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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO

ESCOLA DE MINAS - NÚCLEO DE GEOTECNIA (NUGEO)


MESTRADO ACADÊMICO EM GEOTECNIA

GTA110 – ENSAIOS DE LABORATÓRIO EM MECÂNICA DOS


SOLOS
PROFESSOR LUCAS DELEON FERREIRA

FLÁVIA GOMES LINS


JOÃO BATISTA DA SILVA NETO
LUIZA GABRIELA VASCONCELOS ALVES

ENSAIOS DE PERMEABILIDADE

Ouro Preto - Minas Gerais - Brasil

20 de outubro de 2023
1. INTRODUÇÃO

O fluxo da água intersticial nos solos, em sua maioria, pode ser considerado laminar.
E em 1850, de forma experimental, Darcy verificou que, para um fluxo laminar em um meio
poroso, a velocidade média do fluxo é proporcional ao gradiente hidráulico i (relação entre a
carga h que se dissipa na percolação e a distância L ao longo da qual a carga se dissipa). O
coeficiente de proporcionalidade desta relação é chamado de condutividade hidráulica ou
coeficiente de permeabilidade do solo (K), está associado à facilidade pela qual o fluxo passa
através de um meio poroso e é costumeiramente expresso em m/s ou cm/s.
Vários fatores influenciam o fluxo da água intersticial nos solos, como o estado, o
grau de saturação, a estrutura e a anisotropia do solo. Nos solos granulares, a permeabilidade
aumenta com o índice de vazios, sendo mais elevada em solos em estado mais fofo. Além
disso, o coeficiente de permeabilidade é menor nos solos não saturados em comparação com
os saturados, e a determinação convencional é feita para os solos saturados. Solos
compactados a um menor teor de umidade para o mesmo índice de vazios, apresentam maior
condutividade hidráulica. Em geral, o solo não é isotrópico em relação à permeabilidade,
sendo maior na direção horizontal do que na vertical em solos sedimentares ou compactados.
Os coeficientes de permeabilidade dependem também da viscosidade do líquido, que varia
com a temperatura.
A condutividade hidráulica de um solo pode ser determinada a partir de ensaios de
laboratório utilizando permeâmetros de carga constante ou carga variável. O método para a
determinação do coeficiente de permeabilidade à carga constante se aplica aos solos
granulares e é normatizado pela NBR 13292 “Solo - Determinação do coeficiente de
permeabilidade de solos granulares à carga constante” (1995). A NBR 14545 “Solo -
Determinação do coeficiente de permeabilidade de solos argilosos à carga variável” (2000)
especifica os métodos para determinação do coeficiente de permeabilidade à carga variável e
se aplica aos corpos de prova talhados ou moldados, obtidos, respectivamente, a partir de
amostras indeformadas ou da compactação de amostras deformadas, com o coeficiente de
permeabilidade menor que 10-3 cm/s (10-5 m/s) após o ensaio.
Este relatório aborda a execução de ensaios laboratoriais para determinar o coeficiente
de permeabilidade à carga constante e à carga variável, com percolação de água através do
solo em regime de escoamento laminar, de amostras reconstituídas.
2. OBJETIVOS

O objetivo deste trabalho é realizar ensaios de permeabilidade, com percolação de


água através do solo em regime de escoamento laminar, buscando determinar o coeficiente de
permeabilidade à carga constante de uma amostra reconstituída de areia grossa, bem como o
coeficiente de permeabilidade à carga variável de uma amostra reconstituída de silte
pedregulhoso.

3. METODOLOGIA
3.1. ENSAIO DE PERMEABILIDADE COM CARGA CONSTANTE

Para a realização do ensaio de permeabilidade com carga constante, foi preparada


uma amostra de areia grossa e moldado um corpo de prova (de aproximadamente 7219,8
gramas) seguindo as recomendações de formação do corpo de prova abordado no item 5.2 da
NBR 13292 (1995). Foi realizada a montagem do sistema para execução do ensaio, conforme
a Figura 1.

