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Prática Terapêutica Ocupacional Baseada

em Evidências

Conteudista
Prof. Me. Adriano Conrado Rodrigues

Revisão Textual
Esp. Danilo Coutinho de Almeida Cavalcante
OBJETIVO DA UNIDADE
• Correlacionar teoria e prática da Terapia Ocupacional para desenvolver
o raciocínio clínico e a evolução de casos na atenção terapêutica ocupa-
cional, considerando os aspectos da complexidade humana, bem como
os aspectos coletivos e singulares presentes.

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A Formação do Raciocínio
Clínico Terapêutico
Ocupacional
Para iniciarmos uma construção teórica sobre o clínico em Terapia Ocupacional,
muitos fatores devem ser levados em consideração e organizados para delinear
toda a trajetória de atenção a ser desenvolvida, seja em um caso específico ou
para um determinado grupo ou contexto de prática.

Ao entendermos o raciocínio clínico como um processo, temos uma sequência


contínua de fatos ou operações que apresentam certa unidade, ou que se re-
produzem com regularidade (contínuo e sistematizado), a partir de um ponto,
situação ou problema que exige controle de condução ou gerenciamento e que
expresse a abordagem proposta, nesse caso, a terapêutica ocupacional.

Como vimos ao longo desta disciplina, trabalhamos intensamente para definir as


bases teórico-metodológicas ou conceituais que darão sustentação, e até justifi-
cativa, para as práticas propostas. É a partir disso que partimos para estabelecer
nosso processo de intervenção em Terapia Ocupacional e a definição do raciocí-
nio clínico.

Os sete passos do raciocínio clínico são:

1. Base teórico-metodológica;

2. Anamnese e avaliação;

3. Determinação de objetivos e abordagem;

4. Definição dos recursos, materiais e métodos;

5. Organização do setting terapêutico (espaço);

6. Evolução;

7. Análise dos resultados (em relação aos objetivos).

Um ponto importante é o entendimento de que esse é um processo cíclico,


que se fortalece por meio da análise de feedback/feedfoward. Ou seja, durante
todo o processo, esse profissional responsável acompanhará criteriosamente

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se o raciocínio clínico está correspondendo ao que foi proposto (feedback), ou
se precisa ser reconsiderado para que novos resultados possam compor com o
plano terapêutico proposto.

Dessa forma, entende-se que o perfil profissional do terapeuta ocupacional está


intimamente ligado à maneira como esse profissional propõe a estruturação de
sua prática, o que, por sua vez, advém dos fundamentos históricos da profissão
(suas questões epistemológicas e ontológicas), e encontra expressão em forma
de “raciocínio clínico”, de modo que a abordagem profissional deverá se estabe-
lecer em um processo sistematizado (inclusive, baseado em evidências) para que
seja possível seu desenvolvimento e haja impacto na vida das pessoas.

E como se deu a produção das evidências da prática no campo da Ciência


Ocupacional?

A Ciência Ocupacional, como uma disciplina emergente e direcionada ao estudo


do ser humano na condição de um ser ocupacional, estabelece sua relação com
a fundamentação teórica da Terapia Ocupacional por intermédio de intensa dis-
cussão e correlação ao longo dos anos, o que a coloca como protagonista em
diversos cenários. Logicamente, não desconsideramos as outras ciências, que
também apresentam seu valor, como as Ciências Biológicas, Sociais, Políticas e
da Psicologia, que, conjuntamente, colaboram para a composição das bases teó-
ricas ou fundamentos da Terapia Ocupacional no estabelecimento de um racio-
cínio clínico.

A ocupação é o constructo central desse processo, e as relações com a saúde,


a inclusão e a participação das pessoas aparecem como elementos fundamen-
tais. Como toda ciência, o amadurecimento ou consolidação dos conceitos está
ligado ao tempo, que proporciona não só um olhar cada vez mais amplo e pro-
fundo sobre o Ser Humano como promove seu impulsionamento à medida que
se emancipa para compor os raciocínios clínicos terapêuticos ocupacionais em
diferentes públicos, realidades, culturas ou países.

