Você está na página 1de 128

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

ALANA FIGUEIREDO PONTES

A PRODUÇÃO DO URBANO E A (RE)PRODUÇÃO DE DESIGUALDADES: A


COVID-19 NOS ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS DE CURITIBA

CURITIBA
2023
ALANA FIGUEIREDO PONTES

A PRODUÇÃO DO URBANO E A (RE)PRODUÇÃO DE DESIGUALDADES: A


COVID-19 NOS ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS DE CURITIBA

The production of the urban and the (re)production of inequalities: COVID-19 in


precarious settlements in Curitiba

Dissertação apresentada como requisito para


obtenção do título de Mestre em Planejamento e
Governança Pública da Universidade Tecnológica
Federal do Paraná (UTFPR).
Orientadora: Profª. Drª. Simone Aparecida Polli

CURITIBA
2023
Esta licença permite que outros remixem, adaptem e criem a partir do seu
trabalho para fins não comerciais, desde que atribuam a você o devido
crédito e que licenciem as novas criações sob termos idênticos.
International 4.0
Dedico este trabalho às vítimas da COVID-19, em
especial à minha avó Nereide, à minha tia Margarida
e ao querido Edinardo, que tiveram suas partidas
antecipadas, deixando saudades.
AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, ao meu marido, Raphael, por não ter desistido,


mesmo quando eu desisti. Você acreditar no meu potencial foi meu impulso diário.
Agradeço à minha orientadora Profa. Dra. Simone Aparecida Polli, por toda a
paciência na condução dessa pesquisa, mesmo com todas as mudanças e desafios
surgidos.
Aos professores e à secretaria do Curso pela cooperação e aprendizado.
Aos diversos setores da Prefeitura Municipal de Curitiba pelos dados.
Aos meus colegas de sala, em especial Carmen e Alcides, que, mesmo a
distância, se fizeram presentes e me motivaram a continuar.
Aos amigos, Manoel e Wellington, por dividirem comigo o amor pelo
pensamento geográfico.
Às minhas amigas, Raquel, Letícia e Renata, por terem acompanhado esse
processo desde o início e escutado, pacientemente, tantas vezes sobre esse trabalho.
À minha família, por me ensinar a lutar até o fim por tudo que acredito. Somos
insistentes até demais.
Por fim e sempre, a Deus, pelo dom da minha vida e da vida de todos os
meus, em especial do meu filho que estar por vir.
RESUMO

O mundo atualmente vivencia um cenário de incertezas frente às


consequências do surgimento do novo Coronavírus (Sars-Cov-2), que, alastrando-se
pelo mundo inteiro, ocasionou, em 2020, o início da pandemia da COVID-19. Por ser
o Brasil um país reconhecidamente marcado por fortes desigualdades socioespaciais
e com sua construção urbana resultando em um espaço excludente, observa-se que
a pandemia tem um potencial de impactar de forma diferente os seus diversos
territórios, repercutindo dessa forma na possibilidade de uma maior exposição de
certa parcela da população a maiores riscos e contingências. Tomando como estudo
de caso a cidade de Curitiba, essa pesquisa busca analisar se a COVID-19 atinge de
modo desproporcional os territórios marcados por precariedades, principalmente em
aspectos de renda, moradia e acesso a serviços públicos. A partir da espacialização
dos dados da Secretaria Municipal de Saúde para os casos de contaminação e óbito
confirmados pela COVID-19, da análise dos dados socioeconômicos e da
territorialização dos assentamentos precários e conjuntos habitacionais da Cidade, se
verifica que comparativamente com outras capitais com maiores índices de
desigualdades sociais e maiores precariedades, Curitiba, por apresentar melhores
indicadores de saúde pública, saneamento e de qualidade dos domicílios, não
apresenta de forma discrepante o agravamento da pandemia nos bairros periféricos
da Cidade, apesar da concentração de casos. Nesse sentido, o juntamente aos fatores
de risco relacionados à moradia, os fatores relacionados à saúde, como a idade, são
mais vinculados com a concentração de óbitos e a própria taxa de letalidade da
doença, visto que se apresenta uma certa diminuição do contingente de idosos nas
áreas periféricas. A pesquisa busca destacar também a importância da qualidade das
informações espaciais dos dados coletados, em especial, pelos órgãos públicos de
saúde para possibilitar o monitoramento e a ação pública nas áreas mais precarizadas
da Cidade para o enfrentamento da pandemia, justamente por considerar sua
capacidade de catalisar a transmissão da Doença.

Palavras-chave: COVID-19; assentamentos precários; desigualdades socioespaciais;


geoprocessamento; Curitiba.
ABSTRACT

The world currently lives a scenario of uncertainty facing the consequences of the
emergence of the new Coronavirus (Sars-Cov-2), which, spreading throughout the
world, caused, in 2020, the beginning of the pandemic of COVID-19. As Brazil is a
country known for its strong socio-spatial inequalities and its urban construction
resulting in an excluding space, it is observed that the pandemic has the potential to
impact differently on its various territories, thus resulting in the possibility of a greater
exposure of a certain portion of the population to greater risks and contingencies.
Taking as a case study the city of Curitiba, this research seeks to analyze whether the
COVID-19 affects disproportionately territories marked by precariousness, especially
in aspects of income, housing and access to public services. From the spatialization
of data from the Municipal Health Secretariat for the cases of contamination and death
confirmed by COVID-19, from the analysis of socioeconomic data and from the
territorialization of precarious settlements and housing developments in the city, it
appears that, in comparison with other capitals with higher rates of social inequality
and greater precariousness, Curitiba, by presenting better indicators of public health,
sanitation and quality of homes, does not present in a discrepant way the worsening
of the pandemic in precarious territories, despite the concentration of cases in
peripheral neighborhoods. In this sense, along with the risk factors related to housing,
the factors related to health, such as age, are more linked to the concentration of
deaths and the lethality rate of the disease itself, since there is a certain decrease in
the contingent of elderly people in peripheral areas. The research also highlights the
importance of the quality of spatial information of the data collected, especially by
public health agencies to enable the monitoring and public action in the most
precarious areas of the city to face the pandemic, precisely because of its ability to
catalyze the transmission of the disease.

Keywords: COVID-19; precarious settlements; socio-spatial inequalities;


geoprocessing; Curitiba.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Renda por população até 1 salário-mínimo e mais de 10 salários-


mínimos.................................................................................................................... 35
Figura 2 – Distribuição das ocupações irregulares ............................................. 36
Figura 3 – Conjuntos Habitacionais de Curitiba – 1967 a 2003 ........................... 37
Figura 4 - Desempenho dos indicadores do eixo Ocupações Irregulares no
Plano Setorial de Habitação de Interesse Social – 1970/2009 ............................. 40
Figura 5 - Etapas de trabalho ................................................................................. 62
Figura 6 - Casos confirmados em Curitiba por data de divulgação e média
móvel de 7 dias para os anos de 2020 e 2021....................................................... 65
Figura 7 - Óbitos confirmados em Curitiba por data de divulgação e média
móvel de 7 dias para os anos de 2020 e 2021....................................................... 65
Figura 8 – Assentamentos Precários/Informais em Curitiba (PEHIS, 2019) ....... 71
Figura 9 – Assentamentos Precários/Informais e Setores de Habitação de
Interesse Social (SEHIS) em Curitiba ................................................................... 73
Figura 10 – Assentamentos Precários/Informais, Setores de Habitação de
Interesse Social (SEHIS) e Conjuntos Habitacionais em Curitiba ...................... 75
Figura 11 – População por bairro (2020) ............................................................... 77
Figura 12 - Densidade populacional (hab/km²) por bairro - 2020 ........................ 78
Figura 13 – Adensamento Domiciliar – Domicílios com 5 ou mais moradores. 80
Figura 14 – Domicílios Improvisados .................................................................... 82
Figura 15 – Domicílios sem banheiro .................................................................... 83
Figura 16 - Domicílios sem energia elétrica .......................................................... 84
Figura 17- Domicílios com presença de esgoto a céu aberto em seu entorno .. 85
Figura 18 - Domicílios com presença de lixo em seu entorno ............................ 86
Figura 19 – Renda domiciliar per capita a partir de 10 salários-mínimos .......... 88
Figura 20 - Renda domiciliar per capita até 1 salário-mínimo ............................. 89
Figura 21 - População idosa ................................................................................... 91
Figura 22 - Pessoas negras, pardas ou indígenas ............................................... 93
Figura 23 - Bairros periféricos de Curitiba ........................................................... 95
Figura 24 - Territorialização da Rede Municipal de Saúde em Curitiba .............. 97
Figura 25 - Espacialização – IVAB ......................................................................... 99
Figura 26 – Taxa de incidência por 10.000 habitantes - COVID-19 (2020-2021)
................................................................................................................................ 102
Figura 27 - Taxa de mortalidade por 10.000 habitantes - COVID-19 (2020-2021)
................................................................................................................................ 104
Figura 28- Taxa de letalidade por 100 casos confirmados - COVID-19 (2020-
2021) ....................................................................................................................... 106
Figura 29 - Casos confirmados de COVID-19 por mês (março a maio de 2020)
................................................................................................................................ 110
Figura 30 - Casos confirmados de COVID-19 por mês (junho a agosto de 2020)
................................................................................................................................ 111
Figura 31 - Casos confirmados de COVID-19 por mês (setembro a novembro de
2020) ....................................................................................................................... 112
Figura 32 - Casos confirmados de COVID-19 (2020-2021) ................................. 113
Figura 33 - Óbitos confirmados de COVID-19 por mês (março a maio de 2020)
................................................................................................................................ 114
Figura 34 - Óbitos confirmados de COVID-19 por mês (junho a agosto de 2020)
................................................................................................................................ 115
Figura 35 - Óbitos confirmados de COVID-19 por mês (setembro a novembro de
2020) ....................................................................................................................... 116
Figura 36 - Óbitos confirmados de COVID-19 (2020) ......................................... 117
Figura 37 - Óbitos confirmados de COVID-19 (2020-2021) ................................ 118
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Classificação Metodológica .................................................................. 23


Tabela 2 - Delineamento da pesquisa a partir dos objetivos específicos .......... 24
Tabela 3 - Crescimento populacional, adensamento e evolução das ocupações
irregulares em Curitiba ........................................................................................... 39
Tabela 4 - Casos e óbitos confirmados por mês em Curitiba ............................. 66
Tabela 5 - Dados COVID-19 (2020-2021) por bairro ............................................ 107
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CIC Cidade Industrial de Curitiba


COHAB-CT Companhia de Habitação Popular de Curitiba
COHAPAR Companhia de Habitação do Paraná
DSS Determinantes Sociais da Saúde
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDHM Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
IPPUC Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba
IVAB Índice de Vulnerabilidade das Áreas de Abrangência das Unidades
Básicas de Saúde
OMS Organização Mundial da Saúde
OPA Organização Pan-Americana de Saúde
PIB Produto Interno Bruto
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
RMC Região Metropolitana de Curitiba
SMS Secretária Municipal de Saúde de Curitiba
SNIS Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento
UTFPR Universidade Tecnológica Federal do Paraná
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12
1.1 Problema ........................................................................................................ 16
1.2 Objetivos ........................................................................................................ 19
1.2.1 Objetivo Geral ........................................................................................... 19
1.2.2 Objetivos Específicos ................................................................................ 19
1.3 Justificativa .................................................................................................... 19
1.4 Classificação e procedimentos metodológicos .......................................... 21
1.5 Estrutura da dissertação ............................................................................... 24
2 A PRODUÇÃO DESIGUAL DO URBANO E DA MORADIA ................................. 27
2.1 A produção espacial de Curitiba e a produção e reprodução de
desigualdades sociais e territoriais ................................................................... 33
3 AS DOENÇAS, AS CIDADES E AS MORADIAS .................................................. 42
3.1 A COVID-19..................................................................................................... 46
4 METODOLOGIA .................................................................................................... 50
4.1 Geoprocessamento e análise espacial na Saúde ....................................... 52
4.2 Etapas de trabalho ......................................................................................... 59
5 A COVID-19 E OS ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS: O CASO DE CURITIBA .. 64
5.1 A COVID-19 e sua disseminação: dados gerais .......................................... 64
5.2 Os assentamentos precários e suas desigualdades territoriais: dados
socioeconômicos ................................................................................................ 70
5.2.1 A Rede Municipal de Saúde de Curitiba e o Índice de Vulnerabilidade das
Áreas de Abrangência das Unidades Básicas de Saúde (IVAB) ........................ 96
5.3 A COVID-19 e sua espacialização: o agravamento da pandemia ............ 100
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 120
REFERÊNCIAS....................................................................................................... 124
12

1 INTRODUÇÃO

As cidades e as epidemias mantêm uma antiga relação. O surgimento das


cidades envolta na típica aglomeração de pessoas somada à baixa qualidade da
infraestrutura e aos escassos hábitos de higiene tornaram o espaço urbano um local
propício para o surgimento e a disseminação de diversos tipos de doenças.
Nesse sentido, com o passar do tempo, a melhoria dos hábitos de higiene e o
incremento nas instalações sanitárias e nas infraestruturas e serviços urbanos se
mostraram uma das principais formas de combate às doenças e mazelas tipicamente
urbanas. O avanço da ciência, em paralelo, impulsionou de forma significativa tanto a
prevenção como o tratamento destas.
O combate às doenças, o surgimento de novas e a tentativa de evitá-las
marcam, então, a trajetória da humanidade, promovendo alterações nos modos de
vida, influenciando a arquitetura dos espaços – e principalmente das moradias – na
busca pela salubridade através de elementos como a amplitude dos ambientes, a
insolação e a ventilação natural, e moldam também o espaço urbano e o seu
planejamento, que evolui através da expansão e melhoramento de suas
infraestruturas e serviços, especialmente de saneamento.
Em diferentes momentos da história, algumas doenças se destacaram pelo
seu alcance no território mundial e sua capacidade de transmissão, sendo
consideradas epidemias e pandemias, causando uma alta taxa de mortalidade
humana. São algumas delas a Peste Bubônica (ocorrida no século XIV), a Varíola
(erradicada pela vacinação em massa), a Cólera (ainda não erradicada), a
Tuberculose (considerada controlada, mas ainda presente em regiões mais pobres),
a Gripe Espanhola e, mais recentemente, a Gripe Suína (surgida em 2009).
A COVID-19 é uma doença infecciosa causada por um novo coronavírus,
identificado pela primeira vez em dezembro de 2019, em Wuhan, na China. Em 11 de
março de 2020, esta doença foi considerada uma pandemia pela Organização Mundial
da Saúde (OMS), devido à sua distribuição em grande escala, registrando-se uma
13

quantidade expressiva de casos presentes em mais de 100 países1.


Segundo dados do Ministério da Saúde2, o Brasil teve seu primeiro caso
confirmado em 26 de fevereiro de 2020, na cidade de São Paulo. A partir disso
aumenta-se substancialmente o número de casos, tornando o Brasil um dos países
mais afetados pela COVID-19 em todo o mundo. Finaliza-se, então, o ano de 2021
com 22.287.521 casos de contaminação e 619.056 óbitos confirmados em todo o
território nacional que se concentram nos perímetros urbanos das cidades,
principalmente, nas metrópoles.
Nesse sentido, é preciso ter em mente que o processo de urbanização
brasileiro, enquanto configuração do espaço onde a maioria da população vive
atualmente3, conformou-se por meio de um processo excludente e desigual,
caracterizado pela marginalização da população mais pobre em um contexto de forte
concentração de renda e poder que consolida a segregação de classes (MARICATO,
1996).
Ao se analisar historicamente a conformação socioeconômica e territorial
brasileira, observamos alguns processos relevantes desde a colonização brasileira,
que conformou e consolidou uma estrutura patriarcal latifundiária, fomentando uma
forte segregação de classes e concentração de renda. Até os tempos atuais marcados
pela exploração capitalista da terra, que proporciona a insegurança da posse e amplia
a dificuldade no acesso formal à terra e pela produção capitalista do meio urbano, que
promove valorizações desiguais do espaço, gerando expulsões e espoliações a
determinadas classes sociais (MARICATO, 1982; FERREIRA, 2005).
Assentamentos precários, favelas, periferias e aglomerados subnormais são
territórios que se construíram – e ainda se constroem atualmente – a partir de uma
diferenciação revelada em diversos aspectos: sociais, demográficos, econômicos,
ambientais, simbólicos. São caracterizados pelas precárias estruturas urbanas e

1 A Organização Pan-Americana de Saúde (OPA) apresenta em notícia, no mesmo dia, que o diretor-
geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, faz esse o anúncio
em Genebra, na Suíça. Porém, esclarece que, em 30 de janeiro de 2019, a OMS já havia declarado
que o surto do novo coronavírus constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância
Internacional (ESPII) – o mais alto nível de alerta da Organização, conforme previsto no Regulamento
Sanitário Internacional. Fonte: https://www.paho.org/pt/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-
pandemic. Última visualização em 14 de novembro de 2021.
2 É possível consultar os dados do Ministério da Saúde para a COVID-19 em:
https://covid.saude.gov.br/. Última visualização em 12 de fevereiro de 2022.
3 De acordo com o IBGE, a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)
2015, 84,72% da população brasileira vive em áreas urbanas e, consequentemente, 15,28% vivem em
áreas rurais.
14

habitacionais que geram uma baixa qualidade de vida para sua população e uma
maior exposição a riscos diversos (e.g. desemprego, violência, desastres ambientais,
doenças) em um contexto de difícil mobilidade social, baixas seguranças jurídicas e
cerceamento de direitos básicos. Demonstra-se, com isso, a relação que se construiu
e se constrói constantemente entre território e desigualdade.
Essa é uma reflexão que se fundamenta a partir do conceito de efeito-
território, que busca apreender os benefícios e prejuízos que incidem em pessoas ou
grupos sociais em função da sua localização num território. Efeito este que pode ser
positivo ou negativo, configurar ativos ou passivos para o desenvolvimento social,
econômico, cultural de um indivíduo ou de um grupo (ANDRADE; SILVEIRA, 2013).
Ou seja, as desigualdades, em suas diferentes formas, se associam ao
território que expressa e (re)produz vulnerabilidades, que também se reflete num
processo de exclusão urbanística e social da população.
Abordagem essa reforçada por Lima (2016, p. 23) quando diz que

o conceito de Vulnerabilidade Social se explica a partir do estado de


maior ou menor exposição dos indivíduos e das populações aos
fatores de exclusão social, que em última instância revelam uma
situação de desigualdade social, em contextos de negação dos
direitos sociais.

Ou ainda por Cançado, Souza e Cardoso (2014, p. 12), onde a vulnerabilidade


social, como uma sobreposição de fatores que favorece a suscetibilidade de uma
pessoa ou de um grupo a riscos e contingências, “é um indicador da iniquidade e da
desigualdade social”.
Com isso, a urbanização das cidades brasileiras e seu fenômeno de
metropolização marca o espaço da centralidade e da concentração de pessoas, de
renda, de serviços, de empregos, mas também de desigualdades, de injustiças, de
exclusão, de pobreza (SANTOS, 2004).
O Brasil apresenta-se, no contexto global, como um dos países mais
socialmente desiguais4. Como efeito disso, observa-se que seus centros urbanos -
sobretudo as metrópoles -, com seus processos de segregação social e espacial, se
configuram como um dos principais espaços que expressam e (re)produzem essas

4 Alguns indicadores relatam essa realidade. Nesse sentido, destacamos o Relatório de


Desenvolvimento Humano de 2019, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD),
que apresenta, com base no Coeficiente Gini (utilizado amplamente para medir a desigualdade e
concentração de renda), que o Brasil ocupa a sétima pior posição de desigualdade do mundo.
15

desigualdades, tendo no acesso aos serviços de saúde um exemplo dessas.


Com a pandemia ainda em curso, essa dissertação se propõe a analisar se a
COVID-19 atinge de forma diferenciada esses espaços em relação ao restante da
cidade. Torna-se fundante o mapeamento dos casos da doença – por onde se
espalha, se concentra e se agrava – para entendermos como o poder público pode,
através de uma política pública, locar seus recursos financeiros e sociais, na busca
pela equidade5 nos serviços dispostos à população e pela eficiência nos gastos
públicos, principalmente na época de incertezas e contingenciamentos que se
enfrenta atualmente.
A partir do entendimento de que as características socioeconômicas de um
indivíduo, aqui tratadas com foco na moradia, estão fortemente correlacionadas com
sua saúde6, a discussão se concentra, então, em entender a propensão que os
territórios marcados por assentamentos precários apresentam para o agravamento da
pandemia da COVID-19, a partir da espacialização dos dados de contaminação e
morte pela doença para os anos de 2020 e 2021 em Curitiba, capital do estado do
Paraná.
A hipótese desta pesquisa é de que a pandemia da COVID-19 incide de forma
desproporcional nos assentamentos precários em comparação ao restante da cidade
de Curitiba, afetando de forma mais massiva e/ou letal a população residente nessas
áreas com maior vulnerabilidade social.
O trabalho se propõe, então, a compreender a disseminação da doença nos
territórios marcados por moradias periféricas, ilegais e precárias na Cidade,
possibilitando o reconhecimento desses locais como espaços urbanos com uma maior
propensão para o agravamento da doença, a fim de possibilitar o planejamento de
políticas públicas mais contextualizadas ao efetivo enfrentamento à pandemia.
Embora as recomendações mundiais para o controle da pandemia,
preconizados pela OMS, devam ser seguidas e aplicadas a todos os territórios, a

5 O princípio da equidade está presente tanto na base do Sistema Único de Saúde (SUS), como, no
Brasil, também deve nortear as políticas públicas de saúde. Relacionando-se com os conceitos de
igualdade e de justiça, sua utilização visa reduzir o impacto das diversidades e desigualdades sociais
na saúde, reconhecendo as diferentes necessidades de cada pessoa a partir das suas condições de
vida.
6 Definições e estudos sobre os determinantes sociais de saúde (DSS) são realizadas tanto pela

Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde como pela Comissão Global sobre
Determinantes Sociais da Saúde para a formulação de políticas e estratégias em favor do tema, mas
ambas entendem que as condições econômicas e sociais influenciam decisivamente as condições de
saúde de pessoas e populações.
16

identificação da gravidade da doença nos assentamentos precários de Curitiba,


proposta neste estudo, pode auxiliar na criação e no aprimoramento de medidas
específicas mais efetivas, de forma a dar a devida atenção a esses territórios,
buscando, como fim, reduzir-se as desigualdades sociais presentes no espaço urbano
e, consequentemente, a vulnerabilidade dessa população a maiores riscos de saúde.

