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DOI: 10.22278/2318-2660.2021.v45.n2.a3413

ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E PREÇO PRATICADO EM EQUIPAMENTOS PÚBLICOS DE


COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS ORGÂNICOS

Aline Daniela da Cruz e Silvaa


https://orcid.org/0000-0003-1159-5196

Aichely Rodrigues da Silvab


https://orcid.org/0000-0001-9447-2380
Doroteia Aparecida Höfelmannc
https://orcid.org/0000-0003-1046-3319

Resumo
Este estudo comparou a existência de pontos de comercialização de frutas e horta-
liças provenientes de sistemas de produção convencional e orgânicos, verificando diferenças nos
preços desses alimentos em Curitiba (PR). A coleta de dados aconteceu em 2018, mapeando os
pontos de venda cadastrados na Secretaria Municipal de Abastecimento de Curitiba, registrando
os alimentos ofertados (convencional e orgânico), e os preços de frutas, legumes e verduras, lis-
tados no instrumento de avaliação de estabelecimentos de comercialização dos alimentos para
consumo em domicílio (ESAO-s Feiras Livres). Realizou-se o cálculo da razão de preços do dia,
registrado conforme os preços praticados na central de abastecimento de Curitiba. Os alimentos
convencionais foram encontrados em mais pontos (n =74) em relação aos alimentos orgânicos
(n = 15). A oferta dos orgânicos ficou limitada a áreas mais centrais e regiões com maior renda.
A maioria dos orgânicos apresentaram preços mais altos que os convencionais. Foi demonstrado
que existem desigualdades na distribuição espacial e no preço entre frutas e hortaliças orgânicas
e convencionais, indicando que a população do município não tem qualidade no acesso a estes
alimentos, dispendendo valores maiores, caso queira optar por escolhas orgânicas.
Palavras-Chave: Alimentação. Agricultura orgânica. Segurança alimentar e nutricional. Agrotóxicos.

a
Nutricionista. Mestre em Saúde Coletiva (UFPR). Bolsista Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior – Brasil (CAPES). Docente Centro Universitário de Tecnologia de Curitiba – UNIFATEC PR. Curitiba, Paraná,
Brasil. E-mail: alinedaniela.w@gmail.com
b
Docente. Doutora em Geografia (UFSC). Professora Adjunta da Universidade Estadual da Região Tocantina do
Maranhão (UEMASul). Imperatriz, MA, Brasil. E-mail: aichely.rodrigues@uemasul.edu.br
c
Docente. Doutora em Saúde Coletiva (UFSC). Docente na Universidade Federal do Paraná. Curitiba, Paraná, Brasil.
E-mail: doroteia.hofelmann@ufpr.br
Endereço para correspondência: Universidade federal do Paraná. Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva,
Rua Padre Camargo, 280, Alto da Glória. Curitiba, Paraná, Brasil. CEP: 80060-240. E-mail: doroteia.hofelmann@ufpr.br

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Revista Baiana SPATIAL DISTRIBUTION AND PRICE PRICED ON PUBLIC MARKETS OF ORGANIC FOODS
de Saúde Pública

Abstract
The study compared the existence of points of commercialization of fruits and
vegetables from conventional and organic production systems and verifying differences in
the prices of these foods in Curitiba, Paraná. Data collection took place in 2018, mapping
the points of sale registered with the Curitiba Municipal Secretariat of Supply, registering the
foods offered (conventional / organic), and the prices of fruits and vegetables, listed in the
Instrument of Evaluation of establishments in marketing of food for consumption at home
(ESAO-s Feiras Livres). The price ratio of the day was calculated, recorded according to
the prices practiced at the Central de Abastecimento of Curitiba. Conventional foods were
found in more points (n = 74) in relation to organic foods (n = 15). The supply of organics
was limited to more central areas, a region with higher income. Most organic products had
higher prices than conventional ones. It has been shown that there are inequalities in the
spatial distribution and in the price between organic and conventional fruits and vegetables,
indicating that the population of the municipality does not have quality access to these
foods and may have higher values if
​​ they want to choose organic choices.
Keywords: Diet. Organic agriculture. Food and nutrition security. Agrochemicals.

