamin
vocatícios. Reexame de Matéria Fática. Impos- Agravante: Fazenda Nacional
sibilidade. Procuradores: Claudio Xavier Seefelder Filho
1. Em recurso especial, não se conhece de ma- Márcia Henriques R. de Oliveira e
téria não prequestionada. Outro(s)
2. Faz jus ao crédito presumido do IPI o esta- Agravado: Trikem S/A e Outro
belecimento comercial que adquire insumos e Advogado: Marcos José Santos Meira e Outro(s)
os repassa a terceiros para beneficiá-los, por
encomenda, para posteriormente exportar os Ementa
produtos. Precedentes. Processual Civil e Tributário. IPI. Litispendên-
3. É devida a correção monetária de créditos cia. Demandas Ajuizadas pela Matriz e pelas
escriturais quando o seu aproveitamento, pelo Filiais. Empresas Distintas.
contribuinte, sofre demora em virtude de resis- 1. O STJ firmou o entendimento de que inexis-
tência oposta por ilegítimo ato administrativo te litispendência entre ações intentadas pela
ou normativo do Fisco. Precedentes. empresa matriz e filiais, porque as partes são
4. A Primeira Seção, ao julgar o REsp pessoas jurídicas distintas.
1.035.847/PR, Min. Luiz Fux, DJe 03/08/2009, 2. Agravo Regimental não provido.
sob o regime do art. 543-C do CPC, reafirmou
o entendimento, que já adotara em outros pre- Acórdão
cedentes sobre o mesmo tema, no sentido de Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
que ocorrendo oposição constante de ato esta- partes as acima indicadas, acordam os Ministros
tal, administrativo ou normativo, postergando da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
o exercício do direito de crédito, exsurge legí- ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
tima a necessidade de atualização monetária. to ao agravo regimental, nos termos do voto do(a)
5. Não é cabível, em recurso especial, exami- Sr(a). Ministro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros
nar a justiça do valor fixado a título de hono- Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon e
rários, já que o exame das circunstâncias pre- Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro
vistas nas alíneas do § 3º do art. 20 do CPC Relator.
impõe, necessariamente, incursão à seara fáti- Impedido o Sr. Ministro Castro Meira.
co-probatória dos autos, atraindo a incidência Brasília, 18 de agosto de 2009 (data do julgamen-
da Súmula 7/STJ e, por analogia, da Súmula to).
389/STF. (DJe de 27.8.2009)
6. Recurso especial parcialmente conhecido e,
nesta parte, desprovido. NOTA DA DIALÉTICA
Vide Decisão do Magistrado Sergio Feltrin Cor-
Acórdão rêa, Corregedor-Geral no exercício da Presidên-
Vistos e relatados estes autos em que são partes as cia, em regime de plantão (RDDT 150:205), e
acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT 44:224) e do
do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, TRF da 4ª Região - 2ª Turma (RDDT 69:234).
IPI - SELO DE CONTROLE - NATUREZA IPTU - ENVIO DO CARNÊ AO ENDEREÇO
JURÍDICA - OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA - DO CONTRIBUINTE - NOTIFICAÇÃO DO
REFLEXO PECUNIÁRIO NO CUSTO DE LANÇAMENTO
PRODUÇÃO - INCLUSÃO NA BASE DE
CÁLCULO DO ICMS Súmula n. 397
O contribuinte do IPTU é notificado do lança-
Recurso Especial nº 732.617 - MG mento pelo envio do carnê ao seu endereço.
(2005/0041354-0)
Referência:
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki CPC, art. 543-C.
Recorrente: Companhia Müller de Bebidas Res. n. 8-STJ, de 07/08/2008, art. 2º, § 1º.
Advogado: Fernando Loeser e Outro(s) REsp 1.111.124-PR (1ª S 22/04/2009 -
Recorrido: Estado de Minas Gerais DJe 04/05/2009).
Procurador: Elcio Reis e Outro(s) REsp 842.771-MG (1ª T 27/03/2007 -
DJ 30/04/2007).
Ementa AgRg no REsp 784.771-RS (1ª T 03/06/2008 -
Processual Civil e Tributário. Selo de Contro- DJe 19/06/2008).
le de IPI. Natureza Jurídica. Obrigação Aces- REsp 965.361-SC (1ª T 05/05/2009 -
sória. Reflexo Pecuniário no Custo de Produ- DJe 27/05/2009).
ção. Inclusão na Base de Cálculo do ICMS. REsp 869.683-SC (1ª T 02/06/2009 -
1. A ausência de debate, na instância recorri- DJe 10/06/2009).
da, dos dispositivos legais cuja violação se ale- REsp 868.629-SC (2ª T 07/08/2008 -
ga no recurso especial atrai a incidência da DJe 04/09/2008).
Súmula 282/STF. REsp 1.062.061-SC (2ª T 19/02/2009 -
2. A aquisição de selo para controle do IPI tem DJe 25/03/2009).
natureza jurídica de obrigação acessória, por- (DJe de 7.10.2009)
quanto visa a facilitar a fiscalização e arreca-
dação do tributo principal, conforme previsão NOTA DA DIALÉTICA
contida no artigo 113, § 2º, do CTN. A cobran- A Súmula nº 397, acima, foi aprovada pela Pri-
ça pela confecção e fornecimento dos selos, meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de
amparada pelo Decreto-Lei 1.437/75, nada setembro de 2009.
mais é do que o ressarcimento aos cofres pú-
blicos do seu custo, não configurando taxa ou
preço público. Precedente: REsp 836.277, 1ª IPTU - PERMISSÃO DE USO DE IMÓVEL
Turma, Min. Francisco Falcão, DJ de PERTENCENTE AO ESTADO - IMUNIDADE
20.09.07.
3. O custo com a aquisição dos selos de con- AgRg no Recurso Especial nº 721.095 - RJ
trole de IPI, portanto, integra o preço final da (2005/0015069-5)
mercadoria comercializada e, dessa forma, está
compreendido no “valor da operação”, que Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
vem a ser a base de cálculo do ICMS, nos ter- Agravante: Município do Rio de Janeiro
mos do art. 13, § 1º, da LC 87/96. Procurador: Christiana Mariani da Silva Telles e
4. Recurso especial parcialmente conhecido e, Outro(s)
nessa parte, desprovido. Agravado: Petrobras Distribuidora S/A
Advogado: Alexandre Portugal Paes e Outro(s)
Acórdão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as Ementa
acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma Tributário. Agravo Regimental. IPTU. Art. 34
do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, do CTN. Permissão de Uso de Imóvel Perten-
conhecer parcialmente do recurso especial e, nes- cente ao Estado. Imunidade.
sa parte, negar-lhe provimento, nos termos do 1. O permissionário do imóvel público, que de-
voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros tém a posse mediante relação pessoal, sem
Denise Arruda, Benedito Gonçalves, Francisco animus domini não se confunde com o contri-
Falcão e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro buinte do IPTU, qual seja, o proprietário do
Relator. imóvel, o titular do domínio útil ou o possui-
Sustentou oralmente o Dr. Fabiano Meireles de dor por direito real (art 34 do CTN). Assim,
Angelis, pela parte Recorrente: Companhia Mül- cabendo ao Estado, proprietário do bem, o pa-
ler de Bebidas e Dra. Patricia Pinheiro Martins, gamento do imposto, e tendo ele a imunidade
pela parte recorrida: Estado de Minas Gerais. tributária, não há a incidência do IPTU. Prece-
Brasília, 14 de abril de 2009. dentes.
