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Revisão de literatura

Enfermos com histórico de Febre


Reumática e suas implicações em
odontologia: uma revisão de literatura
Sick with history of rheumatic fever and its implications in dentistry: a
literature review
Natália Franco Brum*
Flávia Kolling Marquezan**
Patrícia Kolling Marquezan***

Resumo
Objetivo: analisar informações presentes na literatura sobre a citada patologia com enfoque odontológico,
baseando-se em evidências atuais, a fim de estruturar uma conduta clínica, métodos preventivos e terapêu-
ticos. Revisão de literatura: executou-se busca na literatura em dezembro de 2020, por meio dos descritores
pré-estabelecidos, nos bancos de dados LILACS e PubMed/MEDLINE, além de complementações utilizando
o Google Scholar. Foram encontrados 563 artigos, refinados em 10, juntamente ao uso de 3 livros. Conside-
rações finais: a partir dos achados, constatou-se que a realização de uma anamnese criteriosa durante a pri-
meira consulta faz-se imprescindível, por auxiliar na compreensão dos aspectos fisiopatológicos do paciente,
os quais irão determinar o emprego ou não de fármacos, principalmente antes de procedimentos invasivos.
Em contrapartida, verificou-se a negligência desse assunto no âmbito odontológico, pelo fato de existirem
poucos estudos relacionados ao manejo clínico de pacientes com Febre Reumática (FR), sendo necessárias
maiores pesquisas, com o fito de construir-se uma conduta clínica adequada, reduzindo-se os riscos e a in-
cidência de tal enfermidade.

Palavras-chave: Febre Reumática; odontologia; profilaxia dental.

http://dx.doi.org/10.5335/rfo.v26i1.12297

*
Graduanda em Odontologia, Departamento de Microbiologia e Parasitologia, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil.
**
Docente do Curso de Odontologia, Departamento de Odontologia, Universidade Franciscana.
***
Docente em Ciências Odontológicas, Docente Departamento de Microbiologia e Parasitologia, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Rio Grande
do Sul, Brasil.

RFO UPF, Passo Fundo, v. 26, n. 1, p. 113-123, jan./abr. 2021 113


Introdução lhor compreensão da fisiopatologia da doença irá
influir na conduta clínica, bem como na real ne-
A Febre Reumática (FR) apresenta-se como cessidade de fármacos, como vasoconstritores e
uma problemática mundial, tanto no âmbito sa- anticoagulantes, aos enfermos febre-reumáticos,
lutar quanto no social1. A etiologia da doença ain- auxiliando no entendimento de outras doenças
da não é totalmente conhecida, embora se saiba autoimunes, para que, consequentemente, estra-
que há influência de fatores imunológicos indivi- tégias e métodos de prevenção sejam expostos e/
duais, hereditários e ambientais1. Nesse sentido, ou desenvolvidos.
devido à negligência quanto à realização de tra-
balhos relacionados a tal temática, acarretam-se Materiais e métodos
os mesmos impactos da era pré-antibiótica, clas-
sificando-a, atualmente, como um “hotspots”1. Por meio de uma ampla busca na literatura
É de decisão unânime que a FR se caracteri- científica, incluindo todos os delineamentos de
za como uma doença imunológica, inflamatória e estudo (experimentais ou não experimentais) e
que, geralmente, acomete crianças e adolescentes excluindo aqueles que não contemplassem a te-
entre 3 a 19 anos, que apresentem algum fator mática buscada, a presente revisão integrativa
de risco, tais como: sequelas por infecções no tra- de literatura foi realizada, baseando-se, expondo-
to respiratório superior (maltratadas) ou o meio -se e aprofundando-se em conhecimentos científi-
residente, assim como as suas condições1. Assim, cos, para que os resultados tenham aplicabilida-
é ocasionada pela secreção bacteriana de Strepto- de clínica11.
coccus pyogenes (Grupo A), a qual libera células Inicialmente, realizou-se a escolha dos des-
humorais e celulares que, ao evadirem à corrente critores e suas combinações, através do Medical
sanguínea, desencadeiam uma cascata inflama- Subject Headings (MeSH) e dos Descritores em
tória, dando início à Resposta Imunológica (com Ciências da Saúde (DeCS), sendo eles: “Rheu-
vistas à eliminação de tal antígeno)1-3. A doença matic Fever”, “Dentistry”, “Dental Prophylaxis”
pode evoluir para quadros mais graves, bem como e “Practice Management, Dental”, adaptados em
acometer outros órgãos corpóreos, favorecendo outros idiomas, conforme o banco de dados ana-
doenças como a Endocardite Bacteriana (EB) e/ lisado.
ou a Doença Cardíaca Reumática (DCR)1-3-9. A partir disso, desenvolveram-se pesquisas
Dessa forma, a Estomatologia/Semiologia bibliográficas em livros e artigos científicos sobre
urge, ao ser responsável pela semiotécnica, pro- o tema, entre 4 e 7 de dezembro, através das ba-
pedêutica clínica e semiogênese, fazendo-se de ses de dados: Google Scholar, LILACS e PubMed/
extrema importância para a identificação de MEDLINE, agregando aqueles que contivessem
pacientes com histórico/apresentação de FR e a informações relevantes sobre o desenvolvimento
compreensão em relação à conduta clínica a ser da Febre Reumática, assim como as suas impli-
empregada nesses em consultas odontológicas10. cações no âmbito odontológico (manejo odontoló-
O cirurgião-dentista (CD), juntamente ao infec- gico), caracterizando, dessa forma, uma pesquisa
tologista, faz-se muito importante à prevenção qualitativa. A escolha dos trabalhos foi realizada
primária da FR e de seus impactos, por meio da sem critérios de período de tempo, analisando-os
realização de procedimentos que, por exemplo, pelo seu conteúdo, em detrimento do ano de de-
possibilitam analisar as culturas de garganta, senvolvimento/publicação.
servindo como profilaxia ao desenvolvimento de Ao serem realizadas buscas distintas, utili-
bacteremias e até mesmo da FR4. zando os descritores: “Rheumatic Fever”, “Den-
Nesse sentido, por existirem poucos estudos tistry”, “Dental Prophylaxis” e “Practice Manage-
que contemplem o correto manejo clínico odonto- ment, Dental”, juntamente ao operador booleano
lógico a pacientes com histórico de FR e diversas “AND”, na base de dados PubMed, encontraram-
questões a serem discutidas, a presente revisão -se 176 artigos; diferentemente do encontrado no
de literatura foi desenvolvida. Além disso, a me- LILACS, somente 3 artigos, enquanto se visava

