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A HERANÇA

por Eric
Flávio

Dona Célia é uma mulher que vive às voltas com suas


duas filhas, o marido e se vira para poder manter a casa.
Mas a sorte finalmente parece lhe sorrir, quando recebe a
visita de uma tia-avó muito rica e que, ao que tudo indica,
não tem outros parentes e vai colocá-las em seu testamento.
Mas nem tudo é realmente o que parece ser…

2023
PERSONAGENS:
Tia Lenita
Célia
o marido Rogério
a filha Lídia
a – outra filha – Márcia
a vizinha Cilene
a – outra – vizinha Regina
Advogado Dr. Marcondes
e Jeremias
O médico, Dr Nicolau
Musica Instrumental
A Atriz fica em cena, enquanto uma música toca ao fundo
Terceiro sinal
Em cena Tia Lenita, sentada em um banco, cabisbaixa, escrevendo em um pequeno papel

PROLOGO
Musica
Entra todos os atores dançando ao fundo

CILENE CILENE
Se tem uma verdade nessa vida Se Deus escreve certo por linhas tortas não sabemos
É que uma boa herança sempre é bem-vinda E o desfecho dessa herança aguardaremos
Eu não tô aqui desejando a morte de ninguém Mas com essa história complicada contaremos
Mas quem não quer dinheiro dado por alguém? Que nem tudo que reluz é ouro, assim
ouviremos!
REGINA
Ta certo que nem sempre a sorte tá do nosso REGINA
lado Silencie os celulares para não atrapalhar nossa
E que dinheiro dado não é roubado história
A gente só não pode contar com aquilo que E fiquem à vontade para rir com essa trajetória
ainda não foi dado Só não vale chegar no final da peça
Sem saber que o testamento ainda nem tinha Querendo a sua herança antes da hora
sido planejado

LENITA – (respira fundo) É verdade… A gente vive uma vida desgraçada. Consegue uma gracinha e
no final acaba assim… (tosse) Tanta coisa… as vezes bate uma saudade… na verdade se eu parar para
pensar eu tenho mais agradecer do que reclamar, sabia? Muitas viagens, festas por essa fazenda…
Foi.. olhe, enfim… acho mesmo que chegou a hora… de hoje não passa…

Musica
Tia Lenita ler o papel e respira fundo
Entra Dr. Marcondes recebe o papel e sai com ela
CENA 01
Entra Célia e Adalberto
Musica – Divida (Ultramem)
CÉLIA – Contas e mais contas… que vida difícil Deus?
ROGÉRIO – Difícil? Difícil pro rato que nasceu pelado, a gente tá é lascado mesmo
CÉLIA – Eu to vendo a hora da gente ter que joga as contas para cima, e pegar uma para ver qual a
gente vai pagar em dias esse mês
ROGÉRIO – Essa noite eu tive um sonho, um sonho muito bom. Algo me diz que tudo ira se
ajeitar por aqui. Alguma boa notícia vai chegar para a gente.
CÉLIA – Se eu for esperar pela realização desses sonhos, já já a gente tá morando debaixo da ponte
ROGÉRIO – Eta mulher pessimista!
CÉLIA – Pessimista não, realista meu bem! Eu é que sei o quanto eu tenho que esfregar a barriga
no fogão e a mão no sabão para criar essas duas meninas
ROGÉRIO – E eu, não faço nada né?
CÉLIA – Faz… Ajuda… mas sonha! Sonha alto demais e depois vem a queda… bem no final do
mês.
ROGÉRIO – A como você é exagerada!
CÉLIA – Então eu vou deixar você sonhar por ai, e vou aproveitar que as meninas ainda não
chegaram em casa para ir no mercado
ROGÉRIO – Eu também vou precisar dar uma saidinha
CÉLIA – Então vamos juntos e você me conta mais sobre esse sonho. (para e grita do outro lado
do palco) Cilene… Regina…
ROGÉRIO – olhe, eu não vou ter tempo para esperar o papo de vocês não viu? Preciso ir.
Dar um beijo na testa de Célia e sai
Entram Cilene e Regina
CILENE – Pois não vizinha…
CÉLIA – Minha filha, eu ia ali na feira antes das meninas chegarem, mas esqueci que não falei com
vocês hoje
REGINA – Pois é… eu ouvi você mais cedo, só reclamando das dívidas (ri)
CÉLIA – Ah, não ria não, que a situação aqui em casa tá pela hora da morte
CILENE – Mulher, mas não é você que tem uma parte da família que é podre de rica?
CÉLIA – E onde foi que você viu a parte da família rica, ligar para parte da família pobre. Só
quando tem enterro e olhe lá..
REGINA – Isso é verdade… vou te contar que uma vez lá no meu interior, um parente morreu e o
povo só foi para o enterro, porque o advogado dele estaria lá
CÉLIA – E o que é que o advogado tem a ver com isso?
REGINA – Não é ele que cuida de toda a papelada do testamento mulher?
CILENE – Diz que é uma burocracia da peste… assinatura daqui, reconhece de lá… uma confusão.
CÉLIA – Bom, o que eu tenho para deixar como herança, ninguém vai brigar muito não.
REGINA E CILENE – E o que é?
CÉLIA – As dívidas. (as três caem na risada) E que não são poucas… Olhe, deixa eu ir, antes que
essas meninas cheguem e eu nem tenha feito o almoço ainda.
REGINA – Tchau vizinha, depois a gente papeia mais…
CILENE – Até!
Saem de cena
Musica
Entra Lídia e Marcia, cada uma fazendo uma coisa e espalhando roupas, livros e objetos pelo chão
Cena com a música
Saem as duas
Célia vindo da rua, recolhendo algumas peças de roupa espalhadas pela sala, em cima do sofá
CÉLIA – Ai, meu Deus… Essas meninas, nem prá me ajudar… (chamando) Lídia! Márcia! Bem
que me disseram que ser mãe é padecer no paraíso… E eu estou pagando dobrado por ter duas
filhas…
LÍDIA – (entrando, sonolenta) Chamou?
CÉLIA – Lídia, você e sua irmã podiam me ajudar um pouco… Olha só a bagunça que está esta
sala. O quarto de vocês, não quero nem imaginar…
LÍDIA – Ah, mãe… agora não dá! Estou estudando!
CÉLIA – Com essa cara de sono? Conta outra!
LÍDIA – Ué… Não é a senhora que vive dizendo pra gente estudar, ser alguém na vida e não sei
mais o quê?!
CÉLIA – É… o problema é que vocês nunca ouvem o que eu digo.
LÍDIA – Tanto ouço, que estava estudando
CÉLIA – Olhe menina, não me torre a paciência não que eu já estou por aqui de problemas
LÍDIA – O que houve mãe?
CÉLIA – Nada não… nada que você possa fazer para ajudar… alias, pode… cadê sua irmã?
LÍDIA – No quarto.
CÉLIA – Dormindo!
LÍDIA – Estudando…
CÉLIA – É incrível como vocês tomam gosto pelo estudo de uma hora para outra. Principalmente
quando se tem serviço para fazer. Só eu sei o quanto vocês gostam de estudar. Com certeza fazem
isso de olhos fechados… e roncando! Vá chamar sua irmã.
LÍDIA – (gritando) Márcia, a mãe está chamando.
CÉLIA – (com olhar de reprovação) Se fosse pra gritar, eu mesma faria.
MÁRCIA – (entrando) O que foi?
LÍDIA – É que você está perdendo um dos melhores momentos das nossas vidas: o sermão.
CÉLIA – Não é sermão! É uma súplica que faço a vocês. Eu preciso de ajuda para manter essa casa
em ordem. Não consigo fazer os serviços domésticos, cuidar de vocês e trabalhar fora.
