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Introdução à

Educação
Cristã
Perry G. Downs
Uma Introdução à Educação Cristã

o que significa ser espiritualmente maduro? O que a


igreja pode fazer para ajudar as pessoas a crescerem
espiritualmente? Essas questões são discutidas neste
livro a partir da Teologia, da Psicologia do desenvolvi­
m ento e da teoria do aprendizado:
1. O que a natureza de Deus nos ensina sobre ensino e
crescimento espiritual?
2. De que modo Deus nos criou para o desenvolvi­
m ento e como isso afeta o nosso crescimento espiritual?
3. Como é o processo que experimentamos para atingir
a maturidade espiritual?

Perry Downs (Ph.D. pela New York University) é


professor de Educação Cristã na Trinity Evangelical
School in Deerfield, Illinois.

ISBN 85-86886-24-6
CDITOIM CUlTUflfl CmSTA

S
Rua Miguel Teles Júnior, 382/394 - Cambuci
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C.Postal 1 5 .1 3 6 -S 3 0 P a u lo -S P -0 15 9 9 -9 70
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Educação Cristâ/Crescimento espiritual
Introdução à

Perry G. Downs

CRESCIMENTO
Ensino e Crescimento - Uma Introdução à Educação Cristã © 2001 Editora Cultura
Cristã. Originalmente publicado nos EUA pela Zondervan Publishing House - Grand
Rapids,Michigan, USA, comotitulo TeachingforSpiritualGrowth © 1994byPerry
Downs. Todos os direitos são reservados.

Tradução:
Marcelo Cliffion Tolentino

Revisão:
Claudete Agua de Melo
Arlinda Madalena Torres Marra

Editoração:
Gilson da Silva Oliveira Filho

Capa:
Magno Paganelli

Publicação autorizada pelo Conselho Editorial:


Cláudio Marra (Presidente), Alex Barbosa Vieira,
Aproniano Wilson de Macedo, Fernando Hamilton Costa,
Mauro Meister, Ricardo Agreste, Sebastião Bueno Olinto.

C D IT O n n C U L T U R A C R IS T A
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Superintendente: Haveraldo Ferreira \hrgas


Editor: Cláudio Antônio Batista Marra
Em honra aos meus pais

E lm erH . D owns (1914 - 1964)


e
Violet M. Downs

Fairfield, Connecticut
ÍNDICE

Prefácio 7

PARTE I ENSINO COM UMA PERSPECTIVA BÍBLICA


Capítulo 1 Questões básicas 13
Capítulo 2 O ensino a partir de uma perspectiva bíblica 25
Capítulo 3 M odelando nosso ensino conforme o de Jesus 35
Capítulo 4 Entendendo Deus, entendendo as pessoas 51

PARTE II A RENOVAÇÃO DA MENTE


Capítulo 5 A renovação da m ente 69
Capítulo 6 A Teoria do desenvolvimento 81
Capítulo 7 Desenvolvimento cognitivo 97
Capítulo 8 Desenvolvimento moral 115
Capítulo 9 O desenvolvimento da fé 135

PARTE III O APRENDIZADO E O CRESCIMENTO


ESPIRITUAL
Capítulo 10 O aprendizado e o crescimento espiritual 155
Capítulo 11 O aprendizado e as influências da primeira infância 171
C apítulo 12 Aprendendo pela interação e pela observação 189
Capítulo 13 Aprendendo pelo desenvolvimento lógico 205
Capítulo 14 Aprendendo pela experiência 223
C apítulo 15 Ensino e crescimento espiritual 239
Apêndice; A evangelizacãn de crianças 245
índices 261
Prefácio
A disciplina de Educação Cristã tem perambulado muito nos últimos anos,
como se em busca de um a missão. Os interesses em um a variedade de temas
causaram um acúm ulo de tópicos um tanto quanto am plos, sob o título
abrangente de “Educação Cristã” . Tópicos como ministérios específicos para
faixas etárias, ministérios para jovens, ministério para famílias problemáticas,
adm inistração e mídia, têm ocupado a mente de muitos educadores cristãos.
O resultado positivo desse alargamento do campo tem sido o estabelecim en­
to de alguns ministérios muito frutíferos para vários segmentos da sociedade.
A Ig reja tem respondido às necessidades especiais de um a sociedade
crescentemente ferida, e ministérios têm sido às vezes direcionados diretamente
à parte principal da cultura moderna.
Mas essa diversidade de interesses não tem acontecido sem custos. Enquan­
to a amplitude de interesses tem aumentado, a profundidade e o foco dos assun­
tos centrais ficaram comprometidos. O foco da disciplina, que é o ensino para o
crescimento espiritual, tem muitas vezes sido marginalizado. A Psicologia se tor­
nou o fundamento básico à custa de uma Teologia sadia. Responder às necessi­
dades das pessoas é às vezes percebido como mais importante do que respon­
der à real necessidade de se reconciliar com Deus. Ajudar as pessoas a senti­
rem-se bem tomou o lugar de ajudar as pessoas a serem boas e fazerem o bem.
Esse é um preço que eu não estou disposto a pagar.
Eu tentei, neste livro, oferecer um rem édio simples. Escolhi usar o cres­
cim ento espiritual do povo de Deus como m eu foco, e a B íblia e a Teologia
como m eus fundam entos básicos. Uso a Psicologia e as teorias de aprendi­
zado com o fontes im portantes de inform ação, m as sem pre em interação
com a Teologia. Eu não quero nem que as Ciências Sociais nem a Teologia
se levantem independentem ente— ambas devem ser valorizadas, mas a B í­
blia deve perm anecer como árbitro final. A revelação especial deve sempre
preceder a revelação geral.
A lógica do livro é clara. N a prim eira parte, “Ensino com uma Perspectiva
Bíblica”, eu começo a estabelecer a base para a natureza da maturidade espiritu­
al. N a segunda parte, o desenvolvimento psicológico e as teorias de aprendiza­
do, providenciam a base social, procurando descrever a natureza do desenvolvi­
mento humano e o modo como as pessoacs aprendem. O livro termina com uma
exploração de como nós devemos ensinar para o crescimento espiritual. Então,
partimos da Teologia, depois vamos para a Psicologia e para a Educação.
8 E nsino e C rescimento

Minha posição teológica é Reformada, mas eu tenho tentado evitar polêmicas.


H á suficientes pontos em com um entre as tradições agostinianas e não-
agostinianas, de m odo que essas questões não precisam sempre nos dividir.
Elas têm m uita importância, na verdade, mas muitos dos pontos de diferença
surgem após as questões fundamentais terem sido resolvidas. O leitor decidirá
se eu fui bem sucedido em evitar trazer divisão a respeito desses pontos.
Em um sentido, este livro é um passo para trás, mas não no sentido de
retrocesso. Antes, é um passo para trás com o propósito de correção. Eu enfatizo
a im portância da Bíblia como essencial para o crescim ento espiritual, e não
ofereço nada em termos de programas inovativos. M inha razão é que eu creio
que as respostas que precisam os para uma educação cristã eficaz estão na
interpretação histórica da Igreja. Não estou convencido de que m uitos dos
programas contemporâneos tenham produzido mais santidade, piedade e amor
a Deus e ao próxim o. A razão disso é que nós tem os perdido nosso foco.
M inha esperança e oração é que o presente volume possa ajudar-nos a voltar
ao nosso interesse central.
A presento um a filosofia de educação cristã que ajuda o leitor a aprender
como pensar sobre os assuntos educacionais na igreja. Tentei m ostrar como
são os diálogos entre as Ciências Sociais e a Teologia. Se o leitor conseguir um
melhor entendimento de como pensar sobre o ensino para crescimento espiritual
eu ficarei muito satisfeito.
Q ualquer pessoa que conheça o campo da Educação Cristã reconhecerá a
influência de Ted Ward em m eu pensam ento. Adaptei suas idéias em vários
exem plos, mas sua m arca é inconfundível. Sou grato por ter um colega tão
estim ulantes e cortês como esse, que tão livrem ente com partilha suas idéias
com aqueles ao seu redor. E também a Warren Benson, Linda Cannell, Charles
Sell e a m eu encorajador pessoal, M ark Senter. Todos eles têm sido grandes
companheiros em nosso departamento de Educação Cristã.
O maravilhoso program a sabático da Trinity Evangelical Divinity School
perm itiu que eu tivesse tempo para pesquisar e escrever. Quero agradecer ao
Presidente Meyer e ao Conselho Diretor pelo tempo livre que me foi oferecido
para que eu com pletasse este projeto.
Os editores da Zondervan têm sido um deleite absoluto. A crença inicial de
Stan G undry a respeito deste projeto e a orientação amável de Jam es Ruark
foram extremamente úteis para mim. Meu amigo Kiersten Crocker desenvolveu
os índices com grande velocidade, precisão e com seu costum eiro espírito
ajudador.
M inha esposa Sandra ajudou-m e de tal modo que sou incapaz de colocar
P refácio 9

em palavras. Ela torna possível que eu trabalhe em casa preparando um ambi­


ente de paz e beleza. Posso contar com seu apoio emocional, cognitivo e espi­
ritual. Eu não tenho nem idéia onde ela acaba e eu começo. Acho que é
exatamente como deve ser.
Finalm ente, obrigado aos m uitos estudantes que ajudaram a refinar meus
pensamentos através de infindáveis aulas. O diálogo na sala de aula serviu para
enriquecer meu entendimento a respeito desses assuntos e corrigiu-me onde eu
estava errado. As vezes acho que meus alunos são meus melhores professores.
Louvado seja o nome de Jesus.
PARTE I
ENSINO COM UMA
PERSPECTIVA BÍBLICA
CAPÍTULO 1
QUESTÕES BÁSICAS

Ministérios educacionais exigem uma grande soma de energia e consomem


um a am pla proporção dos recursos da igreja. A maior parte do espaço físico
da igreja é usado para o ensino, e a m aior parte da ajuda dos voluntários é
direcionada a esse aspecto do m inistério da igreja. Claram ente, os líderes da
igreja vêem a educação como importante, mas mesmo assim há em geral muita
frustração por parte dos professores, líderes e estudantes.
Alguns professores consideram os materiais curriculares como irrelevantes
para a vida de seus alunos ou, como fazendo exigências que eles consideram
difíceis de atender. A lguns líderes questionam o m otivo pelo qual não há
resultados m elhores em relação a tam anho gasto de energia e dinheiro, pois
freqüentem ente o ensino não resulta em transformação de vidas. E os alunos
podem considerar as aulas m açantes ou sem inspiração— algum as vezes
interessantes, mas que geralmente não falam aos assuntos do dia-a-dia de uma
maneira poderosa.
M uitas pesso as já ten taram p ro c la m ar a E sco la D o m in ical com o
ultrapassada e desnecessária para os dias de hoje. Mas a Escola D om inical é
“tão americana quanto as ervas daninhas” , que resistem e mudam com o tem ­
po. A Escola Dominical precisa, no entanto, ser m elhorada e fortalecida, as­
sim como todos os m inistérios educacionais da igreja. N a preparação para
entrarm os no século 21, nos Estados U nidos pós-cristão, nós necessitam os
um m inistério educacional que ajuda as pessoas a chegar a uma “unidade na
fé e no pleno conhecim ento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à m e­
dida da estatura da plenitude de C risto” (E f 4.3).
O propósito deste livro é desenvolver um a filosofia de educação cristã
que seja profunda, guiada por aquelas idéias tanto da Teologia quanto das
C iências Sociais que são relevantes à tarefa de educar pessoas para o cres­
cimento espiritual. Não há soluções fáceis. A longo prazo as soluções fáceis
não duram. Antes, deve haver um a abordagem séria para a Educação Cristã
que respeite tanto as Ciências Sociais quanto a Teologia, conduzindo a uma
filosofia unificada de Educação C ristã que capacite a igreja a ensinar para
uma maturidade espiritual.
14 E nsino E C rescimento

AS CliNClAS SOCIAIS E A TEOLOGIA

A lguns cristãos discordam do uso das C iências Sociais para inform ar o


processo de Educação C ristã, por tem er que essas abordagens “ seculares”
possam substituir a abordagem “bíblica” apropriada. Essa preocupação, no
entanto, é baseada num a visão de m undo que não entende a unidade da v er­
dade. Um a visão de mundo cristã vê validade tanto na Ciência como na Teo­
logia, reconhecendo que am bas são necessárias. Q uando propriam ente en­
tendidas, não são contraditórias em sua natureza, mas apresentam um a des­
crição m ais com pleta da realidade do que pode ser alcançada quando so ­
m ente as C iências Sociais ou a Teologia são consideras exclusivam ente. A
figura número 1 mostra como a Ciência Social e a Teologia são m elhor enten­
didas de um a perspectiva cristã.

i
Criação Palavra

t
Ciência Social
í
Teologia

QUESTIONAMENTO

HUMANO

Figura 1

Deus revela
Como criador de tudo o que há. Deus é a fonte de toda a realidade. Deus
revela a verdade de duas maneiras; pela criação (revelação geral) e pela Palavra
(revelação especial). Tanto a criação como a Escritura devem ser respeitadas
como fontes da revelação de Deus e devem ser estudadas para que se entenda
as m aravilhas da sabedoria e da expressão de Deus.
Q uestõe‘s B ásicas 15

A metade superior da figura 1 se refere à metafísica—^aquilo que é real. Essa


realidade é baseada na verdade de que Deus é criador e criou todas as coisas.
Deus criou todas as coisas por meio de suas palavras, e tudo o que há foi criado
por ele. Por Deus ser a fonte de tudo o que há, há um a unidade da verdade na
criação. A perspectiva cristã reconhece essa verdade onde quer que ela seja
encontrada, que tem sua fonte em Deus e portanto deve ser valorizada.

O questionam ento humano


A m etade inferior da figura 1 se refere à epistem ologia— a busca do ser
humano por conhecimento, tentando descobrir o que é a verdade. Enquanto os
com ponentes m etafísicos são objetivos, existindo independentem ente da
experiência humana, os aspectos epistemológicos são mediados pela pessoa.
O questionamento epistemológico é mais subjetivo, propenso ao erro ou influência
do indivíduo. Pode haver erros tanto nas Ciências Sociais como na Teologia,
porque estas são esforços humanos para entender a revelação de Deus.
A Teologia é o questionamento sistemático da Escritura. A Teologia é uma
tentativa hum ana de tirar conclusões da revelação especial de Deus. As regras
que controlam esse questionamento são as regras da hermenêutica e da lógica.
Para fazer uma boa Teologia deve-se buscar uma objetividade rigorosa quando
se procura determinar a verdade, mas sempre com um grau de humildade que
reconhece que somente a Escritura é a verdade absoluta. A Teologia pode ser
corrom pida pelo pecado humano e feita obscura por falta de visão espiritual.
A Ciência é o questionam ento sistem ático da criação. U m a boa ciência
segue as regras do questionam ento científico, geralm ente se lim itando ao
que pode ser im piricam ente observado. Propriam ente entendida, a Ciência
é um a investigação da ordem criada de D eus e pode aju d ar em nosso
entendimento da revelação geral. Como tal, o questionamento científico deve
ser respeitado pelo cristão.
A Educação Cristã pode ser informada pelas descobertas da Ciência Social
em sua pesquisa dentro da criação de Deus no sexto dia— a hum anidade. A
Psicologia, a Sociologia, a Antropologia e a Educação (conliecidas coletivamente
como Ciências Sociais) são todas tentativas humanas para entender a criação
maior de Deus, a humanidade. Assim como a Teologia está sujeita ao erro, assim
também a Ciência pode ser distorcida pelo pecado e pelas limitações humanas.
M as a boa Ciência fornece visões críticas sobre como as pessoas aprendem e
amadurecem, dando importantes linhas mestras para o educador cristão.
16 E nsino e C rescimento

A Educação Cristã deve ser guiada por um a visão de mundo que valoriza
tanto a revelação geral quanto a especial. Questões claramente teológicas, como
a natureza da maturidade espiritual, devem ser consideradas a partir de uma base
teológica. Mas questões a respeito das funções normais do homem, tal como de
que m odo as pessoas aprendem devem ser abordadas de um ponto de vista
científico. N aturalm ente, nenhum desses assuntos é puramente teológico ou
puramente científico; portanto uma abordagem integrada deve ser mantida. Mas
porque toda a verdade vem de Deus, idealmente não deve haver nenhum conflito
entre boa Ciência e boa Teologia, e nenhuma distinção entre verdade “sagrada” e
“secular”.
A im plicação é que os cristãos devem valorizar tanto a Ciência quanto a
Teologia. E indo além da pergunta, “isto é bíblicoT' nós devemos perguntar
“isto é verdadeiroT' Toda Escritura é verdadeira, mas nem toda verdade está
contida na Escritura. Educadores responsáveis estudam tanto a revelação
especial quanto a geral para entenderem a criação de Deus e projetarem um
m inistério de acordo com o modo como Deus projetou seu mundo.

Estruturando as perguntas
Como as questões são estruturadas é algo crítico. Dois sacerdotes estavam
debatendo se era admissível orar e fumar ao mesmo tempo ou não. A discussão
deles tornou-se tão controversa que eles decidiram pedir ao papa para ser o
m ediador da questão. Cada um deles escreveu ao Santo Padre, perguntando a
sua opinião, mas eles ficaram impressionados quando compararam as respostas
as suas questões. O papa concordava com ambos sacerdotes! “ Com o você
colocou a questão?”, o primeiro perguntou. O outro respondeu, “Eu perguntei
se era adm issível fumar enquanto se ora. Sua Santidade afirmou que não era,
porque orar era uma coisa muito séria. Como você fez a sua pergunta?”
O primeiro explicou, “Eu perguntei se era admissível orar enquanto se fumava,
e Sua Santidade afirmou que sim, pois a oração é sempre aceitável” .
A m aneira como a questão é feita determ inará a resposta que obterem os.
Questões sobre Educação Cristã podem ser estruturadas de maneira que sejam
teológicas ou científicas. A chave de tudo é manter um equilíbrio que perm ita
que ambas as fontes passem inform ação para nossa filosofia de educação.
A m pliar as questões para além de “Qual é a maneira bíblica de ensinar?” per­
mite que perguntemos, “Como as pessoas aprendem e crescem ?” e nos capa­
cita a usar tanto as Ciências Sociais quanto a Teologia para construir a nossa
filosofia de educação.
Q uestões B ásicas 17

O PROPÓSITO DA EDUCAÇÃO CRISTÃ


A Educação Cristã, definida de m aneira simples, é o m inistério de levar o
crente à maturidade em Jesus Cristo. A questão prática da disciplina é “Qual é
a melhor maneira de levar os cristãos a crescerem em direção à maturidade?”
Essa definição sugere três conceitos-chave: ministério, crentes e propósito.

M inistério
A Educação Cristã é um ministério, um meio de servir a outros. O foco do
m inistério educacional é servir ao corpo de Cristo por meio do ensino. Há
obstáculos éticos sobre o que podemos fazer em programas educacionais. Os
métodos não devem nunca ser manipulativos ou autoritários; antes, eles devem
servir aos outros ao capacitá-los a aprender. Quando Jesus viu a multidão, como
relatado em Marcos 6.34, ele teve
A Educação Cristã, definida de
compaixão deles porque ele os viu
maneira simples, é o ministério
como ovelhas sem pastor. Ele ex­
de levar o crente à maturidade
pressou sua compaixão ao ensiná-
em Jesus Cristo.
los. O coração do educador cristão
deve ser motivado pelo amor. Ainda que ninguém tenha uma motivação absoluta­
mente pura, mesmo assim o crescente desejo de nosso coração deve ser o de ver
pessoas crescendo na fé. Nosso ministério educacional não deve ser egoísta, mas
um serviço aos outros. O ensino deveria ser apresentado como um dom de amor
aos outros. Somente essa motivação é digna do adjetivo cristã.

Crentes
A definição sugere que a Educação Cristã deve ser orientada em direção
aos crentes. Em sua forma pura, a Educação Cristã começa onde aevangelização
term ina, ajudando crentes a crescer na fé. O foco e projeto dos m inistérios
educacionais deve ser direcionado aos crentes.
Há uma história um tanto quanto longa de evangelização por meio da Educa­
ção Cristã. O fato de se convidar não-cristãos para os programas educacionais
da igreja para ouvirem o Evangelho tem trazido resultados significantes. No en­
tanto, a igreja não pode se esquecer de que ela funciona prim eiro por causa
18 E nsino e C rescimento

dos crentes, para que possam ser edificados na fé.


U m a parte essencial de edificar crentes na fé é capacitá-los para a
evangelização. O evangelismo está perto do coração de Deus e é um propósito-
chave da igreja. M as os descrentes não se ajuntam em nossas igrejas para
ouvir o Evangelho. A igreja se reúne para adorar a Deus e edificar crentes para
que sejam enviados para testificar e trabalhar em nome de Deus. Portanto, o
foco da Educação Cristã é educar cristãos. Esse deve ser nosso alvo prim ário
e nossa preocupação.

Propósito
A definição tam bém sugere que o propósito do m inistério educacional é
levar crentes à maturidade espiritual. Talvez a m aioria das pessoas concorde
com isso na teoria, mas parece que há tantas definições de maturidade espiritu­
al quanto há grupos cristãos.
Para alguns, maturidade espiritual significa conhecer a Bíblia. Quanto mais
uma pessoa conhece a Bíblia, mais espiritual ele ou ela é. Para outros, m aturi­
dade espiritual significa a habilidade de louvar e adorar. Se as pessoas valori­
zam e amam o louvor a Deus, elas podem ser consideradas maduras. E ainda
para outros, maturidade é piedade. Quanto mais “profundamente” alguém anda
com Deus, mais maduro ele é. Para outros, maturidade significa ação social.
Maturidade espiritual é estar envolvido com o pobre e oprimido, aliviando seus
problemas. E outros dizem que maturidade significa ganhar almas. A pessoa
verdadeiramente espiritual será um evangelista pessoal. E, para outros, maturi­
dade significa experimentar a totalidade do Espírito Santo e exercitar os dons
do Espírito de maneira espetacular.
Sem dúvida, então, os crentes discordam sobre o que significa ser cristão e
o que significa ser maduro espiritualmente. Mas o modo como os propósitos
são definidos determinarão como os ministérios educacionais serão projetados.
O mais desgastante é que alguns educadores cristãos nunca consideraram a
questão de definir cuidadosamente maturidade espiritual. Além de atrapalhar a
caminhada de uma pessoa com Deus, essa omissão também limitará a habilida­
de de essa pessoa conduzir outros à maturidade. E crucial que os educadores
cristãos considerem como definirão maturidade espiritual.
A Bíblia usa uma variedade de termos e metáforas para descrever maturida­
de espiritual. Termos tais como provado (2 Co 9.13), maduro (E f 4.13), santo
(1 Ts 4.3), e completo (Tg 1.4) referem-se ao conceito de maturidade espiritu-
Q uestões B ásicas 19

al. Metáforas tais como Cristo habitando nos crentes (E f 3.17), permanecendo
em Cristo (Jo 15.5), e crentes andando como Jesus andou (1 Jo 2.6) tam bém
descrevem o conceito de maturidade. Mas nenhuma definição única e simples é
oferecida. Portanto um a definição teológica dever se estabelecida no sentido
de reunir os diferentes dados bíblicos de um modo que seja significativo.
Para os propósitos da Educação Cristã, o conceito de fé ou crença pode
ser usado para determ inar a natureza da m aturidade espiritual. É claro, com
base nos evangelhos, que nosso Senhor valorizava a fé e que ele queria que
seus seguidores tivessem fé. Ele elogiava a fé onde quer que a encontrasse, e
censurava a falta de fé. A Bíblia declara que nós somos salvos por meio da fé
(Rm 1.17) e que sem fé é im possível agradar a Deus (Hb 11.6). O term o fé é
usado de diversas form as para descrever o que Deus deseja em seu povo e é
útil ao descrever o que é maturidade espiritual.

A NATUREZA DA FÉ
Educar para maturidade espiritual significa educar para a fé. Mas qual é a
natureza e a substância da fé? O que a Bíblia quer dizer com o termo fé l
A Escritura fala da fé em três modos diferentes mas de ação interativa. Um
entendimento teológico próprio de maturidade espiritual inclui cada um destes
aspectos de fé: o cognitivo, o afetivo e o volitivo.

Cognitivo
A fé tem um aspecto intelectual {notitia) ou cognitivo. Há um elemento do
conhecimento ou conteúdo da fé. A Escritura afirma que fé significa crer que
certas coisas são verdade. Há um conteúdo para ser crido, e esse conteúdo
tem detalhes. Por exemplo, em 1 Tessalonicenses 4.14 Paulo diz, “Nós cremos
que Jesus m orreu e ressuscitou”, e João 20.31 declara que o propósito do
Evangelho é: “creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus . . . ”
A fé é mais do que um a esperança superficial que não tem substância. A
noção popular de que “você tem de crer” está longe do ensino bíblico segundo
o qual verdadeira fé tem como seu objeto o Deus vivo e sua palavra revelada
na Escritura. Não é suficiente que as pessoas tenham fé. Em quê as pessoas
crêem é tão importante como o fato que elas crêem.
Para alguns cristãos, conteúdo é substituído pela forma. A experiência de fé
20 E nsino e C rescimento

é m ais importante do que o conteúdo da fé. Pessoas são consideradas crentes


sim plesm ente porque elas podem dizer, “eu creio” . Parece haver pouco inte­
resse sobre qual é o conteúdo dessa crença. Mas a Bíblia enfatiza que no que
uma pessoa crê é im portante. Por exem plo, tanto aos Romanos quanto aos
Gálatas, Paulo escreveu para inform ar ou corrigir o conteúdo da crença dos
leitores. A Teologia é importante, e o que uma pessoa crê é significativo.
Se os ministérios educacionais querem ajudar as pessoas a crescerem na fé,
nós devemos nos importar em comunicar o conteúdo da fé. Parte da maturidade
espiritual é o conhecim ento de Deus e o conhecim ento da sua Palavra. É
impossível ser maduro espiritualmente e ignorante sobre as verdades da Palavra
de Deus. A maturidade espiritual depende do conhecimento do que Deus disse.
A crença ortodoxa mantém -se fiel ao correto conteúdo da fé, crenças que
foram identificadas e descritas pelos vários concílios da igreja através da
História. Heresia é crer em conceitos que não são ortodoxos. Os evangélicos
devem continuar a se im portar com a ortodoxia. Nós devemos nos interessar
tanto pelo fato da fé quanto pelo conteúdo da fé.
U m a redescoberta da Teologia ajudará a evitar uma Educação C ristã que
não está interessada no conteúdo e que pode, portanto, inadvertidam ente
introduzir heresias dentro da igreja. Um ministério de Educação Cristã que ajuda
pessoas a crescer na fé estará interessado em ensinar o conteúdo da fé
acuradamente.

Relacionai
A B íblia tam bém fala de fé como em ocional {assensus) ou relacionai. A
epístola de Tiago adverte contra os perigos de se ter uma fé que é somente
conteúdo e nos diz que ortodoxia sozinha não é suficiente. O conteúdo que é
crido deve tam bém capturar o coração e a vontade do crente.
A verdadeira fé faz com que concordemos com a veracidade do objeto da
fé e nos faz ter o coração controlado. A B íblia descreve isso como crer em
Deus ou em Jesus. Essa construção lingüística {pisteuo eis) é particular do
Novo Testamento, implicando um diferente tipo de crença, diferente da noção
helenística tradicional que separa crença do compromisso.
João 1.12 refere-se “aos que crêem em seu nom e” . Em Gálatas 2.16 Paulo
diz que “também temos crido em Cristo Jesus” . Assim “crença em” vai além do
aspecto intelectual da crença e apela para um a crença que acarreta um com ­
promisso emocional com o objeto da fé de alguém.
O m aior de todos os m andam entos é que amem os ao Senhor nosso Deus
Q uestões B ásicas 21

com todo 0 nosso coração e com toda a nossa alm a e com toda a nossa força
(Dt 6.5). Isso requer um a fé que é relacionai e viva para com D eus, não um
intelectualism o desinteressado. O que um a pessoa crê é im portante, mas o
comprometimento de coração é igualmente importante. O crente maduro terá
um coração que am a a Deus, deleita-se em conhecê-lo e deseja agradá-lo de
todas as m aneiras. Não é possível falar de m aturidade espiritual sem essas
qualidades do coração.
Ministérios educacionais que ajudam pessoas a crescerem na fé devem ajudar
pessoas a m overem o coração em direção à Deus. Elas não devem som ente
entender a verdade, mas também serem capturadas pela verdade. Fé significa
um com prom etim ento com a verdade de Deus e um coração que se alegra na
verdade. A distinção entre conteúdo e emoção em fé é a distinção entre crença
passiva e ativa. A igreja deve ensinar de m aneira que as pessoas abracem
ativamente o Evangelho como verdade e significativo para a vida.

Volitivo
A Bíblia também fala da fé como volitiva {fiducia). Esse elemento final da fé
traduz-se em estilo de vida. Fé verdadeira fez com que as pessoas ajam baseadas
no que elas crêem, empregando não somente coração e mente, mas tam bém a
vontade. Nosso Senhor ensinou, “Se me amais, guaifiareis os meus mandamentos’’
(Jo 14.15). O resultado da fé salvadora é obediência a Deus. O teste final sobre
se a fé de alguém é verdadeira é que ela seja expressa por boas obras.
■Em um esforço para proteger a doutrina da justificação pela fé som ente,
algumas pessoas têm entendido mal a natureza da fé, removendo dela qualquer
entendimento ou inclusão de obras. Mas ninguém é justificado por um a fé que
está só, sem boas obras. Efésios 2.8, 9 ensina que a salvação é som ente pela
graça . Mas o versículo 10 enfatiza que “nós somos feitura dele, criados em
Cristo Jesus para boas obras as quais Deus de antem ão preparou para que
andássem os nelas” . N osso Senhor advertiu que se nossa fé não está sendo
expressa em obediência, não é fé verdadeira de maneira alguma (Mt 7.21-23).
As pessoas não podem dizer verdadeiramente que crêem em Jesus a menos
que tenham um com prom isso com ele que se traduz em obediência ativa.
Parte do am or a Deus é um desejo de agradá-lo com obediência. Paulo
descreve seu m inistério como chamando pessoas à “obediência que vem da
fé” (Rm 1.5). A fé bíblica verdadeira finalmente afeta a vontade, levando uma
pessoa a desejar obedecer a Deus. O processo de santificação é aprender a
22 E nsino e C rescimento

tornar-se cada vez mais obediente à Deus. Um a fé que ju stifica deve ter um
aspecto desse desejo por obediência residindo dentro de si. Tiago diz-nos
enfaticamente que “assim como o corpo sem o espírito é morto, assim também
a fé sem obras é m orta” (Tg 2.26).

Proclamando o Evangelho
Um entendimento completo da fé tem implicações profundas sobre o modo
como o Evangelho é proclamado. Quando pessoas são convidadas a aceitar o
dom da salvação, deve ser com um entendimento de que fé em Cristo relaciona
crença com comportamento. Receber a Cristo significa mais do que receber os
benefícios da expiação; significa recebê-lo. Significa crer que ele morreu pelos
pecados da hum anidade, am á-lo, e estar determ inado a esforçar-se para
obedecer aos seus mandamentos.
A lgum as igrejas são fracas parcialm ente porque não têm proclam ado o
Evangelho de modo correto. Elas têm convidado pessoas a crerem que Jesus
m orreu por elas (notitia) sem convidá-las a recebê-lo. H á pessoas que pen­
sam que são cristãs porque seus sistem as de crença são ortodoxos. M as os
dem ônios têm um a crença ortodoxa e não são salvos (Tg 2.19)! Deixar de
ensinar que fé não é somente intelectual, mas também afetiva e volitiva, tem
produzido igrejas fracas.
Educadores cristãos devem ensinar o que significa ter fé em Cristo. Nós
devemos entender que pode haver pessoas na igreja que conhecem o conteúdo
da crença cristã, mas não conhecem a Cristo verdadeiram ente. Elas não têm
um coração que se alegra nele, nem uma vontade que seja submissa a ele. Elas
crêem que obediência é para um a classe especial de cristãos que querem ir
mais além com Cristo. Elas reduziram a fé a uma afirmação em forma de credo,
rem ovendo dela o poder de transform ação que tem. Como resultado, a vida
delas não foi mudada, e elas não experim entam o poder de Deus.
Uma educação digna do adjetivo cristã deve ser fiel à Bíblia, proclamando
a totalidade de sua mensagem. Por muito tempo a igreja se conformou em ensinar
um a teologia popular que faz cócegas nos ouvidos, m as que não transform a
vidas. A igreja deve ensinar o que significa ser cristão, seguir a Cristo e ser sal
e luz num mundo faminto. Isto acontecerá somente quando o conceito bíblico
total de fé for ensinado.
Q uestões B ásicas 23

ENSINANDO PARA A MATURIDADE


ESPIRITUAL
A Educação Cristã, como eu a tenho definido (p. 17) entende que a educação
é um m eio eficaz de ajudar pessoas a crescer em direção a um a m aturidade
espiritual. No entanto, essa concepção é feita com o entendim ento que fé é
prim eiram ente um dom de Deus. “N inguém pode dizer Senhor Jesus!, senão
pelo Espírito Santo” (1 Co 12.3). Nós somos totalmente dependentes de Deus
que atrai pessoas para ele e lhes concede o dom da fé.
M esmo assim a igreja é com andada pelo Senhor a ensinar (M t 28.19-20).
Nossa tarefa é descobrir os modos mais eficazes de cumprir a Grande Comissão
aprendendo a educar efetivamente.
Os educadores cristãos supõem que seja possível ajudar pessoas a am adu­
recerem na fé. M as como é esse processo ?
Aparentemente, as pessoas devem acreditar que a experiência de se sentar
nos bancos da igreja e ouvir palestrantes é vital para o crescimento espiritual.
Por que mais gastaríam os tanto tempo fazendo isso? Eu não estou satisfeito
com isso. Há outras coisas que nós podemos fazer educacionalmente para ajudcir
as pessoas a crescerem na fé. Eu creio que nós podemos projetar outros tipos
de experiências para ajudar as pessoas a se desenvolverem como crentes.
Currículo é um plano para desenvolver estratégias para a educação. A figura
2 mostra um exemplo de um currículo modelo. Ainda que esse modelo se pareça
com um a fábrica e não leve em consideração as com plexidades de trabalhar
com pessoas, de fato serve para revelar certos assuntos críticos.

ENTRADA

Como são O que é


os alunos? uma fé
madura?
Figura 2
24 E nsino e C rescimento

É m elhor “entrar” no modelo pela direita, pensando prim eiro no propósito


ou resultado. Eu sugeri que o propósito da Educação Cristã é um a fé bem
desenvolvida que tem componentes cognitivos, afetivos e volitivos.
No lado esquerdo do modelo nós consideramos pessoas, perguntando como
elas são. Aqui, tanto o desenvolvimento psicológico como teológico ajudam-
nos a entender nossos alunos. Nós devem os consultar am bas as fontes para
entender propriam ente como Deus criou as pessoas para aprender.
A parte superior do modelo focaliza o processo educacional, perguntando o
que as pessoas devem experimentar para que cresçam do modo como queremos.
A maioria das pessoas envolvidas em ministérios educacionais desgasta-se com
as questões do processo, sempre tentando encontrar o melhor modo de ensinar.
Estratégias educacionais são melhor determinadas quando nós identificamos
o propósito da educação e as características do aluno. Quanto mais nós
examinarmos a teologia do crescimento espiritual e considerannos como Deus
projetou as pessoas para aprender, mais claras se tornarão as questões do
processo educacional. Não há um modo melhor de ensinar, mas nós podemos
tirar conclusões importantes sobre como nós devemos conduzir o m inistério
educacional da igreja para que as pessoas possam crescer na fé.
CAPÍTULO 2
O ENSINO A PARTIR DE UMA
PERSPECTIVA BÍBLICA
Ted Ward, meu colega de seminário, tem um lema desconcertante: “Educa­
ção C ristã não é educação e nem cristã” . O que ele quer dizer é óbvio. A
Educação Cristã em muitas de suas formas contemporâneas não é nem “cristã”
nem particularmente educativa. A Educação Cristã como uma disciplina tem-se
tornado tão trivializada que muitas escolas cristãs tiraram -nado currículo. E
mais, o que uma vez foi um aspecto importante da vida da igreja é agora visto
por muitos como sendo irrelevante e inofensivo.
M as antes de sim plesm ente expressar desgosto pelo estado atual da
Educação Cristã, nós seremos mais responsáveis se perguntarmos o que a Bíblia
ensina sobre ensinar. Se a Escritura valoriza o m inistério do ensino, a igreja
deve valorizá-lo também. Se o ensino é importante numa perspectiva bíblica,
deve ser também importante em nossa perspectiva para o século 21.
Antes que possam os desenvolver uma abordagem adequada do m inistério
educacional, devem os ter um a visão geral da perspectiva bíblica. Em vez de
tentar um estudo exaustivo, neste capítulo eu forneço uma am ostra de textos
bíblicos-chave e um sumário de uma teologia bíblica do ensino. Meu propósito
é estabelecer a centralidade do ensino como um meio de capacitar as pessoas
a crescerem na fé como cristãos.

O ENSINO NO ANTIGO TESTAMENTO

No Antigo Testamento, o propósito do ensino era que Israel pudesse aprender


a obedecer à lei de Deus para que sua posição distinta como povo de Deus
fosse evidente e Deus fosse glorificado. Ü livro de Deuteronômio repetidamente
enfatiza esse ponto.

Eis que vos tenho ensinado estatutos e juízos, como me mandou o


SENHOR, meu Deus. para que assim façais no meio da terra que passais
a possuir.
Guardai-os, pois, e cumpri-os, porque isto será a vossa sabedoria e o
vosso entendimento perante os olhos dos povos que, ouvindo todos estes
estatutos, dirão: Certamente, este grande povo é gente sábia e inteligente.
26 E nsino e C rescimento

Pois que grande nação liá que tenha deuses tão chegados a si como o
SENHOR, nosso Deus, todas as vezes que o invocamos? E que grande
nação há que tenha estatutos e juízos tão Justos como toda esta lei que eu
hoje vos proponho? (Dt 4.5-8)

O bediência à lei é um tem a constante no Antigo Testamento, ilustrando o


conceito hebraico de aprendizado. Ensino e aprendizado no Antigo Testamento
não envolviam somente a comunicação de informação, mas também instrução
na vontade de Deus e o entendimento de como viver. O professor ensinava o
povo a obedecer aos mandamentos de Deus, não simplesmente a conhecê-los.
De fato, 0 conhecim ento era tão ligado com a ação na mente hebraica que as
pessoas não podiam afirmar saber o que elas não praticavam.
O propósito da obediência de Israel era que Deus pudesse ser honrado e
glorificado. Em segundo lugar, a obediência devia trazer paz e conforto a Israel.
Am bos deveriam ser resultados do ensino, mas a questão prim ária era que
Deus fosse louvado.
A esse tema Deuteronômio 6 acrescenta o princípio de que o contexto para
a instrução é o lar. O Shema (vs. 4-9) sugere um padrão de instrução que
focaliza a responsabilidade dos pais em inculcar os mandamentos de Deus em
seus filhos. Seria errado sugerir que essa passagem prescreve um padrão rígi­
do; antes, ela enfatiza a comunicação natural entre pais e filhos. Mas os pais
deveriam ensinar diligentemente os mandamentos de Deus à criança para que
ela vivesse em obediência a Deus.
O Antigo Testamento continuamente enfatiza a responsabilidade do pai em
fornecer treinamento religioso aos seus filhos (Êx 10.2; 12.26; 13.8; Dt6.20ss.).
Por causa dos papéis definidos claramente pelo sexo, e as responsabilidades
restritas das mulheres naquela cultura, a mãe deveria ensinar as meninas. Mas
era a mãe quem dava a educação moral primária para os filhos e dava início aos
rudim entos de sua educação formal (Pv 1.8; 6.20). Nesse sentido, havia uma
parceria verdadeira entre os pais, sendo que ambos tinham responsabilidades
na educação das crianças no lar.
Deuteronômio 31 fornece orientações para a instrução pública na Palavra
de Deus, oferecendo orientações adicionais sobre o conceito de aprendizado
de uma perspectiva hebraica.

Ordenou-lhes M oisés, dizendo: Ao fim de cada sete anos, precisamente


no ano da remissão, na Festa dos Tabernáculos, quando todo o Israel vier
a comparecer perante o SENHOR, teu Deus, no lugar que este escolher,
lerás esta lei diante de todo o Israel. Ajuntai o povo, os homens, as mulheres.
o E nsino a P artir de uma P erspectiva B íblica 27

os meninos e o estrangeiro que está dentro da vossa cidade, para que


ouçam, e aprendam, e temam o SENHOR, vosso Deus, e cuidem de cum­
prir todas as palavras desta lei; para que seus filhos que não a souberem
ouçam e aprendam a temer o SENHOR, vosso Deus, todos os dias que
viverdes sobre a terra à qual ides, passando o Jordão, para a possuir,
(vers. 10-13)

Essa passagem sugere uma progressão no aprendizado. Prim eiro, o povo


deveria ouvir os mandamentos de Deus. Num a sociedade que nessa época era
iletrada, ensinamento e o aprendizado aconteciam oralmente, assim, a lei deve­
ria ser lida e ouvida. Entendia-se que Deus havia falado ao seu povo por meio
da Lei e esta Lei deveria ser ouvida. Deveria haver um ritual público de leitura
da Lei como um lembrete de que eles formavam o povo do pacto de Deus.
Mas ouvir não é o mesmo que aprender. E bem possível ouvir uma instrução
e deixar de aprendê-la. Estudantes do nosso tempo confirmam essa concepção
m uitas vezes. M oisés afirm a que queria que o povo aprendesse a tem er ao
Senhor. A palavra traduzida “ aprender” (lamath) é a palavra hebraica m ais
comum para o aprendizado. Essa palavra implica uma assimilação subjetiva da
verdade que está sendo aprendida, um a integração da verdade à vida.
O aprendizado deveria ser demonstrado de duas maneiras; por uma mudan­
ça de atitude e por uma m udança de ação. A nova atitude era que o povo
temesse a Deus. O tem or do Senhor era tanto um medo literal dele como Deus
como um respeito apropriado à sua autoridade sobre a vida. O tem or de Deus
é o começo do conhecim ento (Pv 1.7) e expressa a m otivação prim ária para
servir a Deus. Ele tinha de ser visto como um Deus terrível, mas também como
um Deus para ser amado. O hebreu deveria se colocar diante deste Deus em
tem or e reverência, em terror e em amor.
O temor do Senhor deveria ser expresso pela obediência aos mandamentos
de Deus. Uma mudança de coração deveria ser expressa por uma mudança de
comportamento. Somente então poderia ser dito que uma pessoa tinha apren­
dido a Lei de Deus. A prender a Lei de Deus não era algo divorciado da vida,
mas antes algo que controlaria toda a vida.
A função do professor no Antigo Testamento era produzir pessoas obedien­
tes, pessoas motivadas pelo respeito profundo por Deus. O professor deveria
instruir outros nos m andam entos de Deus para que o povo fosse reconhecido
como tendo sido separado por Deus.
Eventualm ente um grupo de professores profissionais em ergiu no Antigo
Testam ento, mas a princípio toda a nação era responsável pelo ensino. Por
meio das várias festas e rituais, os pais e anciãos ensinavam às crianças o con-
28 E nsino e C rescimento

teúdo da Lei e a necessidade de obedecê-la. O estilo de vida com um todo


deveria ser didático em natureza e em função.
M ais tarde emergiu um amplo papel de ensino para os sacerdotes e levitas.
Além disso, como Roland DeVaux explica, “o ensino era dado completamente
a partir da adoração, nas sinagogas, e uma nova classe surgiu, a dos escribas e
m estres da Lei. Essa classe era aberta a todos, sacerdotes e levitas e leigos
igualmente, e fmalmente substituiu a classe sacerdotal na obra do ensino” . '
Em um sentido poder-se-ia dizer que o colapso da vida religiosa de Israel
constituiu um colapso no sistema educacional. As pessoas deveriam ser ensina­
das a obedecer à Lei e assim serem o povo de Deus. Mas havia uma profunda
falta de obediência na nação, e como resultado Deus repetidam ente adm inis­
trava disciplina para levar o povo de volta à obediência. Finalmente emergiu a
classe dos fariseus, com sua ênfase no ensino e na obediência numa tentativa de
fazer a nação retornar a Deus.
A relação do mestre com o aluno no Antigo Testamento era a relação do pai
com o filho. A terminologia em Provérbios sugere esse relacionamento. A edu­
cação não era im pessoal e neutra, mas pessoal e relacionai. A lém do m ais,
Jesus preservou esse padrão em seu relacionamento com seus discípulos.
M as o sistem a educacional estabelecido em Israel desmoronou. O profeta
Jeremias, proclamando o julgamento vindouro à nação, perguntou:

Assim diz 0 SENHOR: Que injustiça acharam vossos pais em mim,


para de mim se afastarem, indo após a nulidade dos ídolos e se tornando
nulos eles mesmos, e sem perguntarem: Onde está o SENHOR, que nos
fez subir da terra do Egito? Que nos guiou através do deserto, por uma
terra de ermos e de covas, por uma terra de sequidão e sombra de morte,
por urna terra em que ninguém transitava e na qual não morava homem
algum? Eu vos introduzí numa terra fértil, para que com ésseis o seu fruto
e o seu bem; mas, depois de terdes entrado nela, vós a contaminastes e da
minha herança fizestes abominação. Os sacerdotes não disseram: Onde
está o SENHOR? E os que tratavam da lei não me conheceram, os pastores
prevaricaram contra mim, os profetas profetizaram por Baal e andaram
atrás de coisas de nenhum proveito. (Jr 2.5-8)

Aqueles que estavam numa posição de liderança profissional tinham se afas­


tado tanto de Deus que não mais o conheciam. Não havia relacionamento pes­
soal com ele, de modo que eles eram verdadeiramente “guias cegos” . Nenhum
sistem a educacional está acim a do povo que trabalha nele. Se os m estres não

Roland Devaux, /írae/(Nova York; McGraw-Hill, 1961), 355.


o E nsino a P artir de uma P erspectiva B íblica 29

tem em ao Senhor e não se alegram nele, o melhor de todos os sistemas educa­


cionais falhará.

O ENSINO NO NOVO TESTAMENTO


No período do N ovo Testam ento, os fariseus estavam tentando restaurar
Israel por m eio de sua m eticulosa aderência à Lei. Eles eram fanáticos pelo
estudo e pela guarda da Lei, mas estavam totalm ente errados em seus ju lg a ­
m entos. M uito da instrução de nosso Senhor a respeito do ensino era uma
resposta aos fariseus e ao modo de eles ensinarem.
M ateus 5.17-20 descreve o relacionam ento de Jesus com a Lei. Ele veio
cum prir a Lei e valorizou grandem ente o lugar dela no reino de Deus. N esse
contexto, ele afirm ou que quem quer que praticasse e ensinasse os m anda­
m entos de D eus seria grande no reino (v. 19). A dupla responsabilidade do
seguidores de Cristo é obedecer aos m andam entos de Deus e ensinar outros
a obedecer. De m odo oposto, aque-
Propriamente entendida, a
les que não obedecem e ensinam ou­
Educação Cristã é um meio
tros a procederem do m esm o modo
decisivo de manter a vida da
serão os m enores no reino.
igreja e levar a igreja para
O educador cristão é responsável
frente. Foi decisivo na vida do
por ensinar a E scritura de um modo
Senhor e tornou-se decisiva
que exija resposta por parte dos que
na vida da igreja.
estão aprendendo. Aulas da Bíblia que
servem som ente para com unicar inform ações, mas não m udam vidas, não
têm parte no reino. O educador cristão deve ser obediente e deve ensinar
outros a serem obedientes também. Ensinar para obediência, de acordo com
nosso Senhor, é um dos ministérios mais importantes, que resulta em grande­
za dentro do reino.
Os evangelhos dão descrições da vida de Jesus que ajudam a determ inar
seus valores. Um incidente registrado em M arcos 6 dem onstra sua visão de
ensino. Quando os apóstolos retornaram de seus ministérios, eles estavam can­
sados e precisando de alimentação. Jesus sugeriu que eles se retirassem por
um pouco e descansassem . M as quando o Filho de Deus estava andando
incarnado na terra, era impossível para ele evitar as multidões.
Ele conduziu os doze a um lugar quieto, mas as multidões haviam chegado
primeiro que eles. A sua resposta às multidões não foi ira, frustração ou conde­
nação. Ele não via essas pessoas como uma interrupção, mas antes como ove-
30 E nsino e C rescimento

lhas sem um pastor (v. 34). Ele estava movido pela compaixão por elas porque
ele as via tanto como vulneráveis quanto sem direção. Ele olhou para eles com
olhos de amor.
Como Jesus expressou sua com paixão para com a m ultidão? M arcos nos
diz que “ele passou a ensinar-lhes m uitas coisas” (v. 34). Desde que Jesus
expressou seu am or pelo ensino, o que se deduz é que uma das coisas mais
am áveis que nós podem os fazer pelos outros é ensiná-los. A judar pessoas a
conhecer a Deus e serem obedientes a ele é talvez o m aior presente que
possam os dar a alguém. Entendida deste modo, a Educação C ristã pode ser
um dos ministérios mais misericordiosos da igreja.
A Grande Com issão de Jesus em M ateus 28.18-20 fornece um a m aior
compreensão de seu entendimento da importância do ensino. Ele começou por
afirm ar que toda a autoridade era sua de direito, proclam ando seu senhorio
sobre toda a criação. Baseado nessa verdade, a tarefa prim ária de todo cristão
é fazer discípulos de todas as nações. O Evangelho com eça com senhorio de
Cristo e é motivado por ele. Qualquer evangelho que não proclame seu senhorio
é um falso evangelho.
Um discípulo é alguém que está comprometido com o Senhor com lealdade
e devoção. O imperativo do mandamento é que devemos estar envolvidos com
0 fazer discípulos. Ao vivermos a vida, nossa tarefa é sempre a mesma.
Sobre esses versículos, D. A. Carson observa:

Batizar e ensinar não são os meios para fazer discípulos, mas eles o
caracterizam. Tem-se em vista a proclamação do evangelho que resultará
em arrependimento e fé, pois matheteuo (“eu discípulo”) envolve tanto
pregação quanto resposta. A resposta do discipulado é o batismo e a
instrução. Portanto, batismo e instrução não são coordenados— seja
gramaticalmente ou conceitualmente— com a ação de fazer discípulos...
O NT dificilm ente pode conceber um discípulo que não seja batizado ou
não seja instruído. De fato, a força desse mandamento é fazer discípulos
de Jesus responsáveis por fazer outros discípulos, uma tarefa caracteriza­
da pelo batismo e instrução.-

Os novos discípulos devem ser primeiro batizados no nome do Pai, do Filho


e do Espírito Santo e então ensinados a obedecer a tudo o que o Senhor tem
com andado. O batism o é o sinal de que aquelas pessoas foram convertidas,
e o ensino é o meio pelo qual os novos convertidos devem ser levados à matu-

- D. A. Carson, '‘Matthew,” em Frank E. Gaebelein, organ. geral do The Expositor's Bible


Commentary, 12 vols. (Grand Rapids: Zondervan, 1984), 8:597.
o E nsino a P artir de uma P erspectiva B íblica 31

ridade. Então, como no Novo Testamento, a obediência aos m andam entos do


Senhor é resultado desejado do ensino. A comissão term ina com a prom essa
da presença de Cristo conosco até o fim dos tempos.
O ensino é central no plano do Senhor, indicando sua centralidade na vida
da igreja. Propriam ente entendida, a Educação Cristã é um meio decisivo de
m anter a vida da igreja e levar a igreja para frente. Foi decisiva na vida do
Senhor e tornou-se decisiva na vida da igreja.
A igreja prim itiva continuou dando ênfase ao ensino. D epois do dia de
Pentecostes, quando três mil pessoas se converteram, Lucas registra que “per-
severavam na doutrina (ensino) dos apóstolos” (A t 2.42). Os m eios usados
para edificar novos convertidos foram a instrução, a comunhão, a adoração e a
comunidade. Ao compartilharem os bens materiais e as refeições, ao orarem e
adorarem juntos, e ao aprenderem juntos, os crentes eram edificados e o povo
da comunidade local estava vendo a realidade do Evangelho sendo vivida diante
deles. Como resultado de seu ensino e relacionam ento com Deus e com os
outros, os crentes eram transformados em novas criaturas em Cristo que podi­
am ser reconhecidas como tal.
Uma educação cristã eficaz não acontece no vácuo; é mais bem realizada no
contexto de relacionam entos de amor e adoração eficaz. O poder do Espírito
Santo estava sobre a com unidade de crentes tanto que vidas estavam sendo
tocadas. O reino não é uma questão de encontrar as técnicas educacionais mais
novas, mas de crentes sendo cheios com o amor por Deus e pelos outros. E o
poder do Espírito Santo na vida dos crentes.

O ENSINO NA IGREJA PRIMITIVA


Paulo descreve a si mesmo como “um pregador, apóstolo e mestre” do Evan­
gelho (2Tm 1.11). Seu ministério era proclamar e ensinar as boas-novas. Clara­
mente, o ensino era um aspecto importante de sua estratégia total de ministério.
C olossenses 1.25-29 fornece um im portante vislum bre da estratégia de
m inistério do apóstolo. No contexto de explicar como ele trabalhou a favor da
igreja, Paulo explica que seu m inistério era sofrim ento (v. 24), proclam ação
(vs. 25-29) e intercessão (2.1-5).
Um aspecto central do ministério de Paulo era a proclamação da Palavra de
Deus. Ele era um servo da igreja porque ele foi antes de tudo um mordomo de
Deus. O único modo de alguém poder efetivam ente servir à igreja é prim eiro
com prom eter-se com o Pai. Essa era a fonte da motivação de Paulo para dar-
se a si mesmo no ministério da Igreja.
32 E nsino e C rescimento

O conteúdo da proclam ação de Paulo era o m istério da plenitude da Pala­


vra, o glorioso mistério que tinha estado escondido, mas agora fora revelado.
O m istério, Paulo disse aos colossenses, “é Cristo em vós, a esperança da
glória” (1.27). O m istério é a chave da vida espiritual, a experiência subjetiva
interior do Cristo habitando em todo o seu povo, judeus e gentios igualmente.
A m ensagem de Paulo era Cristo, e seu m étodo era adm oestação e ensino
com toda sabedoria, para que todos pudessem ser apresentados completos em
Cristo. Admoestação (uma forma de aconselhamento) nesse contexto prova­
velmente se refere à tentativa de Paulo de convencer não-crentes de sua neces­
sidade de Cristo. As exigências da proclamação são profundas, com profundas
im plicações sobre como nós devemos viver. Esse tipo de proclam ação dever
vir com admoestação.
O ensino era requerido porque os m istérios de Cristo não são facilm ente
entendidos e requerem instrução e explicação. Assim era a prática do apóstolo
Paulo de proclamar o Evangelho num novo território e então perm anecer para
ensinar aos convertidos os m istériós de Cristo para que a vida deles pudesse
ser mudada. O apóstolo precisava de sabedoria tanto para entender a mensagem
quanto fazê-la relevante aos ouvintes. Assim, para os judeus Paulo tornou-se
como um judeu para ganhá-los, e para os gentios ele se tom ou como um gentio
para ganhá-los. Dè fato, ele tornou-se “tudo para com todos, com o fim de por
todos os modos, salvar alguns” (1 Co 9.22).
O objetivo dessa proclam ação era que Paulo pudesse apresentar a todos
perfeitos, oumaduros e completos, em Cristo. Uma proclamação e umainstmção
fiel na Palavra eram feitas para que vidas pudessem ser mudadas por meio da
obediência à Palavra.
Um a educação cristã eficaz deve focalizar os mistérios de Deus. Por muito
tem po agora, grande parte da igreja perdeu esse enfoque em seus program as
educacionais; em vez disso-, tem havido um conteúdo projetado para falar-às
necessidades imediatas, mas ao mesmo tempo há um a negligência a respeito
das profundas verdades de Deus. As pessoas não entendem prontam ente a
verdade do Evangelho, e para m uitos a Teologia tornou-se irrelevante. Como
resultado, sua fé está fraca e sua vida destruída. Eles estão m aduros para a
corrupção da heresia e decadência moral porque não há um centro da verdade
em sua fé. A igreja deixou de proclam ar o conteúdo da fé, então as pessoas
não sabem em que acreditai'.
Educadores cristãos eficazes proclamam os mistérios de Deus com toda sabe­
doria, esclarecendo a relevância da verdade bíblica para a vida. Os mistérios de
Deus não são in-elevantes para a vida, mas eles são de fato o único meio de a vida
fazer sentido. Eles fornecem a estrutura pela qual nós podemos entender a vida e
o E nsino a P artir de uma P erspectiva B íblica 33

encontrar o significado último. O apóstolo se mantinha com um pé firmemente


plantado nos mistérios de Deus e o outro nas experiências da vida. Enquanto
ensinava os mistérios, Paulo relacionava a Teologia com a experiência de vida,
mostrando como uma pessoa deveria viver em resposta à verdade. Essa tarefa é a
mesma para o educador cristão moderno. Nós também temos de proclam ar a
verdade de Deus e relacioná-la com a vida das pessoas que nós ensinamos.
Paulo descreveu essa obra como um esforço (Cl 1.29). Não é fácil entender
os mistérios de Deus e relacioná-los às experiências da vida. Educadores cristãos
devem ser biblicam ente profundos e teologicam ente especialistas, e devem
também entender as pessoas. Eles não podem se dar o luxo de somente estudar
o texto; eles devem também estudar as pessoas. Nem podem eles se preocupar
somente com os métodos e esquemas organizacionais sem estar preocupados
com o conteúdo do ensino. Uma educação cristã competente requer visão
teológica e entendimento das pessoas tanto psicologicamente como culturalmente.
M as o melhor da percepção não produzirá pessoas retas por si mesmas. O
poder de Deus deve estar trabalhando para trazer a maturidade espiritual. Paulo
lutou em seu esforço, mas ele entendeu que ele estava em parceria com Cristo.
Cristo estava trabalhando nele. Uma educação cristã produtiva é sempre uma
parceria entre Deus e o educador.
Enquanto Paulo trabalhava para estabelecer igrej as, desenvolver liderança era
essencial. Trabalhando para nomear presbíteros em várias igrejas, Paulo listou
critérios que deveriam ser preenchidos por aqueles que conduziríam as igrejas.
Uma questão essencial era que eles fossem “aptos para ensinar” (1 Tm 3.2). Paulo
ensinou Timóteo, que em troca deveria “transmitir a homens fiéis e também idôneos
para instruir a outros” (2Tm 2.2) as verdades que ele aprendeu de Paulo.
A igreja deveria progredir por meio da evangelização e da educação. Esses
tem as gêmeos são a parte essencial do m inistério da igreja. A m bos são
importantes para o crescimento e a saúde da igreja.

CONCLUSÃO
Essa breve visão geral demonstra que o ensino não é opcional na igreja, mas
um imperativo bíblico a ser obedecido. A forma do ensino pode variar. Escolas
dominicais, por exemplo, não são mandatos bíblicos. Elas são uma forma cul­
turalmente estabelecida nos dois últimos séculos para cumprir o mandato bíbli­
co. Como a igreja ensina está aberto para uma variedade de expressões cultu­
rais, mas que a igreja ensine é algo não-negociável. As Escrituras ordenam que
a igreja eduque seu povo para a maturidade espiritual.
CAPÍTULO 3
MODELANDO NOSSO ENSINO CONFORME
O DE JESUS
Jesus continua sendo o principal exem plo de um professor eficaz. Sua
influência é sentida tão poderosamente hoje como ela foi há dois mil anos. Sua
capacidade de tocar vidas com seus ensinam entos e ajudar pessoas a ver e
entender as questões espirituais serve como um ideal que nós devem os lutar
para atingir. Os métodos e ensinamentos de Jesus eram culturalmente apropriados
para seu contexto, mas eles continuam sendo instrutivos para nós em nosso
contexto. M uitas das coisas que ele fez e disse servem como um modelo para
os educadores cristãos na idade moderna.

O problema do que é normativo


Antes de examinarmos os métodos de ensinamento de Jesus, devemos con­
siderar em que grau Jesus é verdadeiram ente um padrão para os professores
contemporâneos. E apropriado e realístico usar Jesus como um exemplo para
os professores contem porâneos? Nós devem os considerar duas im portantes
questões antes de podermos explorar mais de perto a abordagem de Jesus em
relação ao ensino.
Jesus tinha dentro dele duas naturezas; a hum ana e a divina. Essa união
hipostática das duas naturezas resultou na existência da natureza sui generis de
Jesus (em um a classe por si mes-
ma). Nenhum outro humano pos­ Muito do que Jesus fez e disse
suiu os poderes e as introvisões serve como um modelo para os
que ele possuía. Jesus podia fazer educadores cristãos na idade
m ilagres e entender a vida das moderna.
pessoas antes mesmo de conhecê-las. Por causa desses atributos, Jesus podia
ensinar de maneira que outros não podiam imitar.
Esse problema foi de alguma forma resolvido pela kenosis—o esvaziamento
dele mesmo descrito em Filipenses 2.7. Talvez assim como ele se “fez nada”,
Jesus limitou suas divinas regalias de algumas maneiras, tomando-se dependente
do Pai do mesmo modo que nós. Jesus ensinou que se nós tivéssem os fé nós
poderiam os fazer m ilagres maiores que os dele (Mt 17.20). Teólogos discor­
dam a respeito significado da kenosis, mas o fato de Jesus ter-se esvaziado de
36 E nsino e C rescimento

si mesmo sugere que, enquanto ele estava na terra, suas limitações devem ter
sido semelhantes às nossas,
Uma segunda consideração é que a cultura de Jesus era completamente diferente
da nossa. Jesus ensinou em ambientes abertos, viajando de um lugar para outro,
levando seus discípulos consigo. Porque os rabinos itinerantes eram muito comuns
naquele tempo, a abordagem de Jesus não era incomum. M as poderia essa
abordagem de algum modo ser transferida para a nossa cultura de hoje?
A lguns autores acreditam que havia um plano específico para os seus
ensinamentos, especialmente a respeito do treinamento dos apóstolos— um plano
que é transferível para o nosso contexto. Por exemplo, no seu livro With Chrisl
in lhe School o f Discipleship [Com Cristo na Escola do D iscipulado], Carl
W ilson argumenta que há um modelo definido nos trabalhos de Jesus com os
Doze. Para encontrar o modelo, ele diz, nós devemos primeiro obter um a har­
monia dos evangelhos. Cada um dos quatro evangelhos deve ser integrado dentro
de um todo para que cheguemos a uma clara história da vida de Cristo. Uma
vez que tenhamos feito isso, acredita Wilson, poderemos estudar o modelo das
experiências para os Doze e descobrir o m étodo do discipulado de Jesus.
A abordagem de W ilson é em basada num a harm onização bem -sucedida
dos evangelhos. Mas a harm onia dos evangelhos por melhor que seja é frágil
porque os evangelhos não foram escritos para fornecer a história da vida de
Cristo. Antes, os evangelhos foram escritos como um a declaração teológica
sobre Cristo e são mais bem compreendidos quando lidos independentemente,
procurando a m ensagem interna de cada um. Q uando eles são lidos como
afirm ações teológicas sobre Cristo, nenhum padrão claro da abordagem de
Jesus sobre o treinam ento dos D oze em erge; em vez disso, cada escritor
apresenta um a descrição singular de Cristo que revela os princípios usados
por Cristo como professor. A ssim , procurar por um padrão cronológico do
qual nós possam os derivar um padrão específico para o discipulado é
provavelmente algo inapropriado.
Procurar por princípios em lugar de padrões é uma atitude mais fiel ao modo
como os evangelhos foram registrados. Pareceu bem ao Pai não nos fornecer a
história da vida de Cristo de forma cronológica, e portanto nós não precisamos
procurar por isso. Mas nós podem os pegar a informação que cada escritor
fornece e usá-la para entender os princípios principais que parecem guiar nosso
Senhor como professor.
A Escritura nos ensina que Jesus serve como um exemplo para nós. E-nos
dito que devemos andar “como Jesus andou” (1 Jo 2.6), vivendo nossa vida de
acordo com os princípios que o guiaram. Além do mais, Lucas nos diz que ele
M odelando N osso E nsino C onforme o de J esus 37

registrou “tudo o que Jesus com eçou a fazer e ensinar” (At 1.1). Lucas não
estava preocupado somente com o que Jesus disse, mas também com o que ele
fez. Um estudo de Jesus como professor deve considerar tanto o que ele ensinou
quanto ao modo como ele ensinou. H á pelo menos quatro áreas principais nas
quais Jesus serve como modelo para os professores modernos.

Objetivos: Qual era o alvo primário de Jesus


como professor?

Por ser essa uma questão difícil de responder, é melhor primeiro respondê-la
negativamente— isto é, determinar quais não eram seus objetivos. Parece claro
que não era objetivo de Jesus deixar somente um corpo de verdades. Jesus estava
preocupado com a comunicação do conteúdo, mas isto não parece ter sido sua
preocupação primária. Houve muitas vezes em q u e , como professor, ele pai'ecia
estai' procurando algo mais do que a comunicação de novas informações.
Jesus reinterpretou o Antigo Testamento, oferecendo uma visão mais proflinda
dos significados que ele contém. Mas ele não estabeleceu um a nova teologia.
A ntes, 0 ensino de Jesus era uma extensão da teologia existente enquanto
mostrava ao povo todo um modo inteiramente novo de pensar sobre as verdades
do Antigo Testamento e revelar quem ele era e o seu papel no plano redentivo
do pai. Ele se ateve ao cum prim ento da Lei, e não a um a nova interpretação
teológica dela.
Jam bém não era objetivo de Jesus como professor a sistem atização da
Teologia. Claramente ele estava interessado na verdade coerente e congruente e
no pensam ento lógico, mas não a ponto de isso se tornar sua preocupação
principal. Não há exemplos dele organizando uma verdade teológica de novas
maneiras.' Ele seguiu a interpretação tradicional do Antigo Testamento de acordo
com os costumes judaicos, mas nós nunca lemos que ele formou “classes bíblicas”
para ensinar todo o conselho de Deus.^

' Isso de forma alguma deve ser interpretado como significando que a Teologia Sistemática é
algo sem importância. Devido ao fato de que os humanos são seres lógicos e que as leis de
comunicação requerem lógica, é absolutamente necessário para a igreja sistematizar seu enten­
dimento da revelação divina. O único ponto que eu quero enfatizar é que essa não era uma
preocupação essencial de nosso Senhor como professor.
■'Novamente, eu não quero dizer com isso que o ensino sistemático das Escrituras seja sem
importância ou não-bíblico. Isto serve somente para destacar que essa não era a preocupação
principal de nosso Senhor.
38 E nsino e C rescimento

Jesus seguiu a tradição normal de sua época, que presumia o estudo da Torá,
mas não ofereceu um comentário ou interpretação sobre o Antigo Testamento
em qualquer ordem lógica ou seqüencial.
Qual, então, era seu objetivo como professor? Jesus disse, “eu vim para que
tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10.10). Seu objetivo como professor
era mudar a qualidade de vida de seus alunos, colocando-os num patamar mais
alto de obediência a Deus e num nível maior de santidade. Por ter dado sua vida
por eles (v. 11), Jesus pôde ensiná-los e capacitá-los a viver de uma nova maneira.
O propósito de Jesus como professor era influenciar as experiências de seus
alunos para que a vida deles fosse diferente. Ele queria que eles experimentassem
a Deus como Pai e vivessem na realidade desse relacionamento. Jesus queria
que eles vivessem retamente em obediência aos m andam entos de Deus e
experimentassem a vida completa em relação a Deus. Seu objetivo como professor
era tocar a vida de seus alunos.
Alguns professores confundem NÓS não podemos mudar vidas,
m eio s com fin s. E les som ente mas nossa responsabilidade é
enfocam os métodos e se esquecem ensinar para que Deus possa
dos objetivos. Ensinar a Bíblia é um usar nossos esforços para levar
método; mudar vidas é um objetivo. nossos alunos à maturidade.
A razão pela qual nós ensinamos na Maturidade, bem entendida,
igreja é que vidas sejam transforma­ significa uma vida mudada.
das. A razão pela qual nós promove­
mos estudos bíblicos é que vidas sejam transformadas. A razão pela qual nós
estabelecemos Escolas Dominicais, grupos de jovens, grupos de solteiros, e ou­
tros programas educacionais é que vidas sejam transformadas.
Quando o objetivo se tornar mudar a vida dos alunos, o foco e as atividades
do professor serão influenciados. Jesus não era obcecado pelo “cumprimento
do conteúdo”, pois este não era seu objetivo. Ele podia gastar tempo ouvindo
seus alunos e interagindo com eles porque sua agenda era a vida deles, e não
um conteúdo a ser cumprido.
Professores atuais devem aprender com esse exemplo. Nós devem os nos
lem brar que nossos objetivos vão além da com unicação de um conteúdo e
deve chegar até à resposta do aluno àquele conteúdo ensinado. N ós não
podemos nos satisfazer apenas com o fato de que nossos alunos “conhecem a
verdade”. Nossos alunos devem viver a verdade. Somente então podemos dizer
que nosso ensino foi bem-sucedido.
Mas é algo realista esperar que nosso ensinamento traga mudanças de vidas?
Podemos esperar tocar a vida de outros, levando-os a serem mais retos e mais
M odelando N osso E nsino C onfoilmh o de J esus 39

obedientes a Deus? Podemos realm ente causar esse tipo de resposta em nos­
sos alunos? A resposta é simples; nós não podemos m udar vidas. M as o con­
teúdo da Escritura ensinada no poder do Espírito Santo muda vidas. Deus pode
usar nosso ensinamento para fazer mudanças.
A Educação Cristã é mais bem entendida como uma parceria educacional
com Deus. Nós somos responsáveis por ensinar outros fazendo o m elhor que
pudermos, esforçando-nos para ajudá-los a entender a Palavra de Deus e obe­
decer a ela. O Espírito Santo é responsável por usar nossos esforços para
tocar o coração de nossos alunos e conduzi-los a um relacionamento obediente
com 0 Pai. Nós devemos ensinar como se isso dependesse de nós, entendendo
que se os alunos de fato responderem ao ensino é por causa da graça de Deus
na vida deles. Nós não podemos m udar vidas, mas nossa responsabilidade é
ensinar para que Deus possa usar nossos esforços para levar nossos alunos à
maturidade. Maturidade, bem entendida, significa uma vida mudada.

Relacionamentos com alunos: em que bases Jesus


aceitava ou rejeitava os alunos?
Jesus respondia diferentemente a pessoas diferentes. Com alguns, Jesus era
gentil e complacente, enquanto com outros ele era duro e condenatório. Jesus
era procurado pelas m ultidões e rejeitado pelos líderes religiosos. O pobre e
oprimido saudava a Jesus como seu herói, enquanto os líderes religiosos o con­
denavam como um herege. Pessoas respondiam a ele de maneiras diferentes, e
ele respondia às pessoas em formas variadas. O que determinava o modo como
Jesus aceitava ou rejeitava as pessoas?
O encontro de Jesus com Zaqueu, registrado em Lucas 19.1-10, fornece
um entendimento sobre essa questão. Zaqueu era um rico coletor de impostos
e, por própria confissão, um trapaceiro. Quando Jesus viu Zaqueu na árvore,
ele lhe disse para descer porque ele iria jantar em sua casa.
O povo reclamou porque Zaqueu era um “pecador” (v. 17). As pessoas con­
sideraram uma ofensa que Jesus se associasse com um homem com aquele.
Elas destacaram o que estava errado com aquele homem, chamando-o de pe­
cador. M as Jesus ponderou sobre o que era bom em Zaqueu, observando,
“também este é filho de Abraão” (v. 9). Enquanto a multidão via Zaqueu como
um pecador, Jesus via-o como um descendente de Abraão.
Zaqueu respondeu com um arrependim ento verdadeiro. Sua vida foi tão
m udada que imediatam ente ele prom eteu vender suas propriedades e dar aos
pobres a fim de reparar com juros os erros que ele tinha cometido. Sua conver-
40 E nsino e C rescimento

são foi tão profunda que mesmo sua carteira foi afetada! A aceitação de Zaqueu
por parte de Jesus enquanto todos os outros o rejeitaram foi um a afirm ação
poderosa que tocou Zaqueu profundamente.
O texto sobre a mulher pega em adultério (Jo 8.3-11) é bastante discutido,
que não aparece nos manuscritos mais antigos, mas ainda assim é considerado
confiável por muitos estudiosos do Novo Testamento.'’ Quase todos concordam
em que a história é autêntica; é a localização e a colocação das palavras que
estão em questão. Mas a história nos ajuda com mais informação sobre como
nosso Senhor se relacionava com as pessoas.
Os líderes religiosos levaram a Jesus uma mulher que tinha sido pega em ato
de adultério. Eles deixaram o homem ir embora, mas a mulher ímpia deveria ser
punida. (Já naquela época era aceito o padrão duplo em relação ao m odo de
tratar as mulheres e os homens.) Os líderes estavam somente usando a mulher
como um a peça no jogo que eles estavam fazendo para apanhar Jesus numa
armadilha. Eles queriam colocar Jesus na difícil posição de ter escolher entre a
lei judaica, que mandava apedrejar, e o governo romano, que tinha a aplicação
da pena capital como direito exclusivo seu. Se Jesus concordasse que ela fosse
apedrejada como a lei judaica exigia, ele estaria em conflito com Roma. Se ele
pedisse tolerância e complacência, ele estaria em conflito com a lei judaica.
Quando confrontado com esse desafio, Jesus se abaixou e com eçou a
escrever no chão com o dedo. Ele então se levantou e virou a acusação contra
os líderes religiosos, mostrando a hipocrisia da ação deles. Ele desafiou-os ao
dizer que aquele que não tinha pecado atirasse a prim eira pedra. N ovam ente
Jesus se abaixou e começou a escrever no chão.
Não nos é dito o que ele estava escrevendo. O dr. Rufus Jones, ex-
superintendente-geral da Conservative Baptist Home M ission Society, sugere
que talvez Jesus estivesse escrevendo os nomes e as datas de quando aqueles
hom ens acusadores tinham com etido adultério! O convite de Jesus para que
aquele que não tivesse pecado atirasse a prim eira pedra serviu para silenciar a
multidão e fazer com que fossem embora.
Deixado só com a mulher, Jesus teve grande pena dela. Dá para imaginar a
grande humilhação que ela tinha sofrido. Jesus perguntou se havia ainda algum
acusador para condená-la, e quando ela disse que não, Jesus ofereceu seu
perdão, dizendo a ela para ir e deixar sua vida de pecado. Isso não quer dizer
que Jesus simplesmente perdoou o pecado, mas que, embora a lei tivesse vindo
por M oisés, a graça e a verdade vinham por Jesus (Jo 1.17).

