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CONGRESO
IBERO-AMERICANO 12, 13 y 14
EN INVESTIGACIÓN de julio
2017
CUALITATIVA

2nd
INTERNATIONAL
SYMPOSIUM ON
QUALITATIVE
RESEARCH

Salamanca España
EDITORES
ANTÓNIO PEDRO COSTA
ATAS PAULO ALEXANDRE DE CASTRO
SUSANA OLIVEIRA E SÁ
INVESTIGACIÓN CUALITATIVA EN EDUCACIÓN RODRIGO ARELLANO SAAVEDRA
INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA NA EDUCAÇÃO
VOL. 1
APOYO / ASOCIADOS

webQDA
®

LICENSED BY:

www.ciaiq.org
5, 6 e 7
12, 13 y 14
AGOSTO
de julio
de
Salamanca España de 2015
2017

>>FICHA TÉCNICA
Título // Atas do 6º Congresso Ibero-Americano em Investigação Qualitativa
Subtítulo// Investigação Qualitativa na Educação

Web // www.ciaiq.org

>>Editores
António Pedro Costa
Paulo Alexandre de Castro
Susana Oliveira e Sá
Rodrigo Arellano Saavedra

>>Comissão Editorial
Marlene Oliveira
Fábio Freitas

Edição // Ludomedia
Rua Centro Vidreiro, 405
São Roque
3720-626 Oliveira de Azeméis
Aveiro - PORTUGAL

e-mail // info@ludomedia.pt

web // www.ludomedia.pt

ISBN // 978-972-8914-75-2

>> COMISIONES//COMISSÕES
>> VER EN LÍNEA: https://goo.gl/3zF953
>>CONSULTE ONLINE: https://goo.gl/3zF953

2 | CIAIQ2017
6º 2nd
E 6º SIMPÓSIO
CONGRESO INTERNATIONAL
IBERO-AMERICANO SYMPOSIUM ON
EN INVESTIGACIÓN QUALITATIVE
CUALITATIVA RESEARCH

>> EDITORIAL//
O 6º Congresso Ibero-Americano em Investigação Qualitativa (CIAIQ2017) decorreu nos dias 12, 13 e
14 de julho de 2017, em Salamanca, Espanha. Na continuidade das edições anteriores, o sucesso do
CIAIQ2017 é um importante indicador da existência de uma comunidade multidisciplinar, empenhada
e de qualidade nesta área da investigação. Deste modo o CIAIQ assume-se como um evento de
prestígio internacional, incontornável e de presença obrigatória nas agendas dos investigadores ibero-
americanos que desenvolvem investigação com abordagem qualitativa.
Para o CIAIQ2017 foi encorajada a submissão de artigos científicos que focassem diversos campos
de aplicação na Investigação Qualitativa. Para criar laços e identificação com a comunidade científica,
foi divulgado que a ênfase do CIAIQ2017 se relacionava com diversos processos de investigação tais
como: i) Educação (ênfase nos processos de Investigação nas diversas áreas do Ensino Superior,
Ensino básico, Avaliação, Currículo, Didáticas, Ensino de Ciências, Línguas, História, Tecnologia,
entre outras.); ii) Saúde (ênfase nos processos de investigação nas áreas de Medicina, Enfermagem,
Tecnologias da Saúde, Geriatria, Gerontologia, Psicologia, entre outras.); iii) Ciências Sociais (ênfase
nos processos de Investigação nas áreas da Comunicação, Artes, Linguística, Sociologia, Antropologia,
Psicologia das Organizações e do Trabalho, Administração, Marketing, Gestão e Economia, Ciência
Política, entre outras.); e iv) Engenharia e Tecnologia (ênfase nas metodologias de suporte baseadas
em computador e no software para investigação qualitativa e na investigação qualitativa nas áreas da
Engenharia e Tecnologia, Sistemas de Informação e Educação em Engenharia). No entanto, para uma
visão mais transversal e holística da investigação, foi solicitada aos autores a submissão de artigos em
diversas temáticas organizadas em duas principais dimensões:

1. Fundamentos
• Fundamentação e Paradigmas de Investigação Qualitativa (estudos teóricos, reflexão crítica sobre
as dimensões epistemológicas, ontológicas e axiológicas);
• Sistematização de estudos com Abordagens Qualitativas (revisão da literatura, integração de
resultados, agregação de estudos, meta-análise, meta-análise qualitativa, meta-síntese, meta-
etnografia);
• Investigação Qualitativa e Métodos Mistos (ênfase em processos de investigação apoiados em
metodologias mistas mas com prioridade às abordagens qualitativas).

2. Operacionalização
• Tipologias de Análise de Dados (análise de conteúdo, análise do discurso, análise temática, análise
de narrativas, etc.);
• Processos inovadores de Análise Qualitativa de Dados (desenho de análise, articulação e triangulação
de diversas fontes de dados – imagens, áudios, vídeos);
• Investigação Qualitativa em Contexto Web (eResearch, etnografia virtual, análise de interações,
corpus latent na internet, etc.);
• Análise Qualitativa com Apoio de Software Específico (estudos de usabilidade, user experience,
impacto do software na qualidade de investigação e da análise).

Para além dos artigos científicos, a 6ª edição do CIAIQ teve ainda duas Conferências Plenárias:
• “Desde el relato cualitativo al análisis cuantitativo no convencional: Rigor en la

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extracción de patterns y estructuras en el microanálisis comunicativo”, apresentada por


M. Teresa Anguera Argilaga, da Universidade de Barcelona (Espanha);
• “A Investigação Qualitativa e os Desafios da Complexidade”, apresentada por António Dias de
Figueiredo, da Universidade de Coimbra (Portugal).

No CIAIQ2017 foram ainda dinamizados 12 (doze) painéis de discussão e 19 (dezanove) workshops,


que procuraram abordar diferentes dimensões relacionadas com as temáticas do evento. Os Painéis
de Discussão foram:
• “A pesquisa qualitativa realizada segundo a abordagem fenomenológica” dinamizado por Maria A.
V. Bicudo, Débora Candido de Azevedo, Tais A. M. Barbariz, da Universidade Estadual Paulista e da
Universidade Paulista (Brasil).
• “Aportaciones de los registros audiovisuales a la investigación cualitativa en educación”, dinamizado
por Antonio Bautista, Laura Rayón, Ana María de las Heras, Yolanda Muñoz, Silvia de la Sen e Pilar
Rubio, da Universidade de Alcalá, Universidade a Distancia de Madrid e do Colegio de Educación
Infantil e Primaria La Paloma (Espanha).
• “Aproximaciones cualitativas para la definición y validación de constructos de instrumentos
estandarizados de medida”, dinamizado por Jesús Miguel Jornet Meliá, José González-Such, María
Jesús Perales Montolío, Purificación Sánchez-Delgado, Mercedes Bisquert Martínez, Margarita
Bakieva, Carlos Sancho-Álvarez, Aina Belda Galbis, Anna Jordina Llorens, Ana Rosa Bodoque
Osma e Sonia Ortega Gaite, das Universidades de Valência, de Castilla la Mancha e de Valladolid
(Espanha).
• “Líneas de investigación de la fundación Intras”, dinamizado por Manuel Franco, Francisco José
García Peñalvo, Mª Cruz Sánchez-Gómez, Juan Luis Muñoz Sánchez, Esther Parra Vidales, Felipe
Soto-Pérez e Mª Victoria Martín Cilleros, da Universidade de Salamanca (Espanha).
• “Tenho um software de análise qualitativa. E agora? Potencialidades e limitações das ferramentas
de (auto)aprendizagem”, dinamizado por Fábio Freitas, Jaime Ribeiro, Catarina Brandão, Francislê
Neri de Souza e António Pedro Costa, da Universidade de Aveiro, da Universidade do Porto e do
Instituto Politécnico de Leiria (Portugal).
• “Transição segura: um projeto da translação do conhecimento para a prática clínica”, dinamizado
por Maria Helena Presado, Mário Cardoso, Cristina Lavareda Baixinho e Óscar Ferreira, da Escola
Superior de Enfermagem de Lisboa (Portugal).
• “El diálogo entre los métodos cuantitativos y cualitativos en la investigación en comunicación”,
dinamizado por Miguel Vicente-Mariño, Félix Ortega, Pilar Sánchez e Carlos Arcila, da Universidade
de Valladolid e da Universidade de Salamanca (Espanha).
• “Líneas de investigación del grupo Ciberdidact. Enfoques mixtos”, dinamizado por Ricardo Luengo
González, Luis M. Casas García e José Luís Torres Carvalho, da Universidade da Extremadura
(Espanha).
• “Líneas de investigación del grupo Infoautismo”, dinamizado por Ricardo Canal Bedia, Maria Victoria
Martín Cilleros, Maria Cruz Sánchez-Gómez, da Universidade de Salamanca (Espanha).
• “Narrativas comparadas sobre a formação – expetativas de futuros professores”, dinamizado por
Adriana de Almeida, Ana Isabel Andrade, Eda Henriques, Jane do Carmo Machado, Maria Celi
Chaves de Vasconcelos e Rui Neves, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, da Universidade
Federal Fluminense, da Universidade Católica de Petrópolis (Brasil) e da Universidade de Aveiro
(Portugal).

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• “Nuevas ecologías del aprendizaje: análisis de proyectos de aprendizaje trialógico y educación


expandida”, dinamizado por Jesús Valverde Berrocoso, María del Carmen Garrido Arroyo, Francisco
Ignacio Revuelta Domínguez, María Rosa Fernández Sánchez, María José Sosa Díaz, eJorge Guerra
Antequera, da Universidade da Extremadura (Espanha).
• “O coletivo como objeto do cuidado de enfermagem: uma abordagem qualitativa”, dinamizado por
Emiko Yoshikawa Egry, Rosa Maria Godoy Serpa da Fonseca, Marcia Regina Cubas, Maria Marta
Nolasco Chaves, Tania Rehem, Maíra Rosa Apostólico, da Universidade de São Paulo, da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná, da Universidade Federal do Paraná, da Universidade de Brasília
e da Universidade de Guarulhos (Brasil).

Os dezanove Workshops foram:


• “A influência da intervenção pedagógica no desenvolvimento da autonomia moral”, dinamizado por
Antonio Douglas de Moraes e Orly Zucatto Mantovani de Assis.
• “Aplicação de metodologias problematizadoras em investigação Qualitativa”, dinamizado por
Elizabeth Esperidião e Camila Cardoso Caixeta.
• “Construção de roteiro de entrevista para coleta de dados de pesquisa Qualitativa”, dinamizado por
Luciana Borges e Stella R. Taquette.
• “Intervenção teórico-prática empreendedora para o desenvolvimento da prática avançada em
Enfermagem”, dinamizado por Dirce Stein Backes, Claudia Zamberlan, Marli Terezinha Stein Backes,
Lurdes Lomba e Jorge Manuel Amado Apóstolo.
• “Nvivo11, una herramienta de gran utilidad para la investigación cualitativa”, dinamizado por Andrea
Gutiérrez e Beatriz Palacios.
• “Observatório de cultura escolar: um programa de pesquisa e sua metodologia de Investigação”,
Fabiany de Cássia Tavares Silva, Manoel Camara Rasslan e Marcus Vinícius Medeiros Pereira.
• “O jogo da pesquisa com crianças: uma abordagem Qualitativa”, dinamizado por Mighian Danae
Ferreira Nunes e Sandra Mara da Cunha.
• “Introdução à análise qualitativa suportada pelo software webQDA”, dinamizado por Fábio Freitas
e Jaime Ribeiro.
• “A técnica dos incidentes críticos – da investigação à intervenção”, dinamizado por Catarina
Brandão.
• “A importância do brincar para a construção das estruturas infralógicas / espaço”, dinamizado Ana
Lúcia Pinto de Camargo Meneghel e Orly Zucatto Mantovani de Assis.
• “El uso de la conversación en la investigación cualitativa: aspectos epistemológicos y metodológicos”,
dinamizado por Valéria Deusdará Mori, Luciana de Oliveira Campolina e Daniel Magalhães Goulart.
• “Los formularios en línea en la recolección y análisis de datos en la investigación cualitativa”,
dinamizado por Ángela Teresa Kaliniuk e Rocio Mariel Obez.
• “Mapa conceitual em pesquisa: organizando o pensamento sistémico”, dinamizado por Adriana
Magalhães.
• “O audiovisual na investigação qualitativa: potencializando a escuta e análise de vozes”, dinamizado
por Marina Tarnowski Fasanello, Aluízio de Azevedo Silva Júnior e João Arriscado Nunes.
• “Análise de dados visuais em investigação qualitativa: usos e aplicações”, dinamizado por Ana
Isabel Rodrigues.

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• “Sistema de elaboração e gestão de projeto de investigação (IARS)”, dinamizado por


Francislê Neri de Souza.
• “Técnica de entrevista em grupo focal para coleta de dados de pesquisa Qualitativa”, dinamizado
por Stella R. Taquette e Luciana Borges.
• “Uma rede de histórias no fluxo de outras: uma metodologia baseada em contos literários”,
dinamizado por Eda de Oliveira Henriques e Jane do Carmo Machado.
• “Uso de vídeos e filmes na pesquisa qualitativa em ciências humanas”, dinamizado por Fabrícia
Teixeira Borges, Renata Magalhães Naves e Larissa Krüger Fernandes.

O CIAIQ2017 recebeu um total de 667 submissões de artigos, sendo 446 (66,8%) aceites e publicados
neste livro de Atas. Cada artigo foi submetido a um processo de revisão double-blind realizado por uma
comissão científica composta por elementos altamente qualificados nas áreas científicas do congresso.
De acordo com as classificações atribuídas, dos 446 artigos aceites para publicação, apresentam-se
os 364 artigos que foram apresentados presencialmente e 82 artigos que foram apresentados online,
através de um canal do YouTube (https://goo.gl/9Xhh3J).
Os artigos aceites para apresentação e discussão durante a conferência estão agora publicados no
livro de atas da conferência com registo ISBN. Os autores dos melhores artigos serão convidados
a fazer a extensão e aprofundamento do artigo para publicação em reputadas revistas indexadas
(Springer, Ámbitos. Revista Internacional de Comunicación, Athenea Digital: Revista de Pensamiento e
Investigación Social, Cadernos de Educação, Tecnologia e Sociedade, Discurso & Sociedad, Educação
a Distância e Práticas Educativas Comunicacionais e Interculturais, Escola Anna Nery Revista de
Enfermagem, FOTOCINEMA. Revista Científica de Cine y Fotografia, Intangible Capital, International
Journal of Marketing, Communication and New Media, Internet Latent Corpus Journal. JOTSE, Journal
of Technology and Science Education, Journal of the Education in the Knowledge Society (EKS), Revista
Brasileira de Enfermagem, Revista Campo Abierto, Revista Ciência & Saúde Coletiva, Revista da
Escola de Enfermagem da USP, Revista de Investigaciones, Revista Digital Education Review, Revista
Eixo, Revista Eletrónica Debates em Educação Científica e Tecnológica, Fronteiras: Journal of Social,
Technological and Environmental Science, Revista Ibérica de Sistemas y Tecnologías de la Información,
Revista Indagatio Didactica, Revista Latina de Comunicación Social, Revista Lusófona de Educación,
Revista Portuguesa de Educación e Revista TICs & EaD en Foco).
Finalizamos, agradecendo a todos os que de forma direta ou indireta colaboraram com a organização
do CIAIQ2017 (participantes, autores, comissões, instituições parceiras, apoios, revistas, entre outros),
participando e promovendo a expansão e qualidade da investigação qualitativa.

Julho, 2017
António Pedro Costa
Paulo Alexandre de Castro
Susana Oliveira e Sá
Rodrigo Arellano Saavedra

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

O discurso da gestão escolar democrática em uma política de avaliação


institucional participativa

Neusa Chaves Batista¹

¹Fa culdade de Educação da Universidade Federal do Rio Gra nde do Sul – neuchaves@gmail.com

Resumo. Es te a rtigo tem por objetivo analisar o discurso de a tores escolares a o a va l ia r i ndi ca dores d e
ges tão democrática em uma política de a valiação i nstitucional participativa i mplementada na Rede Es tadual
de Ens ino do estado do Rio Grande do Sul (Brasil). Real i za a a s s o ci açã o en tre d a dos q ua nti ta ti vos e
qua litativos a fim de explicitar e compreender a i nterp reta çã o d e a to res es col a res s o bre a g e s tã o
democrática da escola pública. Metodologicamente entende o discurso como prática s ocial, preocupa n do-
s e com a regulação s ocial da produção, recepção e circul a çã o d os d i s curs os e m f u nçã o d o co ntexto
s oci opolítico. Infere que a i nterpretação dos atores escolares revela i ncoerências e contra di çõ es f re nte à
a va liação do indicador que remete à gestão escolar democrática.
Palavras-chave: Ges tão escolar democrática; a valiação i nstitucional participativa; políticas educacionais.

The discourse of democratic school management in a policy of participatory institutional evaluation


Abstract. Thi s study i nvestigate the discourse of school a ctors by a nalyz e th e i n di ca to rs o f d em ocra ti c
ma nagement in a policy of participatory i nstitutional evaluation i mplemented in the education netw ork o f
the s tate of Rio Grande do Sul (Brazil). The study associates quantitative and qualitative data to indicate and
understand how s chool a ctors i nterpret the democratic management of public schools. Method ol og i ca l l y
the res earch understands the discourse as a s ocial practice, focusing on the s ocial regulation o f d i sco urs e
production, reception and circulation according to the s o ci opol i ti ca l co n text. I t i s i n ferre d th a t th e
i nterpretation of school actors reveals i nconsistencies and contradicti ons w h en m ea s ured a ga i ns t th e
eva l uation of the i ndicator that refers to the democratic management of schools.
Keywords: Democra tic management of schools; participatory i nstitutional evaluation; education policies.

1 Introdução

A Constituição Federal do Brasil de 1988 estabeleceu o princípio da gestão democrática do ensino


público (Brasil, 1988). A partir desta normatização foram desencadeadas ações que possibilitassem a
gestão participativa da unidade escolar, dentre as quais se pode destacar: a elaboração do Projeto
Político-Pedagógico com a participação de todos os atores escolares; a constituição de Grêmios
estudantis como instâncias de representação da autonomia política da juventude escolar; a e l e i ção
de diretores e diretoras pelo voto direto da comunidade escolar; a organização de Conselho s
Escolares deliberativos com a participação/representação de todos os segmentos escolares. P or meio
desta última ação, a comunidade escolar e local pode participar diretamente na gestão
administrativa, pedagógica e financeira das escolas públicas.
Em 2012, o governo do estado Rio Grande do Sul iniciou a implementação da política de avaliação
institucional participativa para toda a Rede Estadual de Ensino.
A proposta dos formuladores da política, no que tange às escolas, fundamentava-se na parti ci pação
de toda a comunidade escolar na avaliação diagnóstica da situação de indicadores escolares,
apontando o conselho escolar como protagonista da organização deste processo na unidade escolar.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

As 2.570 escolas públicas estaduais distribuídas em 30 Coordenadorias Regionais de Educação (CRE) 1


avaliaram 50 indicadores considerando seis dimensões: da gestão institucional; espaço físico;
organização e ambiente de trabalho; políticas para acesso, permanência e sucesso na escola;
formação dos profissionais da educação; práticas pedagógicas e de avaliação.
O objetivo especifico deste artigo é analisar a dimensão da gestão institucional avaliada pelas 232
escolas da 1ª CRE (Região de Porto Alegre), nomeadamente, o indicador 1 (Existência de
planejamento e monitoramento de metas/ações de gestão democrática), o qual pertence ao eixo da
política intitulado qualificação e democratização da gestão.
A partir da análise da avaliação do citado indicador pelos atores escolares pretendo demonstrar
como estes interpretam a gestão democrática da escola pública.
Metodologicamente remeto a análise ao discurso dos atores escolares como prática social, isto é,
entendo que existe uma relação entre as estruturas e as relações sociais que, podem tanto
configurar os discursos quanto podem por ele serem influenciadas, reproduzidas ou qu e sti onadas,
como é o caso do tema da gestão democrática da escola pública.
Com base nessa referência, a preocupação desta pesquisa se dá em função da regulação social da
produção, recepção e circulação dos discursos em função do contexto sociopolítico.
Basicamente, tal posicionamento metodológico questiona sobre quais são as implicações sociais e
políticas das ideologias, das representações dos acontecimentos e dos atores sociais que emanam do
discurso (Rojo, 2004; Bourdieu, 1996; Ball 1994).

2 Contexto das políticas de avaliação institucional da educação

Nos anos de 1990 o Brasil se insere no contexto mundial de reestruturação dos Estados nacionais
com vistas a uma readequação ao modelo normativo global baseado nos princípios de
descentralização, privatização e flexibilização 2.
Tal procedimento produz efeitos na organização e estrutura da gestão pública bem como na
implementação de políticas públicas de corte social. Imerso neste ordenamento para as soci e dade s
capitalistas, o Estado nacional brasileiro atendendo à solicitação de ajuste estrutural das contas
públicas, dá inicio à modificação da forma de atendimento das demandas sociais, dentre estas as da
educação escolar, adotando como uma de suas estratégias as avaliações de larga escala como forma
de regular o desempenho dos indicadores educacionais (Brasil, 1995).
A avaliação institucional da educação na sociedade brasileira vem se consolidando no discurso
político como estratégia para a universalização de uma educação de qualidade para todos.
Contudo, a construção de um modelo sistêmico de avaliação tem se mostrado controversa no
sentido de que estabelece uma regulação cuja lógica, frequentemente, relaciona-se aos diagnósticos
de organismos internacionais que postulam uma crise de ineficácia do sistema educacional,
especialmente dos países periféricos, como é o caso do Brasil, localizand o a “culpa da crise” no

1 Na es trutura de governo do Estado do Rio do Sul, o órgão central vol tado à implementação da política educacional s o b a
coordenação direta do governo é a Secretaria de Es tado da Educação (Seduc) que, por s ua vez, regiona l i za ta l p ol í ti ca
mediada por tri nta unidades administrativas denominadas, ca da uma, Coordenadoria Regional de Educação (CRE). Ca da
uma das Coordenadorias possui um Coordenador/a i ndicado/da pela Secretaria que, com sua equipe, admi ni stra ce rto
número de escolas, construindo articulações entre as políticas educacionais formuladas para o â mbito da Rede Es ta d ua l
de Ens ino (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2015).
2Tra ta -se de uma a genda global cujas diretrizes são cl aramente defendidas por organismos i ntern a ci o na i s ta i s co m o o
Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM) (Dale., & Ga ndin 2014; Ama ral, 2010).

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

desempenho das escolas e de seus gestores bem como dos professores (Ball , 2005) e não no
processo de reestruturação do próprio sistema capitalista em função de reorganizar a educação
escolar com a finalidade de atender às novas necessidades de formação profissional (e de consumo!)
ocasionadas pelo seu modo de produção (Tedesco, 2012).
No Brasil, a avaliação sistêmica da educação como política pública, mesmo que tenha seus primeiros
sinais já nos anos de 1930, quando se criou o Ministério da Educação e Cultura (Azevedo, 2004),
pode ser compreendida no conjunto de ações governamentais implementadas no contexto da
reestruturação do Estado brasileiro na década de 1990 (Brasil, 1995).
Nesse âmbito, a política de avaliação da educação brasileira, nos últimos vinte anos, tem sido
relacionada às recomendações de organismos internacionais, com ênfase do Banco Mundi al , te ndo
em vista a superar a crise de eficiência, eficácia e produtividade do sistema (Coelho, 2008; Amaral,
2010) independente das especificidades e necessidades da educação brasileira.
Com essa referência as políticas de avaliação institucional trazem a marca de uma regulação baseada
na administração gerencial e competitiva, segundo interpreta Afonso (2001) referindo-se à
emergência do “Estado avaliador” a partir da radicalização da interferência e controle do Estado por
meio da avaliação sistêmica.
Conforme indica Afonso (2013), nos países que iniciaram há mais de duas décadas atrás, a vaga de
reformas neoliberais e neoconservadoras, a avaliação de larga escala constitui-se el a própri a como
uma política estatal; enquanto instrumento da ação dos Estados e governos, ainda que re l aci onada
com leituras internas das especificidades nacionais, foi filtrada e interpretada tendo como base as
novas orientações ideológicas então emergentes – nas quais, em certos casos, os aspectos simbólicos
foram ampliados (e dramatizados) por oposição a outras realidades nacionais.
Nesta esteira insere-se a avaliação institucional da educação brasileira na atualidade , por um l ado,
fruto da austeridade das recomendações de organismos internacionais para as contas públicas de
Estados nacionais com diferentes contextos sociais, econômicos e culturais, pode ser um mero
instrumento para impor modelos de gestão estatal que adequem os sistemas de ensino e as e scol as
às metas e objetivos da economia capitalista; por outro lado, pode ser um recurso indispensável para
diagnosticar a situação educacional das escolas e dos sistemas de ensi no em todas as suas dimensões
(da gestão, da formação dos professores e profissionais de serviços e apoio escolar, da avaliação e
das práticas pedagógicas, da infraestrutura física e recursos pedagógicos) com o propósito de
garantir o direito à educação de qualidade para todos os cidadãos e cidadãs brasileiros/as por me i o
da gestão democrática da educação pública.

3 A política de avaliação institucional participativa da Rede Estadual de Ensino do RS

Sob este cenário, no estado do Rio Grande do Sul (RS), no ano de 2012, iniciou-se a impl e mentação
de uma política de avaliação institucional da educação de cunho participativa.
Os formuladores da política propuseram avaliar as 2.570 escolas estaduais de ensino público a parti r
de seis dimensões: da gestão institucional; espaço físico; organização e ambiente de trabalho;
políticas para acesso, permanência e sucesso na escola; formação dos profissionais da educação;
práticas pedagógicas e de avaliação.
A avaliação dessas dimensões estava relacionada à materialização de um dos principais eixos do
Programa de Governo da Gestão 2011-2014 (Partido dos Trabalhadores): qualificação e
democratização da gestão.
O processo de implementação da política de avaliação participativa nas escolas elenca o conselho
escolar como protagonista ao incumbí-lo de elaborar um diagnóstico preliminar a partir da análise
dos indicadores das seis dimensões.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Essa avaliação se constituiria na base para as discussões sobre os indicadores em reuniões com os
diferentes segmentos da comunidade escolar (Rio Grande do Sul, 2012).
No processo foram realizados diagnósticos escolares anuais, de 2012 a 2014, tendo sido avaliados
cinquenta indicadores 3, distribuídos em suas dimensões, com o propósito de possibilitar uma
reflexão-ação sobre o processo de ensino e aprendizagem na rede estadual do RS.
A avaliação dos indicadores foi composta por uma escala de valores estabelecida pelos formuladores
da política, nomeadamente, a equipe gestora da Secretaria de Estado da Educação (SEDUC), que
pontuava situações para os indicadores escolares os quais transitavam entre: (1) situação críti ca; (2)
situação precária; (3) situação boa; (4) situação muito boa; (5) situação excelente.
Todas as situações dos indicadores apresentavam descritores que detalhavam sua condição.
Ao avaliar e pontuar o indicador a escola atribuía-lhe uma justificativa (Rio Grande do Sul, 2012).
Nesta pesquisa foco a dimensão da gestão institucional avaliada pelas escolas da 1ª CRE (Porto
Alegre), mais especificamente, o indicador 1 - Existência de planejamento e monitoramento de
metas/ações de gestão democrática.
Entendo que este indicador é representativo do eixo qualificação e democratização da gestão be m
como que sua avaliação pode revelar a interpretação dos atores escolares para a gestão democrática
da escola pública.

4 Metodologia

Conforme indica Ball (1994), as políticas representam os valores do grupo que possui autoridade para
desenhá-las, apesar de serem apresentadas como universais e generalizadas.
As políticas são resultados de conflitos e disputas de interesses em um dado contexto.
Nessa perspectiva, a política de avaliação institucional participativa, formulada pela equi pe ge stora
da SEDUC para o período de 2012 a 2014, chegou às escolas estaduais sem a participação das
mesmas em termos dos seus conteúdos (construção dos indicadores e marcos referenciais) e de se u
desenho institucional, isto é, a política propõe um processo de avaliação participativa na escola, com
efeito, foi institucionalmente formulada sem a participação dos atores centrais do processo , as
escolas.
Entretanto, a interpretação de uma política é um tema em debate e em constante movimento de
transformação e ressignificações.
No contexto da prática, das escolas, os atores interpretam a política por meio de suas próprias
histórias, experiências valores e propósitos. Suas respostas aos textos das políticas são em última
instância, construções sobre “interpretações das interpretações” (Bowe; Ball; Gold, 1992).
Assumo, assim, um posicionamento metodológico de não atribuir ao objeto empírico uma ve rdade
absoluta sobre a realidade analisada, mas, apresentar possibilidades de aproximações à

3 Conforme a ponta o texto da política, os indicadores revelam a lgum a s p ecto p ecul i a r d a d i mens ã o a s er a va l ia da .
Porta nto, os indicadores são a expressão das situações de realida de a s er o bs erva da , a va l i ad a e a na li s a da . Já o s
des critores, para cada situação do i ndicador, são os desdobramentos e os detalhamentos dos i ndicadores, que aponta m
a qua lidade e gra dação (dos pontos fortes aos mais fracos) das condições e existênci a d e ca da i ndi ca do r. As s i m, o s
des critores manifestam-se como cri térios de a valiação que a uxiliam no a companhamento do processo educacion a l ( R i o
Gra nde do Sul, 2012).

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

interpretação de uma determinada realidade posta pelos atores escolares frente a avaliação de
indicadores da gestão democrática da escola pública.
Deste modo, compreendo que as políticas em seus processos produzem uma grande variedade de
dados, implicando ao pesquisador/a fazer escolhas cujos resultados serão sempre reveladores de um
recorte da realidade e de um curso de ação que implicou no descarte de outros (Groulx, 2014).
O curso de ação adotado nesta pesquisa se inicia pela observação de um dado estatístico que
comparou as médias e desvio-padrão das pontuações dadas aos indicadores avaliados pelas e scolas
de um ano para outro, bem como da observação do processo de participação dos atores escolares na
autoavaliação.
A avaliação externa da política (Universidade Federal do Rio Grande do Sul , 2015) 4 apontou para
uma recorrência posta pelas escolas para o indicador 1-Existência de planejamento e monitoramento
de metas/ações de gestão democrática -, no que diz respeito à sua situação no período de 3 anos
consecutivos (2012-2013-2014): entre os 7 indicadores5 da dimensão da gestão institucional, foi
avaliado, tendo em vista o número total de escolas (2.570) distribuídas nas regiões das 30
Coordenadorias Regionais de Educação, com situação entre muito boa e excelente 6.
Outro dado identificado na avaliação externa foi a predominância, no processo de implementação da
política nas escolas, de segmentos escolares institucionalizados como a direção da escola e
professores/as (mais de 80%) e apresentando menor participação dos segmentos funcionários,
alunos/as e pais/mães7.
Tendo como base as citadas observações empíricas e com a finalidade de associar dados
estabelecendo suas (in)coerências e contradições, realizou-se os seguintes procedimentos para a
análise qualitativa: a escolha da CRE, que incorpora o maior número de escolas - 1ª CRE -, que
abarca a capital do RS, Porto Alegre, com 232 unidades escolares sob sua gestão, afim de mapear
nestas as justificativas das escolas sobre a avaliação emitida ao indicador 1 da dimensão da gestão
institucional no ano de 2013.

4 A a va l iação externa da política foi realizada pelo Núcleo de Estudos de Políticas e Gestão da Educação d a U ni ve rs i da d e
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) por meio de co n vêni o f i rma d o co m a S ecreta ri a d e Es ta do da Ed u ca çã o
(SEDUC/RS). Esta pesquisadora atuou como Coordenadora a djunta do projeto de extensão (UFRGS) de a valiação externa
da política por 03 a nos consecutivos.
5 Indicadores da gestão i nstitucional: 1) Quanto a o planejamento de metas/ações de gestão d emo crá ti ca ; 2) Qu a nto à
s oci alização das i nformações para todos os s egmentos do Conselho Escolar; 3) Quanto à situação e feti va d o Co ns el ho
Es colar nas questões a dministrativas, financeiras e pedagógicas, conforme determina a Lei da Gestão D emo crá ti ca n º.
10.576/1995, a l terada pelas Leis 11.695/2001 e nº 13.990/2012; 4) Qua nto à cooperação da escola com a s s o ci a çã o d e
mora dores, cl ubes desportivos, fóruns, dentre outros, com vi s ta s à q ua l i fi ca çã o d a g es tã o; 5) Qu a nto à b us ca e
pa rti cipação nas redes de s erviço de apoio, municipais e/ou estadual, com vistas a garantir a aprendizagem; 6) Qua nto a
regra s de convivência ou a mecanismos institucionais específicos para a mediação de conflitos que ocorrem no cotidia no
da escola; 7) Qua nto à relação Escola com a CRE.
6 Res pectivamente com os seguintes descritores: pontuação 4 - existe planejamento sistemático de a ções/metas de gestão
democrática que envolvam questões a dministrativas, pedagógicas e financeiras, mas não existe monitoramento de todas
a s questões. Pontuação 5 - exi stem planejamento e monitoramento sistemáticos de a ções/metas de gestão democráti ca
que envolvam questões administrativas, pedagógicas e financeiras.
7 Uma a mostra representativa (104 escolas), estatisticamente, das 2.570 escolas a po nta o s s eg ui ntes p ercentua i s d e
pa rti cipação na implementação da política nas escolas: equipe diretiva, 98.59%; prof es so res , 87.32% ; f u nci o ná ri os ,
64.29%; a l unos, 63.38%; pais/mães, 45.07% (Universidade Federral do Rio Grande do Sul, 2015).

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Na avaliação era emitida, para cada pontuação dada ao indicador, uma justificativa que não ofere ci a
padrão para ser observada estatisticamente. Consistia em uma interpretação não estruturada dos
atores escolares sobre o indicador.
Para constituir um corpus de justificativas representativas das avaliações das 232 escolas foi utilizado
o software NVIVO, o qual contribui com análises qualitativas a partir da organização de informaçõe s
não estruturadas.
O primeiro procedimento realizado foi a busca de palavras-chave (no mínimo 50 palavras mais
frequentes) no total de justificativas relacionadas ao indicador 1 das 2.570 escolas (justificativas)
distribuídas nas 30 CRE e, ao final, à seleção das 2 palavras-chave com maior percentual de
frequência: planejamento e monitoramento.
Com as duas palavras-chave elencadas busquei destacar as justificativas das escolas da 1ª CRE que
incluíssem tais palavras, o que gerou um primeiro bloco de justificativas que foram analisadas e
classificadas por categorias.
Na sequencia, tendo em vista a classificação das justificativas por categorias, as palavras-chave, de
forma composta, foram associadas com outras palavras-chave relativas à gestão democrática da
escola pública como, por exemplo, conselho escolar. Com este procedimento se obteve o corpus de
justificativas das escolas para o indicador 1 utilizadas nesta análise.

5 A gestão escolar democrática: o que dizem os dados?

A análise das justificativas das 232 escolas da 1ª CRE para o indicador 1 (Existência de planejamento e
monitoramento de metas/ações de gestão democrática) referentes ao ano de 2013, foram
classificadas em duas categorias: 1) Razões que dificultam a gestão democrática da escola pública; 2)
Razões que facilitam a gestão democrática da escola pública.
Nas justificativas, selecionadas em função da maior frequência de palavras (planejamento e
monitoramento)8, percebe-se a predominância de razões que dificultam a gestão democrática, ainda
que as 232 escolas tenham avaliado este indicador em situação muito boa ou excelente.
O quadro 1 indica o total de justificativas em função das dificuldades e facilidades para a gestão
democrática da escola pública.

JUSTIFICATIVAS DAS ESCOLAS POR FREQUÊNCIA DE PALAVRAS


Indicador 1 - Existência de planejamento e monitoramento de metas/ações de gestão
democrática
PALAVRA TOTAL DE DIFICULTADES FACILIDADES
JUSTIFICATIVAS
Planejamento 96 54 42
Monitoramento 85 61 24

Quadro 1 – Jus ti ficativas das escolas da 1ª CRE – 2013

8 Na s eleção de justificativas por frequência de palavras, algumas se repetiram porque apa reci a m d e f orm a co nju ga da
(pl anejamento e monitoramento) ou não conjugada na mesma justificativa. Es ta margem de repetições foi co ns i dera da
no tota l de justificativas por palavra -chave, motivo pelo qual não se s omou os totais.

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Na observação dos dados se percebe que nas dificuldades apresentadas para planejar e monitorar
ações/metas de gestão democrática da escola destacam-se questões recorrentes tais como: fal ta de
recursos humanos e/ou verbas; falta de tempo; processo em construção; precariedade da
infraestrutura escolar; ausência de previsão no Projeto Político-pedagógico; atendimento de
demandas da mantenedora; imprevistos do cotidiano escolar; planejamento sem monitoramento
das ações.
Por sua vez, as facilidades podem ser destacadas a partir das seguintes recorrências: realização de
reuniões pedagógicas semanais; participação do conselho escolar no planejamento e monitoramento
das ações escolares; prestação de contas à comunidade escolar em Assembleias e informativos;
envolvimento da equipe diretiva, de professores e funcionários; planejamento descentralizado;
participação dos segmentos escolares; adequação das ações escolares à realidade da escola.
No que diz respeito às dificuldades (maioria das justificativas) encontradas pela escola para a ge stão
democrática, as justificativas, em contraste com as avaliações muito boa e excelente aferidas para o
indicador 1, concentraram-se em explicar as razões para a não existência de ações/metas para a
gestão democrática da escola. Já nas justificativas elencadas pela presença de elementos que
indicam as facilidades (minoria das justificativas) para a gestão democrática, predominaram entre
estas a seguinte frase: “existe planejamento e monitoramento de ações/metas de gestão
democrática” isto é, repetiu-se, afirmativamente, o que diz o próprio indicador, sem maiores
preocupações em apontar instrumentos e processos.
Contudo, salta à reflexão analítica o fato de que as unidades escolares que estabeleceram relação
com as facilidades para a gestão democrática trazem elementos de uma escola cuja base de sua
gestão centra-se na participação da comunidade escolar e no conselho escolar como órgão gestor da
escola.
Tal verificação pode ser comprovada quando se associou as palavras planejamento e monitoramento
de forma composta com a palavra conselho escolar (tendo como base as 232 justificativas/escolas)
resultando em 12 justificativas (12 escolas) que estabeleciam esta relação.
Ainda considerando as categorias dificuldades e facilidades para a gestão democrática da escola
pública, se observa que, neste caso, tanto as dificuldades (05 justificativas) quanto às facilidades (07
justificativas) estão relacionadas com a participação da comunidade escolar e local e a atuação do
conselho escolar no planejamento e monitoramento das ações escolares.
Sendo que, nas dificuldades apontadas pelas escolas, a não participação do conselho escolar é
pronunciada como um fator negativo para o cumprimento das ações/metas de gestão democráti ca;
já as facilidades guardam relação direta com a participação da comunidade e do conselho escolar
para o cumprimento de tais ações/metas.
Uma primeira observação a ser feita, nas escolas públicas anali sadas, relaciona-se à interpretação
encontrada nas justificativas das escolas que tende a expressar os limites do discurso segundo o grau
de hierarquia político-administrativo da própria organização do sistema de ensino; por um lado, a
avaliação positiva dada ao indicador que vislumbrava práticas, instrumentos e processos de ge stão
democrática da escola pública, implicou em não estabelecer relações de conflito com o texto original,
dos formuladores da política, gerando avaliações positivas e sem mudanças na gestão, o que poderi a
acontecer no caso de uma avaliação negativa.
Por outro lado, as justificativas, por exigirem uma argumentação mais estruturada sobre a real i dade
escolar, podem ter induzido os atores escolares a contradizerem a pontuação assinalada como muito
boa e excelente ao indicador 1, expressando, ao que parece, a real interpretação destes para ge stão
democrática da escola pública.
Outro elemento a ser destacado refere-se ao fato de que a avaliação dos indicadores nas escolas não
teve a participação, em todo o processo, de todos os segmentos escolares.

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Nesse sentido, cabe questionar sobre o lugar de fala dos segmentos equipe diretiva e professores/as,
que participaram integralmente na avaliação dos indicadores, na hierarquia escolar e o quanto os
seus discursos são determinados pelas instituições e estruturas sociais bem como constitutivos
destas.
Sabe-se que, o Estado brasileiro, ainda guarda em sua estrutura burocrática e sociopolítica, fortes
traços da gestão pública do tipo patrimonialista, da qual deriva a não separação entre o bem públ i co
e o bem privado, isto é, os atores institucionalizados gerem o bem público como se fosse parte do
seu patrimônio pessoal - privatizando as decisões -, sendo legitimados pela própria comunidade
escolar em função do poder da autoridade que emana da hierarquia na organização da escola
(Batista, 2007; Bourdieu, 1996).
Tal prática institucionalizada na gestão da escola pública brasileira tem, frequentemente, se
confrontado com a gestão democrática e participativa do bem público (Batista, 2013).
Resta, ainda, ressaltar que as escolas públicas estaduais, no contexto da prática, sofrem a infl uê nci a
das reformas educacionais induzidas desde a década de 1990 por um modelo normativo global, que ,
atualmente, reproduz o discurso da gestão escolar do tipo gerencial focado na eficiência do si ste ma
de ensino (Batista, 2016).
Tal eficiência é medida por indicadores educacionais construídos para a comparação entre diferentes
países, no caso brasileiro a exemplo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ide b) 9, com
o objetivo de regular a educação no âmbito do próprio sistema capitalista e de suas necessidades,
gerando conflitos e incertezas entre demandas locais e globais para a gestão da escola pública.

6 Considerações finais

Nestas considerações finais, com base em Ball (1994), infiro que as políticas e seus textos são sempre
fruto de múltiplas influências e agendas e sua formulação envolve intenções e negociações dentro do
Estado e dentro do seu processo de formulação.
Já a política como discurso incorpora significados e se utiliza de proposições e palavras, expressando
o contexto em que certas possibilidades de pensamento são construídas.
Como foi possível perceber, a política de avaliação institucional participativa f oi fruto de um contexto
sociopolítico cuja lógica de implementação nas escolas públicas estaduais do RS apresentou
possibilidades de autoavaliação de indicadores escolares, em especial, os de gestão escolar
democrática frequentemente associados a ideologias politico partidárias e não como um princípio do
próprio ordenamento legal referente ao direito à educação.
Este estudo, além disso, reforça a perspectiva de que a escola como bem público n ecessita de
participação ativa de toda a comunidade escolar na sua gestão, contudo, identifica nas justifi cativas
das 232 escolas da 1ª CRE para o indicador - Existência de planejamento e monitoramento de
metas/ações de gestão democrática - uma interpretação que demonstra os limites do di scurso dos
atores escolares institucionalizados, nomeadamente, a equipe diretiva e professores/as, que ao
avaliarem os indicadores ao revés da participação paritária de todos os segmentos escolares, teve
um efeito de distribuir “vozes”, apontando o que é permitido pensar, porque seriam portadores
legítimos da autoridade escolar (Bourdieu, 1996; Ball, 1994).

9 Indicador criado com base em recomendações de organismos i nternacionais que tem como objetivo monitorar a evolução
da s ituação educacional por meio de dados sobre rendimento escol a r co mb i na do co m o d es emp enho d o s a l unos
cons tantes no Censo Escolar e no Sistema de Ava liação da Educação Básica (Saeb), compostos pela Ava liação Nacional da
Educa ção Básica e pela Ava liação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc) ta mbém co nh eci da co mo Pro va B ra s i l
(Ba tista, 2013).

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Para finalizar, ressalto que analisar o discurso como prática social, do ponto de vista desta pesqui sa,
teve também a intenção de incrementar a “consciência crítica” dos sujeitos em relação ao uso
linguístico da palavra institucionalizada como instrumento de poder e, neste processo, oferecer a
todos os atores escolares a oportunidade de enfrentar paritariamente a produção e a interpre tação
dos discursos no espaço escolar.

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Contribuições do Mestrado Profissional em Ensino na Saúde na


Trajetória Profissional de seus Egressos: uma visão qualitativa

Adenize Ribeiro1, Maria Antonieta A. de Oliveira 1, Rosana Brandão Vilela1


1
Progra ma de pós-graduação em Ensino na Saúde Universidade Federal de Alagoas, Brasil.
a denizeribeiro@gmail.com; mariaantonieta07@gmail.com; za navilela@gmail.com

Resumo. Es te estudo teve o propósito de conhecer a percepção dos e g res sos s obre a co ntri b ui çã o d o
Mes tra do Profissional em Ensino na Saúde para a prática profissional. Pa ra tanto, aincorporação do método
qua litativo foi fundamental. Aplicou-se uma entrevista aberta a 35 egressos do programa. Os dados f o ra m
s ubmetidos à a nálise de conteúdo. As percepções ancoravam-se na ideia que: os egress os , a p esa r d e te r
domínio em suas especialidades, carecem do preparo peda g óg i co e , a s a ti vi da d es d es envo l vi da s n o
mes trado responderam às necessidades profissionais de caráter docente. A a bordagem a tiva dos conteúdos
da s disciplinas propiciaram mudanças na forma de atuar enquanto docentes. O p ro d uto d e i nterve nçã o
des empenhou i mportante papel na materialização da pesquisa ao longo do tra jeto formativo. Co ncl u ím os
que a s atividades desenvolvidas no mestrado contribuíram para uma prática profissional mais q ua l i fi ca da
dos egressos.
Palavras-chave: Pós -graduação – Ensino – Egresso.

Contributions of the Professional Master Degree in Health Teaching to the graduates Professional Career:
a qualitative view
Abstract. Thi s study aimed to know the perception of gra duates about the contribution of the Profess io na l
Ma s ter Degree in Health Teaching to professional practice. For that, an incorpora ti o n o f th e q ua l ita ti ve
method for the foundation. An open interview was a pplied to 35 gra duates of the program. The data w e re
s ubmitted to content analysis. As perceptions anchored in the i dea th a t: th e g ra d ua tes, d es pi te th ei r
ma s tery i n their s pecialties, the work of pedagogical preparation, as a ctivities devel o ped i n th e m a s ter s
degree, responds to the professional needs of teaching character. The a ctive approach o f th e d i s ci pl i nes
contents will l ead to changes i n the way of working a nd i n d o cumen ts . Th e p a per p ro du ct p l aye d a n
i mportant role i n the materialization of the research along the f o rm a ti ve pa th . W e co n cl u de th a t th e
a cti vi ties developed during the graduation contribute to a more qualified professional practice of the former
s tudents.
Keywords: Gra duation - Teaching – gra duates

1 Introdução

As novas exigências do mundo do trabalho e sociais têm direcionado e encaminhado o e nsi no para
novos rumos, e em consequência disso os desafios contemporâneos exigem dos docentes um pe rfi l
diferenciado, levando-os a refletir sobre sua prática profissional, e com isso se adequar as atuais
demandas da sociedade que perpassam pelo universo do conhecimento.
Essas exigências apontam para necessidade de melhor preparo dos profissionais para pesquisa e para
o ensino.
Nos últimos anos convivemos com uma rápida modernização na estrutura e formação do
conhecimento e no aprimoramento de técnicas e procedimentos no campo da saúde,
exigindo do profissional um olhar investigativo, reflexivo e crítico no âmbito de sua atuação
profissional (Ramos et al., 2010, p. 363).

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Apesar de muitos avanços a formação dos docentes na área da saúde, ainda encontra-se distante de
atingir um patamar ideal. No Brasil, a grande maioria dos cursos da área da saúde carece de uma
formação pedagógica. Percebe-se, uma tendência a reduzir os saberes dos professores a aspectos
técnico-científicos, empobrecendo as possibilidades de transformação e avanço nas relações de
aprendizagem e ensino (Batista& Silva, 1998).
Parte das necessidades de formação do profissional de saúde, que participa das atividades
curriculares na área de ensino, tem sido suprida pelos cursos de especialização e/ou de curta
duração sobre educação em saúde. Estas atividades têm atendido parcialmente, os anseios de
formação dos profissionais e a necessidade de produção do conhecimento na instituição, gerand o
uma crescente demanda por formação em nível de mestrado (UFAL, 2010).
Neste sentido, foi incentivada a abertura de mestrados do tipo profissional [MP] na áre a de e nsi no
na saúde [MPES] (Brasil, 2010). Esta modalidade de pós-graduação apresenta diferenças do tipo
acadêmico no que diz respeito à orientação dos currículos, composição do corpo docente e disce nte
e trabalho de conclusão de curso (Brasil, 2009a; 2009b).
Esse tipo de mestrado está voltada para profissionais já inseridos no mundo do trabalho e qu e
procuram articular o conhecimento com suas práticas. Surge como um espaço de reflexão e prática
de novos desenhos de ensino e aprendizagem, de modo não apenas a se reinventar, como contribuir
com soluções educacionais para mudanças na formação docente, no âmbito dos serviços de saúde ,
contribuindo para o fortalecimento do sistema único de saúde - SUS. (Brasil, 2010)
O Mestrado Profissional em Ensino na Saúde da Universidade Federal de Alagoas [MPES/UFAL] e stá
associado à Política Nacional de Formação e Desenvolvimento para o Conjunto dos Profi ssi onais da
Saúde, que visa implementar processos com capacidade de impacto no ensino, na gestão setorial,
nas práticas de atenção e no controle social em saúde. Diante disso, recomenda-se que o programa
tenha um corpo discente inserido no serviço de saúde, preferencialmente no cotidiano do conte xto
SUS, do qual deverá emergir o seu objeto de pesquisa (Brasil, 2010).
O público alvo do Programa são professores, técnicos e profissionais da área da saúde que se
encontrem atuando em cenários de ensino-aprendizagem, com vínculo ao SUS e desenvolvendo
atividades de docência, preceptoria ou gestão junto a graduandos ou residentes de saúde (UFAL,
2010).
Na última década, como consequência da crescente participação da sociedade civil nas discussões
sobre a destinação de recursos públicos e da disseminação da cultura de avaliação, aumentaram a
pressão por resultados e transparência dos programas de pós-graduação. avaliar a qualidade de
processos formativos em todos os níveis de ensino, notadamente cursos de mestrado e doutorado, e
sua relação com o mundo profissional passou a fazer parte da agenda de instituições de ensino
superior.
Estudos em países com alto grau de desenvolvimento social e econômico têm como pre ocupação a
qualidade dos cursos de pós-graduação. Calmon (1999) afirma que para que estes se mantenham, é
preciso julgar sua eficácia e eficiência. O programa tem a necessidade de auto avaliação e
estabelecer prioridades.
Considerando que os egressos constituem-se o caminho eficaz para aprimorar a qualidade de um
programa de pós-graduação, esta pesquisa teve como objetivo conhecer a percepção dos egressos
sobre a contribuição do Mestrado Profissional em Ensino na Saúde para a prática professional, e
avaliar o contributo da metodologia qualitativa nesse tipo de estudo.

2 Metodologia

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Este estudo é derivado da pesquisa de mestrado, intitulada: Mestrado Profissional em Ensino na


Saúde: Contribuições para prática Docente e Profissional sob a Ótica dos Egressos ,a qualfoi realizada
entre os anos de 2013 e 2015.
Uma das principais potencialidades da pesquisa do tipo qualitativa é o desvelamento dos sentidos
que orientam as ações e as interações humanas (Minayo, 2013; Taquette &Vilella, 2017). Portanto,
dada a natureza do objeto em questão, escolhemos essa abordagem para o estudo.
A pesquisa qualitativa se ocupa do nível subjetivo e relacional da realidade social, se apropriando das
histórias, experiências, significados, motivos, crenças e valores dos atores sociais (Minayo, 2013).
Green &Thorogood apregoam o potencial da abordagem para dar respostas a problemas que não
são solucionados com estudos de base quantitativa.
O público alvo da pesquisa foi composto por egressos do MPES/UFAL. As informações foram colhidas
em ambiente de intersubjetividade, por meio de entrevistas abertas.
Para Boni e Quaresma (2005):
A entrevista aberta é utilizada quando o pesquisador deseja obter o maior número possíve l
de informações sobre determinado tema, segundo a visão do entrevistado, e també m para
obter um maior detalhamento do assunto em questão. Ela é utilizada geralmente na
descrição de casos individuais, na compreensão de especificidades culturais para
determinados grupos e para comparabilidade de diversos casos (p.74).

O MPES/UFAL tem entre seus objetivos formar mestres com a capacidade de compreender a relação
entre a produção de conhecimentos científicos e as possibilidades de intervenção na realidade,
especialmente a relação entre ensino, saúde e cidadania (UFAL, 2010).
Desde o início do funcionamento do Programa, em 2011, até o início da coleta de dados (2015)
foram titulados 47 mestres das mais variadas profissões. Todos com atuação na graduação e/ou pós-
graduação em saúde. Os sujeitos foram contatados pela equipe de pesquisadores e, após aprovação
do comitê de ética e anuência dos participantes, foi iniciada a coleta de dados.
O critério de inclusão foi ser egresso do curso com titulação obtida até a data da coleta de dados. Os
sujeitos que preenchiam esse perfil foram recrutados por meio de carta-convite, receberam
informações sobre o conteúdo da pesquisa e, estando de acordo, foram entrevistados sozi nhos e m
ambiente com garantia de privacidade. Para compor a amostra, a equipe realizou a coleta de dados
durante 18 meses. Esta foi encerrada quando avaliamos ter ocorrido saturação das informações
colhidas visando os objetivos do estudo.
As entrevistas realizadas obedeceram a um roteiro com questões sobre informações demográficas e
o impacto provocado pelo curso na trajetória profissional desse egresso. As autoras gravaram em
áudio e transcreveram na íntegra as entrevistas. Todo o material recolhido e pesquisado subsidi ou a
análise das entrevistas por meio da técnica de análise temática utilizada para o aprofundamento
compreensivo e crítico das narrativas considerando-se as estruturas de relevância que se fizeram
presentes na categorização do material (Minayo, 2012).
O conjunto das informações passou por um processo de ordenação, classificação, busca das
categorias relevantes que compuseram os núcleos temáticos e evidenciaram a lógica interna do
pensamento dos egressos que deram origem às categorias que emergiram do campo estudado. As
categorias encontradas na pesquisa foram: Pertinência dos conteúdos para a prática profi ssi onal, O
uso das metodologias ativas como estratégia de ensino e A importância do produto de i nte rve nção
como materialização da pesquisa. Esse acervo foi rediscutido através de um diálogo comparativo
com a literatura, trazendo-se à tona as descobertas da pesquisa (Minayo, 2012).
A pesquisa foi aprovada Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas, sob
parecer nº 577.338. Todos os 35 entrevistados assinaram o Termo de consentimento livre e

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esclarecido. E, com a garantia do sigilo e anonimato, foram nomeados com a letra “E” e nume rados
obedecendo a sequência das entrevistas.

3 Resultados e Discussão

As categorias de relevância encontradas na pesquisa se referem a: Pertinência dos conteúdos para a


prática profissional, O uso das metodologias ativas como estratégia de ensino e A importância do
produto de intervenção como materialização da pesquisa. Elas são analisadas a seguir.

A estrutura curricular comprometida com a prática profissional


Andrade, D’Ávila & Oliveira (2004) asseguram que os MPs têm como características a articulação
entre a pesquisa e a produção científica e técnica, um corpo docente qualificado e com e xpe ri ênci a
gerencial, além de desenhos curriculares e estratégias de ensino-aprendizagem inovadoras, que
incorporem as experiências profissionais dos alunos e as demandas da sociedade.
Nessa pesquisa, os egressos ressaltam essa característica da estrutura curricular do MPES com
conteúdos específicos da área de ensino:

“É... o estudo do comportamento do aluno, das metodologias de ensino, é...


as teorias de aprendizado, então acho que isso abriu portas para que a gente
compreendesse melhor o processo de ensino-aprendizagem (E-03)”.

“A maioria das disciplinas que foram ofertadas elas dialogam muito próximo
com a nossa prática docente, então, as bases que a gente viu logo no início, é
vimos teoria do ensino, todas elas convergem pra nos habilitar pra uma
prática docente mais qualificada (E-08)”.

Os fragmentos de fala acima corroboram também com as afirmações de autores quando estes
enfatizam que:
... é primordial que os conteúdos acessados e elaborados no decorrer de um curso de
mestrado sejam propulsores de processos reflexivos que impulsionem a capacidade e a
vontade de se envolver com o entorno social no qual está inserido, no intuito de estabele ce r
vínculos entre a prática profissional e a dinâmica social (Ramos et al. 2010, p. 363).
É possível observar que o conteúdo das disciplinas está em sintonia com a proposta do mestrado e m
instrumentalizar e qualificar a prática profissional do egresso, com um ensino direcionado para o
fortalecimento do SUS.
“As disciplinas contribuíram mais pra que eu tivesse um olhar pra minha
prática profissional, para eu orientar o estagiário, fazer uma supervisão, para
eu melhorar também em sala de aula, que eu dou a parte da Saúde Coletiva,
então eu consegui tentar direcionar mais um ensino voltado pra o SUS”(E-20).

Santos, Hortale e Arouca (2012) sustentam que, para que o egresso do MP possa propor inovações,
ele deve instigar saberes que vão além do domínio técnico da investigação. Isto envolveria sua
capacidade de iniciativa e de criação, da mobilização de pessoas para empreender a inovação, da
gestão e realização de trabalhos coletivos e de gerenciamento de projetos. Para atender a tal pe rfi l
profissional, os cursos dessa modalidade devem criar situações de aprendizagem que potenci ali ze m
o saber-fazer do mestrando.
Portanto, os MP se colocam como um grande desafio, onde a estrutura curricular exige qualidade de
ensino, constante confronto teoria-prática e, inclusive, níveis crescentes de interdisciplinaridade.

20
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O uso das metodologias ativas como estratégia de ensino


Le Boterf (2003) afirma que para melhor mobilizar e combinar recursos na administração de uma
situação nova e complexa para este profissional já envolvido na prática, as instituições proponentes
dessa modalidade de ensino devem adotar estratégias de aprendizagem significativas no
desenvolvimento de competências para formação científica e profissional. Esta recomendação da
utilização de estratégias de ensino-aprendizagem voltadas para educação de adultos foi real çada no
documento do Seminário (Brasil, 2010b).
Nesse estudo, observamos a diversidade de técnicas de ensino utilizadas durante as atividades do
curso, muitas delas com abordagens ativas, como: os trabalhos de grupo, a multiprofissionalidade, a
técnica da roda de conversa e os seminários.

“... o que mais me chamou atenção foram os momentos que a gente pode
desempenhar alguma coisa sobre metodologias ativas” (E-06).

“... as dinâmicas, as metodologias têm sido utilizadas, isso a gente tá levando


para o trabalho da gente, eu tenho utilizado ultimamente muito a questão
das metodologias ativas, tanto com os alunos e até com os usuários” (E-12).
“É eu acho que assim, as aulas que tiveram muito movimento ativo, como:
Roda de Conversa, Seminários, Trabalhos de Grupos ...” (E-07).

O trabalho em equipe foi incentivado, como indicam os depoimentos:

“... acho que o que mais contribuiu foram as discussões em grupo, os


trabalhos em grupo” (E-14).

“... principalmente das disciplinas da integração do grupo e de algumas


disciplinas que me ajudaram ainda mais a fortalecer essa coisa da equipe
interdisciplinar da participação do docente mais ativa dentro da constru ção
do ensino-aprendizagem” (E-26).

Da análise do conjunto dos depoimentos foi possível observar a ocorrência de aportes signifi cati vos
de metodologias ativas para a prática profissional docente.
Pelos relatos dos egressos, verificamos que há uma preocupação desse mestrado em trabalhar
estratégias de ensino de forma ativa, promovendo a integralização da teoria e da prática, be m como
o estímulo ao trabalho em equipe. Esta aposta exige disponibilidade para desconstruir e reconstrui r
conceitos, dando lugar às produções coletivas e, consequentemente, novas formas de pensar, se ntir
e colaborar

A importância do produto de intervenção como materialização da pesquisa


Os documentos (Brasil, 2009a; 2009b) recomendam que os MP´s devem tomar a própria prática
como ponto de partida para empreender mudanças no cotidiano. Especificamente, dos MPES espera-
se transformações do ensinar e aprender no âmbito dos serviços de saúde, em um movimen to de
ação-reflexão-ação (Brasil, 2010).
Para tanto, diferente do mestrado acadêmico, no mestrado profissional, o aluno desenvolve sua
pesquisa a partir de uma inquietude encontrada no seu cotidiano profissional. Esses produtos
poderão ser aplicados em diferentes ambientes de trabalho. Assim, esp era-se que os produtos
originados das pesquisas durante o curso contribuam para a qualificação de profissionais das áreas

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de ensino em saúde e possam produzir conhecimentos nos espaços formais ou não -formais de
ensino (UFAL, 2010).
Nas falas a seguir, os egressos demonstram a importância do produto de intervenção para sua
prática profissional.
“... a preocupação de não ser um mestrado acadêmico e sim um mestrado
profissionalizante para contribuir com a minha prática. Como gera um
produto (de intervenção) você vai contribuir pra sua formação, para o seu
serviço. No meu caso o meu serviço é a docência” (E-05).

“... É a questão da produção do Projeto de Intervenção pra mim foi


fundamental, apesar de muita gente não dar valor, mas pra mim foi
fundamental porque até hoje eu estou trabalhando nisso na minha prática
profissional” (E-19).

O depoimento revela que o produto de intervenção colaborou para a qualificação profissional dos
egressos, significando mudanças no ambiente profissional. Resultados semelhantes aos encontrados
por Vilela & Batista (2016a, 2016b) quando constaram, em pesquisa nacional, que nesta modalidade
de PG, profissionais experientes - já inseridos na prática - voltam à academia para qualificá-la com
teorias e pesquisas apropriadas.
Observamos que, os produtos de intervenção desempenharam o papel de ser a materialização da
pesquisa ao longo do trajeto formativo, pois, foi na elaboração e aplicações deles que a investigação
de cada profissional ganhou vida. Ou seja, o produto final possibilita que o egresso de senvol va, no
seu local de trabalho, novas técnicas de organização das atividades institucionais e, com isso, realizar
também transformações nas instituições de que são oriundos.
Diante dos resultados e discussão apresentadas, acreditamos que o MPES não é um tipo si mpl e s de
PG; é diferente. E, por seu formato, exigências e perfil discente, torna-se uma modalidade até mai s
difícil do que o mestrado acadêmico, principalmente porque o pesquisador deve debruçar -se sobre
um objeto no qual está envolvido.
Nesse estudo, a abordagem qualitativa apontou inúmeras vantagens em sua utilização. A mais
relevante é que, por seu intermédio, pode-se investigar o como das situações e não ape nas o que ,
onde e quando os fenômenos acontecem.

4 Considerações finais
É importante destacar a difícil tarefa de reunir os dados do trabalho e, ao mesmo tempo, garanti r o
distanciamento entre o pesquisador e o objeto. Para isso, o estudo da literatura foi fundamental,
garantindo a valorização dos muitos aspectos da pesquisa e diminuindo a influência do e ntusi asmo
profissional das pesquisadoras e do envolvimento como protagonistas na construção de um MPES.
Responder ao questionamento sobre as contribuições do mestrado profissional em ensino na saúde
para a prática profissional, na visão do egresso, permitiu, a partir do referencial teórico construído,
evidenciar que a estrutura curricular propiciou estes sujeitos repensarem o processo de ensino
aprendizagem. As disciplinas didático-pedagógicas e as leituras ali realizadas proporcionaram,
segundo os depoimentos, mudanças na forma de trabalhar de alguns egressos, a partir de uma vi são
mais ampla sobre o processo de ensino e aprendizagem.
Nas narrativas dos egressos, apreendemos que o MPES/UFAL atende aos seus objetivos: propi ciar a
utilização de novas e diferentes metodologias e estratégias de ensino para adultos, ocasionando
mudanças na forma de atuar como docentes.
Os egressos mencionaram os múltiplos efeitos produzidos em cada um, e no grupo, a partir das
diferentes metodologias de ensino-aprendizagem utilizadas no programa. Isto atende ao modelo

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provocativo do MP que se propõe a estimular a criatividade e a inovação, atributos fundamentais de


processos artesanais. O MPES/UFAL, ao se assumir como curso de caráter multidisciplinar, com um
corpo docente multiprofissional, abre uma maior possibilidade de inovar em seus currículos,
adequando-os a ambientes complexos e interdisciplinares.
O produto de intervenção, elaborado a partir das pesquisas, desempenhou o papel de ser a
materialização destas, ao longo do trajeto formativo e do enfrentamento das demandas de cada
professor. Representa a qualificação das práticas pela pesquisa, bem como, a transformação do
ambiente profissional com contribuições para o avanço do ensino na saúde e fortalecimento do SUS.
É importante pensar no desenvolvimento de instrumentos de avaliação que permitam
acompanhamento dos egressos, seguindo sua trajetória profissional, bem como o desenrolar do
Produto Final.
As concepções reveladas sobre o MPES/UFAL são compatíveis a Portaria de n. 17/2009 da Capes, a
qual tem como premissa que o mestrado profissional é um curso de pós-graduação stricto sensu que
oportuniza a capacitação voltada para a prática profissional, por meio da aplicação do conhecimento
em conjunto com o rigor metodológico e os fundamentos científicos, possibilitando a transformação
de procedimentos.
Este tipo de PG, de caráter permanente e regularidade de oferta, implica em: continuidade de
projetos de transformação da realidade, na medida em que vão se sucedendo e aprimorando; a
valorização da força de trabalho inserida nos serviços; a exigência de integração real entre acade mia
e serviços; o incentivo à busca de objetos de estudo que tenham origem no mundo do trabalho, para
onde retornam como conhecimento construído.
Por fim, mostra-se necessária a atitude de refletir e atuar para encarar um novo formato educacional
que traz tantos desafios na sua proposta de ser, aprender e entender mais sobre a identidade dos
MPES.
Gostaríamos ainda de destacar que a abordagem qualitativa utilizada em nosso estudo possi bi litou
conhecer elementos relevantes e decisivos para avaliação e o planejamento, a médio e longo prazo,
das ações do programa.
Nosso estudo apresenta limites, pois resumiu-se à perspectiva do egresso, não considerando o outro
lado desta relação, o corpo docente do programa. E, deixa em aberto questões a serem investigadas
sobre o impacto e a divulgação dos produtos de intervenção. Contudo, nossos achados e videnci am
que, para os egressos, o mestrado em foco exerce sua função de espaço de reflexão de práticas,
contribuindo para o avanço do ensino na saúde no Estado de Alagoas e consequente fortaleci mento
do SUS.

Referências

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Dispõe sobre o mestrado profissional no âmbito da Fundação Coordenação de
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O Processo de Construção de um Quadro de Análise da Inovação e


Sustentabilidade (QUAIS) para Instituições de Ensino Superior

Diego de Queiroz Machado 1, Fátima Regina Ney Matos 2 , Augusto Marcos Carvalho de Sena 3 e
Mario Henrique Ogasavara4
1
Uni versidade Federal do Ceará. digomachado@ufc.br
2
Ins tituto Superior Mi guel Torga, Portugal, e Universidade Potiguar, Brasil. fneymatos@globo.com
3
Uni versidade de Fortaleza, Brasil. amsena@unifor.br
4
Es col a Superior de Propaganda e Ma rketing, Brasil. mario.ogasavara@espm.br

Resumo. O objetivo deste estudo consiste em desenvolver um quadro de a nálise do processo de gestã o d a
i nova ção e s ustentabilidade organizacional, considerando suas ca pacidades tecnol óg i ca s e d i mens ões e
econômica, s ocial e ambiental, para instituições de ensino superior. Pa ra ta nto, utilizou-se de uma pesquisa
documental, para coleta de legislações e manuais técnicos relativos ao ens i n o s u peri or n o B ra s il e em
di ferentes países e, desse modo, elaborar um quadro com diferentes níveis hierárquicos e a ti vi da des q ue
torna possível a valiar o nível de desenvolvimento da IES e m ca da u ma d el a s . S ua u ti li z a çã o p ermi te
i dentificar a s atividades que estão em um nível maior de a cumulação de capacidades, tan to te cnol ó gi ca s
como s ustentáveis, e a s atividades que ca recem de um maior esforço de desenvolvimento.
Palavras-chave: Qua dro de análise; i novação; s ustentabilidade; instituições de ensino s uperi o r; p es qui s a
documental.

The Construction Process of a Framework for Innovation and Sustainability Analysis (FISA) for Higher
Education Institutions
Abstract. The objective of this study is to develop a framework for a nalyzin g th e p ro ces s o f i n nova ti o n
ma nagement and organizational s ustainability, considering i ts technological ca pa bi l iti es a n d e cono mi c,
s oci al a nd envi ronmental dimensions for higher education institutions. In order to do s o, a d ocum enta ry
res earch was used to collect legislation a nd technical manuals related to higher education in B ra zi l a nd i n
di fferent countries a nd, i n this way, elaborate a fra mework with different hierarchical l evels and a cti vi ti es
tha t ma kes i t possible to evaluate the l evel of development of the HEI in each one of them. I ts us e a l lo ws
i dentifying those activities that are a t a higher l evel of accumulation of ca pacities, both tech nol og i ca l a nd
s us tainable, a nd the a ctivities that need a greater effort of development.
Keywords: Fra mework; innova tion; s ustainability; higher education institutions; documentary research.

1 Introdução

Sendo as instituições de ensino superior (IES) um tipo de instituição voltado para as práticas de
pesquisa e desenvolvimento de inovações, seus mecanismos de desenvolvimento de capacidades de
inovação merecem destaque e análise própria. Nos últimos anos, alguns trabalhos têm sido
desenvolvidos no sentido de possibilitar um maior desenvolvimento da inovação nas IES (Danjum &
Rasli, 2012; Golooba & Ahlan, 2013; Hamid et al., 2015). Esses estudos, contudo, abordam a gestão
da inovação nas IES apenas no nível conceitual, não permitindo a aplicação dos seus quadros e
estruturas construídos para analisar a gestão da inovação e, consequentemente, favorecer o
desenvolvimento de inovações nessas instituições.
No que se referem ao fenômeno da sustentabilidade, análises de seus aspectos no contexto das IES
também têm sido cada vez mais realizadas (Stephens & Graham, 2010), já que estas instituiçõe s são
consideradas fundamentais na construção de sociedades mais sustentáveis e na consolidação de

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novos paradigmas de desenvolvimento (Hoover & Harder, 2014; Katiliūtė, Daunorienė & Katkutė,
2014). Essas análises, porém, são voltadas apenas para aspectos específicos da sustentabilidade,
como os institucionais e ambientais. Assim, pode-se avançar nas pesquisas com o desenvolvimento
de análises que envolvam um conjunto maior de aspectos da sustentabilidade organizacional, como
os propostos pelo triple bottom line de Elkington (1997).
O paradigma tecnológico atual, ao voltar-se para o pensamento e princípios do desenvolvimento
sustentável na criação e gestão de novas tecnologias, vem reforçando a exigência de novos
elementos para o processo de inovação, como as inovações sustentáveis e as capacidades
sustentáveis. Desse modo, reconhece-se a necessidade de desenvolvimento de quadros de anál i se
que apreciem os principais elementos de ambos os fenômenos e permitam analisar as relações entre
esses elementos, especialmente dentro de organizações que são consideradas elementos -chave no
processo de inovação e sustentabilidade, como é o caso das IES.
Para suprir esta lacuna percebida nas pesquisas da área, o objetivo deste estudo consiste em
desenvolver um quadro de análise do processo de gestão da inovação e sustentabilidade
organizacional, considerando suas capacidades tecnológicas e dimensões e econômica, social e
ambiental, para instituições de ensino superior.

2 Metodologia

Inicialmente, a partir das funções tecnológicas referentes ao processo de gestão da inovação e das
dimensões da sustentabilidade, e incorporando ainda diferentes níveis de capacidades sustentáveis e
tecnológicas para esses fenômenos, foi construído um quadro de análise genérico para ambos os
fenômenos, em um modelo tridimensional, como exposto na figura 1.
Níveis de capacidades
tecnológicas sustentáveis

Nível N

Nível 4

Nível 3 Funções tecnológicas na


gestão da inovação

Nível 2 Função N
Função D
Função C
Função B
Nível 1
Função A
Dimensões da sustentabilidade
Dimensão N
Dimensão D
Dimensão A

Dimensão B

Dimensão C

Fig. 1. Quadro de análise em inovação e sustentabilidade – QUAIS (genérico).

Para esta pesquisa, este quadro de análise foi adaptado para refletir os seus objetivos e campo
pesquisado. Quanto à gestão da inovação, sendo as organizações foco da pesquisa as instituições de
ensino superior, optou-se por concentrar os esforços de construção e aplicação do QUAIS apenas

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para o eixo do ensino, considerado como fundamental pela relevância e significado que lhe confere a
comunidade universitária ao integrar o conhecimento produzido por meio das atividades de pesquisa
e os anseios da sociedade que são o objetivo das atividades de extensão (Moita & Andrade, 2009).
No que se refere ao fenômeno da sustentabilidade, optou-se pelas dimensões do triple bottom line
de Elkington (1997) — econômica, social e ambiental.
Para a identificação das atividades e construção dos diversos níveis que compõem o QUAIS, foi
utilizado método de pesquisa documental, mediante coleta de legislações e manuais técnicos
relativos ao ensino superior que possibilitassem fundamentar essa construção.
No contexto brasileiro, foram analisadas legislações, portarias, resoluções e manuais relativos ao
ensino superior no país, sobretudo os publicados pelo Ministério da Educação (MEC). Al é m di sso, a
fim de possibilitar a incorporação de aspectos do contexto internacional, foram considerados
também os padrões e regulamentações relativos às universidades de outros países. Para a seleção
desses países, utilizou-se o ranking do QS World University (2013), que é uma das principais
instituições internacionais que realiza pesquisas relativas ao ensino superior em todo o mundo. Em
seu relatório de 2013, os países com mais universidades entre as cem primeiras do ranking foram:
Estados Unidos; Reino Unido; Austrália; Japão; e Holanda. Desse modo, foram utilizados també m os
padrões exigidos para a regulamentação e avaliação das IES nesses países, sendo seus agentes
reguladores: Commission on Institutions of Higher Education (CIHE), nos Estados Unidos; Europe an
Association for Quality Assurance in Higher Education (ENQA), European Students’ Union (ESU),
European University Association (EUA) e European Association of Institutions in Higher Education
(EURASHE), na União Européia, que tem entre os seus membros, na época de realização desta
pesquisa, o Reino Unido e a Holanda; Tertiary Education Quality and Standards Agency (TEQSA), na
Austrália; e Japan University Accreditation Association (JUAA), no Japão.
As seções seguintes trazem esse processo de construção do QUAIS adaptado para as IES, com suas
funções e atividades tecnológicas relativas à gestão da inovação e suas dimensões e atividades
sustentáveis relativas à sustentabilidade organizacional.

3 Funções e Atividades Tecnológicas para a Construção do QUAIS

Em um primeiro momento, foram selecionadas as dimensões de avaliação mais relacionadas com o


eixo do ensino nas IES, apresentadas nos instrumentos de avaliação do MEC (2014, 2015), sendo
elas: organização didático-pedagógica; corpo docente e discente; e infraestrutura. Em cada uma
dessas dimensões, as principais atividades correspondentes foram descritas e organizadas, tendo
como nível básico as exigências mínimas para a autorização e reconhecimento dos cursos por parte
do MEC e de alguns órgãos internacionais, considerando ainda como nível avançado os critérios de
excelência que compõem esses diversos padrões de avaliação. Na tabela 1, constam essas atividade s
relacionadas com a organização didático-pedagógica.

Tabela 1. Ca pa cidades tecnológicas para a função organização didático-pedagógica nas IES

Nívei s de Ati vi dades tecnológicas no eixo do ensino


ca pa cidades
tecnológicas (CTs) Funçã o organização didático-pedagógica
Es trutura curri cular a tualizada, flexível e i nterdisciplinar, mas autocentrada, s em f o co n o a l uno .
(1) Ati vi dades de prospecção de novos cursos s e concentram no acompanhamento dos conco rrentes
Opera cional- (benchmarking). Procedimentos de a valiação a tendem à co ncepçã o d e ca da u m d os cu rs os ,
bá s ico ba s eando-se nos conhecimentos das disciplinas envolvidas. Reali za f u nções b uro crá ti ca s e d e
(CTOB) s upervisão relativas a os estágios. Núcleos de práticas obrigatórios, como os dos cursos n a s á rea s
jurídi ca e da s aúde.

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Es trutura curri cular com foco nas necessidades de mercado. Realiza a tivi dades de pros pecçã o d e
(2)
novos cursos com benchmarking e pesquisas informais. Procedimentos d e a va l ia çã o a va l ia m a
Opera cional-
a pl icação prática de conhecimentos, habilidades e competências no campo das disciplinas de ca da
a va nçado
curs o. Progra ma de divulgação de va gas de estágio para os alunos. Núcleos de práticas obrigatórios
(CTOA)
que s ão referências regionais.
Es trutura curri cular fundamentada em pesquisa de mercado e benchmarking i n terno e e xtern o
(nível local). Programa formalizado de prospecção de novos cursos, em u m h ori z onte d e cu rto
(3)
pra zo (inferior a ci nco anos). Procedimentos de a valiação avaliam os aspectos necessá ri o s pa ra o
Inova dor-básico
emprego e admissão em registro profissional, ca so seja exigido. Programa completo de gestão d a s
(CTIB)
a ti vi dades de estágio com a ções de formação e orientação para os alunos. Possui outros núcleos de
prá ti cas além dos obrigatórios.
Es trutura curri cular fundamentada em pesquisa de mercado e benchmarking i n terno e e xtern o
(4) (nível nacional). Programa formalizado de prospecção de novos cursos, em um horizonte de médi o
Inova dor- pra zo (ci nco a dez a nos). Procedimentos compl etos d e a va l ia çã o ( te ori a , p rá ti ca e re gi s tro
i ntermediário profi ssional), fundamentandos em um pensamento críti co. Prog ra m a co mpl eto d e g es tã o d a s
(CTII) a ti vi dades de estágio, com parcerias e convênios com empresas. Núcleos de práticas voltados para
todos os s eus cursos.
Es trutura curri cular fundamentada em pesquisa de mercado e benchmarking i n terno e e xtern o
(nível internacional). Progra ma formalizado de prospecção de novos cursos, em um h o ri z o nte d e
(5) l ongo prazo (a cima de dez a nos). Procedimentos de completos d e a va l ia çã o ( te ori a , p rá ti ca e
Inova dor- regi stro profissional), fundamentados em um pensamento crítico e voltados para os resultados d e
a va nçado a prendizagem esperados em comparativos nacionais e internacio na i s. Pro g ra m a co mpl eto d e
(CTIA) ges tão das atividades de estágio, co m s i s tema s a va n ça dos d e a va l i a çã o e n íve i s a l tos d e
des empenho e contratação dos alunos. É referência em núcleos de práticas voltados para todos o s
s eus cursos.

As atividades relativas à organização didático-pedagógica são referentes aos aspectos curri cul are s,
prospecção de novos cursos, avaliação do processo de ensino e aprendizagem, estágio
supervisionado e núcleos de práticas. No âmbito curricular, que se configura no cerne da mi ssão de
ensino das IES (ENQA, ESU, EUA & EURASHE, 2015), o MEC (2015) considera como fundamental as
características de flexibilidade, interdisciplinaridade e atualização de sua estrutura, assi m como de
seus conteúdos e metodologias. Essa atualização deve possibilitar o desenvolvimento do perfil
profissional dos egressos e estar relacionada com tendências acadêmicas e expectativas da
sociedade e dos ambientes nacional e internacional, refletindo as relações entre o ensino e a
aprendizagem (ENQA et al., 2015; JUAA, 2011).
Contudo, no que diz respeito aos procedimentos de avaliação do processo de e nsino e aprendizagem
nas IES, o MEC (2014, 2015) aponta apenas a necessidade de existência de uma relação entre esses
procedimentos e a concepção de cada um dos cursos, conforme prevista nos projetos pedagógicos
dos cursos (PPC). Um detalhamento mais profundo deste aspecto é encontrado nas diretrizes da
TEQSA (2014), que ressalta a avaliação das competências práticas no campo das disciplinas, al é m do
pensamento crítico, e da fundamentação em padrões nacionais e internacionais de cada curso.
Quanto aos aspectos referentes às atividades de estágio curricular supervisionado, conforme a JUAA
(2011), é necessário que as universidades desenvolvam estruturas e processos que possam ofe rece r
apoio para o desenvolvimento de carreira dos discentes, fornecendo orientaçõ es relacionadas à
seleção de planos de carreira.
Em relação aos núcleos de práticas, o MEC (2015) determina como obrigatórios apenas os núcleos de
práticas jurídicas e os núcleos de práticas de saúde. Para as demais áreas, como gestão ou
engenharias, núcleos de práticas também podem ser implantados como forma de desenvolver
atividades simuladas ou de aplicação, atendendo às demandas desses cursos e, em complemento, da
própria sociedade.
Quanto ao segundo grupo de atividades, este tem como foco aspectos de p essoal, mais
especificamente do corpo docente e discente, como consta na tabela 2.

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Tabela 2. Ca pa cidades tecnológicas para a função corpo docente e discente nas IES

Nívei s de Ati vi dades tecnológicas no eixo do ensino


ca pa cidades
tecnológicas (CTs) Funçã o corpo docente e discente
(1) Rea lização esporádica de formações gerais para o desenvolvimento docente. Sistemas bá s i cos d e
Opera cional- a tendimento a os alunos e controle a cadêmico, com u ma n o rma ti z a çã o m í ni ma d os f l u xos e
bá s ico processos. Programas básicos de assessoria pedagógica e de acessibilidade do aluno.
(CTOB)
(2) Rea lização regular de treinamentos e formações gerais para os docentes . S i s tema s b á si cos d e
Opera cional- a tendimento a os alunos e controle a cadêmico, com a normatização de todos os fluxos e processos.
a va nçado Progra mas completos de assessoria pedagógica e a cessibilidade do aluno.
(CTOA)
Progra ma básico de desenvolvimento docente, com formações gerais. Sistemas d e a tendi m ento
a os alunos e controle acadêmico desenvolvidos pela própri a i ns ti tui çã o, co m u ma co ns ta nte
(3)
revi s ão da normatização dos fluxos e processos e com alguns s erviços i nformatizados. Pro g ra ma s
Inova dor-básico
de a ssessoria pedagógica e programas de apoio psicopedagógico avançados, voltados para todos os
(CTIB)
ti pos de dificuldades e deficiências (emocionais, físicas e de aprendizagem), i niciando uma cu l tura
de i nclusão.
Progra ma de des envol vi mento docente com forma ções gera i s e es pecífi ca s . Si s tema s de
(4)
a tendimento a os alunos e controle a cadêmico desenvolvidos pela própria i nstituição, com um nível
Inova dor-
médi o de informatização dos serviços. Programas de assessoria pedagógica e programas de a p oi o
i ntermediário
ps i copedagógico a vançados, com um campus totalmente acessível , f o rta l ecendo a cu l tura d e
(CTII)
i ncl usão.
Progra ma avançado de desenvolvimento docente, fundamentado na análise de u m p ortf ól i o d o
(5) perfi l dos docentes. Sistemas de atendimento aos a lunos e controle acadêmico desenvolvi dos pel a
Inova dor- i ns tituição, com os s erviços totalmente informatizados na chamada s ecretaria digital. Programas de
a va nçado a s sessoria pedagógica e programas de apoi o p s ico peda g ógi co a va n ça dos , co m u m cam pus
(CTIA) tota l mente acessível e a daptação completa dos recursos instrucionais, em um cultura estabelecida
de i nclusão.

As atividades voltadas para a capacitação docente podem ocorrer em diversos formatos, desde
formações básicas e gerais para todos os docentes, até a constituição de um programa compl e to de
acompanhamento e capacitação dos docentes, dotado de formações específicas, como
coordenadores e diretores (JUAA, 2011; TEQSA, 2014).
No âmbito discente, para os processos de controle acadêmico e atendimento aos estudantes, a CIHE
(2011) e a TEQSA (2014) sobressaltam os processos de tratamento de queixas e reclamações dos
estudantes, afirmando a necessidade da existência de políticas e processos cl arame nte de fi ni dos e
divulgados de análise e devolução de queixas formais ou recursos contra decisões acadê mi cas, se m
custos ou represálias para os alunos.
Quanto aos programas de apoio aos alunos, observa-se o diposto no decreto nº 7.611, de 17 de
novembro de 2011 (Brasil, 2011), o qual visa garantir a existência de serviços de apoio especializado
voltados para a eliminação de barreiras físicas, de comunicação e de informação que restringem a
participação e o desenvolvimento acadêmico e social de estudantes com deficiência ou transtornos
de aprendizagem. Neste sentido, os padrões da TEQSA (2014) salientam ainda a importância da
inclusão de grupos culturais nativos, como é o caso dos aborígenes australiados que, no caso do
Brasil, correspondem aos povos indígenas brasileiros, criando oportunidades de participação e
integração de alunos dessas comunidades no ambiente acadêmico.
Finalmente, a última função para o eixo do ensino aponta para os principais elementos da
infraestrutura (salas de aula, recursos de tecnologias de informação e comunicação, bibliotecas,
laboratórios didáticos), que dão suporte às demais atividades das IES (MEC, 2014, 2015). A tabela 3
traz a descrição dos seus níveis de capacidades tecnológicas.

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Tabela 3. Ca pa cidades tecnológicas para a função infraestrutura nas IES

Nívei s de Ati vi dades tecnológicas no eixo do ensino


ca pa cidades
tecnológicas (CTs) Funçã o i nfraestrutura
(1) Sa l as de a ula adequadas ao funci o na mento . La b ora tóri os e re curs os s i m pl es d e a ces s o à
Opera cional- i nformática. Biblioteca com diponibilidade mínima de acervo básico e complementar da bibliografia
bá s ico dos cursos, a lém da assinatura de periódicos especializados. Laboratórios didáticos especiali za d os
(CTOB) i mplantados com respectivas normas de funcionamento, utilização e segurança.
Sa l as de a ula com conforto e disponibilidade de equipamentos. La boratórios completos de acesso à
(2)
i nformática, com boa velocidade de a cesso à i nternet e wi-fi n a s p ri nci pa i s á rea s d o cam pus .
Opera cional-
Bi blioteca com disponibilidade média de a cervo básico e complementar da bibliografia dos curs os ,
a va nçado
a l ém da assinatura de periódicos especializados e boa infra es trutura . La bo ra tóri os d i dá ti co s
(CTOA)
es pecializados com equipamentos e recursos a vançados.
Sa l as de a ula com excelente conforto e recursos multimí di a d e úl ti ma g e ra çã o. La b ora tóri os
compl etos de a cesso à informática, com excelente velocidade de acesso à i nternet e wi-fi em todas
(3) a s á reas do campus, além de orientações e treinamentos para o uso desses recu rs o s . B i bl io teca
Inova dor-básico com di sponibilidade grande de acervo básico e complementar da bibliografia dos cursos , a l ém da
(CTIB) a s sinatura de periódicos especializados e excelente infraestrutura. Fornece treina mento e a poi o
a dequado para a s ua utilização. Laboratórios didá ti cos es peci a l i za dos co m e qui pa m entos e
recurs os a vançados para a poio técnico e manutenção de equipamentos.
Sa l as de a ula em um formato que priorize a interação entre discentes e do centes . La bo ra tóri os
compl etos de a cesso à informática, com excelente velocidade de acesso à i nternet e wi-fi em todas
(4) a s á reas do campus, além de treinamentos para o u s o e p ol í ti ca s b á s i ca s d e a tua li z a çã o d e
Inova dor- equi pa mentos e softwares. Bi bl i oteca com di s poni bi l i da de gra nde de a cervo bá s i co e
i ntermediário compl ementar da bibliografia dos cursos, a lém da assina tura d e p eri ódi cos e s peci a li z a dos e
(CTII) excel ente i nfraestrutura, com treinamentos e alguns s erviços de a cesso vi rtual, bases d e d a do s e
bus ca de referências. La boratórios didático s es peci a l iz a dos co m e qui pa m entos e recu rs os
a va nçados, a lém de políticas básicas de a tualização de equipamentos e disponibili dade de insumos.
Sa l a s de a ul a com má xi ma i ntera çã o entre di s centes e docentes , em um a mbi ente de
a prendi za gem a l ém do ens i no forma l . La bora tóri os com recurs os a va nça dos de a ces s o à
i nformática, com excelente velocidade de a cesso à internet e wi-fi em todas as á reas d o cam pus ,
(5) a l ém de treinamentos para o uso e políti ca s co m pl eta s d e a tua l i za çã o d e e qui pa m entos e
Inova dor- softwares. Bi blioteca com disponibilidade grande de a cervo básico e complementar da bibliogra f i a
a va nçado dos cursos, a lém da assinatura de periódicos especializ a dos e excel en te i nf ra es trutura , co m
(CTIA) trei namentos e serviços completos de a cesso vi rtual, bases d e da d os e b us ca d e re f erênci a s.
La boratórios didáticos especializados com equipamentos e recursos avançados, além de p o l íti ca s
compl etas de a tualização de equipamentos e disponibi l i da de d e i ns u mos , a tua nd o a i nda n a
pres tação de servi ços à comunidade.
Infraestrutura é tida como essencial para o bom desenvolvimento de todas as demais atividades das
IES (ENQA et al., 2015), sendo o aspecto mais destacado pelas diversas diretrizes e padrões relati vos
ao ensino superior analisados. As salas de aula e outras instalações, portanto, devem ser
devidamente equipadas e adequadas em termos de capacidade, com recursos tecnológicos e
educacionais adequados para apoiar o ensino e a aprendizagem (CIHE, 2011). Neste ambiente, o
acesso seguro a tecnologias de informação, como recurso de informática e internet, deve estar
disponível continuamente, com interrupções razoáveis sendo permitidas apenas em casos de
manutenção (TEQSA, 2014).
No que se referem às bibliotecas, elas devem se constituir como um espaço de acesso a mate ri ai s e
informações, podendo ainda estabelecer um sistema de partilha de informações acadêmicas com
outras instituições de ensino e pesquisa, dentro e fora do seu próprio país, usando redes de
bibliotecas (JUAA, 2011). Além disso, as bibliotecas e os demais recursos de aprendizagem, como
laboratórios didáticos, estúdios de simulação ou quaisquer instalações que são especificadas ou
recomendadas para determinados cursos, devem se encontrar constantemente com seus recursos e
equipamentos atualizados e estar sempre acessíveis aos estudantes quando necessários (TEQSA,
2014).

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4 Dimensões e Atividades Sustentáveis para a Construção do QUAIS

No caso das atividades relativas à dimensão econômica da sustentabilidade , que integram às


dimensões da sustentabilidade que compõem o QUAIS, foram considerados quatro grupos principai s
de atividades, que são: foco da missão institucional; visão temporal nos negócios; transparênci a nas
atividades; e consequências econômicas das atividades. A tabela 4 apresenta as atividades desses
grupos em seus diferentes níveis.

Tabela 4. Ca pa cidades sustentáveis para a dimensão econômica nas IES

Nívei s de
ca pa cidades Ati vi dades sustentáveis na dimensão econômica
s us tentáveis (CSs)
Foco da missão institucional voltado para a qualidade dos produtos ou s erviços. Visão de negóci os
(1) Rea tivo
de curto pra zo. Ausência de transparência em suas atividades. Consequências econômicas i nternas
(CSR)
da s atividades, como a maximização do l ucro.
Foco da missão institucional expandido para envolver ações de comércio justo e é ti co. Vi s ã o d e
(2) Adota nte negócios de curto e médio prazo. Pouca trans pa rên ci a e m s ua s a ti vi da d es. Co n s equên ci a s
(CSA) econômicas internas das a tividades, indo além da ma ximização do lucro, com a redução de cus tos
ou a umento da eficiência operacional.
Foco da missão institucional expandido para envolver pesquisas e ações em sustentabilidade. Visão
(3) Proa ti vo
de negócios de médio prazo. Média transparência em suas atividades. Consequências econômica s
(CSP)
i nternas e externas das atividades, com a tuação inicial no desenvolvimento econômico da região.
Foco da missão institucional expandido para envolver bons resultados p el a i m pl ementa çã o d e
(4) Vol untário prá ti cas sustentáveis. Visão de negócios de médio e l ongo pra z o. Al ta tra ns pa rên ci a e m s ua s
(CSV) a ti vi dades. Consequências econômicas internas e externas das atividades, com influência média no
des envolvimento econômico da região.
Foco da missão institucional expandido para envolver o desenvolvi mento de negócios sustentáveis,
(5) Sus tentável com tecnologias s ociais e ambientais. Visão de negócios de l ongo prazo. Tra nsparência co m pl eta
(CSS) em s uas atividades. Consequências econômicas i nternas e externas das a tivi dades, com i nfluênci a
concreta no desenvolvimento econômico da região.

Nesta dimensão econômica percebe-se que os níveis de capacidades sustentáveis apontam uma
evolução da gestão do curto para o longo prazo (JUAA, 2011), com aumento dos investimentos em
sustentabilidade e inovação, de forma a construir uma sustentabilidade econômica para a
organização. Além disso, as atividades da universidade devem impactar positivamente no
desenvolvimento econômico da região já que, de acordo com o MEC (2014), a sustentabilidade
econômica ou financeira das IES deve ser acompanhada de ações institucionais vol tadas para o
desenvolvimento econômico da região.
Para a dimensão social, as atividades sustentáveis ressaltam os projetos de responsabilidade social e
os relacionamentos entre a instituição e a comunidade, assim como com os demais stakeholders. A
tabela 5 expõe cada uma dessas atividades e seus níveis de capacidades.

Tabela 5. Ca pa cidades sustentáveis para a dimensão social nas IES

Nívei s de
ca pa cidades Ati vi dades sustentáveis na dimensão s ocial
s us tentáveis
(1) Rea tivo Aus ência de projetos de responsabilidade s ocial. Pouca interação entre a i nstituição e s eus agentes
(CSR) rel evantes.
(2) Adota nte Des envolvimento de projetos embrionários de responsabilidade s ocial. Construção d e ca na i s d e
(CSA) comunicação para o desenvolvimento de relacionamentos com a comunidade i nterna e externa.
(3) Proa ti vo Di versas ações de responsabilidade s oci a l d es envo l vi da s p el a i ns ti tui çã o , co mo a çõ es d e

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(CSP) forta l ecimento cultural e do papel dos principais grupos, defesa e promoção dos direitos humanos
e i gualdade étnico-racial. Relacionamento desenvolvido com a comunidade i nterna e externa , n o
entorno da i nstituição.
Progra ma formalizado de projetos de responsabilidade soci a l , q ue i ncl ui a çõ es d e d ef es a d a
(4) Vol untário memória cultural, produção a rtística e patrimônio cu l tura l da re g i ã o. R el a ci o na men to b em
(CSV) des envol vi do com a comuni da de i nterna , externa e outros a gentes l oca i s como ONGs e
a s sociações l ocais.
Progra ma institucionalizado e amplo de projetos de responsabilida d e s oci a l , co m p ro jetos d e
(5) Sus tentável referência no ca mpo. Relacionamento bem desenvolvi d o co m to dos o s a g entes re l eva ntes ,
(CSS) i ncl uindo parceria com outros centros de pesquisa, univers i da des e i ns ti tui ções , e m ca rá ter
i nternacional.

Em suas diretrizes e manuais, o MEC (2014) salienta o direcionamento das ações de responsabilidade
social das IES como estando prioritariamente voltadas para a memória cultural, produção artística,
patrimônio cultural, inclusão social, direitos humanos e igualdade étnico-racial, e stas duas úl ti mas
devendo ainda estar incluídas como conteúdo curricular em todos os seus cursos (MEC, 2015),
minando quaisquer ações de intolerância ou discriminação contra estudantes, professores ou
quaisquer pessoas (ENQA et al., 2015). Para tanto, o estabelecimento de canais de comunicação
entre a instituição e seus diversos stakeholders é essencial, de forma a possibilitar a construção de
relacionamentos com esses agentes, incentivando a sua participação nas atividades e projetos da IES
(CIHE, 2011).
Por fim, a tabela 6 apresenta cada uma das atividades tecnológicas de sustentabilidade na dimensão
ambiental em seus níveis de capacidades.

Tabela 6. Ca pa cidades sustentáveis para a dimensão ambiental nas IES

Nívei s de
ca pa cidades Ati vi dades sustentáveis na dimensão a mbiental
s us tentáveis
(1) Rea tivo Implantação de práticas sustentáveis a penas em nível de correção, com uso coercitivo dos recursos
(CSR) na turais. Abordagem mínima e concentrada de conteúdos pertinentes à educação ambiental.
Impl ementação de medidas como práticas de proteção, gestão e redução de consumo de recursos
(2) Adota nte
nã o renováveis. Educação a mbiental a mpla, interdisciplinar e tra nsdisciplinar, envolvendo aspectos
(CSA)
ecol ógicos, psicológicos, l egais, políticos, s ociais, econômicos, ci entíficos, culturais e éticos.
Progra ma formalizado de gestão ambiental, com uso balancea do d e f o ntes re no vá vei s e n ã o
(3) Proa ti vo renová veis de energia e gestão completa de resíduos. Educação ambiental consolidada e crí ti ca ,
(CSP) promotora de estímulos e fortalecimento de uma co ns ci ên ci a crí ti ca s ob re a p ro bl emá ti ca
a mbiental e social.
Progra ma institucionalizado de gestão a mbiental (fontes de energ i a e re s í duos ) , q ue i ncl ue a
(4) Vol untário i nternalização dos custos de externalidades am bi enta i s e a mpl a s a çõ es d e b i o di vers i da de.
(CSV) Educa ção a mbiental proativa como consolidadora do incentivo à participação indivi dual e coletiva,
perma nente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente.
Progra ma referência de a mplas políticas ambientais, que tra ba lha e m p robl em a s a mbi en ta i s
(5) Sus tentável gl obais em uma perspectiva i ntegrada e h i s tóri ca d o m ei o a m bi ente. Ed uca çã o a mbi enta l
(CSS) a va nçada, ca paz de estimular a cooperação com a gentes externos da i ns ti tui ç ã o, co m vi s ta s à
cons trução de uma s ociedade a mbientalmente equilibrada.

Neste contexto da dimensão ambiental, a CIHE (2011) ressalta as instalações físicas das IES, que
devem ser construídas e mantidas em conformidade com os requisitos legais para garan tir o ace sso,
segurança, e um ambiente saudável, não apenas para alunos, professores ou funcionários, mas para
toda a comunidade e meio ambiente no entorno. Neste sentido, é importante que sejam
implementadas atividades e controles relacionados com aspectos ambientais, principalmente de
gestão de resíduos (EPA, 2007).

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No que se refere à educação ambiental, considerando a lei federal nº 9.795, de 27 de abri l de 1999,
que instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental, e o decreto nº 4.281, de 25 de junho de
2002, que regulamenta a lei de 1999, considera-se a educação ambiental como um componente
essencial e de caráter permanente em todos os níveis de educação. Sendo assim, a educação
ambiental pode se apresentar nas IES a partir de disciplinas específicas ou diluída nos programas
curriculares de todos os cursos, além de projetos ou atividades que despertem nos estudantes uma
consciência crítica sobre o meio ambiente e ações ambientais.

5 Considerações Finais

Tendo como objetivo desenvolver um quadro de análise do processo de gestão da inovação e


sustentabilidade organizacional, considerando suas capacidades tecnológicas e dimensões e
econômica, social e ambiental, para instituições de ensino superior, o quadro de análise da gestão da
inovação e sustentabilidade (QUAIS) em instituições de ensino superior pôde se r e strutura do para
fins de aplicação em estudos de caso.
Desse modo, este trabalho contribui no estudo das capacidades tecnológicas em instituições de
ensino superior, já que tais estudos são tradicionalmente realizados em organizações industriai s ou
empresas de serviços. A caracterização das capacidades tecnológicas, mesmo que tendo se
concentrado apenas nas capacidades relacionadas com o eixo do ensino das IES, demonstra a
aplicabilidade e a importância de investigações que considerem este agente tão importante para os
sistemas de inovação. Em complemento, o estudo denota a importância de investigações que, al é m
das capacidades tecnológicas, promovam a análise das capacidades sustentáveis nas IES.
Em relação ao contexto organizacional, esta pesquisa evidencia o grande potencial que este model o
de análise possui no sentido de compreender as atividades desenvolvidas pela IES, tanto no contexto
tecnológico como sustentável, e suas principais características. Além disso, a partir dos diferentes
níveis hierárquicos nos quais foram estruturadas essas atividades, torna-se possível avaliar o nível de
desenvolvimento da IES em cada uma delas, de forma a identificar as atividades que estão em um
nível maior de acumulação de capacidades, tanto tecnológicas como sustentáveis, e as atividades
que carecem de um maior esforço de desenvolvimento. Esse trabalho, portanto, avança ao
possibilitar esta aplicação e diagnóstico a partir da análise do QUAIS, complementando abordage ns
mais conceituais e pouco aplicáveis, como as presentes nos trabalhos de Danjum e Rasli (2012),
Golooba e Ahlan (2013), Hoover e Harder (2014), Katiliūtė, Daunorienė e Katkutė (2014) e Hamid et
al. (2015).
Ademais, ressalta-se ainda que diante das possibilidades de aplicação do QUAIS, não apenas e m IES,
mas em qualquer tipo de organização, desde que sejam feitas as devidas adaptações, e sse formato
de quadro de análise se apresenta como uma alternativa válida para instituições ou empresas dos
mais variados setores, que pretendam analisar e desenvolver suas capacidades e atividades, tanto de
gestão da inovação quanto de sustentabilidade, ou ambas.

Referências

Brasil. (2011). Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011. Disponível em


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/decreto/d7611.htm.
Commission on Institutions of Higher Education – CIHE. (2011). Standards for accreditation.
Disponível em https://cihe.neasc.org.

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Danjum, I., & Rasli, A. (2012). Imperatives of service innovation and service quality for customer
satisfaction: perspective on higher education. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 40,
347-352.
Elkington, J. (1997). Cannibals with forks: the triple bottom line of 21st century business. Oxford:
Capstone Publishing.
European Association for Quality Assurance in Higher Education – ENQA, European Students’ Union –
ESU, European University Association – EUA, & European Association of Institutions in Higher
Education – EURASHE. (2015). Standards and guidelines for quality assurance in the European
Higher Education Area (ESG). Disponível em https://revisionesg.files.wordpress.com.
Golooba, M., & Ahlan, A. R. (2013). Service value co-creation in research & innovation practices in
higher education institutions in Malaysia. Procedia Technology, 11, 342-347.
Hamid, M. R., Abdullah, M., Mustafa, Z., Abidin, N. B., & Ahmad, H. (2015). Conceptual framework of
innovation excellence model for higher education institutions. Procedia - Social and Behavioral
Sciences, 174, 2846-2848.
Hoover, E., & Harder, M. K. (2014). What lies beneath the surface? The hidden complexities of
organizational change for sustainability in higher education. Journal of Cleaner Production, in
press.
Japan University Accreditation Association – JUAA. (2011). University standards and explanation.
Disponível em http://juaa.or.jp/en/images/accreditation/pdf/standard_university.pdf.
Katiliūtė, E., Daunorienė, A., & Katkutė, J. (2014). Communicating the sustainability issue s i n hi gher
education institutions world wide webs. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 156, 106-
110.
Ministério da Educação – MEC. (2014). Portaria nº 92, de 31 de janeiro de 2014. Disponível em
http://download.inep.gov.br/educacao_superior/avaliacao_institucional/legislacao_normas/20
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Ministério da Educação - MEC. (2015). Instrumento de avaliação de cursos de graduação presencial e
a distância. Disponível em
http://download.inep.gov.br/educacao_superior/avaliacao_cursos_graduacao/instrumentos/2
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Moita, F. M., & Andrade, F. C. (2009). Ensino-pesquisa-extensão: um exercício de indissoci abi lidade
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Evolución de las redes cognitivas en el aprendizaje del Sistema Métrico


Decimal utilizando Redes Asociativas Pathfinder.
Isabel Maria Roldán 1 , Ricardo Luengo González2 , Luis Manuel Soto Ardila 3 , José Luís Torres
Carvalho4

1Uni versidad de Extremadura, isabelroldan@gmail.com


2Uni versidad de Extremadura, rl uengo@unex.es
3Uni versidad de Extremadura, l uismanuel@unex.es
4Uni versidad de Extremadura, jltc@unex.es

Resumen. El Si stema Métrico Decimal (SMD) es un tema de considerable i mportancia en la enseñanza de las
ma temáticas y en s u aplicación en el resto de las ciencias. En este a rtículo se a borda el SMD, teniendo como
propósito principal el estudio de las Redes Cognitivas en el a prendizaje del SMD en a lumnos de primer curso
de l a Educación Secundaria Obligatoria en el Sistema Educativo español. Teniendo por base la Teoría de l os
Conceptos Nucleares (TCN) y utilizando un enfoque mixto (cuantitativo - cua li ta ti vo ), s e rep re s enta ron
grá fi camente y s e a nalizaron las estructu ra s co g ni ti va s d e l os a l um nos , rel a ti va s a l os co ncep tos
fundamentales del SMD, a través de Redes As ociativas Pa thfinder (RAP). El propósito de la investigación fue
es tudiar cómo se produce el a prendizaje a partir de l os cambios en las estructuras cognitivas de l os alumnos
y l a estabilidad de dichas estructuras.
Palabras clave: Medi da; Sistema Métrico Decimal; Teoría de los Conceptos Nucleares (TCN); Representación
del conocimiento; Redes Asociativas Pa thfinder (RAP).

Evolution of cognitive networks in learning the Metric Decimal System


Abstract. The Decimal Metric System (SMD) is a considered a n i mportant subject either in the tea chi n g o f
ma thematics and in the rest of sciences. The current article is about the DMS, with the purpose of s tudyi ng
the Cognitive Networks i n their l earning wi thin the students of the first ye a r o f Co m pul s ary S e co nda ry
Educa tion. Based on the Theory of Nuclear Concepts (TCN) and using a m i xed a pp roa ch ( q ua nti ta ti ve -
qua litative), the cognitive s tructures of the s tudents, related to the fundamental concepts o f D MS , w ere
gra phically represented. Then, they were a nalyzed through Pa thfinder Associati ve N e two rks ( R AP) . Th e
ma i n a im of the research was to study how learning occurs from changes in students cogniti ve s tru ctures
a nd their s tability.
Keywords: Mea s ure; Metric system; Theory of Nuclear Concepts; Representation of knowledge; Pa thfinder
As s ociative Networks (PAN).

1 Introducción
La idea elemental para hablar de cualquier sistema de medidas es partir y fundamentar la
importancia que tiene para el hombre, la necesidad de un sistema de comparación que proporci one
lo más exacto posible las cantidades. “Diariamente realizamos mediciones de todo género, las
mediciones de magnitudes… se encuentran a cada paso y son conocidas por el hombre desde
tiempos remotos. Sin ellas serían imposibles el comercio, la construcción…”, “la importanci a de l as
mediciones en la técnica y en la investigación científica es extraordinaria gracias a las medicio nes,
obtuvieron la posibilidad de establecer razones cuantitativas exactas que expresan las leyes objetivas
de la Naturaleza”, “Sin mediciones, mejor dicho, sin mediciones exactas, sería imposible la
estandarización” (Sena, 1979, p.11). La mayoría de las personas hacemos mediciones de manera
cotidiana. Para ello utilizamos diferentes instrumentos de medidas y unidades, como por ejempl o e l
tiempo que se tarda en llegar al trabajo, el peso de una persona, la velocidad de un coche… Por otro
lado, y también de forma cotidiana, realizamos estimaciones del tipo: calcular a qué distancia está e l
trabajo, qué unidad sería la más apropiada para esta medida, o cuántas manzanas pondré en la bolsa

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para comprar un kilo… Estas cuestiones son de gran utilidad en la vida re al, pero ¿conocemos el
tamaño de las unidades estandarizadas? ¿Qué estrategias se utilizan para medir o para estimar?
¿Qué destrezas son necesarias para medir o estimar? ¿Qué se aprende en la escuela? ¿Dónde se
aprende? ¿Cómo se aprende? ¿Cómo se enseña? En esta investigación se pretende dar re spue sta a
alguna de estas preguntas, centrándonos en conocer cuál es la estructura cognitiva de los alumnos y
qué se mantiene de la misma con el paso del tiempo. El marco teórico del estudio aparece
enmarcado por la Teoría de los Conceptos Nucleares (TCN) (Casas y Luengo, 2004; Luengo, 2013).
Esta teoría lleva asociada una técnica, Redes Asociativas Pathfinder (RAP), que permite la
representación de la estructura del conocimiento de una manera analítica y gráfica. Ade más ofre ce
información acerca de cómo se produce el aprendizaje , en función de los cambios de la estructura
cognitiva, con un procedimiento de obtención de datos no invasivo. El propósito central de la
investigación es hacer un estudio sobre las redes cognitivas del alumnado y su estabilidad entorno a
conceptos sobre el Sistema Métrico Decimal (en adelante SMD). Los objetivos específicos i ntentan
responder a las siguientes preguntas de investigación:
Pregunta 1: ¿Cuál es la estructura cognitiva de un estudiante de 1º ESO (Educación Secundaria
Obligatoria) respecto al SMD?
Pregunta 2: ¿Qué diferencias y similitudes tienen las RAP del alumnado, comparadas con la Red
Conceptual Básica (RCB) establecida por el profesor?
Pregunta 3: ¿Los buenos alumnos presentan mayor similaridad en sus redes que los demás respecto
de la RCB?
Pregunta 4: ¿Cuál es el “poso cultural” que permanece en la mente del estudiante después de habe r
pasado un cierto tiempo? ¿Son estables sus redes cognitivas?
2 Fundamentación teórica
Desde diferentes ciencias se ha tratado de dar explicación a los factores que influyen en el
aprendizaje y a los fundamentos psicológicos, cognitivos y/o pedagógicos que los suste ntan dando
lugar a diferentes teorías sobre el aprendizaje. Conocer y representar adecuadamente la forma e n l a
que se procesan la adquisición y representación del conocimiento, cómo se construye y se modi fi ca
la estructura cognitiva del alumnado durante el aprendizaje, es uno de las preocupaciones de mayor
interés en las Ciencias de la Educación y sobre todo en las Didácticas.Sabemos que la información
que nuestra mente recibe la vamos almacenando de una forma organizada y que los conce ptos que
incluimos en ella están relacionados por su significación semántica. Mientras esta relaci ón semántica
sea más significativa mejor se recuerda y subsiste en nuestra memoria. Estas relaci ones se pue den
representar por medio de estructuras compuestas de nodos, que serían los conceptos o grupos de
conceptos y de enlaces que son los elementos que l os relacionan. Teniendo en cue nta l as i de as de
Ausubel, Novak y Hanesian (1978) el aprendizaje consistiría en edificar nuevas estructuras de
conocimiento que relacionasen nodos existentes con nodos nuevos. Ausubel, planteó que el
aprendizaje del alumno depende de la estructura cognitiva previa que se relaciona con la nueva
información. Debe entenderse por "estructura cognitiva" el conjunto de conceptos e ideas que un
individuo posee en un determinado campo del conocimiento, así como su organización. De acue rdo
con Ausubel, el aprendizaje significativo tiene lugar cuando se conecta un concepto relevante
preexistente en la estructura cognitiva con la nueva información. Esto implica que, las nuevas i deas,
conceptos y proposiciones pueden ser aprendidos significativamente en la medida en que otras
ideas, conceptos o proposiciones relevantes estén adecuadamente claras y disponibles en la
estructura cognitiva del individuo y que funcionen como un punto de "anclaje" a las primeras.

2.1 La Teoría de los Conceptos Nucleares (TCN)

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La Teoría de los Conceptos Nucleares (Casas y Luengo, 2004; Luengo, 2013), que encarna una nueva
visión sobre la adquisición y representación de los conocimientos, surge de la tesis de Casas (2002)
dirigida por Luengo, donde se estudia la estructura cognitiva de los alumnos en diferentes niveles de
enseñanza en relación al concepto de “ángulo”. En su tesis, Casas explora el aprendizaje del concepto
ángulo y nos dice que está asociada a la dificultad originada por la diferencia entre la definición
formal y el proceso cognitivo seguido por el alumnado. Cuando un estudiante constru ye el conce pto
ángulo lo hace a partir de la definición, de la imagen mental y de los procesos relacionados con su
experiencia educativa.Esta teoría surge con la intención de responder a un problema que se
fundamenta en la teoría del aprendizaje significativo de Ausubel. Para sus autores, la adquisición
general del conocimiento y su almacenamiento en una estructura cognitiva sigue un proceso análogo
al del conocimiento del medio físico que nos rodea. Para explicarlo nos indican que los conceptos no
se aprenden de forma aislada sino que se van asociando a otros en forma de estructura y e stas a su
vez van formando redes. Pero también observaron que los alumnos cada vez van agrupando su
aprendizaje en torno a menos conceptos, pero enlazados. Las redes que crean van adquiriendo
mayor coherencia según ellos van madurando con la edad y cada vez se vislumbra una estructura
común que engloba los conceptos parciales (Bizarro et al, 2015). Los autores llaman conceptos
nucleares a aquellos conceptos en torno a los cuales, y de forma mayoritaria, se organizan l as re de s
de los alumnos. No son necesariamente los más generales o los más abstractos sino l os que a e l l os
les resultan más significativos (Contreras et al, 2016).Considerando que la adquisición del
conocimiento sigue un paradigma jerárquico, una estructura cognitiva se vuelve más compleja con e l
aumento del número de conceptos, pero Casas y Luengo (2004) , a la luz de los resultados de su
investigación, definen los “senderos de mínimo coste” cuando dada una situación que implica utilizar
aprendizajes ya adquiridos y almacenados en la estructura compleja el alumno recorre aquellas rutas
que dependiendo de los propósitos de cada acaso les resultan más rápidas y simples. Así e l al umno
resuelve eficazmente los problemas, recorre caminos poco usuales y aplica su creatividad.

2.2 Representación del Conocimiento. Redes Asociativas Pathfinder (RAP).


Las Redes Asociativas Pathfinder según Schvaneveldt (1989) son representaciones donde los
conceptos aparecen como nodos y sus relaciones como segmentos que los unen, de mayor o me nor
longitud según el peso o fuerza de su proximidad semántica. Por esta característica pueden ser
incluidas entre los métodos de representación del conocimiento que hacen uso de la puntuaci ón de
similaridad entre conceptos. Para obtener estas redes se parte de un conjunto de conceptos y el
sujeto evalúa la proximidad que considera que existe entre cada par de ellos. Para ello se puede usar
el programa MICROGOLUCA (Godinho, Luengo y Casas, 2011) creado en e l ámbito del grupo de
investigación Ciberdidact de la Universidad de Extremadura (UEx), que presenta en pantalla de forma
aleatoria todos los pares posibles y permite asignar el nivel de relación entre ellos mediante el
deslizamiento del cursor. Con los datos obtenidos, el programa calcula una matriz de corre l aci one s
que representa los «pesos» de los enlaces entre conceptos. A partir de esa matriz y utilizando los
algoritmos de Kamada y Kawai ofrece una representación gráfica de la que se obtiene la red
resultante usando el algoritmo Spring Embedding. Las matrices obtenidas se tratan mediante
técnicas estadísticas (análisis de componentes principales, análisis de Clúster, escalamiento
multidimensional o RAP) y transforman los datos de interrelación entre conceptos en distancias
entre puntos en un espacio de dimensiones mínimas, de tal manera que se obtiene una
representación espacial o se determina la estructura subyacente de los datos. La gran aportación que
suponen las RAP es que permiten crear representaciones en forma de redes de la estructura
cognitiva de un sujeto a partir de datos empíricos, y pueden ser generadas de forma totalmente
automática (Carvalho, 2011).