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complementar o estudo, usando a busca avança- (fuga do tema) e duplicatas. Com isso, restaram
da, por meio das palavras-chave: “Febre Reumá- 35 estudos, os quais foram analisados e compara-
tica”, “Cirurgião-dentista” e “Manejo odontológi- dos, incluindo-se, ao final, 10 trabalhos que con-
co”, no Google Scholar, encontraram-se 384 tra- templaram o assunto pretendido.
balhos a serem analisados. Visando melhores compreensão, confiabili-
Além disso, utilizaram-se os livros: Terapêuti- dade do processo metodológico empregado e con-
ca medicamentosa em odontologia, Fundamentos clusões consistentes, elaborou-se um fluxograma
de Odontologia: Estomatologia e Manejo odon- (Figura 1), o qual apresenta os números de: arti-
tológico do paciente clinicamente comprometido, gos encontrados (de acordo com a base de dados),
com o fito de obter informações complementares. artigos excluídos pelos critérios de exclusão e os
No que tange à filtração dos artigos, eles fo- incluídos na revisão de literatura.
ram removidos por critérios de título e resumo

Figura 1 – Fluxograma do estudo

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Quadro 1 – Estratégia de busca
Resultados
Banco de Resultados:
Palavras-chave:
dados: (n=562)
Google “Febre Reumática”; “Manejo Odontológico”; Para a amostra final desta revisão, houve a
384
Scholar “Cirurgião-Dentista” leitura crítica dos artigos (títulos, resumos e re-
“Fever, Rheumatic AND Dentistry” 3 moções de duplicatas) e seleção de 10 estudos e
LILACS
“Fever, Rheumatic AND Dental Prophylaxis” 0 3 livros. O Quadro 2 apresenta o processo meto-
“Fever, Rheumatic AND Management, dológico de organização dos achados, em ordem
Dental Practice” 0
alfabética, a fim de que fossem melhores analisa-
“Fever, Rheumatic AND Dentistry” 132
dos e sintetizados.
“Fever, Rheumatic AND Dental
PubMed/ Prophylaxis” 38
MEDLINE
“Fever, Rheumatic AND Management,
Dental Practice” 5
Fonte: autoria própria, 2020.

Quadro 2 – Síntese dos achados


Título Autor/Ano Revista Metodologia
Cardiac murms: echocardiography in the assessment
Estudo observacional
1 of patients requiring antibiotic prophylaxis for dental Ching et al.3 (2005) Aust Dent J
(transversal)
treatment
Conhecimentos e condutas para prevenção da endo-
Estudo observacional
2 cardite infecciosa entre cirurgiões-dentistas e acadê- Rocha et al.7 (2008) Robrac
(transversal)
micos de odontologia
Febre Reumática: doença negligenciada subdiagnosti-
3 Branco et al.2 (2016) Ponto de Vista Revisão de literatura
cada. Novas perspectivas no diagnóstico e prevenção
Infective endocarditis and the heavily restored denti-
4 tion: are clinicians becoming more complacent re- Ahmed e Eliyas (2019) BDJ Relato de caso
garding prevention?
Management of Dental Problems in Patients with
5 Anderson et al.14 (1964) JAMA Revisão de literatura
Cardiovascular Disease
6 Medical conditions affecting dental treatment planning Sutherland (1972) Aust Dent J Revisão de literatura
Acervo Digital UFPR
Terapêutica aplicada à Odontologia: Profilaxia An-
7 Lachowski et al.5 (2019) (Terapêutica aplicada à Revisão de literatura
tibiótica
Odontologia -UFPR)
The bacteremia of dental origin and its implications Med Oral Patol Oral Cir
8 Rosa et al.8 (2014) Revisão de literatura
in the appearance of bacterial endocaditis Bucal
The dentist’s role in the primary prevention of rheu-
Estudo observacional
9 matic fever. Reporto of the Stickney Public Health Franchi et al.4 (1967) JADA
(caso controle)
District’s 3-year dental study on throat cultures
Rheumatol
10 Understanding rheumatic fever Azevedo et al.1 (2012) Revisão de literatura
Int
Fonte: autoria própria, 2020.