1.1 Problema

O estudo sobre a incidência e a mortalidade de doenças diversas na periferia


é amplamente abordado. Partindo do princípio de que as cidades nunca se
constituíram um espaço igualitário, diversas pesquisas buscam entender como a baixa
qualidade das habitações e a ausência ou ineficiência dos serviços urbanos dentro
dos assentamentos precários impactam na qualidade de vida dos moradores.
Nesse sentido, aponta-se para o conceito de Kowarick (1979) de espoliação
urbana, entendido como o somatório de inequidades sobre a parcela da população
carente e explorada, como o trabalho, a moradia, o transporte, a ausência de áreas
de lazer.
Com o acontecimento da nova pandemia da COVID-19, expõe-se os desafios
e desigualdades da vida urbana com mais clareza do que o habitual. Os órgãos de
saúde, entendendo o vírus como um mal que estar suscetível a todos de forma igual,
sugerem estratégias gerais (e genéricas) de tratativas para a diminuição do contágio
enquanto um método de prevenção ou de tratamento não é elaborado. As
recomendações feitas pela OMS são, em suma, de reforço nos hábitos de higiene
pessoal, baseadas principalmente na necessidade de se lavar as mãos e na utilização
de máscaras faciais, além da instrução sobre a manutenção de um distanciamento
social, com a sugestão de isolamento domiciliar.
Porém, a diferenciação espacial desses territórios precários reflete-se numa
diferenciação social que expõe uma parte da população a maiores riscos e privações.
No Brasil, quem pode ter acesso regular à água, à moradia e à renda que possibilitem
o isolamento social e o incremento nos hábitos de higiene? Ou ainda, quem pode ter
acesso a serviços de saúde, principalmente nos países periféricos, onde o poder
público apresenta uma limitação quantitativa e qualitativa dos seus serviços básicos
ofertados?
O atual contexto em que vivemos expressa com mais contundência as
17

profundas desigualdades urbanas e as diferentes formas de exposição a riscos para


a sua população. Esse vírus que adentrou o território brasileiro através do turismo
internacional atingiu inicialmente às classes de renda mais alta, mas apresenta um
potencial para um efeito catalisador nas periferias, observado também através das
consequências da implantação das medidas preventivas determinadas pela OMS, que
impactam a todos, mas de formas bem diferenciadas.
Observa-se, nesse sentido, as más condições de habitação para essa parcela
da população que recorre a moradias precárias em assentamentos informais, por
encontrar-se privada de seus direitos básicos. Percebe-se um agravo na situação
dessas pessoas neste momento, não só pela dificuldade para se isolar em função das
moradias com grande adensamento domiciliar, mas também por outras formas de
privações, visto que estas habitações são caracterizadas não só pela coabitação, mas
ainda, pela insalubridade, a irregularidade no acesso à água e ao saneamento básico,
a baixa qualidade (ou ausência) de infraestrutura urbana e de oferta de serviços
públicos do seu entorno7.
Deve-se considerar, ainda, àqueles que não tem moradia e que observam
uma falta de assistência crônica pelo Estado, resultante de - e resultando em - uma
profunda invisibilização desse contingente populacional do planejamento público 8.
Ainda, é preciso entender que tanto o isolamento como o distanciamento
social demandam uma suspensão das atividades que produzem aglomerações, sejam
elas atividades comerciais, fabris, de lazer ou cultura. Isso provoca um choque na
produção, circulação e consumo de bens e serviços, afetando profundamente a
geração de renda, os valores comerciais de produtos, os empregos, em suma, a
economia de uma forma geral, gerando um impasse para o poder público na
conciliação e definição de prioridades entre a saúde pública e a economia.
Além disso, destaca-se que a reclusão domiciliar e o trabalho remoto não são
possíveis para boa parte da população que, para garantir sua sobrevivência, precisa
se expor mais ao risco de contaminação ao tentar continuar sua rotina de vida da

7 Como exemplo disso, destaca-se que, segundo o Sistema Nacional de Informações sobre
Saneamento (SNIS), em 2018, 35 milhões de brasileiros vivem sem acesso à água tratada e 100
milhões não possuem rede esgoto.
8 Somente em 2019 é decidido pela Justiça a inclusão de moradores em situação de rua no Censo.

Pela primeira vez, então, deverá ser realizada uma contabilização efetiva deste contingente
populacional. Ou seja, o Censo de 2020 – adiado devido à pandemia da COVID-19 –, pesquisa
realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para medir a densidade populacional
e o perfil da população brasileira, incluirá moradores em situação de rua.
18

forma como se encontrava anteriormente à pandemia. São exemplos destes, os


trabalhadores informais ou aqueles que trabalham com serviços essenciais. Essas
são pessoas que, em sua maioria, não podem continuar seus trabalhos de casa ou
garantir outras formas de renda.
Como consequência disso, por um lado, percebe-se que a população que já
apresentava outros privilégios (e.g. empregos valorizados, educação de qualidade,
moradia própria e adequada, fundos de reserva financeira) são, em sua maioria, as
que mantém-se empregos e com seus serviços por meios virtuais; do outro lado, as
classes que já apresentava outras vulnerabilidades (sociais e territoriais) são
impedidas de exercer suas atividades, perdendo seus empregos e renda ou são
submetidas a condições ainda mais precárias de trabalho e deslocamento, se
sujeitando a utilização de transportes públicos e ao contato com pessoas, aumentando
o risco de contaminação.
Portanto, a pesquisa em questão procura se deter, dentro do contexto urbano,
na espacialização específica da pandemia que estamos enfrentando, com foco nos
assentamentos precários de Curitiba, de forma a entender como a pandemia afeta
essa mesma parcela da população mais vulnerabilizada.
Mesmo com a pandemia ainda em curso, entender onde alocam-se os casos
de contágio e como isto se deu cronologicamente pode responder a perguntas como:
quais são os territórios que apresentam mais casos de contágio? Quais os que
evoluíram mais rapidamente? Quais os que apresentam um maior agravamento da
doença, refletidos nos casos de mortes? Existe alguma relação entre a COVID-19 e
esses territórios precários? De que forma a evolução da doença se vincula à aspectos
socioeconômicos (como renda, domicílios precários, coabitações, regiões com baixa
oferta e qualidade de infraestrutura urbana e ligações intradomiciliares)?
Diante do exposto, a questão desta pesquisa é: como a COVID-19, refletida
no número de casos de contágio e de morte pelo vírus, atinge os assentamentos
precários em Curitiba? A doença afeta de modo desproporcional os moradores desses
19

lugares?

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo Geral

O objetivo desta dissertação é analisar os efeitos da pandemia da COVID-19


sobre os assentamentos precários em Curitiba (PR), de forma a verificar se esta afeta
de modo desproporcional essa parcela da população, a fim de criar subsídios para
políticas públicas de enfrentamento da pandemia específicas para os territórios
precários.

1.2.2 Objetivos Específicos

Para que o objetivo geral seja atingido, são propostos os seguintes objetivos
específicos:
a) Compreender, historicamente, como se dá o processo de (re)produção
de desigualdades sociais e espaciais, com foco na produção do espaço urbano em
Curitiba;
b) Compreender o impacto das doenças e epidemias nas cidades, com
foco nos modelos de urbanização para o enfrentamento destas e os fatores físicos e
sociais da habitação que contribuem para a sua disseminação e o seu agravamento;
c) Relacionar e mapear os casos de contaminação e óbito nos
assentamentos precários de Curitiba, reconhecidos pelas autoridades públicas,
buscando relações entre esses territórios e o agravamento da COVID-19;
d) Analisar os aspectos socioeconômicos dos moradores dos
assentamentos precários de Curitiba, de forma a relacioná-los com a espacialização
dos casos e mortes pela COVID-19, através de uma análise temporal e espacial da
evolução e da distribuição dos casos de contaminação e óbito nesses assentamentos
em relação ao restante do Município.

1.3 Justificativa

A preocupação que orienta este trabalho é entender a interligação entre a


produção do território e a (re)produção de desigualdades (sociais, ambientais,
econômicas, etc.), conformando o ambiente urbano como um espaço fragmentado,
20

onde determinados grupos e classes se encontram mais suscetíveis a agravos e


contingências.
Nesse sentido, a territorialização da COVID-19, através do estudo de caso de
Curitiba, busca explorar como essa conformação desigual se relaciona à dimensão
territorial e refletem-se em maiores riscos para sua população.
No caso deste estudo, retratados através dos casos de contágio e morte pela
COVID-19 e seu acometimento nos assentamentos precários, busca-se contribuir
para uma maior compreensão sobre como as desigualdades sociais urbanas, com
enfoque nas desigualdades territoriais, impactam na qualidade de vida e saúde da
população mais pobre, visando fomentar no poder público a necessidade da
proposição de políticas públicas de enfrentamento à pandemia específica para esses
territórios.
Neste momento, refletir sobre as vulnerabilidades e sua territorialização é
essencial para, de forma prática, buscar entender quais aspectos devem ser
priorizados para o enfrentamento a COVID-19 nos territórios fragilizados, visando
possibilitar ações mais efetivas na manutenção de vidas e no combate à pandemia.
De forma mais ampla, busca-se fomentar a reflexão sobre o modelo de
desenvolvimento que tem sido implementado, ambientalmente insustentável,
socialmente desigual, que promove crises de diversos gêneros, cada vez mais
recorrentes e com consequências perversas, especialmente para os países
periféricos, a exemplo do Brasil.
Utilizou-se, como exemplo, ainda que de forma parcial devido se caracterizar
como uma situação ainda em curso, a pandemia da COVID-19 para possibilitar a
demonstração concreta de como a configuração desses espaços desiguais incide na
capacidade de sobrevivência das pessoas que, já apresentando outras
vulnerabilidades, encontram-se com o risco de contágio e morte potencialmente
agravados, seja pela sua realidade socioeconômica, seja pela incapacidade de
atendimento do setor público à essa parcela da população.
Nesse sentido, a proliferação da COVID-19 na periferia preocupa pelo impacto
que poderá apresentar para a saúde pública brasileira, visto que a população mais
vulnerabilizada é a que corre maiores riscos de morte nos casos de contaminação,
devido ao menor acesso aos serviços de saúde e pela frequência maior de doenças
pré-existentes e debilidades de saúde em geral. Sendo estes também os que menos
tem ativos para observância das recomendações de saúde e higiene e o que se
21

encontram em conformações habitacionais que impactam negativamente no controle


da disseminação do vírus, acarretando um aumento dos casos de contágio e,
consequentemente, do potencial de transmissão, de uma forma geral, no território
brasileiro.
Com vistas nisso, o monitoramento da dinâmica de contágios e mortes por
COVID-19 é de importância estratégica para o desenvolvimento e o melhoramento de
políticas públicas de combate à pandemia, e um dos aspectos fundamentais para o
seu planejamento é o reconhecimento das áreas com maior propensão para o
aumento do contágio e o agravamento da doença.
A exposição destas questões busca deflagrar a situação atual em que as
cidades continuam a se estabelecer, em bases desiguais, reforçando vulnerabilidades
historicamente existentes, onde, ainda, o poder público se mostra ineficiente em gerir
as necessidades da população, principalmente, da sua parcela mais marginalizada.
O que se procura instigar é que, a partir dessa constatação, possa se propor
novas formas de ação pública e contribuição conjunta da população, para que se
construam bases sociais mais igualitárias.
Neste momento, refletir sobre as desigualdades e sua territorialização é
essencial para entender como melhor enfrentar a pandemia que se atravessa,
possibilitando ações mais efetivas, contextualizadas com cada território, para o
alcance do objetivo principal: a manutenção das vidas e a restauração da saúde
pública.
E, para além deste momento em específico, se possa refletir na forma de
desenvolvimento que a sociedade está construindo, a fim de que ela se torne mais
equilibrada e justa socialmente, ambientalmente, economicamente, culturalmente e,
consequentemente, territorialmente.

1.4 Classificação e procedimentos metodológicos

Os procedimentos metodológicos que orientam essa pesquisa partem de uma


revisão integrativa da literatura disponível para consolidação de uma fundamentação
teórica e de um estudo de caso, que possui no seu cerne a coleta de dados
secundário, para avaliação da hipótese gerada.
Para alcançar seu objetivo principal, o trabalho se fundamenta em um
processo de georreferenciamento e geoprocessamento dos registros gerados, a partir
22

da base de dados da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, para os casos de


contaminação e óbitos confirmados pela COVID-19 nos anos de 2020 e 2021 no
Município. Assim, configura-se, portanto, um estudo de caso de Curitiba.
Quanto à natureza, trata-se de uma pesquisa aplicada, pois visando
solucionar problemas específicos, busca gerar conhecimentos para uma aplicação
prática, além de envolver verdades e interesses locais (GERHARDT; SILVEIRA,
2009). Assim, utilização desses dados será feita com vistas a possibilitar uma análise
crítica sobre a propensão que os territórios marcados por assentamentos precários e
outras deficiências socioeconômicas apresentam para o agravamento da pandemia
da COVID-19, de acordo com as informações de local de residência do paciente.
A pesquisa objetiva gerar conhecimentos práticos, a partir da análise da
espacialização da COVID-19, que fundamentam a confecção de políticas públicas
específicas para o enfrentamento de debilidades nesses territórios.
Desta forma, será analisado o comportamento da pandemia nesses territórios
precarizados de forma comparativa ao restante do Município, visando entender se
esses territórios marcados por um contingente populacional que se encontra em
piores condições sociais e de moradia refletem em maiores coeficientes de incidência
e de mortalidade por COVID-19.
Nesse sentido, será necessário a realização de uma abordagem quali-
quantitativa, pois dada a complexidade do problema que pretende investigar, a
utilização conjunta das duas abordagens possibilita recolher mais informações do que
seria possível isoladamente (GERHARDT; SILVEIRA, 2009).
A pesquisa quantitativa se fundamenta na análise dos dados de forma a
apresentar os resultados quantificáveis da espacialização da COVID-19 no município
de Curitiba, contando com a verificação da relação entre variáveis quantitativas. Já
com a abordagem qualitativa esperasse relacionar os aspectos socioeconômicos
entre os territórios precários e a cidade como um todo de forma a identificá-los como
um fator gerador de vulnerabilidade para a COVID-19.
Para efeitos deste estudo, para análise dos dados considerar-se-á territórios
precários aqueles reconhecidos pelo poder público. Nesse aspecto, dois níveis de
dados serão utilizados:
a) os dados descritivos e a delimitação georreferenciada pelo Município,
através do IPPUC e da COHAB, dos assentamentos precários de Curitiba, realizado
em 2019, por se mostrarem mais precisos a realidade existente no território;
23

b) a espacialização das vulnerabilidades sociais para a saúde realizada


pelo Município a partir do Índice de Vulnerabilidade das Áreas de Abrangência das
Unidades Básicas de Saúde (IVAB), por entender a importância que há em se
considerar, nesta análise, os territórios já tidos como vulneráveis para o contexto da
saúde pela própria gestão pública, visto que antes que a COVID-19 surgisse e
chegasse às favelas e periferias a situação da precariedade dos serviços de saúde
que atendem estes territórios já era uma realidade.
O registro de pacientes a partir da base de dados Secretaria Municipal de
Saúde também auxiliará na aferição das principais características socioeconômicas
da moradia do paciente, a partir de outras informações levantadas no cadastro como:
se o domicílio possui energia elétrica, os tipos de abastecimento e tratamento de água,
o tipo de habitação, a destinação do lixo e de fezes/urina, a quantidade de cômodos
e os meios de transporte utilizados na residência.
A partir da identificação dos territórios a serem objetos de estudo, eles serão
espacializados no território municipal e analisados juntamente com os dados da
Secretaria Municipal de Saúde para a COVID-19 em Curitiba, por meio da
geolocalização da moradia do contingente populacional acometido pela doença, assim
como aqueles que chegaram a óbito, de forma entender se territórios precários
guardam alguma relação espacial entre o agravamento de contágios e óbitos por
COVID-19.
Constatando-se a existência de um agravamento da pandemia da COVID-19
nesses territórios, a pesquisa reforçará o alerta para a necessidade de implementação
de políticas públicas voltadas para o atendimento das necessidades das comunidades
precárias, com vistas a um efetivo enfrentamento da COVID-19.
Desta forma, resume-se a caracterização da pesquisa a partir da metodologia
empregada neste trabalho nos seguintes quadros:

Tabela 1 - Classificação Metodológica


Resumo metodológico
Abordagem Natureza Objetivos Procedimentos técnicos
Pesquisa quali- Pesquisa Pesquisa exploratória, Pesquisa Bibliográfica, pesquisa
quantitativa aplicada descritiva e explicativa documental e estudo de caso
Fonte: elaborado pela autora com base em Gerhardt e Silveira (2009).
24

Tabela 2 - Delineamento da pesquisa a partir dos objetivos específicos


Delineamento da pesquisa
Objetivos específicos Metodologia Principais fontes

Compreender, historicamente, como se dá o processo de


Pesquisa Teses, dissertações,
(re)produção de desigualdades sociais e espaciais, com
bibliográfica artigos e livros.
foco na produção do espaço urbano em Curitiba

Compreender o impacto das doenças e epidemias nas Pesquisa Teses, dissertações,


cidades, com foco nos modelos de urbanização para o bibliográfica; artigos, livros, jornais
enfrentamento destas e os fatores físicos e sociais da Pesquisa locais, publicações
habitação que contribuem para a sua disseminação e o documental oficiais, reportagens.
seu agravamento
Relacionar e mapear os casos de contaminação e óbito Estudo de caso
nos assentamentos precários de Curitiba, reconhecidos (coleta e Dados IPPUC, SMS,
pelas autoridades públicas, buscando relações entre interpretação de COHAB.
esses territórios e o agravamento da COVID-19 dados)
Analisar os aspectos socioeconômicos dos moradores
dos assentamentos precários de Curitiba, de forma a
relacioná-los com a espacialização dos casos e mortes Estudo de caso
Dados IPPUC, SMS,
pela COVID-19, através de uma análise temporal e (discussão dos
COHAB, IBGE.
espacial da evolução e da distribuição dos casos de resultados)
contaminação e óbito nesses assentamentos em relação
ao restante do Município
Fonte: elaborado pela autora.

1.5 Estrutura da dissertação

De forma a resumir o exposto, apresenta-se a seguir a estrutura da


dissertação prevista para o desenvolvimento desta pesquisa.
Neste capítulo 1, parte-se inicialmente da consolidação do Projeto de
Pesquisa proposto, onde são abordados o problema, os objetivos e a justificativa da
presente pesquisa.
Avança-se nos capítulos 2 e 3 com a fundamentação teórica da pesquisa. Ela
se dividirá em dois grandes temas, formando dois capítulos: um nomeado de “a
produção desigual do urbano e da moradia” e o outro de “as doenças, as cidades e as
moradias” com o objetivo de analisar como as desigualdades são estruturalmente
construídas nas cidades e as interrelações entre moradia, infraestrutura e condições
de saúde.
O capítulo 2 terá como objetivo fomentar a discussão sobre como a cidade
é produzida de forma desigual, segregando o seu território a partir de fatores sociais,
econômicos, culturais e de mercado, formando, de modo genérico, os espaços
privilegiados e as “periferias”, que se refletem em aspectos físicos como de
implantação de infraestrutura, equipamentos e serviços urbanos.
25

Nesse sentido, procurar-se-á responder a questões como: por que se tem


uma produção precária da moradia no Brasil? Por que são essas produções precárias
também marcadas por informalidades? Como isso se reflete no acesso à
infraestrutura, equipamentos e serviços urbanos?
Posteriormente, a pesquisa se dedicará a trazer o debate inicial de um cenário
nacional para a realidade de Curitiba com um subcapítulo nomeado de “a produção
espacial de Curitiba e a produção e reprodução de desigualdades sociais e
territoriais”. Nela será aprofundada a produção do seu espaço urbano com base no
seu histórico de planejamento, ocupação e expansão da cidade e a consequente
invisibilização da sua periferia, tratado tanto numa dimensão mais ampla da produção
das suas desigualdades socioespaciais.
Tendo fundamentado como a questão central da produção precária da terra
urbana se conforma no território brasileiro e, em especial em Curitiba, município do
Estudo de Caso, parte-se, no capítulo 3, para o entendimento da relação existente
entre o surgimento e disseminação das doenças e as cidades, com foco nos modelos
de urbanização para o enfrentamento de doenças urbanas e os fatores físicos e
sociais da moradia precária que contribuem para a sua disseminação e o seu
agravamento. Este capítulo procura se aproximar da problemática enfrentada com o
advento de uma nova doença, a COVID-19, e sua relação com o território.
Como a pandemia da COVID-19 está em curso, os estudos acadêmicos sobre
essa problemática são escassos. Diante de uma problemática tão recente, a pesquisa,
nesta seção, se fundamentará em sintetizar o que vem sendo produzido e o que falta
na literatura científica, considerando ainda a orientação dos órgãos internacionais e
as políticas públicas de enfrentamento à pandemia.
Nesse sentido, será utilizada a revisão bibliográfica integrativa e a pesquisa
documental para se obter a síntese do conhecimento disponível, possibilitando uma
compreensão do que está sendo produzido acerca do fenômeno a ser analisado.
A pesquisa bibliográfica consistirá na análise de fontes secundárias, como
periódicos nacionais e internacionais, livros nacionais e internacionais, teses,
dissertações, anais de eventos nacionais e internacionais, envolvendo também uma
pesquisa documental em leis, decretos, entre outros documentos oficiais de distintos
órgãos públicos.
Os resultados despontam em publicações que abrangem o período de abril
de 2020 a junho de 2021, tendo como recorte teórico: COVID-19; Território; Periferia;
26

Cidades; Curitiba. E como recorte temático: o impacto desigual da pandemia da


COVID-19 nos diferentes territórios urbanos.
Mesmo com a perceptível falta de aprofundamento da temática em teses, ou
mesmo em dissertações, devido ser um tema muito recente e de relevante
importância, as fontes serão trabalhadas a nível de revisão bibliográfica a partir da
aproximação do tema e metodologia propostos, como em Guimarães et al. (2020),
Pisani e Bellini (2021), Braga et al. (2020), Santos et al. (2020) e Bógus et al. (2020),
ou, ainda, a partir de uma aproximação da temática no território (Curitiba), como em
Souza (2020) e PDUR (2021).
Em seguida, busca-se, no capítulo 4, aprofundar-se na metodologia
empregada, ou seja, explicitar com os dados serão utilizados, que mapas serão
produzidos e como será a forma de análise das informações utilizadas.
No capítulo 5 apresenta-se e discute-se os resultados do presente trabalho.
Estes divididos nas seguintes temáticas: a disseminação da COVID-19 na Cidade
através dos dados gerais da pandemia; a análise dos dados socioeconômicos com
foco nos assentamentos precários; a espacialização da COVID-19 e o agravamento
da pandemia nos territórios.
O primeiro deles destina-se a análise de como comportou-se a pandemia
durante o período relatado na cidade de Curitiba, os picos de disseminação e óbitos
da Doença e a relação com as políticas públicas adotadas.
No segundo momento, discute-se a delimitação dos assentamentos precários
definidos pela Companhia de Habitação Popular de Curitiba (COHAB-CT) e outros
níveis de precariedade habitacional, cruzando com os dados socioeconômicos obtidos
através da utilização de dados secundários disponibilizados pela base de dados do
Censo, PNAD, Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba (SMS) e Instituto de
Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC). Apresenta-se, ainda, um
subcapítulo sobre a Rede Municipal de Saúde de Curitiba e o Índice de
Vulnerabilidade das Áreas de Abrangência das Unidades Básicas de Saúde (IVAB).
Por fim, apresenta-se o tratamento em mapas dos dados obtidos pela
Secretaria Municipal de Saúde para os casos confirmados de contaminação e óbitos
de COVID-19, segundo a proposta da metodologia. Por fim, será apresentado o
subcapítulo onde serão discutidos os resultados e confirmada ou não a hipótese do
agravamento da pandemia nos assentamentos precários de Curitiba.
27

2 A PRODUÇÃO DESIGUAL DO URBANO E DA MORADIA

Como dito, a cidade, produzida de forma desigual, segregando o seu território


a partir de fatores sociais, econômicos, culturais e de mercado, forma espaços
privilegiados e “periferias”9, que se refletem em aspectos físicos como de implantação
de infraestrutura, equipamentos e serviços urbanos.
Em países com elevada concentração da riqueza, como é o caso do Brasil,
as áreas sem urbanização, com fragilidades ambientais e menos valorizadas são, em
geral, ocupadas pelos grupos sociais de mais baixa renda. Desse modo, é importante
compreender como se dá a distribuição espacial das desigualdades nas cidades, a
partir da caracterização de áreas precárias de moradia, infraestrutura e serviços e com
exposição a riscos.
A produção capitalista do espaço gera o modelo de exclusão hoje vivenciado
nas cidades, refletidos no acesso à terra urbanizada, na produção precária da moradia
e na oferta de infraestrutura desigual, formando assim, os assentamentos precários.
Segundo Rolnik (2000, p. 173), o assentamento precário é “marcado pela
inseguridade, quer do terreno, quer da construção, ou ainda da condição jurídica da
posse daquele território”, assim como por todo um conjunto de práticas e ideias que
fizeram, e ainda fazem, as cidades brasileiras se construírem e persistirem no cenário
atual de desigualdades, segregações e déficits.
Entendendo o acesso à propriedade privada urbanizada, dentro do processo
capitalista de produção do território e do acesso à moradia no Brasil, como um dos
principais geradores de desigualdade, busca-se nesse capítulo uma reflexão sobre a
produção do urbano no Brasil que, assentada em bases desiguais e impõe riscos e
vulnerabilidades que afetam de forma também desigual a população.
Voltando-se para a questão habitacional, apesar da moradia conformar-se um
direito constitucional – em uma competência comum da União, dos estados e dos
municípios –, o que se percebe é que a utilização do modelo de propriedade privada,
dentro do processo capitalista de produção do espaço, serve como uma forma de
concentrar renda, tornando-se um capital precioso, disputado, e, consequentemente,
não disponível para todos.