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2.3 La enseñanza aprendizaje del SMD y la estimación


El origen de la medida podemos situarlo en la necesidad de los hombres para realizar comparaciones
más o menos estables. Al principio éstas se van realizando tomando partes del propio cuerpo (de ahí
nombres como braza o pie) o fenómenos de la naturaleza para medir el paso del tiempo o de los
recipientes para los pesos de sólidos y medida de líquidos (Sánchez, Casas y Luengo, 1997). El he cho
de que existieran grandes diferencias entre los sistemas de medida de unos países a otro e incluso de
cada una de las regiones que los componían hizo pensar en la necesidad de las conversiones de un
sistema a otro y finalmente en la necesidad de unificar los sistemas de medida en uno solo que
adquiriera valor universal. La aparición del SMD fue un intento de superación de los inconvenie nte s
que tenían los sistemas anteriores, por lo que suponía de dificultad en las transacciones comercial es
internacionales que obligaban a unas operaciones de equivalencias de gran complejidad. Picado, Rico
y Gómez (2013) señalan una serie de destrezas previas que facilitarían la realización de estimacione s
razonables en medida, así como de las principales estrategias que se utilizan en los procesos de
estimación. Estas destrezas previas incluyen: la interiorización de las unidades de medida, el
referente, las técnicas indirectas, las estrategias de comparación, y estrategias de descomposici ón y
recomposición. Los contenidos sobre estimación en medida se desarrollan en los cursos de 1º y 2º de
la ESO. En el primer curso se señalan los contenidos siguientes: Estimación y cálculo de perímetros de
figuras. Estimación y cálculo de áreas mediante fórmulas, triangulación y cuadriculación”. En el
segundo curso, en el Bloque 4. Geometría: Volúmenes de cuerpos geométricos. Resolución de
problemas que implican la estimación y el cálculo de longitudes, superficies y volúmenes”.

3 Diseño de la investigación
Como antes referimos, el presente estudio se engloba dentro de las investigaciones del grupo de
investigación Ciberdidact de la UEx, desarrolladas en torno de la TCN, y pretende conocer la
estructura de alumnado sobre el SMD en el inicio de la ESO, concepto adquirido en la etapa de
primaria y que los alumnos utilizan ampliamente en su vida cotidiana.Es una investigaci ón mi xta ya
que requiere de un análisis cualitativo y de un análisis cuantitativo. Se usó el método de encuesta
donde se sustituye el tradicional cuestionario por una consulta a través de un programa informático,
el MICROGOLUCA, que permite obtener las redes conceptuales de los alumnos en estudio. Esta
encuesta se realizó a dos grupos de alumnos en tres momentos diferentes: antes de que la profesora
imparta la UD sobre el SMD, una vez finalizada dicha UD y una vez transcurridos tres meses de ese
momento. Su diseño puede observarse en la siguiente figura y a continuación describimos
sucintamente cada una de las cuatro fases de investigación.

Fig. 1. Diseño de la investigación

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La investigación se inició con la aplicación de una prueba de evaluación inicial de los conceptos
previos que los alumnos han adquirido en la etapa de Educación Primaria sobre el SMD. Ade más, se
elaboró la Red Conceptual Básica (RCB), se obtuvo las redes conceptuales iniciales de los alumnos
(RAP1), así como la correspondiente a la profesora (RAP). Posteriormente, la profesora i mpartió l as
clases a los alumnos basada en una UD sobre el SMD. Al final, fueron evaluados los contenidos
adquiridos por los alumnos a través de una prueba de evaluación final para comprobar la adquisición
de contenidos adquiridos y analizar sus redes conceptuales finales (RAP2). La investigaci ón fi nal izó
tres meses después, con el análisis de las redes de los alumnos en ese momento (RAP3) y con el
estudio del “poso cultural” que los alumnos mantienen sobre el SMD. La muestra de participantes en
la investigación estaba constituida por alumnos de dos grupos del 1º curso de la ESO del I.E.S
“Lacimurga Constantia Iulia” de Navalvillar de Pela de la provincia de Badajoz. El grupo 1B formado
por 25 alumnos y el grupo 1C por 22 alumnos.

3.1 Selección de conceptos


Para la selección de los conceptos a aplicar en las pruebas de RAP se entrevistaran docentes con
experiencia y se revisaran varios libros de texto de 1º ESO que se utilizan en la Comunidad Autónoma
de Extremadura y se obtuvo una lista inicial sobre los conceptos relacionados con el SMD,
Posteriormente, se seleccionaron los conceptos más relevantes, para ello se tomó como cri te ri o de
selección la frecuencia de aparición en los textos, por lo tanto los términos seleccionados serán
aquellos que más aparecen en la literatura. La lista final de conceptos elegidos es la siguiente:
Magnitud; Unidad; Medir; Instrumentos de medida; SMD; Múltiplos y Submúltiplo s de 10;
Aproximar; Contar.

3.2 Red Conceptual Básica (RCB)


La RCB es una red de referencia sobre el concepto de SMD y representa gráficamente las re l aci ones
entre los conceptos elementales. Así mismo, se puede decir que es la representación esquematizada
de la ciencia sobre el SMD a través de las RAP (Roldán, 2013).
La RCB sobre el SMD, que sirve para determinar el grado de similitud de las redes de los alumnos,
antes y después de impartir la UD sobre el SMD, fue creada en el programa MICROGOLUCA
utilizando los criterios aplicados en las investigaciones de Hidalgo (2007) y Arias (2008).

Fig. 2. Red Conceptual Básica (RCB)

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3.3 Procedimientos de análisis de los datos


Como se ha mencionado anteriormente, con el programa MICROGOLUCA se obtienen las RAP de l os
alumnos en tres momentos, antes y después de impartir la UD, teniendo en vista estudiar la variación
de la estructura cognitiva a lo largo de un proceso de aprendizaje y tres meses después de l a mi sma
para comprobar el “poso cultural” y estudiar la estabilidad de las redes. Con el mismo programa
también se ha obtenido la RAP de la profesora y la RCB que sirvió de comparación con las RAP de l os
alumnos. Las redes se evaluaran a partir de tres indicadores:
- Nodos nucleares o múltiples: conceptos que tienen más de dos enlaces en la estructura cognitiva
del alumno. Representan conceptos que sirven como anclajes a la estructura cognitiva de tal
forma que cuanto mayor es el número de nodos nucleares más son las posibilidades de anclar los
conceptos nuevos con los conceptos previos.
- Índice de coherencia: Mide la consistencia de las relaciones de conceptos y se evalúa el grado de
atención y concentración del alumno el momento de la prueba. Este índice oscila entre -1 y 1, de
tal forma que cuanto mayor es el valor mayor será la coherencia de la red.
- Índice de complejidad estructural: Mide la complejidad de la red. Su valor oscila entre 0 a 1,
cuanto más próxima a 0 la red será más simple o menos compleja y cuanto más próxima a 1 la
red será más compleja.
- Índice de similaridad entre dos redes: Permite determinar la semejanza o acercamiento entre las
redes. Sus valores van desde 0 a 1 de tal forma que dos redes serán idénticas si tienen un índi ce
de similitud 1 y dos redes no tienen ninguna similitud si el índice de similaridad es 0. En esta
investigación se estudia la similaridad de las RAP de los alumnos con la RCB y con la red de la
profesora.
4 Análisis y discusión de los resultados
Para estudiar las hipótesis planteadas y procurar responder a las preguntas de investigación se
empezó por obtener la calificación de la prueba de evaluación final de los alumnos. Los al umnos se
han calificado en “Buenos”, “Normales” y “Con dificultades”. Los “Buenos” son aquellos cuya
clasificación corresponde o es mayor que 8, los “Normales” son los que tienen una calificación e ntre
5 y 8 y los alumnos que “Presentan dificultades” son los que obtienen una calificación inferior a 5.
4.1 Coherencia de las redes medias
Las redes medias son calculadas a partir de los valores de los pesos entre los conceptos de dos o más
matrices. Como su nombre indica, una red media resulta de la media de los valores entre cada par de
conceptos y puede ser calculada y representada mediante Redes Asociativas Pathfinder,
representando, en este caso, al grupo en su conjunto. Como se puede observar en la figura 3 las
estructuras cognitivas de los alumnos tienen una coherencia variable en tiempo. En la RAP2 y la RAP3
la coherencia de los alumnos “Buenos” pasa a ser superior a la de los otros dos grupos. O sea, la
coherencia de la red media de los alumnos “Buenos” aumenta con el paso del tiempo, lo que i ndi ca
que su atención e interés sobre el concepto de SMD va en aumento.

Fig. 3. Índice de coherencia para grupos en función de la calificación

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4.2 Índice de Complejidad Estructural de las redes medias


Los resultados que se muestran en la figura 4 indican que, en general, la complejidad de las redes de
los alumnos “Buenos” es mayor que la del resto de los alumnos en los momentos anterior y posterior
a la impartición de la UD. En el caso de los alumnos “Buenos” la complejidad de la estructura
disminuye con el transcurso de la investigación. El hecho de que el índice de complejidad de l a RAP3
sea inferior al de las RAP anteriores va en concordancia con los resultados de los “senderos de
mínimo coste” expuestos por Casas y Luengo (2004). Los alumnos que “Con Dificultades”, mantienen
la estructura de la red cognitiva, lo que se justifica por sus dificultades a la hora de adqui ri r nue vos
conceptos.

Fig. 4. Índice de complejidad para grupos en función de la calificación

4.3 Conceptos nucleares de las redes medias


Observando los resultados de la figura 5 se constata que para los alumnos “Con dificultades” las
estructuras cognitivas se mantienen estables en el tiempo y que para los “Buenos” tienden a hacerse
más sencillas. En rasgos generales, van en concordancia con los obtenidos anteriormente para el
Índice de Coherencia de Redes.

Fig. 5. Conceptos nucleares para grupos en función de la calificación

4.4 Similaridad de las redes medias con respecto a la RCB

Fig. 6. Similaridad con la RCB de grupos en función de la calificación

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Lo primero a destacar es que todos los valores de similaridad son bajos lo que indica, desde luego,
que las redes cognitivas de los alumnos están en general alejadas de la RCB. Considerando el
momento inicial y final de la investigación, se comprueba cómo para los alumnos “Normales” y para
los que “Presentan dificultades” las redes cognitivas se alejan de la RCB mientras que para los
alumnos “Buenos” éstas mantienen la misma similaridad. Por tanto, se puede afirmar que l as re de s
de los alumnos se alejan o permanecen estables con respecto a la RCB. Es posible que este hecho se
produzca ya que el tiempo transcurrido entre la RAP2 y la RAP3 es insuficiente.
4.5 Similaridad de las redes medias con respecto a la rede de la profesora

Fig. 7. Red de la profesora

Del siguiente gráfico puede extraerse que mientras la red media de los alumnos “Bue no s” cada ve z
se aleja más de la red de la profesora (Figura 7), las redes de los alumnos “Normales” y “Con
dificultades” cada vez se aproximan más con el transcurso de la investigación. Este hecho puede
basarse en que los alumnos buenos “piensan por su cuenta” mientras que el resto “se deja llevar”.
En general, las redes de los alumnos están alejadas tanto de la red de la profesora como de la RCB. Si
bien es importante destacar que están más próximas a la Red de la profesora que a la RCB.

Fig. 8. Similaridad con la rede de la profesora de grupos en función de la calificación

5 Conclusiones
Esta investigación, cumpliendo con su propósito, hace un estudio sobre las redes cognitivas del
alumnado de 1º de ESO y su estabilidad a través del SMD y profundiza en un nuevo concepto de
evaluación del aprendizaje como diferencia de las RAP antes y después del tratamiento de una UD.
Las conclusiones obtenidas con respecto a las preguntas de investigación son las siguientes:

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1. La estructura cognitiva de un estudiante de 1º ESO con respecto al SMD es una estructura menos
compleja que la estructura de la profesora y a su vez que la estructura de la RCB. En general las
estructuras más coherentes son las de los alumnos “Buenos”. Las estructuras cognitivas de los
alumnos son estables en el tiempo o bien tienden a hacerse más sencillas lo cual coincide con los
resultados de la TCN de Casas y Luengo (2004).
2. En general, las redes de los alumnos están alejadas tanto de la red de la profesora como de la RCB.
Si bien es importante destacar que están más próximas a la Red de la profesora que a la RCB.
3. No se puede afirmar que los buenos alumnos tengan sus redes cognitivas más similares a la RCB
que el resto de alumnos. De hecho, los “Buenos” alumnos alejan sus redes cognitivas de l a RCB una
vez impartida la UD. En ningún caso se produce un aumento de la complejidad o del número de
Conceptos Nucleares.
4. Estudiando el “poso cultural” y la estabilidad de las redes cognitivas de los alumnos, se deduce que
en los alumnos “Buenos” la complejidad de la estructura y el número de Conceptos Nucleares
disminuye con el transcurso de la investigación, es decir que las redes cognitivas son más simples con
el paso del tiempo y que la de los alumnos “Con dificultades” se mantienen. Ambos resultados
apoyan la TCN de Casas y Luengo (2004). En el caso de los alumnos “Normales” ocurre lo contrario.
Con el paso del tiempo los alumnos adquieren redes cognitivas más complejas. Las redes de los
alumnos son relativamente estables ya que se mantienen o disminuyen la complejidad de las
mismas. En ningún caso se produce un aumento de la comple jidad o del número de Conceptos
Nucleares. Se puede afirmar que las redes de los alumnos se alejan o permanece n estables con
respecto a la RCB. El tema no se cierra con esta investigación, por el contrario se abren nuevas
posibilidades. Por ejemplo, la de incorporar un número mayor de alumnos de los que ha tenido e sta
investigación piloto, ajustar los tiempos de realización de la tercera toma de datos (3 meses)
aumentando quizá el intervalo, ya que, para estudiar la estabilidad de redes, quizá sería necesario
tomar un tiempo mayor (de seis meses o de un año). Quizá debamos también profundizar en el
Diseño de la Unidad Didáctica, ajustándose más al Marco teórico de la TCN (Veríssimo et al, 2013).

6 Líneas de investigación abiertas


A tenor de lo indicado en las conclusiones, quedan abiertas las siguientes líneas de investigación:
Diseños mixtos Cualitativo-Cuantitativos:
- Avanzar en la interpretación de las RAP de los alumnos con entrevistas semiestructuradas
susceptibles de ser analizadas mediante programas cualitativos como webQDA, que puedan explicar
el significado de los enlaces entre nodos.
- Realizar un estudio de caso, con un enfoque cualitativo, que analice las redes individuales de los
alumnos, posible investigación de utilidad en diferentes campos como el de la Educación Especial.
Profundizar en la aplicación de la TCN:
- Comprobar la variación en los resultados al utilizar UD diseñadas en base a TCN y evaluadas con
diferentes métodos.
- Investigar sobre la elaboración y construcción de la RCB o red de la ciencia ya que no existen
suficientes investigaciones que determinen con certeza sus criterios de construcción y significancia.
Profundizar en el empleo de las RAP:
- Averiguar las posibilidades de las RAP como herramienta complementaria para la evaluación de l os
alumnos.
- Detección de los aprendizajes a través de la variación de sus RAP (nuevo concepto de aprendizaje).

Referências

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Extremadura, Badajoz.

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Globish e Cockney: uma proposta de aplicativo especialista inteligente na


avaliação efetiva da comunicação full duplex através da língua inglesa entre
nativos, não nativos e máquinas

Iolanda Borges Carneiro 1 ; Luciano Vieira Lima 1

1 Departamento de Engenharia Elétrica - La boratório de Inteligência Natural e Arti ficial da Universidade


Federal de Uberlândia, Brasil. i olanda.carneiro11@gmail.com; vi eira@ufu.br

Tra ba lho a presentado com a poio Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de Mi nas Gerais (FAPEMIG)

Resumo. O objetivo deste artigo é de propor a i mplementa çã o d e u m a f erra m enta te cnol óg i ca q ue


pos sibilite verificar e avaliar a eficácia do uso do Globish e do Cockney como mecanismos faci l i ta d ores d a
comunicação entre não nativos, nativos e máquinas de forma a medir os resultados e i d enti fi ca r a jus tes
nes s e proces s o. A pes qui s a de ca rá ter expl ora tóri o bus ca conhecer mel hor os probl ema s des s a
comunicação e por meio de uma metodologia científica experimen ta l co m pa ra r o u s o d o G l obi s h, d o
Cockney e de particularidades fonéticas do inglês na tenta ti va d e ve ri f i ca r s e o q ue é d i to é o q ue é
compreendido pelo aplicativo. O experimento permitiu a constatação da fragilidade no estabelecimento d a
comunicação entre humanos e máquinas, e da necessidade de s e atentar para o problema de compreensã o
entre má quinas e falantes não nativos da língua i nglesa, uma vez que estes a caba m p o r us a rem ve rs ões
s i mplificadas do i nglês como o Globish e o Cockney.
Palavras-chave: comunicação; l íngua i nglesa; máquina; Globish; Cockney

Globish and Cockneys: a intelligent expert system proposal in the effective evaluation of full duplex
communication through the English language between native, non-native and machines
Abstract. The a im of this a rticle i s to propose the i mplementation of a technolo gi ca l to ol th a t a l l ows to
veri fy a nd evaluate the effectiveness of the use of Globish and Cock ney a s f a ci li ta ti ng m echa ni s ms o f
communication between natives, natives a nd machines in ord er to measure th e re s ul ts a nd to i d enti fy
a djustments in this process The exploratory research seeks to better u n ders ta nd th e p ro bl ems o f th i s
communication a nd through a n experimental s cientific methodo l og y to co m pa re th e u s e o f G l o bi sh ,
Cockney a nd phonetic peculiarities of English in a n a ttempt to verify tha t what is said i s what is understood
by the a pplication . The experiment allowed the confirmation o f th e f ra g i li ty i n th e e s ta bl is hm ent o f
communication between humans and machines , a n d th e n eed to p a y a ttenti o n to th e p rob l em o f
comprehension between machines a nd non native English speakers, since they e n d u p u s i ng s i mp l if i ed
vers i ons of English as the Globish and the Cockney.
Keywords: communication; English language; machine; Globish; Cockney

1. Introdução

Falar em comunicação na atual conjuntura é, além de estar conectado aos mais diversos dispositivos
tecnológicos, estar também apto a estabelecer troca de informações com os indivíduos, uns com os
outros em um contexto globalizado. Quando se fala em globalização e comunicação entre as pessoas,
quase que inconscientemente e espontaneamente, imagina-se a efetivação de diálogos sendo
realizados na língua inglesa, equivocadamente, considerada a língua falada pelo maior conti nge nte
de pessoas, onde, na realidade, é o chinês. Ser ou não a língua mais falada não qualifica a
importância da mesma. Em negócios, principalmente de produtos tangíveis, o chinês lidera
atualmente o mercado, mas, nas negociações que não sejam diretas com chineses, o ingl ê s é ai nda
considerado a língua mais utilizada universalmente, com imprescindível importância para se

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estabelecer a comunicação em diversas áreas de atuação no mundo dos negócios, acadêmico e,


efetivamente, na própria transmissão da informação.
Nesse sentido, conseguir estabelecer a comunicação de forma efetiva na língua inglesa é pri mordi al
para o entendimento entre os interlocutores. É dentro deste contexto que este artigo busca, por
meio da tecnologia, propiciar a possibilidade não somente de efetivação da língua inglesa, mas de
reconhecimento e de qualificar o quanto de informação é, adequadamente, interpretada entre
nativos e não nativos e máquinas com as particularidades das pronúncias e articulações dos sons que
diferem significativamente, mesmo em nativos de países diferentes. Uma grande preocupação, desta
pesquisa, se dá nas dificuldades e particularidades no que se refere, principalmente, à pronúnci a e
fala dos brasileiros.

2. Desenvolvimento

A necessidade de falar corretamente a língua inglesa para o estabelecimento da comuni cação pode
ser percebida em recente evento mundial realizado no Rio de Janeiro no Brasil, os Jogos Ol ímpi cos
2016. Nessa ocasião, em vários momentos foi possível perceber certa dificuldade de e nte ndi me nto
dos questionamentos, feitos pelos repórteres brasileiros, por parte dos atletas nativos. No entanto, é
preciso destacar que a comunicação, em inglês, entre os brasileiros com outros atletas estrange iros,
também não nativos, frequentemente era estabelecida, o que não significa poder afirmar que
estavam pronunciando corretamente ou falando corretamente a língua. Segundo Nerri ère and Hon
(2009), essa dificuldade pode ser destacada pela quantidade de falantes não nativos da língua inglesa
que se comunica com outros não nativos, sendo apenas 4% da comunicação internacional
estabelecida entre falantes nativos de diferentes nações da língua inglesa, como am ericanos e
australianos.

Professores afirmam que, no mundo, existem mais de 6000 línguas. O Inglês é a


língua oficial de 45 países. Mas nem todo mundo fala Inglês, mesmo onde o Inglês
é língua oficial. Somente 12% de todo o mundo tem o Inglês como língua materna.
Para 88% de nós, o Inglês não é noss a primeira língua ou língua materna. Então,
96% da comunicação internacional Inglês ocorre com, pelo menos, um falante nã o
nativo. (NERRIÈRE and HON, 2009, p. 4)

Segundo o Prof. Dr. Luciano V. Lima, da Universidade Federal de Uberlândia, o estabe le cimento d a
comunicação entre não nativos é até facilmente efetivada com sucesso, mas , quando os
interlocutores são não nativos com nativos, tudo pode complicar. “Muito se fala, pouco se ent e nde .
Na realidade, os não nativos muitas vezes até conseguem entender razoavelmente os nativos, mas a
recíproca não é verdadeira: falar inglês é algo muito mais complexo do que a maioria das escolas
pelo mundo quer fazer parecer ser, e o Brasil não é diferente.”
Ao contrário do que se pensa e do que se prega, falar o inglês é um grande desafio, pri nci palmente
para os brasileiros. Lima (2013) e Pereira (2015) apontam que os maiores problemas na comunicação
falada entre os interlocutores são a separação de palavras através da primeira consoante aspirada
em cada palavra, que pode interferir na compreensão das palavras. Outro agravante é a
diferenciação no contexto se uma palavra é verbo ou operador e o schwa, o som mais comum no
inglês / ə /, muito curto, pronunciado semelhante ao som do / â /. O schwa é um som de baixo
volume, mas, que se não pronunciado de forma correta, pode inviabilizar o entendimento e ntre os
agentes do diálogo.

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É a partir dessas dificuldades que, Jean Paul Nerrière e David Hon desenvolveram uma nova forma de
comunicação da língua inglesa, o Globish ou Global English, considerada uma língua global no que diz
respeito à comunicação da língua inglesa, focada em comunicação entre não nativos e entre nati vos
com não nativos. É uma variação simplificada do Inglês que estabelece um número restrito de
palavras com schwa e de palavras que exigem a aspiração, mantendo as regras gramaticais que a
língua exige.

Globish é um subconjunto do Inglês, mas continua sendo Ingl ês correto. O inventor


da língua tentou limitar o número de palavras em que o som de schwa distingue
verbos de substantivos. Mas seria impossível eliminar todos os casos. As s im, Jea n
Paul Nerriére manteve 30 ocorrências de verb/noun separados pelo som de schwa .
De forma análoga, a aspirações foi mantida apenas nas situações em que ela é
aceita por todos os dialetos do Inglês, ou seja, Inglês Americano, Australiano,
Middle East, Inglês da Inglaterra e Inglês Canadense. (NERRIÈRE, p. 12, 2009)

Quando se direciona para o Inglês Britânico, uma solução para a comunicação é um dialeto de
séculos e amplamente falado na região de Londres: o Cockney (“is the characteristic speech of the
greatest city of the greatest empire that the world has known” (MATTHEWS, 2015)). Neste caso, se
apresentando o Cokney não como uma solução para as particularidades do Inglês, mas como uma
variante falada que, se melhor conhecida, possibilita o melhor entendimento do inglês entre não
nativos e entre os britânicos. Um falante do Cockney, por exemplo, diria, ‘Can I have a glass of water,
please?’, no qual as letras em negrito e grifadas não seriam pronunciadas. Outra disparidade é uso
glotal do T. Em uma frase como ‘Do you have a bottle of water?’ em Cockney seria pronunci ada ‘Do
you ‘ave a bo’le of wa’er?’ , onde o L soa como W e o som o schwa é longo e forte. Ainda existem
alguns sons não expressos em consoantes não sonorizadas como TH em thank you, thursday,
everything, que em Cockney devem ser trocadas pelo som de F, sendo pronunciadas fank you,
fursday, everyfing. Em casos que a consoante TH é sonora como em brother, mother, father, clothes,
leather, por exemplo, em Cockney são usadas com som de V: bruvah, muvah, favah, cloves, levah.
O uso dessa variante da língua inglesa se justifica por ser um facilitador linguísticos para a
compreensão e uso de uma língua particularmente de difícil aprendizagem para os brasileiros e
outros não nativos. De acordo com Costa (2016) uma das razões da dificuldade do brasileiro em falar
o inglês está na raiz da língua portuguesa do Brasil que tem origem no românico, as línguas latinas,
diferente do inglês e alemão originário do germânico. Por isso observa-se a facilidade de brasi le iros
aprenderem o francês em contraponto ao inglês.

2.1 Língua, fala e comunicação

É preciso estabelecer primeiramente que o que se pretende com esta pesquisa é uma efetiva
comunicação entre os indivíduos não nativos e nativos e máquinas na língua inglesa, assim defende -
se nesse trabalho que o indivíduo consiga se comunicar naquela língua mesmo não tendo a fl uê nci a
da fala que compete aos nativos. A comunicação posta neste trabalho, é definida pela pesquisadora
como a capacidade que os indivíduos têm de estabelecerem relações de troca, sejam elas de
informações, conhecimentos, opiniões, valores. Assim, conseguir entender a mensagem que o outro
transmite é imprescindível para que a comunicação seja estabelecida. Dessa forma “p ara que a
comunicação seja possível é preciso produzir, codificar, transmitir mensagens que possam circular
entre as pessoas, para que sejam interpretadas, se tornem comuns e possam ser trocadas e
compartilhadas, criticadas e questionadas” (BRASIL, 2006, p. 36).

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Fundamentalmente para que essa comunicação ocorra é necessário, então, que exista um emissor e
um receptor, conceitos convencionados pela Teoria Matemática da Comunicação (SHANNON, 1948).
Destaca-se que somente transmitir a informação não é suficiente para que se estabeleça a
comunicação. É necessário que exista uma unidade entre emissor e receptor ou fonte e destinatário,
neste caso a língua, para que a comunicação seja efetivada. Assim, conhecer o código, a língua
inglesa, possibilitaria, então, a compreensão do sentido da informação.

O “sentido” da informação – o que determina que algo seja ou não informação


para um determinado sujeito ou grupo de sujeitos – está, assim, totalmente
dependente do conhecimento do código por parte do sujeito ou grupo de sujeitos,
o que nada muda à objetividade intrínseca da mensagem (SERRA, p. 91, 2007)

Segundo Rüdiger (2011) a problemática da comunicação para o Shannon na Teoria Matemática da


Comunicação pode ser analisada técnico, semântico e pragmaticamente. “Resol vendo-se o primeiro,
soluciona-se o conjunto. [...] diz respeito à capacidade de o canal conduzir as informações sem ruído
para o destinatário, capacidade essa que é passível de definição técnica (RüDIGER, 2011, p 19)
Ao adaptar o modelo de comunicação da Teoria Matemática da Comunicação a esta pesquisa, tem-
se o emissor representando o sujeito não nativo que quer se comunicar e que determina as unidades
do repertório, as palavras que serão usadas para estabelecer a comunicação através de um
transmissor, que pode se estabelecer ser a linguagem escrita ou falada, que por me i o de um canal ,
língua inglesa, pode sofre interferências de ruídos, o schwa, as consoantes aspiradas, que mesmo
não pretendidos pelo emissor ocorrem durante o processo de transmissão, de m aneira que o
entendimento seja comprometido pelo destinatário, ou seja, o nativo, ao ser decodificado.

Fig. 1: Sistema de informações adequado ao modelo de comunicação da Teoria Matemática da Comunicação (elaborado
pela autora)

Fig 2: Esquema do sistema de informações da Teoria Matemática da Comunicação (RÜDIGER, 2009, p. 20)

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2.2 Processos de reconhecimento de fala

A partir da compreensão dos dificultadores de aprendizagem da língua inglesa, outro fator pode se r
acrescido como um complicador para o estabelecimento de relações de significado e se nti do ne sta
comunicação, a saber: o uso da comunicação com máquinas e utilizando máquinas (celulare s, e tc.).
Não se pode, atualmente, focar a comunicação apenas entre interlocutores humanos. É preciso
considerar que o desenvolvimento e as evoluções tecnológicas estão cada vez mais inseridos no
cotidiano das pessoas e que a interação entre humanos e máquinas cresce constantemente. A
solicitação de tarefas, buscas, informações e até mesmo a realização de atividades podem e são
feitas por comando de voz. Processos baseados em reconhecimento da linguagem falada por
máquinas têm conquistado cada vez mais espaço em várias aplicações do dia a dia. Os proce ssos de
"ouvir" por uma máquina que antes exigia um sistema matemático complexo e especial izado, hoje
podem ser facilmente usados através de aplicativos, rodando em nuvem, os quais estão cada vez
mais autônomos desde que Yann Lecun (2013) criou a técnica de deep learning para
reconhecimento de padrões (visão, fala, escrita e outros).

Animais e seres humanos podem aprender a ver, perceber, agir e se comunicar


com uma eficiência que nenhum método de Aprendizado de Máquina pode se
aproximar. Os cérebros dos humanos e dos animais são "profundos", no sentido de
que cada ação é o resultado de uma longa cadeia de comunicações sinápticas
(muitas camadas de processamento). Atualmente estamos pesquisando algoritmos
de aprendizado eficientes para tais "arquiteturas profundas". Atualmente, estamos
nos concentrando em algoritmos de aprendizado não supervisionados que podem
ser usados para produzir hierarquias profundas de recursos para rec onhec i mento
visual. Nós supomos que a compreensão da aprendizagem profunda não só nos
permitirá construir máquinas mais inteligentes, mas também nos ajudará a
entender a inteligência humana e os mecanismos de aprendizagem humana.
(LECUN, 2004)

Com estas técnicas, vários aplicativos foram implementados para reconhecimento, por exemplo:
reconhecimento de músicas e o reconhecimento de face e expressões faciais, existentes em
praticamente todos os smartphones, até de baixo custo. A questão é: quão preciso é o
reconhecimento por essas máquinas e/ou tecnologias no que se refere ao uso da língua i ngl e sa por
não nativos? Como garantir que haverá assimilação correta por uma máquina se até mesmo a
comunicação entre humanos não nativos e nativos pode ser comprometida?

2.3 Metodologia de pesquisa

É nesse contexto que este artigo propõe a criação de uma ferramenta tecnológica, um aplicativo
voltado especificamente à verificação da qualidade, da eficácia de tais técnicas quando e feti vadas ,
principalmente, entre humanos e máquinas, sejam: celulares, computadores ou qualquer
equipamento com tecnologia IoT (Internet of Things). Para tanto, propõe-se a implementação de
Learning Machines1 com técnicas de deep learning com o objetivo de avaliação do processo de
comunicação entre humanos/humanos e máquinas. Muito mais que averiguar índices de acertos,
busca-se com este software, um aplicativo especialista e inteligente para determinar os melhores
ajustes nas ferramentas e técnicas do Globish e do Cockney de tal forma que tanto se consiga uma

1Segundo Arthur Sa muel (1959, a pud MCCREA, 2014): “Machine Learning is the field of study that gives computers the
ability to learn without being explicitly programmed”.

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comunicação efetiva entre humanos (nativos e não nativos) e humanos-computador (celular, IoT,
learning machines). Segundo Lima (2016), no processo de avaliação entre humanos e dispositivos
será fundamental a identificação do sotaque do humano, o que poderia ser reconhecido atravé s da
identificação do IP (Internet Protocol – o identificador de um dispositivo) da máquina, o qual indicará
a região geográfica com precisão de onde o interlocutor humano está. Outra opção é evitar o
reconhecimento automático e permitir que a pessoa, o humano, ajuste, decline a regi ão de ori ge m
ou o sotaque que julga ter (pode ser que um nativo americano esteja conversando com uma
máquina no Brasil e vice versa).
A pesquisa, de caráter exploratório, busca conhecer melhor os problemas dessa comunicação e por
meio de uma metodologia científica experimental compara o uso do Globish, do Cockney e de
particularidades fonéticas do inglês na tentativa de verificar se o que é dito é o que é compree ndi do
pelo aplicativo. Os testes, realizados pela pesquisadora, não nativa da língua inglesa e que faz um
bom uso do inglês, usou cada um dos métodos (Globish, Cockney e as particularidades fonéti cas do
inglês) para realizar as tentativas de comunicação. Dessa forma, a partir de experimentos real izados
no Laboratório de Inteligência Natural e Artificial – LINA, da Universidade Federal de Uberlândia,
juntamente com o Prof. Luciano Lima, foi possível a criação de um protótipo para a aferição do
reconhecimento do Inglês, utilizando recursos de learning machines e deep learning e xi ste ntes e m
nuvem, no Google, e acessados facilmente pela plataforma appInventor 2 suportada atualmente pelo
MIT2 . Este protótipo desenvolvido faz o reconhecimento de voz que verifica o que foi dito em
determinada língua. A figura 1 mostra a página de desenvolvimento de aplicativos de sta plataforma,
com o aplicativo de reconhecimento de fala citado.

Fig 3: Imagem da janela do appInventor 2 capturada pela pesquisadora

O sistema possibilita que seja feita uma comparação entre o que foi dito e o que foi compre e ndi do
pelo aplicativo. Isto é feito pela leitura de uma frase sugerida pelo sistema, onde o usuário faz a
leitura e o sistema mostra o que foi compreendido. Os testes realizados mostram que quando o
falante não nativo faz uso do Globish o sistema não reconhece o que está sendo dito (já que o
sistema estava calibrado para nativos). Porém quando a pesquisadora faz o uso do schwa e das
sílabas aspiradas, as frases são reconhecidas, o que explica o fato citado da incompreensão entre

2 ta mbém conhecido como App Inventorfor Androi d, é uma aplicação código aberto originalmente cri ada p el a G o og l e, e
a tua lmente ma ntida pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT).

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nativos e não nativos durante as Olimpíadas de 2016 (poucos aprendem e muito menos treinam, nos
países não nativos, a produzir os schwa e as vogais aspiradas). Para esse teste fez-se o uso de frase s
simples que não gerassem dúvida quanto ao que se desejava comunicar.
Nas figuras de 2 a 7, a seguir, capturadas por print screem da tela do celular da pesquisadora, tem-se
exemplo aleatórios de frases as quais foram pronunciadas em Globish, em seguida com té cni cas do
inglês nativo com uso de schwa e aspirações e finalmente em Cockney.

 Experimento 1: My teacher is very good. (frase pronunciada)

Us o de Globish Us o de s chwa e aspiração

Us o de Cockney

Fig 4: captura da tela do aplicativo MIT app Inventor

Nesse teste, especificamente nas palavras very e good, existe a utilização da aspiração nas sílabas
iniciais o que dificulta para um não nativo a pronúncia similar ao do nativo. Dessa forma a não
utilização da aspiração reforçou o não reconhecimento das palavras pelo sistema.
Ao falar do Cockney é preciso primeiro enfatizar que ele faz uso do schwa em uma entonação mui to
mais forte daquele usualmente pronunciado pelos nativos americanos o que torna o som do schwa
inteligível pelos usuários Cockney, mas que requer um esforço maior de compreensão desse som por
parte daqueles que não o utilizam com frequência, como os não nativos e usuários do Globish. No
exemplo acima todas as palavras são reconhecidas, principalmente pela pronúncia forte do schwa,
exceto pelo pronome possessivo My, que no Cockney é preferencialmente pronunciado como Me.

 Experimento 2: This is my phone. (frase pronunciada)

Us o de Globish Us o de s chwa e aspiração

Us o de Cockney

Fig 5: captura da tela do aplicativo MIT app Inventor

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No segundo experimento, a dificuldade observada tanto no Globish quanto no Cockney foi na


pronúncia do pronome demonstrativo this que requer o uso fonético de / ð / no inglês nativo. Um
som que requer a vibração e aspiração para se pronunciar. Som complexo para os falante s que tê m
como língua nativa o português.

 Experimento 3: Hi, how are you? (frase pronunciada)

Us o de Globish Us o de s chwa e aspiração

Us o de Cockney

Fig 6: captura da tela do aplicativo MIT app Inventor

Diferente das tentativas anteriores, essa foi uma frase que não se verificou distorções durante o
reconhecimento com Globish, Cockney e Nativo. Uma explicação é que a pronúncia de how e are
serem semelhantes ao /rr/ brasileiro, como em: ar, armário, robô entre outros.

 Experimento 4:
frase pronunciada – Would you like a glass of water? (frase pronunciada)

Us o de Globish Us o de s chwa e aspiração

Us o de Cockney

Fig 7: captura da tela do aplicativo MIT app Inventor

Na quarta frase usada no experimento a pesquisadora não obteve sucesso em nenhuma das
tentativas. Acima estão três tentativas que mais se aproximam com que se queria comunicar.
Observa-se que há nesta frase um dificultador, o modal verb would, que no aplicativo é reconhe cido
por you, ody e cut. Assim como would, outros dois modal verbs should e could possuem pronúnci as
semelhantes e certo grau de dificuldade de pronúncia que pode ser levando em consideração devido
ao uso de ditongos na língua portuguesa que leva o sujeito a pronunciar o /o/ e o /u/ ao passo que
no inglês a pronúncia seria /wʊd/. A palavra like que deveria ser entonada com o som /aɪ /, é

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pronunciada no cockney com o som de /oe/, bem como em palavras alright, pie, thigh. O que se
nota é que o aplicativo enfatiza o som do /o/ e do /e/ já que se pronuncia algo parecido com ‘lôek’.
As demais palavras são captadas de certa forma com tranquilidade. Dito ‘de certa forma’ porque e m
outras duas tentativas o aplicativo detectou palavras totalmente distintas do que se esperava que
fosse compreendido pelo sistema, como se observa nas imagens abaixo.

Fig 8: captura da tela do aplicativo MIT app Inventor

Nesta pesquisa, o uso de um sistema simples possibilitou a criação de um modelo descomplicado de


aplicativo que viabilizou o teste de uso do Globish e como uma máquina ou sistema ope raci onal de
um celular, no caso, capta o que é falado. A verificação da língua inglesa pelo aplicativo se mostrou
arbitrária à fala, o que permite sustentar a fragilidade de sistemas de reconhecimento de voz para
usuários não nativos do Inglês e como esses sistemas devem então considerar a identi fi cação do IP
das máquinas e as variantes da língua inglesa, como o Globish, uma vez que observado que 88% da
população global não possui o Inglês como língua nativa, apenas de 12%, conforme afirma Nerrière e
Hon (2009) .

3. Conclusão

As observações, os experimentos realizados neste estudo com o suporte da alta tecnologia de


reconhecimento de padrões existente em nuvem e de fácil acesso, domínio aberto, permitiu a
constatação da fragilidade no estabelecimento da comunicação entre humanos e máquinas, assim
como já era esperada e reconhecida entre nativos com não nativos, mais especificadamente entre os
usuários que não possuem o Inglês como língua nativa com os nativos. Observa-se a necessidade de
se atentar para o problema de compreensão gerado entre máquinas e falantes não nativos da língua
inglesa, uma vez que estes acabam por usarem na comunicação versões simplificadas do inglês como
o Globish e o Cockney. A pesquisa também evidencia que é preciso uma solução, a apresentação de
aplicativos alternativos de reconhecimento de pronúncias de não nativos por máquinas para que
essa troca de informações falante não nativo/máquina possa garantir a compreensão e assim a
efetivação da comunicação. Ou o não nativo passa a utilizar outras formas corretas de falar um inglês
que as máquinas possam compreender, ou as máquinas devem ser dotadas da compreensão de
outras formas simplificadas de falar "Inglês", como o Globish ou o Cokney londrino. Essa reflexão
reitera o uso do Globish, já testado com sucesso comercialmente entre vários países, haja vista a
dificuldade de aprendizagem do Inglês por não nativos e às particularidades fonéticas que a ele
compete. Ensinar máquinas é um processo mais simplificado, não precisa ser feito uma a uma e
devido à padronização dos softwares e hardwares, o que já não ocorre com humanos, dos quais
apenas 12% falam o inglês como língua nativa.
Este artigo inicia um ponto importante de investigação e apontamento de soluções para que a
efetivação da comunicação entre nativos da língua inglesa possam comunicar adequadamente com
os não nativos e para que os não nativos possam comunicar efetivamente com os nativos e máquinas
(celular, IoT, learning machines) utilizando a língua inglesa como meio. A avaliação da qualidade,

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precisão na comunicação utilizando a língua Inglesa, pelos atores citados, é fundamental em um


mundo globalizado em todos os aspectos e ambientes da comunicação.
Estabelecer diretrizes ou metodologias de como aprender a se comunicar através da fala (speaking) e
o real entendimento (listening) é parte importante do processo de comunicação, não apenas na
língua inglesa. Assim, uma ferramenta de mensuração das reais contribuições do Globish e dos
Cockneys (objeto de estudos subsequentes e semelhante aos utilizados neste artigo) como
facilitadores da oralidade da língua entre nativos, não nativos e máquinas, pode ser considerada uma
das soluções para evitar arbitrariedade da compreensão da língua inglesa.

4. Referências

Altendorf, Ulrike. “Ejtuary English: Is English going Cockney”. Moderna Sprak, v. 93, 2-11, 1999.

Kerswill, Paul. Dialect levelling and geographical diffusion in British English. “Social diale ctol ogy: i n
honour of Peter Trudgill”, 223-243, 2003.

Lecun, Yann; Ranzato, Marc'Aurelio. “Deep Learning Tutorial”. ICML, Atlanta, jun. 2013. Disponível
em: <http://www.cs.nyu.edu/~yann/talks/lecun-ranzato-icml2013.pdf>. Acesso em: 19 agos.
2016.

Lima, Luciano V.; Costa, Nayara S. da. “Leitores de livro digital ativos e passivos, uso e aplicação”. In:
Encontro Regional de Bibliotecas Universitárias: Sudeste 1, Centro-Oeste e Distrito Federal.
Uberlândia, 2013.

Matthews, William. “Cockney past and present: A short history of the dialect of London”. Routledge,
2015.

Mccrea, Nicholas. “An Introduction to Machine Learning Theory and Its Applications: A Visual Tutorial
with Examples”. Disponível em: <https://www.toptal.com/machine-learning/machine-learning-
theory-an-introductory-primer>. Acesso em: 19 agos. 2016.

Nerrière, Jean-Paul; Hon, David. “Globish the world over”. International Globish Institute, 2009.

Rocha, Julia. et al. “Computers and Language Learning”. Creative Education, 6, 2015.

Rüdiger, Francisco. As Teorias da Comunicação. Porto Alegre: Penso, 2011.

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Investigação biográfico-narrativa e história das instituições escolares 1

Wolney Honório Filho

Profes sor da Unidade Acadêmica Especial - Educação - Universidade Federal de Goiás - Regional Ca talão,
Bra s il, onde a tua no Programa de Mestrado em Educação e no Curs o de Pedagogia. E-mail:
whonoriof@gmail.com

Resumo. Pes quisas s obre i nstituições escolares no Brasil cresceram s ignificativamente nos útlimos trinta
a nos, i ncorporando i mportantes conhecimentos no ca mpo da Hi stória da Educação. Porém, há poucas
pes quisas s obre história das instituições escolares que a dotam as biografias narrativas como metodologia.
Es te texto compreende anotações iniciais de uma experiência de pesquisa que busca relacionar a metodologia
bi ográfico-narrativa com pesquisas s obre história da s i nstituições es colares, desenvolvidas no Es tado de
Goi ás, Bra sil. Al guns res ultados pa rciais s e a presentam s atisfatórios: a l gumas dessas experiências nos
mos tra m a utilidade em se considerar ta nto fontes escritas quanto orais enquanto narrativas históricas. Outro
res ultado parcial é positivi dade em se considerar enquanto sujeitos narradores de uma instituição não apenas
os docentes, mas ta mbém técnicos a dministrativos e alunos.

Palavras-chave: Investigação biográfico-narrativa; historia das instituiçãoes escolares; narrativas.

Biographical-narrative investigation and school institutions history


Abstract. Res earch on school institutions in Brazil has grown significantly in the last thirty years, incorporating
i mportant knowledge i n the fi eld of Educa ti on Hi story. However, there i s l ittle res earch on the s chool
i ns titutions history tha t a dopt narrative biographies as a methodology. This text comprises initial notes of a
res earch experience that s eeks to relate the biographical-narrative methodology with research on the school
i ns titutions history, developed in the State of Goiás, Brazil. Some partial results are satisfactory: s ome of these
experiences s how us the us efulness of considering both wri tten a nd oral s ources as historical narratives.
Another pa rtial result i s the positivity i n cons idering a s na rrator s ubjects of a n i nstitution not only the
tea chers, but a lso administrative technicians a nd s tudents.
Keywords: Bi ographical-narrative research; s chool institutions history; na rratives.

1 Introdução

Pesquisas sobre instituições escolares no Brasil cresceram significativamente nos útlimos trinta anos,
incorporando importantes conhecimentos no campo da História da Educação. Nosela e Buffa (2013)
dizem que apesar de terem seu primeiro momento nas décadas de 1950 e 1960, essa modalidade de
pesquisa ganhou consistência em 1990. Porém, há poucas pesquisas sobre história das instituições
escolares que adotam as biografias narrativas como metodologia. Este texto compreende anotações
iniciais de uma experiência de pesquisa e tem por objetivo relacionar a metodologia biográfico-
narrativa com pesquisas sobre história das instituições escolares, desenvolvidas no Estado de Goiás,
Brasil. Desta forma, nossa questão de pesquisa é: como relacionamos o uso da metodologia biográfico-
narrativa com pesquisas sobre história das instituições escolares, desenvolvidas no Estado de Goiás,
Brasil?

11 Agra deço o a poio fi nanceiro da FAPEG, através do edital 01/2017, pa ra participação em eventos i nternacionais.

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2 História das instituições escolares – experiência com pesquisa

O termo “Instituição” deriva do latim institutio, onis. O mesmo indica, ainda, quatro variações
significativas para o termo: 1) disposição, plano, arranjo; 2) Instrução, ensino, educação; 3) criação,
formação; 4) Método, sistema, escola, seita, doutrina (Saviani, 2005).
Em outro artigo intitulado Instituições escolares no Brasil: conceito e reconstrução histórica se diz que
as instituições são criadas para cumprirem funções sociais de caráter duradouro. Por isso, são fundadas
para permanecerem, e não para serem desfeitas, após satisfazerem a uma necessidade transitória, já
que para as necessidades transitórias não é necessário criar instituições. No entanto, o autor também
afirma que, como todo produto humano, as instituições não deixam de se submeterem ao tempo
histórico e, em última instância, também são transitórias. Elas devem se moldar, dessa forma, às
necessidades que o tempo histórico lhes impõe, mantendo-se sólidas e perenes, mas adaptando-se às
funções sociais que lhes são exigidas. Assim, para a transitoriedade das instituições, o autor res salta a
importância do tempo histórico, muito mais significante que o tempo cronológico ou o tempo
psicológico (Saviani, 2007, p. 4-5).
Para Sanfelice (2007), captar a singularidade de uma instituição é importante tomar a relação entre o
singular e o universal. Diz o autor que “o estudo das instituições escolares e/ou educativas poderá
acrescentar conhecimentos históricos à história da educação se além de revelar as minúcias das
singularidades escolares, inserir a compreensão e a explicação delas na totalidade histórica” (p.198).
É esta perspectiva, portanto, que adotamos nas pesquisas que estamos realizando, qual seja, a de
acrescentar conhecimento histórico à história da educação. Entretanto, são raras, para não dizer
inexistentes, pesquisas que tratam deste conhecimento histórico através da metodologia biográfica-
narrativa, no Brasil.

3 Metodologia - Investigação biográfico-narrativa

A ideia de se pesquisar a história de instituições escolare s por meio da metodologia biográfico-


narrativa ocorreu quando da participação no VI Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)biográfica
- VI CIPA, realizado na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, em 2014. Numa das publicações do evento,
encontramos o texto de Bolívar (2014, p.330), o qual ressalta a importância do enfoque biográfico e
narrativo nas pesquisas sobre organizações escolares.
Afinal, o que é a abordagem biográfico narrativa, termo utilizado por Bolívar (2002, 2012a, 2012b,
2014)?
No mundo globalizado as pessoas passam a ter uma necessidade imperiosa de se individualizar, de
contar suas histórias de vida. Pessoas até então “sem voz” passam a narrar suas lembranças, seus
desejos, seus projetos. Emerge, assim, a necessidade de recolocar o sujeito no centro das pesquisas:

Em lugar de explicar casualmente as práticas sociais, como se os atores fossem marionetes dependentes
da estrutura social e escolar (DE MIGUEL, 1996), entende-se que o ator joga em suas ações um papel
de primeira ordem. A tarefa investigadora consiste em solicitar contar historias sobre os eventos/ações
e, a partir de sua análise/compreensão conjunta, interpreter e construir novas histórias/relatos, que
registram a possível mudança e melhoria (BOLÍVAR, 2012a, p.39. Grifos do autor. Traduação nossa).

A perspectiva biográfico narrativa toma essa ideia de que o sujeito/ator tem um papel fundamental
em sua inserção/interação social, especialmente quando a narra, contando para outro sua experiência.
O sujeito tem uma relação singular, pela sua atividade biográfica, “com o mundo histórico e social”
(Delory-Momberger, 2012, p.524).

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A ênfase na narrativa é singular: “as narrativas como nós estratégicos na construção do sentido de
comunidade, são os meios pelos quais se manifesta a memória institucional, a história e se constitui a
identidade organizacional e profissional” (Bolívar, 2014, p.330). Para Bolívar, isso é compreendido
porque “Identidades, memória e história institucional se constituem dentro dos regimes discursivos,
que - por sua vez - fornecem materiais e oportunidades para as pessoas refletirem sobre outras versões
de si na instituição” (2014, p.331, Traduação nossa). A história de uma instituição, que habita nas falas
de seus atores, fornece materiais e oportunidades, de modo que quem pesquisa possa refletir sobre
as versões que cada um tem de sua convivência na instituição e assim elucidar as suas identidades.
Bolívar nos diz ainda que “Compreender el centro escolar como una realidade construída socialmente,
conduce a verlo como una instituición que tiene su propia historia, que – por eso mismo – ha generado
estructuras, roles, patrones de acción, significados, ritales, etc.; es decir, su cultura organizativa.”
(Bolivar, 2014.p. 332).
Assim, o que nos interessa, nas pesquisas que estamos realizando, é tomar essa construção social de
uma instituição, por meio de narrativas de professores, tecnicos administrativos, e/ou2 ainda de alunos
que a experimentaram na condição de trabalhadores ou de estudantes, e que relatam essas
experiências através de suas narrativas, sejam escritas ou orais.

4 Relação entre investigação biográfico-narrativa e história das instituições escolares

Por ser uma experiência de pesquisa recente, vou citar três dissertações que orientei, nas quais foi
tomado como perspectiva metodológica a investigação biográfico-narrativa. A primeira delas (JACOB,
2016), tomou como objeto a história de um grupo escolar numa cidade do interior do Estado de Goiás,
de 1949 a 1971.
A segunda (PAISLANDIM, 2016), trata de uma pesquisa que buscou compreender as transformações
que ocorreram quando da passagem da Escola Técnica Federal de Goiás para Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás (IFG), de 1999 a 2014, na perspectiva de técnicos
administrativos.
A Terceira pesquisa (ALVES, 2017) trata da história da Universidade Federal de Goiás – Regional
Catalão, de 1987 a 2014, também na perspectiva de seus técnicos administrativos.
Inicialmente, houve dificuldade de referências para essas três pesquisas, especialmente nessas duas
últimas, pois não encontramos outros estudos que tomassem a história institucional na perspectiva de
seus técnicos administrativos. Geralmente, quando se elege sujeitos para se fazer entrevistas, esses
são professores ou professoras. Traçar a biografia instituicional de uma escola, um instituto ou ainda
uma universidade, através de narrativas de seus sujeitos, pode nos levar a pensar que professores e
professoras são sujeitos privilegiados para falarem sobre determinada instituição. Isso faz com que
outros trabalhadores, tais como técnicos administrativos, ou os alunos e al unas têm pouco a dizer
sobre a Instituição. Trabalhamos com a perspectiva de que tanto docentes, quanto técnicos
administrativos e alunos têm o mesmo valor documental para a pesquisa com biografia instituicional.
São sujeitos diferentes que lançam olhares diferentes sobre as instituições.
Essas três pesquisas, por outro lado, não se restringiram apenas à documentação oral. Dados de fontes
escritas do Grupo escolar, do IFG e da Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão foram levados
em conta, tendo em vista ampliar o manancial informativo sobre as instituições em pauta. Mais do que
isso: as fontes escritas foram tomadas também como narrativas.
2 Res salto que essas pesquisas dizem respeito a um projeto guarda -chuva, no qual s ão i ncluídos projetos de alunos
ori entandos do mestrado. Isso s ignifica que pode ha ver projetos que s e uti lize a penas de entrevistas de técnicos
a dministrativos, ou professore, ou ainda apenas alunos, ou mesmo de todas as três categorias.

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Pensamos que “educadores estão interessados em vida. Vida, pegando emprestado a metáfora de
John Dewey, é Educaçao” (Clandinin e Connelly, 2011, p.22). A experiência educacional são as histórias
que as pessoas vivem. Neste caso, a vivência de professores, técnicos e alunos em uma instituição
escolar são contadas/narradas, seja através de registros escritos, ou orais. Certamente, a autoria dos
registros escritos encontrados numa escola é mais difícil de ser registrada do que aquela que colhemos
através de entrevistas. Porém, considerando que as fontes escritas foram produzidas por alguém, elas,
então, são tomadas como narrativas de histórias vividas por alguém, ou um grupo de pessoas numa
instituição escolar.

5 Conclusões

Algumas questões se abrem ao nos aproximar desse referencial metodológico, a abordagem biográfico
narrativa. A primeira delas é sobre a relação entre fontes documentais escritas e as fontes orais.
Indiscutivelmente, a forma de analisar essas fontes documentais é diferente. Tomá-las como
produções narrativas não diminui o rigor com que o pesquisador deve utilizá-las. Por algum motivo, a
experiência social é relatada tanto nos documentos escritos quanto orais. Tomar tanto um, quanto o
outro assegura-nos apenas a perspectiva de que as fontes que estamos tratando a história da educação
são narrativas e têm algo a nos dizer sobre o(a) narrador(a) e o mundo que ele/ela vive.
A segunda, trata-se da propriedade mesma da narrativa dos sujeitos entrevistados, como esses
sujeitos, professores, técnicos administrativos e alunos, devem sem abordados e que tipo de perguntas
fazemos aos mesmos tendo em vista a biografia institucional. À primeira vista, imaginamos questões
objetivas, as que o sujeito narrador/entrevistado nos dissesse sua visão sobre uma determinada
instituição. Esses sujeitos são tomados como depoentes de um determinado tema. Porém, na medida
em que as narrativas iam sendo construídas, fomos percebendo uma invisibilidade do sujeito narrador
no processo de construção histórica da instituição. Assim, outra questão nos apareceu: para se falar
em biografia instituicional não teríamos que tomar também a biografia individual do sujeito narrador?
Uma biografia não estaria entrecruzada na outra?
A pesquisa utilizando a narrativa de sujeitos explora a ideia de que a biografia é a “escrita da vida”.
Para Delory-Momberger (2012, p.17), “os homens, ao narrar sua história para si mesmos e para os
outros, dão forma às suas experiências, representam e inscrevem o curso de suas vidas nas
temporalidades e espaços de seu ambiente histórico e social”. Não se trata de espelhar na biografia
do sujeito narrador, a da instituição. Mas, de relacioná-las, tomando suas aproximações e
distanciamentos.

Referências

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servidores técnicos administrativos entre os anos 1987-2014. Dissertação (Mestrado em
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Campinas, SP: Autores Associados: Histedbr; Sorocaba, SP: Uniso; Ponta Grossa, PR: UEPG, 2007,
5-93.

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Estudiantes con discapacidad física y el acceso a Tecnologías de


Información y Comunicación en centros escolares

Santos Bravo (1, 2), Jhonny Villafuerte (1,2), Xavier Ramírez (1,3), Lorena Luzardo (2), Teresa
Zambrano (1,4)

(1) Doctora ndo en Universidad del País Vasco, España


(2) Profes or en la universidad La ica El oy Al faro de Ma nabí, Ecuador
(3) Profes or en la universidad Técnica Luis Va rgas Torres, Ecuador
(4) Profes or en la Pontificia Universidad Ca tólica del Ecuador, Sede Santo Domingo

Resumen. Es te tra bajo ti ene como objetivo identifica r l a s b a rrera s d e a cces o a l a s Tecn ol og ía s d e
Informa ci ón y Comuni ca ci ón (TIC) que ti enen es tudi a ntes con di s ca pa ci da d fís i ca en l os centros
es colarizados. Pa rticipan 10 estudiantes de Ecuador, diagnosticados con discapacidad física, en un p ro ces o
de observa ción y entrevista semiestructurada. Los datos colectados s on tra bajados con la técnica de a nálisis
ca tegorial, y procesados con el software MAXQDA V12. Los hallazgos ra tifican que, persisten las barreras de
a cces o a l as TIC en l os centros escolarizados públicos y pri va dos, ci rcunstancia que limita l a a uto nom í a d e
l os estudiantes con discapacidad física en el tra bajo escolar. Si n embargo, l os participantes logra n s upera r
l a s barreras de acceso haciendo uso de s u capacidad de resiliencia y moti vados por el deseo de a pren der a
tra vés del internet, practicar idiomas, y fortalecer l os vínculos con sus compañero s d e a ul a y l os n u evos
a mi gos hechos a través de l as redes s ociales.
Palabras clave: Incl usión educativa ; salud pública; a utoconcepto; resiliencia; redes sociales.

Students with physical disabilities and their access to Information and Communication Technologies in
schools
Abstract. Thi s paper aims to i dentify the barriers to a ccess to Information a nd Communication Technologies
(ICT) tha t have students with physical disabilities in schools. Five s tudents diagnosed with physical disabili ty
from Ca nton Manta, Ecuador participate in a process of observation a nd s emi-structure d i n tervi ew . The
col l ected data are worked with the technique of categorical analysis, and processed the s oftware MAXQD A
V12. The findings confirm that barriers to access to ICT remain in public and private schools, a
circumstance that limits the autonomy of students with physical disabilities in school work.
However, participants manage to overcome access barriers by making use of their resilience a nd
motivated by the desire to learn through the internet, practice languages, and strengthen
affective bonds with their classmates and new friends made through of social networks.
Keywords: Educa tive inclusion; Public health; resilience; s elf-concept; resilience; s ocial networks sites.

1 Introducción
La inclusión social y educativa es transformar y no sólo es acceder, afirma Blanco (2013), ya que la
meta buscada es ofrecer educación de calidad y superar las diferencias, barreras y brechas aún
presentes en las comunidades educativas tradicionales en América del Sur. Se agrega que para lograr
los cambios en la sociedad se requiere de un marco jurídico favorable, pero sobre todo, del
compromiso y participación de los actores directos, docentes y autoridades escolares, y de los
actores de la salud pública, dispuestos a emprender intervenciones innovadoras, que “pe rmitan e l
acceso de todo el alumnado sin discriminación y una respuesta educativa adaptada a las
posibilidades del alumnado” (Marchesi, Blanco y Hernández, 2014, p.11), el que hace uso de su
capacidad de resiliencia para acceder y “usar tecnologías, empleando elementos presentes en el
entorno y que resultan de interés” (Alcívar, Bravo y Villafuerte, 2015, p. 14). Desde la política de la
salud pública se ejecutan su promoción, prevención e intervención desde una representación
multidisciplinaria centrándose en el bienestar colectivo. En este marco jurídico, la Organización
Panamericana de la Salud (OPS), define el término salud pública como: “El esfuerzo organizado de l a

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sociedad, principalmente a través de sus instituciones de carácter público, para mejorar, promove r,
proteger y restaurar la salud de las poblaciones por medio actuaciones del alcance colectivo” (2000,
p. 47). Por su parte, Franco (2006), define la salud pública como: “La ciencia y el arte de prevenir la
enfermedad, prolongar la vida y promover la salud mediante los esfuerzos organizados de la
sociedad” (p. 12), así, la salud pública tiene como fines: gestión, vigilancia y facilitación de la cal i dad
de vida de la población. A este punto, Franco (2006), indica que: “la esencia de la salud pública es
que se adopte una perspectiva basada en grupos de personas o en poblaciones, como un campo de l
conocimiento y como una esfera para la acción” (p. 13). Según Betanzos (2001) la OMS reemplazó los
términos: “Déficit en el funcionamiento” por “deficiencia”; “Limitación en la actividad” en vez de
“discapacidad” y “Restricción en la participación” eliminando la palabra “minusvalía”. Así, en la
segunda clasificación internacional del funcionamiento de la salud, define la discapaci dad como un
término genérico que incluye “déficit, limitaciones en la actividad y restricciones en la participaci ón,
lo que indica aquellos aspectos negativos de la interacción entre un individuo (con una condici ón de
salud) y sus factores contextuales (factores ambientales y personales)” (Betanzos, 2001, p. 29). “Estas
características dependen del nivel de afectación funcional y el origen de la discapacidad” (Turri ago,
2005, p.287). Para facilitar su diagnóstico Jacobs y Austin (2003) presentaron la clasificación de la
discapacidad física derivada de la parálisis cerebral que planteó los niveles leve, moderado, grave y
profundo, el que es vigente actualmente. El compromiso neurológico varía considerablemente entre
los casos: “Algunos tienen compromisos leves otros tienen alteraciones graves que produce n total
discapacidad permanente, por ello no hay que generalizar y la intervención (terapéutica, pedagógica,
etc.) debe considerarse de manera individual, sin desconocer los trastornos asociados” (Turriago,
2005, p.288). Para Bonals y Sánchez (2007), la discapacidad física es una “alteración del aparato
motor, que dificulta o imposibilita el desarrollo de capacidades, que permiten participar en
actividades propias de la vida cotidiana, como estar de pie, caminar, desplazarse, tomar y manipul ar
objetos con las manos, hablar, hacer gestos, […]que requieren movimiento y control de la postura
corporal” (p.29). Además, las discapacidades físicas presentan variaciones del sistema músculo-
esquelético que son causadas por un deficiente funcionamiento de los sistemas nervioso, muscular y
óseo–articular, los mismos que se interrelacionan entre sí y pueden estar o no estar asociados a
déficit visual, auditivo, cognitivo, entre otros (Agreda, 2009). Por lo tanto, las personas en condi ci ón
de discapacidad física enfrentan numerosas dificultades que podrían influir sobre el proceso de
aprendizaje, debido a una deficiencia en el control postural, desplazamiento, manipulación y
comunicación con los demás, entre otros efectos (Betanzos, 2008). La integración de las TIC en la
educación aporta al desarrollo de la creatividad, autonomía, el trabajo colaborativo y aporta a la
superación de las barreras físicas y espaciales que enfrentan las personas (Cabero, Córdoba, y
Fernández, 2007); por lo tanto, su introducción en los sistemas educativos, sintoniza con las ideas de
la inclusión educativa, que se define como un “proceso orientado a responder a la diversidad de
necesidades de todos los estudiantes, incrementando su participación en el aprendizaje, la cul tura y
las comunidades y lograr reducir y eliminar la exclusión desde la educación (UNESCO, 2009). En
cuanto a las competencias funcionales básicas, éstas son entendidas como aquellos saberes
necesarios para que una persona logre desenvolverse en diferentes contextos, de mane ra que e sta
pueda solventar sus necesidades cotidianas y dar las soluciones adecuadas a problemas del diario
vivir (Marchesi, Blanco y Hernández, 2014). Las competencias funcionales que deben desarrol lar l os
estudiantes en el proceso de escolaridad, desde la visión de Rodríguez, León, Alcázar, y Velasco
(2013) son “Convivencia de manera democrática en cualquier contexto o circunstancia, y con todas
las personas sin distinción; delibera sobre asuntos públicos, a partir de argumentos razonados, […] y
Participa democráticamente en espacios públicos para promover el bien común” (p. 12).
En referencia a los procesos adaptativos que favorecen la integración psicosocial de los niños, niñas y
adolescentes de centros escolares, es necesario tomar en consideración el concepto de resiliencia, de

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ello varios autores y autoras consensuan en definirla como el logro de una adaptación positiva, es
decir que, a pesar de que existan experiencias significativas de adversidad o trauma, consideradas
circunstancias de riesgo al asociarse con una alta probabilidad de ajuste negativo, la persona
resiliente puede afrontar adecuadamente las tareas del desarrollo propias de una etapa y cultura
específica (Rutter, 2006; Ungar, 2011; Vanistendael, 2005; Vera, Carbelo y Vecina, 2006), citados por
(Muñoz, 2012). Otros autores varían en la forma de definir la resiliencia. En esencia se define la
resiliencia no solo como la capacidad de sobreponerse y recuperarse ante la adversidad, sino salir
fortalecido de ella, muy a pesar de estar expuesto a situaciones de estrés y dificultad grave. (Gross y
John, 2003; Hildon, Montgomery, Blane, Wiggins y Netuveli, 2010; Quiceno Sierra y Vinacci a, 2012),
citados por (Suriá, 2016). Por otro lado, Muñoz (2012), observa que en relación a los variados
enfoques utilizados para el estudio de la resiliencia, actualmente impera una noción de la resil i encia
que se acentúa más en el equilibrio dinámico de los factores implicados y su relación con la etapa de l
ciclo vital, y con menor énfasis en los conceptos relacionados con inmutabilidad o invul nerabi lidad .
En este sentido Suriá (2016), y Uriarte (2013), coinciden en definir este constructo como un conjunto
de procesos sociales e intrapsíquicos de la persona y su ambiente, social y cultural, en el que
interactúan diferentes dimensiones tales como la aceptación de la vida y de sí mismos, así como
también el desarrollo de habilidades sociales, dimensiones implicadas en la inclusión educativa de los
niños, niñas y adolescentes con discapacidad física, y la formación de su identidad personal y soci al
vinculada a la escuela. Al margen de los factores relacionados entre la resiliencia y el sistema
inmunológico que protege de contraer patologías, Uriarte (2012), sugiere que el bagaje de
información derivada de la psicología y la neurología articuladas entre sí coincide con la perspe cti va
salugénica de la resiliencia vinculada al sistema adaptativo de tratamiento de la información que
existe en el cerebro, el cual explicaría las diferencias individuales y los cambios tanto en el desarrol l o
evolutivo, como en la capacidad de asimilación de los traumas emocionales. Cyrulnick (2002) se ñal a
que la adversidad puede conducir a la “elasticidad” o la capacidad para ceder y recuperarse de los
sistemas neuronales. Cuando el trauma es demasiado intenso, el sistema neurológico adaptativo
puede desbordarse. También puede ocurrir que los factores desencadenantes no sean muy grave s y
a pesar de ello, ser igualmente traumáticos si la persona es frágil o se encuentra en una situaci ón de
susceptibilidad emocional al haber una serie de situaciones complejas. Para el caso de Ecuador, Ve ga
(2008) afirma que Ecuador tiene entre sus retos la promoción de valores, ideas, concepción de los
niveles comunitaria y nacional, para que se asuma la diversidad y la pluralidad. Por su parte, el
profesorado expresa la carencia de conocimiento y experiencia para acompañar a los alumnos con
discapacidad, a pesar de la inversión del Estado en capacitación y asesoría del profesorado en te mas
de inclusión y, por su parte, los centros escolares deberán ajustar cambios que favorezcan la
inclusión educativa, para garantizar que todo el alumnado tenga acceso a los mismos aprendizajes
(Marchesi, Blanco y Hernández, 2014). Para trabajar en dicho horizonte el gobierno, las institucione s
y las comunidades educativas, requieren de información completa sobre las problemáti cas soci ale s
que afectan a la población (Villafuerte, Zambrano, Ramírez, Bravo y Corral, 2017). Entre los estudi os
previos, se cita el trabajo de Camacho y Varela (2011) sobre la inclusión educativa virtual de ni ños y
niñas realizada en México; y el trabajo de (Alcívar, et al, 2015) quienes aplicaron apoyo de TIC, para
fortalecer el remanente visual en niños con déficit visual en Ecuador. Desde el escenario descri to se
plantean las siguientes preguntas:
A: ¿Cuáles son las barreras de acceso a TIC que los estudiantes con discapacidad física perciben en los
centros escolares?
B: ¿Cuáles son las prácticas escolares que limitan el acceso de estudiantes con discapacidad a las TIC?
2 Metodología
Se seleccionó la metodología cualitativa que, a criterio de Palacios (2008), facilita el análisis social de

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la discapacidad. Para la selección de los participantes, se realizó la identificación de 25 casos de y e n


condición de discapacidad física, todos ellos domiciliados en la provincia de Manabí, Ecuador. La
selección consideró los siguientes criterios:
a.- Estar legalmente matriculado/a en educación básica media o básica superior
b.- Asistir habitualmente a un centro de educación en el cantón Manta, Ecuador
c.- Aceptar el compromiso de invitado/a para participar en calidad de informante.
Finalmente, fueron 5 los estudiantes quienes accedieron a participar de este estudio, cuyos pe rfil es
se presentan a continuación. (Ver tabla 1).
Tabla 1. Des cripción del grupo estudiado
No Seudónimo Eda d Ni vel de estudios Sexo Ti po Centro escolar
1 Pol i cía 11 a ños s éptimo grado E.B. Ma s culino Públ ico
2 Profes or 14 a ños noveno grado E. B. Ma sculino Pri va do
3 Arqui tecta 15 a ños déci mo grado E. B. Femenino Público
4 Pa na dero 14 a ños déci mo grado E. B. Femenino Pri va do
5 Bombero 10 a ños octa vo gra do E. B. Ma s culino Público
6 Pes ca dor 12 a ños noveno grado E. B. Femenino Pri va do
7 Profes ora 13 a ños octa vo gra do E. B. Ma s culino Público
8 Mús i co 15 a ños pri mero E. S. Ma s culino Pri va do
9 Aboga do 17 a ños tercero E. S. Femenino Pri va do
10 Agri cul tor 17 a ños tercero E. S. Ma s culino Público
Nota : E.B. Educación básica. E. S. Educación secundaria
El a borado por: el equipo i nvestigador.

El protocolo aplicado fue diseñado ad. hoc, por el equipo de investigadores consistió de cuatro
momentos: (i) Acercamiento a los participantes, (2) aplicación de instrumentos y colecta de
testimonios, (3) entrevista personal para superar dudas surgidas en el análisis de testi monios, y (4)
trabajo de inferencia y redacción del informe. Siguiendo las normas de ética de la APA, se requirió del
consentimiento informado de los padres y madres de familia, la colaboración de las autori dades de
los centros escolares, y se asumió en lo posible, las recomendaciones dadas por los profesores y
profesoras, para el trabajo con los participantes. El primer momento tuvo como objetivo acercarnos a
los participantes para colectar datos personales (lugar de nacimiento, discapaci dad diagnosticada,
lugar de estudio, contacto telefónico, etc.); tiempo estimado 15-20 minutos por cada participante. El
segundo momento tuvo como objetivo aplicar la observación de las actividades realizadas por los
participantes en el eco ambiente escolar. Participaron las madres o padres de familia, el/la
profesor/a, tutor/a y el estudiante; tiempo estimado 120 minutos por cada participante, distribuidos
en sesiones de 30 minutos. El tercer momento tuvo como objetivo aplicar la entrevista
semiestructurada. Esta etapa se ejecutó en el domicilio de cada participante. La actividad se re al i zó
en presencia de los padres de familia; tiempo estimado 50-70 minutos, en relación al interés del
estudiante. De ser consentido por los participantes, este proceso debería ser grabado o filmado, y
posteriormente documentado por escrito. Se administra un sistema de códigos para la protección de
la identidad de los participantes. El cuarto momento tuvo como objetivo la restitución de datos con la
participación de cada estudiante y al menos uno de sus padres. Se realizó validaciones sobre los
datos obtenidos.
2.1. Los instrumentos: Los instrumentos aplicados en este trabajo son:
a. Ficha de registro de observación respecto a las actitudes, lenguaje corporal, expresiones utilizadas,
etc., que los y con discapacidad física demuestran consciente e inconscientemente ante las barre ras
de acceso a las TIC en los centros escolarizados.
b. Ficha de accesibilidad de personas con discapacidad de Aguado y Real (2011), la que permite
determinar el estado de la infraestructura de los centros escolares, ante las necesidades de y con
discapacidad física.

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c. La entrevista semiestructurada aplicada a profundidad, cuyo diseño fue basado en el cuesti onario
de Alonso (2011) para la investigación titulada: “Percepción de las relaciones entre los profesional es
de la educación escolar y social que intervienen con la Infancia en situación de desprotecci ón e n l a
comunidad Autónoma Vasca”.
2.2. Análisis de datos: Para el análisis se acudió a la triangulación de los datos en contraste con las
fichas de observación y las entrevistas semiestructuradas. Se aplicó las siguientes categorías con
soporte del software MAXQDA V12.
Tabla 2. Ca tegorías a plicadas en el estudio
Cod. Conceptualización Des cripción
Ca tegoría Dependencia o a poyos re ci b i dos e n Acondi cionamiento de los espacios, equi pos y m o b i l ia ri o
1 entorno escolar y us o de TIC pa ra el a cceso a decuado a l os apren di za jes , y s a ti s fa cer
necesidades básicas, educativas, s ociales y emocionales.

Ca tegoría Ba rreras físicas en el acceso a TIC d e Pres encia de actitudes desfavorables de l os a ctores d e l a
2 un a dolescente con discapacidad física i ncl usión educativa hacia los y con discapacidad física.

El a borado por el equipo i nvestigador (Ene. 2016).

3. Resultados
3.1. Objetivo A: Identificar las barreras de acceso a TIC de y con discapacidad en los centros escolares
a través de la entrevista a y con discapacidad física
A continuación, se exponen los resultados de la entrevista semiestructurada en la Categoría No.1.
Dependencia o apoyos recibidos en entorno escolar y uso de TIC.
Pregunta No.1.: ¿Recibes apoyo para ir al centro de cómputo? ¿De quién?
A1 “…Pero, ir a lugares más lejanos como el centro de cómputo o biblioteca no puedo ir solo. Necesito que un adulto me
ayude debido a que no puedo subir las escaleras. Casi no puedo practicar computación en el colegio a pesar de que me
gusta. Yo practico en mi casa.

J4 “…Normalmente yo hago sola todas las cosas, pero, el tema de la clase de computación es algo especial pues, cuando
explican teoría en el aula si participo, pero al ir a practicar no puedo hacerlo, pues mi silla no cabe entre las mesas del
centro de cómputo…a veces mejor me quedo en el aula”

J4 “…Me mi mamá me ayuda a trasladarme tanto en casa como en el colegio… en ocasiones mis compañeros también se
ofrecen a ayudarme…Debo ir pues el profe se molesta si no voy y me canso bastante al subir. Deberíamos tener wifi y
computadoras en el aula”

F2 “…La mayoría de las veces me movilizo yo solo sin ayuda, pero cuando no puedo me ayudan mis compañeros de
clase…Yo no los obligo, pero, ellos se ofrecen… pero, ir el centro de cómputo es otra historia. Allí sí que necesito
ayuda…pues, queda en el tercer piso”

J5 “…recibo apoyo de mi mamá, pero ella no está todo el tiempo en el colegio por eso, necesito de mis compañeros y de la
profesora para trasladarme al centro de cómputo…Complicado para todos y a veces me dejan. Luego el mayor problema
es que no entra mi silla entre las mesas del centro de cómputo”

D3 “…Me ayudan algunos compañeros porque el profesor les obliga a que me ayuden…Subir al centro de cómputo es difícil
porque hay muchos alumnos… me ayudan más los varones…que mis amigas”.
A continuación, se exponen los resultados de la entrevista semiestructurada en la Categoría No.2.
Dificultades y Tensiones en el acceso a TIC de un adolescente con discapacidad física

Pregunta No 2.1. ¿Necesitas que alguien te ayude a hacer tus tareas, proyectos de computación?
J8 “…Mi mamá me ayuda siempre a hacer los deberes, ya que mi motricidad es muy lenta... pero, en el caso de
computación lo hago yo solo, porque mi mamá sabe muy poco de ofimática. Me gusta andar en la computadora.”

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F9 “…Yo misma copio las tareas y hago mis proyectos usando computadora en mi casa. Soy un poco lento, pero tengo
el tiempo para hacerlo. A veces el ruido que hace mi hermanito me molesta, pero, pasa pronto…
Mi profesora de computación me felicita, pues hago tareas muy buenas usando TIC. Me gustaría integrar más
aplicaciones en mis presentaciones, pero, el internet en el colegio no está disponible”

J10 “…Es complicado, mi mamá me ayuda a hacer mis tareas, pero, matemática ni informática son sus fuertes. Mi pri m o
que estudia computación en la universidad me ayuda a configurar textos, pero con programas de gráficos es complicado
porque mi problema con mi brazo derecho no me deja trabajar de manera rápida… pero, al final sí completo a tiempo mis
tareas”.

Comentario: Los estudiantes entrevistados revelan, que reciben permanente ayuda para hacer las
tareas de parte de sus profesores, madre, hermanos u otros familiares. Ellos tienen dificultades a
nivel físico y suelen ser lentos para escribir, pero, si son motivados por sus maestros p ara compl e tar
los proyectos, más, la tendencia en las respuestas, evidencia que existe un ambiente poco favorabl e
para el uso de TIC en los planteles a los que asisten los participantes. Los estudiantes revelan que, l a
institución educativa no ha proporcionado ninguna ayuda técnica como equipos informáticos para
uso personal. En el colegio ellos deben usar los equipos disponibles y en ocasiones , estos no son
suficientes en número. El acceso al wifi está restringido para evitar que los alumnos se de di quen a
navegar en vez de atender al profesor/a. Los padres de los participantes adquieren los equipos de
computación y practican en casa, pero, en el centro educativo es muy limitado el acceso a TIC. Otros
entrevistados no tienen computadora en casa, debido a sus escasos medios económicos, lo que
desmotiva a dichos estudiantes.
Pregunta 2.2. ¿Cómo te sientes cuando realizas trabajos usando TIC?
J6: “he sido excluido en deportes, educación física y actividades sociales. Los proyectos usando TIC sí los puedo hacer sin
problemas y a la hora de hacer equipos de trabajo si me toman en cuenta mis compañeros”.
J7: “El proceso educativo está bien. No puedo subir al centro de cómputo y me pierdo de clases nuevas. Mi papá me pus o
un profesor que va a mi casa a enseñarme computación. Me gusta mucho TIC”
D3: “Me excluyen en el colegio por mis defectos al hablar. Lo mismo sucede en el centro de cómputo pues soy lento
digitando y el mouse no me gusta; para mí es difícil.”

2.2. ¿Qué tipos de adaptaciones curriculares hacen para ti en la clase de computación?


F2: “Para tomar exámenes de computación a todos nos toman pruebas de la misma manera, y yo a veces no logro
terminar el examen de computación…”
J4: “como yo soy muy lento para escribir, el profesor me toma el examen oral…”
J10: “Los profesores me tratan igual que a todos mis compañeros… pero, como no puedo subir al centro de cómputo a
todas las clases, hay algunas funciones que no se en computación. Mis compañeros no tienen paciencia para explicarme”.
Comentario: Los participantes comunicaron que su discapacidad física les provoca desajuste soci al y
afectivo; asuntos que se reflejan en su rendimiento escolar en todos los proyectos que requieran de l
uso de TIC, lo que se debe al limitado acceso que ellos tienen en el plantel, y esto amplia la brecha de
conocimiento del uso de TIC en el aula. En este marco se aprecia debilidad en las políticas y prácti cas
inclusivas institucionales, entendidas como una de las dimensiones fundamental es de l a i ncl usi ón
educativa.
3.1. Objetivo B: Identificación de las barreras físicas en relación al acceso a TIC en los centros
escolarizados.
Tabla 5.La s barreras físicas relacionadas al acceso a TIC
COD Seudónimo Forma s de exclusión percibidas en el Ba rreras físicas notorias
a ul a Pa ra el a cceso a TIC en el plantel

J5 Pa na dero El es tudiante es excluido de la cl a se d e Pres enci a de muros y ba rrera s


computación por s us compañeros i mpi den l l ega r a l a cl a s e de
computación

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F2 Profes or A todos l es toman las mismas pruebas y Ha y muros y es ca l era s por es o s e


de l a misma forma toma más ti empo en llegar a l a s a l a
de computación
J4 Arqui tecta Por s er l ento a l tipear y el p rof es or n o Es ca so número de computadores e n
me cons i dera en l os proyectos de rel a ción al número de alum nos q u e
computación a cuden al centro escolar.
D3 Agri cul tor Se s i ente excl ui do porque no puedo Debi l i da des no a tendi da s ni
ma nejar el mouse tra ba jadas para s u superación

J7 Médi co Pa s o s ol o dura nte el reces o. No me La s barreras persisten


gus tan actividades que usan TIC
J8 Pes ca dor Me s i ento solo. Mis a migos chatean y yo No tengo a cceso a TIC pues el centro
no tengo computadora en ca sa de cómputo está en el úl ti m o p i s o.
Yo no puedo l legar s olo.
J10 Pol i cía Yo qui ero a prender i ngl és en l a Es una pena que nos prohíba n el
computadora pero, no tengo internet en i nternet pues, nos ayuda mucho para
ca s a y en el col egi o no me deja n ha cer ta rea s y conocer nueva s
conecta rme a l internet para practicar pers onas.
El a borado por el equipo investigador. Junio (2016).

Tabla 6. Obs ervaciones realizadas en los centros escolares


Cod Seudónimo Discapacidad Tareas que requieren de Apoyo para realizar Ambiente escolar
física computación tareas
J5 Bombero Ni vel Funci ona l Pres enta dificultad para Requiere permanente Poco fa vora ble
gra ve ha cerla en la escuela. a yuda del profesor.
F2 Profes or Ni vel leve Si completa tareas. No Es a yudado por su Poco fa vora ble
pres enta dificultades profesor y compa ñeros
a pa rte del acceso.
J9 Arqui tecta Ni vel Funci ona l Pres enta dificultad pues es Es a yudado por su madre Ca tegori za do
gra ve una escuela numerosa l as en l a casa. El profesor poco fa vora bl e a
computadoras no son ti ene que controlar al pa rti r de s us
s uficientes grupo pues, es numeroso. ges tos faciales.
D3 Mús i co Ni vel Moderado Pres enta dificultad en llegar Es a yudado por sus Fa vora ble
a l a sala de computo compa ñeros.
J7 Médi co Ni vel Moderado No cumpl e con ta reas de Es a yudado por su Muy des favorable
computación. No le gusta profesor, padres y no s e motiva el
us a r TIC a prendizaje
El a borado por el equipo i nvestigador. Junio (2016).

4. Discusión
Al responder a la pregunta: ¿Cuáles son las barreras de acceso a TIC, que los estudiantes con
discapacidad física perciben en los centros escolares? Desde la teoría se ratifica que los e studi ante s
con discapacidad física hacen uso de su capacidad de re siliencia y autoconcepto positivo, para
superar las barreras físicas y sociales que persisten en los centros escolares (falta de plataformas,
prejuicios sociales, espacios insuficientes para la circulación de sillas de ruedas, entre otros), para
finalmente acceder a las TIC, y estar a la par con sus colegas sin discapacidad. Así, Uriarte (2005)
menciona que, entre los pasos para fortalecer la resiliencia propuestos Henderson y Milstein (2003),
está el de reducir los factores de riesgo procedentes del medio, favorece r los lazos prosociales,
establecer límites claros y firmes en la acción educativa y enseñar habilidades para la vida. Así
mismo, otros de los objetivos de los pasos antes mencionados para propiciar la resili enci a, e s e l de
promover al apego positivo, fomentar la construcción de expectativas medianamente di ficultosas,
realistas pero realizables, y, por último, brindar oportunidades de participación significativa en el
ambiente, y para ello habría que recordar que uno de los ambientes que fomentan los seis p asos
para fortalecer la resiliencia, es el escolar pero, existent áreas pendientes en torno al mejoracimiento

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del acceso e inclusión de estudiantes con discapacidad (Vega, 2008). Uriarte (2005) expresa además,
que cuando se analizan las potencias que permiten a los individuos a sobrevivir y adaptarse a
situaciones difíciles de gran complejidad, se puede observar la construcción de modelos de
prevención primaria, cuyo objetivo primordial es lograr la reducción de los factores de riesgos
vinculados a la salud. Por ello, cuando se habla de la resiliencia en salud comunitaria e s i mpe rativo
considerar tanto los mecanismos utilizados en la prevención de comportamientos de riesgo de salud,
como en el afrontamiento de enfermedades agudas y crónicas, y que la comunidad llegue a
empaparse y tomar consciencia de los indicadores de riesgos de salud, así como de los factores
protectores de la resiliencia frente a la discapacidad física. Para trabajar en dicho horizonte, es cierto
que el gobierno, las instituciones y las comunidades educativas, requieren de información compl eta
sobre las problemáticas sociales que afectan a la población (Villafuerte, et al, 2017). Sin embargo, y a
pesar de que los datos estadísticos podrían resultar parciales, se requiere aplicar las políticas
gubernamentales, por lo tanto, los educadores deben asumir el rol de gestores sociales en favor de la
inclusión, a nivel de la gestión de los recursos disponibles.

5. Conclusiones
Del análisis cualitativo de los datos colectados se infiere que, no existe el impulso dirigido al uso de
las TIC como un instrumento que apoya el proceso de aprendizaje de un estudiante con discapacidad
en los centros escolarizados convencionales. Tampoco son evidentes el uso de ayudas tecnol ógicas ,
como respuesta educativa adaptada a sus posibilidades, a pesar de que son una pista de intercambio,
desarrollo personal y colectivo, aporta a la autonomía del alumnado (Cabero, 2007), que aporta a l a
convivencia en libertad y sin discriminación. Entre las nuevas tensiones, surge la exclusión de
estudiantes con discapacidad física al uso de las tecnologías “tecno exclusión”; situación que se
agudiza, debido al número limitado de equipos informáticos disponibles y las aulas sobre pobl adas ,
especialmente en los centros de educación pública. A su vez, esta situación afecta e l cumpl i mi ento
del currículo, anula la posibilidad de hacer revisiones en fuentes electrónicas de temas de actualidad,
y de otras tareas. Se reduce la motivación al aprendizaje, se incrementa la imposibilidad de la
autoformación en línea, y la interacción e intercambio entre sus iguales a través de redes soci al e s y
otros medios electrónicos, estando dentro del centro escolar. Finalmente, los resultados p e rmiten
afirmar que los estudiantes con discapacidad física, hacen esfuerzos desde su autoconcepto posi ti vo
y capacidad de resiliencia para lograr acceder al uso de TIC y son apoyados por sus compañeros y
profesores pero, es necesario mejorar la dotación de equipos informáticos, promover campañas para
la superación de las secuelas del prejuicio negativo y, mantener los trabajos en el mejorami ento de
las instalaciones físicas en los centros escolares como acciones permanentes.

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Avaliação do processo e dos recursos educacionais na visão do estudante de


medicina

Elza de Fátima Ribeiro Higa 1, Haydèe Maria Moreira 1 , Osni Lázaro Pinheiro 1, Silvia Franco da
1 1
Rocha Tonhom1 Maria Helena Ribeiro de Carvalho Luzmarina Aparecida Doretto Braccialli
1
Grupo de Ava liação da Faculdade de Medicina de Marília, Brasil. nucleodeavaliacao@famema.br

Resumo. O objetivo desta pesquisa foi a nalisar a representação social dos estudantes de medicina s o bre a
Uni dade Educacional Sistematizada (UES), por meio de dois ca mpos que compõe o Formato Ci nco ( F 5) d e
a va liação, referente a o processo de ensino e a prendizagem e aos recursos educacionais. A p e s qui s a teve
a bordagem qualitativa fundamentada na Teoria d e Representações Sociais e foi a nalisada pela técni ca d o
Di s curso do Sujeito Coletivo. Pa rticiparam 16 estudantes d o q ua rto a no d e Me di ci na . Os re s ul ta d os
i ndicaram oito ideias centrais: mobilização de recursos de a prendizagem; co rre l açã o en tre a te ori a e a
prá ti ca; discussões cl ínicas e terapêuticas; descompasso entre a teoria e a prática; fi delidade dos tutores aos
pa ssos do processo tutorial; falta de capacitação dos tutores e f o rta l eza s e f ra gi l i da des d os re curs os
educa ci ona i s . A a va l i a çã o dos es tuda nte s des ta cou os pontos fortes e frá gei s do proces s o
ens ino/aprendizagem e forneceu subsídios para as adequações necessárias à melhoria proposta educacional
da UES e curri cular.
Palavras chave: Aprendizagem. Ava liação Educacional. Educação Médica.

Evaluation of educational process and resources in medical student's view


Abstract. Thi s research a imed to analyze the so ci al re pres enta ti on o f th e m e di ca l s tuden ts o n th e
Sys tematized Educational Unit, through two fields that compose the Format Five (F5) of evaluation referring
to the process of teaching and learning a nd to the educational resources. This research used a q ua l i ta ti ve
a pproach based on Social Representation Theory a nd it was analyzed by the Collective S u bject D i s cours e
technique. Sixteen students from the fourth year of medicine participated . Th e res ul ts i n di ca ted ei g ht
centra l i deas: mobilization of l earning resources; correlation between theory a nd p ra cti ce; cl i ni ca l a nd
thera peutic discussions; mismatch between theory a nd practice; loyalty of the tutors to the tutori a l s teps ;
l a ck of tutors' training a nd s trengths and weaknesses of educationa l re s ou rces . The e va l ua ti on o f th e
s tudents highlighted the strengths a nd weaknesses of th e te a chi ng / l ea rni n g p ro ces s a nd p ro vi ded
s ubsidies for the necessary a daptations to the UES educational and curricular i mprovement.
Key words: Lea rning. Educational Measurement. Medical Education.

1 Introdução

Conforme o planejamento educacional de uma Faculdade de Medicina, o curso possibilita a inserção


dos estudantes nos cenários de prática profissional e participam da Unidade Educacional
Sistematizada (UES), desde a primeira série. Essa organização visa contribuir com o desenvolvimento
integrado dos recursos cognitivos, psicomotores e afetivos, ancorados pelo olhar ampliado das
necessidades de saúde dos indivíduos e suas famílias, com enfoque nos aspectos biopsicossociai s e
no estabelecimento da competência médica (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Essa lógica curricular, na contemporaneidade, nasceu da necessidade de mudança na formação dos
profissionais de saúde tanto para melhorar o cuidado à saúde, quanto para atualização e o manejo
das novas tecnologias educacionais (Leon & Onófrio, 2015). Assim, o desenvolvimento curri cul ar na
Famema passou a ser permanente e de responsabilidade de todos.

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Para o desenvolvimento dessa proposta, a UES, objeto de estudo dessa pesquisa, utiliza a
metodologia da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) e oferece atividades de experimentação
prática em laboratórios (Faculdade de Medicina de Marília, 2014).
Na 4ª série, a partir do alicerce desses conhecimentos, os estudantes buscam consolidar e apl i car o
entendimento do processo saúde-doença, tendo em vista as intervenções necessárias, na l ógi ca da
integralidade do cuidado (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Assim, eles têm a oportunidade de desenvolver também os aspectos fundamentais para a quali dade
do cuidado, como respeito, autonomia, consciência cidadã, trabalho em equipe e gestão
compartilhada do trabalho, necessários à construção da competência do médico (Faculdade ----,
2016).
Nessa estratégia organizacional, as atividades são desenvolvidas em diferentes cenários do Si ste ma
Único de Saúde (SUS), no qual o estudante pode desenvolver um olhar crítico e reflexivo quanto à
proposta, organização, resolutividade e fragilidades do SUS. Possibilita, também, o trabal ho mul ti e
interprofissional que se exercita na prática nas relações com o outro, equipe e comuni dade. Ne sse
contexto, os estudantes, atuam desde a promoção à saúde até a sua recuperação e reabilitação, a
fim de desenvolver os recursos esperados para a formação de um profissional competente
(Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Nessa mesma lógica das séries anteriores, desenvolvidas por meio de metodologias ativas de
aprendizagem, são estruturados para a 4a série: Unidade de Prática Profissional (UPP4) – onde a
vivência da prática profissional é desenvolvida sob a supervisão dos profissionais das equipes nas
Unidades Básicas de Saúde (UBS), na Cirurgia Ambulatorial, e nos Ambulatórios de Especialidade s. O
Laboratório de Prática Profissional (LPP) apoia o desenvolvimento de habilidades necessárias aos
cenários de prática.
A reflexão e discussão sobre a realidade é desenvolvida por meio do cicl o pedagógico, onde ocorre a
discussão sobre uma situação-problema, com identificação de necessidades de aprendizagens e
busca na literatura para responder tais inquietações. Esse movimento vivido é registrado no portfólio
e orientado pelo professor da UPP4. As reuniões anátomoclínicas também contribuem para o
desenvolvimento das habilidades em apresentação de casos e na organização do conhecimento.
A UES se constitui pelas apresentações de casos clínicos, sob a forma de tutorias, além das
conferências e consultorias (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Nesta série também os estudantes desenvolvem um trabalho de iniciação científica, por meio da
elaboração de um projeto de pesquisa, cujo problema esteja vinculado à prática vivenciada pelo
estudante, devidamente orientado por um docente (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Estão incluídos ainda, os recursos educacionais em complementação e apoio a todas as atividades de
aprendizagem desenvolvidas, a saber: Biblioteca, Laboratório Morfofuncional, Consultorias,
conferências e/ou outros. (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
A avaliação do Curso de Medicina, de modo geral, por ser, formativa e somativa, contempla: o
estudante, o professor, a Unidade Educacional Sistematizada e os Recursos Educacionais. Para a
avaliação são utilizados instrumentos que permitem ao professor coletar informações sobre a
capacidade de aprendizado dos estudantes, medida, em especial, pela competência dos mesmos
para resolver problemas e instrumentalizar o conhecimento para a tomada de decisões, assim como
para avaliar o professor e o próprio planejamento educacional (Faculdade de Medicina de Marília,
2015).
Dentre os instrumentos utilizados, está o Formato Cinco (F5) com a finalidade de cole tar dados sobre
o processo de ensino e aprendizagem das unidades educacionais. É constituído por seis campos:
"Proposta da Unidade Educacional Sistematizada, Processo de Ensino-aprendizagem, Efetividade dos
problemas no processo tutorial, Recursos educaci onais; Conferências, Comentários adicionais e
sugestões". O F5 está disponível online e contém esses campos abertos que devem ser pre e nchidos

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de maneira a justificar a avaliação final e permitir a identificação dos pontos fortes e dos aspectos
que requerem melhoria (Castilho, Higa, Otani, & Soares, 2017; Faculdade de Medicina de Marília,
2015).
Esta pesquisa se propõe a avaliar a representação social do estudante sobre a organização da
Unidade Educacional Sistematizada (UES), por meio do Formato Cinco (F5) (Faculdade de Medicina
de Marília, 2015), no que refere aos campos dois e quatro, que estão assim estruturados: " Proce sso
de ensino-aprendizagem que engloba três perguntas: 1. A forma como esta Unidade Educacional
Sistematizada foi organizada contribuiu para que você mobilizasse os recursos cognitivos, afe t ivos e
psicomotores para desenvolver o cuidado em saúde? Justifique. 2. A forma como esta Unidade
Educacional Sistematizada foi organizada contribuiu na articulação com a Unidade de Prática
Profissional no cenário real (UPP)? Justifique. 3. No processo pedagógico, os passos de tutori a e stão
sendo seguidos? O campo quatro, refere-se aos Recursos educacionais, assim constituído: "Assinal e
quais recursos educacionais você utilizou/participou nessa unidade: Biblioteca, Morfofuncional,
Consultorias, Outros: Esses recursos/atividades contribuíram para a sua aprendizagem? Justifique.
Caso você não tenha utilizado/participado, justifique. Avalie Recursos educacionais: Biblioteca,
Morfofuncional, Consultorias, Atividades Práticas, Outros: Este recurso contribuiu para sua
aprendizagem? Justifique. Aponte as fortalezas de cada recurso".
Desse modo, há necessidade de compreender como os estudantes estão avaliando a estrutura
organizacional da UES, por meio do F5, para que sirva de subsídios à gestão curricular tendo em vista,
ajustes que se fizerem necessários. Como pergunta direcionadora dessa pesquisa foi e stabele cido:
como os estudantes estão avaliando a UES, e a representam em seus discursos, por meio do F5?

2 Objetivo

Analisar a representação social do estudante de Medicina sobre a unidade educacional


sistematizada, por meio do Formato Cinco.

3 Metodologia

Trata-se de uma pesquisa ex-post-facto, qualitativa, fundamentada nos pressupostos da Teoria de


Representações Sociais (TRS) (Lefrève & Lefrève, 2012). Essa teoria foi retomada por Serge
Moscovici, em 1960, dos estudos de Émile Durkheim que analisava da forma que a psicanálise era
conhecida em Paris, como “representação coletiva”, no ramo da Sociologia. A obra La psychanalise,
son image et son public, de Moscovici é um balizador nas pesquisas sobre Representações Sociais,
sendo significativa para os estudos nas ciências sociais e na psicologia pela interpretação das
representações mentais expressas pelo fenômeno real estudado (Duran, 2012; Peluccio, 2016; Reis &
Bellini, 2013).
No ponto de vista psicossociológico, proposto por Moscovici, as pessoas se comunicam como
agentes ativos que acionam as informações e revelam suas representações para solucionar
conjecturas específicas. As representações sociais são consideradas um arcabouço de saberes e
utilizados para apresentar a realidade mais compreensível (Moscovici, 2009; Peluccio, 2016).
A representação social proporciona quatro características essenciais: 1) concebe um objeto e/ou um
sujeito; 2) associação entre o simbolismo e a significação dos objetos; 3) a represe ntação conforma
uma maneira de distinguir e formar modelos dos objetos por meio de estrutura linguística; 4) as
pessoas realizam ponderações e definem qualidades do conhecimento de acordo com seu conte xto
social (Peluccio, 2016; Reis & Bellini, 2013).

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A teoria das TRS propicia um novo olhar dirigido aos saberes produzidos no cotidiano da soci e dade
contemporânea. Na interpretação da realidade, o compartilhamento das representaçõe s sobre um
mesmo fenômeno, entre os diferentes indivíduos e grupos sociais, entende-se que há a construção
de uma representação social, que são conhecimentos elaboradas e compartilhadas com objetivos
práticos do cotidiano, e contribuem para a construção de uma realidade comum a um mesmo
conjunto social (Guerra & Ichikawa, 2013).
Participaram da pesquisa 16 estudantes da quarta série do curso de medicina, por meio das
mensagens emitidas no F5 nos campos dois e quatro que avaliam o processo ensino-aprendizagem e
os recursos utilizados na UES que faz parte do planejamento do curso. Os dados obtidos são
referentes aos segundo semestre de 2015. A amostra foi intencional e o critério de inclusão foi ter
entregue o formato de avaliação preenchido e qualificado.
Para garantir o sigilo, os depoimentos foram identificados pelas letra E para estudante seguido de
um numero colocado de forma aleatória.
A técnica utilizada para essa análise dos dados foi a do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), que é
procedimento metodológico com o objetivo de iluminar uma representação social (Lefevre &
Lefevre, 2012).
O DSC é uma técnica de análise dos dados qualitativos, elaborado por Ana Maria Cavalcanti Lefevre e
Fernando Lefevre na década de 90, tendo como parâmetro os pressupostos da Teoria das
Representações Sociais. Nos procedimentos metodológicos, retoma as representações sociais
expressas em circunstâncias vivenciadas em uma determinada sociedade e cultura (Figueiredo,
Chiari, & Goulart, 2013; Peluccio, 2016).
O DSC é constituído pelas seguintes figuras metodológicas: Expressões-chave (ECH), Idei as Ce ntrai s
(IC), e a Ancoragem (AC). As ECH são trechos dos depoimentos que caracterizam o senti do do dado
obtido; as ICs representam a marca do discurso, a síntese e o resgate da descrição do sentido do
depoimento, e a AC é a expressão de uma teoria que o autor do discurso professa. O DSC deve ser
redigido na primeira pessoa do singular, reunindo os di scursos que tem a mesma ideia central e que
representa a fala de todos os participantes (Lefevre & Lefevre, 2005a, 2012).
A sequência de passos até chegar à síntese dos discursos foi: (1) Análise dos depoimentos col etados
na leitura dos formatos selecionados a partir da qualificação da avaliação, de modo satisfatório ou
insatisfatório; (2) Análise da resposta de cada um em particular, assinalando as expressões-chave; (3)
reconhecimento das ideias centrais de cada resposta; (4) agrupamento e análise de todos os
conjuntos análogos entre ideia central e expressões-chave; 5) elaboração dos discursos do sujeito
coletivo de cada ideia central(Lefevre & Lefevre, 2005a; Lefevre & Lefevre, 2005b).
Considerando os aspectos éticos e legais, contidos na Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012
do Conselho Nacional e Saúde (Brasil, 2013), o projeto desta pesquisa foi autorizado pelo Comi tê de
Ética em Pesquisa – CEP envolvendo Seres Humanos, da Faculdade de Medicina de Marília - Fame ma
sob o parecer n.1.210.110 de 1º de setembro de 2015.

4 Resultados

A análise das respostas obtidas sobre o processo ensino-aprendizagem, e sobre os recursos


educacionais, está estruturada nas tabelas 1 e 2, que apresentam as ideias centrais acompanhadas
de seus respectivos discursos, constituídos a partir da avaliação dos itens dois e quatro do Formato
cinco (F5).

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Tabela 1. Ideias centrais e Discurso do Sujeito Coletivo da a valiação dos estudantes de medicina da 4ª s érie, sobre o
processo de ensino e a prendizagem, Famema, 2015.

Processo de ensino-aprendizagem - Pergunta 1: A forma como es ta Uni da de Educa ci ona l


Si s tematizada foi organizada contribuiu para que vo cê mobilizasse o s re curs os co g ni ti vos ,
a fetivos e psicomotores para a desenvolver o cu i d a do e m s a úde e d es envol vi mento d o
ra ci ocínio cl ínico, a ções de intervenção diagnóstica e terapêutica no s entido da res ol uçã o d e
probl emas? Justifique
IC 1: Promoveu a mobilização DSC: Houve mobilização dos recursos afetivos, cogni ti vos e
de recursos de a prendizagem ps i comotores. (E8, E3)

IC2: Fora m rea l i za da s b oa s DSC: Si m, os casos permitiram boas d i scus s ões cl íni ca s e
di s cus s ões cl íni ca s e tera pêuticas. O ra ciocínio clínico tem sido desenvo l vi do d e
tera pêuticas forma eficaz e completa. (E1, E3)
Processo de ensino-aprendizagem - Pergunta 2: A forma como es ta Uni da de Educa ci ona l
Si s tematizada foi organizada contribuiu na a rticulação com a Unidade de Prá tica Pro f i s si on a l
nos cenários real e simulado (UPP/LPP)? Justifique.
IC1: Proporci onou correlação DSC: Mui to dos conhecimentos a dquiridos na UES pudera m
entre a teoria e a prá ti ca d e s er utilizados na prática. El es foram eficientes e co eren tes
modo eficiente nes sa a rticulação. Contribuíram para o desenvolvimento d o
ra ci ocíni o i nter-rel a ci ona ndo UPP/LPP e reforça ra m o
conhecimento teórico a plicados à prática, considerando que
os cenários eram ca da vez mais reais e exigentes. (E1, E3, E9,
E11, E12)

IC2: Ocorreu certo Os ca s os discutidos na UES nem sempre combinavam com o


des compasso entre a teoria e a tua l estágio na UPP. Nã o houve associação da U ES co m a
a prá tica. UPP, s a lvo em alguns problemas. (E8, E10)
Processo de ensino-aprendizagem - Pergunta 3: No proces s o peda gógi co, os pa s s os de
tutori a estão sendo s eguidos?
IC1: Os tutores ca pa ci ta dos Os pa s s os do proces s o tutori a l es tã o s endo s egui dos
fora m fi ei s a os pa s s os da correta mente. Os tutores des te a no s ã o mui to bem
tutori a. ca pa citados e orientados para seguir os passos tutori a i s d e
forma efetiva e didática. (E8, E3)

IC2: Fa l ta de ca pacita çã o d o O tutor di s cute e o es tuda nte es cuta . Nã o teve ca s os o


tutor e preceptor. s uficiente para me preparar para o internato. Os professores
nã o explicam os casos, apenas passam a conduta. Na mi nha
tutori a, a penas o tutor dis cuti a , a g e nte d i scu ti a m u i to
pouco, a penas o escutamos. (E5, E4)

A tabela 1 aponta a representação social dos estudantes sobre o planejamento do Processo de


Ensino e Aprendizagem desenvolvido na UES. Os di scursos indicam a necessidade de ajuste na
correlação teórico/prática, bem como melhor preparo de tutores e preceptores responsáveis pela
formação médica. Ressaltam ainda, a preocupação de não estarem sendo preparados nesse período
para o internato. Esses aspectos merecem reflexões pelos gestores, docentes e estudantes, tendo em
vista, a compreensão dos envolvidos e os ajustes que se fizerem necessários.
Conforme consta no planejamento da quarta série do curso médico a UES se organiza por meio de
tutorias, conferências, laboratório de parasitologia, curso de radiologia, e ainda realização de
trabalho científico com professor orientador e a Unidade de Prática profissional (Faculdade de
Medicina de Marília, 2016). Também nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para formação
médica, reformuladas em 2014, a formação deve privilegiar e articular diferentes cenários de
aprendizagem, possibilitando assim a formação do médico em atenção à saúde, gestão e e ducação,
dentre outros requisitos (Brasil, 2014).

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Considerando o que se preconiza para construção do conhecimento na estrutura curricular da


Famema, na representação social do estudante de medicina da 4ª série, o planejamento da UES
contribui positivamente para sua formação.
Estudos realizados na Famema por meio do F5 sobre o planejamento curricular, em todos os cenários
de aprendizagem, vêm demonstrando a importância dessa organização para a formação em saúde e
confirmam esse posicionamento dos estudantes também sobre a UES (Carvalho et al., 2016; Castil ho
et al., 2017; Higa et al., 2016).

Tabela 2. Ideias centrais e Discurso do Sujeito Coletivo da a valiação dos estudantes de medicina da 4ª s érie, sobre os
recurs os educacionais utilizados para a prendizagem na Famema, 2015.

Recursos educacionais:
Indique quais recursos educacionais você utiliz ou /pa rti ci po u n es s a u ni da d e: ( B i bl io teca ,
Morfofuncional, Consultorias e/ou outros e conferências).
Pergunta 5: Es s es recursos/ativi dades contribuíram para a s ua aprendizagem? Justifique. Indique
a s fortalezas e fragilidades. Ca so você não tenha utilizado/participado, justifique:
A cons ul tori a contri bui u pa ra o es cl a reci mento de dúvi da s
es senciais e eventuais e facilitou o a prendiz a do . H á p rof ess ores
di s poníveis em algumas disciplinas e eles tra zem s uas experiências.
A bi blioteca contribui para o a cess o a f o ntes d e p esq ui sa q ue
a uxi l i a m no es tudo. Os l i vros s ã o novos e a tua l i za dos e os
funci onários qualificados. Pode - s e u ti l i za r o s l i vros q ue e s t ã o
mel hor organizados e o s erviço de Xérox. A bi blio teca é s i m pl es ,
ma s o a mbiente é confortável com bom espaço físico. Atra vés d el a
pude consultar os livros necessários para os problemas aborda d os
IC1: Fortalezas dos
na tutoria. Biblioteca disponível é essencial para uma universidade.
recursos educacionais
Na bi blioteca, tem também espaço bom para estudos, funcionários
(Biblioteca, Laboratório
a tenciosos, acesso a PUBMED, outros s i tes n a b us ca d e a rti gos
morfofuncional,
a tua is, chegaram muitos livro s n ovos e o a cess o a p eri ódi cos
Consultoria, conferências
a tua lizados ta mbém foi um grande diferencial.
e outros)
A bi blioteca e o l aboratório morfofuncional contribuíram de f o rma
s a tisfatória para que meu conteúdo s obre medicina aumenta s s e a
nível exponencial e para sedimentar o conhecimento. Eles dispõem
de recursos como: l ivros, bonecos, com pu ta d ores , m o ni tores e
outros equipamentos importantes para o estudo , es s as d i vers a s
ferra mentas são essenciais para o estudo, pois possui recursos q ue
s i mulam o a mbiente real. O espaço é s empre a b erto a os a l un os
com recurs os de bonecos e materiais para s utura treinando assim o
conhecimento teórico na prática. (E 8, E 10, E 7, 3, E 6)

A Bi blioteca ainda p os sui m u i tos l i vro s d esa tua l i za dos e , o s


a tua l i za dos encontra m-s e em número reduzi do, com poucos
exemplares. Nem s empre é possível ter a cesso a alguns exemplares,
devi do à quantidade de livros insuficiente para todos os a l u nos . O
xerox nem s empre funciona. Faltam livros para todos os estudantes
IC2: Fragilidades dos
e ta mbém o prazo de devolução é mui to p eq ueno . Al ém di s s o,
recursos educacionais
poderia haver um sistema de renovação dos livros online.
(Biblioteca, Laboratório
Na s consultorias muitos professores nos mandam estudar a o i nvés
morfofuncional,
de s anarem nossas dúvidas.
Consultoria, conferências
Nã o teve cons ul tori a , poi s o tempo entre a s ol i ci ta çã o e o
e outros)
a gendamento é grande o que d i fi cul ta , u ma ve z q u e os ca s o s
muda m semanalmente. Em a lgumas disciplinas os professores s ã o
i ndisponíveis.
As conferências 7, 8, 11 e 13 fora m i nsatisfatórias sem qualificação.
(E 8, E 2, E 6, E 10, E5,E 3)

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Os estudantes apontaram na tabela 2, a importância dos recursos educacionais na metodologia de


aprendizagem ativa, bem como, o que ainda precisa ser melhorado para sua plena aprendizagem.
Conforme o que está descrito no caderno de planejamento da quarta série, a biblioteca possui a
literatura básica para formação e também facilita o acesso em bases confiáveis para construção do
conhecimento. As consultorias fazem parte desse processo, uma vez q ue contribui para o
esclarecimento de dúvidas e o laboratório morfofuncional disponibiliza os recursos complementares
para a aprendizagem (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Essa participação ativa do estudante no processo avaliativo da sua aprendizagem é preconizada no
manual de avaliação do estudante quando aponta que a avaliação caracteriza como um contínuo da
aprendizagem, desse modo, ela contribui com a transformação humana e profissional e busca
desmistificar o paradigma tradicional de “acerto de contas” e competição entre estudantes e
professores (Faculdade de Medicina de Marília, 2015).

5 Conclusões

Considerando o objetivo desta pesquisa, é importante destacar que tanto a Teoria das
Representações Sociais, quanto o Discurso do Sujeito Coletivo, fundamentados nos pressupostos da
pesquisa qualitativa, permitiram ampliar o foco na análise da representação social dos estudantes, e
fotografar a realidade sob seus pontos de vista, na qual, ficou claramente refletida a seriedade dessa
estrutura organizacional da UES para o bom desenvolvimento de suas aprendizagens.
Dentre os pontos positivos descreveram os aspectos relacionados ao processo de aprendizagem e
aos recursos educacionais, que foi o foco dessa pesquisa, onde sinalizou positividade na arti cul ação
entre os recursos afetivos, psicomotores e afetivos, momentos de articulação teoria e prática e
acesso aos recursos educacionais que possibilitaram a construção de novos conhecimentos.
Os estudantes também apontaram necessidade de melhorias fundamentais em toda a estrutura que
vão desde a capacitação dos docentes no exercício de sua função, passando pela adequação e ajuste
no compasso entre a teoria e a prática, revisão dos conteúdos das conferências, complementação
dos recursos institucionais faltantes ou precários, bem como, a revisão do que falta quanto às
consultorias, até sugestões de ajustes no próprio formato de avaliação.
Esses apontamentos podem subsidiar a tomada de decisão institucional, tendo em vista a
continuidade do desenvolvimento curricular e da avaliação formativa instituída no caderno de
planejamento da aprendizagem da quarta série e no projeto pedagógico do Curso de Medicina da
Famema, como preconizados pelas DCN e diretrizes do SUS em nosso país.

Referências

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diretrizes de normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres hu manos. Brasília:
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Brasília: Diário Oficial da União.

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Lei n. 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente: uma política


pública para adolescente com comportamento desviante?

Darliane Amaral

Fa culdade de Educação da Universidade de Brasília-UnB, Brasil. darliane.amaral@gmail.com.

Resumo. As di scussões a presentadas nesse tra balho são de ca ráter preliminar, uma vez que a pesquisa não se fi nda n es se
texto. Entretanto, é nosso objetivo refletir sobre a relação das políticas públicas para adolescente autor de comportamento
des viante, com foco no debate s obre os normativos l egais considerando-os uma p ol í ti ca s oci a l p a ra u m p úbl i co co m
ca ra cterísticas tão específicas. Empiricamente, optamos pela metodologia qualitativa, na qual sugeri u- s e u ma m a tri z d e
ca tegorização de dados para o estudo da Lei n. 8.069/1990 – Es ta tuto da Cri ança e do Adolescente. Os dados serão tratados
com ba se em técnicas da Análise de Conteúdo, considerando quatro dimensões para proceder com a a nálise docu men ta l ,
qua is sejam: (i ) i dentificação da l egislação; (ii) proteção integral; (iii) adolescente/jovem; e, (iv) unidades de i nternação.
Palavras-chaves: Es ta tuto da Cri ança e do Adolescente; Adolescente; Políticas Públicas.

Law no. 8.069 / 1990 - Child and Adolescent Statute: a public policy for adolescents with deviant behavior?
Abstract. The di scussions presented in this paper a re preliminary, s ince the research does not end in this text. However, it is
our objective to reflect on the relation of public policies to a dolescent a uthor of deviant behavior, focusing on th e d eba te
on l egal norms considering them a s ocial policy for a n public wi th such specific characteristics. Empirically, we opted for t he
qua litative methodology, i n which a data ca tegorization of matrix was s uggested for the stu dy o f La w n . 8,069 / 1990 -
Sta tute of the Child and Adolescent. The data will be treated based on Content Ana lys i s te chni qu es, co ns i d eri n g f o ur
di mensions to proceed with the documentary a nalysis, which are: (i ) i dentification of the l egislation; (Ii) full protection; (Ii i )
Adol escent/youth; a nd, (iv) hospitalization units.
Keywords: Chi l d and Adolescent Statute; Adolescent; Public Policy.

