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ISSN 1413-7097

REVISTA DIALÉTICA
DE DIREITO TRIBUTÁRIO
(RDDT)

Repositório autorizado de jurisprudência dos seguintes tribunais:

- do Supremo Tribunal Federal (Despacho do Exmo. Sr. Presidente no Processo nº 304743,


publicado no DJU 1 de 18 de maio de 1998, página 1; inscrição sob nº 23/98, em 24 de junho de 1998,
conforme Ofício 2434/98-SD);

- do Superior Tribunal de Justiça (sob nº 36 - Portaria nº 1, de 16 de junho de 1997, do Exmo.


Sr. Ministro Diretor da Revista do STJ, publicada no DJU I de 23 de junho de 1997, página 29422);

- do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Portaria nº 12, de 13 de agosto de 1997, do Exmo.


Sr. Juiz Diretor do Gabinete da Revista do TRF da 1ª Região, publicada no DJU II de 21 de agosto de
1997, página 65574);

- do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Processo nº 97.02.16454-0, autuado em 30 de


maio de 1997 e julgado em 5 de junho de 1997);

- do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (sob nº de inscrição 8 - Portaria nº 2, de 30 de


maio de 1997, da Exma. Sra. Juíza Diretora da Revista do TRF da 4ª Região, publicada no DJU II de
5 de junho de 1997, página 41344); e

- do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (sob nº 7 - Despacho do Exmo. Sr. Juiz Diretor
da Revista do TRF da 5ª Região, publicado no DJU II de 9 de setembro de 1997, página 72372).

197
FEVEREIRO - 2012
REVISTA DIALÉTICA
DE DIREITO TRIBUTÁRIO
(RDDT)
ISSN 1413-7097

197
(FEVEREIRO - 2012) Marola Omartem
é o autor da obra reproduzida em
destaque na capa desta edição.
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Valdir de Oliveira Rocha
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Rocha (Adjunto) Na página inicial do site
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facilitará muito a localização de textos
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Os acórdãos estampados na íntegra
Capa (fundo) correspondem às cópias obtidas nas
Detalhe da obra “100% Azul ou Quase”, Secretarias dos Tribunais ou se originam
de Marola Omartem de publicações oficiais de seus julgados.
Tiragem superior a 3.000 exemplares.
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de responsabilidade de seus autores.
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SUMÁRIO
Doutrina
Célio Armando Janczeski - O efeito suspensivo na exclusão da empresa do Simples
1. Notas introdutórias - Simples federal e Simples Nacional. 2. A exclusão da empresa do
Simples e o direito de defesa. 3. Efeito suspensivo da impugnação administrativa contra a
exclusão. 4. Conclusão. 7

César Augusto Di Natale Nobre - Juros sobre Capital Próprio (JCP), planejamento
tributário e a dupla alíquota zero de IOF/câmbio na recapitalização de JCP pagos
em operações internacionais
1. Introdução. 2. Da natureza jurídica dos JCP - juros ou dividendos lato sensu? 3. JCP e
planejamento tributário. 4. Da possibilidade de pagamento de JCP referente a períodos
pretéritos. 5. A capitalização dos JCP pagos e a respectiva dedutibilidade da base de cál-
culo do IRPJ e da CSLL. 6. O imposto sobre a renda incidente (IRRF). 7. O imposto so-
bre operações financeiras modalidade câmbio (IOF/câmbio) - Da incidência da alíquota
zero nas remessas fictas a não residentes. 8. Considerações finais. 12

Diego Marcel Bomfim - Reconsiderações sobre a neutralidade tributária


1. Introdução. 2. Neutralidade em que sentido? 3. Livre concorrência, neutralidade con-
correncial e neutralidade tributária. 4. Neutralidade tributária e fiscalidade. 5. Livre con-
corrência e extrafiscalidade. 6. Conclusões. 27

Diogo Ferraz - A ilegitimidade da vedação à compensação de créditos de contri-


buição previdenciária com débitos de outros tributos administrados pela Receita
Federal do Brasil
1. Introdução. 2. A estrutura arrecadatória federal e a ilegítima vedação à compensação.
3. Do direito à compensação à luz da igualdade. 4. Conclusão. 40

Francysco Pablo Feitosa Gonçalves - A inclusão das pessoas com deficiência e


as problemáticas isenções do ICMS na compra de veículos automotores
1. Considerações primeiras. 2. Sobre deficiência e inclusão. 3. As isenções do ICMS e seu
potencial inclusivo. 4. Considerações finais. 46

Hugo de Brito Machado - O princípio da legalidade como limitação constitucio-


nal ao poder de tributar
1. Introdução. 2. O princípio da legalidade. 3. Legalidade tributária nas Constituições bra-
sileiras. 56

Iuri Engel Francescutti - Prescrição de créditos escriturais 66

Ives Gandra da Silva Martins - Fundo de comércio e sucessão tributária em trans-


ferência de locação 77

João Dácio Rolim e Paulo Rosenblatt - Dez anos da norma geral antielisiva no
Brasil
1. O contexto da LC nº 104: a tendência de universalização da norma geral antielisiva. 2.
Abuso de direito: requisito da norma geral antielisiva (CTN) e instituto comum do Direi-
to brasileiro (Código Civil e lei de introdução às normas do Direito brasileiro). 3. A juris-
prudência administrativa brasileira e o emprego da simulação como abuso de direito. 4. Dez
anos da norma geral antielisiva brasileira: reflexões para uma nova regulamentação. 5. A
contrapartida: cláusulas de proteção à confiança do contribuinte. 6. Conclusões. 83
Leonardo Freitas de Moraes e Castro - Possibilidade de manutenção e utilização
de créditos de PIS/Cofins relativos a bens do ativo permanente na hipótese de
comodato/locação de maquinário para terceiros
1. Introdução. 2. Não cumulatividade do PIS e da Cofins. 3. Direito aos créditos relativos
aos bens do ativo imobilizado. 4. Entendimento da Receita Federal do Brasil sobre o tema.
5. Conclusão. 97

Luana Vargas Macedo - Ação rescisória em matéria tributária e os seus reflexos


em relação ao crédito tributário
I - Objeto do presente artigo. II - Análise do objeto do presente artigo. 107

Onofre Alves Batista Júnior - Base de cálculo do ICMS na saída de minério para
estabelecimento do mesmo titular localizado em outro Estado
1. Introdução. 2. Base de cálculo excepcional do ICMS em transferências interestaduais.
3. A interpretação teleológica do art. 13, parágrafo 4º, da LC nº 87/1996. 4. A atividade
extrativa de minérios não pode ser considerada atividade industrial. 5. O minério de ferro
como produto primário. 116

Renato Lopes Becho - Responsabilidade tributária de terceiros - O art. 135 do CTN


I - Colocação do tema. II - Resumo da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. III
- Algumas lições acadêmicas de relevo. IV - Interpretando o art. 135 do CTN sistematica-
mente. V - Conclusão. 127

Ricardo Mariz de Oliveira - Cabimento e dimensionamento das penalidades por


planejamentos fiscais inaceitáveis (breves notas) 138

Wladimir Novaes Martinez - Contribuição sobre o aviso prévio indenizado 154

Parecer
Sacha Calmon Navarro Coêlho - O direito de aproveitar o ICMS devido pelo con-
tribuinte que recebeu de outro Estado mercadorias com incentivo declarado in-
constitucional 158

Jurisprudência

Íntegras de Acórdãos Sentença


• Cofins e PIS - regime de tributação - contratos •Imposto de renda - telecomunicações - remes-
de prestação de serviço a preço determinado fir- sa ao exterior de valores referentes a ligações
mados antes de 31.10.2003 - IN 468/2004 - internacionais - isenção (Sentença do Juiz Mar-
aumento reflexo de alíquota - violação do prin- celo Mesquita Saraiva, da 15ª Vara Cível da
cípio da legalidade (STJ - 2ª T.) 163 Justiça Federal de São Paulo) 190
• ICMS - guerra fiscal - cancelamento de notifi-
cações fiscais e devolução dos valores - ausên- Decisão
cia de convênio - inadmissibilidade (STF - Ple- •Reclamação - modulação de efeitos - matéria
no) 178 julgada inconstitucional - ausência de usurpa-
• ISS - base de cálculo - construção civil - abati-
ção de competência do STF - boa-fé do parti-
mento de materiais e subempreitadas - possibi- cular amparado por decisão judicial transitada
lidade - entendimento do STF (STJ - 1ª T.) em julgado (Ministro Luiz Fux, do STF) 193
181 Ementário de Acórdãos
• ISS - plano de saúde - base de cálculo - descon- •Ação de consignação em pagamento - discus-
tos - repasses a outros prestadores de serviço são de valores relativos a prestações de parce-
(STJ - 2ª T.) 185 lamento - impossibilidade (STJ - 2ª T.) 197
• Ação rescisória - denúncia espontânea - tribu- • Execução fiscal - prescrição intercorrente - de-
to declarado e pago a destempo - erro de fato - cretação de ofício sem prévia oitiva da Fazen-
ocorrência (STJ - 1ª S.) 197 da Pública - nulidade (STJ - 2ª T.) 210
• Auto de infração - incorporação - extinção da • Execução fiscal - prescrição ocorrida antes da
incorporada - sucessão pela incorporadora - propositura da ação - decretação de ofício -
nulidade (Carf - 4ª Câm./ 1ª T. Ord.) 199 possibilidade (TRF da 1ª R. - 8ª T.) 211
• Certidão positiva com efeitos de negativa - dé- • Execução fiscal - redirecionamento - dissolu-
bitos das filiais - expedição em relação à matriz ção irregular da empresa - prescrição (STJ - 2ª
- possibilidade (STJ - 2ª T.) 199 T.) 211
• Cofins e PIS - arrendamento mercantil - alíquo- • ICMS - alíquota - sabonetes - produtos de hi-
ta zero - internalização do bem - inaplicabilida- giene ou de toucador (STJ - 2ª T.) 212
de (STJ - 2ª T.) 199 • ICMS - chamadas telefônicas internacionais -
• Cofins e PIS - base de cálculo - importação - DDI - ilegitimidade passiva da empresa de te-
valor aduaneiro - matéria constitucional (STJ - lefonia local (STJ - 1ª T.) 212
2ª T.) 200 • ICMS - energia elétrica - demanda contratada
• Cofins e PIS - base de cálculo - inclusão do - ilegitimidade ativa - contribuinte de fato (STJ
ICMS - conceito de faturamento - matéria cons- - 2ª T.) 213
titucional (STJ - 2ª T.) 200 • ICMS - guerra fiscal - utilização de política de-
• Cofins - não incidência sobre pecúlio, rendas soneratória pelo DF - necessidade de consenso
ou benefícios acordados com participantes de de todos os entes federativos (STF - Pleno)
plano de previdência privada - ausência de pre- 214
questionamento (STF - 2ª T.) 201 • ICMS - importação de mercadorias por pessoas
• Compensação de débitos tributários com crédi- que não são contribuintes habituais - pendência
tos de precatório vencido e não pago - art. 78, de julgamento do Plenário - repercussão geral -
§ 2º, do ADCT - superveniência da EC nº 62/ efeito suspensivo concedido (STF - 2ª T.) 215
09 (STJ - 1ª T.) 201 • ICMS - importação - duplo negócio jurídico -
• Contribuição - conselho profissional - majora- legitimidade ativa (STF - 1ª T.) 215
ção - legalidade estrita e anterioridade - submis- • ICMS - substituição tributária - instituição da
são (STJ - 2ª T.) 202
sistemática sem anterior regulamentação por
• Contribuição previdenciária - tomador de servi-
normas gerais (STF - 2ª T.) 216
ço - solidariedade - aferição indireta - impossi-
bilidade antes da Lei 9.711/98 (STJ - 2ª T.) 203 • Imposto de renda e contribuição social sobre o
• Contribuições ao Sesc e ao Sebrae - empresas lucro - base de cálculo - empresa de telefonia -
prestadoras de serviços - incidência - atividades locação de aeronave para uso dos dirigentes -
- panorama da jurisprudência (STJ - 2ª T.) 203 dedução - impossibilidade (Carf - 4ª Câm./ 2ª
• Crime tributário - informações falsas - constitui- T. Ord.) 216
ção de empresa - interposição de pessoas - pros- • Imposto de renda e contribuição social sobre o
seguimento da ação penal (STF - 1ª T.) 204 lucro - resultados auferidos por controlada no
• DCTF - compensação - rejeição - ausência de exterior - método de equivalência patrimonial -
intimação do contribuinte - inscrição em dívi- regra CFC - tratado Brasil-Hungria - compen-
da ativa - impossibilidade (STJ - 2ª T.) 205 sação de tributo pago no exterior - possibilida-
• Empréstimo compulsório - Eletrobras - troca de (Carf - 4ª Câm./ 2ª T. Ord.) 217
por obrigações ao portador - resgate - prazo de • Imposto de renda - isenção - moléstia grave -
natureza decadencial (STJ - 2ª T.) 205 requisitos - interesse de agir - necessidade de
• Empréstimo compulsório - energia elétrica - laudo pericial emitido por médico oficial (STJ
correção monetária - reflexo nos juros remune- - 2ª T.) 218
ratórios - prescrição (STJ - 2ª T.) 206 • Imposto de renda - lucros no exterior - lança-
• Empréstimo compulsório sobre consumo de mento de ofício - exclusão de valores indevida-
energia elétrica - interesse jurídico da União - mente incluídos na base de cálculo pelo contri-
solidariedade (STJ - 2ª T.) 208 buinte - princípio da verdade material (Carf - 4ª
• Execução fiscal - contribuições sociais - remis- Câm./ 2ª T. Ord.) 219
são - extensão aos débitos relativos ao FGTS - • Imposto de renda - pessoa jurídica - base de
impossibilidade (STJ - 2ª T.) 208 cálculo - aquisição de veículo luxuoso e inapro-
• Execução fiscal - extinção - remissão - hono- priado à atividade rotineira da empresa - mera
rários advocatícios - não cabimento (STJ - 1ª suposição - glosa da despesa - impossibilidade
S.) 209 (Carf - Câm. Superior/ 1ª T.) 220
• Execução fiscal - penhora - precatório - direito • Imposto de renda - pessoa jurídica - juros sobre
de crédito - possibilidade de recusa por parte da capital próprio - tratamento (Carf - 4ª Câm./ 1ª
Fazenda (STJ - 1ª T.) 209 T. Ord.) 221
• Imposto de renda - pessoa jurídica - lançamen- • PIS/Pasep - regime não cumulativo - insumos -
to por homologação - decadência - ausência de materiais para manutenção de máquinas - dedu-
pagamento (Carf - Câm. Superior/ 1ª T.) 221 tibilidade (Carf - 2ª Câm./ 2ª T. Ord.) 231
• Imposto de renda - pessoa jurídica - operação • Precatório - poder liberatório do pagamento de
de “swap” - perdas comprovadas (Carf - 4ª tributos - suspensão de eficácia do art. 2º da EC
Câm./ 2ª T. Ord.) 222 30 (STJ - 1ª T.) 232
• Imunidade - IPVA - ECT (STF - Pleno) 222 • Processo administrativo fiscal - documentos le-
• IPI - prazo de recolhimento - legalidade - insub- vantados em via digital pela fiscalização - ciên-
missão (STF - 2ª T.) 223 cia do contribuinte - inexistência de nulidade
• IPTU - contrato de promessa de compra e ven- (Carf - 3ª Câm./ 1ª T. Ord.) 232
da de imóvel - legitimidade passiva do com- • Processo administrativo fiscal - recurso especial
da Fazenda em recurso de ofício - não conhe-
prador e do vendedor - caso concreto (STJ - 2ª
cimento (Carf - Câm. Superior/ 1ª T.) 233
T.) 223 • Remissão - Lei 11.941 - requisitos - limites -
• IPTU - promessa de compra e venda - legitimi- impossibilidade de reconhecimento de ofício
dade passiva do possuidor e do proprietário em execução fiscal (STJ - 2ª T.) 233
(STJ - 2ª T.) 224 • Repercussão geral - ausência - empréstimo
• ISS - base de cálculo - sociedades uniprofissio- compulsório sobre o consumo de energia elétri-
nais - tratamento diferenciado (STJ - 1ª T.) 225 ca - restituição - matéria infraconstitucional
• ISS - base de cálculo - tratamento conferido a (STF - Pleno) 234
profissionais liberais e sociedades uniprofissi- • Repercussão geral - existência - execução fiscal
onais - empresário individual ou sociedade em- - prazo de que dispõe a Fazenda Pública para
presária - exercício de profissão intelectual - localizar bens do executado - marco inicial -
inaplicabilidade (STJ - 1ª T.) 225 prescrição intercorrente (STF - Pleno) 234
• ISS - empresa prestadora de trabalho temporá- • Repercussão geral - existência - ICMS - guer-
rio - base de cálculo (STJ - 2ª T.) 226 ra fiscal - estorno de créditos decorrentes de be-
• ISS - plano de saúde - base de cálculo - descon- nefício fiscal por outro ente federado (STF -
tos - repasses a outros prestadores de serviço Pleno) 235
(STJ - 2ª T.) 227 • Repetição de indébito - compensação de crédi-
• ISS - sociedade limitada - caráter empresarial - to com débitos objeto de parcelamento especial
tratamento privilegiado - impossibilidade (STJ - Paes - inadmissibilidade (STJ - 1ª T.) 235
- 2ª T.) 227 • Responsabilidade tributária - contraditório,
• ISS - sociedade uniprofissional de advogados - ampla defesa e devido processo legal - inexis-
valor fixo anual (STJ - 2ª T.) 228 tência de violação na espécie (STF - 2ª T.) 236
• ITBI - controvérsia sobre a localização do bem • Responsabilidade tributária do sócio - simples
transacionado - definição do município favore- falta de pagamento - inexistência - dissolução
irregular - gerência fraudulenta - reexame de
cido (STJ - 1ª T.) 229 prova (STJ - 2ª T.) 236
• Lançamento - pessoa jurídica extinta e liquida- • Taxa de controle e fiscalização ambiental -
da - impossibilidade - transferência do auto de TCFA - lançamento por homologação - deca-
infração a um dos sócios - necessidade de ob- dência e prescrição (STJ - 2ª T.) 237
servância do devido processo legal para identi- • Taxa de fiscalização e funcionamento - TFF -
ficação da responsabilidade (Carf - Câm. Supe- Anatel - lançamento por homologação - deca-
rior/ 1ª T.) 230 dência e prescrição (STJ - 2ª T.) 238
• Multa de ofício - incorporação de pessoa jurí- • Taxa de serviços metrológicos - poder de polí-
dica sob controle comum - sucessão (Carf - cia - balança de uso interno - aferição não obri-
Câm. Superior/ 1ª T.) 230 gatória (STJ - 2ª T.) 238
• Parcelamento - Lei 11.941 - empresa optante • Taxa florestal - poder de polícia - base de cál-
pelo Simples - inclusão - impossibilidade (STJ culo - exigência de consonância (TJPR - 2ª
- 2ª T.) 230 Câm. Cível) 240
DOUTRINA
O Efeito Suspensivo na Exclusão
da Empresa do Simples
Célio Armando Janczeski

1. Notas Introdutórias - Simples Federal e Simples


Nacional
O Simples é um regime especial de tributação unificada
e favorecida, destinado para pequenas atividades empresa-
riais e que deu eficácia ao mandamento constitucional que
determina o tratamento jurídico diferenciado às microem-
presas e empresas de pequeno porte (art. 170, IX e 179 da
CF).1 Constitui-se em um microssistema tributário “enfeixa-
do em conjunto delimitado de princípios e normas tributá-
rias em sentido amplo, que prescrevem o modo e os limites
materiais, formais e processuais de sua aplicabilidade”.2
O novo regime, como seu nome sugere, conseguiu sim-
plificar a apuração e o recolhimento dos tributos, incentivan-
do a formalização de pequenas atividades econômicas e pro-
piciando competitividade aos empreendimentos que ficavam
à margem da legislação.
O regime diferenciado, sempre opcional para a empre-
sa, foi inicialmente inserido no cenário nacional por intermé-
dio da Lei n. 9.317/1996, quando foi denominado de Sim-
ples Federal, em vista de se limitar à esfera tributária fede-

1
Constituição Federal: “Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência dig-
na, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…)
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as
leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (…) Art. 179 - A Célio Armando
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempre-
Janczeski
sas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico di-
ferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações adminis- é Advogado em Santa
trativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução Catarina, Mestre em
destas por meio de lei.” Direito e Professor de
2
MARINS, James; e BERTOLDI, Marcelo M. Simples Nacional. São Paulo: RT, Direito Tributário da
2007, p. 70. Para os autores, “embora o regime especial criado pelo Simples Nacio-
nal esteja amplamente dedicado à disciplina material do tributo, seu conjunto nor- Faculdade Mater Dei,
mativo também contempla importante plexo de normas formais e processuais. En- da Escola Superior da
gendrou o legislador um microssistema que cria certo grupo de novas disposições OAB e da Escola
com relação a determinado número de tributos, de modo que esse regime se com- Superior da
ponha de uma mescla que contém estimações objetivas, reduções de base de cál-
Magistratura do
culo, isenções, reduções de alíquota e simplificações contábeis que ensejam a apli-
cação do princípio constitucional da diferenciação e favorecimento às microempre- Estado de Santa
sas e empresas de pequeno porte.” (Op. cit., p. 71) Catarina.
ral. Com a edição da Lei Complementar n. 123/2006, criou-se o denominado Sim-
ples Nacional, que abrange tributos de competência também dos Estados e Municí-
pios, para quem os recolhimentos e a apuração ficam obrigatoriamente unificados
(via documento único de arrecadação - art. 13 da LC n. 123/2006), bastando a op-
ção do contribuinte.

2. A Exclusão da Empresa do Simples e o Direito de Defesa


As empresas optantes do Simples Federal (Lei n. 9.317/1996) e posteriormente
Simples Nacional (Lei Complementar n. 123/2006) por razões diversas trazidas pela
legislação de regência, podem ser excluídas do regime simplificado, ao praticarem
atos aptos a dar azo para a exclusão.3
O ato da exclusão deve ser justificado e fundamentado, bem como deverá ter
como base apenas aqueles motivos esculpidos pela lei, respeitando-se sempre os
princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, constitu-
cionalmente amparados (incisos LIV e LV do art. 5º da CF).
Na prática, apesar de a impugnação administrativa ser recebida e apreciada pela
Receita Federal do Brasil, o procedimento administrativo tem desrespeitado os di-
tames constitucionais, na medida em que a exclusão é realizada e somente após a
exclusão realizada, é dado o direito de defesa para a empresa.
Os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, elen-
cados entre os direitos e garantias fundamentais do cidadão, formam, em conjunto,
a base de sustentação do processo judicial e administrativo. Como o regime do Sim-
ples normalmente é benéfico para o contribuinte que, inserido no sistema, tem a
oportunidade de pagar uma carga tributária menor, excluir o mesmo do sistema para
depois lhe propiciar a defesa, é desvirtuar os princípios constitucionais arrolados,
minimizando indevidamente seus efeitos práticos.
Em qualquer processo administrativo a defesa eficaz pressupõe que o interes-
sado somente terá privação de qualquer direito se antes lhe houver sido propiciado

3
Prevê a Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006, em seu art. 29, a previsão de exclusão da empresa do
Simples Nacional: “Art. 29 - A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando: I -
verificada a falta de comunicação de exclusão obrigatória; II - for oferecido embaraço à fiscalização, caracterizado
pela negativa não justificada de exibição de livros e documentos a que estiverem obrigadas, bem como pelo não for-
necimento de informações sobre bens, movimentação financeira, negócio ou atividade que estiverem intimadas a
apresentar, e nas demais hipóteses que autorizam a requisição de auxílio da força pública; III - for oferecida resistên-
cia à fiscalização, caracterizada pela negativa de acesso ao estabelecimento, ao domicílio fiscal ou a qualquer outro
local onde desenvolvam suas atividades ou se encontrem bens de sua propriedade; IV - a sua constituição ocorrer
por interpostas pessoas; V - tiver sido constatada prática reiterada de infração ao disposto nesta Lei Complementar;
VI - a empresa for declarada inapta, na forma dos arts. 81 e 82 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, e altera-
ções posteriores; VII - comercializar mercadorias objeto de contrabando ou descaminho; VIII - houver falta de es-
crituração do livro-caixa ou não permitir a identificação da movimentação financeira, inclusive bancária; IX - for cons-
tatado que durante o ano-calendário o valor das despesas pagas supera em 20% (vinte por cento) o valor de ingres-
sos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade; X - for constatado que durante o ano-
calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipó-
teses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo
período, excluído o ano de início de atividade. XI - houver descumprimento da obrigação contida no inciso I do
caput do art. 26 desta Lei Complementar; XII - omitir da folha de pagamento da empresa ou de documento de infor-
mações previsto pela legislação previdenciária, trabalhista ou tributária, segurado empregado, trabalhador avulso ou
contribuinte individual que lhe preste serviço.”
o direito de ser ouvido e de produzir provas. Como aduz Agustín Gordillo,4 ouvir o
interessado, antes de decidir algo que o vai afetar, não é apenas um princípio de jus-
tiça: é também um princípio de eficácia; porque indubitavelmente assegura um
melhor conhecimento dos fatos e, portanto, ajuda a uma melhor administração, ade-
mais de uma decisão mais justa.
A obediência da autoridade fiscal ao devido processo legal (due process of law),
engloba o procedural due process (garantia de cumprimento do procedimento) e o
substantive due process (garantia de que sejam ofertadas, asseguradas e levadas em
conta, todas as exceções e as circunstâncias de defesa no ato impositivo). A garan-
tia da ampla defesa não se contenta com o simples direito de defesa. O preceito sig-
nifica que é dado ao contribuinte se insurgir contra a imposição fiscal com todos os
meios e recursos, com efeito suspensivo e sem restrições.5
Ao se pronunciar acerca da restrição de direitos e garantia do due process of law,
o STF tem determinado que o Estado, em tema de punições disciplinares ou de res-
trição a direitos, qualquer que seja o destinatário de tais medidas, não pode exercer
a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no exercício de
sua atividade, o postulado da plenitude de defesa, pois o reconhecimento da legiti-
midade ético-jurídica de qualquer medida estatal - que importe em punição disci-
plinar ou em limitação de direitos - exige, ainda que se cuide de procedimento me-
ramente administrativo (CF, art. 5º, LV), a fiel observância do princípio do devido
processo legal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reafirmado a
essencialidade desse princípio, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que,
instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício,
pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administra-
tiva, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou na medida restritiva de direi-
tos.6
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, sensível ao desrespeito com a ordem
constitucional, tem garantido ao contribuinte o direito de se defender em recurso
administrativo com efeito suspensivo antes do ato da exclusão do regime simplifi-
cado:
“Tributário. Exclusão da Empresa do Simples. Ausência de Prévia Oportunidade para
Defesa. Nulidade do Ato Declaratório Executivo. Aplicação Retroativa dos Efeitos da
Exclusão. Impossibilidade.
1. A oportunidade para o contribuinte se manifestar acerca do não preenchimento dos
requisitos para participação do Simples deve ocorrer antes do Ato Declaratório Exe-
cutivo - ADE de exclusão, já que se trata de restrição de direito, que deve obedecer ao
prévio devido processo legal.

4
GORDILLO, Agustín. Tratado de Derecho Administrativo. Tomo 2. Buenos Aires: Macchi, 1980, pp. 35/36. Para o
autor, o princípio de ouvir o interessado antes da tomada de decisão “se mantém incólume inclusive quando os fatos
sobre os quais se deve decidir parecem absolutamente claros, e a prova existente seja contundente e unívoca, por-
que, se a Administração tem em conta não apenas razões ou motivos de legitimidade, como também motivos de opor-
tunidade, mérito ou conveniência, então é meridiano que a voz do afetado, mesmo no mais claro dos casos, aporta
sempre um elemento mais de juízo a ter em conta para o julgamento do mérito ou oportunidade do ato.” (Idem)
5
Neste sentido: JANCZESKI, Célio Armando. Direito Tributário e Processo Tributário. Caxias do Sul: Plenum, 2011,
p. 236.
6
STF, 2ª Turma, Ag. Rg. AI n. 241.201-2/SC, Rel. Min. Celso de Mello, DJU 1 de 20.9.2002, p. 109, publicado na
Revista Dialética de Direito Tributário n. 86. São Paulo: Dialética, novembro de 2002, p. 237.
2. O recurso administrativo contra o ato de exclusão do Simples possui efeito suspen-
sivo, somente produzindo seus efeitos a partir da decisão definitiva na esfera adminis-
trativa. Se esta ainda não foi proferida, não pode o ADE ser aplicado de imediato.
3. Apelação da Fazenda Nacional improvida.”7 (Destacou-se)

“Tributário. Mandado de Segurança. Exclusão do Sistema Integrado de Impostos e


Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - Simples. Inobser-
vância dos Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório. 1. A exclusão da impetrante
do sistema integrado de impostos e contribuições de microempresas e empresas de
pequeno porte - Simples deveria ter sido precedida de procedimento administrativo
regular, em que fossem observados os princípios da ampla defesa e do contraditório.
2. Tais princípios não foram respeitados no caso concreto, considerando que a empre-
sa foi intimada a apresentar documentos e, sem que tenha sido, em nenhum momento,
notificada para a apresentação de sua defesa e a comprovação de que faria jus ao regi-
me diferenciado, restou cientificada a respeito do ato que declarou a sua exclusão, que,
portanto, deve ser invalidado. 3. Apelação provida.”8 (Destacou-se)

“Remessa e Apelação em Mandado de Segurança. Administrativo Constitucional. Ex-


clusão do ‘Simples’. sem Prévia Notificação. Violação ao Princípio do Contraditório
e da Ampla Defesa e do Devido Processo Legal. 1. Observa-se existência do Ato De-
claratório Executivo - ADE, apenas informando à apelada sua exclusão do Simples (fls.
28). 2. Conforme se verifica com os documentos de (fls. 26), à apelada-impetrante
desde 1998, integrava o simples, na condição de microempresa. Logo, não poderia, sem
prévia notificação, ser excluída. 3. Assim, o ato praticado unilateralmente não está de
acordo com as regras básicas da constituição federal, que assegura o contraditório, a
ampla defesa e o devido processo legal, conforme assegurado nos incisos LIV e LV. 4.
Precedentes deste Eg. Tribunal (AMS 69.940/PB e AMS 64.194/CE). 5. Sentença
mantida. 6. Remessa e apelação improvidas.”9
Ou seja, primeiro a empresa deve ser notificada sobre os fatos contra si argui-
dos, para somente depois ser excluída do regime simplificado, caso não acolhida sua
defesa administrativa.

3. Efeito Suspensivo da Impugnação Administrativa contra a Exclusão


A Receita Federal do Brasil, além de concretizar a exclusão da empresa antes
de lhe propiciar o direito de defesa, ainda tem negado efeito suspensivo à impugna-
ção administrativa contra o ato de exclusão, autorizando inclusive que autos de in-
fração sejam lavrados pressupondo uma exclusão ainda não julgada.10 Colhe-se de
manifestações administrativas:
“Exclusão do Simples e Simples Nacional. Lançamento dos Créditos Tributários De-
correntes. Promovida a exclusão da pessoa jurídica do Simples e do Simples Nacio-
nal, proceder-se-á, se for o caso, a lavratura de auto de infração para a exigência do

7
TRF da 5ª Região, AC n. 361411, Rel. Napoleão Maia Filho, DJ de 22.6.2009.
8
TRF da 5ª Região, AMS n. 86.409, Rel. Francisco Wildo, DJU de 25.2.2005.
9
TRF da 5ª Região, AMS n. 87.051, Rel. Paulo Gadelha, DJU de 3.8.2004.
10
A lavratura de auto de infração normalmente vem acompanhada de termo de arrolamento que objetiva garantir o
recebimento do valor notificado, prejudicando seriamente as transações corriqueiras com o imobilizado da empresa
que somente é liberado para ser transacionado quando houver a substituição do bem arrolado por outro de igual ou
maior valor (art. 10 da Instrução Normativa SRF n. 1.171/2011).
crédito tributário devido, independentemente do julgamento de eventual manifestação
de inconformidade contra o ato declaratório de exclusão.”11
Permitir-se que os valores sejam lançados antes do julgamento administrativo
definitivo acerca da exclusão ou não da empresa no Simples é olvidar-se dos prin-
cípios constitucionais acima realçados e desprezar o disposto no art. 33 do Decreto
n. 70.235/1972, que pressupõe o efeito suspensivo nas impugnações e os recursos
administrativos tributários:
“Art. 33. Da decisão caberá recurso voluntário, total ou parcial, com efeito suspensi-
vo, dentro dos trinta dias seguintes à ciência da decisão.” (Destacou-se)12
É também a orientação de James Marins e Marcelo M. Bertoldi, para quem “no
âmbito do Simples Nacional (...) a pena de exclusão deverá ser notificada regular-
mente ao contribuinte e ensejar a oportunidade de defesa através de processo admi-
nistrativo, com efeito suspensivo da declaração e da exclusão, e com todas as ga-
rantias a ele inerentes.”13
As impugnações e recursos administrativos em matéria tributária fazem parte
de um complexo de procedimentos que visam certificar a efetiva existência da situa-
ção atribuída ao sujeito passivo, seja quanto aos fatos que lhe dão nascimento, seja
quanto ao direito que se lhes aplica.14
Utilizar o pressuposto de que a empresa já encontra-se excluída definitivamen-
te do Simples, enquanto tal providência encontra-se suspensa por manifestação de
inconformismo, é inquinar de nulidade o processo administrativo, como orienta a
jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
“Tributário. Simples. Exclusão. Recurso Administrativo. Efeito Suspensivo. Cabimen-
to, Legislação que regula o Processo Tributário Administrativo. Decreto 70.235/72.
1. O recurso administrativo interposto em face de decisão que exclui o contribuinte do
Simples tem efeito suspensivo, nos termos das normas que regulam o processo tribu-
tário administrativo (Decreto 70.235/72).
2. Remessa Oficial e Apelação não providas.”15

4. Conclusão
Vale dizer: a exclusão da empresa do regime do Simples somente pode ser le-
vada a efeito depois de julgada definitivamente manifestação de inconformismo
eventualmente interposta, a qual deve ser recebida no efeito suspensivo, em obe-
diência à orientação constitucional dos princípios do devido processo legal, do con-
traditório e da ampla defesa (incisos LIV e LV do art. 5º da CF).
11
Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento em Florianópolis, Acórdão n. 07-24.936, 5ª Turma, Rel. Leila
Simone Monego, unânime, j. em 17.6.2011. No mesmo sentido: Acórdão n. 07-22.084, 3ª Turma, Rel. Éden Ricardo
Zanato, unânime j. em 12.10.2010.
12
Tal exegese inclusive é corroborada pelo disposto no parágrafo único do art. 23 da Instrução Normativa SRF n. 355,
de 29 de agosto de 2003, que ao tratar da exclusão da empresa do regime do Simples consigna que “a exclusão de
ofício dar-se-á mediante ADE da autoridade fiscal da Secretaria da Receita Federal que jurisdicione o contribuinte,
assegurado o contraditório e a ampla defesa, observada a legislação relativa ao processo administrativo fiscal da União,
de que trata o Decreto n. 70.235, de 06 de março de 1972.”
13
MARINS, James; e BERTOLDI, Marcelo M. Simples Nacional. São Paulo: RT, 2007, pp. 172/173.
14
Neste sentido a doutrina de OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. “Processo Administrativo Tributário”. In: MARTINS, Ives
Gandra da Silva (coord.). Processo Administrativo Tributário. Pesquisas Tributárias - Nova Série 5. 2ª ed. São Pau-
lo: RT, 2002, p. 199.
15
TRF da 3ª Região, AMS n. 2004.61.26.005820-3/SP, Rel. Wilson Zauhy, j. em 12.11.2010. No mesmo sentido: TRF
da 3ª Região, AMS n. 2004.61.26.005823-9/SP, Rel. Wilson Zauhy, j em 22.10.2010.
Juros sobre Capital Próprio (JCP),
Planejamento Tributário e a Dupla
Alíquota Zero de IOF/Câmbio na
Recapitalização de JCP Pagos em
Operações Internacionais
César Augusto Di Natale Nobre

Diversas sociedades possuem dúvidas sobre o tratamen-


to deste instituto jurídico, os juros sobre capital próprio -
JCP, como forma de remuneração dos acionistas. A propos-
ta é, além de demonstrar com exemplos numéricos de fácil
compreensão seu cálculo, abordar algumas questões funda-
mentais sobre a regulação deste instituto e sua tributação
como: (i) a recapitalização dos lucros; (ii) a possibilidade de
pagamento de juros sobre o capital próprio referente a perío-
dos pretéritos e sua dedutibilidade do ano-calendário corren-
te; (iii) a imputação destes juros pretéritos aos dividendos
obrigatórios do exercício atual e até mesmo aos dividendos
não obrigatórios; (iv) a possibilidade de pagamento de juros
sobre o capital próprio ainda que todo o lucro já tenha sido
destinado; (v) a incidência de Imposto de Renda nesta re-
messa para o exterior e, principalmente; (vi) sobre a incidên-
cia do Imposto sobre Operações Financeiras na modalidade
Câmbio na remessa e no retorno, ainda que fictos, para acio-
nistas não residentes para fins de aumento de capital.

1. Introdução
Os juros sobre o capital próprio (JCP) são instituto jurí-
dico peculiar do ordenamento jurídico brasileiro. Alguns os
interpretam como possuindo natureza de dividendo, uma vez
que remuneram os acionistas pelo seu investimento em so-
ciedades brasileiras, mas também são considerados pelas
autoridades fiscais como juros, uma vez que remuneram o
capital investido de acordo com a Taxa de Juros de Longo
César Augusto Prazo (TJLP) do período utilizado.
Di Natale Nobre Dessa forma, este instrumento híbrido é de difícil com-
é Mestrando em
preensão para investidores estrangeiros e os aspectos regu-
Direito do Estado
(PUC/SP), Professor latórios e tributários que circundam as relações jurídicas dos
Universitário de beneficiários dos juros sobre capital próprio e as instituições
Direito Tributário e pagadoras dos mesmos merecem estudo mais aprofundado.
Advogado em Para tanto, foram escolhidos alguns temas correlatos
São Paulo. para introduzir o leitor à problemática da tese central acer-
ca da utilização deste instituto como planejamento tributário, abrangendo também
a incidência à alíquota zero do IOF/Câmbio nas operações fictas de remessa para o
exterior e retorno para o Brasil dos juros sobre o capital próprio quando os investi-
dores não residentes desejam reinvestir estas remessas na sociedade pagadora para
aumento de capital.

2. Da Natureza Jurídica dos JCP - Juros ou Dividendos Lato Sensu?


Os JCP foram criados no período de altas taxas inflacionárias visando remune-
rar o capital dos investidores que fora investido como capital social integrante do
patrimônio líquido (PL) das sociedades.
Foi previsto que se realizasse o seu cálculo por meio da aplicação da taxa de
juros de longo prazo, TJLP, sobre o PL da empresa para que se atingisse a “quantia
abstrata” total autorizada a ser distribuída a título de juros sobre o capital próprio.
Após este procedimento, deve-se obter os dois limites legais de distribuição e,
comparando-se o primeiro valor acima descrito (quantia abstrata) com o maior den-
tre os dois limites legais, obtém-se o montante que a empresa pode concretamente
distribuir a título de JCP.
Os limites legais são assim obtidos: (i) sobre a conta contábil de PL denomina-
da “Lucros e Prejuízos Acumulados” somada a “Reservas de Lucros”, aplica-se o
percentual de 50% e obtém-se o primeiro valor limite; (ii) sobre a conta contábil
“Resultado do Exercício”, aplica-se o percentual de 50% e obtém-se o segundo va-
lor limite. Dentre estes dois valores, o maior é comparado com a “quantia abstrata”
explicada acima. Caso o montante abstrato seja superior ao montante concreto, a
empresa está legalmente autorizada a distribuir tão somente até o limite concreto;
caso contrário, se o montante abstrato for inferior ou igual ao montante concreto,
pode-se distribuí-lo totalmente.
Os JCP são, portanto, uma maneira eficaz de distribuir os lucros para os acio-
nistas da empresa e, ainda por cima, deduzir este montante distribuído da base de
cálculo do IRPJ e da CSLL, pois se trata de despesa financeira dedutível para a en-
tidade pagadora. Esta deve reter, a título de antecipação de imposto de renda, 15%
do valor distribuído, mas considerando que a tributação sobre o lucro que deveria
ser paga por esta empresa pagadora de JCP sobre a base de cálculo seria de 34%
(somando-se a carga tributária do IRPJ, seu adicional e da CSLL), ainda que haja
retenção de 15% do montante distribuído, tem-se economia tributária autorizada pela
legislação de 19% sobre este montante distribuído, que será deduzido da base de
cálculo total.
Portanto, o grande benefício que o JCP gera em uma primeira análise é justa-
mente esta diminuição da base de cálculo do IRPJ e da CSLL que a legislação au-
toriza.
Entretanto, salienta-se questionamento importante para o estudo deste instituto
que existe somente em nosso País. Qual é a natureza jurídica do JCP? Seria uma
espécie de dividendo, pois remunera os sócios ou acionistas da entidade? Ou seria
mesmo uma espécie de juros por ser pago como contraprestação do aporte de capi-
tal por estes realizado na empresa?
Na Deliberação CVM 207/1996, a autarquia estipulou que os JCP fossem cal-
culados com uma dedução dos “Lucros Acumulados”, na conta do PL da empresa.
Esta mesma sistemática é utilizada para o pagamento de dividendos, o que aproxi-
mou ainda mais estas duas figuras jurídicas. Contudo, o Decreto 5.442/2005, que
atribui alíquota zero das contribuições PIS e Cofins sobre receitas financeiras, ex-
pressamente excluiu os JCP da aplicação de tal alíquota zero, ou seja, ainda que JCP,
no caso, seja uma receita financeira, foi expressamente excluída do benefício pelo
Decreto.
Isto tem ainda grande relevância quando estamos diante de remessas a não re-
sidentes, pois a depender do tratado internacional para evitar a bitributação o qual
estamos enfrentando, o tratamento tributário da remessa de juros é um, enquanto o
dado aos dividendos é outro, completamente distinto.
Ainda que haja argumentos para ambos os lados, cremos que dividendos e JCP
são institutos distintos. Ambos possuem a mesma finalidade, remunerar o capital
investido dos acionistas na empresa, mas não podem ser totalmente equiparados.
Entretanto, também não concordamos com o argumento de que JCP seria equi-
parado ao pagamento de juros, pois se este argumento prosperasse, estaríamos afir-
mando que quando um acionista realiza um aporte de capital ele está na verdade
realizado um contrato de mútuo com a empresa, o qual seria remunerado por juros.
Esta interpretação não seria juridicamente sustentável, uma vez que o aporte de ca-
pital não é equiparado a mútuo, tendo obrigações, riscos e direitos completamente
diferentes um instituto do outro.
Dessa forma, cremos serem os JCP instituto jurídico próprio, diferente dos di-
videndos e também distinto dos juros. É, assim como o dividendo, uma forma de
remunerar o capital do acionista, mas não possui as mesmas prerrogativas, pois foi
tratado pelo legislador de maneira autônoma e distinta.

3. JCP e Planejamento Tributário


Este trabalho pretende colocar à disposição dos contribuintes uma maneira efi-
ciente de utilizar o instituto dos JCP para (i) além de reduzir a base de cálculo do
IRPJ e da CSLL com a dedutibilidade dos JCP não só do período atual; (ii) como
também com o pagamento e dedutibilidade de JCP referente a períodos pretéritos;
(iii) também dar uma destinação legalmente autorizada para as reservas de lucros,
que podem se tornar “dinheiro parado” (como se diz no mercado financeiro) em
conta de capital, se não bem utilizada; e, ainda por cima (iv) no caso de recapitali-
zação do dinheiro pago a título de JCP para acionista não residente na sociedade
pagadora, nada recolher aos cofres públicos a título de IOF/Câmbio devido a apli-
cabilidade da alíquota zero na operação de reinvestimento.

3.1. Alternativas societárias para utilização eficiente das reservas legais


As reservas legais e estatutárias das companhias para a destinação de seus lu-
cros são constituídas por obrigação decorrente de lei, ou do Estatuto social, e mui-
tas vezes não estão disponíveis aos administradores das empresas para livre utiliza-
ção. Entretanto, tanto a lei societária como a lei tributária autorizam estes adminis-
tradores a calcular e pagar JCP sobre estas contas contábeis de reservas ou sobre o
resultado do exercício.
Ora, se é atribuída a escolha ao administrador, com o recente posicionamento
do STJ pela procedência de recurso especial no qual o contribuinte buscava a tutela
jurisdicional pelo direito de pagar aos seus acionistas JCP referente a períodos an-
teriores ao do exercício social de distribuição, o administrador pode eleger a conta
de reservas como a contrapartida para tal pagamento e dela deduzir não só o mon-
tante referente aos JCP do período atual, X, como também de todos os períodos pre-
téritos, X-1, X-2, X-3, X-4 até X-5, pois o direito a dedutibilidade acaba com a pres-
crição do crédito tributário.
Este é o fundamento econômico da operação ora trabalhada. Esta é a motiva-
ção extratributária exigida pela doutrina e pela jurisprudência mais recentes. A uti-
lização eficiente e autorizada pelo capital constante das reservas da companhia.

3.2. Da possibilidade jurídica de imputação de JCP como dividendos além dos


mínimos obrigatórios
Outra relevante questão é sobre a possibilidade de imputação dos JCP como
dividendos além dos mínimos obrigatórios.
Vale lembrar a razão da obrigatoriedade de a sociedade distribuir “dividendos
mínimos obrigatórios” contida na Lei das Sociedades Anônimas (LSA), art. 202. A
razão de ser de tal instituto é remunerar os acionistas da sociedade pelo capital in-
vestido na mesma. À medida que se paga JCP atuais e retroativos aos mesmos acio-
nistas que fariam jus aos respectivos dividendos, não se elide o objetivo da Lei, pois
estas mesmas entidades, pessoas físicas ou jurídicas, receberão determinada remu-
neração, ainda que a título de JCP.
Para responder diretamente à questão colocada frente às ponderações realiza-
das, sim, é possível realizar uma interpretação teleológica frente ao instituto dos JCP
e, de acordo com o ora explanado, imputar os JCP pagos a dividendos ainda que não
os mínimos obrigatórios.
Além de tudo, não há obrigatoriedade alguma do intérprete realizar uma inter-
pretação restritiva destes institutos, já que estamos na seara societária e, a imputa-
ção ou não deste JCP como o dividendo mínimo obrigatório é tão somente uma
questão de obediência à legislação societária, ou seja, não implicará em exclusão
de crédito, isenção ou descumprimento de obrigação acessória, o que torna inapli-
cável a interpretação literal dos dispositivos imposta pelo art. 111 do CTN, uma vez
que toda a apuração do lucro real já ocorreu em momento anterior, quando do cál-
culo e distribuição de tal JCP. O ponto central é que os JCP em questão seriam dis-
tribuídos de qualquer forma, mas societariamente eles serão distribuídos e imputa-
dos como dividendos.

3.3. Otimização tributária


Ante o exposto, defende-se a otimização tributária que esta operação oferece ao
contribuinte devido ao fato de reduzir consideravelmente a base de cálculo do IRPJ
e da CSLL com a distribuição de JCP não só do período atual, como também de
períodos pretéritos com efeitos no resultado do período atual, de acordo com a dou-
trina e com a jurisprudência mais atual sobre o tema.
Exemplificando, imaginando uma sociedade de PL igual a R$ 715,00 e uma
TJLP de 7% ao ano; se o contribuinte obtivesse um lucro de R$ 100,00 e estivesse
autorizado a distribuir a título de JCP o valor de R$ 50,00 (i.e., 50% do lucro líquido
do exercício que é compatível com a aplicação da TJLP sobre o PL); seria feita a
distribuição destes R$ 50,00 e seria retido a título de antecipação de IR o valor de
R$ 50,00 x 15% = R$ 7,50; o que resultaria em uma distribuição líquida de JCP de
R$ 50,00 - R$ 7,50 = R$ 42,50.
Isto reduziria a base de cálculo anterior de R$ 100,00 para R$ 50,00. Em outras
palavras, antes se pagaria 34% sobre R$ 100,00, ou seja, R$ 34,00. Após a utiliza-
ção dos JCP, pagar-se-á 34% sobre R$ 50,00, ou seja, R$ 17,00. Mas também reter-
se-á 15% de R$ 50,00, ou seja, R$ 7,50.
Finalizando nosso exemplo, na opção (i), sem a utilização de JCP, teremos uma
carga tributária final de R$ 34,00, ou seja, 34% do lucro. Enquanto na opção (ii),
teremos uma carga tributária final de R$ 17,00 somados com R$ 7,50, ou seja, R$
24,50, que significa uma carga tributária final em termos percentuais de 24,5%.
Esta diferença entre as cargas tributárias incidentes é muito variável, pois a TJLP
varia, o PL das empresas varia, enfim, as variáveis são muitas, mas pode-se garan-
tir que sempre terá menor a carga tributária a empresa que utilizar o instituto dos
JCP, quando possível.
Ademais, agora que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) posicionou-se sobre o
tema, ainda que não haja jurisprudência firmada, mas somente poucos casos em sede
de recurso especial, esta carga tributária poderia ser ainda mais diminuta, pois uma
vez que a empresa não tivesse pago JCP nos períodos pretéritos e o fizesse neste
atual, isso reduziria mais ainda a base imponível final sobre a qual incidiria IRPJ e
CSLL.

4. Da Possibilidade de Pagamento de JCP referente a Períodos Pretéritos


Exploraremos a questão sobre a possibilidade jurídica do pagamento de JCP
referente a períodos anteriores.
Para se responder a esta questão, vale a pena recorrer ao que o Regulamento do
Imposto de Renda1 (RIR/1999) atribui aos JCP:
“Art. 347. A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos de apuração do lucro real, os
juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título
de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido
e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP (Lei nº
9.249, de 1995, art. 9º).
§ 1º O efetivo pagamento ou crédito dos juros fica condicionado à existência de lucros,
computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros,
em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou cre-
ditados (Lei nº 9.249, de 1995, art. 9º, § 1º, e Lei nº 9.430, de 1996, art. 78).”

1
Aprovado pelo Decreto 3.000/1999.
Assim, não existe no ordenamento jurídico qualquer referência a algum limite
temporal para o pagamento de JCP pela pessoa jurídica. Em outras palavras, os ad-
ministradores da sociedade podem deliberar o pagamento de JCP em períodos sub-
sequentes relativos a períodos pretéritos simplesmente porque não há qualquer veda-
ção para tanto. O fato de os administradores não terem pago JCP não implica re-
núncia de direito.
Entretanto, cabe ressaltar que uma vez deliberado acerca da distribuição de JCP
retroativos, deve-se utilizar os valores para o cálculo destes vigentes à época. Ou
seja, a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) a ser utilizada deverá ser aquela vi-
gente à época correspondente, assim como os valores do Patrimônio Líquido (PL)2
da pessoa jurídica a serem utilizados.
Neste sentido, vale citar o posicionamento da Primeira Câmara do Conselho de
Contribuintes no Processo 1847.001473/2006-47, em sessão de 29 de maio de 2008,
que demonstra claramente o entendimento deste órgão antecessor do atual Carf
(Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Este entendimento permanece inal-
terado.
Deve-se perceber novamente que a Lei que descreve os parâmetros que esta dis-
tribuição deve obedecer é a vigente à época da Assembleia que deliberar sobre a
distribuição de JCP retroativos, mas os valores a serem utilizados não podem ser
outros que não àqueles existentes no período pretérito. O próprio STJ recentemen-
te vem autorizando esta prática, contudo, deve-se observar que ainda inexiste juris-
prudência formada sobre o assunto, mas sim alguns julgados relevantes para de-
monstrar o incipiente entendimento da Corte (e.g., REsp 1.086.752/PR).3
Assim, o pagamento ou o crédito de JCP relativos a períodos pretéritos somen-
te pode ser tido como despesa dedutível da base de cálculo do Imposto de Renda
da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)
do período em que foi deliberada e aprovada a sua distribuição. Isto decorre do fato
de que ainda que os JCP tenham sido calculados com base em valores pretéritos (i.e.,
TJLP e valor do PL), esta despesa somente será incorrida de fato pela pessoa jurí-
dica no período da deliberação e aprovação do pagamento ou crédito.
Deve-se lembrar, contudo, que o pagamento de JCP retroativo não possuirá
impactos no Balanço Patrimonial da sociedade referente aos períodos pretéritos re-
lativos aos quais serão pagos ou creditados os JCP. Isto decorre do fato de este pa-
gamento ou crédito ter direta influência no PL da sociedade somente no ano em que
for pago ou creditado, não se alterando os balanços anteriores.

2
Vale lembrar o disposto no parágrafo 4º do art. 347 do RIR/1999:
“(...)
§ 4º Para os fins de cálculo da remuneração prevista neste artigo, não será considerado o valor de reserva de reavaliação
de bens ou direitos da pessoa jurídica, exceto se esta for adicionada na determinação da base de cálculo do imposto
de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido (Lei nº 9.249, de 1995, art. 9º, § 8º).”
3
REsp 1.086.752/PR; 2008/0193388-2.
4.1. Pagamento de JCP pretérito ainda que os lucros já tenham sido totalmente
distribuídos
A pessoa jurídica está autorizada a pagar JCP referente a exercício anterior cujo
Lucro Líquido (LL) já tenha sido 100% destinado e aprovado em AGO devido à
redação do art. 9º e de seu parágrafo 1º da Lei 9.249/1995:
“Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os
juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título
de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido
e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP.
§ 1º O efetivo pagamento ou crédito dos juros fica condicionado à existência de lucros,
computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros,
em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou cre-
ditados.” (Destaque nosso)
Assim, não necessariamente deverá ser debitada a conta de passivo relativa ao
“Lucro do Período” para o creditamento ou pagamento de JCP, permitindo a legis-
lação que este débito seja lançado a partir do somatório da conta “Lucros Acumu-
lados” e da de “Reserva de Lucros”4 e crédito em conta do exigível que represente
direito de crédito do acionista. Para finalizar este lançamento contábil, deverá ha-
ver a baixa desta obrigação contra “Caixa e Bancos”, conta de ativo circulante, no
momento do efetivo pagamento ou creditamento para os acionistas, registrando-se,
portanto, a “Despesa Financeira com JCP” como conta de resultado.
Em outras palavras, no caso da pessoa jurídica já ter dado destinação a todo o
lucro de determinado período, uma vez existente em período subsequente um saldo
credor em uma destas duas contas de PL, saldo este que necessariamente deve ser o
dobro dos JCP a serem pagos ou creditados, encontra-se autorizada a pessoa jurídi-
ca a efetuar esta operação.
Imaginemos um exemplo no qual houve distribuição de R$ 1.000.000,00 e des-
tinação de R$ 500.000,00 para a conta de “Reserva para a Retenção de Lucros”.
O art. 178, parágrafo 2º, III, Lei das Sociedades Anônimas (LSA - Lei
6.404/1976), prevê as contas de “Reservas de Lucros” como parcela integrante do
PL da sociedade e o art. 182, parágrafo 4º, c/c o art. 196, LSA, estabelece que a conta
de “Reserva para a Retenção de Lucros” integra este conceito delimitado por “Re-
servas de Lucros”. Assim, é de nosso entendimento que esta conta (prevista no art.
196 da LSA como conta de PL) pode ser considerada como abarcada no conceito
do parágrafo 1º do art. 9º da Lei 9.249/1995 para fins de apuração dos JCP a serem
pagos ou creditados.
Nestes termos, poderá a sociedade calcular a partir deste montante, i.e., R$
500.000,00, os JCP a serem pagos ou creditados.
Diante disso, verifica-se que a destinação do LL é importante para delimitar qual
será a base de cálculo a ser utilizada para a distribuição de JCP, estando no caso em
tela a empresa autorizada a distribuir JCP sobre este valor supramencionado.
Poderia surgir uma dúvida acerca de se os JCP referidos a períodos anteriores
não deveriam ser calculados com o lucro da época antes da destinação aqui mencio-

4
Art. 29 da Instrução Normativa SRF 93/1997.
nada. Contudo, isto não é uma condição necessária porque a própria legislação que
trata de JCP autoriza o débito não somente da conta “Lucro do Exercício”, mas tam-
bém do somatório das contas “Reservas de Lucros” e “Lucros Acumulados”. Ou
seja, ambas estas contas são abertas somente após a destinação do LL, o que torna
o entendimento da impossibilidade de cálculo dos JCP somente anteriormente a tal
destinação dos lucros fora de lugar.
Em outras palavras, há previsão de que JCP possam ser pagos após destinação
total do lucro, pois uma parcela deste lucro poderia ser distribuído como dividendo
e outra parcela destinada as contas de “Reservas de Lucros” e “Lucros Acumula-
dos” que também poderiam servir de base de cálculo para apuração de JCP; claro,
respeitando-se o Estatuto social e os direitos dos acionistas.

4.2. JCP pretérito e a imputação como dividendos atuais


Devemos ter em mente o disposto no parágrafo 7º do art. 9º da Lei 9.249/1995:
“§ 7º O valor dos juros pagos ou creditados pela pessoa jurídica, a título de remunera-
ção do capital próprio, poderá ser imputado ao valor dos dividendos de que trata o
art. 202 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sem prejuízo do disposto no
§ 2º.” (Destaque nosso)
O art. 202 da LSA prevê a distribuição dos dividendos obrigatórios aos acionis-
tas. Dessa forma, uma vez a despesa com JCP sendo incorrida em determinado pe-
ríodo, ainda que posterior, cremos estar autorizada a pessoa jurídica a utilizar-se
desta norma insculpida no parágrafo 7º, supra e imputar o pagamento ou credita-
mento de JCP como o “dividendo mínimo obrigatório”, nos termos da lei acioná-
ria, relativamente ao período em que foi deliberada e aprovada sua distribuição.
Ressalta-se que os valores distribuídos a título de JCP só podem ser imputados
aos dividendos obrigatórios aqui analisados uma vez líquidos do Imposto de Renda
Retido na Fonte (IRRF).
Isto decorre do fato de não haver nenhuma restrição temporal na norma supra-
citada. Ora, se o próprio Carf autoriza a distribuição de JCP relativo a períodos pre-
téritos, não faria sentido afastar a possibilidade de utilização desta distribuição de
JCP pretéritos como imputável aos dividendos obrigatórios do ano de distribuição,
uma vez que a norma acima transcrita não limita a utilização desta prerrogativa aos
JCP do período, mas, diferentemente, menciona somente que o valor pago a título
de JCP poderá ser imputável aos dividendos obrigatórios. Assim, não existe previ-
são legal que obrigue necessariamente que estes JCP imputáveis a título de dividen-
dos devem ser relativos ao ano atual, autorizando, portanto, que os JCP relativos a
períodos pretéritos também possam ser computados, para fins de distribuição de
dividendos, conjuntamente com os relativos ao período atual.
Dessa forma, em um exemplo prático, caso os dividendos mínimos obrigatórios
sejam de R$ 25,00; os JCP relativos ao ano atual sejam R$ 15,00 e os JCP relativos
a períodos pretéritos sejam R$ 30,00; afirma-se que não haveria a necessidade de
distribuição de mais dividendos justamente pelo permissivo legal do parágrafo 7º
do art. 9º da Lei 9.249/1995. Em outras palavras, neste caso, ainda que os dividen-
dos mínimos obrigatórios fossem de até R$ 45,00, não haveria a necessidade de
quaisquer pagamentos a mais do que os já realizados.
5. A Capitalização dos JCP Pagos e a Respectiva Dedutibilidade da Base de
Cálculo do IRPJ e da CSLL
Na vigência da regulação antiga, o parágrafo 9º do art. 9º da Lei 9.249/1995
autorizava a pessoa jurídica a aumentar o capital social ou manter este valor relati-
vo aos JCP em uma conta de “Reserva para Aumento de Capital Social” ao invés
de creditar ou pagar diretamente aos acionistas tais valores.5
Entretanto, com o advento da Lei 9.430/1996, mais precisamente de seu art. 88,
XXVI, foi expressamente revogado tal dispositivo. Frente a isso, a SRF editou a
Instrução Normativa 93/1997, na qual o art. 30 é bastante relevante para esta dis-
cussão:
“Art. 30. Somente serão dedutíveis na determinação do lucro real e na base de cálculo
da contribuição social os juros sobre o capital próprio pagos ou creditados aos sócios
ou acionistas da pessoa jurídica, descabendo a dedutibilidade nos casos em que sejam
incorporados ao capital social ou mantidos em conta de reserva destinada a aumento
de capital.”
Diante desse novo cenário, a sociedade que desejar capitalizar estes valores re-
ferentes aos JCP pagos ou creditados e ainda manter o direito de deduzir tais valo-
res da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, deverá efetuar um crédito em conta dos
sócios ou acionistas e somente em seguida deste lançamento aumentar o capital
social com a subscrição em dinheiro ou créditos; restando impossibilitada tal so-
ciedade de efetuar a escrituração dos JCP diretamente na conta de “Reserva para Au-
mento de Capital”.

6. O Imposto sobre a Renda Incidente (IRRF)


A alíquota de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) aplicável sobre os pa-
gamentos ou créditos realizados a título de JCP é de 15% na fonte, na data do cré-
dito ou do pagamento ao beneficiário, de acordo com o art. 9º, parágrafo 2º, da Lei
9.249/1995. Logo, no caso citado acima, no momento do crédito ou pagamento ao
acionista, haveria a retenção e, posteriormente, somente o valor líquido de IRRF
poderia ser capitalizado na companhia.
Caso o beneficiário esteja nos denominados Tax Havens (i.e., Paraísos Fiscais),
a alíquota do IRRF pode ser majorada para 25%, conforme art. 8º da Lei 9.779/1999.
Apesar de pensarmos ser incompatível com o art. 172 da CF/1988 (explorado
mais adiante) a incidência de IRRF na remessa de JCP para não residente que irá
reinvestir no Brasil este mesmo montante, não há como escapar de tal incidência
posto que existe a disponibilidade jurídica dos haveres ao acionista que, assim, de-
cide reinvestir. Pensamos que este reinvestimento deveria ser incentivado com uma
isenção de IRRF na remessa quando haverá, necessariamente, o retorno dos recur-

5
Redação revogada do dispositivo: “§ 9º À opção da pessoa jurídica, o valor dos juros a que se refere este artigo po-
derá ser incorporado ao capital social ou mantido em conta de reserva destinada a aumento de capital, garantida sua
dedutibilidade, desde que o Imposto de que trata o § 2º, assumido pela pessoa jurídica, seja recolhido no prazo de 15
dias contados a partir da data do encerramento do período-base em que tenha ocorrido a dedução dos referidos juros,
não sendo reajustável a base de cálculo nem dedutível o imposto pago para fins de apuração do lucro real e da base
de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido.”
sos a serem reinvestidos na empresa pagadora, assim como ocorre com o IOF/Câm-
bio, conforme demonstraremos a seguir.

7. O Imposto sobre Operações Financeiras Modalidade Câmbio


(IOF/Câmbio) - Da Incidência da Alíquota Zero nas Remessas Fictas
a não Residentes
Deve-se atentar para o fato de a legislação atual não permitir a capitalização
direta dos JCP se a dedutibilidade do IRPJ e da CSLL for desejada. Conforme aci-
ma explicado, deve-se primeiramente lançar um crédito em conta de direitos dos
acionistas, logo, uma obrigação a pagar (i.e., passivo) da sociedade. Somente após
este procedimento os acionistas podem decidir por capitalizar tal montante na so-
ciedade. Ou seja, os valores relativos aos JCP saem do patrimônio da sociedade,
sofrem tributação na fonte de 15%, incorporam-se ao patrimônio dos acionistas e
depois voltam para o patrimônio da sociedade como aumento de capital.
Caso os acionistas sejam não residentes, desejem reinvestir o JCP distribuído na
sociedade pagadora e, ainda assim, utilizar-se da dedutibilidade prevista, devemos
considerar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente nesta operação
de câmbio.
O art. 15-A do Regulamento do IOF6 (RIOF), caput, decide que a alíquota do
IOF/Câmbio é de 0,38% e elenca exceções a esta regra. Uma das exceções é a pre-
vista no inciso X, que dispõe ser zero a alíquota “nas liquidações de operações de
câmbio para remessas de juros sobre o capital próprio e dividendos recebidos por
investidor estrangeiro”.
Pois bem. Neste nosso caso, lembremos, o investidor estrangeiro deseja reinves-
tir os JCP distribuídos na empresa, entretanto, para que a empresa utilize os JCP
como despesa dedutível, ela deve efetivamente pagar tais JCP aos acionistas para
que, posteriormente, estes acionistas reinvistam na sociedade, conforme explorado
acima.
O problema é que quando o acionista se encontra fora do Brasil esta imposição
faz incidir IOF/Câmbio na operação. Em outras palavras, no pagamento dos JCP ao
acionista incide IOF no fechamento do câmbio e no investimento deste mesmo
montante na empresa, novamente, deve-se fechar câmbio e, logo, incide IOF nova-
mente.
Este problema aumenta quando a empresa envolvida é companhia aberta, pois
de acordo com o inciso XIV do mesmo art. 15-A (com a redação dada pelo Decreto
7.412/2010), este reinvestimento dos JCP pagos teria incidência de IOF/Câmbio à
alíquota majorada de 2%.
Ademais, se este reinvestimento tratado não for caso de oferta pública ou subs-
crição de ações (previsão do inciso XIV mencionado), faz-se incidir o inciso XII,
incluído pelo mesmo decreto, que prevê a alíquota majorada de 6% para o ingresso
destes recursos no Brasil para aplicação no mercado financeiro e de capitais.

6
Aprovado pelo Decreto 6.306/2007 e posteriores alterações.
A legislação, contudo, amenizou a situação. O inciso X do art. 15-A, RIOF, dis-
pôs que no pagamento de JCP a investidor não residente o IOF/Câmbio incide à alí-
quota zero.
Assim, teríamos na operação ora analisada que: (i) na saída dos JCP haveria
incidência de IOF/Câmbio à alíquota zero; mas (ii) na entrada deste mesmo mon-
tante a título de reinvestimento na mesma empresa pagadora, haveria IOF/Câmbio
a recolher (variando entre a alíquota de 0,38% para empresas não listadas em Bol-
sa de Valores e 2% ou 6% para companhias abertas, a depender do caso).
Cumpre-nos ressaltar que pela falta de regulamentação do art. 116 do Código
Tributário Nacional, as autoridades fiscais poderiam, ainda, interpretar que não se-
ria aplicável o disposto no inciso X acima tratado (ou seja, a aplicação de alíquota
zero no pagamento de JCP) porque a ratio deste dispositivo seria o pagamento fi-
nal dos JCP ao investidor como remuneração de seu investimento e, como este di-
nheiro é reinvestido pelo acionista na empresa, deveríamos interpretar a operação
como um todo e não em partes, o que poderia ensejar a aplicação de alíquota geral
de 0,38% tanto na saída como no retorno do dinheiro e, a depender do caso, 2% ou
6% no retorno do dinheiro. Ou, ainda, poder-se-ia questionar a dedutibilidade na
empresa dos valores pagos a título de JCP e reinvestidos na mesma empresa.
A interpretação correta da legislação, a nosso ver, é pela incidência sob alíquo-
ta zero de IOF/Câmbio nesta operação, tanto na saída dos recursos como na entra-
da (quando do reinvestimento), a partir da análise dos dispositivos abaixo transcri-
tos.
“Art. 15-A. A alíquota do IOF fica reduzida para trinta e oito centésimos por cento,
observadas as seguintes exceções:
(...)
XIX - na operação de compra de moeda estrangeira por instituição autorizada a ope-
rar no mercado de câmbio, contratada simultaneamente com uma operação de venda,
exclusivamente quando requeridas em disposição regulamentar, excetuadas as opera-
ções de que tratam os incisos XI, XII, XV, XVII, XVIII e XXII: zero.”
Em outras palavras, quando a obrigação de se fechar o câmbio para comprar
moeda estrangeira for contratada simultaneamente com a obrigação de se vender
esta moeda “recém comprada” por disposição regulamentar, há incidência de IOF/
Câmbio à alíquota zero, excetuadas as operações mencionadas.
Nossa interpretação é pela incidência de alíquota zero tanto no câmbio de com-
pra como no câmbio de venda de moeda estrangeira, neste caso analisado, por inci-
dência da regra insculpida no inciso XIX, e não pela regra insculpida no inciso X
(que prevê a alíquota zero somente para remessas a não residentes de JCP), pois esta
regra do inciso X parece-nos abarcar o caso de “pagamento definitivo” de JCP, ou
seja, não haverá reinvestimento na companhia pagadora ou, se houver, não é algo
já predeterminado quando do pagamento.
Para o nosso caso, interessa analisarmos a exceção à regra do inciso XIX que
consta no inciso XII (i.e., a hipótese de incidência a 6% quando houver “aplicação
no mercado financeiro e de capitais”), pois está expressamente prevista.
Entretanto, não necessariamente a empresa pagadora de JCP deve ter ações ne-
gociadas em ambiente bursátil ou submetidas à regulação do mercado financeiro e
de capitais. Neste momento, cumpre-nos firmar o entendimento de que nosso racio-
cínio abaixo pela dupla incidência de alíquota zero no IOF/Câmbio somente se apli-
ca a operações realizadas por empresas limitadas ou sociedades anônimas fechadas,
pois a exceção ao inciso XIX descrita acima da incidência de 6% para “aplicações
em mercado financeiro e de capitais” elimina qualquer possibilidade de outra inter-
pretação que não seja: caso o investidor reinvista o JCP pago no mercado financei-
ro ou de capitais, ainda que seja na mesma empresa que pagou os JCP, ele deverá
se submeter à alíquota majorada.
Contudo, quando se trata de empresas fechadas (sociedades anônimas fechadas
ou limitadas) pagadoras de JCP cujo montante pago é reinvestido na mesma empresa
pelo recebedor do JCP não residente, faz-se incidir na hipótese do inciso XIX, con-
forme demonstraremos a seguir.
A Circular do Banco Central do Brasil (Bacen) 3.545/2011 aprovou o novo
Regulamento do Mercado de Câmbio e de Capitais (RMCCI) que trouxe a previsão
justamente da hipótese ora tratada, uma vez que se autoriza o reinvestimento deste
montante na sociedade pagadora dos JCP em seu capital social:
“5. As seguintes disposições aplicam-se ao registro de investimento estrangeiro direto
nos termos deste capítulo:
(...)
c) as capitalizações de lucros e dividendos, de juros sobre capital próprio e de reser-
vas de lucros provenientes da parcela de capital registrada nos termos deste capítulo
devem ser registradas no módulo IED do RDE (...).”7 (Destaques nossos)
Quando o mesmo RMCCI regula o procedimento para tal reinvestimento, exis-
te a previsão da obrigatoriedade de uma operação de compra de moeda estrangeira
para a remessa ao investidor estrangeiro (sujeita a registro no Bacen). Vejamos:
“1. Esta seção dispõe sobre o registro, no módulo IED do RDE, das remessas ao exte-
rior de lucros e dividendos, de juros sobre capital próprio e de retorno de capital, re-
lativas a investimento estrangeiro no País.
2. A remessa a investidor estrangeiro de lucros, dividendos e juros sobre capital pró-
prio deve ser precedida do registro das respectivas distribuições no módulo IED do
RDE.”8
Nos mesmos termos, também há obrigatoriedade de uma operação de venda de
moeda estrangeira para fins do reinvestimento (também sujeita a registro no Bacen):
“1. São registradas no item investimento do módulo IED do RDE as capitalizações e
as aquisições com utilização de rendimentos auferidos e não capitalizados por investi-
dor não residente em empresas receptoras no País, oriundos de distribuição de lucros
ou de pagamento de juros sobre capital próprio.
2. O registro da reaplicação desses rendimentos em qualquer empresa no País deve
ser precedido pela realização de lançamento, com essa destinação, no registro de ori-
gem dos rendimentos auferidos.
3. O valor da contrapartida em moeda estrangeira do registro de que trata esta sub-
seção é calculado mediante aplicação da taxa cambial média disponível na opção 5

7
RMCCI. Título 3 - Capitais Estrangeiros no País; Capítulo 4 - Capital em moeda nacional - Lei nº 11.371/2006.
8
RMCCI. Título 3 - Capitais Estrangeiros no País; Capítulo 2 - Investimento Estrangeiro Direto; Seção 5 - Remessas
ao exterior de lucros e dividendos, de juros sobre o capital próprio e de retorno de capital.
da transação PTAX800 do Sisbacen, válida para o dia da integralização do capital ou
da aquisição de participação.”9
Assim, na medida em que o item 3, acima, se refere à conversão em reais do
valor reinvestido a uma taxa cambial ali estabelecida, ele está na verdade obrigan-
do o contribuinte não residente a realizar uma operação de compra de moeda es-
trangeira simultânea com uma de venda (ainda que simbólica).
Isso faz aplicar-se o dispositivo do RIOF supramencionado (inciso XIX) e, por-
tanto, gera incidência a alíquota zero tanto na saída dos recursos (ou remessa ao
exterior com a compra de moeda estrangeira) como na entrada, praticamente si-
multânea, dos mesmos recursos (com a venda de moeda estrangeira e compra de
reais) para o reinvestimento desta quantia na empresa pagadora.
A antiga regulação cambial sobre o tema possuía a exata mesma racionalidade.
O tema da capitalização de JCP pagos a investidor estrangeiro era antes regulado
pela Circular Bacen 2.722/1996, materialmente igual à regulação atual feita pelo
RMCCI atual, com poucas alterações de forma. Vale a pena conferir esta regulação
pretérita:
“Art. 2º A remessa de juros a investidor estrangeiro, a título de remuneração de capital
próprio, ou o registro das capitalizações desses juros, terão como limite o percentual
da participação registrada do investidor estrangeiro aplicado sobre a parcela paga, cre-
ditada ou capitalizada pela empresa receptora do investimento, não podendo exceder
os limites de dedutibilidade como despesa financeira fixados na legislação do impos-
to de renda das pessoas jurídicas.
Parágrafo único. O valor dos juros a que se refere este artigo, que de acordo com a
legislação em vigor pode ser incorporado ao capital social ou mantido em conta de
reserva destinada a aumento de capital, quando capitalizado será registrado como
reinvestimento. (...)
Art. 4º O valor em moeda estrangeira da remessa ou do reinvestimento será obtido: (...)
II. no caso do reinvestimento, pela conversão do valor reinvestido em reais a taxa de
venda constante da transação PTAX800/Opção 5/Cotações para Contabilidade do Sis-
tema de Informações Banco Central Sisbacen correspondente a data do aumento de
capital.” (Destaque nosso)
Em suma, tanto a Circular Bacen 2.722/1996 como o atual RMCCI, quando re-
gulam como se dará o reinvestimento de JCP pagos ou creditados a investidor não
residente na sociedade pagadora, podem ser considerados como “disposição regu-
lamentar” que obrigam o contribuinte de IOF (no caso, o investidor estrangeiro) a
contratar uma operação de compra de moeda estrangeira, simultaneamente com uma
operação de venda, o que por sua vez faria incidir o IOF a alíquota zero em ambas
as operações, nos termos do art. 15-A, XIX, do RIOF.
Vale destacar julgado de recurso repetitivo da seara do Ministro Luiz Fux do
Superior Tribunal de Justiça à época (e atualmente Ministro do Supremo Tribunal
Federal) que reconheceu a incidência tributária em operação simbólica de câmbio,
mas no que tange a antiga CPMF. Vejamos:

9
RMCCI. Título 3 - Capitais Estrangeiros no País; Capítulo 2 - Investimento Estrangeiro Direto; Seção 2 - Registro
de Investimento; Subseção 3 - Rendimentos auferidos por investidor não residente em empresas receptoras no País.
“5. Assim, a conversão dos créditos (oriundos de empréstimo) em investimento exter-
no direto concretiza-se mediante a realização de operações simultâneas de compra e
venda de moeda estrangeira (sem expedição de ordem de pagamento do ou para o ex-
terior), consubstanciadas em lançamentos fictícios de entrada e saída de recursos, a
saber: (i) a transferência, pela empresa brasileira receptora do investimento (devedora
do empréstimo), ao investidor não residente ou investidor externo (credor do emprés-
timo), do valor correspondente ao pagamento da dívida principal e juros, para quita-
ção e baixa na pendência; e (ii) o recebimento, pela empresa receptora (devedora na
primeira transação), da quantia, disponibilizada pelo investidor externo (credor naque-
la), para integrar o capital societário.”10
Neste julgado percebe-se que o Ministro admite tal incidência tributária sobre
remessas fictas, mas afasta a isenção no caso por inexistir previsão no que tangia à
CPMF. Outrossim, no caso ora analisado pelo presente estudo, o Regulamento do
IOF prevê a mesma incidência tributária nestas “remessas fictas”, não se está aqui
argumentando-se que estamos diante de hipótese de não incidência de IOF/Câmbio,
muito pelo contrário, concordamos com o Ministro; incidência há!
Entretanto, para o IOF a alíquota a ser aplicada é zero, o que gera a incidência
normativa da hipótese de incidência tributária, mas com a mutilação parcial do as-
pecto quantitativo do consequente normativo, tendo em vista que a alíquota a ser
aplicada seria zero. Consequentemente, não se gera obrigação tributária alguma,
logo, o crédito tributário sequer é constituído.
Ademais, cumpre destacar que tal entendimento se coaduna expressamente com
nossa Carta Magna de 1988 em seu art. 172, que dispõe: “a lei disciplinará, com
base no interesse nacional, os investimentos de capital estrangeiro, incentivará os
reinvestimentos e regulará a remessa de lucros.”
Ora, uma vez que temos uma incidência a alíquota zero de tributo com forte
caráter extrafiscal como o IOF, está-se, na verdade, incentivando que este capital seja
reinvestido no Brasil, exatamente o que se argumenta no presente estudo, já que por
se tratar de remessa ficta, os valores e haveres não deixarão fisicamente o Brasil,
mas serão reinvestidos na própria atividade empresarial.
Esta é a razão pela qual discordamos da incidência tributária de IRRF nesta
operação de remessa ficta. Pensamos que há disponibilidade jurídica do investidor
estrangeiro sobre estes haveres (já que é ele que decide se reinvestirá o montante
recebido ou não na empresa pagadora de JCP), e, logo, resta caracterizado o aspec-
to material da hipótese de incidência do Imposto sobre a Renda (IR), o que gera a
obrigação da retenção na fonte do IR devido. No entanto, como forma de incentivo
aos agentes internacionais a manterem seus recursos investidos no Brasil, deveria
haver política pública isentando a operação de reinvestimento deste IRRF para fins
de dar máxima concretude ao dispositivo constitucional ora citado, o art. 172 da
Carta Cidadã.

8. Considerações Finais
Ante o exposto, buscou-se demonstrar que o JCP é instituto jurídico que pode
ser muito utilizado pela administração das sociedades.

10
REsp 1.129.335/SP.
O recente posicionamento do STJ sobre o pagamento de JCP referentes a perío-
dos pretéritos pode ser utilizado a fim de reduzir significativamente a base de cál-
culo dos tributos incidentes sobre o lucro das empresas.
Além de tudo isso, conforme se tentou demonstrar, ainda que este pagamento
seja realizado a investidor não residente, deve incidir a dupla alíquota zero do IOF/
Câmbio nesta operação ficta de câmbio.
É importante, neste momento final da exposição, lembrar que a legislação que
regula o pagamento de JCP não obrigatoriamente exige que o JCP seja “pago” ao
acionista, mas ela dispõe clara e expressamente que o JCP deve ser “pago ou credi-
tado”.
Esta é uma diferença fundamental, pois o Fisco poderia argumentar, glosando
todas as deduções, que este dinheiro não foi de fato para a empresa recebedora, uma
vez que somente transitou pelo balanço de ambas as empresas, pagadora e recebe-
dora, nunca sequer saindo do saldo de “Contas a pagar” da empresa pagadora, por
exemplo.
Entretanto, quando a lei autoriza não só o “pagamento”, mas também o “credi-
tamento”, ela está colocando não a obrigação de pagar efetivamente à empresa, con-
tra “bancos” ou “caixa”, mas sim colocando uma opção entre o efetivo pagamento
desta forma, ou pelo creditamento como uma obrigação da empresa pagadora con-
tra a recebedora.
Em outras palavras, devemos nos atentar para a redação da Instrução Normati-
va SRF 93/1997 em seu art. 30 quando expressa que os JCP, para serem dedutíveis,
podem ser “pagos ou creditados”, o que gera na verdade a opção ao administrador
a utilizar quaisquer dos dois institutos jurídicos, o pagamento efetivo com saída de
caixa, ou o mero crédito, sem a respectiva saída de caixa, mas com o efetivo regis-
tro da obrigação. Em ambos os casos, de acordo com a Lei e com a Instrução Nor-
mativa, existe o direito a dedutibilidade.
Assim, cremos que se abre uma boa opção às empresas a utilização dos JCP
como forma de planejamento tributário.
Reconsiderações sobre a
Neutralidade Tributária*
Diego Marcel Bomfim

1. Introdução
É perceptível que a ciência do Direito Tributário no Bra-
sil vem passando, nos últimos anos, por profundas transfor-
mações. Há uma mudança de enfoque em curso1, sendo pos-
sível reconhecer-se uma preocupação maior com a função,
sem deixar de lado, no entanto, as ferramentas que a análise
estrutural do Direito propicia2.
Por isso mesmo, a função exercida pelos tributos passa
a ser reconhecida como elemento de extrema importância na
identificação das formas de incidência das regras e dos prin-
cípios constitucionais, sendo certa a existência de caminhos
diversos quando se está diante de uma tributação funcional-
mente identificada com a fiscalidade ou com a extrafiscali-
dade3, mesmo que se tenha em mente a necessidade de res-
peito ao regime tributário em ambos os casos4.
Essa guinada vem permitindo análises focadas na inte-
ração das normas tributárias com normas tradicionalmente
reputadas como pertencentes a outros ramos do Direito po-
sitivo, como dão conta estudos que passam a considerar
como critério de validade dos tributos a correta aplicação
constitucional dos recursos arrecadados5 (Direito Tributário

* Este artigo foi apresentado, originalmente, como exigência parcial para aprovação
na disciplina “Desenvolvimento Econômico e Tributação”, oferecida pelos Profes-
sores Luís Eduardo Schoueri e Paulo Ayres Barreto no âmbito do programa de pós-
graduação em Direito da Universidade de São Paulo. Sua publicação não deixa de Diego Marcel Bomfim
ser uma homenagem ao franco debate de ideias proporcionado, em que o argumento é Doutorando em
de autoridade não se fez presente, indicando-se a todos que ali, verdadeiramente, Direito Tributário pela
se fazia ciência. USP, Mestre em
1
Sobre a superação de paradigmas na ciência do Direito Tributário, cf. BOMFIM,
Direito Tributário pela
Diego. Tributação e Livre Concorrência. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 63-74.
2
BOBBIO, Norberto. Da Estrutura à Função: Novos Estudos de Teoria do Direito. PUC/SP, Professor
São Paulo: Manole, 2007, passim. Cf. também CARVALHO, Cristiano Rosa de. Substituto de
Teoria da Decisão Tributária. Tese (Livre-docência). São Paulo: Universidade de Legislação Tributária
São Paulo - USP, 2010, pp. 133-152. da Universidade
3
Nesse sentido, por todos, cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias In-
dutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005, pp. 225-326; e Federal da Bahia -
ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, UFBA, Professor da
2008, pp. 347-354. Escola Paulista de
4
Cf. ATALIBA, Geraldo. Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. São Paulo: Direito - EPD e do
RT, 1968, pp. 156 e ss; e CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Lin-
Instituto Brasileiro de
guagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 241.
5
BARRETO, Paulo Ayres. Contribuições: Regime Jurídico, Destinação e Contro- Estudos Tributários -
le. São Paulo: Noeses, 2006, pp. 171 e ss. Ibet e Advogado.
e Direito Financeiro), a possibilidade de utilização da tributação como instrumento
de alcance da defesa do meio ambiente6 (Direito Tributário e Direito Ambiental) e,
no que mais interessa para fins de desenvolvimento deste trabalho, as relações da
tributação com o Direito Econômico, notadamente com o princípio da livre concor-
rência7 (Direito Tributário e Direito Econômico).
É, inclusive, nesse contexto de interação que se pautam os mais recentes estu-
dos sobre o chamado princípio da neutralidade tributária, sacado como conse-
quência direta da influência do princípio da livre concorrência sobre o exercício da
competência tributária.
O objetivo deste trabalho é repensar a amplitude da neutralidade tributária, in-
dicando sua definição, sua diferenciação com os princípios da igualdade e da livre
concorrência para, só então, e reunindo esse instrumental, propor um caminho coe-
rente para justificar sua aplicabilidade em razão das funções (fiscal ou extrafiscal)
exercidas pela tributação.

2. Neutralidade em que Sentido?


A expressão neutralidade tributária é absolutamente plurívoca, atraindo seu uso
em sentidos muito diversos. Dentre esses muitos sentidos, alguns não são compatí-
veis com o ordenamento jurídico pátrio, sendo certo que outros são de difícil ou
impossível realização prática, havendo, ainda, aqueles que são, do ponto de vista
normativo, supérfluos8.
Em que sentido, então, costuma-se propugnar por uma neutralidade tributária?
Existem abordagens diversas, sendo possível destacar-se, em um primeiro momen-
to, a noção de que a neutralidade tributária impõe a conformação de um sistema tri-
butário ideal9 e, próxima a esta, a proposição segundo a qual os tributos não deve-
riam se constituir “em um elemento fundamental de decisão do agente econômico
nas suas escolhas de investimento”10.
Não há propriamente um erro na abordagem que, em verdade, denota apenas
uma predileção pela adoção de um modelo de tributação considerado mais eficien-
te do ponto de vista econômico, mas que, apesar disso, parece não ter sido prescri-
to pelo texto constitucional, o que torna a abordagem normativamente irrelevante.
Ao revés, entre o dilema (se é que assim se mostrou a decisão para o legislador cons-
tituinte) entre eficiência econômica e preservação da igualdade em matéria tributá-
ria, não há dúvida de que a decisão foi pelo segundo caminho, vedando-se, de um
lado, a existência de tributos fixos tendentes à neutralidade (lump-sum tax) em con-

6
Sobre o tema, cf. diversos trabalhos colacionados em TÔRRES, Heleno Taveira (org.). Direito Tributário Ambien-
tal. São Paulo: Malheiros, 2005.
7
Sobre o assunto, cf. BRAZUNA, José Luis Ribeiro. Defesa da Concorrência e Tributação: à Luz do Artigo 146-A
da Constituição. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 110 e ss. e o nosso BOMFIM, Diego. Tributação e Livre Con-
corrência. Op. cit., passim.
8
ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 97.
9
KAHN, Douglas A. “The Two Faces of Tax Neutrality: do They interact or are They Mutually Exclusive?” Northern
Kentucky Law Review v. 18, 1990, pp. 1-19 (1).
10
CALIENDO, Paulo. Direito Tributário e Análise Econômica do Direito: uma Visão Crítica. Rio de Janeiro: Elsevier,
2009, p. 117.
traposição ao princípio da capacidade contributiva, para, por outro, prever mecanis-
mos expressos de utilização da tributação como veículo de intervenção do Estado
sobre o domínio econômico.
Além do impedimento do ponto de vista jurídico, a utilização da expressão nesse
sentido não se mantém, já que, como atesta Douglas A. Kahn11, “a imposição de um
sistema tributário influenciará algumas decisões de mercado, não importa como o
sistema seja estruturado”.
Se nesse sentido a expressão perde em operacionalidade, a pouca doutrina que
se dedicou ao tema no Brasil passa a requalificá-la, definindo-a de maneira mais ou
menos uniforme para indicá-la (i) como norma que “exige repercussão fiscal equâ-
nime entre os agentes econômicos”12; (ii) no sentido de “que produtos em condições
similares devem ser submetidos a mesma carga fiscal”13; (iii) como uma norma que
visa “garantir um ambiente de igualdade de condições competitivas”, impondo que
“produtos em condições similares devem ser submetidos à mesma carga fiscal”14; e
(iv) como “um elemento em favor da concorrência, que acaba garantindo a igual-
dade de oportunidades no mercado”15.
Passa-se a defender, portanto, a existência de uma acepção específica para o
termo neutralidade tributária, tomado como uma norma que impõe um tratamento
tributário pelo Estado em igualdade de condições, retirando-se fundamento para
tanto na neutralidade concorrencial do Estado que, como defende Eros Roberto
Grau16, é um dos sentidos de alcance do princípio da livre concorrência.
Essa acepção específica, portanto, tem de ser concatenada com o princípio da
livre concorrência, sob pena de encarar-se a neutralidade tributária como um novo
nome para designar-se o princípio da igualdade em matéria tributária, o que torna-
ria o emprego da expressão absolutamente despiciendo e desaconselhável. Essa ideia
também é percebida por Humberto Ávila17, quando afirma ser a neutralidade “uma
manifestação estipulada da própria igualdade na sua conexão com o princípio da
liberdade de concorrência” e por Luís Eduardo Schoueri18, para quem “tem-se, pois,
um sentido próprio para a neutralidade tributária, tendo em vista seu viés concor-
rencial”19.

11
No original: “the imposicion of a tax system will influence some market decisisons no matter how the system is de-
signed”. Cf. KAHN, Douglas A. “The Two Faces of Tax Neutrality: do They interact or are They Mutually Exclusi-
ve?” Op. cit., p. 11 (tradução livre). Cf., ainda, STIGLITZ, Joseph E. Economics of the Public Sector. 3ª ed. Nova
Iorque/Londres: W. W. Norton, 1999, pp. 462-463.
12
ZILVETTI, Fernando Aurelio. “Variações sobre o Princípio da Neutralidade no Direito Tributário Internacional”.
Direito Tributário Atual nº 19. São Paulo: Dialética, 2005, pp. 24-40 (27), 2005.
13
CALIENDO, Paulo. “Princípio da Neutralidade Fiscal: Conceito e Aplicação”. In: PIRES, Adilson Rodrigues; e
TÔRRES, Heleno Taveira (orgs.). Princípios de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, pp.
503-540 (537).
14
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Livre Concorrência e Tributação”. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes
Questões Atuais do Direito Tributário. V. 11. São Paulo: Dialética, 2007, pp. 241-271 (254).
15
ELALI, André. “Algumas Considerações sobre Neutralidade e Não-discriminação em Matéria de Tributação”. Re-
vista Tributária e de Finanças Públicas nº 85. São Paulo: RT, março/abril de 2009, pp. 26-40.
16
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 204.
17
ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. Op. cit., p. 99.
18
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Livre Concorrência e Tributação”. Op. cit., p. 255.
19
Também no mesmo sentido de existência de uma ligação entre neutralidade tributária e o princípio da livre concor-
rência, cf. DERZI, Misabel Abreu Machado. “Não-cumulatividade, Neutralidade, PIS e Cofins e a Emenda Consti-
Nesse caso, ainda que se reconheça a estreita ligação entre neutralidade tribu-
tária e o princípio da livre concorrência, é importante esclarecer suas diferenças e
suas zonas de aplicabilidade, sob pena de se incorrer em contradições internas ou
afirmações vazias que nada contribuem para a correta interpretação do direito pos-
to.

3. Livre Concorrência, Neutralidade Concorrencial e Neutralidade


Tributária
Não há como interpretar corretamente o princípio da livre concorrência sem
antes tomar contato com o desenho da ordem econômica prescrita pelo texto cons-
titucional que, conforme seu art. 170, além de fundada na valorização do trabalho e
na livre iniciativa, tem como objetivo assegurar a todos a existência digna, confor-
me os ditames da justiça social, desde que respeitada uma série de outros princípios,
dentre os quais se insere a livre concorrência.
Há, por assim dizer, um escalonamento constitucional indicando a existência de
três vetores diferentes de conformação da ordem econômica que deve ser levada em
consideração pelo intérprete, sobressaindo-se, portanto, a necessidade de valoriza-
ção do trabalho humano e preservação da livre iniciativa20.
É a partir desses pressupostos que se inicia o percurso para que a correta gera-
ção de sentido seja realizada, indicando-se o delineamento do princípio da livre
concorrência, sacado e tomado como elemento integrante de uma ordem econômi-
ca detidamente traçada pelo texto constitucional.
De plano, é importante estabelecer que, diversamente do que uma leitura rápi-
da pode sugerir, a livre concorrência não permite uma concorrência ilimitada e des-
regrada entre os diferentes agentes econômicos. O vocábulo livre da expressão não
deve ser entendido neste sentido, havendo, em verdade, de se fixar a noção de que a
livre concorrência funciona como um delineador - e também garantidor - da própria
liberdade do particular de atuar no domínio econômico, parcela de liberdade, por-
tanto, tomada como reflexo da livre iniciativa.
Fala-se em delinear porque o princípio da livre concorrência impõe restrições,
conformações, tangenciamentos à livre iniciativa, garantindo, em um raciocínio cir-
cular, que esta seja mantida. A livre iniciativa, então, protege a liberdade de atua-
ção do particular no domínio econômico, desde que esta atuação não macule a li-
vre concorrência. Ou de outro modo, a livre concorrência limita a livre iniciativa de
alguns para que a livre iniciativa de todos seja preservada, mantendo-se de maneira
universal.

tucional nº 42/03”. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. V. 8.
São Paulo: Dialética, 2004, pp. 339-355 (346).
20
Como afirma Tércio Sampaio Ferraz Júnior, “não se contrapõem aos fundamentos da ordem, mas dão-lhes o seu es-
paço relativo. Cumpre ao Estado assegurar os fundamentos, a partir dos princípios. Não se pode, por isso, em nome
de qualquer deles eliminar a livre iniciativa nem desvalorizar o trabalho humano.” (FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sam-
paio. “Congelamento de Preços - Tabelamentos Oficiais”. Revista de Direito Público nº 91. São Paulo, 1989, pp.
76-86 (78))
Isso conduz à interpretação, assente na doutrina21 e confirmada pela legislação
ordinária22, que o princípio da livre concorrência não tutela um direito subjetivo dos
concorrentes, mas, antes disso, a preservação de um mercado ajustado que tenha o
condão de fomentar o alcance dos objetivos da ordem econômica. Por isso, fala-se
em livre concorrência como um princípio instrumental.
O mercado, tomado como patrimônio nacional23, portanto, é que deve ser pro-
tegido pelo princípio, sendo possível falar-se até mesmo na permissão de condutas
restritivas da concorrência quando, por outro lado, estiverem presentes benefícios
ao mercado como um todo. Como afirma Paula A. Forgioni24, “nossa lei antitruste,
assim como os sistemas norte-americano e europeu, também prevê sistema de via-
bilização de práticas que, embora restritivas da concorrência, encerram eficiências
compensatórias”.
Por isso mesmo, a Lei nº 8.884/1994 estabelece, em um primeiro momento (art.
20), que constitui infração à ordem econômica limitar, falsear ou de qualquer for-
ma prejudicar a livre concorrência para, em seguida (art. 54), determinar que os atos
que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência poderão
ser autorizados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica - Cade, desde
que:
i) tenham por objetivo, cumulada ou alternativamente:
i.a) aumentar a produtividade;
i.b) melhorar a qualidade de bens e serviços; ou
i.c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico;
ii) gerem benefícios distribuídos de maneira equitativa entre os seus participan-
tes, de um lado, e os consumidores ou usuários finais, de outro;
iii) não impliquem eliminação da concorrência de parte substancial de merca-
do relevante; e
iv) sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os obje-
tivos visados25.
Nessa linha, ainda que se extraia uma primeira definição do princípio da livre
concorrência tomado como um “princípio jurídico capaz de preservar uma compa-
tibilidade concorrencial entre os agentes econômicos, conduzindo-os a uma igual-
dade de condições de competir”26, é preciso entender que sua aplicabilidade é maior.

21
DUTOIT, Bernard. “O Direito da Concorrência Desleal e a Relação de Concorrência; Dupla Indissociável? Uma
Perspectiva Comparativa”. Revista dos Tribunais v. 717. São Paulo, 1995, pp. 7-18 (16); e FORGIONI, Paula A. Os
Fundamentos do Antitruste. 3ª ed. São Paulo: RT, 2008, pp. 190-191.
22
A Lei nº 8.884/1994, em seu art. 1º, parágrafo único, determina que a coletividade é a titular dos bens jurídicos pro-
tegidos pela lei de defesa concorrencial.
23
A Constituição Federal, em seu art. 219, determina que “o mercado interno integra o patrimônio nacional e será in-
centivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a auto-
nomia tecnológica do País, nos termos de lei federal”.
24
FORGIONI, Paula A. Os Fundamentos do Antitruste. Op. cit., pp. 190-191.
25
A lei permite ainda a substituição de um dos requisitos acima indicados pela demonstração de que o ato é necessário
por motivo preponderante da economia nacional e do bem comum, e desde que este não implique prejuízo ao consu-
midor ou usuário final.
26
BOMFIM, Diego. Tributação e Livre Concorrência. Op. cit., p. 179. No mesmo sentido, cf. BUNTE, Hermann-Jo-
sef. “La Tutela della Libertà di Concorrenza in Germania”. Costituzione Economica e Libertà di Concorrenza.
O dever de o Estado tratar os concorrentes em igualdade de condições27 (neutrali-
dade concorrencial), inclusive por meio do exercício da competência tributária (neu-
tralidade tributária), é apenas um dos sentidos do princípio da livre concorrência,
como já foi dito.
Desdobrado como uma faceta do princípio da livre concorrência, a neutralida-
de concorrencial do Estado tem como função garantir que o ente estatal não interfi-
ra negativamente na consecução ou preservação da livre concorrência.
Se um dos princípios retores da ordem econômica é justamente a livre concor-
rência, o próprio ente público deve se pautar em suas relações com os particulares
de modo a não ser um agente fomentador de desequilíbrios, uma vez que “se o prin-
cípio da livre concorrência é prestigiado pela Ordem Econômica, justificando as
normas tributárias que o procurem alcançar, é coerente admitir que não deve a mes-
ma norma tributária atuar em sentido diverso daquela meta”28.
É por essa razão que Tércio Sampaio Ferraz Júnior29 confirma que “da livre con-
corrência decorre, assim, a exigência de imparcialidade dos atos impositivos (sobe-
ranos) do Estado em face dos concorrentes”.
A neutralidade concorrencial do Estado, então, garante aos concorrentes um tra-
tamento estatal em igualdade de condições, o que faz nascer um dever de análise
dos efeitos concorrenciais que atos do Poder Público são capazes de gerar, já que
não devem funcionar como fomentadores de privilégios entre concorrentes.
No entanto, a existência de igualdade de condições entre dois concorrentes é,
reitere-se, apenas uma faceta do princípio da livre concorrência, sem que possa ser
feita uma correspondência biunívoca entre igualdade de condições (incluída a ne-
cessidade de repercussão fiscal equânime entre os agentes econômicos30 - neutrali-
dade tributária) e o princípio da livre concorrência31.
É preciso ficar claro que o princípio da livre concorrência, sendo um instrumento
para consecução dos fins últimos da ordem econômica, garante, inicialmente, um
tratamento dos concorrentes em igualdade de condições, impondo que produtos em

MEZZETI, Luca (org.). Torino: G. Giappichelli, 1994, pp. 3-34 (3); e GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na
Constituição de 1988. Op. cit., p. 210.
27
É preciso que fique clara a inexistência de autorização constitucional para que o princípio da livre concorrência seja
utilizado como fundamento de validade para que planificações entre concorrentes sejam realizadas pelo Estado, sob
pena de ofensa ao princípio da livre iniciativa. O princípio da livre concorrência, em um de seus sentidos, impõe que
o Estado trate os concorrentes em igualdade de condições, o que é muito diferente de impor a existência de igualda-
de entre os próprios concorrentes. A igualdade, portanto, é das condições de competitividade, nunca dos competido-
res, que poderão se destacar, seja pela redução de preços, melhores condições de pagamento, ou pela melhoria dos
produtos e serviços comercializados, tudo na tentativa de conquistar o mercado.
28
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Livre Concorrência e Tributação”. Op. cit., p. 255.
29
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. “Obrigação Tributária Acessória e Limites de Imposição: Razoabilidade e Neu-
tralidade Concorrencial do Estado”. In: TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Teoria Geral da Obrigação Tributária -
Estudos em Homenagem ao Professor José Souto Maior Borges. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 264-280 (277).
30
ZILVETTI, Fernando Aurelio. “Variações sobre o Princípio da Neutralidade no Direito Tributário Internacional”. Op.
cit., p. 27.
31
Como será visto a seguir, poderão existir situações, como nos casos de utilização pelo Estado da tributação com an-
seios extrafiscais, em que não se terá aplicabilidade da neutralidade tributária, devendo estar presente, no entanto, o
respeito ao princípio da livre concorrência.
condições similares sejam submetidos à mesma carga fiscal32 (neutralidade tribu-
tária).
Essa aproximação inicial, no entanto, pode e deve ser afastada - não havendo
mais que se falar em igualdade de condições (e, portanto, em qualquer tipo de neu-
tralidade), quando outros valores, também consagrados pelo texto constitucional, são
contrapostos de modo a legitimar a discriminação pretendida. Neste caso, não existe
neutralidade, já que ínsita uma postura aberta e fundamentada de discriminação e
tratamento diferenciado, entrando em cena, no entanto, o próprio princípio da livre
concorrência em sua acepção própria e completa, tomado como instrumento de pre-
servação do mercado (que é, na expressão do art. 219 da Constituição, patrimônio
nacional) de modo a garantir que a ordem econômica logre seu fim: assegurar a
todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, fundando-se, para isso,
na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa.
Nessa linha, para que seja configurada o que se nomeia de ofensa própria ao
princípio da livre concorrência é necessário mais do que a constatação da presença
de condições desiguais entre os concorrentes, não podendo o princípio ser tomado,
estritamente, como um princípio garantidor de igualdade de parâmetros aos agen-
tes econômicos. Para que se caracterize ofensa própria ao princípio, é necessário que
a vantagem competitiva (que pode ou não ser gerada pelo exercício da competên-
cia tributária) seja de tão alto grau, que gere, ou seja capaz de gerar, uma restrição
ao exercício de atividade econômica por parte de determinado concorrente, malfe-
rindo, em última análise, a livre iniciativa, o mercado e a sociedade como um todo,
já que, como já foi abordado, o princípio da livre concorrência tem caráter instru-
mental.
Conclui-se, então, pela necessidade de demarcar com rigor os limites e ampli-
tudes do princípio da livre concorrência, de um lado, e da neutralidade concorren-
cial e seu corolário em matéria fiscal, a neutralidade tributária, de outro.
O princípio da livre concorrência em matéria tributária pode se manifestar im-
pondo aos entes detentores de competência tributária limites negativos, ora impe-
dindo um tratamento não igualitário no âmbito da tributação com função fiscal (neu-
tralidade tributária), ora servindo como um dos parâmetros de avaliação da juridi-
cidade da discriminação empreendida por uma tributação com anseios extrafiscais,
além de legitimar a tomada de posturas positivas pela utilização de normas tributá-
rias indutoras que tenham como fundamento a preservação da livre concorrência.
Os campos de aplicabilidade são diversos, sendo, por isso, salutar manter-se o em-
prego das duas expressões, desde que fixados os seus sentidos conforme se preten-
deu realizar.

4. Neutralidade Tributária e Fiscalidade


Como foi demonstrado, há uma sensível diferença entre o princípio da livre
concorrência e um dever de neutralidade tributária por parte do Estado.