MÁRCIA – Até parece que é assim… mas do que eu faço nessa casa…
CÉLIA – Essa é boa, falta dizer o que? Que eu que não faço nada né? Esses jovens de hoje em dia
MÁRCIA – Não disse isso mãe!
CÉLIA – Quando eu morrer, vocês vão sentir minha falta… eu acho né?
MÁRCIA – Vai começar…
CÉLIA – Eu estou falando sério. Tá achando que vai ter mãe e pai para a vida toda né? Nossa hora
tá chegando minha filha
MÁRCIA – (em tom de brincadeira) Deixa uma boa herança para a gente viu?
CÉLIA – (brava) Como é que é?
MÁRCIA – Brincadeira mãe! Também não precisa dramatizar tanto. A gente ajuda.
CÉLIA – (jogando as roupas que havia recolhido para o alto) Ótimo! Arrumem esta sala! (vai
saindo, pára) A propósito… amo vocês!
Célia Sai
LÍDIA E MÁRCIA – Nós também te amamos!
MÁRCIA – (mesmo jogo de D. Célia) A propósito…
CÉLIA – (em off) O que foi?
MÁRCIA – Preciso de dinheiro! Para comprar umas coisas…
CÉLIA – (voltando) Eu também! Tem algum para me emprestar? (séria) Filha, eu queria muito
poder ajudar, mas não é tão fácil assim… o que eu ganho mal dá para cobrir as despesas da casa…
MÁRCIA – É… A senhora nunca tem… (sai, chateada)
CÉLIA – Sabe o que é que eu nunca tenho minha filha? PACIÊNCIA! É isso que tá me faltando
LÍDIA – Liga não, mãe! A Márcia está passando por uma febre de consumo: quer comprar tudo o
que vê pela frente…
CÉLIA – E eu, Lídia, estou passando por uma febre financeira… Vamos, me ajude aqui… Leve
essas roupas lá para dentro.
Sai as duas
Black
CENA 02
Outro ambiente
Entra Jeremias bêbado
Musica
JEREMIAS – Eta vida, porque Deus! Porque me fez tão pobre… não tenho dinheiro nem para
comprar as minhas bombinhas… sabe o que eu queria, um parente rico. Um parente rico velho, sabe
aquele com o pé na cova… que me deixasse uma boa herança. Ah eu ia saber o que fazer viu…
ROGÉRIO – Jeremias… (Musica do além)
JEREMIAS – Senhor, és tu? Já vai me levar? Ô senhor, o que eu falei do parente rico foi
brincadeira. O Senhor sabe que meu coração só tem bondade… bondade e umas bombinhas… mas
nada que…
ROGÉRIO – Deixe de blasfêmia homi… Sou eu, Rogério…
JEREMIAS – A, é você meu brother… porque não disse antes
ROGÉRIO – Acho melhor você parar de beber viu? Ta me confundindo até com o altíssimo.
JEREMIAS – Sei lá né? Tava falando com ele e de repente… o que fazes por aqui?
ROGÉRIO – Eu? Eu to voltando do serviço… o que você deveria tá fazendo também né? E largar
essa bebida…
JEREMIAS – Largar a bebida? Pra que? Pra ver a vida dura? Pra sentir as dores da solidão? Pra…
ROGÉRIO (cortando Jeremias) – Deixe de drama e agradeça…
JEREMIAS – Agradeça! Ai ai… parece que quem tomou umas foi você agora…
ROGÉRIO – Só to dando uns conselhos… você que sabe.
JEREMIAS – Se conselho fosse bom, não se dava… se vendia né? E eu seria rico… porque o que
eu sei de conselho dessa vida…
ROGÉRIO – Ta bom, tá bom… deixa para lá…
Entra Marcondes
MARCONDES – Rogério, é você? (Musica do além)
JEREMIAS – Agora és o senhor! Eu sei… eu sinto! Eu tava só brincando Deus… o senhor sabe
que meu coração é…
MARCONDES (cortando Jeremias) – Quem é esse?
ROGÉRIO – Grande Doutor Marcondes… quanto tempo! (se cumprimentam) Não ligue para esse
cabra não, é bebum mas é gente boa e meu amigo…
MARCONDES – Rapaz, esperava encontrar qualquer pessoa por aqui, menos você…
ROGÉRIO – Eu moro logo ali, e o que traz você aqui…
MARCONDES – Eu vim acompanhar uma pessoa que tá passando por sérios problemas e eu
aconselhei ela a procurar a família… mas vir na frente.
JEREMIAS – É solteira… se for o papai tá on viu?
MARCONDES (rindo) – É solteira sim, mas eu acredito que não é para seu bico não.
JEREMIAS – Olha só… não me conhece não. Aqui eu faço bico para todas.
ROGÉRIO (rindo) – Ai ai… só você para me fazer rir viu Jeremias…
JEREMIAS – Vai rindo… já já eu caso com essa mulher ai, deixa só ela melhorar da saúde…
MARCONDES – Bem… é… (corta o assunto) E as meninas, como vão?
ROGÉRIO – Ah, estão ótimas! Dando um pouquinho de trabalho dentro de casa, mas bem…
MARCONDES – Faz parte da idade né? Quem nunca deu trabalho aos pais nessa fase
JEREMIAS – Eu dou trabalho até hoje
MARCONDES E ROGÉRIO – A gente percebe
JEREMIAS – Pronto… falou os santos.
ROGÉRIO – Acho que minha mulher vai gostar bastante de te ver viu?
MARCONDES – Nossa, faz anos que não vejo a Célia, como ela tá?
ROGÉRIO – Mas reclamona e dramática do que quando a gente se casou.
JEREMIAS – Aquela ali é viu? Ô mulher…. Oia, as vezes eu vejo ela reclamando de la de cima
MARCONDES – E não pensa também que é Deus falando com você também não?
JEREMIAS – Voz de mulher né? Eu bebo mas não é pra tanto
ROGÉRIO – Sei…
MARCONDES – Então, eu fico na cidade mais um tempinho ainda. Vamos marcar alguma coisa
ROGÉRIO – Lá em casa, por favor!
MARCONDES – Claro! To doido para rever as meninas…
JEREMIAS – Se tiver uma dosezinha, me chama também!
ROGÉRIO – Ah sim, pode deixar que você será o primeiro a ser convidado.
MARCONDES – Anote meu número ai e me ligue…
Os dois trocam telefone
ROGÉRIO – Fechado então. Pô cara, muito bom te encontrar aqui e do nada
MARCONDES – A vida tem dessas… Quem diria que a Lenita me traria para perto de um dos
meus melhores amigos.
ROGÉRIO – Quem?
MARCONDES – Lenita. Aquela que eu vou acompanhar aqui
ROGÉRIO – Engraçado… a Célia tem uma parente com esse nome
Vão saindo de cena
JEREMIAS – Lenita então é o nome da minha futura esposa..
Sai de cena
Black
CENA 03
Entra Lídia e Marcia, cada uma fazendo uma coisa e espalhando roupas, livros e objetos pelo chão
Cena com a música – mesma movimentação da entrada anterior.
Entra Célia
CÉLIA – Não é possível que todos os dias essa casa esteja desse mesmo jeito
Celular toca.
CÉLIA (gritando) – Lídia! Marcia! Venham cá…
Celular toca novamente
CÉLIA – Quem é que já tá ligando uma hora dessas… (gritando) Ô meninas
Entram as duas enquanto Célia atende o telefone
CÉLIA – Alô! Sim, ela mesma!… Pois não… (improvisos ao telefone, depois de algum tempo)
Tudo bem… Muito obrigada… Tchau!
LÍDIA – Quem era?
CÉLIA – Dr. Marcondes, advogado da tia Lenita.
MÁRCIA – De quem?
CÉLIA – Tia Lenita… A irmã mais velha de sua falecida avó!
LÍDIA – Aquela ricaça, que tem várias fazendas em Itabuna?