1 Introdução

No Brasil, um dos marcos nas políticas públicas para a juventude se dá em meados dos anos 90 com a
aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Na
concepção de Apolinário o ECA “elevou os adolescentes ao status de sujeitos de direitos, implicando
alterações no atendimento a eles dispensado” (Apolinário, 2014, p.206). Podemos conside rar que o
ECA em seu conjunto representa um sistema de proteção integral dos direitos da criança e do
adolescente, incluindo também a proteção nos sistemas socioeducativos, tema pelo qual nos
debruçaremos com maior detalhe nos próximos trabalhos.
A legislação brasileira para a juventude é abrangente quanto as necessidades e as especificidades do
adolescente, especialmente do adolescente enquadrado como autor de comportamentos
desviantes? De que modo essa legislação pode ser efetiva? Para McCowan e Gandin (2012) um dos
fatores que há de se ter em conta ao falar em legislação é a ineficiência e o caráter incompleto das
implementações. Ainda referem que “os direitos civis são geralmente preservados apenas de acordo
com a riqueza do indivíduo envolvido, e os mais pobres quase não têm direitos sociais. Na esfera
política, a participação é formal, mas não é efetiva” (Mccowan & Gandin, 2012, p.89). A partir dessa
afirmação podemos refletir sobre a desigualdade social corroborada com o não cumprimento das
leis, uma vez que estas legalmente são consideradas uma garantia igual para todos, mas na práti ca
classifica, segrega e por vezes é um mecanismo de promoção da exclusão.

81
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É importante referir que a Lei Nº 8.069 de 1990, foi criada considerando os direitos previstos na
Constituição Federal da República promulgada em 1988, dos quais um dos princípios fundamentais é
a garantia a cidadania. Portanto, cabe ao Estado garantir que os direitos previstos em lei sejam
assegurados em sua integralidade. Ademais, o ECA também prever medidas aplicáveis aos pais ou
responsáveis para que em conjunto se garanta a proteção da família, incluindo a destituição da tutela
caso entenda-se que os pais não reúnem condições para responder pelos fil hos. A lei trata de
maneira diferente o adolescente com comportamento desviante, tendo em vista a classe soci al e m
que este vive? As responsabilizações e punições aplicadas aos pais e familiares, também se
diferenciam a partir da condição financeira em que se vive cada família? Esses adolescentes são
retirados da tutela da família com a justificativa de que as vulnerabilidades no ambiente familiar
retiram da famílias as condições de cuidar do adolescente. Quais são essas vulnerabilidades? Te mos
cidadania e práticas cidadãs na escola? Quais são as marcas que os adolescentes com
comportamentos desviantes levam da escola? Há marcas? O que é educação para os adolescentes e
para a escola?
Nos debruçaremos posteriormente sobre essas questões com o objetivo de confronta-las com a
análise documental do ECA, mas, nesse texto pretendemos apresentar uma matriz de categori zação
do ECA com vistas a problematizar sobre os procedimentos metodológicos escolhidos, considerando-
os como a melhor opção para amparar a discussão sobre política publica para o adolescente com
comportamento desviante.

2 Procedimentos Metodológicos

Ao analisar os paradigmas metodológicos de uma pesquisa, optamos pela investigação quali tativa e
análise documental, por entendermos sua pertinência e adequação aos objetivos do estudo. A opção
pelas diretrizes da investigação qualitativa ocorre pelo fato de essa ter-se consolidado como uma
modalidade investigativa que visa “responder ao desafio da compreensão dos aspectos
formadores/formantes do humano, de suas relações e construções culturais, em suas dimensões
grupais, comunitárias ou pessoais” (Gatti & André, 2013, p. 30). A análise documental “é a
representação condensada da informação, para consulta e armazenamento” (Bardin, 2011, p. 52).
Como já referimos anteriormente, no âmbito desse trabalho apresentaremos em caráter preliminar a
matriz de categorização para a análise da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Compreende-se por categorização, “uma operação de
classificação de elementos constitutivos de um conjunto por diferenciação e, em seguida, por
reagrupamento segundo o gênero (analogia), com critérios previamente definidos” (Bardin, 2011, p.
147).

2.1 Categorias de análise


Após uma apreciação do ECA, sugerimos quatro dimensões para guiar a análise documental e em
cada dimensão nós buscaremos identificar aspectos distintos do documento. Essas mesmas
dimensões serão em outras etapas da pesquisa analisadas pelos dirigentes das Unidades de
Internação, representante do Ministério Público e os jovens. Em cada dimensão perspectiva-se:

I. Identificação dos Normativos Legais, temos o intuito de informar a lei que está em anál i se , no
que concerne aos dados da lei, e se ela é nacional ou um normativo legal da Unidade de
Internação.
II. Proteção Integral, pretendemos identificar nos normativos legais nacional e institucional quais
as prerrogativas legais que podem ser consideradas como políticas sociais públicas com foco

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especialmente na relação jovem e família, entendendo essa relação como um fator de


proteção integral do jovem enquadrado com autor de comportamentos desviantes.
III. Adolescente/Jovem, tem como objetivo apontar na legislação os direitos e deveres do jovem.
IV. Unidade de Internação, é uma dimensão que norteará a verificação na legislação de como está
regulamentado o atendimento nas Unidades de Internação com foco nas subcategorias
medidas socioeducativas, pena e atendimento.

2.2 Matriz de categorização

DIMENSÕES CATEGORIAS SUBCATEGORIAS SUJEITOS

1.IDENTIFICAÇÃO 1.1 Legislação 1.1.1 Lei nacional 1.1.1.1Pesquisador


DOS NORMATIVOS
LEGAIS 1.1.2 Documento institucional 1.1.2.1 Pesquisador

2. PROTEÇÃO 2.1Políticas Sociais 2.1.1 Jovem 2.1.1.1 Pesquisador


INTEGRAL Públicas
2.1.2Fámilia 2.1.1.1 Pesquisador

3.ADOLESCENTE/ 3.1Direito 3.1.1Decisão 3.1.1.1 Pesquisador

JOVEM

3.2 Dever 3.2.1 Decisão 3.2.1.1 Pesquisador

4.UNIDADES DE 4.1 Medidas 4.1.1Advertência 4.1.1.1 Pesquisador


INTERNAÇÃO socioeducativas
4.1.2 Serviços à comuni dade 4.1.1.2 Pesquisador

4.1.3 Liberdade Assistida 4.1.1.3 Pesquisador

4.1.4 Semiliberdade 4.1.1.4 Pesquisador

4.1.5 Internação 4.1.1.5 Pesquisador

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4.2 Pena 4.2.1 Definição 4.2.1.1 Pesquisador

4.3 Atendimento 3.3.1Regulamentação 4.3.1.1 Pesquisador

Em seguida, o tratamento e discussão das informações obtidas serão realizados recorrendo a


ferramentas da Análise de Conteúdo, compreendendo-a no quadro de um processo de formação de
significados (Gil, 1999; Teixeira, 2003; Bardin, 2011; Amado, 2013). Para tratar as informações,
observar-se-ão as categorias e subcategorias de análise que constituirão os instrumentos a partir dos
quais desenvolveremos as nossas inferências e interpretações. Para Gil (1999, p. 68), “a
interpretação tem como objetivo a procura do sentido mais amplo das respostas, o que é feito
mediante sua ligação a outros conhecimentos anteriormente obtidos”.
Por outro lado, conforme Teixeira, a análise de dados “é o processo de formação de sentidos além
dos dados, e esta formação se dá consolidando, limitando e interpretando o que as pessoas disseram
e o que o pesquisador viu e leu, isto é, o processo de formação de significado” (Teixeira, 2003, p.
191-192). Desse modo, essa etapa da pesquisa, exigirá o que Lessard-Herbe (1994) chama de
operação intelectual, ou seja, a decomposição de um todo nas suas partes, com o propósito de
relacionar as partes.

3 Conclusão

Consideramos que a metodologia qualitativa atende ao objetivo do trabalho e propicia através da


análise documental um suporte de discussão pertinente sobre a temática da juventude e das
políticas públicas para adolescente considerados como autor de comportamentos desviantes .
Importa-nos nesse texto um olhar sobre a legislação, pois pretendemos relacioná-lo com as políti cas
públicas para a juventude. Consideramos que os normativos legais quando implementados
efetivamente, podem conduzir o desenvolvimento do indivíduo-cidadão, que ao nosso ver pe rpassa
pela inserção e atuação do homem no mundo e na cultura, não reduzindo-o ao conhecimento dos
deveres e direitos. Para isso, importa refletir sobre as exigências dessa estrutura social proposta pelo
Estado brasileiro, na qual os adolescentes com comportamentos desviantes estão, mas da qual não
necessariamente participam enquanto integrantes efetivos e que muitas vezes não recebem a
proteção integral prevista em lei.

4 Referências
Amado, J. (2013). (Org.). Manual de investigação qualitativa em educação. Coimbra: Editora
Universty Press.

Apolinário, F. (2014). Entre Muros: educação profissional como estratégia de inserção social para
adolescentes em privação de liberdade. In Macambira, J. & Andrade, F. (Orgs.). Estado e
Políticas Sociais: fundamentos e experiências. Fortaleza: Instituto de Desenvolvimento do
Trabalho e Universidade Estadual de Fortaleza, 203-226.

Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.

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Brasil. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e
dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília.

Gatti, B; André, M. (2013). A relevância dos métodos de pesquisa qualitativa em Educação no Brasi l .
In WELLER, W., PFAFF, N. (Orgs.). Metodologias da pesquisa qualitativa em educação.
Petrópolis: Editora Vozes, 29-38.

Gil, A. C. (1999). Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Altas.

Lessard-Hébert, M. (1994). Investigação qualitativa: fundamentos e práticas. Lisboa: Gradiva.

Mccowan, T., Gandin, L. (2012). Reinventando espaços educacionais, construindo uma cidadania
atuante: duas experiências brasileiras. In: Cowen, R., Kazamias, A., Ulterhalter, E. (orgs.)
Educação Comparada: panorama internacional e perspectivas. Brasília: UNESCO, CAPES, 89-
109.

Teixeira, E. (2003). A análise de dados na pesquisa científica. Importâncias e desafios em estudos


organizacionais. Red de revistas Científicas de América latina y el Caribe, España y Portugal, v. 1,
n. 2, 177-202, jul./dez.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Diyers en la tercera ola: un estudio de casos para el análisis de entornos de


aprendizaje autorregulados, conectados y distribuidos
María Rosa Fernández Sánchez1, y Jesús Valverde Berrocoso1
1
Depa rtamento de Ci encias de l a Educación, Universidad de Extremadura, España. rofersan@unex.es;
jeva be@unex.es
Resumen. En el contexto del Proyecto de Investigación «Ecologías de aprendizaje en contextos m úl ti pl es :
a ná l i s i s de proyectos de educa ci ón expa ndi da y conforma ci ón de ci uda da nía (EDU2014 -51961-P)»
pres entamos un estudio de ca sos abordado desde l a metodología cualitativa b a jo e l m a rco te óri co d el
a prendizaje trialógico. El escenario a nalizado es u na «co m uni da d D IYer» d e ce rvecero s ca s eros . El
procedimiento de recogida de datos s e han realizado a través de entrevistas en profundidad a inform a ntes
cl a ve y a tra vés de un foro de referencia para la comunidad seleccionada. El análisis cualitativo de los da tos
obtenidos en el ca so ha sido realizado con el software NVivo en l a versión 11. Tra s el riguros o p roces o d e
ca tegorización y a nálisis de contenido cualitativo se obtiene u na es tru ctura d e n od os ( «i s su es») q ue
permi ten i nterpretar el escenario estudiado.
Palabras clave: Ecol ogías del aprendizaje, Aprendizaje tri alógico, Aprendi z a je i nf orm a l , Co m uni da d d e
Prá cti ca , Estudio de Caso.

Third wave Do-It-Yourself (DIY): a case study for the analysis of self-regulated, connected and distributed
learning environments.
Abstract. Thi s paper presents a case s tudy from the research project enti tl ed "Ecol og i es o f l earn i ng i n
mul tiple contexts: analysis of expanded education projects a nd building ci tizenship" (EDU2014-51961-P). In
thi s study a qualitative methodology is a pplied within th e th eoreti ca l f ra mew ork ca l l ed "Tri a l og i ca l
Lea rning». The scenario analyzed is a «DIYer community» of homebrewers. The data collection p roced ure
ha s been ca rried out through i n-depth intervi ews with key i nformants a nd through a referen ce f oru m f o r
the s elected community. The qualitative a nalysis of the data obtained in this case s tudy wa s carried out with
NVi vo s oftware (version 11). After the ri gorous process of categorization a nd a nalysis of qualitative content
we obtain a s tructure of nodes ("issues") that a llow us to interpret the s cenario s tudied.The a bstract shoul d
s ummarize the contents of the paper and s hould contain between 70 a nd 150 words.
Keywords: Ecol ogies of l earning, Trialogical Learning, Informal Learning, Community of Pra ctice (CoP), Ca s e
Study.

1 Introducción

Los actuales entornos de aprendizaje más complejos, distribuidos, contectados y flexibles, exigen
incorporar una nueva metáfora sobre la «creación del conocimiento», es decir, la creación col e cti va
del conocimiento por medio de objetos de actividad compartidos. Este enfoque se conoce como
«aprendizaje trialógico» (co-evolución de investigadores, de objetos de investigación). Los
antecendentes del aprendizaje trialógico son identificados por Paavola et al. (2011) a través de los
elementos comunes de las teorías de Nonaka y Takeuchi (1995) sobre la creación de conocimiento en
las organizaciones, Engeström (2001) sobre el aprendizaje expandido y Bereiter (2002) sobre la
construcción de conocimiento. Los objetos pueden ser conceptuales (preguntas, teorías, di seños) o
materiales (prototipos, productos concretos) o representar prácticas sobre las que reflexionar o
transformar colectivamente. El aprendizaje es un proceso de indagación innovadora en el que el
objetivo es refinar progresivamente los artefactos de conocimiento y desarrollar procesos a largo
plazo para extender el conocimiento de la comunidad y sus competencias (Hakkaraine n & P aavol a,
2009). El avance del conocimiento y la creatividad pueden ser comprendidos como una «actividad
trialógica», es decir, una actividad en la que las personas trabajando conjuntamente están

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elaborando un objeto compartido, ya sea un problema de investi gación, una teoría, un plan, un
diseño, un producto o una práctica (para ser reflexionada o transformada)
En este contexto teórico de aprendizaje podemos situar, en la actualidad, la denominada «Fil osofía
DIY (Do It Yourself)». Las redes DIY han construido procesos alternativos innovadores de aprendizaje
adulto, construcción de conocimiento y conocimiento compartido. En algunos casos, el movi mie nto
DIY se constituye como un fenómeno contracultural de carácter anticapitalista y anarquista. Los
«activistas DIY» manifiestan una orientación anticonsumista, minimalista y poseen una ética
democrática alternativa a los sistema de gobernanza establecidos. Son muy críticos con los actual e s
sistemas educativos por su orientación capitalista. Poseen una visión anarquista del aprendizaje que
se refleja en que los criterios para un aprendizaje eficaz incluyen la autonomía, la libre opción, la
auto-regulación, la cooperación, el aprendizaje comunitario y la deconstrucción de las jerarquías e n
los roles docente-discente. Además, los activistas de este movimiento, a menudo, crean sus propi os
modelos alternativos de enseñanza y difusión de la información a través de modalidades innovadoras
(Hemphill & Leskowitz, 2013) y desde entornos o contextos informales (Cabero, 2013).
Como veremos a continuación, nuestro caso analiza un proceso de aprendizaje de una comunidad
«DIYer» sobre fabricación de cerveza casera, adentrándonos en los entornos donde se genera el
aprendizaje. Esto conlleva no sólo conocer la percepción de los «DIYe r» sobre el proceso sino la
participación que se produce en comunidades informales (foros, comunidades de birrifactores,
materiales digitales). Estas últimas se producen, en su mayor parte, de modo virtual pero también
existen espacios de participación presencial, aunque en niveles bastante menores.

2 Metodología

El desarrollo actual de investigaciones cualitativas en relación con los procesos de aprendizaje y lo


entornos virtuales como lugares de interacción y de comunicación, nos permite determinar
diferentes enfoques de la metodología cualitativa en estudios concretos, sus límites y sus
posibilidades. En nuestro caso, situándonos en el eje central que ocupa la investigación, esta tesis
está ligada al paradigma interpretativo, abordando el estudio desde la metodología cualitativa
utilizando como apoyo el método del estudio de casos tomando el ciberespacio como campo de
estudio (Hine, 2000; Olsson, 2000; Domínguez, 2007). En este sentido reformulamos y adaptamos
técnicas de recogida de datos (Hine, 2000) por las características propias del campo de estudio
(Ardevol et al., 2003).
Para esta metodología, además de reformular y adaptar técnicas de recogida de datos al ámbito de la
virtualidad, y plantear instrumentos de recogida de datos para cada objetivo, se ha procedido a la
codificación e interpretación de la información obtenida, utilizando como técnica de análisis la
triangulación (comparación en base a la categorización). Desde esta aproximación metodológica,
como nuestro referente conceptual, en el campo del método del estudio de casos, aplicamos algunas
de las técnicas asociadas a esta metodología. Para la obtención de la información, hemos te nido e n
cuenta una serie de cuestiones:
• Diferentes informantes de un mismo escenario de investigación.
• Varias técnicas de recogida de información: entorno virtual -foro- y entrevistas en
profundidad.
• Se ha trabajado con las fuentes de información que el estudio nos permitía.

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2.1 Justificación metodológica

El abordaje de este estudio se realiza desde la perspectiva cualitativa y, concretamente, desde los
estudio de caso (Stake, 1999; Yin, 2009) con recogida de datos mediante técnicas observacionales,
conversacionales o narrativas y análisis documental. El estudio de casos lo utilizamos para obte ner
una comprensión en profundidad de una situación y de su significado para todos los age ntes
implicados en ella. El interés se pone en el desarrollo del proceso, en el contexto, más que en una
variable específica, es decir, la estrategia de indagación se caracteriza por tratar de interpretar el
fenómeno en el contexto en el que tiene lugar (Cronbach, 1975), enfocándose en descripciones y
explicaciones holísticas. Los estudios de casos se basan en descripciones y análisis en profundidad de
unidades simples o de sistemas delimitados tales como un individuo, un programa, un
acontecimiento, un grupo, una intervención, o una comunidad. Desde esta visión, Merrian (1988)
caracteriza el estudio de caso como particularista, puesto que se enfoca a una situación,
acontecimiento o fenómeno concreto; descriptivo, pues pretende una descripción ri ca y de nsa d e l
objeto de estudio; heurística, porque muestra al investigador una comprensión global del fenómeno
estudiado, dando lugar al descubrimiento de nuevos significados, a ampliar la experiencia o a
confirmar algo que sabe; e inductivo, porque llega a generalizaciones, conceptos o hipótesis a travé s
de procedimientos de carácter inductivo, caracterizándose más por el descubrimiento de nuevas
relaciones y conceptos que por verificación de hipótesis predeterminadas.
El diseño de esta investigación se articula, por tanto, en un estudio de caso para llegar a comprende r
la particularidad y la complejidad de este caso singular. El diseño de esta investigación se articula, por
tanto, en un estudio de caso para llegar a comprender la particularidad y la complejidad de este caso
singular. Este caso muestra un escenario donde se ha producido un proceso de aprendizaje auto -
organizado, distribuido e invisible (aprendizaje informal y trialógico), en el contexto de una
educación expandida, y en la interacción con contenidos, personas, materiales, artefactos di gital es
que van activando diversos mecanismos para llegar a un objetivo final. Desde esta perspecti va, nos
situamos en el método de estudio de caso que nos permite estudiar la particularidad y compl e jidad
de este caso singular (Stake, 1999). Cebreiro y Fernández (2004) señalan la adecuación del estudio de
caso "cuando el objeto que se quiere indagar está difuso, es complejo, escurridizo o controvertido. Es
decir, para analizar aquellos problemas o situaciones que presentan múltiples variables y (…)
vinculados al contexto en el que se desarrollan" (p. 667). Robert Yin (2009) coincide en los aspe ctos
anteriores señalados, y añade la apropiación de dicha estrategia cuando se pretende responder a l as
preguntas “cómo” o “porqué”, estudiar acontecimientos en su contexto y cuando el investigador
tiene poco o ningún control.
A su vez, el caso seleccionado responde a nuestro interés por generar nuevas variables, dimensiones
o conceptos y no al hecho de comprobación de hipótesis (Rodríguez, Gil y García, 1996; Cebreiro y
Fernández, 2004; Yin, 2009).

2.2 Características del caso seleccionado

Verifique El caso seleccionado lo representa una comunidad DIYer conformada por un ampli o grupo
de personas que han iniciado un proceso de aprendizaje de elaboración de cerveza casera
autorregulado (Zimmerman, 2008). La propuesta concreta que se plantea es el análisis de los
aprendizajes invisibles, competencias y habilidades blandas que se puedan producir en e se proce so
de aprendizaje, utilizando unos indicadores generales seleccionados a partir de la revisión teórica
sobre las nuevas ecologías del aprendizaje. Para ellos se han realizado entrevistas en profundi dad y
análisis de las interacciones y comunicación en un foro de referencia para esta Comunidad. En
concreto se han realizado entrevistas narrativas en profundidad a cuatro informantes que responden

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a diferentes perfiles profesionales y con trayectorias personales diversas, siendo su únicas similitudes
el sexo (hombre) y el centro de interés que los une (fabricación de cerveza casera). Por otro l ado, e l
movimiento DIYer de la comunidad de cerveceros caseros tienen un referente en el Foro ACCE
(Asociación de Cerveceros Caseros Españoles). Este Foro, estructurado y gestionado por un grupo de
personas que forman parte de la Asociación, tiene un total de 7125 usuarios en cuatro perfiles
diferentes (Administradores, Moderadores, Socios -840- y Usuarios registrados). El equipo de gestión
del Foro está conformado por 2 administradores y 9 moderadores. Cada usuario tiene un «rango»
definido que constituye en sistema de insignias en función del número de mensajes haya e scri to e n
el Foro. A diferencia de los moderadores globales, para los que no existen niveles de parti ci pación
identificados en las insignias, cada socio y usuario registrado tiene un «rango» definido por el sistema
de insignias en función del número de mensajes que haya compartido en el Foro. Este sistema de
insignias identifica la participación de cada usuario determinada en ocho niveles que se
corresponden con el proceso por el que pasa la cerveza al fabricarse. El número total de mensajes del
foro es de 148.746 agrupados en 13.133 temas. Para el abordaje del análisis de contenido de este
foro se han seleccionado los temas con más número de mensajes (28 temas con 2.712 mensajes).

2.3 Objetivos

Los objetivos de investigación que nos hemos planteado son:


a) Revisar las teorías del aprendizaje y de las competencias que están dando nuevos sentidos al
conocimiento práctico por su condición ubicua, tácita e informal en los procesos de aprendi zaje de l
«DIYer».
b) Identificar los tipos diferentes procesos, mecanismos o herramientas de interacción o me di aci ón
sociales que se han producido y sus posibles repercusiones en el proceso de aprendizaje del «DIYer».
c) Analizar la interacción de las dimensiones formales, no formales e informales de los
aprendizajes/habilidades/competencias desarrolladas o adquiridas por el «DIYer».
d) Analizar las representaciones y discursos de los agentes implicados en la producción, distribución y
adquisición del conocimiento en los diferentes contextos utilizados en la conformación de la
identidad digital de los «DIYer».
e) Analizar la comunidad de práctica (Foro ACCE) en el proceso de producción del conoci mi e nto e n
los diferentes contextos en los que se ha ido generando.

2.4 Técnicas de recogida de datos

Se han empleado varias técnicas de recogida datos de tipo documental, observacional y


conversacional:
1. Análisis documental: Con esta técnica se ha determinado la contextualización teórica que sustenta
el establecimiento de dimensiones generales de análisis para la interpretación del caso. Se
identificaron, caracterizaron y compararon las fuentes y enfoques teóricos llevando a cabo un
análisis de varias fuentes documentales, que ha permitido la obtención de ideas e información fiabl e
y actualizadas.
2. Observación no participante: El acceso al Foro ACCE nos ha permitido la obtención de datos
contextualizados que pueden ayudarnos a comprender e interpretar el objetivo de estudio. Los foros
virtuales, en nuestro caso, han constituido una fuente principal de recogida de datos. Minguez y
Fuentes (2004) hacen referencia a que los foros sirve n para recoger el intercambio de ideas y
opiniones en la red. Por analogía, este tipo de recogida de datos podría equipararse a la técnica de
observación permanente, ya que, en el caso del entorno virtual, todo queda recogido

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sistemáticamente: cuándo acceden, qué revisan y qué aportan. La captura de los temas analizados se
ha realizado a través de la grabación automática de datos del entorno virtual con la extensión
NCapture For Nvivo.
3. Entrevista narrativa en profundidad. Varios miembros del grupo de investigación han realizado una
entrevista narrativa en profundidad (5h.) al sujeto seleccionado con la finalidad de obtener
información profunda y contextualizada de su experiencia para comprenderla e interpretarla. Las
entrevistas en profundidad se basan en preguntas con respuesta abierta con la intención de obtener
datos sobre los significados del profesorado. Este tipo de entrevistas no están sujetas a ninguna
estructura formalizada de antemano, pero aún así, las entrevistas en profundidad nos han permiti do
obtener información a partir del establecimiento de un listado de temas. Estas entrevistas
pretenden acercarse a la ideas y supuestos mantenidos por las personas informantes, siendo lo
realmente importante sus explicaciones (Rodríguez, Gil y García, 1996). Nuestras entrevistas, en este
sentido, se ha desarrollado a partir de cuestiones abiertas que persiguen reconstruir qué signi fica e l
problema de estudio para la persona entrevistada. A excepción de una entrevista realizada de modo
presencial con una duración de 5 horas, las demás se han realizado en modo virtual síncrono a travé s
de Google Hangout teniendo una duración media por entrevista de 2h y 30 minutos.

2.5 Análisis de los datos obtenidos

El procedimiento de análisis de los datos obtenido se ha realizado de modo inductivo mediante


análisis de contenido cualitativo utilizando el software NVivo 11. El análisis de contenido es una
metodología de investigación que se basa en los procedimientos para hacer inferencias válidas a
partir de texto (Anderson & Kanuka, 1997). Aunque esta técnica de investigación es utilizada
frecuentemente, las normas no están todavía establecidas. De hecho, algunos autores (Rourke et al.,
2000; De Wever et al., 2006; Strijbos y Fisher, 2007), han destacado que pese a ser una de las
metodologías más usadas, sus revisiones han detectado una falta de rigor metodológico con l a que
se aplica en ocasiones, subrayando como principal limitación, la ausencia de marcos teóricos q ue
sustenten las categorías de análisis. Desde este punto de vista encontramos que los instrumentos
aplicados reflejan una amplia variedad de enfoques y difieren en su nivel de detalle y el tipo de
categorías de análisis utilizado, además de en la base teórica, la cantidad de información y la elección
de la unidad de análisis. Gros y Silva (2006) realizan una excelente revisión de metodologías e
instrumentos desarrollados para el análisis de contenido.
Por otro lado, en las dos últimas décadas se han desarrollado instrumentos para el análisis de la
comunicación sincrónica y asincrónica en entornos virtuales de aprendizaje. Por mencionar alguno de
los estudios de mayor relevancia se encuentran los modelos clásicos de de Henri (1992) y
Gunawardena et. Al (1997), los múltiples trabajos de Scardamalia y Bereiter (2006), Garrison y
Anderson (2005) y los de Resta y Laferrière (2007). En todos estos estudios las alternativas son
variadas, fundamentalmente en relación a las unidades de análisis aplicadas. En unos casos se han
escogido unidades temáticas, en otros se analizan mensajes completos o toda la discusión es una
unidad de análisis. En referencia al análisis de contenido cualitativo, y concretamente de foros
electrónicos de debate asíncronos, los modelos tambi én son variados. De Wever et al. (2006),
realizan una revisión de los principales modelos utilizados en investigaciones.
El tratamiento de los datos se ha realizado a través de este análisis de contenido cualitativo con
NVivo v. 11, siendo la unidad de análisis y codificación el mensaje en el contexto del «tema» abierto,
seleccionando las unidades sintácticas como la palabra, la proposición, la frase o el párrafo para el
estudio de las diferentes «dimensiones» (nodos o issues) del modelo que va emergiendo d el análisis.
El trabajo de categorización se inició partiendo de las entrevistas en profundidad almacenadas como

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archivos de audio .mp3, transcritas posteriormente en formato de texto. Tras esta categorizaci ón se
procedió a captar (extensión NCapture de Nvivo) el contenido de los mensajes del Foro.
Los criterios de clasificación son semánticos (categorías temáticas), de estructuración del lenguaje
(delimitación del texto por mensajes) y de perfiles de los participantes (casos). El análisis de este
sistema de categorías ha sido adaptado a partir del análisis cualitativo de los datos que hemos
recopilado en esta investigación. Debemos añadir que, a pesar de que esa unidad de codificaci ón ha
sido el mensaje completo, un mensaje puede hacer referencia a varias dimensi one s, de ahí que se
tome la palabra, frase o párrafo/fragmento para el estudio de cada una de las categorías. Se
procedió, por tanto, para una identificación más minuciosa, a segmentar las comunicaci ones de l as
participantes en aquellas categorías que estos investigadores proponen, recurriendo al uso de
puntos suspensivos y paréntesis en la indicación del segmento del discurso seleccionado a modo de
«posting».
La categorización de los datos obtenidos ha hecho posible clasificar conceptualmente l as uni dades
que son cubiertas por un mismo tópico. Las categorías soportan un significado o tipo de significado y
pueden referirse a situaciones, contextos, actividades, acontecimientos, relaciones entre pe rsonas,
comportamientos, opiniones, sentimientos, perspectivas sobre un problema, métodos, estrategias,
etc. La codificación, sin embargo, ha constituido la operación concreta por la que hemos asi gnado a
cada unidad un indicativo propio de la categoría en la que se considera incluida. Los indicadores, que
representan a las categorías, consisten, por tanto, en marcas que se añaden a las unidades de datos,
para indicar la categoría a que pertenecen. Estas marcas en nuestro estudio son abreviaturas de
palabras con las que se han etiquetado las categorías. Los principios, consensuados por los
investigación que caracterizan a la categorización de datos en nuestro estudio han sido:
- Exhaustividad: que cubrió todas las unidades diferenciadas de los datos.
- Exclusión mutua: cada unidad se incluye en una sola categoría.
- Único principio clasificatorio: las categorías son el único criterio de ordenación y clasificación.
- Objetividad: las categorías fueron inteligibles para cada uno de los codificadores.
- Pertinencia: las categorías fueron relevantes respecto de los objetivos del estudio y se adecuaron al
contenido analizado (Rodríguez, Gil y García, 1996).
Podemos resumir básicamente en siete etapas todo el proceso de construcción del sistema de
categorías empleado en nuestra investigación. Éstas son: 1ª) adopción de un modelo de re fe re ncia;
2ª) definición de la unidad de análisis e identificación de las categorías; 3ª) aplicación del siste ma de
referencia en la codificación de datos y comprobación de la estructura del sistema; 4ª) codi fi caci ón
inicial; 5ª) doble categorización; y 6º) comprobación de la doble categorización; 7º) codificación final.
Cada una de estas fases constituyó, en su conjunto, un momento preliminar al tratamiento y a la
sistematización de los datos.
Esta metodología de análisis de contenido mediante categorización de datos por indicadores ha
implicado un doble análisis que asegure el rigor científico del estudio. Para ello se ha re curri do a l a
doble categorización, comprobando aquellos mensajes que pudiesen dar lugar a dudas entre dos
investigadores. De este modo se valida el estudio con la doble categorización, lo que permite
asegurar un consenso en la aplicación e interpretación de los datos posterior.
Una vez categorizado los datos se ha procedido a la triangulación de toda la información obten ida
mediante las técnicas de recogida de datos. Para proceso de triangulación de datos se han uti l i zado
varias fuentes de información que permiten dar una visión holística y una reconstrucción de la
realidad más fidedigna.
Los primeros pasos del análisis de cualitativo con Nvivo 11 de los textos fueron los siguientes:
1. Se separó el texto en unidades temáticas.
2. Se señalaron con abreviaturas los indicativos de una unidad tema (conversaciones, sucesos,
actividades, etc.)

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3. Se encontraron segmentos referidos a un mismo tema.


4. Se agruparon las unidades de datos para identificar en ellos componentes temáticos que
permitieron construir las categorías de contenido.
5. Se definieron estas categorías operacionalmente, lo que permitió distinguir subcategorías.
6. A partir de una categoría de mayor o menor potencial conceptual se enfocó en las propiedades de
la misma para sistematizar a través de la codificación. Se procedió a categorizar y codificar el texto
seleccionado y al final se asignó un código a cada categoría inicial.
7. Una vez que se obtuvieron estas categorías se volvió al texto para asegurarse que las frases
estaban correctamente ubicadas en las categorías correctas. Dicho proceso permitió percibir la
existencia de diferentes atributos dentro de las categorías, por lo cual se generaron subcategorías.
Tras este proceso se constituyó el modelo de categorías e indicadores (issues) que, tras el proceso de
codificación de los datos requirió de varios ajustes, hasta llegar al modelo final que se presenta en e l
siguiente apartado.

3 Resultados

Los Issues (nodos) que conforman este estudio de caso se presentan en la figura 1. Surgen diferentes
aspectos relevantes para el estudio de las nuevas ecologías del aprendizaje que no s permiten
comprender los procesos de aprendizaje vinculados con la experiencia Do it Yourself (Hazlo tú
mismo). Se agrupan en función de los resultados obtenidos:
- Los «datos biográficos» nos permiten hacer un recorrido por las experiencias educativas de los
informantes previas y más recientes en el ámbito formal; así como las relaciones entre sus
profesiones y aficiones con la práctica DIYer (elaboración artesanal de cerveza).
- El nodo «Proceso de aprendizaje» se identifican una serie de estrategias de aprendizaje que se
activan para conseguir un aprendizaje eficaz. Este nodo se descubre a través del análisis de una
dimensión cognitiva en el proceso de aprendizaje que se produce en las interacciones que se
producen en los diferentes temas del Foro. Además, revela cuáles son los motivos que promueven l a
actitud hacia el aprendizaje permanente.
- El nodo «Autonomía» nos permite identificar su visión sobre el perfil compartido del colectivo DIYer
en el que participa, así como los principios ideológicos que se descubren en este grupo. De sus
expresiones como DIYer se extrae el concepto de democracia, gobierno y jerarquía que comparten l a
comunidad de cerverceros artesanales y cómo se promueve la acción, participación y cambi o soci al
desde este colectivo.
- El issue «Jerarquía» vincula, las experiencias como estudiantes en el sistema educativo formal como
las experiencias de aprendizaje informal dentro de la comunidad de DIYer. Emergen aquí subnodos
relacionados con el concepto de autoridad, el modelo igualitario y la ruptura de los tradicionales
roles docente-discente que se orienta más hacia un modelo igualitario «peer to peer».
- El nodo «Aprendizaje informal y pensamiento crítico-creativo» nos descubre las experiencias fue ra
de las instituciones formales, el modo como se produce el control del aprendizaje en estos contextos
desinstitucionalizados, de dónde surgen los deseos y necesidad para aprender de manera i nformal ,
así como los procesos internos de reflexión y crítica aparejados con los resultados del aprendizaje.
Por último, se incluyen también los procesos de innovación y creatividad que surgen de las
experiencias DIYer.
- La comunidad de cerveceros artesanales genera una comunidad de práctica que se analiza a travé s
del issue «Aprendizaje cooperativo». Se observa una dicotomía entre esta comunidad de aprendi ce s
y los procesos tradicionales de escolarización. Se analiza el concepto de colaboración que emerge de

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la experiencia de esta comunidad DIYer, se describe cómo es el aprendizaje entre iguales ente ndido
como un proceso social y colectivo.
- El nodo «compartición del conocimiento» nos aporta un descripición de las prácticas re l aci onadas
con la creacion de comunidades de aprendizaje y la demostración pública de habilidades. Además, se
describe la concepción práctica del concepto que la comunidad DIYer tiene de propiedad intele ctual
y derechos de autor a través del acceso (y compartición) a determinados recursos di gitales para su
aprendizaje.
- Por último, emerge un nodo relación con los aspectos económicos y empresariales de las
experiencia DIYer, con un subnodo que informa sobre la visión crítica de esta comunidad en relaci ón
al marketing y la publicidad de la industria cervecera.

Fig. 1. Esquema de «Issues» (nodos) obtenidos tras el proceso de análisis con Nvivo 11.

4 Conclusiones

En nuestro análisis hemos descubierto nuevas formas de entender la producción y difusión del
conocimiento y las interacciones que se producen en este proceso focalizando nuestro interés en l os
mecanismos (cognitivos y metacognitivos) que se activan y desactivan en este proceso), la
construcción de una identidad profesional de cada sujeto y la generación de prácticas de
participación social y democratización del conocimiento (PNL y redes de aprendizaje).
En la propia conceptualización del entorno se analizan las experiencias de los sujetos en la
comunicación e interacción con otros sujetos y con diferentes artefactos que van mediando la
construcción del conocimiento y la generación de identidad digitales diferentes. Esas i nte racci ones
con personas, materiales, recursos, contenidos, son las que van produciendo los saberes sobre los
que se asienta la práctica en la fabricación de la cerveza y las mejoras en los procesos de creación de
la misma. No sólo eso, sino que la apertura en las relaciones con otros expertos en el tema van
generando prácticas de participación que derivan, a su vez, en la creación de comunidades de

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práctica en el que se va produciendo democratización del conocimiento sobre los procesos de


creación de cerveza.

Agradecimientos. Este artículo es resultado del proyecto de investigación «Ecologías del aprendizaje en
contextos múltiples: análisis de proyectos de educación expandida y conformación de ciudadanía», financ iado
por el Ministerio de Economía y Competitividad – Proyectos I+D, del Programa Estatal de Fomento de la
Investigación científica y técnica de excelencia, Subprograma Estatal de Generación del Conocimiento.
Referencia: EDU2014-51961-P.
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Imprensa e Violência escolar: um estudo comparado entre Brasil e


França.

Joyce Mary Adam1


1
Depa rtamento de Educação Universidade Estadual Pa ulista/UNESP, Rio Cl aro/São Paulo/Brasil.
joyce@rc.unesp.br

Resumo. O pres ente a rtigo propõe a a nálise do texto jornalístico s obre a vi olência que acontece no es pa ço
es colar, buscando a produção de s entidos, que contribui para a construção da re de s oci al s i m ból i ca e o
i ma ginário social vi venciado pelos diferentes grupos em interação nesse espaço. Analisa as notícias de doi s
jorna is, um no Brasil e outro na França, em dois períodos caracterizados como de significativo conflito social
e em que a questão da vi olência nas escolas é destacada com mais ênfase. O foco p ri n ci p a l d o es tud o é
a na lisar como a i mprensa noticia os eventos de vi olênci a e s col a r d es vel a ndo o s a s p ectos p ol í ti co s ,
i deológicos e sociais. É destacado enquanto foco de discussão de metodologia de pesquisa q ualitativa d ua s
l i nhas centrais que s ão os estudos comparados e a utilização d e jorn a is e nqua n to f o nte d e d a dos d e
pes quisa social.
Palavras-chave: pes quisa qualitativa em educação; estudos comparados; mídia e vi olência escolar; mi di a e
produção de sentidos.

Press and School Violence: a comparative study between Brazil and France.
Abstract. Thi s article proposes the a nalysis of the journalistic text a bout the vi olence that h a ppens i n th e
s chool s pace, seeking the production of meanings, which contributes to the construction o f th e s ym b ol i c
s oci al network and the social i maginary experienced by the different groups intera cti ng i n th i s s pa ce. I t
a na lyzes the news of two newspapers, one in Brazil a nd the other in Fra nce, in two periods characterized as
s i gnificant social conflict a nd in which the issue of vi olence i n schools is highlighted with m o re e mpha s i s .
The ma in focus of the study is to a nalyze how the press reports the events of s cho ol vi ol ence re vea l i ng
pol itical, ideological and social aspects. It is highlighted as a focus of discus s i on o f q ua l i ta ti ve res ea rch
methodology two central l ines that a re the comparative studies a nd the use of newspapers a s a s ource o f
s oci al research data.
Keywords: Qua l itative research in education; Comparative s tudies; Media and school vi olence; Me d i a a nd
production of meanings.

Introdução

Este artigo analisa as notícias de dois jornais, um no Brasil e outro na França, em dois períodos
caracterizados como de significativo conflito social e em que a questão da violência nas escolas é
destacada com mais ênfase nas notícias de jornal. O foco principal do estudo é analisar como a
imprensa noticia os eventos de violência escolar desvelando os aspectos políticos, ideológicos e
sociais.
É destacado enquanto foco de discussão relacionada a metodologia de pesquisa qualitativa duas
linhas centrais que são os estudos comparados e a imprensa escrita enquanto fonte de dados de
pesquisa social. Além da questão metodológica o artigo discute os resultados do estudo que uti l i zou
as referidas metodologias.
Para contextualizar o estudo dentro das metodologias de pesquisa em educação comparada, são
apresentadas algumas definições e ideias trabalhadas por Vigour (2005) e Nóvoa & Yariv -Mashal e a
forma como estas definições contribuíram para a pesquisa realizada.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Com respeito à utilização de textos jornalísticos como fonte de dados de pesquisa, tomou-se como
ponto de partida que o sentimento de insegurança e a produção do medo na sociedade tem nos
textos jornalísticos um referencial significativo, constituindo-se em fonte importante de análise.
Martin-Barbero (2003) coloca a importância da comunicação e da cultura como campos primordiais
de embate político, por produzirem uma batalha no terreno simbólico. Essa batalha no terreno
simbólico, considera-se que se expressa no imaginário social implícito nos discursos e image ns, que
circulam na mídia produzindo e legitimando sentidos para os diferentes eventos cotidianos, de ntre
eles a violência escolar e a visão sobre a instituição escolar e seus membros.
A produção social da insegurança e o medo do crime, devido ao enfraquecimento dos laços soci ai s e
insegurança, no emprego aliado ao medo de falhar, são aspectos característicos do que alguns
autores têm chamado de pós-modernidade (Sennett, 2006; Taylor, 2006; Bauman,1998). Nesse
sentido, colaborando ou legitimando o contexto social e político dominante tem-se os meios de
comunicação, que contribuem para a criação de sentidos, a partir do que os diferentes grupos, que
estão em interação na sociedade, defendem e estabelecem como regras e significados para sua
atuação cotidiana. Nessa direção, o imaginário construído sobre os fatos do cotidiano resulta em
representações sociais, que estabelecem o que é o certo e o errado, construindo as conce pçõe s de
violência e do que deve ser temido, assim como as formas de enfrentamento para essas si tuaçõe s a
partir de tais premissas.
Estudos sobre os efeitos da mídia, principalmente, a televisão e sua contribuição, para o cul ti vo do
sentimento de insegurança e medo, foram destacados por Fernandez Villanueva et all (2008) em
estudo, que aponta os efeitos das imagens violentas veiculadas pela televisão nos indivíduos.
Diferentes estudos têm sido feitos, também, a respeito do discurso jornalístico e os diferentes ti pos
de violência, violência de gênero, violência de jovens e violências sociais. Nesse se ntido, bu scamos
complementar essa discussão, tomando a violência escolar como objeto de análise e como a mídia
impressa representa a escola e os eventos ocorridos em seu interior e no entorno.
Pesquisadores de diferentes países têm-se debruçado para estudar como as mídias descrevem e
produzem sentidos para a questão da violência na sociedade e de jovens, destacando a questão
política e ideológica envolvida nessas descrições (Golding& Murdock, 1979; Mattelart & Mattelart,
1979). Favorecendo o estabelecimento de clichês e de estereótipos a partir de situações envolvendo
jovens da periferia, a mídia supervaloriza o sensacionalismo e em geral não contribuiu com o
esclarecimento.
Autores brasileiros como Njaine e Minayo (2002, p. 286), em artigo em que fazem reflexão a re speito
do discurso da imprensa sobre rebeliões de jovens infratores em regime de privação de l i be rdade ,
utilizam uma frase bastante significativa para interpretar a atuação da mídia, afirmando que : “[...] a
mídia não cria preconceitos, julgamentos ou verdades, mas absorve o imaginário social, revestindo-o
de uma roupagem especial, tecnicamente sofisticada e específica para agradar aos mai s di fe re nte s
segmentos sociais e aos mais variados gostos.” Tomando essa afirmação, a reinterpretamos para o
texto jornalístico, no sentido de que consideramos que, ao mesmo tempo em que ele absorve o
imaginário social, o reveste ideologicamente, recriando esse imaginário, legitimando interpre tações
que vão ao encontro de políticas e práticas sociais contrárias à valorização da cidadania e de
solidariedade.
Nessa linha de pensamento, é que o presente artigo propõe a análise do texto jornalístico sobre a
violência que acontece no espaço escolar, buscando a produção de sentidos, que contribui para a
construção da rede social simbólica e o imaginário social vivenciado pelos diferentes grupos em
interação.
Assim, o presente artigo objetiva apresentar a análise de textos jornalísticos sobre as diferentes
concepções de violência de jovens e a violência ocorrida em espaço escolar, v eiculada pelos mesmos.
No Brasil, foram analisadas ocorrências noticiadas em um jornal de grande circulação no estado de

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SP, jornal Folha de São Paulo, no período de início dos anos 2000 e 2001, no qual se percebe o
aparecimento de um número significativo de artigos e pesquisas que enfocam a violência escolar. Na
França tomou-se como objeto de estudo as notícias sobre violência escolar no jornal Liberation, nos
finais dos anos 90 e início dos anos 2000, período pós convulsão social e de significativo confli to
social envolvendo jovens em situação escolar. A opção pelos dois jornais citados se deu pelo fato de
que ambos são considerados jornais de centro, moderados.
A busca pelas notícias se deu utilizando-se como palavra-chave “violência escolar”. Procurou-se
analisar as notícias agrupando-as conforme a ênfase dada pelo jornal conforme fosse agressão de
alunos contra colegas e contra professores, ataques à escola por pessoas de fora da escola ou
vandalismos feitos por alunos. A seção do jornal onde são aprese ntadas as notícias foi um aspecto
importante considerado pois se é noticiada na parte de educação supõe-se que é um problema a se r
tratado nesse âmbito, se é noticiada na parte de segurança ou outra relacionada a órgãos de justi ça
ou de crimes parte-se do princípio que a notícia terá forte ênfase relacionada a essas questões.

Sobre os Estudos em Educação Comparada: algumas reflexões

Ao discutir o método comparativo em ciências sociais, Vigour (2005) apresenta, primeiramente,


definição sobre o sentido de comparar para depois discutir como esta será tomada como refe rê ncia
para estudos em diferentes áreas e sobretudo pelas ciências sociais. A autora define comparar da
seguinte maneira:
“Comparer, c´est donc, dans une première appoche, relever des diferences et des points
comuns em fonction d´um critère qu’il convient de definir au préalable et qui oriente le
regard du chercheur. Dès lors que l’on considere au moins deux termes em fonction d’um
même critère, a priori, rien n’est incomparable.”( p. 7)
Continuando a autora apresenta pelo menos duas características que marcam o método comparativo
em ciências sociais, como resume Grawitz, 1996 (Apud Vigour, 2005, p.16). Uma das características é
que o método comparativo não possui técnicas de pesquisa particulares. Outra característi ca é que
pode ser utilizada nos diferentes estágios da pesquisa, tanto na descrição, quanto na classi fi cação e
na explicação. Ainda destaca que a pesquisa comparativa aponta para uma abordagem
pluridisciplinar, enfocando diferentes aspectos que podem elucidar a complexidade de cada grupo
social, evento ou situação.
Em recuperação histórica a respeito da pesquisa em educação comparada Nóvoa & Marshal
delimitam três momentos diferentes da educação comparada. Afirmam em um primeiro mome nto,
que a educação comparada surge, em finais do século XIX, marcada pelo interesse de “saber do
outro”, no sentido de saber como eram os processos educativos nos outros países e buscar auxiliar
na reforma ou na constituição dos sistemas de ensino de algumas nações. Em um segundo momento,
após a segunda guerra mundial, impulsionada pela necessidade de criar relações cooperadas
internacionais com o objetivo de construir uma nova escola, a educação comparada passa a se
preocupar em conhecer a política educacional e o movimento pedagógico dos diferentes paíse s. Em
um terceiro momento, que se constitui em uma renovação, a partir da década de 60, a abordagem
comparada preocupou-se com a “construção do outro”, no sentido de constituir os sistemas de
ensino dos chamados países em desenvolvimento. As ideias do desenvolvimentismo com a forte
presença de agências internacionais deram aos estudos comparados uma tônica científica e de
exportação de propostas educacionais para os diferentes países e regiões (Perez & Passone, 2005).
A globalização e os movimentos pela qualidade geram, a partir de 2000, uma vertente da e ducação
comparada muito voltada para o “mensurar o outro”, avaliando a “eficiência” e a “qualidade” da
educação. O mundo atual passa por uma transição que envol ve um fluxo de comunicação e relaçõe s
interdependentes de redes de trabalhos que aumentaram a influência dos estudos comparativos

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ligados a um clima global de intensa competição econômica. Nessa perspectiva, a educação


comparada se volta para estabelecer um padrão único de qualidade da educação, onde as
particularidades e peculiaridades não é o aspecto central. O que importa nesse modelo é a
normatização e o controle global sobre os resultados.
A abordagem dos estudos comparados, utilizada na pesquisa aqui apresentada, encontra-se mais
perto de uma ideia de analisar os contextos de produção das notícias, realçando o quanto o ce nári o
político, econômico e ideológico orienta a forma de noticiar os eventos relacionados à violência
escolar, favorecendo o estabelecimento de clichês e de estereótipos. Os padrões sociais gerados pela
globalização e o diálogo entre o global e o local são variáveis importantes, na medida em que nos
propiciam elementos para elucidar os imaginários e sentidos produzidos em diferentes pa íse s, com
diferentes desenvolvimentos sociais e históricos, se constituindo em um instrumento de análise
crítica.
A partir de tais premissas é que se propõe analisar as notícias, buscando discutir de que forma as
notícias podem ser vistas de maneira mais crítica, possibilitando refletir de forma mais isenta,
contribuindo para uma leitura abrangente dos fatos.

A Imprensa e a Violência escolar: leituras do Brasil e da França

A entrada de temáticas nas pautas da imprensa e das políticas públicas depende de diferentes
fatores. Maillard e Kübler (2015, p. 28) trazem a discussão sobre como diferentes temas sociais
aparecem e se tornam foco de políticas públicas, isto é, entram na agenda política e governamental.
Esses autores definem cinco modelos de estabelecimento das agendas das políticas públicas, a parti r
de diferentes movimentos que seriam: mobilização de grupos; mi diatização da temática;
sensibilização de atores administrativos e políticos e ação corporativa.Tal reflexão nos leva a analisar
como esta situação se coloca para o Brasil e para a França, no que tange à questão da violência
escolar.
No Brasil Gonçalves & Sposito 2002 (p. 106 e 107) ressaltam que o Ministério da Justiça se destacou
ao sair à frente do Ministério da Educação na indução de políticas de redução da violência escolar.
Atribuem esse fato ao crescimento na década de 90, principalmente ao crescimen to do
envolvimento da juventude com o crime organizado. Esse aspecto nos leva a observar a forte
presença do setor judiciário nas diferentes políticas de prevenção da violência escolar.
Não podemos nos furtar a uma discussão importante levantada por Gonçalves e Sposito (2002) que
se trata do crescimento da discussão sobre segurança pública que toma conta da sociedade e da
mídia nas décadas de 80 e 90 refletindo também na violência escolar, substituindo a discussão que se
centraria em propostas voltadas para a democratização política da sociedade e da escola. Vamos
observar esse fato também nas propostas pós anos 2000, período em que se acirra ainda mais o foco
na questão da segurança.
Na França a situação não é diferente, nesse sentido, Bailleau (1999) comenta que nesse país, de sde
os anos 70, a ação pública das políticas para a juventude, em especial os jovens dos “banl i eues”, da
periferia se deram principalmente por meio de dois pontos centrais que são: políticas de formação
profissional e de inserção social e profissional e políticas de regulação e defesa dos espaços públicos.
Segundo Bailleau tais políticas contribuíram para orientar e definir ações para a juventude até os dias
atuais. O contexto social e econômico em que se dão as ações voltadas para a juventude na Europa é
também observado por Bailleau e Cartuyvels (2007), onde destacam a substituição das políticas do
welfare state pelas políticas neoliberais onde se passa de uma abordagem solidaria e de
responsabilidade coletiva pelo problema da juventude para uma perspectiva punitiva. Paty (2004)
em tese de doutorado aponta que, na França, a partir do início da década de 90, há forte mobilização

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contra a violência na escola, destacando, até o ano 2000, ao menos 07 relatórios nacionais sobre a
temática, sem falar na mobilização da comunidade acadêmica sobre a discussão da violência escolar.
Passando-se à discussão das notícias veiculadas pelos dois jornais em estudo, tendo em vista o pouco
espaço neste artigo, serão destacadas algumas das muitas questões abordadas pelos mesmos.
A pesquisa no jornal “Folha de São Paulo”, foi feita por meio do Acervo Folha, disponível on-line,
tendo como alvo notícias veiculadas no início dos anos 2000, que abordassem a temática violência
escolar. Essa pesquisa foi objeto de artigo publicado neste ano em periódico brasileiro, onde se
encontram maiores detalhes das notícias (Adam, 2017).
No jornal “Liberation”, utilizamos o acervo digital e também foi realizada pesquisa na Bi bl i oteca do
Centro George Pompidou em Paris, pois nem sempre as notícias estavam disponibilizadas no ace rvo
digital.
Nos acervos citados foi possível realizar a pesquisa das notícias, delimitando um período de tempo e
um grupo de palavras-chave. Foram utilizadas palavras como violência, escola, polícia, vandal ismo,
medo, insegurança e demais outros termos relacionados, a fim de ampliar as possibilidades da
pesquisa, mas o foco final principal foi o termo violência escolar. Após fechar na temática da
violência escolar, passou-se a analisar as notícias em seu conteúdo completo.
Procurou-se analisar as notícias agrupando-as conforme a ênfase dada pelo jornal conforme fosse
agressão de alunos contra colegas e contra professores, ataques à escola por pessoas de fora da
escola ou vandalismos feitos por alunos. A seção do jornal onde são apresentadas as notícias foi
considerada importante, pois se é noticiada na parte de educação supõe -se que é um problema a se r
tratado nesse âmbito, se é noticiada na parte de segurança ou outra relacionada a órgãos de justi ça
ou de crimes parte-se do princípio que a notícia terá forte ênfase relacionada a essas questões.
Realizou-se uma primeira leitura das notícias, com a finalidade de conhecer o material coletado e
suscitar hipóteses para a análise. O conteúdo dos jornais, as me nsagens em linhas e entrelinhas
retomam o contexto do noticiado.
Os elementos centrais que serão destacados nesse artigo serão: as ações noticiadas para pre ve nção
da violência escolar e a maneira como as famílias e os jovens são caracterizados nas notícias.
No jornal brasileiro, “Folha de São Paulo”, observa-se que é destacada a forma como as instituições e
reagem frente ao ato violento. A mensagem trazida pelas notícias, em geral, destaca a
responsabilidade atribuída à gestão da escola e ao governo, como uma resposta à demanda social de
segurança e da qualidade no ensino. Atribui-se à direção, de forma simbólica, o grau máximo de
autoridade no âmbito escolar, na qual o discurso do jornal espera desse grupo um posicionamento e
atitude clara quanto às medidas necessárias para a contenção da violência e da insegurança. O
imaginário presente é o de que uma direção forte e a presença da polícia na escola são as soluções
para um controle maior do espaço escolar e a diminuição da violência escolar. Um exemplo é a
notícia reproduzida a seguir:
“Segundo o coordenador da Segurança Escolar de Ribeirão Preto, além ‘do
policiamento preventivo e repressivo imediato’ para tentar diminuir a violência nas
escolas, a polícia promove programas educacionais a alunos. Um dos pro gramas
citados por ele é o Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas), destina do
a alunos da 4ª série. ‘É para ensiná -los a dizer não às drogas. É uma semente que
estamos plantando hoje e colheremos o fruto muito em breve’. ‘Para ele, uma das
medidas que diminuiria a violência nas escolas é a maior participação dos pais na vi da
escolar dos filhos. ‘Uma pergunta que eu sempre coloco é: será que todo pai observa a
bolsa de seu filho quando ele chega em casa? ” (Folha de São Paulo, Folha Ribeirão, 2 7
abr. 2001, p. C1, grifo do autor).
Outras notícias têm como foco principal a importância da presença policial no entorno da escola e
apesar de algumas notícias terem como foco a criminalidade presente no entorno da escola, utiliza a
expressão casos de crimes nas escolas, produzindo um sentido equivocado da questão e reforçando

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o imaginário da insegurança que se estende automaticamente do entorno para o interior da e scol a,


sem análises mais aprofundadas. A análise da violência na escola enquanto resultant e de um
processo de interações no interior da mesma não é objeto de discussão. As duas notícias destacadas
a seguir, são exemplos da ênfase
“Para a Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Pa ul o),
a extinção da função dos ASEs (Agentes de Segurança Escolar) em 95, pelo governo
estadual, é considerada o principal agravante da violência escolar por professores e
diretores da rede pública paulista. "Agora a escola fica na mão do diretor, que es tá na
diretoria, e do professor, que está na sala de aula", afirma a presidente da Apeoesp.
Segundo ela, os "vigias" de escolas tinham uma atuação preventiva entre os
estudantes. "A partir de 95, os problemas viraram casos de polícia e não se atua com
prevenção", afirma. ” (Folha de São Paulo, 25/03/2000).
“Se não tomarmos medidas rápidas, a situação ficará incontrolável", disse o diretor do
Udemo (Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de Sã o
Paulo). A Secretaria de Estado da Educação não quis comentar os casos de cr i mes na s
escolas, alegando que o problema é de competência exclusiva da Secretaria da
Segurança Pública. ”(Folha de São Paulo, 25/03/2000)
As propostas para prevenção da violência escolar citadas nas notícias trazem elementos importantes
como: abrir a escola para a comunidade para realização de atividades; incentivar a realização de
atividades esportivas; trazer os pais a participar da escola. Embora algumas notícias vêm nesse
sentido, de apresentar algumas soluções que as escolas vêm encontrando para encaminhar o
problema da violência escolar, com maior frequência o enfoque é sobre a criminalidade e a violência
fora da escola, que afeta os alunos também dentro da escola, e as agressões e brigas entre os alunos.
Embora algumas notícias destaquem a importância da participação dos pais, as famílias são descritas,
em geral, como fragilizadas, seja a partir de suas condições econômicas, de sua estrutura de vida, ou
reproduzindo o sentimento de medo que a imprensa ajuda a disseminar. A possibilidade de di ál ogo
aparece com frequência vinculada aos projetos de socialização (ex.: a escola permitir o uso das
quadras de esportes pela comunidade, projetos que propõem a abertura da escola nos finais de
semana, etc.). Os ataques a professores, também, aparecem noticiados e reafirmam a fragilidade da
escola e dificuldade dos professores e gestores, em lidar com o problema.
No jornal “Liberation” foram encontradas entre os anos de 1995 a 2001, doze notícias que falavam
especificamente de violência escolar, houve a incidência de algumas outras notícias que se re fe ri am
a conflitos na escola, mas não foi utilizada a expressão “violência escolar”. Principalmente nos finais
dos anos 90 e início dos anos 2000, a denominação dos “quartiers dificiles” para os bairros
periféricos onde a violência social é mais visualizada, é objeto de atenção do jornal , com de staque
para a necessidade de intervenção policial e de políticas sociais para conter a violência, inclusive a
escolar. Em diferentes notícias veiculadas, no ano de 1995, a importância da intervenção policial é
constantemente apresentada como solução para a contenção da violência escolar ( Banlieues: les
commissaires de police dressent un état des lieux, 16/12/1995; les mineurs délinquants rajeunissent.
En 1994, plus de 60.000 jeunes ont été impliqués dans des affaires judiciaires, 14/10/1995). A
preocupação com a violência juvenil e o reflexo de tal situação na violência escolar resulta em
diferentes políticas públicas no sentido de “acomodar” os jovens de periferia em uma fo rmação para
o trabalho e de endurecer a legislação correspondente. As notícias veiculadas reforçam esse
aspecto, sem apresentar questionamento sobre o funcionamento das instituições educacionais e
sociais em geral que geram as violências simbólicas, a intolerância e não reconhecimento das
diferentes culturas presentes. A seguinte notícia veiculada pelo jornal em 17/09/1997 ilustra bem
esse aspecto:
“Mission spécifique. De même qu'elle s'efforce de combattre l'échec scolaire dans les
«zones d'éducation prioritaires», l'Education nationale entend «assumer pleinement»

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

le pilotage de cette nouvelle opération de lutte contre la violence. Au-delà des actions
de prévention déjà développées dans le cadre de la politique de la ville em relation
avec la justice et la police, l'ambition est de confier à l'école une mission spécifique.
Dans chaque site expérimental, le ministère envisage notamment la création de
«réseaux d'établissements» comprenant des lycées professionnels, collèges et écoles
élémentaires d'un même quartier. Au sein de chaque réseau, il serait ainsi possible de
garantir un réel suivi des populations scolaires aux différentes étapes de leurs
parcours.” (Libération, 17/09/1997)
Com respeito às famílias, em notícia veiculada em 30/09/2017, o jornal Libération apresenta a
seguinte manchete “Prioritaires, les ZEP devront être exemplaires. Ségolène Royal veut redynamiser
les zones scolaires sensibles”. Nessa noticia a ministra da Educação da França apresenta algumas
ações que serão desenvolvidas no sentido da prevenção da violência escolar, sendo uma de l as uma
aproximação maior das escolas com as famílias nas regiões com maiores problemas de violência
juvenil. Uma das ações seria um envolvimento das escolas na alfabetização das mães dos alunos.
Embora a notícia dê destaque para uma proposta significativa em termos de aproximação com as
famílias, percebe-se que ainda permanece sem discussão o quanto a instituição escolar re je ita e ssa
relação e mantém uma relação de hierarquia cultural e ideológica com relação às famílias,
principalmente as de imigrantes.
Embora a tônica das notícias do jornal “Libération”, seja o vínculo entre os conflitos escolares e a
questão da insegurança social e reforce as soluções judiciais e policias para tais conflitos, o jornal
também dá espaço para discussões que promovem uma reflexão mais aprofundada, como as
destacada a seguir:
Certains élus instituent un couvre-feu pour les mineurs de 13 ans au motif de la
protection de l'enfance. Ces arrêtés municipaux ne créent pas du droit, ils cr éent une
confusion et essaient d'introduire des devoirs nouveaux pour les parents comme si de
nombreux enfants circulaient la nuit noire dans nos quartiers. Tactiques locales d'un
positionnement sécuritaire! Tout mineur circulant non accompagné la nuit doi t faire
l'objet d'un contrôle de police: il est présumé en danger. Nous défendons une stratégie
à long terme d'une véritable politique éducative et soutenons l'esprit de l'ordonnance
de 1945. (Carpentier,Libération, 20/08/2001)
Essa reflexão trazida por Carpentier questiona a solução judicial e securitária presente nas propostas
veiculadas pelo senso comum e recoloca a discussão em termos de uma perspectiva educacional e
não meramente policial. Embora não se refira exatamente à questão da violência escola r, traz uma
discussão que permeia o tema por referir-se à forma de enfrentamento da questão juvenil e das
situações de conflito com os alunos nas escolas.
Um outro exemplo de reflexão trazida pelo jornal “Libération” que ajuda a aprofundar a discussão
sobre a violência escolar é a análise de Auffray a respeito de um evento havido em 2001 onde o
tema central era a questão da violência central:
Opportunisme. Pour autant, les sociologues et les pédagogues rassemblés à l'Unesco
n'auront pas la naïveté de croire que c'est uniquement par intérêt pour leurs travaux que
le gouvernement honore ainsi de sa présence ce colloque scientifique. A l'évidence, la
proximité des élections municipales n'est pas étrangère à ce choix. La violence et
l'insécurité se sont invitées dans la campagne et il ne sera sans doute pas inutile, à
quelques jours du scrutin, que le Premier ministre s'exprime une nouvelle fois sur ces
questions.Pour Eric Debarbieux, professeur en sciences de l'éducation à l'université de
Bordeaux et fondateur de l'Observatoire européen de la violence scolaire, cette
conférence aura d'abord le mérite de rappeler que les phénomènes de violence scolaire
sont liés à l'inégalité sociale et économique. Ils con cernent donc, d'une manière ou d'une
autre, la plupart des Etats confrontés à cette inégalité, autant dire le monde entier. «Au
fond, la violence à l'école est un excellent outil d'analyse des sociétés libérales», cons ta te

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Eric Debarbieux, qui ne craint pas de conclure que l'enjeu n'est autre qu'un «choix de
civilisation».

Nessa reflexão, observa-se o questionamento a respeito das reais intenções dos gove rnantes a e m
participar do evento, para analisar criticamente a situação social que leva à violência juvenil e
consequentemente à violência escolar. É uma visão crítica, que chama a atenção para questões
centrais que contribuem com o debate.
Observa-se que as notícias sobre violência escolar, tanto no jornal brasileiro como no jornal francê s,
em geral, focam nos eventos em si e em relação à ideia de insegurança social, este último aspecto
reflexo da sociedade globalizada. Pode-se, no entanto, notar que o jornal Líbérati on apre se nta um
número maior de discussões com maior aprofundamento, que não ficam somente na descri ção dos
fatos, descrição esta que se situa e se baseia em relatos de vítimas e agressores, mas traz elementos
críticos para permitir uma amplitude da discussão.

Conclusões

A metodologia dos estudos comparados apresentado neste artigo, foi tomada a partir de uma análise
das diferentes realidades que enfrentam o Brasil e a França em termos da discussão sobre vi ol ê nci a
escolar, interpretadas pela mídia. O crescimento da preocupação com a segurança e o crescimento
das denúncias do comportamento incivilizado ou violento de crianças, adolescentes e joven s,
presente em diferentes países, de diferentes condições econômicas reflete-se nas formas dos jornai s
apresentarem a violência escolar.
A utilização do jornal enquanto fonte de dados foi considerada de significativa validade por expressar
como boa parte da sociedade ou pelo menos os que detêm o poder das mídias nas mãos pensam
sobre as questões mais candentes de cada contexto. Como já afirmado anteriormente, as mídias
contribuem para a construção dos sentidos e consequentemente para a sensibilização do po der
público e da sociedade para que determinadas temáticas sejam assumidas e para o norte das
principais propostas que serão colocadas em prática.
Considera-se que a mídia atua como um dispositivo de poder, uma vez que relativiza os
acontecimentos conforme interesses diversos, e que sua comunicação é criada e opera por me i o de
símbolos, que são interpretados pelos indivíduos, gerando diferentes compreensões, Conclui-se que
a forma como a questão da violência escolar é tratada pela mídia acaba inflando o con ceito,
supervalorizando as situações mais graves e vinculadas ao crime, contribuindo com a produção do
sentimento de insegurança social, formando um imaginário sobre a violência escolar que direciona a
discussão para o estabelecimento de medidas repressivas, mais que educativas.
Para além das questões metodológicas o artigo chama a atenção para dois aspectos centrais nas
notícias veiculas pelo jornal Folha de São Paulo no Brasil e pelo jornal Libération na França. As
discussões trazidas têm como referência, em geral uma visão única e induz a que seja reforçada a
perspectiva do endurecimento das regras e leis para dar resposta ao sentimento de insegurança
presente na sociedade. Nesse sentido, a veiculação das notícias sobre violência escolar, quando não
se direciona ao alarmismo, conduz a discussão para questões judiciais e policiais.
Aspecto comum aos dois jornais e já destacado anteriormente, é a veiculação da violência escolar
enquanto vinculada às áreas judiciais e policiais. Na França fica mais claro tal fato, devido ao
endurecimento das regras e legislações relacionadas à “delinquência juvenil” e ao e nquadrame nto
nelas de diferentes situações, desde as mais banais até as mais graves. No entanto, obse rva -se um
emprenho maior do jornal Libération em veicular análises mais aprofundadas, com artigos que
trazem reflexão melhor fundamentada, permitindo a veiculação de ideias além do senso comum.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Concluindo, destaca-se que a possibilidade de a imprensa analisar as questões e trazer notícias de


maneira a refletir a partir de diferentes perspectivas, questionando inclusive o que parece ser
consenso, isto é o imaginário do senso comum criado, pode trazer mais contribuições para que
melhores soluções sejam buscadas para a prevenção da violência escolar.

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La competencia comunicativa y lingüística oral en la formación inicial de


maestros: un estudio piloto

Marta Gràcia 1 , Maria Josep Jarque1


Marta Astals 2 , Kholoud Rouaz2, Carme Tovar 2
1
Depa rtamento de Cognición, Desarrollo y Ps icología de la Educación, Universidad de Barcelona, España.
mgra ci ag@ub.edu; mj_jarque@ub.edu
2
Es tudiante de Gra do, Universidad de Barcelona, España.martastals@gmail.com;
kroua z.imp@gmail.com; carmetovarf@gmail.com

Resumen. La competencia comunicativa y l i ngüística (CCL) de l os maestros es cruci al pa ra l a creación de


a mbientes ri cos que a yuden a l os a lumnos a a prender l os contenidos del currículum de una manera
cons tructiva y a desarrollar la CCL. La investigación tiene como objetivo detectar los ca mbios que se producen
en l a s s esiones de cl ase de dos grupos de es tudiantes en l as que s e i ntroducen i nnovaciones docentes
vi nculadas a l a CCL en una a signatura a nual del gra do de ma estro de una uni versidad ca talana. Las
obs erva ciones realizadas a lo l argo de tres meses muestran diferencias en las sesiones de clase de los grupos
en l os que l as docentes han i ntroducido ca mbios rel acionados con l a reflexión s obre l a competencia
comunicativa oral y con la construcción de textos orales a rgumentativos de tipo conversacional respecto a los
grupos que no l o han hecho. Ta mbién s e observan a lgunas diferencias entre l as cl ases en función de su
ubi cación en el conjunto del bloque temático.
Palabras clave: competencia comunicativa y l i ngüística; forma ción i ni cial de ma estros; discusión
a rgumentativa; i nnovación docente.

Communicative and linguistic competence in Initial Teacher Training: a pilot study


Abstract. Tea chers’ communicative a nd l inguistic competence (CLC) i s cruci a l for the crea ti on of rich
envi ronments that help s tudents learn the curriculum contents i n a constructive way a nd develop their CLC.
Our res earch aims to detect the changes produced i n the cl ass s essions of two groups where the i nstructors
a re i mplementing teaching innovations linked to communicative and linguistic competence in a subject of the
tea cher degree. The three month long observations show differences, with respect to the comparison group,
rel a ted to the reflection on oral communicative competence and to the construction of conversational-type
ora l a rgumentative texts. The res ults a lso i ndicate di fferences a mong cl ass s essions depending on their
temporal location in the teaching unit.
Keywords: communicative a nd l i nguistic competence; i nitial tea cher tra i ning; a rgumentative discussion;
tea ching innovations.

1 Introducción
1.1 Diseño de Entornos Comunicativos en el Aula
La competencia comunicativa y lingüística de los maestros es crucial para la creación de ambientes
ricos que ayuden a los alumnos a aprender los contenidos del currículum de una manera constructiva
y a desarrollar su lenguaje (Marinac, Ozanne, & Woodyatt, 2008; Mercer, 2010; Gràcia, Vega, & Galván-
Bovaira, 2015). A través de la implementación del currículo, especialmente de aquellos objetivos y
contenidos vinculados a la pragmática y a la construcción de textos, se espera que los alumnos acaben
la etapa de educación primaria habiendo alcanzado una competencia pragmática en su primera
lengua, en la lengua vehicular de los contenidos académicos, en la segunda lengua de la escuela (si
procede), así como en la lengua o lenguas extranjeras, que les permita preguntar, pedir explicaciones,
hacer demandas de información, cuestionar, plantear dudas, argumentar, en situaciones diversas, más
o menos formales o académicas, en relación con contenidos (relacionados con las matemáticas,
lengua, experiencias personales...), interlocutores, contextos y objetivos diversos (Gràcia, Galván-
Bovaira, & Sánchez-Cano, 2017; Generalitat de Catalunya, 2013; Ishihara & Cohen, 2014). Todas estas
funciones y habilidades comunicativas deberían poderlas poner en juego en el marco de textos orales
correctos desde el punto de vista semántico-pragmático y formal (con relación a su fonética-fonología,

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

morfología, sintaxis y estructura textual). Esta meta únicamente puede ser alcanzada si en la escuela
se facilita a los alumnos utilizar el lenguaje para interactuar de manera dialógica (Kathard, Pillay, &
Pillay, 2015). La interacción tendría lugar en situaciones en las que se sientan seguros, en las que
puedan solicitar ayuda, en las que los compañeros, el docente y otros profesionales puedan ser
modelos a imitar, en las que se utilicen estrategias que faciliten estas habilidades y el desarrollo de la
competencia lingüística, y en las que se promueva la reflexión sobre el lenguaje, es decir, las
actividades metalingüísticas
1.2 La Competencia Comunicativa en la Formación Inicial de Maestros
Para conseguir que los alumnos en las etapas de educación infantil y primaria desarrollen las
habilidades a las que se acaba de hacer referencia en el apartado anterior, es necesario que los
maestros sean conscientes de esta necesidad y que , al mismo tiempo, hayan desarrollado
competencias para ayudar a sus alumnos a hacerlo. En los últimos veinte años, esta competencia ha
sido uno de los contenidos más importantes de la formación inicial de maestros (FIM) (Ogienko &
Rolyak, 2009; ZlatićBjekić, Marinković, & Bojović, 2014), así como en la formación de universitarios de
otras disciplinas (Doherty, Kettle, May, & Caukill, 2011). El análisis de los datos recogidos en una
primera fase del estudio (Gràcia, Vega, Castells, Vinyoles, & Galve, 2015) a partir de entrevistas a
maestros, docentes universitarios, observaciones en aulas de educación infantil y primaria, así como
de la revisión de planes docentes del Grado de Formación Inicial de Maestros (FIM), pone de relieve la
necesidad de introducir cambios en la FIM con el fin de ayudar a los estudiantes a mejorar su
competencia comunicativa, como estudiantes universitarios y como futuros maestros. Los estudiantes
necesitan tomar conciencia (y lo han hecho durante las entrevistas) de que la habilidad de intervenir
en clase, durante la revisión de conocimientos previos, durante el trabajo cooperativo en clase,
durante las puestas en común posteriores, es fundamental para dar sentido a los contenidos y para
aprenderlos con un elevado grado de significatividad. Y ello incluye la reflexión sobre sus competencias
para gestionar una conversación, para generar textos coherentes y cohesionados, para argumentar
sus opiniones, para contraargumentar o refutar las de los compañeros o el profesor, para formular
preguntas que enriquezcan la discusión, etc. Como futuros maestros estas estrategias les serán útiles
para convertir las clases en entornos comunicativos en los que l os alumnos participen, pregunten,
gestionen, reflexionen sobre el lenguaje para mejorar su competencia comunicativa y para dar sentido
al aprendizaje de todos los contenidos. También les será útil para participar activamente en las
reuniones de ciclo, de claustro, con los especialistas (psicopedagogos, orientadores, logopedas…). Las
reuniones con las familias, en toda su diversidad, sin duda también se verán enriquecidas, si sus
habilidades conversacionales y de gestión son buenas. Los resultados del estudio citado ponen de
relieve que las dos actividades que los docentes de todos los niveles educativos y los estudiantes
universitarios consideran que propicia de manera más evidente la participación activa de los alumnos
en clase es la revisión de los conocimientos previos sobre una temática (al inicio) y el cierre o síntesis
de un tema (al final). A partir de los resultados a los que nos acabamos de referir, nos planteamos
observar los cambios en las sesiones de clase cuando se introducen instrumentos, recursos y
estrategias por parte de docentes universitarios con el fin de incrementar la participación oral de los
estudiantes universitarios y contribuir a su competencia comunicativa y lingüística. Concretamente,
nos propusimos responder a las siguientes preguntas de investigación: 1) ¿Habrá diferencias en las
características de la interacción entre los participantes (docentes y estudiantes) y de los textos orales
producidos entre las sesiones de clase en las que los docentes introduzcan innovaciones dirigidas a
promover la participación oral de los estudiantes y aquellas en las que los docentes no lo hagan? Y 2)
¿Habrá diferencias entre las sesiones de clase en función del momento dentro de la unidad temática
(inicio-final)?
2 Metodología

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Se trata de un estudio de casos (Yin, 2009) que sigue una metodología de investigación-acción
participante en la que dos de las investigadoras del equipo participan como investigadoras y como
docentes de universidad, implementando una innovación docente, cada una de ellas con un grupo de
estudiantes diferente. Otra investigadora trabaja de manera colaborativa con ellas durante todo el
proceso de planificación de la intervención, implementación y recogida de datos. Es decir, los
principales agentes implicados en el estudio son docentes e investigadores al mismo tiempo, que
persiguen mejorar su práctica educativa, así como la comprensión de la misma en aras de contribuir a
la mejora de la competencia comunicativa y lingüística de sus estudiantes.
2.1 Participantes
Han participado en esta investigación cuatro docentes universitarios (dos del Grado de Educación
Infantil y dos del Grado de Educación Primaria) y sus grupos estudiantes (entre 48 y 54 por grupo) de
la asignatura anual Psicología de la Educación, de primer curso, con dos sesiones de clase de dos horas
semanales. Una docente de cada grado ha introducido innovaciones en sus clases ( dos grupos de
innovación o GI) y los otros dos han realizado sus clases de la manera habitual (dos grupos de
comparación o GC). Una de las docentes ha coordinado la investigación trabajando conjuntamente con
la otra docente que ha introducido innovaciones y una tercera investigadora predoctoral.
Conjuntamente, las tres han participado en el diseño, el seguimiento y reajustes de la innovación. Otra
investigadora predoctoral y dos estudiantes de grado han proporcionado apoyo en los registros de
vídeo de clases y en el almacenado del material registrado y recogido. En el análisis de datos han
participado otras tres estudiantes de grado. Las observaciones se han realizado en las aulas de la
Facultad de Educación de la Universidad de Barcelona.
2.2 Instrumentos
1. Uso de la Discusión Argumentativa en el Aula como Recurso para Enseñar y Aprender: la Metodología
Conversacional
En la Metodología conversacional (Gràcia et al., 2017) el discurso oral es objeto y mediador en el
proceso de enseñanza y aprendizaje e incluye los siguientes recursos y estrategias:
a. Trabajar los contenidos de los diferentes bloques temáticos otorgando especial importancia a
la lengua oral, tanto desde el punto de vista expresivo (hablar) como comprensivo (escuchar).
b. Promover la capacidad metalingüística de los estudiantes.
c. Otorgar relevancia al contexto comunicativo y su gestión; explicitar los objetivos que se
pretenden alcanzar; utilizar estrategias para reformular las producciones de los estudiantes y
para promover el uso del lenguaje con diferentes intenciones (preguntar, aclarar, sugerir…).
d. Incorporar elementos vinculados a la construcción de textos orales con especial referencia a
la conversación argumentativa: introducción de argumentos, contraargumentos, refutaciones,
coherencia y cohesión textual, léxico preciso…
e. Trabajar en grupos cooperativos.
f. Incorporar a la evaluación de la asignatura la construcción de textos argumentativos
monogestionados y plurigestionados registrados en vídeo.
2. Instrumentos Específicos para Evaluar la Discusión Argumentativa como Recurso para Enseñar y Aprender:
la Rúbrica y la Observación de la Interacción Comunicativa en Clase
Instrumento de seguimiento, registro y evaluación de la conversación argumentativa.
Este instrumento, construido ad hoc para esta investigación, tiene como objetivo observar, registrar y
evaluar la competencia comunicativa y lingüística relacionadas con la conversación argumentativa en
grupo cooperativo y en grupo clase. Incluye 2 elementos: 1) una rúbrica, que comprende dimensiones,
indicadores, una breve explicación de indicadores y una breve explicación de cada uno de los
descriptores (del 1 al 4); 2) un documento, con los fundamentos teóricos que están en la base de la
rúbrica. En la Tabla 1 se presentan las dimensiones e indicadores.

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Tabla 1. Di mensiones e i ndicadores de l a rúbrica


Dimensiones Indicadores 1 2 3 4
Gestión de la interacción Ma rca dores interactivos
Turnos comunicativos
Ges tión de la participación
Es tra tegias de cortesía
Multimodalidad Ges tos manuales
Ges tos batutas
Ges tos faciales y corporales
Prosodia Entona ción
Locuci ón
Coherencia Orga ni zación de la información
Exposición, agrupamiento y secuencia de las ideas
Rel evancia, s entido unitario, carácter completo de l a información
Cohesión textual Conexi ón entre fragmentos
Conexi ón entre oraciones
Tra ta miento de la información
Estrategias argumentativas Tes is
Va l idez de la a rgumentación
Contra a rgumentos
Fa l acias
Concl usión
Cons trucciones evidenciales
Pa trones de i nteracción de la secuencia argumentativa
Léxico y terminología Léxi co común
Termi nología del área de conocimiento

Como se aprecia en la Tabla 1, la rúbrica está organizada en 7 dimensiones. La dimensión Gestión de


la interacción hace referencia a la capacidad para gestionar la interacción en red. Comprende cuatro
subdimensiones: (1) el uso de marcadores interactivos que favorecen la participación en red, tanto
lingüísticos como gestuales; (2) la participación en turnos comunicativos, (3) la gestión de la
participación y (4) el uso de estrategias de cortesía (Schegloff, 2007). La segunda dimensión remite a
la capacidad de poner en marcha los recursos multimodales que caracterizan la interacción social.
Incluye el uso de gestos que contribuyen cualitativamente a la expresión verbal: gestos manuales,
batutas, faciales y corporales. Con relación a la tercera dimensión, esta hace referencia al uso de la
prosodia, es decir, a la capacidad de poner la locución al servicio de la expresión clara del contenido y
la transmisión de emociones. Comprende dos subdimensiones: (1) el uso de la entonación en las
diferentes construcciones lingüísticas – curvas entonativas y acento prosódico— y (2) las
características que presenta la locución, tanto con relación a elementos prosódicos como
paralingüísticos – la intensidad, la velocidad, el tono y la articulación (Selting, 2010). En cuanto a la
cuarta dimensión, esta evalúa la coherencia, es decir, la exposición, agrupación y secuencia de las ideas
que proporcionan un sentido unitario y un carácter completo al contenido de la información. La
cohesión textual es el objeto de análisis de la quinta dimensión. Se analiza tanto la conexión entre
fragmentos y oraciones mediante conectores, como el tratamiento de la información mediante
marcadores discursivos u operadores modales.La sexta dimensión incluye los elementos que remiten
a la capacidad de formular y argumentar razonadamente una posición con el objetivo de llegar a un
consenso. Presenta 7 subdimensiones: (1) la formulación de la tesis, (2) la validez de los argumentos,
(3) la exposición de contraargumentos, (4) la identificación de falacias, (5) la formulación de
conclusiones, (6) el uso de construcciones evidenciales que indiquen la fuente de la información y (7)
el uso de patrones en la secuencia argumentativa (Cano, 2010; Kuhn, 1991; Felton , Garcia-Milà,
Villarroel, & Gilabert, 2015). La última dimensión remite a la capacidad de expresión precisa y variada

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teniendo en cuenta dos subdimensiones: (1) el léxico común y (2) la terminología del área. Un ejemplo
del tipo de descriptores que se han usado (indicador validez de la argumentación, pun tuación 4) es
“aporta los argumentos suficientes, aceptables y relevantes para justificar la hipótesis en función de
los contraargumentos que exponga el interlocutor”. Escala de Valoración de la enseñanza de la lengua
oral en contexto escolar (EVALOE). La EVALOE es una escala formada por 30 ítems agrupados en tres
subescalas que pueden ser puntuados del 1 al 3. Se trata de una escala validada en contexto de
educación infantil y primaria (Gràcia et al., 2015) que se usará por primera vez en contexto
universitario para valorar la manera como los profesores participantes enseñan lengua oral en clase
(ver tabla 2).
Tabla 2. Subescalas que forman l a EVALOE
Subescalas Descripción Puntuación
Contexto y ges tión de la Eva l úa de manera global l a organización del contexto aula y de l a -/ 24
comunicación (7 ítems) comunicación (contexto físico y normas)
Di s eño i nstruccional Eva l úa aquellos objetivos, actividades y l a evaluación en relación con la -/ 21
(8 ítems ) l engua oral, para ver s i se i ncorpora dicha información y s i se hace explícita
en l as programaciones
Funci ones Eva l úa cómo el maestro enseña a utilizar los recursos de l a lengua oral para -/ 45
comunicativas y determinados propósitos sociales (informar, preguntar y otros ), así como el
es tra tegias (15 ítems) us o de ci ertas estrategias educativas para promover la expresión de los
a l umnos
TOTAL -/ 90

2.3 Procedimiento de recogida de datos observacionales


El proceso de recogida de datos se ha desarrollado siguiendo una serie de pasos. En primer lugar, se
solicitó el permiso a las directoras de estudios del grado de EI y de EP. En segundo lugar, la investigadora
principal (IP) se reunió con las dos coordinadoras de las asignaturas implicadas y les propuso cuatro
profesores como posibles participantes en el proyecto de innovación docente. A continuación, tuvo
lugar una primera reunión de la IP con los dos profesores de los GC en la que se les presentaron las
líneas generales del proyecto de innovación docente y se tomaron decisiones conjuntas sobre su
colaboración. Teniendo en cuenta los resultados de la primera fase del proyecto al cual ya nos hemos
referido, así como las características de los cuatro profesores participantes, las tres investigadoras
introdujeron los ajustes necesarios a la propuesta de innovación docente inicial, concretando las
estrategias y recursos que se introducirán en cada una de los bloques temáticos, la evaluación, la
información a los estudiantes, el documento de consentimiento para poder grabar en vídeo algunas
sesiones de clase y algunas discusiones en grupo en audio, etc. Durante el periodo de recogida de datos
(septiembre-diciembre del curso 2015-16), se trabajaron en la clase los tres primeros bloques temáticos
incluidos en el plan docente, de los seis que incluye. En la segunda clase del curso se explicó a los
estudiantes (más detalladamente en el caso de los GI) el proyecto, se pidió su consentimiento y se les
proporcionó la dirección electrónica a la que debían enviar los registros en audio de las discusiones en
grupo cooperativo en clase. A partir de la segunda clase del curso, comenzó la introducción de las
innovaciones en los GI. Se llevaron a cabo tres registros en vídeo de cada bloque (inicio-medio-final) de
las dos profesoras de los GI (9 en total). En el caso de los profesores del GC se registraron las sesiones
de clase iniciales y finales de cada bloque (seis sesiones). Las tres investigadoras se reunieron de manera
semanal desde el inicio de la recogida de datos para compartir el proceso de innovación, discutir las
dudas y las dificultades, valorar los cambios e introducir reajustes.
2.4 Procedimiento de análisis de datos observacionales cualitativos y cuantitativos
Las clases han sido analizadas por una de las investigadoras participantes en el estudio piloto como
también como docente, la investigadora que participó en el diseño y seguimiento de la innovación
docente y tres estudiantes del grado de psicología. Con el fin de acordar criterios de análisis de las

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actividades llevadas a cabo por los docentes y los estudiantes que participaron en el estudio piloto,
cada una de las estudiantes y las dos investigadoras analizaron de manera independiente cuatro
sesiones de clase, una de cada uno de los docentes implicados, con cada uno de los dos instrumentos
(rúbrica y EVALOE). Después de llevar a cabo el análisis de una sesión de clase de manera independiente
se pusieron en común las puntuaciones en cada uno de los dos instrumentos de las dos investigadoras
y las tres estudiantes, así como de las sesiones de clase entendidas globalmente (características de la
sesión de clase, actividad que se propone, actitud general de los estudiantes y del profesor, estado de
ánimo…), y se discutieron los criterios seguidos, y se llevó a cabo el siguiente análisis de otra sesión y
de otro docente. Se procedió así hasta que los criterios fueron acordados a través de un proceso de
discusión y toma de acuerdos en el que se recorría un camino de ida y vuela desde la valoración general
cualitativa de las sesiones de clase siguiendo los criterios que están en la bas e de la rúbrica, de la
EVALOE hasta las puntuaciones numéricas. Una vez alcanzado este acuerdo, una de las estudiantes
analizó las sesiones de clase de los dos docentes de los grupos de EP, y las otras dos estudiantes
analizaron las sesiones de clase de uno de los dos docentes de los grupos de EI. Ambas utilizando como
base los dos instrumentos citados y los criterios para la valoración general de la sesión de clase, que no
se transformaron en cifras numéricas.
3 Resultados y discusión
3.1 Análisis de las Sesiones de Clase con la Rúbrica
Se presentan a continuación los resultados de la sesión de clase de educación infantil (EI) en la Tabla 3
y los de educación primaria (EP) en la Tabla 4. Como se aprecia, se han analizado las sesiones inicio y
final de cada bloque, puesto que son las que se habían registrado en todos los grupos.

Tabla 3. Res ultados de la evaluación de las sesiones de clase con la Rúbrica en los grupos de EI. Se muestra la media en cada
una de l as 7 di mensiones, puntuando del 1 a l 4 en función del ajuste a la descripción cualitativa que se i ncluye en la rúbrica.
Se ha n puntuado con un 0 cuando una s esión de clase se ha considerado no evaluable en dicha dimensión.

Grupo de Innova ción (GI) Grupo de Comparación (GC)


BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3 BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3
DIMENSIONES INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL

Ges tión de la
1,5 1,5 2,3 1,8 3,0 2,5 1,0 1,0 1,0 1,0 1,3 1,0
i nteracción
Mul ti modalidad 1,5 2,0 3,0 3,0 3,0 3,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0
Pros odia 1,5 2,0 2,5 3,0 2,5 3,0 2,0 1,0 2,0 1,5 1,5 1,5
Coherencia 2,5 2,5 3,0 2,5 3,0 3,0 2,5 1,5 1,5 1,0 1,5 1,0
Cohesión textual 2,0 2,0 3,0 2,7 3,0 3,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0
Es tra tegias
1,4 2,0 2,3 2,1 2,3 2,1 0,0 0,0 0,0 0,0 1,0 1,0
a rgumentativas
Léxi co y
1,5 2,0 2,0 2,5 3,0 3,0 2,0 1,0 2,0 1,0 2,0 1,0
termi nología
Total 1,5 2,0 2,5 2,5 3,0 3,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,3 1,0
La primera pregunta de investigación que nos planteábamos al inicio era si se percibirían diferencias
entre las sesiones de clase de los docentes que promoviesen la participación oral de los estudiantes y
aquellos que no lo hiciesen. Como se aprecia en las tablas 3 y 4, en las sesiones de clase de los grupos
GI se observan más indicadores que en las clases de los GC, y en el caso de los GI se incrementan estos
indicadores a lo largo del periodo analizado, mientras que las clases de los GC hay pocas variaciones.
Se observa que las docentes y los estudiantes de los GI incorporan el uso de gestos de diferente tipo y
de expresiones faciales que acompañan al texto oral durante las conversaciones en clase, así como la
entonación, especialmente por parte de los estudiantes, que son cada vez más conscientes de su
importancia. También se aprecian avances en la gestión de la conversación, especialmente por el

111
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hecho de que los estudiantes hacen referencia a las intervenciones anteriores de sus compañeros
cuando toman la palabra e incorporan progresivamente estrategias de cortesía, que modela la
docente. Cabe señalar que la incorporación de las estrategias argumentativas es más lenta por la
complejidad que supone a menudo para los estudiantes aportar razones claras a sus intervenciones, a
pesar de las ayudas que proporciona la docente. El análisis global de las sesiones de los cuatro grupos
pone de relieve que en las clases delos GI los estudiantes participan con mucha más frecuencia durante
toda la sesión que los estudiantes delos GC, puesto que las docentes de los GI promueven que lo hagan
usando estrategias diversas, algunas de las cuales se van a revisar más adelante. La segunda pregunta
de investigación se centraba en las diferencias entre las sesiones de clase en función del momento
dentro de la unidad temática, es decir, la diferencia entre las clases de inicio de bloque y final en un
mismo grupo clase. En las Tablas 3 y 4 se aprecia que en el caso de los GI no hay diferencias en este
sentido y en cambio en los GC se aprecia un ligero incremento de indicadores observados en las
sesiones iniciales. El análisis cualitativo global de los vídeos de las sesiones de clase ha permitido
detectar que el docente del GC de EI planteaba la sesión inicial de clase como una revisión de
conocimientos previos, lo cual promovía mayor participación de los estudiantes. En cambio, en la clase
final, el protagonismo era del profesor, quien resumía los contenidos principales del bloque trabajado.
Por su parte, el docente del GC de EP dedicó la primera sesión observada a revisar conocimientos
previos y a debatir sobre cuestiones fundamentales de la materia, lo cual propició mucha participación
por parte de los estudiantes. Esta metodología se dejó de usar en las siguientes clases, incluso en
aquellas en las que se iniciaba un bloque temático, aunque sí se promovía más la participación de los
estudiantes, lo cual se refleja en las observaciones realizadas en las sesiones iniciales de los bloques 2
y 3.

Tabla 4. Res ultados de la evaluación de las sesiones de clase con la Rúbrica en los grupos de EP. Se muestra la media en
ca da una de las 7 dimensiones, puntuando del 1 a l 4 en función del ajuste a l a descripción cualitativa que s e incluye en la
rúbri ca . Se han puntuado con un 0 cua ndo una sesión de clase se ha considerado no evaluable en dicha dimensi ón.

Grupo de Innova ción (GI) Grupo de Comparación (GC)


BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3 BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3
DIMENSIONES INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL

Ges tión de la
2,3 2,3 2,3 2,5 2,8 2,0 1,8 1,0 1,0 1,0 1,3 1,0
i nteracción
Mul ti modalidad 2,3 2,5 2,8 2,8 2,8 2,8 2,0 0,0 1,8 2,0 2,5 2,5
Pros odia 3,0 3,0 3,0 2,5 3,0 3,0 2,5 1,0 1,5 2,0 3,0 2,0
Coherencia 2,5 2,5 2,0 2,5 2,0 2,5 1,0 0,5 0,5 0,5 2,0 1,0
Cohesión textual 1,7 1,7 2,3 2,3 2,3 2,0 1,3 0,0 1,0 1,0 1,7 1,0
Es tra tegias
1,7 2,0 2,1 2,3 2,1 2,4 1,3 0,1 0,0 1,7 1,4 1,3
a rgumentativas
Léxi co y
2,0 2,0 3,0 2,5 2,0 3,0 1,0 0,0 0,5 2,0 1,5 2,0
termi nología
Total 2,3 2,3 2,3 2,5 2,3 2,5 1,3 0,1 1,0 1,7 1,7 1,3
3.2 Análisis de las Sesiones de Clase con EVALOE
En las tablas 5 y 6 se muestran los resultados relativos al análisis de las sesiones de clase con la EVALOE
en EI y EP, respectivamente.
Tabla 5. Resultados de la evaluación de las sesiones de clase con EVALOE en los grupos de EI. Se muestra el
nombre de las tres subescalas y porcentaje alcanzado en cada sesión respecto al que se podría haber alcanzado
(100%).
Grupo de Innova ción (GI) Grupo de Comparación (GC)
BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3 BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3
SUBESCALAS INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL

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Contexto y ges tión de la


71% 71% 88% 79% 88% 83% 54% 33% 54% 33% 50% 33%
comunicación
Di s eño i nstruccional 62% 57% 67% 62% 67% 62% 33% 38% 33% 38% 33% 38%
Funci ones comunicativas
58% 58% 71% 67% 71% 67% 38% 38% 38% 38% 38% 38%
y es tra tegias
Total 62% 61% 74% 69% 74% 70% 41% 37% 41% 37% 40% 37%

Tabla 6. Res ultados de la evaluación de las sesiones de clase con EVALOE en l os grupos de EP. Se muestra el nombre de las
tres s ubescalas y porcentaje alcanzado en cada s esión respecto al que se podría haber a lcanzado (100%).

Grupo de Innova ción (GI) Grupo de Comparación (GC)


BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3 BLOQUE 1 BLOQUE 2 BLOQUE 3
SUBESCALAS INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL INICIO FINAL

Contexto y ges tión de la


79% 79% 88% 79% 75% 79% 54% 38% 42% 46% 46% 46%
comunicación
Di s eño i nstruccional 57% 81% 67% 33% 52% 57% 38% 33% 33% 33% 43% 38%
Funci ones comunicativas
58% 56% 51% 51% 49% 58% 44% 33% 36% 44% 38% 44%
y es tra tegias
Total 63% 68% 64% 54% 57% 63% 46% 34% 37% 42% 41% 43%

En relación con la primera pregunta de investigación, los análisis de las observaciones con el
instrumento de observación EVALOE ponen de relieve que los docentes de los GI introducen en sus
clases más estrategias dirigidas a promover que los estudiantes participen oralmente en las clases, que
gestionen la conversación y que sean más conscientes de que están usando la lengua oral para
aprender y para mejorarla, que los profesores de los GC. En el caso del GI de EI, se observa in
incremento de estas estrategias y habilidades por parte de los estudiantes a lo largo del periodo de
recogida de datos, mientras que en las clases del GI de EP las características de las clases se alej an más
de aquello esperable que en las clases del GI de EI. La observación global de las clases permite detectar
que la docente y los estudiantes del GI de EI explicitan más en sus clases las estrategias que están
usando, que se relaciona con la subescala de Diseño instruccional.
4 Conclusiones
Este artículo explora los cambios en las características de la interacción y de los textos orales en las
sesiones de clase cuando se introducción instrumentos, recursos y estrategias por parte de docentes
universitarios con el fin de incrementar la participación oral de los estudiantes universitarios y
contribuir a su competencia comunicativa y lingüística. Las observaciones realizadas parecen poner de
relieve que la incorporación progresiva en las clases, a lo largo del trabajo de los tres bloques de la
asignatura, de los elementos vinculados a la conversación argumentativa, tanto en el GI de EI como en
el GI de EP promueve una mayor participación oral de los estudiantes universitarios, así como una
mayor consciencia sobre su aprendizaje. La observación de estos cambios parece indicar que la
introducción progresiva de elementos, instrumentos y momentos de reflexión sobre las discusiones
argumentativas en las clases por parte de los docentes de los GI ha sido incorporada a las clases por
parte de los estudiantes, en el sentido que proponen diversos autores (Cano, 2010; Felton et al. 2015;
Leitão, 2011; entre otros). Si nos centramos en los datos que nos proporciona la escala EVALOE, se
pone de manifiesto que desde el inicio de la asignatura las docentes introducen cambios en las clases
que promueven la mayor participación de los estudiantes, que en uno de los grupos se incrementa a
lo largo del semestre. En cambio, en el caso de los docentes de los GC, las características de las clases
se mantienen durante el trabajo de los tres bloques de contenido. Si revisamos los baremos
orientativos que establece el manual de la escala de observación EVALOE (Gràcia, coord., 2015) para

113
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los niveles de educación infantil y primaria, las docentes de los GI se situarían en la franja media y los
docentes de los GC se situarían en la franja baja. Se trata de unos baremos establecidos para otro tipo
de situaciones de educación formal, muy diferentes de los que estamos analizando en este estudio.
Aun así, nos pueden estar indicando que, a pesar de que en los GC se han incorporado estrategias por
parte de docentes y de estudiantes, es posible incorporar más elementos que indicarían que los
estudiantes son capaces de gestionar la conversación en mayor medida (Mondada, 2013; Selting, 2010;
Schegloff, 2007), que las actividades de discusión tienen un formato en red, que los estudiantes
incorporan la autoevaluación de su participación como algo habitual en las clases (Kuhn et al., 2013) o
que utilizan el lenguaje con intenciones comunicativas diversas. En conjunto, los resultados parecen
indicar que la innovación diseñada y aplicada para mejorar la competencia comunicativa y lingüística
oral de los estudiantes de FIM a través de los instrumentos elaborados e incorporados en las sesiones
del primer semestre de clase (septiembre-diciembre) en una asignatura anual de primer curso, ha
permitido observar cambios progresivos en la manera de actuar de los docentes y de los estudiantes
en el sentido que se pretendía. Las clases de los GI incorporan elementos vinculados a una determinada
manera de entender la docencia, como una actividad participativa, activa, que parte del
cuestionamiento, de la revisión conjunta de los conocimientos previos, del planteamiento de
problemas que es necesario discutir y llegar a acuerdos (Felton et al. 2015; Lefstein & Snell, 2014;
Leitão, 2011; Ogienko & Rolyak, 2009; van Eemeren et al., 2002). Al mismo tiempo este tipo de
situaciones se aleja de las clases universitarias tradicionales en las que el conocimiento parece estar
únicamente en manos del profesor, que tiene como labor transmitirlo a los estudiantes y estos
reproducirlo en el momento de la evaluación (Pozo, 2016).

Agradecimientos. Esta investigación ha sido posible gracias a la ayuda concedida por el Programa d’Ajuda i
Innovació en la Formació de Mestres (ARMIF_2014) de la Generalitat de Catalunya. Agradecemos las
orientaciones metodológicas al Dr. Carles Riba, Universidad de Barcelona.

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115
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Valoración de las rutinas e interacciones comunicativas de familias de


preescolares y diseño de una intervención centrada en la familia

Marta Gràcia 1 , Camila Domeniconi 2

1
Depa rtamento de Cognición, Desarrollo y Ps icología de la Educación, Universidad de Barcelona, España.
mgra ci ag@ub.edu
2
Uni versidade Federal de Sao Ca rlos, Sao Ca rlos, Brasil. domeniconicamila@gmail.com

Resumen. La i nvestigación sugiere la necesidad de elabo ra r y u ti l iz a r h erra mi en ta s q ue p erm i ta n l a


va l oración de las interacciones comunicativas en contextos naturales con el fin de utilizarlas como base para
pl a nificar una i ntervención. El objetivo del estudio que presentamos es describir l as prácticas de las familia s
y a rgumentar como este conocimiento puede contribuir a la planifica ci ón d e i nterve nci ones e f ecti va s
centra das en la familia en el ma rco de s us ruti na s. En e s te tra ba jo p res en ta m os re s ul ta d os d e d os
i ns trumentos, la EVALOF a mplia y l a EVALOF breve auto aplicada, y de u na e ntre vi s ta p a ra co no cer l a s
a cti vi dades que cuatro familias con hijos de ci nco a ños realizan durante las rutinas diarias. Lo s re s ul ta d os
i ndican que es necesario reflexionar conjuntamente con l as fa milias con el fin de a yudarles a d etecta r s us
competencias así como aspectos mejorables de las i nteracciones con sus hijos, para contribuir a l desarro l lo
de l a comunicación y el l enguaje.
Palabras clave: i nteracción; comunicación; l enguaje; rutinas; familias.

Evaluation of routines and comunicative interactions of families with preschool children and family-
centered intervention design
Abstract. The res earch suggests the need to elaborate a nd evaluate the s cales and other kind of m ea s ures
to a na lyze the communicative i nteractions i n natural contexts a nd plan a n interven ti o n. T h e a i m o f th e
pres ent s tudy is to describe educative practices of families a nd to discuss the use of this knowledge to p l an
effective family-centered interventions based on their routines. In the present study, we present resul ts o f
two s ca les: large EVALOF and brief s elf-applied EVALOF. We present a lso some results of the routines based
i nterview with four fa milies of five years old children. Th e g enera l res u l ts i ndi ca ted th e n eed o f th e
di s cussion with the families to help them to become aware of their competencies a s w el l a s to i mp rove
a s pects of i nteractions with their children to contribute to the communicative and linguistic de velopment.
Keywords: i nteraction; communication; language; routines; fa milies.

1 Introducción

Las prácticas de intervención centradas en la familia tienen un potente impacto sobre los resul tados
obtenidos por los niños puesto que las familias son las más interesadas y las que tienen mejores
condiciones para ayudar a sus hijos, dado que los conocen mejor que cualquier profesional, y además
pasan más tiempo con ellos (Espe-Sherwindt & Serrano, 2016).
Uno de los primeros aspectos que tienen que ser considerados cuando se planifica una interve nci ón
centrada en la familia es la manera de obtener los datos sobre las prácticas que se llevan a cabo
durante las rutinas de la familia, de qué manera los miembros de la familia interactúan, qué
preocupaciones o qué objetivos se plantean, y cuál es el punto de partida. Una de las he rrami e ntas
más utilizadas en las prácticas de intervención centradas en la familia es la entrevista basada e n l as
rutinas (McWilliam, 2016). Con la entrevista basada en rutinas, el profesional tiene una manera
práctica y operacional de construir con la familia una imagen muy clara de l os contextos rutinarios de
aprendizaje de los niños, las preocupaciones de las familias, los objetivos más importantes de
intervención para ellas, y las herramientas que las familias tienen para planificar y ayudar a sus hijos.

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El análisis de situaciones naturales de rutinas familiares puede contribuir a valorar las inte racci one s
comunicativas que ocurren en este contexto. La construcción de herramientas que permitan
cuantificar de una manera operacional las estrategias que las familias usan para enseñar l a lengua
oral a los niños es fundamental para la planificación de intervenciones centradas en la familia.
Con el objetivo de construir una herramienta flexible y ajustable a los contextos naturales que
permita medir de manera muy clara aspectos importantes de la enseñanza de la lengua oral en las
escuelas, Gràcia y colaboradores construyeron la Escala de Valoración de la Enseñanza de l a Le ngua
Oral en contexto Escolar (EVALOE) (Gràcia, Galván-Bovaira, Sánchez-Cano, Vilaseca, Vega, & Ri ve ro,
2015). La EVALOE ha sido utilizada para valorar la manera como los maestros enseñan la lengua oral
en las escuelas, y sus ítems han sido utilizados como base para procesos de asesoramiento, con el
objetivo de mejorar la enseñanza en los contextos naturales de actuación ( Gràcia, Vega, & Galván-
Bovaira, 2015).
Con el objetivo de valorar como las familias enseñan la lengua oral en sus contextos naturales hemos
llevado a cabo una adaptación de la escala EVALOE. La Escala de Valoración de la Enseñanza de la
Lengua Oral en contexto Familiar (EVALOF) está en proceso de validación. Se han elaborado dos
versiones de la EVALOF, una versión amplia con 32 ítems distribuidos en 2 subescalas (ge stión de l a
comunicación y funciones comunicativas y estrategias) y una versión breve autoaplicada, con 11
ítems en una única subescala que permiten a la familia valorar las actividades que promueven el
desarrollo de la lengua oral en sus rutinas diarias.
Teniendo en cuenta lo dicho en líneas anteriores, el objetivo del estudio que presentamos es valorar
las interacciones comunicativas y lingüísticas que forman parte de las rutinas de las familias con el fin
de planificar un asesoramiento. Concretamente nos proponemos describir las prácticas de las
familias y argumentar como este conocimiento puede contribuir a la planificación de intervenci ones
efectivas centradas en la familia en el marco de sus rutinas.

2 Metodología

Se trata de una investigación en la que se utiliza una metodología mixta. Para medir el desarrollo
lingüístico de los niños se ha utilizado una prueba estandarizada. Sin embargo, se han utilizado la
observación, la auto observación y relato como medidas cualitativas para analizar las i nte racci one s
comunicativas en contexto familiar.

2.1 Participantes

Han participado cuatro familias con al menos un hijo de cinco años que viven en el extrarradio de
una ciudad de 200.000 habitantes. Dos de los niños -José y Juan- son hermanos gemelos.

2.2 Instrumentos

Prueba de Lenguaje Oral Navarra (PLON) (Blázquez, Ayerra, Suso, Bidegain, Baquedano, 2004).
Prueba estandarizada para evaluar el lenguaje de los niños.
Guión para llevar a cabo una entrevista con las familias sobre las rutinas diarias. El guión está
elaborado en base a la Entrevista Basada en Rutinas (EBR) propuesta por McWilliam (2016).
EVALOF amplia. La versión EVALOF amplia está formada por 32 ítems distribuidos en dos subescalas:
1) Contexto y gestión de la comunicación (12 ítems); y 2) Funciones comunicativas y estrate gias (20
ítems). Cada uno de los ítems puede ser valorado por el observador con una puntuación de 0 a 4,
siendo 0 – No se puede observar (esta opción debe ser elegida si por alguna razón, la acción no
puede ser observada, por ejemplo, si la pregunta hace referencia a una interacción en red y solo

117
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estaban presentes dos personas la acción no puede ser observada); 1 - no se observa la acción; 2 - se
observa algunas veces; 3 - se observa sistemáticamente o casi siempre. Esta versión de la EVALOF se
completa a partir del visionado de un registro en vídeo de un episodio de una rutina natural de la
familia.
La tabla 1 presenta un ejemplo de un ítem de la subescala 1 (Contexto y gestión de la comunicaci ón)
y otro de la subescala 2 (Funciones comunicativas y estrategias). Para ayudar a los profesionales a
usar la escala se ha elaborado un glosario con la definición y ejemplos de todos los ítems.

Tabla 1. Ejemplo de un ítem de ca da una de las subescalas de l a EVALOF a mplia

CONTEXTO Y GESTIÓN DE LA COMUNICACIÓN


1. Dura nte la actividad observada, el adulto ajusta su posición y el mobiliario en función de l as ca racterísti ca s d e l a
a cti vi dad que s e realiza
0. La a cci ón no puede ser observa da.
1. La posición del adulto y el mobiliario no está a justada.
2. La posición del adulto y del mobiliario está a justada a lgunas veces o parcialmente.
3. La posición del adulto y del mobiliario está a justada.
FUNCIONES COMUNICATIVAS Y ESTRATEGIAS
1. El a dulto aprovecha l a actividad en curso para trabajar aspectos de la lengua oral
0. La a cci ón no puede ser observa da.
1. El a dulto no aprovecha las actividades en curso para tra bajar aspectos de l a lengua oral.
2. El a dulto aprovecha de ma nera parcial las actividades en curso para tra bajar aspectos de la lengua oral.
3. El a dulto aprovecha de ma nera sistemática las a ctividades en curso para tra bajar a spectos de la l engua oral .

EVALOF breve autoaplicada. Se trata una versión construida para conocer la manera como los
padres valoran las interacciones con sus hijos en casa. La versión breve autoaplicada de la EVALOF
está formada por 11 ítems que tienen como objetivo valorar algunos aspectos del ambiente físico
que pueden ayudar a la interacción comunicativa y tambié n algunas estrategias que utilizan los
padres para facilitar que puedan tener lugar las interacciones y su calidad (por ejemplo, si los padre s
valoran positivamente los intentos de hablar de los niños, si ajustan su lenguaje para facilitar la
comprensión del niño, entre otras). Cada uno de los ítems puede ser valorado por una persona de l a
familia utilizando el mismo continuo de 4 puntos utilizado en la escala EVALOF amplia.

Tabla 2. Ejemplos de ítems que forman parte de la versión breve autoaplicada de la EVALOF

Ítem 2. Los a dultos intentamos a provechar l as a ctividades rutinarias o crear otras activi da d es d i s ti nta s q u e
a yuden a los niños a comunicarse (por ejemplo, a provechamos momentos en l os que estamos prepa ra ndo l a
cena para hablar con los niños o les animamos a jugar).
Ítem 6. Los a dultos ajustamos / adaptamos nuestro lenguaje para facilitar la comunicación con l os ni ñ os ( po r
ejemplo, los a dultos utilizamos frases cortas y s encillas, contenidos adecuados pa ra l a eda d d e l os n i ños y
comprensibles para ellos).
Ítem 8. Los a dultos intentamos clarificar lo que el niño ha dicho o pedimos que repita algo que ha dicho p a ra
mejora r la comprensión.
Ítem 9. Los a dultos enseñamos a los niños a sintetizar o s acar conclusiones s obre a lgo que han dicho o s ob re
a l gún tema específico (por ejemplo, cuando miramos un cuento o cuando alguien ha explicado a lgo).

2.3 Procedimiento
Hemos seguido el orden siguiente en el uso de los instrumentos: 1) Prueba de Lenguaje Oral Navarra
(PLON); 2) Entrevista sobre las rutinas familiares; 3) EVALOF breve autoaplicada; 4) EVALOF ve rsi ón
amplia. La aplicación de la prueba PLON fue llevada a cabo por la segunda autora con cada uno de los

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cinco niños en la escuela. La duración aproximada de cada aplicación fue de 20 minutos y se regi stró
en audio. Posteriormente se realizó una entrevista con los padres sobre sus rutinas basada en la
propuesta por McWilliam (2016). La duración de la entrevista fue de entre 1 - 3:30 h., y se llevó a
cabo en la casa de la familia o en la escuela. Las familias eligieron el lugar en el que pensaban que le s
sería más cómodo. Algunas entrevistas las realizó una de las investigadoras y otras las dos
conjuntamente. En la entrevista se explicó a la familia que el objetivo era recoger informaciones
sobre las rutinas de la familia, especialmente aquellas que incluían actividades comunicativas, por l o
que se les pedía que describiesen un día completo normal (actividades que hacen, cuándo las hace n,
quienes, durante cuánto tiempo, dónde, el grado de satisfacción de los diferentes miembros de la
familia con las actividades…). Al final de la entrevista se proporcionó a las familias un documento con
la versión breve autoaplicada de la EVALOF y se acordó que cuando la hubiesen contestado la
enviarían por correo electrónico a las investigadoras. Una vez realizada la entrevista, en el transcurso
de una semana, se llevó a cabo una observación y registro en vídeo de unos minutos de i nte racci ón
comunicativa en el domicilio familiar, entre el padre y/o la madre y el niño, en el caso de los dos
gemelos, con los dos. Las interacciones fueron consideradas por los padres como un ejemplo
representativo de sus interacciones naturales.

2.4 Procedimiento de análisis de datos

La Prueba de Lenguaje Oral Navarra (PLON) ha sido analizada de acuerdo con l os parámetros que
recogidos en el Manual de Aplicación de la Prueba. Todas las aplicaciones han sido registradas en
audio, lo que ha permitido una revisión en casos de duda. Los registros en vídeo de la interacción
comunicativa en el domicilio familiar han sido valorados por la segunda autora y los ítems que han
presentado dudas han sido discutidos entre ambas autoras, así como los resultados generales
obtenidos con la aplicación de la EVALOF amplia y con las autoaplicaciones realizadas por las familias.
Las entrevistas han sido registradas en audio y las dos investigadoras han discutido y han
seleccionado conjuntamente los elementos principales, que se recogen en el resumen de los
principales aspectos relacionados con la interacción comunicativa en cada familia que se presenta en
el siguiente apartado.
3 Resultados y discusión
Los resultados obtenidos con la aplicación de la prueba PLON indican que todos los niños, con
excepción de Ana, necesitan mejorar en una o más de una de las dimensiones de la prue ba (forma ,
contenido o uso de la lengua oral) y en el total de la prueba. En las tablas 3 y 4 y 5 se presentan los
resultados obtenidos con los instrumentos descritos anteriormente (la EVALOF y la entrevista sobre
rutinas diarias).