(DJe de 28.9.2009) 2. Agravo regimental não provido.
Acórdão Recorrente: Estado do Paraná
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que Procurador: Cesar Augusto Binder e Outro(s)
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- Recorrido: Adriana Aparecida dos Santos Costa
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Advogado: Ademir Simões e Outro(s)
Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas, por unanimidade, negar provimen- Ementa
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Tributário. Recurso Especial. IPVA. Aliena-
Ministro Relator. ção. Responsabilidade do Antigo Proprietário.
Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Castro Meira, Artigo 134 do Código de Trânsito Brasileiro.
Humberto Martins e Herman Benjamin votaram Infrações de Trânsito.
com o Sr. Ministro Relator. 1. O artigo 134 do CTB dispõe sobre a incum-
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto bência do alienante de comunicar a transferên-
Martins. cia de propriedade ao órgão de trânsito, no pra-
Brasília (DF), 08 de setembro de 2009. zo de trinta dias, sob pena de responder soli-
(DJe de 24.9.2009) dariamente por eventuais infrações de trânsito.
O referido dispositivo não se aplica a débitos
tributários relativos ao não pagamento de
IPTU - SUJEITO PASSIVO - IPVA, por não serem relacionados a penalida-
ESTABELECIMENTO PELA LEGISLAÇÃO de aplicada em decorrência de infração de trân-
MUNICIPAL sito.
2. Recurso especial não provido.
Súmula n. 399
Cabe à legislação municipal estabelecer o su- Acórdão
jeito passivo do IPTU. Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
partes as acima indicadas, acordam os Ministros
Referência: da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi-
CPC, art. 543-C. ça, por unanimidade, negar provimento ao recur-
CTN, art. 34. so especial, nos termos do voto do Sr. Ministro
Res. n. 8-STJ, de 07/08/2008, art. 2º, § 1º. Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido,
REsp 1.111.202-SP (1ª S 10/06/2009 - Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram com o
DJe 18/06/2009). Sr. Ministro Relator.
REsp 475.078-SP (1ª T 14/09/2004 - Licenciada a Sra. Ministra Denise Arruda.
DJ 27/09/2004). Brasília (DF), 1º de outubro de 2009 (Data do
REsp 979.970-SP (1ª T 06/05/2008 - Julgamento).
DJe 18/06/2008). (DJe de 8.10.2009)
REsp 793.073-RS (2ª T 15/12/2005 -
DJ 20/02/2006). NOTA DA DIALÉTICA
REsp 759.279-RJ (2ª T 16/08/2007 - Vide Acórdãos do STJ - 2ª Turma (RDDT
DJ 11/09/2007). 168:231), do TJSP - 10ª Câmara de Direito Públi-
REsp 712.998-RJ (2ª T 04/09/2007 - co (RDDT 155:226), do TJRS - 22ª Câmara Cí-
DJ 08/02/2008). vel (RDDT 169:224) e do TIT-SP - 8ª Câmara
AgRg no REsp 1.022.614-SP (2ª T 08/04/2008 - (RDDT 5:201).
DJe 17/04/2008).
(DJe de 7.10.2009)
ITCMD - IMPOSTO DIRETO REAL -
NOTA DA DIALÉTICA ALÍQUOTAS PROGRESSIVAS -
A Súmula nº 399, acima, foi aprovada pela Pri- DESCABIMENTO - TRIBUTO DEVIDO
meira Seção do STJ, na sessão ordinária de 23 de PELA ALÍQUOTA MÍNIMA
setembro de 2009.
Apelação Cível nº 70030606842

IPVA - ALIENAÇÃO DO VEÍCULO - Vigésima Primeira Câmara Cível - Comarca de


RESPONSABILIDADE - NÃO-APLICAÇÃO Porto Alegre
DO ART. 134 DO CTB Apelante: Estado do Rio Grande do Sul
Apelado: Glacy Conceição Soares Rodrigues
Recurso Especial nº 1.116.937 - PR
(2009/0007611-8) Apelação Cível. Tributário. ITCD. Imposto Di-
reto Real. Alíquotas Progressivas. Descabi-
Relator: Ministro Benedito Gonçalves mento. Valor do Bem Transmitido ou Doado.
Critério que não mensura e/ou expressa a Ca- ção; dá trato seletivo a situações jurídicas que
pacidade Contributiva. Tributo Devido pela se diferenciam.
Alíquota Mínima para Transmissão por Doa- Apelo provido, por maioria.
ção (art. 19, I da Lei 8.821/89).
A Constituição Federal subordina todo o sis- Acórdão
tema tributário nacional a vários princípios, Vistos, relatados e discutidos os autos.
uns gerais e expressos, outros decorrentes, Acordam os Desembargadores integrantes da Vi-
outros, ainda, específicos a determinados im- gésima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Jus-
postos. São princípios gerais expressos o da tiça do Estado, por maioria, em dar provimento ao
legalidade estrita (art. 150, I), da igualdade tri- recurso, vencido, em parte, o Desembargador
butária (art. 151, II), da personalização do tri- Francisco José Moesch, nos termos dos votos a
buto e da capacidade tributária (art. 145, pará- seguir transcritos.
grafo 1º), da irretroatividade (art. 150, III, a), Custas na forma da lei.
da anualidade (art. 150, III, b), da ilimitabili- Participaram do julgamento, além do signatário, os
dade do tráfego de pessoas e bens (art. 150, V). eminentes Senhores Des. Francisco José Moesch
Entre os decorrentes, destaca-se o princípio da (Presidente e Revisor) e Desª Liselena Schifino
universalidade, que não há de ser próprio tão Robles Ribeiro.
só para o Imposto de Renda, como dispõe o Porto Alegre, 26 de agosto de 2009.
art. 153, parágrafo 2º, I, mas comum a qual- Des. Genaro José Baroni Borges,
quer tributo, posto que o art. 19, III, veda ao Relator.