^Ver, por exemplo, R. V. G. Tasker, The Gospel According to John (Grand Rapids: Eerdmans,
1960), 1i 0; D. A. Carson, The Gospel According to John (Grand Rapids: Eerdmans, 1991),
M odelando N osso E nsino C onforme o de J esus 41

Que efeito isso teria tido nas pessoas com uns? Pessoas que eram acostu­
madas a ser condenadas e rejeitadas pelos líderes religiosos viram -nos sendo
feitos de tolos pelo novo rabino. Elas tinham de com em orar o que Jesus fize­
ra, vendo finalmente alguém que podia se levantar conta a tirania religiosa que
elas tinham sofrido. A quelas pessoas haviam sido pisadas por muito tem po
pelos hipócritas fariseus que colocavam m ais e m ais peso sobre elas sem
levá-las para mais perto de Deus. Afinal havia alguém que podia ser o advo­
gado deles contra a religião organizada e opressora.
Parece que Jesus não se sentia ofendido pelas pessoas pecadoras. N ão há
dúvida de que tanto Zaqueu quanto essa mulher eram pecadores e que estavam
dolorosamente cientes de suapecaminosidade. Mas Jesus ofereceu-lhes o perdão
em meio à dor que eles sentiam. Enquanto os líderes religiosos pediam a
condenação deles, ele ofereceu-lhes redenção.
O mesm o tipo de história é contada no incidente da m ulher no poço,
registrada em João 4. Enquanto todos evitavam a mulher porque ela tinha tido
cinco m aridos e estava agora vivendo com um outro homem, Jesus teve uma
conversa natural e aberta com ela. Ele a tratou com respeito e lhe disse que ele
era o M essias (v. 26).
Jesus era um ‘‘amigo de pecadores'’ (Mt 11.19), aceitando-os mais do que
aos líderes religiosos. Os pecadores sabiam que Jesus era um homem de Deus,
e mesmo assim eles se sentiam à vontade com ele. Os coletores de impostos e
as prostitutas vinham a ele livremente, e ele era o amigo dessas pessoas. Mas
Jesus tiiúia fortes conflitos com os líderes religiosos.
O evangelho de Marcos registra a degeneração do relacionamento de Jesus
com os líderes religiosos. Marcos 2.1-12 nos conta a cura do paralítico. Todos
se alegraram com a cura do homem, exceto os m estres da lei que estavam
ofendidos porque Jesus tinha afirm ado ser capaz de perdoar pecados. Para
eles, assuntos da lei e da propriedade religiosa eram mais importantes do que o
sofrim ento e a cura. As tradições religiosas eram superiores às questões
humanitárias e a resposta misericordiosa diante do sofrimento humano. De fato,
a tradição deles eram mais im portantes do que mesmo os milagres. Eles não
podiam ou não queriam ver os milagres por causa da sua posição teológica.
M arcos 2.13-17 registra o chamado de Levi. Ele era um coletor de im pos­
tos, um colaborados dos opressores romanos. Mas Jesus chamou-o e o esco­
lheu para com er com ele. Quando Jesus foi criticado por com er e beber com
pecadores, ele explicou que ele tinlia vindo para os pecadores, usando a analogia
de que o doente é que precisa de médico e não o são. Mas os hipócritas mestres
da lei e os fariseus não aceitaram essa explicação. Ele não se viam como
necessitados de redenção.
42 E nsino e C rescimento

Os líderes judeus também desafiaram Jesus porque ele não seguia os rituais
de jeju m (vs. 18-22). Outros rabinos ensinavam e praticavam o jeju m , mas
Jesus ensinou que enquanto ele estava presente era tem po para festejar. Isso
também ia contra os padrões religiosos e teológicos deles.
A m aioria dos conflitos de Jesus com os fariseus estava centrada nas leis
referentes ao sábado. Ele perm itia que seus discípulos colhessem grãos no
sábado, e fínalmente Jesus desafiou completamente os líderes religiosos sobre
0 assunto. M arcos 3.1-6 diz como ele levou o hom em que tinha um a mão
ressequida para diante da congregação. Os olhos de todas as pessoas estavam
fixos nele porque elas entenderam que um confronto direto estava prestes a
acontecer. Suas leis declaravam que nenhum trabalho poderia ser feito no
sábado, e uma cura era classificada como trabalho.
Jesus elevou a confrontação ao nível dos valores básicos ao perguntar, “ E
lícito nos sábados fazer o bem ou fazer o mal? Salvar a vida ou tirá-la? Mas
eles ficaram em silêncio” (Mc 3.4). Não se tratava de um conflito sobre tradições
religiosas, mas sobre valores básicos. As pessoas e suas necessidades eram
mais importantes do que as leis humanas e as tradições? M arcos registra que
Jesus '‘olhou para eles indignado e condoído com a dureza do seu coração”
(Mc 3.5). A observância rígida do sábado era m ais im portante do que a
deformidade daquele homem. Eles defendiam aquela posição com tanto fervor
que após Jesus curar o homem eles saíram do lugar e com eçaram a tram ar
como o matariam.
E evidente que conquanto Jesus fosse um amigo de pecadores, ele não
tolerava hipocrisia religiosa. Quando as pessoas afirmavam amar a Deus, mas
estavam controlando os outros com seu legalismo em nome da religião, isso era
mais do que ele podia tolerar. A atitude hipócrita destes pessoas causou em
Jesus ira em vez de complacência.
N ós, educadores cristãos m odernos, deveriam os aprender, a partir disso,
que nunca devem os rejeitar as pessoas porque são pecadoras. A ntes, para
serm os verdadeiram ente educadores como Cristo, nós devem os aprender a
am ar as pessoas como Jesus o fez. Os program as educacionais deveríam ser
um refúgio para pessoas que têm sido desprezadas pelas religiões oficiais e
pelos líderes religiosos. A educação que é cristã traz perdão e redenção, não
condenação e lei.
E triste que em algumas igrejas os pecadores sejam tratados como objetos—
alm as para serem ganhas em vez de pessoas para serem am adas. Eles são
humilhados, criticados, e tratados com desrespeito, tudo em nome de Cristo.
Q uando eu era professor de faculdade, estava entrevistando pessoas para
M odelando N osso E nsino C onforme o de J esus 43

serem mem bros do corpo docente no meu departamento. Eu entrevistei uma


mulher que queria sair da escola pública e entrar na Educação Cristã. Perguntei-
lhe sobre seu relacionamento com outros professores. Ela disse que havia uma
m ulher que era um a boa amiga, mas não conhecia o Senhor, e ela ainda não
tinha conseguido que ela fosse à sua igreja. Ela então continuou a dizer-me que
o m arido dessa m ulher era proprietário de um bar, e que por várias vezes ela
fora convidada para almoçar no bar. “M as” , disse ela, “claro que eu nunca iria
nesse ‘lugar de bebedeiras' com ela.” Eu fíquei pensando como ela iria então
alcançar aquela am iga se nunca fosse alm oçar com ela e seu m arido no bar.
Mas para essa mulher, não ser vista onde bebidas alcoólicas são servidas era
mais importante do que estabelecer um relacionamento com sua amiga. Eu decidi
então que não queria aquela mulher ensinando no meu departamento.
Jesus era um m estre poderoso porque ele não rejeitava as pessoas só por
elas serem pecadoras. Ele se relacionava com o discrim inado e o rejeitado,
levando-lhes o amor de Deus não somente em palavras, mas também em ações.
Ele escolhería comer com eles, ser visto com eles e ensiná-los. E ele se recusou
a ser controlado por uma organização religiosa caracterizada pela arrogância
em vez de pela misericórdia.
As mais duras palavras registradas dos lábios de Jesus são encontradas em
M ateus 23— palavras dirigidas aos líderes religiosos. Ele não rejeitava a auto­
ridade deles como representantes da Lei (vs. 2-3), o que ele condenava era o
estilo de vida deles. Eles não viviam vidas de compaixão e cuidado pelas pes­
soas ao redor deles. Estavam mais preocupados em manter as tradições religi­
osas do que ministrar às pessoas em sofrimento.
De vez em quando o mesmo problem a emerge em nossas igrejas. Nós en­
contramos aqueles que estão mais preocupados com as tradições e as propri­
edades do que com as pessoas. Nos anos 60 quando Deus agiu entre os jovens
de nossa sociedade no que foi chamado O Movimento de Jesus, muitas igrejas
não aceitavam os novos convertidos porque eles não se vestiam de modo tradi­
cional. As pessoas não eram bem-vindas nas igrejas porque elas não queriam
calçar sapatos ou não usavam gravata. Alguns membros de igreja estavam mais
preocupados com a m oda do que com as pessoas.
Pode ser um a coisa perigosa am ar pecadores e se relacionar com eles.
Além de se ficar exposto às tentações inerentes ao seu estilo de vida, pode-se
tam bém correr o risco de provocar a ira de outros cristãos. A idéia de
separação do m undo está tão im pregnada em alguns crentes que, com o os
fariseus, eles só podem condenar aqueles que tentam oferecer ao m undo a
redenção. M as ser obediente a Cristo e viver em verdadeira retidão requer
amar nosso próxim o como a nós mesmos.
44 E nsino e C rescimento '

Que métodos de ensino parecem principais no


ministério de Jesus?
Claramente Jesus usou uma grande variedade de métodos de ensino. Muitos
são bastante óbvios, como palestras, parábolas, ensinam entos com objetos e
discussões. Outros são menos óbvios, tal como usar a experiência de vida de
seus discípulos e projetar “estágios” para eles. Mas o fato de que Jesus usou
uma grande variedade de métodos de ensino é indiscutível.
A ampla variedade de métodos de ensino que ele usou é instrutiva para nós.
Um ensino eficaz requer uma variedade de métodos, dependendo do conteú­
do, do aluno e da situação. Assim como Jesus variava o modo de ensinar, assim
também nós devemos variar nossa abordagem ao ensinar. Não há nenhum mé­
todo de ensino que possa ser considerado o melhor; não há sequer um método
chamado “bíblico” de ensinar. Existe uma am pla gama de opções, e o mestre
sábio aprenderá a ensinar de várias maneiras.
Jesus parece enfatizar um ensino informal em vez de formal. Claramente era
um costume seu entrar na sinagoga no sábado e ensinar num ambiente formal;
mas o retrato dele que predom ina nos evangelhos é aquele que o mostra como
um professor informal. Ele é visto ensinando no campo, nas estradas, mas prai­
as, em lares e em vários outros ambientes não muito comuns para o ensino.
Enfatizar o ensino informal não quer dizer que o ensino formal seja sempre
ineficaz, mas significa que há um grande poder no ensino informal. Conquanto
as salas de aulas possam ser ambientes importantes para alguns tipos de apren­
dizado, uma educação para mudança de vida ocorre mais freqüentem ente em
contextos m enos formais. A proxim idade do professor com o aluno em um
contexto informal ou não- formal tende a tocar vidas mais eficazmente do que o
relacionamento mais distante da sala de aula formal.
Como professor de seminário, gasto um bom tempo no contexto formal da
sala de aula. M eu ensino é controlado por relógios, program as acadêm icos,
padrões de qualidade e várias outras coisas normalmente associadas com a edu­
cação formal. Eu aceito esses embaraços ao meu ensino, mas também entendo
que o contexto formal da sala de aula limita minha habilidade de ensinar. A sala
de aula não é um contexto muito eficaz para tocar vidas de maneira profunda.
Educadores responsáveis estão sempre interessados em resultados— os tipos
de aprendizado que resulta de nosso ensino. Uma taxonomia muito útil dos resul­
tados do aprendizado foi sugerida por Norman Steineker e M. Robert Bell.'*

Norman W. Steineker e M. Robert Bell. The Experiential Taxononiy: A New Approach to


Teaching and Learning (Nova York: Academic Press, 1979).
M odelando N osso E nsino C onforme o de J esus 45

A taxonomia deles sugere os seguintes níveis de aprendizado:


• Lembrança— eu lembro
• Lembrança e Aprovação— eu gosto
• Lembrança e Especulação— eu penso
• Lembrança e Aplicação— eu experimento
• Lem brança e Adoção— eu adoto

O nível mais baixo é uma simples lembrança, pela qual o aluno é capaz de
lem brar o que foi ensinado. Esse é um sim ples exercício cognitivo, não
relacionado com a vida. A lem brança é necessária para níveis m ais altos de
aprendizado mais tarde, mas é dificilmente capaz de penetrar na vida do aprendiz.
M uitos estudantes desenvolvem uma boa memória e são bem-sucedidos nesse
tipo de aprendizado.
Aprovação envolve não somente a m ente do estudante, mas tam bém seu
com prom isso emocional com o que foi aprendido. O estudante gosta do que
ele lembra, e tem um sentimento positivo sobre a informação. Um aprendizado
eficaz que traz m udança de vida requer um envolvimento tanto afetivo como
cognitivo do aluno.
Especulação é um envolvimento cognitivo com o conteúdo. N esse nível o
aluno pensa sobre como essas idéias podem ser aplicadas em seu contexto.
Ainda não há uma resposta de vida ao conteúdo, mas há um pensamento ativo
sobre o que tem sido aprendido. O envolvimento afetivo do nível dois conduziu
à atividade cognitiva do nível três.
No nível da aplicação, o aluno experimenta o conceito num a situação da
vida real como um resultado do pensam ento do nível três. Esse passo serve
como um campo de teste para a validação da verdade aprendida. A aplicação
pode conduzir à rejeição do conteúdo, ou ao nível final do aprendizado se o
conceito '‘funcionou” na experiência crucial da vida.
A adoção ocorre quando o aluno incorpora o conceito em sua vida. O teste
do nível quatro provou ser positivo, e o aluno agora escolhe integrar esse conceito
na estrutura do seu próprio raciocínio e ação. Este é o últim o passo para o
aprendizado eficaz.
Conteúdos formais de aprendizado são poderosos para ajudar os alunos a
atingir os três prim eiros níveis de aprendizado. Os conceitos podem ser
com unicados de m aneiras agradáveis, e os alunos podem ser conduzidos a
considerar as possíveis aplicações na vida diária. Mas a educação formal tende
a ser m enos eficaz que a educação informal para ajudar os alunos a alcançar
níveis mais altos de aprendizado. Os passos da aplicação e adoção são mais
bem criados por um modo mais informal de ensino. O contato pessoal da
46 E nsino e C rescimento

instrução inform al é suprem am ente mais poderoso do que m odos de ensino


mais restritamente formais. Talvez tenha sido por isso que nosso Senhor esco­
lheu ensinar por métodos informais.
Jesus também enfatizou o estabelecimento e a manutenção de relacionamentos
com alunos como um método principal de ensino. Ele escolheu doze para “estarem
com ele” (Mc 3.14), observando-o e interagindo com ele enquanto cumpria seu
ministério. Enquanto ensinava, ele entrava em relacionamentos com as pessoas,
tocando a vida delas com a proxim idade da intimidade.
O evangelho de João fornece um a im pressionante descrição da natureza
relacionai do m inistério de Jesus. O prólogo de João apresenta a idéia da
encarnação com a notável observação de que “o Verbo [logos] se fez carne e
habitou entre nós” (Jo 1.14). Enviado ao mundo pelo Pai, o Verbo tomou forma
humana e entrou em relacionamento conosco ao mudar-se para a nossa vizinhança
e viver como um de nós.
Mas qual era o programa educacional do Filho de Deus? Como ele cumpriu
sua tarefa de ensinar a humanidade sobre o Pai e o Evangelho do Filho? João 2
diz que ele foi a uma festa de casamento. Talvez o que é mais impressionante é
que nós não sabemos quem se casou. Tratava-se de um casal anônimo de Caná
da Galiléia, uma cidade pequena e sem importância. O casal não podia pagar
por um suprim ento adequado de vinho (um problem a sem dúvida agravado
com a chegada de um rabino itinerante e seus sedentos discípulos).
Enquanto no casam ento, Jesus escolheu decidiu fazer o prim eiro de seus
sinais m ilagrosos. O fato de transform ar a água em vinho tinha maiores
implicações do que providenciar bebida para a recepção do casamento, ü simples
fato de ele ter ido ao casamento é instrutivo em si mesmo. Quando ele poderia
ter promovido grandes encontros públicos ou conferências importantes com os
religiosos e líderes políticos, ele escolheu ir ao casamento de amigos da família.
O capítulo 3 do evangelho de João nos diz que ele conversou a noite inteira
com um hom em sobre sua necessidade de regeneração. N icodem os era um
membro da concilio judaico, mas o foco da conversa deles era altamente pessoal.
Em vez de falar com o grupo político, Jesus falou som ente com um homem
nessa noite. Essa conversa frutificou numa poderosa teologia para a igreja, mas
é significante que o contexto no qual isso aconteceu foi o de uma conversa
particular com um homem. A descrição que emerge da narrativa do evangelho
é de uma abordagem de ministério relacionai.
O capítulo 4 registra uma outra conversa íntima, dessa vez com uma mulher
cuja vida pessoal estava em desordem e cuja moralidade estava falida. A mulher
samaritana tinha tido cinco maridos e estava no momento vivendo com um sexto
homem. Sem dúvida ela era rejeitada pela sociedade, uma pessoa evitada por
M odelando N osso E nsino C onforme o de J esus 47

cidadãos respeitáveis. Mas quando o Verbo se fez carne, ele escolheu entrar em
relacionamento com ela, dizendo-lhe que ele era o Messias prometido (Jo 4.26).
Nenhum judeu tinha negócios com samaritanos, ainda mais alguém da classe
dela. Apesar disso, ele foi até ela, e foi para ela que ele falou sobre a água viva.
O resultado desse relacionamento foi que muitos samaritanos acreditaram
nele. Eles-primeiro ouviram a descrição que a mulher fez do encontro, e então
experimentaram a Jesus por si mesmos. Eles ouviram suas palavras no contexto
de seu relacionam ento com eles e isso provou a verdade de seu ensino.
O capítulo 5 registra sua entrada em Jerusalém. Parece lógico que quando o
Verbo entrou na história humana ele deveria ir para o trono de poder na região
onde ele vivia. Mas João nos diz que quando ele entrou em Jerusalém ele foi à
piscina de Betesda e conversou com um paralítico, um homem que tinha estado
naquela condição há 3 8 anos! Mesmo no centro urbano de seu mundo, ele escolheu
entrar num relacionamento com uma das pessoas mais simples que lá havia.
O educador cristão m oderno deve aprender com esse exem plo que um
ministério eficaz envolve tanto relacionamentos como conteúdo. Ministérios de
ensino desprovidos de contato pessoal são somente parcialmente bem-sucedidos
em seu poder de m udar vidas. Com unicadores poderosos podem se eficazes
em instruir outros sobre assuntos de doutrina e vida cristã, mas os resultados
de m udança profunda de vida norm alm ente ocorrem no contexto dos
relacionam entos humanos. Porque somos chamados para amar. nós som os
chamados a um envolvimento relacionai com os outros. E impossível amar as
pessoas sem nos envolvermos com elas.
Há um a tentação sutil de estabelecer program as educacionais em nossas
igrejas, exigir que as pessoas os apóiem, e insistir em que a freqüência será
um a marca de espiritualidade. Essa atitude inverte a noção de educação como
serviço ao povo; isso força as pessoas a servirem à educação. A educação
que é cristã procede da base do amor às pessoas, procurando seus m elhores
interesses e preocupações, não exigindo que sirvam aos programas.

Qual era o papel do conteúdo no


ensino de Jesus?

Embora para Jesus deixar um corpo doutrinário organizado não fosse uma
questão primária, ele tinha uma verdade proposicional a comunicar. O conteú­
do teve um importante papel em seu ministério enquanto procurava alcançar
sua geração e as gerações que viriam . Várias observações podem ser feitas
sobre o uso do conteúdo em seu ministério de ensino.
Jesus referia-se ao Antigo Testamento regularmente e é evidente que ele eria
48 E nsino e C rescimento

que ele fosse verdadeiro. Ele aceitava a autoridade da Escritura sobre a conduta
humana, regularmente exortando, “Está escrito... ”, assim indicando a natureza
autoritativa da Palavra de Deus. Além do mais, ele cria na fidelidade das histó­
rias do Antigo Testamento. Por exemplo, ele ensinou sobre a sua própria ressur­
reição dos m ortos ao usar a analogia de Jonas na barriga do peixe (M t 12.39-
42). Ele regularmente ensinava com base nas Escrituras. Não há qualquer indi­
cação de que ele duvidasse da veracidade ou exatidão histórica do texto.
.Tesus acreditava que o testemunho da Escritura era o testemunho de Deus,
que Deus era o verdadeiro autor da Escritura. Ele reconhecia os autores humanos
mas cria que atrás deles estava o autor divino. Portanto ele poderia tanto dizer,
“M oisés disse” ou “Deus disse,” porque para ele os dois eram o mesmo. Além
do m ais, ele argum entou que a “Escritura não pode falhar” (Jo 10.35) e que
“ até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jam ais passará da Lei, até
que tudo se cum pra” (M t 5.18).
Talvez ele tenha feito os ataques mais mordazes aos líderes religiosos quando
perguntou-lhes, “Não lestes. . . ?” (M t 12.3, 5). Sua m ensagem era clara: se
eles deviam conduzir as pessoas, eles deveriam conhecer a Escritura. Se eles
eram povo de Deus, deveriam co­
Uma Educação Cristã eficaz
nhecer a Palavra de Deus.
conduz o povo para o estudo da
Um conflito também se levantou
Bíblia como um meio de
sobre a questão de autoridade. Os
crescimento, não como um fim
fariseus nivelaram suas tradições
em si mesmo. Um estudo fiel da
com a autoridade das Escrituras,
acreditando que ambas deveriam ser
Bíblia deve ser um meio de
obedecidas. Mas nosso Senhor fez
aprendizado para conhecer e
distinções fortes entre as tradições
obedecer a Deus.
dos homens e os mandamentos de Deus (Mc 7.1-12), distinguindo entre o que
M oisés havia dito (v. 10) e o que os fariseus diziam (v. 11). Os fariseus criam
que M oisés e “os anciãos” (os fundadores históricos do Farisaísmo) eram não
só comparáveis, mas exatamente iguais. Jesus via isso como um conflito entre a
autoridade de Deus e a autoridade humana.
Jesus estava interessado no conteúdo do ensino, mas o conteúdo teria de
ser a Palavra de Deus revelada na Escritura. N um a era em que alguns cristãos
estão questionando a veracidade da Escritura, é instrutivo lembrar que nosso
Senhor tanto acreditava na veracidade da Escritura como tam bém ensinava
isso. Ele não se im portava com questões da “baixa ou alta crítica” , mas
acreditava no significado manifesto da Escritura. Além disso, ele fez uma distinção
entre as tradições religiosas dos fariseus e a Palavra de Deus. A prim eira era
humana e a última divina.
M odelando N osso E nsino C onforme o de J esus 49

Educadores que seguem o modo de ensino de Jesus ensinarão a Bíblia com


confiança e autoridade e distinguirão entre as tradições da igreja e a Palavra de
Deus. Educadores cristãos eficazes devem estar convencidos da validade da
Escritura e serem capazes de distinguir a Palavra de Deus da tradição humana.
Jesus cria que a Escritura era verdadeira, mas ele entendia que ela era um
meio pai'a um fim, e não um fim em si mesma. Ele advertiu contra a possibilidade
de superexaltá-la ao fazer dela um fim em si mesma (Jo 5.39-40). O propósito
da Escritura é cham ar a atenção das pessoas para Cristo. E verdade que hoje
muitas pessoas têm uma visão deficiente da Escritura, não a aceitando como de
fato Palavra escrita de Deus. M as há outros com um a visão alta dem ais da
Escritura, vendo-a quase como um objeto de reverência. John Stott observa
que estes “se tornam tão absorvidos na própria Escritura que perdem de vista
seu propósito, que é manifestar Cristo para eles” .^
E também possível usar o estudo bíblico como um modo de escapar de nos­
sas responsabilidades como crentes. Pode ser “ seguro’' correr de um estudo
bíblico para outro, assim eficazmente retirando-nos de qualquer ministério ativo
ou envolvimento com pessoas. A última coisa que alguns crentes precisam é de
mais estudo bíblico; antes, o que é necessário é ter nossa vida transformada pela
Bíblia. Uma Educação Cristã eficaz conduz o povo para o estudo da Bíblia
como um meio de crescimento, não como um fim em si mesmo. Um estudo fiel
da Bíblia deve ser um meio de aprendizado para conhecer e obedecer a Deus.
Quando Jesus foi levado a Pilatos para ser julgado, Pilatos examinou-o para
determ inar se havia um a justificativa para sua execução. Ele concluiu, “Não
vejo neste homem crime algum ” (Lc 23.4). Mas os judeus gritavam para que
fosse crucificado, insistindo, “Ele alvoroça o povo, ensinando por toda a Judéia,
desde a G aliléia, onde com eçou, até aqui” (v. 5). A acusação feita contra ele
era que ele era um professor dinâmico! Seu ensino alvoroçava as pessoas,
fazendo-as pensar e se com portar de modo diferente.
Infelizmente essa acusação é raramente feita ao ministério de ensino de nossas
igrejas. Nós somos acusados de incompetência e irrelevância— duas acusações
que podem ser duramente precisas. Nós ensinamos lições não relacionadas com a
vida, e nós o fazemos de uma maneira bem pobre. Nós deixamos de engajar o
coração e a mente das pessoas como nosso Senlror fez e somos inclinados a isolá-
las em vez de influenciá-las para Deus. Olho para o ministério de ensino de Jesus e
vejo princípios que fizeram dele um professor dinâmico. Esses mesmos princípios
podem ser incorporados ao ministério educacional hoje. Nós precisamos de uma
aplicação consciente desses preceitos em nosso ensinamento para que, pela graça
de Deus, nós também possamos alvoroçar as pessoas pelo nosso ensino.

’ John R. W. Stott, Christ, the Contwversialist (Downers Grove; InterVarsity, 1972), 90.
CAPÍTULO 4
ENTENDENDO DEUS, ENTENDENDO AS
PESSOAS
Educadores cristãos trabalharam duro para entender o ser humano— como
nós aprendem os, como nós nos desenvolvem os, por que reagim os do m odo
como reagimos. O educador cristão moderno claramente deve entender alguma
coisa de Psicologia, procurando com preender a natureza das pessoas. M as
não tem havido um esforço igual para entender a natureza do D eus que nós
servim os e cujas características nós devem os imitar. Não é de adm irar que a
nossa fé seja freqüentemente frágil e nossa adoração não inspirada. Tendemos
a colocar maior ênfase em entender as pessoas do que em entender Deus. Nós
devemos aprender a fazer ambos com igual fervor.
Tentativas de construir uma teologia de Educação Cristã têm normalmente
c o m e ç a d o n a a re n a de ^
^ . . . O entendimento de como Deus e dara
Eclesiologiaporque aigreia , x ■
. X j ■
e o contexto do crescimento
: forma ao nosso entendimento do que
. - -x . , .
^ ^ X X ' significa
e sp iritu a l.' O contexto e ^
ser espiritualmente maduro e
importante, mas essa ênfase ''«vemos ajudar os crentes a
tem sido feita à custa de
assuntos mais profundos— a natureza da m aturidade espiritual e o caráter de
Deus. Prim eiro devem os explorar o conceito mais básico de como Deus é,
então nós poderem os nos mover para considerar o contexto. O entendimento
de com o Deus é dará form a ao nosso entendim ento do que significa ser
espiritualm ente m aduro e como nós devem os ajudar os crentes a crescer em
direção à maturidade. Além do mais, o conhecimento de como Deus é ajuda os
crentes a manterem -se longe da idolatria, especificamente a idolatria de criar
Deus à nossa imagem, em lugar de aceitá-lo como ele é.

A SANTIDADE DE DEUS
Em um sentido, o atributo da santidade de Deus é central para todos os seus
outros atributos. A santidade de Deus pode ser entendida como o modificador
ou o identificador de tudo o que Deus é. Seu amor é um amor santo; sua graça,
uma graça santa; sua ira, uma ira santa, sua justiça uma justiça santa.

' Ver, por cxemp\o, SharpeningtheFociis qfíhe Church, de Gene Getz (Chicago: Moody, Press.
1974) ; A Theology ofChrislian Education, de Lawrence O. Richards (Grand Rapids; Zondervan,
1975) .
52 E nsino e C rescimento

A teologia contem porânea tende a enfatizar o amor de Deus como sua ca­
racterística central. De fato a Escritura enfatiza a maravilha da profundidade e
am plitude e altura do amor de Deus (E f 3.18-19). Mas nós tem os enfocado
tanto o amor de Deus que nós deixamos de entender que sob seu amor está sua
santidade. Seu amor é tão impressionante porque é um amor santo.
Talvez a santidade de Deus tenha sido ignorada nos últimos anos por causa
de sua associação necessária com sua justiça. Se Deus é totalm ente santo, ele
deve ser também justo, punindo o pecado como uma afronta a sua pureza moral.
Parece m ais seguro acreditar num Deus amoroso e gentil do que num Deus
santo e justo que julga o pecado de acordo com sua justiça. Pode ser que por
e ssa ra z ão a sa n tid ad e de D eus te n h a sid o ig n o ra d a nas te o lo g ia s
contem porâneas da Educação Cristã. Mas o que diz a Escritura?
A visão de Isaías da presença de Deus incluía serafins que clam avam ,
“ Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos; toda terra está cheia de sua
glória” (Is 6.3). Similarmente, quando João olhou para dentro das cortinas do
céu, ele ouviu as quatro criaturas ao redor do trono dizendo incessantemente,
“ Santo, santo, santo é o Senhor Deus poderoso, aquele que era, que é, e que
há de v ir’' (Ap 4.8).
O enfoque da adoração nos céus é Deus e sua santidade. E o atributo da
santidade, acima de todos os outros, que estimula a adoração celestial. Somente
o atributo da santidade é elevado ao nível do triplo pronunciamento, mostrando
a im portância colocada nela. A Escritura usa a repetição como um recurso
literário para enfatizar a santidade. R. C. Sproul observa:

Somente uma vez na Escritura sagrada um atributo de Deus é elevado


ao terceiro grau. . . . Somente uma vez uma característica de Deus é
mencionada três vezes em uma sucessão. A Bíblia diz que Deus é santo,
santo, santo. . . . A Bíblia nunca diz que Deus é amor, amor, amor, ou
misericórdia, misericórdia, misericórdia, ou ira, ira, ira, ou justiça, justiça,
justiça. A Escritura diz que ele é santo, santo, santo, toda terra está cheia
da sua glória.-

Especialmente no Antigo Testamento, Deus parece querer esse atributo co­


nhecido acima de todos os outros. Thiessen escreveu que a santidade de Deus

é enfatizada pelos limites colocados no Monte Sinai, quando Deus des­


ceu sobre a montanha. . . .pela divisão do tabernáculo e do templo em

- R. C. Sproul, The Holiness of God{VTheaXon, 111.: Tyndale House. 1985), 40.


E ntendendo D fxis, E ntendendo as P essoas 53

lugar santo e santo dos santos. . ., pelas ofertas prescritas que deviam ser
levadas quando um israelita quisesse se aproximar de Deus. . . , pela
instituição de um sacerdócio especial para mediar entre Deus e o povo . .
. , pelas diversas leis sobre impureza. . . , e pelo isolamento de Israel na
Palestina.’

O lugar central dado ao conceito de santidade faz com que esse atributo
seja o princípio regulador de tudo o que Deus é. Ele estabelece seu trono baseado
em sua santidade (SI 47.8), e a santidade define acim a de tudo como Deus é.
Há dois aspectos do conceito de santidade, ambos os quais são centrais ao
entendimento da idéia principal. O primeiro aspecto é que a santidade indica a
posição de Deus ou o relacionamento com tudo o mais. Ela denota que Deus é
separado e absolutamente distinto de toda a sua criação.
O salm ista se refere à M ajestade de Deus (SI 93.1) e Pedro usa esse term o
para se referir à grandeza de Cristo (2Pe 1.16). Referências à majestade divina
são baseadas no conceito deste primeiro significado da santidade e sempre são
convites à adoração. A preender algo da m ajestade de Deus requer adoração
como a resposta mais apropriada.
O segundo aspecto da santidade de Deus, intimamente relacionado com o
prim eiro, é o da absoluta perfeição m oral, isto é. Deus é diferente de tudo o
mais porque ele é completamente sem pecado e é moralmente puro e reto em
tudo o que ele é e faz. A ética da santidade de Deus significa que ele é
absolutam ente separado de qualquer mal ou injustiça. Esse é o m otivo pelo
qual ele exige que seja tratado de modo especial— para relem brar-nos de que
ele é diferente de tudo o mais que nós podemos encontrar.
E im pressionante contrastar as orientações rígidas do Antigo Testamento
para se aproxim ar de Deus com o modo tão despreocupado e quase arrogante
com que as pessoas se aproxim am dele hoje. Em algum as adorações
contem porâneas não há quase o senso de que Deus é santo, que ele deve ser
reverenciado e temido por causa de sua terrível santidade. Antes, o domesticado
Deus de alguns cristãos pode ser abordado de qualquer forma e com qualquer
atitude que se deseje. Como resultado, as pessoas não têm a im pressão de
Deus e o vêem quase como secundário na vida diária. O enfoque se move para
o eu. A felicidade e a realização se tornam exaustivas, e as chamadas bíblicas
para negar-nos a nós mesmos e seguir a Deus quase não são ouvidas.

’ Henry Clarence Thiessen, Inírodiictoiy Lectures in Systeinaíic Theology (Grand Rapids:


Erdmans, 1949), 129.
54 E nsino e C rescimento

O TRAUMA DO ENCONTRO COM


A SANTIDADE
Os encontros com a santidade são sempre aterrorizantes. Quando a um ser
humano é permitido ver um pouco do que Deus é, há sempre um a resposta de
terror e desespero, porque a presença de um Deus santo nos força a ver a
extensão de nossa pecaminosidade.
Quando Isaías teve um a visão de um Deus santo, ele respondeu lançando o
“oráculo de m aldição” sobre si mesmo, proclam ando, “Ai de m im !” (Is 6.5).
“Ai de ti” era a fórmula usada pelos profetas para pronunciar julgam ento sobre
os inimigos de Deus. Mas agora Isaías proclama destruição sobre si mesmo. A
razão é clara. Ele grita, “Estou perdido! Porque sou um homem de lábios impu­
ros, habito no meio dum povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei,
0 Senhor dos Exércitos!” (Is 6.5). Quando as pessoas têm a perm issão de ver
algo da glória de Deus, a resposta é invariavelm ente um profundo senso de
tristeza e im potência por causa da própria pecaminosidade. A verdadeira pie­
dade será sem pre acom panhada por um senso de vergonha e desespero por
causa da própria pecaminosidade.
Q uando H abacuque estava contrariado porque Deus não estava respon­
dendo ao seu clam or a respeito da injustiça (Hc 1.2-4), Deus lhe disse para
esperar e ver o que ele faria com as nações. M as H abacuque reclam ou mais
uma vez, dizendo que Deus estava sendo injusto em usar os babilônios para
executar o julgam ento sobre seu povo (Hc 1.12-2.1). Ele colocou-se como
juiz sobre a ju stiça de Deus. A resposta do Senhor foi poderosa, m ostrando
sua própria justiça e perguntando quem era aquele homem para questioná-lo.
Habacuque respondeu com uma oração de arrependim ento (cap. 3), confes­
sando, “O uvi-o, e o m eu íntim o se com oveu, à sua voz, trem eram os meus
lábios; entrou a podridão nos meus ossos, e os joelhos me vacilaram , pois,
em silêncio, devo esperar o dia da angústia, que virá contra o povo que nos
acom ete” (3.16).
Após o encontro de Habacuque com a santidade de Deus, sua fanfarronice
foi substituída pelo medo, e sua ira pelo desespero. Ele agora entendia quem
ele era, e seu argumento se acabou.
Jó também experimentou o trauma do encontro com a santidade de Deus. Jó
era um homem reto e íntegro que temia a Deus (Jó 1.1). Mas Deus permitiu que
Satanás testasse a Jó, removendo sua riqueza, sua família, e sua saúde. A espo­
sa de Jó o aconselhou, “Am aldiçoa a Deus e m orra!” (Jó 2.9). Jó se recusou a
fazer isso e permaneceu fiel a Deus. Mas seus amigos levaram-no ao ponto de
Entendendo D eus, E ntendendo a s P essoas 55

total frustração quando eles o acusaram de injustiça e pecado. Jó, irado, fmal-
mente clama a Deus dizendo que se ele descesse ele iria discutir pessoalmente
seu caso diante de seu criador. A im plicação era que Deus estava tratando Jó
injustamente.
Deus respondeu a Jó subm etendo-o a um a terrível inquisição. N ós lemos
capítulo após capítulo como Deus questionou a Jó, desafiando-o a defender-
se. O ponto do questionamento com Jó era “Quem é você para me questionar?”
perguntou Deus, “Acaso anularás tu, de fato, o meu juízo? Ou me condenarás,
para te justificares?” (Jó 40.8).
Então Jó entendeu sua pequenez diante de Deus e não fez m ais tentativas
para se justificar. Mas o sofrimento continuou quando Deus novamente questionou
a Jó. Finalmente, quando ele respondeu, foi com desespero de alguém que se
encontrou com um Deus santo. Sua réplica em parte foi “Eu te conhecia só de
ouvir, mas agora os meus olhos tevêem . Por isso, me abomino em e arrependo
no pó e na cinza” (Jó 42.5-6).
Experiências sim ilares são registradas no N ovo Testam ento. Quando as
pessoas se encontravam com a santidade de Cristo, elas dolorosamente também
ficavam cientes de sua própria pecam inosidade. Lucas 5 registra o chamado
dos primeiros discípulos. O contexto eram as praias do Mar da Galiléia. Depois
que os discípulos tinham pescado a noite toda e não tinham pego nada, Jesus
disse a Pedro para afastar o barco um pouco e lançar as redes. Um tanto quanto
cético, Pedro obedeceu, e a pesca foi fenom enal. R econhecendo que Jesus
não era um rabino comum, a resposta de Pedro foi “ Senhor, retira-te de mim
porque sou pecador!” (Lc 5.8). Pedro reconheceu que Jesus era santo, distinto
de todos os outros hum anos, e ao fazer isso ele foi forçado a confrontar sua
própria pecam inosidade. A resposta um tanto estranha de Pedro torna-se
inteligível à luz do trauma do encontro com a santidade.
Uma resposta sim ilar é vista no povo que testem unhou a cura do hom em
endem oninhado cuja história está registrada em Lucas 8. D epois que Jesus
restaurou o homem ao normal, o povo “estava possuído de grande m edo” (Lc
8.37). Eles pediram para Jesus ir em bora daquele lugar. Os gerasenos
reconheceram a santidade de Jesus como um a am eaça para eles porque de
alguma forma sua sublimidade os fazia cientes de sua própria pecaminosidade.
Se eles soubessem — como Pedro e os outros discípulos descobriram — que a
m aravilhosa santidade de Deus era contrabalançada com a maravilhosa graça
de Deus, eles teriam implorado para que Jesus ficasse com eles.
56 E nsino e C rescimento

A GRAÇA DE DEUS
Graça e Temor
Em cada um dos encontros mencionados acima, a resposta de Deus é m ise­
ricordiosa. Para Isaías, ele manda um dos serafins (uma das criaturas que rode­
avam 0 trono) retirar um a brasa quente do altar. Com ela os lábios de Isaías
foram purificados, seu pecado expiado e sua culpa retirada (Is 6.7). Deus res­
ponde ao arrependim ento de H abacuque e Jó tam bém com m isericórdia. No
entanto, o tem or de Deus é uma resposta apropriada ao conhecimento de sua
santidade. E um dom de Deus, porque é essencial para a mudança espiritual e
crescimento maduro. De fato, “O tem or do Senhor é o princípio do saber, mas
os loucos desprezam a sabedoria e o ensino’' (Pv 1.7).
O ponto de partida para um relacionam ento com Deus é um verdadeiro
temor. O tem or de Deus serve para purificar a vida de seu povo. Quando Deus
revelou-se no terrível trovão e na fum aça na m ontanha, em Êxodo 19 e 20,
M oisés encorajou o povo ao dizer, “O seu tem or esteja diante de vós a fim de
que não pequeis” (Êx 20.20).
Há pelo m enos dois resultados prejudiciais no fato de não se ter um real
tem or de Deus. Primeiro, o pecado abundará mais facilmente sem o tem or de
Deus para refreá-lo. Quando o apóstolo Paulo estabeleceu que todo o povo,
judeu e gentio igualmente, estava condenado diante da santidade de Deus, ele
resumiu seu argumento com citações selecionadas do Antigo Testamento. Ele
concluiu declarando, “Não há temor de Deus diante de seus olhos” (Rm 3.18).
A terrível ladainha dos pecados registrada em Romanos 1.1-3.20 revela que o
ser humano havia perdido qualquer noção do tem or de Deus.
E a graça de Deus que nos perm ite tem ê-lo do modo como devem os. A
tentação é às vezes vencida simplesmente porque nós temos medo de pecar. O
temor pode ser uma motivação importante para fazer o bem. Em última análise
nós devem os servir a Deus com o coração agradecido, mas essa resposta é
aprendida prim eiro por meio do processo de tem er a Deus.
Segundo, não tem er a Deus reduz nossa apreciação da m isericó rd ia de
D eus. A té que nós entendam os a condição desesperada de pecadores ante
um Deus santo, não podemos entender a magnitude e m aravilha da graça que
ele nos tem m ostrado em Cristo. A triste verdade é que algum as pessoas não
se im pressionam com sua salvação, não agradecendo propriam ente pelo que
Deus fez por elas. Essa falta de gratidão está enraizada na falta de entendi­
mento do que foi feito a favor delas. Quando crescem os no entendim ento de
quem Deus é. nós tam bém crescerem os no entendim ento das m aravilhas de
sua graça para com aqueles que crêem.
E ntendendo D eus, E ntendendo as P essoas 57

Graça e gratidão
D esde que a m eta do m inistério educacional da igreja é produzir pessoas
espiritualm ente maduras, os educadores cristãos devem entender que o tem or
de Deus é o ponto de partida necessário para um relacionam ento com Deus.
Porque Deus é santo e nós somos pecadores, nós naturalm ente respondem os
com temor a quem ele é. Mas o temor é redentivo porque produz pureza espiritual
e gratidão em nosso coração.
U m a grande frustração para m uitos educadores cristãos é tentar m otivar
pessoas a servirem a Deus. Alguns cristãos parecem acreditar que Deus existe
para sei-vi-los. em lugar de verem a si mesmos como servos do Deus Altíssimo.
O m otivador prim ário para servir a Deus é um coração agradecido.
A narrativa a respeito da visão que Isaías tem de Deus mostra que depois de
Isaías ter sido esm agado pelo terror ao ver a santidade de Deus, o Senhor
responde em graça, oferecendo expiação por seus pecados e chamando-o para
o serviço. A resposta de Isaías diante de tudo isso foi seu clam or agradecido,
“Eis-me aqui, envia-me a m im !” (Is 6.8).
As dimensões do amor de Deus tornam-se mais aparentes quando nós enten­
demos que sua justiça requer a punição do pecado e que em sua graça ele enviou
seu Filho para morrer em nosso lugar. A misericórdia da cruz torna-se absoluta­
mente incompreensível quando parece estar contra um pano de flindo de um san­
to e fiarioso Deus. Quando o temor de Deus está em nosso coração, nós entende­
mos sua graça mais completamente, e a gratidão então nos conduzirá ao serviço.
O apóstolo Paulo fundamentou seu apelo a seus leitores para que servissem a
Deus no fato de que Deus havia sido misericordioso para com eles (Rm 12.1 -2).

Graça e Dignidade Humana


A narrativa da criação de Gênesis 1 afirma que “Criou Deus, pois, o homem
à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gn 1.26-
27). Todos os seres hum anos têm grande valor e dignidade porque eles são
feitos à imagem de Deus. Todos nós carregam os a sem elhança de Deus em
nosso ser e portanto devemos ser tratados com respeito. Além do mais, apesar
da habilidade, da riqueza, da raça, do sexo ou qualquer outro fator, nós devemos
refletir a santidade de Deus. Nós devemos ser santos porque ele é santo.
Desde que todas as pessoas têm dignidade porque elas têm a imagem de
Deus, a Educação Cristã deve usar técnicas educacionais que respeitem as pes­
soas. Abordagens que sejam manipulativas ou diminuam a pessoa devem ser
58 E nsino e C rescimento

evitadas. Mesmo as abordagens que podem produzir resultados impressionan­


tes mas não valorizem ou respeitem as pessoas não devem ser usadas. Antes, a
santidade de Deus e a resultante dignidade do sexto dia de sua criação exigem
técnicas educacionais que respeitem todas as pessoas como tendo grande valor.
E somente a graça de Deus que pode restaurar a dignidade humana e garan­
tir o valor eterno de um ser humano. Nós fomos feitos à imagem de Deus, “e de
glória e honra o coroaste” (SI 8.5), mas nós somos curvados em autodestruição,
e som ente a graça de Deus pode levar-nos de volta a perfeição. “E assim , se
alguém está em Cristo é nova criatura, as coisas antigas já passaram, eis que se
fizeram novas!” (2 Co 5.17).

O PROBLEMA DA PECAMINOSIDADE
HUMANA
Porque todas as pessoas são criadas à imagem de Deus, elas têm dignidade
e valor. Mas a Escritura e a experiência também ensinam que os seres humanos
são pecadores, não conseguindo viver no nível do potencial que Deus lhes deu.
A Escritura relata não somente a narrativa da Criação, mas também a história
da Queda. Portanto qualquer teologia de santificação e crescimento espiritual
deve incluir uma visão apropriada da pecaminosidade humana.
Na era moderna, tanto a educação como um todo e a Educação Cristã em
particular têm-se inclinado a reduzir ou a ignorar o ensino bíblico sobre o peca­
do. Mas é essencial para uma abordagem bem-desenvolvida da Educação Cristã
um entendimento apropriado da pecaminosidade humana. Isso ajudará a m o l­
dar tanto como nós vemos o processo educacional quanto nosso entendimento
da obra de Deus na vida de seu povo.

O ensino bíblico a respeito do pecado

A Escritura declara que "Todo aquele que pratica o pecado, também trans-
g rid e a le i: porque o pecado é a transgressão d a le i” (IJo 3.4). Deus nos deu
leis para obedecer, e o pecado é a quebra da lei de Deus. Propriamente enten­
dido, o pecado é uma traição cósmica à autoridade de Deus. É um desacato
deliberado de sua autoridade.
O pecado pode ser tanto uma desobediência ativa a Deus quanto uma igno-
E ntendendo D eus, E ntendendo as P essoas 59

rância passiva de Deus. O pecado ativo é a desobediência deliberada da lei


divina, enquanto o pecado passivo é um a responsabilidade negligenciada ou
uma violação não-intencional da lei de Deus. Tiago escreveu, “Portanto, aquele
que sabe que deve fazer o bem e não o faz nisso está pecando” (Tg 4.17). Os
capítulos 4 e 5 de Levítico contém instruções sobre a purificação daqueles que
sem intenção pecam contra Deus. Nosso Senhor levou esse ensinamento para
o N ovo Testam ento, ensinando que mesm o aqueles que não sabem o que é
esperado deles serão punidos, mas sua punição será m enor do que a punição
daqueles que deliberadam ente desobedecem (Lc 12.47-48).
Todas as pessoas entendem que os seres hum anos se com portam mal às
vezes, mas não há um consenso a respeito do que leva as pessoas a pecar. O
conceito contemporâneo a respeito do pecado original é que ele vem de nosso
am biente, nosso contexto. Quando esse pensam ento é levado para a esfera
moral, afirma que nosso problema primário é nosso contexto— lares ruins, escolas
ruins ou passados ruins.
Se isso é verdade, então ninguém é responsável por seu com portam ento.
“N ão é m inha culpa” se torna uma explicação apropriada para tudo o que
fazem os, porque nós somos somente produtos do meio em que vivem os. A
sociedade m oderna ajuda as pessoas a evitar responsabilidade por seus atos
ao declarar uma forma de determinismo que ensina que é o ambiente que nos
faz desviar, e nunca nossa pecam inosidade inata. Por essa razão, governos
gastam m ilhões com projetos sociais e esforços para criar am bientes que
produzirão “boas” pessoas.
Claramente, como cristãos nós devemos nos envolver com as necessidades
sociais das pessoas e tentar ajudá-las a viverem em melhores ambientes. Mas
também temos de entender que as necessidades humanas vão além dos fatores
econômicos e ambientais. Melhorar as condições do ambiente em que se vive é
um passo necessário para ajudar as pessoas, mas não é suficiente para mudar
as pessoas no íntimo do seu ser.
A Escritura oferece uma explicação diferente para a radical pecaminosidade
humana. Ela defende que a pecam inosidade é uma doença de família que foi
herdada de nossos primeiros pais, mas também insiste em que nós somos res­
ponsáveis por nossa própria rebelião contra Deus. A origem do pecado estava
no Jardim do Éden, onde Adão se rebelou contra Deus. Paulo escreveu, “por­
tanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo peca­
do a m orte, assim tam bém a morte passou a todos os hom ens, porque todos
pecaram . . . .” (Rm 5.12) ensinando que a inclinação ao pecado é passada
para todos os humanos. Nesse sentido é mais do que nossa rebelião deliberada
60 E nsino e C rescimento

contra Deus; é tam bém um a condição que é com partilhada por toda a ra ç a /
Contrário à avaliação contem porânea que os humanos são por natureza bons
ou reagem passivamente ao ambiente, a Escritura argumenta que somos peca­
dores em nosso coração, sempre nos rebelando contra Deus.
A Escritura apresenta uma descrição gráfica de nossa condição. Por exemplo.
Gênesis relata, “Viu o SENHOR que a maldade do homem se havia multiplicado
na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração” (Gn 6.5).
■íeremias disse, “Enganoso é o coração, m ais do que todas as coisas, e
desesperadam ente corrupto; quem o conhecerá?” (Jr 17.9).
A Escritura ensina que os seres humanos estão infeetados totalm ente pelo
pecado e que não há bem algum em nós. O resultado é que som os culpados
diante de D eus, totalm ente condenados e sem esperança. De fato nós somos
inim igos de Deus e “por natureza, filhos da ira” (E f 2.1-3). A indicação mais
forte da seriedade de nosso peeado é a morte de Cristo, M uito séria deve ser
nossa culpa pois somente o sangue de Cristo poderia purificar-nos do pecado!
A agonia de Cristo na cruz indica não somente a extensão do amor de Deus por
nós mas tam bém a seriedade de nossa condição diante dele.
A sociedade m oderna tem -se tornado eom pletam ente adepta da negação
da pecam inosidade. Nós usamos as categorias da Psicologia e da Sociologia
para descrever nossa pecam inosidade. As pessoas são descritas como tendo
fraquezas ou cometendo, ou sofrendo erros em lugar de serem descritas como
pecando contra Deus. M as a Escritura expõe o pecado do jeito que ele é—
rebelião contra Deus e uma força destrutiva na vida dos seres humanos.
A Teologia descreve a pecaminosidade humana como uma corrupção radical
ou depravação total. O uso desses term os é uma tentativa de capturar a
força do ensino da Bíblia sobre pecado. Os termos não significam que os seres
humanos são tão maus quanto possivelmente conseguem ser. Antes, eles querem
dizer que a pecaminosidade se estende ao ser total. Berkhof descreve-o assim:

A concomitância imediata do primeira pecado . . . foi a depravação


total da natureza humana. O contágio de seu pecado espalhou imediatamente
pelo homem inteiro, não deixando nenhuma parte de sua natureza intocada,
mas corrompendo cada poder e faculdade do corpo e da alma. . . . A
depravação total aqui não significa que a natureza humana tenha se torna-

■* Algumas pessoas consideram isso como injusto porque estamos sendo acusados de algo
que não fizemos. A suposição é que Deus fez uma "escolha errada” quando designou Adão
como nosso representante no jardim. Mas a verdade é que nós teríamos feito exatamente o
mesmo se estivéssemos no lugar dele. Além do mais, se rejeitamos a idéia da liderança federal
de Adão com relação ao pecado, temos de rejeitar também a idéia de liderança federal de Jesus
no tocante à salvação.
E ntendendo D eus, E ntendendo as P essoas 61

do tão depravada quanto seria possível que ela se tornasse. Na vontade


essa depravação se manifestou como uma inabilidade espiritual.^

Algumas das afirmativas mais fortes da Bíblia a respeito do pecado humano


parecem ser exageradas quando nós consideramos as pessoas que conhecemos.
Nós todos conhecemos pessoas que são “boas”— pessoas decentes, tanto cristãs
como pagãs, que vivem vidas exemplares, ajudando outros e promovendo a pureza
moral. Em que sentido nós podemos dizer que essas pessoas não são boas?
Bom e mal são term os relativos, tom ando sua definição de com parações.
Eles são entendidos em relação a algum padrão de comparação. Por exemplo,
nossa fam ília tinha uma cadela chamada Maggie que era um a boa cadela. Por
isso, eu quero dizer que ela tinha uma natureza agradável, era uma linda cadela
e muito bem comportada. Ela um tipo de cocker. Suas pernas eram muito longas,
seu rabo não era cortado e suas orelhas eram muito pequenas para um cão de
raça normal. Se nós tentássemos mostrar nosso “bom” cão no kennel club, nós
teríam os sido ridicularizados. Ela somente era “boa” quando comparada com
os padrões não-profissionais aceitos por aqueles que estão interessados somente
num bom animal de estimação para a família. M as de acordo com os padrões
profissionais dos criadores ela não era absolutam ente “boa” . Ela seria inútil
como um cão de exibição.
D a m esm a form a, o padrão bíblico de “bondade” é o caráter m oral de
Deus. C onquanto haja m uitas pessoas “boas” quando com paradas a outras
pessoas, sua “bondade” vira nada quando com parada à de D eus. É neste
sentido que a B íblia conclui que “não há quem faça o bem ” (Rm 3.12). So­
m ente os crentes m ais m aduros entenderão a n atu reza radical de sua
pecam inosidade. A m aioria tende a ser alegremente ignorante de sua verda­
deira natureza diante de um Deus santo.
A bondade é com posta de dois aspectos— ação e m otivo. Um a boa obra é
aquela que corresponde à vontade e à lei de Deus e procede de um coração
que está procurando agradar a Deus e ama a Deus. Portanto, retidão é um
assunto tanto de conformidade exterior quanto de motivação interior. O proble­
ma com os fariseus era que exteriormente eles se conform avam à lei, mas
inleriormente eles eram corruptos (Mt 23.27-28). O problem a é que m uitas
vezes as pessoas farão a coisa certa mas pela razão errada. Suas ações pare­
cem ser boas, mas na realidade, em relação à sua motivação, elas não são boas.

Louis Bevkhof, Systeinatic Theology’, 2 ed. (Grand Rapis; Eerdmans, 1941), 225-26.
62 E nsino e C rescimento

Há m uitos anos um grupo de m úsicos de rock criou a m úsica e videoteipe


entitulado “We Are the W orld.” A m úsica foi composta e executada para aju­
dar a levantar fundos por causa da fome na Á frica Ocidental. Perguntaram a
um a das participantes por que ela havia participado daquele vídeo. A sua res­
posta foi que era bom ajudar outras pessoas, “e por outro lado”, disse ela, “nós
nos sentimos bem quando podemos ajudar outras pessoas” . O que parecia na
superfície ser uma maravilhosa ação humanitária— e de fato a música levantou
o dinheiro para ajudar a aliviar a fome— era no final também um a outra forma
de auto-serviço: ajudar outros para que ela pudesse se sentir bem consigo mesma.
O ponto básico é que se tratava de processar a própria felicidade e a realização
pessoal. Egoísmo esclarecido é o processo de fazer o bem a outros como um
meio de ajuda a si mesmo. Mas a Escritura nos diz que a única m otivação
aceitável para qualquer ação é agradar a Deus e glorificá-lo (Cl 3.17). Essa é
a razão pelo qual a B íblia conclui que “todos as nossas ju stiças ‘são’ como
trapo da im undícia” (Is 64.6). M esmo os m elhores atos da bondade hum ana
são muitas vezes contaminados por ações impróprias.
Eu e m inha esposa escolhem os ser pais adotivos como um m eio de
expressarm os nossa fé cristã. Até agora já levam os para nossa casa e demos
educação por longo período de tempo a 25 crianças. Eu gostaria de dizer que a
nossa motivação sempre foi completamente pura-—que nós desejamos somente
agradar a Deus e servir às crianças. Mas por causa de nosso coração pecaminoso,
outros m otivos como orgulho ou desejo por reconhecimento têm tam bém nos
influenciado. As crianças ainda estão sendo ajudadas, mas tais ações podem
dificilmente ser chamadas de retas. Elas são “boas” de acordo com os padrões
humanos, mas elas ainda são insuficientes diante do padrão divino.
O resultado da pecaminosidade dos seres humanos é que em um sentido eles
na verdade odeiam a Deus por causa da ameaça de sua santidade. Não se trata
de ira no aspecto de um estado emocional consciente, mas antes, no sentido de
indiferença para com Deus, que é a ausência de amor. Os seres humanos correm
de Deus em vez de dirigirem -se para ele, por causa da am eaça da santidade.
Isso é o que Paulo quer dizer quando afirmou, “Não há quem busque a Deus”
(Rm 3.11, parafraseando o SI 53.2). A separação de Deus está profundamente
incrustada em nosso ser e é expressa pela aversão que algumas pessoas sentem
em relação à religião ou à fé. A depravação pode ser vista nas ações e atitudes
de todas as pessoas, tanto cristãs como pagãs. Somente Deus é bom.
Charles H odge acreditava que todas as pessoas são conscientes de seus
pecados:
E ntendendo D eus, E ntendendo as P essoas 63

Todo homem por ser uma criatura moral, e porque é um pecador, tem
portanto em sua própria consciência o conhecimento do pecado. . . . Ele
sabe que o pecado não é simplesmente uma limitação de sua natureza;
nem meramente um estado subjetivo de sua própria mente, não tendo caráter
diante de Deus; que não é somente algo que não é sábio, ou derrogatório
para sua própria dignidade; ou simplesmente inadequado porque é prejudicial
aos seus próprios interesses, ou injurioso ao bem-estar dos outros.'’

A depravação hum ana não é somente uma doutrina abstrata; ela tem uma
relevância direta em relação ao modo como as pessoas se com portam e como
nós devemos pensar e abordar o ministério da educação cristã.

IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇAO CRISTA


Os seres humanos, deixados a mercê de si mesmos, nunca procurariam Deus.
M as a m isericórdia de Deus é m aior do que nosso pecado. A essência da
m isericórdia é que ela é voluntária. Deus decidiu chamar pessoas para si m es­
mo e capacitá-las para crer nele.
Ao desenvolver-se uma teologia de Educação Cristã, ela deve incluir uma
visão apropriada da pecam inosidade hum ana e uma visão apropriada do
envolvimento redentor de Deus com as pessoas. Nós devemos entender tanto
a extensão da pecaminosidade humana quanto a magnitude da graça de Deus.
Somente então poderemos nos deslocar para um entendimento apropriado do
ministério educacional da igreja.
Várias implicações para a Educação Cristã podem serem tiradas. Primeiro,
nós devem os entender que pessoas não redimidas não podem entender uma
verdade espiritual. “Ora, o homem natural não aceita as coisas do Espírito de
Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem
espiritualmente (1 Co 2.14).
Os não-redim idos são incapazes de entender a verdade espiritual porque
eles não têm o Espírito Santo neles. Um a verdade espiritual é entendida pela
mediação do Espírito Santo. Assim como uma pessoa sem olhos não pode ver,
assim aqueles sem o Espírito de Deus neles não podem entender uma verdade
espiritual. O apóstolo Paulo pergunta, “Porque qual dos homens sabe as coisas
do hom em , senão o seu próprio espírito, que nele está? A ssim , tam bém as
coisas de Deus, ninguém as conhece, senão o Espírito de D eus” (1 Co 2.11).
N ossa fam ília tinha uma obstinada gata chamada Dolores. Ela insistia em
afiar suas unhas em nosso sofá. Ela acreditava que lá fora no mundo era “cão

^Charles Hodge, Systematic Theolog}!, vol. 2 (Grand Rapids: Eerdmans, 1977), 81.
64 E nsino e C rescimento

come gatos” e que precisaria de unhas afiadas para sobreviver. Eu creio que
sofás são para sentar e que afiar unhas neles era um comportamento inaceitá­
vel. Eu e Dolores nunca nos comunicamos claramente sobre esse assunto por­
que ela tinha o espírito de um gato, e eu tinha o espírito de um homem em mim.
D a m esm a form a, nunca haverá um a clara com unicação sobre assuntos
espirituais entre aqueles que têm o Espírito de Deus e aqueles que não têm.
Não é um a questão de truque educacional ou persuasão poderosa. A m enos
que o Espírito de Deus entre em uma pessoa, ele ou ela é incapaz de entender
uma verdade espiritual.
Eu gastei horas explicando o Evangelho para uma amiga, colocando os fatos
da salvação do modo mais simples possível. A resposta dela f o i : “Eu não sei o
que você quer dizer” . Sem o Espírito de Deus nela, ela não poderia entender
mesmo as m ais sim ples verdades sobre a cruz de Cristo. Para ela, a cruz era
uma tolice.
Segundo, tem de haver uma intervenção sobrenatural em nosso ministé­
rio para que vidas sejam tocadas. Como educadores nós podem os distrair,
iluminar, ensinar e guiar pessoas, mas para capacitar uma pessoa para crescer
na fé é necessário o toque de
A Educação Cristã é mais bem
Deus. Seres humanos não podem
entendida como um processo
fazer com que outros seres huma­
tanto natural quanto sobrenatural.
nos cresçam na fé. N ós podemos
somente criar um contexto no qual um a pessoa pode crescer.
Educação Cristã é mais do que um projeto educacional; é uma batalha espi­
ritual. Não nos atrevamos a trivializar a obra ao criar pequenos efeitos bobos
para ajudar as pessoas a aprender. Antes, nós devem os entender que nós
dependem os do Pai para ser m isericordioso para com seu povo e enviar seu
Espírito para ajudá-lo a aprender.
A oração no ministério educacional da igreja não é opcional; é uin imperativo.
Quando nós entendem os que a menos que Deus esteja trabalhando, nossos
esforços são vãos, então nós entenderemos o lugar essencial que a oração tem
no ministério de ensino da igreja.
Terceiro, a Educação Cristã é uma parceria entre Deus e o educador.
Embora nós sejamos absolutamente dependentes de Deus para nossos resulta­
dos, ainda assim nós temos a responsabilidade de ensinar da m elhor form a
possível. Deus usa os esforços dos seres humanos para edificar seu povo. Nos
somos intimados a ensinar, com o entendimento de que Deus usará nossos es­
forços e com seu Espírito causará o crescimento do seu povo.
A Educação Cristã é mais bem entendida como um processo tanto natural
E ntendendo D eus , E ntendendo as P essoas 65

quanto sobrenatural. Deus criou o mundo para funcionar de acordo com a lei
natural; e nós somos responsáveis por estudar e descobrir a ordem natural das
coisas. O aprendizado é uma parte da ordem natural e portanto requer que nós
entendam os o processo de aprendizado. Quando o aprendizado é entendido,
os princípios de ensino podem ser extrapolados. Atrás desse processo está a
compreensão de que Deus criou o ser humano para aprender de certas maneiras
e que o educador é responsável por entender e trabalhar de acordo com os
modos em que as pessoas aprendem.
Portanto, estando com pletam ente cientes do fato que eles são totalm ente
dependentes do trabalho sobrenatural de Deus para deixar seu ensino tocar
uma pessoa espiritualmente, os educadores cristãos são responsáveis por ensinar
bem e orar bem. Eles estão em parceria dinâmica com Deus, trabalhando tanto
nos aspectos naturais como sobrenaturais simultaneamente.
Parte 2
A RENOVAÇAO
DA MENTE
CAPÍTULO 5
A RENOVAÇAO DA MENTE
“Nós não tem os nenhuma teologia; nós somente amamos o Senhor” , disse
um jovem cristão recentemente. Ele explicou que seu grupo “não esquentava a
cabeça” com discussões sobre a fé que professavam. O que um a pessoa acre­
ditava era de pouco conseqüência para eles— eles som ente queriam am ar a
Jesus. Essa perspectiva é adequada e útil no que diz respeito a ser cristão?
A fé cristã é um a questão do que nós crem os, quem am am os, e com o nós
n o s c o m p o rta m o s. S eus c o m p o n e n te s são ra c io n a is , re la c io n a is e
comportamentais, todos combinados para formar a substância da fé. A m aturi­
dade espiritual, então, é um a questão de ter as crenças corretas, am ar a Deus
mais profundamente e viver em crescente obediência a Deus. Juntos, esses três
aspectos são necessários para a maturidade espiritual.
Infelizmente, o Cristianismo experimentou um período altamente “escolástico”,
quando a fé foi reduzida a um a série de proposições teológicas e filosóficas
intrincadas que deveriam ser memorizadas, dominadas e discutidas. A acusa­
ção de “ortodoxia morta” foi merecida porque era inteiramente possível jogar
esse tipo de jogo acadêmico e nunca ter o coração tocado pelo am or de Deus
e a profundidade de sua graça. Além do mais, esse tipo de pensam ento levou
as pessoas a um a fé desprovida de com paixão e alma; antes, o C ristianism o
tornou-se, para alguns, a habilidade de discutir eficazmente uma d o u trin a.
Infelizmente, vestígios dessa tradição permanecem em alguns grupos, onde
a E ducação C ristã eficaz é entendida como treinar pessoas para que elas
aprendam esses argum entos para depois usá-los contra aqueles que acredi­
tam de form a diferente. A Teologia é reduzida a assuntos de nenhum a
consequência— assuntos que podem ser debatidos e discutidos, mas dificil­
m ente vividos. Como um recuo contra esse tipo de religião, o C ristianism o
para muitos têm-se tornado qualquer coisa menos uma questão para a mente.
Para essas pessoas, as crenças são arraigadas na experiência pessoal e não
na auto-revelação de Deus na Escritura. Assuntos de ortodoxia (crença cer­
ta) são considerados irrelevantes contanto que as pessoas “amem a Deus” . A
m aneira como Deus é percebido não é considerado im portante; som ente o
fato de que se ama a Deus é que importa. O resultado é que a m ente é deixa­
da fora da fé cristã e da experiência e o julgam ento é considerado periférico
para que se seja um cristão. Q uando as pessoas consideram as questões
sobre ortodoxia e heresia como sendo de nenhuma importância, elas abrem a
porta a todos os tipos de problem as.
70 E nsino e C rescimento

B asicam ente, a m aturidade é um a questão de estilo de vida. Q uando nós


nos colocarmos diante de Deus para sermos julgados, isso acontecerá baseado
em nossas obras— a m aneira como temos vivido nossa vida à luz de nossa fé
em C risto. Paulo adm oesta, “Porque im porta que todos nós com pareçam os
perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o bem ou o mal
que tiver feito por meio do corpo (2Co 5.10).
Portanto, o propósito final do ministério educacional da igreja é mudar vidas.
Mas a mente não deixa de estar envolvida nesse processo; a Escritura afirm a
que parte da transform ação
Para ser eficaz, a Educação Cristã
d e v e o c o rre r em n o s so
deve resgatar um entendimento
pensam ento. Paulo adverte os
apropriado do papel da mente no
Efésios, “Isto, portanto, digo e
crescimento espiritual.
no Senhor testifico que não
mais andeis como tam bém andam os gentios, na vaidade dos seus próprios
pensamentos, obscurecidos de entendimento, alheios à vida de Deus por causa
da ignorância em que vivem, pela dureza do seu coração” (E f 4.17-18).
Para ser eficaz, a Educação Cristã deve resgatar um entendimento apropriado
do papel da mente no crescimento espiritual. A igreja deve novamente valorizar
o modo de as pessoas pensarem como um im portante aspecto de ser o povo
de Deus. Nós devemos aprender a seguir os imperativos bíblicos a respeito do
relacionam ento entre o pensam ento e a ação, valorizando tanto o cognitivo
quando o volicional na vida cristã.
O apóstolo Paulo escreveu:

“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o


vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso
culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos
pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa,
agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.1-2, os itálicos são meus).

Esta passagem fornece um modelo para o crescimento espiritual e um man­


dado claro para o ministério educacional da igreja. O livro de Romanos é cen­
tral em sua clareza doutrinária e importância. Calvino escreveu a respeito dos
Romanos, “ Quando se obtém um conhecimento dessa Epístola, abre-se porta
para todos os tesouros mais escondidos da Escritura” .'
Romanos 12.1-2 funciona como um ponto de transição da porção doutrinária
ou ética da epístola para a porção prática ou imperativa.

' João Calvino, Calvin s Commentaries on Romans (Grand Rapids: Eerdmans, 1947), xxix.
A R enovação D a M ente 71

A ssim como faz em todos os seus escritos, o apóstolo Paulo conduz seus
leitores das bases teológicas para a mudança do estilo de vida. A palavra “por­
tanto” indica que a seção seguinte se forma com base no ensino precedente.
Há sempre um perigo quando se sustenta uma teologia não relacionada com a
prática, ou de se seguir uma prática não relacionada com a Teologia. A teoria e a
prática devem sempre estar juntas, tanto na educação quando na vida. A Escritura
não conhece nada sobre uma discussão teológica abstrata, nem de exigências
para a vida que sejam infundadas. A verdade teológica deve ser expressa
basicamente na vida que é consistente com ela. Depois de desenvolver as doutrinas
da misericórdia de Deus, Paulo agora atenta para os assuntos da vida.
Seu apelo aos romanos é, em últim a análise, que eles devem experim entar
tal m udança radical que sejam transformados. A transformação deve ser uma
metamorfose, literalmente uma “mudança de forma”. Quando uma lagarta muda
sua forma para uma borboleta, é transformada em uma nova criatura. Assim o
cristão dever ser transformado de pecador em santo. Lutero comentando sobre
essa idéia, observa que

o homem [cristão] está sempre na condição de nudez, sempre no estado


de tornar-se, sempre no estado de potencialidade, sempre na condição de
atividade. Ele está sempre em pecado e sempre em justificação. Ele é
sempre um pecador, mas também sempre arrependido e assim sempre
reto. N ós som os em parte pecadores, e em parte retos, e assim nada mais
que penitentes.-

O processo de transformação na vida do crente é o processo de santificação


ou crescimento em Cristo. É a vontade de Deus para seu povo que eles conti­
nuem a se tornar m aduros e santos (1 Ts 4.3). E portanto im perativo que os
crentes sejam transformados.
A base teológica para esse apelo é a misericórdia de Deus. Os onze pri­
meiros capítulos da epístola descrevem como todas as pessoas estão condena­
das por causa do pecado diante de um Deus santo, mas eles também declaram
que Deus foi misericordioso, enviando seu próprio Filho para morrer em nosso
lugar. Somente pela fé nós podemos ser justificados, e pela fé nós podemos ser
libertos das leis do pecado e da morte. À luz dessa misericórdia nossa resposta
deve ser de transformação.
N ossa necessidade prim ária enquanto estam os condenados diante de um
Deus santo é sermos perdoados. Somente depois que nós entendemos alguma
c o isa sobre a santidade de D eus e sobre a nossa p ecam in o sid ad e é
’ Martinho Lutero, Commenlary on the Epistle to the Romans (Granel Rapids: Zondervan,
1954), 152.
72 E nsino e C rescimento

que podem os entender algo sobre os m istérios de sua graça. Se nós com pre­
endem os que Deus é m isericordioso para nós como pecadores, a gratidão
funciona com o um a m otivação para servi-lo. M as se nós vem os sua graça
como barata e inconseqüente, dificilm ente somos m otivados a transform ar a
nossa vida.
O problem a contemporâneo é, naturalmente, que nós perdemos a noção da
santidade de Deus, da nossa pecaminosidade e da magnitude da graça de Deus.
R adicada num vácuo teológico a respeito da santidade de Deus, a Teologia
contem porânea tem pouco a dizer sobre a m isericórdia de D eus. Como
resultado, os crentes não são altamente motivados para servir a Deus em função
de um coração agradecido. Eles se voltam para a questão pragmática, “O que
é que eu vou ganhar cora isso?”, em vez da questão mais apropriada, “Como
posso servir a Deus?” Os crentes devem ser ensinados a entender e a responder
à misericórdia de Deus.
A vida transform ada deve ser expressa por um a nova dedicação radical à
Deus. Paulo usa a terminologia de oferta sacrificial, encorajando-nos a oferecer
nosso corpo como “sacrifício vivo,” o qual ele vê como uma forma sensata de
adoração. Stuart Briscoe observa;

O uso de Paulo das palavras apresenteis (o verbo usado é uma expressão


técnica para apresentar uma vítima para um sacrifício) e sa crifício
mostram claramente que ele espera que os crentes entreguem seus corpos
para Deus de uma maneira semelhante a que o povo de Israel apresentava
suas ofertas ao Senhor. Havia, é claro, dois tipos principais de ofertas;
primeiro aquelas que conduziam à reconciliação; e, segundo, aquelas que
eram uma expressão de celebração após a reconciliação feita.’

O sacrifício vivo é uma adoração total a Deus. Em lugar de ser somente


uma questão de liturgia ou música, a adoração que é agradável a Deus é vivida
na arena da vida. A doxologia é em íütima instância uma questão de obediência.
Não é bom louvar a Deus com as mãos levantadas e com uma linda canção e
então negá-lo com as ações. A adoração diz respeito a como nós vivem os, e
não ao estilo de nossos cultos eclesiásticos. Jim Guyer, pastor da Igreja
Presbiteriana Beulah, em Pittsburgh, frequentem ente encerra o culto com a
seguinte declaração; “O culto acabou; vamos começar a adorar” . Ele adverte
seu povo que a adoração é conduzida, em última instância, na vida.

’ D. Stuart Briscoe, The Communicator 's Commentary: Romans (Waco Texas: Word, 1982),
215.
A R enovação D a M ente 73

Barclay escreveu;

Verdadeira adoração é a oferta do corpo a Deus, e tudo o que se faz


diariamente com o corpo. Adoração real não é a oferta a Deus de uma
liturgia, ainda que nobre, e de um ritual, ainda que magnificente. JJma
adoração real é a oferta diária da vida a ele, não algo consagrado em
uma igreja, mas algo que vê o mundo todo como o templo do Deus vivo
(itálicos de Barclay)."*

A lém disso, Paulo nos cham a à pureza m oral, lem brando-nos que nosso
sacrifício a D eus deve ser santo. A lguns cristãos crêem que podem estar
relacionados a Deus e ainda assim continuar pecando. Mas crentes de verdade
serão santos— lutando para agradar a Deus em tudo o que eles fazem, evitando
o pecado e reconhecendo a imoralidade em todas as suas formas modernas.
U m a dedicação radical a Deus requer não-conform idade com o m undo.
Aqui o term o mundo se refere aos sentim entos e à m oral da sociedade.'
Significa que não devem os aceitar nem ser controlados por aqueles valores
de n o ssa so cied ad e que são o p o sto s aos v alo res do reino de D eus.
M undanism o é ser controlado pela m alícia, pela avareza, pelo poder ou por
qualquer valor com um ao pecado hum ano. M as aqueles que estão sendo
transform ados estão resistindo a esses valores e lutando para buscar em
prim eiro lugar o reino de Deus e a su aju stiça (Mt 6.33).
É perigoso reduzir o conceito de mundanismo a assuntos de vestim enta ou
entretenimento sem confrontar a questão maior dos valores. É lamentável que
haja pessoas que nunca pensariam em fumar ou beber bebida alcoólica, mas que
são racistas ou materialistas e não vêem conflito algum entre esses valores e sua
vida cristã. Mas tais valores vêm do mundo e não têm lugar no reino de Deus.
A questão educacional em jo g o aqui é que essa transform ação deve
acontecer pela renovação de nossa m ente. Q uando as pessoas aprendem a
pensar de novas m aneiras, com valores novos e categorias novas, a m ente
delas é renovada. A tarefa da Educação C ristã é ensinar para que a m ente
das pessoas possa ser renovada.
Num sentido, o ato divino da regeneração cria uma m ente renovada no
momento do novo nascimento. Mas é também verdade que renovação deve ser
um processo contínuo na vida dos crentes. Esse processo contínuo de renovação
é expresso diversas vezes na Escritura.