Tabla 3. Res umen de l os resultados obtenidos con EVALOF amplia y con EVALOF breve a utoaplicada

EVALOF a utoaplicada EVALOF a mplia

Ana 28/33 78/93

Da niela 28/33 53 /93

Jos é y Jua n 31/33 58/93

Sa ndra 25/33 56/93

Tabla 4. Res umen de l os datos obtenidos a partir de la entrevista sobre rutinas

119
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Ana Daniela José Juan Sandra


Actividades Al gunas Des ayunan Leche en Leche en Bebe la leche
durante la veces juntos , se bi berón, bi berón, mi ra ndo la tele,
mañana des ayunan pei nan, s e mi ra ndo la mi ra ndo la s e peina
juntos , pero vi s ten tel e tel e
no s i empre
Actividades Ca s a de la Col egio Árabe 2 Juega n, Juega n, Ca s a de la abuela
durante la tarde a buela con veces a la meri endan, meri endan, a l gunas veces
pri ma s emana, otros ducha ducha (pri mos y
a l gunas día s parque y pri mas), inglés 1
veces , i nglés deberes en una vez a la
1 vez a l a ca s a s emana
s emana
Actividades Sa l en mucho, Va n de No s a len No s a len Sa l en mucho,
durante festivos vi s i tan a la compra s, mucho, mucho, visitan vi a ja n cuando
o fines de fa mi lia y a l gunos días vi s i tan el piso el piso del ti enen dinero,
semana a mi gos, cine, pa rque, hacen del a buelo y a buelo y vi s i tan la familia
bi blioteca deberes l os comen con el comen con el
domi ngos tío tío
Momentos en En el coche, Dura nte las Cua ndo Cua ndo Ca mi nando hacia
los que cua ndo comi das y ca mi nan ca mi nan zumba , en
acostumbran l l egan a casa, cua ndo hacen vol vi endo de vol vi endo de a l gunas comidas,
hablar en muchos deberes l a escuela (en l a escuela (en l a niña habla
momentos general van general van en todo ti empo
en coche) coche)
Actividades Ba i lar, Pa rque, salir en Acti vi dades Acti vi dades Ma nualidades,
preferidas de los di bujar, mirar coche movi das movi das di bujos
niños cuentos (pel ota, (pel ota,
pa ti nes…) pa ti nes…)

¿Miran cuentos Sí, por l a s Sí, mi entra s No No Sí, a ntes de i r a


juntos? noches ha cen deberes dormi r

Los resultados obtenidos con la aplicación de las dos ve rsiones de la escala EVALOF (amplia y
autoaplicada) ponen de manifiesto algunas características interesantes de las actividades. En la
versión autoaplicada, tres de las cuatro familias han obtenido puntuaciones altas, señalando
dificultades solo respecto a los ítems relacionados con hacer síntesis (ítem 9) y con la estrategi a de
enseñar los niños a autovalorar sus habilidades comunicativas (ítem 11). Sin embargo, de acue rdo
con la valoración de la observadora (EVALOF amplia), casi todas las familias obtienen un 62% e n l a
prueba, con la excepción de la familia de Ana, lo que puede ser un indicativo de que existen
bastantes aspectos a mejorar en la calidad de las interacciones comunicativas en el contexto
familiar. En los resultados presentados en la Tabla 4 se pone de relieve que las familias no
aprovechan muchas de las actividades de sus rutinas diarias para hablar con los niños. Por ejemplo,
en las comidas, solo la familia de Daniela aprovecha para estar juntos y hablar. Las actividade s más
elegidas por las familias para hablar son las que implican un traslado, por ejemplo, de casa a la
escuela o viceversa. Tres de las cuatro familias acostumbran mirar cuentos con los niños y esta
actividad forma parte de su rutina, aunque el horario y la manera como lo hacen probablemente no
son los más adecuados si se pretende aprovechar la potencialidad que tiene esta actividad para
desarrollar las habilidades comunicativas y lingüísticas (Gràcia, 2003). Todo lo anterior indica que
existen rutinas familiares, que se repiten de manera similar cada día de la semana, y también otras
durante los fines de semana, lo cual es un elemento importante, puesto que es en estas rutinas
donde será posible ayudar a los padres a ser conscientes de que son momentos privilegiados para
ayudar a sus hijos a desarrollar la competencia lingüística, conversando sobre lo que están

120
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

haciendo (Espe-Sherwindt & Serrano, 2016), lo cual no significa que no puedan crearse otros
momentos específicos dedicados a hablar

4 Conclusiones
En este trabajo hemos presentado resultados del uso de dos instrumentos, EVALOF versión ampl i a
y EVALOF breve autoaplicada, construidos en base a la escala EVALOE (Gràcia, coord., 2015) y de
una entrevista basada en rutinas (McWilliam, 2016), con el objetivo de conocer y describir las
características de las actividades que las familias llevan a cabo durante las rutinas diarias que
promueven el desarrollo de la comunicación y el lenguaje e identificar aspectos mejorables. El
conocimiento y valoración de este tipo de actividades e intercambios comunicativos es decisivo
para la planificación de intervenciones centradas en la familia. La evaluación del lenguaje de los
niños participantes en este estudio a través de la prueba PLON (Blazquez et al., 2004) pone de
manifiesto que casi todos necesitaban mejorar su desarrollo lingüístico. Al mismo tiempo, las
entrevistas con los padres sobre las rutinas diarias indican que pueden aprovechar mejor las rutinas
diarias para hablar con sus hijos. Desde nuestro punto de vista estos primeros resultados se ñal an
que puede ser útil reflexionar conjuntamente con las familias con el fin de ayudarles a detectar
aspectos mejorables de las interacciones con sus hijos. Además, la entrevista nos ha permitido
apreciar una diversidad importante en las rutinas, aun cuando se trata de pocas familias, con ni ños
de la misma edad y de la misma escuela. Desde un modelo de intervención centrado en las
prácticas familiares (Dunst & Trivette, 2011) entendemos que es importante partir de las rutinas de
cada familia y conocer su percepción de las actividades que realizan conjuntamente para pode rl as
contrastar con nuestra valoración como profesionales, con el fin de poder diseñar conjuntame nte
una intervención. Esta incluirá la propuesta de cambios que se puedan ir introduciendo en las
rutinas y que se mantengan, con el objetivo último de mejorar el nivel de desarrollo lingüísti co de
los niños.

Referências
Blázquez, A. F., Ayerra, G. A., Suso, M. L. L., Bidegain, N. U., & Baquedano, P. O. (2004). Prueba de
Lenguaje Oral Navarra (PLON). Gobierno de Navarra. Departamento de Educación y Cultura.
Dunst, J. C. & Trivette, C. M. (2009). Capacity-Building Damily-Systems Intervention practices. Journal
of Family Social Work, 12(2), 119-143.
Espe-Sherwindt, M. & Serrano, A. M. (2016). It takes two: The role of famiy -centered practices.
Revista de Logopedia, Foniatría y Audiologia, 36, 162-169.
Gràcia, M. (2003). Comunicación y lenguaje en primeras edades. Intervención con familias. Lleida:
Milenio.
Gràcia, M. (coord.), Galván-Bovaira, M. J., Sánchez-Cano, M., Vilaseca, R., Vega, F., & Rivero, M.
(2015). Evaluación de la enseñanza de la lengua oral. Escala EVALOE. Barcelona: Graó.
Gràcia, M., Vega, F., & Galván-Bovaira, M. J. (2015). Developing and testing EVALOE: a tool for
assessing spoken language teaching and learning in the classroom. Child Language Teaching
and Therapy, 31 (3), 287-304.
McWilliam, R. A. (2016). The Routines-Based Model for supporting speech and language. Revista de
Logopedia, Foniatría y Audiología, 36, 178-184.

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El Acompañamiento Pedagógico en las Escuelas Primarias de la República


Dominicana: Estudio en 16 Distritos Educativos

Utate García, Jairo1


1
Facultad de Ciencias, Universidad Adventista Dominicana. jairoutate@unad.edu.do

Resumen: El estudio tuvo como objetivo describir el proceso de Acompañamiento Pedagógico realizado en
las escuelas primarias en 16 Distritos Educativos de la República Dominicana. Los datos se obtuvieron a
través de entrevistas, el uso de una ficha de análisis de documentos y la observación. Estuvieron envueltas
36 escuelas en distintos contextos sociales, económicos y culturales, y se contactaron 49 participantes de
los que componen el equipo de gestión de los Centros Educativos y 8 maestros acompañados. A modo de
conclusiones se consideró que el proceso de acompañamiento pedagógico en las escuelas estudiadas se
realiza con cierto apego al plan diseñado por el Ministerio de Educación de la República Dominicana, sin
embargo, los actores no siempre tienen claros los elementos que implica este proceso, sobre todo una
concepción que lo diferencie de la supervisión tradicional.
Palabras clave: Acompañamiento Pedagógico; Educación Dominicana; Educación Primaria; Calidad
Educativa.

Pedagogical Accompaniment in Primary Schools in the Dominican Republic: Study in 16 Educational


Districts
Abstract. With this study it was proposed to describe the process of Pedagogical Accompaniment carried
out in elementary schools in 16 Educational Districts of the Dominican Republic. Data were obtained
through interviews, a document analysis tab and observation. Thirty-six schools were involved from
different social, economic and cultural contexts, and 49 participants from the management team of the
Educational Centers and 8 accompanied teachers were contacted. As a conclusion, it was considered that
the process of pedagogical accompaniment in the schools studied is carried out with certain adherence to
the program designed by the Ministry of Education of the Dominican Republic, however, the actors are not
always clear of the elements involved in this process, specially a conception that differentiates it from
traditional supervision.
Keywords: Pedagogical Accompaniment; Dominican Education; Elementary Education, Educational Quality.

1 Introducción

El sistema educativo en la República Dominicana se ha visto afectado negativamente por diferentes


elementos a lo largo de su historia (Morrison, 1991). Los esfuerzos serios por mejorar datan del 1992,
año que marca el inicio de una serie de transformaciones en su sistema educativo, comenzando con
el Plan Decenal de Educación 1992-2002. Otros intentos han seguido con resultados evidentes, pero
también con grandes problemáticas aun por resolver. En diciembre del 2016, la Organización para la
Cooperación y el Desarrollo Económico (OCDE) publica los resultados de la Prueba PISA 2015, donde
72 países, incluyendo la República Dominicana fueron evaluados en ciencias, lectura y matemáticas.
Según los resultados obtenidos, se puede inferir que el sistema educativo dominicano enfrenta
grandes desafíos.
Siendo más específicos, a partir del año 2008, en busca de transformar la educación, muchos
aspectos se han enfocado hacia la mejora, y en particular, la práctica de supervisión educativa se ha
ido transformando con miras a apoyar y garantizar un mejor nivel de calidad educativa. Esta
transformación está sustentada en los siguientes planes de reformas:

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

a. Plan Estratégico de Desarrollo de la Educación Dominicana 2003-2012.


b. Plan Decenal de la Educación 2008-2018.
c. Estrategia Nacional de Desarrollo y el actual Modelo de Gestión de la Calidad para los
Centros Educativos.

Desde estos planes se asume un “nuevo perfil del supervisor, basado en el conocimiento, las
competencias, sentido ético, formación en valores y experiencia” (MINERD, 2014, p. 11).
En tal sentido, el Ministerio de Educación de la República Dominicana (MINERD) ha diseñado y
puesto en marcha un programa de Acompañamiento Pedagógico con la finalidad de elevar la calidad
educativa desde la figura del maestro que ya está en las aulas. El proyecto se concibe con incidencia
en aspectos pedagógicos y del sistema, orientado a la mejora cualitativa de “las capacidades, las
actitudes, las competencias profesionales y la calidad como ser humano de todos los actores”.
Enfocado intencionalmente hacia el “fortalecimiento de la calidad del sistema educativo para
asegurar aprendizajes con significados en los estudiantes y en todos los sujetos involucrados en el
proceso educativo” (MINERD, 2013, p.1).
Los propósitos que orientan el sistema de acompañamiento de los niveles del Sistema Educativo
Dominicano, son (MINERD, 2013, p.1):

• Fortalecer la calidad de la educación del Sistema Educativo Dominicano.


• Propiciar experiencias educativas y aprendizajes innovadores, especialmente en los
estudiantes y en los demás actores del sistema.
• Fortalecer las competencias profesionales y el compromiso ético de los profesores, técnicos
distritales y regionales, así de los coordinadores pedagógicos y equipos de gestión de los
centros educativos.
• Potenciar en los niveles educativos, el desarrollo de culturas personales, colectivas e
institucionales, comprometidas con procesos educativos transformadores e inclusivos.
Dentro del proceso de Acompañamiento, el cambio en la perspectiva pedagógica del docente se
considera prioritario. El maestro debe ser guiado hacia enfoques e inducido a acciones, desde los
cuales pueda analizar, comprender y reencausar su práctica educativa y su crecimiento profesional
(Martínez Diloné y González Pons, 2010). Si consideramos la preponderancia del trabajo docente,
inferimos naturalmente que este cambio se reflejará en otras aristas de los procesos de enseñanza y
de aprendizaje, dando como resultado el incremento de la calidad educativa.
FONDEP (2008) define el acompañamiento como un “sistema y un servicio destinado a ofrecer
asesoría planificada, continua, contextualizada, interactiva y respetuosa del saber adquirido por
docentes y directores, orientado a la mejora de la calidad de los aprendizajes de los estudiantes, del
desempeño docente y de la gestión de la escuela” (p.3). Por su parte, el MINERD (2015) considera el
acompañamiento como la tarea de “asistir, observar, describir y dialogar sobre procesos para el
desarrollo de la práctica del acompañado; es la asesoría técnica continua mediante el desarrollo de
diversas estrategias y acciones que se ofrece a los equipos directivos y docentes” (p. 16). De igual
manera, el sistema de acompañamiento pedagógico se considera como el proceso para situar
significativamente las habilidades que poseemos como sujetos pensantes y así fortalecer la calidad
educativa, para poder asegurar aprendizajes significativos en nuestros estudiantes (MINERD, 2013).
Este estudio tiene como objetivo general describir el proceso de Acompañamiento Pedagógico
realizado en las escuelas primarias de los Distritos Educativos que participan en la investigación. De
este modo, se considera pertinente, pues, podría servir de elemento informativo y documental al
Ministerio de Educación para la toma de decisiones; a las universidades para orientar la formación de

123
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docentes; a los Distritos Educativos para implementación de políticas; a los diferentes actores en los
Centros Educativos para optimizar su gestión; y al docente mismo en su práctica diaria.

2 Metodología

El presente es un estudio cualitativo descriptivo. Como cualitativo, buscó comprender el punto de


vista de los participantes, profundizar en sus vivencias, sus puntos de vista, opiniones y significados,
en torno al proceso de Acompañamiento Pedagógico; como descriptivo, se enfocó en obtener
información sobre los tópicos que están involucrados en el proceso estudiado (Hernández Sampieri,
Fernández Collado y Baptista Lucio, 2014). Partimos de dos contextos: Uno al que llamamos
contexto inmediato, el cual se refiere a las características de sus actores y los medios físicos donde
ellos se desenvuelven. Con el segundo, el contexto educativo dominicano, nos referimos a la
situación del Sistema Educativo Dominicano y los grandes desafíos en el tema de la calidad educativa.

2.1 Contexto Inmediato

Participaron 36 escuelas que imparten educación en el Nivel Primario distribuidas en 16 Distritos


Educativos, en 8 provincias de las regiones Norte, Nordeste y Norcentral, además de dos escuelas de
Santo Domingo, República Dominicana. Estos centros educativos están ubicados en zonas rurales
(19) y urbanas (17) y van desde escuelas grandes (950 estudiantes) hasta consideradas pequeñas (78
alumnos). La cantidad de maestros en estos Centros va desde tres hasta 32, lo que nos muestra la
diversidad de escuelas por su tamaño.
En cuanto a su financiamiento, la mayoría fueron escuelas públicas (33) habiendo sólo 2 dentro de la
clasificación privada y una semioficial. Los recursos disponibles para la enseñanza en las escuelas
participantes fueron muy variados y la infraestructura de las edificaciones en su mayoría es buena. La
escuelas imparten los dos ciclos del Nivel Primario: Primer Ciclo (1 a 3) y Segundo Ciclo (4 a 6). En 20
de las escuelas participantes laboran con Jornada Escolar Extendida (8 horas por día), el resto tiene
modalidad regular con sólo 4.5 horas aproximadas de docencia.
El nivel económico de las comunidades a las que pertenecen más de la mitad de los Centros es bajo y
muy bajo. En por lo menos la mitad de dichas comunidades, se reportan gran cantidad de familias
disfuncionales, hogares matriarcales, problemas de violencia doméstica, madres menores de edad,
niños y jóvenes dedicados al trabajo, y problemas de vicios, drogadicción y otros flagelos sociales.

2.2 Contexto Educativo Dominicano

Otro aspecto que enmarca este estudio es la realidad educativa de la República Dominicana, que a su
vez está dentro del contexto latinoamericano. El país tiene un sistema que, entre otros aspectos,
adolece de buenas prácticas que lleven al alumno al logro de aprendizajes para la vida. En tal sentido,
Utate García (2016) investigó la práctica metodológica de los maestros de ciencias del Nivel
Secundario en la Provincia Monseñor Nouel, llegando a la conclusión de que los docentes de esta
área utilizan metodologías tradicionales que no se corresponden con el trabajo científico, aunque
dicen conocerlas. Esto se refleja en un nivel de motivación, manejo de contenidos y cultura bajos,
similar a lo encontrado en otros estudios que describen un nivel de calidad bajo (TERCE, 2014; OCDE,
2016).

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2.3 Participantes

Las 36 escuelas en las que se realizó la investigación, están distribuidas en 8 provincias de la


República Dominicana. Fueron contactados 49 individuos del equipo de gestión que realiza el
acompañamiento en dichos Centros. Un segundo grupo fueron 8 maestros que su acompañamiento
coincidió con el periodo de tiempo dedicado a la recolección de datos.
Los equipos de acompañamiento comprenden el director, el subdirector, el coordinador docente, y
en muy pocas ocasiones se reporta la intervención de algún técnico distrital. En otras escuelas se
combinan más de una de las posiciones mencionadas.

2.4 Instrumentos

Como instrumentos para la recolección de datos fueron utilizados: la Entrevista, la Ficha de Análisis
de Documentos y la Observación no participante. Estos instrumentos fueron útiles para acceder a la
información desde ángulos diferentes, lo que también permitió obtener datos que fueron
triangulados en el análisis de los mismos.

2.5 Análisis de los Datos

Los resultados obtenidos con los instrumentos de investigación se transcribieron para luego ser
procesados utilizando el software para análisis de datos cualitativos Atlas.ti 7.1.7, haciendo inducción
con los resultados que emergieron en el proceso, según el método de la Teoría Fundamentada.

3 Resultados y Discusión

Partiendo del objetivo general se propusieron preguntas de investigación que apuntaron hacia 9
aspectos del proceso de acompañamiento pedagógico: la organización, los instrumentos, las
condiciones, las estrategias, las competencias del equipo de acompañamiento, aspectos que pueden
entorpecer, la actitud de los acompañados, el uso que hacen los centros con los resultados del
acompañamiento y si los maestros cumplen con los acuerdos y compromisos.
Durante el proceso de recolección de datos se llevaron a cabo 53 entrevistas a actores del proceso
(acompañantes y acompañados), 8 observaciones a procesos de acompañamientos y se completaron
29 fichas de análisis de documentos.
A continuación presentamos cada pregunta de investigación propuesta, seguida de los datos
obtenidos a través de los instrumentos mencionados. En caso de ser citadas unidades de análisis,
éstas aparecen identificadas con una clave que indica el tipo de instrumento, el autor, la fuente y el
número asignado por el Atlas.ti:

3.1 Organización: ¿Cómo está organizado el proceso de Acompañamiento Pedagógico en las escuelas
objeto de estudio?
Según los datos obtenidos el proceso de acompañamiento pedagógico en los centros educativos
estudiados se organiza partiendo de las necesidades que son detectadas, con los que se elabora un
cronograma. Este puede contemplar frecuencia, desde una vez cada dos semanas, hasta 3 o cuatro
veces por año académico. Esto depende del criterio del equipo de gestión y de las necesidades del
maestro acompañado. El proceso lo organiza, generalmente, el equipo de gestión del centro. En
cuanto a quién realiza el acompañamiento, depende mucho del tamaño del Centro. En escuelas

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grandes se encontraron equipos de acompañamiento compuesto por el director, el coordinador


docente, a veces el subdirector y hasta algún técnico distrital.
A juzgar por los resultados obtenidos para esta pregunta, el proceso se planifica, en la mayoría de los
casos, siguiendo una estructura que corresponde con los lineamientos del MINERD en relación a los
aspectos organizativos. Sin embargo nos surge la interrogante: ¿Cuál es la visión del acompañante
sobre lo que es Acompañamiento Pedagógico, a la luz de las corrientes pedagógicas
contemporáneas?
3.2 Instrumentos Utilizados en el Proceso: ¿Cuán apropiados son los instrumentos utilizados
apropiados para la realización del proceso?
Según los documentos analizados existen evidencias, en la mayoría de los casos, de fichas de registro
de acompañamiento. La siguiente unidad de análisis lo ilustra: “los instrumentos que existen para el
acompañamiento son los del sistema de acompañamiento emanado por la Dirección General de
Educación Primaria [del MINERD], otro instrumento que está presente es el que utiliza el SAS [el
Sistema de Acompañamiento y Supervisión] y existe uno que es elaborado por la acompañante y la
directora” (FODM 3:49).
Cabe reflexionar que el uso de los instrumentos y herramientas mencionados no garantiza por sí solo
unos resultados que apunten a la calidad educativa. Se necesita un recurso humano con unas
competencias que le permitan la buena implementación de procesos educativos innovadores, según
las teorías pedagógicas actuales y que pueda hacer uso óptimo de dichos instrumentos.

3.3 Condiciones en que se Desarrolla el Proceso de Acompañamiento: ¿En qué condiciones se


desarrolla el proceso de Acompañamiento Pedagógico?
De un entrevistado extrajimos la siguiente unidad de análisis: “los acompañamientos de nuestro
centro educativo son realizados en un ambiente armónico, de ayuda y cooperación” (FOECD 3:134).
Otro expresó que en su Centro el acompañamiento “se desarrolla haciendo uso de estrategias
flexibles que faciliten la cercanía con el docente y el director” (FOECTD 3:136). Según los datos
recabados, el equipo de gestión considera que el proceso de acompañamiento se desarrolla con las
mejores condiciones.
El MINERD sugiere que el equipo de gestión debe garantizar el apoyo suficiente para que los
docentes lleven a cabo su labor diaria con eficiencia, al tiempo que fomentan políticas de formación
continua que encaucen al docente en metodologías y prácticas que apunten hacia la calidad. Este
debe ser un proceso respetuoso y continuo, evitando la fiscalización.

3.4 Las Estrategias Metodológicas: ¿Cuál es el grado de pertinencia de las estrategias metodológicas
aplicadas en el proceso de Acompañamiento Pedagógico?
En la mayoría de los casos se sigue el siguiente método:
• El acompañante observa el proceso.
• Realiza anotaciones usando las fichas dispuestas por el MINERD u otro registro.
• Discute con el maestro los puntos de interés.
• Se establecen acuerdos y compromisos.
• Se firma el registro de acompañamiento.

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Gran parte de los actores dicen que las estrategias utilizadas son adecuadas y que el
acompañamiento, como lo están realizando, contribuye a gestar un mejor proceso pedagógico. Estos
resultados nos llevan a reflexionar y preguntarnos sobre cuál sería la preconcepción de los diferentes
sujetos participantes en esta investigación sobre los procesos pedagógicos, si nos miramos dentro
del contexto de calidad educativa que exhibe el sistema educativo dominicano.
3.5 Competencias de los Acompañantes: ¿Cuáles competencias posee el acompañante que le
permitan ser efectivo?
Al realizar el análisis de los resultados obtenidos para este objetivo relativo a las competencias del
recurso acompañante, partimos de la premisa que el MINERD ofrece con cierta frecuencia el
entrenamiento para llevar a cabo el acompañamiento a través de Talleres y Seminarios. Es sin
embargo relevante analizar tanto el nivel académico de los participantes como su área de formación,
pensando en la responsabilidad que conlleva la función de un acompañante.
Según los datos obtenidos, el 51 % de los acompañantes tienen nivel de licenciatura. El área del
mayor porcentaje de los licenciados es la Educación Básica (57.14%). Alrededor del 40% de los
acompañantes tienen formación inicial en áreas ajenas al Nivel Primario. En tal sentido,
consideramos muy bajo o inadecuado el nivel académico de la mayoría de los acompañantes
(licenciatura). Es además significativo el caso para las titulaciones de especialidad donde, además de
que apenas representan el 30.61% de los participantes, sólo el 13.4% posee especialidad en algún
área específica de enseñanza en la educación primaria. Igualmente relevante es la situación para el
nivel de maestría, donde los mayores porcentajes son para el título en Gestión de Centros, sin
registrarse ningún acompañante con titulación en áreas específicas de enseñanza de la educación
primaria.

3.6 Aspectos que Puedan Entorpecer el Acompañamiento Pedagógico: ¿Cuáles aspectos entorpecen
el proceso de Acompañamiento Pedagógico en las escuelas estudiadas?
Con esto nos acercamos bastante a la “operatividad” del acompañamiento. El aspecto que más
resaltó fue la negativa de los maestros al proceso de acompañamiento. Un participante expresa “la
negativa de algunos maestros que aun conociendo el cronograma se muestran predispuestos a la
hora de ser acompañados” (EAHC 2:31). Otro aspecto identificado como entorpecedor del proceso
fue la interferencia de reuniones “de organismos superiores relacionados con el sector magisterial”
(EFJC 2:264). Los participantes dicen que son con “frecuencia” y “rompe la programación” (ERFC
2:400), por lo que interfieren con las sesiones de acompañamiento.
En tercer lugar, los participantes señalan que los responsables de realizar el acompañamiento tienen
múltiples responsabilidades. Un entrevistado expresó “otro aspecto que afecta negativamente es la
carga [de trabajo] en los Centros: el trabajo, reuniones, ejecuciones de proyectos y programas,
entonces nos ocupan mucho y nos hacen descuidar un poco el acompañamiento pedagógico” (EYOO
2:433).
Otro elemento entorpecedor relevante mencionado fue la falta de organización del proceso. Los
participantes lo expresaron así: “falta de programación eficaz del MINERD… falta de coordinación del
personal distrital” (EDRP 2:138); “poca organización y planificación a todos los niveles” (EDRDO
2:143). Estas respuestas contrastan con las obtenidas para la primera pregunta de investigación,
relativa a la organización del proceso.
Los participantes también expresaron su percepción sobre la falta de competencia del acompañante.
En este sentido se refirieron a diferentes estratos que intervienen en el acompañamiento. Una
unidad de análisis expresa “que el coordinador o coordinadora no tenga las competencias y el perfil
que demanda para realizar acompañamiento pedagógicos a docentes” (EYOO 2:433). En el mismo

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orden otro entrevistado señaló “falta de competencia de los técnicos para asesorar al equipo de
gestión en la realización del acompañamiento pedagógico. El poco seguimiento del Distrito al Centro
para ayudar a mejorar las debilidades existentes” (EYPO 2:440).
El aspecto anterior fue corroborado por los datos obtenidos en las observaciones. Un participante lo
expresó así: “el acompañante se distrajo desde el principio hasta el final… no hubo un llenado de
fichas…” (ROYP 4:189). Otra unidad de análisis dice “la acompañante no posee titulación en Gestión
Educativa o cursos de capacitación en materia de acompañamiento docente, se pudo notar que
interrumpió el proceso docente en dos ocasiones para pedirle documentación a la maestra…” (ROJR
4:95).
Estos resultados fueron aportados tanto por los acompañantes como por los maestros acompañados.
Sin duda los elementos que pueden interferir el acompañamiento deben ser considerados de manera
prioritaria. Este aspecto está estrechamente relacionado con las actitudes de los acompañados y
ambas pueden incidir grandemente en el buen desarrollo de cualquier proyecto. De los datos
presentados, llama la atención la resistencia del docente a ser acompañado, y esto nos conduce a
preguntarnos cuáles razones llevan al acompañado a mostrar dicha actitud. Si relacionamos este
dato con otros obtenidos en esta investigación, como la percepción de falta de competencias del
acompañante, podríamos inferir que lo encontrado en este estudio se acerca más a supervisión que a
acompañamiento.

3.7 Actitud del Docente Acompañado: ¿Cuál es la actitud del docente ante el proceso de
acompañamiento?
Según los datos recogidos para este estudio, los participantes presentan situaciones encontradas. Es
relevante que en las entrevistas realizadas, los acompañantes consideran que “el acompañamiento
personal crea entre el acompañado y el acompañante una relación de sinceridad” (EDMD 2:80).
Contrariamente, tanto los acompañantes como los maestros acompañados, también expresaron
actitudes negativas hacia el proceso de acompañamiento. Algunas unidades de análisis nos ilustran lo
dicho: “pero la docente acompañada reflejaba una actitud de indisposición para ser acompañada”
(RODoL 4:36); “algunos docentes se resisten al tener que firmar los acuerdos y compromisos” (EECCP
2:226).
Creemos que para superar las dificultades que revela esta pregunta de investigación, se debe
propiciar una comunicación abierta y flexible, que lleve hacia la reflexión y que se traduzca en
acciones concretas. Sin lugar a dudas, debería este ser punto de agenda en los equipos de gestión,
tanto de las escuelas como de los Distritos Educativos.

3.8 Uso de los Resultados del Acompañamiento: ¿Cuáles medidas aplican los centros educativos
para mejorar las debilidades que se detectan en el proceso?
Con esto nos referimos a las acciones que se aplican en los centros educativos para mejorar las
debilidades que se detectan en el proceso de Acompañamiento Pedagógico. Según los datos, los
acompañantes proponen acciones como las que muestran las siguientes unidades de análisis: “se
anotan las observaciones del acompañamiento, se establecen acuerdos para mejorar esas
observaciones y ponen fechas para otro encuentro” (EDLD 2:168); se llevan a cabo “firmas de
acuerdos y compromisos” (EECD 2:333); se realiza “supervisión para garantizar el cumplimiento de los
acuerdos (EJRCSC 3:365); “se reflexiona sobre la práctica” (EJRCSC 3:346 ). Paralelo a esto, con los
datos recogidos con las observaciones se percibe que el acompañante observa la clase, hace
anotaciones para llenar una ficha y conversar con el acompañado al final la clase.

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Esto nos lleva a comparar lo que se está haciendo con un proceso de supervisión en lugar de
acompañamiento. A esta altura nos preguntamos si existirán estrategias para que el acompañante se
integre junto al acompañado a un proceso dinámico en el aula, proceso que permita ir caminando
juntos (acompañando) a medida que se van resolviendo situaciones, ilustrando métodos,
reflexionando sobre la práctica y transformando la acción docente, en fin, transformando la práctica
del maestro desde la misma acción.

3.9 Cumplen los Acompañados con Acuerdos y Compromisos: ¿En qué medida cumplen los
acompañados con los acuerdos y compromisos que contraen como fruto del proceso de
Acompañamiento Pedagógico?
Los datos obtenidos nos permiten apreciar que en gran parte de los casos se registran acuerdos que
pueden ser retomados en una próxima jornada de acompañamiento, sin embargo fueron también
considerables los casos donde no se da el seguimiento al acuerdo tomado. Las siguientes unidades de
análisis ilustran lo dicho: “casi siempre, debido a que se le da un seguimiento a esos acuerdos y se
procura el fiel cumplimiento para la mejora de los procesos” (FOECCP 3:161); otro sujeto bosquejó
este procedimiento en: “los acuerdos y compromisos se evidencian en el cuaderno de la docente y de
la coordinadora, también en el registro de grado de cada docente” (FODM 3:58). Por otro lado, otro
participante expresó que los acompañados cumplen los acuerdos “a veces, porque si quedamos en
algún acuerdo me he dado cuenta que solo lo cumplen cuando voy a acompañarlo, porque de lo
contrario no lo hacen” (FODiL 3:601).

5 Conclusiones

Las conclusiones generales a las que llega el estudio son las siguientes:
• El proceso de acompañamiento pedagógico en las escuelas estudiadas se realiza con cierto
apego a los lineamientos del Ministerio de Educación de la República Dominicana (MINERD)
en lo que atañe a su organización.
• Los actores del proceso no siempre tienen claros los elementos que implica el
acompañamiento pedagógico, sobre todo una percepción que lo diferencie de la supervisión.
• Entre los elementos que pueden entorpecer el acompañamiento y que fueron considerados
como los más importantes están, las actitudes negativas del acompañado, las múltiples
ocupaciones del equipo de acompañamiento lo que le resta espacio y dedicación, y la
preparación académica de los que llevan a cabo el proceso.
• Los resultados del proceso de acompañamiento pedagógico no siempre son utilizados para
elaboración de planes de mejora de la calidad educativa en los distritos estudiados.
Como estudio cualitativo reconocemos que las conclusiones presentadas no pueden generalizarse a
realidades en otros contextos, sin embargo consideramos que se acercan a lo que sucede en los
centros participantes. Dichas conclusiones podrán servir de posibles hipótesis de trabajo para
estudios futuros.
En tal sentido, sugerimos posibles acciones que pueden llevarse a cabo tomando en cuenta los
resultados de este estudio:

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Al MINERD:

• Llevar a cabo un programa de avalúo del sistema de acompañamiento pedagógico que se


está desplegando en la República Dominicana.
A los Distritos Educativos:
• Gestionar recursos humanos que pueden dedicarse, previo entrenamiento tanto en
acompañamiento como en pedagogía innovadora, con mayor dedicación al acompañamiento
pedagógico.
• Capacitar el personal que realiza el acompañamiento en asuntos actitudinales y pedagógicos
innovadores.
A los Centros Educativos:
• Realizar avalúo del proceso de acompañamiento pedagógico.
• Desplegar campañas de concienciación sobre lo que es el Acompañamiento Pedagógico con
la finalidad, entre otras, de que el maestro desarrolle una actitud positiva hacia el proceso.

Referências

Fondep. (2008). Guía para el Acompañamiento Pedagógico en las Regiones. Lima: Fondep.

Hernández Sampieri, R., Fernández Collado, C. y Baptista Lucio, M. (2014). Metodología de la


investigación, (6ª ed.). México: McGraw-Hill.

Martínez Diloné, H. A. y González Pons, S. (2010). Acompañamiento pedagógico y profesionalización


docente: sentido y perspectiva. Ciencia y sociedad, XXXV(3), 521-541.

Minerd. (2013). Sistema de acompañamiento a la práctica educativa para una educación


transformadora. Santo Domingo: Minerd.

Minerd. (2014). Manual de supervisión educativa. Santo Domingo: Minerd.

Minerd. (2015). Sistema Nacional de Supervisión Educativa (SNSE). Santo Domingo: Minerd.

Morrison, R. (1991). Historia de la educación en la República Dominicana. Santo Domingo: Taller.

Utate García, J. (2017). La práctica metodológica del profesorado de Ciencias Naturales del Nivel
Secundario: un estudio en una provincia de la República Dominicana. En A. Díaz-Valladares
(Coord.) Oportunidades para la investigación e innovación, CIDIA 2016, 224-229. Nuevo León:
Universidad de Montemorelos.

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Investigação Qualitativa: desafios para a avaliação de políticas de formação


de professores
Maria Inês Bomfim1, Valéria Morgana Goulart2, Sonia Rummert3

1Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense- UFF, Brasil. mib@globo.com


2Vice-Presidência de Ensino, Informação e Comunicação da Fundação Oswaldo Cruz-FIOCRUZ, Brasil.
valeria.morgana@fiotec.fiocruz.br
3Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense-UFF, Brasil.

rummert@uol.com.br

Resumo. O presente trabalho volta-se à reflexão sobre desafios da investigação no campo das políticas
públicas, particularmente com o uso de metodologias qualitativas. Problematiza, no atual contexto, as
possibilidades de ruptura com a cultura gerencialista hegemônica, que promove rigidez metodológica, por
meio de indicadores mensuráveis e comparáveis. Apresenta uma proposta alternativa de investigação
qualitativa, na qual indicadores, numa perspectiva crítica, buscam responder à complexidade do objeto a ser
avaliado. Indica, finalmente, desafios teórico-metodológicos à construção de investigações qualitativas em
bases sólidas.
Palavras-chave: Avaliação de Políticas Públicas; Investigação Qualitativa; Metodologias Mistas.

Qualitative Research: the challenge of evaluate polices on professors training system


Abstract. The present paperwork is a reflection about government policies and its challenges, particularly by
using qualitative research methods. It discuss, in the actual context, the possibility of escape the hegemonic
managerial culture that promotes a methodological stiff drive, by using measurable and comparable
indicators. Furthermore, it comes with an alternative proposal in qualitative investigation, in which indicators,
in a critical perspective, seek to answer the researched object's complexity. Finally, it indicates a theoretical-
methodological challenge to build qualitative investigations on solid bases.
Keywords: Government Polices Evaluation; Qualitative Research; Mixed Methodologies.

1 Introdução

De forma ampla, considera-se que avaliar é ação própria dos seres humanos, condição fundamental
para compreender, aperfeiçoar e orientar ações pensadas e realizadas. No caso específico da avaliação
de políticas sociais, uma proposta de avaliação envolve questões teóricas, metodológicas e políticas e
está voltada para a realidade, no sentido de vê-la com clareza, profundidade e abrangência, por meio
de processo sistemático (Belloni, 2001; Saul, 1997), enraizado social e historicamente.
Os estudos de House (1992) e, posteriormente, os de Afonso (2009), mostram que tanto as bases
estruturais como os pilares conceituais da avaliação sofreram mudanças importantes nas últimas
décadas. Essas mudanças estão atreladas às transformações estruturais ocorridas no plano global,
conferindo à avaliação uma natureza política, ou seja: a avaliação é afetada por forças políticas e, ao
mesmo tempo, é capaz de promover efeitos políticos.
Especificamente no Brasil, no contexto da Reforma de Estado de cunho neoliberal, promovida na
década de 1990, a avaliação de políticas sociais ganhou centralidade como instrumento de gestão, de
modo a alcançar um novo perfil de eficiência e qualidade no setor público. Tal perfil, destaca Afonso
(2009), também observado em outros países, vincula-se à criação de um ethos competitivo, com o uso
de modelos da gestão privada no espaço público, mediante uma cultura gerencialista. Assim, a teoria
da avaliação, que havia evoluído com base em epistemologias pluralistas e antipositivistas, teria
sofrido um retrocesso, visto que a crença em indicadores mensuráveis passou a ser o exemplo
paradigmático das mudanças (Afonso, 2009). Sem desconsiderar a existência de tensões e conflitos na

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luta pela hegemonia na definição do sentido e dos desenhos de avaliação de políticas públicas, Lima
(2012), observa, como atual tendência, a subordinação da investigação a uma razão técnica e
instrumental, com um certo pendor pragmatista.
Há, ainda, no caso brasileiro, especificidades a serem indicadas no campo da avaliação de políticas
sociais. Trata-se da reduzida explicitação dos pressupostos teóricos e metodológicos, dos princípios e
dos valores que sustentam as análises, da frágil articulação da realidade estudada com o todo social e
da ausência de relações entre as políticas e o seu contexto histórico, o que confere significativos limites
aos processos avaliativos (Mainardes, 2009). Tais limites trazem desafios, particularmente quando a
ênfase é conferida à investigação qualitativa. Entre eles, a definição de indicadores compatíveis com o
objeto da investigação, que não se configurem como amarras, mas guias. Diante disso, questiona-se:
é possível fugir da cultura gerencialista e dos indicadores supostamente mensuráveis, feitos para que
os resultados possam ser comparados? Como escapar da rigidez metodológica, sem perder o rigor na
avaliação de políticas públicas?
O presente trabalho volta-se a essa reflexão, indicando bases de uma experiência alternativa de
investigação com o uso de metodologias mistas, de natureza crítica, com características distintas das
propostas hegemônicas desenvolvidas no âmbito do Estado brasileiro, na atualidade.
A política pública mencionada, alvo de avaliação, é o Curso de Formação Docente em Educação
Profissional Técnica na Área da Saúde, uma proposta da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), instituição do Ministério da Saúde do Brasil,
desenvolvido até 2012, em várias unidades da federação. No país, convém esclarecer, formação
docente é tema sobre o qual há poucos consensos e muitas disputas, sendo necessário superar a falsa
consciência de uma suposta neutralidade das políticas e das propostas de formação (Kuenzer, 2011;
Machado, 2011).
O Curso buscava caminhos alternativos às propostas que enfatizam, apenas, as técnicas de ensinar e
foi realizado de forma semipresencial, com carga horária total de 440 horas, com uso de material
instrucional impresso e também de plataforma virtual. Promovido de forma descentralizada, com o
apoio de instituições de ensino superior parceiras, especialmente públicas, a formação adotou a
história das lutas sociais por saúde no Brasil como eixo de sustentação da estrutura curricular, de forma
a subsidiar a análise da complexa realidade do setor e do processo histórico de defesa da saúde
pública. A formação era destinada a profissionais que já atuavam em escolas de educação profissional
públicas, privadas e filantrópicas. Eram, portanto, alunos-docentes, sem formação pedagógica,
graduados nas diferentes subáreas da saúde (Medicina, Enfermagem, Odontologia etc.).
Em síntese, essa rica e ousada experiência privilegiava a reflexão e a crítica sobre o trabalho docente
realizado nas escolas de educação profissional que formam trabalhadores para o sistema público de
saúde e, também, a oferta de bases para a construção de outras práticas nessa área, reconhecendo-
se que as efetivas mudanças na realidade em saúde e em educação demandam, também,
transformações no modelo social.
O eixo da investigação desejada colocava-se em torno das possibilidades e dos limites da formação, de
sua contribuição para a transformação dessa realidade, na medida em que a proposta discutia as
condições essenciais em que as práticas de saúde e de educação eram realizadas, assumindo um papel
político explícito (Saviani, 2000). As bases da proposta de avaliação são apresentadas, de forma
resumida, a seguir.

2 A avaliação e suas opções teórico-metodológicas

A avaliação externa do Curso teve a duração total de 16 meses e foi concluída no ano de 2012, não
sendo possível realizar o estudo da etapa ex ante. De forma específica, procurou-se investigar em que

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medida a proposta formativa fornecia os requisitos necessários à compreensão ampla da realidade na


qual se inscrevem as práticas em saúde e em educação e qual o potencial formativo do Curso para a
adoção de uma ação docente crítica e emancipadora. Não era, assim, uma atividade de
monitoramento, nem uma avaliação padronizada da proficiência dos alunos.
Entre as questões gerais que serviram de guia para a avaliação, destacam-se as seguintes: o Curso
contribuiu para que o docente compreendesse as múltiplas dimensões envolvidas nos problemas da
saúde e da educação profissional dos trabalhadores em saúde? Estimulou o aluno-docente a tomar a
prática social em saúde como ponto de partida e ponto de chegada do fazer pedagógico? A
problematizar a realidade social como elemento-chave da relação entre a saúde e o processo de
adoecimento? A explicitar o compromisso docente com a saúde como direito de todos, com as
necessidades sociais de saúde e com os usuários sujeitos de direitos? Tais questões, como não poderia
deixar de ser, estão relacionadas às circunstâncias socialmente condicionadas. Resultam de
determinada visão no real, nele encontrando suas razões e seus objetivos (Minayo, 2005).
A investigação, em razão do seu complexo objeto, optou pelo uso de metodologias mistas, com ênfase
na investigação qualitativa, evitando-se reforçar dicotomias entre quantitativo e qualitativo. A
abordagem quantitativa poderia identificar padrões comuns a universos distintos e examinar
tendências a serem qualificadas por meio de outros estudos de natureza qualitativa. Uma de suas
principais possibilidades era a identificação das condições concretas de trabalho do conjunto de
participantes, marcadas pelos processos de desregulamentação dos vínculos profissionais, de
fragilidade contratual e de intensificação das atividades, tendo em vista as alterações promovidas pela
atual fase do desenvolvimento capitalista.
A abordagem qualitativa, por sua vez, traria como contribuição um contato estreito e direto com a
realidade investigada e com os sujeitos envolvidos. Tendo em vista o objeto, os objetivos e a opção
por metodologias mistas, foram selecionados como instrumentos e técnicas: o questionário
(abordagem quantitativa), a realização de grupos focais e a análise dos Trabalhos de Conclusão de
Curso (TCC) (abordagem qualitativa), estes últimos, obrigatórios em cursos de pós-graduação lato
sensu. A observação da prática docente em escolas configurou-se como aporte metodológico
complementar, embora bastante rico.
No caso da avaliação quantitativa, a amostra probabilística definida garantiu percentuais acima dos
padrões amostrais geralmente utilizados no Brasil (cerca de 20%). A partir dessa amostra, foram
definidas subamostras aleatórias visando à seleção de Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) e de
alunos-docentes para a composição de grupos focais representativos de todas as instituições parceiras
na realização do Curso.
No total, foram realizados 34 grupos focais, com participação de 222 alunos-docentes. Além disso,
foram analisados 267 Trabalhos de Conclusão de Curso-TCC e, de forma complementar, procedeu-se
à observação da prática pedagógica docente em oito escolas, o que caracteriza a ênfase conferida à
avaliação qualitativa. A opção por grandes amostras também na investigação qualitativa foi
intencional, em virtude da complexidade do objeto. Tal escolha mostrou-se acertada, posteriormente,
visto que as realidades formativas eram bastante diversas.
O enfoque da análise de conteúdo proposto por Bardin (1979), com algumas atualizações, serviu de
base para a organização dos dados e para o mapeamento dos resultados da investigação qualitativa.
Frequentemente, encontrou-se, nos grupos focais e nos registros de observação em escolas, respostas
às questões sinalizadas na investigação quantitativa, reforçando o potencial das metodologias
qualitativas. Os dados qualitativos e quantitativos foram analisados de forma contextualizada,
buscando-se uma concepção relacional da realidade (Bourdieu & Wacquant, 2012).
De forma a assegurar a consistência da avaliação de natureza qualitativa, em bases teórico-
metodológicas sólidas, e, tendo em vista o objeto da investigação, definiram-se como requisitos de
seleção dos pesquisadores a formação em Ciências Humanas ou Sociais, em nível de mestrado ou

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doutorado, e a experiência anterior na realização de grupos focais. Participaram da investigação 12


pesquisadores e um estatístico, responsável pela elaboração do plano amostral.
Na fase inicial, foram discutidos, em profundidade, o objeto, teorias relacionadas e possibilidades
metodológicas, sendo planejado o desenho da avaliação. Uma das primeiras atividades coletivas foi o
estudo meticuloso, pela equipe, do Projeto do Curso, de seus objetivos, de sua matriz teórica e
metodológica, decidindo-se pelo aprofundamento em torno das categorias trabalho, trabalho docente
e trabalho em saúde e, ainda, pela construção de indicadores de avaliação que norteassem a
elaboração de todos os instrumentos utilizados: questionários, roteiros de grupos focais e de
observação e de análise de trabalhos de conclusão.
Como Minayo (2005), entretanto, defende-se que indicadores são parâmetros qualitativamente
elaborados, capazes de detalhar se os objetivos de uma proposta foram adequadamente alcançados,
embora não sejam capazes de dar conta da totalidade do real. Por isso, mesmo, quando são muito
potentes, assinalam, apenas, determinadas tendências. Não oferecem certeza quanto aos resultados
de uma ação ou de um processo.

3 A centralidade dos indicadores em processos de investigação qualitativa

Qualquer investigação comprometida com os direitos sociais como bens públicos, provavelmente
encontrará, na atual conjuntura brasileira, sérios obstáculos à sua realização. Embora um novo ciclo
de expansão de direitos tenha se inaugurado, a partir dos anos 2000, deve-se mencionar que, no Brasil,
a crise de hegemonia do neoliberalismo não pode ser confundida com a crise do neoliberalismo
(Minteguiaga, 2012), uma doutrina ideológica e, ao mesmo tempo, coleção de práticas, que ganharam
força no momento.
Porém, se é imperioso reconhecer que as condições do quadro político atual não estimulam a
proposição de investigações críticas, apostar na formação docente como momento privilegiado de luta
e resistência pode ser um rico caminho. Defende-se, assim, que educação, saúde e também avaliação
são alvo permanente de disputa de sentidos, inclusive no âmbito do Estado. E foi nesse espaço de
disputa de sentidos que o Curso e sua avaliação foram realizados, cabendo ressaltar que não se trata
de abraçar um estatismo acrítico, como esclarece Rinesi (2013), mas de compreender que o Estado
não é um mecanismo unitário, mas um amálgama complexo de instituições, ideologias e história.
Os indicadores de avaliação apresentados, a seguir, procuravam traduzir valores, compromissos e
atitudes de grande amplitude que representam uma determinada forma de concepção de mundo, de
saúde e de educação que não é nem neutra, nem hegemônica no Brasil.
Na avaliação, considerou-se, também, a carga horária do Curso, as condições concretas de vida e
trabalho dos alunos-docentes, bem como as características da formação em nível superior recebida,
muitas vezes tecnicista, nas quais saúde e educação foram vistas como aspectos isolados do todo
social, sendo a saúde pública conteúdo acessório. Por isso mesmo, é preciso ressalvar os limites desta
ou de qualquer outra proposta formativa voltada para o significado social da ação educativa no âmbito
da saúde pública, que traz conhecimentos de campos desconhecidos, pelos alunos-docentes, como os
da História, da Filosofia, da Sociologia e da Educação.
Feitos esses esclarecimentos, indica-se o perfil do aluno-docente a ser formado, isto é, um professor
da área da saúde que associe uma visão crítica e ampla da sociedade às competências de sua área de
atuação; que atue, de forma interdisciplinar, nas lutas pelo atendimento integral e de qualidade ao
usuário do Sistema Único de Saúde (SUS) e concorra para a transformação da realidade, com
autonomia intelectual, social e ética. Certamente, tal perfil foge às tendências que privilegiam a
objetividade e a técnica, revigoradas atualmente.

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Em virtude dos limites do presente trabalho, serão apresentados, a seguir, indicadores construídos a
partir de dois dos aspectos do perfil docente acima indicado: Visão crítica e ampla da sociedade
associada às competências técnicas de sua área de atuação e Atuação que evidencie autonomia
intelectual, social e ética. Foram detalhadas, ainda, as respectivas questões específicas
orientadoras.Tais indicadores e suas questões orientadoras poderiam ser ampliados, caso a realidade
assim indicasse.

Quadro 1. Indicadores e questões orientadoras da avaliação, segundo aspecto selecionado do perfil docente

Aspecto do perfil Questões orientadoras da


Indicadores
docente avaliação
Explicitação, no fazer pedagógico, de Que dimensões estão presentes nos
múltiplas dimensões objetivos e nos conteúdos da
(conceitual/científica/técnica, histórica, disciplina sob a responsabilidade do
econômica, política e cultural) envolvidas docente? Qual é a ênfase? Qual a
nos problemas da saúde e da educação participação do docente nesta
profissional em saúde elaboração?
Ênfase na prática social em saúde como O docente interroga, questiona a
ponto de partida e ponto de chegada do realidade em saúde, no âmbito do
fazer pedagógico. SUS, suas contradições e
possibilidades, articulando-a com a
Problematização da realidade social como
totalidade social?
elemento-chave da relação entre saúde e o
processo de adoecimento O fazer pedagógico contempla a
produção histórica do conhecimento
Explicitação, no Trabalho de Conclusão do
inerente à sua disciplina, bem como o
Curso (TCC), e na prática pedagógica, da
processo histórico de construção dos
centralidade do compromisso em relação à
termos legais e da realidade do SUS?
Visão crítica e ampla da saúde como direito e aos alunos como
sociedade associada às sujeitos que produzem cultura. O aluno docente explicita seu
competências técnicas conhecimento acerca dos
Explicitação, no TCC, de posicionamento
de sua área de atuação condicionantes sociohistóricos do
crítico em relação aos limites e
trabalho em saúde e em educação e
possibilidades da prática docente em
encaminha em sua ação pedagógica
saúde, considerando os condicionantes da
possibilidades de superação deles?
realidade sócio histórica.
O TCC expressa articulação das
questões da saúde e da educação
com os condicionantes da realidade
sociohistórica?
As aulas do docente têm como ponto
de partida e de chegada a realidade
concreta em saúde?

Os materiais pedagógicos produzidos


pelo docente guardam coerência com
essas escolhas?

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Quadro 2. Indicadores e questões orientadoras da avaliação, segundo aspecto selecionado do perfil docente

Aspecto do perfil Questões orientadoras da


Indicadores
docente avaliação

Explicitação, no TCC (particularmente na Na totalidade de sua ação o docente


definição dos objetivos do trabalho e na estabelece, permanentemente, a
abordagem do tema) de uma postura articulação entre a teoria e a prática?
crítica em relação aos valores hegemônicos
Que dimensões teórico-práticas
na sociedade de mercado que
estão presentes no Trabalho de
desconsideram os seres humanos como
Conclusão do Curso - TCC do
medida de todas as coisas.
docente? Qual é a ênfase? Evidencia-
Atuação profissional e cidadã que denote o se a articulação teoria prática?
reconhecimento da importância da ação
O aluno docente analisa criticamente
coletiva para a promoção de mudanças de
a proposta curricular do Curso em
caráter ético-político na auto formação
que atua, identificando se o mesmo é
permanente e na formação de seus alunos.
elaborado com base na tradição de
Atuação pedagógica (âmbito teórico- ensino fragmentado e parcial da área
prático) propiciadora de vivência, por parte da educação profissional em saúde?
dos alunos, da condição de sujeitos Discute o assunto com outros
portadores de direitos e produtores de docentes que atuam no mesmo
cultura. espaço educativo?
Atuação pedagógica centrada no O aluno docente sente-se seguro para
Atuação que evidencie reconhecimento da importância de que os indicar alternativas à proposta
autonomia intelectual, alunos construam, no Curso, qualificação curricular existente? Evidencia
social e ética. técnica coletiva necessária à atuação de compreender as implicações ético-
qualidade socialmente referenciada no políticas de seu trabalho como
atendimento aos usuários do SUS. professor?
Atuação pedagógica que possibilite aos O aluno docente preocupa-se em
alunos a apreensão consistente dos articular sua disciplina às outras
conhecimentos fundamentais à análise da desenvolvidas por outros docentes?
vida social, em particular no que concerne Participa de reuniões/encontros para
à área da saúde. discussão de alternativas de
integração?
O aluno docente, em sua prática
pedagógica, analisa criticamente com
os alunos-trabalhadores a divisão
técnica existente nas equipes de
saúde?
O aluno docente evidencia em sua
prática pedagógica compromisso com
a superação de formação estreita,
com ênfase nos procedimentos,
destituída dos fundamentos teórico-
práticos que permitem compreender
a totalidade do cuidado em saúde?

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Com base nessa descrição de indicadores e de questões orientadoras específicas de investigação,


discutidos também com as equipes que produziram o Curso, foi possível observar, entre os
pesquisadores, diferentes percepções sobre o sentido de determinados conceitos, sendo necessário
torná-los mais claros. A título de exemplo, podem ser mencionados os diferentes sentidos conferidos
a qualidade socialmente referenciada no atendimento aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).
Em que pesem todas as dificuldades, reafirma-se a potencialidade da investigação qualitativa e de
indicadores compatíveis com aquilo que se quer investigar.
Embora não seja propósito deste estudo apresentar os resultados da investigação realizada, indica-se
um dos aspectos centrais identificados em todas as etapas da avaliação, isto é, a dificuldade de os
alunos do Curso compreenderem saúde e educação como práticas sociais.

4 Considerações finais

Nas considerações finais a seguir apresentadas, retomam-se as questões propostas no início desta
reflexão: é possível fugir da cultura gerencialista e dos indicadores mensuráveis, feitos para que os
resultados possam ser comparados? Como escapar da rigidez metodológica, sem perder o rigor na
avaliação qualitativa de políticas públicas? Tais perguntas são amplas e complexas e, certamente, não
é possível esgotá-las nos limites deste trabalho. Diante disso, de forma breve, destacam-se questões,
tensões e desafios a serem aprofundadas em outros estudos.
Sublinha-se, primeiramente, a importância da análise crítica sobre a pertinência e a contribuição de
qualquer política social, bem como das relações existentes entre a intervenção e o contexto no qual
ela se situa, especialmente no Brasil, país marcado por forte desigualdade. O desafio não é pequeno,
pois, na atualidade, as propostas de avaliação de políticas sociais hegemônicas mostram, pelo seu
caráter frequentemente pragmatista e descontextualizado, que os espaços para realização de
investigações pautadas pelo pensamento crítico estão limitados.
Essa tendência decorre, essencialmente, de orientações de organismos internacionais, que oferecem
cooperação técnica com base em indicadores que integram os chamados “quadros lógicos”, para o
que as metodologias quantitativas têm privilégio, sem conseguir, em boa parte das vezes, fugir a um
caráter estatístico e simplificado.
Nesses casos, as metodologias exclusivamente quantitativas são consideradas mais ágeis, abrangentes
e potentes para medir, de forma objetiva, a magnitude dos fenômenos, o que acaba por definir um
status de maior prestígio a elas, com reflexos na produção acadêmica e na definição das fontes de
financiamento pelas agências de fomento públicas.
Assim como Pacheco (2011), alerta-se para o reducionismo dessa tendência, em que o pesquisador
por vezes é transformado num prático, deixando de considerar que a investigação voltada para a
avaliação pode ter sentidos muito diversos e conflitantes, portadores de novos questionamentos.
Trata-se, assim, de resgatar a natureza distinta das metodologias quantitativas e qualitativas e suas
possibilidades de complementariedade, tendo em mente o objeto da investigação.
Na avaliação aqui relatada, o lugar e o potencial de ambas eram claros. Mas era na investigação
qualitativa que residia a possibilidade de se conhecer diferentes realidades visando à compreensão
dos grupos e de suas lógicas internas, particularmente no que diz respeito à prática pedagógica em
educação profissional na área da saúde. A investigação qualitativa, vale lembrar, se ocupa daquilo que
não pode ser quantificado, atuando dentro de um universo de significados e valores que, por isso
mesmo, não pode ficar restrito à manipulação de variáveis.
Os obstáculos impostos à investigação qualitativa, em particular na área de políticas públicas de
formação de professores, não são nem secundários, nem desprezíveis, principalmente quando se tem
em mente a necessidade de assegurar bases teórico-metodológicas sólidas nos projetos. Não há tempo
nem recursos financeiros para propostas que não ofereçam respostas rápidas, ainda que superficiais.

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Em virtude do fetiche em torno da técnica, presente no que poder-se-ia denominar de neotecnicismo,


considera-se oportuno indicar novos/velhos desafios a serem enfrentados.
O primeiro deles diz respeito à definição com rigor, mas não com rigidez, do objeto da investigação,
como uma das apostas ainda necessárias. Se, de um lado, prevalecem as propostas com ênfase
quantitativa, como mencionado, de outro, a ideia de que tudo é possível em investigação qualitativa
tem limitado a sua potencialidade. Não há nessa aposta, isto é, na defesa do rigor, mas não da rigidez,
uma valorização positivista da supremacia da investigação quantitativa, em detrimento da qualitativa,
nem de uma oposição entre teoria e metodologia, tradição tão presente na investigação, de forma
geral.
Os indicadores e as questões orientadoras da proposta apresentada neste trabalho tiveram como
origem opções teóricas e metodológicas que constituíam o próprio objeto de investigação. Eram
aspectos estruturantes da avaliação, numa perspectiva crítica, nas brechas encontradas dentro da
cultura política de tradição autoritária do Estado brasileiro. Apostou-se no processo coletivo de
construção, o que tomou tempo significativo da investigação, a fim de se evitar a audácia sem rigor e
o rigor sem imaginação (Bourdieu & Wacquant, 2012). Tal processo não era um procedimento técnico,
apenas. Constitui-se como momento privilegiado da investigação, tendo em vista a necessidade de se
evitar um laissez faire epistemológico, já que a construção de um indicador ou, a inclusão de cada novo
item no questionário ou no roteiro de grupo focal, demandam opções teóricas, conscientes ou não
(Bourdieu & Wacquant, 2012).
A inclinação de separar a reflexão sobre os métodos de seu uso real, cultivando o método por ele
mesmo, reduzindo o problema da construção teórica do objeto à manipulação técnica dos indicadores
e, particularmente, dos instrumentos é outro desafio a ser enfrentado, visto que a teoria é o
conhecimento que orienta não só a coleta de dados, mas a sua própria análise. De fato, na experiência
de avaliação relatada, a produção de um vasto número de instrumentos, bem como o tempo destinado
à sua elaboração, discussão e crítica, indicava uma ameaça permanente àquilo que os autores citados
denominam de metodologismo, que desafia a investigação porque traz riscos de consolidação de uma
miopia científica.
Em suma, se o endeusamento da técnica produz um formalismo árido, seu desprezo pode levar a
especulações estéreis (Minayo, 2005). Em outras palavras, se o metodologismo é sempre um risco, a
teoria também não pode estar separada do trabalho de investigação que a alimenta. Ressalta-se,
assim, o caráter práxico necessário à produção científica, o que demanda articular momentos de
reflexão teórica e de inserção empírica em bases sólidas.

Referências

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políticas avaliativas contemporâneas. São Paulo: Cortez.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Internacionalização dos Programas de Pós-Graduação em Educação:


experiências discentes e de titulados/as na região sul do Brasil (2006-2016)

Jordana Wruck Timm, Tatiane de Freitas Ermel1.


1
Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul,
Brasil. jordana.timm@acad.pucrs.br1; tatiane.ermel@acad.pucrs.br2.

Resumo. O estudo analisa o processo de internacionalização da Educação Superior nos Programas de Pós-
Graduação em Educação de excelência da região sul do Brasil, entre 2006-2016. Objetiva conhecer e analisar
as experiências vividas por discentes que participaram em intercâmbios internacionais, na forma de bolsas de
estudo, convênios, grupos de investigação ou outros modelos e parcerias. Utiliza uma abordagem quali-
quantitativa, examinando um amplo corpus documental (constituído por dados estatísticos) e
questionários/entrevistas semiestruradas. Como procedimento metodológico, será adotada a Análise Textual
Discursiva e documental. Das 3 instituições selecionadas, até o momento, recebemos dados totais de uma e
parciais de outra. Aplicamos o questionário com o primeiro grupo, no qual foram identificadas 45
experiências, sendo a maioria proveniente de dois convênios existentes entre Programas de Pós-Gradução no
Mercosul. Também observamos que o tempo de permanência de estudantes estrangeiros no Brasil é bastante
inferior se comparado com o período que estudantes brasileiros permanecem em outro país.
Palavras-chave: internacionalização; discentes; educação; programas de excelência.

Internationalization of Graduate Programs in Education: professors' and graduate students' experiences in


Southern Brazil (2006-2016)
Abstract. The study analyzes the process of internationalization of Higher Graduate Programs in Education
within standards of excellency in Southern Brazil, between 2006 and 2016. It aims at getting to know and
analyzing the experiences lived by students that participated in international interchange programs, which
involved scholarships, inter-university agreements, research groups, among other resources and
partnerships. It is based on a quali-quantitative approach, examining a broad documentary corpus
(constituted of statistical data) and questionnaires/semi-structured interviews. Regarding methodological
procedures, Textual-Discursive Analysis and document analysis is adopted. Among the 3 selected institutions,
we have received so far full data from one of them and partial data from another one. We applyed the
questionnaire with the first group, in which we identified 45 experiences, whose majority came from two
existing agreements between Graduate Programs within Mercosul (Southern Common Market). In addiction,
we verified that the time of permanence of foreign students in Brazil is quite inferior if compared with the
period in which Brazilian students remain in another country.
Keywords: internationalization; graduate students; education; excellency programs.

1 Introdução

O presente estudo integra o projeto de pesquisa “Internacionalização dos Programas de Pós-


Graduação em Educação: experiências discentes (Brasil, 2006-2016)” que tem como objetivo principal
analisar o processo de internacionalização da Educação Superior nos Programas de Pós-Graduação em
Educação (PPGEdu) de excelência do Brasil, entre 2006 e 2016. Para tanto, busca conhecer e analisar
as experiências vividas por discentes que participaram em/de intercâmbios internacionais, na forma
de bolsas de estudo, convênios, grupos de investigação ou outros modelos e parcerias; compartilhar

1 Bolsista de Doutorado da CAPES, Programa Doutorado Sanduíche no Exterior/PDSE. Processo n.: 88881.133805/2016-01.
2 Bolsista de Pós-Doutorado Júnior do CNPq/Brasil. Processo n.: 150403/2017-8.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

as vivências acadêmicas e culturais e o impacto profissional e pessoal daqueles que passaram todo ou
algum período de sua formação por universidades estrangeiras ou aqueles que vieram do exterior para
realizar seus estudos junto aos PPGEdu brasileiros.
O processo de internacionalização da Educação Superior no século XXI está inserido em um projeto
amplo de relações internacionais do país, que foi posto em ação, sobretudo, a partir dos governos de
Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula da Silva. De acordo com Galvão (2016, p. 200), a
“democracia foi incorporada à teoria e prática da política exterior brasileira, como política pública e
instrumento de inserção internacional”. No período entre anos 2000 e 2015:

houve uma perceptível sobreposição dos períodos de construção das bases e alicerces materiais e
imateriais da política externa brasileira com a decolagem do Brasil na política mundial; também a fase
de ascenção pelo aumento do prestígio e influência, combinou-se com a trajetória do declínio, gerando
certa confusão quanto ao momento no qual o Brasil deixava de estar no ápice e iniciava uma trajetória
descendente. Foram processos que se complementaram e formaram, a seu tempo, a conjuntura crítica
ou a janela de oportunidades necessárias às mudanças ou transações de período (Galvão, 2016, p. 200)

Essa conjuntura trouxe para as universidades, em suas diferentes áreas do conhecimento, uma série
de possibilidades de relações com países vizinhos, estimulando as parcerias com o Mercado Comum
do Sul (Mercosul), criado em 19913; articulando novas possibilidades através da União das Nações Sul-
americanas (Unasul), criada em 2008, e da diversificação de parcerias, como por exemplo, a
composição dos BRICS, formalizada em 2008, fomentando uma aliança com Rússia, China, Índia e
África do Sul4. O panorama de relações internacionais tem por base um viés financeiro-econômico,
mas se expande para inúmeras outras áreas, como direitos humanos, saúde, agricultura, ciência,
tecnologia e inovação, educação, dentre outros5.
Para as Universidades brasileiras, um dos principais impactos desse processo de internacionalização
foi a disponibilidade de bolsas de estudos fornecidas pelo Governo Federal, por meio de suas agências
de fomento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Com distintas configurações, esse
benefício se estendeu tanto em nível de Graduação, quanto de Mestrado, Doutorado e Pós-
doutorado6. Na Pós-Graduação, as possibilidades foram mais abrangentes para os programas que
integram uma categoria de excelência, classificados como 6 ou 7 pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)7. Nesta categoria, os mesmos recebem uma
cota permanente anual e realizam os processos seletivos de forma autônoma em cada instituição,
denominado Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE/CAPES), instituído em 20118.

3 Sobre as políticas e ações universitárias no Mercosul, ver Morosini (1994, 1998); Morosini & Leite (1992).
4 Sobre a Educação Superior nos MBRICS, ver Morosini & Somers (2015)
5 Dentre as ações executadas pelo Brasil no BRICS no campo da educação, podemos destacar o Encontro Ministerial de

Educação, realizado em Brasília, nos dias 02 e 03 de março de 2015 (Galvão, 2016, p. 214).
6 Cabe mencionar o impacto do programa Ciências sem Fronteiras, criado pelo Governo Federal em 2011, abrangendo cursos

de Graduação e de Pós-Graduação, com áreas contempladas específicas. Para mais informações, acessar:
http://www.cienciasemfronteiras.gov.br/web/csf/o-programa (acesso em 22 de fevereiro de 2017, às 9h:14min.).
7 O Programa de Excelência Acadêmica-PROEX tem como objetivo manter o padrão de qualidade dos programas de Pós-

Graduação Strictu Sensu, avaliado(s) pela CAPES com nota 6 ou 7, atendendo adequadamente às suas necessidades e
especificidades.
8 De acordo com a Capes, o programa PDSE “foi instituído em 2011, em substituição ao Doutorado Sanduíche Balcão e ao

Programa de Doutorado no País com Estágio no Exterior (PDEE). A alteração visou ampliar o número de cotas concedidas
às Instituições de Ensino Superior (IES), e dar maior agilidade no processo de implementação das bolsas de estágio de
doutorando no exterior. A Pró-Reitoria de Pós-graduação das IES, ou órgão equivalente, é responsável por gerenciar as
cotas, homologar as candidaturas, divulgar os resultados e realizar o acompanhamento dos bolsistas e egressos, mantendo

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Ainda, temos as chamadas para bolsas e outros auxílios que são abertos em calendários anuais pelo
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Ao analisar a internacionalização na Educação Superior como campo de estudo, Morosini (2006, p. 97)
nos coloca que consiste em uma “área do conhecimento da Educação Superior que enfatiza a noção
de nação e as relações entre nações, políticas e programas de governo, sistemas e IES para lidar com
a globalização”. Nesta perspectiva, a mesma autora destaca que esse processo está baseado nas
relações entre nações e suas instituições, sendo que o termo “internacionalização da Educação
Superior” toma proporções após a Guerra Fria, sendo observado na Europa, Austrália e Canadá9.
Diante desse contexto, o número de discentes em estágios de estudos no exterior foi crescente desde
princípios do século XXI, formando um conjunto significativo de experiências acadêmicas e
profissionais de relevância em diferentes países. Esse processo foi praticamente paralisado pela crise
política e econômica vivida no último governo de Dilma Roussef (2015-2016), sendo que os principais
programas e auxílios ao exterior foram suspensos, retomando suas atividades no início de 2017. Desse
modo, a temporalidade selecionada nesta pesquisa compreende um marco no processo de
internacionalização da Educação Superior no Brasil a partir das experiências discentes, inseridos em
uma política de relações internacionais com objetivo de tornar o país uma referência em diferentes
áreas do conhecimento. A proposta desse estudo consiste em analisar o impacto quantitativo e
qualitativo que envolveram os estudantes de Pós-Graduação no campo da Educação, a partir de suas
experiências acadêmicas e culturais, almejando a discussão de temáticas como “Cidadania global”
(formação do cidadão global); relações entre governo e universidade no processo
de internacionalização; suporte e acolhida aos intercambistas; inserção e permanência de
pesquisadores brasileiros como colaboradores em universidades, centros de investigação e grupos de
pesquisa internacionais; atração de pesquisadores colaboradores, professores e alunos estrangeiros
para as universidades brasileiras; possibilidades de bolsas e financiamentos no âmbito nacional e
internacional.

2 Metodologia

Dentre os inúmeros Programas de Pós-Gradução em Educação existentes no país, o primeiro critério


para reduzir o corpus analisado foi a classificação quanto ao nível de excelência (CAPES), fator que
direciona o programa a um número de bolsas específico, de acordo com disponibilidade ofertada pelo
Governo Federal. Em seguida, dividimos por regiões do país, neste momento, adotando a região sul,
da qual selecionamos 3 instituições. Em um primeiro momento verificamos nos programas a existência
de convênios, grupos de pesquisa, redes de colaboração e outros mecanismos de contato que
configuram relações internacionais entre universidades brasileiras e estrangeiras e outras instituições
científicas onde os discentes estiveram inseridos. Contatamos coordenadores para disponibilização de
dados quantitativos, como número de estudantes que viajaram ao exterior no período estabelecido
pela nossa pesquisa, qual tipo de bolsa/financiamento recebido pelo discente, período que o mesmo
ficou no exterior, país e universidade em que realizou sua experiência internacional.
Para uma análise de caráter qualitativo, o estudo objetiva conhecer as experiências acadêmicas e
culturais dos sujeitos que passaram parte de sua formação no exterior, por meio de um questionário
semi estruturado, com uma questão aberta, conforme quadro a seguir:

a Capes informada sobre o andamento do estágio no exterior e garantindo o cumprimento das normas do PDSE”. Disponível
em: http://www.capes.gov.br/component/content/article/4561 (acesso em 23 de fevereiro de 2017, às 10h:30min.).
9 O termo educação internacional corresponde ao período entre a Segunda Guerra Mundial e o fim da Guerra Fria, sendo

mais observada nos Estados Unidos (Morosini, 2006, p. 97).

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Quadro 1. Questionário semi-estruturado.

Nome completo (opcional)10:


A experiência no exterior foi Mestrado ( )
realizada concomitante ao curso de: Doutorado ( )
Pós-Doutorado( )
Instituição no Exterior:
Período de estágio:
Agência de financiamento:
Não ( ) Sim ( ), qual?
Atividade que exerce
atualmente/instituição:
Principais experiências acadêmicas
e culturais durante seu estágio no
exterior:
Outras informações que gostaria de
acrescentar:

A pesquisa utiliza uma abordagem quali-quantitativa, examinando um amplo corpus documental,


constituído de dados estatísticos. Além disso, a pesquisa também está composta por questionários e
entrevistas semiestruradas. A opção pela adoção dessa abordagem se justifica

Com o desenvolvimento e a legitimidade percebida tanto da pesquisa qualitativa quanto da pesquisa


quantitativa nas ciências sociais e humanas, a pesquisa de métodos mistos, empregando a combinação
de abordagens quantitativas e qualitativas, ganhou popularidade. Essa popularidade deve-se ao fato de
que a metodologia da pesquisa continua a evoluir e a se desenvolver, e os métodos mistos são outro
passo adiante, utilizando os pontos fortes das pesquisas qualitativa e quantitativa. Além disso, os
problemas abordados pelos pesquisadores das ciências sociais e da saúde são complexos, e o uso de
abordagens quantitativas ou qualitativas em si é inadequado para lidar com essa complexidade. A
natureza interdisciplinar da pesquisa também contribui para a formação de equipes de pesquisa
compostas de indivíduos com interesses e abordagens metodológicos diferentes. Por fim, pode-se obter
mais insights com a combinação das pesquisas qualitativa e quantitativa do que com cada uma das
formas isoladamente. Seu uso combinado proporciona uma maior compreensão dos problemas de
pesquisa. (Creswell, 2010, p. 238)

Esclarecido isso, convém destacar que a fim de manter o anonimato dos participantes, quando
remetemos aos trechos das perguntas abertas do questionário e/ou entrevistas, optamos por utilizar
nomes aleatórios de países, seguidos da data em que a coleta foi realizada, por exemplo: “França,
20/10/2016”. Como procedimento metodológico de análise, será adotada a Análise Textual Discursiva
(ATD) e documental. A ATD, conforme Moraes & Galiazzi (2011, p. 7), “corresponde a uma metodologia
de análise de dados e informações de natureza qualitativa com a finalidade de produzir novas
compreensões sobre os fenômenos e os discursos”. Durante todos os processos dessa forma de
análise, os autores enfatizam a necessidade de envolvimento intenso e rigoroso do pesquisador no
processo de análise e reconstrução. A metodologia é apresentada, pelos autores, como processo auto-
organizado e emergente, que se fundamenta no poder criativo de sistemas complexos e caóticos. A
ATD se organiza/sistematiza em três fases: desconstrução, emergência e comunicação.
Nessa análise, objetivamos identificar os países de maior recorrência e compreender o que motiva
essa escolha; analisar o período médio de permanência no exterior; verificar os departamentos,
programas, projetos, convênios e grupos que desenvolvem iniciativas de internacionalização no campo

10 Os contatos e dados que identifiquem o contexto pessoal/institucional, não serão divulgados em hipótese alguma durante
a pesquisa e publicações posteriores.

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da e/ou que tenham relação com a educação. Além disso, o estudo visa prospectar nos programas, os
acordos ou convênios internacionais estabelecidos no período em questão.

3 Discussões dos resultados preliminares

O projeto, em fase inicial, está sendo desenvolvido em várias etapas e visa parcerias com
pesquisadores de outras regiões do país por meio de redes colaborativas. Sendo assim, a coleta de
dados depende da acessibilidade dos Programas de Pós-Graduação em Educação, pró-reitorias de
pesquisa, departamento de relações internacionais, dentre outros setores que estão envolvidos neste
processo de internacionalização da Educação Superior. Até o presente momento, recebemos os dados
quantitativos de duas instituições, sendo um total e outra parcial. Contamos, ainda, com a
disponibilidade de discentes e ex-discentes para resposta do questionário e, em um terceiro momento,
com entrevistas semi-estruturadas.
Da instituição que recebemos os dados quantitativos completos, os questionários já foram aplicados,
sendo possível a análise de alguns resultados preliminares. Constatamos que os discentes que
participaram de experiências no exterior em fase mais recente responderam com mais precisão às
demandas da pesquisa, pois ainda estão envolvidos com o processo de estágio no exterior.
No período selecionado, o total de experiências nessa instituição foi de 45, sendo 13 alunos
estrangeiros que estiveram em estágios no Brasil e 32 que viajaram ao exterior. Podemos constatar
que um número significativo desses estágios é fruto de convênios com dois países do Mercosul,
Argentina e Uruguai, sendo de maior recorrência o primeiro. O tempo médio de alunos que vieram
realizar seus estudos no Brasil é curto, de um a dois meses. Dos estudantes que saíram para estágios
no exterior, total de 32, identificamos o maior número para Argentina (11), seguido por Portugal (7),
Espanha (6), Estados Unidos (3), Uruguai (3), Escócia (1) e Canadá (1). O tempo médio de permanência
no exterior é maior, entre 5 a 6 meses, merecendo destaque o fato que os estudantes que viajam para
convênios da Argentina e Uruguai são os que ficam menos tempo. Ao contrário, os estágios na Europa
e Estados Unidos demandam uma média bastante superior, de 9 a 12 meses.
Dentre as experiências acadêmicas, observamos que foram salientadas nas respostas da pergunta
aberta questões como a participação em cursos/seminários de Pós-Graduação, o acesso a uma
bibliografia não disponível em seu país de origem, consulta a fontes/bancos de dados/bibliotecas,
participação em congressos e grupos de pesquisa internacionais, as saídas de campo com diferentes
configurações, conhecimento das políticas educativas de outros países (básica e superior), a vivência
em uma estrutura universitária diferenciada e as possibilidades de publicações no exterior. Conforme
salienta um/a discente, a sua experiência acadêmica englobou questões tanto dentro quanto fora da
universidade, permitindo:

Ver o tema da minha pesquisa na prática da Universidade; participar de aulas e saídas de campo muito
diferentes; participar de eventos dentro e fora da Universidade; acompanhar a rotina de um projeto
ambiental no Campus; experienciar outra cultura e outro olhar sobre questões ambientais e sociais
(Venezuela, 15/04/2016)

Desde o ponto de vista cultural, a aprendizagem de outra língua é destacada como fator importante,
assim como a convivência com diferentes hábitos culturais, tendo em vista o contato com diferentes
nacionalidades nas universidades e residências, as oportunidades de viagem para outras cidades e/ou
países, acesso aos centros culturais, museus e exposições, o afastamento de família e amigos/as, estar
diante de novos desafios e descobertas e a construção de novas amizades.

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No trecho a seguir, um discente acrescenta algumas reflexões acerca de sua experiência e os processos
de transformações pelos quais passou:

Acredito que a experiência de viver longe das referências pessoais permite desenvolver uma descoberta
pessoal perturbadora e recriadora. Ao alterarmos a perspectiva sobre nós mesmos mudamos também
nossa mirada sobre o mundo. Essas mudanças enriquecem o desenvolvimento da pesquisa e
contribuem profundamente com os conhecimentos adquiridos (Itália, 22/02/2017).

Por fim, salientamos a intenção de construção de um panorama sobre o processo de internalização da


Educação Superior valendo-se de um significativo número de discentes que passaram por essa
experiência, durante sua formação nos cursos de Pós-Graduação em Educação, tanto em nível de
Mestrado como Doutorado. Para tanto, necessitamos criar redes colaborativas para adentar nos dados
institucionais, visando um levantamento quantitativo para, em seguida, contar com a disponibilidade
dos sujeitos através de questionários/entrevistas. Um dos objetivos futuros consiste, ainda, em
mapear as redes de relações que se estabelecem a partir desses estágios, assim como publicações
deles decorrentes.

Referências

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http://www.cienciasemfronteiras.gov.br/web/csf/o-programa.

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A formação de professores no Brasil e em Portugal: narrativas de futuros


professores

Adriana de Almeida1, Ana Isabel Andrade 2, Eda Henriques3, Jane do Carmo Machado4, Maria
Celi Chaves de Vasconcelos5, Rui Neves6.

1 Professora Adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e do Curso de Pós-graduação em


Gestão Escolar da Faculdade de Formação de Professores/UERJ – Rio de Janeiro – Brasil -
adryanaalmeida@gmail.com
2 Professora Associada no Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Aveiro – Portugal
- aiandrade@ua.pt
3 Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense e do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense - edahenriques@gmail.com
4Professora do Programa de Pós- graduação em Educação da Universidade Católica de Petrópolis – Brasil
– jane.machado@ucp.br
5 Programa de Pós-Graduação em Educação (Proped). Chefe do Departamento de Políticas, Avaliação e

Gestão da Educação (Depag) - maria2.celi@gmail.com


6 Professor Auxiliar no Departamento de Educação e Psicologia / Centro de Investigação em Didática e

Tecnologia na Formação de Formadores (UAveiro) - rneves@ua.pt

Resumo. O objetivo deste artigo é problematizar a formação inicial de professores a partir da voz dos
sujeitos que escolhem ser professores. Articulam-se duas pesquisas de natureza qualitativa, a primeira com
campo de investigação em uma universidade brasileira e uma universidade portuguesa, na qual os sujeitos
investigados foram ouvidos sobre as razões de escolha do curso de Pedagogia (Brasil) e Educação Básica
(Portugal) e o modo como os percursos de formação se ajustam às suas expetativas. Os dados foram
recolhidos a partir de relatos narrativos, com apresentação de tópico inicial, atendendo aos pressupostos
teóricos e metodológicos da pesquisa narrativa e histórias de vida na linha de Nóvoa e Finger. A segunda
pesquisa confrontou os dados oficiais sobre a formação e a valorização de professores ao previsto nos
Planos de Educação. Os resultados permitem problematizar e iluminar políticas e práticas de formação
inicial e continuada de professores no Brasil e em Portugal.
Palavras-chave: formação de professores; investigação qualitativa; pesquisa narrativa; planos de educação.

Teacher training in Brazil and Portugal: narratives of future teachers


Abstract. The purpose of this article is to problematize initial teacher training from the voice of the subjects
who choose to be teachers. The study considers two qualitative researches, the first with a field of research
in a Brazilian university and a Portuguese university, in which the investigated subjects were heard on the
reasons for choosing the course of Pedagogy (Brazil) and Basic Education (Portugal) and how this course fits
to their expectations. The data were collected from narrative reports, presenting an initial topic, attending
to the theoretical and methodological assumptions of the narrative research and life stories in the line of
Nóvoa and Finger. The second research sought to confront the official data on teacher training and
valorization as provided in the Education Plans. The results allow us to problematize and illuminate policies
and practices of initial and continuous teacher education in Brazil and Portugal.
Keywords: teacher training; qualitative research; narrative research; training plans.

1 Introdução

A formação de professores, tanto inicial como continuada, é chamada a responder a inúmeros


desafios, muitas vezes, não contestados durante o processo de formação, mas que precisam ser
trazidos para o centro das discussões para que ganhem seus próprios sentidos. Nessa linha, torna-se
relevante considerar a narrativa dos futuros professores sobre os caminhos que os levaram a

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escolher tal formação, bem como suas angústias, expetativas e dificuldades em permanecer atuando
na profissão escolhida. Tais narrativas se constituem dados essenciais para esse estudo e surgem
não como material estático, mas, sim, como dispositivo capaz de promover o entrecruzamento de
histórias vividas por cada um dos sujeitos, individual e coletivamente, em uma verdadeira rede de
experiências, nas quais cada história narrada é única e contribui para a compreensão de todas as
outras que formam o corpus da pesquisa, não sendo possível desconsiderar nenhuma delas.
Benjamin (1996) contribui com o entendimento dessa perspectiva quando defende que “o cronista
que narra os acontecimentos, sem distinguir entre os grandes e os pequenos, leva em conta a
verdade de que nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido para a história (p.
223)”. O mesmo pode ser dito sobre o cotidiano dos professores que se exibe cercado de imagens,
vozes, acontecimentos e representações, tornando suas histórias únicas e carregadas de
aprendizados e de experiências que devem ser partilhadas e confrontadas. No que tange ao percurso
inicial de cada um desses profissionais, os diferentes modos de inserção na profissão docente levam
a compreender o status quo da formação e do trabalho e a buscar outras possibilidades de
significação dos itinerários vividos e de melhoria dos que ainda estão em processo de construção. Os
estudos realizados por Gatti, Barreto e André (2011) e André (2015) sobre a formação inicial de
professores têm apontado muitos desafios, principalmente, no que diz respeito às diferentes
propostas curriculares a que os alunos e as alunas são submetidos, algumas privilegiando as
disciplinas de fundamentos e outras as matérias pedagógicas, evidenciando, em muitos casos, certo
descompasso entre a teoria e a prática, que tem implicações na prática docente dos futuros
professores, especialmente, no modo como concebem e realizam a sua atividade. Diante do exposto,
o objetivo desta discussão é problematizar a formação inicial de professores, a partir das vozes dos
sujeitos envolvidos, identificando formas de maior ou menor adequação dos planos de formação às
expetativas dos estudantes que, no Brasil e em Portugal, escolhem ser professores por diferentes
razões. Parte-se da premissa que, nessa escolha, os envolvidos constroem seus próprios sentidos
sobre o que é ser professor, como é ser professor e para que ser professor, além de como a
formação pode ajudar a responder a tais questionamentos. É importante destacar que as referidas
pesquisas assumem que os futuros professores ocupam um lugar de destaque, uma vez que são eles
os que melhor podem falar sobre seus processos de formação e o que, realmente, esperam desse
processo. Considera-se também que a formação de professores precisa dialogar com as políticas
públicas instituídas ou a instituir. Nesse sentido, os Planos de Educação, particularmente, nas sessões
que se referem à formação e à valorização de professores, confrontando o previsto e o que tem sido
realizado nas redes públicas, a partir da análise da situação dos profissionais da educação
apresentada nos relatórios oficiais, devem também se configurar como objeto dessa reflexão.
Os resultados ora apresentados evidenciam duas vertentes de discussão, sendo que se destacam,
inicialmente, como dados recolhidos da pesquisa envolvendo narrativas, as novas perspectivas dos
estudantes sobre as razões de escolha da profissão docente, bem como sobre os percursos de
formação realizados. A segunda pesquisa abordada, ao confrontar os dados oficiais apresentados
sobre a formação e a valorização de professores ao previsto nos Planos de Educação, demonstrou
que para alcançarmos uma articulação de ações políticas que conduzam a uma valorização dos
profissionais da educação e, como consequência, uma melhoria da educação pública, é preciso
implementar um sistema público de formação dos profissionais da educação capaz de contemplar a
formação inicial, condições de trabalho, salário e carreira e formação continuada, assim como
condições de melhoria da qualidade da Educação Básica, na perspectiva de construir uma política de
profissionalização e valorização do magistério para os profissionais da educação. Tais reflexões em
torno da formação inicial, considerando a voz dos alunos e futuros professores, e das políticas
públicas, a partir de Planos de Educação instituídos, permitem problematizar e iluminar políticas e
práticas de formação inicial e continuada de professores no Brasil e em Portugal. Nessa linha, a

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

articulação das pesquisas citadas e a integração de seus resultados demonstram, numa lógica
comparativa, que, apesar das diferenças, identificam-se pontos comuns entre as realidades dos dois
países, possibilitando levantar questões que permitem refletir sobre a profissão docente no presente
e que podem influenciar futuros estudos sobre a mesma temática.

1.1 A formação de professores à luz das histórias de vida

As contribuições das histórias de vida em contextos de formação de professores surgem em um


cenário onde as ciências sociais em função da insatisfação relacionada ao conhecimento produzido,
demandam uma mudança paradigmática, que promove a reaparição do sujeito e um foco que coloca
a qualidade face à quantidade, a vivência face ao instituído. Assim, os anos 1980, vão, segundo
Bragança (2008), marcar a busca da reinvenção das práticas educativas e de pesquisa que respondam
melhor aos desafios do cotidiano, caracterizando o momento de eclosão do movimento
socioeducativo das histórias de vida e de formação na perspectiva da formação permanente
procurando, reafirmar a importância da reflexividade humana e procurando compreender o processo
pelo qual as pessoas significam suas trajetórias de vida e de formação e como constroem esses
significados na complexa dinâmica entre o individual e o social. Como nos mostra Nóvoa (2010), as
novas perspectivas teóricas e metodológicas trazidas por esse aporte, viabilizam a escuta de vozes
silenciadas e de espaços e de situações não considerados, num caminho mais dialógico na relação
com o mundo e a ciência e a formação. A esse respeito, o autor pondera que, em geral, nas
sociedades ocidentais, toda a formação tem seguido o modelo escolar, originário da Época Moderna,
que se consolida nos finais do século XVIII, onde a prática de formação segue o pressuposto que há
um tempo de preparação que se atem ao presente com vistas a uma ação no futuro, promovendo
uma dissociação entre tempo da formação e tempo da ação. Tal dissociação leva a distinção entre
espaços de formação e espaços de ação e também a duas lógicas distintas em que uma situação de
formação segue a lógica dos conteúdos e das disciplinas a ensinar e a outra a lógica dos problemas a
resolver e dos projetos a desenvolver, o que coloca o desafio, extremamente atual para todo o
processo de formação, da mobilidade e da circulação entre os saberes e conhecimentos adquiridos
nesse processo e situações reais de trabalho. Nesse cenário, Nóvoa (2010), indentifica, entre alguns
movimentos de contestação a esse paradigma escolar, o surgimento de uma nova epistemologia de
formação, que se manifesta nos trabalhos e nas pesquisas que se utilizam do aporte das histórias de
vida e do método (auto) biográfico. Dessa forma, o autor aponta que, nas histórias de vida, para
além da ruptura epistemológica, pode-se encontrar não só um sentido ontológico, mas também uma
nova epistemologia da formação. O sentido ontológico vem com a possibilidade de um novo
encontro do homem com ele mesmo e com um novo espaço de reflexividade sobre suas formas de
pensar, sentir e se colocar no mundo e com as pessoas no mundo. Como uma nova epistemologia da
formação, o aporte (auto) biográfico traz em si um viés formador com potencial de transformação
pessoal e coletiva, entre outras coisas, ao permitir a tematização da vida em um percurso que
propõe uma relação dialética entre rememorar o passado a partir do presente, apontando
perspectivas para o futuro. Walter Benjamin, em um ensaio intitulado “A Imagem de Proust”, ao
comentar sua obra “Em busca do Tempo Perdido” tece uma interessante relação entre experiência,
memória, passado e presente, mostrando que a genialidade de Proust está justamente no fato de
transformar uma experiência particular e privada de uma existência individual burguesa em uma
busca universal, por meio da lembrança, pois para Benjamin (2012, p.37) “...o acontecimento
lembrado é sem limites, porque é apenas uma chave para tudo que veio antes e depois”. Nessa
direção, a lembrança narrada pode subtrair os acontecimentos das contingências do tempo,
mostrando as semelhanças e as analogias entre passado e presente inscritos nas linhas do atual e

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permitir novas reflexões sobre ela, ou seja, há uma presentificação do passado, que, ao se
materializar na narrativa, permite sua reconstrução a partir de perspectivas do presente. Dessa
forma, como nos mostra Nóvoa (2010), para além de conectar o processo de formação de
professores a ideia de um “progresso” e um “desenvolvimento” linear, esse aporte introduz a
importância de um olhar retrospectivo, ao modo do balanço de vida, valorizando a autoformação,
isto é, a implicação do sujeito em seu próprio processo de formação, à medida que elabora outras
possibilidades de compreensão sobre seu percurso de vida. Ainda dentro de uma perspectiva
epistemológica, Finger (2010), ao levantar alguns problemas suscitados pela ciência moderna no
âmbito de formação de pessoas, assinala que o saber, tal como é produzido pela ciência moderna,
configura-se cada vez mais como informação. A questão, segundo o autor, é que uma informação só
adquire sentido, quando se integra a outros saberes e, poderíamos acrescentar, a outras
experiências de vida. Benjamin (2012), em suas reflexões sobre o paulatino desaparecimento da arte
de narrar, relaciona esse fato diretamente às dificuldades da narrativa de uma experiência plena, em
função da substituição do modo de produção artesanal pelo modo de produção capitalista. Dessa
forma, a pobreza de experiências que caracteriza o nosso mundo, com cada vez menos espaços de
compartilhamento das mesmas, faz com que sejamos pobres de histórias surpreendentes, mas ricos
de informação que já nos chegam explicadas, definitivas, com muito pouco espaço de integração a
outras redes de significação, ou como nos diz Finger (2010) a outros saberes. Tecendo e
aprofundando essas considerações sobre a experiência e o saber da experiência, Larrosa (2014) frisa
que esse saber é adquirido na forma como se responde aos acontecimentos que alguém vive ao
longo da vida e aos sentidos que lhes são atribuídos. E na contramão de uma concepção científica e
tecnológica de conhecimento, aqui não é a verdade dos fatos que está em jogo, mas, sim, o sentido
ou o sem-sentido do que foi vivido, na perspectiva de quem o viveu. Assim, o saber da experiência
possui uma qualidade existencial que o vincula a uma vida singular e concreta com suas inscrições
institucionais e sociais. Nessa direção, história de vida, no campo da formação docente, vai permitir
também uma densa relação entre o pessoal e suas inscrições institucionais e sociais, entre outras
coisas pela produção social de significados apropriados pelo sujeito ao longo de sua trajetória de
formação, pois, de acordo com Bragança (2008), quem narra não só traz os processos sociais de sua
produção narrativa, como, acrescenta Nóvoa (2010), passa a ter uma consciência contextualizada
dessa produção. Sob este aspeto, a teoria sócio-histórica de Vygotsky (2001) vai propor uma
compreensão sobre o desenvolvimento e a construção do conhecimento do sujeito, dando ênfase ao
contexto sócio-cultural e a criação de um espaço interno, a consciência, a partir da internalização de
práticas sociais específicas, como, por exemplo, os processos instituídos de formação. Assim, há uma
complexa relação entre sujeito, sociedade e cultura, mediada pelos instrumentos culturais e sistemas
de representação disponíveis no meio social, que, ao serem apropriados e internalizados, também se
apropriam do sujeito e o constituem. Nessa direção, como destaca Bragança (2008), quem narra traz
sempre o contexto e os processos de constituição de sentidos de sua narrativa. Assim, dentro do
pensamento de que o aporte (auto) biográfico no campo da educação pode proporcionar novas
relações espaço-temporais sobre a trajetória de formação, novas possibilidades de integração de
experiências, sentimentos e saberes e também uma contextualização institucional e social da
produção de sentidos sobre o processo de formação, se considerou o mesmo um aporte
extremamente fecundo para uma pesquisa que se volta para a formação do professor. Portanto,
dentro do tema mais amplo de formação inicial do professor, as narrativas aqui apresentadas vão ter
como eixo investigativo aspetos da formação inicial como os caminhos que levam a essa formação e
as expetativas em relação à mesma. Segundo Nóvoa (2010), é importante que a narrativa, no caso
(auto) biográfica, se organize a partir de um eixo de investigação, assegurando uma linha de reflexão
teórica e epistemológica sobre o tema. Nesse caso, a metodologia escolhida para esse trabalho foi a
entrevista narrativa, que é descrita por Jovchelovicth e Bauer (2011), como um método de geração

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

de dados, no formato sistematizado por Schütze, ao qual os autores acrescentam algumas


contribuições. Nessa perspectiva, a entrevista narrativa é compreendida como um método de
pesquisa qualitativo, sendo uma forma de entrevista não estruturada, de profundidade, como um
contraponto ao esquema pergunta e resposta que caracteriza a maioria das entrevistas, e que se
atem a um tópico inicial como deflagrador da narrativa. Assim, a ideia básica que permeia esse tipo
de entrevista é reconstruir acontecimentos sociais, ou como, neste caso, trajetórias de formação a
partir da perspectiva dos informantes. Isto porque, como afirmam Jovchelovitch e Bauer (2011),
compreender uma narrativa não é apenas acompanhar a sequência cronológica dos acontecimentos,
mas é também reconhecer outras dimensões expressas pelas funções e sentidos contidos na história
narrada.

1.2 Abordagem metodológica

Os dados foram recolhidos a partir de relatos de 80 alunos, 34 brasileiros e 46 portugueses, em


formação inicial, com apresentação de um tópico inicial – Como chegou ao curso de formação inicial
de professores e o que espera dessa formação? -, atendendo aos pressupostos teóricos e
metodológicos da pesquisa narrativa e histórias de vida na linha de Nóvoa e Finger (2010),
precursores desse aporte. Para tanto, o instrumento metodológico foi a entrevista narrativa a partir
das contribuições de Jovchelovitch e Bauer (2015). A segunda pesquisa a ser apresentada reporta-se
ao movimento de se pensar os processos de formação dos professores como parte da discussão mais
ampla em políticas públicas, cujo foco incidiu, especialmente, sobre a formação continuada,
verificando e refletindo como as políticas governamentais ajudaram a construir consensos e
dissensos para a formação permanente e a carreira dos professores. No que concerne à análise dos
Planos de Educação, os procedimentos teórico-metodológicos identificam o estudo como uma
pesquisa de natureza bibliográfica, destacando-se como fontes principais os documentos legais em
vigor, tendo como pressuposto a concepção de Ozga (2000) sobre políticas educacionais, entendidas
como processos. Essa abordagem facilita a investigação porque permite acessar o desenvolvimento e
a aplicação das políticas educacionais por parte do governo, observando suas ressonâncias no nível
macro e micro, nos sistemas de ensino em que foram implementadas.
Ambas as pesquisas contribuem para pensar sobre os caminhos da formação de professores na
perspectiva dos próprios envolvidos nesse processo em diálogo com políticas públicas que nem
sempre se concretizam na totalidade, fragilizando a formação e o trabalho dos professores.

2 Os dados: recolha e análise

A seguir, dada a natureza deste artigo, optou-se por trazer o registro na íntegra de quatro narrativas,
desenvolvidas a partir de tópico inicial mencionado acima, que foram escolhidas por apresentarem
pontos em comum com outras narrativas em relação aos temas propostos:

Quando era criança, tive uma experiência em ensinar crianças, fui professor de aula particular de 4 crianças
com idade entre 6 e 7 anos, com o passar do tempo fui tomando gosto pelo ensinar e educar. Percebi que essa
era uma das minhas vocações, sempre gostei de brincar de escolinha com meus irmãos e primos, isso tudo
ajudou a concretizar o gosto pela pedagogia.
Eu espero poder aprender mais a cada dia com a educação, quero que essa graduação me faça aumentar mais
ainda o gosto pela educação. Espero ver a felicidade no rosto das crianças ao conseguirem aprender. Quero ser
igual a meus professores do ensino médio e fundamental, tive uma base ótima, esta formação vai me fazer

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crescer mais a cada dia, gosto de cuidar, adoro educar mas o mais importante gosto de ser professor! (Yuri –
Licenciatura em Pedagogia)

Inicialmente eu não pensava em fazer pedagogia, sempre quis fazer Direito para passar em um concurso para
ser Delegada Federal, mas meu pai começou a conversar comigo sobre ser professor me mostrando a
importância que a professora tem na vida das crianças, desde então, comecei a pensar nessa possibilidade,
depois de algum tempo decidi que iria fazer Pedagogia e hoje estou aqui, super ansiosa para começar a
trabalhar na área. Hoje eu vejo como é gratificante trabalhar na Educação, o como é bom ensinar e aprender
com os alunos e sempre ver resultado. Como é gratificante ver todos os dias aqueles olhinhos brilhando olhando
pra mim, cada cartinha recebida, cada flor e cada gesto de carinho, assim podendo retribuir cada gesto a eles.
Espero aprender diversas formas de ensinar, conhecer sempre algo novo, para que assim eu possa ensinar a
eles de formas diferentes, aprender a como lidar com certas situações e o principal aprender conteúdos para
estar sempre inovando meus conhecimentos, para que assim eu possa estar disponibilizando a eles a melhora
no aprendizado, o ser sempre a mediadora do conhecimento. Espero aprender também sempre com meus
alunos, e ser muito dedicada no meu trabalho. (Paola – Licenciatura em Pedagogia)

Nessas duas narrativas de alunos de Pedagogia em uma instituição de ensino superior privada no
Brasil, é possível inferir que em relação ao tema caminhos de escolha embora seja marcante a
presença da família, de professores que foram importantes nessa trajetória como referências
significativas, a experiência com situações que envolvem práticas pedagógicas, de maneira informal
ou não, em diversos períodos da vida ou do próprio curso de Pedagogia, parece ter um papel muito
importante na escolha desse caminho, consolidando essa opção e encaminhando as expetativas na
direção de um aprimoramento do que foi constatado como possibilidades de desenvolvimento não
só do futuro professor, mas também dos futuros alunos.
Destaca-se ainda, principalmente na segunda narrativa, a expetativa de aprender diversas formas de
ensinar, de lidar com certas situações no contexto do ensinar e aprender e, sobretudo, aprender
conteúdos para melhorar os conhecimentos, como se tratassem de conhecimentos de ordem
diferenciada, questão já assinalada por Nóvoa (2010), como uma das dicotomias do modelo escolar.
A mesma narrativa apresenta a docência como uma atividade que tem uma dimensão afetiva que
permeia toda prática pedagógica. Evidencia também, na perspectiva de Freire (2005), um professor
que se assume como aquele profissional que ensina e aprende ao mesmo tempo.
Destacam-se ainda alguns outros aspetos nas narrativas seguintes que contribuem para essa
discussão:

Este interesse e deslumbre que tenho pela infância manifestou-se desde muito cedo. Ainda criança, o carinho e
o cuidado pelo mais novo era sempre muito notório. Sempre tive como referências a minha educadora e mesmo
em brincadeiras, o meu nome era sempre o nome da minha educadora. Ao longo dos anos, as escolhas, os
passatempos eram sempre direcionados em torno de uma via que com o passar do tempo se evidenciava mais,
ser educadora de infância. Tive bons e maus professores, como toda a gente. Mas de facto, os maus tiveram
grande peso naquilo que sou “menos apta” , como a matemática. O estar em grupo, lidar com pessoas
diferentes de nós, a partilha, a entreajuda sempre foram práticas educativas que me marcaram e que me eram
incutidas. Quero poder transmitir determinados valores, práticas educativas, formas de estar e agir a crianças,
essas que tomam sempre um adulto como referência. Para isso há muito que quero aprender para poder
transmitir as coisas certas, nas alturas indicadas. Estou completamente disposta a aprender o que na prática no
dia-a-dia pode ser de facto aplicado. (Renata – Educação Básica)

Desde pequena que quero ser professora. Era e é o meu sonho. Nesta escolha fui muito influenciada pela minha
educadora e pela minha professora primária. Uma das práticas educativas que me marcaram foi o ensino do
respeito pelo outro e a organização que devemos ter. Desde a pré-primária que me lembro de ser educada
assim. Ao longo do meu processo tive bons e maus professores e espero que neste curso consiga aprender a ser

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uma boa professora/educadora e que desenvolvia capacidades que até aqui não desenvolvi! (Célia – Educação
Básica)

Um dos padrões que poderemos identificar, nessas narrativas de alunos futuros professores de uma
universidade em Portugal, refere-se ao desejo de desde cedo manifestarem um forte interesse em
ser educadora ou professora, ao mesmo tempo aludindo ao papel influenciador dos profissionais que
tiveram ao longo do seu percurso escolar. Assumem ainda destaque a importância atribuída às
interacções pessoais, à natureza dos valores a estimular numa base de grande afeição pelas crianças
e pelo mundo da infância em geral. As expetativas futuras incidem no desenvolvimento de
conhecimentos e de capacidades pessoais, visando a uma melhor intervenção na Educação de
crianças. Neste sentido, a entrevista narrativa pode contribuir não só na constatação de alguns
sentidos ainda presentes nas concepções sobre formação, promover reflexões sobre aspetos que
ainda constituem desafios nesse processo que estão, de algum modo, relacionados à própria
concepção de formação das instituições para o atendimento desse alunado, como também à
formulação de políticas públicas já instituídas e a instituir, tanto no Brasil como em Portugal.

3. Como as políticas públicas sobre a formação de professores dialogam com as


expetativas dos futuros professores: compassos e descompassos

As políticas públicas para a formação de professores, tanto no Brasil, bem como em Portugal,
precisam se aproximar mais dos envolvidos nesse processo, especialmente, quando se verifica que
há nas narrativas sobre a escolha da profissão docente uma visão romantizada da carreira que,
pouco a pouco, vai sendo desconstruída com a inserção na realidade de trabalho dos professores. Os
alunos e alunas levados à licenciatura de pedagogia, no Brasil, e educação básica, em Portugal,
declarando-se movidos por um proclamado “gosto pela infância”, ou pelo exemplo dado por seus
antigos professores, ou, ainda, por experiências vividas enquanto crianças, ao se depararem com a
realidade de atuação, particularmente, nas redes públicas, começam a ter a dimensão das
dificuldades que cercam a profissão, desde as deficiências técnicas para exercerem seu trabalho,
muitas vezes constatadas logo após a conclusão dos cursos de formação inicial, até as condições
oferecidas para que possam cumprir sua “missão” e “vocação”, ambas justificativas que aparecem
nas narrativas.
Silva (1997, p.54) utiliza a expressão “choque com a realidade”, aplicada aos professores em início de
carreira, para traduzir “todo o impacto por eles sofrido quando iniciam a profissão e que poderá
perdurar por um período de tempo mais ou menos longo”. Esse impacto inicial, por sua vez, já
começa a movimentar certezas e narrativas sobre a escolha da profissão, as quais passam a
incorporar mais justificativas de ausência de outras possibilidades, do que as afirmações presentes
anteriormente que se referiam a desejos pessoais como: “sempre quis ser professor”, ou “desde a
infância queria ser professora”. Além de aprender um “novo papel”, assim como adequar as suas
características pessoais à forma de ensinar, fazendo com que os alunos aprendam, outras
preocupações são elencadas por Silva (1997, p.56-57) como inerentes ao início de carreira dos
professores. Para a autora, o confronto com o meio socioprofissional causa nos professores “medos,
frustrações e insegurança”, especialmente, relacionados à carga de trabalho burocrático, ausência de
condições materiais, carga horária exaustiva, relação com os gestores, turmas numerosas, falta de
apoio para a resolução de problemas, entre outras circunstâncias que contribuem para uma
desilusão progressiva que vai culminar com a perda de entusiasmo pela carreira docente. As
narrativas apresentadas mostram que os futuros professores têm diversas expetativas em relação à
atividade docente que, nas palavras de Huberman (2007, p.39-46), fazem parte do “ciclo de vida

152
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

profissional” em que se encontram, cuja “entrada na carreira” é marcada por um entusiasmo inicial
que vai, ao longo das fases subsequentes, passar por uma “crise existencial”, na qual são colocadas
em questão as escolhas e a própria permanência na atividade docente, para, a seguir, após um
“distanciamento afetivo” e “conservantismo e lamentações”, partir-se para o “desinvestimento”,
algo comum de ser encontrado no fim da carreira dos docentes, mas que aparece, cada vez com mais
frequência, pouco tempo depois dos anos iniciais de exercício do magistério. Embora outras carreiras
apresentem ciclos semelhantes, a continuidade de pesquisas que tem como foco às motivações
referentes ao “desinvestimento” na carreira por parte dos professores com esse perfil evidencia que
“o cansaço, o sentimento de rotina, os alunos indiferentes ou mal comportados e razões
institucionais, que vão das condições de trabalho a conflitos com os colegas”, são causas elencadas
para o desestímulo designado como característico dos “piores anos da carreira” (Gonçalves, 2007, p.
154). É nesse sentido que as políticas de formação e valorização de professores buscam normatizar
aspetos que possam garantir ações específicas e constantes para os profissionais da educação, entre
elas, Formação continuada; Pós-graduação para todos os professores; Fórum permanente e políticas
de valorização salarial; Plano de Carreira; Qualificação profissional; Fórum permanente de discussão
das condições de trabalho; Repasse e aplicação de recursos para a formação inicial e continuada;
Formação dos gestores; assim como outros temas que são destacados em Lei.
Todavia, quando se analisam os preceitos normativos estabelecidos na legislação vigente, para
promover a formação continuada e a valorização dos professores, confrontados à realidade
constante dos relatórios oficiais, apresentados pelos gestores, com a finalidade de demonstrar o
cumprimento da lei, o que se depreende é que há um ritmo bastante lento para a implantação de
qualquer melhoria das condições de trabalho desses profissionais, bem como suas deficiências
salariais históricas comprometem outras medidas que, embora não estejam diretamente ligadas,
acabam por interferir no processo como um todo. A valorização profissional passa, necessariamente,
por Planos de Carreira adequados ao nível de formação dos profissionais docentes, e somente essa
valorização pode se tornar propulsora de ações como a busca por formação continuada, a maior
titulação e a qualificação profissional, o interesse pela gestão das escolas e dos setores pedagógicos
etc. No entanto, o pano de fundo para a efetivação de qualquer uma dessas perspectivas prevista em
lei é o financiamento da educação que envolve o repasse e a aplicação de recursos, de forma
equilibrada, atendendo-se, prioritariamente, ao que já é uma norma a ser cumprida. Embora o
investimento naquilo que é previsto em lei pareça o óbvio, nem sempre essa relação é respeitada e,
muitas vezes, os gestores elegem suas “políticas de governo”, como alvos prioritários dos
investimentos, desrespeitando os Planos de Educação que, por sua natureza resultante de
conferências e de congressos com a participação dos profissionais da educação, além de instituídos
por lei municipal, estadual ou federal, são considerados “políticas de estado” (Valle, Meneses, &
Vasconcelos, 2010). Ao colocar em diálogo as políticas públicas sobre a formação de professores e as
expetativas dos futuros professores expressas em suas narrativas, observam-se os descompassos que
vão sendo acumulados ao logo da trajetória docente, permitindo que sujeitos que se
autodenominavam com “gosto” pelo ensinar e educar, por ser professor, por estar com as crianças,
encontrem-se, já inseridos na profissão docente, constantemente “perante numerosos dilemas”
(Sacristán, 1999, p.86), “já que a realidade do ensino produz-se num quadro bem diferente” (p.89),
do que aquele imaginado pelos licenciandos em suas reflexões iniciais sobre a escolha da profissão
docente. As políticas públicas para a formação inicial e continuada e a valorização dos profissionais
de educação se fazem, cada vez mais, urgentes e necessárias, não somente no estabelecimento de
avanços nesse campo, mas, notadamente, na fiscalização das conquistas já incorporadas à legislação
que, todavia, não vêm sendo cumpridas integralmente, como ocorre no Estado do Rio de Janeiro,
onde dados oficiais e estatísticas, muitas vezes, encobrem a realidade que se apresenta muito aquém
do proposto, embora sinalizada como objetivos e metas atingidas do Plano Estadual de Educação.

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4 Conclusões

Ao serem inseridas no contexto da formação de professores, as histórias de vida trouxeram uma


imensa contribuição a esse campo, porque propõem aos sujeitos, nas palavras de Pineau (apud
Delory-Momberger, 2014, p.313), “o poder transformador” de examinar suas próprias condições de
formação. Para os pesquisadores da área, é inegável a significação dessas experiências, uma vez que
esse poder se multiplica, à medida que, de acordo com Ferrarotti (2014, p.92), “a fala que cada um
de nós deve recitar, a que lhe cabe no grande palco da sociedade, pesa indiscutivelmente sobre as
estruturas arquetípicas das motivações e das orientações individuais”. Dessa forma, em uma
sociedade cada vez mais individualista, compartilhar histórias de vida para, por meio delas, encontrar
seu lugar na história coletiva da formação dos professores, torna-se “uma perspectiva emancipadora
e militante” (Delory-Momberger, 2014, p.314).
Nesse sentido, a entrevista narrativa realizada com alunos do curso de Pedagogia e da Educação
Básica revela mais do que parte da história de formação de cada um deles, mas também evidencia as
premissas que envolvem as trajetórias para se chegar até o curso de formação de professores e o
que os sujeitos esperam dessa formação. Os argumentos presentes na narrativa demonstram que há
um distanciamento entre as expetativas, as concepções do fazer docente, e a realidade em que essa
prática será inserida. Essa lacuna que se encontra entre as aspirações e o contexto real vai sendo
preenchida com narrativas construídas com elementos adquiridos no ciclo de vivências profissionais,
fortemente marcadas por etapas que vão do entusiasmo inicial a um profundo desinteresse e
desinvestimento na carreira docente.
A linha descendente de motivações para a permanência e manutenção do entusiasmo pela profissão
docente também está eivada da ausência de políticas públicas efetivas para a formação inicial e
continuada e a valorização dos profissionais da educação que, pouco a pouco, compromete o
trabalho cotidiano e as possibilidades de transformá-lo. Diante da ineficácia em tentar alterar suas
condições de trabalho, os sujeitos submergem as suas expetativas e abdicam de seus projetos
iniciais, conformando-se com as condições existentes.
Embora muitas narrativas posteriores aos momentos iniciais de inserção na carreira docente
sinalizem resistências e militâncias (Machado, 2015), parte dos professores autores de narrativas
positivas enquanto estão realizando a formação inicial, abdicam de percursos mais elaborados e
passam a agir burocraticamente em suas funções cotidianas quando se tornam profissionais.
O Estado, por sua vez, responsável pela gestão de grande parte das redes escolares que atendem à
população, não tem demonstrado, por meio de políticas públicas, compromisso com a efetivação de
condições que possam aproximar as expetativas de jovens ingressantes em cursos de licenciatura à
realidade das escolas, tornando-as mais adequadas ao desenvolvimento do trabalho docente. As
próprias diretrizes legais são reduzidas ao seu mínimo de efetivação, muitas vezes, apenas para
cumprir os protocolos exigidos. Aos professores sobrevêm as narrativas de vida e, incluídas nelas, as
de formação, que podem revelar outra possibilidade metodológica de compreender seu trabalho,
modificando o campo em que se verifica a realidade e, posteriormente, a própria realidade.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Um olhar sobre o planejamento das aulas de matemática nas classes


hospitalares de Goiás, Brasil

Uyara Soares Cavalcanti Teixeira1; Ricardo Antonio Gonçalves Teixeira2; Mário José de Souza1;
Lírian Pinheiro Parreira Borges2

Universidade Federal de Goiás

Resumo. A pesquisa que se apresenta elege como tema as classes hospitalares, como objeto a educação
matemática nesse contexto e como objetivo geral a compreensão do processo ensino-aprendizagem de
matemática nos atendimentos pedagógicos realizados nos hospitais em Goiás. Pesquisa de base
explorátoria, de abordagem qualitativa, valendo-se de observação, questionário e entrevista. Partindo das
principais politicas de atenção às classes hospitalares, elegeu-se como campo de investigação o Núcleo de
Atendimento Educacional Hospitalar (NAEH), órgão da Secretaria de Estado da Educação, Esporte e Cultura
de Goiás (SEDUCE) e como sujeitos, os docentes atuantes no ensino de matemática nos hospitais e a
coordenação do NAEH. O estudo oportunizou compreender o trabalho pedagógico desenvolvido nas classes
hospitalares em Goiás, com foco nos hospitais da cidade de Goiânia, possibilitando investigar como os
professores elaboram suas propostas de ensino para as aulas de matemática.
Palavras-chave: classe hospitalar, ensino-aprendizagem, planejamento, matemática.