9Não se pretende fazer uma explicação dualista da cidade que divide entre porções infraestruturadas
e precárias, mas, essa imagem colabora na explicação das desigualdades intraurbanas na cidade,
estruturalmente construídas ao longo do tempo.
28

Essa dificuldade de aquisição formal da terra faz parte do processo histórico


de conformação territorial do Brasil, onde a população mais desfavorecida, para
satisfazer sua necessidade básica de moradia, precisou se utilizar de meios informais
para sua obtenção, geralmente em lugares menos “disputados” (relacionados ao
processo de valorização e especulação imobiliária), com baixa urbanização e, por
muitas vezes, distantes da mancha urbana de infraestrutura e serviços. Processo
esse, muitas vezes, permeado pela contribuição e até indução do poder público e do
mercado imobiliário (SILVA, 2012; ROLNIK, 2000).
Dessa forma, é importante se perguntar: quem são as pessoas que podem
ser proprietários de terra no Brasil?
Esta é uma questão fundante para o entendimento das desigualdades
socioespaciais existentes atualmente nas cidades brasileiras, reflexo deste processo
histórico de obtenção formal de terras, que se dá de forma desigual desde a
colonização do Brasil – com as sesmarias – até os tempos atuais; reforçado, ainda,
pela adoção e formalização do regime de propriedade individual e excludente e pela
desconsideração e criminalização do regime de posse, culturalmente praticado pela
parcela da população espoliada e pobre, por meio do qual perpetuou-se diversas
inseguranças e dramáticas injustiças, tanto jurídicas como sociais, para aqueles que
se encontram nessa situação (FERREIRA, 2005; ROLNIK, 2015).
Nesse sentido, o processo inicial de constituição da propriedade privada se
associa ao processo capitalista de mercantilização. No contexto brasileiro, isso se
reflete na concentração da propriedade privada da terra como um processo de
concentração da riqueza por meio da produção/exploração da terra. O posterior
processo de urbanização e industrialização do Brasil, que toma força a partir da
segunda metade do século XIX, relaciona-se com um novo momento do capitalismo,
voltado para o aumento da produtividade e expansão comercial que se inicia na
Europa com a Revolução Industrial.
Este novo momento é marcado por um modelo de desenvolvimento que busca
a sua replicação à nível mundial e que se expressa em aspectos basicamente
econômicos voltados à industrialização. No caso do Brasil, esse desenvolvimento é
marcado por uma industrialização que, num primeiro momento, se dá de forma restrita
ao progresso técnico para o fortalecimento da industrialização de produtos para a
exportação, o que cristaliza a concentração de renda nas mãos de poucas pessoas,
incrementando o processo de desigualdade social existente.
29

O regime de colonização do Brasil consolidou uma sociedade agrária


alicerçada na família patriarcal e na exploração da mão de obra escrava. Com a
urbanização brasileira, “simplesmente reproduzia-se na cidade a mesma
diferenciação social resultante da hegemonia das elites que se verificava nos
latifúndios.” (FERREIRA, 2005, p. 5). (Re)produzia-se, então, a diferenciação
socioespacial que se tornará uma das principais características dos espaços urbanos
brasileiros, onde a população mais pobre, geralmente, se encontra excluída dos seus
direitos e obrigadas a ocupar as áreas menos privilegiadas e, por vezes, não
adequadas à urbanização. As cidades brasileiras tornam-se a expressão urbana de
uma sociedade que nunca conseguiu superar sua herança colonial. (FERREIRA,
2005).
Autores como Freyre (2013) e Holanda (1995), ao abordarem aspectos
culturais da vida particular e cotidiana do povo brasileiro, provocam uma reflexão
sobre as mudanças, permanências e interferências, podendo estender-se até os
tempos atuais, da herança colonial e rural nos processos políticos, sociais e
econômicos do Brasil.
A urbanização brasileira, para além da simples migração da população do
espaço rural para o urbano, reflete uma reconversão cultural e tecnológica que
modifica os padrões de ocupação do território. As relações existentes entre “casa-
grande e senzala”, com o processo de urbanização e industrialização, se alteram
neste novo espaço cada vez mais urbano, caracterizado agora por “sobrados e
mucambos”, mas também mantém claras vinculações com a estrutura de poder e
exclusão que se consolidou no período passado: “estereotipada por longos anos de
vida rural, a mentalidade de casa-grande invadiu assim as cidades e conquistou todas
as profissões, sem exclusão das mais humildes.” (HOLANDA, 1995, p. 87).
O processo desigual não só do acesso à terra, mas da própria formação
social, caracterizada pela escravidão e pelo fortalecimento de uma aristocracia
detentora de terras, permanecem também no processo de urbanização brasileira e na
dificuldade em ocorrer mudanças significativas nas suas estruturas de poder, “ou seja,
nas cidades como no campo, a estrutura institucional e política de regulamentação do
acesso à terra foi sempre implementada no sentido de não alterar a absoluta
hegemonia das elites.” (FERREIRA, 2005, p. 4).
De um lado as modificações físicas nas cidades, com o incremento técnico e
tecnológico, propiciam uma urbanização cada vez mais sofisticada, principalmente de
30

infraestruturas e serviços urbanos. O desenvolvimento de novos ofícios e a


industrialização geram mais possibilidade de empregos e um maior acesso à bens de
consumo, antes restritos à produção limitada e patriarcal dos engenhos.
Por outro lado, no entanto, essa realidade não se observa nos assentamentos
da população mais pobre, caracterizado por coabitações de homens e mulheres
‘livres’, localizadas em áreas inadequadas para urbanização e com insuficiente
infraestrutura: “mas enquanto as senzalas diminuíam de tamanho, engrossavam as
aldeias de mucambos e de palhoças, perto dos sobrados e das chácaras.
Engrossavam, espalhando-se pelas zonas mais desprezadas das cidades.”
(FREYRE, 2013, p. 167).
O País se urbanizava e se industrializava. Esse processo fomentou um rápido
crescimento populacional nas cidades que não é associado a estruturação de uma
urbanização de todas as suas áreas e que, a partir do século XX, é acompanhado
pela crise de moradia. Segundo Abramo (2007, p. 27),

a lógica da necessidade impulsiona o processo de ocupação popular


de terras urbanas no início do século XX e, a partir da urbanização
acelerada dos anos 50, vai se transformar na principal forma de
acesso dos pobres ao solo urbano em muitos países latinoamericanos.

O primeiro ciclo de industrialização do país inicia-se na segunda metade do


século XIX, mas somente na segunda metade do século XX é que a população urbana
excede a população rural, processo esse fomentado pela política “desenvolvimentista”
do Governo, que se encontrava enquadrado dentro de um contexto global regido pelo
capitalismo industrial:

A ideologia do desenvolvimento que tanto apreciamos nos anos 50 e


sobretudo a ideologia do crescimento reinante desde fins dos anos 60
ajudam a criar o que podemos chamar de metrópole corporativa, muito
mais preocupada com a eliminação das já mencionadas
deseconomias urbanas do que com a produção de serviços sociais e
com o bem estar coletivo. (SILVA, 2012, p. 113)

A priorização dos investimentos públicos era destinada aos setores das


cidades que interessavam às elites e ao desenvolvimento industrial, restando aos
seus trabalhadores (boa parte vindo do meio rural), soluções informais de moradias
em áreas marginais que se adensavam à medida que ia se expandindo as cidades e
as indústrias. Áreas essas que evoluíam sem que fossem acompanhadas por uma
ação do Estado que garantisse condições mínimas de infraestrutura urbana e
31

qualidade de vida.
Reflexo disso é que, a partir de 1950, pela primeira vez, contabiliza-se no
Censo Demográfico as favelas nas cidades brasileiras, reconhecendo-se a sua
existência, caracterizando-a pela precariedade da habitação e da infraestrutura local
(SILVA, 2012).
Não só pela falta de estruturação urbana, mas também por meio de
legislações urbanísticas influenciadas por um mercado voltado para classes de maior
renda, observa-se como o poder público contribuiu e, por vezes, induziu a ação
irregular tanto do mercado imobiliário informal como dos processos de ocupação
popular de terras urbanas em áreas marginais (ROLNIK, 2000).
Nesse sentido, no processo de exclusão socioespacial, somando-se à
dificuldade do acesso formal à terra, tem-se a valorização fundiária e imobiliária ligada
ao seu entorno urbano, que se interliga a uma produção dos espaços urbanos tanto
pela iniciativa privada, através, principalmente, do mercado imobiliário (formal e
informal), como do poder público, por meio das intervenções urbanas para melhorias
de infraestruturas e de serviços e das normas de uso e ocupação do solo.
Carvalho e Sugai (2014, p. 320) reforçam que

a intervenção estatal no espaço urbano brasileiro costuma gerar a


produção e/ou aprofundamento das desigualdades, decorrente da
aplicação desequilibrada dos investimentos no espaço, valorizando
diferenciadamente os lugares da metrópole, influenciando e
interferindo no mercado de solo urbano.

No Brasil, o que se percebe desde as primeiras ondas de crescimento das


cidades, na virada do século XIX para o XX, e, principalmente, nos dias atuais, é que
esses dois atores (Estado e Mercado), salvo raras exceções, concentram-se na
produção do espaço dentro de uma lógica capitalista, conformado pelas e para as
elites, promovendo a expulsão dos mais pobres das áreas centrais, em um processo
de constante formação de novos focos de valorização dos espaços urbanos e suas
vantagens locacionais, relegando essa parte da população a espaços de carência,
invisibilizados dentro do contexto e planejamento urbano:

Tem-se observado, com efeito, um processo de intensificação da


desigualdade nas cidades, quando articulam-se logicamente os
espaços destinados à degradação (as chamadas “zonas de sacrifício”)
e os espaços valorizados pelo marketing urbano de “consumismo de
lugar”, próprios ao urbanismo-espetáculo contemporâneo, gerando
32

uma intensificação dos processos de gentrificação e de remoção de


grupos sociais de baixa renda de áreas de interesse para
megaeventos e grandes projetos urbanísticos. (ACSELRAD, 2015, P.
63).

Esse processo, então, relaciona-se a uma terceira e nova fase do capitalismo,


a fase de financeirização global, que dificulta, mais ainda, o acesso às terras urbanas
e rurais, que se tornam ativos financeiros altamente disputados.
Rolnik (2015) demonstra que, num primeiro momento, o rápido crescimento
das cidades e seu processo migratório urbano cria contingentes populacionais num
modelo periférico de acumulação capitalista que reproduz uma parcela sobrante de
mão de obra que está associada à necessidade de manutenção de baixos níveis
salariais e de garantia de um "exército industrial de reserva" permanente. Nesse
contexto, conforme já exposto, os assentamentos populares informais, marcados pela
insegurança da posse, são a solução habitacional adotada pela maior parte dos
trabalhadores latino-americanos no processo de expansão industrial e urbana.
Porém, “foi nos anos 1990 e no início dos anos 2000 que as favelas tiveram
um enorme crescimento” (ROLNIK, 2015, p. 159). Esse processo é apresentado pela
autora, não mais como um ciclo de ocupação capitalista do espaço na produção dessa
“mão de obra reserva” destinada ao processo de industrialização, mas como um fruto
de uma nova relação do capital com a terra: “sob a hegemonia do capital financeiro e
rentista, a terra, mais do que meio de produção, torna-se uma poderosa reserva de
valor.” (ROLNIK, 2015, p. 160).
Os processos mais atuais de expulsão e despossessão da população das
áreas informais, marcadas pela transitoriedade permanente e estigma territorial da
posse construídos historicamente no Brasil, apontam para um novo papel das terras
ocupadas pela parcela da população menos favorecida, não mais relacionado com a
produção do exército de proletários reservas do capitalismo industrial, mas como
efeito colateral do controle de ativos, que tem na terra a sua principal extração de
renda e nas favelas as suas reservas de terras.
A submissão da terra urbana ao capital imobiliário conforma-se, então, como
um mecanismo fundamental para continuar-se mantendo, pela desigualdade, o
controle das cidades pelas elites. Nesse processo, restringe-se, com altos preços, o
acesso às parcelas da cidade bem servidas de estruturas urbanas, enquanto é
construído à sua margem um vasto território de reserva que pode ser retomado e
33

valorizado a qualquer momento:

Esta parte da população acaba morando em lugares em que, por


alguma razão, os direitos de propriedade não vigoram (...). Quando os
direitos da propriedade privada se fazem valer de novo, os moradores
das áreas em questão são despejados, dramatizando a contradição
entre a marginalidade econômica e a organização capitalista do uso
do solo. (SINGER, 1979, p. 33-34).

Expulsões, espoliações, marginalização e precariedade. A história do acesso


à terra no Brasil é marcada por essas características. “A cidade capitalista não tem
lugar para os pobres”. (SINGER, 1979, p. 33-34). O Brasil se industrializa, se urbaniza,
se “moderniza”, mas o direito à moradia continua sendo vedado à mesma parcela da
população - pobre, negra, migrante - pela barreira da propriedade privada do solo.
Nisso percebe-se que as cidades brasileiras são marcadas pela segregação
e pela irregularidade, onde a reminiscência do Brasil Colônia é latente até os dias
atuais e a sua estrutura socioespacial desigual parece não ter se modificado.

2.1 A produção espacial de Curitiba e a produção e reprodução de


desigualdades sociais e territoriais

Curitiba, capital do estado do Paraná, apresentando o quarto maior Produto


Interno Bruto (PIB-2018) do País e o maior da região Sul, o nono maior IDHM (2010)
do Brasil, e, ainda, bons índices de saneamento e acesso a serviços públicos e
expressiva concentração industrial e de serviços, tem imagem construída e veiculada
a partir de um discurso de “cidade-modelo”, famosa nacionalmente e
internacionalmente, com diversos prêmios relacionados ao seu planejamento urbano
e modelo de gestão “exitosos” que – aparentemente – compatibilizam a qualidade de
vida com o desenvolvimento econômico, a inovação nos sistemas de transportes e a
sustentabilidade ambiental. No entanto, há uma profunda lacuna entre a “Cidade-
Modelo” e suas favelas (ALBUQUERQUE, 2007; SÁNCHEZ, 1993).
Isso aponta para a reflexão fomentada até o momento sobre o processo
histórico de urbanização brasileira, que embasado na forte presença do Estado que
legitima (e por vezes induz com ações próprias) a ação do Mercado na construção e
estruturação de espaços privilegiados para as classes dominantes, acaba por formar
metrópoles marcadamente fragmentadas e desiguais, como procura-se demonstrar
ao se deter em Curitiba.
34

Neste sentido, uma análise crítica dos dados em questão alerta para que,
mesmo cidades onde apresenta-se – aparentemente – uma melhor classificação a
nível nacional em relação a questão habitacional, esta situação está longe de estar
resolvida tanto num cenário nacional de uma forma geral, como nos melhores cenários
entre as grandes cidades e metrópoles brasileiras.
O processo de urbanização de Curitiba, a “cidade-modelo” exemplo de
planejamento urbano para o contexto de uma metrópole num país em
desenvolvimento como o Brasil, também apresenta uma faceta – quase sempre
invisibilizada pelo city marketing e pela construção do ideário de cidade-modelo,
conforme trabalhado por Sánchez (1993) – onde observa-se um crescimento
populacional que é acompanhado por uma grande produção habitacional informal,
precária e marginal, principalmente na sua região metropolitana, como destaca
Sánchez e Moura (1999, p. 110),

na busca do melhor desempenho entre as capitais brasileiras, o


governo municipal de Curitiba enfatizou, durante muito tempo, a
qualidade de seus indicadores locais, sem referência aos
contrastantes indicadores dos municípios periféricos (Ultramari e
Moura, 1994) – uma forma de adquirir visibilidade apenas a partir de
um fragmento do espaço metropolitano.

A construção dessa cidade fragmentada parte também da estruturação do seu


contexto metropolitano e da construção socioespacial dos municípios vizinhos à sede,
onde o fenômeno dos assentamentos irregulares e precários é ainda mais marcante
nos municípios limítrofes e, principalmente, nas suas fronteiras com a Sede.
Com isso posto, ao se analisar os dados para Curitiba, consegue-se
apreender esse processo de produção do espaço urbano marcado por contrastes
internos, expostos pela disparidade socioeconômica que aparta seus bairros
periféricos da “cidade-modelo”.
Sendo assim, a “cidade-modelo” é caracterizada pelos parques e memoriais,
pelo inovador sistema de transporte, pela conservação e manutenção das áreas
públicas e pelos altos índices de renda e de desenvolvimento humano. Já seus bairros
periféricos são caracterizados por uma população de baixa renda (Figura 1) e por
concentrar a maior parte das ocupações irregulares (Figura 2) e a quase totalidade
dos conjuntos habitacionais da cidade (Figura 3).
Nesse sentido, entende-se que esse contraste da “cidade-modelo” e suas
favelas têm suas raízes no planejamento urbano excludente e, principalmente, através
35

das políticas habitacionais adotadas. De acordo com Albuquerque (2007, p.113),

se há um elemento que se fez presente nas três fases da Política


Habitacional de Curitiba - de nosso ponto de vista -, esse elemento foi
a periferização da população de baixa renda. Em todas as fases, de
maneira declarada e intencional (na 1ª fase) ou de maneira omissa e
terceirizada (3ª fase), a produção habitacional da "cidade-modelo”
empurrou os pobres de Curitiba para as bordas do Município. Não se
diferenciou, dessa forma, da Política de Habitação "tradicional" do
país, política que, historicamente, localizou os empreendimentos
habitacionais nas porções mais distantes e menos urbanizadas das
cidades brasileiras.

Figura 1 – Renda por população até 1 salário-mínimo e mais de 10 salários-mínimos.

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados do Censo 2010 (IBGE,2010).

Pela Figura 1, pode-se observar a concentração da população por faixas de


renda que se encontram em dois polos extremos (até 1 salário-mínimo e acima de 10
salários-mínimos, respectivamente). O que se destacada na imagem é a
contraposição entre os mapas das concentrações das faixas de renda, onde a
população com até 1 salário-mínimo aparece de forma mais consistentes nos bairros
periféricos, em especial os da porção sul, havendo um esvaziamento deste
contingente nos bairros centrais. De forma inversa, no mapa de mais de 10 salários-
mínimos, o esvaziamento ocorre nos bairros periféricos e concentram-se nos bairros
centrais.
36

Figura 2 – Distribuição das ocupações irregulares

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados de Ocupações Irregulares (PEHIS, 2019) – e
Aglomerados Subnormais (IBGE, 2019).

Já na Figura 2, pode-se observar a distribuição das ocupações irregulares que


ocorre, na sua maioria, em pequenas áreas (por vezes invisibilizadas) e situadas,
principalmente, nos bairros periféricos de Curitiba, tais como Cajuru, Uberaba, Cidade
Industrial de Curitiba (CIC), concentrando-se de forma similar, na porção sul.
37

Figura 3 – Conjuntos Habitacionais de Curitiba – 1967 a 2003

Fonte: COHAB/IPPUC.

Por fim, a Figura 3 apresenta a produção habitacional feita pelo Poder Público,
onde, além de se caracterizar espacialmente pela concentração dessa produção de
interesse social em uma mesma área, de forma similar às Figuras 1 e 2, essa se
localiza em áreas periféricas e, em sua maioria, na porção sul, fortalecendo a
produção de uma cidade segregada.
38

No exemplo de Curitiba, observa-se que a forte atuação do Poder Público


(especialmente a nível municipal), justamente a partir do seu aclamado processo de
planejamento urbano, foi um dos maiores responsáveis por induzir essa segregação
socioespacial (POLUCHA, 2010). O autor trabalha em sua dissertação uma análise
do processo de planejamento urbano a partir da visão do oficial da gestão e das
críticas elaboradas a esse processo, com o objetivo de compreender essa segregação
socioespacial e o papel do planejamento urbano nesse processo:

O modelo de desenvolvimento implantado em Curitiba a partir da


década de 1970 seguiu essa lógica. As intervenções propostas pelo
planejamento urbano qualificaram o espaço urbano de Curitiba de
maneira desigual, favorecendo as áreas centrais em detrimento das
periféricas. O resultado foi a acentuação da diferenciação do valor da
terra, reforçando a segregação sócio-espacial existente. (POLUCHA,
2010, p. 35).

Nesse sentido, se reforça que a (re)produção de espaços centrais


privilegiados ocorreram de forma mais evidente, em especial, quando se legalizou o
Plano Diretor na década de 70, definindo os eixos estruturais de crescimento e
adensamento da cidade - sendo essas áreas justamente as áreas centrais, já bem
estruturadas e habitadas predominantemente pela população de alta renda.
Amparados ainda por uma justificativa tecnicista que determinava os espaços
urbanos a serem alvos de planejamento, investimentos e valorização, mediado pelo
Instituto de Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), o planejamento urbano de
Curitiba tendeu a invisibilizar de seus planos os territórios considerados controversos,
insalubres ou distantes deste centro urbano idealizado.
Ainda, baseados num modelo de planejamento que provocava um controle
urbano do uso e ocupação do solo nesses eixos estruturais que se transformaram
numa grande área homogênea e conectada pelos eixos de transportes com boa
estrutura e com grande oferta de transporte público, não só se impossibilitou outros
tipos de uso que divergem das grandes e densas construções que se percebe
atualmente, como também inviabilizou-se a permanência e provocou a consequente
expulsão da população mais pobre desses locais valorizados ou que foram se
valorizando, mantendo e, ainda, ampliando a população mais pobre em lugares mais
periféricos e menos valorizados, como afirmam Carvalho e Sugai (2014, p. 324),

a Curitiba “ilegal”, informal, não prevista e desconsiderada dos Planos


Diretores que surgiu no entorno da cidade “idealizada” foi a que restou
39

aos habitantes menos favorecidos economicamente e àqueles que


acabaram sendo expulsos pelas “cirurgias urbanas” e valorização do
solo, ocorridas a partir da década de 1970.

Ação essa não só fomentada pela legislação urbanística em vigor, mas como
pela ação concreta do poder público, por meio de investimentos em habitação popular
localizados em áreas periféricas e com infraestrutura precária. A exemplo disto tem-
se a criação da Cidade Industrial de Curitiba (CIC), em 1973.
Então temos, na cidade de Curitiba, um processo que segue de forma comum
ao que ocorria nos demais centros urbanos brasileiros: o crescimento dos
assentamentos informais periféricos como a solução habitacional encontrada para
remediar a dificuldade de acesso à moradia no Brasil que se urbanizava. Movimento
que começa a ser monitorado pelo poder público municipal a partir dos anos 1970 e
que se intensifica na década de 1980, acompanhando o forte processo de urbanização
e crescimento populacional que ocorria na capital e na sua região metropolitana
(Tabela 3).
De forma ilustrativa, na tabela abaixo, percebemos esse processo: o grande
crescimento populacional nas décadas de 1970 e 1980 e o início do monitoramento
das ocupações irregulares, que apresenta um considerável aumento populacional e
de áreas entre o levantamento de 1982 e 1992.

Tabela 3 - Crescimento populacional, adensamento e evolução das ocupações irregulares em


Curitiba

Fonte: elaborado pela autora partir dos dados do IBGE - Censos Demográficos de 1970 a 2010,
Contagem Populacional de 1996 e estimativas populacionais de 2015 e 2019; ocupações
irregulares (IPPUC) e Pesquisa das Necessidades Habitacionais do Paraná.

Nesse sentido, o próprio Município reconhece o processo intenso de


urbanização de Curitiba e sua Região Metropolitana:

(...) quando da extinção do Banco Nacional de Habitação - BNH - Sul


que diminuiu drasticamente a oferta de habitação popular dotada de
infraestrutura mínima. A partir daí, consolidou-se o modelo de
ocupação da periferia, principalmente no sentido sudoeste da cidade,
e em 1991, passou a acontecer no sentido sul, o que ocorre até os
dias atuais. (IPPUC, 2010, p. 29).
40

Historicamente, as ocupações irregulares se apresentam um entrave para a


gestão pública. Reflexo disso apresenta-se em IPPUC (2010), que tem por finalidade
analisar o resultado do desenvolvimento habitacional geral da cidade e as Políticas
para a Habitação e Habitação de Interesse Social.
Neste plano os indicadores são divididos em três eixos: produção
habitacional, ocupações irregulares e unidades habitacionais (acesso a serviços) e é
analisado o desempenho pela comparação simples do indicador ao longo tempo
sendo definido em: melhorou, manteve-se, piorou e não há dados para comparação.
Dentre os indicadores apresentados, um dos poucos desempenhos que
apresenta piora nos indicadores relaciona-se à análise dos anos de 1970 a 2009 no
quesito de domicílios e habitantes em ocupações irregulares, apresentando
acréscimos relevantes, conforme apresentado na Figura 4. Destaca-se ainda que,
para o restante dos indicadores do eixo “ocupações irregulares” não há dados para
comparação (desempenho na cor branca).

Figura 4 - Desempenho dos indicadores do eixo Ocupações Irregulares no Plano Setorial de


Habitação de Interesse Social – 1970/2009

Fonte: Plano Diretor Setorial de Habitação de Interesse Social (IPPUC, 2010).