Outro modo de se avaliar o desenvolvimento de um campo científico e sua re-


lação com a prática, é tomando como base a análise da formação de pessoas e
organizações para atuar no mesmo. Vimos que o desenvolvimento da Ciência
Ocupacional se deu dentro da Academia. A primeira turma do programa de
Doutorado em Ciência Ocupacional da Universidade do Sul da Califórnia foi com-
posta por 7 discentes.

No ano de 2017, um levantamento mostrou que mais de 100 pessoas se gradu-


aram em Ciência Ocupacional, a partir de instituições acadêmicas nos Estados
Unidos e no Canadá.

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Atualmente existem diversos programas de graduação e pós-graduação em
Ciência Ocupacional em diferentes países. Inúmeros departamentos de Terapia
Ocupacional nas universidades passaram a incluir o nome “Ciência Ocupacional”
em suas denominações.

Em termos de associativismo, existem no mundo muitas associações e socieda-


des científicas voltadas para a promoção da Ciência Ocupacional. Dentre elas,
destaca-se a Sociedade Internacional para a Ciência Ocupacional (International
Society for Occupational Science, ISOS), que é uma sociedade que advoga por um
mundo ocupacionalmente justo, no qual “as pessoas têm oportunidades e esco-
lhas para fazer as coisas que elas precisam e querem fazer”. Como objetivo prin-
cipal, essa sociedade visa congregar uma rede mundial de profissionais e institui-
ções comprometidas com pesquisa e educação sobre a Ocupação Humana e sua
relação com a saúde e o desenvolvimento das sociedades, bem como favorecer o
desenvolvimento de pesquisa e da formação em Ciência Ocupacional em univer-
sidades de referência e expressão mundial. Tudo isso acaba, por consequência,
influenciando as práticas profissionais e consolidando a importância da Terapia
Ocupacional no cenário da saúde, da educação e da assistência social.

Atualmente, a Ciência Ocupacional tem sua relevância reconhecida pela


Federação Mundial dos Terapeutas Ocupacionais, e seus estudos são utilizados
como base no delineamento dos padrões internacionais de formação em Terapia
Ocupacional.

Uma outra forma de se compreender o crescimento e a consolidação da discipli-


na no contexto mundial é por meio da produção de conhecimento, que tem sido
crescente, com publicação de livros e artigos. Como já vimos, no ano de 1996 o
primeiro livro sobre o assunto foi publicado – “Occupational Science: The evolving
discipline”.

Já em 1998, a partir de seu doutorado no contexto da saúde comunitária, Ann


Wilcock publicou o segundo livro da área, intitulado “An Occupational Perspective
of Health”.

Desde então, outros livros têm sido publicados no campo da Ciência Ocupacional,
evoluindo fortemente em direção a teorias e pesquisas sobre a relação entre
o Ser Humano e suas ocupações, entre eles: “The meaning of everyday life”,
“Occupation by design: Building therapeutic power”, “Introduction to Occupation:
The Art and Science of Living”, “Occupational Science in the service of Gaia”, “Life
Balance: Multidisciplinary and Research”, “Occupational Science: Society, Inclusion,
Participation” e “Transactional Perspectives on Occupation”.

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Já outros, trazem contribuição direta da Ciência Ocupacional para a Terapia
Ocupacional, como, por exemplo, “Occupation for Occupational Therapists” e
“Occupational Science for Occupational Therapy”.

O crescimento e o amadurecimento da Ciência Ocupacional também podem ser


visualizados pelo aumento do número de pesquisas e trabalhos acadêmicos pu-
blicados em periódicos especializados e apresentados em eventos acadêmicos. O
“Journal of Occupational Science” tem estado em atividade desde 1993. Esse peri-
ódico aumentou seu número de edições por ano em 2010, indicando claramente
o aumento de publicações nesse campo. É importante destacar também que ou-
tros periódicos da Terapia Ocupacional têm dedicado números especiais para di-
vulgação da Ciência Ocupacional, tais como, “The American Journal of Occupational
Therapy” e “The Scandinavian Journal of Occupational Therapy and Work”.