The perception of math planning in hospital classes in Goiás, Brazil


Abstract. The present research selects the hospital class as a theme, as an object of mathematics education
in this context and as a general objective the understanding of the teaching-learning process of
mathematics in the pedagogical attendance carried out in the hospitals in Goiás. Research based
exploratory, qualitative approach, using observation, questionnaire and interview. Starting from the main
policies of attention to the hospital classes, it was chosen like field of investigation THE Núcleo de
Atendimento Educacional Hospitalar (NAEH), department of Secretaria de Estado da Educação, Esporte e
Cultura de Goiás (SEDUCE) and as subjects of study, teachers working in the teaching of mathematics in
hospitals and the coordination of NAEH. The study opportunized to understand the pedagogical work
developed in the hospital classes in Goiás, focusing on hospitals in the city of Goiânia, making it possible to
investigate how teachers prepare their teaching proposals for math classes.
Keywords: hospital class, teaching-learning, planning, mathematics.

1 Introdução
Elegendo como tema de investigação o atendimento educacional em ambiente hospitalar e
domiciliar, as denominadas classes hospitalares, este estudo busca compreender o processo ensino-
aprendizagem de matemática no contexto hospitalar. O estudo é do tipo exploratório, de base
qualitativa, valendo-se de base documental e empírica. A pesquisa parte de estudos do campo
documental com levantamento dos principais referendos de constructos das políticas de classe
hospitalar no Brasil e em Goiás. Os dados primários foram coletados por meio de aplicação de um
questionário e realização de entrevistas semiestruturadas com docentes e equipe gestora do Núcleo
de Atendimento Educacional Hospitalar (NAEH).
Com base na política de educação especial de 1999, a rede estadual de educação de Goiás institui as
primeiras experiências nas classes hospitalares. A partir de diretrizes e orientações do Ministério da
Educação (MEC) para organização das classes hospitalares em todos os estados brasileiros, o
atendimento pedagógico domiciliar e hospitalar em Goiás modifica sua estrutura de organização e
oferta das classes hospitalares.
Este artigo se orienta pela política de atendimento hospitalar e domiciliar no sentido de
compreender, na perspectiva dos docentes do NAEH, como se dá o planejamento nas aulas de

156
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

matemática para os alunos hospitalizados, focando nos conteúdos, estratégias pedagógicas adotadas
e o processo de avaliação.
2 Classe hospitalar
2.1 Aspectos políticos e operacionais das classes hospitalares
As garantias legais na especificidade de estudantes em tratamento de saúde, sem condições de
frequentar a sala de aula regular, darem continuidade aos seus estudos é uma premissa
constitucional brasileira (Brasil, 1988), reforçada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB, Lei n. 9.394/1996) (Brasil, 1996) e estruturada pela Resolução CNE/CEB n. 2/2001.
Em termos de orientação para organização de tais atendimentos em ambientes hospitalares ou
domiciliares nas diferentes redes de educação de todo o Brasil, em 2002, o Ministério da Educação
(MEC) instituiu a política denominada “Classe Hospitalar e Atendimento Pedagógico Domiciliar:
estratégias e orientações” (Brasil, 2002).
De acordo com a política, a organização e funcionamento desses atendimentos se dão por meio do
encadeamento dos sistemas de educação das secretarias estaduais, do Distrito Federal e municipais
de educação, como também as direções dos hospitais em que se localizam. Atribui às secretarias de
educação atender aos hospitais quando lhe for solicitado o atendimento pedagógico. Apresenta
demanda de formação de professores, preferencialmente em Educação Especial, para atuação nas
classes hospitalares.
No Estado de Goiás, localizado no Centro-Oeste brasileiro, as classes hospitalares foram instituídas
em 1999, em atendimento à Política Nacional de Educação Especial deste mesmo ano, por meio do
Projeto Hoje, desenvolvido pela, então, Superintendência de Ensino Especial, órgão da Secretaria de
Estado da Educação (SEE). O Projeto Hoje teve sua primeira classe hospitalar no Hospital de Combate
ao Câncer Araújo Jorge, em Goiânia, sendo mais tarde o serviço expandido para outras instituições
da rede pública.
Em 2013, em função da complexidade e importância dos serviços prestados, o projeto se estabelece
na atual Gerência de Ensino Especial da Secretaria de Estado da Educação, Cultura e Esportes de
Goiás (SEDUCE) como núcleo, passando a ser denominado Núcleo de Atendimento Educacional
Hospitalar (NAEH), cujo objetivo consiste em “possibilitar às crianças, adolescentes e adultos
impossibilitados de frequentar a escola regular e/ou em condição especial de saúde iniciar ou dar
continuidade à escolaridade favorecendo o processo de inclusão escolar” (Goiás, 2014, p.5).
O atendimento pedagógico hospitalar ou domiciliar a estudantes da Educação Básica matriculados na
rede pública de ensino é um serviço assegurado pelo NAEH, em parceria com dez hospitais públicos
da rede estadual de Goiás. O NAEH dispõe de um grupo gestor para atender as demandas e
orientações da SEDUCE, e para assegurar o serviço tem uma equipe composta por um coordenador
geral, coordenador domiciliar, secretária, assistente social, psicólogo e professores (em número
variável, em conformidade com a demanda). Além de funções administrativas, compete ao NAEH a
articulação de informações e orientações com o estudante, escola regular onde este se encontra
matriculado, seus familiares e hospital, quando se encontram internados.
No hospital o atendimento, quanto possível, é realizado de forma coletiva, formando uma turma
multisseriada, ou seja, o atendimento é simultâneo, direcionado a educandos de diferentes idades e
níveis escolares. Em todos os casos, salvo em condições especiais, os professores se orientam pela
proposta curricular da escola de origem do educando, com isso fica a cargo do professor de classe
hospitalar adequar a proposta de acordo com as necessidades do educando (Goiás, 2013; 2014).
Para que o atendimento seja desenvolvido no ambiente hospitalar, em conformidade com
orientação da política do MEC (Brasil, 2002), é necessário que haja um espaço físico mínimo que
ofereça suporte para que as aulas aconteçam, seja na pediatria, ambulatório, ortopedia, hemodiálise,
diálise, clínica médica, clínica cirúrgica, quimioterapia, ou no leito das enfermarias.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Enquanto perfil do docente para atuação nas classes hospitalares, em conformidade com a política
do NAEH, é necessário que seja efetivo da rede estadual ou devidamente contratado pela SEDUCE.
Nesse sentido, em Goiás, o atendimento pedagógico hospitalar ou domiciliar é ofertado por
profissionais da educação e não por voluntários. Tais docentes, de acordo com as orientação do
NAEH, devem apresentar equilíbrio emocional e psicológico e vida saudável, bem como formação
específica para atuação no contexto hospitalar (Goiás, 2014).
De acordo com dados disponibilizados pelo NAEH (2016), todos os professores que realizam
atendimento educacional hospitalar e domiciliar em Goiás possuem curso de licenciatura, sendo a
maioria (43,8%) graduados em Pedagogia, com curso de especialização na área de educação especial
(45%).
Vasconcelos (2015) apresenta que o professor da classe hospitalar deve ter um olhar sensível, porém
atento às necessidades e habilidades dos educandos em tratamento de saúde, a fim de contribuir
com a construção do conhecimento e da cidadania. O trabalho do professor na classe hospitalar se
diferencia de um professor da escola comum do ensino regular em diversos aspectos (Brasil, 2002),
dentre os quais destaca sua sensibilidade para perceber o momento pedagógico de cada educando,
promovendo adequações e adaptações no planejamento e metodologia das aulas (Goiás, 2014).
2.2 Educação matemática e aproximações com a classe hospitalar
O ensino de matemática no contexto regular, da escola comum, ainda se apresenta como um
desafio.
Embora seja reconhecido o volume de esforços – de instituições de ensino superior, de secretarias de
educação, dos próprios professores – a matemática e o seu ensino, principalmente na Educação
Básica, tem se constituído como uma área do saber pouco acessível aos estudantes, tornando-se,
assim, mais como um instrumento de exclusão do que inclusão (Teixeira, 2010). É a partir dessa
demanda que surge a Educação Matemática, uma área interdisciplinar (pre)ocupada com a
matemática, seu ensino e implicações históricas, sociais, políticas e culturais.
A educação matemática, para Bicudo (1999), deve reverter o caráter eletista historicamente
construído, se apresentando de modo sensível e pertinente com o cuidado. Para a autora, é
necessário ter “cuidado com ...” o aluno que mesmo estando inserido em um ambiente escolar
possui experiências e hipóteses relacionadas ao processo de matematizar trazidos do meio em que
ele está inserido; “cuidado com...” a matemática enquanto ciência, sendo importante considerar sua
história, suas manifestações em diversos contextos e o modo como se apresenta cientificamente;
“cuidado com...” o espaço escolar, pois, é nele que nasce os saberes escolares. As diversas formas de
cuidado que são definidos se relacionam com clareza ao objetivo da educação matemática que ela
também expõe como sendo uma “pré-ocupação” com os (des)caminhos educacionais, pontuando
que esses trajetos podem ser influenciados por fatores históricos, sociais e políticos, gerando assim
possibilidades ou consequências.
A Educação Matemática, na perspectiva de Bicudo, busca o “novo...”, com esse propósito gera novos
caminhos para aprendizagem não só de conteúdos de matemática, mas novos sentidos, reflexões
durante o processo de produção e construção do conhecimento significativo, novas práticas
pedagógicas que possibilita o professor expor suas ações de maneira dinâmica, ser o potencializador
e não o detentor do conhecimento enfim, por meio dessa perspectiva o saber matemático é
construído aos poucos com o “cuidado” necessário para que a aprendizagem seja significativa e
prazerosa.
Pensar a matemática e o seu ensino no contexto especial, como é o caso das classes hospitalares,
torna-se um desafio ainda mais complexo. É neste contexto que a pesquisa se estabelce.
Em termos de desafios, possivelmente um deles é pensar uma matemática significativa tendo como
parâmetro a estrutura curricular proposta pela SEDUCE. De acordo com as políticas do NAEH, assim

158
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

como as escolas da rede regular de ensino, a classe hospitalar tem como diretriz o Currículo
Referência de matemática da SEDUCE, instituído em todo estado em 2011.
O Currículo Referência na SEDUCE é um instrumento pedagógico para todas as áreas do saber,
incluindo a área de matemática. Esse instrumento se propõe

[...] orientar, de forma clara e objetiva, aspectos que não podem se ausentar no
processo ensino aprendizagem em cada disciplina, ano de escolaridade e bimestre.
Assim, busca-se referenciar uma base comum essencial a todos estudantes, em
consonância com as atuais necessidades de ensino identificadas não somente nas
legislações vigentes, Diretrizes e Parâmetros Curriculares Nacionais, mas também
nas matrizes de referências dos exames nacionais e estaduais, bem como a matriz
curricular do Estado de Goiás. (Goiás, 2013, p. 10).

Na área de matemática, do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental e 1ª a 3ª série do Ensino Médio, o


Currículo Referência tem como orientação, a aplicação dos conteúdos, partindo do pressuposto que
as expectativas de aprendizagem que norteiam a fragmentação dos conteúdos sejam atingidas.
De modo ordenado os conteúdos estão estruturados em quatro eixos temáticos: números e
operações, espaço e forma, grandezas e medidas e tratamento da informação - definida a partir dos
Parâmetros Curriculares Nacionais- Matemática (Brasil, 1997).
O Currículo Referência da SEDUCE1, embora exponha como objetivo possibilitar ao estudante “a
compreensão da sua realidade, quando favorece as culturas local e juvenil, estimulam a leitura e a
escrita [...]” (p. 118), apresenta os conteúdos de matemática, aos moldes tradicionais, de forma
fragmentada, bimestralizada, em eixos temáticos indicados, e expectativas de aprendizagem
exclusivamente direcionadas a conteúdos. Esse modelo de currículo proporciona, ao docente, seja da
classe regular ou especial de ensino, uma plataforma rígida de conteúdos a serem desenvolvidos, a
partir de uma perspectiva padrão de aprendizagem. Os objetivos apresentados no documento, com
base em expectivas de aprendizagem, norteiam um processo de avaliação na competência adquirida
nos conteúdos ensinados.
O sentido do “desafio” do ensino de matemática para as classes hospitalares se orienta, enquanto
objeto de investigação, pelo motivo de a classe hospitalar demandar, conforme estabelece a política
nacional do MEC para esse fim (Brasil, 2002) e as políticas do NAEH (Goiás, 2013; 2014) no sentido de
estabelecerem, enquanto princípio, a flexibilização pedagógica, a adaptação curricular, a escuta
sensível, o processo de humanização, elementos não coerentes com o preconizado pelo Currículo
Referência da SEDUCE.
3 Metodologia
O delineamento adotado para o estudo foi do tipo exploratório que, segundo Gil (2008), busca
contribuir para a complementação de um conhecimento inicial, proporcionando uma visão ampla e
geral de aproximação sobre o tema; de base qualitativa em que o pesquisador se apresenta como
um observador que interage com os sujeitos em estudo, sem a busca pela neutralidade. Os
investigadores na pesquisa qualitativa, de acordo com Bodgan e Biklen (1994), ao assumirem que o
comportamento humano é influenciado pelo contexto, buscam, no campo, o local para o estudo.
Para os autores, “os investigadores qualitativos frequentam os locais de estudo porque se
preocupam com o contexto” (p. 48). Na perspectiva de Marconi e Lakatos (1999), a pesquisa de
campo possibilita, ao pesquisador, informações e/ou conhecimentos acerca de um problema que
deseja aprofundar ou conhecer para obtenção de respostas. Nesse tipo de pesquisa, o levantamento

1
O Currículo Referência do Estado de Goiás. Disponível em:<http://www.seduc.go.gov.br>. Acesso em:
20/fev/2017.

159
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

de informações, a atuação do pesquisador, os diálogos estabelecidos, bem como a interpretação do


campo são características fundamentais em todo processo de investigação (Ghunter, 2006).
A pesquisa, ora apresentada, partiu de estudos de base documental, com o levantamento dos
principais referendos de construtos das políticas de classe hospitalar no Brasil e em Goiás. Elegeu
como campo de atuação o Núcleo de Atendimento Educacional Hospitalar de Goiás (NAEH), órgão da
Gerência de Ensino Especial da Secretaria de Estado da Educação, Cultura e Esporte de Goiás
(SEDUCE). Participaram como sujeitos da pesquisa os professores que realizam atendimento
pedagógico na área de matemática nos hospitais de Goiânia, capital do estado de Goiás.
O estudo foi realizado no período de julho de 2016 a janeiro de 2017. No âmbito da pesquisa, foram
feitas observações sistemáticas em campo. Como parâmetro, os pesquisadores participaram de
reuniões estabelecidas em cronogramas institucionais, de encontros de formação docentes
promovidas pelo NAEH, bem como de duas aulas de matemática ocorridas em hospitais distintos.
Para organização das informações observadas, utilizou-se como suporte um diário de pesquisa,
definido por Barbosa e Hess (2010), como um instrumento para anotações, registro, sistematização
de ideias e construtos multirreferenciais e plurais resultantes de observações e reflexões do campo
vivido. Nesse processo de registro, ressalta-se, enquanto fundamento, a compreensão de que a
essência de um fenômeno não se encontra na “pureza” definitivamente dada, definida ou objetivada,
como expõe Merleau-Ponty (1994). A sua apreensão se mostra a partir da reflexão. A descrição dessa
essência, como elemento da expressão do sujeito, é o modo como esse sujeito percebe, a partir do
seu mundo vivido, essa experiência e como ela se dá. O instrumento, como exposto, se constituiu de
uma ferramenta de registro do percebido, observado, discutido e refletido a partir dos olhares dos
pesquisadores.
Além da observação, optou-se pela aplicação de um questionário aos docentes atuantes nos
hospitais. O questionário foi composto com 11 questões, sendo 7 abertas e 4 fechadas. O
instrumento abordou aspectos sócio demográficos e educacionais, bem como apontamentos
específicos sobre o processo ensino-aprendizagem de matemática. O instrumento foi aplicado a
todos os 31 professores do NAEH que lecionam matemática nas classes hospitalares. Os critérios de
inclusão para responder ao instrumento foram: ser professor do NAEH; atuar como docente em um
dos dez hospitais conveniados com a SEDUCE; realizar atendimento pedagógico aos educandos na
área de matemática.
O questionário, conforme Gil (2008), como técnica de investigação, é importante instrumento de
pesquisa. Na premissa de uma investigação qualitativa, esse instrumento, aliado a outras
modalidades de recolha de dados, possibilita, ao investigador, melhores condições de apreender o
fenômeno a ser estudado/compreendido, tendo em vista a não negação da subjetividade. As
questões fechadas dos questionários, além de possibilitar melhor compreensão do contexto, em
termos de perfis e cenários, podem contribuir com uma análise filtrada em determinados atributos
como gênero, faixa etária, determinadas condições sociais, nível de escolaridade, dentre outros.
No âmbito da pesquisa, optou-se, ainda, pela realização de uma entrevista semiestruturada com a
coordenadora pedagógica do NAEH no sentido de levantar e confrontar informações obtidas no
processo de observação e dos questionários aplicados.
O tratamento das questões fechadas foi realizado com apoio do pacote estatístico Statistical Package
for the Social Science (SPSS)®, versão 23. As questões abertas foram analisadas a partir da Análise de
Conteúdo na perspectiva de Franco (2004) e Bardin (2010), sendo utilizado o software NVivo, versão
11, como apoio e suporte para consolidação dos dados não numéricos e não estruturados.
Na condução da Análise de Conteúdo, no processo das unidades de análise, levantou-se as unidades
de registro e unidades de contexto, sendo tais informações cadenciadas por aproximações de ideias
em seus respectivos registros, conduzidos, a posteriori, em subcategorias, convergindo
sequenciamente em categorias de análise. De acordo com Franco (2004), “formular categorias, em

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análise de conteúdo, é, via de regra, um processo longo, difícil e desafiante” (p. 59). As categorias
que emergiram foram: escolha dos conteúdos; práticas pedagógicas adotadas; avaliação do processo
ensino-aprendizagem; principais dificuldades para condução das aulas.
Em termos de caracterização dos sujeitos atuantes nas classes hospitalares do NAEH que atuam no
ensino de matemática, segundo dados do NAEH de 2016, todos os professores de classe hospitalar
são do sexo feminino, sendo que 45,83% atuam em Goiânia e os demais em cidades no interior do
Estado de Goiás.
Sobre a formação em nível de graduação, todos os professores do NAEH são graduados em cursos de
licenciatura (grau acadêmico destinado à formação de professores para o exercício do magistério na
Educação Básica no Brasil), tendo 89,3% com curso de pós-graduação, sendo 78,6% com
especialização (destes, 45% com curso de especialização na área de educação especial) e 10,7% com
mestrado na área de educação. O documento redigido pelo MEC (Brasil, 2002) para as classes
hospitalares orienta que “o professor deverá ter a formação pedagógica preferencialmente em
Educação Especial ou em cursos de Pedagogia ou licenciaturas” (p.22).
Ressalta-se que nenhum dos professores possui graduação na área de matemática. A matemática, na
SEDUCE, em função da falta de professores em toda rede de ensino, é caracterizada como uma área
prioritária, cujos professores são impedidos de assumir funções que não as de docência em classes
comuns do ensino regular. As principais áreas de formação dos professores de classe hospitalares
são: pedagogia (43, 8%); letras (28,1%), ciências biológicas (9,4%), educação física (6,3%).
No que tange a capacitação dos professores para o atendimento pedagógico hospitalar, o NAEH, em
parceria com a Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG), oferece aos
educadores, cursos para o aprimoramento da prática pedagógica, dentre eles, o curso de formação
de professores para classes hospitalares, com carga horária de 120 horas-aula. Mais recentemente,
com resultado deste estudo, o Instituto de Matemática e Estatística da UFG iniciou o processo de
formação de professores de classe hospitalar na área de matemática.
4 Análise
Uma das questões apresentadas aos professores do NAEH foi quanto à suficiência da formação
docente para realização dos atendimentos pedagógicos nas classes hospitalares. Embora o grupo
docente seja constituído de professores com tempo de atuação no NAEH variando entre os mais
experientes, 10 anos ou mais (25,8%), aos iniciantes, com menos de três anos (32,5%), dos
professores inquiridos, 74,2% avaliaram que a formação conduz a uma prática pedagógica no
ambiente hospitalar e domiciliar de forma satisfatória.
Porém, quando questionados sobre a segurança em tal atendimento na área de matemática, apenas
29% disseram ter segurança em ensinar matemática para alunos de diferentes séries e idades.
Ressalta-se que, embora o curso de pedagogia (com maior concentração de professores) contemple
a área de matemática no processo de formação do professor, a atuação do pedagogo, em vias de
regra, se restringe à educação infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental. Nas classes
hospitalares, a atuação do docente, seja ele pedagogo ou não, se expande para anos finais do Ensino
Fundamental e Ensino Médio.
Para além das questões de formação docente ofertada aos profissionais, é necessário salientar que o
trabalho dos professores das classes hospitalares difere dos demais que atuam em classes regulares
em vários aspectos, dentre os quais destacamos o espaço físico e ambientes não apropriados ao
campo educacional, educandos físico e psicologicamente fragilizados, salas de aula multisseriadas
(com presença de educandos de idades e séries variadas), ambiente insalubre e estranho ao
professor, demandas de conhecimento em biossegurança (não contemplados na formação inicial dos
professores), dentre outros.

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Por vivenciar situações inconstantes dos alunos no ambiente hospitalar, em função de suas
condições de saúde, os professores encontram dificuldades em planejarem suas atividades
pedagógicas, visto que não sabem o cenário que vão presenciar ao chegarem no hospital, ou se
naquele dia um educando atendido anteriormente ainda será parte do seu grupo de discentes.
Partindo da orientação do art.13 da Resolução n. 2/2001 do CNE/CEB que determina às classes
hospitalares e ao atendimento pedagógico domiciliar flexibilizar as propostas pedagógicas, a fim de
dar continuidade as atividades que promovam o desenvolvimento e a aprendizagem do educando,
facilitando o seu regresso a escola de origem (Brasil, 2001), foi que surgiu a indagação para o
desenvolvimento dessa pesquisa: como se dá o processo de ensino-aprendizagem de matemática
nas classes hospitalares? Tal questão suscita a reflexão e aprofundamento no sentido de que,
conforme os documentos orientadores da prática pedagógica nas classes hospitalares da SEDUCE
(Goiás, 2013; 2014), os conteúdos a serem trabalhados devem ser orientados pelo Currículo
Referência da SEDUCE.
Como apresentado, o referido currículo, em específico da área de matemática, traz como essência,
uma estrutura conteudista e bimestralizada. Assim, o processo de flexibilização, também presente
como orientação nos documentos da SEDUCE (Goiás, 2013; 2014), se torna complexo no sentido de
chocar com a proposta inflexível presente no modelo do Currículo Referência.
A esse respeito, segundo a coordenadora do NAEH, em entrevista2, o Currículo Referência, embora
traga um modelo robusto e inflexível, nas classes hospitalares, não se apresenta como um fim em si
mesmo, mas, tão somente, como base de orientação. Assim, o professor conduz as aulas em
conformidade com o momento pedagógico do educando o que, na maioria das situações, não condiz
com o preconizado pela orientação curricular, haja vista em que não se pode fazer a transposição do
ensino regular para a classe hospitalar. Esse impasse, segundo expõe, no âmbito do NAEH é bem
administrado, porém, quando o aluno retorna à sala de aula, por vezes, há questionamentos sobre
conteúdos que não foram trabalhados.
Na classe hospitalar, conforme a indica a Coordenadora, o planejamento das aulas de matemática
deve ser feito de forma interdisciplinar, ou seja, o professor relaciona o que é comum a duas ou mais
disciplinas ou outras áreas do conhecimento e faz a conexão entre elas, para assim tornar o processo
de aprendizagem mais dinâmico e estimulante, de tal forma, busca ponderar a série do educando e o
momento pedagógico que ele se encontra. Outro fator relatado é quanto às condições do ambiente,
que por se tratar de um hospital, expõe riscos e desafios pedagógicos para ambas as partes.
Nos encontros para realização da etapa do planejamento, observou-se que os professores eram
orientados a seguirem os conteúdos de acordo com o Currículo Referência da SEDUCE, porém com
atenção ao momento pedagógico de cada educando, sendo que tal momento sobrepunha a
exigência do currículo proposto.
O uso do Currículo Referência da SEDUCE na etapa de planejamento foi observada nos discursos de
19 docentes (57,78%), ao exporem como selecionavam os conteúdos para as aulas de matemática.
Cerca de 23% dos docentes disseram que levam em consideração o momento pedagógico dos
educandos para tal seleação, enquanto quatro docentes (11,11%) apresentaram que, em
determinadas situaçõs, a própria escola de origem do educando encaminha os conteúdos a serem
trabalhados. Três docentes (7,69%) expuseram que, ao trabalharem com projetos, os conteúdos
eram selecionados conforme a abordagem da temática envolvida.
Os professores enfatizam a etapa do planejamento como uma ação importante e sistematizada no
processo de ensino aprendizagem, contudo devem seguir uma dinâmica diferenciada de uma
instituição de ensino regular. A rotina de trabalho docente parte do planejamento dos conteúdos a
serem trabalhados, as estratégias de ensino adotadas, o processo de avaliação a ser conduzido.

2 Entrevista cedida no dia 16 de agosto de 2016.

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Porém, é no contato com o aluno que o mesmo se confirma ou se modifica. A indisposição do aluno,
em função de algum uso de medicamento; o estado de saúde no momento da aula; a recusa do
aluno motivada pelo medo ou insegurança do tratamento; as recomendações médicas de repouso;
dentre outros são variáveis que podem suspender um atendimento devidamente planejado.
O planejamento dos professores é previamente avaliado e discutido com a equipe pedagógica do
NAEH, no sentido de possibilitar possíveis adequações do instrumento às condições do aluno, da
demanda da escola, das orientações estabelecidas.
Para as aulas de matemática, a análise dos dados nos conduziu a compreender que as atividades
lúdicas (24,49%) e aulas expositivas (20,41%) se constituíram como ações mais recorrentes enquanto
estratégias metodológicas, seguidas da resolução de exercícios (16,33%) e uso de material concreto
(12,24%). As aulas expositivas e a resolução de exercícios não se caracterizam como as estratégias
adequadas à realidade de classe hospitalar. Recomenda-se como estratégias pedagógica o
desenvolvimento de atividades lúdicas (contemplada no posicionamento dos docentes), uso de
recursos tecnológicos a partir de práticas inter e transculturais (Fonseca, 1999, 2001) (Ceccim, 1997,
1999) (Ortiz, 2001). Os principais recursos pedagógicos adotados para as aulas de matemática foram:
jogos (30,43%); Material concreto (Material dourado, blocos lógicos...) (17,39%); Material impresso
(lista de exercícios, figuras, imagens...) (10,87%); livro didático (8,70%).
Dowbor (2008) reforça que, “é pelo planejamento que podemos organizar-nos, perceber e verificar
como estamos construindo a história do grupo” (p. 101). No planejamento, a avaliação se apresenta
como uma etapa de registros e reflexão em relação às propostas de ensino que foram previamente
estabelecidas. Na perspectiva de Vasconcelos (2015) é a partir da avaliação que surgem os elementos
para o (re)planejamento do trabalho pedagógico.
A avalição dos estudantes é feita, na perspectiva dos professores, a partir do desenvolvimento do
educando, presente em 27% dos entrevistados, por meio da verificação dos conteúdos apreendidos
pelos educandos (22, 73%), pela qualidade do desempenho dos educandos nas produções propostas
(18,18%), pelo interesse/participação/envolvimento nas atividades desenvolvidas (15,91%), por meio
de atividades/exercícios (4,55%), de forma processual e contínua (6,82%), por meio da valorização de
toda produção realizada (4,55%).
De acordo com orientações das políticas de classe hospitalar do MEC e do NAEH (Brasil, 2002) (Goiás,
2013; 2014), a avaliação deve ser conduzida de forma processual e contínua, valorizando o
desenvolvimento de cada educando nos aspectos cognitivos e emocionais, levando em consideração
o seu desempenho durante as produções, o interesse e participação no momento das interações.
Observou-se, nas falas dos sujeitos investigados, algumas dificuldades apontadas no processo
ensino-aprendizagem de matemática, dentre as quais se destaca a necessidade de aprender
conteúdos para ensiná-los aos educandos; dificuldade dos alunos em compreender os conteúdos
trabalhados; falta de professor da área específica de matemática para assumir tais disciplinas, visto
que se caracteriza como um grande desafio aos docentes; seguir e acompanhar sistemateicamente o
Currículo Referência da SEDUCE nas aulas de matemática; lidar com a dor e sofrimento dos
educandos, levando ao entristecimento e, por conseguinte, adoeciento do docente; desafio de
trabalhar com classe multisseriada; dentre outros.

5 Considerações finais
A iniciativa desse estudo buscou compreender o processo de ensino-aprendizagem de matemática
no contexto das classes hospitalares em Goiás, a partir dessa lente buscou investigar como os
professores planejam as aulas de matemática, quais as estratégias adotam, como avaliam e quais as
principais dificuldades apontam nesse processo.

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Com base nos estudos, constatou- se que, mesmo desenvolvendo um trabalho indispensável ao
educando hospitalizado, as atividades desenvolvidas pelo NAEH ainda se revelam de maneira
suscinta, no sentido de serem pouco conhecidas e divulgadas.
No que diz respeito à construção e consolidação do planejamento nas aulas de matemática, foi
possível perceber que os professores enfrentam constantes desafios durante a elaboração das
propostas para o ensino, uma vez que, é preciso colocar em pauta diversos fatores que corroboram
para uma prática flexível e personalizada. Levantou-se a condução da escolha dos conteúdos a serem
trabalhados, sendo estes norteados pelo Currículo Referência da SEDUCE. Tais princípios, embora
tidos como flexíveis, em muitos casos são levados à cabo por alguns professores. Sobre as estratégias
pedagógicas adotadas para as aulas, observou-se, em alguns casos, uma sincronia entre a aplicação
conteudista indicada no medelo curricular da SEDUCE e as estratégias pedagógicas adotadas em
algumas aulas, sendo apresentados a aula expositiva e a resolução de exercícios, acompanhadas
material impresso, livro didático como recursos materiais.
Diante das dificuldades pontuadas pelos educadores do NAEH nas aulas de matemática, os
levantamentos relacionados à formação dos professores suscitaram uma reflexão, no sentido de que,
a formação inicial ofertada na graduação ou pós-graduação não é suficiente para atender as
demandas exigidas nos campos de atuação, especificamente nos hospitais e domicílios. Foi possível
constatar uma importante demanda de formação continuada na especificidade da área de
matemática.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Protagonismo estudantil: abordagem socioambiental local debatida em


escolas da comunidade

Maria Rosane Marques Barros1, Gerson de Souza Mól1, Eduardo Luiz Dias Cavalcanti1,
Lenise Aparecida Martins Garcia1
1 Programa
de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Instituto de Química, Universidade de Brasília,
Brasil.
romarq_@hotmail.com; gersonmol@gmail.com; eldcquimica@yahoo.com.br; lenise.garcia@gmail.com

Resumo. Trata-se de um recorte de pesquisa de mestrado em Ensino de Ciências que utilizou metodologia
lúdica para abordar uma problemática socioambiental local relacionada ao córrego Guará. Para desenvolver
uma cultura de valorização ambiental local, alunos do 9º ano de uma escola pública de Brasília idealizaram e
apresentaram uma peça teatral nas escolas da cidade em que estão inseridos e que faz parte do contexto do
córrego. Para verificar o reflexo dessa iniciativa na percepção da problemática e como auxílio nas práticas
pedagógicas, os professores que assistiram à peça foram convidados a responder a um questionário. Os
resultados mostram que a iniciativa dos alunos, por meio lúdico, criativo e dinâmico, desvelou uma
realidade até então desconhecida pela maioria dos professores e esquecida pelas escolas, contextualizou o
ensino, alinhou-se ao currículo, estimulou a aprendizagem e senso de pertencimento da comunidade, além
de entrelaçar teoria e prática, provocando reflexão sobre a prática pedagógica.
Palavras-chave: protagonismo estudantil; metodologia lúdica; abordagem socioambiental; educação
ambiental; ensino de ciências.

Student as protagonists: Local socio-environmental approach debated in community schools


Abstract. This is a research cut from a master's degree in science teaching that used a play methodology to
address a local socio-environmental problem related to the Guará stream. In order to develop a culture of
local environmental valuation, students of the 9th grade of a public school in Brasília idealized and
presented a play in the schools of the city in which they are inserted and that is part of the context of the
stream. In order to verify the reflex of this initiative in the perception of the problem and as an aid in the
pedagogical practices, the teachers who attended the play were invited to answer a questionnaire. The
results show that the students' initiative, through play, creative and dynamic means, unveiled a reality
previously unknown to most teachers and forgotten by schools, contextualized teaching, aligned with the
curriculum, stimulated learning and a sense of belonging to the Community, in addition to interweaving
theory and practice, provoking reflection on pedagogical practice.
Keywords: students as protagonists; play methodology; socio-environmental approach; environmental
education; science teaching.

1 Introdução
A crise ambiental atual desafia a todos para uma nova orientação na relação sociedade-natureza. A
dicotomia marcada por uma visão antropocêntrica afastou os seres humanos da natureza enquanto a
exploração desmedida dos bens naturais atendia a novas formas de consumo e de poder. Sabendo-
se que a crise tem muitos entrelaçamentos, o grande desafio é refletir sobre sua complexidade,
entendendo que suas raízes são profundas e que requer um olhar amplo que seja capaz de projetar
ações rumo a mudanças. Se analisar a crise é um processo complexo que requer ampliação das
lentes, intervir nela pressupõe desconstruir paradigmas historicamente e culturalmente postos na
relação sociedade-natureza. A Educação Ambiental (EA) em sua vertente crítica, cuja referência parte
de ideiais freireanos, tem em seu projeto político-pedagógico a intenção de contribuir na formação
de um sujeito ecológico que seja “capaz de identificar e problematizar as questões socioambientais e
agir sobre elas” (Carvalho, 2008, p.157).

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Um dos princípios que norteou os Conselhos Jovens criados para a 1ª Conferência Nacional Infanto-
Juvenil pelo Meio Ambiente, realizada em 2003 pelo governo brasileiro, foi de que Jovem educa
jovem, o qual discutiu-se que entre jovens a comunicação flui com mais facilidade, que eles próprios
ensinam e aprendem entre si, trocam informações e experiências, negociam situações, pensam e
conversam sobre o mundo e agem sobre sua própria realidade (Deboni & Mello, 2007). Na
perspectiva de uma educação problematizadora da realidade e atuante, a Educação Lúdica (EL) se
apresenta como um processo de formação para tomadas de decisão e ação. É uma excelente
preparação para os papéis reais que futuramente os estudantes desempenharão na sociedade (ABT,
1974). Deseja-se o aluno como um sujeito ativo e alinha-se essa intencionalidade à proposta de
intervenção nas problemáticas socioambientais, em total sinergia com uma EA Crítica.
A EL é um meio motivador para que os jovens, de forma criativa e inovadora, se voltem para outros
jovens, na perspectiva do jovem educa jovem, envolvam sua geração para o conhecimento e
comprometimento das causas socioambientais que fazem parte da sua realidade, a fim de
operacionalizar mudanças socioambientais. É nesse sentido que um projeto de EA Crítica utilizou
metodologia lúdica para abordar um problema socioambiental local, relacionado ao córrego Guará,
buscando privilegiar a liberdade de ideias e atuação dos alunos, após formação crítica sobre o
problema. Logo, alunos de uma escola pública de Brasília idealizaram, produziram e apresentaram
uma peça teatral, intitulada “Pirá-Brasília”, em três escolas da comunidade. Nessa perspectiva,
buscamos analisar os reflexos dessa iniciativa dos alunos, convidando os professores das escolas
onde a peça teatral foi apresentada para responder a um questionário quanti-qualitativo, a partir do
qual tentaremos responder à seguinte questão: Quais foram as contribuições da peça teatral “Pirá-
Brasília” para o entendimento docente e discente sobre um problema socioambiental local e como
essa iniciativa dos alunos interferiu na prática pedagógica dos professores e no comportamento dos
alunos que assistiram à peça?
Entende-se que as discussões em torno da EA Crítica, pautada na formação de valores que ensejam
transformações socioambientais, e da Educação Lúdica, como ferramenta metodológica ativa capaz
de corresponder à intencionalidade das práticas de EA, são dois campos importantes a se considerar
no enfrentamento dos problemas socioambientais. Assim sendo, o presente artigo se apoiará nos
pressupostos teórico-metodológicos de Carvalho (2008) e Almeida (1987).
2 Educação Ambiental Crítica e Educação Lúdica
Analisando a história da Educação Ambiental no Brasil, Loureiro (2004) categoriza suas tendências
em dois grandes blocos político-pedagógicos, os quais abarcam diferentes entendimentos. Um deles
é denominado pelo autor como conservador ou comportamentalista, que dentre algumas
características se destacam a pouca ênfase nos aspectos políticos da ação pedagógica e a
sobrevalorização das soluções tecnológicas. O outro bloco é denominado como emancipatório,
crítico ou tranformador e se caracteriza pela politização e publicização das questões ambientais,
compreendidas como inerentemente sociais e históricas, busca por alternativas aos conflitos
ambientais por meio do diálogo considerando o conhecimento científico, as manifestações culturais
populares e uma nova ética na relação sociedade-natureza. Para Loureiro (2004), a EA crítica se
define como “um processo educativo permanente que tem por finalidade a construção de valores,
conceitos, habilidades e atitudes que possibilitem o entendimento da realidade de vida e atuação
lúcida e responsável de atores sociais individuais e coletivos no ambiente” (Loureiro, 2004, p.39).
Na perspectiva crítica da EA, Carvalho (2008) aponta alguns objetivos dessa vertente: promover a
compreensão dos problemas socioambientais em suas múltiplas dimensões, identificando os
problemas e conflitos que afetam o ambiente em que vivemos, implicar os sujeitos da educação na
solução ou melhoria desses problemas e conflitos, contribuir para a transformação dos atuais
padrões de uso e distribuição dos recursos naturais, atuar no cotidiano escolar e não escolar

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provocando novas questões, situações de aprendizagem e desafios para a participação na resolução


de problemas, construir processos de aprendizagem significativa e, por fim, situar o educador como
mediador de relações socieducativas e coordenador de reflexões que possibilitem novos processos
de aprendizagens sociais, individuais e institucionais.
A Educação Lúdica no seu sentido evolutivo de “trabalho-jogo” também apresenta um enfoque
político-libertário com premissas freireanas. É uma perspectiva séria de jogos que exige do aluno
uma ação ativa, indagadora, reflexiva, desvendadora, socializadora, criativa, em total oposição à
passividade, alienação e submissão da pedagogia dominadora (Almeida, 1987). É uma preparação
para tomadas de decisão e ação que fazem do ato de ensinar um compromisso na formação de
atores sociais que poderão desenvolver lideranças participativas em contextos socioambientais.
Almeida (1987) acredita que há uma estreita relação entre atividade expressiva, criativa e a
experiência científica. O adolescente, partindo da observação dos fatos, parte para o trabalho
científico como se fosse para um jogo, a fim de desvendar tudo o que existe: “Na verdade, o trabalho
científico e o trabalho artístico têm como característica central o pensamento criador, cuja meta é
projetar, dar sentido e transformar as realidades, isto é, transformar objetos e fatos em significados
sociais” (Almeida, 1987, p. 40).
Diante do contexto encontram-se convergências entre a proposta transformadora de uma EA crítica
e a perspectiva ativa da Educação Lúdica. Essa confluência permite compreender que a EA crítica
pode encontrar na EL sua ferramenta metodológica para operacionalizar transformações
socioambientais e formar novos valores e novos sentidos à relação sociedade-natureza.
3 Metodologia
Trata-se de uma análise quanti-qualitativa, com enfoque na qualitativa, sobre um recorte de dados
de pesquisa de um mestrado profissional em Ensino de Ciências, que teve parceria com a Fundação
Jardim Zoológico de Brasília e que usou a ludicidade como metodologia de aplicação para abordar,
discutir e propor ações de transformação a um problema socioambiental local relacionado ao
córrego Guará. Na tentativa de desenvolver uma cultura de valorização ambiental local para que
professores e alunos de 3 escolas públicas situadas no contexto do córrego pudessem conhecê-lo e
debater sobre seus problemas, alunos de outra escola pública, localizada na mesma cidade,
produziram e apresentaram uma peça teatral intitulada “Pirá-Brasília”. Foi utilizado o estudo de caso
como estratégia de pesquisa. Para a coleta de dados, foi aplicado um questionário semi-aberto com
11 questões aos 61 professores que assistiram à peça teatral. Os dados quantitativos foram
tabulados e seguiu-se com a análise estatística das questões fechadas. A maior parte das questões
abertas foram analisadas segundo a análise de conteúdo de Bardin (2001), um método em que os
dados são sistematizados em categorias, unidades de registro e unidades de contexto. Para tal,
foram percorridas diferentes fases processuais, seguindo o ordenamento da referida autora: pré-
analise dos dados; exploração do material; tratamento dos resultados; inferência e interpretação.
4 Resultados e Discussões
No início do ano letivo de 2016, foi aplicado em 3 turmas de 9º ano de uma escola pública de Brasília,
um projeto de Educação Ambiental sobre a problemática socioambiental do córrego Guará,
localizado a 400 metros da escola, em que 86% dos alunos a desconheciam. Esse dado pode ser
explicado pelo fato do córrego ter suas margens tomadas por casas irregulares que dificultam o
acesso e apropriação de sua realidade. Por meio de uma metodologia lúdica, em formato de gincana,
foram criadas provas-desafios em que os 58 alunos das 3 turmas de 9º ano, com faixa etária entre 13
e 19 anos, foram dividos em 9 equipes e passaram a conhecer o problema, discutí-lo e propor
soluções de modo a transformá-lo. Por meio de uma proposta indagadora e reflexiva da realidade,

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

desejavam-se alunos atuantes no seu meio, perspectiva que refletiu em envolvimento comunitário
para transformação socioambiental.
Os alunos discutiram que há uma cultura social de desvalorização ambiental que justifica os
problemas socioambientais atuais e, em especial, o do córrego Guará. As equipes pensaram em
estratégias que pudessem desenvolver uma cultura de valorização ambiental local e sentimento de
pertencimento ao ambiente. Para Cousin (2013), “a compreensão do lugar é fundamental para
construção do sentimento de pertencimento, porque significa entender, para além das suas
condições naturais ou humanas, o que acontece no espaço onde se vive” (p.10). Para isso, os alunos
idealizaram, produziram e apresentaram uma peça teatral para que outros professores e alunos
pudessem conhecer os problemas socioambientais do córrego Guará, isto é, conhecer a realidade em
que estavam inseridos de modo a ampliar o debate rumo a transformações.
A peça intitulada “Pirá-Brasília” refere-se ao nome popular da espécie Simpsonichtys boitonei. Trata-
se de uma espécie endêmica de peixe descoberta no córrego Guará na década de 1950, época da
construção da capital do Brasil, Brasília, e que atualmente está na lista de animais em processo de
extinção (Diário Oficial da União, 2014). A peça teatral foi apresentada nos turnos matutino e
vespertino a três escolas públicas de Brasília que atuam na Educação Infantil e no Ensino
Fundamental do 1º ao 5º ano, todas localizadas na mesma cidade, alcançando um público de 1201
alunos e 61 professores. A fim de responder à questão de pesquisa que norteia esse trabalho, os
professores que assistiram à peça teatral foram convidados a responder a um questionário. Ao total,
foram recolhidos 27 questionários respondidos, o que equivale à quase 1/2 dos professores que
assistiram à peça, dos quais aproximadamente 3/4 são professores efetivos da Secretaria de Estado
de Educação do Distrito Federal (SEEDF) e 1/4 professores contratados temporariamente pela SEEDF.
Os alunos dos professores que participaram da pesquisa representam quase 1/2 do total dos que
assistiram à peça, cuja faixa etária varia entre 4 e 14 anos.
Para entender o perfil desses professores, nos interessamos em saber seu tempo de magistério e o
período que leciona na cidade onde o córrego Guará faz parte de seu percurso. Do total de
professores que responderam à pesquisa, 47% tem entre 17 e 21 anos de magistério, enquanto 14%
dos professores tem entre 12 e 16 anos, 25% possuem entre 7 e 11 anos e 14% dos professores tem
entre dois e seis anos de tempo que lecionam. Esses dados revelam que a maior parte dos
professores possui mais de 12 anos de profissão. Sobre o período em que trabalham na mesma
cidade onde passa o córrego Guará, 63% possuem no máximo cinco anos de efetivo exercício na
cidade, enquanto 18,5% deles trabalham entre seis e dez anos, 12% entre 11 e 14 anos e, por fim,
7,5% dos professores trabalham entre 15 e 19 anos nessa mesma cidade, o que representa um
tempo razoável para que os professores conheçam o contexto onde a escola está inserida.
A problemática socioambiental do córrego Guará era desconhecida até então por 74% desses
professores, incluindo todos os professores que possuem mais tempo de trabalho na cidade, entre
15 e 19 anos. Apesar de 26% conhecerem a problemática, a maioria, representada por 58% desse
percentual, nunca havia abordado o assunto antes com seus alunos em sala de aula. Esses dados
revelam que os alunos estavam alheios ao mundo vivido deles, o que os impossibilitava de
desenvolver senso crítico sobre seus problemas e, consequentemente, de tomarem decisões de
modo a transformar a sua realidade.
Construir cotidianamente valores comprometidos com a conservação, melhoria e qualidade do
ambiente em que vivemos é um planejamento importante que toda estrutura educativa deveria se
ocupar. Assim sendo, partimos do pressuposto da necessidade de uma educação para além dos
muros da escola, uma educação que revele e discuta a natureza dos problemas socioambientais
locais, numa perspectiva de transformação, conforme sugere a educação ambiental crítica.
Na tentativa de descobrir se a peça teatral havia auxiliado o professor a entender a problemática do
córrego Guará, 100% afirmou que sim, incluindo os que já conheciam alguns dos problemas. Destaca-

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

se em alguns relatos dos professores que a peça os auxiliou a conhecer e compreender o problema
principalmente por ter tratado de forma lúdica, dinâmica, esclarecedora e significativa um assunto
que faz parte da vida cotidiana dos alunos, despertando curiosidade e atenção pelo fato da
destruição da fauna e flora estar bem perto:
“A peça foi muito importante para que eu compreendesse um problema que faz parte da vida
cotidiana dos alunos.”
“A peça me ajudou a conhecer o problema de forma lúdica e significativa.”
“Eu nunca havia trabalhado em sala de aula esse assunto. Achei de grande importância trabalhar
com eles o problema socioambiental do córrego Guará.”
“A peça ajudou muito, não só a entender o problema mas mostrar que a destruição da fauna e da
flora está bem perto, logo ali, no nosso quintal.”
“Com certeza a peça teatral foi bem esclarecedora e dinâmica.”
As cenas da peça, a organização do cenário e as falas dos personagens iam aos poucos revelando a
realidade do córrego Guará, numa trama em que se discutia além dos problemas, a natureza deles.
Nesse sentido, foi pedido aos professores que relatassem quais situações mostradas na peça os
fizeram entender a problemática, porque pretendia-se que os professores mediassem discussões
posteriores sobre o assunto com seus alunos. Os relatos estão expostos na Tabela 1.

Tabela 1. Problemas abordados na peça teatral

Unidades de Contexto – Alguns Exemplos


Indicadores/Unidades
Tema Categorias
de Registro
“Parte dos alunos chegando no rio que estava sujo,
quando o peixe começa a relembrar como era o
córrego antes e passa um garoto jogando mais lixo no
córrego”
Resgate da memória “A fala do peixe explicando a situação, a falta de
do córrego cuidado da população e a questão da extinção de sua
Extinção do peixe espécie”
Lixo “Momento em que um grupo de crianças conversa
Comprometimento do sobre a situação do córrego Guará. Elas falam que a
ecossistema quantidade de lixo prejudica o meio ambiente e afeta o
Momentos da Impossibilidade de peixe Pirá-Brasília, além de todo o ecossistema”
peça teatral que lazer no córrego “O fato de não poder passear nas margens do córrego,
Fala dos
ajudaram a Invasões ou banhar, ou até mesmo observar peixes que eu,
personagens
entender o Existência de espécie nascida em Brasília, não conhecia”
contexto do endêmica de peixe “A questão das invasões e do lixo jogado”
córrego Guará Poluição “A presença de um peixe que eu desconhecia e não
Desconhecimento da sabia que só havia esse peixe aqui e em lugar nenhum
comunidade local mais do mundo!!!”
Falta de “a poluição do córrego e a falta de conhecimento da
conscientização comunidade local”
Desmatamento “falta de consciência das pessoas em não respeitar os
ambientes”
“Diminuição da espécie, quantidade de lixo e
desmatamento”
“A preservação do peixe que eu não sabia que existia”

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

“Objetos jogados no rio”


“No momento em que o peixe percebe a quantidade de
Lixo lixo jogado no córrego”
Cenário Descaso da população “O descaso da população jogando lixo no córrego e
Animais ameaçando o Pirá”
Desmatamento “O lixo no cenário, os animais ali presentes e o
desmatamento”

Os problemas do córrego Guará percebidos pelos professores, por meio da apresentação da peça
teatral realizada por alunos, são tanto de ordem ambiental quanto de ordem econômico-social,
evidenciando um entrelaçamento de fatores que influenciam nas questões ambientais, e que as
definem, na verdade, como questões socioambientais. Nessa perspectiva, pode-se elencar: invasões,
poluição, desmatamento, comprometimento do ecossistema e de espécies que ficam vulneráveis à
extinção, desconhecimento e descaso da população local, fatores esses, que, juntos, intensificam a
problemática do córrego. Foi possível notar uma perspectiva de surpresa dos professores por até
então desconhecerem a existência do peixe Pirá-Brasília. Apesar de não ter mostrado em seu relato
maiores detalhes sobre a memória do córrego, um professor lembrou que o personagem que fazia o
papel do peixe Pirá-Brasília resgatou a historicidade do ambiente no momento em que foi
surpreendido por outro personagem que sujava o córrego.
O resgate da historicidade do ambiente amplia o horizonte de compreensão sobre a relação do
homem com o ambiente, os valores culturais e sociais que incidem em nosso presente nos fazendo
entender que somos seres sociais culturalmente situados (CARVALHO, 2008). À medida que
entendemos o passado e um percurso histórico-cultural que justifica o nosso presente,
amadurecemos nossas projeções sobre um futuro melhor, porque nos convida a refletir “o que
fazer” daqui pra frente.
Na tentativa de compreender se a iniciativa dos alunos em apresentar uma peça teatral nas escolas
interferiu no planejamento pedagógico dos professores e contribuiu para a discussão da
problemática do córrego Guará em sala de aula, perguntamos ao professor se os problemas
mostrados na peça foram depois abordados em sala de aula. Os resultados revelam que a maioria
dos professores (88%) abordou o assunto em sala de aula. Também tivemos interesse em descobrir
como a peça teatral repercutiu no comportamento dos alunos. Assim sendo, perguntamos ao
professor como foram as reações dos alunos após a passagem da peça, nos relatando algo que
julgasse relevante no comportamento e perceção deles sobre os problemas do córrego. Os dados
estão dispostos na Tabela 2.

Tabela 2. Reação dos alunos após a peça teatral

Indicadores/Unidades Unidades de Contexto – Alguns Exemplos


Tema Categorias
de Registro
“Pareceram bastante interessados na peça e todos queriam
participar da limpeza do córrego”
“Os alunos adoraram a peça, se encantaram pela música e
coreografia e eu também adorei a iniciativa do elenco.
Parabéns”
Interessados no “Adoraram a forma como vocês contaram o problema que está
assunto tão perto deles”
Adoraram “Os alunos reagiram de forma positiva querendo colaborar
Reação positiva com a limpeza do córrego”
Entusiasmo Divertido e interativo “Os alunos acharam a peça muito divertida e adoraram
Encantados interagir com os atores, disseram ter adorado a música no final
Cantarolaram a da peça”
música “Os alunos ficaram encantados com o peixe Pirá-Brasília e

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Curiosidade mais ainda com a namoradinha dele”


“Ficou bem memorizado a figura do peixe, a música cantada,
tanto que ficaram várias semanas ainda cantarolando em suas
brincadeiras livres”
Comportamento “Alguns ficaram curiosos para conhecer o córrego, outros
e percepção dos foram acessar a internet para ver imagens”
alunos após a Conhecimento sobre “Alguns relataram conhecer o córrego e realmente está como
passagem da o córrego o apresentado na peça.”
peça teatral Importância em “Comentaram o valor de preservar o meio ambiente”
preservar “Relataram a importância da preservação e preocupação com
Relato de situações os peixes em extinção”
cotidianas “As crianças comentaram situações cotidianas sobre os
Poluição e cuidados problemas ambientais do setor de chácaras”
com os mananciais “Eles reagiram de maneira positiva quanto à apreciação da
Interesse por falar peça e iniciaram debates sobre o que sabem sobre poluição,
sobre o Pirá-Brasília cuidados com rios, córregos”
Debate Desconhecimento “Os alunos da classe especial quiseram falar sobre o peixe e
sobre o peixe e sobre sobre a sujeira do córrego”
a importância do “A maioria relatou não conhecer a espécie de peixe mostrada e
córrego não sabiam da importância do córrego”
Muita conversa e “Os alunos voltaram pra sala muito elétricos e conversamos
acesso à fanpage do bastante sobre a peça. Inclusive curti e divulguei para eles a
projeto página no facebook e falamos também sobre como a internet
Percepção da tem alcance maior de divulgação”
realidade ”Comentaram sobre o que conhecem do lugar onde moram”
Prejuízo do peixe e “Fizeram comentários e se sentiram tristes por acabar
interesse em prejudicando os peixinhos e pediram para que fôssemos no
colaborar córrego ajudar a retirar o lixo”

Apesar da peça teatral divulgar um problema com impactos ambientais sérios revelando
vulnerabilidade de espécies e também social de uma comunidade local, os alunos ao produzí-la
levaram em consideração a idade do público que iria assistí-la, sendo a maioria formado por crianças,
e a maneira como a problemática seria apresentada, primando por um formato leve, dinâmico e
descontraído, ao mesmo tempo que possibilitaria a interação e participação do público durante as
cenas. Por essa razão, os dados revelam encantamento, interatividade dos alunos com os
personagens, dança, música, curiosidade sobre o assunto, demonstrando que o lúdico, tão frequente
no mundo infantil, foi algo que atraiu e envolveu as crianças fazendo-as relembrar, em meio a
cantorias, a canção da peça em suas brincadeiras livres. Os dados ainda demonstram que o teatro
também envolveu o professor quando ele afirma ter adorado a iniciativa do elenco. Também foi
possível perceber em meio às respostas dos professores que o teatro favoreceu ao aluno capacidade
de ampliar a compreensão de seu mundo vivido, perceber não somente os problemas aí existentes
mas, sobretudo, a necessidade de intervenção em busca do equilíbrio ambiental. Nota-se que os
alunos quiseram discutir informações do seu cotidiano e suas apreensões sobre o lugar onde moram,
o que demonstra uma oportunidade para que o professor melhore sua compreensão sobre a
comunidade em que a escola está inserida.
Loureiro (2004) discorre que cotidianidade não se refere à rotina mas ao lugar ocupado e habitado
pela pessoa, onde exercitamos nossa cidadania diariamente, num processo de realização e
desenvolvimento do indivíduo. Para o autor a cotidianidade e territorialidade são conceitos-chave,
pois quando nos referimos ao processo educativo, é necessário entender onde se situa cada
educador e educando (comunidade, família, classe social, cultura regional, individualidade), “de
modo a promovermos uma prática que seja simultaneamente específica e universal, que reconheça a
diversidade na busca da igualdade, evitando um ‘educar para todos’ que desconsidere os sujeitos
concretos” (Loureiro, 2004, p.41). Diante das considerações do autor, entende-se que as discussões

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

sobre o cotidiano, promovidas após a peça, enriquecem o processo educativo, alinhando as práticas
educativas à perspectiva inclusiva do ponto de vista em que se privilegia a realidade do aluno.
Após a apresentação da peça teatral, os alunos distribuiram folders explicativos que convidavam os
professores e seus alunos a conhecerem mais profundamente a problemática do córrego por meio
da fanpage do projeto intitulada “Em Defesa do córrego Guará”. Por essa razão aparece nos dados
que uma professora curtiu e divulgou para seus alunos a fanpage, discutindo com eles o alcance da
internet. A politização e publicização das questões ambientais, entendidas como sócio-históricas, são
uma das caracterizações que se enquadram ao que Loureiro (2004) chamou de bloco emancipatório,
crítico ou transformador de EA, o que converge com a proposta do projeto que além de se imbuir
com uma formação crítica e participativa, possui um meio, administrado pelos alunos, que publiciza
as questões do córrego para que a comunidade se inteire delas.
Ainda nos prestamos a analisar a opinião dos professores sobre a iniciativa dos alunos do 9º ano na
divulgação de um problema local entre as escolas da comunidade e se, de alguma forma, essa
iniciativa os auxiliou em suas práticas pedagógicas. Todos os professores responderam com
entusiasmo e satisfação sobre a iniciativa dos alunos. Os dados estão categorizados na Tabela 3.

Tabela 3. Opinião dos professores sobre a iniciativa dos alunos

Indicadores/Uni Unidades de Contexto – Alguns Exemplos


Tema Categorias dades de
Registro
“Maravilhoso! Precisamos de jovens comprometidos não só com o
bem estar do nosso planeta mas também em comunicar a outros
jovens e crianças o problema e buscar soluções, tenho orgulho de
vocês. E a maneira correta é essa, de forma leve e divertida!”
“Foi muito interessante!!! Para mim foi como ver também um
pouquinho do meu trabalho indo ‘pra frente.’”
“Foi uma iniciativa excelente, pois trouxe um problema que parece ser
Maravilhoso longe da nossa realidade, e no entanto, está tão próximo de nós, além
Muito de aliar teoria e prática.”
interessante “Achei sensacional a preocupação deles com a problemática que faz
Entusiasmo Excelente parte do contexto e vivência dos estudantes e que auxiliam na reflexão
Sensacional de suas atitudes.”
Ótimo “Foi ótimo pois mostrou a real situação da cidade de forma lúdica e
Louvável concreta.”
Extrema “Foi uma iniciativa louvável e que deve ter continuidade no decorrer
importância do ano.”
“A iniciativa da professora e dos alunos foi de extrema importância,
pois além de abordarem a situação atual do córrego Guará, os alunos
Opinião dos puderam conhecer o peixe Pirá-Brasília e ter uma consciência
professores ambiental.”
sobre a “Foi muito relevante principalmente para o 4º ano que trabalha e
iniciativa dos estuda sobre os rios brasileiros e os animais, assim pude trabalhar
alunos ambos os temas e lembrar que o córrego e os peixes daqui também
precisam de ajuda. Da nossa ajuda!”
Alinhamento “Ajudou na minha prática pois é um conteúdo que eu já tinha que
curricular trabalhar dentro do currículo e de suma importância para a formação
Estímulo à de pessoas conscientes em relação ao meio ambiente.”
aprendizagem e “Foi uma iniciativa que estimulou a criatividade, ludicidade e
senso de aprendizagem de forma não sistematizada, podendo fazer mais
Auxílio pertencimento sentido e trazer senso de pertencimento para os alunos. Expôs uma
pedagógico Reflexão sobre problemática da comunidade e um tema do currículo de forma leve
a prática que pôde despertar a consciência ambiental.”
Ajuda na “Me auxiliou a repensar a prática abordando o tema.”
abordagem “Me ajudou a abordar o assunto de forma lúdica e ajudou os alunos a

173
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Ensino ter conhecimento de uma realidade tão próxima a nós.”


contextualizado “A aula ficou enriquecida e ampliamos a discussão de outros
Pesquisa problemas que eles vivenciam. Eles perceberam que o problema é
nosso e que podemos ajudar a resolvê-lo.”
“Com certeza auxiliou na prática, pois apresentou algo contextualizado
da vivência dos estudantes.”
“Depois da peça fizemos pesquisa sobre o Pirá-Brasília.”

Paulo Freire (2014) já trazia como premissa importante do processo educativo o desvelamento da
realidade do estudante, e a partir dessa realidade o uso de temas, conhecidos como “temas
geradores”, de modo que fossem articulados com conteúdos programáticos a serem estudados e
debatidos. Em outras palavras, o autor propôs meios para que o estudante compreendesse seu
mundo vivido e pudesse agir nele, num processo de formação política libertária. Essa perspectiva do
autor apresenta sinergia com os dados encontrados, que reiteradamente demonstra a importância
da iniciativa dos alunos e de sua professora na abordagem e desvelamento da realidade, cujo tema
gerador foi um problema socioambiental local que contribuiu para contextualizar o ensino,
alinhando-se ao currículo, estimulando a aprendizagem e senso de pertencimento, entrelaçando
teoria e prática, provocando reflexão sobre a prática pedagógica do professor e estimulando a
investigação. Os dados também revelam a importância dos jovens alunos serem comprometidos e
dialogarem com seus pares sobre os problemas da comunidade em busca de soluções.
Conclusões
O protagonismo dos alunos trouxe perspectivas inovadoras de participação escolar e comunitária,
ampliando horizontes de compreensão e discussão sobre problemas socioambientais. Nesse
contexto, quem trouxe a realidade para ser discutida dentro da escola foram alunos engajados,
contrariando expectativas históricas na educação, em que a escolha dos temas a serem trabalhados
geralmente fica a cargo do professor. No entanto, se o professor desconhece o mundo vivido de seus
alunos, como os dados sugeriram, a escola deixa de cumprir um papel importante na formação de
seus alunos. O desconhecimento impede uma formação crítica, reflexiva e indagadora da realidade,
pois distancia o aluno de sua história, de sua comunidade, de seu contexto socioambiental,
impossibilitando atuação e exercício da cidadania.
Percebeu-se a importância dos professores de apropriarem-se da realidade de seus alunos, de serem
analíticos sobre as demandas de seu contexto que se traduzem também em demandas pedagógicas,
já que, segundo os dados, a grande maioria desconhecia a problemática do córrego Guará e, metade
dos que a conhecia, nunca havia abordado antes o tema, o que significa que quase 90% dos alunos
não tiveram oportunidade de debatê-lo criticamente na escola. Ainda que todos os professores
tenham indicado que compreenderam melhor o problema do córrego Guará após a peça teatral, o
tema não foi abordado por todos eles em sala de aula após a apresentação da peça. Essa perspectiva
indica a necessidade de maior comprometimento pedagógico por parte dos professores pois,
somente o docente compreender o problema não basta, é preciso fazê-lo tema gerador em sala de
aula para que alcance os alunos, aqueles que de fato estão inseridos no contexto do problema,
garantindo assim uma formação mais profícua.
Considerando o desconhecimento da maioria dos professores e alunos sobre a problemática do
córrego Guará, o engajamento estudantil para divulgá-lo foi bastante relevante pois aproximou
professores e outros alunos aos aspectos desconhecidos e esquecidos pela escola, contribuindo para
um sentimento de pertecimento comunitário sobre seu contexto ambiental. Percebeu-se que a
iniciativa dos alunos em apresentarem uma peça teatral interferiu positivamente no planejamento e
prática pedagógica de alguns professores, na medida que os professores convergiram teoria e
realidade, dando chances aos alunos dos conhecimentos serem aplicados na vida real.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Os dados também indicaram que a apresentação da peça foi oportuna para que alguns alunos, que já
conheciam a problemática do córrego, pudessem discutí-la com seus colegas e professores, trazendo
especificidades da realidade que eles, por viverem no contexto, poderiam traduzir melhor.
A peça teatral Pirá-Brasília, adequada à linguagem do público para o qual se apresentou, mostrou ser
uma ferramenta atrativa, envolvente e mobilizadora para se abordar um tema sociambiental. Foi
uma oportunidade dos jovens debaterem suas questões e provocarem mudanças. O desafio está na
forma como esse tema será depois abordado pelos professores em sala de aula, que deve fugir de
explicitações superficiais e meramente informativas. Tratar de demandas socioambientais locais é
uma necessidade eminente diante da crise ambiental que o mundo está atravessando, e a educação
formal se faz importante e imprescindível nesse contexto, pois é um convite ao saber-ação, isto é,
conhecer a realidade para poder transformá-la.

Agradecimentos. Agradecemos a todos os alunos idealizadores da peça teatral Pirá-Brasília, às direções das
escolas onde ela foi apresentada e a todos os professroes participantes dessa pesquisa por contribuirem com
novas discussões no campo do Ensino de Ciências focado na Educação Ambiental.

Referências
Abt, C. C. (1974). Jogos Simulados: Estratégia e tomada de decisão. Rio de Janeiro, Olympo.
Almeida, P. N. de. (1987). Educação Lúdica: Técnicas e Jogos Pedagógicos. 5.ed. São Paulo: Loyola.
Bardin, L. (2011). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70.
Carvalho, I. C. M. (2008). Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. 4.ed. São Paulo:
Cortez.
Cousin, C. da S. (2013). Pertencimento ao lugar e a formação de educadores ambientais: um diálogo
necessário. VII EPEA- Encontro Pesquisa em Educação Ambiental, Rio Claro, São Paulo.
Deboni, F., & Mello, S.S. (2007). Pensando sobre a “geração do futuro” no presente: jovem educa
jovem, Com-vidas e Conferência. In: Vamos cuidar do Brasil: conceitos e práticas em educação
ambiental na escola. Brasília: Ministério da Educação, Coordenação Geral de Educação
Ambiental: Ministério do Meio Ambiente, Departamento de Educação Ambiental: UNESCO.
Diário Oficial da União, Brasília. n. 245, 1 de dezembro de 2014. Brasil. Acessado Fevereiro, 17, 2017,
em http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/biodiversidade/fauna-brasileira/avaliacao-
do-risco/PORTARIA_N%C2%BA_445_DE_17_DE_DEZEMBRO_DE_2014.pdf
Freire, P. (2014). Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa. (49.ªed.). Rio de
Janeiro: Editora Paz e Terra.
Loureiro, C.F.B. (2004). Educação Ambiental e gestão participativa na resolução e explicitação de
conflitos. In: Gestão em Ação. Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da UFBA;
ISP/UFBA – v.1, n.1, 37-50, Salvador, Bahia.

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O Grupo Focal como ferramenta de avaliação em Museu de Ciência

Thalles Yvson Alves de Souza1,2, Maylta Brandão dos Anjos1,4, Grazielle Rodrigues Pereira1,3,4
1
Campus Mesquita, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Brasil.
tyvson@hotmail.com; maylta.anjos@ifrj.edu.br; grazielle.pereira@ifrj.edu.br
2
Departamento de Artes, Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro, Brasil.
3
Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo De Meis, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.
4
Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu em Ensino de Ciências, Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Brasil.

Resumo. Os museus de ciência, atualmente, vêm estabelecendo profícuas relações com o público por meio
de suas exposições interativas, que buscam a integração da arte com a ciência. Por conseguinte, este trabalho
objetivou avaliar as percepções de licenciandos em Belas Artes em um museu de ciência. Após participarem
da visita a duas exposições interativas, foi realizado um grupo focal, visando o levantamento de suas
experiências pessoais e olhares sobre os módulos interativos. Foi evidenciado pelos dados da pesquisa que
os participantes identificaram diferentes manifestações artísticas na exposição e perceberam que a relação
entre a ciência e a arte é um fator essencial no processo comunicacional. A investigação constatou que essa
relação favorece o processo de interatividade, proporcionando ao visitante diferentes experiências sensoriais
que irão despertar o interesse pelo conhecimento científico. Em suma, o grupo focal foi determinante para a
avaliação das exposições científicas, sobretudo por permitir o debate entre os participantes após a visita.
Palavras-chave: Museu de ciência; grupo focal; avaliação; arte e ciência.

The use of the Focus Group as an evaluation tool in a science museum


Abstract. Science museums are now establishing fruitful relationships with the public through their interactive
exhibits that seek the integration of art and science. Therefore, this work aimed to evaluate the perceptions
of graduates in Arts in a science museum. After taking part in the visit to two interactive exhibitions, a focus
group was held, aiming the survey of their personal experiences and looks on the interactive modules. The
research data showed that the participants identified different artistic manifestations in the exhibition and
realized that the relationship between science and art is an essential factor in the communication process.
The investigation showed that this relationship favors the process of interactivity, providing the visitor with
different sensory experiences that will arouse interest in scientific knowledge. In sum, the focal group was
determinant for the evaluation of the scientific expositions, mainly because it allowed the debate between
the participants after the visit.
Keywords: Science museum; focus group; evaluation; science and art.

1 Introdução

A avalição de uma exposição científica, sob o viés do público visitante permite o aperfeiçoamento no
processo comunicacional, bem como favorece a construção de diferentes abordagens nas estratégias
de divulgação da ciência nos museus e centros de ciência (Almeida, 2005). Nesse sentido, o presente
trabalho objetivou avaliar as exposições científicas de um museu de ciência a partir do olhar de um
grupo de alunos do Curso de Licenciatura de Belas Artes, assim como buscou verificar se estes
estabelecem relações entre a arte e a ciência nas exposições do espaço de divulgação científica.
Em pesquisa anterior, identificou-se que o licenciando em Belas Artes não têm o hábito de visitar
centros ou museus de ciência, muitos nunca entraram nesses espaços de educação não formal e ainda
desconhecem suas potencialidades e objetivos (Souza, 2016). Desse modo, ignoram as possibilidades

176
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

de interação entre a Arte e a Ciência, que comumente está presente em exposições dos centros e
museus de ciência. Em uma pesquisa de avaliação do impacto dos centros interativos de ciência sobre
visitantes jovens e adultos, Falk, et al (2014) verificaram impactos positivos tais como: conhecimento
e compreensão da ciência e da tecnologia; interesse e curiosidade pela ciência; interesse e participação
nas atividades de ciência na escola (jovens); participação em atividades relacionadas com Ciência e
Tecnologia (C&T) fora da escola; identidade pessoal e confiança na Ciência e Tecnologia. Todavia, cabe
destacar que cada sujeito terá uma experiência diferenciada dentro do espaço museal, de forma que
tais experiências estão associadas aos seus conhecimentos prévios, nível de escolaridade, nível
sociocultural, entre outros fatores.
Nesse sentido, em um estudo realizado por Falk & Dierking (1992), os pesquisadores destacaram que
a visita ao museu envolve a interseção de três contextos: o pessoal, o físico e o sociocultural. Já em um
segundo trabalho, os autores acrescentaram a dimensão temporal, uma vez que a experiência museal
pode acarretar em novos conhecimentos após meses ou anos depois (Falk & Dierking, 2000).
Diante desse contexto, buscamos responder a seguinte indagação: quais as possíveis relações que os
estudantes de Arte estabelecem ao participar de uma exposição científica com a módulos interativos?
Destarte, considerando o contexto sociocultural, para a realização deste trabalho reunimos um grupo
de estudantes de uma mesma universidade, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, do Campus
localizado em Seropédica, região da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro.

1.2 Abordagens interativas e a relação entre a arte e a ciência no espaço museal

Os centros e museus de ciência têm a missão de promover no público o engajamento e o interesse


pelo conhecimento científico e, embora as visitações às exposições apresentem um caráter positivo,
há de se aprender mais sobre de que forma a imagem da ciência está sendo comunicada (Stocklmayer,
2002). Tal missão, em geral, aponta para a promoção, aproximação e para a compreensão do público
em relação a ciência e a tecnologia por meio de atividades de popularização e de experiências
educativas baseadas em abordagens interativas e participativas (Padilla, 2002).
Padilla (2002) ainda assinala que os centros e museus de ciência têm como função ser um espaço de
convivência e interação; de recreação com foco científico; estímulo à formação de vocações científicas;
criação de uma consciência de contribuição da ciência; apoio às escolas; educação não formal em
ciências e popularização da C&T.
Dessa forma, as propostas estabelecidas nos espaços museais, perpassam pelas diferentes formas de
interatividade. A arte, por sua vez, é um elemento importante durante o processo de interação no
espaço museal. “Uma vez que a Arte pode estabelecer emoções científicas e o Museu de Ciência
moderno deve favorecer uma profusão de estímulos baseados nos objetos e fenômenos da realidade”
(Wagensberg, 2006, p. 36). Nessa corrente, Wagensberg (2006) estabelece três categorias de
interatividade no ambiente museal: a interatividade manual (hands on), onde o visitante é um
elemento ativo dentro da exposição, usando as mãos para provocar as emoções, na qual sua ação
causa seu questionamento e a reação de sua ação devolve com a resposta sem qualquer intermediação
externa. A interatividade mental (Minds on) parte da contemplação do objeto e, com isso, gera
reflexões, dúvidas sobre a experiência praticada, provocando no visitante perguntas e inquietações A
terceira é a interatividade cultural (Heart on), onde o museu busca a valorização da cultura do local
onde está inserido. O visitante que vem de fora desta localidade se sensibiliza com os objetos culturais
locais, da mesma forma que o visitante regional se sensibiliza com a evidência de sua cultura (Ibid).
McManus (2009), ao tecer considerações a respeito da interatividade nos espaços museais, esclarece
que os “módulos interativos são construções tridimensionais projetadas para que o visitante possa
manipulá-las de algum modo, ou explorar o que se possa fazer fisicamente, com o objetivo de

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compartilhar algum entendimento com o projetista desconhecido desses módulos” (p. 60). Segundo a
pesquisadora, o visitante pode “brincar” com o módulo, como consequência “aprender fazendo”,
tendo em vista que “muito do que compreendemos do mundo em nossa volta foi aprendido ao agir
no mundo, ao testemunhar e observar os resultados a ao refletir sobre nossas experiências” (ibid).
A interatividade, numa exposição, cria estímulos sensoriais, torna a percepção um ato de
compreensão, que envolve um “processo altamente dinâmico e característico da consciência humana”
(Ostrower, 1998, p.73). Um módulo interativo, comumente emprega diferenciados elementos da arte,
de maneira que, utiliza a arte e suas linguagens para transmitir temas científicos e tornam, esses
conteúdos mais prazerosos, de fácil assimilação para qualquer público, tanto o leigo quanto o
especialista, transformando a experiência museal num contato mais humano (Wagensberg, 2005).
Dessa maneira, o museu de ciência tem por essência estabelecer o diálogo entre arte e ciência. A
relação entre a arte e a ciência tende a auxiliar na construção de novos caminhos para ambas as áreas
desde a Revolução Científica, Galileu por exemplo, estudou desenho para entender a aparência da lua
vista de sua luneta, capaz até de calcular a altura das montanhas só pela compreensão da perspectiva.
Os artistas da fase Impressionista investigaram a dimensão do tempo em suas pinturas, influenciados
pelo advento da fotografia, quebraram paradigmas da perspectiva, mostrando como o objeto
representados nas pinturas mudava com o tempo (REIS, GUERRA e BRAGA, 2006). Cézanne, Seurat e
Monet se apropriaram das novas teorias das cores para descobrir fusões luminosas entre elas através
de suas pinceladas curtas e rápidas (OSTROWER, 1998).
A ciência foi uma constante na vida artística de Salvador Dalí, que se aprofundou nos conceitos da
física, matemática e psicanálise para representar nas suas pinturas uma nova realidade a partir das
teorias da relatividade e da física quântica, ajudou com isso, a criar o movimento Surrealista, aplicou
em seu trabalho conceitos científicos e artísticos para compor suas obras (LOPEZ FERRADO, 2006).
Com esses breves exemplos, percebe-se a importância da junção Ciência e Arte.

2 Metodologia

O presente trabalho foi norteado pelos parâmetros da pesquisa qualitativa (Minayo, 2004), em que se
avaliou a perceção dos alunos do curso de Licenciatura em Belas Artes, acerca das exposições
científicas presentes em um museu de ciência, por meio da ferramenta do grupo focal (GF).

2. 1 A técnica do Grupo Focal

No que tange às definições para grupo focal, Kitzinger & Barbour (1999) afirmam que “qualquer
discussão de grupo pode ser chamada de um grupo focal, contanto que o pesquisador esteja
ativamente atento e encorajando às interações do grupo” (p.20). Para Powell & Single (1996), o grupo
focal é um grupo de indivíduos previamente selecionados e organizados por pesquisadores para
discutir e comentar sobre a experiência pessoal de determinado tema, assim como as informações
podem ser usadas para identificar potenciais áreas de investigação, ou para esclarecer assuntos
importantes. Gondim (2003) destaca, ainda, que o emprego da técnica do grupo focal pode ser
utilizado de diferentes formas pelo pesquisador, de modo que tal técnica pode ser empregada como
uma forma de autorreflexão e transformação social, ou como uma forma de investigação sobre um
tema pouco conhecido, visando pesquisas futuras.
Na pesquisa social, a técnica do grupo focal é muito comum dentre o conjunto de métodos para coleta
de dados, sobretudo quando nos reportamos à pesquisa qualitativa (Powell & Single, 1996). Trade
(2009) afirma, ainda, que “a utilização dos grupos focais, de forma isolada ou combinada com outras
técnicas de coleta de dados primários, revela-se especialmente útil na pesquisa avaliativa” (p. 779).

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Dessa maneira, uma vez que o trabalho em questão teve como proposta avaliar exposições científicas
sob a ótica de um grupo de estudantes, o GF foi uma importante ferramenta para tal coleta de dados.

2.2 Local e participantes da pesquisa

O Museu de Ciência no qual ocorreu a pesquisa, foi o Espaço de Ciência IterAtiva – ECI, museu do
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro – IFRJ, campus Mesquita,
localizado no município de Mesquita, na região metropolitana do Estado do Rio de Janeiro/Brasil.
O ECI possui duas exposições científicas permanentes; no salão de exposições científica, há a exposição
“NeuroSensações”, onde o foco principal é divulgar e promover debates e questionamentos a partir
de oficinas, modelos e módulos interativos sobre os temas: sentidos do corpo humano; o sistema
nervoso; memória; fenômenos ópticos; entre outros fenômenos físicos e biológicos, os quais
encontram-se integrados, de maneira a estabelecerem conexões entre si. Na área externa do ECI,
localiza-se o “Parque da Ciência”, neste parque há experimentos interativos que demostram diferentes
fenômenos físicos a partir de brinquedos, tais como o elevador humano; orelhões parabólicos; tubos
sonoros; giroscópio humano (este último encontrava-se em manutenção no dia da pesquisa).
Nesse sentido, antes da realização do GF, os participantes visitaram os dois espaços de exposição do
Espaço Ciência InterAtiva. A visita contou com a presença da equipe de mediadores do ECI, os quais
proporcionaram debates e discussões entre os alunos acerca dos temas explorados pelas exposições.
O GF aconteceu no mesmo dia da visita ao ECI, na sala de vídeo desse museu de ciência. Para tanto,
participaram 15 alunos, sendo 11 do terceiro período, 3 do quarto e 1 do quinto período do curso de
Licenciatura em Belas Artes da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Quanto ao
tamanho do grupo, Barbour (2009) expressa que em trabalhos “mais antigos”, havia a orientação no
qual o GF deveria ter de 10 a 12 participantes, sobretudo na área de marketing. Contudo, atualmente
não há tal rigidez no tamanho da amostra, de sorte que “o número de pessoas que podem
prontamente receber igual voz nos procedimentos dependerá não só da habilidade do moderador [...],
mas também do nível e da complexidade da discussão deseja (Ibid, p.88).

2.3 Instrumentos e técnicas de avaliação por meio do GF

No processo de aplicação do grupo focal, diferentes autores apresentam orientações acerca dos
instrumentos e as técnicas para a realização do GF, tais como o roteiro para discussão, o papel do
moderador e do pesquisador durante o GF, tempo de duração, entre outras questões importantes para
uma profícua realização do grupo (Gondim, 2003, Barbour, 2009 & Trade, 2009). Sendo assim, será
detalhado os procedimentos empregados nesta pesquisa, baseado nesses autores.
Durante a realização do GF, participaram o pesquisador, como observador e o moderador. Trade
(2009), elucida que o moderador precisa “ter sensibilidade e bom senso para conduzir o grupo de
modo a manter o foco sobre os interesses do estudo, sem negar aos participantes a possibilidade
de expressar-se espontaneamente” (p. 787). Dessa forma, com o auxílio de um roteiro, o moderador
levantou questões e temas relativos à exposição, trazendo assim, “recursos para compreender o
processo de construção das percepções, atitudes e representações” (Gondim, 2003, p. 151)
vivenciadas pelos participantes durante a visitação. Sendo assim, o grupo focal foi norteado pelo
seguinte roteiro:

1) O que achou da exposição NeuroSensações?


2) Quais foram os conceitos científicos observados nos módulos expositivos?
3) Há expressões artísticas presentes nas exposições?

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4) O que você sentiu quando ficou em frente aos módulos expositivos?


5) Você encontrou alguma relação entre de arte e ciência nas exposições?

A atividade teve uma duração de aproximadamente 30 min, o grupo focal foi filmado e posteriormente
transcrito pelos pesquisadores.
Todos os participantes autorizaram a filmagem com a assinatura no Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido. Importa ressaltar que a pesquisa foi submetida e aprovada no Comitê de Ética do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro. Durante o processo de transcrição os
nomes dos participantes da pesquisa foram substituídos pelas iniciais dos seus nomes, a fim de manter
o sigilo de suas identidades. Para análise dos dados obtidos, foi empregada a técnica de análise
temática, baseado no trabalho de Fontoura (2011). A partir da análise do grupo focal, os dados
semelhantes foram agrupados em cinco categorias temáticas.

3 Resultados e Discussão

Após a análise das respostas dos participantes produzidas pelo grupo focal, foram estabelecidas cinco
categorias temáticas: “promoção do conhecimento científico de forma prática”; “criação de centros
de ciência no espaço escolar”, “interatividade nos módulos experimentais”, “relação entre arte e
ciência” e “possibilidade de vivenciar diferentes experiências”.
Para os alunos de Belas Artes, a teoria aliada à prática foi fundamental para a compreensão dos temas
e fenômenos presentes nas exposições. Dessa maneira, foi identificada entre as respostas a categoria
“promoção do conhecimento científico de forma prática” tal como ilustram os depoimentos a seguir:

JVS: “Achei muito legal ter a parte da teoria, ao mesmo tempo ter a experiência para mostrar na prática
mesmo que a gente já soubesse, provavelmente ninguém viu assim na prática.”

WB: “[...] a forma de ilustrar tudo foi bem claro, até as esculturas e tal, todo o visual, assim [...] foi bem
válido para a gente adquirir o conhecimento, ficou muito legal, bom mesmo!”

Os participantes, também, demonstraram interesse e compreensão acerca dos fenômenos naturais


evidenciados pelos módulos interativos. Portanto, foi falado principalmente sobre a cor luz na câmara
escura, tendo em vista o fato desse grupo pertencer às Artes, o conceito de cores ficou bem destacado
nas falas como uma forma bem esclarecedora e dinâmica. Da mesma maneira foi mencionada a
sensibilidade tátil e as papilas gustativas.

CM: “O experimento da luz, principalmente, o da óptica [...] naquela roda que tem vários negocinhos
de vidro como a luz funciona em cada superfície.”

EG: “Tem o da língua tem um [...]é [...] que a gente não aprendeu na escola, que ela falou ali que nós
temos e eu não sabia, pelo menos eu não sabia.”

AC: “A questão das cores, da luz, acho que seria um foco que chamaria mais atenção, principalmente
para a prática, em aula por causa dos experimentos.”

Foi identificada, ainda, a categoria “criação de centros de ciência no espaço escolar”, uma vez que se
levantou a possibilidade de implantação de centros de ciência dentro do espaço escolar, sendo este
uma ferramenta importante no processo de formação do aluno. Verificou-se no depoimento dos

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participantes que para eles, um espaço científico que trabalhe com módulos interativos tende a
facilitar a compreensão dos conteúdos do currículo básico:

MS: “A educação como um todo é uma deficiência, porque isso deveria ter em toda as escolas, todas
elas deveriam no mínimo, o espaço não é grande, caberia numa escola, [...] numa escola estadual,
municipal qualquer, um espaço desse feito, para que a criança e até o adolescente tivesse essa
sensação, tivesse esse conhecimento nessa prática visual. É muito boa a questão do tato, a questão de
você perceber as misturas de cores, formas [...]”.

Durante o GF os alunos pontuaram a importância da interação entre o objeto e o visitante, com isso
destacaram, em seus relatos, que a possibilidade de poder experimentar através do toque e da
manipulação de forma livre, amplia a percepção sobre o fenômeno a ser observado. Como
consequência, favoreceu uma melhor compreensão dos temas apresentados pelo módulo. Sendo
assim, esses depoimentos foram agrupados na categoria “interatividade nos módulos experimentais”.

PG: “A parte de você poder pegar, mexer, abrir, tocar, fazer o que quiser ali [...] você descobrir ali a
questão, facilitou bastante a assimilação daquilo ali que é o ensino né”.

HM: “É quando você pode tocar para ver como funciona fica mais fácil de assimilar, achei interessante,
gostei bastante.”

EG: “Isso de poder tocar e fazer a experiência falou da memória, você teve o reconhecimento, você usa
e não esquece.”

Ao serem indagados a respeito das sensações frente aos módulos, as respostas convergiram para o
discurso voltado para a “possibilidade de vivenciar diferentes experiências”. Para eles, os módulos
presentes nas exposições despertaram sensações que afloraram memórias infantis associadas à
brincadeira e ao lúdico, tendo em vista a permissão de manipular sem controle prévio e de forma livre.

LS: “[...] eu gosto muito de explorar esse campo sensorial, assim eu acho fantástico, então eu me
identifiquei muito na música, nos pêndulos, na lira e também no paladar, como estava falando que eu
fiz o teste... são coisas que você sente assim, quando você procura saber é outra coisa e quando há a
oportunidade assim então.”

MS: “[...] durante muito tempo eu me sentia assim ... e vejo o cara com um pezão um bocão eu me vi
ali no “Igor” (Homúnculo de Penfield1) ali no cantinho foi bem legal dá de cara com ele ali e ver que é
só questão de sensações a gente que se vê meio esquisito, com sensações “sinistras”, é legal foi bem
bacana.”

GS: “Eu me senti infantil, porque deu aquele sentimento de criança sabe de querer mexer para ver como
funciona e eram coisas bem intuitivas com aquele negócio da luz [...] É o cérebro também, eu fiquei
apertando todos os botões assim aí o pessoal falou – vai quebrar, mas o cérebro é isso aqui gente,
várias sensações! Muito louco” (risos).

1O “homúnculo de Penfield” é uma representação artística e distorcida do corpo humano, onde determinadas áreas recebem
mais inervação (condução de impulsos nervosos de um local para o outro), como é o caso da face e da mão em humanos, de
acordo com a sua importância e necessidade de precisão de movimentos e sensações (Santos, 2002).

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Quanto às experiências sensoriais proporcionadas pelos módulos interativos aos participantes deste
estudo, verificou-se que muitos conhecimentos científicos, que comumente são apresentados de
forma teórica, ao serem explorados por meio dos módulos interativos, em terceira dimensão,
facilitaram o entendimento e a compreensão dos fenômenos. Nessa corrente, McManus (2009) afirma
que os módulos interativos “oferecem uma rara oportunidade de levar de volta sua experiência para
uma situação concreta, livre da ‘caixa-preta’ da linguagem” (p. 60). Como também, os módulos “são
meios de comunicação excelentes para o público variado. As pessoas apreciam a experiência de
aprender por meio da manipulação interativa e, muitas vezes, usam um pouco o módulo, saem para
fazer algo mais, pensam em outra possibilidade e voltam [...]” (Ibid). Ademais, verificamos, por meio
dos relatos duas classes de interatividade, a manual (hands on) e a interatividade mental (Minds on),
tal como descreve Wagensberg (2005), uma vez que os alunos teceram debates, formularam
questionamentos e reflexões a respeito dos fenômenos observados durante a visita.

Durante o GF, foi também constatado que os alunos estabeleceram relações entre arte e ciência ao
longo da visita. Com isso, foi suscitado durante o GF as diferentes expressões artísticas presentes na
exposição, tais como escultura, pintura, desenho, a linguagem musical, a interação entre cor e música.
Para eles, a exposição evidenciou diferentes expressões como mecanismo de percepção. Essas
respostas foram agrupadas na categoria temática “relação entre arte e ciência”.

WB: “Escultura, pintura, desenho tudo! Tá bem completa nesse sentindo”.

GS: “Tem um esquema de música, no negócio de memória som de cada cor é um som único, então tem
como você gravar somente o som.”

AS: “Tem a parte da ilusão de ótica, tinha várias figuras, também tem haver assim com artes visuais.”

LS: “Que é cientifico se aprende tanto essa questão de arte, como científico, para que serve, e tal, a
descoberta do corpo, assim tá tudo ligado, é fundamental para a educação”

AS: “Acho que talvez, assim como prática, daria para usar, ver tudo e usar numa atividade de desenho
ou modelagem talvez.”

Quando a articulação entre arte e ciência, a compreensão do conhecimento teorizado se torna mais
prazerosa, de fácil assimilação. Nesse sentido, os recursos artísticos se compõem em uma forma de
envolver num ambiente sensorial, de modo a estimular e contribuir para o acesso imediato, a
experiência pela vivência, transformando o modo de aprendizado (Ostrower, 1998). Neste trecho dos
depoimentos fica evidente tal relação:

WB: “Acho que cumpre o papel da arte de você transmitir algo com esses recursos visuais, você criar
uma vivência com aquilo, então o fato de você ter uma escultura que possibilite você ver tocar, mexer
você cria uma vivência e faz com que se aprenda melhor”.

EG: “Fica mais divertido né, só teoria, teoria, as vezes a pessoa não presta a atenção [...]”

De maneira geral, as narrativas demonstraram que o fato de estarem em um ambiente que buscou
correlacionar diferentes campos do saber, como a ciência e a arte, além de proposições que
estimularam os sentidos, despertaram nos participantes interesses pelos temas em discussão de modo
a reconhecem a importância da arte no ambiente científico.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

4 Conclusões

O emprego da técnica do grupo focal possibilitou avaliar a experiência pessoal de cada participante
após a visita. Embora o grupo fosse homogêneo, proporcionou um ambiente de trocas e diálogos, uma
vez que cada visitante tende a ter experiências específicas em um mesmo espaço museal. Os
momentos de debates durante a sessão do GF promoveu a participação de todos, de maneira
organizada, a fala de um, foi estimulando a fala dos outros. De sorte que tal técnica também permitiu
uma variedade significativa de respostas, as quais trouxeram contribuições significativas para a coleta
e análise dos dados.
A visita ao Espaço Ciência InterAtiva proporcionou aos estudantes, participantes da pesquisa, uma
possibilidade a mais para o ensino de arte. Ao interagirem com esse espaço de educação não formal,
viram que a interdisciplinaridade por meio do diálogo entre ciência e arte é possível, prazerosa, bem
como perceberam possibilidades de articulações entre a popularização do conhecimento científico e
o conceito artístico.
Ao longo do GF, foi possível ter um panorama de como o grupo se posicionou diante dos módulos
interativos das exposições, verificou-se que eles conseguiram perceber a importância da interatividade
nos espaços expositivos, como também identificaram que a relação entre a ciência e a arte precisa
estar presente dentro do espaço museal. A interatividade os sensibilizaram, facilitando o
entendimento dos fenômenos presentes nos módulos. Todavia, importa ressaltar que esse trabalho
não buscou mensurar o quanto de conhecimento foi adquirido por parte dos sujeitos da pesquisa, mas
foi possível constatar que durante o intervalo de tempo o qual puderam interagir com a exposição,
muitos ali em sua primeira visita, demostraram engajamento e motivação para a aquisição de novos
saberes.
Não obstante, os alunos pontuaram que a educação formal é uma necessidade humana, mas que
precisa dialogar com a educação não formal, sobretudo mediante a apropriação dos ambientes não
formais de educação, tais com os centros e museus de ciência, uma vez que esses ambientes fornecem
ao espectador estímulos e interações que tendem a valorizar as emoções, ampliando a compreensão
sobre o conhecimento científico e artístico.
Neste estudo, foi identificado ainda que os alunos participantes compreenderam a diferença entre um
museu de ciência e uma sala expositiva de arte, como também entenderam que o museu de ciência
depende não só do cientista, mas também do artista, sendo um espaço rico e importante para a
apropriação de conhecimento também artístico. Portanto, este trabalho aponta ainda para a
necessidade de introdução de debates sobre o uso e apropriação dos espaços de ciência durante a
formação do licenciando em Belas Artes, com vistas a aproximar esse aluno do museu de ciência,
criando espaços de diálogos e debates entre os estudantes das artes e das ciências.
Agradecimentos. Agradecemos à jornalista Verônica Trindade Marques pela valiosa contribuição na fase de
coleta de dados.

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Compreender a Construção de Competências Profissionais: Um Estudo no


Contexto do Estágio em Enfermagem

Carmen Cunha1
Flávia Vieira2
Ana Paula Macedo3

1Pós-doutorada em Educação-Supervisão Pedagógica, Universidade do Minho, Portugal. carmenma-


rielouis@hotmail.com
2Instituto de Educação, Universidade do Minho, Portugal. flaviav@ie.uminho.pt
3Escola Superior de Enfermagem, Universidade do Minho, Portugal. amacedo@ese.uminho.pt

Resumo. O artigo apresenta um estudo de caso desenvolvido no âmbito de uma Licenciatura em Enferma-
gem com a finalidade de compreender processos de construção de competências profissionais em contexto
de estágio. Os dados foram recolhidos através de um questionário aos estudantes do 2º ano do curso e en-
trevistas semiestruturadas a um grupo de estudantes e duas supervisoras, uma da escola de formação e ou-
tra do hospital. Apresenta-se um recorte dos resultados obtidos, com um enfoque principal nos testemu-
nhos das entrevistas, os quais evidenciam a existência de tensões relativas à relação teoria-prática e à arti-
culação entre os dois contextos de formação, sinalizando a necessidade de reforçar modalidades de super-
visão de orientação reflexiva e dialógica, assim como a colaboração interinstitucional.
Palavras-chave: enfermagem; estudantes; estágio clínico; competências; supervisão.

Understanding professional competence development: a study in Nursing clinical practice


Abstract. The paper presents a case study conducted within a Nursing programmme with the purpose of
understanding processes of professional competence development in the practicum. Data was collected
through a questionnaire to 2nd grade students and semistructured interviews to five of those students and
two supervisors, one from the training school and the other from the hospital. Partial results are presented
with a focus on interview accounts, which show the existence of tensions regarding the theory-practice
nexus and the articuation between both training contexts, suggesting the need to reinforce reflective, dia-
logical supervision practices as well as interinstitutional colaboration.
Keywords: nursing; students; practicum; competences; supervision.

1 Introdução

A Ordem dos Enfermeiros confere primazia ao reconhecimento e certificação de competências, à


atribuição de títulos profissionais, bem como ao processo de qualidade de supervisão clínica, na es-
teira do respetivo enquadramento legal (Lei nº 156/2015, de 16 de setembro; Regulamento nº
515/2014, de 14 de novembro). Neste sentido, importa investigar os processos de formação inicial
dos enfermeiros, em particular o modo como vivenciam o desenvolvimento da sua profissionalidade
em contextos de prática. O estudo aqui relatado, realizado numa Escola Superior de Enfermagem
(ESE) do norte de Portugal, centra-se em perceções de estagiários e supervisores sobre a construção
de competências profissionais no estágio clínico.
O estágio clínico, entendido como um espaço curricular central de formação em prol do serviço do
cuidar, apresenta-se como um cenário de aprendizagem híbrido e bastante complexo, potencialmen-
te gerador de tensões entre os dois campos de formação envolvidos, a escola de enfermagem e o
hospital, frequentemente associados a racionalidades e formas de trabalho distintas, e também à
separação entre teoria e prática, o que exige a definição de um projeto de formação coerente e par-

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tilhado por todos os intervenientes, assim como uma estratégia de articulação interorganizacional e
uma abordagem colaborativa nas práticas supervisivas (Cunha, Macedo, & Vieira, 2017; Macedo,
2012, 2013; Pinheiro, Macedo, & Costa, 2014). Assim, importa estudar as dinâmicas de formação
desenvolvidas em contextos de estágio, enquanto processos dialéticos vivos, de encontros e desen-
contros entre os seus atores, que interagem continuamente para potenciar processos formativos de
qualidade no contexto profissional. Foi nesta perspetiva que se adotou uma metodologia de investi-
gação naturalista, dando voz aos participantes dos processos formativos e construindo conhecimento
a partir das suas representações e vivências, com base no qual seja possível projetar melhorias rele-
vantes no contexto de investigação e potencialmente úteis em contextos análogos.

2 Enquadramento Teórico

A supervisão clínica na formação em enfermagem é um campo de atuação complexo, onde confluem


diversas racionalidades relativamente às finalidades e modalidades de formação, às competências do
supervisor e dos formandos, assim como ao papel das instituições envolvidas, o que pode gerar ten-
sões e conflitos (Creaner, 2014; Cutcliffe & Sloan, 2014; Falender, Shafranske, & Ofek, 2014; Jones,
2006; Silva, Pires, & Vilela, 2011). Sob esta ótica, o estágio clínico deve constituir um espaço de inda-
gações constantes, sendo necessário investigar o modo como o seu sentido é construído pelos inter-
venientes, de forma a compreender e melhorar os processos formativos. No estudo aqui apresenta-
do, centrámo-nos no desenvolvimento de competências na construção do saber profissional dos
futuros enfermeiros, com implicações no papel da supervisão e na relação Escola-Hospital.
No contexto português, o Regulamento do Perfil de Competências do Enfermeiro de Cuidados Gerais
(OE, 2012) constitui um quadro de referência na atuação do enfermeiro e, assim, deverá orientar a
formação dos futuros enfermeiros. Nesse Regulamento (artigos 5º, 6º e 7º) é identificado um conjun-
to de competências organizadas em três domínios, apresentadas no Quadro 1.

Quadro 1. Competências do enfermeiro (OE, 2012)


Domínios Competências
Responsabilidade Profis- Desenvolve uma prática profissional com responsabilidade
sional, Ética e Legal Exerce a sua prática profissional de acordo com os quadros ético, deontológico e jurídico
Atua de acordo com os fundamentos da prestação e gestão de cuidados
Contribui para a promoção da saúde
Prestação e Gestão de Utiliza o Processo de Enfermagem
Cuidados Estabelece comunicação e relações interpessoais eficazes
Promove um ambiente seguro
Promove cuidados de saúde interprofissionais
Delega e supervisiona tarefas
Desenvolvimento Profis- Contribui para a valorização profissional
sional Contribui para a melhoria contínua da qualidade dos cuidados de Enfermagem
Desenvolve processos de formação contínua

Na construção destas competências profissionais em contexto de estágio, emerge como potencial-


mente problemática a relação teoria-prática e a articulação Escola-Hospital na socialização dos estu-
dantes no mundo do trabalho (Macedo, 2014; Dantas Silva, 2013). O estágio coloca em diálogo dois
espaços formativos na mediação entre teoria e experiência, sendo necessário desenvolver estraté-
gias de supervisão colaborativa, que promovam a autorregulação das aprendizagens e a construção
da identidade e autonomia dos formandos (Pinheiro, Macedo, & Costa, 2014; Silva, 2012; Silva, Pires,
& Vilela, 2011; Vieira et al., 2010). A reflexão e o feedback construtivo são elementos fulcrais na
promoção de mudanças conceptuais e acionais do futuro enfermeiro (Goodyear, 2014; Silva, 2012).

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Importa que as aprendizagens realizadas na ESE sejam relevantes na preparação dos estudantes para
a prática, mas também que as estratégias de supervisão favoreçam uma epistemologia praxeológica,
através da qual eles produzam conhecimento situado e aprendam a lidar com a natureza complexa,
indeterminada e única da sua profissão, em linha com uma formação de natureza reflexiva (Alarcão
& Tavares, 2003; Schön, 1987; Vieira et al., 2010). Desta perspetiva, a supervisão deve possibilitar a
compreensão da complexidade das situações profissionais, visando uma atuação informada e consci-
ente.
No caso da ESE onde se realizou o presente estudo, tem havido a preocupação de favorecer a forma-
ção reflexiva dos estudantes (v. Macedo, 2012; Martins et al., 2009), pretendendo-se nesta investi-
gação aprofundar conhecimento acerca do modo como os atores da formação em estágio percecio-
nam os processos de desenvolvimento profissional, com particular atenção a potenciais problemas
vivenciados.

3 Metodologia

O estudo enquadra-se num projeto de pós-doutoramento da primeira autora, desenvolvido de janei-


ro a dezembro de 2015 com o acompanhamento das outras autoras. Insere-se no campo da supervi-
são na área da Enfermagem e constitui um estudo de caso exploratório, tendo-se adotado uma me-
todologia qualitativa que incorpora a interpretação de representações e vivências dos atores da for-
mação como base para a produção de conhecimento acerca do modo como constroem significados
para a realidade (Minayo, 2004). A investigação qualitativa “responde a questões muito particulares
(...), ou seja, ela trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenôme-
nos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (...)” (Minayo, 1996, p. 21). Embo-
ra a investigação qualitativa possa integrar dimensões quantitativas, abandona o “processo de pro-
va” como único critério de validade e evidencia o “interesse social” da investigação numa perspetiva
humanista e emancipatória (Develay, 2001). O estudo insere-se, assim, num paradigma naturalista,
no qual o que se investiga e o modo como se investiga dependem do posicionamento ideológico de
quem investiga (Guba & Lincoln, 1988), esbatendo-se fronteiras entre ontologia, epistemologia e
método (Lincoln, 2001). Recusa-se, portanto, uma visão neutra da investigação, pressupondo-se que
“Todo pensamento sai do nosso ventre, como o fio da teia. Cada teoria é um acessório da biografia,
cada ciência, um braço do interesse” (Alves, 2003, p. 35). Sendo esta uma condição da compreensão
e da transformação do mundo, é também uma das condições da investigação sobre o mundo. O co-
nhecimento assim produzido é situado e idiossincrático, embora passível de “generalização impreci-
sa” para situações idênticas (Bassey, 1994).
O cenário de recolha de dados foi a Licenciatura em Enfermagem de uma ESE no norte de Portugal,
um curso com 240 créditos (ECTS - European Credit Transfer System), cujo plano de estudos se de-
senvolve em 4 anos/8 semestres e prevê períodos de estágio em todos os anos, com a supervisão de
um enfermeiro no hospital e um formador da ESE. A recolha de dados decorreu durante o estágio do
2º ano do curso, no período de março a maio de 2015, tendo-se administrado um questionário anó-
nimo a todos os estudantes, num total de 101 dos quais responderam 92, e realizando-se uma entre-
vista a um grupo de cinco estudantes e duas supervisoras, uma da ESE e a outra do hospital.
Presidiram ao estudo duas questões de investigação: Como são percecionados os processos de de-
senvolvimento profissional do futuro enfermeiro em contexto de estágio? Que problemas emergem
nesses processos? Na amplitude dos processos de desenvolvimento profissional, atendeu-se sobre-
tudo à relação teoria-prática, à articulação Escola-Hospital e ao papel da supervisão, o que determi-
nou o conteúdo dos instrumentos de investigação, apresentado no Quadro 2.

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Quadro 2. Instrumentos de investigação: questionário e entrevistas


Questões de investigação: Como são percecionados os processos de desenvolvimento profissional do futuro enfermeiro em
contexto de estágio? Que problemas emergem nesses processos?

Instrumentos Formato Foco


Questionário Secção 1: 10 afirmações face às quais o Papel da supervisão no desenvolvimento profissional
(estudantes) se expressa o grau de concordância o Articulação entre os conhecimentos teóricos adquiridos na
numa escala de Likert: Concordo ESE e a prática hospitalar
Totalmente/ Concordo/ Discordo/ o Papel da prática hospitalar na promoção do conhecimento
Discordo Totalmente/ Tenho Dúvidas profissional e na resolução de problemas
o Saber construído em estágio clínico e preparação para atuar
na prática hospitalar
Secção 2: 2 questões de resposta o Dificuldades/ dilemas percebidos na experiência de estágio
aberta o Aprendizagens/ ganhos percebidos na experiência de estágio
Entrevistas 2 guiões de entrevistas semi- o Construção da competência profissional na ESE e no Hospital
(estudantes e estruturadas, com 11 questões aber- o Conceções de supervisão e da relação ESE-Hospital nos
supervisoras) tas processos de supervisão e construção do conhecimento pro-
fissional
o (In)satisfação com a experiência do estágio

Os dados do questionário foram sujeitos a uma análise estatística descritiva das respostas às ques-
tões fechadas (Secção 1) e a uma análise de conteúdo das respostas às questões abertas (Secção 2).
Depois de analisados os seus resultados, e a fim de os aprofundar, foram entrevistados cinco dos
estudantes, distribuídos em quatro setores do serviço hospitar (ortopedia, cirurgia geral e vascular,
neurocirurgia e urologia), quatro do sexo feminino e um do sexo masculino, com idades compreen-
didas entre os 21 e os 38 anos. Foram também entrevistadas duas supervisoras: a supervisora destes
estagiários na ESE, docente especialista em Enfermagem e doutorada em Educação, com 50 anos de
idade e 27 anos de tempo de serviço, e uma enfermeira supervisora do hospital que trabalhava com
a supervisora da ESE, licenciada em Enfermagem e com uma pós-graduação em Supervisão Clínica,
com 27 anos de idade e 4 anos de tempo de serviço. As entrevistas foram conduzidas individualmen-
te pela investigadora principal, audiogravadas, transcritas e sujeitas a uma análise temática que de-
correu em três etapas: pré-análise através da leitura flutuante dos testemunhos, agrupamento dos
dados por semelhança para identificação de unidades temáticas e interpretação dos resultados.
Todos os paricipantes aceitaram participar voluntariamente no estudo, tendo sido respeitados os
princípios éticos da investigação, o que se expressa no anonimato dos sujeitos, na confidencialidade
dos dados e no consentimento informado dos entrevistados, os quais assinaram um Termo de Con-
sentimento Informado, Livre e Esclarecido (Gauthier, 1998). Para iniciar a investigação de campo, o
projeto foi apresentado ao Comitê de Ética de Pesquisa do Hospital, que emitiu parecer favorável.

4 Resultados e Discussão

Nesta secção, apresentamos alguns dos resultados do estudo que se articulam com algumas das
competências e critérios de um bom desempenho profissional previstos no Regulamento do Perfil de
Competências do Enfermeiro de Cuidados Gerais (OE, 2012), sintetizados no Quadro 3 e relativos a
uma atuação responsável, fundamentada e continuamente aperfeiçoada. Focamos a atenção em
depoimentos das entrevistas que explicitam alguns dos resultados do questionário e que evidenciam
a emergência de tensões nos processos formativos, embora o estudo também ilustre as potenciali-
dades desses processos, relatadas noutro lugar (Cunha, Macedo, & Vieira, 2017). Nos depoimentos

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apresentados, identificam-se os entrevistados com as seguintes siglas – E (Estagiário), P-S (Professo-


ra-Supervisora da ESE) e E-S (Enfermeira-Supervisora do Hospital).

Quadro 3. Competências do enfermeiro: responsabilidade, fundamentação e aperfeiçoamento (OE, 2012)


Competências Critérios de competência
Desenvolve uma práti- Aceita a responsabilidade e responde pelas suas ações e pelos juízos profissionais que elabora.
ca profissional com Consulta peritos em Enfermagem, quando os cuidados de Enfermagem requerem um nível de
responsabilidade perícia que está para além da sua competência atual ou que saem do âmbito da sua área de
exercício.
Atua de acordo com os Aplica os conhecimentos e as técnicas mais adequadas, na prática de Enfermagem. Incorpora, na
fundamentos da pres- prática, os resultados da investigação válidos e relevantes, assim como outras evidências. Aplica
tação e gestão de o pensamento crítico e as técnicas de resolução de problemas. Ajuíza e toma decisões funda-
cuidados mentadas, qualquer que seja o contexto da prestação de cuidados.
Promove um ambiente Cria e mantém um ambiente de cuidados seguro, através da utilização de estratégias de garantia
seguro da qualidade e de gestão do risco.
Contribui para a valori- Contribui para o desenvolvimento da prática de Enfermagem. Atua como um modelo efetivo.
zação profissional Valoriza a investigação como contributo para o desenvolvimento da Enfermagem e como meio
para o aperfeiçoamento dos padrões de qualidade dos cuidados.
Desenvolve processos Leva a efeito uma revisão regular das suas práticas. Assume responsabilidade pela aprendizagem
de formação contínua ao longo da vida e pela manutenção e aperfeiçoamento das competências. Aproveita as oportu-
nidades de aprender em conjunto com os outros, contribuindo para os cuidados de saúde.

Os resultados do questionário mostram que os estudantes reconhecem o valor da formação teórica e


do estágio no seu desenvolvimento profissional, assim como o papel dos supervisores como especia-
listas a quem recorrem e que os apoiam na tomada de decisões responsáveis e fundamentadas. Con-
tudo, também identificam problemas na compreensão da relação teoria-prática e na articulação ESE-
Hopital, o que parece afetar a sua capacidade de tomar de decisões e agir de modo competente.
Alguns testemunhos das entrevistas reforçam estes aspetos:

É-nos instruída uma rigidez tal, que o conhecimento tem que ser assim, e não pode sair dali, e
chegamos ao hospital e tem que ser muito mais flexível. Por vezes nem os próprios docentes
percebem isso. É claro, trocamos impressões na aula e mesmo entre os docentes há diferen-
ças. Entre nós não sabemos o que temos que fazer, lá está, adaptamos-nos (…).É quase impe-
rativo haver uma uniformidade do conhecimento, (…) não pode haver estas disparidades, e
havendo na própria instituição ainda é mais gritante. (E5)

De maneira que agora quando eu tenho dúvidas eu vou pesquisar, porque não me lembro. A
professora diz que eu devo saber. Eu acho que não tenho que saber tudo, pois ela é que me
deve ensinar. Eu venho para aprender, no ensino clínico, não sou licenciada, não sou doutora-
da, não sou mestre, de maneira que eu não sei, então têm a obrigação de me ensinar. Depois
há contradições, e os alunos ficam sem saber o que é certo. Fazer como aprendemos na Esco-
la, nem sempre podemos porque desperdiçamos material! (E1)

As supervisoras reconhecem este tipo de problemas, contudo encaram-nos como parte integrante de
uma aprendizagem continuada, rejeitando uma visão aplicacionista da relação teoria-prática ou uma
relação linear entre a formação recebida na ESE e a prática hospitalar:

[Existem] dilemas por falta de conhecimentos, muitas vezes não sabem como atuar, e procu-
ram ajuda. Os conhecimentos teóricos são importantes, sim, porque há aspetos que já não vão
constituir novidade em contexto clinico, e dão-lhes muito maior à vontade. No entanto há

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muitos conhecimentos novos que eles vão encontrar e que vão ter que estudar sucessivamen-
te. (P-S)
E é importante que consigamos passar ao estudante que não está errado, aquilo que apren-
deu. (…) ou então, explicar-lhe que na prática fazem-se as coisas mais improvisadas, não é tão
exigente como é a teoria na Escola. (E-S)

A transferência das aprendizagens efetuadas na ESE para a prática clínica hospitalar não se apresenta
suficiente para uma atuação profissional competente, já que o aprendido precisará ser aplicado aos
doentes e não mais aos manequins, exigindo a construção de conhecimento a partir da experiência:
“A aquisição de competências, aptidões e atitudes adequadas à prática clínica pressupõe uma ação
refletida e uma transferência de conhecimentos da teoria para a prática, levando à construção do
conhecimento pessoal na ação” (Martins et al., 2009, p. 110). As respostas dos estudantes ao questi-
onário sublinham o papel central do saber adquirido na ESE e no contexto hospitalar, mas também
indicam a perceção de inseguranças técnicas, falta de conhecimentos, dificuldades de comunicação
com o doente e dilemas emocionais perante situações de doença grave ou morte. Nas entrevistas, as
suas dificuldades surgem associadas à perceção de um distanciamento existente entre a formação na
ESE e as exigências do contexto de trabalho:

Na Escola, nós aprendemos a parte teórica no boneco, no máximo. Da prática, o que é que te-
mos? Uma coisa é trabalhar com objetos, outra coisa é trabalhar com o ser humano. É inevitá-
vel a pessoa sentir certa empatia por aquela pessoa, e ter um dilema moral ao saber que está
eventualmente a magoar e que é para o bem dela, e isso é só com a prática. (E5)

Na Escola vemos fotografias, mas depois de chegar aqui e olhar para uma ferida é muito dife-
rente de ver nas fotografias. Olhamos, sentimos o cheiro, se está infetado, se não está. Com a
fotografia não dá. Nós não conseguimos ver uma pessoa, não sabemos como é que ela se sen-
te com aquela ferida. (E2)

Os supervisores estão bem cientes destas dificuldades e reforçam a necessidade de aproximar a for-
mação na ESE à formação no hospital, nomeadamente para promover a ponte entre teoria e prática
e a construção de um conhecimento reflexivo e situado:

Os nossos estudantes fazem formação em alternância (…). É uma forma dos estudantes adqui-
rirem aprendizagens sucessivas, e conseguirem relacionar mais facilmente aquilo que apren-
dem em sala de aula, e depois no próprio contexto clínico. Há uma tentativa de aproximação
da escola ao hospital. Isto porque, embora a escola esteja muito perto do hospital, proximida-
de física, há sempre um distanciamento quando falamos no modus operandi dos seus atores.
(P-S)

O facto de virem para estágio obriga-os a repensarem as teorias, aquilo que foi lecionado na
Escola, os conteudos teóricos. Obriga-os a fazer a ponte para a prática. Saberem reajustar de
acordo com a pessoa que está à frente, que necessita dos nossos cuidados. Vão começando
gradualmente, (…) a reajustar e validar conhecimentos. Tenho sempre o cuidado de os questi-
onar, como é que foi nas aulas, como é que vocês fizeram. E tento sempre conjugar, justificar,
argumentar. (E-S)

Face à complexidade dos contextos de trabalho, importará que a supervisão de estágio crie “oportu-
nidades para que os estudantes disponham de uma diversidade de experiências no sentido de de-

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senvolverem a tomada de decisão na resolução de situações-problema, favorecendo um papel ativo


no seu processo de aprendizagem, de autonomia e responsabilidade profissional” (Martins, et al.,
2009, p. 117). A supervisão deverá também favorecer uma epistemologia para a incerteza, promo-
vendo capacidades de questionamento do conhecimento e da realidade, tolerância da ambiguidade
e ação crítica (Barnett, 2000, p. 420). Esta ideia subjaz a alguns testemunhos dos estudantes onde se
reconhece a incerteza inerente à tomada de decisões profissionais, que não depende apenas do co-
nhecimento teórico adquirido ou de procedimentos padronizados:

O [conhecimento] básico fica connosco sempre, mas se nos aparece uma patologia mais com-
plicada, algo que não é tão comum, mesmo algum fármaco a que não estejamos tão habitua-
dos, temos que parar para vermos. Primeiro fazemos o trabalho de pesquisa, uma pesquisa
rápida aqui, depois em casa iremos fazer com mais calma, mas aqui temos de saber mais ou
menos (...). (E2)

O que aprendemos na Escola é indispensável, sem essa base de conhecimento não saberíamos
o que fazer em termos de contexto hospitalar. Porque uma pessoa tem que adequar à situação
ao doente, ao ambiente e, às vezes, não se podem seguir as regras à risca. Bem, a principal ca-
racterística é a adaptabilidade, temos que saber adaptar-nos ao serviço e por vezes também
ao doente. (E5)

Em consonância com os posicionamentos dos entrevistados, concordamos que o estágo clínico é “um
espaço insubstituível de transformação de conhecimentos e aquisição de saberes práticos e proces-
suais” (Abreu, 2003, p. 9), sendo a aprendizagem profissional um processo de reflexão e de constru-
ção da identidade profissional. O estágio configura, deste modo, um espaço de aprendizagem da
profissão, no qual os estudantes “experienciam o que será a sua vida profissional, aproximam-se dos
profissionais de saúde e da prática de cuidados, assim como das pessoas alvo dos seus cuidados,
sendo preponderante nesta fase da sua formação a prática efetiva de uma educação reflexiva” (Mar-
tins, et al., 2009, p.112). Desta perspetiva, vemos como salutares as inquietações dos estudantes
diante das dificuldades sentidas, revelando uma consciência crítica dos contextos em que atuam e a
preocupação de agir de modo competente. Contudo, essas inquietações também se associam fre-
quentemente a sentimentos de frustração e desânimo face às exigências da formação e da profissão.
Mesmo a formação teórica na ESE apresenta dificuldades, nomeadamente no que diz respeito à ges-
tão do volume de informação:

Às vezes é complicado absorver tanta informação. Mesmo em contexto de sala, nós somos
cento e tal alunos numa sala, somos muitos, se chegarmos cedinho à aula e ficarmos bem lá à
frente, nós conseguimos absorver muita coisa. (...) às vezes chega-se mesmo a perder o que o
professor diz, porque não se consegue ouvir. O pessoal opta por ficar até ao final da aula e de-
pois dirigir-se ao professor e perguntar, ou por via de email, que também é complicado. (E2)

Eu acho que esses conhecimentos teóricos são a base de tudo. O que acontece é que muita
coisa se perde, se desvanece depois. Claro que agora criticam-nos muito numa prática clínica,
mas a verdade é que a culpa não é nossa. É uma prova de esforço, em demasia, acho que não
são métodos muito eficazes. Somos sacrificados porque nós não sabemos tudo, nós não po-
demos saber tudo. (E1)

Face às tensões identificadas, a formação deverá assumir uma natureza dialógica através de “práticas
de negociação pedagógica, que podem flexibilizar processos e melhor ajustar as exigências dos do-

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centes aos estudantes, para que se obtenha uma relação pedagógica verdadeiramente transforma-
dora, e reforçada pelo poder da emancipação” (Martins et al., 2009, p. 15). Concordamos com postu-
ras de dialógo e com propósitos democráticos diante das exigências que brotam dos sistemas institu-
cionais e que por vezes geram problemas e conflitos. Neste sentido, importa que a supervisão de
estágio assente em valores humanistas, trabalhando em direção a um ideal partilhado. Como subli-
nha Vieira (2014, p. 24), a resistência frequentemente criada pelo termo “supervisão” deixa de fazer
sentido se, em vez de associarmos a supervisão ao exercício do poder de uma pessoa sobre outra, a
associarmos à regulação da prática, supondo sempre a construção, individual ou colaborativa, de
uma visão dessa prática, no que ela é e no que pode (vir a) ser, o que significa que qualquer profis-
sional deverá desenvolver competências de supervisão da sua ação. Contudo, mesmo quando a su-
pervisão assume uma natureza dialógica e emancipatória, é difícil suavizar ou minimizar sentimentos
de insegurança dos estudantes face ao desconhecido, sobretudo num cenário de relações desiguais e
diferenciadas, onde os seus desempenhos são objeto de observação e avaliação. A supervisão tem
assim o duplo efeito de apoiar a aprendizagem profissional e gerar ansiedade profissional, estando
esta ansiedade fortemente associada ao medo de errar e de obter avaliações negativas:

Nós vimos para aqui como alunos, como estagiários sabemos que estamos com medo, por-
que vamos ser repreendidos por isto, por aquilo, não podemos sentar, não podemos fazer
aquilo porque vai ficar errado (…). Acho que são muitos dias, muita pressão. (E1)

Eles têm que sair com uma nota daqui, e é essa pressão que às vezes os condiciona no de-
senvolvimento do estágio. (E/S)

Os resultados do estudo revelam a complexidade do estágio como espaço de construção de compe-


tências profissionais, sinalizando a necessidade de reforçar uma supervisão de orientação reflexiva e
dialógica, e também a colaboração Escola-Hospital na consensualização de modos de atuação que
favoreçam essa orientação.

