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INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO PRIVADO DO KILAMBA

Criado pelo Decreto Presidencial Nº173/17 de 3 de Agosto - Diário da República Nº 131

I Série.

Manual de Apoio de Língua Portuguesa

Prof. Mateus Halaiwa

Luanda, 2022
TEXTOS DE APOIO

GÉNERO NARRATIVO

CATEGORIAS DA NARRATIVA

Narrador, narratário, acção, personagens, Espaço


Tempo
1 Definições

Quanto à presença
Quanto à Ciência
2
Quanto à posição
Acção, personagens,
3 Caracterização

Texto n. 1
O Baile
O rapaz perguntou:
- Quer dançar?
- Não sei dançar – respondeu ela duramente. O rapaz tornou a sorrir e disse:
- É fácil, eu ensino-lhe.
Começaram a dançar. Lúcia tropeçava nos próprios passos. Tornou a dizer:
- Não sei dançar. _ E acrescentou: - É melhor pararmos.
Mas ele continuou a dançar, olhou-a, sorriu de novo e disse:
- Não faz mal. Eu gosto de dançar consigo mesmo que dance mal.
O rosto de Lúcia iluminou-se. Não era só o elogio daquele rapaz bonito que a alegrava. Era, posta nela, a
atenção de alguém que pertencia ao mundo do brilho e poder onde ela queria penetrar.
Deixou de tropeçar, começou a seguir a música, sorrir, inclinando a cabeça para o lado. Mas foi então que a
coisa mais temida aconteceu. Estavam agora a dançar no meio da sala, quando o sapato esquerdo escorregou do pé
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de Lúcia. Ela sentiu-o escorregar, mas, levada pelo movimento da dança, não conseguiu parar logo para o segurar.
Olhou e viu o sapato separado de si no meio da sala. Ia a dizer: “É meu”, quando uma rapariga começou a rir e
perguntou:
- O que é aquilo? Mas o que é aquilo?
Lúcia calou-se. Várias pessoas olharam. Riam. As palavras cruzavam-se no ar.
- Um sapato!
- Todo roto!
- De quem será?
- Não é de ninguém. É uma partida?
- Quem terá tido esta ideia?
- Talvez não seja partida. Talvez seja de alguém que o perdeu.
- Ninguém é capaz de vir para um baile com um sapato daqueles.
O sapato estava miserável. Com os movimentos do pé de Lúcia, a seda do forro tinha rebentado na
biqueira e no salto. Algumas pessoas não viam ou fingiam não ver, mas outras olhavam, comentavam.
Lúcia dançava muito direita em equilíbrio na ponta do pé descalço que o vestido comprido escondia.
Quando a música acabou e os pares abandonaram o espaço da dança, o sapato ficou sozinho no centro da sala,
esfarrapado e miserável sobre o chão polido.
Lúcia e o rapaz tinham-se sentado num sofá. Ela não sabia se ele tinha ou não compreendido que o sapato
era dela. Não ousava encará-lo.
A dona da casa chamou um criado e murmurou qualquer coisa.
O criado foi buscar as pinças que estavam penduradas ao lado do fogão e agarrou com elas o sapato e
levou-o. A música recomeçou a tocar.
O rapaz perguntou qualquer coisa à Lúcia, mas ela só respondeu:
- Tenho sede.
- Vou-lhe buscar uma bebida – disse ele. Levantou-se e saiu pela porta da esquerda.
- Compreendeu que o sapato era meu – pensou ela – e arranjou uma maneira de se ir embora.
Uma das raparigas que conhecera no princípio da noite veio sentar-se junto dela: olhou Lúcia na cara e
perguntou-lhe com ar trocista:
- De quem seria o sapato?
- Não sei – disse Lúcia.
- Eu sei – respondeu a rapariga.
E, rindo, afastou-se e dirigiu-se para um grupo de amigas.
- Tenho de sair daqui depressa, depressa – murmurou Lúcia. Levantou-se e saiu da sala.
Sophia de Mello B. Andresen, in Histórias da Terra e do Mar.

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Compreensão do texto

1. Que razão Lúcia não se identificou como dona do sapato?

2. Identifique os sucessivos estados de espírito revelados por ela, indicando os respectivos momentos.

3. Atente na frase: “Era, posta nela, a atenção de alguém que pertencia ao mundo do brilho e poder...”

a) A personagem pertencia a este mundo? Justifique.

4. Apresente os motivos que a levaram a abandonar a sala do baile.

5. Demonstre a gentileza do rapaz ao longo da narrativa.

6. Resuma o que aconteceu com Lúcia em, no máximo, quatro linhas.

Texto n. 2

A astúcia da velha
Era uma vez uma velha que vivia no campo com um netinho. Uma noite, acendeu o lume para fazer
a ceia e disse ao pequeno que fosse debaixo da cama buscar uma alcofinha que lá estava com ovos. O rapaz
foi, mas começou de lá a gritar, cheio de medo:
_Minha avó, venha cá ver! Estão aqui uns olhos a luzir. Venha cá, venha cá!
Ela foi ver e encontrou lá um homem com cara de ladrão. Não se deu por achada e disse:
_Ai, não te atormentes! É um pobrezinho que se recolheu na nossa casa! Venha cá, irmãozinho, deve
estar com muito frio. Venha aquecer-se ao meu lume e comeremos uns ovinhos.
O homem saiu de lá, agradecendo e dizendo que estava ali por causa do frio. Acrescentou que tinha
visto a porta aberta e por isso entrara. A velha dava-lhe toda a razão e foi-o levando para a cozinha.
Sentaram-se ao pé da chaminé e cearam todos três. Depois contou a velha:
- Meu irmãozinho, agora vou entretê-lo um bocado de tempo enquanto não adormecemos, contando-
lhe alguma coisa com respeito à minha família. Começando por meu pai, que era muito bom homem, mas
muito falto de paciência na doença: sofria com resignação, menos na doença. Qualquer coisa que tivesse, por
pequena que fosse, custava-nos imenso a aturar! Pois um dia apareceu-lhe um tumor, que chegou a termos de
ir à cidade consultar um médico. Não estando ainda o tumor capaz de ser operado, mandou-o lá voltar dois
dias depois. Como era muito impaciente, nós pedimos-lhe muito que não fizesse barulho. Bem! Daí a dois
dias voltámos lá com ele e o médico pegou na lanceta. Apenas lhe levantou a pele, começou a gritar: «Aqui-
d'el-rei! Aqui-d'el-rei!»
E a velha gritava com quanta força tinha.
O ladrão, aflito, dizia-lhe:
- Senhora, não grite tanto que podem ouvir os vizinhos!

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- Não há dúvida! Olhe, meu irmãozinho, já tenho contado esta história a tantos hóspedes que aqui
têm pousado que os vizinhos já se habituaram. Pois, como dizia, acomodámos meu pai e tornou o médico a
espetar a lanceta. Não imagina o senhor o que foi ali! Era uma gritaria que não se parava!
E a velha insistia com toda a força:
- Aqui-d'el-rei! Aqui-d'el-rei! Aqui-d'el-rei que me matam!
E o homem muito aflito:
- Não grite assim, tiazinha! Olhe os vizinhos!
- Isso, sim! Descanse, que não há novidade! Depois foi preciso espremer o tumor. Já se vê que não
podia ficar assim, e então é que foi o bom e o bonito!
E a velha berrava cada vez mais alto. Ainda ela não tinha acabado a história e já a vizinhança lhe
estava a bater à porta. E ela, muito descarada, foi abrir:
- Que é isto, vizinha, o que se passa?
- Ai, não é nada! Era eu que estava a contar uma história a este irmãozinho.
E, muito baixo, foi informando:
- Agarrem aquele homem, que é um ladrão. Estava escondido debaixo da minha cama!
Deitaram-lhe a mão e foi levado para a cadeia. E a velha livrou-se da morte e ao neto também, graças
à sua esperteza e coragem.
Viale Moutinho, Contos

Compreensão do texto

1. Por que a velha não se deu por achada quando viu o ladrão? Justifique

2. A velha conseguiu iludir o ladrão.

a. Que estratagema usou para mantê-lo em sua casa?

b. Porque é que assim o fez?

4. A dada altura, o homem começou a ficar preocupado. Teria ele razões para tal? Fundamente.

5. Resuma o que aconteceu com a velha.

Texto n. 3
A Revelação

O menino parou de mastigar. Ficou suspenso, a boca cheia de jinguba surripiada na panela que estava
sobre a fogueira. A voz da mãe repetiu o chamamento:
– Candimba, vem aqui.
O menino levantou-se, engolindo rapidamente a massa da jinguba e saliva. Aproximou-se em passo
lento, mãos nos bolsos dos calções, cabeça baixa. A mãe viu-me a roubar na panela e vai castigar-me? O semblante

