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RESUMO INTRODUÇÃO
Com o objetivo de avaliar o emprego da fíbula do A maioria das fraturas distais ocorre em
cão conservada em glicerina a 98%, como método animais imaturos, na faixa etária de 4 a 12 meses
de fixação para fraturas femorais distais em cães de idade (GILMORE, 1996). A extremidade distal
e gatos jovens; foram utilizados 10 cães e 10 gatos do fêmur em animais jovens pode ser dividida
hígidos, entre três e cinco meses de idade, de raças anatomicamente em quatro regiões: epífise, placa
não definidas e médio porte. Realizou-se osteoto- de crescimento metafisária, metáfise e diáfise
mia transversa através da linha epifisária distal dos (PARKER; BLOOMBERG, 1984). A grande ocorrên-
fêmures esquerdos e redução dos fragmentos, cia de lesões epifisárias femorais é devido a pouca
seguida de perfuração na superfície articular entre quantidade de matriz óssea existente na região
os côndilos femorais para introdução do implante, metafisária, o que a torna mais frágil em relação
auxiliada por recalcador de pinos e martelo. Clini- aos ligamentos, cápsula articular e ossos adjacen-
camente, observou-se na maioria dos animais apoio tes à mesma (MANLEY, 1992).
do membro operado após o 2° dia do procedimento, Existem diversas formas de tratamento pa-
evidenciando-se aumento de volume local entre o ra fraturas femorais distais, como por exemplo, a
7° e 10° dia, que regrediu após aproximadamente utilização de pinos intramedulares (PARKER;
20 dias. A avaliação radiográfica foi realizada no BLOOMBERG, 1984; DALLABRIDA et al., 2005),
pós-operatório imediato, aos 15, 30, 45, 60 e 90 parafusos (KNIGHT, 1956; HINKO, 1974), placas
dias de evolução. Aos 15 dias observou-se início (CROVACE et al., 1992; ALIEVE et al., 2007), além
de formação de calo ósseo, estando este quase de métodos fechados como tala de Thomas modifi-
completo aos 30 dias na maioria dos animais, cada e bandagens simples (BOUDRIEAU, 1984).
verificando-se remodelação óssea a partir dos 45 A maioria dos métodos, freqüentemente requer um
dias. Não foram detectadas alterações degene- segundo procedimento cirúrgico para a remoção
rativas na superfície articular correspondente ao dos implantes após o processo de cicatrização (EI-
local de introdução do implante em nenhum dos MANTAS, 1997).
períodos de avaliação. Não houve evidência signi- As alternativas para a reparação óssea
ficativa de encurtamento ou deformidade dos mem- incluem a utilização de vários tipos de enxertos
bros operados, comparando-se aos contralaterais, ósseos, transporte ósseo e os implantes de bio-
concluiu-se ser este um método bastante simples e materiais (MARIA et al., 2003). Os biomateriais po-
eficaz para a reparação de fraturas femorais distais dem ser definidos como substâncias de origens
em animais jovens. naturais ou sintéticas, que são toleradas de forma
transitória ou permanente pelos diversos tecidos
Palavras-chave: fratura fêmur, fíbula, glicerina, que constituem os órgãos dos seres vivos (SCHI-
cães, gatos. MITZ et al., 1999). Os vários efeitos adversos dos
1
Médico Veterinário. Professor Doutor. UNESP. Jaboticabal-SP. padilha@fcav.unesp.br.
2
Médica Veterinária. Mestre. Programa de Pós-graduação em Cirurgia Veterinária – UNESP. Jaboticabal-SP.
3
Médica Veterinária. Doutoranda. Programa de Pós-graduação em Cirurgia Veterinária – UNESP. Jaboticabal-SP.