■*William Barclay, The Letter to the Rornans {VW?iàé\f\íí\ Westminster, 1975), 157.
Calvino, Romans, 453
74 E nsino e C rescimento

Segundo Coríntios 4.16 se refere a ser renovado interiorm ente dia a dia, e
Colossenses 3.10 diz: “e vos revestistes do novo hom em que se refaz para o
pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” .
O m inistério educacional na igreja não existe somente para a aquisição de
conhecimento, mas também para que as pessoas possam aprender a pensar de
m odo cristão sobre todos os assuntos da vida. Ter a mente renovada significa
aprender a pensar de maneiras novas, de acordo com o ensino das Escrituras,
sobre todas as coisas, para que possam os “levar cativo todo pensam ento à
obediência de C risto” (2 Co 10.5).
Se as pessoas não absorvem ou não entendem as categorias bíblicas sobre a
realidade e sobre as questões éticas, elas dificilm ente podem pensar em
conformidade com essas categorias bíblicas. Se uma pessoa nunca ouviu sobre
a ju stiça, por exem plo, não é surpresa algum a que ela não pense sobre uma
questão como sendo relacionada a assuntos de justiça. N ós não podem os
esperar que pessoas pensem ou ajam de m aneira cristã se elas nem mesmo
conhecem as categorias cristãs.
Por exemplo, alguns podem dizer, “Nós queremos amar a Deus” . Mas qual
é a natureza do Deus que eles querem amar? Se eles não conheçam a Bíblia,
não podem ter qualquer senso da ira de Deus para com o pecado e podem
om itir totalmente este aspecto do caráter de Deus. Então quando eles deparam
com sua justiça para com aqueles que se opõem a ele, eles não terão categorias
em que pensar ou se fundam entar diante da realidade da ira de Deus. M as se
eles tiveram a mente renovada pela instrução em idéias bíblicas e m odos de
pensar, eles serão capazes de entender melhor como Deus age em seu mundo.
O resultado da transform ação e da dedicação radical é que o crente será
capaz de “experimentar a vontade de Deus” (Rm 12.2). Muitos crentes aceitam
na teoria a idéia da vontade de Deus, mas na prática eles não têm a m ínim a
idéia de qual possa ser essa vontade. A vontade de Deus é entendida como
uma realidade mística que alguém nunca pode encontrar completamente ou seguir,
algo como a trama de uma novela de mistério. Paulo resiste a essa idéia, insistindo
em que a vontade de Deus é inteligível e com provável por meio do processo
de dedicação radical a Deus. Aqueles que serão transform ados, radicalm ente
dando-se a si m esm os a Deus em pureza moral, resistindo às influências do
mundo ao redor deles, conhecerão com certeza a bondade da vontade de Deus.

John Murray escreveu que experimentar a vontade de Deus significa


descobrir, entender ou aprender pela experiência qual é a vontade de Deus.
E uma vontade que nunca falhará e nunca será insuficiente. Se a vida
estiver sem sentido, estagnada, infrutífera, vazia de conteúdo, é porque
nós não estamos entrando, por meio da experiência, nas riquezas da vontade
A R enovação D a M ente 75

de Deus. O mandamento de Deus é muitíssimo amplo. Não há momento


da vida que a vontade de Deus não comande, não há circunstâncias que
não sejam preenchidas com significado se respondermos à totalidade de
seu conselho revelado para nós.®

Conhecer a vontade de Deus depende da obediência à palavra revelada de


Deus na Escritura. Aqueles que genuinamente fazem o que é requerido deles na
Escritura encontrarão em sua própria experiência a bondade da vontade de
Deus. N ão é um a questão de visão mística; antes, o discernimento da vontade
de Deus se desenvolve por se ter um a m ente transform ada pelo ensino e pela
obediência à Escritura.

IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS
M uitas im plicações para a Educação C ristã podem ser tiradas dessa
passagem, mas quatro parecem especialmente desafiadoras. Cada uma é ampla
em seu escopo, m as serve para dar um a base para a educação que conduz à
uma maturidade espiritual.
Primeiro, a instrução na Palavra de Deus é essencial para ajudar pessoas
a renovar a mente. Se as pessoas devem aprender a pensar e agir de acordo
com a Palavra de D eus, é óbvio que elas devem conhecer sua Palavra. Nós
deverm os aprender a obedecer tanto o estím ulo do Espírito Santo dentro de
nós quanto os mandamentos claros da Escritura. Em seu excelente ensaio, “Pondo
a mente renovada para trabalhar”, Douglas Moo observa:

Certamente o N ovo Testamento enfatiza fortemente a função do


Espírito Santo de dirigir os passos do crente. Jesus prometeu que enviaria
“o Consolador, o Espírito Santo” para “ensinar todas as coisas” (Jo 14.26).
E Paulo diz aos Gálatas: “Andai no Espírito e jam ais satisfareis à
concLipiscência da carne” (G1 5.16). Mas é importante reconhecer que o
N ovo Testamento não pára aí. Na mesma passagem em que ele prometeu
0 dom do Espírito, Jesus também disse a seus discípulos; “Aquele que tem
os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; e aquele que
me ama será amado por meu Pai, e eu também o amarei e me manifestarei
a ele” (Jo 14.21). E Paulo, o grande apóstolo da liberdade no Espírito,
relembrou os eoríntios desobedientes de que “o que vale é guardar as
ordenanças de Deus” (1 Co 7.19).''
John Murray, The Epistie to lhe Romans (Grand Rapids: Eerdmans, 1965), 2:115.
’ Douglas Moo em John D. Woodbridge, org., Renewing Your Mind in a Secular World
(Chicago; Moody Press, 1985), 146.
76 E nsino e C rescimento

U m a educação que conduza ao crescim ento espiritual deve com unicar as


verdades da Escritura claramente. Se pessoas querem agir como cristãs, elas
devem pensar como cristãs. Se pessoas devem pensar como cristãs, elas devem
prim eiro conhecer o que a Escritura diz e o que requer delas. E irresponsável
oferecer na igreja qualquer programa educacional que não ensine a Palavra de
Deus. Nossa mente deve ser levada cativa a Cristo, e isso pode ser feito somente
quando a Palavra de Deus é aprendida.
Tendências recentes na educação na igreja têm estado longe da B íblia e da
Teologia e voltadas para “assuntos da vida” e cursos orientados à necessidades
pessoais. Estes podem ajudar m uito em certo aspecto, mas a ajuda com pleta
está em ensinar às pessoas os temas e assuntos da Escritura para que elas possam
pensar sobre a vida partindo das amplas perspectivas oferecidas pela Bíblia.
Somente por meio do aprendizado de temas como santidade e justiça, pecado
e redenção, graça e perdão, o povo de Deus pode ter a m ente renovada para
pensar de modo bíblico.
, , ; Se pessoas devem agir como cristas,
responsável ensina a Escri- ■ ■ <.- o
^ , elas devem pensar como cristas. Se
tu ra de m aneira que aiude . . ._
,
as pessoas a descobrirem
,. pessoas devem pensar como cristas,
, . . . .
^ elas devem primeiro conhecer o que a
seu s te m a s e p re o c u p a- r- -x !j - _i ■
, ,1,,. ^ Escritura diz e o que requer delas,
çoes. Estudos bíblicos que
são puram ente inform ativos ou deixam de explorar um a aplicação para a
vida não são eficazes. Mas estudos controlados pela boa exegese e sensíveis
à cultura contem porânea podem fazer muito para ajudar pessoas a aprender
a ver a v ida de acordo com a intenção da E scritura. O valor da Teologia
nesse aspecto é que descreve conceitos eternos profundos, essenciais ao cres­
cim ento e ao desenvolvim ento espiritual. A Educação Cristã deve valorizar
as idéias da Teologia B íblica e Sistem ática e ensinar esse entendim ento no
contexto de questões da vida real para que as pessoas possam aprender a
pensar e agir de m odo cristão.
A Educação Cristã deve evitar ensinar a Bíblia e a Teologia como fins em si
mesmos, reduzindo-as a construções puramente cognitivas. Antes, os estudos
devem ser projetados para que os estudantes aprendam a pensar de m aneira
bíblica, usando a Teologia como um guia para as categorias de pensam ento.
Abordagens instrucionais que conduzem as pessoas a análises e atividades de
resolução de problemas usando orientações teológicas, farão muito para ajudar
as pessoas a terem a mente renovada.
Segundo, adultos convertidos devem ser ensinados a entender a vida
de uma nova maneira. O adulto que se converteu deve aprender a rejeitar
A R enovação D a M ente 77

os antigos m odos de pensar e ser treinado a pensar de acordo com princípios


escriturísticos. N ovos modos de se relacionar com o povo e com Deus serão
necessários também.
Referindo-se ao título de seu livro, Born A gain [Nascido de N ovo], Chuck
C olson diz, “Para m im é um clichê sugerir que alguém tenha chegado a um
certo estado de superioridade espiritual; significa somente um novo começo
ao colocar m inha vida em ordem— mas tem de vir acompanhado da renovação
de meu espírito” .*
Ele continua a narrar sua experiência de salvação e o processo de seu
aprendizado para pensar de m aneira nova. Seus livros posteriores dão
inform ações sobre o processo de como uma mente superior como a dele tem
sido retreinada a pensar sobre a vida de um a nova perspectiva. Ver, por
exemplo, que há na verdade uma batalha espiritual acontecendo, e que de fato
há reinos em conflito, é o resultado de ter o pensam ento e as percepções
moldados pela verdade bíblica.
A antiga prática de c a te q u e se era a instrução do adulto convertido na
verdades do Cristianism o. Em um sentido, quando os adultos se convertem ,
eles devem ser catequizados. Não é suficiente que eles tenham uma “experiência
do novo nascimento”; eles devem agora ser ensinados a pensar e viver de acordo
com as realidade do reino de Deus. Ter a mente renovada significa ensiná-lo a
rejeitar seus antigos modos de pensar e substituí-los por m aneiras bíblicas de
pensar. Essa foi a obra de Jesus com seus discípulos e a obra de Paulo com
seus convertidos. Essa é também a obra dos ministérios educacionais da igreja.
M uito freqüentem ente, na era contem porânea, os cristãos têm crido que
Cristo poderia simplesmente ser “acrescentado” às suas crenças. Jesus se toma
mais uma coisa em que se acreditar, mais uma adição à filosofia de vida. Mas
Jesus é muito mais que isso, e ser um cristão é mais do que acrescentar princípios
cristãos à vida. Jesus requer total lealdade a seu ensino, e ser um cristão significa
ter nossa vida radicalmente transformada pelo Evangelho e o Espírito de Deus
dentro de nós. Ser cristão é tanto uma questão de adotar a perspectiva de
Deus quanto abandonar nossas antigas perspectivas. Para o adulto convertido,
isso requer treinamento nas coisas de Deus.
Terceiro, a s c ria n ç a s p o d e m se r e n sin a d a s d e sd e o c o m eço a p e n s a r de
m odo cristão. A admoestação de Paulo, “criai-os na disciplina e admoestação
do Senhor” (E f 6.4) significa em parte que os pais devem treinar seus filhos a
pensar como cristãos. O m aravilhoso privilégio dos pais cristãos é que nós
podemos ensinar a nossos filhos as verdades de Deus.

‘ Charles W. Colson, Born Again (Lincoln, Va.: Chosen Books, 1975),


78 E nsino e C rescimento

Em lugar de ter de lutar as batalhas de lim par os erros de percepção da


mente deles, nós podemos desde o começo ensinar-lhes a verdade.
Escrevendo a pais cristãos, Horace Bushnell em seu clássico livro, Christian
Nurture [Alimentação Cristã], escreveu que o ohjetivo de seu argumento era
estabelecer

que a criança deve crescer um cristão, e nunca aprender a ser diferente.


Em outras palavras, o objetivo, o esforço e a expectativa deve ser . . . que
ele está aberto no mundo como alguém que é espiritiialmente renovado, não
relembrando a época que passou por uma experiência técnica [de conversão],
mas aparentar ter amado o que é bom desde a mais tenra idade.^

A força da posição de Bushnell é que ele valorizou e encorajou os pais


cristãos a treinar seus filhos para serem cristãos. Desde sua mais tenra idade
eles podem ser ensinados sobre uma visão cristã de mundo, vendo e entendendo
o mundo ao redor deles de uma perspectiva cristã.
Todas as pessoas, incluindo os filhos dos crentes, devem ser regenerados
por Deus para terem a m ente renovada. M as a tarefa da educação dessas
crianças não tem de incluir o retreinamento da mente delas. Elas, como Timóteo,
podem ser ensinadas desde a infância as Escrituras sagradas, que são capazes
de torná-las sábias para a salvação pela fé em Jesus Cristo (2 Tm 3.15).
O problem a de como se relacionar com as escolas públicas não é novo. No
terceiro século, Tertuliano escreveu um tratado entitulado On Idolatry [Sobre
a Idolatria]. Nesse tratado ele discutiu como a igreja deveria se relacionar com
literatura pagã daqueles dias. Sem fazer concessões, Tertuliano deixou claro
que ele odiava os poetas que advogavam a idolatria, exaltando os m itos dos
deuses. M as ele era tam bém um realista, sabendo que as crianças deveriam
entender essa literatura para atuar naquela sociedade. Tendo grande fé no poder
do lar cristão para contra-atacar as influências da sociedade, Tertuliano chegou
à conclusão de que os crentes deveriam enviar os seus filhos às escolas pagãs,
mas que nenhum crente de verdade deveria ser um mestre. Como professor,
seria pedido do cristão advogar o paganism o como um a visão válida, e isso
seria inaceitável.
Treinar as crianças para pensar de m odo cristão não requer um sistem a
escolar alternativo. Enquanto m uitos crentes valorizam a escola em casa ou
escolas cristãs particulares, é também possível treinar um a criança para que ela
adote valores diferentes dos valores das escolas públicas.
Horace Bushnell, Christian Nurture (1861; reedição, Grand Rapids: Baker, 1959), 239.
William Barclay, Educational Ideais in theAncient World (Grand Rapids: Baker, 1959), 239.
A R enovação D a M ente 79

A Escritura não exige um sistem a escolar alternativo, mas requer o ensino


das crianças no Senhor. U m a educação cuidadosa e conscienciosa dos pais e
da igreja trabalhando em harmonia podem facilmente contra-atacar as influên­
cias negativas de um sistem a escolar secular. Isso requer que os pais e os pro­
fessores da escola dom inical estejam cientes do que está sendo ensinado nas
escolas públicas e que eles abram um a discussão com a criança sobre esses
assuntos. Assim como Tertuliano, nós também podemos e devemos ter confi­
ança no poder da fam ília cristã para m oldar a mente das crianças para o bem
do reino.
Se a tarefa educacional é ensinar às crianças uma visão cristã de mundo, nós
não podemos trivializar a educa­
Se a tarefa educacional é ensinar
ção infantil. Muito fi-eqüentemente
às crianças uma visão cristã de
deixamos que o ministério educa­
mundo, nós não podemos
cional das crianças se torne um
trivializar a educação infantil.
entretenimento e não uma educa-
ção. E, infelizm ente, é um entretenim ento pobre. M as o ensino das crianças
pode ser tanto agradável quanto significativo quando ensinamos as crianças a
olharem a vida através de lentes da verdade cristã. Professores que amam cri­
anças e entendem Teologia podem fazer muito para moldar o modo como uma
criança pensa sobre a vida. Pais que gastarão tempo para falar respeitosam en­
te com uma criança podem fazer muito para formar o pensamento desta criança
em m odos apropriados do reino. R obert Coles m ostrou que as crianças de
fato pensam em m odos fortem ente teológicos." Pais cristãos e professores
podem usar esse recurso e m oldá-lo num aspecto im portante da m aturidade
cristã para a criança.
Q uarto, a Escritura é essencial para a renovação da mente e deve ser
ensinada em relação à vida. Há uma diferença entre ter conliecimento bíblico
e ter entendimento bíblico. Conhecimento bíblico significa que as pessoas têm
informação bíblica guardada na memória. Significa que há fatos e dados a serem
consultados, talvez mesm o versículos ou porções da Escritura que foram
memorizados. Mas é possível conhecer a Bíblia sem ter entendimento dela.
Um dos problemas com os fariseus era que eles tinham conhecim ento mas
não entendimento. Eles sabiam muitos detalhes, mas perdiam as implicações
mais amplas. Eles podiam “coar o mosquito, mas engolir um camelo” (Mt 23.24)
quando se tratava do entendimento bíblico deles. Jesus ensinou às pessoas muito
pouco a respeito do conteúdo do A ntigo Testamento, mas ele ensinou a elas
muito a respeito do significado das Escrituras.

' Robert Coles, The Spiritnal Life of Children (Boston: Houghton Mifflin, 1990).
80 E nsino e C rescimento

Os fariseus não entendiam o significado dos ensinamentos dele. O propósito


do aprendizado da Escritura é que nossa m ente seja renovada. A Escritura é
um meio para um fim, não um fim em si mesma. Quando nós nos colocam os
diante de Deus, ele não verificará os versículos bíblicos que temos decorados;
antes, nós daremos conta de como vivemos (2 Co 5.10). A Escritura é para ser
um guia para a vida, ensinando-nos como pensar sobre os assuntos da vida.
Portanto a educação bíblica que não se relaciona com a vida serve som ente
para atrasar o processo de renovação de nossa mente.
Um ensino bíblico responsável explora a verdade de um a passagem , mas
tam bém explora como esta verdade se relaciona à vida. Ele ensina às pessoas
não somente um conteúdo, mas também um significado. O processo de pensar
biblicamente deve ser modelado na sala de aula, e então os alunos devem ganhar
experiência ao analisar os assuntos por si mesmos.

CONCLUSÃO
A fé cristã nunca pode ser reduzida som ente a questões da m ente; mas
tam bém não pode desconsiderar a mente em relação à fé. O m odo como nós
pensam os sobre as coisas de fato im porta, e como crentes nós devem os ter
nossa m ente renovada para que nossa vida seja transform ada. A tarefa
educacional da igreja começa com ajudar as pessoas a terem a mente renovada,
ensinando-as que a Teologia interage com tudo que há na vida e que nós devemos
pensar de modo cristão sobre tudo que vemos e que fazemos.
A Educação Cristã tem falhado por um longo período não comprometendo
a mente do povo. A maneira como pensamos sobre as coisas é muito importante.
M aturidade espiritual é mais do que como pensamos; nunca é menos do que
isso. Ensinar as pessoas a pensar de modo cristão é um aspecto importante de
ajudá-las a aprender a viver como cristãs.
CAPITULO 6
A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO

U m a educação cristã eficaz diz respeito não somente ao que a Bíblia ensina,
m as tam bém ao modo como Deus fez as pessoas. Os educadores cristãos de­
vem entender tanto a Teologia como as pessoas se quiserem mn ministério edu­
cacional produtivo. A rraigada na teologia da criação, que ensina que as
pessoas têm valor e dignidade, a educação que é distintamente cristã evidenci­
ará um respeito pelo sexto dia da criação de Deus e os educadores cristãos
tentarão entender como as pessoas aprendem e o que m otiva o m odo como
elas se comportam. E um incrível desrespeito assumir que as pessoas são sim­
plesmente vasos vazios que devem ser enchidos com conhecimento, mesmo se
esse conhecimento seja o conteúdo da Escritura. A teoria do desenvolvimento
fornece um a estrutura para o entendim ento do processo de educar para um
crescimento espiritual.
A Educação Cristã está interessada em ensinar para o crescimento espiritual,
entendendo que o aprendizado é um a parte integral de se tornar m aduro
esp iritualm ente. D esde que aprender é um fenôm eno humano^ é uma
incum bência do educador entender como as pessoas aprendem. Essa questão
poder ser Julgada como puramente psicológica; Como as pessoas aprendem?
Pode ser também julgada mais integrativamente; Como Deus criou as pessoas
para aprenderem? Ao julgar a questão da última maneira, nós estamos entendendo
que toda verdade é verdade de Deus e que tanto as Ciências Sociais quanto a
Teologia são importantes para um entendimento dos seres humanos.

INTEGRANDO CIÊNCIAS SOCIAIS E TEOLOGIA


É responsabilidade dos educadores cristãos usar as Ciências Sociais com
sabedoria, integrando a Psicologia dentro de sua filosofia de Educação Cristã
de modo correto.
Fazer uma abordagem integrativa da Educação C ristã é algo necessário,
mas também difícil. É necessário desenvolver um completo entendimento do
m in istério, m as é difícil por causa da tendência hum ana de separar e
com partim entalizar a verdade. N ós devem os chegar a um ponto em que
entendem os que há questões m aiores do que “ É bíblico? ”. N ós devem os
perguntar também, “É verdade
82 E nsino k C rescimento

Uma verdade que existe fora da Escritura deve ser considerada. Por exem ­
plo, ninguém tenta desenvolver uma abordagem bíblica em relação à eletrônica.
O estudo da eletrônica está arraigado na Física, que é um estudo da ordem
criada por Deus. O cristão entende que a criação é ordenada, e parte do divino
mandato aos humanos é que nós entendamos a criação de Deus.
M as pode a m esm a abordagem ser feita em relação à Psicologia? O estudo
' das pessoas é o mesmo que o estudo da eletricidade? Em um sentido é, porque
ambos são questões dentro da A chave para o cristão é primeiro
ordem criada de Deus. M as a entender as pressuposições do
questão fica confusa quando
cientista, e depois, integrá-las de
os cientistas que conduzem
maneira correta. É responsabilidade
um a investigação aderem a
dos educadores cristãos
pressupostos que controlam o
usar as Ciências Sociais com
m odo como eles conduzem
sabedoria, integrando a psicologia
suas pesquisas. Se, por exem ­
dentro de sua filosofia de educação
plo, o psicólogo é um natura-
cristã de modo correto.
lista comprometido, seria im ­
possível para ele reconhecer que ocorre qualquer coisa sobrenatural. Para ele,
todo fenômeno tem de ser explicado naturalmente.
Existem três correntes ou abordagens psicológicas principais. Cada uma delas
tem elem entos de verdade, mas uma se destaca em relação às outras em ter­
mos de validade de suas pressuposições e utilidade para a Educação Cristã.
Em cada uma dessas há muitas variações, mas todas as abordagens podem ser
colocadas dentro de um a das três seguintes posições.

Psicanálise ou psicologia profunda


A primeira abordagem principal é um modo de terapia que enfatiza as forças
inconscientes da mente. A hipótese principal da psicologia profunda é que os
seres humanos são primariamente proativos em relação ao ambiente deles, isto
é, o comportamento humano é mais bem entendido como um resultado de far­
pas internas operativas dentro das pessoas. Aqueles que defendem esta abor­
dagem crêem que em lugar de esperar por um estímulo ambiental, a atividade
humana tem início dentro da pessoa.
Primeiramente desenvolvida por Sigmund Freud e mais tarde adaptada por
Carl Jung, Anna Freud e Erik Erikson, essas escolas psicanalíticas vêem as pes­
soas como sendo compostas de várias forças internas que moldam a personali­
dade e a atividade do indivíduo. A psicologia psicanalítica clássica crê que den-
A T eoria DO D esenvolvimento 83

tro de todas as pessoas há o idi, o ego o superego, que regulam e controlam o


comportamento e os sentimentos da pessoa, procurando um equilíbrio dentro
da psiquê humana. Enquanto o behaviorismo enfatiza o comportamento huma­
no, a psicologia profunda enfatiza a atividade interior do ser humano.
A contribuição primária dessa “primeira força” psicológica é que ela oferece
um a tentativa de entender as atividades interiores da personalidade humana.
H á um certo respeito pela pessoa e com isso um a consciência de “m istério” .
Seres humanos não são facilmente reduzidos a uma série de estímulos e respos­
tas como no behaviorismo. Antes, eles são vistos como um complexo interativo
de várias energias operativas dentro da personalidade humana.
Conquanto a Psicanálise possa ser um modo de terapia muito útil, não é par­
ticularmente útil para os propósitos da educação. Há uma crescente desconfian­
ça da Psicanálise entre os psicólogos e pouco uso de suas teorias fora da esfera
do aconselhamento. O trabalho de Erik Erikson tem sido o mais útil, descreven­
do uma série de estágios epigênicos pelos quais as pessoas progridem enquanto
movem-se em direção a uma maturidade psicológica. Entender esses estágios é
especialmente útil para aqueles que trabalham em ministérios com jovens, mas
eles não são diretamente relevantes para as questões educacionais.
A fraqueza fundamental da perspectiva psicanalítica é a ênfase muito grande
nas forças internas, sem um ênfase adequada na habilidade de a pessoa contro­
lar seu comportamento. Há importantes idéias para a terapia, mas nem tudo é
útil para o educador. A ênfase nos aspectos inconscientes da personalidade
faz com que ela não seja de m uita ajuda para o educador.

Behaviorismo
Primeiramente apresentada pelo psicólogo russo Ivan P. Pavlov e então apli­
cada à Psicologia por John B. W atson e Edw ard L. Thorndike, a “ segunda
força” psicológica do behaviorismo chegou ao primeiro plano sob a influência
de B. F. Skinner (1904-1990). A hipótese principal do behaviorism o é que o
com portam ento humano é explicado em termos de estímulos am bientais. As
pessoas são mais bem descritas como sendo reativas em relação ao ambiente.
Primeiro há o estímulo ambiental, que é seguido pelo comportamento humano.
Os behavioristas oferecem uma abordagem empírica à Psicologia. Eles es­
tão interessados somente naqueles fenômenos que podem ser empiricamente
observados. Os aspectos não observáveis como m otivos, em oções e valores
não são considerados porque eles não são passíveis de observação empírica.
As pressuposições dos behavioristas imediatamente dificultam a sua utilidade
porque são lim itadas por suas próprias regras. Não há espaço para o interior
84 E nsino e C rescimento

da pessoa, ou para questões eomo convicção do Espírito Santo.


O behaviorism o é muito popular, especialm ente nos Estados U nidos. Sua
popularidade pode ser explicada por vários fatores. Primeiro, ele é altamente
“científico”, sendo guiado pelas regras da investigação empírica. Ele abre cam­
po para análises estatísticas e é facilmente reduzido a dados de computador. A
população americana tem sido treinada a valorizar esse tipo de informação.
Segundo, ele fornece urn maravilhoso meio de fugir da responsabilidade. Se
é verdade que o com portam ento hum ano é totalm ente determ inado pelo
ambiente, então tudo que nós fazemos é um resultado de fatores externos a nós
m esm os e assim não podem os ser considerados responsáveis. “Eu não sou
responsável” tem -se tornado o clam or de nossa era, e isso está arraigado na
psicologia do behaviorismo.'
Terceiro, em muitos aspectos o behaviorismo funciona. Para certos tipos de
aprendizado no qual comportamentos necessitam ser adquiridos, o behaviorismo
pode ser altam ente eficaz. Qualquer pessoa que já tenha treinado um animal
usando prêmios e punições para conseguir o efeito desejado já viu o poder do
behaviorism o. A lém do mais, mudança de comportamento, a abordagem da
disciplina que ignora um comportamento negativo e premia um comportamento
positivo, pode ser um meio eficaz de disciplinar crianças.
M as 0 behaviorism o deve ser rejeitado pelo cristão como totalm ente
inadequado e incom pleto como um m eio de entender os seres hum anos. É
inadequado porque não admite aspectos da realidade que não podem ser
empiricamente observados (identificados por Immanuel Kant como os aspectos
“num enais” da realidade). O cosm os é m ais do que o mundo m aterial, e os
seres hum anos são mais do que comportamento. Ainda que seja verdade que
as pessoas respondem aos estím ulos do am biente, isso não explica tudo do
comportamento humano.
O behaviorism o é incompleto para o cristão por causa de seu desrespeito
fundamental aos seres humanos. É um método de manipulação que tenta controlar
outros. Mesmo o termo mudança de comportamento indica a intenção de mudar
pessoas, e assume que a pessoa que está fazendo a “modificação” sabe melhor
como a outra deveria se comportar. Pesquisadores behavioristas vão diretamente
de um estudo de ratos e cam undongos para um estudo de seres hum anos,
assumindo que todos os organismos aprendem do mesmo jeito.

' Para uma boa explicação e crítica do behaviorismo, ver Mark P. Cosgrove, B.F. Skinuer 's
Behaviorism: AnAnalysis (Grand Rapids: Zondervan, 1982).
A T eoria do D esenvolvin4ENto 85

De fato, Skinner ensinou diretamente que nós devemos ir além das noções
rom ânticas da liberdade e dignidade hum ana e entender que as pessoas não
são diferentes de animais. Skinner cria que as pessoas podem e devem ser
controladas pela manipulação do ambientes manipulados.-
Infelizmente, o behaviorismo está tão impregnado em nossa sociedade que
tem sido usado inadvertidamente em muitos ministérios cristãos. Abordagens
de ministérios radicadas em métodos de recompensa e punição, ou abordagens
altamente individualizadas em relação ao ensino e ao aprendizado estão sendo
controladas pelo behaviorism o. Claram ente as Escrituras apelam aos seres
h u m a n o s ao o fe re ce r re c o m p en sa s e p u n iç õ es por co m p o rta m e n to s
correspondentes, mas esse não é o único meio de ensino sugerido pela Escritura.
Conquanto alguns aspectos do behaviorismo possam ser úteis, os cristãos devem
ad o tar um a abordagem m ais co m p leta para en ten d er as p esso as e o
comportamentos delas.

Psicologias Humanísticas
A “terceira força” psicológica, geralmente categorizada como abordagens
“hum anísticas”, oferece um a perspectiva mais equilibrada.-^ Essas psicologias
são chaiuadas humanísticas porque, mais do que o behaviorismo e a psicologia
profunda, valorizam os seres hum anos como sendo sérios e intencionais.
Populai’izada primeiramente por Carl Rogers, Abraham Maslow e Erich Fromm,
essas psicologias tam bém incluem os trabalhos de .lean Piaget, Lawrence
Kohlberg e James Fowler.
Os psicólogos da terceira força entendem os seres hum anos com o
interativos em relação ao am biente, reconhecendo que as pessoas não são
apenas influenciadas pelo am biente, mas também exercem influência sobre
ele. Um entendim ento orgânico reconhece que há vezes em que as pessoas
estão definitivam ente reagindo ao ambiente e outras vezes em que elas estão
agindo sobre o ambiente.

- B. F. Skinner, BeyondFreedoni andDignity (Nova York: Knopf, 1971).


’ As psicologias humanísticas não devem ser confundidas com o Humanismo secular.
Humanismo secular é um movimento anticristão enraizado numa filosofia naturalística que
coloca os seres humanos como o mais importante de tudo o que há. No entanto, as psicologias
humanísticas enfatizam a dignidade da humanidade e foram originalmente baseadas no Cristi­
anismo. Historicamente, o Humanismo foi um movimento cristão que tentou restaurara digni­
dade de todas as pessoas feitas à imagem de Deus e não era anticristão.
86 E nsino e C rescimento

Dessa perspectiva emerge uma imagem mais completa do motivo pelo qual
as pessoas fazem as coisas do modo como fazem.
Alguns dos movimentos dentro da psicologia humanista têm tido divergên­
cias com a visão cristã de mundo e têm sido destrutivos à nossa sociedade. O
m ovim ento do “esclarecim ento dos valores”, por exemplo, com seu m ito da
educação destituída de valores, tem sido prejudicial às estruturas sociais e
precisa ser confrontado pelas pessoas sérias. M as nem todas as abordagens
incluídas nesse grupo de psicologias são negativas. Por exemplo, a teoria do
desenvolvimento é uma abordagem que é altam ente com patível com um a
perspectiva cristã e oferece inform ações úteis para o m inistério educacional
da igreja.

HIPÓTESES DO DESENVOLVIMENTO
Há várias abordagens à psicologia do desenvolvimento, com ênfases dife­
rentes em cada abordagem. Em termos gerais, no entanto, todas as abordagens
do desenvolvimento conterão a maioria, se não todas, das dez seguintes hipó­
teses.'' Essas são pressuposições sobre a natureza dos seres humanos, e para o
cristão, podem ser entendidas como descrições de como Deus projetou as
pessoas para que se desenvolvessem.

1. Em geral os seres humanos são mais similares do que diferentes


Desafiando abertamente o individualismo prevalecente nos Estados Unidos,
a teoria do desenvolvimento afirma que há mais aspectos que nos fazem seme­
lhantes do que diferentes. Enquanto a nossa sociedade gosta de enfatizar nos­
sas diferenças, a teoria do desenvolvimento enfatiza nossas similaridades.
N ós às vezes dizem os aos nossos filhos, “Você é único. N ão há ninguém
como você em todo o m undo” , num sentido isso é verdade, porque não há
duplicatas exatas de pessoas. Mas há mais que nos faz “iguais” a outras pesso­
as de nossa idade do que nos faz diferentes delas. Porque as pessoas têm
atributos similares em cada estágio da vida, é possível generalizar sobre elas.
Por exemplo, podemos conduzir um seminário sobre desenvolvimento do ado­
lescente porque há padrões previsíveis no processo de crescim ento na ado­
lescência. A psicologia do desenvolvimento reconhece e descreve as sim ilari­
dades nos seres humanos.

Essas hipóteses são adaptadas de palestras e discussões com Ted Ward e são usadas com a
sua permissão.
A T eoria do D esenvolvimento 87

Esse entendimento é difícil para os americanos aceitarem porque gostamos


de pensar sobre nós mesmos como “especiais” . Quando descobrimos que uma
experiência que nós estamos tendo é na verdade muito comum às pessoas de
nossa idade, isso pode tornar-se para alguns, uma descoberta deprimente. Mas
nas culturas em que as igualdades são aceitas, e o grupo é mais enfatizado do
que o indivíduo, as pessoas facilmente aceitam o fato de que nós somos muito
mais parecidos do que distintos.

2. A essência da humanidade é transmitida pela estrutura genética e


é inerente em todos os aspectos.
O que faz com que nós sejam os “hum anos” não é o am biente, m as a
genética, isto é, a humanidade é uma questão de estrutura “interna” (conduzida
pelo DNA) e não um a questão de onde ou como nós fom os criados. Os seres
hum anos são m ais do que produtos do estim ulo am biental, som os criaturas
geneticamente distintas.
De vez em quando ouvimos falar de uma criança crescer num galinheiro ou
algum tipo horrível de am biente e ser criada como um anim al. Elas são
cham adas “crianças-fera” , e tais crianças m uitas vezes se com portam m ais
com o anim ais do que com o crianças de sua idade. M as, exceto por seu
com portam ento, elas ainda são distintas e com pletam ente hum anas, porque
sua estrutura genética é humana.
O ponto principal dessa afirmação é que as influências am bientais são
inadequadas para explicar a natureza básica das pessoas. O ambiente nos influencia
de certa maneira, mas não controla o que somos. De um ponto de vista cristão, a
genética é simplesmente o meio que Deus usou para projetar sua criação.

3. Os padrões do desenvolvimento humano estão na natureza da


humanidade.
Os seres hum anos se desenvolvem de modos previsíveis por causa da
estrutura genética. Por exemplo, com a exceção de certos defeitos de nascimento,
todos os bebês nascem pequenos e então crescem com o passar do tempo. Em
todo lugar do mundo, em todas as etnias e culturas, o padrão de desenvolvimento
físico é com eçar pequeno e crescer .
Q uando nasceu a filha de um casal am igo m eu, eu perguntei “ Qual é o
tamanho dela?”
A mãe respondeu “Três...” . “Três metros é muito para um bebê!” , foi meu
comentário. E claro que minha observação era ridícula porque eu sabia que ela
estava se referindo ao peso de sua filha, e não à sua altura. A razão era que o
padrão de desenvolvim ento para todas as pessoas em todos os lugares é o
88 E nsino e C rescimento

m esm o, e os bebês não nascem com três m etros de altura. Isso é verdade por
causa da estrutura genética dos seres bumanos.

4. Os padrões de desenvolvimento não podem ser significativamente


alterados.
E ssa a firm a ç ão , cham ada de predeterm inism o, in d ic a que som os
geneticamente programados para nos mover através de padrões previsíveis em
nosso desenvolvim ento. Esses padrões são parte e parcela do ser hum ano e
não são normalmente suscetíveis a influências externas.
Porque há padrões previsíveis que não podem ser facilmente alterados, nós
podemos prever e generalizar sobre o desenvolvimento humano. Recentemente
uma amiga me perguntou sobre algumas características pessoais que ela estava
vendo emergir em sua filha pré-adolescente. Enquanto nós conversávam os eu
pude afirmar-lhe que as coisas que ela estava vendo eram completamente nonnais
para um a criança daquela idade e provavelmente não durariam muito. Eu pude
afirm ar isso baseado nos padrões do desenvolvim ento das pessoas, que são
completamente seguros.
Os estágios do desenvolvim ento são invariáveis e sequenciais. Todas as
pessoas passam pelos m esm os estágios na m esm a ordem. A lgum as pessoas
passam mais depressa pelos estágios e são chamadas avançadas ou dotadas,
enquanto que outras se movem mais devagar e são geralm ente cham adas re­
tardadas. O padrão perm anece no lugar, m as a velocidade do d esen v o lv i­
mento varia.

5. O desenvolvimento pode ser visto em vários aspectos que estão


intimamente entrelaçados - físico, cognitivo, afetivo, social e moral.
C inco aspectos da personalidade hum ana perm item um a investigação
em pírica e revelam estágios previsíveis de desenvolvim ento. Para efeito de
estudo e discussão, cada um deles é considerado separadam ente; m as os
seres hum anos são um todo integrado e cada aspecto interage com os outros
aspectos e os influencia.
O aspecto físico do ser humano é óbvio, e os padrões de desenvolvim ento
são facilm ente vistos. Ainda que as pessoas possam tentar parar ou esconder
os padrões norm ais do crescim ento e do declínio do corpo ao colorir seus
cabelos ou participar freneticam ente de “programas de boa form a física.” os
aspectos físicos movem-se por estágios claros com o passar do tempo.
O aspecto cognitivo diz respeito a como as pessoas reconhecem as coisas
e pensam sobre elas.
A T eoria do D esenvoi.vimento 89

A Escritura reconhece que as crianças pensam de modo diferente dos adul­


tos (IC o 13.11)e que é inapropriado para os adultos continuarem a pensar
como crianças. A teoria do desenvolvimento cognitivo tem por objetivo enten­
der os padrões de raciocínio por meio dos quais as pessoas progridem ao m o­
ver-se até a fase adulta.
O aspecto afetivo dos seres hum anos se refere ao seu desenvolvim ento
emocional e está intimamente relacionado aos valores que eles têm. As pessoas
movem-se por estágios de desenvolvimento emocional à medida que progridem
desde a absoluta necessidade infantil de receber amor até a fase adulta de poder
viver de modo interdependente com outros, tanto dando como recebendo amor.
O desenvolvim ento social se refere aos estágios pelos quais as pessoas
passam enquanto crescem para ser seres socialm ente responsáveis. A
necessidade dos a d o lesc en te s de serem ao m esm o tem po in d e p en d e n te s
d o s p a is e d e p e n d e n te s dos
O desenvolvimento pode ser visto
am igos é um a parte p rev isív el
em vários aspectos que estão
do d e se n v o lv im e n to so cia l.
intimamente entrelaçados: físico,
A lgum as sociedades (tais como
cognitivo, afetivo, social e moral.
os Estados U nidos) perm item
um a grande liberdade nessa esfera, enquanto outras exercem um controle m ui­
to m aior sobre como esse processo é desenvolvido. M as todas as pessoas se
m ovem através de padrões previsíveis desde a dependência da infância até a
interdependência da fase adulta.
O aspecto moral do desenvolvimento se refere aos modos em que as pessoas
separam o certo do errado. As crianças fazem decisões m orais baseadas em
critérios egoístas, enquanto os adultos moralmente maduros vêem as questões
maiores ou princípios como importantes. Entre esses extremos os adolescentes
fazem decisões m orais baseadas nas expectativas da sociedade. M as ainda
assim, há padrões previsíveis no progresso desse desenvolvimento.
Comum a muitas literaturas na área de Educação Cristã, estão as discussões
do aspecto “espiritual” das pessoas.^ Mas é mais apropriado ver o “espiritual”
como a essência do que os humanos são e não como um aspecto. A Escritura
descreve-nos como espirituais no âmago de nosso ser. Ted Ward usa a
ilustração da mão hum ana, com cada dedo representando um aspecto da
personalidade humana.

Veja, por exemplo, o capítulo de Robert E. Clark em Christian Education Foundatiomfor the
Future, organizado por Robert E. Clark, Lin Johnson e Allyn K. Sloat (Chicago; Moody Press,
1991), 233-48. Clark descreve o “desenvolvimento espiritual” de crianças no ensino fundamental.
90 E nsino e C rescimento

Em sua ilustração, a essência espiritual da pessoa reside na palm a da mão,


indicando que cada aspecto da pessoa interage com o espiritual e é influenciado
por ele. Quando os cristãos falam em ministrar “espiritualmente” a alguém, eu
geralmente fico curioso para ver como isso será feito. O único meio de ministrar
espiritualm ente é mediante um dos aspectos descritos acima. O espiritual não
é um aspecto de nossa humanidade; é a essência do que somos. Portanto, nós
alimentam os as pessoas, damos roupas, discutimos com elas, as amamos, nos
relacionam os com elas e as tratam os com justiça, tudo como um m eio de
m inistrar-lhes espiritualmente. Os aspectos da personalidade hum ana são as
avenidas pelas quais nós ministramos às pessoas espiritualmente.

6. O desenvolvimento deve ser entendido holisticamente.


Em lugar de se fazer uma abordagem atomística das pessoas, vendo-as como
partes não-relacionadas, devemos reconhecer o relacionam ento orgânico
funcional entre as partes e o todo. Os seres humanos são completos e devem,
em últim a análise, ser entendidos como um todo integrado. A antiga referência
fundamentalista às pessoas como “almas” (no sentido de “quantas almas foram
à frente?”) realm ente presta um desserviço ao modo como as pessoas devem
ser vistas. Da m esm a forma, as pessoas da área m édica podem se referir aos
pacientes como “o quadril do quarto 214” (referindo-se a uma cirurgia realizada)
em vez de ver a pessoa como um todo.
A mistura de aspectos da personalidade humana é crucial para o entendimento
das pessoas. Por exemplo, uma criança com paralisia cerebral tem um a condi­
ção física— dano no cérebro— que geralmente ocorre no nascimento ou próxi­
mo ao nascimento. O problem a físico pode causar um problem a cognitivo de
retardamento mental. Porque a criança é afetada cognitivamente, as emoções
podem também ser envolvidas, tornando o desenvolvimento emocional lento.
A falta de habilidade física, relacionada ao cérebro danificado, influenciará a
criança no campo social, afetando sua habilidade de brincar e se relacionar
com outras crianças. Finalmente, o problema cognitivo terá um efeito na esfera
moral, provavelmente inibindo o desenvolvimento moral.
Da m esm a forma, os vários aspectos da personalidade hum ana podem ter
uma influência na espiritualidade de uma pessoa. Um problema físico pode levar
um a pessoa a ficar irada com Deus. A inabilidade de se relacionar socialmente
exclui as pessoas da influência da igreja. Os problemas emocionais influenciarão
a m aneira em que um a pessoa se relaciona com Deus e entende Deus.
Para finalidade de pesquisa e discussão, o d esenvolvim ento é descrito
em relação aos vários aspectos da p ersonalid ad e hum ana. M as p ara ser
A T eoria do D esenvolvimento 91

tanto realista quanto respeitador das pessoas, o desenvolvim ento deve ser
entendido holisticamente.®

7. O ambiente facilita ou reprime o desenvolvimento.


O am biente é im portante, seja ajudando ou im pedindo o processo de
desenvolvim ento. Ele influencia o desenvolvim ento m as não o controla. O
ambiente tem um papel no processo de desenvolvimento, mas não é tão grande
como os behavioristas argumentam.
Em várias ocasiões fiquei observando meu vizinho trabalhar em seu jardim.
Depois de decidir que ter um jardim seria uma boa idéia, eu zelosamente cavei
o chão e plantei algumas sementes ou mudas de plantas. Infelizmente, isso foi
tudo o que eu fiz no meu jardim. Como resultado, minhas plantas — os tomates
ou alface ou cenoura — , não são muito saudáveis ou impressionantes. O papel
do jardineiro é criar um ambiente no qual o desenvolvimento seja facilitado.
Tirar as ervas daninhas, fertilizar e aguar servem para criar tal ambiente. Meu
jardim, no entanto, consiste num ambiente que atrapalha o desenvolvimento.
A tarefa do educador, pai, ou líder dos jovens é criar um am biente em que
as pessoas possam crescer. N ão há nada que possam os fazer para m udar o
padrão de desenvolvimento. Nós somos responsáveis por criar o ambiente que
facilite a ordem natural de Deus e a sua intervenção sobrenatural na vida de seu
povo. O behaviorism o m anipula o ambiente para m udar as pessoas. A teoria
do desenvolvimento também trabalha com o ambiente, mas o faz com um m o­
tivo completamente diferente. O seu motivo é criar um ambiente que facilite o
programa de desenvolvimento inato.

8. O desenvolvimento é mais bem entendido como uma questão de


perda de limitações.
O preformacionismo é a pressuposição de que os estágios com pletos do
desenvolvim ento são inerentes ao indivíduo. Desde a sua concepção (mais
propriam ente que no nascim ento) a pessoa é um ser com pleto, ainda que
lim itado. Inerente à pessoa está tudo o que é necessário para se tornar um
adulto totalmente funcional.
Quando os bebês nascem, eles não podem andar, falar, comer comida sólida,
pensar conceitualmente, ou fazer um miríade de outras coisas apropriadas aos
adultos.

Quando isto foi escrito, o termo holístico era muito popular entre certos grupos da Nova Era.
Embora esta associação possa ser confusa, eu escolho usar a palavra porque é bem descritiva
em relação ao conceito e não necessariamente carrega em si qualquer conotação imprópria dos
movimentos da Nova Era.
92 E nsino e C rescimento

Eles são seres humanos completos mas limitados pelo seu desenvolvim en­
to. E mais apropriado pensar sobre o processo de desenvolvimento como per­
der as limitações do que pensar em term os de acrescentar algo às pessoas.
Elas obtêm conhecimento e habilidades, mas já são pessoas completas.
O preform acionism o nos ajuda a olhar as pessoas com respeito, vendo-as
como completas, ainda que limitadas. As crianças precisam perder as limitações
do pensamento infantil— e não se tornar de alguma forma mais humanas. Nossa
tarefa é ajudar as pessoas a perderem as lim itações dos estágios m ais baixos
para que elas possam apreciar a totalidade do potencial humano dado por Deus.
O preform acionism o pode também ser útil para o cristão maduro. Quando
as pessoas nascem novamente em Cristo, elas também já são com pletas, mas
limitadas. Elas podem não saber como orar, com partilhar a fé com outros ou
andar por meio do Santo Espírito, e são portanto limitadas como cristãs. Mas
elas são completas em Cristo e precisam somente ser “libertadas” das limitações
da im aturidade espiritual. Nós não “acrescentam os” nada a elas quando as
ensinamos; antes, nós ajudamos as pes­
Ê o desejo de Deus que as
soas a serem “livres” em Cristo.
pessoas feitas à sua imagem
se desenvolvam em todos os
9. O desenvolvimento pode ser
aspectos de sua
paralisado por condições adversas.
personalidade.
As vezes, o am biente pode ser tão
destrutivo que o processo de desenvolvim ento pára. As crianças que são
maltratadas ou passam fome podem ser tão profundamente prejudicadas pelo
am biente que seu desenvolvim ento em alguns aspectos é interrom pido. Os
vários aspectos da personalidade humana diferem quanto à suscetibilidade à
influência do ambiente. A força relativa do processo de desenvolvimento avança
num a ordem descendente, com o físico sendo o menos suscetível à influência
do am biente e o ser m oral o m ais suscetível. Essa é a razão, por exem plo,
pela qual o clim a moral em nossa nação é pobre. O ambiente de queda moral
está fazendo com que o crescim ento m oral das pessoas seja dem orado ou
mesmo paralisado.
De modo geral, o processo de desenvolvimento pode ser confiável, vendo-
se a possibilidade de progredir apesar do controle do ambiente. Mas em situações
extremas, o desenvolvimento pode ser frustrado.

10. Cumprir o padrão contínuo do desenvolvimento humano através


da vida é um requisito para a efetivação humanidade.
O desenvolvimento é natural; não se desenvolver é uma patologia. Um grande
potencial e um grande valor são inerentes ao ser humano. Os cristãos entendem
A T eoria do D esenvolvimento 93

que esse potencial foi escrito pelo dedo de Deus. Ser humano significa, entre
outras coisas, tomar-se maduro, totalmente desenvolvido em todos os aspectos
da p e rso n a lid a d e . É algo te rrív e l v er as p e sso a s e stag n ad as no seu
desenvolvimento, porque há um grande potencial em todos os seres humanos.
Colocando isso em termos cristãos, é o desejo de Deus que as pessoas feitas
à sua imagem se desenvolvam em todos os aspectos de sua personalidade.
Certas doenças inibem o desenvolvim ento, e há pessoas que, não por sua
própria culpa, nunca se desenvolvem . Isso é parte do fato de viverm os num
mundo caído. M as deve ser visto como uma patologia e um m al, não como
parte da ordem desejada de Deus. Cumprir os privilégios da humanidade significa
cumprir nosso potencial para o desenvolvimento.

IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS
Se é verdade que Deus criou as pessoas para se desenvolverem de acordo
com padrões previsíveis e que esses padrões são inerente às pessoas, m uitas
im plicações importantes podem ser tiradas. Primeiro, os educadores cristãos
devem entender o processo de desenvolvimento. Em bora não sejam psicólo­
gos do desenvolvim ento per se, os educadores cristãos devem entender os
padrões do desenvolvimento. Os vários estágios moldam o modo como as pes­
soas aprendem e também influenciarão como elas experimentam a fé. Entender
os padrões ajudará o educador a projetar as experiências de aprendizado que
são apropriadas ao estágio do desenvolvimento da pessoa.
Segundo, o processo de desenvolvimento deve ser respeitado. Em vez
de apressar as pessoas pelos vários estágios de desenvolvim ento, ou impedi-
las de se desenvolverem naturalm ente, deve-se perm itir que o processo pro­
grida de acordo com seu curso norm al. As pessoas precisam de tem po para
viver e experim entar cada estágio do desenvolvim ento. A sociedade am eri­
cana tende a acelerar o processo, tentando acelerar o desenvolvim ento. As
crianças são em purradas para frente, quase im pedidas de serem crianças.
Infelizm ente, os cristãos tam bém caem nessa arm adilha, preocupados que
seus filhos sejam deixados para trás se tam bém não forem em purrados para
frente em seu desenvolvimento.
Por outro lado, algumas pessoas querem se opor ao processo do desenvol­
vimento, não permitindo que outros cresçam e se desenvolvam. Especialmente
durante a adoleseência, alguns pais têm medo do progresso social natural de
libertação do controle paterno, e tentam segurar seus filhos. A luta entre o
94 E nsino e C rescimento

desenvolvim ento e o controle dos pais pode criar um a tensão no lar e um a


confusão na vida do adolescente.
Os estágios do desenvolvim ento são m ais bem descritos como grandes
quartos em vez de caixas apertadas. C ada estágio precisa ser explorado e
experimentado, e ter o seu potencial exaurido antes que seja deixado para trás
e se avance para o estágio seguinte. Se nós tentarm os em purrar as pessoas
através do processo do desenvolvimento, estaremos demonstrando nossa falta
de confiança no desígnio de Deus para as pessoas e provavelmente criando um
estresse indevido para as pessoas envolvidas. O respeito pelo processo de
desenvolvim ento perm ite que as pessoas sejam quem elas são em qualquer
m om ento e confiem no desígnio de Deus para o seu crescim ento individual.
Permite que a velocidade do desenvolvimento progrida normalmente, nem for­
çando as pessoas para frente nem segurando-as para que não se desenvolvam.
Pode ser difícil observar uma outra pessoa progredir ao longo dos estágios
do desenvolvimento. Pais de adolescentes às vezes agonizam quando observam
seus filhos crescer. “É somente um estágio” pode ser uma resposta conveniente
para um a situação difícil, ou pode ser um a análise honesta do que está
acontecendo. Respeitar o processo do desenvolvimento significa permitir que
as pessoas estejam no estágio apropriado para sua idade.
Terceiro, nós devemos desejar ver o crescimento nas pessoas que nós
servimos. M uitos educadores fecham a questão sobre o propósito da educa­
ção como sendo a aquisição de informações. Mas educação, bem entendida, é
sobre desenvolvimento, e não simplesmente a obtenção de informação ou no­
vas habilidades. Inform ação e habilidades são parte do processo, mas o de­
senvolvimento é a chave do resultado. A teoria do desenvolvimento define es­
tágios m ais altos e nos ajuda a entender os m odos pelos quais nosso povo
precisa crescer. A meta do desenvolvimento pode ajudar a organizar a agenda
para os resultados educacionais, especialmente quando as descobertas da teoria
do desenvolvimento estejam integradas com a perspectiva teológica.
O d esen v o lv im e n to com o um a m eta é um a len te atrav és da qual as
pessoas podem ser entendidas. U sada im propriam ente to rn a-se um outro
m eio de co n tro le pelo qual o e d u ca d o r fo rça as p esso as p ara d en tro de
“caixas” predeterm inadas e desconsidera a singularidade de cada indivíduo.
M as entendido de m odo correto, o desenvolvim ento hum ano se torna um
“m a p a ” do d esíg n io de D eus para os seres h u m an o s, re p re se n ta n d o os
m a is am p lo s m o v im en to s p elo s qu ais as pesso as se m ovem en q u an to
crescem em direção à m aturidade. Com os controles no lugar, a teo ria do
desenvolvim ento pode ser um modo muito “cristão” de entender as pessoas.
A T eoria do D esenvolvimento 95

Q uando integrado ao entendim ento teológico, pode fornecer inform ações


úteis para ensinar visando ao crescim ento espiritual.
Q uarto, o desenvolvimento interagirá com o crescimento de uma pessoa
como cristã. Porque os seres hum anos são entidades com pletas, suas vidas
espirituais não estão separadas do resto de sua existência. O desenvolvimento
interage e influencia como nós experimentaremos nossa fé, e ajuda os educadores
a entender os tipos de estratégias de ensino apropriadas aos diferentes grupos
etários. Entender o desenvolvimento é uma chave importante para o entendimento
do ensino. A teoria do desenvolvim ento não é o único m odo de entender as
pessoas (cada sistema é deficiente de alguma maneira), mas é um modo útil de
entender como as pessoas são. Ela fornece inform ações im portantes para o
trabalho com as pessoas e perm ite que os educadores façam o papel de
facilitadores em vez de controladores. Reconhece a ordem da criação de Deus
e luta para cooperar com o processo do crescimento humano.
CAPITULO 7
O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO

“ Nós queremos que as nossas crianças conheçam a Bíblia” é um a preocu­


pação com um e apropriada dos pais e dos líderes cristãos. Porque o conheci­
mento da Escritura é central para o crescimento e a maturidade cristãos, qual­
quer pessoa que deseja ajudar as crianças a crescerem na fé quererá que elas
aprendam as Escrituras. Mas há um problema com a capacidade de as crianças
conhecerem e entenderem esse livro distintamente adulto. O problema é que as
crianças conhecem as coisas e pensam sobre elas de um modo diferente dos
adultos. Algo essencial para um ministério eficaz com as crianças é entender as
maneiras como elas pensam e aprendem.
Ronald Goldman,' um educador religioso inglês que escreveu de uma pers­
pectiva teológica liberal, destacou os problemas sobre como as crianças enten­
dem a Escritura. Como elas não
O problema e que as crianças
pensam do mesm o modo que os
conhecem as coisas e pensam
adultos, elas freqüentemente irão
sobre elas de um modo diferente
rearranjar os conceitos bíblicos e
dos adultos. Algo essencial para
os termos de uma maneira que faça
um ministério eficaz com as
sentido para elas. “Santificado seja
crianças é entender as maneiras
o teu nom e” pode se transform ar
em que elas pensam e aprendem.
em “ Santos seja o teu nom e” na
mente de uma criança, fazendo dessa incompreensível frase algo que seja com­
preensível para ela. Goldman concluiu que “a Bíblia não é um livro para crian­
ças e que o ensino de várias porções dela pode causar mais dano do que ajudar
no entendim ento religioso da criança e que um excesso de m aterial bíblico é
usado cedo demais e com muita freqüência”.-
M as a B íblia exige que nós ensinem os aos nossos filhos o seu conteúdo.
Muito do Antigo Testamento foi registrado para que as histórias pudessem ser
passadas para as crianças para que elas pudessem saber da fidelidade de Deus
para com elas. Estratégias foram estabelecidas para incentivar as crianças a
perguntar e para que os pais pudessem contar-lhes as histórias do cuidado

' Ronald Goldman, Religious Thinkingfrom Childhood to Adolescence (Nova York; Seabury,
1964).
- De Ronald Goldman, Readinessfor Religion (Nova York; Seabury, 1965), citado em Lawrence
O. Richards, A Theology ofChrislian Education (Grand Rapids; Zondervan, 1975).
98 E nsino e C rescimento

fiel de Deus. Claramente é a intenção de Deus que as crianças sejam ensinadas


a respeito das verdades bíblicas.
De um ponto de vista teológico é im portante ensinar a B íblia às crianças,
mas de um ponto de vista psicológico é importante compreender que as crian­
ças entendem de uma forma diferente dos adultos. Como podemos juntar essas
duas situações para que ensinemos a Bíblia de forma responsável às crianças?

JEAN PIAGET E O
DESENVOLVIMENTO COGNITIVO

Os escritos de Goldman foram baseados no trabalho de Jean Piaget (1896-


1980), o “epistemologista genético” suíço que foi o primeiro a descrever o pro­
cesso de desenvolvimento nas crianças. Seu nome é facilmente reconhecido,
mas assim mesmo uma breve visão geral sobre sua vida e obra é apropriada.^
Ele nasceu na Suíça e foi criado por um pai erudito e uma mãe inteligente e
devotamente religiosa. Ele aprendeu logo cedo os valores do pensamento siste­
mático e quando tinha 10 anos de idade publicou sua prim eira obra— uma des­
crição de um pardal parcialmente albino que ele havia observado num parque.
Ele recebeu treinamento em Biologia, com ênfases em malacologia (O ramo
da zoologia que estuda os m oluscos), tendo recebido seu Ph.D. em 1918 na
U niversidade de Neuchatel. Durante sua adolescência seu padrinho, Samuel
Cornut, passou algumas férias de verão ensinando-lhe a filosofia de Henri
Bergson, que escreveu sobre a criação evolucionista. Isso abriu para o o jovem
cientista o m undo das idéias e das questões mais amplas da Epistem ologia.
Como resultado, ele começou a ler sobre Filosofia, Religião e Lógica, pergun­
tando, “ O que é conhecimento?” e, “Como ele é alcançado?”
O duplo interesse, pela Biologia e pela Filosofia, conduziu-o a tentar encon­
trar uma explicação biológica para o conhecimento. O com prom isso que ele
havia assumido com a Biologia e a Filosofia na adolescência nunca diminuiu
através de toda a sua vida. Fred M cCormick afirma:

^ Esta visão geral é baseada na excelente apresentação de Piaget, de Mary Ann Spencer
Pulaski, ü n d e r s t a n d i n g P i a g e t Harper&Row, 1971).
o D esenvolvimento C ognitivo 99

Ele estava continuamente julgando suas buscas biológicas contra o


contexto da Filosofia e da Epistemologia. Leu avidamente Kant, Spencer,
Cante, Durkheim, Tarde, James, Ribot e Janet, assim como outros filóso­
fos e psicólogos, chegando à conclusão de que a explicação mais viável
da realidade estava no relacionamento das partes com o todo, idéias que
ele armazenou das discussões entre Durkehim e Tarde. Piaget concluiu
que particulares não existem em uma forma isolada, mas em dependência
com as outras partes e com o todo. D esse sistema de lógica derivou o
conceito de Piaget do equilíbrio (ou equilibração)."*

Piaget usou o term o epistemologia genética para descrever a interação


entre o corpo e a mente que seria o foco de sua reflexão. Ele estava convencido
de que o desenvolvim ento intelectual e o modo que nós aprendem os estão
“firm em ente arraigados no desenvolvim ento biológico do indivíduo, como
expresso pelo termo ‘genético’” .^
Enquanto fazia pós-graduação em Sorborme, Piaget trabalhou com Theophile
Sim on, que com A lfred Binet desenvolveu o prim eiro teste de inteligência.
Enquanto tentava padronizar certos aspectos do teste, ele descobriu que
crianças da mesma idade erravam as mesmas perguntas sistematicamente
da mesma forma. Ele então com eçou a se perguntar a razão disso e foi se
tornando cada vez m ais interessado no pensam ento das crianças sobre os
assuntos. Ele esperava descobrir como elas raciocinavam. Como resultado das
prim eiras publicações dessas descobertas, ele foi convidado para ser diretor
de pesquisa no Institut Jean Jacques Rousseau em Geneva. N essa época ele
estava com 25 anos de idade.
A sua carreira progrediu num a velocidade espantosa à m edida que seus
prodigiosos escritos e impressionantes teorias avançaram. Por meio de detalhada
observação, a princípio de seus próprios filhos e depois de crianças de todo o
mundo, ele desenvolveu e refinou sua teoria sobre a lógica, o raciocínio moral e
os estágios cognitivos nas crianças. Em 1950 ele publicou sua teoria do
conhecimento em três volumes, que era um sumário do trabalho de sua vida até
aquele ponto. Quando morreu, em 1980, ele tinha publicado quarenta livros e
centenas de artigos.

Fred D. McCormick, “Implications ofthe Conceptual Developmental Theory of Jean Piaget


for Teaching Biblical/Theological Concepts to Children,” tese de mestrado, Trinity Evangélica!
Divinity School, 1981,13.
^Pulaski, Understanding Piaget, 3.
100 E nsino E C rescimento

Adaptação
Piaget acreditava que a adaptação é a essência de como a pessoa funciona
cognitivamente, assim como é a essência do funcionamento biológico. A adap­
tação é a capacidade de organizar o estím ulo sensor que nós recebem os em
um a certa ordem e então nos adaptar ao nosso contexto.
A adaptação consiste de dois processos, a assimilação e a acomodação.
A assimilação é o processo pelo qual nós incorporamos idéias, pessoas, costu­
mes, m aneiras, e toda sorte de coisas em nossas atividades. Por exem plo, a
criança pequena que deseja levar uma Bíblia para a igreja porque a mamãe e o
papai o fazem, assimilou esse costume à sua vida.
A acomodação é o equilíbrio à assimilação, o ajuste de como nós nos rela­
cionamos com nosso ambiente. Pode-se dizer que a criança pequena que apren­
deu a levantar suas mãos em louvor, acomodou-se ao seu ambiente ao apren­
der o com portam ento das pessoas ao seu redor.
A população de veados no norte de Illinois, onde eu m oro, estava fora de
controle por causa do crescimento do tam anho dos rebanhos e o decréscim o
da área em que viviam. Como resultado, o veado teve de acomodar seu com ­
portamento e pastar ao longo das estradas, diante dos humanos; eles também
aprenderam a assimilar novos tipos de alimento, já que suas áreas comuns de
alimentação tinham desaparecido.
Da mesma forma, os seres humanos aprendem a se acomodar ao ambiente e
a assim ilá-lo. Bebês aprendem a colocar novas coisas na boca quando seus
pais tentam lhes ensinar a comer comida sólida. Mas eles devem também apren­
der que nem tudo o que eles encontram deve ir para a boca. Portanto, à medida
que os bebês atuam se adaptando ao ambiente, eles também se desenvolvem
cognitivam ente quando estabelecem categorias de coisas que posso colocar
na boca e coisas que não podem ir para a minha boca.
As crianças continuam a se relacionar e a explorar ativamente o ambiente.
Pode-se praticam ente vê-las aprendendo enquanto exploram seu mundo e o
organizam cognitivamente em sistemas significativos. Enquanto isso, eles adap­
tam seu comportamento ao que eles estão aprendendo, sempre tentando m an­
ter um equilíbrio entre o que eles estão aprendendo e como se comportam.

Equilíbrio
A força reguladora entre a assimilação e a acomodação é o equilíbrio.
A mente humana procura entender para manter as idéias em equilíbrio; assim as
o D esenvolvimento C ognitivo 101

crianças encontram modos simples para explicar o mundo, oferecendo explica­


ções infantis para o que elas experimentam. Mas à medida que o mundo delas
cresce e suas habilidades para entender se desenvolvem, as crianças procuram
níveis melhores e mais adequados de equilíbrio. As explicações infantis não con­
seguem satisfazer a mente sofisticada do adulto, assim o ímpeto da procura do
equilíbrio estimula a mente em direção a níveis de raciocínio mais altos.
Piaget acreditava que três fatores estimulavam o desenvolvimento cognitivo:
maturação, experiência e transmissão social. Primeiro, a maturação é mais do
que uma força biológica; é também cognitiva. Assim como o corpo amadurece,
a mente também amadurece, desenvolvendo novas capacidades para pensar e
raciocinar. As crianças exercitam os músculos que crescem, fortalecendo-os
pelo uso. Da mesm a forma, elas devem usar a mente para fortalecê-la a cada
nível de desenvolvim ento. Mas a m ente é mais do que um m úsculo a ser
fortalecido; é um aspecto do desenvolvim ento da personalidade hum ana,
crescendo de maneiras previsíveis.
A experiência também incentiva o desenvolvimento cognitivo ao fornecer
informação sensorial para as crianças. Um envolvimento ativo com o ambiente
p e rm ite q u e as c ria n ç a s o b te n h a m in fo rm a ç ã o n e c e s s á ria p a ra o
desenvolvimento cognitivo posterior. A experiência do envolvimento sensorial
direto com o am biente é o que Piaget tinha em m ente— não um tipo de
envolvim ento “acadêm ico” estéril, mas aquele que possibilita tocar, provar,
cheirar e ouvir de modo direto. Por causa dessa necessidade, Piaget acreditava
que “a brincadeira é o trabalho da criança” . E pela brincadeira que a criança
é capaz de obter esse tipo de experiência.
A transmissão social é o terceiro fator que estim ula o desenvolvim ento
cognitivo. As instruções verbais dadas pelos pais e pelos professores são
estímulos essenciais para o crescimento cognitivo. As crianças devem discernir
entre as várias coisas ditas a elas, conciliando as várias mensagens que rece­
bem. Quando elas ouvem uma mensagem contraditória, um conflito cognitivo
é experim entado à medida que o seu senso de equilíbrio é perturbado. Nesse
sentido elas podem ser desequilibradas (não é um term o usado por Piaget,
mas descreve o estado) e procurarão encontrar níveis mais altos de entendi­
m ento que possam servir para resolver o conflito e restaurá-las a um estado
de equilíbrio.
A criancinha aprende que “Jesus é o bebê do natal” que foi colocado numa
manjedoura por sua mãe. Mais tarde, a mesma criança aprende que “Jesus era
o Filho de Deus que morreu nma cruz pelos nossos pecados” . Essas mensagens
estranhas e conflitantes podem ser resolvidas somente quando a criança enten-
102 E nsino e C rescimento

de que o bebê cresceu e se tornou um homem que morreu nma cruz. O equilí­
brio é restabelecido quando o nível mais alto de pensamento é conseguido.

ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO


o trabalho de Piaget é notável porque ele via as crianças, não como adultos
em miniatura, mas como seres cognitivamente diferentes dos adultos. Ele enten­
dia que elas viam o mundo de maneiras diferentes dos adultos e que estes dife­
rentes modos de entendimento deveríam ser respeitados. Além do mais, em vez
de procurar entender diferenças individuais, ele tr-abalhou para descrever as
maneiras nas quais as crianças são iguais. Ele acreditava que em todas as
épocas e em todas as culturas houve padrões previsíveis em relação ao modo
como as crianças fizeram o seu ambiente fazer sentido para elas. Houve “estágios
invariáveis e seqüenciais do desenvolvimento cognitivo” pelo qual todas as crian­
ças devem passar em suas jornadas em direção à vida adulta.'’
Por meio de um a extensa observação e entrevistas com crianças, Piaget des­
creveu e refinou os estágios do desenvolvimento cognitivo pelos quais as crianças
progridem. Somente um breve resumo desses estágios pode ser oferecido aqui.’

Período Sensorimotor
Os dois primeiros anos de vida são caracterizados pela aquisição sensorial
crescente sofisticada e pelo início rudimentar do pensamento cognitivo.

^ Piaget usou o modo filosófico do estruturalismo, que nunca havia sido usado antes na
Psicologia. O estruturalismo procura entender as partes em relação ao todo, que é o oposto
à pesquisa científica normal. Ele procura padrões de relacionamentos, procurando encontrar
a estrutura de uma cultura, linguagem ou trabalho literário, ou, no caso de Piaget, a
epistemologia da criança. Seu amplo uso de equações algébricas para explicar o produto da
lógica de uma criança é uma tentativa para definir os relacionamentos de pensamento na
mente da criança. Seu poder de análise estrutural permitiu-lhe tirar conclusões excepcionais.
Quase sempre, as literaturas sobre os estágios de Piaget descreverão quatro estágios do
desenvolvimento cognitivo—o sensorimotor, o pré-operacional, operações concretas e ope­
rações formais. Nos escritos de Piaget, o estágio pré-operacional é na verdade um subestágio
importante das operações concretas. No entanto, a maioria dos escritores que discutem sua
teoria separa as pré-operações num subestágio distinto por causa da quantidade de atividade
incluída ali. Eu escolho seguir esse caminho e descrever quatro estágios do desenvolvimen­
to cognitivo.
o D esenvolvimento C ognitivo 103

O estágio é chamado sensorimotor porque as crianças dem onstram sua


inteligência por meio de dados sensitivos e atividade motora. Os pais se deliciam
quando seus filhos demonstram um reconhecimento visual deles por meio de
um atividade m otora— sorrindo ou chutando os pés de alegria quando os pais
aparecem diante deles.
As crianças começam a vida exclusivamente egocêntricas— cientes somente
de si mesmas. Há pouca sensibilidade em relação ao mundo fora delas mesmas
e nenhum claro significado de entender a ampla gama de estímulos sensoriais
que elas recebem . M as à m edida que am adurecem , elas estabelecem novos
padrões de com portam ento como um meio de interagir com seu m undo.
G eralm ente concentradas em torno do sugar, as crianças progridem para
com portam entos (atividades m otoras) projetadas para ajudá-las a encontrar
novas coisas para sugar.
Piaget descreve seis subestágios no período sensorimotor que fornecem o
movimento em direção à finalização do estágio cognitivo. A necessidade principal
das crianças neste nível é ser cuidada física e em ocionalm ente. As crianças
precisam de um ambiente seguro e do estímulo sensorial de ser tocada e segu­
rada. Isso demonstra-lhes que o mundo é um lugar seguro. Esta não é a hora de
ensinar conteúdo; antes, é a hora de perm itir que as crianças explorem seu
mundo e descubram as “regras” básicas da existência.
As crianças diminuem seu egocentrismo ao aprender que outros existem no
m undo, e estes outros tam bém devem ser levados em consideração. Elas
aprendem que ações específicas podem produzir resultados específicos e que
elas podem influenciar seu ambiente. Os animais são capazes desse tipo de
aprendizado também, mas aos 2 anos a criança está progressivamente adiante
da habilidade dos animais na medida em que o desígnio de Deus para os seres
humanos continua a emergir.

Período Pré-operadonal

As idades de 2 a 7 anos constituem o período de transição do período


sensorim otor da criança para o mundo pensante da criança em idade escolar.
Atividades mentais interiores ou operações que começaram nos últimos estágios
da infância são refinadas e desenvolvidas nos primeiros anos da infância.
A tarefa principal neste estágio é aprender a usar os símbolos do pensa­
mento como um substituto para o objeto. A linguagem substitui a atividade
m otora assim como as maneiras em que as crianças adquirem o que elas que-
104 E nsino E C rescimento

rem, e elas aprendem a pensar sobre as coisas em vez de sempre precisar delas
em seu ambiente imediato. Piaget e Inhelder escreveram:

No final do período sensorimotor, mais ou menos com um ano e meio ou


2 anos de idade, aparece uma função que é fundamental ao desenvolvimento
dos padrões de comportamento futuro. Consiste na habilidade de representar
algo (algo importante: um objeto, um evento, um esquema conceituai, etc.)
por meio de um “indicador” que é diferenciado e que serve somente para
um propósito representativo: uma linguagem, uma imagem mental, gestos
sim bólicos e assim por diante . . . nós geralmente nos referimos a essa
função que leva à representação como “sim bólica”.*

B rincadeiras de “fazer de conta” são m uito im portantes para as crianças


neste estágio, porque essa atividade fornece um a experiência im portante ao
usar objetos como símbolos para outros objetos. As crianças usam um graveto
como um a arma, ou um folha como um prato, fingindo que o objeto substituído
é a coisa real. Ou elas “se vestem ” com roupas diferentes, representando um
pensamento simbólico ao fingir ser alguém em uma diferente época ou lugar.
O monólogo coletivo é o padrão primário da fala da criança pré-operacional.
As crianças falam mais consigo mesmas do que com os outros, fornecendo um
com entário para com suas próprias ações e seus pensam entos. É som ente na
parte final deste estágio que as crianças na verdade interagem verbalmente com
alguma consistência com outras crianças.
A criança pré-operacional olha para o mundo de maneira bem diferente dos
adultos. Tudo é visto como existindo especificamente para a criança, e todos
compartilham com o ponto de vista da criança. Uma bolinha de gude rola descida
abaixo porque ela sabe que você está lá embaixo e portanto deseja ir até
você. As explicações ainda são muito egocêntricas, e m uitas das funções do
mundo podem ser controladas como por mágica pela criança.
O egocentrism o não perm ite que a criança tome o ponto de vista de outra
pessoa. Quando Piaget levou seu filho para uma volta de carro, ele observou
que o garoto não reconhecia uma certa montanha já conhecida quando ela era
vista de um ponto de vista diferente. O garoto acreditava que a montanha tinha
mudado e não seu ponto de vista.
A conservação é a habilidade de entender que certos atributos de um objeto
permanecem constantes. Em um experimento clássico, Piaget mostrou às crianças
duas bolas de barro iguais.
* Jean Piaget e Barbei Inhelder, The Psychology o f the Child (Nova York: Basic Books,
1969), 51.
o D esenvolvimento C ognitivo 105

Quando um a das bolas foi transform ada num a salsicha, as crianças criam
que agora continha m ais barro do que antes, por ser “m ais longa” . Elas não
podiam conservar o fato de que somente a forma havia mudado e não o volume.
Centi'alização é a tendência de enfocar somente certos aspectos de um objeto,
idéia ou evento e ignorar o resto. As crianças neste estágio tendem a centralizar
sua perspectiva em um aspecto de seu campo de percepção, não conseguindo
perceber outros aspectos ou relacionamentos do fenômeno sob investigação.
Os pais podem perguntar à criança o que ela fez na Escola Dominical. Ela diz,
“Nós comemos biscoitos”. “Sim, mas o que você aprendeu?” replicam os pais.
“Os biscoitos estavam bons!”, é a resposta da criança. “Mas vocês conversaram
sobre Jesus?” o pai pergunta (indicando um interesse crescente pela falta de
conteúdo do que está sendo ensinado na Escola Dominical). “Os biscoitos eram
de chocolate”, é a resposta final da criança sobre o assunto. Papai e mamãe
decidem que ou a Escola Dominical tem de ser mais eficiente ou que a criança
não se interessa por coisas espirituais. Claramente algo tem de ser feito.
E claro que o que realmente aconteceu é que a criança centralizou, enfocando
som ente aquele aspecto na Escola D om inical que foi mais sensório e mais
prazeroso para ela. Ao amadurecer, ela aprenderá a “descentralizar” , ou
focalizar-se em complexidades maiores em seu ambiente de percepção. Mas
no momento, seu estágio de desenvolvimento cognitivo limita sua capacidade
de perceber o quadro mais amplo.
O período pré-operacional é um tempo de reaprender coisas previam ente
aprendidas no estágio sensorimotor. Agora essas coisas são percebidas de
m aneiras novas e podem ser pensadas sim bolicam ente, em vez de serem
expressas somente por meio da atividade motora. M as uma outra revolução
epistemológica está à frente à medida que a criança se desenvolve para aprender
as operações concretas.