DISTRIBUCIÓN ESPACIAL Y TARIFICACIÓN DE EQUIPOS PÚBLICOS PARA LA


COMERCIALIZACIÓN DE ALIMENTOS ORGÁNICOS

Resumen
El estudio comparó la existencia de puntos de comercialización de frutas y
verduras de sistemas de producción convencionales y orgánicos, y verificó diferencias en los
precios de estos alimentos en Curitiba, Paraná. La recolección de datos se llevó a cabo en 2018,
mapeando los puntos de venta registrados en la Secretaría de Abastecimiento Municipal de
Curitiba, registrando los alimentos ofertados (convencionales / orgánicos), y los precios de frutas y
verduras, enumerados en el Instrumento de Evaluación de Establecimientos de comercialización
de alimentos para consumo en el hogar (ESAO-s Feiras Livres). Se calculó la ratio de precios
del día, registrado de acuerdo con los precios practicados en la Central de Abastecimento de
Curitiba. Los alimentos convencionales se encontraron en más puntos (n = 74) con relación a los
alimentos orgánicos (n = 15). La oferta de productos orgánicos se limitó a áreas más centrales,

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una región con mayores ingresos. La mayoría de los orgánicos tenían precios más altos que los
convencionales. Se ha demostrado que existen desigualdades en la distribución espacial y en
el precio entre frutas y verduras orgánicas y convencionales, lo que indica que la población del
municipio no tiene acceso de calidad a estos alimentos y puede tener valores más altos si así lo
desea elija opciones orgánicas.
Palabras clave: Dieta. Agricultura orgánica. Seguridad alimentaria y nutricional. Agroquímicos.

INTRODUÇÃO
Conforme a lei 10.831, o sistema orgânico de produção agropecuária tem
como finalidade ofertar produtos saudáveis isentos de contaminantes intencionais, preservar
a diversidade biológica dos ecossistemas naturais, promover o uso saudável do solo, da água e
do ar e reduzir ao mínimo a contaminação desses elementos que possam resultar das práticas
agrícolas, entre outros1.
O uso de pesticidas, também chamados de agrotóxicos, pretende melhorar a
produção agrícola. Porém, é cada vez mais evidenciada a relação entre o uso dos agrotóxicos
e problemas de saúde, como alergias, asma e até o aparecimento de câncer2-3. Estudos
epidemiológicos sugerem uma relação entre a exposição aos agrotóxicos e déficits neurológicos
e cognitivos, principalmente a doença de parkinson4-5. Por outro lado, um estudo prospectivo de
base populacional realizado na França entre 2009 e 2016, observou que uma maior frequência
de consumo de alimentos orgânicos esteve relacionada a um risco reduzido de câncer6.
O Brasil é considerado o maior mercado de agrotóxicos no mundo, segundo
dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Observatório da Indústria dos
Agrotóxicos da Universidade Federal do Paraná, com o mercado nacional movimentando 936
mil toneladas de agrotóxicos na safra de 2010/20117. O Plano Nacional de Segurança Alimentar
e Nutricional (Plansan) prevê o incentivo a unidades de produção utilizando o sistema orgânico,
núcleos de estudos em Agroecologia e Produção Orgânica, e a aplicação do Programa Nacional
de redução do Uso de Agrotóxicos (Pronara)8.
A alimentação contemporânea sofre os impactos do modelo agrícola predominante,
baseado em monoculturas de grande escala e uso intensivo de insumos químicos. Esse modo
de consumo afeta a biodiversidade, padronizando a produção e dificultando a cultura
alimentar local. A produção e o comércio de alimentos ficam sob controle de grandes empresas
transnacionais, e a população menos favorecida socioeconomicamente apresenta dificuldades
de acesso a uma variedade de alimentos9.