Estado criar distinção entre brasileiros. Deter-
minados impostos, ainda, ficam submetidos a NOTA DA DIALÉTICA
princípios que se podem dizer específicos, Vide Decisão da Ministra Cármen Lúcia, do STF
como o da progressividade, próprio para o (RDDT 152:204).
imposto sobre a renda (art. 153, parágrafo 3º,
I) e ao IPTU, isto a contar da Emenda Consti-
tucional 29, e os da não cumulatividade e da ITR - BASE DE CÁLCULO - EXCLUSÃO DE
seletividade, aplicáveis ao IPI e ao ICMS (arts. ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL -
153, IV, parágrafo 3º, I e II e 155, II, parágra- DESNECESSIDADE DE ATO
fo 2º, I e III). DECLARATÓRIO
Tem-se certo, pois, que salvo expressa vênia
constitucional, é vedada a progressividade nos Recurso Especial nº 1.031.353 - TO
impostos reais posto que, para ficar no caso o (2007/0040969-9)
valor do bem transmitido ou doado - que cons-
titui a base de cálculo do ITCD - não mensura Relator: Ministro Teori Albino Zavascki
e nem é expressão da capacidade contributiva. Recorrente: Fazenda Nacional
Também no ITBI, imposto que tem fato gera- Procuradores: Claudio Xavier Seefelder Filho
dor comum - a transmissão de bens - só que Aline Vitalis e Outro(s)
difere na causa, razão porque o Pretório Excel- Recorrido: Federação da Agricultura do Estado do
so a seu respeito já proclamou a inconstitu- Tocantins
cionalidade da progressão. Advogado: Milton Roberto Toledo e Outro(s)
Vê-se, pois, que as disposições dos artigos 18
e 19 da lei 8.821/89 afrontam o princípio cons- Ementa
titucional que veda a progressão para os im- Processual Civil e Tributário. Violação ao art.
postos de natureza real, como inegavelmente é 535 do CPC. Inocorrência. ITR. Base de Cál-
o ITCD. culo. Área de Proteção Ambiental. Exclusão.
Por isso, deixo de aplicá-las ao caso concreto; Ato Declaratório Ambiental. Desnecessidade.
mas nem por isso as transmissões de bens ou Precedentes de Ambas as Turmas. Recurso
doações hão de ficar à margem e ao largo da Especial a que se nega Provimento.
tributação, devendo prevalecer a alíquota mí-
nima. Acórdão
Assim, na transmissão “causa mortis” aplicá- Vistos e relatados estes autos em que são partes as
vel a alíquota mínima de 1% (art. 18, I) e para acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma
a transmissão por doação, de 3%, também a do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
mínima (art. 19, I), vedada a progressão por negar provimento ao recurso especial, nos termos
conta do valor dos bens transmitidos. Ponde- do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
ro que a lei estadual 8.821/89 dispõe [de] Benedito Gonçalves (Presidente), Hamilton Car-
modo diferenciado as alíquotas para as duas valhido e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro
espécies de transmissão - “causa mortis” e doa- Relator.
Ausente, por motivo de licença, a Sra. Ministra 3. O STJ possui o entendimento de que a dis-
Denise Arruda. cussão judicial do débito, acompanhada de sua
Brasília, 03 de setembro de 2009. garantia integral, é causa de suspensão do re-
(DJe de 24.9.2009) gistro do nome do devedor no Cadin federal.
Trata-se de situação similar à versada nos au-
NOTA DA DIALÉTICA tos que reflete a mesma orientação do art. 206
Vide Acórdãos do STJ - 2ª Turma (RDDT do CTN, isto é, emissão de Certidão Positiva
162:236) e do TRF da 1ª Região - 3ª Turma com Efeitos de Negativa, a qual livra de restri-
(RDDT 73:235). ções o devedor, que poderá desempenhar nor-
malmente suas atividades, como se estivesse
em situação de plena regularidade perante o
LISTA DE DEVEDORES DE FAZENDA Fisco.
ESTADUAL - SITUAÇÕES DE DISCUSSÃO 4. O art. 13, §§ 1º e 2º, da Lei Estadual 6.537/1973
JUDICIAL COM APRESENTAÇÃO DE deve ser lido à luz da jurisprudência do STJ,
GARANTIA - SEGURANÇA CONCEDIDA razão pela qual não constará da relação de de-
vedores o débito que estiver em fase de discus-
Recurso em Mandado de Segurança são judicial, acompanhado de garantia integral
nº 22.794 - RS (2006/0211291-5) - como comprovado in casu.
5. Recurso Ordinário provido.
Relator: Ministro Herman Benjamin
Recorrente: Bianchini S/A Indústria Comércio e Acórdão
Agricultura Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Advogada: Valéria Falcão e Outro(s) partes as acima indicadas, acordam os Ministros
T. Origem: Tribunal de Justiça do Estado do Rio da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
Grande do Sul ça: “A Turma, por unanimidade, deu provimento
Impetrado: Secretário de Fazenda do Estado do ao recurso ordinário, nos termos do voto do(a)
Rio Grande do Sul Sr(a). Ministro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros
Recorrido: Estado do Rio Grande do Sul Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon, Cas-
Procurador: Marisa Kaminski Marques Pinto e tro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr.
Outro(s) Ministro Relator.
Brasília, 03 de setembro de 2009 (data do julga-
Ementa mento).
Processual Civil e Tributário. Recurso Ordiná- (DJe de 30.9.2009)
rio em Mandado de Segurança. Lista de Deve-
dores. Disciplina Legal no Sentido de que ape-
nas aqueles que Possuem Débitos Parcelados
MANDADO DE SEGURANÇA -
não Devem ser Relacionados. Ampliação para
as Situações de Discussão Judicial com Apre- DESISTÊNCIA APÓS PROLAÇÃO DE
sentação de Garantia. Prova Incontroversa. SENTENÇA DE MÉRITO -
Ordem Concedida. IMPOSSIBILIDADE
1. A lista de devedores da Fazenda do Estado
do Rio Grande do Sul foi instituída pelo art. 13 AgRg nos Embargos de Divergência em
da Lei Estadual 6.537/1973, com a redação REsp nº 412.393 - PR (2009/0102951-5)
dada pela Lei Estadual 12.209/2004. Trata-se
de documento público de caráter informativo e Relator: Ministro Teori Albino Zavascki
de conteúdo similar ao do denominado Cadin, Agravante: Deville Hotéis e Turismo Ltda e Ou-
cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo tros
STF. Advogado: Flavio Zanetti de Oliveira e Outro(s)
2. A referida lei prevê regra geral no sentido de Agravado: Fazenda Nacional
que a lista conterá o nome dos devedores, res- Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
salvados os casos em que houver parcelamen- cional
to. Acrescentou a faculdade - conforme razões
de conveniência e oportunidade - de a Receita Ementa
Estadual, por atos de natureza infralegal, exce- Processual Civil. Mandado de Segurança. De-
tuar também as hipóteses de débito discutido sistência após a Prolação de Sentença de Mé-
judicialmente, com apresentação de garantia rito. Impossibilidade. Matéria Pacificada no
(art. 13, § 1º), ou de adotar, alternativamente, Âmbito da 1ª Seção (AGRG no Resp 889.975/PE,
os mesmos critérios utilizados no Cadin/RS DJe de 08/06/2009). Agravo Regimental a que
(art. 13, § 2º). se nega Provimento.