implantes metálicos, especialmente sua rigidez As fíbulas foram obtidas de cães enca-
excessiva, implicando na remoção dos implantes minhados ao Hospital Veterinário da FCAV-UNESP,
após a consolidação, recentemente vêm desper- submetidos à eutanásia por apresentarem lesões
tando pesquisadores a elaborarem materiais bio- irreversíveis de medulas espinhais. Todos os
degradáveis e flexíveis (RÄIHÄ, et al., 1993; ALIEVE animais eram adultos, não portadores de doenças
et al., 2007). infecto-contagiosas ou neoplasias, de médio ou
Os enxertos e implantes ósseos são am- grande porte, para a obtenção de fíbulas mais
plamente utilizados, principalmente em substituição resistentes. Procedeu-se a coleta das fíbulas de
a grandes falhas ósseas, sejam elas causadas por forma limpa e não asséptica. Após a colheita,
fraturas cominutivas, excisão da neoplasias ou cis- removeu-se o periósteo com auxílio de lâmina de
tos ósseos; sendo também empregados como bisturi. Em seguida, os ossos foram lavados em
estímulo para o processo de cicatrização óssea, e água corrente, secos e acondicionados em frascos
no auxílio a tratamentos de pseudoartroses e má- de vidro com tampa para conservação do material
formação congênita (TSHAMALA et al., 1993). à temperatura ambiente.
São utilizados diversos métodos e meios O meio de conservação dos implantes
para conservação de ossos. A glicerina desidrata utilizados constitui-se de glicerina a 98%, sendo
o tecido ósseo substituindo a maior parte da água os ossos acondicionados em frascos de vidro, onde
intracelular, sem alterar a concentração iônica das permaneceram por no mínimo 30 dias imersos em
células, atuando como eficaz protetor da integri- glicerina antes de sua utilização.
dade celular (PIGOSSI, 1964), e mantendo a função Após jejuns hídrico e alimentar de 12 horas,
osteoindutora (CAVASSANI et al., 2001). Além o protocolo anestésico empregado constituiu-se de
disso, age como anti-séptico ante os vários gêneros cloridrato de tramadol associado à midazolam como
de microrganismos patogênicos ou não, atuando medicação pré-anestésica, indução anestésica
como bactericida e fungicida, exceto contra formas com propofol4 e manutenção com isoflurano5 va-
esporuladas (PIGOSSI, 1967). porizado em oxigênio a 100%, posicionados em
O presente trabalho teve como objetivo decúbito dorsal, realizada a anti-sepsia e isolamen-
avaliar a eficácia da utilização da fíbula de cão to da extremidade do membro com malha tubular6
conservada em glicerina a 98% como método de estéril e campos operatórios apropriados. O acesso
fixação em fraturas femorais distais em cães e gatos cirúrgico à região foi o preconizado por Piermattei
jovens. (1993). Realizou-se incisão de pele curva para-
patelar lateral abrangendo o terço distal do fêmur,
MATERIAL E MÉTODOS estendendo-se aproximadamente a 2cm distalmen-
te ao platô tibial. Em seguida, divulsão do tecido
Utilizou-se no presente estudo, 10 cães e subcutâneo e incisão da fáscia lata. Após a incisão
10 gatos hígidos, de raças não definidas, jovens da cápsula articular paralela à incisão da pele, a
(entre três e cinco meses de idade), machos e fê- patela foi afastada medialmente, para a exposição
meas de porte médio, fornecidos pelo canil de ex- das regiões distais da diáfise e epífise femorais.
perimentação do Hospital Veterinário da Faculda- A articulação foi irrigada com solução fisio-
de de Ciências Agrárias e Veterinárias – FCAV- lógica estéril a 0,9% e permaneceu exposta, e a
UNESP, campus de Jaboticabal-SP. Os animais inspeção da região realizada. Selecionou-se a
foram clinicamente avaliados, submetidos a fíbula de tamanho adequado para preencher dois
vacinação e vermifugação, e receberam ração terços do canal medular femoral, e em seguida
adequada à espécie e idade correspondentes. submetida à reidratação em solução de cloreto de
A distribuição dos animais se deu em dois sódio a 0,9% por aproximadamente 30 minutos.
grupos, um deles constituiu-se de 10 cães e o se- Realizou-se osteotomia transversa através
guinte de 10 gatos e cada grupo subdividido em da linha epifisária distal femoral com auxílio de uma
cinco subgrupos compostos por dois animais, serra manual, e logo após, redução dos fragmen-
sendo cada subgrupo correspondente respecti- tos seguida de perfuração na fossa intercondilar
vamente aos tempos de avaliação de pós-opera- (Figura 1), com auxílio de perfuratriz e broca com-
tório: 15, 30, 45, 60 e 90 dias. patível ao diâmetro do implante a ser colocado.