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da mulher aquietou-se. Não tinha os olhos que fazia quando descobria uma falta. Era então para um recado, só
podia ser. E ele preferia estar descansado à sombra da mandioqueira, vigiando a mãe à espera de uma oportunidade
para encher os bolsos com a jinguba.
– Candimba, vai à loja do Sr. Ferreira. Compra sal. A mãe entregou-lhe uma caneca pequena e
algumas moedas que tirou do pano. O menino recebeu as moedas, enfiou-as nos bolsos. Com a caneca na mão,
perguntou aborrecido:
– Sal acabou, mãe?
– Se te mando é porque não há. Vai depressa e volta logo. Não te quero ver com os vadios de rua que
não trabalham.
– Posso tirar um bocadinho? Só para provar.
E o menino olhava gulosamente para a jinguba descascada, repousando num tabuleiro. Em seguida, a
mãe deitaria os bagos na panela de açúcar em calda, mexendo com a colher. Depois de deixar secar, dividiria em
pacotinhos de papel de seda que o miúdo venderia na cidade. Agora era a última ocasião de poder saborear a
jinguba. Por isso, os olhos luziram quando entendeu a resposta:
– Bom, tira uma mãozada, mas anda depressa. Candimba encheu os bolsos precipitadamente, saiu a
correr.
À entrada da loja, ouviu a voz irada de Sr. Ferreira. Discutia com Mariana, rapariga que casou no ano
passado com Chico da serração. Pôs a cabeça na porta, os olhos muito grandes e redondos, espiando. O branco do
balção não reparou nele. Estava vermelho, gesticulava, tudo acompanhado de muitos berros. Mariana chorava de
costas para a porta, tapando a boca com o antebraço. O menino ouviu-a a suplicar:
– Sr. Ferreira, meu marido var saber. Filho sai mulato. Chico perceberá logo que não é dele. Ele mata-
me.
– Quero lá saber! Que culpa tenho eu? Agora avia-te. Que provas tens que o filho é meu? Ainda não
nasceu! Como podes saber?
- Sei, sim, juro com Deus. Senti mesmo!
Miúdo Candimba esqueceu a jinguba na boca aberta. Os assustados olhos tudo perscrutando. Não
percebia bem a conversa, pois era muito pequeno para compreender imediatamente. Mas sentia algo de terrível nas
palavras trocadas.
– Ouve lá. Julgas que me levas assim? Como podes ter sentido? Como se eu fosse parvo… O filho é
do teu marido, ficaste com ele muito mais vezes do que comigo.
– Mas eu sei. Eu sei! Juro. Vai sair mulato.
– E depois? E se fui eu que o fiz? És casada com o teu homem, não tenho nada com isso.
O menino já percebera tudo. Fez-se mais pequenino, encostado à porta. A mão apertava nervosamente
a caneta de lata. Viu Mariana erguer decididamente a cabeça, passar os dedos pela barriga inchada, falar com raiva:
– Sr. Ferreira prometeu. Dou-te vestidos, vais mesmo à cidade. Tiro-te da sanzala, dou-te comida boa,
brincos e pulseira. Sr. Ferreira prometeu mesmo. O teu filho vai ser meu no papel, dou-lhe educação. Não vai ser
menino de sanzala.
– Então? Prometi? Alguém ouviu? Só tu mesmo. Vai dizer ao teu marido. Vê lá se ele acredita. Digo-
lhe que é mentira, que foste tu que me pediste. Vai à polícia, se eles acreditam em ti ou em mim.
Maria abateu-se novamente sobre o balção. Os soluços voltaram a sacudir-lhe o corpo. Miúdo
Candimba, perturbado, chegou-se mais para dentro da loja, embora a sua vontade fosse fugir como um mbambi.
Vou dizer ao meu marido. Ele mata-me, mas depois vem-lhe matar a si. O comerciante riu-se.
Desferiu uma palmada no balção para indicar que já se fartava da discussão. Falou com rancor: que venha! Tenho
uma espingarda à espera dele. Dou-lhe tantos tiros que fica como um Cristo!
Miúdo Candimba sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha ao ouvir a ameaça. E voltou-se assustado
quando, repentinamente, uma mão lhe pousou no ombro.
– Que fazes aqui na porta? Deixa-me entrar.
O miúdo sentiu os olhos do comerciante fixos nele. E Mariana disfarçando o choro. O menino desatou
a fugir.

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Dirigiu-se à casa para que concorriam as mulheres e as crianças. A casa de Mariana. Lá chegado,
percebeu imediatamente o que se passara, Mariana morrera. Matou-se. Uma facada mesmo no coração.
Miúdo Candimba sentiu um frio invandi-lo. Depois um calor quente. Era uma fogueira que nele se
instalara.
Pepetela, in Contos de Morte (texto com cortes)

Compreensão do texto

1. O que terá desencadeado toda a trama do texto?

2. Caracterize, com dois adjectivos, o estado anímico de Mariana perante a situação descrita no texto.

3. Apresente as razões por que Mariana se envolvera com Sr. Ferreira. Justifique com uma frase do texto.

4. Considere a fala de Sr. Ferreira: “Vai à polícia, se eles acreditam em ti ou em mim.”

a) Na sua opinião, de que forma a polícia resolveria esse diferendo?

5. Por que Mariana optou pelo suicídio?

Texto n. 4

Três tesouros perdidos


Eram quatro da tarde, o Sr. Xavier voltava à sua casa para jantar. O apetite que levava não o
fez reparar num cabriolet que estava parado à sua porta. Entrou, subiu a escada, penetra na sala e dá
com os olhos um homem que passeava a largos passos como agitado por uma interna aflição.
Cumprimentou-o polidamente; mas o homem lançou-se sobre ele e com uma voz alterada, diz-
lhe:
Senhor, eu sou Francisco, marido da senhora Dona Elvira.
- Estimo muito conhecê-lo, mas não tenho a honra de conhecer a senhora Dona Elvira.
- Não a conhece! Não a conhece! Quer juntar a zombaria à infâmia?
- Senhor!...
E o Sr. Xavier deu um passo para ele.
- Alto lá!
O Sr. Francisco, tirando do bolso uma pistola, continuou:
- Ou o senhor há de deixar esta corte, ou vai morrer como um cão!
- Mas, senhor, disse o Sr. Xavier, a quem a eloquência de Francisco tinha produzido um certo efeito.
Que motivo tem o senhor?
- Que motivo! É boa! Pois não é um motivo andar o senhor a fazer a corte à minha mulher?
- A corte à sua mulher! não compreendo!
- Não compreende! oh! não me faça perder a estribeira.
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- Creio que se engana...
- Enganar-me! É boa! Mas eu vi-o a sair duas vezes de minha casa.
- Sua casa!
- No Andaraí... por uma porta secreta. Vamos! ou...
- Mas, senhor, há-de ser outro, que se pareça comigo...
- Não; é o senhor mesmo. Como me escapar este ar de tolo que ressalta de toda a sua cara?
Vamos, ou deixar a cidade, ou morrer. Escolha!
Era um dilema. O Sr. Xavier compreendeu que estava metido entre um cavalo e uma pistola.
Pois toda a sua paixão era ir a Minas, escolheu o cavalo.
Surgiu, porém, uma objeção.
- Mas, senhor, disse ele, os meus recursos...
- Os seus recursos! Ah! Tudo previ. Descanse. Eu sou um marido previdente. Tirou da
algibeira da casaca uma linda carteira de couro da Rússia, diz-lhe:
- Aqui tem dois contos de réis para os gastos da viagem; vamos, parta! Parta imediatamente.
Para onde vai?
- Para Minas.
- Deus o leve a salvamento. Perdoo-lhe, mas não volte a esta corte. Boa viagem! Dizendo isto,
o Sr. Francisco desceu precipitadamente a escada, e entrou no cabriolet, que desapareceu numa
nuvem de poeira.
O Sr. Xavier ficou por alguns instantes pensativo. Não podia acreditar nos seus olhos e
ouvidos; pensava sonhar. Um engano trazia-lhe dois contos de réis, e a realização de um dos seus
mais caros sonhos. Jantou tranquilamente, e daí a uma hora partia para a terra de Gonzaga, deixando
em sua casa apenas um menino encarregado de instruir, pelo espaço de oito dias, aos seus amigos
sobre o seu destino.
No dia seguinte, pelas onze horas da manhã, voltava o Sr. Francisco para a sua casa, pois
tinha passado a noite fora. Entrou na sala, e indo deixar o chapéu sobre uma mesa, viu o seguinte
bilhete:
- “Meu caro esposo! Parto no paquete em companhia do teu amigo Pedro. Vou para a
Europa. Desculpa a má companhia, pois melhor não podia ser. Tua Élvira.”
Desesperado, fora de si, o Sr. Francisco lança-se a um jornal que perto estava: o paquete tinha
partido às 8 horas.
- Era Pedro que eu acreditava meu amigo. Ah! Maldição! Ao menos não percamos os dois
contos! Tornou a meter-se no cabriolet e dirigiu-se à casa do Sr. Xavier. Subiu, apareceu o menino
- Teu senhor?
- Partiu para Minas.
- O Sr. Francisco desmaiou.
Machado de Assis (adaptado)

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Compreensão do texto

1. O que terá desencadeado toda a trama da história?


2. No princípio, o Sr. Xavier mostrou delicadeza. Porém, esse comportamento alterou-se. Explique porquê?
3. Dos vários argumentos apresentados pelo Sr. Xavier, qual deles o beneficiava?
4. Qual era, na verdade, a causa desse benefício?
5. A reação do Sr. Francisco teve consequências para a sua vida. De que consequências se trata?
6. Classifique o narrador quanto à presença, justificando a sua resposta

Texto n. 5

Frei Simão
As notas de frei Simão nada dizem do lugar do seu nascimento nem do nome de seus pais. O que se
pôde saber dos seus princípios é que, tendo concluído os estudos preparatórios, não pôde seguir a carreira das
letras, como desejava, e foi obrigado a entrar como guarda-livros na casa comercial de seu pai.
Morava em casa de seu pai uma prima de Simão, órfã de pai e mãe, que haviam por morte deixado
ao pai de Simão o cuidado de a educarem e manterem. Quanto ao pai da prima órfã, tendo sido rico, perdera
tudo ao jogo e nos azares do comércio, ficando reduzido à última miséria.
A órfã chamava-se Helena; era bela, meiga e extremamente boa. Simão, que se educara com ela, e
juntamente vivia debaixo do mesmo teto, não resistiu às elevadas qualidades e à beleza de sua prima.
Amaram-se. Em seus sonhos de futuro contavam ambos o casamento, coisa que parece mais natural do
mundo para corações amantes.
Não tardou muito que os pais de Simão descobrissem o amor dos dois. Ora, é preciso dizer, apesar de
não haver declaração formal disto nos apontamentos do frade, é preciso dizer que os referidos pais eram de
um egoísmo descomunal. Davam de boa vontade o pão da subsistência a Helena; mas casar o filho com a
pobre órfã é que não podiam consentir. Tinham posto a mira numa herdeira rica, e dispunham de si para si
que o rapaz se casaria com ela.
Uma tarde, como estivesse o rapaz a adiantar a escrituração do livro mestre, o pai entrou no
escritório com ar grave e risonho ao mesmo tempo, e disse ao filho que largasse o trabalho e o ouvisse. O
rapaz obedeceu. O pai falou assim:
- Vais partir para a província. Preciso de mandar umas cartas ao meu correspondente Amaral, e como
sejam elas de grande importância, não quero confiá-las ao nosso desleixado correio. Queres ir no vapor ou
preferes o nosso brigue? Obrigado a responder-lhe, o velho comerciante não dera lugar que seu filho
apresentasse objeções. O rapaz enfiou, abaixou os olhos e respondeu:
- Vou onde meu pai quiser.
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O pai agradeceu mentalmente a submissão do filho, que lhe poupava o dinheiro da passagem no
vapor, e foi muito contente dar parte à mulher de que o rapaz não fizera objeção alguma.
Nessa noite, os dois amantes tiveram ocasião de encontrar-se a sós na sala de jantar. Simão contou a
Helena o que se passara. Choraram ambos algumas lágrimas furtivas, e ficaram na esperança de que a
viagem fosse de um mês, quando muito.
À mesa do chá, o pai de Simão conversou sobre a viagem do rapaz, que devia ser de poucos dias.
Isto reanimou as esperanças dos dois amantes. O resto da noite passou-se em conselhos da parte do velho ao
filho sobre a maneira de portar-se na casa do correspondente. Às dez horas, como de costume, todos se
recolheram aos aposentos.
Os dias passaram-se depressa. Finalmente raiou aquele em que devia partir o brigue. Helena saiu de
seu quarto com os olhos vermelhos de tanto chorar. Interrogada bruscamente pela tia, disse que era uma
inflamação adquirida pelo muito que lera na noite anterior. A tia prescreveu-lhe abstenção da leitura e
banhos de água de malvas.
Quanto ao tio, tendo chamado Simão, entregou-lhe uma carta para o correspondente, e abraçou-o. A
mala e um criado estavam prontos. A despedida foi triste. Os dois pais sempre choraram alguma coisa, a
rapariga muito.
Quanto a Simão, levava os olhos secos e ardentes. Era refratário às lágrimas, por isso mesmo padecia
mais.
O brigue partiu. Simão, enquanto pôde ver terra, não se retirou de cima; quando finalmente se
fecharam de todo as paredes do cárcere que anda, na frase pitoresca de Ribeyrolles, Simão desceu ao seu
camarote, triste e com o coração apertado. Havia como um pressentimento que lhe dizia interiormente ser
impossível tornar a ver sua prima. Parecia que ia para um degredo.
Chegando ao lugar do seu destino, Simão procurou o correspondente de seu pai e entregou-lhe a
carta. O Sr. Amaral leu a carta, fitou o rapaz e, depois de algum silêncio, disse-lhe, volvendo a carta:
- Bem, agora é preciso esperar que eu cumpra esta ordem de seu pai. Entretanto venha morar para a
minha casa.
- Quando poderei voltar? Perguntou Simão.
- Em poucos dias, salvo se as coisas se complicarem.
Machado de Assis, in Contos Fluminenses

Compreensão do texto

1. Quais os impedimentos que Simão teve na sua vida?

a) Qual deles lhe custou mais? Explique porquê?

