Você está na página 1de 228

Cadastre-se em www.elsevier.com.

br para
conhecer nosso catálogo completo, ter acesso a
serviços exclusivos no site e receber informações
sobre nossos lançamentos e promoções.
Do original: 28 Business Thinkers Who Changed the World
Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Kogan Page Limited
Copyright © 2011, by Rhymer Rigby

© 2012, Elsevier Editora Ltda.

Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei no 9.610, de 19/02/1998.


Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou
transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou
quaisquer outros.

Copidesque: Ivone Teixeira


Revisão: Edna Cavalcanti e Roberta Borges
Editoração Eletrônica: Estúdio Castellani

Elsevier Editora Ltda.


Conhecimento sem Fronteiras
Rua Sete de Setembro, 111 – 16o andar
20050-006 – Centro – Rio de Janeiro – RJ – Brasil

Rua Quintana, 753 – 8o andar


04569-011 – Brooklin – São Paulo – SP – Brasil

Serviço de Atendimento ao Cliente


0800-0265340
sac@elsevier.com.br

ISBN 978-85-352-5632-1
Edição original: ISBN: 978-0-7494-6239-0

Nota: Muito zelo e técnica foram empregados na edição desta obra. No entanto, podem ocorrer erros de digitação,
impressão ou dúvida conceitual. Em qualquer das hipóteses, solicitamos a comunicação ao nosso Serviço de
Atendimento ao Cliente, para que possamos esclarecer ou encaminhar a questão.
   Nem a editora nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoas
ou bens, originados do uso desta publicação.

CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

R425v Rigby, Rhymer


28 mentes que mudaram o mundo [recurso eletrônico] : os maiores desbravadores da gestão
em todos os tempos / Rhymer Rigby ; tradução Alessandra Mussi. – Rio de Janeiro : Elsevier, 2012.
recurso digital

Tradução de: 28 business thinkers who changed the world


Formato: PDF
Requisitos do sistema: Adobe Acrobat Reader
Modo de acesso: World Wide Web
ISBN 978-85-352-5632-1 (recurso eletrônico)

1. Profissionais de negócios – Biografia. 2. Administração. 3. Negócios. 4. Livros eletrônicos.


I. Título. II. Título: Vinte e oito mentes que mudaram o mundo.

11-7850. CDD: 923.3


CDU: 929:330
Sumário

Introdução O que torna alguém um desbravador da gestão? 1

Capítulo 1 Steve Jobs 7

Capítulo 2 Richard Branson 13

Capítulo 3 Warren Buffett 19

Capítulo 4 Jeff Bezos 25

Capítulo 5 A dupla do Google (Sergey Brin e Larry Page) 33

Capítulo 6 Sir Tim Berners-Lee 41

Capítulo 7 Anita Roddick 47

Capítulo 8 Ray Kroc 55

Capítulo 9 Rupert Murdoch 63

Capítulo 10 Peter Drucker 71

Capítulo 11 Ingvar Kamprad 77

Capítulo 12 Oprah 85

Capítulo 13 Sam Walton 93


Capítulo 14 Mary Kay Ash 101

Capítulo 15 Bill Gates 107

Capítulo 16 David Ogilvy 115

Capítulo 17 Meg Whitman 123

Capítulo 18 Mark Zuckerberg 131

Capítulo 19 Howard Schultz 135

Capítulo 20 Jack Welch 143

Capítulo 21 Michael Dell 151

Capítulo 22 Tom Peters! 157

Capítulo 23 Ricardo Semler 165

Capítulo 24 Herb Kelleher 173

Capítulo 25 Andy Grove 181

Capítulo 26 Roman Abramovich 189

Capítulo 27 George Soros 195

Capítulo 28 Akio Morita 201

Fontes 207

Índice 209
Introdução
O que torna alguém um
desbravador da gestão?

P odemos usar a descrição de Rupert Murdoch para início de conversa – “é


a capacidade de sempre ver o que está por vir”. Contudo, quanto mais
analisamos, mais percebemos que definir o que torna alguém um desbravador
é quase tão fácil quanto pregar gelatina na parede. Em muitos casos, é possível
resumir em uma frase o que essas pessoas fizeram com certa acuidade. Ingvar
Kamprad: levou estilo às massas. Warren Buffett: investiu no que entendia e
acreditava. Anita Roddick: criou um negócio para promover mudanças sociais.
Howard Schultz: introduziu o café como marca de um estilo de vida, e assim
por diante, mas isso não ajuda muito.
Talvez tenham feito algo surpreendentemente original ou o óbvio ululan-
te, mas que só agora conseguimos ver como tal. Às vezes, é esse o caso. Por
exemplo, o grande diferencial de Mary Kay Ash foi que seu negócio oferecia
às mulheres as chances que todas as demais empresas lhes negavam. Outras
vezes, as pessoas descobrem um novo jeito de fazer o que já existe. O Google
certamente não é o primeiro mecanismo de busca, mas é infinitamente me-
lhor que seus antecessores. Há quem se destaque sem fazer nada realmente
original. Ray Kroc não foi o inventor do conceito original do McDonald’s,
tampouco foi o dono da primeira rede de restaurantes. E, como muitas com-
parações com Hearst insinuam, Rupert Murdoch está longe de ser o primeiro
magnata a ver o poder e as possibilidades decorrentes de ser dono de meios de
comunicação.
Por fim, chegamos à conclusão de que, embora possível, não há uma fór-
mula mágica para reunir uma lista de atributos capazes de transformar as
2  28 mentes que mudaram o mundo

pequenas vitórias cotidianas de um empreendedor no tipo de sucesso capaz de


transformar um setor – e, às vezes, o mundo. Em uma resenha deliciosamente
mordaz de um livro publicado em 1987, PJ O’Rourke escreveu: “São os apa-
tetados jovens da gestão da América, e cada pobre mortal que tenta imitá-los
tem uma cópia do livro Iacocca: A Biography embaixo do braço... O segredo
está lá e o aparvalhado sabe disso. Quem sabe, se ler com bastante atenção,
conseguirá decifrar o código?” O’Rourke nunca fez segredo de seu desdém por
Iacocca, descrevendo-o, poucas linhas depois, como um “mascate convencido,
falastrão e demagogo”. Mas O’Rourke levantou uma questão importante e
tão óbvia que quase ninguém conseguia ignorar. Na maior parte do tempo,
a chave do sucesso não existe. Em outras palavras, o segredo é tão óbvio que
nem chega a ser segredo.
Sem dúvida, qualquer lista desse tipo será arbitrária até certo ponto. É
como uma lista dos cem melhores filmes, músicas ou livros. Sem mencionar os
argumentos convencionais, sempre é possível alegar que X deveria ficar de fora
e que Y deveria ser incluído – sem contar os casos extremos. Aqui, o critério foi
que, de uma forma ou de outra, os integrantes desta lista são desbravadores
que causaram impacto importante ou duradouro no mundo dos negócios e,
muitas vezes, na própria humanidade.
Essa ideia permite um escopo mais amplo e levou à inclusão de Tim Ber-
ners-Lee, um homem que, acima de tudo, é acadêmico. Isto posto, como esse
é o homem por trás da world wide web, não é difícil dizer que ele mudou o ce-
nário dos negócios – o dia a dia de quase todo mundo no planeta. Sem dúvida,
existe um limite para esse tipo de justificativa. Se ampliasse muito esse parâ-
metro, acabaria incluindo políticos, artistas etc. Mas Berners-Lee foi mantido
porque mudou diretamente o mundo dos negócios. Esse tipo de argumento é
válido, em menor grau, para casos como o de Anita Roddick. Há pessoas que
criaram impérios corporativos muito maiores que não entraram aqui, mas ela
foi a primeira a misturar preocupações comerciais e éticas de forma convincen-
te para a cultura predominante. Desse modo, o impacto que causou no mundo
é desproporcional ao tamanho de seu negócio.
A lista também pende bastante para os Estados Unidos, o que não deve
ser surpresa para ninguém. O século XX – berço do moderno mundo dos
negócios – foi, em grande parte, o século dos Estados Unidos. Além disso, a
maioria das mudanças que abalaram o mundo – da automação à terceirização,
à revolução das empresas pontocom e às crises financeiras – teve origem nos
O que torna alguém um desbravador da gestão? 3

Estados Unidos. Durante quase cem anos, esse país abrigou a maior concen-
tração de riqueza e talento empreendedor da história. Se este livro fosse publi-
cado em 1911, provavelmente seria dominado por personagens britânicos. Por
outro lado, se for publicado daqui a cem anos, empresários indianos e chineses
certamente ocuparão o maior número de lugares da lista.
Há outra razão também: talvez a natureza do capitalismo anglo-saxão, que
levou os Estados Unidos a produzirem tantas pessoas influentes. Nesses mol-
des, o capitalismo tem dois atributos dignos de nota. Primeiro, é um modelo
para vencedores, que tende a produzir figuras heroicas de alta visibilidade,
veneradas principalmente porque representam, até certo ponto, o sonho capi-
talista americano. Lugares como Europa e Japão também têm empreendedo-
res que causaram grande influência, mas tendem a ser bem mais comedidos,
com uma cultura muito mais contemporizadora e colegial (vale ressaltar que o
Reino Unido situa-se no meio-termo). O segundo atributo é que o capitalismo
americano também provocou verdadeiras revoluções, especialmente quando
comparado ao sistema japonês. Paradigmas antigos morrem rapidamente e
novos surgem em seu lugar, e essa dinâmica tende a produzir figuras heroicas.
Esses fatores podem ser pontos fortes e fracos, mas esse tipo de capitalismo
tende a produzir mais líderes iconoclásticos que suas variações.
Se já é difícil listar desbravadores por suas ações, que dirá tentar especificar
seus atributos. Por exemplo, é de se esperar que, para ser uma grande mente da
gestão, é preciso ser excepcionalmente inteligente. Sem dúvida, alguns deles o
são, em especial em setores mais intrincados. A dupla do Google, Bill Gates
e Steve Jobs é, indubitavelmente, dotada de inteligência brilhante. Contudo,
esse não é um pré-requisito. O antigo clichê segundo o qual muitas atividades
comerciais não são nenhum bicho de sete cabeças tem um bom fundo de ver-
dade. Em muitos setores, há pessoas de extremo sucesso, provavelmente dota-
das de grande “inteligência emocional”, mas que não podem ser consideradas
de grande destaque intelectual. Como Sir Martin Sorrell diz: “Gestão não é
neurocirurgia, certo?” (Rigby, 2004).
O mesmo se pode dizer de história de vida. É tentador pensar que os Ro-
ckefeller de nosso tempo surgiram tranquilamente de plataformas douradas
ou trilharam um caminho de pedras para sair da mais profunda pobreza. Às
vezes, isso acontece. Oprah Winfrey foi criada em condições muito difíceis no
interior sulista dos Estados Unidos, e há outros na lista deste livro que, como
diz o ditado, “nasceram em berço de ouro”. Mas também há muitos oriundos
4  28 mentes que mudaram o mundo

da classe média. As grandes mentes da gestão advêm de todas as camadas


sociais. Em 2009, Robert Peston, o jornalista da BBC, falou sobre a “ferida
do empreendedor”, insinuando que a infância difícil, da qual o sujeito passa
a vida fugindo, pode ser o segredo do sucesso. Isso também não é verdade.
Os ambiciosos extravagantes não são necessariamente felizes ou motivados
pelo que se pode descrever como ambição saudável, e suas vitórias podem ter
sido conquistadas à custa dos outros. “Pessoas de muito sucesso costumam
ser ligeira ou grandemente malucas”, disse Gerry Robinson, ex-presidente da
Granada Media (Rigby, 2004). “Essa obstinação tem um lado negativo, capaz
de levar à procura de algo que não existe ou ao medo do fracasso. Por exemplo,
veja uma pessoa como Murdoch – por que diabos ele faz o que faz? Será que
outro negócio fechado vai fazer alguma diferença? Deve haver algum signifi-
cado maior na vida.”
No entanto, é possível ser, ao mesmo tempo, um desbravador e uma pes-
soa equilibrada. Para cada Sam Walton, há pessoas que alcançaram enorme
sucesso e parecem genuinamente felizes. Richard Branson vive ingressando
em novos segmentos, mas sua grande motivação parece ser um tipo de jovia-
lidade permanente. Outros expoentes, de Buffett à dupla do Google, parecem
bastantes felizes com o que fazem. Também é mito dizer que é preciso tratar
mal as pessoas. Sem dúvida há sujeitos como Zuckerberg, do Facebook, que
parecem deixar uma trilha de ressentimento para trás, mas o que dizer de Tim
Berners-Lee e Anita Roddick? A maioria os considera simpáticos, equilibra-
dos e felizes da vida. O próprio Bill Gates, apesar de todos os seus detratores,
decidiu tornar-se o maior filantropo da história.
Talvez a coisa mais surpreendente neste mundo obcecado pela juventude
seja a premissa de que a grandiosidade está relacionada à mocidade. Outro
mito. Ray Kroc, o homem por trás do McDonald’s, estava na casa dos 50 anos,
quando muitos já pensam em se aposentar, quando surgiu a maior oportuni-
dade de sua vida profissional. Quando perguntaram a Mary Kay Ash como
conseguira atingir o sucesso tão rápido, ela respondeu: “Eu estava na meia-
idade, tinha varizes e não tinha tempo para ficar vadiando.” Pouco antes de
sua carreira decolar, David Ogilvy escreveu um memorando começando com
“será que alguma agência contratará este homem? Ele tem 38 anos, e está
desempregado...”.
Duas características que todos eles parecem ter em comum são a ambição e
a obstinação, às vezes em grau extraordinário. Um exemplo muito claro disso
O que torna alguém um desbravador da gestão? 5

é Ray Kroc, que não foi quem teve a ideia original do restaurante, não abriu
a empresa, tampouco aplicou o modelo Henry Ford ao segmento de restau-
rantes de serviço rápido. Contudo, Kroc tinha uma ambição e uma visão que
faltavam aos irmãos McDonald (os fundadores da rede de fast food). Foi isso,
não um nome sugestivo ou um sistema fantástico, que tornou um punhado
de restaurantes na Califórnia uma das marcas mais reconhecidas no mundo.
Como diz o ex-CEO da Marks & Spencer, Sir Richard Greenbury, esse tipo
de mente obstinada não pode ser fabricada: “Você nasce assim ou não – são
coisas que fazem parte do caráter da pessoa.” Talvez também exista outro fator
comum a todos esses gênios – o apetite pelo risco. Quase todos os grandes
cérebros da gestão – em especial os dotados de uma veia altamente empreen-
dedora – gostam de assumir riscos de um jeito que os demais detestam.
Embora talvez necessárias, essas condições não são exclusivas. Em termos
de fatores externos, existe o timing, o ambiente de negócios, o “estar no lu-
gar certo, na hora certa”, entre uma série de outros quesitos. Personalidade,
habilidades pessoais e políticas certamente ajudam, ao passo que certa rigidez
também não mata ninguém. Uma mentalidade contestatória não é um mal, e
assim por diante. Há um ingrediente muito importante, como Gerry Robin-
son certa vez me disse: “É preciso ter sorte – todo mundo precisa de um pouco
de sorte.”
Embora muitas vezes de modo bastante discreto, a sorte não perde sua
importância só porque os estudiosos da administração gostam de pensar nessa
disciplina como uma ciência real. No entanto, um pouco de sorte é crucial.
Warren Buffett observou, de modo memorável, que, se tivesse nascido no
Peru ou em Bangladesh, não passaria de um agricultor de subsistência. Mesmo
quem foi criado em condições confortáveis, geralmente teve a sorte de apostar
no setor certo, na hora certa, em algum momento da vida. Além disso, somos
responsáveis pela própria sorte. Robinson diz que “a maioria das pessoas de
muito sucesso é extremamente dedicada ao que faz”. Na verdade, é de se ima-
ginar que, apesar de toda a modéstia populista de Buffett, se ele tivesse de ser
um agricultor no Peru ou em Bangladesh, não ficaria muito tempo como tal.
Estou dizendo que você não pode aprender nada com essas pessoas? Claro
que não. A história da gestão ilumina o presente e o caminho para o futuro.
A evolução de muitas dessas pessoas está vinculada à história do século XX;
por exemplo, Grove e Soros escaparam do Holocausto e fizeram uma nova
vida nos Estados Unidos. Além disso, visto que as grandes empresas causavam
6  28 mentes que mudaram o mundo

impacto cada vez maior no cotidiano das pessoas, é interessante analisar como
esses expoentes refletiram e influenciaram a transformação do mundo.
Na esfera prática, as grandes mentes da gestão têm muito a ensinar. Para
quem deseja ser mais inovador, não é má ideia imitar alguns aspectos do com-
portamento da dupla do Google. Para quem quer aprender sobre publicidade
e construção de marca, não existe modelo melhor do que Richard Branson.
E, para qualquer pessoa ansiosa por estabelecer um negócio com responsabi-
lidade social, um bom ponto de partida pode ser ler a respeito de Anita Rod­
dick. Entretanto, você não aprenderá como ser qualquer um deles. Aliás, isso é
quase tão certo quanto a propensão de detentores de MBA ao sucesso, mas os
diplomas não os tornam, necessariamente, desbravadores da gestão. Po­de-se
ensinar muitas coisas às pessoas, mas é impossível ensiná-las a ser alguém além
de si mesmas.
É isso aí. Trabalhar com afinco, assumir riscos, encontrar as circunstân-
cias certas e contar com uma pitada de sorte, entre alguns outros itens, são os
ingredientes da receita de um empreendedor de sucesso. Esse é o segredo e a
essência do negócio. Se você tem esse dom, provavelmente já sabe disso ou age
de maneira não premeditada. Do contrário, não se censure por isso. Você é
apenas alguém equilibrado e bem-sucedido pelos parâmetros normais.

Referências e leituras adicionais

O’Rourke, PJ (1987) The deep thoughts of Lee Iacocca (resenha), in Give War a
Chance, pp 145–50
Peston, Robert (2009) The Entrepreneur’s Wound, BBC Radio 4, 30 de outubro
Rigby, R (2004) Naked ambition and how to get it, in Management Today [Online]
http://www.managementtoday.co.uk/news/450123/Naked-ambition
Capítulo 1
Steve Jobs

S e você tivesse de escolher uma única pessoa que personificasse o Vale do


Silício, teria uma lista de candidatos que provavelmente incluiria Bill Hew-
lett e David Packard, Bill Gates (mesmo que a Microsoft não esteja no Vale),
Andy Grove e a dupla do Google. Entretanto, para muitas pessoas, a escolha
seria outra, muito mais fácil – escolheriam Steve Jobs. Por um lado, Jobs era a
síntese do geek descolado, que naturalmente mesclava o conhecimento e a pai-
xão por tecnologia com uma visão de mundo inovadora e um tanto alternativa.
Por outro, Jobs era, de fato, um homem de negócios formidável. A Apple, da
qual Jobs foi cofundador, presidente e CEO, tem uma compreensão intuitiva
de design e interface do usuário que é, indiscutivelmente, a mais admirável que
a de qualquer outra empresa no mundo.
É inegável que Jobs personificava a Apple, que não só é uma empresa mas
também um fenômeno cultural. Os lançamentos de seus produtos são “aconte-
cimentos”, seus consumidores têm uma devoção que às vezes beira o fanatismo
religioso, são inovações que geram polêmica e, tanto uma pessoa que goste de
design quanto o mundo consumidor moderno, todos devem ter interesse pela
Apple. Para muitos, a Apple era Jobs e Jobs era a Apple.
Jobs nasceu em 1955; sua mãe biológica, uma jovem solteira, entregou-o
para adoção. Paul e Clara Jobs, o casal que o adotou, viviam em Mountain View
na Califórnia. Jobs passou a infância e a adolescência perto de San Francisco,
a capital da contracultura. Mas enquanto o norte da Califórnia talvez tenha
sido a capital hippie do mundo, outra revolução também acontecia nas proxi-
midades. Dos anos 1950 em diante, a pesquisa na Universidade de Stanford
8  28 mentes que mudaram o mundo

transformava o Vale do Silício (o termo foi cunhado em 1971) em centro de


alta tecnologia global. As duas revoluções ocorridas no norte da Califórnia no
século XX deixaram suas marcas em Jobs. Ele era a quintessência liberal da
costa oeste – com sua visão alternativa e, vale dizer, pela maneira como dirigia
sua empresa. No entanto, Jobs foi um dos homens de negócios mais influentes
do final do século XX e, quando se trata de produtos de alta tecnologia para o
consumidor, um gênio inigualável.
Depois que terminou o ensino médio em Cupertino, Califórnia, Jobs foi
estudar ciências – além de literatura e poesia – na Reed College, em Portland,
no Oregon. Cursou somente um semestre e voltou para sua cidade natal,
onde arrumou emprego como técnico na Atari. Na época, já era um nerd
e jun­tou-se ao lendário Homebrew Computer Club, onde conheceu Steve
Wozniak. Em seguida, fez uma viagem para a Índia em busca de iluminação
espiritual, e retornou para a Atari. Em 1976, Jobs, Wozniak e Ronald Wayne
(que hoje não passa de uma nota de rodapé esquecida e um tanto melancólica
na história do Vale) fundaram a Apple na garagem da casa de Jobs. O Apple I
foi lançado em 1977, fornecido desmontado, sem teclado, gabinete ou moni-
tor; custando US$666,66, ou o equivalente a pouco menos do que US$2.500
pelo valor do dólar em 2010, foi um sucesso imediato.
A startup evoluiu rapidamente. Em 1977, lançou o Apple II e, em 1979, o
Apple II+. Em 1980, o capital da empresa foi aberto, e a fortuna de Jobs alcan-
çou a marca de US$165 milhões. Mas foi numa visita à Xerox, em 1979, que a
Apple realmente colocou-se em seu atual caminho. Jobs havia comprado ações
da empresa e foi conferir o Xerox Alto, o primeiro computador com interface
gráfica para usuários (GUI – Graphical User Interface), elemento usado até
hoje em praticamente todos os computadores desktop ou laptop. A Apple já
vinha trabalhando numa GUI, mas o que Jobs viu na Xerox foi um estímulo a
mais e, em 1983, foi lançado o Apple Lisa. As políticas internas tornavam-se
um fator importante, e Jobs foi colocado de fora do projeto do Lisa. O con-
tratempo não foi tão ruim, pois o Lisa foi um fracasso comercial e levou Jobs
a ingressar no projeto Macintosh. Em 1984, o Apple Mac foi lançado com
grande alarde através do famoso comercial da empresa baseado no livro 1984.
Embora Jobs e a Apple sejam considerados totalmente inseparáveis, muitas
pessoas se esquecem que ele não durou muito tempo lá depois do lançamento
do Mac, e os dois se separaram por mais de uma década. Em 1985, Jobs foi
demitido da Apple depois de uma luta de poder com o CEO, John Sculley. Os
Steve Jobs 9

motivos talvez não causassem surpresas: Jobs era brilhante e inspirador, mas
podia ser temperamental e inconstante, e a empresa estava se tornando mais
burocrática e corporativa à medida que crescia.
Assim, Jobs saiu da Apple para fundar a NeXT, uma empresa de informá-
tica da qual, fora dos círculos geek, quase ninguém se lembra. Para ser justo,
seu produto, o Cubo NeXT, era maravilhoso e tecnologicamente avançado –
talvez avançado demais. Mas o problema principal era sua faixa de preço – a
considerável quantia de US$6.500. Como resultado, as vendas do Cubo foram
medíocres. Nesse meio-tempo, Jobs estava interessado em outras coisas tam-
bém. Em 1986, ele comprou a Pixar, de George Lucas, por US$10 milhões.
Em 1995, a Pixar lançou Toy Story, e depois veio sua oferta pública inicial –
a participação de Jobs valia US$585 milhões. Mas foi difícil não ficar com a
sensação de que a Apple e Jobs eram como uma grande banda de rock cujo
difícil porém brilhante vocalista havia saído em busca de projetos solo. Eles
estavam muito bem separados, mas nada se comparava ao que eram quando
estavam juntos.
A Apple foi bem até meados dos anos 1990, quando o preço de suas ações
teve uma queda acentuada. Em 1996, Jobs vendeu a NeXT para a Apple
por US$430 milhões, montante pago em ações. A empresa teve prejuízos de
US$816 milhões naquele ano. Até 1997, muitos previam seu fim. Em um bom
exemplo da visão de muitos, em julho daquele ano a Newsweek publicou um
artigo com a seguinte manchete: “Uma morte em espiral: depois de anos de
declínio, a Apple precisa de uma estratégia – e de um salvador.” O salvador era
o brilhante e difícil cofundador da empresa.
Jobs retornou à Apple e colocou o pessoal da NeXT em cargos importan-
tes. E embora, comercialmente falando, a NeXT deixasse um pouco a desejar,
sua influência sobre a Apple – e no mundo da informática como um todo – era
significativa. Em primeiro lugar, a NeXT representava um grande salto em
termos de interfaces gráficas. Em segundo lugar, na NeXT, Jobs havia criado
uma cultura que ele sentia ser a resposta a uma burocracia sufocante. Logo
após retornar, Jobs tornou-se o CEO interino; dois anos mais tarde, assumiu
a posição em caráter permanente.
Com Jobs de volta na posição de líder, a empresa tornou-se focada e lu-
crativa novamente. Ele abandonou uma série de projetos, como o Newton
Handheld, e concentrou-se no iMac. Também começou o processo de di-
versificação que tornou a Apple não só uma empresa de eletrônicos para o
10 28 mentes que mudaram o mundo

consumidor, como também de vendas de computadores. Em 2001, foi lançado


o iPod, um fantástico e imbatível player de áudio digital e, em 2007, o iPhone
fez sua primeira aparição – repetindo o mesmo fenômeno em termos de apa-
relhos celulares. Ambos agora vendem muito mais do que os computadores da
empresa. Em 2010, a Apple lançou o tablet iPad. Muitos não estavam certos
(especialmente porque os tablets têm uma história de altos e baixos), mas as
vendas expressivas indicavam que os leais clientes da Apple manteriam sua
fidelidade. Na verdade, o sentimento recorrente de que Steve Jobs sabe o que
você quer antes que você deseje parece acertado.
Muitos diziam que tudo estava indo bem, mas, embora tenham feito es-
trondoso sucesso, o iPod e o iPhone não conseguiram alavancar a venda dos
Macs. Além disso, enquanto a empresa tinha de 4% a 8% do mercado de
sistemas operacionais, a Microsoft nunca teve menos de 90%, e o Mac conse-
guiu uns poucos ganhos fora de seus redutos tradicionais do setor de criação
e de usuários domésticos aficionados por imagem. Mas Jobs talvez estivesse
novamente um passo à frente. Como, cada vez mais, as pessoas acessam os
telefones usando grande variedade de aparelhos, é possível que a transição de
empresa de informática para empresa de estilo de vida digital seja o movimen-
to mais inteligente no longo prazo.
Os mercados certamente parecem concordar. Talvez por causa da imagem
de boutique dos produtos e da atitude anti-establishment que eles passam, mui-
tas pessoas tendem a esquecer do verdadeiro gigante que a Apple se tornou.
Em abril de 2010, era a segunda no índice S&P 500, perdendo somente para
a Exxon Mobil (e à frente de sua arquirrival Microsoft). Se você comparar o
desempenho quinquenal de suas ações com o de seus principais rivais, a Apple
é a estrela. De fato, por todas as suas posturas alternativas, a Apple é um ne-
gócio muito grande e de muito sucesso.
Esse tipo de contradição pode ser encontrado por toda a empresa também,
e pode-se argumentar que é a chave tanto para a Apple quanto para o ho-
mem que a incorporava. A empresa se apresenta como outsider, comandando
mais de 70% do mercado de MP3 players e cerca de 50% do mercado de
telefones celulares. Ela afeta a compatibilidade, mas o bloqueio que coloca
em seus produtos é muito mais forte do que qualquer trava da Microsoft
(com a Apple, você compra o hardware e o sistema operacional). De alguma
forma, a Apple car­rega um sopro dos valores hippies em seus produtos, mas
se quiser um computador ecologicamente correto compre um Dell, não um
Steve Jobs 11

Mac. E embora Jobs tenha dito que “a inovação é o que distingue líderes de
seus seguidores”, a Apple não foi a criadora de nenhum de seus produtos. Do
Xerox Alto ao iPod e ao iPhone, alguma outra pessoa sempre foi a primeira.
De fato, se você tiver de resumir a estratégia da empresa, seria a “segunda
brilhante” em vez de criadora genuína.
Para que não soe como crítica, pois não é, o título do livro de 2004, Fast
Second: How smart companies bypass radical innovation to enter and dominate
new markets (O ligeiro vice-campeão: como empresas inteligentes contornam a ino-
vação para ingressar em novos mercados e dominá-los, numa tradução livre) diz
tudo. Aqueles que mergulham primeiro, muitas vezes não conseguem colher
os frutos do novo mercado que adentraram. É melhor ser o segundo quando já
se aprendeu com os erros do concorrente. A quem possa interessar, o primeiro
MP3 player foi o MPMan F10, da coreana SaeHan Information Systems.
Chegou em 1998, três anos antes do iPod, e outros o seguiram. Mas, com
interfaces difíceis e natureza complicada, os novos gadgets* pareciam feitos
somente para geeks. O iPod, por sua vez, era fácil de usar e, como resultado,
dominou o mercado. Seis anos mais tarde, o iPhone repetiu o feito, embora
em um mercado muito mais maduro. A Apple fez algo maravilhosamente
funcional e fácil de usar.
A genialidade da Apple está na interface com o cliente e não nos elementos
básicos. Jobs sabia que as pessoas querem aparelhos lindos e muito fáceis de
usar. A maioria não liga para compatibilidade (como no caso do iPhone) ou
indicadores de desempenho bruto (como no caso dos processadores do Mac)
ou até mesmo para a qualidade de som (o iPod provavelmente não é a escolha
de um geek aficionado por música). O público se importa com o famoso look
and feel (algo como aspecto e sensação de uso, numa tradução bastante livre) –
e o brilhantismo da Apple nesse quesito ganhou não só legiões de clientes fiéis,
mas também verdadeiros fãs dispostos a pagar preços salgados. O fenômeno é
tipificado pelo estereótipo do “fanboi” da Apple, um devoto servil da empresa
e seus produtos, muito bem resumido numa falsa entrevista no Onion, site hu-
morístico, no qual um fanboi diz: “Compro qualquer coisa que seja brilhante
e feita pela Apple.”

* Nota da Editora: Gíria tecnológica para um equipamento prático e útil que possui um propó-
sito e função específicos.
12 28 mentes que mudaram o mundo

Contudo, apesar de uma longa carreira de sucesso, existiram algumas nu-


vens no universo de Jobs. As vendas de iPods nivelaram-se, e os telefones
Android (que usam o sistema operacional de código aberto do Google) estão
fazendo incursões sérias em um mercado no qual o iPhone, até recentemente,
dominava sem ser desafiado. De fato, para os observadores de tecnologia, é
interessante ver a mudança da dinâmica Microsoft–Google–Apple. Alguns
anos atrás, tanto o Google quanto a Apple eram antiMicrosoft. Hoje, porém,
as coisas não estão tão claras.
Entretanto, com certeza, a maior preocupação da Apple (de seus fanbois,
funcionários e acionistas) era a saúde de Jobs. Ele teve sérios problemas nos
últimos 10 anos – primeiro com um câncer no pâncreas e depois com um
transplante de fígado. Portanto, a grande pergunta é: o que vai acontecer com
a Apple? Acontecimentos precedentes em meados dos anos 1990 não foram
bons. Muitas vezes, foi dito que na Apple somente a opinião de uma pessoa é
que conta – a de Steve Jobs. Será que a empresa vai continuar sendo a Apple
sem ele?

Referências e leituras adicionais

Aguilar, Quinn (2010) Do you know Steve Jobs?, Silicon Valley Curious, 20 de junho
no site da Apple em www.apple.com
Appleyard, Bryan (2009) Steve Jobs: the man who polished Apple, Times, 16 de
agosto
Booth, Cathy, Jackson, David S and Marchant, Valerie (1997) Steve’s job: restart
Apple, Time, 18 de agosto
Campbell, Duncan (2004) Profile: Steve Jobs, Guardian, 18 de junho
Cnet.com, Apple turns 30
Elkind, Peter (2008) The trouble with Steve Jobs, Fortune, 5 de março
Lohr, Steve (1997) Creating jobs, New York Times Magazine, 12 de janeiro
Markides, Constantinos C and Geroski, Paul A (2004) Fast Second: How smart com-
panies bypass radical innovation to enter and dominate new markets, Jossey-Bass, San
Francisco, CA
Usborne, David (2004) The iPod carrier, Independent on Sunday, 4 de janeiro
Waters, Richard and Menn, Joseph (2010) Silicon Valley visionary who put Apple on
top, Financial Times, 22 de dezembro.
Capítulo 2
Richard Branson

C om mais de 360 empresas diferentes no grupo Virgin, de interesses que


vão de telefones celulares e internet a trens e bebidas, e um patrimônio
líquido de £2,6 bilhões, Richard Branson é, provavelmente, o empresário
mais conhecido do Reino Unido. Muito disso foi conquistado graças à
sua grande paixão pela publicidade – às vezes, é difícil dizer se ele é um
homem de negócios ou uma celebridade. Mas seja lá como for, o famoso
empresário britânico tem estado nas manchetes nos últimos 30 anos. Em
1986, o jornal Sunday Times escreveu: “Seja anunciando carros ou cartões
de crédito, dentro de uma banheira brincando com um modelo de aero-
nave ou partindo numa aventura para conquistar o Atlântico (...) hoje em
dia, Branson vende-se a si mesmo, com frequência e muita imaginação, da
mesma forma que suas inúmeras empresas vendem discos, filmes e outros
produtos” (Brown, 1986).
Nesse sentido, pouca coisa mudou no último quarto de século. Aos 60
anos, Branson ainda está presente em todos os lugares e ainda é muito a cara
da marca Virgin. A única verdadeira diferença é que, agora, ele tem muito
mais concorrentes. A certa altura, constatou que ser uma celebridade poderia
ser tão bom para os negócios quanto costuma ser para ídolos pop e artistas,
pois a maioria dos empreendedores e executivos do Reino Unido é fechada
e reservada, e considera usar truques e autoimagem para vender seus produ-
tos uma estratégia um tanto inconveniente ou inimaginável. Hoje, em muitos
casos, pessoas de destaque do mundo dos negócios são nomes familiares, e
Branson passou de excêntrico a pioneiro.
14 28 mentes que mudaram o mundo

Branson nasceu em 1950 perto de Guildford, em Surrey. Seu pai era advo-
gado, seguindo uma tradição familiar, e sua mãe fora dançarina e comissária
de bordo na América do Sul. Ele não se sobressaiu na escola – e a razão disso,
como descobriu mais tarde, foi a dislexia – mas era bom atleta e, com a ajuda
de um curso preparatório, conseguiu entrar na Stowe, famosa escola indepen-
dente. Desde cedo, já mostrava tino para o empreendedorismo e, aos 16 anos,
lançou uma revista chamada Student enquanto ainda estava no colégio (antes
disso, tentou alguns empreendimentos sem muito sucesso, que incluíam cria-
ção de periquitos e cultivo de árvores de Natal). Branson dirigiu a revista por
mais três anos, e a circulação alcançou 100 mil exemplares.
Em 1969, Branson publicou um anúncio na revista para vender discos pelo
correio com desconto. Diante da indústria de discos da época – um mercado
fechado em que gravadoras e lojas conspiravam para engrossar o lucro –, a
resposta ao anúncio de Branson foi enorme. O único problema era que ele não
tinha nenhum estoque, mas acabou encontrando uma loja que lhe forneceu os
discos. Branson concluiu que discos eram muito mais lucrativos que revistas
e, assim, fechou a revista Student. Esse foi o começo de sua operação musical
com pedidos feitos pelo correio. Aliás, acredita-se que o nome Virgin tenha
sido ideia de um funcionário, numa alusão ao fato de serem todos novatos no
negócio – nada a ver com a crença popular de que o nome tenha alguma liga-
ção com as Ilhas Virgens.
Nesse meio-tempo, a namorada de Branson ficou grávida, e os dois tiveram
muita dificuldade para encontrar ajuda e aconselhamento. O bebê foi abortado
e, chocado com a falta de apoio, Branson montou o Student Advisory Centre
para ajudar jovens com problemas, como gravidez indesejada e uso abusivo
de drogas. Todas essas atividades deram a ele uma boa imagem pública e, em
1971, aos 20 anos de idade, já tinha causado furor considerável. Foi tema de
um documentário da BBC, que apresentava, entre outras coisas, uma sequên-
cia ligeiramente surreal de Branson andando à beira de um rio, mastigando
uma semente de capim e falando sobre a dificuldade que ele e a namorada
tiveram quando passaram pelo aborto. Contudo, até então, sua vida de jovem
girava em torno de seus empreendimentos e viagens.
Os primeiros anos da Virgin foram bem difíceis. A empresa pagava mui-
tos impostos e, às vezes, seus funcionários fingiam que não havia ninguém lá
quando os cobradores batiam à porta. No final dos anos 1970 – sobretudo por
causa de uma greve nos correios –, Branson decidiu que precisava de instalações
Richard Branson 15

físicas e encontrou um espaço em cima de uma loja de sapatos em Tottenham


Court Road. Sendo assim, abriu sua primeira loja de discos em janeiro de
1971 com a mesma filosofia – grandes volumes e grandes descontos – e ex-
pandiu rapidamente, em especial porque achava que a concorrência tentaria
esma­gá-lo se não fosse ágil o bastante. Nessa época, ele era memoravelmente
descrito como “a escola pública de Arthur Daley”.*
Caído no descontentamento das grandes gravadoras, Branson voltou os
olhos para a criação de seu próprio selo. Então, com dinheiro suficiente, com-
prou uma mansão perto de Oxford e a transformou num estúdio de gravação;
em 1972, fundou o selo de discos Virgin. A primeira contratação da empresa
– Mike Oldfield – gravou Tubular Bells, que vendeu mais de 5 milhões de có-
pias. Diante do rápido sucesso do primeiro lançamento, a gravadora contratou
os Sex Pistols, em 1977. Na época, eram tão polêmicos que nenhuma outra
gravadora quis saber deles. Foi uma atitude ousada que pagou altos dividendos
em termos de publicidade. No final dos anos 1970 e 1980, Branson continuou
a expandir os negócios, revelando seu recém-descoberto papel de empreende-
dor favorito do Reino Unido. Além disso, à medida que seu império crescia,
aqueles que o haviam menosprezado como sendo um “hippie capitalista” des-
cobriram que teriam de levá-lo um pouco mais a sério.
Em 1984, a Virgin lançou a companhia aérea Virgin Atlantic, atualmente
a segunda maior empresa de aviação de longa distância do Reino Unido. No
ano seguinte, Branson tentou ganhar o Blue Riband ao estabelecer um novo
recorde por ter atravessado o Atlântico. O barco, o Virgin Atlantic Challenger,
afundou, mas a publicidade em torno do acidente não afetou Branson. No ano
seguinte, ele bateu o recorde com o Virgin Atlantic Challenger II. O resto dos
anos 1980 foi um turbilhão de empreendimentos. A Virgin Records tornou-se
internacional, lançou uma empresa de balões e aeronaves, criou uma marca
de preservativos, ingressou no segmento hoteleiro, além da breve passagem
pela área de retransmissão por satélite. O grande tropeço do grupo nos anos
1980 foi a abertura do capital da empresa em 1986. A presença da Virgin no
mercado de ações perdurou por dois anos (conseguindo passar pela Segunda-
feira Negra de 1987). Em 1988, Branson tornou o grupo privado novamente.

* Nota da Tradutora: Arthur Daley era personagem de uma tragicomédia transmitida na In-
glaterra de 1979 a 1994, que retratava o submundo do crime. Arthur Daley era um ambicioso
social, totalmente inescrupuloso, e seu objetivo era ganhar dinheiro de qualquer forma, legal-
mente ou não.
16 28 mentes que mudaram o mundo

Ele comentou que estava cheio dos investidores da cidade, donos de uma visão
imediatista, mas vale dizer que a recíproca também era verdadeira – muitos
deles também estavam cansados de Branson.
Nos anos 1990 aconteceu a mesma coisa: livros, vodca e refrigerante, rádio,
serviços para noivas, trens, cosméticos, academias de ginástica e celulares –
tudo chamava a atenção de Branson. Em 1992, ele teve de vender a Virgin
Music para a EMI a fim de socorrer sua companhia aérea; disse que chorou
quando o negócio foi finalizado, já que a Virgin Music fora seu primeiro negó-
cio. Branson também tentou ganhar a operação da Loteria Nacional do Reino
Unido, prometendo que todos os lucros iriam para caridade, mas perdeu para
o consórcio Camelot. Nesse meio-tempo, entre a quebra de recorde com o
Virgin Atlantic Challenger II e muita publicidade, os empreendimentos conti-
nuavam a todo vapor, indo do mar para o ar. Em 1991, atravessou o Pacífico
num balão, quebrando o recorde. De 1995 a 1998, tentou várias circum-na­
vegações pelo mundo em um balão, mas sua equipe perdeu o prêmio para
o Breitling Orbiter 3, em 1999. Como prêmio de consolação, tornou-se Sir
Richard Branson na lista de honrarias no ano-novo do milênio.
O início do novo século não foi nada calmo e, embora nessa época Branson
estivesse com 50 anos, a marca registrada de sua cabeleira loura e barba ainda
estava lá. A Virgin lançou a Virgin Blue, uma companhia aérea australiana de
baixo custo; Branson vendeu as megalojas da Grã-Bretanha e da Irlanda; lan-
çou a Virgin Fuel, uma empresa de produção de combustível limpo, seguindo
seu crescente interesse em resolver problemas ambientais, e a lista não tem
fim. Mas alguns empreendimentos se destacaram. Primeiro, a Virgin Money,
seu grupo de serviços financeiros, chegou muito perto de comprar o proble-
mático banco do Reino Unido, o Northern Rock. Acabou não comprando, e
o Rock permaneceu sob a guarda estatal do Reino Unido. O segundo tema
que o levou a aparecer nas manchetes foi a Virgin Galactic, empreendimento
voltado para viagens espaciais de turistas, que atualmente aceita reservas e leva
absolutamente a sério a proposta. Por fim, em 2007, ele e Al Gore criaram o
Virgin Earth Challenge Prize para combater o aquecimento global – o prêmio
vai para a primeira pessoa ou grupo que apresentar uma forma de limpar um
bilhão de tonelada de CO2 da atmosfera anualmente durante 10 anos.
O que Branson tem feito de forma consistente é personificar a marca Vir-
gin. Naturalmente, existem muitas outras pessoas que incorporam suas marcas
– Steve Jobs, Warren Buffett e a mais recente, que me vem à mente, Anita
Richard Branson 17

Roddick –, mas Branson é diferente porque, em todos esses casos, existe uma
espécie de produto principal, sejam eletrônicos pessoais, investimentos ou cos-
méticos. Com Branson, o produto é secundário. A marca Virgin pode ser
estampada em qualquer coisa, em preservativos, vodcas, telefones celulares ou
aviões. Às vezes funciona; outras, não. Mas é preciso tentar, porém quando as
coisas não funcionam as pessoas raramente vão contra Branson.
Até mesmo os fatos que geram publicidade – que podem parecer ridículos
em outra pessoa menos à vontade com sua celebridade – agregam à marca, pois
são inteiramente consistentes com a figura de Branson. Você pode até argu-
mentar que a vida toda de Branson parece ser um golpe publicitário, mas isso
realmente não o diminui. Talvez seja porque ele parece divertir-se muito, não
importa o que esteja fazendo. Em 2009, Robert Peston, jornalista da BBC,
citou algo como “as feridas do empreendedor”, ou seja, a infância desagradável
ou experiência traumática que torna muitas pessoas bem-sucedidas, mas que
as torna eternas insatisfeitas. Branson é exatamente o oposto. Sem dúvida, um
homem hiperativo e obstinado, mas que parece agir assim porque realmente
se diverte.
Mesmo com todo o amor de Branson pela publicidade, há uma área em que
essa notória figura pública é bem privada. Quem verifica os assuntos financei-
ros de Branson quase sempre aprende alguma coisa. O livro Branson, do famo-
so jornalista investigativo Tom Bower, pinta um quadro de um homem que
costuma navegar muito próximo do vento e cujo grupo tem, com frequência,
se defrontado com uma possibilidade muito real de insolvência. A pergunta
que muitos fazem é: quais das empresas de Branson realmente dão lucro (e
quais delas são subsidiadas pelas coirmãs lucrativas)? De fato, as contas das
empresas pertencentes ao grupo Virgin têm, muitas vezes, demonstrado que
muito pouco se ganha fora da empresa aérea. Talvez por essa razão Branson
goste de manter fechado o capital das empresas, e não porque os investidores
sejam chatos ou sem imaginação. Bower retrata Branson como uma pessoa
que não tem vergonha de sua autopromoção, um operador sagaz e um homem
cujo maior talento é separar banqueiros de suas fortunas.
Os infindáveis feitos de Branson podem também estar começando a dar
sinais de cansaço. Em 2008, a revista Economist percebeu que agora Bran-
son passa muito pouco tempo em sua terra natal: “No princípio, os britânicos
tinham Sir Richard no coração por causa de sua imagem rebelde, mas mui-
tos estão começando a ficar cansados da excessiva autopromoção. Talvez os
18 28 mentes que mudaram o mundo

americanos aplaudam sua ousadia.” Pode ser que haja alguma verdade nisso
tudo, mas ainda é muito cedo para dizer que Branson já era. Ele fez 60 anos
em 2010, mas aparenta 15 anos a menos e parece muito improvável que vá
envelhecer passivamente.

Referências e leituras adicionais

Appleyard, Bryan (1986) Record maker with no flip side, Times, 30 de outubro
Blackhurst, Chris (1998) At the court of King Richard, Management Today, 1o de
abril
Bower, Tom (2000) Branson, Fourth Estate, Londres
Branson, Richard (1998) Perdendo minha virgindade, São Paulo: Editora de Cultura,
1998, 1a ed.
Branson, Richard (2009) Business Stripped Bare: Adventures of a Global Entrepreneur
Brown, Mick (1986) Profile of Richard Branson, Sunday Times, 8 de junho
Moore, Martha T (1995) Rash, brash Branson has Virgin soaring, USA Today, 5 de
julho
New Zealand Herald (2008) Branson: walking on water, or on thin ice, 3 de outubro
Peston, Robert (2009) The Entrepreneur’s Wound, BBC Radio 4, 30 de outubro
Specter, Michael (2007) A modern knight, Australian Women’s Weekly, 31 de agosto
Capítulo 3
Warren Buffett

A maioria das assembleias gerais anuais de empresas são eventos chatos, em


que a única emoção é proporcionada pelos acionistas ativistas que fazem
um tremendo barulho (embora não tenham basicamente nenhum poder de
voto se comparados aos acionistas institucionais, que geralmente nem se dão
ao trabalho de comparecer). Na Berkshire Hathaway, é bastante diferente. O
comparecimento fica por volta de 30 mil marcas, apesar de o evento acontecer,
efetivamente, numa cidade pacata do interior de Omaha, Nebraska. As reu-
niões anuais da Berkshire Hathaway são o segundo maior evento do ano na
cidade depois do torneio College World Series Baseball.
Muito disso, diz Kelly Broz, diretora da reunião anual, deve-se ao lendá-
rio fundador do negócio: “Os acionistas estão interessados no que Warren e
[o cofundador] Charlie [Munger] têm a dizer, não só sobre as operações da
Berkshire, mas também sobre suas filosofias e visões de negócios em geral.
Além disso, Warren e Charlie são incrivelmente engraçados quando estão jun-
tos. Não é só educativo, mas também divertido ouvi-los no palco durante as
sessões de seis horas de Q&A (Perguntas e Respostas).”
Warren Buffett é uma figura extraordinária. Ele parece mais com uma pes-
soa normal ou, talvez, um palestrante universitário do que com um bilionário.
Vive modestamente, é extremamente vigoroso e interessante, e pérolas do tipo
“somente quando a maré está baixa é que podemos perceber quem estava na-
dando pelado” parecem saltar de sua boca com total naturalidade. Ele também
é extraordinariamente modesto e irônico em relação à sua própria pessoa e
acredita que muito de sua fortuna se deva à sorte: “Se você me colocar no meio
20 28 mentes que mudaram o mundo

de Bangladesh ou do Peru ou em algum outro lugar, vai descobrir quanto este


talento produzirá no tipo de solo errado.” Como se não bastasse, ele é o mais
bem-sucedido investidor do mundo. Não é exagero dizer que, se não fosse por
Buffett, muitas pessoas nunca teriam ouvido falar de Nebraska.
Assim como ocorre com muitas grandes estratégias de investimento, as de
Buffett são excepcionalmente simples. Buffett só investe em negócios que ele
entenda, que considere com boas chances de crescimento de longo prazo e que
sejam administrados por gestores que ele julgue competentes. Compra ações e
empresas que acredita valerem a pena. Essa estratégia simples tornou Buffett o
terceiro homem mais rico do mundo, mas vale lembrar que ele também já ocu-
pou o primeiro e o segundo lugar desse ranking. O magnata também é muito
conhecido como sendo um contestatário – Buffett geralmente é visto indo na
direção oposta às pessoas que estão ganhando muito dinheiro e que seguem
a sabedoria convencional. Como todos sabem, ficou de fora do boom das em-
presas pontocom e evitou os derivativos nos anos 2000. Mas, como esses dois
exemplos mostram, embora não raro estivesse errado a princípio, em inúmeras
ocasiões Buffett provou estar certo no médio e longo prazo. Por essas razões,
muitas vezes é chamado de “o sábio de Omaha” ou “o oráculo de Omaha”.
Buffett nasceu em 1930, filho de um congressista republicano e corretor de
bolsa local. Como muitos homens de negócios muito bem-sucedidos, mos-
trou aptidão bem cedo. Aos 6 anos, dividia a caixa de Coca-Cola com seis
unidades e as revendia com 20% de lucro. Aos 11, ficou famoso por comprar
suas primeiras ações a US$38 cada. Elas rapidamente caíram para US$27, mas
foram recuperadas a US$40, quando ele as vendeu. Embora tenha feito um
pequeno lucro, se tivesse esperado um pouco mais teria lucrado bastante, pois
as ações alcançaram US$200 algum tempo depois. Essa ocasião é frequente-
mente citada como a primeira lição sobre longo prazo. Buffett fez sua primeira
declaração de imposto de renda em 1944. Antes de ter se formado no ensino
médio, comprou máquinas de fliperama para alugar, poupou milhares de dó-
lares entregando jornais (dezenas de milhares em moeda de hoje) e comprou
uma área agrícola de mais de 16ha, que arrendou a um agricultor local.
Depois de terminar o ensino médio, não queria ir para a faculdade, mas a
vontade de seu pai prevaleceu, e Buffett foi estudar na Faculdade de Admi-
nistração de Wharton na Universidade da Pensilvânia, antes de se transferir
para a Universidade de Nebraska. Lá, leu o livro de Benjamin Graham, O
investidor inteligente (Nova Fronteira, 2007), que aconselhava os investidores
Warren Buffett 21

a procurarem o que o autor chamava de empresas guimba de charuto – em-


presas subvalorizadas, mas ainda com uma pequena baforada de vida. Após
a graduação, Buffett foi rejeitado pela Harvard Business School e foi estudar
na Universidade de Columbia. Com um diploma de mestrado em Economia
debaixo do braço, ele foi trabalhar para Graham.
Buffett estava começando a desenvolver ideias próprias de investimento:
em vez de procurar por empresas que estivessem morrendo, das quais ainda
poderia espremer algum pequeno valor, estava mais interessado em comprar
empresas bem administradas, porém fora de moda. Em 1957, estabeleceu uma
parceria de investimento em Nebraska, com o objetivo de bater o índice Dow
Jones em 10%. Doze anos mais tarde, quando a sociedade foi dissolvida, ele
tinha conseguido uma taxa um pouco abaixo de 30%, enquanto o índice Dow
Jones apontava 7,4%.
Mas foi em 1962 que os alicerces da instituição que conhecemos hoje fo-
ram estabelecidos. Nesse ano, ele comprou uma empresa têxtil com proble-
mas, sediada em Massachusetts, chamada Berkshire Hathaway, que, como
Graham diria, era uma verdadeira guimba de charuto. Entretanto, como não
queria apenas espremer as últimas gotas de valor dessa aquisição, Buffett co-
meçou a redirecionar seus recursos para outras áreas, mais precisamente para o
setor de seguros. Desse modo, obteve uma fonte regular de capital barato e, o
mais importante, a lacuna entre o recebimento dos pagamentos dos segurados
e a liquidação das indenizações significava vultosas quantias de dinheiro para
Buffett. O melhor de tudo é que isso ocorreu numa época em que os mercados
de ações estavam em baixa. Foi uma combinação perfeita para um homem que
era especialista em ver o valor de longo prazo onde outros não viam.
Buffett tem mantido basicamente essa mesma estratégia. As contas e os
relatórios anuais da empresa correspondem bem ao desempenho previsto
pelo índice da S&P 500. Entre 1965 e 2009 (o último relatório disponível), a
Berkshire Hathaway atingiu a média composta de 20,3% ao ano, enquanto o
índice da S&P 500 subiu 9,3%. Em termos mais precisos, US$100 investidos
no S&P em 1965 valeriam US$5.430, ao passo que, se investidos na Berkshire
Hathaway, valeriam US$434.057. De fato, a Berkshire Hathaway criou uns
poucos milionários-surpresa em Omaha.
Contudo, nem sempre Buffett foi louvado. O milionário ficou famoso por
ter ficado de fora das atividades frenéticas das empresas pontocom, uma vez
que as ações da bolha tecnológica não eram de longo prazo ou algo que ele
22 28 mentes que mudaram o mundo

entendesse. Em 1999, as ações da Berkshire Hathaway apresentaram desem-


penho de 0,5%, enquanto a S&P conseguiu 21%, e o índice Nasdaq aumentou
para mais de 80%. Além disso, como a Nasdaq alcançou alturas estonteantes
e um monte de gente acreditou pia e cegamente – sem questionar, sem fazer
uma análise crítica – que o preço das ações se tornaria permanentemente dis-
sociado de quesitos como a capacidade de ganhar dinheiro, Buffett foi alvo de
duras críticas. Então, em 10 de março de 2000, a bolha estourou, e nos três
anos seguintes a Berkshire Hathaway conseguiu ganhos reais (perdeu dinheiro
em 2001), enquanto o S&P não fez nada além de cair. Quanto à Nasdaq, 10
anos depois, ainda não se recuperou e gira em torno de 50% do pico da época
das pontocom. No período de um ano, Buffett passou de um dinossauro que
não entendia a nova economia para uma das poucas pessoas inteligentes o
suficiente para investir somente naquilo que compreendia. Outro tijolo era
assentado no templo do Buffett – o guru do investimento.
O modelo se repetiu quase uma década depois. Com sua costumeira pres-
ciência e seu comportamento simples e despretensioso, Buffett avisava sobre
os perigos de comércio com crescimento rápido em instrumentos financeiros
exóticos não muito após o crash das pontocom. No relatório anual de 2002
da Berkshire Hathaway, o empreendedor escreveu: “Vejo os derivativos como
bombas-relógios, tanto para quem os negocia quanto para o sistema econô-
mico.” Continuou afirmando que eram “armas financeiras de destruição em
massa” e também as relacionou ao “inferno (...) fácil de entrar e quase impos-
sível de sair”. Uma definição absolutamente coerente com a mente financeira
e o estilo característico de Buffett, numa linguagem que qualquer um poderia
entender. Como era de se esperar, ele estava certo. E, apesar de 2008 ter sido
o pior ano da Berkshire, o grupo perdeu meros 9,6% em comparação aos 37%
do S&P.
Além disso, nos dias mais negros de 2008, quando a maioria do mundo fi-
nanceiro se perguntava para onde as coisas estavam se encaminhando, Buffett
estava indo às compras. Perto do fim do ano, investiu a vultosa quantia de US$5
bilhões no banco Goldman Sachs, seguindo outra de suas receitas: “Seja come-
dido quando os outros são gananciosos; seja ganancioso quando os outros estão
comedidos.” Na primeira metade de 2010, quando muita gente estava enfureci-
da com o banco, Buffett ofereceu sólido apoio a Lloyd Blankfein, o controver-
tido CEO da instituição.
Warren Buffett 23

Então, há alguma coisa ruim para se falar sobre Buffett? Bem, ele cometeu
alguns erros crassos mas, em muitos casos, como ocorreu com as companhias
aéreas americanas nos anos 1990, sua disposição para esperar anos significou a
recuperação das ações. O culto a Buffett, a literatura devocional que ele inspira
e seus tantos seguidores com olhos vidrados podem irritar um pouco. Mas é
difícil achar muita coisa para não gostar nesse homem modesto e admiravel-
mente honesto. Ele pratica exatamente o que prega. Paga para si mesmo um
salário de US$100 mil por ano, uma quantia pequena em um país onde CEOs
de muito menos sucesso costumam definir seus salários anuais em milhões. O
magnata come hambúrgueres e toma Coca-Cola, dirige um carro velho e vive
numa casa em Omaha, adquirida em 1957 por US$31.500, embora tenha uma
casa de praia em Laguna Beach que vale cerca de US$4 milhões. Em 1989,
comprou um jato particular ao qual deu o nome de Indefensible, fazendo troça
de si mesmo, visto que ele já criticou duramente os excessos dos CEOs em
áreas como os transportes.
Ainda assim, a imagem de um homem que não foi afetado pela riqueza
apesar de ter sido a maior fortuna do mundo é, em grande parte, verdadeira.
As pessoas que lhe enviam ideias de negócios que não foram solicitadas ge-
ralmente recebem respostas atenciosas e respeitosas. Há inúmeras histórias
sobre como ele nunca fez o tipo “você sabe com quem está falando?”; jornalis-
tas que chamam seu assistente pessoal para uma entrevista, às vezes, acabam
falando como o próprio Buffett, pois ele sempre atende as próprias chamadas
telefônicas.
Já na casa dos 80 anos, Buffett disse que está procurando um sucessor, e
os rumores são de que poderia ser Ajit Jain, a principal pessoa das operações
de resseguro da Berkshire, a quem Buffett descreveu com sendo um “supe-
rastro”. Seguindo fielmente sua filosofia – e seu desdém aberto por fortunas
herdadas –, Buffett não deixará toda a sua herança material para os filhos.
Em várias ocasiões, ele declarou que quem cresce com uma grande fortuna é
membro do “clube dos espermatozoides sortudos” e completou: “Quero dar
para meus filhos apenas o suficiente para que eles sintam que podem fazer
qualquer coisa, mas não muito, de maneira que eles não pensem que não
precisam fazer nada.” Quanto à sua vasta fortuna, em 2006 ele anunciou que
daria 85% de sua participação na Berkshire Hathaway para a caridade e que
cinco sextos disso irão para a Bill & Melinda Gates Foundation, que tem
como foco assistência médica, pobreza e educação (Buffett e os Gates são
24 28 mentes que mudaram o mundo

grandes amigos). Em 2006, o valor do donativo foi avaliado em cerca de


US$37 bilhões, o maior ato filantrópico jamais visto. Depois indicou que os
15% restantes também iriam para a caridade.
Em 2010, ele e Bill Gates propuseram que os ricos deveriam comprometer
pelo menos metade de suas fortunas com a filantropia. Numa carta à revista
Fortune, Buffett escreveu:

Minha sorte foi acentuada pelo fato de eu viver num sistema de mercado que às
vezes produz resultados distorcidos, mas que, no geral, serve muito bem ao nosso
país. Trabalhei em uma economia que recompensa com uma medalha alguém que
poupa a vida de outros num campo de batalha, recompensa um grande professor
com bilhetes de obrigado dos pais, ao mesmo tempo em que recompensa os que
conseguem detectar uma anomalia de mercado de títulos de valores com somas
que alcançam bilhões. Em resumo, a distribuição que o destino faz dos méritos é
descontroladamente caprichosa.