Na América Latina, algumas revistas científicas de expressão, como o “Cadernos


Brasileiros de Terapia Ocupacional” e a “Revista Chilena de Terapia Ocupacional”,
também trazem em seu escopo publicações sobre assuntos relacionados à
disciplina.

Assim como estar presente no cenário acadêmico tem sua importância, todos
esses veículos de comunicação dão ressonância às evidências dessa disciplina,
inclusive correlacionadas à Terapia Ocupacional, o que contribui de maneira sin-
gular para o desenvolvimento das melhores práticas profissionais.

Em relação ao conhecimento produzido no interior da Ciência Ocupacional e di-


vulgado por meio dos artigos publicados, os principais autores trazem um au-
mento no número de publicações, bem como a maior variabilidade de periódicos
que publicam trabalhos e pesquisas relacionados a essa disciplina, considerando
país e campo profissional de origem. Isso quer dizer que há uma elaboração que
já considera questões culturais ou características populacionais na composição
do raciocínio clínico terapêutico ocupacional.

E para onde vamos caminhando numa perspectiva de futuro da profissão?

Ainda no início do Século XXI, estudos apontaram uma estrutura conceitual para
a compreensão do papel central da ocupação, segundo a qual o conhecimen-
to gerado pela Ciência Ocupacional poderia ser abordado em quatro grandes
blocos:

• Para abordar os “elementos essenciais da ocupação”, tendo por propósito


investigar as características e os “elementos constituintes da ocupação”;

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• Para abordar a compreensão sobre os “processos ocupacionais”, com o
intuito de desvelar como as ocupações acontecem e as experiências sub-
jetivas dos indivíduos no que concerne ao seu envolvimento ocupacional;

• Para abordar a relação da ocupação com outros fenômenos, como saú-


de, qualidade de vida, identidade, desenvolvimento humano, políticas e
estruturas sociais, entre outros;

• Para abordar a descrição de experiências gerais relacionadas à ocupação.

Quanto aos objetivos da Ciência Ocupacional, estudos mais contemporâneos


identificaram os seguintes eixos de pesquisa para melhor análise da ocupação:
a ampliação do conhecimento sobre a ocupação humana, o desenvolvimento de
fundamentos teóricos para a Terapia Ocupacional e a contribuição da Ciência
Ocupacional para alcançar justiça e transformação social.

No que se refere ao perfil populacional ou de pacientes, estudos apontam um


predomínio de análises voltadas para pessoas sem qualquer tipo de deficiência
e na faixa etária de 18 a 64 anos, além de um predomínio de estudos desen-
volvidos com mulheres, sendo adultos e idosos a faixa de idade predominante.
Apesar de menos evidente, há também o predomínio de pesquisas voltadas para
pessoas com algum tipo de deficiência.

Assim, temos evidência dos públicos que tendem a emergir no cenário de aten-
ção terapêutica ocupacional a partir da análise da Ocupação Humana como área
da Ciência Ocupacional.

É fato também que não há uma visão única de ocupação, uma teoria universal
ou método de pesquisa mais adequado. Alguns autores acreditam que essas
diferenças sejam decorrentes das diferentes origens da disciplina, do seu tipo
de relação com a Terapia Ocupacional e das histórias pessoais e acadêmicas dos
próprios pesquisadores do campo.

Essas diferenças têm culminado em importantes debates e reflexões sobre os


rumos da disciplina e têm sido consideradas como parte do seu processo de
amadurecimento.

Com base no entendimento da centralidade da ocupação na vida das pessoas e


da sociedade, é possível desenvolver pesquisas no âmbito dos indivíduos, das fa-
mílias, das comunidades e da população. Dessa forma, tanto as pesquisas sobre
as experiências subjetivas das pessoas acerca do seu envolvimento ocupacional
quanto os estudos sobre as influências sociais, políticas, econômicas e culturais
acerca das ocupações de grupos e comunidades são possíveis.