2. Apresente as razões por que os pais de Simão impediam sua relação com Helena.

3. Como reagiu ele à decisão dos pais?

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4. Que expectativa tinha Simão em relação ao seu futuro com Helena? Transcreva a frase do texto que

reforça a sua resposta.

Texto n. 6

A Estrela

Um dia, à meia-noite, ele viu-a. Era a estrela mais gira do céu, muito viva, e a essa hora passava
mesmo por cima da torre. Como é que a não tinham roubado? Ele próprio, Pedro, que era um miúdo, se a
quisesse empalmar, era só deitar-lhe a mão. Talvez depois a pusesse no quarto, talvez a trouxesse ao peito. E
daí, se calhar, talvez a viesse a dar à mãe para enfeitar o cabelo. Devia-lhe ficar bem, no cabelo.

De modo que, nessa noite, não aguentou. Meteu-se na cama e quando calculou que o pai e a mãe já
dormiam, abriu a janela devagar e saltou para a rua. Com sete anos, ele estava treinado a subir às oliveiras
quando era o tempo dos ninhos. Assim que se viu na rua, desatou a correr até à torre, porque o medo vinha a
correr também atrás dele. A igreja ficava no cimo da aldeia e a aldeia ficava no cimo de um monte. Mas
conseguiu e agora estava ali. Olhou a estrela para ganhar coragem, ela brilhava, muito quieta. A torre era
muito alta e tinha uma porta para a rua. Pedro empurrou-a um pouco e viu que rangia pouco, mas o silêncio
era muito e parecia, por isso, que também a porta rangia muito. E teve medo. Reparou mesmo que estava a
suar, e não devia ser da corrida, porque este suor era frio. Meteu-se de lado e entrou. Havia um grande escuro
lá dentro, e cheirava lá a ratos, a cera, às coisas velhas que apodrecem na sombra. Como estava escuro, pôs-se
a andar às apalpadelas. Mas as pedras frias assustaram-no. Lembravam-lhe mortos ou coisas assim. Já com os
pés não se assustava tanto, porque o frio que entrava por aí era só frio da falta de botas. Até que pisou o
primeiro degrau e começou a subir. Cheirava mal que se fartava. Mas, à medida que ia subindo, vinha lá de
cima um fresco que aclarava o cheiro. À última volta da escada em caracol, olhou ao alto o céu negro, muito
liso. Via algumas estrelas, mas era tudo estrelas velhas e fora de mão. Até que chegou ao campanário e
respirou fundo. Agora tinha de subir por uma escadinha estreita que começava ao lado; e depois ainda por
uma outra de ferro, ao ar livre, e com o adro lá em baixo. Mas quando chegou à de ferro, não olhou. Deu foi
uma olhadela à estrela, que já se via muito bem. Todavia, quando a escada acabou, reparou que lhe não
chegava ainda com a mão. Tinha pois de subir o resto de gatas, dobrando e desdobrando as pernas como uma
rã. Mesmo no cimo da torre havia uma bola de pedra e enterrado na bola havia um ferro e ao cimo do ferro
estava um galo com os quatro pontos cardeais. Pedro segurou-se ao varão e viu que tinha ainda de subir até se
pôr mesmo em cima do galo. Subiu devagar, que aquilo tremia muito, e empoleirou-se por fim nos ferros
cruzados dos quatro ventos. Enroscando as pernas no varão, tinha agora os braços livres. E então ergueu a
mão devagar. Os ferros balançavam, mas ele nem olhava lá para baixo. Fez força ainda nas pernas, apoiou-se
na mão esquerda e com a outra, finalmente, despegou a estrela. Não estava muito pregada e saiu logo.
Entalou-a então no cordel das calças, porque não tinha bolsos, e começou a descer. A chatice era se lhe caía e
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se partia lá em baixo. Mas não a levando entalada, só se a levasse nos dentes, o que podia dar em resultado
parti-la à mesma. Porque precisava dos dentes para fazer força nos sítios mais difíceis. Em todo o caso, com
jeito, lá conseguiu. E assim que pôs pé em terra, largou para casa, mas não muito depressa. Apetecia-lhe
mesmo parar de vez em quando e olhar a estrela com uma atenção especial. Era formidável. Lembrava um
pirilampo, mas muito maior. Oh, muito maior. E de outro feitio, já se vê. A certa altura, voltou-se para trás e
olhou ao alto o sítio donde a despegara, como se para ver se realmente já lá não estava. E não.
Vergílio Ferreira, Contos

Compreensão do texto

1. O que pensava o protagonista fazer com a estrela?

2. No texto, verifica-se um paradoxo vivido pelo protagonista.

a. Identifique esse paradoxo.

b.Explique, por palavras suas, a causa de tal paradoxo

c. Face a toda a ocorrência do texto, escreva o adjectivo que melhor caracteriza psicologicamente o

protagonista.

3. O momento da ocorrência dificultou e facilitou a tarefa do protagonista. Fundamente.

4. O protagonista ponderou na hipótese de segurar a estrela com os dentes, mas desistiu. Porquê?

Texto n. 7
Noite de Natal
Dasdores sentia-se dividida entre a Missa do Galo e o presépio. Se fosse à igreja, o presépio não
ficaria armado antes de meia-noite e, se se dedicasse ao segundo, não veria o namorado. É difícil ver
namorado na rua, pois moça não deve sair de casa, salvo para rezar ou visitar parentes. Festas são raras. O
cinema ainda não foi inventado, ou, se o foi, não chegou a esta nossa cidade, que é antes uma fazenda
crescida.
Dasdores e suas numerosas obrigações: cuidar dos irmãos, velar pelos doces de calda, pelas
conservas, manejar agulha e bilro, escrever as cartas de todos. Os pais exigem-lhe o máximo, não porque a
casa seja pobre, mas porque o primeiro mandamento da educação feminina é: trabalharás dia e noite. Se não
trabalhar sempre, se não ocupar todos os minutos, quem sabe de que será capaz a mulher? Quem pode vigiar
sonhos de moça? Eles são confusos e perigosos. Portanto, é impedir que se formem. Dasdores nunca tem
tempo para nada. O seu nome, alegre à força de repetido, ressoa pela casa toda. “Dasdores, as dálias já foram

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regadas hoje?” “Viste Dasdores, quem deixou o diabo desse gato furtar a carne?”. Dasdores multiplica-se,
corre, delibera e providencia mil coisas.
Dasdores sente-se livre em meio às tarefas e até mesmo extrai delas algum prazer. (Dir-se-ia que as
mulheres foram feitas para o trabalho. Alguma coisa mais do que resignação sustenta as donas-de-casa.) Ela
sabe combinar o movimento dos braços com a actividade interior ‒ é uma conspiradora ‒ e sempre acha
folga para pensar em Abelardo. Esta véspera de Natal, porém, veio encontrá-la completamente desprevenida.
O presépio está por armar, a noite caminha, lenta como costuma fazê-lo no interior, mas Dasdores é íntima
do relógio grande da sala de jantar, que não perdoa. Sucede que ninguém mais, salvo esta moça, pode dispor
o presépio, arte comunicada por uma tia já morta. E só Dasdores conhece o lugar de cada peça, determinado
há quase dois mil anos, porque cada bicho, cada musgo tem seu papel no nascimento do Menino.
As caixas estão depositadas no chão ou sobre a mesa e desembrulhá-las é a primeira satisfação entre
as que estão infusas na prática ritual da armação do presépio. Todos os irmãos querem colaborar, mas antes
atrapalham, e Dasdores prefere ver-se morta a ceder-lhes a responsabilidade plena da direção. Jamais lhes
será dado tocar, por exemplo, no Menino Jesus, na Virgem e em São José. Nos pastores, sim, e nas grutas
subsidiárias. O melhor seria que não amolassem e Dasdores passaria o dia inteiro a compor sozinha a
paisagem de água e pedras, relva, cães e pinheiros, que há-de circundar a manjedoura.
Alguém bate palmas na escada. Amigas que vêm combinar a hora de ir para a igreja. Entram e
acham o presépio desarranjado, na sala em desordem. Esta visita rouba mais tempo. Quando alguém dispõe
apenas de uns poucos minutos para fazer algo de muito importante e que exige não somente largo espaço de
tempo, mas também uma calma dominadora ‒ algo de muito importante e que não pode absolutamente ser
adiado – se esse alguém é nervoso, sua vontade se concentra, numa excitação aguda e o trabalho começa a
surgir, perfeito, de circunstâncias adversas. Dasdores não pertence a essa raça torturada e criadora; figura no
ramo também delicado, mas impotente, dos fantasistas. Vão-se as amigas, para voltar duas horas depois, e
Dasdores, interrogando o relógio, nele vê apenas o rosto de Abelardo, como também percebe esse rosto de
bigode e a cabeleira lustrosa e os olhos acesos.
A mão continua a tocar maquinalmente nas figuras do presépio dispondo-as onde convém. Nada fará
com que erre; do passado a tia repete sua lição profunda. Entretanto, o prazer de distribuir as figuras, de fixar
a estrela, de espalhar no lago de vidro os patinhos de celuloide, está alterado, ou subtrai-se. Dasdores não o
saboreia por inteiro. Ou nele se insinuou o prazer da missa? Ou o medo de que o primeiro, prolongando-se,
viesse a impedir o segundo? Ou um sentimento de culpa, ao misturar o sagrado ao profano, dando, talvez,
preferência a este último, pois no fundo da caminha de palha suas mãos acariciavam o Menino, mas o que a
pele queria sentir sentia, Deus me perdoe ‒ era um calor humano, já sabeis de quem.
Aqui desejaria, porque o mundo é cruel e as histórias também costumam sê-lo, acelerar o ritmo da
narrativa, prover Dasdores com os muitos braços de que ela carece para cumprir com sua obrigação, vestir-se
violentamente, sair com as amigas ‒ depressa, depressa, ir correndo ladeira acima, encontrar a igreja vazia, o
adro já quase deserto, e nenhum Abelardo. Mas seria preciso atribuir-lhe, não braços e pernas suplementares,
e sim outra natureza, diferente da que lhe coube, e é pura placidez. Correi, sôfregos, correi ladeira acima e
chegai sempre ou muito tarde ou muito cedo, mas continuai a correr, a matar-vos, sem perspectiva de paz ou

