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DEFORMIDADE FLEXURAL ADQUIRIDA DA ARTICULAÇÃO META-

CARPOFALANGEANA ESQUERDA DE UMA BEZERRA- RELATO DE

CASO

Caroline Marques da Silva¹, Thiago Carvalho¹, Leticia Godoi Finoti¹, Piero Henrique Mi-

randa Teodoro²

¹Discentes do Curso de Medicina Veterinária da Universidade São Judas Tadeu

[FCBS/USJT], ²Médico Veterinário Mestre em Cirurgia Animal pela Universidade Es-

tadual Paulista Júlio de Mesquita Filho [UNESP-Botucatu]

Resumo

Deformidades flexurais congênitas e adquiridas são presenciadas com certa resistência,

não sendo tão comuns na rotina clínica em bezerros, evidenciando a relevância de relato

quando isso sucede. O objetivo do presente estudo é relatar o caso de uma bezerra com

deformidade flexural adquirida da articulação metacarpofalangeana esquerda de origem

idiopática, ao qual observou-se no exame físico que o animal não conseguia se locomover

normalmente e durante o exame de extensão e flexão, observou-se a rigidez da articulação

metacarpofalangeana do lado esquerdo. Diante disso, optou-se pelo tratamento clínico

mediante a imobilização do membro acometido com tala de PVC e a aplicação de uma

injeção de Oxitetraciclina, associada a Dexametasona. Após oito dias a tala foi retida e a

bezerra passou a apoiar o membro no chão, locomovendo-se normalmente.

Palavras-chaves: deformidade flexural adquirida, bezerro, tratamento clínico.


1. Introdução

As deformidades flexurais são caracterizadas pela restrição de uma articulação em posi-

ção flexionada ou a inabilidade de estendê-la completamente (CORRÊA e ZOPPA.,

2007). As estruturas de tecidos moles responsáveis pela flexão estão mais curtas que as

estruturas ósseas, levando a um grau de flexão em uma ou mais articulações (SMITH,

1994). São geralmente identificadas nas articulações metacarpo-falangeana ou radio-cár-

pica-metacárpica, e com pouca frequência nas articulações interfalangianas distais e tíbio-

tarso-metacárpica (GREET e CURTIS., 2003). Sendo de maior incidência em membros

torácicos (REBHUN., 2000).

Podem ocorrer em bezerros e bovinos jovens, ao qual podem ser congênitas ou adquiridas

(REBHUN., 2000). Em relação a origem etiológica congênita possivelmente é relacio-

nada a fatores hereditários, mau posicionamento no útero e gestação gemelar. Todavia,

alguns autores sugerem que essa condição é causada pelo gene autossômico recessivo

(ADAMS e SANTSCHI., 2000). Determinada condição pode ser observada entre a pri-

meira e segunda semana de vida do animal (FUBINI e DUCHARME., 2004), sendo que

os bezerros afetados se apoiam sobre o boleto (metacarpo-falangeana; REBHUN., 2000).

Relativamente, a deformidade flexural de origem adquirida pode ser uni ou bilateral,

sendo geralmente localizada nas articulações interfalangianas distais e metacarpo-falan-

geanas (STASHAK., 2003). Os tendões afetados pela deformidade flexural metacarpo-

falangeana são: Tendão Flexor Digital Superficial (TFDS) e Tendão Flexor Digital Pro-

fundo (TFDP). Nas contraturas de TFDP, manifesta-se clinicamente a elevação dos talões

e aspecto de “casco em pinça” (STASHAK., 2003).


A palpação dos tendões envolvidos juntamente com a avaliação radiográfica é de grande

importância para a suspeita clínica. Os animais podem ser submetidos a uma terapia clí-

nica ou cirúrgica, sendo válido a associação das suas modalidades, sendo que a melhor

reposta à terapia são os casos onde o diagnóstico é realizado precocemente (CORRÊA e

ZOPPA., 2007). O prognóstico varia de acordo com o grau de acometimento, tempo de

evolução e tipo de tratamento instituído (CORRÊA e ZOPPA., 2007).

O objetivo do presente trabalho é relatar um caso de deformidade flexural adquirida na

articulação metacarpofalangeana em uma bezerra, de aproximadamente dois meses de

idade, da raça holandesa.

2. Relato de Caso

Foi atendida em uma propriedade na cidade de Tiros, Minas Gerais, uma bezerra de apro-

ximadamente sessenta dias de vida, da raça holandesa, apresentando uma das mãos atro-

fiadas, segundo o responsável pelo animal. Durante a anamnese, o proprietário relatou

que há alguns dias atrás a bezerra começou a apresentar o membro torácico esquerdo

contraído, não sabendo relatar a origem do problema. Ao exame físico observou-se que o

animal não conseguia se locomover normalmente, apoiando o membro em pinça para sua

movimentação. Durante o exame de extensão e flexão, foi observada a rigidez da articu-

lação metacarpofalangeana do lado esquerdo, impossibilitando sua extensão. Contudo foi

possível o diagnóstico de deformidade flexural adquirida da articulação metacarpofalan-

geana esquerda (Figura 1), de origem idiopática.