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Essa diversidade de possibilidades se relaciona com o desenvolvimento de dife-
rentes métodos e estratégias de pesquisa. No início, os principais focos de estu-
do da Ciência Ocupacional eram sobre a forma, a função e os significados das
ocupações. Para tanto, os métodos de pesquisa mais frequentes eram oriundos
principalmente das ciências sociais e se caracterizavam por abordagens predo-
minantemente qualitativas e narrativas.

Com o desenvolvimento de diferentes campos de pesquisa e a aproximação de


outras disciplinas, como é o caso de Ciências Biológicas, Epidemiologia e Saúde
Pública, associada à necessidade de produzir evidências para informar a prática
da Terapia Ocupacional, ocorreu também o crescimento de abordagens quanti-
tativas de pesquisa.

A Terapia Ocupacional, neste contexto e dentro da diversidade de ações que


compõem essa atividade profissional, está em constante movimento para provar
cientificamente a eficiência de sua prática clínica, o que vem ocorrendo por meio
de pesquisas observacionais, experimentais e operacionais, bem como estudos
randomizados, de coorte, caso-controle, ecológicos, qualitativos, pesquisa-ação,
entre outros.

Diante dessas considerações, cabe aos profissionais terapeutas ocupacionais re-


fletirem sobre sua prática clínica diária, sobre sua intersecção com os gestores e
ou/pesquisadores, sua inserção na ciência e, por fim, sobre a busca na literatura
quanto às intervenções mais eficazes e cientificamente comprovadas (baseadas
em evidências) que possam ser adotadas como instrumentos norteadores da
intervenção em Terapia Ocupacional.

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Figura 1 – Representação gráfica do raciocínio clínico terapêutico ocupacional em abor-
dagem específica de integração sensorial
#ParaTodosVerem: a imagem mostra um fluxograma em forma de “mandala” ou círculo, dividido em seis
passos. Os passos representam o caminho do raciocínio clínico terapêutico ocupacional na abordagem de
integração sensorial para a efetivação da prática. O primeiro passo refere-se à análise do comportamento
do paciente, o segundo passo refere-se às hipóteses, o terceiro passo refere-se à testagem, o quarto passo
refere-se à análise cruzada da avaliação funcional qualitativa e quantitativa, o quinto passo refere-se às
causas, e o sexto passo refere-se aos marcos teóricos para o tratamento. As cores assumem tons pastéis
(cores frias e quentes), e ao centro está a representação gráfica do cérebro humano, com seus lobos e
tronco encefálico igualmente coloridos. Fim da descrição.

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Saiba Mais
Linhas de Pesquisa em Ciência Ocupacional
Sempre se considerou a necessidade do desenvolvimento de
métodos de pesquisa próprios na ciência ocupacional para se
adequar à natureza multifacetada das ocupações humanas.
Atualmente, é reconhecida a necessidade da adoção de um plu-
ralismo metodológico, com a utilização de abordagens quanti-
tativas, qualitativas e mistas (12), bem como a utilização de dife-
rentes técnicas, como entrevistas, métodos visuais e estudos do
uso do tempo, entre outros. Com isso será possível subsidiar as
diferentes possibilidades de investigação.
Abaixo apresentarei uma proposta de organização dos estudos
da disciplina em quatro diferentes níveis interdependentes de
tipos de pesquisa:
Em uma esfera mais básica, no primeiro tipo, situam-se os estu-
dos descritivos, aqueles voltados para descrever e explorar os
diferentes aspectos e contextos das ocupações, bem como as
experiências e significados das pessoas derivadas do seu envol-
vimento nessas ações.
O segundo tipo envolve os estudos relacionais, nos quais situam-
-se pesquisas que relacionam o envolvimento das pessoas em
ocupações com conceitos e aspectos geralmente oriundos de
outras disciplinas, como deficiência, saúde, cultura, identidade,
entre outros.
O terceiro tipo de pesquisa em Ciência Ocupacional, denomina-
do de pesquisa preditiva, amplia as descobertas das pesquisas
descritivas e relacionais com o intuito de identificar padrões de
ocupação nas populações, assim como as influências tempo-
rais, espaciais e sociais dos diferentes contextos.
Por fim, o quarto e último tipo de investigação envolve os estu-
dos prescritivos, que avaliam o impacto de práticas baseadas na
ocupação. Esses estudos têm sido desenvolvidos principalmen-
te no âmbito da Terapia Ocupacional.
É oportuno reconhecer que os diferentes focos e tipos de pes-
quisa apresentam contribuições elementares para a ampliação
do conhecimento sobre o homem e suas ocupações na vida
cotidiana. No entanto, eles também apresentam contribuições
e limitações importantes no que diz respeito à adequação de
seus achados aos diferentes cenários de prática da Terapia
Ocupacional.