12
conciliação. Não assim os serenos, aqueles que, mesmo sensuais, se policiam. O dono desta noite, depois do
Menino, é o relógio, e este vai mastigando seus minutos, seus cinco minutos, seus quinze minutos. Se nos
esquecermos dele, talvez pule meia hora, como um prestidigitador furta um ovo, mas, se nos pusermos a
contemplá-lo, os números gelam, o ponteiro imobiliza-se, a vida parou rigorosamente. Saber que a vida
parou seria reconfortante para Dasdores, que assim lograria folga para localizar condignamente os três reis
na estrada, levantar os muros de Belém. Começa a fazê-lo, e o tempo dispara de novo (…) Pronto, este ano
não haverá Natal. Nem namorado. E a noite fundir-se-á num largo pranto sobre o travesseiro.
Mas Dasdores continua, calma e preocupada, cismarenta e repartida, juntando na imaginação os dois
deuses, colocando os pastores na posição devida e peculiar à adoração, decifrando os olhos de Abelardo, as
mãos de Abelardo, o mistério prestigioso do ser de Abelardo, a auréola que os caminhantes descobriram em
torno dos cabelos macios de Abelardo, a pele morena de Jesus, e aquele cigarro ‒ quem botou! ‒ ardendo na
areia do presépio, e que Abelardo fumava na outra rua.

Carlos Drummond de Andrade (Adaptado)

Compreensão do texto

1. Resuma o texto, em no máximo, seis linhas


2. Dasdores vivia um dilema. Qual?
3. Explique, por palavras suas, o mandamento a que Dasdores estava submetido.
4. Refira as vantagens e desvantagem do referido provérbio para Dasdores.
5. “… ao misturar o sagrado ao prafano…” Explicite o antogonismo vivido por Dasdores.

Texto n. 8
Igualdade de direito

O rancor de Lucrécia em relação a mim acumula-se no espírito dela, a cada ano, como água
lamacenta numa represa abandonada. Um dia o peso da lama destruirá a barragem. Não há muito que eu
possa fazer. Percebi, faz tempo, que todos os meus gestos lhe desagradam, sejam eles de aproximação ou de
confronto. Quando saí de casa, uns bons anos antes do divórcio, Karinguiri era muito pequena. Nos primeiros
quinze meses, Lucrécia não me deixou ver a menina. Mudou-se com ela para casa dos pais. Recusava-se a
atender os meus telefonemas e deu instruções aos guardas para me manterem à distância. Um deles chegou a
ameaçar-me com a arma. Alexandre Pitta-Gróz, que é advogado de formação, embora nunca tenha exercido,
fez-me ver a inutilidade de avançar com um processo em tribunal, reivindicando os meus de direitos de pai:

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Este país está dividido entre aqueles eu podem reivindicar direitos, e os outros, os que não têm
direitos nenhuns. A tua mulher está no primeiro grupo. Tu até já estiveste no grupo dela, enquanto vocês
eram casados, depois voltaste ao nosso. Habitua-te a isso.
Fui-me habituando. Quinze meses após ter saído de casa, Lucrécia ligou-me. Disse-me que poderia ir
ao apartamento de uma tia dela, nessa tarde, para ver a menina. Fui. Karinguiri completara há pouco quatro
anos. Segurei-a ao colo. Perguntei-lhe:
- Sabes quem sou eu?
A menina sorriu feliz:
- És o meu papá.
Regressei a casa devastado. A partir desse dia passei a visitar a menina, duas a três vezes por mês.
Comecei a escrever contos que líamos juntos. Brincávamos com bonecas. Fazíamos desenhos, estendidos no
chão, enquanto ela me falava sobre a melhor amiga, uma menina muito loira, filha de um empresário francês,
amigo de Homero Dias da Cruz. Eu chegava a casa, à noite, com os joelhos doridos, o esqueleto
desconjuntado, como se tivesse passado duas horas a malhar num ginásio.
No ano seguinte, Lucrécia permitiu que ficasse com Karinguiri durante uma semana, nas férias da
Páscoa. Nessa época ainda vivia no apartamento de Armando Carlos. Lembro-me do olhar espantado da
menina, ao entrar:
- Onde estão as empregadas?
- Não temos empregadas.
- Quem vai cuidar de mim?
- Eu cuidarei de ti. Sou o teu pai. A minha função é cuidar de ti.
Nem sempre foi fácil. A maior dificuldade era penteá-la. Karinguiri usou durante muitos anos uma
juba espessa, que reverberava ao sol, como uma fresca labareda de cobre. Podiam fazer-se almofadas com os
caracóis dela.
Um amigo do meu pai, Pedro da Mata, administrador dos Caminhos-de-ferro, vivia na Restinga do
Lobito com a esposa e nove filhos. Na época colonial costumávamos passar as férias de março em casa deles.
Após a independência, a família Mata foi para Portugal. O filho mais novo, Mauro da Mata, permaneceu no
Lobito. Passei a visitá-lo com frequência, depois que o meu pai voltou para Benguela. Ficámos muito amigos.
José Eduardo Agualusa, in A Sociedade os Sonhadores
Involuntários.

Compreensão do texto

1. O que terá provocado ruptura entre Lucrécia e o narrador?

2. Que consequências advieram dessa ruptura?

3. A dada altura, Lucrécia foi benevolente para com o narrador. O que terá contribuído para isso?

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4. O narrador não estava satisfeito com a sua condição e queria interpor recurso. Terá ele conseguido levar a

cabo essa interposição?

5. Caracterize o protagonista física e psicológica e socialmente.

Texto n. 9
O confronto de áreas
As áreas da educação, da política e do futebol confrontam-se, sempre, com a análise dos processos e
dos resultados da parte de leigos e de especialistas. Muitas vezes acontece que os analistas e os decisores
tomam partido por uma perspectiva de análise que valoriza os resultados em detrimento dos processos
devido à predominância da mentalidade pragmática. Segundo este pensamento, o critério da verdade é a
utilidade prática das técnicas educativas, das medidas políticas ou das tácticas de jogo.
Num mundo crescentemente tecnocrático, com parâmetros econométricos que submergem os outros
critérios de avaliação, não admira a importância excessiva que é dada aos resultados educativos, políticos e
futebolísticos. Nas leituras apressadas, desta Era da Globalização, sempre que os resultados são frustrantes
abrem-se crises. No entanto, como é sabido, a verdadeira crise actual reside no esquecimento de valores
morais que devem reger as condutas humanas.
Na verdade, tem de se encontrar um meio-termo, dificilmente quantificável, de análise que pondere
os processos e os resultados, pois irei dar dois exemplos relativos à desvalorização deste princípio basilar.
Nem sempre é fácil atingir em educação este meio-termo, daí que o Professor Nuno Crato tenha andado a
criticar, aquilo que o Professor Marçal Grilo chamou de “eduquês”, as modernas pedagogias românticas de
darem demasiado destaque aos processos educativos construtivos baseados nos sujeitos das aprendizagens.
Com efeito, só através de uma dose de Humanismo e de Pragmatismo se pode alcançar este meio-termo nas
práticas pedagógicas, porque nos devemos recordar que a pedagogia exige arte, ciência e técnica. Se
centramos a pedagogia na ciência visamos, mormente, os resultados de aprendizagem, mas se centramos a
pedagogia na arte visamos, sobretudo, os processos de aprendizagem. De forma que, o grande desafio que se
abre à Educação Internacional, à revelia desta Era Tecnocrática, é a de conseguir um equilíbrio entre os
processos e os resultados educativos.
A hegemonia da corrente pragmática nesta era da Globalização tem favorecido o ataque especulativo
aos países criativos de matriz Latina, ou de influência católica, em 2010-2011 (Grécia, Irlanda, Portugal,
Espanha, Itália e Bélgica). De facto, mais uma vez, é a pressão dos resultados e a depreciação da capacidade
criativa destes povos e da sua rica herança cultural que está em questão. Ora o destino da moeda única
Europeia (o Euro), e da própria União Europeia, não pode depender da adopção de um padrão cultural
comum que garanta a concretização de resultados financeiros, porque a riqueza da Europa é, precisamente, a
sua diversidade de costumes, de tradições e de culturas. Este é, pois, o desafio incontornável que se abre à
Europa neste momento de crise financeira.

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Um bom exemplo desta dicotomia ideológica foi o Campeonato da Europa 2004, realizado em
Portugal, em que a selecção portuguesa dirigida por um brasileiro, Luiz Felipe Scolari, foi vencida na Final
pela selecção grega dirigida por um alemão, Otto Rehhagel, que conquistou o título de selecção campeã
Europeia de Futebol nesse ano. Enfrentaram-se dois estilos de futebol: o grego, germanizado, que adoptou
um estilo pragmático à procura de resultados e o português que adoptou um estilo artístico, baseado na
“posse de bola”, que buscou os processos que encantaram milhões de espectadores em todo o mundo, mas
que claudicou frente ao Hércules grego possuidor de um estilo de jogo “sem arte, mas com engenho”.
O Futebol Clube de Barcelona, na Europa em 2010-2011, é o modelo de futebol síntese que
conseguiu conciliar os resultados desportivos com os processos futebolísticos, que deram um grandioso
espectáculo ao mundo, comandados pelo catalão Josep Guardiola. Este edificante exemplo deve servir de
inspiração, na Educação e na Política, para que se pense, concomitantemente, nos processos e nos resultados,
no sentido de se superarem estes estrangulamentos da crise destes sectores da vida colectiva global, que mais
não são do que um reflexo da crise de valores que atravessa a História da Humanidade no início do século
XXI. Em suma, o Futebol Clube de Barcelona por se ter alavancado nos três pilares interdependentes (a arte,
a ciência e a técnica) proporcionou ao mundo um futebol magistral que obteve resultados estratosféricos com
processos artísticos moldados na consabida criatividade catalã.
Nuno Sotto Mayor
Ferrão

Compreensão do texto

1. A crónica reflecte sobre uma temática actual e pertinente.

a) O que motivou o cronista a essa reflexão?