32
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Livre Concorrência e Tributação”. Op. cit., p. 254.
Enquanto a neutralidade tributária impõe, nos termos, inclusive, do que a dou-
trina propugna, uma necessidade de tratamento por parte do Estado em igualdade
de condições para agentes em condições similares, o princípio da livre concorrên-
cia aplicado em matéria tributária é avaliado de outra forma, impedindo que a tri-
butação seja um elemento causador de prejuízos efetivos à livre iniciativa de alguns,
prejudicando o mercado.
Daí decorre a premissa fundamental na interpretação deste princípio atrelado às
normas tributárias: a simples constatação de regimes tributários diferenciados não
legitima que se fale, a priori, em ofensa ao princípio da livre concorrência. Dife-
renciar, portanto, entre neutralidade tributária e livre concorrência é fundamental
porque quando se exige neutralidade tributária, a mera demonstração de existência
de cargas tributárias diversas é elemento capaz de demonstrar ofensa ao ditame
normativo, o que não ocorre quando a questão é contraposta ao princípio da livre
concorrência.
O princípio da neutralidade tributária deve ser entendido como um delineador
do exercício da competência tributária com anseios fiscais, impondo a realização da
neutralidade concorrencial do Estado, tendo em vista o dever estatal de tratar com
imparcialidade os agentes econômicos alocados numa mesma situação, não geran-
do, portanto, por meio de seus tributos, privilégios desarrazoados que possam ferir
o princípio da livre concorrência, tomado aqui como princípio jurídico que garante
a igualdade de condições para os agentes econômicos, competidores de um mesmo
mercado. Esse dever será alcançado pela instituição de uma tributação com respei-
to ao princípio da igualdade e seu corolário, o princípio da capacidade contributi-
va.
É que no caso do exercício da competência tributária, funcionalmente identifi-
cada com anseios fiscais, não há, em jogo, qualquer outro valor, traduzido por um
princípio jurídico, que possa ser contraposto a uma possível constatação de desigual-
dade entre concorrentes. Em matéria de tributação com anseios fiscais, a própria
Constituição Federal impôs o critério de discrímen que deve ser utilizado na dife-
renciação e, portanto, na realização do próprio princípio da igualdade. Trata-se da
capacidade econômica dos contribuintes.
Aqui, o objetivo principal e destacado da tributação é angariar recursos, não
havendo, pelo menos não intencionalmente, pretensões indutoras. Há, portanto,
nesse caso, uma aproximação entre o princípio da neutralidade tributária e o prin-
cípio da igualdade.
Uma tributação com anseios fiscais respeitará o princípio da neutralidade tribu-
tária na medida em que se mostrar condizente com o princípio da igualdade tribu-
tária, não havendo diferenciações tributárias injustificadas ou não homologadas pelo
sistema normativo.
A neutralidade tributária, então, é, em última análise, tomada com uma regra
jurídica que impede a utilização da tributação como instrumento de indução com-
portamental sem que existam justificativas, também prescritas pelo ordenamento,
para tanto (quando se passaria à seara da extrafiscalidade). Trata-se de um critério
objetivo prescrito pelo texto constitucional para a própria aplicação da igualdade
tributária, conformando, na expressão de Humberto Ávila, numa espécie de igual-
dade-regra33. Essa interpretação da neutralidade é relevante do ponto de vista jurí-
dico porque, em primeiro lugar, indica esse critério como elemento objetivo e defi-
nitivo, devendo ser levado em consideração pelo legislador sem chances de sopesa-
mentos (natureza de regra), depois, porque trabalha com a diferenciação entre neu-
tralidade e livre concorrência, contribuindo para que afirmações vazias de ofensa à
livre concorrência não sejam realizadas apenas para fins retóricos, quando, em ver-
dade, a tributação (nesse caso, em vista de possuir fins fiscais) deveria ser analisa-
da apenas através deste instrumento que é a neutralidade tributária.
Ainda que reconheça uma maior importância deste aspecto negativo da neutra-
lidade tributária (como limite ao exercício da competência tributária), parte da dou-
trina entende pela existência de um aspecto positivo, de onde seria extraído funda-
mento de validade para que os tributos fossem utilizados como instrumentos de
equalização pelo Estado de eventuais distúrbios concorrenciais.
Sobre este aspecto positivo, Gerd Rothmann34 afirma que “os impostos devem
ajudar a frear e, na medida do possível, eliminar tendências enfraquecedoras da
concorrência e, ainda, ajudar a fomentar todas as tendências que aumentam a con-
corrência”. Não há equívoco na frase. Os tributos podem ser utilizados como ins-
trumentos de indução comportamental, podendo buscar fundamento de validade na
ordem econômica que, em vista de expressa prescrição constitucional, indica a li-
vre concorrência como um dos princípios.
A utilização da tributação como instrumento de promoção da concorrência, no
entanto, encontra limites muito rígidos. É que, como vem sendo exposto, o ordena-
mento não impõe uma igualdade ou planificação dos agentes econômicos, mas ape-
nas que sejam oferecidas condições de igualdade, inclusive quando a óptica é o tra-
tamento tributário ditado pelo ente estatal. Em assim sendo, uma atuação positiva
do Estado como instrumento de correção da concorrência, ainda que em tese seja
possível, deve ser altamente fundamentada, sob pena de se instalar no Brasil um
dirigismo fiscal não homologado pelo texto constitucional35. É preciso lembrar que
a tributação não pode ser individualizada, mas geral, ponto que afasta o uso da tri-
butação como instrumento de correção concorrencial em um grande volume de ca-
sos.
É de se afirmar que, ainda que tais distúrbios advenham de práticas abusivas
empreendidas por agentes de mercado, gerando distúrbios concorrenciais endóge-
nos36, a tributação será incapaz de intervir, sob pena de transmudar-se o tributo em
sanção, fato que contraria frontalmente o Código Tributário Nacional, bem como o
regime jurídico tributário prescrito pela Constituição Federal.

33
ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. Op. cit., p. 136.
34
Cf. ROTHMANN, Gerd Willi. “Tributação, Sonegação e Livre Concorrência”. In: FERRAZ, Roberto (coord.). Prin-
cípios e Limites da Tributação 2: os Princípios da Ordem Econômica e a Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2009,
pp. 331-371 (342).
35
Cf. FERRAZ, Roberto. “Intervenção do Estado na Economia por Meio da Tributação: a Necessária Motivação dos
Textos Legais”. Direito Tributário Atual nº 20. São Paulo: Dialética, 2006, pp. 238-252.
36
Para uma diferenciação entre distúrbios concorrenciais endógenos e exógenos, cf. BOMFIM, Diego. Tributação e
Livre Concorrência. Op. cit., pp. 192-196.
A tributação, em verdade, deve funcionar como um instrumento de fomento para
que distúrbios concorrenciais exógenos (causados pela própria atuação do Estado)
sejam afastados, o que implica oferecer tratamento em igualdade de condições, ainda
que pela adoção de posturas positivas, sem que, no entanto, seja possível fundamen-
tar tal emprego da tributação como elemento de planificação entre os concorrentes-
contribuintes.

5. Livre Concorrência e Extrafiscalidade


Como foi exposto ao longo do presente texto, toma-se como pressuposto que o
princípio da livre concorrência, quando contraposto às normas de Direito Tributá-
rio, apresenta-se de maneira diversa em razão das funções (fiscal ou extrafiscal) a
serem exercidas pela tributação. Numa tributação funcionalmente identificada com
a fiscalidade, o princípio da livre concorrência se manifesta mediante um dever de
neutralidade concorrencial do Estado ante a tributação (neutralidade tributária),
entendido como uma regra jurídica que garante aos concorrentes uma igualdade de
tratamento tributário, nos mesmos termos, inclusive, do que propugna os escritos
brasileiros anteriormente citados37.
Diversamente, na tributação voltada à concretização de induções comportamen-
tais, o princípio da livre concorrência não se manifesta mediante o dever de neutra-
lidade, mas como um dos princípios jurídicos que serão levados em consideração
quando da instituição ou majoração do tributo e, ainda, em eventual revisão judi-
cial. A existência de normas tributárias indutoras, seja pela técnica de agravamen-
tos ou de incentivos, pressupõe, pelo menos potencialmente, a discriminação de pes-
soas, atividades ou bens em função do objetivo almejado, impossibilitando a exis-
tência de uma neutralidade tributária. Na expressão de Fernando Aurelio Zilveti38,
“a indução é a antítese da neutralidade”.
Claro que se poderia argumentar que a neutralidade tributária, nesse caso, de-
veria ser encarada como um ideal a ser alcançado em sua máxima medida, sendo
entendida como um objetivo a ser perquirido mesmo na extrafiscalidade. Essa in-
terpretação, no entanto, passa por uma redefinição drástica do conceito de neutrali-
dade, tomando-a como sinônimo do princípio da igualdade tributária, já que a ne-
cessidade de igualdade de condições (como é entendida a neutralidade) seria reali-
zada, assim como o próprio princípio da igualdade na máxima medida possível.
A neutralidade tributária (tomada como espécie da neutralidade concorrencial
do Estado) é apenas um dos sentidos de alcance do princípio da livre concorrência,
tido como garantia (uma regra) de tratamento tributário em igualdade de condições.
Permitida a discriminação tributária com base em outros princípios constitucionais,
a neutralidade tributária como instrumento de alcance do princípio da livre concor-
rência perde sentido.
Na tributação extrafiscal, o princípio da livre concorrência não será alcançado
pela via da neutralidade tributária, já que pressuposto o tratamento tributário desi-

37
Cf. item 2 supra.
38
ZILVETI, Fernando Aurelio. “Variações sobre o Princípio da Neutralidade no Direito Tributário Internacional. Op.
cit., p. 26.
gual (seja por agravamentos ou incentivos), mas sim pela admissão de sopesamen-
to do próprio princípio da livre concorrência com os demais princípios constitucio-
nais utilizados na fundamentação da extrafiscalidade.
Essa forma de apresentar a matéria tem a vantagem de indicar que, numa tribu-
tação funcionalmente identificada com a fiscalidade, o tratamento sempre (como
uma consequência definitiva) deverá respeitar a regra da neutralidade, não havendo
possibilidades de sopesamentos ou flexibilizações interpretativas. Trata-se, em uma
classificação baseada no modo final de aplicação das normas39, de uma regra, não
de um princípio, de um parâmetro inafastável de aplicação do princípio da igualda-
de toda vez que se estiver diante de uma tributação funcionalmente identificada com
a fiscalidade.
A tributação, nestas hipóteses, não poderá de forma alguma servir como elemen-
to de discriminação entre contribuintes que estejam na mesma situação, não podendo
servir como instrumento de desequilíbrio concorrencial. Aqui, o critério de discri-
minação que pode ser utilizado já foi eleito pelo texto constitucional: a capacidade
contributiva de cada um dos contribuintes.
Diversamente, na extrafiscalidade, tem-se um tratamento em desigualdade de
condições sem que, infalivelmente, possa falar-se em ofensa ao princípio da igual-
dade. Uma coisa é impor ao ente detentor de competência tributária um dever de
tratamento tributário (de bens ou pessoas) em igualdade de condições, outra bem
diferente é impor a este mesmo ente o respeito ao princípio da igualdade tributária.
O primeiro limite (tomado como regra) deve estar sempre presente apenas numa
tributação voltada à fiscalidade ( já que um tratamento diferenciado na extrafiscali-
dade é evidente), o segundo, por sua vez, tomado como autêntico princípio, deve ser
sempre levado em consideração, sendo aplicado em sua máxima medida de acordo
com as condições fáticas e jurídicas do caso concreto.
Um exemplo pode esclarecer o comentário. O texto constitucional prevê uma
clara possibilidade de manejo da tributação com anseios extrafiscais, permitindo em
seu art. 151, inciso I, “a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o
equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País”.
Nesse caso, instituído dado incentivo fiscal, não haverá que se falar em identi-
dade de cargas fiscais (acepção em que se toma a neutralidade tributária como aci-
ma indicado). A indução, neste caso, pressupõe o tratamento desigual. Por certo que
o princípio da igualdade estará preservado, em vista de que a discriminação foi rea-
lizada com base em um critério constitucionalmente indicado como relevante pela
Constituição (tratamento favorecido com o objetivo de promover o equilíbrio so-
cioeconômico das diferentes regiões do País), não sendo certo falar-se, no entanto,
na necessidade de tratamento dos bens ou dos contribuintes em igualdade de con-
dições (com a mesma carga fiscal). Como já afirmamos em outra oportunidade,

39
Sobre o tema, cf. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São
Paulo: Malheiros, 2008, passim; SILVA, Virgílio Afonso. Direitos Fundamentais: Conteúdo Essencial, Restrições
e Eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009; e ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da Definição à Aplicação dos
Princípios Jurídicos. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
“na tributação extrafiscal, o princípio da livre concorrência não será alcançado pela via
da neutralidade tributária, já que pressuposto o tratamento tributário desigual (seja por
agravamento ou incentivos), e sim pela admissão de sopesamento do próprio do pró-
prio princípio da livre concorrência com os demais princípios constitucionais utiliza-
dos na fundamentação da extrafiscalidade”40.
Em conclusão, se a neutralidade tributária for tomada como necessidade de
igualdade de condições ou, o que é o mesmo, como uma norma que visa “garantir
um ambiente de igualdade de condições competitivas”, indicando que “produtos em
condições similares devem ser submetidos à mesma carga fiscal”41, deve ser reco-
nhecida também sua inaplicabilidade nos casos em que se estiver diante de uma tri-
butação indutora ou voltada a fins extrafiscais, como no exemplo acima indicado.
Nestes casos, o princípio da livre concorrência encontra forte campo de atua-
ção, não sendo correto falar-se, neste ponto, em livre concorrência como um prin-
cípio que prescreve um tratamento em igualdade de condições (neutralidade tribu-
tária). Esta é apenas uma de suas facetas que perde sentido na tributação extrafis-
cal. Neste ponto, o próprio princípio da livre concorrência (e não apenas uma de suas
facetas, a neutralidade concorrencial derivando a neutralidade tributária) deve en-
trar em cena, devendo ser sopesado com os demais princípios indicados pelo texto
constitucional para fins de validação da tributação indutora.
No exemplo dado, o tratamento diferenciado outorgado às empresas situadas nas
regiões menos desenvolvidas do País não pode ser questionado perante a igualdade
ou perante uma pretensa neutralidade tributária (que, claramente, não se mostra pre-
sente), mas pode e deve ser sopesado ante o princípio da livre concorrência. Deve-
rá ser ponderada, de um lado, a necessidade de desenvolvimento das regiões mais
carentes do País, sendo, de outro, levada em conta a proteção da livre concorrência.
Não há de se confundir, então, o princípio da livre concorrência em sua especí-
fica aplicação às normas tributárias com o princípio da igualdade tributária, partin-
do do raciocínio simplório de que todas as implicações entre tributação e livre con-
corrência poderiam ser dirimidas em função do princípio da igualdade.
Não é assim. O princípio da livre concorrência mantém íntima ligação como o
princípio da igualdade, mas com ele não se confunde, sendo muito mais específico
em sua zona de aplicabilidade.
Esses princípios são programados pela Constituição Federal levando-se em con-
sideração zonas de aplicabilidades diferentes, sendo certo que o próprio direito po-
sitivo é quem determina os critérios que podem ser utilizados para discriminação
em cada situação.
A fixação da diferença entre o princípio da livre concorrência e seus desdobra-
mentos - igualdade de condições para competir, princípio da neutralidade concor-
rencial do Estado e princípio da neutralidade tributária - é de extrema importância
porque o princípio da livre concorrência atua de maneira diversa sobre a tributação
na dependência da função que está sendo por essa exercida, devendo o intérprete
estar atento a isto.

40
BOMFIM, Diego. Tributação e Livre Concorrência. Op. cit., p. 199.
41
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Livre Concorrência e Tributação”. Op. cit., pp. 241-271 (254).
Esta diferenciação pode impedir, por exemplo, que sejam levantados argumen-
tos (absolutamente vazios) de ofensa à livre concorrência ante a existência de regi-
mes tributários diferenciados ou de que a neutralidade tributária (que impõe trata-
mento em igualdade de condições) legitima a utilização da tributação como instru-
mento de planificação entre concorrentes (o que, claramente, ofende a livre inicia-
tiva). Posições que, certamente, contaminam o discurso jurídico, colocando ainda
mais névoa neste assunto ainda tão pouco explorado na dogmática brasileira.

6. Conclusões
Ao final do discurso, é possível afirmar que o estudo da neutralidade tributária
no Brasil ainda se mostra carente de uma sistematização mais atenta, quando resta-
ria indicada sua amplitude, distinguindo-a dos princípios da igualdade tributária e
da livre concorrência.
Apesar disso, é possível verificar uma clara evolução doutrinária no sentido de
não tomar a expressão como representativa de inexistência de não afetação dos com-
portamentos dos agentes econômicos pela tributação. Estudos recentes publicados
no Brasil vêm aprimorando a ideia de uma correlação entre tributação e Direito
Econômico, descobrindo a importância de se estudar o Direito do ponto de vista
funcional.
Inserido nesse contexto, este artigo procurou demonstrar que só tem sentido
falar-se em neutralidade tributária, tomada como uma das vertentes do princípio da
livre concorrência que impõe um tratamento em igualdade de condições, quando se
estiver diante de uma tributação voltada a anseios fiscais, em vista de que uma tri-
butação neutra e, portanto, não distorciva da concorrência, será aquela que respeite
a igualdade tributária e, por isso, o princípio da capacidade contributiva. A neutra-
lidade, então, é vista e interpretada como um elemento objetivo restritivo de apli-
cação da igualdade tributária, como uma regra jurídica que impede a utilização da
tributação como instrumento de indução comportamental sem que existam justifi-
cativas para tanto.
Diversamente, quando se está diante de uma tributação voltada à extrafiscalidade
(o que pressupõe a existência de fundamentos constitucionais válidos que susten-
tem tal atuação), não haverá que se falar em igualdade de condições, mas no pró-
prio princípio da livre concorrência, tomado como instrumento de consecução dos
fins perseguidos pela ordem econômica, sendo este - e não uma mera faceta de neu-
tralidade - sopesado no caso concreto, quando restarão exorcizados argumentos no
sentido de que a mera constatação de tratamento desigual já é capaz, a priori, de
levar à conclusão de ofensa própria à livre concorrência.
A Ilegitimidade da Vedação à
Compensação de Créditos de Contribuição
Previdenciária com Débitos de
Outros Tributos Administrados pela
Receita Federal do Brasil
Diogo Ferraz

1. Introdução
É sabido que os contribuintes que prestam serviços que
envolvem a cessão de mão de obra sujeitam-se à retenção de
11% sobre as notas fiscais por eles emitidas aos seus contra-
tantes, os quais recolhem o valor equivalente diretamente ao
Fisco federal, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212, de 24
de julho de 1991.
Segundo o parágrafo 1º daquele mesmo art. 31 da Lei nº
8.212/1991, o valor retido pelos contratantes serve como
antecipação da contribuição previdenciária devida pelo con-
tribuinte e é “compensado (...) quando do recolhimento das
contribuições destinadas à Seguridade Social devidas sobre
a folha de pagamento dos segurados a seu serviço”.
Acontece que, não raro, as quantias retidas pelos contra-
tantes superam em muito o montante da contribuição previ-
denciária devida pelo contribuinte ao final de cada período
de apuração, de modo que nada resta a ser recolhido, surgin-
do um crédito a favor do contribuinte perante o Fisco.
Para contornar situações como esta, o art. 31, parágrafo
2º, da Lei nº 8.212/1991 prevê que o saldo remanescente
(= valor retido - contribuição efetivamente devida) será ob-
jeto de restituição.
Não obstante, essa possível restituição, que também no-
toriamente é enormemente dificultada/procrastinada pelo
Fisco federal, não é o único meio possível para que os con-
tribuintes recebam de volta os valores retidos que superaram
ou vierem a superar a contribuição previdenciária ordina-
riamente devida, pois a interpretação sistemática e confor-
me à Constituição da legislação aplicável revela o cabimen-
Diogo Ferraz to da compensação desses créditos com débitos de outros tri-
é Doutorando em butos que não as próprias contribuições previdenciárias,
Direito Financeiro e como procuraremos demonstrar.
Tributário na
Universitat de 2. A Estrutura Arrecadatória Federal e a Ilegítima
Barcelona, Mestre em Vedação à Compensação
Direito Público pela Antes do advento da Lei nº 11.457, de 16 de março de
Uerj e Advogado no 2007, havia uma forte segregação entre a gestão governa-
Rio de Janeiro e em mental das contribuições previdenciárias e a dos demais tri-
São Paulo. butos federais:
a) as contribuições previdenciárias eram fiscalizadas, arrecadadas e cobradas
pela Secretaria da Receita Previdenciária (SRP), vinculada ao INSS, e seus
débitos eram executados pela Procuradoria desta autarquia; e
b) os demais tributos federais eram fiscalizados, arrecadados e cobrados pela
Secretaria da Receita Federal (SRF) e seus débitos eram executados pela Pro-
curadoria-Geral da Fazenda Nacional.
A mencionada Lei nº 11.457/2007, no entanto, inseriu uma profunda modifica-
ção neste quadro, do que resultou o seguinte:
a) a SRF passou a se chamar Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB)
(art. 1º);
b) a RFB detém todas as competências da SRF e, também, a competência de
“tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribui-
ções sociais previstas nas alíneas ‘a’, ‘b’ e ‘c’ do parágrafo único do art. 11 da
Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991”, anteriormente exercida SRP (art. 2º,
parágrafo 1º);
c) a SRP foi extinta (art. 2º, parágrafo 4º);
d) todos os processos administrativos-fiscais referentes às contribuições pre-
videnciárias, que anteriormente ficavam a cargo da SRP, foram transferidos
para a RFB (art. 4º); e
e) a execução dos débitos de contribuições previdenciárias foi transferida da
Procuradoria-Geral Federal vinculada ao INSS para a Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional (art. 16).
Como se vê, o diploma legal em apreço unificou integralmente a administração
de todos os tributos federais em um só órgão: a Secretaria da Receita Federal (SRF),
que apenas passou a se chamar Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB).
A consequência lógica da incorporação da SRP pela SRF/RFB é que as atribui-
ções da primeira passam a se submeter às legislações e regulamentações da última.
Nesse sentido, é bem de ver que o art. 74, caput, da Lei nº 9.430, de 27 de de-
zembro de 1996, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 10.637, de 30 de de-
zembro de 2002, assim dispõe:
“Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em
julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita
Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensa-
ção de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados
por aquele Órgão.” (Destaques nossos)
Desse dispositivo, extrai-se que, caso o contribuinte possua créditos de tributos
então administrados pela SRF e passíveis de restituição, poderá, em vez de postu-
lar essa restituição, proceder à compensação com outros débitos de tributos tam-
bém administrados pela SRF.
Ora, a partir do momento em que as contribuições previdenciárias passam a ser
administradas pela SRF, órgão que apenas teve a sua denominação modificada para
RFB, fica evidente que também a elas seria aplicável o procedimento previsto do
supra transcrito dispositivo legal.
Entender que este dispositivo não alcançaria a RFB, pois que menciona expres-
samente a SRF, é de um formalismo incompatível com a racionalidade e desprovi-
do de razoabilidade, na medida em que não se pode cogitar que a simples alteração
da denominação de qualquer pessoa, seja de direito público ou de direito privado,
possa ter o condão de alterar as relações jurídicas com ela mantidas.
No entanto, ao arrepio da lógica acima, o legislador ordinário se valeu da tática
chamada “Cavalo-de-Troia”, ao inserir, em um capítulo da mesma Lei nº 11.457/2007
completamente estranho à matéria da compensação (“Do Processo Administrativo-
fiscal”), a previsão de que o art. 74 da Lei nº 9.430/1996 não se aplicaria às contri-
buições cuja administração foi transferida para a SRF/RFB:
“Art. 26. O valor correspondente à compensação de débitos relativos às contribuições
de que trata o art. 2º desta Lei será repassado ao Fundo do Regime Geral de Previdên-
cia Social no máximo 2 (dois) dias úteis após a data em que ela for promovida de ofí-
cio ou em que for deferido o respectivo requerimento.
Parágrafo único. O disposto no art. 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996,
não se aplica às contribuições sociais a que se refere o art. 2º desta Lei.” (Destaques
nossos)
Esta insinceridade do legislador deve ser repelida pelo aplicador do Direito, pois
afronta a um dos mais basilares princípios constitucionais: o da igualdade.

3. Do Direito à Compensação à Luz da Igualdade


O art. 5º, caput, da CF/1988 é expresso ao afirmar que “todos são iguais peran-
te a lei”.
O conteúdo jurídico desta norma corresponde, basicamente, à busca do equilí-
brio de forças entre os diversos agentes sociais, equalizando seus direitos, obriga-
ções e condições nas relações entre eles mantidas segundo uma medida de compa-
ração devidamente identificada e pertinente a uma determinada finalidade.
Parte-se, assim, da célebre máxima aristotélica de que se deve tratar igualmen-
te aqueles que se encontram em situação igual e desigualmente aqueles que se en-
contram em situações diferentes, na medida dessa diferença e obedecido o critério
de discrímen que se mostrar adequado a restituir o equilíbrio àquela relação. Não
basta, portanto, a simples consideração abstrata de características de determinada
pessoa, por exemplo, se de natureza pública ou privada, pois as pessoas serão apro-
ximadas ou distanciadas (enfim, comparadas) sempre a partir de um parâmetro, qual
seja, a relação efetivamente havida entre elas com os elementos relevantes para essa
relação.
Na seara tributária, talvez o exemplo mais pungente do que se afirmou acima
esteja nas exceções à chamada imunidade recíproca prevista no art. 150, VI, “a”, da
CF/1988, que veda que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios ins-
tituam impostos sobre o “patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros”, com o claro
objetivo de preservar o federalismo (autonomia dos entes federativos) - além de ser
fundamentada na ausência de capacidade contributiva dos entes estatais.
Pois bem, por mais nobres e relevantes que sejam os fundamentos da imunida-
de recíproca - e o são -, essa imunidade é excepcionada quando o patrimônio, a renda
ou os serviços dos entes estatais estejam “relacionados com a exploração de ativi-
dades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados”
(art. 150, parágrafo 3º, da CF/1988), o que tem o lídimo escopo - pelo menos um
deles - de garantir a igualdade de condições quando o Estado atue em regime de
concorrência com os particulares. Obviamente, permitir que um concorrente (o Es-
tado) não se submeta à carga tributária imposta aos demais (particulares) geraria uma
situação de absoluta desigualdade que não é justificada pela simples diferença de
natureza (pública ou privada) entre os sujeitos.
Por essas razões, estando dois indivíduos (seja qual for a sua natureza) em situa-
ção materialmente igual, é obrigatório que o tratamento dispensado a ambos tam-
bém seja igual. E esta obrigatoriedade é imposta também à Lei, como já há muito
sufragado pela doutrina:
“Entende-se, em concorde unanimidade, que o alcance do princípio não se restringe
a nivelar os cidadãos diante da norma legal posta, mas que a própria lei não pode ser
editada em desconformidade com a isonomia.
O preceito magno da igualdade, como já tem sido assinalado, é norma voltada quer
para o aplicador da lei quer para o próprio legislador. Deveras, não só perante a nor-
ma posta se nivelam os indivíduos, mas, a própria edição dela assujeita-se ao dever
de dispensar tratamento equânime às pessoas.”1
Uma primeira aproximação que podemos fazer do caso concreto a partir do que
foi dito acima reside no que Humberto Ávila chama de igualdade sistemática, es-
treitamente vinculada ao dever de coerência que o legislador deve manter ao regu-
lar determinada matéria. Nos dizeres sempre brilhantes do autor:
“O legislador, ao criar novas regras, vincula-se às suas próprias decisões fundamen-
tais anteriores na regulação da mesma matéria. Essa vinculação decorre da própria
noção de igualdade: tendo tomado, ‘antes’ (não cronologicamente, mas logicamente),
uma decisão legislativa fundamental a respeito de determinado tema, estabelecendo um
critério de diferenciação entre os contribuintes com base em determinada justificati-
va, deverá, ‘depois’, seguir, de modo conseqüente, aquele mesmo critério quando hou-
ver a justificativa. Se assim não proceder, cairá em contradição: ou a decisão funda-
mental (e logicamente anterior) será arbitrária, por falta de razoabilidade da diferencia-
ção, ou a decisão consequente (e logicamente posterior) terá esse caráter, por ausên-
cia de congruência da distinção.”2
Como visto inicialmente, antes da Lei nº 11.457/2007, não havia qualquer li-
mitação à compensação entre créditos e débitos de tributos administrados pela
SRF/RFB, podendo o contribuinte realizá-la quaisquer que fossem os tributos en-
volvidos, desde que administrados por aquele órgão. Tal regulação possui uma ra-
tionale evidente: a compensação deve alcançar os tributos administrados por um
mesmo órgão porque isto permite o perfeito controle entre os créditos e os débitos
compensados, nos quais aquele órgão é igualmente “parte” (ora como “credor”, ora
como “devedor”) e sobre os quais faz o devido controle.
A partir do momento em que novos tributos ingressam na estrutura daquele ór-
gão (que passa a administrá-los, fiscalizá-los e controlá-los), não há justificativa
plausível para que eles não possam ser objeto da compensação já anteriormente pre-
vista pelo legislador. Por exemplo, permitir a compensação de débitos de IRPJ com

1
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. São Paulo: Malheiros, 1995,
p. 9. Destacou-se.
2
ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 129. Destacou-se.
créditos de Cofins e não permiti-la em relação a créditos de contribuição previden-
ciária não encontra respaldo em qualquer fundamentação razoável - e é contraditó-
rio às próprias decisões (logicamente) anteriores do legislador no que concerne a
compensação tributária.
Nem mesmo a eventual alegação de que os recursos da contribuição previden-
ciária são destinados a finalidades específicas, cujo controle orçamentário poderia
ser mais complexo e sensível a variações no recebimento efetivo de recursos, pro-
cede: a uma, porque a Cofins e outras contribuições também têm o produto da sua
arrecadação vinculado e nem por isso são excluídas da sistemática geral da compen-
sação; a duas, porque estamos falando de créditos “contra” a previdência social, ou
seja, um valor que deixará de sair dos seus cofres mediante a compensação com
débitos de outros tributos, e não de débitos “a favor” da previdência que deixarão
de ingressar nos cofres públicos previdenciários.
Há, ainda, uma segunda aproximação a ser feita ao caso concreto. No que con-
cerne à possibilidade de compensação tributária, contribuinte e Fisco estão em si-
tuações absolutamente iguais:
a) se o contribuinte possuir créditos e débitos para com o Fisco, é de seu inte-
resse efetuar a compensação, para não ter de efetivamente desembolsar nenhum
valor, ou para que esse desembolso seja reduzido;
b) se o Fisco possuir créditos e débitos para com o contribuinte, é de seu inte-
resse efetuar a compensação, para não ter de efetivamente desembolsar nenhum
valor, ou para que esse desembolso seja reduzido.
Acontece que ambas as situações vêm recebendo um tratamento legal ilegitima-
mente diferenciado, porque o art. 7º, parágrafo 2º, do Decreto-lei nº 2.287, de 23
de julho de 1986, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 11.196, de 21 de no-
vembro de 2005, permite a compensação entre créditos de tributos administrados
pela SRF/RFB com débitos de contribuições previdenciárias, a exclusivo critério do
Fisco:
“Art. 7º A Receita Federal do Brasil, antes de proceder à restituição ou ao ressarci-
mento de tributos, deverá verificar se o contribuinte é devedor à Fazenda Nacional.
(...)
§ 2º Existindo, nos termos da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, débito em nome
do contribuinte, em relação às contribuições sociais previstas nas alíneas a, b e c do
parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, ou às contribui-
ções instituídas a título de substituição e em relação à Dívida Ativa do Instituto Na-
cional do Seguro Social - INSS, o valor da restituição ou ressarcimento será compen-
sado, total ou parcialmente, com o valor do débito.” (Destaques nossos)
Ou seja, mesmo na época em que os tributos eram administrados por órgãos
absolutamente diferentes do ponto de vista estrutural, já era possível ao Fisco va-
ler-se de créditos devidos ao contribuinte e referentes a tributos que não a contri-
buição previdenciária para compensá-los com débitos devidos pelo contribuinte e
relativos a esta última contribuição. Vê-se, portanto, que duas situações iguais são
tratadas pelo legislador com absoluta desigualdade:
a) se o contribuinte possui créditos e débitos para com o Fisco e pretende
efetuar uma compensação já prevista em Lei (art. 74 da Lei nº 9.430/1996),
em vez da restituição, isto é vedado (art. 26, parágrafo único, da Lei nº
11.457/2007);
b) se o Fisco possui créditos e débitos para com o contribuinte e pretende efe-
tuar a compensação, em vez de proceder à restituição ao contribuinte, isto é
permitido (art. 7º, parágrafo 2º, do Decreto-lei nº 2.287/1986).
Talvez seja difícil imaginar uma ofensa tão cristalina ao princípio da igualda-
de, salvo as de conteúdo racial, religioso etc., pois é inconcebível que se admita a
compensação entre tributos administrados pela SRF/RFB e a contribuição previden-
ciária, quando de interesse do Fisco, mas não se possibilite a mesma compensação,
quando de interesse do contribuinte.
Não há critério de discrímen razoável ou minimamente conforme à CF/1988
para essa diferenciação. Ela significa simplesmente dizer que o Estado pode; o con-
tribuinte, não. E um pode apenas porque é o Estado; o outro não pode somente por-
que é o particular. Simples assim e ponto final.
Não, juridicamente não é simples assim e muito menos pode ser o ponto final,
sob pena de se abrir um precedente que validará toda e qualquer diferenciação de
tratamento entre o Estado e o particular, ainda que desprovida de qualquer funda-
mento fático ou jurídico.

4. Conclusão
Por todos esses motivos, concluímos que:
a) a vedação à compensação de créditos da contribuição previdenciária com
débitos de outros tributos administrados pela RFB, prevista no art. 26, pará-
grafo único, da Lei nº 11.457/2007, decorre de uma insinceridade do legisla-
dor que ofende o art. 5º, caput, da CF/1988;
b) essa ofensa resulta da constatação de que a vedação contradiz e é incoeren-
te em relação a toda a normativa legislativa concernente a compensação tribu-
tária, que há muitos anos solidificou-se de forma ampla, desde que os tributos
cujos débitos e créditos seriam compensados fossem administrados pelo mes-
mo órgão estatal, como ocorre hoje em dia com a contribuição previdenciária
e os demais tributos administrados pela RFB (igualdade sistemática);
c) a vedação à compensação também não se sustenta a partir do momento em
que se constata a existência de tratamentos diferenciados a situações mate-
rialmente iguais, uma vez que ao Fisco é garantido o direito de impor ao con-
tribuinte a compensação de créditos de outros tributos com débitos de contri-
buição previdenciária, mas o contribuinte não pode se valer dessa mesma fa-
culdade; e
d) consequentemente, é imprescindível que o Poder Judiciário declare a incons-
titucionalidade do art. 26, parágrafo único, da Lei nº 11.457/2007, por violação
ao princípio da igualdade, e garanta a aplicação do art. 74 da Lei nº 9.430/1996
a todos os tributos administrados pela RFB, sem qualquer limitação.
A Inclusão das Pessoas com Deficiência e
as Problemáticas Isenções do ICMS na
Compra de Veículos Automotores
Francysco Pablo Feitosa Gonçalves

1. Considerações Primeiras
As pessoas com deficiência são um dos grupos vulnerá-
veis que mais sofreram preconceito ao longo da história.1
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-
tística - IBGE, cerca de 14,5% da população brasileira pos-
sui alguma deficiência. Vale lembrar que no Censo 2000
havia quase 170 milhões de pessoas habitando o Brasil, nú-
mero que aumentou para mais de 190 milhões, de acordo
com o censo de 2010. Um cálculo simples nos revela que,
hoje, cerca de 27.550.000 pessoas teriam alguma deficiên-
cia no Brasil.2 Isso faz com que essas pessoas sejam “nossa
maior minoria”.3
Mais de 27 milhões e meio de brasileiros com alguma
deficiência e, por conta disso, em condição de vulnerabili-
dade social, lutando pelo reconhecimento e afirmação de
seus direitos. O presente trabalho pretende contribuir para o
debate em torno dos direitos dessas pessoas, abordando o
Direito Tributário e, mais especificamente, analisando os
problemas das isenções do ICMS na compra de veículos
automotores, quando empregadas visando a promoção da
inclusão social das pessoas com deficiência.
Para a consecução desse objetivo, abordaremos breve-
mente as questões referentes à inclusão das pessoas com
deficiência, tentando estabelecer os conceitos e premissas
que nos guiarão na efetiva análise das isenções. Na sequên-
cia, faremos a análise das isenções do ICMS quando da com-
Francysco Pablo
Feitosa Gonçalves 1
Poderíamos trazer inúmeros autores embasando nossa afirmativa. Apenas a título
é Mestre em Direito de exemplo, citamos Damien Hazard, que diz que “a deficiência denota uma longa
pela Universidade história de discriminação e de exclusão” (“Os Direitos das Pessoas Portadoras de
Católica de Deficiência”. In: MOSER, Cláudio; e RECH, Daniel (orgs.). Direitos Humanos no
Pernambuco (Unicap), Brasil. Rio de Janeiro: Ceris, 2003, p. 408) e Nelson Kilpp, para quem “As pessoas
com deficiência talvez tenham sido as mais afetadas por preconceito religioso e
Professor na discriminação social na história da humanidade.” (Espiritualidade e Compromis-
Faculdade Estácio do so. São Leopoldo: Sinodal, 2008, p. 70)
Recife (Estácio - FIR) 2
Cf. http://www.direitoshumanos.gov.br/pessoas-com-deficiencia-1/censo/censo-
e na Faculdade 2010.
3
SANTOS, Wederson Rufino dos. “Pessoas com Deficiência: nossa Maior Minoria”.
Integrada de
Physis: Revista de Saúde Coletiva nº 3. Vol.18. Rio de Janeiro, setembro de 2008.
Pernambuco (Facipe) Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-73312008000300008&
e Advogado. script=sci_arttext.
pra de automóveis, procurando avaliar de forma crítica os problemas práticos que
tais isenções ocasionam, bem como as soluções que a jurisprudência vem dando aos
mesmos.
A forma de abordagem permanece a mesma de trabalhos anteriores que reali-
zamos no Direito Tributário. Continuamos considerando a tributação um fenôme-
no demasiado complexo para ser visto pelo jurista apenas em seu aspecto normati-
vo, devendo considerar, igualmente, os efeitos que ela provoca na sociedade. Nessa
perspectiva, antes de passar ao conteúdo do trabalho propriamente dito, convém re-
gistrar que, diante da complexidade dos temas que estamos abordando, não temos
a menor pretensão de exauri-los em um trabalho tão breve como o presente. Nosso
objetivo é, tão somente, contribuir para o debate em torno deles.

2. Sobre Deficiência e Inclusão


Nesta seção iremos apresentar algumas premissas e conceitos necessários ao
desenvolvimento do tema do presente artigo, uma vez que não temos como falar no
potencial inclusivo das isenções sem antes deixar claro o que entendemos por in-
clusão. Falar em inclusão na perspectiva deste trabalho, por sua vez, pressupõe es-
clarecer como vemos a questão da deficiência. Compreendemos a deficiência como
uma construção social, e não como uma característica essencial à pessoa. Nossa
compreensão, que num primeiro momento pode soar estranha ou contraditória, é
facilmente constatável quando deslocamos a questão de o que é deficiência? para
deficiência para quê?
Um cadeirante certamente possui uma deficiência diante de uma escada, mas,
se tiver acesso à formação adequada, poderá ser eficiente para atividades intelec-
tuais; já uma pessoa com deficiência mental poderá ter dificuldade para as mesmas
atividades intelectuais, mas poderá se revelar perfeitamente eficiente no desempe-
nho de atividades mais simples. A deficiência, nessa perspectiva, sempre depende
do contexto em que as pessoas se encontram e das expectativas que nós, enquanto
sociedade, temos em relação a elas.
Nesse sentido, Luiz Alberto David de Araújo lembra que
“há relacionamento íntimo entre deficiência e tarefas a serem desenvolvidas, ou seja,
a pessoa portadora de deficiência deve ser, de preferência, analisada no meio em que
vive, na sua condição social. Muitas vezes, numa cidade como São Paulo, determina-
da pessoa é tida como portadora de deficiência, podendo, em outra realidade social,
com certeza, desempenhar, de forma satisfatória, tarefas rurais simples.”4
Claro que sempre haverão argumentos contrários a essa compreensão, normal-
mente no sentido de que existem condições e características tão limitantes - por
exemplo, a tetraplegia - que sempre seriam deficiências. Em resposta a tais argumen-
tos sempre mencionamos as pessoas que, embora possuam características limitan-
tes, conseguem se mostrar plenamente eficientes,5 e como contra-argumento, desa-

4
ARAUJO, Luiz Alberto David de. A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: Cor-
de, p. 17.
5
Como exemplos de pessoas eficientes apesar das suas limitações, mencionamos: Stephen Hawking, uma das mentes
mais brilhantes de todos os tempos que, embora praticamente imobilizado, consegue ser extremamente eficiente; a
fiamos quem apresenta os argumentos contrários a questionar seus próprios
(pre)conceitos e, sobretudo, ao quê suas opiniões se vinculam.
Sim, porque nenhum discurso provém de um vácuo social nem é nele proferi-
do.6 Todos os nossos discursos provêm de nossas (pré-)compreensões e são recepcio-
nados pelos nossos interlocutores a partir de suas próprias (pré-)compreensões. Todo
discurso acaba se vinculando a um estado de coisas e pretendemos vincular o nos-
so à causa da inclusão de todas as pessoas, independentemente de suas característi-
cas. É nesse ponto que deixamos a pergunta: será que um discurso que rejeita a de-
ficiência como construção social não é um discurso vinculável ao preconceito e à
exclusão?
Acreditamos, portanto, que a forma mais adequada de compreender a deficiên-
cia é a partir de um modelo social.7 Nesse sentido, se uma sociedade normal e or-
ganizada “é aquela que consegue estabelecer um sistema que, razoável e eficiente-
mente adaptado ao meio físico, também permite aos seus componentes a sobrevi-
vência e o cumprimento das tarefas geralmente entendidas como necessárias, dese-
jáveis ou simplesmente toleradas pelo grupo”,8 então parece razoável contrapor o
modelo social de deficiência a um modelo, também social, de eficiência.
Num mundo povoado por cerca de seis bilhões de pessoas humanas - onde ine-
xistem duas sequer que sejam rigorosamente iguais em tudo - habitando socieda-
des extremamente complexas, parece adequado afirmar que todos são, simultanea-
mente, capazes de fazer determinadas coisas e incapazes de fazer outras. Todos são
deficientes em relação a determinadas coisas e situações, da mesma forma como são
eficientes em relação a outras.
Não por acaso, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Defi-
ciência registra expressamente em seu preâmbulo que os Estados-partes, no ato da
sua assinatura, estavam:
“Reconhecendo que a deficiência é um conceito em evolução e que a deficiência re-
sulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras atitudinais e ambientais
que impedem sua plena e efetiva participação na sociedade em igualdade de oportuni-
dades com as demais pessoas.”9
A partir do que viemos refletindo até o presente momento em relação à questão
da deficiência - um estigma que acaba representando alguma forma de exclusão

qualidade da obra do escritor argentino Jorge Luis Borges parece ter melhorado à medida em que ele perdia a visão;
Tony Meléndez, embora tenha nascido sem braços, é um grande violonista, tocando o instrumento com os pés. Po-
deríamos seguir exemplificando indefinidamente, mas neste momento o próprio leitor provavelmente já deve estar
lembrando de outros tantos casos em que pessoas se mostram eficientes em detrimento de suas deficiências.
6
Essa concepção, evidente a quem tem familiaridade com os estudos da linguagem, às vezes passa despercebida aos
juristas mais formalistas. Para um aprofundamento, recomendamos: COLARES, Virginia (org.). Direito, Linguagem
e Sociedade. Recife: Appodi, 2011, passim, esp. p. 405.
7
Para a reflexão sobre o modelo social em oposição ao modelo médico de deficiência, recomendamos a dissertação
de Cristiane Pasqua Prumes (Ser Deficiente, ser Envelhescente, ser Desejante. Curso de Mestrado em Gerontologia.
São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2007, 104 f.).
8
ROSA, Felippe Augusto de Miranda. Patologia Social: uma Introdução ao Estudo da Desorganização Social. Rio
de Janeiro: Zahar, 1978, pp. 28-29.
9
Organização das Nações Unidas. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela Assem-
bleia Geral das Nações Unidas, no dia 6 de dezembro de 2006, através da Resolução A/61/611. Como é notório, a
referida Convenção ingressou no nosso ordenamento com status de Emenda à Constituição.
social -, pela via oposta, concluímos que é exatamente nisso que consiste a inclu-
são, na ideia de se construir uma sociedade apta a receber todas as pessoas, em to-
das as suas especificidades,10 proporcionando a tais pessoas os meios necessários
para que elas possam contribuir eficientemente para a própria sociedade. A cons-
trução dessa sociedade inclusiva passa, necessariamente, por uma reformulação do
nosso modo de pensar a deficiência e das políticas públicas, inclusive tributárias.
Nesse ponto é conveniente trazer mais um excerto da Convenção sobre os Di-
reitos das Pessoas com Deficiência, porquanto os Estados-partes estavam:
“Reconhecendo as valiosas contribuições existentes e potenciais das pessoas com de-
ficiência ao bem-estar comum e à diversidade de suas comunidades, e que a promo-
ção do pleno desfrute, por pessoas com deficiência, de seus direitos humanos e liber-
dades fundamentais e sua plena participação na sociedade resultará na elevação do seu
senso de fazerem parte da sociedade e no significativo avanço do desenvolvimento
humano, social e econômico da sociedade, bem como na erradicação da pobreza.”11
Convém notar que a inclusão, conforme a concebemos, possui íntima ligação
com a ideia de direitos humanos. Qualquer discurso que pregue a universalidade dos
direitos humanos, aliás, vai ser um discurso que direta ou indiretamente trata da
questão da inclusão. A inclusão se vincula, e também com muita intimidade, à de-
mocracia, enquanto valor e enquanto procedimento. João Maurício Adeodato nos
lembra que “As democracias vivem a partir da domesticação da intolerância, pois a
democracia significa inclusão, regras comuns, reconhecimento do outro, fragmen-
tação do poder.”12
Nossa concepção de inclusão, em suma, não pretende ser algo inédito ou ino-
vador, pretende, muito mais, reafirmar os ideais de todos que, anteriormente, defen-
deram a construção de uma sociedade para todos. Dito isso, passamos à análise das
isenções do ICMS.

3. As Isenções do ICMS e seu Potencial Inclusivo


Visto, ainda que superficialmente, o que representa a ideia de inclusão, temos,
enfim, o momento adequado para analisar, especificamente, o Convênio ICMS 03/2007
- e suas alterações posteriores - no que interessa à inclusão social das pessoas com
deficiência. A cláusula primeira mostra a que veio o Convênio e estabelece os re-
quisitos para a concessão do benefício, dispondo que ficam
“isentas do ICMS as saídas internas e interestaduais de veículo automotor novo com
características específicas para ser dirigido por motorista portador de deficiência físi-
ca, desde que as respectivas operações de saída sejam amparadas por isenção do Im-
posto sobre Produtos Industrializados - IPI, nos termos da legislação federal vigente”.
Para compreendermos quais veículos fazem jus à isenção, portanto, precisamos
recorrer à Lei 8.989/1985 (e alterações posteriores):
“Art. 1º Ficam isentos do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI os automóveis
de passageiros de fabricação nacional, equipados com motor de cilindrada não supe-

10
Cf. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma Sociedade para Todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
11
Idem.
12
ADEODATO, João Maurício. “Função Retórica do Direito na Construção das Fronteiras da Tolerância”. In: CAS-
TRO JÚNIOR, Torquato da Silva (coord.). Anuário dos Cursos de Pós-graduação em Direito nº 17, de 2007. Reci-
fe: Edufpe, 2008, p. 11.
rior a dois mil centímetros cúbicos, de no mínimo quatro portas inclusive a de acesso
ao bagageiro, movidos a combustíveis de origem renovável ou sistema reversível de
combustão, quando adquiridos por: (…)
IV - pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou
autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal;
§ 1º Para a concessão do benefício previsto no art. 1º é considerada também pessoa
portadora de deficiência física aquela que apresenta alteração completa ou parcial de
um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função
física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monopa-
resia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputa-
ção ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita
ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para
o desempenho de funções.
§ 2º Para a concessão do benefício previsto no art. 1º é considerada pessoa portadora
de deficiência visual aquela que apresenta acuidade visual igual ou menor que 20/200
(tabela de Snellen) no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior
a 20º, ou ocorrência simultânea de ambas as situações.”13
Interessante perceber que, ao selecionar o que são as deficiências para fins de
concessão da isenção, a norma acaba confirmando a nossa tese de que a deficiência
é uma construção social e uma questão contextual. Nesse caso, para fins de obten-
ção da isenção, o legislador estabelece a fronteira entre a eficiência e a deficiência.
De posse dessas informações, podemos voltar à cláusula primeira do Convênio
ICMS 03/2007. Ela estabelece, em seus parágrafos, uma série de exigências e for-
malidades que são exigidas para a concessão da isenção. Este é um primeiro aspec-
to para o qual temos necessariamente de atentar, a cláusula supratranscrita estabe-
leceu um procedimento burocrático complexo para a concessão do benefício.
Estas referidas exigências e formalidades parecem se destinar a assegurar um
pretenso telos da norma. Melhor explicando, se a isenção tem por finalidade favo-
recer a aquisição de veículos por pessoas com deficiência e, com isso, facilitar a sua
inclusão social, devem existir requisitos e instrumentos de controle a fim de garan-
tir que ela não seja usufruída por pessoas sem deficiência, pessoas que, portanto, não
precisem da isenção em questão. Como exemplo temos o parágrafo 3º, I, “b”, da
cláusula primeira, anteriormente mencionada, que exige a apresentação de laudo de
perícia médica, fornecido pelo Detran do domicílio do interessado, que “discrimi-
ne as características específicas necessárias para que o motorista portador de defi-
ciência física possa dirigir o veículo”.
Por características específicas no veículo, pressupõe-se que o mesmo seja adap-
tado para as pessoas com deficiência. Esta exigência, que à primeira vista parece ser
razoável - quem pode dirigir um veículo normal precisaria da isenção? - pode,
na prática, se tornar injusta. É que as montadoras nem sempre se preocupam em dis-
ponibilizar adaptações para os veículos de acordo com as deficiências reconhecidas
em lei. Além disso, em alguns Estados, são poucas as oficinas que adaptam veícu-
los para pessoas com deficiência. A jurisprudência, entretanto, vem sinalizando no
sentido de que a direção hidráulica ou modificações no câmbio dos veículos pode-

13
Brasil. Lei nº 8.989, de 24 de fevereiro de 1995.
riam ser consideradas adaptações para fins de concessão da isenção. Sobre o tema
separamos a seguinte decisão do Superior Tribunal de Justiça:
“Tributário. ICMS. Isenção. Motorista com Deficiência Física. Estado da Paraíba.
Enquanto esteve em vigor o Convênio ICMS nº 43/94, o portador de deficiência física
tinha o direito de adquirir um veículo com direção hidráulica e câmbio automático, ou
com a alavanca manual adaptada, sem o pagamento do Imposto sobre Operações Re-
lativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços; já a isenção do Imposto
sobre a Propriedade de Veículos Automotores só aproveita ao portador de deficiência
física se o veículo, de fabricação nacional, foi especialmente adaptado (Lei nº 5.698,
de 29 de dezembro de 1992, do Estado da Paraíba, art. 9º, VII). Recurso ordinário pro-
vido em parte.”14
Outro problema decorre da exigência de que o veículo se destine a ser dirigido
por motorista portador de deficiência física - vide o caput da cláusula anteriormente
mencionada -, sendo exigido inclusive que a pessoa apresente cópia da Carteira
Nacional de Habilitação, sendo feita exceção apenas quando a aquisição do veículo
se destinar à obtenção da referida carteira, nos termos do parágrafo 5º da mesma
cláusula.
Essa exigência, que provavelmente se destina a impedir que pessoas sem defi-
ciência se aproveitem de pessoas com deficiência para adquirir veículos com isen-
ção, eventualmente se torna injusta. Primeiro porque nem sempre é fácil às pessoas
com deficiência, sobretudo as que residem no interior dos Estados, obterem a CNH
- seja por falta de autoescolas com instrutores e veículos adequados, seja pelo fato
de os próprios Departamentos de Trânsito instituírem poucas comissões para ava-
liar tais pessoas.
Além disso, e ainda mais grave, é que pessoas que tenham uma deficiência tão
incapacitante que não possam, elas mesmas, dirigir um automóvel, podem ser pre-
judicadas, na medida em precisem de um. Exemplificando, pensemos em uma pes-
soa com tetraplegia que precise de um automóvel para ir à fisioterapia ou alguém
com deficiência visual total que precise de um automóvel para ser conduzida à es-
cola ou ao trabalho. Em ambos os casos, se a norma que estamos analisando for
aplicada de forma pretensamente literal, o veículo que seria instrumento facilitador
da inclusão será negado a quem mais necessita.
Agora vamos imaginar alguém que, porventura, tenha perdido um dedo de uma
das mãos e que, por conta disso, somente possa guiar um carro que tenha direção
hidráulica. Esse alguém, eventualmente, poderá precisar menos da isenção do que
as pessoas do exemplo anterior e ainda assim obtê-la, ao passo que, se as disposi-
ções do convênio forem seguidas à risca, as pessoas com deficiência que por algu-
ma razão estejam incapacitadas de dirigir não poderiam obter a isenção, por mais
que necessitem dela para ter acesso a uma vida digna.
Desconhecemos qualquer julgado dessa natureza, referente ao ICMS, no âmbi-
to do STJ, havendo, contudo, interessante precedente referente ao IPI:
“Constitucional. Tributário. IPI. Isenção na Compra de Automóveis. Deficiente Fí-
sico Impossibilitado de dirigir. Ação Afirmativa. Lei 8.989/95 Alterada pela Lei nº
10.754/2003. Princípio da Retroatividade da Lex Mitior.

14
RMS 9.051/PB, Rel. Ministro Ari Pargendler, Segunda Turma, julgado em 3.12.1998, DJ de 22.2.1999, p. 88.
1. A ratio legis do benefício fiscal conferido aos deficientes físicos indicia que indefe-
rir requerimento formulado com o fim de adquirir um veículo para que outrem o diri-
ja, à míngua de condições de adaptá-lo, afronta ao fim colimado pelo legislador ao
aprovar a norma visando facilitar a locomoção de pessoa portadora de deficiência fí-
sica, possibilitando-lhe a aquisição de veículo para seu uso, independentemente do
pagamento do IPI. Consectariamente, revela-se inaceitável privar a Recorrente de um
benefício legal que coadjuva às suas razões finais a motivos humanitários, posto de
sabença que os deficientes físicos enfrentam inúmeras dificuldades, tais como o pre-
conceito, a discriminação, a comiseração exagerada, acesso ao mercado de trabalho,
os obstáculos físicos, constatações que conduziram à consagração das denominadas
ações afirmativas, como esta que se pretende empreender.
(...)
12. Recurso especial provido para conceder à recorrente a isenção do IPI nos termos
do art. 1º, § 1º, da Lei nº 8.989/95, com a novel redação dada pela Lei 10.754, de
31.10.2003, na aquisição de automóvel a ser dirigido, em seu prol, por outrem.”15
Se esse precedente não garante que casos semelhantes referentes ao ICMS re-
cebam o mesmo tratamento, ele - assim como o outro anteriormente transcrito - si-
naliza que o STJ é sensível à causa das pessoas com deficiência quando elas se de-
param com a aplicação injusta de uma norma tributária. Nesse ponto, os mais afei-
tos ao formalismo, lembrariam do art. 111 do CTN, que dispõe o seguinte:
“Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
I - suspensão ou exclusão do crédito tributário;
II - outorga de isenção;
III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.”
Paulo de Barros Carvalho16 entende que o dispositivo em questão é inócuo e que
não é possível, em virtude da semântica e da pragmática, prescrever uma interpre-
tação meramente literal. Não há texto sem contexto e uma norma não pode ser pen-
sada isoladamente em detrimento do restante da ordem jurídica, principalmente em
detrimento das normas hierarquicamente superiores.
Acrescentamos que as isenções tributárias devem ser interpretadas em conso-
nância com a Constituição Federal assim como, da mesma forma, o próprio art. 111
também deve ser compreendido à luz da Constituição. Desse modo, qualquer inter-
pretação pretensamente literal de leis tributárias - no que estas se refiram à suspen-
são ou exclusão do crédito tributário, à dispensa do cumprimento de obrigações tri-
butárias acessórias, ou à outorga de isenção - não pode levar a uma afronta à Cons-
tituição.17
Voltando ao ICMS, e em diálogo com as questões referentes à problemática da
interpretação, os Tribunais de Justiça estaduais e os juízos de primeira instância
contêm farta jurisprudência no sentido de conceder a isenção às pessoas com defi-
ciência impossibilitadas de dirigir. A título de exemplo, citamos, pelo seu teor, a
seguinte decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

15
REsp 567.873/MG, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 10.2.2004, DJ de 25.2.2004, p. 120.
16
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
17
Uma forma interessante de problematizar essa busca por uma interpretação literal seria a partir das questões da tex-
tura aberta da linguagem e da pré-compreensão. São reflexões que intencionamos desenvolver em outras ocasiões.
“Ementa: Remessa oficial e apelação cível voluntária. Ação de mandado de seguran-
ça. Deficiência visual. Lei estadual nº 15.757, de 2005. Isenção de ICMS. Admissibi-
lidade. Segurança concedida. Sentença confirmada. 1. A Lei estadual nº 15.757, de
2005, autoriza o Poder Executivo a isentar do ICMS a aquisição de veículo automotor
por pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda e au-
tistas. 2. A lei tributária não admite interpretação extensiva. A tipicidade do tributo, em
face do nosso sistema constitucional, congrega o concurso da Constituição, das leis
complementares e das leis ordinárias. O perfil típico de um tributo é normativo, para
atingi-lo é necessário o exame de várias leis, inclusive das que concedem isenções. 3.
O Estado deve propiciar meios que atenuem a carência de oportunidades dos deficientes
físicos e visuais. 4. Deve preponderar o princípio da proteção aos deficientes, porque
os interesses sociais mais relevantes devem prevalecer sobre os interesses econômicos
menos significantes. 5. Assim, a Lei estadual nº 15.757, de 2005, que é mais abran-
gente, deve ser interpretada em conjunto com o Convênio Confaz nº 3, de 2007, para
conceder a isenção de ICMS às pessoas mencionadas. 6. Remessa oficial a apelação
voluntária conhecidas. 7. Sentença que concedeu a segurança confirmada em reexa-
me necessário, prejudicado o recurso voluntário.”18
Como já foi registrado, entendemos que não conceder a isenção às pessoas com
deficiência que não podem guiar automóvel poderá consistir - e em regra consistirá
- em uma discriminação injusta. Resta, entretanto, o problema do controle para que
as isenções sejam concedidas apenas em benefício das pessoas com deficiência, e
sobre isso temos algumas ponderações a fazer.
Claro que não estamos nos referindo apenas ao controle realizado pelo Judiciá-
rio, quando as isenções forem negadas, até porque, temos alguma ressalva à judi-
cialização excessiva de questões políticas. Temos de observar que a dependência ex-
clusiva do Judiciário pode representar uma demora e um desgaste desnecessário a
quem precisa das isenções; além disso, acreditamos que podem existir alternativas
mais coerentes e eficazes, que tornam desnecessárias as medidas discriminatórias
e injustas de que já tratamos.
Se tais medidas e exigências - que, na prática, podem resultar em verdadeiras
políticas de exclusão - se destinam a evitar fraudes e irregularidades na concessão
da isenção, primeiramente temos que considerar que não se pode simplesmente pre-
sumir que todas as pessoas sem deficiência irão tentar adquirir a isenção em ques-

18
Número do processo 1.0702.07.383858-4/001(1), numeração única 3838584-05.2007.8.13.0702, Relator Caetano
Levi Lopes, data do julgamento 2.12.2008, data da publicação 9.1.2009.
Do mesmo Tribunal, apresentamos também o seguinte julgado, tornando mais justa a concessão das isenções do
ICMS: “Ementa: Mandado de Segurança - Aquisição de Veículo por Menor, Portador de Paralisia Cerebral - Lei
Estadual nº 15.757/2005 - Isenção de ICMS - Admissibilidade. Cabe ao Estado propiciar condições hábeis de forma
a atenuar a carência dos deficientes físicos, preponderando o princípio da sua proteção, pois os interesses sociais mais
relevantes devem prevalecer sobre os interesses econômicos de menor significado. A Lei Estadual nº 15.757/2005
deve ser interpretada em conjunto com o Convênio Confaz nº 03/2007, admitindo a isenção de ICMS para as pes-
soas ali mencionadas. Se a própria lei admite que um portador de paralisia cerebral, sem nenhuma condição de diri-
gir veículo possa adquiri-lo com redução da carga tributária, é inadmissível que se indefira o pedido por falta de amparo
legal. Negar tal direito é criar exclusão social das mais severas. Súmula: confirmaram a Sentença, no Reexame Ne-
cessário, Vencido o Relator.” (Número do processo 1.0105.08.272840-0/001(1), numeração única: 2728400-
10.2008.8.13.0105, Relator Edivaldo George dos Santos, data do julgamento 15.9.2009, data da publicação
27.11.2009)
tão nem, muito menos, podemos sequer supor que as pessoas com deficiência irão
compactuar com tal aquisição indevida. Em suma, não podemos supor, simplesmen-
te, que todas as pessoas estão interessadas em fraudar o benefício.
A segunda é que, mesmo em relação à minoria que poderia tentar obter o bene-
fício indevidamente, é possível controlar a aquisição e o uso do automóvel em be-
nefício das pessoas com deficiência sem recorrer a requisitos que na prática obsta-
culizem e segreguem pessoas que estejam impossibilitadas de dirigir. Algumas das
cláusulas seguintes do Convênio ICMS 03/2007, aliás já se prestam a esse controle:
“Cláusula segunda: O adquirente deverá recolher o imposto, com atualização monetá-
ria e acréscimos legais, a contar da data da aquisição constante no documento fiscal
de venda, nos termos da legislação vigente e sem prejuízo das sanções penais cabíveis,
na hipótese de:
I - transmissão do veículo, a qualquer título, dentro do prazo de 3 (três) anos da data
da aquisição, a pessoa que não faça jus ao mesmo tratamento fiscal;
II - modificação das características do veículo, para lhe retirar o caráter de especial-
mente adaptado;
III - emprego do veículo em finalidade que não seja a que justificou a isenção;
IV - não atender ao disposto no § 8º da cláusula primeira.
Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso I desta cláusula nas hipóteses de:
I - transmissão para a seguradora nos casos de roubo, furto ou perda total do veículo;
II - transmissão do veículo em virtude do falecimento do beneficiário;
III - alienação fiduciária em garantia.
Cláusula terceira: O estabelecimento que efetuar a operação isenta deverá fazer cons-
tar no documento fiscal de venda do veículo:
I - o número de inscrição do adquirente no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério
da Fazenda - CPF;
II - o valor correspondente ao imposto não recolhido;
III - as declarações de que:
a) a operação é isenta de ICMS nos termos deste convênio;
b) nos primeiros 3 (três) anos, contados da data da aquisição, o veículo não poderá ser
alienado sem autorização do fisco.”
Além disso, diversas outras medidas poderiam ser tomadas para o controle e
coerção de eventuais fraudes na venda e utilização dos veículos destinados a pes-
soas com deficiência. Uma primeira medida possível - e extrema - seria tipificar es-
pecificamente a fraude em questão.19 Outras medidas possíveis, e diga-se de passa-
gem tão simples como viáveis, seriam o registro nos documentos do veículo da des-
tinação a que ele se presta, desde eventual registro na nota fiscal, até nos certifica-
dos de registro e de licenciamento, bem como registro na CNH daquele que conduz
o veículo da pessoa com deficiência - a exemplo, aliás, da observação que já é feita
na CNH das pessoas com deficiência. Enfim, existem várias possibilidades, penais
e administrativas, que seriam mais efetivas do que as medidas discriminatórias pre-
sentes na cláusula primeira do Convênio ICMS 03/2007.

19
A rigor, dependendo de como se proceda para obter indevidamente a isenção em questão, estar-se-á incorrendo num
dos tipos previstos na Lei nº 8.137/1990, definidora dos crimes contra a ordem tributária. Quando falamos em tipifi-
car, nos referimos à criação de infração, penal se for o caso, com atribuição de sanção severa aos fraudadores às isen-
ções do ICMS concedidas às pessoas com deficiência, criminalização esta que, a nosso ver, poderia se prestar à pro-
teção de tais pessoas.
4. Considerações Finais
Nas linhas anteriores do presente trabalho apresentamos brevemente a nossa
compreensão do que é deficiência e inclusão social, e procuramos defender, sobre-
tudo, a concepção de inclusão enquanto construção de uma sociedade para todos.
Posteriormente, analisamos as isenções do ICMS direcionadas à aquisição de veí-
culos automotores por pessoas com deficiência, e tivemos a oportunidade de verifi-
car alguns problemas referentes às normas isentivas e sua aplicação, bem como a
sua correção pelo Judiciário.
Aproveitamos para relembrar que os temas abordados não foram aqui exauri-
dos e permanecem merecendo outros estudos, por exemplo, no que concerne à re-
lação entre isenção e seletividade, à isenção de outros bens que promovam a inclu-
são da pessoa com deficiência, às próprias questões relativas à deficiência, teorias
da isenção e da interpretação tributária etc. São temas que pretendemos retomar no
futuro mas que, sobretudo, gostaríamos de ver abordados por outros estudiosos do
Direito Tributário. As questões relacionadas ao potencial inclusivo da política tri-
butária, sobretudo, não nos parece ter despertado o devido interesse dos estudiosos
da matéria.
Para encerrar, lembramos que no início do presente trabalho trouxemos o registro
de que 14,5% da população brasileira possui alguma deficiência, um número con-
siderável de brasileiros. Quantas destas pessoas teriam uma vida mais digna se pu-
dessem adquirir um veículo automotor? Quantas deixam de fazê-lo em decorrência
da aplicação equivocada da cláusula primeira anteriormente transcrita? Não temos
como responder a estas perguntas, mas estamos convencidos de que elas merecem
ser refletidas. Se parece haver um consenso no sentido de que a política tributária
brasileira deve ser revista, gostaríamos de acrescentar mais uma variável à equação:
a política tributária brasileira deveria ser mais inclusiva.
O Princípio da Legalidade como Limitação
Constitucional ao Poder de tributar
Hugo de Brito Machado

1. Introdução
Temos afirmado repetidas vezes que o Direito é um sis-
tema de limites do poder. E o poder de tributar é inerente ao
Estado, pois, nas palavras de Aliomar Baleeiro, “o tributo é
vetusta e fiel sombra do poder político há mais de 20 sécu-
los. Onde se ergue um governante, ela se projeta sobre o solo
de sua dominação. Inúmeros testemunhos, desde a Antigüi-
dade até hoje, excluem qualquer dúvida.”1 Assim, podemos
afirmar que o poder de tributar sempre foi exercido, sem lei
ou nos termos desta.
Com o surgimento e a evolução dos sistemas jurídicos,
então, podemos afirmar com segurança que o Direito funcio-
na como um sistema de limites e que as regras jurídicas que
cuidam da tributação constituem limitações ao poder de tri-
butar. Entretanto, neste estudo, tal expressão tem um senti-
do restrito. Abrange apenas as regras jurídicas que estão em
nossa Constituição Federal, que ao tratar da Tributação e do
Orçamento, tem um capítulo dispondo sobre o Sistema Tri-
butário Nacional, dividido em seções, a segunda das quais
trata das Limitações do Poder de tributar. Assim, as limita-
ções ao poder de tributar, às quais aqui nos referimos, são so-
mente aquelas que estão nos arts. 150 a 152, da vigente
Constituição Federal, que compõem a seção em referência.
Entre essas limitações encontra-se o denominado prin-
cípio da legalidade tributária, expresso no art. 150, inciso I,
segundo o qual “sem prejuízo de outras garantias assegura-
das ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Dis-
trito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar tributo
sem lei que o estabeleça”.
Começaremos estudando a distinção entre princípio e
norma. Em seguida examinaremos os significados e a ori-
gem do princípio da legalidade, a distinção entre legalidade
e tipicidade, para finalmente examinarmos o princípio da
Hugo de Brito legalidade tributária como foi posto nas constituições brasi-
Machado leiras.
é Professor Titular de
Direito Tributário da
UFC e Presidente do
Instituto Cearense de 1
Aliomar Baleeiro, Limitações Constitucionais ao Poder de tributar, 7ª edição, Rio
Estudos Tributários. de Janeiro, Forense, 1997, p. 1.
2. O Princípio da Legalidade
2.1. O princípio e a norma
Constitui ponto pacífico, atualmente, a assertiva segundo a qual a relação de tri-
butação é uma relação jurídica e não uma relação simplesmente de poder. Assim,
submetida que está a relação de tributação ao disciplinamento jurídico, tem-se que
examinar, em primeiro plano, as prescrições jurídicas mais importantes no discipli-
namento dessa relação, as quais são geralmente designadas como princípios jurídi-
cos da tributação.
Não há, é certo, consenso doutrinário em torno da questão de saber o que é um
princípio jurídico. Terá o princípio a mesma natureza da norma?
A resposta evidentemente varia, de acordo com a postura jusfilosófica de cada
um. Para os jusnaturalistas, não obstante divididos estes em várias correntes, é pos-
sível afirmar-se que os princípios jurídicos constituem o fundamento do Direito
Positivo. Neste sentido, portanto, o princípio é algo que integra o chamado Direito
Natural. Para os positivistas, o princípio jurídico nada mais é do que uma norma
jurídica. Não uma norma jurídica qualquer, mas uma norma que se distingue das
demais pela importância que tem no sistema jurídico. Essa importância decorre de
ser o princípio uma norma dotada de grande abrangência, vale dizer, de universali-
dade, e de perenidade. Os princípios jurídicos constituem, por isto mesmo, a estru-
tura do sistema jurídico. São os princípios jurídicos os vetores do sistema. Daí por
que, no dizer de Celso Antônio Bandeira de Mello, desobedecer a um princípio é
muito mais grave do que desobedecer a uma simples norma.
Por isto mesmo o princípio jurídico tem grande importância como diretriz para
o hermeneuta. Na valoração e na aplicação dos princípios jurídicos é que o jurista
se distingue do leigo que tenta interpretar a norma jurídica com conhecimento sim-
plesmente empírico.
Doutrina Souto Borges, com inteira propriedade:
“Ora, a violação de um princípio constitucional importa em ruptura da própria Cons-
tituição, representando por isso mesmo uma inconstitucionalidade de conseqüências
muito mais graves do que a violação de uma simples norma, mesmo constitucional.
A doutrina vem insistindo na acentuação da importância dos princípios para iluminar
a exegese dos mandamentos constitucionais.
Salientou, com propriedade e clareza, jovem mestre paulista, (refere-se a Celso Antô-
nio Bandeira de Mello, como se vê da nota de rodapé, nº 9) que o princípio deve ser
entendido como a disposição expressa ou implícita, de natureza categorial em um sis-
tema, pelo que conforma o sentido das normas interpretadas em uma dada ordenação
jurídica. E mais: que o princípio é um mandamento nuclear de um sistema, verdadei-
ro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, com-
pondo-lhes o espírito e servindo de critério para a exata compreensão e inteligência
delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, con-
ferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico, donde poder concluir-se pela rele-
vância do princípio e da sua supremacia até sobre as próprias normas constitucionais.
Por todas as considerações antecedentes, impõe-se a conclusão pela eficácia eminente
dos princípios na interpretação das normas constitucionais. É o princípio que ilumi-
nará a inteligência da simples norma; que esclarecerá o conteúdo e os limites da eficá-
cia de normas constitucionais esparsas, as quais têm que harmonizar-se com ele.”2

2
José Souto Maior Borges, Lei Complementar Tributária, São Paulo, RT, 1975, pp. 13/14.
É relevante notar que a concepção jusnaturalista de princípio jurídico não ex-
clui e em nada prejudica a concepção positivista. A questão que se pode colocar é a
de saber se um princípio, como, por exemplo, o princípio da capacidade contributi-
va, há de ser observado, ou não, pelo legislador tributário, mesmo que não conste
da Constituição. Parece-nos que essa não é bem uma questão específica do Direito
Tributário, mas uma questão situada no âmbito da Filosofia do Direito, exatamente
a mesma questão de saber se existem, ou não, normas de Direito Natural, cuja in-
vocação é possível utilmente, tenham sido, ou não, consagradas pelo Direito Posi-
tivo.
O exame dessa questão, no plano da Filosofia do Direito, evidentemente não se
comporta nos estreitos limites destes comentários, de sorte que não a enfrentaremos,
embora a consideremos de notável importância, e sobre ela se tenha de adotar uma
posição em qualquer estudo jurídico, com ou sem fundamentação explícita.
Examinaremos a seguir o princípio da legalidade da tributação.

2.2. Significados e origem do princípio


O princípio da legalidade pode ser entendido em dois sentidos, a saber, (a) o de
que o tributo deve ser cobrado mediante o consentimento daqueles que o pagam; e
(b) o de que o tributo deve ser cobrado segundo normas objetivamente postas, de
sorte a garantir plena segurança nas relações entre o Fisco e os contribuintes.
Em suas origens mais remotas, surgiu o princípio da legalidade com o primeiro
dos referidos significados, vale dizer, o princípio da legalidade no sentido de prin-
cípio da tributação fundada no consentimento. Neste sentido o princípio é bastante
antigo. Como demonstra Uckmar, manifestou-se inicialmente sob a forma de con-
sentimento individual, na Inglaterra, em 1096, para transformar-se pouco a pouco
em consentimento coletivo.3 Sua origem, todavia, tem sido geralmente situada na
Magna Carta, de 1215, outorgada por João Sem Terra, por imposição dos barões.4
O tributo deve ser consentido, vale dizer, aprovado pelo povo, por seus repre-
sentantes nos parlamentos. No dizer de Cláudio Pacheco, para quem a base do prin-
cípio da legalidade reside no art. 14 da “revolucionária declaração francesa dos di-
reitos do homem e do cidadão”,5 a obrigação tributária está ligada ao princípio da
representação política. Nas palavras desse eminente constitucionalista:
“As imposições tributárias deverão estar autorizadas em lei, mas a lei é obra do poder
legislativo, cujo órgão é mais freqüentemente e mais desejavelmente um corpo coleti-
vo de base eletiva e de caráter representativo, autorizando a presunção de que são os
contribuintes que, indiretamente, consentem essas imposições.”6
Sustentando este seu ponto de vista, Cláudio Pacheco assevera que
“essa base consensual do tributo foi uma das aspirações coletivas sustentadas em ár-
duas lutas contra o absolutismo monárquico, que se exercia desregradamente no cam-

3
Cf. Victor Uckmar, Princípios Comuns de Direito Constitucional Tributário, São Paulo, RT, 1976, pp. 9/20.
4
Cf. Fábio Fanucchi, Curso de Direito Tributário Brasileiro, vol. I, São Paulo, coedição Ibet/Resenha Tributária, 1986,
p. 54.
5
Cláudio Pacheco, Tratado das Constituições Brasileiras, vol. III, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1965, p. 393.
6
Cláudio Pacheco, Tratado das Constituições Brasileiras, vol. III, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1965, p. 393.
po das imposições fiscais, quando ainda não era bem patente sua finalidade de inte-
resse público e saíam a cobrá-las a ordem e agentes de soberanos que precisavam de
recursos para seus confortos, seus luxos, suas ostentações, para a realização de seus
interesses dinásticos e para as suas guerras de pendor pessoal ou de conquista”.7
Alberto Xavier, fugindo embora à abordagem do tema das origens históricas do
princípio da legalidade, assevera que o mesmo
“surgiu ligado à idéia de que os impostos só podem ser criados através das assembléias
representativas e, portanto, à idéia de sacrifício coletivamente consentido, ou seja, à
autotributação”.8
O princípio da legalidade, outrossim, é a forma de preservação da segurança.
Ainda que a lei não represente a vontade do povo, e por isto não se possa afirmar
que o tributo é consentido por ter sido instituído em lei, ainda assim, tem-se que o
ser instituído em lei garante maior grau de segurança nas relações jurídicas.
Adotado o princípio da legalidade, pode-se afirmar, pelo menos, que a relação
de tributação não é uma relação simplesmente de poder, mas uma relação jurídica.
Isto evidentemente não basta, mas é alguma coisa, menos ruim que o arbítrio. Não
garante que o tributo seja consentido, mas preserva de algum modo a segurança.
É oportuno lembrar a diferença que existe entre uma relação simplesmente de
poder e uma relação jurídica. A relação simplesmente de poder nasce, desenvolve-
se e se extingue sem qualquer ligação com normas, enquanto a relação jurídica nas-
ce, desenvolve-se e se extingue nos termos das previsões normativas. Quem atua
numa relação simplesmente de poder não se submete a nenhuma norma. Submete-
se somente às limitações não normativas, tais como as de ordem física, psicológi-
ca, moral, religiosa, mas não se submete a nenhum limite decorrente de norma ju-
rídica. Quem atua numa relação jurídica, diversamente, está submetido a normas.
Submete-se a todas as limitações normativas.
Reportando-se à relação tributária como relação jurídica, Rubén O. Asorey en-
sina, com inteira propriedade:
“El Derecho tributario debe, en forma substancial, su desarrollo y evolución al esque-
ma esencial de la relación jurídica tributaria. Los enfoques dinámicos o procedimen-
talistas aparecidos a partir de la década del sesenta no pudieron relativizar el papel
transcendental de esa relación dentro de la teoria general del Derecho tributario.
Esse núcleo esencial, objeto de los más profundos análisis y disquisiciones intelectua-
les, permitió la incorporación legislativa de la juridicidad de tales desarrollos dogmá-
ticos, convirtiendo en anatema el principio de subordinación del administrado a un
poder estatal situado en un plano superior y consagrando la plena sumisión de los dos
sujetos de la relación al mismo plano de igualdad.”9
É certo que as limitações normativas constituem limites do dever ser. Por isto
mesmo às vezes não são respeitadas, mas isto não retira o caráter jurídico da rela-
ção. Pelo contrário, a não observância da norma que disciplina a relação ressalta o

7
Cláudio Pacheco, Tratado das Constituições Brasileiras, vol. III, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1965, p. 393.
8
Alberto Xavier, Os Princípios da Legalidade e da Tipicidade da Tributação, São Paulo, RT, 1978, p. 7.
9
Rubén O. Asorey, “Protección Constitucional de los Contribuyentes frente a la Arbitrariedad de las Administracio-
nes Tributarias”, Protección Constitucional de los Contribuyentes, livro de autoria coletiva, dirigido pelo referido
autor, Madrid/Barcelona, Educa/Marcial Pons, 2000, p. 25.
caráter jurídico desta na medida em que faz presente a possibilidade de sanção. A
relação é jurídica precisamente porque os atos que na mesma estão envolvidos de-
vem ser praticados com observância das normas que a regulam.
A distância entre o que deve ser, segundo a Constituição, e o que na verdade é
na prática da relação tributária, é uma questão de eficácia da Constituição que, como
a questão da eficácia das normas jurídicas em geral, depende da crença que nelas
se tenha. Infelizmente a conduta das autoridades em geral contribui para a descren-
ça, mas temos de lutar contra isto e o caminho nos é oferecido pelo próprio ordena-
mento jurídico. Na medida em que um número maior de pessoas passa a utilizar-se
dos instrumentos de defesa de seus direitos a eficácia da ordem jurídica tende a se
fortalecer.

2.3. Legalidade e tipicidade


O princípio da legalidade não teria grande utilidade como instrumento de pro-
teção do contribuinte se nele não se incluísse o princípio da tipicidade. Por isto
mesmo, desde Montesquieu tem-se preconizado que “o princípio da competência
legislativa do parlamento em matéria tributária deve completar-se com o princípio
da tipicidade”.10
Insistimos em que o princípio da legalidade não quer dizer apenas que a rela-
ção de tributação é jurídica. Quer dizer que essa relação, no que tem de essencial,
há de ser regulada em lei. Não em qualquer norma jurídica, mas em lei, no seu sen-
tido específico.
González García identifica, com base em autorizadas manifestações doutriná-
rias, duas formas de legalidade, assim explicadas:
“a) En primer lugar, la modalidad de acto legislativo primario, que consiste en que se
exige ley no para regular en su totalidad los elementos fundamentales del tributo, sino
tan sólo para crearlo.
b) Existe, después, el principio de reserva de ley propiamente dicho, para regular una
materia determinada. Dentro de ésta, a su vez, suele distinguirse entre la reserva abso-
luta de ley, que se produce en el supuesto, harto infrecuente, de que la totalidad de la
materia acotada deba venir regulada en exclusiva por la ley o, al menos, por actos con
fuerza de ley; e la denominada reserva relativa o atenuadas, que consiste en exigir la
presencia de la ley tan sólo a efectos de determinar los elementos fundamentales o iden-
tidad de la prestación establecida, pudiendo confiarse al ejecutivo la integración o de-
sarrollo de los restantes elementos.”11
Como se vê, González García entende criar como simplesmente referir-se a, ou
dizer que fica criado. Em nosso sistema jurídico, porém, não é assim, como será
explicado ao examinarmos o sentido da expressão exigir ou aumentar tributo, al-
bergada pelo art. 150, inciso I, da Constituição Federal de 1988.
Segundo González García, o princípio constitucional da legalidade pode ser
entendido como simples exigência de lei para criar o tributo, no sentido por ele

10
José Luis Pérez de Ayala, Montesquieu y el Derecho Tributario Moderno, Madri, Dykinson, 2001, p. 49.
11
Eusébio González Garcia, “Principio de Legalidad Tributaria en La Constitución de 1978”, Seis Estudios sobre De-
recho Constitucional e Internacional Tributario, Madri, Editorial de Derecho Financiero, 1980, pp. 62/63.
adotado, e não para regular em sua totalidade os elementos fundamentais do tribu-
to, ou no sentido de reserva legal, vale dizer, no sentido de que só a lei pode regular
os elementos fundamentais do tributo. Essa reserva legal, por seu turno, divide-se
em reserva absoluta, e reserva relativa. Para ele, a doutrina que tem estudado o prin-
cípio da reserva está sempre de acordo, com algumas exceções, em que sempre que
se exige lei para criar um tributo, na verdade não se exige que a lei regule todos os
elementos do tributo, mas apenas os essenciais, como os sujeitos da relação e o seu
fato gerador, não tendo de ser precisa a regulação de outros elementos, como, por
exemplo, a base de cálculo e a alíquota.12
Dejalma de Campos esclarece, com inteira propriedade, que o princípio da le-
galidade há de ser examinado tanto em razão da fonte produtora de normas, como
em razão do grau de determinação da conduta. Em razão da fonte produtora das
normas, tem-se uma reserva de lei material, e uma reserva de lei formal. No primeiro
caso, “basta simplesmente que a conduta da Administração seja autorizada por qual-
quer norma geral e abstrata, podendo ser tanto uma norma constitucional, ordinária
ou mesmo um regulamento”. Já no segundo caso, é “necessário que o fundamento
legal do executivo seja uma norma emanada do legislativo”. Por outro lado, no que
pertine ao grau de determinação da conduta, tem-se a reserva legal absoluta, e a re-
serva legal relativa, conforme esteja a conduta da Administração inteiramente esta-
belecida na lei, ou apenas nesta tenha fundamento, podendo desenvolver-se com
relativa liberdade.13
Como geralmente acontece com as divergências em temas jurídicos, a questão
essencial também aqui reside nos conceitos. Aqui a verdadeira questão está na de-
terminação do significado da palavra lei, e da expressão criar ou aumentar tributo.
Sabendo-se o que significa a palavra lei tem-se resolvida a questão de saber se a
reserva legal há de ser simplesmente material, ou também formal. Sabendo-se o que
quer dizer criar ou aumentar um tributo tem-se resolvida a questão de saber se a
reserva legal há de ser relativa ou absoluta. Em face da importância dessas questões,
voltaremos a elas mais adiante.
Há quem se oponha à prevalência do princípio da legalidade absoluta, com o
argumento segundo o qual esse princípio impede a utilização de instrumentos de
política econômica, embaraçando o desenvolvimento. Tal argumento é falso. “O
princípio da legalidade, como reserva absoluta de lei, não só não se revela incom-
patível com as modernas políticas econômicas, como é o que melhor se coaduna com
os princípios em que assenta uma livre economia de mercado.”14
Não se pode confundir medidas de política econômica com improvisações, posto
que as primeiras caracterizam-se pelo planejamento, enquanto estas últimas carac-
terizam-se pela ausência deste, revelada muita vez pelos retrocessos, pelas mudan-
ças bruscas, que incutem no empresário a insegurança inibidora de suas iniciativas.

12
Eusébio González Garcia, “Principio de Legalidad Tributaria en La Constitución de 1978”, Seis Estudios sobre De-
recho Constitucional e Internacional Tributario, Madri, Editorial de Derecho Financiero, 1980, pp. 63/64.
13
Dejalma de Campos, “O Princípio da Legalidade no Direito Tributário”, Caderno de Pesquisas Tributárias, São Paulo,
Ceeu/Resenha Tributária, 1981, pp. 217/219.
14
Alberto Xavier, Os Princípios da Legalidade e da Tipicidade da Tributação, São Paulo, RT, 1978, p. 53.
Como assevera Alberto Xavier, com apoio em Nissen e Sainz de Bujanda,
“a livre iniciativa exerce-se através de planos econômicos elaborados pelos empresá-
rios para um dado período e nos quais se realiza uma previsão, mais ou menos empíri-
ca, dos custos da produção, do volume dos investimentos adequados à obtenção de dado
produto e da capacidade de absorção do mercado. Tal previsão não pode deixar de
assentar na presunção de um mínimo de condições de estabilidade, dentro do que a
normal margem de riscos e incertezas razoavelmente comporte para o horizonte de
planejamento a que respeita. O planejamento empresarial, por que a iniciativa privada
se concretiza, supõe assim uma possibilidade de previsão objetiva e esta exige, por seu
turno, uma segurança quanto aos elementos que a afetam. É sabido que o volume dos
tributos - dado o papel que assumem na economia global - representa para a empresa
não só elevada percentagem dos seus custos de produção, como determina as disponi-
bilidades que, no mercado representam procura para os seus produtos. Um sistema que
autorize a Administração a criar tributos ou a alterar os elementos essenciais de tribu-
tos já existentes, viria do mesmo passo a criar condições adicionais de insegurança
jurídica e econômica, obrigando a uma constante revisão dos planos individuais, à qual
a livre iniciativa não poderia resistir. Pelo contrário, um sistema alicerçado numa re-
serva absoluta de lei em matéria de impostos confere aos sujeitos econômicos a capa-
cidade de prever objetivamente os seus encargos tributários, dando assim as indispen-
sáveis garantias requeridas por uma iniciativa econômica livre e responsável.”15

3. Legalidade Tributária nas Constituições Brasileiras


3.1. Nas Constituições anteriores
Em todas as Constituições brasileiras o princípio da legalidade está de algum
modo presente. Já a Constituição do Império o registrava, em seu art. 171, e o Ato
Adicional, de 1834, o estendeu às áreas provinciais, atribuindo às Assembleias Le-
gislativas das Províncias competência para estabelecer os impostos locais.16 Na
Constituição de 1891 estava o princípio assim enunciado: “nenhum imposto de qual-
quer natureza poderá ser cobrado senão em virtude de uma lei que o autorize”.17 Na
Constituição de 1934 estava também o princípio, embora não consagrado como
garantia individual, mas claramente configurado na regra que vedava à União, aos
Estados e aos Municípios “cobrar quaisquer tributos sem lei especial que os autori-
ze”.18 A Constituição de 1937 foi a única que não o enunciou explícita e diretamen-
te, entretanto, mesmo assim, pode ser nela encontrado na regra que dá ao Presiden-
te da República o poder de expedir decretos-lei sobre as matérias da competência
legislativa da União, e coloca entre as ressalvas a matéria pertinente a impostos.19
Na Constituição de 1946 o princípio da legalidade aparece plenamente, coloca-
do entre os direitos e garantias individuais, em dispositivo segundo o qual nenhum
tributo será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça.20 Com a Emenda
Constitucional nº 18, de 1965, o princípio foi mantido com ressalvas.21 Assim, os

15
Alberto Xavier, Os Princípios da Legalidade e da Tipicidade da Tributação, São Paulo, RT, 1978, pp. 53/54.
16
Cf. Cláudio Pacheco, Tratado das Constituições Brasileiras, vol. XI, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1965, p. 267.
17
Constituição de 1891, art. 72, parágrafo 30.
18
Constituição de 1934, art. 17, inciso VII.
19
Constituição de 1937, art. 13.
20
Constituição de 1946, art. 141, parágrafo 34.
21
Emenda Constitucional nº 18, art. 2º, inciso I.
impostos sobre o comércio exterior (importação e exportação), e o imposto sobre
operações financeiras, podiam ter suas alíquotas e bases de cálculo alteradas, nas
condições e nos limites estabelecidos em lei, por ato do Poder Executivo.22
A Constituição de 1967, que regulou pela primeira vez em capítulo específico
o sistema tributário, incorporando normas da Emenda Constitucional nº 18/1965,
estabeleceu como limitação constitucional da competência tributária da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, o princípio da legalidade, ao dispor
que a tais pessoas é vedado instituir ou aumentar tributo sem que a lei estabeleça,
ressalvados os casos nela previstos.23 Tais ressalvas dizem respeito aos impostos
sobre o comércio exterior, e ao imposto sobre operações financeiras, relativamente
aos quais tinha o Poder Executivo a faculdade de alterar as alíquotas e bases de cál-
culo, nas condições e nos limites estabelecidos em lei,24 pelas razões que adiante
examinaremos. Além disto, reproduziu, entre os direitos e garantias individuais, o
dispositivo da Constituição de 1946 segundo o qual nenhum tributo será exigido ou
aumentado sem que a lei o estabeleça.25
A Emenda Constitucional nº 1, de 1969, manteve o dispositivo vedando à União,
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, instituir ou aumentar tributo sem
que a lei o estabeleça, com as ressalvas nela previstas, as quais, reguladas agora
mediante técnica legislativa diversa, eis que mencionadas nos próprios dispositivos
definidores da competência da União, passaram a abranger, além dos impostos so-
bre o comércio exterior, o Imposto sobre Produtos Industrializados,26 deixando, to-
davia, de abranger o imposto sobre operações financeiras.27 Manteve, outrossim,
entre os direitos e garantias individuais, o dispositivo pelo qual nenhum tributo será
exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça.28

3.2. Na Constituição de 1988


Na vigente Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988, o prin-
cípio da legalidade está expresso no art. 150, inciso I, que veda à União, aos Esta-
dos, ao Distrito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar tributo sem lei que o
estabeleça. Nisto não há novidade. Cumpre destacar, todavia, que o princípio da
legalidade restou consideravelmente fortalecido em virtude de algumas normas, não
destinadas a regular especificamente a tributação, entre as quais podem ser mencio-
nadas:
a) a que atribui competência ao Congresso Nacional para sustar os atos nor-
mativos do Poder Executivo que exorbitem do Poder Regulamentar ou dos li-
mites de delegação legislativa;29 e

22
Emenda Constitucional nº 18, arts. 7º, parágrafo 1º, e 14, parágrafo 1º.
23
Constituição de 1967, art. 20, inciso I.
24
Constituição de 1967, art. 22, parágrafo 2º.
25
Constituição de 1967, art. 150, parágrafo 29.
26
Constituição de 1969, art. 21, incisos I, II e V.
27
Constituição de 1969, art. 21, inciso VI.
28
Constituição de 1969, art. 153, parágrafo 29.
29
Constituição Federal de 1988, art. 49, inciso V.
b) a que revoga, a partir de 180 dias da promulgação da Constituição, sujeito
este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou
deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constitui-
ção ao Congresso Nacional, especialmente no que tange a ação normativa.30 Por
outro lado, também fortaleceram o princípio da legalidade tributária o fato de
haver sido proibida a delegação de competência na matéria reservada à lei com-
plementar31 e o fato de haver deixado de ser da competência privativa do Pre-
sidente da República a iniciativa das leis sobre matéria tributária. Na verdade,
só restou na competência privativa do Presidente da República a iniciativa das
leis em matéria tributária relativamente aos Territórios.32
Registre-se que o princípio da legalidade tributária sofre restrições a seu alcan-
ce. Não no que pertine à instituição dos tributos, que somente por lei pode ocorrer,
mas quanto à majoração destes, em certos casos. Majoração que somente nos limi-
tes e nas condições fixados em lei poderá ocorrer.
Nestes termos, as restrições ao princípio da legalidade são as mencionadas no
parágrafo 1º do art. 153, que faculta ao Poder Executivo, atendidas as condições e
os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos sobre: (a) impor-
tação de produtos estrangeiros; (b) exportação, para o exterior, de produtos nacio-
nais ou nacionalizados; (c) produtos industrializados; e (d) operações de crédito,
câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários. E ainda, aquelas re-
lativas às contribuições de intervenção no domínio econômico, decorrentes do pa-
rágrafo 4º, inserido no art. 177 da Constituição pela Emenda nº 33, de 11 de dezem-
bro de 2001.
Destaque-se que essa faculdade concedida ao Poder Executivo refere-se apenas
a alíquotas. Na Constituição anterior ela compreendia também a alteração das ba-
ses de cálculo. Aliás, desde a Emenda nº 18 à Constituição de 1946, foi atribuída
ao Poder Executivo a faculdade de alterar as alíquotas e as bases de cálculo de al-
guns impostos, que por isto mesmo passaram a ser conhecidos como impostos fle-
xíveis. Na vigência da referida Emenda, com fundamento na qual foi elaborado o
Código Tributário Nacional, eram flexíveis os impostos de importação, de exporta-
ção (art. 7º, parágrafo 1º), e sobre operações de crédito, câmbio e seguro ou relati-
vas a títulos ou valores mobiliários (art. 14, parágrafo 1º). Não o imposto sobre pro-
dutos industrializados. Com a Constituição de 1967, passou a ser flexível o impos-
to sobre produtos industrializados, mas perdeu essa qualificação o imposto sobre
operações de crédito, câmbio e seguro ou relativa a títulos e valores mobiliários.
Com a Emenda nº 1, de 1969, tornaram-se flexíveis esses quatro impostos.
Não se há de confundir as restrições ao princípio da legalidade com as exceções
ao princípio da anterioridade. As primeiras estão previstas no parágrafo 1º do art.
153, enquanto as últimas estão estabelecidas no parágrafo 1º do art. 150. Realmen-
te, ao formular exceção ao princípio da legalidade, a norma do parágrafo 1º do art.
153, facultou aumentos de impostos por instrumento diverso da lei. O elemento re-

30
Art. 25, inciso I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
31
Constituição Federal de 1988, art. 68, parágrafo 1º.
32
Constituição Federal de 1988, art. 61, parágrafo 1º, inciso II, letra “b”.
levante, nessa norma considerado, foi o instrumento, e não o tempo. Já a norma do
parágrafo 1º do art. 150, ao formular exceção ao princípio da anterioridade, afastou
exigência relativa ao tempo, vedou a cobrança do tributo no mesmo exercício em que
tenha sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou.
Destaque-se que o imposto extraordinário de guerra não figura como exceção
ao princípio da legalidade, o que reforça o entendimento por nós há muito tempo
sustentado de que ele pode ser instituído por medida provisória. Figura, todavia,
entre as exceções ao princípio da anterioridade, posto que as próprias circunstân-
cias que autorizam sua instituição indicam sua incompatibilidade com tal princí-
pio.
É importante notar que a Constituição Federal de 1988, ao estabelecer a possi-
bilidade da adoção de medidas provisórias, pelo Presidente da República, corrigiu
o defeito técnico consistente na falta de previsão da forma de instituição do impos-
to extraordinário de guerra e do empréstimo compulsório para atender a despesas
extraordinárias decorrentes de guerra externa ou calamidade pública. As Constitui-
ções anteriores eram omissas neste ponto. É certo que, na vigência da Constituição
anterior, já o problema encontrava solução na possibilidade de edição de decreto-
lei pelo Presidente da República. De todo modo, a fórmula adotada pela Constitui-
ção de 1988 é tecnicamente mais adequada.
Realmente, a situação de guerra externa, ou sua iminência, é exemplo típico de
situação que justifica o uso, pelo Presidente da República, de sua competência para
editar medidas provisórias com força de lei, nos termos do art. 62 da vigente Cons-
tituição.
A faculdade atribuída ao Poder Executivo, de alterar as alíquotas dos mencio-
nados impostos, não consubstancia poder discricionário. O ato pelo qual é exerci-
tada é plenamente vinculado, posto que deve ser praticado “atendidas as condições
e os limites estabelecidos em lei”. Primeiro, é preciso que a lei estabeleça as condi-
ções que ensejam modificação de alíquotas e determine os limites dentro dos quais
essa alteração é admitida. Sem lei, o Poder Executivo não poderá exercer a facul-
dade em referência.
Prescrição de Créditos Escriturais
Iuri Engel Francescutti

Em 22 de agosto de 2011, a Receita Federal do Brasil


publicou a Solução de Divergência nº 21, na qual afirmou
que o direito de uso dos créditos acumulados de PIS e Co-
fins apurados sob o regime não cumulativo, das Leis nos
10.637/2002 e 10.833/2003, está sujeito ao prazo prescri-
cional de cinco anos, nos termos do Decreto nº 20.910/1932.
A Solução de Divergência, disciplinada pelo art. 48 da
Lei nº 9.430/1996, tem por objetivo uniformizar o entendi-
mento da Receita Federal, haja vista a possibilidade de que
existam diferentes conclusões internas sobre consultas de
contribuintes a respeito de determinada matéria.
Embora a referida decisão só produza efeito em relação
ao contribuinte que formulou a consulta, ela sinaliza a con-
solidação do entendimento da Receita Federal sobre a ma-
téria, afetando o planejamento tributário de diversos contri-
buintes, principalmente daqueles que, devido ao ramo de
atividade a que se dedicam, acumulam créditos de PIS e
Cofins cujo uso não conseguem vislumbrar num cenário de
curto prazo.
A resposta à Solução de Divergência acima menciona-
da sugere uma sintonia com a jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça a respeito da prescrição aplicável aos
créditos escriturais de ICMS1. Entretanto, parece-me que o
debate sobre o tema ainda não foi esgotado. Minha propos-
ta é trazer à luz algumas dúvidas sobre o assunto e as possí-
veis soluções para desdobramentos ainda não examinados,
a fim de fomentar sua discussão.
O ponto de partida deste trabalho, portanto, reside na
seguinte indagação: os créditos que dizem respeito a insu-
mos adquiridos há mais de cinco anos e cujo uso pelo con-
tribuinte ainda não foi possível estariam atingidos pela pres-
crição e, sendo o caso, deveriam ser baixados do ativo?
Em princípio, o exercício de qualquer direito de ação
está vinculado a um limite temporal, pelo interesse público
em se evitar a instabilidade nas relações jurídicas e presti-
giar a pacificação e harmonia sociais. A esse respeito, são
válidos os apontamentos de Antônio Luiz da Câmara Leal:

Iuri Engel
Francescutti 1
REsp nº 1.178.930/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em
é Advogado. 20.5.2010, DJe de 31.5.2010.
“Tendo por fim extinguir as ações, ela foi criada como medida de ordem pública, para
que a instabilidade do direito não viesse a perpetuar-se, com sacrifício da harmonia so-
cial, que é a base fundamental do equilíbrio sobre que se assenta a ordem pública.
O não cumprimento de uma obrigação, a ameaça ou violação de um direito, são esta-
dos antijurídicos que perturbam a harmonia social, e a ação foi instituída como meio
reintegratório dessa harmonia, fazendo cessar o desequilíbrio provocado pela ofensa
ao direito. Se o titular deste, porém, se conserva inativo, deixando de protegê-lo pela
ação, e cooperando, assim, para a permanência do desequilíbrio antijurídico, ao Esta-
do compete remover essa situação e restabelecer o equilíbrio, por uma providência que
corrija a inércia do titular do direito. E essa providência de ordem pública foi que o
Estado teve em vista e procurou realizar pela prescrição, tornando a ação inoperante,
declarando-a extinta, e privando o titular, por essa forma, de seu direito, como justa
consequência de sua prolongada inércia, e, por esse meio, restabelecendo a estabili-
dade do direito, pela cessação de sua incerteza.”2
Algumas exceções a essa regra estão expressamente previstas na Constituição
Federal, como a ação de ressarcimento ao Erário3, o crime de racismo4 e o direito à
pensão especial a ex-combatentes das Forças Armadas que tenham participado de
operações bélicas durante a Segunda Guerra Mundial5, ou decorrem de uma inter-
pretação pós-positivista dos direitos fundamentais e se escoram no princípio da dig-
nidade da pessoa humana, como a ação de investigação de paternidade6 e a ação
indenizatória por atos praticados durante o regime de exceção (ditadura militar)7.
A inércia prolongada no tempo, do titular do direito, não mereceu tratamento
diferenciando no campo do Direito Tributário.
Assim é que existe um prazo prescricional para que a Fazenda Pública leve a
juízo a cobrança de uma dívida definitivamente constituída, bem como para que, de
outro lado, o contribuinte exerça o seu direito de crédito em face da Fazenda Públi-
ca. Interessa-nos, para este estudo, o prazo prescricional a que se sujeitam os con-
tribuintes no exercício de seus direitos.
Pela sistemática adotada pelo legislador no Código Tributário Nacional, o pra-
zo prescricional para a repetição de um indébito tributário é, atualmente, de cinco
anos8.
No caso de créditos resultantes de pagamento a maior, esse prazo prescricional
quinquenal tem início na data do efetivo pagamento9. E a partir dessa data até a sua
efetiva restituição, o crédito do contribuinte é atualizado monetariamente.
A hipótese sob exame, entretanto, não se confunde com um pagamento a maior.
Os créditos de PIS e Cofins têm natureza escritural e, portanto, são créditos mera-
mente contábeis, o que lhes nega, por exemplo, a aplicação de correção monetária10.

