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A Lei 8.

429/92, Lei de Improbidade Administrativa, traduz-se como um


código de conduta do agente público no Brasil, sendo considerada uma
conquista da população brasileira, uma vez que até então o país não possuía
um meio legal efetivo para punir e responsabilizar agentes públicos que fossem
processados por improbidade administrativa. Com o advento da Constituição
Federal, em 1988, pensou-se na realização de uma nova lei, espelhada nas
normas internacionais, que tivesse por objetivo responsabilizar e punir atos de
improbidade. Havia uma certa cobrança de postura do Brasil, no cenário
internacional, para que o país procurasse a responsabilização, não apenas no
âmbito penal, mas também no contexto cível, dos agentes administrativos que
praticassem atos ilícitos no exercício de sua função. 1
Mariano Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio
Junior ensinam que a Lei 8.429/92 entrou em vigor em de 02 de junho de 1992
tendo por objetivo regulamentar o artigo 37 § 4° da Constituição Federal de
1988, especificando os atos de improbidade administrativa e,
consequentemente, impondo sanções com base no aludido artigo
constitucional.2
Da mesma maneira, explica Marcelo Figueiredo Santos que os atos de
improbidade cometidos por qualquer agente público têm disciplina legal na Lei
n° 8.429, de 02 de junho de 1992, que possui fundamento na Constituição
Federal, em seus artigos 37, § 4° 3, e 15, V4. O autor refere que a Lei de
Improbidade admite, basicamente, três categorias de atos de improbidade
administrativa: atos que importam em enriquecimento ilícito; atos que causam

1
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 23 de
abr. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.
2
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 31-32.
3
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos,
a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e
gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
4
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos
casos de:
(...)V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.
prejuízo ao erário e atos que atentam contra os princípios da administração
pública (artigos 9°, 10 e 11 da Lei de Improbidade). 5
A Lei de Improbidade Administrativa tem por objetivo classificar,
descrever e estabelecer sanções para os atos de improbidade na
administração pública, fixando regras processuais e procedimentais. Sérgio
Turra Sobrane doutrina que a Lei n° 8.429/92 descreve de forma abrangente os
atos de improbidade administrativa, compreendendo múltiplas condutas com
potencial de violar os princípios da moralidade administrativa, sendo um
conjunto de valores morais, legais e éticos que impõem um padrão de
comportamento a ser exigido de qualquer agente público. Nas palavras do
autor, “Esse plexo de valores pertence de forma indeterminada a toda
sociedade, possui objeto incindível e indisponível, revelando, assim, sua
dimensão difusa”. 6
Emerson Garcia destaca que se deve primeiro apontar, mesmo que
superficialmente, o que são considerados atos de improbidade:

(...)somente serão considerados atos de improbidade, para os fins da


Lei n. 8.429/1992, aqueles praticados em detrimento: a) da
administração direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, dos Município sou do Distrito Federal;, b) de empresa
incorporada ao patrimônio público, o que, salvo , melhor juízo, denota
que esse, ente deixou deter individualidade própria e suas atividades
foram absorvidas pelo ente incorporador, sendo este, não aquele, o
verdade ir o sujeito passivo do ato, ou de entidade para cuja criação
ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de
cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual ; c) do
patrimônio de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja
concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do
patrimônio ou da receita anual, ou que receba subvenção, benefício
ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público. 7

Sendo a Lei de Improbidade Administrativa fortemente ligada a


princípios constitucionais, Sérgio Turra Sobrane doutrina que:

A Constituição de 1988 deu tratamento adequado ao tema da


improbidade administrativa, especificadamente as sanções a serem
aplicadas ao agente autor do ato ímprobo, além de lhe atribuir uma
consequência de natureza política, consistente na suspensão de
direitos políticos.8

5
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p. 13.
6
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 1.
7
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.285.
Nelia Edna Miranda Batisti e Júlia Acioli Pimenta explicam que deve se
enxergar o ente público, em um sentido amplo, como sujeito passivo do ato de
improbidade administrativa9. Desta forma apontam o artigo 1º da Lei nº
8.429/92, o qual indica as entidades públicas que podem ser atingidas por atos
de improbidade administrativa:

Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente


público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou
fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa
incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação
ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de
cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos
na forma desta lei.10

Em primeiro plano, pode-se constatar prevista na norma o preceito


proibitivo, no entanto, deve-se atentar à lesão do bem jurídico tutelado, e por
reflexo, ao direito de outrem. O titular do bem jurídico tutelado, ameaçado ou
violado por meio de ato de improbidade ou conduta ilícita receberá a
designação de sujeito passivo material. Segundo Emerson Garcia, tal norma é
de natureza cogente, ou seja, sua aplicação não pode ser afastada pela
vontade dos interessados. 11
A ação, que caracteriza a improbidade administrativa, está ligada à
conduta antiética do agente da administração, uma vez que a Improbidade
Administrativa nada mais é do que a falta de ética na conduta do agente
público, dolosa ou culposa, na condução da coisa pública, sendo preciso
apontar o que é ‘a coisa pública’. 12
Faz-se necessária a compreensão de agente ativo de ato de
improbidade, sendo possível sintetizar um conceito mais completo do agente
público para fim de responsabilização pelos atos de improbidade
8
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 19.
9
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 23 de
abr. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.
10
BRASIL, Lei n.º 8.429 de 02 de junho de 1992. Lei de Improbidade Administrativa, Brasília,
DF, jun, 1992. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm>. Acesso em:
31 mar. 2018.
11
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.283-285.
12
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 42-43.
administrativa: aquele que “de alguma forma se relaciona com o Poder Público,
gerindo recursos ou trabalhando com os interesses da Administração Pública”
e, portanto, pode ser sujeito ativo dos atos de improbidade administrativa. 13
Antônio Pagliaro e Paulo José da Costa Junior doutrinam que o sujeito
ativo haverá de ser agente que exerce função ou cargo público mesmo que de
forma temporária, sendo passível de responder por atos de improbidade
administrativa praticados no exercício da função. 14
Marcelo Figueiredo doutrina que o objetivo do artigo 1º da Lei de
Improbidade é delinear o raio de abrangência da própria Lei, para que possa
alcançar toda e qualquer pessoa que com a administração pública se relacione,
da forma mais ampla possível. O autor afirma que a Lei n.º 8.429/92 tem por
desígnio proteger a administração em sentido amplo, afirmando que a máquina
pública é quase sempre alvo de ‘corrupção’, de má gestão, ilícitos e
favoritismos em suas variadas faces e representação orgânicas e funcionais. 15
Ao entender quem e o que é ente público, Benedicto de Tolosa Filho fala
que deve procurar entender quem é o sujeito que com o Ente Público se
relaciona:

 A identificação do sujeito ativo do ato de improbidade administrativa,


não é tarefa das mais intrincadas. Intrincado, na verdade, é
conceituar com precisão o agente do poder público, dada a
pluralidade de nomenclaturas utilizadas a nível constitucional,
infraconstitucional, na jurisprudência e na própria doutrina, bem como
em sua dimensão de atividade. 16

Desta forma faz-se necessária a análise do art. 2º da Lei de Improbidade


Administrativa, que define quem são os agentes públicos para o âmbito da
improbidade administrativa:

 Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo


aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração,
por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra

13
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em:
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 23 de
abr. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.
14
PAGLIARO, Antônio; COSTA JR., Paulo José da. Dos Crimes contra a administração
pública. 4. ed., São Paulo, SP: Atlas, 2009, p. 107.
15
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p. 27-29.
16
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 46.
forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função
nas entidades mencionadas no artigo anterior.17

Mariano Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio


Junior doutrinam que agente público para Lei n.º 8.429/92 é todo indivíduo que
exerça, de forma permanente ou temporariamente, remunerada ou não, por
meio de qualquer laço, função, emprego ou cargo na administração pública, em
qualquer das esferas governamentais, em empresas pública ou qualquer ente
que para a sua realização e custeio precise de verba relacionada ao erário. 18
Para Marcelo Figueiredo, o art. 2º da Lei de Improbidade dispõe
claramente que é indiferente o regime jurídico vigente entre o agente e a
administração pública, explica que o agente pode estar em exercício por meio
de mandato político, nomeação, contrato indeterminado, cargo em comissão,
designação, contrato de CLT (consolidação das leis trabalhistas), dentre outros,
pois para a lei bastaria a constatação de vinculo jurídico consolidado, sob as
mais variadas formas, para ser considerado agente público. 19
Todavia, apesar dessas delimitações, persiste a controvérsia sobre a
amplitude do conceito de agente público, vale dizer, se envolve, ou não, a
noção de agentes políticos. O tema será objeto de estudo e delimitação no
capítulo seguinte, podendo-se, por ora, dizer que o conceito de agente político
é diferente daquele atribuído aos demais agente públicos, tanto em face das
funções que exercem como das prerrogativas que os protegem no exercício do
mandato. Existem assim, na Lei n.º 8.429/92, algumas restrições quanto aos
agentes políticos, para garantir que eles possam exercer com maior liberdade
as suas funções, usualmente a partir de premissas fixadas na Constituição
Federal.20