Ele acredita que dar uma grande parcela de sua fortuna é a melhor maneira
de compensar toda a grande sorte que teve.

Referências e leituras adicionais

Contas e relatórios do grupo Berkshire Hathaway


Site da Berkshire Hathaway em www.berkshirehathaway.com
Cornwell, Rupert (2002) Profile, Independent on Sunday, 27 de julho
Kanter, Larry (1999) Warren Buffet, Salon.com, 31 de agosto
Loomis, Carol J (2006) Warren Buffett gives away his fortune, Fortune, 25 de junho
Rigby, Rhymer (2004) Naked ambition and how to get it, Management Today, 1o de
setembro
Rigby, Rhymer (2009) AGMs that rally investors with a share of the fun, Financial
Times, 10 de fevereiro
Schroeder, Alice (2008) A bola de neve: Warren Buffett e o negócio, Rio de Janeiro:
Sextante, 2008
Sullivan, Aline (1997) Buffett, the Sage of Omaha, makes value strategy seem simple:
secrets of a High Plains investor, New York Times, 20 de dezembro
Capítulo 4
Jeff Bezos

S e Andy Grove personifica a marca número um do Vale do Silício e Steve


Jobs a marca número dois, então Jeff Bezos é o avatar vivo da marca nú-
mero três do Vale do Silício – a revolução pontocom. A empresa que ele ainda
comanda, a Amazon, foi criada em 1995 como uma livraria on-line com base
em Seattle. Em seus primeiros anos, num verdadeiro estilo pontocom, o negó-
cio cresceu a passos largos, alcançando a cifra de US$500 milhões. Mas dife-
rentemente de muitas outras empresas pontocom, a Amazon sobreviveu para
se tornar uma gigante global que hoje vale US$56 bilhões: não só sobreviveu,
mas teve sucesso e se tornou uma parte colossal no cenário do varejo.
Mas embora Bezos e a Amazon sejam frequentemente usados como si-
nônimo de qualquer coisa pontocom, o fato de terem sobrevivido enquanto
muitas outras não conseguiram explica-se porque, em muitos aspectos im-
portantes, eles acabaram provando que não eram uma verdadeira iniciativa
pontocom. Em primeiro lugar, o foco da empresa estava sempre diretamente
nos clientes, proporcionando-lhes a melhor experiência possível; isso é algo
que Bezos mantém com zelo messiânico. Em segundo lugar, diferentemente
de muitas pontocom, Bezos tinha plena consciência de que a startup não obte-
ria lucros nos primeiros quatro ou cinco anos. E, em terceiro lugar, a empresa
manteve-se fiel aos seus objetivos durante a quebra das pontocom, enquanto
outras perdiam a cabeça.
Bezos nasceu em Albuquerque, Novo México, em 1964. Sua mãe ainda
era adolescente quando o teve, e seu casamento não durou muito. Ela se casou
novamente quando ele tinha 4 anos. Seu avô materno, que tinha um rancho
26 28 mentes que mudaram o mundo

muito grande, era diretor regional da Comissão de Energia Atômica e foi


uma influência significativa para o pequeno Jeffrey. Quando criança, Bezos era
notável por uma coisa: ele era muito, muito inteligente, tinha aptidão espe-
cial para ciências e, desde pequeno, demonstrava grande capacidade inventiva.
Sua precocidade logo nos primeiros anos de vida era um sinal das coisas que
viriam: ele ganhou prêmios em ciências e estudou na Universidade de Prince-
ton. Lá, começou a ler sobre física, mas mudou para computadores. Acabou
graduando-se em ciência da computação e engenharia eletrônica.
Depois de se formar, em 1986, Bezos foi trabalhar em finanças. Foi fun-
cionário de várias empresas em Wall Street, momento em que a ciência da
computação estava entrando na moda como ferramenta para fazer previsões
das tendências do mercado de ações. Em 1994, quando trabalhava no fundo
de hedge DE Shaw teve um estalo. Nessa época o número de usuários de in-
ternet estava crescendo mais de 2.300% ao ano. Assim, Bezos, famoso por ser
meticuloso e metódico, analisou 20 empresas de pedidos pelo correio para ver
qual funcionaria melhor na nova mídia. Optou por livros, pois eram escolhas
naturais para o mercado de pedidos pelo correio, mas havia um problema: um
catálogo de livros seria enorme. Diante desse porém, a internet, ainda inci-
piente, poderia oferecer um avanço significativo. Isto posto, vale ressaltar que
a ideia toda era bastante hipotética. Na época, o e-commerce ainda não existia
e pouquíssimas pessoas possuíam e-mail.
Prosseguindo com seu empenho, Bezos deu os primeiros passos partici-
pando da convenção das livrarias americanas em Los Angeles, onde descobriu
que os atacadistas de livros tinham listas eletrônicas de seus produtos. Sua
convicção sobre a venda de livros on-line cresceu. Sua primeira proposição
exclusiva de vendas (USP, na sigla em inglês) foi bastante óbvia – uma livraria
on-line poderia oferecer variedade muito maior do que aquelas que precisam
manter um estoque nas prateleiras. Além do mais, os livros eram um grande
produto para vender on-line – a relação peso-valor significa que a postagem
não seria problema, os livros não são perecíveis, e as pessoas, em geral, estão
preparadas para esperar alguns dias por eles. Além disso, muitas moram longe
de uma livraria com bom estoque, especialmente nos Estados Unidos – para
esse público, um vendedor de livros on-line seria uma dádiva dos céus.
No entanto, como não conseguiu deixar seus funcionários interessados, Be-
zos decidiu arriscar-se com sua esposa. Elaborou um plano de negócios e, em
1994, fundou a Amazon.com, tendo a família e os amigos como os primeiros
Jeff Bezos 27

investidores. Na melhor tradição das startups da costa oeste, o local de nasci-


mento da Amazon era humilde – a garagem de uma casa de dois dormitórios
em Seattle. A cidade foi escolhida por causa da alta concentração de pessoas
com habilidades em informática, e dizem que Nick Hanauer, homem de ne-
gócios de Seattle e primeiro investidor “de fora” na Amazon, persuadiu Bezos
a tomar a atitude. Hanauer investiu US$40 mil na nova empresa, convencido
das vantagens da Amazon. No auge do boom das pontocom, seu investimento
valia US$250 milhões. Uma vez que Bezos havia testado o site com amigos e
estava convencido de que funcionava como deveria, criou sua própria livraria
on-line em julho de 1995. De acordo com o site da empresa, o primeiro livro
vendido foi Fluid Concepts and Creative Analogies: Computer models of the fun-
damental mechanisms of thought.
A Amazon rapidamente tornou-se a queridinha das empresas pontocom.
Bezos lidava bem com a mídia, e livros são coisas que as pessoas realmente
queriam comprar on-line. Em 1997, a empresa levantou US$54 milhões em
sua oferta pública inicial e, em outubro do mesmo ano, completou seu milio-
nésimo pedido – com olhos voltados para a publicidade, Bezos fez a entrega
em mãos no Japão. Mas os pessimistas já recorriam a uma métrica menos
impressionante – quanto dinheiro a empresa estava perdendo. Bezos sempre
dissera que o crescimento inicial era mais importante que a lucratividade e
que estava preparado para perder dinheiro, mas o montante do prejuízo fazia
alguns questionarem essa estratégia.
A Amazon também começou a se diversificar: em 1998 abriu uma loja de
música e, em 1999, passou a comercializar eletrônicos e roupas. Bezos come-
çou a olhar além dos Estados Unidos, indo para a Alemanha e o Reino Unido
em 1998. O tráfego cresceu: em 1999, as vendas alcançaram a inebriante cifra
de US$1,6 bilhão e, segundo outros indicadores – vendas, presença e os velhos
eyeballs (indicadores do número de acessos a sites) das pontocom –, a Amazon
ia de vento em popa. De fato, a revista Time fez de Bezos a personalidade do
ano (Ramo, 1999). Mas, por outro indicador muito importante, as coisas não
estavam tão boas assim. Em novembro de 1999, mesmo com prejuízos to-
tais de mais de US$500 milhões, Bezos continuava cauteloso quanto a querer
alcançar depressa a rentabilidade. Isso continuou por todo o ano seguinte,
quando a bolha das empresas pontocom estourou. Em junho de 2000, as ações
da empresa caíram 19% quando um relatório sugeriu que ela poderia ficar sem
dinheiro. Contudo, a despeito disso, ele abriu lojas na França e no Japão. Em
28 28 mentes que mudaram o mundo

2001 foi a mesma coisa – a Amazon disse que iria cortar sua força de traba-
lho, houve mais rumores e mais especulação de que a empresa seria também
outra vítima pontocom; comediantes faziam piadas sobre a Amazon.bomba e
Amazon.frita. Nada disso fez Bezos perder o controle, e o mais perto que ele
chegou de verdadeiramente reconhecer que talvez o desempenho não estivesse
de acordo com os planos foi em sua carta aos acionistas de 2001 na qual de-
clarou: “Caramba, foi um ano terrível.” E de fato foi: a Amazon tinha perdido
US$1,4 bilhão.
Eu me lembro de entrevistar Jeff Bezos mais ou menos nessa época. Em
termos jornalísticos, foi o meu melhor momento. Estava um calor absurdo – o
dia mais quente da história de Londres – e eu decidi que seria uma boa fazer
a entrevista de bermudas, pois esse era o traje do mundo das pontocom. Não
tenho certeza do que Bezos realmente achou disso, e ele fez algumas piadas.
Não foi uma das melhores entrevistas – eu estava convencido de que ele viria
com uma porção de clichês corporativos quando, na verdade, deveria admitir
que a Amazon nunca seria um negócio lucrativo. Hoje, é claro, percebo que
Bezos estava dizendo que acreditava firmemente na empresa e que a convicção
de que a Amazon fracassara estava completamente errada. Além disso, eu não
era o cara mais inteligente da sala. Desse modo, mais uma vez, o que se pode
esperar de alguém que aparece para entrevistar o homem do ano da Time de
bermudas?
Mas havia muita pressão agora e Bezos tinha de fazer alguma coisa. Diante
disso, ele disse que a empresa daria lucro até o final do ano. No início de 2002,
a empresa registrou um pequeno, pequeníssimo, lucro para o quarto trimestre
de 2001, superando as expectativas de todos. Registrou seu primeiro lucro
anual no começo de 2004, referente ao ano de 2003, sete anos depois de sua
criação. Isso se resumiu a saudáveis US$125 milhões. Parecia que Jeff Bezos,
o empresário de longo prazo da pontocom, estava certo o tempo todo. Ele
desdenhou os céticos e os franco-atiradores, venceu as dificuldades e construiu
a maior rede de varejo dentre todos eles. Hoje em dia, a única varejista dos
Estados Unidos que supera a Amazon em termos de capitalização de mercado
é o Walmart. No Reino Unido, em 2009, foi eleita a terceira rede de varejo
favorita do país (pela Verdict Research), atrás apenas de John Lewis e Ikea.
Uma vez que provou ser um negócio viável, a Amazon continuou avançan-
do e inovando. Comprou o site chinês Joyo.com em 2004 e o renomeou para
Amazon.cn em 2007. Além disso, a Amazon se expandiu para toda categoria
Jeff Bezos 29

de produtos imaginável. No início dos anos 2000, começou a vender itens de


terceiros e outros com a própria marca e, como resultado, tornou-se um vasto
mercado on-line com milhares de vendedores em vez de apenas um varejista.
Em 2007, a empresa começou a vender downloads de MP3, colocando-se
em concorrência direta como o todo-poderoso iTunes da Apple. Mais uma
vez, a Amazon agiria de maneira diferente – enquanto o iTunes e outros ven-
diam arquivos de música com GDD (gestão de direitos digitais, significando
que você não podia copiá-los), o GDD da Amazon era de graça. Além disso,
eram fornecidos em MP3, um formato que tocaria basicamente em qualquer
aparelho. Esse foi um diferencial importante e imediatamente cativou mui-
tos consumidores insatisfeitos por sentir o doentio controle da Apple. Atual­
mente, a Amazon detém 12% do mercado contra os 70% da Apple (NPD
Group, maio de 2010), mas a parcela desta última está estagnada, enquanto
a da Amazon segue crescendo. A outra notável inovação da empresa foi o
Kindle, um leitor de livros baixados na internet. Em 2010, pensava-se que
cerca de 8 milhões de livros baixados pela internet haviam sido vendidos. Em
contrapartida, em 2010 a Apple vendeu aproximadamente 15 milhões de seus
computadores tablets, o iPad – um aparelho que também pode ser usado para
ler livros, com a desvantagem, diferentemente do Kindle, de não oferecer boa
leitura na claridade.
Naturalmente, houve erros ao longo do caminho. Bezos disse: “Em 1999,
investimos em todas as falidas startups do então tosco e-commerce – Pets.
com, living.com e kozmo.com. Investimos em uma porção de grandes fracas-
sos. A única coisa boa é que, apesar de termos adquirido muitas empresas, elas
não nos tiraram de nossa própria missão, mas foi um desperdício de capital.”
(Quittner, 2008). A empresa também tentou entrar na área de pesquisa (lição:
não tente competir com o Google). Mas a grande diferença entre a Amazon
e as tantas pontobombas é que com ela os fundamentos sempre pareciam cer-
tos. Havia uma visão clara e um plano sensato, Bezos sempre foi um homem
bem detalhista, e a empresa sempre representava uma forma melhor de fazer
as coisas. Além do mais, a Amazon sempre foi fanática pela experiência do
cliente e sempre os incluía no processo. Os imensos volumes de dados que
coletava não somente permitiam que refinassem suas ofertas a “lojas para um
único cliente”, mas também tornavam o site parecido com uma comunidade
em que as opiniões das pessoas sobre suas compras realmente importavam e
ajudavam os outros.
30 28 mentes que mudaram o mundo

Na conferência “Disruptive by design” da revista Wired em 2009, numa


sessão de Perguntas e Respostas com Steve Levy, perguntaram a Bezos o que
fez a Amazon sobreviver quando várias pessoas duvidavam dele. Veja a respos-
ta do empreendedor:

Havia duas coisas: os indicadores dos negócios e o preço das ações. Depois da
explosão das bolhas, os preços das ações caíram, mas os indicadores continuaram
a melhorar. Tivemos algumas críticas muito duras durante esse tempo, mas sem-
pre notamos que nossos mais ferrenhos críticos estavam entre os nossos melhores
clientes. Ter uma equipe totalmente focada no desenvolvimento de produtos torna
você mais resiliente contra a opinião alheia.

Vale a pena lembrar também que, por mais que fosse uma voz de otimismo
no momento da explosão, Bezos foi uma voz de moderação sóbria durante os
piores excessos do boom. Um mantra que ele vivia repetindo para seu pessoal
era: “Não se sintam 30% mais espertos porque a ação está 30% mais alta este
mês, pois vocês vão se sentir 30% mais burros quando elas caírem.” Ele tam-
bém disse: “Uma das diferenças entre fundadores/empreendedores e gerentes
financeiros é que os fundadores/empreendedores são teimosos sobre a visão do
negócio e continuam a trabalhar nos detalhes. O segredo de ser um empreen-
dedor é saber quando ser teimoso e quando ser flexível. Para mim, o segredo é
ser teimoso sobre grandes coisas.”
Contudo, Bezos não é um empreendedor nos moldes de Branson. Em
várias ocasiões, ele disse que não tem nenhum desejo em particular de fun-
dar outra empresa. Entretanto, ele tem outros interesses – e um deles é em
viagens espaciais que, sem dúvida, é o mais atual hobby dos homens ricos do
novo século. Em 2005, Bezos anunciou o Blue Origin, um projeto para colo-
car passageiros pagantes no espaço. Em 2010, sua venda de dois milhões de
ações da Amazon (que o deixou com meros 92 milhões) levou a especulações
de que, talvez, ele estivesse apressando as atividades nessa esfera. Mesmo
que seja um simples hobby, tendo Bezos por trás disso é bom ficarmos de
olho no espaço.
Jeff Bezos 31

Referências e leituras adicionais

Achievement.org, Biography of Jeff Bezos


Anderson, Chris (2001) The zen Jeff Bezos, Wired, 13
Businessweek (2006) Jeff Bezos’ risky bet, 13 de novembro
Deutschman, Alan (2004) Inside the mind of Jeff Bezos, Fast Company, 1o de agosto
Frey, Christine and Cokk, John (2004) How amazon.com survived, thrived and tur-
ned a profit, Seattle Post-Intelligencer, 28 de janeiro
Quittner, Josh (2008) The charmed life of Amazon’s Jeff Bezos, Fortune, 15 de abril
Ramo, Joshua Cooper (1999) Jeffrey Preston Bezos, person of the year, Time, 27 de
dezembro
Rigby, Rhymer (2001) Entrevista com Jeff Bezos, Business 2.0
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 5
A dupla do Google
(Sergey Brin e Larry Page)

G raças, em parte, a um artigo da revista Playboy publicado em setembro


de 2004, Sergey Brin e Larry Page serão conhecidos para sempre como
“Google guys” (o título da entrevista seria “Os caras do Google – os mais novos
bilionários da América”, numa tradução livre). Embora a inteligente alite-
ração possa parecer uma forma um tanto trivial de descrever dois dos mais
ricos e influentes empreendedores da tecnologia, ela reflete exatamente o que
eles são. A manchete da Playboy nos deu uma amostra disso. Brin e Page são
cofundadores do maior mecanismo de busca do mundo, uma das empresas de
tecnologia mais interessante e, segundo alguns, a que detém a marca mais va-
liosa do mercado. Atualmente, a dupla é formada pelo presidente tecnológico
(Brin) e o CEO (Page), que têm participações significativas na empresa; Eric
Schmidt, que os dois contrataram em 2001, foi CEO até o início de 2011.
Page nasceu em Michigan e lá estudou antes de se matricular como aluno
de PhD na Universidade de Stanford, na Califórnia. Brin nasceu na Rússia e
seus pais emigraram para os Estados Unidos em 1979. Formou-se pela Uni-
versidade de Maryland antes de se mudar para Stanford para fazer o doutorado
em Ciência da Computação. Os dois se tornaram amigos e, em 1996, come-
çaram a trabalhar juntos num mecanismo de busca que, na época, chamava-se
Backrub. Em 1997, decidiram mudar o nome para Google, uma brincadeira
com o termo matemático “googol” (um seguido de cem zeros) em uma alusão
à já imensa quantidade de informações on-line.
No verdadeiro estilo do Vale do Silício, os dois conseguiram convencer
o cofundador da Sun Microsystem, Andy Bechtolsheim, a investir US$100
34 28 mentes que mudaram o mundo

mil. Eles montaram uma oficina numa garagem alugada e a legalizaram como
Google Technology Inc. O domínio google.com foi registrado em setembro
de 1997, e a empresa foi incorporada após um ano. Pouco tempo depois, eles
contrataram seu primeiro funcionário, Craig Silverstein, que ainda é o dire-
tor de tecnologia. Em uma entrevista em 2008 para o The Times (Londres),
Silverstein disse: “Sempre imaginei que seríamos uma empresa de 80 a 100
pessoas.” Atualmente, contam com mais de 20 mil empregados. No final de
seu primeiro ano, a PC World a citou, honrosamente, como o melhor meca-
nismo de busca. Era o início do que viria a ser uma ascensão notável – de uma
empresa da qual poucos haviam ouvido falar para um colosso global em menos
de uma década.
Mas o que a dupla do Google fez de tão diferente? Certamente não foram
os primeiros. De fato, se olharmos em retrospecto para a lista de mecanismos
de busca (Excite, Ask Jeeves, Lycos – que hoje não passam de sombras pálidas
do que um dia foram), o Google era um participante tardio que oferecia aos
usuários algum diferencial. Primeiro, classificou as páginas de modo diferente.
Outros mecanismos de busca classificavam o número de vezes que o termo
pesquisado apareceria na página em questão, enquanto o Google reconheceu
que páginas importantes tinham maior probabilidade de estar vinculadas por
outras páginas, e seu algoritmo PageRank conseguiu analisar isso. Disseram
que os resultados eram mais parecidos com a maneira como uma pessoa atri-
buiria importância a uma página. Em uma entrevista dada em 2001 à revista
Businessweek, Page disse que “ao conversar com todos os CEOs das empresas
de busca – que, na verdade, começavam a se transformar em portais –, perce-
bemos que, em termos comerciais, ninguém iria desenvolver mecanismos de
busca. Eles disseram: ‘Bem, de fato, nós não nos importamos com mecanis-
mos de busca.’ Foi então que percebemos que havia uma enorme oportunidade
de negócio e que ninguém mais queria trabalhar nisso”.
O segundo grande diferencial do Google era a simplicidade de sua página.
Numa era em que muitos mecanismos de busca e portais adotavam uma abor-
dagem de miscelânea para suas páginas iniciais, o Google era o exercício do
minimalismo. Era – com sempre foi – essencialmente uma caixa de pesquisa,
a palavra Google e o fundo em branco. Tudo isso cativou os usuários, mas não
trazia nenhuma receita.
As diferenças entre o Google e as empresas pontocom mais comuns não se
limitou à experiência do usuário e à tecnologia. Sua terceira grande diferença
A dupla do Google (Sergey Brin e Larry Page) 35

apareceu em 2000 quando o Google começou a vender anúncios baseados


nas pesquisas dos usuários. São anúncios normalmente exibidos do lado di-
reito da página, e o modelo de receita foi (e é) uma combinação de empresas
“que compram” essas palavras-chave em um processo de leilão e pelo número
de cliques (clickthroughs) dados no banner do anunciante, ou seja, a empresa
paga para o Google determinada quantia quando os usuários acessam o site
da empresa através do Google. Isso significou que, diferentemente de muitas
startups pontocom, o Google teve um fluxo de receita decente desde os pri-
meiros dias de funcionamento. Não teve de passar anos queimando o dinheiro
do investidor e vir cada vez mais com motivos rebuscados para explicar por
que o número de visitantes era mais importante do que a lucratividade. Em
vez disso, o primeiro lucro da empresa foi em 2001, cerca de três anos depois
de ter sido incorporada.
O maior diferencial da empresa é cultural. Há muito tempo ela é conhecida
como um ótimo lugar para se trabalhar e é famosa por vários aspectos – da
qualidade da comida de sua cantina e creches para filhos de funcionários até
facilidades engraçadas para seu pessoal, como paredes para escaladas indoor.
Quando eu escrevia uma pequena coluna para o Financial Times sobre o lado
curioso e agradável da vida corporativa, tinha uma regra autoimposta de que
poderia usar o Google somente uma vez a cada três meses, mas, não importa o
que eu procurasse, eles sempre pareciam ter a resposta. Você certamente tem a
impressão de que essa cultura emana de lá de cima. Quando entrevistei Sergey
Brin em 2001, ele parecia muito com uma pessoa comum, embora fosse dono
de uma inteligência fora do normal. Seu escritório era um pouco bagunçado, e
o canto da sala estava cheio de equipamentos de esqui. Passamos 15 minutos
da entrevista falando sobre esquiar no Lago Tahoe.
Talvez a manifestação mais famosa da filosofia Google seja o slogan infor-
mal “Don’t be evil” (Não seja mau). Page, Brin e Schmidt explicaram que isso
estava no manual do “proprietário” antes da oferta pública inicial (IPO – Initial
Public Offering) da empresa em 2004. Em parte, é possível que tenham ado-
tado o slogan para amenizar as preocupações do pessoal de que abrir o capital
poderia mudar a cultura: “Não seja mau. Acreditamos firmemente que, no
longo prazo, vamos nos dar bem – como acionistas e de todas as outras formas
– com uma empresa que faz coisas boas para o mundo, mesmo que tenhamos
de abrir mão de alguns benefícios no curto prazo. Esse é um aspecto importan-
te de nossa cultura e é amplamente compartilhado dentro da empresa.” Algum
36 28 mentes que mudaram o mundo

tempo depois, alteraram o slogan para “evil scale” (balança do mal), publicado
no site do Google no menu Informações Corporativas (Corporate information
no site em inglês).
A oferta pública inicial levantou US$1,67 bilhão e tornou muitos funcioná-
rios milionários – mas, embora a empresa esteja listada na bolsa, Page e Brin
retêm a participação acionária majoritária, que lhes confere o controle final. E,
depois da IPO bem-sucedida, certamente o Google não deitou nos louros ou
permaneceu “apenas” como um mecanismo de busca.
O Google é um negócio altamente lucrativo, que controla mais de dois
terços do mercado de publicidade on-line, o que lhe permitiu continuar com
um plano de jogo bem incomum. Basicamente, a organização passou grande
parte dos últimos sete ou oito anos lançando produtos brilhantes, inovadores e
bem elaborados, e depois oferecendo-os gratuitamente.
O mais conhecido deles é o Gmail, seu serviço de e-mail, que se mostrou
tão popular e foi tão bem recebido (muito por causa da qualidade de seu de-
sign), que revolucionou o uso do correio eletrônico sem vínculo com o pro-
vedor de acesso à internet. A aceitação foi tão grande que algumas empresas,
como a Rentokil, trocaram seus sistemas corporativos pelo Gmail (IT Pro, 13
de outubro de 2009). De novo, o Google foi um participante tardio no mer-
cado. Seus principais concorrentes são o Hotmail, que funciona desde 1996 e
foi comprado pela Microsoft em 1997, e o Yahoo Mail, que surgiu em 1997.
O Gmail não havia aparecido até 2004. Apesar de tudo, conseguiu um pro-
gresso impressionante no mercado. O Hotmail tem 360 milhões de usuários;
o Yahoo, 284 milhões, e Gmail, 173 milhões.
Vale lembrar que o Gmail é amplamente visto como o serviço de e-mail
gratuito mais moderno e descolado do que seus rivais. É verdade que, recente-
mente, o Hotmail passou por uma reformulação e, de acordo com o blog Tech
do New York Times (18 de maio de 2010), o layout do Hotmail foi modificado
para ficar mais parecido com o Gmail. Nos Estados Unidos, o Hotmail tem
um pequeno “problema de percepção”, como observou o vice-presidente da
Microsoft, Chris Jones. As pessoas percebem que o Hotmail está atolado de
spam, tem baixa capacidade de armazenamento, carece de um monte de re-
cursos e é, basicamente, um serviço de e-mail do passado. “Isso, em parte, é
porque o Hotmail está no mercado há algum tempo”, disse Jones, celebrando
o Hotmail como o primeiro serviço de e-mail da Web a alcançar grande su-
cesso. “Nos últimos tempos, o Gmail está em primeiro lugar com uma grande
A dupla do Google (Sergey Brin e Larry Page) 37

capacidade de armazenamento, é o primeiro com IMAP e, por causa desses


dois aspectos de liderança, tem causado grande agitação.” A última frase pro-
vavelmente diz quase tudo o que você precisa saber sobre a diferença entre
Microsoft e Google.
O Gmail pode ser uma da melhores ofertas do Google, mas seus produtos
mais recentes são igualmente interessantes e até mais preocupantes para os
concorrentes. No ano passado, a empresa lançou o navegador Chrome, que foi
muito bem recebido e hoje tem apenas 7% do mercado, atrás do Firefox, com
cerca de 25%, e o Internet Explorer, com 60% (Netmarketshare, 2010). De ma-
neira notável, o Chrome está à frente do Safari, o navegador desenvolvido pela
Apple. Mas o Chrome aponta para alguma coisa muito mais revolucionária.
O Google quer não só fornecer aos consumidores serviço de busca e e-mail,
mas também um sistema operacional grátis. Desse modo, atacam diretamente
o terreno da Microsoft, cujo sistema operacional (OS – Operational System),
o Windows, atualmente roda em mais de 90% dos computadores do mundo.
A questão é que o Chrome não foi concebido para ser apenas um navegador
– entre os avanços futuros está a prerrogativa de funcionar como sistema ope-
racional. Baseado no Linux, o Chrome será um OS gratuito e de código aberto
(ou seja, qualquer pessoa pode visualizar e alterar o código). Desenvolvido para
ser um software leve, o Chrome deve funcionar melhor em laptops menores,
oferecendo inicialização instantânea (instant on). É claro que existem sistemas
operacionais gratuitos com base no Linux no mercado há anos. Mas nenhum
deles chega sequer perto da adoção maciça nos computadores desktop e em
laptops; calcula-se que o maior, o Ubuntu, tenha cerca de 12 milhões de usuá-
rios. Parte disso é porque não há uma potência corporativa por trás do Ubuntu,
ao passo que um sistema operacional grátis com o suporte da Google é uma
perspectiva muito diferente.
O Google já tomou forma nessa área – embora, nesse caso, tenha pre-
judicado mais a Apple do que a Microsoft. Em 2008, a empresa lançou um
sistema operacional de telefonia móvel chamado Android, também baseado
no Linux, lançado com código aberto. O Android foi um grande sucesso e,
dependendo de em quem você prefira acreditar, talvez esteja quase alcançando
ou ultrapassando o OS do iPhone. Em 2010, certamente alguns analistas insi-
nuaram que, no que diz respeito aos recursos próprios para celulares, agora era
a Apple que perseguia o Google e não mais o contrário. E quanto à Microsoft
no espaço de telefonia móvel? Como observa John Gruber, em seu blog sobre
38 28 mentes que mudaram o mundo

tecnologia, “o grande perdedor desta semana (...) foi a Microsoft. Ela nem
sequer faz parte do jogo. Ela não tem nada. Nenhum aparelho interessante, as
vendas estão fracas, e a base de usuários diminui a cada dia. A irrelevância da
Microsoft é fato consumado”.
A empresa está incomodando os maiores players do setor de tecnologia de
duas outras maneiras. O Google passou muito cedo (em 2006) para a arena
de aplicativos on-line, que são versões reduzidas de programas como o Word
e só precisam de um navegador para rodar – na prática, o Google oferece uma
versão rudimentar do Office on-line. É importante salientar que o Google
Apps, mesmo em seu formato empresarial pago, não corresponde à funciona-
lidade do MS Office, mas vale observar que a grande maioria dos usuários do
Office não precisa de todos os recursos da versão completa. Além disso, em
meados de 2009, a Microsoft lançou uma versão on-line gratuita do Office.
Na verdade, a maioria dos produtos Google segue os dois caminhos. Quan-
do lançado de modo pioneiro, é brilhante e inovador; se lançado mais tarde,
faz o então líder parecer pesado e insuficiente para atender às necessidades dos
usuários. Muitas pessoas atribuem isso à cultura corporativa. O Google é am-
plamente reconhecido por ter uma força de trabalho apaixonada pelo que faz e
com um espírito corporativo que incentiva a inovação. A empresa é famosa por
permitir que seus engenheiros passem 20% do tempo estudando os projetos de
seu interesse. Muito disso tudo provém do fato de os fundadores da empresa
terem uma forte convicção na aplicação criativa de novas tecnologias.
É claro que nem tudo que o Google toca vira ouro. O Google Video Player
teve uma morte tranquila em 2007 (a empresa comprou o YouTube). Houve
também o Google Orkut, uma tentativa bem fraca da empresa de ingressar na
seara das redes sociais, e o Google Answers, que está bem longe de alcançar o
mesmo grau de sucesso de seu equivalente da Yahoo. Mas se compararmos es-
ses fracassos com sucessos como Gmail, Google Earth, Google Maps, Google
Apps, Chrome, e assim por diante, eles parecem um preço muito pequeno a
se pagar. Entretanto, pode-se argumentar que o Google age como um desin-
centivo para outras empresas inovadoras, pois qualquer coisa que se desenvolva
on-line será, em algum momento, superada por um trabalho do Google. Nessa
linha de raciocínio, o melhor que se há de fazer é esperar que o Google ou
outro gigante do setor lhe faça uma oferta de compra.
O enorme sucesso do Google tem visto um aumento no controle de suas
atividades pelos cães de guarda da concorrência, que também se queixam de
A dupla do Google (Sergey Brin e Larry Page) 39

seu comportamento e poder excessivo. Além disso, a empresa tem enfrentado


a preocupação crescente dos que defendem a privacidade e temem o impres-
sionante volume galopante de informações que o Google detém sobre as pes-
soas. Foi necessário algum tempo para tranquilizar de alguma forma aqueles
que temem por sua privacidade. Mas a preocupação sempre permanece – e se
o gigante relativamente benigno decidir um dia começar a usar alguns dados
sob seu poder de maneira mais agressiva e menos escrupulosa?
Curiosamente, a maior dor de cabeça da empresa até os dias de hoje não
tem sido tanto na parte tecnológica, mas no âmbito político. A questão está
firmemente arraigada no desejo antigo de Brin e Page de comandar uma em-
presa que nunca fará o mal e no fato de que os lemas graciosos são relativa-
mente fáceis de colocar em prática quando se é apenas um pobre coitado e
todos gostam de você, mas nem tanto quando se é uma multinacional líder de
mercado. Depois de muitos momentos de angústia, a empresa entrou na Chi-
na em 2006 com uma versão censurada de seu mecanismo de busca. Na época,
Brin disse: “Achamos que talvez pudéssemos abrir mão de alguns de nossos
princípios, mas acabar por fornecer mais informação para o [povo] chinês (...)
e fazer a diferença.” Muitos acusaram a empresa de contorcionista da ética,
traidora de suas raízes, o que deve ter sido especialmente difícil para Brin, com
todas as suas lembranças de infância na Rússia. No final, combinar o desejo do
governo chinês de controlar a informação com o anseio do Google de que ela
fosse livre mostrou-se um arranjo difícil demais. Em março de 2010, depois
de ataques de hackers que foram rastreados na China continental, o Google
anunciou que não queria mais censurar os seus resultados de busca no país e
que as pesquisas dos chineses no Google seriam redirecionadas para Hong
Kong, que é mais liberal. Esse fato terminou efetivamente com a presença da
empresa na China, embora a China fosse um dos poucos mercados em que o
Google não era o número um.
Quanto a Page e Brin, nenhum dos dois chegou ainda aos 40 anos. Segun-
do a revista Forbes, em 2010, juntos, eles eram a 24a maior fortuna pessoal do
mundo e ainda detêm uma parte substancial das ações da empresa e do poder
de voto, embora tenham dito que vão vender grandes cotas para diluírem suas
participações em menos de 50%. Parece haver poucos motivos para qualquer
um deles deixar a empresa, que, com pouco mais de 10 anos, parece pronta
para continuar seu recorde de inovação que abala o mercado. Isto posto, ambos
expressaram interesse em energia renovável.
40 28 mentes que mudaram o mundo

Referências e leituras adicionais

Economist (2008) Enlightenment man, 6 de dezembro


Ignatius, Adi (2006) Meet the Google guys, Time, 12 de fevereiro
Kang, Cecilia (2010) Cars and wind: what’s next for Google as it pushes beyond the
web?, Washington Post, 12 de outubro
Malseed, Mark (2007) The story of Sergey Brin, Moment Magazine, fevereiro
Playboy (2004) Interview: Google guys, setembro
Rigby, Rhymer (2000) Interview with Sergey Brin, Business 2.0
Spiegel (2010) Google co-founder on pulling out of China, 30 de março
Capítulo 6
Sir Tim Berners-Lee

F az sentido perguntar o que Tim Berners-Lee – que não é homem de negó-


cios – está fazendo em uma lista de grandes mentes da gestão. A resposta
é simples. Berners-Lee é o homem amplamente reconhecido como o pai da
Web (a despeito das reivindicações de Al Gore). Como um dos principais
participantes da grande revolução tecnológica do final do século XX e início
do século XXI, ele teve uma influência muito mais profunda no modo como
fazemos negócios – e, consequentemente, em nossa vida em geral – do que
centenas de outras pessoas mais nitidamente ligadas ao mundo do comércio e
da indústria. Sem seu trabalho, as empresas administradas por outras mentes
mencionadas neste livro, como a dupla do Google e Jeff Bezos, não poderiam
existir. Contudo, ao contrário deles, Berners-Lee não é particularmente rico
e leva a vida de um acadêmico, embora seja aclamado como o mais notável
cidadão britânico vivo.
Antes de qualquer coisa, é importante compreender que a Web e a internet
não são a mesma coisa. A internet é constituída de uma série de redes (incluin-
do todos os computadores físicos e todos os sistemas de fiação a eles conec-
tados). Em um dos pratos da balança pode estar um PC ou telefone celular e
no outro os vastos clusters de servidores do Google. A Web (ou World Wide
Web, como Berners-Lee batizou-a originalmente) é um meio de compartilhar
informações pela rede. Em termos de tráfego na rede, a Web constitui uma
considerável parte do total, porém não é tudo. Por exemplo, o e-mail repre-
senta uma considerável parte do tráfego que ocorre na internet, mas não é
parte da Web, a menos que seja webmail. A internet foi criada 20 anos antes
42 28 mentes que mudaram o mundo

da Web e tem suas origens na Arpanet, patrocinada pelo Departamento de


Defesa americano. A primeira mensagem foi enviada pela internet no dia 29
de outubro de 1969, da UCLA para o Stanford Research Institute (a men-
sagem era a palavra “login”, embora somente a sílaba “lo” tenha sido enviada
antes que houvesse uma pane no sistema). Essa data é amplamente utilizada
como o dia do nascimento da internet.
Antes da Web, a internet era um lugar muito diferente – e muito menos
interessante – que aquele com o qual hoje estamos familiarizados. Era uma
série de sistemas militares e acadêmicos interligados, um mundo de códigos
secretos utilizados principalmente por pessoas donas de um cérebro fenomenal
e quase tão distante quanto se pode imaginar da experiência intuitiva de multi-
mídia dos dias de hoje. Atualmente, e de modo geral, quando as pessoas dizem
“internet”, querem dizer Web. É incrível que, para algo que está tão claramen-
te relacionado ao Vale do Silício e que mais tarde foi dominado pelas startups
da costa oeste, as origens da Web (se não da internet) estejam, na verdade,
localizadas no Velho Mundo. Seu pai, Berners-Lee, um inglês que trabalhava
em uma instituição europeia de pesquisas; o primeiro site do mundo, denomi-
nado info.cern.ch (nome fácil de memorizar), não era, de modo algum, uma
empresa pontocom – era .ch, extensão que indica domínio da Suíça.
Berners-Lee nasceu em 1955 em East Sheen, subúrbio londrino de classe
média sem grandes atrativos. Sua educação foi bastante convencional – na
verdade, a única coisa notável sobre sua infância é que tanto ele quanto seus
pais eram pessoas brilhantes. Seus pais eram matemáticos e trabalharam com
os primeiros computadores que surgiram no mundo, como o Ferranti Mark
I. Tim era fascinado pela eletrônica, e em sua casa as conversas durante as
refeições incluíam tópicos como inteligência artificial e jogos que envolviam
números imaginários (por exemplo, a raiz quadrada de números negativos).
Berners-Lee frequentou a escola de Wandsworth e, mais tarde, estudou no
Queens College, em Oxford, onde se diplomou em Física.
Após se formar, passou a se dedicar à área de software, trabalhando na
Plessey Telecommunications por dois anos, antes de ingressar na DG Nash
Ltd. Segundo seus contemporâneos, era um homem extremamente inteli-
gente e muito determinado. Mais tarde, Berners-Lee tornou-se consultor
independente e, nesse período, mais precisamente em 1980, assinou um
contrato de seis meses com a CERN, importante instituição de pesquisas
físicas localizada em Genebra. Querendo descobrir uma forma de interligar
Sir Tim Berners-Lee 43

informações e documentos em seu computador, Berners-Lee desenvolveu


um estudo sobre software cuja finalidade era organizar informações de forma
semelhante à executada pela mente humana. Ele dizia que a ideia era “acom-
panhar todas as associações aleatórias com as quais nos deparamos na vida
real”. O estudo foi denominado Enquire e, segundo Berners-Lee, “consti-
tuía a base conceitual para a World Wide Web”. Em essência, o Enquire
significava que palavras constantes de um arquivo podiam ser vinculadas a
outros arquivos. E o conceito funcionou, embora estivesse muito longe do
hipertexto de alcance global que hoje conhecemos, pois funcionava apenas
no computador de Berners-Lee.
De 1981 a 1984, ele trabalhou na John Poole’s Image Computer Systems,
na área de design técnico. Em 1984, retornou à CERN como membro, e seu
interesse em organizar informações em computadores se reacendeu. Entre-
tanto, na época, isso representava um verdadeiro pesadelo. A padronização e
a interoperabilidade de hoje estavam muito distantes, havia vários tipos dife-
rentes de hardware e software, e máquinas distintas, muitas vezes, não usavam
a mesma linguagem, e seus inventores não tinham nenhum interesse em con-
seguir isso. Em 1989, Berners-Lee desenvolveu uma proposta de um “grande
banco de dados de hipertexto com links digitados”, ideia que foi recebida com
cortês indiferença, embora seu chefe, Mike Sendall, tenha sugerido que ele a
experimentasse em um computador.
Berners-Lee encontrou maior receptividade a suas ideias na figura do bel-
ga Robert Cailliau, um cientista da área de informática que estava disposto a
ajudá-lo a obter um financiamento junto à CERN. Em 1990, os dois apre-
sentaram a ideia durante uma conferência, fazendo uma exposição sobre uma
rede de documentos que seria visualizada em navegadores e seria baseada na
arquitetura cliente-servidor. Como ninguém se entusiasmou, eles decidiram
empreender o projeto sem nenhuma ajuda externa. No fim do ano, Berners-
Lee tinha tudo de que precisava para construir uma rede básica, embora essa
rede pudesse operar somente em computadores NeXT. (Se fosse possível ter
um hiperlink, este se conectaria a Steve Jobs.)
No dia 6 de agosto de 1991, Berners-Lee colocou seu primeiro site em
operação. Para aqueles que estiverem interessados, esse site ainda pode ser
encontrado. O despretensioso primeiro parágrafo diz: “O projeto WorldWi-
deWeb (WWW) tem como objetivo permitir que sejam efetuados links com
qualquer informação, em qualquer lugar. O formato do endereço inclui um
44 28 mentes que mudaram o mundo

método de acesso – namespace ou espaço para nomes – e para a maioria deles


há um nome do host e algum tipo de caminho.” Mais à frente, o parágrafo diz:
“O projeto WWW foi desenvolvido para permitir que cientistas dotados de
mente privilegiada compartilhem dados, notícias e documentação. Estamos
muito interessados em ampliar a Web para que englobe outras áreas e em ter
servidores de gateway para outros dados. Colaboradores serão bem-vindos.”
Naquela época, Berners-Lee – um homem extremamente modesto – não
imaginava que em um futuro não muito distante seu projeto seria comparado
à invenção da prensa tipográfica. Contudo, em vista do passado medíocre do
projeto, ele talvez tenha pensado que sua invenção não passaria de uma útil
ferramenta acadêmica. As pessoas raramente se lembram de como era difícil
navegar na Web nos primeiros anos.
Vale a pena enfatizar também que o conceito de hipertexto não era, na
realidade, de Berners-Lee; era muito anterior, mais precisamente de 1945.
Contudo, foi dele a ideia de juntar hipertexto e internet. No início de 1990,
o interesse se intensificou e alguns sites começaram a surgir, embora fossem
restritos a departamentos de ciências, universidades e laboratórios. Em 1993,
a CERN liberou os protocolos e códigos da Web para que fossem utilizados
por qualquer indivíduo e, em 1994, Berners-Lee estabeleceu o World Wide
Web Consortium (W3C) para implementar padrões relativos à Web e manter
a qualidade.
Entretanto, 1993 não foi apenas o ano em que os protocolos por trás
da Web foram liberados; outro marco altamente significativo foi o apare-
cimento do navegador Mosaic. Criado por Marc Andreessen e Eric Bina,
esse navegador é amplamente reconhecido por ter tornado a Web popular
e por tê-la colocado ao alcance de pessoas comuns. Na verdade, embora a
existência do Mosaic tenha durado apenas de 1993 a 1997, ainda hoje é re-
conhecido como um navegador da Web. Na realidade, o Mosaic representou
o último estágio do processo iniciado por Berners-Lee em 1984. Conforme
qualquer pessoa que estivesse trabalhando ou estudando no início dos anos
1990 poderá lembrar, no começo daquela década, para a maioria das pessoas,
a internet não existia. Alguns anos mais tarde, os primeiros adeptos talvez
já tivessem um e-mail, mas foi somente em meados da década de 1990 (o
Internet Explorer surgiu em 1995) que as coisas realmente deslancharam e
a Web fez sua transição final, passando de uma ferramenta para cientistas
para um trem no qual todas as empresas queriam embarcar. O Amazon.com
Sir Tim Berners-Lee 45

foi lançado em julho de 1995, menos de quatro anos após o surgimento do


primeiro site.
Berners-Lee é visto pela maioria das pessoas como um homem modesto e,
mais de uma vez, declarou que estava no lugar certo na hora certa, observando
que outros estavam explorando as mesmas ideias que ele havia explorado como
pioneiro. Tudo isso é verdade, mas é também excesso de modéstia. Muitos
outros grandes inventores do passado (como Edison) eram indivíduos que li-
deravam equipes de pesquisadores, enquanto Berners-Lee idealizou e realizou
o projeto da Web praticamente sozinho. Nesse sentido, ele de fato a inventou
e, na imaginação popular, tornou-se um gênio solitário. Na opinião das pes-
soas que colaboraram na implantação, difusão e disseminação de seu invento,
ele foi o mentor da ideia. Naturalmente, não se trata apenas da invenção. Seu
outro grande feito – o que o coloca em uma situação ímpar em relação à maio-
ria das outras pessoas citadas neste livro – é que, tendo inventado algo que se
tornaria extremamente útil e serviria de base para a grande virada econômica
ocorrida no setor de informação, ele abriu mão de sua ideia. Berners-Lee ja-
mais ganhou dinheiro diretamente de sua invenção.
Sua crença no intercâmbio de informações é algo que faz parte da estrutura
intrínseca da Web. Às vezes é muito semelhante a um produto puro, como a
Wikipédia e os blogs, e às vezes é uma mistura muito mais complexa, como o
compartilhamento de arquivos, e é muito difícil cobrar por um serviço que leve
à descoberta de novas fontes de informações. Mais recentemente, Berners-Lee
tem atuado como incansável defensor da neutralidade da rede, ou seja, o princí-
pio de que todas as informações são iguais e que os ISPs (provedores de serviços
de internet) não favorecem determinados sites e serviços em detrimento de ou-
tros. Em 2004, Berners-Lee tornou-se professor de Ciência da Computação na
Universidade de Southampton, onde trabalha na Web semântica. O conceito
por trás dessa expressão é que os computadores compreendem as informações
com as quais lidam, e não apenas as apresentam aos usuários. No final de 2009,
Berners-Lee inaugurou a World Wide Web Foundation. Ele não ganhou di-
nheiro com sua invenção, mas tem sido alvo de grandes honrarias. Assim como
o título de nobreza, tem dezenas de títulos honorários e ganhou inúmeras me-
dalhas e prêmios – por exemplo, em 2004, foi eleito o mais notável cidadão vivo
da Grã-Bretanha. É uma honraria adequada a um homem que inventou algo de
tanta utilidade que, em pouco mais de uma década, redesenhou a forma como
grande parte do mundo faz negócios – e abriu mão dela.
46 28 mentes que mudaram o mundo

Referências e outras leituras

Austin, Marcus (2001) Profile, Business 2.0


Biografia de Tim Berners-Lee extraída de seu próprio site
Johnson, Bobbie (2005) Profile, The Guardian: Tim Berners-Lee, 12 de agosto
Naughton, John (2003) Profile, The Observer – To serve us all his days, 19 de abril
Quittner, Joshua (1999) Network designer: Tim Berners-Lee, Time, 29 de março
Capítulo 7
Anita Roddick

Q uando Anita Roddick faleceu, em 2007, aos 64 anos, os tributos chove-


ram, mas muitos não partiram de pessoas que, de acordo com o esperado,
estariam louvando uma mulher de negócios. Juntamente com Gordon Brown,
o então primeiro-ministro do Reino Unido, ela foi também louvada pelo dire-
tor executivo do Greenpeace e chefe da Anistia Internacional. Esse talvez te-
nha sido o traço mais marcante da personalidade de Roddick porque, embora
ela tenha construído um vasto e bem-sucedido império comercial composto
de centenas de lojas e amealhado considerável fortuna, não é por seu tino co-
mercial que será lembrada. Seu lugar na história está assegurado porque ela foi
a primeira pessoa que realmente unificou o comércio e o engajamento social.
Anita reconhecia que o comércio era uma das mais poderosas forças propulso-
ras do mundo moderno – e estava determinada a usar essa força para promover
uma pauta ambiental ética. Nesse sentido, ela era incomum – no seu entender,
os negócios eram um meio para atingir um fim, não um fim em si.
Em seu campo (empresas com responsabilidade social) foi pioneira no sen-
tido lato da palavra. Nos dias de hoje, muitas pessoas promovem a reciclagem,
preocupam-se com o fato de que os habitantes do local em que a empresa se
instala possam ser prejudicados e se aborrecem com os rastros de carbono dei-
xados pelo homem; qualquer empresa moderna digna do nome tem um discur-
so sobre sustentabilidade, múltiplos resultados finais e múltiplos stakeholders.
Mas se você fizer um retrospecto e analisar o início da década de 1980, no apo-
geu da era Thatcher e Reagan, para a maioria das pessoas de negócios o verde
era uma bela cor para um Jaguar. Na verdade, é fácil esquecer que, naquela
48 28 mentes que mudaram o mundo

época, a maioria das pessoas de negócios não estava muito preocupada com
questões éticas. Não exatamente porque fossem insensíveis (embora existissem
muitas pessoas desse tipo na Inglaterra de Thatcher). Era porque naqueles dias
essa questão não fazia parte da pauta das empresas; elas não se importavam
porque não tinham consciência da questão. É óbvio que havia um movimento
em favor do verde naquela época, mas esse movimento era, em grande parte,
contra o mundo dos negócios. A genialidade de Roddick foi tornar a ética uma
proposição crucial e usar a empresa como uma força em favor do bem.
Anita Perilli nasceu no dia 23 de outubro de 1942 em um abrigo antibom-
bas em Littlehampton, West Sussex, cidade localizada na costa sul da Ingla-
terra – a Body Shop ainda mantém seus escritórios centrais lá. Era filha de
imigrantes italianos, e a única outra família de italianos da cidade era consti-
tuída de primos de Anita. Conforme ela dizia, isso a tornava uma estranha – e
ela se sentia atraída por outros estranhos e rebeldes (http://www.anitaroddick.
com). James Dean era um herói, e Anita afirmava que desenvolveu um precoce
sentimento de indignação: “[Esse sentimento] despertou com a leitura de um
livro sobre o Holocausto quando eu tinha 10 anos.”
Como muitos imigrantes italianos naquela época, seus pais dirigiam um
café. Quando Anita estava com 8 anos, seus pais se divorciaram e a mãe se
casou com um primo do ex-marido, Henry. Na verdade, Henry era o verda-
deiro pai de Anita, pois sua mãe tivera um caso amoroso com ele durante o
casamento. Conforme Anita afirmou, ela se sentiu muito satisfeita com essa
virada dos acontecimentos. Tragicamente, um ano e meio depois que eles se
casaram, Henry veio a falecer.
Após cursar a escola secundária, Roddick recebeu treinamento como pro-
fessora e passou um ano em um kibutz em Israel. Depois disso viajou para vá-
rias regiões distantes, como as ilhas do Pacífico Sul e a África do Sul, de onde
foi expulsa por ter participado de uma noite de jazz em um clube de negros.
Esse ponto talvez tenha representado o primeiro sinal do que estava por vir.
Ela dizia que viajar a ajudara a desenvolver sua consciência social, embora seja
razoável perguntar quantas mulheres jovens na década de 1960 tinham uma
consciência social bem desenvolvida. Quando Anita retornou ao Reino Unido,
a mãe a apresentou a um escocês chamado Gordon Roddick. “Nossa empatia
foi instantânea.” E, de fato, foi: ela se mudou para o apartamento dele cinco
dias depois de se conhecerem, e eles viveram quase 40 anos juntos, até a morte
de Anita.
Anita Roddick 49

Aos 26 anos, Anita deu à luz sua primeira filha, Justine; dois anos mais
tarde, nascia Sam (que seguiu livremente as pegadas da mãe, abrindo uma
sofisticada sex shop ética no distrito de Covent Garden, Londres, onde os
produtos mais vendidos incluíam vibradores de madeira certificada). Anita e
Gordon casaram-se em 1970, quando ela estava esperando Sam, e abriram um
restaurante e, a seguir, um hotel.
É notório que a Body Shop nasceu por força da necessidade. Em 1976,
Gordon Roddick decidiu empreender uma jornada a cavalo de Buenos Ai-
res a Washington, DC (abandonou a expedição quando seu cavalo caiu em
uma vala). Antes de partir, ajudou a mulher a contratar um empréstimo no
valor de £4 mil; a ideia era que ela começaria um negócio para se sustentar
e sustentar as filhas. Anita declarou que, na época, não tinha a menor ideia
sobre o que as vendas a varejo envolviam, mas tinha uma “rica experiência”,
adquirida em suas viagens. Havia testemunhado pessoalmente os rituais de
beleza e os produtos usados pelas mulheres nas sociedades pré-industriais
que ainda existiam em grande número nas décadas de 1960 e 1970, e fora
influenciada pelo fato de ter crescido na Inglaterra dos tempos de guerra e
pós-guerra, e vivenciado o racionamento e a austeridade, quando tudo era
reutilizado. Anita abriu uma loja na pitoresca Lanes, em Brighton, em 1976,
vendendo uma gama bastante limitada de produtos que fabricava em casa.
Quando o marido retornou de sua expedição, 11 meses mais tarde, ela já
tinha aberto uma segunda loja.
Existe certa confusão sobre o quão ética e ecologicamente correta era a
Body Shop no início de suas operações, mas parece bastante claro que os pro-
dutos sempre foram naturais e que Roddick era profundamente contra a rea-
lização de testes com animais – vale lembrar que esse tipo de preocupação era
quase inexistente no fim dos anos 1970. No entanto, não há dúvidas de que
os clientes de Roddick amavam seus produtos simples e testados sem cruelda-
de. Em 1978, a empresa abriu seu primeiro ponto de vendas no exterior (um
quiosque em Bruxelas) e, até os anos 1980, a rede tornou-se um importante
ícone do comércio britânico, embora curiosamente estivesse fora de sincronia
com as características da Inglaterra de Thatcher.
Em 1984, a Body Shop foi inscrita no mercado londrino de títulos não
negociados em bolsas de valores (o segmento júnior do mercado de ações,
que foi suplantado pela AIM). No ano seguinte, a empresa passou a operar
plenamente nas bolsas de valores. O fato de a Body Shop ter se tornado uma
50 28 mentes que mudaram o mundo

empresa de capital aberto foi um rude despertar para Roddick. Conforme ela
afirmou mais tarde: “Eu nunca deveria ter transformado a Body Shop em uma
empresa de capital aberto, mas como poderia saber disso naquela época?” Era
muito simples: sua ideia de uma empresa com múltiplos resultados finais e
múltiplos stakeholders estava cerca de 15 anos à frente de seu tempo, e a City
estava interessada apenas em uma coisa: nos verdadeiros resultados. Anita se
desentendeu com seu CEO, Patrick Gournay; nos Estados Unidos, a empresa
enfrentava uma batalha, e a experiência fez Anita experimentar um profundo
sentimento de falta de confiança na empresa, no mundo corporativo e nos
jornalistas da área econômica. No entanto, as ações da empresa apresentavam
bom desempenho e, em 1990, a Body Shop foi avaliada em £800 milhões,
fazendo de Anita a quarta mulher mais rica do Reino Unido, com 30% das
ações da empresa.
Mas o mais interessante era o engajamento de Roddick. Em 1985, ela
envolveu a empresa na luta pela salvação das baleias; em 1989, empenhou-se
em salvar as florestas tropicais e, em 1990, fez uma campanha contra os tes-
tes com animais. A empresa coletou assinaturas para campanhas em defesa
dos direitos humanos. Em vez de comprar produtos como manteiga de cacau
e nozes brasileiras nos mercados de commodities, Roddick ia se encontrar
com os plantadores em lugares como América Central, Índia e Amazônia, e
negociava diretamente com eles, garantindo que obtivessem um preço mais
ra­zoável para suas mercadorias. Em 1986, a Body Shop lançou seu primeiro
bem de consumo, um massageador para os pés, produzido por um forne-
cedor da região sul da Índia. Em 1990, foram estabelecidas a Body Shop
Foundation e a revista Big Issue, que proporciona uma fonte de renda para
pessoas sem teto – esses foram seus primeiros projetos. Sabe-se que a Body
Shop nunca teve um departamento de marketing; com Anita Roddick na
direção, há uma boa razão para que ela nunca tenha realmente precisado
de um. Estivesse ela lutando contra as multinacionais, esposando a filosofia
feminista ou envolvendo-se nos tumultos da WTO em 1999, Anita sempre
atraiu a atenção do público.
Mas a década de 1990 foi menos compassiva com a Body Shop. Os Ro-
ddicks continuavam a lutar com a City e afirmavam que teriam privatizado
a empresa novamente se tivessem condições para tal. As características que
transformaram Anita no grande retrato da marca não a ajudaram a conquistar
pessoas de dinheiro, e, como muitas outras empresas, a Body Shop descobriu
Anita Roddick 51

que para uma empresa pequena é fácil angariar simpatia, porém é muito mais
difícil quando se trata de uma multinacional. As críticas não partiam apenas
do público conservador; em 1994, o jornalista Jon Entine escreveu um incri-
minador artigo sobre a Body Shop na revista Business Ethics, e havia muitos
outros inclinados a fazer críticas semelhantes.
Se fizermos um retrospecto, isso talvez pareça um pouco injusto. É verdade
que nem sempre a empresa foi fiel às suas sublimes aspirações, mas é também
verdade que, de modo geral, ela estava tentando fazer a coisa certa; mas se
uma empresa se propõe a adotar uma política ecologicamente correta, a mais
ínfima infração não passará despercebida. Foram cometidos erros, mas mui-
tos ocorreram porque a empresa estava desbravando um caminho, em vez de
seguir um caminho já trilhado, e, conforme observou Roddick, a Body Shop
estabelecera padrões muito mais altos do que a maioria das empresas. Um
exemplo do tipo de desentendimento que a empresa teve com seus detratores
pode ser constatado no artigo de Jon Entine publicado no Daily Mail. Etine
dizia:

Pela primeira e única vez tive permissão para lhe fazer uma pergunta. Citei uma
versão de seu discurso, feito em 1993, no qual ela incitava a um boicote da China.
“Honestamente, como é possível sugerir um boicote quando a Body Shop adqui-
re dezenas de produtos da China? De acordo com organizações que se pautam
pelo comércio justo, você pessoalmente descartou solicitações para procurar fontes
mais éticas.” Ela me lançou um olhar duro. “Você não entende, não é? Eu estava
falando sobre o modo como as empresas devem agir, não sobre o modo como nós
agimos. Minha tarefa é inspirar. Mas temos uma maldita de uma empresa para
administrar.”