5 Conclusão

Nunca é demais sublinhar a complexidade dos processos formativos em contexto de ensino clínico,
que ao mobilizar saberes teóricos e práticos, e ao exigir um diálogo interinstitucional, cria desafios
aos estudantes e aos supervisores. O estudo apresentado, de cariz naturalista, permitiu desvendar e
compreender alguns aspetos dessa complexidade a partir da voz dos atores da formação, o que, do
ponto de vista metodológico, confere validade ecológica aos resultados obtidos. Por outro lado, não
se tratou apenas de saber o que esses atores pensam, mas também interpretar os seus testemunhos
por referência a um quadro ético-conceptual que valoriza uma formação de natureza reflexiva, expe-
riencial e dialógica. Assim, o significado atribuído aos problemas e tensões sinalizados relaciona-se
diretamente com o posicionamento ideológico da investigação, nomeadamente quanto ao que deve
ser a formação neste contexto. Neste sentido, os resultados apresentados não podem ser encarados
como verdades definitivas, mas sim como interpretações situadas, idiosincráticas e passíveis de con-
testação. Em todo o caso, julgamos que o estudo fornece pistas relevantes para uma reflexão acerca
da natureza dos processos formativos, nomeadamente quanto à relação teoria-prática e à articula-
ção ESE-Hospital, com implicações na supervisão. Embora se reporte a uma única instituição, o que
limita a amplitude e o significado dos resultados, interessará certamente a outros atores envolvidos
na formação inicial em Enfermagem, esperando-se que contribua para reforçar a ideia de que conhe-
cer as vivências dos intervenientes da formação pode constituir uma base importante de reflexão

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acerca da qualidade dos processos formativos, no sentido de os compreender, problematizar e me-


lhorar. Desta perspetiva, uma abordagem naturalista pode conferir à investigação um “interesse
social” (Develay, 2001) que vai além da produção de conhecimento e visa apoiar a transformação da
realidade.

Agradecimentos. Agradecemos a colaboração dos estudantes e docentes que participaram no estudo, desen-
volvido no âmbito do CIEd-Centro de Investigação em Educação, Universidade do Minho, UID/CED/01661/2013
(fundos nacionais da FCT/MCTES-PT).

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Análisis del aprendizaje expansivo en un colectivo de carácter horizontal:


Estudio de Caso.

María José Sosa Díaz1, María del Carmen Garrido Arroyo2

1,2 Departamento de Ciencias de la Educación, Universidad de Extremadura, España.


1mjosesosa@unex.es; 2cargarri@unex.es

Resumen. El aprendizaje expansivo es un modelo teórico del aprendizaje que se caracteriza principalmente
por tener una dimensión transformadora, y horizontal del aprendizaje, pues a través del diálogo colectivo se
crea el conocimiento y transforma la realidad (Engeström, 2007). En este contexto, se considera necesario
identificar los elementos claves que componen el sistema de actividad y analizar las características del
proceso cíclico del aprendizaje expansivo en el estudio de caso. Para ello, se ha utilizado una metodología
cualitativa basada en Estudios de Casos tomando como unidad el colectivo “Espacio Libre Candil” que surge
con el objetivo de construir la escuela “alternativa” como proyecto educativo. Como técnicas de recogida de
datos se ha empleado la entrevista personales, documentos institucionales y observaciones de asambleas
organizativas. Mediante el uso del software de análisis de contenido cualitativo Nvivo 11 se ha obtenido un
análisis tanto del triangulo de la actividad y acciones de aprendizaje que conforman los sistemas de
actividad. A continuación se detalla el diseño metodológico del estudio de investigación sobre el análisis del
aprendizaje expansivo, identificando el proceso llevado a cabo y cómo este ha favorecido la extracción de
conclusiones.
Palabras clave: Aprendizaje expansivo, comunidad de práctica, estudio de casos, metodología cualitativa.

Analysis of the expansive learning in a group of horizontal character: Case Study.


Abstract. Expansive learning is a theoretical model of learning that is characterized mainly by having a
transformative and horizontal dimension of learning, because through collective dialogue creates
knowledge and transforms reality (Engeström, 2007). In this context, it is considered necessary to identify
the key elements that compose the activity system and analyze the characteristics of the cyclical process of
expansive learning in the case study. To this end, a methodology based on Case Studies has been used,
taking as a unit the group "Espacio Libre Candil" which arises with the objective of constructing the
"alternative" school as an educational project. As data recognition techniques, personal interviews,
institutional documents and observations of organizational assemblies have been used. Using the qualitative
content analysis software Nvivo 11, we have obtained an analysis of both the triangle of the activity and the
learning actions that make up the activity systems. Next, the methodological design of the research study on
the analysis of the expansive learning is identified, identifying the process carried out by a corporal and how
it has favored the extraction of conclusions.
Key words: Expansive learning, community of practice, case study, qualitative methodology

1 Introducción

1.1 Aprendizaje expansivo

Según Engeström (2007) cualquier teoría del aprendizaje debe tener respuesta a cuatro preguntas:
(1) ¿Quiénes son los sujetos de aprendizaje, ¿cómo se definen y ubican?; (2) ¿Por qué aprenden, que
los hace realizar el esfuerzo?; (3) ¿Qué es lo que aprenden, cuáles son los contenidos y resultados de
aprendizaje?, Y (4) ¿Cómo aprenden?, ¿cuáles son las acciones clave o procesos de aprendizaje?
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Considerando como base el concepto de Zona de Desarrollo Próximo de Vygostsky y la Teoría de la


Actividad de Leontèv, Engeström (1987, p. 78) elabora su modelo teórico sobre el aprendizaje
expansivo.
Este modelo teórico considera que el aprendizaje se produce a través de una colaboración social (en
este caso el colectivo) mediante la construcción de redes de sistemas de actividad (conjunto de
acciones) compuestas por individuos, artefactos culturales (ideas, lenguaje, saberes, conocimientos,
etc) y la sociedad.
Así pues, según este modelo de aprendizaje el aspecto clave es la actividad que tiene como fin último
transformar un aspecto de la realidad, y que parte de la relación entre distintos individuos que han
analizado un problema y establecido una necesidad común, el cual es el motivo o objetivo que les
une.
En este sentido, propone el Triángulo de la Actividad, que identifica los elementos más importantes y
la relación entre estos, que son considerados como fundamentales en nuestro estudio de
investigación (Engeström, 2000).
Dentro de esta actividad se produce un conjunto de acciones interrelacionadas entre ellas
conformando una red o redes de sistema, que es lo que llamaremos sistema de actividad. Cada una
de las acciones que se producen dentro de la actividad, normalmente tienen un desarrollo cíclico, e
incluye mecanismos de transición a través de contradicciones que tiene la comunidad que son el
motivo para el cambio.
Por tanto, el análisis de cada acción implica identificar y analizar los motivos, las condiciones,
resultados, regulación de la acción, y establecimiento del orden y procedimientos para la ejecución.
Así como, la secuencia, reglas y condicionantes que establece el colectivo para llevar a cabo cualquier
proceso.
Es necesario tener en cuenta que se establece unos principios determinantes que debe cumplir la
Teoría de la Actividad (Engeström, Rantavuori, & Kerosuo, 2013):
1. Un sistema de actividad colectivo mediado por artefactos y orientados a objetos se toma
como principal unidad de análisis.
2. Un sistema de actividad siempre es una comunidad de múltiples puntos de vistas,
tradiciones e intereses.
3. Un sistema de actividad toman forma y se transforman durante largos periodos de tiempo.
Sus problemas y posibilidades solo se entiende por su historia.
4. Las contradicciones son las fuentes del cambio y desarrollo. Las contradicciones son
tensiones estructurales que a menudo generan disturbios y conflictos, pero también
innovadores intentos de cambiar la actividad.
5. Los sistemas de actividad se desplazan a través de ciclos que promueven transformaciones
cualitativas. Una transformación expansiva se logra cuando el objeto y el motivo de la
actividad son reconceptualizados.
Desde este modelo teórico, se potencia el valor de las contradicciones que se producen dentro del
grupo y que son los elementos detonadores de una transformación colectiva y empujan hacia el
cambio de la realidad. Por lo que son un aspecto a identificar y analizar.
Además, en el estudio de investigación se valorarán los instrumentos y medios utilizados que crean
una nueva cultura digital, como es Internet, redes sociales, y dispositivos de comunicación móvil que
han contribuido como herramienta a la transformación colectiva y cambio de la realidad.
Así pues, es un modelo teórico del aprendizaje que se caracteriza principalmente por tener una
dimensión transformadora, y horizontal del aprendizaje, pues a través del diálogo colectivo se crea el
conocimiento y transforma la realidad (Engeström, 2007).

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1.2 La metodología cualitativa y estudio de casos

La elección de la metodología de investigación es el momento más importante del proceso de


investigación. En este estudio, se ha seleccionado una metodología de corte cualitativo ya que nos
interesa la “realidad”, tal y como la interpretan los sujetos, respetando el contexto donde dicha
“realidad social” es construida.
Así pues, en esta investigación la subjetividad será un aspecto muy tenido en cuenta. Por tanto, se
pretende llevar a cabo, según señala Strauss e Corbin (2002, p. 12), un proceso de interpretación con
el propósito de descubrir conceptos y relaciones en los datos brutos.
Además, el aprendizaje expansivo es un fenómeno complejo. Sólo las metodologías cualitativas
permiten comprender e interpretar desde un análisis comprensivo, holístico y profundo este tipo de
fenómenos tales como experiencias vividas, comportamientos, emociones y sentimientos, así como
funcionamiento organizacional, movimientos sociales, entre otras (Strauss & Corbin, 2002, p. 12).
En este sentido, se prefiere utilizar estrategias de observación y entrevistas abiertas con las cuales se
renuncia a la búsqueda de relaciones causales, que nos permiten otras metodologías como la
cuantitativa. Se opta pues, por el establecimiento de relaciones globales, tratando de conservar
siempre la complejidad del fenómeno y la aplicabilidad directa en el contexto.
La investigación cualitativa es, en esencia, multimétodo y plural (Flick, 2004), puesto que las
investigaciones cualitativas son abiertas y flexibles para adaptarse al escenario de estudio (Denzin &
Lincoln, 2005). Son muchos los métodos cualitativos que podemos encontrar y numerosas las
clasificaciones que los distintos autores han elaborado a lo largo de la historia, en nuestro estudio
nos decantamos por el Estudios de Casos.
El Estudio de Casos es considerado como una estrategia metodológica de investigación que “implica
un proceso de indagación caracterizado por el examen sistemático y en profundidad de casos de un
fenómeno, entendidos éstos como entidades sociales o entidades educativas únicas” (Sabariego,
Dorio, & Massot, 2004, p. 309). Por tanto, el Estudio de Casos es “el estudio de la particularidad y de
la complejidad de un caso singular, para llegar a comprender su actividad en circunstancias
importantes” (Stake, 1998, p. 11-20).
No obstante, también el Estudio de Casos será un método de investigación muy valioso porque
permite obtener importante información que pueden ser transferibles a otros contextos. Como
señala Stake (1998, p. 47) “el caso, la actividad y el suceso son únicos, a la vez que comunes. La
comprensión de cada uno de ellos exige comprender otros casos, otras actividades y otros sucesos,
pero también comprender la unicidad de cada uno”.
Además, es una metodología excelente cuando hay muchas dimensiones de interés que no pueden
ser captadas a través de otros métodos, sobre todo aquellos que son de corte cuantitativo. Como
afirma Yin (2009), es el más adecuado para las investigaciones en las que es imposible separar las
dimensiones a analizar de su contexto, que es precisamente lo que ocurre en este estudio, donde las
dimensiones están completamente contextualizadas.

2. Objetivo

Strauss & Corbin (2002, p. 13) señalan que todas las investigaciones cualitativas tienen tres
componentes principales. Por un lado, están los datos que pueden provenir de fuentes diferentes,
tales como entrevistas, observaciones, documentos, registros y películas. Por otro, están los
procedimientos que los investigadores pueden usar para interpretar y organizar los datos. Y, por
último, los resultados o informes escritos y verbales y que pueden presentarse como artículos en
revistas, charlas o congresos.
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El objetivo de este trabajo es explorar y analizar el diseño metodológico llevado a cabo en una
estudio de investigación sobre el análisis del aprendizaje expansivo, identificando el proceso llevado
a cabo y cómo este ha favorecido la extracción de conclusiones.

3. Diseño de investigación.

3.1 Conformación de objetivos y preguntas de investigación.

En cualquier investigación cualitativa es importante establecer los objetivos y preguntas de


investigación dirigir la atención y el proceso que se llevaría a cabo. Estos aspectos no sólo son el
punto de referencia durante la recogida de datos y en la redacción del informe, sino que dotan de
sentido los estudios previos y clarifican la utilidad de los posibles descubrimientos.
Como propone Stake (1998), las preguntas elaboradas en esta investigación se han organizado en
dimensiones y temas extraídos de una breve revisión bibliográfica, que conforman una estructura
conceptual para el investigador y que le obliga a prestar la atención a los aspectos importantes para
el estudio.
1. Identificar y analizar los elementos claves que componen el sistema de actividad
desarrollada en el estudio de caso.
(a) ¿Quiénes son los sujetos de aprendizaje?, ¿cómo se definen y ubican?;
(b) ¿Por qué aprenden?, ¿qué los hace realizar el esfuerzo?;
(c) ¿Qué es lo que aprenden?, ¿cuáles son los contenidos y resultados de aprendizaje?
2. Analizar las características del proceso cíclico del aprendizaje expansivo en el estudio de
caso.
(d) ¿Cómo aprenden?, ¿cuáles son las acciones clave o procesos de aprendizaje?

3.2. Trabajo de campo del Estudio de Caso

3.2.1. Estudio de caso


A fin de dar respuesta a los interrogantes planteados, se ha utilizado una metodología cualitativa
basada en Estudios de Casos tomando como unidad el colectivo “Espacio Libre Candil” que surge con
el objetivo de construir la escuela “alternativa” como proyecto educativo.
En esta investigación, este caso se define y delimita como comunidad de prácticas en la cual se
desarrollan una serie de interacciones y se intercambian aprendizajes y conocimientos (Wenger,
2001). Como en cualquier comunidad de práctica el caso cumple con las tres dimensiones
principales: tarea u objetivo común, reglas y compromisos adquiridos por el grupo, un repertorio o
acciones compartidas (procedimientos, conocimientos prácticos, rutinas, producciones) (Wenger,
2001).

3.2.2. Justificación de su elección


Según Stake (1998:17) es difícil seleccionar un caso típico o representativo de otros casos, y el
objetivo de la elección de un Estudio de Casos no es la comprensión de otros, sino la de comprender
dicho caso elegido. Así pues, dicho autor señala algunos criterios para seleccionar los casos, como
rentabilidad, tiempo de trabajo y acceso al caso, así como la unicidad y los contextos de los casos.
En este caso la selección del caso fue debido principalmente a dos principales razones:
- Cumplía las características de comunidad de prácticas.
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- Las principales características del estudio de caso se ajusta a una institucional horizontal que
aprende de manera colectiva.
- Accesibilidad del caso. Una de las investigadoras pertenece al colectivo estudiado y conoce
en primera persona como funciona el colectivo.
- Fue considerado como un caso de gran interés educativo debido a su proyecto educativo de
crear una “escuela alternativa”.

3.2.3. Descripción del caso


Espacio Libre Candil es una asociación sin ánimo de lucro. La experiencia de este colectivo comienza
con la conformación de un grupo de personas, tanto madres, padres, y educadores con un interés
común por la educación alternativa, y metodologías que se pueden definir como activas y
respetuosas con el ritmo de aprendizaje del alumnado. Desde su creación, la asociación se ha
conformado como un espacio de referencia regional relacionada con la educación alternativa y libre.

a) Principios que conforma el colectivo


Se cree en una educación que se vaya acercando constantemente a un aprendizaje autoconstructivo,
autogestionado, personal y colectivo, y se defiende una educación que engloba a toda la persona,
todas sus dimensiones física, emocional, social, moral-espiritual y cognitiva. Además, el colectivo
entiende la importancia de la implicación de los padres en el centro y en el desarrollo educativo del
alumnado.

b) Dimensión organizativa del colectivo


El colectivo es un grupo horizontal. Todas las personas deben participar y aportar según sus
posibilidades. En cuanto a las decisiones se organiza en distintas asambleas y se opta por el consenso
y teniendo muy en cuenta a la minoría. Principalmente, se realizan dos tipos de asambleas a las
cuales puede asistir todos los miembros del colectivo. Por un lado, las asambleas organizativas, las
cuales se debaten se toman decisiones respecto a aquellos aspectos más organizativos como la
distribución de los materiales, de las funciones y tareas de cada uno, etc. Y por otro lado, las
asambleas pedagógicas en las que se debate y se toman decisiones sobre aspectos metodológicos
que se están llevando a cabo en el centro, problemas y conflictos en el grupo de alumnos, desarrollo
de talleres o formación, entre otras cuestiones.
Además, existen comisiones de trabajo que facilita asumir responsabilidades, a la distribución de
trabajo y a la colaboración entre todos. Estas comisiones son flexibles y se van modificando cada año
según las necesidades y el desarrollo de las experiencias.

c) Escuela alternativa
Actualmente, ofrecen una escuela alternativa para la etapa de Educación Infantil desde los 4 meses
hasta los 6 años. Se ofrece una educación respetuosa con los procesos vitales del niño y la niña,
donde se le permita desarrollarse y aprender a su propio ritmo. El aprendizaje se da por el grado de
maduración, por el interés personal, por el juego, por el ambiente preparado y los materiales, por las
actividades propuestas, por la convivencia, por la experimentación...
Los materiales y el espacio están acondicionados a las necesidades y edad de las niñas y niños.
Ordenados por rincones, puede utilizar los materiales cuando lo necesite y el docente se limitará a
acompañar el proceso de juego sin interrumpir ni obligar a dejar su tarea.

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3.2.3. Acceso y despedida del campo


Como señala Stake (1998, p.58) “la recogida de datos siempre se «juega en casa» de alguien” y, por
tanto, es necesario obtener permiso. En la presente investigación se consideró de vital importancia la
realización de una solicitud de acceso. Con el fin de poner al corriente al colectivo de su selección
para su participación en la investigación, se participó en una asamblea para explicar los objetivos y
los compromisos para desarrollar la investigación. En ella se pretendió convencer a los sujetos de que
participaran de manera activa en la investigación, y que permitieran al investigador introducirse en el
colectivo sin ningún tipo de inconvenientes. Durante la asamblea además, se explicó el método de la
protección de datos de los participantes, así como informar de cómo y cuándo se seleccionó la
organización y del proceso que el investigador había diseñado para el desarrollo del estudio.
Una vez finalizadas nuestras actividades en el centro, se procedió a realizar una reunión o jornada
para compartir la información y conclusiones consideradas. Como señala Stake (1998, p. 60) es
aconsejable mantener las buenas formas y el contacto, y revertir los hallazgos encontrados.

3.3 Técnicas de recolección de datos

3.3.1. Técnicas de lectura y documentación:


La selección de tales documentos debe ser cuidadosa, es decir, que solamente se deben elegir
aquellos que proporcionen información útil para el planteamiento del problema (Hernández,
Fernández-Collado, & Baptista, 2006, p. 616). Para esta investigación consideraremos importante los
siguientes documentos: información web, proyecto educativo infantil/ programación anual, redes
sociales: facebook, twitter y actas de asambleas. Que serán analizados para dar respuesta al objetivo
de Identificar y analizar los elementos claves que componen el sistema de actividad desarrollada en
el estudio de caso.

3.3.2. Técnicas de observación y participación


Se realizará la observación y registro audiovisual de una asamblea, en la cual se toman las decisiones
y se definen las diferentes líneas de actuación del colectivo con el objetivo de analizar las
características del proceso cíclico del aprendizaje expansivo en el estudio de caso. Además, se
procurará escribir un diario de campo como instrumento para recoger los acontecimiento relevantes,
cuestiones de menor importancia, acontecimientos perdidos en la interpretación, acercamiento a los
primeros resultados, siempre desde una perspectiva del investigador, que nos servirá para
reflexionar sobre todo el trabajo de investigación.

3.3.3. Técnicas de conversación y narración


La entrevista personales será el recurso más importante para la recogida de información para dar
respuesta al objetivo de identificar y analizar los elementos claves que componen el sistema de
actividad desarrollada en el estudio de caso, ya que nos interesa especialmente la percepción que
tiene las familias y los acompañantes de la escuela.
Para la recolección de información se usará la protocolos o guión de preguntas, basadas en
preguntas con respuestas abiertas, con la intención de obtener datos sobre los significados del
participante. Los guiones tienen una estructura predeterminada que el investigador debe haber
elaborado con anterioridad a la reunión. No obstante, esta estructura pretende ser flexible y
modificable según el desarrollo de la entrevista y en función de las respuestas dadas, en línea de la
información que se desea conocer.

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3.4 Sistema de categorías y dimensiones

El sistema de categorías y dimensiones, que se presenta en la tabla 1, se ha elaborado a través de un


proceso de Revisión Bibliográfica: a) Localización de documentos científicos; b) Lectura y
organización de la documentación; c) Identificación de elementos claves de la Teoría de la Actividad;
d) Adaptación de los elementos claves al contexto español; e) Definición y conformación de
dimensiones, categorías y subcategorías de investigación.
Según este proceso de revisión bibliográfica, que permitió elaborar identificar los elementos clave de
la Teoría de la Actividad en los que se debían focalizar la investigación, se realizó a través de cuatro
trabajos principales de investigación:
- Define la Teoría de la Actividad y describe los distintos aspectos del triángulo, y los principios
(Engeström, 2000).
- Matriz de preguntas de aprendizaje con sistema de actividad y contradiciones (Engestrom,
2001).
- Descripción y análisis de contradicciones (Engeström, 2007).
- Categorías para identificar distintos aspectos del ciclo de actividad (Engeström et al., 2013).

Tabla 1:Dimensiones y sistema de categorías


Dimensiones Categorías Subcategorías
Qué personas
Sujeto
Perfil de los sujetos
Filosofía o realidad común
Objetivos comunes
Objeto
Motivaciones
Identidad grupal
Contenidos aprendidos
Resultado de aprendizajes
Representación del conocimiento
Triángulo de la Actividad
Códigos de interacción
Reglas
Normas éticas
Identidad grupal
Comunidad
Participación, implicación y compromiso con el colectivo
Roles en el grupo
División del trabajo
estructuras y jerarquías internas
Dispositivos digitales
Medios
Herramientas de comunicación
Desafiando a los participantes en el interrogatorio
Cuestionamiento (Estado de
Al criticar la práctica existente
necesidad)
Cuestionando el desarrollo propuesto analizando
Necesidades de articulación e ideas
Análisis histórico
Análisis (elección)
Problemas de articulación o desafíos
Identificación de contradicciones
Soluciones alternativas
Idea inicial de un modelo
Explotación de los modelos o conceptos existentes
Acciones de aprendizaje Modelando la nueva situación
Denominación y definición del modelo
expansivo (Avance, adelanto)
Fijación del modelo de material o de gráfico
La variación y adaptación del modelo
Discusión del modelo de manera crítica
Examinando el nuevo modelo Nuevas herramientas
Enriquecer el modelo
Demostración de aplicación
Implementando
Obstáculos
Preparación de la implementación
Reflexionando sobre el Consolidar y generalizar la nueva práctica
procesos Potencial

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3.5. Análisis de datos

Para el análisis de los datos, Flick (2004, p. 266) señala que la utilización de software informático en
investigación cualitativa, aumenta la calidad de la investigación, puesto que permite un aumento de
coherencia y rigor en el análisis. En la actualidad, se dispone de un abanico bastante amplio de
programas informáticos, que pueden ayudarnos en el análisis de datos cualitativos. Basándonos en la
distintas formas de utilización de los ordenadores y los programas informáticos en el contexto de la
investigación cualitativa, que señala Flick (2004: 267), de forma específica hemos utilizado los
siguientes software para distintas tareas.
1. Para escribir, corregir y ampliar el diario de campo, se ha utilizado un procesador de texto
(Open Office Write).
2. Para transcribir entrevistas y discusiones de grupo se ha usado el software Digital Voice
Editor para la escucha de distintos audios.
3. Para codificar, almacenar y buscar y recuperar datos en el análisis se ha utilizado el programa
de análisis cualitativo NVIVO.
4. Para analizar el contenido, así como contar frecuencias, sucesión o localizaciones de palabras
y frases se ha realizado a través del software NVIVO.
5. Para elaborar memorandos y los comentarios reflexivos sobre algunos aspectos de los datos
se realiza a través de documentos de texto (Open Office Write).
6. Para escribir informes provisionales y finales, se ha utilizado un procesador de texto (Open
Office Write).
El software NVIVO es un programa que tiene como objeto la construcción teórica a través del análisis
de los textos, aunque en el presente estudio de investigación se ha utilizado funciones básicas, de
rastreo, codificación y de contabilización. Se ha utilizado este programa informático para introducir
los textos trascritos, asignar códigos a los trozos de textos relativos a cada categoría de estudio, y
seleccionar los distintos segmentos identificativos, agrupándolos, y contabilizando para facilitar el
trabajo de búsqueda de evidencias.

4 Conclusiones

A partir de el estudio de caso como método cualitativo de investigación ha permitido describir,


registrar y analizar cómo el proceso de aprendizaje expansivo puede ocurrir en diferentes sistemas
de actividad; y/o bien, advertir obstáculos, dificultades y desafíos en el aprendizaje entre agentes en
el seno de prácticas, instituciones y sentidos.
Así pues, los resultados obtenidos de las entrevistas personales, los documentos analizados y la
observación de las asambleas, han posibilitado examinar de manera exhaustiva la teoría de
aprendizaje expansivo, así como:
- Reconocer y describir el triangulo de actividad del colectivo Espacio Libre Candil, lo que
demuestra que el colectivo presenta un aprendizaje expansivo continuo que hace que su
organización vaya cambiando y evolucionando a través del tiempo.
- Elaborar la matriz de aprendizaje nos permite clarificar quienes, qué, por qué y cómo
aprende el colectivo.
- Identificar a lo largo de la investigación algunas contradicciones que se producen en el
colectivo y que son el detonante del aprendizaje.
- Analizado las distintas fases de aprendizaje expansivo en el desarrollo de una asamblea
organizativa de este colectivo. En concreto se han analizado dos aspectos: las acciones de
aprendizaje expansivo y la ciclicidad de estos.
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Estos hallazgos enriquecen y amplían la comprensión de la actividad de aprendizaje expansivo,


confirmándose que el aprendizaje es un proceso vital que a través del cual se adquiere mayores
niveles de competencias o contenidos mayores (Engeström, 2001). La observación y análisis de la
asamblea ha permitido deducir que el desarrollo de este aprendizaje puede ser grupal, y por tanto no
sólo debe ser analizado desde un punto de vista individual, puesto que puede ser colectivo, tanto
como mecanismo de aprendizaje como en el sujeto que aprende.

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Estudio de análisis documental sobre la relación entre herramientas para la


evaluación de narraciones
María Jesús Fernández, Universidad de Extremadura, España

mafernandezs@unex.es

Resumen. Este estudio pretende establecer una relación entre diversos recursos para la evaluación de
textos narrativos. Para ello, un total de 22 profesores de Primaria (seleccionados no probabilísticamente)
evaluaron 241 textos producidos por alumnos de entre 10 a 12 años. Posteriormente, se corrigieron los
textos utilizando dos instrumentos: una prueba estandarizada y una rúbrica de evaluación de narraciones. A
partir de los datos, se realizó un análisis de la correlación existente entre los sumatorios de las calificaciones
globales de los textos obtenidas por los instrumentos y la calificación del profesorado participante. Los
resultados muestran que existen correlaciones positivas y significativas (a un nivel de confianza del 99%),
entre las 3 puntuaciones tenidas en cuenta. Se observa que la correlación entre el profesorado y el PROESC
es menor que la del profesorado con la rúbrica.
Palabras clave: Evaluación del estudiante; Redacción; Educación Básica.

Documentary analysis study on the relationship between tools for the assessment of stories
Abstract. This study aims to establish a relationship between different tools for assessment stories. For this,
a total of 22 Primary teachers (non-randomly selected) assessed 241 texts produced by students aged 10 to
12 years. After that, the texts were assessed using two tools: a standardized test (Cuetos, Ramos & Ruano,
2002) and a narrative evaluation rubric (Montanero, Lucero & Fernández, 2014). An analysis of the
correlation between the overall punctuation of the texts obtained by the instruments and the marks of
teachers was carried out. The results show that there are positive and significant correlations (at a
confidence level of 99%), among the 3 scores taken into account. It is observed that the correlation between
teachers and PROESC is lower than that of teachers with the rubric.
Keywords: Student evaluation; Writing; Basic Education.

1 Introducción

La evaluación de la escritura es una práctica docente que se realiza habitualmente en el aula (Rogers
& Graham, 2008). En algunas ocasiones el objeto de valoración es la calidad formal y gramatical de
una composición escrita mientras que, en otras, el texto se convierte en el medio que permite
determinar el conocimiento de los contenidos de una materia concreta (Graham & Perin, 2007). La
realización de evaluaciones justas y caracterizadas por el aporte de información útil al alumnado en
el primero de los casos anteriormente mencionados, es un aspecto que entraña gran dificultad
(Crusan, Plakans & Gebril, 2016; White, 2009). La escasez de formación y de conocimientos por parte
del profesorado a la hora de evaluar las habilidades relacionadas con la redacción de textos provoca
que éste no se sienta suficientemente capacitado para realizar dicha tarea (Malone, 2013; Mertler,
2009; Taylor, 2013). Según Zhu (2004) algunos maestros experimentan incomodidad al evaluar los
textos que componen sus estudiantes por dos motivos fundamentales; por una parte, al considerar
que no pueden anticiparse a los problemas que pueden surgirle al alumnado al escribir un texto y,
por otra, al no poder aportar enunciados que permitan mejorar su competencia escrita (Crusan,
2010). Además, la validez de las evaluaciones del profesorado es cuestionada al considerarse que la
información que proporcionan sobre la escritura y los procesos que intervienen en la misma es muy
limitada (Dunsmuir et al., 2015). Fife e O’Neill (2001) atribuyen esta poca utilidad de información a

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las habilidades del docente, argumentando que si el feedback no tiene suficiente calidad el alumno
no puede progresar en la escritura. Según diversos estudios la evaluación del profesorado
únicamente se centra en cuestiones superficiales, como la ortografía y la gramática (Connors &
Lunsford, 1993; Hargreaves & McCallum, 1998; Schwartz, 1984; Sommers, 2011). Sin embargo,
aquellos aspectos menos visibles como el hilo conductor de las ideas o la organización de las mismas
suelen recibir menos atención en las evaluaciones (Struthers, Lapadat & MacMillan, 2013).
Existen pocas investigaciones que documenten qué prácticas de evaluación llevan a cabo los
profesores cuando tienen que evaluar textos creados por sus alumnos en su lengua materna.
Concretamente, hay un cierto vacío en cuanto a los criterios que guían la evaluación de los
profesores, el contenido de sus prácticas y el modo en el que indican correcciones en los textos
(Berg, 1999; Cho & MacArthur, 2010; Min, 2003). El profesorado puede utilizar diversidad de escalas
para evaluar globalmente la escritura de un texto; incluso, puede no calificar el manuscrito y
proporcionar otro tipo de retroalimentación. Según Morales (2004) es muy habitual que las
evaluaciones del profesorado se reduzcan a una nota. Sin embargo, se desconocen los criterios que
subyacen a esa calificación.
Teniendo en cuenta este contexto de desconfianza hacia la validez de las evaluaciones del
profesorado en este estudio se pretende establecer una relación entre tres recursos didácticos para
la evaluación de la escritura narrativa en Educación Primaria: rúbrica, PROESC y calificación global del
profesorado de Primaria.

2 Metodología

2.1. Participantes
En la investigación participaron un total de 22 (15 mujeres y 7 hombres) profesores de diversos
centros educativos distintas ciudades de Extremadura (España). Los docentes han sido seleccionados
teniendo en cuenta la disponibilidad de los investigadores. Todos ellos contaban con más de 5 años
de experiencia docente en el área de Lengua Castellana y Literatura. Cada profesor evaluó entre 5 y
10 textos de tipo narrativo, redactados por 241 alumnos de entre 10 a 12 años. En la tabla 1 se
detalla la muestra del estudio:
Tabla 1. Muestra del profesorado de Educación Primaria

Centro Profesor Género Nº textos


1 Hombre 5
2 Mujer 12
1
3 Mujer 7
4 Hombre 5
5 Hombre 8
2
6 Mujer 7
7 Mujer 12
3
8 Mujer 14
4 9 Hombre 5
10 Mujer 5
11 Mujer 5
5
12 Mujer 5
13 Mujer 5
14 Mujer 20
6 15 Hombre 20
16 Mujer 20
17 Mujer 19
7
18 Mujer 9

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19 Mujer 20
20 Hombre 20
8 21 Mujer 13
9 22 Hombre 5

2.2. Procedimiento de recogida de los datos


Los alumnos de Educación Primaria redactaron las narraciones en unos 30 minutos. El tema sobre el
que escribieron fue “un niño que se convierte en héroe de su pueblo”. Las narraciones fueron
distribuidas de manera aleatoria entre los profesores participantes, que desconocían el objetivo de la
investigación. Dado que el profesorado emplea diversas escalas de calificación, decidimos indicarles
en la fase de recogida de datos que valorasen cada texto con escala de valores numéricos de 0 a 10.

2.3. Materiales
 Ficha de narraciones. A cada estudiante se le proporcionó una “ficha de narraciones”. Se
trata de una hoja de papel en la que se indicaba la temática sobre la que el alumnado debía redactar
una narración. En esta ficha se recoge el texto creado por el alumnado y la calificación que
profesorado ajeno a la investigación ha proporcionado a cada estudiante, por escrito y de manera
individualizada.
 Rúbrica creada para la evaluación de las narraciones (Montanero, Lucero & Fernández,
2014). Se trata de un instrumento compuesto por 7 criterios de evaluación, distrubidos en dos
grandes dimensiones: “organización y contenido” y “aspectos gramaticales”. Cada uno de estos
criterios cuenta con 4 niveles de ejecución. A cada nivel de ejecución le fueron asociadas las
siguientes puntauciones: 0 puntos (nivel 1), 0,5 puntos (nivel 2), 1 punto (nivel 3) y 1,5 puntos (nivel
4). Finalmente, se hizo un sumatorio de las puntuaciones obtenidas en total por el alumno y ese dato
se correlacionó.
 PROESC (Cuetos, Ramos & Ruano, 2002). Esta batería de evaluación se compone de 10
criterios de evaluación agrupados en dos grandes dimensiones: contenido y coherencia. Así, la
dimensión “contenido” se encuentra constituida por los siguientes criterios: dónde y cuándo,
personajes, suceso consecuencias, desenlace coherente y creatividad. Mientras que la dimensión
“coherencia” cuenta con los siguientes criterios: continuidad lógica, sentido unitario, figuras
literarias, oraciones complejas y vocabulario. De acuerdo con el manual de la prueba, se consideró
que cada uno de estos criterios contaba con dos niveles de ejecución a los que se otorgó una
puntuación determinada. Así, la puntuación de ‘0’ se correspondió con la ausencia de los requisitos
de ese criterio en la narración evaluada, mientras que la puntuación de ‘1’ se empleó para indicar su
presencia. Finalmente, se hizo un sumatorio de las puntuaciones obtenidas en total por el alumno y
ese dato se correlacionó.

2.4. Procedimiento de análisis de los datos


Las narraciones fueron analizadas desde diferentes perspectivas. Por un lado, cada relato fue
valorado a través de los sistemas de categorías de análisis documental creadas a partir de una
prueba estandarizada, el test de Procesos Escritores (PROESC), y una rúbrica de evaluación de
narraciones (descritas en el apartado anterior). Por otro lado, los maestros de Primaria (ajenos a la
investigación y a los centros educativos en los que se llevó a cabo el estudio) corrigieron las
narraciones utilizando una escala de 0 a 10. Posteriormente, para poder conocer si la calificación
global de los relatos aportada por el profesor estaba relacionada con el sumatorio de puntuaciones
utilizando una rúbrica de evaluación de textos narrativos (Montanero, Lucero & Fernández, 2014) y el
sumatorio de puntuaciones utilizando el PROESC (Cuetos, Ramos & Ruano, 2002) se estableció un
análisis de correlación.

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3 Resultados

En la tabla 2 se pueden observar las correlaciones de las correcciones realizadas por el profesorado
de Primaria y el sumatorio de las puntuaciones de los 2 instrumentos utilizados:

Tabla 2. Correlación entre el sumatorio de la rúbrica y el PROESC, y las calificaciones de los docentes

Instrumento 1 Instrumento 2 Correlación de Pearson (r)

PROESC Nota de profesor 0,26**

Rúbrica Nota de profesor 0.34**

Rúbrica PROESC 0.55**

Existen correlaciones positivas y significativas, trabajando a un nivel de confianza del 99%, entre las 3
puntuaciones tenidas en cuenta. No obstante, se observa que la correlación del profesorado y el
PROESC (r=0.26; p<0.05) es más baja que la del profesorado con la rúbrica (r=0.34; p<0.05).
La media de puntuaciones obtenidas según las calificaciones del profesorado son de 5,35, mientras
que con el PROESC son de 5,05 y con la rúbrica de 4,62; habiendo una mayor desviación típica en la
del PROESC (2,07).
En la tabla 3 se observa la relación de las notas obtenidas con la rúbrica y el PROESC con cada uno de
los profesores participantes:

Tabla 3. Correlación por profesor


Profesor Correlación de Pearson (rúbrica) Correlación de Pearson (PROESC) Media Desviación típica N
1 0,7 0,9** 5,0 2,4 5
2 - - - - 0
3 0,6 0,3 5,7 1,3 12
4 0,3 0,4 5,9 1,6 7
5 0,4 0,4 5,0 1,4 14
6 0,9** 0,5 9,0 0 3
7 0,4 0,3 3,0 1,9 12
8 0,6 0,8* 5,3 1,4 7
9 0,1 0,1 5,8 1,8 5
10 0,5* 0,1 4,4 1,1 20
11 0,8 0,8 9,0 0 5
12 -0,3 0,9 8,5 1,0 4
13 0,2 0,1 6,4 2,1 18
14 0,1 0,1 3,4 1,8 20
15 -0,1 -0,1 4,6 1,2 20
16 - - - - 0
17 0,5* 0,4 5,5 0,9 20
18 0,1 0,2 5,8 1,0 15
19 - - - - 0
20 0,6 0,8 7,0 0,0 5
21 0,6 0,8 7,8 1,1 5
22 0,7 0,8 6,6 1,1 5
Se encuentran por debajo de 0,5 la correlación con las puntaciones indicadas por 9 maestros de
Primaria y la rúbrica, mientras que de las correlaciones superiores a 0,5 entre las puntuaciones de
ambos instrumentos tan solo 3 son significativas. En el caso de la correlación entre las notas
obtenidas con el PROESC y la de los profesores, un 50% de los docentes de Primaria correlacionan

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con la prueba estandarizada con niveles inferiores a 0,5. De las correlaciones superiores a 0,5 entre
las puntuaciones de ambas herramientas, 2 de ellas son significativas en Primaria. Todo ello, expresa
que las puntuaciones de los textos asignados con la rúbrica coinciden con la de los profesores en
mayor medida que las otorgadas tras corregir los textos usando el PROESC.

4 Conclusiones

El presente estudio se llevó a cabo para reunir más evidencias acerca de la validez de las correcciones
del profesorado para valorar la calidad de redacción de textos, a fin de resolver algunas discrepancias
existentes en el campo científico. Para ello, un total de 241 estudiantes de 2º y 3 er ciclo de Primaria
compusieron una narración que, posteriormente, fue corregida utilizando los criterios de evaluación
de una rúbrica y del PROESC, un instrumento estandarizado. Además, 22 profesores calificaron los
textos. Posteriormente, se analizó la correlación entre estas puntuaciones. Tras realizar una
correlación de Pearson, se ha observado que la relación de las notas obtenidas con la rúbrica y el
PROESC, se observa que las puntuaciones del profesorado coinciden en mayor grado con las
obtenidas tras corregir los textos con la rúbrica.
La limitación principal de esta investigación afecta a la muestra del mismo, dado que se ha
seleccionado de manera no probabilística; de modo que, la validez externa e interna del estudio
podrían estar amenazadas. Por ello, se recomienda replicar la investigación en el futuro intentando
utilizar procedimientos probabilísticos de selección muestral.

Agradecimientos. Se agradece al Gobierno de Extremadura y al Fondo Social Europeo la financiación recibida


para realizar este trabajo (PD12129).

Referências

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Crusan, D. (2010). Assessment in the second language writing classroom. Ann Arbor, MI: University of
Michigan Press.
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Dunsmuir, S. Kyriacou, M. Batuwitage, S. Hinson, E. Ingram, V., & O’Sullivan, S. (2015). An evaluation
of the Writing Assessment Measure (WAM) for children’s narrative writing. Assessing Writing,
23 (2015), 1–18.

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Fife, J. M., & O’Neill, P. (2001). Moving beyond the written comment: narrowing the gap between
response practice and research. College Composition and Communication, 53 (2), 300-321.
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Hargreaves, E., & McCallum, B. (1998). Written feedback to children from teachers, ERSC Project
‘Teaching, learning and feedback strategies’. Project Paper No. 7, London: University of London,
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Mertler, C. (2009). Teachers’ assessment knowledge and their perceptions of the impact of
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Min, H. T. (2003). Why peer comments fail? English Teaching and Learning, 27(3), 85-103.
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Morales, F. (2004). Evaluar la escritura, sí…Pero ¿Qué y cómo evaluar?. Acción Pedagógica, 1 (13),
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As contribuições das Histórias de Vida para a pesquisa qualitativa em


Educação e para a formação de professores

Alexandra Pena

Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil,


alexandracpena@yahoo.com.br

Resumo: O artigo pretende discutir as contribuições da metodologia de Histórias de Vida para pesquisas
qualitativas em Educação e para a formação de professores. O texto traz achados de uma pesquisa de
doutorado, que teve como objeto de estudo as histórias de vida de dez profissionais – entre professoras,
auxiliares de serviços gerais, cozinheiras e coordenadoras – de três creches comunitárias situadas em um
município da Baixada Fluminense do Rio de Janeiro. Teve como objetivo conhecer quem são as profissionais
responsáveis pelo atendimento de crianças entre zero a cinco anos de idade das creches e pré-escolas e
suas histórias, a partir do contexto de onde se produzem as narrativas dos sujeitos da pesquisa.
Palavras-Chave: Histórias de vida; pesquisa qualitativa; formação de professores.

The contributions of Life Stories to the qualitative research in Education and to the education of teachers
Abstract: The article intends to discuss the contributions of the Life Histories methodology for qualitative
research in Education and for the education of teachers. The text presents findings from a doctoral
research, which had, as object of study, the life histories of ten professionals - among teachers, general
service aides, cooks and coordinators - of three community day care centers located in a municipality of
Baixada Fluminense at Rio de Janeiro. The research aimed to know who are the professionals responsible
for attending children between zero and five years of age from day care centers and pre-schools and their
stories, from the context where the narratives of the research subjects are produced.
Keywords: Life Histories; qualitative research; education of teachers.

1. Introdução
O artigo tem como objetivo discutir as contribuições da metodologia das Histórias de Vida para a
pesquisa em Educação assim como para a formação dos professores. Os achados de uma pesquisa de
doutorado (PENA, 2015) apontam para o entrelaçamento possível entre as histórias de vida e
propostas de formação mais próximas da realidade e do cotidiano dos educadores.
A tese tomou como objeto de estudo as histórias de vida de dez profissionais – entre professoras,
auxiliares de serviços gerais, cozinheiras e coordenadoras – de três creches comunitárias situadas em
um município da Baixada Fluminense do Rio de Janeiro. Teve como objetivo conhecer quem são as
profissionais responsáveis pelo atendimento de crianças entre zero a cinco anos de idade das creches
e pré-escolas e suas histórias, a partir do contexto de onde se produzem as narrativas dos sujeitos da
pesquisa.

2. A formação de professores de Educação Infantil


Diversas pesquisas (Campos, Füllgraf & Wiggers, 2006; Barreto & Gatti, 2009; Nunes, Corsino &
Kramer, 2011), vêm apontando os desafios a serem enfrentados para a construção de uma Educação
Infantil de qualidade e entre eles está o de se repensar a formação dos profissionais, que segundo
documentos oficiais (Brasil, 2006a, 2006b), é um dos principais fatores que afetam a qualidade das
práticas educativas.

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Por outro lado, documentos oficiais mostram avanços. A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 (Brasil,
1996) afirma que a Educação Infantil é a primeira etapa da educação básica e assegura o direito de
todos à educação. Esta lei implica necessariamente a atenção à formação dos profissionais da
Educação Infantil, de forma a possibilitar ações educativas de qualidade, atendendo às demandas
específicas de crianças na faixa etária de zero a cinco anos.
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Brasil, 2009), as creches
e pré-escolas se constituem em estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e
cuidam de crianças de zero a cinco anos de idade por meio de profissionais com a formação
específica legalmente determinada, a habilitação para o magistério em nível superior ou médio –
modalidade Normal, refutando assim funções de caráter meramente assistencialista, embora
mantenham a obrigação de assistir às necessidades básicas de todas as crianças. As Diretrizes
reafirmam ainda o direito dos professores a programas de formação continuada como oportunidades
de aprimoramento da prática e desenvolvimento de si e de sua identidade profissional (Nunes,
Corsino & Kramer, 2011).
Analisando o material de pesquisa produzido sobre a questão da qualidade na Educação Infantil, no
período de 1996 a 2003, Campos, Füllgraf e Wiggers (2006) apontam que, no que se refere à
formação de professores, parece já existir uma consciência bastante disseminada de que a oferta
existente, tanto no nível do ensino médio – o curso de magistério – quanto no ensino superior – o
curso de pedagogia –, não responde às necessidades de qualificação requeridas para a atuação em
creches e pré-escolas.
Ainda segundo Barreto e Gatti (2009), há uma enorme lacuna quanto à formação de professores de
Educação Infantil, uma vez que este segmento compreende vários anos de atenção à criança
pequena e que concentra, de acordo com a pesquisa realizada, o maior percentual de docentes sem
formação adequada.
A pesquisa realizada pelo grupo de pesquisa Infância, Formação e Cultura (INFOC) “Educação Infantil
e formação de profissionais no estado do Rio de Janeiro (1999-2009)” fez um balanço sobre os
avanços e desafios da última década, e no que diz respeito à formação dos profissionais, aponta,
entre outras questões, para a multiplicidade e diversidade, e pela convivência entre uma concepção
instrumental de formação e propostas que valorizam os conhecimentos dos professores e suas
histórias de vida, buscando viabilizar espaços de fala e de partilha de experiências. Mesmo com as
divergências de concepções, a formação aparece como um caminho que deve ser percorrido para a
construção de uma Educação Infantil de qualidade (Nunes, Corsino & Kramer, 2011).
A pesquisa de doutorado pretendeu ser uma interface, na dimensão micro, daquilo que as pesquisas,
na dimensão macro, vêm apontando nos últimos anos – que a formação profissional ainda não é
eficaz em proporcionar qualidade na Educação Infantil. E, nesse sentido, apostou nas histórias de
vida como metodologia privilegiada para se chegar às memórias das pessoas. Voltamos ao passado
não só para conhecê-lo, mas para, servindo-se dele, “colocar o presente numa situação crítica”
(Konder, 1988, p. 22).

3. Memória, narrativa e formação


Benjamin (1994), já no início do século XX, alertava para a extinção da arte de narrar causada pelo
empobrecimento da experiência em função da industrialização, das forças produtivas e do progresso.
Com a modernidade, a informação ganha grande destaque e o homem da sociedade de consumo vai
perdendo sua capacidade de narrar. Tudo passa a ser relativo, cada indivíduo tem sua própria
opinião e precisa cada vez menos dos conselhos dos outros. É como a comparação feita por Benjamin
(1994) sobre a transformação na arquitetura das grandes cidades, marcada pela substituição da
madeira pelo vidro – substância lisa, homogênea, que não permite o choque, o registro das marcas

212
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com a passagem do tempo. A relação entre as pessoas a partir da modernidade também não propicia
o choque, os vestígios do encontro, do confronto; tende a se tornar marcada por um “excesso de
informações que saturam sua fome de conhecer, incham sem nutrir, pois não há lenta mastigação e
assimilação” (Bosi, 1983, p. 45).
O declínio da narrativa se vincula à perda gradativa da memória e à incapacidade de deixar rastros
(Benjamin, 1994), e, por isso, nessa pesquisa, se faz necessário escutar as recordações dessas
pessoas historicamente marginalizadas e esquecidas, devolvendo-lhes um lugar fundamental
mediado por suas narrativas. O resgate de uma memória que revele uma experiência significativa
traz possibilidades não só de ressignificação do já vivido, mas também de uma ação no presente.
A memória, ao ser liberada pela rememoração através da narrativa, permite o entrecruzamento
entre passado e presente, uma vez que lembramos daquilo que fomos e vivemos ontem a partir
daquilo que somos e vivemos hoje. Como diz Bosi (1983), a lembrança é construída com os materiais
que temos à disposição agora, no tempo atual. “Por mais nítida que nos pareça a lembrança de um
fato antigo, ela não é a mesma imagem que experimentamos na infância, porque nós não somos os
mesmos de então e porque nossa percepção alterou-se e, com ela, nossas ideias, nossos juízos de
realidade e de valor” (Bosi, 1983, p. 17).
A formação, segundo Nóvoa (1988), se dá em espaços e tempos separados da ação, uma vez que, ao
longo do tempo, apesar de tantas transformações, a educação vem sendo concebida como
preparação no presente para agir no futuro. Nesse sentido, o autor pergunta: “em que medida as
atitudes, as capacidades e os conhecimentos adquiridos durante a formação podem ser mobilizados
numa situação real de trabalho?” (Nóvoa, 1988, p. 110). Na contramão de uma ideia tecnicista de
formação, que valoriza os meios e os instrumentos, Nóvoa (1988) defende uma concepção de
formação de adultos caracterizada pela abordagem biográfica – em especial com as histórias de vida
–, pela perspectiva retroativa (do presente para o passado), que permita ao sujeito tornar-se ator do
seu processo de formação, através da apropriação retrospectiva do seu percurso de vida.
A compreensão de que os professores vão se formando em contextos e tempos diversos fundamenta
a necessidade de criar um espaço de diálogo com esses profissionais, para que através da linguagem
seja possível recriar o elo que se perde quando os homens são transformados em meros
reprodutores e consumidores, reassumindo o lugar de autores da própria vida. Ao narrar, as pessoas
se deslocam do lugar da vivência, das comunicações instantâneas e recuperam a capacidade de
contar experiências. Dessa forma, a narrativa se associa com a memória, com a oportunidade de
deixar marcas.

4. As histórias de vida: mais que uma metodologia de pesquisa


Para muito além de conhecer as histórias de vida das profissionais das creches comunitárias, o que a
pesquisa buscou foi chegar às pessoas, foco do estudo, tentando seguir na contramão de um
discurso que reconhece a importância de se ouvir o professor e conhecer sua história, mas que de
verdade, na prática, não garante esse diálogo.
O relato oral tem se afirmado como a maior fonte humana de conservação e difusão do saber (Lélis,
Teixeira & Nascimento, 2010) ao longo dos séculos. No entanto, com a pretensa busca da
neutralidade científica pautada na objetividade positivista, a história oral recebeu muitas críticas
relativas à sua utilização para a produção do conhecimento e “somente no século XX, a fonte oral é
reintroduzida como recurso metodológico para as pesquisas em ciências sociais” (Lélis, Teixeira &
Nascimento, 2010, p. 92).
Do campo da história oral, as histórias de vida vêm, nas últimas décadas, se destacando na área da
educação. Caracterizam-se como uma metodologia de investigação que toma o discurso oral como

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fonte e tem forte tradição nas ciências humanas, especialmente nas esferas da sociologia, da
psicologia e da história. Enquanto a história oral se dedica a fatos, a história de vida é marcada pela
não linearidade dos processos e acontece na confluência do profissional com o pessoal, recuperando
a ideia do sujeito enquanto indivíduo e ser social.
Segundo Souza (2006), o percurso epistemológico da história de vida enquanto campo da sociologia
contemporânea “leva a refletir sobre a heterogeneidade em torno desta abordagem proveniente de
diferentes campos e disciplinas do saber humano, configurando-se numa prática multidisciplinar e
polissêmica” (p. 23). Autobiografia, biografia, relato oral, depoimento oral, história de vida, história
oral de vida, história oral temática, relato oral de vida e as narrativas de formação são modalidades
tipificadas da expressão polissêmica História Oral. Ainda segundo o autor, a compreensão construída
sobre história de vida como um relato oral ou escrito, recolhido através de diários ou entrevista, tem
por objetivo compreender uma vida ou parte dela.
Na literatura internacional, os trabalhos de autores como Nóvoa (1992), Huberman (1992) e
Goodson (1992), entre outros, trouxeram, nos últimos anos, um forte respaldo ao uso da abordagem
biográfica – expressão genérica ligada a histórias de vida -, apontando possibilidades e limites à sua
utilização na pesquisa, influenciando a produção dos estudos brasileiros e produzindo outro
conhecimento sobre os professores, mais adequado para compreendê-los como pessoas e como
profissionais.
As histórias de vida ganharam destaque nas pesquisas do campo da educação, traduzindo uma
preocupação com a produção de um conhecimento que possa “ajudar-nos a ver o indivíduo em
relação com a história do seu tempo, permitindo-nos encarar a intersecção da história de vida com a
história da sociedade, esclarecendo, assim, as escolhas, contingências e opções que se deparam ao
indivíduo” (Goodson, 1992, p. 75), contribuindo para transpor uma concepção de formação de
professores marcada pela racionalidade técnica e apostando em uma perspectiva caracterizada por
uma racionalidade mais humana, sensível e partilhada (Bragança, 2012).
A história de vida tem sido alvo de críticas, entre elas, a de Bourdieu, que escreveu: “falar de história
de vida é, pelo menos pressupor, e é muito, que a vida é uma história e que uma vida é
inseparavelmente o conjunto de acontecimentos de uma existência individual, concebida como uma
história e a narrativa dessa história” (Bourdieu, 1996, p. 74).
Para Bourdieu (1996), o fato de o entrevistado ser o próprio ideólogo de sua vida, selecionando
certos acontecimentos e não outros, e estabelecendo conexões entre eles, torna esse recurso
artificial em termos de significado. “Produzir uma história de vida, tratar a vida como uma história,
isto é, como a narrativa coerente de uma sequência significativa e coordenada de eventos, talvez
seja ceder a uma ilusão teórica” (p.76). Trazendo a noção de “trajetória”, o autor sugere pensar os
acontecimentos biográficos como alocações e deslocamentos no espaço social.
Em resposta a essa e outras críticas, Lélis, Teixeira e Nascimento (2010) defendem que no cerne do
debate sobre a credibilidade e confiabilidade das narrativas como fonte, estão em jogo diversas
concepções de verdade e ciência.
A utilização das histórias de vida na pesquisa em Educação traz a possibilidade de ouvir a voz do
professor, que assume o lugar de narrador e “retira da experiência o que ele conta: sua própria
experiência ou a relatada pelos outros” (Benjamin, 1994, p. 201).
A história de vida se define como o relato de um narrador sobre sua existência através do tempo na
tentativa de reconstruir os acontecimentos vivenciados e de transmitir a experiência adquirida. Essa
metodologia caracteriza-se por uma mínima interferência do pesquisador, cuja aplicação demanda
muito tempo e quem decide o que relatar é o narrador.
Na pesquisa, apesar de ter sido elaborado um roteiro prévio, as narrativas seguiram o fluxo
discursivo das entrevistadas, havendo pouca interferência da pesquisadora, o que permitiu um
aprofundamento dos relatos.

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Para Souza (2006), na história de vida, quem decide o que deve ou não ser contado é o narrador, não
importando a cronologia dos acontecimentos e sim o percurso vivido. Mesmo que o pesquisador
dirija a conversa de maneira sutil, é o entrevistado que determina o que contar de sua história. Ao
lembrar, o sujeito dá outros significados à sua vida e tem a possibilidade de escrever outro futuro.
Nesse sentido, recordar é refazer, fazer diferente, é retirar o passado de um lugar estagnado e, com
isso, colocar o presente numa situação crítica. E é na linguagem que o sujeito se constitui, narrando
sua experiência e contando sua história.
Na trilha de Benjamin, a entrevista no contexto da pesquisa foi um convite a um mergulho na vida do
entrevistado, à escuta atenta e à ressignificação de suas histórias. “A entrevista recupera a trajetória
do sujeito e, ao mesmo tempo, insere e abre um novo espaço ou um espaço para o novo na própria
história de cada um” (Kramer, 2001, p. 177).
Para que a entrevista seja um espaço de narrativa se faz necessária uma disposição para escutar o
outro, para se estabelecer um diálogo autêntico, ou seja, “um diálogo onde cada um dos
participantes tem de fato em mente o outro ou os outros na sua presença e no seu modo de ser e a
eles se volta com a intenção de estabelecer entre eles e si próprio uma reciprocidade viva” (Buber,
2003a, p. 53).
A preocupação é marcar uma diferença entre a forma que as entrevistas são comumente
compreendidas no âmbito da pesquisa educacional e nesse estudo. Sejam estruturadas ou
semiestruturadas, as entrevistas podem inibir a memória ou fluir das ideias dos entrevistados,
tornando-se relatos monossilábicos e sem eco no interlocutor. Questionando esse modelo corrente
de entrevista, o aporte metodológico dessa investigação caracteriza-se por um convite endereçado
ao profissional para que fale de um interesse comum: sua história de vida.
Nas entrevistas realizadas, para que a conversa pudesse fluir, foi necessário internalizar um roteiro
que servisse de orientação para captar os principais aspectos relativos às experiências das
profissionais das creches estudadas. Não se trata de ter um questionário ou um roteiro
semiestruturado, mas de elencar alguns pontos que fossem orientadores das entrevistas e,
posteriormente, de sua análise.
Nesta linha, as entrevistas se caracterizam como estratégia metodológica e foram tomadas no
sentido dialógico de Bakhtin (2012) e Buber (2003a, 2009), visando à construção e a reconstrução
dos sentidos mais do que a aplicação de perguntas, como se fosse um questionário oral. Nesse
sentido, cada entrevista acontece dentro de um contexto dialógico, um encontro entre dois ou mais
locutores, e, por isso, se constitui como um campo onde estão presentes os conflitos, as
discordâncias e as tensões.
As entrevistas se configuram como produção de linguagem, concretizando-se entre duas pessoas
numa situação de interação verbal visando à compreensão mútua. Sendo assim, as entrevistas nesse
contexto podem ser chamadas de dialógicas, uma vez que estabelecem uma relação de sentido entre
os enunciados na comunicação verbal (Freitas, 2007).
A leitura das entrevistas realizadas e transcritas sugeriu temas diversos para aprofundamento, entre
os quais se destacaram aspectos relacionados a dois eixos de análise. O primeiro constituído pelas
histórias de infância e de formação e o segundo pelas histórias das práticas com crianças, adultos,
instituições, com a cultura e a religião.
A definição das categorias ou dos temas recorrentes na pesquisa não se deu nem a priori a partir da
teoria nem somente pela empiria, uma vez que o olhar do pesquisador não é neutro. As categorias
emergiram de forma a preservar a totalidade dos discursos e também para dar conta dos significados
comuns às narrativas. Na tese, que tomou o diálogo como eixo central, os sujeitos envolvidos,
pesquisador e pesquisados, é que deram o tom do discurso e espalharam pistas dos caminhos por
onde seguir.

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5. Considerações Finais
As categorias analisadas – cuidado, brincadeiras de infância, escolha da profissão, o alcoolismo, o
desejo de aprender, relação com a cultura, a presença da religião e a experiência comunitária -
apontaram que as relações estabelecidas entre adultos e crianças nas creches pesquisadas estão
fortemente marcadas pelas concepções de criança e de educação construídas por essas mulheres ao
longo de suas trajetórias pessoais e profissionais, influenciadas pelas experiências de formação
continuada em cursos de graduação, por projetos promovidos por entidades não governamentais e
universidades na Baixada Fluminense e, principalmente, pela convivência com educadoras mais
experientes dentro das próprias instituições.
Cuidar de crianças quando ainda não sabiam cuidar de si mesmas. Cuidar dos irmãos, cuidar de seus
próprios filhos, cuidar dos filhos dos outros, cuidar da casa e cuidar das crianças na creche. Cuidar,
cuidar, cuidar... Mas a brincadeira, que nunca desiste da criança, também estava lá, guardada nas
memórias. Brincar na rua, com a vizinha, debaixo da amendoeira, dançar na chuva, ouvir histórias –
elementos que fizeram a infância ser ótima; que trouxeram a sensação de terem sido crianças
mesmo! Cuidar e brincar. Brincar e cuidar.
A entrada na profissão nem sempre foi uma escolha. Ou melhor, nem sempre foi uma escolha
profissional, mas sim uma escolha pessoal determinada por motivos diversos. Às vezes, para fugir de
momentos difíceis, a creche significou um refúgio. Outras vezes, foi sinônimo de sobrevivência.
Mas o trabalho com as crianças pequenas foi também resultado da influência de uma professora com
a qual há tanta identificação que até se escreve do mesmo jeito que ela. E, se, o início da trajetória
foi imposto pela família, hoje, é uma escolha trabalhar com as crianças. E, para exercer o trabalho no
campo da educação, o que não se sabe, se quer aprender.
O alcoolismo estava presente nas lembranças e, inevitavelmente, se fez presente na pesquisa. Como
um intruso indesejado, mudou o rumo de muitas famílias e deixou marcas na autoestima das
mulheres. A pesquisa, ao se deparar com esse aspecto, abre espaço para discutir o imprevisível e
alertar para a necessidade de abordar temas como o do alcoolismo nos cursos de graduação e de
pós-graduação em Educação, uma vez que sua incidência na população brasileira é bastante elevada.
O maior desafio é trabalhar com as famílias que cobram aprendizagens que não são da Educação
Infantil, que não querem que as crianças se sujem, que querem que elas se tornem adultas logo. Na
outra ponta, educadoras que não construíram, academicamente, um espaço de argumentação
possível de diálogo com as famílias, que demonstram não se sentirem preparadas para defender as
concepções de educação que acreditam. São essas educadoras um pouco crianças também?
Precisam elas sempre de um outro que digam como agir? Se não puderam aprender sobre si porque
cuidavam de outras crianças quando ainda eram crianças, como confiar nelas mesmas?
Fazer um esquecimento do passado de professora aprendido no Curso Normal foi o caminho para a
construção de uma identidade profissional na Educação Infantil. Esquecer cadernos, quadros-negros,
cadeiras enfileiradas e se familiarizar com brincadeiras, histórias, tintas, dar colo, acolher, inventar...
Desafios cotidianos que, às vezes, se chocam com uma realidade dura de escassez de recursos
materiais e de experiências culturais. Gostar de tudo que encanta, que tira da realidade, é o caminho
de resistência, onde a imaginação assume o lugar de protagonista e leva para longe da rotina
marcada pela mesmice e pela repetição, reforçando a aversão às coisas prontas, que trazem, para as
crianças, mais do mesmo. O oposto das coisas prontas é a possibilidade de criar, de se utilizar dos
restos e das sobras, de caminhar na contramão de uma sociedade que oferece às crianças apenas
produtos de massificação da indústria cultural.
Se as creches comunitárias surgiram com a finalidade de acolher as crianças enquanto suas mães
trabalhavam, a convivência no âmbito do comunitário extrapolou esse objetivo utilitário e se

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transformou no fazer junto, sofrer junto, tudo junto. Um lugar que dá identidade e confirma um
modo de viver e se relacionar.
Ouvir as narrativas e as rememorações é conhecer a visão de mundo do sujeito, que é sempre
constituída pela história e pela memória. Essa perspectiva aponta para outra concepção de
formação, que valoriza a subjetividade e compreende que as práticas docentes se encontram
enraizadas em contextos e histórias individuais e não só no momento em que os professores entram
em contato com as teorias pedagógicas nos centros de formação.
Promover o encontro, apurar a escuta e estabelecer um diálogo foram exercício complexo e
desafiador durante o trabalho de campo dessa pesquisa. Deixar fluir a narrativa, seguindo o ritmo do
entrevistado, revelou-se como uma experiência de alteridade e reconhecimento do lugar do outro.
As histórias mobilizaram afetos, trazendo à tona emoções guardadas e reflexões sobre o percurso de
vida singular de cada entrevistada e também da trajetória coletiva delas dentro das instituições. Essa
emoção se fez presente nas entrevistas e pode vir à tona devido ao clima de confiança construído e
estabelecido no encontro com a pesquisadora. Como afirma Buber (2003b), a confiança é o que
rompe com a incomunicação. E a comunicação se estabeleceu não só através das palavras, mas dos
gestos, dos olhares, dos silêncios, revelando uma atmosfera de intimidade que permitiu compartilhar
segredos e esmiuçar memórias guardadas e raramente revisitadas.
Embora esteja disseminada a ideia de diálogo na formação de professores, este conceito não parece
ser aquele que, de verdade, inclui o outro, com seus valores, sua visão de mundo e sua história. A
formação de professores de Educação Infantil não tem sido marcada por um comportamento
dialógico dos sujeitos envolvidos nesse processo. Temos, muitas vezes, um monólogo disfarçado de
diálogo, que tem a aparência de um diálogo, mas não a sua natureza. Essa essência fica
comprometida pela urgência que têm os professores em receber uma receita e na pouca
disponibilidade que têm os formadores em se abrir para uma escuta verdadeira do outro, para a
inteireza do outro. Se o aluno cresce no encontro com a pessoa do professor em toda a sua inteireza,
em sua espontaneidade e exemplo, é necessário, no trabalho de formação de professores,
considerar a pessoa que o professor é. Ou seja, sua história de vida, seus valores, sua visão de
mundo. Escutar os sujeitos e suas histórias de vida é ouvir a sociedade na qual estão inseridos: cada
sujeito totaliza a sociedade através da mediação de seu contexto social mais próximo, dos grupos
específicos do qual fazem parte no seu dia a dia (Ferrarotti, 1983).
É comum nos processos de formação de professores nos depararmos com palavreados sem sentido,
em que predomina a transmissão de conteúdos. Munidos de teorias, de resultados de pesquisas
recentes, levamos para os espaços de creches e pré-escolas aquilo que acreditamos ser o correto, o
melhor a se fazer. E, muitas vezes, é. Mas como chegar no outro? Como impregnar de sentido para o
outro aquilo que para nós parece tão óbvio?
Para romper com o automatismo e a repetição de práticas engessadas, a formação de professores
também precisa se humanizar, incluindo as histórias e as experiências de cada professor; ela precisa
ser marcada pelas muitas vozes que a compõem, abrindo espaço para o diálogo, para a formação
cultural, tornando o professor responsável e responsivo, capaz de estabelecer relações dialógicas e
autênticas com as crianças.
A tese apostou na importância das narrativas para a qualidade da educação. Permear os encontros
de formação com as histórias de cada um, as histórias de cada comunidade, de cada grupo é se abrir
para o concreto, para a realidade. É entrar em relação com o outro. E se as interações são um dos
eixos norteadores do currículo da Educação Infantil, as relações devem ser, antes de qualquer outra
coisa, o foco da formação de professores. Não para ensinar o que é relacionar-se com o outro, mas
para relacionar-se. O aprendizado para o diálogo é um processo que precisa ir além do aprendizado
intelectual, ele precisa ser vivido nas situações concretas do cotidiano, no encontro e confronto com
o outro.

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A metodologia de histórias de vida destaca a centralidade do sujeito no processo de pesquisa e de


formação já que lhe permite produzir um conhecimento sobre si, sobre os outros e sobre o
cotidiano. A tese apostou nas histórias de vida em consonância com o modelo interativo e dialógico
(Souza, 2006), que adota uma nova relação de lugar entre o pesquisador e os atores sociais, em que
o sentido é co-construído entre o pesquisador e o sujeito, possibilitando apreender as memórias e
histórias tanto para o pesquisador, quanto para os sujeitos envolvidos na pesquisa.

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O Contributo dos Mapas Conceptuais para o Processo de Aprendizagem da


Criança
Ana Sofia Carita1, Cristina Pereira 1

1Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco, Portugal.


sofiacarita@hotmail.com; cristina.pereira@ipcb.pt

Resumo. O presente artigo descreve e analisa um estudo realizado no contexto da prática pedagógica em
educação pré-escolar e ensino do 1º ciclo do ensino básico e que teve como base metodológica os princípios
da investigação-ação. A problemática subjacente à realização do estudo relaciona-se com a contributo dos
mapas conceptuais na organização e aprofundamento das aprendizagens das crianças, pretendendo
identificar as vantagens e os constrangimentos na utilização desta ferramenta cognitiva. As evidências
obtidas apontam para a importância da utilização dos mapas conceptuais junto das crianças da amostra pois
a sua utilização permitiu que clarificassem e organizassem os seus conhecimentos, desenvolvendo
estratégias de representação/visualização da organização estrutural dos conceitos, quer a nível individual,
quer em grupo de pares. Por sua vez, através da metodologia de investigação-ação e das técnicas de recolha
de dados utilizadas foi possível aferir, com algum rigor, os resultados obtidos, permitindo a implementação
de um ciclo de planificações e reflexões promotoras de ajustamentos na intervenção pedagógica.
Destacamos, ainda, o facto de, fora do contexto das intervenções investigativas, as crianças terem tido a
iniciativa de construir mapas conceptuais como um recurso de sistematização e consolidação da
informação, indiciando a interiorização e a generalização da sua utilização a outros conteúdos e situações.
Palavras-chave: investigação-ação; educação pré-escolar e ensino do 1º ciclo do ensino básico; mapas
conceptuais; estratégias de aprendizagem ativa.

The contribution of concept maps for children’s learning process


Abstract. This article describes and analyzes a study accomplished in the context of the pedagogical practice
in pre-school and primary school education, based on the principles of action research. The problem
underlying the study is related to the contribution of conceptual maps in the organization of children's
learning, aiming to identify the advantages and constraints in the use of this cognitive tool.
The evidences obtained point to the importance of using the concept maps to the children of the sample
because their use allowed them to clarify and organize their knowledge, developing strategies of
representation visualization of the structural organization of the concepts, both individually and in groups of
pairs. In turn, through the methodology of action research and data collection techniques used, it was
possible to assess with some rigor, the results obtained, allowing the implementation of a cycle of planning
and reflections that promote adjustments in the pedagogical intervention.
We also highlight the fact that, outside the context of investigative interventions, children have taken the
initiative to construct conceptual maps as a resource for systematizing and consolidating information,
suggesting the internalization and generalization of their use to other contents and situations.

Keywords: action research; pre-school education and primary school education; Concept maps; active
learning strategies.

1 Introdução
Um dos objetivos primordiais da investigação em educação é construir conhecimentos enraizados
nos problemas e nas perspetivas da prática educativa, garantindo que as ações, as observações e as
análises realizadas pelos educadores/professores se tornem mais coerentes, racionais e
fundamentadas. A investigação-ação, como movimento de professores-investigadores, pretende
assumir o pressuposto que os profissionais em exercício podem ser, simultaneamente, produtores e
consumidores de investigação em educação. Ensinar e investigar são encaradas como atividades
complementares: o objetivo último da investigação em educação é compreender, e compreender é a
base para a reformulação, no sentido de uma maior adequação da ação educativa (Pereira, 2004).

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As definições de investigação-ação são múltiplas, traduzindo influências, conceções e metodologias


diferenciadas. Em todas elas se pode, no entanto, identificar a complexidade de um processo que
pretende articular ou integrar duas atividades que, ao longo da história do Homem, têm sido
consideradas, muitas vezes, contraditórias: a investigação e a ação. Apesar das dificuldades
conceptuais e metodológicas que envolvem a investigação-ação, tem-se assistido nas últimas
décadas a um interesse crescente por esta forma de pesquisa, verificando-se a existência de uma
multiplicidade de projetos educativos que dizem inspirar-se na metodologia de investigação-ação. O
presente artigo pretende descrever um estudo realizado no contexto da prática pedagógica em
educação pré-escolar e ensino do 1º ciclo do ensino básico e que teve como base metodológica os
princípios da investigação-ação. A problemática subjacente à realização do estudo relaciona-se com a
contributo dos mapas conceptuais na organização e aprofundamento das aprendizagens das
crianças, pretendendo identificar as vantagens e os constrangimentos na utilização desta ferramenta
cognitiva. O estudo foi implementado por uma das autoras, no âmbito da realização da Prática de
Ensino Supervisionada do Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico,
da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco, junto de uma turma de
crianças a frequentar o jardim de infância de uma instituição particular de solidariedade social (IPSS)
e de uma turma de alunos de uma escola do 1º ciclo do ensino básico inserida num Agrupamento de
Escolas do Ministério da Educação, numa cidade do interior centro de Portugal. No presente artigo,
optámos por apresentar apenas alguns dos resultados obtidos junto das crianças do 1º ciclo do
ensino básico (1º CEB) por razões relacionadas com as regras de publicação (limite do nº de páginas).

2 Identificação do problema e objetivos do estudo


Um dos desafios que um professor deve assumir é o de planificar e de implementar atividades
pedagógicas que permitam ao aprendente uma construção organizada e ativa de conhecimentos,
num contexto de aprendizagens partilhadas. Com vista a atingir este objetivo, consideramos
importante analisar o contributo dos mapas conceptuais no processo de aprendizagem, tentando
perceber se a sua utilização permite que as crianças clarifiquem, retenham e organizem os seus
conhecimentos, desenvolvendo paralelamente estratégias de representação/visualização da
organização estrutural dos conceitos, quer a nível individual, quer em grupo de pares. De acordo com
Novak & Canãs (2009, n.p) “concept maps are graphical tools for organizing and representing
knowledge”. Tendo por base esta definição, pensamos que a sua utilização em contexto educativo
pode permitir ao professor avaliar os conhecimentos que as crianças detêm sobre o tema em análise,
podendo também ser uma estratégia adequada para que os aprendentes tenham consciência dos
seus conhecimentos prévios, permitindo a sua reorganização e proceder a eventuais reformulações,
ao visualizar os conceitos nas suas inter-relações e níveis de abrangência (hierarquia; classificação).
Considerando a revisão de literatura efetuada e as características do desenvolvimento cognitivo e
socioemocional das crianças dos grupos etários da amostra, tínhamos consciência de algumas
dificuldades na aplicação de mapas conceptuais junto de crianças a frequentar o jardim de infância.
Contudo, o pensamento intuitivo, característico deste período de desenvolvimento (cf. Piaget, 1983),
poderia revelar-se, ao mesmo tempo, um potencial interessante na exploração desta ferramenta de
representação visual e gráfica. Pensamos também que é importante a criança dispor o mais cedo
possível de instrumentos úteis para a construção e organização ativa de conhecimentos, bem como
de estratégias de suporte à expressão da sua individualidade e criatividade.
De acordo com estes pressupostos, pretendemos compreender se, através da construção e análise
de mapas conceptuais, as crianças terão uma melhor compreensão e memorização dos conceitos e
uma organização mais adequada das ideias e conteúdos lecionados.
Os objetivos subjacentes ao estudo foram os seguintes:

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- Analisar o grau de recetividade das crianças participantes no estudo relativamente à utilização de


mapas conceptuais;
- Analisar a progressão da recetividade das crianças na utilização desta ferramenta pedagógica;
- Analisar, numa perspetiva comparativa, os mapas conceptuais construídos pelas crianças ao longo
do estudo.
- Aferir o desenvolvimento da organização do pensamento e do raciocínio associativo nas crianças ao
longo do processo de utilização dos mapas conceptuais como ferramenta pedagógica.

3 Enquadramento Conceptual
3.1 Conceito de Mapa Conceptual
Os mapas conceptuais foram desenvolvidos por Joseph Novak tendo por base a teoria cognitivista de
David Ausubel que valorizou o papel dos conhecimentos prévios na aprendizagem de novos
conceitos (Cañas & Novak, 2009). Um mapa conceptual proporciona aos alunos, de todas as idades, a
oportunidade de demonstrarem a aprendizagem de conceitos através da sua representação.
Organizam-se como uma rede que representa graficamente a relação entre conceitos, ideias e
informações, tendo como base as suas conceções prévias (Gallenstein, 2013; Cañas & Novak, 2009;
Hernández, 1999, referido por Zapata, 2009). Neste sentido, constituem um instrumento que
mobiliza os processos de assimilação e acomodação, ajudando os aprendentes a ter um papel ativo
na construção e reconstrução dos conhecimentos. Cañas & Novak (2009) consideram que o
confronto dos conceitos prévios sobre o assunto em análise com novas ideias e informações potencia
a construção de aprendizagens significativas. A estratégia mais adequada para a construção desta
ferramenta cognitiva é definir uma questão central (focus question) que identifica o problema ou
assunto que o mapa conceptual pretende esclarecer (Cañas & Novak, 2009). A este propósito
Marques (2008, p.36) refere que “a ideia principal é normalmente colocada no centro e as ideias
associadas são descritas apenas com palavras-chave e ilustradas opcionalmente com imagens, ícones
e cores variadas.” Os símbolos visuais são os primeiros a serem reconhecidos pelas crianças. O nosso
cérebro descodifica mais facilmente a informação visual do que a informação textual e os mapas
conceptuais auxiliam o sujeito nesse processo, uma vez que são expressos no papel os dois modos de
representação que o cérebro elabora em relação às coisas (Lopes, 2014). Com isto, a utilização de
imagens, cores e palavras-chave possibilitará rapidamente a decifração da informação e,
posteriormente, a retenção e organização da mesma. No mesmo sentido, Buzan, 1996 e Torreblanca
(n.d.) afirmam que, durante a elaboração de um mapa conceptual, o nosso cérebro integra um
processo lógico e imaginativo com entrada de funções dos dois hemisférios cerebrais, melhorando a
capacidade de aprendizagem, a memorização e o respetivo processamento de informação. Em
síntese, e de acordo com os autores consultados, os mapas conceptuais organizam-se como
ferramentas úteis para a intervenção pedagógica, permitindo desenvolver nos aprendentes
mecanismos cognitivos de construção ativa de conhecimentos.
3.2 A utilização dos mapas conceptuais em contexto educativo
No ambiente educativo é importante escolher e aplicar os métodos de aprendizagem mais
adequados às crianças, permitindo-lhes enriquecer toda a sua formação.
Como salienta Zapata (2009, n.p.), é fundamental a existência de “um modelo educativo centrado no
aluno e não no professor”. Nesta perspetiva, os mapas conceptuais possibilitam uma orientação que
atende ao desenvolvimento de destrezas e habilidades cognitivas, através da aprendizagem
significativa e não na repetição memorística da informação por parte dos educandos. Na mesma
linha, Pelizzari et al. (2002, p.40) sugerem que os alunos “realizem aprendizagens significativas por si
próprios”, ou seja, que aprendam a aprender, proporcionando-lhes uma compreensão mais

222
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facilitadora de novos conceitos. Sendo o mapa conceptual um instrumento que se adapta a todas as
idades, este pode ser aplicado através de atividades em grupo ou individuais, a fim de responder às
necessidades das crianças. A realização de atividades individuais é mais rentável para a aquisição de
competências, uma vez que cada criança elabora os mapas de acordo com a sua visualização e
organização mental. Contudo, os mapas conceptuais devem ser sempre adaptados quando aplicados
em crianças de uma faixa etária mais baixa, uma vez que estas ainda apresentam algumas
dificuldades na interpretação e na reprodução individual. Cabe ao professor/educador adaptar a sua
aplicação, não apenas no modo como os emprega mas, também, nos materiais que utiliza para a
atividade. Como Gallenstein (2013, p. 63) refere “as crianças devem ter a oportunidade de manipular
e mover materiais para entender os conceitos enfatizados antes de introduzir as atividades de papel
e lápis”. Um dos principais benefícios da utilização dos mapas conceptuais no contexto educativo é a
ligação que estes estabelecem entre os conhecimentos prévios das crianças e os novos conceitos a
serem aprendidos. Para Ausubel (citado por Díaz, 2002, p.195), “a variável mais importante é o
conhecimento prévio que tem o aluno na sua estrutura cognitiva na relação com as novas
informações (…) relacionando os conhecimentos novos com os anteriores”. Outra das
funcionalidades da utilização desta ferramenta de aprendizagem é que esta pode transformar-se
num poderoso instrumento de avaliação, permitindo ao professor avaliar as dificuldades e os
progressos de cada um. Como sustenta Gallenstein (2013, p. 63) “Eles fornecem aos professores
informações valiosas sobre a avaliação do processo de aprendizagem dos alunos”.
4 Metodologia

4.1 Design metodológico


A opção por um design investigativo de natureza qualitativa, mas assente nos pressupostos da
investigação-ação teve como base os objetivos do estudo, o contexto e processo da sua
implementação/operacionalização. De acordo com Kemmis (1985), a investigação-ação é uma forma
de pesquisa autorreflexiva conduzida pelos práticos em situações sociais a fim de melhorar a
inteligibilidade e o rigor das suas próprias práticas sociais e educativas, a sua compreensão dessas
práticas e das situações em que se desenvolvem. Investigar é, pois, imprescindível para a construção
do conhecimento profissional, permitindo questionar, fundamentar e reajustar as ações e opções
educativas (Costa & Oliveira, 2015). Nesse sentido, a operacionalização do presente estudo
evidenciou a necessidade de imergir na investigação-ação de natureza qualitativa, uma vez que o
investigador desempenhava, simultaneamente, o papel de educador e professor estagiário, sendo o
responsável pela implementação das estratégias e ferramentas educativas em análise. Outra
dimensão interessante e válida nesta metodologia relaciona-se com a operacionalização de um ciclo
dinâmico e retroativo entre planificação, intervenção, análise avaliativa e reformulação, ou seja, “a
investigação-acção é uma metodologia dinâmica, uma espiral de planeamento e acção e busca de
factos sobre os resultados das acções tomadas, um ciclo de análise e reconceptualização do
problema, planeando a intervenção, implementando um plano, avaliando a eficácia da intervenção.”
(Matos, 2004, p. 7, citado por Fernandes, 2006). Como o referido autor salienta, esta metodologia é
dinâmica, passando por variados processos até obtermos o produto final. Esta lógica organizativa é
fulcral para o trabalho educativo, uma vez que orienta o professor na prática, permitindo-lhe
reajustá-la sempre que necessário, através da reflexão da ação desenvolvida. O decorrer das
intervenções realizadas no decorrer do presente estudo possibilitou um processo de análise crítica
após a primeira aplicação dos mapas conceptuais. Deste modo, nas semanas seguintes, os
procedimentos adotados para a aplicação desta ferramenta foram reorganizados de forma a
potenciar a representação e a organização das aprendizagens. Outro aspeto importante que a
investigação-ação permitiu operacionalizar foi a possibilidade dos alunos refletirem sobre os mapas

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conceptuais construídos, a partir da análise individual e em grupo de pares, podendo consciencializar


e discutir os procedimentos de elaboração e o resultado final, projetando alterações a introduzir na
elaboração dos mapas seguintes.

4.2 Participantes no estudo


A amostra deste estudo foi constituída por dois grupos de crianças, na qual se desenvolveram a
PSEPE e a PES 1º CEB. O primeiro grupo era formado por 14 crianças, sendo 7 pertencentes ao
género feminino e 7 ao masculino, com idades compreendidas entre os 3 e 4 anos, da sala dos 3
anos. No que respeita ao segundo grupo, este era constituído por 21 crianças, sendo que 10
pertenciam ao género masculino e 11 ao feminino, tendo idades compreendidas entre os 7 e os 8
anos, a frequentar o 2ºano de escolaridade. Neste estudo foram também participantes a educadora
e a professora cooperantes.

4.3 Procedimentos e técnicas de recolha de dados


Durante uma investigação de cariz qualitativo é fulcral utilizarmos diversas técnicas de recolha de
informação de forma a podermos introduzir algum rigor tendo por base a análise integrada de
diferentes fontes de informação. Segundo Aires (2011, p. 24), a escolha das técnicas e instrumentos
de recolha de dados a utilizar no estudo “constitui uma etapa que o investigador não pode
minimizar, pois destes depende a concretização dos objetivos do trabalho de campo.” Tendo por
base estas preocupações, recorremos a quatro técnicas de recolha de dados, mais especificamente,
entrevista semi-estruturada (Ketele & Roegiers, 1993; Máximo-Esteves, 2008) à educadora e à
professora cooperantes; observação participante; notas de campo (Bogdan & Biklen,1994; Máximo-
Esteves, 2008) e produções dos alunos (Máximo-Esteves, 2008), como é o caso dos mapas
conceptuais. Relativamente à implementação dos mapas conceptuais é importante clarificar os
seguintes aspetos:
Ao longo do estudo, quer durante a prática de ensino supervisionada em educação pré-escolar
(PSEPE), quer no contexto do 1º ciclo do EB, recorremos a esta ferramenta de organização cognitiva.
No primeiro caso, devido à faixa etária dos elementos do grupo de crianças, optámos por
implementar mapas conceptuais de construção coletiva, tendo esta decisão sido acordada com a
educadora cooperante. Por sua vez, na PES no 1º ciclo do EB os alunos realizaram o seu próprio
mapa, aplicando as técnicas e materiais que se encontravam ao seu dispor. Porém, em todas as
intervenções foram construídos simultaneamente mapas concetuais coletivos, de modo a que se
pudesse partilhar, com todo o grupo, a análise dos mesmos. Na PSEPE a aplicação dos mapas
conceptuais teve como objetivo central a clarificação e a consolidação de conteúdos relacionados
com a área do conhecimento do mundo, mais especificamente, o meio físico e meio social. Já no que
respeita ao 1º ciclo do EB, a construção relacionou-se com conteúdos da área curricular de estudo do
meio e na interpretação de textos na área de português.De forma a analisar os dados recolhidos
recorremos à análise de conteúdo (Bardin, 2015) tendo como categorias orientadoras os objetivos
subjacentes à pesquisa; foi ainda construída uma grelha para a análise dos mapas conceptuais.
5 Apresentação e análise dos resultados

5.1 Apresentação e análise dos mapas conceptuais


É fundamental a criança ter ao seu dispor variadas técnicas e métodos que a ajudem durante todo o
processo de aprendizagem. A aplicação dos mapas conceptuais no ambiente educativo pode
promover a assimilação de conceitos, possibilitando à criança conhecer e desenvolver o seu
potencial imaginativo e cognitivo. Os mapas conceptuais foram utilizados com dois grupos de

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crianças de dois ciclos de educação diferentes, sendo estes a Educação Pré-Escolar e o 1º Ciclo do
Ensino Básico. O primeiro grupo era formado por catorze crianças que frequentavam a sala dos três
anos da Educação Pré-Escolar e o segundo por vinte e um alunos que frequentavam 2º ano de
escolaridade do 1º CEB. No presente artigo, apresentam-se e analisam-se apenas alguns dos mapas
conceptuais construídos no contexto da PES do 1º ciclo do ensino básico por razões relacionadas com
as regras de publicação (limite do nº de páginas).
5.1.1 Aplicação dos mapas conceptuais no 1º ciclo do ensino básico
Os mapas conceptuais podem ser utilizados como uma ferramenta de análise da relação do aluno
com o seu espaço de vivência, tornando-se necessário trabalhá-los de acordo com o contexto de uma
abordagem humanística, proporcionando, simultaneamente, condições favoráveis à criatividade.
As crianças deste ciclo de ensino apresentavam idades compreendidas entre os 7 e 8 anos de idade,
demonstrando um grau de autonomia (cognitiva e socioemocional) mais elevado, quando
comparados com as crianças a frequentar o jardim de infância. Neste sentido, optámos pela
construção de mapas conceptuais individuais, onde cada um poderia expressar o seu pensamento do
modo mais ajustado às suas características conceptuais. Contudo, considerámos ser mais
enriquecedor para a aprendizagem a elaboração de um mapa conceptual colectivo, no final de cada
uma das sessões, uma vez que a troca de ideias e de conhecimentos potencia uma aprendizagem
mais rica e integrada. Na primeira implementação, o mapa conceptual foi utilizado como um recurso
na interpretação do conto “A História da Pequena Estrela”, de Rosário Alçada Araújo. Esta
ferramenta de aprendizagem já era utilizada com este grupo de alunos pela professora cooperante,
facilitando todo o processo de abordagem. Uma vez que a análise de todos os mapas individuais
seria muito extensa, optámos por realizar uma análise comparativa apenas entre dois mapas
conceptuais de duas crianças (crianças E e F) que apresentaram diferenças notórias nas
representações gráficas elaboradas. No que respeita à análise do mapa conceptual da criança E,
durante a atividade esta apresentou grande concentração e envolvimento em todo o processo de
execução, recorrendo a vários tipos de materiais e representações gráficas, uma vez que utilizou três
técnicas distintas na construção do mapa conceptual, como é o caso da escrita, do desenho e da
colagem.

Fig. 1 – Mapa conceptual elaborado pela criança E.

Através do registo das notas de campo e da análise do mapa conceptual apoiada pela grelha
construída para o efeito, foi possível perceber que a criança começou por organizar toda a
informação ao redor de um tema central e, com base neste, começou por elaborar ramificações com
a informação recolhida. Como Rodríguez (2010, p. 86) afirma, “os mapas conceptuais baseiam-se

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num principio de associação entre o tema central e as várias ramificações”. Também foi possível
verificar que em alguns casos, a criança E, substituiu palavras por desenhos executados pela própria
e em outros optou por utilizar o desenho como um complemento à palavra escrita, como por
exemplo sucedeu na ramificação referente à “ilha escondida”, na qual escreveu a expressão e
desenhou a ilha. Em concordância, Rodríguez (2010, p. 83) realça que “a combinação de imagens,
palavras e cores reforça a capacidade de memorização a curto e longo prazo do cérebro”.
Com base nestes aspetos, foi possível constatar que o mapa conceptual promoveu a compreensão do
texto trabalhado, uma vez que a criança o interpreta corretamente, expressando os conhecimentos
adquiridos através do mapa. Para além de utilizar o mapa como uma ferramenta de sistematização
de informação, recorreu ao mesmo para expressar a sua criatividade através dos recursos materiais
que utilizou que facilitaram e enriqueceram a sua leitura. O segundo mapa conceptual seleccionado
foi elaborado pela criança F. Através dos registos efetuados nas notas de campo constatámos que
esta apresentou falta de concentração e dificuldades, quer a nível da expressão dos conteúdos
abordados, quer na esquematização e organização dos mesmos no papel, tendo-se limitado a
representar o nome de duas das personagens principais e um dos assuntos essenciais da história.

Fig. 2 - Mapa conceptual elaborado pela criança F.

Apesar de esta ser uma atividade em que cada criança tinha a plena liberdade para construir o mapa,
só após alguma insistência e orientação da nossa parte é que F. iniciou a sua elaboração.
Considerando as dificuldades identificadas, aquando da elaboração do primeiro mapa mental, por
parte da criança F, pensamos ser pertinente apresentar os resultados referentes à construção do seu
segundo mapa conceptual.

Fig. 3 - Segundo mapa conceptual elaborado pelo aluno F.

Este mapa foi utilizado como ferramenta de interpretação e análise do texto narrativo “Um presente
do céu”, de Isabel Lamas e Catarina Cardoso. Foi visível, ao longo da sua elaboração, uma mudança
de atitude por parte da criança F., mantendo-se mais concentrada e envolvida na tarefa.

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“Enquanto me deslocava pela sala, verifiquei que a criança F estava empenhada a construir
o mapa mental. Quando me aproximei dela, questionei-a se tinha dúvidas ou se não se
lembrava de alguma parte do texto, respondendo-me que não. Apesar de estar “alerta”
nesta criança, devido às dificuldades que apresentou na primeira sessão, pouco foram os
momentos em que se distraia com o colega do lado.” (Notas de campo, 15 de dezembro de
2015).
Ao analisarmos a grelha de análise referente ao mapa conceptual verificámos que os objetivos
estabelecidos relativamente à aprendizagem do aluno foram atingidos, sendo transpostos através da
representação gráfica, como é o caso do tema, o assunto do texto e os elementos relacionados com
a quadra natalícia. Porém, os mesmos foram apresentados de um modo muito sucinto, uma vez que
refere três das personagens (Anastácio, Anjo e Pinheiro) e três ações que se salientam em toda a
história apresentada. Apesar do pouco aprofundamento de conteúdos, estes eram coesos. O aluno
executou o mapa com base num elemento central, mais especificamente, o nome da personagem
principal – Anastácio – desenvolvendo a partir deste, informação conectada entre si, nomeadamente
duas das personagens e ações que as interligam ao elemento central. No que respeita ao tipo de
representação gráfica, a criança recorreu apenas à escrita, utilizando novamente os mesmos
materiais, o lápis de carvão e o caderno. Do ponto de vista de Marques (2008, p. 42), é muito mais
fácil memorizar informação através de um esquema onde o texto e a imagem contracenam
simultaneamente. Contudo, nesta segunda representação esta situação não ocorreu, uma vez que a
criança apenas utilizou, mais uma vez, um tipo de representação gráfica, a escrita, recorrendo
apenas ao lápis de carvão. A elaboração de um mapa conceptual propicia o desenvolvimento
cognitivo e criativo da criança, estimulando-a a expressar a informação que aprendeu e como esta a
visualiza no pensamento. Desta forma, foi-nos possível analisar se os conteúdos foram ou não
assimilados e as dificuldades que a criança sentiu durante todo o processo de elaboração.
Como anteriormente referimos, após todas as crianças terem elaborado o mapa individualmente,
realizámos também mapas conceptuais coletivos com o objetivo de consolidar e coordenar as ideias,
integrando as diferentes perspetivas individuais. A realização desses mapas após a elaboração
individual permitiu que cada uma das crianças organizasse, num primeiro momento, as suas ideias,
assumindo uma atitude de maior iniciativa e autonomia. O primeiro mapa conceptual coletivo foi
construído com base no diálogo estabelecido com as crianças, sendo estas questionadas sobre os
vários aspetos do texto explorado. Cada uma apresentava no quadro uma das ideias que tinha
exposto no seu mapa individual, para que no final conseguíssemos obter um conjunto de ideias que
seriam organizadas e utilizadas no mapa conceptual coletivo.

Fig. 4– Mapa conceptual realizado coletivamente.

227
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A realização desta atividade permitiu a todas exporem as suas ideias e identificar dúvidas
provenientes da construção individual, debatendo-as. Esta atividade despertou motivação e
curiosidade por parte das crianças, graças ao trabalho em equipa e, segundo Ausubel, Novak e
Hanesian (1980, p. 331), “a motivação (…) é absolutamente necessária para a aprendizagem”. Apesar
da utilização dos mapas coletivos revelar potencialidades para o processo de aprendizagem e ser
uma ferramenta essencial na clarificação e integração de conhecimentos, a realização do mapa
individualmente pode potenciar a expressão criativa de cada aluno, uma vez que é o próprio que o
constrói em conformidade com o seu pensamento. O aluno traduz graficamente a informação tal
como esta se enquadra na sua mente, sendo mais percetível para o professor a identificação das
potencialidades e dificuldades específicas de cada aluno.

Considerações finais
Analisando o percurso construído ao longo da realização do presente estudo, a opção por um design
investigativo de natureza qualitativa, assente nos pressupostos da investigação-ação, afirmou a sua
pertinência e adequação ao dar resposta aos objetivos delineados. Paralelamente, os procedimentos
e técnicas adotados revelaram-se extremamente importantes para o desenvolvimento profissional
do investigador, permitindo-lhe assumir, de uma forma mais fundamentada, a planificação e a
implementação de atividades pedagógicas. Estando conscientes das limitações do estudo e da
importância de prosseguir a metodologia implementada num período temporal mais extenso, as
evidências obtidas apontam para a importância da utilização dos mapas conceptuais junto das
crianças da amostra pois a sua utilização permitiu que clarificassem e organizassem os seus
conhecimentos, desenvolvendo paralelamente estratégias de representação/visualização da
organização estrutural dos conceitos, quer a nível individual, quer em grupo de pares. Por sua vez,
através das técnicas de recolha de dados utilizadas foi possível aferir, com algum rigor, os resultados
obtidos, permitindo a implementação de um ciclo de planificações e reflexões promotoras de
ajustamentos na intervenção pedagógica. Destacamos, ainda, o facto de, ao longo das sessões de
aplicação dos mapas conceptuais, as crianças evidenciaram um interesse e envolvimento crescente,
vivenciando a utilização desta ferramenta como parte integrante do seu processo de aprendizagem;
fora do contexto das intervenções investigativas as crianças tiveram a iniciativa de construir mapas
conceptuais como um recurso de sistematização e consolidação da informação, indiciando a
interiorização e a generalização da sua utilização a outros conteúdos e situações.

Referências
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Universidade Aberta.
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229
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El uso del vídeo para el análisis competencial de la practica docente en la


formación inicial del profesorado de educación física
José Luis Aparicio Herguedas1, Antonio Fraile Aranda1, Sandra Velasco Martín1
1
Departamento de Didáctica de la Expresión Musical, Plástica y Corporal. Facultad de Educación y
Trabajo Social. Universidad de Valladolid, España. jlaparicio@mpc.uva.es; afraile@mpc.uva.es;
sandra.velasco@alumnos.uva.es

Resumen. Se presenta una experiencia metodológica de desarrollo competencial a partir de la utilización


del videoanálisis de las intervenciones prácticas de 45 estudiantes de Educación Física de la Universidad de
Valladolid. Tiene lugar en el desarrollo de la asignatura de Expresión Corporal durante el curso 2016/2017,
en la que asumen el rol de “docentes” y observadores coevaluadores de la intervención de sus compañeros.
Para ello se promueve una estructura metodológica en la que los roles asumidos, condicionan la estructura
de evaluación formativa a partir de las estrategias de autoevalaución y coevaluación, promoviendo con ello
la reflexión sobre su estado competencial a partir de la grabación en video y audio de sus intervenciones.
Tras el desarrollo del proceso, se utiliza el software para el análisis cualitativo de datos Atlas.ti (versión
1.5.0) para organizar y categorizar los videodatos.
Palabras clave: Competecias transversales; videoanálisis; evaluación formativa; análisis de la práctica.

The use of the video for the analysis of competences of the teaching practice in the initial training of
physical education teachers
Abstract. It is presented a methodologic experience of competence development from the using of the
video analysis of the practise intervention of 45 physical education students from the university of
Valladolid, during the start up of the corporal expression subject in the course 2016/2017, in which they
assume the role of "teachers" and co-evaluators observers of the intervention of their colleagues. For this it
is promoted a methodologic structure in wich the assumed roles condition the structure of formative
evaluation based on the strategies of self-evaluation and co-evaluation, promoting with it the reflection
about their competency status from the video and audio recording of their interventions. After the
development process, it is used the software for the cualitative data analysis Atlas.ti (1.5.0 version) to
organize and categorize the videos data.
Keywords: Transversal competences; video analysis; formative evaluation; practice analysis.

1 Introducción
Esta experiencia parte del análisis mediante grabación audiovisual de las competencias transversales
de las clases prácticas que se vienen desarrollando en la asignatura de expresión corporal, en la
formación inicial del profesorado de Educación Física. Con ello, se pretende contribuir a la toma de
conciencia competencial en los estudiantes, con objeto de vincular el saber teórico y práctico dentro
de la complejidad de la formación docente (MECD, 2003).
El enfoque competencial en la educación superior tiene en cuenta que los estudiantes han de ser
capaces de comprender, utilizar y actualizar el conocimiento, contextualizarlo, habituarse a aprender
continuamente y observar la necesidad de adaptar lo aprendido a los contextos cambiantes que les
exigirá la realidad laboral (Yániz, 2007).

2 Las competencias transversales en la formación inicial del profesorado de educación


física
El enfoque competencial de la experiencia que se plantea, se fundamenta en la creación para los
estudiantes de posibilidades de actuación, para a partir de ellas, tomar conciencia y analizar las
propias competencias personales y profesionales que en el ejercicio docente se ponen en juego. Este
enfoque competencial, desde los fundamentos del paradigma de las capacidades de Nussbaum

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

(2012), responde a la pregunta ¿qué es capaz de hacer y de ser cada persona?, apostando para ello
por la creación de una red de oportunidades para la actuación, la experimentación y la reflexión a
partir de la acción. Desde ahí, entendemos las competencias como la oportunidad para movilizar
todos los recursos disponibles para tomar decisiones y abordar, en la aproximación al ejercicio
docente, los problemas diversos y complejos de la práctica que se va abordando y reconociendo, de
una manera autónoma y responsable (Moreno Murcia & Silveira Torregrosa, 2015; Zabalza, 2012).
La complejidad de la realidad de la escuela, nos lleva a reflexionar sobre la idea de formar un
profesorado de Educación Física que aborde la educación, desde un planteamiento sociocomunitario
transformador, que lidere respuestas educativas a la diversidad reconociéndola como un valor en
alza a partir de la cooperación grupal y sus posibilidades de aprendizaje (Ríos Hernández, 2009). Las
capacidades adaptativa, emocional, de liderazgo, de resolución de problemas y de aplicación de
soluciones creativas e innovadoras resultan, entre otras competencias del profesorado, esenciales
para desarrollar su función docente en clave inclusiva, permitiendo abordar las barreras de
aprendizaje que dificultan el desarrollo de la cultura participativa y democrática de todo el alumnado
en el aula (Ainscow, 2001; Fraile, 2004; Ríos Hernández, 2009).
Tanto el Proyecto Tuning (González & Wagenaar, 2003) como los Libros Blancos para los títulos de
Grado de Maestro de Educación Primaria con la mención en Educación Física, y de Ciencias de la
Actividad Física y del Deporte, establecen las competencias transversales y específicas para los
perfiles docentes (ANECA, 2005a, 2005b). Las primeras, como objeto de estudio de la presente
experiencia, se ordenan en tres categorías: instrumentales, interpersonales y sistémicas. Las
competencias instrumentales recogen las capacidades para comprender y manejar el entorno,
organizar los tiempos, tomar decisiones, resolver problemas, manejar los recursos tecnológicos y
comunicativos. Las competencias interpersonales, integran diversas capacidades relacionadas con la
inteligencia social (Goleman, 2006), que requieren del conocimiento y funcionamiento de las
relaciones sociales y del comportamiento inteligente en ellas. De tal ejercicio, dependen importantes
competencias para la praxis docente como la crítica y autocrítica, la cooperación y el trabajo en
equipo, las habilidades en las relaciones interpersonales y el compromiso ético. En un estudio sobre
competencias interpersonales desarrollado por Aparicio y Fraile (2016) con estudiantes de Educación
Física, se observó cómo diversas capacidades básicas como la empatía, la emocionalidad o la
escucha activa, eran constitutivas y necesariamente parte de las competencias interpersonales
estudiadas.
Por su parte, el desarrollo de competencias sistémicas requiere de un suficiente dominio de
competencias instrumentales e interpersonales, pues solo desde la coexistencia de ambas es posible
comprender la realidad como la suma de unas partes que se relacionan entre si (González &
Wagenaar, 2003). En este grupo estarían contenidas las competencias de aprendizaje permananente,
liderazgo, creatividad y la capacidad de adaptación a situaciones nuevas.
Por otro lado, la evaluación formativa a través de las estrategias de autoevaluación y coevaluación,
pone especialmente en funcionamiento la competencia para la crítica y la autocrítica, estando
presente a lo largo de toda la experiencia y rompiendo la barrera de la incomodidad a la hora de
asumir y emitir, responsablemente, retroaliementaciones (Asún, Romero, Aparicio, & Fraile, 2017).

3 El vídeo como recurso para el análisis y el desarrollo competencial del profesorado de


educación física durante su formación inicial
Dentro de los estudios cualitativos de investigación, el videoanálisis es un método que viene
desarrollándose desde los ámbitos de la antropología y la teoría de la comunicación humana. En el
campo educativo va adquiriendo cada vez mayor importancia en tanto la creciente presencia que
tienen las tecnologías audiovisuales para la producción y difusión del conocimiento; sus posibilidades

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de investigación en el contexto real se vinculan, entre otras, con los análisis de las interacciones en el
aula (Rosales, 2014) o el análisis competencial docente (Schnettler, Knoblauch, & Baer, 2012).
La dimensión interpretativa del videoanálisis, nos lleva a prestar atención tanto a la observación de
las acciones en situación, como a los significados de dichas acciones que como investigadores
interpretamos; así consideramos que los actos solamente pueden ser explicados si son
comprendidos, necesitando el investigador conocimiento de la cultura en la que suceden las acciones
para comprender lo que acontece registrándolo. De esta forma se contempla una doble
hermenéutica entre los constructos de primer orden (emic) en cuanto significados que los actores
dan a sus acciones, y constructos de segundo orden (etic) en cuanto significados que como
investigadores damos a las acciones observadas y registradas (Giddens, 1984). El individuo pasa de
ser objeto de investigación a sujeto con capacidad narrativa, que poniendo voz e imagen a su
experiencia, también la colma de significado; y el investigador, parte del proceso investigativo,
consigue hacer emerger realidades en ocasiones ocultas, mediante el análisis pormenorizado de la
realidad investigada, apoyándose en el registro de la cámara y su interpretación (Baer & Schnettler,
2014).
A lo largo de la experiencia presentada, se describe cómo las intervenciones prácticas de los
estudiantes (simulacros docentes) se registran mediante grabaciones de video y audio, para
desarrollar una orientación didáctica reflexiva, que permite mediante la conservación de los
registros, acercarnos a la función docente y entender las interacciones durante la tarea
experimentada, y con ello, reconocer su estado competencial. Así, los datos videográficos a recoger
permitirán, conservando la realidad experimentada, abordar los microdetalles de las interacciones
sociales con el fin de analizarlos e interpretarlos gradualmente, siendo de forma iterativa, los propios
datos en su análisis, quienes puedan ir proporcionando la robustez de las categorías identificadas,
Grounded Theory (Glaser & Strauss, 1967), para continuar guiando el proceso investigativo a través
del análisis de los datos provenientes de otras fuentes (grabaciones de audio, transcripciones).

4 El desarrollo de un proceso metodológico fundamentado en la evaluación formativa,


haciendo uso la grabación de vídeo
Entre los fines a alcanzar con los estudiantes, desde la expresión corporal, está la de orientar el
desarrollo de sus competencias transversales en relación a su práctica docente (Fraile & Aparicio,
2015).
Paralelamente, se busca la co-participación de esos estudiantes como observadores y coevaluadores
de dicha práctica, de tal forma que se co-responsabilicen del aprendizaje, desde la evaluación
formativa, a través de la coevaluación y la autoevaluación; todo ello, a partir de la información
subyacente de las grabaciones en video y de audio de las intervenciones de los estudiantes
“docentes”, y de las grabaciones de audio de los conversatorios que mantienen, tras su intervención,
con los propios coevaluadores. Se pretende desarrollar así, a través del análisis de la información
obtenida, un proceso de reflexión personal desde la investigación-acción participativa (Fraile, López-
Pastor, Castejón, & Romero, 2013), y un proceso de coevaluación a partir de las impresiones
anotadas por los coevaluadores (ayudados de rúbrica de observación sobre competencias
transversales), en relación a la práctica docente de sus compañeros, mediante el debate y la reflexión
conjunta.
Con carácter previo se desarrolla, a través de trabajo colaborativo grupal, el estudio de las diferentes
dimensiones corporales que caracteriza la expresión corporal (espacial, temporal, comunicativa,
introyectiva, emocional, lúdico-hedonista y cooperativa). Con el fin de posibilitar su carácter práctico
y experimental, los grupos diseñan propuestas didácticas para cada una de esas dimensiones para
llevar posteriormente a intervención docente.

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Metodológicamente, para la puesta en práctica de las sesiones, se desarrollan dos itinerarios


simultáneos de participación por parte de los estudiantes; un primero, asumiendo cada uno de ellos
paulatinamente el rol de “docente”, diseñando y dirigiendo las sesiones prácticas relacionadas con su
tema durante 10 minutos; y un segundo, como observadores y coevaluadores de la práctica de sus
compañeros “docentes” (Fig.1).

Fig. 1. Estructura metodológica de intervención seguida, para la puesta en práctica de las estrategias de autoevaluación y
coevaluación.

Con objeto de recoger su exposición (descripción de la tarea, organización de los grupos,


interacciones con el grupo, etc.) cada “docente” llevará puesto un micrófono conectado al teléfono
móvil, registrando su propio audio, y debiendo transcribirlo posteriormente. También se registrará
mediante grabación de video con cámara digital su intervención, de forma que su registro como
documento de video pueda ser secuenciado y cortado, para poder ser más fácilmente visualizado con
el resto de estudiantes y a partir de él, analizar las competencias y capacidades que están o no
presentes en su actuación.
Por su parte, los coevaluadores, con el apoyo de rúbrica, observan y registran anotando en una ficha
datos en relación a las siguientes competencias transversales: comunicativa, habilidades en las
relaciones interpersonales y liderazgo. Para ayudar a la mayor atención a cerca de cómo éstas se
presentan en cada actuación “docente”, se divide a los coevaluadores en tres parejas que asuman la
tarea de observar, analizar y anotar sus impresiones para cada una de ellas. Tras la intervención de
los “docentes”, se producirá un conversatorio de no más de 10 minutos con tres de los seis
coevaluadores-observadores de cada competencia junto con el docente implicado, quienes
aportarán sus observaciones en relación a los éxitos y aspectos de mejora. Este conversatorio es
grabado con teléfono móvil y posteriormente transcrito.
Después del visionado de la grabación de video y el trabajo de secuenciación por parte de cada
“docente”, junto con la escucha y transcripción de los audios en relación a su práctica y al

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conversatorio mantenido con los coevaluadores, se contempla un tiempo de reflexión personal para
desarrollar un proceso de autoevaluación; posteriormente, ya en el aula, se dispensa un tiempo para
la presentación de la secuenciación de video de cada “docente” a los demás, apoyando o refutando
las impresiones de los coevaluadores y manifestando la propia mediante el establecimiento de un
debate participativo. Tal debate será grabado, con el fin de registrar la riqueza participativa.
Finalmente, en relación al análisis de la información obtenida, se tiene previsto a partir del software
Atlas.ti (version 1.5.0), realizar un videoanálisis con el fin de establecer un proceso de codificación a
partir de las evidencias en cuanto segmentos con significado, estableciendo una red de categorías
que condensen la significación de tales evidencias, con el fin de comprender y relacionar mejor los
significados de éstas en el contexto para generar conceptos (Coffey & Atkinson, 2003) a partir de los
videodatos.

5 Conclusiones
En estos últimos años están adquiriendo una mayor presencia, en la formación del profesorado, el
uso y aprovechamiento de los medios audiovisuales, como el video, como avances tecnológicos para
generar cambios y una clara evolución hacia nuevos modelos pedagógicos de enseñanza-aprendizaje
colaborativos. En la formación del profesorado de educación física, cada vez está más presente el
desarrollo de las competencias transversales y entre ellas se destacan aquellas que inciden en el
trabajo en equipo, la gestión emocional, el liderazgo, la capacidad de comunicación con empatía y el
desarrollo de la autonomía profesional.
La experiencia desarrollada con los estudiantes que cursan la asignatura de expresión corporal, nos
ha permitido comprobar la importancia que tiene para ellos asumir labores docentes relacionadas
con el diseño de las actividades, la dirección de las clases, la observación y los posteriores procesos
de coevaluación y autoevalución, dentro de un sistema de evaluación formativa.