4
Propovan 15% – Cristália SP.
5
Isoflorine – Cristália SP.
6
Malha Tubular ortopédica – Luratex SP.
Figura 1. Fotografia representativa da porção distal do fêmur de um cão, local de perfuração com auxílio de perfuratriz e broca compatível
ao diâmetro do implante a ser inserido na fossa intercondilar
7
Vicryl – Ethibond - SP.
resultados encontrados por Pigossi (1964); Pigossi foram constatadas evidências de deformidades dos
(1967); Alieve et al.(2007) e Salbego et al. (2007). membros operados. Os resultados observados
Observou-se apoio do membro operado ao demostraram que a lesão obtida na placa de cres-
solo no 2° dia de pós-operatório em todos os cimento pela presença do implante ou na osteotomia
animais, exceto em um cão, que efetuou após o 5° foi mínima, não havendo alteração do crescimento
dia. A função precoce do membro foi obtida com a longitudinal do osso.
técnica empregada, assim como Alcantra; Stead A utilização de dose única de antibiótico
(1975) atingiram, utilizando pinos de Rush. Parker; prévia ao procedimento cirúrgico mostrou-se efi-
Bloomberg (1984) empregando o pino intramedular ciente contra processos infecciosos no decorrer
único inserido pela cartilagem articular distal femoral do experimento, não havendo necessidade de anti-
e Hurov; Seer (1968) com aparelho de fixação bioticoterapia no pós-operatório, concordando com
externa. Penha (2000) empregou o enxerto ósseo os resultados de Alieve et al. (2007); Salbego et al.
cortical bovino, sob a forma de pino conservado (2007).
em glicerina a 98% em osteotomias femorais em Os aspectos radiográficos obtidos asse-
gatos jovens e adultos e observou a deambulação melharam-se para os dois grupos de animais estu-
normal dos animais aos 15 dias, em média. O apoio dados, sendo que os fragmentos mantiveram-se
do membro operado ao solo mais precoce que o alinhados sem evidências de rotação entre os mes-
encontrado por Penha (2000) pode ter ocorrido mos, comparando-se às radiografias retiradas ao
porque a autora não restringiu a movimentação dos pós-operatório imediato (Figura 2). Ligeiros graus
pacientes durante todo o período de pós-operatório, de reação endosteal foram verificados principal-
diferentemente do realizado neste estudo. mente nos gatos até o final do período de avaliação
A falta de uniformidade no alinhamento (90 dias). Isto pode ter ocorrido devido à natureza
entre os fragmentos é um dos fatores mais rela- do implante ser heterólogo para os felinos, já Dubey
cionados a resultados negativos e complicações et al., (1993) não citam reações endosteais inde-
no reparo de fraturas femorais distais. A técnica sejáveis utilizando implantes confeccionados a partir
empregada permitiu adequado alinhamento entre de corno de búfalo no reparo de fraturas femorais
os fragmentos, não sendo observada rotação entre em cães. Em trabalho realizado por Maria et al.
os mesmos. O tecido ósseo empregado na con- (2003) constataram-se proliferação óssea abun-
fecção dos pinos permitiu maior aderência entre o dante, macroscopicamente, sobre a linha de osteo-
implante e o osso hospedeiro, impedindo a rotação tomia. Amendola et al. (2003) utilizaram o mel como
entre os fragmentos comumente observada, pos- conservante de ossos para serem utilizados como
terior à utilização dos pinos intramedulares me- implantes corticais e observaram que houve de-
tálicos únicos, citada por Berzon (1980). A técnica créscimo da densidade óssea do material implan-
promoveu perfeita estabilidade do foco de fratura, tado, constatado no exame radiográfico. Observou-
assim como Hurov; Seer (1968) obtiveram com a se diminuição intensa da radiopacidade em um cão
utilização de aparelhos de fixação externa, todavia e um gato, e diminuição moderada da radiopaci-
Dallabrida et al. (2005) tenham verificado através dade em apenas um cão.