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Revista Baiana Um estudo de revisão observou que a preocupação com a saúde é o fator
de Saúde Pública determinante na compra e no consumo de alimentos orgânicos, sendo valorizado o menor
risco de exposição aos contaminantes. As preocupações seguintes são o bem-estar animal e o
meio ambiente, como a qualidade do solo e da água e a preservação da biodiversidade10. No
Brasil, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em 2016 havia
aproximadamente 17 mil produtores orgânicos registrados, em uma área de 750 mil hectares11-12.
A população dispõe de diferentes canais de compra desses alimentos, desde feiras
específicas para orgânicos como supermercados, centrais de abastecimento (Ceasa) e comércio
direto com o produtor. Porém, nem sempre há disponibilidade próxima ao local de residência,
assim como a pouca variedade, sendo fatores dificultadores do acesso a estes alimentos, assim
como o custo, que pode variar consideravelmente tanto entre os diferentes canais de compra
quanto em relação aos alimentos convencionais13. Conforme um estudo realizado em Brasília
(DF) entre 2015 e 2016, comparando alimentos convencionais e orgânicos, foi verificado
que os alimentos convencionais apresentaram menores preços no geral, porém os alimentos
orgânicos provenientes da agricultura familiar apresentaram menor preço que os alimentos
convencionais em supermercados12. Nesse contexto, este artigo pretende comparar a existência
de pontos públicos de comercialização de frutas, legumes e verduras provenientes de sistemas
de produção convencional e orgânica, assim como verificar diferenças nos preços desses
alimentos, no município de Curitiba (PR).

MATERIAL E MÉTODOS

LOCAL E DELINEAMENTO DO ESTUDO


O presente estudo analítico, de delineamento transversal, foi realizado em Curitiba
(PR) avaliando os pontos de venda de frutas e hortaliças convencionais e orgânicas ligadas à
Secretaria Municipal de Abastecimento (SMAB). Curitiba é a capital do estado, sendo a cidade
mais populosa, com estimativa pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de quase
dois milhões de habitantes em 2018, e 75% da área sendo urbana. O Paraná se destaca como um
dos maiores produtores de orgânicos do Brasil, consoante dados do Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas (Sebrae)13. O município de Curitiba, capital do estado, conta com um
circuito de feiras de alimentos convencionais e orgânicos, em diversos dias e horários.

COLETA DE DADOS
A coleta de dados foi realizada entre os meses de março e dezembro de 2018,
evitando a realização em dias de chuva ou feriado, a fim de evitar perdas por ausência

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de comerciantes ou produtos. Para mapeamento dos pontos de venda, foi realizada uma
busca no site da Secretaria Municipal de Abastecimento de Curitiba (SMAB), verificando a
listagem de todos os pontos de venda registrados, endereço, dia e hora de funcionamento.
Nessa busca também se verificou que o município consta de feiras específicas de alimentos
orgânicos, ou algumas barracas orgânicas em feiras convencionais, sendo reconhecidas
pelo certificado de produção orgânica, fixada nas barracas. Dessa forma, ao encontrar os
certificados apresentados, foi registrado o tipo de alimento ofertado. Todos os pontos de
venda foram visitados e apresentaram sua localização exata registrada por aplicativo de
mapas (Google Maps).
Os dados de variedades e preços dos alimentos foram coletados por meio do
instrumento de avaliação dos estabelecimentos de comercialização dos alimentos para consumo
em domicílio – ESAO-s Feiras Livres, proposto por Duran14. A aplicação do instrumento consiste
em verificar a disponibilidade de frutas e hortaliças mais consumidas na região e o menor preço
ofertado de cada variedade. Todas as barracas de todos os pontos de venda foram avaliadas por
meio do questionário, excetuando as recusas dos vendedores.
A fim de corrigir diferenças na análise dos preços das frutas e hortaliças relacionadas
à sazonalidade, foi realizado o cálculo da razão de preços. Os preços registrados em cada
dia da coleta de dados foram divididos pelos preços praticados na central de abastecimento
de Curitiba (Ceasa), realizando o acompanhamento das informações de preços diários no site
da Ceasa. Os preços utilizados como referência foram os mais baixos praticados no dia e de
qualidade média ofertada.
As informações sociodemográficas do município referentes à área, população,
número de domicílios, densidade demográfica e renda domiciliar das regionais de Curitiba
foram obtidas por dados secundários, no site do instituto de pesquisa e planejamento urbano de
Curitiba, a partir dos dados do censo demográfico 2010. As regionais são áreas de abrangência
de cada território em que a cidade está dividida administrativamente.

TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS


A partir da delimitação do local dos pontos de venda no aplicativo de mapas, foi
realizado o georreferenciamento no software QGIS 2.18 Las Palmas, diferenciando os tipos de
alimentos encontrados (convencionais ou orgânicos). Para análise dos dados sociodemográficos
e da disponibilidade e preço dos alimentos, foram feitas planilhas do Microsoft Office Excel.
A correlação entre as variáveis sociodemográficas e a disponibilidade de alimentos foi realizada
por meio da Correlação de Spearman. Para avaliação da diferença de preços entre alimentos

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Revista Baiana convencionais e orgânicos, foi realizado o Teste de Mann Whitney. Os dados foram analisados
de Saúde Pública no programa Software for Statistics and Data Science – STATA versão 14.0.

ASPECTOS ÉTICOS
A investigação sobre alimentos convencionais e orgânicos foi submetida como
adendo à projeto e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Setor
de Ciências da Saúde, da Universidade Federal do Paraná, com parecer consubstanciado de
número 2.518.789, no dia 28 de fevereiro de 2018. Os comerciantes assinaram Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS
Segundo o site da SMAB, no início da pesquisa, o município contava com 102
equipamentos públicos de comercialização de alimentos, sendo 15 feiras de alimentos orgânicos.
Durante a coleta de dados, dois equipamentos não foram encontrados em funcionamento e
um fornecia apenas pescados. Em duas feiras de alimentos convencionais, havia uma barraca
de alimentos orgânicos cada. Totalizou-se 407 barracas ofertando frutas, legumes e verduras e
houve 13 recusas de participação, duas em barracas de feiras livres e 11 em mercados públicos.
Todas as recusas ofertavam alimentos convencionais.
Os equipamentos públicos de venda de alimentos convencionais estiveram
presentes em maior quantidade (n = 74) do que os de alimentos orgânicos (n = 15).
Os alimentos orgânicos estavam presentes em feiras “exclusivas” de orgânicos, mas havia
três feiras convencionais com a presença de barracas de alimentos orgânicos. Os alimentos
convencionais estavam distribuídos em feiras, mercados, e nos pontos de venda dos programas
de preço único. Algumas feiras não ofertavam nenhum tipo de frutas, legumes e verduras
(n=10) (Figura 1).
As variáveis sociodemográficas de renda média domiciliar e renda mediana
domiciliar apresentaram correlação significativa com a disponibilidade de alimentos orgânicos
e convencionais nos equipamentos públicos, demonstrando que quanto maior a renda, maior a
disponibilidade desses alimentos. Outras variáveis como área, população e número de domicílios
da regional apresentaram correlação inversa à disponibilidade, ou seja, quanto maiores estas
variáveis, menor a oferta desses alimentos. Estes dados estão demonstrados na Tabela 1.

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Figura 1 – Número de barracas que ofertavam frutas, legumes e verduras nos
equipamentos públicos de venda de alimentos. Curitiba, Paraná, Brasil - 2018.

Feiras livres
284 2 recusas

Mercados
15 11 recusas

Direto da roça
6
Equipamentos Barracas
102 FLV 409
Programa
Nossa Feira
9

Sacolão
14

Feira de
orgânicos
68

Fonte: Elaboração própria.