doença é diagnosticada em fase avançada (ma-


Revisão de literatura nifestação de Cardite), devido ao fato de estudos
Febre Reumática: contextualização e investimentos tanto públicos quanto privados
serem escassos2. Sendo assim, a perspectiva bra-
São numerosas as doenças classificadas como sileira gira em torno de faringites (infecções bac-
sistêmicas, as quais podem afetar a cavidade oral terianas na garganta), além do aparecimento de
ou, a partir desta, desenvolverem8. Dessa manei- Cardiopatia Reumática (CR), levando ao óbito
ra, geralmente, doenças graves relacionam-se às cerca de 233.000 a 500.000 portadores de FR/CR
válvulas cardíacas2,5,8,12. ao ano, no que tange ao contexto mundial2.
A Febre Reumática e, por consequência, a A FR, ocasionada principalmente em jovens,
Cardiopatia Reumática (CR) são problemas im- decorre como uma doença inflamatória ocasionada
portantes em populações de países em desen- por cepas beta-hemolíticas Streptococcus pyogenes
volvimento, visto que, normalmente, a primeira na fase inicial da faringite, a qual, caso não seja

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tratada, evolui para DCR, degenerando as válvulas o Complexo Principal de Histocompatibilidade
cardíacas1,2,4-6,8,9,12. Entretanto, também há evidên- (MHC) será fundamental à progressão da doença,
cias de DCR sem a ocorrência de Febre Reumática, visto que as células apresentadoras de antígeno
em que foi desencadeada Endocardite ou Miocardi- (macrófagos, células dendríticas e linfócitos B)
te, por meio de defeitos na válvula mitral e/ou aór- apresentam o invasor através do MHC de classe
tica do ventrículo esquerdo, que podem progredir II aos linfócitos T, diferenciando-se em Linfóci-
para Insuficiências Cardíacas Congestivas5,8,9. tos TCD4+, perfil TH1 e TH21. Essas células li-
berarão citocinas como o Fator Necrose Tumoral
Febre Reumática: fisiopatologia (TFN) e Interleucinas (IL), principalmente a IL-1
e IL-1beta, que culminarão em diversas respostas,
Apesar da relevância da cepa bacteriana ao
como a potencialização da Resposta Imunológica
desenvolvimento da doença, discutem-se demais
Inata, ao amplificar a ação do macrófago, culmi-
fatores relacionados à etiologia da FR, visto que
nando na intensificação da resposta inflamatória
esse aspecto por si só não é o responsável pela sua
e no desenvolvimento de sequelas teciduais1.
ocorrência, como: os meios intrínsecos (herança
genética), que induzirão aos aspectos adquiridos
Febre Reumática: importância
(ambientais), fazendo com que, em conjunto, in-
odontológica
centivem-se manifestações diversas, através de
Respostas Autoimunes com sintomas variados, Nesse contexto, a consulta inicial ao CD fa-
uma vez que tais manifestações também depen- z-se extremamente importante ao paciente e ao
dem da causa suscetibilizada à doença, ou seja, profissional, necessitando ocorrer de forma cui-
da cepa de Streptococcus que interagirá com os dadosa, individual e responsável, uma vez que, a
antígenos HLA1. partir dela, será possível obter informações acer-
Inicialmente, ao ser ativado o Sistema Imuno- ca da saúde geral do paciente e traçar o seu per-
lógico, será desenvolvida a Resposta Imunológica fil, compreendendo-se quais procedimentos/tra-
Inata, a qual recrutará células (como: macrófa- tamentos poderão ser empregados na clínica, já
gos, células dendríticas, neutrófilos) aos locais de que este estará sob cuidado do profissional1,6,10,13.
infecção, buscando reconhecer o antígeno e esti- Por muitos pacientes apresentarem doen-
mular Respostas Imunológicas Adaptativas, que, ças com alto índice de mortalidade e morbidade,
por serem mais rápidas, apresentarão o antígeno como as cardiovasculares, exige-se maior atenção
e liberarão citocinas, ativando a cascata comple- quanto à realização dos tratamentos odontológi-
mento e a produção de anticorpos1. cos que deverão ser condizentes ao estado salutar
Os componentes celulares da bactéria ocasio- dos citados3,4,9,12-14. Dessa forma, torna-se impres-
nadora da FR, como peptídeoglicanos e lipoproteí- cindível que o CD tenha conhecimento quanto às
nas, interagem com o Sistema Imunológico, atra- enfermidades como a FR, para que haja a com-
vés, por exemplo, dos receptores Toll-Like (TLRS) preensão acerca da importância da multidiscipli-
da Imunidade Inata, os quais, ao mediarem infla- naridade em saúde entre cardiologistas e dentis-
mações contra antígenos, fazem com que o TLR-2 tas (assim como as demais profissões), devido à
interaja com estes1. Ademais, a Lectina de Liga- grande abrangência do assunto4,12-14. Para isso,
ção à Manose (MBL) reconhece as ligações e eli- logo na primeira consulta do paciente, deve ser
mina patógenos, ao se ligar aos imunopeptídeos, realizada a semiografia, contendo todas as in-
como N-Acetilglucosamina1. Ainda relacionada à formações do paciente (devendo ser atualizada
Resposta Imunológica Inata, há a codificação de a cada consulta)7. A partir dela, o exame clínico
Ficolinas (FCN), que formalizam uma ligação por será dividido em: fase subjetiva (anamnese) e
meio da Ficolin-2 às lipoproteínas constituintes fase objetiva (física)7.
dos Streptococcus1. Durante a anamnese inicial, são realizados
Logo após ocorrer o desencadeamento da Res- questionamentos que buscam obter o maior nú-
posta Imunológica Inata, há o acionamento do mero possível de informações acerca do paciente,
Sistema Imunológico Adaptativo1. Nesse viés, como histórico de doenças e estado de enfermida-

