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TURBILHÃO DE VENTANIAS

E FARRAPOS, ENTRE BRISAS


E ESPERANÇARES
Michèle Sato
Giseli Dalla Nora
(Organizadoras)
Comissão científica

Prof.ª Dr.ª Araceli Serantes Pazos


Universidade da Coruña – UDC (Galícia, Espanha)
Prof.ª Dr.ª Bárbara Yadira Mellado Pérez
Universidad do Oriente - UO (Cuba)
Prof. Dr. Celso Sánchez-Pereira
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – Unirio
Prof. Dr. Edgar Gonzales
Universidad Veracruzeana – UV (México)
Prof.ª Dr.ª Elni Elisa Willms
Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT
Prof.ª Dr.ª Fátima Elisabeti Marcomin
Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL
Prof.ª Dr.ª Giseli Dalla-Nora
Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT
Prof.ª Dr.ª Giselly Rodrigues das Neves Silva Gomes
Secretaria de Estado de Educação – SEDUC
Prof. Dr. Heitor Medeiros
Universidade Católica Dom Bosco - UCDB
Prof. Dr. Irineu Tamaio
Universidade de Brasília – UnB
Prof. Dr. Marcos Sorrentino
Universidade de São Paulo – USP (ESALQ)
Prof.ª Dr.ª Michèle Sato
Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT
Prof. Dr. Pablo Meira
Universidade de Santiago de Compostela -USC (Galícia, Espanha)
Prof.ª Dr.ª Rachel Trajber
Centro de Controle e Monitoramento de Acidentes e Desastres Naturais – CEMADEN
Prof. Dr. Ramiro Valera Camacho
Universidade de Estado do Rio Grande do Norte – UERN
Prof.ª Dr.ª Regina Silva
Universidade Federal de Rondonópolis – UFR
Prof. Dr. Ronaldo Eustáquio Feitoza Senra
Instituto Federal de Mato Grosso – IFMT
Prof.ª Dr.ª Solange Ikeda
Universidade de Estado de Mato Grosso – UNEMAT
Prof. Dr. Victor Marchezini
Centro de Controle e Monitoramento de Acidentes e Desastres Naturais – CEMADEN
Michèle Sato
Giseli Dalla Nora
(Organizadoras)

TURBILHÃO DE VENTANIAS
E FARRAPOS, ENTRE BRISAS
E ESPERANÇARES

Cuiabá - MT
2021
Copyright © 2021 Michèle Sato, Giseli Dalla Nora (organizadoras).
Os autores são expressamente responsáveis pelo conteúdo textual e imagens desta publicação.
A reprodução não autorizada desta publicação, por qualquer meio, seja total ou parcial, constitui violação da Lei nº9.610/98.
Publicação do Grupo Pesquisador em Educação Ambiental Comunicação e Arte – GPEA.

Ficha Catalográfica
Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecária: Elizabete Luciano/CRB1-2103

S253t Sato, Michèle.

Turbilhão de Ventanias e Farrapos, entre Brisas e Esperançares. Michèle Sato;


Giseli Dalla Nora (organizadoras.). Cuiabá MT: Editora Sustentável, 2021.
Formato Ebook).
520p.
ISBN: 978-65-87418-16-2

1.Educação Ambiental. 2.Aurora e Crepúsculo do Capitaloceno. 3.Educação para Construir


Sociedades do Bem Viver. 4.Liu Arruda e o Teatro: contribuições à educação ambiental e à justiça
climática. 5.Injustiça Ambiental e Climática no Quilombo de Mata Cavalo e Comunidade do
Chumbo, Mato Grosso – Brasil. 6.A seca e a enchente: Educação Ambiental de base comunitária
e Justiça Climática no Vale do Jequitinhonha.
CDU 37:504

Produção Executiva
GFK Comunicação
Produção Editorial
Editora Sustentável
www.gfk.com.br
Capa
Eichwaldmond (Áustria), “Gênese na água”
Revisão
Cirlene Ferreira

www.editorasustentavel.com.br

Apoio Realização

REAJA
Sumário

Aurora e Crepúsculo do Capitaloceno........................................................ 9


Michèle Sato

Formação e Comunicação no Contexto do Colapso Climático............... 18

Educação para construir Sociedades do Bem Viver............................... 19