17
BRASIL, Lei n.º 8.429 de 02 de junho de 1992. Lei de Improbidade Administrativa, Brasília,
DF, jun, 1992. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm>. Acesso em:
31 mar. 2018.
18
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 43-44.
19
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p. 27-29.
20
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 23 de
abr. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.
Também importa observar que, segundo o art. 3º da Lei de
Improbidade21, as sanções por improbidade administrativa podem ser
aplicadas, no que couber, àqueles que mesmo não sendo agentes ou
funcionários da Administração Pública induzam ou concorram para a realização
de ato ímprobo ou dele tenham obtido benefício de qualquer natureza, direta ou
indiretamente. Nestes casos faz-se imprescindível a existência de um terceiro,
estranho aos quadros da Administração, que concorra ou se beneficie do ato
de improbidade, junto ao agente diretamente implicado. 22
Wallace Paiva Martins Junior destaca que o artigo terceiro amplia o
dever de sujeição à probidade administrativa, e de certa forma aumenta as
hipóteses de legitimidade passiva na ação de improbidade, ao beneficiário,
cúmplice, coautor ou partícipe dos atos ilícitos que causem lesão à
Administração, sejam pessoas físicas ou jurídicas. Nas palavras do autor, o
artigo é sensível ao avanço da matéria, podendo-se apontar que a Lei Federal
n.º 3.502/58 não previa a punição de terceiros (que não fosse servidor público),
gerando uma “incompreensível impunidade”. 23
Desta forma, o autor aponta o conceito de terceiro beneficiário, que é
aquele que lucra, com qualquer espécie de vantagem, em razão da prática de
um ato ímprobo. Ele poderá ser responsabilizado, inclusive de forma solidária,
pelo ressarcimento do dano ao ente público. O terceiro partícipe, a seu turno,
corresponde àquele que de qualquer forma induz ou concorre para a prática do
ato ilícito. Por fim, indica o autor que ambos podem incorrer nas sanções
previstas em lei, exceto no que se refere à perda de função pública. 24
Benedicto de Tolosa Filho menciona que, em razão da redação do art. 3º
da Lei de Improbidade, pode ser incluído como sujeito ativo da conduta ilícita o
dirigente, sócio ou preposto de empresas terceiras que venham a induzir ou

21
BRASIL, Lei n.º 8.429 de 02 de junho de 1992. Lei de Improbidade Administrativa, Brasília,
DF, jun, 1992. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm>. Acesso em:
22 mai. 2018
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo
agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie
sob qualquer forma direta ou indireta.
22
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 47.
23
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.151.
24
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.151-152.
concorrer com o agente público no ato de lesivo à Administração Pública, ou
que dele seja beneficiário. 25

O particular ou terceiro (aquele que não é agente público segundo a lei),


poderá figurar apenas como coautor ou participante do ato de improbidade. O
autor expõe que apenas o agente público é quem dispõe dos meios efetivos e
das condições eficazes para praticar o ato ilícito, pertencendo apenas ao
agente público “o poder de praticar atos lesivos ao estado”, não impedindo que
o terceiro seja o mentor intelectual da ação ilícita, uma vez que a lei é clara a
dizer “induzir ou concorrer”.26
Sobre o tema já se manifestou a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal
da 4ª Região, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo
Ministério Público Federal contra Multiferramentas Comércio de Máquinas Ltda,
Edson Kazumi de Oliveira Horota e Peri da Motta Teixeira. À época dos fatos,
Edson era gerente empresarial da Caixa Econômica Federal – Agência
Cachoeirinha – e autorizou financiamento para compra de máquinas industriais,
com recursos FAT/PROGER, por meio de transferência bancária diretamente
para a conta da empresa Multiferramentas, sem observar de parâmetros
administrativos fixados pela CEF, resultando no desvio de verbas públicas e no
enriquecimento ilícito de terceiros, os corréus Peri e Multiferramentas. O
prejuízo apurado, na época dos fatos, foi de R$ 314.828,67. O Ministério
Público Federal requereu a condenação dos réus com base no artigo 12, II, da
Lei nº 8.429/92.27
Em sentença, foram condenados Edson e Peri, sócio/administrador da
empresa Multiferramentas, pelas práticas de atos de improbidade tipificados no
art. 10, caput e inciso VI da Lei nº 8.429/1992, ou seja, prática de
enriquecimento ilícito com consequente imposição das penalidades
estabelecida em sentença:28
25
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 48.
26
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p. 41.
27
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5045250-
76.2011.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 09 mar.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=8777499&termosPesquisados=IHRlcmNlaXJvIGltcHJvYm8g>. Acesso
em: 18 mai. 2018.
28
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5045250-
76.2011.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 09 mar.
Os requeridos Edson Kazumi de Oliveria Horota e Peri da Motta
Teixeira ficarão com seus direitos políticos suspensos por 5 (cinco)
anos, a contar da data do trânsito em julgado desta decisão. Tanto
eles, quanto a empresa Multiferramentas ficam proibidos de contratar
com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de outra
pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de 5
(cinco) anos, novamente, a contar da data do trânsito em julgado
desta sentença.29

Inconformados, os corréus recorreram da sentença condenatória.


Multiferramentas, em síntese, alegou que o fato em questão estava prescrito
por se tratar de pessoa jurídica e que o prazo prescricional é de 05 anos a
partir da data do fato, mencionou ainda que a matéria deveria ser discutida no
âmbito cível comum por se tratar de inadimplemento contratual. Edson alegou
a falta de comprovação de dolo, e que foi vítima de golpe aplicado pelo,
também réu, Peri. Peri, por sua vez, arguiu a sua ilegitimidade passiva por não
ser agente público, a prescrição do fato, a incidência de "bis in idem",
porquanto já fora condenado na ação penal a ressarcir o erário. Por fim, todos
postularam a reforma da sentença, com a absolvição pela narrada conduta de
improbidade administrativa.30
Em decisão colegiada, decidiram os Desembargadores Federais,
preliminarmente quando a prescrição, que a empresa ré, por se tratar de ato de
improbidade administrativa, e os terceiros beneficiários incorrem nas mesmas
penas e se sujeitam ao mesmo prazo prescricional imposto aos agentes
públicos ímprobos. Ainda preliminarmente, quanto à ilegitimidade passiva do
réu Peri, entendeu-se que não prosperaria o argumento, com base no artigo 3
da Lei de Improbidade, por restar tipificada a conduta do terceiro ímprobo,

2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?


orgao=1&documento=8777499&termosPesquisados=IHRlcmNlaXJvIGltcHJvYm8g>. Acesso
em: 18 mai. 2018.
29
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5045250-
76.2011.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 09 mar.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=8777499&termosPesquisados=IHRlcmNlaXJvIGltcHJvYm8g>. Acesso
em: 18 mai. 2018.
30
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5045250-
76.2011.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 09 mar.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=8777499&termosPesquisados=IHRlcmNlaXJvIGltcHJvYm8g>. Acesso
em: 18 mai. 2018.
mesmo não sendo agente público, como passível de responsabilização por
atos de improbidade.31
No mérito, entendeu a Corte Regional que restou comprovada a prática
do ato de improbidade que resultou no enriquecimento ilícito dos corréus que
não eram agentes públicos. Delimitou-se que a tipificação do enriquecimento
ilícito admitiria tanto a forma dolosa ou culposa do ato. Desta forma, decidiu-se
pelo parcial provimento ao recurso dos réus, unicamente para afastar a
suspensão dos diretos políticos por 05 anos.32
Assim, também a partir da citada decisão judicial, verifica-se que a ação
do terceiro pode se apresentar em oportunidades distintas, que podem ser
identificadas a partir da análise do ato de improbidade e do momento de
formação do elemento subjetivo de atuação do agente público. Na primeira
situação, o terceiro provoca no agente o interesse na prática do ato ímprobo,
ou seja, induz ou incita o agente público ao ato ilícito. Na segunda situação, o
terceiro contribui ou coopera para a prática ilícita, sendo que esta participação
pode se entender por facilitação, auxílio, ou divisão de tarefas para a conclusão
do ato. Na última ocasião, o terceiro não desempenha qualquer interferência
sob o “animus” do agente púbico, no entanto, recebe benefícios da conduta
ilícita do agente, de forma direta ou indireta. 33
A indução significa que o terceiro implanta a ideia da prática do ato de
improbidade no agente público, não sendo suficiente por tanto a mera
instigação, ou seja, o estímulo ou o reforço de uma intenção já latente no
agente. Já o terceiro concorrente é aquele que auxilia de forma material o
agente público a cometer os atos de improbidade administrativa. Beneficiário
do ato, por sua vez, é aquele que, de forma dolosa, recebe os benefícios do ato
de improbidade cometido pelo agente público, sendo extremamente necessário
a demonstração do dolo, ou do conhecimento dos atos ilícitos praticados em
seu favor.34
31
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5045250-
76.2011.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 09 mar.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=8777499&termosPesquisados=IHRlcmNlaXJvIGltcHJvYm8g>. Acesso
em: 18 mai. 2018.
32
33
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.283/285.
34
NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Manual de
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Método, 2014, p. 5758.
Entende-se que o componente subjetivo do ato de improbidade que
tipifica a conduta antijurídica de enriquecimento ilícito, é admitida até mesmo
na forma culposa, em que o agente não compreende que em determinado
momento pode estar obtendo vantagem ou permitindo que terceiro a obtenha,
como na “ação corriqueira de ‘dar carona’ e carro oficial, ou o de usar ou
permitir que se utilize um telefone de órgão ou entidade pública para ‘ligações
pessoais’”.35
Deste modo, deve ser verificado se o terceiro tinha conhecimento da
origem ilícita dos benefícios que recebeu, uma vez que apenas a
responsabilidade subjetiva tem amparo legal, conforme doutrina Emerson
Garcia:

É preciso, portanto, seja demonstrada a presença do liame subjetivo


entre o terceiro e o agente público, não a mera obtenção de benefício,
a partir da conduta alheia, cuja ilicitude era simplesmente
desconhecida. Esse liame subjetivo/ à evidência, não é necessário
em se tratando de mera pretensão de ressarcimento dos danos
causados ao erário, sendo plenamente possível a condenação do
agente público e do terceiro beneficiado pelo ato, como devedores
solidários, ainda que inexista um liame prévio entre eles.36

É de destacar a imprescindibilidade da comprovação do dolo do terceiro


ímprobo, impondo-se avaliar as seguintes situações: a primeira, no sentido de
que a responsabilidade civil objetiva só encontra base legal em casos
especificados em lei ou em relação às atividades de risco (art. 927 do CC), e a
segunda, a indicar que a improbidade administrativa culposa só é admitida nas
hipótese do artigo 10 da Lei n.º 8.429/92, incompatível com as condutas
descritas no artigo 3º da mesma lei. 37

Por fim, Emerson Garcia aponta o advogado como passível de ser


terceiro ímprobo, indicando as relações negociais e os valores recebidos a
título de honorários advocatícios pelos serviços prestados como meio, uma vez
que podem ser remunerados pelo produto obtido de forma ilícita do ato de

35
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 67-68.
36
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.337-338.
37
NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Manual de
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Método, 2014, p. 57-58.
improbidade. No entanto, destaca que, segue sendo indispensável a
comprovação do conhecimento da origem destes valores. 38
Conforme recentemente analisado pelo Superior Tribunal de Justiça,
(https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/576431564/recurso-especial-resp-
1591279-mt-2016-0061682-2/decisao-monocratica-576431587?ref=serp).
Compreendidos os sujeitos que figuram na Lei de Improbidade
Administrativa, deve-se analisar os atos, intrinsecamente considerados, que
uma vez praticados configuraram-se como improbidade administrativa. Assim,
faz-se necessária uma breve análise dos princípios que norteiam a
Administração Pública, tendo em vista que apontam para preceitos obrigatórios
na atuação dos agentes públicos, sob pena de nulidade dos atos praticados e
tipificação por ato ilícito administrativo, independente do ato resultar em lesão
ao patrimônio público. 39
Em face da plural atuação dos entes públicos e da ampla atividade
estatal, seria totalmente inviável uma produção normativa que apontasse todos
os ilícitos administrativos praticados por agentes públicos passíveis de
tipificação como atos de improbidade. Foi de extrema sensibilidade o legislador
quando ao ver a realidade dos fatos preferiu absorver o
art. 37, § 4º, da Constituição, de modo que permitiu melhor tipificação,
enquadramento e, consequentemente, maior apropriação de todos os atos que
violam os princípios da administração pública.40
O artigo 4º da Lei n.º 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa)
estabelece que os agentes públicos, independente do cargo ou função que
ocupem “são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade” 41. Daniel Amorim Neves
destaca que atualmente é transparente a importância dos princípios, muito pela

38
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.338-339
39
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 54.
40
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.772.
41
BRASIL, Lei n.º 8.429 de 02 de junho de 1992. Lei de Improbidade Administrativa, Brasília,
DF, jun, 1992. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm>. Acesso em:
31 mai. 2018.
Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita
observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato
dos assuntos que lhe são afetos.
relevância normativa e vinculante nas relações públicas e privadas, o que
configurará ato de improbidade a possibilidade de violação de todo e qualquer
princípio, explícito ou tácito, da administração pública. 42
À vista disso, mesmo que o agente público não tenha enriquecido
ilicitamente e nem causado prejuízo ao erário, e seus atos apresentem desvio
ético, falta de moralidade para a função pública, poderá ser responsabilizado
por improbidade administrativa.43
Aos poucos, os princípios que regem a atividade do Estado passaram a
condicionar o Estado aos seus fins institucionais, garantindo de forma estrita o
cumprimento das liberdades públicas, e desta forma, consequentemente, o
aumento da segurança dos administrados. Desse modo, o princípio da
legalidade deixou de ser o único componente de efetivação e delimitação da
atividade do Estado, sendo que este não representava, de modo exclusivo, os
valores da organização estatal.44
Pode-se explicar o princípio da legalidade como o ato de delegar
competência a alguém por meio de voto para que o represente na elaboração
de leis; por consequência, o cidadão abre mão de uma fração de sua liberdade
para o interesse da coletividade. Como princípio da administração pública, a
legalidade indica que os agentes públicos devem incondicionalmente sujeitar-
se às condições e contornos da lei, sendo o campo do agente restrito a norma
e às opções que ela oferece.45
O maior contraste entre o indivíduo e a Administração pública frente à lei
é que o indivíduo possui vontade transcendente, enquanto a Administração
uma vontade imanente. Ao contrário do que acontece aos particulares, à
Administração Pública a lei não é um limite, mas um pressuposto de atuação.
Podendo somente atuar e agir para os fins previstos em lei. Assim, “Os
particulares podem fazer, ou omitir, desde que a lei não os obrigue ou proíba o
contrário”; a Administração Pública pode apenas fazer ou deixar de fazer o que

42
NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Manual de
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Método, 2014, p. 75.
43
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.224.
44
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.169.
45
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 55.
a lei permite, a atuação administrativa não chega apenas a ser compatível com
a lei, exige-se que atue segundo a lei, de forma congruente com a
democracia.46
Deve-se salientar que, no Brasil, os agentes públicos por vezes
interpretam regulamentos de forma equivocada, contrariamente ao que está
prescrito em lei. No entanto, a Administração Pública “nada pode senão aquilo
que a lei lhe comanda e determina”, ou seja, diferente do cidadão comum, que
não pode praticar o que é tipificado como crime, o ente público limita-se a fazer
apenas aquilo que a lei o autoriza.47
A adaptação do ato administrativo à norma passou a ser vista por um
prisma diferente, deixando de ser meramente formal, vinculada a uma
concepção clássica da legalidade, e passando a corresponder a valores que
definem o próprio Direito. Uma vez que não se trata de simples cumprimento
da lei ou de conferência mínima da norma, devendo atentar à finalidade,
competência, à forma, objeto e ao motivo que justifica a atuação
administrativa.48
Muito importante também é o princípio da moralidade, que possui
conceito variado e muito depende da ordem social, dos costumes e padrões
éticos de determinada sociedade. Em síntese pode se dizer que moral é o
conjunto de princípios coletivos entre membros do coletivo. 49
O agente público, apesar de anseios sociais, deve agir com base nos
preceitos éticos de honestidade, legalidade e competência, sabendo distinguir
o certo do errado, o justo do injusto. O princípio da moralidade requer a
obediência a regras para o desempenho das atividades administrativa e a
observância da lei, no entanto, também exige a análise daquilo que é

46
MODESTO, Paulo. Os regulamentos de organização no direito brasileiro e os decretos
autônomos de extinção de cargos públicos vagos: uma distinção necessária <
http://www.academia.edu/1035253/OS_REGULAMENTOS_DE_ORGANIZA
%C3%87%C3%83O_NO_DIREITO_BRASILEIRO_E_OS_DECRETOS_AUT
%C3%94NOMOS_DE_EXTIN%C3%87%C3%83O_DE_CARGOS_P
%C3%9ABLICOS_VAGOS_UMA_DISTIN%C3%87%C3%83O_NECESS%C3%81RIA>,
Acesso em: 02 jun de 2018;
47
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p.36.
48
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 51.
49
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.202.
necessário, levando em consideração a máxima de que “nem tudo que é legal
é honesto” 50.
Os atos praticados pela administração pública são institucionais e
impessoais, devendo ser objetivos, não intersubjetivos e imunes aos laços
pessoais, como o nepotismo, o clientelismo, e os favorecimentos na utilização
da máquina pública, para a promoção pessoal do agente ou de terceiros. Deve
a conduta do agente ser pautada pela norma administrativa, de modo geral e
abstrato, e de forma alguma focada em pessoas ou grupos, tendo suas
finalidades voltadas a realização do bem comum. Fundado na isonomia de
seus atos, o princípio da Impessoalidade decorre diretamente da democracia,
uma vez que o administrador público representa o povo, teve seus poderes
delegados pelo povo para assim gerir por ele e para ele, e de forma geral, a res
publica.51
Sérgio Turra Sobrane entende que o princípio da Impessoalidade e da
Igualdade são próximos e se confundem, tendo em vista que o art 5º, caput, da
Constituição Federal determina que todas as pessoas sejam tratadas com
equidade, sem qualquer distinção. Assim, a impessoalidade também deve
pautar os atos da administração pública, que deve tratar todos de forma
igualitária, sem discriminação ou preferências. Todavia, por vezes, para
garantir a igualdade, o tratamento para com os indivíduos deve ser desigual por
estarem em condições de desigualdade, como exemplifica a adoção do
sistema de cotas na educação superior pública.52
Todos os atos do Poder Público devem ser levados a conhecimento
público, com exceção das hipóteses previstas na Constituição Federal,
permitindo assim a fiscalização dos atos pelo povo e os demais legitimados
para tal controle. A falta de transparência dos atos público impossibilitaria a
fiscalização necessária do equilíbrio entre os atos do Estado e o cumprimento
do interesse público. Segundo o princípio da Publicidade, a divulgação dos atos