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des atuais, hábitos, tratamentos médicos e ante- de estresse, nas quais, caso o paciente não se
cedentes hereditários, permitindo que o CD deli- sinta confortável, o Sistema Nervoso Simpático
neie o perfil do paciente, para atendê-lo de forma secreta 40 vezes mais Catecolaminas (Epinefri-
segura, de acordo com as suas necessidades10,13. A na e Noradrenalina), do que comparado aos ní-
partir dos dados fornecidos na anamnese, é possí- veis basais, atingindo maiores níveis sanguíneos
vel enquadrar o paciente em uma das categorias do que quando comparado ao uso de tubetes de
do sistema de classificação Physical status (ASA- Epinefrina (1:50.000) durante procedimentos
-PS) de acordo com as comorbidades que apre- odontológicos1. Dessa forma, a demanda que so-
senta e direcionando a conduta odontológica13. fre de problemas cardiovasculares pode ter maio-
Geralmente, enfermos com FR classificam-se em res comprometimentos e predispor ao Acidente
ASA II, ASA III, ASA IV ou ASA V (dependendo Vascular Encefálico (AVC) durante tratamentos
da gravidade da doença). Findada a anamnese, clínicos envolvendo tal parcela populacional1. A
é indispensável a realização do exame físico, no busca pela redução da liberação endógena de Ca-
qual serão observadas as características físicas tecolaminas, por meio de sedação mínima e téc-
de cabeça e pescoço do paciente, para a mais com- nicas psicológicas, aparece como solução viável e
pleta e adequada ficha clínica10. notável frente ao uso de soluções anestésicas sem
A partir do reconhecimento do paciente com vasoconstritor1.
FR pelo CD, induzir-se-á ou não à prescrição de A correta identificação de pacientes realiza-
certos tratamentos medicamentosos, como a pro- da no correto exame clínico (anamnese + exa-
filaxia antibiótica (PA), necessários durante pro- me físico) constitui-se como ponto chave em um
cedimentos complexos ou em casos de pacientes profissional qualificado, uma vez que é grande a
de risco e em terapias de alto risco7,12. Por isso, porcentagem de pacientes que vão ao consultório
torna-se imprescindível alertar a família da im- odontológico e apresentam Doenças Cardíacas
portância do fornecimento correto dos dados, (DC)3. Além disso, aos pacientes com histórico de
visto que a o uso descontrolado da PA acarreta FR, a partir do tipo e da extensão desta, devem
reações adversas e, da mesma forma, seu desuso ser propostos tratamentos dentários condizentes
quando necessário representa riscos ao desenvol- às necessidades, ou seja, febre-reumáticos com
vimento de bacteremias durante os tratamentos7. envolvimento cardíaco mínimo, há pouca preocu-
Depreende-se que a Odontologia vai muito pação com o uso de anestésicos locais contendo
além do quesito boca, por ser responsável pelo drogas vasoconstritoras, mas, para os que abran-
diagnóstico e/ou desenvolvimento de diversas gem defeitos cardíacos, a atenção deve ser am-
patologias, como a FR. Assim, há necessidade de pliada9,13.
maior multidisciplinaridade em saúde, com en- No que condiz ao manejo clínico odontológico,
caminhamentos de relatórios dos pacientes dos quanto ao uso de soluções anestésicas em pacien-
diversos departamentos, além da importância da tes portadores de Doenças Cardiovasculares e/
literatura para a compreensão desta4. Por meio ou Febre Reumática, o uso dos vasoconstritores
do trabalho retratado no artigo de Franchi et al. é muito questionado, uma vez que se sabe que
(1967), percebe-se que a Odontologia se destaca a Epinefrina, por ser um agonista adrenérgico
como uma das profissões contribuintes à preven- de ação direta, atua como um potente vasopres-
ção da FR, a qual, por meio de seus conhecimen- sor, ao se ligar aos receptores β1, proporcionan-
tos e suas práticas clínicas, contribui para a inte- do, por exemplo: cronotropismo e ionotropismo
gralidade do paciente4. (dependendo da dose/via administrada), efeitos
os quais podem comprometer não só o coração,
Febre Reumática e o manejo mas também o Sistema Nervoso Central1,10,12. Em
farmacológico odontológico anestesias, o uso de vasoconstritores em eleva-
das concentrações, aumentaria a pressão arterial
A importância de manter o paciente seguro e
de pacientes com Doenças Cardiovasculares9,12.
confiante frente aos procedimentos odontológicos
Além disso, a administração dos inibidores de
muito pode ser explicada por meio das situações