2
Da Prescrição e da Decadência. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 30.
3
Constituição Federal, art. 37, parágrafo 5º.
4
Constituição Federal, art. 5º, inciso XLII.
5
ADCT, art. 53, inciso II.
6
RE nº 71.088, Rel. Ministro Thompson Flores, Segunda Turma do STF, julgado em 6.8.1972.
7
AgRg no REsp nº 1.056.333, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma do STJ, julgado em 25.5.2010.
8
Código Tributário Nacional, art. 168.
9
Salvo nas ações de repetição ajuizadas antes do término da vacatio legis da Lei Complementar nº 118/2005, confor-
me decidiu o STF no julgamento do RE nº 566.621.
10
No caso do PIS e da Cofins a própria lei nega a aplicação da correção monetária.
Trata-se apenas do resultado de uma técnica de contabilização para a equação entre
débitos e créditos do contribuinte, a fim de fazer valer o princípio da não cumulati-
vidade11.
No julgamento do RE nº 195.643, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal
sinalizou no sentido de que o saldo escritural de ICMS em favor do contribuinte não
revela uma obrigação do Estado, mas tão somente a inexistência de um débito fis-
cal, daí por que a correção monetária seria incabível na espécie12.
Mas como compatibilizar essa jurisprudência, que nega a existência da obriga-
ção estatal, com a autorização legal, no caso do ICMS, de que os créditos escritu-
rais decorrentes de exportação sejam transferidos a terceiros13?
Ou como compatibilizar a citada jurisprudência com a autorização legal de que
créditos acumulados de PIS e Cofins decorrentes de exportação sejam compensa-
dos com débitos relativos a outros tributos administrados pela Receita Federal ou,
ainda, na sua impossibilidade, sejam ressarcidos em dinheiro ao contribuinte14?
Ou, ainda, como fazer a compatibilidade entre o entendimento jurisprudencial
e a possibilidade prevista em lei de que os créditos acumulados de IPI, inclusive
aqueles decorrentes da industrialização de produtos isentos ou tributados à alíquo-
ta zero, sejam utilizados na compensação de outros tributos administrados pela
Receita Federal15?
A Receita Federal, por exemplo, entende que o uso do crédito escritural acumu-
lado de IPI na compensação com outros tributos depende de prévia autorização (em-
bora essa exigência não conste da lei), que, uma vez concedida, os transformaria em
créditos de natureza financeira:
“Os créditos de natureza escritural só podem ser esgotados na redução do imposto
devido na saída das mercadorias. Compensá-los com débitos de outros tributos e con-
tribuições, que não o IPI, exige prévia autorização da Secretaria da Receita Federal que,
ao concedê-la, os transforma em créditos de natureza financeira.”16
Essa alteração da natureza jurídica do crédito explicaria, segundo a Receita Fe-
deral, as possibilidades legais de utilização de créditos escriturais acumulados para
outras finalidades que não aquelas originariamente previstas.
A questão ainda merece melhor exame pela jurisprudência e pela doutrina. O
fato certo, porém, é que a lei não autoriza que os créditos escriturais acumulados
de PIS e Cofins que não estejam vinculados à exportação sejam utilizados pelo con-

11
Neste sentido, ver RE nº 205.453, Rel. Ministro Maurício Correa, Segunda Turma do STF, julgado em 3.11.1997
12
RE nº 195.643, Rel. Ministro Ilmar Galvão, Primeira Turma do STF, julgado em 24.4.1998.
13
Lei Complementar nº 87/1996, art. 25, parágrafo 1º, inciso II.
14
Lei nº 10.833/2003, art. 6, parágrafos 1º e 2º: “§ 1º Na hipótese deste artigo, a pessoa jurídica vendedora poderá uti-
lizar o crédito apurado na forma do art. 3º, para fins de:
I - dedução do valor da contribuição a recolher, decorrente das demais operações no mercado interno;
II - compensação com débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos e contribuições administrados
pela Secretaria da Receita Federal, observada a legislação específica aplicável à matéria.
§ 2º A pessoa jurídica que, até o final de cada trimestre do ano civil, não conseguir utilizar o crédito por qualquer das
formas previstas no § 1º poderá solicitar o seu ressarcimento em dinheiro, observada a legislação específica aplicá-
vel à matéria.”
15
Lei nº 9.779/1999, art. 11.
16
Acórdão nº 09-2570/2002, Delegacia da Receita Federal de Julgamento de Juiz de Fora.
tribuinte com outros propósitos17. Somente se admite seu uso na compensação de
débitos escriturais das próprias contribuições, valendo a premissa fixada pelo STF
de que eles não representam uma obrigação estatal.
Assim, surge uma nova pergunta: é possível a fluência do prazo prescricional
para uso do crédito enquanto o contribuinte não tem meios hábeis para fazê-lo, ou
melhor, durante o tempo em que o contribuinte não apura em sua atividade débitos
suficientes para esgotá-lo?
A resposta a essa indagação deve ser negativa.
De fato, seria absurdo e inconciliável com o instituto da prescrição condicionar
o uso do crédito já escriturado a um limite temporal. Isto porque a prescrição, se-
gundo doutrina e jurisprudência, tem como pressupostos básicos a existência de uma
ação exercitável e a inércia do titular da ação durante certo lapso de tempo.
Se o contribuinte não tem condições de utilizar esse crédito mediante compen-
sação, não haveria como lhe imputar qualquer inércia, muito menos impor-lhe a
perda de um direito que está, na prática, impossibilitado de exercer. Entender de
forma contrária seria aceitar que o prazo prescricional possa fluir independentemente
de estarem preenchidos os seus pressupostos elementares. Nas palavras de Câmara
Leal:
“Sem exigibilidade do direito, quando ameaçado ou violado, ou não satisfeita sua obri-
gação correlata, não há ação a ser exercitada; e, sem o nascimento desta, pela necessi-
dade de garantia e proteção ao direito, não pode haver prescrição, porque esta tem por
condição primária a existência da ação.”18
O próprio STJ proferiu diversos julgados no sentido de que a prescrição está
intimamente ligada à inércia do titular do direito e que se a demora no seu uso não
é imputável ao seu titular, então não se lhe pode impor os ônus da prescrição.
Além disso, para a fluência do prazo prescricional é preciso que não exista qual-
quer óbice fático ao uso do direito, o que caracterizaria uma condição suspensiva:
“(...) 1. A perda da pretensão tributária pelo decurso de tempo depende da inércia do
credor, que não se verifica quando a demora na citação do executado decorre unica-
mente do aparelho judiciário. Inteligência da Súmula 106/STJ. (...)” (AgRg nos EDcl
no Ag nº 1.248.816/RJ, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em
22.6.2010, DJe de 1º.7.2010)

“(...) 2. A prescrição pressupõe lesão e inércia do titular na propositura da ação, e se


inaugura com o inadimplemento da obrigação. (...)” (AgRg no Ag nº 1.291.085/RJ, Rel.
Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 1º.6.2010, DJe de 18.6.2010)

“(...) 8. Nada obstante, o surgimento do fato jurídico prescricional pressupõe o decur-


so do intervalo de tempo prescrito em lei associado à inércia do titular do direito de
ação pelo seu não-exercício, desde que inexistente fato ou ato a que a lei atribua efi-
cácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva do curso prescricional. (...)” (AgRg no
Ag nº 1.131.197/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 11.5.2010,
DJe de 27.5.2010)

17
Lei nº 10.833/2003, art. 6º, parágrafo 3º: “O disposto nos §§ 1º e 2º aplica-se somente aos créditos apurados em rela-
ção a custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação, observado o disposto nos §§ 8º e 9º do art. 3º.”
18
Op. cit., p. 25.
No último julgado acima, o STJ faz referência a atos ou fatos a que a lei atribua
eficácia suspensiva. Mas a única interpretação possível dessa regra é a que qualquer
ato ou fato, lato sensu, que impeça o uso do direito também impedirá que o prazo
prescricional corra, porque a teleologia por trás dela é que ninguém pode ser pena-
lizado pela prescrição se não tinha possibilidade de exercer o seu direito e, portan-
to, não pode ser responsabilizado pela demora.
Assim, pelo que se expôs até aqui, a única conclusão a que se pode chegar é que
o direito do contribuinte ao uso dos créditos escriturais de PIS e Cofins acumula-
dos não está sujeito à prescrição enquanto ele estiver, na prática, impossibilitado de
utilizá-los, pela inexistência de débitos suficientes a serem compensados.
Em outras palavras, o direito ao uso do crédito está sujeito à prescrição de cin-
co anos, mas a fluência desse prazo depende da existência de uma inércia prolon-
gada no tempo. Não se verificando inércia, não se pode cogitar de prescrição.
Incabível, assim, a baixa de créditos do ativo, mesmo que passados os cinco anos
desde a sua escrituração, se não tenha sido possível ao contribuinte usar os crédi-
tos, em face da inexistência de débitos a serem compensados. Repita-se: na impos-
sibilidade de uso do crédito, não há como se entender que esteja fluindo o prazo de
prescrição.
Na verdade, permito-me ir além no reconhecimento do direito do contribuinte,
embora com isso corra o risco de trilhar um terreno ainda nebuloso do ordenamen-
to jurídico.
De fato, a jurisprudência tem entendido de forma uníssona que os créditos es-
criturais estão sujeitos à prescrição, aplicando-se, neste caso, o prazo prescricional
previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/193219, também de cinco anos:
“Tributário - ICMS - Crédito Escritural - Prescrição - Decreto 20.910/32 - Preceden-
tes.
1. O prazo para o exercício do creditamento extemporâneo de créditos escriturais de
ICMS é de 5 anos, nos termos do art. 1º do Decreto 20.910/32.
2. Recurso especial provido.” (REsp nº 1.178.930/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon,
Segunda Turma, julgado em 20.5.2010, DJe de 31.5.2010)
Mas qual direito seria atingido pela prescrição: o direito ao creditamento escri-
tural ou o direito ao uso do crédito mediante compensação?
Salvo melhor juízo, entendo que o direito atingido pela prescrição é aquele vin-
culado ao creditamento escritural do imposto; ou seja, o contribuinte tem o prazo
de cinco anos para registrar em seus livros fiscais o crédito do imposto e, em não o
fazendo, perde esse direito.
Em outras palavras, o creditamento somente seria admitido dentro dos cinco
anos da emissão do documento fiscal, em atenção ao princípio da segurança jurídi-
ca, mas o uso desse crédito, mediante compensação com outros débitos, não estaria
condicionado a limite temporal, pois o crédito, uma vez escriturado, passa a inte-
grar o ativo da empresa, como qualquer outro, numa conta fungível em que é im-
possível discernir, a priori, a origem temporal de cada elemento.

19
“Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra
a fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do
ato ou fato do qual se originarem.”
Com efeito, seja na conta de tributos diferidos do balanço patrimonial, seja no
somatório do saldo acumulado de períodos anteriores constante dos livros de apu-
ração do PIS e da Cofins, não é possível definir, prima facie, a origem temporal dos
créditos acumulados.
Esta, portanto, se afiguraria a melhor interpretação das decisões judiciais que
tratam da matéria.
Muitos doutrinadores defendem a tese acima exposta. Por exemplo, “Aroldo
Gomes de Mattos entende que o mencionado prazo é para o contribuinte registrar o
crédito na escrita contábil, sendo imprescritível o direito de utilizá-lo, ou seja, apro-
veitá-lo (...).”20
No mesmo sentido, José Cassiano Borges e Maria Lucia Américo dos Reis afir-
mam que
“o contribuinte tem o prazo de 5 (cinco) dias, contado da data da entrada da mercado-
ria em seu estabelecimento, para efetuar o registro do documento nos livros fiscais.
Contudo, o direito ao lançamento do crédito fiscal somente prescreve em 5 (cinco) anos.
Assim, durante o prazo de mais de 5 (cinco) dias, e menos de 5 (cinco) anos da data
da entrada da mercadoria em seu estabelecimento, o contribuinte poderá aproveitar o
crédito fiscal do IPI e/ou do ICMS.”21
Hugo de Brito Machado, por sua vez, argumenta que o direito ao crédito seria
peculiar, porque
“somente se completa com a ocorrência do débito do imposto, não se podendo, por-
tanto, antes disso, cogitar de decadência. (...) A norma do art. 23, parágrafo único, da
Lei Complementar nº 87/96, portanto, há de ser interpretada no sentido de que o pra-
zo extintivo por ela instituído somente começa a correr no momento em que o contri-
buinte deixa de usar o crédito do ICMS relativo a operações de entrada de mercadoria
ou do recebimento de serviços tributáveis, tendo como fazê-lo em face da realização
de operações que ensejam débito desse imposto.”22
O tema ainda merece melhor exame pelo Superior Tribunal de Justiça. Quando
do julgamento do AgRg no REsp nº 518.777, a Relatora, Ministra Eliana Calmon,
esclareceu que “é qüinqüenal a prescrição da ação que pretende reconhecer o direi-
to ao creditamento escritural”. Também existem alguns precedentes tratando de cré-
dito-prêmio de IPI em que o STJ negou o direito ao reconhecimento de crédito an-
terior aos cinco anos que antecederam a propositura da ação. Em nenhum dos ca-
sos, entretanto, aquele Tribunal tratou da matéria sob a ótica de créditos já escritu-
rados.
Aliás, a experiência parece revelar que as empresas, diante da acirrada repres-
são fiscal a respeito desta matéria específica, buscaram ver reconhecido em juízo
seu direito antes de escriturar tais créditos, evitando, com isso, autuações fiscais.
Além disso, vale lembrar que a legislação autoriza que o contribuinte utilize
créditos acumulados de IPI (mesmo que decorrentes de saídas isentas ou tributadas
com alíquota zero) na compensação de débitos relativos a outros tributos adminis-

20
ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Direito Tributário. 17ª ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2003, p. 1.023, nota de rodapé 241.
21
O ICMS ao Alcance de Todos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 423.
22
Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 147.
trados pela Receita Federal, previsão legal inexistente em relação aos créditos da
contribuição ao PIS e da Cofins que não sejam decorrentes de exportação.
Logo, em relação ao IPI é possível restar configurada a inércia do contribuinte
- já que ele pode, em tese, compensar os créditos acumulados - e, consequentemen-
te, o direito ao uso do crédito desse imposto estaria sujeito à prescrição, ao contrá-
rio do que ocorre em relação ao PIS e à Cofins em geral.
O Ministro José Delgado, no julgamento do AgRg no REsp nº 507.313, enten-
deu que o tratamento dado aos créditos escriturais acumulados de IPI deveria ser o
mesmo conferido à restituição de crédito-prêmio:
“A questão foi tratada como se fosse restituição do crédito-prêmio do IPI. No entanto,
versa a mesma de crédito acumulado em escritura fiscal, relativo às entradas de insu-
mos tributados para a fabricação de produtos tributados à alíquota zero.
Assim, nessa parte, corrijo a decisão ora impugnada.
Porém, o decisório hostilizado, com relação ao prazo prescricional, não merece refor-
ma. Mantenho-o pelos seus próprios fundamentos. Para tanto, mister se faz a sua trans-
crição, litteratim: (...)
Com relação à irresignação da parte agravante, neste aspecto, não vislumbro qual-
quer novidade em seu agravo modificadora dos fundamentos supra-referenciados,
denotando-se, pois, razão para a manutenção do ‘decisum’ agravado, pelo que nada
tenho a acrescentar.
Restou perfeitamente demonstrado que a pacífica jurisprudência desta Corte é no sen-
tido de que, para as ações objetivando o recebimento de creditamento do IPI (crédito
acumulado em escritura fiscal, relativo às entradas de insumos tributados para a fabri-
cação de produtos tributados à alíquota zero), a prescrição atinge apenas as prestações
vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação (Súmula nº 85/STJ).”23
Parece-me, entretanto, que em sede de agravo regimental não foi dada à maté-
ria o exame necessário. Até mesmo porque todos os precedentes que supostamente
fundamentariam o acórdão tratam do prazo prescricional para se reconhecer o di-
reito ao creditamento escritural do imposto e não sobre o prazo para utilização de
créditos já escriturados. E ainda fica a dúvida sobre o que seria exatamente “rece-
bimento de creditamento”.
Em geral, no que se refere ao ICMS e ao IPI, o Superior Tribunal de Justiça tem
examinado a questão sob a ótica do contribuinte que busca ver reconhecido o direi-
to ao creditamento em si, e não o direito à compensação do crédito escriturado. Isso
parece revelar que o exercício do direito - e, consequentemente, a inércia - está mais
ligado à escrituração do que ao encontro financeiro de contas (compensação):
“Processual Civil e Tributário - Embargos de Declaração - Créditos Escriturais do
ICMS - Aproveitamento Pretérito - Prazo Decadencial e não Prescricional.
1. Não merecem acolhida embargos de declaração que não se amoldam às previsões
constantes do art. 535 do CPC.
2. O creditamento escritural do ICMS a posteriori não pode ser equiparado à repeti-
ção de indébito, por não haver naquele crédito no sentido autônomo, oponível ao Fis-
co, mas sim pretensão de aproveitamento de créditos escriturais pretéritos para cálcu-
lo do imposto devido, em respeito ao princípio da não-cumulatividade.

23
AgRg no REsp nº 507.313, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma do STJ, julgado em 7.8.2003, publicado no
DJ de 22.9.2003, p. 272.
3. Aplica-se aos créditos escriturais o prazo decadencial de cinco anos, contados a partir
da emissão do documento fiscal do qual decorre o débito do ICMS, conforme precei-
tua o art. 23, caput e parágrafo único da Lei Complementar 87/96.
4. Embargos de declaração rejeitados.” (EDcl no REsp nº 278.884, Rel. Ministra Elia-
na Calmon, Segunda Turma do STJ, DJ de 12.3.2002)

“Tributário. Recurso Especial. ICMS. Créditos Escriturais. Prazo Prescricional Qüin-


qüenal. Precedentes.
1. O prequestionamento dos dispositivos legais tidos como violados constitui requisi-
to indispensável à admissibilidade do recurso especial. Incidência das Súmulas n. 282
e 356 do Supremo Tribunal Federal.
2. Inexistindo omissão, obscuridade ou contradição a ser sanada no acórdão embarga-
do, mostra-se inequívoco o julgado que rejeita os embargos declaratórios.
3. O prazo de prescrição da ação que visa o reconhecimento do direito ao creditamen-
to do ICMS é qüinqüenal. Precedentes.
4. Recurso especial não-provido.” (REsp nº 579.023/SP, Rel. Ministro João Otávio de
Noronha, Segunda Turma, julgado em 6.12.2005, DJ de 6.3.2006, p. 299)

“Processual Civil - Tributário - IPI - Agravo Regimental - Questões que não foram
Objeto do Decisum Agravado - Não Conhecimento do Recurso - Creditamento - Aqui-
sição de Insumos, Matéria-Prima e/ou Produtos Intermediários Isentos ou com Alíquota
Zero - Prescrição Qüinqüenal - Decreto 20.910/32 - Correção Monetária.
1. Não se conhece do agravo regimental quanto a questões que não foram objeto da
decisão agravada.
2. É qüinqüenal a prescrição da ação que pretende reconhecer o direito ao creditamento
escritural.
3. É pacífico o entendimento desta Corte quanto à impossibilidade da correção mone-
tária dos créditos escriturais do IPI.
4. Agravo regimental conhecido em parte e, nessa parte, improvido.” (AgRg no REsp
nº 518.777/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 18.8.2005,
DJ de 19.12.2005, p. 312)

“Tributário. IPI. Saldos Credores. Prescrição. Correção Monetária. Decisão da Maté-


ria, em Sede de ICMS, Aplicável à Espécie pelo Supremo Tribunal Federal. Afastamen-
to da Correção Pretendida. Precedentes.
1. A Primeira e a Segunda Turmas e a Primeira Seção, deste Superior Tribunal de Jus-
tiça, firmaram entendimento de que, nas ações que visam ao reconhecimento do di-
reito ao creditamento escritural de IPI, o prazo prescricional é de 5 anos, sendo atin-
gidas as parcelas anteriores à propositura da ação.
2. Entendimento do Relator de que o não reconhecimento de correção monetária de
créditos do IPI, em regime de moeda inflacionária, quer sejam lançados extempora-
neamente ou não, fere os princípios da compensação, da não-cumulatividade e do en-
riquecimento sem causa. A permissibilidade de se corrigir monetariamente créditos de
IPI objetiva impedir que o Estado receba mais do que lhe é devido se for congelado o
valor nominal do imposto lançado quando da entrada da mercadoria no estabelecimen-
to. O crédito é uma ‘moeda’ prevista na lei para que o contribuinte, mediante o siste-
ma de compensação com o débito apurado pela saída da mercadoria, pague o imposto
devido.
3. A linha de entendimento supradestacada é a defendida pelo Relator. Submissão,
contudo, ao posicionamento da eg. Primeira Seção, desta Casa Julgadora, no sentido
de que o especial não merece ser conhecido por abordar matéria de natureza constitu-
cional ou de direito local (EREsp nº 89.695/SP, Rel. designado para o acórdão o Min.
Hélio Mosimann).
4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido, com a ressal-
va do meu ponto de vista.” (REsp nº 501.015/RS, Rel. Ministro José Delgado, Primei-
ra Turma, julgado em 4.9.2003, DJ de 13.10.2003, p. 251)

“Tributário - Imposto sobre Produtos Industrializados - Creditamento do IPI dos Insu-


mos e Matéria-prima - Prescrição - Correção Monetária dos Créditos Escriturais.
1. Questão jurídica que, não se identificando com repetição de indébito, afasta a inci-
dência do art. 165 do CTN e, em conseqüência, a contagem do prazo prescricional
consagrada pela jurisprudência para os lançamentos por homologação ‘cinco mais cin-
co’.
2. Prescrição qüinqüenal da ação que pretende reconhecer o direito ao creditamento
escritural.
3. Os créditos escriturais do IPI são tratados com simetria aos débitos, inexistindo dis-
positivo legal que ordene a incidência da correção monetária.
4. A correção monetária, se aplicada aos créditos escriturais, ensejaria a correção dos
débitos da mesma conta, sendo inalterável o resultado final e efetivo, se comparado aos
valores históricos.
5. O Supremo Tribunal Federal, examinando a correção monetária em semelhante si-
tuação, relativa ao ICMS, deixou por conta do legislador estadual estabelecer a inci-
dência, vedando a atualização se não houvesse norma própria e específica.
6. Recurso especial improvido.” (REsp nº 449.768/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon,
Segunda Turma, julgado em 5.6.2003, DJ de 4.8.2003, p. 270)
Mesmo raciocínio se depreende da prática fiscal de exigência de estorno de cré-
ditos indevidamente escriturados, com imposição de multa (que não tem caráter
formal), o que independe de eles terem ou não sido utilizados na compensação de
débitos.
Logo, em síntese, no caso do PIS e da Cofins a prescrição estaria afastada pelo
registro escritural tempestivo (dentro de cinco anos) do crédito e o seu uso ficará
condicionado à efetiva existência de débito passível de ser compensado, sem limi-
tes temporais.
Esse raciocínio decorre, em essência, da própria característica escritural destes
créditos, que têm natureza meramente contábil. O direito exercitável pelo contri-
buinte é a escrituração dos créditos. Porém, dessa escrituração não surge uma obri-
gação da Fazenda Pública, como assinalado pelo Supremo Tribunal Federal no jul-
gado antes citado, como se expôs no início deste trabalho.
O confronto entre créditos e débitos, com a efetiva utilização dos créditos me-
diante compensação, reveste-se de natureza meramente contábil, repita-se. Ou seja,
uma vez escriturados, os créditos passam a integrar uma apuração contábil fungí-
vel do contribuinte, um verdadeiro ativo cuja existência está condicionada à inexis-
tência de débitos, não estando sujeito a prazos prescricionais; caso contrário, não
haveria como justificar a falta de correção monetária de tais créditos.
Em outras palavras, ou se entende que os créditos escriturais não representam
uma obrigação estatal, mas apenas uma técnica contábil, que visa preservar a não
cumulatividade tributária, ou então se desconstrói a antiga jurisprudência do STF
que negava correção monetária a tais créditos, com fundamento, justamente, na sua
natureza escritural. O que não se pode admitir é o contribuinte “sair perdendo” nas
duas pontas, com créditos sujeitos a prescrição e sem correção monetária.
Não custa lembrar que o próprio STJ flexibilizou o entendimento quanto à cor-
reção monetária dos créditos escriturais, para defender sua aplicação nos casos em
que há resistência da fiscalização ao seu uso24.
Cumpre ainda destacar, a título de esclarecimento, que os créditos escriturais de
PIS e Cofins serão utilizados pelo contribuinte pelo mesmo critério de valoração de
seus estoques, que seguem as normas do Pronunciamento Técnico do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis - CPC 16.
Dispõe o referido Pronunciamento que custos identificáveis, destinados a pro-
jetos específicos, devem ser mensurados de forma segregada. Entretanto, “quando
há grande quantidade de itens de estoque que sejam geralmente intercambiáveis”,
o método sugerido é o Peps: primeiro a entrar, primeiro a sair.
Desse modo, se o contribuinte utilizar o método Peps para mensurar seus esto-
ques, o mesmo critério deverá ser observado para definir a ordem cronológica de
uso dos créditos acumulados de PIS e Cofins, ou seja, os créditos mais antigos te-
rão preferência sobre os créditos mais recentes.
A aplicação do método PEPS decorre não somente de uma questão de razoabi-
lidade, mas também de uma interpretação sistemática de todo o ordenamento jurí-
dico.
Por exemplo, o art. 163, inciso III, do Código Tributário Nacional dispõe que a
imputação de pagamentos prioriza os débitos vencidos há mais tempo para aqueles
vencidos a menos, a fim de se evitar a prescrição. No mesmo sentido estabelece o
art. 51, inciso III, da Instrução Normativa RFB nº 900/2008, ao tratar das compen-
sações de ofício na esfera federal.
Também no que se refere ao cálculo do crédito presumido de IPI, a Receita Fe-
deral traçou a seguinte orientação:
“A apuração do crédito presumido será efetuada com base em sistema de custos coor-
denado e integrado com a escrituração comercial da pessoa jurídica que permita, ao
final de cada mês, a determinação das quantidades e dos valores de MP, de PI e de ME
relativos à industrialização durante o período. Este sistema deverá permitir a identifi-
cação de MP, de PI e de ME sujeitos à incidência da contribuição para o PIS/Pasep e
da Cofins. Portanto, a pessoa jurídica deverá manter sistema de controle permanente
de estoques, no qual a avaliação dos bens será efetuada pelo método da média ponde-
rada móvel ou pelo método denominado Peps, em que as saídas das unidades de bens
seguem a ordem cronológica crescente de suas entradas em estoque.”
Na própria DIPJ, o campo destinado aos créditos acumulados de períodos ante-
riores precede o campo de créditos do mês em curso.
Em resumo, portanto, entendo que ainda que o direito ao uso dos créditos de PIS
e Cofins apurados pelo regime não cumulativo esteja sujeito à prescrição quinque-
nal prevista no Decreto nº 20.910/1932, esse limite temporal refere-se apenas à es-

24
Súmula nº 411 do STJ: “É devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveita-
mento decorrente de resistência ilegítima do Fisco.”
crituração dos créditos e não ao seu aproveitamento em si, mediante o confronto com
débitos. E, mesmo que assim não fosse, tal gravame jamais poderia prejudicar o
contribuinte que está, na prática, impedido de usar os créditos, ante a inexistência
de débitos compensáveis, já que, neste caso, não há inércia.
Além disso, a tarefa de datar os créditos acumulados de PIS e Cofins deve sem-
pre levar em consideração o método de mensuração de estoques utilizado pelo con-
tribuinte, ou, na falta deste, o critério PEPS, cuja adequação, por sua racionalidade,
pode ser extraída de uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico.
Fundo de Comércio e Sucessão Tributária
em Transferência de Locação
Ives Gandra da Silva Martins

No XXXVI Simpósio Nacional de Direito Tributário do


Centro de Extensão Universitária-Instituto Internacional de
Ciências Sociais (18 de novembro de 2011), o Ministro
Moreira Alves, em sua palestra inaugural, sobre o tema, as-
sim se referiu:
“Como salienta Rubens Requião (Curso de Direito Comer- Ives Gandra da Silva
cial, 1º volume, 21ª edição, nº 157, p. 204, Editora Saraiva, Martins
São Paulo, 1993), fundo de comércio e estabelecimento co- é Professor Emérito
mercial são expressões sinônimas, porquanto ‘na nomencla- das Universidades
tura jurídica, usada pelos nossos autores, aplicam-se, comu- Mackenzie, Unip,
mente, as expressões fundo de comércio, por influência dos Unifieo, UNIFMU, do
escritores franceses ( fonds de commerce), e azienda, por ins- Ciee/O Estado de São
piração dos juristas italianos, como sinônimas de estabeleci- Paulo, das Escolas de
mento comercial’, razão porque ‘usaremos, pois, indistinta- Comando e
mente, os três vocábulos’. No mesmo sentido, Fran Martins, Estado-Maior do
Curso de Direito Comercial, 24ª edição revista e atualizada Exército - Eceme,
por Jorge Lobo, nº 383, p. 328, Editora Forense, Rio de Ja- Superior de Guerra -
neiro, 1999, que observa que ‘no Brasil tem sido emprega- ESG e da Magistratura
da, para significar o fundo de comércio, a expressão estabe- do Tribunal Regional
lecimento comercial’, embora o autor ache mais apropriado Federal da 1ª Região,
usar da expressão fundo de comércio. Professor Honorário
Por outro lado, são integrantes do fundo de comércio os ele- das Universidades
mentos incorpóreos e corpóreos de que se utilizam os comer- Austral (Argentina),
San Martin de Porres
ciantes em suas atividades, não se podendo dizer, generica-
(Peru) e Vasili Goldis
mente, qual desses elementos é o preponderante.
(Romênia), Doutor
Daí, e em face do disposto no caput do artigo 133 do CTN
Honoris Causa das
que versa a sucessão tributária, estar eu de pleno acordo com
Universidades de
a resposta do Dr. Ives Gandra da Silva Martins, verbis:
Craiova (Romênia) e
‘Trata-se (o fundo de comércio) de rigor, de um conjunto de da PUC/Paraná, e
atributos que determinado negócio adquire, transcendendo Catedrático da
de muito a característica de um elemento isolado, como, por Universidade do
exemplo, local, atividade ou mesmo clientela, se isoladamen- Minho (Portugal),
te considerado cada um desses elementos. É o conjunto de- Presidente do
les e de outros que constitui aquilo que representa o ‘fundo Conselho Superior de
de comércio’, algo que transcende a própria noção de empre- Direito da Fecomercio/
sa. O valor do ‘fundo de comércio’ é sempre superior ao da SP, Fundador e
própria empresa, em seus valores escriturais, visto que nele Presidente Honorário
considerado está não só o valor patrimonial da sociedade e do Centro de Extensão
do negócio, como todos os elementos que o compõem - Universitária-CEU/
como o ‘good will’, o ‘earning power’ - além de outros que Instituto Internacional
conformam o seu valor real, de resto, o que é permanente- de Ciências Sociais -
mente considerado para efeitos de alienações empresariais. IICS.
No que concerne à sucessão tributária ‘fundo de comércio’ é o conjunto de todos es-
ses atributos isoladamente considerados.
Transferência de locação não é aquisição de estabelecimento ou fundo de comércio.
Apenas nas hipóteses de ‘aquisição’ ou ‘alienação’ de ‘fundo de comércio’ ou ‘esta-
belecimento comercial’ é que se pode falar em sucessão tributária.
Na transferência de locação, o detentor do imóvel não é a empresa que o transfere, mas
terceiro, que de rigor, continua a ser o proprietário do imóvel com um novo locatário,
como o foi em relação ao antigo.
Locação não é alienação, nem transferência de locação aquisição de estabelecimento
comercial.
À evidência, o tipo de negócio a ser explorado pelo novo locatário é irrelevante, no
caso, para determinar ou não a sucessão tributária.”1
De rigor, minha posição, cujas conclusões foram reproduzidas pelo eminente
Ministro do qual se dizia, quando ocupando uma das cadeiras do sodalício, que se
o STF era o guardião da Constituição, Moreira Alves era o guardião do Supremo e
que foi o único brasileiro a ocupar a presidência dos Quatro Poderes (República,
Judiciário, Legislativo e Constituinte), é rigorosamente idêntica a do eminente ju-
rista no que diz respeito ao fundo de comércio.
Há anos venho defendendo que não se pode confundir “acervo” com “fundo de
comércio”. O fundo de comércio representa, não obstante constituir-se em concei-
to mais amplo de Direito Privado e de fronteiras mais elásticas, uma universalidade
de bens corpóreos e incorpóreos.
Alguns dos juristas que procuraram definir o fundo de comércio, sempre real-
çaram tais características, no direito pátrio e comparado, como Albert Cohen (Traité
Theorique et Pratique des Fonds de Commerce), Alfredo Buzaid (Da Ação Reno-
vatória, Saraiva), L. Autuori (“Fundo de Comércio”, Repertório Enciclopédico do
Direito Brasileiro vol. 23, Borsoi, p. 230), A. B. Cotrim Neto (“Fundo de Comér-
cio”, Enciclopédia Saraiva de Direito vol. 39)2.
Ora, um dos aspectos mais polêmicos na atualidade é o que concerne a locação
de imóvel, que muitos têm considerado como elemento caracterizador da sucessão,
confundindo a transferência do local como transferência do fundo de comércio. Não
me parece, como também ao Ministro Moreira Alves, que possa ser elemento de-
flagrador da sucessão por não constituir “fundo de comércio”.

1
18 de novembro de 2011, no Centro de Extensão Universitária, São Paulo.
2
Às páginas 243/244 do livro Da Ação Renovatória, Alfredo Buzaid entende por fundo de comércio o conjunto de
todos os bens corpóreos e incorpóreos de uma empresa: “A generalidade dos autores costuma classificar os elemen-
tos que compõem o fundo de comércio em duas categorias fundamentais, que reúnem espécies variáveis e de nature-
za diversa, consoante a importância do ramo e da atividade mercantil: a) direitos ou coisas incorpóreas: I - o direito
à renovação judicial do contrato de arrendamento; II - o nome comercial, compreendendo a firma e a denominação;
o título e a insígnia do estabelecimento; a expressão ou sinal de propaganda; as marcas de indústria e de comércio;
as recompensas industriais; as invenções e os privilégios; os modelos de utilidade, os desenhos e os modelos indus-
triais; III - os direitos autorais e os de resguardo do nome ou pseudônimo contra os seus usurpadores; IV o aviamen-
to; a freguesia e sua defesa contra a concorrência desleal; b) coisas corpóreas: I - os imóveis, a saber, terrenos, cons-
truções, edifícios, fábricas, armazéns, depósitos, com tudo neles intencionalmente empregado em sua exploração
industrial, aformoseamento ou comodidade, irretiráveis sem fratura ou dano; II - os móveis, i.e., as instalações, o
mobiliário, os utensílios, veículos, máquinas, maquinismo, acessórios e pertences, a matéria-prima, os produtos
manufaturados ou semimanufaturados, as mercadorias, ou fazendas em geral, os títulos ou efeitos do comércio.” (Da
Ação Renovatória. São Paulo: Saraiva, pp. 243/4)
Com efeito, reza o art. 133 do CTN o seguinte:
“Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por
qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou pro-
fissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou
sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabele-
cimento adquirido, devidos até à data do ato:
I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;
II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar den-
tro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro
ramo de comércio, indústria ou profissão.”
O corpo do art. 133 prevê a responsabilidade sucessória na alienação das em-
presas dentro das seguintes ideias centrais:
“1) O sucessor poderá ser pessoa natural ou jurídica;
2) A pessoa jurídica só poderá ser de direito privado;
3) Qualquer que seja o tipo de transferência implicará a responsabilidade sucessória
(aquisição por qualquer título);
4) O bem adquirido poderá ser o fundo de comércio ou qualquer estabelecimento co-
mercial, industrial e profissional;
5) A responsabilidade estará vinculada à continuação da exploração do objeto do ne-
gócio;
6) O rótulo sob o qual a exploração for continuada (mesma ou outra razão social e fir-
ma ou nome individual) será irrelevante para a aplicabilidade do artigo analisado nos
casos concretos de sucessão;
7) A responsabilidade estará limitada aos tributos devidos pelo sucedido e até a data
do ato traslativo.”
A responsabilidade criada pelo art. 133, poderá, ainda, ter dupla característica:
a) ser integral, no caso de o alienante cessar suas atividades; e
b) ser apenas subsidiária do alienante, se este continuar suas atividades no
ramo, no próprio ou em outro negócio, até seis meses da data da alienação.
A primeira ideia-base é a de que o sucessor poderá ser uma pessoa natural (físi-
ca) ou jurídica (empresa). Empresa a firma, individual ou coletiva, que explora o
comércio, indústria ou atividade profissional com o intuito de lucro ou remunera-
ção. Não cuidou, o legislador, da pessoa física, exceção feita à firma individual, pela
impossibilidade de quem não o seja ou não venha a sê-lo, em decorrência da aqui-
sição, poder suceder, fundos de comércio ou estabelecimento.
Se o sucessor for pessoa jurídica, a sua responsabilidade tributária só existirá se
de Direito Privado. Pessoa jurídica de Direito Público não se responsabiliza pelos
tributos que deva o sucedido.
O princípio é facilmente explicável se a pessoa jurídica de Direito Público for a
própria titular do crédito tributário, porque este estará compensado pela confusão,
em uma única pessoa, do credor e devedor. Quando o sucessor não é o titular do
crédito, a exclusão, na intenção legislativa, deveu-se, em minha opinião, ao fato de
a sucessão, normalmente, decorrer dos elevados interesses do Estado, não sendo
desejável sejam os seus objetivos prejudicados pela sub-rogação nos ônus sucessó-
rios.
Nesses casos, o princípio não me parece o mais justo, por colocar o Estado em
condições privilegiadas de concorrência e intervenção no mercado privado, sendo,
todavia, o princípio da atual legislação.
Creio mesmo que fere o art. 173, parágrafos 1º e 2º, da Constituição Federal,
assim redigido:
“§ 1º A empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explo-
rem atividade econômica sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas priva-
das, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias.
§ 2º As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de
privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.”
Entendo, também, nesses casos, que, não havendo transferência de responsabi-
lidade tributária, será suportada integral e exclusivamente pelo sucedido, o que con-
traria o princípio defendido por civilistas e comercialistas insignes, antes do advento
do Código Tributário.
O terceiro comando do art. 133 do CTN cuida da forma traslativa da alienação,
a qualquer título, do bem por parte do sucedido ao sucessor. O dispositivo fala em
aquisição no caput e em alienação nos itens I e II, entendendo-se expressões equi-
valentes, conforme seja vista a transferência da óptica do sucessor ou do sucedido.
O conceito fundamental da alienação envolve a ideia de transmissão de direito
de um determinado patrimônio, que em virtude dela é desfalcado, para outro, que
aumenta.
Na expressão “a qualquer título” está contida a intenção legislativa de abranger
qualquer espécie, sem exceção, de transferência.
O bem alienável ou adquirível só poderá ser de duas espécies: (a) fundo comér-
cio; e (b) estabelecimento comercial, industrial ou profissional, sendo o primeiro o
conjunto dos bens da empresa ou do profissional, inclusive neles de ordem imate-
rial (clientela), e o segundo apenas uma unidade muitas vezes, poderá ser a única
operativa.
Estranhamente, tratou, o legislador, de três tipos de estabelecimentos (profis-
sional, comercial ou industrial), não cuidando de estabelecimentos agrícolas.
Entendo que, sendo a lei analisada taxativa para os estabelecimentos agrícolas,
os sucessores não assumirão a responsabilidade tributária dos sucedidos.
A legislação italiana também menciona apenas a responsabilidade tributária para
a sucessão nos estabelecimentos comerciais e industriais:
“La stessa responsabilità solidade é stabilita nel conffronti del sucessore a qualsiasi
titolo, por atto fra vivi, in un ‘azienda industriale o commerciale por il pagamento.”
Nem profissionais, nem agrícolas.
Restrição compreensível é aquela decorrente de a responsabilidade estar vincu-
lada apenas à continuação da respectiva exploração. Evita-se, com isso, dificultar a
alienação de estabelecimentos que possam servir para outras finalidades. Até por-
que, nesses casos, não haveria sucessão da empresa, mas a mera alienação de seus
bens.
E agora entro a analisar uma das características que mais interpretações diver-
gentes tem acarretado na aplicação do dispositivo em estudo, reconhecendo ser
minha interpretação minoritária.
Pretendeu o legislador evitar, na caracterização da figura sucessória, qualquer
forma de desresponsabilização. Por essa razão, desde que continuada a exploração
do negócio, seja com outra razão social, seja em nome individual, o sucessor estará
automaticamente sujeito à responsabilidade tributária do sucedido.
Pergunta-se agora: a mera alteração do controle acionário configuraria a suces-
são tributária?
Entendo que sim, mesmo que a direção da empresa não seja transformada, já que
simples delegada dos grupos detentores da maioria das ações.
Tivesse o legislador a intenção de não considerar o fato mencionado como in-
cluso na responsabilização tributária, a expressão “mesma razão social” teria sido
excluída.
Numa economia de raízes capitalistas, como é a brasileira, cujo mecanismo
exige, todavia, nas sociedades por ações, constantes remanejamentos, a exegese
acima tem acarretado inúmeros problemas práticos, principalmente em face da le-
gislação específica, em que a sucessão empresarial, implicando certas responsabi-
lidades tributárias, não acarreta, porém, assunção de todas elas.
A extensão dessa responsabilidade está limitada aos tributos, pelo princípio da
personalização da pena, conforme variadas decisões judiciais atrás citadas.
Aliomar Baleeiro, na 2ª edição de seu livro Direito Tributário Brasileiro (Fo-
rense), contesta o princípio rebatendo minha opinião, posição, todavia, anterior à
avalanche de decisões no sentido da transferência apenas da responsabilidade por
tributos e anterior ao próprio livro Direito Tributário 1, em que discuti seus funda-
mentos. Com o tempo, rendeu-se ao argumento, tendo, como Ministro do Supremo
Tribunal Federal, assim decidido:
“o problema reside na cláusula ‘responde pelos tributos’ sem multas ou penalidades.
O v. acórdão inclinou-se pela interpretação estrita, por ser a peculiar ao Direito Tribu-
tário, que gira em torno do princípio da reserva da lei: a criação de qualquer obriga-
ção tributária há de ser rigidamente circunscrita aos termos expressos da lei. E a multa
é uma obrigação tributária sujeita à reserva da lei (CTN, art. 97, V). Essa interpreta-
ção não é razoável mas já teve consagração no RE 76.153 de 30/11/73 e no AI 9.333,
relator Orosimbo, Jurisprudência do STF, 1941, III, p. 183. E admissível também uma
interpretação larga, a despeito de o art. 133, mencionar apenas ‘tributos’, sem mencio-
nar multas. Eu próprio já me inclinei a aceitá-la, embora hoje não me pareça a melhor,
p. 8.041 (RE 71.471 - Resenha Tributária 4.2, n. 34/75, p. 796/807).”
Finalmente, a respeito das duas hipóteses de responsabilidade integral e subsi-
diária do sucessor, expostas nos dois itens do art. 133 do CTN, assim explica Alio-
mar Baleeiro: “O Fisco exigirá diretamente os débitos anteriores à alienação ao
adquirente se o alienante retirar-se do negócio ou atividade e não iniciar outra nos
6 meses seguintes; mas os exigirá diretamente do próprio alienante em caso contrá-
rio, reservando-se a cobrá-los do adquirente se aquele for insolvente, desaparecer,
ou tornar impraticável a cobrança.”
Esta, em minha inteligência, a interpretação mais correta do texto examinado3.
Feitas tais considerações, parece-me claro que, na hipótese considerada, ou seja,
nas locações, não há qualquer aquisição de “fundo de comércio” ou “estabelecimen-
to comercial”, visto que o primeiro é um conjunto de atributos, inexistente na mera
transferência de um contrato de locação. Por outro lado, entendo que a mera trans-

3
Comentários ao Código Tributário Nacional. Vol. 2. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, pp. 267/271.
ferência de um contrato de locação não constitui alienação de um estabelecimento
comercial, nem a alienação por quem o recebe, de estabelecimento.
A própria hipótese de responsabilidade integral, no caso de cessação de ativi-
dades pela empresa alienadora ou subsidiária do adquirente, se houver continuida-
de em outro local daquela atividade ou início em três meses, não se pode aplicar às
hipóteses, visto que transferência de locação não é aquisição de estabelecimento ou
fundo de comércio4.
Ora, tal posição do Ministro Moreira Alves e minha foi aprovada pelo Plenário
do referido Simpósio com a seguinte redação, tendo havido apenas um voto contrá-
rio. Eis a conclusão da Comissão de Redação presidida pelo Professor Alcides Jor-
ge Costa, com a colaboração de Fátima Fernandes Rodrigues de Souza e Rodrigo
Rebouças5:
“Fundo de comércio é o conjunto dos elementos materiais e imateriais que compõem
a atividade de uma empresa. Não ocorre sucessão tributária na hipótese de transferên-
cia da locação de um imóvel de uma empresa para outra do mesmo ramo de atividade,
permanecendo a primeira em plena exploração de seu objeto social em outro endere-
ço, por não se caracterizar a transferência de todos os elementos que compõem o fun-
do de comércio, exceto o local.” (18 de novembro de 2011)

4
“Processo REsp 108.873/SP
Recurso Especial
1996/0060339-1
Relator: Ministro Ari Pargendler
Órgão Julgador: T2 - Segunda Turma
Data do Julgamento: 04/03/1999
Data da Publicação/Fonte: DJ 12/04/1999, p. 111
Ementa
Tributário. Responsabilidade por Sucessão. Não Ocorrência.
A responsabilidade prevista no artigo 133 do Código Tributário Nacional só se manifesta quando uma pessoa natu-
ral ou jurídica adquire de outra o fundo de comércio ou o estabelecimento comercial, industrial ou profissional; a
circunstância de que tenha se instalado em prédio antes alugado à devedora, não transforma quem veio a ocupá-lo
posteriormente, também por força de locação, em sucessor para os efeitos tributários. Recurso Especial não conhe-
cido.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça,
na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, no conhecer do recurso, nos termos
do voto do Sr. Ministro-Relator. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Aldir Passarinho Júnior, Helio Mosi-
mann e Peçanha Martins.” (Revista Fórum de Direito Tributário nº 36. Ano 6. Belo Horizonte, novembro/dezembro
de 2008, pp. 9/26 - destaques meus)
5
Escreveram para o Simpósio os seguintes autores: Ives Gandra da Silva Martins, Hugo de Brito Machado, Sacha
Calmon Navarro Coêlho, Kiyoshi Harada, Yoshiaki Ichihara, Luís Eduardo Schoueri, Vittorio Cassone, Jorge de
Oliveira Vargas, Carlos Henrique Abrão, Carlos Valder do Nascimento, Marilene Talarico Martins Rodrigues, José
Eduardo Soares de Melo, Douglas Yamashita, Agostinho Toffoli Tavolaro, Luís Antonio Flora, Leonel Cesarino
Pessoa, Maria Odete Duque Bertasi, Ricardo Mariz de Oliveira, Bruno Fajersztajn e Cláudia Vit de Carvalho, Edi-
son Carlos Fernandes, Elidie Palma Bifano, Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho, Octavio Campos Fischer, Vi-
nicius T. Campanile, Fernando L. Lobo d’Eça, Moisés Akselrad, Angela Maria da Motta Pacheco, Schubert de Fa-
rias Machado, Dirceu Antonio Pastorello, Melford Vaughn Neto, Mario Luiz Oliveira da Costa, Ana Regina Cam-
pos de Sica, Roberto Ferraz e Nelson Souza Neto, Maria Helena Tavares de Pinho Tinoco Soares, André Elali e Fer-
nando Lucena Jr., André Portella, tendo as Comissões temáticas sido presididas por Marcelo Borghi (1ª), Rogério
Gandra Martins (2ª) e Cláudia Pavan (3ª), com a colaboração de Miguel Gutierrez, Adib Sad, Soraya Locatelli, Thais
Folgosi, Fatima Haidar e Fernanda Hernandez.
Dez Anos da Norma Geral
Antielisiva no Brasil
João Dácio Rolim
Paulo Rosenblatt

1. O Contexto da LC nº 104: a Tendência de


Universalização da Norma Geral Antielisiva
A elisão fiscal1 é um fenômeno universal, independente
da cultura. À medida em que se especializa, acompanhando
a complexidade da legislação tributária, e se torna abusiva e
agressiva, em um contexto de competição global exacerba-
da, os Estados reagem por meio de normas antielisivas, con-
sideradas parte inseparável dos sistemas tributários moder- João Dácio Rolim
nos. é Doutor em Direito
O pensamento liberal de que o contribuinte pode orga- Tributário pela
UFMG, PhD
nizar suas transações de maneira a pagar menos tributos e
Researcher pelo
que o Estado deve respeitar os direitos e obrigações criados Queen Mary College
pelas partes, celebrizado no caso do Duque de Westminster2, University of London,
é um dos mais importantes pilares do Direito Tributário, mas LLM em International
não é um princípio absoluto3. Praticamente nesta mesma Taxation pelo London
época, nascia nos Estados Unidos a doutrina judicial da bu- School of Economics,
siness purpose no caso Gregory v. Helvering4. e Professor de Direito
As jurisdições ocidentais passaram a impor limites à Tributário da FGV.
completa liberdade de planejamento tributário, para preser-
var outros valores como justiça fiscal, igualdade e capacida-
de contributiva, neutralidade tributária, e eficiência econô-
mica. Criou-se um paradigma de moralidade fiscal: o con-
tribuinte não tem o direito de pagar o mínimo possível de
tributos, nem o dever de pagar o máximo, mas de suportar

1
A expressão elisão fiscal é multívoca e geralmente definida negativamente. Cf.
BAKER, Philip. “Tax Avoidance, Tax Evasion & Tax Mitigation”. Londres: Gray’s
Inn Tax Chambers Articles, 2000, disponível em www.taxbar.com/documents/
Paulo Rosenblatt
tax_avoidance_tax_mitigationPhilip_Baker.pdf, acesso em 8.3.2011. Para evitar os
equívocos do critério temporal, utilizaremos as consequências dos atos e negócios é Doutorando em
jurídicos como elemento diferenciador. Então, evasão fiscal se refere à conduta ti- Direito Tributário no
pificada como crime (ineficaz, ilícita e sujeita a consequências penais, civis e tri- Institute of Advanced
butárias), elisão fiscal à supressão, redução ou postergação do pagamento do tri- Legal Studies
buto (lícita civilmente, mas ineficaz quanto à sua finalidade econômico-fiscal), e
planejamento tributário à economia lícita de tributo (eficaz em relação à finalidade University of London,
tributária). Mestre em Direito
2
IRC v. Duke of Westminster [1936] AC 1 (HL). Público pela UFPE,
3
ARNOLD, Brian. “A Comparison of Statutory General Anti-avoidance Rules and Graduado pela UFPE
Judicial General Anti-avoidance Doctrines as a Means of controlling Tax Avoidan-
e Procurador do
ce: Which is Better?” In: JONES, J. A.; HARRIS, P. et al (ed.). Comparative Pers-
pectives on Revenue Law. Cambridge: Cambridge University Press, 2008, pp. 2-3. Estado de
4
Gregory v. Helvering 293 US 465 (1935). Pernambuco.
um ônus fiscal “justo”5. O planejamento tributário é reconhecido, nesses países,
como meio lícito de economia de tributos, desde que não abusivo ou artificioso.
A economia de tributos não ocorre apenas pela organização dos negócios pelo
contribuinte, mas pela exploração por este da letra da lei ou de operações artificiais
e sem finalidade empresarial. E a própria lei estimula a opção por formas fiscalmente
menos onerosas, como o financiamento para utilização de um bem (compra e ven-
da a prazo, financiamento de terceiros, arrendamento mercantil), ou investimentos
em diferentes instrumentos financeiros ou bens de capital.
Para preservar a certeza formalista-conceptual de que apenas fatos previstos em
lei sofrem a incidência tributária, e ao mesmo tempo combater artificialismos cria-
dos para gerar benefícios fiscais sem propósito econômico, os Estados passaram a
editar normas antielisivas específicas. Porém, essa estratégia demonstrou ter limi-
tado sucesso, dada a impossibilidade de prever os esquemas criados para contornar
as regras de tributação e até mesmo as normas antielisão6, e o fato de que o aumen-
to da quantidade e complexidade das normas (denominada de hyperlexis pela dou-
trina americana) cria novas oportunidades para a elisão fiscal.
A Alemanha e a Itália do Estado intervencionista substituíram esse conceptua-
lismo pela interpretação econômica ou funcional, com a adoção de normas gerais
que primam pelo resultado econômico em detrimento da liberdade negocial7. Criti-
cada essa concepção no mundo todo, a resistência dos países em adotar normas ge-
rais antielisão não impediu o Fisco e os Tribunais deles em coibir abusos através de
figuras do Direito Civil (simulação, fraude à lei e abuso de formas, em países de civil
law), ou de doutrinas judiciais (forma sobre substância, propósito negocial, artifi-
cialidade, descaracterização de operações circulares ou de etapas inseridas sem fi-
nalidade empresarial, nos de common law)8.
As normas gerais antielisão passaram a ser vistas sob a perspectiva de que o
combate à elisão fiscal com clareza (e não necessariamente certeza) é mais vanta-
joso do que as táticas fluidas e imprevisíveis do Fisco e das Cortes, porque aquelas
fixam critérios e procedimentos para a sua aplicação9. A elisão não pode ser enfren-

5
MURPHY, Liam; e NAGEL, Thomas. The Myth of Ownership: Taxes and Justice. Oxford: Oxford University Press,
2002, pp. 1-4. No Brasil, sobre as consideradas três fases do debate sobre o planejamento tributário (liberdade salvo
simulação na primeira fase, liberdade salvo abuso de direito e fraude à lei como segunda fase, e a terceira como li-
berdade com capacidade contributiva), vide GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. São Paulo: Dialéti-
ca, 2004, caps. VII a XIII.
6
No Reino Unido, apelidou-se de “avoidance karate” (“karatê elisivo”) as estratégias utilizadas pelo contribuinte para
contornar as próprias normas específicas antielisão (cf. SANDFORD, Cedric. Why Tax Systems differ. EVANS, C.
(atual.). Bath: Fiscal, 2000, cap. 11, no prelo) e de “creative compliance” (“adimplemento criativo”) a busca de al-
ternativas para obter vantagens fiscais quando novos limites são legalmente estabelecidos (cf. FREEDMAN, Judith;
LOOMER, G.; et al. “Moving Beyond Avoidance?”Beyond Boundaries: Developing Approaches to Tax Avoidance
and Tax Risk Management. FREEDMAN, Judith (ed.). Oxford: Oxford University Centre for Business Taxation, 2008,
p. 115).
7
TORRES, Ricardo Lobo, “Normas Gerais Antielisivas”. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico,
2005, disponível em www.direitodoestado.com.br, acesso em 31.3.2011, pp. 1-6.
8
ZIMMER, Frederik. “General Report”. Form and Substance in Tax Law. International Fiscal Association - IFA.
Cahiers v. 87a, 2002, pp. 37-38. TORRES, Ricardo Lobo. Ibidem, pp. 1-6.
9
GODOI, Marciano Seabra de. “Uma Proposta de Compreensão e Controle dos Limites da Elisão Fiscal no Direito
Tributário Brasileiro e Estudos de Casos”. Planejamento Tributário à Luz da Jurisprudência. YAMASHITA, Dou-
tada apenas com interpretação, nem uma norma geral é sua única solução. Ela não
exclui outras técnicas, mas é importante por promover a interpretação teleológica
pelo Judiciário e conferir poderes descaracterizadores à Administração10. As normas
gerais antielisivas, contudo, estão longe de ser um consenso.
Na década de 1990, organismos multilaterais, como a OCDE11, recomendaram
a adoção e o reforço de medidas antielisivas para combater a concorrência fiscal
prejudicial12. Mesmo países não integrantes dessas organizações, como o Brasil,
foram compelidos a adotar essas regras13. Nos Estados Unidos, ante o sucesso de
doutrinas judiciais antiabuso, ainda há resistência a uma norma geral antielisiva,
embora muitas doutrinas tenham sido incorporadas à legislação14 para afastar incon-
sistências na jurisprudência e tentar unir as doutrinas da substância sobre a forma
com a da business purpose15. E no Reino Unido, ante as incertezas das doutrinas
judiciais dos casos Ramsay16 e Furniss e Dawson17 pela Casa dos Lordes - que as
consideram meros princípios de interpretação18-, discute-se há anos a introdução de
uma norma geral antielisão19.
Nesse contexto, em 2001, o Brasil editou a Lei Complementar nº 104, para in-
cluir o parágrafo único ao art. 116 do CTN, saindo de uma situação de liberdade do
contribuinte na estruturação de seus negócios, para restringir o planejamento tribu-
tário abusivo20. Sem inovar, a LC nº 104 se inspirou no modelo francês21 do art. 64

glas (org.). São Paulo: Lex, 2007, pp. 249-57; ALMENDRAL, Violeta Ruiz. Tax Avoidance and the European Court
of Justice. Londres: Intertax v. 33, n. 12, 2005, pp. 560-1.
10
TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., p. 15; ALMENDRAL, Violeta Ruiz. Op. cit., pp. 560-1.
11
OCDE. “Harmful Tax Competition: an Emerging Global Issue”. Disponível em http://www.oecd.org/dataoecd/33/
0/1904176.pdf, acesso em 1º.12.2009.
12
Assim, vários Estados adotaram normas gerais antielisão: Itália (1990), Bélgica (1993), Suécia, Finlândia e Espanha
(1995), e Portugal (1999). Cf. THURONYI, Victor. Comparative Tax Law. Londres: Kluwer Law International, 2003,
p. 195. No mesmo sentido, ZIMMER, Frederik. Op. cit., pp. 37-38.
13
AVI-YONAH, Reuven S. International Tax as International Law: an Analysis of the International Tax Regime. Cam-
bridge: Cambridge University Press, 2007, pp. 1-3.
14
JENSEN, Erik. “The US Legislative and Regulatory Approach to Tax Avoidance”. Comparative Perspectives on
Revenue Law. JONES, J. A.; HARRIS, P.; et al (ed.). Cambridge: Cambridge University Press, 2008, pp. 99-118;
PICKUP, David. “In Relation to General Anti-avoidance Provisions: a Comparative Study of the Legal Frameworks
used by Different Countries to protect their Tax Revenues”. Beyond Boundaries: Developing Approaches to Tax
Avoidance and Tax Risk Management. FREEDMAN, J. (ed.). Oxford: Oxford University Centre for Business Taxa-
tion, 2008, pp. 9-21; e GRECO, Marco Aurélio. Op. cit., pp 325-343.
15
Enquanto os tribunais federais e dos terceiro, quinto, décimo e décimo primeiro circuitos concordam com o teste
conjuntivo (de aplicar concomitantemente as duas doutrinas), o tribunal do quarto circuito aplica qualquer uma de-
las apenas como requisito para validar as transações do contribuinte. Cf. International Tax Review, maio de 2009. O
Health Care and Eduaction Affordability Act de 31 de março de 2010 incluiu o Code section 7701(o) codificando as
duas doutrinas e considerando que uma transação teria substância econômica somente se (1) ela muda significada-
mente a posição econômica do contribuinte exceto pelos efeitos fiscais federais, e (2) se há um propósito substancial
que não apenas fiscal.
16
WT Ramsay Ltd. v. Inland Revenue Commissioners [1982] A.C. 300 (HL).
17
Furniss (Inspector of Taxes) v. Dawson [1984] A.C. 474 (HL).
18
HOFFMAN, Leonard. “Tax Avoidance”. British Tax Review nº 2. Londres, pp. 197-206; e HALKYARD, Andrew.
“Common Law and Tax Avoidance: Back to the Future?” Revenue Law Journal v. 14, nº 1. Londres, pp. 30-1.
19
HM TREASURY. The New Approach to Tax Policy Making: a Response to the Consultation. Londres, 2010, pp. 1-20.
20
SCHOUERI, Luís Eduardo. “O Desafio do Planejamento Tributário”. Planejamento Tributário e o “Propósito Ne-
gocial”. SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); FREITAS, Rodrigo de (org.). São Paulo: Quartier Latin, 2010, pp. 15-6.
21
TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., 2005, pp. 5-6. Vide também ROLIM, João Dácio. Normas Antielisivas Tributá-
rias. São Paulo: Dialética, 2001, p. 240.
do Livro de Procedimentos Fiscais vigente à época22, que cuida dos procedimentos
de abuso de direito, e tinha como elementos centrais o instituto civilista do abuso
de direito de um lado, e, de outro, a expressão vaga e imprecisa dissimulação23.
Parte da doutrina mais formalista brasileira24 ignora o verdadeiro propósito da
regra e defende que ou a norma é inconstitucional, ante os princípios da legalidade
estrita e tipicidade fechada25, ou que se trata de uma norma antievasiva, sob o en-
tendimento de que dissimulação seria simulação relativa e ao argumento de inexis-
tência na tradição brasileira do instituto do abuso do direito no campo tributário26.
Na Exposição de Motivos da LC nº 104, a norma antielisão seria “um instrumento
eficaz para o combate aos procedimentos de planejamento tributário praticados com
abuso de forma ou de direito”. É, pois, norma geral antielisiva (e não antievasiva ou
antissimulação), cujo escopo é o abuso de direito, tão comum em vários sistemas.

2. Abuso de Direito: Requisito da Norma Geral Antielisiva (CTN) e Instituto


Comum do Direito Brasileiro (Código Civil e Lei de Introdução às Normas
do Direito Brasileiro)
A linha divisória entre a elisão lícita e ilícita é relativa e depende de cada direi-
to positivo. Não se trata de uma categoria lógica e universal de teoria geral do Di-
reito. Mas as normas gerais antielisivas dos países que as possuem não são essen-
cialmente diferentes umas das outras, porque poucos países desenvolvem e inovam
suas normas antielisivas, preferindo transplantar e adaptar as de outros ordenamen-
tos. E ainda que decorrentes de lei ou doutrina judicial, há elementos semelhantes
nessas normas, que diferem mais quanto à ênfase que lhes é dada27.
A fraude à lei é o elemento fundamental na Alemanha, na Holanda, na Espanha
e em Portugal, o abuso de direito na França, e o primado da substância sobre a for-
ma nos Estados Unidos. A maior semelhança entre eles é que, estando essas normas
calcadas em conceitos jurídicos indeterminados, ficam vinculadas ao desenvolvi-
mento e à concretização judicial28. Os conceitos jurídicos indeterminados conferem

22
“Art. 64. Não podem ser opostos à administração fiscal atos que dissimulem o verdadeiro significado de um contra-
to ou acordo (...). A Administração tem o direito de requalificar a verdadeira característica da operação litigiosa. Em
caso de desacordo sobre a retificação notificada com base nesse artigo, o litígio deverá, a pedido do contribuinte, ser
submetido à opinião do Comitê Consultivo para a repressão do abuso de direito. A Administração também pode igual-
mente submeter o litígio à opinião da comissão, cujo parecer será objeto de um relatório anual.” (Tradução dos auto-
res)
23
Na França, cujo modelo foi adotado no Brasil, houve uma alteração do dispositivo do art. 64 pela Lei nº 2008-1443,
de 30 de dezembro de 2008, que suprimiu a expressão dissimulação, conforme será discutido adiante.
24
Por todos, XAVIER, Alberto. Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Antielisiva. São Paulo: Dialética, 2001,
p. 68.
25
Tramita perante STF, desde 2001, a ADIn nº 2.588-1 em face do parágrafo único do art. 116 do CT, mas que até hoje
se encontra aguardando julgamento tanto do pedido liminar, quanto do principal. Em nenhuma jurisdição houve a
declaração de inconstitucionalidade de uma norma geral antielisiva.
26
Sobre a função nova do art. 116, parágrafo único, do CTN e sua desnecessidade para eventualmente aplicar as figu-
ras da simulação, abuso de direito e fraude a lei, ver GRECO, Marco Aurélio. Op. cit., pp. 403 e seguintes.
27
FREEDMAN, Judith. Beyond Boundaries: developing Approaches to Tax Avoidance and Tax Risk Management.
FREEDMAN, Judith (org.). Oxford: Oxford University Centre for Business Taxation, 2008, p. 1; e ALMENDRAL,
Violeta Ruiz. Op. cit., p. 560-1.
28
ROLIM, João Dácio. “Reflexões sobre Normas Gerais Antielisivas na Jurisprudência”. Planejamento Tributário à
Luz da Jurisprudência. YAMASHITA, Douglas (org.). São Paulo: Lex, 2007, pp. 166-179.
à Administração certa liberdade valorativa, mas não discricionariedade29. Ao deci-
dir, por exemplo, se há ou não motivo extratributário, artificialismo ou propósito
negocial, o Fisco tem apenas uma decisão de duas possíveis, sim ou não, não ca-
bendo gradações ou valorações. O princípio da legalidade não impede a utilização
de conceitos indeterminados, e eles são largamente utilizados no Direito Tributário
brasileiro30.
Conforme visto, a LC nº 104 se baseou no modelo francês. Apesar da ausência
de cautela no transplante de legislação estrangeira e da má técnica legislativa utili-
zada, o fato é que o conceito indeterminado de abuso de direito é o elemento cen-
tral do parágrafo único do art. 116 do CTN. E mais, o abuso de direito foi poste-
riormente posto no art. 187 do Código Civil de 2002. Não significa que o instituto
deva ser aplicado indistintamente, já que as consequências civilísticas (a declaração
de nulidade e anulabilidade dependente de um ato judicial) são diversas das tribu-
tárias (a desconsideração ou inoponibilidade fiscal do ato elisivo pela autoridade tri-
butária não depende de decisão de um juiz, mas pode ser revisto pelo Judiciário).
Verifica-se certa coerência do ordenamento jurídico na utilização do instituto comum
do abuso de direito.
A relação entre o Direito Civil e o Tributário não é de prevalência, mas de auto-
nomia relativa (arts. 109 e 110 do CTN), e de sobreposição, porque “a tributação se
assenta sobre atos ou negócios jurídicos primeiramente disciplinados pelo Direito
Privado”31. O abuso de direito do CC/2002 apenas sinaliza que esta figura passou a
ser indiscutivelmente um instituto comum do Direito brasileiro, o que se confirma
com a alteração da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº 4.657/1942),
para Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lei nº 12.376/2010). Não
foi só uma nova redação de ementa, mas a alteração da lei para compreender todo o
Direito brasileiro sem exceção. Disto se infere uma maior aproximação entre o Di-
reito Civil e o Direito Tributário, e no campo da elisão, a comunicação da figura do
abuso de direito.
A LC nº 104 fixou como a chave da norma geral antielisiva o abuso de direito32,
embora há quem defenda a fraude à lei como a sua base33. A dissimulação e a simu-
lação (nela incluída a simulação relativa do art. 102 do CC/2002) não se confundem.
Esta tem por consequência a revisão do lançamento (art. 149, VII, do CTN), enquan-
to aquela autoriza a desconsideração do ato ou negócio elisivo, quando dissimula-
do o fato gerador ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária34.

29
FALCÃO, Amílcar. Fato Gerador da Obrigação Tributária. NOVELLI, Flávio Bauer (atual.). Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2002, pp. 61-2; GRAU, Eros Roberto. O Direito Posto e o Direito Pressuposto. 5ª ed. São Paulo: Malheiros,
2003, p. 203; e OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. “Legalidade Tributária - O Princípio da Proporcionalidade
e a Tipicidade Aberta”. Revista de Direito Tributário nº 70. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 112.
30
ROSENBLATT, Paulo. Competência Regulamentar no Direito Tributário Brasileiro: Legalidade, Delegações Le-
gislativas e Controle Judicial. São Paulo: MP, 2009, pp. 178-85.
31
YAMASHITA, Douglas. “Limites a Economia de Tributos: da Teoria Legal à Prática Jurisprudencial”. Planejamen-
to Tributário à Luz da Jurisprudência. YAMASHITA, Douglas (org.). São Paulo: Lex, 2007, p. 73.
32
ROLIM, João Dácio. Op. cit., pp. 166-179.
33
GODOI, Marciano Seabra de. Op. cit., pp. 249-257.
34
TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., pp. 23-33.
Relevante ainda a distinção entre abuso do direito como princípio jurídico geral e
simulação, quando se trata da interposição de pessoas ou de declaração falsa, que
tenham eventualmente uma motivação fiscal. A presença deste elemento objetivo de
obtenção de uma vantagem fiscal por si só não é suficiente para caracterizar ou o
abuso ou a simulação, mas sim o requisito da artificialidade (artifício irreal ou fal-
so, não dotado de qualquer significância econômica, ou excesso no exercício de um
direito) no primeiro caso ou o da falsidade estrita no segundo nas hipóteses ali ex-
pressamente previstas (art. 167, parágrafo 1º, do CC/2002). A necessidade ou con-
veniência de uma reorganização societária evidentemente não pode obrigar o con-
tribuinte a optar pela forma jurídica mais onerosa dentro das várias possíveis.
A doutrina do abuso de direitos teve origem na construção jurisprudencial fran-
cesa e depois se tornou norma legislada, sob a concepção do exercício de um direi-
to por alguém com propósitos impróprios. Esse instituto foi adaptado por várias
jurisdições35, no plano tributário, para se referir a uma estratégia cuidadosamente
estruturada pelo contribuinte de organização dos fatos e da base legal das operações,
mas que exerce seu direito apenas para reduzir ou suprimir a obrigação tributária
ou obter um benefício fiscal. Assemelha-se, em larga medida, à doutrina norte-ame-
ricana do business purpose (propósito negocial)36.
O abuso de direito tem se firmado como princípio do Direito comunitário euro-
peu. Ele foi aplicado pela Corte de Justiça Europeia no caso Halifax37, que tratou
de operações elisivas de imposto sobre valor agregado (Value Added Tax - VAT, em
inglês), mas depois foi aplicado a outros tributos38, e está fundado em dois pilares:
(i) a transação, apesar de ter preenchido os requisitos previstos na regra comunitá-
ria e na legislação nacional, resulta em um benefício fiscal contrário à intenção dos
dispositivos normativos; e (ii) torna-se aparente, por meio de uma série de fatores
objetivos, que a finalidade essencial da transação é obter a vantagem fiscal39.
A cláusula geral antielisiva da LC nº 104, baseada no abuso de direito, deve ter
como requisitos a ausência de propósito negocial (finalidade econômica principal
ou única a obtenção de uma vantagem fiscal), e a manifesta artificialidade da ope-
ração40. Não é uma regra baseada na substância sobre a forma, a qual, em geral, usa
da analogia para afastar a forma eleita pelo contribuinte para adequar a operação aos
fins econômicos pretendidos pelo Fisco.
Assim como a norma antielisão, a discussão dos seus critérios é um assunto
polêmico. Dentre eles, o propósito negocial não esconde a dificuldade na sua defi-
nição e aplicação. Isto porque não há decisão negocial em que o contribuinte não

35
“Dada a generalidade do conceito, não é surpresa que tenha sido aplicado de forma tão diferente nos países de Civil
Law.” (THURONYI, Victor. Op. cit., p. 159, tradução dos autores)
36
Tax Law Review Committee. Tax Avoidance. Londres: Institute for Fiscal Studies, 2007, p. 6.
37
Halifax plc and others v. Customs and Excise Commissioners (C-255/02), [2006] STC 919 [ECJ].
38
Vide Cadbury Schweppes Overseas Ltd v. Commissioners of Inland Revenue (196/04), [2004] [ECJ].
39
O’SHEA, Tom. EU Tax Law and Double Tax Conventions. Londres: Avoir Fiscal, 2008, p. 119; PICKUP, David.
Op. cit., pp. 9-21; e BOWLER, Tracey. “Countering Tax Avoidance in the UK: Which Way Forward?” Tax Law
Review Committee. Londres, 2009, pp. 39-40.
40
ROLIM, João Dácio. Op. cit., p. 166-179.
tome o aspecto tributário como relevante41. Porém, o propósito negocial do art. 116,
parágrafo único não deve se referir à intenção subjetiva, mas à causa objetiva do
negócio jurídico, ou seja, a finalidade única ou preponderante de atingir um benefí-
cio fiscal, ausente a relevância da operação para o negócio celebrado (artificialida-
de)42.

3. A Jurisprudência Administrativa Brasileira e o Emprego da Simulação


como Abuso de Direito
Há algum tempo, a jurisprudência administrativa do Carf sobre os planejamen-
tos tributários, incluindo-se as reorganizações societárias com efeitos fiscais, vem
mudando para examinar tais operações sob um conceito amplo de simulação, mais
precisamente a simulação relativa43, que não se prende às hipóteses previstas no art.
167 do CC/2002. A questão, em síntese, resume-se em que a jurisprudência admi-
nistrativa passou a incluir como um dos elementos da simulação a inexistência de
outros propósitos negociais que não simplesmente a economia fiscal.
De acordo com reiterados julgados, a economia de tributos não é justificativa
suficiente à realização de reorganizações societárias ou planejamentos tributários.
Haveria que se verificar, portanto, outros propósitos econômicos em que se baseiem
as operações praticadas. Para admitir os efeitos fiscais relacionados com uma reor-
ganização societária, o Carf examina o conjunto de fatos envolvidos e os efeitos
advindos da reestruturação societária, não mais se atendo à análise isolada formal
de cada ato praticado e dos efeitos relativos a este ato44.

41
DERZI, Misabel Abreu Machado. “O Princípio da Preservação das Empresas e o Direito à Economia de Imposto”.
Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. V. 10. São Paulo: Dialética, 2006, p. 355; e SCHOUERI, Luís Eduar-
do. Op. cit., pp. 13-6.
42
ROLIM, João Dácio. Op. cit., pp. 166-79; FREITAS, Rodrigo de. “É Legítimo economizar Tributos? Propósito Ne-
gocial, Causa do Negócio Jurídico e Análise das Decisões do Antigo Conselho de Contribuinte”. Planejamento Tri-
butário e o “Propósito Negocial”. SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); FREITAS, Rodrigo de (org.). São Paulo:
Quartier Latin, 2010, pp. 441-490.
43
“Operação Ágio - Simulação Relativa - As operações estruturadas, realizadas em prazo ínfimo, de aporte de capital
com ágio, capitalização e alienação, constituem-se em simulação relativa, cujo ato verdadeiro dissimulado foi a alie-
nação das ações. Seu único propósito foi evitar a incidência de ganho de capital.” (Ac. nº 101-96.087, julgado em
29.3.2007, DRJ-RJ, 2ª Turma)
“Simulação. Caracterizada a simulação, os atos praticados com o objetivo de reduzir artificialmente os tributos não
são oponíveis ao fisco, que pode desconsiderá-los. Operação Ágio - Subscrição de Participação com Ágio e Subse-
qüente Cisão - Verdadeira Alienção de Participação - Se os atos formalmente praticados, analisados pelo seu todo,
demonstram não terem as partes outro objetivo que não se livrar de uma tributação específica, e seus substratos es-
tão alheios às finalidades dos institutos utilizados ou não correspondem a uma verdadeira vivência dos riscos envol-
vidos no negócio escolhido, tais atos não são oponíveis ao fisco, devendo merecer o tratamento tributário que o ver-
dadeiro ato dissimulado produz. Subscrição de participação com ágio, seguida de imediata cisão e entrega dos valo-
res monetários referentes ao ágio, traduz verdadeira alienação de participação societária.” (Ac. nº 101.95.537, julga-
do em 24.5.2006, DRJ-RJ, 2ª Turma)
44
“Simulação - Conjunto Probatório - Se o conjunto probatório evidencia que os atos formais praticados (reorganiza-
ção societária) divergiam da real intenção subjacente (compra e venda), caracteriza-se a simulação, cujo elemento
principal não é a ocultação do objetivo real, mas sim a existência de objetivo diverso daquele configurado pelos atos
praticados, seja ele claro ou oculto. Operações Estruturadas em Sequência - O fato de cada uma das transações,
isoladamente e do ponto de vista formal, ostentar legalidade, não garante a legitimidade do conjunto de operações,
quando fica comprovado que os atos praticados tinham objetivo diverso daquele que lhes é próprio. Ausência de
Motivação Extratributária - O princípio da liberdade de auto-organização, mitigado que foi pelos princípios cons-
titucionais da isonomia tributária e da capacidade contributiva, não mais endossa a prática de atos sem motiva-
A partir da análise dos fatos e das transações como um todo, fazendo referên-
cia expressa à doutrina do step transaction do common law, o Carf verifica o efeito
realizado pelo conjunto das operações e se estas operações, se analisadas isolada-
mente ou em conjunto, apresentam outras justificativas negociais que não a estrita
redução da carga fiscal. Caso não sejam apontadas outras justificativas para a reali-
zação da reorganização societária, elas tendem a ser desconsideradas pelo Fisco,
sendo anulados os efeitos tributários delas advindos45.
Na maioria dos casos, o Carf desconsiderou reorganizações societárias, decla-
rando haver simulação relativa por ausência de propósito negocial46. Há uma ten-
dência de perquirir, além da validade dos atos e negócios jurídicos, a substância
econômica deles. Não se trata de mera aplicação da teoria econômica do Direito
Tributário, da analogia em matéria tributária ou de institutos típicos de países de
common law (substance over form, step transaction, business purpose), mas não se
pode olvidar que essas doutrinas têm influenciado, ainda que indiretamente, os jul-
gados do Conselho.
Outra fonte de inspiração para a jurisprudência administrativa brasileira pare-
cem ser os comentários da OCDE sobre as normas antielisivas, para a qual o sim-
ples fato de se buscar a economia de tributos, por si só, não caracteriza um business
purpose para efeitos de validade do planejamento tributário47. Essa posição é refor-
çada pela análise dos comentários do Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE, que
avaliou a questão do uso de empresas-veículo sob a ótica dos tratados de dupla tri-
butação. Em resumo, aquele Comitê vem entendendo que, no uso impróprio dos tra-
tados, quando uma pessoa (residente ou não em um Estado contratante) age através
de uma empresa-veículo (conduit-companies) criada em um outro Estado somente
com o objetivo de aproveitar as vantagens do tratado, que não seriam possíveis caso
a operação fosse feita diretamente com essa pessoa, a regra perseguida através des-

ção negocial, sob o argumento de exercício de planejamento tributário.” (Ac. nº 10421498, Proc.
11080008023200478, 2006, destacou-se) No mesmo sentido, Ac. nº 10617149, Proc. 18471001589200686, 2008.
Ressaltando o prazo ínfimo em que as operações foram realizadas, vide Ac. nº 10196087, Proc. 10940002633200428,
2007.
45
“Planejamento Tributário, Simulação. Negócio Jurídico Indireto. A simulação existe quando a vontade declarada no
negócio jurídico não se coaduna com a realidade do negócio firmado, para se identificar a natureza do negócio prati-
cado pelo contribuinte, deve ser identificada qual é a sua causalidade, ainda que esta causalidade seja verificada na
sucessão de vários negócios intermediários sem causa, na estruturação das chamadas step transactions. Assim,
negócio jurídico sem causa não pode ser caracterizado como negócio jurídico indireto. O fato gerador decorre da
identificação da realidade e dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos, e não de vontades formalmente declaradas
pelas partes contratantes ou pelos contribuintes. Simulação. A subscrição de novas ações de uma sociedade anôni-
ma, com a sua integralização em dinheiro e registro de ágio, para subseqüente retirada da sociedade da sócia originá-
ria, com resgate das ações para guarda e posterior cancelamento caracteriza simulação de venda da participação so-
cietária.” (Ac. nº 140100155, Proc. 19515001895200711, 2010, destacou-se)
46
Algumas decisões do Conselho de Contribuintes já aplicaram a doutrina do abuso de direito, como a seguinte: “140.
Em suma, não há dúvida de que a interessada tem o direito, previsto na Constituição Federal, de organizar sua vida
da maneira que melhor julgar. Porém, o exercício deste direito supõe a existência de causas reais que levem a tal ati-
tude. A auto-organização com a finalidade predominante de pagar menos imposto configura abuso de direito. Como
tal, uma vez provado tratar-se de operação com esta razão principal, como penso restou provado nestes autos pelos
motivos por mim expostos neste voto, pode o Fisco recusar-se a aceitar seus efeitos no âmbito tributário de modo a
neutralizar os efeitos fiscais do excesso abusivo.” (Ac. nº 103-23.290, 2007)
47
OECD. Model Tax Convention on Income and Capital. [S.l.], 2000. v. 2, Cap. Double Taxation Conventions and the
Use of Conduit Companies, p. 616.
sa “empresa-veículo” seria desconsiderada para fins fiscais e a operação seria tri-
butada como se ela não existisse. Entretanto, o simples fato de existir uma empresa
veículo, como se infere dos referidos comentários da OCDE, não significa que há
abuso, sendo necessários outros testes como os da bona fide commercial purpose
ou outras justificativas econômicas para a sua existência48.
Em resumo, a jurisprudência administrativa do Carf passou a verificar se tran-
sações ou reorganizações empresariais seriam válidas do ponto de vista tributário,
com base principalmente nos seguintes aspectos: (a) propósito negocial: neste caso
o Conselho entende que é necessária a análise dos motivos não tributários para rea-
lizar a operação - um dos fatores determinantes de validade do planejamento tribu-
tário é a consideração dos “motivos” que levaram os contribuintes a praticar a ope-
ração, i.e., o chamado “propósito negocial” (business purpose); (b) operações es-
truturadas em sequência: o Carf considera que, ao analisar operações realizadas em
sequência, o intérprete deve avaliar os efeitos produzidos pelo conjunto de opera-
ções, não devendo analisar cada uma de um modo isolado (step transaction)49; (c)
uso de sociedades: o Carf verifica a real existência das sociedades envolvidas nas
operações, ou se elas são sociedades constituídas com a finalidade exclusiva de via-
bilizar a simulação de atos jurídicos (com relação a esse último ponto, alguns acór-
dãos alertam para a existência de “empresas veículo”, instituídas apenas para que
se realize o trânsito do patrimônio ou do dinheiro, sem que as referidas empresas
tenham alguma função real e efetiva dentro do contexto do grupo empresarial); e
(d) operações entre partes relacionadas: esse aspecto é caracterizado quando a ope-
ração ocasiona um efeito tributário dentro de um grupo econômico e não produz
efeitos no mercado - nessas operações, a composição patrimonial consolidada do
grupo econômico permanece inalterada, sendo que a única consequência relevante
da reorganização societária será uma redução da carga fiscal.

4. Dez Anos da Norma Geral Antielisiva Brasileira: Reflexões para uma Nova
Regulamentação
Promulgada há dez anos, a LC nº 104 carece de regulamentação e aplicação. A
regra é tecnicamente de má qualidade e precisaria de maior detalhamento para afas-
tar a controvérsia. Na verdade, não se sabe qual corrente prevalecerá quanto ao seu
conteúdo, quer seja uma norma antielisiva, quer seja uma norma antievasiva ou an-
tissimulação, ou ainda, na primeira hipótese, quer se trate de abuso de direito, frau-
de à lei, negócio indireto ou simulação relativa.

48
OECD. Idem. Vide, no âmbito de operações de fusão, incorporação e aquisições de empresas, o art. 11 da Diretiva
da Comunidade Europeia nº 434, de 23 de julho de 1990, que exige válidas razões econômicas que não sejam predo-
minantemente fiscais para a neutralidade daquelas operações, e o caso Leur-Bloem (C-28/95, do Tribunal de Justiça
Europeu) em que se confirma o entendimento de simplesmente, por haver uma vantagem ou benefício fiscal, não
significa que há válidas razões econômicas (business purpose) para serem reconhecidos os efeitos fiscais daquelas
mesmas operações.
49
De inspiração inglesa e norte-americana, a doutrina da step transaction pode ser vista como uma das mais importan-
tes regras antielisivas e que consiste no fato de que “etapas intermediárias numa cadeia preordenada de transações
podem ser desconsideradas, ou a cadeia toda ser tratada como um ato único, se as etapas forem evidentemente desig-
nadas para produzir um resultado que, se levado a efeito diretamente, incidiria imposto” (ROLIM, João Dácio. Op.
cit., p. 176).
O parágrafo único do art. 116 do CTN exige a edição de lei ordinária para esta-
belecer os procedimentos administrativos. Cabe à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios editar a sua lei ordinária própria estabelecendo as normas
procedimentais especiais que suas Administrações Tributárias deverão seguir na
desconsideração dos atos e negócios jurídicos elisivos. A previsão de procedimen-
tos especiais para aplicação dessa regra não é uma inovação brasileira, estando pre-
vista em quase todos os ordenamentos que adotaram uma norma antielisiva legisla-
da50.
No plano federal, houve a rejeição da Medida Provisória nº 66/2002, na parte
em que pretendia atender a esse comando regulamentar e, até o momento, não hou-
ve a edição de nova lei. Provavelmente, os demais entes da Federação aguardam a
lei federal para seguir de modelo. Esta situação tem levado à aplicação da norma
sem consistência pelo Fisco.
Como visto, por falta de regulamentação e compreensão da norma, as autorida-
des fiscais têm alegado a simulação para descaracterizar atos e negócios jurídicos,
não raro, com a lavratura de autos de infração e a imposição de multas, e às vezes
acompanhadas da propositura de ação penal por sonegação51. Caso utilizada a nor-
ma antielisiva, a operação seria descaracterizada, mas nenhuma multa ou pena pri-
vativa de liberdade seria aplicada, por ausência de previsão legal.
A MP nº 66/2002, nos arts. 13 a 19, visava à regulamentação do parágrafo úni-
co do art. 116 do CTN, e excluía do seu alcance os atos de evasão fiscal, relaciona-
dos a dolo, fraude ou simulação. Os elementos previstos para a aplicação da norma
eram a falta de propósito negocial ou o abuso de forma. A norma ainda previa os
procedimentos especiais a serem seguidos pelo Fisco federal. A rejeição parcial da
MP nº 66/2002 deixou uma lacuna na legislação52. Em todo caso, os dispositivos
rejeitados eram discutíveis quanto ao seguinte: a aplicação de multa; a ausência de
previsão de uniformização da norma, em proteção do contribuinte; a confusão de
conceitos, como dissimulação e negócio indireto; o tratamento do abuso de direito
e do propósito negocial como elementos diferentes, e não o segundo como um dos
critérios para concretizar o primeiro.
O Congresso Nacional poderia ter aperfeiçoado as regras ou as substituído por
regras mais adequadas, ao invés de simplesmente rejeitar tal MP. Contudo, o maior
equívoco da MP nº 66/2002 é que, à exceção das regras procedimentais, todas as
demais normas substantivas eram matéria reservada à lei complementar, por versa-
rem sobre normas gerais de Direito Tributário. Assim é que a previsão dos critérios
de propósito negocial e artificialidade deveriam ter sido inseridos no CTN por meio
da LC nº 104, e não por medida provisória. Melhor seria fosse editada uma nova lei
complementar para aperfeiçoar o texto do parágrafo único do art. 116 do CTN, até
mesmo criando mais de um parágrafo para detalhar os requisitos e critérios de sua
aplicação.

50
A Lei Geral Tributária portuguesa, por exemplo, prevê um processo especial para aplicação das normas antiabuso
(art. 28, nº 2, introduzido pela Lei nº 100/1999).
51
YAMASHITA, Douglas. Op. cit., p. 73.
52
YAMASHITA, Douglas. Op. cit., p. 73.
Conforme dito, até mesmo a França, em cujo modelo o legislador brasileiro se
baseou, aperfeiçoou o art. 64 do Livro de Procedimentos Fiscais53 - o qual versa
sobre os procedimentos de abuso de direito -, e suprimiu a referência à equívoca
expressão dissimulação, provavelmente por influência das decisões do Tribunal de
Justiça Europeu. O dispositivo se referia a abuso de direito, mas também à dissimu-
lação, que na alteração do final de 2008 foi totalmente suprimida.
O mesmo caminho pode trilhar o legislador brasileiro, já que a exposição de
motivos da LC nº 104 já fala em abuso de direito, mas o texto da norma lançou ape-
nas de dissimulação. Nesse caso, uma nova lei complementar poderia seguir o exem-
plo francês, suprimindo a referência à dissimulação e a substituindo simplesmente
pelo conceito indeterminado de abuso de direito, embora com a redução teleológi-
ca por meio dos seguintes requisitos: a ausência de propósito negocial e a artificia-
lidade. A simples referência a abuso de direito não é suficiente para dotar a lei de
clareza, sendo necessário, então, conter esses elementos objetivos.
As normas gerais antielisivas têm longa história em várias jurisdições, algumas
com mais de cem anos, como Nova Zelândia e Austrália54, mas que passaram por
mudanças ao longo dos anos para se adaptarem às circunstâncias, e até mesmo no-
vas versões da regra foram editadas para substituir as anteriores que não obtiveram
os resultados almejados. Na Austrália, a antiga norma geral foi modificada em 1981;
a Nova Zelândia introduziu uma nova norma em 1994; na África do Sul, a norma
de 1941, verdadeira letra-morta, foi substituída em 2006; e no Canadá, a norma foi
introduzida em 1988 e logo modificada em 200555. E nenhum dos países que intro-
duziu a regra demonstrou qualquer sinal de que pretende abrir mão dela56.
Portanto, não há demérito em reconhecer que o parágrafo único do art. 116 do
CTN possui falhas, não atingiu a finalidade para a qual foi previsto há dez anos, que
a tentativa de sua regulamentação não foi aprovada no Congresso Nacional, e que o
seu conteúdo e alcance estão longe de atingir um mínimo de consenso doutrinário.
Esse reconhecimento é necessário para que, na linha de outras nações, possa o Bra-
sil editar uma nova norma geral antielisiva mais clara e até mesmo buscando inspi-
ração em sistemas nos quais a aplicação da norma obteve algum sucesso.

53
“Artigo 64. Para restaurar o seu verdadeiro caráter, a administração tem o direito de rejeitar, como não sendo oponí-
vel a ela, os atos que constituam um abuso de direito, quer esses atos tinham um caráter fictício, quer busquem o
benefício de uma aplicação literal dos textos ou decisões em relação aos objetivos perseguidos por seus autores, que
não sejam inspirados por outro motivo que o de evitar ou atenuar a carga fiscal que o interessado, se esses atos não
tivessem sido aprovadas ou realizados, normalmente teria incorrido, independentemente de sua localização ou de suas
atividades atuais.” (Dispositivo alterado pela Lei nº 2008-1443, de 30 de dezembro de 2008 - art. 35 (V). Tradução
dos autores)
54
ARNOLD, Brian. “A Comparison of Statutory General Anti-avoidance Rules and Judicial General Anti-avoidance
Doctrines as a Means of controlling Tax Avoidance: Which is Better? (What would John Tiley think?)”. In: JONES,
John Avery; HARRIS, Peter et al (ed.). Comparative Perspectives on Revenue Law: Essays in Honour of John Tiley.
Cambridge: Cambridge University Press, 2008, pp. 11-15.
55
CASHMERE, Maurice. “A Gaar for the United Kingdom? The Australian Experience”. British Tax Review v. 2.
Londres, 2008, pp. 125-159; PICKUP, David. Op. cit., pp. 9-21; ARNOLD, Brian. “The Canadian Experience with a
General Anti-avoidance Rule”. Beyond Boundaries: Developing Approaches to Tax Avoidance and Tax Risk
Management. FREEDMAN, Judith (ed.). Oxford: Oxford University Centre for Business Taxation, 2008, pp. 29-35.
56
FREEDMAN, Judith. Op. cit., 2008, pp. 2-3.
5. A Contrapartida: Cláusulas de Proteção à Confiança do Contribuinte
A criação de uma norma antielisiva, nos moldes apontados, é uma vantagem ao
contribuinte. Sem um texto claro, a Administração buscará meios para coibir práti-
cas que considere abusivas, enquanto os Tribunais encontrarão argumentos para in-
validar os atos e negócios que entendam contrários aos propósitos da legislação e
dos princípios constitucionais, o que ocorre caso a caso e gera insegurança jurídica
para o Fisco e para os contribuintes. A norma geral antielisiva, na maioria dos paí-
ses, foi uma resposta à proliferação de esquemas elisivos, e a ausência de um con-
trole judicial efetivo dessas operações57. Por outro lado, em países nos quais preva-
lecem doutrinas judiciais, verifica-se uma tendência dos contribuintes em pressio-
nar pela edição de uma cláusula antiabuso que limite o ativismo dos tribunais e guie
a Administração Tributária58. O interesse em uma norma geral antielisiva clara deve
ser comum do contribuinte e do Erário.
A aplicação da norma exige uma ponderação entre o interesse público de pre-
servar a base tributária e o legítimo interesse dos contribuintes nos seus assuntos
privados e empresariais. Por outro lado se “justiça e segurança estão em conflito”59
com relação à elisão fiscal, instrumentos adequados a atender de uma forma mais
harmoniosa possível aqueles valores, num desejável grau de otimização dos interes-
ses legítimos em jogo, devem ser implementados e aplicados mediante uma ponde-
ração ou teste de razoabilidade e proporcionalidade60. Para isto, deve-se assegurar
que a norma geral antielisiva seja orientada para as situações abusivas, e não de pla-
nejamento tributário como expressão do direito de organização dos próprios negó-
cios. E dada a utilização inevitável de conceitos indeterminados na redação de nor-
mas antielisivas, é necessário apor uma série de salvaguardas procedimentais para,
de um lado, coibir abusos e evitar a discricionariedade subjetiva pelo Fisco, e de
outro lado, não se tornar um empecilho às regras de livre mercado. Essas medidas
visam promover a transparência na relação Fisco-contribuinte e respeitar direitos
constitucionais. Trata-se de uma contrapartida do Estado ao contribuinte por con-
ceder um instrumento tão poderoso à Administração Tributária.
Ao tratar da consulta administrativa, no âmbito federal, o art. 48 e seguintes da
Lei nº 9.430/1996, prevê um sistema concentrado de solução de consultas, em ins-

57
No Canadá, a introdução da norma geral antielisiva foi uma reação à decisão da Suprema Corte que rejeitou a aplica-
ção da doutrina do propósito negocial em 1984, no caso Stubart (Stubart Investments Ltd. v. The Queen, [1984] CTC
294 (SCC)). Cf. ARNOLD, Brian. “The Long, Slow, Steady Demise of the General Anti-avoidance Rule”. Canadian
Tax Journal/Revue Fiscal Canadienne v. 52, n. 2, 2004, p. 488.
58
ARNOLD, Brian. “A Comparison of Statutory General Anti-avoidance Rules and Judicial General Anti-avoidance
Doctrines as a Means of controlling Tax Avoidance: Which is Better?” In: JONES, J. A.; HARRIS, P. et al (ed.).
Comparative Perspectives on Revenue Law. Cambridge: Cambridge University Press, 2008, pp. 11-15.
59
“Tax equity demands that artificial tax avoidance schemes should be of no effect, yet certainty demands that the tax
laws should be such that an individual can arrange affairs in the expectation that he will not have to pay tax.” (TI-
LEY, John. Revenue Law. 5ª ed. Hart, 2005, pp.101-02)
60
Sobre o uso de lei retroativa para combater elisão abusiva, mas submetida a um teste de razoabilidade ou de propor-
cionalidade, vide nos Estados Unidos Milliken v. US [1931] 283 US 15, US v. Carlton [1994] 512 U.S. 26, Nichols
v. Coolidge [1927] 274 US 531, Boldgett v. Holden [1928] 275 U.S. 142, e Untermayer v. Anderson [1928] 276 U.S.
440; e na União Europeia o uso da doutrina do abuso de direito, submetido a um teste de proporcionalidade, os casos
mencionados Halifax (C-255/02), e Leur-Bloem (C-28/95), e De Lasteyrie du Saillant Case C-9/02.
tância única, como forma de promover a uniformidade de entendimentos61. Estru-
tura similar poderia ser utilizada para a norma geral antielisiva da LC nº 104, com
um órgão especializado central para analisar as operações e decidir pela desconsi-
deração ou não dos atos e negócios jurídicos. Isto permitiria soluções homogêneas
sobre questões complexas, dando-se maior segurança para o contribuinte.
Deverá o Poder Executivo de cada ente da Federação regulamentar via Decreto
a lei que estabelecer os procedimentos de aplicação da norma geral antielisiva, com
fundamento no art. 84, IV, da CF/1988, de modo a, sobretudo, uniformizar a inter-
pretação e aplicação da lei por sua Administração Tributária62. E para reduzir esse
grau de incerteza, pode-se prever exceções ou “portos seguros” (statutory safe har-
bours63), no que se refere ao planejamento tributário lícito, como as condutas dese-
jadas, induzidas ou autorizadas (por exemplo, a opção conferida ao contribuinte
pessoa física entre a declaração completa com as deduções ou o desconto simplifi-
cado, e à pessoa jurídica entre a tributação sobre o lucro real ou presumido).
Enfim, é necessário que a norma antielisão seja acompanhada de um de estatu-
to que proteja a confiança do contribuinte, com regras que tenham por finalidade:
(i) definir os procedimentos pelos quais a autoridade fiscal irá recaracterizar os atos
e negócios elisivos; (ii) centralizar as decisões acerca da aplicação dessa norma, para
assegurar interpretação uniforme e simétrica; (iii) definir sobre quem recai o ônus
da prova - a Administração Pública ou o contribuinte; (iv) enumerar as hipóteses de
presunções e ficções legais admissíveis, e o valor das provas documentais; (v) esta-
belecer um procedimento especial e célere de consulta administrativa; (vi) prever
penalidades para os casos de aplicação arbitrária pela autoridade fiscal.

6. Conclusões
A norma geral antielisiva brasileira surgiu formalmente, há dez anos, com o
parágrafo único no art. 116 do CTN (LC nº 104/2001). Sem um desenvolvimento
jurisprudencial ou doutrinário próprio, o Brasil transplantou o modelo francês, o qual
há muito havia se mostrado ineficaz no seu próprio país de origem. Na sua redação
original, o requisito requalificador francês centrava-se na figura imprecisa da dissi-
mulação, posteriormente afastado. O mérito do exemplo francês, contudo, é a utili-
zação do abuso de direito como elemento principal da norma antielisiva, com in-
fluência em muitos países e no Direito comunitário europeu.
Apesar de a exposição de motivos da LC nº 104 falar em abuso de direito, a re-
gra do art. 116, parágrafo único, do CTN, não é expressa. Cumpre contextualizar a
norma para compreender que tal figura se tornou não só requisito da cláusula antie-
lisão, mas um instituto comum do Direito brasileiro, com a edição do CC/2002 e a
alteração da LICC em Lei de Introdução das Normas Brasileiras.
A norma geral antielisiva não é apenas um objeto de desejo dos Fiscos, mas aten-
de aos interesses do contribuinte, porque evita, em certa medida, estratégias indire-

61
TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., pp. 9-10.
62
ROSENBLATT, Paulo. Op. cit., pp. 88-104. Sobre a necessidade de lei de cada ente federado, vide dentre outros
GRECO, Marco Aurélio. Op. cit., p. 429.
63
BOWLER, Tracey. Ibidem, pp. 33-4.
tas e mais gravosas de combate à elisão pela Administração Tributária, como a ca-
racterização dos atos e negócios elisivos como simulados, a aplicação de elevadas
multas e até mesmo a persecução penal.
Em muitos países, o insucesso de normas gerais antielisivas não foi motivo para
desistir desse instrumento. Ao contrário, a experiência demonstrou novos caminhos
para que as regras fossem aprimoradas ou substituídas. O Brasil deveria seguir esse
exemplo, em especial o da França, que claramente inspirou a LC nº 104, e que re-
forçou na alteração da sua regra antielisão o abuso de direito como seu elemento
central, suprimindo a figura incômoda da dissimulação.
A melhor opção seria tornar o abuso de direito explícito da norma geral antieli-
siva do CTN, e incluir um rol de requisitos legais, dentre os quais, a ausência de
propósito negocial e a artificialidade dos atos e negócios jurídicos. Tudo isto preci-
sa estar previsto na própria Lei Complementar, haja vista cuidar de norma geral de
Direito Tributário (art. 146 da CF/1988). À Lei Ordinária de cada ente da Federa-
ção cabe regulamentar os procedimentos de aplicação, atentando-se para criar um
ambiente de proteção à confiança do contribuinte.
Não se pretende aqui transplantar a concepção de abuso de direito de outros
ordenamentos jurídicos, mas de encontrar alternativas com os recursos e instrumen-
tos legais e constitucionais próprios do ordenamento brasileiro adaptados aos casos
concretos. Não há qualquer lei ou princípio jurídico que obrigue o contribuinte a
escolher a forma jurídica mais onerosa fiscalmente. Entretanto, se a atividade ou
operação específica em si mesmo for absolutamente artificial, aí sim poderia ser
considerada abusiva e desconsiderada para efeito fiscal, devendo-se a sua “existên-
cia” a uma exclusiva vantagem fiscal artificiosa. E aqui pode se referir não neces-
sária e somente à figura do abuso de direito tal como positivada no art. 187 do
CC/2002, mas sim a um instituto principiológico comum a todo ordenamento ou que
teria a sua especificação na figura da dissimulação do parágrafo único do art. 116
do CTN. O requisito para se configurar abuso de direito, no caso o direito de gerir
os próprios negócios de uma maneira mais econômica possível inclusive do ponto
de vista fiscal, impede que o contribuinte seja vedado a atuar também com razões
fiscais, pois nesta hipótese não estaria ultrapassando aquele limite, pois um dos fins
econômicos e sociais do direito de planejar e gerenciar as próprias atividades é a
racionalização ou a busca da eficiência na assunção do ônus tributário.
Finalmente, é verdade que a norma geral antielisiva não é a solução para todos
os casos de abuso no planejamento tributário, nem substitui outros instrumentos de
combate à elisão fiscal, como as normas específicas antielisivas. Essas normas não
são mutuamente excludentes, cada uma tem a sua importância para a preservação
da base dos sistemas tributários, e são uma das formas de se perseguir, dependendo
de como sejam positivadas e aplicadas, um razoável equilíbrio entre a igualdade, a
eficiência, a equidade e a segurança na tributação.
Possibilidade de Manutenção e
Utilização de Créditos de PIS/Cofins
Relativos a Bens do Ativo Permanente
na Hipótese de Comodato/Locação de
Maquinário para Terceiros
Leonardo Freitas de Moraes e Castro

1. Introdução
O presente artigo tem por escopo analisar a possibilidade
de manutenção e utilização de créditos da contribuição para
os Programas de Integração Social (PIS) e de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (Pasep) e da Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) relati-
vos a bens do ativo permanente na hipótese de comodato/
locação de maquinário para terceiros.
No dia a dia empresarial é comum a celebração de con-
tratos de comodato (cessão gratuita de bens) e contratos de
locação (cessão onerosa de bens) de máquinas e equipamen-
tos de propriedade de uma companhia para seus clientes. De
acordo com a estrutura de venda de determinados produtos,
faz-se necessário o uso exclusivo das máquinas e equipa-
mentos locados e cedidos pela companhia aos clientes.
Essas companhias (comodantes) normalmente contabi-
lizam tais máquinas e equipamentos como bens de seu ati-
vo permanente (imobilizado), e utilizam os créditos de PIS
e de Cofins pagos por razão de sua importação, mesmo após
a locação ou o comodato dos equipamentos ser feito ao
cliente.
Diante do presente cenário, passamos a tecer nossos co-
mentários sobre a possibilidade de manutenção e utilização,
por companhias, dos créditos de PIS e de Cofins relativos aos
bens do ativo permanente, considerando que tais bens estão
locados/cedidos a um terceiro. Leonardo Freitas de
Moraes e Castro
2. Não Cumulatividade do PIS e da Cofins é Mestrando em
Assim como o ICMS e o IPI, para as empresas sujeitas ao Direito Tributário pela
USP, Master of Laws
Imposto de Renda sobre o lucro real, bem como nos casos
(LL.M.) in Taxation
expressos nas Leis Ordinárias nos 10.637/2002 e 10.833/2003, pela Georgetown Law,
o PIS e a Cofins são atualmente tributos não cumulativos. Professor de Direito
Cabe ressaltar que não se trata, propriamente, de não Tributário
cumulatividade, mas de mero abatimento, eis que este insti- e Advogado em
tuto apresenta nítidos delineamentos que, uma vez desaten- São Paulo.
didos, desvirtuam completamente a finalidade para a qual foi instituído. Aires Bar-
reto, diante dos impropérios praticados pelo legislador na edição dos referidos di-
plomas legais, destaca que nesta sistemática “não se terá tributo não cumulativo, mas
tributo parcialmente não cumulativo ou, da perspectiva diversa, tributo parcialmente
cumulativo, contrariando o propósito perseguido pelo sistema”1.
Esta é a razão pela qual a sistemática aplicada às contribuições ao PIS e à Co-
fins não elimina total ou adequadamente o indesejável “efeito cascata”, uma vez que
a técnica escolhida pelo legislador não se coaduna com o fim supostamente colima-
do.
Apesar de serem tributos incidentes sobre a receita bruta das pessoas jurídicas,
sejam elas industriais ou comerciais, a legislação específica dessas contribuições foi
buscar o conceito de insumos e a origem do direito ao creditamento no quadro nor-
mativo do IPI2, tributo este que atinge atividades industriais.
De acordo com Ricardo Mariz de Oliveira3, no regime da não cumulatividade
do ICMS e IPI, diferentemente do que acontece no regime de não cumulatividade
do PIS e da Cofins, o que se tem é o creditamento, nas respectivas escriturações fis-
cais, dos valores que vêm destacados nas notas fiscais que acompanham as entra-
das dos bens que de alguma forma sofrerão nova incidência em etapa posterior da
cadeia produtiva. Por esta razão, quando as saídas desses bens forem isentas de um
desses impostos, os respectivos créditos de entrada devem ser estornados.
Contudo, o mesmo autor adverte que:
“Tudo isso é diferente quanto às contribuições sobre receitas, a propósito das quais a
Constituição nada exige e tudo transfere para a lei comum, e cujas leis apenas permi-
tem determinadas deduções dos valores das mesmas. Mesmo a inexistência de previ-
são legal relativa a estornos de valores deduzidos, que subsistiu nas Leis nº 10.637 e
10.833 até que a Lei nº 10.865 a previu em determinadas situações específicas, demons-
tra a diferença entre os sistemas dessas contribuições e os do IPI e do ICMS.”4
Precisamente por este motivo é que, no âmbito da legislação infraconstitucio-
nal, não há que se confundir regras de cálculos dos créditos relativos a estas contri-
buições com as regras pertinentes aos créditos do IPI e do ICMS.
Ressalte-se aqui que a chamada “não cumulatividade” de tais contribuições é
somente parcial, e não plena, tampouco perfeita. Isto se extrai das próprias normas
veiculadas pelas leis ordinárias, que não atribuem o creditamento a todos os valo-
res já onerados anteriormente, nem correspondentes aos exatos valores que ante-
riormente o tenham sido.