2. Por que ele chama atenção da não valorização dos processos em detrimento dos resultados?

3. Essa prática é muito recorrente no mundo actual. Explique porquê.

4. Que consequências advêm da referida prática?

5. Para o cronista, em que deve basear-se o pensamento pragmático?

Texto n. 10

Bentinho
Ia a entrar na sala de visitas, quando ouvi proferir o meu nome e escondi-me atrás da porta. A casa
era a da rua de Matacavalos, o mês novembro, o ano é que é um tanto remoto, mas eu não hei-de trocar as
datas à minha vida só para agradar às pessoas que não amam histórias velhas; o ano era de 1857.
- D. Glória, a senhora persiste na idéia de meter o nosso Bentinho no seminário? É mais que tempo, e
já agora pode haver uma dificuldade.
- Que dificuldade?
16
- Uma grande dificuldade.
Minha mãe quis saber o que era. José Dias, depois de alguns instantes de concentração, veio ver se
havia alguém no corredor; não deu por mim, voltou e, abafando a voz, disse que a dificuldade estava na casa
ao pé, a gente do Pádua.
- A gente do Pádua?
- Há algum tempo estou para lhe dizer isto, mas não me atrevia. Não me parece bonito que o nosso
Bentinho ande metido nos cantos com a filha do Tartaruga, e esta é a dificuldade, porque se eles pegam de
namoro, a senhora terá muito que lutar para os separar.
- Não acho. Metidos nos cantos?
- É um modo de falar. Em segredinhos, sempre juntos. Bentinho quase não sai de lá. A pequena é
uma desmiolada; o pai faz que não vê; tomara ele que as coisas corressem de maneira que… Compreendo o
seu gesto; a senhora não crê em tais cálculos, parece-lhe que todos têm a alma cândida…
- Mas, Sr. José Dias, tenho visto os pequenos a brincar, e nunca vi nada que faça desconfiar. Basta a
idade; Bentinho mal tem quinze anos. Capitu fez quatorze à semana passada; são dois criançolas. Não se
esqueça de que foram criados juntos, desde aquela grande enchente, há dez anos, em que a família Pádua
perdeu tanta coisa; daí vieram as nossas relações. Pois eu hei de crer? … Mano Cosme, você que acha?
Tio Cosme respondeu com um Ora! que, traduzido em vulgar, queria dizer: São imaginações do José
Dias; os pequenos divertem-se, eu divirto-me; onde está o gamão?
- Sim, creio que o senhor está enganado.
- Pode ser, minha senhora. Oxalá tenham razão; mas creia que não falei senão depois de muito
examinar…
- Em todo caso, vai sendo tempo - interrompeu minha mãe- vou tratar de metê-lo no seminário
quanto antes.
- Bem, uma vez que não perdeu a idéia de o fazer padre, tem-se ganho o principal. Bentinho há de
satisfazer os desejos de sua mãe. E depois a igreja brasileira tem altos destinos. Não esqueçamos que um
bispo presidiu a Constituinte, e que o padre Feijó governou o Império…
- Governou como a cara dele! atalhou tio Cosme, cedendo a antigos rancores políticos.
- Perdão, doutor, não estou a defender ninguém, estou a citar. O que eu quero é dizer que o clero
ainda tem grande papel no Brasil.
- Você o que quer é um capote; ande, vá buscar o gamão. Quanto ao pequeno, se tem de ser padre,
realmente é melhor que não comece a dizer missa atrás das portas. Mas, olhe cá, mana Glória, há mesmo
necessidade de fazê-lo padre?
- É promessa, há de cumprir-se.
- Sei que você fez promessa… mas uma promessa assim… não sei… Creio que, bem pensado…
Você que acha, prima Justina?
- Eu?

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- Verdade é que cada um sabe melhor de si, continuou tio Cosme; Deus é que sabe de todos.
Contudo, uma promessa de tantos anos… Mas, que é isso, mana Glória? Está chorando? Ora esta! Pois isto é
coisa de lágrimas?
Minha mãe assoou-se sem responder. Prima Justina creio que se levantou e foi ter com ela. Seguiu-se
um alto silêncio, durante o qual estive a pique de entrar na sala, mas outra força maior, outra emoção… Não
pude ouvir as palavras que tio Cosme entrou a dizer. Prima Justina exortava: Prima Glória! Prima Glória!
José Dias desculpava-se: Se soubesse, não teria falado, mas falei pela veneração, pela estima, pelo afeto, para
cumprir um dever amargo, um dever amaríssimo.
Machado de Assis, in Dom Casmurro

Compreensão do texto

1. Que expectativa/intenção tinha D. Glória para com o filho?

2. O texto faz referência a uma dificuldade. De que se trata?

3. A advertência de José Dias terá influenciado na decisão de D. Glória? Explique porquê?

4. A família partilha da opinião de D. Glória? Justifique a sua resposta.

5. Clarifique o sentido da frase “(…) parece-lhe que todos têm a alma cândida.”

6. Classifique o narrador quanto à presença, justificando a sua resposta.

18
FUNCIONAMENTO
DA LÍNGUA

 Regras de acentuação gráfica

1. O que é a sílaba?
A sílaba é um som ou conjunto de sons de uma palavra cujo núcleo é formado por uma
vogal ou um ditongo e que se pronuncia numa só emissão de voz.

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De realçar que as consoantes, por si só, nunca constituem sílabas, necessitando, para tal, de
estarem combinadas com uma ou mais vogais.

2. Classificação de sílabas
Sílaba tónica é a sílaba que pronunciamos com maior intensidade de voz. Esta sílaba pode
ou não estar acentuada graficamente.
Ex.: Caneca, tónico, amor, tímido, papel, universidade.
Quando se tem dificuldade em identificar a sílaba tónica, deve experimentar-se chamar a
palavra como se fosse um nome, como no exemplos abaixo:
Ex.: Caneeeeeeeeca, tóooooooonico, amooooooor, etc.

Sílaba átona é a sílaba que pronunciamos com menor intensidade de voz. Esta sílaba não
tem acento gráfico. Ex.: Caneca, tónico, amor, tímido, universidade, etc.

3. Classificação das palavras quanto à sílaba tónica


Quanto à sílaba tónica, as palavras podem ser classificadas em:
 Agudas ou oxítonas são aquelas em que a sílaba tónica recai na última sílaba. Ex.:
Funil, café, parabéns, principal, etc.

 Graves ou paroxítonas são aquelas em que a sílaba tónica recai na penúltima sílaba.
Ex.: Barro, poderoso, lápis, universidade, Mártir, etc.

 Esdrúxulas ou proparoxítonas são aquelas em que a sílaba tónica recai na


antepenúltima sílaba. Ex.: Matemática, Física, lógico, tónico, árvore, etc.

4. Acentos gráficos
Os acentos gráficos são sinais diacríticos que indicam, na escrita, a pronúncia de uma vogal
ou sílaba tónica de uma palavra. Podem ser:
 Acento agudo (´) utiliza-se para indicar a vogal aberta da sílaba tónica principal a, e
ou o abertos, i ou u.
Ex.: Maracujá, céu, pó.

 Acento grave (`) utiliza-se para marcar a contracção da preposição a com o artigo
definido a ou com pronome demonstrativo começado por a.
Ex.: à (a + a), àquele (a +aquele), àquela (a+ aquela).
20
 Acento circunflexo utiliza-se para assinalar a vogal tónica oral ou nasal, se esta for
a, e ou o. Marca, portanto, uma vogal fechada.
Ex.: Avô, câmara, vê, etc.

5. Regras de acentuação gráfica


 Acentuam-se as palavras aguadas ou oxítonas:
 Terminadas em a, e e o seguidas ou não de s.
Ex.: Haverá, até, pó.
 Terminadas em em, ens, excepto as palavras monossilábicas:
Ex.: Armazéns, ninguém, parabéns, reféns, etc.
Excepto: Bem, cem, sem, nem, etc.
 Terminadas em el ou ol.
Ex.: Papel papéis, anzol anzóis.
 Terminadas em oi e eu.
Ex.: Herói, destrói, chapéu, céu, etc.

Obs.: As palavras agudas terminadas em i e u não são graficamente acentuadas.


Ex.: Caju, peru, Maqui, caqui, morri, Juju, Ju, etc.
Excepto: Baú, caí, país, saí, etc.

 Acentuam-se as palavras graves ou paroxítonas:


 Terminadas em vogais i e u, seguidas ou não de s.
Ex.: Táxi, bónus, vénus, etc.
 Terminadas em r, n, x, l, ps.
Ex.: Carácter, abdómen, tórax, adorável, bíceps, etc.
 Terminadas por um ditongo crescente io, ia, uo, ie.
Ex.: Contínuo, sumário, espécie, etc.
 Terminadas em ão (s), ã(s), um (-uns).
Ex.: Álbum, órfã, órgão, etc.
 Acentuam-se ainda a vogal tónica dos hiatos, seguidas ou não de s.
Ex.: Viúva, saída, conteúdo, saúde, etc.

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 Todas as palavras esdrúxulas são graficamente acentuadas, independentemente da
terminação. Ex.: Esdrúxulo, típico, inválido, megalómano, económico, etc.

Exercícios
1. Coloque, na respectiva coluna, as palavras abaixo, de acordo com a sua classificação quanto
ao acento tónico. Sublinhe a sílaba tónica:

Pá, mandioca, passageiro, canela, Cátia, tónico, lençol, petróleo, somente, até, cafeína,
avião, especialidade, pastel, paciente, boémio, trimestre, fotógrafo, cabidela, factor,
esdrúxulo, maracujá, emblema, híbrido, amor, pacífico, universidade, computador, sala,
exame.
Palavras agudas ou oxítonas Palavras graves ou paroxítonas Palavras esdrúxulas ou
proparoxítonas

2. Acentue as palavras que se seguem e coloque-as nos seus respectivos critérios de correcção:

Passaro, pe, parabens, sabado, orgao, propedeutico, polen, ananas, musical, fregues, paraiso,
destroi, ceu, Cesar, entendi, bisavo, taxi, mas, musica, abdomen, creem, rapido, metrico,
solido, martir, ferias.

22
Palavras agudas ou oxítonas Palavras graves ou paroxítonas Palavras esdrúxulas ou
proparoxítonas

 Relações semânticas entre as palavras


São relações que se estabelecem entre as palavras. Essas relações podem ser de
sinonímia, antonímia, homonímia, homofonia, homografia, paronímia, hiperonímia, hiponímia,
holonímia e meronímia.