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saliva aos enfermos que contenham problemas e aórticos, sendo utilizada, geralmente, com Pri-
cardiovasculares deve ser muito restrita, já que locaína9.
podem induzir à taquicardia12. Nesse sentido, depreende-se que, ao serem
Geralmente, usa-se a Penicilina, conforme o administrados anestésicos locais em pacientes
Comitê de Prevenção da Febre Reumática e En- com DC, deve ser avaliado o histórico médico
docardite Bacteriana da Associação Americana do completo do caso obtido, verificando-se a gravi-
Coração, sendo a anestesia local em procedimen- dade da doença, se faz uso de medicamentos crô-
tos injetada lentamente, com quantidades peque- nicos, e administrá-los de forma lenta (2 ml/min),
nas de vasoconstritores juntamente ao anestésico após realizar pré-medicação adequada, visando
de escolha, uma vez que se apresenta perigosa aos minimizar a descarga de Adrenalina endógena,
pacientes cardiopatas (vasoconstritores podem tendo cuidados especiais ao seguir os protocolos
resultar em complicações ou óbitos)12. Na mesma da American Heart Association (AHA)9.
interpretação, injeções intra-arteriais provocam
branqueamento da área, enquanto reações às Febre Reumática: uso de profilaxia
anestesias locais podem ocasionar depressão no antibiótica (PA)
Sistema Nervoso Central, crises hipertensivas e
Uma das maiores questões acerca do manejo
até mesmo isquemias cardíacas12.
odontológico aplicado a pacientes com comprome-
O uso de vasoconstritores é tido como nor-
timentos como a FR é quanto à administração da
mal em Odontologia, juntamente aos anestési-
PA, uma vez que, por meio de seu uso, tenta-se
cos locais, por limitar as taxas de absorção dos
evitar infecções, ao mesmo tempo, sua efetivida-
últimos12. No entanto, quando empregados em
de não é totalmente comprovada3,6. Além disso,
pacientes com DC, as concentrações devem ser
a PA empregada de maneira exacerbada faz com
modificadas, usando: Epinefrina (1: 50.000 a 1:
que bactérias cada vez mais resistentes sejam
250.000), Levarterenol (1: 30.000), Levonorde-
formadas e, ao mesmo tempo, incluam-se efeitos
frina (1: 20.000) e Fenilefrina (1: 2.500); e o uso
adversos, choques anafiláticos e distúrbios cor-
destes em gengivas retraídas torna-se perigoso
póreos, como gastrointestinais8. Ademais, devido
e deve ser evitado12. Além disso, procedimentos
à inexistência de evidências que demonstrem a
devem ser evitados pelo menos 3 meses após o
eficiência da PA para prevenção da EB, analisa-
paciente ter um ataque coronário e, caso necessi-
-se que esta é responsável por mortes por reações
te de tratamentos emergenciais, estes devem ser
anafiláticas a antibióticos, 5 a 10 vezes mais co-
mínimos12.
muns do que infecções por EB, além da hipersen-
Por meio da medula da glândula adrenal, no
sibilidade3,8.
Sistema Simpático, libera-se a amina Adrenalina
Conforme Ching et al.3 (2005), 72% dos pa-
para ser utilizada como vasoconstritor durante
cientes em seu estudo tinham sopro no coração
soluções anestésicas, uma vez que essa, ao au-
e usavam antibióticos para tratamento dentário
mentar a taxa de saída e dilatar artérias coroná-
(mesmo com coração normal), para não corre-
rias, produz a vasoconstrição periférica das veias
rem risco de EB, mas apresentavam risco para
do sangue9. A amina Noradrenalina também oca-
alergias devido à terapia empregada, visto que a
siona efeitos semelhantes aos possibilitados pela
taxa de alergia a antibióticos do tipo Penicilina
Adrenalina, porém o aumento da pressão arterial
é 3% para reações alérgicas (tipo urticariforme),
devido à vasoconstrição periférica é associado à
ocasionando como resultado morte em 10% dos
redução da frequência cardíaca, por isso se faz
pacientes com anafilaxia, além do risco de desen-
menos eficaz quando comparada à adrenalina em
volver cepas resistentes3.
mesma concentração9. Entretanto, a Felipressi-
Através dos resultados obtidos pelos médicos,
na, secretada pela glândula pituitária posterior,
pelo Ecocardiograma, aplica-se ou não a PA a pa-
causa a vasoconstrição de todas as partes do
cientes que indicam que têm sopro no coração ou
sistema cardiovascular, reduzindo a frequência
que apresentam histórico de FR3, e, quando ocor-
cardíaca, através dos barorreceptores carotídeos
re o seu emprego (PA) em tratamentos dentários,