CÉLIA – Ela mesma! Parece que estão vindo pra Salvador, coisa de saúde, documentos, ou coisa
assim. E nós somos os parentes mais próximos dela.
MÁRCIA – Quer dizer então que a tia Lenita vai colocar a gente no testamento dela?
CÉLIA – Não sei direito… Ela vai passar uns dias aqui… aí a gente fica sabendo dos detalhes.
LÍDIA – Mas… sendo da mesma família, por que tia Lenita sempre teve tanto dinheiro e a vovó
Carmem, que era irmã dela, não tinha onde cair morta?
CÉLIA – É uma longa história… Seu bisavô era um homem muito rico e também muito severo.
Quando mamãe disse que iria se casar com seu avô, Pedro, ele ficou uma fera. Não admitia que uma
de suas filhas, herdeira de uma grande fortuna, se casasse com um empregado da fazenda. Aí os
dois fugiram para se casar e o vovô não a considerava mais como filha, tanto é que a tirou do seu
testamento e a fortuna foi dividida entre tia Lenita e tio Alfredo.
MÁRCIA – E o tio Alfredo?
CÉLIA – Viúvo, sem filhos, morreu há alguns anos, num acidente de avião quando voltava de uma
viagem à Europa. Seu corpo nunca foi encontrado… Agora, só resta tia Lenita.
LÍDIA – E que vai passar toda sua fortuna para nós…
CÉLIA – Só mesmo um milagre desses para nos salvar financeiramente…
Entra Rogério
ROGÉRIO – Eu ouvi a palavra Milagre…
MÁRCIA – Mamãe tava aqui falando que a gente vai ficar rico
ROGÉRIO – Como é essa história?
CÉLIA – Eu não disse nada disso. Estava falando só de uma ligação que recebi.
ROGÉRIO – E na ligação dizia que você ganhou na loteria?
CÉLIA – Outro milagre para tirar a gente dessa miséria…
LÍDIA – Um moço que ligou para ela ai… de não sei a onde… falando de não sei que tia…
CÉLIA – Era sobre a Tia Lenita
ROGÉRIO – Serio? Nossa… eu ouvi esse nome ontem…
MÁRCIA – Quem seria a outra sortuda nesse mundo a ter um nome desses…
ROGÉRIO – Ontem quando eu estava voltando do serviço… você não sabe quem eu encontrei
amor… O Marcondes.
CÉLIA – Serio? Acabei de escutar esse nome…
LÍDIA – Quem seria o sortudo nesse mundo a ter outro nome desses… (Lídia e Marcia riem)
CÉLIA – Marcondes aquele seu amigo Doutor? Nossa… acho que faz anos que não vejo ele
ROGÉRIO – Mais ou menos a idade das meninas. Peguei o número dele para ele vir aqui em casa.
LÍDIA – Mas mãe, quando sua tia chega?
CÉLIA – Nossa tia, chega hoje à noite…
LÍDIA – Já?
CÉLIA – Já o que?
MÁRCIA – Nem leu o testamento e já tá dizendo que a tia é nossa
CÉLIA – Olhe menina… Cate esses pano de bunda que vocês espalharam pela casa e vão estudar
vão…
Márcia e Lídia saem
ROGÉRIO – É sério, que sua tia chega hoje… já?
CÉLIA – Pois é! Também achei estranho, mas… Deus escreve certo por linhas tortas…
ROGÉRIO – Vai ver que no Céu não tem papel pautado…
CÉLIA – Em todo caso… Pobreza, nunca mais!
ROGÉRIO – Eu tava brincando… mas gostei da ideia de ficar rico…
CÉLIA – A gente paga as dívidas… abandona tudo e vai viver por ai…
Os dois começam a fazer planos
A campainha toca
Márcia e Lídia saem correndo
MÁRCIA E LÍDIA: É a Tia Lenita!
Célia abre a porta
CILENE E REGINA: Quem é Tia Lenita?
MÁRCIA (desempolgada) – É uma tia da mamãe… (se concertando) uma tia nossa.
LÍDIA – Que vai deixar a gente rico.
CÉLIA – Lá para dentro… as duas… estudar…
Márcia e Lídia saem
CILENE – Que história é essa ein?
REGINA – Vai ficar rica e nem contou nada para a gente…
CILENE – Quem é essa tia?
REGINA – E porque ela vai deixar você logo você rica?
CÉLIA – Fique ai dando ouvido a essas duas meninas viu?
CILENE – Nos conte tudo agora
REGINA – E não esconda nada da gente
CÉLIA – Mulher, não é nada demais não. É só uma tia minha que vem passar dois ou três dias aqui
em casa. Só isso.
CILENE – É parente rico, aposto.
REGINA – Para ela tá escondendo isso da gente assim
CÉLIA – Tô escondendo nada não. Só recebi uma ligação agora a pouco de que ela tá a caminho
REGINA – E ela disse o que vem fazer?
CÉLIA – Não.
CILENE – Nem o que quer com você?
CÉLIA – Também não.
REGINA – Então é dinheiro sim
CILENE – E deve tá com o pé na cova, pra ter essa urgência.
CÉLIA – Vocês estão aumentando a história demais. Tia Lenita, é uma tia que mora lá em Itabuna.
Deve tá vindo fazer exames, passear, jogar dinheiro fora… foi isso que ela fez a vida toda
REGINA – Dinheiro fora? Você tem uma tia rica assim, e vive nessa pindaíba?
CÉLIA – Eu nunca tive contato direito com ela não. Ela é irmã da minha mãe… sabe esses parentes
como são né?
CILENE – Mas na hora testamento…
CÉLIA – Que testamento? (se fazendo de desentendia)
CILENE – Mulher… tia, rica, velha… só pode ser testamento.
CÉLIA – Em nenhum momento eu falei de testamento aqui
REGINA – Mas a gente supõe né?
CÉLIA – Quando é da vida dos outros, vocês supõe ate demais… Bora caminhando que eu tenho
mais o que fazer
Cilene e Regina saem resmungando
Toca Campainha
CÉLIA – É hoje meu Deus! (abre a porta) O que foi Jeremias?
Entra Jeremias cambaleando das pernas
JEREMIAS – E precisa me receber assim, nessa grosseira?
CÉLIA – Fale logo que eu não tenho o dia todo?
JEREMIAS – Rogério, cadê?
CÉLIA – Saiu!
JEREMIAS – A
Silêncio entre os dois
CÉLIA – É só isso? (apontando para a porta)
JEREMIAS – Sem querer parecer intrometido..
CÉLIA – Eu sabia…
JEREMIAS – E esse testamento todo?
CÉLIA – Mas que testamento homem? Céus… as paredes dessa casa tem ouvidos. E línguas…
JEREMIAS – Vai ficar rica?
CÉLIA – Vou… rica! Milionária. Vou dar um pé na bunda de Rogério e sair por ai.
JEREMIAS – Não acredito!
CÉLIA – Mas é a verdade… mas alguma coisa?
JEREMIAS – Faça isso não Dona. Seu marido um cara tão bom. Honesto. Trabalhador. Digno. Até
eu se fosse mulher, casava com ele
CÉLIA – Ah não… paciência é uma coisa que hoje acordei sem… vá vá vá Jeremias, que eu não
tenho tempo para bebum não…
Jeremias sai ainda falando do assunto
Célia dar as costas e a campainha toca
CÉLIA – Olhe, se for Jeremias outra vez, eu vou colocar ele para correr a vassouradas (abre a
porta) O que é peste…?
Entra Dr Marcondes
MARCONDES – É… desculpe…
CÉLIA – Me desculpe eu… o senhor é…?
MARCONDES – Ta me reconhecendo não?
Célia tenta lembrar de onde conhece
MARCONDES – Marcondes… lá de Itabuna?
CÉLIA – Claro! Meu deus… como tá diferente… entre.