1. Sinonímia (palavras sinónimas)


É a relação de equivalência semântica entre duas ou mais palavras, ou seja, palavras que têm
significados semelhantes.
Ex.: Belo / lindo / formoso; Feliz / alegre, etc.

2. Antonímia (palavras antónimas)


É a relação estabelecida entre duas ou mais palavras que apresentam significados diferentes,
contrários.
Ex.: Nascer / morrer; bonito / feio; alto / baixo, etc.

3. Homonímia (palavras homónimas)

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É a relação de palavras que partilham a mesma grafia e pronúncia, mas possuem
significados diferentes.
Ex.: O rio fica distante da cidade. Eu brinco com os meus alunos
Eu rio muito quando estou alegre. O brinco da Maria é lindo.

4. Homofonia (palavras homófonas)


É a relação de palavras que têm o mesmo som, mas grafia e significados diferentes
Ex.: Estou sem dinheiro. A Maria coze os alimentos.
O táxi é cem kwanzas. O alfaiate cose a roupa.

5. Homografia (palavras homógrafas)


É a relação de palavras que partilham a mesma grafia, mas têm pronúncia (som) e
significados diferentes.
Ex.: A fábrica avariou. A sede do BAI é no Gika.
O José fabrica pães. Eu tenho muita sede.
6. Paronímia (palavras parónimas)
É a relação de palavras que têm a grafia e a pronúncia semelhante, mas têm significados
distintos.
Ex.: A polícia está preocupada com o tráfico de drogas. Comprei uma nova enxada na loja.
Em Luanda, o tráfego é intenso. A cabeça da Maria está
inchada.

7. Hiperonímia (palavras hiperónimas)


É a relação hierárquica entre as palavras, que parte do sentido mais geral para o específico.
Ex.: Peixe, animal, lacticínios, etc.

8. Hiponímia (palavras hipónimas)


É a relação hierárquica entre as palavras, que parte do sentido específico para o geral.
Ex.: Cão, gato, insecto, carapau, etc.

9. Holonímia (palavras holónimas)


É a relação entre as palavras marcada pela referência semântica do todo face à parte.
Ex.: Mão, carro, casa, etc.

10. Meronímia (palavras merónimas)


É a relação entre as palavras marcada pela referência à parte ou componente de um todo.
Ex.: Dedo, unha, quarto, motor, etc.

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Exercícios
1. Os hiperónimos de gato, rosa e amor são, respectivamente:
a) Desporto – órgão - sentimento.
b) insetos – mamíferos - veículos.
c) felino – flor - sentimento.
d) felino – sentimento - esporte.
e) felino – sentimento - órgão.

2. Indique o item em que o antónimo da palavra ou expressão em destaque está correcto.


a) duradouro sucesso – efêmero
b) fama em ascendência – excelsa
c) elegante região – carente
d) sala lotada – desabitada

3. A palavra tráfico não dever ser confundida com tráfego, seu parónimo. Em que item a seguir o
par de vocábulos é exemplo de homonímia e não de paronímia?
a) estrato / extrato
b) flagrante / fragrante
c) eminente / iminente
d) inflação / infração
e) cavaleiro / cavalheiro

 Pronominalização
Pronominalizar é substituir o complemento directo ou indirecto pelo respectivo pronome
pessoal de complemento correspondente.

Assim, no âmbito da pronominalização, temos o complemento directo e o indirecto.

1. Complemento directo
O Complemento directo designa a entidade sobre a qual recai a acção enunciada pelo verbo
e, quando representado por um pronome pessoal, corresponde-lhe os pronomes o, a, os, as.
Para se identificar esse complemento, faz-se as seguintes perguntas:
O quê?: para coisas;
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Quem?: para pessoas.
Vejamos os exemplos:
A Maria comprou uma flor. A Maria Comprou-a. Comprou o quê?

O pai levou os filhos à escola. O pai levou-os à escola. Levou quem?


Vi o João/ a Maria ontem. Vi-o/a ontem. Vi quem?

Quanto ainda ao complemento directo, se o verbo terminar em r, s ou z, o pronome toma as


formas lo, la, los, las.
Exemplos:
Vou comprar um anel. Vou comprá-lo.
Devolvemos as fichas na biblioteca. Devolvemo-las na biblioteca.
Fiz os trabalhos ontem. Fi-los ontem.

Se o verbo terminar em ditongo nasal, isto é, am, em, ão, õe, o pronome toma as formas no,
na, nos, nas.
Exemplos:
Os meninos falaram a verdade. Os meninos falaram-na.
Levem os meninos para casa. Levem-nos para casa.
Os professores dão bem as aulas. Os professores dão-nas bem.
Põe a loiça no lugar. Põe-na no lugar.

2. Complemento indirecto
Complemento indireto designa a entidade sobre a qual recai, indirectamente, a acção do
sujeito e quando representado por um pronome pessoal, corresponde-lhe o pronome lhe.
Para se identificar esse complemento, faz-se a seguinte pergunta: A quem?
Exemplos:
O Mateus telefonou à mãe. O Mateus telefonou-lhe. (Telefonou a quem?)

Os filhos obedecem aos pais. Os filhos obedecem-lhes. (Obedecem a quem?)

3. Pronominalização de dois complementos


Pode ocorrer a pronominalização dos dois complementos, isto é, directo e indirecto.
Exemplos:
O João ofereceu uma flor à Maria.

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O João ofereceu- a à Maria. Aqui se pronominalizou apenas o c. directo
O João ofereceu- lhe uma flor. Aqui se pronominalizou apenas o c. indirecto
O João ofereceu-lha. Aqui a pronominalização é dos dois complementos.

Obs.: a = a flor lhe = a Maria juntando os dois dá lha (lhe+a)

Exercícios

Pronominalize os complementos das frases:


a) Alguém viu as minhas calças de ganga preferidas?
b) Conheces os novos computadores?
c) Disse-te que dei os brinquedos ao Rodrigo, ontem.
d) É preciso limpar estas chávenas.
e) Ele resolve sempre os trabalhos de casa
f) Eles poriam a chave no local certo.
g) Embora a avó explicasse tudo ao neto...
h) Queres estes desenhos para ti?
i) Essa recompensa será dada aos atletas, brevemente
j) Eu não provei o bolo.
k) Eu pus a pasta na mesa.
l) Ficaria eternamente grata a ti.
m) Hoje, não dirigiste a palavra à minha pessoa.
n) Já viste os ursos no Jardim Zoológico?
o) Nós comprámos aquele carro.
p) O Luís emprestou as canetas ao seu colega.
q) Os notários verificaram a escritura.
r) Tu comerias pão.
s) Tens os livros aí contigo?
t) Se um dia a civilização ganhar essa paragem longínqua...
u) Eu já lhe fizera essa promessa.
v) João, faz os exercícios sozinho.
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 Pontuação
Os sinais de pontuação servem para representar aspectos da entoação, tipos de frase,
delimitar elementos da frase e organizar o discurso e permite compreender melhor e tornar mais
claro e expressivo o texto escrito.

A vírgula
É um sinal de pontuação que exerce três funções básicas: marcar as pausas e as inflexões da
voz na leitura, enfatizar e/ou separar expressões e orações e impedir qualquer ambiguidade.
Ex.: Vou precisar de farinha, ovos, leite e açúcar.
Desta maneira, não posso mais acreditar em ti.

Casos do uso da vírgula

 Para isolar vocativo:


Ex.: Maria, não saias da sala. // Não saias, Maria, da sala. //Não saias da sala, Maria.
 Para isolar os constituintes apositivos (ou o aposto):
Ex.: Luanda, capital de Angola, tem excesso de pessoas:
 Depois de não e sim quando estes advérbios se referem a uma oração anterior:
Ex.: Sim, isto é caso de polícia.
Não, é um comportamento inadmissível.
 Para separar termos coordenados em enumeração (quando não estão ligados pelas
conjunções e, ou):
Ex.: O livro estava velho, sujo, rasgado, imprestável.
 Para separar nome de lugar anteposto à data:
Ex.: Luanda, 15 de Agosto de 2019.
 Para intercalar a conjunção:
Ex.: Não há, portanto, razões de queixas.
 Para intercalar expressões explicativas ou correctivas:
Ex.: Ele omitiu-se, isto é, acovardou-se.
Não se usa a vírgula

 Para separar sujeito e o verbo:


Ex.: O João, comprou um carro.
A Maria, deitou-se muito cedo hoje.

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 Para separar o verbo e os seus complementos:
Ex.: Entreguei, os pedidos, aos clientes.
Comprei, um carro novo.
 Com conjunções não são seguidas de vírgula:
Ex.: Vi a Maria com, o João.
Ela afirmou que, a situação era verídica.

Exercícios

1. Ponha a vírgula nas frases abaixo:


a) Querido trouxe um presente para você.
b) Desde a infância descobri que a vida é cheia de possibilidades.
c) Ela a menina mais popular da escola pediu-me ajuda para estudar matemática.
d) Sinceramente eu me senti muito feliz!
e) A jovem, cansada, deixou-se embalar pelas boas lembranças.
f) Prefiro futebol: ela vólei.
g) Eu recuperei as notas a confiança a calma e a viagem nas férias.
h) Escreva frases coerentes isto é com sentido dentro do contexto.
i) Eu estava certa de minha decisão portanto não me arrependeria.
j) Onze meses depois elas chegam de viagem.
k) Huambo 26 de Agosto de 2019.
l) O Manuerl é jovem obediente carinhoso estudioso.
m) José menino educado já chegou.
n) Lucas não faças isso.
o) Ana era uma menina alta magra e muito ágil.
p) Naquela tarde os filhos aprontaram.
q) Gostava de cozinhar limpar lavar e passar a roupa.

O ponto e vírgula
É um sinal de pontuação que indica uma pausa maior que a vírgula e menor que o ponto; é
intermédio entre a vírgula e o ponto final; emprega-se para separar orações dentro de um mesmo
período e indica um tom ligeiramente descendente.
Ex.: O Joaquim celebrou o seu aniversário na praia; não gosta do frio e nem das montanhas.
Os conteúdos da prova são: Geografia; História; Português.
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Casos do uso da vírgula

 Para separar vários itens de enunciados, leis ou outros documentos:


Ex.: O contrato de serviço doméstico pode cessar:
- por mútuo acordo das partes;
- por caducidade;
- por rescisão de qualquer das partes, ocorrendo justa causa;
- por rescisão unilateral do trabalhador com pré-aviso.