Figura 1. Animal apresentando a deformidade da articulação metacarpofalangeana esquerda

Fonte: Arquivo pessoal do M.V Piero Teodoro

Diante disso, optou-se pelo tratamento clínico mediante a imobilização do membro aco-

metido com tala de PVC, onde a mesma foi moldada para se adequar ao animal (Figura

2), e a aplicação de uma injeção de Oxitetraciclina, associada a Dexametasona na dose de

0,5mg/kg/SID durante três dias. O animal se mostrou responsivo ao tratamento e após

oito dias a tala foi retirada e a bezerra passou a apoiar o membro no chão (Figura 3),

locomovendo-se normalmente.

Figura 2. Colocação da tala no membro torácico esquerdo do animal para auxiliar na sua correção

Fonte: arquivo pessoal do M.V Piero Teodoro


Figura 3. Animal se mostrou responsivo ao tratamento, após oito dias, retornando o apoio do

membro no solo

Fonte: Arquivo pessoal do M.V Piero Teodoro

3. Discussão

As deformidades flexurais em bezerros podem ter origem congênita ou adquiridas (DU-

CHARME, 2004). Após alguns dias de vida os animais podem vir a desenvolver a forma

adquirida, como o animal relatado acima, que ocorre devido a excessiva contração mus-

cular, recorrente de algum desconforto ou dor que o animal venha apresentando, onde o

animal posiciona o membro de maneira que o deixe confortável naquele momento, tra-

zendo por consequência a atrofia da musculatura e o encurtamento do mesmo. O cresci-

mento desproporcional dos ossos em relação às estruturas de tecidos moles também in-

fluencia para que o membro se apresente mais curto (REBHUN, 2000).

Casos de deformidade flexural são comumente relatados em filhotes, podendo compro-

meter toda a vida do animal (DUCHARME, 2004), atingindo tanto os tendões superficiais

quanto os profundos. O diagnóstico se dá através da observação comportamental do ani-

mal, se apresenta claudicação ou não, e da palpação do membro em questão (STASHAK,


2003). A alteração ocorre na unidade músculo-tendínea, deixando o membro mais curto

e impedindo sua extensão, fazendo com que o animal realize o movimento de pinça ao se

locomover. O conhecimento anatômico do sistema locomotor dos animais é de suma im-

portância no momento do diagnóstico (WEAVER, 2005).

Em nosso estudo optou-se pelo tratamento clínico devido ao quadro moderado que o ani-

mal apresentava. Segundo Trauner et.al (2011) e Stashak (1994), este tipo de tratamento

é indicado quando não há anomalia ortopédica predisponente e o membro pode ser esten-

dido manualmente para que a sola do casco possa tocar o solo. A utilização da tala auxilia

na reabilitação do animal, tendo por objetivo principal a extensão forçada do membro, a

fim de induzir o reflexo miotático inverso e consequentemente o relaxamento dos mús-

culos flexores, devido à imobilização do local. Esse método demonstra-se eficaz desde

que haja boas condições de manejo na propriedade e a supervisão em tempo integral do

animal (WEAVER, 2015).

Diferentemente do que é proposto por Hendrickson (2010), foi feita a utilização de De-

xametasona, pertencente a classe dos corticoesteroides, com o intuito de promover sinais

anti-inflamatórios através da vasodilatação e permeabilidade dos capilares, permitindo

assim, a migração de leucócitos, células que atuam no combate às inflamações, para a

área afetada (SPINOSA, 2016). Apesar do uso de AINEs ser preferível, este fármaco

apresentou resultados satisfatórios.

O uso da oxitetraciclina em baixas doses é importante, pois ela auxilia no relaxamento

muscular, quelando os íons de cálcio e prevenindo o seu influxo nas fibras musculares

(KIDD, 2012), e na correção mais rápida da deformidade. Altas doses desse medicamento

são nefrotóxicas em bezerros (DUCHARME, 2004; ANDERSON, 2008).


4. Conclusão

No presente relato, pode-se comprovar que o tratamento clínico, constituído através do

uso da injeção de oxitetraciclina, associada ao corticoesteroide e a imobilização do mem-

bro com a tala, contribuiu na correção da deformidade flexural da articulação metacar-

pofalangeana da bezerra. O animal apresentou uma excelente recuperação em um curto

período de tempo, podendo voltar a realizar as suas atividades normalmente.

5. Referências Bibliográficas

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