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Evolução de Casos em Terapia
Ocupacional
Após percorrermos todo o caminho da história e dos fundamentos da Terapia
Ocupacional no Brasil e no mundo, entendendo, se não todos, grande parte dos
aspectos que se relacionam com a identidade profissional, além de suas bases
teórico-metodológicas, com a organização das práticas e do raciocínio clínico, en-
tramos agora na reta final, ou seja, na parte que traz considerações para orientar
a evolução dos casos. Nesse processo, as diretrizes de intervenção, ou “guidelines
profissionais”, aparecem como protagonistas no cenário das melhores práticas
profissionais.

Podemos dizer que a composição de diretrizes para a prática profissional parte


da riqueza dessa composição de saberes direcionados a objetivos específicos.
Isso não só auxilia na elaboração do raciocínio clínico como também sugere
ações, fluxos e processos testados em ensaios clínicos para determinar a sua
eficácia em diferentes ambientes e contextos da prática da Terapia Ocupacional.

Com mais parâmetros de controle, os casos tendem a apresentar melhor evolução,


em consonância com o potencial que apresentam e com os objetivos do terapeuta
ocupacional, que sempre terá autonomia para determinar os caminhos a serem
percorridos conforme sua experiência, inclusive para propor novas diretrizes.

Figura 2 – Exemplo de guideline ou diretrizes para orientar a intervenção terapêutica


ocupacional
#ParaTodosVerem: a imagem mostra uma sequência de quatro fases dispostas verticalmente em caixas.
Das caixas partem setas que expressam as situações ideais de evolução, desde a criação da linha de
abordagem ou raciocínio clínico até o processo de alta do paciente. Fim da descrição.

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Os procedimentos descritos numa diretriz permeiam conceitos e questões ine-
rentes à profissão, como identificar e avaliar as questões de desempenho ocupa-
cional prioritárias para o usuário; planejar e implementar intervenções baseadas
em evidências e teorias centradas em ocupações pessoalmente e psicologica-
mente significativas ou gratificantes; e avaliar os resultados terapêuticos diante
dos objetivos traçados.

Como exemplo, vamos abordar o fenômeno “dor”, que representa o principal


motivo de procura por cuidados de saúde. Pessoas com dor aguda e crônica en-
frentam desafios significativos para acessar e entender que facetas do manejo
integrado da dor centrado na pessoa, multimodal e abrangente (CIPM) poderiam
proporcionar melhoria na capacidade funcional, na interferência da dor, na qua-
lidade de vida e nas habilidades de enfrentamento da dor.

A maioria das diretrizes clínicas e terapêuticas recomenda terapias não farma-


cológicas e integrativas como intervenções primárias em resposta à dor. Além
disso, todos os serviços especializados em dor e que possuem um enfoque hu-
manizado mostram abordagens convincentes para a proposta das melhores prá-
ticas de cuidados de caráter multidisciplinar e integral.

A depender da complexidade do caso, se houver demandas envolvendo dife-


rentes disciplinas, como emocionais, físicas entre outras, diferentes abordagens
podem se associar. Como exemplo, temos a medicação tradicional ou alopatia;
temos a medicação naturalística ou homeopatia; procedimentos aplicados, inva-
sivos ou não invasivos; serviços complementares e integrativos (PICS); terapias
restaurativas; e abordagens de saúde comportamental.