1
BARRETO, Aires F. “A Nova Cofins: Primeiros Apontamentos”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 103. São
Paulo: Dialética, 2004, p. 9.
2
A Constituição Federal, em seu artigo 153, parágrafo 3º, II, dispõe que o IPI “será cumulativo, compensando-se o
que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores”. Da mesma, forma temos o CTN, em seu
artigo 49, elencando que “o imposto é não cumulativo, dispondo a lei de forma que o montante devido resulte da
diferença a maior, em determinado período, entre o imposto referente aos produtos saídos do estabelecimento e o
pago relativamente aos produtos nele entrados”.
3
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. “Aspectos Relacionados à ‘Não-cumulatividade’ da Cofins e da Contribuição ao PIS”.
In: FISCHER, Octavio Campos; e PEIXOTO, Marcelo Magalhães (coords.). PIS-Cofins: Questões Atuais e Polêmi-
cas. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 39.
4
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Op. cit., p. 39.
Ademais, o crédito dos valores de PIS e de Cofins não é apoiado em valores de
tributos destacados em notas fiscais de operações anteriores, assim como ocorre com
o IPI e o ICMS.
Uma constatação importante é que as listas dos insumos que dão direito a cré-
dito, veiculadas nas Leis nos 10.637/2002 e 10.833/20035, são consideradas pelo
Fisco federal como numerus clausus, isto é, são taxativas6, não comportando adi-
ções e, embora a abrangência de algumas delas seja extensa, ainda assim são inde-
vidamente restritivas.
Portanto, a sistemática aplicada ao PIS e à Cofins não elimina o indesejável
“efeito cascata”, uma vez que a técnica escolhida pelo legislador não se coaduna com
o fim supostamente colimado. Com efeito, as Leis nos 10.637/2002 e 10.833/2003
determinam que o montante de crédito será calculado mediante a aplicação das alí-
quotas de 1,65% e 7,6% sobre o valor dos bens, serviços e despesas incorridos, con-
forme se trate de contribuição ao PIS/Pasep7 ou à Cofins8, respectivamente. Para tal
creditamento, é irrelevante o fato de as entradas terem se sujeitado a alíquotas infe-
riores ou sequer terem sofrido a incidência desses tributos nas etapas antecedentes
do ciclo, diferentemente do que ocorre para o ICMS9 e para o IPI10.
Adicionalmente, por incidirem sobre a receita bruta, o conceito de insumos para
essas contribuições deveria ser certamente mais amplo, relacionando-se com toda

5
Os artigos 3º da Lei 10.687/2002 e 3º da Lei 10.833/2003 listam os insumos que geram direito ao crédito para a con-
tribuição social ao PIS e à Cofins.
6
Contribuindo com argumentos contrários à taxatividade, mas, neste caso, com relação à impossibilidade de empre-
sas prestadoras de serviços poderem optar pelo regime não cumulativo, vide a Apelação Cível nº 2004.71.08.010633-8/
RS, Rel. Leandro Paulsen, publicada em 26 de abril de 2007, que traz à baila a “redução teleológica” de Karl Larenz
como argumento, com o qual concordamos plenamente:
“Esse rol não é exaustivo, nem pode sê-lo, porque o universo das empresas prestadoras de serviços é crescente e quase
inesgotável (é, provavelmente, o setor da economia em maior crescimento) e o critério adotado pelo legislador leva,
inevitavelmente, a lacunas de regulamentação. A hipótese é da chamada lacuna oculta de regulamentação que ocor-
re, no dizer de Karl Larenz, naqueles casos ‘em que se faz sentir a falta na lei duma ‘ordenação de vigência negati-
va’, portanto, duma regra restritiva. A lacuna não é aqui patente, mas está oculta, porque existe uma regra positiva
dentro da qual cabe a situação de facto; falta todavia a esperada restrição da regra, que dela exceptua a situação’ (em
Metodologia da Ciência do Direito, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2ª ed., 1969, p. 434). Lacuna cujo su-
primento se faz por redução teleológica, ‘pelo aditamento da restrição postulada, de harmonia com o sentido da lei’
(id., p. 451).”
7
Lei nº 10.637/2002: “Art. 2º Para determinação do valor da contribuição para o PIS/Pasep aplicar-se-á, sobre a base
de cálculo apurada conforme o disposto no art. 1º, a alíquota de 1,65%.”
8
Lei nº 10.833/2003: “Art. 2º Para determinação do valor da Cofins aplicar-se-á, sobre a base de cálculo apurada con-
forme o disposto no art. 1º, a alíquota de 7,6%.”
9
“Tributário. ICMS. Base de Cálculo Reduzida. Isenção Parcial. Crédito Proporcional. Agravo Improvido. I - A Cor-
te reformulou seu entendimento quanto à matéria em debate e passou a equiparar a redução da base de cálculo do
ICMS à isenção parcial do imposto, para fins de aplicação da vedação ao crédito prevista no art. 155, § 2º, II, b, da
Constituição Federal (RE 174.178/SP, Redator para o acórdão Min. Cezar Peluso). II - Ressalvada a existência de
legislação dispondo que o crédito será maior, o direito ao crédito de ICMS deverá ser proporcional à base de cálculo
reduzida. Precedentes. III - Agravo regimental improvido.” (STF, AI-AgR nº 614.072, Rel. Min. Ricardo Lewan-
dowski, 1ª Turma, julgado em 30.6.2009)
10
“Tributário. IPI. Insumos Isentos, Não-tributados ou Sujeitos à Alíquota Zero. Inexistência de Direito aos Créditos.
Decisão com Fundamento em Precedentes do Plenário. 1. A decisão recorrida está em consonância com a jurispru-
dência do Plenário desta Corte (RE 370.682/SC e RE 353.657/RS), no sentido de que não há direito à utilização dos
créditos do IPI no que tange às aquisições insumos isentos, não-tributados ou sujeitos à alíquota zero. 2. Agravo re-
gimental improvido.” (STF, RE nº 566.551 AgR, Rel. Ministra Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 30.4.2010)
a atividade produtora de receita bruta desempenhada pelo contribuinte, e não res-
tringir-se apenas à atividade industrial desenvolvida pelo contribuinte.
Com relação aos bens do ativo fixo, a legislação sofreu diversas alterações em
um curto espaço de tempo, gerando bastante polêmica e insegurança jurídica, ora
mudando a sistemática de créditos, ora restringindo a utilização desses créditos.
Abaixo comentamos o regime de aproveitamento de créditos dessas contribui-
ções para bens do ativo fixo, para o caso sob análise.

3. Direito aos Créditos Relativos aos Bens do Ativo Imobilizado


Antes de traçarmos o tratamento conferido aos bens do ativo fixo, cumpre es-
clarecer que no presente estudo consideramos, para fins de PIS e de Cofins, que
todos os bens do ativo fixo foram adquiridos a partir de outubro de 2004.
O direito aos créditos do PIS e da Cofins, relativos aos bens do ativo fixo, estão
assegurados pelas Leis nos 10.637/2002 e 10.833/2003, posteriormente alteradas
pelas Leis nos 10.865/2004, 10.925/2004 e 11.196/2005. Vejamos o que dispõem as
leis ordinárias aplicáveis:
“Lei nº 10.637/02:
Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica poderá descontar crédi-
tos calculados em relação a:
(...)
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adqui-
ridos ou fabricados para locação a terceiros ou para utilização na produção de bens
destinados à venda ou na prestação de serviços.”

“Lei nº 10.833/03:
Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica poderá descontar crédi-
tos calculados em relação a:
(...)
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adqui-
ridos ou fabricados para locação a terceiros, ou para utilização na produção de bens
destinados à venda ou na prestação de serviços.”
Com o fim de regulamentar o aproveitamento de tais créditos, a secretaria da
Receita Federal editou a Instrução Normativa nº 457/2004 (IN nº 457/2004), a qual
estabelece regras gerais para o aproveitamento dos créditos aqui discutidos.
Com relação a bens do ativo fixo adquiridos a partir de maio de 2004, de acor-
do com o artigo 1º da IN nº 457/2004, as pessoas jurídicas sujeitas à incidência não
cumulativa das contribuições para o PIS e a Cofins, em relação aos serviços e bens
adquiridos no País ou no exterior a partir de 1º de maio de 2004, podem descontar
créditos calculados sobre os encargos de depreciação dos bens do ativo fixo, tais
como:
a) máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado
para utilização na produção de bens destinados a venda ou na prestação de ser-
viços; e
b) edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de terceiros, utilizados nas
atividades da empresa.
Como se observa, o requisito para o direito ao crédito de PIS e de Cofins nas
aquisições de máquinas e equipamentos, isto é, bens do ativo imobilizado, é que
estes sejam utilizados na venda dos bens do contribuinte. Tal requisito, para tais
contribuições, é mais amplo e abrangente, em sintonia com a natureza e o fato ge-
rador de tais tributos, que incidem não sobre o preço da mercadoria ou produto, mas,
sim, sobre as receitas decorrentes da atividade do contribuinte.
Cumpre estabelecer que a própria IN nº 457/2004 estabelece quais são os crité-
rios para a apropriação da parcela de depreciação, especificando que os encargos que
devem ser tomados mediante a aplicação da taxa de depreciação determinada pela
Receita Federal em função do prazo de vida útil do bem, nos termos das Instruções
Normativas nos 162/1998 e 130/1999. Tais normas estabelecem o prazo de vida útil
de bens relativos ao ativo imobilizado, seguindo o critério geral de classificação
contábil.
Opcionalmente, para fins de determinação dos créditos de PIS e de Cofins, é
facultado ao contribuinte a apuração dos créditos sobre o valor de aquisição dos bens
do ativo imobilizado no prazo de quatro anos (relativos a qualquer bem do ativo
imobilizado) ou dois anos (relativo a bens específicos listados nos Decretos nos
4.955/2004, 5.173/2004 e 5.222/2004), conforme estabelecido no artigo 1º, parágra-
fo 2º, da IN nº 457/2004. Vejamos:
“Art. 1º As pessoas jurídicas sujeitas à incidência não-cumulativa da Contribuição para
o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins),
em relação aos serviços e bens adquiridos no País ou no exterior a partir de 1º de maio
de 2004, observado, no que couber, o disposto no art. 69 da Lei nº 3.470, de 1958, e
no art. 57 da Lei nº 4.506, de 1964, podem descontar créditos calculados sobre os en-
cargos de depreciação de:
I - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado para uti-
lização na produção de bens destinados a venda ou na prestação de serviços; e
II - edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de terceiros, utilizados nas ati-
vidades da empresa.
§ 1º Os encargos de depreciação de que trata o caput e seus incisos devem ser deter-
minados mediante a aplicação da taxa de depreciação fixada pela Secretaria da Recei-
ta Federal (SRF) em função do prazo de vida útil do bem, nos termos das Instruções
Normativas SRF nº 162, de 31 de dezembro de 1998, e nº 130, de 10 de novembro de
1999.
§ 2º Opcionalmente ao disposto no § 1º, para fins de apuração da Contribuição para
o PIS/Pasep e da Cofins, o contribuinte pode calcular créditos sobre o valor de aqui-
sição de bens referidos no caput deste artigo no prazo de:
I - 4 (quatro) anos, no caso de máquinas e equipamentos destinados ao ativo imobili-
zado; ou
II - 2 (dois) anos, no caso de máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos, no-
vos, relacionados nos Decretos nº 4.955, de 15 de janeiro de 2004, e nº 5.173, de 6 de
agosto de 2004, conforme disposição constante do Decreto nº 5.222, de 30 de setem-
bro de 2004, adquiridos a partir de 1º de outubro de 2004, destinados ao ativo imobi-
lizado e empregados em processo industrial do adquirente.” (Destaques nossos)
Os créditos relativos aos bens acima listados deverão ser calculados mediante a
aplicação, em cada período, dos seguintes fatores: 1,65% para o PIS, e 7,6% para a
Cofins, sobre o valor dos encargos de depreciação incorridos no mês.
4. Entendimento da Receita Federal do Brasil sobre o Tema
A partir das decisões administrativas emanadas pela Receita Federal do Brasil,
considerando a questão de aproveitamento de crédito de bens do ativo imobilizado
locados ou cedidos a terceiros e sua depreciação para fins de apuração do PIS e da
Cofins, podemos concluir que o Fisco Federal permite tal aproveitamento, sendo
irrelevante que os bens estejam fisicamente na sede do contribuinte ou de seu cliente.
Observe-se:
“Processo de Consulta nº 196/09
Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF/8ª Região Fiscal
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins. Ementa:
Bens do Ativo Imobilizado. Locação. Crédito. A depreciação de máquinas, equipamen-
tos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos após 1º de maio de
2004 para locação a terceiros, pode ser descontada como crédito na apuração da
Cofins não-cumulativa no período posterior a 01 de dezembro de 2005. Dispositivos
Legais: Lei nº 10.833, de 2003, art. 3º, VI, e § 1º, III, com a redação da Lei nº 11.196/
2005, art. 45. Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep. Ementa: Bens do Ativo Imobi-
lizado. Locação. Crédito. A depreciação de máquinas, equipamentos e outros bens
incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos para locação a terceiros, pode ser des-
contada como crédito na apuração da contribuição para o PIS/Pasep não-cumulativa
apenas no período de 01 de janeiro de 2003 até 31 de janeiro de 2004, e, para os bens
adquiridos após 1º de maio de 2004, o direito de crédito ocorre a partir de 01 de de-
zembro de 2005.”

“Processo de Consulta nº 417/07


Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF/8ª Região Fiscal
Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep Créditos. Encargos de Depreciação. Bens do
Ativo Imobilizado.
A partir de 1º de dezembro de 2005, é permitido descontar créditos calculados sobre
os encargos de depreciação de máquinas fabricadas a partir de 1º de maio de 2004,
incorporadas ao ativo imobilizado para locação a terceiros. Não integram o valor das
máquinas os custos de que tratam os incisos do § 2º do art. 3º da Lei nº 10.637, de 2002.
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins Créditos.
Encargos de Depreciação. Bens do ativo imobilizado.
A partir de 1º de dezembro de 2005, é permitido descontar créditos calculados sobre
os encargos de depreciação das máquinas fabricadas a partir de 1º de maio de 2004,
e incorporadas ao ativo imobilizado para locação a terceiros. Não integram o valor
das máquinas os custos de que tratam os incisos do § 2º do art. 3º da Lei nº 10.833, de
2003.”

“Processo de Consulta nº 6/06


Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF/9ª Região Fiscal
Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep
Ementa: Bens do Ativo Imobilizado. Locação. Crédito. A depreciação de máquinas,
equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabri-
cados para locação a terceiros, pode ser descontada como crédito na apuração da
Contribuição para o PIS/Pasep não-cumulativa.
Dispositivos Legais: Lei nº 10.637/2002, art. 3º, VI, e § 1º, III, com a redação da Lei
nº 11.196/2005, art. 45.
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins
Bens do Ativo Imobilizado. Locação. Crédito.
A depreciação de máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imo-
bilizado, adquiridos ou fabricados para locação a terceiros, pode ser descontada como
crédito na apuração da Cofins não-cumulativa.
Dispositivos Legais: Lei nº 10.833/2002, art. 3º, VI, e § 1º, III, com a redação da Lei
nº 11.196/2005, art. 43.

“Processo de Consulta nº 202/05


Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF/8ª Região Fiscal
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins
Ementa: Desconto de Crédito.
Para efeito de determinação da Cofins não-cumulativa, na atividade de locação de
máquinas para preparar bebidas quentes, e na de ‘gestão’, mediante remessa das re-
feridas máquinas no local indicado pelo cliente, com o fornecimento de bebidas quen-
tes, sob a sua administração, o contribuinte poderá descontar créditos calculados em
relação as partes e peças adquiridas e sobre os serviços prestados por pessoa jurídica
para a manutenção das citadas máquinas, integrantes do ativo imobilizado e destina-
das às atividades de locação e de ‘gestão’, desde que as partes e peças não estejam
incluídas no ativo imobilizado.
Na determinação da Cofins não-cumulativa, o contribuinte poderá descontar créditos
calculados sobre os encargos de depreciação, incorridos no mês, relativos a máqui-
nas para preparar bebidas quentes incorporadas ao ativo imobilizado, destinadas às
atividades de locação e de ‘gestão’. A partir de 1º de agosto de 2004, o contribuinte
poderá descontar somente os créditos calculados em relação à depreciação das referi-
das máquinas incorporadas ao ativo imobilizado, adquiridas a partir de 1º de maio de
2004.
Contribuição para o PIS/Pasep Desconto de Crédito.
Na determinação do PIS não-cumulativo, o contribuinte poderá descontar créditos
calculados sobre os encargos de depreciação, incorridos no mês, relativos a máqui-
nas para preparar bebidas quentes incorporadas ao ativo imobilizado, destinadas às
atividades de locação e de ‘gestão’. A partir de 1º de agosto de 2004, o contribuinte
poderá descontar somente os créditos calculados em relação à depreciação das referi-
das máquinas incorporadas ao ativo imobilizado, adquiridas a partir de 1º de maio de
2004.”
Desta forma, diversas decisões da própria Administração Tributária corroboram
nosso entendimento de que a companhia comodante pode aproveitar os créditos de
PIS e de Cofins decorrentes da aquisição de máquinas e equipamentos contabiliza-
dos em seu ativo imobilizado e, portanto, pode descontar tais créditos sobre os en-
cargos de depreciação mensal, não obstante serem tais bens locados ou cedidos em
comodato a clientes ou terceiros de forma geral.
Isto porque, a condição para que os bens adquiridos permitam a utilização de
créditos de PIS e de Cofins é que tais bens estejam intrinsecamente ligados às ati-
vidades de produção ou venda de bens e serviços, pelo contribuinte.
Em outras palavras, a exigência para tal creditamento é que as máquinas e bens
adquiridos e contabilizados no ativo imobilizado do contribuinte sejam essenciais
para seu negócio jurídico, de forma que sejam necessários à geração de receita.
A questão de os bens do ativo imobilizado estarem ou não, fisicamente, na sede
da companhia comodante ou locados ou cedidos em comodato na sede de clientes,
assim como no caso do ICMS11, também pouco importa para fins de direito a cré-
dito de PIS e Cofins, uma vez que tais créditos não se relacionam com a utilização
dos bens em si, mas, sim, com a receita deles originada.
Por fim, vale ressaltar que, no caso das contribuições ao PIS e à Cofins, a ques-
tão de o contrato ser de comodato ou de aluguel produz os mesmos efeitos para fins
de creditamento, apesar de haver, no caso de aluguel, mais um argumento em favor
do direito ao crédito.
Isto porque, quando a companhia locadora aluga tais máquinas e equipamentos
e, como contrapartida, recebe remuneração por isso, a Receita Federal do Brasil tem
inúmeras decisões afirmando que a máquina/equipamento que gera a receita de alu-
guel dá direito a utilização do crédito de PIS e de Cofins decorrente de sua aquisi-
ção, conforme acima reproduzidas, incluindo, inclusive, o valor do frete no mon-
tante de tais créditos12.
Todavia, em recente decisão em Processo de Consulta neste ano, a Receita Fe-
deral aparentemente expôs entendimento contrário, oposto às manifestações ante-
riormente exaradas sobre a matéria por este órgão, conforme se verifica:
“Processo de Consulta nº 300/11
Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF/7ª Região Fiscal
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins.
Ementa: Bens Móveis. Imobilizado. Locação a terceiros. Créditos. As máquinas, equi-
pamentos e demais bens do imobilizado destinados à locação a terceiros não fazem jus
ao critério de cálculo de créditos da Cofins não cumulativa, referentes à depreciação,
previsto no artigo 1º da Lei nº 11.774, de 2008.
(...)
Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep.
Ementa: Bens Móveis. Imobilizado. Locação a Terceiros. Créditos . As máquinas, equi-
pamentos e demais bens do imobilizado destinados à locação a terceiros não fazem jus
ao critério de cálculo de créditos da Contribuição para o PIS/Pasep não cumulativo,
referentes à depreciação, previsto no artigo 1º da Lei nº 11.774, de 2008.
(...)
José Carlos Sabino Alves - Chefe
(Data da Decisão: 25.7.2011).”
Todavia, entendemos que o escopo desta decisão administrativa, na realidade,
diz respeito à máquinas que não fazem parte do processo produtivo do contribuinte
e, quando estas são locadas ou dadas em comodato, passam a não fazer parte direta
ou indiretamente da geração de receita principal, i.e., atividade prevista como obje-
to social, de tal contribuinte. Entretanto, as ressalvas anteriormente destacadas pe-
las manifestações prévias da Receita Federal de que a depreciação de máquinas e
equipamentos dados em locação ou em comodado a terceiros ainda assim permite
o desconto como crédito de PIS e Cofins a tal contribuinte (locador ou comodante),

11
Vide ROLIM, João Dácio; e MARTINS, Daniela Couto. “ICMS - Manutenção de Créditos Relativos a Bens do Ati-
vo Permanente na Hipótese de Comodato”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 127. São Paulo: Dialética, 2006,
p. 54.
12
Processo de Consulta nº 204/2008, Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF/8ª Região Fiscal, data da
decisão: 2 de julho de 2008.
desde que a receita tributável de tal contribuinte esteja relacionada a tal atividade
de locação ou derive/dependa de tal comodato, como ocorre no caso ora tratado.
Não obstante, se não houver remuneração pela locação, isto é, se esta for gra-
tuita (comodato), as receitas de aluguéis não serão o motivo que ensejaria o direito
a crédito das máquinas/equipamentos, mas sim, a venda de produtos per se.
Note-se que a diferença seria apenas quanto à justificativa do direito ao crédito,
mas em ambos os casos é permitido o aproveitamento dos créditos decorrentes de
aquisição com bens do ativo imobilizado.
Ressalte-se que, em razão da base de cálculo de tais contribuições ser a “recei-
13
ta” , isto é, relacionando-se à riqueza auferida pelo contribuinte e não sobre o va-
lor dos bens e serviços em si (como ocorre com o ICMS14, IPI15 e ISS16), a interpre-
tação tanto do conceito de insumo como de ativo imobilizado, para fins de direito à
crédito do PIS e da Cofins, deve ser mais ampla e abranger todos os bens que con-
tribuam para a geração da receita bruta decorrente da própria atividade do contri-
buinte.
É o que, por exemplo, aponta Natanael Martins:
“no caso da Contribuição ao PIS e da Cofins, a materialidade do tributo vai além da
atividade meramente mercantil, fabril ou de serviços, alcançando todo o universo de
receitas auferidas pela pessoa jurídica (...) o conceito de insumo erigido pela nova
sistemática do PIS e da Cofins não guarda simetria com aquele delineado pelas legis-
lações do IPI e do ICMS, visto não estar limitado apenas a operações realizadas com
mercadorias ou produtos industrializados, sendo, inclusive, aplicado aos prestadores
de serviços.”17

5. Conclusão
Uma vez que o requisito para o direito a crédito para fins de apuração das con-
tribuições para o PIS e para a Cofins, no que tange à aquisição de máquinas e equi-
pamentos é simplesmente de que estes bens sejam “adquiridos ou fabricados para
locação a terceiros, ou para utilização na produção de bens destinados à venda ou
na prestação de serviços” (conforme artigo 3º, VI, das Leis nos 10.637/2002 e 10.833/
2003), entendemos que a condição em análise é de que tais máquinas e equipamen-
tos contribuam de forma essencial para a geração da receita bruta, ensejando o pa-
gamento de tais contribuições por parte do contribuinte sobre tal base de cálculo.

13
“Receita não é todo e qualquer ingresso, mas tão somente aquele que, efetivamente, se incorpora ao patrimônio do
contribuinte.” (CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. “Tratamento Tributário Aplicável aos Contratos de Rateio/
Compartilhamento de Custos e Despesas (Cost Sharing Agreements): IRPJ, CSLL, PIS, Cofins, ISS e Critérios para
Dedutibilidade de Despesas”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 177. São Paulo: Dialética, 2010, pp. 90-102.
14
A base de cálculo do imposto é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria (Código Tributário Nacio-
nal, artigo 53, I, e Lei Complementar nº 87/1996, artigo 13, I).
15
A base de cálculo do imposto é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria (Código Tributário Nacio-
nal, artigo 47, II, a, e Decreto nº 7.212/2010, artigo 190, II).
16
A base de cálculo do imposto é o preço do serviço (Código Tributário Nacional, artigo 72 e artigo 7º da Lei Comple-
mentar nº 116/2003).
17
MARTINS, Natanael. “O Conceito de Insumos na Sistemática Não-cumulativa do PIS e da Cofins”. In: FISCHER,
Octavio Campos; e PEIXOTO, Marcelo Magalhães (coords.). PIS-Cofins: Questões Atuais e Polêmicas. São Paulo:
Quartier Latin, 2005, p. 204.
Havendo qualquer restrição no que tange ao aproveitamento ou utilização dos
créditos de PIS e de Cofins relacionados a bens do ativo permanente temporariamen-
te locados ou dados em comodato a terceiros, desde que tais bens tenham partici-
pado na produção/geração dos bens ou na prestação dos serviços objeto da ativida-
de empresarial desenvolvida contribuinte (e, desta forma, contribuído para a gera-
ção da receita objeto da tributação por tais contribuições sociais), cabe a este pro-
curar ingressar com medida judicial cabível para ver satisfeito seu direito, ampara-
do na Constituição Federal e nas leis ordinárias que veicularam tais contribuições
sociais.
Ação Rescisória em Matéria Tributária
e os seus Reflexos em Relação ao
Crédito Tributário
Luana Vargas Macedo

I - Objeto do Presente Artigo


Como se sabe, uma das consequências decorrentes do
trânsito em julgado de uma decisão declaratória de inexis-
tência de uma dada relação jurídica tributária consiste, a teor
do art. 156, X, do Código Tributário Nacional (CTN), na
extinção do crédito tributário. Ocorre que, não raras vezes,
o Fisco, sucumbente naquela primeira demanda, ajuíza ação
rescisória visando desconstituir a respectiva coisa julgada e,
ao fim, comumente após longos anos, obtém êxito. Fixado
esse contexto, a questão que se pretende analisar neste bre-
ve estudo é a seguinte: quais são as consequências, em rela-
ção à cobrança de créditos tributários, advindas da procedên-
cia de ação rescisória movida pelo Fisco? A este será legíti-
mo cobrar, do contribuinte sucumbente na ação rescisória,
todo o tributo que deixou de ser pago durante o período em
que a coisa julgada, posteriormente rescindida, produzia
efeitos? Noutras palavras: ocorrendo a rescisão de decisão
judicial declaratória de inexistência de relação jurídica tri-
butária, e sendo proferida outra decisão, em seu lugar, ago-
ra julgando existente tal relação, o Fisco recobra o direito de
lançar os créditos tributários relativos ao período compreen-
dido entre a data do trânsito em julgado da decisão rescin-
denda e a data da prolação da decisão de procedência da ação
rescisória?
É essa a questão que será analisada e respondida dora-
vante, o que será feito mediante o breve estudo de dois pon-
tos complementares entre si: (i) natureza e efeitos da deci-
são de procedência da ação rescisória; e (ii) procedência da
ação rescisória e as suas consequências em relação ao pra-
zo decadencial para o exercício do direito do Fisco de cons-
tituir créditos tributários. Luana Vargas Macedo
é Procuradora da
Fazenda Nacional e
II - Análise do Objeto do Presente Artigo Coordenadora da
a) Natureza e eficácia das decisões judiciais de Divisão Nacional de
procedência da ação rescisória Acompanhamento
O primeiro passo para o deslinde da questão objeto des- Judicial e Estratégia
te artigo consiste na análise acerca da natureza e dos efeitos de Defesa da PGFN.
das decisões judiciais de procedência das ações rescisórias, com especial enfoque
para aquelas relacionadas à matéria tributária.
Assim, é de se assinalar, inicialmente, que o julgamento da ação rescisória com-
porta, ao menos em tese, o exercício de dois juízos de mérito: o juízo rescindente -
em que será decidido se a decisão rescindenda deverá ou não ser desconstituída - e
o juízo rescisório - subordinado ao prévio acolhimento do juízo rescindente, em que
será realizado um novo julgamento da “causa rescindenda”, com a procedência ou
improcedência desta. Cada um desses juízos será exercido em capítulos distintos da
decisão que julgar a ação rescisória, sendo que o capítulo que, em juízo rescinden-
te, julgar procedente o pedido de rescisão da coisa julgada, terá natureza constituti-
va negativa - consequência direta disso é que os seus efeitos serão prospectivos (efi-
cácia ex nunc, própria das sentenças constitutivas)1.
Uma vez desconstituída a decisão, passa-se ao exame do juízo rescisório, opor-
tunidade em que serão rejulgados os pedidos postos na causa originária: se estes
forem tidos como procedentes, o específico capítulo que os rejulgar lhes absorve a
natureza, de modo que tal capítulo poderá ter, conforme o caso, natureza constitu-
tiva, declaratória ou condenatória; por outro lado, se os pedidos deduzidos na ação
originária forem julgados improcedentes, o capítulo que os rejulgar terá natureza
declaratória negativa, como, no mais, ocorre com a generalidade das sentenças de
improcedência da demanda.
Observe-se que o capítulo da decisão que, em juízo rescisório, declarar impro-
cedentes os pedidos contidos na demanda originária, reveste-se de efeitos retroati-
vos (eficácia ex tunc, própria das sentenças declaratórias2). Isso significa que a de-
claração de improcedência da demanda originária, constante da decisão proferida
na ação rescisória, substitui, com efeitos retroativos, a decisão rescindida, doravan-
te extirpada do mundo jurídico; e isso significa, ainda, que todos os efeitos eventual-
mente decorrentes da decisão rescindida desfazem-se retroativamente, de forma que
a situação jurídica exposta e julgada na ação originária retoma o seu status quo an-
terior3. Realmente, conforme ensina o Professor Francisco Cavalcanti Pontes de

1
“Acolhida a ação rescisória, a conseqüência natural é desfazer a coisa julgada material. Sendo a rescisória uma ação
constitutiva, sua eficácia é, em princípio, ex nunc, podendo, por expressa previsão legal, conter efeitos ex tunc.”
(PARÁ FILHO, Tomás. Estudo sobre a Sentença Constitutiva. São Paulo: Obelisco, 1973, p.139)
2
Na clássica lição do Professor Cândido Rangel Dinamarco: “Como afirmação que é, toda declaração tem sempre por
objeto fatos passados ou direitos e obrigações também preexistentes a ela, sendo natural que a eficácia das sentenças
declaratórias se reporte à situação existente no momento em que o fato ocorreu ou seu efeito jurídico-material se
produziu. Elas têm eficácia ex tunc, colhendo as realidades desse passado e assim prevalecendo quanto aos atos e
fatos ocorridos depois. Se o contrato é nulo, ele o é desde quando foi realizado (vício de formação). Se A é filho de
B, ele o é desde quando nasceu.” (Instituições de Direito Processual Civil. Vol. III. São Paulo: Malheiros, 2005, pp.
225-226)
3
Em respaldo ao que se disse sobre a natureza declaratória e a eficácia ex tunc das decisões (rectius: dos capítulos
dessas decisões) que, em juízo rescisório, julgam improcedentes os pedidos deduzidos na demanda originária, con-
fira-se o ensinamento do Professor Ernane Fidélis dos Santos: “O pedido que se pode cumular ao de rescisão é ape-
nas o de novo julgamento da causa. Não se comporta, na rescisória, pedido específico de condenação à devolução de
coisa, dinheiro, indenização por serviço prestado etc., quando já tiver havido execução da sentença ou acórdão res-
cindendos. Mas, na consideração de que, declarada a rescisão do ato jurídico judicial, tudo volta ao estado ante-
rior, o iudicium rescissorium poderá gerar efeitos secundários que também autorizam execução. O autor da resci-
sória fora condenado, como réu, a pagar quantia em dinheiro, ou a entregar imóvel que tinha em sua posse. No novo
Miranda, “a execução ou cumprimento da sentença rescindenda, se advém a resci-
são com a desconstituição completa, não pode beneficiar a quem recebeu algo do
efeito sentencial”4.
Essa natureza declaratória da decisão que, em juízo rescisório, julga proceden-
te a ação rescisória, seguida pela eficácia retroativa que lhe é própria, poderia, a
princípio, e especificamente no que tange ao campo do Direito Tributário, conduzir
à conclusão de que a rescisão de decisão judicial que havia declarado inexistente
determinada relação jurídica tributária, com a sua substituição por outra decisão,
agora julgando improcedente a ação originária, autoriza a exigência, pelo Fisco,
de tudo o que deixou de ser pago pelo contribuinte durante todo o período em que
estavam em vigor os efeitos da decisão rescindida. Ora, cobrar o valor que deixou
de ser pago no passado, pelo contribuinte, em razão dos efeitos da decisão rescin-
dida seria, justamente, a decorrência direta da natureza declaratória e da eficácia
retroativa que marcam a decisão de procedência da ação rescisória, em seu capítu-
lo atinente ao juízo rescisório.
Entretanto, a questão não é tão simples assim. É que, embora seja certo que a
procedência da ação rescisória opera, quanto ao juízo rescisório, efeitos retroativos
- o que permitiria, a princípio, a cobrança do valor que deixou de ser pago pelo con-
tribuinte durante o período de vigência da decisão rescindida -, é igualmente certo,
por outro lado, que a exigência tributária pressupõe a existência de crédito tributá-
rio constituído dentro do prazo decadencial previsto em lei.
Exatamente por isso, a cobrança, pelo Fisco, do que deixou de ser pago pelo
contribuinte durante o período de vigência dos efeitos da decisão rescindida não
pode ser efetivada sem que sejam observadas, em cada caso, as limitações atinen-
tes ao prazo decadencial incidente. Assim é que, num segundo passo rumo ao des-
linde do objeto deste artigo, serão lançadas breves considerações acerca do institu-
to da decadência.

b) Noções gerais sobre a decadência


A decadência, na clássica lição do Professor Caio Mário da Silva Pereira, “é o
perecimento de um direito potestativo, em razão do seu não-exercício em um prazo
predeterminado”5. Vale dizer: não exercido o direito em determinado prazo tempo-
ral (previsto em lei), tem-se como consequência a sua extinção. Desse conceito fun-
damental decorre logicamente que: (i) o prazo temporal previsto em lei para o exer-
cício do direito somente começa a correr a partir do momento em que esse direito
puder ser exercido; e (ii) se, por algum motivo, o titular do direito passa a estar im-
pedido de exercê-lo, o prazo decadencial, reflexamente, deixa de correr, somente
retomando seu curso quando removido o óbice que impedia o exercício do direito.

julgamento, o acórdão da rescisória deu pela improcedência do pedido condenatório, ou ao de reivindicação. Como
efeito secundário da decisão, que é declaratória, muito lógico que, já tendo havido execução, por outra se façam
voltar as coisas ao estado anterior, isto é, que se permita ao autor fazer, através do processo executório, o imóvel
voltar a sua posse, e a se reembolsar da quantia que pagou indevidamente, em execução, com os acessórios que lhe
são peculiares.” (Manual de Direito Processual Civil. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2006, pp. 762/763)
4
Tratado da Ação Rescisória. São Paulo: Borsoi, 2003, pp. 539-540.
5
Instituições de Direito Civil. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 68.
Veja-se que a afirmação contida na alínea (ii) acima merece atenção especial. É
que o sentido nela contido, de que o prazo decadencial tem sobrestado seu curso
enquanto existir óbice ao exercício do direito, parece estar em choque com outra
afirmação, bastante frequente, aliás, segundo a qual os prazos decadenciais não se
suspendem nem se interrompem. O choque, de fato, existe, mas é de se dizer, des-
de já, e sem pretender, aqui, esgotar a questão, que a tão propagada impossibilida-
de de suspensão e/ou interrupção dos prazos decadenciais não se sustenta em bases
sólidas, merecendo, portanto, ser revista.
Com efeito, embora se saiba que o prazo decadencial não se sujeita às hipóte-
ses ordinárias de suspensão e de interrupção do prazo prescricional, sabe-se, tam-
bém, que assim como ocorre com a prescrição, a decadência, para se consumar, pres-
supõe a inércia do titular do direito, que, podendo, deixa de exercê-lo. Assim, a inér-
cia está para o conceito de decadência como seu elemento integrante e anteceden-
te, sem o qual o seu respectivo consequente, a saber, a extinção do direito, não se
verifica.
Ora, não está inerte quem, por fatores externos, impositivos, que não se acham
à sua disposição, está impedido de exercer o direito. É por isso que se diz que, em-
bora o prazo decadencial não se sujeite às regras usuais de suspensão e de interrup-
ção da prescrição, esse mesmo prazo deixará de fluir - restará verdadeiramente sus-
penso - caso sobrevenha fator impeditivo ao exercício do direito, e isso simplesmente
porque, nesse caso, não haverá a inércia, indispensável à configuração da decadên-
cia.
Demonstrando a necessidade de superação da assertiva de que os prazos deca-
denciais não se suspendem nem se interrompem, vale conferir o ensinamento do i.
Ministro do STJ, Teori Albino Zavascki:
“É possível que entre a data da concessão da liminar e a da sua revogação tenha de-
corrido o prazo prescricional ou decadencial para o exercício de ação ou de direito
fundado em norma cuja vigência fora suspensa e posteriormente restabelecida. Por
exemplo, é possível que, entre o trânsito em julgado da sentença no caso concreto e a
revogação da liminar na ação de controle concentrado, tenha transcorrido período de
tempo superior ao previsto para o ajuizamento da ação rescisória. Terá o interessado,
que se submeteu ao comando liminar, perdido o direito de promover a ação? Esta ques-
tão há que ser examinada e resolvida à luz do princípio, acima anotado, do não-prejuízo
a quem obedeceu a liminar, por força do qual devem ser asseguradas ao jurisdiciona-
do, integralmente, todas as faculdades e pretensões que poderia ter exercido não fosse
o comando impeditivo da medida judicial. À luz de tal princípio, deve-se entender que
o prazo para o ajuizamento da ação rescisória terá como termo inicial a data do trânsi-
to em julgado, não da sentença do caso concreto, mas do acórdão ou da decisão que,
na ação de controle concentrado, revogou a liminar.
Dir-se-á que se trata de prazo decadencial, não sujeito a suspensão ou interrupção. A
objeção não procede. Não se pode ter por absoluta, como demonstrado em doutrina
[MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado, 4ª ed., São Paulo, Ed. Revista dos
Tribunais, 1974, tomo VI, p.141; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Di-
reito Civil, 14ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1993, vol. I, p. 479, nota 23], a regra de
que o prazo de decadência não comporta incidências que alterem o seu curso. A pen-
dência de demanda judicial, por exemplo, é causa de interrupção não apenas dos pra-
zos prescricionais (CPC, art. 219), mas igualmente dos prazos extintivos do direito
(CPC, art. 220), nos quais se incluem, conforme a jurisprudência [STJ, REsp 1.450,
3ª Turma, Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 18.12.89, p. 18.475; REsp 50.363, 4ª Turma,
Min. Torreão Braz, DJ de 21.11.94, p. 31.773; REsp 63.732, 1ª Turma, Min. César
Asfor Rocha, DJ de 14.08.95, p. 23.993; REsp 63.751, 1ª Turma, Min. Humberto
Gomes de Barros, DJ de 02.10.95, p. 32.333; REsp 72.660, 1ª Turma, Min. Cesar As-
for Rocha, DJ de 05.02.96, p. 1.365; REsp 90.164, 6ª Turma, Min. Luiz Vicente Cer-
nichiaro, DJ de 16.12.96, p. 50.970; REsp 11.106, 2ª Turma, Min. Adhemar Maciel,
DJ de 10.11.97, p. 57.731; REsp 89.522, 2ª Turma, Min. Peçanha Martins, DJ de
25.02.98, p. 37], também os de natureza decadencial. Ora, regime jurídico semelhan-
te não se poderia negar à situação aqui enfocada. Na verdade, a medida antecipatória
deferida nas ações de controle concentrado importa a suspensão da eficácia do precei-
to normativo questionado, ou a imposição dela (o que significa, também, inibição da
eficácia de eventual norma em sentido diferente). Ou seja, a liminar atua inclusive no
plano da incidência da norma, inibindo, assim, não apenas o exercício dos direitos
eventualmente sujeitos a prazos decadenciais, mas o próprio surgimento deles.
Suspensa a incidência, não tem sequer início o prazo (decadencial) para o exercício
do direito. Por outro lado, quando a liminar for deferida após a incidência da norma
objeto da ação, inibe-se o exercício de eventual direito daí decorrente, e, portanto, fica
suspenso o curso do respectivo prazo decadencial. Assim, qualquer que seja a hipóte-
se, não há como computar-se no prazo decadencial o período de vigência da liminar
deferida na ação de controle concentrado. Daí afirmar-se que, nas situações acima
enfocadas, o termo inicial do prazo para ajuizamento da ação rescisória é o do trânsito
em julgado do acórdão que revogou a liminar.
A mesma solução é aplicável a todas as demais situações em que, no interregno de
vigência da liminar revogada, tenha transcorrido período de tempo superior ao do prazo
de prescrição ou de decadência. O princípio do não-prejuízo impõe que, com a revo-
gação da liminar, haja reposição integral da situação jurídica de quem ficou submeti-
do ao seu comando, inclusive no que se refere aos prazos para exercício dos direitos,
das ações e das pretensões. Conseqüentemente, não se pode incluir no cômputo dos
prazos de decadência ou de prescrição [STJ, REsp 158.004, 5ª Turma, Ministro José
Dantas, DJ de 18.05.1998, com a seguinte ementa: ‘Administrativo. Ação. Prescrição.
Em conta o princípio da actio nata e da modernidade do Direito, há de compreender-
se ao lado do vetusto rol numerus clausus do art. 169 do Código Civil a causa suspen-
siva da prescrição da ação fundada na lei suspensa nos seus efeitos por liminar do Su-
premo Tribunal Federal, concedida em ação direta de inconstitucionalidade’], inclusi-
ve os que tem o Fisco para efetuar o lançamento e a cobrança dos tributos, o período
de vigência da liminar. Tais prazos somente terão início ou retomarão seu curso na data
do trânsito em julgado do acórdão ou da decisão que, na ação de controle concentrado
de constitucionalidade, tiver revogado a medida liminar.”6
Veja-se que todas essas noções gerais acerca do instituto da decadência se apli-
cam, naturalmente, à decadência em Direito Tributário. Nessa específica seara, a
decadência se refere ao exercício, pelo Fisco, do direito subjetivo de efetuar o lan-
çamento para a constituição do crédito tributário - não exercido, no prazo legal, o
direito de lançar, este restará fulminado pela decadência.
Ainda na esteira das balizas gerais acima expostas, e trazendo-as para o campo
do Direito Tributário, é de se dizer que o prazo decadencial somente começa a fluir

6
Eficácia das Sentenças na Jurisdição Constitucional. São Paulo: RT, 2001, pp. 74-76.
a partir do momento em que o correspondente direito de lançar puder ser exercido;
e esse momento se verifica quando, ocorrido o fato gerador previsto na norma de
incidência tributária, nasce a respectiva relação jurídica tributária7. É dessa relação
jurídica tributária que surge, para o Fisco, o direito de lançar o crédito tributário em
face do sujeito passivo. Diz-se, portanto, que ocorrido o fato gerador, e nascida a
correspondente relação jurídica tributária, passa a correr, a partir desse momento, o
prazo decadencial para o Fisco efetuar o lançamento tributário.
Daí se segue que se (i) a relação jurídica tributária não nasce, seja por que a
correspondente norma tributária não incide, seja por que não ocorre o fato gerador
previsto nessa norma, não surge, para o Fisco, o direito potestativo de lançar: con-
sequência disso é que o respectivo prazo decadencial não inicia seu curso. Da mes-
ma forma, se (ii), após iniciado o fluxo do prazo decadencial, o direito de lançar,
por motivo qualquer, restar realmente obstado, o fluxo de tal prazo será sobrestado,
somente retomando seu curso quando removido o óbice ao exercício do direito em
tela.
Coloca-se como exemplo da primeira hipótese a situação em que determinada
norma de incidência tributária é considerada inconstitucional, por decisão judicial
transitada em julgado. Nesse caso, essa norma, tida por inconstitucional, não inci-
de, não nascendo, portanto, a relação jurídica tributária correspondente. Decorre daí
a inexistência, para o Fisco, do direito potestativo de lançar, e, por conseguinte, a
não fluência do respectivo prazo decadencial.
Como exemplo da segunda hipótese, cita-se a situação, não muito usual, em que
é proferida determinação judicial vedando expressamente o exercício do direito de
lançar pelo Fisco. Essa decisão, embora equivocada (a decisão poderia, quando
muito, impedir a inscrição em dívida ativa e a cobrança judicial do crédito tributá-
rio, mas, jamais, a sua constituição), enquanto em vigor, deve ser cumprida pelos
seus destinatários, sob pena de os mesmos incidirem em crime de desobediência,
previsto no art. 330 do CP. Sendo assim, determinação judicial nesse sentido confi-
gura fator verdadeiramente impeditivo do direito de lançar, de modo que, durante a
sua vigência, não deve fluir o prazo decadencial.
Veja-se que, embora tal situação felizmente seja pouco usual, nada impede a sua
ocorrência na prática; assim é que o E. STJ, ao se deparar com tal hipótese, deci-
diu, em recente julgado, exatamente no sentido aqui defendido: o curso do prazo
decadencial para a constituição do crédito tributário fica suspenso durante o perío-
do em que o Fisco não efetua o lançamento tributário por estar impedido de fazê-
lo. Confira-se:
“Tributário. Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário. Decadência do Direito
de o Fisco lançar. Existência de Óbice Judicial à Constituição do Crédito. Inércia do
Fisco. Não Configuração. Ocorrência do Lançamento antes do Decurso do Lustro
Decadencial.
1. As causas supervenientes suspensivas do crédito tributário não inibem a Fazenda
Pública de providenciar a sua constituição, posto atividade administrativa vinculada e

7
É o que se extrai do art. 173, I, do CTN, que traz a regra geral em tema de decadência tributária (“Art. 173. O direito
de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I - do primeiro dia do
exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado”).
obrigatória. É que a Administração Ativa deve lançar o crédito tributário a fim de evi-
tar a ocorrência da decadência, possibilitando sua cobrança após encerrada a causa
suspensiva de exigibilidade (Precedente da Primeira Seção: EREsp 572.603/PR, Rel.
Ministro Castro Meira, julgado em 08.06.2005, DJ 05.09.2005).
2. Entrementes, impende ressaltar que a decadência, assim como a prescrição, nasce
em razão da realização do fato jurídico de omissão no exercício de um direito subjetivo.
3. In casu: (i) cuida-se de tributo sujeito a lançamento por homologação (ICMS); (ii)
por força de liminar deferida em 21.07.1994, em sede de ação cautelar, o contribuin-
te, a partir de março de 1995, passou a creditar, em sua escrita fiscal, a correção mo-
netária de créditos escriturais excedentes de ICMS; (iii) em 30.03.1999, o contribuin-
te teve contra si lavrado o Auto de Lançamento nº 001241664, no qual a autoridade
coatora cobrava os valores creditados em sua escrita fiscal; (iv) em 19.01.2000, após a
discussão na esfera administrativa, o contribuinte impetrou mandado de segurança
preventivo, com pedido de liminar, visando a anulação do Auto de Lançamento lavra-
do pelo Fisco; (v) em 21.06.2002, restou provido recurso extraordinário interposto pelo
Fisco, tendo sido reformadas as decisões que favoreciam a impetrante; (vi) em
18.12.2003, transitou em julgado o mandado de segurança, que reconhecera o direito
do contribuinte em ver anulado o auto de lançamento, por afronta à decisão judicial
que lhe autorizara a utilização da correção do saldo credor de ICMS; (vii) em
23.09.2004, o Fisco Estadual efetuou novo lançamento (nº 0013875825), objetivando
a cobrança do valor aproveitado a partir do ano de 1995.
4. Desta sorte, malgrado a jurisprudência pacífica do STJ no sentido de que a suspen-
são da exigibilidade do crédito tributário não impede o lançamento, no caso sub exa-
mine, restou obstado o exercício, pelo Fisco, do seu dever de constituir o crédito tribu-
tário enquanto vigorasse a liminar deferida no âmbito de mandado de segurança, o que
ocasionou a desconstituição de anterior auto de lançamento lavrado tempestivamente
(por desobediência à aludida ordem judicial), razão pela qual não fluiu o lustro deca-
dencial, uma vez que não se caracterizou a inércia do sujeito ativo, que, com a cassa-
ção da decisão impeditiva, pelo STF, em 21.06.2002, procedeu ao lançamento antes
do decurso do prazo qüinqüenal, em 23.09.2004.
5. Recurso especial desprovido.” (REsp n. 849.273/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJU de
7.5.2008)
De qualquer forma, ressalte-se que, nas duas hipóteses acima lançadas (i e ii),
não se pode dizer que o Fisco estava inerte quanto ao exercício do seu direito de
lançar. Exatamente por isso é que, em ambas as hipóteses, não há fluência de prazo
decadencial.

c) Consequências advindas da procedência de ação rescisória em matéria


tributária em relação ao crédito tributário: algumas conclusões
Bem fixadas essas considerações acerca da decadência tributária, e conjugan-
do-as com tudo o que se disse, antes, acerca da natureza declaratória e dos efeitos
retroativos da decisão de procedência da ação rescisória, é possível, finalmente, lan-
çar algumas conclusões importantes para o deslinde da quaestio iuris objeto deste
estudo.
Assim é que se pode dizer, com base nas considerações acima lançadas, que
durante o curso de ação judicial em que se pretenda obter declaração da inexistên-
cia de determinada relação jurídica tributária, flui, normalmente, o prazo decaden-
cial para o Fisco constituir os créditos tributários relativos aos fatos geradores ocorri-
dos no curso da ação, bem como nos cinco anos anteriores ao seu ajuizamento. O
prazo decadencial corre, igualmente, na vigência de decisão liminar que defere a
suspensão da exigibilidade do crédito tributário discutido, sendo certo que tal me-
dida impede, apenas, a inscrição do crédito tributário em dívida ativa e a sua poste-
rior cobrança judicial. Veja-se que, em qualquer caso, nada impede o exercício, pelo
Fisco, do seu direito de lançar, razão pela qual o respectivo prazo decadencial flui
normalmente.
Exatamente por isso, no curso da ação judicial, e enquanto não transitada em
julgado eventual decisão judicial declaratória da inexistência da relação jurídica tri-
butária, o Fisco permanece com o poder-dever de efetuar o lançamento tributário, o
que deve ser feito nem que seja, apenas, para evitar a decadência, exatamente tal qual
permitido pelo art. 63 da Lei n. 9.430/1996. Se esse lançamento “com a exigibili-
dade suspensa” não for efetivado no curso da ação, continuará a fluir o respectivo
prazo decadencial.
O advento do trânsito em julgado de eventual decisão declaratória de inexistên-
cia da relação jurídica tributária acarreta três consequências que, por interessarem
ao tema ora sob enfoque, merecem ser elencadas: (i) a extinção dos créditos tribu-
tários já constituídos mediante lançamentos efetuados no curso da ação (art. 156,
X, do CTN); (ii) suspensão do prazo decadencial para o exercício do direito de lan-
çar nascido durante o curso da ação (a suspensão, obviamente, atinge apenas os pra-
zos decadenciais que, no momento do trânsito em julgado, ainda não tenham se es-
gotado); e (iii) a impossibilidade de, a partir do trânsito em julgado, o Fisco consti-
tuir os créditos tributários relacionados à relação jurídica tributária discutida na ação
já finalizada em favor do contribuinte. Ora, se a relação jurídica tributária é tida
como inexistente, por decisão judicial irreformável, então não surge, para o Fisco,
o direito de lançar (relembre-se: o direito de lançar surge com a ocorrência da rela-
ção jurídica tributária), não correndo, consequentemente, o prazo decadencial cor-
respondente. Em suma: após o trânsito em julgado de decisão declaratória de ine-
xistência de relação jurídica tributária, não há mais sentido em se falar em fluência
de prazo decadencial.
Diante de todo esse panorama, a primeira conclusão que se pode extrair é a de
que, havendo a desconstituição, em sede de ação rescisória, da decisão judicial de-
claratória de inexistência da relação jurídica tributária, e sendo proferida outra, em
seu lugar, agora julgando existente tal relação jurídica tributária, o Fisco recobra o
direito de lançar os créditos tributários relativos aos fatos geradores ocorridos no
curso da ação originária, desde que esse direito já não tenha sido fulminado pela
decadência (ou seja, desde que, no curso da ação originária, não tenha se consuma-
do o prazo decadencial). Relembre-se que o prazo decadencial, com o trânsito em
julgado da decisão rescindenda, restou suspenso, retomando o seu curso apenas a
partir da prolação da decisão de procedência da ação rescisória. A partir desse mo-
mento, recomeça a correr o prazo decadencial para a constituição dos créditos tri-
butários relativos a fatos geradores ocorridos no curso da ação rescindenda, com-
putado nesse prazo, obviamente, o tempo já transcorrido anteriormente, antes da
suspensão.
A segunda conclusão que se pode extrair é a de que a rescisão da decisão judi-
cial que havia declarado a inexistência da relação jurídica tributária faz como que
os créditos tributários já constituídos no curso da ação, que tinham sido extintos em
razão do advento da decisão final nela proferida, sejam automática e plenamente
restabelecidos. Diz-se que tais créditos serão automaticamente restabelecidos por
que, com a procedência total da ação rescisória, a decisão rescindida, assim como
todos os seus efeitos, devem desaparecer do mundo jurídico de forma retroativa, de
modo que o crédito tributário, extinto por decorrência direta de tal decisão, com a
rescisão desta, volta a existir, restando restaurado o respectivo lançamento tributá-
rio. Diz-se, ainda, que tais créditos serão plenamente restabelecidos por que, com a
sua a constituição, mediante lançamento efetuado no curso da ação, afastou-se o
fluxo do correspondente prazo decadencial, de forma que tais créditos poderão ser,
a partir da rescisão, exigidos de forma plena, sem limitação.
Essa segunda conclusão, aliás, corresponde à orientação acolhida pelo E. STJ
no julgamento cuja ementa se transcreve abaixo:
“Tributário e Processual Civil. Contribuição Social sobre o Lucro das Empresas. Ação
Rescisória. Desconstituição de Decisão que reconheceu a Inconstitucionalidade da
Exação Prevista na Lei 7.689/88. Matéria essencialmente Constitucional e Jurisprudên-
cia em Consonância com o Acórdão Recorrido. Ausência de Prequestionamento. Não
Conhecimento do Especial sob tais Aspectos. Extinção do Crédito Tributário. Rescin-
dida a Sentença o Crédito Tributário fica Intacto; volta-se ao Status Quo Ante. Inocor-
rência de Violação o Art. 156, X, do CTN.
I - Não cabe conhecer do recurso especial na parte em que o Tribunal a quo decidiu a
questão em bases essencialmente constitucionais, estando o acórdão em consonância
com jurisprudência do STJ, ausente o prequestionamento de dispositivo legal aponta-
do como malferido.
II - A decisão judicial transitada em julgado extingue o crédito tributário, a teor do
disposto no art. 156, inciso X, do Código Tributário Nacional. Julgada procedente res-
cisória, na espécie, volta-se ao status quo ante, resurgindo o crédito tributário, que pode
ser exigido novamente do contribuinte, eis que, com a procedência da ação, desapare-
ce a decisão judicial passada em julgado e fica sem efeito a extinção, porquanto dei-
xou de existir a coisa julgada.
III - Recurso especial parcialmente conhecido, mas improvido.” (REsp n. 333.258/DF,
Rel. Min. Garcia Vieira, DJU de 12.8.2002)
Veja-se que, na hipótese ora em foco, a partir da prolação da decisão de proce-
dência da ação rescisória, com o conseqüente restabelecimento dos créditos tribu-
tários constituídos no curso da ação originária, inicia-se, para o Fisco, o respectivo
prazo prescricional para o ajuizamento de execução fiscal tendente a cobrá-los.
A terceira e última conclusão a que se chega diante de todo o exposto é a de que,
com a rescisão da decisão judicial que havia declarado a inexistência da relação
jurídica tributária, o Fisco passa a ter o direito de constituir os créditos tributários
correspondentes ao período compreendido entre a data do trânsito em julgado da
decisão rescindenda e a data da prolação da decisão de procedência da ação resci-
sória. É que, nesse período, como visto, não corria prazo decadencial algum, já que,
ante a vigência da decisão definitiva de inexistência de relação jurídica tributária,
não havia direito de lançar. Apenas com a prolação da decisão de procedência da
rescisória é que o Fisco, dada a eficácia ex tunc dessa decisão, passa a ter o direito
de lançar os créditos correspondentes a esse período pretérito. E apenas a partir daí
é que começa a correr o respectivo prazo decadencial.
Base de Cálculo do ICMS na Saída de
Minério para Estabelecimento do Mesmo
Titular Localizado em Outro Estado
Onofre Alves Batista Júnior

1. Introdução
Pobres Estados-Membros e Municípios, no federalismo
brasileiro! Sofre o Rio de Janeiro com o petróleo; sofre Mi-
nas Gerais com os buracos resultantes da exploração de mi-
nérios! A terra vermelha que suja... O ar que fica empoeira-
do... O verde que se transforma em montanhas de buracos...
As estradas destruídas... Como sofrem as Minas Gerais!
Por certo, a questão da base de cálculo do ICMS nas
transferências interestaduais de minério de ferro precisa ser
revisitada. Essa é a proposta das linhas que se seguem.

2. Base de Cálculo Excepcional do ICMS em


Transferências Interestaduais
Em linhas gerais, a base de cálculo do ICMS vem disci-
plinada pela Lei Complementar nº 87/1996, nos termos de
seu art. 13:
“Art. 13. A base de cálculo do imposto é:
I - na saída de mercadoria prevista nos incisos I, III e IV do
art. 12, o valor da operação;
II - na hipótese do inciso II do art. 12, o valor da operação,
compreendendo mercadoria e serviço;
III - na prestação de serviço de transporte interestadual e in-
Onofre Alves Batista termunicipal e de comunicação, o preço do serviço;
Júnior IV - no fornecimento de que trata o inciso VIII do art. 12: a)
é Procurador do o valor da operação, na hipótese da alínea ‘a’; b) o preço
Estado de Minas corrente da mercadoria fornecida ou empregada, na hipóte-
Gerais, Mestre em se da alínea ‘b’;
Ciências Jurídico- V - na hipótese do inciso IX do art. 12 a soma das seguintes
políticas pela parcelas: a) o valor da mercadoria ou bem constante dos
Universidade de documentos de importação, observado o disposto no art. 14;
Lisboa, Doutor em b) imposto de importação; c) imposto sobre produtos indus-
Direito Administrativo trializados; d) imposto sobre operações de câmbio; e) quais-
pela Universidade quer despesas aduaneiras;
Federal de Minas VI - na hipótese do inciso X do art. 12, o valor da prestação
Gerais e Professor do serviço, acrescido, se for o caso, de todos os encargos
Adjunto de Direito relacionados com a sua utilização;
Público na Graduação VII - no caso do inciso XI do art. 12, o valor da operação
e na Pós-graduação acrescido do valor dos impostos de importação e sobre pro-
(Mestrado e dutos industrializados e de todas as despesas cobradas ou
Doutorado) da UFMG. debitadas ao adquirente;
VIII - na hipótese do inciso XII do art. 12, o valor da operação de que decorrer a en-
trada;
IX - na hipótese do inciso XIII do art. 12, o valor da prestação no Estado de origem.
§ 1º Integra a base de cálculo do imposto:
I - O montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação
para fins de controle;
II - o valor correspondente a: a) seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas
ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; b) frete, caso o transporte
seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em se-
parado.
§ 2º Não integra a base de cálculo do imposto o montante do Imposto sobre Produtos
Industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto
destinado à industrialização ou à comercialização, configurar fato gerador de ambos
os impostos.
§ 3º No caso do inciso IX, o imposto a pagar será o valor resultante da aplicação do
percentual equivalente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sobre o
valor ali previsto. (...)
§ 5º Nas operações e prestações interestaduais entre estabelecimentos de contribuin-
tes diferentes, caso haja reajuste do valor depois da remessa ou da prestação, a dife-
rença fica sujeita ao imposto no estabelecimento do remetente ou do prestador.
Na situação excepcional de saída de mercadoria para estabelecimento localizado
em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, isto é, nas transferências interesta-
duais de mercadorias, a disciplina vem estabelecida no parágrafo 4º do mesmo art.
13 da LC nº 87/1996:
“Art. 13. (...) § 4º Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro
Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo do imposto é:
I - o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;
II - o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-
prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;
III - tratando-se de mercadorias não industrializadas, o seu preço corrente no merca-
do atacadista do estabelecimento remetente.”
Nas transferências interestaduais de mercadorias, como parece confirmar recente
julgado do Superior Tribunal de Justiça (STJ),1 firma-se o seguinte:
1) quando se tratar de comércio levado a cabo por contribuinte do imposto, a
base de cálculo do ICMS é a prevista no mencionado inciso I;
2) tratando-se de mercadoria industrializada, a base de cálculo é a prevista no
inciso II;
3) no caso de mercadoria obtida por outros processos, não relativos à aquisi-
ção de outros contribuintes ou à industrialização, a base de cálculo aplicável
é a disciplinada no inciso III, ou seja, o preço corrente no mercado atacadista
do estabelecimento remetente.
A base de cálculo do ICMS mercantil, em regra, é o valor da operação pela qual
se transfere a mercadoria, o que demonstra a estreita relação entre o tributo e o ne-

1
Nesse sentido, vale conferir o Recurso Especial nº 1.109.298/RS (2008/0279009-9) da 2ª Turma do STJ (Relator
Ministro Castro Meira, Recorrente Nestlé Brasil Ltda., Recorrido Estado do Rio Grande do Sul, julgado em 26.4.2011),
que traz a seguinte ementa: “Processual civil e tributário. ICMS. Base de cálculo. Estabelecimentos. Mesmo titular.
Transferência entre fábrica e centro de distribuição. Artigo 13, § 4º, da LC 87/96.”
gócio jurídico praticado (art. 13 da LC nº 87/1996). No entanto, o parágrafo 4º do
referido dispositivo prevê base de cálculo específica para a situação de saída de
mercadoria pertencente ao mesmo titular para estabelecimento em outro Estado.
O Tribunal Superior, no citado acórdão, decidiu que a interpretação do art. 13,
parágrafo 4º, da LC nº 87/1996 deve ser restritiva, porque o parágrafo estabelece
bases de cálculos específicas. Em outras palavras, a interpretação deve ser restriti-
va para não se alargarem as exceções da base de cálculo do ICMS mercantil posta
como regra geral no caput do art. 13, uma vez que o parágrafo 4º do art. 13 estabe-
leceu bases de cálculo a serem adotadas em situações excepcionais, estratificando
o quantum. Entretanto, a hipótese estabelecida para aplicação do parágrafo 4º do art.
13 vem bem demarcada na LC nº 87/1996, ou seja, deve o dispositivo ser aplicado
quando se tratar de saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro
Estado, pertencente ao mesmo titular. Frise-se, assim, que, nesses casos, irrefuta-
velmente, deve ser aplicado o dispositivo.
O STJ, da mesma forma, marca, no acórdão, que os incisos do art. 13, parágrafo
4º estão conectados às atividades do sujeito passivo. Nesse compasso, os incisos do
parágrafo 4º fazem expressa referência à atividade desenvolvida pelo sujeito passi-
vo: no inciso I, mercantil; no II, a industrial e; no III, a relativa a produtos primá-
rios.

3. A Interpretação Teleológica do Art. 13, Parágrafo 4º, da LC nº 87/1996


Como pondera Oliveira Ascensão, todo o direito é finalista; toda fonte existe para
atingir fins e objetivos sociais.2 Assim, a interpretação adequada exige a pesquisa
da justificação social da lei. Como afirma o autor, enquanto se não descobrir o para
quê duma lei, não se detém ainda a chave da sua interpretação.
O Direito brasileiro expressamente consagra a relevância do elemento teleoló-
gico na interpretação das leis, em dispositivo que se aplica, em sua plenitude, ao
Direito Tributário. Trata-se do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil brasi-
leiro, que determina que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que
ela se dirige e às exigências do bem comum”. Trata-se de um princípio geral de
aplicação do direito, que estabelece dois padrões: os fins sociais a que a lei se diri-
ge e as exigências do bem comum.
Com elogiável precisão, Oliveira Ascensão, explica que a referência aos “fins
sociais da lei” é a própria referência e consagração do elemento teleológico da in-
terpretação, com a vantagem de acentuar que toda lei se destina a cumprir uma fi-
nalidade social.3 Na mesma direção, vai a lição de Calos Maximiliano:4
“Inspira-se a Hermenêutica em os mesmo princípios da ciência de que é auxiliar; atente,
sobretudo, ao fim social, ‘elemento especificamente jurídico; substância, realidade do

2
Cf. ASCENSÃO, José de Oliveira. O Direito - Introdução e Teoria Geral. 10ª ed. Coimbra: Almedina, 1997, p. 408.
Como observa Hugo de Brito Machado (Curso de Direito Tributário. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 77),
todo o direito tende a um fim, tem uma finalidade, e esta finalidade deve ser considerada na interpretação, de sorte
que o intérprete não extraia do texto um significado incompatível com o fim visado pelo legislador.
3
Cf. ASCENSÃO, José de Oliveira. O Direito - Introdução e Teoria Geral. Op. cit., pp. 410-411.
4
Cf. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, pp. 153 e
157.
Direito’; grande fator, portanto; um dos mais eficientes da exegese moderna. (...) Se é
certo que o juiz deve buscar o verdadeiro sentido e alcance do texto; todavia este al-
cance e aquele sentido não podem estar em desacordo com o fim colimado pela legis-
lação - o bem social.”
A interpretação, antes de tudo, deve ter em conta o elemento teleológico, em
especial porque a lei deve assegurar a função social do Direito.5 A consideração do
elemento teleológico da interpretação, portanto, que deriva da exigência de busca
da finalidade social da lei, faz-se necessária para trazer à consideração do intérpre-
te os valores materiais básicos estabelecidos no ordenamento jurídico, que se encon-
tram esculpidos, sobretudo, na Constituição.6
Trazido para a seara tributária, o elemento teleológico traduz a exigência de
busca da finalidade social da lei impositiva, que deverá, no processo hermenêutico,
iluminar e orientar o intérprete da lei. Por certo, nesse elemento teleológico, inar-
redável para uma adequada interpretação da norma, deve-se perquirir a essência da
norma tributária, sua razão de ser, a finalidade social perseguida pela lei. Daí por
que ao Direito Tributário não basta a pesquisa da palavra, da letra, trabalho este do
especialista em gramática, mas deve-se buscar o sentido da norma, sua essência. No
caso do ICMS, portanto, não se pode interpretar a norma sem apreender a lógica do
tributo e os fins sociais buscados pela lei impositiva. Nesse compasso é que se deve
buscar o sentido dos dispositivos da LC nº 87/1996.
No caso em tela, em operações comerciais nas quais a pessoa jurídica é a mes-
ma, de fato, não faz sentido tomar o “preço” ou “valor da operação” como critério
determinante da base de cálculo do ICMS, como em regra deve-se fazer, porque
não se verifica a transferência da titularidade jurídica da mercadoria (posse ou pro-
priedade).7 Exatamente por isso é que o inciso I do art. 13, parágrafo 4º, da LC nº
87/1996, firma a expressão “entrada mais recente”.
Corroborando esse pensamento, o STJ firmou o entendimento de que o inciso I
diz respeito a operações nas quais o titular do estabelecimento compra os produtos,
isto é, aplica-se o dispositivo quando o titular do estabelecimento adquire-os de ter-
ceiros em operações empresariais típicas, e depois os transfere a estabelecimento
dele próprio localizado em outro Estado.
No que diz respeito ao inciso II, a expressão “custo da mercadoria produzida”
refere-se ao valor das operações em que o titular do estabelecimento fabrica os pro-
dutos. Neste caso, a base de cálculo é sempre o custo da mercadoria produzida (soma
do custo da matéria-prima, do material secundário, mão de obra e acondicionamen-
to), sem qualquer agregação de valor (plus).
O inciso II deve ser aplicado quando se trata de estabelecimento industrial. Não
faz sentido tomar a “entrada mais recente” porque o inciso trata de estabelecimen-

5
Como avalia Lúcio Flávio de Vasconcellos Naves (Abuso no Exercício do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p.
260), “a função social do Direito é sua razão de existir. É a sua alma. É sua forma substancial. É, em última análise,
o espírito que lhe dá vida.”
6
Daí a importância da “Interpretação conforme a Constituição”, que trataremos linhas a frente.
7
Nesse sentido, SOUZA, Fátima Fernandes Rodrigues de. Curso de Direito Tributário. 10ª ed. Coordenação de MAR-
TINS, Ives Gandra da Silva. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 770.
to industrial, que, usualmente, dá entrada a diversos produtos que compõem a ca-
deia produtiva e os industrializa. O inciso II não poderia mesmo utilizar o “preço”
porque se está, como no inciso I, diante de operações realizadas entre estabeleci-
mentos do mesmo titular.
O critério legal do inciso II marca, assim, que, no caso de estabelecimento in-
dustrial, deve-se tomar o custo da mercadoria produzida. De fato, se tomado o “va-
lor final de venda do produto industrializado”, incorporando-se o plus valorativo de
toda a cadeia de circulação econômica ainda no Estado de origem (no qual se deu a
industrialização), aconteceria uma espécie de “substituição tributária inversa”. Em
uma visão mais genérica, se assim disciplinasse a LC nº 87/1996, os Estados de
origem mais industrializados, onde se situassem as indústrias, como São Paulo, fi-
cariam com todo o ICMS da cadeia produtiva.
No caso do inciso II, a LC nº 87/1996, ao fazer a transferência entre estabeleci-
mentos do mesmo titular ao valor de custo do produto industrializado, faz com que
o ICMS seja recolhido, em essência, no Estado de destino. Basta verificar que, no
estabelecimento industrial (estabelecimento origem), o crédito dos insumos com-
pensa o valor lançado na saída (nos termos do inciso II), portanto, em geral, o valor
agregado (o plus) é tributado no Estado de destino. Entretanto, a indústria, em re-
gra, se instala onde existem insumos para a transformação industrial. Nesse senti-
do, o Estado de origem, geralmente, contará com o ICMS cobrado dos insumos. Em
síntese, o Estado de origem, que tem a indústria, em geral, recebe o tributo cobrado
dos insumos, mas não fica com o tributo da operação com o produto industrializa-
do, que fica com o Estado de destino.
Por outro giro, o inciso III deve ser aplicado quando não se está perante estabe-
lecimento industrial, nem se tratar de operação empresarial típica de comércio. O
dispositivo, como se pode verificar, tem especial aplicação para o caso de ativida-
de extrativa. No caso da atividade extrativa, o valor a ser lançado na saída é o “pre-
ço corrente no mercado atacadista do estabelecimento remetente”.
No caso de produtos industrializados (inciso II), a LC nº 87/1996 privilegia, por
certo, o Estado de destino, que efetivamente fica com o tributo incidente sobre o
plus; no caso da atividade extrativa (inciso III), a LC nº 87/1996 privilegia o Esta-
do de origem. Nesse compasso, os dois incisos estabelecem tratamentos absoluta-
mente opostos para a questão.
Se observado o arcabouço constitucional, poder-se-ia verificar que, ao privile-
giar o Estado de destino no inciso II, a LC estará favorecendo, em regra, evidente-
mente, os Estados menos industrializados. Nesse sentido, de alguma forma, o dis-
positivo estaria em sintonia com o art. 3º, II, da CRFB/1988, que determina que
constituem objetivos fundamentais da República reduzir as desigualdades sociais
e regionais. Entretanto, como visto, o Estado de origem (no qual se localiza a in-
dústria), em regra, conta com o ICMS incidente sobre os insumos.
Em sentido contrário, quando se está perante atividade extrativa, o inciso III da
LC nº 87/1996 favorece o Estado de origem. Em primeiro lugar, como é consabido,
na atividade extrativa, em regra, o ICMS referente aos insumos não é (e nem pode-
ria ser) significativo, pela própria natureza da atividade. Em segundo lugar, como
ressabido, a extração causa problemas severos ao Estado que a efetua. Exatamente
por isso é que, se o art. 20, IX, da CRFB/1988 prevê que são bens da União os re-
cursos minerais, inclusive os do subsolo, o parágrafo 1º do mesmo artigo, assegura
aos Estados participação, como compensação financeira pela exploração (royalties,
a propósito, insignificantes para minério). É sabido que, os danos ambientais são
elevados; a degradação de reservas é significativa; a geração de empregos não é ele-
vada, em regra, como na indústria etc.
Indústria, afinal, é toda atividade humana que, através do trabalho, transforma
matéria-prima em outros produtos, que, em seguida, podem ser, ou não, comercia-
lizados.8 Por outro giro, o extrativismo, que é a mais antiga atividade humana, con-
siste na retirada de recursos da natureza pelo homem. Em outras palavras, se o es-
tabelecimento industrial, na essência de sua atividade, transforma matéria-prima em
produtos industrializados, o estabelecimento (não industrial) voltado para o extra-
tivismo, essencialmente, em sua atividade, promove a retirada de recursos naturais
(do solo).
É sabido que a extração de recursos não renováveis, como é o caso dos mine-
rais, causa danos à natureza, degrada o meio ambiente, e a riqueza do Estado se vai
junto com o minério. O mesmo não ocorre com a indústria que, recebendo a maté-
ria-prima, produz o produto industrializado, gerando riqueza que sempre se reno-
va.
Nessa direção, não faz sentido, uma empresa abrir jazidas e “buracos” no Esta-
do de Minas Gerais, retirando a maior de todas as riquezas do Estado, sem que o
povo desse Estado nada receba de tributos. As estradas usadas pela empresa e pelos
empregados dela são as mineiras; os filhos dos mineiros estudam em escolas públi-
cas mineiras; a segurança nas cidades é feita pela Polícia Militar mineira etc. No
local de exploração das jazidas de minério sequer gado pode pastar por entre má-
quinas de grande porte; sequer plantações rasteiras podem ser cultivadas. Seria
mesmo descabido extrair minérios em Minas Gerais e pagar o ICMS no Estado de
São Paulo, ou em qualquer outro Estado, apenas porque a empresa resolveu abrir
um escritório nesse Estado!
Esse é o entendimento que deve prevalecer para a questão; essa é a única inter-
pretação plausível para a LC nº 87/1996 lastreada em uma lógica que toca a finali-
dade social da lei. O aspecto teleológico da lei, assim, apenas pode ser devidamen-
te capturado à luz da diferença essencial que as duas atividades propiciam para os
Estados que tributam.
Não fosse esse o entendimento, no final, em situação completamente injusta e
legalmente desvirtuada, o Estado de destino acabaria ficando com todo o imposto
do Estado extrator, e o Estado de origem, que sofreu com a exploração de suas jazi-
das, apenas com o dever de admitir a ocupação de vastas áreas de seu território e
compensar os créditos do contribuinte.
A letra do inciso III permite, claramente, o entendimento posto. Exatamente por
isso é que a LC nº 87/1996 determina que o inciso I se aplica para o comércio; o
inciso II para a indústria; e o inciso III se aplica para atividades não industriais. A

8
Cf. COELHO, Marcos de Amorim; e TERRA, Lygia. Geografia Geral. 4ª ed. São Paulo: Moderna, 2003, p. 310.
essência da atividade, sua natureza e seus efeitos, como apontado acima, à luz da
finalidade social da lei, são decisivos para se determinar o dispositivo que incide.

4. A Atividade Extrativa de Minérios não pode ser Considerada Atividade


Industrial
O caso em análise diz respeito a transferências interestaduais de minério de ferro
(classificado no código NBM 2601.1), promovidas por estabelecimento extrator
(classificado na CNAE 0710-3/01). À luz do disposito no art. 13, parágrafo 4º, cabe,
para elucidar a questão, verificar se as mercadorias transferidas pelo estabelecimento
extrator devem ser consideradas industrializadas ou não, pois para um dos casos cabe
a aplicação ou do inciso II, ou do inciso III do citado dispositivo.9
A atividade extrativa de minérios, nos termos da Classificação Nacional de Ati-
vidades Econômicas, Seção B, introduzida em nossa legislação pelas Resoluções
IBGE/Concla nº 01, de 4 de setembro de 2006, e nº 02, de 15 de dezembro de 2006,
é assim descrita:10
“Seção B
Indústrias Extrativas
Esta Seção compreende as atividades de extração de minerais em estado natural: sóli-
dos (carvão e outros minérios), líquidos (petróleo cru) e gasosos (gás natural), poden-
do realizar-se em minas subterrâneas, a céu aberto ou em poços.
Inclui as atividades complementares de beneficiamento associado à extração, realiza-
das principalmente para melhorar a qualidade do produto e facilitar a comercialização,
desde que o beneficiamento não altere as características físicas ou químicas dos mine-
rais. As atividades de beneficiamento são, geralmente, executadas pela empresa mine-
radora junto ao local da extração.
São consideradas atividades de beneficiamento: trituração, classificação, concentração,
pulverização, flotação, liquefação de gás natural, etc.
As atividades extrativas são classificadas nas divisões, grupos e subclasses de acordo
com o principal mineral produzido.
Esta Seção compreende também os serviços industriais realizados sob contrato que
fazem parte do processo produtivo das atividades desta Seção, particularmente na ex-
tração de petróleo, e as atividades especializadas de apoio à exploração mineral.
Esta Seção não compreende: o beneficiamento de minerais não-metálicos, executado
fora do local da extração (Seção C); a preparação do terreno para extração de mine-
rais (Seção F); os estudos geofísicos, geológicos e semelhantes (Seção M).”
Divisão 07 Extração de Minerais Metálicos
Grupo Classe CNAE Denominação
07.1 Extração de Minério de Ferro
07.10-3 Extração de Minério de Ferro
0710-3/01 Extração de minério de ferro
0710-3/02 Pelotização, sinterização e outros
beneficiamentos de minério de ferro

9
Essencialmente, no capítulo, a avaliação acerca da consideração do minério como produto primário, foi lastreada no
Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011, da lavra de Kalil Said de Souza Jabour.
10
Cf. JABOUR, Kalil Said de Souza. Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011.
As classificações nacionais devem ser interpretadas tomando-se por base a ideia
de necessária compatibilidade destas para com as classificações internacionais. Em
especial para produtos que circulam no mercado internacional, como no caso do
minério de ferro, a compatibilização é uma necessidade inarredável do comércio
internacional.
Nesse sentido, como bem avalia Kalil Jabour,11 o Instituto Brasileiro de Geogra-
fia e Estatística (IBGE) efetivamente compatibiliza as classificações nacionais com
as internacionais. Nesse sentido, a classificação nacional das atividades econômi-
cas trazida no CNAE deve ser verificada em sintonia com o padrão internacional
posto pela International Standard Industrial Classification (Isic 2) desenvolvida pela
Divisão de Estatísticas da Organização das Nações Unidas. A questão vem assim
posta pela Classificação Internacional da Organização das Nações Unidas (Interna-
tional Standard Industrial Classification of All Economic Activities):
“Section: B - Mining and quarrying
This Section is divided into the following Divisions:
05 - Mining of coal and lignite
06 - Extraction of crude petroleum and natural gas
07 - Mining of metal ores
08 - Other mining and quarrying
09 - Mining support service activities
This section includes the extraction of minerals occurring naturally as solids (coal and
ores), liquids (petroleum) or gases (natural gas). Extraction can be achieved by different
methods such as underground or surface mining, well operation, seabed mining etc.
This section also includes supplementary activities aimed at preparing the crude ma-
terials for marketing, for example, crushing, grinding, cleaning, drying, sorting, con-
centrating ores, liquefaction of natural gas and agglomeration of solid fuels. These
operations are often carried out by the units that extracted the resource and/or others
located nearby.
Mining activities are classified into divisions, groups and classes on the basis of the
principal mineral produced. Divisions 05, 06 are concerned with mining and quarrying
of fossil fuels (coal, lignite, petroleum, gas); divisions 07, 08 concern metal ores,
various minerals and quarry products.
Some of the technical operations of this section, particularly related to the extraction
of hydrocarbons, may also be carried out for third parties by specialized units as an
industrial service, which is reflected in division 09.
This section excludes the processing of the extracted materials (see section C -
Manufacturing), which also covers the bottling of natural spring and mineral waters
at springs and wells (see class 1104) or the crushing, grinding or otherwise treating
certain earths, rocks and minerals not carried out in conjunction with mining and
quarrying (see class 2399). This section also excludes the usage of the extracted
materials without a further transformation for construction purposes (see section F -
Construction), the collection, purification and distribution of water (see class 3600),
separate site preparation activities for mining (see class 4312) and geophysical,
geologic and seismic surveying activities (see class 7110).”

11
Cf. JABOUR, Kalil Said de Souza. Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011.
Como se pode verificar, a atividade extrativa não é qualificada como “indústria”.
A propósito, o próprio IBGE determina expressamente que “o padrão de relaciona-
mento seguido pela CNAE é o seguinte: nos dois primeiros níveis hierárquicos -
seções e divisões - a CNAE adota estrutura da Ciiu/Isic, inclusive na definição dos
códigos”.12 Nesse sentido, a mineração aparece como atividade de produção primá-
ria na International Classification of Activities for Time-use Statistics, como se pode
facilmente verificar:
“02 - Work for household in primary production activities.
021 - Core activities: working time in primary production activities
0211 - Working time in primary production activities
02111 - Growing of crops and trees; kitchen gardening
02112 - Farming of animals; production of animal products; animal husbandry servi-
ces
02113 - Hunting, trapping and production of animal skins
02114 - Gathering of wild products, woodcutting, gathering firewood and other fores-
try activities
02115 - Fishing and fish/aquatic farming
02116 - Mining and quarrying
02117 - Collecting water
02118 - Training and studies in relation to work in primary production activities of
households
0211x - Working time in primary production activities n.f.d.”
Enfim, se a essência da atividade extrativa não se confunde com a essência da
atividade tipicamente industrial, como visto, a atividade extrativa de minérios se-
quer pode ser considerada atividade industrial. Em outras palavras, a extração de
minério de ferro, à toda evidência, não configura atividade industrial para fins tri-
butários, daí cabe a aplicação do inciso III, do parágrafo 4º do art. 13 da LC nº
87/1996 (mercadoria não industrializada).

5. O Minério de Ferro como Produto Primário


Sob a perspectiva do produto, a aplicação do art. 13, parágrafo 4º, III, da LC nº
87/1996 fica ainda mais clara, uma vez que, à luz da classificação internacional de
produtos, o minério de ferro é classificado como produto bruto ou produto primá-
rio. Tomando a Standard International Trade Classification da Organização das
Nações Unidas, pode-se claramente verificar que o minério de ferro deve ser assim
classificado:
“Crude materials, inedible, except fuels
21 - Hides, skins and furskins, raw
22 - Oil-seeds and oleaginous fruits
23 - Crude rubber (including synthetic and reclaimed)
24 - Cork and wood
25 - Pulp and waste paper
26 - Textile fibres (other than wool tops and other combed wool) and their wastes (not
manufactured into yarn or fabric)

12
Extraído em 1º de junho de 2011. Disponível em www.ibge.gov.br/concla/pub/revisao2007.
27 - Crude fertilizers, other than those of Division 56, and crude minerals (excluding
coal, petroleum and precious stones)
28 - Metalliferous ores and metal scrap
29 - Crude animal and vegetable materials, n.e.s.

Division 28 is divided into the following Groups:


281 - Iron ore and concentrates
282 - Ferrous waste and scrap; remelting scrap ingots of iron or steel
283 - Copper ores and concentrates; copper mattes; cement copper
284 - Nickel ores and concentrates; nickel mattes, nickel oxide sinters and other inter-
mediate products of nickel metallurgy
285 - Aluminium ores and concentrates (including alumina)
286 - Uranium or thorium ores and concentrates
287 - Ores and concentrates of base metals, n.e.s.
288 - Non-ferrous base metal waste and scrap, n.e.s.
289 - Ores and concentrates of precious metals; waste, scrap and sweepings of precious
metals (other than of gold).”
Diversos documentos produzidos por organismos públicos e privados tratam o
minério de ferro como produto bruto (crude material), produto primário (primary
product), bem primário (primary good) ou commodity primária (primary commo-
dity), dentre eles, a Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral e
o Departamento Nacional de Produção Mineral, ambos do Ministério das Minas e
Energia; o Instituto Brasileiro de Mineração e o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada etc. A propósito, como bem verifica Kalil Jabour, esse é o tratamento dado
à questão pelo Banco Mundial:13
“Primary goods. Goods that are sold (for consumption or production) just as they were
found in nature. Include oil, coal, iron, and agricultural products like wheat or cotton.
Also called commodities.”
Da mesma forma, a European Comission da União Europeia considera o miné-
rio de ferro produto ou bem primário:14
“A commodity, also called primary good or primary product, is a good sold for pro-
duction or consumption just as it was found in nature. Commodities include crude oil,
coal, copper or iron ore, rough diamonds, and agricultural products such as wheat,
coffee beans or cotton; they are often traded on commodity exchanges.
The Standard international trade classification distinguishes five main categories (sec-
tions) of commodities or primary goods:
- Food and live animals (SITC 0 );
- Beverages and tobacco (SITC 1);
- Crude materials, excluding fuels (SITC 2);
- Mineral fuels (SITC 3);
- Animal and vegetable oils, fats and waxes (SITC 4).”
A Unesco coloca a questão nos mesmos termos:15

13
Cf. JABOUR, Kalil Said de Souza. Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011.
14
Cf. JABOUR, Kalil Said de Souza. Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011.
15
Extraído em 2 de maio de 2011. Disponível em www.unesco.org. Da mesma forma, vale conferir em JABOUR, Ka-
lil Said de Souza. Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011.
“Primary goods or products - for example, iron ore, diamonds, wheat, copper, oil, or
coffee-that are used or sold as they are found in nature. They are also called commo-
dities.”
Quanto à legislação tributária brasileira, a questão fica muito bem elucidada na
legislação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Basta verificar que o
IPI não incide sobre a extração mineral e suas atividades complementares. A pro-
pósito, o IPI jamais incidiu sobre a indústria extrativa de minérios, seja por ocasião
da incidência do antigo Imposto Único sobre Mineirais, seja na égide da atual CRFB/
1988, que estabelece a não incidência do IPI nessa atividade. Nesse sentido, a toda
evidência, a legislação tributária mais especializada em industrialização não tem a
extração mineral e suas atividades complementares como modalidades de industria-
lização.
Em síntese, tal como o IBGE e os órgãos internacionais competentes, a legisla-
ção do IPI não considera o processo de lavra como industrialização, nem o estabe-
lecimento extrator como industrial. Na realidade, o processo produtivo de extração
visa obter o produto mineral (pertencente à concessionária) a partir do recurso ou
substância mineral (que pertence à União). O processo de beneficiamento a que se
submete o minério não o descaracteriza como produto primário.16 O produto resul-
tante da extração mineral é que é aproveitado como matéria-prima em processos
ulteriores, estes sim industriais.
Em síntese, de forma inequívoca, a extração mineral e suas atividades comple-
mentares não são processos de industrialização, portanto, a elas cabe a aplicação do
inciso III do parágrafo 4º do art. 13 da LC nº 87/1996 (mercadoria não industriali-
zada). Em outras palavras, nas transferências interestaduais de produtos primários,
como é o caso em análise, a base de cálculo do ICMS é o preço corrente da merca-
doria ou de sua similar no mercado atacadista do local da operação, caso o reme-
tente seja produtor, extrator ou gerador.

16
Como bem afirma Kalil Said de Souza Jabour (Parecer Dolt/Sutri, de 25 de maio de 2011), o beneficiamento a que
se refere o Código de Mineração (Decreto-lei nº 227/1967) é uma atividade complementar à extração, como descrita
na Classificação Nacional de Atividades Econômicas e, literalmente, na International Standard Industrial Classifi-
cation of All Economic Activities. Nesse sentido, o processo de beneficiamento de minerais é entendido como ativi-
dade complementar à extração, realizada por fragmentação, pulverização, classificação, concentração, separação
magnética, flotação, homogeneização, aglomeração ou aglutinação, briquetagem, nodulação, sinterização, pelotiza-
ção, ativação, coqueificação, calcinação, desaguamento, inclusive secagem, desidratação, filtragem, levigação, bem
como qualquer outro processo, ainda que exija adição ou retirada de outras substâncias, desde que não resulte na
descaracterização mineralógica das substâncias minerais processadas ou que não implique sua inclusão no campo de
incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), nos termos do art. 14 do Decreto federal nº 01/1991.
Tais processos não se confundem com o beneficiamento considerado como modalidade de industrialização de que
trata o art. 4º do Regulamento do IPI (Decreto nº 7.212/2010).
Responsabilidade Tributária de
Terceiros - O Art. 135 do CTN
Renato Lopes Becho

I - Colocação do Tema
O art. 135 do Código Tributário Nacional, que estabele-
ce a responsabilidade tributária de terceiros, tem sido reco-
nhecido como de difícil compreensão. Eis a sua redação:
“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos cor-
respondentes a obrigações tributárias resultantes de atos pra-
ticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato
social ou estatutos:
I - as pessoas referidas no artigo anterior;
II - os mandatários, prepostos e empregados;
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurí-
dicas de direito privado.”
A jurisprudência que o aplica parece estar sendo conso-
lidada na responsabilização do sócio-gerente nos casos de
dissolução irregular da sociedade. Entretanto, não nos pare-
ce clara que a conclusão obtida pelos tribunais tenha ocorri-
do a partir da leitura do dispositivo legal. Assim, em princí-
pio, não há evidente subsunção do fato à norma.
Na tentativa acadêmica de avançar na compreensão dos
fatos resumidamente apresentados, abordaremos brevemente
(i) a aplicação que o art. 135 tem recebido pelo Superior
Tribunal de Justiça; (ii) apontaremos algumas lições de nos-
sos grandes mestres; e, por fim, (iii) apresentaremos nossa
interpretação para o dispositivo legal citado.

II - Resumo da Jurisprudência do Superior Tribunal de


Justiça
A jurisprudência dominante parece aplicar o art. 135 do
CTN em interpretação difícil de ser encontrada na leitura do
texto legal. Veja-se, por exemplo, o seguinte julgado, subme-
Renato Lopes Becho
tido à sistemática dos recursos repetitivos: é Mestre, Doutor e
“2. É igualmente pacífica a jurisprudência do STJ no senti- Professor
do de que a simples falta de pagamento do tributo não con- de Direito Tributário
figura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a na PUC/SP,
responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 Livre-docente em
do CTN. É indispensável, para tanto, que tenha agido com ex- Direito Tributário
cesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao pela USP e Juiz
estatuto da empresa (EREsp 374.139/RS, 1ª Seção, DJ de Federal em
28.02.2005). São Paulo/SP.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido. Acór-
dão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.”1
O egrégio Superior Tribunal de Justiça, no ponto que gostaríamos de abordar
aqui, construiu um comando que talvez possa ser assim reduzido: para que haja a
responsabilização tributária, o não pagamento de tributo tem que ter sido resultado
da ação excessiva ou infracional por parte do responsável. Em outras palavras: para
a Administração Tributária requerer a aplicação do art. 135, o apontado como res-
ponsável tributário tem que ter agido com “excesso de poderes ou infração à lei, ao
contrato social ou ao estatuto”, o que teria gerado o não pagamento do tributo.
Um bom exemplo dessa construção foi dado pela Súmula 435 do mesmo tribu-
nal: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no
seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o re-
direcionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.”2
Mudando a ordem da apresentação, mas sem alterar o conteúdo, parece que o
STJ está aplicando o art. 135 do CTN assim: a dissolução irregular de sociedade é
infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto, legitimando a responsabilização do
terceiro (sócio-gerente). Este responderá por todos os tributos devidos pela pessoa
jurídica e não pagos. Assim, um fato posterior (dissolução irregular) substitui o con-
tribuinte pelo responsável em relação aos créditos tributários não pagos no passa-
do.
Destaquemos, exemplificativamente, três momentos distintos que parecem re-
fletir na Súmula 435-STJ:
i) ocorrência de um fato gerador (fato imponível) qualquer (i.e., faturamento,
a fazer surgir obrigação de recolher PIS/Cofins, em 2005);
ii) dissolução irregular da sociedade (i.e., em 2009); e
iii) redirecionamento da execução (na ação de cobrança do PIS/Cofins) do con-
tribuinte (a pessoa jurídica) para o responsável, o sócio-gerente (em 2013),
quando ficou caracterizado que a pessoa jurídica não tinha condições de sol-
ver o devido.
Acreditamos que a descrição acima se coadune com os redirecionamentos do
contribuinte para o responsável, constantemente ocorrentes nas execuções fiscais,
e que esteja de acordo com a jurisprudência indicada. Todavia, essa interpretação/
aplicação parece desconsiderar uma parte importante do que está no art. 135 do
CTN: “(...) responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias re-
sultantes de atos praticados (...)”. O fato que resultou no PIS/Cofins do exemplo foi
a geração de faturamento. O que lemos no indigitado dispositivo legal nos parece
ser que, permanecendo no mesmo exemplo, se o faturamento obtido resultou da
prática de atos contrários à lei, ao contrato social ou ao estatuto, o terceiro res-
ponderá pessoalmente por eles. Assim, a letra da lei (art. 135 do CTN) nos parece
indicar para o seguinte quadro:

1
Recurso Especial 1.101.728-SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, STJ, 1ª seção, unânime, j. em 11.3.2009, DJe de
23.3.2009.
2
Diário da Justiça Eletrônico n. 576. Brasília, 12.5.2010. Publicado em 13.5.2010. Disponível em http:www.stj.jus.br,
acesso em 8.4.2010.
i) o responsável tributário pratica atos com infração de lei, contrato social ou
estatuto que gera faturamento para a pessoa jurídica, sobre o qual haverá inci-
dência de PIS/Cofins;
ii) a pessoa jurídica não poderá ser obrigada a recolher a exação; e
iii) nesse caso, o terceiro responderá sozinho pelo crédito tributário.
Essa exposição pode provocar uma objeção: a pessoa jurídica se beneficia com
a geração do faturamento e se eximirá do recolhimento do tributo, que será exigido
do terceiro (que não se beneficiou do fato imponível e não possui, necessariamen-
te, a mesma capacidade contributiva da empresa).
Para enfrentar esses pontos, vejamos as lições de alguns expoentes de nossa
dogmática.

III - Algumas Lições Acadêmicas de Relevo


Alguns doutrinadores têm procurado compreender e explicar o art. 135 do CTN.
Colhemos as lições de alguns expoentes antes de declararmos nossa visão atual.
Como se verá, são explicações díspares, que indicam como não há um mínimo de
consenso entre os juristas a respeito do tema em comento.
Hugo de Brito Machado indica a “questão de grande relevância” da responsa-
bilização contida no inciso III do art. 135 para as sociedades de responsabilidade
limitada ou de sociedade anônima. Ele destaca, de maneira muito oportuna, que
“(...) a lei fala em diretores, gerentes ou representantes. Não em sócios. Assim, se o
sócio não é diretor, nem gerente, isto é, se não pratica atos de administração da socie-
dade, responsabilidade não tem pelos débitos tributários desta.”3
Investigando o assunto desde a jurisprudência do extinto Tribunal Federal de
Recursos, Hugo de Brito Machado aduz:
“Em síntese, os atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato
social ou estatutos, aos quais se reporta o art. 135, III, do CTN, são aqueles atos em
virtude dos quais a pessoa jurídica tornou-se insolvente.”4
Ao que nos parece, essa é uma boa conclusão do pensamento do autor, funda-
mentada na jurisprudência dominante. Todavia, ela nada diz da redação legislativa,
notadamente ao não mencionar o trecho do art. 135 que estamos destacando (“(...)
responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de
atos praticados (...)”).
Os pressupostos para aplicação do art. 135 do CTN foram bem marcados por
Misabel Abreu Machado Derzi. Para a jurista, seria necessária a prática dolosa, pelo
responsável, de um ato em desfavor do contribuinte. O art. 135 exige dolo do res-
ponsável e o efeito é transferir para ele o débito decorrente da obrigação tributária.
A lição de Derzi é assim resumida:
“A aplicação do art. 135 supõe assim:
1. a prática de ato ilícito, dolosamente, pelas pessoas mencionadas no dispositivo;
2. ato ilícito, como infração de lei, contrato social ou estatuto, normas que regem as
relações entre contribuinte e terceiro-responsável, externamente à norma tributária
básica ou matriz, da qual se origina o tributo;

3
Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 160.
4
Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 162-163.
3. a atuação tanto da norma básica (que disciplina a obrigação tributária em sentido
restrito) quanto da norma secundária (constante do art. 135 e que determina a respon-
sabilidade do terceiro, pela prática do ilícito).
A peculiaridade do art. 135 está em que os atos ilícitos ali mencionados, que geram a
responsabilidade do terceiro que os pratica, são causa (embora externa) do nascimen-
to da obrigação tributária, contraída em nome do contribuinte; mas contrariamente a
seus interesses. São, assim, do ponto de vista temporal, antes concomitantes ao acon-
tecimento do fato gerador da norma básica, que dá origem à obrigação. Por isso, o
dispositivo menciona ‘obrigações resultantes de atos praticados com excesso de po-
deres, infração de lei, contrato social ou estatuto’.”5
A única objeção que fazemos diz respeito à necessidade (nossa) de melhor re-
ferência a quais atos ilícitos trata o texto legal. Salvo melhor juízo, o que está esta-
belecido no art. 135 do CTN não se refere à prática genérica de ilícitos, mas a atos
lícitos contrários aos interesses do contribuinte (aqui está o ilícito). Assim, voltan-
do à citação de Derzi, ela menciona ilícito tanto no item 1 quanto no item 2, assim
como parece indicar o ilícito na norma básica quanto na norma secundária. Consi-
derando que, para nós, os atos ilícitos não são tributáveis,6 supomos que, no primeiro
momento (norma fiscal básica), o fato gerador (fato imponível) realizado era lícito.
O ilícito é no animus do agente (responsável), que contraria os interesses do contri-
buinte. Além da intributabilidade dos atos ilícitos, a prática de atos ilícitos, em ge-
ral, pelo responsável, deve ser tipificada no art. 137 do CTN, cujo estudo vai além
do aqui desejado.
Melhor esclarecendo, quando o legislador estabeleceu, no caput do art. 135, que
este dispositivo se aplica à responsabilidade “pelos créditos correspondentes a obri-
gações tributárias resultantes de atos praticados”, podemos visualizar, efetivamen-
te, duas regras-matrizes tributárias, uma lícita, outra ilícita. A primeira, para pros-
seguirmos no exemplo aventado, gera faturamento para a pessoa jurídica, o que é
lícito. Todavia, como o faturamento gerado decorreu da prática de atos com infra-
ção de lei, contrato social e estatuto, há a segunda regra-matriz. Esta decorre de um
ilícito não tributário, mas que gera efeitos fiscais: a imputação da responsabilidade
ao terceiro e não mais ao contribuinte.
Ives Gandra da Silva Martins,7 de seu turno, ao explicar o mesmo texto legal,
asseverou:
“O elemento, todavia, fundamental reside no fato de cuidar, o artigo, de atos pratica-
dos de forma dolosa contra os interesses dos contribuintes representados, com o que
houve por bem o legislador considerar responsável não os representados, mas exclusi-
vamente os representantes.
Por essa razão, julgou legítima a solidariedade quanto aos atos culposos, porque pra-
ticados com imperícia, negligência, imprudência ou mesmo omitidos, e limitou essa
responsabilidade (art. 134). As mesmas pessoas, no entanto, praticando atos lesivos ao
Fisco, dolosamente, se procurarem responsabilizar seus representados, tal responsabi-

5
Direito Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro. 11ª ed., rev. e ampl. por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de
Janeiro: Forense, 2000, p. 757.
6
Vide nosso Lições de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 68-94.
7
Ives Gandra da Silva Martins. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. 2. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 253.
lização inviabilizar-se-à pela clara formulação legal, fazendo-os pessoalmente respon-
sáveis e excluindo as outras pessoas da relação jurídico-tributária, por decorrência,
criada.”8
Os comentários nos parecem muito bons e ilustrativos da decisão acolhida pelo
legislador. Contudo, identificamos que, no primeiro parágrafo citado, o autor afir-
ma que os atos tipificados no art. 135 foram cometidos “contra os interesses dos
contribuintes representados”, enquanto, no parágrafo seguinte, Ives Gandra da Sil-
va Martins faz alusão à prática de “atos lesivos ao Fisco”. Assim, salvo melhor juí-
zo, não ficou claro se os atos juridicizados são cometidos contra o contribuinte ou
contra o Fisco, fazendo com que aprofundemos mais ainda a pesquisa dos indigita-
dos dispositivos.
Vejamos, pois, o caminho trilhado na formulação do texto legal. Cuidemos, ain-
da que brevemente, dos antecedentes históricos do art. 135 do CTN.
O Anteprojeto de Código Tributário Nacional, de autoria de Rubens Gomes de
Sousa, “serviu de base aos trabalhos da Comissão Especial” que sugeriu o respecti-
vo Projeto de CTN.9 Nele, colhemos o seguinte dispositivo, que nos parece correla-
to ao atual art. 135:
“Art. 247. As pessoas naturais ou jurídicas são pessoalmente responsáveis, nos termos
do disposto no art. 230, pelos créditos correspondentes a obrigações decorrentes de atos
regularmente praticados por seus mandatários, funcionários, prepostos ou empregados.
Parágrafo único. Quanto às pessoas jurídicas de direito privado, o disposto neste arti-
go aplica-se às obrigações tributárias decorrentes de atos praticados pelos respectivos
diretores, gerentes ou administradores, ainda que com excesso de poderes ou infração
de lei, contrato social ou estatuto.”10-11
A proposta recebeu críticas, mas foi mantida pelo jurista e aprovada pela Co-
missão Especial que elaborou o Projeto de CTN. No relatório apresentado por Go-
mes de Sousa,12 o professor justifica sua opção com o seguinte comentário:
“O art. 171, oriundo do art. 247 do Anteprojeto, consagra o princípio pacífico em
matéria de responsabilidade tributária pelos atos praticados no exercício regular de
mandato, cargo ou emprego. Todavia, no § 1º, abre-se exceção à regra, para determi-
nar que as pessoas jurídicas respondem pelas consequências tributárias dos atos prati-
cados por seus diretores, gerentes ou administradores com excesso de poderes ou in-
fração de lei, contrato social ou estatutos. Visou-se com isso derrogar expressamente,

8
Comentários ao Código Tributário Nacional. V. 2. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 271.
9
Brasil. Trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954,
p. 263.
10
Brasil. Trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954,
pp. 328-329.
11
Por sua vez, o mencionado art. 230, que compunha o título dedicado às garantias do crédito tributário, possuía a
seguinte redação: “Art. 230. Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, previstos neste Códi-
go ou em lei tributária, responde pelo pagamento do crédito tributário a totalidade dos bens e rendas, de qualquer
natureza, do contribuinte, ou do seu espólio ou massa falida, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de ina-
lienabilidade, incomunicabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula,
excetuados unicamente os bens e rendas que este Código declara absolutamente impenhoráveis.” (Brasil. Trabalhos
da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954, p. 325)
12
Brasil. Trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954,
p. 79.
para efeitos fiscais, a regra do art. 121 da Lei das Sociedades por Ações (decreto-lei n.
2.627 de 1940), que consagra, em tais casos, a responsabilidade pessoal dos diretores
para com os terceiros prejudicados: além de não se poder considerar o fisco como um
terceiro no tocante aos efeitos tributários dos atos de direito privado, a exceção é ne-
cessária para impedir que, na prática, a pessoa jurídica se pudesse exonerar de respon-
sabilidade por manobras de evasão ou de fraude concertadas, em benefício daquela,
pelos seus próprios administradores. Em consonância com esse fundamento, foi rejei-
tada a sugestão 773, ficando outrossim prejudicada a sugestão 1.002. No § 2º, foi en-
tretanto aberta exceção, omissa no Antreprojeto, ao princípio da objetividade das in-
frações (infra: 125).”13
Assim, em relação ao atual art. 135, Rubens Gomes de Sousa pretendeu abar-
car duas hipóteses. A primeira, no sentido habitual de que a pessoa jurídica respon-
de por atos regulares de seus administradores. Esse aspecto é tão comum ao Direi-
to obrigacional que os legisladores não o mantiveram no CTN. A segunda previsão
de Sousa foi estabelecida no sentido de que também a pessoa jurídica responderia
pelos atos irregulares (contrários ao direito ou à extensão dos mandatos conferidos)
praticados pelos administradores de empresas. Nos termos como expressamente
afirmado pelo jurista em seu relatório, visou-se “derrogar expressamente” uma nor-
ma da Lei das Sociedades por Ações.