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as consultas devem ter espaço de 2 semanas e o Comumente, Staphylococcus, Streptococcus
tratamento deve ser interrompido de 3 a 4 dias, e Enterococcus, pertencentes ao Grupo viridans,
caso use outros antibióticos8. são os mais favoráveis agentes da EI, uma vez
que podem provir de hábitos cotidianos (masti-
Febre Reumática e demais associações gação e escovação), conhecida como bacteremia
patológicas transitória, por meio de procedimentos dentários,
bacteremia induzida ou até mesmo acesso intra-
A FR encontra-se amplamente relacionada à
vascular com agulhas, em que as cepas penetram
Endocardite Infecciosa (EI) e vice-versa, por mos-
através destas8. O perfil clínico de EI apresenta-
trar-se uma doença rara mais comum em pessoas
-se, principalmente, com pigmentações claras na
em idade avançada e por apresentar difícil trata-
pele, dores nas articulações e lesões cardíacas,
mento, dá-se ênfase à prevenção em meios odon-
sendo que, ao decorrer, mostram-se sopros car-
tológicos, visto que, pela microbiota oral apre-
díacos, infecções ou danos em órgãos; assim, a
sentar muitos microrganismos e estes, fatores de
libertação de êmbolos pode levar à morte súbita,
virulência, torna-se uma provável irradiadora de
devido ao AVC8.
tal doença, devido à FR5-8,12,14.
A grave dúvida surge pelo fato de que a maio-
A EI caracteriza-se como uma grave doença
ria dos enfermos com EI não foi submetida a
ocasionada por diversos microrganismos (fungos,
procedimentos salutares, portanto não há nítida
vírus ou bactérias), os quais advêm de bactere-
correlação de bacteremias pós-procedimentos e
mias bucais cotidianas e, também, procedimentos
ocorrência da EI, não se sabendo a magnitude do
odontológicos invasivos, aderindo à superfície en-
inóculo e o tempo necessário para a colonização
dotelial do coração ou das valvas cardíacas, prin-
do endocárdio1. No entanto, o risco da EI é maior
cipalmente, em locais próximos a defeitos cardía-
em bacteremias decorrentes da má saúde bucal
cos (congênitos ou adquiridos)6,8, sendo como uma
(infecções e hábitos), quando comparado aos pro-
das causas mais comuns de defeitos valvares ao
cedimentos odontológicos1. Por isso, deve haver
acometer uma das camadas, denominada endo-
antissepsia e assepsia prévia a procedimentos
cárdio4-8.
odontológicos, evitando-se o número mínimo de
Por meio, principalmente, de processos coti-
casos de EI, através da PA prévia aos procedi-
dianos, como o uso do fio dental, os microrganis-
mentos, embora seja provável que os riscos de
mos penetram a corrente sanguínea e dão início
efeitos adversos de antibióticos (administrados
à Resposta Imunológica, a qual estimulará o de-
de forma indiscriminada) excedam o benefício da
pósito de plaquetas/fibrinas, colonização bacte-
profilaxia, visto que houve casos de EI mesmo
riana e formação/disseminação de vegetações ao
após o uso de antibióticos, não se tendo, assim,
restante do corpo1.
absoluta segurança para não empregar antibióti-
Devido à infecção ser expressa de diversas
cos na prevenção de doenças1,6.
formas, pode ser diagnosticada por meio de exa-
Atualmente, consoante a AHA, para que se
mes adicionais, como a regra de títulos baixos de
previna a EI, recomenda-se a PA em condições
Anticorpos Antiestreptolisina O (ASO), em que
como: valva cardíaca protética/material de repa-
identifica infecções Streptocóccicas8.
ro de válvula; histórico de EB prévia; valvopatia
A EI apresenta-se como uma doença ocasiona-
em paciente transplantado; doenças cardíacas
da por bacteremias orais, que afetam diversos ór-
congênitas (cardiopatia congênita não corrigida,
gãos e em que, caso haja baixa incidência, o risco
corrigida com material protético ou corrigida que
de morte é elevado8. Geralmente, desenvolve-se
evoluiu com defeito residual), além de todo pro-
em válvulas cardíacas previamente danificadas,
cedimento que envolva manipulação de tecidos
como válvulas mitral e aórtica3,8, apresentando-
gengivais/região periapical da mucosa oral1,6. No
-se mais vulnerável quando houver presença de
entanto, o que não requer: técnicas de anestesia
endocárdio afetado ou alta carga bacteriana san-
em tecidos não infectados, radiografias, apare-
guínea8.