 Para alongar a pausa de conjunções adversativas (mas, porém, contudo, todavia,


entretanto, etc.), substituindo, assim, a vírgula.
Ex.: Gostaria de vê-lo hoje; todavia, só o verei amanhã.
 Para separar orações coordenadas não unidas por conjunção, que guardem
relação entre si.
Ex.: O rio está poluído; os peixes estão mortos.
 Para separar orações independentes:
Ex.: A Maria estudou muito hoje; ela está muito cansada.
Em Luanda, chove; em Malanje, faz sol.
 Para delimitar grupos conexos de coisas ou de factos constitutivos de sucessões:
Ex.: Pedro foi às compras e adquiriu um lápis, uma borracha, uma caneta e um
caderno de papel; um colchão, um travesseiro, uma almofada e uma fronha; uma faca, um garfo,
uma colher e um prato.

Exercícios

1. Ponha o ponto e vírgula no texto abaixo:

Dos primeiros tempos da nacionalidade portuguesa merecem mencionar-se: o conde D. Henrique,


que procurou firmar a independência, que ele e os habitantes do condado tanto desejaram D. Teresa,
senhora inteligente e enérgica, que se esforçou também por tornar o condado independente Egas
Moniz, que deu um belo exemplo de lealdade, quando ofereceu a vida em paga da falta do
cumprimento da sua palavra Afonso Henriques, que alargou o território com as conquistas feitas aos
Mouros Mem Ramires, que foi um batalhador incansável e contribuiu para a conquista de Santarém

30
Fuas Roupinho, que foi um dos primeiros navegadores portugueses, num tempo em que se ignorava
ainda a ciência náutica.

 Crase
Crase é a contracção da preposição a que rege um verbo, um nome ou um adjectivo com o
artigo/determinante definido feminino singular a, (à = a + a).

Regra básica
A crase acontece antes dos nomes femininos. Em caso de dúvida, substitua o nome feminino
pelo masculino. Se na troca resultar em “ao” há crase. Se resultar “o” não há crase. Vejam-se os
exemplos:

Ex.: Levamos o livro à biblioteca Levamos o livro ao armário.


Ontem, fomos à praça. Ontem, fomos ao trabalho.
Comprei a flor na loja. Comprei o vaso na loja.

Atenção:
Mas a crase pode ocorrer antes dos nomes masculinos, quando estes se referem ao modo e
à maneira.
Ex.: Fiz um golo à CR7.
Cortei cabelo à Neymar.
Vesti à João Rolo.

Casos que ocorrem crase

1. Com horas: A reunião começa às 11 horas;


Obs.: Excepto depois das preposições: após, desde, entre e para. Só com até.
Ex.: Faltam vinte minutos para as sete.
Estamos à espera desde as 7h00 da manhã.
A reunião durou até às nove da noite.

2. Com locuções prepositivas e conjuntivas constituídas de palavras femininas:


à espera de à razão de à procura de à medida que
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à cata de (procura) à expensas de (a custa de) à beira de à proporção de
à semelhança de à farta à roda de
à primeira vista à vista à parte
à hora certa à milanesa (panado) à custa de
3. Com pronome demonstrativo: aquele (s), aquela (s) e aquilo:
Ex.: Pergunta àquele rapaz // Pergunta àquela menina.

4. Ocorre também antes do pronome qual:


Ex.: Esta é a festa à qual me referi. (ao qual)
As pessoas às quais me referi já chegaram. (aos quais)

Casos proibidos
a + um/a/s + nome. Ex.: Dá isso a um menino de rua.
a + este/a/as + nome. Ex.: Vai a esta clínica.
a + nome masculino. Ex.: Gosto de andar a cavalo.
a + verbo no infinitivo. Ex.: Estou apto a discutir.
a + indefinidos. Ex.: Não digas a ninguém // Falo a toda a gente.
a + interrogativos. Ex.: A que horas vens? // A qual banco te referes?
a + quem. Ex.: A rapariga a quem falo.
a entre duas palavras iguais. Ex.: lado a lado, frente a frente, cara a cara, um a um, etc.
a + nome de disciplina. Ex.: Tive 10 a Português.
a + nome de mulheres ilustres ou desconhecidas. Ex.: Referi-me a Isabel II. Mas, se o
nome vier precedido do cargo, a crase é obrigatória. Ex.: Refiro-me à Rainha Isabel.
a + Sua/Vossa Excelência. Ex.: Entrego o documento a Sua/Vossa Excelência

Crase com topónimo


Topónimos são palavras que designam nomes de lugares, como Benguela, Mutamba,
Angola, Africa do Sul, Portugal, França, etc.
Há, portanto, topónimos:
 masculinos (o Brasil, o Huambo, o Egipto, o Sumbe);
 femininos (a Namíbia, a China, a Catumbela) e
 agéneros, isto é, que não se usam artigos (Portugal, Moçambique, Luanda, Malanje,
Cabinda, etc.)
Para que se saiba se há crase ou não, usa-se o verbo vir. Se der venho da, então há crase. Se
der venho de, não há crase.
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Exemplos:
Vou a Angola Venho de Angola Vou à Samba Venho da Samba
Vamos a Luanda Vimos de Luanda Vamos à Huila Vimos da Huila
Vais a Cabinda? Vens de Cabinda? Vais à Europa? Vens da Europa?

Exercícios
1. O plano dos bandidos saiu as avessas.
2. Não chegaram a saber quem era a autoridade.
3. Encontramos os barcos as margens da lagoa.
4. Fui a casa, mas voltei logo.
5. Não fui aquela farmácia.
6. Entregamos o prémio aquele aluno.
7. Submeterei aqueles alunos a uma prova.
8. Reprovo aquela atitude.
9. Encontrei-o a porta de minha casa.
10. A noite, reuniam-se para ouvi-lo.
11. A sua aversão a estrangeiros era censurada.
12. As dez e meia todos dormiam.
13. Enviei a encomenda a Fernanda.
14. Você vai a aula hoje?
15. Não desobedeça a ninguém.
16. Os guardas ficaram a uma grande distância.
17. Os meninos chegaram a uma hora.

18. Você entregou a encomenda a Dona Luísa?


19. Você deu parabéns a Sua Alteza?
20. Ofereci um presente a Carolina?
21. Ela foi a Nigéria.
22. A meia-noite, os fantasmas aparecem.
23. Ele não se prendia a nenhuma menina.
24. Iremos a Malanje.
25. As notas já foram devolvidas a gerência.
26. Compareceu a prova indisposto.
27. Fez a prova indisposto.
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28. A lua e as estrelas enfeitam o céu.
29. A sua atitude agradou a maioria.
30. A sua atitude satisfez a maioria.
31. Fui a casa de Pedro.
32. Rezo a Nossa Senhora.

 Formas de tratamento
As formas de tratamento são os meios linguísticos que os interlocutores usam para
estabelecer as relações interpessoais e que representam as maneiras pelas quais nos dirigimos uns a
outros.
De salientar que as sociedades estão divididas hierarquicamente, por isso o tratamento que
recebe um membro da sociedade depende do papel que desempenha e das suas características:
idade, sexo, posição familiar, hierarquia profissional, grau de intimidade, etc.

Tipos de formas de tratamento


1. Formal
Usa-se com pessoas que não são da mesma intimidade, pessoas desconhecidas, etc. Trata-se
de uma linguagem que pode caracterizar-se pelo rigor sintáctico, pela riqueza do vocabulário de
tipo erudito e pelo uso de formas de tratamento adequadas ao contexto.
Ex.: Senhor Director, pode emprestar-me o seu material, por favor?
Obs.: Quer os verbos, quer os pronomes ficam na 3.ª pessoa do singular ou do plural.

2. Informal
Pelo contrário, o tratamento informal é aquele que os falantes usam com pessoas que têm
uma certa intimidade, como por exemplo, entre amigos, família, conhecidos, etc., em que a
preocupação com a correcção linguística é menor e o vocabulário utilizado é simples, incluindo
frequentemente palavras e expressões familiares, bem como o calão.
Ex.: Se vires a Maria, dá-lhe este presente.
Obs.: Quer os verbos, quer os pronomes ficam na 2.ª pessoa do singular.

3. Tratamento reverente (muito formal)

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As formas de tratamento reverente são muito formais e usam-se para entidades que ocupam
cargos diversos, na hierarquia social. É o caso de Vossa Santidade, Sua Excelência, Vossa
Senhoria, Sua Eminência, Vossa Magnificência, Vossa Alteza, etc.
Embora se tenha a palavra “Vossa” na expressão, que é um pronome da 2ª pessoa plural,
estas formas de tratamento exigem sempre os verbos na terceira pessoa do singular.
Ex.: Vossa Excelência solicita ajuda?
Vossa Senhoria está satisfeito com os trabalhos?
Escrevi uma carta a Sua Excelência Ministro da Educação.

a) Não te preocupas que você não és cúmplice.


b) Eu dei-te mas você não recebeste
c) Ontem liguei-te e você não atendeste.
d) Tu não se preocupaste em ligar para mim.
e) Já te disse que você és culpado.
f) Te esperei e você não vieste.
g) Quando te liguei, você já estavas a dormir.
h) Depois não diga que não te avisei.
i) Já te falamos para não sair, mas você é teimoso.
j) Senhor, posso pedir-te um favor?
k) Você deste-lhe motivo para ele te faltar ao respeito.
l) Não falei contigo é bom você não se meter.
m) Eu vi-te quando você tiraste.
n) Não se preocupes comigo, é bom preocupar-se com você mesmo.
o) Pode ir, ninguém te precisa mais.
p) Não te disse que podias ficar melhor?
q) Você tens que estudar, porque tu já és adulto.
r) Estou a falar contigo e você não respondes.

 Uso de imperativo formal e informal

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É um modo verbal que serve para exprimir uma ordem, dar conselho, fazer
convite, solicitar, exortar, etc.
Existem dois tipos de imperativo:

1. Forma formal
forma afirmativa
Corresponde à 3.ª pessoa do singular do presente do conjuntivo.
Ex.: Senhor sair da sala. Senhor, saia da sala.
João comer frutas João, coma frutas

Forma negativa
Corresponde à 3.ª pessoa do singular do presente do conjuntivo.
Ex.: Sair da sala. Não saia da sala.
João comer frutas João, não coma frutas

2. Forma informal
Forma afirmativa
Corresponde à 3.ª pessoa do singular do presente do indicativo.
Ex.: Sair da sala. Sai da sala.
João comer frutas João, come frutas

Forma negativa
Corresponde à 2.ª pessoa do singular do presente do conjuntivo.
Ex.: Sair da sala. Não saias da sala.
João comer frutas. João, não comas frutas.
Obs.: O imperativo negativo por tu termina sempre em “s”.