(a) Montagem esquemática (b) Montagem real

Figura 1 - Esquema de montagem para ensaio de permeabilidade com carga constante

Em seguida, a válvula da base do corpo de prova foi aberta de modo a ser realizada a
saturação do corpo de prova, elevando-se gradualmente o reservatório de água. A entrada de
água no corpo de prova ocorreu pela ação da gravidade, de baixo para cima, de modo a
remover o ar remanescente nele. Com todas as válvulas abertas, aguardou-se a estabilização
das cargas nos tubos piezométricos, até não apresentarem variações apreciáveis nos níveis de
água e mediu-se e registrou-se a diferença de carga (Dh) nos tubos piezométricos, a
temperatura (T), o intervalo de tempo (Dt) e o volume (V) percolado pela seção transversal do
corpo de prova (A) neste período de tempo, veja a Figura 2. Foram realizadas quatro
medições, aumentando-se gradativamente a carga, de modo a estabelecer adequadamente a
região do fluxo laminar, na qual a velocidade é diretamente proporcional ao gradiente
hidráulico, veja a Figura 3, e coeficiente de proporcionalidade desta relação é o coeficiente de
permeabilidade K do solo (v = K x i).

Figura 2 – Realização de leituras de carga nos piezômetros, temperatura, intervalo de tempo e volume para
cálculo da velocidade de percolação

Figura 3 - O coeficiente angular, no regime laminar, da curva velocidade de percolação versus gradiente
hidráulico é o coeficiente de permeabilidade K

3.2. ENSAIO DE PERMEABILIDADE COM CARGA VARIÁVEL

Para a realização do ensaio de permeabilidade com carga variável, foi realizada a


montagem do sistema para aplicação e medição das cargas hidráulicas, constituído por uma
bureta de vidro graduada de 5,54 mm, formando, com o permeâmetro, o conjunto indicado na
Figura 4 para execução do ensaioError: Reference source not found.

(a) Montagem esquemática (b) Montagem real

Figura 4 - Esquema de montagem para ensaio de permeabilidade com carga variável

O permeâmetro é constituído por um cilindro metálico com aproximadamente 15 cm


de diâmetro e 13 cm de altura, acoplado a duas tampas. A tampa inferior é dotada de um
orifício que permite, na fase de saturação do corpo de prova, a entrada de água e, na fase de
leituras, a sua saída. A tampa superior é dotada de um orifício central que permite a saída de
ar, durante a fase de saturação, e a entrada de água, na fase de leituras. A esse orifício foi
acoplada a bureta de vidro graduada, para medição das cargas hidráulicas. Na montagem do
permeâmetro foram empregados o’rings, anéis de borracha, tela metálica e filtros, conforme
indicado esquematicamente na Figura 5. A argila plástica (bentonita) foi empregada na
vedação do espaço entre o corpo de prova e a parede do permeâmetro. O corpo de prova foi
posicionado no centro do cilindro e envolvido com bentonita, sendo esta colocada em
camadas da ordem de 2 cm de altura e compactada de forma a evitar o aparecimento de
caminhos preferenciais entre as paredes do cilindro e o corpo de prova. Veja na Figura 6 as
evidências do processo de montagem do permeâmetro.
Figura 5 - Vista e corte esquemático do permeâmetro (NBR 14545, 2000)

Figura 6 - Montagem do permeâmetro: filtros de areia, o’rings, anéis de borracha, tela metálica, posicionamento
do corpo de prova reconstituído e aplicação do selo de bentonita.

O corpo de prova da amostra reconstituída de silte pedregulhoso foi preparado


conforme as prescrições da NBR 14545 (2000) para corpo de prova compactado. O corpo de
prova moldado de silte pedregulhoso apresentou massa de aproximadamente 1222,2 g,
umidade inicial de 18,05%, diâmetro f igual a 10,00 cm, altura de 10,05 cm, grau de
compactação de 80,8 % e peso específico seco igual 1,312 g/cm³.

Finalizada a montagem do sistema, o corpo de prova foi saturado por meio de


percolação no sentido ascendente, efetuada pelo orifício localizado na tampa inferior. O
processo é considerado satisfatório quando ocorre o surgimento de água no orifício localizado
na tampa superior e a percolação ocorre sem a presença de bolhas de ar. Após a saturação, o
sistema de aplicação e medição de cargas hidráulicas foi conectado ao orifício localizado na
tampa superior e iniciado o ensaio, efetuando medidas das cargas hidráulicas, dos tempos
decorridos e da temperatura da água que percola pelo corpo de prova. O ensaio foi realizado
para três medições e o coeficiente de permeabilidade K é obtido a partir da média dos
resultados dessas medições.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1. ENSAIO DE PERMEABILIDADE COM CARGA CONSTANTE

Com o uso de paquímetro, foi medido e registrado o diâmetro interno D do


permeâmetro em três posições igualmente espaçadas e a distância L entre os centros das
aberturas dos tubos manométricos com precisão mínima de 0,1 cm. Utilizando-se a média das
medidas registradas para o diâmetro do corpo de prova, foi calculada a área da seção
transversal interna A do permeâmetro, veja a Tabela 1.