É importante ressaltar, ainda, que a problemática habitacional de Curitiba não


pode ser analisada de forma desvinculada da sua região metropolitana,
principalmente nos seus municípios limítrofes.
Silva (2012) apresenta que a periferização faz parte de um processo de
(re)estruturação espacial da Região Metropolitana de Curitiba de forma extensiva
(expansão horizontal da mancha urbana) e intensiva (adensamento dos
assentamentos informais) de avanço de favelas e loteamentos clandestinos sobre os
municípios mais próximos da cidade-polo, influenciados pelo menor custo de terras, o
mercado imobiliário (formal e informal) e a proximidade da “cidade-modelo” e da sua
política habitacional.
Ao se deter especificamente sobre Curitiba, estudo de caso desta pesquisa,
esse processo de reestruturação espacial da Região Metropolitana se reflete na
41

Cidade também de forma extensiva, na coroa de ocupação periférica, surgida entre


as décadas de 1970 e 1980 que se expande e consolida ao final da década de 2000
“como uma mancha de ocupação contínua que abrange praticamente todo o território
de Curitiba, com exceção de áreas no extremo sul desse município onde ela ainda é
rarefeita” (SILVA, 2012, p. 217), como de forma intensiva, em uma nova dinâmica
caracterizada “pelas maiores densidades observadas nos espaços informais de
moradia pré-existentes, situadas na cidade polo e proximidades” (Ibid., p. 226). Ou
seja,

em Curitiba ela – a reestruturação espacial - resulta, em especial, da


produção das favelas e dos loteamentos clandestinos nas duas
últimas décadas e se expressa pelos movimentos de desconcentração
e reconcentração espacial, responsáveis por um crescimento que ao
mesmo tempo intensifica-se no núcleo e expande-se em direção a
periferias cada vez mais distantes. (SILVA, 2012, p. 245-246).

Em suma, como observado nos dados acima, há uma concentração da


habitação popular na porção sul de Curitiba, justamente onde crescem os
assentamentos precários, concentrando-se especialmente nos bairros Sítio Cercado
(Bairro Novo) e Pinheirinho. No entanto, como dito anteriormente, a ocupação informal
e precária se manifesta, de uma forma geral, nas bordas da Cidade e, dessa forma,
destaca-se ainda, como exemplo disso, os bairros Cajuru (sudeste) e Cidade Industrial
(sudoeste).
Essas ocupações informais e precárias são, em geral, espalhadas em áreas
periféricas, pulverizadas, densas e marcadas pela fragilidade ambiental. Com isso,
entende-se que essa situação aponta que tanto o planejamento urbano municipal
quanto o mercado imobiliário especulativo e restrito tem forte influência no problema
habitacional não resolvido e, Curitiba, assim como as outras metrópoles brasileiras,
se forma a partir da (re)produção desigual do espaço urbano que (re)produz uma
segregação social que se revela de forma espacial na cidade e impacta na qualidade
de vida das pessoas mais pobres, analisada nesta pesquisa através da moradia e do
seu acesso a infraestrutura e serviços urbanos.
No próximo capítulo será mais aprofundada essa relação entre moradia,
assentamentos precários e a qualidade de vida da população residente que, ao se
encontrar mais expostas a fragilidades ambientais e iniquidades em saúde, se
encontram potencialmente mais vulneráveis a novos males como a COVID-19.
42

3 AS DOENÇAS, AS CIDADES E AS MORADIAS

Tendo sido visto até o momento a conformação desigual da construção do


espaço urbano no Brasil - e em específico em Curitiba –, buscou-se ressaltar a relação
entre a busca pela moradia e a inserção da população mais pobre em áreas urbanas
de baixa qualidade, desprovidas ou com déficit de infraestruturas e serviços urbanos.
Nessa sentindo, é também de suma importância para essa pesquisa discutir
ainda outra relação: o surgimento e disseminação das doenças nas cidades e os
fatores físicos e sociais da moradia precária que contribuem para a sua disseminação
e o seu agravamento.
Como dito anteriormente, a industrialização e os avanços das tecnologias no
Brasil possibilitaram o avanço do urbano, que tem como característica própria a
concentração de pessoas. Essa urbanização gerou um expressivo aumento
populacional nas cidades brasileiras que apresentou, no início da república, uma
grande carência de moradias, solucionada pela expressiva construção de casas
insalubres e cortiços, destinadas a aluguéis baratos para os trabalhadores de baixa
renda. Conforme reforça por Bonduki (1994, p. 713),

este relativo equilíbrio entre oferta e procura de habitação, no entanto,


era proporcionado graças a produção ou adaptação para moradia
popular de pequenas células insalubres, de área reduzida e precárias
condições habitacionais, genericamente denominadas “cortiços”,
consideradas o inimigo número 1 da saúde pública.

Com o avanço rápido da urbanização, os grandes centros urbanos se


conformaram em espaços insalubres, com uma grande disseminação de doenças. A
moradia – da população de baixa renda - teve um papel central nesse processo. Como
afirmam Tochetto e Ferraz (2015, p. 95),

a qualidade das habitações, principalmente as de aluguel, foi um sério


problema nas cidades brasileiras e europeias, como a Inglaterra e a
França na Revolução Industrial e o Rio de Janeiro na Primeira
República. Um cômodo, que era parte de uma habitação, era alugado
como uma habitação para uma família. Aquele espaço de pequenas
dimensões era impróprio para o novo uso e nem tinha instalações
sanitárias.

Com o avanço de modelos europeus de urbanização voltados para o


enfrentamento de doenças urbanas, o incremento nas instalações sanitárias e nas
infraestruturas e serviços urbanos se mostraram uma das principais formas de
43

combate às doenças e mazelas tipicamente urbanas e foram absorvidos e aplicados


também no Brasil.
Representado por engenheiros como Saturnino de Brito, Aarão Reis, Pereira
Passos e Theodoro Sampaio e marcado pelos ideais de higiene, embelezamento e
progresso, o urbanismo sanitarista – que orientou, com seus planos e projetos, o
processo de organização do espaço urbano no Brasil do século XX – influenciou
decisivamente no desenvolvimento do planejamento urbano no Brasil e no controle de
doenças próprias do meio urbano (MÜLLER, 2002).
Destaca-se nesse movimento Saturnino de Brito que, indicando um conjunto
de regras urbanas, desenvolveu temáticas que integram os planos diretores e os
instrumentos urbanísticos do Estatuto da Cidade, influenciando o planejamento
urbano até os tempos atuais (TOCHETTO; FERRAZ, 2015).
No entanto, este mesmo modelo, orientando planos de expansão urbana e
intervenções em áreas centrais foi responsável por remoções das classes
economicamente mais pobres para periferias, estas sem planejamento e
infraestrutura.

Em São Paulo, durante o Estado Novo (1935-1945), a implantação,


pelo prefeito Prestes Maia, do Plano de Avenidas, na zona central e
adjacências, gerou um inusitado movimento imobiliário, valorizando os
imóveis situados nas zonas de intervenção. Foram abertas ou
alargadas dezenas de vias que visavam ampliar o centro de negócios
e revitalizar zonas que, embora fossem centrais, eram consideradas
deterioradas e, portanto, habitadas pela população pobre da cidade.
(...) A abertura ou alargamento de ruas, as demolições e,
consequentemente, as modificações imobiliárias provocam uma
acentuada elevação nos preços dos terrenos nas áreas da cidade
atingidas pela “cirurgia urbana”. (BONDUKI, 1994, p. 723)

A baixa qualidade da habitação da população de baixa renda, à medida que


as cidades foram crescendo, foi sendo vista como um empecilho para o seu
desenvolvimento “saudável” e foi necessário intervir. Os cortiços, as vilas e, em
resumo, a ocupação por moradias de baixa renda nessas áreas centrais estavam no
caminho do embelezamento e limpeza das cidades.
Com isso, as repercussões urbanas e sociais das remoções motivadas pelo
urbanismo sanitarista do século XX e a consolidação do urbanismo moderno
contribuíram com o espraiamento e a especulação imobiliária nas cidades, acabando
por intervir no traçado urbano atual e nas transformações da paisagem nas áreas
44

centrais, aprofundando a segregação espacial, com reassentamentos em áreas


afastadas das áreas centrais, na busca da população mais pobre por moradia:

assim, surgem ou se desenvolvem novas “alternativas habitacionais”


baseadas na redução significativa, ou mesmo na eliminação, do
pagamento regular e mensal de moradia: a favela e a casa própria
autoconstruída ou auto-empreendida em loteamentos periféricos
carentes de infra-estrutura urbana. As primeiras favelas de São Paulo
e a intensificação do crescimento das favelas no Rio de Janeiro
ocorrem exatamente nesta conjuntura nos primeiros anos da década
de 40, ocupando terrenos públicos e abrigando famílias despejadas ou
migrantes recém-chegados. (BONDUKI, 1994, p. 729)

No entanto, reforça-se que “a habitação e o meio ambiente tem um profundo


impacto na vida humana” (PASTERNAK, 2016, p. 51). A moradia, aqui entendida
como um conceito mais amplo do que propriamente a unidade habitacional construída,
mas considerando sua inserção no contexto urbano e, consequentemente, o acesso
a infraestruturas e serviços públicos, possui fortes relações com a saúde humana.
Prova disto é o impacto que o urbanismo sanitarista teve no ideário da
habitação. Normas de salubridade das edificações e posturas sobre a eliminação de
rejeitos e efluentes domésticos norteiam o avanço daquilo que se entende como
habitação digna, determinando qualidade dos materiais, tamanho e locação de
esquadrias, as formas correta de armazenamento e destinação de resíduos e
efluentes domésticos, entre outros.
A necessidade de insolação e ventilação, os tipos de materiais utilizados ou a
ausência de revestimentos, a existência de abastecimento de água e de sanitários
com correta destinação dos efluentes, entre outros vários aspectos físicos de uma
habitação se relacionam com o seu contexto urbano e impactam na exposição dos
seus moradores à riscos de saúde, principalmente idosos e crianças sendo eles os
que passam mais tempo dentro de suas moradias (PASTERNAK, 2016).
Reflexo disto é o direito constitucional da moradia que, sendo atribuição das
três esferas de poder tem sua competência descrita da seguinte forma: “promover
programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de
saneamento básico”. (BRASIL, 1988). Ou seja, relacionando a necessidade de
construção de unidades habitacionais com a necessidade de melhorias delas quando
não atenderem a uma determinada “condição”, considerando, ainda, o acesso delas
ao saneamento básico.
No entanto, como visto, a produção desigual do espaço urbano, fomentadas
45

pelo mercado imobiliário em conjunto com o poder público, não permitiu e ainda não
permite que esse direito seja usufruído por um contingente populacional que se
encontra excluídos do processo de urbanização e valorização imobiliária.
Os assentamentos precários se caracterizam por famílias que, cerceadas do
direito à cidade e à moradia, vão construindo seus domicílios num processo de
autoconstrução, de acordo com o seu fluxo de recursos, e frequentemente residindo
em casas pouco saudáveis. Excluídas do mercado formal de moradias e desassistidas
pela maioria das políticas públicas, a forma como muitas ocupações espontâneas vão
se apropriando dos espaços, com frequência, resultam em riscos à saúde e à vida dos
moradores. (PASTERNAK, 1983).
Nesse sentido, observa-se que esse padrão de ocupação acompanha um
padrão de mortalidade, onde percebe-se um aumento da proporção de óbitos por
doenças infecciosas e parasitárias, assim como de óbitos por causas externas -
homicídios, suicídios, acidentes (PASTERNAK, 2016).
Essa análise busca, portanto, demonstrar a correlação entre o
agravamento de doenças e a qualidade do espaço urbano tanto numa escala macro,
tratando de questões como disponibilidade de infraestrutura e saneamento, acesso à
serviços de saúde, condições de emprego e renda e de isolamento social, como numa
escala micro, onde é abordado questões como qualidade e salubridade da moradia,
coabitação e condições de isolamento domiciliar.
Destacamos, ainda, a importância para este trabalho do conceito da área de
saúde pública, que reconhece essa correlação. São os Determinantes Sociais da
Saúde (DSS). Segundo a OMS (2011):

as iniquidades em saúde são causadas pelas condições sociais em


que as pessoas nascem, crescem, vivem, trabalham e envelhecem,
as quais recebem a denominação de determinantes sociais da saúde.
Esses determinantes incluem as experiências do indivíduo em seus
primeiros anos de vida, educação, situação econômica, emprego e
trabalho decente, habitação e meio ambiente, além de sistemas
eficientes para a prevenção e o tratamento de doenças.

Os DSS são associados ao conceito de equidade em saúde porque impactam


de forma diferente, e muitas vezes injusta, na saúde de pessoas, grupos sociais e
comunidades e suas possibilidades de acesso à proteção e ao cuidado à vida,
determinando vulnerabilidades para a saúde.
Com o surgimento da COVID-19, é necessária a identificação e
46

sistematização das causas que levam determinados grupos a serem mais vulneráveis
à Pandemia. No Brasil, essa vulnerabilidade de alguns grupos sociais à COVID-19
vem sendo explorado diretamente ou indiretamente em vários trabalhos. Alguns
exemplos destes irão ser aprofundados a seguir.

3.1 A COVID-19

Tendo sido introduzido a relação entre cidade, moradia e saúde, esta seção
procura se aproximar do estado da arte da relação entre o território, as
vulnerabilidades sociais e a nova problemática de saúde enfrentada com o advento
de uma nova doença, a COVID-19.
Viu-se até agora que a dificuldade do acesso à terra urbanizada e à moradia
conformam em grande medida a produção e reprodução desigual do território
brasileiro e repercute diretamente no enfrentamento de doenças pela população que,
na busca por seus direitos, assentam-se em territórios precários.
Novos males de saúde sempre surgirão. Eles são representados nesse
estudo pela COVID-19 e é necessário entender como essa nova doença infecciosa
afeta o território urbano, em especial os assentamentos precários.
Como já visto anteriormente, a baixa qualidade das moradias e a não
existência ou baixa qualidade da rede de água e esgoto, aspectos relevantes para a
identificação de assentamentos precários, impactam nas condições de saúde dos
indivíduos.
Em se tratando da COVID-19, devido ao baixo acesso à água tratada,
saneamento e renda que permita adotar as medidas de prevenção preconizadas pela
OMS, baseadas no isolamento e em medidas sanitárias de higiene pessoal e uso de
máscaras de proteção facial, o simples ato de lavar as mãos, por exemplo, fica
impossibilitado em muitos lugares. Com isso, retomando o conceito anterior dos DSS,
as condições sociais da população ajudam a determinar as taxas de transmissão e de
infecção da Doença.
Poucos meses após do início da disseminação de casos no Brasil, começam
a surgir bibliografias que se detém na relação entre território, aspectos
socioeconômicos e a COVID-19. Figueiredo et al. (2020) indicam em seu artigo a
influência e o impacto que os fatores socioeconômicos, como adensamento domiciliar,
renda domiciliar, idade, comorbidades, rede de saúde e acesso a rede de água e
47

esgoto, tiveram sobre a COVID-19 nos diferentes estados brasileiros, estimando que

Nos estados brasileiros, 59,8% da variação da incidência de COVID-


19 foi justificada pela desigualdade de renda, maior adensamento
domiciliar e maior letalidade. No caso da mortalidade, essas mesmas
variáveis explicaram 57,9% das variações encontradas nas Unidades
Federativas do país. (Figueiredo et al., 2020, p. 1)

Nesse sentido, serão abordados também 4 estudos em diferentes territórios


brasileiros que, através de mapeamento, buscam auxiliar na leitura territorial da
COVID.
Braga et al. (2020), num estudo de caso de Fortaleza (CE), detendo-se na
modelagem de mobilidade populacional, observam a propensão de bairros da Capital
a um agravamento da epidemia da COVID-19.
Os autores destacam que os bairros com maior propensão apresentam um
amplo espectro de perfis socioeconômico, mas ressaltam as desigualdades sociais
existentes internamente aos bairros mais ricos da lista e a presença de bairros muito
pobres e caracterizados pelo grande número de aglomerados subnormais, indicando
que, para além do aspecto de mobilidade da população no espaço urbano, a
transmissão da doença é influenciada pela situação de vida da população moradora
dos bairros.
Já Pisani e Bellini (2021), num estudo de caso de Alfenas (MG), se detém no
cruzamento de dados de faixa etária, de pessoas acima de 60 anos, com os dados do
Cadastro Único dos Benefícios de Prestação Continuada (BPC) e Bolsa Família, de
forma a possibilitar o mapeamento de uma população vulnerável à COVID-19, a fim
de priorizar ações de enfrentamento a pandemia nas áreas de concentração dessa
população.
Esse trabalho, além de ressaltar a relação entre vulnerabilidades
socioeconômicas e um maior risco relacionado à COVID-19, busca, através da análise
espacial dessas vulnerabilidades, uma forma de priorização de áreas para o
enfrentamento da pandemia por meio de ações sociais e destinação de recursos.
Santos et al. (2020) também tem como objetivo evidenciar áreas de maior
vulnerabilidade aos casos graves da doença no estudo de caso da cidade do Rio de
Janeiro (RJ). Para isso, os autores elaboram um índice de vulnerabilidade aos casos
graves de COVID-19 com base em três tipos de dados: a densidade intradomiciliar
média, a densidade de pessoas a partir de 60 anos e a incidência de casos de
48

tuberculose.
O estudo parte do pressuposto de que os fatores territoriais e
socioeconômicos apontam para o risco diferenciado de ocorrência da COVID-19 e
destacam a importância da distribuição espacial de aspectos relacionados à pandemia
para o desenvolvimento de estratégias de assistência e vigilância. Este trabalho em
específico já traz aspectos relacionados à moradia, por considerar a densidade
intradomiciliar média.
Bógus et al. (2020), analisando o padrão de disseminação da COVID-19 em
São Paulo, busca evidenciar o efeito das desigualdades socioespaciais na letalidade
da doença. Ao afirmar que “reveladora de nossas desigualdades, a Covid-19
evidencia, com isso, a centralidade do tema da moradia e das condições da habitação
na capacidade de resistir à doença” (Ibid., p. 7), os autores ainda procuram trazer a
vulnerabilidade como um dos pontos para o agravamento da pandemia, onde essa
superposição de carências pode tornar as condições sociais e econômicas mais
determinantes que o padrão etário da população, sendo este último um dos principais
fatores de risco reconhecidos para a COVID-19. Nesse sentido, os autores trazem que

tem sido uma constante no debate científico sobre a Covid-19 o papel


que as desigualdades sociais estão tendo no agravamento da doença.
A superposição de carências faz do contexto social uma variável
decisiva, o que amplia o leque dos grupos vulneráveis e dispersa mais
que em outros países a composição etária dos óbitos. (BÓGUS et al.,
2020, p. 14).

Em se tratando de Curitiba, também se encontra aproximações relevantes


sobre a análise entre o padrão espacial de desigualdades da Cidade e uma maior
vulnerabilidade para a COVID-19. Os autores abordados a seguir destacam como o
padrão de urbanização centro-periferia, característico de Curitiba, é problemático para
o enfrentamento da pandemia, visto que os bairros periféricos se apresentam, em sua
maioria, com maior privação de acesso à bens e serviços públicos, em especial de
saúde.
Nesse sentido, destaca-se Souza (2020) que, a partir da análise de
indicadores como renda, habitação, saneamento, coleta de lixo, acesso a serviços e
bens públicos e, principalmente, mobilidade urbana, desponta que a desigualdade de
acesso a esses serviços pela periferia pode ter consequência problemáticas para
enfrentamento da Covid-19 em Curitiba:
49

um eventual, e previsível, aumento do número de casos de Covid-19


nestas periferias – devido a outras situações de vulnerabilidade social,
como condições precárias de moradia, o acesso restrito ou inexistente
de serviços de abastecimento de água e esgoto, entre outros – poderia
fazer delas o foco de uma transmissão descontrolada. (SOUZA, 2020,
p. 143).

Corroborando a preocupação sobre a alta potencialidade de transmissão da


COVID-19 na periferia de Curitiba, ressalta-se, ainda, dois boletins: o primeiro, no sítio
do Observatório das Metrópoles, intitulado “O Índice de Vulnerabilidade das Unidades
Municipais de Saúde como estratégia de enfrentamento da Covid-19 na periferia de
Curitiba”, e o segundo, intitulado “O Programa Saúde da Família como estratégia de
enfrentamento da Covid-19 na periferia de Curitiba”, publicado pela Associação
Nacional de Pós-graduação em Ciências Sociais (Anpocs).
Esses boletins ressaltam a importância do Índice de Vulnerabilidade das
Áreas de Abrangência das Unidades Básicas de Saúde (IVAB) e das ações do
Programa de Saúde da Família na pulverização do serviço de saúde para uma melhor
equidade nos serviços de saúde, uma ferramenta muito importante no enfrentamento
à pandemia nos territórios vulneráveis e que será considerada na presente pesquisa.
Por fim, destaca-se o relatório de pesquisa elaborado pelo Grupo de Pesquisa
e Extensão em Políticas Sociais e Desenvolvimento Urbano da Universidade Federal
do Paraná (PDUR/UFPR) que apresenta os resultados de um estudo sobre as ações
de gestores públicos frente à pandemia de COVID-19 no ano de 2020, com foco na
Região Metropolitana de Curitiba (RMC).
O trabalho é publicado em março de 2021 e compreende a análise das
políticas públicas adotadas e da evolução da pandemia em Curitiba e sua região
metropolitana. Uma das evidências apresentadas para o estudo é que “à medida que
a pandemia se consolida os maiores índices de contaminação passam a ser
registrados nas periferias, bem como as maiores taxas de letalidade”. (PDUR, 2021,
p. 8).
É sobre este fato, portanto, que iremos nos aprofundar nesta pesquisa, por
meio da análise dos casos no perímetro dos assentamentos precários de Curitiba para
os anos de 2020 e 2021.
50

4 METODOLOGIA

Após analisados os referenciais teóricos acerca das diversas facetas da


produção desigual do espaço urbano e das moradias e da relação entre
assentamentos precários, habitação e saúde, a presente pesquisa testará
empiricamente uma hipótese, levantada a partir da literatura apresentada, da
existência de uma forte correlação entre as precárias condições socioeconômicas e
habitacionais e a tendência de agravamento da pandemia de COVID-19.
Para tal, nesta pesquisa busca-se testar a hipótese de que os assentamentos
precários em Curitiba, durante o recorte temporal a ser analisado, entre de março de
2020 e dezembro de 202110, são as áreas com maiores incidência de casos e/ou com
maior mortalidade de COVID-19 se comparado com o restante da cidade.
Considerando a classificação e os procedimentos metodológicos trabalhados
no Capítulo 1, o atual capítulo procura explicitar a metodologia desta pesquisa a partir
da base de dados e dos procedimentos a serem utilizados e a produção de
informações, em forma de mapas, que se pretende com o presente trabalho.
Nesse sentido, a contribuição deste estudo de caso tem seu cerne na análise
da espacialização dos casos confirmados e óbitos da COVID-19 em Curitiba por
endereço, de forma a possibilitar a identificação da concentração do dado, por mapas
de calor, mesmo em perímetros pequenos, como é o caso dos assentamentos
precários de Curitiba.
Esta metodologia possibilita ainda o cruzamento dessas informações com
outras bases de dados que possam correlacionar os aspectos socioeconômicos e
habitacionais da população e a concentração de casos e/ou óbitos.
Esses dados serão espacializados usando como base cartográfica os dados
geográficos do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) e
como ferramenta de geoprocessamento o Sistema de Informação Geográfica
Quantum GIS (QGIS), com o objetivo de produzir mapas que possam esclarecer
espacialmente sobre essa relação entre os assentamentos precários e COVID-19.
A escolha pela utilização de um Sistema de Informação Geográfica (SIG) vem
a partir do entendimento que essa ferramenta possibilita um maior avanço nas

10Segundo os dados abertos da Prefeitura Municipal de Curitiba, o primeiro caso confirmado de COVID-
19 na Cidade tem sua data de inclusão no dia 11 de março de 2020. Disponível em:
https://www.curitiba.pr.gov.br/dadosabertos/busca/?grupo=16.
51

seguintes questões essenciais a essa pesquisa: a integração de dados de diferentes


temáticas (demográficos, socioeconômicos, de saúde, entre outros);
georreferenciamento dos dados; utilização de ferramentas de geoprocessamento para
análise dos dados; produção de informações mais precisas através da composição de
mapas (CARVALHO, PINA E SANTOS, 2000).
Segundo Carvalho, Pina e Santos (2000, p. 13) “uma das maneiras de se
conhecer mais detalhadamente as condições de saúde da população é através de
mapas que permitam observar a distribuição espacial de risco e dos problemas de
saúde”, sendo fundamental essa análise espacial constante da pandemia para o
acompanhamento de suas tendências.
Guimarães et al. (2020), tratando de uma análise de dados específicos da
COVID-19 no Brasil11, destacam em seu artigo a importância e a necessidade de uma
análise espacial da COVID-19, possível a partir de vários processos existentes de
mapeamento, e entendem o raciocínio geográfico como a chave de leitura da COVID-
19, que se torna essencial para possibilitar respostas mais rápidas ao problema de
saúde pública enfrentado.
Com o auxílio dos conceitos trazidos pela Geografia, os autores entendem
que a leitura espacial contribui para evidenciar a importância do arranjo espacial na
distribuição do fenômeno mapeado e sua correlação com os fatores sociais, de
produção do espaço:

Numa primeira instância, os dados mapeados, devidamente


localizados no espaço – e compreendidos em sua extensão e conexão
com outros fenômenos mapeados, devem ser analisados tendo em
vista uma ordem espacial superior, uma estrutura de ordem política e
econômica que explica a produção social da doença. (GUIMARÃES et
al., 2020, p. 121-122).