Acórdão na Apelre nº 2001.72.00.003802-6/SC, Rel.
Vistos e relatados estes autos em que são partes as Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira, 1ª
acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Seção Turma, D.E. 22.07.09)
do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
negar provimento ao agravo regimental, nos ter- Acórdão
mos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Mi- Vistos e relatados estes autos em que são partes as
nistros Humberto Martins, Herman Benjamin, acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do
Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una-
Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon e Luiz Fux nimidade, negar provimento à apelação e à remes-
votaram com o Sr. Ministro Relator. sa oficial, nos termos do relatório, votos e notas
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Deni- taquigráficas que ficam fazendo parte integrante
se Arruda. do presente julgado.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Mei- Porto Alegre/RS, 01 de setembro de 2009.
ra. Juiz Federal Artur César de Souza
Brasília, 26 de agosto de 2009. Relator
(DJe de 4.9.2009) (DEJF da 4ª R. de 30.9.2009, pp. 110/1)

NOTA DA DIALÉTICA
Vide Decisão do Magistrado Luciano Tolentino PIS - BASE DE CÁLCULO - RECEITA
Amaral, do TRF da 1ª Região (RDDT 109:202), ESTRANHA AO FATURAMENTO -
e Acórdão do STJ - 2ª Turma (RDDT 161:238). SEGURO, TAXAS DE TERMINAIS E
PEDÁGIOS

PAES - ADESÃO - TOTALIDADE DOS Agravo de Instrumento


DÉBITOS - PIS - OMISSÃO DE RECEITAS - nº 2008.04.00.006160-7/PR
ARBITRAMENTO - NULIDADE
Relatora: Juíza Vânia Hack de Almeida
Apelação/Reexame Necessário Agravante: Empresa Princesa do Ivai Ltda
nº 2000.72.00.008787-2/SC Advogado: Antônio Ivanir Gonçalves de Azevedo
e Outros
Relator: Juiz Federal Artur César de Souza Agravado: União Federal (Fazenda Nacional)
Apelante: União Federal (Fazenda Nacional) Procurador: José Diogo Cyrillo da Silva
Advogado: Procuradoria-Regional da Fazenda
Nacional Ementa
Apelado: Santa Fé Veículos Ltda Agravo de Instrumento. Base de Cálculo do
Advogado: Andre Henrique Lemos PIS. Receita Estranha ao Faturamento. Segu-
Remetente: Juízo Federal da Vara Federal das ro. Taxas. Pedágios.
Exec. Fiscais de Florianópolis 1. Os valores despendidos com Seguros, Taxas
de Terminais e Pedágios são custos/despesas
Ementa que se agregam ao preço. O destaque destes
Embargos à Execução. Adesão ao Paes. Tota- valores no bilhete de passagem é meramente
lidade dos Débitos. PIS. Omissão de Receitas. para fim contábil. Esses valores são embutidos
Arbitramento. Nulidade. no preço total da operação, consistindo em
A Lei nº 10.684/03 que criou o Paes, não obri- uma alíquota, que embora destacada, é incluí-
ga o contribuinte a incluir no programa todos da no preço. E o preço é o produto final da
os débitos existentes em seu nome. venda, computável como receita da empresa,
“1. O lançamento por arbitramento é mero cri- inserindo-se no faturamento e, portanto, so-
tério substitutivo que a Lei defere ao Fisco, mando para a base de cálculo do PIS.
quando o contribuinte não cumpre as obriga- A regra que previa a exclusão das receitas
ções legais, para apurar o lucro ou a renda tri- transferidas a outras pessoas jurídicas da base
butáveis. Este não é o caso dos autos. 2. O de cálculo do PIS, preconizada no inciso III,
pressuposto para que a autoridade fiscal se valha § 2º, do art. 3º, da Lei nº 9.718/98, é norma de
do arbitramento é a omissão do sujeito passivo, eficácia limitada, dependendo de regulamenta-
recusa ou sonegação de informação ou a irregu- ção. A inexistência do decreto de execução no
laridade das declarações ou documentos que de- período em que o artigo de lei esteve em vigor
vem ser utilizados para o cálculo do tributo. 3. In impede que o regramento seja aplicado.
casu, efetivamente ocorreu o arbitramento, pois O valor apresentado pela Fazenda Pública deve
houve uma dedução da realidade das operações ser atualizado antes de ser determinada a libe-
e não uma verificação fática.” (Agravo Legal ração.
Acórdão Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
Vistos e relatados estes autos em que são partes as cional
acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Recorrido: Va Tech Hydro Brasil Ltda
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una- Advogado: Danielle Campos Lima Serafino e Ou-
nimidade, dar parcial provimento ao agravo de tro(s)
insgrumento [sic], nos termos do relatório, votos
e notas taquigráficas que ficam fazendo parte in- Ementa
tegrante do presente julgado. Processual Civil. Recurso Especial Represen-
Porto Alegre, 09 de junho de 2009. tativo de Controvérsia. Art. 543-C, do CPC.
(DEJF da 4ª R. de 1º.7.2009, pp. 68/9) Execução Fiscal. Extinção. Cancelamento do
Débito pela Exeqüente. Erro do Contribuinte
no Preenchimento da Declaração de Débitos
QUEBRA DE SIGILO MAGNÉTICO - e Créditos Tributários Federais - DCTF. Ho-
APREENSÃO DE COMPUTADORES POR norários Advocatícios. Aplicação do Princípio
SUSPEITA DE SONEGAÇÃO FISCAL - da Causalidade. Imprescindibilidade da Veri-
IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DA ficação da Data de Apresentação da Declara-
LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL E ção Retificadora, se houver, em Cotejo com a
REEXAME DE PROVAS PELO STF Data do Ajuizamento da Execução Fiscal.
1. Não viola o art. 535, do CPC, o acórdão que
Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 528.096-9 vem dotado de fundamentação suficiente para
sustentar o decidido.