50
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 57.
51
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 51.
52
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 72.
da administração deverá ser ampla, sendo ilícita as omissões ou incorreções
detectadas, é obrigatória a todos os entes da administração. 53
A publicidade dos atos administrativos é princípio indisponível e
condição necessária para a validade e eficácia de atuação administrativa. Os
atos oficiais devem ser publicados em órgão de imprensa oficial e quando
expresso em lei, pode ser feito mediante publicação de aviso afixado em local
de fácil acesso ao público.54
Junto aos princípios constitucionais que norteiam a Lei de Improbidade,
os princípios elencados no artigo 11, do mesmo dispositivo, tais como os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições
também são aplicáveis e sancionáveis, como requisitos e deveres. Pode-se
ainda acrescentar o princípio de agir com eficiência, de probidade e o de
prestar contas, tendo em vista que para o ato administrativo deve ser
observada a supremacia do interesse público e os seus requisitos constituintes:
competência, finalidade, continuidade, motivo, forma e igualdade. 55

Nesse rumo, a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª


Região, em ação de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério
Público Federal contra agentes da Polícia Rodoviária Federal que na cidade de
Montenegro/RS abordaram um ônibus vindo da cidade de Cascavel/PR com
destino a Porto Alegre/RS e apreenderam mercadorias estrangeiras sem a
devida documentação fiscal e, do material recolhido, separam e suprimiram,
para si, as seguintes mercadorias:56
a) duas (02) filmadoras, as quais foram colocadas atrás da
garagem localizada nos fundos do Posto da PRF; b) oito (08) pentes
de memória para notebook, acondicionados dentro de uma mochila
de propriedade das flagradas que foi deixada em cima de um armário
do recinto policial em Montenegro; c) um (01) pente de memória para

53
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.176.
54
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 60-61.
55
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 54-55.
56
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
computador; e d) quatro (04) processadores, colocados dentro de
uma mochila de propriedade do réu Norton.57

Outro policial, que participou da apreensão junto com os corréus, foi


quem os denunciou para a corregedoria da Polícia Rodoviária Federal que, por
sua vez, encontrou os bens desviados em posse dos agentes. O fato resultou
na abertura de expediente administrativo disciplinar, onde foi constatado que
parte dos objetos apreendidos não constavam no auto de apreensão feito pelos
policiais e também não foram entregues para a autoridade competente. A
apuração administrativa resultou na demissão dos agentes por justa causa e
deu ensejo a uma ação penal por peculato, na qual ambos foram condenados.
O Ministério Público Federal, à vista dos fatos, ajuizou Ação de
Improbidade Administrativa com base no artigo 10, I e artigo 11 da Lei n.
8.429/92, sob a alegação que os atos dos agentes causaram prejuízo ao erário
pela apropriação indevida das mercadorias e pela violação dos princípios da
administração pública, tais como dever de honestidade, legalidade e lealdade à
instituição. O juiz de 1º grau condenou os réus nos seguintes limites: 58

às sanções dos incisos II e III do artigo 12 da Lei n. 8429/92, em


especial à suspensão dos direitos políticos, pagamento da multa civil
e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios
ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que
por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios. 59

Um dos réus recorreu da condenação de primeira estância. Em sua


decisão, entendeu a Terceira Turma da Corte Regional da 4ª Região por negar
provimento ao recurso e manter a sentença condenatória. Preliminarmente o
réu requereu a suspensão do processo até o julgamento do Recurso Especial
159.622, que versava sobre a prescrição do ato imputado, especificamente do
crime de peculato com base na pena aplicada. O recurso, porém, teve
57
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
58
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
59
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
julgamento e transitou em julgado antes da análise da apelação em questão,
tendo o STJ decidido que deve ser aplicado o prazo prescricional
considerando-se a pena em abstrato cominada ao crime correspondente,
negando provimento ao recurso do réu. Assim, foram afastas duas preliminares
do recurso do réu, tendo em vista que ele também alegou prescrição do
processo, pedindo para constatar a ocorrência da prescrição levando em conta
a pena imposta no expediente criminal.60
Ainda preliminarmente, requereu ele a nulidade da sentença em razão
da condenação extra petita de perda da função pública, alegando que o
Ministério Público não o requereu no pedido inicial, sob a alegação de excesso
na sentença. Também não foi acolhido o pedido, uma vez que ao analisar a
petição inicial verificou-se que o MPF havia postulado a condenação do réu nos
dos incisos II e III do art. 12 da Lei nº 8.429/92. 61
No mérito, sustentou que os fatos imputados são baseados apenas no
depoimento do policial que os denunciou, sem outra prova para sustentar a
denúncia, bem como que não teria sido comprovado o dolo dos agentes,
necessário para a caracterização da improbidade administrativa. Quanto a isso
– e delimitando a amplitude probatória aceita em ações de improbidade
administrativa, os desembargadores apontaram diversos depoimento de outros
policiais federais que corroboraram as declarações do denunciante e que
também evidenciariam a materialidade e intuito dos réus. 62
O Acórdão assim, evidenciou a ocorrência de dois atos de improbidade
administrativa; primeiro, o prejuízo causado ao erário pela conduta ímproba de
apropriação indevida dos bens apreendidos pela Polícia Federal e, no ponto
principal da análise da decisão, a flagrante violação dos princípios da

60
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
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BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
62
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
Administração Pública, evidenciando-se a deslealdade à Administração e a
falta de honestidade dos agentes.63
Wallace Paiva Martins Junior doutrina que, a violação dos princípios é a
mais grave transgressão cometida contra administração pública, posto que é
uma ofensa às bases orgânicas dos entes administrativos; daí surge a
necessidade de punição do agente que viola os princípios, e desta forma
assegura a razão de ser da administração pública. Explica que a inobservância
dos princípios gera responsabilização, conforme artigo 11 da Lei de
Improbidade.64
No artigo 1165 da Lei de Improbidade, o legislador trouxe um rol
específico de atos que tipificam os atos de improbidade, que independem da
ocorrência de lesão ao erário ou de enriquecimento ilícito do agente público ou
do terceiro beneficiário, a ação ou omissão que gere a quebra da obediência
dos princípios ou que atentem contra os mesmos. Deve o administrador público
cumprir e fazer cumprir os princípios contidos no caput do artigo 37 da
Constituição, agindo assim, com imparcialidade, honestidade, e lealdade às
instituições, e cumprindo regras mínimas de ética e moralidade na atividade
pública.66
Na análise da Lei de improbidade administrativa, há outros atos que
igualmente configuram de improbidade administrativa. O art. 5º da Lei de
improbidade refere atos que causam prejuízo ao erário, ou lesão ao patrimônio
público e determina o ressarcimento desse prejuízo causado. No entanto, faz-
se necessário distinguir erário e patrimônio público, sendo o erário o
econômico/financeiro, o fisco, o tesouro; o patrimônio público trata-se de um