É interessante mencionar que Entine observou que a China, a mais nova e


instigante economia do mundo, demonstrou ser um grande obstáculo para a
maioria das empresas que adotavam princípios éticos. Uma década mais tarde,
o Google enfrentou um problema semelhante quando os chineses solicitaram
a imposição de censura às suas operações e protestaram contra o fato de o
governo ter o direito de bisbilhotar suas contas. E, para todos os grupos que
defendem ideias isoladas, é um dilema de difícil solução. Não é que ter uma
empresa lucrativa e fazer a coisa certa sejam duas coisas praticamente incom-
patíveis; é também porque nem sempre fica muito claro o que significa fazer
a coisa certa.
52 28 mentes que mudaram o mundo

Contudo, os problemas da Body Shop não se limitavam às dores do cresci-


mento. No início da década de 1980, o que Roddick estava fazendo era genui-
namente inovador e incomum, ao passo que em 1997 todos estavam fazendo
aquilo que ela fizera como pioneira, em alguns casos provavelmente de uma
forma mais inovadora e mais interessante do que aquela da Body Shop. Na
década de 1990, quando as primeiras lojas Lush começaram a surgir, de uma
hora para outra a Body Shop passou a ser vista como parte do establishment
contra o qual lutara no passado.
Em 2006, a Body Shop foi vendida para a poderosa empresa francesa de
cosméticos L’Oréal, decisão que alguns dos mais antigos fãs da empresa ja-
mais perdoaram, não só pelo fato de a L’Oréal ser uma empresa de cosméticos
muito mais convencional, mas por todas as implicações que isso acarreta. A
Body Shop tinha administração independente, e ter sido vendida para uma
multinacional que estava à procura de uma adição ética ao seu portfólio é um
destino a que estão fadadas muitas organizações com responsabilidade social
– os fabricantes de chocolates Green & Black’s agora pertencem à Cadbury
(de propriedade da Kraft), e o fabricante de sorvetes hippie Ben & Jerry’s
pertence ao conglomerado anglo-holandês Unilever. Alguns podem pensar
que isso significa liquidar a empresa, mas também é questionável o fato de que
tornar-se parte desses grupos expõe um número maior de pessoas aos concei-
tos e princípios de empresas éticas.
Infelizmente, Roddick não tinha muito tempo de vida, pois recebeu o diag-
nóstico de cirrose hepática, em consequência de uma hepatite tipo C contraída
30 anos antes em uma transfusão de sangue após o parto de sua segunda filha.
Até 2004, Anita não tinha conhecimento da doença. Seguindo sua natureza,
ao descobrir que era portadora da mesma, passou a lutar pela conscientização
sobre esse mal e a ajudar outros que sofriam da mesma doença, em vez de lutar
sozinha contra o destino. Conforme ela declarou ao tornar público seu proble-
ma, no início de 2007, “é um grande choque, mas você resmunga e segue em
frente”. Anita faleceu em setembro de 2007, vítima de hemorragia cerebral.
Em 2008, soube-se que ela não deixara nenhuma parcela de sua fortuna, que
montava a £51 milhões, para a família ou amigos – doou tudo para várias ins-
tituições de caridade.
Entretanto, seu maior legado não foi financeiro, mas cultural. Ela mu-
dou para sempre o conceito sobre o que uma empresa é capaz de fazer – e
sobre a razão de sua existência. Hoje, mesmo empresas que fabricam armas
Anita Roddick 53

preocupam-se com a responsabilidade social (ou pelo menos fingem se preo-


cupar). Isso se deve, em grande parte, a Anita Roddick.

Referências e leituras adicionais

Site de Anita Roddick


BBC News (2007) Dame Anita Roddick dies aged 64, 10 de setembro
Site da Body Shop
Entine, J. (1994) Shattered Image: Is the Body Shop Too Good to be True?, publica-
do na revista Business Ethics (outubro de 1994), 23–28
McCarthy, Michael (2007) How Anita changed the world, The Independent, 12 de
setembro
Moore, Matthew (2008) Anita Roddick’s will reveals she donated entire £51m fortu-
ne to charity, The Telegraph, 16 de abril
Roddick, Anita, Biografia publicada em seu site
Roddick, Gordon (2007) I want to do Anita justice, The Telegraph, 21 de outubro
Siegle, Lucy (2007) Profile: Anita Roddick, ‘And this time, it’s personal’, The Obser-
ver, 19 de fevereiro
The Telegraph (2007) Anita Roddick Obituary, 12 de setembro
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 8
Ray Kroc

S e já existiu um homem para o qual o epíteto (aliás, de mau gosto) “uma


lenda em seu horário de almoço” foi inventado, esse homem foi Ray Kroc.
Ele era (muito apropriadamente) chamado de Henry Ford dos hambúrgueres
e pai do fast food. Um testemunho de seu incrível êxito é que o nome da cadeia
para cujo crescimento ele deu o pontapé inicial é hoje utilizado como forma
abreviada de globalização, tanto por seus defensores como por seus detratores,
e que muitos aspectos das multinacionais hoje aceitos como válidos tenham
surgido pela primeira vez na empresa por ele fundada.
Conforme ocorre com a maioria dos homens de negócios que realmente
exerceram grande influência, o impacto provocado por Kroc vai muito além
do mundo comercial, e o McDonald’s tem um lugar na cultura popular ao
qual poucas empresas podem aspirar. O jornal The Economist publica uma ta-
bela com taxas de câmbio alternativas denominada Big Mac Index, e o termo
“McJob” foi recentemente incorporado ao Oxford English Dictionary. Embora
o McDonald’s tenha criado uma grande celeuma alegando que o termo dene-
gria as oportunidades de emprego que a organização proporcionava às pessoas,
suspeita-se que, secretamente, tenha ficado muito satisfeito. E tudo isso se
deve a um homem que parecia fadado a terminar sua carreira vendendo má-
quinas para preparar milkshakes.
Ray Kroc era, de acordo com qualquer padrão, um fracassado. Seu en-
volvimento com a maior cadeia alimentícia do mundo começou quando ele
estava na casa dos 50 anos, idade em que a maioria das pessoas está pensando
na aposentadoria, não em causar uma revolução no setor alimentício, na dieta
56 28 mentes que mudaram o mundo

das pessoas e na paisagem americana. Kroc nasceu em 1902, em Illinois. Em


1917, em plena Primeira Guerra Mundial, tentou trabalhar como motorista
de ambulância (ele mentiu a idade), mas durante seu treinamento a guerra
acabou e ele permaneceu em solo americano. Precisando ganhar a vida, passou
a tocar piano antes de começar a trabalhar na Lily Tulip Cup Company, em
1922, vendendo xícaras e outros produtos de papel.
No decorrer de sua vida como vendedor itinerante, Kroc conheceu Earl
Prince, um cliente que tinha inventado o “multiprocessador”, máquina que
era capaz de preparar cinco milkshakes ao mesmo tempo. Kroc, na época com
37 anos, percebeu o potencial da máquina e obteve direitos exclusivos para
comercialização do equipamento. Passou os 17 anos seguintes viajando pelo
país e vendendo multiprocessadores a proprietários de drogarias e restauran-
tes. Contudo, na década de 1950, as vendas começaram a cair. A urbanização
dos subúrbios americanos começara, e os pequenos fabricantes de refrigerantes
estavam desaparecendo. A empresa de Kroc entrara em declínio e estava perto
de fechar as portas. Contudo, trilhando a direção contrária a essa tendên-
cia havia um restaurante em San Bernardino, Califórnia, que encomendara
o extraordinário número de oito multiprocessadores, o que significava que o
restaurante pretendia preparar 40 milkshakes ao mesmo tempo. Kroc ficou
intrigado.
Richard e Maurice McDonald tinham deixado a Nova Inglaterra em 1930,
atraídos à Califórnia pelas brilhantes luzes de Hollywood. Seus sonhos de ri-
queza ainda não haviam se concretizado, e eles abriram um restaurante em
San Bernardino, na época uma cidade quase desconhecida localizada a cerca
de 100km a leste de Los Angeles. Quando Kroc conheceu o restaurante, fi-
cou impressionado com o que viu. Graças ao sistema de “serviços rápidos”
introduzidos pelos dois irmãos em 1948, o restaurante parecia uma fervilhan-
te colmeia de atividades bem organizadas, onde o preparo dos alimentos se
assemelhava à linha de montagem de Henry Ford. O cardápio era limitado
a nove itens; a comida era servida em pratos de papel, e os demais utensílios
eram de plástico; não havia lugar para os clientes se sentarem. Os preços eram
extremamente baixos, e os pedidos eram atendidos no máximo em um minu-
to. Em uma época em que a higiene dos restaurantes muitas vezes deixava a
desejar e os empregados eram negligentes, o lugar era o retrato da limpeza e
da eficiência. Mais tarde, Kroc escreveu em sua autobiografia: “Eu me sentia
como um Newton dos tempos modernos que acabara de levar uma pancada na
Ray Kroc 57

cabeça.” Ele acreditava que tivera uma visão do futuro, e nesse futuro haveria
um McDonald’s em cada cruzamento movimentado.
No dia seguinte, Kroc descreveu sua visão aos dois irmãos, mas eles não
se mostraram muito interessados. Já haviam tentado expandir o negócio ven-
dendo algumas franquias, mas em síntese a empresa estava lhes proporcio-
nando uma vida muito confortável e não viam necessidade de trabalhar mais.
Entretanto, Kroc confiava em sua intuição e, apelando para seus poderes de
persuasão coroados por anos de experiência como vendedor, conseguiu con-
vencer a dupla a lhe conceder direitos exclusivos para a venda de seu modelo.
Kroc venderia as franquias por US$950. Além disso, receberia 19% das vendas
brutas de cada franquia, dos quais 0,5% seria destinado aos dois irmãos. Kroc
abriu seu primeiro McDonald’s perto de Chicago para servir como modelo e
como propaganda para possíveis franqueados.
É interessante observar que muitas pessoas supõem que Kroc tenha sido o
mentor da ideia original do McDonald’s, mas vimos que não foi esse o caso – o
conceito e grande parte do modelo inicial foram criados pela dupla de irmãos.
Contudo, é absolutamente correto enxergar Kroc e não a dupla como o indi-
víduo por trás do McDonald’s. Sem Kroc, provavelmente o McDonald’s teria
sido outra pequena cadeia de restaurantes (hoje provavelmente extinta) da qual
quase ninguém ouviu falar.
O que Kroc tinha – e faltava à dupla de irmãos – era a energia para trans-
formar uma pequena empresa em um colosso que se expandiria ao redor do
mundo. Na verdade, Kroc é, possivelmente, o exemplo mais verdadeiro do
truísmo empresarial, ou seja, de que ter uma boa ideia não é suficiente. É tam-
bém a personificação da famosa frase de Edison: “A genialidade é composta
de 1% de inspiração e 99% de transpiração.” No caso do McDonald’s, a dupla
de irmãos forneceu esse 1%. Uma das razões da extraordinária energia de Kroc
talvez tenha sido que, em 1955, ele não tinha nenhum plano B; embora os
multiprocessadores tenham lhe proporcionado uma boa receita, obviamente
ele não estava ficando mais novo. O McDonald’s era, na verdade, sua última
cartada.
Kroc era adepto da regulamentação e da uniformidade, e enxergava nesses
elementos a chave do êxito; assim, empenhou-se em aperfeiçoar o modelo
idealizado pela dupla de irmãos. Tudo era padronizado, dos hambúrgueres às
batatas fritas e milkshakes, descendo a detalhes como os 3mm (no caso da es-
pessura do hambúrguer, por exemplo). Em vez de implantar um treinamento
58 28 mentes que mudaram o mundo

relativamente complexo necessário a um chef encarregado de servir refeições


rápidas, Kroc resumiu tudo em tarefas simples que qualquer pessoa tinha con-
dições de executar com um mínimo de treinamento. Essa é a razão pela qual a
comparação com Henry Ford é tão apropriada. Antes de Kroc, o fast food era
um processo um tanto descuidado que exigia empregados treinados e resultava
em um produto cuja qualidade variava. Kroc mudou isso com sua visão ímpar
da perfeição. Ele acreditava que, independentemente da localização geográfica
do lugar em que você fazia suas refeições, a comida e a experiência deveriam
ser sempre as mesmas, da Flórida ao Alasca.
Foi também um inovador de duas outras formas. Em uma época em que a
cozinha ainda era vista como arte, ele conferiu rigor científico ao processo, a
ponto de construir um laboratório. Cortava custos para manter preços baixos e
foi um dos primeiros a empregar adolescentes e mão de obra cuja carga horária
semanal é variável. A separação das tarefas em componentes e o estabeleci-
mento de equipes para trabalharem nas cozinhas contribuíram para o êxito do
processo. Kroc era também um grande defensor da manutenção da qualidade
– em uma época em que muitos hambúrgueres eram preparados com produtos
de má qualidade, ele insistia no uso dos hoje famosos hambúrgueres de carne
pura. Procurava também novos locais nos subúrbios para estabelecer seus res-
taurantes, tendo em mente o aspecto estratégico da organização e levando em
consideração a economia e o planejamento da cidade.
Naturalmente, quando Kroc começou, o campo não estava completamen-
te livre. Existiam outras cadeias recém-inauguradas. Mas Kroc queria que o
McDonald’s fosse diferente. A maneira pela qual ele conseguiu essa diferen-
ciação era representada pela limpeza e pela uniformidade de seus restaurantes.
A outra era o relacionamento que mantinha com seus franqueados porque,
embora Kroc talvez não gostasse das tarefas executadas pelos empregados nos
restaurantes, tratava os franqueados com grande consideração. Naquela época,
as empresas achavam que os franqueados não passavam de vacas leiteiras que
estavam ali para serem ordenhadas e produzirem o máximo de dinheiro pos-
sível. Kroc tratava seus franqueados de forma muito melhor. Queria que eles
tivessem um restaurante que se assemelhasse a uma fábrica em funcionamento
– e queria trabalhar em parceria com eles, em vez de sugar cada centavo que
conseguissem. Além disso, embora prezasse a uniformidade, dava espaço para
que os franqueados fizessem experiências e implantassem inovações dentro da
estrutura, e dava atenção às suas ideias. Muitos produtos da empresa, como
Ray Kroc 59

o filé de peixe, o Egg McMuffin e mesmo o tradicional Big Mac, foram in-
ventados por franqueados individuais. No entender de Kroc, toda vez que ele
vendia uma franquia do McDonald’s, dava início a uma relação comercial de
longa duração.
De acordo com essa descrição, parece que Kroc estava trilhando um rápido
caminho em direção ao sucesso. Mas, na verdade, ele tinha um problema sério.
A despeito dos números polpudos em termos de crescimento, naquela época a
empresa não apresentava bom desempenho financeiro. Os termos do negócio
que Kroc havia contratado com os irmãos McDonald’s não o favoreciam e sig-
nificavam que, embora a empresa tivesse apresentado um polpudo faturamen-
to no início da década de 1960, os ganhos de Kroc eram praticamente nulos.
Pior ainda, a obsessão de Kroc estava se chocando com a indiferença dos dois
irmãos. Kroc queria muito comprar a parte pertencente à dupla, pois sentia
que a abordagem deles representava um obstáculo para a marca.
A salvação de Kroc a longo prazo surgiu na figura de um advogado muito
esperto, Harry J. Sonneborn, que propôs uma solução elegante: a empresa
deveria se tornar proprietária das franquias. Em 1956, foi fundada a Franchise
Realty Corporation. A ideia era que essa empresa compraria os locais e depois
os alugaria aos franqueados. Estes pagariam à empresa-mãe uma taxa ou uma
porcentagem de seu faturamento, o que fosse maior. Foi uma jogada de mes-
tre, e mais tarde Kroc creditaria a Sonneborn a responsabilidade pela virada
experimentada pela empresa. Conforme mencionado no livro McDonald’s: a
verdadeira história do sucesso (de autoria de John Love, publicado no Brasil em
1996), “o que transformou o McDonald’s em uma máquina de fabricar dinhei-
ro não teve nada a ver com Ray Kroc ou com os irmãos McDonald, nem mes-
mo com a popularidade dos hambúrgueres, batatas fritas e milkshakes servidos
no restaurante. Na realidade, o McDonald’s ganhou dinheiro com imóveis e
com uma fórmula pouco conhecida desenvolvida por Harry J. Sonneborn”. Na
verdade, embora Kroc nunca tenha concordado com esse ponto de vista, certa
vez Sonneborn disse a um grupo de investidores que o McDonald’s era, em es-
sência, uma empresa que atuava no ramo imobiliário: “A única razão pela qual
vendemos hambúrgueres a US$0,15 é que eles representam o maior provedor
da receita da qual nossos inquilinos podem tirar o aluguel que nos pagam.”
Porém, embora no frigir dos ovos a Franchise Realty tenha socorrido Kroc,
seriam precisos alguns anos para que ele superasse aquela difícil situação. Em
1961, um ano particularmente amargo para Kroc, seu casamento terminou em
60 28 mentes que mudaram o mundo

divórcio, e sua mulher, na época com 39 anos, alegou que a empresa ocupava
todo o espaço na vida do marido. Além disso, após conceder aos empregados
valiosos lotes de ações porque não conseguia arcar com os altos salários, Kroc
foi obrigado a abrir mão de outros 22% do capital acionário como garantia de
um empréstimo.
Mas mesmo isso tudo não foi suficiente. Ele faria qualquer coisa para se
livrar dos fundadores que o mantinham acorrentado e que muitas vezes pare-
ciam estar trabalhando para minar o que ele havia construído. Por fim, eles
chegaram a um acordo. Os irmãos exigiam US$1 milhão livre de impostos
para cada um, o que correspondia a US$2,7 milhões; Kroc conseguiu levantar
o dinheiro, porém à custa de um grande ônus. Embora em retrospecto tenha
sido um negócio terrível para os McDonald’s, na época Kroc achava que pa-
gara um preço alto demais. As partes também se desentenderam em relação
ao restaurante original – se deveria ou não ser incluído no negócio. Por fim, os
irmãos ficaram com ele, mas foram obrigados a mudar o nome, e o restaurante
passou a se chamar “The Big M”. Kroc abriu um McDonald’s do outro lado
da rua, obrigando o “The Big M” a fechar as portas.
Finalmente, Kroc tinha o negócio que desejava. Em meados da década de
1960, a empresa contava com centenas de pontos de venda espalhados pelo
território americano e, em 1965, transformou-se em empresa de capital aber-
to, o que lhe forneceu o capital para se expandir em um mercado florescente,
porém cada vez mais competitivo. Passou também a atuar na área de publi-
cidade, e em pouco tempo estava fazendo anúncios nacionais, que custavam
muito caro, mas eram bastante eficazes. Ronald McDonald, que apareceu pela
primeira vez no início da década de 1960, foi imitado por uma série de outros
personagens, incluindo Grimace, Mayor McCheese e Hamburglar; de todos
eles, somente Ronald existe até hoje.
Na década de 1970, o McDonald’s se transformou na maior cadeia de fast
food dos Estados Unidos, e em 1971 abriu lojas na Alemanha e no Japão. Em
1977, abriu sua primeira loja em Londres. Kroc tornou-se uma figura de des-
taque no cenário nacional, comprou o time de beisebol San Francisco Padres
e tinha encontros com presidentes. A empresa começou a ser criticada tanto
por aqueles que se preocupavam com as falhas nutricionais observadas nos
alimentos do McDonald’s como pelos que se preocupavam com a mudança
ocorrida nos Estados Unidos, que passara de uma economia de fabricação para
uma economia fornecedora de serviços.
Ray Kroc 61

Contudo, nada disso preocupava Kroc. Ele praticamente não fora influen-
ciado pela riqueza e pelo poder que esta lhe proporcionava fora da esfera dos
Arcos Dourados. Resistiu também à tentação de se aburguesar. Abriu mão do
cargo de CEO em 1968, embora tenha continuado profundamente envolvido
– às vezes de modo obsessivo – com a organização até sua morte em 1984, aos
81 anos.
Por ocasião de sua morte, a empresa tinha vendido cerca de 50 bilhões de
hambúrgueres e era uma das maiores organizações americanas; seu valor era
de aproximadamente US$4 bilhões, mas a influência exercida por Kroc no
mundo todo representou muito mais do que isso. Na verdade, se quisermos
citar uma empresa que incorpora um grande número das mudanças econômi-
cas que tiveram lugar na segunda metade do século XX poderíamos mencionar
o McDonald’s. Mais que isso, a organização modificou a maneira como os
americanos se alimentam, o modo como trabalham, e modificou também a
paisagem americana; poderíamos dizer que modificou até mesmo a aparên-
cia física dos americanos. Poucas mentes da gestão causaram um impacto tão
grande fora do mundo dos negócios.

Referências e leituras adicionais

Entrepreneur.com, Biografia de Ray Kroc, www.entrepreneur.com


Gross, Daniel (1999) Forbes: as maiores histórias do mundo dos negócios, Compa-
nhia das Letras
Kroc, Ray (1997) Deu certo! Como nasceu, cresceu e prosperou o McDonald’s,
Record
Love, John F (1987) McDonald’s: a verdadeira história do sucesso, Bertrand
Site do McDonald’s, www.mcdonalds.com
Pace, Eric (1984) Obituary, New York Times, 15 de janeiro
Pepin, Jaques (1998) Burger meister, Ray Kroc, Time, 7 de dezembro
Schlosser, Eric (2001) País fast food, Ática
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 9
Rupert Murdoch

M urdoch é, com frequência, retratado como uma espécie de Montgomery


Burns da mídia. Isso não é inteiramente injusto, pois ele é não apenas
rico, como também detém enorme poder e influência através de redes de jor-
nais e emissoras de televisão, do The Sun (o jornal diário mais vendido no
Reino Unido) ao Fox News (o controvertido canal de televisão de direita dos
Estados Unidos). Mesmo os Simpsons, o desenho animado em cartaz há mais
tempo no mundo, faz parte do império de Murdoch, e em 1999 ele apareceu
na série como convidado, talvez para zombar daqueles que dizem que ele não
tem senso de humor.
Mas, além do homem em si, há também a lenda que Murdoch tem cul-
tivado cuidadosamente ao longo dos anos. Ele é uma figura que inspira sen-
timentos fortes – muitos o detestam. Em geral, as pessoas argumentam que
ele é responsável pelo emburrecimento planejado e pela vulgaridade da mí-
dia em geral, e dizem também que exerce uma influência maléfica sobre os
políticos dos países nos quais opera. Em seu leito de morte, o dramaturgo
britânico Dennis Potter disse uma frase memorável: “Vou dar a meu câncer
o nome de Rupert” (BBC, 2002). Alan Bennett recusou um diploma hono-
rário de Oxford em virtude dos ardis da universidade com Murdoch. E a re-
vista satírica Private Eye está sempre ridicularizando Murdoch, chamando-o
de “o sórdido escavador”. Entretanto, poucos chefes de Estado recusariam
um pedido para se reunir com Murdoch. E, conforme veremos, no final das
contas sua influência sobre a mídia talvez seja menos maléfica do que muitos
pensam.
64 28 mentes que mudaram o mundo

Keith Rupert Murdoch nasceu em Melbourne, Austrália, em 1931. Seu


pai, Keith, dirigia um grupo de jornais regionais, o News Ltd, e a família leva-
va uma vida confortável. Murdoch cursava a Universidade de Oxford, e suas
leituras incluíam filosofia, política e economia (PPE). PPE (Philosoçhy, Po-
litics e Economics – Filosofia, Política e Economia) era a opção de estudo
da maioria dos que pertenciam à elite do Reino Unido. Seu pai faleceu em
1953, e Murdoch herdou a empresa da família. Logo se estabeleceu como
experiente operador de mídia e se expandiu muito além de sua base regional,
tornando-se uma poderosa força dentro do jornalismo australiano. Em pouco
tempo passou a lançar seu olhar em direção a outros países e adquiriu títulos na
Nova Zelândia. Em 1964, lançou o The Australian, o primeiro jornal nacional
diário. O jornal previu muitas coisas que viriam a acontecer mais tarde. Era,
naturalmente, um empreendimento comercial, mas como jornal de qualidade
fora projetado também para conferir influência política a Murdoch.
No entanto, um país pequeno (em termos de população e economia) como
a Austrália não poderia segurar Murdoch por muito tempo, e ele voltou os
olhos para o Reino Unido. Sua primeira grande aquisição no exterior foi o
obsceno jornal dominical do Reino Unido News of the World, do qual obteve
o controle em 1969 após amarga batalha com Robert Maxwell, outro colossal
magnata da imprensa. No mesmo ano, Murdoch adquiriu o The Sun, embora
naquela época o jornal fosse uma publicação de qualidade e estivesse muito
distante do belicoso sensacionalismo que envolve os tabloides de hoje. Com
seu espírito empreendedor, Murdoch fez essa aquisição em parte porque os
jornais que havia adquirido com a compra do News of the World não estavam
faturando praticamente nada. Após comprar o jornal The Sun, Murdoch o
relançou como tabloide; a vergonhosa página três, que mostrava modelos em
trajes sumários, apareceu um ano mais tarde e, em 1979, a transformação se
completou quando o jornal abriu mão de sua aliança com o Partido Trabalhis-
ta e passou a dar apoio a Margaret Thatcher. Dois anos mais tarde, em 1981,
Murdoch provocou tumulto no Reino Unido ao comprar dois pilares do esta-
blishment, The Times e o The Sunday Times. É compreensível que seus críticos
estivessem preocupados com o que ele faria a esses dois jornais. Sem dúvida,
Murdoch tinha planos, mas não eram o que muitos esperavam.
Em meados da década de 1980, em resposta às constantes disputas tra-
balhistas que ocorriam em Fleet Street, Murdoch despediu 6 mil grevistas e
transferiu seus quatro jornais para Wapping, na zona portuária da região leste
Rupert Murdoch 65

de Londres. As disputas e os protestos estenderam-se por um ano, mas por fim


Murdoch saiu vencedor; ao contrário dos grevistas, ele estava suficientemen-
te preparado (e financeiramente escorado) para esperar sentado pelo fim da
greve. As disputas ocorridas em Wapping representaram um episódio-chave
para o declínio do poder dos sindicatos trabalhistas na Inglaterra de Margaret
Thatcher. Mudaram, inclusive, a aparência de Fleet Street e o equilíbrio do
poder nos jornais. No final da década de 1980, quase todos os jornais nacio-
nais do Reino Unido haviam se mudado para a zona portuária, e o modelo de
imprensa de Murdoch foi amplamente adotado.
A Inglaterra e a imprensa também não eram suficientemente grandes para
acomodar as ambições de Murdoch. Ele estava de olho no maior mercado
existente. No início dos anos 1970 escolheu um jornal local americano e o
tabloide Star. Contudo, em 1976, suas ambições cresceram e ele adquiriu o
New York Post, prometendo manter as tradições do jornal, mas imediatamente
transformando-o no sensacionalista tabloide de direita que hoje conhecemos.
Mas ele estava de olho em algo além da imprensa, percebendo que o poder
dos jornais estava se desvanecendo e que a televisão passara a representar um
papel ainda mais importante no sentido de modelar as pautas. Em 1983, as-
sumiu o comando da decadente emissora via satélite Satellite Television UK,
que foi relançada no ano seguinte com o nome de Sky Channel. Em 1990, a
emissora empreendeu uma fusão com sua rival, a BSB, formando a British Sky
Broadcasting e tendo a Murdoch’s News International como acionista majo-
ritário. Em seus primeiros anos, a empresa sangrou capital, mas foi subsidiada
durante o restante de sua existência (Murdoch nunca enfrentou problemas
com as partes rentáveis do negócio, que suportavam seus não lucrativos pri-
mos). Em 1992, ele adquiriu os direitos de transmissão dos jogos da Premier
League, empreendimento que desde meados da década de 1990 tem apre-
sentado grande lucratividade e é um dos principais participantes do mercado
televisivo do Reino Unido. Hoje, seu presidente é James Murdoch, filho de
Rupert Murdoch.
Murdoch atuou intensamente também em outras áreas do setor de entre-
tenimento. Em 1985, adquiriu inicialmente metade da TCF, a holding da
20th Century Fox e, mais tarde, o restante. A partir de então, começou a ad-
quirir emissoras de televisão, tendo em mente a formação de uma quarta rede
televisiva americana para rivalizar com ABC, NBC e CBS. Em 1985, optou
pela cidadania americana, pois somente cidadãos americanos podem ser donos
66 28 mentes que mudaram o mundo

de emissoras de televisão no país. Nos primeiros tempos, a Fox Television


foi vítima de muitas críticas devido à má qualidade de seus programas, mas
conquistou certa audiência e credibilidade com séries como The OC e House.
Em 1996, a Fox inaugurou o canal que veio a torná-la mais conhecida: o Fox
News. Dizer que o canal de notícias é alvo de controvérsias é o mesmo que
dizer que Murdoch é ambicioso. Lançado pelo estrategista do antigo Partido
Republicano, Roger Ailes, o canal de notícias que se autoproclamou “justo e
equilibrado” tinha grande popularidade nos anos do Governo Bush, com suas
populistas tendências de direita.
Entretanto, para os americanos da ala moderada e da esquerda, a Fox era
um verdadeiro desastre, pois acabou fornecendo à ala direitista seu próprio
canal de notícias e algo que se aproximava de uma voz coerente, e passou a
exercer grande influência. O canal é frequentemente acusado de ter tendências
flagrantemente direitistas e de interpretar os fatos erroneamente para que se
encaixem em sua pauta, mas na política polarizada reinante nos Estados Uni-
dos queixas provenientes da esquerda tendem a ser um manjar para a ala direi-
tista, e a Fox e seus apresentadores se deliciam com os insultos lançados sobre
eles por seus detratores bien pensant (conformistas). Contudo, vale a pena sa-
lientar que Murdoch é como uma palha que se curva ao vento. Após a vitória
de Obama, ele tomou cuidadosas providências para se distanciar tanto da ten-
dência política do canal como de Ailes, um homem sem papas na língua.
Naturalmente, agora que Murdoch está perto dos 90 anos, há muita espe-
culação a respeito de seu legado, particularmente pelo fato de a estrutura de sua
herança ser bizantina, com diferentes direitos de voto para crianças nascidas
de diferentes casamentos e cuja idade varia de menos de 10 anos à meia-idade.
No entanto, Murdoch não dá sinais de desistência. Na verdade, seu apetite
pela influência e sua fome por negócios não diminuiu, embora digam que sua
mais nova esposa tenha, de certa forma, abrandado sua política. Sua aparente
imortalidade – ou crença na própria imortalidade – pode se manifestar das for-
mas mais estranhas. Em 2008, seu biógrafo Michael Wolff disse que a cor dos
cabelos desse influente indivíduo varia do laranja-brilhante ao roxo-berinjela,
e prosseguiu explicando que o multibilionário colore os próprios cabelos na
pia do banheiro.
A década de 2000 trouxe muitas variações para Murdoch, pois algumas
mudanças interessantes ocorreram ao longo desses anos. Conforme acontece
com a maioria dos jornais, a estabilidade de Murdoch foi abalada pelo declínio
Rupert Murdoch 67

da circulação dos jornais e das receitas provenientes dos anúncios; outro fator
foi o crescimento da internet porque, enquanto antigamente os jornais lu-
crativos subsidiavam as televisões via satélite, hoje acontece o contrário. Ele
teve também diversos embates com a nova economia. Um dos mais notáveis
ocorreu em 2005, quando adquiriu o site MySpace por US$580 milhões. Ini-
cialmente, essa aquisição pareceu um perspicaz passo em direção à nova mídia,
pois as receitas advindas dos anúncios pareciam atraentes. Mas o sucesso do
Facebook nos últimos anos fez muitas pessoas acharem que Murdoch adquirira
um site decadente. Esse fato e suas recentes desavenças com o Google (ele e os
executivos da News Corp repetidamente descreviam esse dispositivo de busca
como um “parasita” que se beneficiava do conteúdo criado por outros) levaram
alguns a sugerir que Murdoch não compreendia a internet e que essas eram
atitudes de um homem velho que estava vendo seu império desmoronar.
Mesmo seus lucrativos jornais não mais eram o que haviam sido no passado.
No início da década de 1990, o jornal The Sun costumava se gabar (e muitos
acreditavam) de que tinha o poder de dar uma guinada nas eleições do Reino
Unido, e, exatamente quando o jornal estava no auge de sua belicosidade, sua
influência atingiu o ápice. Em 1992, o jornal apoiou claramente os Tories
nas eleições gerais do Reino Unido (golpeando o Partido Trabalhista), e mais
tarde um editorial do jornal publicou a seguinte declaração: “Foi a sabedoria
do The Sun que ganhou as eleições.” Em poucos anos, a circulação do jornal
estava um pouco abaixo dos cinco milhões. Atualmente, esse número está um
pouco acima dos três milhões. Nas últimas eleições gerais do Reino Unido, o
partido apoiado pelo jornal que, esperava-se, venceria por ampla maioria, fez
uma coalizão com os democratas liberais, atitude bastante reveladora.
Mas existem outras boas razões para não considerar Murdoch uma “carta
fora do baralho”. Sua mais recente e significativa aquisição nos Estados Uni-
dos foi o The Wall Street Journal, em 2007. Muitos receavam que ele destruiria
um dos poucos jornais sérios e bem-sucedidos ainda existentes no país, mas,
surpreendentemente, parece que Murdoch o revigorou. Na verdade, o co-
mentarista da mídia do Reino Unido, Roy Greenslade (Time, 28 de junho de
2007) escreveu o seguinte: “Parece que para seu jornal sério Murdoch adotou
uma abordagem que não inclui grandes intervenções, enquanto se compraz
intrometendo-se em seus tabloides.” O The Wall Street Journal é uma verda-
deira joia da coroa de Murdoch, pela qual ele pagou um preço alto demais. No
entanto, talvez agora ele esteja de olho no The New York Times, provavelmente
68 28 mentes que mudaram o mundo

o jornal mais influente do mundo e a prova final para um homem que é visto
como um filisteu. Um artigo da revista New York Magazine publicado no início
de 2010 dizia: “Alguns dizem que a obsessão de Murdoch pelo Times lembra
Ahab (antigo rei de Israel).” Conforme declarou um ex-executivo sênior da
News Corp, “[Comprar o The Wall Street Journal] foi o pior negócio que ele
fez na vida, uma real insensatez. Ele não tinha nenhuma justificativa para fazer
essa aquisição – fez porque quis” (Sherman, 2010).
Aqueles que pensam que a idade diminuirá o apetite de Murdoch por ne-
gócios e pela ampliação de seu império deveriam olhar para o passado, que
serviria como orientação para o futuro; parece provável que a única coisa que
o deterá é a morte ou uma doença que o leve à morte. Ele é o arquétipo do
magnata para quem o suficiente nunca é bastante. Trata-se da necessidade de
estar sempre pronto para o próximo passo e o próximo negócio.
Fazendo uma comparação com as atividades de Murdoch nos Estados Uni-
dos, o que está acontecendo do outro lado do Atlântico também é interessante,
talvez mais interessante ainda. A tática mais recente adotada por Murdoch
tinha o objetivo de abordar o problema que a internet causou aos mercados
de jornais no mundo todo, particularmente nos Estados Unidos e no Reino
Unido. Como os títulos ao redor do mundo vêm lutando com o problema
relacionado à redução das receitas provenientes de anúncios conjugado ao fato
de que os jornais estão abrindo mão de seu conteúdo – que é lido na internet
livremente e sem nenhum ônus –, recentemente Murdoch começou a cobrar
pelos títulos mais procurados pelo público.
A partir de junho de 2010, o The Times e o The Sunday Times (dois dos jor-
nais “de qualidade” do Reino Unido mais conhecidos e mais lidos) começaram
a cobrar dos leitores pelo conteúdo on-line. Esse é um passo extremamente
ousado, pois os únicos jornais que até hoje tiveram êxito ao adotar essa política
foram o The Financial Times e o The Wall Street Journal, e ambos podem ser
considerados casos especiais (as notícias financeiras fazem parte de uma área
especializada e, muitas vezes, as empresas não se importam em pagar pela
assinatura). Mas com o The Times, Murdoch está competindo com três outros
jornais de qualidade existentes no Reino Unido (e possivelmente com o Daily
Mail) que oferecem um produto muito semelhante gratuitamente. Ele está
apostando que aonde for, outros também irão. Se Murdoch estiver certo, o
homem que foi punido por muitos por ter provocado a ruína de vários jornais
ao longo dos anos talvez se transforme no redentor daqueles que o criticaram.
Rupert Murdoch 69

A revista Time descreveu Murdoch como “o mais recente e o último dos


magnatas da mídia, que hoje tem tentáculos descomunais, um homem que
ama suas propriedades e as utiliza para adquirir grandes fortunas e influência
sobre a política e a sociedade”. E continuava: “Ao contrário de seus contem-
porâneos, Murdoch conseguiu enxergar muito além” (Pooley, 2007). Prova-
velmente, essa é a afirmativa mais concisa e acurada da qual os ávidos por
descartar Murdoch deveriam se lembrar.

Referências e leituras adicionais

Perfil, BBC, Rupert Murdoch


BBC (2002) Entrevista com Dennis Potter, 31 de junho
Pooley, Eric (2007) Exclusive: Rupert Murdoch speaks, Time, 28 de junho
Robinson, James (2007) Rupert Murdoch, protector of the printed word, The Obser-
ver, 9 de agosto
Sherman, Gabriel (2010) The raging septuagenarian, New York Magazine, 8 de
março
Sydney Morning Herald (2010) Murdoch said: live and let dye go, 9 de março
Walker, Andrew (2002) Rupert Murdoch: bigger than Kane, BBC, 31 de julho
Wolff, Michael (2008) Tuesday with Rupert, Vanity Fair, outubro
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 10
Peter Drucker

E m 2005, quando Peter Drucker faleceu, aos 95 anos, os tributos choveram.


Jack Welch declarou: “O mundo todo sabe que ele foi o maior desbravador
da gestão do último século”, enquanto o guru Tom Peters o descreveu como
“o inventor da gestão moderna”. Essas duas declarações estabelecem o tom:
praticamente ninguém teve uma palavra desfavorável a Peter Drucker – e ele
conquistou seguidores nos mais variados setores. Seus fãs incluíam de Karl
Rove e George W. Bush a Andy Grove, da Intel, Winston Churchill e Bill
Gates.
Quando Drucker começou a filosofar sobre gestão, no final da década de
1940 e início dos anos 1950, a administração moderna como disciplina pra-
ticamente não existia, e os gestores não tinham o jogo de ferramentas de que
necessitavam para lidar com o florescente número de corporações multinacio-
nais. Drucker lhes forneceu esse jogo, mas sua história vai muito além disso.
É a história da própria corporação moderna (ele cunhou as expressões “traba-
lhadores do conhecimento” e “sistema de gestão baseado em objetivos”), e a
história desse homem vai do capitalismo ocidental e dos dias de tranquilidade
das décadas de 1950 e 1960 à desilusão, cinismo e autointeresse dos gestores
da década de 2000.
Drucker pode ser considerado uma excentricidade da gestão. Em um
campo notoriamente propenso a novidades e modismos (provavelmente de-
vido à escassez de teorias verdadeiramente sérias e proféticas), os conceitos
de Drucker continuam a ser reverenciados; na verdade, Drucker enxergava
a gestão não como uma ciência, mas como uma arte generosa. Não é difícil
72 28 mentes que mudaram o mundo

(particularmente depois da crise do setor bancário) encontrar pessoas que con-


firmam a relevância de Drucker. Na verdade, nem tudo que ele disse ou escre-
veu era genial; algumas coisas eram bobagens rematadas, mas o The Economist
certa vez observou: “Mesmo quando estava errado, ele encontrava um jeito de
parecer provocante.”
Era também um grande intelectual e uma espécie de polímata, e seu am-
plo e diversificado conhecimento contribuiu para aperfeiçoar sua maneira de
pensar sobre gestão, tornando-a, em suas próprias palavras, ainda mais con-
vincente. Drucker virou uma lenda em virtude da extensão de suas influências
culturais; era comum ouvi-lo fazer citações que variavam da época bizantina
a Jane Austen. Cinco anos após sua morte, ele ainda tem uma multidão de
fãs ao redor do mundo. Conferências continuam a ter lugar para discutir sua
importância, e livros que falam sobre ele continuam a ser publicados.
Muitas características da personalidade de Drucker eram devidas às suas
raízes e ao modo como foi criado. Ele nasceu em Viena, em 1909, quando
a cidade era um importante centro cultural. O pai era funcionário público e
a mãe estudou Medicina. A família pertencia à classe média alta, e sua casa
era frequentada por intelectuais. Drucker conheceu Sigmund Freud quando
criança, e o economista Joseph Schumpeter era amigo da família. Esse pre-
coce contato com gigantes de diversas áreas o transformou em algo parecido
com um homem da Renascença. Seu biógrafo, Jack Beatty (2005), escreveria:
“Como o Mr. Kurtz de Conrad, toda a Europa contribuiu para a formação de
Peter Drucker.”
Após se formar na escola acadêmica local, Drucker mudou-se para Ham-
burgo, onde trabalhava como balconista e frequentava a Universidade de
Hamburgo no período noturno. Em 1929 conseguiu emprego em uma filial
de uma empresa de Wall Street localizada em Frankfurt e passou a estudar
na Universidade de Frankfurt. Ingressou também no maior jornal diário da
cidade (o Frankfurter General-Anzeiger) como jornalista financeiro; um ano
mais tarde foi promovido a chefe do departamento de negócios e relações ex-
teriores (suas tarefas incluíam ainda a edição da página feminina). A despeito
da pouca idade, Drucker entrevistou até mesmo Hitler. Em 1931, aos 22 anos,
diplomou-se em Direito Internacional. Um ano mais tarde publicou um pan-
fleto sobre Friedrich Julius Stahl, filósofo conservador alemão que não tinha
a aprovação dos nazistas. O panfleto havia sido projetado para fazer oposição,
e realmente fez. O governo nazista baniu a publicação e queimou as cópias
Peter Drucker 73

existentes. Pouco tempo depois, Drucker percebeu que precisava deixar a Ale-
manha, e mudou-se para o Reino Unido.
Encontrou trabalho como analista financeiro em Londres e, enquanto
morou no Reino Unido, assistiu a palestras de John Maynard Keynes, em
Cambridge. Isso lhe permitiu fazer uma importante constatação: a de que, en-
quanto os economistas estavam interessados no comportamento das moedas,
commodities e outras coisas do tipo, ele estava interessado na maneira como
as pessoas agiam. Drucker não gostava muito de Londres; achava que a cidade
era antiquada e fazia lembrar Viena. Em 1937, mudou-se para os Estados
Unidos para atuar como correspondente para um grupo de jornais.
Em 1939, Drucker publicou seu primeiro livro, O fim do homem econômico:
as origens do totalitarismo. Três anos mais tarde ingressou no Bennington Col-
lege, Vermont, como professor de Política e Filosofia. Em 1943 publicou seu
segundo livro, O futuro do homem industrial. Com essa obra atraiu a atenção
da General Motors (GM), que o convidou para passar dois anos estudando a
empresa. A GM abriu suas portas para Drucker, que tinha acesso irrestrito do
chão de fábrica à sala da diretoria. Quando Drucker sugeriu que poderia escre-
ver um livro sobre gestão, seus patrocinadores na GM ficaram surpresos, pois
não acreditavam que alguém o leria. Um deles disse: “Não conheço ninguém
que possa estar interessado em um livro sobre gestão.” O livro que Drucker
escreveu nessa época, O conceito da corporação, foi seu trampolim para a fama.
Introduziu muitos conceitos novos, sendo os dois mais importantes a delega-
ção de responsabilidades e trabalhadores do conhecimento. Com o primeiro,
o modelo de comando e controle começava a parecer ultrapassado; a descen-
tralização estava se difundindo, e Drucker era o homem certo para articular
a maneira como ela funcionaria, bem como a maneira de liberar membros
individuais do quadro de pessoal. Com a última providência ele previa a mu-
dança do trabalho pesado para o trabalho intelectual nas economias avançadas
do Ocidente. O livro se tornou um best-seller, embora o então presidente
da GM, Alfred Sloan, o abominasse, a ponto de se recusar a reconhecer sua
existência.
Em 1950, Drucker tornou-se professor de Gestão na Faculdade de Ad-
ministração da Universidade de Nova York e, em 1954, publicou a obra The
Practice of Management. O livro estabeleceu seus preceitos mais conhecidos:
O que nossa empresa é? Quem é nosso cliente? O que nosso cliente entende
por valor? Credita-se também a esse livro o fato de ter introduzido o conceito
74 28 mentes que mudaram o mundo

de gestão baseada em objetivos. Drucker ficou conhecido também por suas


previsões – foi na década de 1950 que ele afirmou que a Tecnologia da Infor-
mação transformaria os negócios e que o Japão se tornaria uma superpotência
econômica mundial. Hoje isso não parece digno de nota, mas foi na época em
que o Japão era amplamente visto como fabricante de artigos de segunda ca-
tegoria. Além disso, Drucker previu também o desmoronamento do país após
a década de 1990.
Ao longo da década de 1960, Drucker continuou a lecionar na Universi-
dade de Nova York e a publicar trabalhos, e foi agraciado com a Presidential
Citation (Menção Presidencial), a mais alta honraria concedida pela universi-
dade. Em 1971, ingressou na Claremont Graduate School, Califórnia, e, em
1975, passou a escrever uma coluna para o The Wall Street Journal, tarefa que
desempenharia por 20 anos. Entre 1970 e 1980, produziu a média de um livro
por ano – época descrita por ele como seu período mais produtivo. Talvez o
fato mais notável seja que, em 1974, as vendas de seu livro Administração: ta-
refas, responsabilidades e prática suplantaram as do livro do Dr. Alex Comfort,
Prazeres do sexo. A partir dessa ocasião, Drucker passou a ser aclamado como
guru, mas ele costumava brincar, dizendo: “Há muitos anos digo que usamos
a palavra ‘guru’ só porque ‘charlatão’ é um vocábulo longo demais para se en-
caixar em uma manchete.”
Drucker foi também um consultor que trabalhou com muitos nomes famo-
sos nos Estados Unidos pós-guerra. Empresas como GE, Coca-Cola, IBM
e Intel foram colocadas sob seu microscópio, e ele estava sempre pronto a
oferecer conselhos francos em relação ao que essas empresas estavam fazendo
de errado, mas sempre fazia isso de forma que sugeria compreensão e empa-
tia, não confronto. Trabalhou também com governos e organizações sem fins
lucrativos, muitas vezes sem ganhar nada, e previu o surgimento desse tipo
de organização como um meio de proporcionar a satisfação que a maioria das
empresas não proporcionava. Foi também na década de 1980 que Drucker
começou a perceber outra tendência perturbadora – a ganância dos executivos.
Conforme artigo publicado pela revista Business Week (Byrne, 2005):

Em um ensaio de 1984, Drucker argumentava de forma persuasiva que um CEO ga-


nhava um salário exorbitante e que isso estava ficando fora de controle. Ele implorava
aos diretores dos conselhos que limitassem a remuneração do CEO a, no máximo, 20
vezes o salário mais alto pago pela organização. O que deixava Drucker furioso era a
Peter Drucker 75

tendência dos gestores corporativos de obterem ganhos enormes enquanto despediam


milhares de seus trabalhadores. “Em termos morais e sociais, isso é imperdoável”, es-
creveu Drucker, e acrescentou: “vamos pagar um alto preço por isso.”

Essa sua atitude poderia ser vista como o início de um desencanto com os
gestores, desencanto este que aumentou no final de sua vida. À medida que a
remuneração dos executivos aumentava e a ideia de que a empresa deveria ter
outro propósito além de produzir lucros diminuía, Drucker tornava-se cada vez
mais desiludido. Acreditava que os gestores de má qualidade recebiam remune-
ração excessiva, pois abriam seu caminho brutalmente através da exploração da
força de trabalho. Ele sempre achara que os gestores eram verdadeiros heróis,
mas agora os criticava, e eles não mais gostavam de ouvir o que Drucker dizia.
Essa foi provavelmente a razão pela qual, no hipercapitalismo do final da
década de 1990 e início da década seguinte, alguns começaram a rejeitar Dru-
cker, considerando-o um homem cujo tempo já se fora. Em 1997, ele declarou:
“Na próxima virada econômica haverá uma explosão de amargura e desprezo
contra os líderes que ganham milhões.” Até certo ponto, estava certo – houve
uma explosão de amargura e desprezo, embora ele não tenha previsto quão im-
precisa e mal direcionada essa tempestade seria. No entanto, a crise fez mui-
tos que tinham dúvidas perceberem que Drucker, não os CEOs, estava certo.
Além disso, ele era coerente com o próprio discurso e, a despeito da riqueza
que seu trabalho lhe proporcionou, tinha pouco tempo para dedicar a coisas
materiais. Aqueles que frequentavam sua casa comentavam que ele levava uma
vida bastante modesta. Drucker faleceu em 2005 de causas naturais, pouco
antes de completar 96 anos. Continuou a trabalhar e a publicar trabalhos até o
final da vida – na verdade, seu último livro foi publicado após sua morte.
Naturalmente, Drucker não era perfeito. Simon Caulkin (2005), na épo-
ca editor administrativo do jornal The Observer, escreveu no obituário de
Drucker:

Entre suas inúmeras realizações, ele descobriu não só a importância da gestão,


como também, talvez inevitavelmente, a importância dos gestores – com conse­
quências menos favoráveis. Conforme salienta Chris Grey da Judge Business
School, Drucker foi ímpar em seu tempo e trabalho, e quando, nas décadas de
1950 e 1960, apresentou aos gestores corporativos o lisonjeiro retrato deles mes-
mos, considerando-os heróis da economia e da nova cultura, eles se sentiram des-
lumbrados diante do que viram.
76 28 mentes que mudaram o mundo

Outras críticas consideradas justas por muitos incluem o fato de que Dru-
cker era muito melhor quando se tratava de organizações de grande porte do
que quando o assunto girava em torno de empresas pequenas, a ponto de pra-
ticamente ignorá-las, e que a gestão baseada em objetivos foi, em essência,
abandonada. Porém, comparadas ao legado que ele deixou, essas são falhas
insignificantes. Drucker foi a primeira e a maior mente da gestão e um verda-
deiro intelectual, e poderia ter obtido êxito nas mais diversas áreas. Em 1996,
o jornal McKinsey Quarterly escreveu: “Peter Drucker é o único guru diante do
qual os outros gurus se ajoelham.” E isso continua a ser verdade. Conforme
afirmou a revista The Economist em 2009, “a razão mais importante pela qual
as pessoas reverenciam Drucker até hoje é que seus escritos continuam extre-
mamente relevantes”.

Referências e leituras adicionais

Beatty, Jack (2005) The education of Peter Drucker, Atlantic, dezembro


Byrne, John A (2005) The man who invented management, Business Week, 28 de
novembro
Caulkin, Simon (2005) Putting the man into manager, The Observer, 20 de novembro
Drucker School, Claremont Graduate University, Drucker biography and timeline,
site da Claremont Graduate University
The Economist (2005) Remembering Drucker, 21 de novembro
The Economist (2005) Peter Drucker: trusting the teacher in a grey-flannel suit, 24 de
novembro
The Economist (2009) Remembering Drucker, 19 de novembro [On-line] http://www.
economist/node/14903040?story_id=14903040
http://www.druckersociety.at/index.php/peterdruckerhome/texts/friedrich-julius-stahl
Micklethwait, John and Wooldridge, Alan (1996) Drucker: the guru’s guru, na
McKinsey Quarterly, 22 de junho
Starbuck, Peter (2005) Obituary: Peter Drucker, The Guardian, 14 de novembro
Stern, Stefan (2009) Drucker’s ideas stand the test of time, The Financial Times, 24
de novembro
Sullivan, Patricia (2005) Management visionary Peter Drucker dies, Washington Post,
12 de novembro
Capítulo 11
Ingvar Kamprad

A criação de Ingvar Kamprad – a IKEA, gigante do setor de móveis que


trabalha também com artigos para decoração e outros acessórios correlatos
– é o exportador mais conhecido no mundo. Na verdade, pode-se dizer que, se
você pedisse a várias pessoas que citassem uma empresa sueca, provavelmente
a IKEA seria a única da qual elas se lembrariam de imediato. Como muitos
de seus contemporâneos que mudaram o panorama do setor, a influência de
Kamprad estende-se muito além do êxito comercial – engloba também nossa
cultura e nosso modo de vida. Na verdade, nas duas últimas décadas a IKEA
tem sido a grande e única influência que temos sofrido em relação à maneira
como mobiliamos nossa casa – é provável que você tenha um artigo IKEA em
algum lugar de sua residência, e a influência da marca está por toda parte, seja
ela clara ou obscura. Em uma ponta do espectro, a dificuldade de montar os
itens da IKEA na casa do cliente torna a empreitada um quadro de programa
humorístico. No outro extremo está o minimalismo moderno e estético po-
pularizado pela empresa que é, em grande parte, responsável pela destruição
do outrora exuberante mercado de antiguidades medianas existente no Reino
Unido. O homem por trás disso tudo, Ingvar Kamprad, tem um caráter inte-
ressante – é extremamente frugal, embora às vezes beba demais; na juventude
flertou com o nazismo; tem uma ética de negócios quase calvinista e, talvez
e acima de tudo, é presidente de uma empresa que se assemelha a um culto
religioso dedicado à fabricação de móveis pré-montados.
Ingvar Kamprad nasceu em 30 de março de 1926 na província de Småland,
no sudeste da Suécia, e cresceu em uma fazenda chamada Elmtaryd. Diz a
78 28 mentes que mudaram o mundo

lenda que o jovem Ingvar, como quase todo adolescente, era um tanto pre-
guiçoso e não gostava de acordar cedo para ordenhar as vacas; isso o levou
a explorar outras formas de ganhar a vida. Seu primeiro negócio envolvia a
venda de fósforos. Ele percebeu que, se adquirisse o material no atacado, em
Estocolmo, poderia vendê-lo a seus vizinhos por um preço considerado baixo
e ainda assim auferir um bom lucro. Logo passou a vender canetas, lápis, arti-
gos para decoração e outros itens correlatos. Em 1943, quando estava com 17
anos, seu pai o presenteou com uma quantia em dinheiro como recompensa
por seu bom desempenho escolar e ele usou o dinheiro para fundar uma em-
presa à qual deu o nome de IKEA – nome inventado com base em suas pró-
prias iniciais, no nome da fazenda e no nome do vilarejo próximo, Agunnaryd.
A primeira linha de produtos vendidos pela empresa consistia em pequenos
bens de consumo.
Em 1946, Kamprad publicou seu primeiro anúncio em um jornal (sobre
canetas esferográficas) e, em 1948, construiu seu primeiro armazém, um gal-
pão na fazenda da família. As mercadorias eram entregues pelo caminhão que
transportava o leite da região. Os móveis fabricados localmente começaram a
ser vendidos em 1948 e, em 1951, surgiu o hoje tradicional catálogo. Na época,
o catálogo era fornecido gratuitamente aos consumidores, e isso acontece até
hoje. A empresa abriu um salão de exposições em 1953 e, em 1955, começou
a projetar seu próprio mobiliário – isso ocorreu em resposta aos concorrentes
que pressionavam os fornecedores para que boicotassem a IKEA. Um ano
mais tarde, o primeiro dos artigos de fácil montagem fornecidos em módulos,
a mesa Lovet, chegou ao mercado. O conceito de automontagem surgiu por
acaso – um trabalhador removeu as pernas da mesa para colocá-la dentro do
carro e o móvel não sofreu nenhum dano. Em 1958, a primeira loja foi aberta
na cidade de Almhult, numa instalação que ocupava 6.700m2, sendo a maior
loja de móveis da Suécia. Dois anos mais tarde, a empresa abriu seu primeiro
restaurante dentro de uma loja, servindo sua principal marca registrada fora
do setor moveleiro: almôndegas. Em 1965, abriu uma loja com 31.000m2 em
Estocolmo; logo surgiu um depósito self-service.
Ao longo das décadas de 1970 e 1980, a empresa se expandiu por toda
a Europa. Em 1985, abriu sua primeira loja na Filadélfia e, em 1987, insta­
lou-se também no Reino Unido. A fórmula tem sido um retumbante sucesso
– em 2008, a organização contava com 253 lojas controladas diretamente, e
o número de compradores anuais passava de meio bilhão. Kamprad deixou a
Ingvar Kamprad 79

administração em 1986 e tornou-se consultor da controladora do grupo, a


INGKA Holdings, embora isso não tenha significado uma aposentadoria no
sentido literal da palavra, pois o grau de controle exercido por Kamprad sobre
a empresa continua a ser motivo de especulação. Conforme observa o site da
empresa de maneira bastante elíptica, “Ingvar Kamprad jamais abandonou sua
‘família’. Trabalha incansavelmente como conselheiro da administração sê-
nior e continua a dar um bom exemplo com suas viagens ao redor do mundo
IKEA, motivando seus colaboradores e, com entusiasmo, provando que nada
é impossível. Ingvar Kamprad jamais perdeu de vista seu propósito de criar
uma rotina diária mais agradável para um grande número de pessoas”.
Não ficaríamos surpresos se você considerasse isso quase uma religião:
muitos que estudaram a IKEA observaram que ela está entre uma loja de
móveis e uma religião, tendo Kamprad como sumo sacerdote. Ele é famoso
por sua ética comercial proveniente do fato de ter sido criado em uma fazenda
localizada em uma região com solo pobre e rochoso, clima frio, e longos e
cinzentos invernos. É uma lenda em virtude de sua frugalidade – é econômico,
compra verduras e legumes na parte da tarde, quando custam menos, e dirige
um velho Volvo. E gostaria que seu pessoal fizesse o mesmo: seus empregados
servem de modelos para os catálogos, e ele recomenda que, quando em via-
gem, os gestores dividam o quarto de hotel; espera até mesmo que seu pessoal
use os dois lados de uma folha de papel. E diz: “Como posso pedir às pessoas
que trabalham para mim que façam viagens econômicas se eu viajar com todo
o conforto? É uma questão de boa liderança.” Hoje, com mais de 80 anos,
ainda faz visitas de surpresa às suas lojas e abraça os empregados, que têm por
ele verdadeira devoção. Talvez você argumente que essa autoconfiança e esse
espírito de economia estendem-se também a seus clientes: as lojas IKEA são,
sabidamente, lugares nos quais o cliente se encarrega do serviço.
Kamprad pouco faz para dissipar a ideia de que a IKEA tem matizes reli-
giosos. Normalmente é discreto e tímido nas entrevistas, e leva uma vida re-
clusa na Suíça. Quando faz pronunciamentos formais, estes não são o que seria
esperado de um CEO. Em um documento intitulado “O testemunho de um
comerciante de móveis”, ele esboçou seus “nove mandamentos” com a usual
ênfase na parcimônia, autoconfiança, humildade, simplicidade e perpetuação
do “espírito IKEA”. Em 1999, com a colaboração do jornalista sueco Bertil
Torekull, Kamprad expandiu esses conceitos, transformando-os em um livro
intitulado Leading by Design: The IKEA story, que conta a história da IKEA,
80 28 mentes que mudaram o mundo

que é metade autobiográfica, metade a filosofia da corporação. Em sua crítica,


o jornal The Guardian declarou:

A visão de Kamprad é, de fato, religiosa: a empresa existe não só para melhorar a


vida de muitas pessoas, mas também para fazer as pessoas se tornarem melhores.
A autossuficiência é o lema: você encontra seu caminho dentro da loja, escolhe
as mercadorias que deseja com o mínimo de assistência por parte dos emprega-
dos, carrega-as até o caixa e até o carro, leva-as para casa e executa a necessária
montagem. A empresa não adota essa política apenas porque reduz os custos (e,
consequentemente, os preços), mas porque isso é bom para você, pois o torna um
ser melhor.