Ivo Poletto
De la alfabetización climática a la necesidad de la educación para
el cambio climático: Estado actual y retos en el alumnado de la
Universidad de Santiago de Compostela............................................... 39
Pablo Ángel Meira Cartea
Antonio García Vinuesa
A percepção dos alunos do PIBIC/EM sobre as Mudanças Climáticas:
Reflexões sobre o papel da escola frente aos problemas ambientais
contemporâneos..................................................................................... 86
Alexandre Fagundes Cesário
Giseli Dalla-Nora
Débora E. Pedrotti-Mansilla
Aprendizaje social y educación ambiental desde la promoción de salud
como práctica educativa: Estudios de caso en escuelas de Brasil y Cuba....97
Bárbara Yadira Mellado Pérez
Pedro Roberto Jacobi
Maria Aparecida Pimentel Toloza Ribas
Compreensões de Justiça Climática na formação de professores:
Estudo de caso na Estação Ecológica de Águas Emendadas,
Planaltina - Distrito Federal................................................................... 128
Irineu Tamaio
Roberta Fabline da Silva Barros
Contribuições para a reflexão e debate sobre Mudanças Climáticas
e Justiça Ambiental: Os saberes de estudantes da EJA em um
assentamento rural do Sudeste mato-grossense................................. 164
Lindalva Maria Novaes Garske
Lucimara Afonso Castilho
Crisnaiara Cândido
Justiça Climática e MST: Aproximações de uma educação ambiental
campesina no Assentamento Egídio Brunetto..................................... 189
Dionisio Garcia de Souza
Ronaldo E. Feitoza Senra
Heitor Queiroz de Medeiros
Mudanças Climáticas nas percepções de
caminhantes de longas travessias......................................................... 211
Júlio Resende
Michèle Sato
Araceli Serantes Pazos
Brisas e Vendavais em Mata Cavalo:
os colapsos climáticos em antíteses....................................................230
Thiago Cury Luiz
Michèle Sato
Liu Arruda e o Teatro:
Contribuições à Educação Ambiental e à Justiça Climática... 251
Ivan Correa do Belém
Michèle Sato

Colapso e Justiça Climática...................................................................... 269

Educação Ambiental Popular e Mudanças Climáticas:


Exclusão, Vulnerabilidade, Resistência e Rebelião na
Construção de Sociedades Sustentáveis.............................................. 270
Marcos Sorrentino
Simone Portugal
MichèleSato
Educação ambiental, mudanças do clima e redução de riscos de
desastres: Esperanças e vida em tempos de Capitaloceno.................. 292
Rachel Trajber
Injustiça ambiental e climática no Quilombo de Mata Cavalo e
Comunidade do Chumbo, Mato Grosso - Brasil.................................. 331
Déborah Luiza Moreira
Michelle Jaber-Silva
Michèle Sato
Jakeline M. A. Fachin
Regina Silva
Mudanças Climáticas e os desafios da restauração ecológica de área
degradada pela agricultura no semiárido............................................. 351
José Laércio Bezerra de Medeiros
Ramiro Gustavo Valera Camacho
A seca e a enchente: Educação Ambiental de Base Comunitária e
Justiça Climática no Vale do Jequitinhonha......................................... 361
Daniel Renaud Camargo
Celso Sánchez
Percepção de moradores de comunidades rurais do
Pantanal mato-grossense sobre as Mudanças Climáticas e
sua relação com a escassez de água.................................................... 396
Nayara Ferreira
Solange Kimie Ikeda Castrillon
João Ivo Puhl
Alessandra Morini
(In)visibilidades acerca das vulnerabilidades das Pessoas com
Deficiência Visual frente a desastres e mudanças ambientais globais:
Um estudo de caso em Cuiabá, Mato Grosso-Brasil............................ 414
Giselly Gomes
Victor Marchezini
Michèle Sato
Vulnerabilidade e Mudanças Climáticas: Percepções sobre algumas
comunidades tradicionais no Brasil e Espanha..................................... 441
Giseli Dalla-Nora
Michèle Sato
Araceli Serantes Pazos
Aprendizagens em tempos emergentes: a crise climática, a água e a
justiça climática na vivência pedagógica de educação ambiental das
escolas públicas em Planaltina, Distrito Federal................................... 451
Irineu Tamaio
Michèle Sato

Autores e Autoras..................................................................................... 518


Eichwaldmond, “Berço da vida”.
Apresentação do pintor da capa

EICHWALDMOND
(Pseudônimo, em português:
Lua Acima da Floresta)
Pintor - autodidata
Ele é uma “alma da natureza” e já sofreu as primeiras fraturas drásticas no contraste da
crescente cidade de Viena. Ele viu o impacto dramático do meio ambiente desde que
era um menino. E desde sua infância, luta com a força arte para proteger a natureza.
A incompreensão e o escárnio sobre sua forma crítica de lutar pela natureza nunca
puderam pará-lo – porque ele está profundamente ligado no coração do Cacique
Raoni e de todos os povos indígenas.
Hoje, sua pintura tem foco na “Amazônia” mais do que nunca, que revela - tão
claro como em nenhum outro lugar - todas as valas profundas entre a natureza
primordial e os danos da natureza - e o direito humano que está se espalhando
globalmente como uma teia de aranha.
Incompreensão e escárnio se perdem em medos e manifestações globais. Com seu
passado como trampolim, com a lua em suas costas e os velhos carvalhos como amigos,
seus anos restantes serão um sorriso e uma pintura à natureza.

http://www.eichwaldmond.at/
Tradução para o Português: Michèle Sato
Percepção de moradores de comunidades
rurais do Pantanal mato-grossense sobre
as Mudanças Climáticas e sua relação com a
escassez de água
Perception of residents of rural communities in the
Pantanal of Mato Grosso about Climate Change and its
relationship with water scarcity
Percepción de los residentes de las comunidades rurales
del Pantanal de Mato Grosso sobre el cambio climático y su
relación con la escasez de agua.