Proced.: São Paulo 2. Em sede de execução fiscal é impertinente
Relatora: Min. Cármen Lúcia a invocação do art. 1º-D, da Lei n. 9.494/97,
Agte(s).: Drogaria Drogaelisa Ltda tendo em vista que o Plenário do STF, em ses-
Adv(a/s).: José Luiz Mattes e Outro(a/s) são de 29.09.2004, julgando o RE 420.816/PR
Agdo(a/s).: Estado de São Paulo (DJ 06.10.2004) declarou incidentemente a
Proc(a/s)(es).: Procurador-Geral do Estado de São constitucionalidade da MP n. 2.180-35, de
Paulo 24.08.2001 restringindo-lhe, porém, a aplica-
ção à hipótese de execução, por quantia certa,
Decisão: A Turma negou provimento ao agravo contra a Fazenda Pública (CPC, art. 730).
regimental no recurso extraordinário, nos termos 3. É jurisprudência pacífica no STJ aquela que,
do voto da Relatora. Unânime. 1ª Turma, em casos de extinção de execução fiscal em
15.09.2009. virtude de cancelamento de débito pela exe-
qüente, define a necessidade de se perquirir
Ementa: Agravo Regimental no Recurso Ex- quem deu causa à demanda a fim de imputar-
traordinário. Tributário. Quebra do Sigilo lhe o ônus pelo pagamento dos honorários ad-
Magnético. Apreensão de Computadores por vocatícios. Precedentes: AgRg no REsp nº
Suspeita de Sonegação Fiscal. Impossibilida- 969.358 - SP, Segunda Turma, Rel. Min. Mau-
de da Análise da Legislação Infraconstitucio- ro Campbell Marques, julgado em 6.11.2008;
nal e do Reexame de Provas (Súmula 279 do EDcl no AgRg no AG nº 1.112.581 - SP, Se-
Supremo Tribunal Federal). Ofensa Constitu- gunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell
cional Indireta. Precedentes. Agravo Regimen- Marques, julgado em 23.7.2009; REsp nº
tal ao qual se nega Provimento. 991.458 - SP, Segunda Turma, Rel. Min. Mau-
(DJe de 15.10.2009, p. 57) ro Campbell Marques, julgado em 2.4.2009;
REsp nº 626.084 - SC, Primeira Turma, Rel.
Min. Denise Arruda, julgado em 7.8.2007;
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO AgRg no REsp 818.522/MG, 1ª Turma, Rel.
DE CONTROVÉRSIA - EXECUÇÃO FISCAL Min. José Delgado, DJ de 21.8.2006; AgRg no
- EXTINÇÃO - CANCELAMENTO DE REsp 635.971/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz
DÉBITO PELA EXEQUENTE - ERRO NO Fux, DJ de 16.11.2004.
PREENCHIMENTO DA DCTF - 4. Tendo havido erro do contribuinte no preen-
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - chimento da Declaração de Débitos e Créditos
PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE Tributários Federais - DCTF, é imprescindível
verificar a data da apresentação do documen-
Recurso Especial nº 1.111.002 - SP to retificador, se houver, em cotejo com a data
(2009/0016193-7) do ajuizamento da execução fiscal a fim de, em
razão do princípio da causalidade, se houver
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques citação, condenar a parte culpada ao pagamen-
Recorrente: Fazenda Nacional to dos honorários advocatícios.
5. O contribuinte que erra no preenchimento da Liberalidade do Empregador. Natureza Remu-
Declaração de Débitos e Créditos Tributários neratória. Incidência. Indenização Paga no
Federais - DCTF deve ser responsabilizado Contexto de Programa de Demissão Voluntá-
pelo pagamento dos honorários advocatícios, ria - PDV. Natureza Indenizatória. Não Inci-
por outro lado, o contribuinte que a tempo de dência. Súmula 215/STJ. Recurso Especial
evitar a execução fiscal protocola documento Representativo de Controvérsia. Art. 543-C,
retificador não pode ser penalizado com o pa- do CPC.
gamento de honorários em execução fiscal pela 1. Nas rescisões de contratos de trabalho são
demora da administração em analisar seu pe- dadas diversas denominações às mais variadas
dido. verbas. Nessas situações, é imperioso verificar
6. Hipótese em que o contribuinte protocolou qual a natureza jurídica de determinada verba
documento retificador antes do ajuizamento da a fim de, aplicando a jurisprudência desta Cor-
execução fiscal e foi citado para resposta com te, classificá-la como sujeita ao imposto de
a conseqüente subsistência da condenação da renda ou não.
Fazenda Nacional em honorários. 2. As verbas pagas por liberalidade na rescisão
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, do contrato de trabalho são aquelas que, nos
nessa parte, não provido. Acórdão submetido casos em que ocorre a demissão com ou sem
ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolu- justa causa, são pagas sem decorrerem de im-
ção STJ 08/2008. posição de nenhuma fonte normativa prévia ao
ato de dispensa (incluindo-se aí Programas de
Acórdão Demissão Voluntária - PDV e Acordos Coleti-
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que vos), dependendo apenas da vontade do em-
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- pregador e excedendo as indenizações legal-
tros da Primeira Seção do Superior Tribunal de mente instituídas. Sobre tais verbas a jurispru-
Justiça, na conformidade dos votos e das notas dência é pacífica no sentido da incidência do
taquigráficas, por unanimidade, conhecer parcial- imposto de renda já que não possuem nature-
mente do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe za indenizatória. Precedentes: EAg - Embargos
provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro de Divergência em Agravo 586.583/RJ, Rel.
Relator. Ministro José Delgado, DJ 12.06.2006; EREsp
Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Hamilton 769.118/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Pri-
Carvalhido, Eliana Calmon, Luiz Fux, Castro meira Seção, DJ de 15.10.2007, p. 221; REsp
Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. nº 706.817/RJ, Primeira Turma, Rel. Min.
Ministro Relator. Francisco Falcão, DJ de 28/11/2005; EAg
Ausentes, justificadamente, a Sra. Ministra Denise 586.583/RJ, Rel. Ministro José Delgado, Pri-
Arruda e o Sr. Ministro Herman Benjamin. meira Seção, v.u., julgado em 24.5.2006, DJ
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Teori Albi- 12.6.2006, p. 421; EREsp 775.701/SP, Relator
no Zavascki. Ministro Castro Meira, Relator p/ Acórdão Mi-
Brasília (DF), 23 de setembro de 2009. nistro Luiz Fux, Data do Julgamento 26/4/2006,
(DJe de 1º.10.2009) Data da Publicação/Fonte DJ 1.8.2006, p. 364;
EREsp 515.148/RS, Relator Ministro Luiz
Fux, Data do Julgamento 8/2/2006, Data da
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO Publicação/Fonte DJ 20.2.2006, p. 190 RET
DE CONTROVÉRSIA - IMPOSTO DE vol. 48 p. 28; AgRg nos EREsp. nº 860.888 -
RENDA - RESCISÃO DE CONTRATO DE SP, Primeira Seção, Rel. Min. Francisco Fal-
TRABALHO - INDENIZAÇÃO POR cão, julgado em 26.11.2008, entre outros.