Tabela 1 – Coeficiente de correlação entre variáveis sociodemográficas e disponibilidade


de alimentos nas feiras livres e sacolões. Curitiba, Paraná, Brasil - 2018.
Frutas e hortaliças convencionais Frutas e hortaliças orgânicas
Área (km2) -0,24* -0,18
População (hab) -0,33* -0,09
Domicílios (unidades) -0,33* -0,06
Densidade demográfica (hab/ha) -0,18 0,08
Renda média domiciliar (R$) 0,29* 0,25*
Renda mediana domiciliar (R$) 0,28* 0,27*
Coeficiente de correlação de Spearman, *p < 0,05
Fonte: Elaboração própria.

A Tabela 2 demonstra a distribuição e a razão da média de preços dos alimentos


convencionais e orgânicos. A maioria das frutas e hortaliças orgânicas apresentaram quase o
dobro da média de preços das frutas e hortaliças convencionais, exceto a melancia, o limão,
a uva e o alface. Alguns alimentos apresentaram média de preços até 2,88 maior, como o
abacaxi; e até três vezes maior, como o pimentão.

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Revista Baiana Tabela 2 – Média de preços encontrados das frutas, legumes e verduras convencionais e
de Saúde Pública orgânicos nos equipamentos públicos de venda de alimentos em Curitiba, Paraná, 2018.

Alimentos Média Preços Convencionais (R$) Média Preços Orgânicos (R$)


Frutas
Laranja 3,06 6,35
Banana 2,86 4,48
Mamão 5,11 9,43
Maçã 6,98 12,94
Melancia 2,99 5,67
Tangerina 4,33 5,95
Manga 6,11 11,59
Abacaxi 5,23 13,59
Limão 5,26 5,86
Uva 12,49 13,48
Melão 6,67 10,60
Verduras e Legumes
Tomate 4,13 10,26
Cebola 3,65 8,46
Cenoura 3,03 8,01
Alface 1,68 1,99
Abobrinha 3,50 7,99
Pimentão 5,85 15,27
Repolho 2,30 4,60
Pepino 3,57 8,56
Berinjela 4,24 8,58
Chuchu 2,77 5,64
Vagem 8,46 11,79
Fonte: Elaboração própria.

O Índice de Moran Global para alimentos orgânicos e renda foi de 0,100. Com
relação à distribuição geográfica dos equipamentos no município, a regional matriz concentrava
o maior número de equipamentos de comercialização de alimentos, tanto convencionais como
orgânicos. Essa informação é demonstrada na Figura 2, com o índice Lisa Moran. A regional
Matriz apresentou correlação do tipo alto-alto, indicando que a maior oferta dos dois tipos
de alimentos está correlacionada com a Renda Média Domiciliar mais elevada encontrada na
regional. Três regionais – Pinheirinho, Bairro Novo e Tatuquara – com menor Renda Média
Domiciliar apresentaram correlação do tipo baixo-baixo com a distribuição de equipamentos
nessas regionais, 0,20, 0,30 e 0,32 respectivamente (Figura 2).

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Figura 2 – Distribuição dos equipamentos públicos que ofertavam frutas e hortaliças
convencionais e orgânicos no município. Curitiba, Paraná, Brasil – 2018.

Fonte: Elaboração própria.

DISCUSSÃO
Este artigo observou que a disponibilidade de frutas e hortaliças foi maior em
regionais com melhor renda tanto para frutas e hortaliças convencionais quanto orgânicas.
Os equipamentos de venda de alimentos convencionais estão presentes em maior quantidade
do que os de alimentos orgânicos, e estes também ficam restritos à região central do município.