Essa fidelidade ao conceito “faça você mesmo” é a razão pela qual podemos
comprar uma xícara de café por um preço bastante baixo, e basta analisar as
vendas da IKEA para constatar que a maioria das pessoas se sente mais feliz
em pagar menos por menos. A tiragem do catálogo da IKEA, que já atingiu
centenas de milhões, ultrapassa a da Bíblia. O nome IKEA é tão popular que,
durante a inauguração de uma loja na região norte de Londres em 2005, cinco
pessoas foram hospitalizadas devido ao tumulto que ocorreu quando as por-
tas da loja foram abertas. Um ano antes, quando uma loja na Arábia Saudita
ofereceu vouchers concedendo um crédito no valor de US$150, duas pessoas
morreram na desenfreada corrida para entrar na loja. É claro que esse tipo de
frenesi pode ocorrer em qualquer lugar – e muitas vezes já foram testemunha-
dos em lojas que vendem artigos da Apple – quando uma empresa que é con-
siderada cult lança novos produtos. Existem também outras lojas que vendem
móveis modernos com foco no projeto, como a Habitat, sediada no Reino
Unido. Mas tanto a Apple como a Habitat produzem mercadorias direciona-
das à classe média, enquanto os produtos IKEA são acessíveis a um número
muito maior de consumidores; na verdade, a empresa vende até mesmo casas
pré-fabricadas.
No entanto, a IKEA não está isenta de críticas. Alguns dizem que a versão
democratizada do estilo da empresa não representa, de forma nenhuma, um
estilo e que a empresa oferece um projeto equivalente ao do fast food. Em
artigo publicado no jornal The Times (30 de maio de 2010), o crítico de proje-
tos Stephen Bayley afirmou: “A IKEA globalizou uma versão deselegante da
cultura que a alimentou.” E acrescentou que os projetos da empresa eram me-
díocres. Muitas pessoas reclamam que a IKEA ampliou o conceito de móveis
Ingvar Kamprad 81

descartáveis: quando uma pessoa muda de casa acha que não vale a pena levar
os móveis que possui, pois provavelmente durariam pouco. Embora a empresa
esteja na vanguarda em termos de projeto, muitas pessoas detestam suas lojas
e dizem que se assemelham a “grandes caixas” que, pintadas de azul e amarelo,
são responsáveis por uma das estruturas mais feias e menos harmoniosas já
vistas em uma paisagem. Dizem ainda que, como todo varejista localizado fora
do perímetro urbano, estimula a dependência do carro e destrói os pequenos
negócios.
E há também outras acusações. Em várias ocasiões, a cadeia de forneci-
mento da empresa já foi alvo de críticas, e seus detratores argumentam que,
basicamente, o baixo preço das mesas e estantes é conseguido em detrimento
do meio ambiente e à custa do trabalho de cidadãos do Terceiro Mundo. Em
2009, a empresa foi incluída no Sweatshop Hall of Fame (lista de empresas
que pagam baixos salários e oferecem más condições de trabalho aos funcio-
nários) pelo Fórum Internacional sobre Direitos Trabalhistas. A organização
tomou providências para abordar essas questões, mas muitos ainda dizem que
a IKEA merece as críticas que recebe e que sua falta de transparência torna
difícil dizer se ela está ou não abordando as questões da forma como deveria.
Contudo, a maior das críticas diz respeito a sua complicada estrutura, cuja
definição em si é nebulosa. O grupo IKEA é de propriedade da Stichting
INGKA Foundation, um truste holandês que reúne instituições de caridade
que, segundo a revista The Economist, em 2006 foi avaliado em US$36 bilhões;
isso o tornaria o maior truste do mundo entre os outros do mesmo tipo, maior
até mesmo que a Bill & Melinda Gates Foundation. Contudo, suas doações
a diferenciam da filantropia clara da Gates Foundation no sentido de que as
doações feitas pela Stichting INGKA Foundation são irrisórias se comparadas
a seus bens e sua receita. De maneira ainda mais confusa, a marca registrada e
a marca comercial IKEA são de propriedade da Inter IKEA Systems – outra
empresa holandesa –, e o imbróglio vai por aí afora; várias empresas holding
estão ligadas a trustes no Caribe, cujos beneficiários não precisam ser reve-
lados. Não é surpreendente que a IKEA se recuse a tocar nesse assunto. Em
2006, a revista The Economist escreveu:

O que emerge é uma organização que se vale engenhosamente das peculiaridades


das diferentes jurisdições para criar uma instituição de benemerência dedicada a
uma causa de certa forma banal [design de interiores] quando é não só a fundação
82 28 mentes que mudaram o mundo

mais rica do mundo como também, no momento, a menos generosa. A estrutura


geral da IKEA minimiza os impostos e a transparência, recompensa liberalmente a
família fundadora, os Kamprads, e torna a IKEA imune a uma tomada do controle
acionário.

Kamprad disse que uma das razões pelas quais ele preferiu não abrir o capi-
tal da empresa foi porque não queria se sentir responsável por pessoas de fora.
E ele não estava brincando.
Existem muitos outros esqueletos pessoais em seu armário. Em 1994, um
jornal sueco revelou que, entre os 16 e os 25 anos, Kamprad esteve envolvido
com um grupo sueco da extrema direita e que era amigo do líder do movimen-
to, Per Engdahl, simpatizante do nazismo, a ponto de tê-lo convidado para
seu primeiro casamento. Kamprad escreveu uma carta a todos os seus empre-
gados dizendo que aquilo havia sido um erro da juventude, e a família IKEA o
perdoou. E disse ainda: “Poucas pessoas cometeram tantos erros na vida como
eu.” Alguns sugeriram que sua imagem de frugal homem do povo também
talvez não seja exatamente o que parece. Kamprad é dono de um vinhedo e de
uma mansão na Suíça, onde mora sem pagar impostos. Na verdade, a despeito
de toda a conversa sobre a parcimônia dos escandinavos, há muito a IKEA
deixou de ser uma empresa sueca. Talvez o fato mais extraordinário sobre esse
homem sui generis seja que ele é alcoólatra confesso, embora de tempos em
tempos pare de beber para dar um descanso ao fígado e aos rins, e afirme que
tem esse problema sob controle. Ele diz: “Passo por um período de desinto-
xicação três vezes por ano. Meu problema começou quando visitei a Polônia
na década de 1960 para comprar materiais. Era quase obrigatório tomar uma
vodca com nossos contatos.” Ele diz que não tem planos de parar de beber
porque “beber é um dos prazeres da vida”.
Apesar de tudo, comparado a muitos gestores corporativos inexpressivos
de hoje, Kamprad é, sem dúvida, fascinante; e não há dúvida também de que
seu pessoal tem grande afeição por ele e pela extraordinária empresa que ele
construiu. O que acontecerá quando o homem que representa a personalida-
de da IKEA se for ainda é uma incógnita. Kamprad declarou que uma das
razões por trás da complexa estrutura acionária da empresa é evitar que se
formem feudos da família: “Paguei muito dinheiro para proteger o que cons-
truí. Só espero que esse dinheiro tenha sido bem gasto” (The Independent, 23
de julho de 2000).
Ingvar Kamprad 83

Referências e leituras adicionais

Bailly, Olivier, Caudron, Jean-Marc and Lambert, Denis (2006) Low prices, high
social costs: the sins of the founder found out, Le Monde Diplomatique, 1o de
dezembro
Perfil na BBC, Ingvar Kamprad
Crampton, Robert (2008) The home land: IKEA, Times, 7 de junho
Economist (2006) Ikea: flat packing, 13 de maio
Ellam, Dennis (2008) He is the world’s 4th richest man, yet he drives an old Volvo,
flies easyJet and at 81 is an alcoholic who dries out three times a year, Sunday
Mirror, 13 de abril
The Gold Coast Bulletin (2009) Man behind the flatpack, 13 de junho
The Guardian (2004) Morality and meatballs, 17 de junho
Hagerty, James R (1999) How to assemble a retail success story, The Wall Street Jour-
nal, 9 de setembro
Site da IKEA, www.ikea.com
McLuckie, Kirsty (2008) Swede inspiration comes of age, Scotsman, 17 de abril
Swain, Gill (2005) The strange world of Mr Ikea, Daily Express, 12 de fevereiro
Perfil no The Times (2005): Ingvar Kamprad, 13 de fevereiro
Triggs, John (2003) Flat pack king who’s given us Swede dreams, 26 de agosto
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 12
Oprah

É preciso ter um ponto de partida e escolhemos o talk show, pois esse foi o
caminho pelo qual Oprah Winfrey conquistou fama e fortuna. Mas ela é
muito mais que isso. Provavelmente, Oprah é a mulher mais poderosa dos
Estados Unidos ou até mesmo do planeta. Sua influência pode moldar as elei-
ções do país mais poderoso do mundo; seu talk show é o mais conhecido e o
que tem a maior audiência jamais registrada. Oprah é produtora e empresária
de um vasto império. De acordo com a revista Forbes, é a afro-americana mais
rica do mundo e, em determinada época, foi a única pessoa negra bilionária. E
mesmo com tudo isso, é absolutamente acessível; seu programa é visto todos
os dias por milhões de telespectadores e ela tem grande empatia com pessoas
comuns (às vezes seu público chega às lágrimas).
Nascida no Mississippi em 1954, é filha de uma adolescente solteira e de
um soldado, e cresceu em meio à pobreza e a privações, comuns no sul do país
naquela época. Seus pais se separaram logo depois que ela nasceu, e Oprah
conta que, quando criança, usava vestidos feitos de sacos e tinha baratas como
animais de estimação. Era realmente muito inteligente, pois antes dos 3 anos
aprendeu a ler com a avó. Quando estava com 6 anos, as circunstâncias, que já
eram ruins, tornaram-se ainda piores: ela e a mãe mudaram-se para um subúr-
bio pobre de Milwaukee. Lá, Oprah foi estuprada por um primo e por um tio,
e fugiu de casa aos 13 anos. Aos 14 ficou grávida, mas a criança morreu logo
após o nascimento.
Talvez de forma surpreendente, a sorte de Oprah mudou quando ela foi
morar com o pai, Vernon Winfrey, que acreditava na educação e na disciplina.
86 28 mentes que mudaram o mundo

Na East Nashville High School, começou a se destacar em várias áreas. Era


aluna exemplar, oradora talentosa e atriz nata. Ganhou uma bolsa de estudos
da Universidade do Estado do Tennessee e, aos 17 anos, venceu um concurso
de beleza como Miss Fire Prevention (Prevenção de Incêndio). Como resulta-
do desse concurso, visitou uma rádio local e lhe ofereceram um emprego como
leitora das manchetes da tarde. Ela realmente tinha vocação para a coisa: aos
19 anos tornou-se a primeira locutora negra de Nashville.
Em 1976, mudou-se para Baltimore para trabalhar como apresentadora do
noticiário das seis horas. No início, não se saiu muito bem. Deram-lhe uma
repaginada malfeita e pediram que mudasse seu nome para Suzy, o que ela se
recusou a fazer. Oprah também não era a maior jornalista da televisão – achava
difícil ser objetiva, e muitas vezes se envolvia emocionalmente com as notícias
que, em princípio, deveria apenas transmitir, chorando quando a história era
muito triste. Logo sofreu um surpreendente revés: foi rebaixada do posto de
âncora do noticiário para coapresentadora de um talk show matinal denomi-
nado People Are Talking, que foi ao ar pela primeira vez em 1978. No entanto,
como hoje todo mundo sabe, a aparente derrota foi uma verdadeira bênção
que mudou sua vida. Como mais tarde ela diria, preferia contar histórias sobre
pessoas a relatar notícias objetivas: “Para mim, era como respirar, só isso – eu
apenas converso.”
E quando se tratava de “apenas conversar”, Winfrey se saía muito bem.
Em 1983, ela se mudou para Chicago e passou a apresentar o programa AM
Chicago, que estava em baixa. Logo ele se tornou o talk show mais assistido
da cidade, superando o programa de Donahue, na época o número 1, e foi
rebatizado com o nome de The Oprah Winfrey Show. Quando o guru da mú-
sica Quincy Jones viu Oprah na televisão, preparou um teste de apresentação
com Spielberg. Resultado: ela foi escolhida para fazer o papel de Sofia no
filme A cor púrpura, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar. Em 1986, seu
programa passou a ser transmitido em rede nacional, e o sucesso que ela
havia alcançado em Chicago se repetiu por toda a nação. Surgia um ícone
americano.
Para entender por que Oprah foi um sucesso tão grande é necessário lem-
brar que, no início da década de 1980, os talk shows pertenciam ao domínio
dos homens. A informalidade começava a aparecer – Donahue fora o pioneiro
no uso da técnica de caminhar e conversar com o microfone na mão, o que
derrubou as barreiras físicas entre o apresentador e o público, mas foi Oprah
Oprah 87

quem derrubou as barreiras emocionais. Embora ela seja muito inteligente no


sentido acadêmico, sua inteligência emocional deve estar fora dos padrões.
Tem cordialidade natural, incrível poder de estabelecer empatia e compreen­
são intuitiva da natureza humana – as pessoas querem se abrir com ela. Em-
bora seu programa seja transmitido para um público de milhões em todo o
mundo, as conversas entre a apresentadora e seus convidados têm o mesmo
tom íntimo de um bate-papo entre amigos.
Além disso, Oprah está sempre de coração aberto. Suas revelações sobre a
própria vida têm ajudado a tornar as entrevistas ainda mais reais. Com seu pas-
sado difícil ela pode de fato solidarizar-se com pessoas que estão atravessando
turbulências – não há nada falso nesse aspecto. Além do mais, sua franqueza
em relação à eterna luta contra o peso, testemunhada por todos ao longo de
muitos anos, a fez conquistar grande parte de seu público feminino; a vergonha
que sente de seu peso oscilante é real. Na verdade, um memorável “momento
Oprah” ocorreu em 1988, quando ela mostrou no programa um carrinho de
bebê contendo mais de 30 quilos de gordura para demonstrar quanto havia
emagrecido. Ela tem também uma incrível energia – e precisa dela. Gravando
cerca de 200 episódios por ano, não tem muito tempo livre, levando-se em
consideração suas inúmeras outras atividades e aparições.
Nesse ponto, vale observar que sete anos mais tarde outro influente talk
show, The Jerry Springer Show, fez sua estreia em Chicago. Na verdade, du-
rante certo tempo, parecia que os dois estavam travando uma guerra de pro-
gramas do gênero. Em 1990, Oprah declarou que deplorava a direção vulgar
que os talk shows estavam tomando e que não tinha a intenção de “suplantar
o programa de Jerry”.
Contudo, Oprah tinha não só experiência profissional como também bom
senso. Percebendo que junto com a popularidade viera o poder, decidiu se tor-
nar a CEO do produto que representava (ela mesma), em vez de receber um
alto salário. Em 1986, fundou a Harpo Productions (Harpo é o nome Oprah
ao contrário) e assumiu o controle do talk show. No mesmo ano, o progra-
ma passou a servir como âncora em toda a nação e faturou US$163 milhões.
A parte de Oprah montava a US$39 milhões. Ela separou essa quantia para
contratar um bom advogado e depois revelou que nunca havia pensado que
tal controle seria possível até que seu advogado insinuou: “Todas as pessoas
precisam de alguém na vida para lhes dizer ‘Sim, você pode fazer isso’.” (Aus-
tralian Women’s Weekly, 2005). Esse esperto advogado, Jeff Jacobs, continua
88 28 mentes que mudaram o mundo

trabalhando para Oprah como Presidente da Harpo – é o homem discreto por


trás da marca.
Desde então, a influência, o poder e a fortuna de Oprah têm aumentado
muito e não há dúvida de que grande parte disso tudo tem sido em favor do
bem. Seu clube do livro é famoso pelo fato de persuadir aqueles que assistem
a seus programas – normalmente não muito fãs de leitura – a ler, e muitas das
recomendações de Oprah vão muito além de mera literatura de ficção para
passar o tempo. Quando ela recomendou a obra de Toni Morrison, A canção
de Salomão, o livro vendeu em três meses mais do que vendera em 20 anos.
Quando o autor James Frey escreveu o livro Um milhão de pedacinhos, obra se-
mificcional, a reação de Oprah e a agitação do próprio público de Frey fizeram
a nação – e o mundo – parar. Na verdade, o poder de Oprah é tão grande que,
mesmo sem aparecer em seu programa, ela consegue incrementar a vendagem
dos livros que recomenda. A obra de Jonathan Franzen, As correções, deveria ter
sido um sucesso, mas durante uma entrevista o autor expressou preocupação,
dizendo que pelo fato de ser um livro recomendado pela Oprah não atrairia
leitores do sexo masculino. O convite para que ele aparecesse no programa foi
cancelado, e a celeuma causada em torno do assunto chamou a atenção para o
livro, que acabou se tornando um tremendo best-seller. Mais tarde, em uma
cerimônia de premiação, Franzen prestou agradecimentos a Oprah.
Os melhores momentos de Oprah na televisão assemelham-se a um culto
aos grandes ídolos da cultura popular. Quando, em 1993, Michael Jackson
concordou em dar uma entrevista (o que era raro) a Oprah, o programa teve
uma das maiores audiências de todos os tempos. Em 2004, Oprah deu um car-
ro de presente para cada membro da plateia; o custo dos veículos representou
um mero trocado em comparação à publicidade que gerou. Em 2005, Tom
Cruise, um dos entrevistados do programa, a certa altura pareceu ter perdido
o juízo, dando saltos no sofá e declarando seu eterno amor a Katie Holmes. E,
em 2010, quando Sarah Ferguson foi execrada após receber algumas alfineta-
das por parte de um jornal, escolheu Oprah como confessora e redentora.
Mas nem tudo se resume a trivialidades e escândalos de revistas de celebri-
dades. Oprah criticou o racismo existente no sul do país. Em 1993, desempe-
nhou importante papel na aprovação da Lei Nacional de Proteção à Criança,
que defendia o estabelecimento de um banco de dados nacional que incluiria
todas as pessoas envolvidas com maus-tratos a crianças. Quando o projeto
se transformou em lei, recebeu o nome de “Lei Oprah”. Sua capacidade de
Oprah 89

mobilizar o espírito nacional é impressionante. Após a passagem do furacão


Katrina, ela foi diretamente para New Orleans com o objetivo de ouvir as
histórias dos sobreviventes – e se solidarizou com eles (pelo que estavam vi-
venciando naquele momento e pelo seu próprio passado). Entrou no inferno
em que o Superdome se transformara, clamando para que alguma coisa fosse
feita. Sua reação foi muito elogiada quando comparada à atitude de George
W. Bush, que quase nada fez além de sobrevoar a área.
Ela é mais que um simples reflexo do espírito nacional. Muitas vezes,
nada contra a maré, com excelentes resultados. Por exemplo, em um país
no qual o Direito Cristão freia o discurso público populista, há muito ela
defende os direitos dos homossexuais. Entretanto, talvez sua atitude que
teve o maior reflexo tenha ocorrido na arena política. Desde o início, Oprah
apoiou Barack Obama – quando o nome dela era mais conhecido que o dele
–, e acredita-se que a influência de Oprah tenha sido um fator preponderan-
te para que Obama derrotasse Hillary Clinton nas eleições primárias. Mas o
apoio dado a Obama provocou controvérsias e Oprah pagou um preço por
isso – muitas de suas fãs a chamaram de traidora quando ela confirmou que
Obama estava à frente de Hillary Clinton.
É interessante observar que se existe um público que Oprah vem lutando
para atingir é o sexo masculino. O formato e o conteúdo de seu programa são
famosos por constituírem algo que, na verdade, os homens não entendem.
Muito depois de Oprah ter se tornado um tremendo sucesso, sua popularidade
entre os homens ainda permanecia baixa, pois eles tendiam a não dar impor-
tância ao que ela fazia. O que acabou fazendo os homens passarem a levá-la a
sério foi sua enorme fortuna – sua imensa capacidade de influenciar aconteci-
mentos nacionais, inclusive as eleições presidenciais.
Seus negócios cresceram pari passu com sua influência. Sua revista O (que
está por toda parte) foi o lançamento de maior sucesso jamais visto e hoje tem
uma circulação ao redor de 2,5 milhões de exemplares. Oprah detém um subs-
tancial lote de ações da Oxygen Media, empresa de televisão a cabo voltada às
mulheres; ganha uma pequena fortuna com suas palestras; seu site registra 70
milhões de acessos por mês. Em 2008, ela anunciou a abertura do canal Oprah
Winfrey Network, joint venture estabelecida com o Discovery Channel. Por
trás de tudo isso está a marca Oprah, com sua mescla de empatia, cresci-
mento pessoal e autodescoberta. É uma marca que ela protege com unhas e
dentes – seja recusando solicitações para endossar produtos ou fazendo seus
90 28 mentes que mudaram o mundo

funcionários assinarem contratos de confidencialidade. Oprah detém prati-


camente todo o capital acionário da Harpo – pouco mais de 90%, enquanto
Jacobs detém pouco menos de 10%.
Contudo, ela também tem detratores e, ao longo de sua carreira, sempre
foi alvo de críticas. Em termos de mídia, existem alegações de que ela “embur-
receu propositalmente” e que tem obsessão por novidades banais sobre perda
de peso, demagogia que sensibiliza as pessoas e gurus de autoajuda que muitas
vezes não passam de charlatões. Seus críticos dizem ainda que ela tende a “ser
manipuladora” quando se trata de celebridades e políticos dos quais gosta,
e que é responsável por promover o tipo de frenesi emocional como o que
ocorreu quando da morte da Princesa Diana. Como era de se esperar, dizem
também que ela não é exatamente uma mulher do povo como diz ser e que
gosta de extravagâncias.
Em 2010, a biógrafa Kitty Kelley, apelidada “a primeira-dama do escân-
dalo”, publicou a biografia de Oprah, contendo várias alegações, algumas
bastante prejudiciais. Provavelmente, a mais desfavorável foi que Oprah era
fria e manipuladora. Mas no grandioso esquema de revelações sobre celebri-
dades, essas alegações representam coisas sem valor, e é provável que não ve-
nham a causar nenhum dano real ao sólido império representado pela marca
Oprah. Além disso, o fato de que a maioria dos talk shows mais conhecidos
nos Estados Unidos recusou a oportunidade de entrevistar Kelley sobre o
livro é uma indicação da estima da qual Oprah usufrui. A própria escritora
foi muito franca ao dizer que a negativa foi um sinal do poder de Oprah.
E declarou: “Não acho, de maneira alguma, que Oprah tenha telefonado e
dito: ‘Barbara, não entreviste Kitty.’ Ela não precisa fazer esse tipo de coisa
– é poderosa demais.”
Recentemente, Oprah anunciou o que será a maior mudança em sua car-
reira. Em 2009, ela declarou que pretendia encerrar o The Oprah Winfrey Show
em setembro de 2011. Provavelmente essa será uma decisão sábia, pois embora
o programa continue extremamente popular sua audiência caiu consideravel-
mente na década de 2000, juntamente com a de todas as redes de televisão,
pois a mídia tornou-se fragmentada. Em 2010, Oprah anunciou que seria
a apresentadora de seu próprio programa de fim de tarde, chamado Oprah’s
Next Chapter, transmitido pelo canal Oprah Winfrey Network, o que seria um
grande impulso para a rede. Mas alguns comentaristas sugerem que uma car-
reira política poderia ser mais adequada como segundo ato para uma mulher
Oprah 91

que ainda está na casa dos 50 anos. Conforme observado por John Friedman
no site MarketWatch, “creio que Oprah tenha sonhos mais ousados do que
apenas ganhar outro bilhão de dólares”.

Referências e leituras adicionais

Australian Women’s Weekly (2005) A woman of substance: the story of Oprah, 9 de


fevereiro
Harris, Paul (2005) You go, girl, The Observer, 20 de novembro
Leonard, Tom (2010) The omnipotence of Oprah Winfrey, Telegraph, 13 de abril
Pearce, Garth (1999) When it’s not so good to talk, Sunday Times, 7 de fevereiro
Sellers, Patricia (2002) The business of being Oprah, Fortune, 1o de abril
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 13
Sam Walton

Q uando falamos sobre a maneira como um varejista, no caso representado


pelo Walmart, influenciou a sociedade americana, redesenhou mapas e
transformou o modo de vida das pessoas, Sam Walton tem como rival apenas
Ray Kroc. Na verdade, a influência de ambos, tanto em termos positivos como
negativos, é muito parecida. Os dois estão inextricavelmente ligados à história
dos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial, com grande parte da
população vivendo em subúrbios e centrada no automóvel. Ambos são ex-
tremamente bem-sucedidos, mas fazem muitos imaginarem qual teria sido o
preço pago por esse êxito pela sociedade como um todo. Ambos gostavam de
se retratar como homens comuns, que não foram afetados pela enorme fortuna
acumulada.
No caso de Walton, uma parte de sua imagem de “Mister Sam”, que por
sinal era bastante apreciada, era que mesmo quando ele passou a valer milhões
– e mais tarde bilhões de dólares – continuou a dirigir uma caminhonete que,
diziam, tinha o cheiro forte de seus amados cães. Pessoas que visitavam os
escritórios do Walmart muitas vezes pegavam carona com o fundador e dono
da empresa naquele veículo malcheiroso. Quando um de seus cães morreu, em
1981, ele publicou uma apologia ao animal na revista da empresa e deu o nome
do cão morto a uma linha de rações para cães.
Sam Walton morreu em 1992, aos 74 anos, vítima de leucemia, e a em-
presa que leva seu nome carrega também uma lista de superlativos. É o maior
empregador do setor privado nos Estados Unidos, onde é também a maior
empresa em termos de receita, o maior vendedor de gêneros alimentícios e
94 28 mentes que mudaram o mundo

também o maior varejista do mundo. É o maior empregador no México e


um dos maiores no Canadá. O Walmart é também uma das empresas mais
controvertidas do mundo, e é alvo de muitas críticas sob os mais variados as-
pectos – desde seu recorde em termos de poluição ambiental, passando pelo
tratamento que dispensa aos empregados, à destruição da economia de cidades
pequenas.
Conforme cai bem a um gigante do comércio americano, Sam Walton era
oriundo de uma cidade pequena. Nasceu em 1918 em Kingfisher, Oklaho-
ma, e logo após seu nascimento os pais se mudaram para o Missouri. Filho
da Depressão, Sam cresceu durante uma época de dura depressão econô-
mica, quando o pai lutava para colocar comida na mesa e esperava-se que o
jovem Sam fizesse sua parte. E isso foi primordial em sua educação. Walton
era, acima de tudo, um trabalhador incansável. Trabalhava sete dias por se-
mana, pois era o que gostava de fazer. Quando estava no hospital, já à beira
da morte, chamou o gerente do Walmart local para discutirem os números
relativos às vendas da loja. Muitos que o conheciam bem diziam que para ele
trabalho era diversão.
Na escola não era particularmente dedicado, mas se esforçava o suficiente
para tirar notas decentes e era bom nos esportes, destacando-se no futebol e
no basquete. Estudou economia na Universidade do Missouri e entregava jor-
nais para custear seus estudos. Foi na faculdade que ele aprendeu outra grande
lição: ser uma pessoa sociável e comunicativa. Walton almejava o cargo de pre-
sidente do centro acadêmico, e seu modus operandi era muito simples. Dirigia-
se às pessoas antes que elas se dirigissem a ele – e em pouco tempo tornou-se
o garoto mais popular do campus, granjeando a simpatia dos colegas. Durante
seus tempos de faculdade desenvolveu verdadeira paixão pela leitura e lia mui-
to, independentemente do local em que se encontrasse ou da atividade que
estivesse desenvolvendo. Passou a acreditar naquilo que mais tarde as grandes
mentes da gestão chamariam de “educação continuada”.
Walton recebeu o diploma de bacharel em 1940 e passou a trabalhar na
JCPenney em Des Moines, Iowa. Ele declarou que a forma como a empre-
sa tratava seus funcionários (demonstrava grande interesse por eles, por suas
opiniões e seu desenvolvimento) exerceu grande influência sobre seu modo de
pensar. Permaneceu na empresa por 18 meses, saindo porque os Estados Uni-
dos haviam entrado na guerra e ele precisou retornar ao Missouri para aguar-
dar sua convocação. Entre 1942 e 1945 ocupou o cargo de capitão da Unidade
Sam Walton 95

do Serviço de Informações com sede nos Estados Unidos. Em 1943 conheceu


a esposa, com quem se casou no mesmo ano. Tiveram quatro filhos.
Após dar baixa em 1945, Walton abriu sua primeira loja em Newport,
Arkansas. Era uma franquia da Ben Franklin, cujos preços variavam de
US$0,05 a US$0,10 (o tipo de comércio conhecido no Brasil como “loja de
R$1,99”). O nome da empresa, que provavelmente foi a primeira nos Estados
Unidos a adotar o sistema de franquia, foi inspirado no estadista, cientista e
popular pensador do século XVIII Benjamin Franklin, que cunhou a frase
“De tostão em tostão se faz um milhão”. A loja existe até hoje, embora seja um
peixinho comparada ao Walmart.
Walton abriu sua loja do outro lado de uma rua onde ficava um comércio
estabelecido há muito mais tempo e, dentro de poucos anos, seus negócios
tinham um volume muito maior do que os do concorrente. Em 1950, quando
o dono do imóvel não renovou o contrato, Walton não vacilou e mudou a loja
para a vizinha cidade de Bentonville, Arkansas; escolheu essa cidade porque
achava o lugar agradável e com potencial para crescer. E estava certo. Logo
ele era dono de várias lojas na região, e todos os seus filhos trabalhavam nelas.
Já na década de 1950, a empresa de Walton exibia as características que iriam
resultar na maior loja varejista do mundo. Ele tinha um interesse especial por
seus gerentes e empregados, que o consideravam um chefe exemplar. Adotava
um conjunto de regras comerciais simples e informais, e não tinha receio de
fazer experiências.
Em 1960, Walton tinha mais de 12 lojas e era o maior franqueado da Ben
Franklin nos Estados Unidos. Nessa época tinha pouco mais de 40 anos e
estava se saindo muito bem. Na verdade, sua carreira teria deixado satisfeitos
muitos homens com um espírito empreendedor menos acentuado, mas sua
ideia de transformar o negócio só lhe ocorreria quando estava bem entrado na
casa dos 40. Mas Roy Kroc não estava jogando os dados pela última vez e mos-
trava todos os sinais de um homem que, possivelmente, teria um desempenho
muito melhor do que a maioria de seus pares, embora não viesse a mudar o
mundo.
Entretanto, o mundo do varejo estava mudando velozmente. Até a déca-
da de 1960, o modelo prevalente das lojas de departamentos e das “lojas de
US$1,99” contava com grande número de vendedores que serviam os clien-
tes individualmente. Embora essas lojas vendessem mercadorias modernas,
seu esquema de funcionamento lembrava a época vitoriana. Mas no leste dos
96 28 mentes que mudaram o mundo

Estados Unidos, que era a parte mais desenvolvida do país, duas tendências
estavam se tornando populares. Uma era representada pelas lojas self-service
e a outra por lojas que ofereciam descontos, ou seja, adotavam a seguinte filo-
sofia: “Se a pilha estiver alta, venda barato.” Walton viajou pelo país para ver
como uma loja self-service funcionava e logo abriu a primeira loja desse tipo,
uma Ben Franklin, em sua área. É interessante observar que, embora Walton
fosse um dos primeiros a botar fé no sistema de autoatendimento, era a favor
de bons serviços. Um de seus famosos ditados, conhecido como “regra dos três
metros”, é que você deve dizer “Como posso ajudá-lo?” a qualquer cliente que
esteja no máximo a três metros de distância.
Walton estava também bastante interessado no sistema de descontos, já
amplamente adotado nas áreas metropolitanas do leste desenvolvido, e tinha
a convicção de que o sistema poderia funcionar em mercados rurais menores,
como o dele. Até então, essas áreas haviam sido ignoradas pelos grandes vare-
jistas, que achavam que as populações rurais eram pequenas demais e espalha-
das demais para que valesse a pena levá-las em consideração. Mas Walton ti-
nha uma crença diferente. Achava que se os descontos fossem compensadores,
todos esses clientes dispersos encontrariam o caminho até sua loja.
O problema era que a administração da Ben Franklin não compartilhava
o mesmo ponto de vista. Walton viajou até o escritório central da empresa,
que ficava em Chicago, apenas para ouvir que a administração não estava in-
teressada. Mas se sua visita a Windy City (apelido de Chicago) pouco fez para
persuadir os líderes da empresa, fez muito para reforçar a crença de Walton
de que ele estava certo. Enquanto estava em Chicago, visitou um dos pon-
tos de venda da cadeia Kmarts (outra grande cadeia americana de lojas que
ofereciam descontos) e isso o convenceu de que, mesmo sem o apoio de Ben
Franklin, estabelecer lojas desse tipo era o caminho a seguir. Assim, em 1962,
quando Walton estava no meio da casa dos 40, o Walmart propriamente dito
finalmente passou a existir. A primeira loja Walmart foi aberta em Rogers,
Arkansas. Por fim, Walton estava trilhando seu caminho.
Walton era adepto da filosofia “o comércio não é uma ciência inacessível”.
Suas famosas 10 regras para construir uma empresa (veja a relação adiante) re-
presentam, basicamente, o bom-senso. E esse foi o modelo que ele seguiu. Na
década seguinte, concentrou-se na área geográfica que conhecia e naquilo que
conhecia. O crescimento foi deliberado, não particularmente rápido, e se limi-
tou ao Arkansas e aos estados vizinhos. Foi dada ênfase nos relacionamentos
Sam Walton 97

e na franqueza, e ele procurava conhecer bem todos os gerentes de suas lojas.


Sabia-se que Walton preferia visitar as lojas a ficar trancado no escritório,
e frequentemente era visto caminhando pelas lojas, perguntando ao pessoal
como iam os negócios. Em 1969, ele tinha 18 lojas Walmart e 14 franquias
Ben Franklin.

Os 10 princípios de Walton para


construir uma empresa bem-sucedida

1. Comprometa-se com sua empresa.


2. Compartilhe os lucros com seu pessoal.
3. Motive as pessoas para que deem o melhor de si.
4. Informe o que está acontecendo.
5. Valorize as pessoas que o estão ajudando.
6. Comemore os êxitos.
7. Preste atenção ao que as pessoas dizem, principalmente consumidores ou clientes.
8. Vá além das expectativas.
9. Controle as despesas melhor que seus concorrentes.
10. Não nade contra a corrente.

A empresa abriu seu capital em 1971 e gradualmente se desfez das lojas


Ben Franklin franqueadas. Naquela época, a Ben Franklin era apenas uma
cadeia de varejo pouco conhecida fora de sua base. Mas Walton reinvestiu em
sua empresa o dinheiro proveniente da flotação e continuou a trabalhar com a
extraordinária energia de sempre. Em 1977, era dono de 190 lojas e, em 1985,
de 800. Em 1985, sua participação acionária na empresa o fez o homem mais
rico dos Estados Unidos. Em 1991, a empresa ultrapassou o varejista Sears em
termos de porte e ele abriu sua primeira loja no México, país no qual hoje tem
cerca de 1.500 pontos de venda.
A convicção de Walton na educação continuada jamais o abandonou. Era um
entusiasta da inovação, fosse no tocante a pequenos detalhes (por exemplo, colo-
cando comidas congeladas perto das fraldas, pois os jovens casais com filhos pe-
quenos não têm tempo de cozinhar), fosse adotando sistemas computadorizados.
98 28 mentes que mudaram o mundo

Fez experiências com novos tipos de lojas, como depósitos para membros do
Sam’s Club (clube de compras do Grupo Walmart) e Supercenters.
Walton foi um homem que sempre enxergou mais além. Enquanto outros
varejistas disputavam as áreas metropolitanas, ele se concentrava em lugares
nos quais ninguém mais estava interessado, mas que eram de fácil acesso de
carro. Nesse sentido, ele poderia ser considerado o pai das compras fora da
cidade. Como Ray Kroc, farejava novos locais no ar, geralmente descobrindo
o melhor lugar para instalar suas novas lojas, depois comprando um pedaço de
terra do respectivo agricultor.
A despeito disso tudo, continuou a ser um homem simples, e esperava que
seu pessoal também fosse assim. Os escritórios de seus gestores eram simples,
sem nenhuma ostentação; poderiam ser considerados espartanos, o que in-
cluía a alta administração. E isso merece aplausos. Outras facetas da cultura
da empresa talvez sejam um pouco estranhas. Existe um “grito de guerra” da
empresa para os iniciantes:

Me dê um W!
Me dê um A!
Me dê um L!
Me dê um M!
Me dê um A!
Me dê um R!
Me dê um T!

O que significam essas letras?


Walmart!

De quem é o Walmart?
O Walmart é meu!

Quem está em primeiro lugar?


O cliente! Sempre!

E o site do Walmart avisa: “Não fique surpreso se você ouvir nossos co-
laboradores recitando esse verso com entusiasmo na loja Walmart que você
frequenta.” Se isso parece um pouco inquietante, há muito mais abaixo da
superfície. O enorme êxito alcançado pela empresa causou muito escrutínio, e
muitos não gostaram do que veio à tona.
Sam Walton 99

Um artigo publicado pelo jornal The New York Times em 2005 é um bom
exemplo do tipo de acusação levantada contra o Walmart por seus detratores:
“Um memorando interno enviado ao conselho diretor do Walmart propõe
inúmeras formas de conter os gastos com assistência médica e outros benefí-
cios e, ao mesmo tempo, tenta minimizar os danos causados à reputação do
varejista. Entre as recomendações estão contratar um número maior de em-
pregados com carga horária semanal menor e desencorajar as pessoas que têm
problemas de saúde a trabalharem no Walmart.”
Além disso, embora a empresa alardeie seus preços baixos (onde mais você
compra uma calça Levi’s por menos de US$20?) e se identifique com as fa-
mílias trabalhadoras, muitos a veem como uma organização que intimida seus
fornecedores, particularmente em economias nas quais os salários são baixos.
E se ela está estimulando práticas trabalhistas duvidosas em outros países, em
seu país de origem é o grande vilão, expulsando do mercado as empresas pe-
quenas. Dizem os críticos que, quando é aberta uma loja Walmart, os centros
de compras das redondezas morrem e que, embora o Walmart com seus preços
baixos se retrate como amiga dos cidadãos da classe média, na verdade des-
trói a economia local e empobrece os membros da classe média. A empresa é
também doentiamente contra os sindicatos. Segundo os críticos, após levar
em consideração todos os fatores, na verdade o Walmart explora as pessoas
simples, e a única família americana que realmente se beneficia são os Waltons
que, a despeito de sua tão difundida imagem simples, estão entre as pessoas
mais ricas do mundo.
Talvez consciente de que tinha um problema de imagem, o Walmart em-
preendeu grande parte de sua expansão internacional sob outros nomes; no
Reino Unido, por exemplo, os consumidores fazem compras na Asda. Nesse
meio-tempo, mais precisamente em 2006, a empresa se retirou da Alemanha a
um custo de US$1 bilhão, e já havia saído da Coreia antes, no mesmo ano. Os
comentaristas disseram que grande parte da razão era que a cultura da empresa
não se adaptou muito bem nesses países e que os liberais alemães achavam suas
práticas excessivamente conservadoras e, particularmente na área trabalhista,
inaceitáveis.
Porém, embora não seja possível garantir que o Walmart conseguirá repe-
tir no resto do mundo o sucesso que fez nos Estados Unidos, sem dúvida as
lojas de Sam Walton exerceram tanta influência que mudaram a demografia
de um continente. E talvez seja também uma marca de seu êxito o fato de que
100 28 mentes que mudaram o mundo

os filhos de Sam Walton estejam entre as 10 pessoas mais ricas dos Estados
Unidos. Apenas Bill Gates, Warren Buffett e Larry Ellison são mais ricos.

Referências e leituras adicionais

Bell, John (1999) Sam Walton (1918–1992): everyday low prices pay off, Journal of
Business Strategy, 1o de setembro
Clark, Andrew (2010) Walmart, the US retailer taking over the world by stealth,
Guardian, 13 de janeiro
Gross, Daniel (1996) Forbes Greatest Business Stories of All Time, pp 266–83
Hosenball, Mark (1985) Shy Sam, the man with billions in store, Sunday Times, 20
de outubro
Markowitz, Arthur (1989) Mr Sam: Walmart’s patriarch, Retailing Today, 18 de
dezembro
Meyerson, Howard (2009) In Walmart’s image, American Prospect, 1o de setembro
Painter, Steve (2007) Friendly invasion: the annual shareholders meeting will bring
hordes of national and international ‘Wal-Martians’ to Northwest Arkansas,
Arkansas Democrat-Gazette, 20 de maio
Pilieci, Vito (2002) How Walmart conquered the world, Ottawa Citizen, 2 de abril
Sunday Times (2001) Mr Sam – the folksy tycoon with a killer instinct, 10 de junho
Walmart, Samuel Moore Walton, biografia, walmartstores.com
Walton, Sam (1993) Sam Walton: Made in America, Bantam
Capítulo 14
Mary Kay Ash

Q uando pensam em Mary Kay Ash, muitas pessoas provavelmente pensam


em cosméticos e pouco mais além disso. Quem a conheceu melhor talvez
se lembre da cor rosa, de uma predileção por adereços vistosos e um gosto
para decoração de interiores inspirado nas preferências de seu amigo íntimo,
Liberace. Quem trabalhou com e para ela sabia que Ash era muito mais que
isso e que por trás de toda aquela doçura estava uma mulher de negócios com
bons princípios, determinada e bem-sucedida, cujas ideias estavam anos, se
não décadas, à frente de seu tempo.
Ash era uma mulher extremamente rica e bem-sucedida em um mundo
que, em comparação aos padrões de hoje, era extremamente machista. Por
fazer parte do gênero que, muitas vezes, era alvo da discriminação, quando
finalmente conquistou a própria independência suas ideias sobre gestão eram
bastante radicais. Algumas eram totalmente excêntricas para a época, mas se
você as analisasse com cuidado veria que eram ideias de uma mulher que ver-
dadeiramente sabia como envolver e motivar as pessoas, que concedia promo-
ções com base na capacidade, não no sexo, e que se preocupava com o “equi-
líbrio entre a vida pessoal e a vida profissional” de seus funcionários, décadas
antes que a expressão passasse a existir. Na verdade, embora superficialmente
as duas fossem bastante diferentes, era possível traçar muitos paralelos entre
Ash e outro expoente do mundo dos cosméticos, Anita Roddick.
Mary Kay era também interessante em seu status de celebridade e em como
fazia uso dele. Trabalhou em uma época em que as pessoas de negócios eram
homens (a grande maioria) que, como norma, não chamavam muita atenção
102 28 mentes que mudaram o mundo

e desempenhavam suas funções. Assim como muitas de suas ideias, seu perfil
e como ela o usava parecem mais em consonância com o início do século XXI
do que com a metade do século XX. Como uma iconoclasta, tinha amigos
que variavam de Laura Bush, Fannie Flagg, autora de Tomates verdes fritos, a
membros do time de futebol Dallas Cowboys. Para que você não pense que
ela se importava mais com o estilo do que com o conteúdo, vale mencionar
que seu pessoal a amava de verdade. Quando ela morreu, seus funcionários e
ex-funcionários formaram filas diante de seu caixão para lhe prestar homena-
gens, muitos chorando copiosamente. Eles admiravam seu desprendimento e
comentavam como ela havia mudado a vida deles. Para muitos, era como se
tivessem perdido um membro da família. Em geral, as primeiras palavras do
elogio eram: “Nós a adorávamos...”
Mary Kay, batizada Mary Kathryn Wagner, nasceu em 1918 em Hot
Wells, Texas, estação de veraneio que atualmente está sendo engolida pela
expansão da área urbana de Houston. Seus pais eram donos de um hotel-
restaurante de classe média. Quando Ash estava com 7 anos, o pai contraiu
tuberculose e passou a morar em um sanatório. A mãe vendeu o negócio e
a família mudou-se para Houston. Sua mãe trabalhava em um restaurante
em turnos de 14 horas e Ash ajudava nos serviços domésticos, cozinhando e
limpando a casa. A despeito das difíceis circunstâncias, a mãe exerceu uma
influência positiva sobre Mary Kay. Mesmo com a pesada jornada de trabalho,
encontrava tempo para incentivar a filha, dizendo-lhe constantemente que ela
poderia fazer qualquer coisa, desde que tivesse determinação. Ash costumava
mencionar isso como a fonte de sua autoconfiança: “As palavras de minha mãe
se transformaram no tema de minha infância e me acompanharam ao longo
de toda a minha vida.”
Ash era boa aluna, mas as circunstâncias não permitiram que ela cursasse
uma faculdade. Em 1935, casou-se com Ben Rogers, que era frentista, cantava
em uma banda local e trabalhava em uma rádio. O casal teve três filhos, mas
o casamento não durou muito. Ash declarou que desmoronou depois que Ro-
gers foi servir o exército. O casal se divorciou quando ele voltou da Segunda
Guerra Mundial. Ash afirmou que esse foi o pior período de sua vida, acres-
centando: “Eu me sentia um completo fracasso como mulher.” Além disso,
tinha três filhos para sustentar sozinha.
Começou a estudar Medicina na Universidade de Houston. Trabalhava
como secretária e conseguiu um emprego de meio período na Stanley Home
Mary Kay Ash 103

Products (SHP), empresa que vendia artigos de uso doméstico, como vassou-
ras e escovas de dentes. Atribui-se a essa empresa a origem dos chás de ven-
das (sendo os mais famosos as reuniões Tupperware). Ash participou de uma
convenção da SHP em Dallas que mudou sua vida. Nesse evento, a empresa
organizou um concurso para eleger a Rainha de Vendas e Ash conquistou
uma boa posição. No ano seguinte, foi eleita Rainha de Vendas. Passou a fazer
tanto sucesso, que deixou a diretoria da SHP irritada e, para cortar suas asas,
eles a transferiram para Dallas.
Em 1952, passou a trabalhar em uma empresa de vendas diretas, a World
Gifts. E o padrão se repetiu: em seu primeiro ano estava ganhando mais de
US$1 mil por mês, o equivalente a cerca de US$8 mil hoje e quatro vezes
mais que a média nacional. Mas a discriminação que ela enfrentara na SHP se
repetiu. Ash permaneceu na World Gifts por 11 anos e deixou a empresa por
uma série de razões. Uma delas foi que queria escrever um livro sobre negócios
com base em suas experiências, dirigido às mulheres. Outra foi que ela estava
cansada de ser preterida em favor de colegas do sexo masculino menos qua-
lificados. O site da empresa afirma que a última gota foi quando um homem
que fora contratado como seu assistente e por ela treinado foi promovido em
detrimento dela, passando a ganhar o dobro do que Ash ganhava na época.
Mais tarde ela diria:

Naquela ocasião aprendi que, enquanto os homens não acreditassem que as mu-
lheres eram capazes de fazer qualquer coisa, elas jamais teriam uma chance. Eu
sabia que me haviam sido negadas oportunidades de realizar meu pleno potencial
pelo fato de eu ser mulher. Esse não era um mero sentimento de autopiedade,
pois eu conhecia pessoalmente muitas mulheres que haviam sofrido injustiças
semelhantes.

Embora Ash pretendesse escrever um livro, as coisas se encaminharam de


uma forma muito diferente. As ideias que ela havia ruminado para os vários
capítulos que escreveria acabaram se transformando em sua empresa. Diz-se
que, certo dia, ela se sentou à mesa da cozinha e escreveu duas listas: uma era
sobre as coisas boas que tinha visto nas empresas onde trabalhara; a outra se
referia a áreas que, em seu entender, poderiam ser melhoradas. Ao analisar as
duas listas, teve um clique: aquilo não era um livro, era o plano de uma em-
presa. Assim, em 1963, com os US$5 mil que economizara ao longo da vida e
com a ajuda de um dos filhos, Richard, abriu a Beauty by Mary Kay em Dallas,
104 28 mentes que mudaram o mundo

em um espaço que ocupava cerca de 15m2. Os móveis eram de segunda mão, e


as cortinas eram feitas à mão, mas ela começara a trilhar seu caminho. O prin-
cipal produto da empresa era um creme para a pele sobre o qual adquirira os
direitos de fabricação. Supõe-se que o creme tenha sido desenvolvido por um
tingidor de peles de animais cuja filha percebera que a pele parecia muito mais
jovem do que seria de se esperar. As consultoras de Ash eram independentes:
compravam no atacado e vendiam no varejo, trabalhando como autônomas.
Vale a pena lembrar – a exemplo de muitos outros empresários de meados
do século XX que mudaram o jogo dos negócios, como Ray Kroc e Sam Wal-
ton – que Mary Kay não era nenhuma criança quando fundou sua empresa.
Na verdade, já estava com 45 anos. Mais tarde, quando lhe perguntaram como
conseguira obter êxito tão grande em tão pouco tempo, ela respondeu: “Eu
estava na meia-idade, tinha varizes e não tinha tempo para ficar vadiando.” É
claro que isso talvez lhe tenha dado o empurrão de que precisava, mas é prová-
vel que a verdadeira razão tenha sido o fato de ela ter testemunhado a maneira
como as empresas tratavam as mulheres talentosas.
E acrescentou: “Eu não estava muito interessada na parte que dizia respeito
aos dólares e centavos do negócio. Meu interesse em fundar a Mary Kay era
oferecer às mulheres oportunidades que não encontrariam em nenhum outro
lugar.” Não é preciso ser um gênio para descobrir que uma das melhores manei-
ras de motivar as pessoas é lhes oferecer as oportunidades que não tiveram em
outros lugares. Em suas palestras sobre motivação, celebradas nas reuniões da
empresa, Ash sempre dizia: “Quero ser a mulher mais bem paga da América.”
Muitas de suas colaboradoras levavam esse conselho a sério: quando Ash mor-
reu, 150 mulheres tinham ganhado mais de US$1 milhão trabalhando para ela.
Dona de seu próprio negócio, Ash deixou para trás seus anos de dificul-
dades. A empresa começou com 11 consultoras de beleza e faturou cerca de
US$200 mil no primeiro ano. No ano seguinte, essa soma foi quadruplicada,
ou seja, atingiu US$800 mil. Em 1964, Ash deu início a uma tradição – o
seminário da empresa. O primeiro foi um jantar de confraternização quan-
do a própria Mary Kay preparou frango e salada com gelatina para os 200
funcionários da empresa, além das consultoras. O jantar foi servido em um
depósito decorado com bexigas e papel crepom, e a própria Ash o serviu em
pratos descartáveis. Essa reunião constituiu o primeiro dos famosos seminá-
rios da organização e, à medida que o império de cosméticos crescia, foram
se transformando em eventos cada vez mais sofisticados que, muitas vezes,
Mary Kay Ash 105

mais pareciam espetáculos de entretenimento que reuniões corporativas. Mas


o propósito desses eventos era sério. A empresa oferecia cursos de motivação e
treinamento, e havia uma premiação na qual os funcionários de maior desta-
que recebiam elogios e prêmios equivalentes a dezenas de milhares de dólares.
Em 2009, 35 mil pessoas participaram do seminário. A maioria era constituída
de consultoras da empresa que, como são autônomas, arcam com as despesas
de viagem e hospedagem.
Os seminários de Ash em Dallas (hoje acontecem em vários países ao re-
dor do mundo) tornaram-se lendários. Os participantes pagantes incluem até
mesmo professores da Harvard Business School, que viam sob o rosa e os dia-
mantes um cérebro privilegiado e inovador.
Em 1968, Ash comprou seu primeiro Cadillac, que mandou pintar de rosa
para combinar com a cor de um de seus produtos. O carro fez tanto sucesso (e
passou a representar uma ferramenta de marketing tão eficaz) que Ash presen-
teou suas cinco principais consultoras com automóveis semelhantes. Hoje, a
empresa oferece uma ampla gama de carros (nem todos rosa). Em 2006, a GM
calculou que produzira 100 mil Cadillacs rosa para a Mary Kay. Conforme ela
dizia, “o segredo é a identificação”.
Nos anos 1970, a empresa viveu um verdadeiro boom. No fim da década, seu
faturamento ultrapassou US$100 milhões e passou a ser listada na Bolsa de Valores
de Nova York. Com sua aparência peculiar e modos exibicionistas, Ash transfor-
mou-se em uma celebridade. Hoje é citada centenas de vezes na cultura popular.
Em suas aparições públicas tinha de sair pela porta dos fundos ou por túneis como
se fosse um astro do rock para evitar o assédio dos entusiasmados fãs.
No entanto, a despeito disso tudo (e de sua empresa), sua filosofia não
mudou. Ela acreditava que você deve tratar os outros da mesma forma como
gostaria de ser tratado (seus funcionários e consultoras eram estimulados a se
comportar como se todas as pessoas que conheciam tivessem uma tabuleta
pendurada no pescoço dizendo: “Faça com que eu me sinta importante”). Ela
acreditava piamente no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal ou, de
acordo com a filosofia texana, entre a vida profissional, pessoal e religiosa.
Dizia a seus funcionários que eles deveriam colocar Deus em primeiro lugar,
a família em segundo e a carreira em terceiro. (Isso dá margem a um diver-
tido contraste com o ditado de Ray Kroc. Ele dizia: “Acredito em Deus, na
família e no McDonald’s – e no escritório essa ordem é invertida.”) Por fim,
Ash acreditava que qualquer pessoa poderia ser bem-sucedida desde que fosse
106 28 mentes que mudaram o mundo

incentivada corretamente. Às vezes, os funcionários premiados por seu desem-


penho ou que ganhavam Cadillacs rosa eram do sexo masculino.
Contudo, em meados da década de 1980, a empresa enfrentou um trope-
ço. As vendas e o preço das ações caíram e, em 1985, a família privatizou a
Mary Kay novamente com uma aquisição alavancada do controle acionário
que montou a US$450 milhões. Ash se aposentou em 1987 e teve um derrame
em 1996, depois do qual sua saúde ficou debilitada. Morreu em 2001, aos 83
anos; naquele ano, o faturamento da empresa ultrapassou US$1 bilhão. Em
2010, chegou perto de US$3 bilhões. Ao longo dos anos, Ash recebeu dezenas
de prêmios atribuídos a empresas e era estimada e admirada por grande nú-
mero de pessoas. Em um setor sujeito a tantas controvérsias, poucos tinham
coisas negativas a dizer sobre ela. Mas isso não é surpreendente, visto que sua
motivação era, de modo geral, extremamente positiva.

O obituário de Mary Kay publicado pelo jornal New York Times menciona
que ela teria dito o seguinte a um amigo:

Em 1963, as forças sociais que hoje apoiam a igualdade financeira e jurídica das
mulheres não eram bem aceitas pela opinião pública. Mas havia uma empresa
que daria às mulheres todas as oportunidades que eu nunca tive. Não acredito que
Deus quisesse um mundo no qual a mulher teria de trabalhar 14 horas por dia
para sustentar a família, conforme fez minha mãe. Acho que Ele utilizou minha
empresa como veículo para dar uma chance às mulheres.