O objetivo desse esforço colaborativo é conscientizar as pessoas ou pacientes


de que a Terapia Ocupacional é parte importante no cenário de controle da dor,
integrando a equipe e participando das diretrizes de atendimento com seu saber
específico.

Como seria uma diretriz de atenção à dor?

Avaliar é fundamental. A partir da avaliação, é possível estabelecer o perfil da dor


(como dor aguda ou dor crônica), descobrir suas causas ou etiologia e determi-
nar as abordagens para “combatê-la”. Como vimos acima, diferentes olhares ou
disciplinas podem ser utilizados nessa fase de avaliação. Exames podem ser soli-
citados, testes podem ser realizados e protocolos, aplicados para que o paciente
seja abordado em toda a sua complexidade. Assim temos que a primeira fase da
nossa diretriz de atenção à dor, poderia ser a Fase 1 – Avaliativa.

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A partir dos resultados da(s) avaliação(ões), seguimos para a definição das li-
nhas de cuidado ou condutas profissionais. Tão importante quanto avaliar bem
é determinar linhas de cuidado ou abordagens que atuarão de forma resolutiva,
cessando o quadro de dor estabelecido e permitindo que o paciente retome sua
rotina com mais satisfação e qualidade de vida. Essa seria a Fase 2 - Definição das
Linhas de Cuidado.

A partir daí, seguimos para a fase do tratamento, durante a qual as práticas pro-
fissionais serão aplicadas e os resultados aferidos para análise de eficiência e
resolutividade. Essa seria a Fase 3 – Tratamento.

A quarta fase se faz importante na medida em que determina se há a necessida-


de de reavaliação do caso, ou de revisão das abordagens propostas. Essa seria a
Fase 4 – Análise de Resultados.

Por fim, a quinta e última fase se relaciona com o processo de alta do paciente.
Essa seria a Fase 5 – Alta.

Assim como na abordagem da dor, abordagens de outros contextos, clínicas,


diagnósticos, áreas, doenças ou sintomas que impactam a relação das pessoas
com suas atividades cotidianas podem ter suas próprias “guidelines” ou diretrizes.

É importante considerar que as diretrizes para a orientação da prática terapêuti-


ca se pautam também no uso criterioso das descobertas científicas, determinan-
do a conduta clínica orientada ou adotada. Assim sendo, essa prática também
poderá ser classificada como “baseada em evidências”, e isso se torna um fator
importante para a validação de qualquer proposta ou intervenção, pois garante
sua eficiência e diminui as incertezas clínicas.

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Figura 3 – PBE – Prática Baseada em Evidências
#ParaTodosVerem: a imagem apresenta uma representação de três esferas dispostas em intersecção, cujo
espaço central traz as letras PBE. Nas demais esferas, temos: melhor evidência científica, preferências do
paciente e expertise do profissional. Na base temos os seguintes dizeres: “Três pilares para a definição do
tratamento”. Fim da descrição.

A proposta é que o profissional selecione e reconheça publicações com


o melhor rigor científico (estudos metodologicamente bem conduzidos e
conclusões validadas), e que aplique as descobertas na sua prática diária
organizadamente.

Qualquer proposta que impacte a prática diária do terapeuta ocupacional deve


derivar da implantação de procedimentos e ações baseados em evidências cien-
tíficas. Essa implantação deve estar alinhada aos processos organizacionais do
serviço de saúde ao qual o profissional está vinculado e ter sempre como priori-
dade a qualidade na assistência à população.

Tanto do ponto de vista ético como para a segurança do processo terapêutico


(terapeuta e paciente), toda evolução de caso ou atendimento deve ser registra-
da em prontuário.

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Considerada uma atribuição profissional obrigatória, a evolução de prontuário
está oficializada (e descrita) na Resolução COFFITO 415/2012, artigo 1º.

E o que deve constar numa evolução mínima de prontuário?