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POESIA NAS QUEBRADAS, PALAVRAS RECICLADAS

Ravena Carmo; Patrícia Rodrigues¹, Maria do Amparo de Sousa¹, Juliana Eugenia Caixeta ²

¹Faculdade UnB Planaltina,Universidade de Brasília,Brasil. ravenacarmounb@gmail.com ;


patharodrigues@hotmail.com
² Secretaria do Estado da Educação – DF, Brasil. ampmsousa@gmail.com; Faculdade UnB
Planaltina,Universidade de Brasília,Brasil. eugenia45@hotmail.com

Resumo. Este artigo tem como objetivo descrever o processo de construção de conceitos realizados com
estudantes deficientes intelectuais e com outras síndromes através do projeto Poesia nas Quebradas, com
objetivo de mediar contextos através da linguagem poética para que fossem construídas noções básicas e
conhecimentos sobre Reciclagem. A partir da proposta de mediação da escola realizou-se uma pesquisa
qualitativa com a ênfase nas pessoas: como se expressam, o que é importante para elas, como atuam e
pensam sobre suas ações e as dos outros. A análise dos dados se deu a partir de desenhos e poesias
construídas pelos estudantes.
Palavras-chave: poesia; deficiência intelectual; inclusão; reciclagem.

BROKEN POETRY, RECYCLED WORDS


Abstract.This article aims to describe the process of constructing concepts developed with intellectually
disabled students and other syndromes through the Poetry in Quebradas project, in order to mediate
contexts through poetic language so that basic knowledge and knowledge about Recycling can be
constructed. From the proposal of mediation of the school, a qualitative research was carried out with the
emphasis on the people: how they express themselves, what is important to them, how they act and think
about their actions and those of others. The analysis of the data was based on drawings and poetry
constructed by the students.
Keywords: poetry; Intellectual disability; inclusion; recycling.

1. Introdução

Poesia nas Quebradas, Palavras Recicladas é resultado de um projeto aplicado para uma turma de
estudantes em processo de alfabetização, portadores de deficiência intelectual e outras síndromes,
com objetivo de mediar contextos através da linguagem poética para que fossem construídas noções
básicas e conhecimentos sobre Reciclagem.
A questão da reciclagem dos resíduos sólidos ou lixo, no contexto escolar, exige o comprometimento
de toda a sociedade. Não se trata de assunto isolado, mas que permeia todo o modo de vida de uma
população, já que os problemas ambientais não só preocupam, mas atingem a todos, sem distinção.
A importância da educação ambiental é formar indivíduos comprometidos e conscientes da
preservação do meio ambiente.
Mediar conhecimentos com alunos com deficiência intelectual e outras síndromes é um grande
desafio, porém, Mantoan (1997) explica que não podemos limitar os recursos para mediações
voltadas para estudantes com alguma deficiência ou síndrome, mas devemos mediar conhecimentos
para que eles sejam capazes de formarem conceitos e de se conscientizarem diante de um tema.
Segundo Castro (2002), utilizar da linguagem poética em sala de aula é uma forma interdisciplinar de
ensinar, porque envolve Português, Literatura, Arte, Ciências Naturais e outras áreas do
conhecimento, além de trabalhar a escrita e favorecer a aprendizagem, tornando as aulas mais
interessantes, apresentando conceitos de várias áreas do conhecimento. A liberdade poética
desperta a criatividade dos alunos, permitindo que eles criem, questionem e, acima de tudo, que eles

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tenham autonomia para expor suas ideias e debater sobre o tema trabalhado.
Para Capra (2003), uma das possibilidades para a inclusão da temática ambiental nas escolas é “a
aprendizagem em forma de projetos”, baseado nisso, as oficinas foram desenvolvidas
especificamente para atender essa turma.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

O processo de ensino e aprendizagem para estudantes com deficiência intelectual e outras


síndromes tende a ter caminhos que facilitem o desempenho de aulas e propostas, partindo da
realidade que é notada em sala de aula cada aluno tem suas habilidades e seu tempo individual para
aprender.
De acordo com o Decreto nº 5.296, a deficiência mental, atualmente denominada deficiência
intelectual, refere-se ao "funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com
manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades
adaptativas.” (Brasil, 2004, p.5).
Segundo Almeida (2010), alunos/pessoas com deficiência intelectual tendem a ter dificuldades de
compreensão, noções de espaço e tempo, relações sociais, obedecer a regras, dificuldades em
realizar tarefas até mesmo do dia a dia, dificuldades em noções matemáticas e, em geral, a maior
dificuldade é compreender conteúdos abstratos, resolver problemas e até mesmo encontrar sentido
no mundo.
Para Vigostky (1995), o desenvolvimento natural da criança não acompanha o desenvolvimento
cultural e isso se torna mais desigual diante de crianças com alguma deficiência ou síndrome. Ou
seja, a influência de caminhos alternados do meio externo é de extrema importância para ambos os
desenvolvimentos, porque se de alguma forma é proporcionado como, por exemplo, a essas crianças
atividades em que elas desenvolvam o seu natural (fala, escrita), por si só a criança estará sendo
imersa no meio cultural daquele contexto. Os professores podem promover a inclusão nas escolas
com alunos com deficiência intelectual e outras síndromes, inovando, criando ferramentas,
utilizando novos métodos para que esses alunos possam encontrar uma melhor forma de aprender,
respeitando as limitações de cada um, mas vislumbrando as possibilidades de desenvolvimento
delas. “O aprendizado escolar produz algo fundamentalmente novo no desenvolvimento da criança”
(Vygotsky, 1991, p.95).
A importância que a escola e a sociedade têm de garantir que deficientes intelectuais e com outras
síndromes estejam incluídos é significativa na vida social desses estudantes, a escola é o principal
local de aprendizagem, tendo grande responsabilidade na formação e desenvolvimento, cabe ao
professor e toda escola estar atento à diversidade para que não eternize a desigualdade, pois o fato
do estudante estar matriculado não garante inclusão.
Sabemos que a presença na escola não é garantia de que o indivíduo se aproprie do acervo de
conhecimentos sobre áreas básicas daquilo que foi elaborado por seu grupo cultural. O
acesso a esse saber dependerá, entre outros fatores de ordem social e política e econômica, da
qualidade do ensino oferecido (Rego, 2002).
As questões ambientais e a educação ambiental são de extrema importância para que através de
ações educativas sejam formados cidadãos conscientes do destino do lixo e da preservação do meio
ambiente. A reciclagem, reutilização de resíduos, coleta seletiva e cuidados com a natureza são
temas transversais que devem e podem ser explorados por professores e estudantes com diversas
linguagens e práticas.
A reciclagem pode ser definida como uma separação sistemática do lixo através da coleta seletiva,
separando papéis, metais, plásticos, vidros, lixo orgânico entre outros, para a sua futura

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transformação e reutilização na fabricação de outros produtos. O recolhimento desse lixo,


previamente separados na fonte geradora, que são passíveis de serem reciclados e possam sofrer
transformações em suas propriedades para depois se tornarem matéria prima para produção de
novos produtos. Para Valle (1995, p.71), “reciclar o lixo significa refazer o ciclo, permite trazer de
volta, à origem, sob a forma de matéria-prima aqueles materiais que não se degradam facilmente e
que podem ser reprocessados, mantendo as suas características básicas”. Assim, poderíamos dizer
que a reciclagem se concretiza sempre que se encontra um novo uso para alguma coisa que, até
então, já não teria nenhuma utilidade, se consolida sempre que se encontra uso para alguma coisa
que, possivelmente seria descartado de forma incorreta e já não teria nenhuma utilidade, reciclar é a
forma mais racional de eliminarmos os resíduos produzidos pela humanidade, pois todo o material
usado retorna para o ciclo de produção, ou então, reutilização, o que ajuda a solucionar o problema
do excesso de lixo.
A reutilização de alguns resíduos sólidos é uma prática que diferente da reciclagem, não precisam
passar por processos químicos, mas podem ser reaproveitado em diversas outras possibilidades de
uso. Ao reutilizar um produto, você pode aplicá-lo novamente na mesma função ou não.
A tarefa de conscientização com relação à reciclagem é uma missão de todos nós em qualquer parte
do mundo.

3. Metodologia

As pesquisadoras adotaram a abordagem qualitativa no que tange à ênfase nas pessoas: como se
expressam, o que é importante para elas, como atuam e pensam sobre suas ações e as dos outros. A
partir daí, propomos modo de estabelecer as relações entre os sujeitos, e com os objetos, enquanto
aprendem-ensinam e se desenvolvem, conhecem e constroem conhecimentos e significados
(Sampieri, Collado& Lucio, 2013); (Sousa, Caixeta, Santos, Carmo & Turma, 2017. O Centro de Ensino
Especialmente Azul, situado em Planaltina DF, fez um convite ao Projeto: Psicologia e Educação:
Mediações possíveis em tempos de inclusão, coordenado pela professora/doutora Juliana Caixeta na
Universidade de Brasília campus Planaltina – FUP, do qual faz parte o subprojeto: Poesia nas
Quebradas. Todas as atividades realizadas desses projetos são voltadas para inclusão e pessoas em
situações de exclusão. A Oficina Poesia nas Quebradas foi desenvolvida com o objetivo de contribuir
para que os estudantes pudessem explorar de outras maneiras o tema Reciclagem. No período de
outubro a dezembro de 2015, foram aplicadas à turma da 1ª etapa (alfabetização) da Educação de
Jovens e Adultos Interventivo – EJA Interventivo de uma escola pública de Planaltina, Distrito
Federal. A oficina foi desenvolvida em 3 encontros, com 3 horas de duração cada encontro, uma vez
por semana. Ao todo, participaram da oficina 12 pessoas, com idade entre 12 a 33 anos, sendo 5 com
Deficiência Intelectual, dentre eles uma cadeirante e 7 com síndromes como: autismo, síndrome de
Down e esquizofrenia. Carvalho (2004, p.77) afirma que “a educação acontece como parte de uma
ação humana de transformar a natureza em cultura, atribuindo-lhe sentidos, trazendo-a para o
campo da compreensão e da experiência humana de estar no mundo e participar da vida”. Baseadas
nessa indagação e de posse do tema, as pesquisadoras, no primeiro encontro, iniciaram a atividade
perguntando quem gostava de poesia, quem gostava de música e quem gostava de desenhar, a partir
de perguntas investigativas para saber o nível de conhecimento dos estudantes, introduziram o tema
e recitaram a seguinte poesia de sua própria autoria:

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A caixinha que vira carteira


Em um carrinho pode se transformar
Uma garrafa de vidro
Vira um vaso a encantar
Pneus quando bem reutilizados
Viram bancos pra se sentar
Reciclando os materiais
Da natureza eu ajudo a cuidar
Uma garrafa pet
Transforma a brincadeira
Um leão e um macaco eu posso criar

Na qual citam objetos reciclados que também estavam presentes no encontro, para que os
estudantes fizessem associação do que estava sendo recitado na poesia, comparando com a vida
cotidiana, foi apresentado imagens de resíduos que foram reciclados e reutilizados. Em seguida foi
passado um vídeo musical que explica conceitos de reciclagem. Como afirma Vygotsky (2008),
inicialmente as ações assumem a forma externa, mediadas pelo outro e pelo ambiente, depois se
transformam em ações internas, mentais, da própria criança/estudante. A presença do outro, assim
como o uso de recursos, no caso a poesia, os objetos, o vídeo musical e as imagens, como
mediadores entre as informações, foram usadas para proporcionar condições para os estudantes
terem uma maior compreensão sobre o tema. Ao final aconteceu um debate onde as pesquisadoras
contextualizaram o termo reciclagem e reutilização. De acordo com Mantoan (2010), o debate é um
dos processos pedagógicos que permite ser abordado por diferentes níveis de compreensão e de
desempenho dos estudantes, sem distinção daquele que sabe mais para aquele que sabe menos.
Notou-se que 5 estudantes nunca tinham tido contato com o termo reciclagem, após as trocas de
ideias, foi pedido para que os estudantes construíssem poesias através de desenhos, expressando
aquilo que eles entenderam, o produto final desse encontro foram os desenhos construídos pelos
estudantes, inspirados no tema apresentado. No segundo encontro, a oficina iniciou com o mesmo
vídeo musical passado na primeira oficina, após, relembrou-se tudo que aconteceu na oficina
anterior. Foi abordado o tema: Coleta Seletiva, as pesquisadoras levaram lixeiras de papel e objetos
destinados para serem colocados pelos estudantes nessas lixeiras, cada uma com as cores
respectivas de cada lixo: azul para papel, vermelho para plástico, amarelo para metais e verde para
vidros. Os estudantes separaram todos os resíduos de maneira correta, todos e todas se ajudavam
quando surgiam dúvidas. Após este momento, iniciou-se uma brincadeira com balões contendo
dentro de cada um, uma palavra, sendo elas LIXO, LIXEIRA, NATUREZA, MEIO AMBIENTE,
RECICLAGEM e REUTILIZAÇÃO, ao total foram 6 balões. Colocamos uma música, a mesma utilizada no
vídeo que foi passado no início das oficinas, em círculo, os estudantes passaram o balão, um por vez
para o estudante a sua direita, quando a música parava, quem estava com o balão estourava e
escolhia outro ou outra estudante para compor uma poesia inspirada na palavra que estava dentro
do balão até formar 6 duplas, após esse momento, com a orientação das pesquisadoras, os
estudantes compuseram as poesias, após esse momento, todos recitaram suas poesias que foram
registradas pelas pesquisadoras. Utilizou-se a brincadeira considerando a perspectiva sócio-cultural
que estuda o brincar a partir da concepção de que é o social que caracteriza a ação na atividade
lúdica do sujeito. Para Vigotsky (1991), brincar é imprescindível para o desenvolvimento cognitivo,
pois os processos de simbolização e de representação levam ao pensamento abstrato. No terceiro

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encontro, a atividade desenvolvida foi em grupo, de forma problematizada. Vygotsky (2007), diz que
o conhecimento é construído através da relação dos sujeitos com seu meio ambiente, ou seja, as
interações são o principal meio para construção social de conceitos, não ocorrendo pela
transferência, no caso, das pesquisadoras para os estudantes. Baseadas na aprendizagem
colaborativa, segundo Torres, Alcantara e Irala (2004), o conhecimento é o resultado de uma
concordância entre os sujeitos de uma comunidade de conhecimento, resultado do que as pessoas
construíram juntas, seja dialogando, trabalhando na solução de problemas, estudos de casos,
projetos, de forma direta ou indiretamente, chegando a um consenso ou um acordo. As
pesquisadoras fizeram perguntas sobre tudo que foi aplicado, levando os estudantes a refletirem
sobre os conceitos abordados nas oficinas desde o primeiro encontro, a partir das respostas que
foram escritas no quadro as pesquisadoras apenas organizaram as frases de forma que fez sentido e
ajustando-as para virar uma poesia. Durante o decorrer das oficinas houve a interação, tanto da
professora e monitora que acompanhou as atividades como dos estudantes, com o tema proposto. A
cada nova oficina, estes se mostravam maravilhados (as) e surpresos (as) com as várias possibilidades
apresentadas para criar e reaproveitar resíduos que, quase diariamente eram jogados fora.

4. Análise dos Resultados

O corpus de análise desta pesquisa será composto por três conjuntos de dados: os desenhos, as
poesias construídas em duplas e a poesia construída coletivamente, identificando o percurso que os
estudantes utilizaram até o término da formação do conceito.

4.1 Generalização

Na primeira oficina, alguns dos estudantes não tinham nenhum contato com conceito de reciclagem,
o produto dessa oficina foi a construção de desenhos pelos estudantes. Ao serem analisados, as
pesquisadoras identificaram que houve reprodução das imagens e os objetos que foram levados.
Segundo Vigotsky (2001), o desenvolvimento decorrente da imitação é um fato fundamental no
processo de aprendizagem, ou seja, para estudantes/pessoas que estão em processo de construção
de conceitos, a imitação é forma de explorar aquilo que eles sabem fazer, neste caso, desenhar,
mesmo que apenas reproduzindo as imagens e objetos, para aquilo que eles não sabem fazer. Para
Vigotsky (2001), a imitação é a primeira influência da aprendizagem sobre o desenvolvimento, seja
na fala, seja no aprendizado na escola, no convívio social, são organizados através da imitação.

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Fig. 1. Esta imagem mostra exemplo de um ônibus construído com caixas de leite e um jarro de flor de objetos que foram
citados na poesia para associação

Fig. 2. Esta imagem mostra um exemplo desenho construído por um dos estudantes que reproduz um objeto mencionado na
poesia de autoria das pesquisadoras

As pesquisadoras observaram que no primeiro momento houve generalização do tema, apesar do


produto final dessa oficina ter sido representado por desenhos, o conceito “reciclagem” foi a
aprendizagem de uma nova palavra dando início de um grande processo de desenvolvimento.
Embora o significado da palavra sempre seja um ato de generalização, ele se modifica na medida em
que a criança se depara com outras situações de uso da palavra e se desenvolvem seus processos
intelectuais de abstração e generalização (Goes, & Cruz, 2006)

4.2 Categorias

Na segunda oficina, o tema principal foi coleta seletiva. Foi identificado um avanço na construção do
conceito, impetrando a relação das oficinas com realidades, como nos mostra a fala de um
estudante: "Professora minha mãe faz isso, separa a comida das garrafas e papéis." O produto
final dessa oficina resultou na construção de poesias realizadas em duplas. Ao analisar as poesias, as
pesquisadoras identificaram três subcategorias: Reutilização, Cuidado com a natureza e Lixo
Orgânico,
Reutilização: Nesta categoria foi identificado que houve compreensão de que reutilizar pode ser uma
tarefa simples e de fácil acesso em seus cotidianos. Associaram a reutilização principalmente como
uma prática de construir brinquedos, como mostra a poesia abaixo:

“Uma garrafa pet transforma a brincadeira, em jarra, em peteca, em carrinho e também o vai e vem,
brincar ficou fácil se reutilizar.”

Cuidado com a Natureza: Nesta categoria, as pesquisadoras avaliaram que a ideia principal que as
poesias expressaram é o cuidado com a natureza. Destacou-se que reciclagem, reutilização e coleta
seletiva são práticas de cuidado com a natureza para preservar o meio ambiente, que pode matar
animais e poluir rios, mares e oceanos. A compreensão que o ser humano é responsável por cuidar
do meio ambiente e que seus hábitos podem salvar a natureza, a poesia abaixo mostra essas
características:

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“Onde eu moro tem ambiente muito bom, eu cuido do ambiente, não deixo lixo no chão, eu cuido das
plantas, eu faço a garrafa horta e tem o ar bom.”

Lixo Orgânico: Esta categoria foi a prática com a qual os estudantes mais tiveram contato, alguns
relataram que em suas casas os pais separavam o lixo corretamente e o lixo orgânico era utilizado
para adubo. Fica claro que para usar os dois tipos de lixo, seco e orgânico, é preciso separar de forma
correta.
A poesia abaixo mostra que reciclagem, reutilização para esses estudantes está ligada a separação do
lixo.

“Eu aprendi a reciclar o lixo orgânico, a reutilizar com meu amigo Jeferson. Reciclagem do lixo,
separar bem lixo seco do orgânico.”

Nesta categoria, as pesquisadoras identificaram que o conceito generalizado pelos estudantes


referente à reciclagem começou a ter outros significados isolados a partir de diferentes eixos que
foram apresentados dentro desse conceito geral. Para que um conceito seja formado é fundamental
abstrair, isolar, analisar elementos separados de seu todo. Vigotski (1934/1998, p. 95) coloca que
“(...) na verdadeira formação de conceitos, é igualmente importante unir e separar.”

4.3 Expressão
No terceiro encontro, percebeu-se que os estudantes estavam mais confiantes para falar sobre o
tema, a forma em que as pesquisadoras conduziram essa oficina permitiu que os estudantes
tivessem liberdade para se expressarem de acordo com o que eles entendiam. Durante a realização
da oficina, houve ajuda mutua entre os participantes. O produto final desta oficina é uma poesia
construída coletivamente e de forma democrática escolheram o nome da poesia:

EJA 1º ETAPA AJUDANDO A CUIDAR DA NATUREZA

Não jogar lixo no chão


Não jogar pneu, garrafa e lata
Separando o lixo
Na lixeira exata
A caixa de leite virou boneco
Eu já posso brincar
Dinheiro, moedas e cartão
Eu tenho documentos, na carteira reciclada
Eu posso guardar.
Economize água
Feche a torneira, água vem, água lava o rosto,
Mamãe aproveita a água do tanquinho
Limpando, ficando limpinho.
Aproveitando o lixo para reciclar,
Deixando o rio limpo para o peixe nadar
As plantinhas crescendo na beira do rio,
Para sombra virar.
Agora eu já sei reciclar!
Agora eu posso descansar!

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Identificou-se nessa categoria que os estudantes conseguiram expressar suas ideias, para Vigotsky
(1998), a capacidade de comunicação da criança por meio da linguagem esta relacionada
diretamente com a diferenciação dos significados das palavras na fala e na sua consciência. Notou-se
que o pensamento verbalizou-se e a linguagem racionalizou-se, permitindo a expressão adaptada
para uma linguagem poética.

5. Considerações Finais

Geralmente pessoas deficientes intelectuais e com outras síndromes demonstram dificuldades para
novas situações e conhecimentos, em alguns casos a diferença entre as idades mentais e
cronológicas provocam diminuição na capacidade de interagir socialmente, as dificuldades na fala e
compreensão muitas vezes desestimulam a expressão. As atividades socioeducacionais tem grande
importância, pois têm grande influência para o desenvolvimento desses indivíduos, provocando
estímulos fundamentais.
Independente das condições físicas e mentais, deficientes intelectuais e com outras síndromes tem
os mesmos direitos que os outros cidadãos. Garantir a inclusão dessas pessoas na escola e na vida
social ainda não é uma realidade positiva, mas através de outras linguagens podemos contribuir para
que este processo avance.
Apesar de muitas limitações, os estudantes dessa turma foram capazes de generalizar o conceito
proposto, em seguida construir significados isolados dentro desse mesmo conceito e expressarem
suas ideias a partir da linguagem poética, cada um no seu tempo e compreensão.
A arte é parte integrante na formação das pessoas e trabalhar com poesia como ferramenta de
mediação contribuiu fortemente para o desempenho da criatividade, leitura, produção escrita e
conscientização do público a que se destina.
Trazer a arte à escola e à educação, talvez essa seja uma grande chave para criar uma educação com
significado e com vida que possibilite a cada estudante aprender criando e se expressando. As
pesquisadoras concluíram que os estudantes através das suas expressões entenderam que
Reciclagem são ações e práticas possíveis de realização em suas casas, escolas e em qualquer outro
espaço. Reutilizar pode ser uma maneira de brincar, criar e contribuir para preservação da natureza e
do meio ambiente. Separar o lixo devidamente permite que as práticas de reciclagem e reutilização
se realizem com mais facilidade, separando o lixo seco do lixo orgânico e assim, destinando
corretamente cada tipo de lixo. Os estudantes compreenderam que eles também são responsáveis
pelo lixo que eles produzem e pra onde esse lixo vai e assim, também devem estar atentos às
questões ambientais. Para Reigota (1994, p. 32), “levar os indivíduos e os grupos a adquirir o sentido
dos valores sociais, um sentimento profundo de interesse pelo meio ambiente e a vontade de
contribuir para a sua proteção e qualidade”, é uma contribuição da Educação Ambiental. A
linguagem poética permitiu que esses estudantes brincassem com as palavras de forma lúdica
despertando a criatividade e a imaginação, uma linguagem que permitiu a criação e a expressão sem
medo do erro. Possibilitou a interação entre todos e o trabalho coletivo, quando o outro se
disponibilizava para ajudar. As relações construídas entre as diversas mediações possibilitaram que
os estudantes, ainda que em curto espaço de tempo, comprovaram a importância da criação destes
ambientes de troca de conhecimentos nas diversas linguagens como foi a poesia, nas escolas,
capazes de fazer com que pessoas com deficiência intelectual e com outras síndromes construam
não somente avanços cognitivos, mas inclusive de nova consciência sobre sua presença e
participação no mundo.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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Una aproximación autoetnográfica a la construcción de la identidad en


entornos de diversidad cultural

Cristina Zhang-Yu1 y José Luis Lalueza2

1
Departamento de Teoría e Historia de la Educación Universidad de Barcelona, España.
czhangyu@ub.edu
2
Departamento de Psicología Básica, Evolutiva y de la Educación Universidad Autónoma de Barcelona,
España. joseluis.lalueza@uab.cat

Resumen. El presente artículo surge de una propuesta de tesis doctoral que toma como objetivo indagar en
la construcción de la identidad de la propia investigadora en su desarrollo y aprendizaje con marcos
culturales diferenciados entre familia y escuela. En concreto, la elección metodológica nos lleva a plantear
cuestiones epistemológicas y metodológicas de la investigación autoetnográfica en el ámbito de la
Psicología de la Educación. La reflexividad es nuestro eje de reflexión en tanto que permite emerger la
polifonía identitaria de la investigadora. El diseño de la investigación forma parte de la elaboración de una
novela gráfica, género literario que aporta nuevas formas de narrar y construir el yo gracias a la conjugación
de los elementos textuales y gráficos.
Palabras clave: autoetnografía; reflexividad; diversidad cultural; identidad

Autoetnographic approach to the construction of identity in cultural diverse environments


Abstract. The present article arises from a PhD proposal that aims to inquire in the construction of identity
of the researcher herself and her development and learning with different cultural frameworks between
family and school. Specifically, the methodological choice leads us to raise epistemological and
methodological questions about autoethnographic research in Educational Psychology field. Reflexivity is
our point of discussion since it allows to emerge researcher’s own polyphony of identity. The research
design is part of the elaboration process of a graphic novel, a literary genre that allows new ways of
narrating and constructing the self because of its textual and graphic elements.
Keywords: autoetnography; reflexivity; cultural diversity; identity

1 Introducción
La creciente hibridación cultural y el surgimiento de nuevas formas de vivir, aprender y transitar por
nuestros entornos socioculturales a raíz de los fenómenos migratorios nos llevan por interesarnos
en, precisamente, estas nuevas formas de narración identitaria en el desarrollo e interacción con
nuestro(s) mundo(s) social(es). En otras palabras, gracias a los relatos que creamos a partir de
nuestra experiencia social construimos nuestra identidad (Bruner, 2009).
Comprender el acto de narrarnos como aquello que posibilita y media la identidad implica partir de
una perspectiva vygotskiana en la que pensamiento y conciencia humana son mediados por el
lenguaje. Fruto de esta participación social, se da la interiorización del lenguaje social suponiendo,
además, la apropiación de su característica más constitutiva: la dialogicidad (Silvestri y Blanck, 1993).
Desde una perspectiva bakhtiniana, este lenguaje interno posee géneros discursivos que constituyen
formas de enunciados verbales que se expresan en la relación con uno mismo. Y en tanto que los
enunciados discursivos siempre son dirigidos a otros sociales, al convertirse en instrumentos
subjetivos nos encontramos dialogando con nosotros mismos. Por lo tanto, la narración en la
construcción de la identidad se entiende como una forma de contacto social con uno mismo (Silvestri
y Blanck, 1993) y en la que se suceden tramas dialógicas en su definición. Esta aproximación aporta
una visión pragmática dado que permite entender que la narrativa identitaria pasa por una

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construcción dialógica con tensiones y contradicciones polifónicas donde “el sujeto compite, dialoga,
disputa con estas voces y es a través del diálogo, sostenido e inacabado, a veces tenso, como se
generan relatos identitarios” (Esteban-Guitart, Nadal y Vila, 2008, p.135).
En entornos de diversidad cultural, las expresiones en la conformación del yo se ven afectadas por
una relación sistémica entre el reconocimiento (Taylor, 1996) de los otros sociales y la enculturación
de las personas (Lalueza, 2012). Además, nos definimos y construimos en entornos y prácticas
culturales y, por lo tanto, cabe entender que la narración de esta identidad puede variar en nuestros
entornos sociales y grupos sociales (Hedegaard, 2005). En el caso de las narrativas identitarias de
jóvenes de familia inmigrante, es de interés comprender cómo la participación en entornos
socioculturales generan relaciones entre cultura mayoritaria y minoritaria y apropiaciones de las
mismas que dan lugar a diferentes expresiones y definiciones de sí mismos (Ogbu, 1994). Esta
dialéctica entre ambas referencias culturales puede constituir en sí misma una confrontación de
voces familiares y escolares en las que se expresan valores, actitudes y creencias diferenciadas en
tanto que proyectan diferentes alternativas de desarrollo en el sujeto (Lalueza, 2012).
De esta manera, comprender la construcción de la identidad y, en concreto, cómo se da la
multiplicidad de formas para narrarse nos debería ayudar a conocer mejor los procesos de
enculturación que viven, en este caso, las y los jóvenes de familia inmigrante. Un ejemplo de ello nos
lo muestra el estudio de Verkuyten y De Wolf (2002), quienes realizan grupos focales con estudiantes
universitarios de ascendencia China que han crecido y/o nacido en Holanda para comprender cómo
se definen a sí mismos. El interés que suscita este estudio es el foco de análisis, situado en el proceso
narrativo. Bajo la pregunta ¿qué es ser chino en Holanda?, Maykel Verkuyten y Angela De Wolf
identifican tres formas narrativas que usan las y los participantes para expresar cómo o quién son:
una basada en la apariencia física o de diferencia física con la comunidad autóctona (ser), otra a
través de un relato interno y afectivo de vinculación a un grupo cultural u otro (sentirse) y una
tercera vinculada al conjunto de prácticas socioculturales de una cultura u otra (hacer).
En suma, las y los jóvenes de familia inmigrante resuelvan la polifonía de voces adoptando diferentes
actitudes frente a la enculturación (Jensen y Arnett, 2012), donde usar un discurso u otro se usan
indistintamente para argumentarse o justificarse.

2 Narrativas identitarias situadas en la investigación autoetnográfica


La complejidad de la construcción de la identidad en entornos de diversidad cultural nos llevan a
reflexionar sobre qué diseños metodológicos posibilitan una comprensión de las narrativas
identitarias que puedan dar cuenta del contexto en el que se desarrollan, las personas con quienes
interactúa y a quienes van dirigidas las construcciones narrativas. En otras palabras, que permita
indagar en narraciones y reconstrucciones del yo con una aproximación holística de la persona para
comprender las vivencias de desarrollo y aprendizaje (en nuestro caso entre escuela y familia),
considerando los valores y conocimientos predominantes en cada entorno y en cómo la participación
en estos entornos pueden configurar variedad de narrativas identitarias. Como bien enfatiza Bruner
(2009, p.126): “(…) Para tener una noción general de un yo determinado en la práctica, debemos
obtener una muestra de sus actividades prácticas en distintos contextos, contextos que sean
culturalmente especificables”.
Una propuesta interesante y que entra en sintonía con esta mirada es la investigación
autoetnográfica, la cual propone como material de análisis la construcción y reconstrucción de
biografías, autobiografías o historias de vida de la propia persona investigadora y su entorno social.
Las narrativas autobiográficas, en tanto que formadas histórica y culturalmente (González-
Monteagudo y Ochoa-Palomo, 2014), nos permiten llegar a entrever las relaciones y dinámicas entre
sujeto y sociedad en cuestiones como la etnicidad. Más allá de concebirse como una narración lineal
y puramente descriptiva, surge en el desarrollo de la narrativa autobiográfica una constante

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necesidad para justificar aquello que se narra (Bruner, 2009), tanto para sí mismo como para la
persona a quien se dirige. Por lo tanto, constituye en sí mismo un medio o recurso que permite a la
persona relatadora recuperarse en la memoria y en los escenarios sociales; entretejiendo la vida
personal con la de otros, las otras memorias y con la historia (Rosa, Bellelli y Bakhurst, 2008) para
conferir una coherencia y continuidad a la construcción de la identidad. Es por lo tanto una actividad
humana retrospectiva y reflexiva en la que evocamos lo vivido para narrarnos en el presente (Bruner,
2009; González, 2010) y que nos permite comprender cómo se construye el sistema de valores y
creencias de una persona a través de sus propias palabras.
En el estudio de los fenómenos de migración y enculturación, para Rudmin (2010) esta nueva
perspectiva constituye a crear un nuevo corpus de conocimiento que abre nuevos caminos de
indagación. Mediante el uso de las autobiografías, es posible dar voz a las comunidades menos
presentes en el mundo académico y más ignoradas por la cultura hegemónica (González-
Monteagudo y Ochoa-Palomo, 2014), otorgando nuevos espacios de debate a la vez que se visibiliza
al sujeto investigador (Guerrero, 2014; Tilley-Lubbs, 2014).
La autoetnogafía se ubica dentro de la investigación con aproximación cualitativa en tanto que sitúa
el foco de interés en los significados que las personas otorgan a las experiencias y trata de
comprender en profundidad un determinado fenómeno (Willig, 2013). Etimológicamente, el término
autoetnografía contiene las tres características más relevantes de esta metodología. Siguiendo a Ellis
y Bochner (2000), auto se refiere al sí mismo, de manera que visibiliza la figura de la investigadora o
investigador. Etno aporta, como señala Chang (2007), la orientación metodológica en el estudio de
grupos humanos desde una perspectiva fenomenológica. Por último, grafía destaca la dimensión
narrativa del contenido mediante la escritura, donde los datos primarios surgen primordialmente de
los materiales autobiográficos. Es decir, la autoetnografía se compone por una confluencia entre la
investigación etnográfica y la investigación biográfico-narrativa, de manera que comparte también
sus características (Chang, 2007; Ellis, Adams y Brochner, 2011; Montagud, 2015; Tilley-Lubbs, 2014).
El interés y elección metodológico en este caso surgió en un momento vital crítico de la
investigadora, en un diálogo tenso y polifónico de los yoes académico y personal. La formación en el
ámbito de la investigación psicoeducativa y en especial en procesos de enseñanza y aprendizaje en
entornos de diversidad cultural me han llevado a recuperar en la memoria la propia vivencia de la
escolarización y las relaciones entre la cultura familiar y la cultura escolar. En concreto, me llevaron a
la necesidad de comprender mejor los motivos que llevaron a mi familia tomar la decisión de emigrar
de China a España y poder comprender, en conjugación con la literatura académica revisada hasta la
fecha los discursos familiares que han guiado mi aprendizaje y desarrollo a lo largo de estos años.
El propósito en deconstruirme para construirme de nuevo además de contribuir a mi propia
construcción de la identidad, también pretende involucrar a las y los lectores en tanto que permitan,
como señala Montagud (2015), conjugar la narrativa individual con una dimensión más relacional y
contextual más amplia. Es decir, que pueda servir para comprender las experiencias de aprendizaje
de jóvenes con marcos de referencia cultural diversos así como de referencia y de reflexión a otras
personas que han vivido o vivirán situaciones similares.

3 La reflexividad en el proceso investigador


De acuerdo con Guerrero (2014) y Tilley-Lubbs (2014), la premisa epistemológica de la
autoetnografía se sitúa en el construccionismo social, en tanto que la experiencia humana es
mediada histórica, cultural y lingüísticamente (Willig, 2013). En nuestro caso, se busca la calidad y el
matiz de la información en las narrativas identitarias, mediadas y construidas a través del lenguaje.
Montagud (2015) añade dos principios epistemológicos – la subjetividad y la hermenéutica – que
ubicamos dentro de la reflexividad de la investigadora o investigador. Al tratar de estudiar la propia
polifonía identitaria, a lo largo del proceso se suceden procesos reflexivos hermenéuticos con las

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propias identidadas, los entornos sociales y en diálogo con documentos y narrativas tanto propias
como de otros sociales. Las voces investigadoras de otros sociales y la del yo investigador impulsan el
interés en recuperar, reconstruir y reinterpretar las narrativas y diálogos identitarios del self en
relación con la cultura mayoritaria (escuela, comunidad) y con la cultura minoritaria (familiar).
Una de las críticas recibidas por la investigación autoetnográfica se haya en la pérdida de los
objtetivos de investigación en tanto que la narrativa autobiográfica del yo personal predomina por
encima de las voces interpretativas o con finalidad indagadora. Si bien disponemos de recursos
metodológicos como la triangulación con documentos textuales u otras voces investigadoras, la
reflexividad es el recurso de mayor importancia en todo el proceso investigador. El distanciamiento y
acercamiento a la propia vivencia escolar y a los discursos culturales tras cada entorno de
socialización sólo tendría sentido si se disponen de recursos para poder contrastar e interpretar esas
narraciones. Para facilitar la comprensión de lo expuesto, podemos recurrir a un breve ejemplo.
Cuando cursaba cuarto de la ESO nuestro profesor de sociales nos propuso un trabajo de
documentación sobre la época de nuestras abuelas y abuelos y qué situación sociopolítica había en
ese momento. Cuando terminó de explicar, me acerqué a él y le pregunté cómo debía hacer este
trabajo ya que mis abuelas y abuelos estaban en China y tampoco habían vivido aquí. Mi profesor
amablemente me propuso indagar en la historia de mi madre o mi padre, siendo finalmente una
entrevista a mi padre en la que narraría su vivencia de la guerra civil China y su llegada a España. En
ella pude descubrir los motivos sociopolíticos que llevaron a mi abuelo refugiarse en España. A pesar
de que no fue una actividad pensada con esta intencionalidad (y por lo tanto sin un acompañamiento
reflexivo sobre el proceso o resultado), la simple posibilidad de llevarla a cabo ya posibilitó la
vinculación de esa situación educativa con los saberes de mi familia que de otro modo no hubiera
emergido en el diálogo intergeneracional. La generación de mis abuelos vivió la invasión de Japón
durante la segunda guerra mundial y tanto mi madre como mi padre vivieron la posterior Revolución
Cultural liderada por Mao. Estos sucesos sociopolíticos tuvieron un impacto en sus vidas que,
seguramente, repercutiría en la ausencia de historias familiares durante mi infancia y adolescencia,
así como de la perpetuación de la memoria histórico-cultural china. Sus vivencias de pobreza y
autodeterminación hacia el éxito les servían como argumentos para que tanto yo como mi hermano
nos esforzáramos en estudiar y tener un buen futuro, discurso que se repita en esas historias
familiares que también han tenido episodios vitales de gran impacto.
En el anterior párrafo es un fragmento autobiográfico en la que emergen voces personales pasadas,
presentes y voces profesionales que pretenden guiar al lector a comprender la finalidad que tiene
exponer el propio self. La dificultad en poder identificar qué voz es la emergente en un momento u
otro en las anteriores líneas nos obliga a pensar en unos yoes fluctuantes y maleables donde no se
trataría de identificar un yo predominante según lo narrado sino, más complejo, en una
superposición y una hibridación de voces constantes. Llegados aquí, planteamos la posibilidad en
recurrir a las propiedades semióticas que ofrece la novela gráfica como medio a través del cual
mostrar esta polifonía identitaria y la superposición de voces que nos permiten escuchar lo que
vemos (El Refaie, 2012).

4 Conclusiones
La reflexividad de la investigadora forma, en este caso, un todo integral que emerge a lo largo de la
investigación para atender al surgimiento de nuevas ideas, de cambios de rumbo o ante decisiones
analíticas e interpretativas (Hernández, Sancho y Creus, 2011). Es decir, en el ejercicio reflexivo del
quehacer investigador de una investigación autoetnográfica, ocurre una polifonía interna donde la
voz investigadora entra en diálogo con otras voces identitarias de la propia persona. Éste diálogo en
conjugación con el mi (otros sociales) será presente a lo largo de la investigación y nos llevará a la
consecución de los objetivos planteados.

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La posibilidad de acercarnos a la construcción de la identidad generando un conocimiento situado,


construido desde la propia subjetividad de la relatadora y contrastada para dar cuenta de su
ubicación en un momento temporal y social, llevan a considerar la investigación autoetnográfica y el
recurso narrativo de las autobiografías totalmente pertinentes para este ámbito de estudio. Además
el foco de análisis e interpretación es precisamente en la calidez de la narrativa, donde “no importa si
el relato coincide o no con lo que dirían otras personas, testigos de los hechos, ni es nuestra meta
ocuparnos de cuestiones ontológicamente tan oscuras como saber si la descripción es autoengañosa
o verídica. Nuestro interés está en lo que la persona piensa que hizo, por qué piensa que lo hizo, en
qué tipo de situación creía que se encontraba, etc.” (Bruner, 2009, p.127).
Por lo tanto, las narrativas situadas en contexto constituyen un corpus narrativo que pretenden ser
de utilidad para comprender, con una aproximación fenomenológica, las formas de participación de
las y los aprendices que aprenden y crecen en entornos de diversidad cultural. A su vez, que ello
posibilite la discusión y reflexión para la emergencia de prácticas educativas sostenibles ante la
pluralidad creciente en las formas de expresión del yo.

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Uma análise de conteúdo das políticas educacionais do Mercosul para


inclusão digital na Educação Básica

Maurinice Evaristo Wenceslau 1, Débora de Oliveira Santos1


1
Laboratório de Estudos e Pesquisa em Direito Difuso (LEDD/PPG-DH/FADIR/UFMS). Programa de Pós
Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil.
maurinice@uol.com.br; 1Laboratório de Estudos e Pesquisa em Direito Difuso (LEDD/PPG-DH/FADIR/UFMS).
Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. 1oliveiradedebora@gmail.com.

Resumo. A globalização reestruturou as relações de mercado, das fronteiras entre os Estados e os meios de
produção, tornando-os dependentes de fatores tecnológicos. A interação com a tecnologia deu novos
paradigmas nas atividades humanas, tornando-se a inclusão digital fator da própria inclusão social. Este
trabalho, oriundo de pesquisa, objetivou analisar políticas educacionais do Mercosul sobre o uso de
tecnologias na Educação Básica. Para isto, utilizou a abordagem qualitativa para análise de categorias eleitas
presentes nos documentos dos Planos de Ação do Setor Educacional do Mercosul, de 1991 a 2015,
disponíveis online. Os resultados sugerem uma compreensão inicialmente utilitarista, que se ocupou da
produtividade do sujeito e no seu incremento para modernizar o Estado; e é posteriormente suplantada
pela ideia de que a inclusão digital nos sistemas educacionais corresponde ao incremento na qualidade da
Educação, como favorecimento à própria inclusão social.
Palavras-chave: Educação; Cidadania; Inclusão Digital; Mercosul.

A content analysis of Mercosur’s educational policies for digital inclusion in basic education
Abstract. The globalization restructured the relations of the market, the borders between the states and the
means of production, making them dependent on technological factors. The interaction with technology
proposed new paradigms in human activities, making digital inclusion factor of one's social inclusion. This
papper, part of ongoing research aimed at analyzing educational policies on the use of technology in basic
education in Mercosur. For this, we used the qualitative approach for the analysis of elected cathegories
presentes in documents of the Mercosur’s Education Sector Action Plans, from 1991 to 2015. The results
suggest an utilitarian understanding, which held the individual's productivity and its growth to modernize
the State; by the end, supplanted by the idea that digital inclusion in education systems corresponds to the
increase in the quality of education as a tool to their own social inclusion.
Keywords: Education; Citizenship; Digital Inclusion; Mercosul.

1 Considerações Iniciais

Este trabalho, oriundo de pesquisa, teve como questão central, como o Mercosul compreende a
relação entre Inclusão Digital e Educação Básica? Para respondê-la investigamos 06 (seis)
1
documentos , a partir da premissa de mapeamento e análise do enfoque dado à inclusão digital, por
compreendê-la como componente elementar ao processo educacional contemporâneo, reflexo de
necessidades típicas do contexto da Sociedade do Conhecimento.
Para tanto, entendemos que o fomento das políticas educacionais para o uso de tecnologias na
Educação Básica e a inclusão digital faz parte de um novo paradigma da inclusão social.
Compreendemos que o assunto é próprio ao Mercosul, por sua origem ser uma resposta à

1 É importante destacar que o Plano de Ação que vigorou de 1992 a 1997, instruído pela Decisão 07/92, do
GMC/MERCOSUL, não estava disponível na base de dados do órgão, restando a análise ao lapso temporal de: 1991; 1998-
2015.

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globalização, fenômeno cujos reflexos também se apresentam na globalização tecnológica e pela


Revolução da Informação e da Comunicação, na Sociedade do Conhecimento.
A Educação tem função histórico-cultural, no ensinar dos homens pelos homens, transitando em
uma constante transmissão de técnicas, conhecimentos e fatores culturais, de acordo com o espaço
e o tempo de sua manifestação (Monteiro, 2013). Faz parte da natureza do fenômeno educacional a
apropriação em suas práticas, conteúdos e objetivos componentes de um projeto social do Estado,
que, verticalmente, estipula diretrizes e liames para a Educação (Marques & Silva, 2014).
A repercussão desta relação Estado-Educação se manifesta em competências requeridas à formação,
em demandas impressas na escolarização e na agenda escolar, por outras instituições sociais (família,
igreja, mercado, etc). Essa gama de demandas encontra uma variabilidade de acordo com o espaço e
o tempo de manifestação, que, neste trabalho, são: o Mercosul e o período de 1991 a 2015.
Tendo como base o contexto temporal e regional, tivemos como objetivo geral entender como as
políticas educacionais se articularam frente ao processo de aceleração informacional, se relacionam
a inclusão digital à inclusão social. O processo de desenvolvimento de tecnologias da informação está
presente no cerne da Sociedade do Conhecimento, que se caracteriza como um período histórico-
cultural que gerou e ainda gera mudanças paradigmáticas no sujeito, seja em sua força produtiva,
seja na estrutura social da atividade humana (Silva et. al., 2005) e também nas competências
necessárias à qualidade de vida contemporânea.
Logo, a inclusão/exclusão digital supera a discussão do acesso à infraestrutura tecnológica, já que o
conhecimento não se constrói simplesmente pelo acesso ou aprendizagem do código (Silva, et.al.,
2005). O ciberespaço deve ser entendido como espaço social e cultural, sob a ideia de locus de e para
a cidadania, no qual o acesso, domínio, leitura crítica e percepção autônoma devem compor a gama
de habilidades do sujeito e devem ser os princípios de uma Inclusão Digital na Educação para
Informação, como Educação para Cidadania.

2 O Desenho Metodológico

Diante do objetivo geral estipulado, enumeramos os seguintes objetivos específicos: mapear e


levantar as principais fontes documentais de políticas públicas educacionais no Mercosul; enumerar
categorias que se relacionassem tanto com propostas de inclusão digital quanto do uso de
tecnologias dentro do espaço escolar; analisar a presença das categorias enumeradas nas fontes
documentais; descrever a incidência das categorias, analisando principais perspectivas da relação
entre as políticas do Mercosul para Educação Básica e a inclusão digital.
Utilizamos para o alcance dos propósitos desta investigação, técnicas ancoradas na metodologia de
abordagem qualitativa. Flick, Von Kardorff e Steinke (2000) definem esta abordagem pela
apresentação de quatro bases teóricas: a) a realidade social é vista como construção e atribuição
social de significados; b) a ênfase no caráter processual e na reflexão; c) as condições “objetivas” de
vida tornam-se relevantes por meio de significados subjetivos; d) o caráter comunicativo da realidade
social permite que o refazer do processo de construção das realidades sociais torne-se ponto de
partida da pesquisa.
Diante disso, as técnicas, que empregamos, tomaram forma ancorados nas palavras de Mayring
(2002, p.29), isto é, “Os passos da pesquisa precisam ser explicitados, ser documentados e seguir
regras fundamentadas”. Para tanto, iniciamos com o levantamento bibliográfico da temática, a fim
de “promover uma análise rigorosa de seu objeto para [...] dimensionar a sua extensão”, e para
dialogar com as disposições do uso de tecnologias na Educação pelo Mercosul, “descreve os
fenômenos” sugeridos pelos documentos oficiais (Mezzaroba & Monteiro, 2009, pp. 116-117).
Por se tratar de análise de conteúdo documental, os documentos foram tomados na condição de
fontes históricas, isto é, produzidas pelo homem, ou apresentando vestígios de sua interferência, o

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que nos proporciona o acesso à compreensão do passado. Além de procedimentos tradicionais de


leitura e resumo de ideias, foi possível extrair e sumarizar resultados por meio de meta-análise
(Rosenthal, 1984).
Vale ressaltar, que estas fontes estruturaram a pesquisa explicativa, a fim de “registrar e analisar os
fenômenos” dos recortes descritivos em suas “condições de manifestação” (Severino, 2007, p. 123).
Acrescemos, ainda, que a questão do objeto de estudo na pesquisa qualitativa, nos leva de volta às
controvérsias entre o todo e as partes, uma vez que pesquisar não significa apenas, que não possa
ser conveniente, concentrar-se em uma parte do processo. Mesmo tal controvérsia estando
presente, classificamos três variáveis, consideradas relevantes e interferentes, para alimentarmos
nossa questão estratégica. Em princípio, destacamos, que qualquer variável pode explicar uma parte,
mesmo que infinitésima, da variabilidade do fenômeno sob estudo. Neste sentido, tais variáveis
foram analisados a partir dos seguintes critérios: como unidade de registro foram selecionados os
documentos referentes às políticas públicas educacionais do Mercosul, especificamente os Planos de
Ação; a partir destas unidades, foi selecionada a categoria Tecnologia, dividida nas subcategorias
Tecnologia, Ciência, Educação Tecnológica e Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), por
meio das quais eram mapeadas e selecionadas as unidades de contexto que serviriam à análise dos
objetivos da pesquisa.
Neste processo, destacamos a importância das formas de coletar dados e da sua não-
estandardização, uma vez que existem meios de representação de dados e, de transcrição de dados,
propriamente dita, o que dá forma aos sistemas descritivos. Esse destaque denota, que a pesquisa
qualitativa, por ser mais indutiva do que dedutiva, não permite afirmar que a construção de um
sistema descritivo seja totalmente livre de perspectivas, valores e emoções de quem escolheu,
preparou e materializou o sistema de categorização de análise.
Por fim, em cada um dos documentos extraídos da base de dados do Setor Educacional do Mercosul
(SEM), foram destacadas as incidências das categorias de análise, analisamos as condições de
manifestação das unidades de contexto e quais indícios de fenômenos poderiam ser descritos por
meio dos recortes.

3 Aproximação Teórica

A instrumentalização da ciência com a evolução constante e rápida das tecnologias e técnicas foi o
quê garantiu um avanço dinâmico e acelerado processo de globalização. Cenário da Sociedade do
Conhecimento, baseada na informação como pressuposto de existência e de sustentação (Pezzela &
Ghisi, 2013). Estreitam-se as relações entre conhecimento e economia, numa visão utilitarista, em
que o conhecimento é “o atributo de uma forma específica de organização social”, que se dá por
meio de “geração, o processamento e a transmissão da informação” (Castells, 1999, p. 50-51). Esta
conjuntura pressupõe uma naturalização da tecnologia nas práticas sociais, integrando-se à vida
cotidiana pela influência na atividade humana, produtiva e cívica (Pimenta, 2011). Abreu, (2002)
aponta para uma mudança no universo holístico humano, que assume uma constante dinâmica de
relações em rede e com tecnologias.
Isso leva a inclusão digital a ser um componente da própria inclusão social nas sociedades
contemporâneas, já que o quê caracteriza a produção da globalização é o fato de seu impacto se
estender tanto às realidades que inclui como às realidades que exclui (Silveira, 2013). Schwarzel-
Muller (2005, pp. 1-3) considera que:

[...] a inclusão social passa pela questão da informação para a cidadania, que visa
à criação de conteúdos de utilidade pública como seguridade, saúde e educação,
cuja disponibilidade facilitará a interação entre o cidadão e o Estado, com efeitos

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impactantes na qualidade do serviço prestado e consequente melhoria na


qualidade de vida, criando uma necessidade de atendimento e de inserção às
novas tecnologias, seja em “mudanças nas instituições de ensino”, seja na
superação da “fragmentação curricular que tanto limita as relações estabelecidas
dentro e fora do espaço escolar”.

Cria-se um novo locus à sociedade com a tecnologia da informação: o ciberespaço. Apesar de ser um
locus virtual, representa, simbolicamente, condições similares de interações e relações sociais que
um espaço físico-social. Caracteriza-se também como espaço social e público, e se constitui como
uma demanda do novo modelo de organização social do trabalho, sendo seu domínio substancial
para a inserção do sujeito no mercado, o que torna urgente a integração tecnológica.

Se a inclusão digital é uma necessidade inerente deste século, então isso significa
que o “cidadão” do século XXI, entre outras coisas, deve considerar esse novo
fator da cidadania, que é a inclusão digital. E que constitui uma questão ética
oferecer essa oportunidade a todos, ou seja, o indivíduo tem o direito à inclusão
digital, e o incluído tem o dever de reconhecer que esse direito deve ser
estendido a todos. Dessa forma, inclusão digital é um processo que deve levar o
indivíduo à aprendizagem no uso das TIC e ao acesso à informação disponível nas
redes, especialmente aquela que fará diferença para sua vida e para a
comunidade na qual está inserido. (Silva et. al., 2005, p. 32).

Embora a inclusão digital seja uma parcela inexorável do quê engloba a inclusão social no século XXI,
o acesso às tecnologias não é diretamente relacionado a maior inclusão social. Em primeiro lugar, as
condições estruturais tecnológicas não são realizadas de forma equânime e a distribuição do acesso à
tecnologia depende de altos investimentos financeiros; em segundo lugar, a utilização da tecnologia
e do ciberespaço não significa reflexão crítica e autônoma sobre seus conteúdos, práticas e símbolos.
Pimenta (2011, p. 8811) aponta que “a exclusão reduz a capacidade dos indivíduos não só de se
beneficiarem do progresso dos países, mas também de contribuírem produtivamente para sua
construção”. Portanto, ações que visem apenas o acesso não são suficientes nem mesmo ao
atendimento da informação/instrução. O domínio e a capacitação das habilidades são fatores que
precisam ser considerados no processo de inclusão digital para que o uso da informação disponível
promova o desenvolvimento da cidadania. Especialmente em parcelas socialmente marginalizadas,
nas quais a desigualdade econômica-social é reiterada pela exclusão digital. Importa localizar as
condições da inclusão digital no bloco regional:

Tabela 1. Indicadores sobre o uso e acesso à internet e tecnologia nos Países do Mercosul, segundo a UIT/ONU.
Pessoas com
Pessoas Pessoas com Casas com Casas com
Países/Indicad banda-larga
usando a banda-larga fixa computadores acesso à internet
ores móvel a cada
internet (%) a cada 100/hab (%) (%)
100/hab
ARGENTINA 64,7% 14,7 53,6 62,1% 52%
BRASIL 57,6% 11,5 78,1 52% 48%
PARAGUAI 43% 2,5 4,2 32,3% 23,5%
URUGUAI 61,5% 42,6 59,8 67,4% 57,4%
VENEZUELA 57% 7,8 43,9 43,7% 34,2%
Fonte dos dados: Measuring the Information Society 2015: International Telecommunication Union/UN.

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Há ampla desigualdade de acesso entre os Países, principalmente quanto à disposição de recursos


por habitantes e o acesso à internet de País para País. Estudos sobre o caso brasileiro2 sugerem que
a desigualdade na distribuição de renda reverbera na desigualdade de acesso à tecnologia (FGV,
2012).
Neste contexto, a escola passa a responder ao paradoxo da globalização, embora com dificuldades.
Ao mesmo tempo em que surge como elementar a inclusão e uso de TIC no processo educacional,
não há uma superação do modelo escolar inaugurado pelo capitalismo industrial, com ritos “de
saberes oficiais, disponíveis nos livros e manuais didáticos utilizados em aula”, em que os alunos são
subsumidos da “exposição feita pelo mestre” com “exercícios de treino e repetição”, tendo-se “a
educação [...] como produto e não como processo” (Leal da Silva, 2010, p. 2639). Por estas razões,
necessária a rediscussão do papel da escola e da realidade escolar frente a esses novos paradigmas.
O desafio da Educação frente à inclusão digital se dá no sentido de apropriar-se dos recursos e TIC,
para uma formação na assimilação, domínio e uso ético do locus virtual. É preciso considerar que a
escola “recebe um aluno já letrado, mesmo que não seja de acordo com os preceitos tradicionais” e
que este aluno, necessariamente, está “em contato com um espaço sociocultural reconfigurado e
imerso nas Novas Tecnologias da Informação e Comunicação” (Pimenta, 2011, p. 8810).
Considera-se não somente o domínio exclusivo da técnica na reconstrução escolar. É preciso
reestruturar metodologias, práticas e conteúdos que preparem o aluno às habilidades requeridas
pelo seu tempo e possibilitem o contato dos excluídos digitalmente com as TIC, pensando-se “numa
pedagogia das relações humanas no espaço virtual” (Leal da Silva, 2010, pp. 2639-2644).
Takaki (2012) pondera que a Educação tem que se propor à reeducação, no sentido de conduzir a
formação e a informação para um enfrentamento crítico, empoderado, daquilo que é produzido de e
pelas tecnologias, como resposta para formação de “uma sociedade saturada de textos e que não
pode lidar com eles de maneira instantânea, amorfa e alienada” (Pimenta, 2011, p. 8801).

Sem dúvida a Internet, no contexto pós-industrial, e a maneira e concepções pelas


quais esta se coconstrói, possibilita aos hiperleitores outras visões de mundo e,
mais do que isso, possibilita relacionar esse espaço de coconstrução cultural ao
mundo público das instituições, às redes entrelaçadas e dinâmicas de poder, às
constituições identitárias, às experiências e narrativas [...]. o espaço cibernético
foi concebido como um local no qual os usuários podem criar um espaço de
interesses afins [...], ao mesmo tempo em que promovem reflexões de diversas
naturezas [...]. (Takaki, 2012, p. 9).

A Educação para Informação e para Cidadania engloba fatores que promovem práticas colaborativas,
coletivas e multiculturais, tais como: a convergência entre dos interesses entre a equidade social e a
competitividade econômica; a mobilidade e a conectividade entre espaços e tempos; e a própria
utilização dos meios eletrônicos para construção de comunidades de aprendizagem que, em rede,
podem atuar cooperativamente para ampliar a contextualização do conhecimento e o processo
educacional (Pimenta, 2011). O ciberespaço é, afinal, “um importante laboratório social para a
experimentação com as construções e reconstruções que caracterizam a vida pós-moderna” (Turkle
apud Wertheim, 1999, p. 170).
Ao considerarmos o ciberespaço como um espaço social a ser ocupado pelo cidadão, e que o
manuseio de tecnologias e técnicas é habilidade demandada pela Sociedade do Conhecimento e,
também, que a exclusão digital reforça padrões estabelecidos de desigualdade social, justifica-se

2 Fundação Getúlio Vargas (FGV, 2012). Mapa da Inclusão Digital no Brasil.

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discutir as políticas educacionais para o ambiente escolar diante da naturalização do novo locus e das
novas práticas.

4 Das análises ou do sistema descritivo

Os documentos utilizados para o estudo foram os Planos de Ação disponibilizados no endereço


3
eletrônico do Setor Educacional do Mercosul (SEM), no período de 1991 a 2015, do ano de criação
do Mercosul até o ano anterior à realização do levantamento. Os critérios de inclusão/exclusão
elegeram apenas documentos disponíveis para download, sendo que destes foram incluídos apenas
os Planos de Ação por imprimirem ações programáticas às políticas educacionais nacionais, ou seja,
constituíam, a grosso modo, as principais políticas educacionais exequíveis do plano supranacional
para o plano nacional. Excluímos, portanto, demais documentos (decisões, pareceres, acordos, atas
de reunião e editais), bem como os documentos que não estivessem disponíveis para download. Da
análise foi possível apreender, em um primeiro momento, a própria evolução da elaboração e da
execução dos Planos: quando comparados o Plano Trienal (1998-2000) e o Plano de Ação do Setor
Educacional do Mercosul (2011-2015). A importância dada à estruturação estratégica e à descrição
das ações programáticas, não só explicita a maior abertura dada às questões de tecnologias na
Educação no Mercosul, pela maior incidência de recortes conforme as metodologias das políticas
educacionais se aperfeiçoam, como também demonstram uma maior preocupação com o
desenvolvimento e elaboração de políticas públicas na Educação no Mercosul. A valorização da
Educação como instituição social dentro do bloco sugere uma relação de interesse entre o
desenvolvimento econômico, como objetivo principal do Mercosul, e a formação educacional, neste
período histórico; podendo ser lida como uma demonstração da importância do conhecimento nos
novos paradigmas de estandartização econômica.
A fim de demonstrar o quadro observado da temática da inclusão digital nos sistemas educacionais e
no processo de escolarização, descrevemos as amostragens de conteúdo retiradas, de forma
cronológica, dos documentos do Mercosul.
O Protocolo de Intenções (1991), documento que dá origem ao SEM, compreende à Educação a
missão de ser um “meio eficaz de modernização para os Estados-Membros”, reiterando que o papel
da Educação no processo de Integração é de criar conveniências para o “desenvolvimento humano,
cultural, científico e tecnológico”. Como documento fundacional do SEM, propõe marcos como a
“reformulação dos currículos, em todos os níveis, introduzindo temas referentes ao trabalho,
emprego, produção e inovação científico-tecnológica”, e a necessidade do diálogo da Educação com
“as áreas de Cultura, Ciência e Tecnologia” (Mercosul-a, 1991, p. 1-3).
Assume de forma uníssona que “a melhoria dos fatores de produção requer necessariamente a
elevação dos níveis de educação e a formação integral das pessoas.” (Mercosul-a, 1991, p.1). Ou seja,
notamos que embora atrele a Educação com um sentido humano e cultural, liga seu
desenvolvimento ao avanço e sucesso econômico, a uma finalidade utilitarista. A intenção
corresponde à adequação das economias nacionais aos cenários de competição internacional
daquele momento histórico, pautado pelo avanço da globalização econômica e de sedimentação do
capitalismo como modelo de produção.
A tratativa dada pelo Protocolo de Intenções teve prosseguimento no Plano Trienal (1998-2000). O
documento sucedeu o Mercosul 2000, que trata dos objetivos da Educação no Mercosul para o novo
século. O Mercosul 2000 traz inovações quanto a democratização do ensino, a qualidade das escolas
e o respeito à multiculturalidade regional, mas não discute o avanço da Revolução Tecnológica e a
articulação da tecnologia com a Educação, especificamente. O Plano Trienal, sucedaneamente,

3 Recuperado de http://edu.mercosur.int/pt-BR/.

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reitera pontos do Protocolo de Intenções com leitura da Educação como “firme possibilidade que
oferece para a modernização dos Estados-Partes”, mas também abarca a influência democratizante
do Mercosul 2000 ao abraçar políticas de “incorporação de tecnologias avançadas no ensino”, em
especial propondo subsídios na “modernização da docência” (Mercosul-b, 1997, p. 2-5), fator
inovador nas políticas educacionais da época.
Posteriormente, o Plano de Estratégico (2001-2005) apresentou contradições: muito embora não
mencione nenhuma proposição para tecnologias na Educação ou inclusão digital, constatamos
experiências ligadas ao uso de tecnologias, em especial nas ações ligadas à Educação Tecnológica,
que ocorreram durante a sua vigência e foram relatadas pelo Plano de Ação (2006-2010), documento
que o sucedeu. Apontamos que os documentos ainda não dispunham de um padrão, seja na
exposição de conteúdo, no relatório das experiências anteriores ou, ainda, nas ações programáticas
em si. Dentre as políticas educacionais realizadas durante o Plano Estratégico (2001-2005),
destacamos a realização do Congresso de Educação Tecnológica e abertura do diálogo nesta
modalidade.
Já nos dois últimos documentos, o Plano de Ação (2006-2010) e o Plano de Ação do Setor
Educacional do Mercosul (2011-2015), podemos constatar reforma no papel da tecnologia no
processo de escolarização e no sistema educacional. A Educação Tecnológica, que começou a ser
pauta em ações realizadas pelo SEM a partir do Plano Estratégico (2001-2005), iniciou o debate e a
inserção de políticas de fomento às tecnologias.
No Plano de Ação (2006-2011), encontramos como alinhamentos estratégicos a “incorporação à
educação das novas tecnologias com a intenção de melhorar a qualidade e favorecer a inclusão
social”4 e o “intercambio de conhecimentos e transferência de tecnologias”5, tendo como resultado
esperado “materiais e ferramentas para introduzir e facilitar o uso de novas tecnologias na
educação”6 e realização de congressos sobre as temáticas. Reitera ainda a “capacitação de docentes
de educação tecnológica”7 (Mercosul-c, 2005, p. 7-11).
O Plano de Ação do Setor Educacional do Mercosul (2011-2015), por sua vez, reitera os mesmos
alinhamentos estratégicos e os resultados deles esperados do Plano anterior, e acima descritos.
Sugeriu que a concretização de categorias analíticas das políticas públicas educacionais do Mercosul,
e demonstrou maior consistência dos conteúdos programáticos, embora restando sem inovações
quanto à crescente incorporação de tecnologias no cotidiano dos últimos anos.
Este Plano trouxe, ainda, alinhamentos com a Unasul8, relatando ao Conselho a ela vinculado a
complementariedade das ações junto ao documento; inovou em ações programáticas que propõe o
compartilhamento de recursos de TIC nos sistemas educacionais, bem como cursos virtuais sobre TIC
na educação, além de propor para o fortalecimento dos processos de inclusão pedagógica dos TIC na
Educação Obrigatória e na formação docente, socializou experiências “no sentido de garantir o
direito a uma educação de qualidade” (Mercosul-d, 2010, p. 6-8).
O conteúdo estrutural do documento considera sugerir metas, das quais partem ações e estipulam-
se resultados esperados. Destacamos dentro das políticas estratégicas para a Educação no Mercosul
a “Meta C.1” que objetiva o “intercambio de boas práticas sobre o uso das TIC” e o

4 “incorporación a la educación de las nuevas tecnologias com vistas a mejorar la calidad y favorecer la inclusión social.”
(Mercosul-c, 2005, p. 11).
5 “Intercambio de conocimientos y transferência de tecnologias [...].”(Mercosul-c, 2005, p. 11).
6 “Materiales y herramientas para introducir y facilitar el uso de nuevas tecnologias em la educación [...].”(Mercosul-c,
2005, p. 17)
7 “[...] la capacitación de docentes de educación tecnológica [...].”(Mercosul-c, 2005, p. 7)
8 União das Nações Sul-Americanas. É um bloco regional supranacional, composto por 12 Países e criado em 2008.

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compartilhamento de “recursos educacionais digitais”, subsidiando-se a investida com a capacitação


dos documentos em “cursos virtuais sobre o uso das TIC na educação” (Mercosul-d, 2010, p. 38).
Quanto à reestruturação escolar, a “Meta B.5” sugere “processos de inclusão pedagógica às TIC na
educação formal obrigatória, na formação docente” e, também nas “equipes de diretores e
supervisores”. Esta meta objetiva ampliar a qualidade da educação com o uso das TIC, promovendo
uma socialização das experiências e com a produção de estudos qualitativos sobre o uso das TIC
como incremento ao ensino e à aprendizagem. Para tanto, instituiu um “Fórum virtual de atualização
e socialização de experiências com alunos e docentes” como plataforma colaborativa para a inclusão
digital na Educação da região (Mercosul-e, 2010, p. 42).
Os resultados sugerem uma compreensão utilitarista no começo do Mercosul, que, pelas exigências
do mercado ao Estado e ao sujeito, muito se preocupou com a produtividade do sujeito e como
incrementá-la para modernizar o Estado. Isso se dá em razão, principalmente, do próprio mote de
origem do bloco, qual seja: a salvaguarda das economias regionais. O momento de recente transição
democrática, pouca experiência industrial e competitiva das economias locais, combinados ao
avanço veloz da competitividade e do consumo no mercado internacional não abriam, naquele
momento, espaço para a incorporação da Educação como outra coisa que se não o meio para o
avanço e estabelecimento econômico da região.
Em outro momento, a partir do Plano de Ação (2006-2010), observamos não só um incremento
programático significativo nos documentos, mas também a supressão da visão utilitarista no discurso
documental, passando a entender a inclusão digital nos sistemas educacionais como incremento à
qualidade da Educação, como ferramenta de favorecimento à própria inclusão social, principalmente
com a inserção de TIC e recursos digitais nos processos educacionais, possivelmente como uma
democratização do próprio acesso à tecnologia e uma possibilidade de formação e letramento do
sujeito diante das necessidades de seu tempo.

5 Considerações Finais

A Sociedade do Conhecimento imputa uma série de novos paradigmas ao sujeito, oriundos da


presença de novos fatores e meios de produção, muito distintos e avançados tecnologicamente em
relação aos modelos anteriores, e que exigem adaptabilidade do sujeito a sua utilização. O avanço
tecnológico dos meios de produção gerou demandas no mercado de trabalho, refletidas,
consequentemente, nas políticas do sistema educacional.
As mudanças trazidas com a tecnologia não modificaram apenas o sujeito e as necessidades das
instituições sociais sobre este, mas também o seu espaço de atuação. O avanço da tecnologia criou
mais um locus para a existência humana, o ciberespaço, no qual a interação tecnológica ocorreria de
maneira naturalizada para aqueles que cresceram utilizando destes instrumentos e, ao mesmo
tempo, criando imigrantes e outsiders9 entre os que não saberiam operacionalizar as máquinas.
Sendo a Educação uma vazão aos planos sociais do Estado para o seu sujeito, a escola subsumiu na
função adaptar e incluir os sujeitos aos novos paradigmas e às novas demandas inauguradas pela
Sociedade do Conhecimento e pela intensa e contínua globalização. Entretanto, ainda limitado a
práticas e conteúdos do modelo de escola tradicional, o ambiente escolar não conseguiu
corresponder às demandas do contexto espaço-temporal atual. A reestruturação escolar ocorre em
função da difusão das tecnologias e da necessidade de apropriação delas pelo sujeito, que, diante da
imensidão de informações do universo digital, precisa aprender a selecionar e filtrar, assimilando
autônoma e criticamente.

9 O termo “outsiders” vem em referência à obra “Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder a partir
de uma pequena comunidade”, de Norbert Elias e John Scotson, de 2000.

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Neste sentido, a análise dos documentos sugeriu uma evolução na leitura do Mercosul sobre a
inserção de tecnologias na Educação. Se inicialmente, entre 1991 e 2000, a Educação era lida como
meio para modernização dos Estados, instrumento cuja finalidade era de garantir condições para
competição com as economias internacionais; ela passou a ser entendida, de 2001 a 2015, como
oportunidade para que a interação de Educação, Ciência e Tecnologia permita a melhoria da
qualidade escolar.
A mudança da interpretação das TIC na Educação pelo Estado-Região do Mercosul foi percebida por
diretrizes como a capacitação de docentes, a implementação de canais de cooperação, a
coletivização de tecnologias e a promoção de análises e estudos sobre as propostas; demonstrando-
se uma reinterpretação da Educação nos planos sociais do Mercosul, conforme as demandas da
globalização, tecnológica e cultural, iam se aperfeiçoando.
Assim, se torna indissociável tratar a inclusão digital como inclusão social. As relações em rede e a
utilização da internet como um locus do ciberespaço criam necessidades de uma adaptação coerente
da Educação, tanto com o tempo (Sociedade do Conhecimento), bem como com o espaço (virtuais,
reais e de fronteiras cada vez mais indistinguíveis) com os quais atua.

Referências

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Materialismo histórico-dialético: contributos para a investigação


qualitativa em educação

Tiago Nicola Lavoura1

1Departamento de Ciências da Saúde Universidade Estadual de Santa Cruz. tiago.lavoura@ua.pt

Resumo. O presente trabalho pretende apresentar contributos do método denominado de materialismo


histórico-dialético para as investigações qualitativas em educação. Tal método de conhecimento da
realidade concreta foi sistematizado por K. Marx e F. Engels cujas bases e elementos centrais são resultantes
de um longo e rigoroso processo de investigação, método exposto pelos autores no conjunto de suas obras.
Ao tempo em que se espera lançar argumentos que possam servir de fundamentos e parâmetros de
análises para as investigações qualitativas em educação norteadas pela premissa científica da busca pela
inteligibilidade da realidade social, três diferentes aspectos serão abordados: 1) a relação entre a dimensão
ontológica e a dimensão epistemológica da realidade; 2) as diferenças, os nexos e relações entre o
conhecimento teórico e o saber prático do sujeito investigador face ao objeto de investigação e; 3) o
tratamento dado às referidas categorias de análise do objeto investigado.
Palavras-chave: Materialismo histórico-dialético; Método; Conhecimento científico.

Historical-Dialectical Materialism: contributions to qualitative research in education


Abstract. The present work intends to present contributions of the denominated method of historical-
dialectic materialism for the qualitative investigations in education. Such a method of knowledge of the
concrete reality was systematized by K. Marx and F. Engels whose bases and central elements are the result
of a long and rigorous process of investigation, method presented by the authors in the totality of their
works. At the time when it is expected to launch arguments that can serve as foundations and parameters
of analysis for qualitative research in education guided by the scientific premise of the search for the
intelligibility of social reality, three different aspects will be addressed: 1) the relation between the
ontological dimension and the epistemological dimension of reality; 2) the differences, the links and
relations between the theoretical knowledge and the practical knowledge of the investigating subject in
relation to the research object; (3) the treatment given to the said categories of analysis of the object under
investigation.
Keywords: Historical-dialectical materialism; Method; Scientific knowledge.

1 Introdução

O objetivo do presente trabalho é realizar uma reflexão crítica acerca da investigação qualitativa em
educação, notadamente no que se refere à temática dos fundamentos metodológicos da pesquisa
em educação. Para tanto, busca-se apresentar algumas contribuições do método de investigação
denominado de materialismo histórico-dialético, método de conhecimento da realidade concreta
sistematizado por K. Marx e F. Engels cujas bases e elementos centrais são resultantes de um longo e
rigoroso processo de investigação, encontrando-se sintetizados no famoso texto de Marx, (2011)
intitulado A introdução de 1857 – O método da economia política.
Ao tempo em que os fundamentos do método estão sendo apresentados, intenta-se relacioná-los
com três questões centrais que entende-se fulcrais para toda e qualquer investigação científica, com
destaque aqui para as pesquisas em ciências humanas e sociais e, notadamente, na educação: 1) a
relação entre a dimensão ontológica e a dimensão epistemológica da realidade; 2) as diferenças, os
nexos e relações entre o conhecimento teórico e o saber prático do sujeito investigador face ao

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

objeto de investigação e; 3) o tratamento dado às referidas categorias de análise do objeto


investigado.
Com isso, espera-se lançar argumentos que possam servir de fundamentos e parâmetros de análises
para as investigações qualitativas em educação norteadas pela premissa científica da busca pela
inteligibilidade da realidade social.

2 O método em questão

As investigações científicas as quais possuem como estofo metodológico de análise o materialismo


histórico-dialético possuem como premissa central a necessidade de se buscar compreender e
explicar os objetos e fenômenos investigados tais quais eles verdadeiramente são na realidade
concreta. Diante disso, há um pressuposto de análise em questão que não se pode deixar de
explicitar: a dimensão epistemológica do conhecimento científico que permite à humanidade
sistematizar um conjunto de postulados acerca de como é possível conhecer a realidade natural e
social está subsumida à dimensão ontológica dessa mesma realidade, aquela que permite explicitar o
que essa realidade verdadeiramente é na sua existência efetiva, constituindo-se histórica e
socialmente por meio da própria atividade prática realizada pelo conjunto dos homens (Netto, 2011).
Tal premissa carrega consigo duas importantes características, tal qual assinalado por autores como
Marx & Engels, (2007), Lukács, (1967), e Pinto, (1979): a primeira, a de que os objetos e fenômenos
da realidade possuem uma existência objetiva, ou seja, a consideração e o reconhecimento da
objetividade da realidade. Independentemente do conhecimento e da consciência humana sobre tal,
o conjunto dos elementos constitutivos da realidade existem, são reais e possuem uma estrutura e
dinâmica interna de funcionamento efetivo a qual pode ser apreendida pela consciência humana por
meio, notadamente, da atividade de investigação científica. Decorre daí a necessidade da ciência na
prática humana.
Disso se desdobra a segunda característica do método em questão diante do postulado da dimensão
ontológica como efetivamente anterior à dimensão epistemológica: a de que os objetos e fenômenos
da realidade concreta podem ser apreendidos gnosiologicamente pelos homens, ou seja, é possível
compreender e explicar o que as coisas verdadeiramente são em sua existência efetiva.
Dentre as diferentes formas ou modalidades de conhecimento do real produzidas historicamente
pela humanidade, estamos aqui a discutir o conhecimento científico, uma modalidade muito peculiar
de conhecimento e explicação da vida humana. À luz do materialismo histórico-dialético, o
conhecimento científico se constitui na prática social humana à medida em que a própria vida social
vai se desenvolvendo e se complexificando, e os homens vão adquirindo condições determinadas
social e culturalmente de refletir e teorizar (com métodos cada vez mais desenvolvidos) sobre essa
mesma prática social e seus objetos e fenômenos constitutivos.
Tal condição assinala outro postulado que aqui há de ser considerado e que pode ter toda a
relevância para as investigações qualitativas em educação: a atividade científica é uma atividade
essencialmente teórica, ou seja, é a reprodução ideal (da ordem do pensamento) dos objetos e
fenômenos da realidade em seu movimento real (Marx & Engels, 2007).
Reproduzir no plano do pensamento o movimento real do objeto ou fenômeno é o que se entende
por teoria, sinônimo de conhecimento científico para o método em questão. O conhecimento teórico
é o conhecimento do objeto, o conhecimento do seu movimento real reproduzido em pensamento
(Netto, 2011), reafirmando-se o postulado da concepção ontológica de teoria. Reprodução aqui
assume o significado de reconstrução no plano do pensamento daquilo que se passa anteriormente
na realidade efetiva.

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Não obstante, tal reprodução do objeto em pensamento não deve ser compreendida como um
espelhamento, como uma imagem fotográfica, mas sim como processualidade histórica e dinâmica,
características cuja realidade necessariamente é portadora. Portanto, a investigação sobre o social
deve levar em conta o constante movimento dos objetos e fenômenos em seu devir, o que significa
levar em consideração a herança hegeliana de que ser é vir-a-ser.
A apreensão teórica pelo investigador do movimento real, prático e efetivo do objeto ou fenômeno
investigado, por sua vez, não pode ser realizada de forma imediata. O processo de conhecimento
para o materialismo histórico-dialético não se dá por intermédio do imediatismo do pensamento. O
conhecimento do real não pode se limitar àquilo que é imediatamente dado, pensado ou sentido. Se
o pensamento se limita a isto, ele se põe no nível da obviedade, se restringe a captar o evidente. E há
que se considerar a efetiva distinção entre a aparência e a essência dos processos do real, tal qual
assinalou Marx, (2008) ao afirmar que se a aparência das coisas se confundisse com sua essência,
toda ciência seria supérflua. Dessa maneira é que se pressupõe um caminho de investigação de
superação do nível empírico ao nível concreto do real, superação essa que só é possível – para tal
método de pesquisa – por meio da análise e da abstração do pensamento do investigador.
A aparência fenomênica, imediata e empírica da realidade é importante e não pode ser descartada,
visto que ela é o ponto de partida do processo do conhecimento – portanto, necessariamente onde
se inicia o conhecimento. Não obstante, deve-se, partindo desta aparência, alcançar a essência do
objeto de estudo, capturar sua lógica interna de funcionamento que corresponde à estrutura e
dinâmica essencial. Com efeito, Marx, (2011) não deixa dúvidas quanto à capacidade intelectiva da
abstração como aquela necessária para se realizar o procedimento analítico de ultrapassagem da
aparência imediata da realidade. É ela – a abstração – que permite extrair um elemento da realidade,
isolá-lo e examiná-lo nas suas particularidades, extraindo deste elemento suas múltiplas
determinações por meio da saturação da análise.
A abstração é um recurso decisivo do pensamento o qual possibilita alcançar aquilo que Marx, (2011)
denominou de as determinações mais simples do objeto, determinações estas altamente complexas
as quais se caracterizam pelos traços constitutivos pertinentes ao objeto. As determinações do
objeto carregam os traços essenciais da dinâmica e da estrutura do funcionamento do objeto
investigado, permitindo explicitar a lógica de sua existência efetiva. Com efeito, elas podem ser
alcançadas por meio de um recurso analítico-formal.
Não obstante, embora a lógica formal tenha uma função específica e importante no processo de
conhecimento da realidade, na medida em que busca identificar, caracterizar e classificar os
elementos por si mesmos e em suas especificidades, se mostra insuficiente para apreender a
realidade em sua dinamicidade, processualidade e em movimento (Oliveira, 2005).
Em que pese a lógica formal seja necessária para identificar cada elemento da realidade em suas
características específicas e classificá-los conforme parâmetros e princípios inerentes do processo de
conhecimento, ela não possibilita captar as relações e as mediações destes múltiplos elementos do
real. Seu critério lógico de identificação, organização, catalogação e classificação de cada complexo
constitutivo da realidade é uma organização meramente lógico-formal dos elementos do real,
elementos estes considerados estáticos, sem movimento. É por isso que Marx, (2011) irá afirmar que
o verdadeiro caminho do conhecimento científico é o que se dá por meio da ascensão do abstrato ao
concreto.
Ascender do abstrato ao concreto significa para o materialismo histórico-dialético captar o conjunto
dos nexos e relações dos diferentes elementos que constituem a totalidade de um objeto ou
fenômeno, vale dizer, apreender as relações entre as diferentes determinações mais simples as quais
se constituem como unidade mínima de análise e que possibilitam explicar a coisa investigada na sua
totalidade, num movimento lógico dialético que vai do todo às partes e das partes ao todo
constantemente.

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Apreender as relações dinâmicas e processuais do conjunto das determinações de um objeto ou


fenômeno e sintetizá-las teoricamente é o significado do conhecimento científico para este método
de conhecimento da realidade. Tal como afirmou Marx, (2011), o verdadeiro conhecimento é a
síntese de múltiplas determinações e relações numerosas, ou seja, uma rica totalidade de
determinações em suas relações constitutivas, de modo que se considera como importante tarefa
das ciências estudar e explicar de um modo historicamente concreto um objeto ou fenômeno
singular, analisado em suas condições estruturais mais gerais e universais (o que requer uma análise
lógico-sincrônica) e as suas transformações históricas particulares, desde sua gênese até seu
desenvolvimento efetivo (o que requer uma análise histórico-diacrônica do objeto). Essa é a síntese
do método lógico-histórico em discussão.
Por fim, falta se reportar ao terceiro e último postulado metodológico aqui discutido, qual seja, o
tratamento dado às referidas categorias de análise do objeto investigado. Como afirmado
anteriormente, para o materialismo histórico-dialético há que se ter uma separação clara do que é
da ordem da realidade, portanto, aquilo que de fato é propriedade do objeto ou fenômeno
investigado, daquilo que é da ordem do pensamento, ou seja, aquilo que se constitui como o
conhecimento operado pelo sujeito investigador. Como bem destaca Marx, (2011), o grande
equívoco de Hegel e de toda a filosofia idealista foi o de confundir o que é da ordem do pensamento
com aquilo que é da ordem do real, sucumbindo ao erro de que o pensamento é, em última
instância, criador da própria realidade.
Há que se ter sempre em vistas que em todos os processos investigativos da realidade social as
categorias de análises expressam formas de ser do objeto ou fenômeno investigado sendo, portanto,
formas de existência, ontológicas e históricas, do objeto em questão. Para o método de investigação
em questão, analisar e investigar um objeto ou fenômeno é ir à busca dos traços essenciais que o
mesmo é portador, operando o sujeito investigador com graus cada vez maiores de abstração que
permitam chegar a unidades de análise cada vez mais tênues e simples, encontrando no objeto
investigado aquilo que no conjunto o determinam, as determinações do objeto. O objeto investigado
é portador dessas determinações, mas, o pensamento é que as reproduz idealmente. Quanto mais se
satura um objeto de determinações, mais ele se concretiza. Concreção que é da ordem da realidade,
e não do pensamento.
Ocorre que as categorias de análise que expressam as determinações do objeto não estão reveladas
na imediatez factual do mesmo. É preciso arrancá-las, extraí-las do objeto, pois são constitutivas
dele. E somente podem ser alcançadas e reproduzidas em pensamento por meio do processo de
abstração analítica do investigador, alcançando as categorias e os conceitos. Como se vê, a
investigação científica é um verdadeiro processo de enriquecimento do pensamento do sujeito
investigador, que se confronta com o objeto investigado em um processo de sucessivas
aproximações, visto que as determinações não estão isoladas entre si. Elas estão articuladas dentro
da totalidade do objeto, num verdadeiro sistema de mediações. Conhecer o objeto é alcançar suas
múltiplas determinações e relações numerosas.

3 Conclusões

Ao apresentar estes três postulados metodológicos do materialismo histórico-dialético, espera-se


contribuir para as atuais investigações qualitativas em educação, visto estas terem tido nas últimas
décadas um importante avanço no campo das ciências humanas e sociais. Tem existido um conjunto
enorme de produção científica na área que tem procurado debater – com muita qualidade e
competência – procedimentos e técnicas de investigação nas pesquisas qualitativas.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Não obstante, há que se ter a preocupação de que as técnicas e os procedimentos de análise nas
pesquisas compõe um –não menos importante – passo ou momento da investigação científica, sendo
que essa necessariamente pressupõe um método que é expressão da relação sujeito-objeto que
permite ao sujeito investigador desnudar as formas fenomênicas de um objeto investigado,
apreendendo o seu movimento, encontrando as determinações constitutivas da dinâmica, da
estrutura, da gênese e do desenvolvimento desse objeto.
Para o materialismo histórico-dialético, o processo referente à indagação de como é possível
conhecer um objeto (dimensão epistemológica) está internamente contida num processo de maior
expressão e objetividade, qual seja, a indagação do que as coisas, os objetos e fenômenos da
realidade verdadeiramente são (dimensão ontológica).
Como exposto anteriormente, esse caminho metodológico investigativo possui como ponto de
partida o dado imediato do objeto investigado, aquilo que é a aparência, um sinalizador, um
indicador de processos que não se mostram em sua plenitude. A factualidade imediata do objeto é a
expressão coagulada de processos sem nexos.
Cabe ao sujeito investigador, utilizando-se da abstração, mediante a capacidade da análise, ir além
da factualidade do dado imediato para alcançar a identificação dos processos que ela – factualidade
– é aparência. Ir além da factualidade é deslocar-se da empiria à concretude real do objeto ou
fenômeno, descobrindo seus traços essenciais que se revelam por meio das categorias analíticas que
são expressão das determinações do objeto. Sem a capacidade de abstrair-se do fato dado é
impossível o conhecimento teórico. Como afirma Netto, (2011), os fatos nada dizem, são inaudíveis
na sua forma imediata. O conhecimento teórico dissolve a imediatez factual aparentemente à mostra
no processo de investigação, de modo que o objeto investigado não é um dado, mas sim, expressão
de um processo.
Em termos de fundamentos e pressupostos metodológicos, acredita-se que tais elementos aqui
apresentados constituem-se em grande desafio às investigações qualitativas em educação.

Referências

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Formação de professores para o uso das tecnologias: um mapeamento


sistemático no contexto nacional e internacional

Dagmar Heil Pocrifka Bley1 , Ana Beatriz Gomes Pimenta de Carvalho1


1
Programa de Educação Matemática e Tecnológica (EDUNATEC) da Universidade Federal de
Pernambuco, Brasil. dagheil@gmail.com; anabeatrizgpc@gmail.com

Resumo. Após pelo menos uma década de políticas públicas de implantação de tecnologias nas escolas
públicas do Brasil, sentiu-se a necessidade de avaliar se o investimento aplicado refletiu na qualidade da
educação. Nesse contexto, o professor tornou-se o centro desse processo, cabendo-lhe a responsabilidade
de adotar uma inovação e integrá-la ao currículo escolar. O objetivo deste estudo foi o de realizar um
mapeamento sistemático para investigar a formação de professores como um dos fatores de influência na
adoção da tecnologia, bem como a viabilidade de aliar a Teoria da Difusão da Inovação (TDI) com a
educação. Os resultados sinalizaram que uma formação de curto prazo, ou que promove a
instrumentalização dos aparatos tecnológicos retardam ou até inibem a adoção da inovação por parte do
professor. No cenário internacional, a TDI é utilizada para fundamentar e analisar as pesquisas na área da
educação.
Palavras-chave: Mapeamento sistemático; pesquisa qualitativa; formação continuada de professores;
tecnologias digitais, Teoria da Difusão da Inovação.

Teacher training for the use of technologies: a systematic mapping in the national and international
context
Abstract. After at least a decade of public policies for the implantation of technologies in public schools in
Brazil, it was felt the need to evaluate whether the investment applied reflected the quality of education. In
this context, the teacher has become the center of this process, being responsible for adopting an
innovation and integrating it into the school curriculum. The aim of this study was to carry out a systematic
mapping to investigate the formation of teachers as one of the factors influencing the adoption of
technology, as well as the feasibility of joining the Theory of Innovation Diffusion (TDI) with education. The
results indicate that short-term training or that which promotes the instrumentalization of technological
devices slows or even inhibits the teacher's adoption of innovation. In the international scenario, TDI is used
to substantiate and analyze research in the area of education.
Keywords: Systematic mapping; qualitative research; Continuing teacher education; Digital technologies,
Theory of the Diffusion of Innovation.

1 Introdução

As pesquisas sobre o uso de tecnologias digitais na Educação são necessárias não apenas para
responder aos seus propósitos e questionamentos acadêmicos, mas também para subsidiar o
desenvolvimento de políticas públicas eficazes na inserção de tecnologias digitais nas escolas. O
campo de pesquisa do uso das tecnologias digitais nas escolas costuma ser amplo, tanto quanto ao
número de sujeitos, escolas e práticas, como no número de variáveis: inúmeros projetos, práticas,
perfil de professores e alunos, propostas pedagógicas, entre outros. Para abarcar tantos elementos
distintos, o desenvolvimento de pesquisas qualitativas sobre o tema precisa avançar, envolvendo as
tecnologias digitais como objeto de estudo e incorporando as tecnologias no próprio
desenvolvimento da pesquisa. São necessários softwares de análise de dados, instrumentos de
coletas que usam plataformas digitais, estratégias eficazes de mapeamento das pesquisas realizadas

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

na área, equipamentos de comunicação, gravação e registro, entre outros elementos que otimizem o
processo de pesquisa.
Neste artigo são apresentados os resultados de um mapeamento sistemático, que busca encontrar,
nas pesquisas científicas de âmbito nacional e internacional, respostas sobre a efetividade das
formações de professores em relação à adoção da tecnologia e à presença da Teoria da Difusão da
Educação como lente de análise para a pesquisa na área educacional. Os resultados apresentados
são parte de uma pesquisa de doutorado em andamento com o objetivo de compreender a relação
entre os programas de formação continuada para o uso das tecnologias digitais em sala de aula, bem
como o efetivo avanço dos professores neste contexto. A presença da tecnologia em todos os
segmentos da sociedade faz com que a escola seja inserida no contexto tecnológico. Mais uma vez, o
foco é o professor, sendo lhe atribuindo o papel de articular o currículo com as mais diversas
ferramentas tecnológicas.
Ao menos uma década já se transcorreu desde que as primeiras políticas públicas de inserção da
tecnologia na escola foram implantadas. Como foi o avanço a preparação dos professores para este
contexto? Que frutos as formações estão produzindo na prática pedagógica?

2 Fundamentos Teóricos

A formação de professores o uso das Tecnologias Informação e da Comunicação (TIC) passou por
diversas ações e modelos em busca da inclusão, letramento e alfabetização digital dos docentes
brasileiros. Como exemplo de algumas dessas formações, verifica-se o Proinfo Integrado que,
implantado em 1997, adquiriu, distribuiu e instalou computadores nas escolas públicas municipais e
estaduais, além de capacitar professores, técnicos gestores e agentes educacionais no uso das
tecnologias, promovendo o uso pedagógico dessa ferramenta (Takahashi, 2000). O Programa Um
computador por Aluno (PROUCA) propõe a inserção da tecnologia móvel nas escolas públicas federal,
estadual e municipal aliado a uma proposta de formação de professores, de multiplicadores e de
gestores das unidades beneficiadas, cuja formação qualificava o professor “para o uso do laptop
educacional, em práticas que privilegiem a aprendizagem baseada na construção cooperativa do
conhecimento, em consonância com as especificidades das propostas curriculares de suas escolas”.
(Andrade, 2009, p. 5).
Para que o professor iniciasse a sua caminhada para adoção de uma tecnologia, Warschauer (2006)
apontou três componentes: equipamento (um computador), conectividade (acesso a rede de dados)
e letramento (formação).
A discussão em torno da adoção de uma tecnologia não compreende, além da aquisição da
ferramenta/equipamento tecnológico, a sua utilização para a construção do conhecimento.
Partindo do ponto do letramento apresentado por Warschauer (2009), Kenski (2009) foi além desse
letramento, quando acrescentou que a assimilação do conhecimento oriundo das TICs e a
possibilidade de inserir-se na prática pedagógica, com novas metodologias, esse novo contexto social
e educacional exigia que os docentes adquirissem nova lógica. Isto é, uma nova percepção de
mundo, de cultura e sensibilidade, considerando-se que:

As mídias há muito tempo abandonaram suas características de mero


suporte tecnológico e criaram suas próprias lógicas, suas linguagens e
maneiras particulares de comunicar-se com as capacidades perceptivas,
emocionais, cognitivas, intuitivas e comunicativas das pessoas (Kenski,
2009, p. 23).

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Cabe, portanto, aplicar nas formações dos professores estratégias que desenvolvam a habilidade e a
lógica de utilizar as tecnologias digitais na produção do conhecimento. Com isso, o professor
posiciona-se como um parceiro, caminhando e orientando o aluno para as tantas possibilidades e
formas de adquirir conhecimento e de como estabelecer relações com esse conhecimento (Kenski
2009).
Como teoria de apoio ao estudo deste estudo, apresenta-se a Teoria da Difusão da Inovação (TDI),
desenvolvida pelo sociólogo Everett Rogers (1931-2004), que investigou o fenômeno da difusão de
inovação, analisando como ocorre a adoção e a sua rejeição. Observou-se que a teoria constitui um
aporte para a compreensão da dinâmica que a inovação apresenta a partir do momento da sua
origem, passando pelos vários graus de ajustes, até a sua adoção. Essa teoria, a princípio, enfocou o
estudo da inovação tecnológica em que se incluía a área de marketing.
Com a presença da tecnologia abrangendo, cada vez mais, todas as áreas da sociedade, a educação
foi igualmente beneficiada com a chegada dos aparatos tecnológicos, em que os estudantes
representavam a parcela mais aberta à adoção das tecnologias.
Rogers (2003) articulou a TDI em torno de quatro elementos: Inovação (agregada à expressão
“novidade”), Comunicação (processo de convergência [ou divergência] entre dois ou mais
indivíduos), Tempo (organização temporal vivenciada pelo sujeito até que adote uma inovação) e o
Sistema Social (unidades inter-relacionadas envolvidas na resolução conjunta de problemas para
alcançar um propósito comum).
Rogers (2003) apresentou um modelo que classificava os sujeitos em cinco categorias de adotantes:
Inovadores, Adotantes Iniciais, Maioria Inicial, Maioria Tardia e Retardatários.
1. Inovadores (Apaixonados): uma pequena parcela, primeira a utilizar a inovação, capaz de
trabalhar com as incertezas da inovação, assumindo riscos assumindo riscos como qualidade ou
eficácia duvidosa. Esse grupo é considerado influenciador de opinião, sendo uma referência para
os demais grupos (exemplificando, quando uma inovação chega à escola os inovadores são os
primeiros a testar).
2. Adotantes Iniciais (Idealistas): Esse grupo tem os inovadores como referência e possuem traços de
inovação, mas não estão dispostos a correr os riscos que a inovação pode conter nas etapas
iniciais de desenvolvimento. Também representa uma parcela pequena de sujeitos.
3. Maioria Inicial (Práticos): Nesse segmento verifica-se que uma determinada inovação entrou na
fase da difusão e consegue ser disseminado pelo restante da sociedade. A adoção é incorporada,
após o convencimento de que a inovação possui uma trajetória de sucesso.
4. Maioria Tardia (Tradicional): Esse grupo é composto por sujeitos que não reconhecem as
vantagens na inovação, principalmente em relação ao investimento. Resistem à adoção até o
momento em que as vantagens sejam compatíveis com o investimento.
5. Retardatários (Incrédulo): Apresentam insegurança em relação à adoção de inovação, não
possuem tendências a seguir modismos e não exploram novidades. São metódicos e adotam uma
inovação quando não há outra escolha.

3 Metodologia

A metodologia aplicada para este estudo foi o mapeamento sistemático. O mapeamento sistemático
é uma maneira de identificar, avaliar e interpretar todas as pesquisas disponíveis e relevantes para
uma questão de pesquisa (Kitchenham, 2004).
Este método apresenta especificações precisas, explícitas para que se localizem, em bibliografias,
análises e relatórios, cujo rigor científico e metodológico é aplicado a partir de um protocolo que
define as etapas e processos pelo qual a análise deve percorrer, com a finalidade de eliminar as

270
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interpretações e interferências pessoais do pesquisador, e que permita a reaplicação desse processo


a qualquer momento (Faria, 2016).
Um dos principais motivos para se aplicar um mapeamento sistemático é a viabilidade de extrair-se
as evidências que se encontra em relação a um tratamento ou a uma tecnologia (Kitchenham, 2004).
Kitchenham (2004) e Kitchenham (2007) elencaram fatores que conduzem à proposta do
mapeamento sistemático:
▪ Sintetizar provas ou evidências.
▪ Identificar lacunas nas pesquisas, possibilitando propor novas verificações, auxiliando na
delineação de novas pesquisas primárias.
▪ Apresentar uma estrutura para fornecer uma posição mais adequada para novas atividades de
pesquisa.
▪ Analisar até que ponto os indícios empíricos refutam ou acatam as hipóteses de uma teoria ou
apoiam a criação de novas hipóteses.

3.1 Protocolo de pesquisa

Para a realização do mapeamento sistemático, utilizou-se de etapas que conduzem a análise da


pesquisa.

3.1.1 Questão de pesquisa

Alicerçada no questionamento central da tese “Como as ações de formação continuada de uma Rede
Municipal de Ensino podem influir na adoção das tecnologias pelos professores”, este estudo propôs
as seguintes questões de pesquisa:
Q1. As pesquisas indicam a formação como um dos fatores que influencia a não adoção da
tecnologia?
Q2. É possível aliar Teoria da Difusão da Inovação com a educação?

3.1.2 Seleção das fontes

Neste mapeamento sistemático aplicou-se um piloto de busca com o intuído de calibrar o


entendimento do processo de busca, identificar os seus diferentes motores em cada uma das bases
de dados, assim como os diferentes modos de adicionar-se as strings.
As bases de dados mais adequadas para a realização do mapeamento sistemático foram:
▪ Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), por ser uma base de dados aberta,
com as pesquisas de mestrado e de doutorado realizados em território nacional, tendo o
português como língua oficial.
▪ Education Resources Information Center (ERIC), por ser uma base de dados com foco em
pesquisas e informações educacionais, e que inclui dissertações e teses de âmbito internacional,
tendo o inglês como língua oficial.

3.1.3 Seleção dos estudos

O período de pesquisa nas bases de dados ocorreu entre os dias 29.01.2017 à 03.02.2017 para a Q1 e
dos dias 09.02.2017 à 14.02.2017 para a Q2.

271
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Palavras-chaves: Formação de Professores e Tecnologia Digital para responder à primeira pergunta e


a Teoria da Difusão da Inovação e Educação para responder à segunda pergunta.
A seguinte estratégia foi adotada para rastreamento dos estudos no preenchimento dos campos na
BDTD:
▪ Acesso por meio da “Busca avançada”.
▪ Definido “assunto” sem restrição.
▪ Correspondência de busca: “Todos os termos”.
▪ Idioma (página retornada) “Português”.
As strings criadas foram “formação de professores” AND tecnologias digitais e “Teoria da Difusão da
Inovação” AND “Educação” para a base BDTD e “teacher training” AND “digital Technologies” e
“Teory of diffusion of innovation” AND “educational” para a base ERIC.
Na base ERIC, após as buscas, utilizou-se dois filtros: pesquisas com data de publicação a partir 2008
(Q1) e 2013 (Q), tendo como justificativa a data das pesquisas da base BDTD, o descritor Educational
Technology e no tipo de publicação a opção teses e dissertações.
Foram identificados 16 títulos BDTD e 128 no ERIC na Q1 e 1 BDTD e 17 no ERIC para a Q2.

3.1.4 Critérios de Inclusão e de Exclusão

Para a Q1 e palavras chaves formação de professores e tecnologia digital foram aplicados os critérios1
apresentados no Quadro 1 e 2.
Quadro 1. Critérios de inclusão da Q1.

CÓDIGO CRITÉRIO DE INCLUSÃO

INCL.1 Estudo sobre formação de professores para as tecnologias na educação.

INCL.2 Estudo com o foco no professor.

INCL.3 Estudo com o foco na formação continuada.

INCL.4 O estudo ser uma tese ou dissertação

Quadro 2. Critérios e exclusão da Q1.

CÓDIGO CRITÉRIO DE EXCLUSÃO

EXC.1 Estudo em área específica.

EXC.2 Estudo fora da área de educação.

EXC.3 Estudo fora do ensino fundamental.

EXC.4 Estudo com foco no aluno.

EXC.5 Estudo com foco na formação inicial.

EXC.6 Fora da formação do professor.

EXC.7 Não ser tese ou dissertação.

1
Na BDTD não foi necessário atribuir o critério de tese ou dissertação. Mantendo este padrão, do BDTD utilizou-se para a
base ERIC.

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Para a Q2 e palavras chaves Teoria da Difusão e Inovação e educação foram aplicados os critérios2
apresentados nos Quadros 3 e 4.
Quadro 3. Critérios de inclusão da Q2.

CÓDIGO CRITÉRIO DE INCLUSÃO


INCL.1 Ser sobre o Ensino Fundamental ou Médio.
INCL.2 Ser sobre o Ensino Superior, mas voltada a educação.

Quadro 4. Critérios e exclusão da Q2.

CÓDIGO CRITÉRIO DE EXCLUSÃO


EXC.1 Fora do Ensino Fundamental ou Médio.
EXC.2 Ensino a distância.
EXC.3 Não aplica a TDI de Rogers (2003).
EXC.4 Não relacionado ao ensino.

3.1.5 Resultados das buscas

Após a apresentação da listagem apresentada pelas buscas inicias, cada resultado foi submetido à
catalogação contendo uma identificação (ID) para posterior consulta, ano da publicação, título da
publicação e os critérios aplicados (inclusão ou exclusão).
Após a aplicação de todos os critérios, foram analisadas 12 publicações para a Q1 e 7 publicações
para a Q2.

4. Apresentação dos dados e análise dos resultados

Os resultados do mapeamento sistemático realizado, bem como os dados coletados durante o


processo de análise das pesquisas selecionadas responderam às questões 1 e 2.
Este estudo buscou identificar, nas pesquisas realizadas, o contexto em que foi elaborada, quais os
seus objetivos, qual a metodologia utilizada para analisar os dados, e quais os resultados obtidos.
Para análise, deste estudo, utilizou-se o software Atlas Ti em que todas as pesquisas pertinentes a
cada questão foram inseridos categorizados.
A primeira análise realizada foi a de identificar os elementos coocorrentes em que mais de um código
(unidade de registro) são atrelados a uma unidade básica de análise (unidade de contexto) (Bardin,
2010).
Observou-se nas pesquisas analisadas neste mapeamento sistemático, para responder a Q1 que, em
alguns casos, quando se descreve o contexto (nível de dados), são apresentados os objetivos e a
metodologia utilizada na pesquisa.
Também são coocorrentes a metodologia-objetivo-resultado e conclusão, isto é, quando a
metodologia é descrita, são identificados os objetivos assim como os resultados. Estas coocorrências
são visualizadas e identificadas no software (Figura 1).

2 Não foi aplicado nenhum critério de exclusão, pois o único resultado apresentado contemplava as duas
palavras chaves.

273
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Fig. 1. Coocorrências referentes à análise dos estudos da Q1.

Na análise dos estudos para responder a Q2, identificou-se a coocorrência em uma pesquisa entre
contexto-objetivos e método-resultado (Figura 2).

Fig. 2. Coocorrências referentes à análise dos estudos da Q2.

Julgou-se relevante, para esta análise, os códigos contexto, objetivos, metodologia (para a Q2) e
resultados.

4.1 Contexto

Os contextos das pesquisas para a Q1 revelaram que ambientes educacionais possuem uma gama de
investimento em aparatos tecnológicos, mas que esta existência não gera resultados efetivos no
ensino, pois o professor não está devidamente capacitado. Há ênfase na instrução, no uso
administrativo e no âmbito pessoal. Contudo, não na formação para a integração curricular.
Na análise dos contextos da Q2, observou-se que a presença da tecnologia em todos os campos da
sociedade faz com que o professor componha, também, o cenário educacional. Há a concordância de
que, quando inovadora e bem integrada, traz benefícios ao ensino. Porém, o oposto gera
desconforto tanto para o professor quanto para o estudante. A implantação de ambientes virtuais de
aprendizagem que, cada vez, vem ganhando espaço na educação, exige do professor habilidades e
competências diferenciadas das da prática de sala de aula presencial.

4.2 Objetivos

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Os objetivos das pesquisas analisadas para a Q1 procuravam conhecer qual o impacto que as
formações para a integração das tecnologias exerciam sobre os professores, quais eram as
necessidades e as dificuldades dos professores em relação à adoção das tecnologias, como
integravam a tecnologia em sua prática educativa, o que influenciava na adoção de uma tecnologia,
como ocorria a apropriação, bem como comparar os graus de inovação entre os professores.
Os objetivos das pesquisas analisadas para a Q2 focavam a identificação de como uma inovação era
difundida na escola, a identificação dos fatores que conduziam à adoção da tecnologia por parte dos
professores, bem como motivar os professores para que adotassem uma inovação.

4.3 Metodologia

A análise da metodologia ocorreu nas pesquisas concernentes à Q2 (Figura 1)3, devido à


especificidade da pergunta em relação à Teoria da Difusão da Inovação (TDI) de Evertt Rogers. Todas
as pesquisas selecionadas para este mapeamento sistemático utilizaram tanto no seu referencial
teórico como na metodologia.

Fig.3. Análise da metodologia dos estudos para a Q2

4.4 Resultados

Os resultados de Q1 sinalizaram que os professores reconheciam que a formação representava um


dos caminhos para se adotar uma inovação. Ao mesmo tempo defendiam tanto uma formação com
carga horária ampliada, como o seu aprofundamento, permitindo o autoensino e a colaboração. O

3 As análises referentes ao contexto, objetivo e resultados geraram redes e, por motivo de espaço, foram suprimidas do
artigo.

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suporte, a relevância curricular, o ambiente favorável e os incentivos mostraram-se fundamentais


para o acesso do professor à inovação, sendo que a formação de cunho instrumental e
descontextualizado da tecnologia foi alvo de críticas dos professores.
Os resultados Q2 basearam-se na classificação das categorias de adoção estabelecidas por Rogers
(2003). Esta classificação orientou o planejamento de formações dos professores para que a adoção
de uma inovação fosse eficaz, e cuja ausência, não desenvolveria habilidades, sendo, portanto,
mínimas as chances de um professor adotar uma inovação de forma a refletir na sua prática
pedagógica.

5 Considerações Finais

O foco deste estudo de mapeamento sistemático foi o de apresentar um panorama do que tem sido
investigado no contexto da formação continuada, na tecnologia educacional, na Teoria da Difusão da
Inovação aplicada à educação, tanto no contexto nacional como internacional. Para cumprir esse
propósito, seguiu-se o protocolo do mapeamento sistemático, sendo apresentadas duas questões de
pesquisa a serem respondidas pelo mapeamento. Q1: As pesquisas indicam a formação com um dos
fatores que influencia a adoção ou a não adoção da tecnologia? Q2: É possível aliar a Teoria da
Difusão da Inovação com a educação?
Em relação à Q1 (As pesquisas indicam a formação com um dos fatores que influencia a não adoção
da tecnologia?) as pesquisas apontaram que sim, que a formação é um dos fatores que influencia a
adoção de uma inovação por parte do professor. Comprova-se este fato devido aos apontamentos
provenientes da análise dos resultados dos estudos tanto nacional como internacional em que os
próprios professores reconhecem que não são adotantes e que o processo de adoção ocorrerá a
partir de formações de qualidade e que permitam a colaboração entre pares, bem como que sejam
capazes de integrar as tecnologias na sua prática pedagógica e ao currículo, proporcionando um salto
qualitativo na aprendizagem dos estudantes. É necessário ampliar as discussões e proporcionar
planos de formação, que atendam às necessidades dos professores, desenvolvendo em si habilidades
e competências essenciais para que a adoção de inovação seja satisfatória.
Para a Q2 (É possível aliar Teoria da Difusão da Inovação com a educação?) os estudos apontaram, de
forma positiva, a contribuição da TDI para as pesquisas educacionais. A TDI originou da investigação
do contexto de marketing, em que o foco baseava-se na aceitação ou não de produtos. Quando
Rogers classificou e caracterizou perfis de sujeitos e a relação que estabelecem com as inovações,
abre-se um leque de possibilidade de aliar a sua teoria com outras áreas do conhecimento.
Esta conclusão foi obtida com a análise do contexto e da metodologia das pesquisas selecionadas
para a análise. A TDI esteve presente em contextos de educação presencial e a distância, em escolas
urbanas e rurais, além de permear o ensino fundamental e médio. Todos os trabalhos selecionados
(100%) possuíam a TDI em seu referencial teórico e na metodologia.
Percebeu-se que a aplicação da TDI na educação possuía uma empregabilidade maior no contexto
internacional. No cenário brasileiro, a TDI aliada à educação ainda é um campo a ser explorado e
investigado.
Portanto, é necessário ampliar as investigações referentes ao papel da formação continuada de
professores, bem como a influência que pode exercer perante a adoção de uma inovação tecnológica
por parte dos docentes no contexto brasileiro.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Referências

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das Ações / Cursos. Brasil: Ministério da Educação Secretaria de Educação a Distância.
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http://www.consultaesic.cgu.gov.br/busca/dados/Lists/Pedido/Attachments/457157/RESPOST
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Bardin, L. (2010). Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70.

Faria, P. M. (2016) Revisão Sistemática da Literatura: Contributo para um Novo Paradigma


Investigativo. Metodologia e Procedimentos na área das Ciências da educação. Aplicação
prática aos temas desenvolvimento profissional docente e inovação educativa com tecnologias
digitais. Portugal: WhiteBooks. Recuperado de http://whitebooks.pt/web/wp-
content/uploads/2016/02/NOVO-PARADIGMA-INVESTIGATIVO_M_INDICE.pdf

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http://www.ebook777.com/diffusion-innovations-5th-edition/

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Warschauer, M. (2006). Tecnologia e inclusão social: a exclusão digital em debate. São Paulo: SENAC.

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Acercamiento a la definición de una universidad de calidad: responde el


alumnado
Ignacio González López1, Carlota de León Huertas1, María Dolores Eslava Suanes1
1
Departamento de Educación Universidad de Córdoba, España. ignacio.gonzalez@uco.es;
carlota.leon.huertas@uco.es; mdolores.eslava@uco.es

Resumen. Al amparo de una investigación cuya pretensión ha sido diseñar un modelo de indicadores de
evaluación institucional universitaria, en estos párrafos se busca la aproximación al concepto de universidad
de calidad desde la percepción manifestada por el alumnado, principal destinatario de las acciones
desarrolladas en el seno de esta institución. La misma ha sido emitida por un total de 293 estudiantes de la
Universidad de Córdoba a partir de una pregunta abierta dentro de un cuestionario diseñado al efecto. El
análisis de contenido de las distintas respuestas obtenidas ha dado lugar a un conjunto de 99 categorías de
análisis clasificados en 10 dimensiones que, conjuntamente con la información aportada por el resto de
elementos del instrumento de valoración, dotan de sentido al término calidad y aportan evidencias para la
mejora continua de la labor desarrollada en la universidad.
Palabras clave: evaluación educativa; indicadores; universidad de calidad; alumnado.

Approach to the definition of a University's quality: speaking students


Abstract. Under the aegis of an investigation whose aim has been to design a model for university institutional
evaluation indicators, these paragraphs seeks to approach to the concept of quality university from the
perception expressed by students, principal recipient of the actions developed within this institution. The
same has been issued by a total of 293 students at the University of Cordoba from an open question in a
questionnaire designed for this purpose. The content analysis of the different answers obtained has given rise
to a set of 99 categories of analysis classified in 10 dimensions that, jointly with the information provided by
the rest of elements of the instrument of valuation, provide with sense to the term quality and provide
evidence for the continuous improvement of the work carried out in the university.
Keywords: educational evaluation; indicators; university of quality; students.

1 Introducción

Los elementos que configuran la realidad de la formación universitaria contemplan dimensiones muy
dispares entre sí y, a la vez, contradictorias. Nos encontramos en un mundo globalizado que se
caracteriza por un incesante devenir de cambios económicos, culturales y sociales, donde el empleo
de las nuevas tecnologías de la información y la comunicación es indispensable para alcanzar el éxito
profesional, donde las actitudes y los valores son imprescindibles para lograr el desarrollo personal y
donde los sistemas de relaciones son inherentes a la integración social de las personas. Ante estos
planteamientos, la universidad manifiesta la necesidad de adaptación de estas nuevas demandas
(Vázquez, 2015), de manera que se aporte al alumnado una formación de calidad, pero la dificultad
comienza cuando tratamos de identificar este concepto.
Este término es una de las palabras más utilizadas hoy en día y evidencia una elevada carga polisémica
que ha de ser analizada desde una perspectiva multidimensional, más aún cuando se trata de integrar
dicho concepto dentro del ámbito educativo y, en definitiva, cuando se trata de evaluar. Se ha
convertido en uno de los símbolos más propagados en este siglo XXI, en un núcleo de expectativas,
aspiraciones y posibilidades que, como señalan Escudero (1999) o Díaz (2013), afectan a la mejora
social y humana, en un derecho de la ciudadanía. Es, como comenta Ferrández (2000, p. 14), un eslogan

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

político que, insertado en un discurso, consigue un propósito de esperanza placentera, pero quien lo
usa ignora todo el marco de plasmación práctica. Olivo y González(2015) destaca que es un tema de
moda, una realidad omnipresente que incluso pretende sustituir a otros temas dentro de la reflexión
educativa sufriendo, de este modo, un desgaste significativo
Llevar a cabo un análisis de su significado supone una tarea ardua y compleja debido a la multitud de
interpretaciones que se le otorgan desde diversas facetas de la realidad social, económica y cultural.
Como adjetivo admite significados como importancia, aptitud, mejora, perfeccionamiento,
satisfacción, excelencia, eficacia, superioridad (Rodríguez Diéguez, 1988, p. 221) pero, como señala
Quintanilla (1998, p. 89), se trata de un concepto del que todo el mundo entiende aunque nadie sabe
definirlo, más cuando el contexto de aplicación es la educación superior.
La búsqueda de esta excelencia (grado máximo de la calidad según De la Orden, 1997) es un argumento
utópico ya que no es un período, sino un proceso continuo de mejora donde no hay un último escalón
de la calidad sino que todo se puede optimizar. Los problemas comienzan cuando se intenta precisar
qué es la calidad de la educación superior.
La institución universitaria actual es una organización eminentemente compleja. Su naturaleza y
composición refleja la variedad de miembros que conviven en ella y las metas que persigue y, aunque
es un sistema jerárquico con una organización administrativa determinada, no actúa con la autoridad
y los procedimientos de una empresa comercial, sino que, aceptando que recibe ayudas por parte de
diferentes estamentos económicos y sociales, tiene características propias resultantes de la
comunidad de personas y actividades sobre las que opera.
La Universidad, desde el punto de vista de los alumnos, es un lugar donde se adquiere una preparación
profesional, donde se fortalecen sus aptitudes intelectuales, afectivas y sociales, y donde se producen
diferentes relaciones de convivencia (Méndez, 2008).
Los profesores, tal y como refleja Zabalza (2009), ven en ella no sólo el medio donde se desenvuelve
su trabajo profesional, sino una particular sociedad intelectual donde cohabitan docencia e
investigación, regida por valores como el respeto y la libertad, con sus propias fortalezas y debilidades.
Igualmente, la sociedad y el Estado la consideran como un gran instrumento de servicio, enriquecedor
de la calidad ciudadana, suministrador de las aptitudes profesionales y sociales que el país requiere y
punto de partida del progreso científico y cultural (Garbanzo, 2007).