LIBERALIDADE E NO ÂMBITO DE PDV 3. “Os Programas de Demissão Voluntária -
PDV consubstanciam uma oferta pública para
Recurso Especial nº 1.112.745 - SP
a realização de um negócio jurídico, qual seja
(2009/0055524-3)
a resilição ou distrato do contrato de trabalho
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques no caso das relações regidas pela CLT, ou a
Recorrente: Werner Rudolf Sablowski exoneração, no caso dos servidores estatutá-
Advogado: Nelson Esmerio Ramos e Outro(s) rios. O núcleo das condutas jurídicas relevan-
Recorrido: Fazenda Nacional tes aponta para a existência de um acordo de
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- vontades para por fim à relação empregatícia,
cional razão pela qual inexiste margem para o exer-
cício de liberalidades por parte do emprega-
Ementa dor. (...) Inexiste liberalidade em acordo de
Tributário. Imposto de Renda. Rescisão do vontades no qual uma das partes renuncia ao
Contrato de Trabalho. Indenização Paga por cargo e a outra a indeniza (...)” (REsp nº
940.759 - SP, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz te não ocorra de forma imediata e integral du-
Fux, julgado em 25.3.2009). “A indenização rante o processo de industrialização não gera
recebida pela adesão a programa de incenti- direito a creditamento de IPI, consoante a ratio
vo à demissão voluntária não está sujeita à essendi do artigo 164, I, do Decreto 4.544/2002
incidência do imposto de renda”. Enunciado (Precedentes das Turmas de Direito Público:
n. 215 da Súmula do STJ. AgRg no REsp 1.082.522/SP, Rel. Ministro
4. Situação em que a verba denominada “gra- Humberto Martins, Segunda Turma, julgado
tificação não eventual” foi paga por liberalida- em 16.12.2008, DJe 04.02.2009; AgRg no
de do empregador e a chamada “compensação REsp 1.063.630/RJ, Rel. Ministro Francisco
espontânea” foi paga em contexto de PDV. Falcão, Primeira Turma, julgado em
5. Recurso especial parcialmente provido. 16.09.2008, DJe 29.09.2008; REsp 886.249/SC,
Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, jul-
CPC e da Resolução STJ 08/2008. gado em 18.09.2007, DJ 15.10.2007; REsp
608.181/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavas-
Acórdão cki, Primeira Turma, julgado em 06.10.2005,
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que DJ 27.03.2006; e REsp 497.187/SC, Rel. Mi-
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- nistro Franciulli Netto, Segunda Turma, julga-
tros da Primeira Seção do Superior Tribunal de do em 17.06.2003, DJ 08.09.2003).
Justiça, na conformidade dos votos e das notas 2. Deveras, o artigo 164, I, do Decreto 4.544/2002
taquigráficas, por unanimidade, conhecer do re- (assim como o artigo 147, I, do revogado De-
curso especial e dar-lhe parcial provimento, nos creto 2.637/98), determina que os estabeleci-
termos do voto do Sr. Ministro Relator. mentos industriais (e os que lhes são equipa-
rados), entre outras hipóteses, podem creditar-
Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Hamilton se do imposto relativo a matérias-primas, pro-
Carvalhido, Eliana Calmon, Luiz Fux, Castro dutos intermediários e material de embala-
Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. gem, adquiridos para emprego na industrializa-
Ministro Relator. ção de produtos tributados, incluindo-se
Ausentes, justificadamente, a Sra. Ministra Denise “aqueles que, embora não se integrando ao
Arruda e o Sr. Ministro Herman Benjamin. novo produto, forem consumidos no processo
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Teori Albi- de industrialização, salvo se compreendidos
no Zavascki. entre os bens do ativo permanente”.
Brasília (DF), 23 de setembro de 2009. 3. In casu, consoante assente na instância or-
(DJe de 1º.10.2009) dinária, cuida-se de estabelecimento industrial
que adquire produtos “que não são consumi-
dos no processo de industrialização (...), mas
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO que são componentes do maquinário (bem do
DE CONTROVÉRSIA - IPI - CRÉDITO - ativo permanente) que sofrem o desgaste no
AQUISIÇÃO DE BENS PARA O ATIVO processo produtivo e cujo preço já integra a
IMOBILIZADO, USO E CONSUMO - planilha de custos do produto final”, razão
IMPOSSIBILIDADE pela qual não há direito ao creditamento do
IPI.
Recurso Especial nº 1.075.508 - SC 4. Recurso especial desprovido. Acórdão sub-
(2008/0153290-5) metido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e
da Resolução STJ 08/2008.
Relator: Ministro Luiz Fux
Recorrente: Metalúrgica Riosulense S/A Acórdão
Advogado: João Joaquim Martinelli e Outro(s) Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Mi-
Recorrido: Fazenda Nacional nistros da Primeira Seção do Superior Tribunal de
Procurador: Procurador-Geral da Fazenda Nacio- Justiça acordam, na conformidade dos votos e das
nal notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
negar provimento ao recurso especial, nos termos
Ementa do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
Processo Civil. Recurso Especial Representa- Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benja-
tivo de Controvérsia. Artigo 543-C, do CPC. min, Mauro Campbell Marques, Benedito Gon-
Tributário. IPI. Creditamento. Aquisição de çalves, Hamilton Carvalhido e Eliana Calmon
Bens Destinados ao Ativo Imobilizado e ao votaram com o Sr. Ministro Relator.
uso e Consumo. Impossibilidade. Ratio Essen- Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Deni-
di dos Decretos 4.544/2002 e 2.637/98. se Arruda.
1. A aquisição de bens que integram o ativo Brasília (DF), 23 de setembro de 2009 (Data do
permanente da empresa ou de insumos que não Julgamento).
se incorporam ao produto final ou cujo desgas- (DJe de 13.10.2009)
RECURSO REPRESENTATIVO DA DL 406/68), quais sejam, uma compra e ven-
CONTROVÉRSIA - ICMS - BASE DE da e outra de financiamento, em que há a inter-
CÁLCULO - VENDAS FINANCIADA E A mediação de instituição financeira, aplicando-
PRAZO se-lhe o enunciado da Súmula 237 do STJ:
“Nas operações com cartão de crédito, os en-
Recurso Especial nº 1.106.462 - SP cargos relativos ao financiamento não são
(2008/0259436-6) considerados no cálculo do ICMS.”