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lhos protéticos, esfoliação de dentes decíduos e entre as sessões, evitando a seleção de bactérias
sangramento da mucosa devido a trauma1,6. resistentes). Ademais, é imprescindível reforçar
Dessa forma, os protocolos terapêuticos de técnicas de higiene bucal e indicar bochechos de
uso da PA, segundo a AHA, baseiam-se, primor- Clorexidina (0,12%) para uso contínuo1.
dialmente, no uso de 2 gramas de Amoxicilina via
oral em adultos, enquanto para crianças, a dose Febre Reumática: diagnósticos e
é de 50 miligramas/quilogramas de Amoxicilina prevenção
via oral6. Entretanto, aos incapazes de ingerir
Com o fito de detectar casos de FR, empre-
medicação oral: 1 grama/2 gramas de Ampicilina
ga-se, no âmbito médico, o Ecocardiograma em
ou Cefazolina/Cefriaxona em adultos, enquanto
todas as suas fases, sendo que, na área odontoló-
aos alérgicos à Penicilina/Ampicilina: 2 gramas
gica, por meio de exames sorológicos, podem ser
de Cefalexina/Clindamicina; já aos alérgicos à
identificados anticorpos para o agente etiológico
Penicilina/Ampicilina e incapazes de ingerir me-
da FR (Streptococcus do grupo A de Lancefield) e,
dicamentos orais, indica-se: Cefazolina/Cefriaxo-
assim, permitir-se o acompanhamento do quadro
na/Fosfato de Clindamicina (1h IM ou IV e 600
infeccioso, a partir da análise de enzimas, como:
mgIM ou IV)1,6. No que concerne às crianças:
antiestreptolisina O, anti-Dnase B, hialuronida-
sempre se indica o uso de 50 miligramas por qui-
se, estreptocinase e NADase, as quais, quando
lograma de Penicilina, exceto quando forem alér-
estão quadruplicas do seu valor normal, confir-
gicas, devendo-se utilizar: 500 miligramas/600
mam a presença da citada patologia10. Além dis-
miligramas de Cefalexina ou Clindamicina, res-
so, testes laboratoriais, como de Hemocultura,
pectivamente, 15 miligramas/quilogramas e 20
Hemograma Completo, Contagem Diferencial,
miligramas quilogramas6.
Eletrólitos e Raio X, utilizados no diagnóstico e
A prevenção da EI não se restringe à antibio-
no tratamento da EI, também auxiliam a identi-
ticoterapia, compreende também o protocolo de
ficar a presença e a progressão desta e se está ou
atendimentos de pacientes suscetíveis, em que,
não relacionada à FR6.
segundo a área de Farmacologia/Anestesiologia/
Na mesma perspectiva, usa-se a asculta coro-
Terapêutica da FOP-Unicamp, deve-se realizar:
nariana, através do estetoscópio, o qual não qua-
anamnese, avaliação dos sinais vitais, classifica-
lifica/quantifica a gravidade da lesão3. Por isso,
ção em ASA, análise da região a ser tratada (o
são utilizados outros métodos, como Doppler, Eco-
tipo, a extensão do procedimento e a presença de
cardiograma e imagem de fluxo em cores, por se-
quadro infeccioso)1.
rem métodos não invasivos e mais precisos, que,
A partir disso, deve-se referenciar ao cardiolo-
quando combinados com a asculta, permitem com
gista sobre o procedimento a ser realizado, usan-
precisão analisar a presença/ausência da doença
do-se a sedação mínima (anestesia com pequenos
valvar cardíaca e as características do fluxo de
volumes de solução de Epinefrina, entre 1:000.000
sangue pelo coração3.
a 1.200.000 ou Felipressina)1. Logo, aguarda-se
A identificação do sopro cardíaco é de gran-
a avaliação do cardiologista, investigando se há
de significância para avaliar o risco de bactérias
zonas de sobrecarga do endocárdio, que possam
para EI, visto que, quando há fluxo turbulento,
conter agregados de plaquetas ou fibrina que fa-
existe um risco aumentado para que bactérias
cilitem a adesão bacteriana, classificando-o de
colonizem plaquetas e agreguem-se nas válvu-
alto/baixo risco para EI1. Após, planeja-se o tra-
las, principalmente se estiverem danificadas,
tamento sobre a mesma cobertura antibiótica e
por isso a importância de ver a necessidade de
com mais procedimentos, seguindo o protocolo da
PA ao paciente com sopro cardíaco (benigno ou
AHA, além de se certificar que o paciente tomou
maligno)3.
a prescrição1. No consultório odontológico, em
Devido ao fato de 50% a 60% das infecções com
cada sessão, realiza-se bochecho de Clorexidina,
Streptococcus spp. serem leves, de difícil diag-
para reduzir as bacteremias e evitar traumatis-
nóstico e afetarem, principalmente, crianças, as
mos desnecessários (tendo intervalo de 10 dias