Operações Concretas
o período de operações concretas envolve as crianças de 7 a 11 anos.
Neste período de suas vidas as limitações da centralização, do egocentrismo e
da in-eversibilidade (a inabilidade de raciocinar ao contrário partindo do efeito
para a causa) são rem ovidas pela assim ilação contínua, pela acom odação e
pelo equilíbrio. Mai‘y Ann Spencer Pulaski escreveu.

A criança pré-operacional pode formar imagens mentais ou represen­


tações sim bólicas, como evidenciado por seus desenhos, suas brincadei-
106 E nsino e C rescimento

ras de fazer de conta e seu uso da linguagem. N o entanto, ele funciona


não logicamente, mas intuitivamente, dependendo da percepção imediata
e da experiência direta. N o experimento com as bolas de barro, por exem ­
plo, o raciocínio da criança pré-operacional é: eu percebo que as bolas são
diferentes; portanto elas devem ser diferentes. A criança que está ope­
rando logicamente raciocina assim: as bolas eram iguais no com eço, então
elas devem ser as mesmas agora, ainda que pareçam diferentes.'’

A habilidade lógica das crianças neste estágio permite que elas entendam o
m undo de m aneiras novas e im pressionantes. Com essas novas habilidades
cognitivas, conceitos que eram previamente misteriosos, conlrecidos somente
por crianças m ais velhas e adultos, agora podem ser entendidos. Operações
Concretas é um estágio de entusiasmo e intenso aprendizado. Neste estágio as
crianças não são mais limitadas a dados perceptuais para fazerem julgam entos
sobre problem as concretos e reais; elas agora podem usar pensam ento
operacional lógico que é capaz de percepções reversíveis descentralizadas.
M uitas habilidades cognitivas novas servem para liberar o pensam ento no
estágio das operações concretas. Grupo é a idéia m atem ática que se refere a
um grupo de elementos que utilizam os princípios de composição, associatividade,
identidade e reversibilidade. Aqueles que estão familiarizados com a lógica da
“nova m atem ática” reconhecerão esses termos. Piaget usou essas idéias para
explicar a lógica das operações concretas.
Pulaski explicou o conceito desta forma:

Um agrupamento fundamental muito sim ples está interessado no


relacionamento da identidade ou equivalência. Se A^B, e B=C, então A=C.
Como um exemplo disso, Piaget perguntou a um grupo de garotos se eles
tinham irmãos. Um garotinho chamado Paul disse que sim, ele tinha um
irmão chamado Etienne. Quando perguntado se Etienne tinha um irmão, o
garoto disse que não. Seu ponto de vista limitado o impedia de entender
que ele tinha o mesmo relacionamento com Etienne que Etienne tinha
para com ele.'°

A conservação que estava ausente nas pré-operações, é evidente neste


estágio. Em um outro experimento clássico, foram mostradas às crianças duas
fileiras de oito moedas, com uma das fileiras mais espalhada que a outra. Quan­
do perguntadas sobre qual fileira tinha mais moedas, as crianças pré-operacionais
escolheram a fileira que tinha mais espaço entre as moedas, a mais comprida.
Pulaski, Understanding Piaget, 53.
Idem, 57.
o D esenvolvimento C ognitivo 107

As crianças no estágio das operações concretas rapidamente contaram as mo­


edas, conservando a idéia de que o número não havia mudado, somente o espaço.
Classificação é a habilidade de ultrapassar pequenas diferenças perceptuais
e manter as sim ilaridades de acordo com um esquem a de classificação. Mos-
trou-se às crianças vinte contas de madeira— dezoito marrons e duas brancas.
Pediu-se para as crianças separarem as m arrons, dando-lhes a classificação
“marrom”. Então perguntou-se se havia mais contas marrons ou de madeira. A
maior parte das crianças pré-operacionais respondem que havia mais marrons
porque percentualmente a classificação de marrom era a mais forte. As crian­
ças no estágio de operações concretas incluíram as contas brancas na classifi­
cação das contas de madeira, mostrando a habilidade de combinar classes para
formar uma nova categoria.
A serialidade tam bém emerge no estágio das operações concretas, perm i­
tindo que as crianças numerem e coloquem objetos, eventos e idéias em ordem
lógica. A criança pré-operacional tem uma grande dificuldade em colocar eventos
históricos em ordem, tais como aqueles registrados na Bíblia. “Quem veio pri­
meiro, Jesus ou M oisés?” é um a questão além da habilidade lógica de um a
criança de 4 anos de idade. Mas um a criança de 9 anos tem a habilidade para
pôr em ordem, junto com a habilidade de entender conceitos de tempo, espaço
e velocidade. Essas novas habilidades permitem que as crianças decifrem mui­
tas das informações adquiridas mas não entendidas em anos anteriores.
Esses tipos de agrupamentos lógicos permitem que as crianças organizem e
entendam seus ambientes de formas mais satisfatórias. Mas elas ainda são limita­
das em relação ao que é concreto— o que elas vêem e experimentam. O m ovi­
mento em direção ao estágio seguinte abre o mundo das possibilidades e hipóte­
ses. Quando entram na adolescência, a libertação final de seus pensamentos emerge.

Operações Formais

Ao redor dos 11 ou 12 anos, as crianças entram nas operações formais, o


últim o estágio do desenvolvim ento cognitivo delas. P iaget e Inhelder
apresentaram o estágio assim:

A grande novidade deste estágio é que pela distinção de forma e con­


teúdo a pessoa se torna capaz de raciocinar corretamente sobre proposi­
ções em que ela não acredita, ou pelo menos ainda não, isto é, proposi­
ções que ela considera pura hipótese. Ela se torna capaz de tirar as con-
108 E nsino e C rescimento

clusões necessárias das verdades que são meramente possíveis, o que


constitui o começo do pensamento dedutivo hipotético ou formal."

No estágio das operações formais, os adolescentes e adultos com eçam a


pensar de uma forma puramente teórica, imaginando possibilidades e raciocinan­
do com uma lógica pura, à parte dos constrangimentos do conteúdo. Um proble­
ma tal como “Se um can'o é maior do que uma casa, e uma casa é maior do que
um caminhão— qual é o maior, o carro ou o caminhão?” não precisa ser resolvi­
do por constrangimentos da realidade, mas com base nas informações dadas.
Também neste estágio uma pessoa pode agora imaginar outras possibilidades
além daquelas que de fato existem. A habilidade de imaginar situações perfeitas
produz o idealismo da adolescência. Além do mais, o questionamento da ado­
lescência nasce da habilidade de pensar de novas maneiras.
O desenvolvim ento dentro Afinal de contas, questionar é muito
do estágio das operações for­ melhor do nunca questionar, porque
mais pode influenciar o pensa­ questionar significa pensar e pensar
mento religioso. Adolescentes é necessário para o crescimento
a g n ó stico s podem em ergir espiritual.
quando a juventude da igreja questiona a real existência de Deus. Outras ques­
tões de fé, tal como a fidelidade das Escrituras ou a exclusividade de Jesus
como o único meio de salvação podem emergir. Essas questões não indicam
um a crise na fé, mas antes indicam o fato de que os jovens estão usando a
capacidade cognitiva para pensar sobre a fé. A final de contas, questionar é
muito melhor do nunca questionar, porque questionar significa pensar e pensar
é necessário para o crescimento espiritual.

IMPLICAÇÕES PARA A
EDUCAÇÃO CRISTÃ
Quando Goldman entrou em cena defendendo uma abordagem revisada da
educação religiosa das crianças, ele havia sido estimulado pelo estado da edu­
cação religiosa na G rã Bretanha.
Lá o treinamento religioso é parte do currículo da escola pública. O proble­
m a era que as crianças pareciam se tornar menos religiosas como resultado
desse treinamento. Tentando falar sobre este problem a e levando Piaget a sé-

" Piaget e Inhelder, The Psychology of the ChUd, 132.


o D esenvolvimento C ognitivo 109

rio, ele term inou defendendo que a Bíblia não deveria ser ensinada até que as
crianças tivessem desenvolvido uma adequada “prontidão para a religião”.
A perspectiva de Goldman era baseada fortemente tanto na Teologia como
na Psicologia. Sua pressuposição sobre a Escritura era que ela é um documento
humano, registrando mitos, lendas e percepções antigas de como Deus se comu­
nicou com o ser humano. Não é a Palavra inspirada e autoritativa de Deus.
Dado esse entendim ento, não é surpresa que ele considere desnecessário o
treinam ento religioso das crianças. Ele escreveu, “uma educação religiosa
bibliocêntrica enfatiza que a Bíblia deve ser ensinada porque ela é a Bíblia. Uma
educação religiosa centrada na criança, no entanto, enfatiza que a criança como
um a pessoa em crescimento é que deveria ser nossa preocupação” .
Goldman montou uma falsa dicotomia, pedindo ao leitor para escolher entre
a Bíblia e a criança. Em lugar de fazer uma escolha, o que é inapropriado, nós
devemos determ inar como considerar ambos — a importância da teologia da
Bíblia e o desenvolvimento cognitivo da criança. Goldman está correto ao tentar
tomar seriamente o trabalho de Piaget, mas está errado em sua conclusão. Quais
são então as im plicações do desenvolvimento cognitivo para a educação que
visa o crescimento espiritual? Como nós podemos usar as informações de Piaget
para nos ajudar a ensinar as crianças mais eficazmente? As seguintes im plica­
ções podem ser tiradas:

1. Ensinar é uma questão de estimular o equilíbrio.


A dm itindo-se os processos de assim ilação e acom odação, nós podem os
desenvolver uma abordagem para um ensino eficaz. Um ensino eficaz começa
ao se ativar as estruturas cognitivas existentes pela introdução de conceitos
fam iliares. Com eçar com o que é conhecido cativa a mente e fornece uma
estrutura para o que virá a seguir.
Segundo, o professor deve introduzir novos conceitos ou fatos que as
estruturas cognitivas existentes não podem acomodar. Essa interrupção do
equilíbrio cognitivo pode causar um certo grau de desconforto, mas é necessário
para o processo de aprendizado. O pequeno nível de ansiedade gerado com o
desequilíbrio fornece a “energia” necessária para o aprendizado.
Alunos que foram incomodados coin uma aula conhecem bem o sentimento
de não estar equilibrado. Há um desconforto que pode ser útil para o aprendi­
zado, não perm itindo que a pessoa descanse até que a questão seja resolvida.
Mas quando o desequilíbrio se torna muito severo, funciona como um dano ao
aprendizado. O estudante que diz, “eu não quero pensar sobre isso” está dizen-

■Goldman, Religious Thinking, 68.


110 E nsino e C rescimento

do, “eu não quero ser desequilibrado.” O professor sábio é sensível sobre o
nível correto de desconforto apropriado para um aprendizado eficaz.
Terceiro, o professor ajuda o aluno a criar novas estruturas cognitivas que
podem assimilar as novas idéias. Ensinar é uma questão de ajudar as pessoas a
pensar de maneiras mais adequadas sobre o assunto em questão.
As parábolas de Jesus serviram a esse propósito. Ele com eçava falando
sobre um conceito familiar, apresentava um a nova idéia que rom pia com as
categorias religiosas de sua audiência, e então resolvia o conflito ao sugerir
m elhores formas de pensar sobre o reino de Deus. Da m esm a form a, ensinar
é um a questão de apresentar novas inform ações ou novos conceitos e ajudar
os alunos a reestruturarem o pensam ento para incluir a nova inform ação de
maneira responsável.

2. Os estágios cognitivos controlam o que a criança pode aprender.


O aprendizado está subordinado ao nível de desenvolvim ento cognitivo.
C onceitos que vão além da habilidade cognitiva da criança não podem ser
atingidos até que um estágio cognitivo apropriado seja alcançado. As crian­
ças gostam de agradar os adultos; elas aprendem a dar as respostas que elas
crêem que nós querem os ouvir, mas isso é diferente de com preender o que
estão dizendo.
Há alguns anos, visitei um a classe de crianças de 2 e 3 anos em um a igreja
na Flórida. A professora estava revisando a lição da aula anterior com as crian­
ças. E la relem brou-os, “Lembram-se da semana passada quando nós estuda­
mos aquela palavra bem g-r-a-n-d-e, ‘propiciação’?” Propiciação é central no
evangelho, afirmando que a morte de Cristo satisfez a justiça de Deus e apazi­
guou a ira de Deus contra o pecado, m as não é um conceito que pode ser
apreendido por crianças nem bem pré-operacionais ainda, em seu desenvolvi­
mento cognitivo.
A pesquisa de Piaget ensina-nos a considerar o conteúdo que nós ensina­
mos, fazendo-o apropriado ao modo como nossas crianças pensam. As crian­
ças precisam ser ensinadas sobre a verdade, mas ela deve ser apresentada de
maneira que elas possam entender.
Larry Richards oferece uma distinção muito útil entre o significado exausti­
vo versus o significado verdadeiro. Ele afirma; As vezes a possibilidade de co­
nhecer a Verdade é rejeitada porque nós não podem os saber toda a Verdade.
M as não é necessário saber a Verdade perfeitam ente para conhecer a Verda­
de. Certamente um a criança não pode “entender” a onipresença. M as ela pode
entender que “Jesus está sem pre com igo” . A verdade m aior da onipresença
o D esenvolvimento C ognitivo 111

veio a ter verdadeiro significado para e la ... .embora seja limitado seu enten­
dimento de “Jesus,” de “sempre,” ou de “com” .'^
A Teologia nos diz sobre o conteúdo que nós precisam os ensinar, m as a
Psicologia nos ajuda a saber quando e como nós devem os ensiná-lo. Paulo
relem brou a Tim óteo, “e que, desde a infância sabes as sagradas letras, que
podem tom ar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus” (2 Tm 3.15).
M as nós devemos também lembrar que quando o menino Jesus foi ao templo
aos 12 anos e sentou-se entre os m estres para ouvir e questionar, “ ... todos
os que o ouviam muito se admiravam da sua inteligência e das suas respostas”
(Lc 2.47). O que foi im pressionante nesse encontro foi que o m enino não
pensava como um a criança.
A Educação Cristã precisa respeitar a Escritura, valorizando-a como a Pa­
lavra de Deus. Mas deve também respeitar as crianças, reconhecendo que Deus
projetou-as diferentes dos adultos. Certamente o Espírito Santo pode dar um
entendimento incomum às crianças, mas no fluxo normal dos acontecimentos,
nós não devemos esperar que ele viole o modo como os projetou.

3. Evitando abstrações multissimbólicas para crianças com menos de


12 anos.
A maior parte de nossa conversa cristã é baseada em conceitos complexos.
Usar ternios tais como “Convide Jesus para entrar em seu coração” ou “Entre­
gue-se totalmente para Deus” requer mais sofisticação cognitiva do que a m ai­
oria das crianças pode ter. Esses conceitos são baseados em uma variedade de
significados simbólicos que estão além do alcance das crianças. De fato, alguns
conceitos estão além do alcance dos adultos (O que significa “pedir para Jesus
entrar em seu coração”?).
Claram ente as crianças são capazes de ter fé. Em M ateus 18.3 nosso Se­
nhor usou a humildade da criança como um modelo para a pessoa que perten­
ce ao reino, afirmando que tal humildade seria a base para uma confiança igual
a que as crianças têm. Mas isso é diferente de entender que as crianças conhe­
cem tudo de nossa term inologia e nossos conceitos abstratos. Especialmente
aqueles que trabalham com crianças devem estar cientes de como as coisas
devem ser ditas, considerando a habilidade cognitiva da criança.

Richards, Theology of Christian Ediication, 185.


112 E nsino e C rescimento

4. O aprendizado concreto é necessário para um pensamento abstrato


posterior.

Em lugar de simplesmente não ensinar a Bíblia, como sugerido por Goldman,


nós devem os nos esforçar para ensinar às crianças as histórias bíblicas para
que, à medida que elas se movem para o estágio das operações formais tenham
inform ação bíblica com a qual possam form ar seu novos m odos de pensar.
Como Richards observou corretamente;

Esse processo de reconstruir a percepção de alguém sobre a realidade


a p a rtir dos dados que se possu i continua à medida que a criança passa
de um estágio para outro. Mas dados que não se têm (por “dados” eu
quero dizer conceitos, termos, sím bolos, etc.) não podem ser m anejados
nesse processo de reestruturação! A criança construirá uma visão de
mundo com os dados que ela tem. . . e ser o conteúdo teológico e
m oral não fizerem p a rte de seu hanco de dados, sua construção da
realidade os deixará de fora! (itálicos do autor)''*

E provavelmente muito melhor contar as histórias bíblicas do que lê-las. Elas


foram feitas para serem contadas, e ao contá-las nós podem os torná-las
apropriadas ao nível cognitivo da criança. Nós podemos escolher uma linguagem
que é apropriada para o nível cognitivo da criança e dar vida à história por
meio da influência da voz e da interpretação oral.
E claro que nem tudo da Escritura é apropriado para as crianças mais novas.
Nós devemos escolher o conteúdo que é inteligível e aplicável à vida da criança.
Especialm ente apropriadas são as histórias que ensinam sobre o caráter de
Deus— sua bondade, grandeza, majestade e santidade. Também, as histórias
que contam sobre os atos poderosos de Deus a favor de seu povo tem um
significado especial para as crianças.

5. Enfatizar uma interação social e um estímulo ambiental.

O aprendizado é conseguido pela interação com o ambiente. “Sente-se e


fique quieto” deve ser dito somente quando se quer obter controle na sala de
aula. As crianças aprendem por meio de um envolvim ento ativo— tocando,
saboreando, cheirando, sentindo e fazendo. Por causa do processo de adaptação,
as crianças precisam de ambientes ativos e interativos para o aprendizado.

idem, 186.
o D esenvolvimento C ognitivo 113

Professores eficazes pensam em termos de atividades para o aprendizado


para as crianças. A atividade é dirigida e controlada de maneira que o aprendi­
zado possa ser conseguido. As crianças são dirigidas em um envolvimento ativo
com seu ambiente para estimular o aprendizado.

6. Concentrar-se em um aspecto central da lição para crianças


menores de 7 anos.

Por causa da tendência da criança de centralizar, lições bem elaboradas


concentram-se em uma idéia-chave. Todas as atividades do dia concentram-se
em uma idéia, que é ensinada numa variedade de maneiras. Um simples conceito
tal como “Deus nos ajuda” é ensinado mediante histórias, músicas, brincadeiras
e desenhos. A repetição embutida permite que a criança apreenda o conceito
de várias maneiras, o que aumenta a probabilidade de aprendizado.

7. Abstração para uma criança com menos de 12 anos deve estar


sempre atrelada a um referencial concreto.

Crianças no estágio de operações concretas são capazes de raciocínio abstrato


se a abstração estiver relacionada com algo real. A matemática é ensinada, por
exemplo, usando “maçãs e laranjas” para atrelar o conceitos abstratos aos objetos
da vida real. Em lugar de pedir à criança para raciocinar somente no domínio
teórico, o professor torna o conceito concreto ao ligá-lo à realidade.
Da mesm a forma, os conceitos teológicos devem ser ligados às situações
da vida real. O am or de D eus, por exem plo, deve ser discutido baseado em
exemplos reais de seu amor para conosco. Se o conceito for deixado totalmente
abstrato, a criança terá dificuldade em compreendê-lo, mas quando é atrelado
às m aneiras reais em que Deus expressa amor, o conceito pode tornar-se
“vivo” e significativo para a criança. M uitos adultos apreciam a discussão
teórica, mas as crianças pensam que tais discussões são “bobas” porque elas
não podem ver a relevância delas para com sua vida. Som ente quando a
teo ria é atrelada à experiência real a criança apreciará a im portância do
conceito que está sendo discutido.

8. Permita questionamentos e diálogo para corrigir concepções erradas.

Com o as crianças pensam de m odo diferente dos adultos, sua percepção


precisa ser verificada para avaliar como elas estão entendendo os conceitos
que estão sendo ensinados. O ensino deve ser com diálogo com as crianças.
114 E nsino e C rescimento

permitindo que expressem seu entendimento e levantem questões. Como a Edu­


cação C ristã está preocupada com um pensam ento correto, é especialm ente
im portante que as crianças entendam o que está sendo ensinado. Concepções
erradas podem levar a temores inapropriados ou outras conclusões que podem
atrapalhar o crescimento espiritual.
Ensinar é um a questão tanto de ouvir como de falar. Especialmente quando
nossos alunos pensam de maneiras diferentes das nossas, nós precisamos ouvir
o que elas estão dizendo e ajudá-las a entender corretam ente. Por m eio de
perguntas e do diálogo nós podemos corrigir os conceitos errados das crianças
e conduzi-las a um melhor entendimento da fé.
A Bíblia foi feita para ser ensinada para as crianças, mas deve ser ensinada
em m aneiras que brotam de como as crianças aprendem e do processo de
informação. Piaget ajudou-nos a entender o modo como as crianças pensam, e
isso é importante para entender como ensiná-las de uma maneira responsável.
A Educação Cristã precisa considerar o desenvolvimento cognitivo das crianças.
CAPITULO 8
DESENVOLVIMENTO MORAL
A Escritura afirma que Deus é santo e que os seres humanos são pecadores
e carecem da glória da perfeição moral de Deus. Somente os m ais ingênuos,
aqueles que não podem suportar ou não desejam ver apecaminosidade humana,
defendem a bondade básica da humanidade. As pessoas têm um grande valor e
um a grande dignidade, mas não uma grande bondade. Nós somos lim itados e
controlados pela natureza moral que se rebelou contra Deus e comete injustiças
co n tra nossos sem elhantes. Com o um a raça, os seres hum anos foram
corrompidos pelo pecado.
O mito educacional que dizia de que as únicas coisas que o homem precisa
são um am biente apropriado e um estím ulo apropriado para serem bons foi
desafiado por muitos. Está se tornando cada vez mais óbvio que é necessário
mais do que um bom ambiente. O que se precisa é de uma educação que ajude
as pessoas a crescerem moralmente e a tomarem decisões morais corretas.Toda
a esfera da educação moral ganhou atenção crescente no setor público à medida
que o século 20 chegava ao seu final.
A moralidade tem sido sempre uma preocupação da igreja, porque ela é um
resultado im portante da fé. Deus quer que nós destingamos o certo do errado
para fazer o que é certo e evitar o que é errado.
A moralidade é, numa grande medida, uma questão de valores. O que a pessoa
valoriza irá moldar as decisões morais que ela toma. Assim a igreja está interessada
em ensinar as pessoas a valorizarem o que Deus valoriza e a odiar o que Deus
odeia. Infelizmente, a abordagem normalmente usada pela igreja de nomear e
comunicar valores cristãos não tem sempre sido bem-sucedida. As pessoas podem
conhecer a coisa certa a fazer mas ainda deixarem de fazê-la. Ou pior ainda,
elas mudam de idéia, decidindo que os valores aprendidos na igreja não são
apropriados ou válidos para seu contexto atual de vida.
Muitas igrejas têm experimentado a dor e a surpresa de enviar alunos para a
faculdade bem -equipados como o conhecim ento do estilo de vida cristão e
seus valores, somente para tê-los de volta anunciando, “N ós não acreditamos
m ais” . Os valores e as perspectivas morais ensinadas tão cuidadosam ente em
casa e na igreja são abandonados com relativa facilidade quando desafiados
por um a sociedade secular. A educação m oral dos pais e da igreja não os
prepara adequadamente para viverem numa sociedade de relatividade moral e
valores anticristãos.
O problem a reside no nível fundamental de um a suposição defendida pela
116 E nsino e C rescimento

igreja, a saber, que educação moral significa ensinar as pessoas a acredita­


rem nas coisas certas. Inerente a essa suposição é que se as pessoas sabem a
coisa certa elas farão o certo. Mas será essa suposição verdadeira ?

AS LIGAÇÕES ENTRE O SABER E O FAZER


Se fosse verdade que saber é fazer, tudo que precisaríamos fazer seria ensinar
às pessoas a verdade e elas então a praticariam. Mas tanto a experiência quanto
a Escritura ensinam que o conhecimento não conduz automaticamente à ação.
Nós todos temos momentos quando sabemos o que deveriamos fazer, mas por
uma variedade de razões escolhemos não fazê-lo. Nós pecamos por não viver
de acordo com o conhecimento que nós temos. As pessoas não devem somente
saber o que têm de fazer; mas devem também estar dispostas a fazê-lo.

Conhecimento Vontade Força

Conhecer Fazer
Figura 3

Às vezes nós não temos um a idéia real de qual é a coisa certa a fazer. Aí
preeisamos de conhecimento moral para nos dizer o que é bom e certo para se
fazer. M as em outros m omentos nós sabemos o que devem os fazer, mas por
medo ou por pura pecam inosidade, sim plesm ente não querem os fazê-lo. A
Escritura nos avisa dessa possibilidade e conclui, “Portanto, aquele que sabe
que deve fazer o bem e não o faz nisso está pecando” (Tg 4.17).
M as 0 problem a é mais complicado ainda quando nós tanto sabemos o que
deveriamos fazer quanto queremos fazê-lo, mas não temos a habilidade para
fazê-lo. Paulo falou dessa condição quando escreveu, “Porque eu sei que em
mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está
em mim; não, porém, o efetuá-lo” (Rm 7.18). Seu problem a não era no nível
do desejo, mas no nível da habilidade. Para que as pessoas façam a coisa
certa, elas devem ter (1) conhecimento moral do que é certo, (2) estar desejosas
de fazer o que é certo, e (3) ter força moral para de fato levar adiante seu
D esenvolvimento M oral 117

desejo. A linha do conhecimento moral para a ação moral não é direta; estão
tam bém incluídos o desejo e a força para fazer a coisa certa (ver figura 3).
Educacionalm ente, não é suficiente ensinar valores morais. C ertam ente a
igreja tem um conteúdo para comunicar, mas ela deve também falar à vontade e
ao poder de fazer o que é certo. H á necessidade de uma estratégia educacional
que capacite as pessoas a crescerem em uma ação moral.

ABORDAGENS INADEQUADAS AO
DESENVOLVIMENTO MORAL
As crianças nascem separadas de Deus por causa do pecado, mas sem qual­
quer consciência moral. Elas nascem sem a capacidade de compreender assun­
tos morais por causa de suas limitadas habilidades cognitivas. M as elas devem
aprender a tornar-se seres morais. Os adultos que são amorais são sociopatas,
incapazes de alcançar as idéias de moralidade e portanto incapazes de deter­
minar o certo do errado. Eles atuam na sociedade do lado de fora dos limites
do comportamento moral aceito, geralmente como terríveis criminosos, desli­
gados de qualquer código moral. Se as pessoas devem atuar na sociedade, elas
devem desenvolver-se como seres morais capazes de raciocínio moral e dese­
jo de se com portar moralmente.
A questão do desenvolvimento moral é, Como iim infante amoral se torna
capaz de iim comportamento moralV Como essa questão é respondida servi­
rá para form ar o modo em que nós educamos para a moralidade. Várias abor­
dagens à educação moral têm sido oferecidas pelos educadores e psicólogos.

Educação do caráter
Provavelmente a abordagem mais antiga à educação moral seja a educação do
caráter. Este é um método de doutrinação que procura transmitir um certo grupo
de valores à geração seguinte. A tarefa dos adultos é dizer às crianças o que uma
boa moral é. As vezes referida como a abordagem da “sacola de virtudes” à educa­
ção moral, esta abordagem enfatiza distinguir o certo do errado e a transmissão
dos valores de uma geração para a seguinte.
O problema mais difícil com esta abordagem é determinar quais as virtudes
que devem ser ensinadas. Em sociedades governadas por tradições firmes, a

‘ Bonnidell Clouse, MoralDevelopment (GrandRapids; Baker, 1985), 20.


118 E nsino e C rescimento

seleção das virtudes ou valores a serem transm itidos já está pronta. O papel
da educação, de acordo com aqueles que adotam esta abordagem, é transm itir
esses valores para a geração seguinte.
M uitas instituições cristãs usam essa abordagem para o desenvolvim ento
moral. Acreditando que seus valores são bíblicos, elas se sentem constrangidas
a transm iti-los à geração seguinte. A dificuldade aparece quando diferentes
grupos cristãos ensinam diferentes valores, cada um defendendo seus próprios
como sendo bíblicos. Isto se tor- ., . ,_
Alguns cristãos caem na
na um problem a herm enêutico,
armadilha de acreditar que a vida
para ser resolvido no âmbito da
cristã é somente uma questão de
Teologia.
estilo de vida. Mas,
M as na sociedade de hoje as
teologicamente, retidão é uma
tradições têm sido colocadas de
lado, e m esm o os cristãos estão
questão de ação e motivação.
interpretando a Escritura de no­ Deus quer que seu povo faça a
vas m aneiras. A lém do m ais, os coisa certa pela razão certa.
cristãos estão enfrentando dilem as m orais nunca enfrentados pelas gera­
ções anteriores. R espostas tradicionais não existem porque essas questões
nunca foram enfrentadas antes. As pessoas precisam pensar sobre assuntos
m orais para que possam decidir corretam en te sobre as questões que se
apresentam a elas na sociedade contem porânea.

Esclarecimento dos Valores

Um a segunda abordagem, enraizada na filosofia da relatividade moral, é o


esclarecimento dos valores. Esta abordagem é baseada na pressuposição de
que todos os valores morais são relativos e que o único valor correto é a tole­
rância. Portanto, a tarefa do educador é ajudar as pessoas a esclarecerem seus
valores e ouvir e respeitar os valores divergentes de outros. O esclarecimento
dos valores assume a igualdade de todos os valores e resiste especificamente à
comunicação direta de qualquer sistema de valores. Diametricamente oposto à
educação do caráter, o esclarecim ento de valores procura perm itir que todas
as pessoas decidam por si mesmas quais serão seus valores.

Comportamento Moral
A terceira abordagem, o comportamento moral, é baseada no entendimento
de que a moralidade é somente uma questão de comportamento. Enraizada na
D esenvolvimento M oral 119

psicologia do com portam ento, esta abordagem enfoca o com portam ento
observável, tomando uma abordagem de aprendizado em relação à moralidade.
As crianças devem ser ensinadas a fazer o certo para que elas possam ser morais.
Alguns cristãos caem na armadilha de acreditar que a vida cristã é somente
uma questão de estilo de vida. Mas, teologicamente, retidão é um a questão de
ação e motivação. Deus quer que seu povo faça a coisa certa pela razão
certa. Um ato justo é um ato que está em com pleto acordo com a vontade de
Deus e procede de um coração que deseja somente agradar a Deus. Qualquer
coisa m enos que isso não pode ser considerada correta.
As vezes os pagãos vivem melhor do que os cristãos, sendo bons, gentis, e
mais complacentes do que aqueles que chamam a si mesmos de cristãos. Mas
porque suas ações são m ais “cristãs” do que as nossas possam ser, não signi­
fica que eles são mais “justos” . Eles podem ser motivados pelo egoísmo e não
pelo desejo de agradar a Deus.
A abordagem do com portam ento m oral pode ajudar a form ar com porta­
m ento, mas não pode ser aceita pelos cristãos como a resposta final para a
educação moral.

Conflito Moral
Brotando de um entendimento psicanalítico do comportamento humano, a
abordagem do conflito moral para o desenvolvimento moral é baseada na crença
de que dentro de todas as pessoas reside um conflito entre o idi, ou os instintos
e desejos básicos da pessoa, e o superego, que aprende as expectativas da soci­
edade. Este conflito é regulado pelo ego, que é aquela parte da personalidade
interior que deve na verdade lidar com o contexto real no qual a pessoa vive. O
método psicanalítico ajuda as pessoas a desenvolverem uma “combinação favo­
rável das características do ego e do superego para que a pessoa seja capaz de
enfrentar tanto o mundo da realidade quanto a esfera da moral” .-
H á m uito pouco de educativo nesta abordagem do desenvolvim ento m o­
ral. A ntes, o interesse é in d iv id u alizad o , enfocado nas p ersp ectiv as
fenom enológicas de cada indivíduo. Pode ser útil como um m odo de terapia
para aqueles que estão passando por dificuldades, mas não é especialm ente
benéfica para os educadores.

-ldem;26.
120 E nsino e C rescimento

A ABORDAGEM COGNITIVA
DES ENVO LVIM ENTISTA
Lawrence Kohlberg (1927-1987) foi o diretor do Centro para o D esenvol­
vim ento M oral na Universidade de Harvard, de 1968 até 1987, quando m or­
reu. Seguindo a linha de Dewey e Piaget, Kohlberg foi o primeiro a identificar
estágios claros no desenvolvimento do raciocínio moral. Sua pesquisa foi saudada
por alguns como o trabalho mais influente no desenvolvimento moral jam ais
visto e ao mesmo tempo atacada por outros como completamente incompetente.
A verdade está em algum lugar entre essas duas posições.
Criado num lar privilegiado, Kohlberg foi educado numa escola preparatória
particular. Em vez de ir para a faculdade, ele escolheu servir na marinha mercante
e terminou ajudando a levar judeus ilegalmente da Europa para a Palestina. Ele
foi preso na ilha de Chipre por causa disso e lá enfrentou a questão sobre como
o que ele entendia ser ético (salvar judeus dos alemães nazistas) poderia ser
declarado ilegal pelos ingleses. Ele se perguntou, Como se pode justificar
uma desobediência à lei e às autoridades constituídas?
Seus interesses em assuntos morais o conduziram à Universidade de Chicago
onde ele com pletou seu bacharelado em um ano. Ele continuou seus estudos
em Psicologia, interessado na possibilidade dos estágios morais do raciocínio,
defendidos mas nunca confirm ados por John Dewey. Sua dissertação de
doutorado tornou-se a base para o trabalho de sua vida, o estudo dos estágios
do desenvolvimento moral.

Terminologia da Pesquisa
Para entender a abordagem do desenvolvimento cognitivo deve-se entender
o que está sendo estudado. K ohlberg distinguia entre julgamento moral e
ação moral, reco n h ecen d o a p o ssib ilid a d e d isc u tid a acim a de um a
discrepância entre o pensamento moral e a ação moral. Sua pesquisa era feita
no campo cognitivo, concentrando-se sobre o modo como as pessoas pensam
sobre as questões m orais.
O julgamento moral tem tanto um conteúdo moral quando uma estrutura moral.
O conteúdo moral enfoca o que uma pessoa acredita ser certo ou errado. "Rou­
bar é errado"' é uma afirmação de conteúdo, declarando o aspecto do “que” do
julgamento moral. A estrutura moral enfoca o raciocínio que apóiaum conteúdo
moral, afirmando porque um conteúdo particular é certo ou errado. "Eu creio
que roubar é errado por que é contra a le i” é uma afirmação estruturada.
Kohlberg estudou o desenvolvimento da estrutura moral, identificando seis está-
D esenvolvimento M oral 121

gios de raciocínio moral, pelos quais as pessoas podem se desenvolver.


Porque K ohlberg não se concentrava no conteúdo, algumas pessoas p en­
sam que ele era relativista moral. N ada poderia estar mais longe da verdade.
Ele cria fortemente na central idade da justiça como a chave do conteúdo moral
que deveria ser crido e defendido pelas pessoas morais. De fato, o surgimento
de padrões de justiça serve, para K ohlberg, como um indicador-chave do
desenvolvim ento moral. O que K ohlberg não aceitava era a possibilidade de
que os absolutos éticos fossem enraizados na revelação divina.
Kohlberg acreditava que a Filosofia tinha de vir da Psicologia no estudo do
desenvolvimento moral. Ele rejeitou a concepção psicológica da relatividade
moral e apresentou argumentos a favor da necessidade absoluta de absolutos
éticos. Seu problema era onde encontrar esses absolutos. Em um ensaio crítico
entitulado “Do ser para o dever; Como praticar a falácia naturalista e ficar impune
no estudo do desenvolvimento moral” , ^ ele argumenta que é possível derivar
conclusões filosóficas de prem issas não-filosóficas. A falácia naturalista
especificam ente consiste em raciocinar a partir do que é (m oralidade ou
com portam entos morais aceitos que são não-absolutos) para o que deve ser
(conclusões éticas que levam consigo um senso de im perativo para todos os
tem pos e todas as pessoas).
A necessidade de absolutos éticos se origina de sua aceitação da linha de
pensamento “formalística” ou “deontológica” que vai de Immanuel Kant a .Tohn
Rawls."* Essa tradição afirmar que a melhor moralidade é de princípios^ a que faz
julgam entos morais com base em princípios éticos universais. Princípios são
diferentes de regras (que são primarianiente prescrições de comportamentos) no
sentido de que eles são orientações universais para a tomada de decisões morais.
Alguns cristãos têm criticado Kohlberg por insistir na justiça como a nor­
ma ética primária. Principalmente Craig Dykstra^ e Paul Vllz** desafiam o uso
da justiça como o fator controlador do conteúdo moral. M as nem Vitz nem
D ykstra interagem com o tem a da justiça a partir de uma perspectiva bíblica,
nem reconhecem a centralidade deste fator na Escritura. Dada a ênfase bíbli­
ca sobre a ju stiç a, parece-m e que a preocupação de K ohlberg é boa. Eu
discordo de com o ele atinge sua conclusão através da falácia n aturalística
baseada na ética deontológica, mas eu creio que a justiça é um interesse ade­
quado e apropriado para o julgam ento moral.

’ Lawrence Kohlberg, The PhHosophy ofMora! Development (São Francisco; Harper & Row,
1981)101-89.
■'John Rawls, A Theory qf Justice (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1971).
’ Craig Dykstra, Vision and Character (NovaYork: Paulist Press, 1981).
Paul Vitz, Psychology as Religion: the Ciilt ofSelf-Worship (Grand Rapids: Eerdmans, 1977).
122 E nsino e C rescimento

A afirmação do profeta Miquéias “Ele te declarou, ó homem, o que é bom e


que é o que o SENHOR pede de ti; que pratiques a justiça, e ames a misericór­
dia, e andes humildemente com o teu Deus” (Mq 6.8) fornece um resumo impor­
tante dos requerimentos éticos do Antigo Testamento para a nação de Israel.
Claramente Deus está interessado na justiça, e seu julgam ento das nações por
agirem injustamente (ver Ez 16.49) é indicativo da centralidade dessa questão.

ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO MORAL


o estudo empírico do desenvolvimento moral como parte do desenvolvimento
cognitivo com eçou com Piaget. Como parte de seu estudo do raciocínio das
crianças, ele pesquisou como elas faziam julgamentos morais. Concentrando-se
no jogo de bolinhas de gude, Piaget pediu que as crianças lhe ensinassem as
regras. Enquanto escutava cuidadosamente o raciocínio delas sobre as regras,
ele identificava duas moralidades distintas que surgiram em seqüênciano processo
de desenvolvimento— primeiro a ética de restrição e depois a de cooperação.
A m oralidade de restrição era heteronõmica, com um respeito quase m ítico
pelas regras, enquanto a outra era autônoma, reconhecendo que as regras
poderiam ser mudadas. Conceitos iniciais de justiça eram baseados na noção de
obediência às regras. Mais tarde isso se desenvolveu em entendim entos de
cooperação e justiça, com um foco na igualdade e reciprocidade.’
Kohlberg continuou esta linha de pesquisa mas concentrou-se originalmente
numa amostra de 84 garotos, de 10 a 12 anos de idade, os quais ele seguiu por
vinte anos, testando-os a cada três anos. A tendência óbvia da amostragem só
de m eninos foi contestada por Carol Gilligan,® que sustenta que as m eninas
veriam outros aspectos além da justiça como fatores controladores no raciocínio
moral. Desde o estudo original, Kohlberg incluiu mulheres em sua amostra e
interagiu com Gilligan a respeito dessa preocupação.®
U sando a antiga técnica de discussão de dilem as m orais, K ohlberg cons­
truiu situações hipotéticas que colocavam valores socialmente aceitos em con­
flito— tal como o valor da vida versus o valor da propriedade-—e então ten ­
tou entender como esses conflitos poderiam ser resolvidos por pessoas de
diferentes idades. Ele identificou seis estágios diferentes em seus conceitos

’ Jean Piaget, The Moral Jiidgement of the Child (1932; reimpressão, Nova York; Free Press,
1965).
®Carol Gilligan, InAnother Voice: Psychologicat Theory and Women's Development (Cambridge,
Mass.: Harvard University Press, 1982).
” Lawrence Kohlberg, The Psychology of Moral Development (São Francisco: Harper & Row,
1984), 320-86.
D esenvolvimento M oral 123

de ju stiça, que apareceram em seqüência invariável. Cada estágio cum pria


um reorganização hierárquica de conceitos m orais do estágio precedente,
conduzindo a um entendimento mais diferenciado e variado do dilema, e por­
tanto, a um a resolução mais justa.
Cada estágio da seqüência identificado por Kohlberg era expresso por uma
expansão da unidade social na qual o julgamento moral se aplicava e um enten­
dim ento mais com pleto de como a justiça pode ser trabalhada num contexto
social crescente. Assim o egocentrismo da infância é substituído por uma cons­
ciência de grapo na adolescência, que é subseqüentemente expandido para uma
m oralidade que tem princípios na fase adulta. Os estágios são agrupados em
três níveis consistindo de raciocínio pré-convencional, convencional e pós-con-
v e n c io n a l. O ra c io c ín io p ré-co n ven cio n a l é e g o c ê n tric o , fa z e n d o
julgam entos m orais a partir das necessidades individuais. O raciocínio
convencional é baseado no com partilhar de valores m orais com uns com o
grupo, as comunidades ou sociedades. O raciocínio pós-convencional assume
um a perspectiva anterior à sociedade, a partir de princípios que têm aplicação
universal. Cada nível consiste de dois estágios distintos, que emergem numa
ordem seqüencial invariável.

MORALIDADE PRÉ-CONVENCIONAL
Estágio Um—Moralidade Heteronômica'^
N este estágio as pessoas fazem julgam entos morais baseados nas conse-
qüências físicas de suas açÕes, procurando primeiramente evitar a punição. Sen­
tindo-se vulneráveis à retribuição das autoridades poderosas, eles tentam so­
breviver ficando longe de problem as. A obediência em si mesm a, como um
meio de evitar a punição, é o fator controlador na tomada de decisões morais.
O conteúdo moral “é errado roubar” é apoiado pela estrutura “você entrará
numa enrascada se roubar” . A justiça ou o erro de um ato é determinado pelas
conseqüências que podem trazer ao indivíduo.
N ão há virtualm ente nenhum a consciência dos aspectos da ju stiça neste
estágio do desenvolvimento.

Vários nomes foram usados por Kohlberg e outros para este estágio. Eu estou escolhendo
usar os nomes designados por Kohlberg no The Psychology of Moral Development.
124 E nsino E C rescimento

Estágio Dois—Individualismo, Propósito Instrumen­


tal e Mudança
o julgam ento neste estágio ainda é egocêntrico, mas as autoridades exter­
nas não são mais consideradas poderosas. A experiência ensinou que as ações
erradas não são sempre punidas imediatamente e as ações certas não são sem ­
pre recom pensadas imediatamente. U m a ação certa é agora vista como sendo
aquela que satisfaz instrum entalm ente às necessidades de alguém. As regras
são seguidas somente quando irão favorecer alguém. A autonomia emergente é
refletida nos julgam entos m orais baseados nos conceitos de reciprocidade e
troca justa, com a justiça sendo identificada com a lealdade.
A reciprocidade é entendida como “você coça as minhas costas e eu coça-
rei as suas”, longe de qualquer entendimento mais proEindo. O conteúdo moral
de “é errado roubar” é apoiado por uma estrutura que pode raciocinar “caso eu
roube, as pessoas provavelm ente roubarão de mim, e de qualquer m odo eu
perderei tudo” .

MORALIDADE CONVENCIONAL
Estágio Três—Expectativas Interpessoais Mútuas
Como o primeiro estágio distintamente sociável em sua orientação, o está­
gio três raciocina a partir das concepções convencionais e estereotipadas de
bondade, com a pessoa procurando ser percebida como “boa” . Às vezes eha-
mado de orientação “bom garoto - boa m enina” quanto à m oralidade, as ex­
pectativas de outros se tornam muito importantes. Uma nova consciência de
relacionamento com outros agora significa que assuntos de lealdade, respeito e
gratidão devem ser considerados.
“E errado roubar” é agora apoiado por uma lógica que diz, “todos iriam pen­
sar que você é um bandido” . A intenção por trás de uma ação agora entra em
cena, e “ele fez por bem” tom a-se uma consideração ao julgar as ações.

Estágio Quatro—Sistema Social e Consciência


N este estágio as pessoas consideram o bem -estar da sociedade como um
todo, tendo um grande respeito por m anter a autoridade das regras sociáveis.
Um comportamento certo significa fazer suas obrigações, mostrar respeito pela
autoridade e manter a ordem social atual. O bem-estar do indivíduo está ligado
D esenvolvimento M oral 125

ao bem -estar do grupo, e suas regras estão ligadas porque elas servem para
prescrever a natureza e extensão da obrigação moral de um a pessoa.
Roubar é errado porque “roubar é contra a lei, e a anarquia é o resultado se
o roubo for tolerado” . O ponto de vista da sociedade é m antido sobre a
perspectiva do indivíduo, e as regras podem ser quebradas som ente quando
elas conflitam com outras regras de igual ou maior importância.

MORALIDADE PÓS-CONVENCIONAL
Estágio Cinco—Contrato Social e Direitos Individuais
o estágio cinco m arca a transcendência das expectativas sociais pela
descoberta dos princípios de ética universal. Um contrato social e os direitos
individuais tornam-se todos importantes, com a possibilidade da realização de
m udanças nas leis para torná-las m ais justas. Os padrões sociais devem ser
exam inados criticam ente e eles devem ser aceitos por toda a sociedade.
Conquanto as pessoas neste estágio reconheçam que a maioria das regras sociais
é relativa a um a dada cultura, elas estão agora cientes de que certos direitos,
tais como aqueles de vida e liberdade devem ser m antidos em qualquer
sociedade, apesar da opinião da maioria.
“E errado roubar” pode ser colocado em questão se o roubo possibilitar a
proteção dos direitos do indivíduo. H averá m om entos em que roubar é uma
justificativa par um bem maior. Se o roubo pode aum entar o bem -estar do
grupo como um todo, o princípio da bondade maior ultrapassaria a lei.

Estágio Seis—Princípios Éticos Universais


Julgam entos morais neste nível são determ inados com base na obrigação
pessoal a princípios éticos auto-escolhidos que se aplicam a toda a hum ani­
d ad e, in d e p en d e n te m e n te de raça, sexo, n a c io n a lid a d e ou situ ação
socioeconôm ica. Os direitos hum anos e o valor e a dignidade de todas as
pessoas são enfatizados. “R oubar é errado” está baseado no princípio de
que roubar violaria os direitos de outros e portanto é injusto. As leis h u ­
m anas são válidas somente na extensão em que elas são baseadas nos princí­
pios éticos universais que servem para proteger as pessoas e m elhorar a ju s ­
tiça. A R egra de Ouro é agora estendida à suas plenas im plicações como um
im perativo categórico para todas as pessoas em todas as eras.
Com o esses estágios são reconhecidos de acordo com a capacidade de se
126 E nsino e C rescimento

raciocinar cognitivam ente, elas são dependentes dos estágios de desenvolvi­


mento cognitivo de Piaget. As pessoas não podem ser capazes de um moralidade
pós-convencional até que sejam capazes de entender as operações formais. O
entendimento do desenvolvimento moral de Kohlberg é dependente dos estágios
do desenvolvimento cognitivo dos estágios de Piaget.

COMPATIBILIDADE COM A ESCRITURA

Conquanto algumas pessoas tenham discutido que o trabalho de Kohlberg é


som ente um a reflexão de sua própria postura e não algo apoiado por dados
concretos," parece a mim que o grande volum e de dados da pesquisa de fato
indica algo válido em suas descobertas. M as esse entendim ento de como as
pessoas raciocinam moralm ente e a seqüência do desenvolvim ento indicada
por essa pesquisa é compatível com a Escritura? Como a Bíblia nos fala sobre
os assuntos morais?
A E scritura claram ente faz apelos m orais em todos os três níveis do
desenvolvimento moral. A moralidade pré-convencional se harmoniza com as
prem iações e as punições. A E scritura apela ao coração do homem por meio
das promessas de bênçãos e punições quando Deus afirma, “Obedeça-me e eu
te abençoarei; desobedeça-m e e eu te am aldiçoarei” . A pelos sobre o céu e o
inferno, benção e maldição, são apelos que têm significado para a pessoa que
raciocina no nível um, o m odo pré-convencional. Essas pessoas seguiríam o
Senhor pelo que ganhariam ou evitariam pela obediência a ele.
Algumas pregações e ensinos têm em vista esse nível ao oferecer “saúde e
riquezas” a quem seguir ao Senhor. A Escritura também fala destes modos, mas
encontramos também apelos de níveis mais altos nas Escrituras.
A m oralidade convencional está interessada na obediência à autoridade.
Muito nas Escrituras chama à obediência porque Deus falou. Tais apelos como
“O Senhor disse” e a observação tão repetida de Jesus “está escrito” m ostra
que há uma autoridade externa a ser obedecida. A Bíblia está cheia de apelos
neste nível, ensinando que Deus deve ser obedecido porque ele é Deus. A
obediência não é dependente das premiações ou punições, mas do fato de que
Deus deve ser respeitado por quem ele é.
Seria uma coisa maravilhosa elevar nossas igrejas ao nível dois de moralidade
onde a obediência à Deus é valorizada por si mesma. Muitos cristãos obedecem

'' Ver, por exemplo, R. Shweder, “Review of Lawrence Kohlberg’s Essays on Moral Development,’
em Contemporary Psychology (Junho de 1982).
D esenvolvimen to M oral 127

somente aquelas partes da Escritura que parecera boas para eles, aquelas partes
que parecem prometer uma bênção ou sucesso. A Escritura nos chama a obede­
cer a Deus porque ele é Deus, independentemente do resultado em nossa vida.
As vezes a obediência traz dor e sofrimento (Lc 14.25-35), mas mesmo assim
somos chamados a obedecer, porque ele é Senhor. N a moralidade de nível dois
as pessoas aceitam uma autoridade externa, reconhecendo que há questões mai­
ores do que “O que eu vou ganhar com isso?”
A m oralidade pós-convencional vai além da letra da lei e procura o princí­
pio subjacente que a lei expressa. A Escritura, no final das contas, inclui to ­
das as leis sob princípio, nos dizendo que se podemos viver por um princípio,
nós cumpriremos a lei. A instrução de Oséias “Pois m isericórdia quero, e não
sacrifício, e o conhecim ento de D eus, mais do que holocaustos” (Os 6.6—
repetida pelo Senhor em M t 9.13 e 12.7) e M iquéias 6.8, citada an terio r­
mente, indicam a intenção final de Deus para com seu povo. M uito do im pul­
so do Sermão da M ontanha é para ajudar as pessoas a irem além da letra da
lei até os princípios que ela está afirmando.
O conflito de Jesus com os fariseus envolvia principalmente o fato de eles
não com preenderem os princípios maiores da lei. Eles estavam tão fechados
em um pensamento legalista que não viam os aspectos maiores da justiça, mise­
ricórdia e fidelidade (Mt 23.23).
Era várias ocasiões Paulo ensina que o “amor é o cumprimento da lei” (Rm
13, 10; G1 5.14). Além do mais, nosso Senhor ensinou que toda a lei de Deus
poderia ser resum ida em dois mandamentos em amar a Deus com todo o cora­
ção e am ar ao próxim o como a nós m esm os (M t 22.37-40).
Os apelos essenciais da Escritura são feitos no nível de princípio. Depois que
Deus m uda nosso coração de modo a querermos agradá-lo, nós finalm ente
chegamos num lugar onde a lei cessa de ser a questão. O problem a com a lei é
que ela não cobre todas as possibilidades. Os fariseus acabaram criando leis
adicionais que falavam sobre questões não definidas claramente na Escritura.
Por exemplo, eles criaram regras extensas sobre o que constituía o “trabalho”,
para que tivessem certeza de não violar o sábado. Mas eles não viam o princípio
de que “o sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado” (Mc
2.27). Eles nunca conseguiram se libertar e chegar ao nível da moralidade do
princípio; não descobriram que há uma ordem mais alta do que o código escrito.
Paulo instruiu os Romanos sobre esse aspecto, ensinando-os, “Agora, po­
rém libertados da lei, estamos mortos, para aquilo a que estávamos sujeitos, de
modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra” (Rm
7.6). Quando Deus promete escrever sua lei no nosso coração (2 Co 3.3), é no
128 E nsino e C rescimento

nível do princípio que sua palavra atinge nosso interior. Esconder a Palavra de
Deus em nosso coração é muito mais do que uma questão de memorização— é
uma questão de interiorizar os princípio da Escritura e aplicá-los à vida diária.
A questão não é, “Kohlberg é bíblico?” (Ele não estudava as Escrituras; ele
estudava as pessoas.) Antes, a questão é, “Suas descobertas são compatíveis com
a Escritura?” Eu penso que sua pesquisa tem o “toque da verdade” tanto biblica-
mente quando experiencialmente e pode ser entendida numa perspectiva bíblica.

IMPLICAÇÕES PARA A
EDUCAÇÃO CRISTÃ
A Educação Cristã precisa ir além da abordagem da “ sacola de virtudes”
para uma educação moral e ajudar os crentes a aprender a pensar corretamente
sobre questões morais. A moralidade vai além do julgamento moral; considera
também a ação moral. Mas incluso na moralidade está o aspecto cognitivo do
julgamento moral. A respeito do relacionamento do julgam ento moral com a
ação moral, Koblberg escreveu:

Se a razão lógica é uma condição necessária, mas não suficiente para


um julgamento moral maduro, o julgamento moral maduro é uma condição
necessária, mas não suficiente para uma ação moral madura. Não se pode
seguir princípios morais sem o entendimento dos princípios morais ou a
crença neles. N o entanto, pode-se pensar em termos de princípios e não
viver no nível desses princípios.'-'

V ários princípios educacionais, enraizados tanto na Teologia quanto nas


descobertas de Koblberg podem ser tirados dessa pesquisa.

Pergunte "por que" sobre assuntos morais


Porque o conteúdo moral é apoiado pela estrutura moral, nós não podemos
nos satisfazer quando aqueles a quem ensinamos simplesmente sabem a resposta
certa. Todos nós conhecemos o sentimento de vazio ao descobrir que as pessoas

Novamente eu estou em dívida com o meu colega Ted Ward por seu ensaio não publicado
“The Meaning of Value Development in Biblical Perspective” por ajudar-me a moldar meu
pensamento sobre este assunto. No entanto, ele não deve ser considerado responsável por
minha perspectiva sobre o assunto.
Lawrence Kohlberg, “The Cognitive-Developmental Approachto Moral Development”, Phi
Delta Kappa 56, n.° 10 (Junho 1975): 670-677.
D esenvolvimento M oral 129

a quem nós estamos ensinando sabem as respostas corretas mas não as praticam.
Ted Ward conta um a história muito boa sobre um pastor que foi convidado
para falar numa reunião de uma classe de primário na escola cristã de sua igreja.
“Eu estou pensando em uma das criaturas de Deus”, ele disse à classe. “Vive nas
árvores e ajunta bolotas para o inverno. Ele tem um rabo grande e peludo e é
cinza. Quem pode me dizer que animal é esse?” ele perguntou. Após um longo e
doloroso silêncio, ele se dirigiu ao filho de um diácono, e este disse “Eu sei que a
resposta é Jesus, mas que parece um esquilo, parece!”
O perigo de lidar som ente com o conteúdo e não com a estrutura é que se
não há estrutura adequada, o conteúdo pode ser abandonado. A dolescentes
podem sair para a faculdade bem -preparados com todas as respostas certas,
m as não preparados para defendê-las. Quando seu pensamento é atacado e
eles não desenvolveram um raciocínio adequado para dizer por que eles crê-
em, o conteúdo moral deles será abandonado rapidamente.
Q uando m inhas filhas estavam
Nós nunca devemos ensinar
crescendo, eu freqüentemente lhes
a Teologia sem considerar as
perguntava se elas usariam algum dia
implicações da vida e nunca fazer
drogas ilegais. “N ão, papai”, era a
exigências éticas sem base
resposta delas. “Mas por que não?”
teológica.
era sempre a minha pergunta seguin-
te. “Porque você nos m ataria!”, era a resposta delas de nível um, como crian­
ças. Mas à m edida que foram ficando mais velhas, elas sabiam e eu sabia que
elas poderiam entregar-se às drogas e que eu ficaria tremendam ente desapon­
tado, mas eu não as “mataria” . Elas precisavam de um nível mais alto de racio­
cínio para não usar drogas. Perguntar o “por que” perm ite que os pais e os
educadores explorem e estimulem a estrutura do raciocínio moral.

Entenda que os "por ques" da vida crista sao basea-


dos na Teologia, principalmente no caráter de Deus.
As exigências éticas da Escritura em anam do princípio de que nós d eve­
m os refletir a santidade de Deus para o restante da criação. N ós devem os
am ar porque Deus nos am ou prim eiro. Nós devem os ser m oralm ente puros
porque D eus é m oralm ente puro. N ós devem os nos interessar pela ju stiç a
porque D eus se preocupa com a justiça. N ós devem os ser m isericordiosos
porque Deus é m isericordioso.
Os cristãos não têm de encontrar seus imperativos éticos no melhor da socie­
dade como fizeram Platão, Kant e Kohlberg. Nossos imperativos são encontra-
130 E nsino E C rescimento

dos em Deus e sua Palavra. Educadores cristãos devem pensar teologicamente


sobre as questões da vida, encontrando um a base estrutural na natureza e no
caráter de Deus. Nós nunca devemos ensinar a Teologia sem considerar as impli­
cações da vida e nunca fazer exigências éticas sem base teológica.
Eu fui exposto logo cedo em m inha vida cristã a pessoas que estavam
vitalm ente interessadas com a Escatologia, que debatiam e exploravam as
passagens bíblicas que falam do “fim dos tempos”. Mas muito desse “ensinamento
profético” referia-se a questões sobre o tempo futuro, tentando provar vários
esquem as escatológicos. Os esquemas eram ensinados sem qualquer ética, e
nós raramente discutíamos como deveriamos viver à luz dessas verdades. Mas
a Escritura nunca discute o futuro à parte de imperativos éticos. O propósito da
profecia não é m apear o futuro de m odo cuidadoso, mas ensinar-nos como
viver à luz do retorno do Senhor.
Permitir o desenvolvimento moral para o cristão, significa ajudar as pessoas
a fazerem conexões entre os valores éticos e a fé. Significa ensinar as pessoas
a pensar de forma cristã, ajudando-as a raciocinar partindo da Teologia para a
Ética e descobrir a estrutura fundamental para o comportamento moral. O de­
senvolvimento moral significará se mover além dos interesses egocêntricos da
infância para um desenvolvimento mais abrangente a respeito da sociedade e
finalmente para os princípios éticos. A interação teológica correta sobre esses
assuntos é essencial para termos nossa mente renovada.

Reconheça que a estrutura de julgamentos das pes­


soas não melhora pelo dizer ou ensinar, mas por meio
da própria experiência delas ao resolver problemas
de valor moral.
o desenvolvimento moral não é uma questão de ouvir palestras, mas na ver­
dade de fazer o trabalho de um filósofo moral. Todas as pessoas são forçadas
pelas experiências da vida a pensar sobre aspectos morais e determ inar como
se comportarão. Kohlberg construiu dilemas morais hipotéticos para estudar o
raciocínio moral das pessoas. M as a vida é cheia de dilemas m orais reais que
devem ser resolvidos se nós queremos atuar moralmente na sociedade.
As crianças encontram dilem as m orais na escola quando elas sabem que
seus am igos colam na prova e são então tentadas a colar tam bém . Os
adolescentes vivem num mundo cheio de decisões morais durante esse período
tão difícil da vida. Os adultos enfrentam questões morais continuamente à medida
que tentam decidir como ser cristão numa sociedade fundamentalmente pagã.
D esenvolvimento M oral 131

Os educadores cristãos devem estar abertos a confrontos e discussões so­


bre as difíceis questões morais do dia para ajudarem os alunos a aprenderem a
pensar. Em lugar de negar os conflitos morais, que nós enfrentamos (“cristãos
não pensam sobre essas coisas”) ou tentar resolvê-los somente com o conteú­
do (“A B íblia diz”), nós devem os estar abertos e perm itir que nossos alunos
enfrentem as questões e ajudá-los a aprender a pensar usando níveis m orais
m ais altos ao abordar os assuntos.
As pessoas ficam frustradas (desequilibradas) quando o seu modo de pensar
não pode acom odar um problem a moral. E esse processo de viver o conflito,
que dá o crescimento moral. Mas se nós tentamos negar ou ignorar o conflito,
ou tentam os “consertá-lo” com um a ou duas lições, nós não deixam os que as
pessoas tenham as experiências necessárias para o crescimento.
Algumas abordagens à Educação Cristã impedem o desenvolvimento moral.
Sempre prom etendo um prêm io por servir a Deus fechará a pessoa dentro de
um a moralidade pré-convencional. N ós servimos a Deus porque ele é Deus,
não porque receberemos algo por servi-lo. Dar é ser sacrificial, não porque ele
“abençoará” nossos 90% se dermos os 10%.
Alguns grupos fecham as pessoas dentro de uma moralidade convencional
ao passar regras e regulamentos sobre várias questões. E muito mais arriscado
oferecer às pessoas um princípio do que uma regra, mas é necessário ajudá-las
para que se desenvolvam além das regras-e-regulamentos do raciocínio moral.
M as grupos cristãos que têm num erosas regras e regulam entos na verdade
impedirão que seu povo avance no sentido de um pensamento pós-convencional.

Ajuste os apelos morais ao nível de desenvolvi­


mento dos seus alunos.
A pelos m orais devem ser feitos no nível em que o aluno age. Pedir às
criancinhas para “fazer o que Jesus faria” é um apelo ao raciocínio mais con­
vencional apropriado aos adolescentes. As crianças entendem a linguagem de
prêm ios e punições, então eles devem ser usados quando se está trabalhando
com crianças. M as se nós tentarm os m otivar os adolescentes adultos desta
forma, nós teremos de elevar o nível de premiações e punições a alturas incal­
culáveis e inapropriadas.
As escolas públicas colocam guardas arm ados nos corredores porque os
adolescentes ainda estão pensando como crianças na esfera moral. A punição
para a desobediência deve ser elevada até o nível do aprisionam ento ou da
132 E nsino e C rescimento

injúria porque eles não aprenderam a tom ar um a perspectiva m ais am pla do


que a de seus próprios interesses pessoais. Este é um com entário profunda­
mente sério sobre nossa sociedade e é indicativo de nossa falta de desenvolvi­
mento moral adequado.
Crianças mais velhas precisam de exem plos, modelos e regras justas para
ajudá-las no crescimento moral. Os pai, os líderes de jovens, os professores e
os que lidam com as crianças podem trabalhar com as crianças no sentido de
ajudá-las a crescer no sentido de imparcialidade e reciprocidade, que é crucial
para o raciocínio moral posterior.
Os adultos precisam mais do que uma abordagem “de exame de textos” da
educação moral. Eles precisam de um diálogo e da exploração de assuntos
morais para ajudá-los a identificar as diferentes fontes da construção da ética e
dos vários valores que elas representam. Em lugar de simplesmente receber o
conteúdo correto, eles precisam experimentar ao refletir e analisar as situações
de form a contem porânea. Os noticiários são cheios de questões m orais que
podem ser usados como estudos de caso para determ inar como nós devemos
pensar sobre esses assuntos e como nós devemos responder. Quando os adul­
tos exercitam sua capacidade para operações form ais a respeito de assuntos
m orais atuais que enfrentam , eles serão capazes de descobrir e explorar os
princípios éticos ensinados na Escritura.

Não tente empurrar as pessoas através dos níveis


de desenvolvimento moral.
Cada nível de desenvolvimento e seus subestágios precisam ser explorados
e vividos antes que a pessoa possa ir para a frente. O único modo de as pesso­
as respeitarem a autoridade externa a elas é primeiro ter vivido uma perspecti­
va egocêntrica e descoberto suas inadequações. O único modo de uma pessoa
poder seguir um princípio fielmente é primeiro ter vivido sob a autoridade ex­
terna e experimentado o desgaste do princípio nas leis do grupo. Cada nível é
a fundação necessária e a garantia para o próxim o nível.
Os estágios do raciocínio moral não devem ser tidos como sendo totalmente
distintos, isto é, as pessoas geralmente viverão em vários estágios sim ultanea­
mente. Seu raciocínio será predominantemente em um estágio, mas também se
moverá para trás e para frente durante o desenvolvimento do processo. Como
com todos os processos do desenvolvimento, nós devemos confiar no desígnio
de Deus para seu povo e deixar o processo se desenvolver normalmente.
D esenvolvimento M oral 133

Uma atmosfera de respeito m útuo pode contri­


buir grandemente para o desenvolvimento moral da
pessoa.
Porque o desenvolvimento moral refere-se à justiça, um ambiente no qual a
justiça prevalece ajudará grandemente o crescimento. Se as pessoas são trata­
das com respeito, não são forçadas em posições que elas não desejam , elas
podem ter a liberdade necessária para o desenvolvimento moral. Os ambientes
que controlam rigidam ente, com som ente aqueles na posição de autoridade
tendo o poder, inibirão o desenvolvimento moral. Ouvir outras pessoas, saber
de suas perspectivas e como elas as integram nas decisões, ajuda as crianças e
os jovens a aprenderem a pensar de maneira mais madura.
Um a prisão é um ambiente rigidamente controlado que faz pouco para aju­
dar os presos a crescerem . Os prisioneiros são punidos por causa de seus
crimes, mas o contexto é dificilm ente redentivo. Um ambiente distintam ente
cristão não coloca constrangim entos, mas trata todas as pessoas respeitosa­
m ente à m edida que os assuntos morais são explorados.
John Dewey pediu escolas experimentais democráticas há quase oitenta anos.
Kohlberg seguiu seu exemplo, preparando “comunidades morais justas” expe­
rim entais como laboratórios onde testava suas teorias. Ele pôde produzir alu­
nos que se saíam bem no raciocínio moral, mas não eram particularmente bem-
sucedidos em traduzir essa habilidade em ações morais. Mas isso não nega a
importância de se tratar as pessoas com respeito. A Educação Cristã precisa ir
além de K ohlberg, usar suas idéias, m as acrescentar a elas os fundam entos
teológicos necessários para uma maturidade moral mais completa.
N ossa nação está em crise m oral porque nós tem os enfocado som ente os
níveis baixos do raciocínio moral, valorizando os direitos individuais e a liber­
dade acim a de qualquer outro princípio. Mas o reino de Deus trata de santi­
dade e justiça. Ele valoriza os princípios da Escritura. N ós necessitam os de
um a Educação Cristã que ajude as pessoas a desenvolverem raeiocínio moral
para que os princípios da E scritura possam ser aplicados às realidades con­
tem porâneas. U m a tarefa da Educação C ristã é produzir pessoas que sejam
moralmente desenvolvidas.
CAPÍTULO 9
O DESENVOLVIMENTO DA FÉ
Por que a m aioria das crianças fica encantada com as histórias bíblicas e
adora ouvi-las repetidas vezes? Por que os adolescentes de repente começam
a questionar sua fé e chegam até a anunciar que não acreditam mais no que seus
pais acreditam ? Por que jovens adultos às vezes fazem novas e dram áticas
descobertas sobre sua fé, entendendo que o C ristianism o é m ais do que
doutrinas e regras, que é, na verdade, um relacionamento pessoal com Deus?
Cada um a dessas tendências e outras similares podem ser explicadas pela
teoria do desenvolvimento da fé. Assim como há estágios do desenvolvimento
cognitivo e estágios do desenvolvimento moral, a teoria do desenvolvimento da
fé apresenta a possibilidade de estágios da fé, isto é, o modo como as pessoas
entendem e experimentam sua fé emergirá através de estágios previsíveis.
Se essa teoria é verdadeira, ela oferece informações im portantes sobre como
nós devemos educar para o crescimento espiritual.

ESSA TEORIA E RAZOAVEL?

A Escritura afirma que a fé é um dom de Deus (E f 2.8-9; c f Rm 12.3; ICo


12.9). M as se nossa fé é um a questão pessoal, que é dada por Deus, será que
pode ser reduzida a estágios previsíveis? Onde está o mistério e a segredo das
experiências da fé? Será que uma teoria dos estágios da fé é algo injusto ao que
está na esfera do Espírito?
Esforços para proteger a essência sobrenatural da fé levam os críticos da
teoria dos estágios da fé a levantar essas questões. A aplicação dos elementos
cognitivo, do desenvolvimento e estrutural à fé parece ser muito lim itada e
previsível para ser apropriada para descrever a fé; para esses críticos, os estági­
os são percebidos como caixas que não permitem a obra singular de Deus.
M as pensar sobre o crescimento na fé de maneira previsível não é uma idéia
nova. A Escritura usa inúmeras metáforas para o crescimento para descrever
como nossa fé deveria amadurecer. As m etáforas do leite e da com ida sólida
sugerem que o desenvolvimento espiritual é como o desenvolvimento físico. Os
hebreus foram exortados porque eles ainda precisavam mais de leite do que de
alimento sólido (Hb 5.11-14). Também, as metáforas das sementes e das plantas
indicam que o crescim ento espiritual pode ser com parado ao crescim ento
botânico, que se move de um estágio posterior preliminar para um estágio mais
136 E nsino e C rescimento

maduro. Os apelos bíblicos à maturidade são chamadas para o crescimento, e


o padrão de crescimento é em parte previsível.
Escritores cristãos de todas as idades têm falado de estágios previsíveis da
fé. No século 12, Bernard de Clairvaux escreveu,

Assim como uma estrela difere de outra, ou uma célula difere de outra,
assim também o espírito do iniciante, o espírito daquele que faz progresso,
e o espírito do maduro podem ser distintos. O estado do iniciante pode ser
chamado “animal”, o estado daquele que faz progresso “racional”, e o
estado do mais maduro “espiritual”.
Todas as instituições religiosas são compostas destas três categorias
de homens. Aqueles no esta­
E importante entender que ter
do “animal” são os que ainda
fé não é o mesmo que colocar
não são governados pela ra­
zão nem pelas afeições. Eles nossa fé em Cristo.
são estimulados pela autoridade e pelo bom ensino e são conduzidos pelo
ensino. Mas eles são ainda como homens cegos conduzidos pela mão,
aceitando o bem onde o encontram, e seguindo e imitando outros.
Depois há o “racional”, que julga com a razão e o discernimento que
vêm do aprendizado natural. Eles conhecem o bem e o desejam. Mas eles
ainda não têm amor.
Finalmente, há os espiritualmente maduros, que são conduzidos pelo
espírito e são mais abundantemente iluminados pelo Espírito Santo. Eles
são chamados “espirituais” porque o Espírito Santo está neles assim como
estava com Gideão.'

Esse místico cristão antigo acreditava que as pessoas progridem em sua fé e


que há padrões previsíveis para o progresso. Nós podemos escolher usar diferentes
descrições desses estágios, mas a validade de tais estágios parece óbvia.
Influenciados pela Reforma, um grande número de escritores mais modernos
reconhecem a realidade dos estágios da fé.^Entendim entos educacionais
o rig in ados no Ilum inism o ofereceram novas avaliações das crianças,
reconhecendo que elas aprendem de um modo diferente dos adultos e que isso

' Bernai-d de Clairvaux, The Love ofGodandSpiritiial Friendship, versão resumida (Portiand,
Ore.; Multnomah Press, 1983), 9.
- Sharon Parks e Craig Dykstra argumentaram que uma teoria de estágios da fé pode ser mais
um modismo, mais reflexivo de nossa sociedade contemporânea do que de uma pesquisa
profunda. (Ver Craig Dykstra e Sharon Parks, org., Faith Development and Fowler [Birmingham,
Ala.; Religious Education Press, 1986].) Mas eles não olharam adequadamente os precedentes
históricos.
o D esenvolvimento DA F é 137

influencia suas experiências religiosas. Tanto o livro Some Thoughts Concerning


Education [Alguns Pensamentos sobre a Educação], de John Locke (publica­
do em 1693) quanto Emile, de Jean-Jacques Rousseau (publicado em 1762),
indicam entendim entos prelim inares do desenvolvim ento da criança e suas
implicações para o treinamento religioso.^ Além do mais, Lutero, Comenius e
Franeke reconheceram a existência e a im portância do desenvolvim ento das
habilidades e das experiências nas crianças à m edida que elas abordam e
experimentam sua fé.
N a década de 1840 Bushnell tam bém argum entou sobre a im portância de
encaixar o treinamento religioso de acordo com as habilidades emergentes da
criança. Em 1849 ele escreveu sobre o treinam ento religioso das crianças
pelos seus pais:

Os pais deveriain começar com um tipo de ensinamento de acordo com


a idade da criança. Primeiro de tudo, eles deveriam procurar ensinar mais
um sentimento do que uma doutrina, tanto para a criança nos seus próprios
sentimentos de amor a Deus, e de dependência nele, e de contrição pelo
erro diante dele, suportando o coração da criança, não temendo encorajar
cada bom motivo que elas possam ter para tornar o que é bom, alegre e
atrativo; e o que é errado, odioso e abominável. Então assim como o
entendimento avança, alimente-o de acordo com sua capacidade, abrindo
gradativamente as visões mais difíceis da doutrina e da experiência cristã."'