IV - Interpretando o Art. 135 do CTN sistematicamente


A chave para a difícil interpretação do art. 135 do CTN que valorize a redação
legal, ao que parece, foi dada por Rubens Gomes de Sousa. Conforme vimos em seu
Relatório, sua intenção foi “derrogar expressamente, para efeitos fiscais, a regra do
art. 121 da Lei das Sociedades por Ações (Decreto-lei n. 2.627, de 1940)”.14 Con-
forme já afirmado, o legislador parece não ter acolhido a sugestão. Investiguemos
essa informação.
Tem sido regra que as sociedades respondem pelos atos praticados por seus ad-
ministradores - até porque são esses que agem em nome da entidade, que é uma fic-
ção jurídica. Todavia, ao menos desde a antiga Lei das Sociedades por Ações, as
pessoas jurídicas não respondem por atos ilícitos (em sentido geral) praticados, em
seu nome, por seus dirigentes.
De fato, no Decreto-lei 2.627, de 26 de outubro de 1940, que dispunha “sobre
as sociedades por ações”, constava que:
“Art. 121. Os diretores não são pessoalmente responsáveis pelas obrigações que con-
traírem em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão.
§ 1º Respondem, porém, civilmente, pelos prejuízos que causarem, quando procede-
rem:
I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo;
II - com violação da lei ou dos estatutos.

13
Brasil. Trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954,
p. 243.
14
Brasil. Trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954,
p. 243.
§ 2º Quando os estatutos criarem qualquer órgão com funções técnicas ou destinado a
orientar ou aconselhar os diretores, a responsabilidade civil de seus membros apurar-
se-á na conformidade das regras deste capítulo.”
Esse texto legal é muito parecido com o art. 135 do CTN.
Conforme pode ser conferido, o princípio que rege a responsabilidade de admi-
nistradores e da pessoa jurídica foi no sentido já apresentado: os atos lícitos prati-
cados pelos administradores, em nome da pessoa jurídica, são por essa suportados.
Os atos praticados, em nome da empresa, que firam o ordenamento interno ou a le-
gislação geral são suportados pelos administradores enquanto pessoas físicas.
Trajano de Miranda Valverde, com a autoridade de quem elaborou o Anteproje-
to da Lei das Sociedades por Ações de 1940, afirmava que a regra citada vinha do
art. 108 do Decreto 434, de 1891, e estipulava o que supomos poder chamar de prin-
cípio norteador da responsabilidade:
“(...) Pessoalmente, não respondem os diretores pelas obrigações que contraírem em no-
me da sociedade e em virtude de ato regular de gestão. É a pessoa jurídica, que se
obriga ao entrar em relação com terceiros.”15
Em relação ao parágrafo 1º, ponto de nosso maior interesse no momento, asse-
verava:
“Trata o § 1º da responsabilidade civil dos diretores pelos prejuízos que, no exercício
das suas funções, causarem à sociedade, aos acionistas ou a terceiros. E distingue,
quanto à causa dos prejuízos, duas ordens de atos: os que são praticados pelo diretor,
dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo, e os que positivam violação
da lei ou dos estatutos. Os prejuízos decorrentes de ações ou omissões da segunda ca-
tegoria prescindem de prova da culpa do diretor, tomado o termo culpa em sentido lato,
compreendendo o dolo ou a má-fé. Os prejuízos, que se originarem de atos ou opera-
ções praticados pelo diretor, dentro de suas atribuições e poderes, somente são repará-
veis mediante a prova da sua culpa ou dolo.”16
Em seguida, Valverde aborda a questão da culpa do administrador, aduzindo que
o “princípio da inversão da prova, que a lei alemã de 1937, § 84, n. 2, generalizou”
somente foi acolhido pelo legislador nas situações de “prejuízos derivantes de ações
ou omissões infringentes da lei ou dos estatutos”.17 A regra é que os diretores ajam
com as diligências “que todo homem ativo e probo costuma empregar na adminis-
tração dos seus próprios negócios” (Decreto-lei 2.627/1940, art. 116, parágrafo 7º),
acrescentando: “Os casos, que podem determinar a responsabilidade civil dos dire-
tores, alicerçada em atos culposos ou dolosos, praticados dentro de suas atribuições
e poderes, variam ao infinito.”18
Diversos fatores impedem a antecipação de atos que podem levar à responsabi-
lização do dirigente, notadamente os diversos tipos de objeto social e as variações
na atuação de cada diretor, mas abrangem as escolhas de auxiliares (culpa in eligen-
do) ou em deficiências de fiscalização e vigilância (culpa in vigilando),19 acrescen-
tando:

15
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 318.
16
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, pp. 318-319.
17
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 319.
18
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 320.
19
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, pp. 320-321.
“Todavia, a responsabilidade civil por ações ou omissões dos auxiliares, empregados,
prepostos, etc., há de ser apurada, tendo-se em consideração as circunstâncias de cada
caso, as atribuições dos diretores, os seus conhecimentos técnicos em relação às fun-
ções de que estava encarregado o subordinado, a malícia ou os artifícios usados por
este, para a prática ou ocultação de atos ilícitos.”20
Ensina Valverde, também, que, apesar de o prejuízo à sociedade ser elemento
essencial da responsabilização do diretor, considerando os riscos da atividade ne-
gocial, outro elemento essencial é a anormalidade das operações levadas a cabo pelo
profissional sujeito à responsabilização. Os juízes deverão apurar a responsabilida-
de, portanto, “em cada caso”.21 Lembra o mestre, ainda, que o administrador não
pode se escusar ao argumento de que desconhecia a lei, o que é um princípio bási-
co do Direito.
Importante para a compreensão do dispositivo comentado são alguns exemplos
- ainda que estejamos atentos para a infinidade de possibilidades já indicada - apre-
sentados por Valverde:
“(...) São ações ou omissões, na maior parte das vezes voluntárias, envolvendo, em
muitos casos, a responsabilidade penal dos administradores, como na distribuição de
dividendos fictícios, na aceitação em penhor ou caução de ações da própria socieda-
de, na ocultação de interesses opostos aos da sociedade em qualquer operação social.”22
Outro comentador da vetusta legislação corrobora esse entendimento. Assim,
Eduardo de Carvalho aduzia:
“Ao adquirir personalidade jurídica, a sociedade pratica atos e operações através de seus
administradores, que a representam na sua vida econômico-social. É evidente que as
consequências desses atos e operações devem ser suportadas pela pessoa jurídica, a qual
se obriga, assim, diretamente com os terceiros com quem contrata ou negocial.
Não há, portanto, responsabilidade pessoal dos diretores nas obrigações que contraí-
rem em nome da sociedade. Desde, porém, que decorram tais obrigações de ato regu-
lar de gestão.
O ato regular de gestão torna-se, dessa forma, a pedra de toque aferidora da legalida-
de da operação praticada pelo diretor, em nome da sociedade. Daí, o preceito do § 1º:
se o ato não for regular, isto é, conforme à lei e aos estatutos, ou exceder as suas atri-
buições ou poderes por culpa ou dolo, - torna-se o diretor responsável civilmente pe-
los prejuízos que causar à sociedade, a qualquer de seus componentes ou, por fim, a
terceiros.”23
Após explicar o que é culpa e dolo, além de abordar questões de prova, que não
serão, aqui, desenvolvidas, continuou Eduardo de Carvalho:
“As reflexões são diferentes, contudo, quando os prejuízos resultarem de atos pratica-
dos pelos diretores com violação da lei ou dos estatutos.
O conhecimento dos textos legais e dos princípios estatutários, pelo administrador de
uma sociedade, é presunção imposta pelos cânones de direito, - aplicação de velha
parêmia romana transformada em preceito de legislação. Ainda aqui, a violação da lei

20
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 321.
21
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 321.
22
Sociedade por Ações. V. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 322.
23
Teoria e Prática das Sociedades por Ações. São Paulo: José Bushatsky, 1960, p. 535.
se entende no sentido lato, estendendo-se a todos os dispositivos legais atinentes, quer
da lei societária, quer das leis especiais em cada caso.”24
O autor exemplificou duas hipóteses em que considerava tipificadas na condu-
ta descrita normativamente: “se [o administrador] emitiu ações ao portador antes de
estarem integralizadas (art. 23, § 1º), [ou] títulos que foram transferidos por sim-
ples tradição, em prejuízo da sociedade”.25
A legislação acima apresentada (Decreto-lei 2.627/1940) vigia à época da ela-
boração do Anteprojeto de CTN. Vejamos como a legislação comercial trata do in-
digitado tema nos dias que correm.
Na Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976, o mesmo assunto é nomeado por
“Responsabilidade dos Administradores”, estabelecendo que:
“Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que con-
trair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém,
civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder:
I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo;
II - com violação da lei ou do estatuto.
§ 1º O administrador não é responsável por atos ilícitos de outros administradores, salvo
se com eles for conivente, se negligenciar em descobri-los ou se, deles tendo conheci-
mento, deixar de agir para impedir a sua prática. Exime-se de responsabilidade o ad-
ministrador dissidente que faça consignar sua divergência em ata de reunião do órgão
de administração ou, não sendo possível, dela dê ciência imediata e por escrito ao ór-
gão da administração, no conselho fiscal, se em funcionamento, ou à assembléia-ge-
ral.
§ 2º Os administradores são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em
virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funciona-
mento normal da companhia, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a to-
dos eles.
§ 3º Nas companhias abertas, a responsabilidade de que trata o § 2º ficará restrita, res-
salvado o disposto no § 4º, aos administradores que, por disposição do estatuto, tenham
atribuição específica de dar cumprimento àqueles deveres.
§ 4º O administrador que, tendo conhecimento do não cumprimento desses deveres por
seu predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do § 3º, deixar de co-
municar o fato a assembléia-geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável.
§ 5º Responderá solidariamente com o administrador quem, com o fim de obter van-
tagem para si ou para outrem, concorrer para a prática de ato com violação da lei ou
do estatuto.”
A doutrina mais recente mostra que os comercialistas consultados continuam
indicando o caminho válido para a análise do instituto abordado. Confira-se, por
exemplo, com Rubens Requião.26
A comparação entre os dois comandos mostra como eles são similares.27 A afir-
mação de Rubens Gomes de Sousa de que pretendia derrogar a regra de responsa-

24
Teoria e Prática das Sociedades por Ações. São Paulo: José Bushatsky, 1960, p. 536.
25
Teoria e Prática das Sociedades por Ações. São Paulo: José Bushatsky, 1960, p. 537.
26
Curso de Direito Comercial. V. 2. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988, pp. 182-186.
27
No corpo do texto, citamos o art. 247 do Anteprojeto de CTN. Agora, no intuito de auxiliar na comparação entre o
que está na legislação tributária e o que está na legislação comercial, citamos o dispositivo correlato do Projeto de
bilização de administradores de empresa, para fins tributários, não foi, contudo,
acolhida pelo legislador. O estudo do Direito Comercial, todavia, pôde nos ajudar a
entender a regra tributária.28
Entretanto, considerando que o legislador foi além do Direito Comercial, pois
estabeleceu, no inciso I do art. 135, que o comando do caput será aplicável a todas
as pessoas referidas no art. 134, fez com que a regra da legislação comercial fosse
ampliada, para fins fiscais, a pessoas diversas, como pais em relação a tributos de-
vidos por filhos menores etc.
Voltando ao art. 135, os exemplos colhidos em Rubens Requião ajudam na nossa
compreensão do texto analisado. O comercialista indica um caso de abuso da ra-
zão social que tipificaria a conduta prevista no art. 158 da Lei 6.404/1976: “quan-
do o administrador, nas sociedades de pessoa ou mesmo nas sociedades de capitais,
viola o estatuto praticando atos que este lhe vedava, como conceder fianças ou
avais”.29 Como é sabido, a concessão de fianças ou avais é lícita. Mas, nas socieda-
des anônimas, pode contrariar seus estatutos. Essa violação estatutária terá efeitos
fiscais, como, por hipótese, a incidência de algum tributo que tenha por fato gera-
dor (fato imponível) justamente as fianças ou avais.
Essa interpretação nos permite compreender, integralmente, o art. 135 do CTN.
Firmando nossa atenção no conteúdo do inciso III do mandamento legal, quando
diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas realizarem atos tributáveis
contra os interesses das empresas, tais como emitirem fianças ou avais em nome
daquelas - mas contra seus interesses, repetimos - o contribuinte habitual (a pessoa
jurídica) poderá objetar-se à cobrança, afirmando que a obrigação é de responsabi-
lidade pessoal do terceiro. Ao que nos parece, diante de fatos praticados por seus
administradores, mas contra seus interesses, as pessoas jurídicas irão denunciá-los
e buscarão a responsabilização apenas (responsabilidade pessoal) da pessoa física
que os praticou.
Esse quadro, ainda que nos permita uma boa leitura do indigitado dispositivo
legal, não encontra eco na aplicação dada pela jurisprudência do Superior Tribunal
de Justiça. Ao que nos parece, a interpretação aceita pelo Tribunal da Cidadania não
está baseada na legislação.30

CTN: “Art. 171. As pessoas naturais ou jurídicas são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a
obrigações tributárias decorrentes de atos regularmente praticados por seus mandatários, prepostos ou empregados.
§ 1º Quanto às pessoas jurídicas de direito privado, o disposto neste artigo aplica-se às obrigações tributárias decor-
rentes de atos praticados pelos respectivos diretores, gerentes ou administradores, ainda que com excesso de pode-
res ou infração de lei, contrato social ou estatutos. § 2º Nos casos previstos neste artigo e no parágrafo anterior, ob-
servar-se-á, quanto à responsabilidade por infrações, o disposto na alínea III do art. 173.” (Brasil. Trabalhos da Co-
missão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da Fazenda, 1954, p. 69)
28
Anotamos, por oportuno, que Paulo Vital Olivo comparou os dispositivos da legislação comercial com o art. 135 do
CTN, ainda que não tenha alcançado quer o Anteprojeto, quer o Projeto de CTN, conforme estamos fazendo. Confi-
ra-se: Ato Anormal de Gestão e Tributação: Identificação, Controle. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Programa de Pós-gradução. Inédito, 2011, pp. 80 e 175.
29
Curso de Direito Comercial. V. 2. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 186.
30
Vide nosso “A Responsabilidade Tributária dos Sócios de Empresas Comerciais tem Fundamento Legal?” Revista
Dialética de Direito Tributário n. 182. São Paulo: Dialética, 2010, pp. 107-126.
V - Conclusão
Conforme exposto no presente estudo, entendemos que a melhor compreensão
para o art. 135 é considerá-lo correlato ao art. 158 da Lei 6.404/1976 (Lei das Socie-
dades Anônimas). Significa dizer que, quando os responsáveis tributários realiza-
rem atos lícitos contra o interesse do contribuinte e que signifiquem descumprimen-
to da legislação que liga um e outro (contribuinte e responsável), esses responderão
pessoalmente pelos créditos tributários decorrentes de seus atos. Nos termos como
positivado pelo legislador, como o responsável terá agido contra os interesses do
contribuinte, este será excluído da ação de cobrança (responsabilidade pessoal do
terceiro).
Essa compreensão - assim como a interpretação dada por juristas de escol - não
encontra ressonância na jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça. Essa
assertiva reforça a ideia, anteriormente explorada, de que a responsabilidade tribu-
tária, como está sendo aplicada, não possui correlação com o que foi decidido pelo
legislador quando da elaboração do Código Tributário Nacional.
Cabimento e Dimensionamento das
Penalidades por Planejamentos Fiscais
Inaceitáveis (Breves Notas)
Ricardo Mariz de Oliveira

O tema acima, a mim proposto para o seminário sobre


Planejamento Tributário, realizado em 30 de novembro de
2011, sob coordenação do Professor Marco Aurélio Greco e
sob os auspícios da Dialética, obviamente supõe a existên-
cia de algum tipo de planejamento tributário que seja inacei-
tável, mas suscita de pronto a indagação sobre o critério para
eleição deste ou daquele planejamento como tal.
Num segundo momento, o tema supõe que, havendo pla-
nejamentos tributários inaceitáveis, eles possam escapar de
qualquer penalidade (daí a temática sobre o “cabimento”),
do mesmo modo que, superada a fase de apuração da possi-
bilidade de penalização, caso tenha sido obtida resposta po-
sitiva, requer finalmente a averiguação dos critérios para o
seu dimensionamento.
Vou tentar enfrentar o assunto em suas sucessivas etapas,
fazendo-o inicialmente por um prisma geral e teórico, isto é,
desprendido de qualquer norma específica do Direito posi-
tivo, para somente depois também fazê-lo perante o que se
encontra na legislação tributária federal, a qual poderá ser-
vir como exemplo ao serem transportadas, para leis locais,
as constatações feitas a propósito daquela.
Outrossim, a presente exposição deve ser encarada como
um mero ensaio em torno de tema tão árduo, e será restrita
ao Direito Tributário do Brasil, pouco importando, aqui, as
disciplinas jurídicas para o planejamento fiscal e os regimes
penais vigentes em quaisquer outras plagas
Passemos, pois, ao primeiro ponto, o qual me parece ser
de extrema relevância na atual quadra em que vivemos, pos-
terior a um período em que se encontravam julgados admi-
Ricardo Mariz de nistrativos de alta qualidade doutrinária, mas muitas vezes
Oliveira lenientes na apreciação dos fatos concretos, e posterior ain-
é Professor de Direito da a um segundo momento jurisprudencial em que se pas-
Tributário em Diversas sou para o extremo oposto, com acórdãos menos qualifica-
Entidades (Eaesp, dos sob o ponto de vista jurídico e muito rigorosos ante os
Centro de Extensão
fatos comprovados e os muitos abusos cometidos.1
Universitária - CEU, e
Outras), Presidente do 1
Os abusos certamente contribuíram para o rigor jurisprudencial, mas este, quando
Instituto Brasileiro de
cabível, deveria ter sido fundado em razões jurídicas sempre corretas, não se justi-
Direito Tributário e ficando a adoção de “fundamentos” impróprios para afirmar quaisquer conclusões,
Advogado. ainda que acertadas.
Realmente, em virtude da passagem de uma tendência jurisprudencial para ou-
tra, muitos contribuintes se viram apanhados num torvelinho de novas ideias e de
simples afirmações que não existiam e não eram ouvidas no momento em que ado-
taram esta ou aquela planificação fiscal, a qual, além disto, muitas vezes encontra-
va suporte em anteriores julgamentos de todos conhecidos.
Não somente isto, pois no terreno doutrinário puro novas discussões passaram
a ser travadas, e seguramente não se chegou a um consenso quanto aos seus obje-
tos. Note-se, os juristas não se puseram de acordo, mesmo pensando e dialogando
no âmbito da pesquisa científica, o que significa ser impossível exigir de homens
de negócio, sem instrução jurídica, distinguir e definir as mesmas questões com
certeza e segurança.
Por fim, apenas centrando-nos no principal, portanto, sem exclusão de outros
aspectos, há dez anos o País convive com uma norma de lei complementar que, se-
gundo sua fonte de origem, pretendeu ser uma “norma geral antielisiva”, mas que
não se aperfeiçoou como tal, ao menos na opinião abalizada da maioria, e que, de
qualquer modo, não logrou eficácia por exigir normatização legal que jamais con-
seguiu passar pelo Congresso Nacional.
Neste cenário, “planejamento fiscal inaceitável” representa uma noção apenas
teoricamente imaginável e possível, eis que de difícil concreção num ordenamento
em que a segurança jurídica se apresenta como princípio inafastável, ou fim a ser
alcançado por ser objeto de superiores princípios constitucionais informadores de
todo o ordenamento, inclusive e principalmente do tributário, mas que na realidade
do dia a dia se mostra cada vez mais enfraquecida.2
Porém, numa perspectiva meramente proposicional, “inaceitável” representa
algo definitivamente fora de um contexto minimamente possível e admissível, isto
é, um procedimento patológico que não se confunde sequer com um planejamento
que possa ser classificado como agressivo (“aggressive tax planning”), podendo o
termo ser aplicado a um procedimento que seja uma ação fraudatória (“fake”), ou
mentirosa (“sham”, “deception”), ou imperceptível pelo Fisco porque dele propo-
sitadamente bem escondida (“bliding the administration”, “concealing income”) ou
além de uma fronteira (“borderline”) reconhecidamente (certamente, indiscutivel-
mente) divisória da elisão e da evasão.
Neste sentido, planejamento inaceitável não é necessariamente todo aquele que
sofra algum vício jurídico invalidante dos seus efeitos, assim como não pode ser
aquele sobre o qual haja opiniões de especialistas, uns o considerando válido e ou-
tros não, ou que seja produto de uma razoável interpretação da lei. Ou, ainda, que
tenha sido praticado à luz da jurisprudência da época.
Contudo, estes são limites teóricos para o aceitável, que não esgotam as situa-
ções hipotéticas de aceitabilidade, muito menos que sejam suficientes para se dizer
que tudo o mais deva ser inaceitável.

2
A respeito de incertezas, inclusive destas, veja-se meu texto “Incertezas Tributárias que entravam o Desenvolvimen-
to”, na coletânea Tributação em Desenvolvimento: Estudos em Homenagem ao Prof. Aires Fernandino Barreto, coor-
denação de SANTI, Eurico Marcos Diniz de. São Paulo: Quartier Latin, 2011.
Não se pode ignorar, também, que aceitar ou não aceitar algo como bom ou
como ruim em matéria de organização tributária depende imensamente do ser hu-
mano que emita um juízo desta natureza, inclusive da atividade a que essa pessoa
se dedique e da sua formação.
Realmente, para um agente do Fisco, a tendência será sempre de um julgamen-
to mais desconfiado de que a pessoa praticante do planejamento poderá estar fugindo
de obrigações tributárias das quais não poderia ter se esquivado. Porém, para a em-
presa e o titular de um patrimônio passíveis de incidências fiscais, o planejamento
não passa de um ato de estruturação ou reestruturação patrimonial e negocial que
tem o tributo como mais um custo a ser necessariamente considerado, tanto quanto
muitos outros fatores econômicos devem ser sopesados, tais como onde localizar o
estabelecimento ou efetuar o negócio, de que fonte se suprir para a obtenção de in-
sumos e outros recursos, como ser mais eficiente na atividade com menores custos
etc.
Igualmente influentes no juízo de valor sobre a qualidade do planejamento são
os graus de especialização técnico-teórica e de vivência prática do emitente de um
tal juízo. Isto é assim mesmo quando juristas estejam envolvidos, mas principalmen-
te quando leigos tenham que tomar uma decisão ou assumir uma posição.
Realmente, é certo que muitas vezes Marco Aurélio e Ricardo Mariz dissentem
sobre pontos teóricos do planejamento, o que, ao analisarem casos concretos, vai
conduzi-los a diferentes posições sobre quais sejam aceitáveis e quais não sejam.
O que não dizer de um homem de negócios não formado em ciências jurídicas?
A vida tem exposto situações dramáticas, de autos de infração caracterizando
como fraudulentos, por conseguinte sujeitos à multa qualificada e representação
criminal, casos em que pessoas naturais ou jurídicas foram orientadas por profissio-
nais experientes, cujos contribuintes manifestaram genuína surpresa pela ação fis-
cal e pela extensão da mesma, algumas vezes comprometendo a própria sobrevivên-
cia da empresa ou o patrimônio antes amealhado justamente. Há casos em que os
próprios profissionais criadores ou aprovadores do planejamento não entenderam a
simples possibilidade da acusação fiscal, tanta era a sua convicção pessoal sobre a
validade da prática adotada.
Estas observações são uma advertência contra qualquer precipitada catalogação
de um planejamento como inaceitável, e uma proposta de parcimônia na aprecia-
ção do tema em concreto, principalmente pelos órgãos julgadores, e certamente
quando da aplicação de penalidades.
Não obstante, para superar a impossibilidade de apresentação de critérios que
delimitem o ponto a partir do qual os planejamentos seriam inaceitáveis, podemos
adotar uma posição teórica razoável, embora extrema.
Quer dizer, se não há critérios gerais para aquele mister, que sejam técnicos,
objetivos, razoáveis, proporcionais, adequados, capazes de assegurar a certeza jurí-
dica, em uma palavra, que possam ser considerados juridicamente justos e válidos,
para não se restar no terreno incerto dos subjetivismos, em que um dado planeja-
mento será inaceitável para uma pessoa, ou algumas pessoas, mas aceitável para
outras, segundo suas inclinações pessoais, profissionais e ideológicas, somente se
pode admitir a pecha de inaceitável para o procedimento que viole frontalmente a
lei e cuja ilegalidade seja plena e inquestionavelmente perceptível ao seu próprio
autor.
Não se trata de um critério qualificador, mas da intuição de que, nestas circuns-
tâncias, no mínimo é possível dizer que o ato é inaceitável porque a própria pessoa
o sabe ilegal, tanto quanto qualquer outro indivíduo o saberia através do emprego
de um mero raciocínio sensato, sensato segundo a sensatez do homem comum, e não
segundo os caminhos conflituosos da interpretação jurídica.
Disse que esta solução se me apresenta razoável, porém é extrema,3 porque na
prática as situações concretas em que será possível afirmar principalmente o cará-
ter de plena consciência da ilegalidade ficarão reduzidas aos casos em que, a todo
rigor, nem se pode dizer que se trata de planejamento tributário, porque são casos
de deslavadas fraudes.
São casos, entre outros, de notas fiscais frias ou espelhadas, de reiterada práti-
ca de declarações de valores inferiores aos reais, de movimentação de recursos fi-
nanceiros à margem da escrituração ou das contas declaradas ao Fisco, de declara-
ção de que a empresa está inativa quando opera regularmente, de negócio através
de “laranja”.
São casos, verifica-se, em que o agente indubitavelmente conhece (não há como
dizer que não conhece) a natureza ilegal e fraudulenta da sua ação, não sendo mini-
mamente crível que ele possa não ter esta percepção.
Mas eles não são casos de planejamento tributário, pois este - distingo eu - é
composto por uma atividade consciente que tem o intuito de obter a economia fis-
cal que seja possível por meios legais, ou que o planificador supõe ser legal com base
em fundamentos conducentes a uma razoável interpretação da lei.
Portanto, a atividade de planificação da economia fiscal, tanto quanto a sua im-
plementação, está muito distante daquilo que indubitavelmente pode ser classifica-
do como inaceitável.
Há, sim, na vida empresarial principalmente, mas também na vida patrimonial
individual, “planejamentos” que devem ser colocados entre aspas porque a expe-
riência profissional, ou mesmo de vida das pessoas que os praticam, é suficiente para
que elas saibam que estarão cometendo uma ilegalidade. São casos mais sofistica-
dos do que os anteriormente exemplificados, para os quais, contudo, a identifica-
ção com estes é perigosa na realidade prática, pois depende da aplicação de crité-
rios seguros e suficientes para apreciar a capacidade de avaliação das pessoas en-
volvidas.
Não obstante, é possível.
Apenas a título tentativo de exemplificação, podemos imaginar uma situação de
inexistência absoluta de qualquer movimento patrimonial, mas em que algum “mo-
vimento” produtor de economia fiscal seja arquitetado e representado em documen-
tos e lançamentos contábeis que, se fossem relativos a uma situação real, produzi-
riam efetivamente aquele efeito fiscal. Não creio que qualquer homem instruído e
sensato possa sequer imaginar que uma ação deste jaez seja correta, mas ressalvo

3
E tem que ser, face às gravíssimas consequências que o juízo acarreta.
que esta é uma crença pessoal, como também ressalvo que o seu transporte para
qualquer caso concreto depende de uma criteriosa análise dos fatos, inclusive cir-
cunstanciais.
Verdadeiros planejamentos tributários, entretanto, têm por pressupostos a pes-
quisa de dados, a coleta de informações, o sopesamento de opiniões, a ponderação
de possibilidades, limites e riscos, que fazem dela uma atividade normal e necessá-
ria na vida econômica de todos, de legítima procura dos menores ônus possíveis,
tanto os fiscais quanto os não fiscais.4 Destarte, ainda que possa haver enganos es-
cusáveis ou erros mais graves, neste âmbito não há planejamentos inaceitáveis.
Também para exemplificar, realizar efetivamente um negócio através de uma
estrutura jurídica que se supõe acarretar menor tributação, ainda que não se logre
esse resultado por alguma razão contrária, é muito diferente do que, não havendo
qualquer negócio, alguém conscientemente simular a sua existência para obter van-
tagem tributária.5
Neste passo, transpondo-nos para o aspecto das penalidades, pode-se dizer que
as situações realmente inaceitáveis, como aquelas acima alinhadas a título de exem-
plo, e que sequer podem ser referidas como de planejamento fiscal, são suscetíveis
das penas pecuniárias e criminais as mais graves que a lei preveja, pois tudo nelas
revela a consciência e a vontade de agir à margem da lei, de modo que aquele que
as pratica é um “fora da lei”.
As mesmas penas não são necessariamente aplicáveis aos ditos “planejamentos”
entre aspas, a menos que as provas disponíveis, materiais ou indiciárias, sejam su-
ficientes para desvendar a sapiência, pelos respectivos autores, da ilegalidade que
estão a praticar e sua vontade de ir adiante em detrimento do Fisco.
Já os verdadeiros planejamentos não podem chegar ao mesmo nível de punição,
mesmo quando agressivos ou situados na proximidade da linha divisória entre a eli-
são e a evasão fiscal, dado que eles são plasmados pela legitimidade intrínseca (cons-
titucional) da planificação fiscal e pela autolimitação das ações aos espaços que se
supõem sejam os da lei.
É, portanto, possível afastar a pecha de inaceitáveis para estes planejamentos,
assim como se deve ter presente que a aceitabilidade deve ser encarada como a re-
gra, dela somente sendo exceções situações como as ventiladas anteriormente, para
as quais foi inclusive descartada a propriedade da utilização da expressão “planeja-
mento fiscal”.
A regra geral de aceitabilidade, porém, não implica dizer que todos os planeja-
mentos tributários sejam necessariamente válidos, pois erros e enganos, inclusive
quanto à qualificação jurídica dos atos, podem ser cometidos, mesmo em boa-fé. A

4
Como se explicaria um administrador que contratasse cem empregados para fazer o que dez poderiam fazer com maior
eficiência? Certamente seria demitido!
5
A respeito da discutida questão da ausência de “business purpose”, tenho feito a distinção entre ausência de motiva-
ção negocial ou de “business purpose” e ausência de negócio ou de “business”. A inexistência de “business” é simu-
lação absoluta. Já o planejamento tributário válido acarreta mudança no patrimônio ou no estado operacional do in-
divíduo ou da empresa, ainda que tenha sido motivado pela economia tributária que pode acarretar. Em outras pala-
vras, o planejamento correto produz um resultado verificável na vida da pessoa física ou jurídica, no seu patrimônio
ou no seu modo de realizar suas atividades.
regra, portanto, somente se impõe para, primeiramente, exigir exame mais profun-
do de cada caso no intuito de demonstrar sua validade ou não, com base em funda-
mentos válidos e observado o devido processo legal, além de, em segundo lugar,
afastar a penalização mais radical da lei para aqueles que forem julgados inválidos,
mas que não possam ser equiparados às atitudes indubitavelmente inaceitáveis.
Quanto a isto, vale lembrar ponderação do Professor Miguel Reale, que demons-
tra que a equiparação entre os casos dolosos e os demais, além de injusta no plano
ético, seria ilegal no plano jurídico:6
“Hoje em dia - superada a visão penalística do Direito - a sanção é, sabidamente, a parte
da norma jurídica que expressa a conseqüência resultante, do adimplemento do pre-
ceito normativo (sanção premial, como, por exemplo, no caso de concessão de um
desconto no tributo exigível) ou, então, o seu inadimplemento (sanção penal, que im-
porta a aplicação de uma pena ou a perda de um direito).
Integrada no contexto da estrutura normativa, a sanção guarda natural equilíbrio entre
o valor daquilo que é preceituado, e o desvalor representado pela transgressão, haven-
do sempre entre o preceito e a sanção uma adequada proporcionalidade.”
Outrossim, a referida regra geral de aceitabilidade dos planejamentos tributários
é uma imposição do momento histórico em que vivemos, acima retratado em suas
linhas principais, no qual se destacam a ausência de norma legal prescritora dos li-
mites no exercício do direito à planificação fiscal, as peripécias da jurisprudência e
as controvérsias entre juristas especializados.
Com razão, o planejamento dos encargos tributários representa um direito (cons-
titucional) da pessoa que ainda não adentrou na situação configuradora de alguma
obrigação tributária, mas não há norma que regule o eventual abuso no exercício
desse direito, que seria uma norma geral antielusão. Destarte, e ressalvadas hipóte-
ses em que haja alguma norma particular aplicável, o exercício desse direito fica
dentro dos limites da regularidade dos atos e negócios jurídicos pelos quais ele se
concretiza.
Muito diferente, portanto, é a situação do momento presente, não somente quan-
to ao julgamento de regularidade ou não do planejamento em si, mas também quanto
à aplicação de penalidades eventualmente cabíveis, de uma situação a ocorrer em
um tempo futuro à promulgação de uma norma antielusão, ou antiabuso no campo
tributário.
Ao lado disso, principalmente quanto à penalização da evasão praticada, há que
distinguir situações em que o direito aplicável esteja incontroverso na doutrina e na
jurisprudência assentada, das situações em que haja disputas doutrinárias, em que
não haja jurisprudência firmada ou em que a jurisprudência tenha sido alterada.
Ainda no aspecto das penas, há um outro fator que não pode ser olvidado, o qual
está situado na “fatalidade” que representa um julgamento administrativo definiti-
vo e mantenedor de autuação com multa agravada e representação para fins penais.
Realmente, a partir dessa decisão desencadeiam-se ônus econômicos gigantescos e
inúmeros óbices à atividade normal, muitas vezes insuportáveis, além do prossegui-
mento dos procedimentos criminais contra a pessoa. Ora, uma situação tão drásti-

6
REALE, Miguel. Parecer publicado em O Estado de São Paulo de 4 de junho de 1989.
ca, num verdadeiro Estado de Direito, somente é tolerável se houver agentes públi-
cos responsáveis e tribunais administrativos capacitados e independentes, qualida-
des que infelizmente (mas precisa ser dito) não estão garantidas nos dias atuais.7
Em suma, erros e enganos na planificação fiscal são partes da natureza das pes-
soas e das próprias coisas objeto de atuações, os quais estão sujeitos a serem corri-
gidos através do devido processo legal, com reposição do prejuízo causado ao Erá-
rio público, mas não com a imposição das penalidades aplicáveis às situações para
as quais se possa dizer, sem um mínimo de dúvida, que o planejamento foi inacei-
tável, ou que a atitude tomada sequer represente um verdadeiro planejamento.
No plano do Direito posto, não encontramos normas que sejam colidentes com
os conceitos teóricos expostos até aqui.
Realmente, em primeiro lugar temos o art. 136 do Código Tributário Nacional,
segundo o qual “salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por in-
frações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsá-
vel e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato”.
Emana desse dispositivo a norma legal da responsabilidade pelas infrações in-
dependentemente da intenção do agente ou responsável, no que podemos vislum-
brar uma espécie de responsabilidade objetiva.
Todavia, a mesma norma legal, que assim estatui em caráter geral, abre exce-
ção para as hipóteses em que haja disposição de lei em contrário, ou seja, em que
exista uma regra legal prevendo situações nas quais a responsabilidade pelas infra-
ções depende da intenção da pessoa.8
Ao lado dessa disposição do CTN, nas situações duvidosas é imperiosa a apli-
cação da norma do art. 112 do CTN, que prescreve a interpretação mais favorável
para a imposição de penalidades quando houver dúvida quanto à capitulação legal
do fato, à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou exten-
são dos seus efeitos, à autoria, imputabilidade ou punibilidade, à natureza da pena-
lidade aplicável, ou à sua graduação.9
Portanto, nos planejamentos tributários imperfeitos por qualquer motivo jurídi-
co, se o art. 112 não chega a conduzir ao total cancelamento de lançamentos fiscais
contra eles promovidos, certamente impede a aplicação da multa em sua graduação
mais elevada.
Esses arts. 136 e 112 fixam diretrizes superiores tanto para o exercício da ativi-
dade de lançamento quanto para a judicante, especialmente para esta, tendo em vista

7
Sobre isto, veja-se especialmente a introdução da minha contribuição, juntamente com FAJERSZTAJN, Bruno; e
CARVALHO, Cláudia Vit de. “Responsabilidade Tributária”, para o XXXVI Simpósio Nacional de Direito Tributá-
rio do Centro de Extensão Universitária, relativo à Responsabilidade Tributária, e respectivo livro Pesquisas Tribu-
tárias - Nova Série n. 17, coordenação de MARTINS, Ives Gandra da Silva, coedição Centro de Extensão Universi-
tária/Saraiva, 2011.
8
Para os efeitos destes comentários, e nos seus limites, não interessa adentrar nos outros aspectos - efetividade, natu-
reza e extensão dos efeitos do ato - colacionados pelo art. 136.
9
“Art. 112 - A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável
ao acusado, em caso de dúvida quanto: I - à capitulação legal do fato; ou dúvida quanto; II - à natureza ou às circuns-
tâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos; ou dúvida quanto; III - à autoria, imputabilida-
de, ou punibilidade; IV - à natureza da penalidade aplicável, ou à sua graduação.”
as gravíssimas consequências desses atos oficiais, principalmente para o sujeito
passivo e para seus representantes, que podem arrostar sanções pessoais.
Pois vamos encontrar a repercussão dessas diretrizes na legislação ordinária,
inclusive quanto ao aspecto da intenção.
Realmente, um exemplo efetivo em que a intenção deve estar presente, portan-
to, em exceção ao caráter objetivo da responsabilidade por infrações, está no art. 44
da Lei Federal n. 9.430, de 27 de dezembro de 1996, dispositivo este que passou por
sucessivas alterações, mas sempre manteve a distinção de punição para as hipóte-
ses em que haja ou não a intenção fraudulenta, agravando a penalidade apenas nes-
ta última.
A redação atual do art. 44 é a seguinte, dada pelo art. 14 da Lei n. 11.488, de 15
de junho de 2005:
“Art. 44. Nos casos de lançamento de ofício, serão aplicadas as seguintes multas:
I - de 75% (setenta e cinco por cento) sobre a totalidade ou diferença de tributo, nos
casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração e nos de declara-
ção inexata;
II - de 50% (cinqüenta por cento), exigida isoladamente, sobre o valor do pagamento
mensal: (...)
(...)
Parágrafo 1º O percentual de multa de que trata o inciso I do ‘caput’ será duplicado
nos casos previstos nos arts. 71, 72 e 73 da Lei n. 4.502, de 1964, independentemente
de outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis.”
No passado, contudo, vigorou a seguinte redação:
“Art. 44. Nos casos de lançamento de ofício, serão aplicadas as seguintes multas so-
bre a totalidade ou diferença de tributo ou contribuição:
I - de setenta e cinco por cento, nos casos de falta de pagamento ou recolhimento, pa-
gamento ou recolhimento após o vencimento do prazo, sem o acréscimo de multa
moratória, de falta de declaração e nos de declaração inexata, excetuada a hipótese do
inciso seguinte;
II - cento e cinqüenta por cento, nos casos de evidente intuito de fraude, definido nos
arts. 71, 72 e 73 da Lei n. 4.502, de 30 de novembro de 1964, independentemente de
outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis.”
A alocução inicial do art. 136 do CTN - “salvo disposição de lei em contrário”
- está plenamente refletida nessas disposições, que exigem distinguir a situação sub-
metida à multa de 75%, devida objetivamente, independentemente da vontade, do
conhecimento da infração ou de qualquer outro fator subjetivo, da situação sujeita
à multa de 150%, que exige o elemento subjetivo da intenção de fraude.
Portanto, em qualquer tempo o art. 44 da lei federal sempre reservou penalida-
de agravada para os casos de fraude previstos nos arts. 71 a 73 da Lei n. 4.502, com
a diferença redacional de que:
- antes, o art. 44 declarava textualmente que tais casos correspondiam a evi-
dente intuito de fraude, adotando a dicção de que o evidente intuito de fraude
era definido naqueles artigos da Lei n. 4.502;
- agora, o mesmo artigo omite essa declaração textual, simplesmente referin-
do-se aos casos dos mesmos dispositivos da mesma Lei n. 4.502.
Seja como for, por uma ou por outra redação, o agravamento somente tem ca-
bimento se o fato for enquadrável em um dos referidos dispositivos da lei de 1964.
A mudança redacional feita no art. 44 procurou contornar uma jurisprudência
pacificada nos Conselhos de Contribuintes,10 que não via evidência de intuito de
fraude em inúmeras situações nas quais os autos de infração eram mantidos quanto
ao principal, mas tinham afastado o agravamento da penalidade.
Porém, no fundo, a norma continua a mesma.
Com razão, até a Lei n. 11.488 a multa qualificada somente podia ser cobrada
se houvesse evidente intuito de fraude, assim considerada a situação em que os fa-
tos se subsumissem a uma das hipóteses dos arts. 71 a 73 da Lei n. 4.502, que elen-
cam situações em que esteja presente o dolo (veja-se os destaques), pois dizem eles:
“Art. 71. Sonegação é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total
ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária:
I - da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou cir-
cunstâncias materiais;
II - das condições pessoais de contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária
principal ou o crédito tributário correspondente.”11

“Art. 72. Fraude é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total
ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a
excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante
do imposto devido, ou a evitar ou diferir o seu pagamento.”12

“Art. 73. Conluio é o ajuste doloso entre duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas,
visando qualquer dos efeitos referidos nos artigos 71 e 72.”13
A leitura criteriosa do conjunto desses dispositivos e do art. 44 da Lei n. 9.430,
este em sua redação anterior, revela que o intuito doloso sempre foi pré-requisito
para a aplicação da multa majorada, eis que:
- o art. 44, inciso II, da Lei n. 9.430 reservava essa penalidade mais onerosa
aos “casos de evidente intuito de fraude”, ou seja, não aos casos de simples ile-
galidades praticadas pelos contribuintes, mas apenas aos casos de ilegalidades
que tivessem sido cometidas sob o impulso de intuito fraudulento;
- somente neste caso o art. 44 remetia a penalização do contribuinte para a mul-
ta agravada, mas a reservava para as hipóteses dos arts. 71, 72 e 73 da Lei n.
4.502, ou seja, a multa qualificada somente era cabível se houvesse o evidente

10
O mesmo esforço fora feito pelo Governo Federal através da Medida Provisória n. 303, a qual, contudo, perdeu efi-
cácia por decurso de tempo, sem aprovação pelo Poder Legislativo.
11
Este artigo, pois, trata da sonegação não no sentido de deixar de pagar tributo por via dolosa, mas por dolosamente
serem criados embaraços para a fiscalização tomar conhecimento do fato gerador e de todos os seus aspectos.
12
Já este artigo trata do próprio fato gerador, cuja ocorrência se impede ou retarda por modo doloso, vale dizer, por via
sabidamente ilegal e que adultere a realidade do fato gerador ou dos seus elementos, podendo consistir em simula-
ção absoluta ou relativa. Mas não impede o exercício regular do direito à elisão, que também visa, por meios legais,
impedir ou retardar a ocorrência do fato gerador ou praticar ato que não corresponda às características essenciais deste.
Na elisão sequer ocorre alteração das características do fato gerador, porque este nem chega a ser completar. Neste
sentido, lembre-se a visão de Luciano da Silva Amaro, de que a elisão não se resume a fazer algo antes da ocorrência
do fato gerador, mas fazer algo “em vez” do fato gerador.
13
O art. 73 não tem vida autônoma, pois se refere às hipóteses anteriores quando praticadas por mais de uma pessoa.
Portanto, nele, além da necessidade de dolo nas ações abrangidas pelos arts. 71 e 72, também é necessário o pacto
doloso.
intuito de fraude porque a situação se subsumia a um dos tipos infracionais
descritos nesses outros dispositivos legais;
- os arts. 71, 72 e 73 da Lei n. 4.502 referiam-se exclusivamente à situações
em que o dolo estivesse presente, pois os dois primeiros referiam-se à “ação
ou omissão dolosa” e o terceiro a “ajuste doloso”.
Portanto, nas três modalidades de evidente intuito de fraude, constantes desses
dispositivos - sonegação, fraude e conluio -, o traço característico e comum a elas
era o dolo, e, por isso mesmo, o art. 44 as considerava como caracterizadoras de
evidente intuito de fraude.
Por conseguinte, toda e qualquer modalidade de evidente intuito de fraude, que
em tese por si já carrega dolo, requeria o componente doloso.
Tanto era assim, que o inciso II do art. 44 declarava textualmente que o eviden-
te intuito de fraude era definido pelos arts. 71 a 73 da lei de 1964, “in verbis”: “(...)
nos casos de evidente intuito de fraude, definido nos arts. 71, 72 e 73 da Lei n. 4.502
(...)”.
Ou seja, o evidente intuito de fraude era definido pelos três dispositivos, ou, em
outras palavras, tudo o que estivesse abarcado por eles seria considerado como evi-
dente intuito de fraude.
Já o que não pudesse ser enquadrado nessa normatização da fraude ficaria sub-
metido à penalidade normal.
Daí a sapiência da remansada jurisprudência que, não à toa, surgiu em passado
antigo e se firmou ao longo dos anos.
O rigoroso Marco Aurélio Greco está de acordo com isto:14
“Outra observação a ser feita é a de que a incidência do inciso II do artigo 44 Lei n.
9.430/96, que leva à multa mais onerosa, supõe a ocorrência inequívoca de intuito frau-
dulento.
Vale dizer, não é toda e qualquer hipótese de falta de pagamento etc. prevista no inci-
so I que vai levar à multa em dobro.
Se não houve intuito de enganar, esconder, iludir, mas se, pelo contrário, o contribuin-
te agiu de forma clara, deixando explícitos seus atos e negócios, de modo a permitir a
ampla fiscalização pela autoridade fazendária, e se agiu na convicção e certeza de que
seus atos tinham determinado perfil legalmente protegido - que levava ao enquadra-
mento em regime ou previsão legal tributariamente mais favorável - não se trata de caso
regulado pelo inciso II do artigo 44, mas sim de divergência de qualificação jurídica
dos fatos; hipótese completamente distinta da fraude a que se refere o dispositivo.”
(Destaque do original)
Tanto este componente qualificador era necessário que o art. 44 da Lei n. 9.430
foi alterado pela Lei n. 11.488, numa tentativa do Poder Executivo de tornar a pu-
nição mais rigorosa aplicável em situações de menor evidência da intenção.
Com efeito, observa-se que o autor da nova redação do art. 44 retirou dele a
expressão “evidente intuito de fraude”, que ao longo do tempo exerceu capital im-
portância nos julgamentos administrativos.
Todavia, a evidência de fraude nunca foi decorrência de uma visão física ou de
uma outra percepção sensorial de natureza pessoal, pois era descrita objetivamente

14
GRECO, Marco Aurélio, Planejamento Tributário. São Paulo: Dialética, 2004, pp. 230/1.
nos arts. 71 a 73, e o enquadramento de cada caso num desses dispositivos depen-
dia de provas seguras.
Destarte, a omissão daquela expressão na nova redação do art. 44 não altera a
norma, porque não altera os pressupostos dos arts. 71, 72 e 73, os quais continuam
os mesmos, de modo que o agravamento da multa continua a depender de, em cada
caso, haver ou não a subsunção dos fatos às regras constantes dos três artigos, sen-
do que em todos eles o agravamento da pena é sempre reservado para uma “ação
ou omissão dolosa tendente” a produzir algum efeito fiscal ilegal, onde, portanto, o
dolo é requisito participante das hipóteses legais.
Não é esta a primeira vez em que se assiste no Brasil a uma pretensão governa-
mental de alterar a realidade das coisas e das normas através de meros artifícios lin-
guísticos que, contudo, não são hábeis a modificar aquela realidade.15
Por conseguinte, para que seja cabível a multa maior, não é suficiente a lei ter
deixado de dizer que ela somente cabe quando houver evidente intuito de fraude
definido pelos arts. 71 a 73 da Lei n. 4.502, se ela continua a penalizar com a mes-
ma intensidade as mesmas situações subsumidas a esses dispositivos, os quais, por
sua vez, descrevem apenas situações dolosas.
Quer dizer, não interessa ficar discutindo se, em dado caso, há ou não evidente
intuito de fraude, porque o relevante é ir diretamente às hipóteses de dolo descritas
nos arts. 71 a 73, que requerem a prova da existência do dolo, e não da mera culpa.
De qualquer modo, as mesmas situações continuam a evidenciar o intuito de
fraude, isto porque a lei, na sua redação pretérita, o dizia com todas as letras, e os
fatos hipoteticamente referidos na lei continuam a ser os mesmos.
De mais a mais, o dispositivo legal contém a norma, mas não é a norma, a qual
decorre de todas as disposições contidas na lei.
Já por isto se pode afirmar que a singela alteração redacional introduzida no art.
44 não alterou a substância da norma, inclusive porque os arts. 71 a 73 não podem
ser isolados de outras disposições que estão contidas num conjunto normativo cons-
tante da Lei n. 4.502, de modo que, ao serem adotados aqueles artigos especifica-
mente mencionados no art. 44, eles o foram dentro do contexto normativo de que
fazem parte.
Em outras palavras, a adoção dos arts. 71 a 73 da Lei n. 4.502, pela Lei n. 9.430,
importa em adoção de todo o conjunto normativo que trata da graduação das pena-
lidades, constante daquela lei.
Realmente, os arts. 71, 72 e 72 fazem parte duma sistemática baixada pela Lei
n. 4.502 que não se reduz a eles dois, eis que vem desde o art. 67 e passa pelo art.
68, que assim dispõem:
“Art. 67. Compete à autoridade julgadora, atendendo aos antecedentes do infrator,
aos motivos determinantes da infração e à gravidade de suas conseqüências efetivas
ou potenciais;
I - determinar a pena ou as penas aplicáveis ao infrator;
II - fixar, dentro dos limites legais, a quantidade da pena aplicável.”

15
Ainda recentemente, tivemos a norma pretensamente interpretativa baixada pela Lei Complementar n. 118 para ten-
tar derrubar retroativamente a interpretação que o Superior Tribunal de Justiça dava à matéria, tentativa esta frustra-
da pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do Recurso Extraordinário n. 566.621/RS.
“Art. 68. A autoridade fixará a pena de multa partindo da pena básica estabelecida
para a infração, como se atenuantes houvesse, só a majorando em razão das circuns-
tâncias agravantes ou qualificativas provadas no processo.
§ 1º São circunstâncias agravantes:
I - a reincidência;
II - o fato de o imposto, não lançado ou lançado a menos, referir-se a produto cuja tri-
butação e classificação fiscal já tenham sido objeto de decisão passada em julgado,
proferida em consulta formulada pelo infrator;
III - a inobservância de instruções dos agentes fiscalizadores sobre a obrigação viola-
da, anotada nos livros e documentos fiscais do sujeito passivo;
IV - qualquer circunstância que demonstre a existência de artifício doloso na prática
da infração, ou que importe em agravar as suas conseqüências ou em retardar o seu
conhecimento pela autoridade fazendária.
§ 2º São circunstâncias qualificativas a sonegação, a fraude e o conluio.”
A seguir, então, especialmente para dar eficácia ao parágrafo 2º do art. 68, vêm
as definições de sonegação, fraude e conluio, dadas pelos arts. 71 a 73.
As disposições dos arts. 67 e 68, que estão em vigor tanto quanto os arts. 71 a
73,16 ajustam-se às duas referidas graduações de penalidades17 previstas no art. 44
da Lei n. 9.430, e requerem que a autoridade julgadora distinga as situações e parta
da menor graduação, sob a presunção de apenas haver atenuantes para o contribuinte
ter cometido a infração, “só a majorando em razão das circunstâncias agravantes ou
qualificativas provadas no processo”.
Porém, essas circunstâncias agravantes ou qualificativas, além de precisarem
estar provadas, não são de livre eleição pelo julgador, já que as agravantes estão
relacionadas no parágrafo 1º do art. 69 e as qualificativas no parágrafo 2º.
Ora, estas últimas são exatamente as descritas nos arts. 71 a 73, de modo que a
distinção entre as situações não dolosas e as dolosas vem na própria estrutura da
disciplina legal das multas e da sua graduação, mais uma vez a afastar qualquer efei-
to concreto na supressão da expressão “evidente intuito de fraude” que o art. 44
empregava originalmente.
Já que adentramos na sistemática legal para aplicação das penalidades, impõe-
se observar o que dizem mais dois dispositivos da mesma Lei, a saber:
“Art. 76. Não serão aplicadas penalidades:
I - aos que, antes de qualquer procedimento fiscal, procurarem espontaneamente, a
repartição fazendária competente, para denunciar a falta e sanar a irregularidade, res-
salvados os casos previstos no art. 81, nos incisos I e II do art. 83 e nos incisos I, Il e
III do art. 87;
II - enquanto prevalecer o entendimento - aos que tiverem agido ou pago o imposto:
a) de acordo com interpretação fiscal constante de decisão irrecorrível de última ins-
tância administrativa, proferida em processo fiscal, inclusive de consulta, seja ou não
parte o interessado;

16
A provar isto, a Lei n. 11.488, que alterou o art. 44 da Lei n. 9.430, revogou apenas o art. 69 da Lei n. 4.502, que até
então integrava a sistemática de graduação de penalidades.
17
Na verdade, há uma terceira graduação aqui não tratada por ser irrelevante. Com efeito, o parágrafo 2º do art. 44 (com
a redação da Lei n. 11.488, de 15 de junho de 2007) prescreve o agravamento, em mais metade, tanto da porcenta-
gem de 75% quanto da de 150%, se o sujeito passivo não atender, no prazo marcado, intimações da fiscalização para
a entrega de informações e dados relacionados em suas alíneas.
b) de acordo com interpretação fiscal constante de decisão de primeira instância, pro-
ferida em processo fiscal, inclusive de consulta, em que o interessado for parte;
c) de acordo com interpretação fiscal constante de circulares instruções, portarias, or-
dens de serviço e outros atos interpretativos baixados pelas autoridades fazendárias
competentes.”

“Art. 77. A aplicação da penalidade fiscal e o seu cumprimento não dispensam, em caso
algum, o pagamento do imposto devido, nem prejudicam a aplicação das penas comi-
nadas para o mesmo fato pela legislação criminal, e vice versa.”
Enquanto o art. 77 da Lei n. 4.502 consagra a regra de que a penalidade fiscal
não exclui sanções criminais que sejam cabíveis, o que vem repetido no art. 44 da
Lei n. 9.430, o art. 76 vai adiante ao prescrever as hipóteses em que a penalidade
fiscal não deverá ser aplicada, havendo-se que se notar a hipótese de pagamento de
imposto ou de ação (que pode ser até a ação de não pagamento de imposto, ou de
se organizar para não adentrar no fato gerador) do contribuinte que esteja de acor-
do com decisão administrativa de última instância, ainda não alterada, mesmo que
em processo do qual ele não seja parte.18
Portanto, repito, a inaplicabilidade de multa agravada a planejamentos tributá-
rios equivocados, mas não dolosos, não é apenas uma imposição de critérios de jus-
tiça ínsitos ao ordenamento jurídico, mas uma decorrência de normas expressas no
direito positivado.
De mais a mais, em matéria de Direito Penal (inclusive Direito Penal Tributá-
rio, qualquer que seja a espécie da pena), é bem apropriado o conceito de erro de
proibição, existente no Direito Penal quanto à punibilidade do próprio ato crimino-
so, e perfeitamente aplicável no Direito Tributário quanto à graduação da penalida-
de.
O erro de proibição existe quando o autor do ilícito supõe estar agindo dentro
da lei.
Julio Fabbrini Mirabete ensina com clareza total:19

18
Principalmente o dispositivo do inciso II, letra “a” suscita algumas surpresas, além do fato de que ainda esteja em
vigor. Vale comentar que as exceções referidas na parte final do inciso I do art. 76 são pertinentes à infrações graves
e também ao pagamento espontâneo após o prazo legal, que tinha multas especificamente previstas no art. 81, o qual,
entretanto, fora revogado já em 1979 pelo Decreto-lei n. 1.736, tendo a hipótese passado a ser regida por legislação
posterior. E, quanto à letra “a” do inciso II do mesmo art. 76, seu aparente choque com o disposto no art. 100 do
CTN, superveniente a ele, pode ser explicado pelo fato de que o CTN é lei nacional que se impõe à União, aos Esta-
dos, ao Distrito Federal e aos Municípios, mas não impede que qualquer dessas unidades estabeleçam regras mais
favoráveis aos contribuintes, em homenagem ao preceito da confiança dos administrados na Administração Pública,
tão defendido pelo Professor Ruy Barbosa Nogueira. Além disso, a letra “a” do inciso II do art. 76 não se incompa-
tibiliza com o art. 100, cujo inciso II considera como legislação complementar as decisões de órgão singular ou co-
letivo de jurisdição administrativa a que a lei atribua eficácia normativa, que, em última análise, é a decorrência do
disposto no art. 67, inciso II, letra “a” (também da letra “b”), da Lei n. 4.502. Neste particular, deve-se ter em conta
que, após o CTN, a Lei n. 4.502 passou por alterações introduzidas pelo Decreto-lei n. 34, ajustando-se, pois, ao
Código, de modo que a manutenção do art. 67 após esse decreto-lei deve ser entendida como explicitadora da sua
consonância com o disposto no art. 100, pois foi mantido pelo decreto-lei apesar de este ter mexido em outras dispo-
sições desse mesmo conjunto normativo. Destarte, quanto a tributos federais, e no contexto do planejamento tributá-
rio, percebe-se a importância da jurisprudência administrativa para a apreciação de casos futuros, enquanto ela se
sustenha.
19
MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal. Vol. 1. 23ª ed. Parte Geral. São Paulo: Atlas, p. 197.
“O erro de proibição, por sua vez, não diz respeito à tipicidade, ao tipo penal, mas a
sua antijuridicidade. Não existe, na hipótese de erro de proibição, a consciência da ili-
citude (atual ou parcial) do fato, que é um pressuposto ou elemento da culpabilidade.
(...)
Foi visto que, para existir culpabilidade, necessário se torna que haja no sujeito ao
menos a possibilidade de conhecimento da antijuridicidade do fato. Quando o agente
não tem ou não lhe é possível esse conhecimento, ocorre o denominado erro de proi-
bição. Há, portanto, erro de proibição quando o agente supõe, por erro, que seu com-
portamento é lícito.
(...)
O agente, no erro de proibição, faz um juízo equivocado sobre aquilo que lhe é permi-
tido fazer na vida em sociedade. Evidentemente, não se exige de todas as pessoas que
conheçam todos os dispositivos legais, mas o erro só é justificável quando sujeito não
tem condições de conhecer a ilicitude de seu comportamento. Não se trata, aliás, de
um juízo técnico-jurídico, que somente se poderia exigir dos mais renomados juristas,
mas de um juízo ‘leigo’, ‘profano’, que é emitido de acordo com a opinião dominante
no meio social.”
São conceitos e ensinamentos perfeitamente adequados a planejamentos tribu-
tários cercados das circunstâncias referidas por esse autor, como inclusive se cons-
tatou em alguns julgados do 1º Conselho de Contribuintes, dentre os quais vale des-
taque para o Acórdão n. 101-95537, de 24 de maio de 2006, em que se lê o seguin-
te:
“Aplica-se à espécie, sem pretensões de maiores conhecimentos no campo de Direito
Penal, o denominado erro de proibição, a afastar, pela razoabilidade do desconheci-
mento da ilicitude do ato praticado, punibilidade diversa daquela do simples retardar
no recolhimento do tributo, ou seja, a multa de lançamento de ofício de 75%.”
A seguir, esse acórdão transcreve escólio doutrinário de Luiz Regis Prado,20 do
qual se destaca a seguinte passagem:
“Trata-se de erro que tem por objeto proibição jurídica do fato. É dizer: o agente per-
de, em decorrência de erro de proibição, a compreensão da ilicitude do fato. Constitui
o lado oposto da consciência do injusto: supõe erroneamente que atua de forma lícita
(...).”
E arremata o seu julgamento dizendo:
“Perceba-se a justificativa que tem um contribuinte, ao pesquisar a jurisprudência va-
cilante e a doutrina divergente, em considerar que estava agindo licitamente. Há pou-
co tempo, inclusive, prevalecia o entendimento de que a adoção de formas lícitas era
suficiente a garantir a economia tributária visada com a seqüência de atos, indepen-
dentemente do seu tempo ou ausência de qualquer outro propósito negocial.
Inaceitável a qualificação da multa, principalmente para os atos praticados há muitos
anos, quando ainda incipientes as discussões a respeito das patologias que tornam não
oponível ao fisco determinado planejamento tributário.”
Portanto, a multa qualificada pressupõe ciência da ilicitude e intuito de fraudar
a lei através de ato que se sabe ser ilícito, o que está muito distante das situações
em que haja mero erro de conduta por erro de direito, isto é, na qualificação jurídi-
ca do ato, ou em que a invalidade do planejamento praticado derive de outras falhas
não cercadas de dolo.

20
PRADO, Luiz Regis. Elementos do Direito Penal. Vol. 1. São Paulo: RT, 2005, p. 132.
Outro não deve ser o enquadramento dos fatos no terreno das sanções criminais,
segundo a disciplina da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que arrola vários
tipos penais, todos eles de natureza dolosa. Vale ler o que consta dessa lei, para se
perceber sem dificuldade que ela está ajustada a tudo quanto antes foi dito a respei-
to das sanções tributárias de natureza pecuniária:
“Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou con-
tribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo opera-
ção de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro
documento relativo à operação tributável;
IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva sa-
ber falso ou inexato;
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equi-
valente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realiza-
da, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.
(...)
Art. 2º Constitui crime da mesma natureza:
I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empre-
gar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;
II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, des-
contado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria reco-
lher aos cofres públicos;
III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer per-
centagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como
incentivo fiscal;
IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou
parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;
V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito
passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por
lei, fornecida à Fazenda Pública.”
É notável como todos os tipos penais descritos correspondem à situações que
não têm qualquer similitude com aquelas em que se pode dizer haver planejamento
tributário, ainda que equivocado, pois, ao contrário, todos os tipos arrolados corres-
pondem aos exemplos de fraudes inequívocas, sabidas como fraudes por qualquer
pessoa.
Por isso mesmo, também são notáveis as palavras pelas quais o Supremo Tri-
bunal Federal afastou a existência de crime em caso no qual um contribuinte credi-
tou erroneamente determinada parcela de ICMS. Disse a Corte:21
“A fraude pressupõe a vontade livre e consciente. Longe fica de configurá-la, tal como
tipificada no inciso II do art. 1º da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o lança-
mento de crédito, considerada a diferença das alíquotas praticadas no Estado de desti-
no e no de origem. Descabe confundir interpretação errônea de normas tributárias,
passível de ocorrer quer por parte do contribuinte ou da Fazenda, com o ato penalmente

21
Habeas Corpus n. 72.584-8/RS, 2ª Turma, em 17 de outubro de 1995.
glosado, em que sempre se presume o consentimento viciado e o objetivo de alcançar
proveito sabidamente ilícito.”
Em conclusão, a legislação ordinária federal confirma que os casos que não
podem ser considerados planejamentos tributários estão sujeitos às mais graves san-
ções pecuniárias e restritivas da liberdade. Também confirma que a graduação das
penalidades deve partir do pressuposto de inexistência de circunstâncias que auto-
rizem o agravamento das multas, o que, em matéria de planejamento, ratifica a vi-
são de que a regra geral é da sua aceitabilidade, somente sendo invalidado median-
te prova da sua incorreção (multa menor, independente de intenção) ou, quando for
o caso, mediante prova inequívoca da noção da ilegalidade pelo respectivo autor, a
despeito da qual este tenha persistido em praticá-la por meios dolosos (multa maior,
dependente da intenção).
Neste quadro, qualquer planejamento tributário requer prudência e moderação:
- do consultor e do contribuinte, quanto a praticá-lo;
- do auditor fiscal, quando da atividade de fiscalização e de lançamento; e
- do órgão judicante, quando da decisão a ser proferida com o devido tempe-
ramento da justiça (“cum grano salis”).
Contribuição sobre o Aviso
Prévio Indenizado
Wladimir Novaes Martinez

A recente Lei n. 12.506/2011, no seu art. 1º diz:


“O aviso prévio, de que trata o Capítulo VI do Título IV da
Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo
Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943, será concedido
na proporção de 30 (trinta) dias aos empregados que contêm
até 1 (um) ano de serviço na mesma empresa.”
Por outro lado, o seu parágrafo único reza:
“Ao aviso prévio previsto neste artigo serão acrescidos 3
(três) dias por ano de serviço prestado na mesma empresa,
até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfazendo um total de
até 90 (noventa) dias.”
Quer dizer, o prazo de 30 dias pode chegar a 90 dias. Se
a empresa resolver dispensar o empregado nesta última hi-
pótese terá de pagar-lhe três salários.
É possível que estejamos às portas de uma nova polêmi-
ca exacional, como aquela da década de 1970 (incidência do
FGTS sobre as horas extras).
Interpretando o conteúdo da Lei n. 9.528/1997, na esteira
de decisões da Justiça do Trabalho, no sentido de que o pe-
ríodo do aviso prévio indenizado deveria incorporar-se ao
tempo de serviço do empregado, o Decreto n. 6.727/2009
reviu a redação do art. 214, parágrafo 9º, f, do Regulamento
da Previdência Social - RPS (Decreto n. 3.048/1999), deter-
minando a incidência de contribuição previdenciária em re-
lação ao valor do aviso prévio indenizado. Note-se, coman-
do destinado ao administrador e não necessariamente ao
administrado (porque a tendência da Justiça Federal é não
exigir contribuições sobre valores trabalhistas indenizató-
rios).
Uma obrigação fiscal que, agora, pode ser triplicada sem
certeza de que o INSS computará os 90 dias para fins dos
benefícios.
Com fulcro nos atuais arts. 195, I, a e II, e 201, parágra-
fo 11, da Constituição Federal, desde a vetusta Lei Orgâni-
ca da Previdência Social - LOPS (Lei n. 3.807/1960), a le-
Wladimir Novaes gislação básica da previdência social define quais são os
Martinez montantes que integram ou não o salário de contribuição.
é Advogado Ao fazê-lo, ela enumera quatro parcelas integrantes e 31
Especialista em Direito parcelas não integrantes. Nos dois casos, são listas tidas pa-
Previdenciário. cificamente pela doutrina como meramente exemplificativas.
Existem imposições fiscalmente não contempladas no parágrafo 8º do art. 28 do
PCSS e não exigibilidades de parcelas não contempladas no parágrafo 9º do mes-
mo artigo.
No art. 28, o que interessa é: “(...) a remuneração efetivamente recebida ou
creditada a qualquer título, durante o mês em uma ou mais empresas, inclusive os
ganhos habituais sob a forma de utilidades, ressalvado o disposto no parágrafo 8º
(...)”. Note-se o caput, quem manda no artigo reafirma o que diz o parágrafo 8º e
silencia quanto ao parágrafo 9º.
Ao decantar a obrigação fiscal correspondente da empresa, o art. 22 do Plano
de Custeio e Organização da Seguridade Social - PCSS (Lei n. 8.212/1991) diz pra-
ticamente a mesma coisa: “total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a
qualquer título, durante o mês (...)”.
Na descrição mais singela e sintética que se tem de um fato gerador, ela se re-
sume numa única palavra: “remuneração”. Não é um conceito previdenciário, mas
trabalhista e descrito no art. 457 da CLT, que alude a “contraprestação de serviço”,
ausente durante o aviso prévio indenizado.
Logo, de forma bem simples, tem-se que os valores remuneratórios integram o
salário de contribuição - a base de cálculo do aporte fiscal previdenciário. Levando
em conta a natureza substitutiva da prestação securitária e o fato de a remuneração
ser o principal e contínuo meio de subsistência do trabalhador (a ser substituído),
diante do silêncio do legislador neste preceito, os ressarcimentos de despesas e as
indenizações não integram o salário de contribuição, pelo simples motivo institucio-
nal de que não respondem pela manutenção do trabalhador, uma mera convenção
histórica normativa, é claro.
O art. 28 do PCSS avançou, foi adiante e exemplificou algumas parcelas: (a)
parágrafo 2º (salário-maternidade); (b) parágrafo 7º (décimo terceiro salário); e (c)
parágrafo 8º (diárias excedentes a 50% da remuneração e gratificações e verbas
eventuais), que entendeu de aclarar; fazem parte desse conceito fiscal por razões
históricas.
Excedeu-se no que diz respeito ao salário-maternidade, que é benefício e, por-
tanto contraria a ideia da Constituição Federal (I), tratou do décimo terceiro salá-
rio, especificamente devido a dúvidas que persistem até hoje (II), e cuidou particu-
larmente das diárias para viagem (III), outro tema polêmico.
Finalmente, no parágrafo 9º, aquele comando dispensa contribuições, sumariou
todos os debates da história da exigibilidade e citou 31 rubricas (sic), entre as quais
a do aviso prévio indenizado (letra e).
Nesse sentido, acompanhou o Parecer CJ/MPAS n. 40/1981 (Proc. MPAS n.
019.941/1981, DOU de 23.9.1981 e a Súmula TFR n. 79 e aludindo aos Pareceres
CJ/MPAS ns. 131/1977 e 24/1978 da Secretaria de Arrecadação e Fiscalização do
Iapas, consolidada na Formulação Iapas/SAF n. 22/1981.
Por isso, até que fosse revogado nesse particular pelo Decreto n. 6.727/2009, no
seu art. 214, parágrafo 9º, V, f, o RPS dispensava a contribuição, acompanhado pela
IN SRP n. 3/2005 e IN INSS n. 20/2007.
A Lei n. 9.528/1997 tirou do PCSS a desoneração fiscal, fazendo com que a lei
previdenciária básica deixasse de ter vedação explícita sobre o aviso prévio indeni-
zado. Quer dizer, subtraiu a dispensa do parágrafo 9º, mas não a incluiu no parágrafo
8º (único a ser excepcionado pelo caput do art. 28), como o fez com relação às gra-
tificações e valores eventuais acima indicados.
O que se teve é que a Lei não mais dispensou essa contribuição - até 13 de ja-
neiro de 2009 não exigida pela Receita Federal do Brasil, atendendo ao então vi-
gente RPS -, mas também não a impôs fiscalmente, dentro de um dispositivo legal
em que fornece um conceito básico (colhidos no caput dos arts. 22, I, e 28, I, do
PCSS), e cita alguns exemplos de parcelas que integram ou não o salário de contri-
buição.
A razão de ser da Lei n. 9.528/1997 parece ser a convicção da Justiça do Traba-
lho de que, in fine, o art. 487, parágrafo 1º, da CLT se aplicaria à previdência so-
cial: “A falta do aviso prévio do empregador dá ao empregado o direito aos salários
correspondentes, ao prazo do aviso, garantida a integração desse período no seu
tempo de serviço.” (Destaques nossos) E do entendimento da Caixa Econômica
Federal, de que é base de cálculo para o FGTS (IN SIT n. 25/2001). Tanto que tem
entendido ser obrigação dos juízes de primeira instância executar a contribuição.
Dessarte, “o prazo do aviso prévio indenizado incorpora-se para vários fins la-
borais, entre os quais para efeito da indenização adicional do art. 9º da Lei n.
6.708/79” (Enunciado TST n. 182), mas não todos (Enunciado n. SDI do TST n. 82),
como lembra Sergio Pinto Martins ao apreciar o aviso prévio.1
Embora subsistam normas trabalhistas na legislação previdenciária - por exem-
plo, a admissão de deficientes (PBPS, art. 93) e a estabilidade do acidentado (PBPS,
art. 118) - e normas previdenciárias na legislação trabalhista, elas comparecem jus-
tificadamente quando adequadas à explicitação da matéria na norma específica.
A CLT não tem conceito de tempo de serviço previdenciário, nem deveria ter:
quem o faz é o PBPS. Quando fala no “seu tempo de serviço”, está aludindo aos
efeitos laborais válidos do período de trabalho para os fins do aviso prévio indeni-
zado. Não passa disso, e equivocou-se a Lei n. 9.528/1997 ao entender que está en-
focando o tempo de serviço do segurado da previdência social.
A natureza jurídica desse aviso prévio é de indenização, conclusão extraída de
sua essência e não necessariamente de seu título. O empregador, deixando de dar
antecipadamente o aviso prévio devido, fazendo cessar abruptamente o contrato de
serviço, causa prejuízo ao empregado e por isso deve indenizá-lo.
Tendo em vista não ser um ganho habitual (CF, art. 201, parágrafo 11) nem sa-
lário - porque não há trabalho e muito menos remuneração -, o valor não é respon-
sável pela manutenção do trabalhador. Não há por que haver contribuição bastante
para substituí-lo.
Aliás, a letra e do art. 28, parágrafo 9º, segue nessa linha de raciocínio e dispensa
a contribuição de várias parcelas indenizatórias.
O “exclusivamente” colhido no início do parágrafo 9º do art. 28 significa falta
de atenção do legislador, querendo dizer que somente os 31 valores constantes do
dispositivo estão dispensados de contribuição.

1
Comentários à CLT, 3ª ed., São Paulo, Atlas, 2000, p. 514.
O rol dos montantes percebidos pelos trabalhadores, entre remuneratórios e não
remuneratórios, chegam a mais de 1.000, e praticamente todo mês surge uma nova
modalidade de retribuição do trabalho humano.
Valores reconhecidamente não integrantes do salário de contribuição não fazem
parte dessa lista, como é o caso da guelta, da quebra de caixa, da remuneração do
aviado amazonense, do pagamento a desoptante do ex-IAPC e assim por diante, taxa
de vexame, taxa de rampa, taxa de chuva e auxílio-paletó etc. (sic)
O caput de um artigo - uma norma geral - pode ser quebrado pela norma espe-
cial, constante de parágrafo, inciso ou da alínea abaixo dele postadas e, então, não
há dúvidas quanto a todas as letras do parágrafo 9º do art. 28. Trata-se de disposi-
ção comissiva. Entretanto, por omissão ou pelo raciocínio do a contrario sensu, nem
sempre a conclusão é possível.
Ausente dessa enorme lista, comporta interpretação e será preciso recorrer ao
caput, em que o aviso prévio indenizado não tem abrigo.
Quer dizer, embora não faça parte do parágrafo 9º (relação de valores não inte-
grantes do salário de contribuição) necessariamente não estão sujeitos à exação se-
curitária.2
Assim ajuizaram Irany Ferrari,3 Almir Pazzianotto Pinto,4 e José Pittas.5

2
Comentários à Lei Básica da Previdência Social, tomo I, 8ª ed., São Paulo, LTr, 2010, p. 380.
3
“Aviso Prévio Indenizado - Incidência Previdenciária”, Suplemento Trabalhista n. 50/81, São Paulo: LTr, 1981.
4
“Indenização Adicional e Aviso Prévio”, Suplemento Trabalhista n. 10/81, São Paulo: LTr, 1981.
5
“Juiz do Trabalho comenta sobre as Verbas Isentas da Contribuição Previdenciária”, Revista BIT, março de 1998,
pp. 43/445.
PA R E C E R
O Direito de aproveitar o ICMS Devido
pelo Contribuinte que recebeu de Outro
Estado Mercadorias com Incentivo
Declarado Inconstitucional
Sacha Calmon Navarro Coêlho

Ementa: Declaração pelo Supremo Tribunal Federal da in-


constitucionalidade de lei, ato normativo ou ato administrativo
concedendo isenções e incentivos fiscais em dado Estado Federal.
Efeitos da coisa julgada no controle abstrato de inconstitucionali-
dade de lei ou ato administrativo do Estado-membro da Federação
- Situação do contribuinte que noutro Estado da Federação pagou
ICMS destacado na nota fiscal - Princípios da aparência de legali-
dade e da boa-fé. O Estado como ente ético - Impossibilidade do
estorno.

Exórdio
Chamo à colação o que juridicamente é importante. O princí-
pio constitucional do crédito do ICMS assumido pelo adquirente
de boa-fé (estorno impossível de ICMS incentivado noutro Esta-
do). Segurança jurídica do contribuinte. Irretroatividade da lei, do
ato administrativo normativo e das sentenças e acórdãos judiciais
relativamente à pessoa do contribuinte, como corolários do prin-
cípio da segurança jurídica.
1) A tomada de crédito do ICMS pelo adquirente da mercado-
ria ou serviço. Quando, for esse o caso, é direito subjetivo de na-
tureza constitucional do sujeito passivo da obrigação tributária.
Reza a Constituição:
“Art. 155. (...)
§ 2º O imposto previsto no inciso I, ‘b’ atenderá ao seguinte:
I - será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada
Sacha Calmon operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de ser-
Navarro Coêlho viços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou ou-
é Professor Titular de tro Estado ou pelo Distrito Federal.”
Direito Tributário da
Sendo um direito subjetivo de radicação constitucional não
UFRJ (Faculdade
pode ser minimizada por lei, ato administrativo ou sentença judi-
Nacional de Direito),
cial, pois a Constituição impõe-se aos três Poderes da República.
ex-Professor Titular de
As restrições ao direito de creditamento são unicamente os
Direito Tributário e
constantes da Constituição, “verbis”:
“Art. 155. (...)
Financeiro da UFMG,
§ 2º O imposto previsto no inciso I, ‘b’ atenderá ao seguinte:
Doutor em Direito II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário
Público pela UFMG, da legislação:
Presidente Honorário a) não implicará crédito para compensação com o montante devi-
da Abradt e Presidente do nas operações ou prestações seguintes;
da ABDF. b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores.”
Nem mesmo a lei complementar pode restringir a Constituição que é, em si, neste pon-
to, bastante “self enforcing” ou autoaplicável, para lembrar Pontes de Miranda.
Com efeito, cabe à lei complementar “disciplinar” a tomada de crédito, não, porém,
impedi-la, sob pena de inconstitucionalidade.
Confira-se:
“Art. 155. (...)
§ 2º (...)
XII - cabe à lei complementar:
c) disciplinar o regime de compensação do imposto.”
2) Fixado o direito público subjetivo do contribuinte do ICMS ao creditamento do im-
posto incidente nas operações anteriores (o ter sido pago ou não, reduzido ou não, financia-
do ou não é “res inter alios”), cabe examinar a atividade ilícita de qualquer Estado-membro
da Federação em relação aos demais, na concessão ilícita de benefícios ou incentivos fiscais
envolvendo o ICMS.
Dispõe a Constituição:
“Art. 155. (...)
§ 2º (...)
XII - cabe à lei complementar:
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, in-
centivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.”
A lei complementar, à sua vez, diz que somente mediante convênio de Estados-mem-
bros isenções e outros benefícios poderão ser validamente concedidos, como é de geral sa-
bença.
Abrem-se então perante o intérprete duas realidades jurídicas, quais sejam:
a) a existência de isenções e outros incentivos válidos; e
b) a existência de isenções e benefícios inválidos.
Na primeira hipótese, a isenção implica o não creditamento do ICMS das operações
anteriores, a teor da Constituição, salvo disposição em contrário da legislação convenial
concessiva. Parece-nos que o constituinte quis tornar oneroso e desinteressante o uso extra-
fiscal do ICMS, como vimos de ver, sem êxito. Os Estados preferiram os incentivos ilegais,
tidos por legais com apoio na teoria da aparência. Os benefícios legais só traziam ônus para
suas políticas extrafiscais de atração de investimentos e não seduziam os contribuintes.
Este ponto merece explicação. É que a teor da Constituição, a isenção e demais incenti-
vos fiscais, para serem alcançados, exigiam que os outros Estados concordassem mediante
convênios. Ademais disso, a lei do incentivo, fosse isenção ou redução de base de cálculo
ou crédito presumido, tinha que dizer expressamente que o crédito das operações anteriores
estava mantido em prol do contribuinte incentivado e que o recebente sito noutro estado po-
dia aproveitar o crédito - evidentemente presumido - porque a operação anterior, reduzia ou
eliminava o ICMS devido. Ora, a fórmula jamais funcionou. Então o que fizeram os Esta-
dos? Passaram a dar incentivos unilateralmente mediante regimes especiais, por decretos e
portarias, usando a técnica do crédito presumido, de modo a anular o ICMS que deveria ter
sido pago e que constava nas notas fiscais do contribuinte incentivado, fazendo com que o
ônus do imposto constasse do preço exigido do contribuinte comprador, ubicado noutro
Estado da Federação. A guerra fiscal, dessarte, generalizou-se em todo o País.
Na segunda hipótese, seja por desconhecer a secreta norma concessiva do benefício ou
por supô-la válida - por isso o Poder Público e seus atos gozam da presunção de legitimi-
dade e de eticidade - o contribuinte/adquirente da mercadoria ou serviços tem direito subje-
tivo ao crédito. Não lhe compete vigiar e julgar a legislação ou sua ausência em todos os
Estados da Federação. Basta-lhe os dizeres da Constituição. Aliás, é exatamente por essa
razão que a Suprema Corte decidiu que os Estados não poderiam glosar ou estornar os cré-
ditos do ICMS, tidos por ilegais, unilateralmente, prejudicando os terceiros de boa-fé. De-
veriam, os Estados, pleitear a anulação da lei ou ato normativo concessivo para depois pro-
mover a anulação dos créditos indevidos (medidas concedidas pelo STF e que, além disso,
considerou de repercussão geral a matéria em exame).
3) A questão das isenções e benefícios fiscais ilícitos ocorre sempre no plano das rela-
ções interestaduais. Um Estado concede - à socapa - o benefício e o outro Estado não que-
rendo arcar com o crédito do ICMS (que teoricamente teria sido pago ao outro Estado mas
não o foi, total ou parcialmente) por ato administrativo unilateral impede ou estorna a cré-
dito do imposto constante da nota fiscal do contribuinte sob sua jurisdição (“guerra fiscal”
entre os Estados da Federação).
4) Coloca-se a questão de saber se as decisões declaratórias e, portanto, não condenató-
rias, tomadas no âmbito do controle abstrato das leis e atos normativos, entre dois Estados
federados, têm o condão de atingir, retroativamente, terceiros de boa-fé que se creditaram
do imposto no pretérito, com espeque na presunção de constitucionalidade da lei e na cren-
ça da conduta ética dos Estados-federados. Ancorado no seu direito subjetivo, de cariz cons-
titucional, de aproveitamento do imposto devido nas operações anteriores, conforme desta-
cado na nota fiscal, o contribuinte, comprovando que pagou o preço estampado na nota fis-
cal (o ICMS é por dentro), tem o direito líquido e certo de opor-se ao estorno a destempo,
após a decisão de inconstitucionalidade do Supremo Tribunal Federal, daí a razão da irre-
troatividade das decisões judiciais em casos que tais. Vejamos a razoabilidade de suas argu-
mentações.
A uma, o seu direito é de radicação constitucional e, portanto, intangível. A duas, não
praticou ato algum que contribuísse para a ilegitimidade do incentivo fiscal. A três, o ato é
de terceiro. A quatro, a “quaestio juris” não lhe diz respeito, é “res inter alios”, entre deman-
dantes qualificados (dois ou mais Estados-membros da Federação). A cinco, os efeitos das
declarações de inconstitucionalidade são despidos de caráter condenatório imputando-lhe
condutas determinadas. A seis, não se pode sofrer dano por fato de terceiro, de natureza es-
tatal. A sete, ele pagou o ICMS destacado na nota fiscal interestadual corretamente. A oito,
não praticou ilicitude. É evidente que a glosa do crédito acarretará, para os contribuintes de
boa-fé, passivos fiscais significativos a onerar o caixa das empresas de maneira injusta e inju-
rídica. Espera-se que o STF cumpra o dever de interpretar a Constituição sistematicamente,
garantindo-lhe a supremacia.
Dir-se-á que não se trata disso, mas dos efeitos da declaração de constitucionalidade em
relação aos Estados concedentes do benefício írrito e seus contribuintes beneficiados e tam-
bém em relação ao Estado reclamante e seus contribuintes, que aproveitaram o ICMS des-
tacado na nota fiscal interestadual conforme prescreve a Constituição. Assim sendo, a lei e
tais atos normativos jamais entraram no sistema jurídico e portanto não poderiam produzir
efeitos (como se dizia nos primórdios do Constitucionalismo norte-americano, com a inge-
nuidade que lhe é ínsita). Ora essa, no caso do Brasil, os incentivos são concedidos por por-
taria dos secretários da Fazenda, por meros atos administrativos.
5) A colocação da questão nos termos acima delineados está profundamente equivoca-
da. Quer no controle difuso, “inter partes”, da constitucionalidade das leis e de atos norma-
tivos do Estado Administração, quer no controle concentrado, o Supremo Tribunal pode -
desnecessário citar os dispositivos legais - modular os efeitos das declarações de inconstitu-
cionalidade de lei, artigo de lei, ou atos normativos que concedem contra a Constituição isen-
ções e benefícios fiscais relativos ao ICMS. Se não o faz, não se pode deduzir que o ICMS
aproveitado - e pago - pelo adquirente deve ser estornado. O emissor da nota fiscal é que
deve ser chamado a recolher o imposto que não pagou mas repercutiu. A novidade não é o
poder que o STF tem de modular os efeitos de suas próprias decisões, mas os limites que
lhe são impostos pela Constituição. Ele não pode substituir o constituinte originário, caso
contrário assumiria o papel de revisor permanente do texto e do contexto constitucional,
tornando-os flexíveis jurisdicionalmente ao invés de rígidos, como quis o constituinte. É por
isso que o STF, com extrema coerência, não impõe o estorno, aos contribuintes dos Estados
que se creditaram do ICMS (isento ou incentivado) oriundo dos contribuintes sitos no Esta-
do infrator. O STF apenas declara que a isenção ou o incentivo é írrito perante a Constitui-
ção. O Estado infrator não poderá mais utilizar a legislação eivada de inconstitucionalidade
e o Estado reclamante, a partir da decisão do STF, tem o direito pleno de desconsiderar os
créditos do ICMS tomados pelos seus contribuintes, da data da decisão em diante.
6) O “punctum dolens” da questão em análise diz respeito ao direito de créditos dos
contribuintes que antes da decisão da Suprema Corte, de natureza declaratória, aproveita-
ram o ICMS na conta-corrente fiscal. É que em razão dos princípios da presunção de cons-
titucionalidade das leis e atos normativos e da boa-fé, eles agiram corretamente. A inconsti-
tucionalidade é superveniente, mas esses contribuintes passam a ser agredidos pelo Estado
que reclamou perante o STF a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, a exigir-lhes
com multas e correção monetária os créditos aproveitados. Ora, em relação a esses terceiros
de boa-fé, a decisão do Supremo tem efeitos evidentemente “ex nunc”, pois a ilicitude não
lhes pode ser irrogada se não ao Estado infrator perante o Estado prejudicado. O STF deci-
de a relação interestatal de Direito Público interno, entre Estados-membros da Federação. É
disso que se trata. Vamos além. Declarada a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, o
Estado da situação do contribuinte emitente da nota fiscal não pode mais utilizar-se deles
sob pena de intervenção federal. Os seus contribuintes emitentes ficam obrigados a recolher
o ICMS que não recolheram em homenagem aos princípios da legalidade, da não cumulati-
vidade e da boa-fé, por isso que os contribuintes noutro Estado, os contribuintes recebentes,
despenderam dinheiro próprio e o entregaram aos vendedores beneficiados sitos no Estado
de origem (enriquecimento ilícito). Ato contínuo, aproveitaram os contribuintes recebentes
das mercadorias os respectivos créditos advindos do ICMS que lhes foram repercutidos. O
efeito “ex tunc”, é claro, endereça-se aos infratores e não aos terceiros de boa-fé, com a res-
salva de que após a declaração de inconstitucionalidade esses terceiros adquirentes ficam
impedidos da alegação de ignorância da lei declarada inconstitucional. O que acabo de di-
zer tem o respaldo, por todos, de Weida Zancaner: “Com efeito, atos inválidos geram con-
seqüências jurídicas, pois se não gerassem não haveria qualquer razão para nos preocupar-
mos com eles.” (Destaques nossos)
E, prossegue: “Com base em tais atos certas situações terão sido instauradas e na dinâ-
mica da realidade podem converter-se em situações merecedoras de proteção (...) de modo
que fique vedado à Administração Pública o exercício do dever de invalidar, pois fazê-lo
causaria ainda maiores agravos ao Direito, por afrontar à segurança jurídica e a boa fé.”1
7) Alguns intérpretes pedestres do ICMS alegam que existe lei complementar prevendo
dupla sanção, anulando no Estado de origem o incentivo ou isenção eivados de inconstitu-
cionalidade e predicando a efetiva cobrança do ICMS dispensado, mas impondo no Estado
do destino, ao contribuinte recebente de boa-fé, o estorno do crédito, embora este último
tenha pago o valor do ICMS destacado na nota fiscal. A Lei Complementar nº 24 dispõe:
“Art. 8º A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente:
I - a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da
mercadoria;
Il - a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda
remissão do débito correspondente.”
Ora, o art. 8º implica cobrar de quem não pagou e logo negar o crédito de quem sofreu
a repercussão onerosa do imposto (que desfalcou o seu “caixa”). A negativa do crédito é
incoerente e inconstitucional.

1
Weida Zancaner. Da Convalidação e da Invalidação dos Atos Administrativos. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993,
pp. 61/62.
É sabido que tanto as emendas à Constituição quando as leis complementares estão su-
jeitadas ao controle de constitucionalidade. No caso em exame as disposições complemen-
tares acima mencionadas na parte que sanciona o terceiro de boa fé são claramente incons-
titucionais, por vários motivos:
a) ferem o princípio da não cumulatividade;
b) desprezam o princípio da boa-fé;
c) implementam a aplicação retroativa da lei e da sentença judicial;
d) criam danos ao princípio da segurança jurídica;
e) vulneram o princípio do não confisco; e
f ) agridem o princípio da moralidade (ditos dispositivos desafiam mandado de segu-
rança ou quando nada ação anulatória precedida de cautelar).
Em situação superior postam-se os grandes princípios jurídicos que orientam o “ordo
juris” e aconselham a aplicação do direito aos casos concretos, em qualquer ramo do Direito.
Para encerrar o presente ensaio - nesses tempos de eloquentes erros retóricos - dou à
estampa o entendimento de Nery Junior:2
“Hoje em dia a boa-fé exigível do Poder Público tem alcançado foros de máxima importância.
Nos ordenamentos mais modernos a boa-fé objetiva aplicável aos poderes públicos tem magni-
tude constitucional, caracterizada como expressa garantia fundamental do cidadão (Grundrecht)[3]
como se pode comprovar pelo exame do art. 9º da Constituição Federal da Suíça, verbis: ‘Cada
pessoa tem o direito de exigir dos órgãos estatais tratamento sem arbitrariedade e segundo a boa-
fé.’[4]
Vemos no direito suíço, de forma perfeitamente delineada, a distinção entre princípio e regra,
identificada a partir da experiência trazida e demonstrada por Dworkin: a boa-fé é um princípio
constitucional positivado enquanto que o direito de exigir que os órgãos públicos se conduzam
segundo a boa-fé é uma garantia fundamental.
Como princípio constitucional, agora sim relativamente à maioria dos ordenamentos democrá-
ticos ocidentais - aqui incluído o Brasil -, o da boa-fé dos órgãos públicos é provido de supere-
ficácia, porque supernorma positivada de Direito[5].
A Constituição suíça é expressa e clara quanto à exigência de os poderes públicos portarem-se
com boa-fé e atribui direito fundamental ao cidadão e jurisdicionado de exigir que essa conduta
seja exteriorizada conforme o texto constitucional (Constituição suíça, art. 9º). No Brasil esse
preceito é, igualmente, garantia fundamental prevista na Constituição, muito embora não esteja
tão claramente expresso no texto constitucional como ocorre no direito suíço.
Referimo-nos à boa-fé como manifestação clara dos princípios do Estado Democrático de Di-
reito (CF 1º caput), da segurança jurídica (CF 1º caput; 5º caput [‘...direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade...’]; 5º XXXVI [irretroatividade]), da legalidade e da
moralidade administrativa (CF 37 caput) que, interpretados sistemática e finalisticamente, im-
plicam a conclusão de que é direito fundamental de todos exigir que os poderes públicos, por
meio de todos os órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, em suas funções típi-
cas e atípicas, ajam de conformidade com a segurança jurídica, da qual a boa-fé objetiva é ins-
trumento de atuação. Trata-se, portanto, de direito fundamental previsto na CF brasileira.”
O contribuinte brasileiro tem o direito liquido e certo de exigir que o Estado atue de boa-
fé e respeite - tão importante quanto - a sua boa-fé.
É o que nos parece.

2
Tércio Sampaio Ferraz Junior, Roque Antonio Carrazza e Nelson Nery Junior. Efeito ex Nunc e as Decisões do STJ.
Barueri: Manole, 2008.
3
Tratando a boa-fé no Direito Constitucional suíço como direito fundamental, cujo objetivo é a proteção da confian-
ça: Elisabeth Chiariello. Treu und Glauben als Grundrecht nach Art. 9 der Schweizerischen Bundesverfassung. Bern:
Stampfli, 2003, n. 3.3, pp. 110 et seq.
4
“Art. 9º Jede Person hat Anspruch darauf, von den staatlichen Organen ohne Willkür und nach Treu und Glauben
behandelt zu werden” - art. 9º da Constituição da Confederação Suíça de 18 de abril de 1999.
5
Carlos Ayres Britto. Teoria da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, n. 5.2, pp. 178 et seq.
JURISPRUDÊNCIA
Íntegras de Acórdãos
COFINS E PIS - REGIME DE TRIBUTAÇÃO - CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE
SERVIÇO A PREÇO DETERMINADO FIRMADOS ANTES DE 31.10.2003 - IN 468/2004 -
AUMENTO REFLEXO DE ALÍQUOTA - VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Recurso Especial nº 1.089.998-RJ (2008/0205608-2)

Relator: Ministro Humberto Martins


Recorrente: Megadata Computações Ltda.
Advogado: Carolina de Oliveira Loureiro
Advogada: Luisa Amaral Ferreira e Outro(s)
Recorrido: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional

Ementa
Tributário. Cofins. Regime de Contribuição. Lei n. 10.833/03. Instrução Normativa n. 468/2004.
Violação do Princípio da Legalidade.
1. Cuida-se de recurso especial interposto pelo contribuinte, questionando o poder regulamentar
da Secretaria da Receita Federal, na edição da Instrução Normativa n. 468/04, que regulamentou
o art. 10 da Lei n. 10.833/03.
2. O art. 10, inciso XI, da Lei n. 10.833/03 determina que os contratos de prestação de serviço
firmados a preço determinado antes de 31.10.2003, e com prazo superior a 1 (um) ano, perma-
necem sujeitos ao regime tributário da cumulatividade para a incidência da Cofins. (Grifo meu)
3. A Secretaria da Receita Federal, por meio da Instrução Normativa n. 468/04, ao definir o que
é “preço predeterminado”, estabeleceu que “o caráter predeterminado do preço subsiste somen-
te até a implementação da primeira alteração de preços” e, assim, acabou por conferir, de for-
ma reflexa, aumento das alíquotas do PIS (de 0,65% para 1,65%) e da Cofins (de 3% para 7,6%).
4. Somente é possível a alteração, aumento ou fixação de alíquota tributária por meio de lei, sen-
do inviável a utilização de ato infralegal para este fim, sob pena de violação do princípio da le-
galidade tributária.
5. No mesmo sentido do voto que eu proferi, o Ministério Público Federal entendeu que houve
ilegalidade na regulamentação da lei pela Secretaria da Receita Federal, pois “a simples aplica-
ção da cláusula de reajuste prevista em contrato firmado anteriormente a 31.10.2003 não con-
figura, por si só, causa de indeterminação de preço, uma vez que não muda a natureza do valor
inicialmente fixado, mas tão somente repõe, com fim na preservação do equilíbrio econômico-
financeiro entre as partes, a desvalorização da moeda frente à inflação.” (Fls. 335, grifo meu)
Mantenho o voto apresentado, no sentido de dar provimento ao recurso especial.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista
do Sr. Ministro Castro Meira, acompanhando o Sr. Ministro Humberto Martins, a Turma, por unani-
midade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.” Os Srs. Ministros
Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira (voto-vista) vota-
ram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 18 de outubro de 2011 (Data do Julgamento).
Ministro Humberto Martins
Relator

Relatório
O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto por Megadata Computações Ltda. com fundamento na[s]
alínea[s] “a” e “c” do permissivo constitucional contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região, nos termos da seguinte ementa (fls. 210/211e):
“Tributário. Cofins. Lei nº 10.833/2003. Instrução Normativa nº 468/2004 que regula o Disposto
em Lei. Possibilidade.
1. A questão posta nos autos cinge-se a esclarecer se a receita advinda do contrato firmado en-
tre a impetrante (ora apelada) e a Fenaseg, por ser anterior a 31 de outubro de 2003, estaria
alcançado pelo comando dos artigos 10 e 15 da Lei nº 10.833/2003, em razão da Instrução
Normativa nº 468/2004, aplicando-se, portanto, a sistemática da não-cumulatividade.
2. O artigo 10, inciso XI, alínea b, da Lei nº 10.833, de 2003, estabelece que as disposições acerca
da nova sistemática de não-cumulatividade, prevista nos artigos 1º a 8º, não se aplicam aos con-
tratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003, desde que com prazo superior a 01 ano,
preço predeterminado, seja de bens ou serviços.
3. A Instrução Normativa nº 468, de 08 de novembro de 2004, da Secretaria da Receita Federal,
regulou a incidência da Contribuição para o PIS/Pasep e para a Cofins, sobre as receitas rela-
tivas a contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003, definindo, entre outras pro-
vidências, o conceito de preço determinado, para efeito de aplicação da regra excepcionada pela
Lei nº 10.833/03.
4. A Instrução Normativa nº 468/2004 encontra-se em conformidade com o CTN, na medida em
que apenas explicita que, havendo majoração do preço antes pré-fixado, ficam os contribuintes
que apuram o Imposto de Renda com base no lucro real, obrigados a incluírem as receitas de-
correntes desse contrato (em que os preços ajustados deixaram de ser prefixados), e a apura-
rem a Cofins de forma não cumulativa, na forma da Lei nº 10.833/2003.
5. A IN nº 468/2004 apenas retoma o que está disposto na alínea ‘b’, do inciso XI, do artigo 10
da Lei nº 10.833/2003, ou seja, somente permanecem tributadas no regime da cumulatividade
as receitas advindas de contratos com validade superior a um ano e firmados anteriormente a
31.10.2003.
6. Apelo e remessa a que se dá provimento.”
Nas razões do recurso especial, a recorrente sustenta, além de dissídio jurisprudencial, que o acór-
dão recorrido negou vigência aos arts. 10, XI e XXVI, e 15, V, da Lei n. 10.833/2003, bem como os
arts. 97 e 110 do CTN, porquanto reconheceu a legalidade à Instrução Normativa n. 468/2004 da SRF
para alterar a sistemática de apuração cumulativa do contrato firmado anterior a 31.12.2003 para não
cumulativo, ante o advento de reajuste do contrato.
Apresentadas as contrarrazões às fls. 274/286e, sobreveio o juízo de admissibilidade positivo da
instância de origem (fls. 291/293e).
Parecer do Ministério Público Federal no sentido de dar provimento ao recurso especial, conforme
ementa que transcrevo:
“Tributário e Administrativo. Cofins e PIS. Regime de Tributação. Lei n. 10.833/03, Inciso XI,
Art. 10. Receita Advinda de Contrato Firmado anteriormente a 31/10/2003, com Predetermina-
ção de Preço. Submissão Excepcional ao Regime Cumulativo. Alteração de Conceito de Preço
Predeterminado, por Instrução Normativa da SRF. Restrição Injusta ao Benefício Fiscal Cumu-
lativo, em Face unicamente de Cláusula de Reajuste Prevista no Contrato. Limitação Ilegal do
Alcance da Norma.
- A simples aplicação da cláusula de reajuste prevista em contrato firmado anteriormente a
31.10.2003 não configura, por si só, causa de indeterminação de preço, uma vez que não muda
a natureza do valor inicialmente fixado, mas tão somente repõe, com fim na preservação do equi-
líbrio econômico-financeiro entre as partes, a desvalorização da moeda frente à inflação.
- Parecer pelo conhecimento e provimento do presente recurso.”
É, no essencial, o relatório.

Ementa
Tributário. Cofins. Regime de Contribuição. Lei n. 10.833/03. Instrução Normativa n. 468/2004.
Extrapolação do Poder Regulamentar. Aumento de Alíquota. Observância do Princípio da Lega-
lidade. Cláusula de Reajuste. Manutenção do Equilíbrio Econômico e Financeiro do Contrato.
Obrigatoriedade. Não Ocorrência de Alteração Contratual.
1. O art. 10, inciso XI, da Lei n. 10.833/03, determina que os contratos de prestação de serviço
firmados a preço determinado, antes de 31.10.2003, e com prazo superior a 1 (um) ano, perma-
necem sujeitos ao regime tributário da cumulatividade para a incidência da Cofins.
2. A Instrução Normativa n. 468/2004 da Secretaria da Receita Federal, com intuito de concei-
tuar o termo “preço determinado”, ultrapassou seu poder regulamentar porque, ao definir a cláu-
sula de reajuste como marco temporal para modificação do caráter predeterminado do preço,
acabou por conferir, de forma reflexa, aumento das alíquotas do PIS e da Cofins.
3. O entendimento jurisprudencial desta Corte Especial só admite alteração, aumento ou fixação
de alíquota tributária por meio de lei, sendo inviável a utilização de ato infralegal para este fim,
sob pena de violação do princípio da legalidade tributária.
4. A legislação federal em comento não previu alteração do regime de contribuição por aplica-
ção de cláusula de reajuste nos contratos firmados, não podendo instrumento normativo hierar-
quicamente inferior determinar a alteração do regime tributário, em observância do princípio da
legalidade.
5. “Às portarias, aos regulamentos, decretos e instruções normativas não é dado inovar a or-
dem jurídica, mas apenas conferir executoriedade às leis, nos estritos limites estabelecidos por
elas.” (REsp 872.169/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23.4.2009, DJe
13.5.2009)
6. A introdução de cláusula de reajuste nos contratos administrativos visa assegurar às partes a
manutenção do equilíbrio econômico e financeiro da avença, e deve constar tanto do instrumen-
to contratual, bem como do próprio ato convocatório do processo de licitação, conforme estabe-
lecidos nos arts. 40, XI, e 55, III, da Lei n. 8.666/93.
7. A aplicação de cláusula de reajuste não provoca alteração contratual, conforme dispõe o § 8º
do art. 65 da Lei de Licitações, pois “as modificações incidentais acaso introduzidas não ino-
vam o acordado; ao contrário, confirmam o seu sentido e conteúdo, apenas adaptando-os às
circunstâncias que envolvem a execução das respectivas prestações.” (Pereira Junior, Jessé Tor-
res. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 8ª ed. rev., atual.
e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2009)
Recurso especial provido.