Os autores destacam, ainda, a dificuldade enfrentada na análise dos dados


causada pela deficiência nos registros de casos confirmados de COVID-19, que se
somam às subnotificações, casos assintomáticos e oligossintomáticos, mas
apresentam que:

Para enfrentar tais dificuldades, diversos grupos de pesquisa têm se


utilizado de eventos sentinelas, como as internações por Síndromes
Respiratórias Agudas Graves (SRAG), ou se baseado na análise de

11Os principais dados utilizados pelos autores foram os casos confirmados de COVID-19 no período
de 5 de fevereiro a 29 de maio de 2020.
52

óbitos por Covid-19 para propor procedimentos técnicos adequados


para a análise espacial da ocorrência da Covid-19 no Brasil, assim
como relacionar essa ocorrência de casos e a distribuição espacial de
óbitos por Covid-19 às condições socioambientais de diferentes
cidades brasileiras (Rodrigues et al., 2020; Alcântara et al., 2020).
(GUIMARÃES et al., 2020, p. 120).

Já em se tratando da opção por apresentação dos dados relacionados aos


casos confirmados e óbitos por COVID-19 em mapas de calor, obtidos a partir da
técnica de estimativa de densidade de Kernel, para além da necessidade de preservar
a identidade das pessoas, esta é uma técnica cartográfica presente em diversos
estudos sobre a incidência de doenças no território, sendo a mesma utilizada pelos
autores Pisani e Bellini (2021), Santos et al. (2020) e Guimarães et al. (2020), entre
tantos outros que não foram citados nesta pesquisa.
De acordo com Brasil (2007), a estimativa Kernel é uma técnica de
interpolação exploratória que gera uma superfície de densidade para a identificação
visual de “áreas quentes”. Ou seja, áreas com uma concentração do evento em estudo
que indica a sua aglomeração em uma distribuição espacial.
Pisani e Bellini (2021, p. 11 e 12) destacam que

A técnica apresenta, como uma das maiores vantagens, a rápida


visualização de áreas que merecem atenção, além de não ser afetada
por divisões político-administrativas. (...) É uma técnica estatística, de
interpolação, não paramétrica, em que uma distribuição de pontos ou
eventos é transformada numa “superfície contínua de risco” para a sua
ocorrência.

Em síntese, o que se propõe para sistematizar as informações levantadas e


identificar os padrões espaciais de manifestação e agravamento da Doença é que, a
partir da identificação dos territórios a serem objetos de estudo – os assentamentos
precários de Curitiba –, serão espacializados e analisados juntamente os territórios e
os dados da Secretaria Municipal de Saúde para a COVID-19 em Curitiba, por meio
da geolocalização da moradia do contingente populacional acometido pela doença,
assim como aqueles que chegaram a óbito, de forma entender se territórios precários
guardam alguma relação espacial com o aumento da contaminação e óbitos por
COVID-19.

4.1 Geoprocessamento e análise espacial na Saúde

Antes de se apresentar os resultados é necessário contextualizar o desafio


53

que se expõe: georreferenciar os casos confirmados e óbitos por COVID-19.


Ao se trabalhar com território e saúde, é importante compreender o
funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil e a organização dos seus
serviços de acordo com o território, o que chamamos de territorialização em saúde.
Estando previsto na Constituição Federal de 1988 o direito de todos à saúde,
é dever do Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício em todo
território nacional. Nesse sentido, o Sistema Único de Saúde do Brasil fundamenta-se
num projeto territorial descentralizado, hierarquizado e integrado através das redes de
atenção à saúde, tendo como princípios a universalidade, equidade e integralidade
(Brasil, 1988; Brasil, 1990).
A Atenção Primária à Saúde (APS) é o primeiro nível de atenção da Rede e
se caracteriza por um conjunto de práticas integrais em saúde, direcionadas a
responder necessidades individuais e coletivas da população, visando uma
assistência à saúde que transcenda somente a prática curativa, contemplando as
necessidades dos indivíduos de uma maneira ampliada e a sua inserção no contexto
social, familiar e cultural.
A APS tem como base a atuação no território e é desenvolvida com maior
descentralização e capilaridade, buscando a proximidade das pessoas através da sua
inserção no território. A noção de território e sua divisão coloca-se, portanto, como
uma das principais estratégias para a organização e consolidação do SUS no Brasil,
por meio da APS. Dessa forma, compreender a dinâmica espacial dos lugares e das
populações é fundamental para a boa execução dos serviços de saúde.
Nesse sentido, para possibilitar-se uma análise territorial implica realizar-se
uma coleta sistemática de dados que vão informar sobre problemas e necessidades
da população, possibilitando inferir sobre suas inter-relações espaciais.
Com isso, a assistência à saúde encontra-se intimamente ligada aos
conceitos da geografia e da produção social dos espaços que, conforme apresentado
anteriormente com os DDS, reproduz socialmente as condições de existência,
expondo as desigualdades sociais e as iniquidades em saúde.
A rede de atenção à saúde, em especial a Atenção Primária, devido sua
capilaridade no território nacional, é uma grande produtora de dados sobre a
população e o território. Seu extenso banco de dados detém informações sobre
cadastros de famílias, perfil de idade e gênero, condições de moradia e saneamento,
situação de saúde, dentre outras.
54

As características desses dados possibilitam uma identificação das


defasagens nos serviços públicos, da qualidade dos domicílios, dos níveis de renda
das famílias, entre outros aspectos que impactam na qualidade de vida da população.
Portanto, sua coleta e análise é uma ação estratégica, não só para o planejamento da
saúde, mas como também para o planejamento territorial. No entanto, “(...) verifica-se
ainda pouca utilização das bases de dados, diante do potencial de variáveis e
informações disponibilizadas.” (MEDEIROS et al., 2005, p. 434).
Para além de sua utilização, outro fator preocupa ainda mais o
geoprocessamento desses dados: a qualidade da informação coletada.
Como explanado anteriormente, a relação entre saúde e território é intrínseca
e, com isso, “(...) é fundamental que as informações sejam localizáveis, fornecendo
elementos para construir a cadeia explicativa dos problemas do território e
aumentando o poder de orientar ações intersetoriais específicas (Souza et al., 1996).”
(CARVALHO; PINA; SANTOS, 2000, p. 13).
Nesse sentido, a crescente capacidade de análise e tratamento de dados,
principalmente através dos SIGs, assim como o avanço no acesso à informação vêm
possibilitando ampliar a capacidade de técnicos e pesquisadores de entender os
acontecimentos no território de forma mais precisa. No entanto, conforme Barcellos e
Ramalho (2002, p. 222),

mais recentemente, observa-se o interesse na instrumentalização dos


serviços de saúde em sistemas de geoprocessamento, não
acompanhada pela capacitação dos profissionais tanto para a análise
desses mapas, como para sua correta redação cartográfica.

Mesmo com a reestruturação das informações da Atenção Primária em nível


nacional, por meio da substituição do Sistema de Informação da Saúde Primária
(SIAB) pelo e-SUS Atenção Primária (e-SUS APS), o que se percebe ainda é que
esse avanço não é acompanhado da devida capacitação dos técnicos municipais para
a coleta e preenchimento dos dados ou, ainda, na gestão desse sistema por
profissionais com formação compatível.
O georreferenciamento de dados tabulares se dá através da sua associação
a um sistema de coordenadas conhecidas. Essa associação pode se dar através da
coleta das coordenadas geográficas ou no relacionamento com unidades espaciais
conhecidas (município, bairro, CEP, endereço), podendo assim ser menos ou mais
preciso a partir da unidade espacial coletada.
55

Nesse sentido, muitas vezes, as informações contidas nas bases de dados


não são passíveis de serem georreferenciadas. Considerando que as equipes de
saúde que coletam os dados não estão capacitadas para o seu correto preenchimento
a partir do entendimento da sua aplicação no SIG, a base acaba por conter diferentes
padrões de resposta ou mesmo não possuindo todos os dados necessários para o
seu geoprocessamento.
Com avanço tecnológico, a precisão espacial do dado se torna cada vez mais
necessária para a uma análise mais completa, no entanto a sua coleta é ainda muito
deficitária, conforme destaca Carvalho, Pina e Santos (2000, p. 31):

o georreferenciamento de dados tabulares ainda é um dos fatores


limitantes da plena utilização do SIG na área da saúde, quando se
trata de análises em microáreas, em que o endereço do evento é
fundamental. (...) a manipulação de informações que envolvam
endereços é sempre complicada, não só por que raramente existem
mapas de trechos de rua associados a um cadastro de logradouros,
o que impede a utilização das funções de georreferenciamento dos
SIG, como também por que o campo referente a endereço (quando
existe), é de baixa qualidade, contendo endereços incompletos, erros
de digitação e ortografia, etc.

Em se tratando da base de dados relativa à COVID-19 no território de Curitiba,


disponibilizados pela Secretaria Municipal de Saúde, esses mesmos problemas são
observados. É necessário relatar, portanto, algumas dificuldades encontradas.
Devido à dificuldade de reconhecimento pelos técnicos da saúde sobre a
unidade espacial da coordenada geográfica, costumeiramente busca-se facilitar o
preenchimento da unidade espacial pela utilização do endereço. Uma forma de
superar o problema relatado da escrita dos logradouros, é a coleta do Código de
Endereçamento Postal (CEP) e do número de porta do local.
No entanto, para base de dados em questão, a inexistência da informação do
CEP faz depender-se do preenchimento correto dos nomes das vias, tanto
considerando seu nome oficial, como sua escrita.
É chamado de geocodificação o processo utilizado para transformar
endereços em coordenadas geográficas de latitude e longitude e assim, através de
uma base viária com o cadastro dos nomes dos logradouros e da numeração predial,
é possível tornar o endereço um ponto preciso no território. Mas, para isso, é
necessário coletar o nome oficial da rua (compatível com a base) e o número de porta
do local.
56

No entanto, a base em questão apresenta diversos erros de digitação e não


apresenta um padrão de preenchimento do campo “endereço” numa estrutura regular
de texto, não só relativo ao nome da rua, mas também sobre a utilização de
abreviações ou utilização da categoria viária (rua, avenida, etc), entre outros.
O campo endereço também apresenta inconsistências no sentido de
preenchimento da numeração predial, não estando informado em todos os endereços.
Isso impossibilita a localização precisa do dado e pode gerar informações imprecisas
através da sua localização equivocada pelo processo de geocodificação.
Em alguns casos ainda se percebeu, ainda, o não preenchimento completo
do campo “endereço”12 ou ainda a utilização do endereço de uma Unidade Básica de
Saúde da rede de atenção primária em substituição ao endereço de moradia do
indivíduo.
Tudo isso impacta na amostra dos casos e óbitos espacializados e analisados
nos mapas que serão apresentados, não podendo ser analisado a pandemia em sua
completude.
Ainda, diante das falhas apresentadas na base de dados e da necessidade
de ajustes nos campos de endereço para se aumentar a amostra de pontos
georreferenciados ou para corrigir sua geolocalização, foi necessário se trabalhar um
período para análise dos casos. Conforme destaca Carvalho, Pina e Santos (2000, p.
32),

Para grandes bases de dados, o georreferenciamento manual é


inviável. Por exemplo, o banco de mortalidade ou de nascidos vivos
de uma grande cidade pode conter milhares de eventos. Nestes casos
é fundamental a disponibilidade de bancos de dados com endereços
e mapas que possibilitem o georreferenciamento automático, através
de um SIG.

No entanto, devido ao comprometimento da análise a partir da base de dados


disponibilizada pela Secretária Municipal da Saúde, foi necessário realizar
anteriormente a correção e padronização dos endereços para sua correta
geocodificação. Visto se tratar de 300.324 casos e sendo inviável essa ação para todo
o período trabalho, com o auxílio do Departamento Acadêmico de Estatística da

12 Se destaca para essa situação a sua quantidade devido a completa impossibilidade de


geolocalização do ponto referente a esses casos: foram 31.480 do total de 300.324 casos confirmados,
ou seja, mais de 10% da amostra. Nesses casos, foi possível a localização somente por bairro ou,
ainda, somente pelo município de Curitiba, visto que desses 31.480 casos, 7.060 também
apresentavam o não preenchimento do campo “bairro”.
57

Universidade Tecnológica Federal do Paraná, delimitou-se o período de análise por


geolocalização dos casos confirmados (abrangendo casos recuperados e óbitos) para
os seis meses primeiros meses da pandemia em Curitiba desde o seu primeiro caso,
em março de 2021.
Chegou-se a essa delimitação de forma a abranger o primeiro pico de casos
(em julho de 2020) e considerando, ainda, que devido ao crescimento substancial da
amostra a partir de novembro de 2020, ela passava a configurar-se como uma grande
massa de dados, dificultando a análise territorial do acumulado por manchas de calor,
onde a continuidade da análise poderia se dar através da utilização dos bairros.
Com a base de dados de casos confirmados fornecidos pela Secretaria
Municipal de Saúde, foi iniciado então o processo de geocodificação nos moldes
acima referidos. Na primeira etapa foi realizado um filtro em 106.030 registros que são
referentes ao ano de 2020, necessitando ainda excluir os endereços que estavam em
branco, um total de 26.903 registro (25% da amostra).
Depois foi utilizado um script em Python, usando biblioteca Pandas, para
identificar os logradouros que estavam registrados na tabela e apresentavam alguma
forma de erro quando comparado com a lista de logradouro oficiais, disponibilizado
pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC).
Foi feita também uma consulta para que fosse identificada a falta de
padronização nos endereços quanto a utilização de caracteres diferentes como
separador. Como exemplo foi usado o ponto final, travessão, barras, letras ou em
alguns casos, depois da primeira vírgula após o nome do logradouro, aparecia outra
informação como o nome popular do logradouro ou pontos de referência no lugar da
numeração predial.
Isso resultou na identificação da grande maioria dos registros disponibilizados.
Os endereços viáveis para geocodificação depois do processo de correção e
regularização passaram pela ferramenta “Geocodificador Nominatim em lote”
disponível no software de Geoprocessamento QGIS que usa dados do
OpenStreetMap para encontrar os locais. Essa ferramenta foi escolhida por não
possuir limite de consultas.
Os endereços não localizados com Nominatim passaram, ainda, por uma
segunda tentativa de Geocodificação usando API Google V3 que tem um limite de
1.200 consultas por dia para contas gratuitas, nesta etapa foi usado um script em
Python.
58

Depois de várias etapas, foi observado que, em sua grande maioria, os


endereços viáveis para geocodificação estavam em bairro centrais, áreas que
possuem a base oficial de logradouros mais estruturada. Essa concentração dos
dados nas áreas mais nobres da Cidade e o baixo percentual de endereços que foi
possível geocodificar (menos que 50% do total), acabaria por distorcer a realidade do
evento ao tentar se analisar os casos por geocodificação.
Em se tratando da base de dados dos casos confirmados de COVID-19, uma
vez não sendo possível realizar geocodificação de um número satisfatório dos
endereços, foi decidido pela elaboração dos mapas através da utilização somente do
campo bairro, onde pode ainda ser constatado entre algumas amostras do contingente
a divergência entre o endereço e o bairro preenchido, onde o endereço localizava-se
em outro bairro daquele descrito, não podendo ser confirmado qual dado trata-se da
informação correta.
Por fim, considerando que a Secretaria Municipal de Saúde já havia
trabalhado e disponibilizou para essa pesquisa a espacialização por endereço dos
óbitos por COVID-19, se expõe aqui que essa espacialização foi utilizada neste
trabalho para análise dos óbitos, porém ela não representa todo o contingente da
amostra, podendo ainda apresentar falhas na localização devido os mesmos
problemas anteriormente relatados sobre a base de dados.
O que se percebe ao analisar a planilha espacializada em QGIS dos óbitos de
2020 e 2021 e a planilha completa de informações contendo todos os casos, sua
evolução para recuperação ou óbito, é que há uma divergência não só do número de
óbitos como também das quantidades apresentadas por mês. Enquanto a planilha
completa de casos apresenta 8.027 óbitos para o período, a planilha espacializada
em QGIS apresenta 7.817 (97,38% do total).
Além disso, pode-se observar, por exemplo, que, em março de 2020, a
planilha completa apresentou 4 óbitos, enquanto a espacialização apresenta 5 óbitos.
Para a amostra do problema em questão, tratou-se de um erro na planilha
especializada no QGIS quanto ao preenchimento da data de inclusão no sistema do
óbito, sendo utilizada a data de inclusão da infecção. Neste mesmo mês, ainda a
apresenta-se outro erro: a divergência entre o endereço relatado e o bairro
preenchido, sendo este preenchido como Boa Vista e aquele espacializado como
Guabirotuba.
Considerando a falta de esclarecimento do órgão quanto a essas
59

divergências, optou-se por considerar a planilha completa como a informação mais


confiável para utilização na análise. Porém, devido aos mesmos erros relatados
anteriormente para a espacialização dos casos, foi necessário utilizar a planilha
especializada em QGIS para produção dos mapas utilizados no próximo capítulo.
Buscou-se, portanto, nesta sessão, antes da apresentação da análise e
discussão dos casos, pontuar-se o estado em que se encontra a base de dados do
Município, alertando que essas falhas impossibilitam a compreensão completa do
evento, impactando no resultado deste trabalho e de qualquer trabalho de
geoprocessamento dos casos e óbitos de COVID-19, quer seja feito por
pesquisadores ou mesmo por agentes municipais; e, ainda, no monitoramento e
compreensão de como a pandemia vem se comportando no território municipal.
Nesse sentido, como uma contribuição deste trabalho, busca-se também
alertar a municipalidade sobre a importância de capacitar seus agentes e de formar
uma base de dados espacial consistente, que possibilite o devido entendimento da
realidade territorial de Curitiba em seus diferentes aspectos e o seu devido
aproveitamento para o planejamento e monitoramento de políticas públicas municipais
mais concretas com a necessidade da população.

4.2 Etapas de trabalho

Apresentadas as dificuldades enfrentadas para a concretização do método a


ser trabalhado, para possibilitar a discussão e análise dos dados, é necessário,
anteriormente, um processo de organização e interpretação de dados. Nesse sentido,
apresenta-se a seguir, em resumo, as etapas necessárias para a conclusão deste
trabalho.
Inicialmente é necessário a organização da base cartográfica para a
elaboração dos mapas. É definida a aplicação da projeção da Universal Transversa
de Mercator e o datum, no caso, SIRGAS 2000 fuso 23K, e da utilização do Sistema
de Informação Geográfica Quantum GIS (QGIS), a partir da importação dos dados
geográficos vetoriais do município de Curitiba, disponibilizados pelo IPPUC, como
arruamento, lotes, divisão de bairros e hidrografia, obtidos no sítio eletrônico do
Instituto.
A segunda etapa refere-se à delimitação das áreas de assentamentos
precários, conjuntos habitacionais e a espacialização de dados socioeconômicos a
60

serem analisados. Neste caso, quatro níveis de dados serão utilizados:


● os dados descritivos e a delimitação georreferenciada das ocupações
irregulares disponibilizadas pelo IPPUC e os dados fornecidos pela COHAB-CT para
o Plano Estadual de Habitação de Interesse Social do Paraná - PEHIS-PR, realizados
em 2019, por se tratar da delimitação que a gestão pública para os territórios alvo
desta pesquisa;
● a delimitação georreferenciada dos conjuntos habitacionais de Curitiba
adaptado de Albuquerque (2007) e dos Setores Especiais de Habitação de Interesse
Social (SEHIS) pela Lei de Uso e Ocupação do Solo de Curitiba (Lei nº 15.511, de 10
de outubro de 2019);
● a espacialização das vulnerabilidades sociais para a saúde realizada
pelo Município a partir do Índice de Vulnerabilidade das Áreas de Abrangência das
Unidades Básicas de Saúde (IVAB), por entender a importância que há em se
considerar, nesta análise, os territórios já tidos como vulneráveis para o contexto da
saúde pela própria gestão pública, visto que muito antes que a COVID-19 chegasse
às favelas e periferias a situação da precariedade dos serviços de saúde que atendem
estes territórios já era uma realidade;
● o perfil socioeconômico de Curitiba a partir dos dados dos setores
censitários do IBGE quanto à renda domiciliar, etnia (pessoas não-brancas), idade
(população idosa), adensamento domiciliar e saneamento.
A partir disso, parte-se para a coleta dos dados da COVID-19 que estão em
bases de dados secundários, disponíveis nos sistemas nacionais de notificação
(Sistema de Vigilância epidemiológica da Gripe e da Síndrome Respiratória Aguda
Grave - SIVEP/SRAG, Sistema de Informação de Mortalidade - SIM, ESUS VE -
Nacional, NOTIFICA SESA PR - Estadual , ESAUDE - Municipal) obtidos a partir da
solicitação do banco de dados anonimizados de monitoramento dos casos e óbitos da
Covid-19, que estão sobre a guarda e responsabilidade do Centro de Epidemiologia
da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, após o parecer de aprovação do estudo
emitido pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná e após emissão do parecer de viabilidade do Comitê
de Ética da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba como Instituição Coparticipante.
Devido a decorrência da pandemia por COVID-19, por questões sanitárias e
de segurança, na realização da presente pesquisa não foi possível a coleta de uma
base de dados primária que auxiliasse a produção de informações para a análise
61

pretendida, sendo utilizado somente bases de dados secundárias. Portanto, não


houve riscos físicos e/ou biológicos nem psicológicos para as partes envolvidas na
pesquisa.
Tendo sido coletado todos os dados em questão, inicia-se a organização,
sistematização e geocodificação dos dados fornecidos pela SMS, onde, a partir dos
endereços, os dados serão transformados no formato de pontos no território onde,
posteriormente, serão analisados os melhores intervalos para a interpolação de Kernel
(mapas de calor) para geração de mapas legíveis e que preservem o anonimato, a
partir do arranjo espacial para as áreas de estudos, com a análise de pontos mais
aglomerados em relação às outras regiões, de modo que fique bem representada a
melhor a densidade de casos e óbitos por COVID-19.
Finalizada a etapa de tratamento dos dados, parte-se para a interpretação das
informações geradas, agora em formato de mapas com o rigor cartográfico necessário
e escala condizente com a pesquisa que proporcione a leitura dos dados de forma a
possibilitar:
● a análise da evolução da doença por mês, comparando os dados gerais
e localizados em assentamentos precários;
● o cruzamento da evolução da doença com a localização dos
assentamentos precários e os dados socioeconômicos;
● a identificação das regiões que possuem as maiores densidades do
dado em questão (casos ou óbitos) e com isso as localizações das populações mais
afetadas.
A Figura abaixo ilustra o fluxograma com as etapas realizadas para a presente
pesquisa.
62

Figura 5 - Etapas de trabalho


• Base cartográfica (IPPUC), delimitação das ocupações irregulares (PEHIS, 2019) e dos
conjuntos habitacionais (adaptado de Albuquerque, 2007);
• IVAB - 2018 (SMS);
Coleta de • Dados Censitários (IBGE, 2010);
dados • Casos e Óbitos da COVID-19 em Curitiba para 2020 e 2021 (SMS).