1. Coloque os verbos entre parênteses no imperativo


a) ____________________ tudo como o professor pediu. (fazer – tu)
b) Não ______________ lixo no chão. (Deitar – tu)

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c) _____________________ o ambiente para que tenhamos um mundo
melhor. (preservar – você)
d) _______________ agora e ____________ a pagar em Janeiro. (comprar /
começar – você)
e) Não ____________ para não seres julgado. (julgar – tu)
f) ____________ tu o problema deste trabalho. (encontrar – tu)
g) Não _______________ as esperanças, tudo vai melhorar. (perder – tu)
h) Não ______________ a fé num mundo melhor. (perder – nós)
i) __________tu também dessa campanha e ____ alimentos não perecíveis.
(participar/ doar – tu)
j) ______________ diariamente para ter uma boa saúde. (exercitar-se – nós)
k) _______________ o teu filho para ser vacinado contra a rubéola. (trazer)
l) _______________ as nossas ofertas e ____________ de carro hoje
mesmo. (aproveitar / trocar - você)
m) ___________ as luzes, o show vai começar. (apagar – vocês)

 Verbos
Verbos são palavras variáveis que exprimem acção, estado, mudança de estado, fenómeno
da natureza e possui inúmeras flexões, de modo que a sua conjugação é feita mediante as variações
de pessoa, número, tempo, modo, voz e aspecto.

1. Estrutura do verbo

O verbo é formado por três elementos:


Radical
O radical é a base e nele está expresso o significado do verbo.
Ex.: DISSERT- (dissert-ar), ESCLAREC- (esclarec-er), CONTRIBU- (contribu-ir).

Vogal temática

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A vogal temática é o elemento que se une ao radical para receber as desinências e, assim,
conjugar os verbos. O resultado dessa união chama-se tema. Assim, tema = radical + vogal
temática.
Ex.: DISSERTA - (disserta-r), ESCLARECE- (esclarece-r), CONTRIBUI- (contribui-r).
A vogal temática indica qual conjugação o verbo pertence. Assim,
 A primeira conjugação abrange os verbos cuja vogal temática é A.
Ex.: argumentar, dançar, cantar, amar, estudar, etc.
 Segunda conjugação abrange os verbos cuja vogal temática é E e O.
Ex.: Escrever, saber, fazer, ter, pôr, supor, repor, etc.
Obs.: o verbo pôr, assim como seus derivados (compor, repor, depor, etc.), pertencem à 2ª
conjugação, pois a forma arcáica do verbo pôr era poer. A vogal “e”, apesar de haver desaparecido
do infinitivo, revela-se em algumas formas do verbo: põe, pões, põem, etc.
 Terceira conjugação abrange os verbos cuja vogal temática é I.
Ex.: Emitir, evoluir, ir, partir, subir, ect.

2. Desinências
As desinências são os elementos que junto com o radical promovem as conjugações. Elas
podem ser:
Desinências modo-temporais quando indicam os modos e os tempos.
Desinências número-pessoais quando indicam as pessoas.
Exemplos:
Dissertávamos (va- desinência de tempo pretérito do modo indicativo), (mos- desinência de
1.ª pessoa do plural)
Esclarecerei (re- desinência de tempo futuro do modo indicativo), (i- desinência de 1.ª
pessoa do singular)
Contribuamos (a- desinência de modo presente do modo conjuntivo), (mos- desinência de
1.ª pessoa do plural)

3. Flexões dos verbos


Para conjugarmos os verbos, temos de ter em conta as flexões, nomeadmente:
Pessoa: 1.ª (eu, nós); 2.ª (tu, vós) e 3.ª (ele, eles).
Número: Singular (eu, tu, ele) e plural (nós, vós, eles).
Tempo: Presente, pretérito e futuro.
Modo: Indicativo, conjuntivo e imperativo.
Voz: voz ativa, voz passiva e voz reflexiva.
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4. Classificação dos verbos
Os verbos são classificados em:
 Verbos Regulares
São verbos que não alteram o seu radical ao longo da sua conjugação.
Ex.: Falar, torcer, tossir.
 Verbos Irregulares
São verbos que alteram o seu radical ao longo da sua conjugação.
Ex.: Dar, caber, medir.
Obs.: Quando as alterações são profundas, eles são chamados de Verbos Anómalos. É o
caso dos verbos ser e vir, estar, haver, ir., etc.

Verbos defectivos

Os verbos defectivos são aqueles que não são conjugados em todas as pessoas, tempos e
modos. Eles podem ser de três tipos:

 Impessoais

Quando os verbos indicam, especialmente, fenômenos da natureza (não tem sujeito) e são
conjugados na terceira pessoa do singular, são verbos impessoais. Ex.: Chover, trovejar, ventar,
trovejar, etc.
 Unipessoais
Quando os verbos indicam vozes dos animais e são conjugados na terceira pessoa do
singular ou do plural.
Ex.: Ladrar, miar, surtir, zurrar, assobiar, etc.

 Pessoais - Quando os verbos têm sujeito, mas não são conjugados em todas as
pessoas, são verbos pessoais.
Ex.: Banir, falir, reaver.

5. Vozes dos verbos

Os verbos apresentam flexão em voz. As vozes do verbo indicam se o sujeito gramatical é o


agente ou o paciente da ação verbal, ou seja, se pratica ou se sofre a ação.
Existem três vozes verbais no português: activa, passiva e reflexiva.

5.1. Voz activa


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A voz activa é usada quando o sujeito gramatical pratica a acção verbal. Indica, assim, que o
sujeito gramatical é o agente da acção.
Ex.: O Manuel lavou o cão.
Os alunos leram os livros.

5.2. Voz passiva

A voz passiva é usada quando o sujeito gramatical sofre a acção verbal. Indica, assim, que o
sujeito gramatical é o paciente de uma ação que é praticada pelo agente da passiva.
Ex.: O cão foi lavado pelo Manuel.
Os livros foram lidos pelos alunos.

5.3. Voz reflexiva


A voz reflexiva é usada quando o sujeito gramatical pratica e sofre a acção verbal. Indica,
assim, que o sujeito gramatical é ao mesmo tempo o agente e o paciente da acção. Apresenta,
obrigatoriamente, um pronome oblíquo reflexivo (me, te, se, nos, vos, se).
Ex.: O Manuel feriu-se com a faca.
Nós lavamo-nos diariamente.
A Joana penteou-se antes de sair.

6. Modo indicativo e conjuntivo: diferenças


O modo indicativo é um modo verbal que designa acções concretas, reais e factíveis no
tempo passado, presente ou futuro. Contém tempos verbais simples e compostos. Assim, usa-se o
modo indicativo quando se quer expressar algo que realmente ocorreu, ou seja, acções factíveis,
sejam elas no passado, no presente, sejam no futuro.
Ex.: O João está doente.
Os alunos assistiram às aulas de ontem.
A Maria não virá amanhã.
O modo conjuntivo é aquele que apresenta o facto, a acção, mas de maneira incerta,
imprecisa, duvidosa ou eventual. Este é o modo verbal exigido nas orações que dependem de outros
verbos.
Existem, portanto, três tempos do modo conjuntivo: presente, pretérito imperfeito e
futuro.
Ex.: Talvez ele chegue mais tarde.
Se não viessem, não esclareceriam a situação.
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Quando chegarem, sirvo os restantes convidados.

Exercícios
1. Passe as frases de voz activa para passiva e vice-versa:

a) Eu comi o bolo.
b) O Manuel comprou o chapéu.
c) Os alunos leram os livros.
d) A leoa caçou a hiena.
e) O funcionário concluirá a tarefa.
f) A Maria foi ferida por uma criança.
g) Os livros serão lidos pelos alunos.
h) O trabalho foi feito pelo professor.
i) Os direitos foram reivindicados pelos trabalhadores.
j) A palestra seria ministrada pelo professor.
k) A fábula foi contada pela professora.
l) Os réus foram orientados pelos advogados.

2. Complete as frases, conjugando no presente do indicativo os verbos que se encontram entre


parênteses.
a) O armário não ___________ (caber) na porta.
b) Eu __________ (crer) que ______________ (trazer) o jornal comigo.
c) Os meninos _________ (pedir) o rádio, pois __________ (querer) ouvir notícias.
d) A empresa que ____________ (construir) essas casas fica aqui perto.
e) De vez em quando ___________ (perder) a minha carteira. E tu, nunca __________ (perder)
nada.
f) _____________ (tu/sentir) alguma dor?
g) Eles _____________ (crer) em tudo o que lhe dizem.

3. Complete as frases, conjugando no pretérito imperfeito do indicativo os verbos que se


encontram entre parênteses.
a) Eu __________ (querer) ir à excursão, mas tenho exame nesse dia.
b) ____________ (haver) melhores filmes americanos do que agora.

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c) Eles ______________ (descobrir) tudo se tivessem mais tempo.
d) ________________ (ouvir) tudo quanto lhe contavam. Quando eu era mais nova
___________ (caber) nesta saia.
e) Tu não _________ (crer) no que te diziam, mas ____________ (ver) que tinham razão.

4. Complete as frases, conjugando no presente do conjuntivo, os verbos que se encontram


entre parênteses.

a) A coordenadora disse-lhe que é preciso que ele _________________ (trabalhar) mais.


b) Pode ser que o Sr. Silva _________________ (conseguir) fazer esta tarefa sozinho.
c) Mal _________________ (chegar) a casa, vai ver a caixa de correio.
d) É pena que a Rita não _________________ (poder) vir connosco.
e) Talvez os nossos amigos _________________ (vir) jantar a nossa casa este sábado.
f) A professora quer que eu _________________ (ler) este livro nas férias.
g) O director espera que todos os professores ___________ ao novo sistema o mais
rápido possível. (aderir)
h) Quero muito que você ___________ à palestra, pois assim pode inteirar-se um pouco
mais das novas propostas. (ir)
i) É bem possível que os alunos veteranos __________ o pedido de isenção de
disciplinas. (requerer)
j) Ainda que eles não __________ ao meu aniversário, convide-os, por favor.
(comparecer)
k) Acredito que eles ___________ a opinião acerca das decisões tomadas no conselho
de classe. (expor)

5. Responde às questões, usando o presente do conjuntivo.

a) Achas que ele vem ao jantar?


Talvez não ______________________________________________________.
b) Achas que eles ainda vão aparecer?
Espero que eles __________________________________________________.
c) Parece-te que ela sabe o aconteceu?
Duvido que ______________________________________________________.
d) O Eugénio chegará hoje?
É provável que ___________________________________________________.
e) Será que os avós querem vir connosco?
É possível que ____________________________________.

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5. Complete as frases, conjugando os verbos no pretérito imperfeito do conjuntivo.

a) Se tu _________________ (ir) ao cinema, conhecerias este filme.

b) Se vocês _________________ (ter) mais cuidado, nada disto acontecia.

c) Eles fariam tudo o que o professor lhes _________________ (dizer).

d) Desde que a turma _________________ (seguir) as indicações, tudo corria bem.

e) Quando éramos pequenos, faríamos tudo o que os nossos pais _______________ (mandar).

f) O presidente age como se _________________ (ser) um cidadão comum.

g) O treinador solicitou ao assistente que ele _____________ (analisar) o calendário dos jogos.

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