63
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5033150-
84.2014.4.04.7100/RS. Relatora Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. Julgamento: 17 out.
2017. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&numero_gproc=40000225696&versao_gproc=4&crc_gproc=d87e38a1>. Acesso em:
18 mai. 2018.
64
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.224
65
BRASIL, Lei n.º 8.429 de 02 de junho de 1992. Lei de Improbidade Administrativa, Brasília,
DF, jun, 1992. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm>. Acesso em:
31 mai. 2018
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente.
66
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 109.
conceito muito mais abrangente, tendo em vista que se entende por patrimônio
público. Nas palavras de Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa;
Waldo Fazzio Júnior patrimônio público “é o complexo de bens e direitos de
valores econômicos, artístico, estético, histórico, e turístico da União, do Distrito
Federal, dos Estados, dos Municípios” e os outros entes públicos. 67
O artigo 5º da Lei de Improbidade, como disposição geral, apresentou o
prejuízo ao patrimônio como disposição de caráter autônomo oriunda do artigo
159 do Código Civil Brasileiro, claramente voltado a administração pública,
admissível não somente de forma exclusiva aos casos de improbidade
administrativa, no entanto, pode ser aplicado em toda circunstancia que se
constate improbidade. Deve se destacar exigisse a comprovação do
comportamento doloso ou culposo do agente público suspeito de ato de
improbidade, da mesma maneira que, no âmbito civil a vontade de causar
prejuízos ou por meio de negligência, imprudência, ou imperícia o agente age
contra a lei no trato dos negócios públicos. 68
A lei de improbidade administrativa estipula normas votadas a proteção
do patrimônio público, fundamentalmente referente ao conteúdo econômico, no
que se diz respeito aos bens coletivos titularizados pela administração pública,
sendo ela direta ou indireta, ou de empresa que é incorporada ao patrimônio
público, ou até mesmo entidade particular que recebeu dinheiro público para
seu custeio (conforme já pontado no artigo 1º da lei). 69
Wallace Paiva Martins Júnior explica é exigido dolo comum, ou seja, é a
simples vontade genérica de fazer aquilo que a lei proíbe, ou não fazer o que
ela manda. Doutrina que não necessário que o gente público fraudasse um
concurso ou uma licitação por motivos extraordinários ou particulares. Trata-se
do administrador público que de maneira voluntaria e consciente realiza ato em
contrariedade com a lei, que a sua conduta é explicitamente proibida pelo
ordenamento jurídico, e que ao analisar a intenção do agente público em frente
aos elementos desta forma terá comprovado o dolo dos seus atos. 70
67
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 70.
68
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.204.
69
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 51.
70
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.204.
Os atos que causam dano ou prejuízo ao patrimônio público muitas
vezes decorrem da inobservância do princípios norteadores da administração
pública, uma vez que é comum a atividade estatal ocorrer de forma arriscada, o
que aumenta a probabilidade de insucessos da iniciativas do poder público;
forte exemplo disso são os inúmeros planos econômico fracassados que se
sucederam no Brasil no século XX.71
Tem que se salientar, a responsabilidade por atos, de qualquer natureza,
é caraterística primordial de um estado democrático de direito. Podendo ainda,
apontar a responsabilidade objetiva do Estado que responde pelos danos
causados por seus agentes causem a terceiros no exercício da função. E com
base nisso, o legislador muito acertou ao fazer constar em lei que aquele, o
agente ou terceiro, por ação ou omissão causa prejuízo ao ente público deve
reparar/restituir o erário.72
Sobre o tema, convém reportar situação concreta que ensejou apuração
de ato de improbidade administrativa. No caso, o Ministério Público Federal
ingressou com ação de improbidade administrativa contra agentes públicos
federais. Dois empresários e mais dois indivíduos que seriam laranjas dos
empresários. Narra a denúncia ministerial os agentes federais que à época dos
fatos estavam vinculados a um grupo hospitalar público e teriam agido
indevidamente, supostamente por ato de improbidade, na compra e uso de
Órteses e Próteses do complexo hospitalar Cristo Redentor. 73

“complexo modus operandi ímprobo é descrito pelo MPF, quase


sempre tendo como cenário licitação, emprego, aquisição e
sobrepreço das órteses e próteses a serem utilizadas em pacientes e
usuários do Sistema Único de Saúde, precisamente no Hospital Cristo
Redentor de Porto Alegre-RS.”

O complexo hospitalar em questão trata-se de um grupo de sociedades


anônimas em que o Ministério da Saúde é acionista majoritário, fazendo parte
da Administração Pública Federal, e consequentemente do Orçamento Geral

71
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.176.
72
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 51.
73
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5043222-
96.2015.4.04.7100/RS. Relator Des. Federal Rogerio Favreto. Julgamento: 11 abr. 2018.
Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=9386342&termosPesquisados=IGxlc2FvIGFvIGVyYXJpbyBpbXByb2JpZ
GFkZSBjdWxwb3NhIA==>. Acesso em: 29 mai. 2018.
da União. O Ministério Público Federal notícia que os atos de improbidade
administrativa iniciaram em 2002, quando o parquet teve conhecimento de
denúncias anônimas sobre o fato, e em face da gravidade os fatos instaurou
procedimentos administrativos e mais tarde, Inquérito Civil Público. Investigou
junto ao Tribunal de Contas da União, à Receita Federal, ao Ministério da
Saúde e ao próprio Grupo Hospitalar Conceição. E por fim, evidenciou a prática
de diversos atos de improbidade administrativa praticados pelos réus, em face
da associação existente, entre os médicos e os empresários, resultava no
“favorecimento de suas empresas nas licitações e/ou aquisições realizadas
pelo HCR, conforme será adiante demonstrado.” 74
Em primeira instância foram detectados fortes indícios da ocorrência de
atos de improbidade que causaram lesão ao erário. Determinou-se
liminarmente o sequestro e indisponibilidade dos bens dos agentes ímprobos.
Em sentença, a ação foi julgada procedente, com a condenação dos agentes
envolvidos por atos de improbidade, nos termos do artigo 12 da Lei n.º
8.429/92:75

a) ressarcirem, solidariamente, os prejuízos causados ao Grupo


Hospitalar Conceição (GHC), especificamente, ao Hospital Cristo
Redentor (HCR), e a União Federal, no valor de R$ 1.721.820,86 (Um
Milhão, Setecentos e Vinte e Um Mil, Oitocentos e Vinte Reais e
Oitenta e Seis Centavos), tudo, devidamente atualizado, pelos índices
oficiais praticados no âmbito desta Justiça Federal até a data do
efetivo pagamento; b) terem seus direitos políticos suspensos por 8
(oito) anos, a contar da data do trânsito em julgado desta decisão; c)
pagarem, solidariamente, a multa de duas vezes o valor estimado do
prejuízo causado, especificamente, o valor de R$ 3.443.641, (...) a ser
atualizado pelos mencionados índices oficiais até a data do efetivo
pagamento; d) ficarem proibidos de contratar com o Poder Público, ou
receber benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo
prazo de 5 (cinco) anos, a contar do trânsito em julgado desta
decisão, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam
sócios; e) não mais integrarem a Administração Pública Federal, por
decorrência da prática de atos de improbidade administrativa, nos
termos do art. 132, caput e inciso IV combinado ao art. 137, caput e
parágrafo único, ambos da Lei 8.112/90.

74
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5043222-
96.2015.4.04.7100/RS. Relator Des. Federal Rogerio Favreto. Julgamento: 11 abr. 2018.
Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=9386342&termosPesquisados=IGxlc2FvIGFvIGVyYXJpbyBpbXByb2JpZ
GFkZSBjdWxwb3NhIA==>. Acesso em: 29 mai. 2018.
75
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5043222-
96.2015.4.04.7100/RS. Relator Des. Federal Rogerio Favreto. Julgamento: 11 abr. 2018.
Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=9386342&termosPesquisados=IGxlc2FvIGFvIGVyYXJpbyBpbXByb2JpZ
GFkZSBjdWxwb3NhIA==>. Acesso em: 29 mai. 2018.
Os réus apelaram. Requereram preliminarmente o reconhecimento da
ilegitimidade passiva do Ministério Público Federal para a propositura da ação
e a prescrição dos alegados atos de improbidade. No mérito, postularam a
remessa do processo para a Justiça Estadual, a extinção do feito, a revogação
da liminar de sequestro e indisponibilidade dos bens, a nulidade da sentença, e
por fim, a improcedência dos pedidos.
Preliminarmente, assentaram os Desembargadores a legitimidade ativa
do Ministério Público Federal para propor a ação de Improbidade
Administrativa, e assim entenderam por ser impositivo reconhecer o interesse
federal, tendo em vista que a União precisar ter controle e exigir contas dos
entes que fazendo uso do erário, ainda que conjugado com recursos
particulares. Assim, delimitaram a competência da Justiça Federal e a
legitimidade ativa do Ministério Público Federal. Ainda preliminarmente, ao
analisar a apontada prescrição, decidiram que o delito imputado aos réus
consistiria na lesão ao erário, que está tipificada no art. 10 da Lei de
Improbidade Administrativa, e que conforme a Constituição Federal, as ações
que busquem o ressarcimento ao erário – desde que ligadas ao
reconhecimento de atos de improbidade administrativa – são imprescritíveis. 76

Quanto ao mérito, a malversação do dinheiro público ocorrida em um


âmbito tão importante e carente como é o da saúde pública aliada à ampla
delimitação probatória indicando a atuação dos réus no ato apontado pelo
Ministério Público Federal, acenou para a culpabilidade dos acusados.
Entendeu a Corte que a sentença que condenou os réus pelos atos de
improbidade estava correta, “haja vista as graves consequências que dela
advêm, pressupõe juízo de certeza, além da dúvida razoável acerca do
comportamento ilícito atribuído aos réus”. E desta forma decidiu por manter a
condenação por improbidade administrativa e as sanções do artigo 12, II, da
Lei n.º 8.429/92 e, ainda, confirmar a possibilidade do sequestro do bens dos
réus para assegurar o ressarcimento ao erário. 77
76
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5043222-
96.2015.4.04.7100/RS. Relator Des. Federal Rogerio Favreto. Julgamento: 11 abr. 2018.
Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=9386342&termosPesquisados=IGxlc2FvIGFvIGVyYXJpbyBpbXByb2JpZ
GFkZSBjdWxwb3NhIA==>. Acesso em: 29 mai. 2018.
77
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5043222-
96.2015.4.04.7100/RS. Relator Des. Federal Rogerio Favreto. Julgamento: 11 abr. 2018.
O acordão em questão expõem atos de improbidade admirativa de
desobediência aos princípios da administração pública, de lesão ao erário e
patrimônio público e de enriquecimento ilícito, no entanto, os réus restaram
condenados apenas pelo dano causado ao erário e ao patrimônio público, por
que não foi possível a comprovação do dolo dos agentes, requisito necessário
para a tipificação do enriquecimento ilícito, conforme ser explicado a seguir. 78
Seguindo a análise, o artigo 10 da Lei de Improbidade disciplina que
constitui improbidade administrativa de lesão ao erário a ação ou omissão,
culposa ou dolosa, que motive perda patrimonial, desvio, apropriação,
dilapidação dos bens ou haveres das entidades conforme mencionado no
artigo 1º da mesma lei. O ato lesivo incorrido pelo agente público se configura
na forma legal quando age ou se omite de agir nos atos de sua competência,
uma vez que o ato ímprobo independe da vontade do agente, que se
caracterizará mesmo quando o agente age de forma culposa. 79