Nayara Ferreira1
Solange Kimie Ikeda Castrillon 2
João Ivo Puhl3
Alessandra Morini4

INTRODUÇÃO
A pressão do ser humano sobre os sistemas naturais do planeta é
algo sem precedentes. Há séculos a influência humana vem modifi-
cando e alterando os ecossistemas. Tudo isso ocorre devido a ativida-
des como o extrativismo, a agropecuária, a industrialização, o cresci-
mento populacional e a urbanização acelerada. O crescente consumo
de recursos naturais exerce grande pressão sobre o ambiente, causando
diversos impactos e alterações socioambientais. Esses fatores têm con-

1 Enfermeira. Mestranda em Ciências Ambientais pela Universidade do Estado do Mato


Grosso-UNEMAT. Professora da Universidade do Estado do Mato Grosso, Campus Tangará
da Serra. E-mail: nayferreira_go@hotmail.com.
2 Bióloga. Professora da Universidade do Estado de Mato Grosso. E-mail: ikedac@gmail.com.
3 Historiador. Professor da Universidade do Estado de Mato Grosso. E-mail: jivopuhl@gmail.com.
4 Bióloga. Professora da Universidade do Estado de Mato Grosso. E-mail: aetmorini@gmail.com.

396
tribuído de forma isolada ou conjuntamente, por meio das ativida-
des econômicas da sociedade, para a depredação de recursos naturais
(FIGUEIRAS, 2009).
Devido à complexidade dos processos envolvidos, as mudanças
ambientais globais constituem importante questão socioambiental,
levando em conta a magnitude dos impactos delas decorrentes,
podendo alterar os envoltórios do sistema terrestre e, dessa forma, são
experimentadas globalmente (CONFALONIERI et al., 2002).
Pesquisas apontam que as mudanças ambientais globais, principal-
mente as mudanças climáticas, têm colocado o nosso planeta em risco.
Esses dados foram apresentados no V relatório do painel intergovernamen-
tal sobre mudanças climáticas (IPCC), desenvolvido com base na revisão
de pesquisas científicas realizadas nos últimos cinco anos (IPCC, 2013).
O IPCC define as mudanças climáticas como “qualquer mudança
do clima, ao longo do tempo, que deriva de uma variabilidade natural
ou em decorrência de ações antrópicas” (2007). O IPCC ao longo
da elaboração de cinco relatórios aponta que o clima na terra poderá,
dependendo da região, aquecer de 2 a 4 graus Celsius. Baseado nessa
estimativa, o grupo de cientistas formulou também possíveis cenários
globais como resultados desse aquecimento (IPCC, 2013).
As mudanças climáticas promoverão impactos na economia, na
sociedade, na política e no meio ambiente. O aumento da temperatura
poderá causar a extinção de várias espécies da biodiversidade, ampliar
o contraste entre precipitações de regiões úmidas e secas, intensificar o
impacto das ondas de calor, de inundações, provocando assim mudanças
no ciclo global da água (SEIXAS et al., 2011).
Outra preocupação em relação às mudanças climáticas diz respeito à
saúde humana, que pode ocorrer de forma direta ou indireta, causando
a expansão das áreas de transmissão de doenças que têm como vetores
a crise da água. Poderá crescer a incidência de doenças de veiculação
hídrica e potencialização do efeito da poluição atmosférica sobre as
doenças respiratórias. Essa previsão foi considerada pela Organização
Mundial de Saúde como uma prioridade para o século, que demandará
do setor inúmeras ações e adaptação (SILVA et al., 2010).
Neste cenário de impactos das mudanças climáticas citamos,
igualmente, os fortes impactos sociais que afetarão de forma mais
intensa as comunidades mais pobres que dependem diretamente da

397
natureza para sobreviver. Serão mais afetadas, portanto, as comunidades
que têm alto grau de vulnerabilidade frente às mudanças climáticas
(IPCC, 2011).
No tocante às consequências das mudanças climáticas sobre
os aspectos políticos, econômicos, sociais, ambientais e de saúde, as
situações das comunidades rurais que já sofrem impactos ambientais
relacionados à escassez hídrica tendem a piorar, agravando assim a
situação de injustiça ambiental5 em que se encontram.
Em consequência das mudanças climáticas, as disputas por água
tendem a piorar, considerando que algumas pessoas dentro das
comunidades e das famílias rurais são mais vulneráveis. Este é o caso
das mulheres que exercem, em seu dia a dia, diversas atividades tanto
domésticas quanto profissionais ligadas à água. Na situação de escassez
de água, a mulher será a principal atingida e nesses casos se torna
importante levar em consideração a singularidade de cada pessoa, as
características da comunidade e os saberes locais.
Consideramos que a realização de estudos de percepção sobre o
tema mudanças climáticas pode tornar-se uma ferramenta importante
de gestão, quando os participantes do estudo não só contribuem para
o trabalho do pesquisador, mas também se sensibilizam para o tema
ambiental. A mudança de percepção e de atitude pode contribuir para
a redução de impactos ambientais na esfera individual/local/global.
O estudo de percepção ambiental também permite identificar grupos
da população mais sensíveis a determinadas ações de mitigação e/ou
prevenção de mudanças ambientais locais e/ou globais.
Esta pesquisa faz parte do projeto da Rede de Educação Ambiental
e Justiça Climática (REAJA) coordenado pela professora Michèle Sato
que, por meio de diálogos locais, nacionais e internacionais, reconhece
que os efeitos drásticos das mudanças climáticas afetarão toda a
humanidade, contudo não de forma e proporção iguais. Haverá diversas
injustiças socioambientais e violações da vida, humanas e não humanas.
A escolha deste objeto de pesquisa também está atrelada ao que se