Relator: Ministro Luiz Fux 4. In casu, dessume-se do voto condutor do
Recorrente: Marco Aurelio Artefatos de Couro aresto recorrido hipótese de venda a prazo, em
Ltda que o financiamento foi feito pelo próprio ven-
Advogado: Nelson Lombardi e Outro(s) dedor, razão pela qual a base de cálculo do
Recorrido: Estado de São Paulo ICMS é o valor total da venda.
Advogado: sem Representação nos Autos 5. A questão relativa à inaplicabilidade do art.
166 do CTN ao caso sub judice resta prejudi-
Ementa cada, em face da incidência do ICMS sobre as
Tributário. Recurso Especial Representativo vendas a prazo.
da Controvérsia. Art. 543-C, do CPC. ICMS. 6. O requisito do prequestionamento é indis-
Encargos Decorrentes de Financiamento. Sú- pensável, por isso que inviável a apreciação,
mula 237 do STJ. Encargos Decorrentes de em sede de recurso especial, de matéria sobre
“Venda a Prazo” propriamente Dita. Incidên- a qual não se pronunciou o Tribunal de origem,
cia. Base de Cálculo. Valor Total da Venda. incidindo, por analogia, o óbice das Súmulas
Ausência de Prequestionamento. Súmulas 282 282 e 356 do STF. (Precedentes: AgRg no Ag
e 356 do C. STF. 1.085.297/RR, Rel. Ministro Og Fernandes,
1. A “venda financiada” e a “venda a prazo” Sexta Turma, julgado em 19/03/2009, DJe
são figuras distintas para o fim de encerrar a 06/04/2009; REsp 1.036.656/SP, Rel. Ministra
base de cálculo de incidência do ICMS, sendo Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em
certo que, sobre a venda a prazo, que ocorre 11/03/2009, DJe 06/04/2009; REsp 771.105/PE,
sem a intermediação de instituição financeira, Rel. Ministro Francisco Peçanha Martins,
incide ICMS. Primeira Seção, julgado em 22/03/2006, DJ
2. A “venda a prazo” revela modalidade de ne- 08/05/2006; AgRg nos EREsp 471.107/MG,
Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julga-
gócio jurídico único, cognominado compra e
do em 22/09/2004, DJ 25/10/2004).
venda, no qual o vendedor oferece ao compra- 7. In casu, o art. 97, I e IV, do CTN não foi ob-
dor o pagamento parcelado do produto, acres- jeto de análise pelo acórdão recorrido, não se
cendo-lhe um plus ao preço final, razão pela manifestando o Tribunal a quo sequer em sede
qual o valor desta operação integra a base de de embargos declaratórios, razão pela qual
cálculo do ICMS, na qual se incorpora, assim, impõe-se óbice intransponível ao conhecimen-
o preço “normal” da mercadoria (preço de ven- to do recurso quanto ao aludido dispositivo.
da à vista) e o acréscimo decorrente do parce- 8. Recurso especial parcialmente conhecido e,
lamento. (Precedentes desta Corte e do Eg. nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao
STF: AgR no RE nº 228.242/SP, Rel. Min. regime do art. 543-C do CPC e da Resolução
Carlos Velloso, DJ de 22/10/2004; REsp STJ 08/2008. Proposição de verbete sumular.
1.087.230/RS, Rel. Ministro Herman Benja-
min, Segunda Turma, julgado em 16/06/2009, Acórdão
DJe 20/08/2009; AgRg no REsp 480.275/SP, Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Mi-
Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Tur- nistros da Primeira Seção do Superior Tribunal de
ma, julgado em 08/04/2008, DJe 04/03/2009; Justiça acordam, na conformidade dos votos e das
AgRg no REsp 743.717/SP, Rel. Ministro notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
Humberto Martins, Segunda Turma, julgado conhecer parcialmente do recurso especial e, nesta
em 04/03/2008, DJe 18/03/2008; EREsp parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto
215.849/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Castro
Seção, julgado em 11/06/2008, DJe 12/08/2008; Meira, Humberto Martins, Mauro Campbell Mar-
AgRg no REsp 848.723/RS, Rel. Ministra ques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido
Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Re-
16/10/2008, DJe 10/11/2008; REsp nº lator.
677.870/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Ausentes, justificadamente, a Sra. Ministra Denise
Albino Zavascki, DJ de 28/02/05). Arruda e o Sr. Ministro Herman Benjamin.
3. A venda financiada, ao revés, depende de Brasília (DF), 23 de setembro de 2009 (Data do
duas operações distintas para a efetiva “saída Julgamento).
da mercadoria” do estabelecimento (art. 2º do (DJe de 13.10.2009)
RECURSO REPRESENTATIVO DE Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Tur-
CONTROVÉRSIA - COFINS - LOCAÇÃO DE ma, julgado em 19.08.2004, DJ 06.09.2004).
BENS MÓVEIS - INCIDÊNCIA 3. Conseqüentemente, a definição de fatura-
mento/receita bruta engloba as receitas advin-
Recurso Especial nº 929.521 - SP das das operações de locação de bens móveis,
(2007/0042341-8) que constituem resultado mesmo da atividade
econômica empreendida pela empresa.
Relator: Ministro Luiz Fux 4. O artigo 535, do CPC, resta incólume quan-
Recorrente: Barravel Veículos e Peças Ltda do o Tribunal de origem, embora sucintamen-
Advogado: Fernando Coelho Atihé e Outro(s) te, pronuncia-se de forma clara e suficiente
Recorrido: Fazenda Nacional sobre a questão posta nos autos. Ademais, o
Procuradores: Djemile Naomi Kodama e Outro(s) magistrado não está obrigado a rebater, um a
Claudio Xavier Seefelder Filho um, os argumentos trazidos pela parte, desde
que os fundamentos utilizados tenham sido
Ementa suficientes para embasar a decisão.
Processo Civil. Recurso Especial Representa- 5. A ofensa a princípios e preceitos da Carta
tivo de Controvérsia. Artigo 543-C, do CPC. Magna não é passível de apreciação em sede de
Tributário. Cofins. Locação de Bens Móveis. recurso especial.