Wallace Paiva Martins Junior expõe que o artigo 10 da Lei de


improbidade Administrativa, introduz a subdivisão desta lei destinado aos atos
lesivos ao erário, aponta ainda que acredita que o principal objetivo seria
relacionado aos valores morais da administração pública. Dentre as suas
disposições, o legislador inseriu a repressão “à ruinosa gestão do patrimônio
público”, de forma que no artigo 5º da lei, derivado do artigo 159 do Código
Civil, que pode ser aplicado nos casos de improbidade administrativa e também
em toda a situação que a refletir. Não sendo necessário a comprovação do
dolo do agente em agir, sendo compreendidos preceitos do Código Civil, tais
como a vontade de causar prejuízo, bem como o agir contra a lei por
negligência, imperícia ou imprudência.80

Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?


orgao=1&documento=9386342&termosPesquisados=IGxlc2FvIGFvIGVyYXJpbyBpbXByb2JpZ
GFkZSBjdWxwb3NhIA==>. Acesso em: 29 mai. 2018.
78
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível Nº 5043222-
96.2015.4.04.7100/RS. Relator Des. Federal Rogerio Favreto. Julgamento: 11 abr. 2018.
Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?
orgao=1&documento=9386342&termosPesquisados=IGxlc2FvIGFvIGVyYXJpbyBpbXByb2JpZ
GFkZSBjdWxwb3NhIA==>. Acesso em: 29 mai. 2018.
79
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 85.
80
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.204.
Ao falar da culpa nos atos de improbidade administrativa, é de suma
importância apontar que, a intenção do agente público pode ser,
aparentemente, boa, mas ao desobedecer a lei seu método é considerado
reprovável, podendo existir desvio de finalidade e como resultado desta,
improbidade administrativa. Wallace Paiva Martins Junior aponta que o artigo
10 caput delineia o prejuízo patrimonial, e refere que seus incisos indicam as
circunstâncias ilícitas que podem configurar a lesão. O artigo relaciona as
hipóteses das ações lesivas ao patrimônio público, resultado do
comportamento culposo ou doloso dos agentes públicos, que causam bônus
indevido a particular e impõe ônus injusto ao erário público,
independentemente do resultado gerar vantagem ao agente público. 81
Diferentemente do que ocorre nos casos do enriquecimento ilícito do
agente, Marcelo Figueiredo doutrina que nos atos de improbidade
administrativa que importem em enriquecimento ilícito, é usual a ocorrência de
concomitante prejuízo ao erário público. Ele aponta como exceção os casos em
que o agente recebe agrados ou presente para acelerar um procedimento
administrativo burocrático sem que haja prejuízo econômico para a
administração pública. Mesmos nesses casos, para os fins legais, houve
enriquecimento ilícito, conforme os artigos 9º e 6º da Lei de Improbidade.
Embora sem prejuízo econômico, fica configurado o dano à moralidade
administrativa, em especial à probidade do agente público. 82

O enriquecimento ilícito do agente público, por sua vez, é apontado


como a forma mais grave dos atos de improbidade, sendo vinculado à pratica
de atos de corrupção. A descrição do artigo 9º 83 da lei não especifica o
elemento subjetivo do agente; no entanto, nos casos dos atos que importem
em enriquecimento ilícito do agente, sua conduta deverá ser comprovadamente
dolosa.84

81
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.205.
82
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p.80-81.
83
Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir
qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato,
função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:
(...)
84
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 38-39.
O artigo 9º caput da lei de improbidade administrativa estabelece e
caracteriza como ato de improbidade administrativa todo ato de agente público
que tiver por objetivo receber vantagem patrimonial indevida, para si ou para
outrem, no exercício do cargo, função, atividade ou emprego nas entidades
elencadas no Artigo 1º da Lei n.º 8.429/92. Sendo o ponto central a conduta do
agente que resulta em obter benefício indevido, ainda que de forma indireta,
mas que oportuniza o enriquecimento sem causa.85
Sob o mesmo entendimento de Marcelo Figueiredo, Renata Lizandra de
Araújo doutrina que os atos de improbidade administrativa que têm por objetivo
a obtenção de vantagem ilícita e/ou indevida não necessariamente precisam
causar prejuízo ou dano qualquer natureza ao erário, sendo suficiente o
recebimento da vantagem que não decorra de contraprestação legal pelos
serviços prestados pelo agente público. Entende ainda que o enquadramento
legal depende da comprovação do componente subjetivo do agente, ou seja, é
dependente da prova da intenção do agente em obter vantagem indevida
(forma dolosa), expondo que não se deve punir caso em que o enriquecimento
ilícito ocorra na forma culposa, sem a vontade de obter o enriquecimento ilícito
decorrente da ação do agente.86
Nenhuma das condutas apontadas nos incisos do artigo 9º admite a
modalidade culposa, todas são dolosas. Segundo Marino Pazzaglini Filho,
Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio Júnior “as espécies de atuação
suscetíveis de gerar enriquecimento ilícito pressupõem a consciência da
antijuridicidade do resultado pretendido”, ou seja, nenhum agente desconhece
a ilegalidade em enriquecer por sua função pública, não havendo
87
enriquecimento por negligencia ou imprudência.
Da mesma maneira entende Benedicto de Tolosa Filho, que ao explicar
a existência de uma corrente doutrinária que não conhece como típica a
conduta do agente que recebe “presentes”, mesmo que de pouco valor,
principalmente em épocas festivas, com base no Código de Ética do Servidor
85
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 67-68.
86
ARAÚJO, Renata Lizandra. Os Principais Aspectos da Lei de Improbidade
Administrativa < http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/3154003 > acesso em: 29 de
abr. 2018
87
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 57-58.
Público, diz ainda que discorda plenamente de tal corrente doutrinaria, tendo
em vista que os pequenos mimos ou comissões de grande monta
compreendem conduta antiética, e não descaracterizam a percepção de
vantagem indevida.88
Sérgio Turra Sobrane aponta os elementos que caracterizam o ato de
improbidade que tem por resultado o enriquecimento ilícito: 89

(a)Vantagem patrimonial auferida por agente público, acarretando ou


não danos ao erário; (b) vantagem patrimonial resultante de causa
ilícita; (c) ciência do agente público da ilicitude da vantagem
patrimonial alcançada (dolo); (d) nexo etiológico entre o exercício
funcional do agente público e indevida vantagem patrimonial por ele
obtida.

A conduta tipificadora do enriquecimento ilícito é a obtenção de


vantagem econômica indevida, podendo ser entendida como qualquer
modalidade de prestação, positiva ou negativa, da qual se beneficie e
enriqueça ilicitamente.90
Nos atos que importam em enriquecimento ilícito do agente
administrativo não se admite punição para a tentativa da prática do ato, sendo
punível apenas a consumação da conduta. A tentativa será passível de punição
com base no 1191 da Lei de Improbidade Administrativa, como afronta aos
princípios da Administração Pública.92
Conforme pode-se verificar em um julgado do Tribunal Justiça do Rio
Grande do Sul, em que o Ministério Público estadual ingressou com Ação Civil
Pública para apurar possível improbidade administrava no caso envolvendo
agente público que recebeu para moradia casa funcional atrelada ao órgão no
qual exercia suas funções. Constatou-se que ao invés de residir no local, o

88
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 70.
89
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa
e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 39.
90
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 57.
91
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
(...)
92
ARAÚJO, Renata Lizandra. Os Principais Aspectos da Lei de Improbidade
Administrativa < http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/3154003 > acesso em: 29 de
jul. 2018
agente sublocava a residência, obtendo para si os rendimentos da locação do
imóvel funcional.93
O Tribunal entendeu, assim, caracterizado o enriquecimento ilícito. No
entanto, conforme apontado anteriormente, o artigo 9º da Lei de Improbidade
Administrativa exige a comprovação do dolo, o que não pode ser comprovado
nos autos, impossibilitando o enquadramento no citado artigo. Contudo, a
conduta do agente, visivelmente violou os princípios da administração pública,
e assim, embora ausente a prova definitiva do dolo, enquadrou-se no artigo 11
da mesma lei, restando o agente condenado nos termos do artigo 12, III, 94
da
Lei 8.429/92.95
Ainda referente ao enriquecimento ilícito do agente público, o artigo 6 96
da mesma lei, autoriza o perdimento dos bens do agente ímprobo ou do
terceiro beneficiário, considerando o que foi adquirido por meio da conduta
ilícita do agente, sendo o perdimento dos bens capitulado como sanção que
autoriza o juiz a decretá-lo.97
Seguindo a análise da Lei de Improbidade Administrativa, o artigo 12
preconiza sanções civis, independentes de outras sanções penais, civis ou
administrativa, uma vez que o artigo 37, § 4º, da Constituição Federal as