Voto
O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):
Ocorrido o prequestionamento e demonstrado o dissídio jurisprudencial, conheço do recurso espe-
cial pela alínea “c”. Passo à análise do recurso especial.
Aduz a recorrente que a Secretária da Receita Federal ultrapassou seu poder regulamentar ao con-
ceituar preço predeterminado no art. 2º, § 2º, da Instrução Normativa n. 468/04, pois acabou por alte-
rar, substancialmente, o alcance do benefício concedido pelos art. 10 da Lei n. 10.833/03, prejudican-
do a recorrente.
Preliminarmente, para aclarar a exposição, os preditos dispositivos, in verbis:
“Lei n. 10.833/03
(...)
Art. 10. Permanecem sujeitas às normas da legislação da Cofins, vigentes anteriormente a esta
Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1º a 8º:
(...)
XI - as receitas relativas a contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003:
(...)
b) com prazo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços.”

“IN 468/2004
Art. 1º Permanecem tributadas no regime da cumulatividade, ainda que a pessoa jurídica esteja
sujeita à incidência não-cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social - Cofins, as receitas por ela auferidas relativas a contratos
firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003:
(...)
II - com prazo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços; e
(...)
Art. 2º Para efeito desta Instrução Normativa, preço predeterminado é aquele fixado em moeda
nacional como remuneração da totalidade do objeto do contrato.
§ 1º Considera-se também preço predeterminado aquele fixado em moeda nacional por unidade
de produto ou por período de execução.
§ 2º Se estipulada no contrato cláusula de aplicação de reajuste, periódico ou não, o caráter
predeterminado do preço subsiste somente até a implementação da primeira alteração de pre-
ços verificada após a data mencionada no art. 1º (...)”
Observa-se que o art. 2º, § 2º, da IN 468/04, ao conceituar o termo “preço determinado”, estipula
que a existência de cláusula de reajuste o descaracteriza, alterando, consequentemente, a situação da
pessoa jurídica do regime tributário da cumulatividade para o não cumulativo.
Entendo que a referida instrução normativa ultrapassou o poder regulamentar, conforme aduz a
recorrente. Isto porque, ao definir a cláusula de reajuste como marco temporal para modificação do
caráter predeterminado do preço, acabou por conferir, de forma reflexa, aumento das alíquotas do PIS
(de 0,65% para 1,65%) e da Cofins (de 3% para 7,6%).
Cumpre asseverar que o entendimento jurisprudencial desta Corte Especial só admite alteração,
aumento ou fixação de alíquota tributária por meio de lei, sendo inviável a utilização de ato infralegal
para este fim, sob pena de violação ao princípio da legalidade tributária.
Neste sentido:
“Processual Civil. Tributário. Violação ao Art. 535 do CPC. Inocorrência. Ausência de Preques-
tionamento. Súmula 211/STJ. Fusex. Natureza Tributária. Fixação da Alíquota por Portaria. Im-
possibilidade. Lançamento de Ofício. Prescrição Quinquenal.
1. É entendimento sedimentado o de não haver omissão no acórdão que, com fundamentação
suficiente, ainda que não exatamente a invocada pelas partes, decide de modo integral a con-
trovérsia posta.
2. ‘Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos de-
claratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo.’ (Súmula 211/STJ)
3. ‘O Fundo de Saúde do Ministério do Exército (Fusex) é custeado pelos próprios militares que
gozam, juntamente com seus dependentes, de assistência médico-hospitalar. A contribuição de
custeio, tendo em vista seu caráter compulsório, tem natureza jurídica tributária, sujeitando-se
ao princípio da legalidade. Precedente: REsp 789.260/PR, Ministro Francisco Falcão, Primei-
ra Turma, DJ 19.06.2006.’ (REsp 761.421/PR, 1ª Turma, Min. Luiz Fux, DJ de 01.03.2007)
4. ‘(...) por se tratar de lançamento de ofício, o prazo prescricional a ser aplicado às ações de
repetição de indébito de contribuições ao Fusex é o qüinqüenal, nos termos do art. 168, I, do
CTN.’ (REsp 1.068.895/RS, 1ª Turma, Min. Francisco Falcão, DJe de 20/10/2008)
5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 857.464/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,
Primeira Turma, julgado em 17.2.2009, DJe 2.3.2009)

“Tributário. Crédito-prêmio Presumido de IPI. Lei n. 9.363, de 1996. Aumento da Alíquota de


Cofins pela Lei n. 9.718, de 1998. Não-repercussão no Benefício. Princípio da Legalidade.
1. O crédito-prêmio presumido do IPI instituído pela Lei n. 9.363, de 1996, no percentual de
5,37%, como forma de ressarcimento do PIS e da Cofins pagos em razão de matérias-primas,
produtos intermediários e de material de embalagem, todos utilizados no processo de industria-
lização dos produtos destinados ao exterior, não foi majorado automaticamente pela Lei n. 9.718,
de 1998, que aumentou a alíquota da Cofins de 2% para 3%.
2. A homenagem ao princípio da legalidade tributária impede que, por construção jurispruden-
cial, sejam aumentadas alíquotas tributárias, quer para cobrar impostos, taxas e contribuições,
quer para deferir incentivos fiscais de qualquer origem (financeiro ou tributário).
(...)
7. Recurso especial conhecido e não-provido.” (REsp 988.329/PR, Rel. Min. José Delgado, Pri-
meira Turma, julgado em 6.3.2008, DJe 26.3.2008)
Com efeito, infere-se da leitura da legislação federal que não houve nenhuma previsão de altera-
ção do regime de contribuição por aplicação de cláusula de reajuste nos contratos firmados, não po-
dendo instrumento normativo hierarquicamente inferior determinar a alteração do regime tributário,
em observância da princípio da legalidade.
A respeito do tema, leciona Hugo de Brito Machado:
“As normas complementares são, formalmente, atos administrativos, mas materialmente são leis.
(...)
Diz-se que são complementares porque se destinam a completar o texto das leis, dos tratados e
convenções internacionais e decretos. Limitam-se a completar. Não podem inovar ou de qual-
quer forma modificar o texto da norma que complementam.
(...)
Como regras jurídicas de categoria inferior, as normas complementares evidentemente não po-
dem modificar as leis, nem os decretos e regulamentos.” (Curso de Direito Tributário, pág. 81/82)
A Primeira Turma, quando do julgamento do REsp 1.109.034/PR, relatoria do Min. Benedito Gon-
çalves (DJe 6.5.2009), reafirmou o entendimento desta Corte nesse sentido, ao asseverar que “Instru-
ções Normativas constituem espécies jurídicas de caráter secundário, cuja validade e eficácia resul-
tam, imediatamente, de sua estrita observância dos limites impostos pelas leis. De consequência, à
luz dos art. 97 e 99 do Código Tributário Nacional, Instruções Normativas não podem modificar Lei
a pretexto de estarem regulando o aproveitamento do crédito presumido do IPI.”
A ementa do julgado ficou assim assentada:
“Tributário. Recurso Especial em Mandado de Segurança. Base de Cálculo do Crédito Presu-
mido de IPI. Lei n. 9.363/1996. Aquisição de Insumos de Pessoas Físicas e/ou Cooperativas. Pos-
sibilidade. Princípio da Hierarquia Normativa. Interpretação Literal da Legislação Tributária.
Art. 111 do CTN. Jurisprudência Pacífica do STJ.
1. ‘Não consubstancia fundamento de natureza constitucional, a exigir a interposição de recur-
so extraordinário, a afirmação de que instrução normativa extrapolou os limites da lei que pre-
tendia regulamentar. Trata-se de mero juízo de legalidade, para cuja formulação é indispensá-
vel a investigação da interpretação dada pelo acórdão recorrido aos dispositivos cotejados, in-
cidindo, portanto, a orientação expressa na Súmula 636/STF, segundo a qual ‘não cabe recurso
extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua veri-
ficação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão re-
corrida.’ (REsp 509.963/BA, Rel. Ministro Luiz Fux, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Za-
vascki, Primeira Turma, julgado em 18/8/2005, DJ 3/10/2005, p. 122)
2. No caso, interpretar-se a Lei n. 9.363/96 com a exclusão das aquisições de insumos de pes-
soas físicas e/ou cooperativas da base de cálculo do crédito presumido do IPI é fazer distinção
onde a lei não a fez. Não há como, numa interpretação literal do citado art. 1º, chegar-se à con-
clusão de que os insumos adquiridos de pessoas físicas ou cooperativas não podem compor a
base de cálculo do crédito presumido do IPI. É certo que a a interpretação literal preconizada
pela lei tributária objetiva evitar interpretações ampliativas ou analógicas (v.g.: REsp 62.436/SP,
Min. Francisco Peçanha Martins), mas também não pode levar a interpretações que restrinjam
mais do que a lei quis.
3. Com efeito, Instruções Normativas constituem espécies jurídicas de caráter secundário, cuja
validade e eficácia resultam, imediatamente, de sua estrita observância dos limites impostos pelas
leis. De consequência, à luz dos art. 97 e 99 do Código Tributário Nacional, Instruções Norma-
tivas não podem modificar Lei a pretexto de estarem regulando o aproveitamento do crédito pre-
sumido do IPI.
4. O acórdão recorrido está em perfeita sintonia com a jurisprudência desta Corte Superior de
Justiça, que tem entre suas atribuições constitucionais a de uniformizar a jurisprudência infra-
constitucional.
5. Recurso especial não provido.” (REsp 1.109.034/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primei-
ra Turma, julgado em 16.4.2009, DJe 6.5.2009)
A Segunda Turma: “Às portarias, aos regulamentos, decretos e instruções normativas não é dado
inovar a ordem jurídica, mas apenas conferir executoriedade às leis, nos estritos limites estabelecidos
por elas. A sistemática criada pela referida portaria (Portaria do Ministério da Fazenda n. 238/840 [sic]),
portanto, ofende o princípio da legalidade, segundo o qual apenas a lei pode criar e modificar obri-
gações, pois ela não estava prevista em nenhum dos artigos do Decreto-lei 2.052/83, extrapolando
os contornos delineados por este.”
Referido julgado ficou assim ementado:
“Processual Civil e Tributário - PIS - Decreto-lei 2.052/83 - Portaria 238/84 - Regime de Subs-
tituição Tributária - Ofensa ao Princípio da Legalidade - Modificação Indevida de Fato Gerador,
Base de Cálculo e Sujeito Passivo da Obrigação. Precedente.
1. Às portarias, regulamentos, decretos e instruções normativas não é dado inovar a ordem ju-
rídica, mas apenas conferir executoriedade às leis, nos estritos limites estabelecidos por elas.
2. Sistemática da Portaria 238/83 [sic] do Ministério da Fazenda que extrapola os limites esta-
belecidos no art. 16 do Decreto-Lei 2.052/83. Ofensa ao princípio da legalidade.
3. Modificação indevida do fato gerador, da base de cálculo e do sujeito passivo da obrigação
tributária.
4. Recurso especial não provido.” (REsp 872.169/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Tur-
ma, julgado em 23.4.2009, DJe 13.5.2009)
Outrossim, cabe lembrar que a introdução de cláusula de reajuste é admitida para assegurar às par-
tes a manutenção do equilíbrio econômico e financeiro da avença. Deve haver uma permanente equi-
valência entre os encargos suportados pelo particular e a remuneração a ele paga pela Administração.
O normativo federal que rege as licitações e contratos firmados pela Administração Pública, Lei
n. 8.666 de 21 de junho de 1993, estabelece a observância obrigatória de determinadas regras, das quais
a cláusula de reajuste de preço deve constar não apenas do instrumento contratual, mas também do
próprio ato convocatório do processo de licitação.
Assim dispõe seu texto:
“Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da reparti-
ção interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a men-
ção de que será regida por esta Lei, o local, o dia e a hora para recebimento da documentação
e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o
seguinte:
(...)
XI - critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida
a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da pro-
posta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada par-
cela;
(...)
Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:
(...)
III - o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajusta-
mento de preços, os critérios da atualização monetária entre a data do adimplemento das obri-
gações e a do efetivo pagamento.”
A aplicação de reajuste apenas representa o repasse da correção monetária durante a vigência do
contrato, e não o estabelecimento de um novo contrato. O reajuste não provoca alteração contratual,
motivo pelo qual é registrado mediante simples apostila. É o que dispõe o § 8º do art. 65 da Lei de
Licitações:
“Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas,
nos seguintes casos:
(...)
§ 8º A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio
contrato, as atualizações, compensações ou penalizações financeiras decorrentes das condições
de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até
o limite do seu valor corrigido, não caracterizam alteração do mesmo, podendo ser registrados
por simples apostila, dispensando a celebração de aditamento.” (Grifou-se)
Neste sentido, a doutrina:
“O § 8º arrola as hipóteses que não constituem alteração ideológica do contrato, isto é, não lhe
transtornam a substância, nem lhe afetam o equilíbrio econômico-financeiro. Nelas, as modifi-
cações incidentais acaso introduzidas não inovam o acordado; ao contrário, confirmam o seu
sentido e conteúdo, apenas adaptando-os às circunstâncias que envolvem a execução das res-
pectivas prestações. Por isto a lei não considera alteração contratual tais adaptações circuns-
tanciais, autorizando que sua ocorrência possa ser registrada nos assentos administrativos por
apostila (na prática dos Tribunais de Contas, basta anotar-se a ocorrência no verso do termo
do contrato, se for este o seu instrumento, ou emitir nota de empenho suplementar).
Qualquer aditamento ao contrato seria, nessas hipóteses, despiciendo, porquanto não se trata
de convencionar-se o que não se pactuara, mas de mantido o acordado, viabilizar-lhe o cum-
primento nas circunstâncias que se seguiram a celebração. Assim, são modificações incidentais
que não alteram o contrato:
a) reajuste de preços, que farão variar o valor inicialmente estimado do contrato, desde que cal-
culados segundo os critérios previstos no próprio contrato;
b) atualizações monetárias e compensações ou penalizações financeiras, desde que nos termos
previstos nas cláusulas atinentes às condições de pagamento;
c) empenho de dotações orçamentárias suplementares, desde que observado o limite do corres-
pondente valor corrigido.” (Pereira Junior, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e con-
tratações da administração pública. 8ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2009)

“O § 8º reconheceu, corretamente, a inocorrência de alteração contratual quando aplicado o


reajuste de preços ou outras compensações financeiras por inflação. A mera atualização mone-
tária importa recuperação do valor real da moeda, deteriorado em virtude da inflação. A cor-
reção monetária mantém a identidade da moeda e não acarreta qualquer elevação dos encar-
gos da Administração” (Justen Filho, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos admi-
nistrativos. 9ª ed. São Paulo: Dialética, 2002)
Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, a fim de reconhecer da ilegalidade da altera-
ção do regime de contribuição promovido pelo art. 2º, § 2º, da IN/SRF 468/2004.
É como penso. É como voto.
Ministro Humberto Martins
Relator

Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2008/0205608-2 Processo Eletrônico REsp 1.089.998/RJ
Número Origem: 200551010035134
Pauta: 21/10/2010 Julgado: 21/10/2010

Relator
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Carlos Eduardo de Oliveira Vasconcelos

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi

Autuação
Recorrente: Megadata Computações Ltda.
Advogado: Carolina de Oliveira Loureiro
Advogada: Luisa Amaral Ferreira e Outro(s)
Recorrido: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Assunto: Direito Tributário - Contribuições - Contribuições Sociais

Sustentação Oral
Dr(a). Rafael Amaral Amador dos Santos (Mandato ex lege Procuradoria da Fazenda Nacional), pela
parte Recorrida: Fazenda Nacional.

Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“Após o voto do Sr. Ministro-Relator, dando provimento ao recurso, pediu vista dos autos, anteci-
padamente, o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques.”
Aguardam os Srs. Ministros Herman Benjamin, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira.
Brasília, 21 de outubro de 2010.
Valéria Alvim Dusi
Secretária

Ementa
Tributário e Processual Civil. Contribuição ao PIS e Cofins. Não-cumulatividade. Regra de
Transição. Art. 10, Inc. XI, Alínea “b”, da Lei n. 10.833/03. Regulamentação. Secretaria da
Receita Federal. Art. 92 da Lei n. 10.833/03. Conceito de “Preço Predeterminado”. Art. 2º, § 2º,
da IN/SRF n. 468/04. Escolha de Critério Válido e Razoável. Ilegalidade. Inexistência. Revoga-
ção. Ausência de Prequestionamento. Súmula n. 211 do STJ.
1. A Lei n. 10.833/03 prescreve que permanecem sujeitas às normas tributárias vigentes anterior-
mente (cumulatividade) as receitas relativas a contratos firmados antes de 31.10.2003, com pra-
zo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço predeter-
minado, de bens ou serviços.
2. Os atos regulamentares infralegais não podem contrariar o disposto em norma de hierarquia
superior, sob pena se incidirem em vício de ilegalidade. Com efeito, “as Instruções Normativas,
editadas por Órgão competente da Administração Tributária, constituem espécies jurídicas de
carácter secundário, cuja validade e eficácia resultam, imediatamente, de sua estrita observân-
cia dos limites impostos pelas leis, tratados, convenções internacionais, ou decretos presiden-
ciais, de que devem constituir normas complementares” (ADI 531 AgR, Re. Min. Celso de Mello,
Tribunal Pleno, julgado em 11.12.1991, DJ 03-04-1992, pp-04288, Ement. Vol-01656-01,
pp-00095, RTJ Vol-00139-01, pp-00067).
3. A regulamentação da Lei n. 10.833/03 pela Instrução Normativa SRF n. 468/04 não incorreu
em ilegalidade, porque os limites da norma legal foram respeitados, não havendo improprieda-
de alguma na atividade promovida pela Secretaria da Receita Federal, que apenas definiu o al-
cance da expressão “preço predeterminado”.
4. O art. 92 da Lei n. 10.833/03 conferiu à Secretaria da Receita Federal a competência para edi-
tar as normas necessárias à aplicação da referida lei. Dessa forma, não existindo no campo do
Direito Administrativo disposição que estabeleça expressamente o sentido da referida expressão,
definiu-se “preço predeterminado”, para fins tributários, como sendo apenas “aquele fixado em
moeda nacional como remuneração da totalidade do objeto do contrato” ou “aquele fixado em
moeda nacional por unidade de produto ou por período de execução” (art. 2º, caput e § 1º, da
IN/SRF n. 468/04). Em seguida, o regulamento especificou que o caráter predeterminado do preço
subsistiria somente até a implementação da primeira alteração de preços verificada após a vigência
da lei nova (art. 2º, § 2º, da IN/SRF n. 468/04).
5. A partir da publicação da MP n. 135/03 (31.10.2003), os preços reajustados não são mais pre-
determinados em relação ao regime da não-cumulatividade instituído pela referida MP, mas, sim,
pós-determinados, de molde a não se subsumirem mais à regra do art. 10, inc. XI, “b”, da Lei n.
10.833/03, restrita, repita-se, aos casos de preços predeterminados.
6. Ao definir o preço determinado como sendo apenas aquele fixado inicialmente (anterior ao rea-
juste), afastando essa característica com a superveniência de sua alteração, a Administração Fa-
zendária, autorizada expressamente por lei, elegeu um critério razoável e válido para conferir os
contornos necessários à aplicação da regra nova, sem ofender qualquer outra disposição norma-
tiva.
7. Configura-se irrecusável a aplicação, ao caso, do sentido consagrado no art. 111, inc. II, do
CTN, que prescreve a interpretação literal da legislação tributária em hipóteses semelhantes.
8. A Lei de Licitações dispõe de mecanismos suficientes para proteger a equação econômico-fi-
nanceira do contrato, afastando qualquer prejuízo às partes contratantes diante de modificação
superveniente na esfera tributária que tenha repercussão no contrato (arts. 65, inc. II, “d”, e § 5º,
da Lei n. 8.666/93).
9. Desta forma, o art. 2º, § 2º, da IN/SRF n. 468/04 atendeu ao disposto nos arts. 97, inc. II, 99 e
100, inc. I, do CTN, na medida em que a regulamentação a cargo da Secretaria da Receita Fede-
ral não teve o condão de extrapolar os limites legais estabelecidos, tampouco ensejou majoração
de tributo.
10. Quanto à tese de que a IN/SRF n. 468/2004 teria sido revogada pela IN/SRF n. 658/06, não
se depreende do acórdão recorrido o necessário prequestionamento da referida tese jurídica, dei-
xando de atender, no ponto, ao comando constitucional que exige a presença de causa decidida
como requisito para a interposição do apelo nobre (art. 105, inc. III, da CR/88). Incidência, pois,
da Súmula n. 211 desta Corte.
11. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.

Voto-vista
O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques: Dando prosseguimento ao julgamento, passo a
fazer uma breve síntese da controvérsia debatida nos autos.
A Lei n. 10.833/03, decorrente da conversão da MP n. 135/03, instituiu o regime da não-cumulati-
vidade para a Cofins, produzindo efeitos a partir de 1º.2.2004. Em seu art. 15, essa disciplina foi es-
tendida à contribuição ao PIS.
O cerne da controvérsia consiste em definir se a regulamentação do art. 10, inc. XI, alínea “b”, da
Lei n. 10.833/03, operada pelo art. 2º, § 2º, da Instrução Normativa SRF n. 468/04, extrapolou os li-
mites legalmente traçados para a cobrança da contribuição relativa ao PIS e à Cofins.
A referida lei prescreve que permanecem sujeitas às normas tributárias vigentes anteriormente (cu-
mulatividade) as receitas relativas a contratos firmados antes de 31.10.2003, com prazo superior a 1
(um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço predeterminado, de bens ou ser-
viços.
A IN/SRF n. 468/04, por sua vez, dispõe que, estipulada no contrato cláusula de aplicação de rea-
juste, periódico ou não, o caráter predeterminado do preço subsiste somente até a implementação da
primeira alteração de preços verificada após 31.10.2003, data em que a legislação nova passou a vi-
ger. A partir daí - alteração posterior a 31.10.2003 -, o novo regime da não-cumulatividade passa a ser
de observância obrigatória.
Esta a redação dos dispositivos em discussão:
Lei n. 10.833/03.
Art. 10. Permanecem sujeitas às normas da legislação da Cofins, vigentes anteriormente a esta
Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1º a 8º:
(...)
XI - as receitas relativas a contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003:
a) com prazo superior a 1 (um) ano, de administradoras de planos de consórcios de bens móveis
e imóveis, regularmente autorizadas a funcionar pelo Banco Central;
b) com prazo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços;
c) de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço predeterminado, de bens ou servi-
ços contratados com pessoa jurídica de direito público, empresa pública, sociedade de economia
mista ou suas subsidiárias, bem como os contratos posteriormente firmados decorrentes de pro-
postas apresentadas, em processo licitatório, até aquela data;

Instrução Normativa SRF n. 468/04.


Dispõe sobre a Contribuição para o PIS/Pasep e a Cofins incidentes sobre as receitas relativas a
contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003.
Art. 1º Permanecem tributadas no regime da cumulatividade, ainda que a pessoa jurídica esteja
sujeita à incidência não-cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social - Cofins, as receitas por ela auferidas relativas a contratos
firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003:
(...)
Art. 2º Para efeito desta Instrução Normativa, preço predeterminado é aquele fixado em moeda
nacional como remuneração da totalidade do objeto do contrato.
§ 1º Considera-se também preço predeterminado aquele fixado em moeda nacional por unidade
de produto ou por período de execução.
§ 2º Se estipulada no contrato cláusula de aplicação de reajuste, periódico ou não, o caráter
predeterminado do preço subsiste somente até a implementação da primeira alteração de pre-
ços verificada após a data mencionada no art. 1º.
§ 3º Se o contrato estiver sujeito a regra de ajuste para manutenção do equilíbrio econômico-fi-
nanceiro, nos termos dos arts. 57, 58 e 65 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, o caráter pre-
determinado do preço subsiste até a eventual implementação da primeira alteração nela fundada
após a data mencionada no art. 1º. (Grifei)
A parte recorrente assevera que “não poderia a Secretaria da Receita Federal alterar a Lei, pois
não tem competência constitucional para criar ou majorar tributos, não cabendo, igualmente, a de-
fesa da citada Instrução Normativa sob o argumento de que apenas veio interpretar o termo descrito
na lei, porque, na verdade, está ampliando o conceito do que seja ‘preço pré-determinado’” (e-STJ
fl. 234). Alegou, ainda, que a IN/SRF n. 468/2004 teria sido revogada pela IN/SRF n. 658/06.
Sua Excelência, o e. Min. Humberto Martins, votou pelo provimento do recurso especial da con-
tribuinte, entendendo que seria ilegal a alteração do regime de contribuição ao PIS e da Cofins, pro-
movido pelo art. 2º, § 2º, da IN/SRF n. 468/2004.
Considerou que, ao definir-se a cláusula de reajuste do contrato como marco temporal para a mo-
dificação do caráter predeterminado do preço, acabou-se por conferir, de forma reflexa, aumento das
alíquotas relativas ao PIS e Cofins, em detrimento do princípio da legalidade tributária.
Ponderou, ainda, que a introdução de cláusula de reajuste nos contratos administrativos visa asse-
gurar às partes a manutenção do equilíbrio econômico e financeiro da avença, e deve constar tanto do
instrumento contratual, bem como do próprio ato convocatório do processo de licitação, conforme
estabelecidos nos arts. 40, XI, e 55, III, da Lei n. 8.666/93.
Não obstante a costumeira excelência dos argumentos dos argumentos [sic] trazidos à baila pelo e.
Relator, ouso discordar da tese apresentada.
Como é cediço, os atos regulamentares infralegais não podem contrariar o disposto em norma de
hierarquia superior, sob pena se incidirem em vício de ilegalidade.
Com efeito, “as Instruções Normativas, editadas por Órgão competente da Administração Tribu-
tária, constituem espécies jurídicas de carácter secundário, cuja validade e eficácia resultam, imedia-
tamente, de sua estrita observância dos limites impostos pelas leis, tratados, convenções internacio-
nais, ou decretos presidenciais, de que devem constituir normas complementares” (ADI 531 AgR, Re.
Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 11.12.1991, DJ 03-04-1992, pp-04288, Ement. Vol-
01656-01, pp-00095, RTJ Vol-00139-01, pp-00067).
Na hipótese vertente, penso não ter ocorrido a referida ilegalidade. Isso porque os limites da nor-
ma legal foram respeitados, não havendo impropriedade alguma na regulamentação promovida pela
Secretaria da Receita Federal, que apenas definiu o alcance da expressão “preço predeterminado”.
O art. 92 da Lei n. 10.833/03 conferiu à Secretaria da Receita Federal a competência para editar as
normas necessárias à aplicação da referida lei. Dessa forma, não existindo no campo do Direito Ad-
ministrativo disposição que estabeleça expressamente o sentido da referida expressão, definiu-se “preço
predeterminado”, para fins tributários, como sendo apenas “aquele fixado em moeda nacional como
remuneração da totalidade do objeto do contrato” ou “aquele fixado em moeda nacional por unida-
de de produto ou por período de execução” (art. 2º, caput e § 1º, da IN/SRF n. 468/04). Em seguida,
o regulamento especificou que o caráter predeterminado do preço subsistiria somente até a implemen-
tação da primeira alteração de preços verificada após a vigência da lei nova (art. 2º, § 2º, da IN/SRF n.
468/04).
Dessarte, entendo que atribuir ao termo “preço predeterminado” o sentido de preço fixado antes
do primeiro reajuste ocorrido na vigência da lei nova não provoca qualquer incompatibilidade entre o
texto legal e o respectivo regulamento. A contrario sensu, também é possível compreender como sen-
do pós-determinado o preço fixado após a edição da legislação pertinente à não-cumulatividade.
A partir da publicação da MP n. 135/03 (em 31.10.2003), os preços reajustados não são mais pre-
determinados em relação ao regime da não-cumulatividade instituído pela referida MP, mas, sim, pós-
determinados, de molde a não se subsumirem mais à regra do art. 10, inc. XI, “b”, da Lei n. 10.833/
03, restrita, repita-se, aos casos de preços predeterminados.
Trata-se, pois, de conceito jurídico indeterminado cujo sentido reclama regulamentação que lhe
confira concretude. Por tal razão, a IN/SRF n. 468/04 é norma nitidamente complementar da lei tribu-
tária, respeitando o conteúdo e alcance da norma de superior hierarquia (Lei n. 10.833/03), nos ter-
mos dos arts. 99 e 100 do CTN.
Ao definir o preço determinado como sendo apenas aquele fixado inicialmente (anterior ao reajus-
te), afastando essa característica com a superveniência de sua alteração, a Administração Fazendária,
autorizada expressamente por lei, elegeu um critério razoável e válido para conferir os contornos ne-
cessários à aplicação da regra nova, sem ofender qualquer outra disposição normativa.
Cumpre destacar que a incidência da norma tributária poderia ter se dado imediatamente, respeita-
da a anterioridade nonagesimal, para determinar a aplicação da sistemática da não-cumulatividade aos
fatos geradores futuros (art. 105 do CTN).
No entanto, o legislador optou por postergar essa mudança de regime apenas em determinados ca-
sos. Daí porque é possível considerar que o art. 10 da Lei n. 10.833/03 estabeleceu benesse parecida
com uma isenção (mas que, a rigor, não é), ao afastar, de modo excepcional e por certo período, a in-
cidência da alíquota nova e mais gravosa. Compreendido isso, configura-se irrecusável a aplicação, ao
caso, do sentido consagrado no art. 111, inc. II, do CTN, que prescreve a interpretação literal da le-
gislação tributária em hipóteses semelhantes.
Não discordo do fato de que as cláusulas de reajuste apenas se destinam a manter o equilíbrio eco-
nômico-financeiro do contrato, sem maiores alterações, conforme sustentado pelo Relator. Todavia,
aqui não está se tratando da existência ou não de alteração contratual como pressuposto para a aplica-
ção da nova sistemática, mas apenas da adequação do conceito de “preço predeterminado” proposto
na IN/SRF, já que a Lei n. 8.666/93 não estabeleceu essa definição.
Além disso, a Lei de Licitações dispõe de mecanismos suficientes para proteger a referida equa-
ção, afastando qualquer prejuízo às partes contratantes diante de modificação superveniente na esfera
tributária que tenha repercussão no contrato.
Com efeito, o art. 65, § 5º, da Lei n. 8.666/03 [sic] impõe a revisão dos preços contratados quando
quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a superveniência de dis-
posições legais, ocorridas após a data da apresentação da proposta, tiverem comprovada repercussão
no contrato. Vejamos:
§ 5º Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a superve-
niência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da proposta, de com-
provada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para me-
nos, conforme o caso.
Dessa forma, repercutindo no contrato a alteração da legislação tributária, é imperiosa a sua revi-
são para mais ou para menos, conforme o caso.
Nesse sentido, ainda, dispõe o art. 65, inc. II, “d” da Lei n. 8.666/93:
Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas,
nos seguintes casos:
(...)
II - por acordo das partes:
(...)
d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contra-
tado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimen-
to, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipó-
tese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, re-
tardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso for-
tuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual. (Reda-
ção dada pela Lei nº 8.883, de 1994) (Grifo nosso)
Dessarte, trata-se daquela situação estudada na doutrina a título de fato do príncipe, cuja lição, por
pertinente, transcrevo:
A maior parte da doutrina francesa reputa que o fato do príncipe se verifica quando a execução
do contrato é onerada por medida proveniente da autoridade pública contratante, mas que exer-
cita esse poder em um campo de competência estranho ao contrato. O exemplo típico consiste
na elevação da carga tributária incidente sobre a execução da prestação devida pelo particular.
(Justen Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14ª ed. São
Paulo: Dialética, 2010, p. 781) (Grifo nosso)
Não há, portanto, prejuízo ao contratado/contribuinte, que pode se valer de outros meios para miti-
gar os efeitos da elevação da carga tributária, sem que, com isso, seja necessário conferir sentido am-
plo ao termo “conceito predeterminado”.
Em suma, com base na MP n. 135/03 e na Lei n. 10.833/03, a IN/SRF n. 468/04 preservou a sub-
missão ao regime antigo (cumulatividade) quanto ao faturamento decorrente de contratos fundados em
preços predeterminados. Por conseguinte, autorizou a aplicação do regime novo (não-cumulativida-
de) quando o faturamento passar a provir de contratos cujos preços já tenham, na vigência da nova
sistemática, sido alterados.
Desta forma, entendo que o art. 2º, § 2º, da IN/SRF n. 468/04 atendeu ao disposto nos arts. 97, inc.
II, 99 e 100, inc. I, do CTN, na medida em que a regulamentação a cargo da Secretaria da Receita
Federal não teve o condão de extrapolar os limites legais estabelecidos, tampouco ensejou majoração
de tributo.
Por fim, quanto à tese de que a IN/SRF n. 468/2004 teria sido revogada pela IN/SRF n. 658/06,
não se depreende do acórdão recorrido o necessário prequestionamento da referida tese jurídica, dei-
xando de atender, no ponto, ao comando constitucional que exige a presença de causa decidida como
requisito para a interposição do apelo nobre (art. 105, inc. III, da CR/88). Incidência, pois, da Súmula
n. 211 desta Corte.
Com essas considerações, peço vênia ao e. Relator e voto por conhecer, em parte, do recurso espe-
cial, para, na parte conhecida, negar-lhe provimento.

Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2008/0205608-2 Processo Eletrônico REsp 1.089.998/RJ
Número Origem: 200551010035134
Pauta: 01/03/2011 Julgado: 01/03/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Luciano Mariz Maia

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi

Autuação
Recorrente: Megadata Computações Ltda.
Advogado: Carolina de Oliveira Loureiro
Advogada: Luisa Amaral Ferreira e Outro(s)
Recorrido: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Assunto: Direito Tributário - Contribuições - Contribuições Sociais

Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Mauro Campbell Marques, di-
vergindo do Sr. Ministro-Relator, conhecendo em parte do recurso e, nessa parte, negando-lhe provi-
mento, pediu vista regimental dos autos o Sr. Ministro Humberto Martins.”
Aguardam os Srs. Ministros Herman Benjamin, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira.

Ementa do Voto-vista Regimental


Tributário. Cofins. Regime de Contribuição. Lei n. 10.833/03. Instrução Normativa n. 468/2004.
Violação do Princípio da Legalidade.
1. Cuida-se de recurso especial interposto pelo contribuinte, questionando o poder regulamentar
da Secretaria da Receita Federal, na edição da Instrução Normativa n. 468/04, que regulamentou
o art. 10 da Lei n. 10.833/03.
2. O art. 10, inciso XI, da Lei n. 10.833/03 determina que os contratos de prestação de serviço
firmados a preço determinado antes de 31.10.2003, e com prazo superior a 1 (um) ano, perma-
necem sujeitos ao regime tributário da cumulatividade para a incidência da Cofins. (Grifo meu)
3. A Secretaria da Receita Federal, por meio da Instrução Normativa n. 468/04, ao definir o que
é “preço predeterminado”, estabeleceu que “o caráter predeterminado do preço subsiste somente
até a implementação da primeira alteração de preços” e, assim, acabou por conferir, de forma
reflexa, aumento das alíquotas do PIS (de 0,65% para 1,65%) e da Cofins (de 3% para 7,6%).
4. Somente é possível a alteração, aumento ou fixação de alíquota tributária por meio de lei, sen-
do inviável a utilização de ato infralegal para este fim, sob pena de violação do princípio da le-
galidade tributária.
5. No mesmo sentido do voto que eu proferi, o Ministério Público Federal entendeu que houve
ilegalidade na regulamentação da lei pela Secretaria da Receita Federal, pois “a simples aplica-
ção da cláusula de reajuste prevista em contrato firmado anteriormente a 31.10.2003 não con-
figura, por si só, causa de indeterminação de preço, uma vez que não muda a natureza do valor
inicialmente fixado, mas tão somente repõe, com fim na preservação do equilíbrio econômi-
co-financeiro entre as partes, a desvalorização da moeda frente à inflação.” (Fls. 335, grifo
meu)
Mantenho o voto apresentado, no sentido de dar provimento ao recurso especial.

Voto-vista Regimental
O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto pelo contribuinte, questionando o poder regulamentar da
Secretaria da Receita Federal, na edição da Instrução Normativa n. 468/04, que regulamentou o art.
10 da Lei n. 10.833/03.
Para melhor ilustração do caso, transcrevo os citados dispositivos legais:
“Lei n. 10.833/03
Art. 10. Permanecem sujeitas às normas da legislação da Cofins, vigentes anteriormente a esta
Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1º a 8º: (...)
XI - as receitas relativas a contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003: (...)
b) com prazo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços;

IN 468/2004
Art. 1º Permanecem tributadas no regime da cumulatividade, ainda que a pessoa jurídica esteja
sujeita à incidência não-cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social - Cofins, as receitas por ela auferidas relativas a contratos
firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003: (...)
II - com prazo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços; e
(...)
Art. 2º Para efeito desta Instrução Normativa, preço predeterminado é aquele fixado em moeda
nacional como remuneração da totalidade do objeto do contrato.
§ 1º Considera-se também preço predeterminado aquele fixado em moeda nacional por unidade
de produto ou por período de execução.
§ 2º Se estipulada no contrato cláusula de aplicação de reajuste, periódico ou não, o caráter
predeterminado do preço subsiste somente até a implementação da primeira alteração de pre-
ços verificada após a data mencionada no art. 1º (...).”
O Ministro Mauro Campbell Marques, em judicioso voto-vista, entendeu que a Instrução Norma-
tiva n. 468/04 não é ilegal, pois a Secretaria da Receita Federal, “ao definir o preço determinado como
sendo apenas aquele fixado inicialmente (anterior ao reajuste), afastando essa característica com a
superveniência de sua alteração, a Administração Fazendária, autorizada expressamente por lei, ele-
geu um critério razoável e válido para conferir os contornos necessários à aplicação da regra nova,
sem ofender qualquer outra disposição normativa”.
Manifestei meu voto no sentido de que a Instrução Normativa n. 468/2004 da Secretaria da Recei-
ta Federal ultrapassou seu poder regulamentar porque, ao definir a cláusula de reajuste como marco
temporal para modificação do caráter predeterminado do preço, acabou por conferir, de forma refle-
xa, aumento das alíquotas do PIS e da Cofins.
E, como é sabido, só se admite alteração, aumento ou fixação de alíquota tributária por meio de lei,
sendo inviável a utilização de ato infralegal para este fim, sob pena de violação do princípio da legali-
dade tributária.
No mesmo sentido do voto que eu proferi, o Ministério Público Federal entendeu que houve ilega-
lidade na regulamentação da lei pela Secretaria da Receita Federal, pois “a simples aplicação da cláu-
sula de reajuste prevista em contrato firmado anteriormente a 31.10.2003 não configura, por si só,
causa de indeterminação de preço, uma vez que não muda a natureza do valor inicialmente fixado,
mas tão somente repõe, com fim na preservação do equilíbrio econômico-financeiro entre as par-
tes, a desvalorização da moeda frente à inflação” (fls. 335, grifo meu).
Com efeito, a Secretaria da Receita Federal, ao definir o que é “preço predeterminado”, determi-
nou que “o caráter predeterminado do preço subsiste somente até a implementação da primeira al-
teração de preços”, e acabou por conferir, de forma reflexa, aumento das alíquotas do PIS (de 0,65%
para 1,65%) e da Cofins (de 3% para 7,6%).
Em outro giro verbal, o preço fixado em contrato não se altera em razão do reajuste dos índices de
correção monetária, que apenas preservam o valor original. Por esse motivo, o marco inicial para se
considerar os benefícios da Lei 10.833/03 é o do contrato firmado e não o do reajuste do contrato, fei-
to tão somente para manter o valor contratado.
Portanto, a regulamentação feita pela Secretaria da Receita Federal extrapola os limites legais ao
fixar que o benefício da lei tributária se encerra no primeiro reajuste do contrato, pois acaba, como dito,
aumentando as alíquotas do PIS e da Cofins por via reflexa.
Nesse sentido, citei, em meu voto, precedente de ambas as Turmas de Direito Público.
Vale reiterar que a Primeira Turma, quando do julgamento do REsp 1.109.034/PR, relatoria do Min.
Benedito Gonçalves (DJe 6.5.2009), reafirmou o entendimento desta Corte nesse sentido, ao asseve-
rar que as “Instruções Normativas constituem espécies jurídicas de caráter secundário, cuja valida-
de e eficácia resultam, imediatamente, de sua estrita observância dos limites impostos pelas leis. De
consequência, à luz dos arts. 97 e 99 do Código Tributário Nacional, Instruções Normativas não po-
dem modificar Lei a pretexto de estarem regulando o aproveitamento do crédito presumido do IPI.”
A Segunda Turma dispôs: “Às portarias, aos regulamentos, decretos e instruções normativas não
é dado inovar a ordem jurídica, mas apenas conferir executoriedade às leis, nos estritos limites esta-
belecidos por elas. A sistemática criada pela referida portaria (Portaria do Ministério da Fazenda n.
238/840 [sic]), portanto, ofende o princípio da legalidade, segundo o qual apenas a lei pode criar e
modificar obrigações, pois ela não estava prevista em nenhum dos artigos do Decreto-lei 2.052/83,
extrapolando os contornos delineados por este.” (REsp 872.169/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Se-
gunda Turma, julgado em 23.4.2009, DJe 13.5.2009)
Assim, não obstante os relevantes fundamentos do voto-vista divergente, apresentado pelo eminente
Ministro Mauro Campbell Marques, mantenho o meu posicionamento inicial, para dar provimento ao
recurso especial.
É como penso. É como voto.
Ministro Humberto Martins
Relator
Retificação de Voto
O Senhor Ministro Mauro Campbell Marques:
Realinho o meu entendimento, aderindo, neste julgamento, aos argumentos do Sr. Ministro Rela-
tor, para dar provimento ao recurso especial do contribuinte.
Por conseguinte, torno sem efeito o voto-vista anteriormente proferido.

Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2008/0205608-2 Processo Eletrônico REsp 1.089.998/RJ
Número Origem: 200551010035134
Pauta: 20/09/2011 Julgado: 20/09/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Eugênio José Guilherme de Aragão

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi

Autuação
Recorrente: Megadata Computações Ltda.
Advogado: Carolina de Oliveira Loureiro
Advogada: Luisa Amaral Ferreira e Outro(s)
Recorrido: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Assunto: Direito Tributário - Contribuições - Contribuições Sociais

Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista regimental do Sr. Ministro Humberto Martins,
dando provimento ao recurso e da retificação de voto do Sr. Ministro Mauro Campbell Marques, acom-
panhando o Sr. Ministro-Relator, pediu vista dos autos, antecipadamente, o Sr. Ministro Castro Mei-
ra.”
Aguardam os Srs. Ministros Herman Benjamin e Cesar Asfor Rocha.

Voto-vista
O Senhor Ministro Castro Meira: Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido
pelo egr. TRF da 2ª Região que reformou a sentença que concedera a segurança com o objetivo de obstar
a aplicação dos §§ 2º e 3º da IN nº 468/04-SRF, expedida para a aplicação do art. 10, XI, “b”, da Lei
10.833/03, em relação a contrato de processamento de dados.
Após o voto do Relator, Min. Humberto Martins, e do Min. Mauro Campbell Marques pelo provi-
mento do recurso, pedi vista para analisar a espécie.
Examino o teor do dispositivo supracitado:
Art. 10 - Permanecem sujeitas às normas da legislação da Cofins, vigentes anteriormente a esta
Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1º e 8º:
(...)
XI - as receitas relativas a contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003:
(...)
b) com prazo superior a 1 (um) ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços (e-STJ fl. 131).
Por seu turno, assim orienta a IN, nas disposições ora referidas:
Art. 2º
Para efeito desta Instrução Normativa, preço predeterminado é aquele fixado em moeda nacio-
nal como remuneração da totalidade do objeto do contrato.
(...)
§ 2º Se estipulada no contrato cláusula de aplicação de reajuste, periódico ou não, o caráter pre-
determinado do preço subsiste somente até a implementação da primeira alteração de preços
verificada após a data mencionada no art. 1º.
§ 3º Se o contrato estiver sujeito a regra de ajuste para manutenção do equilíbrio econômico-fi-
nanceiro, nos termos dos arts. 57, 58 e 65 da Lei nº 8.666, de 231 de junho de 1993, o caráter
predeterminado do preço subsiste até a eventual implementação da primeira alteração nela fun-
dada após a data mencionada no art. 1º. (e-STJ fl. 131)
Para o acórdão recorrido, haveria incidência da interpretação consagrada na IN 468/2004, eis que
se cuida de norma complementar tributária, expedida nos termos do art. 100 do Código Tributário
Nacional. Em consequência, como o contrato celebrado pela recorrente com a Fenaseg tem duração
superior a um ano, seria inarredável a incidência do § 2º do art. 2º, da norma complementar em foco.
Desse modo, havendo cláusula de reajuste, o caráter prefixado do preço permaneceria apenas a ocor-
rência da primeira alteração por tratar-se de contrato com prazo superior a um ano, firmado antes de
31.10.2003.
Discute-se a subsistência da restrição normativa em face do que dispõe ao disposto no art. 10 da
Lei 10.833/2003, que manteve para os contratos celebrados antes de sua vigência a sistemática de apu-
ração da Cofins do sistema anterior (Lei nº 10.637/02, preservando-os das alterações ocorridas após a
sua celebração, em observância, entre outras, ao princípio da não surpresa.
Concluo que há grande descompasso entre a previsão legal e a norma complementar que culmina
por causar gravames inesperado[s] à recorrente, considerando que, após o primeiro reajuste, deveria
passar a observar a sistemática da lei então vigente. Em uma palavra, a indigitada Instrução Normati-
va restringe a garantia assegurada pelo dispositivo legal, assim também vulnerando o art. 99 do CTN,
por interpretação extensiva.
Em abono ao meu convencimento, trago a seguinte passagem do judicioso pronunciamento do
Subprocurador-Geral da República Dr. Fernando H. O. de Macedo:
Com efeito, parece-nos que a tese defendida pela Parte ora Recorrente é que mais se coaduna com
os princípios da irretroatividade da lei tributária, da segurança jurídica e da inalterabilidade dos
atos jurídicos perfeitos, estampados nos arts. 150, inciso III e 5º, XXXVI, da Constituição Fede-
ral ora vigente, motivo esse pelo qual optamos por encampar a idéia ali expressa, e nos firmar-
mos no entendimento de que a Instrução Normativa SFR nº 468 de 2004 pode ter vindo, de fato,
a restringir o alcance dado pela regra de exceção prevista na da Lei nº 10.833, já que a regra ali
exposta excluiu da incidência daquela norma excepcional, receitas elencadas pela própria Lei, e
isto mediante o entendimento de desconfiguração do caráter de predeterminação do preço, em
face de mera aplicação de cláusula de reajuste prevista no contrato.
Ora, a lei tributária deve ser anterior ao conjunto de fatos que constituem o pressuposto da inci-
dência de seus efeitos (ainda que de tais fatos decorram atos de trato sucessivo no tempo), para
que se possa, a partir daí, estabelecer os encargos decorrentes da intervenção do Estado na esfe-
ra econômica do Particular, sob pena, de resto, de ofensa às exigências da segurança jurídica e
ao inafastável direito subjetivo ao conhecimento prévio das regras fiscais aplicáveis. Daí porque
se entender que as receitas relativas a contratos de fornecimentos de bens ou serviços, a preço
determinado, com prazo superior a 1 ano, firmado anteriormente a 31 de outubro de 2003, não
devem se sujeitar às alterações promovidas pela nova sistemática de cálculo e apuração das con-
tribuições ao PIS e Cofins, pois que celebrados levando-se em consideração o sistema normati-
vo à época aplicável e os respectivos impactos na operacionalização do negócio, de forma que,
não se contemplando hipótese de efetiva alteração do preço e das condições pactuadas no con-
trato ou de qualquer forma de recomposição de custos (ressaltando que a correção monetária do
preço ajustado nada mais é do que mera preservação do valor real da moeda frente aos efeitos do
desgaste inflacionário ao longo do tempo, nada alterando quanto ao caráter predeterminado do
preço originariamente idealizado pelas partes), não há que se cogitar da repercussão econômica
da majoração da alíquota associada à implantação da não-acumulatividade do novo regime de
tributação, e tudo, de resto, tanto por força do disposto na alínea “b” do inciso XI do art. 10 da
Lei nº 10.833/2003, como da inafastável obediência ao princípio da irretroatividade da lei tribu-
tária. (e-STJ fl. 337)
Com essas considerações, também sigo o bem elaborado voto apresentado pelo ilustre Relator
para dar provimento ao recurso especial.
É o voto.
Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2008/0205608-2 Processo Eletrônico REsp 1.089.998/RJ
Número Origem: 200551010035134
Pauta: 18/10/2011 Julgado: 18/10/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. Maria Caetana Cintra Santos

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi

Autuação
Recorrente: Megadata Computações Ltda.
Advogado: Carolina de Oliveira Loureiro
Advogada: Luisa Amaral Ferreira e Outro(s)
Recorrido: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Assunto: Direito Tributário - Contribuições - Contribuições Sociais

Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Castro Meira, acompanhando
o Sr. Ministro Humberto Martins, a Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos
do voto do Sr. Ministro-Relator.”
Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha e Castro Mei-
ra (voto-vista) votaram com o Sr. Ministro Relator.

NOTA DA DIALÉTICA
A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 30.11.2011.

ICMS - GUERRA FISCAL - CANCELAMENTO DE NOTIFICAÇÕES FISCAIS E


DEVOLUÇÃO DOS VALORES - AUSÊNCIA DE CONVÊNIO - INADMISSIBILIDADE

Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.345 - Santa Catarina

Relator: Min. Cezar Peluso


Reqte(s).: Governador do Estado de Santa Catarina
Adv(a/s).: PGE-SC - Walter Zigelli
Intdo(a/s).: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina

Ementa: Inconstitucionalidade. Ação direta. Lei nº 11.393/2000, do Estado de Santa Catarina.


Tributo. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS. Benefícios fiscais. Can-
celamento de notificações fiscais e devolução dos correspondentes valores recolhidos ao erário.
Concessão. Inexistência de suporte em convênio celebrado no âmbito do Confaz, nos termos da
LC 24/75. Expressão da chamada “guerra fiscal”. Inadmissibilidade. Ofensa aos arts. 150, §
6º, 152 e 155, § 2º, inc. XII, letra “g”, da CF. Ação julgada procedente. Precedentes. Não pode
o Estado-membro conceder isenção, incentivo ou benefício fiscal, relativos ao imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, de modo unilateral, mediante decreto ou outro
ato normativo, sem prévia celebração de convênio intergovernamental no âmbito do Confaz.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em
Sessão Plenária, sob a Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso, na conformidade da ata de jul-
gamento e das notas taquigráficas, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, em julgar proce-
dente a ação direta. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Dias Toffoli
e, licenciado, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa.
Brasília, 30 de junho de 2011.
Ministro Cezar Peluso
Presidente e Relator

Relatório
O Senhor Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com
pedido de liminar, proposta pelo Governador do Estado de Santa Catarina, contra a Lei Estadual nº
11.393, de 03 de maio de 2000, que possui a seguinte redação:
“Art. 1º Ficam canceladas as notificações fiscais emitidas com base na Declaração de Informa-
ções Econômico-Fiscais Dief, ano base 1998.
Art. 2º O Poder Executivo fica obrigado a restituir, no prazo de trinta dias, os valores eventual-
mente recolhidos aos cofres públicos, decorrentes das notificações fiscais ora canceladas.
Art. 3º O disposto nesta Lei aplica-se igualmente às notificações fiscais emitidas pela falta de en-
trega da Dief.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.”
Os dispositivos destinam-se, portanto, ao “cancelamento de notificações fiscais emitidas com base
na declaração de informações econômico-fiscais - Dief, ano-base 1998.” (fls. 03) O Requerente ale-
ga que “a benevolência do legislador estadual, com a generosa renúncia de receita, contudo, revela-
se contrária ao ordenamento jurídico, ofendendo a Constituição Federal quanto ao disposto nos ar-
tigos 1º, 2º, 61, parágrafo 1º, inciso II, alínea ‘b’, e 155, parágrafo 2º, inciso XII, alínea ‘g’” (fls. 04),
todos da Constituição Federal, uma vez que institui benefícios fiscais sem autorização do Confaz (fls.
12). Afirma, nesse sentido, que a concessão de incentivos tributários (bem como isenções e benefícios)
em matéria de ICMS deve, por imperativo constitucional, ser precedida da celebração de convênio entre
todos os Estados e o Distrito Federal.
Aduz, ainda, vício de iniciativa da Lei impugnada, “por ser ela originária de projeto de lei de ini-
ciativa parlamentar” (fls. 12), já que, “em matéria tributária, a competência para a iniciativa de pro-
jetos de lei é privativa do Chefe do Poder Executivo, consoante entendimento consolidado na juris-
prudência do Supremo Tribunal Federal” (fls. 11).
Pede, diante disso, “seja julgado o mérito da presente ação, declarando-se inconstitucional a Lei
impugnada” (fls. 14).
2. A Corte deferiu a medida liminar, em decisão unânime, nos termos do voto do Min. Relator,
Sydney Sanches, suspendendo a eficácia da Lei catarinense nº 11.393/2000 (fls. 136-155).
3. A Advocacia-Geral da União, após opinar pela inexistência de vício de iniciativa, já que o art.
61, § 1º, II, “b”, se refere exclusivamente à competência do Chefe do Poder Executivo Federal para
dispor sobre matéria tributária no âmbito dos “territórios federais”, posicionou-se, às fls. 159-163,
pela procedência do pedido, em razão da ofensa ao art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição.
4. A Procuradoria-Geral da República, no mesmo sentido, opinou pela procedência da ação, em
parecer de fls. 165-170.
É o relatório.

Voto
O Senhor Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. O caso é de nítida procedência da ação, não pelo
argumento da inconstitucionalidade formal (vício de iniciativa), mas pelo argumento da inconstitucio-
nalidade material.
Explico-me.
2. Não há vício de inconstitucionalidade formal, no caso, pois a Lei nº 11.393, de 03 de maio de
2000, do Estado de Santa Catarina, e ora impugnada, trata de matéria tributária (benefício fiscal), a
qual, segundo consolidada jurisprudência desta Corte, é de iniciativa comum concorrente, não haven-
do falar em iniciativa parlamentar reservada ao Chefe do Poder Executivo. Nesse sentido, os seguin-
tes precedentes: ADI 3.809, Rel. Min. Eros Grau, DJe 14/09/2007; ADI 2.464, Rel. Min. Ellen Gra-
cie, DJe 25/05/2007; ADI 3.205, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 17/11/2006; ADI 2.659, Rel. Min.
Nelson Jobim, DJ 06/02/2004.
Passo, então, à analise da alegação do vício de inconstitucionalidade material.
3. A Lei impugnada prevê a concessão, unilateral e ilegítima, de incentivo fiscal de ICMS. O can-
celamento de notificações fiscais e, inequivocamente, benefício tributário, como anota o parecer do
Procurador-Geral da República: “avulta a ilegalidade constitucional que está a macular a Lei nº
11.393, de 03 de maio de 2000, do Estado de Santa Catarina. Analisando-se o teor do diploma esta-
dual impugnado pode-se inferir que, em patente descompasso com o estatuído na Constituição da
República, ele versa sobre concessão de benefício fiscal” (fls. 87).
O benefício, porém, não tem respaldo em Convênio do Confaz, e, por isso, afronta o disposto nos
artigos 150, § 6º e 155, § 2º, inc. XII, “g”, todos da Constituição Federal, donde lhe vem a patente
inconstitucionalidade. É o que, aliás, tem decidido o Plenário, por votação unânime, em casos seme-
lhantes:
“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Tributário. ICMS. Benefício Fiscal. Redução da Carga
Tributária Condicionada à Origem da Industrialização da Mercadoria. Saídas Internas com Café
Torrado ou Moído. Decreto de [sic] 35.528/2004 do Estado do Rio de Janeiro. Violação do Art.
152 da Constituição. O Decreto 35.528/2004, do estado do Rio de Janeiro, ao estabelecer um
regime diferenciado de tributação para as operações das quais resultem a saída interna de café
torrado ou moído, em função da procedência ou do destino de tal operação, viola o art. 152 da
Constituição. Ação Direta de Inconstitucionalidade conhecida e julgada procedente.” (ADI nº
3.389, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 03.03.2006)

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Art. 2º da Lei Estadual nº 10.324, de 22.12.1994 do Es-


tado do Rio Grande do Sul. ICMS. Isenção. Serviço de Transporte Intermunicipal de Passagei-
ros Efetuado mediante Concessão ou Permissão do Estado do Rio Grande do Sul. Alegada Ofensa
ao Art. 155, § 2º, XII, g, da CF. 1 - A concessão unilateral, por Estado-membro ou pelo Distrito
Federal, de isenções, incentivos e benefícios fiscais relativos ao ICMS, sem a prévia celebração
de convênio intergovernamental, nos termos do que dispõe a LC 24/75, afronta o art. 155, § 2º,
XII, g, da Constituição Federal. Precedentes. 2 - Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedi-
do se julga procedente.” (ADI nº 1.308-RS, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 04.06.2004)

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei nº 6.004, de 14 de Abril de 1998, do Estado de Ala-


goas. Concessão de Benefícios Fiscais Relativos ao ICMS para o Setor Sucroalcooleiro. Alega-
da Violação ao Art. 155, § 2º, XII, g, da Constituição Federal. Ato normativo que, instituindo
benefícios de ICMS sem a prévia e necessária edição de convênio entre os Estados e o Distrito
Federal, como expressamente revelado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária - Confaz,
contraria o disposto no mencionado dispositivo constitucional. Ação julgada procedente.” (ADI
nº 2.458-AL, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 16.05.2003)
No mesmo sentido: ADI nº 2.548-PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 15.06.2007; ADI nº 2.439-MS,
Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 21.02.2003; ADI nº 1.179-SP, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de
19.12.2002; ADI nº 260-SC, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 20.09.2002; ADI nº 286-RO, Rel. Min.
Maurício Corrêa, DJ de 30.08.2002; ADI nº 2.352, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 09.03.2001;
ADI nº 1.587-DF, Rel Min. Octavio Gallotti, DJ de 07.12.2000; ADI-MC nº 1.522-RJ, Rel. Min. Syd-
ney Sanches, DJ de 27.06.1997; ADI-MC nº 1.247-PA, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 08.09.1995;
dentre outras.
4. A situação dos presentes autos é exatamente a mesma dos inúmeros casos que consolidam a ju-
risprudência desta Corte, como bem anota a AGU, “a lei impugnada determinou o cancelamento de
notificações fiscais emitidas com base na Declaração de Informações Econômico-Fiscais - Dief, ano
base 1998, concedendo, desse modo, verdadeiro benefício fiscal, conforme, inclusive, assinalou o
Secretário da Fazenda Estadual, às fls. 34, verbis: ‘(...) o cancelamento de notificações nada mais é
que remissão de créditos tributários, constituídos de ofício, sem observância das cautelas previstas
no Código Tributário Nacional e na Lei Complementar nº 24/75.’ Essa Suprema Corte, ao julgar a
ADIn 2.458/AL, entendeu que a concessão de benefícios fiscais sem a existência da respectiva delibe-
ração entre os Estados e o Distrito Federal, junto ao Confaz, é inconstitucional.” (fls. 162)
Assim, a Lei nº 11.393, de 03 de maio de 2000, do Estado de Santa Catarina, ora em análise, ao
criar benefício fiscal sem cumprir a exigência expressa na Lei Complementar nº 24/75 e no próprio
art. 155, § 2º, inc. XII, “g”, quanto à necessidade de celebração de convênio Confaz, não escapa à ta-
cha de inconstitucionalidade.
5. Ante o exposto, julgo procedente o pedido da ação direta para declarar a inconstitucionalidade
da Lei nº 11.393, de 03 de maio de 2000, do Estado de Santa Catarina.
Extrato de Ata
Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.345
Proced.: Santa Catarina
Relator: Min. Cezar Peluso
Reqte(s).: Governador do Estado de Santa Catarina
Adv(a/s).: PGE-SC - Walter Zigelli
Intdo(a/s).: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina

Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, Ministro Cezar Peluso
(Presidente), julgou procedente a ação direta. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Cel-
so de Mello e Dias Toffoli e, licenciado, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Plenário, 30.06.2011.
Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso. Presentes à sessão os Senhores Ministros Marco
Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Ayres Britto, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Vice-Procuradora-Geral da República, Dra. Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira.
p/ Luiz Tomimatsu
Secretário

NOTA DA DIALÉTICA
A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 5.8.2011, p. 74, e antecipada na
RDDT 195:222.

ISS - BASE DE CÁLCULO - CONSTRUÇÃO CIVIL - ABATIMENTO DE MATERIAIS E


SUBEMPREITADAS - POSSIBILIDADE - ENTENDIMENTO DO STF

AgRg no AgRg no Agravo de Instrumento nº 1.410.608-RS (2011/0101992-7)

Relator: Ministro Benedito Gonçalves


Agravante: Município de Bento Gonçalves
Procurador: Thaís Pellicioli Brun e Outro(s)
Agravado: Construtora Poletto Ltda.
Advogado: Roberta Adami Otton e Outro(s)

Ementa
Processual Civil e Tributário. Agravo Regimental no Agravo Regimental no Agravo de Instru-
mento. Mandado de Segurança. ISS. Construção Civil. Base de Cálculo. Abatimento dos Mate-
riais Empregados e das Subempreitadas. Possibilidade. Entendimento do Supremo Tribunal Fe-
deral.
1. O STF, por ocasião do julgamento do RE 603.497/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 16/9/2010,
reconheceu a repercussão geral sobre o tema, consoante regra do art. 543-B, do CPC, e firmou
entendimento no sentido da possibilidade da dedução da base de cálculo do ISS dos materiais
empregados na construção civil.
2. No mesmo sentido, o eminente Ministro Carlos Ayres Britto, no Agravo Regimental no RE
599.582/RJ, DJ de 29/6/2011, assentou: “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme
no sentido de que o art. 9º do Decreto-lei 406/1968 foi recepcionado pela Constituição Federal
de 1988. Pelo que é possível a dedução da base de cálculo do ISS dos valores dos materiais uti-
lizados em construção civil e das subempreitadas.”
3. Este Tribunal já emitiu pronunciamento, respaldado na linha de pensar adotada pela Corte Su-
prema, confira-se: REsp 976.486/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 10/8/2011 e AgRg
no AgRg no REsp 1.228.175/MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de 1/9/2011.
4. Agravo regimental não provido.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo re-
gimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima e Na-
poleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki.
Licenciado o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Brasília (DF), 18 de outubro de 2011 (Data do Julgamento).
Ministro Benedito Gonçalves
Relator

Relatório
O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Cuida-se de agravo regimental interposto pelo
Município de Bento Gonçalves contra decisão que recebeu a seguinte ementa:
Processual Civil e Tributário. Agravo Regimental no Recurso Especial. Juízo de Retratação. Man-
dado de Segurança. ISS. Construção Civil. Base de Cálculo. Abatimento dos Materiais e Subem-
preitadas. Possibilidade. Entendimento do STF. Reconsideração da Decisão Agravada para dar
Provimento ao Recurso Especial.
O agravante defende a impossibilidade de dedução das parcelas dos materiais fornecidos pelo pres-
tador de serviços e do valor das subempreitadas na base de cálculo do ISS.
Por fim, requer a reconsideração da decisão agravada ou então que seja o feito submetido a julga-
mento no colegiado da Primeira Turma.
É o relatório.

Voto
O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): O agravo regimental não merece prosperar.
Com efeito, a jurisprudência de ambas as Turmas que compõem a Primeira Seção do STJ era firme
no sentido do não cabimento da dedução dos materiais empregados na prestação do serviço de cons-
trução civil na base de cálculo do ISS, consoante interpretação dada aos artigos 9º, § 2º, do Decreto
Lei 406/68 e 7º, § 2º, da Lei Complementar 116/2003.
A propósito:
Tributário. Agravo Regimental no Recurso Especial. Construção Civil. ISS. Base de Cálculo. De-
dução dos Valores Referentes aos Materiais Empregados e às Subempreitadas. Impossibilidade.
Agravo não Provido.
1. “A jurisprudência do STJ pacificou o entendimento de que, em se tratando de empresas do ramo
de construção civil, a base de cálculo do ISS é o custo integral do serviço, não sendo admitida a
dedução do montante relativo às subempreitadas e aos materiais utilizados na obra” (AgRg no
Ag 1.257.286/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 8/6/10).
2. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1.209.472/SC, Rel. Ministro Arnaldo Este-
ves Lima, Primeira Turma, DJe 23/02/2011)

Tributário. Imposto sobre Serviços - ISS. Base de Cálculo. Serviço de Concretagem. Dedução
do Valor dos Materiais. Impossibilidade.
1. Não é cabível a dedução, da base de cálculo do ISS, do valor dos materiais empregados na pres-
tação do serviço de concretagem da construção civil. Precedentes das duas Turmas de Direto
Público.
2. Recurso especial provido. (REsp 1.051.383/SP, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, jul-
gado em 24.6.2008, DJe 12.8.2008)

Tributário e Processual Civil. Apontada Violação a Dispositivo Constitucional. Impossibilida-


de de Análise. ISS. Serviço de Concretagem. Dedução do Valor dos Materiais da Base de Cál-
culo.
Impossibilidade. Agravo Regimental a que se nega Provimento. (AgRg no Ag 909.011/SC, Rel.
Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 1º.4.2008, DJe 23.4.2008)

Tributário. ISS. Serviços de Concretagem. Dedução da Base de Cálculo do Valor Relativo a Ma-
teriais. Impossibilidade. Súmula nº 167/STJ e Incidência de ICMS. Deficiência de Fundamen-
tação. Súmula nº 284 do STF.
I - Não houve qualquer pronunciamento na decisão agravada acerca do enunciado sumular nº 167
desta Corte, bem como sobre a incidência de ICMS sobre a operação discutida, razão pela qual
a impugnação da agravante quanto a tais matérias revela-se deficiência de fundamentação, atrain-
do a aplicação, por analogia, do óbice sumular nº 284/STF.
II - O v. acórdão recorrido encontra-se em consonância com o entendimento esposado no âmbi-
to desta Corte acerca do assunto, no sentido de que as empresas do ramo da construção civil são
contribuintes do ISS, não sendo admitido subtrair da base de cálculo do tributo o montante refe-
rente aos materiais utilizados.
Precedentes: REsp nº 828.879/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 31/08/2006; REsp nº
779.515/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 03/08/2006 e REsp nº 577.356/MG, Relatora
Ministra Denise Arruda, DJ de 30/05/2004.
III - Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 921.804/MG, Rel. Min. Francisco Falcão,
Primeira Turma, julgado em 17.5.2007, DJ 31.5.2007, p. 408)

Tributário. Imposto sobre Serviço. Serviço de Concretagem. Dedução do Valor dos Materiais da
Base de Cálculo. Impossibilidade.
1. Não é cabível a dedução, da base de cálculo do ISS, do valor dos materiais empregados na pres-
tação do serviço de concretagem da construção civil. REsp 622.385/MG, 2ª T., Min. Eliana Cal-
mon, DJ de 28.06.2006; AgRg no REsp 621.484/SP, 1ª T., Min. Denise Arruda, DJ de 14.11.2005;
AgRg no REsp 661.163/SP, 1ª T., Min. Francisco Falcão, DJ de 19.12.2005 e REsp 603.761/PR,
1ª T., Min. José Delgado, DJ de 05.04.2004.
2. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 828.879/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavas-
cki, Primeira Turma, julgado em 17.8.2006, DJ 31.8.2006, p. 255, REPDJ 16.10.2006, p. 312)

Tributário. Agravo Regimental no Recurso Especial. Serviço de Concretagem. Construção Ci-


vil. ISS. Base de Cálculo. Súmula 167/STJ.
Bitributação. Reexame de Provas. Súmula 07/STJ.
I - ‘O fornecimento de concreto, por empreitada, para construção civil, preparado no trajeto até
a obra em betoneiras acopladas a caminhões, é prestação de serviço, sujeitando-se apenas à inci-
dência do ISS’ (Súmula 167/STJ).
II - Consoante jurisprudência desta Corte, não se admite subtrair da base de cálculo do tributo o
montante referente às subempreitadas e aos materiais utilizados.
III - No que se refere à questão da bitributação, a análise do recurso especial enseja o reexame
do substrato fático contido nos autos, uma vez que o Tribunal a quo decidiu que não havia com-
provação nos autos de que os valores subtraídos sofreram incidência de outro imposto. Incidên-
cia à hipótese da Súmula 07/STJ.
IV - Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 661.163/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão,
Primeira Turma, julgado em 8.11.2005, DJ 19.12.2005, p. 223)
No entanto, o STF, por ocasião do julgamento do RE 603.497/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de
16/9/2010, reconheceu a repercussão geral sobre o tema, consoante regra do art. 543-B, do CPC, e fir-
mou entendimento no sentido da possibilidade da dedução da base de cálculo do ISS dos materiais
empregados na construção civil.
Por sua vez, a decisão agravada, ao exercer juízo de retratação, adotou a linha de pensar expressa
pelo Supremo Tribunal Federal, pelo que deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos, confira-
se:
Considerando-se o entendimento firmado pelo STF, exerço juízo de retratação (art. 259 do RISTJ),
para reconsiderar a decisão agravada e dar provimento ao recurso especial (art. 544, § 3º, c/c 557,
§ 1º-A, do CPC).
Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, no RE 603.497/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de
16/9/2010, decidiu que o valor dos materiais de construção adquiridos de terceiros não integra a
base de cálculo do ISS.
A propósito:
1. A hipótese dos autos versa sobre a constitucionalidade da incidência do ISS sobre materiais
empregados na construção civil. O acórdão assim decidiu:
“Tributário - ISS - Construção Civil - Base de Cálculo - Material Empregado - Dedução - Im-
possibilidade. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a base de cálculo
do ISS é o preço total do serviço, de maneira que, na hipótese de construção civil, não pode
haver a subtração do material empregado para efeito de definição da base de cálculo. Prece-
dentes de Corte. Agravo regimental improvido.”
2. Este Tribunal, no julgamento do RE 603.497, de minha relatoria, reconheceu a existência da
repercussão geral da matéria para que os efeitos do art. 543-B do CPC possam ser aplicados.
Esta Corte firmou o entendimento no sentido da possibilidade da dedução da base de cálculo do
ISS dos materiais empregados na construção civil.
Cito os seguintes julgados: RE 262.598, red. para o acórdão Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe
27.09.2007; RE 362.666-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 27.03.2008; RE
239.360-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJe 31.07.2008; RE 438.166-AgR, Rel. Min.
Carlos Britto, 1ª Turma, DJ 28.04.2006; AI 619.095-AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª
Turma, DJ 17.08.2007; RE 214.414-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 29.11.2002;
AI 675.163, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 06.09.2007; RE 575.684, Rel. Min. Cezar
Peluso, DJe 15.09.2009; AI 720.338, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 25.02.2009; RE 602.618,
Rel. Min. Celso de Mello, DJe 15.09.2009.
O acórdão recorrido divergiu desse entendimento.
3. Ante o exposto, com fundamento no art. 557, § 1º-A, do CPC, dou provimento ao recurso ex-
traordinário. Restabeleço os ônus fixados na sentença. Julgo prejudicado o pedido de ingresso
como amicus curiae formulado pela Confederação Nacional dos Municípios - CNM (Petição STF
42.520/2010 - fls. 524-541), bem como o recurso interposto pela Associação Brasileira das Se-
cretarias de Finanças das Capitais Brasileiras - Abrasf (fls. 505-521), em face da presente deci-
são. (RE 603.497/MG, Relatora Ministra Ellen Gracie, DJe-172 de 16.09.2010)
De igual modo, o eminente Ministro Carlos Ayres Britto, por ocasião do julgamento do Agravo
Regimental em Recurso Extraordinário n. 599.582/RJ, DJ de 29/6/2011, assentou:
Ementa: Agravo Regimental em Recurso Extraordinário. ISS. Construção Civil. Base de Cálcu-
lo. Abatimento dos Materiais e Subempreitadas. Possibilidade. 1. A jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal é firme no sentido de que o art. 9º do Decreto-lei 406/1968 foi recepcionado
pela Constituição Federal de 1988. Pelo que é possível a dedução da base de cálculo do ISS dos
valores dos materiais utilizados em construção civil e das subempreitadas. 2. Agravo regimental
desprovido.
Por sua vez, o eminente Ministro Teori Albino Zavascki externou posição, fundado na jurisprudência
citada da Corte Suprema, quando da análise do REsp 976.486/RS, DJ de 10/8/2011, confira-se:
Tributário. ISS. Prestação de Serviços de Construção Civil. Dedução do Valor dos Materiais Em-
pregados na Realização da Atividade da Base de Cálculo do Imposto. Cabimento.
1. Segundo jurisprudência pacificada no STF, os materiais empregados no desenvolvimento da
atividade de prestação de serviço de construção civil podem ser deduzidos da base de cálculo do
ISS.
2. Recurso improvido.
No mesmo sentido, o pronunciamento da Segunda Turma deste Tribunal:
Tributário. ISSQN. Construção Civil. Base de Cálculo. Dedução de Valores Referentes aos Ma-
teriais Empregados. Possibilidade. Precedentes da Suprema Corte.
1. O Supremo Tribunal Federal, no RE 603.497/MG interposto contra acórdão desta Corte, re-
conheceu a repercussão geral da questão posta a julgamento, nos temos do art. 543-B do CPC, e
exarou decisão publicada em 16.9.2010, reformando o acórdão recorrido, com o seguinte teor:
“Esta Corte firmou o entendimento no sentido da possibilidade da dedução da base de cálculo
do ISS dos materiais empregados na construção civil. Precedentes.”
2. A base de cálculo do ISS restou analisada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento aci-
ma, portanto, revejo o entendimento anterior, a fim de realinhar-me à orientação fixada pela Corte
Suprema para reconhecer a possibilidade de dedução da base de cálculo do ISS dos materiais
empregados na construção civil.
3. Como o agravante não trouxe argumento capaz de infirmar a decisão que deseja ver modifica-
da, esta deve ser mantida por seus próprios fundamentos.
Agravo regimental improvido. (AgRg no AgRg no REsp 1.228.175/MG, Rel. Min. Humberto
Martins, DJ de 1/9/2011)
Nesse contexto, a adoção do entendimento esposado pelo STF, conforme linha de pensar expressa,
é medida que se impõe a casos análogos.
Ante o exposto, com fundamento no artigo 259 do RISTJ, reconsidero a decisão agravada para dar
provimento ao recurso especial (art. 544, § 3º c/c 557, § 1º-A, do CPC).
Sem honorários, conforme Súmula 105/STJ. Invertidos os ônus relativos às custas.
Por tais fundamentos, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.

Certidão de Julgamento
Primeira Turma
Número Registro: 2011/0101992-7 AgRg no AgRg no Ag 1.410.608/RS
Números Origem: 10800053906 70033475666 70035545920 70036736940 70039060496
Em Mesa Julgado: 18/10/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Fonseca da Silva

Secretária
Bela. Márcia Araujo Ribeiro (em substituição)

Autuação
Agravante: Construtora Poletto Ltda.
Advogado: Roberta Adami Otton e Outro(s)
Agravado: Município de Bento Gonçalves
Advogado: Thaís Pellicioli Brun e Outro(s)
Assunto: Direito Tributário - Impostos - ISS/Imposto sobre Serviços

Agravo Regimental
Agravante: Município de Bento Gonçalves
Procurador: Thaís Pellicioli Brun e Outro(s)
Agravado: Construtora Poletto Ltda.
Advogado: Roberta Adami Otton e Outro(s)

Certidão
Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Minis-
tro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki.
Licenciado o Sr. Ministro Francisco Falcão.

NOTAS DA DIALÉTICA
1) A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 21.10.2011, e antecipada na RDDT
196:230.
2) Vide textos de Doutrina de Fernando Osorio de Almeida Junior e Luciano Gomes Filippo (RDDT
152:147) e de Ricardo Almeida Ribeiro da Silva (RDDT 110:80), Íntegra de Acórdão do STF - 2ª
Turma (RDDT 91:156), Decisões dos Ministros Carlos Velloso, do STF (RDDT 82:197), Joaquim
Barbosa, do STF (RDDT 138:194) e Eliana Calmon, do STJ (RDDT 138:195), e Acórdãos do STF -
2ª Turma (RDDT 89:237, 90:235 e 188:228) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 144:229, 159:235 e 163:233).

ISS - PLANO DE SAÚDE - BASE DE CÁLCULO - DESCONTOS -


REPASSES A OUTROS PRESTADORES DE SERVIÇO
Recurso Especial nº 1.237.312-SP (2011/0019397-6)
Relator: Ministro Herman Benjamin
Recorrente: Saúde ABC Planos de Saúde Ltda.
Advogados: Pedro Luciano Marrey Junior e Outro(s)
Flávio Mifano e Outro(s)
Marcos Joaquim Gonçalves Alves e Outro(s)
Recorrido: Município de São Paulo
Advogado: Danilo de Arruda Guazeli Paiva e Outro(s)
Ementa
Processual Civil e Tributário. ISS. Plano de Saúde. Incidência. Base de Cálculo. Descontos.
1. Discute-se a validade da cobrança do ISS sobre planos de saúde e sua base de cálculo.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art.
535 do CPC.
3. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem consignou expressamente que “os Planos de Saúde
foram incluídos na Lista de Serviços tributáveis pelo ISSQN, assim permanecendo na lista ane-
xa à Lei Complementar nº 116/03, o que tornou possível aos municípios exercitar sua compe-
tência tributária e exigir o imposto nos termos do art. 156, III da CF” (fls. 297-298 - grifei).
4. No caso em análise não existe, a rigor, discussão quanto à legislação federal, que prevê a exa-
ção nos itens 4.22 e 4.23 da Lista Anexa à LC 116/2003 (isso jamais é negado pela contribuin-
te). A pretensão principal da recorrente, na presente demanda, implica infirmar a análise feita pelo
TJ no tocante ao conceito de serviço fixado pelo art. 156, III, da CF e declarar inconstitucionais
os dispositivos da lei complementar federal, o que é inviável em Recurso Especial.
5. Ainda que impossível acolher integralmente o pedido principal da contribuinte (não incidên-
cia do ISS sobre planos de saúde), é preciso reconhecer parcialmente o seu pleito, no que se re-
fere à base de cálculo da exação.
6. A Segunda Turma ratificou jurisprudência de que a base de cálculo do ISS sobre planos de saú-
de é o preço pago pelos consumidores, diminuído dos repasses feitos pela contribuinte aos de-
mais prestadores de serviços de saúde (hospitais, clínicas, laboratórios, médicos etc.). Com res-
salva de meu entendimento, passo a acompanhar esses precedentes.
7. A empresa pretende afastar totalmente a tributação, pelo argumento de que a base de cálculo
reconhecida pelo TJ-SP (preço pago pelo consumidor, sem abatimento) é incorreta. O pedido deve
ser parcialmente provido, pois, embora devida a cobrança, o cálculo deve ser feito sobre base
menor.
8. Não se trata de decisão extra petita, como aventado pelo Município, mas de deferimento, em
parte, do pedido.
9. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido.

Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista
regimental do Sr. Ministro Herman Benjamin, a Turma, por unanimidade, conheceu em parte do re-
curso e, nessa parte, deu-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.” Os Srs.
Ministros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Humberto Martins votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 20 de outubro de 2011 (data do julgamento).
Ministro Herman Benjamin
Relator

Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2011/0019397-6 Processo Eletrônico REsp 1.237.312/SP
Números Origem: 128004 1280053040210092 12802004 20041280 200900363190 5270345
5270345103 5270345600 5270345801 53040210092
Pauta: 15/09/2011 Julgado: 15/09/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. José Flaubert Machado Araújo

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi

Autuação
Recorrente: Saúde ABC Planos de Saúde Ltda.
Advogados: Pedro Luciano Marrey Junior e Outro(s)
Flávio Mifano e Outro(s)
Marcos Joaquim Gonçalves Alves e Outro(s)
Recorrido: Município de São Paulo
Advogado: Danilo de Arruda Guazeli Paiva e Outro(s)
Assunto: Direito Tributário - Impostos - ISS/Imposto sobre Serviços

Sustentação Oral
Dr(a). Ariane Costa Guimarães, pela parte Recorrente: Saúde ABC Planos de Saúde Ltda.
Pronunciamento Oral do Subprocurador-geral da República, Dr. José Flaubert Machado Araújo

Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“Após a sustentação oral, pediu vista regimental dos autos o Sr. Ministro-Relator.”
Aguardam os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Hum-
berto Martins.

Relatório
O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Trata-se de Recurso Especial interposto, com
fundamento no art. 105, III, “a”, da Constituição da República, contra acórdão assim ementado:
Ação declaratória de inexistência de relação jurídica - ISSQN - Planos de Saúde - Preliminares
de inépcia da petição inicial e cerceamento de defesa afastadas - Operadora de planos de saúde -
Atividade que não se confunde com seguro-saúde, ausentes os requisitos do Decreto-lei nº 73/66 -
Caracterizada a prestação de serviço constante na Lista de Serviços anexa ò Lei Complementar
116/03 - Imposto devido - Sentença reformada - Recurso provido (fl. 293).
Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fl. 314).
A recorrente alega violação dos arts. 535, I e II, do Código de Processo Civil; 1º e 7º da Lei Com-
plementar 116/2003. Afirma:
a) “O r. Acórdão ao dispor que a base de cálculo aplicável ao caso seria a ‘totalidade do preço mensal
pago pelos associados’, omitiu-se quanto ao disposto no artigo 7º da LC nº 116/2003, que estabelece
que a base de cálculo do ISS é o preço do serviço, ou seja, nunca pode incidir sobre as mensalidades
pagas pelos associados” (fl. 345);
b) “sendo o ISS imposto que incide sobre a efetiva prestação de serviços (obrigação de fazer), fazê-
lo incidir sobre pagamentos mensais (prêmios), que se destinam a garantir uma futura e incerta cober-
tura de despesas médicas/hospitalares, como quis o v. Acórdão recorrido, é sem dúvida alguma negar
aplicação ao quanto disposto no artigo 1ª, da LC nº 116/2003, que determina que o fato gerador do
ISS é, tão somente, a efetiva ‘prestação de serviço’” (fl. 347);
c) “na operação de planos de saúde não há qualquer prestação de serviços, mas apenas uma garan-
tia de colocar à disposição dos associados eventuais serviços médicos, o que não guarda relação com
o fato gerador descrito na legislação de regência” (fl. 348).
Requer, ao final, seja reconhecida “a não incidência do ISS nas operações de plano de saúde, por
não haver qualquer prestação de serviços que se amolde ao fato gerador previsto no artigo 1º da Lei
Complementar 116/2003, sendo as mensalidades pagas pelos associados, critério quantitativo totalmen-
te estranho no artigo 7º da Lei 116/2003” (fl. 351).
Contra-razões apresentadas às fls. 376-391.
Anulei a decisão monocrática, determinando a inclusão do processo em pauta, em vista da relevância
da matéria e do recente debate na Segunda Turma.
É o relatório.

Voto
O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Discute-se a validade da cobrança do ISS so-
bre planos de saúde e sua base de cálculo.
O Tribunal de origem aferiu que a contribuinte efetivamente presta serviço de plano de saúde (e não
simples seguro-saúde). Ademais, ratificou a base de cálculo adotada pelo Fisco, qual seja, os valores
pagos pelos consumidores. Transcrevo trecho do acórdão recorrido (fls. 296-297):
De sorte que a empresa encontra-se adstrita à legislação que regulamenta a atividade de plano de
saúde, e nesta condição, atua a autora como intermediária, disponibilizando seus serviços aos
usuários que, na hipótese, caracterizam-se como obrigação de fazer, aptos a ensejar a incidência
do ISSQN.
Assim, observam-se duas relações distintas: uma é a do consumidor com a empresa, que se obri-
ga a prestar os serviços contratados, outra é a da empresa com o médico ou entidade hospitalar,
que receberá um valor determinado pelo serviço prestado.
Cada qual tem a tributação prevista na norma, não podendo misturar as relações jurídicas para
daí tirar conclusão que implique em escape ã [sic] tributação.
(...)
De forma que a obrigação de fazer é imanente à atividade desenvolvida pela empresa de planos
de saúde, tendo como base de cálculo a “totalidade do preço mensal pago pelos seus associados,
isto é, pela receita bruta sem qualquer desconto”.
A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535
do CPC.
Em relação à incidência do ISS sobre os planos de saúde, inexiste, a rigor, discussão quanto à legisla-
ção federal, que prevê expressamente a exação, nos itens 4.22 e 4.23 da Lista Anexa à LC 116/2003:
4.22 - Planos de medicina de grupo ou individual e convênios para prestação de assistência mé-
dica, hospitalar, odontológica e congêneres.
4.23 - Outros planos de saúde que se cumpram através de serviços de terceiros contratados, cre-
denciados, cooperados ou apenas pagos pelo operador do plano mediante indicação do beneficiá-
rio.
A contribuinte analisa a natureza jurídica do serviço com o intuito de desqualificar essa disposição
legal específica. O TJ-SP afastou a inconstitucionalidade nos seguintes termos (fls. 297-298):
Fixando-se essas premissas, verifica-se que nenhuma inconstitucionalidade ou ilegalidade exis-
te em norma que exige o pagamento do ISSQN de empresa de plano de saúde, pois, a atividade
por ela desenvolvida enquadra-se na condição de prestação de serviço.
Por fim, não se pode olvidar que desde a edição da Lei Complementar nº 56/87, os Planos de
Saúde foram incluídos na Lista de Serviços tributáveis pelo ISSQN, assim permanecendo na lis-
ta anexa à Lei Complementar nº 116/03, o que tornou possível aos municípios exercitar sua com-
petência tributária e exigir o imposto nos termos do art. 156, III da CF.
Não compete ao STJ reexaminar a constitucionalidade da norma em Recurso Especial, à luz do
conceito de serviço, sob pena de ofensa à competência do egrégio STF.
Processual Civil. Tributário. Agravo Regimental. ISS. Empresa Franqueada que presta Serviços
Postais e Telemáticos. Período Posterior à Edição da LC 116/03. Incidência. Prestação de Servi-
ço. Conceito. Pressuposto pela Constituição Federal de 1988. Competência do Supremo Tribu-
nal Federal.
(...)
3. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a discussão em torno do conceito
de serviço para fins de incidência do ISS é de cunho eminentemente constitucional (art. 156,
inciso III, da Constituição Federal), descabendo a esta Corte, por meio da via recursal eleita, tal
apreciação, sob pena de usurpação da competência conferida, tão-somente, ao Supremo Tribu-
nal Federal.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1.191.465/ES, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julga-
do em 17/02/2011, DJe 10/03/2011)
Ainda que não seja possível acolher integralmente o pedido principal da contribuinte (não incidên-
cia do ISS sobre planos de saúde), é preciso reconhecer parcialmente o seu pleito, quanto à base de
cálculo da exação.
No que se refere à base de cálculo, o TJ-SP a definiu como a “totalidade do preço mensal pago pelos
seus associados, isto é, pela receita bruta sem qualquer desconto” (fl. 297).
Esse entendimento foi por mim defendido na Segunda Turma, mas acabei vencido.
O Colegiado ratificou a jurisprudência da Primeira Turma, no sentido de que a base de cálculo do
ISS sobre planos de saúde é o preço pago pelos consumidores, diminuído dos repasses feitos pela con-
tribuinte aos demais prestadores de serviços de saúde (hospitais, clínicas, laboratórios, médicos etc. -
REsp 1.137.234/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 14.6.2011.
Cito precedentes:
Agravo Regimental em Agravo de Instrumento. Tributário. Artigo 535 do Código de Processo
Civil. Omissão. Inexistência. ISSQN. Serviços Médico-hospitalares. Empresa Gestora de Plano
de Saúde. Base de Cálculo do Tributo. Preço do “Serviço” Prestado pela Operadora de Plano de
Saúde. Receita Auferida sobre a Diferença entre o Valor Recebido pelo Contratante e o que é
Repassado para os Terceiros.
(...)
2. “A base de cálculo do ISS incidente sobre as operações decorrentes de contrato de seguro-saúde
não abrange o valor bruto entregue à empresa que intermedeia a transação, mas, sim, a comis-
são, vale dizer: a receita auferida sobre a diferença entre o valor recebido pelo contratante e o
que é repassado para os terceiros efetivamente prestadores dos serviços (EDcl no REsp 227.293/RJ,
Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julga-
do em 09.08.2005, DJ 19.09.2005).” (REsp nº 1.041.127/RS, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira
Turma, in DJe 17/12/2008).
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no Ag 1.288.850/ES, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Turma, julgado em
19/10/2010, DJe 06/12/2010)

Tributário. ISS. Planos de Saúde. Prescrição Intercorrente. Demora dos Serviços do Judiciário
não pode ser Imputada à Parte. Súmula 106/STJ. Verificação da Inércia. Impossibilidade. Súmu-
la 7/STJ. Oferta de Serviços Médico-hospitalar. Previsão em Lei Municipal. Possibilidade. Base
de Cálculo. Valor Líquido. Precedentes.
(...)
5. O ISS deve ser calculado pelo valor líquido; ou seja, devem ser excluídos da base de cálculo
os valores repassados aos profissionais que efetivamente prestaram os serviços médicos.
6. Precedentes: REsp 1.211.002/MS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, decisão monocrática, jul-
gada em 12.11.2010; REsp 885.944/MG, Rel Min. Castro Meira, decisão monocrática, julgada
em 12.4.2010; REsp 1.041.127/RS, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 4.12.2008,
DJe 17.12.2008.
Agravo regimental parcialmente provido.
(AgRg no REsp 1.122.424/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em
15/02/2011, DJe 22/02/2011)
A contribuinte pretende afastar a tributação, pelo argumento de que a base de cálculo reconhecida
pelo TJ-SP (preço pago pelo consumidor, sem abatimento) é indevida.
O pleito merece ser parcialmente provido, pois, embora devida a cobrança, o cálculo deve ser feito
sobre base menor.
Saliento que não se trata de decisão extra petita, como aventado pelo Município (fl. 604), mas sim
de deferimento em parte do pedido.
Diante do exposto, conheço parcialmente do Recurso Especial e, nessa parte, dou-lhe parcial pro-
vimento.
É como voto.

Certidão de Julgamento
Segunda Turma
Número Registro: 2011/0019397-6 Processo Eletrônico REsp 1.237.312/SP
Números Origem: 128004 1280053040210092 12802004 20041280 200900363190 5270345
5270345103 5270345600 5270345801 53040210092
Pauta: 20/10/2011 Julgado: 20/10/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. Maria Caetana Cintra Santos

Secretária
Bela. Valéria Alvim Dusi

Autuação
Recorrente: Saúde ABC Planos de Saúde Ltda.
Advogados: Pedro Luciano Marrey Junior e Outro(s)
Flávio Mifano e Outro(s)
Marcos Joaquim Gonçalves Alves e Outro(s)
Recorrido: Município de São Paulo
Advogado: Danilo de Arruda Guazeli Paiva e Outro(s)
Assunto: Direito Tributário - Impostos - ISS/Imposto sobre Serviços
Certidão
Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
“Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista regimental do Sr. Ministro Herman Benjamin,
a Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe parcial provimento,
nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.”
Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Humberto Mar-
tins votaram com o Sr. Ministro Relator.

NOTAS DA DIALÉTICA
1) A ementa do acórdão acima reproduzido foi publicada no DJe de 24.10.2011.
2) Vide Íntegra de Acórdão do STJ - 2ª Turma (RDDT 190:168), e Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT
186:222) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 195:231).

Sentença
IMPOSTO DE RENDA - TELECOMUNICAÇÕES - REMESSA AO EXTERIOR DE
VALORES REFERENTES A LIGAÇÕES INTERNACIONAIS - ISENÇÃO
(Sentença do Juiz Marcelo Mesquita Saraiva, da 15ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo)

Processo nº 0006526-79.2009.403.6100 (2009.61.00.006526-6)

TIM Celular S/A (SP034128 - Eliana Alonso Moyses e SP 257.314 - Camila Alonso Lotito) x Dele-
gado Especial de Assuntos Internacionais - Deain/SP.
Mandado de Segurança
Impetrante: TIM Celular S/A.
Impetrado: Delegado Especial de Assuntos Internacionais - Deain/SP

Sentença Tipo A Vistos, etc. TIM Celular S/A impetra o presente mandado de segurança, com pe-
dido de medida liminar, contra ato do Delegado Especial de Assuntos Internacionais - Deain/SP, vi-
sando obter o provimento judicial de modo a não ser compelida ao recolhimento de Imposto de Ren-
da Retido na Fonte - IRRF sobre os valores remetidos ao exterior à Telecom Itália, referentes às liga-
ções internacionais que utilizam a sua prestação de serviço de telecomunicação internacional. A peti-
ção inicial veio instruída com os documentos de fls. 18/339. Decisão do Juízo às fls. 346 postergando
a apreciação do pedido de liminar para após a vinda das informações. O Sr. Delegado da Receita Fe-
deral do Brasil de Administração Tributária em São Paulo, devidamente notificado, apresentou infor-
mações às fls. 354/361, propugnando pela sua ilegitimidade passiva ad causam, esclarecendo que a
competência para tratar do assunto trazido aos autos seria da Delegacia Especial de Assuntos Interna-
cionais - Deain. Às fls. 362 foi determinado à impetrante que se manifestasse acerca da ilegitimidade
passiva arguida pela autoridade impetrada. A impetrante, através da petição de fls. 369/371, defendeu
a legalidade da permanência do Senhor Delegado da Receita Federal de Administração Tributária em
São Paulo no pólo passivo, requerendo, alternativamente, o deferimento de emenda à inicial visando
a retificação do pólo passivo, passando a figurar como autoridade impetrada o Senhor Delegado da
Delegacia Especial de Assuntos Internacionais - Deain. Às fls. 372/375, foi deferido o pedido de emen-
da à inicial, passando a figurar como autoridade impetrada o Ilmo. Senhor Delegado da Delegacia
Especial de Assuntos Internacionais - Deain, em substituição ao Sr. Delegado da Receita Federal do
Brasil de Administração Tributária em São Paulo. Devidamente notificado, o Sr. Delegado da Delega-
cia Especial de Assuntos Internacionais - Deain, prestou informações às fls. 382/404 defendendo a
legalidade de sua conduta e combatendo a pretensão da impetrante. Decisão às fls. 410/414 deferindo
a medida liminar pleiteada. Petição da União informando da interposição do Agravo de Instrumento
nº 2009.03.00.028289-4 contra a decisão liminar deferida (fls. 426/454). Petição do Ministério Públi-
co Federal às fls. 456/457, informando não haver interesse público a justificar parecer de mérito do
Parquet nos presentes autos, requerendo o prosseguimento do feito. É o relatório.

Decido. Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, visando ao afastamento da co-
brança de Imposto de Renda sobre o pagamento de preço pelo serviço prestado por sociedade domici-
liado na Itália. A questão posta nos autos já foi devidamente enfrentada pelo egrégio Tribunal Regio-
nal Federal da 2ª Região, ao exame da Apelação em Mandado de Segurança nº 2003.51.01.012799-8,
conforme se verifica da seguinte ementa de acórdão:
Constitucional, Tributário e Internacional Público - Constituição e Convenção da União Inter-
nacional de Telecomunicações (UIT) - Regulamento Administrativo de Melbourne - Isenção Tri-
butária - Decreto Legislativo nº 67/98 e Decreto nº 2.962/99. 1. Mandado de segurança objeti-
vando garantir alegado direito líquido e certo de não recolher imposto de renda na fonte sobre as
remessas feitas à empresa domiciliada em país membro da Convenção da União Internacional das
Telecomunicações (UIT), como contraprestação pela cessão de redes de telefonia de que a im-
petrante se utiliza fora do território nacional, para completar as ligações efetuadas do Brasil para
o exterior (tráfego sainte), com base no Decreto Legislativo nº 67/98 e no Decreto nº 2.962/99.
2. Compete privativamente ao Presidente da República celebrar tratados, convenções e atos in-
ternacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional, ao qual compete, exclusivamente, re-
solver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou
compromissos gravosos ao patrimônio nacional (CF/88, arts. 84, VIII, e 49, I). 3. A Constitui-
ção e a Convenção da União Internacional de Telecomunicações, aprovadas em Genebra, em
1992, e Quioto, em 1994, foram incorporadas ao nosso ordenamento jurídico através do Decre-
to Legislativo nº 67, de 15.10.98, e do Decreto Presidencial nº 2.962, de 23.02.99. 4. São instru-
mentos da UIT a sua constituição, convenção e os regulamentos administrativos, ficando seus
membros obrigados a aterem-se às suas disposições, conforme dispõem seus artigos 4, item 29.1;
6, item 37.1; 54, itens 215.1 e 216.2. 5. O Regulamento Administrativo de Melbourne, de 1988,
é parte integrante da UIT, o qual prevê em seu art. 45, item 6.1.3, isenção tributária às despesas
com o denominado tráfego sainte. 6. Sendo parte integrante da UIT, o Regulamento Administrati-
vo de Melbourne teve sua aplicação no direito interno garantida pelo Decreto Legislativo nº 67/98
e pelo Decreto nº 2.962/99, não se tratando de ajuste complementar. 7. O art. 98 do Código Tri-
butário Nacional prevê a primazia dos tratados e convenções internacionais sobre a legislação
tributária interna. 8. Apelação provida. (Origem: TRF-2. Classe: AMS - Apelação em Mandado
de Segurança - 54.461 Processo: 2003.51.01.012799-8. UF: RJ. Órgão Julgador: Terceira Turma
Especializada. Data Decisão: 13/12/2006. Documento: TRF-200160709. DJU - Data: 28/02/2007
- Página: 92. Desembargador Federal Paulo Barata).
Pede-se a devida vênia para transcrever parte do voto proferido pelo eminente relator o Exmo. Se-
nhor Desembargador Federal, Paulo Freitas Barata, por demais elucidativo da questão principal, se-
não vejamos:
Para que o tratado tenha validade no ordenamento pátrio é necessário portanto, a sua aprovação pelo
Congresso Nacional, por meio de decreto legislativo, a sua retificação pelo Chefe do Executivo, e pos-
terior promulgação, através de decreto presidencial, e publicação. A Constituição e a Convenção da
União Internacional de Telecomunicações, aprovadas em Genebra, em 1992, e Quioto, em 1994, fo-
ram incorporadas ao nosso ordenamento jurídico através do Decreto Legislativo nº 67, de 15.10.98, e
do Decreto Presidencial nº 2.962, de 23.02.99, assim redigidos: Aprova os textos (*) [sic] dos Atos
Finais da Conferência de Plenipotenciários Adicional, da União Internacional de Telecomunicações -
UIT, aprovados pelos países membros em Genebra, em 22 de dezembro de 1992, e dos Atos Finais da
Conferência de Plenipotenciários, da União Internacional de Telecomunicações - UIT, aprovados pe-
los países membros, em Quioto, em 13 de outubro de 1994. O Congresso Nacional decreta: Art. 1º
São aprovados os textos dos Atos Finais da Conferência Adicional de Plenipotenciários de Genebra,
ocorrida em 1992, e da Conferência de Plenipotenciários de Quioto, ocorrida em 1994, da União In-
ternacional de Telecomunicações - UIT. Parágrafo único. São sujeitos à aprovação do Congresso Na-
cional quaisquer atos que alterem os referidos Protocolos, assim como quaisquer ajustes complemen-
tares que, nos termos do art. 49, I, da Constituição Federal, acarretem encargos ou compromissos gra-
vosos ao patrimônio nacional. Art. 2º Este Decreto Legislativo entra em vigor na data de sua publica-
ção (fls. 65). Promulga a Constituição e a Convenção da União Internacional de Telecomunicações,
concluídas em Genebra, em 22 de dezembro de 1992, e seu instrumento de Emenda aprovado em
Quioto, em 14 de outubro de 1994. Art. 1º A Constituição e a Convenção da União Internacional de
Telecomunicações, concluídas em Genebra, em 22 de dezembro de 1992, e seu Instrumento de Emenda
aprovado em Quioto, em 14 de outubro de 1994, apensos por cópia a este Decreto, deverão ser execu-
tados e cumpridos tão inteiramente como neles se contém. Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data
de sua publicação (fls. 209). São instrumentos da UIT a sua constituição, convenção e os regulamen-
tos administrativos, ficando seus membros obrigados a aterem-se às suas disposições, conforme dis-
põe seus artigos 4, item 29.1, e 6, item 37.1. Seu artigo 54 (itens 215.1 e 216.2), dispondo sobre os
regulamentos administrativos, estabelece que: 215.1. Os Regulamentos Administrativos mencionados
no artigo 4 da presente Constituição são instrumentos internacionais obrigatórios e estarão sujeitos às
disposições desta última e da Convenção. 216.2 A ratificação, aceitação ou aprovação da presente
Constituição e da Convenção e da Convenção [sic] ou a adesão às mesmas, em razão dos artigos 52 e
53 da presente Constituição, inclui também o consentimento de obrigar-se pelos Regulamentos Ad-
ministrativos, adotados pelas Conferências Mundiais competentes antes da data da assinatura da pre-
sente Constituição e da Convenção. Tal consentimento se entende como sujeição a toda reserva mani-
festada no momento da assinatura dos citados Regulamentos ou a qualquer revisão posterior dos mes-
mos, sempre e quando ele se mantenha no momento de depositar o correspondente instrumento de
ratificação, de aceitação, de aprovação ou de adesão (fls. 75). Como se pode ver dos dispositivos aci-
ma transcritos, o Regulamento Administrativo de Melbourne, de 1998, é parte integrante da UIT, o qual
prevê em seu art. 45, item 6.1.3, isenção tributária às despesas com o denominado tráfego sainte, nos
seguintes termos: 6.1.3. Quando a legislação nacional de um país preveja a aplicação de um tributo
sobre a tarifa de percepção, pelo provimento de serviços internacionais de telecomunicações, esse tri-
buto somente se aplicará aos serviços internacionais de telecomunicações faturados a clientes desse
país, a menos que seja acordado o contrário, para atender a circunstâncias especiais. Sendo parte inte-
grante da UIT, o Regulamento Administrativo de Melbourne teve sua aplicação no direito interno ga-
rantida pelo Decreto Legislativo nº 67/98 e pelo Decreto nº 2.962/99, não se tratando de ajuste com-
plementar, como entendeu o juiz de 1º grau. Portanto, a ressalva feita no parágrafo único do art. 1º do
Decreto Legislativo nº 67 não se refere a compromissos futuros que venham a criar encargos gravosos
ao patrimônio nacional. O Ministério Público Federal, com propriedade, salienta que: Percebe-se, as-
sim, que o decreto legislativo apenas sujeitou à aprovação do Congresso duas espécies de atos: aque-
les que alterem os referidos Protocolos - o que não corresponde à hipótese in casu, uma vez que o
Regulamento das Telecomunicações Internacionais (ou Tratado de Melobourne) é anterior à Consti-
tuição da UIT e sua aplicação é prevista na mesma - é [sic] os ajustes complementares que, nos ter-
mos do artigo 49, I, da Constituição Federal, acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patri-
mônio nacional. Com relação a esta última situação, cabe salientar que, ainda que a isenção tributária
prevista importe em renúncia de receita e, portanto, configure-se como gravosa ao patrimônio nacio-
nal, não se trata de ajuste complementar, uma vez que há dispositivo na Constituição da UIT que pre-
vê não só a aplicação integral do Regulamento que, em seu artigo 6º, determina tal isenção, mas tam-
bém a vinculação a este regulamento e sua obrigatoriedade. Configura-se, portanto, não como ques-
tão complementar, mas essencial a tal documento. Na verdade, é razoável imaginar que as cláusulas
dos Regulamentos só não foram transcritas na Convenção por estarem organizadas em documento
anterior, sendo, portanto, desnecessário tal procedimento. Assim, a aprovação do Congresso Nacional
do texto da Constituição e Convenção da UIT, passa necessariamente pela aprovação destes artigos que
a integram, transcritos e melhor analisados infra. No que se refere ao decreto presidencial, sua sim-
ples leitura permite perceber que foi determinada, sem qualquer ressalva, a integral aplicação das dis-
posições da Convenção e Constituição da UIT, que deve ter por base o texto levado à publicação no
Diário Oficial juntamente com o referido decreto (728). Quanto à isenção pleiteada, o CTN prevê a
primazia dos tratados e convenções internacionais sobre a legislação tributária interna, nos termos do
seu art. 98. Por compartilhar inteiramente com os fundamentos acima expostos pelo eminente Desem-
bargador Federal Paulo Freitas Barata e sendo certo que os mesmos esgotam o exame das questões
postas nos autos, adoto-os como razão de decidir para reconhecer a existência do direito líquido e cer-
to buscado pela impetrante.
Isto posto, concedo a segurança e confirmo a liminar anteriormente deferida para determinar que
autoridade impetrada se abstenha de exigir o IRRF nas remessas de recursos feitas pela impetrante à
Telecom Itália, em função da prestação de serviços de telecomunicação internacional. Sem condena-
ção em honorários advocatícios, a teor do artigo 25 da Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009. Sen-
tença sujeita ao reexame obrigatório. Desta forma, decorrido o prazo para interposição de recurso, re-
metam-se os autos ao egrégio do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com as cautelas de estilo.
Oficie(m)-se à(s) autoridade(s) impetrada(s) cientificando-a(s) do teor da presente decisão, bem como
ao (à) Exmo(a). Senhor(a) Desembargador(a) Federal relator(a) do Agravo de Instrumento nº 0006004-
48.2011.4.03.0000, dando-lhe ciência da presente decisão. Custas ex lege. P.R.I.C.
(DEJF da 3ª R. de 20.10.2011, pp. 117/9)
Decisão
RECLAMAÇÃO - MODULAÇÃO DE EFEITOS - MATÉRIA JULGADA
INCONSTITUCIONAL - AUSÊNCIA DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA
DO STF - BOA-FÉ DO PARTICULAR AMPARADO POR DECISÃO JUDICIAL
TRANSITADA EM JULGADO
(Ministro Luiz Fux, do STF)

Medida Cautelar na Reclamação 11.476

Origem: AR - 6025 - Tribunal Regional Federal da 5ª Região


Proced.: Ceará
Relator: Min. Luiz Fux
Reclte(s).: União
Proc(a/s)(es).: Advogado-geral da União
Recldo(a/s).: Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Intdo(a/s).: Amailza Soares Paiva - Advocacia e Consultoria S/C
Adv(a/s).: Paschoal de Castro Alves e Outro(a/s)

Reclamação. Alegação de Usurpação da Competência do Supremo Tribunal Federal para rea-


lizar Modulação de Efeitos de Julgados, bem como de Ofensa ao Decidido na ADI nº 4.071-AgR.
Argumentos Improcedentes. Modulação de Efeitos como Corolário do Princípio da Proporcio-
nalidade. Competência de Qualquer Órgão Jurisdicional para proceder ao Controle Incidental
de Constitucionalidade. Boa-fé do Particular Amparado por Decisão Judicial Transitada em Jul-
gado como Fator não Considerado pelo STF. Liminar Indeferida.