A avaliação de Brushnell é notável porque sua abordagem é primeiramente


afetiva e depois cognitiva. Ele defende primeiro o ensino das crianças num nível
emocional e então, à medida que elas se desenvolvem cognitivamente, acrescenta
o conteúdo teológico. Isso é com parável com a atual teoria cognitiva e do
desenvolvimento da fé.
A teoria do desenvolvim ento da fé contem porânea tenta descrever as
estruturas da fé e argum enta que todas as pessoas têm fé no sentido de que
todos devem de alguma forma tirar algum sentido de experiências de vida. Sem
considerar o conteúdo da fé, acredita-se que o fato da fé é um fenômeno humano.
James Fowler descreve isso desta maneira:

^Para uma discussão muito útil dos precedentes históricos da atual teoria do desenvolvimento
da fé ver Friedrich Schweitzer, “Developmental Views ofthe Religion ofthe Child: Historical
Antecedents” em Fowler, Nipkow e Schweitzer, org., Stages qfFaith andReligious Development
(Nova York; Crossroad, 1991), 67-81.
“Hora Bushnell, Views of Christian Nurture andSubjects Adjacent Thereto (Hartford: E. Hunt,
1849), 17.
138 E nsino e C rescimento

Ao falar da fé como uma característica genérica dos humanos— como


uma qualidade universal que dá significados— eu defendo que Deus nos
deu de antemão a habilidade para termos fé, isto é, como seres humanos
nós nos desenvolvem os com capacidades e a necessidade para fé desde o
com eço. Quer sejamos ou não explicitamente alimentados na fé de uma
m aneira cristã ou r e lig io s a , nós e sta m o s e n g a ja d o s em form ar
relacionamentos de confiança e lealdade com outros. N ós moldamos os
com prom issos de acordo com as causas e os centros de valor. N ós
consolidam os lealdades e alianças com imagens e realidade de poder. E
nós consolidamos e moldamos nossa vida em relação às histórias principais.
Assim nós nos unimos com os outros na descoberta e na produção de
significados.^

Fowler argumenta que todas as pessoas acreditam em algo, e nesse sentido


todas têm fé. Nós já estabelecemos que o que a pessoas crêem (o conteúdo de
sua fé) é importante. A Escritura afirma que nós devemos crer que certos fatos
são verdadeiros. Mas o desenvolvim ento da fé considera como as pessoas
crêem, examinando as profundas estruturas da fé humana, explorando o modo
em que as pessoas m antém o conteúdo de sua fé.
E nesses pontos que o encontro do natural com o sobrenatural se torna
evidente. O elemento sobrenatural é a aceitação do conteúdo da fé cristã (1 Co
12.3). O elemento natural está no modo como o conteúdo é crido. Se é verdade
que Deus projetou os humanos para terem fé e que a estrutura da fé se desenvolve
através de estágios particulares, então poderia também ser que mesmo a maneira
em que nossa fé em Cristo é m antida seguirá esses m esm os padrões de
desenvolvimento.
E im portante entender que ter fé não é o mesmo que colocar nossa fé em
Cristo. Dizer que a fé é um fenômeno humano não implica que todas as pessoas
têm fé em Cristo. Todos crêem em algo, mas somente aqueles que crêem em
Cristo são salvos (1 Jo 5.12). A conversão é um a m udança no conteúdo (o
que nós crem os), não necessariam ente na estrutura (como nós crem os) de
nossa fé. A fé cristã é singular em seu conteúdo, mas porque é exercida por
seres humanos, sua estrutura seguirá os padrões do desenvolvimento da fé.
Em vez de assum ir um conflito entre os padrões do desenvolvim ento e a
obra de Deus, aqueles que seguem essa abordagem procuram estabelecer uma
com patibilidade entre a teoria do desenvolvim ento e a obra de Deus ao levar
p e sso a s à fé. Eu e sto u te n ta n d o re s p e ita r tan to a p e sq u isa so b re o
^James Fowler, “The Vocation of Faith Development Theory” em Fowler, Nipkow e Schweitzer,
Stages of Faith. 22.
o D esenvolvimento DA F é 139

desenvolvimento da fé quanto as bases teológicas para a fé. Eu creio ser razoável


pensar que mesmo a fé cristã, porque é exercitada por seres humanos, seguirá os
padrões norm ais do desenvolvimento da fé. Se é verdade que Deus nos criou
para que nos desenvolvéssemos de acordo com padrões previsíveis, não podería
ser verdade que a fé também esteja sujeita ao desenvolvimento? Porque os está­
gios do desenvolvimento permitem uma maior flexibilidade dentro deles, é possí­
vel para Deus trabalhar com cada um de nós individualmente e ainda assim ver
estágios previsíveis de fé projetados por sua mão.

OS ESTÁGIOS DA FE SEGUNDO FOWLER


James W. Fowler (1940— ) é amplamente considerado o pesquisador origi­
nal na Psicologia da Religião, e é sua a teoria dominante do desenvolvimento da
fé. Form ado em H arvard, ele ensinou no Boston College e na U niversidade
Harvard antes de assumir sua posição atual como diretor do Centro de Pesqui­
sa do Desenvolvimento da Fé e da M oral na Universidade Emory.
Enquanto estava em Harvard, Fowler foi apresentado à pesquisa do desen­
volvimento de Lawrence Kohlberg, que mais tarde tornou-se seu colega e am i­
go pessoal. Fowler estava trabalhando para entender os aspectos psicológicos
de como as pessoas vêem significados em suas vidas, e Kohlberg apresentou-
lhe a possibilidade dos estágios do desenvolvim ento. Ele definiu o term o fé
para descrever o aspecto da experiência hum ana que ele estava pesquisando.
Fowler descreve a si mesmo como um “protestante liberal clássico”.’ Influ­
enciado fortemente pela teologia de Paul Tillich e H. Richard Niebuhr, e pelas
categorias epistem ológicas a priori de Immanuel Kant, Fowler desenvolveu
um a interpretação de fé que reúne um a variedade de questões. Ele oferece a
seguinte definição de fé e a explica:

Até a época em que este livro estava sendo escrito, os livros de Fowler incluíam To See the
Kingdom: TheTheological Vision ofH. Richard Niebuhr (HashmWe: Abmgàon, \ 91A)\Stages
ofFaith: The Psychology ofHiiman Development and the Qvestfor Meaning (São Francisco:
Harper & Row, 1981); BecomingAdult, BecoiningChristian: Adult Development andChristian
Faiíh (São Francisco: Harper & Row, 1894); Faith Development and Pastoral Care (Filadélfia:
Fortress, 1987); Weaving the New Creation: Stages of Faith and the Public Church (São
Francisco: Harper & Row, 1991).
^ Essa descrição e as características que seguem são tomadas da apresentação de Fowler à
National Association of Professors of Christian Education, agora conhecida como North
American Association of Professors of Christian Education, de 22 a 25 de outubro de 1987, em
Danvers, Mass.
140 E nsino e C rescimento

Fé é uma com posição, uma construção dinâmica e holística de rela­


ções que incluem o eu em relação aos outros, o eu em relação com o
mundo, e o eu em relação com o eu, interpretado como um todo relacio­
nado a um contexto final. Essa visão foi desprezada por alguns críticos
por não fornecer uma definição mais unitária e precisa da fé. . . . Ela
ten ta e v o c a r uma c o n s c iê n c ia de fé com o uma form a cen tra l
m ultidim ensional da ação e da idéia humana. A fé envolve tanto os pro­
cessos conscientes quanto os inconscientes e põe junto tanto uma dinâ­
mica racional quanto a passional. A fé junta as direções e as formas da
religião e da não-religião.*

Q uando essa definição é aplicada à fé em Cristo, Deus é o contexto final,


e 0 relacionam ento com ele e outros é transform ado. A vida e as questões da
vida podem agora ser entendidas através das lentes do Evangelho, com a certeza
de que o Deus soberano nos am a e controla tanto nosso destino final quanto
nossa atual situação. Nós agora vem os a nós m esm os como “justificados e
ainda pecadores simultaneamente” (Lutero) e outras pessoas como tendo grande
dignidade e valor mas em perigo como pecadores ante um Deus santo. A
definição de Fowler é racional em sua aceitação cognitiva da perspectiva bíblica
e passional no seu amor por Deus e pelo próximo.
Fowler sugeriu seis estágios da fé pelos quais a fé humana pode progredir.
Como os estágios da estrutura do desenvolvim ento não são controlados
exclusivamente pelo crescimento cronológico, nem todas as pessoas progridem
para os estágios posteriores. Os estágios são os seguintes:

Fé Primária (Infância)

Antes do desenvolvim ento da fé, a predisposição da criança em confiar é


form ada pelos relacionam entos com os pais e outros como um m odo de
com pensar a ansiedade que resulta de separações que norm alm ente ocorrem
durante o desenvolvimento infantil.’
Fowler chama este estágio de “pré-estágio” porque não é acessível aos modos
normais de pesquisa empírica usada para a pesquisa do desenvolvimento da fé.

Fowler, Nipkow e Schweitzer, Stages of Faith, 21.


Esse entendimento da infância é fortemente influenciado pelos conceitos do desenvolvimen­
to psicossocial de Erik Erikson e seus interesses pela confiança básica versus a desconfiança
básica, e pela concepção de Margaret Mahler do nascimento psicológico do infante.
o D esenvolvimento da Fé 141

Estágio Um—Fé Intuítíva/Projetiva


(Primeira Infância)
N este estágio altam ente im aginativo, a criança pequena é influenciada
fo rtem ente pelas im agens, pelas h istó rias e pelos sím bolos e ain d a não é
co n tro lad a pelo pensam ento lógico. A s percepções e os sen tim en to s são
p o d ero sos p ro fesso res a respeito daquelas p artes da v id a que são tanto
protetoras quanto am eaçadoras. As imagens da fé são m oldadas pelos adul­
tos im portantes no m undo das jovens crianças.
Crianças criadas em lares cristãos aprendem por meio das atitudes de seus
pais que a igreja é um bom lugar para se estar. A oração, um espírito alegre e a
alegria pessoal por parte dos pais ajudará a formar na criança uma atitude que
emocionalmente proclama, “Este é o mundo de meu Pai” . Conquanto ainda in­
capaz de fornecer descrições lógicas, uma fé intuitiva/ projetada conhece certas
realidades sobre seu ambiente.

Estágio Dois—Fé Mítica/Literal


(Infância em Diante)
Operações concretas que emergem (Piaget) perm item que a pessoa pense
logicamente e organize o mundo por meio das categorias de causalidade, espa­
ço e tempo. E mítico no sentido de que pode agora capturar o significado das
histórias, mas literal no sentido em que é em geral limitada ao pensamento con­
creto. H á ainda uma interioridade relativamente não desenvolvida na pessoa,
com um a autoconsciência limitada. Como resultado, é difícil para uma pessoa
neste estágio tom ar a perspectiva de uma outra pessoa.
No estágio dois uma pessoa tende a entender Deus em termos de reciproci­
dade m oral, tendo uma idéia precisa sobre quem deve ser perdoado e quem
deve ser punido. Como resultado, as pessoas neste estágio devem ou ignorar
ou negar vários segmentos de suas experiências de vida.
A criança no estágio dois entende a fé cristã em termos rigidamente literais,
crendo que o céu consiste de uma maravilhosa residência (“N a casa de meu pai
há muitas m oradas” [Jo 14.2]) e que as ruas da cidade são pavim entadas com
ouro (Ap 21.21). Neste estágio, a criança é incapaz de ver realidades espiritu­
ais sem um a idéia literal e é portanto lim itada no m odo como pensa sobre a
verdade bíblica e como responde a ela. Um a tarefa im portante da fé m ítica /
literal é separar a realidade do faz-de-conta.
142 E nsino e C rescimento

U m a fé m ítica/literal é altam ente apropriada para crianças novas, m as


deve ser posta de lado nos anos posteriores. A aprovação que Jesus faz da
fé da criança (M t 18.2-3) afirm a a humildade e a confiança, não os m o­
dos infantis de pensar. Infelizm ente, algum as congregações tendem a “tra ­
v ar” neste estágio. Provavelm ente por causa do desejo de fazer um a in ter­
pretação literal da E scritura, esses grupos são rigidam ente literais no seu
m odo de pensar que os ensinos m ais profundos da E scritu ra se lhes esca­
pam . Tal fé não é apropriada para os adultos. O literalism o deve ser um a
parada durante o cam inho, não um destino.
Um fenômeno interessante na fé mítica/literal é o que Fowler descreve como
“ateísmo dos 11 anos” . À medida que os novos modos de pensar emergem, as
crianças não são mais completamente capazes de reconciliar seu entendimento
de m undo com seu conceito de D eus. Sua literalidade não pode acom odar a
idéia de um Deus invisível que é soberano sobre a ordem criada. Tal conflito
cognitivo pode resultar num a crise tem porária de fé quando eles tentam unir
seus mundos de idéias e experiências.

Estágio Três—Fé SIntétíca/Convencional


(Adoiescênda em Diante)

Um com ponente relacionai forte da fé emerge no estágio três, quando os


adolescentes se vêem em relacionamento com outros. Este estágio é sintético,
no sentido em que as crenças e os valores dos estágios anteriores são sintetiza­
dos num certo tipo de perspectiva coerente. E convencional no sentido em
que tende a dotar os sistem as e formas de crença de um a com unidade maior.
Um emergente senso de individualidade se desenvolve, e uma auto-identidade
é constituída por papéis e relacionamentos.
As pessoas do estágio três tendem a ser altam ente com prom etidas com a
igreja, e para elas a igreja se torna um a fam ília am pliada idealizada. Suas
atividades sociais e políticas, assim como as religiosas e educacionais, são mais
freqüentem ente enraizadas no contexto da igreja. Por causa de sua extrem a
identificação com a igreja, conflitos'é controvérsias dentro do corpo tendem a
ser altamente ameaçadores para eles. Além do -mais, a discórdia ocorrerá quando
as figuras autoritativas estiverem em conflito.
Deus é percebido como uma extensão dos relacionamentos interpessoais e
pode ser contado como um amigo pessoal muito próxim o. No estágio três as
o D esenvolvimento da F é 143

pessoas não têm problem a em acreditar que Deus tem uma espaço perfeito
para eles estacionarem bem em frente da loja porque ele os am a profunda­
mente e está interessado em seus melhores interesses. Deus não ama somente o
indivíduo, mas também o grupo todo com quem essa pessoa se identifica. Aqueles
com uma fé sintética/convencional tem total certeza sobre quem são as verda­
deiras pessoas de Deus e quem não são.
U m a limitação deste estágio é a superdependência de pessoas importantes
dentro da com unidade da fé. Os pastores, líderes de jovens, ou pessoas de
destaque são im portantes tanto quanto ao julgam ento em relação à verdade
(“ Sobre o que nós crem os ...?”) quanto sobre o valor pessoal. Falta a “pers­
pectiva de uma terceira pessoa” , então o indivíduo não consegue ver a si m es­
mo e seu grupo como outros podem vê-lo. E m ais, no estágio três as pessoas
são muito suscetíveis à tirania do "eles ”, perm itindo que o controle externo
se torne o mais importante de tudo.
Pode haver um grande conforto na fé convencional/sintética porque há
um senso de com unidade e um senso de pertencer que está m uito em falta
na sociedade contem porânea. Também, as categorias tendem a se seguras,
com claros delineam entos sendo feitos entre a verdade e o erro e “os m oci­
n h o s” (nós) e “os v ilõ e s” (eles). U m a teo lo g ia eclesiástica que en fatiza a
com unidade e os relacionam entos e fortes líderes pode criar e segurar as
pessoas no estágio três da fé.

Estágio Q uatro—Fé Individualizada/Reflexiva


(Mocidade)
o estágio quatro é m arcado por um desenvolvim ento duplo do ego e do
pensamento religioso. Flá uma experiência de individualidade que se levanta em
contraste com a comunidade própria do estágio três. A auto-autorização emerge
com a possibilidade de fazer escolhas baseadas somente no ego, sem os dita­
mes e expectativas do grupo. E agora possível para alguém tomar a perspectiva
de um a terceira pessoa e ver o ego e a com unidade m aior da fé em relação à
sociedade como um todo.
O ego é agora separado do grupo, e o indivíduo fica suspenso sobre o gru­
po perguntando por que o grupo crê e age como o faz. O ávido “encaixar-se”
do estágio três é substituído com um criticismo consciente (não necessariamen­
te negativo) do estágio quatro. E individualizado no sentido em que a pessoa
agora estabelece sua própria identidade (individualidade), e reflexivo em que
144 E nsino E C rescimento

é marcado por um pensamento consciente sobre (reflexão sobre) as posições e


práticas do grupo.
Uma fé individualizada/reflexiva é geralmente marcada por um sentimento
de culpa e perda pois o conforto do estágio três ficou para trás. A comunidade
da fé que nutriu e apoiou a pessoa é agora o objeto de separação e crítica.
Especialmente aquelas comunidades que encorajam uma fé sintética/convencional
não tolerarão essas mudanças com facilidade, o que criará um sentimento maior
de culpa e de perda.
Meu próprio movimento para fora do fundamentalismo mais rígido de minha
juventude foi especialm ente doloroso. Q uando eu com ecei a questionar
algum as das m ais extrem as crenças de m eu grupo (tal com o “usar barba é
um a violação dos padrões bíblicos”) eu senti que estava crescendo em meu
entendim ento do que significa ser cristão. M as m inha com unidade de fé me
disse que eu estava “ficando liberal” (a pior coisa que poderia ser dita contra
um fundamentalista). Foi uma fase em que eu fiquei sozinho e tentei determinar
se eu estava crescendo na fé como eu pensava, ou se eu estava perdendo
m inha fé como meus amigos acreditavam.
A limitação principal da fé individual/reflexiva é a sua superconfiança em sua
própria perspectiva. Há um a certa arrogância que faz com que alguém se vire
contra um grupo e o critique. Disso pode em ergir um a fé tão particularizada
que nenhum julgam ento externo é tolerado. A igreja se torna totalm ente
pragm ática neste estágio, existindo som ente para servir às necessidades do
indivíduo. O estágio quatro da fé demitologizará os rituais religiosos, procurando
o significado por trás dos rituais. Tal busca pode ser importante à integridade
do grupo, mas pode também indicar uma falha em qualquer nível de alguém que
não se submete à autoridade do grupo, de Deus ou do Evangelho.

Estágio Cinco—Fé Conjuntiva


(Meia Idade em Diante)
Com um a fé conjuntiva a pessoa pode tom ar-se ciente das limitações do eu
e estar menos certa a respeito dos julgam entos e das avaliações feitos no está­
gio quatro. Há um a profunda autoconsciência pela qual entende-se m elhor a
relatividade de sua perspectiva e se tem uma maior ciência da grandiosidade de
Deus. Tanto a imanência divina quanto a transcendência são apreciadas, com a
teologia da incarnação e a santidade sendo mantidas num novo relacionamento,
o D esenvolvimento DA F é 145

m ais paradoxal. Torna-se axiom ático que a verdade seja m ultidim ensional e
torna-se razoável entender que outras pessoa tenham visões que nós não te­
mos. Encontros significantes com outras pessoas e grupos são vistos e valori­
zados, à medida que um a nova busca por entendimento tem início.
Aqueles que atingem uma fé conjuntiva se tornam cada vez mais cientes das
possibilidades de idolatria mesmo dentro de suas próprias afirmações doutri­
nárias, assim eles são marcados por
Aqueles que atingem uma fé
um a grande tolerância para com as
conjuntiva se tornam... cientes
perspectiva externas.'® As pessoas
das possibilidades de idolatria...
'‘obtém ” este estágio pelo trabalho
mesmo dentro de suas afirma­
árduo de viver de m odo ponderado
ções doutrinárias.
através dos estágios anteriores.
Há uma novo senso de humildade na fé conjuntiva que diminui a autoconfiança
do estágio quatro. A nova abertura perm ite e procura um diálogo com grupos
fora da própria comunidade e esta abertura pode ser essencial para os esforços
cooperativos entre uma variedade de grupos. Quando combinado com concei­
tos bíblicos apropriados o estágio cinco pode ser profundamente útil ao perm i­
tir que as pessoas vejam as m últiplas facetas da verdade e as lim itações de
qualquer perspectiva humana.

Estágio Seis—Fé Universalizada


(Meia Idade em diante)
o estágio seis requer uma descentralização radical do eu e uma nova quali­
dade radical de participação com Deus. Todos os assuntos de paradoxo e po­
laridades são colocados de lado por causa de um a nova identificação com a
obra de Deus e seu reino. Um a nova qualidade de liberdade na qual assuntos
do eu são agora identificados com a “razão de viver” .
Há um a nova expectativa de vida focalizada nos assuntos da ju stiça e do
amor, com as divisões e a opressão colocadas de lado.

Há questão crucial sobre a extensão da tolerância necessária para se estar claramente dentro
dos limites do estágio cinco. O próprio conteúdo teológico de Fowler permite que ele seja
bastante indulgente a esse respeito, muito mais do que o seriam as posições teológicas mais
conservadoras. Ele insiste, no entanto, que é possível aderir a uma teologia evangélica e ainda
assim ter uma fé conjuntiva.
146 E nsino e C rescimento

Há “uma encarnação ativista disciplinada—^tomando reais e tangíveis— do im­


perativos do amor e da justiça absolutos, dos quais o estágio cinco tem considera­
ções parciais. O eu do estágio seis está engajado em usar e ser usado para a trans­
formação da realidade presente na direção da realidade transcendente”.

Uma avaliação evangélica


Q uando Fow ler discute a fé, ele está se referindo a um em penho humano
universal para descobrir o sentido da vida. Para ele, fé é num sentido uma rede
hermenêutica através da qual as pessoas interpretam a vida e tentam encontrar
significado. Ele tentou separar o conteúdo da estrutura no processo de fazer fé
{faithing — sua palavra para o exercício da fé), examinando o como da fé em
lugar do que da fé.
Quando os evangélicos discutem a fé, eles geralmente querem dizer algo
específico— aceitação de um conteúdo específico de modos que envolvem a mente,
emoções e os desejos. Eles falam de “a fé,” referindo-se a um conteúdo específico
tido de um modo específico. Serão esses dois conceitos de fé compatíveis?
Eu creio que é tanto razoável quanto útil entender a validade da teoria do
desenvolvimento da fé. A possibilidade dos estágios da fé pode ser difícil para
o americano individualista aceitar, mas não necessariamente faz injustiça à obra
m ística do Espírito na vida das pessoas. Os estágios da fé são categorias am ­
plas e descrições, não caixas rígidas e limitadoras. Parte da ordem da criação
de Deus poderia facilmente ser que os seres humanos se desenvolvam em seus
padrões de fé de m odos sistemáticos.
Mas será que Fowler separou com sucesso o conteúdo da estrutura, perm i­
tindo que qualquer conteúdo da fé seja m antido? A ssim como a teoria de
K ohlberg requer a em ergência da justiça como um conteúdo principal dos
estágios posteriores, assim Fowler requer a emergência de um conteúdo de fé
muito similar à teologia avançada de Paul Tillich. Fowler reconhece este fato e
explica-o assim:

Apesar da crescente comprovação empírica, no entanto, sua estrutura


teórica e seu embasamento indiscutivelmente se apoiam nos fundamentos
e no raciocínio teológicos. Esses fundamentos têm uma posição persuasiva
e fmalmente se apóiam nos compromissos da fé do teórico na tradição da
fé da qual ele é uma parte. Eles podem ser explicados racionalmente, no
entanto, e estão sujeitos a afirmações em termos amplamente funcionais

Fowler, Stages ofFaith, 200.


o D esenvolvimento da F é 147

e formais. A um grau ainda não totalmente testado, eles parecem capazes


de ser afirmados em termos derivados de outras tradições e culturas não
cristãs ou não-ocidentais. E uma tese importante desse capítulo que o
reconhecimento e a explicação racional destas bases teológicas abrangentes
não comprometem a reivindicação de integridade científica. A esse res­
peito há paralelos com bases racionais filosóficas carregadas de convic­
ção para teorias normativas e descritivas do desenvolvim ento cognitivo e
para as teorias do desenvolvim ento do raciocínio moral e religioso.

É difícil estar totalmente correto, assim como é difícil estar totalmente errado.
Fowler fez um trabalho excelente ao juntar uma variedade de questões e conectá-
los numa descrição do construto da fé. Além do mais, ele trabalhou muito para
eselarecer a pesquisa e marcar os procedimentos para determ inar o estágio de
fé de um a pessoa. Ele oferece descrições dos estágios que permitem uma vari­
edade de conteúdos e ouviu atentamente seus críticos, avaliando e responden­
do às questões deles de form a razoável. Ele tam bém está ciente do papel
determinante que sua própria teologia tem em suas construções teóricas.
É precisam ente neste ponto que nós devemos nos separar de Fowler. Seu
uso de Tillich e Niebuhr, com suas pressuposições a respeito de Deus, o papel
da experiência humana e a substância do Evangelho, o conduziu, nos estágios
m ais altos, a conclusões que não são com patíveis com a auto-revelação de
Deus na Escritura. Em última análise nós não somos chamados à identificação
com a Razão de Ser, mas a um a profunda gratidão pela graça de um Deus
santo que tanto buscou quanto executou nossa redenção. Nós somos chamados
para conhecê-lo (Jo 17.3) e servi-lo (Rm 12.1) com o coração agradecido.
Fow ler corretam ente reconhece, como nós tam bém devem os reconhecer,
que um a teoria do desenvolvimento da fé não pode ser totalm ente eientífíca e
desprovida de valores. A ntes, deve necessariam ente com eçar com uma
descrição do ponto final da fé, aquele estado norm ativo em direção ao que
toda fé deve eonduzir. Ele reeonhece que “qualquer teoria do desenvolvimento
que envolva uma descrição das transformações qualitativas no conhecimento,
valorização, comprometimento e ação humanos, deve derivar sua Tendem (in­
tenção) e direção normativa de alguma visão de fé da exeelência para a qual os
hum anos são chamados e para a qual nós somos capacitados” .'-’
Em suma, os evangélicos devem oferecer uma forma corrigida da descrição
dos estágios e validá-los empiricamente para tornar essa teoria com patível
com um a perspectiva distintam ente bíblica. U m a visão mais biblicam ente
Fowler, Nipkow e Schweitzer, Stages of Faith, 33.
" Idem, 36.
148 E nsino e C rescimento

derivada dos estágios essenciais da fé ofereceria uma teoria mais útil para nos­
sos propósitos, mas que seria exclusivista em sua orientação. Isso não quer
dizer que nós não temos nada a ganhar com a teoria de Fowler no estágio em
que ela se encontra. Significa, no entanto, que algo mais precisa ser feito a
partir de um ponto de vista evangélico.

IDÉIAS PARA A EDUCAÇAO CRISTA


Ainda que haj a problemas teológicos com a teoria do desenvolvim ento da
fé com o ela se encontra atualm ente, m uita coisa boa pode se obter desse
trabalho. Se nós estiverm os cientes das fraquezas da teo ria e m antiverm os
nossas âncoras teológicas no lugar, o trabalho de Jam es Fow ler e seus asso­
ciados abrirá visões im portantes para a Educação C ristã e para o processo
de crescimento espiritual.

A fé como um fenômeno universal


Os teóricos do desenvolvimento da fé apresentam um visão “elevada” dos
seres hum anos, argum entando que todos têm fé em algo. Fé não é algo que
som ente as pessoas “religiosas” têm; todas estão engajadas num a busca por
significado que é mediada pela fé. Todas as pessoas dão a um salto de fé quan­
do tentam encontrar significado em sua existência.
Desde que todas as pessoas têm fé, os cristãos não precisam se sentir infe­
riores porque são pessoas de fé. A distinção entre o cristão e o homem secular
está no conteúdo da fé, não no fato da fé. U m a investigação euidadosa da
perspectiva de uma outra pessoa levará ao centro das crenças e relacionam en­
tos que form am a fé da pessoa.
Há utilidade para a apologética aqui quando a racionalidade do conteúdo da
fé de alguém é examinada. Será o evangelho um conteúdo de fé mais adequa­
do do que o do m ercado de ações? Faz m ais sentido eolocar a confiança de
alguém em Jesus de Nazaré e ser leal a ele em vez de em qualquer outro centro
de valor ou poder? N ós podem os oferecer um conteúdo m elhor para a fé do
que as pessoas que estão sem Cristo?
Eu não estou pensando em vencer debates religiosos ou filosóficos. Eu estou
pensando falar sobre a respeito de um a necessidade verdadeira de vida que
Fowler descreveu. Deus projetou-nos como criaturas que pensam/que sentem/
que crêem ; nós todos devem os crer em algo. O Evangelho fala direto a essa
o D esenvolvimento da F é 149

necessidade de transcendência, ao oferecer um conteúdo para que a inclinação


hum ana para a fé possa abraçar. Fowler foi muito útil ao nos ajudar a ver que
todas as pessoas têm fé.

Uma descrição de fé como sendo diferente


de religião e crença
Influenciado por Wilfor Cantwell Smith,''' Fowler oferece uma distinção im­
portante entre fé e crença que é especialm ente necessária para a igreja
evangélica. Questões sobre a pureza doutrinária tem nos consumido tanto que
nós fomos inclinados a reduzir o conceito de fé a um a afirmação em forma de
credo, que cham am os de Confissão de Fé. Tais confissões listam o conteúdo
específico a ser crido pelas pessoas associadas com sua comunidade de origem.
Presum e-se que se alguém assina a confissão, esse alguém tem fé, porque ele
ou ela concorda com a posição doutrinária.
Mas Fowler nos relembra que a fé é algo dinâmico, progressivo e relacionai—
um a parte integral de nossa vida. A fé m olda o modo como nós vem os nossa
vida e damos significado a ela, controlando nossos valores e percepções e o
exercício do poder. Ele nos relem bra que a fé não é estática, m as dinâm ica,
influenciando o modo como nós vemos e nos relacionam os com o m undo ao
nosso redor. Ele oferece uma correção àqueles que reduziriam a fé a um a lista
cognitiva de crenças pela qual, ao afirmá-las como verdade, tem-se salvação.
Fow ler está muito mais perto do conceito histórico de crença do que a
perspectiva moderna. O costume contemporâneo tem reduzido a fé a um a idéia
puramente cognitiva {notitio) sem seus subseqüentes componentes afetivos e
volicionais. Mas historicamente crença quer dizer vital, significando que o que
alguém cria era pelo que ele vivia. Era im pensável declarar que a crença de
alguém não moldava a sua vida. Fowler está nos trazendo à memória novamente
a verdadeira natureza da fé e da crença.

Uma visão mais completa da fé


A pesquisa de Fowler pode ajudar os educadores cristãos a verem as pessoas
de form a m ais com pleta. Ele nos m ostra que a fé está m uito ligada à auto-
imagem e à visão de mundo. Psicólogos há muito tem po já entenderam a
im portância da auto-imagem para o desenvolvimento da pessoa, mas os edu­
cadores têm deixado esse assunto somente para o terapeuta.

' Wilford Cantwell Smith, The Meaning andEndofReligion (Nova York: Macmillan, 1962).
150 E nsino e C rescimento

Fow ler nos ajuda a entender que as autopercepções emergentes da pessoa


influenciarão como ela molda e experimenta sua fé.
As pessoas que entendem e vêem a si mesmas principalmente como funções
e relacionamentos (Eu sou um professor da Escola dominical; Eu sou mãe; Eu
sou membro da Primeira Igreja) encontrarão grande dificuldade para progredir
além do estágio três da fé. Os estágios mais altos requerem um a força do ego
que nem todas as pessoas podem exercitar. Porque a fé é parcialm ente um
fenômeno humano (isto é, um dom de Deus mas exercido pelos seres humanos),
uma perspectiva da pessoal total é necessária para se entender como as pessoas
podem experimentar a fé.
Educadores cristãos responsáveis tentam entender a pessoa toda, não se
limitando somente aos aspectos espirituais. Como a fé envolve a pessoa toda,
ela deve ser entendida num contexto de desenvolvim ento total. Fé não é um
aspecto isolado da personalidade humana, mas é o resultado de vários aspectos
da personalidade sendo integrados numa perspectiva unificada. Tal compreensão
pode nos guardar contra um entendimento superficial deste fenômeno teológico/
psicológico complexo.

Ouvindo a fé com sensibilidade


Educadores cristãos devem aprender a ouvir com sensibilidade quando as
pessoas discutem sobre sua fé. Os evangélicos têm atentado historicamente ao
conteúdo m as têm ignorado a estrutura. N ós tem os estado tão preocupados
em guardar o qiie as pessoas crêem que deixamos de ouvir como elas crêem.
Nós temos ignorado a possibilidade dos estágios da fé, lutando somente para
fortalecer a fé sem nos preocupar com tornar a fé mais madura. N ós tem os
nos inclinado a policiar o conteúdo da fé e fortalecer seu poder, mas tem os
negligenciado sua maturidade.
Fowler nos ajuda a identificar a maturidade da fé. Quando nos familiarizamos
com seus estágios, podem os ouvir com m aior sensibilidade o modo como as
pessoas descrevem sua fé. Pode nos ajudar a ouvir com um a intuição mais
profunda o modo como as pessoas entendem e experimentam sua fé.
Há sempre o perigo de abusar dos estágios do desenvolvimento, classifieando
as pessoas rapidam ente à m edida que os estágios são identificados e então
tentando m anipular as pessoas para que avancem para um estágio m ais alto e
mais adequado. Além de ser um desrespeito às pessoas, tal atitude revela igno­
rância sobre a natureza da psicologia do desenvolvim ento. Se os estágios de
Fowler oferecem novas maneiras de colocar as pessoas em “gavetas” e numa
o D esenvolvimento DA F é 151

nova hierarquia de espiritualidade, então haverá mais prejuízo do que benefício


para a igreja.
M as o ponto central dos estágios do desenvolvimento da fé é ajudar-nos a
entender melhor as maneiras pelas quais as pessoas experimentam e exercitam a
fé. Se nós podemos ouvir com maior sensibilidade a estrutura da fé registrada
pelas pessoas, nós podemos entender melhor aquelas idéias e experiências que
podem trazer conforto assim como aquelas que podem estimular o crescimento.

Descrevendo uma fé madura


Além disso, os estágios de Fowler podem ajudar os educadores cristãos a
entenderem a maturidade da fé de seu povo. Em vez de se concentrarem somente
nos pontos fortes, eles podem também avaliar a maturidade.
Estágios baixos da fé não são inapropriados para pessoas jovens. U m a
adolescente no estágio dois da fé pode ter um a fé forte (um profundo
compromisso com Deus), que é perfeitamente apropriada para sua idade. Mas
se esta mesma pessoa continua na estrutura do estágio dois durante a fase adulta,
pode-se dizer que sua fé é forte m as im atura, isto é, não é apropriada, em
relação ao desenvolvim ento, para a idade da pessoa e seu lugar na vida.
A criancinha que crê que Deus a protegerá de todo o perigo tem uma forte
crença na soberania de Deus e percepções específicas da infância sobre o que
o am or de Deus significa para ela. Tal crença pode ser apropriada para uma
criança. M as quando ela se torna um adulto, se ainda crê que nada de ‘■‘m al”
poderá acontecer a ela porque tem fé, ela é tanto desorientada quanto imatura.
Uma fé mais madura pode diferenciar entre o envolvimento redentivo de Deus
nas situações da vida (Rm 8.28) e um a couraça protetora que isenta o crente
dos sofrimentos da vida.
A m edida que os educadores cristãos se tornam mais sensíveis aos estágios
da fé, eles serão capazes de ouvir a estrutura assim como o conteúdo, e a
maturidade assim como a força. Eles entenderão as pessoas mais profiindamente
e terão um a perspetiva mais realística sobre a saúde de suas congregações.
A lém do mais, eles terão m elhores possibilidades para projetar abordagens
educacionais que se encaixem no nível de m aturidade de seu povo. Fowler
ofereceu um modo de determ inar a maturidade relativa da fé, descrevendo os
estágios através dos quais uma fé que amadurece progredirá. Suas descrições
não são sem erro e sem um a tendência teológica, mas elas são úteis para se
descobrir como as pessoas crescem na fé.
Estar sintonizados com os estágios da fé nos ajudará a reconhecer algumas
das características do crescim ento. Q uando um a pessoa que tem sido
152 E nsino e C rescimento

altam ente convencional em sua fé se torna m ais individualizada e distante,


isso pode ser u m a indicação de que ela está crescendo, e não regredindo,
como é algo sem pre temido.
Um a estudante recentemente me procurou e expressou sua confusão sobre
suas experiências como cristã. Ela tinha sido m uito com prom etida com sua
congregação local, era uma entusiasta sobre o que era emitido nos cultos públicos
Mas agora aos vinte e poucos anos, longe de casa, ela estava muito descontente
com sua igreja. E m ais, ela não m ais com partilhava com sua m ãe sobre os
assuntos espirituais. “M inha mãe pensa que eu estou ficando liberal” foi a sua
cínica observação. Quando eu perguntei-lhe o que ela pensava, ela me disse
que sentia que estava crescendo.
“A minha fé significa mais para mim agora do que nunca”, ela explicou. Ela
sentia que estava lendo as Escrituras com um novo entusiasm o, orando com
maior integridade, e tomando-se ciente do pecado de maneiras que nunca havia
estado antes. “Eu me sinto em fase de crescimento, mas porque eu não posso
apoiar nossa igreja como antigam ente, m inha m ãe pensa que estou me
desviando”, foi o seu triste comentário.
Eu expliquei-lhe brevemente sobre a teoria do estágio da fé e lhe disse que
o que ela estava descrevendo era totalm ente comum para uma jovem adulta e
era, em minha opinião, uma indicação de crescimento. Em vez de tentar “levá-
la de volta para a congregação dos irm ãos” , eu a encorajei em sua busca de
uma fé mais pessoal, pedindo que usasse seu tempo no seminário para aprender
a ter sua fé de um a m aneira mais pessoal. A teoria do desenvolvim ento da fé
deu-m e as categorias pelas quais ouvir e discernir que de fato ela estava
crescendo em sua fé. Há uma variedade de maneiras de discutir a maturidade
espiritual. A maioria tende a ser ou altamente mística ou altamente individualista.
James Fowler ofereceu um caminho razoável para se ver a fé de uma m aneira
desenvolvimental, com os controles apropriados para como os estágios devem
ser compreendidos. Sua teoria não é perfeita, mas fornece algumas categorias
úteis e visões importantes para a Educação Cristã.
PARTE III
O APRENDIZADO E
O CRESCIMENTO
ESPIRITUAL
CAPÍTULO 10
O APRENDIZADO E O CRESCIMENTO
ESPIRITUAL
"‘Ninguém pode realmente conhecer a Teologia com certeza’' é um sentimento
que prevalece em algumas das igrejas de hoje. “Além do m ais, Deus não se
importa com o que pensamos, ele somente quer nos amar do jeito que nós somos”,
é a justificativa oferecida para uma fé não refletida. Essa atitude transmite a idéia
de que pensar é algo irrelevante e não relacionado ao crescim ento espiritual.
Ainda que a Escritura afirme claramente a im portância do conteúdo de nossa
crença, alguns cristãos insistem em que o conteúdo e o aprendizado são sem
importância para o crescimento espiritual. Por que será que essa idéia permanece?

O CONTEXTO CONTEMPORÂNEO
U m a conseqüência dos anos 60 é a aplicação do pensam ento relativista a
virtualm ente todos os aspectos da vida. O grito dos anos 60, “Faça você m es­
mo suas coisas”, estava embasado num sentido do individualismo que era es­
tendido a todas as áreas da vida. A lém dos mais óbvios enfeites dos estilos dos
vestidos e dos cortes de cabelo (ou falta deles), a relatividade daqueles anos
também influenciou am oral, a ética, e por último a metafísica.
As pessoas foram ensinadas não somente a fazer suas próprias eoisas, mas
tam bém a pensar do seu próprio m odo. A relatividade da época foi tam bém
estendida à moral, com o “esclarecimento de valores“ que assegura às pessoas
que todos os valores morais são relativos e portanto iguais. Mas talvez ainda
mais destrutivo tenha sido o fato de que a relatividade epistemológica (as pes­
soas só podem “saber” a partir de suas próprias perspectivas) foi estendida de
modo a tornar todas as verdades relativas. Não poderiamos mais falar sobre a
Verdade; agora nós devem os falar sobre o que é a verdade para você versus
o que é a verdade para mim. A Verdade (com letra maiúscula, denotando uma
verdade absoluta) foi reduzida a verdades (com um v minúsculo, designando
uma verdade relativa).
A relatividade moral resultou num caos ético, com nossa sociedade agora
brigando sobre como deve ser decidido o que é certo errado. Essa batalha é a
m ais ruidosa quando se trata da questão do aborto. Os cham ados advogados
156 E nsino e C rescimento

pró-life argumentam que o direito à vida de uma criança não nascida é o maior
de todos. Os chamados advogados pró-escolha argumentam que o direito que
a m ulher tem de escolher continuar ou não com a gravidez é o correto. Mas na
ausência de um acordo sobre como estabelecer os valores de um a forma abso­
luta, não há possibilidade de resolver o conflito.
A relatividade moral tem criado um a variedade am pla de estilos de vida
conflitantes. Se não há absolutos para um com portam ento certo e errado, as
pessoas podem escolher virtualmente qualquer modo de vida. Absolutos m o­
rais ditavam que relações sexuais fora do casamento eram erradas. A relativida­
de moral diz que as pessoas devem decidir por elas mesmas como elas querem
viver. Absolutos morais ditaram que a
A perda dos absolutos morais
prática homossexual era errada. A re­
(ética) tem criado divisões e
latividade moral diz que todas as pes­
confusões dentro da
soas devem ser livres para decidir como
sociedade americana,
elas querem viver a vida.
conduzindo não
A perda dos absolutos morais (éti­
somente à destruição das
ca) tem criado divisões e confusões
estruturas sociais, mas
dentro de nossa sociedade, conduzin­
também à grande confusão
do não som ente à destruição das es­
no nível pessoal.
truturas sociais, mas também a gran­
de confusão no nível pessoal. Sem absolutos, como se determ ina o certo e o
errado? Como se pode saber se um comportam ento é aceitável ou não?
O único absoluto que está sendo m antido agora é da tolerância, isto é, o
único valor sobre o qual a sociedade está certa é que nós não devem os ter
qualquer absoluto. Um pensam ento “politicam ente correto” é aquele que de
maneira nenhuma ofende, confronta ou limita a liberdade de uma outra pessoa
ou grupo. Os sentimentos de outras pessoas devem ser protegidos a todo
custo, mesmo que seja à custa da mente. A tolerância, argumenta-se, é o cam i­
nho para a liberdade e a felicidade para todos.
A tolerância deve ser exercida não som ente no que se refere ao estilo de
vida, mas também na esfera das idéias. Assim como todos os valores são rela­
tivos e iguais, o clim a atual argumenta que todas as idéias são relativas e, por­
tanto iguais. Nós devemos ser livres para fazer o que quisermos e devemos ser
livres para crermos no que quisermos.
A tolerância sobre as idéias é boa se a verdade for relativa. Se não há tal
coisa como certo e errado ou verdade e erro, então perm itir que todas as pes­
soas pensem o que desejam é apropriado. Mas se há um a verdade absoluta, e
o A prendizado e o C rescimento E spiritual 157

se ela pode ser conhecida, a m elhor coisa a fazer é corrigir as idéias para que
elas sejam congruentes com a verdade.'
O clim a contem porâneo da tolerância e da relatividade penetrou na igreja,
por isso uma ampla diversidade de pensamentos teológicos é aceita. “Todas as
pessoas devem decidir por si mesm as o que elas crêem ” tem -se tornado uma
norma, em nome da tolerância cristã. Seria indelicado corrigir a crença de ou­
tras pessoas, especialm ente se o Senhor revelou essa crença a elas. Devem os
ser tolerantes e não “colocarmos Deus numa caixa”.
O im portante é determ inar quando a tolerância é necessária, e quando nós
devemos ser intolerantes. J. Gresham M achen saiu do Seminário de Princeton
para formar o Seminário de Westminster baseado em questões de intolerância.
Machen cria na liberdade civil e na necessidade de tolerância religiosa. Mas ele
tam bém acreditava que, no tocante à doutrina, a igreja deveria ser intolerante.
D. G. Hart explica;

É claro que o próprio Machen acreditava que a igreja deveria ser


intolerante. Mas o tipo de intolerância que ele advogava era teológica e
não política. Ele acreditava que a tarefa mais importante da igreja era
proclamar o Evangelho, e essa tarefa requeria uma atenção especial para
com a T eologia. De fato, o testem unho da Igreja Presbiteriana foi
circunscrito à C onfissão de Westminster. A ordenação de ministro
presbiteriano contém um voto que o proíbe pregar qualquer coisa contrária
à con fissão. Mas quando se tratava de assuntos públicos, Machen
recomendava o curso da liberdade civ iD

Os conservadores desenvolveram um a reputação pela intolerância. Nós


tem os às vezes tentado forçar nossas visões e práticas de m aneira que não
devem os. M as ser sugado para dentro do clim a da tolerância teológica, que
argum enta que o conteúdo de nossa fé não im porta, m utilará a igreja

' É claro que outro tipo de dúvida é se algum indivíduo ou grupo de fato conhece a
verdade. Em uma sociedade pluralista assume-se que cada pessoa conhece somente
parte da verdade. O ponto central do pluralismo, propriamente entendido, não é a tole­
rância em relação a visões que competem entre si, mas permitir que as visões que compe­
tem entre si contendam uma contra a outra para que a verdade possa ser descoberta.
Mas 0 pluralismo deveria fundamentar-se na possibilidade tanto da existência quanto na
possibilidade de se conhecer a verdade. O pluralismo baseado na relatividade está con­
denado ao fracasso.
- D. G. Hart, “J. Gresham Machen: The Politically Incorrect Fundamentalist,” Tahletalk
17, n° 3 (Março de 1992): 14-15.
158 E nsino E C rescimento

coletivam ente e seu povo individualmente. Jesus ensinou que a verdadeira li­
berdade seria conseguida por meio do compromisso com a verdade.

A VERDADE VOS LIBERTARA

No prólogo de seu evangelho João observa que Jesus era “cheio de graça e
de verdade” (Jo 1.14) e que “ a graça e a verdade vieram por m eio de Jesus
Cristo” (v. 17). Ele estabeleceu uma ligação entre a graça e a verdade de Deus
que é sustentada por todo o evangelho.
Jesus ensinou a N icodem os que “Quem pratica a verdade aproxim a-se da
luz, a fim de que as suas obras sejam m anifestas, porque feitas em Deus” (Jo
3.21). Além do mais, ele ensinou à mulher samaritana que “Deus é espírito; e
im porta que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade (Jo 4.24).
A verdade para o nosso Senhor era tanto possível quanto funcional; é aquilo
pelo que nós vivemos, e deve controlar nossa adoração.
Em um a declaração mais im pressionante, Jesus prom eteu aos judeus que
creram nele e o seguiram que: “conhecereis a verdade, e a verdade vos liberta­
rá (Jo 8.32). E continuou, ao con- A educação cristã deve abordar
trastar seu ensino com as mentiras do e tratar a Escritura como a
diabo: “Porque nele não há verdade” verdade se ela quer produzir
(Jo 8.44). A verdade que nos liberta crescimento espiritual,
é a de Jesus como o Filho de Deus
que nos livra da ira de Deus para com o pecado e do poder do pecado em
nossa vida.
N a afirm ação talvez m ais conhecida a respeito da verdade, Jesus afirm a
que ele in co rp o ra a verdade sobre D eus, e que tam bém é o cam inho para
D eus e a vida em relação a Deus (Jo 14.6). Ele então prom ete o m inistério
do E sp írito Santo, que é “ o E spírito da v erd ad e” (14.17; 15.26; 16.13),
para guiar seus discípulos a toda a verdade (16.12). C laram ente Jesus viu a
verdade tanto com o um a força libertadora quanto um a força capacitadora
na vida de seus discípulos.
N a oração sacerdotal registrada em João 17, Jesus orou por nós dizendo,
“ Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade” (v. 17). Em referência a
esse versículo, Carson comenta,

Isso só pode significar que o meio que Jesus espera que seu Pai use
para santificar os seguidores de seu Filho é a verdade. O Pai imergirá os
o A prendizado e o C rescimento E spiritual 159

seguidores de Jesus na revelação dele mesmo em seu Filho; ele os santi-


ficará ao enviar o Paracleto para guiá-los em toda a Verdade (16.13). Os
seguidores de Jesus serão “separados” do mundo, reservados para o ser­
viço de Deus, enquanto pensam e vivem em conformidade com a verda­
de, a “palavra” da revelação (v. 6) mediada de forma suprema por Cristo
(ele mesmo sendo a verdade, 14.6, e a Palavra encarnada, 1.1, 14)— a
revelação agora incorporada nas páginas desse livro. Em termos práti­
cos, ninguém pode ser “santificado” ou separado para o uso do Senhor
sem aprender a pensar conform e D eus, sem aprender a viver em
conformidade com a “palavra” que ele deu graciosamente. Em contraste,
o coração do “mundanismo”, do que faz o mundo ser o que é (1.19), é
uma supressão fundamental ou uma negação da verdade, uma rejeição
profunda da “palavra” graciosa de Deus, sua auto-revelação em Cristo.^

Finalmente, quando ele foi levado ante Pilatos, Jesus afirmou; “Tu dizes que
sou rei. Eu para isso nasci e para isso vim ao mundo, a fim de dar testem unho
da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a m inha voz” (Jo 18.37).
O evangelho de João esclarece o papel central da verdade na vida do crente.
Nós devem os viver pela verdade, adorar em verdade, ser conduzido pelo
Espírito da verdade e conhecer a verdade. Em troca, o envolvim ento com a
verdade tanto nos liberta como é usado pelo Pai para nos santificar. Em essência,
a verdade é incorporada no Senhor Jesus Cristo e na Palavra escrita de Deus.
As im plicações para a Educação C ristã são profundas. N ão há liberdade
nem crescim ento espiritual à parte da verdade. Tanto a salvação quanto a
santificação vêm pela proclamação da verdade e pela obediência a ela. A Palavra
de Deus é a verdade. A Educação Cristã deve abordar e tratar a Escritura
como verdade se quer produzir um crescimento espiritual.
Aprender significa, para o cristão, compromisso com a verdade de Deus e
submissão a ela. A Educação Cristã se separará da educação m oderna em sua
busca apaixonada pela verdade. Abordagens educacionais atuais abandonaram
a possibilidade da verdade, deixando a educação sem um a base. N o capítulo
de abertura de seu livro, The Closing o f the American M ind [O fecham ento
da mente americana], que critica a educação americana, Allan Bloom observou,

Há uma coisa da qual um professor pode estar absolutamente certo:


quase todos os estudantes que entram na universidade acreditam, ou di­
zem que acreditam, que a verdade é relativa. Se essa crença é colocada à
prova, pode-se contar com a reação dos alunos; eles não compreenderão.

‘D. A. Carson, The Gospel According to John (Grand Rapids: Eerdmans, 1991), 566.
160 E nsino e C rescimento

Que alguém deva eonsiderar a proposição como não sendo auto-evidente


os assusta, como se tratasse de algo como 2 + 2 = 4. Essas são coisas em
que não se pensa. Os antecedentes culturais dos estudantes são tantos
quanto a América pode produzir. Alguns são religiosos, alguns ateístas;
alguns são da Esquerda; alguns são da Direita; alguns querem ser cientis­
tas, alguns humanistas ou profissionais ou homens de negócios; alguns
são pobres, alguns ricos. Eles se unificam somente em seu relativismo e
em sua fidelidade à igualdade. E as duas estão relacionadas num sentido
moral. A relatividade da verdade não é uma visão teórica, mas um postu­
lado moral, a condição de uma sociedade livre, ou assim eles a v ê e m .. . O
perigo que eles aprenderam a temer do absolutismo não é o erro, mas a
intolerância. O relativismo é necessário para a imparcialidade; e essa é a
virtude, a única virtude, que toda educação primária por mais de cinqüenta
anos tem-se dedicado a inculcar.'*

Conquanto eu discorde de muitas das soluções de Bloom, eu penso que sua


avaliação da situação está correta. Tal pensamento é predominante também na
igreja, enfraquecendo as pessoas tanto moralmente quanto espiritualmente, ini­
bindo seu crescimento em Cristo. O tipo de aprendizado necessário é o apren­
dizado que com prom ete a verdade, moldando como as pessoas adoram e v i­
vem, usado por Deus para libertar as pessoas e as santificar para seu reino.

UMA VlSAO PARA A EDUCAÇAO CRISTA


Um dos mais impressionantes exemplos de um ministério de ensino m anti­
do numa igreja local foi conduzido no século 17 por Richard Baxter, um epis­
copal (1615-1691). B axter foi forçado a deixar a Igreja E piscopal porque
ele não tolerava a posição da igreja de que a ordenação episcopal era essen­
cial para a prática do m inistério cristão. Ele se tornou um dos principais pas­
tores dos dissidentes ingleses. Mas durante seus anos como pastor episcopal
em K idderm inster, ele ensinou pessoalm ente a todas as fam ílias envolvidas
em sua igreja.
Baxter foi um prolífico e produtivo escritor, sempre se repetindo e fa­
zendo ensaios longos e um tanto desconexos. Mas a essência do que ele escre­
veu era excelente, tanto para seu século quanto para o nosso.

’Allan Blooin, The Closing of the American Mind(Nova York; Simon e Schuster, 1987), 25-26.
o A prendizado e o C rescimento E spiritual 161

Seu livro mais aceito, The ReformedPastor [O pastor reformado] (1656),


oferece um a visão oportuna sobre o que o ministério educacional pode e deve
ser. O livro não é sectário: seu termo “reform ado” não significa calvinista, ou
mesmo protestante, mas antes se refere a alguém que é revitalizado e renovado
em seu próprio coração.^
Baxter escreveu para companheiros pastores, encorajando-os a considerar
seu m in isté rio de ensino seriam en te. Ele a d v o g av a p e sso a lm e n te e
sistematicamente a catequese da congregação inteira, mantendo registros cui­
dadosos do que havia ensinado a cada família. Usando esse método, ele ensi­
nava sistematicamente a oitocentas famílias de sua congregação a cada ano.
A abordagem de Baxter não é apropriada para a cultura de hoje. O trabalho
semanal, a agenda da família, a realidade econômica, as distâncias a se viajar e
um a som a de outros fatores fariam de seu program a algo im possível para a
maioria dos líderes da igreja atuai. Mas sua preocupação pelo ensino sistemático
da verdade de Deus para a saúde da congregação e da nação não é som ente
relevante, mas crucial para a igreja de qualquer época.
A preocupação de Baxter era que o ministério pastoral devia ser conduzido
tanto num nível pessoal tanto quanto público. Ele reconhecia a validade da
pregação a grandes grupos, mas defendia que as questões individuais das pessoas,
as preocupações e as dúvidas são mais bem tratadas no nível pessoal. As pessoas
podem ser mais bem ensinadas a conhecer a doutrina e a pensar nas categorias
bíblicas quando elas são instruídas individualmente ou em grupos pequenos.
Baxter ofereceu vinte razões pelas quais abordagens pessoais e sistemáticas
ao ensino da congregação deveriam ser implementadas. Ele fez pouca distinção
entre a evangelização e a edificação, considerando corretam ente a prim eira
como conduzindo naturalmente à segunda. Ele argumentou,

O ministério pessoal, quando é bem administrado, também edificará


aqueles que estão sendo firmados na fé. Como você pode edificar sem
colocar uma boa base? Como as pessoas podem avançar na fé e na
verdade quando elas não são primeiramente ensinadas sobre a coisas
essenciais? O básico que nós precisamos para conduzir os homens é
promover a verdade.®

’ Richard Baxter, The Reformed Pastor, resumido e editado por James M. Houston (Portland,
Ore.: Multnomah Press, 1982), xiii.
®Idem, 106.
162 E nsino e C rescimento

Ao pregar, Baxter se preocupava com a clareza. O interesse que ele sentia


pelo seu povo poderia ser prescrito com igual convicção para as congregações
de hoje. Ele afirmou,

De minha parte, estudo para falar tão claramente e eficazm ente quanto
posso. Depois do meu estudo particular, essa é minha primeira prioridade.
Mesmo assim freqüentemente encontro alguns dos meus ouvintes, que
têm me acompanhado por oito ou dez anos e que ainda não sabem se
Cristo é Deus ou homem. Eles ficam em dúvida quando eu lhes falo sobre
o nascimento, vida e morte de Jesus. Eles ainda não sabem que os infantes
têm o pecado original. Nem conhecem a natureza do arrependimento, da
fé ou da santidade requerida deles. A maioria deles tem somente uma
vaga crença em Cristo, esperando que ele os perdoará, justificará e salvará.
E 0 coração deles ainda pertence ao mundo.’

Baxter atribuiu a fraqueza espiritual da Inglaterra do século 17 à ignorância


teológica e bíblica das pessoas. Ele via uma correlação direta entre a maturidade
espiritual e o aprendizado bíblico e das verdades teológicas. Em vez de
repreender as pessoas por sua falta de conhecimento, ele desafiou os pastores
a assum irem a responsabilidade como educadores com m aior seriedade. Ele
valorizou o ministério do púlpito, mas também entendeu a fraqueza da pregação
como modo principal de educar sua congregação teologicam ente. Sua visão
era tanto de uma pregação forte quanto um ministério de ensino forte, porque
ambos eram essenciais à vida da igreja.

PREGAÇAO E ENSINO
M uitas congregações entendem a im portância do ensino, e então elas
procuram um pastor que possa ensinar. Mas a expectativa é que o ensino deve
ser feito do púlpito para toda a congregação. O resultado é que a pregação se
perde, e o ensino fica lim itado a um m onólogo de um a via, do pastor para a
congregação. De um ponto de vista educacional, isso não é ideal.
Um pastor m estre pode cuidadosam ente explicar cada verso, mas acabará
soando como um com entário transm itido por um alto falante. O pastor se
“colocará junto ao texto”, oferecendo explicações sobre o significado, mas
sacrificando a habilidade do texto de elevar e revelar enquanto fala aos corações
e vidas da congregação.

’ Idem, 114.
o A prendizado e o Crescimento E spiritual 163

A pregação se concentra na proclam ação da verdade, com apelos a um a


tom ada de posição. U m a boa pregação explora tanto o texto bíblico quanto o
contexto contemporâneo do povo, aplicando as visões bíblicas e teológicas às
experiências de vida do povo. Sua ênfase é na proclam ação e na aplicação.
Como um a arte, está tristemente ausente de nossas igrejas evangélicas.
O ensino se concentra na explicação e no entendim ento do texto b íb li­
co. Seus m étodos conduzem os alu ­
Tanto a pregação quanto o
nos a d escobrir e entender a verdade
ensino são importantes para
de m aneiras mais profundas, acima de
a saúde e o crescimento do
tudo capacitando as pessoas a pensar
corpo, que é a igreja. Esco­
de um ponto de vista bíblico. Sua ên­
fase está na explicação, descoberta e
lher entre a pregação e o
entendimento. ensino é como escolher
É claro que a pregação trata da ex­ entre a asa direita e a esquer­
plicação e do entendimento e, por outro da de um avião.
lado, o ensino trata da proclamação e da aplicação. A diferença está na ênfase e
nos métodos usados. A pregação é normalmente mais limitada metodologicamente
do que o ensino, com a ênfase colocada mais na proclamação e na aplicação do
que no entendimento. M as tanto a pregação quanto o ensino são importantes
para a saúde e o crescim ento do corpo, que é a igreja.
Escolher entre a pregação e o ensino é como escolher entre a asa direita e
a esquerda de um avião. A ssim como am bas as asas são im portantes para o
vôo, ambos os ministérios são importantes para o crescimento espiritual. Quando
um ou outro é ignorado, o resultado pode ser desastroso.
Quando os dois são combinados, enfatizando um ministério de ensino a par­
tir do púlpito, há dois resultados negativos— o ministério da pregação é ignora­
do, e o ensino é conduzido de um modo ineficaz, a comunicação de uma só via
para um grande grupo. Um método melhor é valorizar tanto a pregação quanto
o ministério do ensino, fazendo com que a pregação seja distintamente exortativa
e o ensino distintamente educativo. Haverá a sobreposição de um ministério em
relação ao outro porque as distinções entre o ensino e a pregação não são
rígidas, mas também haverá igual ênfase no entendimento e na resposta.

IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS

Desde que o crescimento espiritual requer um compromisso com a verdade,


e o ensino é mais eficiente quando feito pessoalmente ou em grupos pequenos,
que implicações educacionais podem ser tiradas para a igreja?
164 E nsino e C rescimento

A Educação Cristã deve enfocar o


ensino da Escritura.
Porque é a verdade que santifica e liberta, e porque a Palavra de Deus é a
verdade, um a educação eficaz deve ensinar a Palavra de Deus. A interação
com a Escritura é essencial para a saúde espiritual da congregação e sem ela o
crescimento espiritual é impossível.
H á um a crescente falta de ênfase no ensino da B íblia nos program as
educacionais de nossas igrejas, com a ênfase cada vez mais em se satisfazer as
necessidades das pessoas. Cursos sobre administração financeira, comunicação
no casamento, a quebra de padrões de co-dependência, e um a gama de outros
estudos “orientados pela necessidade” estão substituindo estudos m ais
biblicam ente e teologicamente orientados. A pressuposição subjacente parece
ser que a Bíblia e a Teologia são irrelevantes para a vida moderna.
O s te o lo g ic am e n te lib e ra is da geração p a ssa d a tin h am a m esm a
pressuposição, descartando ensinos bíblicos tradicionais e tratando de interesses
modernos. A mudança que fizeram baseou-se na desconfiança fundamental na
fidedignidade da Escritura. Os desafios modernos tanto da baixa crítica quanto
da alta crítica deixaram-nos com uma Bíblia falível e enganosa. Eles foram levados
a encontrar a Palavra de Deus em suas experiências, e não na Palavra escrita
da Escritura. M as eles eram coerentes em relação a suas crenças sobre a
natureza da inspiração divina.
Os evangélicos modernos são caracterizados por um alto grau de confiança
na autoridade, infalibilidade e inerrância da Escritura. Nós somos conhecidos
principalm ente como “o povo do livro” . M esm o assim, nossa prática não é
consistente com nossa crença. Nós argumentamos sobre a importância teológi­
ca da Escritura, mas cada vez mais a tratamos como periférica para a nossa fé.
A prender a Palavra significa viver a Palavra. Somente o conhecim ento que é
traduzido em ação é aceitável.
Se é verdade que Deus inspirou os autores da Bíblia e que a Escritura contém
exatam ente as palavras que Deus designou, então o que se segue é que nós
devem os ensinar as Escrituras ao nosso povo. N ós, entre todos os povos,
devem os ser aqueles que não som ente afirm am o valor da Bíblia, mas que
tam bém ensinam a Bíblia ao nosso povo.
A Escritura não é irrelevante para a experiência moderna. As suas verdades
eternas são relevantes e essenciais hoje exatam ente como elas foram quando
prim eiro escritas. Os tem as centrais da E scritura— santidade, eleição,
propiciação, pecado, redenção, providência e um a gam a de outros— são im-
o A prendizado e o C rescimento E spiritual 165

portantes para nós se quiserm os viver como povo de Deus. Se querem os que
nosso povo tenha a mente renovada, nossos program as educacionais devem
ensinar-lhes a Bíblia.
Karl Barth, o brilhante teólogo suíço, não tinha a mesma visão a respeito da
Escritura que os evangélicos modernos, mas ele valorizava a Bíblia. Quando
não ju ro u lealdade a A dolph Hitler, ele foi forçado a deixar sua posição de
professor na Universidade Bonn. Suas palavras finais aos seus alunos foram; “E
agora chegou o fim. Assim, ouçam o meu último conselho: exegese, exegese e
mais exegese! Permaneçam na Palavra, a Escritura que nos foi dada” .*
Karl B arth entendia que o Cristianism o é prim eiro um a religião do texto,
cuja identidade e autoridade são baseadas na doutrina da inspiração. N ossos
programas educacionais devem refletir essa convicção se queremos alimentar
espiritualmente crentes maduros.

A educaçao deve se concentrar na Palavra de


Deus como Verdade.

A B íblia deve ser ensinada por aqueles que têm um a profunda confiança
nela. C onquanto a dúvida não seja um pecado em si m esm a, ela atrapalha a
eficácia de um professor da Bíblia. Uma pessoa que pergunta se a Escritura é a
verdade ou um a de um a variedade de opções de crença, dificilm ente poderá
conduzir outros a crescer na fé. Mas aqueles que têm convicção da infalibilidade
da E scritura serão capazes de conduzir outros a um com prom isso frutífero
com a Palavra de Deus.
Parece haver uma desconfiança assustadora da Escritura entre alguns evan­
gélicos. Alguns estão preocupados em declarar a inerrância da Escritura por
causa de certos abusos dessa posição. Mas uma visão razoável da inerrância diz
que a Bíblia não tem nenhum erro em tudo o que ele afirma. Reconhece que há
figuras de linguagem que não devem ser tom adas literalmente, e que há erros
gramaticais no texto, que é um reflexo da personalidade e humanidade dos autores
humanos. Mas também afirma que Deus não mente, e que sua palavra é fidedigna
em tudo o que declara. Nós devemos tomar uma posição básica sobre a inerrância
(ausência de erro) e infalibilidade (incapacidade de falhar) da Palavra de Deus.

Eberhar Busch, Karl Barth: His Lifefrom Lellers and Auíobiographical Texts (Filadélfia:
Westminster, 1976), 259.
166 E nsino E C rescimento

Tal convicção faz com que o professor proclame com confiança os princípi­
os e a m ensagem da Escritura. Quando os professores são convencidos de que
a Bíblia é a verdade, eles ensinarão seus alunos com confiança e autoridade. O
apóstolo Paulo pediu a Tito que nom easse presbíteros em todas as cidades.
U m a parte das qualificações de um presbítero era que devia ser “apegado à
palavra fiel, que é segundo a doutrina, de m odo que tenha poder tanto para
exortar pelo reto ensino como para convencer os que o contradizem ” (Tt 1.9).
A dupla responsabilidade de encorajar e refutar é baseada na convicção da
fidelidade da mensagem. Sem essa convicção, o ensino dificilm ente pode ser
encorajador.®

Aprender implica envolvimento profundo


com a Verdade.
Desde que o objetivo de nossa educação é a retidão, nós devemos ajudar os
alunos a apreenderem a verdade de maneiras que os façam crescer. Aprender
envolve toda a personalidade— o intelecto, a em oção e a vontade. Um
aprendizado que promove maturidade espiritual não é somente cognitivo. Os
mosteiros da Idade Média promoviam o aprendizado que era somente cognitivo
e eles tinham pouco efeito em sua cultura. Mas, aprender a palavra significa
viver a palavra. Somente o conhecimento que se transforma em ação é aceitável.
Paulo repreendeu os efésios sobre seu m odo de vida, e ligou isso com o
m odo de pensarem . Ele escreveu, “Isto, portanto, digo e no Senhor testifico
que não m ais andeis como tam bém andam os gentios, na vaidade dos seus
próprios pensamentos, obscurecidos de entendimento, alheios à vida de Deus
por causa da ignorância em que vivem, pela dureza do seu coração” (E f 4.17-
18). Sua solução era que eles deveriam ser renovados “no espírito do vosso
entendimento” (E f 4.23).
A prender a Palavra de Deus é mais do que dom inar o seu conteúdo. Inclui
isso, m as se m ove na direção de m udar atitudes e ações que são governadas
pelos interesses da Escritura. Significa comprometer-se com a verdade e deixa-

” Eu escrevo como alguém que Já lutou por um longo período com a questão da fidelidade da
Escritura. Eu incentivo as pessoas a enfrentarem resolutamente tais questões e determinar por
elas mesmas a fidelidade da Escritura. Mas também incentivo que elas não ensinem a Bíblia
publicamente até que essas questões estejam resolvidas. Não é de nenhuma ajuda passar as
nossas dúvidas aos outros.
o A prendizado e o C rescimento E spiritual 167

la moldar e form ar nossos pensamentos, sentimentos e ações. É um difícil tra­


balho cognitivo, emocional e volitivo, mas é também o caminho da vida reta.

A educaçao deve ser conduzida num nível tão


pessoal quanto possível.

Porque o enfoque do ministério educacional é o entendimento, de modo que


um a resposta seja possível, os ambientes educacionais devem permitir interação,
esclarecimento e exploração. Os ambientes devem ser planejados para permitir
um a interação pessoal entre o professor e o aluno e para perm itir questões,
discussões e a exploração de idéias.
Os ministérios educacionais devem evitar a abordagem ao aprendizado do
tipo “ sente-se e absorva”, pois isso faz com que as pessoas se sintam
desencorajadas e funcionem passivam ente no contexto educacional. Richard
Baxter descobriu que seu povo poderia sentar-se para ouvir seus sermões por
anos e mesmo assim não entender as verdades elementares da fé. Quando ele
os ensinou em grupos pequenos é que conseguiu ter certeza que eles entendiam
e progrediam para níveis mais profundos de aprendizado.
A natureza do aprendizado necessário para o crescimento é altamente pes­
soal. As pessoas devem se comprometer individualmente com a verdade e exa­
minar sua vida à luz da verdade. Assim como nosso Senhor falou comNicodemos
pessoalm ente, assim nós devemos estar disponíveis para ajudar as pessoas a
pensar sobre os assuntos no nível pessoal. Isso não quer dizer que devemos
instruir as pessoas individualmente, mas significa que grupos menores e mais
pessoais são preferíveis a grupos maiores.
Na Trinity Evangelical Divinity School, onde eu leciono, algumas das salas
são bem grandes. Não é incomum para mim dar um curso de nível introdutório
para oitenta alunos de um a só vez. Estou tristem ente ciente de que tenho de
me apoiar em palestras e que eu mal conheço os alunos. E possível que no
período das dez sem anas de curso eu não diga um a só palavra pessoal nem
para m etade dos alunos.
Outras m atérias têm matrículas limitadas ou chamam a atenção de poucos
alunos. Nessas classes eu posso usar uma variedade maior de métodos de ensino
e posso absorver o pensamento dos alunos de maneiras muito mais eficazes. A
possibilidade de moldar uma vida é maior numa classe pequena do que numa
grande. Qualquer professor que é sensível a um ensino eficaz entende esse princípio.
168 E nsino E C rescimento

A Educação Cristã deve ser vista como parte do


ministério da igreja, não como todo o ministério
da igreja.
Deus ordenou tanto o ensino quando a pregação como m eios de edificar o
povo na fé. U m m inistério dom inantem ente cognitivo que não é equilibrado
com um m inistério de pregação em ocional não proporcionará um contexto
adequado para o crescim ento espiritual. Por outro lado, um m inistério de
pregação emocional não acoplado com um ministério de ensino mais cognitivo
não pode por si mesmo produzir crescimento espiritual. Tanto a pregação quanto
o ensino devem ser valorizados, e ambos devem ser fornecidos.
A Escritura valoriza tanto o papel dos pastores quanto dos mestres, e ambos
os m inistérios devem estar presentes. Os pastores claram ente ensinam , e os
mestres pastoreiam; não há uma linha clara demarcatória. Mas ambas as ênfases
devem estar presentes para que o povo de Deus amadureça.
Há muito espaço para criatividade ao se determinar como e quando o conteúdo
será estudado. Mas deve-se procurar estudar toda a Escritura fielmente.

A Educaçao Cristã é mais eficaz quando é


conduzida de maneira sistemática.

Richard Baxter mantinha registros cuidados sobre o que cada pessoa havia
aprendido, para que o conhecimento pudesse ser desenvolvido de maneira sis­
temática. Certamente há um lugar para o planejamento de um cuitícuIo psicoló­
gico, que deve se ajustar aos interesses e necessidades im ediatas do povo.
Mas há também um a necessidade do desenvolvimento de um currículo lógico
ajustado ao próprio conteúdo do que está sendo aprendido.
Porque a Escritura contém uma argumentação lógica e porque a Teologia é
um a disciplina altamente lógica, faz sentido oferecer um ministério de ensino
que se desenvolva logicamente. Algumas pessoas afirmam que a lógica é ocidental
em sua orientação porque é linear e que a B íblia é oriental e portanto m ais
circular em seu raciocínio. Tal distinção entre a lógica ocidental e a oriental é
tanto falsa quanto ilusória.
E falsa porque tanto a m ente ocidental quanto a oriental usam am bos os
tipos de lógica. Uma mente oriental, por exemplo, não trabalha com a matemática
ou a eletrônica de m odo diferente da m ente ocidental. A m bas as visões de
mundo e estruturas de pensamento raciocinam sobre essas disciplinas da mesma
o A prendizado e o C rescimento E spiritual 169

maneira. Além do mais, um a mente ocidental pode apreciar uma narrativa tão
bem quanto um a m ente oriental. Conquanto haja um a preferência por um
pensam ento linear no Oeste e circular no Leste, ambas as lógicas são usadas
em ambas culturas.
Essa distinção é ilusória pois tende a forçar as pessoas a escolherem como
pensar. Algumas pessoas rejeitam a Teologia com sendo ocidental, e portanto
falha, como se Deus não se comunicasse de forma lógica e linear. Outros vêem
as narrativas como algo de segunda classe e não tão importante quanto a pura
doutrina. Tal pensam ento fará com que as pessoas percam seções inteiras da
Escritura que não estão de acordo com o seu modo preferido de pensar.
M as uma visão apropriada da inspiração fará com que valorizem os toda a
Escritura igualmente e que lutemos por aprender dos diferentes tipos de literatura
e lógica encontradas nela. Porque é a Palavra de Deus, nós ouvirem os e
aprenderem os de todas as partes da Bíblia.
O planejam ento do program a educacional deve produzir um eistudo
sistemático dos temas e seções da Escritura. Há muito espaço para criatividade
ao se determ inar como e quando o conteúdo será estudado. M as deve-se
procurar estudar toda a Escritura fielmente. Porque o aprendizado é necessário
para o crescimento espiritual, nós devemos ensinar de maneira que pem iita que
o povo se com prom eta com toda a verdade da Escritura.
CAPÍTULO 11
O APRENDIZADO E AS INFLUENCIAS DA
PRIMEIRA INFÂNCIA
A Educação Cristã responsável requer que os filhos sejam educados na fé
desde os seus prim eiros dias. Isso quer dizer que devemos criar nossos filhos
“ na disciplina e na adm oestação do Senhor” (E f 6.4). Trata-se tanto de um
mandamento quanto de um privilégio para os pais cristãos.
Como é formada a fé na criança? Como é o processo e como nós podemos
perm itir que a fé cresça em nossos filhos? Como podem os obedecer ao
mandamento bíblico por meios que sejam compatíveis com o aprendizado das
crianças? O que nos dizem a Teologia e a Psicologia sobre o melhor modo de
ensinar nossos filhos?
A resposta teológica com respeito ao modo como a fé é form ada é que
prim eiro ela é um dom de Deus. A razão pela qual oram os pela salvação de
outros, crianças e adultos do mesmo modo, é que nós instintivamente entendemos
que Deus deve atraí-los para si mesmo e dar-lhes fé. E a razão pela qual damos
graças a Deus pela nossa salvação e pela salvação de outros é que entendemos
que a salvação é um presente dele. R ealm ente, qualquer cristão inteligente
entende que a fé é prim eiramente um dom de Deus.'
Porém , a verdade da soberania de Deus sobre a fé e a salvação não tira a
necessidade da responsabilidade humana. Os pais são ainda responsáveis por
criar seus filhos na fé, e a igreja é responsável por ensiná-los de forma que eles
possam crer. A soberania divina não elimina a responsabilidade humana. Ambos
os co n ceito s são ensinados nas E scritu ras, e essas v erd ad es não são
incompatíveis.-
A Teologia nos diz que a fé é um dom de Deus, e a Psicologia nos ajuda a
entender como as crianças aprendem. Como vimos no capítulo 2, a Bíblia ensina
que somos responsáveis por instruir nossos filhos a serem cristãos, e a Psicologia
nos ajuda a entender algumas das primeiras influências sobre o modo como as
crianças pensam.