de testes biomecânicos que a transfixação es- Aos 15 dias de pós-operatório, a conso-
quelética interna promove maior rigidez que a lidação total da fratura estava presente em dois
utilização do pino intramedular. Embora os resul- gatos e três cães. Aos 30 dias de pós-operatório
tados constatados no presente trabalho tenham as linhas de fratura estavam presentes, desapa-
promovido a estabilidade do foco de fratura, não recendo por completo aos 45 dias. Estes resultados
foram realizados estudos biomecânicos neste confirmam o fato de que o processo de cicatrização
experimento. de fraturas fiseais ocorre de forma mais rápida,
A presença do implante, ou mesmo a fratura comparando-se ao tempo de consolidação neces-
através da placa de crescimento pode resultar em sário para uma fratura diafisária normal de acordo
encurtamento ou deformidade dos membros, se- com as colocações de Berzon (1980); Johnson et
gundo Stone et al. (1981), fato não verificado na al. (1994).
maioria dos animais do experimento, sendo nota- Em investigação semelhante, Penha (2000)
dos ligeiros graus de encurtamento femoral com- utilizou o enxerto ósseo cortical bovino conservado
parando-se ao contralateral, em dois dos cães e em glicerina a 98%, como pino em osteotomias
em um dos gatos, alterações estas que não com- femorais de gatos jovens e adultos e observou
prometiam a marcha normal dos animais, resultan- complicações como acavalamento ósseo, fratura
do em claudicação em apenas um dos cães. Não do enxerto, reabsorção do enxerto e não união. Os
Figura 2. Aspectos radiográficos do enxerto inserido no fêmur de um cão, no pós-operatório imediato, observando-se que os fragmentos
fraturados mantiveram-se alinhados, sem evidências de rotação entre os mesmos.
cães e gatos foram submetidos à restrição de em três animais, porém o período de avaliação foi
movimentos em canis e gatis, diferentemente de de 90 dias, sendo que mais estudos são necessários
Penha (2000), o que pode ter contribuído em para demonstrar se o comportamento da reabsor-
grande parte para que tais complicações não ção do implante com fíbula é o mesmo do cimento
tenham sido observadas. de fosfato de cálcio.
Avaliou-se o emprego da poliuretana deri- Devido ao alto custo dos implantes bio-
vada do óleo de mamona na tíbia de cães em fase degradáveis (RÄIHÄ et al., 1993; HARA et al., 1994),
de crescimento e verificou-se que os implantes implantes confeccionados a partir de tecido ósseo
encontravam-se deslocados distalmente no interior preservado poderiam ser estudados com mais in-
do canal medular em relação ao local inicial de tensidade, evitando um segundo procedimento ci-
implantação (MARIA et al., 2003). Não houve cons- rúrgico para subseqüente remoção com mínimos
tatação de tais complicações radiograficamente no custos, havendo possibilidade de confecção de
presente trabalho no período de 90 dias de diversos tipos de implantes para a utilização no
avaliação. reparo de fraturas em qualquer espécie animal.
Avaliou-se a osteointegração do osso
bovino desvitalizado, hidroxiapatita de coral, CONCLUSÃO
poliuretana de mamona e enxerto autógeno em
coelhos, sendo o enxerto autógeno o que de- Com base nos resultados obtidos, conclui-
monstrou o maior potencial osteogênico e o osso se que a utilização da fíbula de cão conservada
bovino desvitalizado o que produziu maior reação em glicerina proporciona adequada reparação e
inflamatória e maior número de cavidades císticas estabilização de fraturas femorais distais em cães
e lentidão da integração (FIGUEIREDO et al., 2004). e gatos, com até 5 meses de idade.
Já Moraes et al. (2004) testaram a biocompatibi-
lidade do cimento de fosfato de cálcio implantado
no rádio de coelhos para ser usado como substituto Femoral distal osteosynthesis in young dogs
ósseo, constatando ser o polímero biocompatível, and cats with canine fibula preserved in 98%
embora tenha sido reabsorvido no período de 26 glycerin
semanas de avaliação. No presente estudo veri-
ficou-se diminuição da radiopacidade do implante
BERZON, J. L. The classification and management HARA, Y.; TAGAWA, M.; EJIMA, H.; ORIMA, H.;
of epiphyseal plate fractures. Journal of the Ame- FUJITA, M.; YAMAGAMI, T.; SUGIYAMA, M.;