93
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda
Câmara Cível. Apelação Cível n° 70077191856. Relator Desembargador Ricardo Torres
Hermann. Data do Julgamento: 25 mai. 2018. Disponível em:
https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/584513301/apelacao-civel-ac-70077191856-rs/
inteiro-teor-584513306?ref=juris-tabs>. Acesso em: 10 ago. 2018.
94
Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na
legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes
cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade
do fato:
(...)
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem
vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder
Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.
(...)
95
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda
Câmara Cível. Apelação Cível n° 70077191856. Relator Desembargador Ricardo Torres
Hermann. Data do Julgamento: 25 mai. 2018. Disponível em:
https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/584513301/apelacao-civel-ac-70077191856-rs/
inteiro-teor-584513306?ref=juris-tabs>. Acesso em: 10 ago. 2018.
96
 Art. 6° No caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público ou terceiro beneficiário os
bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.
97
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p.47.
institui, sem prejuízo da tutela penal, e determina que tais sanções serão
aplicadas judicialmente.98
Deve ser identificado o bem jurídico tutelado e existir norma positivada
que vise preservá-lo, devendo a sanção ter vínculo com o fato ilícito praticado e
oscilar qualitativa e quantitativamente de modo proporcional à lesividade da
conduta do agente. Ao falar da proporcionalidade da sanção, Emerson Garcia,
explica que a finalidade da sanção não é causar prejuízo ao agente infrator, e
sim punir de forma justa aquele que inflige a norma. Assim, nas palavras do
autor, a “restauração da soberania do direito, principal alicerce da segurança
que deve reinar nas relações sociais”. 99

A Lei de Improbidade administrativa delimita a aplicação das sanções e


prevê aos agentes público que tenham cometido atos de improbidade
administrativa as sanções de suspensão dos diretos políticos, perda da função
pública, indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, aponta ainda
que tais sanções não prejudicam a ação penal cabível. 100
Desta forma, existem três âmbitos jurisdicionais passíveis de
responsabilizar o agente ímprobo, administrativa, civil, e penalmente, que
atuam com certa independência, podendo em alguns casos existir
interferências mútuas, conforme explica Marcelo Figueiredo: 101

A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso


de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria.
De outra parte, não negando a sentença absolutória a existência do
fato ou de sua autoria, limitando-se a considerá-lo atípico, por
exemplo, do ponto de vista penal, há ainda a responsabilidade
administrativa do agente.

Importante destacar que a Lei 8.429/92, como já apontado, descreve os


atos de improbidade administrativa em três classes, estipula e qualifica
sanções que podem ser aplicadas a cada classe e as especifica

98
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.255.
99
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.1189.
100
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 134.
101
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p.113.
proporcionalmente conforme o grau da lesão causada ao princípio da
probidade administrativa, forte no artigo 12, I a III da lei. 102

Se, no caso concreto, o ato ímprobo praticado pelo agente público


resultar em enriquecimento ilícito, as sanções que devem ser impostas são as
previstas no artigo 12, I da Lei de Improbidade 103, ou seja, o agente público
e/ou terceiro injustamente enriquecido perderá os bens ou valores que
acresceu ao seu patrimônio. Em qualquer caso referente aos atos que
impliquem em lesão ao erário ou patrimônio público, por sua vez, será
determinado o integral ressarcimento do dano causado. 104
Para melhor ilustrar, pode-se verificar o entendimento do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, que condenou os réus, Diretor, Vice-Diretor e
Administrador Financeiro de uma Escola Estadual, por fraude nos processos de
compras de produtos, no exercício do cargo público, por meio de falsificação de
orçamentos, assinaturas, carimbos, cheques e notas fiscais, apropriando-se
dos valores desviados, comprovado o enriquecimento ilícito. 105
Ao fim restaram condenados à devolução dos valores desviados,
acrescido de juros, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos e
à proibição de contratar com o poder público, e/ou receber incentivos fiscais ou
creditícios, pelo prazo de dez anos.106
Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio
Júnior doutrinam que as demais regras para aplicação da sanção podem ser
sintetizadas da seguinte maneira: 107

102
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão
difusa e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 155.
103
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.256.
104
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 127.
105
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Terceira
Câmara Cível. Apelação Cível n° 70064798903. Relator Desembargador Eduardo Delgado.
Data do Julgamento: 24 mai. 2018. Disponível em:
<https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/585230618/apelacao-civel-ac-70064798903-rs/
inteiro-teor-585230637?ref=juris-tabs>. Acesso em: 18 ago. 2018.
106
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Terceira
Câmara Cível. Apelação Cível n° 70064798903. Relator Desembargador Eduardo Delgado.
Data do Julgamento: 24 mai. 2018. Disponível em:
<https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/585230618/apelacao-civel-ac-70064798903-rs/
inteiro-teor-585230637?ref=juris-tabs>. Acesso em: 18 ago. 2018.
107
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo.
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 127-128.
em qualquer caso, incidirá a sanção de perda da função pública do
agente público que de qualquer forma incorrer em improbidade
administrativa;

em qualquer caso, incidirá a sanção de suspensão dos direitos


políticos, de oito a 10 anos (art. 9º), de cinco a oito anos (art. 10) e de
três a cinco anos (art. 11), a critério do órgão judiciário;

em qualquer caso, incidirá a multa civil, de até três vezes o valor do


acréscimo patrimonial (art. 9º), de até duas vezes o valor do dano
(art. 10) e de até 100 vezes o valor da remuneração percebida pelo
agente público (art. 11);

em qualquer caso, incidirá a proibição de contratar com o Poder


público ou receber benefícios e incentivos, ainda que via pessoa
jurídica da qual seja sócio, por 10 anos (art. 9º), cinco anos (art. 10) e
três anos (art. 11).

Pode-se observar que esse entendimento corresponde àquele do


Tribunal de Justiça gaúcho, como exemplifica o julgado envolvendo servidora
pública municipal, que desempenhava a função de Tesoureira do Município e
realizou diversas operações e manobras contábeis ilícitas, consistentes na
emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos sacados de contas
bancárias de sua titularidade, destinando-os a recompor saldos da Tesouraria
por ela desfalcada, enriquecendo ilicitamente em detrimento do erário
municipal.108
Configurada a culpa da servidora ao causar prejuízo ao erário, ela foi
condenada a ressarcir integralmente o dano, corrigido monetariamente e
acrescidos juros de mora. O ato praticado também culminou com a perda do
cargo público, a suspensão dos direitos políticos por cinco anos e a proibição
de contratar com o Poder Público, também por cinco anos. 109

Faz-se igualmente possível avaliar a posição dos Tribunais quanto aos


atos de Improbidade Administrativa que violam os princípios da administração
pública, tomando como exemplo o que restou decidido em Ação por
Improbidade Administrativa contra um vereador, que utilizou telefone funcional

108
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quarta
Câmara Cível. Apelação Cível n° 70068689025. Relator Desembargador Eduardo Uhlein.
Data do Julgamento: 09 ago. 2017. Disponível em:
<https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/490388094/apelacao-civel-ac-70068689025-rs/
inteiro-teor-490388114?ref=juris-tabs >. Acesso em: 18 ago. 2018.
109
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quarta
Câmara Cível. Apelação Cível n° 70068689025. Relator Desembargador Eduardo Uhlein.
Data do Julgamento: 09 ago. 2017. Disponível em:
<https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/490388094/apelacao-civel-ac-70068689025-rs/
inteiro-teor-490388114?ref=juris-tabs >. Acesso em: 18 ago. 2018.
da câmara de vereadores para fins pessoais, alheios e atentatórios à dignidade
de seu cargo, quais sejam, a contratação de serviços de uma prostituta. 110
Tal conduta evidenciou a violação dos princípios da administração
pública, razão pela qual, observando o princípio proporcionalidade, foi
condenado ele à suspensão dos direitos políticos por 5 (cinco) anos, uma vez
que o mandato em questão já havia terminado na data do julgamento. 111
É importante destacar que existe uma tese de que a redação dos artigos
37, § 4º da Constituição Federal e o artigo 12 da Lei de Improbidade
Administrativa, indicam que as sanções aplicáveis aos atos ímprobos são
obrigatoriamente cumulativas, e que devem ser aplicadas a todo e qualquer ato
de improbidade administrativa, independente do grau de dano causado pelo
agente, sendo permitido ao magistrado apenas dosar as sanção que permitem
graduação. No entanto, tal tese vai contra o princípio da proporcionalidade,
uma vez que o magistrado deve aplicar as sanções para reprimir a conduta
praticada pelo agente, de forma adequada e razoável. 112