• Espacialização dos dados na base cartográfica;


• Geodecodificação dos casos e óbitos por COVID-19 no Sistema de Informações Geográficas
Organização QGIS.
das
informações

• Cruzamento das informações da base de dados;


• Interpolação de Kernel (manchas de calor) para os dados de casos e óbitos da COVID-19.
Análise e
Interpretação

• Mapas de evolução da COVID-19 no território de Curitiba;


• Mapas de cruzamento das informações da COVID-19 com o perfil socioeconômico;
• Mapas de densidade da população acometida pela COVID-19 com foco nos perímetros das
Produtos ocupações informais.

Fonte: elaborado pela autora.

Na presente pesquisa, é proposta a análise espacial dos casos confirmados


e óbitos por COVID-19 com foco nos assentamentos precários de Curitiba, a fim de
criar produtos cartográficos diante das análises exploratórias de dados que procuram
responder perguntas das mais simples às mais complexas, tais como:
● Como se conforma espacialmente os casos e óbitos por bairro durante
o período? Como isso expressa em dados absolutos e relativos (analisados pelo
contingente populacional) de cada bairro? Como o IVAB se relaciona com esse
resultado?
● Como os casos e óbitos por COVID-19 dentro dos perímetros dos
assentamentos precários se apresentam em relação ao restante do bairro?
● Qual o acumulado de casos e de óbitos e como ele se traduz
espacialmente nos assentamentos precários em relação os pontos mais críticos da
cidade?
63

● Quais os períodos em se apresentam os maiores coeficientes de


incidência e de mortalidade por COVID-19 e como ele se traduz espacialmente nos
assentamentos precários em relação os pontos mais críticos da cidade?
● Em que momento os assentamentos precários se destacam em relação
à incidência de casos e de óbitos em relação ao restante da cidade?
● Qual é o grau de correspondência espacial entre as áreas de ocorrência
de casos de COVID-19 e os assentamentos precários?
Portanto, essas perguntas serão debatidas na próxima seção e buscarão ser
respondidas por meio de uma análise espacial resultante do processo de mapeamento
que seguirá, por sua vez, as etapas da implementação técnica apresentadas.
64

5 A COVID-19 E OS ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS: O CASO DE CURITIBA

5.1 A COVID-19 e sua disseminação: dados gerais

A delimitação da presente pesquisa se dá a partir de um estudo de caso para


o município de Curitiba sobre os casos de contaminação e óbitos confirmados pela
COVID-19, a partir da base de dados anonimizados da Secretaria Municipal de Saúde,
durante o recorte temporal a ser analisado, entre março de 2020 e dezembro de 2021,
tendo como amostra 300.324 casos confirmados e 8.027 óbitos.
Como introduzido anteriormente, a COVID-19 é uma doença infecciosa
causada por um novo coronavírus, identificado pela primeira vez em dezembro de
2019, em Wuhan, na China.
Segundo dados do Ministério da Saúde, o Brasil teve seu primeiro caso
confirmado em 26 de fevereiro de 2020, na cidade de São Paulo, tornando-se ao longo
do tempo um dos países mais afetados pela COVID-19 em todo o mundo, com a
letalidade acima da média mundial.
O País finaliza o ano de 2021 com 22.287.521 casos de contaminação e
619.056 óbitos confirmados em todo o território nacional.
Curitiba, a capital do Paraná, possui estimativa populacional para 2021,
segundo o IBGE, de 1.963.726 habitantes13. Tendo seu primeiro caso de COVID-19
confirmado em 11 de março de 2021, o Município finaliza o ano de 2021 com 300.324
casos acumulados e com o coeficiente de incidência acima do índice mundial,
nacional, regional e estadual.
Sobre os óbitos, o primeiro confirmado foi notificado no dia 28 de março de
2020, totalizando, até o final do ano de 2021, 8.027 óbitos, também com o coeficiente
de mortalidade acida do índice mundial, nacional, regional e estadual. Porém, é
interessante perceber que sua taxa de letalidade, nesse período, se encontra abaixo
da taxa nacional, possuindo, ainda, dentro das capitais com mais de 1 milhão de
habitantes, uma das menores taxas.
Analisando de uma forma ampla a cronologia da pandemia em Curitiba, para
o período analisado, verificamos que durante o ano de 2020 concentrou-se 36,15%

13 Assim como feito pela Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba, para fins de análise dos dados,
será utilizada a estimativa populacional do IPPUC para 2020, visto ser a estimativa que possui a
informação da população por bairros mais atual. Nela apresenta-se o contingente populacional de
1.948.626 habitantes.
65

dos casos totais e 31,27% dos óbitos, enquanto, em 2021, somou-se 63,85% dos
casos e 68,73% dos óbitos. Isso demonstra o agravamento da pandemia que houve
durante o ano de 2021, que somente apresentará melhoras significativas, em relação
às internações e aos óbitos, após a vacinação em massa da população.

Figura 6 - Casos confirmados em Curitiba por data de divulgação e média móvel de 7 dias para
os anos de 2020 e 2021

Casos confirmados por data de divulgação e média móvel de


7 dias
3000

2500

2000

1500

1000

500

0
11/03/2020

11/11/2020

11/05/2021
11/04/2020

11/05/2020

11/06/2020

11/07/2020

11/08/2020

11/09/2020

11/10/2020

11/12/2020

11/01/2021

11/02/2021
11/03/2021

11/04/2021

11/06/2021

11/07/2021

11/08/2021

11/09/2021

11/10/2021

11/11/2021

11/12/2021
Casos novos Média móvel (7 dias)

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba.

Figura 7 - Óbitos confirmados em Curitiba por data de divulgação e média móvel de 7 dias
para os anos de 2020 e 2021.

Óbitos confirmados por data de divulgação e média móvel de


7 dias
80
70
60
50
40
30
20
10
0

Óbitos confirmados Média móvel (7 dias)

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba.
66

Observando a linha do tempo de casos e óbitos para Curitiba (Figura 6), é


importante destacar os picos de transmissão e óbitos para possibilitar a compreensão
de como se comportou a pandemia de uma forma geral no Município. Nesse sentido,
destaca-se os meses de julho de 2020 (1º pico de casos e óbitos), dezembro de 2021
(2º pico de casos e óbitos) e março de 2021 (3º e maior pico de casos e óbitos).
Percebe-se, posteriormente, em meio a números ainda elevados, outros dois picos
em meados de maio e agosto de 2021, conforme tabela abaixo.

Tabela 4 - Casos e óbitos confirmados por mês em Curitiba


Casos e óbitos confirmados por mês em
Curitiba

Mês/ano Casos Óbitos

Março/2020 150 4

Abril/2020 500 29

Maio/2020 635 41

Junho/2020 4466 205

Julho/2020 15431 537

Agosto/2020 12158 378

Setembro/2020 10739 227

Outubro/2020 8760 172

Novembro/2020 25571 438

Dezembro/2020 30282 479

Janeiro/2021 18773 370

Fevereiro/2021 13765 407

Março/2021 32120 1334

Abril/2021 18322 699

Maio/2021 24108 832

Junho/2021 27182 731


67

Julho/2021 17483 369

Agosto/2021 21440 435

Setembro/2021 11166 228

Outubro/2021 4128 80

Novembro/2021 1503 24

Dezembro/2021 1632 9

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba.

O mês de julho de 2020, primeiro grande pico da doença, apresenta o menor


número de casos dos três picos: são 15.431 registros incluídos no sistema, com o
acumulado de 21.182 casos, ou seja, somente neste mês soma-se mais de 70% de
casos confirmados da pandemia acumulado nos 5 primeiros meses. Esse pico é
obtido a partir de uma onda de transmissão que apresenta um salto quantitativo de
maio para junho desse ano, quando passou de 635 novos casos registrados em maio
para 4.466 novos casos em junho.
Ainda em julho, para os óbitos, obtém-se 537 registros, número que só
será superado no 3º pico, em março de 2021, com 1.334 registros. Até junho de 2020
acumulou-se 816 óbitos, sendo em média 65% desse valor registrado somente no
mês de julho.
É interessante também analisar esses dados de forma atrelada às políticas
públicas de enfretamento à pandemia conduzidas pelo Estado e pelo Município por
atos do Poder Público (decretos e resoluções).
Em 13 de março, é decretado Situação de Emergência em Saúde Pública em
Curitiba e, ainda no mesmo mês, iniciou-se uma rigorosa suspensão dos comércios e
serviços não essenciais que perdurou, em média, um mês, sendo substituído por
regras, durante o mês de abril, para a abertura parcial dos estabelecimentos e lojas
de rua em horários especiais e para a adoção de protocolos de higienes e contra
aglomerações. Ao final de maio, um decreto estadual determinou a abertura de
atividades não essenciais, como shopping centers e academias.
Em junho, criou-se o sistema de monitoramento da COVID-19 por bandeiras
(amarela, laranja e vermelho), obtida a partir de nove indicadores relacionados ao
nível de propagação da doença e à capacidade de atendimento da rede de saúde.
68

Nesse mesmo mês, pela primeira vez, obteve-se o patamar de 100 novos casos
confirmados por dia.
Também nesse momento, se denunciou entre estudiosos e em diversos meios
de comunicação o início e os riscos de um grande espalhamento territorial da
pandemia, em especial para as periferias (destacando-se os distritos sanitários de
Tatuquara e Bairro Novo), análise essa que será mais aprofundada adiante.
Diante da disparada de casos, reiniciou-se um período de isolamento social
mais rigoroso em julho. Nesse sentido, percebe-se que as medidas de flexibilização
da pandemia com vistas à dinamização da economia conduziram de uma situação
epidemiológica controlada, obtida por um rígido isolamento social inicial, a um grande
incremento diário de infecções e óbitos a partir do fim de maio, que chegou ao seu
pico em julho, onde retoma-se as medidas mais restritivas.
Em agosto, setembro e outubro percebeu-se uma diminuição no número de
casos e mortes, que é seguido por um aumento relevante de casos em novembro.
Passou-se de 8.760 novos casos em outubro para 25.571 nesse mês e, em dezembro,
novamente obteve-se outro pico, com o total de 30.282 novos casos (quase o dobro
do 1º pico relatado).
Para os óbitos, no entanto, é relevante observar que os registros não chegam
ao mesmo patamar inicial de 537 óbitos de junho deste ano. Em outubro, registraram-
se 172 óbitos, tendo uma grande elevação em novembro, com 438, aumentando
levemente em dezembro, quando obteve-se 479.
Esse número apresenta ainda algumas reduções - tanto de casos como de
óbitos - nos meses de janeiro e fevereiro de 2021. No entanto, em março, ocorre o 3º
e maior pico: apresentou-se um crescimento significativo para 1.334 novos óbitos e
um total de 32.120 casos, similar ao relatado no 2º pico da doença.
O mês de março de 2021, seguido de abril, maio e junho é o período mais
crítico da pandemia em Curitiba, onde são observados os maiores números de
registros de óbitos por mês, sendo o único momento em que se acumula mais de 1000
mortes mensal. Também nesse mesmo momento, chegamos ao colapso do sistema
público de saúde de Curitiba, onde a Prefeitura anuncia a ocupação de 101% dos
leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) exclusivos para COVID-19.
Após a retomada das medidas sanitárias mais restritivas durante o primeiro
pico da pandemia (em julho de 2020), percebe-se que, com a desaceleração da
COVID-19 observada em outubro de 2020, é novamente conduzida a frouxidão das
69

medidas de enfrentamento a pandemia pelo Poder Público: acompanhada pela


bandeira amarela (risco mais baixo), são adotadas regras para horários e condições
cada vez mais flexíveis para o funcionamento de atividades e serviços no Município.
Somente ao final de novembro de 2020, já com um elevado número de casos,
se decretará a bandeira laranja, iniciando-se em dezembro medidas de restrição de
circulação de pessoas e de funcionamento de comércios e serviços, que, no entanto,
serão suavizadas com a proximidade das festas de fim de ano.
É importante destacar que ainda em dezembro obteve-se uma taxa de
ocupação de 93% dos leitos públicos, já indicando a gravidade do estado da pandemia
em Curitiba e o elevado risco para a saúde pública em caso da piora da situação
epidemiológica.
Mesmo assim, em janeiro de 2021, retornou-se à bandeira amarela e
determinou-se o retorno presencial das aulas na rede de educação, que se iniciaram
no mês seguinte. Ainda em fevereiro, foram suspensas as aulas presenciais e
retornou-se à bandeira laranja. Ao final do mês, em um nível de contágio acelerado,
novamente obteve-se a alta taxa de ocupação de 90% dos leitos públicos.
Pela primeira vez, em março de 2021, decreta-se a bandeira vermelha e
Curitiba retornou ao isolamento social rígido. Em abril, retomou-se a bandeira laranja,
mesmo com a manutenção de altos níveis de ocupação dos leitos de enfermaria e UTI
da rede de saúde. Mas, em maio, decretou-se novamente a bandeira vermelha, e, já
no início de junho, apresentou-se 104% de taxa de ocupação de leitos de UTI do SUS.
Observa-se, a partir do pico relatado em março de 2021, a manutenção de
números altos de novos casos nos seis próximos meses, permanecendo no patamar
de, em média, 20 mil novos casos mensais até outubro de 2021. Nesse mês, ocorreu
4.128 novos casos e 80 óbitos, valores similares ao início da pandemia, em meados
de maio de 2020.
Finalizou-se o ano de 2021 com 1.632 novos casos em dezembro e, somente,
9 óbitos. Infere-se que essa diminuição do contingente de mortes é, em especial,
devida ao avanço da vacinação no Município, que se iniciou em 18 de janeiro de 2021.
Nesse sentido, o pico do número de novos casos apresentados em março de
2021, ainda com a vacinação incipiente, só será ultrapassado em janeiro de 2022,
que, apesar do expressivo número de casos (67.608, com o ápice de 4.220 novos
casos somente no dia 28 de janeiro), não será acompanhado pelo número de óbitos
(86 em janeiro e 206 em fevereiro, contingente esse que se reduz nos meses
70

seguintes e que não alcançou novamente esses valores durante o ano de 2022),
demonstrando assim a eficácia da vacinação em massa.
Tendo sido exposto de uma forma mais ampla como a COVID-19 se
apresentou no Município pelo período em questão, nos próximos capítulos, busca-se
apresentar, primeiramente, os aspectos socioeconômicos que relacionam a
habitação, as vulnerabilidades sociais e a COVID-19 e, posteriormente, a análise
territorial da pandemia, a partir da correlação desses aspectos com a espacialização
dos casos e óbitos confirmados da Doença.

5.2 Os assentamentos precários e suas desigualdades territoriais: dados


socioeconômicos

Os assentamentos precários são caracterizados, no Plano Nacional de


Habitação (PlanHab), pela

informalidade na posse da terra, ausência ou insuficiência de


infraestrutura, irregularidade no processo de ordenamento urbano,
falta de acesso a serviços e moradias com graves problemas de
habitabilidade, construídas pelos próprios moradores sem apoio
técnico e institucional. (PLANHAB, 2009, p. 36).

A base de dados utilizada neste trabalho para a identificação dos


assentamentos precários de Curitiba provém dos dados fornecidos pelo IPPUC e pela
COHAB-CT para a atualização do Plano Estadual de Habitação de Interesse Social
do Paraná (PEHIS-PR), em 2019.
Orientados por essa caracterização, nesse levantamento, para
assentamentos precários/informais apresenta-se a subdivisão em: loteamento
irregular/clandestino; ocupação irregular e/ou favela; cortiço; conjunto habitacional
degradado e/ou irregular. A metodologia da pesquisa proposta pelo Estado possibilita,
ainda, a identificação de áreas disponíveis para habitação, de vazios urbanos
passíveis de ocupação e Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS).
Para Curitiba, o Município apresentou ao Estado dados referentes a duas
destas classificações, culminando em 359 polígonos para ocupações irregulares e/ou
favelas, que totalizam 42.990 domicílios, e 94 para parcelamentos irregulares, com
7.509 edificações, conforme mapa abaixo.
71

Figura 8 – Assentamentos Precários/Informais em Curitiba (PEHIS, 2019)

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-
PR, em 2019.
72

O Município informa não possuir as demais categorias de assentamentos


precários da metodologia do Plano e, ainda, que, por decisão do IPPUC, “os Vazios
Urbanos, as Áreas disponíveis para Habitação e as ZEIS (SEHIS) não são divulgados
para evitar ocupações irregulares, mesmo as já ocupadas”14.
No Zoneamento Urbano de Curitiba, as zonas com características mais
similares às Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), como identificado pelo
próprio Município, trata-se dos Setores de Habitação de Interesse Social (SEHIS).
Considerando os SEHIS (Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019), o que
se percebe é que não há, necessariamente, uma sobreposição destes com as áreas
de ocupações e/ou loteamentos irregulares apresentados para o PEHIS-PR (Figura
9).
Essa constatação, no entanto, diverge do que o Município também alega no
PEHIS: “no Município de Curitiba tratamos de SEHIS no lugar de ZEIS. Quanto ao
número solicitado [de ZEIS ocupadas], as áreas ocupadas irregulares em parceria
com a COHAB, na sua maioria tornam-se SEHIS”15.
Considerando que o Município entende que os SEHIS se tratam ou, pelo
menos, são compostos por áreas ocupadas irregularmente, para este trabalho é,
portanto, necessário também considerar essa delimitação como um identificador de
precariedades habitacionais existentes.
No mesmo formulário, o Município ainda deixa evidente que se trata de áreas
já ocupadas, ao passo que informa que “existe o instrumento para a criação de SEHIS
em áreas vazias que serão ocupadas com habitação social, no entanto não existe
mapeamento das áreas”16.

14 Informação contida no formulário preenchido pelo Município para a pesquisa de 2019, apresentado
no Sistema de Informações sobre Necessidades Habitacionais do Paraná (SISPEHIS), disponível em:
https://www.sistemas.cohapar.pr.gov.br/PEHISPUBLICO/formPrincipal.php?idFormPrincipal=wdD0t04
=7pTTnALWN7w9JtEZLQT66wECHtT72em
15 Ibid.
16 Ibid.
73

Figura 9 – Assentamentos Precários/Informais e Setores de Habitação de Interesse Social


(SEHIS) em Curitiba

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-
PR, em 2019 e da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019.
74

Conforme observa-se, a não sobreposição das poligonais sugerem a


existências de tipologias de Habitação de Interesse Social que foram ignoradas na
construção do PEHIS para Curitiba.
Curitiba, em seu padrão de urbanização predominantemente centro-periferia,
exprime, como na maioria das metrópoles brasileiras, a produção desigual do seu
espaço urbano na conformação de núcleos habitacionais precários que se concentram
nas bordas de ocupação da cidade.
Não só caracterizados pela ocupação irregular e/ou informal, mas também
pela concentração da produção habitacional de interesse social construídos pelo
poder público, os Conjuntos Habitacionais se encontram em áreas cujos dados
socioeconômicos e de infraestrutura demonstram um território com maior
vulnerabilidade e precariedade.
Nesse sentido, também é fundamental espacializar esses conjuntos
habitacionais e perceber que estes possuem uma maior correlação com os SEHIS do
que os dados de assentamentos precários do PEHIS 2019 (Figura 10).
Como os conjuntos habitacionais públicos produzidos não é um dado
disponibilizado pela COHAB-CT, optou-se, neste trabalho, por utilizar a distribuição
espacial da produção habitacional da COHAB-CT trabalhada por Albuquerque (2007),
conforme Figura abaixo.
75

Figura 10 – Assentamentos Precários/Informais, Setores de Habitação de Interesse Social


(SEHIS) e Conjuntos Habitacionais em Curitiba

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-
PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
76

Entendendo que esses espaços apresentam camadas de vulnerabilidades


que se somam e se correlacionam a aspectos de saúde e determinam um maior risco
à vida, busca-se analisar nesta seção como os dados sociais se espacializam na
Cidade e, em especial, nos perímetros dos assentamentos precários fornecidos ao
PEHIS, nos SEHIS e nos Conjuntos Habitacionais, de forma a entender o contexto
socioeconômico e a concentração de certas vulnerabilidades dessas áreas.
Nesta seção, iremos analisar a correlação dessas áreas com os dados
socioeconômicos produzidos, principalmente, pelo Censo de 2010, que, por falta de
sua atualização prevista para 2020, encontram-se com defasagens consideráveis.
Mas, devido à ausência de dados públicos que o substituam, são um dos únicos que
possibilitam esse tipo de análise.
Nesse sentido, iremos trabalhar o perfil socioeconômico de Curitiba a partir
dos setores censitários do IBGE quanto à renda domiciliar, etnia (pessoas não-
brancas), idade (população idosa), adensamento domiciliar e qualidade das moradias
e das infraestruturas do entorno e buscar entender como esses dados se espacializam
no território. A utilização desses dados citados se ampara na conclusão da influência
desses fatores na evolução da pandemia de COVID19 por diversas pesquisas,
estando algumas pontuadas neste trabalho como Figueiredo et al. (2020), Santos et
al. (2020) e Souza (2020).
Trabalhando, primeiramente, o adensamento domiciliar é interessante
entender, anteriormente, a densidade populacional de Curitiba. Considerando a
população por bairro de forma absoluta, percebe-se uma concentração nos bairros
periféricos (Figura 11). Naturalmente, essa quantidade também é reflexo da maior
dimensão destes bairros, a exemplo da Cidade Industrial de Curitiba, bairro que
apresenta a maior população.
77

Figura 11 – População por bairro (2020)

Fonte: elaborado pela autora a partir da estimativa populacional do IPPUC para 2020.

Ao tratar-se de densidade populacional (Figura 12) essa concentração


modifica consideravelmente, destacando-se bairros mais centrais (incluindo o bairro
Centro) e Cajuru e Sítio Cercado entre os bairros mais periféricos.
78

Figura 12 - Densidade populacional (hab/km²) por bairro - 2020

Fonte: elaborado pela autora a partir da estimativa populacional do IPPUC para 2020.

A densidade populacional por bairro é um dado mais adequado para análise


quanto a um fator de risco para a COVID-19, considerando ser uma doença
transmissível por gotículas de saliva e catarro que se espalham pelo ambiente. Esse
dado, portanto, reflete uma maior densidade habitacional vertical ou horizontal,
provocando uma maior convivência entre a população e, portanto, uma maior
possibilidade de contágio, principalmente ao se considerar as habitações verticais
devido a necessidade de compartilhamento de elevadores e escadas para a
79

circulação.
Ao analisar-se o adensamento domiciliar (Figura 13), a expectativa seria
trabalhar o entendimento amplamente utilizado por órgãos como IBGE e o Ministério
das Cidades para déficits habitacionais a partir da coabitação, quando há duas ou
mais famílias morando no mesmo domicílio, e adensamento excessivo no domicílio,
considerado quando há mais de 3 moradores por dormitório. Entende-se que esses
dados são de suma relevância para a COVID-19, visto que a incapacidade de
isolamento dos demais moradores da residência possibilita a maior probabilidade de
contágio entre eles.
No entanto, devido a impossibilidade de obtenção destes dados na Prefeitura
Municipal de Curitiba e a ausência desta informação no Censo de 2010 17, optou-se
por adotar a informação de domicílios com mais de 5 moradores como uma forma de
aproximação dos dados intentados.

17Não foram informados nos dados do Censo de 2010 a quantidade de dormitórios por domicílio ou a
quantidade de famílias por domicílio, impossibilitando a geração das informações de coabitação e
adensamento domiciliar excessivo.
80

Figura 13 – Adensamento Domiciliar – Domicílios com 5 ou mais moradores.