' Tanto os calvinistas quanto os arminianos concordam nesse ponto. As diferenças surgem
quando se discute se Deus opera com todas as pessoas igualmente e se é possível resistir ou
recusar o seu dom da salvação. Mas todos os cristãos concordam que a fé e sua resultante
salvação são um dom de Deus.
- Para uma discussão muito interessante a respeito desses tópicos, veja D. A. Carson, Evangelism
and the Sovereignty of God{Atlmta-, John Knox,1981); e J. I. Packer, Divine Sovereignty and
Human Rexponsihi/iíy(Dov/nersGrove,U\:\nterVarshyPvess, 1961).
172 E nsino e C rescimento

OS PRIMEIROS PADRÕES DE REFORÇO


Como vim os no capítulo 6, os behavioristas entendem o com portam ento
humano em termos de estímulos ambientais, principalmente recompensas. Eles
crêem que a m elhor explicação para as ações e o aprendizado humanos é que
as pessoas são “reforçadas” (recom pensadas) por se com portarem de m odos
específicos. A lguns behavioristas vão m ais longe a p o n to de afirm ar que as
recompensas e as punições explicam todo o comportamento humano.
Como pessoas que estimam o valor e a dignidade humanos e que vêem os
seres humanos como mais do que uma combinação de respostas predeterminadas,
a m aioria dos cristãos rejeita o behaviorism o como um a explanação influente
do aprendizado e como um modo aceitável de ensino.
M as como é difícil estar totalm ente certo, do mesmo m odo é difícil ser
totalmente errado. Há um certo elemento de verdade no behaviorismo que não
deve ser negado. Conquanto suas afirmações concernentes à natureza hum ana
estejam erradas e suas teorias sejam inadequadas para explicar todo o
com portam ento hum ano, há alguns aspectos do aprendizado que podem ser
explicados em termos de recompensas e punições. No mínimo podemos dizer
que há um a influência dos padrões de reforço, especialm ente no princípio da
infância, que nos afeta para a vida toda. M ark Cosgrove observou:

O cristão não têm motivos para se queixar dos dados de Skinner. Skinner
descobriu algumas das leis de Deus que governam certos comportamentos
animais e humanos. O problema surge apenas quando Skinner generaliza
seus dados e faz amplas suposições a respeito da natureza da realidade que
não são apoiados por seus dados e estão em conflito com a revelação bíblica.^

A mais sofisticada forma do behavionism o é o condicionamento operante


de B. F. Skinner. O condicionamento operante difere do condicionamento clás­
sico mais histórico e primitivo (mais comumente associado com Pavlov e mais
tarde com J. B. W atson) em sua ênfase sobre com portam entos operantes. O
comportamento operante é emitido pelo organismo por sua própria iniciativa.
O condicionamento operante afirma que aqueles comportamentos (operantes)
que são positivam ente reforçados (condicionados) são mais prováveis de se­
rem repetidos. Em outras palavras, recom pense um comportcunento e prova­
velmente ele será repetido.

^ Mark P. Cosgrove, B.F. Skinner's Behaviorism: An Analysis (Grand Rapids; Zondervan,


1982), 108.
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 173

De modo oposto, ignore ou puna um com portam ento e é m enos provável


que ele seja repetido.
M u ito em bora essa não seja um a ex p licação ad eq u ad a p a ra todo
aprendizado, ela nos ajuda a entender algo a respeito de como as crianças
aprendem alguns de seus comportamentos. Elas tendem a imitar os adultos, os
adultos gostam e elogiam (recom pensam ) a criança, e a criança repete o
comportamento. Muito do nosso aprendizado inicial pode ser explicado nesses
termos. B. F. Skinner o explicou deste modo:

Uma análise behaviorística baseia-se nas seguintes suposições: Uma


pessoa é antes de tudo um organismo, um membro de uma espécie e de
uma subespécie.... O organismo torna-se uma pessoa quando ele adquire
um repertório de comportamento sob contingências de reforço ao qual é
exposto durante toda a sua vida.... Ele é capaz de adquirir tal repertório
sob tal controle por causa dos processos de condicionamento.**

A avaliação de Skinner de que um organismo torna-se uma pessoa quando


ele aprende certos comportamentos
A maturidade cristã é mais do
é detestável à teologia cristã. Mas sua
que uma questão de
alegação de que os comportamentos
comportamento exterior. É
são adquiridos em decorrência de
possível instruir pessoas para
padrões de reforço provavelmente
que façam as coisas certas, mas
esteja con*eta. Muito do aprendizado
elas podem fazê-las pelas
inicial das crianças é resultado de
razões erradas.
recompensas e punições.
Pode a fé ser aprendida dessa forma? Se recompensarmos nossos filhos por
se comportarem como cristãos, isso os tornará cristãos? Obviamente a resposta
é não. Porém, há um aspecto da fé que pode ser ensinado dessa forma.
Parte da nossa fé é volitiva, lidando com as escolhas que fazem os e como
nos comportamos. Deus está interessado em comportamento e um aspecto da
fé lida com o modo como nos comportamos. A crença não está divorciada do
resto da vida e a obediência é um aspecto im portante de ser um cristão.
Parte de nossa responsabilidade como pais e professores é ensinar as crianças
a se com portarem de m odos apropriados, m odos que agradem a Deus. Os
p a d rõ e s de re fo rç o são um a das m ais p o d e ro sas fo rm as de e n sin a r
comportamentos apropriados.

**B. F, Skinner, About Behaviorism (Nova York: Knopf, 1974), 207.


174 E nsino E C rescimento

A maturidade cristã é mais do que uma questão de comportamento exterior.


É possível instruir pessoas para que façam as coisas certas, mas elas podem
fazê-las pelas razões erradas. A limitação de um enfoque puramente behaviorista
de aprendizado é que ele está interessado apenas no aspecto exterior da pessoa,
ignorando as motivações interiores.
Todavia, os padrões de reforço de fato formam atitudes. Porque as crianças
são seres com pletos, a m odelagem de com portam entos tam bém m oldará as
atitudes. A prática da oração antes das refeições, orar antes de viagens e orar
antes de ir dormir formam não apenas as ações das crianças, mas também suas
atitudes. A esse respeito, orar é mais apreendido do que ensinado.
Lawrence Kohlberg demonstrou que os níveis mais baixos de desenvolvimento
m o ral são influenciados por contingências externas. A m o ralid ad e é
prim eiram ente adquirida em relação ao egoísm o. A quilo que é visto como
possível de ser recom pensado é seguido, e o que é punido é evitado. E assim
que as crianças obtêm primeiro a razão moral. Deus instila em cada um de nós
um a consciência, e essa consciência é moldada por influências exteriores.

O REFORÇO NAS ESCRITURAS

A validade de usar o reforço como um meio de m oldar com portam ento é


dem onstrada nas E scrituras. D eus prom eteu bênçãos para o bediência e
p ronunciou m aldições para a desobediência. Parece que ele com eçou a
instrução do seu povo apelando por resultados - recom pensas e punições.
Ele não deixa o seu povo nesse nível, mas há inúmeros exemplos nas Escrituras
de m otivação por resultados.
Quando a nação de Israel preparou-se para entrar na Terra Prom etida,
M oisés ensinou ao povo o que Deus tinha prometido:

Se diligentemente obedecerdes a meus mandamentos que hoje vos


ordeno, de amar o SENHOR, vosso Deus, e de o servir de todo o vosso
coração e de toda a vossa alma, darei as chuvas da vossa terra a seu
tempo, as primeiras e as últimas, para que recolhais o vosso cereal, e o
vosso vinho, e o vosso azeite. Darei erva no vosso campo aos vossos
gados, e comereis e vos fartareis. Guardai-vos não suceda que o vosso
coração se engane, e vos desvieis, e sirvais a outros deuses, e vos prostreis
perante eles; que a ira do SENHOR se acenda contra vós outros, e feche
ele os céus, e não haja chuva, e a terra não dê a sua m esse, e cedo sejais
eliminados da boa terra que o SENHOR vos dá (Dt 11.13-17).
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 175

A m otivação para Israel era clara. Se eles quisessem as bênçãos de Deus,


eles teriam de amá-lo e obedecê-lo. Se deixassem de fazê-lo e se prostituíssem
perante outros deuses, seriam amaldiçoados. Era uma atração bastante básica
para obedecer a Deus por causa das conseqüências.
Para que eles não compreendessem mal, Moisés resumiu a questão uns pou­
cos versos mais à frente:

Eis que, hoje, eu ponho diante de vós a bênção e a maldição: a bênção,


quando cumprirdes os mandamentos do SENHOR, vosso Deus, que hoje
vos ordeno; a maldição, se não cumprirdes os mandamentos do SENHOR,
vosso Deus, mas vos desviardes do caminho que hoje vos ordeno, para
seguirdes outros deuses que não conhecestes (Dt 11.26-28).

O N ovo Testam ento tam bém dem onstra a im portância de recom pensas
externas. M esmo o apóstolo Paulo observou: “Combati o bom combate, com ­
pletei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a
qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas tam ­
bém a todos quantos amam a sua vinda'’ (2 Tm 4.7-8).
Se essa fosse a única m otivação para obedecer a Deus e servi-lo, seria
inapropriada. Entretanto, Paulo também deleitava-se em servir a Deus por ser
grato pela sua salvação. Os cristãos, em última instância, devem ser motivados
pela gratidão, não pelas recom pensas que eles possam receber. Contudo, há
um aspecto do coração humano que é interessado em resultados. Ignorar isso é
ignorar um importante aspecto de como Deus nos criou. De fato, Deus parece
apelar para essas características do coração humano para motivar seu povo em
direção àjustiça.
Se essa for a única motivação para que os adultos sirvam a Deus, a sua fé é
im atura. M as especialm ente para as crianças, as prim eiras m otivações e
influências podem ser mais bem entendidas em term os de recom pensas e
punições. E assim que Deus as projetou para aprender. E natural e norm al que
crianças se preocupem com recom pensas e punições. Essa é um a parte da
psiquê hum ana que está sempre presente.

O APRENDIZADO NA PRIMEIRA INFANCIA

M inha esposa e eu adotam os 27 crianças. A m aioria delas tem estado


conosco desde os seus primeiros anos, normalmente desde o início da infância
até a adolescência. Talvez um a das mais constantes observações que temos
176 E nsino E C rescimento

feito é a im portância desses prim eiros anos . Cada criança vem com sua pró­
pria personalidade e características (natureza) mas cada qual é tam bém pro-
fiindamente influenciada pelo ambiente (educação). Nossa tarefa ao educar esses
pequenos é dar-lhes um ambiente tal que permita que suas personalidades úni­
cas venham a emergir, e a ensinar-lhes a diferença entre o certo e o errado.
A tarefa fácil é deixar emergir a personalidade deles. Semelhante a uma flor
que surge de um botão, assim um a m aravilhosa personalidade surge quando
esses pequenos se desenvolvem . E sem pre com um grau de espanto que
observamos essa pessoas fascinantes emergirem de uma uniformidade um tanto
previsível da infância.
A tarefa m ais difícil é ensinar a elas a diferença entre o certo e o errado.
M oldar valores e comportamentos nas crianças é uma tarefa complexa, do tipo
que requer sabedoria e oração. Mas há certos princípios que sempre parecem
ser aplicáveis na instrução de crianças.
O aprendizado da infância sempre começa com relacionamentos humanos.
N ossa prim eira tarefa quando trazem os do hospital para casa um a criança
(obviam ente além de alimentar e vestir) é estabelecer um laço emocional. Os
infantes precisam sentir-se seguros e amados. Abraçar, segurar, conversar e ter
contato visual ajudam a dar à criança um senso de segurança.
A m edida que as crianças amadurecem, há um desenvolvim ento contínuo
em seus relacionamentos humanos.^ Elas aprendem a confiar em outras pessoas
além de seus pais e aprendem a atuar como seres sociais. Esses aprendizados
vêm da im itação do com portam ento de outros e de recom pensas e punições
causadas pelo próprio com portam ento delas. Os pais aprendem a elogiar e
recompensar seus filhos quando eles comportam-se apropriadamente e a puni-
los pelo comportamento inapropriado. Por meio dessas experiências relacionais,
a criança aprende a agir em relação a outros e a dar e a receber amor.
E triste que algum as crianças nasçam em locais que não podem prover
ambientes amorosos adequados. Tal situação pode ser tão devastadora que as
crianças deixam de prosperar. Algumas das crianças que vieram a nós quase
desistiram de querer viver. Esta condição é gerabnente o resultado de negligência.
Nosso trabalho com esses pequenos é literalm ente am á-los retroativam ente
para despertar neles o desejo de viver. Isso é conseguido por meio dos próprios
meio físicos de abraçar, conversar, acariciar e responder quando eles choram.

■Muito mais do que simples padrões de reforço estão em jogo. Margaret Mahler forneceu uma
importante visão no nascimento psicológico de um bebê quando a simbiose e a individualização
acontecem. Para uma explanação veja Margaret Mahler, Fred Pine, and Anni Bergman, The
Psychological Birth of the Himan Infant (Nova York: Basic Books, 1975).
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 177

À medida que as crianças amadurecem, elas devem aprender comportamen­


tos sociais apropriados. Aprender a atuar adequadamente em relação aos ou­
tros é um aspecto vital do funcionamento como seres humanos. Comportamen­
tos sociais são também ensinados por meio de imitação e recompensas e puni­
ções. “Diga obrigado” seguido de “boa menina” são frases comuns para ensinar
o correto comportamento social. Há tanto instrução quanto recom pensa para a
criança. N esse caso a recom pensa é verbal.
As crianças são ensinadas a obedecer aos pais, a brincar delicadam ente
com outras crianças, a respeitar outras pessoas e a tratar apropriadam ente os
outros. N ós não mordemos, ferimos, beliscamos ou magoamos fisicamente os
outros. Devemos ajudar, ser bondosos, respeitadores e ser gentis com outros.
Relacionamentos sociais corretos são modelados pelos pais e recompensados
quando praticados pela criança. Por um relacionam ento social im próprio a
criança é punida apropriadamente.
As crianças devem tam bém ser treinadas nas habilidades básicas da vida.
Quando se tom am fisicamente capazes, elas são ensinadas a se vestir, praticar
as ações básicas de higiene pessoal e a se alim entarem sozinhas. A m eta é
produzir pessoas que sejam capazes de atuar independentemente, capazes de
exercer por si m esm as as tarefas básicas da vida. Essas tarefas tam bém são
ensinadas por meio de modelos e padrões de reforço. “Quando você conseguir
vestir sua jaqueta, nós poderem os ir ao m ercado” dá um a prom essa de
recompensa por um comportamento apropriado. O objetivo é treinar uma criança
para as tarefas básicas da vida que são necessárias para as obrigações m ais
sofisticadas posteriores.
Além de relacionamentos humanos, comportamentos sociais e tarefas básicris
da vida, as crianças devem também aprender padrões eficientes de comimicação.
As crianças primeiro aprendem a linguagem, ao imitar os sons que elas ouvem
seus pais fazerem. M amãe e papai respondem com recompensas apropriadas
- “Ouça, tenho certeza que ele disse ‘propiciaçãoM ” - e a criança continua a
ganhar habilidades de linguagem,
A aquisição de linguagem sim ples am adurece em padrões apropriados
de com unicação. A ssim , por m eio de recom pensas e p u n içõ es, os pais
instruem seus filhos a se com unicarem de modos adequados. “Eu não posso
en ten d er quando você está ch o ram in g an d o ” é um a form a de punição
destinada a ajudar um a criança a aprender com unicar-se de form a correta.
“Eu lhe darei quando você pedir corretam ente” prom ete um a recom pensa
para padrões apropriados de com unicação.
Obviamente, nem todo aprendizado de crianças e nem toda habilidade dos
pais podem ser reduzidos a um sistem a de recompensas e punições. O erro de
178 E nsino E C rescimento

Skinner é o do reducionism o: reduzir todo com portam ento hum ano a um a


questão de recom pensas e punições. Porém tam bém não devem os ignorar a
verdade do behaviorism o.
Eu já expressei minhas preocupações sobre a filosofia do behaviorism o e
indiquei a razão pela qual acredito que ele seja inapropriado como um paradigma
dominante para a Educação Cristã. Mas agora devo também admitir a validade
dos mecanismos do behaviorismo como parte do entendimento do aprendizado
e da educação humanas. Há um lugar para recompensas e punições na modelagem
do comportamento como um aspecto da tarefa dos pais de treinar suas crianças;
no entanto, a Educação Cristã é mais do que recom pensa e punição. O
behaviorismo é um a filosofia inadequada de educação, porém os mecanismos
do behaviorism o são poderosos, especialmente para ensinar crianças. Um uso
correto dos métodos do behaviorismo não é incompatível com a Educação Cristã.
Ele pode ser efetivo até mesmo para ensinar modos de vida cristã às crianças.

APRENDENDO A SER CRISTÃOS

N um sentido bastante real, ninguém pode aprender a ser cristão. Ser cristão
requer um a operação sobrenatural de Deus na regeneração e seu gracioso dom
de fé para salvação. Mas num outro sentido, nós devemos ensinar nossos filhos
a seguirem o Senhor e, nesse sentido, serem cristãos. Como vim os antes, a
Educação Cristã é tanto um a atividade natural quanto sobrenatural.
O Cristianismo tem um conteúdo para ser acreditado e um a visão de mundo
a ser adquirida. Parte dos ensinam entos para criança é provê-las com um a
perspectiva cristã da vida e das realidades nas quais todos vivem os. Para os
pais cristãos e a igreja, há várias realidades fundam entais que devem ser
aprendidas diretam ente por m eio de exem plos e ensinam entos dos adultos.
Inclusas nessas realidades estão preocupações cruciais sobre D eus, nossa
relação com ele e nossa relação com outros cristãos. As realidades seguintes
deveríam ser incluídas na instrução de nossos filhos.

Deus é presente e real

As crianças não podem ver Deus, mas elas podem ver seus pais viverem na
realidade da presença de Deus. Oração, humildade, reverência a Deus e estilos
de vida que o honram são alguns m eios de instruir a criança com respeito à
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 179

realidade e à proxim idade de Deus. Quando os pais praticam a presença de


Deus, os filhos aprendem a realidade de Deus.
As crianças imitarão o comportamento e as atitudes dos pais. Elas também
começarão a praticar a presença de Deus, não a partir de um a base lógica, mas
da base do exemplo ambiental. A ênfase do Antigo Testamento sobre as festas
e os rituais era especificam ente um artifício educativo para os filhos. A ação
dos pais (os quais tinham experim entado a realidade das operações de Deus
em suas vidas) era destinada a ensinar os filhos (os quais não tinham
experimentado as miraculosas intervenções de Deus em prim eira mão).
Portanto, as festas e os rituais
As atitudes e práticas de nossas
judaicos eram destinados a dar
reuniões de adoração também
aos filhos um a experiência que
formam a maneira de uma criança
pudesse ensiná-los a respeito da
pensar sobre Deus. A teologia é
realidade e de presença de Deus.
exercida nas práticas da igreja ,
Eles não tinham experimentado o
tanto nas reuniões formais de
evento da Páscoa, porém eles
adoração quanto informalmente
poderiam agora experim entar a
na vida em família.
festa da Páscoa. Por m eio dessa
prática, os filhos poderiam ser ensinados sobre a realidade de Deus e das ex­
periências que m ostraram o seu amor para com seu povo.
Nós não praticam os as festas e os rituais do Antigo Testam ento, m as nós
seguimos as ordenanças do Novo. Os rituais do batismo e da comunhão, junto
com as celebrações do Advento, do Natal e da Páscoa, são instrutores poderosos
de nossos filhos para a realidade e presença de Deus.
As diversas práticas informais da vida cristã são mestres ainda mais poderosas
da presença de Deus. N ossas atitudes e ações diárias são m uito im portantes
para ensinar nossos filhos a respeito de Deus. Ensiná-los a orar, a serem
agradecidos pelas provisões de Deus e a estarem cientes de Deus são as lições
diárias da existência de Deus, mesmo que não possamos vê-lo.

Deus deve ser temido e amado

U m a atitude correta em relação a Deus é temê-lo e amá-lo. Sua santidade


nos ensina a tem ê-lo, porque ele é distinto de tudo o mais; e sua m isericórdia
nos ensina a am á-lo, porque ele nos trata com graça. Os pais devem ensinar
seus filhos a tem er e a amar a Deus.
Uma ênfase desequilibrada sobre qualquer atitude criará uma fé desequilibrada.
Se as crianças apenas temerem a Deus, elas o servirão com motivação imprópria,
180 E nsino e C rescimento

empenhando-se apenas para evitar serem punidas. Se houver apenas amor, sem
qualquer senso de temor, a relação delas com Deus pode tomar-se muito informal
e trivial. Com um a atitude adequada, elas entenderão que esse terrível e santo
Deus é um Deus de misericórdia e graça. O amor por Deus deve estar enraizado
apropriadamente no solo de nosso tem or a Deus.
A m aneira em que os pais falam a respeito de Deus m oldará a atitude da
criança. Se Deus é citado apenas em termos mais casuais (“Deus é tão legal!”)
e sem adequada reverência, a criança jam ais aprenderá a temê-lo. Ao contrário,
se Deus for apresentado apenas nos mais austeros termos (“Deus vai m andar
você para o inferno se você fizer isso!”) a criança jam ais aprenderá a am á-
lo. U m a teologia correta de Deus deve dar a m aneira como nós conversam os
a respeito dele.
As influências do início da infância são muito importantes para m oldar o
modo como as crianças sentem e pensam sobre Deus. Nossos cultos também
falam intensamente sobre como nos aproximamos de Deus e como pensamos a
respeito dele. As atitudes e práticas de nossas reuniões de adoração tam bém
formam a maneira de uma criança pensar sobre Deus. A Teologia é exercitada
nas práticas da igreja, tanto nas reuniões form ais de adoração quanto
informalmente na vida em família.

Deus deve ser obedecido

A expressão máxima de nossa fé é nossa obediência. Quando a fé é traduzida


em obediência ativa, podem os estar certos de que a fé é verdadeira. Nosso
Senhor perguntou: “ Por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que eu
vos m ando? (Lc 6.46). O ato m áxim o de adoração é viver um a vida de
obediência a Deus.
Muito cedo, as crianças podem ser ensinadas que Deus deve ser obedecido.
Isso é ensinado não forçando a criança a obedecer, mas por viverm os nós
mesmos em obediência, modelando para nossos filhos como deve ser a nossa
obediência a Deus. Se nossa atitude for a de que Deus deve ser obedecido,
nossos filhos aprenderão a obedecê-lo também.
A obediência a Deus é ensinada prim eiro com exemplo. A consistência do
estilo de vida dos pais será a primeira influência. Ver os pais trabalhando com o
coração alegre para obedecer a Deus servirá como um a demonstração viva do
que significa ser cristãos. Verdadeiros cristãos obedecem a Deus com um coração
agradecido, empenhando-se por agradá-lo de todas as formas.
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 181

A obediência a Deus pode ser um a coisa enganosa um a vez que deve ser
obediência ao que Deus disse de fato. Algumas vezes a obediência a um a voz
interior ou revelação particular pode conduzir a m ais problem as do que
benefícios. A idéia “Eu acho que Deus quer que eu...” pode confundir tanto a
criança quanto os pais. Mas a obediência à sua Palavra como registrada nas
Escrituras é direta. Empenhar-se por viver um a obediência verdadeira ao que
Deus disse na Bíblia é a expressão mais apropriada de nossa fé.
U m a importante parte da criação de filhos na fé é ajudá-los a achar formas
de obedecer a Deus em suas vidas. Ensiná-los que a Palavra de Deus tem suas
implicações para o modo em que eles querem viver a vida servirá para colocar
o fundamento para uma vida de obediência.
As crianças pequenas precisam ser ensinadas a obediência em formas muito
diretas. “Deus quer que você obedeça à Mamãe e ao Papai” é muito apropriado
para ensiná-las. M ais tarde, quando as crianças se tornarem m ais m aduras
cognitivam ente, pode-se- lhes pedir que discutam suas próprias expressões
de obediência.
O início da infância pode ser um terreno fértil para se instilar a atitude de que
parte de ser um cristão é viver uma vida de obediência. Às vezes, a obediência
é cara. Em vez de ensinar as crianças que seguir ao Senhor é sem pre fácil e
divertido, os passos da obediência verdadeira ensinarão a realidade de que,
por vezes, a obediência machuca. M as nós obedecemos a Deus não porque é
divertido, m as porque o am am os e é correto. Tal instrução servirá para
estabelecer a base de um a fé m adura na fase adulta.

Deus deve ser servido

Nós devemos não apenas obedecer a Deus mas também servi-lo. Indo além
do que é ordenado, um coração agradecido serve ao Senhor com alegria. Um
verdadeiro estilo de vida que gloriflque a Deus (Rm 12.1-2) serve a Deus como
um ato de adoração. Novamente, essa é uma atitude a ser m odelada pelos pais
e instilada esperançosamente na criança.
É ilusório e insensato exigir das crianças m ais do que elas possam fazer.
Costum ava ser quase normal ouvir oradores de grande im portância pedir que
as crianças dedicassem suas vidas ao serviço de Deus. Crianças de apenas 8
ou 10 anos de idade assumiam o compromisso de serem missionários. Uma vez
tive de aconselhar um a estudante que estava se preparando para o trabalho
missionário, porque quando ela era criança havia prometido a Deus que o serviría
182 E nsino e C rescimento

dessa forma. N a juventude ela não queria mais fazer isso, mas sentia-se obriga­
da pelo seu compromisso de infância. Pedir às crianças tal compromisso é um
grande desserviço.
Porém não é um desserviço ensinar as crianças a servir a Deus de uma forma
imediata. É apropriado dar-lhes tarefas que elas possam fazer no trabalho ao
Senhor. Instilar um a atitude de que devemos servir a Deus, e não que ele está
aqui para nos servir, formará uma base para o desenvolvimento teológico posterior.
Uma atitude para servir é m oldada na idade jovem . Pedir que as crianças
ajudem e requerer delas isso pode ser lição importante para a vida mais tarde.
Os pais sempre devem ser precavidos em não intimidar as crianças a fazerem o
que elas na verdade não querem fazer; mas eles devem encorajar seus filhos a
desenvolverem uma atitude de serviço.
R ecom pensar as crianças por servirem a Deus é apropriado. Em vez de
solapar o m otivo formal (expressar nosso am or por D eus), as recom pensas
reforçarão, em linguagem que elas entendem, que fizeram uma coisa hoa. Não
é apropriado usar recompensas com adolescentes, mas é altamente apropriado
usá-las com crianças. Isso é característico do modo como aprendem.
N em sem pre os serviços precisam ser recom pensados. Os behavioristas
falam de reforço intermitente, o qual significa que comportamentos apropriados
necessitam ser recompensados apenas periodicamente. Mas quando as crianças
praticam atos de serviço, recompensas verbais ou de outra espécie ajudam-nas
a entender que elas procederam de m aneira correta.
O im portante aqui é não prom eter a recom pensa antes do serviço mas
oferecê-la após a ação ter sido feita. M elhor do que dizer às crianças; “ Se
vocês fizerem isso, eu lhes darei...”, nós podem os dizer-lhes: “Porque vocês
fizeram isso, poderão ter...” Quando respondem os com um elogio tal como
“Fico orgulhoso de vocês quando vocês ajudam desse je ito ”, nós podem os
instilar uma atitude de serviço em nossos filhos.

O envolvimento na igreja é importante

Nenhum cristão pode tornar-se maduro sozinho. Portanto, o envolvimento


no corpo de Cristo não é opcional, mas imperativo. Devemos estar ativamente
envolvidos com nossa congregação local se quisermos crescer espiritualmente.
Isso tam bém é verdade para as crianças. A freqüência à igreja é um dos meios
mais importantes que Deus usa para nos levar à maturidade. As crianças devem
ser ensinadas a valorizar o envolvimento no corpo.
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 183

Para a m aioria das crianças isso não é problem a. Se os pais freqüentam a


igreja com alegria, as crianças geralmente farão o mesmo. U m a senhora con­
tou-m e que um a das lem branças dom inantes de sua infância era a de seu pai
citando: “Alegrei-me quando me disseram: vamos à casa do Senhor” . Sua lem­
brança era a da fam ília toda apertada no carro e a alegria que irradiava da fé
paterna. O homem verdadeiramente amava ir à igreja.
E verdade que igreja não é aonde nós vam os, mas quem som os. A igreja
são as pessoas, não um edifício. M as devem os valorizar estarm os com o
povo de Deus, os seus chamados, e devemos valorizar as atividades da igreja.
Adoração, instrução, comimhão e expansão devem ser atividades importantes
na vida do crente.
As crianças devem ser levadas à igreja com a expectativa de que elas serão
envolvidas de m odos positivos. Não é apenas responsabilidade do professor
receber bem as crianças e fazê-las gostar da experiência; os pais tam bém são
responsáveis por enviai' os filhos com expectativas referentes a comportamento e
envolvimento. A disciplina das crianças é uma das preocupações dominantes nas
igrejas de hoje. Os pais devem tomar a dianteira em estabelecer padrões para o
comportamento de seus filhos e recompensas e punições conforme necessário.
Obviamente, deve-se esperar muito pouco das crianças pequenas; nada além
de brincar gentilm ente e obedecer ao professor. C rianças de 2 e 3 anos de
idade estão basicamente tendo atitudes moldadas a aprender que a igreja é um
bom lugar para se estar. Mas, à m edida que as crianças ficam m ais velhas, os
pais devem esperar que elas aprendam na Escola D ominical e façam a tarefa
designada a elas. Recompensas por um trabalho bem-feito podem ser um fator
positivo em m ostrar às crianças que nós valorizam os aquilo que elas estão
fazendo e aprendendo.

]esus nos ama

A realidade final que deve ser ensinada às crianças - que Jesus nos ama - é
estabelecida contra o cenário dos cinco itens anteriores. Elas devem aprender
não apenas que Deus o Pai deve ser tem ido e am ado, obedecido e servido,
mas também que seu Filho Jesus nos ama. A grande verdade: Sei que Jesus me
quer bem pois a Bíblia assim me diz, está no coração do Evangelho e é um a
verdade que as crianças podem entender. M uito em bora não possam ver a
Deus, as crianças podem conhecer o amor de Deus por meio de Cristo.
A realidade da experiência cristã está no dia de descanso, descansar no
cuidado de Deus para com os seus. N ós podem os parar de trabalhar para
184 E nsino e C rescimento

obter a salvação e descansar no fato de que somos salvos pela graça, à parte
das ações da lei. Esta verdade deve penetrar fundo no coração dos crentes,
modelando o modo de eles viverem, pensarem e sentirem em relação a Deus. E
essa verdade que nos liberta para servi-lo com o coração agradecido.
As crianças têm um a grande necessidade de serem amadas e de saber que
são amadas. Deus projetou-as exatamente dessa forma. Ensinar uma criança sobre
o amor de Deus, manifestado por meio de Jesus, é uma das grandes alegrias de
criar filhos. Corações bondosos respondem à verdade do amor de Deus.
O am or de D eus é ensinado tanto em atitudes quanto em ações. Os pais
devem tom ar tem po para m ostrar as graciosas provisões de Deus para seus
filhos. É por causa da m isericórdia de Deus que temos alim ento para comer,
casas aquecidas, amigos, famílias e igreja. Mesmo nos tempos difíceis a bondade
do am or de Deus para com os seus pode ser vista. Todavia é responsabilidade
dos pais m ostrá-la aos seus filhos.
U m a das coisas m aravilhosas sobre as crianças é sua habilidade era nos
m ostrar o amor de Deus. Por mais de uma vez minhas próprias filhas foram os
veículos das instruções de Deus para me ajudar a obter a perspectiva adequada.
Quando instruímos nossos filhos a verem a mão amorosa de Deus, eles também
nos ajudam a ver através dos olhos infantis .
Descansar no amor de Deus parece ser uma luta para a vida inteira. Talvez
seja a nossa própria maldade, ou a estratégia do inimigo, mas às vezes todos
nós acham o-nos perguntando se Deus realm ente nos ama. A verdade de que
ele de fato nos ama deve estar profundamente enraizada no coração dos pais e
deve ser ensinada aos filhos.
Quando os pais aprendem a viver na realidade do amor de Deus e a mostrar
o am or de Deus para seus filhos, os filhos aprenderão a aceitar seu am or por
eles mesm os. A hum ildade das crianças perm ite que elas aceitem o am or de
Deus m ais facilm ente do que os adultos. Conquanto possam os estar lutando
com o conceito, as crianças acreditam nele. Mais tarde, conforme suas vidas se
tornam m ais com plicadas, a questão se tornará m ais relevante para elas. O
livro devocional para adolescentes Se Deus me ama, por que não consigo
abrir meu armário?^ é uma expressão das complexidades que podem causar
confusão na adolescência. Elá outras realidades que podem e devem ser
ensinadas aos filhos. M as essas servem para ilustrar com o, por m eio de
formação e instrução, junto com recompensas apropriadas, as crianças podem
receber logo na infância influências que m odelem a sua fé.
Lorraine Peterson, If GodLoves Me, Why Can 't I Gel My Locker Open? (Minneapolis; Bethany
House, 1980).
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 185

M esm o em períodos de pressão econôm ica, com am bos os pais tra b a ­


lhando fora de casa, e mesmo com a realidade de casam entos falidos e fam í­
lias de pais solteiros, tais realidades podem e devem ser ensinadas aos filhos.
Os pais às vezes falharão nessas tarefas. A verdade é que todos nós teremos
épocas nas quais não procedem os bem em m odelar ou instruir. É a visão de
longo prazo que devemos ter em mente. Se, no geral, fizermos bem essas tarefas,
teremos feito muito para ensinar nossos filhos a serem cristãos.

PADRÕES DE REFORÇO
H á um a variedade de m eios pelos quais as crianças pequenas podem ser
instruídas em seu crescimento como cristãs. As sugestões seguintes são algumas
das mais óbvias aplicações do uso do reforço para ajudar a edificar a fé cristã
em nossos filhos.

Aprovação Paternal
De longe, a m ais poderosa influência na vida dos filhos é a aprovação de
seus pais. Os filhos desejam muito agradar seus pais e querem saber que seus
pais os aprovam . O elogio de um pai é um reforço poderoso para um bom
comportamento.
N ós estávam os jantando com am igos quando o pequeno K urt, de 5 anos,
derram ou o leite. Seu pai, com m áxim a sinceridade, o elogiou, dizendo: “ Ô,
Kurt, você derramou só metade do copo dessa vez!” O que m inha esposa e eu
observamos foi que esse era um pai que tinha o hábito de elogiar seus filhos.
Elogio demais pode ser ineficiente. Depois de algum tempo a criança pára
de ouvi-lo. M as o elogio genuíno, sincero, especialm ente em questões de fé,
pode fazer muito para instruir um filho a ser cristão. Abraços, tapinhas e palavras
que expressam aprovação dos pais são a linguagem que os filhos entendem e as
recompensas que eles mais buscam.

Aprovação de Outros Adultos


As crianças também podem ter seu bom comportamento reforçado por outros
adultos. Professores, especialmente, se tornam muito importantes na vida das
crianças. Quando os avós, parentes, amigos ou o professor elogiam as crianças,
elas respondem tão bem como fazem com seus pais.
186 E nsino e C rescimento

A m edida que as crianças amadurecem, elas precisam ser expostas a mais


adultos e a autoridades fora de casa. Geralmente, um a das prim eiras pessoas a
se tom ar influente além da família imediata é a professora da Escola Dominical.
A aprovação do professor pode ser um a fonte importante de recom pensa para
o crescimento da fé.
A queles que trabalham com crianças necessitam desenvolver o hábito de
elogiá-las por comportamentos apropriados. Eu não concordo com a teoria de
m odificação de comportamento que diz que o comportamento negativo deve
ser ignorado, porém de fato creio que é infmitamente mais eficaz elogiar o bom
comportam ento do que punir o mau comportamento. No final das contas, to ­
dos nós crescem os mais por meio de experiências positivas do que por meio
das negativas. “Pegar” as crianças fazendo o que é certo e elogiá-las por isso
reforçará atitudes e ações corretas.

Punindo o comportamento errado


H á um lugar para a punição na criação de filhos. Até o Pai celestial pune
seus filhos, e isso é um sinal de seu amor (Pv 3.11-12). A ssim também, deve­
mos amar nossos filhos o bastante para discipliná-los.
A questão da punição não é para infligir dor ou exigir justiça mas, ao con­
trário, instruir. Para enfatizar a im portância do que está sendo ensinado, pode
ser necessário disciplinar a criança. A disciplina pode ser na form a de um a
advertência verbal, pela negação de algum privilégio ou, em raras situações,
uma surra.
Apenas os pais da criança devem administrar uma surra e jam ais com ira, e
jam ais de formas que possam causar ferim entos no corpo. M as pode haver
ocasiões quando um a criança precisa saber que ela errou e que parte das con-
seqüências pode ser uma surra.”0 que retém a vara aborrece a seu filho mas o
que 0 ama, cedo o disciplina” (Pv 13.24). Aqueles que trabalham com crianças
na igreja devem tam bém estar dispostos a disciplinar. R epreensões verbais,
negação de privilégios e m udança de classe, se necessário, podem todos ser
m eios de instruir a criança. Deve haver mais elogio do que repreensão, mas
porque a depravação se estende às crianças, haverá épocas em que a disciplina
será necessária.
As igrejas devem estabelecer procedimentos disciplinares consensuais e pa­
drões de conduta consensuais para crianças. Os pais devem ser colocados a
par desses modos de agir e concordar com eles antes que seus filhos se envol-
o A prendizado e as Influências da P rimeira Infância 187

vam nas atividades da igreja. D essa form a, pode-se agir com coerência, e a
criança saberá e entenderá os limites aceitáveis de comportamento.
Deus não ignora o comportamento negativo e nem nós devemos ignorar. Se
devemos ser modelos do Pai para nossos fdhos, nós precisamos ensiná-los que
há consequências ao comportamento negativo e que os am arem os o bastante
para discipliná-los. Disciplinar os filhos é uma tarefa difícil, mas também um
esforço que compensa.

Recompensas na Educaçao Cristã


As crianças entendem a linguagem das recom pensas e punições, e recom ­
pensas podem ter um lugar na Educação Cristã. As recompensas são inclinadas
ao abuso, porém elas tam bém podem ser usadas eficazmente. R ecom pensas
por frequência, bom comportamento e mesmo pela memorização de versículos,
se não tidas como o mais importante, podem ser eficientes.
O valor das técnicas de modificação de comportamento é que elas podem ser
eficientes em moldar bom comportamento. Se a própria recompensa se tornar o
foco (“aquele que memorizar mais versículos ganhará uma bicicleta!”) a ênfase
está errada. M as se for um benefício adicional ao bom com portam ento, um a
recom pensa pode ser um meio útil de reforçar o com portam ento adequado e
boas atitudes nas crianças. “Se todos vocês se sentarem quietos durante a história,
podem os ter um a festa especial” não é inapropriado na Escola Dominical.
Influências sobre a fé na infância são basicam ente am bientais e podem ser
explicadas em termos de condicionamentos operantes. Mas esses são os meios
que Deus usa para instilar fé nos filhos de pais crentes. No final das contas, ainda
somos dependentes de Deus para usar esses esforços para levar nossos filhos à
fé. Não é simplesmente um processo mecanicista. E, antes, uma responsabilidade
paternal casada com a dependência da misericórdia de Deus para regenerar os
filhos e levá-los à fé. Nossa tarefa é criar, a tarefa dele é regenerar.
CAPÍTULO 12
APRENDENDO PELA INTERAÇAO E PELA
OBSERVAÇÃO
A PALAVRA
Eu abro a minha boca para falar e a palavra está lá, formada pelos
lábios, a língua, o órgão da voz. Formada pelo cérebro, transmitindo a
palavra pelo fôlego. Eu abro a minha boca para falar e a palavra está lá,
viajando entre nós, apreendida pelo órgão da audição, o ouvido, transmitindo
o pensamento ao cérebro por meio da palavra.
Assim nós nos comunicamos . . . você e eu: o pensamento de uma
mente saltando para outra, tendo recebido forma e substância, para que
nós conheçamos e sejamos conhecidos pela palavra.
Mas deixe-me falar com a minha filhinha e as palavras não significam
coisa alguma, pois ela não conhece minha linguagem. E assim eu mostro
para ela; “Este é seu pé?,”eu digo: “e foi feito para andar?.” Eu a ajudo a
levantar-se; “E assim que se anda?.” E um dia “o andar” forma em seu
cérebro uma relação com a palavra.
Deus tinha algo a dizer ao Homem, mas as palavras não significavam
nada, pois nós não conhecíamos a sua linguagem. E assim nos foi mostra­
do. “Veja o homem?,”ele disse. “Esta é a imagem, o pensamento em mi­
nha mente. . . . O homem como eu queria, amável e útil. Eu o fiz de carne.”
Agora a palavra tem forma e substância para viajar entre nós. Que ele
mostre amor até que um dia “o amor” tome forma em seu cérebro com a
Palavra, (autor desconhecido)

Esse texto expressa quão inadequadas são as palavras sozinhas para


expressar pensamentos e idéias. Depois que Deus se auto-revelou por meio da
criação e das palavras, ele se revelou encarnado em seu Filho. Ele nos mostrou
sua intenção para a humanidade mediante o exemplo de Jesus.
Deus projetou as pessoas para aprenderem de várias form as e seria um a
to lice lim itar nosso ensino som ente ao ensino com palavras. A educação
que é eficaz u sa outros m eios além da linguagem para en sin ar para o
crescimento espiritual.
A questão central na Educação Cristã é: Qual a melhor maneira de ensinarmos
a fé? H istoricam ente, a resposta dominante tem sido “Por meio da instrução”
Portanto, nós estabelecemos escolas em nossas igreja, com salas de aula, pro­
fessores, currículo formal, prom oções anuais para os que tiram altas notas, e
190 E nsino e C rescimento

toda sorte de enfeites da educação formal. A abordagem estrutural da educa­


ção formal para o ensino cristão tem sido eficaz em comunicar a verdade, mas
muitos têm argumentado que uma abordagem tão estruturada como essa é, em
última análise, ineficaz para que mudanças aconteçam.
Os dois m aiores críticos do ensino cristão form alizado são Law rence
R ichards e John W esterhoff. Am bos oferecem abordagens alternativas à
educação para a fé baseadas na teoria do aprendizado social. A abordagem de
Richard é fundamentada mais nos relacionamentos individuais, enquanto a de
W eterhoff é fundamentada na comunidade da fé.'
A pressuposição básica da abordagem social é que a fé é aprendida mais
como cultura e é m ais bem transm itida por interm édio de relacionam entos e
m odelos. A ssim como um a criança é socializada inform alm ente num a dada
cultura, assim tam bém as crianças podem ser socializadas na fé cristã. Deus
usará os relacionam entos e exemplos da fam ília cristã e da com unidade para
com unicar o conteúdo e a substância da fé às crianças, e ele as regenerará e
então as levará à fé pelo processo de socialização. Essa abordagem é baseada
na crença de que a fé é aprendida mais como cultura do que como matemática.

A TEORIA DO APRENDIZADO SOCIAL

Os teóricos do aprendizado social perguntam, “Como uma criança aprende


um comportamento socialmente aceitável?” Nós não temos classes ou escolas
formais para o aprendizado dos costumes sociais de uma cultura e mesmo assim
nós geralm ente treinam os as crianças eficazm ente para se com portarem de
maneiras socialmente aceitáveis. Como isso é conseguido? Albert Bandura crê
que muito do comportamento humano pode ser especificado pela observação
e im itação do com portam ento de outros.- As crianças observam como seus
pais se comportam e então im itam o comportamento. M uitos brinquedos são
desenhados especificam ente para m elhorar o com portam ento im itado. As
crianças recebem réplicas de ferram entas de adultos para que elas possam
imitar o mundo adulto por meio da brincadeira.

' Lawrence O. Richards, Christian Education: Seeking to be Like Jesus Christ (Grand Rapids:
Zondervan, 1988); John Westerhoff III, Valuesfor Tomorrow’s Children (Filadélfia; Pilgrim
Press, 1970); idem, Will Oiir Children Have Faith? (Nova York; Seabury, 1976).
- Albert Bandura, SocialLearning Theory (Morristown, NJ.; General Leaming Press, 1977). Ver
também Albert Bandura e R. Walters, Social Learning and Personality Development (Nova
York; Holt, Rinehart e Winston, 1963).
A prendendo P ela Interação e P ela O bservação 191

O motivo que estimula um comportamento imitativo é o reforço. Nós apren­


demos a im itar ao sermos reforçados por ter feito algo, e o reforço m antém o
comportamento imitado.
Os pais normalmente gostam quando as crianças imitam seu comportamento
e o elogio deles incentivará a repetição da im itação p o r parte da criança.
O utros adultos tam bém norm alm ente elogiarão o com portam ento im itativo
das crianças.
O aprendizado social é, em últim a análise, explicado em term os de
condicionam ento operante. Se a pessoa pode imaginar tanto o reforço quanto
o comportamento dos modelos que elas estão imitando, todo comportamento
imitado pode ser explicado em termos de condicionamento operante.
U m a vez visitei um a igreja onde eu conversei com um garoto de m ais ou
m enos 9 anos. “Você deveria ter estado aqui ontem à noite?” ele me disse.
“Deus operou de uma forma maravilhosa” .
Como ele aprendeu a expressar-se dessa forma? A m aioria das crianças de
9 anos não faz esse tipo de observação. O bviam ente ele estava im itando o
entusiasm o e a linguagem dos adultos de sua congregação; e sem dúvida ele
recebeu reforço por fazê-lo. Ele estava sendo muito bem socializado em sua
comunidade religiosa.
A teoria do aprendizado social reconhece dois tipos diferentes de modelos,
que obterão um comportamento imitativo. Modelos simbólicos são pessoas em
livros, filmes, televisão, entretenimento ou nos esportes. Em vez de serem pessoas
reais com quem podemos nos relacionar, modelos simbólicos são representações
ideais das pessoas. Quando propagandas apelam para uma figura esportiva para
vender seus produtos (tal como o tema da Gatorade, “eu quero ser como M ike”
referindo-se à estrela do basquete), estão usando um modelo simbólico.
Apelos bíblicos a figuras históricas, tal como os exemplos de fé em Hebreus
11, são a consagração dos modelos simbólicos. Estes foram pessoas reais, mas
como figuras históricas elas não tiveram um relacionamento com os leitores da
epístola. Além do mais, quando nós tomamos a Jesus como um exemplo, ele
até sendo exaltado como um modelo simbólico.
M odelos exemplares são pessoas reais com quem o aluno tem um
relacionamento. Pastores, líderes de jovens, pais e amigos podem servir como
modelos exemplares. Estes são exemplos vivos dos comportamentos que estão
sendo ensinados. Quando o apóstolo Paulo encorajou os coríntios, “Sede meus
imitadores como também eu sou de Cristo” (1 Co 11.1), ele estava usando a si
mesmo como modelo exemplar.
O reforço por se imitar o modelo pode vir em uma das três seguintes formas.
Primeira, pode haver reforço direto pelo modelo. Pais que elogiam as crianças
192 E nsino e C rescimento

por im itá-los estão usando esta técnica. Segunda, as conseqüências diretas


do com portam ento que está sendo im itado podem servir como um reforço.
Se o com portam ento funciona, cumprindo o que é desejado, as conseqüênci­
as são a recom pensa. Finalm ente, a pessoa pode ser reforçada de form a
in d ireta ao ver o m odelo reforçado. Se um a pessoa vê um com portam ento
funcionar para a pessoa sendo im itada, isso em si m esm o servirá como um
reforço para a imitação.
Eu conheci duas crianças adotivas, garotos gêmeos, que não haviam recebido
muito treinamento em seus dois primeiros anos de vida. Quando eles foram para
a casa da família que os adotara, estavam quase completamente fora de contro­
le. Um dos prim eiros problemas que precisava de correção era a tendência de
m order um ao outro. A mãe usou um fantoche com dentes grandes. Quando o
fantoche mordia, ele era espanca­
Por causa do poder das forças
do e a mãe lhe dizia, “Nós não
informais dos relacionamentos e
mordemos nesta família!”
exemplos, muito do comportamen­
Os meninos viam o fantoche
to humano é aprendido por meio
sendo punido por seu comporta­
da imitação. E o poder de modelar
m ento e logo aprenderam que
e imitar pode também ser eficaz
m o rd er não era certo. Então
para nutrir pessoas na fé.
quando um deles mordia, o outro
dizia, “Nós não mordemos nesta família!” Reforços indiretos podem ser positivos
(uma recompensa) ou negativos (uma punição). Assim a teoria do aprendizado
social explica tanto a aquisição de comportamentos quanto a extinção deles.
Imitação é mais do que uma simples cópia do comportamento de outros. A
teoria e o fato são mais complexos do que isso. Bandura demonstrou três cate­
gorias diferentes de comportamentos que podem ser explicados pela teoria do
aprendizado social.
O efeito modelo é a imitação de novos com portam entos vistos em outros.
Por exemplo, se uma criança é exposta a um comportamento abertamente agres­
sivo e então começa a agir agressivamente, o efeito modelo está sendo exibido.
A exposição a modelos, especialmente para crianças pequenas, pode produzir
novos com portam entos assustadores na criança. Quando os pais perguntam ,
“Onde ele aprendeu isso ? ,” eles pensarão instintivamente sobre quem poderia
ter modelado o com portam ento em questão para a criança.
O efeito inibidor foi descrito acim a quando falamos sobre o fantoche que
m ordia. O fato de ver o fantoche sendo punido por m order inibiu o m esm o
comportamento nos gêmeos. Essa abordagem é usada por terapeutas para ini­
bir com portam entos depravados em clientes. O oposto pode tam bém aconte­
cer, pelo que é cham ado efeito desinibidor. A exposição a m odelos que se
A prendendo P ela Interação e P ela O bservação 193

comportam de maneiras que normalmente alguém não se comportaria desinibirá


a tendência da pessoa para evitar o comportamento. Por exemplo, se um a cri­
ança normalmente não diz palavrões, mas é exposta a essa linguagem, ela final-
mente será desinibida e começará a usar linguagem imprópria também.
O efeito extração reconhece que as pessoas às vezes exibem com porta­
m ento sim ilar ou igual ao que tem sido modelado. M inha esposa e eu decidi­
m os ser pais adotivos e nossa filha mais velha decidiu ser assistente social.
Seu com portam ento é sim ilar, m as não idêntico ao nosso. M as claram ente
sua escolha foi influenciada pelo exemplo de seus pais.
Exemplos do aprendizado social são prevalecentes. Por causa do poder das
forças inform ais dos relacionam entos e exemplos, muito do com portam ento
hum ano é aprendido pela imitação. E o poder de m odelar e im itar pode tam ­
bém ser eficaz para nutrir pessoas na fé.

O APRENDIZADO PELA OBSERVAÇÃO


NAS ESCRITURAS
A Bíblia é cheia de exemplos de aprendizado supervisionado, apresentando
modelos do que Deus deseja e nos chama para imitar. Talvez o exemplo dom i­
nante seja o nosso Senhor. João nos diz, “e o Verbo se fez carne e habitou entre
nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do unigênito
do Pai” (Jo 1.14).
João nos relembra em sua epístola que “aquele que diz que permanece nele,
esse deve também andar assim como ele andou” (1 Jo 2.6). Aqui, um a certeza
que nossa salvação é real será que nós somos imitadores de Cristo. Se nós não
vivem os como Jesus, nós não podemos declarar ser dele.
Jesus m andou que o imitássemos. Após a últim a ceia com os apóstolos ele
modelou a servitude de uma forma impressionante. Quando terminaram de co­
mer, ele se levantou, tirou sua vestimenta externa, enrolou-se com uma toalha e
lavou os pés dos discípulos. Quando terminou, Jesus explicou :

V ós me chamais o Mestre e o Senhor ê dizeis bem; porque eu sou.


Ora, se eu, sendo o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós
deveis lavar os pés uns dos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que
como eu vos fiz, façais vós também. Em verdade, em verdade vos digo
que o servo não é o maior do que seu senhor, nem o enviado, maior do que
aquele que o enviou. Ora, se sabeis estas coisas, bem-aventurados sois se
as praticardes.
194 E nsino e C rescimento
Parte do m inistério de Jesus era ser um exem plo. N ão que nós devam os
viver exatamente como ele, mas que nós devemos adotar seus valores e pers­
pectivas, vivendo nossa vida de uma forma similar ao modo que ele viveu.
O apóstolo Paulo fez vários apelos à sua vida como um exemplo, esperando
que seus seguidores imitassem seu comportamento. Para a igreja em Filipos ele
escreveu, “Irmãos, sede imitadores meus e observai os que andam segundo o
m odelo que tendes em nós”(Fl 3.17). E disse novam ente, “O que tam bém
aprendestes, e recebestes, e ouvistes, e vistes em mim, isso praticai; e o Deus
da paz será convosco”(Fl 4.9).
Paulo via claramente sua responsabilidade de ser um exemplo para a igreja,
e ele desejou ser imitado. Isso pode ser visto ou como um a arrogância muito
grande ou entendim ento de que o cumprimento apropriado da im itação é um
im portante aspecto do aprendizado para ser um cristão. Seu pedido “ Sede
meus imitadores como eu sou de Cristo” (1 Co 11.1) é um lembrete importante
da responsabilidade de modelar para todos que estão no ministério.
A Escritura levanta tanto os modelos exemplares como simbólicos para se­
rem im itados. Os líderes da igreja devem ser exem plos para o rebanho (1 Pe
5.3), e todos devem seguir o exemplo dos profetas. A imitação dos modelos é
um conceito bíblico para conduzir o povo à maturidade.

O APRENDIZADO POR OBSERVAÇÃO E A


TEORIA DA EDUCAÇAO CRISTA

o conceito de observação e imitação há muito tem po tem sido um aspecto


im portante na teoria da Educação Cristã. Escritores de várias perspectivas te­
ológicas têm concordado em que o modelo e a imitação são m eios poderosos
de inculcar a fé em outros. Essa não é um a idéia nova; antes, tem sido um
componente da teoria do ensino aceito já há algum tempo.
O prim eiro dos educadores religiosos atuais a construir sua teoria solida­
mente no modelo da socialização foi C. EllisNelson. Em seu livro Where Faith
Begins, N elson argumenta que a origem da fé reside na com unidade da fé e é
m odelada para os novos m em bros.’ N elson acreditava que os modelos são os
ideais pelos quais os crentes devem lutar, mas não necessariam ente pessoas
reais. “Ame seus inimigos” é um ideal do reino de Deus que Jesus apresentou e
serve como um modelo para o povo do reino. Não é um a pessoa real, mas um
ideal que serve como modelo.

' C. Ellis Nelson, Where Faith Begins (Louisville: John Knox, 1967).
A prendendo P ela I nteração e P ela O bservação 195

Antes disso Harry C. M unro escreveu que os professores são m odelos im ­


portantes para seus alunos. Em seu livro Protestant Nurture Munro argumen­
tou que o caráter e a personalidade do professor tem um efeito mais dominante
sobre a vida do estudante do que o conteúdo da liç ã o .É sempre difícil avaliar
um a afirmação como essa, porque não há um modo claro de se medir o poder
real de uma influência. Mas o que nós sabemos é que a vida do professor pode
ter um impacto poderoso nos estudantes.
R egularm ente peço às pessoas para identificar fatores que elas percebem
como tendo exercido um forte impacto sobre seu crescimento espiritual. Quase
sempre algumas pessoas citarão um professor, um pastor, um líder de jovens,
ou algum outro líder que exerceu uma poderosa influência sobre elas. Quando
eu exam ino m ais profundam ente, descubro que não é o conteúdo das lições
que é lembrado, mas a força da personalidade. É de fato o caráter e a persona­
lidade do professor que são identificados.
Eu creio que a com binação de um bom caráter cristão e a Escritura é a
chave da influência de um professor. O caráter somente, sem a Palavra de Deus,
não produzirá justiça. Por outro lado, a Palavra de Deus, se não for comunicada
por um professor justo, menos provavelmente exercerá uma influência podero­
sa no aluno.
Randolph Cmmp Miller, influenciado por Horace Bushnell, escreveu que os
pais são os modelos dominantes de seus filhos. Em seu livro clássico, Biblical
Theology and Christian Education ele argum entou que o que os pais são faz
um a diferença importante no ensino das crianças. Ele colocou forte ênfase no
contexto dos relacionamentos familiares como importante para alim entar a fé
no lar cristão.^ Esse tema é também desenvolvido por Richards e Westerhoff.
John H. Westerhoff também argumentou que a vida corporativa da igreja, sua
liturgia e suas práticas modelam a fé das crianças. A observação e a inclusão na
vida da comunidade adoradora são meios centrais de passar a fé para as
crianças.*’Ele crê que o perfil da comunidade da fé moldará seu método educaci­
onal e servirá como uma demonstração do que significa ser cristão para as crian­
ças da congregação. Dessa maneira, cada igreja local modelará a fé de maneiras
ligeiramente diferentes ao viver sua própria teologia em sua expressão particular.
Se Westerhoff está correto, e eu penso que ele está, então isso tem implicações
trem endas no m odo como as congregações se comportam. O que as crianças
aprenderão sobre a fé se elas crescem numa igreja que está sempre discutindo.

'■Harry C. Munro, Protestant Nurture (Nova York; Prentice Hall, 1956).


^Randolph Crump Miller, Biblical Theology and Christian Education (Nova York: Scribner,
1956).
’ Westerhoff, Valuesfor Tomorrow's Children.
196 E nsino e C rescimento

brigando ou mesmo se dividindo? O que está sendo modelado para elas sobre
a verdade do Evangelho e o que significa ser um cristão?
Por causa de abusos dos modelos instrutivos de ensino, alguns educadores
cristãos querem conduzir a Educação Cristã quase totalmente a partir de uma
a b o rd a g e m s o c ia l. L a w re n ce
A combinação de um bom
Richards tem discutido com muita in­
caráter cristão e a Escritura é a
tensidade a favor do modelo social,
chave para a influência de um
porque ele crê que as abordagens ins­
professor.
trutivas são incapazes de comunicar
vida, o que ele vê como a m arca singular do Cristianism o verdadeiro.’ A res­
peito da aplicabilidade de um m odelo formal de instrução, Richards afirma,
“U m a educação formal pode ser eficaz ao lidar com os símbolos e conceitos
abstratos da vida, mas quando se deseja a m udança e o desenvolvim ento na
personalidade total, uma educação não-formal tem toda a vantagem .”®
Considerando-se a longa história da socialização como um modelo de ensi­
no, e a óbvia ênfase bíblica no modelar e em seguir o exemplo de outros, será
correto, como Richard sugere, fazer da socialização nossa ênfase principal na
Educação Cristã? Quais são as vantagens e as desvantagens da socialização
como modo principal de Educação Cristã?

ASPECTOS POSITIVOS
Há quatro aspectos positivos principais da socialização que devem ser man­
tidos para um a Educação Cristã eficaz.

É uma função clara da igreja


A ênfase óbvia na socialização está na Escritura e não pode ser negada. A
igreja deve funcionar como um a comunidade, com seu testem unho principal
estando na qualidade de seus relacionamentos. A maneira como os discípulos
se am avam era o m elhor testem unho que eles podiam dar para o m undo ao
redor deles (Jo 13.35). A igreja como um a comunidade redim ida é o contexto
no qual a nutrição cristã deve acontecer, e o aprendizado pela observação é
sempre um a parte dos relacionamentos da comunidade.

''LawrenceRichards,/} Theolog}/ofChristianEdiication{GrandRapids:Zonáervan, 1975), L


Mbid,64.
A prendendo P ela Interação e P ela O bservação 197

Onde quer que haja pessoas juntas em um a soeiedade, haverá o aprendiza­


do observacional. Porque a igreja é um a eomunidade, o aprendizado pela ob­
servação será parte dela.

O enfoque bíblico nos modelos de fé


A Bíblia fala freqüentemente de pessoas eomo modelos de fé e essa ênfase
pareee pressupor o fato do aprendizado pela observação. Por que Deus levantaria
modelos para nós se não devéssemos imitá-los? Nosso Senhor disse, “O discí­
pulo não está acim a do seu mestre; todo aquele, porém, que for bem instruído
será como o seu m estre“ (Lc 6.40).
O enfoque bíblico no m odelo e na im itação esclarece que isso é parte do
plano de D eus para a educação na fé. Porque o m odelo e a im itação c o n s­
tituem um a m aneira natural de aprender. Deus usa-os para ajudar seu povo
a crescer na fé.

O processo de modelar não permite uma separação


acadêmica
U m a abordagem puram ente form al e cognitiva da educação pode levar o
professor a ensinar de uma maneira desconectada, não permitindo que a verdade
penetre a sua vida. A possibilidade de “objetividade acadêm ica” pode levar a
se ensinar a verdade de um a maneira impessoal e estéril. Mas para o professor
ser um m odelo do que está sendo ensinado, deverá haver um envolvim ento
m ais profundo com a verdade. O conteúdo não pode m ais ser ensinado de
m aneira abstrata e não envolvente.
Um m odo de educação puram ente instrutiva tende a ir do professor para
outros. O enfoque do professor será norm alm ente na direção externa. Mas
um a abordagem socializadora também força o professor a olhar para si m es­
mo, porque a hipocrisia não pode ser tolerada. U m a form a socializadora de
ensinar depende de o professor viver a verdade assim como discute a verdade.
A socialização não permite um academicismo seco destacado da vida.

A ênfase está na fé como uma realidade vivida


o crescim ento cristão inclui a aquisição de conhecim ento, mas é mais do
que isso. A m aturidade cristã significa viver a verdade na arena da vida. É a
prática da verdade e não m eram ente o ouvir ou entender a verdade. A ssim ,
tam bém a fé, se não tiver obras, por si só está m orta (Tg 2.17).
198 E nsino e C rescimento

A socialização enfatiza que deve haver algo a ser observado na vida do crente.
O professor deve ser modelo de maturidade, e o aluno deve imitar. Um modo de
ensino e aprendizado pela observação requer categoricamente que algo esteja
acontecendo tanto na vida dos professores quanto na dos alunos. A possibilida­
de de uma fé divorciada da vida é eliminada. Uma discussão abstrata da verdade
desprovida de obediência não é possível num modelo apropriado de socializa­
ção. A palavra e a atitude devem estai' integradas.

ASPECTOS NEGATIVOS
C onquanto haja óbvias vantagens num m odelo de socialização do en si­
no, abandonar totalm ente um modo instrutivo é perigoso. D evem ser con­
sideradas algum as fraquezas inerentes ao m odelo de socialização quando
tom ado com o único m odelo para nutrir o povo.

As pessoas podem imitar comportamentos e não


conhecer a Deus
Há um potencial m uito real para as pessoas serem socializadas num a
subcultura cristã e nunca conhecer verdadeiram ente o Pai. U m a pessoa pode
aprender a linguagem, os comportamentos, as atitudes e os valores do Cristia­
nism o, mas nunca ser salva. Um defensor da abordagem social à educação
cristã foi o liberal clássico George Albert Coe, que observou.

Assim como as crianças prontamente aceitam nossa instrução, assim


elas abertamente imitam nossos atos religiosos. A oração noturna, o agra­
decimento antes das refeições, a participação no culto público—essas
coisas, sob condições favoráveis, são benquistas; não requerem coerção.
Mas elas não podem, sem outras evidências, ser consideradas como si­
nais claros de religiosidade.’’

Coe está correto em sua avaliação. A fé cristã é m ais do que aprender os


comportamentos certos. É uma questão de relacionamento certo com Deus. O
perigo é confundir o exterior com o interior, confundir os costumes sociais com
a regeneração e a fé verdadeira.
Eu tive uma colega na faculdade que era uma forte líder em nossa escola. Ela

George Albert Coe, A Social Theoty of Religous Education (Nova York: Scribners, 1929), 140.
A prendendo P ela Interação e P ela O bservação 199

tinha sido criada num lar cristão, tinha freqüentado o ensino prim ário e o
secundário em escolas cristãs, e estava agora se preparando para o m inistério
profissional. A sua vida e seu testemunho eram exemplares. Ela retomou à facul­
dade para uma visita cerca de um ano após a formatura. Eu estava na época no
corpo docente e nós conversamos. E lam e contou que enquanto estava fazendo
sua graduação entendeu que não era cristã! Quando eu protestei, dizendo-lhe
que eu havia visto a sua fé, ela me interrompeu, “Eu conhecia a linguagem e o
estilo de vida, mas eu não conhecia Deus”, foi a sua simples resposta.
Pode haver um perigo real de induzir as pessoas a “viver como cristãs,” mas
nunca apresentar-lhes Jesus. A
o professor deve modelar a maturida­
salvação é uma questão de fé e
de, e o aluno deve imitar. Um modo de
fé inclui um relacionamento com
ensino e aprendizado pela observa­
Deus. A socialização pode en­
ção requer categoricamente que algo
sinar uma pessoa a fazer parte
esteja acontecendo tanto na vida dos
da comunidade cristã sem ter um
professores quanto na dos alunos.
relacionamento vivo com Deus.
Essa crítica não é só à socialização. Isso pode acontecer em qualquer modo
de ensino, porque nós não podemos medir, ou conhecer com certeza o relaci­
onam ento de alguém com Deus. M as há um perigo inerente e específico em
confundir a adaptação a uma subcultura, tal como a cristã, com ter um relacio­
namento redentivo com Deus. Os defensores de um modelo puro de socializa­
ção devem reconhecer esse perigo.
Nós devemos nos lembrar da mensagem do profeta M alaquias a Israel. Ele
disse-lhes que Deus não queria suas festas, seus sacrifícios e suas ofertas. Por
intermédio do profeta Deus disse, “Tomara houvesse entre vós quem feche as
portas, para que não acendésseis, debalde, o fogo do meu altar. Eu não tenho
prazer em vós, diz o SEN HO R dos Exércitos, nem aceitarei da vossa mão a
oferta” (Ml 1.10).
M esm o que Deus tenha ordenado as festas e os sacrifícios, ele agora os
recusa, porque eles estavam sendo oferecidos sem o com prom isso. O povo
estava praticando rituais vazios, sem significado, e eram portanto um a abomi-
nação ao Senhor. Eles tinham sido socializados em sua religião, mas não ti­
nham fé, não tinham um relacionamento verdadeiro com Deus.

A socialização é fraca em comunicar a verdade


proposicional
o aprendizado pela observação é forte em com unicar valores, com porta­
mentos e atitudes. Aqueles aspeetos de uma orientação social que são mais ime-
200 E nsino e C rescimento

diatos e existenciais são bem comunicados. Mas a verdade sistemática da Escri­


tura não é claramente comunicada de um modo exclusivamente socializador. O
conteúdo da Escritura pode ser perdido quando as formas da fé são comunicadas.
U m a abordagem de aprendizado puram ente social ao ensino cristão pode
conduzir à heresia sendo ensinada e crida, sem que ninguém perceba. E a ver­
dade proposicional da revelação de Deus que fornece as normas e as garantias
para a nossa fé. Se a verdade proposicional for perdida, a base é perdida.
Richards afirm a de forma correta que a m issão da igreja é passar vida para
seus m em bros. E a vida, dada pelo poder regenerador do Espírito Santo que
pode separar o indivíduo. M as nós devem os lem brar que a vida é m ediada
para nós pelas palavras de Deus, e suas palavras devem ser valorizadas e
mantidas. Pedro disse a Jesus “Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras
da vida eterna” (Jo 6.68).
Paulo encorajou os filipenses a resplandecerem como luzeiros no mundo (F1
2.15-16). Ele reconhecia a im portância de m odelar e imitar, mas ele também
m antinha a necessidade crucial de a Palavra de Deus ser proclamada.
O ensino da Palavra pode ser feito pelo exemplo, por meio de rituais e da
liturgia da congregação, mas deve também ser feito mediante o ensino sistemá­
tico e intencional. A abordagem socializadora é essencial, mas deve ser combi­
nada com a abordagem da instrução que proclam a a verdade proposicional da
Escritura. N ão se trata de “ou isso ou aquilo” , mas “tanto isso quanto aquilo.”
Tanto a m odelagem quanto a instrução são requeridas para um a Educação
Cristã eficaz.
A maturidade requer que saibamos tanto como viver em obediência a Deus
quanto o motivo pelo qual nosso estilo de vida é uma expressão de obediência.
Aprender formas sem as suas razões subjacentes não produzirá maturidade.
O músico Mason Williams conta a história de como ele aprendeu a cozinhar
um pernil. A sua mãe havia ensinado a ele que prim eiro o osso deveria ser
rem ovido. Quando ele perguntou o m otivo ela explicou que sua mãe a havia
ensinado assim. Quando ele perguntou à sua avó por que o osso deve ser re­
movido do pernil, ela explicou que era assim que a mãe dela fazia. Ele pergun­
tou à sua bisavó o mesmo e ela explicou que não tinha um a panela grande o
suficiente para cozinhar o pernil com o osso!
Se nós passamos adiante rituais e estilos de vida sem explicar as razões para
a existência deles, as pessoas podem cair no problema que o profeta Malaquias
condenou. Quando a igreja se torna somente formas, sem uma base experiencial
e teológica para apoiar as form as, o institucionalism o e a apatia virão como
resultado. Um modelo puramente social pode levar à heresia e a formas vazias,
assim como um modelo puramente instrutivo pode levar a uma ortodoxia morta.
A prendendo P ela Interação e P ela O bservação 201

A socialização enfoca a experiência, não a verdade


absoluta
A vida cristã deve ser um a realidade experimentada, ou não é sequer um a
realidade. As palavras sem a experiêneia são mortas. Mas igualmente perigoso
seria a experiêneia que não é baseada na verdade. Essas posições são falsas e
destruidoras e servem somente para desviar as pessoas.
Se as experiências desviam-se da base da verdade, elas se tornam um puro
relativismo. Um a pessoa tem uma experiência, uma outra tem outra experiên­
cia, e sem a verdade não há base na qual ju lg ar a experiência. Ela se torna
relativa no sentido de que uma experiência é igual a outra experiência.
M uitas pessoas defendem sua teologia baseados em sua experiência. Elas
explicarão o que Deus fez em suas vidas, deixando de entender que elas podem
estar erradas em sua interpretação da experiência. Podemos tirar conclusões
incorretas sobre a natureza e o caráter de Deus, ou sobre sua obra se basea­
mos nossas conclusões somente em nossa experiência.
A experiência cristã deve ser filtrada pelo entendimento teológico e bíblico.
Nossas experiências devem ser interpretadas e avaliadas com base na Eseritura
porque nossas experiências podem mentir e de fato mentem, ou são propensas
a um a interpretação duvidosa. As experiências são importantes, mas não são
normativas. A experiência deve ser julgada pelo padrão da Palavra de Deus.

IMPLICAÇÕES PARA O MINISTÉRIO


EDUCACIONAL
U m a teoria da Educação Cristã deve incluir um com ponente forte de
modelo e imitação, porque esses são métodos bíblicos de instrução e estão de
acordo com o m odo como Deus projetou as pessoas para aprender. Mas nos­
so modelo de como passar adiante a fé e a vida não devem ser exclusivamente
sociológicos, porque tal abordagem pode conduzir à perda da fé ou no mínimo
reduzir o conteúdo dela. Tanto as abordagens instrutivas e de socialização de­
vem ser usadas. Dadas as forças e as fraquezas da abordagem social ao apren­
dizado, as seguintes implicações podem ser tiradas.
202 E nsino e C rescimento

A qualidade de vida do professor é muito importante


Ao escolher professores para Educação Cristã, tanto o que eles conhecem
quanto como vivem suas vidas deve ser considerado. Pessoas mais jovens es­
pecialm ente aprenderão por imitação, e a vida do professor deve ser digna de
ser imitada. O professor deve m odelar o que ele está ensinando.
A necessidade de ser modelo do que nós ensinamos pode ser terrível se nós
estam os ensinando a perfeição. Se devemos sempre ser modelos de perfeição
e de fé e m aturidade, nenhum de nós é digno de ser considerado professor.
M as Deus nos tem cham ado, não para ser m odelos de perfeição, m as de re­
denção. Nós devemos viver demonstrações, não de como somos bons, mas de
como Deus é bom. Nós devemos ser modelos do Evangelho, dos atos redentivos
de Deus na humanidade pecadora. Ser um modelo da verdade significa ser um
m odelo do que é ser um pecador crescendo em Cristo. N ós som os, como
M artinho Lutero ensinou, simul justus etpecatores, ao mesmo tem po ju stifi­
cados e pecadores. N ós somos m odelos de como Deus tom a pecadores, tais
como nós m esm os, e pela sua graça nos torna santos.
A qualidade de vida desejada no professor é a autenticidade e fé verdadeira.
Se as pessoas são autênticas, deixando que os alunos vejam o processo de reden­
ção acontecer nelas, e se sua fé é real, elas têm as qualidades de bons professores.

Disponibilizar oportunidades para observar a vida


do professor
Os professores devem querer arriscar a vulnerabilidade de perm itir que os
alunos vejam -nos como eles realmente são. Se o processo de redenção é para
ser modelado, os professores devem ser suficientemente abertos para perm itir
que o processo seja visto. Os professores que são extrem am ente reservados,
pessoas fechadas, não compartilham com seus alunos. Ele ensinam o “conteú­
do,” mas não se dão.
O ensino que é verdadeiram ente cristão precede de um coração que ama
Deus e o aluno. Parte do amor aos alunos é estar aberto para com partilhar de
si mesm o com eles. De fato, eu creio que não há um real dom de am or sem a
autodoação. Os professores devem estar desejosos de com partilhar sua vida
com os alunos.
Os professores podem com partilhar ao falar em níveis mais profundos em
lugar de somente compartilhar suas idéias e julgamentos. Eles devem também
estar desejosos de com partilhar seus sentimentos, porque é no nível do sen-
A peiendendo P ela Interação e P ela O bservação 203

timento que quem nós realmente somos é compartilhado. É no nível dos senti­
mentos que nós somos mais vulneráveis, mas é também nesse nível que estamos
sendo mais honestos.
É assustador com partilhar nossos sentim entos com outros, porque isso
nos torna mais vulneráveis. E como tirar as roupas em público. A inda que nos
vistam os novam ente, todos se lem brarão de como som os som ente com as
roupas de baixo!
No m eu ensino na Trinity, freqüentemente compartilho com minhas clas­
ses no nível sentim ental. Eu lhes digo como me sinto sendo um professor de
sem inário, ou um pai adotivo, ou um escritor. Isso é m ais profundo do que
aquilo que eu penso sobre es­
sas c o isa s p o rq u e quando
Se as pessoas são autênticas, dei­
com partilho m eus sentim en­
xando que os alunos vejam o pro­
cesso de redenção acontecer nelas,
tos, eu com partilho quem eu
e se sua fé é real, elas têm as quali­
realmente sou. Mas é também
dades de bons professores.
n esse n ív el que a obra de
Deus pode ser vista mais claramente.
É desconcertante admitir que às vezes eu sinto medo de ensinar, ou me sinto
frustrado com m eu papel de pai adotivo ou inseguro como escritor. M as ao
dizer para m inha classe quem eu realm ente sou, estou deixando-os ver quem
Deus escolheu para usar. Eles descobrem que eu não sou perfeito, m as um
pecador tentando fazer a obra de Deus. Tais confissões são difíceis de fazer,
mas necessárias se eu quero ser autêntico.
A lém de falar de suas vidas os professores devem tam bém deixar que os
alunos vejam-nos na vida real. O relacionamento com os nossos alunos signifi­
ca tê-los em nossos lares, levá-los conosco quando m inistram os e deixar que
eles nos vejam em ambientes não-restritos da educação formal. Parte da tarefa
de m odelar a verdade significa deixar a verdade ser vista à m edida que ela
está sendo trabalhada na arena de nossa vida. Requer que os alunos vejam seus
professores nas situações da vida real.