Tabela 1 - Dados da amostra

Dados da amostra reconstituída - Areia Grossa Gs = 2,626

Dimensões CP D - Diâmetro CP (cm) H - Altura CP (cm) L (cm) A - Área CP (cm²)


1 15,55 27,6
2 15,6 27,5
15,5 190,73
3 15,6 27,65
MÉDIA 15,58 27,58

Foi realizado o ensaio de permeabilidade com carga constante com quatro gradientes
hidráulicos diferentes, conforme a Tabela 3, e, assim, traçada a curva velocidade (20º C)
versus gradiente hidráulico.

Cálculo da diferença de carga, Dh, nos níveis dos tubos manométricos:


∆ h=h1 −h2

Cálculo do gradiente hidráulico (i):


∆h
i=
L

Cálculo da velocidade de percolação (v):


Q V
v= =
A ∆t x A

Cálculo da velocidade de percolação referente à temperatura de 20°C (v 20°C), utilizado


a Tabela 2:
μT
v 20° C =v
μ20
Tabela 2 - Relação de viscosidades da água (μT μ20 ºC) (NBR 13292, 1995)

Tabela 3 – Dados coletados e calculados para o ensaio de permeabilidade à carga constante

Perda de Carga Dh T V Q v v20°C


Leituras i Dt (s) mT/m20
h1 (cm) h2 (cm) (cm) (°C) (mL) (mL/s) (cm/s) (cm/s)
1 57,0 56,3 0,7 21,8 72,5 0,0452 16,44 4,41 0,023 0,957 0,0221
2 61,8 61,0 0,8 22,0 98,0 0,0516 18,35 5,34 0,028 0,952 0,0267
3 67,4 66,4 1,0 22,0 83,5 0,0645 12,50 6,68 0,035 0,952 0,0333
4 72,5 71,4 1,1 22,0 76,0 0,0710 10,37 7,33 0,038 0,952 0,0366

Do gráfico, representado pela Figura 7, foi extraído o coeficiente angular da reta, que
corresponde à condutividade hidráulica ou coeficiente de permeabilidade do solo K 20ºC,
referido à temperatura de 20 °C, da areia grossa ensaiada, igual a aproximadamente 5,1 x 10-1
cm/s.
Condutividade Hidráulica - Areia Grossa
0.040
0.035
f(x) = 0.51254418455733 x
Velocidade 20 (cm/s) 0.030
0.025
0.020
0.015
0.010
0.005
0.000
0.0400 0.0450 0.0500 0.0550 0.0600 0.0650 0.0700 0.0750

Gradiente Hidráulico (i)

Figura 7 – Curva velocidade (20º C) versus gradiente hidráulico

4.2. ENSAIO DE PERMEABILIDADE COM CARGA VARIÁVEL

Inicialmente, foi aferido e registrado o diâmetro interno da bureta de vidro, o diâmetro


do corpo de prova e a altura inicial do corpo de prova e calculada a área da seção
transversal do corpo de prova e a área interna da seção transversal da bureta, veja a
Tabela 4.

Tabela 4 - Dados do ensaio de permeabilidade com carga variável

Dados da amostra reconstituída - Silte Pedregulhoso, GC = 80,8% rd = 1,312 g/cm³


D - Diâmetro do corpo de prova (cm) 10,00
H - Altura inicial do corpo de prova (cm) 10,05
A – Área inicial do corpo de prova (cm²) 78,54
Dados da bureta de vidro
d - Diâmetro interno da bureta (mm) 5,54
a – Área interna da bureta (cm²) 0,241

As medidas das cargas hidráulicas, dos tempos decorridos e da temperatura da água


que percola pelo corpo de prova foram realizadas e registradas e o cálculo do coeficiente de
permeabilidade foi realizado para cada uma das medições, sendo, a partir da média dos
resultados das três medições, o coeficiente de permeabilidade do solo K 20ºC, referido à
temperatura de 20 °C, para o silte pedregulhoso ensaiado, igual a aproximadamente 1,5 x 10-5
cm/s (veja a Tabela 5).