Referências e leituras adicionais

AP/Houston Chronicle (2010) Mary Kay Ash, cosmetics giant dead at age 83, 23 de
novembro
AP/St Louis Post-Dispatch, Cosmetics empire was started to offer women opportuni-
ties; company grew from sales force of 11 to 750,000 in 37 countries
Bodor, Jim, ‘We all loved her’: local associates recall legacy of Mary Kay Ash, Tele-
gram & Gazette, Worcester, MA
Dallas Morning News
Detroit Free Press (2001) Obituary, 23 de novembro
Gross, Daniel (1996) Forbes Greatest Business Stories of All Time, pp 232–45
Site de tributo a Mary Kay, marykaytribute.com
Site de tributo a Mary Kay, biografia, www.marykay.com
Nemy, Enid (2001) Mary Kay Ash, builder of a beauty empire, dies at 83, New York
Times, 24 de novembro
Capítulo 15
Bill Gates

B ill Gates é um dos maiores promotores da revolução da informação no


final do século XX, e tem feito mais para moldar nossa experiência com
computadores pessoais (PCs) do que qualquer outra pessoa. Em 1975, ele
afirmou, de maneira profética, que no futuro haveria um computador em cada
lar e em cada mesa de trabalho. Em grande parte, essa profecia se tornou rea­
lidade graças principalmente a seus esforços. A empresa fundada por ele, a
Microsoft (MS), fabrica o Windows, sistema operacional usado em mais de
90% dos PCs do mundo; e supõe-se que sua suíte operacional, o MS Office,
seja utilizada em cerca de 80% das organizações de todo o globo. Grande parte
do que aceitamos como líquido e certo no mundo da computação – de padrões
de documentos a jargões do setor – teve sua gênese na Microsoft.
Tudo isso fez de Gates o homem mais rico do mundo por um tempo incri-
velmente longo – ele manteve esse título de 1993 a 2007. Na verdade, a certa
altura, Gates era tão rico que sua fortuna ultrapassava US$100 bilhões, número
que superava o PIB da maioria dos países do mundo. A razão pela qual ele não
mais tem essa fortuna é porque doou grande parte dela a instituições de cari-
dade. Mesmo assim, embora tenha doado US$20 bilhões (quantia superada
apenas por Warren Buffett), ainda é o segundo homem mais rico do mundo,
superado apenas pelo magnata mexicano das telecomunicações, Carlos Slim
Helú, e por uma margem bem pequena. Sem dúvida, Gates tem o dom dos
líderes mundiais e é constantemente classificado como um dos homens mais
poderosos do mundo. E agora, graças à Bill & Melinda Gates Foundation, é
o filantropo mais importante do mundo.
108 28 mentes que mudaram o mundo

Por mais estranho que pareça, talvez devido exatamente à sua generosi-
dade, nem Gates nem sua empresa têm a afeição do público, disputada por
seus dois rivais, a Apple e o Google. Na verdade, enquanto a comunidade
de tecnologia espera ansiosamente pelos lançamentos da Apple e do Google,
sua relação com a Microsoft é mais de ódio do que de amor. Os geeks pare-
cem fazer grandes esforços para depreciar os produtos da MS e estão sempre
procurando defeitos neles. Na opinião da empresa, o propósito das críticas é
diminuir a concorrência. As práticas monopolistas da MS permitem que ela
ofereça produtos caros, com preços exagerados e tecnologia mediana, mas os
consumidores não têm outra escolha senão comprá-los, pois mais de 90% dos
computadores rodam com software da Microsoft. De acordo com essa linha de
raciocínio, quando uma oportunidade real aparece, a MS esmaga os concor-
rentes. E não se trata apenas dos consumidores. A Microsoft vem sendo alvo
de muitas críticas por parte de governos – em geral porque é vista como uma
empresa anticompetitiva e monopolista.
Embora as pessoas raramente desgostem de Bill Gates como pessoa, não
há dúvida de que a centelha de Steve Jobs (ou de Richard Branson) falta a Bill.
Ele é um homem rico, porém não é carismático. Contudo, a despeito do que
pensem da MS, as pessoas continuam comprando seus produtos e a empresa
representa uma grande força (mesmo que não muito amada) no mundo da
tecnologia e dos negócios.
Gates nasceu em 1955 em Seattle, Washington. Sua família era rica e ele
teve uma infância confortável. O pai era um advogado bem-sucedido, enquan-
to a mãe ocupava um cargo influente em uma organização sem fins lucrativos,
a United Way. Dizia-se que provavelmente William H. Gates III seguiria
os passos do pai. Gates mostrou sinais de sua inteligência precocemente e os
pais o matricularam em um colégio caro, o Lakeside School. Lá conheceu
Paul Allen, dois anos mais velho que ele, e os dois ficaram fascinados com o
teletipo da escola que, na verdade, não passava de um computador bastante ru-
dimentar. Aos 17 anos, Gates já vendera seu primeiro software (um programa
mostrando uma tabela de horários para sua escola) e recebeu US$4.200 pelo
trabalho.
Uma precoce proeza acadêmica foi uma prova das coisas que o futuro reser-
vava. No SAT – teste de conhecimento exigido para entrar em curso superior
nos Estados Unidos, cuja nota máxima era 1.600 – Gates alcançou 1.590 e foi
estudar na Universidade de Harvard. Lá fez amizade com Steve Ballmer, um
Bill Gates 109

colega que anos mais tarde iria sucedê-lo como CEO da Microsoft. No final
de 1974, Allen, que deixara a universidade e trabalhava como programador da
Honeywell em Boston, leu um artigo na revista Popular Electronics sobre um
microcomputador denominado Altair, um dos primeiros do mundo. Vendi-
do por US$350, estava ao alcance das pessoas comuns. A MITS, fabricante
desse computador, sediada no Novo México, estava convidando os leitores da
Popular Electronics para desenvolverem uma linguagem de programação para
ela. Gates e Allen contataram a MITS e disseram que tinham desenvolvido
uma versão do Basic (a primeira linguagem de programação fácil de usar). Na
verdade, eles não tinham desenvolvido essa linguagem, mas como a empresa
demonstrou interesse a dupla superou todas as dificuldades e fez sua afirmativa
se tornar verdadeira. Quando apresentaram o software para a MITS no Novo
México, a empresa ficou tão satisfeita que fez de Allen seu vice-presidente.
Nessa época, Gates afastou-se temporariamente da universidade, jun­tou-
-se a Allen no Novo México e a dupla passou a chamar seu empreendimento
conjunto de Micro-Soft. Gates retornou a Harvard pouco tempo depois, mas
acabou deixando a universidade definitivamente no final de 1976. Nesse ano,
eles registraram a marca Microsoft, tornaram-se independentes da MITS e
começaram a contratar mão de obra. No fim de 1978, a receita da empre-
sa ultrapassava US$1 milhão. No início de 1979, transferiram a matriz para
Washington, que ficava perto da terra natal dos sócios. Em 1980, Steve Ball-
mer passou a ocupar o cargo de gerente administrativo.
Em 1980, a IBM pediu a Gates para fornecer um intérprete do Basic para o
computador que pretendiam lançar, o PC da IBM, que é o avô de praticamen-
te todos os computadores comuns da atualidade. A IBM precisava também de
um sistema operacional e, depois que as discussões com outra empresa abor-
taram, a Microsoft concordou em fornecer o que a IBM queria. Para tanto, a
MS licenciou um sistema operacional denominado 86-DOS, escrito por Tim
Paterson da Seattle Computer Products. Para ser usado nos equipamentos da
IBM, o sistema foi rebatizado como PC-DOS. Mais tarde, a Microsoft viria a
adquiri-lo por inteiro. Foi a essa altura que a MS deu uma guinada inteligente
e superou completamente a IBM. Na verdade, a negociação da MS causou
impacto desastroso na IBM como um todo e resultou em uma das grandes
mudanças de poder no setor, que passou das mãos dos fabricantes de hardware
para os desenvolvedores de software. Há quem diga que essa foi apenas mais
uma das grandes mudanças do setor.
110 28 mentes que mudaram o mundo

Como acreditava que muito provavelmente outras empresas clonariam o


hardware da IBM, a MS reteve os direitos de licenciar o sistema operacional
para outros fabricantes além da IBM. Vale observar que, enquanto a MS foi
muito esperta na negociação, a IBM dormiu no ponto. O resultado (quando
o clone previsto realmente apareceu) foi que a Microsoft tinha um mercado
amplo e pré-estruturado para seu sistema operacional, enquanto a IBM ficou
limitada à fabricação de hardware, que estava rapidamente se tornando uma
commodity com margens baixas.
Em 1981, a estrutura da empresa era a seguinte: Gates detinha 53% do
capital acionário, Allen, 31% e Ballmer, 8%; o total das receitas da empre-
sa montava a US$16 milhões e ela empregava 128 funcionários. Dois anos
mais tarde, em 1983, esses números haviam triplicado, mas a empresa rece-
beria também um golpe com o diagnóstico de que Allen sofria da doença de
Hodgkin. O tratamento foi bem-sucedido, mas ele deixou a Microsoft e, tem-
pos depois, iniciou uma carreira completamente separada da MS, a despeito
da grande fortuna que acumulara.
Se o DOS dera à MS grande poder e vastos recursos, o software que a
tornaria célebre estava a um passo de ser lançado. Em 1985, a MS lançou uma
interface gráfica para o MS-DOS, ou seja, o Windows 1.0. No ano seguinte, a
empresa abriu seu capital. Suas ações, que antes valiam US$21, subiram US$7
no primeiro dia de negociação. Desde então, mesmo depois de as ações da
empresa na bolsa de valores passarem por split* nove vezes, em 2010 os US$21
iniciais passaram a valer mais de US$7 mil. Em 1987, surgiu o Windows (se-
guido pelo Windows 3 e Windows 4), e o Office foi lançado em 1989. Nesse
meio-tempo, em outro prenúncio das coisas que viriam, a Apple processou a
MS, alegando que o Windows infringia sua interface gráfica de usuário (GUI);
a Apple perdeu após cinco anos de luta.
A década de 1990 testemunhou o auge do poder da MS. Seu êxito conti­
nuava a aumentar, e o vasto crescimento na área da informática, tanto em ter-
mos de computadores pessoais como de sistemas empresariais, aumentou ain-
da mais suas receitas e lucros. Em 1992, a revista Forbes apontou Gates como
o homem mais rico dos Estados Unidos e, no ano seguinte, a MS ultrapassou

* Nota da Tradutora: Split, no mercado financeiro, aplica-se quando as ações de determinada


empresa alcançam valores muito altos. Nesse caso, o valor cai pela metade, mas a quantidade de
ações dobra. Isso é feito para dar mais liquidez às ações. Fonte: site WinAjuda em http://www.
winajuda.com/curiosidades/algumas-curiosidades-da-microsoft.html
Bill Gates 111

a IBM em termos de capitalização de mercado, marcando o fim de uma era.


Em 1994, Gates casou-se com sua namorada de longa data, Melinda French,
e tiveram três filhos. O ano de 1995 marcou a grande sensação – o lançamento
do Windows 95, o primeiro Windows reconhecidamente moderno. O êxito
foi retumbante e, a julgar por qualquer padrão, um dos produtos mais excep-
cionais já lançados até hoje.
No entanto, embora a MS estivesse no ápice, as forças que mais tarde vi-
riam a trazer inúmeros problemas para a empresa tinham começado a agir já
no início da década de 1990. A gigante do setor atraiu a atenção do Depar-
tamento de Justiça dos Estados Unidos, que argumentava que a MS estava
violando as leis antitruste. Talvez mais importante ainda, uma coisa chamada
internet estava provocando grande agitação nos círculos relativos à tecnologia
e aos negócios. Bill Gates não estava muito interessado – pelo menos não no
começo. Então, em 1994, a empresa Netscape lançou seu famoso navegador
Mosaic, e a rede passou a ser encarada como um recurso com chances de cair
no gosto popular e do qual as empresas poderiam fazer uso. Em antecipação às
coisas que estavam por vir, a Netscape fornecia o software gratuitamente. Pela
primeira vez parecia remotamente possível que a história talvez se repetisse e
que alguém poderia fazer à MS o que ela fizera à IBM.
Rapidamente Gates mudou de posição. Em 1995, em um famoso memo-
rando, ele anunciou que a era internet seria, de fato, da máxima importância.
Mais tarde, ainda no mesmo ano, anunciou o navegador da MS, o Internet
Explorer, que finalmente apareceu em agosto de 1996. Vale a pena lembrar
que, nessa época, a Amazon já estava operando há um ano. Isso talvez tenha
marcado o ponto em que a Microsoft deixou de ser a única voz que realmente
contava no setor de informática. Pela primeira vez em anos, a pauta estava
sendo estabelecida por outros players.
A reação da empresa pouco fez para melhorar a percepção do público. Mais
tarde, a Netscape argumentou que a Microsoft usara sua posição monopolista
para intimidar e convencer os usuários do Windows a abandonarem seu nave-
gador em favor do Explorer (o que, por fim, levou o Netscape Internet Service
a perder grande parte de sua fatia do mercado e a ser vendido). Em 1996, a
Netscape solicitou ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos que in-
vestigasse a MS em relação a práticas anticompetitivas. Dois anos mais tarde,
o Departamento de Justiça e 20 promotores públicos estaduais processaram a
MS. Em 1998, Gates forneceu ao Departamento de Justiça um depoimento
112 28 mentes que mudaram o mundo

gravado em vídeo, que foi considerado evasivo, bastante desonesto e de pouca


ajuda. A Microsoft perdeu, e o juiz ordenou a divisão da empresa. Na verdade,
a solução foi muito menos draconiana do que se esperava, e muitos a conside-
raram um mero puxão de orelha. Contudo, o revés não causou grande prejuízo
à imagem da Microsoft ou de Gates. A primeira foi caracterizada como mo-
nopolista abusiva, e o último, um controlador obsessivo.
Mas o ano 2000 testemunhou o início do capítulo seguinte da vida de
Gates, quando ele começou a abdicar do controle de seu império: Ballmer
tornou-se CEO, com a responsabilidade de administrar as operações diárias
da empresa, e Gates tornou-se presidente executivo. Em 2001, a empresa lan-
çou o Windows XP que, depois de alguns problemas iniciais, passou a ser
amplamente elogiado. Na verdade, encontra-se disponível até hoje e até muito
recentemente era visto como o melhor sistema operacional para laptops me-
nores e menos poderosos.
De modo geral, a década de 2000 não foi generosa com a Microsoft. Con-
tudo, à medida que criador e criatura se distanciavam, as coisas ficavam mais
fáceis para Bill Gates. Para a rival da Microsoft, a Apple, para quem a década
de 1990 fora péssima, a década de 2000 estava sendo muito melhor e, com
Steve Jobs novamente no comando, as coisas voltavam a entrar nos eixos. Em
2001, a Apple lançou o iPod e, em 2007, o radical iPhone. Ambos foram di-
visores de águas, além de arautos do mundo digital do futuro. A MS, por sua
vez, tinha seus smarthphones, dos quais quase ninguém gostava, e seu Zune,
pelo qual poucos se interessavam.
Nesse meio-tempo, no final dos anos 1990, surgiu o Google que, embora
inicialmente não parecesse representar uma ameaça, logo passaria a ser. Ao
longo da década anterior, às vezes parecia que a missão do Google era fazer os
esforços da Microsoft na arena on-line parecerem ruins. Se analisarmos o todo,
do Hotmail e Gmail ao Virtual Earth da Microsoft (atualmente conhecido
como Mapas Bing) e o Google Earth, chegaremos à conclusão de que, quan-
do se trata de serviços on-line, o Google está na dianteira. Embora injusta, a
inferência parece verdadeira, seja o Google o primeiro a lançar uma novidade
(como o Google Earth) ou o segundo (como o Gmail). Assim como no início
da década de 1990, quando o poder passou dos fabricantes de equipamentos
para os desenvolvedores de software, agora parece que toda a empolgação se
volta para os produtos on-line e gadgets de última geração – nenhum dos quais
pertencente à área de expertise da MS.
Bill Gates 113

E a situação fica ainda pior. Muitos acreditam que em termos de acesso


à internet o crescimento reside nos telefones, sendo os mais promissores o
iPhone e os que rodam no Android – sistema operacional gratuito, de código
aberto, baseado no Linux, desenvolvido pelo arquirrival Google. Pior ainda,
esses sistemas operacionais talvez estejam extrapolando pouco a pouco a are-
na da telefonia. Computadores do tipo iPad estão se tornando extremamente
populares – e não se assemelham às máquinas que executam o Windows. Na
verdade, são fabricados pela Apple ou usam o Android. A preocupação da MS
é que eles representem o início de sua decadência. Outra grande preocupação é
que a funcionalidade de muitos aplicativos (como os do Office) está migrando
para ambientes on-line, seara dominada pelo Google. Às vezes, parece que a
MS está acuada por todos os lados.
A empresa também teve outros problemas. Seu primeiro grande sistema
operacional do século XXI, o Windows Vista, lançado em 2007, foi muito
criticado e jamais teve o mesmo sucesso que o XP. Em 2008, o governo ame-
ricano decidiu que a MS deveria pagar uma multa de 899 milhões de euros
por ter violado as leis antitruste. Além disso, a empresa perdeu a concorrência
do Yahoo depois que as duas empresas não chegaram a um acordo sobre o
preço. Pior ainda, recentemente, a arquirrival Apple suplantou a Microsoft
em termos de porte.
A despeito de todos esses percalços e ironias do destino, as profecias sobre
a queda da MS são bastante exageradas. Uma das razões é que é muito impro-
vável que as pessoas parem de comprar computadores baseados no Windows,
pelo menos por enquanto. Além disso, o novo sistema operacional da MS, o
Windows 7, tem boa reputação e elimina muitas falhas do Vista. Vale lem-
brar também que é sempre tentador atacar um grande líder de qualquer setor.
Talvez a MS realmente precise se preocupar quando as pessoas deixarem de
reclamar dela. A empresa continua a ser um gigante, e talvez deva apenas ser
um pouco mais ágil.
É provável que a maior surpresa dos críticos de Gates tenha sido o que ele
passou a fazer com a fortuna acumulada. No fim da década de 1990, começou
a fazer doações multibilionárias à Fundação Bill & Melinda Gates, instituição
filantrópica estabelecida por ele e a mulher, dedicada à saúde e à educação. Em
2006, Gates anunciou que começava a se afastar da MS para se concentrar na
filantropia, o que começou a ocorrer em meados de 2008. Ele continua como
presidente da Microsoft, e sua fortuna ainda é considerável, mas hoje Gates é
114 28 mentes que mudaram o mundo

mais um filantropo que um empresário. E tem se mostrado tão competente na


nova atividade que, em 2006, seu amigo Warren Buffett anunciou que preten-
dia fazer uma doação de cerca de US$40 bilhões e que grande parte iria para a
Fundação Bill & Melinda Gates.

Referências e leituras adicionais

Bank, David (1999) Breaking windows, Wall Street Journal, 2 de janeiro


Site da Fundação Bill & Melinda Gates, www.gatesfoundation.org
Bolger, Joe (2006) I wish I wasn’t the richest man in the world, says Bill Gates, Times,
5 de maio
Gates, Bill (1995) A estrada do futuro, São Paulo: Companhia das Letras, 1995
Gates, Bill (1999) A empresa na velocidade do pensamento, São Paulo: Companhia das
Letras, 1999
Gross, Daniel (1996) 7 Greatest Business Stories of All Time, pp 334–51
Heilemann, John (2000) The truth, the whole truth, and nothing but the truth, Wi-
red, 46
Site da Microsoft, www.microsoft.com
Smoking Gun, Mug shots
Wasserman, Elizabeth (1998) Gates deposition makes judge laugh in court, CNN.
com, 17 de novembro
Capítulo 16
David Ogilvy

P ara aqueles que estiverem interessados, a primeira coisa que David Ogilvy
escreveu como profissional ainda está disponível na Web. Começa com o
recôndito título Theory and practice of selling the Aga cooker, escrito em 1935,
quando ele tinha cerca de 25 anos e trabalhava como vendedor em uma tradi-
cional empresa do Reino Unido que atuava no ramo de fogões. Naturalmente,
como o artigo foi escrito há muitos anos, está repleto de ridículos erros machistas
que são, ao mesmo tempo, divertidos. Ainda assim é uma leitura persuasiva e
convincente, mesmo 75 anos depois que o artigo foi publicado, e inclui linhas
memoráveis. Eis um exemplo: “O bom vendedor alia a tenacidade de um buldo-
gue à delicadeza de um spaniel.” Certa vez a revista Fortune publicou a seguinte
frase sobre o trabalho: “O melhor manual de vendas já escrito.”
Grande parte dos anúncios modernos baseia-se nos ensinamentos de Da-
vid Ogilvy e em seus conceitos. Muitos logotipos, slogans e símbolos de mar-
cas devem sua existência a Ogilvy e à agência por ele fundada. Entretanto,
estava longe de ser um publicitário típico. Em um setor famoso por sua rudeza
e cinismo, ele demonstrava um comportamento completamente oposto. Na
verdade, sua maior percepção foi entender que os consumidores podiam ser
inteligentes e não deviam ser tratados como um bando de idiotas. Ele desde-
nhava a ideia de que a publicidade era uma espécie de arte criativa, e era franco
a respeito de seu trabalho como vendedor. (Dizia: “Se o produto não vende é
porque carece de criatividade” e “Não considero a propaganda um entreteni-
mento ou uma forma de arte, mas um meio de informação”.) No entanto, seus
anúncios diziam respeito a ideias, e ele criou um número incontável deles (mas
116 28 mentes que mudaram o mundo

nunca se entendeu muito bem com a televisão). Ogilvy era instruído, tinha
vasta cultura, era vivaz e sagaz. Na verdade, raramente abria a boca sem que
dela saísse alguma piada.
Uma de suas mais famosas citações (e ele era bastante afeito a elas) era: “O
consumidor não é um retardado mental, é sua esposa.” Outros grandes ditados
seus: “Jamais publique um anúncio que você não gostaria que fosse visto por
sua família” e “Diga a verdade, mas torne-a fascinante”. Era também famoso
por usar os produtos que anunciava, fossem eles Rolls Royces ou camisas. Des-
crevia esse comportamento como “boas maneiras elementares”. Até mesmo
abria mão de contas quando sentia que deixara de acreditar no produto.
David Ogilvy nasceu em West Horsley, não muito distante de Londres,
em 1911. O pai era corretor de ações cujos negócios tinham sido seriamente
afetados pela retração econômica da década de 1920. Em consequência disso,
a criação de Ogilvy talvez possa ser mais bem caracterizada por uma pobreza
relativa. Ele frequentou a St. Cyprian’s School, Eastbourne, e gozava de um
desconto nas mensalidades antes de ganhar uma bolsa de estudos da Faculda-
de de Fettes, Edimburgo (a mesma escola frequentada por Tony Blair), aos 13
anos. Mais tarde, em 1929, ganhou uma bolsa de estudos para a Universidade
de Oxford, onde foi estudar história na Christ Church University. Contudo,
a vida de estudante não lhe agradava. Ele descreveu a si mesmo como “fracas-
sado” e depois de certo tempo foi convidado a deixar a faculdade por ser pre-
guiçoso. Mais tarde ele descreveu esse episódio como “o verdadeiro fracasso da
minha vida”. Em 1931, mudou-se para Paris, onde conseguiu um emprego no
Hotel Majestic, que durou um ano. Dizia que o emprego lhe ensinara discipli-
na e administração, e também o momento certo para mudar de emprego. “Se
eu tivesse continuado naquele emprego teria enfrentado anos de um salário
aviltante, pressão perversa e perpétua exaustão.”
Assim, Ogilvy voltou para a Inglaterra, onde começou a vender o fogão
Aga de porta em porta. Era, segundo consta, excelente vendedor. Essa quali-
dade foi observada pelo centro de operações da Aga e, em 1935, a direção da
empresa lhe pediu que escrevesse um manual de instruções para os outros ven-
dedores. O irmão de Ogilvy, que trabalhava no setor de publicidade da Mather
& Crowther, leu o manual e ficou impressionado. Essa foi a primeira grande
sacada de Ogilvy. Seu irmão mostrou o manual aos colegas, e o resultado foi
que Ogilvy recebeu uma proposta para ocupar o cargo de Executivo de Contas.
Ogilvy mostrou um vislumbre de sua genialidade quando lhe pagaram apenas
David Ogilvy 117

US$500 para escrever uma propaganda de um hotel a ser inaugurado. Mesmo


nos anos 1930, essa era uma quantia irrisória. Ele a gastou em cartões postais,
que foram enviados a todas as pessoas que constassem da lista telefônica da
área – o hotel foi inaugurado com lotação plena. Depois que seu método se
mostrou eficaz, declarou: “Senti um gosto amargo.” Isso lhe deu uma crença
no marketing direto que carregou pela vida toda e que sempre foi considerado
um recurso publicitário pobre e, até certo ponto, desonesto.
Dois anos mais tarde, conseguiu convencer a agência a mandá-lo aos Esta-
dos Unidos por um ano. Ele fez enorme sucesso entre os americanos (naquela
época, um sotaque britânico abria portas) e ficou fascinado pelo país. No fim
daquele ano, ele deixou a Mather & Crowther e ingressou no Instituto Na-
cional de Pesquisa George Gallup. Ali sua tarefa era medir a popularidade de
astros de Hollywood e de histórias para o estúdio. Esse trabalho lhe propor-
cionou a oportunidade de viajar por todo o país e de aprender muito sobre ele,
e lhe ensinou também como era importante compreender o que as pessoas
comuns pensavam.
Durante a Segunda Guerra Mundial, trabalhou no Serviço de Inteligência
da embaixada britânica em Washington. Embora essa função envolvesse trei-
namento na função de espião, o que ele acabou fazendo era mais monótono
– elaboração e análise de relatórios. Durante essa época, ele tentou aplicar seus
conhecimentos sobre comportamento a assuntos militares e diplomáticos. Seus
relatórios foram bem recebidos. Depois da guerra, Ogilvy realizou outra mudan-
ça de direção. Comprou uma fazenda no Condado de Lancaster, Pensilvânia,
famosa por sua população amish. Lá ele trabalhou no cultivo do tabaco por vários
anos, embora tenha finalmente reconhecido que jamais teria êxito como agricul-
tor, por mais que gostasse da região e de alguns aspectos do estilo de vida.
Em 1948, sentiu que estava pronto para fundar sua própria agência.
Deu-lhe o nome de Hewitt, Ogilvy, Benson & Mather, inspirado na Mather
& Crowther de Londres. Naquela época, ele tinha US$6 mil no banco e estava
com 38 anos. A despeito de seu tempo como redator de anúncios e do perío-
do em que trabalhou no Gallup, seu currículo era bem reduzido. Mais tarde,
ele observaria que naquela ocasião nunca tinha escrito sequer um anúncio na
vida. Na verdade, em uma idade em que a maioria das pessoas já subiu vários
degraus da carreira profissional, Ogilvy tinha uma experiência eclética – porém
reduzida – em diversas áreas (grande parte irrelevante), não tinha diploma
universitário e estava desempregado.
118 28 mentes que mudaram o mundo

Contudo, ele tinha pendor para a propaganda, e os anúncios da nova empresa


logo fizeram sucesso. Todos se lembram de que Ogilvy revelou que a quarta parte
do sabonete Dove era representada por hidratante, e a Dove acabou sendo a maior
marca em seu setor. Ele inventou o homem vestindo uma camisa Hathaway, um
aristocrata que perdera uma vista e tinha de usar tapa-olho. O tapa-olho tornava
o homem de meia-idade vestindo uma camisa Hathaway um homem indefinido,
misterioso e intrigante. A legenda de Ogilvy na parte inferior naturalmente ajuda-
va, pois ele tinha um jeito especial e bastante peculiar de lidar com as palavras. A
famosa legenda começava com as seguintes palavras: “Os discípulos da melancolia
de Thorstein Veblen teriam desprezado essa camisa.” Veblen era sociólogo e autor
da obra A teoria da classe ociosa. Talvez nem mesmo 1% das pessoas que viam o
anúncio já tivesse ouvido falar da obra de Veblen, mas era uma história excelente
e intrigante, e assim nasceu um ícone. As vendas da Hathaway explodiram, e a
empresa passou a figurar entre as marcas mais importantes. Mais tarde, Ogilvy
declarou que o sucesso daquele aristocrata com um olho só surpreendeu até mes-
mo a ele: “Jamais saberei exatamente por que ele acabou fazendo tanto sucesso. O
anúncio colocou a Hathaway no mapa após 116 anos na obscuridade.”
Sem dúvida, ele contribuiu para recolocar Porto Rico na lista de destinos cul-
turais, dizendo: “Pablo Casals está de volta a Porto Rico, sua terra natal.” E o
anúncio funcionou. Os anúncios que a empresa fazia sobre a Schweppes que
mostravam um britânico distinto chegando aos Estados Unidos e oferecendo
uma Schweppervescence foi visto por extraordinários 18 anos. Conforme Ogilvy
disse certa vez, “todo anúncio deve contribuir para o complexo símbolo que é a
imagem da marca”. Ele era dono de um charme especial. No início da década de
1960, a revista Time disse que ele obtivera uma conta para vender os Estados Uni-
dos como destino turístico para vários países do Leste Europeu: “Todo anúncio
que elaboro para o serviço de viagens via Estados Unidos é um pão com manteiga
oferecido por um imigrante agradecido”, disse Ogilvy certa vez com ironia.
Em 1959, a agência ganhou a conta da Rolls Royce. Essa campanha figura
entre as suas favoritas. O anúncio dizia: “A 100km/h, o ruído mais alto nesse
novo Rolls-Royce vem do relógio elétrico.” Foi um retumbante sucesso. Ao
longo de seus primeiros 20 anos, e desde o início, a agência obteve contas que
gozam de grande prestígio, como a Lever Brothers, General Foods, American
Express, Shell e Sears. Na verdade, se Ogilvy tinha alguma falha, talvez fosse
uma tendência à autopromoção. Eis um exemplo: “Duvido que uma agên-
cia de publicidade tenha tido tantos anúncios premiados em um intervalo de
David Ogilvy 119

tempo tão curto”, acrescentando que a agência era “tão competente que conse-
guir clientes era como pescar em um barril”.
Talvez em virtude de sua vaidade, alguns diziam que sua maior criação era
ele mesmo. Contudo, conforme diziam também, sua imodéstia tinha razão
de ser. Era um escritor extremamente perspicaz, e combinava os modos e a
excentricidade britânica à disposição dos americanos para o trabalho e tinha
aversão ao orgulho que sentia de seu empreendimento. Sua aparência física era
marcante – alto e ruivo, vestia-se com estilo e fumava cachimbo. Diante de
tudo isso, seria um ego exagerado uma coisa tão ruim? No início da década de
1960, Ogilvy decidiu escrever um livro. Era um manual dirigido àqueles que
estavam se iniciando no ramo. Com seu dom para inventar títulos sugestivos,
ele deu ao livro o título Confissões de um homem de propaganda. Com sua prosa
ligeira e o nome sugestivo, o livro atingiu um público que ia muito além da
Madison Avenue. A tiragem inicial foi de 5 mil cópias, mas até hoje vendeu
mais de um milhão de cópias e ainda é considerado leitura obrigatória para os
que trabalham no setor. Escreveu dois outros livros.

Citações de David Ogilvy


ƒƒ “Um bom anúncio é aquele que vende o produto sem chamar a atenção para si
próprio.”
ƒƒ “Não golpeie com pouca força. Não fique na média. Tenha a ambição de tornar-se
imortal.”
ƒƒ “Primeiro, construa a reputação de ser um gênio da criação. Segundo, rodeie-se de
parceiros melhores que você. Terceiro, deixe-os e siga o caminho que deseja seguir.”
ƒƒ “Se você nunca teve a sorte de criar uma grande campanha publicitária, logo verá
que outra agência roubou sua ideia. É irritante, mas não deixe que isso o aborreça;
ninguém jamais construiu uma marca imitando um anúncio de outra pessoa.”
ƒƒ “Considero falta de educação uma revista aceitar um anúncio meu e depois atacá-lo
sob o aspecto editorial – é como convidar uma pessoa para jantar e depois cuspir
na sua cara.”
ƒƒ “Muitas pessoas, inclusive eu, tornam-se mais produtivas depois de beberem um
pouquinho. Percebo que depois de beber duas ou três doses de conhaque minha
capacidade de escrever aumenta consideravelmente.”
ƒƒ “Noventa e nove por cento dos anúncios não vendem praticamente nada de nada.”
120 28 mentes que mudaram o mundo

Trinta e três anos após fundar sua agência, ele escreveu o seguinte memo-
rando a outro diretor:

Será que alguma agência contratará este homem? Ele tem 38 anos e está desem-
pregado. Não terminou a faculdade. Já foi cozinheiro, vendedor, diplomata e
agricultor. Não entende nada de marketing e nunca escreveu sequer um anúncio.
Confessa que está interessado na carreira de publicitário (aos 38 anos!) e disposto
a trabalhar ganhando US$5 mil por ano. Duvido que alguma agência americana o
contrate. Contudo, uma agência londrina o contratou. Três anos mais tarde, ele se
tornou o mais famoso redator de anúncios do mundo e na hora apropriada fundou
uma das 10 maiores agências de propaganda do mundo. Moral da história: às vezes
vale a pena uma agência ser imaginativa e não hortodoxa em suas contratações.

Conforme escreveu Stephen Bayley (2009) na revista britânica New States-


man, “a psicologia de Ogilvy era complicada”. Ogilvy lera Shakespeare e era
um excelente escritor, mas queria ser visto apenas como uma versão evoluída
do vendedor ambulante, que foi a primeira encarnação de sua carreira.
A despeito de sua exacerbada autoestima, muitos gostavam dele. Quando
Kenneth Roman escreveu O rei da Madison Avenue (2009), poucos acharam
que o título era inexato ou grandioso.
Em 1973, Ogilvy se aposentou como presidente da Ogilvy & Mather e
mudou-se para Touffou, sua grande propriedade na França. Segundo o site da
Ogilvy & Mather, ele permaneceu em contato com a empresa e “sua corres-
pondência aumentou tanto o volume de correspondências da cidade vizinha,
Bonnes, que a agência foi reclassificada, adquirindo um status mais alto, e o
salário do carteiro foi aumentado”.
Entretanto, sua carreira não terminara. Em 1989, o Grupo Ogilvy foi ad-
quirido pela Martin Sorrell WPP em uma encampação hostil. Ogilvy chamou
Sorrell de nomes pouco elogiosos. Porém, embora existissem muitas pessoas
no setor de propaganda que não gostavam da forma como Sorrell fazia as coi-
sas, dessa vez era Sorrell, não Ogilvy, quem sabia para que lado o vento estava
soprando. Na verdade, se Ogilvy foi um dos grandes fundadores da publicida-
de moderna, foi Sorrell quem, décadas mais tarde, na era da informação, iria
resistir, gritar e espernear. Ogilvy era suficientemente inteligente para perce-
ber que Sorrell era o novo rei, e Sorrell, astuto e supostamente magnânimo,
continuou a usar os serviços de Ogilvy. Eles entraram em acordo, e a WPP se
tornou a maior empresa de comunicações do mundo, com Ogilvy no cargo de
David Ogilvy 121

presidente não executivo, posição que ocupou por três anos. Um ano depois
Ogilvy declarou: “Quando Sorrell tentou encampar nossa empresa, tive von-
tade de matá-lo. Mas era contra a lei. Eu gostaria de tê-lo conhecido 40 anos
atrás. Mas hoje gosto muito dele.” Ogilvy disse que enviara a Sorrell a única
carta de desculpas que escrevera na vida, e diz-se que mais tarde ele a pregou
na parede de seu escritório.
David Ogilvy faleceu no dia 21 de julho de 1999 em sua casa na França.
Morreu antes de sua terceira esposa, Herta Lans, e do filho, David Fairfield
Ogilvy, de seu primeiro casamento. Mas seu nome sobreviveu no nome da
agência por ele fundada e em sua enorme influência sobre a propaganda. Além
disso, graças ao show da televisão Mad Men e a seu foco naquele período de
formação, pode-se dizer que o interesse por Ogilvy renasceu nos dois últimos
anos.

Referências e leituras adicionais

Bayley, Stephen (2009) Ecstatic materialist, New Statesman, 23 de fevereiro


Cornwell, Tim (2009) First of the madmen, Scotsman, 5 de outubro
Entrepreneur (nd) David Ogilvy: master of the soft sell, profile
Gapper, John (2009) Portrait of advertising’s brilliant tyrant, Financial Times, 26 de
janeiro
Gross, Daniel (1996) Forbes Greatest Business Stories of All Time, pp 158–75
Hays, Constance L (1999) David Ogilvy, 88, father of soft sell in advertising dies, 22
de julho
Ogilvy, David (1963) Confessions of an Advertising Man
Ogilvy & Mather, David Ogilvy biography, www.ogilvy.com
Piggott, Stanley (1999) Obituary, Independent, 22 de julho
Roman, Kenneth (2009) The King of Madison Avenue: David Ogilvy and the making of
modern advertising, Palgrave Macmillan, Houndmills
Time (1962) Ogilvy, the literate wizard, 12 de outubro
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 17
Meg Whitman

T alvez seja um pouco surpreendente encontrar o nome de Meg Whitman


neste livro, considerando que quando ela ingressou no eBay já era uma
empresária bem-sucedida, com perspectivas reais e que, ao contrário de muitas
empresas pontocom, o eBay já era lucrativo. Ela não era uma recém-chegada
como Ray Kroc, que mudou o negócio a ponto de parecer que poderia muito
bem ter sido seu inventor. Whitman foi contratada como CEO profissional
depois que esse cargo já havia sido ocupado por outrem. Mas quando come-
çou, em 1998, o eBay contava com 40 funcionários. Quando Whitman deixou
a empresa, 10 anos mais tarde, o eBay era uma enorme organização mundial
com mais de 10 mil funcionários e uma das empresas mais conhecidas do
planeta.
Embora Whitman ainda não estivesse na empresa na época de sua criação
ou não a tenha mudado a ponto de torná-la quase irreconhecível, poucos dis-
cordariam do fato de que a energia e o profissionalismo de Whitman foram os
fatores que tornaram a empresa o que ela é hoje. Sob seu comando, o eBay teve
crescimento mais rápido que o da Dell ou Amazon. Juntamente com o Google
e o Amazon, o eBay é uma das três maiores empresas pontocom sobreviventes.
Como as outras duas citadas, o eBay afetou profundamente grande número de
pessoas. Para alguns, o site de leilões é quase uma diversão e a chance de obter
uma barganha, enquanto para outros é uma forma de ganhar a vida. Para mui-
tas empresas, é mais um ponto de vendas. E como o site em si diz respeito a
membros vendendo para outros membros, não é apenas um negócio, mas uma
vasta comunidade on-line.
124 28 mentes que mudaram o mundo

Segundo muitos relatos, Whitman era uma chefe para quem valia a pena
trabalhar e, segundo contam, além de cumprir suas obrigações, ela fazia o
máximo para ajudar seu pessoal. Também era muito elogiada porque ganhava
um salário relativamente modesto, embora deva ser observado que ela detém
1,9% do capital acionário da empresa, o que a torna uma das poucas mulheres
bilionárias do mundo que venceram pelo próprio esforço.
O eBay foi fundado por um francês com ascendência iraniana, Pierre Omi-
dyar. Aos 6 anos, ele se mudou com os pais para os Estados Unidos e logo
mostrou interesse por computadores. Após estudar ciência da computação,
passou a trabalhar na Claris, uma subsidiária da Apple, antes de se tornar em-
presário na área de tecnologia e, com um sócio, fundar sua própria empresa.
Em 1995, aos 28 anos, ele teve a ideia do eBay e escreveu o código original
durante o feriado prolongado em comemoração ao Dia do Trabalho nos Esta-
dos Unidos. Lançou o site em 1995 com o sugestivo nome de “Auction Web”.
No início, Omidyar pretendia registrar o site com o domínio Echobay.com,
mas o nome já havia sido registrado por uma empresa de mineração local.
Diante disso, optou por eBay.com, sua segunda escolha. O Auction Web era
tão pequeno que representava apenas uma parte do site pessoal de Omidyar,
que hospedava, entre outras coisas, uma página de informações sobre o vírus
Ebola.
É errado pensar que o eBay foi fundado para ajudar a noiva de Omidyar
a trocar porta-balas Pez, mas esse foi um estratagema publicitário concebido
em 1997. O fato é que Omidyar fundou o site porque estava interessado na
ideia de um mercado global. A primeira venda do Auction Web – na verdade,
Omidyar estava apenas testando seu site – foi um apontador a laser quebrado,
vendido por US$14,83. Omidyar ficou tão surpreso que ligou para o compra-
dor para explicar que o objeto não funcionava. Então ele descobriu, estarreci-
do, que encontrara um homem que colecionava apontadores a laser quebrados.
No início, o site não cobrava nenhuma taxa, mas depois passou a cobrar para
contrabalançar seus custos de hospedagem. A estrutura de cobrança era muito
simples: 35 centavos para listar o produto e um pequeno percentual sobre o
preço final alcançado na venda.
Em 1995, Omidyar contratou seu primeiro funcionário para ajudá-lo com
as operações rotineiras do site. Seis meses após o lançamento, o eBay já era
lucrativo, feito notável em um ambiente de negócios no qual muitas vezes a
lucratividade parecia uma miragem imprecisa. No ano seguinte, ele contratou
Meg Whitman 125

Jeff Skoll e deixou seu emprego diurno. Skoll foi o autor do plano de negócios
que resultaria no rápido crescimento inicial da empresa. Em 1996, o site hos-
pedava 200 mil leilões e a receita mensal montava a US$10 mil. Em janeiro
de 1997, o número relativo aos leilões era de dois milhões. No mesmo ano,
o nome Auction Web foi abandonado, a empresa foi rebatizada com o nome
eBay e tiveram início as famosas pontuações com estrelas. No final do ano, o
total das vendas montou a US$95 milhões e o site tinha 341 mil usuários. A
grande oportunidade chegara, e o site precisava de um CEO profissional com
longa experiência.
Antes de Meg Whitman ingressar no eBay, sua história era o exemplo típi-
co da vida de uma profissional bem-sucedida da classe média alta. Ela nasceu
em 1956 no condado de Oyster Bay, Long Island, no estado de Nova York,
e era a mais jovem de três irmãos, tendo crescido em Cold Spring Harbor.
O pai administrava uma instituição de empréstimos e ela cresceu cercada de
conforto – na mesma área em que é ambientada a obra de Scott Fitzgerald, O
grande Gatsby. Os Whitmans se relacionavam com os brâmanes de Boston, os
WASPs (White, Anglo-Saxon and Protestant – Protestantes Anglo-Saxões
Brancos), a elite da cidade. Whitman frequentou as melhoras escolas locais e
era aluna excelente, destacando-se também nos esportes. Em 1973, ingressou
na Universidade de Princeton, onde pretendia estudar Medicina. Como não
era muito boa em química, acabou graduando-se em Economia e depois foi
para a Faculdade de Administração de Harvard. Seu grupo de colegas era for-
mado por jovens ilustres, alguns dos quais ingressaram na PepsiCo, na Staples
e na Bolsa de Valores de Nova York ocupando cargos executivos. Nessa época,
ela conheceu um estudante de Medicina que se tornou seu esposo, três anos
mais tarde.
Após obter o MBA, ela ingressou na Procter & Gamble, na divisão de
estabelecimento de marcas para o consumidor. Esse emprego não durou mui-
to, pois o marido fora convidado para fazer residência em neurocirurgia na
Universidade da Califórnia. Ela conseguiu um emprego na empresa de con-
sultoria Bain & Co, contratada por Mitt Romney, que, embora republicano
e mórmon, mais tarde se tornaria governador de Massachusetts (de 2003 a
2007) e rival do presidente nas eleições de 2008. Ela ficou oito anos na Bain e
depois trabalhou em várias empresas, exercendo diversas funções, entre elas a
de consultora. Tornou-se mãe e ocupou também um cargo sênior na área de
marketing na Disney.
126 28 mentes que mudaram o mundo

Quando o marido foi convidado para ocupar o cargo de neurocirurgião-


chefe do Hospital Geral de Massachusetts, o casal e os dois filhos se mudaram
para lá. Ela se tornou presidente dos calçados Stride Rite, onde conseguiu
encontrar uma solução para a problemática linha Keds. Mais tarde, ocupou o
cargo de presidente da Florists’ Transworld Delivery (FTD), cooperativa de
floristas há muito estabelecida, que queria se expandir e maximizar seu perfil.
Não foi uma mudança acertada, pois a estrutura arcaica e descentralizada da
organização lhe trouxe frustrações. Ficou nesse emprego por pouco mais de
um ano. A seguir, retornou a um território mais familiar – o fabricante de
brinquedos Hasbro, onde dirigia a divisão de artigos pré-escolares. Lá, passou
a respirar novos ares nas conceituadas porém cambaleantes linhas Playskool e
Senhor Cabeça de Batata, que apresentavam desempenho insatisfatório. Isso
ocorreu em 1997, quando as empresas pontocom estavam a caminho.
Nesse meio-tempo, na costa oeste, Pierre Omidyar e Jeff Skoll tinham co-
meçado a procurar candidatos potenciais para a direção do eBay e, conforme
diriam mais tarde, um nome era sempre cogitado. Eles acreditavam que Whit-
man seria a candidata ideal. A questão era como convencê-la a abandonar uma
empresa estabelecida para se arriscar no desconhecido.
No outono de 1997, Whitman recebeu um telefonema de David Beirne,
executivo que trabalhava no setor de recrutamento e que no passado dera apoio
ao eBay, perguntando se ela estaria interessada em um cargo de CEO. Ela não
estava particularmente interessada, pois nunca ouvira falar do Auction Web
ou do eBay. Analisou o site da empresa – que apresentava, essencialmente,
anúncios classificados – e isso não a impressionou muito, tampouco esclareceu
muita coisa. Contudo, após muita persuasão, ela concordou em voar para a
Califórnia para conhecer Omidyar e Skoll, e mudou de ideia ao ver a forma
como uma comunidade estava sendo construída em torno do site. “A ligação
entre a empresa e seus usuários era algo que eu raramente vira”, Whitman
declarou mais tarde à revista Forbes.
Ela decidiu que queria o emprego e, depois de conversar com a família, fez
as malas e partiu em direção à área da baía de San Francisco. Começou como
CIO do eBay em fevereiro de 1998. Logo forjou um relacionamento com o
AOL que ajudou a proteger a empresa contra rivais predadores. Em setembro
daquele ano, abriu o capital da empresa. Omidyar e Skoll ficaram multibilio-
nários, ela ficou bilionária, e dezenas de funcionários da empresa ficaram mi-
lionários. Mas a euforia durou pouco, e 1999 foi outro ano difícil. No dia 10 de
Meg Whitman 127

junho, o site enfrentou uma vergonhosa sobrecarga que o deixou desconectado


por 26 horas. Para empresas on-line, particularmente naquela época, longas
interrupções aumentavam a possibilidade de deserções em massa e mudança
para um concorrente. Mas para sua grande surpresa, o eBay descobriu que sua
comunidade de usuários queria ajudar e que estava extremamente solidária.
No entanto, Whitman decidiu que a tecnologia, que nunca fora o ponto for-
te da empresa, passaria a ser o seu núcleo. Tendo isso em mente, contratou
engenheiros e, apesar de seus parcos conhecimentos de tecnologia, trabalhou
diretamente com eles durante três meses.
Ela estava convicta de que os dirigentes do eBay deviam estar próximos
àqueles que utilizavam o site. Determinou que os executivos leiloassem itens
regularmente para que pudessem compreender as preocupações dos usuários
mais assíduos. E deu o exemplo, leiloando on-line itens de seu resort para
esquiadores.

eBay

Ao longo dos anos, o eBay vem comercializando os mais disparatados produtos, como
um jato de combate Hornet F/A-18 (a chamada “compre-o agora por US$9 milhões”
não emplacou), uma das Ilhas Virgens americanas, uma tuneladora, a placa original de
Hollywood e uma cidade da Califórnia. Embora essas coisas possam parecer brincadeira,
muitas organizações, de governos a empresas, acharam o site uma forma eficaz de se
desfazer de artigos de difícil troca.
O site tem também um lado bastante fútil e é excelente para publicidade no estilo
dos tabloides. Entre os itens que já foram vendidos, podemos citar um único floquinho de
milho, uma couve de Bruxelas e um sanduíche de queijo grelhado comido pela metade
ostentando uma imagem da Virgem Maria. Provando que um alcance global significa um
mercado global de babacas, o sanduíche alcançou US$28 mil. Até mesmo várias jovens
já tentaram leiloar sua virgindade no eBay.
Mas, para alguns, os sites de leilões on-line são um negócio muito sério e o eBay é,
decididamente, essa coisa pós-moderna – uma empresa que hospeda muitas centenas
de negócios. No final de 2010, o site registrava 127 tipos de negócios, com faturamento
acima de um milhão de libras só no Reino Unido.
128 28 mentes que mudaram o mundo

O site explodiu. Em 2000 tinha 22,5 milhões de usuários; em 2001 regis-


trava 42,4 milhões e, em 2004, 135 milhões. Whitman adotou também uma
abordagem bastante estratégica. Primeiro, expandiu e aperfeiçoou o negócio
de leilões; em 2002, o eBay adquiriu o PayPal por US$1,5 bilhão, algo que
a comunidade eBay insistira para que Whitman fizesse. Ela fez a empresa
penetrar em novos mercados tão diversos como a Alemanha e as Filipinas, e,
em 2004, o eBay adquiriu 28,4% do capital acionário do bem-sucedido site
de classificados Craigslist. Em 2004, as ações atingiram o preço recorde de
US$58. Mas, então, as coisas começaram a piorar. Em janeiro do ano seguin-
te, a empresa registrou um crescimento menor que o esperado, o que talvez te-
nha sido desapontador porque a receita do eBay vinha registrando crescimento
de 50% ano após ano.
Mas as coisas ficaram ainda piores. No fim de 2005, o eBay pagou
US$2,6 bilhões ao Skype, o serviço telefônico disponível gratuitamente através
da Web. Essa negociação não foi bem recebida por Wall Street. Ao contrário
do PayPal, que era visto como uma combinação natural e um óbvio gerador de
receitas, o Skype era considerado algo que não tinha nada a ver com o negócio
principal do eBay. Pior ainda, não havia um caminho claro para que o Skype
passasse a ser lucrativo. Por fim, em 2009, o eBay negociou grande parte de
seu capital acionário com o Skype (mantendo 35%) por cerca de US$2 bilhões,
o que não foi um bom negócio.
Nesse meio-tempo, Whitman estava desenvolvendo outros negócios. Tor-
nou-se politicamente ativa em 2006 através de Mitt Romney, de quem con-
tinuara amiga após sair da Bain, e se envolveu na campanha de Mitt quando
ele disputou a vaga de candidato do Partido Republicano. Quando Romney
desistiu de sua candidatura à corrida presidencial e passou a apoiar McCain,
Whitman tornou-se copresidente da campanha de McCain. Seu nome foi co-
gitado para o cargo de secretária do Tesouro. Em 2008, ela renunciou ao cargo
de CEO do eBay, passando o cetro para John Donahoe, que ocupava o cargo
de presidente da Divisão de Mercados do eBay e que ela havia recrutado na
Bain. Quase imediatamente, surgiram rumores de que ela se candidataria ao
cargo de governadora da Califórnia.
De certa forma surpreendente para uma pessoa que trabalhara em uma
empresa pontocom, Whitman disputou as eleições como candidata do Partido
Republicano (grande parte do Vale do Silício é decididamente a favor dos
democratas, assim como outra fonte de poder na Califórnia, Hollywood). Ela
Meg Whitman 129

venceu a indicação no verão americano de 2010 e foi alvo de críticas devido


ao volume de dinheiro que gastou na campanha. Em tempos de Tea Party
(movimento social e político populista), vale lembrar que os republicanos da
Califórnia, como o Governador Schwarzenegger, estão, em grande parte, no
lado socialmente liberal do partido. Ela recebeu críticas tanto da direita como
da esquerda, e não venceu a disputa. Mesmo se tivesse vencido, poderia ficar
em dúvida se teria sido realmente uma vitória. A situação financeira do Estado
do Ouro é tão terrível que, nos últimos anos, a Califórnia vem lutando para
pagar os funcionários e precisou emitir IOUs (títulos de crédito) para os cre-
dores. Um estranho (e nocivo) dispositivo da legislação torna difícil aumentar
determinados impostos, enquanto os poderosos sindicatos argumentam que é
provável que cortes causem angústia, desagradando muitas pessoas. O exercí-
cio governamental do estado é amplamente considerado um cálice cheio de ve-
neno. Se Whitman vencesse a eleição, talvez olhasse para trás e concluísse que
construir um dos negócios mais bem-sucedidos do mundo, com uma enorme
comunidade de usuários, não representou a menor dificuldade para ela.

Referências e leituras adicionais

Brown, Erika (2007) What would Meg do? eBay’s Meg Whitman does things the
right way, Forbes Asia, 21 de maio
Dillon, Patrick (2004) Peerless leader: perceptive, adaptable, and remarkably low-key,
eBay chief executive Meg Whitman rides e-tail’s hottest segment – the global
garage sale called peer-to-peer, Christian Science Monitor, 10 de março
Holson, Laura M (1999) eBay’s Meg Whitman explores management, Web Style, 19
de maio
Sunday Times (2010) Profile: Meg Whitman, 13 de junho
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 18
Mark Zuckerberg

O Facebook é a maior das empresas Web 2.0 e se tornou uma espécie de


epítome do fenômeno denominado redes sociais. Lançado em 2004, em
meados de 2010 o Facebook tinha meio bilhão de membros. Políticos, empre-
sários, comerciantes e anunciantes são verdadeiros escravos de sua capacidade
de alcançar as pessoas, às vezes a ponto de perderem o bom-senso. Diz-se que
o Facebook teve significava influência – talvez até mesmo decisiva – sobre as
eleições americanas de 2008.
Havia outras redes sociais antes do Facebook, algumas bastante antigas, mas
apenas uma delas, o Myspace, chegou perto do Facebook em termos de sucesso.
Há muito o Facebook deixou seu antigo rival (hoje de propriedade de Rupert
Murdoch) para trás, cuspindo poeira e indignação. Abismados, os investidores
dizem que a empresa vale US$40 bilhões ou mais e especula-se que a oferta pú-
blica inicial (IPO – Initial Public Offering) tenha sido maior que a do Google.
Seu fundador, Mark Zuckerberg, é alvo de intermináveis fofocas e não poucos
processos. É muitas vezes comparado a Bill Gates e à dupla do Google.
Naturalmente, a história de Zuckerberg é bastante curta. Ele nasceu em
White Plains, Nova York, em 1984, o segundo de quatro filhos. Frequentou a
escola local de Dobbs Ferry, e mais tarde estudou na prestigiosa Phillips Aca-
demy, que tem suas raízes na revolução americana e cujos ex-alunos formam
uma longa lista de grandes e destacados cidadãos americanos. Nessa escola,
distinguiu-se em matemática, inglês e literatura clássica. Era capitão da equipe
de esgrima do colégio. Tinha também interesse por computadores e criou um
leitor de música que chamou a atenção da Microsoft e do AOL.
132 28 mentes que mudaram o mundo

Mais tarde, Zuckerberg foi estudar em Harvard. Seu interesse pela área
de programação aumentou, estendendo-se para a área de software para redes
sociais. Em 2003, criou o Facemash, movido por seu lado um tanto perverso
– que hoje parece ter sido amenizado por uma garota. O Facemash era basi-
camente uma versão doméstica do site Hot or Not (onde os usuários classi-
ficavam as fotos das pessoas com base em sua atração física). Para conseguir
essas fotos, Zuckerberg invadia a rede de Harvard e extraía fotos da carteira
de identidade dos alunos. O site era popular – tão popular que prejudicava os
servidores da universidade. Contudo, ao saberem do fato, as autoridades de
Harvard não acharam a menor graça. Fecharam o site, e Zuckerberg foi amea­
çado de expulsão, da qual acabou se livrando.
Zuckerberg continuou burilando diferentes ideias em torno do tema e, no
início de 2004, o resultado de suas elucubrações foi o Facebook. Em apenas
duas semanas, metade dos alunos de Harvard havia se inscrito. No início, o
site era destinado apenas aos alunos de Harvard, mas em poucos meses passou
a aceitar estudantes de Stanford, Columbia e Yale. Pouco tempo depois, foi
aberto a toda a Ivy League (grupo de faculdades e universidades americanas de
altíssimo nível acadêmico) e a universidades de todo o continente americano.
Em 2005, a empresa comprou o nome de domínio Facebook por US$200 mil
e descartou o “The”. Várias escolas e algumas empresas se inscreveram e, em
2006, o site foi aberto para qualquer pessoa que tivesse mais de 13 anos. O trá-
fego explodiu. Em 2008, o site registrou a marca de 100 milhões de membros.
Em 2009, esse número saltou para 200 milhões, passando para 300 milhões no
mesmo ano. Em meados de 2010 havia ultrapassado meio bilhão.
Em setembro de 2009, a empresa declarou que saíra do vermelho. Grande
parte de sua receita provém de anúncios, incluindo uma negociação exclusiva
com a Microsoft, que detém 1,3% das ações da empresa (Zuckerberg detém
24%); uma fatia menor vem da receita de lembranças vendidas pelo Facebook
(recurso que permite que os membros troquem lembranças virtuais). A empre-
sa esperava fazer sua IPO em 2011, embora um recente relatório da Bloom-
berg afirme que 2012 é a data mais provável.
No entanto, mesmo sem a IPO, o site e seu fundador e CEO estão sem-
pre nas manchetes. O Facebook tem sido alvo de crescente tiroteio por parte
daqueles que se preocupam com a privacidade e com a liberdade do cida-
dão, bem como com a vasta quantidade de informações sobre seus membros
que o Facebook captura. Essas queixas se intensificaram em 2006, quando
Mark Zuckerberg 133

a empresa introduziu o Feed de Notícias, que mantém os membros a par


de todas as atividades desenvolvidas pelos amigos. Outro motivo de críticas
negativas foi quando, em 2009, o site realizou mudanças no ambiente com
relação à privacidade de seus membros. A resposta de Zuckerberg foi que
a privacidade não mais era a norma. “As pessoas se sentem mais confortá-
veis, não só trocando uma quantidade maior de informações, como também
compartilhando um número maior e mais diversificado de informações mais
livremente e com um número maior de pessoas. Essa norma social é algo
que vem evoluindo ao longo do tempo”, declarou Zuckerberg no início de
2010. A celeuma em torno da privacidade obrigou-o a cancelar suas férias no
Caribe para comemorar seu 26o aniversário. Mas, no final, ele talvez esteja
certo: as mudanças ocorridas em 2006 hoje representam um dos principais
recursos do site. Além disso, não é segredo que muitos consumidores oci-
dentais trocariam, de bom grado, um conjunto de valiosas ideias abstratas
por uma relativa comodidade.
Mas não são apenas questões que dizem respeito à privacidade que afetam
a imagem de Zuckerberg. Há também as demandas judiciais. A ação mais
famosa é o caso do ConnectU, rede social desenvolvida por três ex-colegas de
Zuckerberg, que o acusam, basicamente, de roubar a ideia para o Facebook.
Segundo eles, Zuckerberg fora contratado para escrever o código para o Con-
nectU e logo depois apareceu com a ideia para seu próprio site de rede social.
Após muitas e embaraçosas revelações sobre Zuckerberg, em 2009 o processo
foi finalmente acertado por uma soma que poderia chegar a US$65 milhões,
dependendo do valor das ações do Facebook incluídas no acordo. Os termos
são sigilosos. Mas é improvável que a resolução desse processo específico faça
os problemas de Zuckerberg desaparecerem completamente.
Em 2010, Paul Ceglia, um ex-colega, afirmou que tinha um contrato
comprovando que Zuckerberg lhe devia 84% do Facebook e declarou que o
documento fora assinado em 2003. O Facebook considerou a reivindicação
inconsistente, embora ela tenha algumas nuances do caso anterior e tenha sido
amplamente divulgada.
Além de tudo isso, Zuckerberg tem um problema de imagem. Muitos o
consideram arrogante e desconexo, com delírios de grandeza, embora outros
digam que essa caracterização é injusta. Além disso, é querer muito esperar
que alguém que acumulou uma fortuna avaliada em bilhões antes dos 30 anos
não seja afetado de alguma forma.
134 28 mentes que mudaram o mundo

Zuckerberg terminou o ano de 2010 em uma situação levemente con-


traditória. Em termos positivos, os editores da revista Time consideraram a
transformação provocada pelo Facebook suficiente para que ele fosse eleito a
personalidade do ano, a segunda pessoa mais jovem a receber esse título depois
de Charles Lindbergh. Em termos talvez apenas levemente negativos, o filme
A rede social, biografia não autorizada de Zuckerberg e do Facebook, embora
encerre uma crítica, foi um sucesso comercial.
Seu slogan “Você não conquista 500 milhões de amigos sem fazer alguns
inimigos” fornece uma indicação do conteúdo do filme. Comentário de Zu-
ckerberg sobre o filme: “É interessante, mas é ficção.” De qualquer modo, 500
milhões de amigos é hoje coisa do passado.