5 Entende-se por injustiça ambiental o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de
vista econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento
às populações de baixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos povos étnicos tradicionais,
aos bairros operários, às populações marginalizadas e vulneráveis. Disponível em: https://
redejusticaambiental.wordpress.com.

398
propõe no Observatório Clima e Saúde da Fiocruz e a Rede Clima,
quando salientam que é importante a participação dos pesquisadores,
dos gestores e da sociedade civil. Deve haver uma troca de informações,
de forma recíproca, para difundir os conhecimentos empíricos e
acadêmicos acerca dos fenômenos climáticos, contribuindo para
responder aos desafios representados pelas causas e efeitos das mudanças
climáticas globais.
Dada a importância dos impactos das mudanças climáticas, o
presente estudo teve como objetivo investigar a percepção de mulheres
de duas comunidades rurais do Pantanal mato-grossense sobre as
mudanças climáticas e sua relação com a escassez hídrica.
Entender como as comunidades assentadas reagem frente à
questão das mudanças climáticas e da falta de água consiste em
pontos fundamentais na busca da qualidade de vida da comunidade,
na promoção da saúde, na conservação dos recursos naturais e na
sensibilização em relação aos problemas ambientais da região.
Foi importante pesquisar formas de resistência e de adaptação frente
a esses problemas, não apenas no âmbito tecnológico, mas a partir de
uma melhor compreensão das particularidades da cultura local e das
percepções dos indivíduos e suas comunidades que estão na linha da
vulnerabilidade.

MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO CONTEXTO DA


VULNERABILIDADE AMBIENTAL
A disponibilidade de água no Brasil depende em grande parte do clima.
Recentemente, a mudança climática tem sido observada como possível
causa de problemas que podem afetar a variabilidade e a disponibilidade
na qualidade e quantidade da água. Mudanças nos extremos climáticos e
hidrológicos têm sido observadas nos últimos cinquenta anos e projeções
de modelos climáticos apresentam um panorama sombrio em grandes
áreas da região tropical (MARENGO, 2008).
Segundo o Relatório IPCC, as mudanças climáticas ocorrem em
decorrência de alterações internas no sistema climático ou nas interações
entre seus elementos – e ainda podem ser causadas por forças externas,
como fatores naturais e ações antrópicas (IPCC, 1995).
Os países da América Latina, África e Sul da Ásia são mencionados

399
pelo IPCC como os mais vulneráveis e que podem sofrer mais
consequências com as mudanças climáticas. O Brasil é citado como um
país que pode ser intensamente afetado pelas mudanças climáticas, uma
vez que sua economia depende fortemente dos recursos naturais (NAE,
2005). Essa vulnerabilidade se manifesta de diversas formas, entre elas
no aumento da intensidade e frequência de secas e/ou enchentes.
A avaliação do painel intergovernamental sobre a mudança do
clima (IPCC, 2007; 2013), em seu quarto e quinto relatório, apresenta
os impactos projetados para este século, dentre os quais estão citados
abaixo apenas os que atingem o Brasil:
• Recursos hídricos: Até a metade do século XXI, o escoamento médio
anual dos rios e a disponibilidade das águas poderão ser reduzidos em
10-30% nos trópicos secos. As zonas afetadas pela seca provavelmente
aumentarão em extensão e o risco de enchentes será maior devido aos
fortes eventos de precipitação.
• Ecossistemas: As mudanças climáticas – aliadas a outras mudanças
globais, como a poluição e a sobreposição de recursos – irão
comprometer a resiliência dos ecossistemas de forma sem precedentes,
fazendo com que de 20 a 30% das espécies de plantas e animais entrem
em risco de extinção.
• Segurança alimentar: As mudanças climáticas podem afetar todos os
aspectos da segurança alimentar, incluindo o acesso aos alimentos, a
utilização e a estabilidade dos preços. Um aumento nas temperaturas
globais de aproximadamente 4°C em relação aos índices do final do
século 20, aliado ao aumento da demanda por alimentos, colocaria
a segurança alimentar regional e global em alto risco e esse risco é
ainda maior em áreas de baixa latitude. Nas regiões secas e tropicais, a
produtividade dos cultivos irá diminuir mesmo num cenário de pouco
aumento da temperatura (1-2°C). Além disso, as secas e enchentes irão
afetar, principalmente, a produção agrícola dos setores de subsistência.
• Zonas rurais: Grandes impactos são esperados para as áreas rurais por
meio de alterações na disponibilidade e no abastecimento de água,
segurança alimentar, renda agrícola, incluindo mudanças nas áreas de
produção de cultura de alimentos e de outros produtos. Esses impactos
podem afetar de forma desproporcional as regiões rurais mais pobres,
como as propriedades lideradas por mulheres e aquelas com acesso
limitado à terra, às tecnologias agrícolas, infraestrutura e educação.