Prevê também, no artigo 8º, a responsabilização do sucessor do


agente ímprobo ou do terceiro por atos de improbidade administrativa no que
diz respeito ao seu patrimônio. Não serão aplicadas sanções de caráter
pessoal, apenas aquelas que implicarem a recomposição de prejuízos ou
devolução de valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio. 113
Para a melhor fiscalização do agente público, a lei prevê a imposição da
apresentação da declaração de bens e valores que compreendem o patrimônio
do candidato ao exercício da função pública como requisito para o
empossamento e exercício do cargo; também é necessária a apresentação da

110
GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda Câmara
Cível. Apelação Cível n° 70075956961. Relatora Desembargadora Lúcia de Fátima Cerveira.
Data do Julgamento: 31 jan. 2018. Disponível em: <
https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/548884550/apelacao-civel-ac-70075956961-rs?
ref=serp>. Acesso em: 18 ago. 2018.
111
GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda Câmara
Cível. Apelação Cível n° 70075956961. Relatora Desembargadora Lúcia de Fátima Cerveira.
Data do Julgamento: 31 jan. 2018. Disponível em: <
https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/548884550/apelacao-civel-ac-70075956961-rs?
ref=serp>. Acesso em: 18 ago. 2018.
112
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão
difusa e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 167.
113
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 12 de
ago. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.
declaração de bens dos dependentes do candidato. Trata-se uma condição
imposta pelo legislador, com o objetivo de proporcionar a transparência
fundamental com o trato da coisa pública, bem como, coibir a eventual
ocorrência de enriquecimento ilícito do agente público. 114
A Lei nº 8.429/92 concebeu uma nova condição para o exercício do
agente público quando no artigo 13 instituiu de forma obrigatória a
apresentação da declaração de bens e rendas para o exercício da função
pública. Marcelo Figueiredo destaca que tal exigência foi também regulada por
lei posterior, de forma mais minuciosa. A Lei nº 8.730 de 1993 faz exigências
maiores que o artigo 13 da Lei de Improbidade Administrativa, uma vez que
busca acompanhar o desenvolvimento econômico e financeiro do agente
público, com o objetivo de visualizar qualquer ilícito. 115
A Lei de Improbidade também fixa o procedimento administrativo e
judicial para a apuração e julgamento dos atos de improbidade administrativa.
Essa perspectiva, embora importante, não integra o problema de pesquisa que
conduz o presente estudo, direcionado, por sua vez, a compreender a efetiva
amplitude de sua aplicabilidade, vale dizer, a quais agentes públicos se
destina. Por essa razão, a análise procedimental da Lei de Improbidade será
realizada em um sentido global, partindo da disposição do art. 5° do texto
constitucional que, ao tratar da tutela dos direitos individuais e coletivos,
assegura que qualquer pessoa tem o direito a representar contra ilegalidades
praticadas por agente público perante a autoridade administrativa competente,
perspectiva que é assegurada pelo art. 14 da Lei de Improbidade. 116
A comissão encarregada de realizar a sindicância ou inquérito
administrativo deve comunicar a instauração ao Tribunal de Contas e ao
Ministério Público competentes. Durante a investigação, se constatado que o
ato praticado pelo agente configura enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário,
a autoridade administrativa ou policial, deve solicitar ao Ministério Público ou a
procuradoria competente o pedido judicial de decretação de sequestro dos
114
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 140.
115
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p.134.
116
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 144.
bens, podendo ainda requerer a quebra de sigilo bancário do acusado, com
base no artigo 16 da Lei de Improbidade.117
Daniel Amorim Neves preconiza que a legitimidade para propor ação de
Improbidade Administrativa é do Ministério Público e da pessoa jurídica
interessada, conforme previsto no artigo 17, caput, da mesma lei, seguindo o
rito ordinário e no prazo de 30 dias do deferimento da medida cautelar.
Importante destacar que o parquet é obrigado a ingressar com ação civil
pública nos casos em que verificados indícios de atos de improbidade
administrativa. Além disso, o art. 17 da Lei de Improbidade, em seu parágrafo
primeiro, disciplina que nas ações de Improbidade Administrativa está proibido
o oferecimento de transação, acordo ou conciliação, por força do princípio da
indisponibilidade dos bens públicos. 118
Caso a Fazenda Pública entenda necessário, deve ingressar com a ação
cabível para complementar o ressarcimento do patrimônio público. Nos casos
em que o Ministério Público figurar no polo ativo da demanda, a pessoa jurídica
interessada pode atuar como litisconsorte para suprir qualquer omissão do
parquet. Por outro lado, nas situações em que Ministério Público não intervir na
ação, figurará como fiscal da lei, conforme atribuição do art. 129 do texto
constitucional.119
Ao ser julgada procedente a ação civil de reparação do dano ao erário
ou constatado o enriquecimento ilícito, a decisão também decretará a
indenização dos demais prejuízos causados e o perdimento dos bens
adquiridos ilicitamente. Por fim, o juízo competente para o ajuizamento da ação
de Improbidade Administrativa é o do foro em que ocorrer o fato. Segundo
Benedicto de Tolosa Filho, o juízo competente é onde acontece o fato, pois a
regra segue o art. 2º da Lei 7.347/85, que reza que nas ações de
responsabilidade por danos patrimoniais e morais. 120

117
SANTOS, Marcelo O. F. Figueiredo. Probidade administrativa: comentários à lei 8.429/92 e
legislação complementar. 4. ed., atual. e ampl. São Paulo, SP: Malheiros, 2000, p. 145.
118
NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Manual de
Improbidade Administrativa. 2. ed. São Paulo: Método, 2014, p. 556.
119
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão
difusa e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 166.
120
TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à lei de improbidade administrativa:
(atualizado de acordo com a medida provisória nº 1.088 e a lei de responsabilidade fiscal). Rio
de Janeiro, RJ: Forense, 2003, p. 149
Ponto igualmente relevante diz respeito à prescrição incidente nas ações
de improbidade administrativa. A prescrição, por sua própria natureza, trata-se
de fator imprescindível para a harmonia das relações sociais, tendo em vista
que atua como impeditivo ao avanço de instabilidade jurídicas. Pode-se dizer
que uma pretensão lícita objetiva a recomposição da ordem jurídica lesada por
uma ação ou omissão do agente público e que o tempo transcorrido tende a
dificultar a arrecadação da substância probatória e enfraquece a lembrança dos
fatos. Deste modo, a prescrição fará com que a inércia e o decurso de tempo
coíbam que o interessado venha a exercer seu direito muito tempo após o fato,
na tentativa de obstar a negligência do interessado. 121
O artigo 23 da Lei de Improbidade traz prazos prescricionais próprios.
Para os agente público que exercem cargos ou funções de mandatos,
comissão e confiança (agentes políticos), o prazo prescricional é de cinco anos,
contados a partir do termino da investidura, já para os agentes públicos que
são titulares de cargos efetivos (agentes administrativos), os prazos
prescricionais serão os mesmos que já estão previstos em lei específica para
faltas disciplinares que são puníveis com demissão do cargo público, ou seja,
cada entidade pública fornecerá o prazo prescricional, conforme lei específica
de cada âmbito administrativo.122
Importante realçar a existência do instituto da imprescritibilidade na ação
de improbidade administrativa, perspectiva que alcança a pretensão
condenatória à reparação do dano causado por atos de improbidade
administrativa.123
Exige o Supremo Tribunal Federal a comprovação do dolo do agente
público que causou prejuízos ao erário. 124

121
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco, Improbidade Administrativa. 7. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p.1357-1358.
122
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa, 1. ed. São Paulo: Saraiva,
2001, p.290.
123
SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão
difusa e coisa julgada. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p.193.
124
https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/595864016/recurso-extraordinario-re-852475-sp-
sao-paulo (Recurso Extraordinário (RE) 852475)
Luís Roberto Barroso doutrina que os crimes de responsabilidade são
“aqueles suscetíveis de ser praticados por determinado agente público, em
razão do cargo público que ocupa”. 125

Os Crimes de Responsabilidade são delitos político-administrativas,


tratam-se de condutas politicamente irregulares e que atentam contra a
Constituição, definidas por lei, praticadas por agentes políticos no exercício do
mandato, tais condutas atentam contra os princípios da administração pública.
A conduta violadora do agente será submetida a um julgamento político, feito
pela casa legislativa competente, e esta suscetível à sanções de lei e de
natureza política, tais como a perda do cargo e o impedimento do exercício da
função pública (por tempo determinado).126
Ao fim do exame da Lei nº 8.429/92, é possível constatar que esta
possui um rol de condutas bem particular, os atos de improbidade
administrativa são amplamente tipificados, da mesma maneira que dispõe
sanções especificas para os atos nela arrolados, e de um procedimento
administrativo/judicial próprio. Em suma a Lei de Improbidade Administrativa
defender o ente público dos atos praticados pelos maus servidores. Na
sequência do trabalho será feita uma análise minuciosa sobre os agente
público, administrativo ou político. 127

125
BARROSO, Luís Roberto. Temas de direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2006, p. 439-440.
126
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 12 de
ago. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.
127
BATISTI, Nelia Edna Miranda; PIMENTA, Júlia Acioli. A Aplicabilidade da Lei de
Improbidade Administrativa aos Agentes Políticos. 2015. Disponível em
<www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/23910/17605> acesso em 12 de
ago. 2018 Revista do Direito Público, Londrina, v.10, n.3, p.119-140, set./dez.2015.

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