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
81

Neste mapa, observamos que volta a se destacar as áreas mais periféricas


de Curitiba, em especial, os setores censitários limítrofes com o perímetro do
Município. Importante ressaltar que a maioria das áreas que se destacam não estão
incluídas na mancha que inclui os conjuntos habitacionais de Curitiba, os
assentamentos precários definidos pelo PEHIS e os SEHIS, apesar de ser um tipo de
um dado relacionado à precariedade habitacional, considerado para o cálculo oficial
do Déficit Habitacional.
Figueiredo et al. (2020) evidencia que mais do que fatores de adensamento
populacional da área, residir em habitações com condições inadequadas, estando
dentre elas o adensamento domiciliar, se associa a maiores taxas de incidência, visto
isto resulta em limitações para a realização do isolamento e aplicação das medidas
de proteção individual necessárias à mitigação da transmissão da COVID-19 no
próprio domicílio.
Nesse sentido, é pertinente a análise dos dados que apresentam uma
correlação com habitações em condições precárias. O que se observa nos próximos
mapas é que, similar a situação do adensamento domiciliar, percebemos também a
discrepância entre o centro e a periferia quando trabalhamos com os dados relativos
à qualidade dos domicílios e da infraestrutura do entorno na espacialização dos
domicílios improvisados (Figura 14), domicílios sem banheiro (Figura 15), domicílios
sem energia (Figura 16) e presença de esgoto a céu aberto (Figura 17) ou lixo (Figura
18) no entorno.
82

Figura 14 – Domicílios Improvisados

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
83

Figura 15 – Domicílios sem banheiro

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
84

Figura 16 - Domicílios sem energia elétrica

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
85

Figura 17- Domicílios com presença de esgoto a céu aberto em seu entorno

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
86

Figura 18 - Domicílios com presença de lixo em seu entorno

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
87

Novamente, é necessário pontuar-se a repetição entre os diferentes dados de


setores censitários com grande concentração dessas vulnerabilidades abordadas que
não estão incluídos na mancha que inclui os conjuntos habitacionais de Curitiba, os
assentamentos precários definidos pelo PEHIS e os SEHIS. Nesse sentido, percebe-
se a repetição dos bairros Campo de Santana, porção sul da Cidade Industrial de
Curitiba, Santa Cândida e Cachoeira, entre outros.
Essa percepção pode tanto sugerir uma considerável desatualização dos
dados socioeconômicos do Censo de 2010, considerando que as delimitações
utilizadas na mancha são dados mais recentes; assim como pode também alertar para
situações de precariedades que não estão mapeadas pelas políticas públicas
habitacionais e urbanas do Município.
Partindo para a análise sobre a renda domiciliar e entendendo que ela se
reflete diretamente na qualidade de vida das pessoas, das suas moradias e da
possibilidade de utilização de serviços de saúde fora da rede pública, observamos
ainda mais do que nas situações anteriores a oposição da concentração de grandes
salários (Figura 19) na região central com a concentração dos baixíssimos salários
(Figura 20) nos bairros periféricos.
88

Figura 19 – Renda domiciliar per capita a partir de 10 salários-mínimos

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).

Percebe-se, na Figura 19, a concentração em maior volume dos altos salários


nos setores censitários dos bairros limítrofes com o bairro Centro, como o Batel,
89

Bigorrilho, Alto da Glória, Juvevê, entre outros, que se irradia em menor concentração,
predominantemente para a área norte da cidade.

Figura 20 - Renda domiciliar per capita até 1 salário-mínimo

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
90

Já para a situação até 1 salário-mínimo percebe-se um esvaziamento quase


que completo da área central e a maior concentração, novamente, nos setores
censitários que se encontram no limite do Município. Os setores censitários que se
destacaram quanto às vulnerabilidades tratadas anteriormente também apresentam
concentrações relevantes, indicando a correlação entre esses dados. Vale destacar a
massiva presença na área sul do Município, em especial, bairros como Ganchinho,
Umbará, Tatuquara, Caximba que apresentam grande concentrações de baixos
salários em contrapartida a baixa densidade populacional anteriormente apresentada.
Quanto a idade (Figura 21), muito discute-se a velhice como um fator de risco
para a COVID-19. Nesse sentido, observamos que, em Curitiba, 66,21% dos óbitos
foram em pessoas a partir dos 60 anos, apresentando uma taxa de letalidade de
13,19%, enquanto a taxa de letalidade geral do Município é de 2,67% para o período
analisado.
91

Figura 21 - População idosa

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
92

Para este dado, observa-se uma diminuição deste contingente populacional


nos bairros mais a sul e oeste e uma maior concentração nos bairros mais centrais.
Os setores censitários de maior de concentração na área central apresenta uma
semelhança com a concentração dos altos salários anteriormente apresentada.
Por fim, quanto a cor e etnia (Figura 22), como é característica da região sul
do país, observa-se uma maior concentração de brancos, dado este que se encontra
bastante concentrado e pulverizado no Município. Porém, ao juntarmos os dados de
pessoas pretas, pardas e indígenas, novamente, observamos a concentração desta
parcela da população nos bairros periféricos e um grande esvaziamento da área
central.
93

Figura 22 - Pessoas negras, pardas ou indígenas

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados dos setores censitários do Censo 2010 (IBGE),
da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de
outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
94

Esse dado infere que as precariedades aqui abordadas atingem de forma


desproporcional a este contingente populacional, visto que os setores censitários que
se destacaram quanto às vulnerabilidades tratadas anteriormente apresentam
também concentrações relevantes de pessoas pretas, pardas e indígenas. Essa
parcela da população, diferentemente da população branca, não se encontra
pulverizada na Cidade, mas sim, concentrada nas regiões reconhecidamente mais
vulneráveis e espoliadas.
Com isso, o que se reforça é a conformação de uma área periférica da Cidade
caracterizada pelo adensamento domiciliar, habitações precarizadas, baixos salário e
a concentração da população preta, parda e indígena.
Quando analisadas por anéis de centralidade dispostos em cinco quilômetros
a partir de Centro (Figura 23), percebemos que a disposição das manchas de
precariedade abordadas se concentra a partir do segundo anel nas áreas próximas
ao perímetro do Município e, predominantemente, onde já encontra-se um traçado
urbano mais rarefeito e irregular.
Elas destacam-se a partir do terceiro anel, que abrange, majoritariamente, a
área sul da Cidade, em quase todo o traçado urbano existente na área, caracterizada
por uma ocupação urbana mais rarefeita e irregular, percebido pela malha viária
disposta.
95

Figura 23 - Bairros periféricos de Curitiba

Fonte: elaborado pela autora a partir dos dados do IPPUC, da COHAB-CT para a atualização do
PEHIS-PR, em 2019, da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019 e de Albuquerque
(2007).
96

Com isso percebe-se a configuração dos bairros periféricos de Curitiba, como


Sítio Cercado, Alto Boqueirão, Pinheirinho, CIC, Cajuru, entre outros, que se
encontram nos limites da ocupação da Cidade, do sistema de transporte público, e da
própria delimitação do Município, onde também se concentram os principais conjuntos
habitacionais, ocupações irregulares e outras formas de precariedades habitacionais,
conforme destacado em autores como Albuquerque (2007) e Silva (2012).

5.2.1 A Rede Municipal de Saúde de Curitiba e o Índice de Vulnerabilidade das


Áreas de Abrangência das Unidades Básicas de Saúde (IVAB)

Sendo a COVID-19 uma questão de saúde pública, é necessário também


entender como se conforma a Rede Municipal de Saúde em Curitiba, sua
territorialização e vulnerabilidades.
Sua organização territorial se dá pela divisão seu território em 10 distritos
sanitários que são subdivididos em 111 áreas de abrangência para cada Unidade de
Saúde (US) existente no município (Figura 24).
97

Figura 24 - Territorialização da Rede Municipal de Saúde em Curitiba

Fonte: produzido pela autora com base nos dados geográficos do IPPUC.

Baseado na busca pela equidade no serviço de saúde18, a Prefeitura de

18O princípio da equidade está presente tanto na base do Sistema Único de Saúde (SUS), assim como
também deve nortear as políticas públicas de saúde. Relacionando-se com os conceitos de igualdade
98

Curitiba, através da Portaria nº155/2017, institui a criação do IVAB de forma a


possibilitar uma melhor avaliação do perfil da população de cada área de abrangência
das USs do Município. Seu intuito é de direcionar as ações e os gastos públicos em
saúde, visando a redução de iniquidades através da distribuição mais equitativa de
recursos (tanto sociais como financeiros) entre as unidades existentes.
A metodologia de construção desse indicador se ampara no Índice de
Vulnerabilidade das Famílias do Paraná (IVF-PR), construído pelo Instituto
Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), que tem o objetivo
de avaliar as características das famílias associadas ao conceito de vulnerabilidade
para além de aspectos exclusivos de renda.
O IVF-PR é um índice composto que utiliza os dados do cadastro único do
Governo Federal e é calculado pela média aritmética entre os índices de 4 dimensões:
adequação do domicílio, perfil e composição familiar, acesso ao trabalho e renda e
condições de escolaridade. O índice busca retratar “uma precariedade, ausência,
inadequação ou condição que limite a capacidade de resposta das famílias diante de
dificuldades”.
O IVAB é obtido, então, através do cálculo da razão entre o número de
pessoas com alta vulnerabilidade (IVF-PR superior a 0,2798), disponibilizado em 2017
pela Fundação de Ação Social (órgão público municipal), e a população da área de
abrangência de cada US, segundo a estimativa populacional para 2017 obtida a partir
do Censo 2010 do IBGE. Dessa forma obtém-se as unidades de saúde que
concentram maior número de pessoas em alta vulnerabilidade e que,
consequentemente, precisam de um suporte maior dos serviços.
O resultado apresentado em 2017 é classificado a partir dos graus de risco
que foram definidos da seguinte maneira: alto (índices de 0,006 a 0,038), com 36
USs19; médio (índices de 0,039 a 0,075), com 37 USs; e baixo (índices de 0,078 a
0,778), com 37 USs20 (Figura 25).
Uma questão a ser ressaltada é que, pela Portaria que institui o IVAB, há a
previsão de sua atualização a cada dois anos. No entanto, até hoje, ele não foi

e de justiça, sua utilização visa reduzir o impacto das diversidades e desigualdades sociais na saúde,
reconhecendo as diferentes necessidades de cada pessoa a partir das suas condições de vida.
19 Destacando-se as US Campina do Siqueira, Bacacheri, Medianeira, Ouvidor Pardinho, Santa Quitéria

II e Mãe Curitibana, todos com IVAB abaixo de 0,01. As três últimas com o menor índice de 0,006.
20 Destacando-se as US Caximba, Pantanal, Monteiro Lobato, Capanema, Sambaqui, Pompéia,

Alvorada e Sabará, todos com IVAB acima de 0,2. A US Caximba apresenta o maior índice (0,778),
apresentando uma notável discrepância do segundo maior da US Pantanal (0,265).
99

atualizado. Outra defasagem ainda é devido ao fato de que, em 2018, a área de


abrangência da US Santa Cândida foi dividida em duas a partir da criação da nova
Unidade de Saúde Jardim Aliança. Em decorrência da não atualização posterior a
2017, atualmente, não há informações sobre a IVAB dessa US.

Figura 25 - Espacialização – IVAB

Fonte: produzido pela autora com base na Portaria Municipal nº 150/2017.


100

O que pode se observar com a espacialização desta classificação é que, como


o IVF-PR é baseado nos dados socioeconômicos da população similares aos
trabalhados até o momento, novamente reforça-se o fato de que as áreas mais
periféricas de Curitiba apresentam os maiores índices de vulnerabilidade, em especial
a região Sul.
Sendo esse indicador elaborado pelo Município desde 2017 e sendo a
COVID-19 um problema de saúde pública que demanda de forma consistente os
serviços da saúde, esperava-se encontrar uma correlação entre as políticas públicas
de enfrentamento a pandemia adotadas e o IVAB, porém, não houve qualquer indício
de utilização desse dado, nem mesmo para análise dos impactos da pandemia sobre
o sistema de saúde de Curitiba.

5.3 A COVID-19 e sua espacialização: o agravamento da pandemia

Considerando os estudos anteriormente comentados sobre a relação


territorial e a COVID-19 no Capítulo 3, é ainda interessante acrescentar e destacar o
estudo de Bega e Souza (2021) que traz uma análise socioespacial da COVID-19 para
as capitais de Fortaleza, Manaus e São Paulo e apresenta em seus achados uma
maior proporção de óbitos em regiões periféricas quando comparado a regiões
centrais, levando-os a concluir que “os dados disponíveis sobre a transmissibilidade
do vírus e os riscos de adoecimento e morte permitem afirmar que a pandemia se
agrava pela vulnerabilidade socioeconômica e acentua as inúmeras formas de
desigualdades sociais” (BEGA; SOUZA, 2021, p.28)
Apesar de Curitiba apresentar maior IDHM do que estes municípios, menor
taxa de letalidade para a COVID-19 e, aparentemente, uma rede de saúde mais bem
distribuída e uma desigualdade social menos marcante e mais latente, é esperado que
também se manifeste alguma forma, mesmo que mais branda, de agravamento da
pandemia da COVID-19 para seus territórios precários, que, conforme relatado
anteriormente, se caracterizam pela sua pulverização em pequeno porte e
periferização característico do padrão centro-periferia, similar ao diagnosticado pelo
autores para as outras três capitais.
A questão é que, para além dos bons indicadores gerais para o Município, as
desigualdades intraurbanas caracterizam as diferentes exposições a riscos que é
imposto para diferentes parcelas da população. E nesse quesito, nenhuma capital
101

brasileira está livre desta realidade. É isto que se busca comprovar com esse estudo.
Antes de se aprofundar sobre a espacialização da doença e sua disseminação
e agravamento, de forma a entender o resultado da pandemia no período abordado,
primeiramente, é importante destacar como encontra-se a Cidade ao final do período
trabalhado quanto às taxas de incidência (Figura 26), de mortalidade (Figura 27) e de
letalidade (Figura 28) por bairro.
Esses são conceitos amplamente utilizados na Epidemiologia para o
monitoramento das doenças. A incidência se refere a medida da ocorrência de novos
casos durante um período especificado em uma população em risco de ter a doença;
a mortalidade é obtida pela relação entre o número de mortos de uma população e
um determinado espaço de tempo; e a letalidade considera a relação entre o total de
óbitos pelo total de casos confirmados de uma doença, demonstrando a gravidade da
doença.
Recorda-se, ainda, que do total de casos (300.324), 7.060 (2,35% do total)
não apresentavam o preenchimento do campo “bairro” e, portanto, não estão dentro
dessas e das outras espacializações que tratarem dos casos confirmados por COVID-
19. Quanto aos óbitos, é necessário também ressaltar a diferença encontrada entre a
planilha completa (8.027 óbitos) e planilha especializada (7.817 óbitos) fornecidos
pela Secretaria Municipal da Saúde. Essas divergências alteram, por exemplo, a real
taxa de incidência, mortalidade e letalidade da Doença.
102

Figura 26 – Taxa de incidência por 10.000 habitantes - COVID-19 (2020-2021)

Fonte: produzido pela autora a partir da estimativa populacional do IPPUC para 2020, dos
dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR (2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10
de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.
103

Para a taxa de incidência, o que se observa é que, quando comparado à da


Cidade (1.541 casos por 10.000 habitantes), apresentam-se acima da média os
bairros limítrofes ao Centro (aqueles onde se destacou anteriormente os altos salários
e a concentração da população idosa) e os bairros mais à Oeste, destacando-se ao
Sul os bairros de Ganchinho e Caximba, sendo este último aquele com maior
incidência (3.181 casos por 10.000 habitantes).
104

Figura 27 - Taxa de mortalidade por 10.000 habitantes - COVID-19 (2020-2021)

Fonte: produzido pela autora a partir da estimativa populacional do IPPUC para 2020, dos
dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR (2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10
de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos dados da COVID-19 da Secretaria Municipal
de Saúde.
105

Quanto à taxa de mortalidade, quando comparado à da Cidade (41 óbitos por


10.000 habitantes), os bairros ao Sul não apresentam destaque, permanecendo acima
da média os bairros limítrofes ao Centro e os bairros Pinheirinho e Novo Mundo, mais
à Oeste, destacando-se o Batel como o bairro com maior mortalidade (84 óbitos por
10.000 habitantes).
106

Figura 28- Taxa de letalidade por 100 casos confirmados - COVID-19 (2020-2021)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.
107

Para a letalidade, quando comparado à da Cidade (2,93 óbitos por 100 casos
confirmados da doença ou 2,93%), novamente os bairros ao Sul não apresentam
destaque. Entre os cinco bairros como maior letalidade estão Jardim Botânico
(4,70%), Hugo Lange (4,18%), Centro Cívico (3,94%), Batel (3,92%) e Juvevê
(3,91%), sendo todos esses bairros limítrofes ao Centro. Apresenta-se também um
agravamento mais a leste da cidade, que não se destacava nos dois mapas anteriores.
Apresenta-se, ainda, na Tabela abaixo, os valores específicos de população,
número total de casos e óbitos e as taxas de incidência, mortalidade e letalidade por
bairro.

Tabela 5 - Dados COVID-19 (2020-2021) por bairro

POP. INCIDÊNCIA MORTALID. LETALIDADE


NOME CASOS ÓBITOS
(2020) CASOS/POP ÓBIT/POP ÓBIT/CASOS

REGIONAL MATRIZ
AHÚ 11934 1352 36 1133 30 2,66%
ALTO DA
5500 998 32 1815 58 3,21%
GLÓRIA
ALTO DA RUA
8349 1932 36 2314 43 1,86%
XV
BATEL 9802 2092 82 2134 84 3,92%
BIGORRILHO 29781 4249 106 1427 36 2,49%
BOM RETIRO 4586 739 17 1611 37 2,30%
CABRAL 14662 1547 43 1055 29 2,78%
CENTRO 42853 5685 203 1327 47 3,57%
CENTRO
4802 686 27 1429 56 3,94%
CÍVICO
CRISTO REI 14357 1862 51 1297 36 2,74%
HUGO LANGE 3661 478 20 1306 55 4,18%
JARDIM
6195 829 39 1338 63 4,70%
BOTÂNICO
JARDIM
5235 705 17 1347 32 2,41%
SOCIAL
JUVEVÊ 11942 1408 55 1179 46 3,91%
MERCÊS 11494 1758 39 1529 34 2,22%
PRADO VELHO 4873 851 16 1746 33 1,88%
REBOUÇAS 14016 2564 76 1829 54 2,96%
SÃO
5765 997 36 1729 62 3,61%
FRANCISCO
REGIONAL PORTÃO
ÁGUA VERDE 53288 5457 182 1024 34 3,34%
CAMPO
37395 4958 105 1326 28 2,12%
COMPRIDO
FAZENDINHA 30407 4367 119 1436 39 2,72%
GUAÍRA 15664 2538 63 1620 40 2,48%
PAROLIN 11042 1466 43 1328 39 2,93%
PORTÃO 44965 6035 149 1342 33 2,47%
SANTA
12499 2159 49 1727 39 2,27%
QUITÉRIA
SEMINÁRIO 6201 838 30 1351 48 3,58%
108

VILA IZABEL 12400 1910 50 1540 40 2,62%


REGIONAL BOA VISTA
ABRANCHES 15608 1916 51 1228 33 2,66%
ATUBA 19883 2760 67 1388 34 2,43%
BACACHERI 24485 3586 119 1465 49 3,32%
BAIRRO ALTO 50974 7765 228 1523 45 2,94%
BARREIRINHA 19207 2878 108 1498 56 3,75%
BOA VISTA 33037 4214 138 1276 42 3,27%
CACHOEIRA 11198 1649 31 1473 28 1,88%
PILARZINHO 29165 4359 123 1495 42 2,82%
SANTA
38710 6935 193 1792 50 2,78%
CÂNDIDA
SÃO
7137 754 26 1056 36 3,45%
LOURENÇO
TABOÃO 4266 426 11 999 26 2,58%
TINGUI 13221 2133 67 1613 51 3,14%
REGIONAL SANTA FELICIDADE
BUTIATUVINHA 15406 1955 51 1269 33 2,61%
CAMPINA DO
7587 922 28 1215 37 3,04%
SIQUEIRA
CASCATINHA 2281 383 12 1679 53 3,13%
LAMENHA
1480 102 2 689 14 1,96%
PEQUENA
MOSSUNGUÊ 14488 2106 36 1454 25 1,71%
ORLEANS 9115 1041 23 1142 25 2,21%
SANTA
39177 5493 142 1402 36 2,59%
FELICIDADE
SANTO INÁCIO 7040 1013 27 1439 38 2,67%
SÃO BRAZ 24085 3742 122 1554 51 3,26%
SÃO JOÃO 3615 529 14 1463 39 2,65%
VISTA ALEGRE 12716 1658 37 1304 29 2,23%
REGIONAL CIDADE INDUSTRIAL DE CURITIBA
AUGUSTA 10161 1201 30 1182 30 2,50%
CIDADE
INDUSTRIAL 191181 32666 793 1709 41 2,43%
DE CURITIBA
RIVIERA 392 46 1 1173 26 2,17%
SÃO MIGUEL 4608 481 10 1044 22 2,08%
REGIONAL PINHEIRINHO
CAPÃO RASO 38084 7261 190 1907 50 2,62%
FANNY 9071 1405 41 1549 45 2,92%
LINDÓIA 8872 1701 38 1917 43 2,23%
NOVO MUNDO 45335 8184 251 1805 55 3,07%
PINHEIRINHO 51252 9846 264 1921 52 2,68%
REGIONAL TATUQUARA
CAMPO DE
49750 7247 137 1457 28 1,89%
SANTANA
CAXIMBA 2578 820 8 3181 31 0,98%
TATUQUARA 72432 10955 238 1512 33 2,17%
REGINAL BAIRRO NOVO
GANCHINHO 15783 2777 72 1759 46 2,59%
SÍTIO
131200 20047 528 1528 40 2,63%
CERCADO
UMBARÁ 23672 3883 84 1640 35 2,16%
109

REGIONAL BOQUEIRÃO
ALTO
56678 8563 226 1511 40 2,64%
BOQUEIRÃO
BOQUEIRÃO 78775 11477 368 1457 47 3,21%
HAUER 12674 2686 80 2119 63 2,98%
XAXIM 60159 9713 259 1615 43 2,67%
REGIONAL CAJURU
CAJURU 103868 15320 501 1475 48 3,27%
CAPÃO DA
19872 2774 88 1396 44 3,17%
IMBUIA
GUABIROTUBA 12397 1413 50 1140 40 3,54%
JARDIM DAS
16923 1664 63 983 37 3,79%
AMÉRICAS
TARUMÃ 9299 741 23 797 25 3,10%
UBERABA 86061 11614 307 1350 36 2,64%
(VAZIO) - 7060 0 - - -
TOTAL
1948626 300324 8027 1613 51 3,14%
(CURITIBA)
Fonte: produzido pela autora a partir da estimativa populacional do IPPUC para 2020 e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

De uma forma geral, o que permanece constante nos três mapas é a


conformação desta área imediata ao Centro como a área mais atingida pela
pandemia. Porém é preciso entender como conformou-se essa situação.
Para isso, analisa-se de forma cronológica durante os meses de março (início
da pandemia) a novembro de 2020, primeiramente, o contingente de casos por bairro
(já que não foi possível realizar a geocodificação dos endereços) e, após isso, óbitos
por endereço em manchas de calor, de forma a entender como se localizou a Doença
no território, demonstrando sua pulverização e concentração durante os períodos
abordados.
110

Figura 29 - Casos confirmados de COVID-19 por mês (março a maio de 2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

Os primeiros casos de COVID-19 são confirmados em Curitiba, como referido


anteriormente, através de contágios por viagens internacionais. Isso explica a
concentração inicial, ainda com baixo número de casos, nos bairros que apresentem
maiores rendas domiciliar. Também se destacam bairros com grandes territórios e
contingentes populacionais como CIC, Cajuru, Uberaba.
À medida que se avança nos meses, percebe-se que os casos vão diminuindo
nas áreas centrais e concentrando-se nos bairros mais ao Sul da Cidade, nos bairros
periféricos que apresentam grande parte das manchas de precariedades habitacionais
como o CIC, Sítio Cercado, Tatuquara, Campo de Santana e Umbará. Fato esse que
também se percebe nas Figuras 29 e 30.
111

Figura 30 - Casos confirmados de COVID-19 por mês (junho a agosto de 2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

Na Figura 30 observamos o primeiro pico de casos, em julho de 2020 e


percebemos o incremento significativo dos números infecções que dividem os quartis
na legenda. Nesses 3 meses abordados nessa Figura, percebe-se muito claramente
a concentração de casos nessa borda da área de urbanização periférica a sul, que vai
de um lado a outro da Cidade, desde CIC e Tatuquara ao Cajuru.
112

Figura 31 - Casos confirmados de COVID-19 por mês (setembro a novembro de 2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

Similar ao referido na Figura 30, também se percebe na Figura 31 o destaque


para os bairros que permanecem nos dois maiores quartis. Nos meses de setembro e
outubro, apresenta-se uma diminuição de casos que irá apresentar um considerável
acréscimo no final nos meses de novembro e dezembro de 2020.
Ao final do período analisado, ao final do 2021, de forma acumulada, a
conformação espacial dos casos confirmados por COVID-19 (Figura 32) apresenta-se
de forma bem semelhante ao encontrado em novembro de 2020: uma grande
concentração de casos borda da área de urbanização periférica a sul, que vai de um
lado a outro da Cidade, desde CIC e Tatuquara ao Cajuru.
113

Figura 32 - Casos confirmados de COVID-19 (2020-2021)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.
114

Como os bairros referidos (dentre eles: CIC, Sítio Cercado, Cajuru, Uberaba,
Boqueirão, Tatuquara, Xaxim) são também os bairros os maiores contingente
populacional influenciados por sua grande área territorial, isso induz ao fato de que
eles também apresentariam os maiores números de casos de forma absoluta. Refere-
se isso para relatar-se a importância de se trabalhar com os dados relativos,
apresentados anteriormente pela taxa de incidência e mortalidade.
Quantos aos óbitos, é interessante observar que a análise por endereços em
manchas de calor possibilita o entendimento da concentração dentro das áreas
territoriais dos bairros, conforme apresentados a seguir.