MARCONDES – Me desculpe vir assim sem avisar…
CÉLIA – Me perdoe a forma como eu te recebi… é que tinha um bebum apertando meu juízo.
MARCONDES – O Jeremias não foi?
CÉLIA – Conhece ele também?
MARCONDES – Conheci ele outro dia, ai na rua com Rogério
CÉLIA – Não sei o que é que dar na cabeça do Rogério para andar com esse tipo de gente
MARCONDES – Mas o rapaz é gente boa.
CÉLIA – Só se for quando tá dormindo.
MARCONDES – E as meninas…? Devem tá enormes…
CÉLIA – Você nem reconhece… vou chamá-las (grita) Lídia! Márcia! Corre aqui…
Entram Marcia e Lídia
CÉLIA – Esse aqui é o Marcondes, um amigo meu e de seu pai.
MARCONDES – Meu deus como vocês estão grandes. Duas mulheres já. Eu tô ficando velho viu?
Márcia e Lídia riem meio sem graça
CÉLIA – Você fazer um café e já volto.
Sai Célia
LÍDIA – O senhor já tinha visto a gente?
MÁRCIA – Eu não me lembro não.
MARCONDES – Primeiro lugar sem essa de senhor… segundo, sim… mas vocês eram bastantes
pequenas
LÍDIA – O que é que traz o senhor (corrigindo) quer dizer, você aqui?
MARCONDES – Foi o grande coincidência. Vim acompanhar uma pessoa a resolver um problema
de família, me bati com o seu pai… e cá estou.
MÁRCIA – Então você é médico?
MARCONDES – Não. Advogado.
MÁRCIA – Interessante…
MARCONDES – Porque?
LÍDIA – A mamãe vai ficar rica, talvez precise de um.
MARCONDES – Rica? Que história é essa?
MÁRCIA – Um testamento, de uma tia dela que tá pra morrer…
MARCONDES – Engraçado, eu vim resolver uma história parecida, mas (Interrompido)
Entra Célia
CÉLIA – O que é que essas duas tão falando ai?
MARCONDES – Que vocês vão ficar ricos…
CÉLIA – Essa é boa…
MARCONDES – Engraçado que vim pra Salvador pra (interrompido)
Campainha Toca
CÉLIA – Se for aquele bebum…
Entra Rogério
CÉLIA – A, é você meu amor… não sabe quem tá aqui…
ROGÉRIO – O Doutor mais safado da Bahia
MÁRCIA – Doutor mesmo não, que ele não é médico.
ROGÉRIO – Mas é advogado… é doutor também.
LÍDIA – Doutor pra mim é quem faz doutorado.
Todos riem
ROGÉRIO – A quem essa menina puxou tão debochada assim ein…
MARCONDES – Está certíssima! E nem doutorado eu tenho, mas essa mania de chamar advogado
de Doutor…
LÍDIA – Pois bem!
MARCONDES – Agora me contem essa história de ficarem ricos
MÁRCIA – Uma tia de minha mãe que vai deixar toda a fortuna dela para a gente
CÉLIA – Olhe… vocês parem de tá espalhando essa história, que eu nem sei se é isso mesmo. As
vizinhas já ouviram, até o Jeremias já tá sabendo.
ROGÉRIO – Mas não é mentira né?
MARCONDES – Mas vocês têm certeza?
LÍDIA – Claro… ela chega hoje!
MARCONDES – Ela quem?
LÍDIA – Tia Lenita
MARCONDES – Lenita?
MÁRCIA – Isso…
MARCONDES – Lenita é o mesmo nome… (interrompido)
CÉLIA – Marcondes, Tia Lenita é uma irmã de minha mãe, que tem dinheiro, e tá vindo aqui pra
Salvador. Ela é lá de Itabuna, talvez você até conheça…
MARCONDES – É talvez, porque eu vim… (interrompido)
ROGÉRIO – Veio para tomar uma comigo… vamo ali em seu Zé?
MARCONDES – Ótima ideia!
CÉLIA – E esquece essa história de testamento… herança… riqueza… que isso só existe em filme
MARCONDES – Na vida real também viu?
LÍDIA – Deus te ouça. Não aguento mais ser pobre.
MÁRCIA – Nem eu…
CÉLIA – Coisa é cá… mas te contar viu? Um dinheiro vindo assim do nada, ia cair bem.
LÍDIA – Não que a gente esteja desejando a morte de Tia Lenita
CÉLIA – Longe de mim
ROGÉRIO – Amor quando sua tia chegar, manda me chamar viu?
Todos se despendem
Black
CENA 04
Toca a campainha. Célia vai atender. Márcia e Lídia ficam esperando
Entra Tia Lenita
CÉLIA – Tia Lenita! É um prazer revê-la. Entre!
TIA LENITA – Obrigada… obrigada, minha filha… Parece que levei uma surra de pau. Estou toda
arrebentada…
CÉLIA – Sente-se! Fique à vontade! (Tia Lenita senta-se) Estas são suas sobrinha-netas: Márcia e
Lídia! (improvisam cumprimentos) Eu vou fazer um cafezinho. Fique à vontade, Tia Lenita. Depois
a gente conversa, com mais calma… Afinal, temos muita coisa para falar, não é verdade?
Campainha toca
Entra Jeremias
JEREMIAS – Vixe, acho que entrei na casa errada… desculpe
MÁRCIA – Não Jeremias, está na casa certa.
JEREMIAS – E essa bela senhora, quem é?
LÍDIA – É nossa tia Lenita
Cumprimenta Lenita
JEREMIAS – A famosa Dona Lenita, que prazer conhecê-la
LENITA – Prazer… o senhor é?
JEREMIAS – Que senhor o que… eu um nobre..
Entra Célia
CÉLIA – Vagabundo...
Todos riem
JEREMIAS – Um nobre jovem… eu ia dizer
CÉLIA – Esse é Jeremias Tia, um amigo de Rogério
LENITA – A sim… imaginei… falar em Rogério, onde está ele?
CÉLIA – Foi ali com o velho amigo dele… o Marcondes
LENITA – Marcondes? Doutor?
LÍDIA – Ele não é Doutor não tia
MÁRCIA – Mas é la da terra de vocês…
LENITA – E é?
CÉLIA – É… ele é lá de Itabuna, talvez vocês até se conheçam…
LENITA – Faz tempo que eu não ando assim por lá…
JEREMIAS – E que mal lhe pergunte, o que traz essa linda senhora aqui?
LENITA – Bom… eu… (Célia Interrompe)
CÉLIA – Ô Jeremias, você não tem mais o que fazer por ai não? Ande… deixa Tia Lenita
descansar que já tá tarde…
JEREMIAS – É que eu marquei com Rogério
MÁRCIA – Meu pai tá na barraca de Seu Zé
JEREMIAS – Eu vou esperar ele por aqui mesmo (olhando fixamente para Lenita)
CÉLIA – Mas só se eu tiver maluca. Ande, saia…
Jeremias sai
LÍDIA – Mamãe… tadinho. (Fala para Lenita) Então tia… fez boa viagem?
Campainha toca
MÁRCIA – Jeremias novamente, quer apostar.
CÉLIA – Eu pago todos meus pegados com esse menino…
Abre a porta
Entram Cilene e Regina
LENITA – Essa casa é sempre movimentada assim mesmo?
LÍDIA – Quase sempre
MÁRCIA – Mas a senhora é uma novidade por aqui… por isso esse movimento
LENITA – Eu? Porque…?
CILENE – Porque Célia sempre dizia por aqui que você é a tia que ela mais gostava
LENITA – Eu?
REGINA – E a gente ficou curiosa para conhecer a senhora
LENITA – Tô me sentindo uma celebridade por aqui
CÉLIA – Não leve a sério essas duas, tia. Exageradas que só
LENITA – Eu tava até gostando. Sem entender, mas gostando
Regina e Cilene chamam Célia no canto
CILENE – Mulher… então essa é a tia rica
CÉLIA – Falem baixo
REGINA – E num é que ela veio mesmo?