Referências e leituras adicionais

Arthur, Charles (2009) Facebook paid up to $65m to founder Mark


Zuckerberg’s ex-classmates, Guardian, 12 de fevereiro
Ashwood, Jon and Heath, Allister (2007) Because he’s worth it, The Business, 29 de
setembro
Burrell, Ian (2010) He’s got the whole world on his site, Independent, 24 de julho
Harvey, Mike (2008) With friends like these, 110 million of them, making a profit
should be easy, shouldn’t it?, Times, 20 de outubro
Johnson, Bobbie (2007) Profile: Mark Zuckerberg, Guardian, 22 de julho
Rivlin, Gary (2006) Wallflower at the web party, New York Times, 15 de outubro
TechCrunch (2010) Interview with TechCrunch (video) on privacy, 8 de janeiro
Capítulo 19
Howard Schultz

S e me pedissem para indicar a pessoa que mais contribuiu para revolucionar


o cenário do varejo de alimentos e bebidas dos últimos 20 anos, eu diria que
poucas poderiam rivalizar com Howard Schultz. Segundo a narrativa da empresa,
era quase unanimidade considerar o café americano péssimo antes de a Starbucks
abrir seus elegantes e estilosos cafés com suas fumegantes canecas de latte. Com
surpreendente rapidez, os cafés se transformaram de lugares nos quais predomi-
nava a fórmica e onde canecas de café java ficavam horas sobre placas quentes em
atraentes pontos de encontro cujas instalações podem abrigar cerca de 20 pessoas
e onde todas as bebidas são preparadas na hora. Embora nem todos concordem,
sem dúvida Schultz e a Starbucks mudaram radicalmente a relação das pessoas
com o café nos Estados Unidos – e em inúmeros outros lugares do mundo.
Naturalmente, a Starbucks não concebeu o café como motivo para reuniões
ou como uma bebida expressa, mas fez mais para popularizar esses aspectos
da bebida do que qualquer outra empresa – e em muitos lugares realmente
melhorou a qualidade daquilo que havia disponível. Ao fazer isso, transformou
ruas em shoppings, e seu característico logotipo verde e azul tornou-se um dos
mais conhecidos do mundo. Schultz talvez não fique muito satisfeito com a
comparação, mas em muitos aspectos ele é o herdeiro de Ray Kroc; a principal
diferença é que seu produto está em sintonia com as populações urbanas dos
anos 1990 e 2000, enquanto Kroc pretendia ter como clientes as populações
urbanas das décadas de 1960 e 1970.
Schultz nasceu em 1952 em um conjunto habitacional do Brooklyn e cres-
ceu pobre. Nos Estados Unidos, os projetos habitacionais populares, que são
136 28 mentes que mudaram o mundo

subsidiados pelo governo, estão entre os lugares mais inóspitos do mundo de-
senvolvido e não podem ser comparados, nem de longe, ao utópico conceito eu-
ropeu sobre habitação social. Quando Schultz tinha 6 anos, o pai, que trabalhava
como motorista de um serviço de reciclagem de fraldas, fraturou a bacia e, como
resultado, perdeu o emprego. Nos Estados Unidos da década de 1950, época
em que os direitos dos trabalhadores eram poucos e a rede de segurança social
quase inexistente, a ocorrência de um acidente desse tipo poderia significar que
a pessoa acidentada não teria condições de sustentar a família. Durante sua in-
fância e adolescência, a pobreza – muitas vezes brutal – teve profundo efeito
sobre Schultz. Certa vez ele disse: “A motivação que tenho é, de certa forma, o
medo do fracasso. Eu não queria continuar a viver daquele jeito. Queria tentar
construir uma empresa que não deixasse as pessoas desamparadas.”
Schultz seguiu um caminho projetado para sair da miséria. Tornou-se atleta
e se sobressaiu nos esportes, particularmente no futebol americano. Era zagueiro
do time da escola e ganhou uma bolsa para a Northern Michigan University.
Estudou comunicações, formando-se em 1975. Depois de formado, trabalhou
três anos na Xerox, no departamento de vendas e marketing. Em 1979, passou
a trabalhar na Hammarplast, empresa sueca fabricante de artigos domésticos,
ocupando o cargo de vice-presidente e gerente-geral. A Starbucks, naquela épo-
ca um varejista que trabalhava com café em grão, era cliente da Hammarplast e,
em 1981, Schultz visitou a Starbucks. Ficou impressionado com o que viu e, um
ano mais tarde, ingressou na empresa como diretor de marketing.
Em 1983, Schultz visitou a Itália, e a viagem o surpreendeu. O país abrigava
um número impressionante de bares que serviam café expresso – algo em torno
de 200 mil pontos – para um país que tinha menos de 60 milhões de habitan-
tes. Ele ficou bem impressionado com os elegantes italianos saboreando café
expresso ou cappuccino e com a forma como esses estabelecimentos funcionavam
– como verdadeiros points por onde as pessoas passavam, encontravam amigos
e batiam papo. Schultz achou que algo parecido poderia funcionar em Seattle.
Ao voltar, conseguiu persuadir os proprietários da Starbucks a abrirem um café
experimental que vendesse bebidas expressas. Eles assim o fizeram e a coisa fun-
cionou, mas Schultz não conseguiu convencê-los a levar a experiência adiante.
Ele acreditava suficientemente em sua ideia para deixar a empresa e encon-
trar um rival, a Il Giornale. Em 1987, os proprietários da Starbucks decidiram
vender a empresa, pois pretendiam se concentrar em outra marca – a Peet’s
Coffee & Tea (a empresa continua operando, embora com pouco menos de
Howard Schultz 137

200 pontos no varejo, ao passo que a Starbucks tem 17 mil). Schultz comprou
a Starbucks e iniciou sua trajetória. No final da década de 1980, a rede tinha 50
cafés na área de Seattle, e Schultz tentava levantar capital junto a investidores
locais para expandir o negócio. Logo percebeu que havia um obstáculo: para
atingir seu objetivo precisaria da força financeira de bancos mercantis.
Em 1991, Dan Levitan, que dirigia o escritório de Los Angeles da Wer-
theim Schroder & Co, foi convencido a fazer uma visita à Starbucks. Saiu de
lá mais sensibilizado do que com qualquer outro sentimento. Disse que a Star-
bucks “era mais um sonho que uma empresa” e, embora achasse a consideração
de Schultz por seu pessoal (opções de ações e assistência médica para todos)
uma atitude louvável, “foi uma espécie de reunião pro forma”.
Schultz, com seu poder de persuasão, conseguiu convencer Levitan que a
Starbucks era mais que um agradável café. Em seu livro Dedique-se de coração:
Starbucks Coofee (1998), Schultz diz: “Perguntei: ‘Você sabe qual é o proble-
ma de sua empresa? [banco de investimento]?’ Dan [Levitan] armou-se para
receber uma séria acusação ao setor de bancos de investimento. ‘Não, qual?’,
perguntou cautelosamente. ‘Não existem pessoas confiáveis’.”
Foi uma jogada ousada, mas valeu a pena. Levitan investiu uma parte de
seu próprio dinheiro na cadeia recém-criada. E o que foi também da máxima
importância, embarcou na ideia de Schultz. Um ano mais tarde, a empresa,
juntamente com a Alex, Brown & Sons, subscreveu a oferta pública inicial
(IPO) da Starbucks. Naquela época, as ações eram oferecidas a US$17 e a or-
ganização tinha 193 lojas. Isso permitiu que Schultz tivesse acesso ao dinheiro
de que precisava para realizar seu sonho: transformar a Starbucks de uma ca-
deia regional em uma rede internacional.
No decorrer da década de 1990, a Starbucks espalhou-se pelo país todo
e iniciou sua expansão pelo resto do mundo. Em 2000, tinha cerca de 3.500
cafés; em 2008, mais de 15 mil em 43 países.
Mas logo a empresa descobriu que, embora seja fácil ser pequena e sim-
pática, quando existe uma Starbucks em cada esquina as pessoas fazem uma
ideia completamente diferente de você. O produtor da série de televisão
Os Simpsons reconheceu isso logo cedo, em sua temporada de 1997/98, quando
a série apresentou um episódio no qual Bart coloca um piercing na orelha. Ao
caminhar pelo shopping, ele passa por várias Starbucks. Quando finalmente
chega à loja In and Out Piercing, o funcionário diz: “Bem, é melhor a gente
fazer logo. Dentro de pouco tempo este lugar será uma Starbucks.” Mais tarde,
138 28 mentes que mudaram o mundo

quando Bart faz uma tatuagem, ele sai do shopping e descobre que todas as
lojas são Starbucks.
Contudo, para fazer justiça a Schultz é preciso dizer que ele não abriu
mão de criar uma empresa que tratasse bem seu pessoal. A despeito de seu
porte gigantesco, a Starbucks continua a oferecer assistência médica a qual-
quer colaborador que trabalhe mais de 20 horas por semana. Seus funcionários
continuam a receber opções de ações, têm plano de pensão e inúmeros outros
benefícios, incluindo meio quilo de café por semana. No todo, é um pacote
bastante razoável, particularmente para o que é, em essência, um emprego
modesto no setor de serviços. Não é de admirar que muitos funcionários da
Starbucks adorem a empresa para a qual trabalham, e às vezes essa adoração
chega a parecer um culto. Em seu livro lançado em 2006, A estratégia Star-
bucks, Joseph Michelli conta a extraordinária história de um gerente regional
que diz: “Canto enquanto limpo os banheiros e faço outros tipos de limpeza.”
Conforme os funcionários dizem, eles se sentem comprometidos.
Schultz abdicou do cargo de CEO em 2000 e passou as rédeas a Orin Smith,
mas permaneceu como presidente. Enquanto Smith era responsável pelas ope-
rações rotineiras da Starbucks, ele decidiu fazer uma tentativa de dar vida nova
a um time profissional de basquete. Comprou o Seattle SuperSonics em 2001,
e a ideia era transformar o time em empresa. Mas a coisa não funcionou dessa
forma. Em 2006, ele vendeu a equipe para um consórcio de investidores, que a
transferiu para Oklahoma. Não é exagero dizer que muitos fãs do SuperSonics
em Seattle passaram a odiar Schultz por ele ter feito isso. Um colunista es-
portivo da ESPN escreveu o seguinte sobre a tentativa frustrada empreendida
por Schultz de transformar o time: “Ele ficou possesso, tornou-se amargo e
insanamente provocador, como uma criança petulante” (Hughes, 2006).
Mas se sua tentativa no campo esportivo não deu certo, pelo menos a Star-
bucks estava indo de vento em popa. De meados ao final de 2006, as ações da
Starbucks foram negociadas pouco abaixo de US$40. Na IPO, o preço das
ações foi de US$17. Sendo assim, houve cinco splits (veja a nota de rodapé
na página 110) de dois para um nas ações, representando um crescimento do
capital em torno de 7.500%. Mas a situação não durou muito. Em outubro
de 2006, a empresa, então com Jim Donald no comando, viu o preço de suas
ações declinar, o que se estenderia por dois anos, chegando a menos de US$8.
Estava claro que alguma coisa precisava ser feita. Em janeiro de 2008, Schultz
assumiu o cargo de CEO, declarando aos analistas: “Assim como fomos nós
Howard Schultz 139

que criamos esse problema, somos nós que vamos resolvê-lo.” Mas mesmo o
retorno de Schultz não foi uma solução imediata: o preço das ações só parou
de cair no final de 2008.
Foi um tempo difícil para as lojas porque, enquanto a sensação de bem-estar
e o luxo do dia a dia estavam em perfeita sintonia com os costumes do início
da década de 2000, eram totalmente incongruentes com as sombrias notícias
econômicas do final da década. Muitos começaram a achar que a marca era,
conforme publicado no jornal Financial Times (2010), “uma perfeita represen-
tação do excesso de superficialidade de uma era ultrapassada”. Mas havia outros
problemas. A indiscutível posição da empresa como um lugar para saborear um
excelente café estava sendo alvo de ataques, tanto por parte dos já mencionados
como dos que vêm a seguir. Sofisticadas cadeias iam em busca dos apreciado-
res do café gourmet que sempre torciam o nariz diante das ofertas da empresa.
Enquanto isso, organizações como o McDonald’s tinham constatado que as
margens relativas à bebida – mesmo um café de primeira linha – eram conside-
ráveis e que poderiam oferecer preços significativamente mais baixos que os da
Starbucks, servir um bom café e ainda assim ganhar dinheiro. O McDonald’s
passou a adotar essa política, e nunca a galhofa de que a Starbucks não passava
de um McDonald’s metido a besta pareceu tão afiada. Schultz, diga-se de pas-
sagem, tinha consciência disso. Em 2007, um de seus memorandos vazou com o
seguinte conteúdo: “Ao longo dos últimos 10 anos, a fim de crescer, desenvolver
e atingir a escala necessária para passar de menos de mil lojas para 13 mil ou
mais, tivemos de tomar uma série de decisões que, em retrospecto, levaram ao
enfraquecimento da experiência da Starbucks e ao que alguns poderiam chamar
de transformação da marca em uma commodity.”
A pergunta era: será que Schultz conseguirá restaurar a magia da expe­
riência da Starbucks do início dos anos 2000? Com certeza ele queria. Algu-
mas frases extraídas dos memorandos que ele escreveu após retomar as rédeas
refletem a sensibilidade corporativa da marca da empresa:

• “Somos e continuaremos a ser uma sólida e notável empresa conhecida


por inspirar e alimentar o espírito humano.”
• “Não existe nenhum outro lugar em que eu preferiria estar do que exa-
tamente aqui com você, exatamente agora!”
• “Temos o controle de nosso destino. Confiem no café e confiem uns
nos outros.”
140 28 mentes que mudaram o mundo

Mais pragmaticamente, muitos achavam que a empresa empreendera uma


expansão exagerada, e o que antes parecera a conquista de um domínio sem
grandes esforços, agora parecia um crescimento excessivo e desordenado.
Aquela famosa cena dos Simpsons de repente parecia terrivelmente premo-
nitória. De novo, os humoristas haviam previsto isso: em 1998, o jornal on-
line Onion publicou uma manchete que dizia: “Uma nova Starbucks é aberta
no toalete de uma Starbucks já existente.” Em muitos casos, a solução foi o
fechamento de algumas lojas que, em grande parte, não apresentavam bom
desempenho, mas em um dos mercados aconteceu um fato notável: em 2008,
a empresa fechou quase três quartos de seus cafés na Austrália. O problema,
conforme muitos diziam, era que a Starbucks não havia compreendido o mer-
cado australiano. Nick Wailes, gerente especialista em estratégia da Univer-
sidade de Sydney, declarou à revista Australian Food News: “A Austrália tem
uma fantástica e rica cultura do café, e empresas como a Starbucks terão de
lutar muito para competir nesse mercado.”
Para fazer justiça a Schultz, as ações da cadeia de lojas de café haviam
readquirido um pouco de sua força, mas é difícil escapar da impressão de que a
Starbucks já havia colhido todos os grãos de café fáceis disponíveis. A empresa
sempre teve detratores, que podem ser divididos em três grupos diferentes: o
primeiro argumenta que a Starbucks faz parte da padronização de importan-
tes ruas locais e que destrói o comércio local. É difícil contestar esse fato. Na
verdade, recentemente a empresa começou a abrir lojas sem marca, apelidadas
“Stealth Starbucks” (“Starbucks disfarçadas”), indicando sua consciência de
que os consumidores talvez não queiram um mundo padronizado. O segundo
grupo argumenta que, a despeito dos excelentes benefícios que oferece, a em-
presa é agressiva com os sindicatos. De fato, nos dois sentidos a Starbucks é
estranhamente contraditória. Consegue ser um símbolo razoavelmente ético
e, ao mesmo tempo, um símbolo ultrajante da globalização. Não gosta dos
sindicatos, mas oferece muitos dos benefícios a favor dos quais os sindicatos
lutam.
Mas é o terceiro tipo de crítica do qual a Starbucks é alvo que talvez seja
o mais problemático. Em 2008, Schultz escreveu no Comunicado no 4 de
sua Pauta de Transformação: “Não existe no mundo uma empresa em nosso
setor que ofereça aos clientes um café de melhor qualidade do que o nosso.
Ponto!” É uma opinião digna de nota, mas o problema é que existem mui-
tas pessoas para quem isso está muito longe de ser verdade. Na realidade,
Howard Schultz 141

a crítica à Starbucks que dói mais que qualquer outra é que seu café não é
tão bom assim e que é caro demais. Schultz pode ter se inspirado na cultu-
ra italiana em termos de café, mas se ele tentasse servir seu café no berço
do expresso as pessoas caçoariam dele. Outros colocam a coisa de forma
mais diplomática, observando que há pouco espaço para a empresa penetrar
no mercado italiano. Pesquisa realizada no Reino Unido pela publicação
Which?, em 2008, confirmou que a Starbucks ocupa uma posição inferior
entre as cadeias do país, e descreve seu café como de má qualidade e exces-
sivamente caro. Foi observado também que, em geral, suas bebidas são ricas
em calorias. Em resumo, conforme dito por um sarcástico blogueiro, o café
da Starbucks lembra mais um sorvete morno do que o tradicional expresso
italiano que o inspirou. A Starbucks talvez seja uma porta de entrada para o
café gourmet, mas está longe de ser o destino final.
Sem dúvida, a Starbucks continua a ser uma grande marca, mas agora
precisa amadurecer. Sua vantagem como pioneira se foi, e ela é assediada
por todos os lados por concorrentes muitas vezes mais espertos, que cobram
preços mais baixos ou ambas as coisas. Precisa conquistar novos clientes e
lidar com paladares mais refinados, sem se desviar de seu objetivo principal.
Em resumo, sua batalha é semelhante àquela enfrentada pelas grandes redes
de alimentos e bebidas, para a qual não há uma solução fácil. A Starbucks
enfrenta ainda outro desafio. Quer desesperadamente ser uma boa empresa,
e seu CEO acredita piamente que ela seja, mas nem todo mundo está con-
vencido disso. Vale lembrar que, quando se é muito grande, é extremamente
difícil ser bom também.
Mesmo assim, Schultz transformou um punhado de cafés localizados em
Seatlle em uma cadeia que abriu 17 mil pontos de venda (fazendo uma com-
paração, o McDonald’s tem mais de 31 mil) em pouco mais de 20 anos. Ele
conseguiu isso com base em valores e no engajamento dos funcionários, em-
bora muitos questionem a extensão de ambos. Seria interessante ver até onde
Schultz chegará. Atualmente, as ações da empresa estão valendo algo em
torno de US$25, preço muito melhor do que quando estavam em baixa, po-
rém ainda não o pico já atingido antes. Se Schultz conseguir que a empresa
reviva seus dias de glória, permaneça ética, lide com as exigências dos consu-
midores e sirva um excelente café, será merecedor dos entusiasmados elogios
– que chegam perto da idolatria – que recebe dos baristas da empresa.
142 28 mentes que mudaram o mundo

Referências e leituras adicionais

Allison, Melissa (2008) Starbucks shake-up: Schultz back as CEO, Seattle Times, 8
de janeiro
BBC (nd) Howard Schultz, profile
Clarke, Andrew (2009) The Friday interview: Starbucks boss: We’re not all froth,
Guardian, 20 de março
Farrell, Greg (2010) Return of the barista-in-chief, Financial Times, 22 de março
Hughes, Frank (2006) Why Schultz tuned out and sold the Sonics, ESPN, 20 de
julho
Michelli, Joseph A, A estratégia Starbucks: 5 princípios para transformar sua empresa em
uma experiência extraordinária, Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 2006
Pressler, Margaret Webb (1997) The brain behind the beans: Starbucks’ Schultz has
drawn praise, derision in building his coffeehouse empire, Washington Post, 5 de
outubro
Schultz, Howard, Dedique-se de coração: Starbucks Coofee, Rio de Janeiro: Campus/
Elsevier, 1998
Starbucks em www.starbucks.com
Capítulo 20
Jack Welch

S e já houve um homem que personificou o espírito das empresas da década


de 1990, esse homem foi Jack Welch. Apelidado de “Jack Nêutron”, era
o rei do valor ao acionista. Sob seu comando, a GE mudou a ponto de ficar
irreconhecível. As linhas de negócios que não apresentavam bom desempenho
eram vendidas e novas empresas eram adquiridas para fortalecer o balanço
patrimonial. Em vez de representarem uma vantagem competitiva, os fun-
cionários eram considerados um custo como outro qualquer, e as forças de
trabalho podiam ser reduzidas para incrementar as margens. Os gestores que
apresentavam bom desempenho eram tratados como reis, enquanto aqueles
cujo desempenho era insatisfatório eram dispensados, muitas vezes de maneira
brutal. Welch detestava os regulamentos e a burocracia, tanto internos como
externos. Era a personificação do CEO celebridade – o executivo-chefe como
uma espécie de Übermensch (super-homem) nietzschiano. Extremamente vi-
goroso e digno de ser citado, estava em toda parte e todos queriam uma parcela
dele. Foi também um dos primeiros super-CEOs em termos de salário, e era
recompensado de uma forma pela qual seus predecessores apenas poderiam
sonhar.
Durante seus 20 anos no comando da GE, o valor da empresa passou de
US$13 bilhões para US$400 bilhões, enquanto os lucros tiveram crescimento
de 1.000%, alcançando cerca de US$13 bilhões. Em 1999, a revista Fortune
o elegeu o Gestor do Século. Quando Welch deixou a empresa, no fim do
ano 2000, os elogios se acumulavam transformando-o em um herói dos nos-
sos tempos. Mas sua saída foi brilhantemente oportuna. O setor em que ele
144 28 mentes que mudaram o mundo

trabalhava como CEO estava perto de mudar com a explosão das empresas
pontocom, a tragédia do 11 de setembro e, algum tempo depois, com a crise
financeira de 2007–2009. Em retrospecto, hoje o legado de Welch sem dúvida
se parece muito mais uma mistura heterogênea do que parecia na época. A re-
vista Fortune talvez o tenha eleito Gestor do Século um pouco prematuramen-
te. Embora não seja possível negar que Jack Welch foi um dos mais influentes
gestores do final do século XX, se isso foi uma coisa realmente positiva ou uma
mistura de bom e ruim é hoje uma pergunta pertinente.
Welch nasceu em 1935, em Peabody, Massachusetts, filho único temporão
de um maquinista de estrada de ferro e de uma dona de casa. Era uma criança
inteligente, e mais tarde diria que fora a mãe quem lhe instilara uma ferrenha
ambição. Estudou Engenharia na Universidade de Massachusetts e fez douto-
rado em Engenharia Química pela Universidade de Illinois. Em 1960, ingres-
sou na GE como engenheiro, ganhando US$10.500 por ano (equivalente hoje
a cerca de US$75 mil). Após seu primeiro ano, ofereceram-lhe um aumento
de US$1 mil, que Welch achou insatisfatório. Esse fato, aliado à sua crescente
impaciência com a morosidade burocrática da empresa, o fez pedir demissão.
A GE chegou a organizar uma festa de despedida, mas seu mentor, Reuben
Gutoff, dirigiu mais de 160km para jantar com ele e conseguiu convencê-lo a
mudar de ideia.
Welch permaneceu na GE, mas não incorporou o espírito da empresa,
principalmente por causa de seu radicalismo e impaciência com um conglome-
rado cujo progresso andava a passos de paquiderme. Às vezes, isso provocava
resultados desastrosos – em 1963, ele causou a explosão de uma fábrica de
plásticos –, mas, de modo geral, os resultados eram suficientemente bons para
assegurar que seus pontos fracos fossem relevados. Em 1969, passou a ocupar
o cargo de gerente-geral da divisão de plásticos. Ao assumir a posição, como
era típico dele, vangloriou-se de que seria capaz de quebrar todos os recordes,
embora esse tipo de bravata não fosse visto com bons olhos pela GE. Na ver-
dade, sua atitude de rebeldia e seu modo franco de falar estavam começando a
desagradar algumas pessoas da empresa. Mesmo assim, ele continuou a apre-
sentar bom desempenho e a crescer dentro da organização.
Tornou-se vice-presidente da GE em 1972. Em 1973, em uma análise de
desempenho, declarou que seu objetivo era tornar-se CEO. Em 1977, assu-
miu o controle da GE Credit Corporation como vice-presidente sênior. Em
1979, passou a ocupar o cargo de vice-presidente geral e, em 1981, finalmente
Jack Welch 145

realizou sua ambição de se tornar CEO da GE. Embora não haja dúvida de
que Welch tinha capacidade e energia para atingir seu objetivo, alguns se sur-
preenderam ao vê-lo naquela posição, pois muitos o consideravam sedento
demais para chegar ao topo em uma empresa que continuava a ser extrema-
mente burocrática e na qual não adiantava perturbar o equilíbrio. Entretanto,
isso era exatamente o que Welch queria fazer e, agora que era CEO, não havia
ninguém que pudesse detê-lo.
Vale observar que, quando assumiu o posto máximo, Welch não estava
assumindo a liderança de uma empresa em dificuldades, que precisasse de-
sesperadamente de uma cirurgia. A GE era lucrativa, e seu CEO anterior,
um sociável inglês chamado Reginald Jones, era muito admirado. Mas, onde
muitos enxergavam a continuidade dos lucros, Welch via uma empresa com
uma rígida hierarquia que precisava sofrer mudanças revolucionárias. O que
aconteceu depois serviu de material para a criação de uma lenda.
Ele começou a eliminar camadas da hierarquia da corporação como um
louco, abrindo o labirinto que era a burocracia da GE “a machadadas”. Vendeu
as subsidiárias que não apresentavam bom desempenho, informou às unidades
que elas teriam de ser as primeiras ou as segundas em seu mercado, e exigia o
crescimento dos lucros a cada trimestre. Abraçou um novo conceito de gestão,
e aqueles que o impressionavam eram generosamente premiados. Em 1981,
deu uma palestra intitulada “Como crescer rapidamente em uma economia
que apresenta crescimento lento”, que, diz-se com frequência, deu impulso
ao culto ao valor para o acionista. Talvez mais famosa tenha sido sua atitude
em relação ao desempenho individual. Ele era muito conhecido por ser incri-
velmente franco e até mesmo desagradável com seus gestores subordinados
no decorrer das análises. Queria realmente que eles incrementassem o jogo
e, com isso em mente, premiava generosamente os 20% melhores, que rece-
biam gratificações e opções de ações, enquanto todos os anos os 10% piores
eram despedidos. Esse não era um assunto sobre o qual Welch refletia muito.
Normalmente, sua argumentação a respeito dessa demissão de 10% da for-
ça de trabalho era que mantê-los na empresa seria mais cruel ainda: “Alguns
acham cruel e brutal demitir 10% de nosso pessoal, mas não é. É exatamente o
contrário. O que eu acho cruel e ‘falsa bondade’ é manter pessoas que não vão
crescer nem prosperar.”
Em sua autobiografia, Jack: definitivo (2001), ele diz que, no final de 1980,
quando assumiu o comando da empresa, a GE tinha 411 mil funcionários. No
146 28 mentes que mudaram o mundo

final de 1985, esse número tinha caído para 299 mil. Dos 112 mil que saíram,
cerca de um terço trabalhava em operações que haviam sido vendidas e dois
terços representavam um “enxugamento” das operações que continuaram a
existir. Na verdade, Welch comprazia-se tanto em reduzir a força de trabalho
que recebeu o apelido de Jack Nêutron, assim chamado porque, como a bomba
de nêutron, matava as pessoas mas deixava as construções de pé. Os funcio-
nários talvez não gostassem de seu novo chefe, mas os executivos de finanças
da corporação o admiravam. A capitalização de mercado da GE decolou e
Wall Street ficou deliciada. Depois de vender tantos negócios, a GE comprou
muitos também, aumentando ainda mais seu já gigantesco valor de mercado.
É claro que a empresa tinha pontos negativos. A fim de obter margens de lucro
ainda mais altas, os gestores reduziram algumas áreas, como P&D, e passa-
ram a assumir um número menor de riscos. Havia também o custo humano,
mas, enquanto a GE obtinha grande êxito nas fanfarronas décadas de 1980 e
1990, essas questões eram educadamente ignoradas por aqueles que realmente
contavam.
Em pouco tempo, Welch passou a ser o mais comentado e imitado gestor
dos Estados Unidos. O fato de que ele era extremamente atraente, popular e
merecedor de citações sem dúvida ajudava, mas havia também muitas outras
coisas concretas. Em seu setor, a GE tornou-se a maior e mais admirada em-
presa do mundo. Na verdade, às vezes era possível observar que fora criado um
culto em torno da figura de Welch, tão fervorosos e isentos de senso crítico
eram seus admiradores.
Perto do final de seu mandato, Welch ganhava extraordinários US$4 mi-
lhões por ano. Seu pacote de aposentadoria foi generoso o suficiente para sus-
citar muitos comentários, mas ele não se incomodou. Era um super-homem
(mais idoso) e merecia isso. Inclusive negociou um valor de US$7,1 milhões
por suas memórias, soma extraordinária para um homem que não fora presi-
dente do país (em 2004, Clinton conseguiu entre US$10 e US$12 milhões por
sua autobiografia).
Após o extenso e demorado processo de seleção do sucessor de Welch,
que deixou o cargo no final de 2000, Jeffrey Immelt foi escolhido e continua
na posição até hoje. Talvez muita coisa tenha mudado na GE, mas a longa
permanência de seu principal executivo parece não ter se repetido. Depois
da GE, Welch escreveu vários livros, alimentava uma popular coluna em um
jornal, dirigiu sua própria empresa e trabalhou como consultor de várias outras
Jack Welch 147

organizações. Mais recentemente, tem ministrado aulas em um curso sobre


liderança na Sloan School of Management do MIT.
Fazendo uma retrospectiva de 10 anos, o legado de Welch hoje talvez pa-
reça menos espetacular do que quando ele saiu da GE, com toda a pompa,
uma década atrás. Naquela época, havia muitos que o criticavam por sua falta
de compaixão e humanidade, e diziam que essa fácil política de destruição de
centenas de empregos era não só tacanha como cruel.
Em 2001, John Cassidy escreveu na revista semanal New Yorker: “Existi-
ram CEOs rígidos antes de Welch, mas nenhum fez tanto quanto ele para
transformar o darwinismo na filosofia de uma empresa.” Sob o ponto de vista
financeiro – o único que importa –, ele disse: “Welch foi um grande sucesso.”
Cassidy também observou: “Antes de seu mandato, quase todos os funcio-
nários da GE desenvolviam toda a sua carreira profissional na corporação e
sabiam que teriam apoio depois que se aposentassem. Essa empresa não existe
mais.”
Se há um resumo perfeito do aspecto negativo do mundo empresarial criado
por Reagan e Thatcher, a época de Welch é um deles. Mas nestes tempos pós-
recessão, muitas outras conquistas de Welch parecem ter perdido um pouco de
seu brilhantismo. Na verdade, o próprio Welch criticou algumas das panaceias
de sua juventude. Em 2009, declarou ao jornal Financial Times que lastimava
sua antiga obsessão pelo valor ao acionista: “Diante das circunstâncias, o valor
ao acionista é a ideia mais idiota do mundo. O valor é um resultado, não uma
estratégia; seus principais eleitores são seus funcionários, seus clientes e seus
produtos.” E acrescentou: “A ideia de que o valor ao acionista é uma estratégia
é insana” (Guerrera, 2009).
Contudo, a crítica mais violenta a Welch se resume a uma única coisa:
embora ele parecesse um grande e verdadeiro administrador, não passava de
um engenheiro de finanças em um frenesi doentio de aquisições que, basica-
mente, aproveitava-se da forma lenta como os mercados avaliavam as empre-
sas. Ele sabia que, desde que proporcionasse um aumento razoável dos lucros,
provavelmente ninguém perceberia isso. Portanto, sua verdadeira genialidade
não era uma abordagem agressiva e ímpar à gestão. Não era nada mais que
um truque de prestidigitação que ele aprendeu administrando a GE Capital.
Cassidy (2001) escreveu: “Os verdadeiros grandes empresários, como Alfred
Sloan, criador da General Motors (...), não se valem de truques financeiros.
Constroem empresas sólidas que duram décadas. Welch não fez isso.”
148 28 mentes que mudaram o mundo

Certamente existem algumas provas para sustentar essa afirmativa. Em


meados de 2000, as ações da GE subiram até cerca de US$60. Welch deixou
a empresa em novembro daquele ano. As ações nunca mais tiveram recupe-
ração e, após oscilarem entre US$30 e US$40 naquele mesmo ano, despen-
caram durante a crise financeira. Em 2010, eram negociadas em torno de
US$15. Em 2009, a GE foi rebaixada de sua posição AAA pelas agências
de classificação de crédito, posição que vinha mantendo desde 1956. Visto
sob esse prisma, o crescimento orgânico de longo prazo parece bastante bom,
e aqueles que crescem a passos não tão largos em vez de apenas comprar,
vender e cortar, afinal não parecem tão idiotas. Na verdade, alguns chegaram
a considerar Welch o homem que destruiu a GE, acusando-o de ter deixado
um legado tóxico na figura da GE Capital e de ter castrado a capacidade da
empresa de inovar. Colocado dessa forma, Welch se assemelha a um clássico
administrador imediatista e também a um escravo do valor ao acionista, e
não de sua missão.
Mais uma vez, esse ponto de vista talvez seja um pouco injusto. Para iní-
cio de conversa, não podemos nos esquecer de que, como Welch se aposen-
tou no final de 2000, nem tudo que aconteceu nos últimos 10 anos pode ser
imputado a ele. Devemos nos lembrar também de que o tipo de abordagem
dedicada, tida em tão alta conta nas décadas de 1980 e 1990, e no início da
década de 2000, talvez esteja completamente desacreditada hoje. Devemos
esperar, no mínimo, até que a análise do período atual seja revista. Além dis-
so, é preciso observar que grande parte do que Welch fez precisava ser feita
e que durante sua gestão ele assumiu uma empresa extremamente arcaica
(um conglomerado) e a transformou na maior corporação do mundo. Além
disso, havia muitos outros conglomerados contemporâneos que não só não
conseguiram prosperar, como também não sobreviveram. Portanto, prova-
velmente a história não irá considerar Jack Nêutron como o homem que des-
truiu a GE, mas também não é provável que o considere o maior gestor do
século XX. É mais certo que ele seja visto como um homem que simbolizou
e modelou uma era e que, ao mesmo tempo, foi por ela modelado.
Jack Welch 149

Referências e leituras adicionais

Byrne, John A (1998) How Jack Welch runs GE, Businessweek, 8 de junho
Cassidy, John (2001) Gut punch, New Yorker, 1o de outubro
Site da GE em www.ge.com
Guerrera, Francesco (2009) Welch rues short-term profit ‘obsession’, Financial Times,
12 de março
Hayes, Thomas C (1980) Changing the guard at GE, 28 de dezembro
McGinn, Daniel (2000) Saving Private Welch, Newsweek, 29 de maio
Nisse, Jason (2001) The lowdown: Neutron Jack flattens the bleeding hearts, Indepen-
dent on Sunday, 14 de outubro
Peterson, Holly (2000) How does he feel about letting people go? It is the most com-
passionate thing he can do, Independent on Sunday, 5 de novembro
The Welch Way (site oficial), www.welchway.com
Welch, Jack (2001) Jack: definitivo: segredos do executivo do século, Rio de Janeiro: Cam-
pus/Elsevier, 2001
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 21
Michael Dell

M ichael Dell é um homem extremamente rico – é o 37o da lista da revista


Forbes, com patrimônio líquido que monta a US$13,5 bilhões e, em virtude
dos caprichos dos preços das ações, já foi muito mais rico. Além disso, enrique-
ceu muito cedo. Na verdade, na década de 1990, quando Dell tinha pouco mais
de 30 anos, sua fortuna foi avaliada em US$10 bilhões. No início dos anos 1990,
quando ele estava na casa dos 20, muitos artigos foram escritos a respeito da
maneira como ele ganhou tanto dinheiro sendo tão jovem. Embora a explosão
da internet tenha aumentado consideravelmente sua fortuna, não foi a criadora
dela. Na verdade, Dell fundou sua empresa em 1984 e ela deslanchou muito
antes que a maioria das pessoas soubesse o que fosse uma empresa pontocom.
A grande ideia de Dell não era nenhum bicho de sete cabeças. Ele pre-
tendia vender computadores diretamente aos consumidores, eliminando os
intermediários. Hoje isso não parece radical, mas na época parecia. Dizem
que Dell é um homem muito comedido. Fora seu impulso empreendedor (e
sua enorme fortuna), ele é uma pessoa absolutamente normal e discreta. Não
é nem mesmo comum no sentido em que indivíduos como Warren Buffett o
são – analise as citações de Dell e não encontrará muita coisa da memorável
sabedoria popular. Sempre foi direto e pé no chão, e sua empresa reflete isso.
Vende o que se transformou em uma commodity. Os equipamentos da Dell
são os mais utilizados no mundo da computação: sólidos, valem o que custam
e são confiáveis. Naturalmente, é possível adquirir máquinas sofisticadas na
Dell, mas ela é a empresa que você vai procurar se quiser um computador
comum a um preço justo.
152 28 mentes que mudaram o mundo

Dell nasceu em 1965 em uma família de classe média. O pai era médico, e a
mãe, corretora da bolsa. Eles moravam em Nova York, mas no início da déca-
da de 1960 mudaram-se para Houston em busca de uma vida mais tranquila.
Quando criança, Dell já demonstrava um precoce talento empresarial. Aos 12
anos, ganhou US$2 mil criando seu próprio leilão de selos e anunciando-o em
uma publicação dirigida a colecionadores. Ele declarou que isso o ensinou a
importância de eliminar os intermediários. Aos 16 anos, conseguiu um empre-
go de verão para vender assinaturas do jornal Houston Post. Coletando infor-
mações sobre quem adquiria as assinaturas, ele constatou que teria uma chance
muito maior de vendê-las a recém-casados e a pessoas que haviam acabado de
se mudar. Pagava a amigos para procurarem essas pessoas e enviava cartas a
elas. Naquele ano, ganhou US$18 mil, que gastou em uma BMW nova.
A história de Dell começa realmente quando ele entrou na faculdade. Esse
foi o início de uma lenda empresarial, pois uma das maiores empresas de com-
putação do mundo nasceu no dormitório de uma faculdade. Em 1983, aos 18
anos, Dell era calouro da Universidade do Texas, em Austin, e frequentava
cursos preparatórios de Medicina. Desde a juventude, demonstrou interesse
por computadores. Os PCs da IBM estavam começando a se tornar o padrão
e tinham um design bastante modular. Dell constatou que poderia adquirir
componentes avulsos junto a varejistas locais, acrescentá-los aos computadores
da IBM e vender o produto incrementado, ou seja, máquinas personalizadas,
com boa lucratividade. Em pouco tempo ganhou uma pequena fortuna. Em
1984, criou uma empresa chamada PCs Limited, sediada em seu quarto de
estudante.
A razão pela qual o negócio funcionou tão bem foi que, naquela época, os
varejistas tinham de encomendar junto à IBM quotas de PCs e de componen-
tes, e quase sempre ficavam com excesso de estoque que vendiam para Dell de
bom grado. Ele então os vendia diretamente por meio de anúncios em jornais
e revistas, o que lhe permitia cobrar um preço menor que o dos varejistas. Seus
pais não aprovavam essa sua atividade, pois receavam que ela prejudicasse seus
estudos. Dell então lhes fez uma promessa: se a empresa começasse a ter difi-
culdades, retomaria os estudos. No entanto, em pouco tempo estava faturando
cerca de US$80 mil por mês, e nunca mais retornou à faculdade. Em vez
disso, tomou emprestado da família US$300 mil para expandir seu negócio.
Em 1985, a empresa lançou sua primeira máquina, o Turbo PC. A PCs Li-
mited já mostrava sinais da empresa que viria a ser – anunciava na imprensa e
Michael Dell 153

vendia diretamente ao consumidor. O cliente podia escolher várias especifica-


ções para o PC que iria adquirir. Há muito essa é uma das marcas registradas
da Dell – o conceito de customização em massa. Como cada computador é
montado sob encomenda com base em um menu de opções, os desperdícios e
o estoque são, em grande parte, eliminados – e os consumidores ficam felizes,
pois obtêm algo muito parecido com o que precisam. Essa abordagem direta
tinha também outros benefícios óbvios – significava que Dell podia oferecer
preços mais baixos e auferir lucros mais altos. Logo o nome da empresa foi
mudado para Dell Computer Corporation.
O negócio cresceu rapidamente. Em 1987, Dell instalou uma subsidiária
no Reino Unido e, em 1988, abriu o capital da empresa. As ações foram nego-
ciadas a US$8,50, e Dell estava com 23 anos. Na época, a empresa criada por
ele foi avaliada em cerca de US$80 milhões. Em 1989, as vendas registraram
US$257,8 milhões. Quando Dell estava com 24 anos, foi eleito pela revista
Inc. Empresário do Ano. Em 1990, a Dell abriu instalações fabris na Irlanda
– um dos primeiros exemplos de investimento interno que iria caracterizar a
economia do “Tigre Celta”. Em 1989, surgiu o primeiro laptop da empresa
e, em 1992, a Dell foi incluída na lista Fortune 500. Dell era o mais jovem
CEO já citado nessa lista, ainda na casa dos 20. A empresa enfrentou alguns
percalços durante esse período. Em 1990, não foi feliz em algumas escolhas
de chips, e seus primeiros laptops apresentavam problemas. Contudo, esses
foram reveses sem muita importância.
Vale observar que, embora estivesse no lugar certo, na hora certa, com uma
ideia que hoje parece óbvia, Dell era um trabalhador incansável. Dizem que,
quando estava na casa dos 20, trabalhava 18 horas por dia, quase sempre, sete
dias por semana. Só diminuiu o ritmo após o nascimento dos filhos e por in-
sistência da esposa.
Em meados da década de 1990, a Dell passou de empresa grande para uma
gigantesca organização. O crescimento do mercado de PCs no início da déca-
da de 1990 foi inexistente, pois os efeitos da recessão ainda se faziam sentir,
e 1993 foi um ano particularmente ruim para a empresa. Mas logo as coisas
começaram a melhorar à medida que a internet decolava. Enquanto, antes, um
PC era utilizado nas residências para escrever cartas ou organizar as finanças
domésticas ou ainda para alguns jogos, aos poucos foi se tornando muito, mui-
to mais que isso. O mercado de PCs explodiu, e com ele a fortuna de Dell. Em
1995, as ações da empresa eram negociadas a US$100. Em 1996, a empresa
154 28 mentes que mudaram o mundo

ingressou no comércio eletrônico, e logo o site estava fazendo negócios equi-


valentes a US$1 milhão por dia. Em 1997, a empresa registrou a venda de 10
milhões de computadores. Em 2000, faturava US$50 milhões por dia através
do site e, no ano seguinte, tornou-se o maior fabricante de computadores, com
base em sua fatia do mercado.
A empresa também estava se diversificando. Depois dos problemas ini-
ciais de desenvolvimento, seus laptops tornaram-se um grande sucesso – e são
equipamentos muito lucrativos. Passou a operar também no mercado de ser-
vidores e periféricos, como impressoras e monitores. A empresa era incomum
de várias formas inesperadas. Em vez de abrir suas fábricas na Ásia, onde os
custos eram baixos, abriu grande parte delas no Ocidente, o que permitia rá-
pido atendimento dos pedidos de máquinas customizadas. A Dell foi também
uma das primeiras a adotar políticas de preservação do meio ambiente em um
setor muitas vezes acusado de negligenciar esse aspecto.
Conforme ocorreu com muitas outras empresas de tecnologia, o preço das
ações da Dell, que sempre estiveram em alta, aproximou-se do pico com a ex-
plosão das empresas pontocom. Experimentou queda na época da baixa, porém
não muito brusca, pois se tratava de um negócio de hardware, não vapourware
(produto fantasma ou virtual) e, em meados da década, houve considerável
recuperação. Em 2004, Dell deixou o cargo de CEO, embora permanecesse
como presidente do conselho. Ele e a esposa tornaram-se grandes filantropos
também, embora não no mesmo patamar de Buffett e Gates. O casal deu a
contribuição máxima permitida para a campanha de reeleição de George W.
Bush. Como conhecem os Bush e são texanos, o fato talvez seja menos notável
do que à primeira vista pode parecer.
No final da década de 1990, a empresa sofreu um brusco revés, e o que an-
tes fora sua vantagem competitiva transformou-se em seu calcanhar de aquiles.
Quando Dell renunciou, a empresa vendia mais computadores nos Estados
Unidos do que seus quatro principais rivais juntos. Mas logo a sorte virou, e a
HP, até então um cambaleante rival, transformou-se em grande concorrente.
A razão disso foi o crescimento da procura por laptops, por seu irmão menor,
o netbook, e por outros dispositivos que permitiam acesso à rede. O problema
era que os consumidores gostavam de comprar esses itens em lojas, onde po-
diam vê-los antes de adquiri-los. Além disso, como os laptops não se benefi-
ciam da “customização de massa”, de repente as fábricas americanas passaram
a ser onerosas e deixaram de representar vantagem competitiva. Dispositivos
Michael Dell 155

de consumo nunca foram o ponto forte da Dell e, conforme a Apple demons-


trou, seria possível ganhar muito dinheiro oferecendo produtos a esse nicho.
Em 2007, atendendo à solicitação do conselho, Dell reassumiu o cargo de
CEO em um ambiente muito mais hostil do que o que deixara. A empresa,
além de estar em uma situação desfavorável, enfrentava uma crise financeira.
Entretanto, ele realizou grandes mudanças. Fez negócios com varejistas, como
o Walmart, e reformulou o notebook e as faixas de mininotebooks da Dell,
tornando-os mais eficientes. (Outras inovações, como o fato de a empresa ter
promovido o Linux, tiveram menos êxito.) A companhia abriu fábricas na
China. Os resultados estavam longe de ser uma solução paliativa, mas lenta-
mente a Dell parece estar dando a volta por cima: recentemente, fez a Acer re-
troceder para o terceiro lugar e reconquistou a segunda posição. Se a Dell con-
seguirá reconquistar a pole position só o futuro dirá. Na verdade, é interessante
observar que Dell, como muitos outros fundadores de empresas (por exemplo,
Jobs e Schultz), encontrou-se pela segunda vez ocupando o cargo máximo na
empresa que fundara, depois que ela quase soçobrou após sua saída.

Referências e leituras adicionais

Arthur, Charles (2000) The all American Dell boy, Independent, 29 de março
Corcoran, Elizabeth (1998) Dell gives what people want, Washington Post, 8 de julho
Corcoran, Elizabeth (1998) The direct approach: thriving Michael Dell keeps honing
PC sales tactics, Washington Post, 1o de julho
Dell, Michael S (2000) Direct from Dell Hoover’s, Profile: Dell Inc
http://www.portfolio.com/executives/features/2008/06/16/Michael-Dell-Returns-to-
Dell-Inc/
Insana, Ron (2004) Dell knows his niche and he’ll stick with it, USA Today, 5 de
abril
Lynn, Matthew (1998) PC whizz kid piles up the billions, Sunday Times, 26 de abril
Processor.com, Dell timeline
Reischel, Diane (1990) Michael Dell: he wasn’t a people person but he knew PCs.
Now he’s programmed that talent to become a computer mogul at 24, Dallas Mor-
ning News, 28 de janeiro
Shack, Justin (2010) Dell’s revival runs into trouble, Wall Street Journal, 28 de
novembro
Sunday Times/Calgary Herald (2003) Computer tycoon lives in fear, 5 de janeiro
Vanity Fair, Michael Dell
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 22
Tom Peters!

T om Peters é louco? Muitas pessoas acham que sim – talvez até ele mesmo.
Eis outras perguntas mais sérias: Ele faz algum bem? É realmente um des-
bravador da gestão? Por que é tão bem-sucedido? Por que é tão popular? Estas
são boas perguntas e resumem as indagações que precisamos fazer sobre esse
extraordinário fenômeno chamado Tom Peters.
Em uma era em que todos – de empresas de descarte de lixo, consultoria a
subcomitês locais do governo – estão em busca da “excelência”, é fácil esquecer
que aquilo que hoje é um dos maiores de todos os clichês sobre administração
foi, em grande parte, responsabilidade de um único homem. Em um mundo
no qual grande parte das livrarias tem seções inteiras dedicadas a esse híbrido
particularmente moderno – o livro de autoajuda –, vale a pena lembrar que
apenas uma geração atrás esse setor praticamente não inexistia. Em uma cul-
tura na qual todos reconhecem (mesmo que desprezem) o valor e a utilidade
da fama, é estranho pensar no que um consultor em gestão (justo da McKinsey
& Co!) fez no início da década de 1980. Com certeza, nenhum guru da gestão
usou o ponto de exclamação da maneira como Peters fez.
No final de 1982, o livro Vencendo a crise, de autoria de Tom Peters e Ro-
bert Waterman, foi publicado e mudou para sempre o modo como os gurus da
gestão eram vistos. O que antes era um tranquilo setor artesanal, de repente
passou a ser o centro das atenções. O livro Vencendo a crise foi, independente-
mente do critério utilizado, um incrível best-seller, e vendeu cerca de 3 milhões
de exemplares nos quatro primeiros anos. Tornou o nome de um de seus auto-
res conhecido por todos e transformou Tom Peters em celebridade. Contudo,
158 28 mentes que mudaram o mundo

apesar de toda a popularidade de Peters, que até hoje permanece imutável,


há muitas pessoas que o consideram um charlatão exibicionista, sedento por
fama, um terno vazio no qual sobressai o estilo, não a substância. Na verdade,
às vezes o próprio Peters diz esse tipo de coisa. Por mais estranho que pareça,
é provável que tanto seus admiradores como seus detratores estejam certos.
Peters nasceu em Baltimore, Maryland, em 1942 (de acordo com seu site,
com um taco de lacrosse nas mãos). O pai trabalhava na Baltimore Gas Com-
pany e a mãe era professora. Peters frequentou a conhecida escola de Maryland
Severn School e estudou na Universidade de Cornell, onde obteve o diploma
de bacharel. Em seguida, obteve o mestrado em Engenharia Civil, embora
a princípio pretendesse ser arquiteto. Em 1966, foi enviado ao Vietnã como
membro da unidade militar de engenharia civil da Marinha americana. Seu
segundo período de serviço militar (citado em sua biografia com a observação
“ele sobreviveu”) foi no Pentágono, e sua dispensa ocorreu em 1970. Seu tem-
po de vida militar teve profunda influência sobre o que ele viria a escrever so-
bre administração e, mais tarde, Peters diria que seus dois períodos de serviço
militar tinham sido o melhor treinamento em gestão que poderia ter tido.
Depois do Vietnã, a Marinha o convidou a assumir um cargo remunerado
em Stanford. Lá ele fez um MBA e depois um PhD em ciências da decisão e
comportamento organizacional. Depois de Stanford, sua vida deu outra gui-
nada interessante: de 1973 a 1974, foi conselheiro da Casa Branca em assuntos
sobre abuso de drogas. Depois de todas essas experiências, finalmente encon-
trou sua profissão. Ingressou na McKinsey & Co em 1974; mais tarde ele diria
que entrou na área de consultoria administrativa totalmente por acaso.
Seu trabalho nessa empresa, na década de 1970, serviu de base para a obra Ven-
cendo a crise. Mais especificamente, foi uma tarefa designada a ele e Waterman em
1977, denominada Projeto da Organização. Nessa época, os dois trabalhavam no
escritório de San Francisco, tido então como um local esquecido, e o projeto não
foi considerado algo de muita importância. (Na verdade, havia um projeto irmão
considerado muito mais importante, mas que não deu em nada.) Apesar de tudo,
Peters teve permissão (e foi subsidiado) para viajar pelo mundo e trocar ideias com
outras pessoas sobre equipes e organizações. Em 1979, ano em que se tornou só-
cio, pediram-lhe para elaborar uma apresentação para a Siemens, baseada em seus
achados. Ele apareceu com 700 slides (Peter é famoso por suas apresentações que
não dispensam slides). Depois disso, pediram-lhe que criasse algo mais sucinto
para a PepsiCo. Foi assim que ele criou seus oito temas (veja o quadro a seguir).
Tom Peters! 159

Em busca da excelência: os oito temas comuns de


Peters e Waterman para empresas de sucesso

1. Propensão para a ação e iniciativa na tomada de decisões –


“dá continuidade às ações”.
2. Proximidade do cliente – como aprender com pessoas atendidas pela empresa.
3. Autonomia e empreendedorismo – como promover a inovação e cultivar “agentes de
mudanças”.
4. Produtividade através das pessoas – como tratar os subordinados como fonte de
qualidade.
5. Uma filosofia de gestão prática, centrada em valores, que orienta as atividades diá-
rias – a administração mostrando seu comprometimento.
6. Mantenha o foco no core business – atenha-se ao negócio que você conhece.
7. Equipe com estrutura simples e enxuta – algumas das melhores empresas têm um
quadro de pessoal mínimo no escritório central.
8. Um misto de participação e direção – autonomia nas atividades do chão de fábrica e
valores centralizados.

Tempos depois, Peters diria que nem ele nem seu parceiro no livro se deram conta da
necessidade de ser ágil e da crescente importância da globalização.

Em 1981, Peters deixou a McKinsey e fundou sua própria empresa de


consultoria. No ano seguinte, publicou o livro Vencendo a crise (In Search of
Excellence ou ISOE), escrito em parceria com Robert Waterman, um colega
da McKinsey. O livro incluía 43 empresas americanas que Peters e Water-
man haviam estudado enquanto trabalharam na McKinsey, e contava his-
tórias empolgantes sobre a maneira como as empresas haviam alcançado a
excelência. Numa época em que os livros sobre administração eram áridos
como um deserto, o ISOE representava uma leitura extremamente acessível.
A reação da crítica ao ISOE não foi de aclamação unânime. Muitos críticos
não gostaram nem um pouco do estilo do livro. O crítico do jornal New York
Times declarou:
160 28 mentes que mudaram o mundo

Não, estas não são recomendações mal traduzidas do manual de instruções de um


brinquedo japonês. São as soluções que os autores encontraram para a atual crise
de produtividade americana. É por isso que digo: se a linguagem que o Senhor
Peters e o Senhor Waterman usam é uma reflexão acurada sobre a maneira de
pensar do empresário americano de hoje, então estamos todos mergulhados até o
pescoço em um caldeirão com água muito perto do ponto de ebulição.

O crítico ainda acrescentou com ironia: “Perdido na confusão sintática do


Vencendo a crise seria uma boa ideia para um livro.”
Talvez a crítica mais áspera de todas tenha vindo de seus colegas consulto-
res. Muitos na McKinsey tacharam o livro de populismo barato que denegria o
trabalho sério que faziam. Mais tarde, Peters diria que nada o havia preparado
para os cruéis ataques que sofreria de ex-colegas de trabalho. Mas, no fim das
contas, não importava o que as pessoas da empresa ou o jornal New York Ti-
mes achavam: o desprezo da elite empresarial talvez o tenha prejudicado, mas
não prejudicou as vendas. Seu livro era um best-seller, não um compêndio de
literatura, e fazia mais sucesso que seus autores (ou editores, ou qualquer outra
pessoa) poderiam imaginar.
Peters tinha um timing excelente. Em 1982, os Estados Unidos passavam
por um período de introspecção e de insegurança (que, a propósito, foi um
reflexo do terrível período que sucedeu a crise bancária de 2010). O país fora
derrotado no Vietnã e presenciava a estagnação de seu poderio industrial con-
quistado na década de 1970. Enfrentara o frustrante governo de Carter, além
da recessão do governo Reagan no início da década de 1980. Naqueles dias,
agora tão remotos, tudo indicava que o Japão conquistaria o mundo. (Nos
áureos tempos do poderio econômico japonês, calculava-se que a região de
Tóquio onde estava situado o Palácio Imperial valia mais que todo o estado
da Califórnia.) Os americanos queriam ouvir das pessoas que eles poderiam
ser grandes novamente e em seus próprios termos (afinal, tinham escolhido
Reagan em vez de Carter).
No entanto, não era só isso. O mercado americano para livros de autoajuda
também estava prestes a decolar. Peters e Waterman estavam na crista de uma
onda dupla. Para sermos honestos, o próprio Peters tinha consciência disso e,
mais tarde, diria que o ISOE era um “livro decente e muito oportuno”. Na ver-
dade, o livro foi o primeiro da área de gestão a conquistar a primeira posição
na lista de best-sellers do jornal New York Times. Sua continuação, Excelência
acima de tudo, foi o segundo. Os dois autores eram homens completamente
Tom Peters! 161

diferentes: o entusiasmado (alguns diriam egoísta) Peters usou o livro como


plataforma para o estrelato. Waterman, mais tranquilo, continuou na McKin-
sey como consultor em administração e, mais tarde, saiu para abrir sua própria
empresa. Aqueles que gostam de se inteirar das trivialidades talvez estejam in-
teressados em saber que ele é também presidente da Restless Leg Foundation
(Fundação da Síndrome das Pernas Inquietas).
Peters logo descobriu que gostava de ser o centro das atenções e aproveitou
a oportunidade para se transformar em algo completamente novo – o guru da
gestão como celebridade. Em 2000, um artigo da revista Red Herring dizia:

Em meados daqueles anos decadentes, enquanto Michael Jackson estava nas pa-
radas da MTV, o Senhor Peters atingia rapidamente o status de um astro do rock
na indústria multimilionária dos gurus que ele criara quase sozinho (...). Mas o
Senhor Peters provou ser mais que um simples escritor. Praticamente da noite para
o dia, despontou como um verdadeiro artista, à altura de Elvis. De acordo com sua
própria estimativa, em 1985 ele ministrou mais de 150 de suas ruidosas palestras,
que mais lembravam um serviço religioso de renovação carismática, às vezes mi-
nistradas no mesmo dia em duas cidades diferentes. No final da década, ele estava
cobrando US$50 mil por palestra, argumentando que seu status era incontestável,
pois era o maior guru de todos os tempos.