Fornecer uma exposição a uma variedade de modelos


Porque as pessoas aprendem tanto pelo exem plo como por m odelos
sim bólicos, am bos os tipos devem ser usados na Educação Cristã. A lém do
professor, do líder jovem , do pastor e do pai, os m odelos sim bólicos devem
tam bém ser usados. Há um lugar para as biografias cristãs, tanto em livros,
film es e peças, para ajudar as pessoas a verem exem plos de um a vida cristã
204 E nsino e C rescimento

autêntica. Os exem plos de hom ens e m ulheres de fé vivendo suas crenças


num a variedade de contextos de vida podem fazer muito para ensinar outros
sobre a vida cristã.
Além das biografias, palestrantes que têm um testemunho cristão claro ser­
vem bem para inspirar especialmente os adolescentes a um a vida cristã. Figu­
ras cristãs do esporte podem influenciar particularmente os adolescentes a ve­
rem como é a vida cristã real. Exposição consciente a modelos de vida cristã é
um bom uso do poder da teoria do aprendizado social.

Enfatizar relacionamentos no contexto educacional


As pessoas imitarão mais aqueles com quem se relacionam. A educação que
é poderosa enfatiza tanto o conteúdo quanto o relacionamento. Os professores
devem am ar seus alunos e entrar em relacionam ento com eles. Por meio do
poder do relacionam ento, os alunos imitarão seus professores. Paulo poderia
incitar a igreja de Corinto a imitá-lo porque ele tinha um relacionamento com
eles. Ao escrever a segunda carta o relacionamento não estava bom, mas m es­
mo assim ele apela ao exemplo que ele tinha sido no meio deles.
Se a im itação deve acontecer, deve ser precedida por um relacionam ento.
Se os alunos sabem que são amados pelo seu professor, eles naturalm ente o
imitarão. M as os alunos não imitarão aqueles de quem eles não gostam . Por­
tanto, um relacionam ento é a base para um a socialização eficaz. Como cris­
tãos, nossa base relacionai é nosso amor por Deus e nosso amor por seu povo.
CAPÍTULO 13
APRENDENDO POR MEIO DO
DESENVOLVIMENTO LÓGICO
A prim eira vista, parece que o mundo está dividido em dois tipos de pesso­
as - aquelas que processam as coisas logicamente e aquelas que processam as
coisas psicologicam ente. Os tipos lógicos pensam coisas de um m odo claro,
ordenado e chegam a conclusões com base na evidência; depois atuam de
acordo. Os tipos psicológicos processam coisas mais de acordo com senti­
m entos e intuições, atuando sobre pressentimentos, percepções intuitivas, ou
simplesmente sobre a emoção crua do momento. Os tipos lógicos dizem: “Eu
penso”, e os tipos psicológicos dizem: “Eu sinto” . Eles parecem não se enten­
der, e um se sente superior ao outro.
Naturalmente, a dicotomia apresentada é falsa. Ninguém é puramente lógi­
co, e ninguém é puramente psicológico. Nós todos somos um a m istura de am­
bos, tendo tendências em uma direção ou noutra, mas jam ais somos puramente
um ou outro. M as isso importa?

CABEÇA E CORAÇAO NA PERSPECTIVA


b íb l ic a

A Bíblia enfatiza tanto a importância da mente como a im portância do co­


ração. De fato, a Bíblia enfatiza que ambos, mente e coração, são fundam en­
tais! Mas a prim azia atribuída j - 1.
, f... ^ Para Jesus, nao devia haver separa-
a cada um e diierente em es- _ .
, . . , , çao entre o coraçao e a mente,
pecie. A mente tem a primazia
em ordem, e o coração tem a prim azia em importância.
Nós vivemos na que talvez seja a era mais antiintelectual da história da igre­
ja. Nós valorizam os a Ciência e a tecnologia, mas tendem os a m enosprezar o
intelectual. Até a nossa linguagem denuncia essa tendência. Nós perguntamos
às pessoas: “ Como você se sente a respeito de...?” em vez de: “O que você
pensa sobre...?” Estam os mais interessados nos julgam entos em ocionais do
que nos intelectuais.
Contudo, como tem os visto, a B íblia coloca um a forte ênfase na mente.
Deus está preocupado sobre como pensamos as questões e nos tem revelado a
verdade para ser conhecida e entendida. Deus jam ais nos pede para am ar e
afirm ar aquilo que não entendemos. O caminho para amar a Deus é prim eiro
206 E nsino e C rescimento

saber algo sobre ele. Em ordem de seqüência, a B íblia prim eiro apela para a
m ente, pedindo-nos para fazerm os julgam entos racionais para a partir deles
moldarmos nossa vida.
Entretanto, a Bíblia não pára no nível da mente. E perfeitamente possível en­
tendermos algo sem que isso esteja agarrado a nós e nos controlando. E possível
ter uma fé que seja toda intelectual, sem que o coração esteja envolvido.
O coração tem a prim azia em im portância porque é por meio dele que res­
pondem os e obedecemos a Deus. A mente é ensinada de modo que o coração
possa amar. Jesus ensinou: “Amarás o Senhor, teu D eus, de todo o teu cora­
ção, de toda a tua alm a e de todo o teu entendim ento” (M t 22.37). Para ele,
não devia haver separação entre coração e mente.
Mas, por alguma razão que eu não consigo decifrar completamente, o ambi­
ente moderno rejeita a mente como, de alguma maneira, sem importância para
a fé. As pessoas orgulhosamente proclamam que não querem estudar, porque
querem am ar ao Senhor com um a fé inocente. Elas parecem pensar que ino­
cente e infantil são a mesm a coisa. Elas se esquecem da observação de Paulo
para a igreja de Corinto: “Quando eu era menino, falava como menino, sentia
como menino pensava como menino; quando cheguei a ser homem, desisti das
coisas próprias de m enino” (1 Co 13.11).
Mais adiante, na mesm a carta, o apóstolo repreendeu-os, escrevendo: “Ir­
mãos, não sejais meninos no juízo; na malícia, sim, sede crianças; quanto ao
juízo, sede homens amadurecidos” (1 Co 14.20). Claramente, a idéia de Deus
a respeito de um a fé inocente não é uma fé que seja desinformada ou simplória.
Seu desejo é que nós raciocinemos e pensemos como adultos.
A B íblia apresenta um a ligação direta entre como pensam os e como nos
com portam os. Paulo descreve os inim igos da cruz como aqueles que “só se
preocupam com as coisas terrenas” (Fp 3.19), em oposição aos crentes, os
quais devem pensar nas “coisas lá do alto, e não nas que são aqui da terra” (Cl
3.2). O foco da mente (aquilo em que pensam os) e a atitude da m ente (como
pensam os sobre as coisas) devem ser diferentes para o crente.
Paulo torna essa questão mais convincente para a igreja em Roma:

“ Porque os que se inclinam para a carne cogitam das coisas da carne;


mas os que se inclinam para o Espírito, das coisas do Espírito. Porque o
pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida e paz. Por
isso, o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei
de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne não
podem agradar a Deus”(Rm 8.5-8).
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 207

O apóstolo faz um a ligação direta entre como nós pensam os e como nos
com portam os, instigando a igreja em Rom a a pensar corretam ente. É nesse
contexto que mais tarde ele os insta a renovarem a mente (Rm 12.2). As liga­
ções entre pensar e com portar-se estão dem onstradas m ais am plam ente no
verso seguinte quando ele escreve: “Porque, pela graça que me foi dada, digo a
cada um dentre vós que não pense de si mesm o além do que convém ; antes,
pense com moderação, segundo a m edida da fé que Deus repartiu a cada um ”
(Rm 12.3). Sua argum entação é que o m odo como nós pensam os sobre nós
mesmos moldará o nosso comportamento.
U m a vez que a m aturidade cristã é m oldada em parte pelo com o p en sa­
m os, é incum bência do educador cristão responsável entender com o D eus
nos tem designado a pensar. Se ensinar inclui form ar m entes de m odo que
pensam ento correto possa conduzir ao viver correto, como as pessoas p en­
sam de form a racional?

O PROCESSO COGNITIVO MAIS ELEVADO


Temos visto que a form a como as crianças pensam desenvolve-se através
de estágios previsíveis. Seu pensam ento am adurece de um sim ples estágio
sensorim otor para um com plexo estágio de operações form ais, a partir das
quais elas podem form ar e testar hipóteses. O pensam ento adulto exibe ex­
pressões aum entadas da capacidade para operações formais. Mas o que esse
m odo de pensar requer do educador?
Jerom e B runer fez muito para ajudar nosso entendim ento dos processos
cognitivos mais elevados na mente humana. Nascido em N ova York em 1915,
Bruner estudou na Duke University (Administração de Empresas) e na Harvard
G raduate School (Ph.D.). Ele foi o presidente da A ssociação A m ericana de
Psicologia e foi o primeiro americano a receber a principal cadeira na Universi­
dade O xford da Inglaterra, onde ele m antinha a Cadeira Watts de Psicologia
Experimental.'
Bruner é amplamente reconhecido por seu trabalho em estudos cognitivos,
que se concentraram numa grande variedade de questões, mas com ênfase primá­
ria nas crianças. Sua afirmação extensamente citada, “qualquer assunto pode
ser ensinado eficazmente de alguma forma intelectualmente honesta para qual­
quer criança em qualquer estágio de desenvolvimento”- é talvez sua idéia mais
bem conhecida e mais radical.
' Academic American Encyclopedia (Princeton, N. J.; Arete, 1980), 525.
- Jerome S. Bruner, TheProcess of Editcaüon (Nova York: Random House, 1960), 33.
208 E nsino e C rescimento

A raiz dessa idéia é seu entendim ento da percepção e dos m odelos para
educação. Provocando Piaget e competindo com ele, Bruner argumenta que se
um conceito é apresentado de um a forma apropriada, ele pode ser com preen­
dido em qualquer nível do desenvolvimento cognitivo.
Em seu trabalho sobre percepção, “ele ajudou a mostrar que a maneira como
um estímulo é identificado depende da necessidade e dos desejos do observa­
dor.... Ele sustentou que a percepção era um processo de categorização” .^ É o
processo de categorização que nos ajuda a entender o modo como as pessoas
pensam sobre as idéias.
B runer estava preocupado com conceitualização, que é tornar-se ciente
dos conceitos. E por meio de conceitualização que um a pessoa pensa. Um
conceito é um a abstração que fazemos em nossa mente que representa objetos
ou eventos que percebemos terem propriedades similares.
A categorização é o termo de Bruner para conceitualização. Quando pen­
samos, nós ajustamos conceitos em categorias que formamos em nossa mente.
Para se encaixar numa categoria, um conceito deve ter atributos e valores simi­
lares àqueles conceitos já incluídos na categoria. Assim, por exemplo, a cate­
goria “animal de fazenda” incluirá aqueles animais normalmente encontrados
numa fazenda, tais como vacas, cavalos, porcos e galinhas.
N ovas experiências ou percepções nos fazem m udar o m odo como
categorizamos os conceitos. Talvez nosso conceito de “lhama” se encaixe numa
categoria de “ animais estranhos da América do Sul” . Mas depois descobrimos
por meio de leituras ou observação direta que algumas pessoas criam lhamas
em suas fazendas. Agora nós podemos colocar o lhama em nossa categoria de
“animais de fazenda” .(Ou nós podemos colocar o fazendeiro na categoria de
“pessoas estranhas que devem ser evitadas” !) N osso pensam ento é parcial­
m ente um a questão de percepções e categorização.
A categorização, de acordo com Bruner, é absolutam ente necessária para
pensar e funcionar cognitivamente. Ela executa pelo menos cinco funções im ­
portantes para nós."* Primeiro, ela serve para reduzir a complexidade do ambi­
ente. Se pudermos pensar em categorias em vez de específicos, o ambiente se
torna muito menos complexo. Os pais podem dizer aos seus filhos: “ Não aca­
riciem cães estranhos” , usando a categoria de “cão”, em vez de usar os nomes
de raças específicas de cães. É m ais fácil pensar e conversar em categorias
mais vastas do que em específicas.

Academic American Encychpedia, 525.


J. S. Bruner; J. J. Goodnow; e G. A. Austin. A Stiidy ofThinking (Nova York; John Wiley,
1956).
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 209

Segundo, a categorização nos permite reconhecer objetos ou idéias que ja ­


mais encontramos antes. Quando eu estava na penúltima série do colégio, meu
vizinho do lado colecionava e comercializava carros esportes. Nos vários anos
em que fom os vizinhos ele trouxe para casa inúmeros autom óveis exóticos.
Muito embora eu jam ais tivesse visto uma Masserati ou um a Ferrari antes, eu
era capaz de reconhecer o objeto como um carro porque ele se encaixava nas
características de m inha categoria de “carro”.
Terceiro, a categorização reduz a necessidade de aprendizado constante. Nós
podem os, por meio da categorização, reconhecer novos objetos sem ter de
passar por qualquer novo aprendizado e somos capazes de inferir a respeito de
nova idéia ou acontecimento a partir da base de nosso conhecimento anterior.
U m dia eu parei num a loja com m inhas filhas para olhar bicicletas com
elas. D entro da loja estava o m aior cachorro que eu jam ais tinha visto, um
m astim . Eu jam ais tinha visto um m astim antes, porém , por causa de m inha
categ o ria cognitiva de “cachorros grandes” eu fui capaz de tirar certas
inferências a respeito daquele animal diante de mim. Após ele ter-m e derru­
bado ao chão em sua saudação amigável, eu acrescentei algum as inferências
mais à m inha categoria.
O encontro com o mastim ilustra o quarto resultado de categorização tam ­
bém , a saber, que a categorização serve para direcionar o com portam ento.
Ninguém precisou dizer-me que eu tinha de ser gentil com o cão, porque minha
categoria de “cachorro grande” (e minha categoria de “autopreservação”) ser­
viu para instruir-m e com respeito ao meu comportamento. M uito em bora eu
nunca tivesse passado por situação sem elhante antes, m inhas categorias
cognitivas instruíram-me sobre como me comportar.
Finalmente, a categorização reduz a complexidade do ambiente por nos per­
mitir relacionar objetos ou classes de eventos simultaneamente. O processo de
relacionar idéias sim ultaneam ente é atingido por m eio de sistemas de
codificação. Os sistemas de codificação são amplos e genéricos em natureza
ou são mais exclusivos e conseqüentemente estreitos. Assim, por exemplo, o
amplo código genérico de mamíferos incluirá o código mais especifico de pe­
quenos cães irritantes. É por meio de sistemas de codificação que a retenção
e a descoberta, entre outras tarefas, são alcançadas.
Por exem plo, eu posso ir para casa, para m inha esposa, a qual anim ada-
m ente anuncia: “Nós vam os ter alcachofras para o ja n ta r” . N esse m om ento
não sei se ela está descrevendo a refeição ou algumas pessoas que ela convi­
dou. Porém vejo que a m esa está posta apenas para a fam ília e que há uma
espécie estranha de vegetal colocada diante de mim. O uso do código “vege-
210 E nsino e C rescimento

ta l” m e ajuda a entender que este pode ser com estível, pode ser bom para
m im e pode se tornar um a parte regular de minha dieta. M esmo que eu nunca
mais volte a com er alcachofras, posso agora reter o conceito de que alcacho-
fra é um vegetal.
E o sistema de codificação cognitivo que torna a percepção possível. Quan­
do nós reunim os idéias, eventos ou experiências, nossa resposta m ental é
conceituá-las por meio do processo de categorização, o qual é percepção.
Para Bruner, perceber é categorizar.
O aprendizado mais elevado envolve a formação de categorias e sistemas
de codificação. Essas categorias e sistemas de codificação perm item percep­
ção acurada, prom ovem descobertas, facilitam a transferência de aprendiza­
do e ajudam na memória. N ossa mente funciona cognitivamente pelo proces­
so de categorização.
Ensinar envolve ajudar as pessoas a estabelecerem categorias cognitivas mais
precisas e mais significativas. Se levarmos uma criança pequena a uma fazenda
e lhe mostrarmos uma vaca, ela pode muito bem exclamar: “Cachorrinho!” A
razão para isso é que o animal diante dela se encaixa em sua genuína categoria
de “cão” . E grande e peludo e tem quatro patas - tem de ser um cachorro.
Todavia nós a corrigim os, dizendo-lhe: “N ão, isso é uma vaca”. “Vaca” , ela
repete, curiosa para estabelecer uma nova categoria.
M ais tarde ela vê um cavalo. “Vaca!” , ela exclam a, com um óbvio prazer.
Este novo animal se encaixa na categoria que ela estabeleceu porque é muito
grande, peludo, vive numa fazenda e tem cheiro desagradável. Q ualquer tolo
pode ver que aquilo é um a vaca. M as novam ente nós a ajudam os com suas
categorias, explicando que esse é um cavalo, m ostrando-lhe as diferenças. E
assim seu aprendizado progride, amadurecendo através de categorias m ais e
mais complexas e sofisticadas.

CATEGORIZAÇAO E A EDUCAÇÃO CRISTÃ


U m a vez que a Educação Cristã tem a ver até certo grau com a renovação da
mente, e uma vez que parte do como nós aprendemos visa desenvolver catego­
rias m elhores e mais sofisticadas, um a tarefa da Educação C ristã é ajudar as
pessoas a estabelecerem categorias bíblicas e teológicas e usá-las no pensa­
m ento. As categorias de santidade, pecado, redenção, justiça, santificação e
inúmeras outras devem se tom ar a grade por meio da qual as pessoas pensem e
deeidam suas experiências de vida. Eu enfatizei que precisamos ensinar a Bíblia
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 211

às pessoas de forma que elas possam viver biblicamente. A ligação entre conhe­
cer a Bíblia e pensar biblicamente está enraizada no processo de categorização.
U m a vez perguntaram-me se eu realizaria a cerimônia de casamento de um
casal cristão que “tinha entrado em dificuldade” . A m ulher estava grávida de
cin co m eses, m as eles se am avam e q u eriam se casar. N o m eio do
aconselhamento pré-marital eu lhes perguntei: “Se vocês pudessem voltar atrás,
o que vocês fariam de diferente?” Eles pensaram por um m om ento e então
responderam refletidamente: “Usaríamos um método anticoncepcional”. Depois
de algum tempo eu lhes perguntei a respeito dessa resposta, dizendo-lhes estar
surpreso que eles, como cristãos, não estivessem arrependidos e que não tives­
sem dito que não desejariam ter pecado em sua conduta sexual. A mulher olhou-
me um tanto surpresa e disse: “Mas eu nunca pensei nisso como pecado!”
A qui estava um casal, am bos reivindicando ser cristão s, que sim p les­
m ente não pensava em categorias bíblicas. Eles tinham violado o sétim o
m andam ento e estavam se apressando para um m atrim ônio para o qual não
estav am p reparados, porém nunca h av ia ocorrido a eles verem -se com o
pecadores e seu com portam ento como pecam inoso. Eu não os censuro pela
sua falta de entendim ento, mas me espanto a resp eito da educação cristã
que os fez pensar daquela forma.
U m a educação cristã sistem ática, tal como aquela praticada por Richard
Baxter, levará o povo a modos crescentem ente mais bíblicos de pensar. C o­
m eçará com amplas categorias teológicas e ajudará as pessoas a desenvolver
m eios crescentem ente m ais adequados de pensar a respeito do m undo e de
suas vidas. “M ais adequado” im plica o uso m ais cuidadoso de percepções
bíblicas e teológicas.
N ossa sociedade nos ensina como pensar, mas as categorias que ela usa
estão longe daquelas da Palavra de Deus. A sociedade nos Estados Unidos
pensa basicam ente em categorias psicológicas e econômicas. As pessoas são
treinadas para pensar em termos de auto-realização e resultados. Essas cate­
gorias são psicológica e econômica, respectivamente.
Q uando as pessoas procuram um a carreira, elas perguntam : “O que vai
me realizar e o que vai dar dinheiro?” M esmo alguns cristãos assum em que
Deus os quer realizados e Deus quer que eles tenham dinheiro. Suas catego­
rias operativas e formas de pensar são as do mundo. Eles são então batizados
num a perspectiva pseudocristã. É triste imaginar que esse pode ser o resulta­
do de nossos program as educacionais, porque esse é o m odo como in stru í­
m os o povo a pensar.
Naturalmente, Jesus tinha uma perspectiva diferente, que requeria abnega-
212 E nsino e C rescimento

ção, um a disposição para sofrer, e obediência a ele (M t 16.24-26). Os crentes


devem tom ar decisões quanto à carreira levando em consideração a glória de
Deus e o serviço a ele e aos outros. A prom essa de Jesus é que é através desse
caminho que encontraremos nossa vida.
Algumas pessoas não gostam de Teologia Sistem ática porque não acham
que a Teologia possa ser útil, considerando-a como irrelevante para a vida
diária. Se a Teologia for enfocada e ensinada como um série de proposições
a serem aprendidas e reajustadas em padrões m ais sofisticados, eu teria de
concordar. Esse tipo de teologia é realm ente tanto irrelevante quanto um a
perda de tem po.
Porém , Teologia, adequadam ente entendida, é um m odo de pensar e um
m odo de ver. As categorias de Teologia devem nos perm itir ver o m undo de
formas diferentes e pensar sobre a vida de um a perspectiva bíblica. Ensinada
adequadam ente, a Teologia oferece categorias por m eio das quais a m ente
pode ser renovada.
O tem a central e o centro integrador da Teologia para João Calvino era a
glória de Deus. Sua teologia centrava-se nessa questão e tudo era visto, em últi­
m a instância, como um meio de
Uma educação cristã sistemática
magnificar a glória de Deus. Essa
conduzirá o povo para modos de
foi a categoria genérica que mol­
pensar cada vez mais bíblicos.
dou e influenciou sua teologia.
Em sua apresentação concernente à habilidade humana de eonheeer a Deus,
ele afirmou que “os atributos de Deus de acordo com as Escrituras concordam
com aqueles conhecidos em suas criaturas”.^ Ele sustentava que há três realida­
des que devemos conhecer, a saber, a misericórdia (porque é a base para nos­
sa salvação), o julgamento (porque é o que é exercitado contra os malfeitores),
e a justiça (porque pela justiça os crentes são preservados e ensinados).
O problem a é que poucos cristãos atualm ente pensam em tais categ o ri­
as. N ós pensam os em certas categorias bíblicas (tais como o poder de Deus
e o poder de Satanás), mas raram ente pensam os em relação à m iserieórdia,
ao ju lg am ento e à justiça. Porque nós deixam os de pensar dessas form as,
não conseguim os ver a m isericórdia de Deus, confiar em seu julgam ento ou
procurar sua justiça. O m odo como pensam os influencia o m odo como nos
comportamos.

’ João Calvino, Institutas da Religião Cristã, 2 vols., org. John T. McNeill (Filadélfia:
Westminster, 1960), 1:97.
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 213

Como educadores cristãos nós precisamos pensar em categorias bíblicas e


teológicas por nós mesmos. Se nós não estamos tendo nossa m ente renovada,
nunca serem os capazes de ensinar a outros a fazerem isso. M as aprender n o ­
vas categorias de modo funcional é um trabalho difícil. Retreinar a nossa mente
e a mente de outros é uma tarefa difícil, Como deveriamos ensinar de maneira
que ajudem os as pessoas a estabelecer novas categorias conceituais?

O PAPEL DO PROFESSOR

De um a form a bem ampla, há duas abordagens para ensinar as pessoas a


pensar. U m a abordagem , geralm ente a mais com um , é que o professor atue
como um especialista, estabelecendo novas categorias para o aluno. O profes­
sor dará uma palestra, ou usará alguma outra abordagem transmissiva, dizendo
ao aluno que categorias usar e como determ inar inform ações para as várias
categorias. A maior parte da Teologia Sistemática é ensinada assim. O profes­
sor apresenta aos alunos a matéria, explica as subdivisões amplas do estudo, e
então sistematicamente conduz o aluno através de uma vasta gama de informa­
ções. O raciocínio é altamente dedutivo, indo do geral para o mais específico.
O modo alternativo de ensino é uma abordagem indutiva. Nesse processo o
professor questiona os alunos, incitando neles a descoberta da verdade por si
mesmos. Essa abordagem normalmente começa com o texto bíblico específico
e conduz os alunos através de um m odo de descobertas para que eles estabe­
leçam categorias por si mesmos. Geralmente uma abordagem mais criativa e
menos estruturada, este modo é mais centrado no aluno do que o anterior.
Um ou outro modo pode ser eficaz para ajudar as pessoas a pensar, e am ­
bos podem ajudar as pessoas a estabelecer categorias bíblicas. É realm ente
um a questão de estilo e das forças e fraquezas relativas de cada abordagem.

Ensino Exposítivo

David Ausubel é o representante principal dessa abordagem, chamada


ensino expositivo. Ele resume sua posição assim;

A partir da época do final do primeiro grau, os alunos adquirem novos


conceitos e aprendem a maioria das novas proposições ao captar
diretamente relacionamentos de maior ordem entre abstrações. Para fa-
214 E nsino e C rescimento

zer isso de modo significativo, eles não precisam mais depender da expe­
riência concreta-empírica anterior e assim podem ignorar completamente
o tipo intuitivo de entendimento reflexivo de tal dependência. Por meio de
um ensinamento expositivo apropriado eles podem avançar diretamente
para um nível de entendimento abstrato que é qualitativamente superior
ao nível intuitivo em termos de generalidade, clareza e precisão. Nesse
estado de desenvolvimento portanto, parece sem razão enfatizar um en­
tendimento intuitivo pelo uso de técnicas de descoberta.*

Ausubel acredita que o significado está relacionado com a estrutura cognitiva.


O único m odo de nós poderm os tirar significado de algo é relacionando-o a
algo já existente em nossa estrutura cognitiva. Assim, quando Jesus disse, “Eu
som o bom pastor,” a afirmação tinha significado para os ouvintes porque o
conceito de “pastor” já estava na mente deles. Para um a pessoa que não tem
nem idéia do que seja um pastor, a afirmação não tem significado.
A usubel crê, além disso, que nossa estrutura cognitiva está organizada
do m ais inclusivo para o m ais específico, com o um a p irâm id e invertida.
P o rtan to, nosso m elhor ensino deve ser dedutivo, indo do geral (o m ais
inclusivo) para o específico.
A prender é identificado com o um a classificação, que é o processo de
incorporar um m aterial significativo dentro das estruturas cognitivas exis­
ten tes. Se não há estruturas nas quais o m aterial p o ssa ser colocado, não
pode haver aprendizado. Se, quando nós ouvim os alguém lecionar, não en­
tendem os nada do que está sendo dito, isso indica que nós não tem os um a
estrutura cognitiva para acom odar aquelas idéias. Para nós a palestra é um
conjunto de palavras sem significado.
Esquecer, de acordo com Ausubel, é um a classificação destrutiva. Q uan­
do esquecem os, nós perdem os a distinção da informação, e está perdida. Ela
se mistura com outra informação similar, não pode mais ser discriminada como
idéia distinta e é portanto “esquecida.”
A distinção entre santidade e justiça, feita anteriormente neste livro, é uma
linha bem fina. As pessoas tendem a perder a distinção entre os dois conceitos,
e eles se tornam m isturados num só. Quando isso acontece, as pessoas não
podem mais diferenciar entre um e outro e, como resultado, os significados
diferentes de santidade e justiça são esquecidos.
Ausubel identifica três variáveis que servirão para tornar um aprendizado
receptivo. Prim eiro, deve haver um organizador. O organizador serve para

David P. Ausubel, Education Psychology: A Cognitive View (Nova York: Holt, Rinehart and
Winston, 1968), 19.
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 215

fornecer categorias nas quais a nova informação deverá ser colocada. Quando
um a pessoa ouve alguém falando, mas não entende o que está sendo discutido,
é porque não há um organizador. Quando nós dizemos, “Espere um minuto; eu
não entendo o que você está falando!” nós estam os pedindo um organizador
do qual tirar um sentido lógico da informação.
Segundo, deve haver diferenciação na informação que está sendo apresenta­
da. Os estudantes devem ser capazes de ver como essa informação é diferente
das que eles já conhecem para que o novo material possa ser absorvido. A dife­
renciação entre idéias é essencial para se entender e reter novas informações.
Terceiro, Ausubel acredita que os alunos devem estar num estado de pron­
tidão para receber a nova informação, isto é, estruturas cognitivas existentes
devem estar no lugar e o aluno deve estar desenvolvimentalmente pronto para
receber a nova inform ação. Se, por exem plo, os alunos não têm estruturas
cognitivas de Jesus, eles dificilmente estarão prontos para uma discussão sobre
seu estado pré-incarnado.
O papel do professor, para Ausubel, é apresentar as informações de maneiras
lógicas, indo do conhecido para o desconhecido, ajudando os alunos a se desen­
volverem e a processarem suas categorias. Isso é exatamente o que bons
palestrantes fazem. Ele fornecem ao aluno uma orientação sobre a informação
que eles receberão (nos termos de Ausubel um ^^organizadorprévio"), que vai
do familiar para as novas idéias, ajudando-os a organizar a informação de manei­
ras significativas. Uma palestra eficaz é bem-organizada e apresentada de ma­
neiras que são relevantes às experiências dos alunos e aos seus modos de pensar.

Aprendizado pela descoberta


A abordagem alternativa, geralm ente conhecida como aprendizado pela
descoberta, é defendida por Jerom e Bruner. Ele afirm a que os alunos não
devem ser apresentados ao material em sua form a final, mas antes devem ser
encorajados a descobrir os relacionam entos da informação por eles mesmos.
Os próprios alunos devem organizar o m aterial, colocando-o em sua própria
categoria. E da responsabilidade do aluno descobrir os relacionam entos en­
tre os conceitos.
O ensino pela descoberta im plica métodos de ensino menos diretivos. Em
lugar de explicar, os professores perguntam. Bruner acredita que os alunos de­
vem obter habilidade para resolver problemas e isso acontece eficientemente à
m edida que os alunos trabalham as questões por eles m esm os. A m otivação
será intrínseca, vindo do desejo do aluno de “encontrar um a resposta” .
216 E nsino e C rescimento

Há quatro fatores que são necessários para esse tipo de aprendizado. Pri­
meiro, os alunos devem ser treinados a pensar em termos de relacionam entos
de idéias. Em vez de aprender conceitos isolados uns dos outros, os alunos
devem sempre ser incentivados a pensar de maneira integrada, relacionando
idéias com idéias.
Segundo, deve haver um a necessidade adequada por parte daquele que
aprende. Os alunos não quererão aprender a menos que haja um estímulo den­
tro deles para aprender. Portanto, uma tarefa do professor é estim ular no estu­
dante um interesse interior pelo material à mão.
Terceiro, o aprendizado por meio de descoberta requer algum grau de domí­
nio da informação específica relativa ao que está sendo aprendido. Se, por exem­
plo, nós pedirmos às pessoas para fazerem teologia sem que tenham qualquer
entendimento da informação bíblica, as descobertas que farão serão provavel­
mente heréticas. Elas obterão somente uma gi'ande ignorância em vez de uma boa
teologia. M as se as pessoas têm conhecimento da informação bíblica, elas esta­
rão prontas para chegar a conclusões teológicas bem fundamentadas.
Finabnente, a diversidade de ^ . . . . .
■ r ~ , O aprendizado pela descoberta im-
miormaçao pre-concebida per- .f , . .
^ ■ u plica métodos de ensino menos
mite um pensamento mais bem . . . _
. , ^ . , diretivos. Em vez de explicar, os
integrado. Quanto mais ampla- , . .
^ ^ , T professores perguntam. A motivaçao
mente definidas as categorias, , . , ...................................
^ ^ . r, sera intrínseca, vindo do desejo do
m ais eficaz a mtegraçao. Pes- . . „
, . , , aluno de encontrar uma resposta,
soas sem conhecim ento das ^
ciências políticas, por exemplo, dificilmente farão julgamentos sobre o proces­
so político. Talvez o que é mais importante, pessoas sem categorias teológicas
não poderão fazer julgam entos teológicos sobre assuntos políticos.
A abordagem de Bruner funciona m elhor com alunos que estão predispos­
tos a pensar sobre o relacionamento das idéias. O conhecimento sobre resolu­
ção de problem as e habilidade para pensar por si mesm o perm ite aos alunos
atuarem bem num contexto de descoberta. M as alunos treinados para serem
receptores de informação do professor se vêem esperando pelo professor para
que lhes dê a “resposta certa” . Eles vêem os professores como gênios que
sabem tudo sobre o assunto e lhes explicarão tudo corretam ente. Para eles,
discussões de idéias são sem significados ou mesmo uma perda de tempo.
O trabalho na abordagem de B runer exige o que ele cham a de currículo
espiral, que repete idéias-chave em direção a níveis sucessivam ente m ais
altos. A repetição intencional das idéias perm ite que os alunos desenvolvam
códigos genéricos para a inform ação e para processá-la em níveis cada vez
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 217

m ais altos. A ssim é perfeitam ente apropriado estudar os m esm os livros da


B íblia repetidam ente, porque cada repetição sucessiva perm ite um novo en­
tendim ento e uma nova visão.

APRENDIZADO CENTRALIZADO NO
PROFESSOR E APRENDIZADO
CENTRALIZADO NO ALUNO
Tanto A usubel quanto B runer acreditam que alunos aprendem por
categorização. Am bos crêem que o papel do professor é ajudar os alunos a
desenvolverem e manterem eategorias para o pensamento e para a organização
da informação. O debate é sobre quem deve desenvolver as categorias. Ausubel
defende um a abordagem mais centralizada no professor, enquanto Bruner de­
fende um a abordagem centralizada no estudante. Há pontos fortes e fracos em
ambas abordagens.
O ponto forte na posição de Ausubel é sua eficiência. Especialmente quanto
se ensina uma área abrangente e complicada como a Teologia, ajudar os alunos
com categorias parece apropriado. Em vez de ignorar dois mil anos de pensa­
mento cristão, nós podemos conduzir os alunos através das doutrinas, ajudan­
do-os a ver como as grandes mentes da igreja pensaram sobre os assuntos. Em
vez de fazê-los escolher as informações e idéias que podem levar anos para se
descobrir, nós podem os m ostrar-lhes a lógica e as conclusões, literalm ente
poupando-lhes muitos anos de trabalho.
Também, em quase todas as áreas de estudo há categorias já aceitas. E o
uso dessas categorias aceitas que faz a com unicação possível. Parte de qual­
quer questão sistem ática está o uso da term inologia com um e das categorias
comuns. Se todas as pessoas desenvolvessem seus próprios termos e eategori­
as, atrapalhariam grandemente a comunicação.
Eu uma vez tive um aluno que fez uma longa exposição sobre hermenêutica
e discutiu prolixamente como um sermão pode ser mais bem construído. Quan­
do eu destaquei que ele estava discutindo homilética, sua réplica foi: “eu acho
que nós temos conceitos diferentes sobre a herm enêutica” . Até que pudésse­
m os concordar sobre o que nossos term os significavam , nós não consegui­
mos ter um diálogo significativo.
A fraqueza do ensino expositivo é que não ensina os alunos a pensar por
conta própria. O termo aprendizado receptivo im plica que o aluno é prim ari­
am ente um receptor. A recepção não é um mau modo de começar. Reconhe-
218 E nsino e C rescimento

cer que outros sabem mais do que nós, e que nós precisam os ficar quietos e
ouvir pode ser o começo de um crescimento importante. Pode também poupar
muito tempo e esforço.
A medida que os alunos progridem, eles também devem se tornar pensado­
res mais independentes, não mais necessitando de outros para terem inform a­
ções. Eu uma vez observei um grupo de professores de faculdade, todos com
diplom a de doutorado, ligarem para um antigo professor para perguntar como
responder a uma questão básica. O que mais me assustou foi que a educação
que haviam recebido não os tinha conduzido a serem pensadores independen­
tes. Eles ainda eram dependentes de seus professores!
N a Trinity eu leciono tanto para alunos de mestrado quando de doutorado.
Se o treinam ento que eu forneço para os alunos de doutorado fosse sim ples­
m ente m ais palestras, eu estaria roubando deles o que m erecem por direito.
Eles não precisam que eu lhes dê m ais inform ação; eles precisam que eu os
ajude a pensar melhor. O pensam ento pode ser m odelado em um a palestra
bem preparada, mas os alunos devem tam bém ser capazes de praticarem o
processo por meio do diálogo e dos projetos em classe.
O ponto forte na abordagem de Bruner é que ela ensina os alunos a pensar.
Ao envolvê-los no processo de ensino e estimulá-los a estabelecer categorias e
trabalhar com elas, sua técnica serve para criar pensadores independentes. O
aprendizado pela descoberta ensina as pessoas a descobrirem idéias e o relaci­
onam ento de um a com a outra. Ensina as pessoas a usar a m ente, para que
sejam mais do que arquivos de idéias de outros.
Um segundo ponto forte é que faz com que as pessoas fiquem mais respon­
sáveis por sua própria educação. Em vez de simplesmente receber informação
de outros, os alunos devem pensar por si mesmos e tirar suas próprias conclu­
sões. Os alunos devem assum ir a responsabilidade por suas posições nos as­
suntos, porque eles tiveram de chegar às conclusões por conta própria.
A Trinity Divinity School é edificada parcialmente no entendimento de que
dentro do C ristianism o ortodoxo há um a variedade de crenças. O corpo do­
cente é teologieamente diversificado, com uma variedade de posições ortodo­
xas representadas. Como resultado, os alunos não são treinados som ente em
um a posição teológica. Antes, eles são expostos a várias opções, com a res­
ponsabilidade pela posição que eles tom am como sendo a deles. Como resul­
tado, nossos alunos se form am com um a variedade de posições teológicas,
mas eles se formam sabendo como pensar. Eu acho que esse é um dos pontos
fortes da educação que oferecemos.
M as a abordagem de Bruner tam bém tem várias fraquezas. A lguns alunos
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 219

não chegam as conclusões claras até que se form am na Trinity. Para alguns
alunos leva mais tempo para descobrir as coisas por si mesmos e o aprendiza­
do p ela descoberta é um processo lento. Especialm ente quando é usado na
igreja, nós devem os estar cientes de que as pessoas entram e saem de nossos
programas educacionais. Como resultado, elas podem não chegar a um a con­
clusão firme, porque elas não ficam o tempo suficiente para chegar às conclu­
sões. Elas podem apreciar o processo mas nunca encontrar o significado.
U m a segunda fraqueza é que o processo de descoberta é dependente de
um a busca constante. Não pode ser conseguida num curto espaço de tempo.
Se as pessoas entram e saem, elas podem nunca ver o quadro geral do que está
sendo estudado. Descobrir e organizar categorias requer experiências longas e
regulares de aprendizado para serem bem feitas.
Um fato a respeito das duas abordagens é que elas dependem de bons pro­
fessores. N em todo professor é um exímio palestrante,’ e portanto nem todo
professor pode fazer um a boa exposição. E necessário certas habilidades e
certos traços da personalidade para dar uma boa palestra e nem todos os pro­
fessores os p o ssu e m .
Por outro lado, nem todo professor é capaz de levar os alunos à descoberta.
Requer-se paciência, visão e m uita criatividade para obter meios eficazes para
estimular os alunos a descobrirem e encontrarem o significado. Alguns profes­
sores não têm a habilidade nem a inclinação para ensinar assim.
Sem ser impertinente, eu sugeriría que o que os professores fazem é ensinar,
e o que os alunos fazem é aprender.^ O que eu quero dizer é que às vezes nós
como professores, estabelecemos as categorias para os estudantes, e às vezes
eles o fazem por si mesmos. Nós nem sempre sabemos exatamente o que está
acontecendo. Nós ensinamos e eles aprendem e o processo é muito complexo.

IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇAO CRISTA


D iante da ênfase bíblica sobre o m odo com o pensam os e das idéias
intrincadas envolvidas num a fé m adura, e dadas as visões a respeito de um
processo cognitivo mais alto de categorização, as seguintes im plicações p o ­
dem ser tiradas.

’ Agora eu fui bem gentil, hein?


*Essa observação dolorosamente óbvia, foi-me feita no livro de Guy R. Lefrancois, Psychology
for Teaching, 4a ed. (BelmonfCalif;Wadsworth. 1982), 121.
220 E nsino e C rescimento

Os alunos devem obter categorias bíblicas e teoló­


gicas para pensar de modo cristão
Os tem as principais da B íblia devem se tornar categorias funcionais na
m ente do crente. Se nós não pensam os com o Deus pensa sobre a vida e a
realidade ao nosso redor, como podem os nos considerar cristãos? A renova­
ção da mente requer o estabelecim ento e o uso de tem as da Bíblia para guiar
nosso pensam ento.
Eu estava ensinando na Zona Oeste de Chicago na noite em que houve a
confusão pública em Los Angeles por causa do prim eiro veredito de Rodney
King. M inha classe de m aioria afro-am ericana estava agitada por causa do
veredito e da resposta da com unidade negra. Enquanto com entavam sobre a
situação naquela noite eu lhes perguntei como eles explicavam aquilo teologica­
mente. Eu os incentivei a pensar sobre a situação usando categorias bíblicas e
teológicas. M eu objetivo era que a Teologia fosse funcional para eles, e não
som ente acadêm ica. O resultado da discussão foi trem endo porque nós usa­
mos a Teologia como meio de entender e m oldar nossas respostas.
Eu creio que isso é um a
parte im portante de ser cris­ NÓS não podemos nos satisfazer
tão. Não é som ente fazer a somente com o conteúdo do pensa­
coisa certa, mas também pen­ mento de nossos alunos; nós deve­
sar do modo certo. O modo mos também estar interessados em
certo de pensar está baseado como eles pensam.
nas categorias da Bíblia.
Cada subgrupo na cristandade enfatizará assuntos de maneira um pouco dife­
rente. Os tem as bíblicos que nós vemos e enfatizamos variam de grupo para
grupo. Mas o que permanece é um grupo de crenças centrais que devem formar
nosso pensamento e nosso modo de viver. Essas crenças centrais devem se tor­
nar categorias cognitivas funcionais na mente dos crentes.

Os professores devem ouvir como seus estudantes


pensam
Nós não podem os nos satisfazer som ente com o conteúdo do pensam ento
de nossos alunos; nós devemos também estar interessados em como eles pen­
sam. O uvir as categorias que eles usam e a inform ação colocada dentro da­
quelas categorias nos ajuda a entender como eles pensam. M esmo o profes­
sor expositor deve ouvir seus alunos quando usam a inform ação que obtive-
A prendendo por M eio do D esenvolvimento L ógico 221

ram . Se as categorias de pensam ento usadas pelos estudantes não são dife­
rentes das categorias do m undo ao redor eles, nós não estam os fazendo um
bom trabalho educacionalmente.
A solução de problemas é um meio eficaz de ouvir o que os alunos pensam.
Ao pedir que reflitam sobre um a situação ou um acontecim ento, o professor
pode perceber as categorias que eles usam, bem como os conceitos incluídos
nessas categorias. Se a Bíblia e a Teologia nunca aparecem em seu pensam en­
to, nós não os estam os ajudando a usar estas categorias. Eles podem tê-las
somente memorizado, mas isto não é o mesmo que usá-las.

A informação deve ser apresentada de maneiras que


ajudem os alunos a categorizá-la apropriadamente
M uitos professores usam o m étodo da palestra, mas nem todos o fazem
bem. Uma boa palestra avança num a ordem lógica, começando com o conhe­
cido, para atingir categorias existentes e então progredindo para o desconheci­
do, para fornecer uma nova informação. Uma palestra eficaz conduzirá os alu­
nos por passos lógicos a organizar e assim tornar úteis as novas idéias.
O uso de um organizador prévio faz muito em ajudar os alunos a organizar
0 material de modo adequado. Um organizador prévio é simplesmente um modo
de orientar os alunos para o que será apresentado para que eles saibam como
entender à m edida que lhes é apresentado. Quando faço um a palestra num a
aula, geralmente escrevo no canto do quadro um curto esboço dos pontos prin­
cipais que pretendo cobrir. Isso serve para deixar os alunos cientes sobre onde
estamos indo e onde eu estou durante o processo de exposição. Serve também
para m anter os alunos orientados e seguindo a lógica do desenvolvim ento do
que eu estou tratando.
Os professores deveriam organizar os dados de modo apropriado e com u­
nicar essa organização aos alunos. Um melhor aprendizado é alcançado quan­
do o material é apresentado de forma lógica. Um dos meus colegas conta sobre
um professor notoriam ente desorganizado da Harvard Divinity School. Uma
vez o professor deixou suas anotações cair quando entrava na sala, então um
dos alunos pulou para ajudá-lo a pegar e organizar o material. O aluno deu ao
professor a prim eira página que ele havia pegado do chão e o professor sim ­
plesm ente com eçou a exposição daquela página. O fato de que as anotações
estavam numa seqüência diferente não fez diferença para o professor. No en­
tanto, esse acontecimento confundiu a mente dos alunos! Eles não tinham nem
idéia do que o professor estava falando.
222 E nsino e C rescimento

Porque o pensam ento lógico requer organização e reorganização de cate­


gorias, o professor tem a responsabilidade de apresentar o material de maneira
clara. A palavra de Deus avança logicamente e nossa apresentação dela deve
ser lógica também.

Ensinar pessoas a pensar teologicamente requer tan­


to o ensino expositivo quanto o aprendizado pela
descoberta
U m dos m ais destacados professores de teologia é John G erstner. Ele é
um renom ado especialista em
Jonathan Edwards e um erudito Uma educação eficaz moida os
de respeito. Como professor ele alunos a conhecerem a verdade e
é um dos m ais poderosos e te ­ a pensarem com a verdade, para
m íveis instrutores que já entrou que seu comportamento seja mol­
num a sala de aula. dado pela verdade.
Seu modo de ensinar é altamente socrático. Ele pede aos alunos que leiam
muito antes de uma aula, uma aula expositiva. Mas quando os alunos vêm para
aula, seu método é quase exclusivamente o modo de descoberta. Ele questiona
os alunos sobre o entendimento dos dados e as implicações do conteúdo para
outras áreas da vida e do pensam ento. A abordagem é assustadora porque é
altam ente lógica e cada aluno tem de depender de sua própria habilidade de
pensar.
O poder da abordagem de G erstner é que ele ensina os alunos a pensarem
teologicam ente; eles devem conhecer os dados, mas eles devem ser capazes
de pensar com os dados. Ele não se satisfaz até seus alunos pensarem clara­
mente sobre as implicações do que eles têm aprendido.
Se é verdade que a mente molda o coração e a vontade, então é imperativo
que os cristãos aprendam a pensar sobre a verdade. U m a educação eficaz
m olda os alunos a conhecerem a verdade e a pensarem com a verdade, para
que seus comportamentos sejam moldados pela verdade.
CAPITULO 14
APRENDENDO PELA EXPERIÊNCIA
“A experiência é o melhor professor” é um provérbio freqüentemente citado,
enfatizando a verdade de a experiência ser uma fonte importante de aprendiza­
do. E difícil oferecer um argumento lógico para contradizer a experiência de
vida de uma pessoa. Se nós tentarmos, a pessoa normalmente responderá, “Mas
eu sei que é verdade. Aconteceu comigo” . Adolescentes em especial acreditam
em suas experiências acima de quase qualquer outra fonte de verdade.
No entanto, nós nem sempre interpretamos nossa experiência corretamente.
D ificilm ente som os observadores objetivos de nossa própria experiência de
vida e portanto nossas interpretações podem ser menos que objetivas.
Conta-se um a história sobre um fazendeiro que estava trabalhando em seu
cam po num dia quente de prim avera. Ele olhou par cim a e viu as letras PC
claram ente visíveis nas nuvens do céu. O hom em era crente e teve a certeza
de que aquilo era um sinal de Deus para que ele deixasse o trabalho na fazen­
da e se dedicasse ao m inistério da Palavra. Ele estava certo de que as letras
PC eram a abreviatura de “Pregue a C risto”. Ele deixou sua fazenda e com e­
çou um ministério longo e infrutífero. Apesar de ser um péssimo pregador, ele
sentia que o sinal que Deus havia lhe dado era verdadeiro. N um dom ingo
quando ele estava levando sua congregação às lágrimas com um de seus ser­
m ões sem inspiração, ele contou aos irm ãos sobre a sua visão. Então um
velho fazendeiro lá do últim o banco da igreja bradou, “Eu acho que as letras
significavam ‘plantecereal’!”
O problem a, é claro, é que não há padrões objetivos pelos quais alguém
pode ju lg ar um a experiência. Sem padrões objetivos, nós estam os perdidos
num m ar de relatividade, com cada pessoa tendo de descobrir o significado
por conta própria.
A Filosofia do Existencialismo eleva o papel da experiência a uma posição
preeminente, argumentando que a verdade em si mesma reside na experiência.
A única coisa em que nós podemos confiar, e a única coisa em que nós podemos
crer, argumentam os existencialistas, é na nossa experiência. Para o existencialista
a experiência é a única fonte significativa da verdade e é o único meio válido de
conhecim ento. Se o existencialism o é verdade, então cada um de nós deve
encontrar a verdade por si só, e cada pessoa, de fato, terá a sua verdade própria,
diferente da verdade das outras pessoas.
O existencialismo no final das contas leva ao desespero. Se tudo que existe
é nossa própria experiência, no final nada tem significado. Se tudo em que
224 E nsino e C rescimento

podem os confiar e tudo o que nós conhecem os é nossa própria experiência,


então, assim como o existencialista histórico Jean-Paul Sartre, nós serem os
reduzidos a uma relatividade e a um desespero absolutos.
M as como cristãos nós sabemos que a realidade e a verdade existem fora
de nossa experiência. Porque Deus existe a realidade é m edida de acordo com
ele e a verdade vem dele. H á mais na vida do que é limitado à nossa experiên­
cia e a verdade existe fora das lim itações de nossa experiência. A verdade
existe em relação a Deus, não em relação a nós mesmos.
Como educadores, no entanto, nós devem os tam bém reconhecer e usar o
poder da experiência para m oldar a crença e auxiliar o aprendizado. N ossa
tarefa é usar a experiência para ajudar as pessoas a aprenderem sobre a vida e
a viverem como crentes maduros.

POR QUE NÓS CREMOS?


De um a perspectiva teológica nós sabem os que crer no Evangelho é um
dom de Deus (E f 2.8-9). M as de um a perspectiva hum ana, o que é que nos
leva a crer nas coisas que cremos? De onde as crenças emergem? O que causa
em nós o crermos no que cremos? Que tipos de coisas Deus usa para desen­
volver em nós a crença?
A m aioria de nós gosta de pensar que nossas erenças são com pletam ente
racionais. Nós consideramos a evidência e tiramos conclusões lógicas que servem
para moldar o modo como cremos. Isso parece bom mas na realidade as crenças
são moldadas por um a variedade de fatores. Os sociólogos concluem que uma
combinação de pelo menos quatro diferentes fatores moldam a nossa crença.
Primeiro, a crença se inclina a seguir padrões reforçados na infância, isto é,
nós nos inclinam os a crer de acordo com o m odo como nós fom os criados
quando crianças. Os pais elogiam seus filhos por certas crenças e os advertem
por outras, e assim eles moldam a crença de seus filhos.
A m aioria das pessoas criadas nos Estados Unidos crê que o capitalism o e
a economia de livre mercado é o melhor sistema econômico que existe. Mesmo
sem o benefício da instrução na teoria da economia básica nós aceitamos isso
como verdade porque foi assim que fomos criados.
Há muitas crenças inculcadas profundamente na mente dos adultos que são
o produto do ensino quando criança. Nós crem os porque fomos ensinados a
crer. Nós dificilmente somos conscientes da existência da crença a menos que
estas sejam questionadas por alguém ao nosso redor. Esses tipos de crença são
mantidas sem questionamento e influenciam profiindamente nossa vida.
A prendendo pela E xperiência 225

Atitudes para com outras etnias são geralmente moldadas primeiro pelos pa­
drões do reforço na infância. Se nossos pais foram abertos e aceitaram as pesso­
as de outras etnias, nós também faremos o mesmo. Mas se nossos pais criam que
as pessoas de diferentes etnias são inferiores, ou deve-se temê-las, nós teremos
essas perspectivas racistas inculcadas em nós, até que sejam contestadas.
Segundo, as crenças tendem a seguir nossos compromissos com as pesso­
as. Quando nos comprometemos com um a pessoa, nós nos inclinamos a adotar
as crenças dessa pessoa. As crianças crêem do modo como seus pais crêem
porque as crianças estão comprometidas com seus pais. Uma criança pequena
perguntará, “M amãe, nós somos democratas ou republicanos?” De qualquer
form a que a mãe responder estará bem para a criança. “ O que quer que seja o
que mam ãe e papai crêem é o que eu creio tam bém ”, é o moto da criança.
N a adolescência os com prom issos tendem a m udar dos pais para os am i­
gos. Como resultado, as crenças dos adolescentes tendem a mudar também.
Os adolescentes não crêem mais como seus pais. Eles agora começam a adotar
o sistem a de crenças de seus amigos.
O poder de um grupo jovem cristão está arraigado nessa verdade. Grupos
de jovens funcionam para fazer
Nós todos podemos olhar para
com que seus com ponentes se
trás e lembrar de certos professo­
comprometam com o líder do gru­
res que tiveram grande influência
po e uns com os outros. Se o gru­
sobre nós e moldaram nossa
po tem crenças cristãs, os ado­
crença. Para todos nós, nossas
lescentes que entram para o gru­
crenças são um tanto quanto
po provavelmente adotarão cren­
relacionadas com o relacionamen­
ças cristãs também. Um m inisté­
to que temos com as pessoas.
rio dejovens funciona mais efícaz-
mente por meio de relacionam entos porque é por meio dos relacionam entos
que a crença dos adolescentes será moldada.
Quando os alunos vão para a faculdade, não é estranho vê-los se tornarem
ligados a determinados professores. Quando eles agem assim, suas crenças se
inclinarão às crenças do professor favorito. N ós todos podem os olhar para
trás e lembrar de certos professores que tiveram grande influência sobre nós e
moldaram nossas crenças. Para todos nós, nossas crenças são um tanto quanto
relacionadas com o relacionamento que temos com as pessoas.
Os pais estão certos ao se preocuparem com quem seus filhos escolhem
como amigos. Os amigos influenciarão as crenças porque as crenças tendem a
seguir o relacionam ento com as pessoas. O apóstolo Paulo nos adverte dessa
verdade quando ele diz, “Não vos enganeis: as más conversações corrompem
os bons costum es” (1 Co 15.33).
226 E nsino e C rescimento

Quando m inha esposa e eu nos casam os, m uitas das nossas crenças eram
completamente diversas. Sua formação era mais cristã e mais conservadora do
que a minha. Mas por causa de nosso relacionamento nossas crenças mudaram
e se assemelharam e agora na maioria das coisas elas são praticamente idênticas.
Terceiro, as crenças tendem a seguir as linhas do pensamento lógico, isto é,
nós acreditaremos somente no que faz sentido para nós. Se nossa crença parece
totalmente ilógica, nós geralmente as abandonaremos.
Para o cristão, por crerm os na existência de Deus, não é ilógico crer em
milagres. Um pensamento lógico não desacredita o que é miraculoso. Requer,
no entanto, que a crença nos milagres tenha um a base lógica.
Por essa razão, os adolescentes se preocupam com a form a apropriada de
crer em Deus. “Faz sentido crer em D eus?”, eles perguntam , porque querem
crer somente no que é lógico. A apologética é essencial para pessoas que estão
tentando decidir no que crer de acordo cora a lógica.
Especialmente para os adultos, as crenças devem fazer sentido lógico . Toma-
se impossível crer no que é absurdo e é fácil crer no que é razoável. As crenças
podem ser fortalecidas quando elas se mostram lógicas e consistentes.
Há um espaço para um discurso lógico e cuidadoso na Educação Cristã. A
racionalidade da fé pode ser um fator im portante ao m oldar a crença,
especialmente nos adultos. Nós não podemos convencer ninguém a fazer parte
do reino porque a fé é um dom de Deus. Mas Deus pode usar a força da lógica
para m oldar a crença de um a pessoa.
Finalmente, as crenças tendem a seguir comportamentos. Nós tem os uma
tendência m aior de crer no que nós fazem os do que fazer o que nós cremos,
Porque o poder das experiências m oldam a crença, nós organizaremos nossas
crenças de acordo com nosso comportamento. A maior parte do nosso sistemas
de crenças tende a ser um resultado de como nós temos vivido.
H á épocas que entendemos que nossas crenças e comportam entos não
combinam muito bem. Quando tal dissonância cognitiva acontece, nós geralmente
mudaremos nossa crença. “Eu não acredito mais nisso” será a nossa explicação
para o motivo pelo qual estamos agindo do modo como estamos agindo.
A razão pela qual nós nos inclinam os a um a m udança de crença mais
facilmente do que de comportamento é que o comportamento é público, mas a
crença é particular. E mais fácil dizer, “Eu não creio nisso” do que dizer, “Eu
estou sendo um hipócrita” . Portanto, nós mudam os nosso sistem a de crença
para combinar com nossos comportamentos.
A faculdade Harvard foi fundada sobre uma afirmação ortodoxa de crença.
Mas com o passar dos anos ela se desviou de suas afirmações iniciais. Em vez
A prendendo pela E xperiência 227

de m udar a prática de acordo com a afirmação de uma crença, Harvard esco­


lheu mudar a declaração de fé. Era mais fácil reescrever a declaração doutriná­
ria do que levar o comportamento de volta ao sistema original de crença.
As pessoas podem fazer o mesmo. Elas se comprometem com uma afirmação
de fé, mas m ais tarde sua prática pode violar suas crenças. Em vez de se
arrependerem , pelo com portam ento, elas m udam suas crenças para se
conformarem com seu novo comportamento. Nós geralmente acreditamos no
que fazemos em lugar de fazer o que cremos.
Para o cristão, existe um a outra opção. N ós podem os nos arrepender do
com portam ento inapropriado, confessar nosso pecado e mudar o nosso com ­
portamento para que ele volte a se alinhar com nossas crenças. Arrependimen­
to e confissão são m eios poderosos para aliviar a dissonância cognitiva que
resulta de se com portar de m aneiras que contradizem nossas crenças.
Infelizmente, alguns educadores cristãos entendem esse princípio de modo
contrário. Eles tentam forçar as pessoas a se com portarem de modo correto
por m eio da manipulação e da culpa. “ Se você realmente crê nisso você irá.”
São feitos longos discursos sobre por que devem os orar, testem unhar ou
p raticar outras virtudes, m as eles não fazem m uito para ajudar a m udar o
com portam ento dos ouvintes. O problem a é que os educadores estão abor­
dando isso de form a errada.
D. Jam es Kennedy, autor do Evangelismo Explosivo' e pastor da Igreja
Presbiteriana de Coral Ridge, na Flórida, ilustra este ponto m uito bem. Ele
estava conduzindo seminários sobre evangelização mas estava vendo poucos
resultados. O problem a era que seu com portam ento não estava com binando
com sua mensagem. Um pastor mostrou-lhe como fazer um evangelismo pessoal.
Ele deixou-o experim entar a alegria de levar um a pessoa à fé e Jim Kennedy
gostou. O poder do Evangelismo Explosivo está em colocar as pessoas para
evangelizarem e esse comportamento então molda a crença no evangelismo.
É impressionante ver como Jesus ensinava seus discípulos a orar. Ele nun­
ca apresentou um a “conferência sobre oração” , ele nunca colocou qualquer
peso de culpa sobre os discípulos sobre a vida de oração. A ntes, a im agem
que emerge dos evangelhos é que ele m odelou a oração para eles. R epetida­
m ente nós lem os que Jesus estava orando sozinho enquanto os discípulos
estavam com ele.
Finalm ente, eles lhe disseram , “ Senhor, ensina-nos a orar” (Lc 11.1).
Sua estratégia era fornecer um exem plo e então vê-los orando. Por m eio da

D. James Kennedy, Evangelism Explosion, 3“ed. (Wheaton, 111.; Tyndale House, 1983).
228 E nsino e C rescimento

experiência da oração o compromisso deles com a oração foi moldado.


A oração tem sido uma questão difícil para mim. Eu sempre acreditei numa
teologia que enfatizava a soberania de Deus controlando toda a vida. Essa pers­
pectiva não havia sido apresentada a m im de um a form a equilibrada com a
ênfase bíblica da responsabilidade hum ana e a ênfase bíblica na oração. Eu
tinha um a grande dificuldade de entender como a oração se relacionava à
soberania de Deus. Como resultado, m inha vida de oração não era forte.
Em sua misericórdia, Deus permitiu que eu passasse por algumas dificulda­
des. Em todos os lugares em que eu procurava ajuda, ninguém podia fazer
nada. Finalmente, em desespero total, eu me em voltei regularmente para Deus
em oração. Encontrei alívio, conforto e finalmente a solução por meio daqueles
m omentos de oração. A experiência de oração moldou a m inha crença na ora­
ção de m aneira que a lógica em si m esm a nunca poderia moldar. Em últim a
análise o que moldou minha crença foi meu comportamento.

USANDO AS EXPERIÊNCIAS DA VIDA


Se é mesmo verdade que o comportam ento m olda a crença, como nós po­
demos, como educadores, moldar as experiências dos alunos para ajudá-los a
crer? Como podemos influenciar suas vidas de tal maneira a fornecer experiên­
cias que modificarão suas crenças?
Algumas instituições cristãs tentam exercer uma influência tão forte sobre
seus alunos a ponto de quase controlar suas experiências de vida para influen­
ciar a crença. Por meio de rígidas regras e regulamentos elas lutam para regular
as vidas numa tentativa de produzir crentes maduros. Um controle rígido, no
entanto, deixa de reconhecer a dignidade humana adequadamente e é um a ex­
pressão do behaviorismo em seu esforço de moldar as pessoas pela influência
do ambiente. Há necessidade de abordagem mais apropriada.
Os contextos de aprendizado geralmente caem em uma das três categorias.
O contexto do aprendizado formal é o mais controlado, o que tem mais estrutu­
ra. O aprendizado formal é caracterizado por aulas designadas, um currículo
apertadamente organizado, prestação de contas, resultados claramente delineados
e padrões de tempo regulados. Os alunos vêm para um designado período de
tempo, progridem através de uma série prescrita de cursos, atingem um específico
nível de habilidade e recebem um certificado por completar o curso.
A força da educação formal está em sua natureza ordenada. Há estruturas de
tempo muito bem determinadas e geralmente um grupo específico de resultados
A prendendo pela E xperiência 229

esperados. Os alunos sabem quando a instrução começa e quando term ina e o


que é esperado deles. A prestação de contas tende a ser alta, com o resultado
sendo lun diploma, um grau, ou algum outro tipo de certificado reconhecido.
Mas a educação formal é deficiente porque pode ser conduzida quase isolada
das experiências da vida norm al. A designação “torre de m arfim ” cham a a
atenção para o fato de que a educação formal é um tanto quanto diferente da
“vida real” . É, por natureza, removida da experiência de vida e enfatiza a teoria
e os esforços cognitivos. Como resultado, as experiências fornecidas na edu­
cação formal são lim itadas em sua habilidade de ensinar da m aneira como a
vida diária pode ensinar. A educação formal é poderosa para os m ais baixos
níveis de aprendizado, mas não tão poderosa para levar as pessoas para níveis
mais altos de aplieação e posicionamento.
Larry Riehards tem sido um critico das armadilhas da educação formal na
igreja. Sua preocupação a respeito da institucionalização da Educação Cristão
tem levado a desprezar as armadilhas da educação formal como um modo de
ensinar a fé. Ele crê que as técnicas da educação formal são virtualmente inúteis
para m oldar a fé nas pessoas.*
O oposto do aprendizado formal é o aprendizado informal. O aprendizado
informal é o dia-a-dia da vida, a cham ada escola da vida. Por intermédio das
experiências normais da vida, pelo bom e pelo mau, nós aprendemos muitas coisas.
Num contexto completamente sem estrutura, nós aprendemos sobre a vida e por
intermédio de nossas experiências adquirimos todos os tipos de habilidades.
Uma das mais significativas responsabilidades que muitas pessoas enfrentam
é a de educar seus filhos. De vez em quando nós assistim os um a aula formal
sobre paternidade mas na maior parte do tempo nós aprendemos por meio das
tentativas e erros. Pela experiência de sermos pais e pelo exem plo de outros
nós desenvolvemos nossas habilidades paternas. De maneiras quase totalmente
inform ais nós aprendem os a fazer algumas das coisas m ais im portantes que
jamais foi requerido de nós.
Eu partieularm ente aprecio um a pescaria. (Eu sempre tento m anter um a
distinção entre pescar e pegar, fazendo m uito mais o prim eiro do que o
segundo.) Minhas habilidades na pescaria são melhoradas no contexto do apren­
dizado informal, por tentativa e erro. M as eu aprecio o processo e os resulta­
dos, porque não há uma pressão real e a úniea pessoa que eu tenho de agradar
sou eu mesmo.

■ Lawrence O. Riehards, Christian Ediication: Learning to be Like Jesus Christ (Grand


Rapids; Zondervan, 1988).
230 E nsino e C rescimento

A força do aprendizado informal está em que ela está em todos os lugares e


é quase totalmente baseada na experiência. E por meio da experiência que nós
aprendem os e o aprendizado tende a ser muito forte. Nós nos agarram os fir­
memente às crenças que são moldadas pela experiência. As lições de vida são
mais fortes do que as lições da educação formal. Para a maioria das pessoas, o
aprendizado informal tende a ter mais influência do que aprendizado formal.
A fraqueza do aprendizado informal está em que pode ser errado, ou pelo
menos incompleto. Porque nós não temos que agradar a ninguém além de nós
m esm os, não há virtualm ente prestação de contas. A vida pode ser mal
interpretada, conclusões erradas podem ser tiradas e habilidades im próprias
podem ser desenvolvidas. Eu tenho a certeza de que desenvolví alguns maus
hábitos por pescar sozinho e estes pesam no resultado mais a favor do peixe do
que a meu favor.
Essa fraqueza não é tão séria quando se relaciona com a pescaria mas se
toma muito crítica quando ela influencia algo como a paternidade. Os pais podem
causar um grande dano a seus filhos se tudo o que sabem é como eles próprios
foram criados, ou se tudo o que fazem é seguir seus próprios instintos. Eu duvido
que qualquer um de nós quereria ser tratado por um m édico que aprendeu
medicina de uma foraia totalmente informal.
Deus pode e faz uso das experiências da vida para nos ensinar. Ele nos
conduz por vários tipos de eventos, tanto fáceis e prazerosos como difíceis e
dolorosos, e essas são a “essência” do crescimento. M uitas pessoas não con­
seguem aceitar que nós não temos de entender o que Deus está ensinando para
que cresçam os. O pregador nos adverte, “A ssim como tu não sabes qual o
caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre da mulher grávida,
assim também não sabes as obras de Deus, que faz todas as coisas” (Ec 11.5).
A inda que não entendamos o que Deus está fazendo, nós podemos crescer
e aprender por meio das experiências da vida, dadas por ele. Nós podem os
dizer isso com segurança porque “ Sabemos que todas as coisas cooperam
para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o
seu propósito” (Rm 8.28).
N ossa responsabilidade como educadores cristãos é reconhecer que nos­
sos alunos estão continuamente aprendendo por meio de suas experiências de
vida e que Deus está trabalhando, ensinando-os por meio das experiências.
Nós não podemos moldar suas experiências mas podemos reconhecer o poder
e a validade das experiências como fontes de aprendizado para eles. N ossa
responsabilidade pastoral é nos colocarm os ao lado e encorajar as pessoas a
verem a m ão de Deus e a confiar na mão de D eus, mesm o quando eles não
podem entender a mão de Deus. Nós som os cham ados à fé, pela qual nós
A prendendo pela E xperiência 231

confiamos no caráter de Deus, mesmo quando não entendemos a obra de Deus.


Entre o aprendizado formal e o informal há uma terceira abordagem chama­
da aprendizado não-formal. O aprendizado não-form al é mais difícil de defi­
nir, mas pode ser descrito. Constitui aqueles m odos de aprendizado que têm
algumas das estruturas e intencional!dade dos contextos formais, mas também a
espontaneidade e a liberdade do aprendizado informal. Talvez a expressão mais
familiar de um contexto não-formal seja a escola dominical.
As escolas dom inicais têm um a estrutura, com horários e lugares para
instrução, um currículo planejado e professores designados. M as elas não têm
qualquer controle rígido externo, nenhum padrão de crédito e nenhuma forma
de reconhecimento formal. Elas têm a liberdade de “ir com a maré” (uma termo
educacional que significa que pode-se trabalhar de acordo com o contexto de
vida das pessoas) a enfatizar tanto os relacionamentos assim quanto o conteúdo.
Os professores podem visitar os alunos fora da aula, gastar tempo informalmente
com eles e usar as experiências da vida de m aneiras que os professores num
contexto formal não podem.
Há um grande poder no aprendizado não-form al. Ele dispõe de estrutura
suficiente para manter um modo sistemático, mas liberdade suficiente para usar
as experiências da vida para ensinar. Por anos, as pessoas têm tentado anunciar
a morte da escola dominical, mas ela continua. Eu penso que isso acontece por
causa da potencialidade do aprendizado não-formal.
U m pouco do poder do aprendizado não-formal está em sua capacidade de
usar as experiências da vida para ensinar. Tem a liberdade de ser responsiva ao
que está acontecendo na vida dos alunos e usar essas experiências para ensi­
nar. Não força a experiência como os behavioristas fazem, mas usa a experiên­
cia como um meio de ensino. Mas como os professores podem usar as experi­
ências de vida dos alunos em seu ensino?

EDUCAÇÃO CRISTÃ EXPERIMENTAL


Educadores que valorizam uma educação cristã experimental usam as expe­
riências da vida dos alunos para ensinar. Reconhecendo que os alunos continu­
amente têm experiências que são poderosas para o ensino, eles tentam usar as
mesm as para reflexão e enriquecimento para que o aluno possa crescer.
M uitas vezes Jesus usou as experiências de seus alunos para instrução. Ele
refletia sobre o que eles estavam fazendo, ou sobre o que tinha acontecido com
eles, como um meio de ensinar. Ele não manipulava suas experiências de vida,
mas ele as usava para ensinar.
232 E nsino e C rescimento

Lucas conta a história da visita de Jesus à casa de M arta e M aria, duas


m ulheres que foram responsivas ao seu ensino. Houve um a discórdia quando
M aria escolheu sentar-se perto de Jesus, enquanto M arta estava “ocupada em
muitos serviços” (Lc 10.40). M arta ficou tão nervosa que gentilmente advertiu
a Jesus por não ligar para o fato de ela estar trabalhando e a outra não. Jesus
usou esse mom ento para ensinar-lhes sobre escolher o que é m elhor versus o
que é meramente importante.
Lucas continua descrevendo o ministério de Jesus, mostrando o desenvolvi­
mento teológico em seu ensino. Mas ele também mostra o método de Jesus de
ensinar, que era responder às experiências de vida de seus ouvintes. Ele refletia
sobre vida, os costumes sociais, a lógica religiosa dominante e sobre um a gama
de outros assuntos, todos no contexto da experiência da vida dos alunos.
A Bíblia e a Teologia freqüentemente são ensinadas de maneiras anti-sépti­
cas e form ais, sem conexão com a vida real. Os professores podem se tornar
tão controlados pelo program a que têm de cum prir, que deixam de usar os
eventos reais do dia-a-dia. Mas pode haver resultados importantes ao refletir
sobre as experiências de vida dos alunos.
Enquanto eu dava um a aula sobre moral e o desenvolvim ento da fé na
adolescência, pedi aos alunos para contarem sua própria história de fé. Um a
m ulher nos contou como tinha sido criada num contexto tão conservador que
fez com que ela perdesse muitas das experiências normais da adolescência. A
sua história era muito triste.
A medida que continuava a contar, ela começou a se perguntar, em voz alta,
por que ela tinha mantido sua fé e se firm ado em Deus durante aqueles anos
difíceis. Eu pude refletir sobre aquilo com ela, destacando que na verdade Deus
é que havia permanecido com ela. Sua fidelidade durante aqueles anos difíceis
era um a expressão da graça de Deus em sua vida.
Ela nunca tinha visto a provisão de Deus dessa forma antes. M inha simples
reflexão sobre sua experiência de vida abriu tremendas possibilidades novas
para ela. M as se eu tivesse deixado de discutir as experiências dos alunos na
aula, eu não teria podido ajudá-la.
A arena da vida fornece um contexto importante para que seja demonstrada
a fidelidade da Palavra de Deus. Por meio tanto das experiências negativas
quanto das positivas da vida, nós ilustramos a validade da perspectiva bíblica e
dos valores. M as se o educador deixa de usar as experiências de vida dos
alunos,um a oportunidade esplendida é perdida.
U m a educação experim ental requer que o professor esteja ciente das
experiências de vida dos alunos. Se os professores não conhecem seus alunos.
A prendendo pela E xperiência 233

eles dificilm ente podem usar as experiências deles para o aprendizado. O po­
der da edueação não-form al é que ela perm ite um a liberdade m aior para usar
as vidas dos alunos para ensinar.
Há certas raras horas quando eu posso usar as experiências de vida em meu
ensino na Trinity. De vez em quando algo acontece na comunidade ou na nação
que fornece um a pequena contribuição para a lição. Nós podemos fazer teologia
considerando acontecimentos e usar isso para aprender a lição do dia. Mas essas
oportunidades são um tanto quanto raras, devida à natureza da educação formal.
M as no contexto da educação não-formal da escola dominical, dos estudos
bíblicos nos lares, dos grupos jovens, ou em meu grupo de conselheiros na
Trinity, eu sou livre para usar as experiências para ensinar. Eu posso perguntar
aos alunos o que está acontecendo em suas vidas e então pensar junto com eles
teologicam ente sobre suas experiências. O contexto perm ite esse tipo de
liberdade, uma liberdade raramente encontrada num contexto formal.
Thomas Groome é o principal proponente desse tipo de reflexão intencional
nas experiências da vida.^ Sua abordagem da “praxis compartilhada” para com
a educação religiosa conduz os alunos a um a reflexão intencional sobre suas
vidas no contexto de um grupo e à luz do Evangelho. Há muita força na aborda­
gem que ele defende, mas há tamhém uma fraqueza crucial.
A força está no fato de que ele conduz as pessoas para um pensam ento
intencional sobre suas próprias vidas. Ele ajuda as pessoas a contarem sua
própria história e refletir sobre ela criticamente à luz da história cristã. Ele ajuda
as pessoas a fazerem teologia na própria vida, perguntando se o lugar onde elas
estão na vida tem ligação com o lugar onde o Evangelho as cham a para estar.
Esse é um ensino intencional poderoso.
A fraqueza dessa abordagem está no uso da hermenêutica dialética, que
coloca a Teologia e a experiência como tese e antítese num relacionam ento
dialético um a com a outra. Ele quer que a Teologia critique a experiência, mas
ele tam bém quer que a experiência critique a Teologia. A síntese é um novo
entendimento do Evangelho, mediado pela Teologia e pela experiência.
A hermenêutica dialética nega a verdade absoluta das Escrituras. Há somente
a tensão entre a experiência e a Teologia e uma reforma continua da “verdade”
baseada parcialmente na experiência. Eu creio que é importante tanto criticar a
experiência com base na Teologia quanto remodelar uma teologia que deixa de
refletir na experiência verdadeira, mas nós nunca devemos criticar a Bíblia com

^Thomas Groome, Sharing Faith: A Comprehemive Approach to Religiotis Education and


Pastoral Care (Nova York; HarperCollins, 1991).
234 E nsino e C rescimento

base em nossas experiências. A sua verdade não está sujeita à reform a com
base na experiência. N ossa única opção é nos dobrarm os diante de sua v er­
dade e aceitar sua autoridade sobre nós. Ela pode e deve nos criticar, mas
nós não a criticam os. Com o, então, podem os usar a força da educação
experim ental sem cair na arm adilha de ju lg a r a E scritura? As seguintes
orientações são úteis para obter as experiências dos alunos sem p erd er a
autoridade da Escritura sobre eles.