CILENE – Ela já falou do testamento?
REGINA – De quanto ela tem de fortuna?
CILENE – Do Advogado?
REGINA – Das posses?
CILENE – Das Joias?
REGINA – Das Casas?
CÉLIA – (gritando) Vocês duas querem me deixar malucas?
LENITA – O que foi ai ein?
CILENE – Nada não Dona Lenita
REGINA – A Célia é meio surtada
CÉLIA – Devo ser mesmo… para deixar vocês duas uma hora dessas apertarem meu juizo. Vão
embora que tia Lenita precisa descansar.
CILENE – Amanhã nos voltaremos para tomar um chá
REGINA – E saber de tudo
Saem Cilene e Regina
LÍDIA – E então, tia? Como foi de viagem?
LENITA – Ai, um horror! Acho que não tenho mais idade para viagens…
MÁRCIA – (à parte) Acha?
LÍDIA – (confidencialmente, para a irmã) Márcia, vê se colabora… A gente tem que fazer a velha
ficar à vontade.
MÁRCIA – Não se preocupe, pelo que estou vendo, ela já está bem à vontade. (olha para Tia
Lenita, que tirou os sapatos e colocou os pés sobre o sofá) E outra: eu acho ridículo ficar
paparicando uma velhinha gagá.
LÍDIA – Acontece que essa “velhinha gagá” tem muito dinheiro e vai colocar a gente no testamento
dela.
MÁRCIA – Bom… todo mundo tem seu preço, não é? (mudando de comportamento) Titia… e
então, fale um pouco da senhora.
LENITA – Falar o que, minha filha? O que uma pobre velha como eu tem para falar?
MÁRCIA – Com certeza, muito mais que a gente…
LENITA – Vou fazer melhor! Vou mostrar algumas fotos que tenho aqui...
LÍDIA – Fotos?
LENITA – Isso… das fazendas lá em Minas, das nossas festas de fim de ano… (fica nostálgica)
Que pena…
MÁRCIA – Pena por quê?
LENITA – Por nada.... por nada...
Entra Rogério
ROGÉRIO – Tia Lenita, que felicidade em ver a senhora.
LENITA – Meu querido… como você tá?
ROGÉRIO – Tudo caminhando…
LENITA – Tava no serviço?
ROGÉRIO – Não… tava aqui no bar com um velho amigo
LENITA – A é verdade Célia falou…
MÁRCIA – Tia a senhora não quer ir pro quarto
LÍDIA – Deve tá cansada
LENITA – Não só fisicamente, mas também mentalmente…
LÍDIA – (fala para Márcia) Podre de rica, e cansada mentalmente.
Márcia repreende
ROGÉRIO – Isso meninas… levem a tia de vocês para descansar
Saem Lenita, Lídia e Márcia
Rogério olha para um lado e para o outro, percebe que está sozinho e comemora
Musica
ROGÉRIO – Ricooooooo! Eu tô rico. Meu deus! Eu nunca imaginei que a sorte poderia sorrir para
o nosso lado. Dividas pagas. Vou poder tomar cervejinha em paz, e será daquela verdinha viu? A
mais cara… A, mas eu vou voltar naquela empresa e dizer tanta, mas tanta coisa para aquele
supervisor meu. Ele vai ver só. Nunca mais busu lotado. Aquele negócio de pegar busu, pegar
metrô, pega outro busu… JAMAIS! Nunca mais cartão de crédito negado. Vou fazer churrasco todo
dia na beira da piscina. Piscina? Casa com piscina… providenciar já.
Célia entra olhando a cena
CÉLIA – Eu posso saber pra que essa casa com piscina.
ROGÉRIO – Meu amor… sua tia aqui em casa. Parece um sonho. Ela já tocou no assunto do
testamento?
CÉLIA – Rogério, Rogério… você não fique contando com o ovo no ... da galinha
ROGÉRIO – Bom, se ela não falou ainda, ela vai falar… não viu o estado que tá a bixinha? Não
sei nem como ela conseguiu chegar em Salvador
CÉLIA – É verdade, também achei a Tia Lenita bem pra baixo
ROGÉRIO – Vocês precisam de um momento a sós. Ela não vai falar assim na frente de todo
mundo.
CÉLIA – E essa casa hoje não parou, parece que estavam adivinhando
ROGÉRIO – E eu desci justamente para não atrapalhar essa conversa
CÉLIA – De todo modo, o que tiver acontecendo, ela deve me falar amanhã
ROGÉRIO – Você acha que eu já devo pedir demissão?
CÉLIA – De onde?
ROGÉRIO – Do serviço hora! Você acha que eu vou continuar trabalhando depois de rico
CÉLIA – Sabe o que eu acho
ROGÉRIO – O que?
CÉLIA – Que você andando com esse Jeremias, tá ficando igual a ele.
ROGÉRIO – Só você ainda não acredita nessa riqueza… (Cantando) Amanhã será um lindo dia…
Venha meu amor, vamos descansar e fazer planos.
Black

CENA 05
Outro Ambiente
Entra Jeremias
Musica
Do outro lado entram Cilene e Regina caminhando e se esbarram em Jeremias
Musica para na hora do encontro
JEREMIAS – Jesus, maria josé, que susto!
CILENE – Que susto digo eu…
REGINA – Digo a gente…
JEREMIAS – Parecem ‘duas assombração’ andando pela rua.
CILENE – Olha rapaz… respeite a gente
JEREMIAS – Ta bom, desculpe…
REGINA – Mas bom te encontrar aqui… já foi na casa da Célia
JEREMIAS – Ontem mesmo… mas ela foi logo me colocando para fora
CILENE – Claro! A tia rica dela chegou, ela não quer deixar ninguém ter contato.
JEREMIAS – Tô pouco me lixando se ela é rica ou não… mas achei ela uma gracinha
CILENE E REGINA – O que?
JEREMIAS – Isso mesmo… desde que eu ouvi esse nome: LENITA que pareceu músicas para
meus ouvidos
CILENE – Não é possível que eu esteja ouvindo uma coisa dessas.
JEREMIAS – Ouça e anote. Eu vou me casar com ela.
REGINA – Só porque ela é rica, se fosse uma de nós…
JEREMIAS – Eu ando bebo, mas não é pra tanto
REGINA – Como assim?
JEREMIAS – Cá pra nós…
CILENE – Veja bem o que vai falar de nós duas viu?
JEREMIAS – Deixa pra lá.
REGINA – Mas tirando esse papo de casamento, você conseguiu saber alguma coisa do testamento
CILENE – A Célia tá mesmo rica
JEREMIAS – Olha, eu tô sabendo…
Silêncio entre os três
REGINA – Anda homem…
Jeremias sai andando
CILENE – Não me faça de palhaça não. Conte tudo que sabe
JEREMIAS – Sabe o que eu sei?
REGINA E CILENE – Ãn…
JEREMIAS – Que nada sei (cai na risada)
REGINA – Mas nós devemos ser mesmo duas desocupadas para ficar aqui no meio da rua dando
ouvidos a Jeremias viu?
JEREMIAS – E num é que são desocupadas mesmo.
CILENE – Você tem razão Regina, larga ele para lá e vamos lá na casa da Célia
JEREMIAS – Vai perder seu tempo
REGINA – Porque?
JEREMIAS – Porque a Célia não tá recebendo ninguém depois que a tia chegou, nem mesmo a
mim que sou intimo da família e quem sabe até futuro parente.
CILENE – Parente… essa é boa.
REGINA – Célia é nossa amiga, duvido que bata a porta na nossa cara.
JEREMIAS – Pois vão lá.. Tentem..
Cilene e Regina saem
Entra Marcondes apressado
JEREMIAS – Ei.. Vai tirar a mãe da forca?