Decisão: Cuida-se de Reclamação Constitucional proposta pela União Federal contra decisão do
Plenário do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no julgamento da Ação Rescisória nº
2008.05.00.060637-7, que julgou procedente, em parte, a referida ação, proposta pela ora Reclaman-
te, reconhecendo como devida a revogação da isenção concedida pela Lei Complementar n. 70/91,
determinando, todavia, que o recolhimento da referida contribuição somente deveria ser efetuado a
partir daquele julgamento.
A decisão reclamada foi ementada da seguinte forma:
Processo Civil. Ação Rescisória. Tributário. Preliminar de Intempestividade. Isenção Concedida
através do Art. 6º, II, da Lei Complementar nº 70/91. Revogação pelo Art. 56 da Lei nº 9.3430/96 [sic].
Súmula 343 do STF. Modulação de Efeitos. Precedente do STF.
- O cômputo para aferição da tempestividade da ação rescisória, nos termos do art. 495 do CPC
deve levar em consideração a data do trânsito em julgado da última decisão efetivamente profe-
rida nos autos, independentemente se ali restou decidida a inadmissibilidade de recurso outrora
interposto.
- O Supremo Tribunal Federal já se manifestou em inúmeros julgados, sendo favorável à possi-
bilidade de revogação da isenção concedida através do art. 6º, II, da Lei Complementar nº 70/91
pelo art. 56 da Lei nº 9.3430/96 [sic]. Tratando-se de matéria de cunho constitucional, afasta-se
a aplicabilidade da Súmula 343 do STF à espécie.
- Aplicação da modulação dos efeitos da decisão, no sentido de que o recolhimento da Cofins
deva ser efetivado, tão-somente, a partir da data deste julgamento.
- Precedente do STF. (RE-AgR 295.563/RS, Rel. Ministro Cezar Peluso, DJ 07.10.2008)
- Ação Rescisória julgada parcialmente procedente.
Alega o Reclamante que a decisão supratranscrita usurpou a competência deste Tribunal para pro-
ceder à modulação de efeitos de decisões judiciais, previsto no art. 27 da Lei nº 9.868/99. Afirma, ain-
da, que houve afronta à decisão proferida por esta Corte no julgamento da ADI nº 4.071 AgR, onde se
teria negado a possibilidade de modulação dos efeitos da decisão que declarou a constitucionalidade
da revogação da Cofins às sociedades civis prestadoras de serviços pelo art. 56 da Lei nº 9.430/96. Eis
a ementa do julgamento do regimental:
Ementa: Agravo regimental. Ação direta de inconstitucionalidade manifestamente improceden-
te. Indeferimento da petição inicial pelo Relator. Art. 4º da Lei nº 9.868/99. 1. É manifestamente
improcedente a ação direta de inconstitucionalidade que verse sobre norma (art. 56 da Lei nº
9.430/96) cuja constitucionalidade foi expressamente declarada pelo Plenário do Supremo Tri-
bunal Federal, mesmo que em recurso extraordinário. 2. Aplicação do art. 4º da Lei nº 9.868/99,
segundo o qual “a petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente
serão liminarmente indeferidas pelo relator”. 3. A alteração da jurisprudência pressupõe a ocor-
rência de significativas modificações de ordem jurídica, social ou econômica, ou, quando muito,
a superveniência de argumentos nitidamente mais relevantes do que aqueles antes prevalecentes,
o que não se verifica no caso. 4. O amicus curiae somente pode demandar a sua intervenção até
a data em que o Relator liberar o processo para pauta. 5. Agravo regimental a que se nega provi-
mento. (ADI 4.071 AgR, Relator(a): Min. Menezes Direito, Tribunal Pleno, julgado em 22/04/2009,
DJe-195, Divulg. 15-10-2009, Public. 16-10-2009, Ement. Vol-02378-01, pp-00085, RTJ Vol-
00210-01, pp-00207)
O Reclamante registra, ainda, que em decisão monocrática, confirmada pelo Pleno, proferida nos
autos da ADI nº 4.071, o Min. Menezes Direito pleiteia, com base nesses argumentos, liminar para a
cassação, ou, subsidiariamente, para a suspensão da eficácia da decisão reclamada, na parte em que
conferiu efeitos ex nunc ao acórdão, e, ao final, a sua cassação definitiva.

É o relatório. Passo a decidir.


O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nos 377.457
e 381.964 (Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 17/09/2008), assentou o entendi-
mento de que ocorreu a revogação, pelo art. 56 da Lei 9.430/96, da isenção concedida às sociedades
civis de profissão regulamentada pelo art. 6º, II, da Lei Complementar nº 70/91, na medida em que
esta Lei é apenas formalmente complementar, mas materialmente ordinária, com relação aos disposi-
tivos concernentes à contribuição social por ela instituída.
Apesar desse julgamento, foi proposta uma ADI sobre a matéria, de nº 4.071, a qual foi julgada
monocraticamente improcedente, nos seguintes termos:
(...)
A questão objeto da presente ação direta de inconstitucionalidade foi recentemente decidida pelo
Plenário deste Supremo Tribunal Federal, em 17/9/2008, no julgamento dos recursos extraordi-
nários de nos 377.457 e 381.964, ambos da relatoria do Ministro Gilmar Mendes.
Naquela oportunidade, firmou-se o entendimento de que o conflito aparente entre lei ordinária e
lei complementar não deveria ser resolvido pelo critério hierárquico, mas pela natureza da maté-
ria regrada, de acordo com o que dispõe a Constituição Federal. Nesta linha, entendeu a Corte
que a isenção prevista na Lei Complementar nº 70/91 configurava norma de natureza material-
mente ordinária, razão pela qual, muito embora aprovada sob a forma de lei complementar, com
quorum qualificado de votação no Congresso Nacional, considerou válida a sua revogação por
lei ordinária, determinada pelo art. 56 da Lei nº 9.430/96.
Na mesma sessão de julgamento, o Plenário rejeitou a possibilidade de atribuição de efeitos pros-
pectivos àquela decisão, mediante a aplicação analógica do art. 27 da Lei nº 9.868/99, por não
vislumbrar razões de segurança jurídica suficientes para a pretendida modulação.
Anoto que fiquei vencido no que se refere à modulação, considerando que a matéria estava paci-
ficada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, havendo, como salientou o eminente
Ministro Celso de Mello, decisões da Suprema Corte na configuração da matéria como infracons-
titucional. Todavia, o entendimento sobre a modulação ficou vencido diante da ausência do
quorum necessário previsto no art. 27 da Lei nº 9.868/99.
Claro, portanto, que a matéria objeto desta ação direta de inconstitucionalidade já foi inteiramente
julgada pelo Plenário, contrariamente à pretensão do requerente, o que revela a manifesta impro-
cedência da demanda.
Ante o exposto, com fulcro no art. 4º da Lei nº 9.868/99, indefiro a petição inicial.
Publique-se.
Brasília, 7 de outubro de 2008.
Ministro Menezes Direito
Relator
O Pleno ratificou a decisão proferida pelo Min. Menezes Direito, negando provimento a Agravo
Regimental contra ela interposto.
Antes que o Pretório Excelso firmasse esse entendimento, a Quarta Turma do Tribunal Regional
Federal da 5ª Região julgou procedente a pretensão de particular em Mandado de Segurança, enten-
dendo ser inadmissível a revogação da LC 70/91 por via de lei ordinária, asseverando ter sido propo-
sital a escolha de lei complementar para isentar as sociedades civis do pagamento da Cofins, em face
de ser esse o instrumento legislativo mais rígido. Esse decisum foi desconstituído por meio de Ação
Rescisória; entretanto, aquele órgão colegiado optou por conferir efeitos meramente prospectivos ao
julgado, com fulcro nos seguintes argumentos:
“(...) em se tratando de manutenção da isenção por sentença judicial transitada em julgado, por-
tanto sem caráter de precariedade, não pode ser desconstituída com efeito retroativo, sem co-
meter-se grave injustiça, por desatendimento ao princípio da segurança jurídica. Por tais fun-
damentos, reconheço a modulação dos efeitos para que a cobrança da referida contribuição
ocorra, tão-somente, a partir do julgamento da presente ação.”
Percebe-se, de plano, que o Tribunal Regional Federal considerou um fator que não foi, e nem po-
deria ser, apreciado pelo Supremo: a boa-fé do particular, que deixou de recolher o tributo por estar
amparado por sentença judicial transitada em julgado.
Quando do julgamento do RE nº 377.457-3/PR, o Relator, Ministro Gilmar Mendes, justificou a
sua posição contrária à modulação de efeitos explicando que “a matéria já era jurisprudência do Su-
premo Tribunal Federal - aí temos essas divergências já na ADC nº 1 (…) e também temos uma dou-
trina bastante rica, nessa perspectiva, a partir do nosso clássico e saudoso Geraldo Ataliba, quanto
a lei complementar”. Vê-se que não foi considerada por esta Corte - mercê de estar julgando, à época,
Recurso Extraordinário em processo não findo - a situação do particular que já havia vencido batalha
judicial contra a Fazenda Pública, amparado por decisão coberta pelo manto da coisa julgada material.
Ante a inclusão desse novo fator, não se pode constatar afronta ao quanto decidido na ADI nº 4.071- AgRg.
A essa altura, é mister memorar que, mesmo à míngua de previsão legal, a doutrina já acenava com
a possibilidade de modular os efeitos de decisões judiciais. A prática é tradicionalmente adotada na
common law, como forma de evitar os inconvenientes gerados pela mudança de orientação jurispru-
dencial - é o chamado prospective overruling.
O problema, antes de se tratar de uma fórmula criada pela Lei nº 9.868/99, é de cunho constitucio-
nal, conforme anota, de forma percuciente, Bruno Bodart:
Sustenta a doutrina que a modulação dos efeitos das decisões proferidas pelo Pretório Excelso
em controle difuso de constitucionalidade resulta do dever de proporcionalidade imposto pela
Constituição. É que, em certos casos, há clara colisão entre o princípio da primazia da Consti-
tuição (aqui considerado em relação à norma constitucional violada pela lei declarada incompa-
tível com a Carta Magna) e o da segurança jurídica (art. 5º, caput, CRFB). Enfrenta o problema
dessa forma, dentre outros, Gustavo Zagrebelsky. Além disso, Hans Kelsen já defendia que a
eficácia ex nunc da declaração de inconstitucionalidade atenderia aos objetivos de segurança ju-
rídica.
(...)
Esses motivos são levantados pela doutrina para sustentar que a modulação de efeitos de deci-
sões judiciais independe de previsão legal. (BODART, Bruno Vinícius da Rós. Embargos de de-
claração como meio processual adequado a suscitar a modulação dos efeitos temporais do con-
trole de constitucionalidade. RePro, vol. 198, p. 389, ago/2011)
Assim também, em sede doutrinária, Gilmar Mendes (A Constitucionalidade do art. 27 da Lei n.
9.868/99. In: Direito constitucional contemporâneo: estudos em homenagem ao Professor Paulo Bo-
navides. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 305-331).
Apesar de haver previsão legal para a modulação de efeitos apenas no controle abstrato de cons-
titucionalidade, conforme o art. 27 da Lei nº 9.868/99, certo é que a jurisprudência desta Corte
Suprema admite a sua utilização também no controle incidental ou por via de exceção, como fixado
no leading case do RE nº 197.917 (Rel. Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, julg. em 06/06/2002).
Na clássica lição de José Afonso da Silva, “o exercício [do controle de constitucionalidade] por via
de exceção é próprio do controle difuso”, o qual, por sua vez, ocorre “quando se reconhece o seu exer-
cício a todos os componentes do Poder Judiciário” (Curso de Direito Constitucional Positivo. 27ª ed.
São Paulo: Malheiros, 2006, p. 49-50).
Basta um exercício silogístico para concluir que, se a modulação de efeitos pode ocorrer também
no controle incidental de constitucionalidade, e se essa espécie de controle é da competência de qual-
quer órgão jurisdicional brasileiro, a decisão de Tribunal Regional Federal que determina que seu jul-
gado tenha efeitos prospectivos não usurpa nenhuma competência privativa deste Pretório Excelso.
Por essas razões, entendo que não há fumus boni iuris para amparar uma decisão antecipatória, em
qualquer das formas pretendidas pelo Reclamante.
Ex positis, indefiro o pedido de medida liminar. Oficie-se ao juízo reclamado, para que preste in-
formações no prazo de dez dias. Prestadas as informações, dê-se vista ao Procurador-geral da Repú-
blica (art. 160 do RISTF).
Publique-se.
Brasília, 4 de novembro de 2011.
Ministro Luiz Fux
Relator
Documento assinado digitalmente.
(DJe de 11.11.2011, pp. 70/1)

NOTA DA DIALÉTICA
Vide textos de Doutrina de Andrei Pitten Velloso (RDDT 157:7), de Célio Armando Janczeski (RDDT
157:17), de Celso de Albuquerque Silva (RDDT 155:7), de Diego Diniz Ribeiro (RDDT 178:25), de
Fábio Martins de Andrade (RDDT 166:61, 172:34 e 178:45), de Renata Elaine Silva (RDDT 170:52),
de Selma Ciminelli (RDDT 159:115) e de Tiago Cappi Janini (RDDT 159:123), Íntegra de Acórdão
do STF - 2ª Turma (RDDT 135:174), Nota de Julgamento do STF - Pleno (RDDT 155:177), e Acór-
dãos do STF - Pleno (RDDT 160:203 e 162:237), do STF - 1ª Turma (RDDT 185:193) e do STF - 2ª
Turma (RDDT 134:240 e 144:228).
Ementário de Acórdãos
Observação: a Equipe Técnica da Revista Dialética de Direito Tributário
não fornece cópias de íntegras de acórdãos publicados neste Ementário.
Quando os reputa muito relevantes, publica-os na íntegra.

AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Se-


PAGAMENTO - DISCUSSÃO DE gunda Turma, DJe 25/10/2010.
VALORES RELATIVOS A 3. Agravo regimental não provido.
PRESTAÇÕES DE PARCELAMENTO -
IMPOSSIBILIDADE Acórdão
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
AgRg no Agravo em Recurso Especial são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
nº 8.255-RS (2011/0096672-9) tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
Justiça, na conformidade dos votos e das notas
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
Agravante: Itagiel Ltda. “A Turma, por unanimidade, negou provimento
Advogado: Edison Freitas de Siqueira e Outro(s) ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
Agravado: Fazenda Nacional Ministro-Relator, sem destaque.”
Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
cional Meira, Humberto Martins (Presidente) e Herman
Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ementa Brasília (DF), 14 de junho de 2011.
Processual Civil e Tributário. Agravo Regi- (DJe de 21.6.2011)
mental em Agravo. Ação Consignatória. Dis-
cussão de Valores Relativos à Prestações de NOTA DA DIALÉTICA
Programa de Parcelamento. Impossibilidade. Vide Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT
Via Inadequada. Precedentes. 115:210, 121:215, 129:195, 139:222 e 156:197),
1. A pretensão da recorrente, ora agravante, é do TRF da 4ª Região - 1ª Turma (RDDT 18:150
desonerar-se do pagamento de prestações de e 110:214) e do TRF da 4ª Região - 2ª Turma
parcelamento por meio de depósito dos valo- (RDDT 28:173).
res que entende devidos em sede de ação con-
signatória.
2. É cediço nesta Corte que, nos termos do art. AÇÃO RESCISÓRIA - DENÚNCIA
ESPONTÂNEA - TRIBUTO DECLARADO E
164, I, do CTN, a importância do crédito tri-
PAGO A DESTEMPO - ERRO DE FATO -
butário pode ser consignada quando o credor
OCORRÊNCIA
se recusa a receber o pagamento, ou quando
subordina o recebimento ao pagamento de ou- Ação Rescisória nº 3.746-RS
tro tributo, penalidade ou ao cumprimento de (2007/0079940-5)
obrigação acessória. Contudo, a ação consig-
natória não é a via adequada para discutir ques- Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
tões relativas a parcelamento, sob pena de per- Revisor: Ministro Benedito Gonçalves
mitir ao contribuinte a obtenção indireta de Autor: Hospital Nossa Senhora da Conceição S/A
benefícios não previstos na legislação de re- Autor: Hospital Cristo Redentor S/A
gência. Nesse sentido: AgRg nos EREsp Autor: Hospital Fêmina S/A
641.329/RS, Rel. Min. João Otávio de Noro- Advogada: Marcia Mallmann Lippert e Outro(s)
nha, DJ de 6.3.2006, AgRg no Ag 811.147/RS, Réu: Fazenda Nacional
Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira
Turma, DJ 29/3/2007, AgRg nos EREsp Ementa
690.478/RS, Rel. Min. Humberto Martins, DJe Processual Civil e Tributário. Ação Rescisó-
de 26.5.2008; AgRg no REsp 1.082.843/RS, ria. Questão Controvertida nos Tribunais.
Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Tur- Acórdão que adotou Jurisprudência Majoritá-
ma, DJe 29/10/2008; REsp 1.020.982/RS, Rel. ria. Súmula 343. Denúncia Espontânea. Tribu-
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda to Declarado e Pago a Destempo. Erro de
Turma, DJe 3/2/2009; REsp 1.095.240/RS, Fato. Ocorrência.
Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, 1. Busca-se na presente ação rescisória, funda-
DJe 27/2/2009, AgRg no Ag 1.285.918/RS, da nos incisos V e IX do art. 485 do Código de
Processo Civil, desconstituir acórdão da Pri- do contribuinte. Ocorre, porém, que, contraria-
meira Turma desta Corte, proferido nos autos mente ao que restou assentado, não houve de-
do Recurso Especial n. 462.584/RS, em sede claração prévia realizada pelo contribuinte para
de ação de repetição de indébito tributário na o fim de informar ao INSS a existência de tri-
qual se postulou a devolução dos valores pagos butos não recolhidos no período de 1990 a
a título de multa moratória, referente a tributos 1998, e, por conseguinte, não houve constitui-
de competência de dezembro de 1990 a junho ção do crédito tributário anterior ao pagamen-
de 2000, em razão do pagamento espontâneo to realizado. Isto porque, à época dos fatos ge-
de que trata o artigo 138 do CTN. radores, encontrava-se em vigor a redação ori-
2. A questão referente à ocorrência de denún- ginal do art. 32 da Lei 8.212/91, que não esti-
cia espontânea já foi matéria controversa no pulava a obrigação de o contribuinte informar
âmbito desta Corte, prevalecendo o entendi- mensalmente ao INSS, por intermédio da Guia
mento, inclusive em sede de recursos repetiti- de Recolhimento ao Fundo de Garantia do
vos, na forma do art. 543-C, do CPC (REsp’s Tempo de Serviço e Informações à Previdên-
n. 1.149.022, 962.379 e 886.462), no sentido cia Social - GFIP ou outra forma de declara-
de que “a denúncia espontânea não resta carac- ção, os dados relacionados a fatos geradores de
terizada, com a conseqüente exclusão da mul- contribuições previdenciárias e demais dados
ta moratória, nos casos de tributos sujeitos a de interesse do INSS. Tal obrigação somente
lançamento por homologação declarados pelo surgiu com a regulamentação, pelo Decreto
contribuinte e recolhidos fora do prazo de ven- n. 2.803/98, do inciso IV da Lei 8.212/91, com
cimento, à vista ou parceladamente, ainda que redação dada pela Lei 9.528/97, e somente
anteriormente a qualquer procedimento do Fis- passou a ser exigida em relação a fatos gerado-
co”. res ocorridos a partir de 1999.
Sobre o tema, esta Corte editou, inclusive, a 7. Portanto, considerando que a ação rescisó-
Súmula n. 360, a qual dispõe que: “o benefí- ria é via processual idônea para desconstituir
cio da denúncia espontânea não se aplica aos julgado com base no inciso IX do art. 485 do
tributos sujeitos a lançamento por homologa- CPC quando o erro de fato decorre de falha na
ção regularmente declarados, mas pagos a des- percepção do julgador no pertinente aos fatos
tempo”. apresentados nos autos originários, e tendo a
3. A decisão rescindenda, ao decidir que a de- decisão rescindenda considerado um fato ine-
núncia espontânea não favorece pagamento de xistente, qual seja, a prévia declaração dos tri-
dívida tributária reconhecida pelo contribuin- butos das competências de dezembro de 1990
te, mas paga após o vencimento, privilegiou o a dezembro de 1998, mostra-se, pois, cabível,
entendimento majoritário e que continua sen- a rescisão da decisão com fundamento em erro
do a interpretação atual sobre a norma que o de fato.
autor entende violada (art. 138 do CTN), o que 8. Pedido rescisório procedente, para reconhe-
afasta o cabimento da ação rescisória pela [sic] cer aplicável o benefício da denúncia espontâ-
inciso V do art. 485. nea em relação às competências de dezembro
4. Todavia, assiste razão à parte autora no per- de 1990 a dezembro de 1998.
tinente à admissibilidade da ação rescisória
pela ocorrência de erro de fato, em relação aos Acórdão
tributos devidos nas competências de dezem- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
bro de 1990 a dezembro de 1998. são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
5. O Superior Tribunal de Justiça tem manifes- tros da Primeira Seção do Superior Tribunal de
tado o entendimento no sentido de que o erro Justiça, na conformidade dos votos e das notas
de fato se configura quando o julgado que se taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
pretende rescindir considera fato inexistente ou “A Seção, por unanimidade, julgou procedente a
reputa inexistente fato efetivamente ocorrido, ação rescisória, nos termos do voto do Sr. Minis-
desde que não tenha havido controvérsia nem tro Relator.”
pronunciamento judicial sobre esse fato. Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Cesar As-
6. O acórdão rescindendo decidiu que, nos ca- for Rocha, Francisco Falcão, Teori Albino Zavas-
sos de tributo sujeito a lançamento por homo- cki, Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins,
logação, não se caracteriza a denúncia espon- Herman Benjamin e Napoleão Nunes Maia Filho
tânea na hipótese em que o contribuinte reco- votaram com o Sr. Ministro Relator.
lhe débito tributário já declarado fora do pra- Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Mei-
zo para pagamento. Assim, verifica-se que o ra.
julgado em referência partiu do pressuposto de Brasília (DF), 23 de novembro de 2011.
que o débito foi lançado mediante declaração (DJe de 2.12.2011)
AUTO DE INFRAÇÃO - INCORPORAÇÃO - Agravado: Makena Máquinas Equipamentos e
EXTINÇÃO DA INCORPORADA - Lubrificantes Ltda.
SUCESSÃO PELA INCORPORADORA - Advogado: Edmundo Cavalcanti Eichenberg e
NULIDADE Outro(s)
Processo nº 17883.000355/2008-79 Ementa
Tributário. Certidão Positiva de Débito com
Recurso nº 501.393 de Ofício Efeitos de Negativa. Débitos em Nome das Fi-
Acórdão nº 1401-00.359 - 4ª Câmara/1ª Turma liais. Expedição em Relação à Matriz. Possi-
Ordinária bilidade.
Sessão de 11 de novembro de 2010 1. A existência de registros de CNPJ diferen-
Matéria: Nulidade. Erro na Identificação do Sujei- tes caracteriza a autonomia patrimonial, admi-
to Passivo nistrativa e jurídica de cada um dos estabele-
Recorrente: Fazenda Nacional cimentos. Desse modo, cada um destes opera
Interessado: Cemibra Indústria e Comércio Inter- de modo independente em relação aos demais.
nacional Ltda.
2. É possível a expedição de certidões positi-
Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário
Ano-calendário: 2004 vas de débito com efeitos negativos às empre-
sas cujas filiais possuam débitos com a Fazen-
Nulidade Configurada por Erro na Identifica- da Pública, desde que possuam números de
ção do Sujeito Passivo. Pessoa Jurídica Extin- CNPJ distintos. Precedentes.
ta por Incorporação. Sucessão Tributária pela 3. Agravo regimental não provido.
Incorporadora.
Extinguindo-se a incorporada, responde a in- Acórdão
corporadora, na qualidade de sucessora, pelos Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
tributos devidos pela sucedida, fato que impõe partes as acima indicadas, acordam os Ministros
seja aquela identificada como sujeito passivo da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
na condição de responsável tributário. Portan- ça, por unanimidade, negar provimento ao agra-
to, é inadmissível a lavratura de auto de infra- vo regimental nos termos do voto do Sr. Ministro
ção contra pessoa jurídica regularmente extin- Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins,
ta por incorporação à data da ciência do lança- Herman Benjamin (Presidente), Mauro Campbell
mento. Marques e Cesar Asfor Rocha votaram com o Sr.
Nulidade reconhecida. Ministro Relator.
Brasília, 20 de setembro de 2011 (data do julga-
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. mento).
Acordam os membros do colegiado [do Carf ], por (DJe de 22.11.2011)
unanimidade de votos, negar provimento ao recur-
so de ofício. NOTA DA DIALÉTICA
(DOU 1 de 18.10.2011, p. 19) Vide Íntegra de Acórdão do STJ - 2ª Turma
(RDDT 168:188), e Acórdão do STJ - 2ª Turma
NOTA DA DIALÉTICA (RDDT 153:195).
Vide Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT
114:226), do STJ - 2ª Turma (RDDT 169:216) e
do Carf - Câmara Superior - 1ª Turma (RDDT COFINS E PIS - ARRENDAMENTO
195:231). MERCANTIL - ALÍQUOTA ZERO -
INTERNALIZAÇÃO DO BEM -
INAPLICABILIDADE
CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE
NEGATIVA - DÉBITOS DAS FILIAIS -
EXPEDIÇÃO EM RELAÇÃO À MATRIZ - AgRg no Agravo de Instrumento
POSSIBILIDADE nº 1.397.197-PR (2011/0019255-0)

AgRg no Agravo de Instrumento Relator: Ministro Herman Benjamin


nº 1.413.153-RS (2011/0075085-6) Agravante: Clínica Hospitalar de Imagem São
José Ltda.
Relator: Ministro Castro Meira Advogado: Roseli Cachoeira Sestrem
Agravante: Fazenda Nacional Agravado: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
cional cional
Ementa tradição ou obscuridade, a justificar sua anula-
Tributário. PIS/Cofins. Importação. Arrenda- ção por esta Corte. Tese de violação do art. 535
mento Mercantil. Alíquota Zero. Inaplicabili- do CPC repelida.
dade. 2. O exame da suposta ilegalidade ou incons-
1. A alíquota zero para PIS e Cofins prevista no titucionalidade da Lei n. 10.865/2004, que ins-
art. 8º, § 14, da Lei 10.865/2004 aplica-se ape- tituiu o PIS/Pasep-Importação e a Cofins-Im-
nas aos pagamentos periódicos feitos para o ar- portação e da redução da base de cálculo dos
rendante, e não à internalização do bem no aludidos impostos, limitando-os ao valor adua-
País. Precedentes do STJ. neiro, é tema de ordem constitucional, tarefa
2. Agravo Regimental não provido. reservada ao Supremo Tribunal Federal.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e,
Acórdão nessa parte, não provido.
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
partes as acima indicadas, acordam os Ministros Acórdão
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen- são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis- Justiça, na conformidade dos votos e das notas
tros Mauro Campbell Marques, Castro Meira e taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro “A Turma, por unanimidade, conheceu em parte
Relator. do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento,
Não participou, justificadamente, do julgamento nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem
o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. destaque.”
Brasília, 06 de setembro de 2011 (data do julga- Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
mento). Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin
(DJe de 12.9.2011) (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 08 de novembro de 2011.
NOTA DA DIALÉTICA (DJe de 17.11.2011)
Vide Acórdão do STJ - 2ª Turma (RDDT
185:190). NOTA DA DIALÉTICA
Vide Íntegra de Acórdão do STF - Pleno (RDDT
152:185).
COFINS E PIS - BASE DE CÁLCULO -
IMPORTAÇÃO - VALOR ADUANEIRO -
MATÉRIA CONSTITUCIONAL COFINS E PIS - BASE DE CÁLCULO -
INCLUSÃO DO ICMS - CONCEITO
Recurso Especial nº 1.212.329-RJ DE FATURAMENTO - MATÉRIA
(2010/0167134-8) CONSTITUCIONAL

Relator: Ministro Mauro Campbell Marques AgRg no Agravo de Instrumento


Recorrente: Lafarge Brasil S/A nº 1.416.786-BA (2011/0089066-1)
Advogado: Luiz Gustavo Antônio Silva Bichara e
Outro(s) Relator: Ministro Herman Benjamin
Recorrido: Fazenda Nacional Agravante: Fazenda Nacional
Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
cional cional
Agravado: Courotex Indústria Comércio e Expor-
Ementa tação de Couros Ltda.
Processual Civil. Tributário. Violação ao Art. Advogado: Moacir Guimarães e Outro(s)
535 do CPC. Inocorrência. Pis/Pasep-impor-
tação. Cofins-importação. Base de Cálculo do Ementa
PIS/Cofins Prevista na Lei n. 10.865/2004. Processual Civil e Tributário. Ofensa ao Art.
Valor Aduaneiro. Matéria Constitucional. 535 do CPC não Configurada. Contribuição.
Competência do STF. PIS e Cofins. Base de Cálculo. Inclusão do
1. O acórdão recorrido analisou todas as ques- ICMS. Conceito de Faturamento (Art. 195, I,
tões necessárias ao desate da controvérsia, só da CF/1988). Acórdão e Razões Recursais
que de forma contrária aos interesses da parte. Fundados em Matéria de Índole Constitucio-
Logo, não padece de vícios de omissão, con- nal. Competência do STF.
1. A solução integral da controvérsia, com fun- quim Barbosa e Ricardo Lewandowski. 2ª Turma,
damento suficiente, não caracteriza ofensa ao 06.09.2011.
art. 535 do CPC.
2. A irresignação quanto ao conceito de fatu- Ementa: Agravo Regimental em Recurso Ex-
ramento e os questionamentos sobre este traordinário. Cofins. Lei 9.718/1998.
comportar incidência de ICMS dizem respei- 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao
to, em verdade, à base de cálculo da contri- apreciar os REs 346.084, da relatoria do Mi-
buição ao PIS e à Cofins, prevista no art. 195, nistro Ilmar Galvão; bem como 357.950,
I, da CF/1988. Por ser de índole constitucional, 358.273 e 390.840, da relatoria do Ministro
não se pode conhecer da controvérsia em Re- Marco Aurélio, declarou a inconstitucionalida-
curso Especial, sob pena de usurpar a compe- de do § 1º do art. 3º da Lei 9.718/1998. Lei que
tência do Supremo Tribunal Federal. trata da ampliação da base de cálculo das con-
3. Agravo Regimental não provido. tribuições destinadas ao PIS/Pasep e à Cofins.
Entendimento, esse, reafirmado em sede de
Acórdão repercussão geral, no RE 585.235-QO, da re-
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são latoria do ministro Cezar Peluso.
partes as acima indicadas, acordam os Ministros 2. A parte agravante carece de interesse em re-
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi- correr no tocante à controvérsia envolvendo a
ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen- constitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. 9.718/1998.
Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis- 3. A tese suscitada no agravo regimental (não-
tros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Ro- incidência da Cofins sobre pagamentos de pe-
cha, Castro Meira e Humberto Martins votaram cúlio, rendas ou benefícios acordados com par-
com o Sr. Ministro Relator. ticipantes de plano de previdência privada) é
Brasília, 13 de setembro de 2011 (data do julga- inovação insuscetível de ser apreciada nesta
oportunidade.
mento).
4. Agravo regimental desprovido.
(DJe de 16.9.2011)
(DJe de 11.11.2011, pp. 25/6)
NOTA DA DIALÉTICA NOTA DA DIALÉTICA
Vide Decisões dos Ministros Celso de Mello, do Vide Íntegra de Acórdão do TRF da 4ª Região -
STF (RDDT 135:180), Eros Grau, do STF 2ª Turma (RDDT 166:183), e Acórdãos do TRF
(RDDT 150:185), Gilmar Mendes, do STF da 4ª Região - 2ª Turma (RDDT 165:204) e da
(RDDT 149:162), Marco Aurélio, do STF (RDDT Coordenação-Geral do Sistema de Tributação
105:202) e Menezes Direito, do STF (RDDT (RDDT 66:194).
151:179), e Acórdãos do STF - Pleno (RDDT
155:236 e 160:196).
COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS
TRIBUTÁRIOS COM CRÉDITOS DE
COFINS - NÃO INCIDÊNCIA SOBRE PRECATÓRIO VENCIDO E NÃO PAGO -
PECÚLIO, RENDAS OU BENEFÍCIOS ART. 78, § 2º, DO ADCT -
ACORDADOS COM PARTICIPANTES DE SUPERVENIÊNCIA DA EC Nº 62/09
PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA -
AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO AgRg no Recurso em Mandado de Segurança
nº 34.177-PR (2011/0098019-1)
Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 485.521
Relator: Ministro Benedito Gonçalves
Origem: AMS - 200002010024951 - Tribunal Agravante: Farmácia e Drogaria Nissei Ltda.
Regional Federal Advogado: Rodrigo Mendes dos Santos e Ou-
Proced.: Rio de Janeiro tro(s)
Relator: Min. Ayres Britto Agravado: Estado do Paraná
Agte(s).: Coifa Pecúlios e Pensões Procurador: Cesar Augusto Binder e Outro(s)
Adv(a/s).: Luiz Gustavo A. S. Bichara e Outro(a/s)
Agdo(a/s).: União Ementa
Adv(a/s).: PFN - Tatiana P. F. Wajnberg Processual Civil e Tributário. Agravo Regi-
mental no Recurso Ordinário em Mandado de
Decisão: Agravo regimental desprovido, nos ter- Segurança. Compensação de Débitos Tributá-
mos do voto do Relator. Decisão unânime. Ausen- rios com Crédito de Precatório Vencido e não
tes, justificadamente, os Senhores Ministros Joa- Pago. Art. 78, § 2º, do ADCT. Superveniência
da Emenda Constitucional n. 62/2009. Revo- tro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavas-
gação do Art. 78, § 2º, do ADCT. Mandado de cki e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr.
Segurança Prejudicado. Ministro Relator.
1. Agravo regimental no qual se discute se há Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Napo-
interesse processual, após a Emenda Constitu- leão Nunes Maia Filho.
cional n. 62/2009, em mandado de segurança Brasília (DF), 02 de agosto de 2011 (Data do Jul-
que objetiva a compensação de débitos tribu- gamento).
tários com crédito de precatório vencido e não (DJe de 5.8.2011)
pago, nos termos do art. 78, § 2º, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias - NOTA DA DIALÉTICA
ADCT. Vide texto de Doutrina de Marcus Abraham
2. No caso, o Tribunal de Justiça do Estado do (RDDT 182:86), e Acórdão do TRF da 4ª Região
Paraná, com apoio no art. 267, VI, do CPC, ex- - 5ª Turma (RDDT 187:202).
tinguiu o processo sem resolução do mérito, de-
negando a segurança, por considerar que “a pro-
mulgação da Emenda Constitucional n. 62/09 e CONTRIBUIÇÃO - CONSELHO
a edição do Decreto Estadual n. 6.335/2010 PROFISSIONAL - MAJORAÇÃO -
constituem fatos novos que conduzem à extin- LEGALIDADE ESTRITA E
ção do processo por superveniente falta de in- ANTERIORIDADE - SUBMISSÃO
teresse processual, uma vez que não é mais
admitida a compensação de débitos tributários AgRg no Agravo em Recurso Especial
com créditos de precatórios, na forma ante- nº 29.659-PR (2011/0182794-2)
riormente prevista no art. 78, § 2º, do ADCT,
acrescentado pela Emenda Constitucional n. Relator: Ministro Herman Benjamin
30/00”. Agravante: Conselho Regional de Engenharia
3. O entendimento jurisprudencial da Primei- Arquitetura e Agronomia Estado do Paraná - Crea/
ra Turma do STJ é no sentido de que o art. 97 PR
do ADCT, ao regular, por inteiro, a matéria Advogado: Edson Soares de Oliveira e Outro(s)
antes disciplinada no art. 78, § 2º, do ADCT, Agravado: Rodovias Integradas do Paraná S/A
revogou, tacitamente, esse último dispositivo Advogado: João Everardo Resmer Vieira e Ou-
constitucional; e que, caso o ente federado de- tro(s)
vedor, opte pelo regime de pagamento previs-
to no inciso I do § 1º do mencionado art. 97, o
Ementa
mandado de segurança que objetiva a compen-
sação de débitos tributários, conforme as re- Processual Civil e Tributário. Anuidade Devi-
gras do anterior regime jurídico previsto no da ao Conselho Profissional. Contribuição
ADCT, encontra-se prejudicado pela superve- Enquadrada no Art. 149 da CF/1988. Majora-
niente alteração normativa. Precedente: RMS ção. Submissão aos Princípios da Legalidade
31.912/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Estrita e Anterioridade. Acórdão Recorrido
Primeira Turma, DJe 25/11/2010. Fundado em Matéria Constitucional e Infra-
4. As Fazendas Públicas Federal, Estaduais, constitucional. Não Interposição de Recurso
Distrital e Municipais estão obrigadas a obser- Extraordinário. Incidência da Súmula 126 do
varem as novas regras constitucionais trazidas STJ.
pela EC n. 62/2009, razão pela qual, diante da 1. Hipótese em que o Tribunal de origem afas-
revogação do art. 78, § 2º, do ADCT, estão tou a majoração da anuidade, qualificando-a
impossibilitadas de pagarem os precatórios de como contribuição de interesse de categoria
forma contrária à previsão constitucional, caso profissional (art. 149, caput, da CF/1988), su-
optem pelo regime especial, como no caso; daí jeita, portanto, ao sistema tributário, notada-
porque prejudicado o mandado de segurança mente aos princípios da legalidade restrita e
pela superveniência da referida emenda cons- anterioridade.
titucional. 2. Firmado o acórdão recorrido em fundamen-
5. Agravo regimental não provido. tos constitucional e infraconstitucional, cada
um suficiente, por si só, para manter inaltera-
Acórdão da a decisão, é ônus da parte recorrente com-
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são provar, ao ser interposto Recurso Especial, o
partes as acima indicadas, acordam os Ministros manejo do Recurso Extraordinário. Aplicação
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi- da Súmula 126 do Superior Tribunal de Justi-
ça, por unanimidade, negar provimento ao agra- ça.
vo regimental, nos termos do voto do Sr. Minis- 3. Agravo Regimental não provido.
Acórdão passou a ser responsável tributária, tornou-se
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são possível aplicar a técnica da aferição indireta
partes as acima indicadas, acordam os Ministros do § 6º do art. 33 da Lei 8.212/91 diretamente
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi- em relação à sua contabilidade, porquanto pas-
ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen- sou a competir a ela o dever de apurar e efeti-
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. var retenções em nome da empresa cedente.
Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis- 4. Não se está a “negar a solidariedade entre a
tros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Ro- empresa contratante e a cedente de mão de
cha, Castro Meira e Humberto Martins votaram obra antes da Lei n. 9.711/98. O óbice à co-
com o Sr. Ministro Relator. brança intentada pela Fazenda Pública é a for-
Brasília, 20 de setembro de 2011 (data do julga- ma utilizada para apurar o crédito tributário,
mento). porquanto se utilizou da aferição indireta a
(DJe de 23.9.2011) partir do exame da contabilidade do devedor
solidário apenas, deixando de buscar os ele-
NOTA DA DIALÉTICA mentos necessários junto à empresa cedente,
Vide Acórdãos do STF - 2ª Turma (RDDT de modo a tratar o devedor solidário como se
194:192), do STJ - 1ª Turma (RDDT 23:186), do substituto tributário fosse, em relação a fatos
TRF da 4ª Região - 1ª Seção (RDDT 157:206), do geradores anteriores à nova sistemática estabe-
TRF da 4ª Região - 1ª Turma (RDDT 11:170) e do lecida a partir da Lei n. 9.711/98.” (AgRg no
TRF da 4ª Região - 2ª Turma (RDDT 103:223). REsp 1.175.241/RS, Rel. Min. Mauro Campbell
Marques, DJe 06.08.10)
5. Agravo regimental não provido.
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -
TOMADOR DE SERVIÇO - Acórdão
SOLIDARIEDADE - AFERIÇÃO INDIRETA - Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
IMPOSSIBILIDADE ANTES DA LEI 9.711/98 partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
AgRg no Agravo de Instrumento ça, por unanimidade, negar provimento ao agra-
nº 1.397.845-RS (2011/0023984-1) vo regimental nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins,
Relator: Ministro Castro Meira Herman Benjamin (Presidente), Mauro Campbell
Agravante: Fazenda Nacional Marques e Cesar Asfor Rocha votaram com o Sr.
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Ministro Relator.
cional Brasília, 20 de setembro de 2011 (data do julga-
Agravado: Open Obras Projetos e Engenharia mento).
Ltda. (DJe de 22.11.2011)
Advogado: Valdir Vilmar Grave Meiner e Outro(s)

Ementa CONTRIBUIÇÕES AO SESC E AO SEBRAE -


Tributário. Embargos à Execução Fiscal. Con- EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS
tribuição Previdenciária. Empresa Tomadora - INCIDÊNCIA - ATIVIDADES -
do Serviço. Solidariedade. Aferição Indireta PANORAMA DA JURISPRUDÊNCIA
antes da Lei 9.711/98. Impossibilidade. Prece- Recurso Especial nº 1.265.176-PR
dentes de Ambas as Turmas de Direito Públi- (2011/0161250-0)
co.
1. No regime vigente até a Lei 9.711/98, a em- Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
presa tomadora dos serviços era apenas deve- Recorrente: Centro de Educação Universitária São
dora solidária da obrigação tributária de pagar José dos Pinhais
a contribuição previdenciária. Advogado: Gonçalo Bonet Allage e Outro(s)
2. A partir da Lei 9.711/98, que conferiu nova Recorrido: Fazenda Nacional
redação ao artigo 31 da Lei 8.212/91, a empre- Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
sa tomadora dos serviços passou a ser respon- cional
sável, por substituição tributária, pela retenção Recorrido: Serviço Social do Comércio - Sesc
de 11% (onze por cento) do valor bruto da res- Advogados: Roberto Rosas e Outro(s)
pectiva nota fiscal ou fatura, bem como pelo Alexandre Fischer Nunes de Olivei-
recolhimento, no prazo legal, da importância ra e Outro(s)
retida. Recorrido: Serviço Brasileiro de Apoio às Micro
3. Portanto, apenas a partir da Lei 9.711/98, e Pequenas Empresas - Sebrae
quando a empresa contratante de mão de obra Advogada: Larissa Moreira Costa e Outro(s)
Ementa buição ao Serviço Brasileiro de Apoio às Mi-
Tributário. Processual Civil. Ausência de Vio- cro e Pequenas Empresas - Sebrae.
lação ao Art. 535, CPC. Contribuição ao Sesc 4. Caso de empresa prestadora de serviços edu-
e Contribuição ao Sebrae. Empresas Prestado- cacionais onde devem incidir as contribuições
ras de Serviços. Incidência. ao Sesc, Senac e Sebrae.
1. Não viola o art. 535, do CPC, o acórdão que 5. Recurso especial não provido.
decide de forma suficientemente fundamenta-
da, não estando obrigada a Corte de Origem a Acórdão
emitir juízo de valor expresso a respeito de to- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
das as teses e dispositivos legais invocados são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
pelas partes. tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
2. As empresas prestadoras de serviço são Justiça, na conformidade dos votos e das notas
aquelas enquadradas no rol relativo ao art. 577 taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
da CLT, atinente ao plano sindical da Confede- “A Turma, por unanimidade, negou provimento
ração Nacional do Comércio - CNC e, portan- ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-
to, estão sujeitas às contribuições destinadas ao Relator, sem destaque.”
Sesc e Senac. Precedente: REsp n. 431.347/SC, Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
Primeira Seção, Rel. Min Luiz Fux, julgado em Meira e Humberto Martins votaram com o Sr.
23.10.2002; AgRgRD no REsp 846.686/RS. Ministro Relator.
2.1. A jurisprudência já afirmou expressamente Não participou, justificadamente, do julgamento
a incidência das ditas contribuições sobre as o Sr. Ministro Herman Benjamin.
seguintes atividades: Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Mauro
a) serviços médicos, de saúde e hospitalares: Campbell Marques.
i. Pela Primeira Turma: AgRg no REsp Brasília (DF), 17 de novembro de 2011.
604.307/PE; AgRg no REsp 605.509/MG; (DJe de 28.11.2011)
AgRg no Ag 539.918/PR; e REsp 499.599/RS;
ii. Pela Segunda Turma: AgRg no REsp
947.992/SP; AgRg no REsp 910.924/BA; CRIME TRIBUTÁRIO - INFORMAÇÕES
AgRg no AgRg no Ag 840.946/RS; REsp FALSAS - CONSTITUIÇÃO DE EMPRESA -
638.835/PE; REsp 911.026/PE; AgRg no Ag INTERPOSIÇÃO DE PESSOAS -
753.002/RS; PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL
b) serviços de ensino e educação:
i. Pela Primeira Turma: EDcl no REsp Habeas Corpus 104.325
1.044.459/PR; AgRg no Ag 882.956/MG;
REsp 887.238/PR; REsp 699.057/SE; Origem: HC - 104325 - Supremo Tribunal Fede-
ii. Pela Segunda Turma: AgRg no Ag ral
1.347.220/SP; AgRgRD no REsp 846.686/RS; Proced.: Rio Grande do Norte
REsp 886.018/PR; AgRg no REsp 1.041.574/PR; Relator: Min. Marco Aurélio
REsp 1.049.228/PE; AgRg no REsp 713.653/PR; Pacte(s).: ...
REsp 928.818/PE; Impte(s).: Ruben Antônio Machado Vieira Mariz
c) serviços de vigilância e segurança: Pela Pri- Coator(a/s)(es): Superior Tribunal de Justiça
meira Turma: AgRg nos EDcl no REsp
1.124.653/RJ; AgRg no Ag 936.749/MG; Decisão: Por maioria de votos, a Turma denegou
REsp 668.110/AL; AgRg no Ag 752.799/SP; a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do
AgRg no REsp 717.602/CE; REsp 502.350/SC; Relator, vencido o Senhor Ministro Dias Toffoli.
d) serviços de engenharia e arquitetura: Pela Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia. 1ª
Segunda Turma: AgRg no Ag 925.862/SP; Turma, 18.10.2011.
REsp 857.842/PR; AgRg no Ag 518.582/MG; Ação Penal - Trancamento - Excepcionalidade.
e) serviços de administração, pela Segunda O trancamento da ação penal, na via do habeas
Turma: REsp 699.162/SC; REsp 491.633/SC; corpus, surge no campo da excepcionalidade.
2.2. Por outro lado, foram excluídas as seguin- Crime Tributário - Informações Falsas. Surgin-
tes atividades: do da denúncia a notícia de falsidade quanto a
a) serviços de comunicação e publicidade: informações sobre a constituição de empresa
i. Pela Primeira Turma: REsp 479.062/PR; visando driblar o Fisco, inclusive com a utili-
AgRg no REsp 1.243.261/PR; zação de interposta pessoa, descabe cogitar de
ii. Pela Segunda Turma: REsp 855.718/RS. inexistência de justa causa para o curso do pro-
3. Havendo a incidência das exações ao Sesc, cesso.
Senac, Sesi ou Senai também incide a contri- (DJe de 1º.12.2011, p. 21)
DCTF - COMPENSAÇÃO - EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO -
REJEIÇÃO - AUSÊNCIA DE ELETROBRAS - TROCA POR OBRIGAÇÕES
INTIMAÇÃO DO CONTRIBUINTE - AO PORTADOR - RESGATE - PRAZO DE
INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA - NATUREZA DECADENCIAL
IMPOSSIBILIDADE
AgRg no Agravo de Instrumento
AgRg no Recurso Especial nº 1.250.139-MG nº 1.414.327-PR (2011/0076162-4)
(2011/0089095-2)
Relator: Ministro Herman Benjamin
Relator: Ministro Humberto Martins Agravante: Agrobil Madeiras Ltda.
Agravante: Fazenda Nacional Advogada: Tânia Regina Pereira e Outro(s)
Agravado: União
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Agravado: Centrais Elétricas Brasileiras S/A -
cional Eletrobrás
Agravado: Gustamar Indústria e Comércio de Advogado: Carlos A. Barata Silva Neto e Outro(s)
Malhas Ltda.
Advogado: Francisco Xavier Amaral e Outro(s) Ementa
Processual Civil e Tributário. Eletrobras. Em-
Ementa préstimo Compulsório. Obrigações ao Porta-
Tributário. Mandado de Segurança. Apresenta- dor. Prescrição Versus Decadência.
ção de Declaração de Contribuição e Tributos 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp
Federais (DCTF). Rejeição pela SRF. Ausên- 1.050.199/RJ, submetido ao rito dos recursos
cia de Intimação do Contribuinte. Inscrição do repetitivos (art. 543-C do CPC), pacificou as
Débito Declarado em Dívida Ativa. Impossibi- seguintes questões: (a) as Obrigações ao Por-
lidade. tador emitidas pela Eletrobras não são debên-
1. A apresentação de DCTF ou documento tures; (b) a relação entre a Eletrobras (delegada
equivalente, pelo contribuinte, dispensa o Fis- da União) e o titular do crédito é de direito
co de proceder à constituição formal do crédi- administrativo, aplicando-se, em tese, o co-
to tributário. Caso o Fisco não concorde com mando do Decreto 20.910/1932; (c) o direito
os termos da DCTF ou do documento apresen- ao resgate configura-se potestativo. Portanto, a
regra do art. 4º, § 11, da Lei 4.156/1962 - que
tado, deve proceder ao lançamento de ofício,
estabelece o prazo de cinco anos, tanto para o
com abertura de prazo para impugnação. consumidor efetuar a troca das contas de ener-
2. É vedada a imediata inscrição em dívida ati- gia por Obrigações ao Portador, quanto para
va dos valores confessados em DCTF, quando posteriormente efetuar o resgate - fixa prazo
o referido documento informar a quitação do decadencial, e não prescricional.
crédito tributário por compensação. Preceden- 2. Opera-se a decadência na hipótese de decor-
tes: REsp 1.140.730/RS, Rel. Min. Mauro rer mais de cinco anos entre a data do venci-
Campbell Marques, Segunda Turma, julgado mento das Obrigações ao Portador e a do ajui-
em 14.6.2011, DJe 21.6.2011; AgRg no Ag zamento da ação.
1.285.897/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 3. Relativamente à verba honorária, cumpre re-
Segunda Turma, julgado em 19.10.2010, DJe conhecer a sucumbência recíproca, devendo o
3.2.2011. percentual, arbitrado na Corte de origem (10%
Agravo regimental improvido. sobre o valor da condenação), ser distribuído
e compensado na proporção da vitória das par-
Acórdão tes, o que deverá ser aferido pelo Juízo da Exe-
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são cução.
partes as acima indicadas, acordam os Ministros 4. Agravo Regimental não provido.
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen- Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
partes as acima indicadas, acordam os Ministros
Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis- da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
tros Herman Benjamin (Presidente), Mauro Camp- ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
bell Marques, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
votaram com o Sr. Ministro Relator. Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis-
Brasília (DF), 27 de setembro de 2011 (Data do tros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Ro-
Julgamento). cha, Castro Meira e Humberto Martins votaram
(DJe de 4.10.2011) com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 08 de novembro de 2011 (data do julga- 1.2. Sistemática de conversão do crédito em
mento). ações, como previsto no DL 1.512/76, inde-
(DJe de 14.11.2011) pendentemente da anuência dos credores.
2. Correção Monetária sobre o Principal:
2.1. Os valores compulsoriamente recolhidos
EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO - ENERGIA devem ser devolvidos com correção monetária
ELÉTRICA - CORREÇÃO MONETÁRIA - plena (integral), não havendo motivo para a su-
REFLEXO NOS JUROS REMUNERATÓRIOS pressão da atualização no período decorrido
- PRESCRIÇÃO entre a data do recolhimento e o 1º dia do ano
subseqüente, que deve obedecer à regra do art.
Recurso Especial nº 1.282.634-DF 7º, § 1º, da Lei 4.357/64 e, a partir daí, o crité-
(2011/0220900-6) rio anual previsto no art. 3º da mesma lei.
2.2. Devem ser computados, ainda, os expur-
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques gos inflacionários, conforme pacificado na ju-
Recorrente: Companhia Maranhense de Refrige- risprudência do STJ, o que não importa em
rantes e Outro ofensa ao art. 3º da Lei 4.357/64.
Advogado: Fernanda Gadelha Araújo Lima e 2.3. Entretanto, descabida a incidência de cor-
Outro(s) reção monetária em relação ao período com-
Recorrido: Fazenda Nacional preendido entre 31/12 do ano anterior à con-
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- versão e a data da assembléia de homologa-
cional ção.
Recorrido: Centrais Elétricas Brasileiras S/A - 3. Correção Monetária sobre Juros Remunera-
Eletrobrás tórios:
Advogado: Jorge Carlos Silva Lustosa e Outro(s) Devida, em tese, a atualização monetária sobre
juros remuneratórios em razão da ilegalidade
Ementa do pagamento em julho de cada ano, sem in-
Processual Civil. Direito Tributário e Adminis- cidência de atualização entre a data da consti-
trativo. Empréstimo Compulsório sobre o tuição do crédito em 31/12 do ano anterior e o
Consumo de Energia Elétrica. Diferença de efetivo pagamento, observada a prescrição
Correção Monetária sobre o Principal e Refle- qüinqüenal. Entendimento não aplicado no
xo nos Juros Remuneratórios. Prescrição. Pra- caso concreto por ausência de pedido da parte
zo Quinquenal. Decreto n. 20.910/32. Termo autora. Acórdão reformado no ponto em que
Inicial. Tema já Julgado pelo Regime do Art. determinou a incidência dos juros de 6% ao
543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/08 que ano a partir do recolhimento do tributo, desvir-
tratam dos Recursos Representativos de Con- tuando a sistemática legal (art. 2º, caput e § 2º,
trovérsia. do Decreto-lei 1.512/76 e do art. 3º da Lei
1. A forma de devolução do empréstimo com- 7.181/83).
pulsório sobre o consumo de energia elétrica é 4. Juros Remuneratórios sobre a Diferença da
tema já analisado em julgamento realizado na Correção Monetária:
Primeira Seção, no dia 12 de agosto de 2009, São devidos juros remuneratórios de 6% ao
onde foram apreciados o REsp n. 1.003.955- ano (art. 2º do Decreto-lei 1.512/76) sobre a di-
RS e o REsp n. 1.028.592-RS, elencados como ferença de correção monetária (incluindo-se os
recursos representativos da controvérsia para expurgos inflacionários) incidente sobre o
efeito do art. 543-C, do CPC, e Resolução STJ principal (apurada da data do recolhimento até
n. 8/2008, ambos de relatoria da Ministra Elia- 31/12 do mesmo ano). Cabível o pagamento
na Calmon, cuja ementa do primeiro transcre- dessas diferenças à parte autora em dinheiro ou
vo, no que pertine ao presente caso: na forma de participação acionária (ações pre-
1. Empréstimo Compulsório da Eletrobrás: ferenciais nominativas), a critério da Eletro-
Conversão dos Créditos pelo Valor Patrimo- brás, tal qual ocorreu em relação ao principal,
nial da Ação: nos termos do Decreto-lei 1.512/76.
1.1. Cabível a conversão dos créditos em ações 5. Prescrição:
pelo valor patrimonial e não pelo valor de mer- 5.1. É de cinco anos o prazo prescricional para
cado, por expressa disposição legal (art. 4º da cobrança de diferenças de correção monetária
Lei 7.181/83) e por configurar-se critério mais e juros remuneratórios sobre os valores reco-
objetivo, o qual depende de diversos fatores lhidos a título de empréstimo compulsório à
nem sempre diretamente ligados ao desempe- Eletrobrás.
nho da empresa. Legalidade do procedimento 5.2. Termo a Quo da Prescrição: o termo ini-
adotado pela Eletrobrás reconhecida pela cial da prescrição surge com o nascimento da
CVM. pretensão (actio nata), assim considerada a
possibilidade do seu exercício em juízo. Con- do acórdão à míngua de recurso da parte inte-
ta-se, pois, o prazo prescricional a partir da ressada.
ocorrência da lesão, sendo irrelevante seu co- 6.3. Juros Moratórios: Sobre os valores apu-
nhecimento pelo titular do direito. Assim: rados em liquidação de sentença devem incidir,
a) quanto à pretensão da incidência de corre- até o efetivo pagamento, correção monetária e
ção monetária sobre os juros remuneratórios juros moratórios a partir da citação:
de que trata o art. 2º do Decreto-lei 1.512/76 a) de 6% ao ano, até 11/01/2003 (quando en-
(item 3), a lesão ao direito do consumidor trou em vigor o novo Código Civil) - arts.
ocorreu, efetivamente, em julho de cada ano 1.062 e 1.063 do CC/1916;
vencido, no momento em que a Eletrobrás rea- b) a partir da vigência do CC/2002, deve inci-
lizou o pagamento da respectiva parcela, me- dir a taxa que estiver em vigor para a mora do
diante compensação dos valores nas contas de pagamento de impostos devidos à Fazenda
energia elétrica; Nacional. Segundo a jurisprudência desta Cor-
b) quanto à pretensão de correção monetária te, o índice a que se refere o dispositivo é a taxa
incidente sobre o principal (item 2), e dos ju- Selic.
ros remuneratórios dela decorrentes (item 4), 7. Não Cumulação da Taxa Selic: Consideran-
a lesão ao direito do consumidor somente do que a taxa Selic, em sua essência, já com-
ocorreu no momento da restituição do emprés- preende juros de mora e atualização monetária,
timo em valor “a menor”. a partir de sua incidência não há cumulação
Considerando que essa restituição se deu em desse índice com juros de mora. Não aplicação
forma de conversão dos créditos em ações da de juros moratórios na hipótese dos autos, em
companhia, a prescrição teve início na data em atenção ao princípio da non reformatio in pe-
que a Assembléia-Geral Extraordinária homo- jus.
logou a conversão a saber: 8. Em Resumo:
a) 20/04/1988 - com a 72ª AGE - 1ª conversão; Nas ações em torno do empréstimo compulsó-
b) 26/04/1990 - com a 82ª AGE - 2ª conversão; rio da Eletrobrás de que trata o DL 1.512/76,
e c) 30/06/2005 - com a 143ª AGE - 3ª conver- fica reconhecido o direito às seguintes parce-
são. las, observando-se que o prazo situa-se em tor-
no de três questões, basicamente:
6. Débito Objeto da Condenação. Correção
a) diferença de correção monetária sobre o
Monetária e Juros de Mora: principal e os juros remuneratórios dela decor-
6.1. Correção Monetária: Os valores objeto da rentes (itens 2 e 4);
condenação judicial ficam sujeitos a correção b) correção monetária sobre os juros remune-
monetária, a contar da data em que deveriam ratórios (item 3);
ter sido pagos: c) sobre o valor assim apurado, incidem os en-
a) quanto à condenação referente às diferenças cargos próprios dos débitos judiciais (correção
de correção monetária paga a menor sobre em- monetária desde a data do vencimento - item
préstimo compulsório, e os juros remunerató- 6.1 e 6.2 e juros de mora desde a data da cita-
rios dela decorrentes (itens 2 e 4 supra), o dé- ção - item 6.3).
bito judicial deve ser corrigido a partir da data 2. Decisão que não se encontra de acordo com
da correspondente assembléia-geral de homo- os precedentes representativos da controvérsia
logação da conversão em ações; REsp n. 1.003.955-RS e REsp n. 1.028.592-RS,
b) quanto à diferença de juros remuneratórios Primeira Seção, Rel. Min. Eliana Calmon, jul-
(item 4 supra), o débito judicial deve ser cor- gados em 12.8.2009, carecendo de adequação
rigido a partir do mês de julho do ano em que quanto à prescrição (o que foi feito no AgRg
os juros deveriam ter sido pagos. no AG nº 1.299.570-DF e no AgRg no AG nº
6.2. Índices: observado o Manual de Cálculos 1.357.754-DF) e quanto à incidência de juros
da Justiça Federal e a jurisprudência do STJ, de mora na forma do precedente EREsp nº
cabível o cômputo dos seguintes expurgos in- 826.809-RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mau-
flacionários em substituição aos índices ofi- ro Campbell Marques, julgado em 10.8.2011.
ciais já aplicados: 14,36% (fevereiro/86), 3. Recurso especial do particular parcialmen-
26,06% ( junho/87), 42,72% ( janeiro/89), te provido.
10,14% (fevereiro/89), 84,32% (março/90),
44,80% (abril/90), 7,87% (maio/90), 9,55% Acórdão
( junho/90), 12,92% ( julho/90), 12,03% (agos- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
to/90), 12,76% (setembro/90), 14,20% (outu- são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
bro/90), 15,58% (novembro/90), 18,30% (de- tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
zembro/90), 19,91% ( janeiro/91), 21,87% (fe- Justiça, na conformidade dos votos e das notas
vereiro/91) e 11,79% (março/91). Manutenção taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
“A Turma, por unanimidade, deu parcial provi- econômico (art. 5º, Lei n. 9.469/97), em razão
mento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Mi- da sua situação de devedora solidária, a refe-
nistro-Relator, sem destaque.” rendar o deslocamento para a Justiça Federal.
Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro 4. Os títulos denominados “Obrigações ao Por-
Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin tador” entregues quando da devolução do em-
(Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. préstimo compulsório sobre o consumo de
Brasília (DF), 08 de novembro de 2011. energia elétrica, veiculam direitos que foram
(DJe de 17.11.2011) atingidos pela decadência. Precedente: recur-
so representativo da controvérsia REsp nº
1.050.199-RJ, Primeira Seção, Rel. Min. Elia-
EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE na Calmon, julgado em 10.12.2008.
CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA - 5. No caso dos autos, título foi emitido em
INTERESSE JURÍDICO DA UNIÃO - 1969 e deveria ter sido resgatado em 1989
SOLIDARIEDADE (vinte anos a contar do ano de emissão), caben-
do ao autor ingressar em juízo até 1994 (cinco
Recurso Especial nº 1.271.634-RS anos depois). Tendo sido a presente ação pro-
(2011/0189577-0) posta somente em 2009 restou caracterizada a
decadência.
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques 6. Recurso especial não provido.
Recorrente: Andre Pires de Moraes
Advogado: Ademir Canali Ferreira e Outro(s) Acórdão
Recorrido: Centrais Elétricas Brasileiras S/A Ele- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
trobrás são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
Advogado: Leandro Barata Silva Brasil e Outro(s) tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
Recorrido: União Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
Ementa “A Turma, por unanimidade, negou provimento
Processual Civil. Tributário. Resgate do Em- ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-
préstimo Compulsório sobre o Consumo de Relator, sem destaque.”
Energia Elétrica. Interesse Jurídico da União Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
(Art. 109, I, CF/88) e não meramente Econô- Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin
mico (Art. 5º, Lei n. 9.469/97). Competência (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
da Justiça Federal. Obrigações ao Portador. Brasília (DF), 22 de novembro de 2011.
Decadência. (DJe de 1º.12.2011)
1. A Corte de Origem, ao considerar que a
União tem “evidente interesse jurídico e eco-
nômico em causas que afetem o patrimônio de EXECUÇÃO FISCAL - CONTRIBUIÇÕES
sociedade de economia mista da qual detém SOCIAIS - REMISSÃO - EXTENSÃO AOS
posição de acionista majoritária e o próprio DÉBITOS RELATIVOS AO FGTS -
serviço público prestado por meio da estatal”, IMPOSSIBILIDADE
destoou da jurisprudência deste STJ, pois o
fato de haver impacto no patrimônio de empre- Recurso Especial nº 1.270.267-CE
sa estatal não implica em interesse jurídico, (2011/0184751-8)
mas interesse econômico a ensejar a interven-
ção anômala prevista no art. 5º, da Lei n. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
9.469/97, que não implica em deslocamento da Recorrente: Edmundo de Castro e Silva
competência para a Justiça Federal. Advogado: Bruno de Andrade Lage - Defensoria
2. No entanto, nas causas onde se discute a de- Pública da União
volução do empréstimo compulsório sobre o Recorrido: Fazenda Nacional
consumo de energia elétrica, instituído em fa- Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
vor da Eletrobrás pela Lei n. 4.156/62, há inú- cional
meros precedentes desta Casa no sentido de
que a responsabilidade da União é solidária Ementa
à da Eletrobrás pelo valor nominal dos crédi- Tributário. Execução Fiscal. Remissão para as
tos a serem resgatados pelo particular. Contribuições Sociais Destinadas ao FGTS.
3. Desse modo, quando intervém a União nos Precedente em Recurso Especial Representa-
autos a fim de declarar seu interesse em tais tivo de Controvérsia. REsp n. 1.208.935/AM.
causas, deve ser reconhecido o seu interesse 1. Discute-se nos autos sobre a possibilidade
jurídico (art. 109, I, CF/88) e não meramente de se estender a remissão prevista no art. 14 da
MP n. 449/08, convertida na Lei n. 11.941/09, Justificada. Entendimento Atual das Turmas
aos débitos relativos ao Fundo de Garantia por que integram a Primeira Seção/STJ. Óbice da
Tempo de Serviço. Súmula 168/STJ.
2. Sobre o assunto, a Primeira Seção desta 1. Não obstante os arestos paradigmas, inexiste
Corte, ao julgar o REsp n. 1.208.935/AM, controvérsia de entendimento, atualmente, en-
mediante o procedimento descrito no art. 543- tre as Turmas que integram a Primeira Seção
C do CPC (recursos repetitivos), consolidou o desta Corte, no que se refere ao não cabimen-
entendimento segundo o qual a citada legisla- to de honorários advocatícios quando a execu-
ção não estabeleceu remissão para as contribui- ção fiscal é extinta em razão da superveniên-
ções instituídas pela Lei n. 8.036/90 (Fundo de cia de lei que ensejou a remissão do crédito
Garantia do Tempo de Serviço - FGTS), por se tributário. Assim, nessa hipótese, não são de-
tratar de recurso dos trabalhadores e não da vidos honorários advocatícios pela Fazenda
Fazenda Nacional, mas somente para as contri- Pública, pois, à época do ajuizamento, a de-
buições previstas na LC n. 110/2001, o que manda tinha causa justificada.
não é a hipótese dos autos. 2. “Não cabem embargos de divergência,
3. Recurso especial não provido. quando a jurisprudência do tribunal se firmou
no mesmo sentido do acórdão embargado.”
Acórdão (Súmula 168/STJ)
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que 3. Agravo regimental não provido.
são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Acórdão
Justiça, na conformidade dos votos e das notas Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
“A Turma, por unanimidade, negou provimento tros da Primeira Seção do Superior Tribunal de
ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro- Justiça, na conformidade dos votos e das notas
Relator, sem destaque.” taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro “A Seção, por unanimidade, negou provimento ao
Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Mi-
Ministro Relator. nistro Relator.”
Não participou, justificadamente, do julgamento Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Cesar As-
o Sr. Ministro Herman Benjamin. for Rocha, Francisco Falcão, Teori Albino Zavas-
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Mauro cki, Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins,
Campbell Marques. Herman Benjamin e Napoleão Nunes Maia Filho
Brasília (DF), 17 de novembro de 2011. votaram com o Sr. Ministro Relator.
(DJe de 28.11.2011) Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Mei-
ra.
Brasília (DF), 23 de novembro de 2011.
EXECUÇÃO FISCAL - EXTINÇÃO - (DJe de 30.11.2011)
REMISSÃO - HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS - NÃO CABIMENTO
EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA -
AgRg nos Embargos de Divergência em PRECATÓRIO - DIREITO DE CRÉDITO -
REsp nº 1.139.726-SC (2011/0215962-5) POSSIBILIDADE DE RECUSA POR PARTE
DA FAZENDA
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
Agravante: Laminados AB Ltda. AgRg no Agravo em Recurso Especial
Advogado: Dalton Luiz Dallazem e Outro(s) nº 4.671-RS (2011/0056987-8)
Agravado: Fazenda Nacional
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- Relator: Ministro Benedito Gonçalves
cional Agravante: Lojas Volpato Ltda.
Advogado: Nelson Lacerda da Silva e Outro(s)
Ementa Agravado: Estado do Rio Grande do Sul
Processual Civil. Agravo Regimental nos Em- Procurador: Natália de Azevedo Morsch e Ou-
bargos de Divergência. Execução Fiscal. Ex- tro(s)
tinção em Razão da Superveniência de Lei que
ensejou a Remissão do Crédito Tributário. Hi- Ementa
pótese em que não são Devidos Honorários Processual Civil e Tributário. Agravo Regi-
Advocatícios pela Fazenda Pública, pois, à mental no Agravo em Recurso Especial. Exe-
Época do Ajuizamento, a Ação tinha Causa cução Fiscal. Precatórios Oferecidos à Penho-
ra. Recusa por Parte da Fazenda. Possibilida- Advogado: Mônica Elisa Steffen - Defensora Pú-
de. Não Observância da Gradação Legal. Ma- blica e Outros
téria Pacificada no Âmbito da Primeira Seção. Agravado: Estado do Rio Grande do Sul
Precedente REsp 1.090.898/SP, DJ 31/8/2009, Procurador: Cláudio Fernando Varnieri e Outro(s)
Submetido ao Art. 543-C do CPC.
1. A jurisprudência do STJ pacificou-se no Ementa
sentido de que é legítima a recusa, por parte da Processual Civil. Execução Fiscal. Prescrição
Fazenda Pública, de bem nomeado à penhora Intercorrente. Decretação de Ofício, sem Pré-
caso não observada a gradação legal, não ha- via Oitiva da Fazenda Pública.
vendo falar em violação do art. 620 do CPC. 1. O STJ vem flexibilizando a literalidade do
2. Especificamente, com relação a créditos de- disposto no art. 40, § 4º, da Lei 6.830/1980
rivados de ações judiciais, representados por para manter a decisão que decreta a prescrição
precatórios, o STJ, por ocasião do julgamento intercorrente sem oitiva prévia da Fazenda
do REsp n. 1.090.898/SP, assentou que: “o cré- Pública quando esta, no recurso interposto
dito representado por precatório é bem penho- contra a sentença de extinção do feito, não de-
rável, mesmo que a entidade dele devedora não monstra o prejuízo suportado (compatibiliza-
seja a própria exeqüente, enquadrando-se na ção com o princípio processual pas de nullitè
hipótese do inciso XI do art. 655 do CPC, por sans grief ).
se constituir em direito de crédito”; contudo, 2. A orientação acima, no entanto, é inaplicá-
destacou que: “não se equiparando o precató- vel no âmbito do Recurso Especial, conforme
rio a dinheiro ou fiança bancária, mas a direi- será abaixo exposto.
to de crédito, pode a Fazenda Pública recusar 3. No caso concreto, o Tribunal de origem in-
a substituição por quaisquer das causas previs- troduziu ex officio o aludido fundamento (pres-
tas no art. 656 do CPC ou nos arts. 11 e 15 da crição intercorrente) para solucionar os Embar-
LEF”. gos Infringentes, sem que as partes pudessem
3. Agravo regimental não provido. se manifestar a respeito.
4. O Recurso Especial, in casu, não se presta
a comprovar o dano supostamente sofrido,
Acórdão dado o impedimento à incursão no acervo fá-
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são tico-probatório.
partes as acima indicadas, acordam os Ministros 5. Por essa razão, a decretação da prescrição
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi- intercorrente, sem que a Fazenda Pública pos-
ça, por unanimidade, negar provimento ao agra- sa previamente se manifestar, torna nulo o
vo regimental, nos termos do voto do Sr. Minis- acórdão hostilizado, por violar o art. 40, § 4º,
tro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavas- da Lei 6.830/1980.
cki e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. 6. Agravo Regimental não provido.
Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Napo- Acórdão
leão Nunes Maia Filho. Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Brasília (DF), 04 de agosto de 2011 (Data do Jul- partes as acima indicadas, acordam os Ministros
gamento). da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
(DJe de 10.8.2011) ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
NOTA DA DIALÉTICA Ministro-Relator.” Os Srs. Ministros Mauro
Vide Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT Campbell Marques, Castro Meira e Humberto
185:203) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 162:214, Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
166:219, 171:221 e 185:204). Não participou, justificadamente, do julgamento
o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.
Brasília, 04 de outubro de 2011 (data do julga-
EXECUÇÃO FISCAL - PRESCRIÇÃO mento).
INTERCORRENTE - DECRETAÇÃO DE (DJe de 17.10.2011)
OFÍCIO SEM PRÉVIA OITIVA DA
FAZENDA PÚBLICA - NULIDADE NOTA DA DIALÉTICA
Vide Íntegra de Acórdão do TRF da 4ª Região -
AgRg no Recurso Especial nº 1.236.887-RS 1ª Turma (RDDT 125:153), Decisões da Ministra
(2011/0031117-7) Denise Arruda, do STJ (RDDT 119:204) e do
Magistrado José Antonio Lisboa Neiva, do TRF
Relator: Ministro Herman Benjamin da 2ª Região (RDDT 122:208), e Acórdãos do
Agravante: DT Distribuidora de Equipamentos de STJ - 1ª Turma (RDDT 102:228, 124:216,
Telecomunicações Ltda. e Outros 134:221 e 156:219), do STJ - 2ª Turma (RDDT
95:228, 96:235 e 111:217), do TRF da 1ª Região mento à apelação da Fazenda Nacional, nos ter-
- 8ª Turma (RDDT 121:229 e 123:216), do TRF mos do voto da relatora.
da 3ª Região - 6ª Turma (RDDT 123:218), do Brasília/DF, 28 de outubro de 2011.
TRF da 4ª Região - 1ª Turma (RDDT 124:228), Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardo-
do TRF da 4ª Região - 2ª Turma (RDDT 119:234, so
120:226 e 123:217) e do TRF da 5ª Região - 3ª Relatora
Turma (RDDT 139:229). (e-DJF1 de 25.11.2011, p. 898)

EXECUÇÃO FISCAL - PRESCRIÇÃO EXECUÇÃO FISCAL -


OCORRIDA ANTES DA PROPOSITURA DA REDIRECIONAMENTO - DISSOLUÇÃO
AÇÃO - DECRETAÇÃO DE OFÍCIO - IRREGULAR DA EMPRESA - PRESCRIÇÃO
POSSIBILIDADE
AgRg no Agravo de Instrumento
Apelação/Reexame Necessário nº 1.253.557-SP (2009/0227282-7)
n. 0027576-02.2010.4.01.9199/GO
Relator: Ministro Herman Benjamin
Processo Orig.: 200802630426 Agravante: José Augusto Salgado e Outros
Relatora: Desembargadora Federal Maria do Car- Advogado: José Luiz Matthes e Outro(s)
mo Cardoso Agravado: Fazenda do Estado de São Paulo
Apelante: Fazenda Nacional Procurador: Carlos Alberto Bittar Filho e Outro(s)
Procurador: Luiz Fernando Juca Filho
Apelado: Dinauto Distribuidora Nacional de Au- Ementa
tomóveis Ltda. Processual Civil e Tributário. Execução Fiscal.
Remetente: Juízo de Direito da Vara das Fazendas Redirecionamento. Prescrição. Fundamento
Públicas da Comarca de Formosa-GO Inatacado. Súmula 283/STF.
1. Deixa-se de aplicar a suspensão ou sobres-
Ementa tamento do feito cuja matéria encontra-se vin-
Processual Civil e Tributário. Sentença por Có- culada a Recurso Especial submetido ao rito
pia. Nulidade Reconhecida. Prescrição. Análi- dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC)
se de Ofício. Possibilidade. Tributos Sujeitos quando não for ultrapassado o juízo de admis-
a Lançamento por Homologação. Confissão de sibilidade no feito.
Débito. Art. 174 do CTN. Parcelamento. Inter- 2. Hipótese em que se discute suposta ocorrên-
rupção. Prescrição Afastada. cia de prescrição para o redirecionamento, por-
1. Nula a sentença juntada aos autos por cópia, que entre a citação da empresa (1992) e a dos
sócios-gerentes (2.5.2000) teria transcorrido
diante da falta da assinatura do juiz, requisito prazo superior a cinco anos.
essencial (art. 164 do CPC). Por versar ques- 3. Não foram atacados, porém, os seguintes
tão exclusivamente de direito e estar em con- fundamentos adotados pelo Tribunal de ori-
dições de imediato julgamento, aplicável o art. gem: (a) a causa do redirecionamento - disso-
515, § 3º, do CPC. lução irregular da empresa - data de 2000,
2. Em execução fiscal, a prescrição ocorrida mesmo exercício em que o juiz, ex officio, de-
antes da propositura da ação pode ser decre- terminou a inclusão dos ora agravantes no pólo
tada de ofício (art. 219, § 5º, do CPC) - Súmu- passivo da Execução Fiscal; e (b) a Fazenda
la 409/STJ. Pública jamais ficou inerte, de modo que os
3. O prazo da prescrição interrompido pela obstáculos que encontrou não podem a ela ser
confissão e parcelamento da dívida fiscal re- imputados, mas sim à morosidade inerente ao
começa a fluir no dia que o devedor deixa de processamento da Execução Fiscal no âmbi-
cumprir o acordo celebrado - enunciado 248 to do Poder Judiciário - ou seja, aplicou-se
da Súmula do extinto TFR. expressamente, de forma análoga, a Súmula
4. Não transcorridos mais de cinco anos (art. 106/STJ.
174 do CTN) entre a exclusão do parcelamen- 4. Não se conhece de Recurso Especial que
to e o ajuizamento da execução fiscal, deve ser deixa de impugnar fundamento apto à manu-
afastada a prescrição do crédito tributário. tenção do acórdão hostilizado. Incide, por ana-
5. Apelação a que se dá provimento, para anu- logia, a Súmula 283/STF.
lar a sentença. Prescrição afastada. 5. Agravo Regimental não provido.
Acórdão Acórdão
Decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Fe- Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
deral da 1ª Região, por unanimidade, dar provi- partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi- go 3º da Lei nº 6.360/76, que dispondo sobre
ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen- as normas de vigilância sanitária, classificou os
to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. sabonetes como produtos de higiene pessoal.
Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis- Tal ponto é de grande relevância para a deman-
tros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Ro- da. Desse modo, ao rejeitar os embargos decla-
cha, Castro Meira e Humberto Martins (Presiden- ratórios, deixando, contudo, de se pronunciar
te) votaram com o Sr. Ministro Relator. sobre a questão neles suscitada, o Tribunal de
Brasília, 07 de junho de 2011 (data do julgamen- origem acabou por violar o art. 535 do Códi-
to). go de Processo Civil.
(DJe de 12.9.2011) 5. Recurso especial provido.

Acórdão
ICMS - ALÍQUOTA - SABONETES - Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
PRODUTOS DE HIGIENE OU DE são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
TOUCADOR tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
Justiça, na conformidade dos votos e das notas
Recurso Especial nº 1.249.361-MG taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
(2011/0053161-8) “A Turma, por unanimidade, deu provimento ao
recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Re-
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques lator, sem destaque.”
Recorrente: Natura Cosméticos S/A Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
Advogados: Julio M. de Oliveira e Outro(s) Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin
Daniel Lacasa Maya e Outro(s) (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Recorrido: Estado de Minas Gerais Brasília (DF), 08 de novembro de 2011.
Procurador: Marco Tulio Caldeira Gomes e (DJe de 17.11.2011)
Outro(s)

Ementa ICMS - CHAMADAS TELEFÔNICAS


Processual Civil. Porte de Remessa e Retorno INTERNACIONAIS - DDI - ILEGITIMIDADE
dos Autos. Deserção não Verificada. Tributá- PASSIVA DA EMPRESA DE TELEFONIA
rio. ICMS. Sabonete. Alíquota Aplicada. Arti- LOCAL
go 3º da Lei nº 6.360/76. Violação do Art. 535
do CPC Configurada. EDcl no AgRg no Recurso Especial
1. Trata-se de recurso especial contra acórdão nº 1.157.106-MT (2009/0162827-3)
proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de
Minas Gerais que, classificando os sabonetes Relator: Ministro Benedito Gonçalves
como produtos de toucador, decidiu pela apli- Embargante: Estado de Mato Grosso
cação da alíquota de ICMS de 25%. Procurador: Rogério Luiz Gallo e Outro(s)
2. O Estado de Minas Gerais, em sede de agra- Embargado: Brasil Telecom S/A
vo regimental apresentado em face da decisão Advogados: Daniela Allam Giacomet
que determinou a subida do recurso especial, Gustavo do Amaral Martins e Ou-
alegou que seria inviável o conhecimento do tro(s)
presente recurso especial, tendo em vista que Leonardo Faria Schenk
a ora recorrente não teria comprovado o reco- Lyvia de Moura Amaral
lhimento do porte e retorno dos autos, por- Wesley Batista de Abreu
quanto não houve referência ao número do res-
pectivo processo. Tal argumento não merece Ementa
prosperar, uma vez que, na hipótese, foi pos- Processual Civil e Tributário. Embargos de
sível se aferir a efetivação do recolhimento do Declaração no Agravo Regimental no Recur-
preparo por outros meios. so Especial. ICMS. Tributação sobre Chama-
3. De acordo com o art. 535 do Código de Pro- das Internacionais (DDI) Realizadas pela Em-
cesso Civil, os embargos declaratórios são ca- bratel. Ilegitimidade Passiva da Empresa de
bíveis quando houver, na sentença ou no acór- Telefonia Local que não pratica o Fato Gera-
dão, obscuridade ou contradição, ou quando dor. Alegada Omissão no Acórdão Embarga-
for omitido ponto sobre o qual se devia pro- do quanto à Aplicação da Súmula 7/STJ e do
nunciar o juiz ou tribunal. Art. 155, II, da CF. Vícios de Integração não
4. No caso concreto, o Tribunal de origem, Evidenciados.
mesmo com a interposição dos embargos de 1. Os embargos de declaração, ainda que ma-
declaração, não se manifestou acerca do arti- nejados para fins de prequestionamento, são
cabíveis quando o provimento jurisdicional Agravante: Castel Frutas Comercial Ltda.
padece de omissão, contradição ou obscurida- Advogado: Paulo César Guillet Stenstrasses e
de, nos ditames do art. 535, I e II, do CPC, bem Outro(s)
como para sanar a ocorrência de erro material. Agravado: Estado de Santa Catarina
2. Na espécie, o acórdão embargado foi claro Procurador: Carla Beatriz Debiasi e Outro(s)
ao decidir que a apreciação do recurso especial
não exige reexame de provas, mas da correta Ementa
repercussão jurídica advinda dos fatos consi- Tributário. ICMS. Energia Elétrica. Demanda
derados pelo Tribunal estadual, sendo, portan- Contratada. Imposto Indireto. Contribuinte de
to, inaplicável o veto contido na Súmula 7/STJ. Fato. Ilegitimidade Ativa ad Causam. Novel
O Colegiado consignou, ainda, que o fato de as Posicionamento Firmado no REsp 928.875-MT
operadoras locais serem responsáveis pela dis- pela Segunda Turma. Aplicação do Entendi-
ponibilização de suas redes, faturamento e co- mento Consagrado no REsp 903.394-AL, Jul-
brança não as tornam contribuintes ou respon- gado sob o Regime de Recurso Repetitivo pela
sáveis pelo recolhimento do tributo incidente Primeira Seção.
sobre chamadas internacionais que foram efe- 1. Em que pesem os iterativos precedentes des-
tivamente prestadas por outra empresa, in casu, ta Corte que reconheceram a legitimidade ati-
a Embratel. va do consumidor final para questionar a co-
3. No caso em tela, é desnecessário tecer quais- brança de ICMS quanto à demanda contratada
quer considerações acerca do art. 155, inciso de energia elétrica, a Segunda Turma, ao julgar
II, da Carta Política, ainda que para fins de pre- o REsp 928.875-MT, relatado pelo Min. Her-
questionamento, na medida em tal preceito man Benjamin, decidiu, por unanimidade,
constitucional não versa sobre responsabilida- aplicar o entendimento consagrado no REsp
de tributária. 903.394-AL, julgado sob o regime de recurso
4. Constata-se que a insurgência da embargan- repetitivo na Primeira Seção, no sentido de que
te não diz respeito a eventual vício de integra- somente o contribuinte de direito pode deman-
ção do acórdão impugnado, mas à interpreta- dar judicialmente, e não o contribuinte de fato,
ção que lhe foi desfavorável, motivação essa para reaver a exação incidente nas operações
que não se enquadra nas hipóteses de cabimen-
em questão.
to dos aclaratórios.
2. No caso dos autos, as operações internas de
5. Embargos de declaração rejeitados.
energia elétrica envolvem empresa adquirente,
Acórdão contribuinte de fato, o que atrai o reconheci-
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são mento de sua ilegitimidade ativa ad causam,
partes as acima indicadas, acordam os Ministros nos termos do julgamento proferido no REsp
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi- 928.875/MT, submetido ao rito reservado aos
ça, por unanimidade, rejeitar os embargos de de- recursos repetitivos (CPC, art. 543-C).
claração, nos termos do voto do Sr. Ministro Re- Agravo regimental improvido.
lator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki,
Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Acórdão
Filho votaram com o Sr. Ministro Relator. Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Licenciado o Sr. Ministro Francisco Falcão. partes as acima indicadas, acordam os Ministros
Brasília (DF), 06 de setembro de 2011 (Data do da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
Julgamento). ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
(DJe de 13.9.2011) to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
Ministro-Relator, sem destaque.” Os Srs. Minis-
NOTA DA DIALÉTICA tros Herman Benjamin (Presidente), Mauro Camp-
Vide Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT bell Marques, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira
193:221) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 137:219). votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 27 de setembro de 2011 (Data do
Julgamento).
ICMS - ENERGIA ELÉTRICA - DEMANDA (DJe de 4.10.2011)
CONTRATADA - ILEGITIMIDADE ATIVA -
CONTRIBUINTE DE FATO NOTA DA DIALÉTICA
Vide Íntegras de Acórdãos do STJ - 2ª Turma
AgRg no Recurso Especial nº 1.268.425-SC (RDDT 130:162 e 134:161), e Acórdãos do STJ
(2011/0176002-6) - 1ª Seção (RDDT 192:222), do STJ - 1ª Turma
(RDDT 142:216) e do STJ - 2ª Turma (RDDT
Relator: Ministro Humberto Martins 130:221).
ICMS - GUERRA FISCAL - UTILIZAÇÃO DE III - Rejeição da alegação de impossibilidade
POLÍTICA DESONERATÓRIA PELO DF - de controle concentrado de decreto regulamen-
NECESSIDADE DE CONSENSO DE TODOS tar, posto não se tratar de mero antagonismo
OS ENTES FEDERATIVOS entre ato infralegal, de um lado, e lei em sen-
tido formal, de outro. A controvérsia enfrenta-
Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.549 da diz respeito ao ato administrativo normati-
vo editado em perfeita consonância com a lei
Origem: ADI - 128224 - Supremo Tribunal Fede- regulamentada, mas que, assim como ela, su-
ral postamente estaria a atentar contra o texto
Proced.: Distrito Federal constitucional.
Relator: Min. Ricardo Lewandowski IV - Alegação preliminar de ofensa indireta à
Reqte(s).: Governador do Estado de São Paulo Constituição que se confunde com próprio mé-
Adv(a/s).: PGE-SP Elival da Silva Ramos rito da controvérsia travada.
Intdo(a/s).: Governador do Distrito Federal V - Acolhimento da alegação de ausência de
Intdo(a/s).: Câmara Legislativa do Distrito Fede- pertinência temática do autor para a discussão
ral da constitucionalidade da Lei 2.427, de 14 de
julho de 1999, pois o mencionado diploma
Decisão: O Tribunal conheceu em parte da ação, normativo não traz referência específica algu-
contra o voto do Senhor Ministro Marco Aurélio ma à competência legislativa estadual, assim
e, na parte conhecida, julgou-a parcialmente pro- como não faz qualquer menção aos incentivos
cedente, por unanimidade e nos termos do voto do ou benefícios tributários relacionados ao
Relator. Votou o Presidente, Ministro Cezar Pelu- ICMS.
so. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro VI - O controle de constitucionalidade concen-
Celso de Mello. Falou, pelo requerente, a Dra. trado não encontra obstáculo na norma cons-
Patrícia Helena Massa Arzabe, Procuradora do titucional de eficácia contida. A regulamenta-
Estado e, pelo interessado, Governador do Distrito ção relegada à lei federal deve necessariamen-
Federal, a Dra. Roberta Fragoso Kaufmann, Pro- te respeitar os fins e os limites traçados pela
curadora do DF. Plenário, 01.06.2011. norma constitucional, razão pela qual, quando
violados algum destes, perfeitamente possível
Ementa: Constitucional e Tributário. Ação Di- o exercício do controle de constitucionalidade.
reta de Inconstitucionalidade. Preliminares de VII - O art. 155, § 2º, inciso XII, g, da Consti-
Inépcia da Inicial, de Incindibilidade da Lei, e tuição Federal dispõe competir à lei comple-
de Impossibilidade de Controle Concentrado mentar, mediante deliberação dos Estados
de Decreto Regulamentar Rejeitadas. Prelimi- membros e do Distrito Federal, a regulamen-
nar de Ausência de Pertinência Temática par- tação de isenções, incentivos e benefícios fis-
cialmente Acolhida. Decretos Atacados que cais a serem concedidos ou revogados, no que
foram Revogados ou Cujos Efeitos se exauri- diz respeito ao ICMS.
ram. Carência Superveniente da Ação. Interes- Evidente necessidade de consenso entre os
se Processual. Utilização de Política Desone- entes federativos, justamente para evitar o
ratória pelo DF. ICMS. “Guerra Fiscal”. Arti- deflagramento da perniciosa “guerra fiscal”
go 155, § 2º, Inciso XII, g, da CF. Lei Comple- entre eles. À lei complementar restou discri-
mentar 24/75. Necessidade de Consenso de cionária apenas a forma pela qual os Estados
Todos os Entes Federativos. Parcial Procedên- e o Distrito Federal implementarão o ditame
cia. constitucional. A questão, por sua vez, está re-
I - Rejeição da preliminar de inépcia da peti- gulamentada pela Lei Complementar 24/1975,
ção inicial pela ausência de indicação dos dis- que declara que as isenções a que se faz refe-
positivos legais apontados como violadores da rência serão concedidas e revogadas nos ter-
Constituição Federal. Deixou evidenciado o mos dos convênios celebrados e ratificados pe-
autor que, no seu entender, os textos legais são, los Estados e pelo Distrito Federal.
na sua integralidade, violadores do ordena- VIII - Necessidade de aprovação pelo Confaz
mento constitucional pátrio. Possibilidade. de qualquer política extrafiscal que implique
Precedentes do STF. na redução ou qualquer outra forma de deso-
II - Rejeição da preliminar de incindibilidade neração do contribuinte em relação ao ICMS.
das leis para efeitos do exercício do controle Precedentes do STF.
concentrado de constitucionalidade, posto que IX - O Decreto 20.957, de 13 de janeiro de
alegação dessa natureza não pode ser invoca- 2000 teve os seus efeitos integralmente exau-
da quando o normativo atacado trata indivi- ridos, enquanto que os Decretos 21.077/00,
dualmente questões diferentes. 21.082/00 e 21.107/00 foram revogados, fato
que implicou na carência superveniente da mento da Existência de Repercussão Geral
ação. Interesse processual. dessa Controvérsia Constitucional (RE
X - Parcial procedência da ação para declarar 594.996-RG/RS) - Situação que enseja a Ou-
a inconstitucionalidade do artigo 2º, inciso I e torga Excepcional de Provimento Cautelar -
seus §§ 2º e 3º; do artigo 5º, seus incisos I, II Medida Cautelar Deferida - Decisão Referen-
e III e seu parágrafo único, inciso I; do artigo dada.
6º, na sua integralidade; e dos parágrafos 1º e Recurso Extraordinário não Admitido. Inter-
2º, do artigo 7º, todos da Lei 2.483, de 19 de posição do Pertinente Recurso de Agravo. Re-
novembro de 1999. conhecimento, pelo STF, da Existência de Re-
percussão Geral Relativa à Controvérsia
Republicado por haver saído com incorreção no Constitucional Suscitada no Apelo Extremo
Diário da Justiça Eletrônico do dia 03.10.2011. Denegado na Origem. Hipótese que justifica,
(DJe de 3.11.2011, p. 17) excepcionalmente, a Outorga de Provimento
Cautelar.
- A jurisprudência do Supremo Tribunal Fede-
ICMS - IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS ral tem recusado, ordinariamente, a outorga de
POR PESSOAS QUE NÃO SÃO provimento cautelar pertinente a recurso ex-
CONTRIBUINTES HABITUAIS - traordinário que sofreu, na origem, juízo nega-
PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DO tivo de admissibilidade. Precedentes.
PLENÁRIO - REPERCUSSÃO GERAL - - Caberá, no entanto, excepcionalmente, a sus-
EFEITO SUSPENSIVO CONCEDIDO pensão cautelar de eficácia do acórdão objeto
do recurso extraordinário não admitido, se o
Referendo na Medida Cautelar na Ação agravo de instrumento, deduzido contra a de-
Cautelar 3.024 cisão denegatória, insurgir-se em contexto que
se revele incompatível com a jurisprudência
Origem: [sic] prevalecente no Supremo Tribunal Federal ou,
Proced.: São Paulo então, se a Corte Suprema houver reconheci-
Relator: Min. Celso de Mello do a repercussão geral da controvérsia consti-
tucional suscitada no apelo extremo.
Autor(a/s)(es): Construções e Comércio Camargo
- Achando-se a controvérsia submetida ao Ple-
Corrêa S/A nário do Supremo Tribunal Federal e havendo
Adv(a/s).: Marcos Drumond Malvar e Outro(a/s) sido reconhecida, em sede recursal extraordi-
Réu(é)(s).: Estado de São Paulo nária (RE 594.996-RG/SP), a existência de
Proc(a/s)(es).: Procurador-geral do Estado de São questão impregnada de transcendência ou de
Paulo repercussão geral (como sucede na espécie),
impõe-se deferir, por tal razão, a suspensão
Decisão: referendo concedido por esta Segunda cautelar de eficácia do acórdão objeto do apelo
Turma quanto à decisão que deferiu, em termos, extremo em cujo âmbito tenha sido suscitado
o pedido de medida cautelar formulado neste pro- o mesmo litígio jurídico-constitucional ainda
cesso. Determinado, em conseqüência, que se co- pendente de definição pela Corte Suprema.
munique, com urgência, o resultado do presente (DJe de 29.11.2011, pp. 34/5)
julgamento, nos termos do voto do Relator. Deci-
são unânime. Ausente, justificadamente, o Senhor
Ministro Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 08.11.2011. ICMS - IMPORTAÇÃO - DUPLO NEGÓCIO
JURÍDICO - LEGITIMIDADE ATIVA
Ementa: Recurso Extraordinário não Admiti-
do - Conseqüente Interposição de Agravo de Ag. Reg. no Agravo de Instrumento 792.467
Instrumento - Suspensão Cautelar da Eficácia
do Acórdão Objeto do Apelo Extremo - Excep- Origem: AC - 10024043688977001 - Tribunal de
cionalidade - ICMS - Discussão em Torno da Justiça Estadual
Possibilidade, ou não, de Incidência do ICMS Proced.: Minas Gerais
sobre Operações Relativas à Entrada de Mer- Redator do Acórdão: Min. Marco Aurélio
cadorias ou Bens Importados do Exterior por Relator: Min. Ricardo Lewandowski
Pessoas em Geral, ainda que não sejam Con- Agte(s).: Voith Paper Máquinas e Equipamentos
tribuintes Habituais de Referido Tributo Esta- Ltda.
dual - a Questão do Alcance Normativo da Adv(a/s).: Luiz Augusto de Mello Belluzzo e Ou-
Regra Inscrita no Art. 155, § 2º, Inciso IX, tro(a/s)
Alínea “a”, da Constituição - Matéria Penden- Agdo(a/s).: Estado de Minas Gerais
te de Julgamento no Plenário do Supremo Tri- Adv(a/s).: Advogado-geral do Estado de Minas
bunal Federal (RE 439.796/PR) - Reconheci- Gerais
Decisão: Após o voto do Ministro Ricardo Geral. Discussão que não se confunde com a
Lewandowski, Relator, que negava provimento ao Possibilidade de Instituição da Sistemática sem
agravo regimental no agravo de instrumento, e do Anterior Regulamentação por Normas Gerais
voto do Ministro Marco Aurélio, que lhe dava de Direito Tributário.
provimento, pediu vista do processo o Ministro Agravo ao qual se nega Provimento.
Dias Toffoli. Presidência da Ministra Cármen 1. Nos autos do RE 593.849 (Rel. Min. Ricar-
Lúcia. 1ª Turma, 15.2.2011. do Lewandowski) discute-se se é devida a res-
tituição do ICMS na hipótese de ser apurada
Decisão: Por maioria de votos, a Turma deu pro- diferença entre a base de cálculo presumida
vimento ao agravo regimental no agravo de instru- (substituta) e a base de cálculo efetiva (substi-
mento para vir a julgamento o recurso extraordi- tuída).
nário, nos termos do voto do Senhor Ministro 2. De modo inconfundível, discute-se neste re-
Marco Aurélio, Redator para o acórdão do agra- curso extraordinário se era possível instituir a
vo regimental, vencidos o Senhor Ministro Ricar- sistemática de substituição tributária indepen-
do Lewandowski, que permanece com a Relatoria dentemente de norma geral em matéria tribu-
do processo, e a Senhora Ministra Cármen Lúcia, tária regulamentadora do direito à imediata e
Presidente. 1ª Turma, 6.9.2011. preferencial restituição do valor arrecadado, no
período compreendido entre a introdução do §
ICMS - Mercadoria Importada - Duplo Negó- 7º no art. 150 da Constituição (EC 93/1993) e
cio Jurídico. De início, cabe ao Estado em que a publicação da LC 87/1996.
situado o estabelecimento do importador o 3. A matéria em análise nestes autos continua
Imposto sobre Operações Relativas à Circula- regida pelo decido [sic] na ADI 1.851, sem
ção de Mercadorias, não alterando a competên- sofrer a influência do futuro precedente que
cia ativa tributária a feitura, no território na- vier a ser formado.
cional, de um segundo negócio jurídico. Tema Agravo regimental ao qual se nega provimen-
a ser definido com maior profundidade no jul- to.
gamento do recurso extraordinário. (DJe de 21.10.2011, p. 27)
(DJe de 27.10.2011, pp. 30/1)

IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO


ICMS - SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA - SOCIAL SOBRE O LUCRO - BASE DE
INSTITUIÇÃO DA SISTEMÁTICA SEM CÁLCULO - EMPRESA DE TELEFONIA -
ANTERIOR REGULAMENTAÇÃO POR LOCAÇÃO DE AERONAVE PARA USO
NORMAS GERAIS DOS DIRIGENTES - DEDUÇÃO -
IMPOSSIBILIDADE
Segundo Ag. Reg. no Recurso Extraordinário
453.125 Processo nº 18471.000590/2007-74