Cálculo da altura inicial do nível d’água corrigida (h 0 corrigida ):


h 0( corrigida)=h0(corrigida) +href

Cálculo da altura final do nível d’água corrigida (h f (corrigida)):


h f (corrigida )=h f +href

Cálculo do coeficiente de permeabilidade (K):


aH h0 (corrigida)
K= ln
A ∆ t h f (corrigida)

Cálculo do coeficiente de permeabilidade referente à temperatura de 20°C ( K20°C),


utilizado a Tabela 2:
μT
K 20 ° C =K
μ 20

Tabela 5 - Dados coletados e calculados para o ensaio de permeabilidade à carga variável

h0 (cm) hf (cm)
Leitura T h0 hf href K mT/ K20°C
Corrigid Corrigid Dt (s)
s (°C) (cm) (cm) (cm) (cm/s) m20 (cm/s)
o o
1,474E- 1,448E-
1 20,8 27,0 21,0 94,0 88,0 138,0 0,982
05 05
1,518E- 1,491E-
2 20,8 27,0 21,0 67,0 94,0 88,0 134,0 0,982
05 05
1,471E- 1,445E-
3 20,8 27,0 14,0 94,0 81,0 312,0 0,982
05 05
1,488E- 1,461E-
Média
05 05

Comparando-se alguns valores típicos de permeabilidade apresentados pela literatura,


Tabela 6, com a ordem de grandeza dos coeficientes de permeabilidade encontrados para a
amostra de areia grossa, ensaiada à carga constante, de 5,1 x 10 -1 cm/s ou 5,1 x 10-3 m/s, e
para a amostra de silte pedregulhoso, ensaiado à carga variável, de 1,5 x 10 -5 cm/s ou 1,5 x
10-7 m/s, podemos concluir que os valores encontrados são coerentes.

Tabela 6 - Valores típicos de coeficiente de permeabilidade (PINTO, 2006)


5. CONCLUSÃO
Foi possível realizar os ensaios de permeabilidade e determinar o coeficiente de
permeabilidade à carga constante de uma amostra reconstituída de areia grossa, bem como o
coeficiente de permeabilidade à carga variável de uma amostra reconstituída de silte
pedregulhoso.
A comparação dos coeficientes de permeabilidade obtidos para a amostra de areia grossa,
ensaiada à carga constante (5,1 x 10-1 cm/s ou 5,1 x 10-3 m/s), e para a amostra de silte
pedregulhoso, ensaiado à carga variável (1,5 x 10-5 cm/s ou 1,5 x 10-7 m/s), com valores
típicos apresentados na literatura (conforme Tabela 5), revela uma consistência notável. Os
resultados obtidos estão dentro da faixa de ordens de grandeza esperadas para esses tipos de
solos, concordando com as informações disponíveis na literatura especializada. A amostra de
areia grossa demonstrou uma permeabilidade significativamente maior em comparação com o
silte pedregulhoso, refletindo as distintas propriedades hidráulicas desses materiais e
enfatizando a importância de avaliar o comportamento permeável de cada tipo de solo em
contextos geotécnicos específicos.
Pode-se concluir ainda que a ordem de grandeza identificada para o coeficiente de
permeabilidade do silte pedregulhoso, um solo de granulometria fina, situando-se abaixo de
10-3 cm/s (10-5 m/s) valida a escolha do ensaio de permeabilidade à carga variável, conforme
preconizado pela norma NBR 14545 (2000). Essa confirmação reforça a importância da
seleção adequada dos ensaios em consonância com as características específicas dos
materiais analisados. Para solos cujo coeficiente de permeabilidade excede esse valor, como
no caso da areia grossa, a norma ABNT NBR 13292 (1995) orienta a realização do ensaio
correspondente, oferecendo assim uma abordagem prática e coerente na avaliação da
permeabilidade de diferentes tipos de solos.

6. REFERÊNCIAS

ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 13292: Solo — Determinação do


coeficiente de permeabilidade de solos granulares à carga constante. Rio de Janeiro, 1995.

ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 14545: Solo — Determinação do


coeficiente de permeabilidade de solos argilosos à carga variável. Rio de Janeiro, 2000.

Pinto, C. S. Curso Básico de Mecânica dos Solos. São Paulo: Oficina de Textos, 2006, 3 ed.

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