MARCONDES – Oi Jeremias, é você…
JEREMIAS – Não… é o Brad Pit.
MARCONDES – Olhando assim.. de longe, no escuro… parece… deixa eu ver… ah, já sei, o
branco do olho parece com o de Brad Pit
JEREMIAS – Deveria tá fazendo comédia no teatro
MARCONDES – Desculpe meu amigo, eu realmente tava apressado.
JEREMIAS – E eu posso saber o porque? Não tá aqui a passeio?
MARCONDES – Quem me dera. Não lembra que eu vim acompanhar uma cliente para resolver
um problema de família?
JEREMIAS – Huum… é verdade. E parece que o pepino é dos grandes né?
MARCONDES – Mais ou menos. Eu tô tentando todos os recursos, mas a situação é grave.
JEREMIAS – Saúde?
MARCONDES – Bom… (é interrompido)
Entram Cilene e Regina
CILENE – Não fique dando papo a ele não viu?
REGINA – Não fala coisa com coisa
JEREMIAS – E vocês duas falam coisas até demais, principalmente se for da vida dos outros.
CILENE – O senhor quem é?
MARCONDES – Desculpe… Marcondes
JEREMIAS – DOUTOR Marcondes!
REGINA – Doutor é?
JEREMIAS – É… mas não é para o bico de nenhuma das duas não
REGINA – Vai cuidar da sua vida.
JEREMIAS – E você vá cuidar da sua.
Jeremias, Regina e Cilene iniciam uma discussão
Marcondes interrompe
MARCONDES – Parem com isso… Estamos na rua! Jeremias, a moça não perguntou nada demais.
JEREMIAS – Vai dando corda para essas duas vai.
CILENE – Ele é assim mesmo. E muito me admira um doutor andando com um bebum desses.
MARCONDES – Jeremias é amigo de um velho amigo meu… ele é gente boa. Mas esqueçam esse
negócio de doutor. Sou só Marcondes.
REGINA – Mas não é daqui né?
MARCONDES – Não. Itabuna.
CILENE – Mesma terra da Célia.
MARCONDES – Se for a Célia, esposa de Rogério… sim…
CILENE – Então conhece nossa amiga
REGINA – E se conhece nossa amiga, deve saber da tia também
MARCONDES – Que Tia?
JEREMIAS – Minha Futura esposa
CILENE – Lenita
REGINA – Mas o ‘futura esposa’ é por conta dele.
MARCONDES – Essa tia eu não conheço não. Lenita… só conheço uma, mas…
JEREMIAS – Não deve ser a mesma
MARCONDES – Porque?
JEREMIAS – Primeiro que Lenita, a tia, não tá passando problema de saúde como a Lenita, sua
amiga.
CILENE – Isso ninguém sabe
REGINA – Dizem que Lenita, a tia, tá com o pé na cova
CILENE – E por isso vai deixar a Célia rica
MARCONDES – Olhe… essa história…
JEREMIAS – É verdade! Eu ouvi a própria Célia falando em testamento
MARCONDES – Bom, vou procurar saber dessa história direitinho, o Rogério não ia me esconder
isso. Agora deixa eu ir, que eu preciso resolver um grave problema.
Cada um sai para um lado
Black
CENA 06
Entra Lenita no telefone
LENITA – Oí? Dr Nicolau…tudo caminhando. Estou em Salvador sim. Podemos marcar aqui na
casa da minha sobrinha. Isso. Ta ótimo. Combinado. Até lá
Entram Marcia e Lídia
LÍDIA – Ta tudo bem tia?
LENITA – Sim. Era o médico.
MÁRCIA – Médico?
LENITA – Isso, marquei uma consulta. Ele vem aqui hoje a tarde
LÍDIA – Algo grave?
Telefone de Lenita toca
LENITA – Alô? Oi Doutor! O que? Testamento?…
Lenita sai de cena disfarçando
LÍDIA – Você ouviu o que eu ouvi?
MÁRCIA – Lídia.. TESTAMENTO. É real minha irmã
LÍDIA – Finalmente!
MÁRCIA – Eu vou poder comprar tudo que eu sempre quis
LÍDIA – E as viagens, festas, celular do ano…
MÁRCIA – Carro. Você sabe o que é isso? A gente vai ter nosso próprio carro
LÍDIA – Eu tô sonhando chegando na faculdade de carro
MÁRCIA – Faculdade? Já viu herdeiro ter faculdade? Eu termino o ensino médio e vou torrar esse
dinheiro. E só termino porque ninguém merece ser rica e ser burra
LÍDIA – Ai Márcia, eu não tava botando fé não, mas depois dessas ligações…
MÁRCIA – Você viu? Primeiro um médico… assim tão urgente… e depois outra ligação falando
de testamento
LÍDIA – Se me contassem eu nem acreditaria
Entra Lenita
LENITA – Acreditaria em que?
LÍDIA – Em nada tia…
LENITA – Precisei ter uma conversa particular com meu advogado
LÍDIA E MÁRCIA – Advogado? (se olham)
LENITA – É… uma longa história…
LÍDIA – Pois nos conte
MÁRCIA – Adoramos histórias longas
Entra Célia
CÉLIA – O que é que vocês duas já estão abusando ai?
LENITA – Suas filhas são uns amores Célia, nunca recebi tanta atenção por sobrinhas assim.
Célia olha para as duas repreendendo
CÉLIA – Imagino tia, imagino bem. Mas, que bom, titia, que vai ficar uns dias aqui com a gente...
LENITA – Uns dias nada… Dr. Marcondes não falou?
CÉLIA – Dr Marcondes?
LENITA – Isso, meu advogado.
MÁRCIA – Mãe, Dr Marcondes não é aquele amigo do pai?
CÉLIA – Seu pai tem um amigo advogado mesmo, mas não pode ser o mesmo
LENITA – Será que estamos falando da mesma pessoa?
LÍDIA – Seria coincidência demais
LENITA – Certamente
CÉLIA – Mas o que o advogado da senhora poderia falar comigo?
LENITA – Como vocês são minha família, a partir de agora, vou morar aqui com vocês.
CÉLIA, MÁRCIA e LÍDIA – (surpresas) Morar?!
LENITA – É... estou muito velhinha.... É preciso que tenha alguém sempre por perto, sabe, pra
quando eu morrer…
CÉLIA – Vira essa boca para lá tia…
Márcia e Lídia cochicham
LENITA – Ai... agora eu queria descansar um pouquinho....
CÉLIA – Venha, titia, eu a levo até seu quarto.
Saem Lenita e Célia
MÁRCIA e LÍDIA – (dando pulos de alegria) Estamos ricas! Estamos ricas!
LÍDIA – Já estou até me vendo… fazendeira!
MÁRCIA – Eu não quero nem saber de trabalhar... Quero só curtir, aproveitar o máximo, passar a
vida viajando... França.... Itália... Espanha... Suíça...
LÍDIA – Eu disse… eu sabia…
Entra Rogério
ROGÉRIO – Sabia de que?
MÁRCIA – Pai, pela primeira vez saiu nessa casa a palavra TESTAMENTO.
ROGÉRIO – Como é que é?
LÍDIA – E o senhor nem sabe, a Tia Lenita vai morar aqui com a gente.
ROGÉRIO – Gente… isso é melhor do que testamento. A gente vai aproveitar a grana dela, desde
agora. Vamos… me contem tudo… TUDO!
Toca a Campainha
MÁRCIA – Deve ser o médico de Tia Lenita
ROGÉRIO – Médico?
Rogério abre a porta
Entra Dr Nicolau
DR NICOLAU – Boa tarde, Senhora Lenita estar?
Entra Lenita
LENITA – Oi Doutor! Pode entrar
DR NICOLAU – Como vai a senhora?