Origem: AMS - 26514826 - Tribunal de Justiça Recurso nº 512.954 Voluntário


Estadual Acórdão nº 1402-00.583 - 4ª Câmara/2ª Turma
Proced.: São Paulo Ordinária
Relator: Min. Joaquim Barbosa Sessão de 29 de junho de 2011
Agte(s).: Estado de São Paulo Matéria: IRPJ e CSLL. Ação Fiscal
Proc(a/s)(es).: Procurador-geral do Estado de São Recorrente: Empresa Brasileira de Telecomunica-
Paulo ções S.A Embratel
Agdo(a/s).: Trans LUB Transportes Ltda. Recorrida: 7ª Turma DRJ Rio de Janeiro RJ I
Adv(a/s).: Walter Gazzano dos Santos Filho Assunto: Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurí-
Adv(a/s).: Hamilton Dias de Souza dica.
Ano-calendário: 2002
Decisão: negado provimento ao agravo regimen-
tal, nos termos do voto do Relator. Decisão unâ- Ementa: IRPJ e CSLL. Pessoa Jurídica Tribu-
nime. Ausente, justificadamente, o Senhor Minis- tada com Base no Lucro Real. Fato Gerador
tro Gilmar Mendes. 2ª Turma, 04.10.2011. Complexivo que se consuma no Dia 31 de
Dezembro de Cada Ano calendário. Prazo De-
Ementa: Agravo Regimental. cadencial que começa a fluir a partir do Dia 1º
Tributário. Imposto sobre Circulação de Mer- de Janeiro do Ano Seguinte. Decadência Afas-
cadorias e Serviços de Comunicação e de tada.
Transporte Intermunicipal e Interestadual. No caso do IRPJ e da CSLL das pessoas jurí-
ICMS. Substituição Tributária. Repercussão dicas tributadas com base no lucro real, o as-
pecto temporal do fato gerador se dá de forma esteja intrinsecamente relacionado com a pro-
anual e tem como marco o dia 31 de dezembro dução ou comercialização dos bens e serviços.
de cada ano-calendário. Nestes casos, o prazo Recurso Voluntário Negado Provimento.
decadencial começa a fluir a partir do dia 1º de
janeiro do ano seguinte ao da ocorrência do Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.
fato gerador. Na situação verificada nos autos, Acordam os membros do colegiado [do Carf ], por
os fatos geradores do IRPJ e da CSLL ocorre- unanimidade de votos, rejeitar a preliminar de
ram em 31/12/2002. A notificação do lança- decadência e a de preclusão de juntada de docu-
mento deu-se em 06/06/2007, isto é, antes de mentos após a apresentação do recurso voluntário,
decorridos os cinco anos de que trata o artigo suscitada pela PFN, e no mérito, por maioria de
150, § 4º, do CTN, norma esta aplicável nos votos, negar provimento ao recurso. Vencidos os
casos de lançamento por homologação. Com Conselheiros Carlos Pelá e Leonardo Henrique
tais fundamentos, rejeita-se a alegação de de- Magalhães de Oliveira, que cancelavam a glosa
cadência. integralmente.
(DOU 1 de 18.10.2011, p. 24)
Provas. Documentos que o Colegiado conside-
rou Pertinentes ao Julgamento. Admissibilida-
de de Juntada a Qualquer Tempo. IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO
Para o julgador, não há preclusão em te[r]mos SOCIAL SOBRE O LUCRO - RESULTADOS
de prova. É admissível a juntada de provas AUFERIDOS POR CONTROLADA NO
sempre que, referidas durante os debates, o EXTERIOR - MÉTODO DE EQUIVALÊNCIA
colegiado entenda que são relevantes ao escla- PATRIMONIAL - REGRA CFC - TRATADO
recimento dos fatos. Ademais, nos casos em BRASIL-HUNGRIA - COMPENSAÇÃO
que o julgado faz referência a situações novas DE TRIBUTO PAGO NO EXTERIOR -
ou fundamentos não especificadas [sic] quan- POSSIBILIDADE
do do lançamento, é lícito à parte trazer provas
para infirmar entendimentos ou fatos que pos-
Processo nº 16561.000136/2007-89
sam influenciar no convencimento dos julga-
dores.
Recurso nº 173.951 Voluntário
IRPJ e CSLL. Glosa de Despesas. Controvér- Acórdão nº 1402-00.391 - 4ª Câmara/2ª Turma
sia Quanto à Efetividade das Mesmas. Análi- Ordinária
se do Caso Concreto. Sessão de 27 de janeiro de 2011
Conforme prova que colho do acórdão que Matéria: IRPJ e CSLL. Tributação de Resultados
analisou o inquérito levado a efeito junto à no Exterior
CVM, a Infraero informou que somente nos Recorrente: Normus Empreendimentos e Partici-
aeroportos do Rio de Janeiro e Manaus houve pações Ltda.
duzentos pousos e decolagens da aeronave Recorrida: 5ª Turma/DRJ em São Paulo-SP
objeto da locação. Tal prova desfaz a dúvida Assunto: Processo Administrativo Fiscal.
suscitada pelo relator quanto à efetividade dos Ano-calendário: 2002, 2003, 2004, 2005, 2006
serviços prestados. IRPJ e CSLL. Tributação de Resultados Auferidos
por Meio de Controlada no Exterior. Tratado Bra-
Despesas com Locação. Dedução da Base de sil-Hungria.
Cálculo do IRPJ e da CSLL. Norma Especial
Contida no Artigo 13, II, da Lei nº 9.249, de A Legislação Tributária Brasileira não estabe-
1995, que não se confunde com a Regra Geral lece incidência sobre os lucros da controlada
do Artigo 47, §§ 1º e 2º, da Lei nº 4.506, de estrangeira (o que é vedado pelo Artigo VII),
1964. mas sim sobre lucros da investidora brasileira,
Para dedução da base de cálculo das despesas isto é, dispõe que o lucro real da contribuinte
com contraprestações de arrendamento mer- engloba os lucros disponibilizados por sua
cantil e do aluguel de bens móveis ou imóveis, controlada, incorporados ao seu patrimônio em
a norma especial contida no art. 13, II, da Lei função do Método da equivalência Patrimonial
nº 9.259, de 1995, exige que estas estejam re- MEP. Logo, a tributação recai sobre os lucros
lacionadas intrinsecamente com a produção ou da empresa brasileira, o que afasta a aplicação
comercialização dos bens e serviços. Neste do aludido Artigo VII do Tratado. O art. 74 da
contexto, em se tratando de empresa de telefo- MP nº 2.158-35 é uma autêntica regra CFC
nia e transmissão de dados, a locação de aero- (regra de tributação de resultados de controla-
nave colocada à disposição de seus dirigentes das no exterior), compreendida como norma
não caracteriza situação em que o bem locado voltada para eliminar o diferimento na tributa-
ção dos lucros auferidos no exterior. Não há IMPOSTO DE RENDA - ISENÇÃO -
um “padrão único” de legislação CFC. O pon- MOLÉSTIA GRAVE - REQUISITOS -
to comum desse tipo de regra é a tributação dos INTERESSE DE AGIR - NECESSIDADE DE
residentes de um Estado Contratante em rela- LAUDO PERICIAL EMITIDO POR MÉDICO
ção à renda proveniente de sua participação em OFICIAL
empresas estrangeiras. No contexto dos trata-
dos, os dividendos pagos correspondem a lu- Recurso Especial nº 1.286.094-CE
cros distribuídos aos sócios da empresa. Por (2011/0241566-0)
força da MP nº 2.158-35, os lucros apurados
pela controlada no exterior são considerados Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
distribuídos por ficção legal, incorporados ao Recorrente: Fazenda Nacional
patrimônio da contribuinte brasileira via MEP. Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
A não incidência tributária dos dividendos res- cional
tringe-se aos lucros produzidos e tributados no Recorrido: Luis Soares Lima
Brasil. Advogado: Ticiana Vitoriano B. Linhares

Variação Cambial. Resultados Auferidos de Ementa


Controlada no Exterior. Equivalência Patrimo- Processual Civil e Tributário. Isenção do Im-
nial. posto de Renda sobre Proventos Percebidos
Descabe a tributação da variação cambial dos por Portadores de Moléstia Grave. Necessida-
investimentos no exterior avaliados pelo méto- de de Comprovação da Doença mediante Lau-
do da equivalência patrimonial, isso porque do Pericial Emitido por Serviço Médico Ofi-
não constitui despesa dedutível ou receita tri- cial.
butável, em face da ausência de norma legal 1. Por força do que dispõe o art. 30 da Lei n.
expressa nesse sentido. 9.250/95, a partir de 1º de janeiro de 1996,
para efeito do reconhecimento de novas isen-
Compensação de Tributo Pago no Exterior. ções de que tratam os incisos XIV e XXI do
Possibilidade. Tratado Brasil-Hungria. art. 6º da Lei n. 7.713/88, a moléstia deverá ser
O artigo XXIII do Tratado entre Brasil e Hun- comprovada mediante laudo pericial emitido
gria autoriza a compensação dos tributos sobre por serviço médico oficial, da União, dos Es-
lucros pagos por controlada situada na Hun- tados, do Distrito Federal e dos Municípios.
gria pela controladora situada no Brasil. Antes do início da vigência da Lei n. 9.250/95,
a moléstia especificada na Lei n. 7.713/88 po-
Recurso Voluntário Parcialmente Provido.
deria ser reconhecida através de parecer ou lau-
do emitido por dois médicos especialistas na
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. área respectiva ou por entidade médica oficial
Acórdão [sic] os membros do colegiado [do Carf] da União. A partir de 1º de janeiro de 1996, é
em dar provimento parcial ao recuso, nos seguin- necessário que a doença mencionada na Lei n.
tes termos: 1) Pelo voto de qualidade, admitir a 7.713/88 seja reconhecida através de laudo
tributação sobre os lucros apurados pela controla- pericial emitido por serviço médico oficial da
da na Hungria, disponibilizados à investidora bra- União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos
sileira (art. 74 da MP 2.158-35/2001), porque Municípios. Para gozo do benefício fiscal, por-
equivalentes a distribuição de dividendos. Venci- tanto, faz-se necessário que o beneficiário
dos os Conselheiros Carlos Pelá (relator), Moises preencha os requisitos legais exigidos, ou seja:
Giacomelli Nunes da Silva e Leonardo Henrique (1) o reconhecimento do contribuinte como
Magalhães de Oliveira. Designado para redigir o portador de moléstia grave, comprovado medi-
voto vencedor o Conselheiro Antônio José Praga ante laudo pericial, emitido por junta médica
de Souza. 2) Por unanimidade de votos, excluir da oficial e (2) serem os rendimentos percebidos
receita de equivalência patrimonial utilizada como durante a aposentadoria.
base do valor autuado, a variação cambial positi- 2. No caso concreto, o juiz da primeira instân-
va, bem como conhecer os documentos relativos cia julgou antecipadamente a lide e extinguiu
aos tributos pagos pela controlada na Hungria, o processo, sem resolução do mérito, por en-
para deduzir o valor efetivamente pago da base de tender ausente o interesse processual, ao pas-
cálculo tributada do IRPJ e CSLL, bem como de- so que a Corte de apelação, ao concluir pela
duzir este mesmo valor do IRPJ lançado de ofício existência de interesse de agir e pela prescin-
e da CSLL, caso ainda remanesça saldo a compen- dibilidade da produção de prova pericial, jul-
sar. Tudo nos termos do relatório e votos que pas- gou procedente o pedido inicial com base em
sam a integrar o presente julgado. simples atestado do médico particular do autor.
(DOU 1 de 18.10.2011, p. 23) Embora haja decidido, com acerto, pela exis-
tência de interesse processual, o Tribunal de Sessão de 31 de março de 2011
origem acabou por contrariar o art. 30 da Lei Matéria: IRPJ e CSLL. Ação Fiscal.
n. 9.250/95. Insta acentuar que o juiz da pri- Recorrentes: Primo Schincariol Indústria de Cer-
meira instância concedeu ao autor a gratuida- veja e Refrigerantes do Rio de Ja-
de da justiça, e consoante já decidiu esta Tur- neiro S.A.
ma, ao julgar o REsp 935.470/MG (Rel. Min. Segunda Turma da DRJ Juiz de Fora
Mauro Campbell Marques, DJe de 30.9.2010), (MG)
quando a Fazenda Pública for ré no processo, Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurí-
não estará sujeita ao adiantamento dos hono- dica - IRPJ
rários do perito se a prova pericial for requeri- Ano-calendário: 1999, 2000, 2001, 2002, 2003,
da pelo autor da ação, beneficiário da assistên- 2004
cia judiciária. Tampouco ficará sujeita a tal
adiantamento a parte autora, porquanto goza- Recurso de Ofício. Omissão de Receita. Audi-
rá dos benefícios da Lei 1.060/50. Não concor- toria de Produção.
dando o perito nomeado em realizar gratuita- Constatado, mediante diligência fiscal, o equí-
mente a perícia e/ou aguardar o recebimento voco do Fisco na determinação das receitas
dos honorários ao final do processo, deve o omitidas apurada em auditoria de produção,
juiz da causa nomear outro perito, a ser desig- correto o ajuste na base de cálculo e conse-
nado entre técnicos de estabelecimento oficial qüente cancelamento parcial da exigência.
especializado ou repartição administrativa do
ente público responsável pelo custeio da pro- Glosa de Despesas Inidôneas. Amortizações de
va pericial, devendo a perícia realizar-se com Ágio supostamente Pago na Aquisição de De-
a colaboração do Poder Judiciário. bêntures.
3. Recurso especial provido, em parte, tão-so- Correta a glosa de despesas contabilizadas a tí-
mente para determinar a produção da prova tulo de pagamento de prêmio na aquisição de
pericial. debêntures entre pessoas ligadas, amparados
em contratos eivados de fraude, cujo objetivo,
Acórdão a toda evidência, foi reduzir o IRPJ e CSLL
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que pelo contribuinte, devendo ser restabelecida a
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- multa qualificada, no percentual de 150%.
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
Justiça, na conformidade dos votos e das notas Lucros no Exterior. Disponibilização. Empre-
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: go do Valor.
“A Turma, por unanimidade, deu parcial provi- A finalidade da norma contida no item 4 da alí-
mento ao recurso, nos termos do voto do Sr.
nea “b” do § 2º da Lei nº 9.532/1997 foi de ca-
Ministro-Relator, sem destaque.”
racterizar como disponibilização qualquer for-
Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin ma de realização dos lucros que não estivesse
(Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. compreendida nas demais situações previstas
Brasília (DF), 22 de novembro de 2011. no parágrafo, entre elas a alienação do inves-
(DJe de 1º.12.2011) timento. Tendo o contribuinte adquirido, em
12/01/2001, participação em empresa no exte-
NOTA DA DIALÉTICA rior, os lucros da mesma, relativo dos anos de
Vide Acórdão do STJ - 2ª Turma (RDDT 1996 a 2000, apurados e ainda não disponibi-
193:229). lizados, devem ser oferecidos à tributação pela
empresa brasileira alienante e não pela contri-
buinte.
IMPOSTO DE RENDA - LUCROS NO
EXTERIOR - LANÇAMENTO DE OFÍCIO - Lucros no Exterior. Tributação. Reconstituição
EXCLUSÃO DE VALORES do Lucro Líquido e Lucro Real. Exclusão de
INDEVIDAMENTE INCLUÍDOS NA BASE Parcela Indevidamente Incluída na Base de
DE CÁLCULO PELO CONTRIBUINTE - Cálculo.
PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL Nos termos do art. 142 do CTN, no lançamen-
to de ofício do IRPJ e CSLL, a autoridade tri-
Processo nº 10730.004842/2005-62 butária deve reconstituir a apuração do lucro
líquido bem como o lucro real, efetuando os
Recurso nº 167.544 de Ofício e Voluntário ajustes devidos em face das infrações porven-
Acórdão nº 1402-00.494 - 4ª Câmara/2ª Turma tura apuradas. Deparando-se com erros ou
Ordinária equívocos do contribuinte, que implicaram na
elevação indevida da base de cálculo nesses mente, o Conselheiro Frederico Augusto Gomes
mesmos períodos de apuração, cumpre à Fis- de Alencar. Participou do julgamento o Conselhei-
calização escoimá-los, pois, a Fazenda Públi- ro Eduardo Martins Neiva Monteiro.
ca deve constituir e cobrar o tributo devido, (DOU 1 de 18.10.2011, p. 24)
nem mais, nem menos, na forma da Lei. Nes-
se diapasão, nos termos do art. 145, inciso I, do
CTN, o lançamento também pode ser alterado IMPOSTO DE RENDA - PESSOA JURÍDICA
pela autoridade julgadora para excluir valores - BASE DE CÁLCULO - AQUISIÇÃO DE
indevidamente incluídos na base de cálculo VEÍCULO LUXUOSO E INAPROPRIADO À
pelo contribuinte, nos períodos de apuração tri- ATIVIDADE ROTINEIRA DA EMPRESA -
butados, procedimento igualmente respaldado MERA SUPOSIÇÃO - GLOSA DA DESPESA
no princípio da verdade Material. - IMPOSSIBILIDADE
Recursos de ofício e voluntário providos em
parte. Processo nº 1012.007410/2002-49

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. Recurso nº 105.135.567 Voluntário


Acordam os membros do colegiado: 1) Pelo voto Acórdão nº 9101-00.041 - 1ª Turma
de qualidade, dar provimento parcial ao recurso Sessão de 10 de março de 2009
de ofício, para restabelecer a qualificação da multa Matéria: IRPJ
de ofício, vencidos os Conselheiros Leonardo Recorrente: Fazenda Nacional
Henrique Magalhães de Oliveira (relator), Carlos Recorrida: Warre Engenharia e Sanemanto [sic]
Pelá e Moises Giacomelli Nunes da Silva, que Ltda.
negavam provimento em sua totalidade. 2) Em Assunto: Imposto de Renda da Pessoa Jurídica -
relação ao recurso voluntário: a) Por unanimida- IRPJ
de de votos, não conhecer do recurso voluntário, Exercício: 1998 a 2003
em face de passivo fictício e auditoria de produ-
ção, por adesão a parcelamento especial? [sic] b) Ementa: Decadência. Multa Isolada. O prazo
Por maioria de votos, excluir do lançamento o decadencial para o lançamento da multa isola-
valor dos lucros gerados no exterior de R$ da pelo não recolhimento, ou recolhimento a
24.539.865,72, por se tratar de resultado até menor, do IRPJ ou CSLL por estimativa é con-
12.01.2001, vencidos os Conselheiros Carlos tado a partir do primeiro dia do exercício se-
Pelá, que negava provimento ao recurso, e Eduar- guinte aquele em que se poderia fazer o lança-
do Martins Neiva Monteiro que dava provimento mento da penalidade, conforme estabelecido
parcial para manter apenas o lucro do ano de do art. 173 o CTN.
2001, por entender estar incluído nesse valor?
[sic] c) Por maioria de votos, manter a glosa de IRPJ. Glosa de Despesas. Aceitação de uma
despesas de amortização de ágio na aquisição de despesa como dedutível.
debêntures somente do valor efetivamente apura- Deve ser examinada em cada caso concreto,
do no Livro Razão, vencidos os Conselheiros sendo imprescindível examinar a transação
Leonardo Henrique Magalhães de Oliveira (rela- realizada pela contribuinte, a atividade a ela re-
tor) e Moisés Giacomelli Nunes da Silva, que da- lacionada e os documentos comprobatórios. A
vam provimento integral ao recurso? [sic] d) Pelo singela constatação de o veículo ser luxuoso a
voto de qualidade, acolher a proposta do Conse- [sic] inapropriado para a atividade exercida ro-
lheiro Antônio José Praga de Souza, para que na tineiramente pela pessoa jurídica é apenas um
reconstituição da apuração do lucro real do ano- indício que não assegura a certeza da existên-
calendário de 2001, seja excluída da tributação, de cia de infração. O auditor deve aprofundar a in-
ofício, o valor de R$ 36.166.313,61, por se tratar vestigação e obter mais provas que levem a evi-
de lucros distribuídos pela empresa Andree Over- denciar a inconsistência nos documentos apre-
seas que foi objeto de lançamento de ofício no sentados pela pessoa jurídica.
Processo nº 16327.001077/2006-58, conforme
Acórdão 1402-00.493, de 30 de março de 2011, Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.
vencidos os Conselheiros Carlos Pelá, Moises Acordam os Membros da Primeira Turma da Câ-
Giacomelli Nunes da Silva e Leonardo Henrique mara Superior de Recursos Fiscais, por unanimi-
Magalhães de Oliveira (relator). Tudo na forma do dade de votos, em negar provimento aos Recur-
relatório e dos votos, vencido e vencedor, que sos Especiais da Fazenda Nacional e do Contri-
passam a integrar o presente julgado. Designado buinte, nos termos do relatório e voto que passam
para redigir o voto vencedor, o Conselheiro An- a integrar o presente julgado.
tônio José Praga de Souza. Ausente momentanea- (DOU 1 de 11.10.2011, p. 18)
IMPOSTO DE RENDA - PESSOA JURÍDICA IMPOSTO DE RENDA - PESSOA JURÍDICA
- JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO - - LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO -
TRATAMENTO DECADÊNCIA - AUSÊNCIA DE
PAGAMENTO
Processo nº 11080.005460/2006-00
Processo nº 11030.000004/99-14
Recurso nº 177.682 Voluntário
Acórdão nº 1401-000.401 - 4ª Câmara/1ª Turma Recurso nº 105-134.344 Especial do Procurador
Ordinária Acórdão nº 9101-00.005 - 1ª Turma
Sessão de 16 de dezembro de 2010 Sessão de 09 de março de 2009
Matéria: Juros sobre Capital Próprio Matéria: IRPJ e Outro - Decadência
Recorrente: Vallmar Participações Ltda. Recorrente: Fazenda Nacional
Recorrida: Fazenda Nacional Interessado: Battisti Indústria e Comércio de Ma-
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurí- teriais de Construção Ltda.
dica - IRPJ Assunto: Decadência
Ano-calendário: 2003 Anos-calendário: 1993 a 1996
Ementa: Juros sobre Capital Próprio. Nature- Ementa: IRPJ - Decadência - Lançamento por
za de Dividendos. Tratamento Tributário. Homologação - O Imposto de Renda, antes do
Os dividendos, juros sobre capital próprio, ju- advento da Lei nº 8.383, de 30/12/91, estava
ros pagos a terceiros, nada mais são que recur- sujeito a lançamento por declaração, operando-
sos utilizados para remuneração dos investido- se o prazo decadencial a partir do primeiro dia
res, sendo que ambos possuem a mesma natu- do exercício seguinte àquele em que o lança-
reza - contraprestação do investimento realiza- mento poderia ter sido efetuado, consoante o
do, seja o investimento em passivo exigível ou disposto no art. 173 do Código Tributário Na-
em patrimônio líquido da empresa investida. cional. A partir do ano-calendário de 1992,
No intuito de se verificar o tratamento tributá- exercício de 1993, por força das inovações da
rio dos valores recebidos pelos investidores, a referida lei, o contribuinte passou a ter a obri-
título de remuneração de capital investido,
gação de pagar o imposto, independentemen-
deve ser analisada a legislação tributária perti-
nente. te de qualquer ação da autoridade administra-
tiva, cabendo-lhe então verificar a ocorrência
Outorga de Isenção. Interpretação por Analo- do fato gerador da obrigação correspondente,
gia. determinar a matéria tributável, calcular e, por
A norma tributária determina que seja interpre- fim, pagar o montante do tributo devido, se
tada literalmente a norma tributária que conce- desse procedimento houver tributo a ser pago.
de isenções, impossibilitando de se estender a E isso porque ao cabo dessa apuração o resul-
isenção concedida a situações não abarcadas tado pode ser deficitário, nulo ou superavitário
pela norma, utilizando-se de analogia. (CTN art. 150, § 4 0[sic]), sendo, portanto, ir-
relevante ter havido ou não pagamento de im-
Regime de Reconhecimento de Receitas. Lu- posto nesse procedimento. O que o CTN ho-
cro Presumido. mologa é o lançamento e não o pagamento. É
É facultado ao contribuinte optante pelo Lucro o procedimento, a atividade desenvolvida pelo
Presumido a tributação pelo regime de caixa. sujeito passivo. Se o citado § 4º do art. 150
Nestes casos, deve o contribuinte demonstrar homologasse apenas o pagamento teria dito
o período do efetivo recebimento dos valores. “homologado o pagamento” e não “homologa-
do o lançamento”, como diz o texto do citado
Receita Proveniente de Juros sobre Capital parágrafo do art. 150 da lei complementar.
Próprio. Receita Operacional. Impossibilidade.
O art. 51, da Lei nº 9.430/96, determina que os Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.
juros sobre capital próprio deverão ser adicio- Acordam os Membros da Primeira Turma da Câ-
nados ao lucro presumido. mara Superior de Recursos Fiscais, por maioria de
Recurso voluntário negado. votos, em negar provimento ao recurso especial,
nos termos do relatório e voto que passam a inte-
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. grar o presente julgado. Vencidos os Conselheiros
Acordam os membros do colegiado [do Carf], por Antonio Praga e Adriana Gomes Rego que deram
unanimidade de votos, negar provimento ao recur- provimento ao recurso especial, aplicando o arti-
so. Ausente momentaneamente o conselheiro go 173 do CTN na contagem do prazo decaden-
Mauricio Pereira Faro. cial.
(DOU 1 de 18.10.2011, p. 22) (DOU 1 de 11.10.2011, p. 15)
IMPOSTO DE RENDA - PESSOA JURÍDICA Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.
- OPERAÇÃO DE “SWAP” - PERDAS Acordam os membros do colegiado [do Carf], por
COMPROVADAS unanimidade de votos, em negar provimento ao
recurso de ofício e dar provimento parcial ao re-
Processo nº 19515.004336/2007-54 curso voluntário, mantendo tão somente a tributa-
ção da glosa de perdas no valor de R$
Recurso nº 178.424 De Ofício e Voluntário 1.858.296,00 (IRPJ e CSLL), nos termos do rela-
Acórdão nº 1402-00.593 - 4ª Câmara/2ª Turma tório e voto que passam a integrar o presente jul-
Ordinária gado.
Sessão de 30 de junho de 2011 (DOU 1 de 18.10.2011, p. 25)
Matéria: IRPJ e Reflexos Ação Fiscal
Recorrentes: Cia. de Gás de São Paulo - Comgás
3ª Turma da DRJ São Paulo I (SP) IMUNIDADE - IPVA - ECT
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurí-
dica - IRPJ Ag. Reg. na Ação Cível Originária 819
Ano-calendário: 2002
Origem: Proc - 200585000002308 - Juiz Federal
Reserva de Reavaliação de Bens. Tributação. Proced.: Sergipe
Decadência. Relator: Min. Dias Toffoli
Verificado o não atendimento das condições Agte(s).: Estado de Sergipe
estabelecidas no art. 434 do RIR/99 para dife- Proc(a/s)(es).: Procurador-geral do Estado de Ser-
rimento da reserva de reavaliação, é cabível sua gipe
tributação integral, mas no período de sua for- Agdo(a/s).: Empresa Brasileira de Correios e Te-
mação. Transcorrido o prazo decadencial, sem légrafos - ECT
que tenha ocorrido auditoria fiscal para esse Adv(a/s).: Luiz Monteiro Varas
fim, cabe verificar as hipóteses de realização
da reserva de que tratam os artigos 435 e se- Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos ter-
guintes. mos do voto do Relator, negou provimento ao
agravo regimental. Ausentes, justificadamente, os
Rendimentos sobre Operação de Swap. Senhores Ministros Cezar Peluso (Presidente) e
Comprovada as perdas em operações de swap Celso de Mello, e, neste julgamento, os Senhores
e de que tais valores foram devidamente apro- Ministros Marco Aurélio e Joaquim Barbosa. Pre-
priados ao resultado como redutor das receitas sidiu o julgamento o Senhor Ministro Ayres Brit-
de renda variável cumpre cancelar a tributação to (Vice-Presidente). Plenário, 17.11.2011.
que foi calcada apenas nos ganhos auferidos
pelo contribuinte. Ementa
Agravo Regimental. Decisão que reconheu a
Ajuste de Inventário. Inexistência de Obrigação de Recolhimento do
Somente se admite a dedução de quebras ou IPVA. Imunidade Recíproca. Empresa Brasi-
perdas de estoques, se demonstrada por meio leira de Correios e Telégrafos (ECT). Julga-
de documentos hábeis e idôneos a sua ocorrên- mento Antecipado da Lide. Matéria exclusiva-
cia, preferencialmente no transcurso da audi- mente de Direito. Ausência de Nulidade. Pre-
toria fiscal. Indispensável ainda a comprova- clusão. Não Provimento do Agravo.
ção de que estas, se decorrentes do processo 1. Conjugando a regra do julgamento antecipa-
produtivo, transporte e manuseio, estavam do da lide com o procedimento contido no Re-
dentro do limite de razoabilidade previsto em gimento Interno desta Corte, não há prejuízo
lei. nem nulidade em despacho que dispensa pro-
dução de provas, determinando diretamente a
Lançamento de Ofício. Aplicação da Multa de oitiva da Procuradoria-Geral da República,
75% e Juros de Mora à Taxa Selic. Artigo 44, sem a apresentação de razões finais pelas par-
Inciso II, e 61 da Lei 9.430/1996. tes, porque lícito o julgamento antecipado
Comprovada a falta de declaração e recolhi- quando se trata de matéria exclusivamente de
mento dos tributos, correto a exigência me- direito. Como não houve instrução probatória
diante auto de infração, aplicando-se a multa no curso do processo, haja vista que foram
de ofício de 75%, incidindo, ainda, juros de bastantes para a formação do convencimento
mora à taxa Selic. do magistrado as provas trazidas na inicial e a
Recurso de Ofício Negado. Recurso Voluntá- na contestação, restou desnecessária a apresen-
rio Provido em Parte. tação de razões finais.
2. A ausência de intimação do réu do conteú- mente abordada pelo TRF da 3ª Região e, por-
do do despacho saneador foi suprida pela con- tanto, a matéria está prequestionada.
cessão de vista ao Procurador do Estado do Segundo orientação firmada por esta Suprema
Sergipe, ocasião em que o agravante deveria, Corte, a fixação do prazo de recolhimento de
sob pena de preclusão, ter alegado seu descon- tributo pode ser realizada por norma infraordi-
tentamento (art. 245, caput, do CPC), e não nária, isto é, sem o rigor do processo legislati-
tardiamente em sede de agravo regimental con- vo próprio de lei em sentido estrito.
tra a decisão de mérito. Se a redução abrupta do prazo de recolhimen-
3. A concessão de imunidade tributaria à Em- to implicou a majoração artificial do montan-
presa Brasileira de Correios e Telégrafos é te real devido, eventual violação constitucional
matéria que resta amplamente difundida nesta ocorreria em relação à capacidade contributi-
Corte, entendimento esse que foi reafirmado va (equilíbrio base de cálculo → critério mate-
na ACO nº 789/PI, ocasião em que restou as- rial), à segurança jurídica e à proibição do uso
sentada a presença da regra de imunidade re- de tributo com efeito confiscatório, mas não
cíproca a afastar a incidência do Imposto sobre em relação à regra da legalidade.
a Propriedade de Veículos Automotores Agravo regimental ao qual se nega provimen-
(IPVA) sobre os veículos de propriedade da to.
agravada, independentemente da natureza da (DJe de 8.11.2011, p. 27)
atividade desempenhada, se serviço público ou
atividade de cunho privado. NOTA DA DIALÉTICA
4. Agravo regimental a que se nega provimen- Vide Íntegras de Acórdãos do STF - Pleno
to. (RDDT 71:185) e do STF - 1ª Turma (RDDT
(DJe de 5.12.2011, p. 32) 27:188), e Acórdãos do STF - Pleno (RDDT
70:236), do STJ - 1ª Turma (RDDT 26:218), do
NOTA DA DIALÉTICA TRF da 1ª Região - 3ª Turma (RDDT 44:230), do
Vide Decisões dos Ministros Cármen Lúcia, do TRF da 3ª Região - 6ª Turma (RDDT 9:188) e do
STF (RDDT 134:210 e 161:186), Dias Toffoli, do TRF da 4ª Região - 1ª Turma (RDDT 40:202).
STF (RDDT 179:203) e Gilmar Mendes, do STF
(RDDT 124:210), e Acórdão do STF - Pleno
(RDDT 138:233). IPTU - CONTRATO DE PROMESSA DE
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL -
LEGITIMIDADE PASSIVA DO
COMPRADOR E DO VENDEDOR - CASO
IPI - PRAZO DE RECOLHIMENTO - CONCRETO
LEGALIDADE - INSUBMISSÃO
Recurso Especial nº 1.204.294-RJ
Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 546.316 (2010/0141083-6)
Origem: AC - 98030599704 - Tribunal Regional Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
Federal Recorrente: Município do Rio de Janeiro
Proced.: São Paulo Procurador: Elaine Tisser e Outro(s)
Relator: Min. Joaquim Barbosa Recorrido: Sul América Capitalização S/A
Agte(s).: Paulispell Indústria Paulista de Papéis e Advogado: Raphael Moreira dos Santos e Ou-
Papelão Ltda. tro(s)
Adv(a/s).: José Carlos Milanez Junior e Outro(a/s)
Agdo(a/s).: União Ementa
Proc(a/s)(es).: Procurador-geral da Fazenda Na- Processual Civil. Tributário. IPTU. Contrato
cional de Promessa de Compra e Venda de Imóvel.
Legitimidade Passiva do Possuidor (Promiten-
Decisão: negado provimento ao agravo regimen- te Comprador) e do Proprietário (Promitente
tal, nos termos do voto do Relator. Decisão unâ- Vendedor).
nime. 2ª Turma, 18.10.2011. 1. É certo que a jurisprudência desta Corte Su-
perior de Justiça é no sentido de que tanto o
Ementa: Agravo Regimental. Tributário. Re- promitente comprador (possuidor a qualquer
gra da Legalidade. Prazo de Recolhimento de título) do imóvel quanto seu proprietário/pro-
Tributo. Insubmissão. mitente vendedor (aquele que tem a proprieda-
A aplicação da regra da legalidade à modifica- de registrada no Registro de Imóveis) são con-
ção do prazo de recolhimento do Imposto so- tribuintes responsáveis pelo pagamento do
bre Produtos Industrializados - IPI foi direta- IPTU. Cumpre destacar que no REsp
1.110.551/SP e no REsp 1.111.202/SP, de mi- tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
nha relatoria, julgados em 10/06/2009, DJe Justiça, na conformidade dos votos e das notas
18/06/2009, submetidos ao Colegiado pelo re- taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
gime da Lei nº 11.672/08 (Lei dos Recursos “A Turma, por unanimidade, não conheceu do re-
Repetitivos), que introduziu o art. 543-C do curso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator,
CPC, reafirmou-se o posicionamento acima sem destaque.”
exposto. Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
2. No entanto, o acórdão de fls. 141/147, pro- Meira, Humberto Martins (Presidente) e Herman
ferido na forma do disposto no art. 543-C, § 8º, Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator.
do CPC, bem demonstrou a inaplicabilidade Brasília (DF), 14 de junho de 2011.
desse entendimento ao caso concreto, nos se- (DJe de 21.6.2011)
guintes termos:
“O acórdão proferido por este Colegiado teve NOTA DA DIALÉTICA
por fundamento não a só existência de contra- Vide Acórdãos do STJ - 1ª Seção (RDDT
to de promessa de compra e venda do imóvel 169:223), do STJ - 1ª Turma (RDDT 111:231,
gerador do tributo, mas as específicas circuns- 124:233, 136:234, 144:228 e 156:217) e do STJ
tâncias de haver ele sido firmado em caráter - 2ª Turma (RDDT 151:227, 163:232, 172:231,
irrevogável e irretratável, com imediata imis- 179:228 e nesta edição, nesta página).
são do promitente-comprador na posse, e sub-
sequente averbação no Registro de Imóveis
(daí advindo os efeitos jurídicos previstos nos IPTU - PROMESSA DE COMPRA E VENDA
arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil), além do - LEGITIMIDADE PASSIVA DO POSSUIDOR
manifesto exaurimento do prazo para usuca- E DO PROPRIETÁRIO
pião do bem. Contornos específicos, que fa-
zem destacar-se um caso particular na massa AgRg no Agravo em Recurso Especial
de demandas repetitivas, reclamam detido nº 50.101-SP (2011/0133155-7)
pronunciamento jurisdicional, como forma
mesmo de aperfeiçoar o regime estabelecido Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
na Lei nº 11.672/2008.” Agravante: Sergus Construções e Comércio Ltda.
3. Além disso, no que se refere ao acórdão pro- Advogado: Luiz Flávio Dias Cotrim e Outro(s)
ferido em sede de apelação (fls. 86/94), o Tri- Agravado: Município de São Paulo
bunal de origem, entre outros fundamentos, Procurador: Ermelinda Biselli Monteiro e Ou-
entendeu que, ainda que o promitente compra- tro(s)
dor não seja o proprietário em virtude da au-
sência de registro da escritura de compra e ven- Ementa
da no Cartório de Imóveis, ele o tornou em ra- Processual Civil. Tributário. IPTU. Contrato
zão da usucapião, explicitando que “por força de Promessa de Compra e Venda de Imóvel.
de promessa de compra e venda celebrada em Legitimidade Passiva do Possuidor (Promiten-
caráter irrevogável e irretratável, com transmis- te Comprador) e do Proprietário (Promitente
são imediata da posse, lavrada no ano de 1979, Vendedor). Tema já Julgado pelo Regime do
devidamente averbada no competente cartório Art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.
de registro de imóveis”, sendo que, “de tão Aplicação de Multa.
longínqua a data de formação do contrato, já se 1. A jurisprudência desta Corte Superior é no
exauriu, há muito, o prazo da usucapião”, ra- sentido de que tanto o promitente comprador
zão pela qual deve ser afastada a responsabili- (possuidor a qualquer título) do imóvel quan-
dade do promitente vendedor. Ocorre que, nas to seu proprietário/promitente vendedor (aque-
razões recursais, o Município do Rio de Janei- le que tem a propriedade registrada no Regis-
ro nem sequer atacou o fundamento acerca da tro de Imóveis) são contribuintes responsáveis
aquisição do imóvel pela usucapião, o que atrai pelo pagamento do IPTU.” (REsp 1.110.551/SP
a incidência da Súmula 283 do Supremo Tri- e REsp 1.111.202/SP, Rel. Min. Mauro Camp-
bunal Federal, por analogia: “É inadmissível o bell, Primeira Seção, DJ 18.6.2009, julgados
recurso extraordinário, quando a decisão re- de acordo com o regime previsto no art. 543-C
corrida assenta em mais de um fundamento do CPC).
suficiente e o recurso não abrange todos eles.” 2. Por se tratar de insurgência manifestamente
4. Recurso Especial não conhecido. inadmissível, diante da análise do mérito pelo
regime dos recursos repetitivos, fica autoriza-
Acórdão da a aplicação da penalidade estabelecida no
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que art. 557, § 2º, do CPC.
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- 3. Agravo regimental não provido.
Acórdão 2. Assim, as sociedades prestadoras de servi-
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que ços profissionais (serviços médicos, entre ou-
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- tros) sujeitam-se à tributação do ISS na forma
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de do § 1º, do artigo 9º, do Decreto-lei 406/68,
Justiça, na conformidade dos votos e das notas calculado em relação a cada profissional habi-
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: litado, sócio, empregado ou não, que preste
“A Turma, por unanimidade, negou provimento serviços em nome da sociedade, embora assu-
ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. mindo responsabilidade pessoal, ex vi do dis-
Ministro-Relator, sem destaque.” posto no § 3º, da referida norma legal.
Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro 3. Recurso especial municipal desprovido.
Meira e Humberto Martins votaram com o Sr.
Ministro Relator. Acórdão
Não participou, justificadamente, do julgamento Vistos e relatados estes autos em que são partes as
o Sr. Ministro Herman Benjamin. acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Mauro Camp- do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
bell Marques. negar provimento ao recurso especial, nos termos
Brasília (DF), 17 de novembro de 2011. do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
(DJe de 28.11.2011) Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Fi-
lho e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Mi-
nistro Relator.
ISS - BASE DE CÁLCULO - SOCIEDADES Licenciado o Sr. Ministro Francisco Falcão.
UNIPROFISSIONAIS - TRATAMENTO Brasília, 06 de outubro de 2011.
DIFERENCIADO (DJe de 13.10.2011)

Recurso Especial nº 1.039.926-BA


(2007/0241670-7) ISS - BASE DE CÁLCULO - TRATAMENTO
CONFERIDO A PROFISSIONAIS LIBERAIS
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki E SOCIEDADES UNIPROFISSIONAIS -
Recorrente: Município de Salvador EMPRESÁRIO INDIVIDUAL OU
Procurador: Anderson Souza Barroso e Outro(s) SOCIEDADE EMPRESÁRIA - EXERCÍCIO
Recorrido: Clínica Cirúrgica Cardiovascular e DE PROFISSÃO INTELECTUAL -
Pulmonar Ltda. INAPLICABILIDADE
Advogado: Maurício Silvestre de Faria e Outro(s)
Recurso Especial nº 1.028.086-RO
(2007/0185621-3)
Ementa
Tributário. Imposto sobre Serviços de Qual- Relator: Ministro Teori Albino Zavascki
quer Natureza - ISS. Base de Cálculo. Trata- Recorrente: Adriano Miranda de Sousa - Mi-
mento Diferenciado Conferido às Sociedades croempresa
Uniprofissionais. Artigo 9º, §§ 1º e 3º, do De- Advogado: Breno Dias de Paula e Outro(s)
creto-lei 406/68. Norma não Revogada pela Recorrido: Município de Porto Velho
Lei Complementar 116/2003. Precedentes. Procurador: Moacir de Souza Magalhães e Ou-
1. Segundo a jurisprudência firmada no âmbi- tro(s)
to da 1ª Seção do STJ, o tratamento diferen-
ciado dispensado às sociedades profissionais, Ementa
nos moldes do artigo 9º do Decreto-lei 406/68, Processual Civil e Tributário. Imposto sobre
não foi revogado pela Lei Complementar 116/03. Serviços de Qualquer Natureza - ISS. Base de
Precedentes: AgRg no Ag 1.229.678/MG, Rel. Cálculo. Tratamento Diferenciado Conferido
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda aos Profissionais Liberais e às Sociedades Uni-
Turma, julgado em 19.08.2010, DJe profissionais. Artigo 9º, §§ 1º e 3º, do Decre-
28.09.2010; REsp 1.184.606/MT, Rel. Minis- to-lei 406/68. Norma não Revogada pela Lei
tra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado Complementar 116/2003. Precedentes. Empre-
em 22.06.2010, DJe 01.07.2010; REsp sário Individual ou Sociedade Empresária. Ina-
1.052.897/MG, Rel. Ministro Teori Albino plicabilidade. Precedentes da Primeira Seção.
Zavascki, Primeira Turma, julgado em Exercício de Profissão Intelectual como Ele-
02.04.2009, DJe 16.04.2009; e REsp mento de Empresa. Configuração.
1.016.688/RS, Rel. Ministro José Delgado, 1. A Primeira Seção consolidou o entendimen-
Primeira Turma, julgado em 06.05.2008, DJe to de que “as sociedades uniprofissionais so-
05.06.2008. mente têm direito ao cálculo diferenciado do
ISS, previsto no artigo 9º, parágrafo 3º, do Ementa
Decreto-lei nº 406/68, quando os serviços são Tributário. Processo Civil. Mandado de Segu-
prestados em caráter personalíssimo e, assim, rança. Autoridade Coatora. Legitimidade. ISS.
prestados no próprio nome dos profissionais Empresa Prestadora de Trabalho Temporário.
habilitados ou sócios, sob sua total e exclusi- Base de Cálculo que abrange, além da Taxa de
va responsabilidade pessoal e sem estrutura Agenciamento, os Valores Relativos ao Paga-
ou intuito empresarial” (EREsp 866.286/ES, mento dos Salários e Encargos Sociais Refe-
Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado rentes aos Trabalhadores Contratados pela
em 29/09/2010, DJe 20/10/2010). “Empresa de Trabalho Temporário”.
2. Segundo o artigo 966 do Código Civil, con- 1. É aplicável a teoria da encampação em ca-
sidera-se empresário aquele que exerce ativida- sos de mandado de segurança sempre que, cu-
de econômica (com finalidade lucrativa) e or- mulativamente, estiverem cumpridos os se-
guintes requisitos: (i) discussão do mérito nas
ganizada (com o concurso de mão-de-obra, informações; (ii) subordinação hierárquica en-
matéria-prima, capital e tecnologia) para a pro- tre a autoridade efetivamente coatora e a apon-
dução ou circulação de bens ou de serviços, tada como tal pela inicial; e (iii) inexistência de
não configurando atividade empresarial o exer- modificação de competência.
cício de profissão intelectual de natureza cien- 2. A orientação da Primeira Seção/STJ firmou-
tífica, literária ou artística, ainda que com o se no sentido de que “as empresas de mão-de-
concurso de auxiliares ou colaboradores, que obra temporária podem encartar-se em duas
não constitua elemento de empresa. situações, em razão da natureza dos serviços
3. A tributação diferenciada do ISS não se apli- prestados: (i) como intermediária entre o con-
ca à pessoa física ou jurídica cujo objeto social tratante da mão-de-obra e o terceiro que é
é o exercício de profissão intelectual como ele- colocado no mercado de trabalho; (ii) como
mento integrante da atividade empresarial prestadora do próprio serviço, utilizando de
(vale dizer, o profissional liberal empresário e empregados a ela vinculados mediante contra-
a sociedade empresária profissional). No caso, to de trabalho”. Na primeira hipótese, o ISS
configurado o caráter empresarial da atividade incide “apenas sobre a taxa de agenciamento,
desempenhada, fica afasta a incidência do ar- que é o preço do serviço pago ao agenciador,
tigo 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-lei 406/68. sua comissão e sua receita, excluídas as im-
4. Recurso especial desprovido. portâncias voltadas para o pagamento dos
salários e encargos sociais dos trabalhado-
res”. Na segunda situação, “se a atividade de
Acórdão prestação de serviço de mão-de-obra temporá-
Vistos e relatados estes autos em que são partes as ria é prestada através de pessoal contratado
acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma pelas empresas de recrutamento, resta afasta-
do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, da a figura da intermediação, considerando-
negar provimento ao recurso especial, nos termos se a mão-de-obra empregada na prestação do
do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros serviço contratado como custo do serviço, des-
Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Fi- pesa não dedutível da base de cálculo do ISS”,
lho e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Mi- como ocorre em relação aos serviços prestados
nistro Relator. na forma da Lei 6.019/74 (REsp 1.138.205/PR,
Licenciado o Sr. Ministro Francisco Falcão. 1ª Seção, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º.2.2010
Brasília (DF), 20 de outubro de 2011. - recurso submetido à sistemática prevista no
(DJe de 25.10.2011) art. 543-C do CPC, c/c a Resolução 8/2008 -
Presidência/STJ).
3. No caso dos autos, é incontroverso que a
ISS - EMPRESA PRESTADORA DE empresa recorrida é prestadora de trabalho
TRABALHO TEMPORÁRIO - BASE DE temporário, que utiliza para tanto empregados
CÁLCULO por ela própria contratados pelo regime traba-
lhista. Desse modo, a base de cálculo do ISS
abrange, além da taxa de agenciamento, os
Recurso Especial nº 1.185.275-PR valores relativos ao pagamento dos salários e
(2010/0045913-7) encargos sociais referentes aos trabalhadores
contratados pela “empresa de trabalho tempo-
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques rário” (art. 4º da Lei 6.019/74).
Recorrente: Município de Londrina 4. Recurso especial parcialmente provido.
Procurador: Fabio Cesar Teixeira e Outro(s)
Recorrido: Employer Organização de Recursos Acórdão
Humanos Ltda. Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
Advogado: Almerindo Pereira e Outro(s) são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de lise feita pelo TJ no tocante ao conceito de ser-
Justiça, na conformidade dos votos e das notas viço fixado pelo art. 156, III, da CF e declarar
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: inconstitucionais os dispositivos da lei comple-
“Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vis- mentar federal, o que é inviável em Recurso
ta do Sr. Ministro Castro Meira, acompanhando o Especial.
Sr. Ministro Mauro Campbell Marques, a Turma, 5. Ainda que impossível acolher integralmen-
por maioria, deu parcial provimento ao recurso, te o pedido principal da contribuinte (não in-
nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Ven- cidência do ISS sobre planos de saúde), é pre-
cido o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha que dele ciso reconhecer parcialmente o seu pleito, no
não conheceu.” que se refere à base de cálculo da exação.
Os Srs. Ministros Castro Meira (voto-vista), 6. A Segunda Turma ratificou jurisprudência
Humberto Martins (Presidente) e Herman Benja- de que a base de cálculo do ISS sobre planos
min votaram com o Sr. Ministro Relator. de saúde é o preço pago pelos consumidores,
Brasília (DF), 05 de abril de 2011. diminuído dos repasses feitos pela contribuin-
(DJe de 23.9.2011) te aos demais prestadores de serviços de saú-
de (hospitais, clínicas, laboratórios, médicos
etc.). Com ressalva de meu entendimento, pas-
ISS - PLANO DE SAÚDE - BASE DE so a acompanhar esses precedentes.
CÁLCULO - DESCONTOS - REPASSES A 7. A empresa pretende afastar totalmente a tri-
OUTROS PRESTADORES DE SERVIÇO butação, pelo argumento de que a base de cál-
culo reconhecida pelo TJ-SP (preço pago pelo
Recurso Especial nº 1.237.312-SP consumidor, sem abatimento) é incorreta. O
(2011/0019397-6) pedido deve ser parcialmente provido, pois,
embora devida a cobrança, o cálculo deve ser
Relator: Ministro Herman Benjamin feito sobre base menor.
Recorrente: Saúde ABC Planos de Saúde Ltda. 8. Não se trata de decisão extra petita, como
Advogados: Pedro Luciano Marrey Junior e Ou- aventado pelo Município, mas de deferimento,
em parte, do pedido.
tro(s) 9. Recurso Especial parcialmente conhecido e,
Flávio Mifano e Outro(s) nessa parte, parcialmente provido.
Marcos Joaquim Gonçalves Alves e
Outro(s) Acórdão
Recorrido: Município de São Paulo Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Advogado: Danilo de Arruda Guazeli Paiva e Ou- partes as acima indicadas, acordam os Ministros
tro(s) da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
ça: “Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-
Ementa vista regimental do Sr. Ministro Herman Benja-
Processual Civil e Tributário. ISS. Plano de min, a Turma, por unanimidade, conheceu em
Saúde. Incidência. Base de Cálculo. Descon- parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe parcial
tos. provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-
1. Discute-se a validade da cobrança do ISS so- Relator.” Os Srs. Ministros Mauro Campbell Mar-
bre planos de saúde e sua base de cálculo. ques, Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Humber-
2. A solução integral da controvérsia, com fun- to Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
damento suficiente, não caracteriza ofensa ao Brasília, 20 de outubro de 2011 (data do julga-
art. 535 do CPC. mento).
3. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem (DJe de 24.10.2011)
consignou expressamente que “os Planos de
Saúde foram incluídos na Lista de Serviços tri- NOTA DA DIALÉTICA
butáveis pelo ISSQN, assim permanecendo na Vide Íntegra de Acórdão do STJ - 2ª Turma
lista anexa à Lei Complementar nº 116/03, o (RDDT 190:168), e Acórdãos do STJ - 1ª Turma
que tornou possível aos municípios exercitar (RDDT 186:222) e do STJ - 2ª Turma (RDDT
sua competência tributária e exigir o imposto 195:231).
nos termos do art. 156, III da CF” (fls. 297-
298 - grifei).
4. No caso em análise não existe, a rigor, dis- ISS - SOCIEDADE LIMITADA - CARÁTER
cussão quanto à legislação federal, que prevê EMPRESARIAL - TRATAMENTO
a exação nos itens 4.22 e 4.23 da Lista Anexa PRIVILEGIADO - IMPOSSIBILIDADE
à LC 116/2003 (isso jamais é negado pela con-
tribuinte). A pretensão principal da recorrente, AgRg no Agravo em Recurso Especial
na presente demanda, implica infirmar a aná- nº 25.626-MT (2011/0098682-4)
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques Acórdão
Agravante: Município de Cuiabá Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
Procurador: José Adelar Dal Pissol e Outro(s) são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
Agravado: Sociedade de Médicos Imogenologis- tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
tas de Cuiabá Ltda. Justiça, na conformidade dos votos e das notas
Advogado: José Guilherme Júnior e Outro(s) taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
“A Turma, por unanimidade, negou provimento
Ementa ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
Tributário. ISS. Sociedade Limitada. Caráter Ministro-Relator, sem destaque.”
Empresarial. Não Incidência do Art. 9º, §§ 1º Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro
e 3º, do Decreto-lei n. 406/68. Tratamento Tri- Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin
butário Privilegiado. Impossibilidade. (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
1. Nos termos do art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei Brasília (DF), 20 de outubro de 2011.
406/68, “a base de cálculo do imposto é o pre- (DJe de 27.10.2011)
ço do serviço” e “quando se tratar de presta-
ção de serviços sob a forma de trabalho pes- NOTA DA DIALÉTICA
soal do próprio contribuinte, o imposto será Vide Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT
calculado, por meio de alíquotas fixas ou va- 103:230, 146:233, 162:235, 175:225, 176:211 e
riáveis, em função da natureza do serviço ou 187:228) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 160:229,
de outros fatores pertinentes, nestes não com- 167:236, 172:232 e 233, 185:230, 189:228 e
preendida a importância paga a título de re- 191:232).
muneração do próprio trabalho”. Tratando-se
de serviços prestados por sociedades, desde
que o serviço se enquadre no rol previsto no § ISS - SOCIEDADE UNIPROFISSIONAL DE
3º do artigo referido, há autorização legal para ADVOGADOS - VALOR FIXO ANUAL
fruição do tratamento privilegiado, devendo o
imposto ser “calculado em relação a cada Recurso Especial nº 1.257.041-SP
profissional habilitado, sócio, empregado ou
(2011/0099689-4)
não, que preste serviços em nome da socieda-
de, embora assumindo responsabilidade pes-
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
soal, nos termos da lei aplicável”. A socieda-
de simples, constituída sob a forma de socie- Recorrente: Ruiz e Monti Advocacia
dade limitada, não pode usufruir do tratamen- Advogado: Ananias Ruiz e Outro(s)
to privilegiado, porquanto nela o sócio não Recorrido: Município de Adamantina
assume responsabilidade pessoal, tendo em Advogado: Luiz Carlos Bocchi Junior e Outro(s)
vista que sua responsabilidade é limitada à
participação no capital social, não obstante to- Ementa
dos os sócios respondam solidariamente pela Processual. Tributário. Sociedade Uniprofis-
integralização do capital social. sional de Advogados. ISS. Recolhimento com
2. A jurisprudência desta Corte Superior é no Base em Valor Fixo Anual. Tratamento Tribu-
sentido de que, para fazer jus ao benefício dis- tário Diferenciado Previsto no Art. 9º, §§ 1º e
posto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-lei n. 3º, do Decreto-lei n. 406/68.
406/68, a empresa deve caracterizar-se como 1. O recurso não pode ser conhecido pela alí-
sociedade uniprofissional, o que não se com- nea “c” do permissivo constitucional, pois não
patibiliza com a adoção do regime da socieda- foi realizado o necessário cotejo analítico, bem
de limitada, em razão do caráter empresarial de como não foi apresentado o dissídio jurispru-
que se reveste este tipo social. Precedentes: dencial, não bastando a simples transcrição de
REsp 1.221.027/SP, Rel. Ministro Mauro ementas.
Campbell Marques, Segunda Turma, julgado 2. A jurisprudência desta Corte Superior é no
em 22/02/2011, DJe 04/03/2011; AgRg no sentido de que as sociedades uniprofissionais
REsp 1.202.082/PB, Rel. Ministro Herman de advogados, qualquer que seja o conteúdo de
Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/09/ seus contratos sociais, gozam do tratamento
2010, DJe 02/02/2011; AgRg no Ag tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º
1.349.283/RO, Rel. Ministro Humberto Mar- e 3º, do Decreto-lei nº 406/68, não recolhendo
tins, Segunda Turma, julgado em 02/12/2010, o ISS sobre o faturamento, mas em função de
DJe 14/12/2010; REsp 1.057.668/RS, Rel. valor anual fixo relativo a cada profissional.
Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 4.9.2008. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e,
3. Agravo Regimental não provido. nessa parte, provido.
Acórdão lecidos na Legislação Federal (DL 311/68).
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que Questão não Enfrentada pelo Tribunal de Ori-
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- gem. Omissão. Nulidade por Infringência do
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Art. 535 do CPC Evidenciada.
Justiça, na conformidade dos votos e das notas 1. Recurso especial interposto nos autos de
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: ação originária julgada no TJES cuja discussão
“A Turma, por unanimidade, conheceu em parte reside nos limites territoriais dos Municípios
do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos de Serra e de Vitória para fins de recebimento
termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem des- de IBTI, no moldes do art. 23, § 10, da CF/69,
taque.” pela alienação de imóvel situado na parte con-
Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro trovertida (complexo industrial da Companhia
Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin Siderúrgica de Tubarão - CST).
(Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. 2. A irresignação do Município de Serra diz
Brasília (DF), 13 de setembro de 2011. respeito ao suporte normativo utilizado para
(DJe de 19.9.2011) elaboração da planta geográfica e que fora ado-
tada como prova pericial nas razões de decidir
NOTA DA DIALÉTICA do acórdão recorrido. Suscita que a lei estadual
Vide textos de Doutrina de Fernando Facury Scaff (Lei 1.919/63) que foi aplicada não obedece os
(RDDT 13:30) e de Gabriel Lacerda Troianelli critérios gerais estabelecidos pela legislação
(RDDT 98:63), Íntegras de Acórdãos do STJ - 2ª federal pertinente, DL 311/68, que assim dis-
Turma (RDDT 116:145, 160:179, 173:203, põe: “Os limites inter-distritais ou inter-muni-
182:188 e 190:177) e do TJRS - 1ª Câmara Cível cipais serão definidos segundo linhas geodési-
(RDDT 109:177), Decisões dos Ministros Nelson cas entre pontos bem identificados ou acompa-
Jobim, do STF (RDDT 97:218) e Benedito Gon- nhando acidentes naturais, não se admitindo
çalves, do STJ (RDDT 168:204) e do Magistrado linhas divisórias sem definição expressa ou
Renato Barth Pires, da 22ª Vara Federal de São caracterizada apenas pela coincidência com
Paulo (RDDT 92:212), e Acórdãos do STJ - 1ª
divisas pretéritas ou atuais.”
Seção (RDDT 127:234, 156:234 e 164:236), do
3. A Corte a quo, mesmo depois de instada em
STJ - 1ª Turma (RDDT 167:237) e do STJ - 2ª
Turma (RDDT 109:233, 121:235, 131:229 e sustentação oral e em aclaratórios, deixou de se
142:229). manifestar sobre a tese de que a norma local
contestada não é válida em face do que dispõe
aludida legislação federal, questão essa que,
ITBI - CONTROVÉRSIA SOBRE A por ser de ordem pública, deve ser conhecida,
LOCALIZAÇÃO DO BEM inclusive, de ofício.
TRANSACIONADO - DEFINIÇÃO DO 4. Tendo em vista, portanto, que a validade da
MUNICÍPIO FAVORECIDO legislação estadual é questão relevante para o
desate da causa, porquanto refletirá diretamen-
AgRg no Recurso Especial nº 1.201.265-ES te na legitimidade dos marcos geográficos con-
(2010/0116950-9) siderados na elaboração da prova produzida
nos autos, deve o acórdão a quo ser integrado,
Relator: Ministro Benedito Gonçalves sob pena de negativa de prestação jurisdicio-
Agravante: Município de Vitória nal.
Procurador: Sandro Vieira de Moraes e Outro(s) 5. Agravo regimental não provido.
Agravado: Município de Serra
Procurador: Edinaldo Loureuro Ferraz e Outro(s) Acórdão
Interes.: Estado do Espírito Santo Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
Procurador: José Ricardo de Abreu Júdice e partes as acima indicadas, acordam os Ministros
Outro(s) da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi-
ça, por unanimidade, negar provimento ao agra-
Ementa vo regimental, nos termos do voto do Sr. Minis-
Processual Civil e Tributário. Agravo Regi- tro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavas-
mental no Recurso Especial. ITBI. Tributação cki, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes
Ocorrida Durante a Vigência da CF/69. Con- Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.
trovérsia sobre a Localização do Bem Transa- Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francis-
cionado para a Definição do Município Favo- co Falcão.
recido. Alegação de que os Limites Geográfi- Brasília (DF), 17 de novembro de 2011 (Data do
cos Contidos na Lei Estadual (Lei 1.919/63) Julgamento).
não estão de Acordo com os Critérios Estabe- (DJe de 22.11.2011)
LANÇAMENTO - PESSOA JURÍDICA MULTA DE OFÍCIO - INCORPORAÇÃO DE
EXTINTA E LIQUIDADA - PESSOA JURÍDICA SOB CONTROLE
IMPOSSIBILIDADE - TRANSFERÊNCIA COMUM - SUCESSÃO
DO AUTO DE INFRAÇÃO A UM DOS
SÓCIOS - NECESSIDADE DE Processo nº 10680.000564/2004-26
OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO
Recurso nº 108-141.293 Especial do Procurador
LEGAL PARA IDENTIFICAÇÃO DA
Acórdão nº 9101-00.051 - 1ª Turma
RESPONSABILIDADE
Sessão de 10 de março de 2009
Matéria: CSLL - Multa Sucessão
Processo nº 10830.005479/2002-21 Recorrente: Fazenda Nacional
Interessado: MG Master Ltda. (Sucessora da Su-
Recurso nº 103-147.607 Especial do Procurador lise Esportes e Comércio Ltda.)
Acórdão nº 9101-00.016 - 1ª Turma Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário
Sessão de 09 de março de 2009 Exercício: 1999
Matéria: IRPJ - Erro identificação sujeito passivo
- pessoa jurídica extinta Ementa: Multa de Ofício - Incorporação de
Recorrente: Fazenda Nacional Sociedade sob Controle Comum - A interpre-
Interessado: Sohpar Administração Participação e tação do artigo 132 do CTN, moldada no con-
Comércio Ltda. ceito de que a pena não deve passar da pessoa
de seu infrator, não pode ser feita isoladamen-
Lançamento - Pessoa Jurídica Extinta - Liqui- te, de sorte a afastar a responsabilidade do su-
dação. O artigo 101 do CTN estabelece que o cessor pelas infrações anteriormente cometidas
sujeito passivo é aquele que estiver obrigado pelas sociedades incorporadas, quando prova-
ao pagamento do tributo, seja ele o contribuin- do nos autos do processo que as sociedades,
te ou o responsável indicado na lei. A pessoa incorporadora e incorporadas, sempre estive-
jurídica subsiste até o final de sua liquidação, ram sob controle comum de sócio pessoa físi-
ca e de controladora informal.
de modo que não é possível promover lança-
mento (formalização da relação jurídica tribu- Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.
tária) contra pessoa extinta pois ela é inexisten- Acordam os Membros da Primeira Turma da Câ-
te no mundo jurídico. mara Superior de Recursos Fiscais, por unanimi-
dade de votos, em conhecer do recurso especial e
Erro de Indentificação [sic] de Sujeito Passivo dar provimento ao recurso especial, e determinar
- Pessoa Jurídica Extinta - É inadmissível a la- o retomo [sic] dos autos à Câmara recorrida para
vratura de auto de infração contra pessoa jurí- apreciar as demais alegações da recorrente, nos
dica extinta, bem como a transferência do pólo termos do relatório e voto que passam a integrar
passivo da relação jurídica tributária no curso o presente julgado.
do processo administrativo a um dos sócios da (DOU 1 de 11.10.2011, p. 19)
empresa sem o devido processo legal para
identificação do responsável na forma estabe- NOTA DA DIALÉTICA
lecida pelo Código Tributário Nacional (arts. Vide Acórdão do Carf - Câmara Superior - 1ª Tur-
128 a 135), abrindo-se a possibilidade de am- ma (RDDT 195:231).
pla defesa e contraditória.

Visto[s], relatados e discutidos os presentes autos. PARCELAMENTO - LEI 11.941 - EMPRESA


Acordam os Membros da Primeira Turma da Câ- OPTANTE PELO SIMPLES - INCLUSÃO -
IMPOSSIBILIDADE
mara Superior de Recursos Fiscais, por unanimi-
dade de votos, em rejeitar a preliminar suscitada Recurso Especial nº 1.253.220-SC
de não conhecimento do recurso e, no mérito, por (2011/0107947-5)
maioria de votos em negar provimento ao recur-
so especial, nos termos do relatório e voto que Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
passam a integrar o presente julgado. Vencidos os Recorrente: Sérgio Coelho de Souza Liberato
Conselheiros Antonio Praga e Alexandre Andra- Advogado: Roseli Cachoeira Sestrem e Outro(s)
de Lima da Fonte Filho que deram provimento ao Recorrido: Fazenda Nacional
recurso. Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
(DOU 1 de 11.10.2011, p. 16) cional
Ementa Não participou, justificadamente, do julgamento
Processual Civil e Tributário. Parcelamento o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.
Instituído pela Lei n. 11.941/2009. Empresas Brasília (DF), 06 de outubro de 2011.
Optantes pelo Simples Nacional. Inclusão. Im- (DJe de 17.10.2011)
possibilidade. Inexistência de Lei Complemen-
tar Concessiva. Legalidade da Portaria Con- NOTA DA DIALÉTICA
junta PGFN/RFB 06/2009. Vide Acórdãos do STJ - 1ª Turma (RDDT
1. O acórdão recorrido analisou todas as ques- 157:236) e do STJ - 2ª Turma (RDDT 191:234).
tões necessárias ao desate da controvérsia, só
que de forma contrária aos interesses da parte.
Logo, não padece de vícios de omissão, con- PIS/PASEP - REGIME NÃO CUMULATIVO -
tradição ou obscuridade, a justificar sua anula- INSUMOS - MATERIAIS PARA
ção por esta Corte. Tese de violação do art. 535 MANUTENÇÃO DE MÁQUINAS -
do CPC repelida. DEDUTIBILIDADE
2. Quanto ao art. 514 do CPC, como bem as-
severado pelo acórdão recorrido, verifica-se Processo nº 11020.001952/2006-22
que a apelação interposta pela Fazenda Na-
cional guardou relação de pertinência com a Recurso nº 369.519 Voluntário
sentença recorrida, pelo que não há falar em vi- Acórdão nº 3202-00.226 - 2ª Câmara/2ª Turma
olação ao citado artigo. Ordinária
3. No mérito, discute-se nos autos sobre a pos- Sessão de 08 de dezembro de 2010
sibilidade das empresas optantes pelo Simples Matéria: Contribuição para o PIS
Nacional aderirem ao parcelamento instituído Recorrente: Móveis Ponzani Ltda.
pela Lei n. 11.941/2009. Recorrida: DRJ-Porto Alegre/RS
4. Esta Corte já se pronunciou no sentido da le- Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep
galidade da Portaria Conjunta PGFN/RFB n. Período de apuração: 01/04/2005 a 30/06/2005
06/2009, a qual vedou a inclusão das empresas
optantes pelo Simples Nacional no parcela- Preliminar de Cerceamento de Defesa.
mento previsto na Lei n. 11.941/2009, por en- Inexistem quaisquer indícios de cerceamento
tender que apenas Lei Complementar pode criar do direito de defesa, haja vista que a Recorren-
parcelamento de débitos que englobam tribu- te acompanhou e teve ampla ciência de todos
tos de outros entes da federação, nos termos do os atos adotados no procedimento de fiscaliza-
art. 146 da Constituição Federal. Assim, em ção.
não havendo a referida lei, não há como auto-
rizar a inclusão dos optantes pelo Simples Na- Exclusão da Base de Cálculo. Venda para Co-
cional no referido parcelamento. Precedente: mercial Exportadora.
REsp 1.236.488/RS, Rel. Min. Humberto Mar- Para que sejam excluídas da base de cálculo da
tins, Segunda Turma, DJe de 3.5.2011. contribuição, as operações de vendas para co-
5. Ademais, segundo disposto no art. 155-A do mercial exportadora, com o fim específico de
CTN, “o parcelamento será concedido na for- exportação, devem se enquadrar em algumas
ma e condição estabelecida em lei específica”. das disposições legais para isenção, fazendo
Portanto, não sendo os débitos do Simples prova de tal enquadramento.
Nacional contemplados pela lei instituidora do
parcelamento, não há falar em ilegalidade da Regime não Cumulativo. Insumos. Materiais
Portaria Conjunta PGFN/RFB n. 06/2009. para Manutenção de Máquinas.
6. Recurso especial não provido. O conceito de insumo dentro da sistemática de
apuração de créditos pela não cumulatividade
Acórdão de PIS e Cofins deve ser entendido como toda
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que [sic] e qualquer custo ou despesa necessária a
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- atividade da empresa, nos termos da legislação
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de do IRPJ, não devendo ser utilizado o conceito
Justiça, na conformidade dos votos e das notas trazido pela legislação do IPI, uma vez que a
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: materialidade de tal tributo é distinta da mate-
“A Turma, por unanimidade, negou provimento rialidade das contribuições em apreço.
ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-
Relator, sem destaque.” Crédito de Energia Elétrica. Comprovação do
Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Mar- Efetivo Consumo.
tins e Herman Benjamin (Presidente) votaram O creditamento relativo a custo com energia
com o Sr. Ministro Relator. elétrica só pode ser admitido mediante a com-
provação do efetivo consumo integral do valor 2. No caso, o STF suspendeu, em liminar, a
faturado ao estabelecimento da empresa, não execução do art. 2º da EC 30/2000, que intro-
havendo previsão legal que ampare e regula- duziu o art. 78 no ADCT da Constituição Fe-
mente o aproveitamento, mediante rateio de deral, razão pela qual os seus dispositivos (que
qualquer espécie. asseguram aos precatórios ali previstos o poder
liberatório do pagamento de tributos), já não
Controle de Constitucionalidade de Normas. mais podem ser invocados perante o Judiciário.
Aplicação da Súmula Carf nº 2. 3. Agravo regimental desprovido.
O controle de constitucionalidade da legislação
que fundamenta o lançamento é de competên- Acórdão
cia exclusiva do Poder Judiciário, não poden- Vistos e relatados estes autos em que são partes as
do ser objeto de pronunciado pelo Carf. acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma
Recurso Voluntário provido em Parte. do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
receber os embargos de declaração como agravo
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. regimental e negar-lhe provimento, nos termos do
Acordam os membros do Colegiado [do Carf], voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
por unanimidade de votos, rejeitar a preliminar de Arnaldo Esteves Lima (Presidente), Napoleão
cerceamento do direito de defesa e, no mérito, dar Nunes Maia Filho e Francisco Falcão votaram
provimento parcial ao recurso voluntário para re- com o Sr. Ministro Relator.
conhecer o aproveitamento de créditos decorren- Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Benedi-
tes da aquisição de Materiais para manutenção de to Gonçalves.
máquinas, por [es]tarem diretamente relacionados Brasília, 22 de novembro de 2011.
a atividade da recorrente, caracterizando-se como (DJe de 2.12.2011)
insumos.
(DOU 1 de 26.10.2011, p. 16)
PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL -
DOCUMENTOS LEVANTADOS EM VIA
PRECATÓRIO - PODER LIBERATÓRIO DO DIGITAL PELA FISCALIZAÇÃO - CIÊNCIA
PAGAMENTO DE TRIBUTOS - SUSPENSÃO DO CONTRIBUINTE - INEXISTÊNCIA DE
DE EFICÁCIA DO ART. 2º DA EC 30 NULIDADE

EDcl no Recurso em Mandado de Segurança Processo nº 35358.000499/2007-74


nº 30.968-PR (2009/0227073-1)
Recurso nº 157.923 Voluntário
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki Acórdão nº 2301-01.659 - 3ª Câmara/1ª Turma
Embargante: Farmácia Farmaútil Ltda. Ordinária
Advogados: Marcio Luiz Blazius Sessão de 22 de setembro de 2010
Márcio Rodrigo Frizzo Matéria: Entrega de documentos em via digital -
Embargado: Estado do Paraná Agroindústria - Enquadramento
Procurador: Vitor Puppi e Outro(s) Recorrente: Móveis Rueckl Ltda.
Recorrida: DRJ-Florianópolis-SC
Ementa Assunto: Contribuições Sociais Previdenciárias
Embargos de Declaração Recebidos como Período de apuração: 01/10/2005 a 31/12/2006
Agravo Regimental. Constitucional. Precató-
rio. Poder Liberatório do Pagamento de Tribu- Nulidade. Entrega de Documentos em Via Di-
tos. Art. 78, § 2º, do ADCT. Suspensão pelo gital.
STF da Eficácia do Art. 2º da EC 30/2000, que Não há que se falar em nulidade do lançamen-
introduziu o Referido Dispositivo (ADI’s to (wand° [sic] o contribuinte restou cientifica-
2.356-MC e 2.362-MC). do de documentos levantados pela fiscalização
1. O deferimento de liminar, com eficácia ex ainda que em meio digital, haja vista expressa
nunc, em ação direta de inconstitucionalidade, disposição legal sobre o tema.
constitui determinação dirigida aos aplicadores
da norma contestada para que, nas suas futu- Agroindostria [sic]. Enquadramento.
ras decisões, (a) deixem de aplicar o preceito O produtor rural pessoa jurídica que industria-
normativo objeto da ação direta de inconstitu- liza produção própria e adquirida de terceiros,
cionalidade e (b) apliquem a legislação anterior ainda que a primeira seja inferior à segunda,
sobre a matéria, mantidas, no entanto, as deci- enquadra-se no conceito legal de agroindústria.
sões anteriores em outro sentido (salvo se hou- Recurso Voluntário Provido.
ver expressa previsão de eficácia ex tunc). Crédito Tributário Exonerado.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. Ementa
Acordam os membros do colegiado [do Carf], Tributário. Recurso Especial. Controvérsia sobre
acordam os membros da 3ª Câmara/1ª Turma Or- a Interpretação do Art. 14 da Lei 11.941/2009.
dinária da Segunda Seção de Julgamento, por una- Remissão. Impossibilidade de Pronunciamen-
nimidade de votos, em dar provimento ao recur- to de Ofício pelo Magistrado. Limite de R$
so voluntário nos termos do voto do relator. 10.000,00 Considerado por Sujeito Passivo, e
(DOU 1 de 25.10.2011, p. 31) não por Débito Isolado. Orientação Adotada
pela Primeira Seção, em Sede de Recurso Re-
petitivo.
PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - 1. Afasta-se a alegada violação do art. 535 do
RECURSO ESPECIAL DA FAZENDA EM Código de Processo Civil, pois o acórdão re-
RECURSO DE OFÍCIO - NÃO corrido está suficientemente fundamentado,
CONHECIMENTO muito embora o Tribunal de origem tenha de-
cidido de modo contrário aos interesses da par-
Processo nº 15374.003962/2001-39 te embargante. Isso, contudo, não significa
omissão, mormente por terem sido abordados
Recurso nº 105-135.226 Especial do Procurador todos os pontos necessários para a integral re-
Acórdão nº 9101-00.019 - 1ª Turma solução da causa.
Sessão de 09 de março de 2009 2. A Lei 11.941/2008 remite os débitos para
Matéria: IRPJ e Outros com a Fazenda Nacional vencidos há cinco
Recorrente: Fazenda Nacional anos ou mais cujo valor total consolidado seja
Interessado: Levons do Brasil Participações S/A igual ou inferior a 10 mil reais.
Exercício: 1997 3. O valor-limite acima referido deve ser con-
siderado por sujeito passivo, e separadamente
Ementa: Recurso Especial da Procuradoria da apenas em relação à natureza dos créditos, nos
Fazenda Nacional em Recurso de Ofício - Não termos dos incisos I a IV do art. 14. Traduzin-
se toma conhecimento de recurso especial da do de forma didática, foram concedidas quatro
Procuradoria da Fazenda Nacional que, com remissões distintas que ficaram assim estabe-
fundamento na Portaria MF nº 55/98, desafie lecidas:
decisão dos Conselhos de Contribuintes que 2.1. Remissão para todos os débitos de um
negarem provimento a recurso de ofício. mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos
Recurso especial não conhecido. ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente
quando o somatório de todos atinja valor igual
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se
Acordam os Membros da Primeira Turma da Câ- apenas os débitos decorrentes das contribui-
mara Superior de Recursos Fiscais, por maioria de ções sociais previstas nas alíneas “a”, “b” e
votos, não conhece[r] do recurso especial, nos “c” do parágrafo único do art. 11 da Lei nº
termos do relatório e voto que passam a integrar 8.212, de 1991, das contribuições instituídas a
o presente julgado. Vencidos os Conselheiros título de substituição e das contribuições devi-
Adriana Gomes Rego e Carlos Alberto de Freitas das a terceiros, assim entendidas outras entida-
Barreto que conheciam do recurso e enfrentavam des e fundos, inscritos em Dívida Ativa da
o mérito. União no âmbito da PGFN;
(DOU 1 de 11.10.2011, p. 16) 2.2. Remissão para todos os débitos de um
mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos
ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente
REMISSÃO - LEI 11.941 - REQUISITOS - quando o somatório de todos atinja valor igual
LIMITES - IMPOSSIBILIDADE DE ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se
RECONHECIMENTO DE OFÍCIO EM apenas os débitos inscritos em Dívida Ativa da
EXECUÇÃO FISCAL União, no âmbito da PGFN que não aqueles
elencados em “2.1”;
Recurso Especial nº 1.281.888-MG 2.3. Remissão para todos os débitos de um
(2011/0222782-5) mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos
ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques quando o somatório de todos atinja valor igual
Recorrente: Fazenda Nacional ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se
Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na- apenas os débitos decorrentes das contribui-
cional ções sociais previstas nas alíneas “a”, “b” e
Recorrido: Maister Motores Ltda. “c” do parágrafo único do art. 11 da Lei nº
Advogado: Ricardo Tadeu Dias Andrade 8.212, de 1991, das contribuições instituídas a
título de substituição e das contribuições devi- Agdo(a/s): Centrais Elétricas Brasileiras S/A -
das a terceiros, assim entendidas outras entida- Eletrobrás
des e fundos, administrados pela Secretaria da Adv(a/s): Vladia Viana Regis
Receita Federal do Brasil;
2.4. Remissão para todos os débitos de um Empréstimos Compulsórios sobre o Consumo
mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos de Energia Elétrica. Lei n. 4.156/62. Restitui-
ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente ção. Responsabilidade Solidária da União.
quando o somatório de todos atinja valor igual Matéria Restrita ao Âmbito Infraconstitucio-
ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se nal.
apenas os demais débitos administrados pela
Secretaria da Receita Federal do Brasil que Decisão: O Tribunal, por unanimidade, recusou o
não aqueles elencados em “2.3”. recurso ante a ausência de repercussão geral da
4. Não pode o magistrado, de ofício, pronun- questão, por não se tratar de matéria constitucio-
ciar a remissão, analisando isoladamente o va- nal.
lor cobrado em uma Execução Fiscal, sem Ministro Gilmar Mendes
questionar a Fazenda sobre a existência de ou- Relator
tros débitos que somados impediriam o contri- (DJe de 18.11.2011, p. 15)
buinte de gozar do benefício. Precedente:
REsp nº 1.207.095-MG, Segunda Turma, Rel.
Min. Herman Benjamin, julgado em 18.11.2010. REPERCUSSÃO GERAL - EXISTÊNCIA -
5. Na assentada do dia 13 de abril de 2011, ao EXECUÇÃO FISCAL - PRAZO DE QUE
julgar o REsp 1.208.935/AM, sob a minha rela- DISPÕE A FAZENDA PÚBLICA PARA
toria e de acordo com o regime do art. 543-C do LOCALIZAR BENS DO EXECUTADO -
Código de Processo Civil, a Primeira Seção MARCO INICIAL - PRESCRIÇÃO
acabou por confirmar o entendimento ora ado- INTERCORRENTE
tado.
6. Recurso especial parcialmente provido.
Repercussão Geral no Recurso
Acórdão Extraordinário 636.562
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
são partes as acima indicadas, acordam os Minis- Origem: AC - 25221919994047200 - Tribunal
tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Regional Federal da 4ª Região
Justiça, na conformidade dos votos e das notas Proced.: Santa Catarina
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: Relator: Min. Joaquim Barbosa
“A Turma, por unanimidade, deu parcial provi- Recte(s).: União
mento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Mi- Proc(a/s)(es).: Procurador-geral da Fazenda Na-
nistro-Relator, sem destaque.” cional
Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro Recdo(a/s).: José Lino Schappo
Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin Adv(a/s).: Eugênio Salomão Richard Câmara
(Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 22 de novembro de 2011. Ementa: Constitucional. Tributário - Adminis-
(DJe de 1º.12.2011) trativo - Financeiro. Prescrição Intercorrente.
Marco Inicial.
Reserva de Lei Complementar de Normas Ge-
REPERCUSSÃO GERAL - AUSÊNCIA - rais para dispor sobre Prescrição. Supremacia
EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE O das Disposições do Código Tributário Nacio-
CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA - nal por Força da Constituição.
RESTITUIÇÃO - MATÉRIA Art. 173 do Código Tributário Nacional. Art.
INFRACONSTITUCIONAL 40, § 4º da Lei 6.830/1980 (Redação da Lei
Repercussão Geral no Agravo de 11.051/2004).
Instrumento 810.097 Art, 146, III, b da Constituição.
Possui repercussão geral a discussão sobre o
Origem: AC - 200572050053314 - Tribunal Re- marco inicial da contagem do prazo de que dis-
gional Federal da 4ª Região põe a Fazenda Pública para localizar bens do
Proced.: Santa Catarina executado, nos termos do art. 40, § 4º da Lei
Relator: Min. Gilmar Mendes 6.830/1980.
Agte(s): União
Proc(a/s)(es): Procurador-geral da Fazenda Na- Decisão: O Tribunal reconheceu a existência de
cional repercussão geral da questão constitucional susci-
tada. Não se manifestaram os Ministros Cezar Procurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Na-
Peluso e Cármen Lúcia. cional
Ministro Joaquim Barbosa
Relator Ementa
(DJe de 1º.12.2011, p. 11) Embargos de Declaração em Recurso Especial.
Tributário. Compensação de Crédito Tributário
(Restituição) com Débitos Objeto de Parcela-
REPERCUSSÃO GERAL - EXISTÊNCIA - mento Especial (Paes). Inadmissibilidade. Art.
ICMS - GUERRA FISCAL - ESTORNO DE 74, § 3º, IV da Lei 9.430/96 com a Redação
CRÉDITOS DECORRENTES DE BENEFÍCIO Dada pela Lei 11.051/04. Precedentes do STJ.
FISCAL POR OUTRO ENTE FEDERADO Omissão e Contradição Inexistentes. Pretensão
de Alteração da Conclusão do Julgado. Embar-
Repercussão Geral no Recurso gos Rejeitados.
Extraordinário 628.075 1. Os Embargos de Declaração são modalida-
de recursal de integração e objetivam, tão-so-
Origem: AC - 70015282189 - Tribunal de Justiça mente, sanar obscuridade, contradição ou
Estadual omissão, de maneira a permitir o exato conhe-
Proced.: Rio Grande do Sul cimento do teor do julgado; não podem, por
Relator: Min. Joaquim Barbosa isso, ser utilizados com a finalidade de susten-
Recte(s).: Gelita do Brasil Ltda. tar eventual incorreção do decisum hostilizado
Adv(a/s).: Marcelo Silva Poltronieri e Outro(a/s) ou de propiciar novo exame da própria ques-
Recdo(a/s).: Estado do Rio Grande do Sul tão de fundo, em ordem a viabilizar, em sede
Proc(a/s)(es).: Procurador-geral do Estado do Rio processual inadequada, a desconstituição de
Grande do Sul ato judicial regularmente proferido.
2. In casu, inexiste omissão no aresto recorri-
Ementa: Constitucional. Tributário. ICMS.
do, que enfrentou detidamente a controvérsia,
Guerra Fiscal. Cumulatividade. Estorno de
afirmando expressamente que a Lei 10.637/
Créditos por Iniciativa Unilateral de Ente Fe-
derado. Estorno Baseado em Pretensa Conces- 2002 alterou a Lei 9.430/96 para instituir a
são de Benefício Fiscal Inválido por Outro modalidade de compensação por meio de de-
Ente Federado. claração do próprio contribuinte, na qual este
Arts. 1º, 2º, 3º, 102 e 155, § 2º, I da Constitui- faz constar as informações relativas aos crédi-
ção Federal. Art. 8º da LC 24/1975. tos utilizados e aos respectivos débitos com-
Manifestação pela Existência de Repercussão pensados (art. 74, § 1º).
Geral da Matéria. Essa compensação declarada extingue o crédi-
to tributário, sob condição resolutória de sua
Decisão: O Tribunal reconheceu a existência de ulterior homologação pela Secretaria da Recei-
repercussão geral da questão constitucional susci- ta Federal (art. 74, § 2º); todavia, a partir da
tada, vencido o Ministro Marco Aurélio. Não se edição da Lei 11.051/2004, foi acrescentado
manifestaram os Ministros Cezar Peluso, Gilmar dispositivo vedando expressamente a compen-
Mendes e Cármen Lúcia. sação com débitos consolidados em qualquer
Ministro Joaquim Barbosa modalidade de parcelamento (art. 74, § 3º, IV).
Relator Precedentes.
(DJe de 1º.12.2011, p. 11) 3. Ademais, a aplicabilidade dessa nova orien-
tação legal aos casos que lhe são anteriores não
foi debatida nas instâncias precedentes, pelo
REPETIÇÃO DE INDÉBITO - que não podem sê-lo em sede de Recurso Es-
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO COM pecial.
DÉBITOS OBJETO DE PARCELAMENTO 4. Embargos de Declaração rejeitados.
ESPECIAL - PAES - INADMISSIBILIDADE
Acórdão
EDcl no Recurso Especial nº 1.218.891-RS Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
(2010/0199218-5) partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justi-
Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho ça, por unanimidade, rejeitar os embargos de de-
Embargante: Varig S/A Viação Aérea Rio Gran- claração, nos termos do voto do Sr. Ministro Re-
dense - em Recuperação Judicial lator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Teori
Advogado: João Luiz Pinto da Nóbrega e Outro(s) Albino Zavascki e Arnaldo Esteves Lima (Presi-
Embargado: Fazenda Nacional dente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Benedi- Agravo regimental ao qual se nega provimen-
to Gonçalves. to.
Brasília (DF), 22 de novembro de 2011 (Data do (DJe de 24.10.2011, p. 31)
Julgamento).
(DJe de 1º.12.2011)
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO
SÓCIO - SIMPLES FALTA DE PAGAMENTO
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - - INEXISTÊNCIA - DISSOLUÇÃO
CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E IRREGULAR - GERÊNCIA FRAUDULENTA
DEVIDO PROCESSO LEGAL - - REEXAME DE PROVA
INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO NA
ESPÉCIE AgRg no Agravo em Recurso Especial
nº 17.980-GO (2011/0073537-1)
Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 608.426
Relator: Ministro Humberto Martins
Origem: AC - 200470000183837 - Tribunal Re- Agravante: Estado de Goiás
gional Federal da 4ª Região Procurador: Alberto Escher de Britto Guimarães
Proced.: Paraná e Outro(s)
Relator: Min. Joaquim Barbosa Agravado: União Atacadistas Integrados Ltda.
Agte(s).: BS Colway Pneus Ltda. Advogado: sem Representação nos Autos
Adv(a/s).: Flávio Zanetti de Oliveira e Outro(a/s)
Agdo(a/s).: União Ementa
Proc(a/s)(es).: Procurador-geral da Fazenda Na- Tributário e Processual Civil. Responsabilida-
cional de Tributária do Sócio. Art. 135, III, do Códi-
go Tributário Nacional. Indícios de Dissolução
Decisão: negado provimento ao agravo regimen- Irregular e Exercício de Gerência Fraudulenta.
tal, nos termos do voto do Relator. Decisão unâ- Reexame de Prova. Súmula 7/STJ.
nime. Ausente, justificadamente, o Senhor Minis- 1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de
tro Gilmar Mendes. 2ª Turma, 04.10.2011. Justiça, ao julgar o REsp 1.101.728/SP, Min.
Teori Albino Zavascki, na sessão do dia
Ementa: Agravo Regimental. Tributário. Res- 11.3.2009, sob o regime do art. 543-C do CPC,
ponsabilidade Tributária. Ausência de Correta firmou entendimento de que a simples falta do
Caracterização Jurídica por Erro da Autorida- pagamento de tributo não configura, por si só,
de Fiscal. Violação do Contraditório, da Am- circunstância que acarrete a responsabilidade
pla Defesa e do Devido Processo Legal. Inexis- subsidiária dos sócios.
tência no Caso Concreto. 2. Somente as irregularidades constantes do
Os princípios do contraditório e da ampla de- art. 135 do CTN, quais sejam, prática de atos
fesa aplicam-se plenamente à constituição do com excesso de poder ou infração de lei, con-
crédito tributário em desfavor de qualquer es- trato social ou estatuto, são aptas a permitir o
pécie de sujeito passivo, irrelevante sua no- redirecionamento do processo executivo aos
menclatura legal (contribuintes, responsáveis, sócios.
substitutos, devedores solidários etc.). 3. In casu, o Tribunal de origem entendeu que
Porém, no caso em exame, houve oportunida- não houve a comprovação da prática de ne-
de de impugnação integral da constituição do nhum dos atos constantes do art. 135 do CTN,
crédito tributário, não obstante os lapsos de nem dissolução irregular da empresa. Infir-
linguagem da autoridade fiscal. mar tal entendimento encontra óbice na Sú-
Assim, embora o acórdão recorrido tenha erra- mula 7/STJ.
do ao afirmar ser o responsável tributário estra- Agravo regimental improvido.
nho ao processo administrativo (motivação e
fundamentação são requisitos de validade de Acórdão
qualquer ato administrativo plenamente vincu- Vistos, relatados e discutidos os autos em que são
lado), bem como ao concluir ser possível redi- partes as acima indicadas, acordam os Ministros
recionar ao responsável tributário a ação de da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi-
execução fiscal, independentemente de ele ter ça: “A Turma, por unanimidade, negou provimen-
figurado no processo administrativo ou da in- to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr.
serção de seu nome na certidão de dívida ativa Ministro-Relator, sem destaque.”
(Fls. 853), o lapso resume-se à declaração la- Os Srs. Ministros Herman Benjamin (Presidente),
teral (obiter dictum) completamente irrelevante Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha e
ao desate do litígio. Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 13 de setembro de 2011 (Data do rá o lançamento do crédito tributário se o pa-
Julgamento). gamento foi parcial (incompleto) ou se não
(DJe de 21.9.2011) houver pagamento em absoluto. Na primeira
hipótese (pagamento parcial), a notificação ao
contribuinte deverá se dar dentro do prazo de-
TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO cadencial de 5 (cinco) anos a contar da ocor-
AMBIENTAL - TCFA - LANÇAMENTO rência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CTN).
POR HOMOLOGAÇÃO - DECADÊNCIA E Já na segunda hipótese (ausência completa de
PRESCRIÇÃO pagamento), a notificação ao contribuinte de-
verá ocorrer dentro do prazo decadencial de 5
Recurso Especial nº 1.176.970-SC (cinco) anos a contar do primeiro dia do exer-
(2010/0009525-2) cício seguinte àquele em que o lançamento
poderia ter sido efetuado (art. 173, I, do CTN).
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques Precedentes: REsp nº 1.259.634-SC, Segunda
Recorrente: Multifer Indústria e Comércio Ltda. Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques,
- Empresa de Pequeno Porte julgado em 13.9.2011; e REsp 1.241.735/SC,
Advogado: Rodrigo Gazzana de Almeida e Ou- Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benja-
tro(s) min, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011;
Recorrente: Instituto Brasileiro do Meio Ambien- REsp nº 973.733-SC, Primeira Seção, Rel.
te e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama Min. Luiz Fux, julgado em 12.8.2009.
Procurador: Mozart Leite de Oliveira Junior e Ou- 5. Notificado o contribuinte para pagar os va-
tro(s) lores faltantes ou se defender, dá-se a consti-
Recorrido: os Mesmos tuição definitiva do crédito tributário, o que
inaugura o prazo prescricional para a sua co-
Ementa brança (art. 174, do CTN), salvo em ocorren-
Processual Civil. Tributário. Taxa de Contro- do quaisquer das hipóteses de suspensão da
le e Fiscalização Ambiental - TCFA. Lança- exigibilidade do crédito tributário (art. 151, do
mento por Homologação. Prazo Decadencial CTN) ou interrupção do lustro prescricional
para a Constituição e Prazo Prescricional (art. 174, parágrafo único, do CTN).
para a Cobrança da Exação. 6. No caso concreto, estão decaídos somente
1. Não conhecido o recurso do Particular quan- os créditos de TCFA referentes aos fatos gera-
to à alegada violação aos artigos 77, 78 e 79 do dores ocorridos em 2001 (decadência em 1º de
CTN; e artigos 1º e 3º, da Lei n. 10.165/2000, janeiro de 2007). Os ocorridos de 2002 em
posto que não prequestionados. Incidência do diante permanecem hígidos, tendo em vista
enunciado n. 211, da Súmula do STJ: “Inad- que a decadência se daria a partir de 1º de ja-
missível recurso especial quanto a questão neiro de 2008 e a notificação de lançamento se
que, a despeito da oposição de embargos de- deu anteriormente, em 01.11.2007.
claratórios, não foi apreciada pelo tribunal a 7. Recurso especial do Ibama não provido. Re-
quo.” curso especial do Particular parcialmente co-
2. O STJ já assentou que a Taxa de Controle e nhecido e, nessa parte, não provido.
Fiscalização Ambiental - TCFA, prevista na
Lei n. 6.938/81, sujeita-se a lançamento por Acórdão
homologação. Nessa sistemática, “(...) a legis- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
lação atribui ao sujeito passivo o dever de são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
antecipar o pagamento sem prévio exame da tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
autoridade administrativa (...)” (art. 150, ca- Justiça, na conformidade dos votos e das notas
put, do CTN). Precedentes: REsp nº taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
1.259.634-SC, Segunda Turma, Rel. Min. “A Turma, por unanimidade, negou provimento
Mauro Campbell Marques, julgado em ao recurso do Ibama; conheceu em parte do recur-
13.9.2011; e REsp 1.241.735/SC, Segunda so de Multifer Indústria e Comércio Ltda. e, nes-
Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, jul- sa parte, negou-lhe provimento, nos termos do
gado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011. voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque.”
3. Sendo assim, o pagamento do referido tribu- Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Humberto
to deverá ocorrer antes da própria constituição Martins e Herman Benjamin (Presidente) votaram
do crédito tributário, isto é, a legislação (art. com o Sr. Ministro Relator.
17-G, da Lei n. 6.938/81) estabelece uma data Não participou, justificadamente, do julgamento
de vencimento que antecede o ato de fiscaliza- o Sr. Ministro Castro Meira.
ção da administração tributária. Brasília (DF), 11 de outubro de 2011.
4. Essa fiscalização posterior somente enseja- (DJe de 18.10.2011)
TAXA DE FISCALIZAÇÃO E 4. Notificado o contribuinte para pagar os va-
FUNCIONAMENTO - TFF - ANATEL - lores faltantes ou se defender, dá-se a consti-
LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO - tuição definitiva do crédito tributário, o que
DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO inaugura o prazo prescricional para a sua co-
brança (art. 174, do CTN), salvo em ocorren-
Recurso Especial nº 1.202.230-RS do quaisquer das hipóteses de suspensão da
(2010/0123651-0) exigibilidade do crédito tributário (art. 151, do
CTN) ou interrupção do lustro prescricional
Relator: Ministro Mauro Campbell Marques (art. 174, parágrafo único, do CTN).
Recorrente: Rádio Tramandaí Ltda. 5. No caso concreto, o débito de TFF mais an-
Advogado: Gabriel Pauli Fadel e Outro(s) tigo teve vencimento em 22.8.1998 e não foi
Recorrido: Agência Nacional de Telecomunica- pago em absoluto, foi notificado o lançamen-
ções - Anatel to ao sujeito passivo em 21.07.2003, sendo que
Procurador: Mozart Leite de Oliveira Junior e o prazo decadencial se findaria, na pior das
Outro(s) hipóteses, em 01.01.2004 (cinco anos após o
primeiro dia do exercício seguinte ao exercício
Ementa de 1998 - art. 173, I, do CTN), não tendo, pois,
Processual Civil. Tributário. Taxa de Fiscali- ocorrido a decadência.
zação de Funcionamento - TFF. Anatel. Fistel. 6. Constituído o crédito tributário em
Lançamento por Homologação. Prazo Deca- 21.07.2003, na pior das hipóteses, a Adminis-
dencial para a Constituição e Prazo Prescri- tração Fazendária tinha até o dia 21.07.2008
cional para a Cobrança da Exação. para ajuizar a execução (cinco anos a contar da
1. A Taxa de Fiscalização de Funcionamento - constituição definitiva). Sem deixar de obser-
TFF prevista no art. 6º, § 2º, da Lei n. 5.070/66, var que o despacho (em 24.8.2005) que orde-
destinada ao Fundo de Fiscalização das Tele- na a citação interrompe a prescrição de forma
comunicações - Fistel e exigida pela Agência retroativa à data da propositura da ação (itens
Nacional de Telecomunicações - Anatel, sujei- “14” e “15” do suso citado recurso representa-
ta-se a lançamento por homologação. Nessa tivo da controvérsia REsp n. 1.120.295-SP,
sistemática, “(...) a legislação atribui ao sujei- Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado
to passivo o dever de antecipar o pagamento em 12.5.2010). Portanto, não ocorreu também
sem prévio exame da autoridade administrati- a prescrição.
va (...)” (art. 150, caput, do CTN). 7. Recurso especial não provido.
2. Sendo assim, o pagamento do referido tribu-
to deverá ocorrer antes da própria constituição Acórdão
do crédito tributário, isto é, a legislação (art. Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
8º, da Lei n. 5.070/66) estabelece uma data de são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
vencimento que antecede o ato de fiscalização tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
da administração tributária. Justiça, na conformidade dos votos e das notas
3. Essa fiscalização posterior somente enseja- taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
rá o lançamento do crédito tributário se o pa- “A Turma, por unanimidade, negou provimento
gamento foi parcial (incompleto) ou se não ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-
houver pagamento em absoluto. Na primeira Relator, sem destaque.”
hipótese (pagamento parcial), a notificação ao Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Humberto
contribuinte deverá se dar dentro do prazo de- Martins e Herman Benjamin (Presidente) votaram
cadencial de 5 (cinco) anos a contar da ocor- com o Sr. Ministro Relator.
rência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CTN). Não participou, justificadamente, do julgamento
Já na segunda hipótese (ausência completa de o Sr. Ministro Castro Meira.
pagamento), a notificação ao contribuinte de- Brasília (DF), 11 de outubro de 2011.
verá ocorrer dentro do prazo decadencial de 5 (DJe de 18.10.2011)
(cinco) anos a contar do primeiro dia do exer-
cício seguinte àquele em que o lançamento
poderia ter sido efetuado (art. 173, I, do CTN). TAXA DE SERVIÇOS METROLÓGICOS -
Precedentes: REsp n. 1.259.634/SC, Segunda PODER DE POLÍCIA - BALANÇA DE USO
Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, INTERNO - AFERIÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA
julgado em 13.9.2011; REsp 1.241.735/SC,
Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benja- Recurso Especial nº 1.268.637-PR
min, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011; (2011/0178588-0)
REsp n. 973.733-SC, Primeira Seção, Rel.
Min. Luiz Fux, julgado em 12.8.2009. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques
Recorrente: Instituto Nacional de Metrologia, de econômica, o consumidor efetivamente pa-
Normalização e Qualidade Industrial - Inmetro gue pela quantidade indicada pelo vendedor.
Procurador: Márcia Pinheiro Amantéa e Outro(s) Assim, somente quando as balanças são utili-
Recorrido: Incepa Revestimentos Cerâmicos zadas para pesar a mercadoria comercializada,
Ltda. atingindo terceiros e consumidores, torna-se
Advogado: Fábio Adalberto Cardoso de Morais e obrigatória a aferiação periódica. É o que se
Outro(s) depreende da leitura da Resolução Conmetro
n. 11/88, que, em seu item 8, estabelece que
Ementa “os instrumentos de medir e as medidas mate-
Administrativo. Poder de Polícia. Taxa de Ser- rializadas, que tenham sido objeto de atos
viços Metrológicos. Balança de Uso Interno normativos, quando forem oferecidos à venda;
para Pesagem de Produtos Utilizados no Pro- quando forem empregados em atividades eco-
cesso Industrial. Aferição não Obrigatória. nômicas; quando forem utilizados na concre-
1. A recorrente defende a exigibilidade da Taxa tização ou na definição do objeto de atos em
de Serviços Metrológicos pelo Inmetro relati- negócios jurídicos de natureza comercial, ci-
vamente às atividades de controle de equipa- vil, trabalhista, fiscal, parafiscal, administra-
mentos de pesagem utilizados internamente no tiva e processual; e quando forem empregados
processo industrial por empresa fabricante de em quaisquer outras medições que interessem
revestimentos de cerâmicos e louças sanitárias. à incolumidade das pessoas, deverão, obriga-
2. Os órgãos julgadores não estão obrigados a toriamente, ser verificados periodicamente (le-
examinar todas as teses levantadas pelo juris- tra ‘c’).”
dicionado durante um processo judicial, bas- 7. A resolução em referência dá relevo ao cu-
tando que as decisões proferidas estejam devi- nho de utilidade pública das atividades metro-
da e coerentemente fundamentadas, em obe- lógicas, notadamente em relação ao interesse
do consumidor, razão pela qual os instrumen-
diência ao que determina o art. 93, inc. IX, da
tos eventualmente utilizados na pesagem de
Lei Maior. Isso não caracteriza ofensa ao art. matéria prima durante as etapas de produção,
535 do CPC. Precedentes. quando não houver relação direta com a ativi-
3. Verifica-se, após leitura do acórdão recorri- dade econômica exercida pela empresa, não se
do, que o Tribunal de origem teceu largas e submetem à fiscalização do Inmetro.
exaustivas considerações a cerca do mérito da 8. Na hipótese dos autos, a pessoa jurídica re-
causa, qual seja, aferição pelo Inmetro das ba- corrida utiliza balanças apenas em seu proces-
lanças utilizadas apenas em atividades inter- so produtivo, para pesagem de produtos que
nas, porém proferiu decisão contrária aos inte- irão ser usados no tingimento e pintura de cou-
resses da parte. O recorrente pretende, na ver- ro, além de não comercializar qualquer de seus
dade, a rediscussão da causa, o que não se produtos com base em peso e/ou utilização de
compatibiliza com os permissivos dos arts. 535 balança, na medida que toda a produção é ven-
do CPC, cuja finalidade consiste em integrar os dida por área ou metro quadrado. Assim, é de-
julgados omissos, obscuros ou contraditórios. sarrazoado o controle metrológico que o Inme-
O aresto foi devidamente fundamentado e tro procura exercer neste particular sobre as
composto de todos os seus requisitos essen- balanças internas, que, repita-se, não se desti-
ciais. Ademais, não se deve confundir funda- nam a atividades econômicas que envolvam
mentação sucinta ou contrária aos interesses da terceiros, sendo mero[s] instrumentos internos
parte com fundamentação inexistente. adotados na mensuração da matéria prima
4. Os arts. 1º e 3º da Lei n. 5.966/76 não foram empregada no processo de fabricação do cou-
prequestionados pelo Tribunal de origem, ra- ro.
zão pelo qual, ocorre a incidência da Súmula 9. Recurso especial não provido.
n. 211 desta Corte. “Inadmissível recurso espe-
cial quanto à questão que, a despeito da opo- Acórdão
sição de embargos declaratórios, não foi apre- Vistos, relatados e discutidos esses autos em que
ciada pelo Tribunal a quo.” são partes as acima indicadas, acordam os Minis-
5. As normas contidas nos arts. 5º e 11 da Lei tros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
n. 9.933/99 não confere ao Inmetro legitimida- Justiça, na conformidade dos votos e das notas
de para cobrança da Taxa de Serviços Metro- taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
lógicos relativamente às atividades de contro- “A Turma, por unanimidade, negou provimento
le de equipamentos de pesagem utilizados in- ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-
ternamente no processo industrial. Relator, sem destaque.”
6. A fiscalização de instrumentos de medição Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Mar-
pelo Inmetro busca proteger os terceiros adqui- tins e Herman Benjamin (Presidente) votaram
rentes de produtos, garantindo que, na ativida- com o Sr. Ministro Relator.
Não participou, justificadamente, do julgamento Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer
o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. do recurso para, no mérito, negar-lhe provimen-
Brasília (DF), 06 de setembro de 2011. to, mantendo a sentença como proferida, inclusi-
(DJe de 14.9.2011) ve em reexame necessário.

Ementa: Tributário. Apelação Cível e Reexa-


TAXA FLORESTAL - PODER DE POLÍCIA - me Necessário. Taxa Florestal. Inconstitucio-
BASE DE CÁLCULO - EXIGÊNCIA DE nalidade da Lei Municipal 68/2008 e do De-
CONSONÂNCIA creto 18/2009. Reconhecimento. Pronuncia-
mento do Órgão Especial quando do Julga-
Processo/Prot: 0668435-5 Apelação Cível e mento do Incidente de Inconstitucionalidade
Reexame Necessário de nº 668.262-2/01. Recurso Desprovido. Sen-
tença Mantida Inclusive em Reexame Necessá-
Protocolo: 2010/81512. rio.
Comarca: Sengés O Órgão Especial deste Tribunal de Justiça re-
Vara: Vara Única conheceu a inconstitucionalidade dos artigos
Ação Originária: 0000432-88.2009.8.16.0161 2º e 3º da Lei Municipal nº 68/2008 e do De-
Mandado de Segurança. creto 18/2009 que instituíram a taxa florestal
Remetente: Juiz de Direito ora em exame. Ficou consignado que, apesar
Apelante: Município de Sengés de possível a exação mediante taxa do exercí-
Advogado: Carlos Roberto Miranda, Rosane Do- cio do poder de polícia, no caso dos autos há
mingues Hobmeier problema com a base de cálculo utilizada pelo
Apelado: Florestal Vale do Corisco Ltda. Município por ser dissonante do fato gerador,
Advogado: Fábio Artigas Grillo, Ana Luiza Nas- além de repetir a base de cálculo própria do
cimento de Souza Polak Imposto sobre Circulação de Mercadorias
Órgão Julgador: 2ª Câmara Cível. (ICMS).
Relator: Des. Silvio Dias (DJe do TJPR de 26.9.2011, p. 275)
Revisor: Des. Cunha Ribas
Julgado em: 20/09/2011 NOTA DA DIALÉTICA
Vide Acórdãos do STF - 1ª Turma (RDDT
Decisão: Acordam os integrantes da Segunda Câ- 58:223) e do Tribunal de Justiça do Estado do
mara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - 14ª Câmara Cível (RDDT 127:240).

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