Incidência. Violação do artigo 535, do CPC. 6. A ausência de similitude fática entre os ares-
Inocorrência. tos confrontados obsta o conhecimento do re-
1. A Contribuição para Financiamento da Se- curso especial pela alínea “c”, do permissivo
guridade Social - Cofins incide sobre as recei- constitucional.
tas provenientes das operações de locação de 7. Recurso especial parcialmente conhecido e,
bens móveis, uma vez que “o conceito de re- nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao
ceita bruta sujeita à exação tributária envol- regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolu-
ve, não só aquela decorrente da venda de mer- ção STJ 08/2008.
cadorias e da prestação de serviços, mas a Proposição de verbete sumular.
soma das receitas oriundas do exercício das
atividades empresariais” (Precedente do STF Acórdão
que versou sobre receitas decorrentes da loca- Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Mi-
ção de bens imóveis: RE 371.258 AgR, nistros da Primeira Seção do Superior Tribunal de
Relator(a): Min. Cezar Peluso, Segunda Tur- Justiça acordam, na conformidade dos votos e das
ma, julgado em 03.10.2006, DJ 27.10.2006). notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
Precedentes das Turmas de Direito Público do conhecer parcialmente do recurso especial e, nesta
STJ acerca de receitas decorrentes da locação parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto
de bens móveis: AgRg no Ag 1.136.371/PR, do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Castro
Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Tur- Meira, Humberto Martins, Mauro Campbell Mar-
ma, julgado em 04.08.2009, DJe 27.08.2009; ques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido
AgRg no Ag 1.067.748/RS, Rel. Ministro Mau- e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Re-
ro Campbell Marques, Segunda Turma, julga- lator.
do em 19.05.2009, DJe 01.06.2009; REsp Ausentes, justificadamente, a Sra. Ministra Denise
1.010.388/PR, Rel. Ministro Teori Albino Za- Arruda e o Sr. Ministro Herman Benjamin.
vascki, Primeira Turma, julgado em Brasília (DF), 23 de setembro de 2009 (Data do
03.02.2009, DJe 11.02.2009; e AgRg no Ag julgamento).
846.958/MG, Rel. Ministra Denise Arruda, (DJe de 13.10.2009)
Primeira Turma, julgado em 05.06.2007, DJ
29.06.2007.
2. Deveras, “a base de incidência da Cofins é REPERCUSSÃO GERAL - AUSÊNCIA -
o faturamento, assim entendido o conjunto de CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -
receitas decorrentes da execução da atividade SERVIDOR - CONDIÇÕES
empresarial e (b) no conceito de mercadoria IMPLEMENTADAS PARA
da LC 70/91 estão compreendidos até mesmo APOSENTADORIA - MATÉRIA
os bens imóveis, com mais razão se há de re- INFRACONSTITUCIONAL
conhecer a sujeição das receitas auferidas
com a operações de locação de bens móveis à Repercussão Geral em Agravo de
mencionada contribuição” (REsp 1.010.388/PR, Instrumento 764.703-9
Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira
Turma, julgado em 03.02.2009, DJe Proced.: Ceará
11.02.2009; e EDcl no REsp 534.190/PR, Rel. Relator: Min. Cezar Peluso
Agte(s).: Estado do Ceará contribuição sindical rural, versa sobre maté-
Adv(a/s).: PGE-CE - Ubiratan Ferreira de Andra- ria infraconstitucional.
de
Agdo(a/s).: Maria Elisabete dos Santos Lima Decisão: O Tribunal, por unanimidade, recusou o
Adv(a/s).: José Nunes Rodrigues recurso extraordinário ante a ausência de reper-
cussão geral da questão, por não se tratar de ma-
Ementa: Recurso. Extraordinário. Incognos- téria constitucional.
cibilidade. Contribuição Previdenciária. Ser- Ministro Cezar Peluso
vidor que implementou requisitos para apo- Relator
sentadoria. Incidência sobre vencimentos. (DJe de 15.10.2009, pp. 10/1)
Matéria infraconstitucional. Ausência de re-
percussão geral. Recurso não conhecido. Não
apresenta repercussão geral o recurso extraor- REPETIÇÃO DE INDÉBITO - PRESCRIÇÃO
dinário que, tendo por objeto a incidência de - AÇÃO RESCISÓRIA - TEMA
descontos previdenciários sobre vencimentos CONTROVERTIDO - INCIDÊNCIA DA
de servidor que implementou os requisitos SÚMULA 343 DO STF
para concessão de aposentadoria, versa sobre
matéria infraconstitucional. AgRg no Agravo de Instrumento
nº 1.130.568 - DF (2008/0241190-1)
Decisão: O Tribunal, por maioria, recusou o re-
curso extraordinário ante a ausência de repercus- Relator: Ministro Herman Benjamin
são geral da questão, por não se tratar de matéria Agravante: A Princesa Calçados Ltda
constitucional, vencidos os Ministros Carlos Brit- Advogado: Maria Tereza Calil Nader e Outro(s)
to e Gilmar Mendes. Não se manifestaram os Mi- Agravado: Fazenda Nacional
nistros Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Menezes Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
Direito. cional
Ministro Cezar Peluso
Relator Ementa
Brasília, 15 de outubro de 2009. Processual Civil. Repetição de Indébito. Pres-
(DJe de 15.10.2009, p. 11) crição. Ação Rescisória. Tema Controvertido.
Incidência da Súmula 343/STF.
1. A questão do prazo prescricional para pro-
REPERCUSSÃO GERAL - AUSÊNCIA - positura de Ação de Repetição de Indébito era
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL - controvertida à época em que proferido o acór-
PUBLICAÇÃO DE EDITAIS - IMPRENSA dão rescindendo (22.11.2000). A matéria só foi
OFICIAL - EXIGIBILIDADE - MATÉRIA pacificada pelo STJ com o julgamento dos
INFRACONSTITUCIONAL EREsp 435.835/SC, Rel. p/ acórdão Min. José
Delgado, em 24.3.2004. Incidência da Súmu-
Repercussão Geral em Agravo de la 343/STF.
Instrumento 743.833-1 2. A Primeira Seção afasta a aplicação da Sú-
mula 343/STF apenas nas hipóteses em que a
Proced.: Paraná interpretação controvertida diz respeito a tex-
Relator: Min. Cezar Peluso to constitucional.
Agte(s).: Confederação Nacional da Agricultura - 3. Agravo Regimental não provido.
CNA
Adv(a/s).: Klauss Dias Kuhnen e Outro(a/s) Acórdão
Agdo(a/s).: Inácio Pedro Klock Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Adv(a/s).: Arni Deonildo Hall e Outro(a/s) partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
Ementa: Recurso. Extraordinário. Incognos- ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
cibilidade. Contribuição Sindical Rural. Noti- to ao agravo regimental, nos termos do voto do(a)
ficação de lançamento. Publicação de editais. Sr(a). Ministro(a) Relator(a).” Os Srs. Ministros
Imprensa oficial. Exigibilidade. Art. 605 da Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon, Cas-
CLT. Matéria infraconstitucional. Ausência de tro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr.
repercussão geral. Recurso não conhecido. Ministro Relator.
Não apresenta repercussão geral o recurso ex- Brasília, 1º de setembro de 2009 (data do julga-
traordinário que, tendo por objeto a publicação mento).
de editais de notificação do lançamento da (DJe de 9.10.2009)

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