LENITA – Do jeito que Deus quer, uma dorzinha aqui, outra acolá
Rogério, Márcia e Lídia se olham
LENITA – Vocês podem nos dar licença?
ROGÉRIO – Claro que sim! Vamos meninas, vamos deixar a tia de vocês a vontade
Saem Rogério, Márcia e Lídia
DR NICOLAU – Então, me conte sobre essas dores
LENITA – Então Doutor, sabe como é as coisas na idade né? Tride, Bete, Cata, Rose… tudo me
acompanhando por aqui.
DR NICOLAU – Quem são essas?
LENITA – Artrose, Artrite, Diabetes, Catarata, Osteoporose.
DR NICOLAU – Só você para me fazer rir viu?
LENITA – Ria não Doutor, que o caso é sério.
DR NICOLAU – Tá bom, vou te examinar um pouquinho
Doutor Nicolau examina Lenita
DR NICOLAU – Vou passar uns exames e assim eu posso dizer com mais clareza (é interrompido)
Entra Célia
CÉLIA – Clareza de que Doutor?
DR NICOLAU – Do que realmente a senhora Lenita tem
CÉLIA – Ai meu deus! Meu senhor Jesus! É muito sério?
DR NICOLAU – Bom… (é interrompido)
CÉLIA – Pode dizer Doutor nós somos fortes
DR NICOLAU – Na verdade… (é interrompido)
CÉLIA – (dramática) Ô titia… o que é que a senhora tem?
LENITA – (dramática igual a Célia) Eu não sei ainda minha filha
DR NICOLAU – Se acalme que… (é interrompido)
CÉLIA – Doutor, não esconda nada da gente
DR NICOLAU – Mas eu… (é interrompido)
Entra Jeremias
JEREMIAS – Ué… um médico por aqui?
LENITA – É para mim.
JEREMIAS – Pra você minha princesa? Porque?
DR NICOLAU – Só vim examiná-la
JEREMIAS – Doutor, não diga que eu vou perder minha amada
DR NICOLAU – Mas quem aqui disse… (é interrompido)
JEREMIAS – Leninha… seja lá o que quer que você tenha eu vou cuidar de você por toda sua vida
CÉLIA – Ora Jeremias, nos polpe… já estamos passando por um momento tão difícil e você vem
pra cá com sua cachaça braba falando besteira. Tia Lenita tem uma família que a ama muito, e que
vai cuida de toda sua fortu… (se concertando) dor. Seja lá o que ela tenha. Vá te embora vá.
Célia coloca Jeremias para fora
CÉLIA – Então Doutor, pode falar…
DR NICOLAU – Olhe só Dona…
CÉLIA – Célia.
DR NICOLAU – Dona Célia, eu nem consegui falar ainda… A Senhora Lenita…. (é interrompido)
Entram Cilene e Regina
REGINA – Um médico? Tá doente Célia?
LENITA – Na verdade é pra mim.
CILENE – Pra senhora… Hum… então foi pra isso que a senhora veio
REGINA – Cuidar da saúde
CILENE – E resolver aquelas coisas lá
REGINA – É grave Doutor?
CILENE – O que ela tem?
REGINA – Quanto tempo de vida ela tem? Sim, porque…
CÉLIA – Mas não é possível, aqui agora virou um brega. Não tocam a campainha, vão entrando
como se fossem a própria casa e chegam se metendo na vida dos outros
CILENE – Mas Célia somos suas amigas
REGINA – E estamos preocupados com toda essa situação.
CÉLIA – A preocupação de vocês é somente com a vida dos outros. Vão… tem nada pra fazer não?
Célia coloca Cilene e Regina para fora
LENITA – Célia, você poderia deixar eu e Dr Nicolau a sós por favor?
CÉLIA – Claro Tia! Como quiser…
Célia Sai
DR NICOLAU – Que confusão… Olhe Dona Lenita. Pelo que eu pude examinar, a senhora tá
muito bem de saúde, fisica… me preocupa é ó… a cabeça. Vamos fazer uns exames…
LENITA – Eu sei Doutor… Mas deixa eles pensarem que estou a beira da morte. É melhor pra mim
e eu ainda me divirto com toda essa situação.
Black
CENA 07
Outro ambiente
Entram Jeremias e Lenita
LENITA – Jeremias, bom te encontrar por aqui… tava mesmo querendo falar com você
JEREMIAS – E que demora foi essa minha deusa…
LENITA – Aquilo que você disse lá na casa da Célia?
JEREMIAS – Do que?
LENITA – Aquilo que você disse de “seja lá o que quer que você tenha eu vou cuidar de você por
toda sua vida”
JEREMIAS – Mas é claro! Eu já tinha me apaixonado por você, desde antes de te conhecer, só de
ouvir seu nome, eu sabia que você era a tampa da minha panela, a metade da minha laranja, a carne
da minha unha…
LENITA – (rindo) Já entendi Jeremias!
JEREMIAS – Mas porque a pergunta?
LENITA – Outra coisa, todo esse amor, não é porque eu sou ri… Quer dizer, porque dizem que sou
rica não né?
JEREMIAS – Leninha, olhe bem para mim… sou um homem lascado desde o dia que nasci, posso
não ter nada nessa vida, mas um amor sempre foi meu sonho. Eu bebo porque sou sozinho, porque
não tenho ninguém por mim, nem mim por ninguém… mas uma mulher, mudaria toda minha vida,
independente se é rica ou pobre, feia ou bonita… o que não é seu caso. Você é a flor mais bonita de
todo o jardim do mundo.
LENITA – (meio envergonhada) Jeremias, assim você me deixa sem jeito…
JEREMIAS – Mas é a mais pura verdade.
LENITA – Olhe, quero que você me escute bem.
JEREMIAS – Não quero nem saber o que você tem, quanto tem, pra quem vai deixar. Nada disso
me interessa. O que eu quero é seu amor.
Toca música romântica
LENITA – Jeremias… é sério…
JEREMIAS – Mas eu também tô falando sério
LENITA – Tudo eu que vou te contar é sério e eu quero segredo
JEREMIAS – Sou todo seu meu amor, inclusive os ouvidos
LENITA – Eu sei… mas olhe… Escute tudo com atenção o que eu vou te contar
Lenita puxa Jeremias e cochicha no ouvido de Jeremias
Ele vai reagindo de acordo com o que vai ouvindo
JEREMIAS – MEU DEUS DO CÉU LENINHA!
Black
CENA 08
Outro ambiente
Entram Márcia e Lídia
MÁRCIA – Lídia, olhe isso aqui…
LÍDIA – O que é isso?
MÁRCIA – Todo o roteiro que eu vou fazer de viagem a partir do próximo mês
LÍDIA – Mas já? Oxe…
MÁRCIA – A gente não pode perder tempo não meu bem
LÍDIA – É mais tô achando você rápida demais. Tia Lenita ainda está entre nós
MÁRCIA – E isso não é maravilhoso? A gente nem precisa esperar por nada. Com ela aqui fica
tudo mais fácil. Eu fiz até uma listinha básica de presentes. Olhe…
LÍDIA – Você é demais viu?
MÁRCIA – Demais eu não sei… mas besta é que eu não sou.
LÍDIA – É, mas eu tô com o pé atrás com essa história viu?
MÁRCIA – Porque?
LÍDIA – Porque tocar no assunto de herança ninguém tocou ainda. Já ouvimos falar de advogado,
médico… mas o money mesmo, até agora nada. Inclusive, ela não tá nem ajudando a mãe com as
despesas da casa.
MÁRCIA – Eu tenho pra mim que ela acertou tudo com o advogado primeiro. Essas coisas
demoram mesmo. É muita papelada. Ai disse que vinha morar com a gente. Logo depois veio o
médico. Ali foi o atestado mesmo. Tanto é que ela pediu para ficar a sós com ele… isso porque a
situação dela não deve ser nada boa. Agora acredito que ela converse a mãe sobre tudo.