A evolução de prontuário deve conter o registro das seguintes informações (de


forma legível):

• Identificação do paciente (nome, naturalidade, estado civil, religião, local


e data de nascimento, profissão, endereço comercial e residencial);

• História clínica (queixas, hábitos, histórico do adoecimento, anteceden-


tes pessoais e familiares, tratamentos realizados);

• Descrição do perfil ocupacional e da qualidade de vida, diagnóstico e


prognóstico terapêutico ocupacional e plano de tratamento;

• Dados acerca da evolução clínica;

• Identificação do profissional.

Como vemos, as informações registradas devem refletir o raciocínio clínico te-


rapêutico ocupacional e permitir a visualização cronológica do curso da inter-
venção terapêutica e do desempenho ocupacional do paciente ao longo do seu
processo de atenção.

Conceitualmente, o conteúdo evoluído também deve expressar os princípios e


nomenclaturas específicas, o que se traduz numa linguagem técnica ou a lin-
guagem da Terapia Ocupacional. Nesse sentido, apontar referências acerca das
funções e significados de atividades, relatórios de progressos nas áreas de de-
sempenho, explicitação de problemas clínicos e função, assim como informações
acerca de mudanças constatadas, como as de ganhos funcionais, diminuição de
inabilidades, fatores vinculados à lentidão de progresso, rotinas, entre tantos
outros trazidos como conteúdo nessa disciplina, trarão sentido, propriedade e
validação técnica para o documento.

Além disso, é por meio do registro em prontuário que ocorre a extração de dados
vinculados à produtividade e faturamento, bem como de informações que per-
mitem a visualização da evolução clínica e da qualidade assistencial prestada.
Tais registros amparam o profissional da saúde juridicamente por se constituir
como prova idônea de defesa legal.

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Atualmente a qualidade documental associada às novas tecnologias (que garan-
tem a segurança da informação), tornou a evolução de prontuários (inclusive di-
gitais) cada vez mais importante institucionalmente.

Nos hospitais, por exemplo, os processos de acreditação hospitalar contemplam


em sua avaliação a coleta de dados e a evolução documentada em prontuário.
Essa evolução documentada é considerada uma das variáveis da qualidade assis-
tencial e da segurança do paciente.

Não obstante, a Política Nacional de Humanização – PNH aborda entre suas


premissas o trabalho transdisciplinar, apresentando o prontuário como uma
ferramenta que estimula e fortalece o trabalho em equipe e o diálogo entre os
profissionais.

Na terapia ocupacional brasileira, temos poucos estudos sobre a temática de


documentação, de modo que fica clara a necessidade de mais investimentos no
ensino sobre a importância do registro em prontuário, seja nos cursos de gradu-
ação ou de pós-graduação – âmbitos assistencial, administrativo e jurídico.

Para concluir nossa jornada nesta disciplina, apresentarei abaixo o brasão ou


símbolo da Terapia Ocupacional no Brasil. Esse símbolo compõe a identidade pro-
fissional e possui um significado que expressa os principais valores profissionais.

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Figura 4 – Brasão da Terapia Ocupacional no Brasil
Fonte: COFFITO
#ParaTodosVerem: a imagem mostra o brasão da Terapia Ocupacional, composto pelo bastão de Esculápio,
representando o poder da cura, e que aqui ganha uma releitura com o formato da letra “T”, de terapia, na
cor verde escura, simbolizando o processo de intervenção na ressignificação do cotidiano em busca da
independência, da autonomia, da funcionalidade, da participação e do empoderamento social. Este último,
por sua vez, é representado pelas asas da Fênix, em cor laranja e dispostas centralizadas ao fundo da
imagem. Essas asas remetem à transformação e ao renascimento para a vida ocupacional do sujeito. Duas
serpentes na cor “mostarda” se entrelaçam ao longo da letra “T” e traduzem a astúcia, a criatividade e a
capacidade de resiliência dos terapeutas ocupacionais, seja por meio da prescrição, da adaptação, do treino
ou da aplicação de atividades significativas que compõem as ocupações. No brasão, as ocupações estão
representadas pela letra “O” sobreposta à letra “T”, que remete ao sujeito ocupacional. Na base das letras
sobrepostas está escrito “Terapia Ocupacional” em preto, e toda a imagem é circundada por um mosaico
fino, nas cores verde-escuro e preto. Fim da descrição.