Peters era uma verdadeira máquina. O livro Excelência acima de tudo foi
seguido das obras Prosperando no caos, Rompendo as barreiras da administração,
A busca do uau! e Seminário de Tom Peters: tempos loucos exigem organizações
malucas. Todos os livros eram diretos e óbvios, e continham uma espécie de
populismo barato – e todos vendiam a mancheias. No total, desde 1982, ele
escreveu 14 livros, o que, para muitos, seria o trabalho de uma vida. Contudo,
Peters foi mais além: tinha uma programação incrivelmente caótica de pales-
tras e aparições pelas quais recebia quantias inimagináveis para a maioria dos
consultores.
Na década de 1990, muitas pessoas começaram a dizer que, embora no
passado talvez estivesse certo em alguns pontos, Peters tinha (para usar uma
expressão da qual ele gostava) ficado maluco. Como seria possível um homem
com esse tipo de energia infantil, cujas declarações eram tão disparatadas, ser
levado a sério – particularmente quando, na maioria das vezes, ele parecia estar
equivocado? Mas em vez de contestar essas críticas, Peters frequentemente
concordava com elas. Eis como ele descrevia a si próprio: “Um governante da
162 28 mentes que mudaram o mundo

desordem, campeão de grandes fracassos, maestro do entusiasmo, profissio-


nal da loquacidade, chefe da torcida corporativa, amante dos mercados, porco
capitalista e membro de carteirinha do ACLU (Sindicato Americano da Li-
berdade Civil).”
Contudo, algumas críticas eram muito mais cautelosas e substanciais. Em
1984, a revista Businessweek publicou uma matéria de capa intitulada “Epa!
Quem é excelente no momento?”, com a observação de que um terço das me-
lhores 43 empresas de Peters enfrentara dificuldades cinco anos depois de terem
sido por ele consideradas excelentes. Mais tarde, em 2001, a revista Fast Com-
pany publicou um artigo sugerindo que alguns dados das pesquisas talvez fossem
falsos. Em uma estranha virada, o artigo foi atribuído ao próprio Peters, embora
mais tarde tenha sido descoberto que se tratava de “conforme dito a...”. Em
2003, Chris Blackhurst, do jornal Evening Standard, escreveu (2003): “[Peters
é] provavelmente o propagador do maior número de tolices do planeta.” Se-
gundo Blackhurst, o maior problema de Peters era que seu próprio recorde era
“muito suspeito” e que ele se valia de seus erros para ganhar mais dinheiro ainda,
e acrescentou: “Ele quer que na placa de seu túmulo esteja escrito: ‘Thomas Pe-
ters – ele era um player.’ E ele era realmente. Se era bom é uma outra questão.”
Conforme mencionado no jornal semanal The Economist (2009), Kathryn
Harrigan, professora de Liderança Empresarial da Columbia Business School,
fez um importante comentário sobre o ISOE: “Os americanos são afeitos à ido-
latria, particularmente ao culto à personalidade. Todos estão em busca da receita
para o sucesso e, nesse aspecto, Tom Peters fez o melhor trabalho. As pessoas
sabiam exatamente onde colocá-lo.” Enquanto isso, um artigo no The Economist
(2009) ponderava: “Ele divulgava suas teorias sobre excelência com a exuberân-
cia e o ardor evangélico de um vendedor de xarope para tosse do século XIX.”
Como de costume, em vez de refutar as críticas, Peters se deliciava com
elas. Em entrevista concedida a Stefan Stern do jornal Financial Times, ele
disse:

Eu digo às pessoas: “Você fez um mau negócio gastando dinheiro para me ouvir
falar. Não tenho absolutamente nada para dizer. Apenas vou lembrá-lo daquilo
que você já sabia aos 22 anos, mas que acabou se esquecendo no calor da batalha.
Você teria de ser um daqueles pregadores da televisão que acreditam que vão traba-
lhar com um grupo de 500 pessoas e mudará a vida delas. Para início de conversa,
a maioria dos espectadores acredita com você. Ninguém paga £1.000 [por cabeça]
para ouvir alguém que considera um imbecil.”
Tom Peters! 163

Na verdade, às vezes ele parece absolutamente incorrigível. Quando lhe pe-


diram para comentar uma reportagem publicada pela revista Fortune dizendo
que ele tinha perdido o juízo, retrucou: “Durante o pico da bolha da internet
havia uma capitalização de mercado para a Microsoft três vezes maior que
o tamanho da IBM. Esse é o tipo de imbecilidade! Esse é o tipo da minha
mensagem! Você deve ser doido em uma época de doidos!” E acrescentou:
“Sinto orgulho da incoerência também! Ser absolutamente coerente diante de
desafios surpreendentes é tolice!” Contudo, embora isso realmente soe ridículo
e Peters estivesse tentando analisar a questão de dois ângulos, talvez exista um
fundo de verdade nesse caso. Quem sabe, muitas vezes, o “pensamento geren-
cial” não se parece em nada com a difícil ciência vaticinadora que muitos de
seus rígidos praticantes acreditam que seja. Afinal, se entender mal as coisas
foi suficiente para destruir reputações, os departamentos de faculdades de ad-
ministração se pareceriam com a Virgem Maria.
Talvez estejamos analisando a questão de maneira equivocada. Peters não
age como um sério desbravador da administração, provável e simplesmente
pelo fato de não sê-lo. Ele é uma mistura de guru da gestão, especialista em
autoajuda, palestrante motivacional e pregador carismático. Seja qual for o
caso, Peters e sua legião de fãs continuam imperturbáveis diante dessas ques-
tões, e ele continua a ganhar muito dinheiro.
Isso talvez seja o que mais deixa seus detratores enfurecidos. Não deve exis-
tir nada mais irritante do que ver alguém ser aclamado como pop star, despejar
baboseiras que você considera de pouca importância, admitir publicamente
que são uma espécie de lixo e vender cem vezes mais que escritores sérios.
“Os gestores sérios” olham para Peters com um misto de desprezo, espanto e
inveja. De qualquer modo, há séculos essa tem sido a história da arte superior
versus a arte inferior, e não há razão para que o que é válido em relação à lite-
ratura e ao cinema não deveria ser válido em relação à gestão.
Talvez aqueles que praticam a haute gestão (ou gestão de alto nível) deves-
sem adotar o mesmo ponto de vista. Peters tem muitos atributos do apresen-
tador populista de má qualidade. A situação lembra o famoso comentário sar-
cástico de Clive James sobre Barry Manilow: “Nenhum conhecido seu gosta
dele, mas todos que você não conhece o acham fabuloso.” Tom Peters, o Barry
Manilow da gestão.
164 28 mentes que mudaram o mundo

Referências e leituras adicionais

Blackhurst, Chris (2003) Master of reinvention, Evening Standard, 1o de outubro


Economist (2009) Guru: Tom Peters, 26 de março
Gibb, Robina (1998) Listen to my story, Scotsman, 23 de maio
Leonard, Carol (1992) Millionaire marketing guru who reigns supreme, Times, 5 de
dezembro
Parker, Ciaran (2006) The Thinkers 50: The world’s most important and influential bu-
siness thinkers, London Business Press, Londres
Peters, Tom e Waterman, Robert (1982) Vencendo a crise: como o bom senso empresarial
pode superá-la, São Paulo: Harper & Rom do Brasil, 1983
Red Herring (2000) The 1980s will be remembered for many things: leveraged
buyouts..., 1o de setembro
Seid, Dennis (2007) In search of Tom Peters, Northeast Mississippi Daily Journal, 2
de novembro
Stern, Stefan (2008) It’s about getting stuff done: lunch with the FT, Financial Times,
22 de novembro
Site de Tom Peters, www.tompeters.com
Capítulo 23
Ricardo Semler

R icardo Semler provavelmente é mais conhecido por seu livro Virando


a própria mesa (Rocco, 1988). Os títulos das publicações de negócios
gostam de hipérboles, mas Semler é um artigo genuíno. Ele é heterodoxo e
iconoclasta, comprovadamente o mais estranho e o mais original CEO dos
anos 1990. Ele rasgou completamente o livro de regras e disse aos seus fun-
cionários que podiam fazer o que quisessem. Comparados a Semler, quase
todos os pretensos radicais dos negócios são conservadores que fazem um
ajuste aqui, outro ali.
Ao longo dos anos, sua empresa, a Semco, tem sido um tipo curioso de
laboratório industrial em que a resposta às noções de gestão mais estranhas
sempre parece ter sido: “Sim, vamos tentar.” Ele utilizou o empowerment até
o máximo que pôde – ao ponto de, basicamente, deixar os trabalhadores diri-
girem o negócio. Ninguém achava que poderia dar certo, mas deu – e de forma
brilhante. Como escreveu o pensador britânico Charles Handy, “a maneira
como Ricardo Semler conduz sua empresa é impossível – exceto pelo fato de
que dá certo – e funciona maravilhosamente para todos”. No entanto, pelos
milhares de consultores que se espalharam por sua empresa e pelas centenas de
artigos escritos sobre a maneira como ele conduz os negócios, a Semco conti-
nua única. Mesmo com todo o sucesso do radicalismo de Semler, ninguém o
imitou. De fato, essa bizarra e maravilhosa empresa brasileira existe como uma
espécie de utopia organizacional, um lembrete de como as coisas poderiam ser,
em vez de como são hoje.
166 28 mentes que mudaram o mundo

Os primeiros anos de vida de Semler foram típicos de uma criança da elite


brasileira. Seu pai, austríaco de nascimento, fundou a Semco nos anos 1950,
e o negócio tornou-se um empreendimento industrial que fabricava compres-
sores e bombas industriais. Até certo ponto, a empresa era bem-sucedida, mas
nada fora do comum. O jovem Ricardo era claramente brilhante e – diferen-
temente de muitos dos principezinhos com quem conviveu – tinha forte im-
pulso realizador. Foi rejeitado pela Harvard duas vezes por ser muito jovem,
mas acabou conseguindo entrar depois de escrever uma carta ao reitor em que
lembrava que, no passado, os monarcas de 14 anos de idade governaram países
inteiros. Semler disse que foi a pessoa mais jovem que já entrou na Harvard
Business School.
Em 1982, aos 21 anos, assumiu a fábrica de seu pai. É verdade que 21
anos é uma idade tenra demais para se fazer tal coisa, mas o pai de Semler
percebia que seu filho era muito inquieto e não queria que ele fosse tentar
a sorte em outro lugar. Dizem que ele também declarou: “Melhor cometer
seus erros enquanto eu estou vivo.” Na época, a Semco era uma empresa
hierárquica bastante convencional, que empregava vários parentes de Sem-
ler – era a norma latino-americana, e Semler começou como um CEO bem
tradicional.
Entretanto, evidentemente, o rapaz de 21 anos tinha muito o que provar,
sobretudo porque, no começo dos anos 1980, a economia brasileira estava em
péssimo estado. Assim, Semler começou tentando aprender tudo o que podia
sobre a empresa, viajou ao redor do mundo e trabalhava 16 horas por dia. A
carga de trabalho era tamanha que um dia cobrou seu preço: enquanto visitava
uma fábrica no estado de Nova York, desmaiou. Os médicos não encontraram
nada de errado com ele, mas o avisaram de que seu estilo de vida estava a um
passo de lhe causar um infarto.
Semler levou a sério as recomendações e resolveu melhorar o equilíbrio en-
tre vida pessoal e profissional. Ele tinha sido um microgestor obsessivo e uma
pessoa detalhista. Agora, começou a se perguntar o que aconteceria se fosse
exatamente o contrário. E se, em vez de manter o controle sobre todos, ele
lhes dissesse que poderiam fazer o que quisessem? Se tornasse todos comple-
tamente responsáveis por suas ações, eles agiriam de forma responsável? Será
que a verdadeira democracia industrial poderia funcionar? Essa era, em poucas
palavras, a visão de Semler. Em 1983, começou a planejar a democratização
Ricardo Semler 167

do negócio de seu pai. Muitos, em toda a empresa, do alto ao baixo escalão,


não gostavam de seus planos, e isso acabou colocando para fora do Conselho
muitos membros da família.
De alguma forma, o que ele propôs não parece tão radical hoje em dia.
Tratava-se de participação de lucros, prática do empowerment com os traba-
lhadores e um local de trabalho humano. Mas o diferencial de Semler é que ele
levou cada uma dessas ideias à mais extrema lógica. Isso foi feito de maneira
penetrante e arrasadoramente radical. Vale também lembrar que a virada foi
feita no Brasil do início dos anos 1980, quando a hierarquia de gestão típica
provavelmente deixaria os vitorianos muito confortáveis.
Ele dividiu o negócio em unidades de fábricas altamente autônomas. Rees-
calonou a hierarquia, deixando somente três níveis entre a cúpula e o pessoal
da fábrica, e aboliu todos os títulos – um anátema na América do Sul, uma
região tão afeita ao status. Semler basicamente inverteu a pirâmide adminis-
trativa. Qualquer pessoa podia verificar os livros contábeis da empresa. Os
trabalhadores avaliavam o desempenho dos gerentes, inclusive o do próprio
Semler. Era uma democracia industrial. Em 1988, no Financial Times, Laura
Leme, que trabalhava na matriz, disse: “Houve resistência de ambos os lados,
de cima e de baixo. A sociedade brasileira é extremamente autoritária. As pes-
soas dos níveis mais baixos não queriam responsabilidade, e muitos gerentes
apenas não conseguiam se acostumar a terem suas ordens desafiadas. De ou-
tubro de 1985 a janeiro de 1987, um terço da gerência saiu da empresa. Aí as
coisas melhoraram.”
Semler tornou-se um dos seis conselheiros que elegem o CEO. Todos os
gerentes eram avaliados pelo seu pessoal – uma baixa avaliação, e você estava
fora e isso também se aplicava ao próprio Semler (embora ele tivesse a maior
parte das ações da empresa). O pessoal estabelecia seus próprios salários. Era
permitido às unidades industriais contratar somente até 100 pessoas. Se ul-
trapassasse esse número, a unidade seria dividida, permitindo que várias uni-
dades operassem em um lugar. Eles podiam ir e vir quando quisessem; como
votaram a favor da abolição do relógio de ponto, podiam trabalhar em casa;
poderiam tornar-se consultores. Os empregados podiam votar para decidir so-
bre a contratação ou não de uma pessoa. A divisão dos lucros foi instituída no
considerável percentual de 15%. No final dos anos 1980, o modelo funcionava
e muito bem.
168 28 mentes que mudaram o mundo

Os seis princípios de Semler

1. Não aumente o tamanho de seu negócio desnecessariamente.


2. Nunca deixe de ser uma start-up.
3. Não seja babá de seus funcionários.
4. Deixe que o talento apareça.
5. Tome decisões rápida e abertamente.
6. Faça muitas parcerias; você não pode fazer tudo sozinho.

Em 1988, Semler publicou seu primeiro livro, Virando a própria mesa. Vendeu
45 mil exemplares em três meses. O livro não fazia elogios às instituições indus-
triais brasileiras e à sabedoria convencional: atestava que as empresas brasileiras
eram conservadoras, concebidas para atender aos próprios interesses e que min-
guariam e morreriam quando o país abrisse suas portas para a concorrência es-
trangeira. Depois, ele deu uma entrevista para a revista Veja e criticou, mais uma
vez, as instituições empresariais. Como o Financial Times declarou, “tudo isso
poderia não passar de um capricho de criança mimada, se não fosse pelo sucesso
estrondoso de Semler como homem de negócios”. De fato, todos aqueles que
rezavam para que esse arrogante industrial caísse de cara no chão ficariam muito
desapontados: em 1980, as vendas da Semco foram de US$4 milhões. Em 1987,
chegaram a US$39 milhões. O crescimento foi, por qualquer ponto de vista, im-
pressionante, e pelos padrões brasileiros foi mais do que surpreendente. Além do
mais, a empresa diversificara de uma simples base para dúzias de áreas.
A história da Semco ficou ainda mais estranha – em 1993, a empresa tinha
somente 200 pessoas na folha de pagamento. O resto estava indiretamente
empregado, fosse como consultores, gerindo seus próprios negócios dentro
da empresa ou como autônomos e, muitas vezes, trabalhando a distância.
Semler passou de enfant terrible para homem admirado pelas instituições e com
o qual todos queriam aprender algo. Foi votado como o homem de negócios
brasileiro do ano em 1990 e em 1992. A empresa foi tida como o negócio de
reengenharia mais bem-sucedido no mundo; seu sucesso é ainda mais notável
ao se considerar a situação da economia brasileira, que experimentara uma
hiperinflação no início dos anos 1990.
Ricardo Semler 169

O que realmente trouxe Semler ao noticiário global foi a publicação, em 1993,


de seu livro Maverick!, a versão em inglês do best-seller Virando a própria mesa.
Foi um dos livros de negócios mais vendidos no mundo. Como todo fenômeno
editorial, foi na hora certa. O Ocidente estava há muito tempo importando a
sabedoria estrangeira sobre negócios do Japão, mas a superestrela asiática havia
perdido seu brilho e começara a entrar na década do declínio. Além disso, os
primeiros sinais da revolução pontocom já eram sentidos. Havia grande apetite
por novas ideias, e um brasileiro radical se encaixava nesse quadro perfeitamente.
Maverick! fez dele uma superestrela da mídia, e o público de negócios queria
sempre muito mais. Depois desse livro, em 2003 Semler escreveu The Seven
Day Weekend: Changing the way work works, publicado no Brasil em 2006 com o
título Você está louco! Uma vida administrada de outra forma.
Durante os anos 2000, o envolvimento de Semler na estranha porém ma-
ravilhosa empresa que ele criara (ou reformulara) diminuiu. De certa forma,
isso era inevitável – ao ceder tanto poder para outras pessoas, ele acabou trans-
formando a posição de CEO em um trabalho de meio expediente. A empresa
praticamente se geria sozinha e ele brincava dizendo que estava mais ou menos
desempregado. Em 2003, a Semco teve uma receita anual de US$212 milhões
ou, aproximadamente, 50 vezes mais do que faturava quando o jovem Semler
de 21 anos tomou as rédeas da empresa. Outra medida de sucesso resultante
das ações estabelecidas por Semler foi a baixa rotatividade de empregados –
1% ao ano.
Felizmente, ele tinha outros interesses e voltou sua atenção para a educação.
Passara sete anos analisando as escolas democráticas e, em 2003, fundou uma
instituição em São Paulo chamada Escola Lumiar, que usou muitas das ideias
que tornaram a Semco um tremendo sucesso e as adaptou para a educação
de jovens brasileiros. Não havia salas de aula nem professores, mas mentores
em tempo integral e especialistas em meio período. A experiência radical na
educação realizada por ele não era só privilégio de filhos de ricos; ao contrário,
75% dos alunos tinham bolsa de estudos e vinham das classes mais pobres.
Existem agora três dessas escolas. Outras atividades para as quais ele também
se dedica incluem a promoção da democracia industrial e causas ambientais.
Tanto Semler quanto a Semco são, sem dúvida, bem-sucedidos, mas existe
ainda uma grande questão não respondida. Se essas ideias são tão brilhantes,
por que não estão em todos os lugares? Por que a Semco ainda é a única em-
presa brilhante? O próprio Semler tentou responder a essa pergunta. Numa
170 28 mentes que mudaram o mundo

entrevista para o Guardian em 1993, ele disse: “O principal problema que


aflige essas empresas é que são todas uma autocracia. Estados Unidos, Grã-
Bretanha e Brasil têm muito orgulho de seus valores democráticos na vida
civil, mas eu ainda não vi um local de trabalho democrático. Esta é a transição
difícil que está acontecendo. Ainda estamos restritos por um sistema que não
permite a democracia para as empresas ou o ambiente de trabalho” (Keegan,
1993). Disse também: “Não há nada no sistema para ajudar as pessoas a darem
um salto de fé e abrir mão do controle. Eu sei que quando permito que as coi-
sas se desconstruam elas ficam melhores, mas muitas pessoas não sabem disso.
Desistir do controle é algo que nenhum de nós faz bem em qualquer aspecto
de nossa vida.”
Ele também sugeriu outra razão pela qual a Semco não é amplamente imi-
tada: outras empresas que tentaram acabaram indo pelo caminho do cole-
tivismo. Também assinala que, durante o boom das pontocom, parecia que
seu modelo anárquico, mas democrático, finalmente tinha um lugar ao sol.
“Disseram: esse negócio da Semco funciona! Havia pufes na recepção, mas
isso não deu em nada. Tão logo as empresas começaram a ficar sérias, os exe-
cutivos começaram a ter salas fechadas e privadas, e duas secretárias.” Existe
certamente uma explicação para isso e que bate com outra de suas observações
que podem estar mais perto da verdade: o sistema vigente nos impingiu o tipo
errado de líder, uma espécie de fanático, ambicioso e obstinado, mas um tanto
sociopata, do sexo masculino, emocionalmente retrógrado, que é o estereótipo
ridicularizado do detentor de MBA para todo mundo.
Há uma verdade aqui também. Uma das grandes razões de por que não
existem mais Semlers é, provavelmente, porque pessoas como ele não conse-
guem subir na maioria das empresas. Assim, de forma paradoxal, a única pes-
soa na posição de instituir a democracia industrial é alguém que tenha herdado
seu trabalho. Semler foi um tipo de Gore Vidal industrial – e os que estão mais
aptos para zombar e subverter a elite têm de sair de dentro dela. Eles enten-
dem como as coisas funcionam e não se impressionam com as armadilhas
do poder. Contudo, é preciso ter caráter e intelecto – e poucos descendentes
de famílias abastadas tentam derrubar o sistema que lhes deu a posição que
ocupam. Semler tinha as duas coisas: caráter e intelecto, e isso fez dele uma
excentricidade – meio homem de negócios, meio filósofo ou pensador. Pou-
cas pessoas têm a chance de dirigir uma empresa séria aos 21 anos – e destas,
uma minúscula parte está disposta a virar a mesa ou metralhar a manada de
Ricardo Semler 171

vacas sagradas. Analisando bem, é quase impossível pensar em qualquer outra


pessoa no mundo dos negócios que seja igual a ele; talvez só exista mesmo um
único Ricardo Semler.
Naturalmente, vale a pena lembrar que muitas das ideias defendidas por ele
agradaram um grande público, e milhares de empresas adotaram uma abor-
dagem com algumas adaptações – aqui e ali – de suas ideias, mas nem todos
as aceitaram e as colocaram em prática – ou pelo menos não de maneira bem-
sucedida. Para a maioria, a Semco existe como um exemplo brilhante do que
poderia ser em vez do que realmente é.

Referências e leituras adicionais

Caulkin, Simon (1993) The boy from Brazil – Ricardo Semler, Observer, 17 de outubro.
Dawnay, Ivo (1998) Management: at odds with a Latin culture – why Ricardo Semler
is a novelty in Brazilian industry, Financial Times, 11 de novembro.
Dawnay, Ivo (1998) Survey of the state of São Paolo (11): corporate enfant terrible,
Financial Times, 15 de setembro.
Downie, Andrew (2004) Learn what you want, Daily Telegraph, 9 de fevereiro.
eWeek (Ziff Davis Media) (2004) Ricardo Semler: set them free, 30 de abril.
Financial Times (1988) At Odds With a Latin Culture, 11 de novembro.
Gardner, Darren (2003) A boss who’s crazy about his workers, Sunday Herald, 13 de
abril.
Keegan, Victor (1993) Has work reached the end of the line? Semco, Guardian, 28
de setembro.
Kellaway, Lucy (2003) How and why of the workers’ paradise, Financial Times, 14
de abril.
Management (2007) In touch: Ricardo Semler: still a maverick, 1o de abril
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 24
Herb Kelleher

M uitos setores foram transformados nos últimos 20 anos, e o da aviação é


um deles. No entanto, sua transformação foi um tanto incomum. Mui-
tos setores tornaram-se praticamente irreconhecíveis, como o da música, im-
prensa ou vídeo que, em virtude dos avanços tecnológicos, tiveram suas regras
totalmente reformuladas. Outros, como o alimentício, foram radicalmente al-
terados por causa das constantes mudanças nas preferências do público. Con-
tudo, o setor aeroviário faz exatamente a mesma coisa que fazia 30 anos atrás.
Continua levando pessoas de A a B pelos mesmos motivos pelos quais elas
sempre voaram e, embora as aeronaves de hoje sejam mais avançadas, conti-
nuam sendo aviões, muitos dos quais estão há 20 anos em serviço.
A grande mudança do setor de linhas aéreas foi ter passado de um ser-
viço comparativamente caro e sofisticado a um negócio barato, com baixas
margens, voltado ao mercado de massa. Até o fim dos anos 1980, voar ainda
era um meio de transporte caro. Em geral, o cidadão comum não voava
para passar o fim de semana na Espanha nem para fazer compras em Nova
York. No entanto, tudo isso estava prestes a mudar, e o mundo atual, onde
passagens aéreas podem ser vendidas a preço de banana – também no qual
a elegância dos anos dourados da aviação não passa de uma apagada e dis-
tante memória –, deve-se, em grande parte, a um homem e a uma empresa:
Herb Kelleher e Southwest Airlines. A empresa serviu de modelo para todas
as Ryanairs, easyJets, SpiceJets e Dragonairs do mundo. Continua sendo a
primeira companhia aérea de baixo custo e, para muitos, continua sendo
a melhor delas.
174 28 mentes que mudaram o mundo

Isso pode ser uma surpresa para o leitor não americano, mas, até pouco
tempo atrás, ela era a maior empresa de aviação do mundo em volume de pas-
sageiros. Além disso, embora nenhuma de suas aeronaves viaje além dos Esta-
dos Unidos e Canadá, a Southwest Airlines opera mais de 3.200 voos por dia
e costuma receber as notas mais altas nas pesquisas de satisfação dos clientes.
Em um mundo onde as aerolinhas enfrentam dificuldades e acabam saindo do
mercado, o balanço patrimonial da Southwest demonstra sua sustentada boa
saúde financeira. É interessante notar que a maior empresa de transporte aéreo
internacional (usando o indicador de passageiros) é a Ryanair, cujo modelo de
negócios é extremamente parecido com o da Southwest (veja o quadro a se-
guir). Um fenômeno do setor foi batizado de “efeito Southwest”, pois em cada
aeroporto que a companhia opera, a concorrência provoca redução das tarifas,
melhoria do serviço e aumento do tráfego.

Ryanair

A Southwest tem disseminado inúmeros imitadores no mundo todo. Na verdade, o ritmo da


imitação tem sido estimulado, em grande parte, pela retirada do controle governamental
– assim que um mercado deixa de ser submetido ao rígido controle estatal, surgem várias
mini-Southwests. Provavelmente, uma das imitadoras mais notáveis é a Ryanair, sediada
na Irlanda, inspirada diretamente pela Southwest (Michael O’Leary visitou a Southwest e
aplicou o modelo à sua companhia). No entanto, tirando a característica de baixo custo,
as duas organizações são bastante diferentes, em grande parte, em virtude das figuras
de seus respectivos CEOs. Enquanto Kelleher é um sujeito encantador e popular, O’Leary
talvez seja mais conhecido por seu “ar desafiador” com a mensagem implícita de “você
vai receber pelo que pagou e nada mais”. O’Leary é um dos CEOs mais azedos do mundo
e tem verdadeiro prazer de dizer aos clientes exatamente o que pensa. Algumas de suas
citações mais memoráveis incluem: “O consumidor europeu rastejaria nu sobre vidro que-
brado para conseguir tarifas mais baixas” e “Não nos derretemos só porque o passageiro
diz que a avó está doente”. É pública e notória sua insinuação de que gostaria de cobrar
os passageiros pelo uso do banheiro e que copilotos representam uma despesa que ele
gostaria de cortar. Nem assim ele afugentou as pessoas: hoje a Ryanair é a maior empresa
aérea de baixo custo na Europa. Segundo O’Leary, sua postura desdenhosa é o preço que
se paga pela democratização das viagens de avião: “Agora todos podem voar.”
Herb Kelleher 175

Herb Kelleher, ex-CEO da Southwest, também não era um CEO normal.


Muitas vezes descrito como uma figura carismática, alegre e imponente, Kel-
leher também ficou conhecido pela paixão por charutos e uísque, e deixou a
marca de sua personalidade divertida na empresa. Sua irreverência como CEO
levou-o ao extremo de se fantasiar de Elvis para os comerciais da empresa e
como um Leprechaun (duende da mitologia irlandesa) para o dia de St. Pa-
trick. Fumava cinco maços de cigarros por dia e adorava passar a noite toda
em festas. Os funcionários o convidavam para caçar, nunca esperando que ele
aceitasse, mas Kelleher ia. Também recebia novos funcionários cantando raps
(o leitor curioso pode encontrar amostras disso pesquisando com o termo “ra-
pping CEO” no YouTube).
Embora possa parecer louco, ele foi um excelente chefe, muitas vezes acla-
mado como o melhor CEO da América. Dizia coisas como “Uma empresa
é mais forte quando unida pelo amor, não pelo temor”, e seus funcionários
realmente o adoravam. Mostravam seu amor com produtividade extraordiná-
ria, que é uma das razões pelas quais a Southwest tornou-se um sucesso. Na
verdade, a mistura de grande personalidade e tino comercial de Kelleher levou
muitos a insinuarem que, embora o modelo da Southwest fosse copiado em
todo o mundo, não é possível assimilar o estilo de gestão do homem por trás
da empresa. Por quê? Porque ele é único – não há outra pessoa como Kelleher
no mundo dos negócios.
Kelleher nasceu em 12 de março de 1931, perto de Camden, no estado de
New Jersey. Era bom aluno, atleta de destaque e presidente do grêmio estu-
dantil. Terminado o ensino médio, ingressou na Wesleyan University, onde
estudou Literatura Inglesa e, em seguida, entrou na New York University
School of Law. Enquanto ainda estava na faculdade, trabalhava no verão para
a Campbell Soup Company, onde seu pai era gerente-geral. Enquanto estu-
dava na New York University, Kelleher morava em Greenwich Village. Sem
sombra de dúvida, era um homem divertido, que gostava de uma festa, motivo
pelo qual escolheu esse endereço. Certa vez ele disse: “Tenho um pequeno
apartamento em Washington Square e é só abrir a porta para muita gente
divertida entrar e fazer a festa.”
Terminado o curso de Direito, começou a trabalhar como escrevente no
Superior Tribunal de Justiça de New Jersey. Depois mudou-se para Newark,
New Jersey, e casou-se com uma texana. Durante uma visita à família da espo-
sa em San Antonio, gostou do lugar, tanto pela qualidade de vida quanto pelas
176 28 mentes que mudaram o mundo

oportunidades profissionais da região. O casal decidiu mudar-se para o Texas


e ele abriu um escritório de Direito no local. Em 1966, um de seus clientes,
Rollin King, que recentemente visitara a Califórnia, falou-lhe a respeito da
PSA, uma companhia aérea de baixo custo da costa oeste. King acreditava
que algo parecido poderia funcionar no Texas. Em 1967, a dupla fundou a
Southwest Airlines. Na época, a aviação comercial era um negócio com altas
margens de lucro, muito sofisticado, e as pessoas se arrumavam com elegância
para viajar de avião. A estratégia deles tinha duas partes: usariam aeroportos
secundários e mais baratos, em vez dos situados nos eixos centrais, e cortariam
todas as futilidades. Os dois tornariam as viagens aéreas um artigo barato.
Ao que dizem, a ideia para a Southwest foi esquematizada em um guarda-
napo. Desenharam um triângulo representando Dallas, Houston e San An-
tonio – atenderiam essas três cidades tendo a base em Dallas. A companhia
aérea, originalmente chamada Air Southwest, foi constituída em 1967, mas só
começou a voar efetivamente em 1971 por causa das exigências regulamenta-
res e do litígio levantado por rivais que pretendiam estrangular o novo negócio
logo no nascimento (nos anos seguintes, lamentariam por não ter tentado com
mais afinco). O início dos anos 1970 foi um período difícil – Kelleher disse
que, na época, “tentávamos apenas garantir a sobrevivência dia após dia”.
Contudo, em 1973, a Southwest teve seu primeiro ano lucrativo e, em
1974, foi a primeira companhia aérea local de pequeno porte a transportar o
milionésimo passageiro. Em 1977, comemoraria o voo de seu quinto milioné-
simo passageiro e passou a ser listada na Bolsa de Valores de Nova York sob a
sigla LUV. No ano seguinte, Lamar Muse assumiu a presidência da empresa e
Kelleher passou a atuar como CEO interino, efetivado quatro anos depois. A
empresa continuou crescendo a passos largos e, em 1979, adicionou voos para
New Orleans. Em 1981, comemorou “uma década do Love Southwest Style”
(“Adoro o estilo da Soutwest”, numa tradução livre) e, em 1982, quando Kel-
leher tornou-se o CEO efetivo, a Southwest passou a operar em destinos mais
distantes, como San Francisco, Los Angeles, Las Vegas e Phoenix.
A empresa também começou a atrair admiração extraordinária. Seus clien-
tes a adoravam – fossem passageiros em viagens de lazer ou pessoas de negó-
cios preocupadas em obter os preços mais baixos. Os funcionários também
amavam a companhia e procuravam ir além das expectativas. Kelleher era um
verdadeiro chefe de torcida de uma empresa em que todos pareciam divertir-
se a valer. Em 1989, a companhia faturou seu primeiro bilhão de dólares. Em
Herb Kelleher 177

1990, formou o Comitê de Cultura, com o objetivo de preservar sua singular


cultura corporativa conforme os negócios se expandiam. Em 1991, comemo-
rou o vigésimo aniversário com o slogan “20 years of loving you!” (20 anos
amando vocês) com festas em suas 32 bases. No fim daquele ano, a empresa
possuía 124 aeronaves e empregava quase 10 mil pessoas. Entre o fim dos anos
1980 e meados dos 1990, a empresa mais do que triplicou seu tamanho.
Pouco tempo depois, a Southwest expandiu suas operações para a costa les-
te e, além da expansão geográfica, continuou seu pioneirismo com várias ideias
inovadoras. Todos os seus aviões eram Boeings 737, pois um único tipo de ae-
ronave facilitava a programação e os serviços de manutenção. Foi a primeira a
lançar um sistema de viagens sem passagens e a maior (e principal) companhia
aérea a disponibilizar reservas on-line. O caráter excêntrico também aparecia
em todos os lugares. Os aviões eram pintados como baleias assassinas. Em
1993, quando adquiriu a Morris Air, empresa de transporte aéreo de Utah,
encenou um casamento. Kelleher desafiou outro CEO a um braço de ferro
para decidir quem usaria determinado slogan. Os espectadores faziam piadas
enquanto repetiam anúncios sobre segurança. Há um relato famoso segundo
o qual, após um pouso particularmente difícil em Salt Lake City, o piloto
anunciou: “Bem, foi um solavanco e tanto, e sei o que todos vocês estão pen-
sando. Estou aqui para dizer-lhes que não foi culpa da companhia aérea, não
foi culpa do piloto, não foi culpa do comissário de bordo (...) a culpa é toda
do asfalto!”
Apesar de todas as loucuras que alimentaram muitas manchetes na im-
prensa, o maior diferencial da Southwest, em relação a operadoras de alto e de
baixo custo, é o vínculo que consegue estabelecer com os clientes. Para citar
apenas um exemplo recente, as companhias aéreas de baixo custo começaram a
cobrar uma taxa de bagagens, geralmente com um sistema bizantino de regras
e tarifas, que mais parecia ser criado para confundir e conseguir meter a mão
no bolso do cliente com maior facilidade. Em um forte contraste, a Southwest
fez um grande acordo de embarque gratuito de bagagens – em um setor em
que o modelo de muitos players parece focado cada vez mais na cobrança de
taxas dissimuladas, essa foi uma grande sacada.
No cerne de tudo isso estava Kelleher e sua confiança plena em sua equi-
pe. Em 1994, um artigo da revista Fortune perguntava: “Herb Kelleher é o
melhor CEO da América?” (Labich, 1994). Parece que a resposta era afirma-
tiva, visto que, em 1998, a Southwest foi considerada a melhor empregadora
178 28 mentes que mudaram o mundo

pela Fortune. Kelleher sempre sustentou que ser uma boa companhia para se
trabalhar nada mais é que uma forma inteligente de defender seus interesses
próprios. Em 2003, ele explicou que “os funcionários vêm em primeiro lugar
e, se forem tratados do jeito certo, tratarão o mundo pelo mesmo critério. Os
clientes usarão os produtos da empresa novamente, o que deixará os acionistas
felizes.” Na verdade, a Southwest é um bom lugar para trabalhar e, além da
cordialidade de Kelleher, paga generosos salários, em um setor conhecido por
fazer exatamente o contrário. A empresa também faz questão de contratar
pessoas com bom senso de humor.
Em 1999, Kelleher recebeu um diagnóstico de câncer de próstata, mas con-
tinuou trabalhando durante todo o tratamento, alcançando a cura. Em 2001,
deixou o cargo de CEO, mas manteve-se como presidente do conselho. Em
2008, aos 71 anos, abdicou da função após presidir sua 31a reunião geral anual.
No entanto, permanecerá como funcionário da empresa até 2013, com um
salário de US$400 mil ao ano e diz que faz tudo o que lhe pedem.
Excentricidades à parte, sem dúvida o teste definitivo de uma empresa é
ver se ela dá lucro. Doidos que ganham dinheiro são rebeldes geniais, ao passo
que desmiolados que só geram prejuízos não passam de loucos. Por esse parâ-
metro, Kelleher e a Southwest demonstram um desempenho extraordinário.
Em 2010, a empresa manteve-se lucrativa pelo 37o ano consecutivo. Em qual-
quer outro setor, isso já seria um feito impressionante, mas na aviação beira o
impossível, especialmente diante das dificuldades impostas pela recente crise
financeira e após as radicais mudanças ocorridas em decorrência do 11 de Se-
tembro. O valor das ações da Southwest disparou entre o fim dos anos 1980
e início dos 2000 e, mesmo diante de todas as tribulações, não sofreu tanto
quanto se poderia esperar.
Contudo, a Southwest não deixa de ser alvo de críticas, e pagou multas
pesadas em 2008 por falhas de segurança e manutenção. Em 2009, um avião
teve de fazer um pouso de emergência em West Virginia quando um bura-
co do tamanho de uma bola de futebol abriu-se na fuselagem, provocando a
despressurização da cabine de passageiros. Em 2010, num incidente menos
grave, o cineasta Kevin Smith desceu a lenha na companhia quando ela o
recusou como passageiro por ser gordo demais para caber nos assentos das
aeronaves. No entanto, o consenso tende muito aos comentários que um de
seus funcionários publicou na Amazon sobre o livro Nuts!: as soluções criativas
da Southwest Airlines para o sucesso pessoal e nos negócios:
Herb Kelleher 179

Já li muitas resenhas sobre como este livro é “piegas”. Talvez digam isso porque não
conseguem acreditar que uma empresa tão boa assim possa existir... Posso dizer,
sem medo de errar, que o livro NÃO é exagerado! O estilo de bem-estar enfatizado
repetidamente ao longo do livro é uma realidade. As pessoas se preocupam umas
com as outras. Todos os dias (como mostra o livro) todos se sentem valorizados, e
esse reconhecimento faz todos quererem trabalhar com mais afinco e inteligência,
promovendo o crescimento da LUV [Southwest Airlines Co].

Referências e leituras adicionais

Bird, J B (2003) An entrepreneur for all seasons, McCombs School of Business Magazi-
ne, edição de primavera/verão
Freiberg, Kevin e Freiberg, Jackie Nuts!: as soluções criativas da Southwest Airlines para
o sucesso pessoal e nos negócios, São Paulo: Manole, 2000
Kelly, Brad (2008) He gave Southwest its wings, Investor’s Business Daily, 8 de
fevereiro
Koenig, David (2008) Kelleher steps down as Southwest Airlines chairman; he and
client started business; employees give emotional send off, Associated Press, 22 de
maio
Labich, Kenneth (1994) Is Herb Kelleher America’s best CEO?, Fortune, 2 de maio
Site da Southwest website, www.southwest.com
WATS (IATA)
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 25
Andy Grove

O homem que ficou conhecido como o Henry Ford dos microprocessadores


também foi o que se pode chamar de integrante da primeira geração do
Vale do Silício (nomes como Steve Jobs e Bill Gates são membros da segunda
geração, e os do boom das empresas pontocom, representantes da terceira gera-
ção). Como tal, Grove é sinônimo de hardware, não de software. Isso pode até
parecer antiquado hoje em dia, mas não é. Prova disso é que os chips da Intel
causaram e continuam tendo um impacto profundo no mundo da tecnologia
na mesma medida do sistema operacional Windows ou dos belos gadgets da
Apple. Na verdade, é fácil dizer que eles são mais fundamentais. O ciclo de
atualização de tecnologia cada vez menor é impulsionado em grande parte
pela Intel. Novos chips Intel aparecem com frequência muito maior que novas
versões do Windows.
O próprio Grove – o terceiro funcionário da Intel que acabou ocupando o
cargo de CEO – tem uma trajetória extraordinária que pode muito bem ser
um resumo da história do século XX. Húngaro por nascimento, sobreviveu
aos nazistas e chegou aos Estados Unidos como imigrante sem um centavo no
bolso. Vindo do nada, Grove prosperou ao status de um dos homens mais in-
fluentes no setor de tecnologia, chegando depois ao ápice de ser incluído entre
as mentes de gestão mais influentes de nossa era. Autor de inúmeros livros –
do best-seller Só os paranoicos sobrevivem (1996) a Swimming Across (2001), sua
autobiografia um tanto comovente. Por fim, tornou-se uma figura de grande
importância na luta contra o câncer de próstata. Contudo, no mundo ególatra
da gestão americana, ele continua um homem muito modesto.
182 28 mentes que mudaram o mundo

Grove nasceu em Budapeste, em 1936, batizado András Gróf. Teve es-


carlatina na infância, quase morreu, e ficou com considerável perda auditiva.
Durante a Segunda Guerra, o pai desapareceu, mas a mãe conseguiu fugir
dos nazistas. No fim da guerra, a opressão e a brutalidade dos nazistas deram
lugar à perversidade dos russos. Como revelam seus relatos em Swimming
Across, um soldado russo estuprou sua mãe. O pai de Grove reapareceu hor-
rivelmente debilitado em decorrência do período que passou nos campos de
concentração. Grove diz que o pai demorou anos para conseguir falar desses
acontecimentos.
Quando os russos esmagaram o levante húngaro, em 1956, Grove e um
amigo conseguiram passar para o outro lado da fronteira com a Áustria. Com
a ajuda de várias pessoas, atravessou a Europa e embarcou em um navio para
os Estados Unidos. Quando chegou a Nova York, em 1957, não tinha um
centavo no bolso e não falava uma palavra em inglês.
Como refugiado húngaro, Grove ganhou uma bolsa de um ano para estu-
dar na City College de Nova York, e lavou louça para se sustentar. Formou-
se em 1960 em Engenharia Química, depois fez doutorado na University of
California, Berkeley. Nessa época, percebeu que o futuro – e a fortuna – não
estavam no setor de produtos químicos, mas no de eletrônicos. Desse modo,
depois de concluir o doutorado, em 1963, ingressou na Fairchild Semiconduc-
tor, uma empresa pioneira na fabricação de circuitos integrados, trabalhando
como pesquisador. Grove progrediu na hierarquia e tornou-se diretor adjunto
de Pesquisa e Desenvolvimento em 1967.
No entanto, logo a Fairchild passaria por dificuldades, tendo de realizar
um profundo corte de funcionários, cuja lista incluía Gordon E. Moore (pai
da Lei de Moore) e Robert Noyce. A dupla saiu para fundar a Intel em 1968.
Andy Grove era o terceiro da lista. Na época, a empresa era pouco mais que
um plano de negócios e uma promessa de recursos financeiros. A ideia era
fabricar circuitos integrados e chips de memória – um campo promissor, mas
sem nada de especialmente inovador.
A princípio, Moore e Noyce pensaram que Grove procuraria oportunida-
des no campo da pesquisa, mas em pouco tempo ele decidiu que, apesar de sua
formação, estava muito mais interessado no setor industrial, onde acreditava
residir seu real talento. Ele queria tornar o processo de fabricação o mais efi-
ciente possível e logo ganharia a reputação de enfrentar problemas com uma
postura resoluta e fazer perguntas embaraçosas que, muitas vezes, pareciam
Andy Grove 183

indelicadas ao interlocutor. Grove tinha duas qualidades que o destacaram dos


rígidos racionais normais. Primeiro, ele era muito bem articulado. Na verdade,
tinha uma queda para frases feitas, e ideias como “confrontação construtiva”
pareciam-lhe bastante interessantes. Segundo, era brilhante em organização
industrial e simplificação de processos de produção, na época ainda muito crus
em relação aos padrões atuais, o que resultou em enorme impulso à lucrativi-
dade. O Washington Post o descreveu como “o instrutor militar da Intel”.
Os anos 1970 viram os primeiros sinais do tsunami tecnológico que resul-
taria na revolução da informação, na onipresença da computação e na internet.
A Intel lançou o primeiro microprocessador comercial no mercado em 1971
e houve um boom nas vendas da empresa. Os chips eram a base dos primeiros
PCs da década de 1970. Embora ainda fosse um mercado bastante especializa-
do, a Intel começava a acreditar que essa característica logo mudaria e que seus
chips poderiam ter uma variedade muito maior de aplicações. Sendo assim,
fez investimentos pesados em P&D. Em 1979, a Intel era um grande player
e Grove, seu presidente, mas o produto principal continuava sendo chips de
memória.
Em 1979, a empresa começou a estabelecer-se como fabricante preferencial
de microprocessadores em uma campanha chamada Operation Crush, diante
da entrada de inúmeros concorrentes no mercado. Mais especificamente, o
objetivo era vencer a IBM (meta que foi alcançada) e, como a IBM começou a
usar os microprocessadores 8086 da Intel, a empresa conquistou esse segmento
conforme almejado. Entretanto, mesmo com esse sucesso, não poderia parar
se quisesse manter a posição alcançada. O mercado manteve a característica de
queda nos preços, concorrentes ricos começavam a alcançá-los (vale lembrar
que a barreira aos novos rivais agora era financeira), e os modelos japoneses
mais baratos deram início a uma verdadeira invasão no mercado de chips de
memória. No início dos anos 1980, Grove decidiu sair desse segmento e man-
ter o foco nos microprocessadores, cujo mercado havia crescido graças à IBM
e seus clones. Além disso, até certo ponto, nessa seara a Intel poderia definir
seu ritmo. Apesar de tudo, esse foi um passo ousado no desconhecido.
Foi então que Grove tornou-se efetivamente o principal motor por trás da
empresa. Ele tinha plena convicção no trabalho árduo e mantinha uma lista
dos funcionários que chegavam depois das oito. Não demorou a ficar conhe-
cido como “general prussiano”, mas também como ótimo gestor. Lado a lado
com a dedicação estava sua capacidade de organizar e motivar, além de uma
184 28 mentes que mudaram o mundo

boa dose de empowerment – como outros tantos chefes geniais, Grove delega-
va. Com o passar dos anos 1980, a empresa percebia que seus microprocessa-
dores saíam dos escritórios para as residências.
Grove tornou-se CEO em 1987. O mercado de microprocessadores conti-
nuava em desenvolvimento, e a velocidade das mudanças aumentou exponen-
cialmente. Cada vez que lançava um novo produto, a Intel logo começava a
pensar no próximo, pois em pouco tempo o lançamento se tornaria o padrão
e, como consequência, o preço cairia. De mais a mais, embora a Intel fosse
líder do mercado, havia concorrentes o suficiente para mantê-la sempre alerta.
Um dos aforismos mais conhecidos de Grove (que também foi o título de um
de seus best-sellers) é Só os paranoicos sobrevivem, e é fácil ver de onde saiu o
ditado em um mercado em que a desconfiança tornou-se hábito.
Em 1989, a Intel começou a desenvolver o microprocessador Pentium,
o sucessor dos antigos 386 e 486, que moviam a maioria dos computadores
do mundo. É interessante notar que escolheram o nome Pentium, em vez de
586, porque a justiça determinou que números não poderiam virar marcas
registradas. A empresa enfrentou dificuldades na recessão do início dos anos
1990, e Grove, o eterno capataz, determinou que todos os funcionários de-
veriam trabalhar 50 horas semanais pelo mesmo salário. Em 1993, as coisas
começaram a melhorar, o Pentium foi lançado com o tipo de alarde mais
comum em novos modelos de carro ou no último CD de pop stars, talvez
numa indicação do quão dominante os computadores haviam se tornado. A
empresa gastou um montante colossal em marketing (quantia inédita para
uma empresa que, essencialmente, fabricava componentes) e lançou o famo-
so jingle “Intel inside”.
Tudo parecia ótimo, mas no ano seguinte Grove cometeria seu maior erro,
e seu microprocessador carro-chefe causou-lhe as maiores dores de cabeça de
sua careira. Em 1994, Thomas Nicely, professor de Matemática da Lynchburg
College, descobriu um defeito de ponto flutuante no Pentium P5. Grove res-
pondeu primeiro como engenheiro, ressaltando que a falha praticamente não
afetaria ninguém. Na época, ele disse: “Se você souber onde cairá um meteoro,
poderá ir lá e pegá-lo.” A resposta não caiu nada bem para as legiões de usuá­
rios domésticos e, pouco tempo depois, ele admitiu não ter entendido que
lidar com consumidores era tão diferente de tratar com pessoas que entendiam
como os componentes eletrônicos funcionam. Por fim, a empresa ofereceu a
troca dos processadores sem custo adicional. A crise acabou custando US$500
Andy Grove 185

milhões, mas, mesmo assim, todos concordam que a atitude assertiva de Gro-
ve fez bem à imagem da empresa.
Fora isso, os anos 1990 foram muito bons para a Intel, pois consolidaram
sua liderança de mercado, e o preço das ações decolou. Grove publicou seu
best-seller Só os paranoicos sobrevivem em 1996, e a combinação de um atraente
gênio gerencial da indústria de tecnologia com o seu lado pé no chão fez de
Grove uma das superestrelas da gestão de meados ao fim dos anos 1990. No
entanto, seu assombroso sucesso como alto tecnocrata estava prestes a sofrer
um revés em virtude de sua saúde. Em 1995, Grove recebeu o diagnóstico de
câncer de próstata, mas não fez o menor segredo disso. Na verdade, em maio
de 1996, foi capa da revista Fortune com a manchete “Enfrentando o câncer de
próstata”. Na matéria, ele escreveu o seguinte:

Minha secretária colocou o rosto no vidro da sala de reuniões e pude ver nos olhos
dela que acabara de receber a ligação que estava esperando. Pedi licença e saí ra-
pidamente da sala. Quando fechei a porta, ela confirmou que meu urologista me
aguardava ao telefone e eu saí correndo para o meu escritório.
Ele foi direto ao ponto: “Andy, você tem um tumor predominantemente do lado
direito, mas que já avançou um pouco para a esquerda. É um tumor moderada-
mente agressivo.” O lado relativamente bom é que “há poucas chances de o tumor
espalhar-se”. A conversa foi absolutamente franca, como se estivéssemos conver-
sando sobre resultados laboratoriais para concluir se eu tinha uma faringite.
No entanto, meu problema não era uma faringite, mas um câncer de próstata.

Sua franqueza sobre a doença só serviu para elevar a consideração e o cari-


nho que o público tinha por ele. (Catherine Fredman, sua ghostwriter, relem-
bra: “Perguntei: ‘Incontinência ou impotência? Isso é o que todo mundo quer
saber.’ Ele fez uma pausa e logo disse o que eu precisava saber.”) Em 1997, foi
aclamado como Homem do Ano pela revista Time. Em resposta ao interesse
que o público passou a demonstrar depois da honraria, Grove começou a es-
crever Swimming Across (publicado em 2001), com grande material, até então
inédito, sobre sua infância.
Para combater a doença, Grove empreendeu o mesmo tipo de esforço her-
cúleo que empreendera para comandar a Intel. Depois de fazer muita pesquisa,
falar com inúmeros especialistas e ponderar criteriosamente as probabilidades,
submeteu-se a um tipo relativamente novo de radiação, que deu certo até ago-
ra. Em 1998, deixou o posto de CEO, mantendo-se apenas como presidente
186 28 mentes que mudaram o mundo

do conselho. Em 2005, abriu mão também dessa função e hoje detém o título
de conselheiro sênior.
Para um homem que venceu tantos obstáculos, a história de Grove tem um
desfecho triste. Em 1999, ele percebeu um tremor na mão. Depois de sobre-
viver a todo tipo de mazela – da escarlatina e nazistas ao câncer de próstata
–, agora Grove estava com doença de Parkinson. Na época, manteve silêncio,
mas acabou revelando a doença na sua autobiografia em 2006. “Não queria
virar um garoto-propaganda por outra doença. Estava cansado de ser a refe-
rência quando se tratava de câncer de próstata.” E acrescenta: “O câncer, você
não vê. Já essa coisa faz a gente parecer um velho e sou um sujeito vaidoso.”
Isto posto, ele combate esse mal exatamente com o mesmo vigor com que lu-
tou contra o câncer. Além disso, como ainda falta muito tempo para a doença
piorar, se alguém tem alguma chance de se recuperar da doença de Parkinson,
essa pessoa é Andy Grove.
Quanto à Intel, como aconteceu com muitas empresas de tecnologia, o va-
lor de suas ações nunca mais recuperou os picos alcançados nos anos de glória
do boom das empresas pontocom, mas a empresa manteve sua participação de
mercado, que continua parecida com a que desfrutava no início dos anos 1980.
Mesmo agora, a despeito da forte e mantida concorrência, a Intel é número
um em todos os principais mercados onde atua e seus microprocessadores con-
tinuam ditando o ritmo das mudanças tecnológicas.
Para terminar, pode ser interessante observar que, pelos padrões do Vale do
Silício e do que Grove alcançou, sua fortuna é relativamente modesta e pode
ser avaliada em centenas de milhões, em vez de bilhões. Na verdade, durante
toda a sua vida, foi conhecido como um homem que se abstém das armadilhas
normais das megafortunas dos CEOs – aviões, mansões projetadas por arqui-
tetos famosos, ilhas, e assim por diante. Como disse uma vez ao Wall Street
Journal: “Há quem se esforce para garantir que as pessoas sempre saibam o
que se faz. O oposto é achar que, como ninguém nunca leva 100% do crédito,
então tanto faz. Fazer alarde das realizações pode levar os outros a achá-lo um
imbecil. Eu me inclino ao segundo ponto de vista.”
Andy Grove 187

Referências e leituras adicionais

Corcoran, Elizabeth (1996) Intel’s blunt edge, Washington Post, 8 de setembro


Corcoran, Elizabeth (1998) Intel CEO Andy Grove steps aside, Washington Post, 27
de março
Dolan, Kerry A (2008) Andy Grove’s last stand, 28 de janeiro
Gross, Daniel (1996) Forbes Greatest Business Stories of All Time, Wiley, Oxford, pp
246–65
Grove, Andrew S (1996) Só os paranoicos sobrevivem: como tirar melhor proveito das
crises que desafiam carreiras e empresas, São Paulo: Futura, 1997
Grove Andrew S (2001) Swimming Across, Warner Books, Nova York
Intel, Biography: Andy Grove, no site em www.intel.com
Parker, Ciaran (2006) The Thinkers 50: The world’s most important and influential bu-
siness thinkers, London Business Press, Londres
Rigby, Rhymer (2010) Ghosts and the corporate gurus, Financial Times, 22 de
fevereiro
Wallace, G David (2001) The struggle to become Andy Grove, Businessweek, 3 de
dezembro
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 26
Roman Abramovich

D e uma infância trágica e pobre passada no gélido interior da Rússia aos


seus atuais bilhões de petrodólares, Roman Abramovich é, provavelmente,
o homem que melhor representa a nova Rússia. Seja nos teatros de Londres,
cercado por guarda-costas, relaxando em seu megaiate ou comprando grandes
obras de arte como outras pessoas compram jornais, ele é o exemplo vivo e
personificado do que aconteceu desde a queda do comunismo e a ascensão do
Estado capitalista russo. Como muito da nova Rússia, ele poderia facilmente
ter saltado, pleno e absoluto, das páginas de um romance de John le Carré.
O curioso é que, no Reino Unido, possivelmente ele é mais conhecido
como alvo preferencial dos tabloides, não porque os principais leitores ver-
melhos sejam fascinados por oligarcas russos, mas porque ele é o dono do
Chelsea Football Club – ou “Chelski”, como foi, inevitavelmente, rebatizado
após ser comprado por Abramovich. Entretanto, mesmo com esse cartão de
visitas, Abramovich tem um passado obscuro e mal documentado: é fácil ler
dez relatos diferentes e obter dez histórias diferentes, de modo perceptível e
bastante destoante. Ele é muito conhecido por ser misterioso e poderoso, e o
poder e o mistério parecem alimentar-se um do outro. É notoriamente tímido
com relação à mídia e raramente concede entrevistas.
Qualquer um que conheceu Abramovich em seus primeiros anos nunca
o imaginaria como um playboy bilionário em Londres. Ele nasceu em 1966
em Saratov, uma cidade consideravelmente grande às margens do Rio Volga,
no sul da Rússia. Sua mãe faleceu quando ele tinha um ano e meio, e seu pai
morreu em um acidente em um canteiro de obras, quando ele tinha apenas 4
190 28 mentes que mudaram o mundo

anos. Na verdade, a morte de seus pais foi somente os últimos episódios em


uma trágica história familiar, pois seus avôs paternos haviam sido capturados
pela KGB sob o comando de Stalin. A família foi dilacerada, e os pais foram
enviados para os gulags (campos de trabalho forçado da ex-URSS), nos quais
só sua avó materna sobreviveu. Quem procura explicação para a motivação ex-
traordinária de Abramovich muitas vezes aponta para esse cenário desolador.
O jovem Roman foi adotado por um tio paterno, que era funcionário pú-
blico da indústria do petróleo, e sua esposa em Ukhta, uma cidade que sobre-
vivia basicamente do petróleo e gás ao sul do Círculo Ártico. Criado como se
fosse filho legítimo, Abramovich só soube que não era aos 16 anos. Ao que
consta, quando descobriu esse fato, aceitou-o e nunca mais tocou no assunto.
Outra figura próxima em sua primeira fase da vida foi sua avó, sobrevivente de
um dos gulags. Abramovich estudou no Industrial Institute de Ukhta e depois
trabalhou para o Gubkin Oil and Gas Institute antes de entrar no Exército
para prestar serviço militar.
Após deixar o Exército, casou-se com sua primeira esposa. O casal recebeu
2 mil rublos dos pais da noiva como presente de casamento. Abramovich usou
essa quantia negociando em um mercado local, subindo na cadeia de valores
e, finalmente, negociando criações de suínos. O comunismo estava mal das
pernas, e Abramovich claramente tinha tendência para o capitalismo, embora
não fosse realmente diferente dos milhares de outros comerciantes que eram
jovens demais para ter sua base de espírito empreendedor derrubada pelo co-
munismo. No entanto, devido à sua formação, Abramovich tinha contatos na
indústria de petróleo e gás, e estava aprendendo a usá-los.
Em pouco tempo, ficou relativamente rico. Ele abriu um negócio de pneus
em Moscou, passando depois para o setor de petróleo e gás, comprando petró-
leo russo muito barato e vendendo-o nos mercados abertos por preços do Oci-
dente. Em 1992, foi investigado por causa do roubo de 55 vagões de gasolina
que eram destinados a uma empresa em Moscou e que foram parar na Letônia
– a investigação foi para sua cidade natal e depois foi abandonada. Nos anos
seguintes, Abramovich fundou mais empresas e transferiu suas atividades para
a fase internacional. Agora, era rico mesmo para os padrões ocidentais, mas
não milionário.
Foi nessa época que a privatização de empresas russas começou. Os traba-
lhadores de estatais receberam títulos que podiam ser trocados por ações; mui-
tos deles não tinham a menor ideia do que isso significava, mas Abramovich
Roman Abramovich 191

era capitalista praticante desde meados dos anos 1980. Ele conhecia o valor
dos títulos e se ligou a esquemas para comprá-los em grandes lotes. Sua grande
chance veio em 1995, quando encontrou Boris Berezovsky, que o apresentou
para o círculo interno do poder russo e a Yeltsin.
Em seguida, veio sua jogada mais importante. Em meados da década de
1990, a Rússia estava quase falida e a administração de Yeltsin estava cam-
baleante. A solução, como então pessoas como Berezovsky já sabiam, era
vender ativos estatais para os “oligarcas” a preços baixíssimos e usar o quid
pro quo (recompensa) para manter o governo solvente. Yeltsin – e os oligar-
cas – também queriam evitar um retorno ao governo comunista, primeiro
porque ficariam fora do poder, depois porque seus bens seriam rapidamente
reestatizados. Reunindo uma série de empresas de vida curta, por pouco
mais de US$100 milhões, Berezovsky e Abramovich compraram a compa-
nhia de petróleo Sibneft, que valia mais de US$2,5 bilhões. Como muitos
outros participantes, Abramovich admite que os ativos foram vendidos por
uma bagatela, mas alegou que o motivo foram os riscos (incluindo o de um
retorno ao comunismo) elevados demais. Essa pode ser uma explicação não
muito convincente.
Em seguida, voltou suas atenções para a indústria de alumínio. Esse perío-
do específico foi chamado de “guerra do alumínio”, da qual Abramovich saiu
triunfante e ileso. Em 1996, ele era tão rico que havia se tornado muito próxi-
mo de Yeltsin e foi convidado a se mudar para um apartamento no Kremlin.
Abramovich tinha um talento que Berezovsky não tinha. Ele era encan-
tador e diplomático. Fez amigos, enquanto seu ex-mentor fez inimigos. Em
1999, Putin assumiu o poder, e pouco depois Berezovsky deixou o país, após
ter entrado em conflito com o novo presidente autoritário, apesar de tê-lo aju-
dado a chegar ao poder. Contudo, enquanto Berezovsky antagonizou o novo
regime, Abramovich foi mais receptivo. Ele e Putin encontraram interesses
em comum e Abramovich se tornou a pessoa que o povo começava a chamar
de “oligarca disfarçado” e “oligarca de lugar nenhum”.
Em 1999, Abramovich entrou na política, tornando-se governador de uma
região congelada e desolada do extremo oriente russo chamada Chukotka,
quase do tamanho da Alemanha, com uma população de pouco mais de 50
mil habitantes. Na verdade, a única coisa que a área tinha de vantagem eram
imensas reservas de petróleo, gás e minerais (quase totalmente inexploradas).
Em 2005, ele foi nomeado para um segundo mandato, que durou até 2008.
192 28 mentes que mudaram o mundo