LÍDIA – Eu espero que isso não seja tudo coisa de nossa cabeça
MÁRCIA – Minha irmã… a coisa tá posta. Só não enxerga quem não quer.
LÍDIA – Como eu não quero cair do cavalo, eu vou esperar ela falar e na minha frente.
MÁRCIA – Aceita que a sorte sorriu para nosso lado minha irmã. Deus finalmente enxergou a
gente. Comece a pensar em tudo que quer. É muito dinheiro viu?
LÍDIA – Só não saia espalhando isso por ai, Márcia. Sabe que a inveja tem sono leve né?
MÁRCIA – Eu sei! Só comentei com você. Nem mostrei a mãe ainda. Sabe como ela é né?
LÍDIA – Sei bem. E eu nem sei o que ela acha de toda essa história ainda
MÁRCIA – Uma maravilha né? Reclamava tanto da miséria…
LÍDIA – Você fala como se já fosse um fato.
MÁRCIA – E não é? Vamos, vou te ajudar com esses planos. Inclusive esse roteiro de viagem é
para nós duas
Black
CENA 09
Outro ambiente
Entram Cilene e Regina conversando
Se encontram com Marcondes
REGINA – Doutor Marcondes, pra onde vai com essa pressa?
CILENE – Esse homem só anda assim…
REGINA – Correndo pra lá e pra cá
MARCONDES – Minha vida é assim mesmo. E eu preciso resolver uma situação, antes que dê
merda lá na frente. Eu não sei como um bom advogado, não me atentei para isso antes
CILENE – E a gente pode saber o que é?
REGINA – Só curiosidade. Do jeito que tava correndo, do jeito que falou… parece ser sério.
MARCONDES – E é viu?
Silêncio entre os três
CILENE – (gritando) Vamos homem….
REGINA – Conte.
MARCONDES – Tô pra ver duas mulheres mais fofoqueiras viu?
REGINA – Quando foi que você já me viu fofocando? A bom…
MARCONDES – Mas talvez vocês ajudem mesmo…
CILENE – Ta vendo ai. Agora precisa da gente…
MARCONDES – Lembram que eu disse que eu vim pra Salvador, para resolver uma situação
delicada com a família de uma cliente lá de Itabuna?
REGINA – Sim… me lembro.
MARCONDES – A família é Célia e Rogério. E minha cliente é a tia de Célia
CILENE – Deus do céu… então é você o advogado que tá cuidando do testamento de Lenita.
REGINA – E de toda a herança que Lenita vai deixar pra Célia
CILENE – E o advogado é amigo da família…
REGINA – E… (Marcondes interrompe)
MARCONDES – E mais nada. Parem de espalhar essas coisas por ai…
REGINA – Que mundo pequeno
CILENE – Minusculo…
REGINA – A quem diga que coincidências não existem…
CILENE – Olha a sorte sorrindo para nossa amiga Célia.
MARCONDES – Eu tô indo agora na casa do Rogério e explicar toda a situação
CILENE – Eu é que não perco esse babado por nada
REGINA – Nem eu
Black
CENA 10
Outro ambiente
Célia entra, deita no sofá, liga o som e relaxa
Entram Márcia e Lídia
MÁRCIA – Ué, mamãe… não foi trabalhar hoje?
CÉLIA – Nem hoje, nem nunca mais! Deixei o emprego! A partir de agora vou tomar conta da tia
Lenita. (pausa) Não é pelo dinheiro… é que ela precisa de alguém para tomar conta dela, coitada, e
como você e sua irmã só sabem dormir…
LÍDIA – Inclusive, dormir nunca mais… Mãe, precisamos te mostrar tudo que planejamos com
essa nova vida da gente…
CÉLIA – Eu também tenho altos planos filha… vou reformar a casa, renovar o guarda-roupa…
MÁRCIA – Mainha… Tia Lenita já conversou com você sobre essa herança?
Toca a campainha
LÍDIA – Deixa que eu atendo!
Entram Marcondes, Regina e Cilene
LÍDIA – Doutor Marcondes…
CÉLIA – Marcondes… que surpresa! Regina, Cilene… o que fazem com Dr Marcondes?
REGINA – Viemos trazer boas notícias.
CILENE – Boas não. Maravilhosas notícias!
MARCONDES – Célia… tudo bom? Rogério também tá por ai?
CÉLIA – Ta sim. (gritando) Rogério… Marcondes tá aqui…
Entra Rogério
ROGÉRIO – Grande Marcondes! A que devo a honra
LÍDIA – Segundo Regina, veio trazer boas notícias
MÁRCIA – Boas não! Maravilhosas
MARCONDES – Isso quem tá dizendo são elas… então, lembram que eu vim aqui para resolver
uma situação delicada com a família de uma cliente lá de Itabuna?
CÉLIA – Sim.
MARCONDES – A minha cliente é a sua tia, Lenita.
Toca Campainha
Entra Jeremias
CÉLIA – Agora não Jeremias. Estamos resolvendo um assunto de família
JEREMIAS – Mal sabendo ela que eu já sou mais da família que ela…
CÉLIA – Como?
CILENE – Não dê ouvidos a ele e escute a notícia mulher…
CÉLIA – Vou preparar um cafezinho para a gente, ou seria melhor uma champagne? (ri)
JEREMIAS – Isso! Champagne para todos! Adorei a ideia!
MÁRCIA, LÍDIA, CILENE E REGINA – Cala a boa Jeremias!
JEREMIAS – Vamos ver quem ri por último!!
MARCONDES – Não, precisa de champagne nenhum. Nem Café…
Lenita vai entrando, se assusta com a presença de Marcondes e volta correndo…
JEREMIAS – Como eu já sei de toda a história, vou lá buscar a Leninha
MARCONDES – Acredito que com o tempo que Dona Lenita está na sua casa, a senhora já deve
estar a par de toda situação. Ou resta ainda alguma dúvida?
CÉLIA – Estou, estou sim… Conversei muito com tia Lenita, ontem à noite. Já sabemos que ela vai
morar aqui com a gente… estamos a par de tudo.
LÍDIA – Mãe, deixa o Marcondes explicar…
MARCONDES – Ótimo! Então só é preciso que a senhora assine aqui, para que eu dê entrada nos
papéis e cuide, o mais rápido possível, da parte jurídica.
ROGÉRIO – Mas não seria melhor ouvir ele primeiro… O que é isso Marcondes?
CÉLIA – Deixa de coisa homem. Marcondes é de casa, Tia Lenita também… (assina sem ler) Mais
alguma coisa?
MARCONDES – Só isso! E quem bom que a senhora aceitou tranquilamente Depois um contador
virá aqui para fazer o levantamento de todas contas e negociar um prazo para o pagamento.
CÉLIA – (estranhando) Pagamento?
MARCONDES – É… Como d. Lenita perdeu tudo o que tinha, em maus negócios, a única fazenda
que restou, se for vendida, não vai dar para pagar nem a metade das contas que tem. Dr Nicolau,
depois de examiná-la, concluiu que ela não tem condições nenhuma de tomar qualquer decisão.
Como a senhora passa a ser responsável por ela, fica também sob sua responsabilidade cuidar dos
seus bens, ou nesse caso, quitar as dívidas!
Todos se olham boquiabertas
CÉLIA – (desesperada) Eu não acredito!!
Entram Lenita e Jeremias
JEREMIAS – E como eu não tenho onde cair morto, vamos ficar juntos e morar todos por aqui
LENITA – Como demostraram tanto amor por mim desde quando eu cheguei, não vão se importar
em ter mais duas boquinhas por aqui né?
CÉLIA – (grita furiosa) Tia Lenita!
LÍDIA – E a mamãe disse que Deus escrevia certo por linhas tortas…
MÁRCIA – Se for verdade… vai ter caligrafia ruim assim no inferno!
Black

FIM

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