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Saiba Mais
A World Federation of Occupational Therapists – WFOT apresenta
padrões mínimos para a formação de terapeutas ocupacionais,
os quais são estabelecidos a partir de quatro eixos inter-relacio-
nados: social, profissional, ético e educativo. Tais padrões foram
estabelecidos com base nos domínios principais que distinguem
a Terapia Ocupacional de outras profissões e reforçam a inte-
gridade de competências, habilidades e atitudes profissionais.
O ensino em Terapia Ocupacional no Brasil é norteado pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs). Em seu artigo 3º é re-
ferido que:

“ O Curso de Graduação em Terapia Ocupacional


tem como perfil do formando egresso/profissional
o terapeuta ocupacional, com formação genera-
lista, humanista, crítica e reflexiva. Capacitado ao
exercício profissional em todas as suas dimensões,
pautado em princípios éticos, no campo clínico-
-terapêutico e preventivo das práticas de Terapia
Ocupacional. Conhece os fundamentos históricos,
filosóficos e metodológicos da Terapia Ocupacio-
nal e seus diferentes modelos de intervenção e
atua com base no rigor científico e intelectual.
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2002, p. 1

Nas DCNs há a descrição das habilidades e competências gerais


e específicas para formação do terapeuta ocupacional, sendo
sinalizado em seu artigo 5º, inciso XXX acerca da realização do
estágio em diferentes equipamentos sociais e de saúde, entre
eles o hospital.
O hospital constitui-se como campo de atuação para o terapeu-
ta ocupacional desde os primórdios da profissão. As práticas
nesse campo sofreram modificações ao longo do tempo em de-
corrência da necessidade de adequação às demandas da mo-
dernidade.
Em um estudo desenvolvido com o objetivo de caracterizar o
ensino nos cursos de graduação brasileiros em relação à Te-
rapia Ocupacional em contextos hospitalares, foi verificada a
reduzida oferta de disciplinas específicas e práticas no hospital.

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MATERIAL COMPLEMENTAR

Site

World Federation of Occupational Therapy – WFOT


https://bit.ly/3qTNGb6

Leituras

Role of Occupational Therapy in Comprehensive Integrative Pain


Management
https://bit.ly/45NknFY

O Ensino do Registro em Prontuário no Campo da Terapia


Ocupacional Hospitalar
https://bit.ly/3qRNKrN

Prontuário Terapêutico Ocupacional – O que Você Precisa Saber


Sobre Prontuário
https://bit.ly/44yLO5x
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Resolução CNE/CES 6/2002. Diário Oficial da


União, Brasília, 4 de março de 2002. Seção 1, p. 12. Disponível em: < h t t p : / / p o r t a l .
m e c . g o v . b r / c n e / a r q u i v o s / p d f / C E S 0 6 2 0 0 2 . p d f >.

CARLO, M. M. R. do P.; BARTALOTTI, C. C. (org.). Terapia ocupacional no Brasil: fun-


damentos e perspectivas. 4. ed. São Paulo: Plexus, 2001.

CAVALCANTI, A.; GALVÃO, C. R. C. Terapia ocupacional: fundamentação e prática. Rio


de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007.

MEDEIROS, M. H. R. Terapia ocupacional: um enfoque epistemológico e social. São


Paulo: Editora HUCITEC, 2003.

MONZELI, G. A.; MORRISON, R.; LOPES, R. E. Histórias da terapia ocupacional na Amé-


rica Latina: a primeira década de criação dos programas de formação profissional.
Cad. Bras. Ter. Ocup., São Carlos, SP, v. 27, n. 2, p. 235-250, 2019. Disponível em:
< https://www.scielo.br/j/cadbto/a/RLnxNfnB73kZSG7H5Mt8KRd/?format=pdf
& l a n g =p t >. Acesso em: 16/03/2023.

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