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Revista Baiana Dessa forma, moradores das regiões periféricas de Curitiba que desejam comprar frutas e
de Saúde Pública hortaliças orgânicas, ou percorrem grandes distâncias para fazê-lo, ou buscam pontos de venda
como supermercados.
Outro dado relevante encontrado no presente estudo foi a diferença da média
de preços entre frutas e hortaliças orgânicas e convencionais, com a maioria dos orgânicos
apresentando valor maior do que os convencionais, podendo chegar até o triplo do valor.
Em um estudo realizado em Brasília (DF), Arantes e Recine12 verificaram o preço médio de
compra de 16 alimentos orgânicos, em diferentes canais de comercialização. O maior valor
foi encontrado em supermercados, chegando a custar mais que o dobro de outros canais.
A agricultura familiar foi o canal de venda com os preços mais baixos, e a variedade maior que
nos supermercados. Outro estudo, realizado em Cuiabá (MT), os valores dos produtos orgânicos
praticados nos supermercados eram maiores que os preços da feira livre, chegando a ser 4,5
vezes maior em um dos alimentos (15).
Ferreira e Coelho16 verificaram que os consumidores de alimentos orgânicos são
mais sensíveis às variações de preço desses alimentos, compreendendo que políticas de incentivo
ao consumo de alimentos orgânicos podem ser mais eficazes se promoverem a redução de preços
desses alimentos. Dessa forma, o acesso aos alimentos orgânicos é mais difícil para a população de
baixa renda, a qual com frequência apresenta dificuldade para adquirir alimentos considerados
básicos, em especial frutas e hortaliças9. Esta parcela da população gasta parte considerável da sua
renda em alimentos ultra processados para conseguir alimentar toda a família. Para existir uma
alimentação adequada, com um aporte adequado de frutas, hortaliças, leite e derivados, seria
necessário um aumento considerável na renda familiar, para suprir esta necessidade17.
Mesmo em países com melhores condições de renda e poder de compra, a
disponibilidade e o preço são os fatores que inibem a compra de produtos orgânicos. Estes
produtos são adquiridos por pessoas de classe mais alta e que tenham crianças, citando
como motivos para o consumo a importância para a sua saúde e das crianças, e afirmando
preocupação com o meio ambiente18-19. Essa preocupação com a saúde é relevante, pois é
crescente a quantidade de estudos que mostram a relação entre a utilização e/ou consumo de
agrotóxicos e o surgimento de doenças2–6,10,20-21.
Em Seattle20, amostras de urina de crianças foram monitoradas quanto à presença
de resíduos de pesticidas organofosforados, e avaliadas correlacionando com o consumo
de alimentos convencionais e orgânicos. Foi verificado que as crianças que relataram dieta
convencional apresentaram uma quantidade aproximada seis vezes maior desses resíduos do que
as crianças que consumiam alimentos orgânicos. Um estudo de 2013 indicou que a exposição