400
Todos esses impactos devem estar associados ao conceito de
vulnerabilidade ambiental que para o IPCC pode ser definido como:
O grau em que um sistema é susceptível, ou incapaz
de fazer face a efeitos adversos da mudança climática,
incluindo variabilidade climática e extremos.
Vulnerabilidade é a função do carácter, magnitude
e graduação da variação climática a que um sistema
está exposto, a sua sensibilidade e a sua capacidade
adaptativa (IPCC, 2007).

Diante dos conceitos e aportes apresentados, é imprescindível


reconhecer que diante de um cenário globalizado, fortemente
caracterizado pela instabilidade do clima e pelo aquecimento global,
tem-se a capacidade de revelar um cenário de injustiça ambiental.

JUSTIÇA AMBIENTAL, INJUSTIÇA CLIMÁTICA E JUSTIÇA CLIMÁTICA


A Injustiça Ambiental pode ser entendida como
o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto
de vista econômico e social, destinam a maior carga dos
danos ambientais do desenvolvimento às populações
de baixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos
povos étnicos tradicionais, aos bairros operários, às
populações marginalizadas e vulneráveis.

Ao contrário, a Justiça Ambiental pode ser definida como:


(...) o conjunto de princípios e práticas que: a) assegura
que nenhum grupo social, seja ele étnico, racial ou
de classe, suporte uma parcela desproporcional das
consequências ambientais negativas de operações
econômicas, de decisões de políticas e de programas
federais, estaduais, locais, assim como da ausência ou
omissão de tais políticas; b) asseguram acesso justo e
equitativo, direto e indireto, aos recursos ambientais
do país; c) asseguram amplo acesso às informações
relevantes sobre o uso dos recursos ambientais, bem
como processos democráticos e participativos na
definição de políticas, planos, programas e projetos
que lhes dizem respeito; d) favorecem a constituição
de sujeitos coletivos de direitos, movimentos sociais

401
e organizações populares para serem protagonistas
na construção de modelos alternativos de
desenvolvimento, que assegurem a democratização
do acesso aos recursos ambientais e a sustentabilidade
do seu uso (REDE BRASILEIRA DE JUSTIÇA
AMBIENTAL).

Frente às mudanças climáticas o conceito de justiça ambiental


também está relacionado com o conceito de justiça climática, que
pode ser entendida como o fato de que nenhum grupo deva suportar
uma carga maior de sofrimentos advindos dos fenômenos extremos
como seca, cheias, fome, calor intenso, por pertencer a grupos que
têm suas vidas ligadas ao meio ambiente e por não disporem dos
avanços tecnológicos necessários para a adaptação a esses fenômenos
(ACSELRAD et al., 2005).
A Justiça Climática é utilizada para se referir a disparidades em
termos de impactos sofridos e responsabilidades no que tange aos
efeitos e às causas das mudanças do clima. Os defensores da Justiça
Climática argumentam que aqueles que são os menos responsáveis
pelas emissões de gases de efeito estufa serão aqueles que mais sofrerão
com os impactos das mudanças climáticas (MILANEZ; FONSECA,
2011). Desse modo, a injustiça climática está relacionada às formas
e à intensidade como as mudanças climáticas afetam distantes grupos
sociais diferentes. Assim, alguns casos de injustiça climática encontram
relação aos efeitos de processo de desertificação, de eventos climáticos
extremos (chuvas intensas, ondas de calor etc.), do aumento do nível
do mar, entre outros.
As diferenças das consequências das mudanças climáticas entre países
e entre grupos sociais dentro do país são o reflexo do descompromisso
do sistema de implementação de políticas públicas que contemple o
acesso a todos. Além disso, Milanez e Fonseca (2011) citam as condições
precárias de acesso à renda e a serviços básicos de cidadania, como
saúde, segurança, educação e infraestrutura, como fator que influencia
na desigualdade dos riscos climáticos entre grupos e classes sociais.