Embora a província funcionasse como um paraíso fiscal para a Sibneft, dois


mandatos de Abramovich verificaram melhora significativa em grande parte
da população comum, e muito disso veio através do investimento de bilhões de
rublos que Abramovich tirou do próprio bolso.
Para alguém que sempre protegeu cuidadosamente sua privacidade, em
2003 Abramovich tomou uma atitude curiosa. Comprou o clube de futebol
Chelsea de Londres por 140 milhões de libras – uma atitude que o colocou no
centro das atenções. Na época, ele disse: “Amo esse jogo. Amo esse esporte.
Amo esse campeonato. Por que não ter a minha própria equipe?” Ele estava
disposto a gastar para transformá-los em vencedores (o que ainda deverá
acontecer) e tinha o dinheiro para isso. A resposta para uma pergunta feita
por torcedores do Chelsea sobre a fonte de riqueza de Abramovich é que ela
veio, em grande parte, do povo da Rússia. Em um trecho do Guardian de
2004, um trabalhador da indústria do petróleo de Noyabrsk, chamado Mi-
khail Karpenko, foi citado por dizer o seguinte: “Ele tirou as ações dos mais
pobres e sem instrução para aumentar o seu valor potencial. Enviou mais de
milhares de sua participação na petrolífera russa para o exterior enquanto a
economia entrava em colapso ao seu redor. Ele ganhou. A Rússia perdeu”
(Levy e Scott-Clark, 2004). Talvez isso seja um pouco verdade, consideran-
do que a grande fortuna de Abramovich é, de certa forma, um grande golpe
de sorte. A década de 1990 na Rússia foi uma época conturbada e caótica,
e ele, por acaso, foi a pessoa certa no lugar certo. Sua extraordinária riqueza
é, até certo ponto, um acidente da história e, se ele não tivesse aproveitado
a oportunidade, outra pessoa teria. Apesar disso, ele foi consideravelmente
mais cuidadoso em relação ao modo como gerenciou seus negócios do que
muitos outros oligarcas e conseguiu reconhecer que, na Rússia de Putin,
com grandes riquezas compra-se enorme influência, mas há limites que não
devem ser ultrapassados.
Nesse meio-tempo, houve muita confusão. Ele adquiriu mansões, formou
sua família e, em 2009, lançou seu novo iate, o maior do mundo, que tem um
submarino próprio. No entanto, apesar de sua grande notoriedade, Abramo-
vich permanece enigmático e muito sobre ele é desconhecido. De fato, se não
fosse pelo Chelsea, é provável que muito menos pessoas o conhecessem. Uma
de suas frases favoritas supostamente é: “O dinheiro adora a tranquilidade.”
Isolado por suas fileiras de guarda-costas, profissionais de relações públicas e
advogados, parece que Roman Abramovich também adora a tranquilidade.
Roman Abramovich 193

Referências e leituras adicionais

Buckley, Neil and Belton, Catherine (2007) Man in the news: Roman Abramovich,
Financial Times, 7 de dezembro.
Conradi, Peter and Lewis, William (2003) The tsar of SW6, Sunday Times, 6 de
julho.
Daily Mail (2005) Tortured past of Britain’s richest man, 22 de outubro.
Kennedy, Dominic (2008) Roman Abramovich admits paying out billions in political
favours, Times, 5 de julho.
Kirby, Terry (2003) From Chukotka to Chelsea, 3 de julho.
Levy, Adrian e Scott-Clark, Cathy (2004) He won, Russia lost, Guardian, 8 de maio.
Levy, Geoffrey (2003) Shadowy tsar of Stamford Bridge, Daily Mail, 3 de julho.
Lloyd, John (2000) The autumn of the oligarchs, New York Times, 8 de outubro.
Meek, James (2003) From Russia with £3.4bn, Guardian, 3 de julho.
O’Connor, Brian (2005) Russian revolution – the billionaire oil baron who has shaken
up Britain’s social elite, Sunday Telegraph, 23 de outubro.
Stewart, Will (2009) Roman and the KGB file that unearths tragic family secret,
News of the World, 20 de dezembro.
Sunday Business Post (2010) Roman’s empire, 2 de maio.
Vander Weyer, Martin (2004) The winner of Russia’s free-for-all, Sunday Telegraph,
31 de outubro.
Página deixada intencionalmente em branco
Capítulo 27
George Soros

S anto ou pecador? Especulador cruel ou filantropo? Face inaceitável do ca-


pitalismo ou ativista de esquerda com estranha inclinação filosófica? Out-
sider – como ele gosta de se definir – ou o insider* definitivo? George Soros, o
notório cidadão que quebrou o Bank of England nos anos 1990, é tudo isso e
muito mais.
Durante sua longa carreira, foi alvo do desafeto de muitos políticos (com
destaque para Norman Lamont e John Major, cujas reputações Soros maculou
de modo irreparável), por seus ataques à moeda nacional. Seu Open Society
Institute – financiado por ele sem parcimônia, com operações em todo o globo
– alcançou o status de complexo divino. Recentemente, Soros prometeu doar
US$100 milhões ao Human Rights Watch. A direita americana o despreza –
afinal, ele costuma financiar organizações que parecem absolutamente opostas
aos desejos dos conservadores –, enquanto muitos do antigo Bloco do Leste
têm grande afeição por ele. Acadêmicos e políticos costumam zombar das
investidas de Soros em suas searas, mas às vezes o magnata está certo. Como
investidor, tem seguidores cuja devoção parece mais adequada a fãs de astros
pop. Pessoalmente, costumam dizer que é homem encantador.
Soros nasceu em Budapeste, em 1930, em uma família de classe média
alta. Seu pai era advogado com forte interesse pelo esperanto, e a família tinha
uma casa em uma ilha no Rio Danúbio. Desfrutavam de um estilo de vida

* Nota da Tradutora: Investidor que tem bom acesso a determinada empresa e recebe informa-
ções antes que estas se tornem conhecidas do mercado.
196 28 mentes que mudaram o mundo

invejável, em uma cidade próspera, com rica vida cultural e intelectual. Apesar
disso, Soros dizia que seu pai não acreditava que as coisas fossem exatamente
como pareciam. Ele fora combatente capturado e preso na Rússia durante a
Primeira Guerra, e a experiência aguçou-lhe a sensação de mau agouro que,
algum tempo depois, mostrou-se presciente.
Em 1944, os nazistas chegaram a Budapeste. Soros disse: “Meu pai estava
mais do que preparado. Ele sabia o que fazer.” A família se separou, e o pai
de Soros pagou um alto funcionário do Ministério da Agricultura para levá-lo
em sua fuga. Mais tarde, Soros descreveria isso como “uma incrível aventura,
nos moldes do filme Caçadores da arca perdida”. Acrescentou também que a
fuga foi a base para algumas de suas divagações filosóficas que surgiriam no
futuro.
O estratagema do pai de Soros funcionou e a família sobreviveu. Dizem
que George teve um envolvimento precoce com finanças durante o caos do
pós-guerra, comerciando ouro e joias enquanto a hiperinflação tomava conta.
Em 1946, a União Soviética começou a assumir o controle da Hungria.
Enquanto participava de uma conferência sobre esperanto, Soros desertou.
Em 1947, emigrou para a Inglaterra, onde trabalhou como carregador na fer-
roviária e garçom enquanto estudava na London School of Economics (LSE).
Nesse período, adquiriu grande interesse pelo trabalho do filósofo Karl Po-
pper, que lhe causou forte impressão. Aprofundou-se nas ideias de Popper,
escreveu vários ensaios para ele, sonhando com a ideia de tornar-se acadêmi-
co, e chegou até a escrever uma tese chamada “The burden of consciousness”
(“O fardo da consciência”). Soros formou-se em 1952, mas suas tentativas de
tornar-se filósofo não deram em nada e, quando deu por si, estava envolvido
na área de finanças. Ingressou no Singer & Friedlander, um banco de investi-
mentos, onde trabalhou no setor de arbitragem, principalmente de ouro.
Em 1956, Soros emigrou para os Estados Unidos e arrumou um emprego
na FM Mayer como analista e árbitro de transações, trabalhando com títulos
e valores mobiliários da Europa, normalmente fora do radar da maioria dos
americanos. Em 1988, Stanley Druckenmiller, braço direito de Soros, disse
que “as coisas que George fazia 35 anos atrás só entraram em voga na úl-
tima década por aqui”. O próprio Soros comentou: “Como ninguém sabia
coisa alguma sobre títulos europeus no início dos anos 1960, eu podia atribuir
qualquer ganho que quisesse às empresas europeias que seguia.” A carreira de
Soros decolou. Em 1959, ingressou na Wertheim & Co e, em 1961, ganhou
George Soros 197

a cidadania americana. Em 1963, mudou para a Arnhold & S. Bleichroeder,


líder no segmento de títulos estrangeiros. Soros era o encaixe perfeito e apre-
sentou desempenho excelente, tornando-se vice-presidente. É interessante
observar que, nessa época, ele continuou trabalhando com filosofia, enviando
artigos para Popper na LSE.
Em 1967, criou um fundo de investimento estrangeiro chamado First Ea-
gle que, em 1969, passou a chamar-se Double Eagle Hedge Fund. Sua car-
reira decolou de verdade no ano seguinte, quando fundou seu próprio fundo
de investimento chamado Quantum Fund, com Jim Rogers, outro investidor
aclamado. A essa altura, ainda queria ser filósofo e achava que a atividade
de trading o sustentaria para que pudesse realizar esse sonho. No entanto, o
fundo foi um sucesso tão extraordinário que colocou Soros na vanguarda dos
investidores globais. Em 1981, a revista International Investor publicou que
“George Soros está para a administração de investimento como [Bjorn] Borg
está para o tênis, Jack Nicklaus para o golfe e Fred Astaire para o sapateado”.
Apesar de tudo, Soros continuava relativamente desconhecido fora da co-
munidade financeira e da imprensa de negócios. No entanto, isso mudaria
uma década depois. Em setembro de 1992, ele fez a maior e mais bem-sucedi-
da aposta de sua vida. Basicamente, apostou £10 bilhões que a libra cairia em
relação ao marco alemão. Ele defendia a ideia de que a moeda britânica entrara
no ERM (European Exchange Rate Mechanism)* em um nível alto demais,
cuja valorização contínua seria insustentável. Desse modo, usando o Quantum
e vários outros fundos de investimento, fez sua aposta, convertendo seus £10
bilhões em marcos alemães.
Norman Lamont e John Major, então chanceler e primeiro-ministro britâ-
nico, disseram que defenderia a libra a qualquer preço e que a moeda não sairia
do ERM (mais tarde, Soros diria que a assertiva não transmitia convicção).
Não chegaram a empenhar-se a “qualquer custo”, mas conseguiram investir
£6 bilhões para defender as libras esterlinas. A estratégia não funcionou. Em
16 de setembro, a libra foi suspensa do ERM e desvalorizou-se efetivamente.
Major e Lamont foram humilhados. Soros converteu os marcos novamente em
libras e embolsou a expressiva quantia de US$1 bilhão. Muitos disseram que,
até certo ponto, quando começou a dizer que a libra estava supervalorizada,

* Nota da Editora: Mecanismo europeu de taxas de câmbio, um sistema criado para reduzir a
volatilidade das taxas de câmbio na Europa.
198 28 mentes que mudaram o mundo

Soros nada mais fez que uma profecia autorrealizável. Quando veio a público
que Soros e outros especuladores vendiam libras a descoberto, foi apenas uma
questão de tempo para o colapso da moeda. Os lucros de Soros foram pagos
pelos cidadãos do Reino Unido – algo em torno de £12 per capita.
Depois disso, Soros foi seguido com avidez ainda maior por aficionados
em investimentos, dando continuidade à sua trajetória fora do comum. Por
outro lado, ele também teve seus deslizes. Em 1998, perdeu US$2 bilhões na
crise financeira da Rússia. Curiosamente, essa era uma área que ele pensava
conhecer muito de perto, e acreditava que os russos haviam feito uma transição
bem-sucedida do capitalismo gângster para o do tipo mais normal. Estava er-
rado e perdeu a aposta. Mais tarde, ele diria que fora enganado por sua crença
na Rússia. Atualmente, a única coisa que diz sobre o assunto é: “Não vou falar
sobre a Rússia, pois não quero investir por lá.”
Também errou no timing em relação ao estouro da bolha pontocom. Apos-
tou que as ações das empresas de tecnologia cairiam e agiu com um ano de
antecedência, perdendo US$700 milhões. Em março de 2000, voltou a apostar
em ações que caíram e totalizou prejuízos na marca de US$3 bilhões. A essa
altura, anunciou sua aposentadoria efetiva do Quantum. A despeito desses
problemas, Soros teve uma trajetória impressionante. Se você tivesse investido
US$1 mil no Quantum Fund, quando inaugurado em 1970, em 2000 teria ga-
nho o equivalente a US$4 milhões, ou seja, um aumento anual de 32% durante
três décadas – um histórico de tirar o fôlego.
Naturalmente, um homem como Soros jamais se aposentaria tranquilamen-
te para cuidar de roseiras, e o magnata ingressou numa segunda carreira, que
não era filosofia. Tornou-se um filantropo diligente do fim dos anos 1970 em
diante, com interesse especial no Leste Europeu, tendo trabalhado com afinco
para promover a democracia nos antigos países comunistas. No geral, Soros
doou cerca de US$6 bilhões a inúmeras causas e, atualmente, depois que Gates
e Buffett doaram enormes quantias, ele é o quarto maior filantropo de todos os
tempos (o terceiro é Li Ka-shing). Ele disse: “Não gosto de tentar encontrar
maneiras de gastar grandes montantes, acho essa uma tarefa desagradável, que
requer muito esforço e não dá a menor satisfação. Desse modo, fazer doações
(em vez de torrar dinheiro) é algo realmente gratificante para mim.” Ele tam-
bém se tornou oponente declarado da administração Bush, tendo feito várias
declarações, como “o Presidente Bush está colocando nossa segurança em jogo,
ferindo nossos interesses vitais e enfraquecendo os valores americanos”.
George Soros 199

Tal postura provocou o ódio da direita americana e, provavelmente, é res-


ponsável por alguns dos mais frenéticos rumores a respeito dele. Na verdade,
Soros foi tão demonizado pelos conservadores e tão odiado por instituições
como a Fox News, que seu apoio a Obama foi bastante enfraquecido. Ele
alegou que isso aconteceu porque Obama queria ser um unificador, enquanto
o próprio Soros reconhecia-se como uma figura desagregadora. Ainda hoje ele
raramente está fora das manchetes, seja fazendo seus típicos pronunciamentos
catastróficos, seja financiando causas progressistas. Soros figura na 35a posição
da lista de bilionários do mundo da revista Forbes (2010), com a agradável
fortuna de US$14 bilhões. Na verdade, apesar de todo o alvoroço em torno
dos novos-ricos administradores de fundos na última década, Soros continua
sendo o mais rico de todos eles, tendo agregado US$1 bilhão à sua fortuna
em 2009.
Por mais estranho que pareça, é capaz de Soros terminar conquistando o
reconhecimento intelectual que tanto almeja. Há muito tem sido uma espécie
de profeta do Apocalipse, mas seu último trabalho, O novo paradigma para
os mercados financeiros, publicado em 2008, foi um best-seller e lhe valeu um
convite para um pronunciamento no Congresso americano. Isto posto, muitos
lembrarão dele como um dos maiores especuladores de todos os tempos e um
homem com um incrível feeling para os mercados. Também será lembrado
como filantropo e ativista. No Reino Unido, sem dúvida será lembrado como
o homem que quebrou o banco central britânico, algo que ele considera uma
tragédia. Infelizmente, a filosofia por certo continuará sendo uma interessante
nota de rodapé em sua trajetória.

Referências e leituras adicionais

Bates, Daniel (2010) Billionaire financier George Soros hands $100m gift to U.S.
human rights group, Daily Mail, 8 de setembro
Clark, Neil (2003) The billionaire trader has become Eastern Europe’s uncrowned
king and the prophet of ‘the open society’. But open to what?, New Statesman, 2
de junho
Deutschman, Alan (2001) George Soros, Salon, 27 de março
Ellis, Charles D (2001) Wall Street People, vol 2, Wiley, Hoboken, NJ
Forbes (2010) The world’s billionaires, 10 de março
Freeland, Chrystia (2009) The credit crunch according to Soros, Financial Times, 30
de janeiro
200 28 mentes que mudaram o mundo

PBS (2008) Bill Moyers journal, 10 de outubro


Rieff, David (1994) The Soros touch, Observer, 16 de janeiro
Slater, Robert (2009) Soros: The life, ideas, and impact of the world’s most influential
investor
Soros, George (2008) O novo paradigma para os mercados financeiros: a crise atual e o que
ela significa, Rio de Janeiro: Agir, 2008
Steiner, Rupert (2001) Last mission of the man who broke the bank, Sunday Times,
15 de abril
Steiner, Rupert (2006) Bill Gates is just a figurehead, I am actively engaged, Spectator,
15 de julho
Sylvester, Rachel e Thomson, Alice (2009) The man who broke the bank says that
we’re facing global meltdown, Times, 28 de março
Thompson, Susan (2008) Business big shot: George Soros, Times, 22 de janeiro
Tyler, Christian (1993) Private view: the man who broke the Bank of England, Fi-
nancial Times, 2 de janeiro
Capítulo 28
Akio Morita

N o final da década que viu o iPod varrer tudo o que existiu antes dele e se
tornar tão popular a ponto de ser mais comum dizer iPod do que MP3
player, vale a pena lembrar que já passamos por isso antes. Em 1979, a Sony
lançou o Walkman, que foi o primeiro toca-fitas estéreo portátil em massa
do mercado. O Walkman tornou-se uma sensação e mudou a maneira como
ouvíamos música. Assim como o iPod, dominou completamente o mercado e
em todos os sentidos foi o antecessor do iPod.
Também foi um indicador do imenso poder global da gigante japonesa
Sony no setor de eletrônicos, que nos anos 1980 (assim como hoje) era fabri-
cante de eletrônicos para consumidores com foco na classe alta do mercado
de massa. Hoje em dia, logicamente, a Sony é uma das melhores empresas de
equipamentos eletrônicos para consumidores, porém seu mercado está mais
maduro e há vários concorrentes que fabricam produtos semelhantes. No en-
tanto, nos anos 1980, ela era muito mais. A empresa e seu famoso cofundador,
Akio Morita, também eram símbolos do sucesso econômico do Japão pós-
guerra, do compromisso com a qualidade e a ameaça econômica que isso pa-
recia significar para os Estados Unidos. De fato, se substituirmos o Japão pela
China, o Walkman pelo iPod e 1980 por 2010, isso não parece tão distante.
Ao mesmo tempo em que Morita personificou a economia japonesa do
pós-guerra, para muitos estrangeiros ele também foi uma espécie de indisci-
plinado dentro do Japão, um país completamente conformista que mostrou ao
mundo a expressão “o prego que se destaca é martelado”. Morita normalmente
nadava contra a maré e desafiava a sabedoria convencional. Também foi um
202 28 mentes que mudaram o mundo

dos maiores entusiastas internacionalistas do Japão. Por esse motivo, durante


seu apogeu, foi com certeza um dos empresários mais conhecidos do Japão
– e provavelmente aquele que a maioria das pessoas do mundo todo viria a
reconhecer.
Morita nasceu em 1921 em Nagoya, na região central do Japão. Seus pais
eram ricos, e ele era o herdeiro de uma dinastia de fabricantes de saquê, cujas
raízes datavam do século XVI. Como era o filho mais velho, esperava-se que
trabalhasse na empresa da família, mas a riqueza desta foi contra seu destino.
Quando garoto, ficou fascinado por uma vitrola importada que seus pais tinham,
uma das primeiras no Japão. Começou a construir seus próprios equipamen-
tos eletrônicos, incluindo um receptor de rádio e outra vitrola projetada por ele
mesmo. Isso o levou a estudar Física na Osaka University, em vez de Economia,
como era o desejo de seu pai. Na Segunda Guerra Mundial, serviu na Marinha
japonesa em um grupo de pesquisa cuja obrigação era serem “pensadores origi-
nais e audaciosos”. Enquanto trabalhava com armas, conheceu Masaru Ibuka,
um engenheiro 13 anos mais velho, que se tornaria o gênio técnico por trás da
Sony. Ibuka também ajudaria a persuadir o pai de Morita a permitir que o filho
seguisse uma carreira em eletrônica, e não na fábrica de saquê.
Em 1946, em uma Tóquio devastada pela Segunda Guerra Mundial, Mo-
rita e Ibuka fundaram uma empresa chamada Tokyo Tsushin Kogyo (Tokyo
Telecommunications Engineering Corporation), sendo a maior parte do ca-
pital inicial de US$500 proveniente da família de Morita. A dupla, então com
25 e 38 anos de idade, abriu uma loja no prédio onde havia uma loja de de-
partamentos danificada pelas bombas, com uma equipe de 20 pessoas, visando
um negócio no qual o conhecimento técnico especializado e a inovação eram
bem-vindos e incentivados. Os recursos eram escassos no Japão pós-guerra, e
a dupla precisava improvisar. Celofane – em vez de um plástico mais resisten-
te – era usado como fita, e o pó magnético original que continha o gravador
era preparado em uma frigideira. O gravador começou a ser comercializado
em 1950 sem nenhum tipo de interesse. O gravador só começou a vender de-
pois que Morita mostrou para os estenógrafos dos tribunais como o aparelho
poderia ser útil. Assim, disse Morita, ele aprendeu uma valiosa lição sobre a
necessidade de criar mercados para novos produtos cujo uso talvez não seja tão
evidente logo de início.
O próximo produto da empresa foi o que ganharia fama e traria dinheiro. O
transistor havia sido desenvolvido pelo Bell Laboratories nos Estados Unidos e,
Akio Morita 203

em 1952, Morita comprou os direitos de licenciamento por US$25 mil, apesar


da enorme resistência do poderoso MITI (Ministry of International Trade and
Industry – Ministério da Indústria e Comércio Internacional) do Japão. Essa foi
provavelmente a maior decisão que Morita tomou sozinho, mais ainda porque
as aplicações do transistor eram consideradas muito limitadas naquela época.
Em 1955, a empresa produziu o primeiro rádio comercial transistorizado. Em
1957, produziu o primeiro rádio transistorizado de bolso. Na verdade, o termo
“de bolso” era um pouco exagerado – a empresa realmente tinha de vestir seus
vendedores com camisas com bolsos enormes para que os rádios coubessem.
Com o sucesso do rádio, as inovações começaram de verdade. Em 1960, a em-
presa desenvolveu a primeira televisão totalmente transistorizada do mundo e,
em 1967, lançou o televisor em cores Trinitron. A tecnologia do televisor foi
desenvolvida de forma a não infringir as patentes restritivas dos Estados Unidos,
mas resultou em uma imagem mais nítida que lhe proporcionou a liderança. Os
Trinitrons seriam os televisores mais desejados durante décadas.
A empresa não estava apenas inovando em termo de produtos. No Japão
insular do pós-guerra, ela tinha os olhos voltados para o mundo exterior. Em
1958, foi tomada uma decisão para alterar o nome da empresa, o qual até então
era bastante conhecido no Japão. Isso não deu muito certo com os consumi-
dores japoneses, mas Morita defendeu a decisão, afirmando que essa era uma
mudança necessária porque a empresa tinha seus olhos voltados para outros
mercados e precisava de um nome com o qual os estrangeiros não tivessem
dificuldade. Sony foi escolhido (do latim sonus) como algo fácil de lembrar
e pronunciar. Em 1960, a empresa fundou a Sony Corporation of America.
Em um Japão ainda muito conservador, Morita foi um internacionalista cos-
mopolita. Em 1961, a Sony tornou-se a primeira empresa japonesa a oferecer
os certificados de depósito dos Estados Unidos, o que lhe permitiu levantar
capital fora do Japão.
Em 1963, Morita foi mais além, cortando o cordão umbilical com seu país
natal e mudando-se para Nova York com a família por um ano para poder
entender melhor como os americanos viviam e trabalhavam. Em 1966, escre-
veu um livro chamado Never Mind School Records, que desafiou as práticas de
trabalho japonesas, dizendo que as empresas deveriam focar as capacidades
dos funcionários e não suas qualificações; isso causou grande tumulto. No iní-
cio dos anos 1970, a Sony construiu uma fábrica nos Estados Unidos e, mais
tarde, teve até americanos como membros do Conselho. O próprio Morita
204 28 mentes que mudaram o mundo

socializou-se com empresários dos Estados Unidos e, em outro fato raro na-
quela época, falava muito bem inglês.
A surpreendente trajetória da empresa em inovação continuou, apesar de
ter tomado uma decisão muito ruim no final dos anos 1970. A Sony havia
desenvolvido os gravadores de vídeo em 1965, embora não tivesse lançado
seu Betamax para uso doméstico até 1975. No entanto, recusou-se a licenciar
a tecnologia para os demais fabricantes. Isso levou um grupo de empresas ja-
ponesas a desenvolver o VHS, que acabou arrasando o Betamax, um sistema
que muitos achavam tecnicamente superior, levando-o ao esquecimento. No
entanto, a Sony logo deu a volta por cima. Em 1979, desenvolveu o que foi in-
discutivelmente seu produto mais famoso – o Walkman. Uma vez mais muitos
duvidavam, enquanto Morita defendia a ideia. A Sony produziu um estéreo
que permitia que as pessoas se desligassem do mundo onde quer que estives-
sem – um aparelho tão perfeito para a década egoísta que alcançou o número
de 230 milhões de unidades vendidas.
Até os anos 1980, a Sony tinha fábricas no mundo inteiro. No início da
década, a empresa, junto com a Philips, desenvolveu o CD que, por volta
de 1990, assinou definitivamente o atestado de morte do LP. O uso do CD
foi ampliado posteriormente como uma mídia gravável para computadores. A
Sony lançou a primeira filmadora para consumidores. No final da década, fez
algo que seria visto como uma grande mancada ao adquirir a Columbia & Tri-
Star Pictures (acredita-se que tenha pagado muito caro). No entanto, tornou-
se uma das maiores gravadoras do mundo. As inovações também continuaram
– fez parte do DVD Consortium, inventou o MiniDisc (que foi um grande
sucesso na Ásia, mas nunca completamente aceito no Ocidente), e surgiu o
primeiro PlayStation. Por várias razões, durante grande parte da década de
1990 a Sony foi a marca mais conhecida nos Estados Unidos.
Porém, os anos 1990 seriam o fim da linha para Morita. Com quase 70
anos, deixando um impressionante legado para trás, ele finalmente havia sido
engolido pelo establishment industrial japonês com o qual sempre mantivera
uma relação muito irascível. Tornou-se presidente da Keidanren, a organiza-
ção de negócios mais influente do país, mas em 1993, durante uma partida de
tênis, teve um acidente vascular cerebral. Em 1994, quando a Sony anunciou
seu fiasco em Hollywood, ele renunciou como presidente. Apesar da reabili-
tação, seu estado piorou e, em 1999, Morita faleceu aos 78 anos de idade de
pneumonia em um hospital de Tóquio. Pouco antes da sua morte, a revista
Akio Morita 205

Time o colocou entre um dos gênios mais influentes no mundo dos negócios
do século XX. O ex-presidente da empresa, Nobuyuki Idei, disse: “Não é exa-
gero dizer que ele foi a cara do Japão.”
Esse talvez tenha sido o aspecto mais contraditório de Morita. Muitos no
Japão já diziam que ele talvez fosse mais feliz no Ocidente do que era em seu
próprio país. Ele não parecia japonês. Em um país onde até hoje a ostentação é
malvista, ele tinha helicóptero e jato corporativo, era um esportista ávido, saía
com celebridades e apareceu em uma propaganda da Amex. Tinha a temeri-
dade de criticar a cultura de negócios do Japão, dizendo que era muito isolada.
Até mesmo convocou seu país a abrir o mercado de arroz.
De forma interessante, seu filho disse que tudo isso era apenas uma fa-
chada, e outros sugeriam que, na verdade, ele sentia um profundo incômodo
em ser considerado a cara do Japão para os estrangeiros. Diz-se que essa “ati-
tude” era uma reação aos efeitos psicológicos e ao complexo de inferioridade
nacional que uma geração de japoneses sofreu após perder a Segunda Guer-
ra Mundial. Qualquer que seja o caso, os estrangeiros com certeza gostaram
disso: compraram produtos da Sony o suficiente para torná-la uma gigante
global, e as atividades internacionais de Morita lhe renderam reconhecimento
internacional. Ele recebeu o prêmio Albert Medal da RSA (Royal Society of
Arts) no Reino Unido, a French Légion d’Honneur e vários outros prêmios
de dezenas de países.

Referências e leituras adicionais

Economist (2008) Guru: Akio Morita, 16 de novembro


Financial Times (1999) Obituary, 4 de outubro
Guardian (2009) Akio Morita – the man who gave the world the Sony Walkman, 5
de outubro
Nahan, John (1999) Asian millennium – Akio Morita 1921–1999, Far Eastern Eco-
nomic Review, 25 de novembro
New Straits Times (2000) Akio Morita, 10 de setembro
Pollack, Andrew (1999) Obituary, New York Times, 4 de outubro
Purcell, William (1999) Sony founder led electronic revolution, Australian, 5 de outubro
Site da Sony, Biography, History, www.sony.com
Times (1999) Obituary, 4 de outubro
Tsuruoka, Doug (2009) Akio Morita made Sony shine, Investor’s Business Daily, 23
de setembro
Página deixada intencionalmente em branco
  
Fontes

BBC
Businessweek
Economist
Financial Times
Forbes
Fortune (especialmente a lista dos ricos e dos bilionários)
Guardian
New York Times
Observer
Sunday Telegraph
Sunday Times
Telegraph
Time
Times
Wall Street Journal
Wikipedia
Página deixada intencionalmente em branco
Índice

11 de setembro, 143, 178 Ailes, R 66


A busca do uau! 161 Allen, Paul 108, 109, veja também
A estratégia Starbucks: 5 princípios para Gates, Bill e Microsoft
transformar sua empresa em uma como vice-presidente do MITS 109
experiência extraordinária 138 deixa a Microsoft 110
A rede social 134 desenvolve versão do Basic 109
Abramovich, Roman 189-192 Amazon 25, 111, 123, veja também
como governador de Chukotka 192 Bezos, Jeff
compra a companhia de petróleo abre na França e no Japão
Sibneft com 191 (2000) 28
compra títulos que podiam ser Amazon.com 27-29
trocados por ações 191 como terceiro varejista preferido no
conhece Boris Berezovsky 191 Reino Unido (2009) 29
conhece Boris Yeltsin 191 diversifica em novos mercados 27
e a “guerra do alumínio” 191 e Amazon.cn 29
e o Chelsea Football Club 189, 192 e o Kindle 29
fonte de riqueza de 192 entra na Alemanha e no Reino
importa petróleo e gás 190 Unido (1998) 27
muda para um apartamento no lançamento da 45
Kremlin 192 participação de mercado (2010) 29
primeira fase da vida e educação de prejuízos da 27-28
190 vende downloads de MP3 29
Administração: tarefas, responsabilidades e Andreeseen, M 44
prática 74 Anistia Internacional 47
210 28 mentes que mudaram o mundo

Apple 7-12, 37-38, 80, 108, 112, 113, Bayley, S 80-81, 120
155, 181, veja também Jobs, Steve Beatty, J 72, veja também Drucker, Peter
como anti-Microsoft 12 Bechtolsheim, A 34
e comando de mercados 11 Beirne, D 126
e John Sculley 10 Bennett, A 63
e Safari 37 Berezovsky, Boris 191
fanboi 12 Berkshire Hathaway 19, 21-24, veja
iMac 9 também Buffett, Warren
iPad 10, 29, 113 relatório anual (2002) 22
iPhone 10, 11, 12, 38, 112, 113 Berners-Lee, Sir Tim 2, 4, 41-46
iPod 10, 11, 12, 112, 201 coloca o primeiro site da Web
iTunes 29 on-line 43-44
Lisa 8 como defensor da neutralidade da
Macintosh 9, 10 rede 45
participação de mercado (2010) 29 como membro do CERN 43
processa a Microsoft 110 e Robert Cailliau 43
segundo no índice S&P 500 (2010) 11 escreve o software Enquire 43
Ash, Mary Kay 1, 4, 101-106 estabelece a World Wide Web
abre a Beauty by Mary Kay 103-105 Consortium (W3C) 44
e a cor rosa 101, 105 lança a World Wide Web
estabelece seminários corporativos Foundation 45
104-105 primeira fase da vida e educação de
fãs de 102 42-43
filosofia de 105-106 torna-se professor de Ciência da
GM produz Cadillacs cor-de-rosa Computação 45
para 105 Bezos, Jeff 25-31, 41
listada na Bolsa de Valores de Nova como a pessoa do ano da revista Time
York 105 (1999) 27
primeira fase da vida e educação de e o projeto Blue Origin de viagens
102-103 espaciais 30
sucesso inicial de 103 funda a Amazon.com. 25, 27 veja
Australian Food News 140 também Amazon.com
Australian Women’s Weekly 88 lança livraria on-line (1995) 27
primeira fase da vida e educação de
Bain & Co. 125 25-26
Ballmer, Steve 109, veja também Gates, sobre a sobrevivência da Amazon 30
Bill e Microsoft vende 2 milhões de ações da Amazon
como CEO da Microsoft 112 (2010) 30
Índice 211

Big Issue 50, veja também Roddick, estratégia de investimento de 20-21


Anita filantropia de 24, 114
Bill & Melinda Gates Foundation 24, primeira fase da vida e educação de
81, 108, 114 20-21
Bina, E 44 Businessweek (sobre Tom Peters)
Blackhurst, C 162 162
Blankfein, L (CEO da Goldman Sachs)
22 capitalismo 3, 71, 190, 195
Body Shop, veja Roddick, Anita gângster 198
Bower, T 17 hiper 75
Branson 17 Cassidy, J 147-148
Branson, Sir Richard 4, 6, 13-18, 30, Caulkin, S 76
108, veja também Virgin Ceglia, P, veja Facebook
cruza o Pacífico de balão 16 Chelsea Football Club 189, 192, veja
forma o Student Advisory Centre 14 também Abramovich, Roman
lança (com Al Gore) o prêmio Virgin China 201
Earth Challenge 16-17 Dell na 155
lança a revista Student 14 e a Body Shop 51
perde a operação da Loteria Nacional e o Google 39, 51
para Camelot 16 código aberto 37-38
primeira fase da vida e educação companhias aéreas, veja também
de 14 Southwest Airlines
questões financeiras de 17-18 Ryanair 174
recebe título de nobreza (1999) 16 conceito de hipertexto 44
Brin, Sergey 33-40, veja também Google conferência “Disruptive by design” da
e Page, Larry Wired (2009) 30
e Google Technology Inc 34 Confissões de um homem de propaganda
entrevista (2001) 35 119, veja também Ogilvy, David
fortuna de 39 crises financeiras 2007-09 138
primeira fase da vida e educação de na Rússia 198
33 Cruise, T 89
Broz, K 19, veja também Buffett,
Warren browsers, veja navegadores Dedique-se de coração: Starbucks Coofee
da internet 137
Buffett, Warren 1, 4, 5, 17, 19-24, 107, Dell Computer Corporation 123,
153, 199 153-155
compra a Berkshire Hathaway 21 abre fábricas na China 155
e Goldman Sachs 22 abre uma fábrica na Irlanda 153
212 28 mentes que mudaram o mundo

abre uma subsidiária no Reino Unido primeira fase da vida e educação de


153 72-73
ações e vendas da 153, 154-155 publicações e textos de 73-74
ingressa na lista da Fortune 500 153 sociedades 72
lança e-commerce no site dell.com tributos a 71
154 eBay 123-128, veja também Omidyar,
máquinas sob encomenda 154 P; Skoll, J e Whitman, Meg
políticas que respeitam o meio como “Auction Web” 124-125
ambiente 11, 154 crescimento e sucesso de 127-128
Dell, Michael 151-155 e AOL 126
abre a PCs Limited 152-153, e John Donahoe 128
veja também Dell Computer investe no Skype 128
Corporation Economist 18, 72, 76
filantropia de 154 sobre a Ikea 81
lança o Turbo PC 153 sobre Tom Peters 163
nomeado Empreendedor do Ano de taxa de câmbio Big Mac 55
1989 (Inc.) 153 Edison, T 45, 57
primeira fase da vida e educação de empresa da Web 2.0 131
152 Entine, J 51
retorna como CEO (2007) 155 na Business Ethics 51
Digital Rights Management (DRM) no Daily Mail 51
29, veja também Apple e Amazon Estados Unidos 5, veja também
Druckenmiller, S 196 presidentes dos Estados Unidos
Drucker, Peter 71-76 capitalismo nos 3
como colunista do Wall Street Journal Departamento de Defesa e Arpanet
74 42
como consultor 74-75 Departamento de Justiça: processos
como correspondente do Financial Microsoft (1998) 112
Times 73 direita 195, 199
como professor de administração marcado de livros de autoajuda 161
74 Excelência acima de tudo 161
escreve sobre a ganância executiva e Exxon Mobil 11
os exacerbados salários dos CEOs
75 Facebook 4, 131-134, veja também
muda da Alemanha para o Reino Zuckerberg, Mark
Unido 73 acordo com a Microsoft 133
na General Motors 73-74 expectativa da IPO (oferta pública
previsões de 74 inicial) de 131, 134
Índice 213

presentes 133-134 General Electric (GE) 74, 143-148,


reivindicação de 84% de participação veja também Welch, Jack
no 133 e o CEO Jeffrey Immelt 146
Fast Company 162 aquecimento global e Virgin Earth
“ferida do empreendedor” 17 Challenge Prize 16
Financial Times 139, 147, 163 Google 1, 3, 4, 6, 33-40, 41, 67, 108,
sobre Semler 167, 168 123, 131, veja também Page, Larry e
Firefox 37 Brin, Sergey
Forbes 85, 111, 126 algoritmo PageRank 34
sobre Page e Brin (2010) 40 Android, telefone celular com OS de
Ford, H 5, 58 código aberto 37-38
Fortune 24, 115, 153, 184 aplicativos 38, 39
classifica Jack Welch como o gestor como anti-Microsoft 12
do século 143, 144 como exercício do minimalismo
nomeia a Southwest Airlines como a 34-35
melhor empregadora (1998) 178 como o principal mecanismo de
sobre Tom Peters 163 busca 34
Fórum Internacional sobre Direitos cultura e filosofia de 35-36, 38
Trabalhistas e Sweatshop Hall e o primeiro funcionário, Craig
of Fame (lista de empresas que Silverstein 34
pagam baixos salários e oferecem e YouTube 38
más condições de trabalho aos Earth 39, 112, 113
funcionários) 81 Gmail 36-37, 39, 112, 113
Fox News 63, 66, 199 Maps 39
Franzen, J e As correções 88 na China 39-40, 51
Frey, J e Um milhão de pedacinhos 88 navegador Chrome/sistema de
Friedman, J 91 código aberto 37, 39
oferta pública inicial (2004) 35-36
Gates, Bill 3, 58, 7, 71, 107-114, 131, Office/aplicativos on-line 38
181, 199, veja também Ballmer, Steve sistema operacional gratuito de
e Microsoft código aberto 12
abre a Microsoft com Paul Allen slogan do 35-36, 39
109 venda de anúncios 35
e Bill & Melinda Gates Foundation Video Player 38
24, 81, 108, 114 Google Technology Inc 34
e o MITS 109 Gore, A 41
primeira fase da vida e educação de Graham, B 20
108-109 Greenslade, R 67
214 28 mentes que mudaram o mundo

Grove, Andy 5, 7, 25, 71, 181-187, veja conceito de pré-montagem (faça você
também Intel mesmo) 78
chega a Nova York 182 críticas da 80-81
como CEO da Intel 184 estrutura de propriedade da
doenças de 184-186 81-82
escreve sobre seu câncer na Fortune expansão da 78
184-185 incorporações
ingressa na Fairchild Semiconductor Ben & Jerry’s pela Unilever 52
182-183 Cadbury pela Kraft 52
na Intel 182-186 Green & Black’s pela Cadbury 52
nomeado Homem do Ano (1997) Prosperando no caos 161
pela revista Time 185 The theory and practice of selling
primeira fase da vida e educação de the Aga cooker 115, veja também
181-182 Ogilvy, David
Guardian 170 Independent sobre Ingvar Kamprad 82
sobre Abramovich (2004) 192 Intel 181-186
Guerrera, F 147 chips de memória 181, 183
desenvolve o chip Pentium 184
Hanauer, N 27, veja também Bezos, e a campanha Operation Crush
Jeff 183-184
Handy, C 165 e consequente crise 184
Harrigan, K 162-163 e IBM 183
Helú, C S 107 participação de mercado 186
Hewitt, Ogilvy, Benson & Mather, veja promove a própria reestruturação
Ogilvy, David (1975) 183
Hewlett Packard 154-155 International Investor 197
Hewlett, B 7 internet
Hotmail 36-37, 112, veja também e Arpanet 42
Microsoft primeira mensagem transmitida via
Hughes, F 138 42
Human Rights Watch 195
Jack: definitivo 145, veja também Welch,
Iacocca: A Biography 2 Jack
IBM 109-111, veja também Microsoft Jackson, M 88-89
como fabricante de hardware 110 Jacobs, J 88, 90, veja também Winfrey,
e Intel 183 Oprah
IKEA 78-81 Japão 3, 27, 28, 60, 74, 161, 169, 184
catálogo 80 veja também Morita, Akio e Sony
Índice 215

Jobs, Steve 3, 7-12, 17, 25, 108, 112, compra restaurante dos irmãos
155, 181 McDonald 60
compra a Pixar 9 compra time de beisebol 60
funda a Apple com Steve Wozniak 8, conhece os McDonalds/adquire
veja também Apple funda a franquias 56-57
NeXT 9 despotismo de 106
ingressa no Homebrew Computer e o relacionamento com os
Club 8 franqueados 58-59
nascimento e adoção de 7-8 obstinação e visão de 57-58
saúde de 12 primeira fase da vida e educação de
55-56
Kamprad, Ingvar 1, 77-83
cria a IKEA 78, veja também IKEA Labich, K 178
e Leading by Design: The IKEA story Lamont, N 197
79-80 Leading by Design: The IKEA story
frugalidade e ética no trabalho de 79 79-80
personalidade/vida pessoal de 79-80, legislação, Estados Unidos 127
82 Lei Nacional de Proteção à Criança
primeira fase da vida e educação de (1993) 89
77-78 Levitan, D 137-138
torna-se anunciante no INGKA subscreve a oferta pública inicial
Holdings 78-79 (IPO) da Starbucks 137-138
Keegan, V 170 e Wertheim Schroder & Co 137
Kelleher, Herb 173-179, veja também Levy, G 192
Southwest Airlines Levy, S 30
e a confiança na equipe 178 Linux 37, 113, 155
funda a Southwest Airlines 176
primeira fase da vida e educação de Major, J 197
175-176 marca Virgin 13-15, 17
Keynes, J M 73 flutuação de 1986 da 16
Kroc, Ray 1, 5, 55-61, 93, 95, 98, Branson retorna 16
104, 123, 135-136, veja também os primeiros anos da 15
McDonald’s marcas Virgin
abre o primeiro McDonald’s 57 Atlantic 15-16
assume o cargo de CEO 61 companhia aérea Blue (australiana)
comercializa “multiprocessadores” 16
56 Fuel 16
como inovador 58 Galactic 16
216 28 mentes que mudaram o mundo

Money 16 retém os direitos de licenciar o OS


Music 16 para 110
Mather & Crowther 116-117, veja smartphones 112, 113
também Ogilvy, David Virtual Earth/Bing Maps 112
McDonald, Richard e Maurice 56-57 Windows 107, 110, 181
McDonald’s 1, 5, 55-61, 140 Windows 7 113
alvo de críticas 60-61 Windows Vista 113
como a maior rede de fast food nos Windows XP 112, 113
Estados Unidos 60 MIT e Sloan School of Management
e a Franchise Realty Corporation 146
59-60 Moore, G E 182-183
enfraquece a Starbucks 139 e a lei de Moore 182, veja também
entra na Alemanha, no Japão e em Intel
Londres 60 Morita, Akio 201-205, veja também
McDonald’s: a verdadeira história do Sony
sucesso 59 conhece Masara Ibuka 202
McKinsey & Co 158-161, veja também critica a cultura corporativa japonesa
Peters, Tom e Waterman, Robert 204, 205
McKinsey Quarterly 76 desenvolve as televisões Trinitron
mecanismo europeu de taxas de câmbio 203
(ERM) 197-198 funda a Sony Corporation of
Michelli, J 138 America 203
Microsoft 7, 10, 11, 36-38, 107-113, funda empresa de telecomunicações
123 em Tóquio 202-203
acusada (pela Netscape) de práticas primeira fase da vida e educação de
anticompetitivas 111-112 202
compra o Hotmail 36 produz o primeiro rádio transistor
críticas à 108, 111 comercial (1955) 203
e leis antitruste 111, 113 produz o primeiro rádio transistor
e o Internet Explorer 37 portátil (1957) 203
e o vice-presidente Chris Jones recebe a French Légion d’Honneur
36-37 205
incorporação (1981) 110 recebe o prêmio Albert Medal da
lança o Office on-line gratuito 38 RSA (Royal Society of Arts)
licencia o sistema operacional para (Reino Unido) 205
uso em máquinas da IBM MP3 players 201
109-110 MPMan F10 (SaeHan Information
Office 110, 113 Systems, Coreia) 11
Índice 217

mudança da dinâmica New Yorker 147


Microsoft-Google-Apple 12 NeXT 9-10
Munger, C veja Buffett, Warren e NeXTube 9
Murdoch, Rupert 1, 63-69, 131 vendido para a Apple 9
adquire a News of the World 64 Noyce, R 182-183, veja também Intel
adquire estações de televisão nos Nuts!: as soluções criativas da Southwest
Estados Unidos 65-66 Airlines para o sucesso pessoal e nos
adquire o Wall Street Journal 67-68 negócios 178
cobra tarifas aos leitores do Times/
Sunday Times pelo acesso ao O conceito da corporação 73
conteúdo on-line 68-69 O fim do homem econômico: as origens do
compra e relança a Sun 64 totalitarismo 73
compra o New York Post 65 O futuro do homem industrial 73
compra o Times e o Sunday Times 64 O investidor inteligente 20
comprado por Rupert Murdoch 67 O novo paradigma para os mercados
e a disputa de Wapping 64-65 financeiros, veja também Soros,
e a internet 67 George
ingressa em transmissão via satélite O’Leary, M 174, veja também Ryanair
65 O’Rourke, P J 2
lança o Australian 64 Obama, Presidente 66, 199
lança o Fox News 66 Ogilvy Group 117-120
Myspace 131 adquirido pela WPP (Martin Sorrell)
primeira fase da vida e educação de 120
64 Ogilvy, David 115-121
torna-se cidadão americano 66 aposenta-se como presidente do
Conselho/muda para a França 120
navegadores da internet citações de 115, 116, 118, 119
Internet Explorer 44, 111 como agricultor na Pensilvânia 117
Mosaic 44, 111 como executivo de contas na Mather
Netscape 111-112 & Crowther 116-117
acusa a Microsoft de práticas contas de prestígio de 118-119
anticompetitivas 112 e a convicção no marketing direto
navegador Mosaic 111 117
Never Mind School Records 203 funda a própria agência 117-118
New Statesman 120 ingressa no instituto de pesquisas
New York Magazine 68 Gallup 117
New York Times 68, 99, 160, 161 primeira fase da vida e educação de
Tech blog (2010) 36 116
218 28 mentes que mudaram o mundo

Omidyar, Pierre 124-126 evolução 25


Onion 140 revolução 169
Pooley, E 69
Packard, D 7 Popper, K 196, 197
Page, Larry 33-40, veja também Google presidentes dos Estados Unidos
primeira fase da vida e educação de Bush, G W 71, 89, 154, 199
33-34 Carter, J 160-161
entrevistado pela Businessweek (2001) Obama, B 66, 89, 199
34 Reagan, R 47, 161-162
PC World 34 Private Eye 63
pesquisa Which? sobre a Starbucks problemas de privacidade e liberdade
(Reino Unido) 141 civil 134
Peston, R 4, 17 propaganda, veja Ogilvy, David
Peters, Tom (e) 71, 157-164, veja
também Waterman, Robert críticas a Quittner, J 29
162-163
críticas de 160 Ramo, J C 27
entrevistado por Stefan Stearn Red Herring magazine 161
(FT, 2007) 163 redes/mídia social, veja também
funda a própria empresa de Facebook
consultoria 160 Myspace 131
o projeto da organização 157, referências e leituras adicionais em
158-159 Abramovich, Roman 193
oito temas comuns para empresas de Ash, Mary Kay 106
sucesso 159 Berners-Lee, Sir Tim 46
primeira fase da vida e educação de Bezos, Jeff 31
158 Branson, Sir Richard 18
textos de 157-159, 160-162 Brin, Sergey 40
Vencendo a crise 157-159, 160 Buffett, Warren 24
Pixar e Toy Story 9 Dell, Michael 155
Playboy e a “dupla do Google” 33, veja Drucker, Peter 76
também Brin, Sergey; Google e Page, Grove, Andy 187
Larry Jobs, Steve 12
pontocom 35, 42, 123, 151 Kamprad, Ingvar 83
boom 20, 22, 27, 126, 154, 169, 181, Kroc, Ray 61
186 Morita, Akio 205
estouro da bolha das 22, 25, 28, 138, Murdoch, Rupert 69
151, 198 Ogilvy, David 121
Índice 219

Page, Larry 40 Rogers, J 197


Peters, Tom 164 Roman, K 120
Roddick, Anita 53 Romney, M 125
Schultz, Howard 142 Rompendo as barreiras da administração
Semler, Ricardo 171 161
Soros, George 199-200 Rove, K 71
Walton, Sam 100
Welch, Jack 151 Schmidt, E 33, 35, veja também Google
Whitman, Meg 129 Schultz, Howard 1, 135-142, 155, veja
Winfrey, Oprah 91 também Starbucks
Zuckerberg, Mark 134 compra a Starbucks 137
Reino Unido compra e vende o time Seattle
Amazon no 27, 29 SuperSonics 138-139
eBay no 127 e a Agenda da Transformação
IKEA no 78, 80 Comunicação 141
imprensa 64, 67-68 entra na Starbucks como
Loteria Nacional 16 diretor-geral 136
mercado de televisão 65 funda a Il Giordano 137
moeda 195, 197-198 primeira fase da vida e educação de
Starbucks no 141 136
subsidiária da Dell em 153 visita a Itália 136-137
Walmart no 99 volta à Starbucks como CEO (2008)
Robinson, G 4, 5 139
Roddick, Anita 1, 4, 6, 17, 47-53, 101 Scott-Clark, C 192
e a Body Shop 49-52 Ask Jeeves 34
como a primeira empresa a unir Excite 34
éticas e negócios 2-3 Lycos 34
como ativista 50-51, 52 mecanismos de busca, veja também
como pioneira em responsabilidade Google
social 47-48, 53 Semco 165-171, veja também Semler
como PLC 50, 51 juventude de Ricardo 168-169
críticas a 51-52 singularidade de 165-166
doa fortuna à caridade 52 Seminário de Tom Peters: tempos loucos
elogios a 47 exigem organizações malucas 161
Foundation 50 Semler, Ricardo 165-171
primeira fase da vida e educação de abre a Escola Lumiar 169
48-49 e a entrevista ao Guardian 170
vendida para a L’Oreal 52 e seus seis princípios 158
220 28 mentes que mudaram o mundo

eleito Empresário Brasileiro do Ano como bilionário 199


(1990, 1992) 169 como filósofo 196, 197
institui a participação nos lucros 168 e Karl Popper 196, 197
lança a democracia no ambiente de e o Open Society Institute 195
trabalho 166-168 emigra para os Estados Unidos 196
primeira fase da vida e educação de filantropia de 198-199
166 fundos de investimentos estrangeiros
promove causas ambientais e a de 197
democracia industrial 170 muda para a Arnhold & S
publica Virando a própria mesa (1988) Bleichroeder 197
168 muda para a Wertheim & Co 197
publica Virando a própria mesa (1993) primeira fase da vida e educação de
169 196
publica Você está louco! Uma vida torna-se cidadão americano 197
administrada de outra forma (2003) trabalha para a FM Mayer
169 196-197
Sendall, M 43 Sorrell, M 37, 120
Sherman, G 68 Southwest Airlines 173-179
Skoll, Jeff 124-126 adquire a Morris Air 177
Só os paranoicos sobrevivem 181, 184 veja aumenta os destinos e expande o
também Grove, Andy portal da empresa 176-177
Sonneborn, Harry J 59, veja também críticas a 178-179
Kroc, Ray e McDonald’s eleita a melhor empregadora (Fortune
Sony 201, 203-205 190) 178
como a marca mais conhecida nos lança sistema de viagens sem
Estados Unidos 204 passagens/reservas on-line 177
compra a Columbia & Tri-Star listada na Bolsa de Valores de Nova
Pictures 204 York 176
desenvolve CDs e videocassetes 204 viagem espacial 16, 30
inventa o MiniDisc e o PlayStation Starbucks 135-142
204 abre lojas disfarçadas 141
Walkman 201, 204 ações 137, 139-140, 141
Soros, George 5, 195-200 agressiva com os sindicatos 141
abandona a Hungria/emigra para a e o CEO Orin Smith 138
Inglaterra 196 e Which? pesquisa sobre a Starbucks
aposenta-se da Quantum 198 (Reino Unido) 141
aposta na queda da libra em relação funcionários da 138
ao marco alemão 197-198 inferiorizada pelo McDonald’s 139
Índice 221

percepção do público em relação à Vencendo a crise 157-158, veja também


138 Peters, Tom
sentimentalismo da empresa 140 Virando a própria mesa (Maverick!, na
torna-se uma rede internacional versão em inglês) 165
137-138 Virgin Atlantic Challenger/Challenger II
vendida para Howard Schultz 15
137 Virgin Records 14-15
Sun 63, 64, 67 contrato com Mike Oldfield
Swimming Across 181, 182, 185, veja 15
também Grove, Andy contrato com Sex Pistols 15
torna-se internacional 15-16
telefones Android 12, 113
The King of Madison Avenue: David Wailes, N 140
Ogilvy and the making of modern Wall Street Journal 67, 74, 186
advertising 120 Walmart 93, 155
The Practice of Management 74 agressivo com sindicatos 99
The Sunday Times (sobre Branson) 13 como Asda (Reino Unido) 99
Time crescimento do 97-98
entrevista do The Times com Craig críticas a 99-100
Silverstein (2008) 34 empresa “alegre” 98-99
Homem do Ano (1997) 185 no Arkansas 96-97
pessoa do ano (1999) 27 Walton, Sam 93-100, 104, veja também
sobre Murdoch 69 Walmart
Tokyo Tshusin Kogyo/Tokyo abre a primeira loja Walmart 96
Telecommunications Engineering abre as primeiras lojas (franquias da
Corporation 202-203 Ben Franklin) 95-96
Torekull, B 79 como inovador 98
e Leading by Design: The IKEA story e as 10 regras para construir uma
79-80 empresa de sucesso 97
e descontos 96
Ubuntu 37 gradualmente se desfez das lojas Ben
para Jeff Bezos 26 Franklin 97
para Mary Kay Ash 1 imagem do Tio Sam de 93
proposição exclusiva de vendas primeira fase da vida e educação de
(USP) 94-95
US Airways, veja Buffett, Warren Waterman, Robert 157, 158-159, 161
veja também Peters, Tom
Vale do Silício 7, 25, 42, 181 Welch, Jack 71, 143-149
222 28 mentes que mudaram o mundo

como Homem do Século (Fortune como jornalista na televisão


1999) 143, 144 86
como Jack Nêutron por fazer cortes críticas a 90-91
profundos na força de trabalho e Oprah’s Next Chapter 90
145-146, 148 e sua revista O 90
e a mentalidade da gestão 145 empatia de 89
e o valor aos acionistas 143, 145, forma a Harpo Productions 88
147, 148 melhores momentos de, na televisão
ingressa na GE como engenheiro 88-89
144 política de 89
leciona sobre liderança na Sloan primeira fase da vida e educação de
School of Management 146 85-86
primeira fase da vida e educação de testes com Spielberg 86
144 Wolff, M 66
torna-se CEO da GE (1981) World Wide Web Consortium
144-145 (W3C) 44
Whitman, Meg 123-129 World Wide Web Foundation 45
como CEO do eBay 126-128 Wozniak, Steve 8
como presidente dos calçados Stride
Rite 126 Xerox 8, 136, veja também Apple
na Florists’ Transworld Delivery e Jobs, Steve
(FTD) 126 Alto 11
na política 128-129
passa a ser o CEO do eBay 128 Yahoo 113
primeira fase da vida e educação de Yahoo Mail 36
125-126 Yeltsin, Boris 191
Wikipédia 45
Winfrey, Oprah 3, 85-91 Zuckerberg, Mark 4, 131-134
anuncia a Oprah Winfrey Network cria o Facebook 133, veja também
90 entrada principal
apresentadora do The Oprah Winfrey e o caso do ConnectU 134
Show 86-87, 91 em Harvard 133
biografia de 90-91 primeira fase da vida e educação de
clube do livro 88 131-133

Você também pode gostar