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desde o nascimento aos agrotóxicos estava associada à morbimortalidade por câncer na população
infanto-juvenil nos municípios do estado do Mato Grosso, estado que concentra grande parte da
produção agropecuária brasileira, e grande utilização de agrotóxicos, com pulverização por avião
e trator, capaz de contaminar fontes de água potável, animais e residências22.
Foi verificado que o comércio público de frutas e hortaliças orgânicas em Curitiba
está concentrado na região central do município. Conforme o Índice de Moran Local, a regional
matriz apresentou correlação entre a maior oferta dos alimentos orgânicos e a maior renda
domiciliar da população residente. Da mesma forma, as três regionais com relação espacial do
tipo baixo-baixo estão entre as cinco regionais com menores rendas médias domiciliares do
município23. Outros estudos apontaram correlações espaciais semelhantes, inclusive em outros
países, demonstrando a importância da renda no poder de escolha na compra dos alimentos24-25.
Uma forma de amenizar essas desigualdades de acesso aos alimentos orgânicos,
seria a utilização das hortas comunitárias. O 1° Plano Municipal de Segurança Alimentar e
Nutricional (Plamsan) do município de Curitiba estabeleceu como objetivo para os anos de 2016
a 2019, a consolidação da agricultura urbana, fornecendo apoio à implantação e manutenção
de hortas dentro do espaço urbano e das hortas escolares26. Para criação das hortas, basta que
a associação de moradores do bairro apresente um ofício indicando a área a ser cultivada e o
número de famílias a serem beneficiadas pela horta comunitária27.
Apesar dos alimentos da cultura convencional apresentarem menor custo, são
evidentes os benefícios da agricultura orgânica para a segurança alimentar e nutricional dos
consumidores e dos agricultores, assim como para a melhora do sistema alimentar. Para que
isso ocorra, é necessário que os consumidores sejam informados acerca dos benefícios e dos
fatores que influenciam o preço dos alimentos, assim como estímulo à cultura agroecológica
e aos diferentes canais de comercialização12. A venda direta e as feiras são eficazes para o
fortalecimento dos agricultores orgânicos, porém as dificuldades, como a distâncias dos
consumidores e as condições de deslocamento podem dificultar as relações28.
O presente estudo pretendeu identificar a oferta desses alimentos nos pontos
de venda públicos por entender que estes têm maior visibilidade da população, por estarem
disponíveis na comunidade com frequência. Estudos futuros, podem verificar a disponibilidade dos
produtos orgânicos em outros tipos de comércios, incluindo os supermercados, e verdureiras. Este
tipo de comércio pode auxiliar a melhorar o acesso dos orgânicos pela população, embora sejam
apontados como pontos de vendas responsáveis por praticar preços mais altos desses alimentos12.
A cultura orgânica faz parte da pauta de políticas públicas no Brasil, com a Política
Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, e incentivo de consumo desses produtos, pelo

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Revista Baiana Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e Programa de Aquisição de Alimentos
de Saúde Pública (PAA). Porém, como ressaltado por Santos et al29, é necessário que se leve em consideração
que estas políticas são resultantes das forças e interesses em um dado momento, e que seus
objetivos e prioridades estão diretamente ligados ao momento em que o País se encontra.
O Paraná é o segundo maior consumidor de agrotóxicos do Brasil, e apesar de ser um dos
estados brasileiros que definiu em suas ações de vigilância epidemiológica estudos sobre as
intoxicações por agrotóxicos, um estudo realizado com dados de 2015 apontou a ocorrência
de subnotificação dos casos de intoxicação no estado30.
Embora toda a preocupação do município de Curitiba em estabelecer políticas e
ofertar pontos públicos de venda de frutas e hortaliças orgânicas, este estudo demonstrou que
existem desigualdades na distribuição desses produtos em relação aos alimentos de origem
convencional e entre as situações socioeconômicas das regionais. Os bairros com menores
rendas não apresentam oferta de alimentos orgânicos. Potencializando essa ausência de oferta,
temos altos preços desses produtos quando comparados aos alimentos convencionais.
Demonstrados esses resultados, pode-se concluir a importância de políticas
públicas que se preocupem em fomentar a agricultura de orgânicos, reduzir seus custos, pois
todas as dificuldades encontradas em sua produção refletem no preço final dos produtos.
Além disso, limitar o uso de agrotóxicos é necessário visto que as evidências científicas
demonstram sua relação com o aparecimento de diversas doenças, principalmente o câncer.
Por fim, deve-se buscar melhores condições de renda e saúde para toda a população, incluindo
um ambiente que ofereça uma maior diversidade de alimentos para que a população consiga
realizar suas escolhas de compra consciente e saudável.

COLABORADORES
1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Aline Daniela da
Cruz e Silva, Aichely Rodrigues Silva, Doroteia Höffelmann.
2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Aline
Daniela da Cruz e Silva, Aichely Rodrigues Silva, Doroteia Höffelmann.
3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Aline Daniela da Cruz
e Silva, Aichely Rodrigues Silva, Doroteia Höffelmann.
4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e
integridade de qualquer parte da obra: Aline Daniela da Cruz e Silva, Aichely Rodrigues Silva,
Doroteia Höffelmann.

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abr./jun. 2021 127
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Recebido: 15.4.2021. Aprovado: 16.4.2022.

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