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quais mantêm consultas regulares ao cirurgião- Conclusões
-dentista, a cultura de garganta urge como uma
forma profilática e até mesmo de diagnóstico de Percebe-se, na literatura, escassez de co-
FR em consultórios odontológicos, uma vez que a nhecimentos e práticas dos cirurgiões-dentistas
detecção de tal patógeno ocorre dentro de 24 ho- quanto à FR. Entretanto, para que haja o corre-
ras4. Esta, por ser viável e facilmente executada, to manejo clínico odontológico em pacientes com
por necessitar somente de um cotonete, além de FR, deve ser feita a avaliação dos pacientes de
mostrar-se com diversas potencialidades, desta- forma eficaz (anamnese), dando destaque, prin-
ca a importância: do conhecimento do cirurgião- cipalmente, àqueles que apresentam histórico
-dentista acerca das vias respiratórias superiores de FR ou complicações coronarianas, além de o
e do bom relacionamento entre médicos-dentistas profissional apresentar conhecimento prévio das
(integralidade do paciente)4. Ademais, isso serve principais desordens coronarianas e as suas com-
como forma educativa aos pais, por manifestar plicações/sequelas, para que as consultas sejam
que a cultura de garganta auxilia tanto em casos planejadas de acordo com as características indi-
leves de infecções respiratórias como em casos viduais e para que não haja resultados indesejá-
graves, em doenças4. veis. Deve-se planejar consultas clínicas de acor-
Pacientes portadores de qualquer insuficiên- do com o risco individual preestabelecido (preferi-
cia cardíaca devem receber sedação pré-anestési- velmente, curta duração), que, visando reduzir os
ca, visando acalmar a preocupação e minimizar níveis de estresse e ansiedade, usem estratégias
aumentos da pressão arterial durante os proce- e medicamentos antiansiolíticos como sedação
dimentos dentários12. Emprega-se, geralmente, complementar.
Pentobarbital ou Secobarbital, em dosagens de No que concerne ao uso de PA em pacientes
30 mg a 100 mg para adultos, entretanto, a re- febre reumáticos durante procedimentos, perce-
ceita deve ser individual, uma vez que podem ser be-se que muito é questionado, pelo fato de não
desenvolvidas reações paradoxais a estas, que po- haver comprovações suficientes de que ela con-
dem interagir ou não a medicamentos utilizados trola bacteremias, mas, sim, de que pode provo-
anteriormente12. A pré-medicação deve ser reali- car efeitos adversos superiores aos benefícios,
zada na sala de espera, 45 minutos antes do pro- como reações alérgicas. O maior destaque é quan-
cedimento cirúrgico12. to à importância dos cirurgiões-dentistas na pre-
Quanto ao prognóstico, geralmente 60% das venção primária à FR, principalmente em estra-
crianças sobrevivem à fase aguda da FR, desen- tégias de promoção de saúde, uma vez que esses
volvendo, posteriormente, danos cardíacos, sem profissionais podem realizar testes de culturas de
Insuficiência Cardíaca8. Comumente, a válvula gargantas aos pacientes que apresentam históri-
mitral é a mais afetada, observados seus defeitos co de tal patologia e, dessa forma, encaminhá-los
através do sopro cardíaco, também podem ocorrer ao infectologista, para que sejam tomadas as me-
estenose, insuficiência valvar ou aumento do co- didas cabíveis.
ração, identificados radiograficamente pelo Ele- Ademais, a fim de que ocorra redução na in-
trocardiograma8. cidência de enfermos com FR, fazem-se necessá-
Por fim, com relação ao exposto, considera-se, rias, por meio dos serviços básicos de saúde, es-
no âmbito odontológico, a importância de consul- tratégias conduzidas aos indivíduos ditos do gru-
tas regulares ao cirurgião-dentista e a manu- po de risco, além de informar aos usuários sobre
tenção de boa saúde bucal, visto que 14% a 20% as doenças (quadro clínico básico e profilaxia),
dos casos de EI são ocasionados pela má higiene promovendo, dessa maneira, diagnósticos e tra-
bucal (negligência) em grande porcentagem de tamentos precoces aos enfermos que contenham
pacientes, sendo que não existem evidências de o grupo A de Streptococcus, com vistas a preve-
que métodos de higiene oral promovam risco à nir o desenvolvimento da FR. Além disso, deve-se
saúde8. priorizar injeções contendo Penicilina Bezzatina
(já que o uso de antibióticos orais como Profilaxia

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Secundária não se faz tão eficiente) e destacar o 7. Rocha LMAD, Oliveira PRD, Santos PB, Jesus LAD, Stefani
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mnesis during the first consultation is essential,
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as it helps to understand the patient’s pathophy- 187(11):848-9.
siological aspects, which will determine the use
of drugs, mainly, before invasive procedures. On
the other hand, this matter was neglected in the
Dental field, due to the fact that there are few stu-
Endereço para correspondência:
dies related to the clinical management of patients
with Rheumatic Fever (RF), and further research is
Patrícia Kolling Marquezan
necessary, with the aim of building an adequate Department of Microbiology and
clinical conduct, reducing the risks and the inci- Parasitology – UFSM
dence of such a disease. Av. Roraima, 1000, Camobi, Prédio 20,
Sala 4236
CEP 97105-900 – Santa Maria, RS, Brasil
Keywords: Rheumatic Fever; dentistry; dental pro- Telefone: (55) 55-999025178
phylaxis. E-mail: patimarquezan@hotmail.com

Recebido: 10/02/2021. Aceito: 03/03/2021.


Referências
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RFO UPF, Passo Fundo, v. 26, n. 1, p. 113-123, jan./abr. 2021 123

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