402
METODOLOGIA: TIPO E ÁREA DE ESTUDO
Este artigo resultou de uma pesquisa do tipo qualitativa, de caráter
exploratório. Em relação ao objetivo, esta pesquisa também pode ser
classificada como descritiva, porque teve como objetivos a descrição de
características de determinada população ou fenômeno ou as relações
estabelecidas entre os seus componentes. Assim, “são incluídas neste
grupo as pesquisas que têm por objetivo levantar as opiniões, atitudes e
crenças de uma população” (GIL, 2009).
As duas áreas de estudo se localizam no município de Cáceres em
Mato Grosso. Uma das áreas que foi estudada compõe um conjunto de
assentamentos rurais, situados à margem direita do rio Jauru e a divisa
seca com a Bolívia6 (Figura 1).
Do total de assentamentos rurais implantados no município
de Cáceres-MT, verifica-se que na região da fronteira Brasil-Bolívia
existem atualmente sete assentamentos rurais. Todos estão devidamente
catalogados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(INCRA). Cada um tem suas especificidades e está em diferentes
estágios de desenvolvimento. São eles: Corixinha, Katira, Jatobá, Nova
Esperança, Rancho da Saudade, Bom Sucesso e Sapiquá.
A área territorial dos 7 assentamentos rurais no município de
Cáceres, região de faixa de fronteira Brasil-Bolívia, é de 11.992,00
hectares, ocupados por aproximadamente 300 famílias, distribuídas em
lotes parcelados e de diferentes tamanhos. Esses assentamentos estão
localizados a uma distância de aproximadamente 70 km da cidade
de Cáceres-MT e a pouco mais de 20 km de San Matias, da Bolívia,
situação que estimula as relações comerciais com o país vizinho (SILVA;
BINZSTOK, 2013).
A outra área estudada foi o Assentamento Laranjeiras I, também
localizado no município de Cáceres - MT, ocupando uma área territorial
de 22,401 km², ou seja, de 2.240,166 hectares (figura 1). A unidade
geomorfológica da área é a Província Serrana, com destaque para as
formas da Serra do Bocainão e suas diversas nascentes de cursos d’água
(CASTRILLON et al., 2017).

6 A fronteira Brasil-Bolívia compreende uma faixa de aproximadamente 3423,2 km de


extensão, dos quais 250 km de território brasileiro estão dentro do município de Cáceres, sob
a guarnição do 2º Batalhão de Fronteira (JANUÁRIO, 2004).

403
A área está inserida na Bacia do Alto Paraguai (BAP), sendo
abastecida pelas nascentes, que convergem principalmente da serra
do Bocainão, e dois cursos d’água, que deságuam na Baía Grande no
Pantanal mato-grossense e situa-se a 80 km da sede do município de
Cáceres (CASTRILLON et al., 2017).

Figura 1 – Área dos assentamentos da região de fronteira Brasil/Bolívia

Fonte: Os autores.

404
Figura 2 – Carta imagem dos limites do Assentamento Laranjeira I e área da
microbacia com a indicação da rede hidrográfica e diversas nascentes na região do
assentamento, no município de Cáceres-MT

Fonte: Castrillon et al. (2016).

405
O procedimento norteador para a obtenção de dados foi a
pesquisa qualitativa, aplicada por meio de questionários, entrevistas
semiestruturadas e observações dos locais de estudo, seguidas de
anotações em um diário de campo com o intuito de compreender
melhor a realidade em questão.
Em pesquisas realizadas anteriormente no Assentamento Laranjeiras
I foi possível verificar a importância fundamental das mulheres e crianças
na busca de soluções para a falta de água (LEÃO et al., 2017). A partir
desta constatação, neste trabalho foram entrevistadas 20 moradoras da
área de estudo no período de 04 de novembro de 2017 a 21 de fevereiro
de 2018.
A coleta de dados foi iniciada somente após a aprovação do projeto
pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sob o Parecer nº: 2.290.691
em 21 de setembro de 2017, e mediante a assinatura do Termo de
Compromisso das Instituições Envolvidas no estudo e do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) daquelas que concordaram
em participar, conforme determinação da Resolução CNS (Conselho
Nacional de Saúde) 466 de 12 de dezembro de 2012 do Ministério da
Saúde.
O primeiro passo no processo de investigação foi a realização da
entrevista piloto. Posteriormente, escolheu-se a roda de conversa por
se tratar de uma técnica metodológica que propicia uma comunicação
dinâmica e produtiva entre comunidade e pesquisadores. A escolha dessa
técnica (Roda de Conversa) ocorreu principalmente por sua característica
de permitir que os participantes expressem, concomitantemente, suas
impressões, conceitos, opiniões e concepções sobre o tema proposto
(MELO; CRUZ, 2014).
Como método de condução das entrevistas semiestruturadas,
foi utilizado a abordagem da Entrevista Compreensiva desenvolvida
pelo sociólogo francês Jean-Claude Kaufmann, o qual orienta que na
condução da pesquisa seja possibilitado uma boa sociabilidade entre
pesquisador e participante com ambiência favorável em campo, bem
como permite uma maior aproximação entre a produção da teoria e a
pesquisa empírica, destacando a relação dialógica com o entrevistado.
Após a aplicação da entrevista compreensiva, deu-se início à análise
dos dados através do momento de escuta e da transcrição das gravações.
Posteriormente, as informações foram agrupadas por categorias de