Figura 33 - Óbitos confirmados de COVID-19 por mês (março a maio de 2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-
PR (2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

Em se tratando dos óbitos iniciais da COVID-19 em Curitiba, no mês de março


de 202021, apresenta-se 4 óbitos. Um deles, localizado no Xaxim, encontra-se dentro

21 Ressalta-se que, para esse mês, a quantidade de óbitos apresentada diverge entre as planilhas
fornecidas pela Secretaria Municipal de Saúde. No texto é explanado sobre a planilha completa que
contém os casos e óbitos. A planilha espacializada auxiliou na confecção dos mapas e localização do
endereço.
115

do perímetro da mancha de precariedade habitacional estabelecida. Destaca-se que


três dos quatro óbitos desse mês encontra-se em bairros que contêm precariedades
habitacionais, destacando-se, em especial, o Xaxim e o Cajuru. Para os demais
meses, começa a perceber-se a pulverização das ocorrências, ainda em pequenas
quantidades que não possibilitam inferir um padrão.

Figura 34 - Óbitos confirmados de COVID-19 por mês (junho a agosto de 2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

Ao trabalhar-se o segundo trimestre (Figura 34), com o aumento substancial


do número de óbitos e alcançando-se o primeiro pico da doença em julho de 2020,
percebe-se o agravamento da Doença em focos centrais ao longo dos corredores de
transporte público e dos eixos de verticalização e adensamento do zoneamento
urbano, nos meses de junho e agosto; e em áreas de precariedade habitacional, em
especial, nos bairros Sítio Cercado, CIC e Cajuru, principalmente no mês de julho.
As áreas de concentração apresentadas permanecem também no próximo
trimestre (Figura 35), em especial, nos bairros Sítio Cercado, CIC e Cajuru.
116

Figura 35 - Óbitos confirmados de COVID-19 por mês (setembro a novembro de 2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.

Ao final do ano de 2020 (Figura 36), ao analisar-se de forma acumulada os


óbitos de Curitiba, as concentrações relatadas se somam e apresentam-se em
conjunto, permanecendo de forma muito similar até o final do período estudado, no
ano de 2021 (Figura 37).
117

Figura 36 - Óbitos confirmados de COVID-19 (2020)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.
118

Figura 37 - Óbitos confirmados de COVID-19 (2020-2021)

Fonte: produzido pela autora a partir dos dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019, de Albuquerque (2007) e dos
dados da COVID-19 da Secretaria Municipal de Saúde.
119

É interessante destacar, novamente, onde se concentram óbitos durante o


período analisado: em mancha de concentração central, vinculados diretamente aos
corredores de transporte público e à densidade populacional dos eixos de
verticalização e adensamento do zoneamento urbano no Eixo Estrutural (EE) e na
Zona Residencial 4 (ZR4) no entorno dos EEs; e nos bairros periféricos onde se
concentra as maiores mancha dos Conjuntos Habitacionais, do SEHIS e do
Assentamentos Precários do PEHIS 2019, em especial na área que abrange o Sítio
Cercado e seu entorno, destacando-se ainda focos no Cajuru, CIC e em menor
proporção no Tatuquara.
Sobre os assentamentos precários e conjuntos habitacionais mais atingidos22
destacamos para o CIC: favela Vila Barigui da Estação e conjuntos habitacionais
Oswaldo Cruz II e Nossa Senhora da Luz dos Pinhais; para o Cajuru: conjunto
habitacional Oficinas e nas zonas relativas ao Setor de Habitação de Interesse Social
e à Área de Proteção Ambiental do Iguaçu; para o Sítio Cercado: conjuntos
Habitacionais Pedro Viriato Parigot de Souza, Damasco, Coqueiros, Girassol, Sítio
Cercado e Sítio Cercado V; para Tatuquara: conjunto habitacional Santa Rita.
Se percebe ainda que alguns bairros, como Uberaba, Barreirinha, Novo
Mundo e Pinheirinho, apesar de não se destacarem quanto a concentração de óbitos
comparativamente aos bairros anteriormente citados, apresentam internamente uma
concentração na região desses assentamentos precários e conjuntos habitacionais.
No caso de Uberaba: nos conjuntos habitacionais Itiberê e Lotiguassu II; para
Barreirinha: no conjunto habitacional Santa Efigênia; no Novo Mundo: nas favelas Vila
Formosa e Vila Leão; no Pinheirinho: na área da favela Bolsão Ulisses Guimarães e
dos conjuntos habitacionais Pinheirinho e San Marco.
Quando correlacionados com os dados socioeconômicos no item anterior,
percebe-se a concentração de óbitos rebate com áreas de concentração de idosos ao
longo da área central e de maiores rendas; em contrapartida, a periferia é marcada
pelas áreas com menores rendas, menor acesso à infraestrutura e outros níveis de
precariedade, que tornam essas áreas as mais vulnerabilizadas em relação ao IVAB.

22Os nomes indicados provêm da base de dados da COHAB-CT para a atualização do PEHIS-PR
(2019), da Lei Municipal nº 15.511, de 10 de outubro de 2019 e de Albuquerque (2007).
120

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Curitiba, tendo seu primeiro caso de COVID-19 confirmado em 11 de março


de 2021, finalizou o ano de 2021 com 300.324 casos acumulados e 8.027 óbitos. Para
esse período, apesar dos altos coeficientes de incidência e de mortalidade, acima do
índice mundial, nacional, regional e estadual, apresenta uma taxa de letalidade abaixo
da taxa nacional, possuindo, ainda, dentro das capitais com mais de 1 milhão de
habitantes, um dos menores índices.
Em seu padrão de urbanização predominantemente centro-periferia, a Cidade
exprime, como na maioria das metrópoles brasileiras, a produção desigual do seu
espaço urbano. Com isso, o que se percebe é a conformação de uma área periférica
caracterizada pelo adensamento domiciliar, habitações precarizadas, baixos salários
e a concentração da população preta, parda e indígena.
Nesse sentido, se verifica a configuração dos bairros periféricos de Curitiba,
como Sítio Cercado, Alto Boqueirão, Pinheirinho, CIC, Cajuru, entre outros, que se
encontram nas bordas de ocupação da Cidade e nos limites do sistema de transporte
público e da própria delimitação do Município, onde também se concentram os
principais conjuntos habitacionais, ocupações irregulares e outras formas de
precariedades habitacionais.
Retomando o conceito dos Determinantes Sociais da Saúde, entende-se que
as condições sociais da população ajudam a determinar a ocorrência de doenças e
mortes prematuras e evitáveis. Com isso, essa pesquisa buscou analisar se COVID-
19 incide de forma desproporcional nos assentamentos precários em comparação ao
restante da cidade de Curitiba, afetando de forma mais massiva e/ou letal a população
residente nessas áreas com maior vulnerabilidade social.
Diferentemente do que se esperava, a qualidade dos dados produzidos pela
Secretaria Municipal de Saúde impossibilitou a análise da Doença conforme
pretendido pela metodologia e limitou bastante o alcance e a profundidade pretendida
neste trabalho.
De forma a concluir a presente pesquisa, a principal conclusão que se obtém
deste trabalho é a falta de estruturação das informações espaciais coletadas pela
Secretaria Municipal de Saúde para os dados da COVID-19. É de suma importância
destacar que, um evento como a Pandemia enfrentada, precisa de um monitoramento
preciso e responsável de como a Doença se comporta no território, a fim de possibilitar
121

a construção de políticas públicas concretas.


Os problemas encontrados nas planilhas e relatados neste trabalho, em
especial no capítulo da metodologia, demonstra a preocupação da autora em
credibilizar as informações disponibilizadas e espacializadas nos mapas produzidos,
visto que é inalcançável o conhecimento da informação verdadeira sobre cada caso
de contágio ocorrido e o preenchimento incorreto da sua localização possibilita
conclusões equivocadas sobre o comportamento da pandemia.
Por tratar-se de uma nova doença, sem informações e estudos prévios,
entende-se que o desafio da COVID-19 para o Poder Público é extraordinário e sem
precedentes. No entanto, a desintegração das ações das secretarias municipais, a
falta de clareza das informações e dos dados públicos fornecidos, assim como a
insistência no funcionamento das atividades econômicas da Cidade em detrimento de
recomendações de saúde necessárias ao controle da propagação do vírus, nos fazem
questionar a efetividade da política pública adotada.
Sendo Curitiba um exemplo cidade brasileira com um forte planejamento
público através de instituições históricas e conceituadas como o Instituto de Pesquisa
e Planejamento Urbano de Curitiba, com o seu vasto repertório de dados e
informações, estranha-se a ausência de estruturação e verificação na coleta de dados
espaciais ou mesmo de monitoramento da dinâmica da doença no sentido territorial.
Questiona-se o porquê da ausência de um esforço conjunto entre as
secretarias municipais que pudesse dinamizar e potencializar os esforços no combate
a Pandemia, alinhados a forma de atuação de cada órgão. Com isso, a concentração
da informação pela Secretaria Municipal de Saúde sugere uma grande falha na
gestão, não possibilitando a integração de habilidades e competências como as de
geoprocessamento que ocorrem no planejamento territorial do IPPUC.
O que se percebe sobre isso é que houve em Curitiba uma política pública de
gerenciamento da Pandemia, ou seja, de lidar emergencialmente e como fosse viável
com as circunstâncias que surgiam; e não uma política de enfrentamento, no sentido
de conhecer o que estava acontecendo nos territórios e de tentar se antecipar e evitar
a propagação dos casos ou o colapso da saúde pública23.

23Conclusão que corrobora com o apresentado pelo Relatório de Pesquisa “Políticas públicas de
combate à pandemia do Coronavírus na Região Metropolitana de Curitiba” elaborado pelo Grupo de
Pesquisa e Extensão em Políticas Sociais e Desenvolvimento Urbano da Universidade Federal do
Paraná (PDUR/UFPR), já citado anteriormente.
122

Ademais, apesar das dificuldades apresentadas para a espacialização dos


casos o que se pode inferir, a partir dos dados apresentados pela Secretaria Municipal
da Saúde, é que, diferentemente de outros estudos, em capitais com maiores índices
de desigualdades sociais e maiores precariedades como Fortaleza, Manaus, São
Paulo, Rio de Janeiro, entre outras, em especial do Norte e Nordeste (Figueiredo et
al., 2020; Santos et al., 2020; Bega e Souza, 2021), Curitiba por apresentar melhores
indicadores de saúde pública, saneamento e de qualidade dos domicílios em relação
a essas cidades, não apresenta de forma discrepante o agravamento da pandemia
nos bairros periféricos da Cidade, apesar da concentração de casos.
Nesse sentido, o que se percebe é que, para Curitiba, juntamente aos fatores
de risco relacionados à moradia, os fatores relacionados à saúde, como a idade, são
mais vinculados com a concentração de óbitos e a própria taxa de letalidade da
doença, visto que se apresenta uma certa diminuição do contingente de idosos nas
áreas periféricas.
No entanto, não se pode excluir a importância do monitoramento e da ação
pública nas áreas mais precarizadas da Cidade para o enfrentamento da pandemia,
justamente por considerar sua capacidade de catalisar a transmissão da Doença,
como pode ser percebido ao analisar-se mês a mês a sua disseminação territorial.
Por fim, destaca-se que se trata de uma exploração parcial sobre a situação
da pandemia em Curitiba, que ainda se encontra em curso. Há muito o que se estudar
e conhecer sobre essa nova doença e se trabalhar com os dados gerados a partir
dela, sendo necessário maior tempo e aprofundamento na questão, sendo este
trabalho somente uma das conclusões possíveis a partir das informações que foi
possível obter sobre a pandemia em Curitiba durante o período disponibilizado.
É sabido que a presente pesquisa não pretende esgotar o tema, dadas ainda
possibilidades claras de aprofundamento. É necessário entender a correlação da
localização e propagação dos casos com o sistema de transporte público de Curitiba;
possibilitar a análise dos atendimentos de COVID-19 gerados na rede pública e a
identificação das Unidade de Saúde mais demandadas; investigar a vacinação, sua
espacialização e disposição de forma temporal, buscando o entendimento das
prioridades na aplicação da vacina e como isso repercutiu no número óbitos ao longo
do período nos territórios; trabalhar na própria expansão da análise considerando os
anos seguintes de pandemia.
Esse trabalho busca, portanto, gerar um alerta para a municipalidade sobre a
123

forma como é necessária a estruturação de sua estrutura administrativa e de suas


políticas públicas. Não é a primeira vez que desafios como a pandemia da COVID-19
se apresentam para a gestão pública e não será este o último. Então é necessário um
comprometimento do Município com a identificação, planejamento, implementação,
monitoramento e avaliação de suas políticas e para isso, a qualidade dos dados
gerados é de suma importância.
Ressalta-se, portanto, a importância da integração, capacitação e
estruturação, em especial da equipe de saúde pública, para possibilitar o
acompanhamento fidedigno das ocorrências na Cidade, de forma que o Poder Público
tenha conhecimento sobre seus territórios e suas vulnerabilidades, possibilitando,
assim, a construção de políticas públicas concretas e compatíveis com as diferentes
necessidades da sua população.
124

REFERÊNCIAS

ABRAMO, Pedro. A cidade com-fusa: a mão inoxidável do mercado e a produção da


estrutura urbana nas grandes metrópoles latino-americanas. Revista Brasileira de
Estudos Urbanos e Regionais, v. 9, n. 2, p. 25-54, nov. 2007.
ACSELRAD, Henri. Vulnerabilidade social, conflito ambiental e regulação urbana. O
Social em Questão, v. XVIII, p. 57-68, 2015. Disponível em:
<http://osocialemquestao.ser.puc-rio.br/media/OSQ_33_1_Acserald.pdf>. Acesso
em: 22 set. 2020.
ANDRADE, Luciana Teixeira; SILVEIRA, Leonardo Souza. Efeito-território:
explorações em torno de um conceito sociológico. Civitas: Porto Alegre, v. 13, n.2, p.
381-402, mai./ago. 2013.
ALBUQUERQUE, Aline Figueiredo de. A questão habitacional em Curitiba: o
enigma da cidade modelo. 2007. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo)
- Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2007.
BARCELLOS, Christovam; RAMALHO, Walter. Situação atual do geoprocessamento
e da análise de dados espaciais em saúde no Brasil. Informática Pública, v. 4, n. 2,
p. 221-230, 2002.
BEGA, Maria Tarcisa Silva; SOUZA, Marcelo Nogueira de. Pandemia e efeito-
território: a desigualdade social como catalisadora da Covid-19. Revista Brasileira de
Sociologia, v. 9, n. 21, p. 25-54, jan./abr. 2021.
BÓGUS, Lucia; PASTERNAK, Suzana; MAGALHÃES, Luís Felipe Aires; SILVA,
Camila Rodrigues. Desigualdades e Espacialidades da COVID-19 no Estado de São
Paulo. As Metrópoles e a Covid-19: Dossiê Nacional. Disponível em:
https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/wp-
content/uploads/2020/07/Dossi%C3%AA-N%C3%BAcleo-S%C3%A3o-
Paulo_An%C3%A1lise-Local_Julho-2020.pdf. Acesso em: 21 mar. 2022.
BONDUKI, Nabil Georges. Origens da habitação social no Brasil. Análises Sociais,
vol. XXIX, p. 711-732, 1994.
BRAGA, Jose Ueleres; RAMOS JR. Alberto Novaes; FERREIRA, Anderson Fuentes;
LACERDA, Victor Macêdo; FREIRE, Renan Monteiro Carioca; BERTONCINI, Bruno
Vieira. Propensity for COVID-19 severe epidemic among the populations of the
neighborhoods of Fortaleza, Brazil, in 2020. BMC Public Health, 20:1486, 2020.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Lei nº 8080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes e dá outras providências. Brasília, DF: Senado Federal:
Centro Gráfico, 1990.
125

BRASIL. Ministério das Cidades. Plano Nacional de Habitação. 2009. Disponível


em: https://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/habitacao/planhab-
2040/referencias/PLANONACIONALDEHABITAO20092023.pdf . Acesso em: 29 jan.
2023.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Fundação Oswaldo
Cruz. Introdução à Estatística Espacial para a Saúde Pública. Ministério da Saúde,
Fundação Oswaldo Cruz; Simone M. Santos, Wayner V. Souza, organizadores. -
Brasília: Ministério da Saúde, 2007. 120 p.: il. – (Série B. Textos Básicos de Saúde)
(Série Capacitação e Atualização em Geoprocessamento em Saúde; 3).
CANÇADO, Taynara Candida Lopes; SOUZA, Rayssa Silva de; CARDOSO, Cuan
Braga da Silva. Trabalhando o conceito de Vulnerabilidade Social. In: Encontro
Nacional de Estudos Populacionais, XIX, 2014, São Pedro/SP.
CARVALHO, André de Souza; SUGAI, Maria Inês. Estado, investimentos e exclusão
social: a produção do espaço da pobreza em Curitiba. Oculum Ensaios: Campinas,
11(2), p. 317-334, jul./dez. 2014.
CARVALHO, Marília Sá; PINA, Maria de Fátima de; SANTOS, Simone Maria dos
(org.). Conceitos Básicos de Sistemas de Informação Geográfica e Cartografia
aplicados à Saúde. Brasília: Organização Panamericana da Saúde/Ministério da
Saúde, 2000.
FERREIRA, João Sette Whitaker. A cidade para poucos: breve história da propriedade
urbana no Brasil. Anais do Simpósio Interfaces das representações urbanas em
tempos de globalização. Bauru, São Paulo, 2005.
FIGUEIREDO, A. M.; FIGUEIREDO, D. C. M. M.; GOMES, L. B.; MASSUDA, A.; GIL-
GARCÍA, E.; VIANNA, R. P. T.; DAPONTE, A. Social determinants of health and
COVID-19 infection in Brazil: an analysis of the pandemic. Revista Brasileira de
Enfermagem: 73(Suppl 2):e20200673, 2020. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-
7167-2020-0673.
FREYRE, Gilberto. Sobrado e Mucambos. ed. digital. São Paulo: Global, 2013.
Disponível em: <https://gruponsepr.files.wordpress.com/2016/10/livro-completo-
sobrados-e-mucambos-gilberto-freyre-1.pdf>. Acesso em: 22 set. 2020.
GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo (org.). Métodos de Pesquisa.
Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009.
GUIMARÃES, Raul Borges; CATÃO, Rafael De Castro; MARTINUCI, Oséias Da Silva;
PUGLIESI, Edmur Azevedo; MATSUMOTO, Patricia Sayuri Silvestre. O raciocínio
geográfico e as chaves de leitura da Covid-19 no território brasileiro. Estudos
Avançados, 34 (99), 2020.
Grupo de Pesquisa e Extensão em Políticas Sociais e Desenvolvimento Urbano
(PDUR). Dez meses de COVID-19 na Região Metropolitana De Curitiba: a
pandemia no território e as políticas públicas de mitigação de danos em 2020. 2021.
Relatório de Pesquisa – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2021. Disponível
em: https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/wp-
content/uploads/2020/07/Dossie-Nucleo-Curitiba_Analise-Local_2020.pdf. Último
acesso: 25.03.2022.
126

HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 26 ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 1995.
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC). Plano Diretor de
Curitiba: habitação e habitação de interesse social – Análise de desempenho, 1970
a 2009. Curitiba: IPPUC, 2010.
KOWARICK, Lucio. Espoliação urbana. São Paulo, Paz e Terra, 1979.
LIMA, Felipe Antunes. Territórios de vulnerabilidade social: construção
metodológica e aplicação em Uberlândia-MG. Dissertação (Mestrado em Geografia) -
Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal de Uberlândia.
Uberlândia, 2016.
MARICATO, E. A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial.
2. ed. São Paulo: Alfa-Ômega, 1982.
MARICATO, Ermínia. Metrópole na periferia do capitalismo: ilegalidade,
desigualdade e violência. 1. ed. São Paulo: Hucitec, 1996.
MEDEIROS, Kátia Rejane de; MACHADO, Heleny de Oliveira Pena;
ALBUQUERQUE, Paulette Cavalcante de; GURGEL JR. Garibaldi Dantas. O Sistema
de Informação em Saúde como instrumento da política de recursos humanos: um
mecanismo importante na detecção das necessidades de força de trabalho para o
SUS. Ciência & Saúde Coletiva,10(2), p. 433-440, 2005.
MÜLLER, Glaucia Regina Ramos. A influência do Urbanismo Sanitarista na
transformação do espaço urbano em Florianópolis. Dissertação (Mestrado em
Geografia) - Curso de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal de Santa
Catarina. Florianópolis, 2002.
Organização Mundial da Saúde (OMS). Declaração Política do Rio sobre
Determinantes Sociais da Saúde. Rio de Janeiro: OMS; 2011.
PASTERNAK, Suzana. Moradia da pobreza: habitação em saúde. 1983. Tese
(Doutorado em Epidemiologia) - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 1983. doi:10.11606/T.6.2018.tde-04012018-173054. Acesso em: 9
abr. 2022.
PASTERNAK, Suzana. Habitação e Saúde. Estudos Avançados (USP), v. 30, p. 51-
66, 2016.
PISANI, Rodrigo José; BELLINI, André Luiz da Silva. Geotecnologias aplicadas ao
mapeamento da densidade da população vulnerável do município de Alfenas-MG para
ações prioritárias no enfrentamento da Covid 19. Revista Cerrados, Montes Claros –
MG, v. 19, n. 02, p. 03-19, jul./dez.-2021.
POLUCHA, Ricardo Serraglio. Ecoville: construindo uma cidade para poucos. 2010.
Dissertação (Mestrado em Habitat) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. doi:10.11606/D.16.2010.tde-16062010-
120955. Acesso em: 2021-07-10.
ROLNIK, Raquel. Guerra dos Lugares: a colonização da terra e da moradia na era
das finanças. São Paulo: Boitempo, 2015.
127

ROLNIK, Raquel. Exclusão Territorial e Violência: O caso do Estado de São Paulo.


Cadernos de Textos, Belo Horizonte, v. 2, p. 173 - 196, 30 ago. 2000.
SÁNCHEZ, Fernanda. Curitiba imagem e mito: reflexão acerca da construção social
de uma imagem hegemônica. Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro: IPPUR-UFRJ,
1993.
SÁNCHEZ, Fernanda; MOURA, Rosa. Cidades-modelos: espelhos de virtude ou
reprodução do mesmo? Cadernos IPPUR, ano XIII, n. 2, p. 95-114, ago./dez. 1999.
SANTOS, Jefferson Pereira Caldas dos; SIQUEIRA, Alexandre San Pedro; PRAÇA,
Heitor Levy Ferreira; ALBUQUERQUE, Hermano Gomes. Vulnerabilidade a formas
graves de COVID-19: uma análise intramunicipal na cidade do Rio de Janeiro, Brasil.
Cadernos de Saúde Pública, 36(5):e00075720, 2020.
SANTOS, Milton. O Espaço Dividido: Os Dois Circuitos da Economia Urbana dos
Países Subdesenvolvidos. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004,
2ª edição.
SILVA, Madianita Nunes da. A dinâmica de produção dos espaços informais de
moradia e o processo de metropolização em Curitiba. 2012. Tese (Doutorado em
Geografia) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Setor de Ciências da Terra,
Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2012.
SINGER, Paul. O uso do solo urbano na economia capitalista. In: MARICATO, E.
(org.). A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial. São
Paulo: Alfa-Ômega, 1979, p. 21-36.
SOUZA, Marcelo Nogueira de. Desigualdade e seletividade social das medidas de
contenção da Covid-19 na periferia de Curitiba. Guaju, Matinhos - PR, v.6, n.1, p. 131-
146, jan./jun. 2020.
TOCHETTO, Daniel; FERRAZ, Célia. O Urbanismo de Saturnino de Brito e as
ressonâncias provocadas. Revista de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo (IAU-
USP), v. 22, p. 84-101, 2015.

Você também pode gostar