Esteja ciente das experiências de


vida de seus alunos
Um a educação cristã eficaz usará as experiências do aluno. Cabe ao profes­
sor conhecer os alunos e ouvir o que dizem sobre suas vidas. Se os professores
não fornecem oportunidades para os alunos falarem sobre suas vidas, eles não
poderão usar as experiências dos alunos. Um contexto educacional não-formal
perm ite que os alunos falem mais livrem ente sobre a vida e perm ite que os
professores usem as experiências de vida mais diretamente.
Os professores devem criar um clim a de abertura e honestidade na classe.
Isso é conseguido um primeiro lugar por meio do exemplo do professor. Se o
professor arrisca um a abertura e um a honestidade, refletindo diante da classe
sobre as experiências de sua própria vida, os alunos estarão m ais abertos para
compartilhar suas vidas.
Perguntas apropriadas por parte do professor podem fazer muito para facilitar
o processo de um compartilhar honesto. Mesmo uma pergunta genérica como,
“Como foram as coisas para vocês nesta sem ana?” pode preparar o ambiente
para um a com unicação aberta. M as quando os professores perguntam isso,
deve ser com uma intenção de ouvir e responder. As pessoas não se arriscarão
se não estiverem sendo levadas a sério.

Reflita teologicamente sobre as experiências da vida


o objetivo da Educação Cristã é colocar as experiências da vida e a teolo­
gia cristã juntas para que a vida seja influenciada pela Teologia. Um ensino
eficaz ajuda os alunos a descobrirem que a Teologia funciona como uma estru­
tura para o entendim ento e como resposta às experiências da vida. Ensinar
para o crescimento espiritual requer uma interação honesta com as experiênci­
as da vida do estudante de um ponto de vista teológico.
A prendendo pela E xperiência 235

M esm o um a questão genérica como “Como você explica isso teologica­


m en te?” ajuda um aluno a aprender a pensar sobre a vida de um ponto de
v ista bíblico. M uitos alunos não têm a ilum inação de pensar sobre a vida
através das lentes da Teologia.
Se, por exem plo, um aluno conta que tem orado muito sobre um assunto,
mais que parece que Deus não está respondendo, então nós temos uma grande
oportunidade de pensar com o aluno sobre sua teologia de oração. “Você pode
me dizer por que Deus não está respondendo?” pode conduzir a um a discussão
im portante sobre a oração. A chave será que a discussão deve ser baseada
num a correta perspectiva bíblica sobre a oração.
A Teologia não é uma disciplina para ser estudada separada das experiênci­
as da vida real. E, sim, a estrutura pela qual nós interpretamos a vida e o con­
teúdo que faz com que nossa mente seja renovada. Ensinar os alunos a pensar
de modo cristão requer que as categorias e as perspectivas da Bíblia se tom em
as categorias do pensamento deles. As categorias se tornam funcionais quando
nós ajudam os os alunos a pensar com eles.
Q uando Jim e Tammy Faye B akker perderam seu m inistério, m uitos na
com unidade cristã ficaram perturbados. Enquanto eu dava um a aula de
fundam entos teológicos de Educação Cristã, pedi aos alunos para pensarem
teologicam ente sobre o que havia se tornado público sobre o caso. Em vez
de deixá-los processar os eventos som ente no nível em ocional, eu pedi que
usassem sua teologia para entenderem esses assuntos. Tal reflexão teológica
intencional fez com que os alunos olhassem a tragédia de uma nova maneira.
Passagens como M ateus 6.19-24 tornou-se a estrutura pela qual nossa análise
foi feita. E u os estava ensinando a re fle tir teo lo g icam en te sobre um
acontecim ento atual e isso se tornou a plataform a de onde nós pudem os exa­
m inar nossos valores de vida.

Deixe a vida questioná-lo


Freqüentemente, em nossas tentativas de entender a vida nós emitimos opi­
niões ignorantes sobre o que Deus pode ou não pode fazer em uma dada situ­
ação. A tentação é grande para explicar a obra de Deus, mesm o quando nós
não a entendemos. Por meio do profeta Isaías, Deus nos diz:

“Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem


os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o SENHOR, porque, assim
como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos
mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos
do que os vossos pensamentos.”(ls 55.8-9)
236 E nsino n C rescimento

Se nós som ente tentam os questionar a vida, perguntando, “Por que isso
aconteceu?”, abrimos caminho para respostas bobas e que não ajudam muito.
Nós começamos a especular, tentando explicar as coisas que não entendemos.
Todos nós já ouvimos o tipo de explicação que tenta fazer o que é mal soar
como bom. “Talvez o Senhor tenha deixado o pneu do seu carro furar para
protegê-lo de um acidente” é o tipo de especulação infrutífera que deve ser
evitada. Nós devemos encarar o fato de que não podemos entender ou explicar
as obras de Deus.
U m a abordagem melhor é deixar a vida questionar você. Com isso eu quero
dizer que nós devemos explorar como as experiências da vida têm afetado a
nossa fé. “O que isso faz sobre As experiências da vida podem e
como você entende D eus?” é uma
devem nos forçar a examinar
pergunta digna de exploração e uma
nosso entendimento do caráter
pergunta que pode ser respondida.
de Deus e da obra de Deus e nos
As experiências da vida podem e
levar de volta à Bíblia à procura
devem nos forçar a examinai- nosso
de ajuda. Quando a vida nos
entendimento do caráter de Deus e
questiona, nos ajuda a ver onde
da obra de Deus e nos levar de vol-
e como nós precisamos crescer.
ta à Bíblia à procura de ajuda. Quan­
do a vida nos questiona, nos ajuda a ver onde e como nós precisamos crescer.
No exemplo acima, se o professor tentar apresentar várias explicações so­
bre “o que Deus está fazendo” quando não responde às orações, o potencial
para respostas erradas é profundo. M as o professor pode perguntar, “O que
esta experiência está fazendo com o seu entendim ento de D eus?” e abrir o
caminho para um aprendizado essencial. Para essa pergunta há respostas para
serem exploradas e avaliadas à luz do ensino da Escritura.

Permita que alguns assuntos fiquem sem resolução


Um a das grandes tentações no ensino é você “parecer bom ” por sempre ter
uma grande resposta a qualquer pergunta. Além de estarmos protegendo nosso
orgulho, nós podem os estar tentando fazer “Deus parecer bom ” . N ós quere­
mos proteger a sua reputação, então apresentam os respostas mesm o se nós
realmente não entendemos o que está acontecendo. M uita vanglória e lingua­
gem bonita podem geralmente convencer os alunos que um a resposta foi dada,
mesmo se não tenha sido.
Em meus primeiros anos como professor, eu tinha uma forte necessidade de
provar a m im mesmo ao dar respostas a qualquer pergunta e qualquer experi­
ência. Eu na verdade desenvolvi a habilidade de parecer conhecedor, mesmo
A prendendo pela E xperiência 237

que quando eu não tinha a m ínim a idéia sobre o que estava acontecendo. Tal
postura é pecado e precisa ser confessada como tal.
M ais tarde, quando eu tive experiências que eu não podia entender, m inha
teologia ignorante e meu discermimento fingido fez muito pouco para me ajudar
a entender as minhas experiências de vida. Eu vi que eu podia examinar o meu
próprio coração e ver como estava a minha fé enquanto eu lutava com dificul­
dade com as situações da vida. Quando eu cresci em meu entendimento teoló­
gico, algumas de minhas perguntas foram respondidas, mas nem todas.
Os alunos não precisam que ofereçamos respostas que nós não temos. Eles
precisam, antes, que ouçamos com empatia e modelemos para eles a confiança
em Deus diante das questões não-respondidas. Eles precisam saber que nosso
Deus não pode ser reduzido a respostas im ediatas e que parte da cam inhada
com Deus é aceitar os mistérios.
Há momentos quando nós devemos estar abertos a dizer, “eu não sei” . Nós
não podem os explicar teologicam ente tudo o que acontece na vida, mas nós
podem os confrontar as experiências através dos olhos da fé, confiando em
Deus mesmo quando nós não entendemos. Assim como Jó,temos de estar aber­
tos a dizer, “Eis que me matará, já não tenho esperança; contudo, defenderei o
m eu procedim ento” (Jó 13.15).

Use acontecimentos atuais para ensinar a verdade


de Deus
Nem todas as experiências que nós usamos devem vir diretamente da vida
dos alunos. A contecim entos atuais que são notícia podem tam bém fornecer
questões poderosas para uma discussão teológica. Eventos em nossa própria
região, ou notícias nacionais ou internacionais podem e devem ser assunto de
reflexão teológica. Meu colega Bruce Fields diz aos seus alunos que a teologia
deve ser feita com a Bíblia em uma mão e o jornal na outra.
Todos nós temos visto exemplos de uma teologia pobre feita sobre aconte­
cimentos atuais. Aqueles que são apaixonados por profecias gastam muito tempo
tentando relacionar os eventos atuais com as perspectivas escatológicas, geral­
mente determinando que um certo líder político ou outro é o Anticristo. Não é
bem isso que eu tenho em mente.
Se nosso objetivo é ajudar as pessoas a pensarem biblicam ente para que
vivam biblicamente, um dos modos para fazer isso é refletir sobre as notícias de
um ponto de vista teológico. A Teologia nos ajuda a entender não som ente as
nossa vida, mas os acontecimentos ao nosso redor também.
Isso é o que Jesus fez em Lucas 13.1-5. Ele refletiu sobre dois eventos
238 E nsino e C rescimento

atuais da época para ajudar os discípulos a verem a necessidade de arrependi­


mento. Ele usou as notícias do dia para prender a mente deles e defender seu
ensino. Todos sabiam sobre o acidente e da matança dos galileus. Esses acon­
tecim entos serviram como ponto de referência para ajudá-los a pensar sobre
sua posição diante de Deus.
Chuck Colson m odela essa abordagem muito bem. Em suas contribuições
regulares para Christianity Today ele seleciona acontecimentos atuais e escreve
teologicam ente sobre os m esm os. Seus ensaios sobre o processo político e
sobre os assuntos no Congresso são modelos de como pensar teologicam ente
sobre questões atuais. Esses podem ser recursos excelentes para aprender a
aplicar a Teologia ao cenário atual e entender questões contemporâneas de um
ponto de vista bíblico.
As experiências da vida oferecem um a ilustração constante da verdade da
Palavra de Deus e do perigo de ignorá-la. Educadores cristãos eficazes que
ajudam no crescimento espiritual são aqueles que confrontam as experiências da
vida sem medo, tentando entendê-las à luz da Escritura e procurando respostas
bíblicas para os acontecimentos da vida. Essa é a matéria da vida real. É o tipo de
ensino que ajuda as pessoas a ter a mente renovada e a vida transformada.
CAPITULO 15
ENSINO E CRESCIMENTO ESPIRITUAL
o foco do ministério educacional da igreja deve ser o desenvolvimento es­
piritual de seu povo. A igreja é “raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo
de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele
que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (IP e 2.9). N ossa tarefa
educacional é ajudar as pessoas a entenderem e viverem nessa realidade. Ensi­
nar para o crescimento espiritual exige ajudar as pessoas a viverem retamente
para a glória de Deus.
A teoria do currículo fala dos princípios de organização, a idéia central ao
redor da qual o currículo gira. A função do princípio de organização é capacitar
os planejadores cristãos a terem um a base para tom ar decisões. O que será
incluído ou excluído é determinado pelo princípio de organização. Além disso,
os m étodos educacionais devem ser escolhidos em relação ao valor central
expresso no princípio da organização.
Os líderes de igreja devem ter um a base a partir da qual tom ar decisões
educacionais. O princípio de organização do ministério educacional da igreja
deve ser o crescimento espiritual de seu povo. Sua tarefa principal é produzir
pessoas que sejam espiritualmente maduras. Paulo disse que o objetivo de seu
ministério era anunciar a Cristo “advertindo a todo homem e ensinando a todo
hom em em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito
em C risto” (Cl 1.28).
M uitas vezes as igrejas se desviam desta tarefa central, envolvendo-se em
atividades que são boas e úteis num certo nível, mas não estão no centro de sua
responsabilidade. O melhor é sacrificado no altar do bom. O resultado é que o
povo de Deus é ignorante a respeito das verdades bíblicas e incapaz de andar
na plenitude e no poder do Espírito Santo. O povo sai da igreja desencorajado
a respeito da autenticidade do Evangelho, e a igreja deixa de ser o sal e a luz
num mundo desesperadamente necessitado.
A igreja está experimentando um crescimento impressionante na América
do Sul, Á sia e África, mas está declinando na América do Norte. Eu creio que
0 declínio se deve parcialm ente à ineficiência da Educação Cristã em enfocar
as tarefas centrais do ensino para o crescim ento espiritual. A lgum as igrejas
estão experimentando um crescimento numérico e financeiro, mas isso não deve
ser confundido com crescimento espiritual.
Se quisesse falar com ironia, eu diria que a Igreja nos Estados Unidos está
m uito bem, exceto por dois aspectos; N ós não acreditam os na B íblia, e nós
240 E nsino e C rescimento

nunca recebemos Jesus. Exceto por isso, nós estamos indo muito bem. E claro
que isso é um exagero, mas não é com pletam ente destituído de verdade. O
falso evangelho que proclam a que nós podemos ser cristãos sem obedecer ao
senhorio de Cristo indica tanto a falha em reconhecer a Bíblia quanto a recusa
de receber aquele que recebeu toda autoridade no céu e na terra. Tal p en sa­
mento me assusta como uma forma de embriaguês com a qual Deus aflige seu
povo em julgam ento (Jr 13.12-27). De que outra maneira podemos explicar o
ensino que nega a autoridade que é direito do Senhor? A responsabilidade da
Educação Cristã é ensinar ao povo de Deus a verdade de Deus e ensiná-la em
relação com a vida. A verdade deve ser vivida, não simplesmente entendida.
A m ensagem do profeta Malaquias precisa ser ouvida pela igrej a nos Esta­
dos Unidos no final do século 20. Deus declarou, “Tomara houvesse entre vós
quem feche as portas, para que não acendésseis, debalde, o fogo do m eu altar.
Eu não tenho prazer em vós, diz o SENHOR dos Exércitos, nem aceitarei da
vossa mão a oferta” (Ml 1.10). A razão do seu desgosto é que Israel estava
mantendo práticas religiosas sem qualquer compromisso com Deus. Deus per­
guntou, “O filho honra o pai, e o servo, ao seu senhor. Se eu sou pai, onde está
a m inha honra? E, se eu sou senhor, onde está o respeito para com igo? diz o
SENHOR dos Exércitos a vós outros, ó sacerdotes que desprezais o meu nome.
Vós dizeis: Em que desprezamos nós o teu nom e?” ( Ml 1.6).
Por intermédio do profeta Malaquias, Deus colocou a culpa sobre os líderes
religiosos da nação, porque ele conduziram o povo pelo cam inho errado.
Malaquias proclamou:

“ Porque os lábios do sacerdote devem guardar o conhecim ento, e da


sua boca devem os homens procurar a instrução, porque ele é m ensageiro
do S E N H O R dos Exércitos. M as vós vos tendes desviado do cam inho e,
por vossa instrução, tendes fe ito tropeçar a muitos; violastes a aliança de
L e v i, d iz o S E N H O R dos E x é rc ito s . P or isso, ta m b é m eu vos fiz
desprezíveis e indignos diante de todo o povo, visto que não guardastes os
meus caminhos e vos mostrastes parciais no aplicardes a le i” ( M l 2 .7 -9 ).

Nós devemos ter a certeza de que nosso ensino produz crescim ento e não
escândalo. O professor carrega uma séria responsabilidade (Tg 3.1). Porque
Deus nos responsabiliza por nosso ministério educacional, nós devemos encará-
lo seriamente. As seguintes prioridades são questões que eu tentei enfatizar por
todo o livro— que pela graça divina podem nos ajudar a ensinar para o cresci­
mento espiritual.
Primeiro, a centralidade da Bíblia deve ser mantida. Moisés ensinou que “Ele
E nsino e C rescimento E spiritual 241

te humilhou, e te deixou ter fome, e te sustentou com o maná, que tu não conhe-
cias, nem teus pais o conheciam, para te dar a entender que não só de pão viverá
o homem, mas de tudo o que procede da boca do SENHOR viverá o hom em ”
(Dt 8.3). É possível conhecer a Bíblia e não ser espiritualmente maduro, mas é
im possível ser ignorante a respeito da Palavra de Deus e ser espiritualm ente
maduro. A maturidade espiritual começa com o conhecimento da Bíblia.
Em um a era de crescimento da desconfiança a respeito da Escritura— ^mes­
mo entre aqueles que chamam-se a si mesmos “evangélicos”— nós devemos
ensinar a B íblia como a única regra de fé e vida. Enfocando as “necessidades
pessoais” como opostas à real necessidade pela Bíblia faz com que as pessoas
tropecem no final de tudo. Uma educação que leva ao crescim ento espiritual
deve ser profundam ente bíblica, porque é a Palavra de Deus que dá vida.
A Bíblia deve ser ensinada como verdade pai'a ser vivida, não simplesmente
como conhecimento para ser entendido. Ela deve ser ensinada em relação à vida
real, não como um informação acadêmica separada das experiências do povo.
M as a B íblia deve ser ensinada, ou o povo tropeçará como bêbados, não sa­
bendo por onde ir ou qual o significado da vida de uma perspectiva bíblica.
Segundo, o contexto educacional deve ser a comunidade. A marca do cris­
tão é o am or de uns pelos outros (Jo 13.35). U m a educação feita de form a
isolada é um a anomalia se afirma ser cristã. O crescimento espiritual acontece
na com unidade quando o corpo de Cristo m inistra para si mesmo e se edifica
por meio dos dons do Espírito.
Não somos o povo de Deus sozinhos. Somos chamados do mundo para um
relacionam ento uns com os outros. Somos novas criaturas, sendo ajustados
uns aos outros por Deus e equipados para o m inistério de uns para com os
outros. Nosso Senhor distribuiu graça para cada um de nós. Paulo nos ensina,

“ E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, ou­
tros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao
aperfeiçoam ento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a
edificação do corpo de C risto, até que todos cheguemos à unidade da fé
e do pleno conhecim ento do F ilh o de D eus, à p erfeita v aro n ilid a d e, à m e­
d id a da estatura da p lenitude de C ris to ” ( E f 4. 11-13).

Nós obtemos maturidade ao nos relacionarmos com outros crentes quando


juntos edificamos uns aos outros. Um a educação que é verdadeiramente cristã
enfatiza a comunidade e os relacionamentos. Nós necessitamos uns dos outros
se queremos eumprir nosso mandato de ensinar para o crescimento espiritual.
A doutrina do corpo de Cristo deve ser vivida na realidade, não som ente
em palavras vazias.
242 E nsino e C rescimento

Terceiro, porque Deus falou e sua Palavra é a verdade, a maturidade espiri­


tual envolve o modo como pensamos. Paulo desejava que a igreja em Colossos
pudesse ter “toda a riqueza da forte convicção do entendim ento” (Cl 2.2). A
sua visão da maturidade espiritual claramente envolvia o moldar o pensamento
das pessoas para que pudessem amar a Deus com a mente.
U m a educação que conduz à maturidade espiritual envolve a mente e m ol­
da o m odo como as pessoas pensam. Pensar em si mesm o e de si mesmo não
é m aturidade espiritual, mas um pensam ento correto é im prescindível para a
saúde do crente individualm ente e a igreja corporativam ente. N um a era em
que m uitas pessoas resistem até mesmo à possibilidade da verdade, a educa­
ção cristã deve lutar pela verdade, ajudando os crentes a terem a m ente re ­
novada pela Palavra de Deus.
Q uarto, ensinar para o crescim ento espiritual requer que nós tom em os o
processo do desenvolvimento das pessoas seriamente. Parte do fato de se res­
peitar as pessoas é respeitar os padrões que Deus escreveu na estrutura da
humanidade. Os seres humanos são complexos, mas a complexidade pode ser
reduzida se entendermos o processo de desenvolvimento.
Embora o estado atual da psicologia do desenvolvimento não seja perfeito,
ela ajuda os educadores a m oldar tanto o conteúdo como o método às habili­
dade do aprendiz . O processo de desenvolvim ento é um a realidade, queira­
mos ou não reconhecê-lo. Nosso ensino será mais efetivo e o aprendizado mais
poderoso se puderm os entender e trabalhar com os padrões de desenvolvi­
mento de nossos alunos.
Quinto, a maturidade espiritual envolve a pessoa como um todo. M aturida­
de que ver com o modo como pensam os, onde colocam os nossas afeições e
como nos comportamos. Ela é cognitiva, afetiva e volitiva, envolvendo a mente,
o coração e a vontade. Ela requer uma perspectiva educacional completa.
Portanto, ensinar para o crescimento espiritual requer métodos que envol­
vam a pessoa com o um todo. N ão é um a questão de truques, m as de um
processo educacional racional que ajuda a pensar, sentir e agir de acordo
com a Palavra de D eus.Trivializar o processo de educação com um conteúdo
superficial e métodos tolos é uma ignomínia ao privilégio de ensinar ao povo
de Deus. Devemos levar a tarefa mais a sério do que temos feito.
Finalm ente, ensinar para o crescim ento espiritual som ente pode ser feito
quando Deus está no processo. Assim como nunca podemos levar alguém até
o Senhor por nossos próprios m eios, do mesmo modo é im possível levar al­
guém à maturidade por nossos próprios esforços. Deus é quem dá um coração
novo (Ez 36.24-32) e Deus leva aqueles que lhe pertencem à maturidade. Pau­
lo lembra-nos que
E nsino e C rescimento E spiritual 243

...aos que de antemão conheceu, tam bém os predestinou para serem


conform es à linguagem de seu filh o , a fim de que ele seja o p rim ogênito
entre m uitos irmãos.
E aos que predestinou, a esses tam bém cham ou, e aos que ju s tific o u , a
esses tam bém g lo rific o u (R m 8 .2 9 -3 0 ).

A responsabilidade hum ana e a dependência no poder de Deus andam de


m ãos dadas. Somos responsáveis por ensinar, e ensinar bem. D evem os tra ­
balhar no processo educacional e trabalhar duram ente para ensinar do m e­
lhor m odo que puderm os. M as devemos tam bém entender que nunca pode­
rem os produzir os frutos da ju stiç a em outra pessoa pela nossa própria
vontade ou pelo nosso próprio esforço. Somente o Pai pode levar seus filhos
à m aturidade. No entanto, ele escolhe usar nosso esforços para atingir seus
objetivos. G raciosam ente, ele perm ite que alim entem os seu rebanho. E nós
fazem os isso, não com o intuito de nos sentir satisfeitos ou honrados, mas
para que ele seja glorificado.
O objetivo de nosso m inistério deve sem pre ser a glória de Deus. Ele é o
único que deve importar e é ele que deve ser glorificado. Ele é o grande pastor
das ovelhas e é a ele que servimos.
APÊNDICE
A EVANGELIZAÇAO DE CRIANÇAS
Um a questão importante e tradicional na Educação Cristã tem sido a salva­
ção das crianças. “C onduzir a criança a C risto” tem sido um dos objetivos
p rim ário s da Educação C ristã, especialm ente na esco la dom inical. A
evangelização da criança é um assunto extremamente importante. Infelizmente
algum as das abordagens que tratam disso se baseiam num a teologia pobre e
incompleta. Eu não contesto os motivos daqueles que trabalham com as crian­
ças quando digo que se queremos conduzir um ministério que honra a Deus e
frutifica na vida das crianças, nós devemos considerar cuidadosamente as ba­
ses bíblicas e teológicas de nossa prática.
Evangelizar crianças é tanto uma questão emocional quanto teológica. Isso
é, nós desejam os fortem ente ver as crianças levadas para perto do Senhor
logo cedo na vida, e ao m esm o tem po nós querem os levar as E scrituras a
sério, sendo guiados por suas orientações em tão im portante questão. Não
podem os tratar dess assunto de form a superficial mas devem os considerar
cuidadosam ente como a igreja tem tentado entender o assunto e executar a
tarefa de levar as crianças à fé.

A NATUREZA DA FE SALVADORA

A raiz de m uitos dos atalhos das abordagens atuais sobre a salvação das
crianças (e isso m ostra um fraqueza geral nas igrejas evangélicas) é uma má
representação fundacional ou um mal entendido sobre a verdadeira natureza da
fé salvadora. E muito claro nas Escrituras que as pessoas são salvas pela fé. A
m ensagem é, “Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa” (At 16.31). O
problem a é que a mensagem tem sido m udada para “Receba Jesus como seu
salvador pessoal e você será salvo” , ou “Convide Jesus para entrar em seu
coração e serás salvo”. Conquanto ambas as mensagens contenham elementos
da verdade, ambas falham diante da mensagem bíblica.
A questão é a natureza da fé salvadora. O que significa “receber” a Jesus no
sentido de João 1.21? Não significa sim plesm ente a recepção dos benefícios
de sua m orte vicária em nosso favor, mas antes a recepção dele, o Senhor
ressurreto e cabeça da igreja. A fé no sentido bíblico não pode ser separada da
obediência. Como o apóstolo João escreveu, um a vida não caracterizada pela
246 E nsino e C rescimento E spiritual

obediência nunca pode ser considerada uma vida redimida: “Ora, sabemos que
o temos conhecido por isto: se guardamos os seus mandamentos. Aquele que
diz: Eu o conheço e não guarda os seus mandam entos é m entiroso, e nele não
está a verdade” (1 Jo 2. 3-4). Se queremos levar João a sério, devemos entender
que não podem os dizer que recebem os Jesus se nossa vida é caracterizada
pela desobediência.
As im plicações para a apresentação do Evangelho são óbvias. Ao mesmo
tempo que proclamamos as boas-novas de que Jesus morreu por nossos pecados
de acordo com a Escritura, e que ele comprou nossa redenção com seu sangue,
nós devemos também proclamar que ele é Senhor. D evemos deixar claro que
recebê-lo implica que devemos aceitar não somente seu dom da redenção, mas
também sua autoridade de direito sobre nossa vida. Um aspecto importante da
Grande Comissão é que nós devemos ensinar os novos discípulos a obedecerem
a tudo o que Jesus ordenou (Mt 28.20). Nossa fé deve influenciar nossa atitude,
nosso com portam ento e nossos valores. Se todas essas áreas da vida não
estiverem sendo conduzidas sob o senhorio de Cristo, então nós não o “rece­
bem os” . Em vez de o recebermos como salvador pessoal (que não é um a ter­
m inologia bíblica), nós devemos recebê-lo como senhor, e ele então se tornará
nosso Salvador pessoal.
A questão em jogo é muito mais do que uma terminologia. Não há palavras
m ágicas que autom aticam ente resultem em salvação. Antes, há um a atitude,
que pode ser expressada em um a variedade de frases, que o Pai considera
como apropriada para a salvação. Porque as atitudes são difíceis de estudar,
ou até im possíveis de estudar, a Escritura descreve para nós o fruto da fé que
resulta em salvação. Tiago nos diz simplesmente que “assim tam bém a fé, se
não tiver obras por si só esta m orta” (Tg 2.17). Nosso Senhor coloca isso em
termos ainda mais fortes, quando ele ensinou, “Nem todo o que me diz: Senhor,
Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de m eu Pai,
que está nos céus” (M t7.21).
A E sc ritu ra ap re se n ta a fé com o algo m uito sério. N ão h á m an eiras
suaves e fáceis dentro do reino. É verdade que as pessoas são salvas pela
fé, m as se essa fé não é e x p ressad a na v id a do crente p elas açõ es, não é
um a fé salvadora verdadeira.'

‘ Para um estudo mais completo sobre este assunto, ver Dietrich Bonhoeffer, The Cost of
Discipleship (Nova York; Macmillan, 1949); Juan Carlos Ortiz, The Disciple (Carol Stream, 111.:
Creation House, 1975); Walter Chantry, Today’s Gospel, Aiithenticvs. Synthetic (Carlisle, Pa.;
Banner of Truth Trust, 1970); John F. MacArthur, Jr., The Gospel According to Jesus, ed. rev.
(Grand Rapids; Zondervan, 1994).
A pêndice 247

Quando esse entendim ento da fé é eonsiderado em relação às erianças, a


questão se torna ainda m ais com plexa. U m a criança pode com preender as
questões em jogo suficientem ente para ter a fé salvadora? O bviam ente a B í­
b lia afirm a essa possibilidade quando nos instrui a ensinar as crianças nos
cam inhos de D eus. M as, como verem os, isso não é tão sim ples com o algu­
m as pessoas o colocam.

O PECADO ORIGINAL

A m aneira como encaramos a evangelização das crianças depende am pla­


mente do nosso entendimento do pecado original. Baseada primariamente nos
ensinos de Rom anos 5, esta doutrina afirm a que o pecado original de Adão
como cabeça da humanidade foi passado para toda a humanidade de maneira
que todas as pessoas nascem culpadas diante de um Deus santo.
Essa questão se torna mais crítica quando considerada em relação a um
infante que morreu. Por causa do pecado de Adão, será que a criança falecida
irá para o inferno?
H istoricam ente há duas respostas teológicas a essa questão. A prim eira
lida com o batismo infantil; a se-
gunda com o aspecto da idade
A maneira como encaramos a
da razão. O batism o infantil é
evangelização das crianças depen­
entendido pelo m enos de três de amplamente do nosso entendi­
maneiras diferentes. A perspec- mento do pecado original.
tiva católica rom ana diz que o batism o infantil purifica a criança do pecado
original. Se crianças morrem sem o batismo elas não irão diretam ente para o
céu. Portanto é im portante, do ponto de vista católico, batizar as crianças o
m ais cedo possível.
A perspectiva luterana é um pouco diferente. Os luteranos crêem que quan­
do as crianças são batizadas. Deus graciosam ente “aplica a fé” no coração
delas de m aneira que elas possam ser salvas. N a perspectiva luterana a fé é
análoga à confiança. A ssim como as crianças confiam em suas m ães, assim
tam bém Deus as capacita para confiar nele. Para os luteranos, o batism o é o
meio da graça pelo qual Deus salva crianças ao colocar a fé no coração delas.
De um ponto de vista Reformado, o ritual é normalmente entendido como
análogo à circuncisão dos judeus e é o sinal do pacto entre os pais e Deus de
que as crianças serão criadas na fé cristã. M ais tarde, quando as crianças são
m ais m aduras para confirm ar que sua fé de fato é real, elas são levadas à
membresia total da igreja por meio da profissão de fé. Acredita-se que se essas
248 E nsino e C rescimento E spiritual

crianças m orrerem antes da profissão de fé, seus pecados serão perdoados


por causa do pacto estabelecido por meio do batism o. As igrejas que defen­
dem um a posição Reformada crêem que quando os pais criam seus filhos na fé,
Deus os regenerará e lhes dará o dom da fé.
A segunda resposta teológica para a salvação de um a criança diz respeito
à idade da razão, isto, é algumas igrejas defendem que antes que as crianças
possam exercitar a fé por conta própria. D eus não as resp o n sab ilizará por
seus próprios pecados, e se m orrerem antes de se tornarem responsáveis,
elas serão perdoadas. Os adeptos dessa posição reservam o ritual do batismo
som ente para os crentes.
Se as crianças serão responsabilizadas por seus pecados, é essencial que elas
sejam levadas à fé o mais cedo possível. Aqueles que rejeitam o batismo infantil
enfrentam uma dificuldade de quanto à maneira em que a criança deve ser levada
à fé. Qual é o melhor ou mais apropriado modo de evangelizar uma criança?

ABORDAGENS À EVANGELIZAÇAO DE
CRIANÇAS
Nos dois últim os séculos, nos Estados U nidos a questão de como uma
criancinha deveria ser conduzida a Cristo tem sido respondida de várias formas.
Cada abordagem tem em si forças e fraquezas específicas.

Avivalístas
Uma das posições mais extremadas foi defendida pelos dissidentes do sécu­
lo 18 na Inglaterra e por alguns dos últimos avivalistas que seguiram suas tradi­
ções. Vindo de um calvinismo extremado com uma forte ênfase na depravação
total, o avivalismo entendia que uma criança não era capaz de ter fé salvadora.
Com binada com uma ênfase na pecam inosidade das crianças era um aspecto
sério para as necessidades da fé na vida do indivíduo. Como resultado desta
perspectiva, os avivalistas criam que a responsabilidade da igreja para com as
crianças era convencê-las de que eram terríveis pecadoras e quando elas fos­
sem mais velhas para se arrependerem apropriadamente, deveríam entregar a
vida para Cristo.
Talvez esta perspectiva seja melhor representada por um poema de Isaac
Watts, escrito quando criança:
A pêndice 249

Eu sou um vil e polu ído pedaço de terra.


Assim eu tenho sido desde que nasci;
Em bora a graça de Jeová venha sobre mim diariam ente,
Tão certo quanto este monstro Satanás me enganará,
Venha, portan to. Senhor, das g arras de Satanás me livrarJ

O tipo de ensino que resultou nessa perspectiva era m uito extrem ado. Os
pais cristãos criam que era tarefa deles m ostrar a seus filhos seus pecados
sem pre que pudessem , assim inculcando neles um a consciência da terrível
condição em que se encontravam diante de um Deus santo. O pai seria cuidadoso
em mostrar que um desejo natural infantil de brincar em lugar de estudar era um
exemplo da natureza pecaminosa da criança. Além do mais, os pais ensinariam
seus filhos que eles não eram capazes de orar ou de qualquer outra prática
religiosa que agradasse a Deus.
A mensagem era simplesmente que as crianças são pecadoras condenadas
diante de Deus e não são capazes de ter um a fé salvadora. Os pais oravam
fervorosamente para que quando seus filhos alcançassem “a idade da sabedoria”
(a idade em que as crianças seriam capazes de exercitar um a fé verdadeira)
elas responderíam a Cristo.
E ntendia-se que a salvação era sem pre o resultado da eleição divina, e
portanto seria presunção para os pais cristãos supor que seus filhos seriam
salvos. A salvação era sempre um resultado da vontade de Deus, e não vontade
dos seres hum anos. N ovam ente, um a anotação do diário de Isaac Watts em
1688, quando ele tinha 14 anos, indica o resultado dessa perspectiva na mente
de um a criança; ele escreveu, “caí sob considerável convicção dos pecados e
fui ensinado a confiar em Cristo, eu espero?” .-’
O aspecto positivo dessa abordagem sobre a salvação das crianças era que
levava a sério a natureza pecaminosa da humanidade e a natureza radical da fé
salvadora. Porque a fé bíblica era entendida como exigência sérias sobre a vida
do crente, não era para se entrar nela de modo leviano. Os pais criam que a
responsabilidades deles era preparar seus filhos para a salvação, mas que estava
além do entendimento que eles tinham natureza da fé cristã ver a fé no coração
da criança. A fé cristã poderia vir somente após a “idade da razão” quando a
criança poderia entender corretamente a verdadeira natureza da fé bíblica.

- E. Paxton Hood, Isaac Watts: His Life and Writings, His Home and Friends (Londres;
Religious Tract Society, 1875), 7.
’ Idem, 342.
250 E nsino e C rescimento E spiritual

O aspecto negativo dessa abordagem é também óbvio. Em seu zelo em pro­


teger a integridade do Cristianismo, eles falhavam em entender que a Escritura
claram ente ensina que as crianças tam bém podem ser parte do reino. Jesus
ensinou, “Deixai os pequeninos, não os embaraceis de vir a mim, porque dos
tais é o reino dos céus” (Mt 19.14). Também, as instruções de Paulo aos cren­
tes em Efeso, ...vós pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na
disciplina e na admoestação do Senhor” (E f 6.4), indica que, pelo menos numa
certa extensão, um a criança é capaz de ter fé. Portanto, conquanto esses
avivalistas devam ser elogiados por seu interesse em tom ar as exigências do
Evangelho e a soberania de Deus seriam ente, eles devem ser acusados pela
falta de confiança na capacidade de uma criança ter a fé salvadora.

Horace Bushnell

U m a segunda perspectiva, que claramente foi um a reação aos abusos dos


avivalistas, surgiu de Horace Bushnell, um pastor de Connecticut. Em 1846 ele
escreveu um livrinho entitulado Discursos sobre o Ensino Cristão, no qual
defendia que as crianças deveriam ser educadas como crentes desde seus p ri­
meiros anos de vida, em vez de serem criadas como pecadoras a serem conver­
tidas numa data posterior. Por causa da controvérsia teológica do livro, Bushnell
foi incentivado a publicar o livro duas vezes em formas diferentes e sob títulos
um tanto quanto diferentes. N a edição final, publicada em 1861 e entitulada
simplesmente Christian Nurture, Bushnell resumiu sua posição assim;

M e u argum ento é estabelecer que a criança deve ser educada como


um cristão, e nunca conhecer-se com o algo d iferen te disso. Em outras
palavras, o o b jetiv o , o esforço e a exp ectativa não devem ser, com o é
com um ente suposto, que a criança deve crescer em pecado, para ser
convertida depois que chegar a uma idade m adura, mas sim que deve
entrar no m undo como alguém que é espiritualm ente renovado, não se
lem brando do tem po que passou por uma experiência técnica, mas sim
como tendo amado o que é bom desde a mais tenra idade.

O conceito chave no argumento de Bushnell é que a Educação Cristã deve,


de fato, evitar a necessidade de um a conversão radical. Ele cria que desde a
mais tenra idade as crianças deveriam ser ensinadas sobre o amor de Deus e a

'' Horace Bushnell, Christian Nurture (Grand Rapids: Baker, 1979), 10.
A pêndice 251

am ar a Deus. O cerne de seu argumento é que há um tipo de conexão natural


entre a fé dos pais e a da criança. Sem um a term inologia m oderna, Bushnell
se referiu a um “tipo de unidade orgânica” ^ que ligava a fé dos pais à da
criança. Ele não queria dizer que as crianças são autom aticam ente salvas se
os pais são crentes. A ntes, ele estava tentando lidar com o ensino de Paulo
em 1 C oríntios 7.14: “ ...o marido incrédulo é santificado no convívio da es­
posa, e a esposa incrédula é santificada no convívio do marido crente. D outra
sorte, os vossos filhos seriam im puros; porém , agora, são santos” ; Efésios
6.4: “ ... vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na discipli­
na e na adm oestação do Senhor” . Para entender Bushnell corretam ente, nós
devem os lem brar que ele estava tentando encorajar os pais cristãos a ensinar
seus filhos de um a forma positiva. Ele estava incomodado com as práticas do
avivalismo e cria que as crianças também tinham um lugar importante no reino.
Bushnell entendia que as crianças podem chegar à fé por outros meios que
não a radical conversão. Ele argumentou que as crianças de pais crentes deveriam
ser tratadas de maneira diferente das crianças de adultos descrentes. Bushnell
ensinou que se um a criança fosse ensinada para a salvação, essa regeneração
era tanto uma obra do Espírito Santo quanto a conversão radical de um adulto.
Mas ele cria que era possível criar as crianças de modo distintamente cristão e
que elas nunca se lembrariam de um tempo quando não haviam sido crentes.
Em vez de se tomarem cristãs mais tarde na vida, as crianças criadas no contexto
de um lar cristão poderiam ser cristãs desde tenra idade.
No século 20 isso não parece um ensino estranho. Muitos crentes criam seus
filhos dessa maneira, ensinando-lhes orações simples e lhes dizendo do amor de
Deus. Baseados no entendimento de que as crianças verão a fé como uma rea­
lidade na vida de seus pais e que elas continuarão como cristãs quando forem
velhas, os pais cristãos ensinam seus filhos na fé. No entanto, se seus filhos não
continuarem na fé, alguns pais são inclinados a se culparem pelo resultado.
Há um a certa fraqueza na posição de Bushnell. Em seu esforço de corrigir
os erros do avivalismo, ele falhou em considerar a pecaminosidade humana de
m aneira suficientem ente séria. Ele não afirm a que há um a “depravação
natural”*^que afeta todas as pessoas, mas ele cria que a tendência para o mal
podería ser mentalizada pelo ambiente positivo de um lar cristão. Para Bushnell,
0 processo de Educação Cristã deveria ser tão natural que não há quase senso
do divino nela. Parece que a regeneração podería ser ensinada com o boas

Idem, 342.
Idem, 22.
252 E nsino e C rescimento E spiritual

maneiras ou como a cultura. Há muito pouco do sobrenatural em seu entendi­


mento do ensino e na salvação infantil que ele imaginava.’

A CONVERSÃO DE UMA CRIANÇA


Um a abordagem mais atual é a teoria apresentada por algumas organiza­
ções que evangelizam crianças e alguns editores evangélicos. Essa perspectiva
defende que todas as pessoas são perdidas e necessitam de salvação, e que a
salvação vem a alguém como resultado da crença de que Cristo morreu por ele
ou ela. Cada pessoa deve fazer a decisão por Cristo, e normalmente um a pes­
soa deve ser capaz de lembrar quan­
A natureza da conversão para a
do esta decisão foi feita.
criança que foi criada num lar
O contexto bíblico para essa
cristão pode ser significativa­
abordagem se baseia nos exemplos
mente diferente da natureza da
da Escritura de conversões à fé cris­
tã. Por exem plo, a experiência de
experiência de conversão de um
Paulo na estrada de Damasco é vis­
pagão adulto.
ta como sendo, pelo menos de alguma forma, normativa para todas as experi­
ências de conversão. Num certo momento Paulo não era um crente, e em outro
era. Esse conceito de uma experiência de crise durante a conversão é conside­
rado um modelo próprio para todas as conversões. Também, a term inologia
que Jesus usou com N icodem os, “Você deve nascer de novo”, im plica que
assim como um nascimento físico é um evento específico, também o deve ser o
nascimento espiritual.
A força dessa perspectiva é o forte interesse por ver especialm ente as
crianças ganhas para Cristo. R econhece o fato de que todas as pessoas, in ­
cluindo as crianças, necessitam de salvação e faz uma tentativa específica
para alcançá-las com o Evangelho. É im portante o desejo evangelístico e o
interesse em que as crianças entendam que de fato responderam a C risto.
Também, o fato de que as crianças são vistas com um valor infinito e dignas
de um trabalho evangelístico é de fato algo que se assemelha ao espírito com
que Jesus lidou com as crianças.

’’ Uma mistura do natural com o sobrenatural é um fenômeno constante na teologia de Bushnell


e não se restringe a este assunto. É geralmente considerado que o entendimento do relaciona­
mento do natural com o sobrenatural no pensamento de Bushnell é a chave para abrir seu
sistema teológico todo.
A pêndice 253

As fraquezas dessa abordagem são talvez um pouco mais sutis, mas elas preci­
sam ser consideradas. Esse modelo é construído com base no conceito de que
todas as crianças devem se converter da mesma maneira que adultos pagãos. Não
considera a possibilidade de que as conversões registradas no livro dos Atos po­
dem não ser normativas para as crianças. A Escritura não fornece nenhum exem­
plo de crianças que se converteram separadas de suas famílias. É claro que na
igreja primitiva houve situações quando famílias inteiras se converteram (tal como
a família de Comélio em Atos 10), mas não há registro de crianças indo a Cristo
espontaneamente. Argumentar pelo silêncio não prova que isso não aconteceu.
Somente significa que não há exemplos claros para seguir na Escritura.
Um a segunda fraqueza muito mais importante da abordagem da conversão
da criança é que não leva em conta a singular situação dos filhos de pais crentes
que de alguma forma devem ser vistos como diferentes dos filhos daqueles que
não têm fé. Não é possível provar, de m aneira rápida e eficiente, o relaciona­
mento entre a fé dos pais em relação aos filhos, mas a Bíblia fornece alguma
inform ação sobre isso. Ern 1 Coríntios 7 Paulo indica que as crianças são de
algum a form a afetadas pela fé de seus pais crentes. Também, a diferença de
ambiente deve ser considerada. Se as crianças vivem num lar em que oraram
por elas desde talvez antes que nascessem, e se desde cedo foram ensinadas a
honrar a Deus e a responder a ele com fé, parece que essas crianças não teriam
de ser evangelizadas da mesma forma que as crianças de histórico pagão. Se os
pais estão de fato criando seus filhos no tem or e no ensino do Senhor, parece
estranho e desnecessário convidá-los a um a resposta de fé a Cristo quando
esse foi 0 enfoque de seu ensinamento.
A natureza da conversão da criança que foi criada num lar cristão pode ser
significativamente diferente da natureza da experiência de conversão de um pagão
adulto. Em lugar de esperar o tipo de experiência de salvação que foi evidente na
vida do apóstolo Paulo, talvez os filhos dos crentes devessem ser considerados
mais como Timóteo, a quem Paulo escreveu, “e que, desde a infância, sabes as
sagradas letras, que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo
Jesus” (2 Tm 3.15). A salvação para tais crianças pode não ser uma crise na qual
um a decisão específica é feita, mas antes pode ser um processo de treinamento
pelo qual a fé em Cristo (no nível humano) é o resultado natural do ensino. Para
as crianças criadas nUm lar cristão, a fé pode sempre ter sido algo normal em sua
experiência e não o resultado de um a decisão específica. A conversão delas é a
experiência de um processo e não a experiência de uma crise.
254 E nsino e C rescimento E spiritual

]ohn Inchley
Um a quarta abordagem foi proposta por John Inchley em seu livro Kids and
the Kingdom, Inchley afirma;

Eu não posso senão crer que todas as crianças pertençam ao Senhor


antes da idade da razão. Sua pecam inosidade natural está coberta pela
obra e xp ia tó ria de C risto, e seus atos errados, que não foram com etidos
deliberadam ente, podem ser cobertos pela expiação, ainda que ainda não
tenha sido apropriada por um ato de desejo próprio. Eu acredito com certeza
que todas as crianças estão incluídas no grande sacrifício e xp ia tó rio e
pertencem a Jesus C risto até que deliberadam ente o neguem.®

O centro da preocupação de Inchley é que as crianças devem ser vistas de


forma diferente dos adultos e que sua salvação tem de ser entendida de modo
diferente também. Ele se baseia muito no ensino de Jesus de M ateus 18 e 19.
Ali Jesus trata as crianças como se pertencessem a ele. Inchley crê que as
crianças não precisam de uma experiência de crise na conversão, m as que se
são criadas apropriadam ente, de acordo com ensino bíblico, elas crescerão
naturalmente na fé e serão regeneradas pelo Espírito Santo. Inchley continua e
oferece sugestões muito úteis e práticas para o ensino eficaz das crianças.
A força de sua posição é que leva a sério os ensinos de Jesus em referência
ao relacionamento das crianças com o reino de Deus. Encoraja-nos a acreditar
que o reino de fato pertence a todas as crianças e que a alta consideração de
Jesus pelas crianças deve ser respeitada. (Parece importante que enquanto nós
enfocamos o m inistério para as crianças na igreja, Jesus falava do m inistério
das crianças para a igreja.)
A visão de Inchley também fornece uma solução ao difícil problema teológico
(e em ocional) das crianças que morrem antes de nascer (como nos abortos),
no nascimento, ou na infância antes de serem capazes de exercitar a fé salvadora.
A salvação antes da idade da razão é um importante antídoto para o dilema do
pecado original e a depravação total. Faz que a graça de Deus seja preeminen-
te e não a pecaminosidade humana.
A dificuldade dessa visão, no entanto, é com respeito à idade da razão.
Inchley não estipula uma idade específica. Antes, a idade da razão é considerada
aquele m om ento em que as crianças espontaneam ente rejeitam a graça de

‘ John Inchley, Kids and the Kingdom (Wheaton, 111.; Tyndale House, 1976), 33.
A pêndice 255

Deus para si. N o entanto, esse conceito não é especificam ente ensinado nas
Escrituras. Há uma narrativa sobre crianças menores de 20 anos que não foram
responsabilizadas por Deus quando a rebelião de Israel após a saída do Egito
(Nm 14.29). M as também há o caso das crianças do povo de Jericó que foram
mortas junto com seus pais por causa dos pecados do povo (Js 6.21). Portanto,
poderia ser argum entado que a idade da razão é aplicável som ente para os
filhos do povo de Deus, e não a todas as crianças. A idade da razão é um
conceito secundário que deriva de considerações teológicas. N ão é sempre
errado se apoiar numa doutrina derivada ou implícita; a doutrina da Trindade é
tam bém é um a doutrina derivada. M as em bora que a idéia da idade da razão
alivie o estresse emocional a respeito do destino das crianças, ela não é clara­
mente baseada no ensino bíblico.
Um segundo problema com a visão de Inchley está intimamente ligado com
o prim eiro. A base bíblica prim ária para sua posição é o ensino de Jesus em
M ateus 18-19. Está claro que nos versículos do capítulo 18, Jesus está falando
em referência às crianças como um exemplo de hum ildade no reino. M as do
verso 6 em diante, pode-se demonstrar que a expressão “pequeninos que crêem
em m im” não se refere às crianças, mas aos discípulos de Jesus. A preocupação
de nosso Senhor era que seus seguidores não fossem desviados pelos falsos
mestres de Israel. Também, no capítulo 19 Jesus afirma que “dos tais é o reino
dos céus” (v. 14). E dem ais dizer, com base nesses versículos, que todas as
crianças, portanto, são membros do reino até que escolham rejeitar a Cristo. O
máximo que podemos concluir é que o reino pertence à pessoas que são humildes
e confiantes como aquelas crianças. Portanto, ainda que essa visão faça sentido
numa perspectiva puramente teológica, é difícil substanciá-la numa base bíblica.
Jesus certamente era muito aberto às crianças. Ele as valorizava e as usava
como m odelos para como um a pessoa do reino deveria ser. M as parece não
haver garantia para se dizer que todas as crianças pertencem a Cristo.

Ronald Goldman
U m a última abordagem ao problema da evangelização de crianças é basea­
da n u m a p e rs p e c tiv a do d e se n v o lv im e n to . B asead a no tra b a lh o do
epistemologista genético Jean Piaget, refinado por Goldman,^ esta visão enfoca

^Ronald Goldman, Religious Thinkingfrom Childhood to Adolescence (Nova York: Seabury,


1964). Tentativas mais recentes de repetir os estudos de Goldman por John Peatling e mais
tarde por Ruth Beechick não foram convincentes.
256 E nsino e C rescimento E spiritual

o desenvolvimento cognitivo e moral das crianças e argumenta que as capaci­


dades naturais do desenvolvim ento das crianças devem ser consideradas. O
padrão do desenvolvim ento da cognição indica que um a criança não é capaz
de pensar conceitualm ente até a idade de 11 ou 12 anos. Desde que o pensa­
mento religioso requer conceituação, é considerado impróprio esperar que cri­
anças entendam conceitos teológicos necessários para a salvação até que elas
sejam desenvolvimentalmente aptas.
A tarefa do ministério educacional das crianças é fornecer um conteúdo cristão
para suas estruturas cognitivas (isto é, suas categorias de pensam ento), que
mais tarde serão incorporadas em sua estrutura conceituai.
Goldman cria que a Teologia e os interesses religiosos são coisas dos adul­
tos (no sentido em que eles são estruturados e discutidos em linguagem adulta)
e não são realm en te p ro jetad o s p ara a m ente das crian ças ou, m ais
acuradam ente, que a mente das crianças não é projetada para isso. Conceitos
como a santidade de Deus, a pecaminosidade da raça humana, os requerim en­
tos da justiça divina e a morte vicária de Cristo estão além do entendimento das
crianças. Portanto, é m elhor esperar até que a criança seja capaz de entender
essas idéias antes de esperar um a conversão verdadeira.
Goldman faz uma tentativa honesta para integrar as descobertas da pesquisa
psicológica às considerações teológicas. Em vez de ignorar os dados da psico­
logia do desenvolvimento, ele tenta lidar corretamente com suas descobertas.
O fato central é que as pessoas se desenvolvem cognitivamente e moralmente e
que alguns tipos de pensamentos estão desenvolvimentalmente além do alcance
de uma criança. Portanto nós não devemos esperar muito da criancinha, espe­
cialmente na esfera da conceitualização.
Em bora exista muito a ser dito sobre as capacidades durante o desenvolvi­
mento das crianças e as implicações dessas capacidades para a Educação Cristã,
podemos concluir que é impossível para as crianças serem cristãs de verdade?
O assunto gira ao redor da questão do que Deus requer para a salvação. Até
onde é necessário o entendim ento da verdade sugerida para a salvação? As
afimiações da Escritura sempre enfocam a fé (como cognitiva, afetiva e volitiva)
como o ingrediente essencial para a salvação. Conquanto deva haver algum
tipo de base racional para a fé de alguém, fé no sentido bíblico não está atada
som ente a considerações teológicas quanto está atada à pessoa e obra de Je­
sus Cristo. Os dois requerim entos básicos do Evangelho são a renúncia ao
pecado e a confiança em Cristo. Certamente há um aspecto do desenvolvimen­
to desses requerim entos no sentido de que, à medida que as pessoas crescem,
as implicações desses requerimentos se tomarão mais profundas para elas. Mas
A pêndice 257

mesmo uma criancinha é capaz de um certo grau de arrependimento e fé.


A m aioria dos escritores que se preocupam com as questões do desenvolvi­
mento não tem tal posição extremada. A maioria dos desenvolvimentalistas com
interesses teológicos crêem que as crianças de fato podem ser salvas, mas que o
entendimento delas do significado e requerimento de sua salvação passarão por
um processo de desenvolvimento enquanto a criança amadurece cognitivamente.

EM BUSCA DE UMA TEOLOGIA DA


EVANGELIZAÇAO DE CRIANÇAS
H á várias abordagens ao assunto da evangelização das crianças. Cada
um a delas tem pontos positivos e negativos. Quando tom am os os diversos
aspectos — bíblico, teológico e do desenvolvim ento-a respeito desse assun­
to e os integramos num sistema coerente, é fácil injustiçar um ou mais aspec­
tos relacionados entre si. M as há algumas linhas gerais que são úteis para o
desenvolvim ento de um a teologia e prática da evangelização das crianças—
linhas que são com patíveis com as questões bíblica, teológica e da teoria do
desenvolvim ento sobre esse assunto.
Prim eiro, todas as pessoas, incluindo as crianças, são pecadoras e ne­
cessitam de redenção. O pecado de Adão passou para a raça hum ana toda,
de m aneira que todos são culpados diante de Deus. Este ponto é claro na E s­
critura e é a base para a necessidade de salvação para todos os povos, incluin­
do as crianças.
Quando a Escritura descreve toda a hum anidade como estando “debaixo
do pecado” (Rm 3.9), inclui as crianças. No entanto, acom panhanto a graça
de D eus, parece apropriado acreditar que um a criança que m orreu e nunca
teve a oportunidade de exercitar a fé estará com o Senhor, por causa da obra
de expiação de Cristo. Q uando o filho de D avi com B ate-Seba m orreu na
infância, Davi acreditou que a criança tinha ido estar eom Deus (2 Sm 12.22-
23). Tanto a ju stiça de Deus quanto a m isericórdia devem ser consideradas
em relação a este assunto.
Segundo, salvação é pela f é na pessoa do Senhor Jesus Cristo. A fé
salvadora enfoca a pessoa do Senhor Jesus Cristo (opondo-se à idéia de so­
m ente a morte ser em nosso favor) e é expressa pela obediência. Portanto, a
salvação não vem por uma simples oração pedindo o perdão de Deus. É rece­
bida ao colocarm os nossa fé em Jesus tanto para o perdão de nossos pecados
quando para a direção de nossa vida.
Terceiro, as crianças são caracterizadas por uma inclinação natural para
258 E nsino e C rescimento E spiritual

a crença. D entro da natureza de um a criança está um a propensão para crer


(credulidade), que nosso Senhor descreve como de grande valor, e que perm i­
te que as crianças aceitem prontamente o que lhes é ensinado.
Quarto, as crianças são aptas para uma f é de criança no Senhor Jesus
Cristo. Esta linha de pensamento é uma união dos dois últimos. Nosso conceito
da natureza da fé salvadora não precisa ser reduzido simplesmente porque nós
estam os lidando com crianças. Conquanto seja certam ente verdade que as
crianças não podem compreender as implicações totais de suas decisões, elas
podem escolher, no seu próprio nível, colocar sua confiança em Cristo como
Senhor e Salvador. Se as crianças não fossem capazes de ter uma fé salvadora,
seria em vão tentar ensiná-las no caminho do Senhor (Pv 22.6). M as porque a
credulidade está na natureza da criança, faz sentido conduzi-las à fé em Cristo.
Q uinto, a tarefa do ensino é dar form a e conteúdo à credulidade para
que possa ser dirigida para Cristo. Um a das grandes misericórdias de Deus é
que ele criou as crianças para cre­
Se nossos filhos estão crescendo
rem no Evangelho prontam ente.
na fé, não é essencial identificar o
Como resultado, não é difícil con­
momento exato de sua conver­
duzir as crianças para Cristo. O
são. É importante que eles conti­
que é mais difícil é ajudá-las a en­
nuem a crescer em sua caminha­
tender a implicação da fé no senti­
da com o Senhor.
do bíblico. O perigo ao evangelizar
crianças é que nós somos tentados a reduzir a mensagem a um evangelho falso,
que não resulta numa fé salvadora.
A grande alegria de se trabalhar com crianças é que elas muito naturalmente
crêem no que lhes está sendo ensinado. Por causa disso, a tarefa de ensinar não
é onerosa, mas prazerosa. A tarefa deve ser levada a sério, mas a fé (no senti­
do natural) já está presente na criança. Só precisa ser dirigida para o Senhor
Jesus Cristo. Quando um a criança chega à adolescência, a fé natural se torna
m ais em baraçada em seus próprios conceitos, e a tarefa se torna mais difícil.
M as com as crianças, o ensino é sim plesm ente fornecer conteúdo e direção
para a credulidade dada por Deus.
E errado entender a credulidade natural de uma criança como a fé salvadora.
Obviamente sua capacidade de crer é expressa de diferentes maneiras. A cren­
ça no Papai Noel, no coelho da Páscoa e nas fadas são exemplos da fé natural.
Quando nós ensinamos uma criança na fé cristã, nós dirigimos a tendência natu­
ral de crer para crer no Senhor Jesus Cristo.
Sexto, somente o Pai sabe quando uma pessoa é verdadeiramente salva.
Como cristãos em processo, nós podemos tom ar muitas decisões sobre nossa
A pêndice 259

fé em Cristo, mas somente Deus sabe quando a salvação acontece. Durante o


processo de ensino, as crianças são aptas para tom ar um a variedade de deci­
sões em relação a sua fé, especialmente durante o crescimento em seu entendi­
m ento da natureza do Cristianism o. N ós não podem os sempre saber em que
ponto a criança está de fato regenerada, mas nós não temos de saber.
As vezes os crentes com zelo mal orientado insistem em que as pessoas
devem ser capazes de apontar para um tem po específico quando elas assu­
m iram um com prom isso com Cristo. No entanto, se as crianças foram cria­
das para seguir ao Senhor desde pequenas, elas podem não saber quando
especificam ente a regeneração aconteceu. Seus pais podem não ser capazes
de destacar um a decisão, porque as crianças fizeram m uitas decisões refe­
rentes a sua fé cristã. N a realidade, som ente Deus sabe com certeza quando
a fé verdadeira foi exercitada.
E ste ponto é especialm ente im portante quando as im p licaçõ es do
desenvolvimento são consideradas. As crianças de 3 ou 4 anos de idade podem
assum ir um certo tipo de com prom isso com Cristo, que pode ou não ser uma
experiência real de salvação. Se, à medida que crescem, seu compromisso com
Cristo cresce também, então aquela decisão pode ter sido a da sua conversão.
M as pode ser tam bém que elas não tinham um entendim ento real na época e
aquela decisão foi preparatória para sua conversão real quando m ais velha.
Não podemos dizer com certeza sobre uma ou outra situação.
Mas se o ensino é um processo contínuo na vida de nossos filhos, não temos
de dizer quando a regeneração aconteceu. Antes, nós devemos continuar a ser
obedientes à nossa responsabilidade de ensinar as crianças na fé. Devemos
lem brar que nossa tarefa é ensinar, e a de Deus é regenerar. Se nossos filhos
estão crescendo na fé, não é importante que o exato momento de sua conversão
seja identificado. É im portante que elas perm aneçam crescendo em sua
caminhada com o Senhor.
Sétimo, os filhos de crentes são, de uma certa forma, diferentes dos filhos
dos não-crentes. Isso não significa que eles estão automaticamente salvos em
virtude da fé de seus pais, mas significa que o ambiente de um lar cristão e as
orações dos pais e outros em favor da criança são fatores fortes no ensino
espiritual. As crianças que foram objeto de oração mesmo antes de nascerem e
que experim entam a presença de Deus em sua própria casa não são iguais às
crianças que não têm qualquer herança espiritual. Embora as implicações totais
e o significado de 1 Coríntios 7.14 não sejam bem claras, esse texto m ostra
algum tipo de relacionamento entre a fé do pai e a vida espiritual da criança. Por
causa disso, algumas igrejas batizam seus infantes e outras os dedicam ao Senhor.
260 E nsino e C rescimento E spiritual

Ambas as práticas são baseadas no conceito de que pelo fato de essas crianças
terem nascido num lar cristão, elas irão desde cedo, pela misericórdia de Deus,
ser de forma singular separadas como crianças que pertencem ao Senhor.
Essa linha de pensam ento deve afetar aquelas pessoas que trabalham com
crianças. E mais apropriado tratá-las como filhos de crentes e complementar o
ensino que acontece na casa deles. A judá-las a explorar a fé cristã será mais
importante do que tentar conduzi-las a uma outra decisão. Ensino mais do que
evangelismo deve ser o enfoque do ministério para as crianças de pais crentes.
D esde os prim órdios da igreja, o m inistério com as crianças tem sido um
assunto vital. Este interesse chegou até o nosso século, e positivam ente. Mas
infelizmente, às vezes a prática dos educadores cristãos de hoje, especialmente
em relação às crianças, não tem sido tão cuidadosa como poderiam ser. A
medida que a Educação Cristã continua a amadurecer dentro do evangelicalismo,
é im perativo que os envolvidos na área sejam guiados pelos princípios da
Escritura e da boa teologia.
índice de Nomes
A usubel, D avid, 213, 214, 215, Cosgrove, M ark R , 84, 172
217 Devaux, Roland, 28
Bakker, Jim e Tammy Faye , 235 Dewey, John, 120, 133
Bandura, A lbert, 190,192 Durkheim, Emil, 98
Barclay, William, 73,78 Dykstra, Craig, 121, 122,135
Barth, Karl, 165 Edwards, Jonathan, 222
Baxter, Richard, 160, 161, 162, Erikson, Erik, 82, 83 ,1 4 0
167, 168, 209 Fields, Bruce, 237
Bell, M. Robert, 44 Fowler, James, 85, 135, 137,138,
Benson, Warren, 8 139, 141, 144, 145, 146, 147,
Bergman, 176 149, 150
Bergson, Henri, 98 Francke, A ugust Herrmann, 136
Berkhof, Louis, 60, 61 Freud, Anna, 82
Bernard o f Clairvaux, 136 Freud, Sigmund, 82
Binet, Alfred, 99 Fromm, Erich, 85
Bloom, Allan, 159,160 Gerstner, John, 222
Bonhoeffer, Dietrich, 245 Getz, Gene, 51
Briscoe, D. Stuart, 72 Gilligan, Carol, 122
Bruner, Jerome S., 207, 209, 210, Goldman, Ronald, 97, 98, 109,
215 112,255, 256
Busch, Eberhar, 165 Groome, Thomas, 233
Bushnell, Horace, 78, 137, 195, Guyer, Jim, 72
250, 2 5 1 ,2 5 2 H art,D , G., 161
Calvino, João, 70, 73, 212 Elitler, Adolf, 165
Cannell, Linda, 8 Elodge, Charles, 62, 63
Cante, 98, 99 H ood, E. Paxton, 249
Carson, D. A., 30, 40, 158, 159, Inchley, John, 254,255
160 Inhelder, Barbei, 104, 107, 108
Chantry, Walter, 246 James, William, 139
Clark, R obert E., 89 Janet, Pierre, 98, 99
Clouse, Bonnidell, 117 Johnson, Lin, 89
Coe, George A lbert, 198, 199 Jones, Rufus, 40
Coles, Robert, 79 Jung, Carl, 82
Colson, Charles, 77,238 Kant, Immanuel, 8 4 ,1 2 1 ,1 3 9
Comenius, 137 Kennedy, D. Jam es, 227
Cornut, Samuel, 98 King, Rodney, 220
262 E nsino e C rescimento

Kohlberg, Lawrence, 83,120,121, Schweitzer, Friedrich, 136, 139,


122, 123, 126, 186, 129, 131, 146
138, Sell, Charles, 8
145, 175 Shweder, R., 126
Lefrancois, Guy R., 219 Simon, Theophile, 99
Locke, John, 136 Skinner, B. R , 83, 84, 85, 172,
Lutero, M artinho, 71, 136, 140, 173,177
202 Sloat, A lly n K .,8 9
M acArthur, John F., Jr., 246 Smith, Wilford Cantwell, 149
M cCorm ick, Fred, 98, 99 Spencer, Fterbert,
M cKnight, Scot, 237 Sproul, R. C., 52
M achen, J. Gresham, 161 Steineker, Norman, 44
M ahler, M argaret, 139, 176 Stott, Jo h n R . W .,49
Maslow, Abraham, 85 Tarde, Gabriel, 98, 99
Miller, Randolph Crump, 189 Tasker, R. V. G., 40
Moo. Douglas, 73 Tertuliano, 78,79
M unro, H arryC ., 189 Thiessen, Henry Clarence, 52, 53
Murray, John, 74, 75 Thorndike, Edward L., 83
Nelson, C. Ellis, 196 Tillich, Paul, 139,146,147
Niebuhr, FI. Richard, 139,140,146 Vitz, Paul, 121, 122
Ortiz, Juan Carlos, 246 Walters, R., 190
Packer, J. L, 171 Ward, Ted, 8 ,2 5 , 86, 8 9 ,1 2 8 ,1 2 9
Parks Sharon, 135 Watson, John B., 81, 167
Pavlov, Ivan R, 83, 172 Watts, Isaac, 248, 249
Peterson, Lorraine, 184 Westerhoff, John, 190, 195
Piaget, Jean, 85,98, 99, 100,101, Williams, Mason, 200
102, 103, 104, 106, 107, 108, Wilson, Carl, 36
109, Woodbridge, John D., 75
110, 114, 120, 121, 126, 140
Pine, Fred, 176
Platão, 130
Pulaski, Mary Ann Spencer, 99,
105
Rawls, John, 121
Ribot, Theodule, 99
Richards, Lawrence O., 51,97,
190, 196, 229
Rogers, Carl, 85
Rousseau, Jean-Jacques, 99, 136
Índice 263

Assuntos
Aprendizado
a ser cristão, 178-185
definição, 159
evidência do, 27
formal, 228
informal, 229
níveis de, 45
não formal, 229
pelo desenvolvimento lógico, 205-222
processo de, 27, 81, 111-114
teoria de aprendizado social, 189-204

B atism o, 30, 179, 247, 248

C o ra çã o , 17, 20, 21, 22, 39, 49, 57, 60, 61, 69, 72, 111, 119, 126, 127,
137, 162, 174, 180, 181, 183, 184, 202, 205-207, 222, 237, 247, 249

C u lp a , 56, 59, 144, 227, 247, 257

C u rríc u lo , 13, 23

D esenvolvim ento cognitivo


adaptação, 100
equilíbrio, 100
estágios, 102
operações concretas, 105
operações formais, 107
pré-operacional, 103
sensorimotor, 102

D eus
aprendendo sobre, 178-185
caráter de, 5 1 ,6 2 , 112, 143-145
graça, 56, 63, 72
justiça, 54, 57, 61, 110
m isericórdia, 56, 63, 71, 72
264 E nsino e C rescimento

santidade, 51-58, 71, 115


como Criador, 14, 54, 74, 81
glória de, 54
vontade de, 71
ira de,- 57, 74, 110

Educação cristã/ ministério educacional, 13, 25


abordagem social e instrucional, 199, 200
a Escritura é vital na, 75, 76
aspecto relacionai, 28, 31, 46, 47, 176, 190
características da eficiente, 32, 43, 70, 81, 190, 222, 234
como batalha espiritual, 63
como parceria com Deus, 39, 65
experimental, 237, 238
foco da, 17, 18
mal interpretada, 69
objetivo da, 14, 17, 18, 21, 25, 26, 31, 37, 56, 74, 166
oração imperativa na, 65
para adultos, 76
para crianças, 77, 78
tarefa da, 32, 33
visão para, 160

“ E m C ris to ” , 20, 22, 92, 138

Ensino
central, 30, 32, 33, 164
crianças, 108-114
conteúdo do, 32, 33, 47, 113, 114
e pregação, 162, 163, 168
propósito do, 49

E scola d om inical, 13, 33, 105, 183, 187, 189, 231, 233, 245

Escritura
autoridade da, 48, 163, 164
como verdade, 16, 163, 164, 169
conteúdo versus significado, 79
Índice 265

ensinada para crianças, 97, 110


essencial para a santificação, 74, 75, 97
função da, 47-49
necessária para ensinar, 164, 165
revelando a Deus, 14, 69,1 4 7

E s p írito S an to , 18, 23, 30, 31, 75, 84, 92, 111, 135, 200
como agente de m udança, 3 9 ,6 3 ,2 5 1 ,2 5 4
como Espírito da Verdade, 158,159

E v an g elh o , 18, 19, 30, 31, 32, 46, 64, 77, 110, 140, 144, 147, 148, 157,
183, 196, 202, 224, 233, 246, 250, 252, 258
requerimentos do, 256

F é/ C re n ça
características dos professores, 29
como um dom, 23
conteúdo da, 19, 69, 138, 148, 155
crianças capazes de ter, 111,247-260
e obras, 21, 25, 70, 197
estágios do desenvolvimento, 141-145
individual/reflexivo, 143
intuitivo/ projetivo, 141
mítico/literal, 141
primário, 140
sintético/convencional, 142
universalização, 145
essencial para crescer, 56,181
fatores que influenciam, 224-228
maturidade da, 151
natureza da, 19-22, 69, 139, 146, 148, 149
objetivo do ensinamento da, 27
salvação pela, 243, 256
versus credo, 149
versus religião, 198

Filosofia da Educação, 13,16


266 E nsino e C rescimento

Heresia, 20, 32, 69, 200

Igreja, envolvimento necessário, 182, 183

Imagem de Deus
como base para o valor, 57
seres humanos criados à, 57

Maturidade Espiritual
como objetivo da educação cristã, 18, 57 ,1 6 2
definida, 18, 19, 39, 51, 69, 70, 79, 80, 136, 174
ensinamento central da, 164
falso entendimento da, 18

Métodos, 33, 163, 167, 201, 215


de Cristo, 35-49
instrução pública, 26, 161

Moralidade, 174
definição, 115
desenvolvimento da, 117-126
educação do caráter, 117
abordagem cognitiva-desenvolvimentista, 120
comportamento moral, 119
conflito moral, 119
esclarecimento dos valores, 118
e Escritura, 126
e raciocínio, 129
e Teologia, 126-128
em educação, 115
estágios da, 122-126
relatividade da, 155
saber versus fazer, 116

Mudança de vida
arrependimento, 39
envolvida a da renovação da mente, 69
como evidência de aprendizagem, 27
Índice 267

como evidência de maturidade, 70, 71


como objetivo da Educação Cristã, 37, 47

Obediência, 26, 27, 173, 212


como resultado da fé m adura, 2 1 ,2 2 , 180,245
como adoração, 73
condição para conhecer a vontade de Deus, 75
ensinada pelo exemplo, 180
estilo de vida como expressão da, 200
propósito da, 26

Ortodoxia, 20, 69,2 0 0

Pecado
definido, 58-63
extensão do, 60
origem, 58
original, 247

Professor/educador
característica do, 29, 49,114
como exemplo ou modelo, 190-193, 201-204
função do, 25
Jesus como, 29-31,231-234
Paulo como, 31-33
responsabilidade, 29, 64, 9 1 ,9 3 , 224, 230, 258-260

Psicologia
behaviorismo, 83,172
do desenvolvimento, 86
humanista, 85
psicanálise, 82

R ed en ção , 41, 76, 147, 164, 202, 210, 257

R eg e n e ra çã o , 46, 62, 66, 162, 178, 187, 198, 251, 259

S alv ação, 77, 78, 108, 111, 159, 171, 175, 178, 184, 193, 199, 212
268 E nsino e C rescimento

Santificação, 21, 50, 58, 71, 158, 210


como chamado a santidade, 72, 73
processo de, 21
renovação da m ente é requerida para a, 69-80

Temor do Senhor, 54
características dos professores, 28, 29
essencial para crescimento, 56, 179, 180
objetivo do ensinamento, 27

Teologia
da Educação Cristã, 51,63
definida, 15,210
e moralidade, 130
im portância da, 69, 76, 81, 111,256
influenciando a vida, 71,234, 235
popular, 22, 72

Verdade
conhecer a, 15, 110
do am or de Deus, 183-185
experiência como, 223,224
libertando as pessoas, 158,164
necessidade do ensino da, 110, 159
relatividade, 155-158
unidade da verdade, 1 4 ,8 1 ,2 2 3 , 224
viver a, 197

Visão cristã do mundo, 78,178

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