406
análise conforme cada objetivo proposto e realizadas as discussões
pertinentes com base nas teorias relativas ao assunto.
Para manter resguardados os direitos de privacidade e proteção da
identidade (anonimato), confidencialidade das informações e evitar
assim qualquer forma de exposição ou constrangimento, os participantes
da pesquisa foram identificados por nomes fictícios, utilizando como
pseudônimos nomes de flores.
Em função de sua natureza individual e pessoal, a pesquisa
qualitativa levanta uma série de questões éticas, mas a maioria delas
deve ser tratada antes do início da análise dos dados. Mesmo assim,
é importante garantir a preservação do anonimato (se foi declarada
essa garantia) e que os entrevistados saibam o destino dos dados que
fornecem (GIBBS, 2009, p. 24).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A pesquisa partiu da hipótese de que as mudanças climáticas
afetarão de forma diferente aquelas comunidades que têm sua vida ligada
diretamente à natureza e que serão, portanto, as que mais sofrerão com
esse fenômeno, justificando assim a escolha desta temática.
As duas comunidades estudadas já sofrem com alterações no
ciclo da água e esta situação da escassez hídrica nos assentamentos foi
o ponto de partida para o processo de investigação acerca de como
estas comunidades percebem as alterações no clima e na água, como
convivem com esta realidade e como a elas se adaptam.
As populações mais vulneráveis, como é o caso do universo
pesquisado neste estudo, sofrem e relatam problemas socioambientais,
em especial quando mencionam que a água está diminuindo e que a
situação piora no período da estiagem, quando a coleta de água, pelas
mulheres do assentamento, é intensificada.
O questionário utilizado como roteiro nas entrevistas perguntou
sobre o ambiente em que vivem, potencialidades e fragilidades de sua
região, o que entendem sobre as mudanças climáticas. O tema foi
abordado através de situações que seriam amplamente conhecidas,
como: a uniformidade das chuvas, os motivos da falta de água, se já
houve perdas nas produções, como as mudanças climáticas acontecem
e o que podem causar.

407
Todas as entrevistadas foram do sexo feminino, com uma idade média
de 45 anos. Deste universo, a maioria (60 %) tem ensino médio completo.
Informaram que 85% das famílias sobrevivem com renda familiar de 1 a
2 salários mínimos, tendo como chefe de família o homem.
Seis entrevistadas atuam na área da educação escolar como
professoras, sete se reconheceram como agricultoras e sete como do
lar, que é uma característica típica de muitas famílias de comunidades
rurais. O tempo médio de residência destas mulheres nos assentamentos
foi de 12 anos.
Em relação à questão das chuvas: aproximadamente 80%
responderam que está cada vez chovendo menos nas épocas de chuva;
10% disseram que estava chovendo mais; 6% disseram que estava
chovendo a mesma coisa; e 4% não souberam responder.
Quanto à falta de água na região e o que poderia ser a causa,
obtivemos os seguintes relatos: “Ah! eu acho que é o clima que está
diferente, por isso não chove e por isso não tem água (...)” (Begônia,
Assentamento Rancho da Saudade). Ela afirma que o clima mudou, por
isso não chove e falta água. Porém, não explica porque o clima mudou.
Outra falou: “O tempo está mais quente, a falta de árvores, o povo
fura muito buraco, muito poço e há pouca chuva, o ano passado choveu
muito pouco (...)” (Rosa, Assentamento Nova Esperança). No relato,
a falta de árvores pode ser atribuída ao desmatamento e à falta de água
porque muitos moradores furaram poços ou buracos na terra para
obterem a água que a chuva não trouxe, que já indica uma estratégia
de adaptação à situação. Assim, representa como consequências da ação
humana: clima mais quente e seco. Percebe que as mudanças climáticas
foram provocadas pela ação antrópica.
A explicação da falta de água ainda foi atribuída ao calor: “O tempo
anda muito quente (...) Lá na minha casa, não chovia, não chovia,
não chovia de jeito nenhum, tive que alugar pasto (...)” (Violeta,
Assentamento Katira). Esta resposta indica uma estratégia de adaptação
à situação da falta de pasto em consequência do calor e da seca porque
não choveu o suficiente no período das chuvas.
A afirmação de que houve um aumento do calor indica que as
mulheres perceberam que o clima mudou e isso influiu na quantidade de
água disponível: “A gente sente que o tempo está mais quente (...) Antes
a represa era cheia, hoje secou (...)” (Lírio, Assentamento Sapicuá).

408
A partir desses relatos foi possível identificar que as mulheres das
duas comunidades sentem as alterações climáticas na região e fazem uma
associação da relação entre as mudanças climáticas com a falta de água.
Esta constatação foi relatada por Dalla-Nora e Sato (2015) em
comunidades tradicionais, onde os moradores da comunidade de São
Pedro de Joselândia informam que pouco sabem sobre o que são as
mudanças climáticas, em sua perspectiva teórica e conceitual, mas têm
percepção climática, pois, sentem alterações no clima como aumento da
temperatura e mudança no regime das chuvas.
Em outro estudo a percepção das mulheres sobre as mudanças
climáticas no Assentamento Laranjeiras I foi relatada, conforme Leão
(2013, p. 56):
Época onde normalmente ocorria a chuva, não ocorre
mais, está impreciso o período da chuva, está muito
mal distribuída. Não se tem uma precisão do período
do frio, está acontecendo alguma coisa na região que
está alterando o clima.

As mudanças no regime e na oferta de água provocam consequências


diretas em seus meios de subsistência, requerendo estratégias de adaptação
por parte das pessoas e famílias das comunidades do campo.
Foi possível identificar que as duas comunidades estudadas já
adotaram medidas e estratégias para conviver ou superar a falta de água.
Pode-se dizer que essa atitude se deu a partir do momento que essas
mulheres e essas comunidades começaram a sentir os efeitos advindos
das mudanças climáticas e seus efeitos sobre o ciclo da água.
Quando questionadas sobre as estratégias que geralmente adotam para
conviver ou superar a falta de água, foi possível identificar que as famílias
realizam a coleta e captação da água da chuva em barragens, açudes,
cisternas ou caixas d’água. Esse tipo de tecnologia tem sido utilizado como
tentativa de amenizar o problema da escassez de água de minas, fontes,
corrixas e córregos, porque o lençol freático fica a grande profundidade
para obter água em poços. Reconhecem inúmeras as vantagens da captação
e aproveitamento da água da chuva, pois, representa uma fonte alternativa
de água com qualidade razoável para vários usos.
A prática da captação da água da chuva pelos assentados, porém, deve
ser investigada com relação ao método utilizado e seu gerenciamento. Ela

409
requer assessoria e capacitação técnica, de forma frequente. As soluções
alternativas não necessariamente estão sob controle do poder público,
ou seja, a solução para o abastecimento de água nesses casos é construída
pela própria população, em geral, a mais carente.
Outro ponto descoberto foi que todas as entrevistadas utilizam
tambores e garrafas pet para o armazenamento da água. Essa prática
merece atenção redobrada sobre as condições desses reservatórios
alternativos, uma vez que podem ser fontes de contaminação para a
saúde humana, se a água não for armazenada corretamente.
A falta de água potável e de tratamento adequado das águas tem
como principal impacto a saúde das famílias, pois, quando pessoas
não dispõem de água de qualidade para o consumo, se desencadeia um
processo perigoso: são forçadas a ingerir água contaminada imprópria
para consumo humano, ficando expostas às doenças de veiculação hídrica
e comprometendo a saúde de suas famílias (CORDEIRO et al., 2015).
Em uma das comunidades observa-se que os impactos das mudanças
climáticas sobre o regime das águas provocam também conflitos e disputas
pela água. A redução da disponibilidade de água intensificará, ainda mais,
a disputa por ela entre os seus usuários. Neste cenário conflitivo pode-se
incluir inúmeras atividades humanas como a agropecuária, a manutenção
de ecossistemas, assentamentos humanos, a indústria e a produção
de energia. Isso poderá comprometer os recursos hídricos regionais,
a segurança energética e alimentar, e potencialmente a segurança
geopolítica, provocando migrações em várias escalas (UNESCO, 2016).
Ressalta-se que a vulnerabilidade da população rural tem uma nítida
relação com a exclusão do acesso às políticas públicas, o que não implica
desconsiderar a riqueza cultural, ambiental e de alternativas criativamente
produzidas nessas regiões (SORRENTINO, 2006).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ressalta-se que já existem evidências científicas documentadas e
projeções de cenários futuros mostrando as alterações climáticas presentes
e as que estão por vir. No entanto, uma peça que frequentemente falta
na discussão é: qual público essas mudanças mais afetam e de que
maneiras? Essa discussão é levantada e defendida pela corrente do
movimento de Justiça Climática.

410
As mudanças climáticas desafiam às sociedades, considerando a
desigualdade socioambiental no planeta/mundo em que as comunidades
mais vulneráveis acabarão pagando a parte maior do preço das
consequências das mudanças climáticas, mesmo sem terem colaborado
para que elas ocorressem.
Os processos adaptativos precisam ser pensados de acordo com os
valores, culturas, memórias e práticas dessas comunidades e não como
sobreposições.
A sociedade civil e os cidadãos necessitam de espaços para discussões
mais densas, não só na área de mudanças climáticas, mas também
nas questões hídricas, biodiversidade, saúde humana e questões
socioeconômicas, enfatizando de forma interdisciplinar as suas inter-
relações com o clima e a natureza.
A educação ambiental pode ser esse espaço de construção do saber e
de outras compreensões do mundo, da natureza, da vida e do indivíduo
em sua subjetividade ou coletividade.
Por fim, reafirma-se a necessidade do fortalecimento do movimento
por justiça climática e o reconhecimento de que “mudanças climáticas”
é uma questão complexa de justiça social e não apenas de um problema
ambiental. Esse processo deve enfatizar a importância da necessidade
de envolver as comunidades na organização de suas próprias ações e nas
decisões sobre seus próprios futuros.

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