2 Metodología

El principal afectado por las políticas de calidad en la universidad es el alumnado, principal beneficiario
de sus planes de formación. Por esta razón le hemos dado la voz al preguntarle su opinión abierta
sobre lo que entiende, con sus propias palabras, por una universidad de calidad. Dentro de una
investigación más ambiciosa cuya pretensión ha sido diseñar un modelo de indicadores de evaluación
institucional universitaria, en estos párrafos se busca la aproximación al concepto de universidad de
calidad desde la percepción manifestada por los y las estudiantes.
En este estudio han participado un total de 584 estudiantes de la Universidad de Córdoba
pertenecientes al curso académico 2014/2015, seleccionados de manera aleatoria estratificada en
atención a la rama de conocimiento a la que pertenecen sus estudios (artes y humanidades, ciencias,
ciencias de la salud, ciencias sociales y jurídicas e ingeniería y arquitectura), siendo significativa a partir
del valor poblacional (N=15745) al asumir un error muestral del 4% y un nivel de confianza del 95%
(K=1,96).
El instrumento base de este trabajo fue un cuestionario diseñado ad hoc configurado por un protocolo
de 109 ítems de valoración escalar que trataban de revelar la significación que diferentes dimensiones
de análisis (calidad institucional, plan de estudios, profesorado, resultados de aprendizaje, orientación

279
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

hacia la enseñanza y satisfacción personal) que afectan a la configuración de una institución


universitaria de calidad, así como por diferentes preguntas cerradas que buscaban la identificación del
grupo informante. En este instrumento se han incorporado, además, diversas preguntas abiertas que
han permitido que el alumnado expresase su opinión libremente sobre los temas demandados, lo que
nos ha permitido obtener una información más amplia y exacta para el estudio. La cuestión objeto de
valoración en estos párrafos, de carácter libre, ha sido: en tu opinión, ¿qué es una universidad de
calidad? Esta pregunta ha sido respondida por un total de 293 estudiantes (50,2% del total de la
muestra).
Para analizar las respuestas obtenidas hemos aplicado la técnica del análisis del contenido debido a su
capacidad para la descripción objetiva, sistemática y cualitativa de los archivos de documento textual,
donde se reducen grandes datos textuales a categorías que pueden representar numérica o
gráficamente (Krippendorff, 1990). Así, los textos resultantes de las respuestas a la pregunta fueron
sometidos a análisis adaptando los procesos descritos por Rodríguez, Gil y García (1996) en tres tareas
concretas: reducción de datos, disposición y transformación de los datos y obtención de resultados y
verificación de conclusiones.

3 Resultados obtenidos

Según Flick (2004), uno de los rasgos esenciales en el análisis de contenido es el uso de las categorías
derivadas a menudo, de modelos teóricos, así como del propio material empírico recogido. Este
proceso de categorización es la decisión más inmediata en el proceso general de reducción de datos.
Siguiendo a Rodríguez, Gil y García (1996) y Taylor y Bogdan (1987), se puede establecer una secuencia
de cuatro pasos: a) pre-análisis de la información recogida, organizando las respuestas y eliminando
los datos que no son relevantes; b) separación de unidades de contenido; c) identificación y
clasificación de las unidades; y d) síntesis y agrupamiento, lo que implica la ubicación de diferentes
unidades de datos bajo un mismo tópico o concepto. En el caso que nos ocupa, la tabla 1 muestra un
total de 99 categorías de análisis clasificadas en 10 dimensiones de análisis, las cuáles han derivado del
marco teórico de referencia así como por el contenido específico revelado por cada una de ellas.

Tabla 1. Categorías del análisis de contenido

Dimensión Categoría
1. Carácter de la 1.1. Gratuita
universidad 1.2. Pública
1.3. Igualitaria
1.4. Atiende a las necesidades individuales
1.5. Satisface las necesidades académicas
1.6. Tiene en cuenta las opiniones del alumnado
1.7. Tiene en cuenta la necesidades de la sociedad
1.8. Muestra interés porque el alumnado aprenda
1.9. Se adapta a los cambios
1.10. Variedad de titulaciones
1.11. Buen clima de trabajo
1.12. Bien organizada
1.13. Eficaz
1.14. Accesible
1.15. Exigente
1.16. Alienta un marco internacional
1.17. Apoya el alumnado
1.18. Muestra liderazgo

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1.19. Forma desde la libertad


1.20. Innovadora
1.21. Independiente
1.22. Eficiente
2. Servicios 2.1. Servicios administrativos
universitarios 2.2. Actividades deportivas
2.3. Servicios de apoyo curricular
2.4. Servicios de orientación profesional
2.5. Servicio de lenguas extranjeras
2.6. Satisfacción de las necesidades personales, académicas y laborales
3. Recursos 3.1. Buenas infraestructuras
materiales 3.2. Adaptados a las diferentes actividades docentes
3.3. Fomentan el desarrollo integral del alumnado
3.4. Materiales tecnológicos desarrollados
3.5. Suficientes
3.6. Recursos informáticos
3.7. Grandes laboratorios
3.8. Adecuados a la titulación
3.9. Adecuados al número de estudiantes
4. Planes de 4.1. Bien planificados
estudios 4.2. Fomento de valores adecuados
4.3. Alto nivel de titulación (docencia, investigación e inserción laboral)
4.4. Coordinación y planificación de las asignaturas
4.5. Contenido adaptado a las competencias profesionales
4.6. Adapta a la realidad actual del mercado laboral
5. Profesorado 5.1. Cualificado
5.2. Altos conocimientos de su área de estudio.
5.3. Atiende a las necesidades del alumnado
5.4. Disponible ante las dudas el alumnado
5.5. Buena relación con el alumnado
5.6. Fomenta la participación dentro del aula
5.7. Capacidad para elegir contenido adecuado
5.8. Motivador
5.9. Comprometido
5.10. Explica con claridad los contenidos
5.11. Cumple con la programación de las asignaturas
6. Alumnado 6.1. Participativo
6.2. Asiste a clase
6.3. Espíritu crítico
6.4. Interesado
6.5. Activo
6.6. Capaz de adaptarse a cualquier situación
6.7. Preparado para su futuro profesional
6.8. Ilusionado por aprender
6.9. Ilusionado por formarse
7. Contenidos de 7.1. Útiles
las materias 7.2. Actualizados
7.3. Claros
7.4. Fomentan conocimientos básicos
7.5. Fomentan conocimientos específicos
7.6. Adecuados a los objetivos del plan de estudio
7.7. Contenidos virtuales
7.8. Fomentan formación integral
7.9. Fomentan formación orientada a conseguir un empleo
7.10. Fomentan formación coherente con la profesión
7.11. Fomentan formación aplicable con la profesión

281
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7.12. Fomentan formación académica más completa


7.13. Adecuados a la demanda social
8. Metodología 8.1. Útil
de enseñanza 8.2. Clases prácticas
8.3. Clases teóricas
8.4. Conocimientos permanentes
8.5. Fomenta la participación
8.6. Fomenta la motivación
8.7. Nuevos modelos de enseñanza
9. Evaluación 9.1. Evaluación continua
9.2. Valoración adecuada del trabajo realizado
9.3. Variedad de modelos de evaluación
9.4. Adaptado a las actividades realizadas
9.5. Refleja el aprovechamiento del alumnado
10. 10.1. Conocimientos básicos de la profesión
Competencias 10.2. Capacidad para trabajar en contextos diversos
profesionales a 10.3. Desempeño adecuado del trabajo
adquirir por el 10.4. Desarrollo integral (personal , social , emocional, laboral)
alumnado 10.5. Capacidad de trabajo autónomo
10.6. Formación continua
10.7. Capacidad de comunicación en otra lengua
10.8. Capacidad de resolución de problemas
10.9. Valores éticos y responsabilidades
10.10. Capacidad de emprendimiento
10.11. Capacidad de interacción con otros equipos profesionales

Esta primera fase de análisis ya constituye en sí misma una aproximación significativa a la pretensión
del estudio, la concepción del alumnado del significado de una universidad de calidad. Son diez las
dimensiones que configuran este concepto y que avanzan que una institución será de calidad en
función de su carácter, los servicios que presta a la comunidad educativa, los recursos de los que
dispone para la ejecución de las diversas tareas de las que es responsable, los planes de estudios de
las diferentes titulaciones que la configuran, las competencias del profesorado, la actitud del
alumnado, los contenidos que se desarrollan en las diferentes materias y disciplinas, las metodologías
de enseñanza, las herramientas de evaluación del rendimiento académico del alumnado y las
competencias profesionales para las que la institución forma a sus estudiantes.
La segunda fase, disposición y transformación de los datos, representa el recuento de las categorías ya
clasificadas en la fase anterior, a partir del que se establecerán las relaciones existentes entre ellas, su
presencia o ausencia, su frecuencia y orden de aparición, la intensidad de las expresiones o su
dirección. Este paso es imprescindible ya que permite presentar los datos de manera abarcable y
operativa de cara a resolver las cuestiones de investigación. Son dos actividades que facilitan el
examen y la comprensión de los datos, permitiendo extraer conclusiones. La disposición supone
organizar los datos, presentándolos en alguna forma espacial ordenada, de tal modo que se simplifique
la información y se posibilite su procesamiento posterior. La presentación de los datos en forma
numérica puede también darse una vez que se ha llevado a cabo un cierto procesamiento estadístico
de la información, recurriendo en estos casos a tablas que recogen distribuciones de frecuencias,
proporciones, porcentajes, etc. Su finalidad no es almacenar datos, sino comunicarlos de algún modo
ordenado que permita extraer conclusiones. Las transformaciones más frecuentes son las que
permiten pasar de una expresión verbal de los datos a una expresión numérica o gráfica, continuando
el análisis a partir del recuento y no de la forma verbal original en la que aparecían los datos. La tabla
2 muestra los resultados obtenidos en atención a estas premisas, discriminando la aparición de las
diferentes categorías de análisis en función de cada dimensión constitutiva del análisis, el total de
categorías extraídas y la rama de conocimiento de los estudios del alumnado (ver tabla 2).

282
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Tabla 2. Frecuencia de aparición de las categorías de análisis por dimensión de análisis, total de categorías y rama de
conocimiento

Rama de conocimiento

Ciencias Sociales
Humanidades

Ciencias de la

Arquitectura
Ingeniería y
y Jurídicas
% %

Ciencias
Arte y
Dimensiones y categorías f

Salud
dimensión total

1. Carácter de la universidad
1.1. Gratuita 4 3,2 0,7 - 2 1 1 -
1.2. Pública 7 5,6 1,3 2 3 - 2 -
1.3. Igualitaria 3 2,4 0,5 - 1 1 - 1
1.4. Atiende a las necesidades individuales 27 21,4 4,9 2 3 5 1 2
1.5. Satisface las necesidades académicas 10 7,9 1,8 2 - 3 3 2
1.6. Tiene en cuenta las opiniones del alumnado 9 7,1 1,6 1 - 1 6 1
1.7. Tiene en cuenta la necesidades de la sociedad 6 4,8 1,1 - 1 1 2 2
1.8. Muestra interés porque el alumnado aprenda 16 12,7 2,9 - 3 2 8 3
1.9. Se adapta a los cambios 4 3,2 0,7 - 1 - 1 2
1.10. Variedad de titulaciones 5 4,0 0,9 - 1 - 2 2
1.11. Buen clima de trabajo 2 1,6 0,4 - 2 - - 2
1.12. Bien organizada 2 1,6 0,4 - - 1 -
1.13. Eficaz 1 0,8 0,2 - 1 - 3 3
1.14. Accesible 7 5,6 1,3 - - 1 - 1
1.15. Exigente 2 1,6 0,4 - 2 - 1 3
1.16. Alienta un marco internacional 6 4,8 1,1 1 - - 2 -
1.17. Apoya el alumnado 3 2,4 0,5 - - - 1 1
1.18. Muestra liderazgo 2 1,6 0,4 - - - 1 1
1.19. Forma desde la libertad 1 0,8 0,2 - - - 1 -
1.20. Innovadora 6 4,8 1,1 - 1 1 1 3
1.21. Independiente 1 0,8 0,2 - 1 - - -
1.22. Eficiente 2 1,6 0,4 1 - 1 - -
Total 126 100 22,8 9 22 17 37 29
2. Servicios universitarios
2.1. Servicios administrativos 1 6,3 0,2 - - - 1 -
2.2. Actividades deportivas 1 6,3 0,2 - - - 1 -
2.3. Servicios de apoyo curricular 1 6,3 0,2 - - - 1 -
2.4. Servicios de orientación profesional 2 12,5 0,4 - - - 1 1
2.5. Servicio de lenguas extranjeras 1 6,3 0,2 - - - 1 -
2.6. Satisfacción de las necesidades personales,
10 62,5 1,8 - 1 3 4 2
académicas y laborales
Total 16 100 2,9 - 1 3 9 3
3. Recursos materiales
3.1. Buenas infraestructuras 25 44,6 4,5 2 5 8 4 6
3.2. Adaptados a las diferentes actividades docentes 12 21,4 2,2 1 - 4 6 1
3.3. Fomentan el desarrollo integral del alumnado 3 5,4 0,5 1 - - 2 -
3.4. Materiales tecnológicos desarrollados 3 5,4 0,5 - 1 - 2 -
3.5. Suficientes 5 8,9 0,9 - 2 1 - 2
3.6. Recursos informáticos 2 3,6 0,4 - 2 - - -
3.7. Grandes laboratorios 2 3,6 0,4 - 2 - - -
3.8. Adecuados a la titulación 3 5,4 0,5 - - 1 1 1
3.9. Adecuados al número de estudiantes 1 1,8 0,2 - - 1 - -
Total 56 100 10,1 4 12 15 15 10
4. Planes de estudios
4.1. Bien planificados 8 28,6 1,4 1 2 3 1 1
4.2. Fomento de valores adecuados 4 14,3 0,7 - 1 - 2 1

283
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4.3. Alto nivel de titulación (docencia, investigación e


1 3,6 0,2 - - - 1 -
inserción laboral)
4.4. Coordinación y planificación de las asignaturas 4 14,3 0,7 - - 1 3 -
4.5. Contenido adaptado a las competencias
6 21,4 1,1 2 - 2 1 1
profesionales
4.6. Adapta a la realidad actual del mercado laboral 5 17,9 0,9 1 - 2 1 1
Total 28 100 5,1 4 3 8 9 4
5. Profesorado
5.1. Cualificado 44 56,4 8,0 7 10 5 14 8
5.2. Altos conocimientos de su área de estudio 5 6,4 0,9 - - 1 2 2
5.3. Atiende a las necesidades del alumnado 4 5,1 0,7 - - - 4 -
5.4. Disponible ante las dudas el alumnado 4 5,1 0,7 - 1 - 2 1
5.5. Buena relación con el alumnado 4 5,1 0,7 - - - 4 -
5.6. Fomenta la participación dentro del aula 2 2,6 0,4 2 - - - -
5.7. Capacidad para elegir contenido adecuado 3 3,8 0,5 1 - - 2 -
5.8. Motivador 7 9,0 1,3 - 3 - 2 2
5.9. Comprometido 2 2,6 0,4 1 - - 1 -
5.10. Explica con claridad los contenidos 2 2,6 0,4 - - - 1 1
5.11. Cumple con la programación de las asignaturas 1 1,3 0,2 - 1 - - -
Total 78 100 14,1 11 15 6 32 14
6. Alumnado
6.1. Participativo 1 5,3 0,2 - 1 - - -
6.2. Asiste a clase 2 10,5 0,4 - - - 1 1
6.3. Espíritu crítico 1 5,3 0,2 - - - 1 -
6.4. Interesado 1 5,3 0,2 1 - - -
6.5. Activo 1 5,3 0,2 - - - 1 -
6.6. Capaz de adaptarse a cualquier situación 2 10,5 0,4 - - - 2 -
6.7. Preparado para su futuro profesional 8 42,1 1,4 1 5 - 1 1
6.8. Ilusionado por aprender 2 10,5 0,4 - - - 2 -
6.9. Ilusionado por formarse 1 5,3 0,2 - - - 1 -
Total 19 100 3,4 2 6 - 9 2
7. Contenidos de las materias
7.1. Útiles 7 5,9 1,3 - - 3 3 1
7.2. Actualizados 17 14,3 3,1 - 2 4 7 4
7.3. Claros 3 2,5 0,5 - 1 1 1
7.4. Fomentan conocimientos básicos 8 6,7 1,4 1 1 1 4 1
7.5. Fomentan conocimientos específicos 7 5,9 1,3 1 - 1 4 1
7.6. Adecuados a los objetivos del plan de estudio 4 3,4 0,7 - 1 - 1 2
7.7. Contenidos virtuales 1 0,8 0,2 - - - 1
7.8. Fomentan formación integral 15 12,6 2,7 1 - 1 9 4
7.9. Fomentan formación orientada a conseguir un
9 7,6 1,6 1 1 - 2 5
empleo
7.10. Fomentan formación coherente con la
17 14,3 3,1 - - 1 8 8
profesión
7.11. Fomentan formación aplicable con la profesión 19 16,0 3,4 1 - 3 9 6
7.12. Fomentan formación académica más completa 7 5,9 1,3 - 2 - 5 -
7.13. Adecuados a la demanda social 5 4,2 0,9 - - - 3 2
Total 119 100 21,5 5 8 15 55 36
8. Metodología de enseñanza
8.1. Útil 1 3,0 0,2 - - 1 - -
8.2. Clases prácticas 16 48,5 2,9 - 4 1 5 6
8.3. Clases teóricas 10 30,3 1,8 - 2 2 1 5
8.4. Conocimientos permanentes 1 3,0 0,2 - - - - 1
8.5. Fomenta la participación 1 3,0 0,2 - - - 1
8.6. Fomenta la motivación 2 6,1 0,4 - - - 2 -
8.7. Nuevos modelos de enseñanza 2 6,1 0,4 - - - 1 1
Total 33 100 6,0 - 6 4 10 13
9. Evaluación

284
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9.1. Evaluación continua 1 16,7 0,2 - - - 1 -


9.2. Valoración adecuada del trabajo realizado 1 16,7 0,2 - - - 1 -
9.3. Variedad de modelos de evaluación 1 16,7 0,2 - - - 1 -
9.4. Adaptado a las actividades realizadas 2 33,3 0,4 - - - 1 1
9.5. Refleja el aprovechamiento del alumnado 1 16,7 0,2 - - - 1 -
Total 6 100 1,1 - - - 5 1
10. Competencias profesionales a adquirir por el alumnado
10.1. Conocimientos básicos de la profesión 21 29,2 3,8 3 1 5 6 6
10.2. Capacidad para trabajar en contextos diversos 8 11,1 1,4 1 2 - 4 1
10.3. Desempeño adecuado del trabajo 20 27,8 3,6 1 2 4 9 4
10.4. Desarrollo integral (personal, social, emocional,
10 13,9 1,8 1 2 - 7 -
laboral)
10.5. Capacidad de trabajo autónomo 1 1,4 0,2 - - - 1 -
10.6. Formación continua 3 4,2 0,5 - - 1 2 -
10.7. Capacidad de comunicación en otra lengua 1 1,4 0,2 - - 1 -
10.8. Capacidad de resolución de problemas 1 1,4 0,2 - - - - 1
10.9. Valores éticos y responsabilidades 4 5,6 0,7 - 1 1 - 2
10.10. Capacidad de emprendimiento 1 1,4 0,2 - - 1
10.11. Capacidad de interacción con otros equipos
2 2,8 0,4 1 - - 1 -
profesionales
Total 72 100 13,0 7 8 12 31 14
Total respuestas 553 - 100 42 81 80 212 126
Total alumnos que dan respuesta 293 - - 35 41 59 106 52

De los resultados obtenidos podemos destacar que el principal elemento que define una universidad
de calidad según el alumnado es la existencia de un profesorado cualificado, motivador y con elevados
conocimientos de su área de estudio. Así, por ejemplo, aparecen expresiones como:
Alumno 10: “una universidad cuyos docentes sean profesionales”.
Alumno 56: “una universidad con profesorado competente”.
Alumno 177: “una universidad que disponga de profesores altamente cualificados”.
Alumno 433: “profesorado que interactúa en confianza”
En segundo lugar, una universidad de calidad es la que atiende a las necesidades individuales del
alumnado y muestra interés porque éste aprenda. Algunas de las manifestaciones que corroboran
dicho argumento son las siguientes:
Alumna 37: “una universidad que se adapta a las necesidades individuales de cada persona”.
Alumno 75: “la que tiene más en cuenta las opiniones, intereses y necesidades del alumnado
universitario”.
Alumno 221: “una universidad de buena calidad es aquella que sepa responder a las necesidades
del alumno”.
El tercer elemento que aporta las claves para definir una universidad de calidad es la dotación de
infraestructuras adecuadas para las diferentes actividades que en ella se desarrollan. Algunas de las
respuestas sugeridas por el alumnado son:
Alumno 177: “……, y respecto a las infraestructuras, de mucha más calidad y comodidad”.
Alumno 222: “una buena universidad con buenas infraestructuras….”.
Alumno 317: “aquella que presente unas condiciones físicas y arquitectas favorables”.
Alumno 433: “…estructuras modernas y adecuadas”.
El cuarto elemento más significativo es el referente a las competencias a adquirir por el alumnado que
curse sus estudios en la institución, destacando conocimientos básicos de la profesión así como
aquellas que supongan su desarrollo integral (personal, social, emocional, laboral). Esta dimensión se
corrobora con los siguientes argumentos expresados por los y las estudiantes:
Alumno 20: “una universidad que prepare a personas para el futuro ámbito laboral, el trabajo
autónomo y la formación continua”.

285
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Alumno 36: “....desarrollando personas competentes que cuando lleguen a la puesta de trabajo
puedan desempeñarlo adecuadamente”.
Alumno 47: “aquella que te capacita para la carrera en la que te sitúas,….., importante la salida
laboral”.
Alumno 72: “… donde aprendas conocimientos verdaderos y eficaces para nuestro futuro”.
Alumno 132: “la que realmente capacita para una profesión en un sentido práctico sobre todo”.
Alumno 334: “aquella que forma a buenos profesionales”.
Alumno 361: “aquella que fomenta el adquirir conocimiento no solo para pasar una asignatura”.
Alumnos 533: “aquella que disponga de todo lo necesario para formar personas cada vez más
cualificadas y preparados para adquirir conocimientos de mayor calidad y dificultades acordes a
la realidad imperante en el mercados laboral de cada momento”.
Si atendemos a las respuestas en función de la rama de conocimiento a la que pertenecen las
diferentes titulaciones cursadas por el alumnado, sigue siendo el elemento relacionado con disponer
de un profesorado cualificado como el primer índice de calidad universitaria en todas la áreas de
estudio, excepto en Ciencias de Salud donde se otorga más relevancia a la posesión de unas buenas
infraestructuras para el desarrollo de las diferentes actividades.
A diferencia de las demás áreas, el alumnado de Ciencias Sociales y Jurídicas y de Ingeniería y
Arquitectura han manifestado que una universidad de calidad ha de fomentar una formación
coherente y adaptada al futuro profesional.
Por último, es destacable que los y las estudiantes de Ciencias, Ciencias Sociales y Jurídicas e Ingeniería
y arquitectura manifestaron la importancia de la existencia de clases prácticas

4 Conclusiones

Dar la oportunidad al alumnado de expresar con libertad su opinión sobre lo que entiende, como
integrante de la comunidad educativa, por una universidad de calidad, nos ha permitido disponer de
evidencias suficientes para aportar una definición concreta de esta institución, así como evidencias
para el diseño de un modelo de indicadores de calidad que queden recogidos en un modelo integral
de evaluación institucional universitaria.
El modelo que se avanza se configura como una taxonomía formada por 10 dimensiones y 99
indicadores de evaluación que sirven de base para la tesis inicialmente pretendida. Para este grupo,
una universidad es de calidad si es pública, gratuita, atiende a sus necesidades personales y
académicas, tiene en cuenta sus opiniones, aliente un marco internacional, innove y use las
infraestructuras más actuales. Debe ofrecer unos servicios para los universitarios que satisfagan las
necesidades personales, académicas y laborales, unos recursos adecuadas a la docencia y unos planes
de estudio bien planificados y adaptados a las demandas del mercado de trabajo. El profesorado debe
estar bien cualificado y el alumno bien preparado para su futuro profesional. Por último, debe usar en
la enseñanza una metodología basada en clases prácticas, teóricas e interactivas.

Referências

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su evaluación. Revista Electrónica de Investigación y Evaluación Educativa, 3. Recuperado de
http://www.uv.es/aidipe.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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287
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Ensino do Projeto Arquitetônico: uma proposta preliminar baseada nos


Estilos de Aprendizagem de Kolb

Kelly Christine Silva de Lima1 e Deborah Padulah Kishimoto1


1
Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário de João Pessoa, Brasil.
lima.kelly3@gmail.com; dpkcontato@gmail.com

Resumo. O ensino do projeto de arquitetura é realizado por meio de orientações de trabalho prático, o
projeto. Neste universo de aprendizagem cada docente aplica sua maneira de ensino do projeto, fator que
por vezes pode ser incompatível com a percepção dos alunos. A teoria de aprendizagem de Kolb por meio
da experiência apresenta uma aplicação prática de identificação de estilos, os quais podem trazer
direcionamentos adequados para a seleção de estratégias de ensino. Pretende-se neste estudo analisar uma
proposta de aplicação dos estilos de aprendizagem de Kolb como subsidio de metodologia de ensino de
projeto em Arquitetura e Urbanismo. Os critérios propostos para este estudo estão em construção e os
resultados esperados com a sua aplicação visam a melhoria e qualidade do ensino.
Palavras-chave: Estilos de aprendizagem; Projeto Arquitetônico; Metodologias de ensino.

Teaching of the architectural project: a preliminary proposal based on the learning styles of Kolb
Abstract. The education of architectural design is carried out through practical work guidelines, the project.
In this learning universe, each teacher applies its way of design project’s education, factor that can
sometimes be incompatible with the perception of the pupils. The theory of Kolb’s learning styles by means
of the experience presents a practical application of style identification, which can bring appropriate
direction to the election of education strategies. This study intends to analyze a proposal of application of
Kolb’ learning styles as a subsidy of methodology of design project education in Architecture and Urbanism.
The proposed criteria for this study are under construction and the expected results with their application
aim at improving and quality of education.
Keywords: Learning styles; Architectural project; Teaching methodologies.

1 Introdução

O ensino nos conteúdos curriculares na Arquitetura e Urbanismo, assim como em outros campos de
conhecimento deve ser motivadores e eficientes para a promoção da aprendizagem. De acordo com
Libâneo, (2007) e Oliveira & Chadwick, (2008), o ensino deve priorizar as características individuais
nos processos de assimilação e acomodação de cada aluno. Assim, a prática docente não está
apenas interligada ao conhecimento levado à sala de aula, ao ato de ministrar aulas; mas sim a uma
postura transformadora da qualidade do ensino e da perspectiva dos alunos sobre os caminhos que
terão de trilhar enquanto profissionais. Por isso, o desempenho em sala de aula é essencial para a
promoção desta postura; a qualidade dos recursos utilizados em ambiente de ensino e as relações
entre professor e aluno, podem proporcionar um aumento no nível da aprendizagem.
No estudo da Arquitetura e Urbanismo, dotado de uma forte interação entre teoria e prática, os
conteúdos curriculares de projeto arquitetônico são desenvolvidos em ambientes de ateliês em que
a interação entre docente, alunos e turma são intensas. Entretanto, o ensino de projeto passou por
diversas modificações ao longo do tempo, desde a descoberta da perspectiva até a adoção da teoria
e prática reflexiva dos ateliês. Em ambos os casos, os professores atuam como tutores no
desenvolvimento dos projetos feitos pelos alunos. Tal processo é sempre orientado pela melhor

288
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

forma de desenvolver o tema de projeto (metodologia do projeto) e pelo compartilhamento de


experiências entre docente e discente e turma (Panet, 2013; Amaral, 2008; Hinojosa, 2004).
A atividade de projetar em Arquitetura, de acordo com Silva, (1998) e Neves, (2012) é complexa e
envolve a tomada de decisão sobre fatores variáveis que podem limitar ou não a experiência
arquitetônica. A própria noção de espaço, tempo e sua qualidade também é imprecisa e nebulosa.
Deste modo, a problemática encontrada é a de como proceder ao ensino de um produto complexo
que exige do aprendiz que tome decisões para compor um produto que será usado às vezes por
muitas ou milhares de pessoas, cada uma com seus individualismos.
Segundo Barros, (2010) os elementos que garantem um bom perfil docente são vistos como
preparação pessoal para o ensino, didática, inovação no uso dos recursos de ensino, comunicação
com os alunos fora e dentro de sala de aula, procedimentos de avaliação, auto-avaliação,
aperfeiçoamento e ensino voltado para a resolução prática de problemas.
Travellin, (2011) coloca que a combinação de estratégias de ensino baseadas nos Estilos de
Aprendizagem de Kolb representa uma possibilidade de expansão dos resultados do ensino-
aprendizagem dos alunos; em virtude das diversas estratégias que podem ser adotadas de acordo
com a forma de apreensão do aluno. Então, desta forma o objetivo deste artigo é de aprensentar
uma proposta preliminar de aplicação dos estilos de aprendizagem como critério para determinação
de metodologias de ensino de projeto arquitetônico.

2 Referencial Teórico

2.1 Estilos de Aprendizagem

Silva, (2008), Cerqueira, (2008), Cué, (2009) e Gomes, (2016) descrevem que os estilos de
aprendizagem estão relacionados à forma com que os indivíduos aprendem, ou seja, o modo com o
qual conseguem processar, acomodar e assimilar as informações em nível ambiental, teórico, prático
e afetivo. Sugere também que a mente é influenciada pela profissão e tem a capacidade de ser
modificada de acordo com as experiências e o tempo. Sendo assim é possível que os mecanismos de
aprendizagem profissional, estejam também relacionados à personalidade e aos valores dos
indivíduos, construídos ao longo de suas experiências e vida. Atualmente, a preocupação no ensino
de adultos é o de identificar e entender como funciona a aprendizagem, várias publicações trazem
resultados promissores (Muñetón, Pinzón, Alarcón, & Olaya, 2012); e por meio interação é possível
traçar estratégias adequadas de ensino.
As publicações que tratam destes estilos de aprendizagem são extensas, de acordo com Cué, (2009)
podem ser encontrados pelo menos trinta e oito instrumentos de medição da aprendizagem; e se
destacam nestes os trabalhos de alguns teóricos mais relevantes (Tabela 01) que retratam as
possibilidades de desenvolvimento e demonstra o universo de diversidade encontrada (Schmitt &
Domingues, 2016; Silva, Candeloro & Lima, 2013; Lefrançois, 2012; Barragán; Deaquino, 2008).

Tabela 1. Principais de estilos de aprendizagem. Fonte: Schmitt & Domingues, (2016).

Autor(es) Estilos de aprendizagem Ano


Kolb Assimiladores, Acomodadores, Divergente e Convergentes 1976
Gregorc Sequencial concreto, Aleatório concreto, Aleatório abstrato, Sequencial Abstrato 1979
Dunn, Dunn e Price Ambientais, Emotivos, Sociológicos, Físicos e Psicológicos 1982
Felder e Silverman Ativo, Sensitivo, Visual e Sequencial 1988
Honey e Munford Ativo, Passivo, Reflexivo e Teórico 1988
Entwistle Profundo, Superficial e Estratégico 1988

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Fleming Visual, Auditivo, Leitura/escrita e Sinestésico 2001

Dos estilos de aprendizagem encontrados destaca-se, e é referência para este estudo, o trabalho de
Kolb, (1976). Este apresenta condições para a aprendizagem experiencial, retratando maneiras com
as quais os indivíduos podem e costumam a aprender, gerando um perfil que pode ser trabalhado
estratégicamente (Cué, 2009).
A teoria de Kolb, (1976) indica que os indivíduos podem aprender por meio: de Experiência concreta
(EC), o aprendizado acontece por meio da experiência, da vivência, da manipulação direta e concreta
do tema estudado, dos sentimentos e sentidos; de Observação Reflexiva (OR), o aprendizado
acontece quando há uma reflexão crítica sobre as experiências que participou, ou seja, aprender
observando; de Conceituação Abstrata (CA), aprendizado por meio de estruturas lógicas de
combinação da teoria com exemplos práticos, uso de lógica e ideias; de Experiência Ativa (EA), o
aprendizado acontece por meio da aplicação do conhecimento, da teoria e prática em novas
situações e desafios enfrentados na vida real.
Contudo, não há apenas uma destas características no processo de aprendizagem dos indivíduos,
mas uma combinação, uma predominância de dois ou mais estilos. Desta forma, de acordo com
Deaquino, (2008) e Gomes, (2016) podem ser identificados os Convergentes, Divergentes,
Acomodadores e Assimiladores. Por meio do inventário de estilos de aprendizagem de Kolb, (1976), é
possível determinar se o individuo tem o perfil: Convergente (CA - EA) que se dedica melhor ao fazer
uma coisa de cada vez, ou seja, se houver uma única solução correta, o aprendizado se desenvolve
de maneira mais eficiente. Aplica bem e fácil as ideias, toma decisões e define bem os problemas;
Divergente (EC - OR), este atua bem em situações que pedem novas ideias, é criativo, gerador de
alternativas e compreende bem os problemas e as pessoas. Possui talento para as artes e serviços;
Acomodador (EA - EC), aceita desafios e tende a se basear mais pelos sentimentos e sentidos do que
pela lógica. Pode resolver problemas triviais e desperdiçar energia, quanto também pode solucioná-
los por meio do ensaio e erro; Assimilador (OR - CA) que se destaca por um raciocínio indutivo e pela
habilidade de criar modelos abstratos e teóricos. Costuma a organizar o pensamento em uma
sequencia lógica, interessando-se em muito pela lógica do conceito do que por sua aplicação prática.
Interesse maior pelas ideias do que por pessoas.
Os estilos de aprendizagem, segundo Cerqueira, (2008) e Sousa, (2013) tendem ser mais expressivos
em diferentes áreas de conhecimento, o que pode resultar em estratégias adequadas para o ensino e
avaliação, promovendo assim o processo de ensino-aprendizagem. Cada professor com seu próprio
estilo de aprendizagem pode possuir seu “modo” próprio de transmitir seus conhecimentos em sala
de aula. A Tabela 2 apresenta estes perfis do docente.

Tabela 2. Comparação entre os estilos de aprendizagem e os estilos de ensino de docentes. Fonte: Cerqueira, (2008).

Estilo de Estilo de Características de ensino


aprendizagem ensino
Assimilador Expositor Tradicional e com aulas expositivas. Visa e valoriza a transmissão de
conhecimentos, sendo autoridade e o material didático deve ser seguido.
Acomodador Inovador Ensino inovador, estimulador e dramático, encorajando a aprendizagem
experimental e autodescoberta. A estratégia de ensino é mutável, dinâmica e
envolve variados métodos de acordo com as necessidades.
Divergente Motivador Ensino motivador e com preocupação no desenvolvimento pessoal dos alunos e
pratica a cooperação, discussão de valores em suas práticas. Simpatia e incentivo
aos debates e questionamentos sobre a vida profissional.
Convergente Tutor Ensino altamente independente e exige dos seus alunos este comportamento. Está
bastante preocupado com a produtividade e a eficiência e procura desenvolver as
habilidades para um bom profissional. A estratégia de ensino é a combinação de
aulas expositivas com atividades extra-classe e em laboratórios práticos.

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Alguns autores (Schmitt & Domingues, 2016; Sousa, 2013; Silva, Candeloro & Lima, 2013; Travellin,
2011; Cerqueira, 2008; Hinojosa, 2004) sugerem que ao aproximar o estilo de aprendizagem dos
alunos com o dos professores, o rendimento escolar se torna melhor e há um maior índice de
satisfação com a qualidade de ensino.

3 Metodologia

Este estudo pode ser classificado como uma investigação qualitativa apoiada em um estudo de caso,
visto que há a uma exploração de temas até então pouco discutidos em uma situação particular de
ensino de projeto de Arquitetura e Urbanismo. Será desenvolvida a pesquisa bibliográfica,
documental e aplicação de instrumentos como o inventário de estilos de aprendizagem de Kolb,
(1976).
A metodologia de condução da pesquisa está em fase de construção e terá como meta principal a
proposição de estratégias e condutas para o ensino de projeto arquitetônico que proporcionem a
melhoria da qualidade de ensino e do rendimento escolar dos estudantes de arquitetura; a partir do
momento que o modo de ensinar do docente seja um aliado ao modo de aprender do aluno, através
da investigação dos estilos de aprendizagem de Kolb, (1976) em ambos os atores.
Os procedimentos a serem adotados para deste estudo, com embasamento trazido por Otani,
Barros, & Marin, (2014); terão como etapas principais: (1) A seleção dos alunos nos componentes
curriculares de projeto arquitetônico, por meio de uma amostragem por conveniência; (2)
Reconhecimento dos estilos de aprendizagem (Convergente, Divergente, Assimilador, Acomodador),
seguindo o Inventário de Kolb (Kolb, 1976; Travellin, 2011) com discentes, através da disponibilização
do instrumento na plataforma virtual com o devido feedback ao aluno; (3) Reconhecimento dos
estilos de aprendizagem dos professores, por meio do inventário e entrevista para identificação das
estratégias de ensino adotadas, bem como identificação do estilo de ensino do professor (Tutor,
Motivador, Expositor e Inovador); (4) Determinação do perfil de estilos de aprendizagem
predominantes nas turmas de alunos, bem como identificação dos rendimentos escolares; (5)
Seleção de estratégias adequadas ao ensino de projeto para cada estilo identificado, após as
conclusões na análise dos dados e com base na bibliografia de referência.
A avaliação do processo de ensino aprendizagem focado nas estratégias escolhidas, será realizada
mediante a demanda de comentários dos discentes, organizados em grupos focais (Pontes, Campos,
& Miranda, 2014), seus representantes e por meio do monitoramento das notas das avaliações dos
estágios, e através de questionário aplicado junto aos discentes.
A análise dos dados será realizada conforme as instruções do inventário de Kolb (Kolb, 1976;
Travellin, 2011) de maneira qualitativa, complementadas por análises estatísticas descritivas e
inferência conforme necessário. Com o intuito de descobrir possíveis correlações entre o perfil de
alunos, professores, estilos de aprendizagem e rendimentos escolares. Serão utilizados também
outros dados para esta fase, como bibliografias de referência, a exemplo dos estudos levantados por
Muñetón, Pinzón, Alarcón, & Olaya, (2012).

4 Considerações Finais

No atual cenário, é imprescindível que a educação e o processo de ensino-aprendizagem estejam em


total consonância com as necessidades dos professores e alunos. Muitas são as teorias sobre o

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processo de aprendizagem (de Piaget, de Vigostky, Skinner e o Behaviorismo, entre outras), com
contribuições advindas da Neurociência, indo até o modo como os processos cognitivos acontecem
para que o conhecimento seja assimilado, acomodado e adquirido.
Assim, o conhecimento sobre os estilos de aprendizagem, especialmente o de Kolb, apresenta uma
nova maneira de compreensão de como os alunos universitários aprendem. E também a possiblidade
de trabalhar estratégias adequadas para a garantia do ensino nos componentes curriculares,
especialmente no campo do projeto arquitetônico. Espera-se com o início deste trabalho, a abertura
de um novo campo para investigação e promoção da melhoria da qualidade do ensino, além de
transformar as atividades desenvolvidas em motivadoras e criativas para os alunos.

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Educação a Distância e Educação Presencial: tecendo reflexões


Andrea Karla Ferreira Nunes1,
Kalyne Andrade Ribeiro²,
Yvahyr Farias Silveira³

¹Departamento de Educação Universidade Tiradentes, Brasil. andreaknunes@gmail.com


²Departamento de Educação a Distância do Instituto Federal de Sergipe, Brasil.
Kalyne.andrade@hotmail.com
³ Departamento de Educação Universidade Tiradentes, Brasil. ivahyrsilveira@gmail.com

Resumo. Este artigo retrata os resultados de uma pesquisa realizada com os discentes concluintes do curso
de Pedagogia de uma universidade particular localizada na cidade de Aracaju no Estado de Sergipe/Brasil. O
objetivo da pesquisa foi analisar os pensamentos e visões apresentadas pelos discentes acerca das
possibilidades concebidas pela educação a distância fazendo um comparativo com a educação presencial.
Para tanto, utilizou-se da investigação qualitativa, considerando as respostas dadas em uma atividade
norteadora aplicada em sala de aula através da disciplina Educação e Tecnologia da Informação e
Comunicação. Com base nos dados coletados foram apresentadas as concepções e analisadas as
considerações sobre a Educação a Distância e feitos os devidos paralelos com a educação presencial
intencionando assim, inferir de forma mais acurada as possibilidades geradas pelas duas modalidades de
ensino.
Palavras-chave: Educação a Distância; Educação Presencial; Tecnologias Digitais.

Distance Education and Classroom Education: weaving reflections


Abstract. This article presents the results of a research carried out with the graduating students of the
Pedagogy course of a private university located in the city of Aracaju in the State of Sergipe, Brazil. The
objective of the research was to analyze the thoughts and visions presented by the students about the
possibilities conceived by distance education, comparing them with face-to-face education. To do so, it was
used qualitative research, considering the answers given in a guiding activity applied in the classroom
through the subject Education and Information Technology and Communication. Based on the collected
data, the conceptions were analyzed and the considerations about distance education were analyzed and
the corresponding parallels were made with the face-to-face education, aiming to infer, in a more accurate
way, the possibilities generated by the two modes of education.
Keywords: Distance Education; Classroom Education; Digital Technologies

1 Introdução

Diversos são os desafios da contemporaneidade. Essa sentença pode parecer banal, considerando o
cotidiano repleto de movimentos frequentes e corriqueiros os quais distraem a percepção e tornam
comuns as novas e diferenciadas ações. Mas é notória a necessidade de novas posturas pessoais,
profissionais, políticas, educacionais, dentre outras. Tudo isso é resultado das mudanças ocorridas na
sociedade através dos avanços tecnológicos que trouxeram a necessidade da busca e aquisição de
conhecimentos amplos.
Todavia, não se deve temer a modernidade, pois como nos mostra Demo (2014) as transformações
são necessárias. Para ele, é preciso entender a modernidade como um desafio para a compreensão
de novos tempos, uma oportunidade de alcançar os desejos e anseios das novas gerações, é a
possibilidade de criar e /ou modificar os rumos do futuro.
Sinônimo de “ser moderno” é ter em si a capacidade de interagir com a realidade, inserindo-se nela e
tornando-se um sujeito participativo, criativo, crítico e transformador. “Ignorar isso é antimoderno,
não porque seja antitecnológico, mas porque é irreal”. (DEMO, 2014, p. 21).

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A visão explicitada anos atrás pelo autor é extremamente atual e percebe-se em sua opinião a
naturalidade desse processo. E dentre as tantas modernidades estão as tecnologias digitais, que
fazem parte do mundo contemporâneo e não há como retroceder. Ser contra ou a favor não altera a
sua abrangência.
Diante desse cenário o que é preciso é quebrar paradigmas, abandonar a armadura da nostalgia dos
tempos de outrora, é ter visão ampla e estar disposto a novas experiências, possibilitando uma
construção crítica de sujeito. E nesse processo não há como negar a importância e influência da
educação. É importante ressaltar que a relação entre tecnologias digitais e educação acontece em via
de mão-dupla. A educação contribui para a mudança de pensamento dos sujeitos sobre as
tecnologias, mas, também é influenciada e modificada por elas.
Sendo assim, é preciso cuidado com os exageros. As tecnologias digitais não possuem o poder de
solucionar todos os problemas, nem a educação o de impor o uso dessas tecnologias sem
apresentar-lhes os seus significados e contribuições.
Segundo D’ambrósio (2015, p.146) “as novas tecnologias, sobretudo a informática e as
telecomunicações, não podem ser operativas na criação de novas estruturas político-sócio-
econômicas sem a dedicação plena de todos os envolvidos”.
Mesmo com todo avanço tecnológico ainda existem disparidades e bem diz Brunner (2005, p. 17)
que “as esperanças se misturam com as frustrações; as utopias, com as realidades”. A educação
ainda é idealizada e propagada como agente transformador, mas é sabido que a prática, em geral,
não coaduna com esse discurso. Todavia,

É imprescindível considerar as contribuições da integração de distintas tecnologias


à educação, bem como a preparação de educadores e formadores dos educadores
para incorporá-las ao fazer profissional e à prática pedagógica, de modo que os
artefatos tecnológicos possam trazer contribuições efetivas [...]. (VALENTE;
ALMEIDA, 2007, p. 27).

A tecnologia digital tem ultrapassado os muros da educação, mas como isso é visto pelos professores
em formação? Como eles visualizam e entendem essa relação? Acreditam que as tecnologias fazem
milagre? Ou ainda se mantêm distantes acreditando que os métodos tradicionais rompem o tempo e
atendem as expectativas discentes? E a educação a distância seria uma alternativa ou um
investimento de sucesso contra as dificuldades na educação?
Considerando todas essas indagações e buscando resposta para elas, o referido artigo, resultado de
uma pesquisa qualitativa apresenta os resultados obtidos através da análise das concepções
apresentadas pelos discentes sobre a educação a distância fazendo um comparativo com a educação
presencial, através de uma atividade norteadora1 aplicada na disciplina Educação e Tecnologia da
Informação e Comunicação, em uma turma de concluintes do curso de Pedagogia de uma
universidade particular da cidade de Aracaju, no estado de Sergipe/Brasil.

1 Atividade norteadora é uma das tarefas utilizadas pelos docentes da Instituição de Ensino Superior para consolidar a
aprendizagem do conteúdo que foi ministrado ao longo do curso. A atividade norteadora aplicada aos estudantes
pesquisados teve por objetivo conhecer a percepção dos mesmos acerca do entendimento sobre EAD, visto que tinha
sido um tema debatido na disciplina.

295
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

2 Educação a Distância e Educação Presencial: apenas modalidades distintas

Conforme dicionário Aurélio (2017) a palavra modalidade, que tem origem latina e deriva de
“Modalis”, significa a maneira de ser; é cada aspecto ou peculiaridade diferente do mesmo fato.
Sendo assim, o conceito aponta para modos diferentes de ser, mas partindo da mesma essência. Da
mesma maneira acontece com a educação a distância e presencial. Elas apresentam modos
diferentes de execução, recursos diferenciados, espaços e tempos distintos. Mas elas partem do
ponto comum: a educação.
Espaços físicos fixos, horários determinados de entrada e saída, aulas em dias correntes, professor
presente em sala de aula e contato direto com os colegas de classe são apenas algumas das
características da educação presencial, e que são vantajosas e extremamente necessárias para
alguns. Para outros, esses moldes são arcaicos e de difícil adaptação. Escolher seus horários de
estudo, seus espaços de aprendizagem, encurtar as distâncias, criar suas próprias diretrizes para a
construção de aprendizagem são possibilidades ofertadas pela educação a distância. E que atraem a
muitos, mas que também assusta uma grande parcela de estudantes.
Dessa forma, as modalidades servem estratégias e necessidades, quer sejam elas sociais, políticas,
culturais ou pessoais. Isso explica porque conceitos pré-definidos ao longo do processo histórico
permanecem circulando entre os educadores promovendo uma fenda entre a educação e as infinitas
possibilidades pedagógicas que as tecnologias digitais podem propiciar. O que é preciso ser
destacado não é o modo de fazer, mas sobre o que se quer fazer.
As modalidades podem ser as mais diversas desde que a boa educação seja primazia. Fazendo uso
das palavras de Paulo Freire (2009) o docente precisa entender que ensinar exige pesquisa,
criticidade, ética, curiosidade, comprometimento, aceitação do novo e do diferente.
A educação necessita ser vista como intervenção e transformação no e do mundo. Sendo assim, não
há como permanecer com posicionamentos cartesianos, é preciso ver a educação além dos limites
conceituais e metodológicos impostos. E esse processo inicia-se na formação inicial docente, no
professor enquanto discente, nas suas escolhas e na utilização dos aportes adquiridos no decorrer da
sua trajetória acadêmica, na construção da sua própria história intelectual. O encantamento
tecnológico deve ser evitado.
Deve haver um equilíbrio entre as necessidades de aprendizagem e o uso das tecnologias, mesmo
considerando que na atualidade a educação vem utilizando a metodologia híbrida incorporando
recursos tecnológicos facilitadores do processo de ensino-aprendizagem como, vídeos, áudios,
programas televisivos, teleconferências, páginas Web, materiais digitalizados, Podcast, fóruns, chats,
sendo todos eles disponibilizados em ambientes virtuais de aprendizagem. Todavia, é importante
ressaltar que a contribuição dos referidos recursos não se restringe a educação a distância. Eles têm
propiciado inovações metodológicas no âmbito geral da educação. Percebe-se que as atividades
desenvolvidas atualmente possuem características que priorizam a indeterminação, desconstrução,
descentramento, fragmentação, hibridação, participação e atuação, envolvendo discentes e
docentes no compartilhamento de aprendizagens. As tecnologias digitais devem ser utilizadas com
propósitos educacionais bem definidos, pois se assim o for, elas prepararão educadores e educandos
para desempenharem seus papeis com eficiência e eficácia na sociedade em que vivem, e
consequentemente, a educação cumprirá a sua finalidade transformadora.

3 O que pensam os discentes: caminho percorrido para obtenção dos resultados

A ciência tem por atividade básica a pesquisa e por objetivo principal descobrir respostas para os
questionamentos surgidos. Contudo, realizar uma pesquisa ultrapassa a simples vontade da

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descoberta, da busca de novas possibilidades ou a confirmação de ideias já percebidas. Não que


esses anseios não sejam importantes, considerando que da inquietação do pesquisador deriva o
pontapé inicial que gera o movimento ou a prática efetivamente. Mas ela exige seriedade, critérios,
rigor, e principalmente uma metodologia clara e bem delineada direcionando-a e possibilitando
percorrer caminhos que a torne real e cientifica. Sendo assim, a referida pesquisa utilizou a
abordagem qualitativa, o método dialético, foi classificada como descritiva, e para obtenção da
informação foram utilizados o procedimento bibliográfico e estudo de caso.
Como técnica de investigação valeu-se da aplicação de uma questão norteadora.
A escolha pela análise qualitativa dos dados teve por base as características explicitadas por Teixeira
(2003), quando diz que, nesse tipo de análise, o ambiente natural é a fonte direta de dados que, por
sua vez, são coletados pelo próprio pesquisador que utiliza de procedimentos descritivos para
apresentar a realidade estudada, buscando o significado para as pessoas e as influências sobre suas
vidas, preocupando-se assim com todo o processo e não apenas com os resultados e o produto.
A abordagem qualitativa busca alcançar as interpretações dos sujeitos frente à realidade estudada.
Justifica-se essa busca e análise das informações por se tratar ainda de um estudo de caso. E
conforme Yin (2015) o estudo de caso é um estudo empírico que investiga um fenômeno atual
dentro do seu contexto de realidade.
Quanto ao método dialético considerou o explicitado por Rodrigues (2011, p.142), quando diz que o
método dialético tem por objetivo contestar uma realidade posta, enfatizando suas contradições.
Para toda tese existe uma antítese que, quando contraposta, tende a formar uma síntese. Procura
ser a investigação das contradições da realidade, pois são essas as forças propulsoras do
desenvolvimento da natureza.
O método dialético é o conflito dos contrários. A atividade norteadora foi aplicada em uma turma de
estudantes concluintes do curso de Pedagogia de uma universidade particular na cidade de Aracaju,
no Estado de Sergipe/Brasil. Ressalta-se que os alunos envolvidos na pesquisa participaram, no
decorrer do curso, de disciplinas em ambas as modalidades de ensino, ou seja, presencial e a
distância. Por sinal, a atividade norteadora falada aqui, que se trata de uma questão contextualizada
e que ao ser explicitada exige do aluno uma resposta embasada na teoria já estudada na disciplina,
teve exatamente essa característica. Ela foi aplicada no Ambiente Virtual de Aprendizagem, onde os
alunos respondiam através do acesso a plataforma criada pela instituição para o desenvolvimento da
aprendizagem, e foi discutida em sala de aula, de forma presencial. Sendo assim, acreditamos que as
experiências vivenciadas pelos discentes apresentariam de forma clara o entendimento sobre as
concepções das metodologias presencial e a distância.
A turma era composta por 28 alunos, mas apenas 17 deles responderam a questão norteadora. A
justificativa para a não participação predominou em não ter tido tempo para cumprir o prazo
determinado para responder a atividade.
O referido questionamento considerou dados apresentados pelo Censo da Educação Superior no
Brasil de 2013 que relata o avanço e abrangência dos cursos a distância e solicitou-se dos alunos a
enumeração de vantagens propiciadas por essa modalidade de ensino, ou seja, quais características
seriam as responsáveis pelo avanço apresentado no Censo. Os mesmos apresentaram nove
vantagens que foram relacionadas à educação a distância, sendo elas: Comodidade, Melhor
administração do tempo de estudo, Uso – Contato com as tecnologias digitais, Encurtamento de
distâncias, Preço, Autonomia, Incentivo a pesquisa, Acesso as informações, Acesso ao Ensino
Superior.A partir do levantamento feito um gráfico foi criado e exposto logo abaixo, para demonstrar
em porcentagem cada uma das vantagens, e as respostas foram transcritas e analisadas gerando
uma reflexão sobre as considerações apresentadas pelos discentes. Para preservar a identidade
criou-se uma sigla – A (aluno) e para manter a ordem agregou-se números.

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Fig. 1. Vantagens enumeradas pelos alunos através da questão norteadora

Observando o gráfico acima, percebe-se que algumas características apontadas são específicas da
modalidade a distância como: comodidade, citada por 47,5 % dos discentes; melhor administração
do tempo, citada por 41%; encurtamento das distâncias, citada por 35%; preço, citada por 17%; e
acesso ao ensino superior, citada por 06%. Isso porque a educação a distância permite ao discente a
organização dos seus próprios horários de estudo, em diversos lugares, sem a obrigatoriedade do
cumprimento de tempos fixos e em locais físicos determinados, o que consequentemente gera
economia, comodidade e maiores possibilidades de ingressar em um curso de nível superior.
Características essas que são viabilizadas pelas tecnologias digitais. Segundo o Censo 2013 da
Educação a Distância/Brasil em 2012 foram autorizados 1.749 cursos a distância e em 2013 esse
número aumentou para 2.219, um percentual de 26,9%. Todavia, como alerta Neves (2005, p.137),
“a educação a distância não é um modismo”.
Ela faz parte das mudanças ocorridas na sociedade e é resultado de um processo contínuo e amplo
de transformações. Não se trata simplesmente da criação de tecnologia para a educação, da
recepção crítica ou da incorporação das informações. Trata-se de entender que se criaram novas
formas de comunicação, novos estilos de trabalho, novas maneiras de ter acesso e de produzir
conhecimento (LITWIN, 2001). Todavia, as outras vantagens apresentadas não são exclusivas da
educação a distância, não estão diretamente atreladas as tecnologias digitais, mas sim a uma
proposta e execução de uma educação de qualidade. O que nem sempre é perceptível pelos
discentes participantes da pesquisa. Exemplo disso é que 40% deles atribuíram o uso das tecnologias
a educação a distância, como explicitado abaixo através das suas falas:

A 08 –“O uso da tecnologia do “momento”, para transmitir e gerar um


conhecimento”.

A 11 – “A inclusão do uso de material de seu dia-a-dia, como celular, televisão, e


computador. Induzir o aluno a usar essas ferramentas como forma de estudo.
Usando uma forma mais inovadora, descontraída e acompanhando a globalização
com seus meios de comunicação”.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A 13 – “Por meio da modalidade EAD o aluno tem a oportunidade de se


desenvolver com as inovações tecnológicas, bem como compartilhar saberes e
experiência”.

A17 – “O aluno EAD, aprende a utilizar com maior precisão as ferramentas


tecnológicas a qual utiliza”.

Nesse momento um questionamento e análise são primordiais: O uso também não acontece na
educação presencial? É permitido ao aluno da contemporaneidade não utilizar as tecnologias
digitais? O uso da internet, a busca por informações, a troca de e-mails, os chats, os blogs e as redes
sociais são utilizados frequentemente e viabilizam a construção de novos saberes. E esses usos estão
presentes independente da modalidade de ensino.
A educação deve ser pensada e elaborada a partir de princípios filosóficos e pedagógicos que
direcionam a formação de um cidadão crítico e reflexivo.
A autonomia, apontada por 12% dos discentes, é outro ponto de reflexão e que vem associada a
promoção da pesquisa, citada por 02%, e ao acesso livre as informações, citada por 06%.

A 02 – “O aluno tem a possibilidade de desenvolver sua capacidade de pesquisar.


Em muitos casos ele contará não contará com a ajuda do tutor e por conta disso
poderá construir seu conhecimento”.

A 07 – “Desenvolve o auto-didatismo. Como o aluno esta modalidade tem encontro


presencial eventualmente, precisa desenvolver através do Ambiente Virtual de
aprendizagem sua própria mobilidade de conhecimentos adquiridos. Auto-
didatismo porque fará “sozinho” as conexões de todo conhecimento adquirido”.

A 16 – “A modalidade possibilita uma autonomia na busca de novos


conhecimentos, pois permite que o aluno tenha total liberdade para o acesso de
informações”.

A autonomia é uma característica que não pode ser atrelada de forma específica a Educação a
Distância, pois o estudante deve elaborar seu plano de estudo, fazer suas buscas, pesquisar, e
aproveitar o acesso livre as informações que as tecnologias digitais ofertam.
O desenvolvimento educacional do aluno está também no seu amadurecimento e na consciência de
que o professor não é a única fonte de conhecimento. Revela-se através das falas a falta de
compreensão de concepção de educação. Pois assim como a distância, nos cursos presenciais as
pesquisas acontecem, as informações estão disponíveis, as leituras de textos e as atividades práticas
possibilitam a construção de saberes e há a necessidade do interesse do aluno em participar da sua
formação, não como co-autor mas como sujeito ativo nessa construção.
Lança-se sobre a educação a distância a obrigatoriedade de formar um discente autônomo,
pesquisador e construtor da sua própria aprendizagem, fato indissociável para os estudantes da
modalidade presencial. Todavia, como nos afirma Brandão (2015) não existe um modelo para se
educar, não existe uma única maneira.
A educação ocorre a partir do momento em que se observa, entende, imita e se aprende; e este
processo não ocorre somente dentro de uma sala de aula, onde existe um professor, formado para
educar, nem também exclusivamente através das tecnologias digitais. É um processo dinâmico,
independente da modalidade de ensino. Está presente em todos os povos, em todas as classes e de
várias maneiras. Pois a educação deve ser provocadora de transformações, suscitando no aluno o
interesse de interferir no seu meio de forma participativa, crítica, consciente e protagonista,
independente da modalidade.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

4 Conclusões

A pesquisa realizada e apresentada neste artigo não traz consigo convicções ou determinações a
serem seguidas. Não apresenta críticas favoráveis ou contrárias às modalidades de ensino presencial
ou a distância. Mas através de um comparativo entre elas, leva-nos a uma reflexão sobre o papel da
educação na formação dos futuros docentes através do uso das tecnologias digitais.
Os resultados apresentados ressaltam o não entendimento do conceito formador e transformador da
educação, seja ela presencial ou a distancia, por parte dos discentes mesmo tendo cursado
disciplinas nas duas modalidades.
Os alunos fizeram suas considerações estabelecendo particularidades entre as duas modalidades,
como se a educação diferisse entre elas. Percebeu-se que a construção da identidade docente é feita
tendo posturas e atitudes padronizadas de acordo com a modalidade. É preciso ultrapassar o
discurso científico, linear e cartesiano que ronda o uso das tecnologias na educação. Características
como autonomia, comodidade, acesso as tecnologias digitais perpassam por ambas as modalidades,
condição não percebida entre os pesquisados, o que reforça uma visão dicotômica sobre o que é
educação a distância e educação presencial.
Entende-se que independente da modalidade de ensino é necessário que os cursos ofertados
tenham desenho curricular claro, objetivo e coeso; que a formação continuada dos professores seja
frequente e que nela sejam realizadas oficinas de aproximação com as tecnologias digitais; uma
gestão educacional participativa e comprometida com a sociedade, tendo um canal de comunicação
aberto e transparente; e um sistema de acompanhamento de curso capaz de verificar as fragilidades
e potencialidades resultantes das práticas de ensino e aprendizagem.
A educação deve ser a grande mola propulsora para encontrarmos fundamentações teóricas
coerentes, para tomarmos decisões metodológicas, para aplicarmos as didáticas que surtam efeito,
para capacitar alunos independente da modalidade escolhida por eles.
Diante do exposto, observa-se que o diferencial de entendimento das modalidades e usabilidades
qualitativas das mesmas está relacionado as visões e posicionamentos singulares. São apenas
escolhas de modos de fazer e aprender. Isso porque o que irá aproximar as duas modalidades é o
entendimento da relevância da concepção de educação.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Biblioteca escolar: inclusiva?

Flomar Ambrosina Oliveira Chagas1, Kênia Reis de Souza2,

1Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação para Ciências e Matemática do Instituto


Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás/IFG, Câmpus Jataí, Brasil. flomarchagas@gmail.com
2Professora da Rede Estadual de Ensino de Jataí, Goiás, Brasil. kenniareis@yahoo.com.br

Resumo. Esta pesquisa de abordagem qualitativa, de caráter descritivo, estudo de caso, foi realizada entre
2015 e 2016, numa escola pública estadual de Jataí-Goiás, região Centro-Oeste do Brasil, com o objetivo de
compreender como a biblioteca escolar contribui no processo ensino e aprendizagem do aluno surdo. Foi
realizado levantamento sobre legislação da educação inclusiva. A coleta de dados se deu por meio de
observação, de entrevistas para saber: A biblioteca escolar cumpre a função pedagógica quanto ao material
didático de ciências e quanto ao aspecto humano em relação ao aluno surdo? Constatou-se pelos resultados
que o espaço da biblioteca é inadequado quanto ao aspecto pedagógico, físico e humano, não havendo
material impresso específico nem computador na biblioteca para acesso ao material digital, contribuindo
pouco para o ensino e a aprendizagem do aluno de necessidades especiais, principalmente o surdo.
Palavras-chave: Biblioteca Escolar; Ensino Fundamental; Educação Inclusiva; Surdez.

School library: inclusive?


Abstract. This qualitative research, descriptive, a case study, was conducted between 2015 and 2016, in a
state public school in Jataí-Goiás, Central-West region of Brazil, in order to understand how the school
library contributes to the teaching-learning process of the deaf student. A survey on inclusive education
legislation was conducted. The data collection was done through observation, interviews to know: The
school library fulfills the pedagogical function regarding the didactic material of sciences and About the
human aspect in relation to the deaf student? The results showed that the library space is inadequate in
terms of pedagogical, physical and human aspects. There is no specific printed material or computer in the
library for access to digital material, contributing little to the teaching and learning of students with special
needs, especially the deaf.
Keywords: School Library; Elementary School; Inclusive Education; Deafness.

1 Introdução

Este trabalho tem como temática a inclusão escolar. Ao atender às diferentes necessidades,
especialmente aos deficientes, a biblioteca escolar, torna-se um espaço democrático, garantindo o
direito dos alunos e de toda a comunidade escolar e do bairro.
De acordo com o Manifesto publicado, em 2000, pela Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Biblioteca Escolar faz parte do processo educativo e
deve, entre outras finalidades, estimular a aprendizagem, numa perspectiva de utilizar a biblioteca
ao longo da vida; deve criar condições de pesquisa para a aquisição de conhecimentos e de lazer;
deve apoiar os alunos no desenvolvimento da pesquisa, proporcionar recursos nas mais variadas
dimensões do setor social; dinamizar atividades que estimulem uma consciência social e cultural nos
alunos; cooperar com todos os elementos da comunidade escolar: professores, alunos, gestores
educacionais, pais e outros agentes educativos, na persecução das finalidades da Educação.
Assim, a organização do mobiliário da biblioteca escolar deve ser de fácil acesso, permitindo aos
estudantes acesso aos materiais disponíveis, deve-se preocupar com a eliminação de barreiras a
documentos pelos alunos com limitações motoras ou visuais; as estantes devem responder a um

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

conjunto de requisitos, como placas de sinalização frontais e laterais, bem como visor de prateleira. E
devem ser instalados equipamentos de informática, de audiovisuais. Deve dispor de documentação
em diferentes formatos, impressos, digitais e audiovisuais, devendo, assim, ter pessoas preparadas
para atendimento de alunos com deficiências.
Considerando como função da biblioteca escolar contribuir na formação científica dos estudantes, foi
proposto o seguinte problema de pesquisa: Como a biblioteca escolar se encontra, do ponto de vista
do material didático de ciências, aspecto humano, em relação ao aluno surdo, para o cumprimento
da sua função pedagógica?
Esta é uma pesquisa que teve como objetivo geral: compreender do ponto de vista do material
didático e humano como a biblioteca escolar contribui para o cumprimento da sua função
pedagógica de auxiliar no processo ensino e aprendizagem do aluno surdo. E como objetivos
específicos: investigar a existência ou não de materiais específicos para alunos surdos; averiguar e
avaliar a adequação do acervo bibliográfico para a formação científica desses alunos; detectar a
existência de bibliotecário, bem como os professores intérpretes da Libras que utilizam a biblioteca
como recurso pedagógico e sua atuação no atendimento aos estudantes surdos; realizar
levantamento, nos últimos anos, da legislação e dos estudos realizados que discutem a inclusão e a
função pedagógica da biblioteca.
Há um número reduzido de trabalhos publicados sobre esta temática. Biblioteca inclusiva se faz tão
ausente das pesquisas educacionais, mesmo que a presença da biblioteca seja tão antiga nas
sociedades. De acordo com Chagas (2010), a biblioteca escolar é um tema de pesquisa relevante e
também é um tema de investigação praticamente inexplorado. Assim, justifica-se a importância de se
estudar práticas de inclusão de surdos neste espaço. As leis vão surgindo no intuito de mudanças
para uma educação inclusiva.

2 Legislação sobre educação dos surdos

Registros históricos antigos apontam indícios de que a exclusão social é tão velha como a própria
humanidade e trazem em diferentes épocas – Antiga, Medieval, Moderna, Contemporânea – marcas
da segregação, da exclusão e da marginalização, tanto de homens quanto de mulheres.
Em diversos países, ao longo dos séculos, crianças não sacrificadas foram acolhidas por instituições
religiosas. Posteriormente, as instituições estatais, como os sanatórios, os asilos, os albergues e os
abrigos assumiram esta função, como lugar de ajuda, de ressocialização e de integração. Mas, de
acordo com Rodrigues (2006), a ressocialização e a integração não ocorreram, uma vez que estas
pessoas foram apenas armazenadas e amontoadas nesses espaços. Conforme Costa (2012), foi a
partir do século XVI que se iniciaram os primeiros serviços aos deficientes criados e mantidos pelo
Estado no mundo ocidental. Apenas em meados do século XX é que se começa a romper com a ideia
de que deficiente é um ser doente.
Em 1880, realizou-se em Milão, na Itália, o Congresso Internacional de Surdo-Mudez. Nesse evento,
contraditoriamente, a língua de sinais foi proibida na educação de surdos, e os professores surdos
foram excluídos e foi-lhes negado o direito de votar. Assim, o marco histórico inicial e real da
inclusão foi durante a década de 1990, com inúmeras convenções internacionais, como por exemplo,
a Convenção Mundial de Educação para Todos, realizada em Jomtien na Tailândia em 1990, que
oportunizaram as mesmas condições educacionais para todos e a Declaração de Salamanca realizada
na Espanha em 1994.
Ao longo dos séculos, no Brasil, não houve a preocupação com a educação formal dos alunos com
necessidade especial. As pessoas com deficiência, só tiveram seu início educacional em meados do

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

século XIX. Pode-se citar como marco principal a fundação, em 1854, do Imperial Instituto dos
Meninos Cegos – hoje, Benjamin Constant – e o Instituto dos Surdos-mudos em 1857.
A Lei de Diretrizes e Bases para o Ensino de 1º e 2º Grau, Lei 5.692 de 11 de agosto de 1971, diz
sobre a educação especial, mas foi com a Constituição Brasileira de 1988, no artigo 208, inciso III, que
estabelece “O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de atendimento
educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de
ensino” (BrasiL, 1988).
A partir dessa lei, as instituições escolares vêm se transformando em “escolas inclusivas”
independentemente da situação que passam. Porém, o reconhecimento da língua de sinais só veio
no ano de 2002, pela Lei Federal 10.436, regulamentada pelo Decreto 5.626, de 22 de dezembro de
2005. Essa lei reconhece a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como meio legal de comunicação e de
expressão, confere à Língua Portuguesa a condição de primeira língua apenas para as situações de
escrita e de leitura, ficando a Libras para todas as situações de fala, oralidade.
A Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394 de 20 dezembro de 1996,
estabelece o ensino especial como uma modalidade que se inicia na educação infantil e vai até o
ensino superior. Recebendo influência das convenções e das declarações internacionais, a referida
lei, no artigo 59, inciso I, assegura aos educandos com deficiência “currículos, métodos, técnicas,
recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades” (BRASIL, 1996). A
partir da LDB que se começou a dar os primeiros passos direcionados à educação inclusiva em nosso
país. De forma lenta e gradativamente, os sistemas de educação começaram a estudar formas de
cumprir e implementar o que a lei determina. O Art. 58, § 1º da LDB, diz que: “Haverá, quando
necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da
clientela de educação especial” (BRASIL, 1996). Ainda, os Parâmetros Curriculares Nacionais:
Adaptações Curriculares de 1999 pressupõem adaptação do currículo regular tornando-o apropriado
aos alunos com necessidades especiais. Se as leis buscam promover o desenvolvimento cultural dos
alunos com deficiência, então, a biblioteca escolar deve oferecer material especial a esses alunos.
A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) - Estatuto da Pessoa com Deficiência- lei nº 13.146, de 6 de julho de
2015, no artigo 2º, “considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo
prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições
com as demais pessoas” (LBI, 2015). Essa mesma lei, no artigo 28, inciso XI, assegura: “formação e
disponibilização de professores para o atendimento educacional especializado, de tradutores e de
intérpretes da Libras, de guias intérpretes e de profissionais de apoio”.
Orientações e leis internacionais e nacionais objetivam garantir educação de qualidade aos alunos
com deficiência. Estudos e experiências de Vygotsky (1997) mostram os caminhos a trilhar para a
construção de uma educação que seja de fato inclusiva nas escolas públicas.

3 Estudos defectológicos vygotskianos

Até a segunda década do século XX, poucos se interessaram em estudar esse universo tão
estigmatizado e, até mesmo, esquecido. Quando Vygotsky começou a pesquisar sobre defectologia,
o fez para entender mais sobre os indivíduos que apresentam algum tipo de “defeito” – aqueles que
não se encaixavam nos moldes normais estipulados pela sociedade, seja sob uma condição biológica,
seja sob uma condição física ou psicológica. Ele mesmo definiu a defectologia como “o ramo do saber
que trata sobre a variedade qualitativa do desenvolvimento de crianças anormais e da diversidade de
tipos de desenvolvimento” (Vygotsky, 1997, P. 37).
Dessas pesquisas, resultou sua obra Defectologia – reunião de seus textos, artigos, palestras e teses
acerca do tema. Vygotsky observou que a criança com deficiência não é menos desenvolvida, porém

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

apresenta um desenvolvimento especial. Alunos podem não ter as mesmas qualidades, habilidades
ou desenvolvimento que seus pares, mas podem apresentar outro modo de desenvolvimento
qualitativamente diferente daquelas consideradas normais.
Para este teórico, os educadores devem ter em conta as particularidades do desenvolvimento do
educando com deficiência, pois seu desenvolvimento é diferente do desenvolvimento do indivíduo
normal. Do ponto de vista pedagógico, alunos surdos ou cegos podem ser equiparados a um aluno
sem deficiência e alcançar êxito tanto quanto este, porém os caminhos e meios usados por aqueles
são diferentes. Essas formas e meios educacionais que levarão o aluno com deficiência ao êxito
devem ser apontados ou mostrados pelo pedagogo que é responsável pelo aluno, ou seja, “A
influência das ações exteriores organizadas é a força determinante da educação” (Vygotsky, 1997, p.
50).
Esse autor escreveu sobre os diversos tipos de deficiência como surdez, cegueira, deficiência física e
deficiência mental. Afirmou que os defeitos físicos como falta de audição ou de visão mudam a
relação da criança com o mundo e que tais defeitos ficam evidentes no relacionamento com as
pessoas que percebem esse (tal) fato como um comportamento social anormal.
Sobre educação social das crianças surdas-mudas, Vygotsky fala sobre o tipo de educação e o melhor
método de ensino e de aprendizagem para elas, reforçando que a surdez é mais um defeito biológico
do que social; que o defeito orgânico tem consequências sociais uma vez que a criança não percebe a
falta de audição como um defeito. A sociedade é que a faz entender que tem um defeito ao pensar,
ao planejar, ao organizar e ao regular o mundo para pessoas que ouvem.
Por meio de suas pesquisas, ele observou que as escolas especiais precisavam melhorar sua forma de
educar e de ensinar, pois elas são despreparadas para atender pessoas com deficiência, visto que
focam por demais o defeito da pessoa; dessa forma, educavam para a anti-sociabilidade. Assim
sendo, para Vygotsky (1997, p. 41), “Nossa escola, em lugar de retirar a criança do mundo isolado,
desenvolve geralmente na criança hábitos que o levam a um isolamento ainda maior e intensifica sua
separação”.
Ele alertou que as escolas especiais eram muito severas para ensinar a oralidade ao surdo e, ao
assim proceder, corriam o risco de paralisar a educação da criança ou até de regredir aprendizagem.
Para que isso não venha a ocorrer, a escola, tanto a regular como a especial, precisa trabalhar as
deficiências, por meio do trabalho criativo, da educação capacitadora, emancipadora, social, visando
à formação de um cidadão e de uma cidadã integral para a construção de uma sociedade inclusiva.
Contudo, alertou que a criança surda deve ser ensinada na escola regular de sua cidade, pois a escola
especial cria uma redoma bem adaptada à falta de audição, de forma que o surdo não tem contato
com a realidade nua e crua, tal como ela é; pelo contrário, fica afastado e isolado da vida real, do
mundo normal, e ainda, fortalece a prática da segregação, do separatismo e que acaba educando os
alunos para a antissociabilidade.
Sugeriu então que uma forma de resolver boa parte desses problemas estaria nas escolas para
crianças normais, na qual os surdos eram educados para viver em sociedade: “a educação é
considerada como parte da vida social e como a participação organizada das crianças nessa vida.
Educação e ensino na sociedade, por meio da sociedade e para a sociedade: esse é o fundamento da
educacão social” (Vygotsky ,1997, p. 125).
A educação não pode ter caráter filantrópico nem considerar os alunos deficientes como inválidos ou
semi-inválidos; ao contrário, deve centrar seus esforços em que a criança se sinta parte da sociedade
em que vive, bem como criar formas superiores de colaboração e que gere condições de adquirir
uma formação para o exercício pleno de uma profissão, pois “as crianças surdo-mudas vivem e
respiram como vivem e respiram todo o país” (p. 127).
Este autor elevou a defectologia ao nível de ciência materialista-dialética; salientou a importância
das atividades coletivas e colaborativas para a formação e o desenvolvimento de pessoas normais e

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

com deficiência. Seus estudos se tornaram base científica para estruturar o sistema educacional e
profissionalizante da Rússia, orientando um ensino diferenciado para os diversos tipos de deficiência
em crianças. Enfim, seu legado científico, até as primeiras décadas do século XXI, serve de alicerce e
apoio para o desenvolvimento educacional e psicológico de crianças com deficiência em diversos
países.

4 Metodologia

Esta é uma pesquisa de abordagem qualitativa, de caráter descritivo, com procedimentos de estudo
de caso. Foi realizada numa escola pública estadual da cidade de Jataí, Goiás, região central do Brasil.
“A abordagem qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador
como seu principal instrumento; os dados coletados são predominantemente descritivos; a
preocupação com o processo é maior do que com o produto” (Lüdke e André, 1986, p. 11). As
características elencadas pelas autoras se aplicam à pesquisa pela presença das pesquisadoras no
ambiente em que se desenvolveu a pesquisa, e isto é importante, uma vez que se compreende o
fenômeno estudado de forma abrangente. A descrição é uma atividade fundamental em um estudo
qualitativo e há esclarecimento sobre um determinado fenômeno, que nesta pesquisa foi a biblioteca
escolar para aluno com deficiência auditiva.
As duas pesquisadoras estudaram a biblioteca escolar e sua interação cotidiana para o aluno surdo.
Inicialmente, estabeleceram-se contatos formais com a gestão escolar, professores de ciências,
professores intérpretes da Libras e auxiliares de biblioteca. As técnicas de coletas de dados foram
observação participante e entrevistas. A observação participante é segundo Moreira (2008), uma
técnica que possibilita aos pesquisadores conhecer o mundo social dos participantes do estudo para
saber como é o cotidiano pesquisado.
A observação ocorreu, a maior parte do tempo, no recinto da biblioteca, para observar o espaço
físico e a atuação do auxiliar/bibliotecário no atendimento aos alunos com deficiência e as aulas
ministradas pelas professoras intérpretes ao aluno surdo. Durante a observação, fez-se o registro de
notas de campo sobre espaços internos e externos, aspectos inerentes ao funcionamento da
biblioteca escolar. A outra forma de coleta de dados foi entrevista semiestruturada que, de acordo
com Gil (2011), é uma técnica adequada para obter informações, sobre o comportamento humano.
A entrevista foi realizada com quatro sujeitos, sendo: duas funcionárias da biblioteca denominadas
(A e B) e duas professoras intérpretes da Libras (C e D), para compreender os desafios e as limitações
para o ensino e a aprendizagem do aluno surdo, assim como verificar a contribuição da biblioteca
escolar no desenvolvimento deste aluno e a dinamização de atividades, a partir do material
existente. Verificou-se a formação de cada uma das funcionárias, como este recinto contribui para a
formação do aluno surdo e como é o relacionamento dele com a biblioteca e com as pessoas da
escola. Foi realizado levantamento do acervo - material lúdico, livros, jornais, revistas e outro suporte
informacional, referente ao ensino de Ciências - para alunos com deficiência auditiva, entrelaçando
com o levantamento da legislação inclusiva e estudos sobre esta temática.
O produto final desta pesquisa de mestrado profissional, foi um livreto sobre conteúdo de ciências
do 8º ano, estudado com o aluno, de acordo com o nível intelectual dele e dos seus conhecimentos
da Libras com o apoio das intérpretes.
Antes da elaboração do produto, leu-se a matriz curricular, porém não se encontrou nela, nenhuma
referência sobre a educação para pessoas com deficiências. O planejamento e a preparação do
conteúdo ficavam sob responsabilidade das professoras intérpretes. Da mesma forma, não constava
do livro didático de Ciências adotado, nenhuma referência sobre alunos com deficiências. Durante a

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

realização da pesquisa, 2015/2016, havia aluno surdo apenas no 8º ano do Ensino Fundamental II, o
qual tinha a maioria de suas aulas numa das salas da biblioteca.
A estrutura física dessa unidade escolar contava com cinco salas de aula para turmas mistas que
funcionavam nos turnos matutino, vespertino e noturno com 585 alunos matriculados. Os cursos
oferecidos no ano da realização da pesquisa foram Ensino Fundamental II e o Ensino Médio.
Os alunos, na maioria, eram oriundos de bairros periféricos. Entre eles, haviam seis alunos com
deficiência matriculados, sendo: um aluno surdo e cinco com deficiência mental, todos com laudo
médico comprobatório. A escola possuía uma sala para secretaria e direção, outra sala que servia à
coordenação de turno e aos professores. Contava com as seguintes dependências: uma área entre
as salas de aula, uma saleta para coordenação da merenda escolar, sanitários masculinos e femininos
para alunos, e sanitários masculinos e femininos para professores e administrativos, uma cozinha,
um espaço denominado biblioteca dividida em três pequenas salas, uma quadra de esportes coberta
e um pequeno pátio para a circulação dos alunos. O Laboratório de Informática foi extinto e o
laboratório de Ciências não comportava uma turma de 35 a quarenta alunos.
A escola contava com 33 professores; destes, apenas 22 eram professores efetivos, onze deles eram
temporários que se tornava um dos principais problemas, pela rotatividade de professores. Em
2015, início da realização da pesquisa, houve mudança de professores de Ciências três vezes na
turma do aluno surdo; isso ocorria pela falta de concurso, não realizado ao longo da década vigente.
Quanto à formação acadêmica dos professores, eram todos graduados. Não havia no colégio grêmio
estudantil.

5 Discussão

A partir da coleta de dados, observações e entrevistas com as servidoras da biblioteca denominadas


(A e B) e com as intérpretes da Língua Brasileira de Sinais (Libras), nominadas (C e D), foi possível
verificar a situação da biblioteca escolar da instituição pesquisada quanto aos materiais pedagógicos
para alunos com deficiência auditiva. Verificaram-se aspectos do processo ensino-aprendizagem que
se desenvolve com o aluno surdo, sendo: 1- a aprendizagem do aluno surdo na disciplina de Ciências;
2- interesse pelos conteúdos ensinados na disciplina de ciências; 3- as dificuldades de aprendizagem
do aluno surdo; 4- as metodologias utilizadas pelas intérpretes da Libras e 5- a importância do ensino
de Ciências para o aluno surdo.
A biblioteca funcionama nos períodos matutino, vespertino e noturno, possuía três pequenas salas,
bastante exígua, com 5,80/3 m2, com pouco espaço de circulação para alunos cadeirantes, com
ventilação e iluminação insuficientes. A primeira sala, da recepção, tinha uma mesa com oito
cadeiras, prateleiras com livros didáticos dos alunos, livros paradidáticos para professor e gibis. Na
segunda sala, num espaço exíguo, ficam livros didáticos do professor, livros literários diversos,
enciclopédias, revistas de diferentes assuntos pedagógicos, livros infantis, um ventilador e uma
estante com livros específicos de um curso extinto. Havia, ainda, duas mesas e alguns banquinhos. A
terceira sala possuía carteiras de estudo, um quadro branco e um armário com vídeos produzidos
pela TV Escola. É nesta sala que os alunos com deficiências assistem à maioria das aulas. Para se
chegar à biblioteca, que fica no fundo da escola, e de frente para a quadra esportiva, há uma rampa
íngreme, estreita, que dificulta o trânsito de pessoas com dificuldade de locomoção, principalmente
em dias chuvosos.
O acervo consta de três mil livros literários/enciclopédias e dois mil livros didáticos, visto que “todos
os anos são acumulados na biblioteca os livros enviados pelo MEC” (B). A maioria das obras é doada
pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE). Esses dados revelam que a escola “deposita” toneladas de livros na biblioteca.
Não possui materiais específicos para os alunos com deficiência, nem acervo bibliográfico adequado

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para a formação científica deles, “não existe livros para deficientes na biblioteca”, afirma A,
confirmado por (B) que disse: “o único material para surdo na biblioteca é um livro com vários sinais
da Libras”.
Não há computadores na biblioteca da escola; os livros são catalogados manualmente, “não há
programas na internet selecionados na biblioteca para serem usados pelos professores e pelos
alunos surdos, aliás, nem temos computadores” (A). As intérpretes da Libras (C e D) afirmaram que
não desfrutam de programas da internet para as atividades do aluno surdo e ambas desconhecem
cursos para professores sobre o uso do computador para aulas com alunos surdos: “Se há cursos
sobre o uso do computador para professores de surdo, desconheço” (C). As intérpretes da Libras
utilizam seus computadores pessoais (notebooks), visto não haver computadores na biblioteca.
A falta de tecnologia digital na escola não é um problema específico dos alunos especiais, mas
constitui-se um problema para toda a comunidade escolar. É uma questão de políticas públicas para
a inclusão. As escolas carecem de materiais didáticos inclusivos, de todas as disciplinas.
Quanto ao processo ensino e aprendizagem do aluno surdo, sobre disciplina de Ciências, interesse
pelos conteúdos nesta disciplina e as dificuldades de aprendizagem, metodologias utilizadas pelas
intérpretes da Libras e a importância do ensino de Ciências para o aluno surdo, as intérpretes da
Libras disseram que a aprendizagem do aluno surdo é comprometida pela linguagem, confirmando
os escritos de Lacerda (2006, p. 165), ao afirmar: “dificuldades acarretadas pelas questões de
linguagem”. E para se ensinar qualquer disciplina ao aluno com deficiência auditiva, é preciso que o
professor disponha de metodologias lúdicas, envolventes, além da Libras.
Do ponto de vista humano, os sujeitos possuem formação inicial, duas em Pedagogia e duas em
Letras. As auxiliares de biblioteca tinham poucas familiaridades com a Libras, ambas exerciam o
cargo de professora, mas foram desviadas da função por causa de rouquidão, de artrose e lesão
meniscal (A), e (B) por problemas psicológicos e rouquidão. Nenhuma delas fez curso de atualização
para trabalhar em biblioteca. Confirmando assim, a tendência da maioria das bibliotecas escolares,
contar com servidores em desvio de função, sem formação específica (Chagas, 2016). Já as
intérpretes da Libras, (C e D), possuem curso de Libras e atuavam há dez anos na educação inclusiva
e são as responsáveis por preparar todo o material.
Verificou-se também que o maior problema de relacionamento tanto com os colegas, como com as
intérpretes da Libras e com as servidoras da biblioteca é a comunicação, por ele “não saber direito”
(C), ou por “não sabe muito bem a Língua Brasileira de Sinais” (D). O aluno surdo tem poucos
recursos de comunicação na escola, e nem ele e nem a comunidade escolar possuem fluência em
Libras, sendo os gestos e as mímicas as formas de comunicação. A problemática se inicia no próprio
lar. Filho de pais semianalfabetos, o aluno surdo não tem em casa suporte para a facilidade em
comunicar-se. Segundo Teske (2005, p. 147), “os surdos que têm pais ouvintes que não se
comunicam em sinais, sofrerão um processo de perdas culturais”. Ele “sabe sinais soltos, mas tem
dificuldade de formação de frases e textos [...], mas não consegue expor com clareza o que vê, o que
pensa, ele sabe utilizar bastantes substantivos soltos [...] sem domínio de formação de frases e de
textos” (D).
Ferreira (2015, p. 100) escreve que sobre o caso do estudante com deficiência, muito pouco mudou
“igualmente aos outros grupos vulneráveis, os estudantes que estão nas escolas continuam
segregados das atividades comuns aos outros alunos e vivem experiências de discriminação e
exclusão, como antes da política de inclusão escolar”. Assim, urge que a escola pública brasileira
procure fazer valer a lei 12.244/2010, (Brasil, 2010) que dispõe sobre a universalização das
bibliotecas nas instituições de ensino do país. Esta lei institui que todas as unidades de ensino
tenham bibliotecas equipadas com materiais como coleção de livros, documentos diversos, bem
como materiais videográficos capazes de dar suporte para a consulta, pesquisa escolar, estudo ou
leitura a alunos com deficiência ou não.

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A biblioteca não acompanhou os avanços tecnológicos para oportunizar aos jovens a aprendizagem,
especialmente aos jovens surdos. A biblioteca não tem material para atender ao usuário surdo e com
outras deficiências. O ambiente não atende às normas para a constituição de bibliotecas escolares
quanto ao mobiliário, ao material pedagógico, sobretudo material informatizado, audiovisual de
ciências para diferentes metodologias de aprendizagem, distante de ser um ambiente de interação
educativo envolvente com implementação de metodologias e de estratégias educativas que atendam
a individualidade de cada aluno, com melhores condições de atendimento aos estudantes surdos.
Para que o trabalho da biblioteca seja feito da melhor maneira possível, são necessárias ações do
poder público, como: cursos da Libras à comunidade escolar, principalmente às servidoras da
biblioteca. É importante que o funcionário da biblioteca saiba a Libras para se comunicar com alunos
surdos. É necessário oferecer recursos didático-pedagógicos, materiais de apoio próprio aos alunos
surdos, ultrapassar o referencial ouvinte como padrão educacional, criar práticas de ensino
comunicativas para a interação e a aprendizagem das pessoas surdas previstas pelo Atendimento
Educacional Especializado (AEE), pelo Plano de Ensino Individualizado (PEI) e os recursos das salas
multifuncionais, rever a prevalência das precárias condições existentes para que não se torne uma
exclusão de incluídos. Desta forma, a biblioteca escolar do ponto de vista do material didático de
ciências e ao aspecto humano, em relação ao aluno surdo, não se encontra adequada ao
cumprimento da sua função pedagógica.
Entre os inúmeros meios educativos, a biblioteca é complemento da sala de aula, recurso
indispensável para o desenvolvimento e a formação do educando, seja ele com deficiência ou não.
Ela é mediadora da aprendizagem, espaço democrático que precisa atentar para o atendimento
especializado do aluno com necessidades especiais.
A partir da presença de estudantes surdos, as condições dos estabelecimentos de ensino precisam
ser outras, pois o público não é mais formado apenas por discentes ouvintes, requer também
profundas mudanças nos projetos de formação de professores tanto surdos cono ouvintes. O
bilinguismo é o que pode ajudar para que ocorram transformações na concepção ideológica sobre o
que é ser surdo, para que aconteçam formas de ensino mais pertinentes a esse público. É preciso ir
ao encontro das necessidades dos alunos, especialmente os alunos surdos, grupo minoritário na
escola, visto que “ensinar o surdo a falar significa não só brindar-lhe com a possibilidade de
comunicar com as pessoas, como desenvolver nele a consciência, o pensamento, a autoconsciência”
(Vygotsky, 1989, p. 66). Assim, suas necessidades deveriam ser o principal ponto de atuação da
escola/biblioteca atendendo aos princípios da info-inclusão.

6 Conclusões

Pesquisas têm mostrado que bibliotecas escolares não têm sido valorizadas ao longo da história da
educação no país. Esta realidade persiste. As tecnológicas digitais estão ausentes deste espaço assim
como as dinâmicas educativas para alunos com deficiência, dificultando a interação, a inclusão social
das pessoas cegas, dos cadeirantes, dos ouvintes e dos surdos. Espera-se que esta pesquisa seja
fonte de estudo para os que militam na educação dos surdos e para os que lutam contra o silêncio,
isto é, a surdez das bibliotecas escolares na garantia de direitos às cidadãs e aos cidadãos com
deficiência. Para Skliar (2005), precisa-se entender a surdez como diferença não como doença. Desta
forma, para uma educação inclusiva, é importante a mudança no ensino como um todo, incluindo
mudanças no material didático pedagógico na biblioteca escolar.
A observação e a entrevista como técnicas desta pesquisa qualitativa foram fundamentais para
verificar que a biblioteca escolar da instituição contribui muito pouco para o cumprimento da sua
função pedagógica, de auxiliar no processo ensino e aprendizagem do aluno com deficiência,

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principalmente os surdos. A biblioteca escolar necessita de material de todas as disciplinas para


aluno surdo, material, como por exemplo, computador e internet, que possa ser utilizado em
substituição aos materiais convencionais. Urge acompanhar os avanços tecnológicos para
oportunizar que os jovens surdos estudem com metodologias inovadoras. Assim, esta pesquisa
mostrou que a biblioteca escolar não se encontra adequada para receber usuários com deficiência,
há necessidade de reestruturar suas áreas internas e externas. O ambiente da biblioteca é exíguo
para alunos cadeirantes circularem; não há materiais específicos para os alunos com deficiência em
surdez, os auxiliares da biblioteca, em desvio de função, não fizeram curso de aperfeiçoamento para
trabalhar na biblioteca e não fizeram curso da Libras para atender alunos surdos neste recinto.
O ambiente ainda é bastante carente em relação às normas para a constituição de biblioteca escolar
quanto ao mobiliário, ao material pedagógico, sobretudo material informatizado e audiovisual de
ciências para diferentes metodologias de aprendizagem. Não se encontrou conjunto de bibliografia
sobre essa temática, nem material de ciências para alunos com deficiência auditiva e demais alunos
com diversas limitações. Os livros didáticos de Ciências adotados e a matriz curricular são omissos,
calam-se, quanto à educação para pessoas com deficiências.
Há necessidade de rever o projeto educativo, o que exige outras formas de atuar, principalmente
quanto às funções da biblioteca escolar, suas finalidades perante a instituição escolar. O trabalho
pedagógico construído e desenvolvido na escola e na biblioteca deve criar condições de mudanças
em benefício do aluno surdo. Necessita-se repensar a metodologia usada, que não deve ser a mesma
para os alunos ouvintes, isto é, a mesma lógica da homogeneização. Eis o grande desafio diante dos
limites, da excessiva carga horária dos professores que traz dificuldades na elaboração do
planejamento em conjunto, além de ter perspectiva de acesso às informações e condições de
permanência. Essas ações abrem novos horizontes para uma educação e uma sociedade mais justa.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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Pesquisa qualitativa e conhecimento geométrico: aberturas de


compreensão

Marli Regina dos Santos1, Maria A. V. Bicudo2


1
Departamento de Matemática da Universidade Federal de Viçosa/MG, Brasil. marliregs@gmail.com
2
Departamento de Educação Matemática da UNESP/Rio Claro, Brasil. mariabicudo@gmail.com

Resumo. Neste artigo apresentamos procedimentos e concepções da pesquisa qualitativa fenomenológica e


possibilidades que ela abre para a área da Educação Matemática, trazendo como objeto de análise um estudo
de cunho fenomenológico que indaga sobre o conhecimento geométrico. Inicialmente destacamos aspectos,
posturas, procedimentos e o movimento da pesquisa fenomenológica e suas interfaces com a área. Em
seguida discutimos a emergência da fenomenologia em um estudo que investigou, em uma pesquisa junto a
alunos de graduação, aspectos significativos da constituição de ideias geométricas, focalizando em seus
aspectos humanos e existenciais.
Palavras-chave: Geometria; Fenomenologia; Conhecimento; Educação Matemática; Procedimentos.

Geometric knowledge and phenomenology: openings of understanding


Abstract. In this article we present procedures and conceptions of the phenomenological research and
possibilities that it opens for the area of Mathematics Education, bringing a phenomenological study that
inquires about the geometric knowledge. Initially, we emphasize aspects, postures, procedures and stages of
phenomenological research and their interfaces with the area. Next, we discuss the emergence of
phenomenology in a study that investigated, in a course with undergraduate students, significant nucleus of
the production of geometric ideas, focusing on their human and existential aspects.
Keywords: Geometry; Phenomenology; Knowledge; Mathematics Education; Procedures.

1 Educação Matemática e fenomenologia: interfaces possíveis

A Educação Matemática é um campo de pesquisa e prática que aborda aspectos relacionados à


educação, à matemática, à visão de mundo, ao ensino e aprendizagem de conteúdos, à produção de
conhecimentos etc. (Bicudo, 2010). Em sentido amplo, a Educação Matemática pode ser apresentada
como campo de investigação e de atuação de educadores, onde surgem pesquisas que, ao mesmo
tempo em que emergem desse cenário, buscam trazer contribuições para a prática, para o
entendimento da produção de conhecimento, para a implementação de novas metodologias, novas
pesquisas, ações e políticas.
Voltando-nos especificamente para a investigação em Educação Matemática, muitos são os modos de
proceder a fim de obter e analisar os dados de pesquisa, explicitando métodos e metodologias que
visam, para além de medir ou contabilizar informações, compreender e interpretar a complexidade do
problema investigado, como, por exemplo, aquele que envolve as interações entre os sujeitos da
aprendizagem.
No universo dessa área de conhecimento, existe uma variedade de estudos, com os mais distintos
objetivos, com métodos e maneiras de proceder que buscam se sintonizar ao foco da investigação, por
meio da metodologia de pesquisa. Araújo & Borba (2004) explicam que a metodologia é uma interface
que engloba pergunta, referencial teórico e métodos que devem estar em consonância com a visão de
mundo do pesquisador, pois isso possibilita que as fases da pesquisa se complementem, revelando o
fenômeno ao seu olhar indagador. A escolha de uma metodologia envolve diferentes nuanças que

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relacionam o estudo, as crenças do pesquisador, as formas de obter os dados e de analisá-los, os


aspectos que se espera explicitar e os métodos disponíveis.
Diversos estudos na Educação Matemática, muitas vezes, solicitam focar a subjetividade dos sujeitos
e também os sentidos e significados que se constituem durante a sua realização. Trabalhar nessa
direção indica ser inviável a abordagem quantitativa de pesquisa, já que a compreensão dos
fenômenos humanos, devido à sua complexidade, não se apresenta como passível de ser tratada como
um sistema de variáveis que podem ser descritas e manipuladas, a fim de prever o que ocorrerá com
os sujeitos em determinadas situações similares.
A insatisfação dos pesquisadores das ciências humanas em relação aos procedimentos considerados
“confiáveis” pelo paradigma positivista, procedimentos esses enquadrados na abordagem empírico-
analítica a qual segue passos determinados para a coleta e análise dos dados, primordialmente
quantitativos, por meio de análises estatísticas e de medições, levou à emergência de novas formas de
se pesquisar. Assim, a pesquisa qualitativa ganha força e passa a ser assumida na realização de estudos
que têm como foco entender e interpretar dados e discursos de indivíduos ou grupos, em situações
nas quais se busca compreender a dinâmica ali constituída e não propor receitas ou fazer previsões
quanto ao tema em questão.
A fenomenologia é uma das linhas filosóficas que está em consonância com a abordagem qualitativa.
Ela busca compreender os sentidos percebidos pelos sujeitos ao focarem um fenômeno específico e
os significados que se articulam nos atos intencionais da consciência, no mundo junto aos cossujeitos.
Um fenômeno é experienciado por um indivíduo que o vivencia ao perceber o fenômeno por ele
intencionado. A vivência é um movimento, portanto, não é pontual, e diz da experiência de perceber-
se percebendo, ou seja, de dar-se conta de estar percebendo algo. Há sempre uma relação entre o
fenômeno que se mostra e o sujeito que o percebe (Martins & Bicudo, 2005, p. 76). Ele (o fenômeno)
é o que é visto disso que se mostra, e o que se mostra, mostra-se para alguém, de uma perspectiva.
“Nesse encontro o percebido (noema) é “enlaçado” por aquele que percebe (noesis)” (Bicudo, 2010).
Destacando na pesquisa qualitativa a abordagem fenomenológica, buscaremos explicitar seus modos
de proceder e a visão de mundo que a sustenta, trazendo ao final a análise de um estudo que tem
como foco o conhecimento geométrico revelado de modo espontâneo, originado das vivências de
calouros graduandos de um curso de Matemática, sem a exigência de atenderem a rigores
matemáticos ou aspectos formais ou axiomáticos.
Dentre as perguntas que direcionam esta discussão, destacamos: porquê realizar um estudo
fenomenológico? O que o diferencia de outro estudo qualitativo? O que o aproxima? Quais aspectos
fazem do estudo fenomenológico uma pesquisa rigorosa? Qual a relação entre fenomenologia e
conhecimento geométrico? entre outras.

2 Pesquisa fenomenológica: procedimentos e busca pelo rigor

Nos dizeres de Joel Martins:


a Fenomenologia é, neste século XX, principalmente, um nome que se dá a um
movimento cujo objetivo precípuo é a investigação direta e a descrição de
fenômenos que são experienciados pela consciência, sem teoria sobre a sua
explicação causal e tão livre quanto possível de pressupostos e de pré-
conceitos. (Martins, 1992, p.50)
Trabalhar na perspectiva fenomenológica é buscar a compreensão do fenômeno focado em suas
formas de se doar ao olhar do pesquisador. Para Bicudo, a fenomenologia “[...] pode ser entendida
como o estudo que reúne diferentes modos de aparecer o fenômeno ou o discurso que expõe a

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inteligibilidade em que o sentido do fenômeno é articulado” (Bicudo, 1993, p. 14), revelando aquilo
que é indagado.
Voltar-se para o fenômeno buscando compreender suas diferentes facetas exige do pesquisador uma
postura que direciona todo o pesquisar. Mas o próprio pesquisar, ao mesmo tempo, também
influencia direcionamentos, no movimento de idas e vindas que vai delineando o traçado da pesquisa.
Ao realizar um estudo, os diversos momentos da investigação não são estanques ou separados entre
si, mas se enredam durante o pesquisar, num complexo que vai além do objeto da pesquisa,
abordando sujeitos, pesquisador, textos, recursos etc.
A pesquisa fenomenológica trabalha com a descrição da percepção do fenômeno vivenciado pelos
sujeitos considerados significativos, entendidos como aqueles que vivenciam experiências
concernentes à interrogação da pesquisa. Ao dar destaque ao relato dessas vivências, o pesquisador
busca pelos sentidos evidenciados por eles. Ele não está preocupado com fatos, mas com o que o
vivenciado diz para o sujeito investigado (Martins & Bicudo, 2005, p.93). Assim, a fenomenologia é um
modo de proceder em sintonia com uma visão de mundo que traz em seu cerne a busca de sentido do
investigado, e não a comprovação de teorias prévias.
O pesquisador volta-se para o fenômeno sem pré-conceitos que possam direcionar o seu olhar e
organiza descrições da experiência vivenciada pelos sujeitos de seu estudo, direcionando seus esforços
na tentativa de compreender o que se mostra ao seu olhar interrogativo, sem pressuposições
antecipadas ou hipóteses a serem comprovadas. O pesquisador obtém e analisa os dados da
experiencia vivida, explicitando aquilo que se evidencia ao longo do pesquisar. Busca olhar o que se
mostra e caminha em direção à análise, orientado pela questão diretriz da investigação. A interrogação
é quem guia o seu olhar. Esse é um movimento dinâmico no qual sujeito, pesquisador e pergunta
tecem uma trama dinâmica e complexa.
[...] a interrogação, o interrogado, o pesquisador e a investigação,
fundem-se em um só organismo, que constitui o seu próprio
movimento. Isto dá dignidade à interrogação e à investigação. E coloca
a interrogação, que brota do interrogado sob o olhar do pesquisador,
a serviço da investigação, que tem como proposta iluminar a pergunta
abrindo horizontes. (Kluth, 2001, p. 75)
Cabe destacar que, na pesquisa fenomenológica, o pesquisador não é tido como neutro nem espera-
se que mantenha-se neutro diante do que busca compreender, ou seja, não se desconsidera suas
vivências e as experiências que o constituíram, ao contrário, elas se imbricam ao pesquisar. Mesmo a
interrogação que guia o estudo surge, muitas vezes, em meio às suas vivências nesse mundo que é
social e cultural. Negar o próprio
pesquisador é caminhar sem o solo que sustenta a pesquisa.
Entretanto, o pesquisador coloca em suspensão suas crenças prévias ou teorias que já dizem sobre o
fenômeno em foco. Toma-o do seu “ponto zero”, dado pelo seu corpo-próprio1, explicitando a todo
momento suas ações e tomadas de decisão, bem como os modos pelos quais compreende e articula
suas compreensões.
Mesmo sabendo da impossibilidade de abranger todas as dimensões do fenômeno investigado, o
pesquisador busca andar ao seu redor, cercando-o e olhando-o de diferentes perspectivas, a fim de
compreendê-lo em sua complexidade.
Sabendo que os destaques que realiza na leitura das descrições das vivências dos sujeitos de seu
estudo também dizem do seu próprio modo de perceber o mundo, ele explicita suas tomadas de
posição visando ao rigor de sua investigação.

1 Corpo-próprio “entendido como Leib, corpo com movimento intencional” (Bicudo & Kluth, 2010, p.135).

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Outro aspecto a ser ressaltado é que os procedimentos fenomenológicos não pretendem legitimar ou
generalizar conclusões. Não se busca conclusões fechadas e estanques, que pretendam dar conta de
toda a complexidade do investigado. Em um estudo qualitativo, essa pretensão nem é almejada por
compreender-se que ela envolve uma multiplicidade de fatores e aspectos que nem sempre são foco
do olhar indagador do pesquisador, ainda que se entrelacem na constituição do fenômeno.
Assim, o que se busca é uma abordagem interpretativa que permita avançar nas análises e
compreensões, enfatizando a explicitação dos sentidos e significados quanto ao investigado.
Na pesquisa fenomenológica, o pesquisador fica atento às descrições obtidas dos relatos dos seus
sujeitos. Lê tais descrições tantas vezes quanto preciso for para que se faça o sentido do que está
sendo dito pelo sujeito. Então, norteado pela interrogação de sua investigação, destaca passagens
importantes que dizem do interrogado. Esses destaques, seguindo Martins e Bicudo (2005) e Bicudo
(2011), são denominados Unidades de Sentido.
As descrições constituem os dados a serem analisados e as unidades de sentido, destacadas delas, são
interpretadas hermeneuticamente, à luz do dito no texto da descrição, do contexto da investigação
que está sendo realizada, dos estudos na área. Depois de articuladas e expressas na linguagem do
pesquisador, tem-se as unidades de significado.
Em um movimento que intenta compreender o trazido pelos sujeitos significativos que dizem do
fenômeno investigado na pesquisa que está sendo realizada, o pesquisador busca reunir, de modo
articulado, sentidos e significados explicitados das unidades de significado em ideias mais abrangentes,
realizando o que, em fenomenologia, denomina-se “redução” (Bicudo, 2011). Nesse movimento vão
sendo articuladas convergências, expondo invariantes do fenômeno e apontando singularidades ou
idiossincrasias. Esse procedimento permite que se transcenda o expresso nos individuais (ou nas
vivências pontuais de sujeitos), caminhando-se para uma compreensão mais abrangente do
fenômeno.
Quanto às formas de relatar os dados constituídos, o investigador pode se valer de diferentes
linguagens, como diário de observação participante, entrevista, filmagem etc. Tendo em vista a
importância da descrição para a compreensão do fenômeno investigado, as ações, as expressões, os
diálogos e mesmo os silêncios dos sujeitos devem ser minuciosamente relatados, possibilitando a
realização das análises posteriores. A fim de englobar a amplitude da vivência em destaque, o
pesquisador procura dar perspectiva à sua descrição, relatando as expressões e gestos dos envolvidos
nos diálogos, apontando detalhes de suas próprias ações.
As análises dos dados constituídos se dão em dois momentos: na análise ideográfica e na nomotética
(Martins, 2005; Bicudo, 2011). A “passagem” de uma para outra é um caminhar que inicialmente dá
destaque aos individuais, buscando, então, em um ato de teorização, as camadas de sentido que se
articulam, conforme compreensões do pesquisador, em ideias mais abrangentes, apontando
características estruturantes a esses individuais.

2.1 A Análise Ideográfica e as Cenas Significativas

Na análise ideográfica, o pesquisador busca uma síntese transitória de compreensão do fenômeno. Ele
volta-se atentivamente para as suas descrições, sob o foco da interrogação, o que permite que se
iluminem aspectos significativos que possibilitam desvelar o fenômeno sob certas perspectivas. Esses
aspectos significativos, “recortados” das descrições, são denominados unidades de significado. Essas
unidades só existem em relação à atitude e disposição do pesquisador, que imerge em suas descrições.
Nessa fase da investigação, “o pesquisador deve deixar que o sentido se revele, e, esse deixar requer
uma atividade elevada, e não passiva, já que é nela que emergem as possibilidades de compreensão
do que está sendo investigado” (Paulo, 2006, p. 54).

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Ele busca, nas descrições, manifestações revelatórias pertinentes que possam conduzi-lo no pesquisar
e mobiliza seu pensar no sentido de esclarecer a descrição, em uma postura que intenta possibilidades
de compreender. Por meio da identificação e interpretação dessas unidades que se apresentaram
como significativas diante da questão diretriz de seu estudo, o pesquisador avança, atento também
para a organização e para os modos de proceder a fim de expor sua compreensão e a análise que
realiza.
Em estudos de campo nos quais as descrições emergem das interações entre os sujeitos, de modo
dinâmico e articulado, envolvendo, muitas vezes, diversas falas, gestos e disposições, é preciso se
atentar para esse pano de fundo onde ocorrem as manifestações dos sentido e significados que o
pesquisador intenta desvelar. Pode ocorrer de as unidades de significado buscadas por ele se
destacarem não nas falas ou gestos individuais de um sujeito, mas em meio às interações entre eles e
que sustentam as ações e expressões.
Nesses casos, o sentido de uma unidade se desvela quando considerada no contexto em que surgem,
muitas vezes em diálogos que se sustentam na complementação das falas e expressões dos sujeitos
envolvidos.
A fragmentação dos diálogos em frases solitárias e desconexas do pano de fundo de onde se originam
pode extinguir a unidade de sentido que o pesquisador identifica em suas descrições, pois as
interligações das manifestações dos sujeitos, ao ocorrerem de forma entrelaçada, repentina e
autêntica, são constituintes do núcleo significativo em destaque, e não fragmentos de falas isoladas.
Desmembrar a unidade de significado em recortes de falas individuais poderia comprometer o
movimento de análise do pesquisador.
No sentido de evitar que esse núcleo, ou unidade, se extinga, e na busca por evidenciar o sentido
desvelado, o pesquisador delimita os recortes das descrições em trechos mais amplos denominados
cenas significativas, conforme a perspectiva de Detoni & Paulo (2000, p.164). São recortes de grande
importância diante da pergunta diretriz, e que revelam o núcleo de sentido que possibilita ao
pesquisador ver uma ideia sendo própria a uma série de manifestações convergentes para ela
[...] Além de ver estas manifestações em cada sujeito, há uma
atribuição comum de significados que o grupo todo de sujeitos
intencionados na experiência deixa ressaltar na iminência do
intersubjetivo. Cada sujeito articula compreensões que necessitam ser
comunicadas ao outro, em uma experiência de alteridade que se
expressa numa rede comum de significados constituídos. (Detoni &
Paulo, 2000, p. 150)

O recorte das cenas não visa apresentar um encadeamento linear das interações entre os sujeitos, mas
possibilitar a compreensão dos sentidos revelados no cenário da pesquisa. Cenário é uma maneira de
dizer do todo que motiva a ação. Os sujeitos, em uma atitude não predicativa, falam, se expressam,
movendo-se num todo aberto ao outro, aos pré-conhecimentos do mundo cultural de cada um, às
experiências passadas que se retomam (Detoni & Paulo, 2000, p. 150). Destacar as unidades
significativas do cenário de onde brotam possibilita que elas se revelem em sua complexidade.
Assim, ao indagar pelas unidades significativas visando desvelar o fenômeno investigado, o
pesquisador busca organizar os trechos que destaca de suas descrições de modo que possa expressar
o núcleo de sentido que se mostra para ele. Após explicitar as unidades ou as cenas significativas que
emergem das descrições, o pesquisador volta-se novamente para elas, interpretando-as e continuando
a explicitar seus procedimentos, avançando em direção à análise nomotética.

316
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2.2 A Análise Nomotética e a compreensão do fenômeno

Na análise nomotética, o pesquisador busca as convergências das unidades de significado que


apontarão aquilo que se mantém, que é essencial, ao fenômeno questionado, mostrando sua
estrutura. Nesse momento, o pesquisador retoma a análise dos individuais em direção a uma
compreensão geral do fenômeno (Martins & Bicudo, 2005), em um movimento reflexivo no qual se
volta para as unidades significativas, interrogando-as novamente, buscando o que dizem do
interrogado, articulando sentidos e significados em ideias mais abrangentes, de modo a compreender
a estrutura do fenômeno. O pesquisador articula suas compreensões quanto às unidades ou cenas,
elaborando asserções que as perpassem, buscando pelas ideias gerais que as reúnem.
Estando as asserções entrelaçadas, elas são agrupadas de forma a explicitar o pensar do pesquisador,
evidenciando as articulações que ele realizou em seu pensar teorizante. As asserções apontam para as
categorias que dizem do fenômeno investigado, as quais se articulam às descrições e às vivencias dos
sujeitos, na rede tecida ao longo da pesquisa.
O pesquisador identifica essas ideias mediante asserções que possam expressar os sentidos e
significados reunidos nesse todo.
Esse movimento da pesquisa não expõe uma “descoberta” individual, mas um conhecimento
desvelado ao pesquisador por meio de suas leituras, do diálogo com outros pesquisadores e com os
sujeitos significativos, mediante as descrições que elaborou e a sua atenção às vivências dos seus
sujeitos significativos.
Ele busca, nesse movimento, o que é característico ao fenômeno investigado, expondo suas
compreensões sobre sentidos e significados que se abrem no transcorrer da análise.
As ideias abrangentes são focadas, agora, em um movimento interpretativo em que o pesquisador fica
atento ao que dizem do fenômeno interrogado e do seu significado para a área de pesquisa. Ele busca
um entendimento mais aprofundado e abrangente, visando transcender uma compreensão pontual.
Na análise das ideias abrangentes – também denominadas categorias – que se revelam no movimento
atento em torno dos dados, o pesquisador busca interpretar e compreender o fenômeno estudado,
articulando-as e expondo o fio que tece essa articulação, podendo dar um salto de teorização no que
concerne ao interrogado.

3 Uma análise fenomenológica frente ao conhecimento geométrico

O estudo destacado nesse artigo tematiza o conhecimento geométrico atentando para os modos de a
Geometria se dar no mundo-vida2, em um nível pré-teórico, ainda não desdobrado em interpretações
por meio da linguagem específica do fazer matemático, ou seja, em um nível existencial e não
axiomático, sem se basear em teorizações nas quais já estão presentes as formalizações dos teoremas
e definições.
Como explicitado neste artigo, para além de uma metodologia de pesquisa, a fenomenologia é um
modo de se voltar para o mundo, no qual as concepções quanto à conhecimento, ensino,
aprendizagem etc. enredam modos de proceder em consonância com uma visão que busca pelos
aspectos existenciais e humanos dos fenômenos, cotidianos ou não.

2 Conforme Bicudo (2010, p. 23), mundo-vida é “entendido como a espacialidade (modos de sermos no espaço) e
temporalidade (modos de sermos no tempo) em que vivemos com os outros seres humanos e os demais seres vivos e
natureza, bem como, com todas as explicações científicas, religiosas, e de outras áreas de atividades e de conhecimento
humano. Mundo não é um recipiente, uma coisa, mas um espaço que se estende à medida que as ações são efetuadas e
cujo horizonte de compreensão se expande à medida que o sentido vai se fazendo para cada um nós e para a comunidade
em que estamos inseridos”.

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Em uma postura fenomenológica, concebemos que o conhecimento científico, ou geométrico em


especial neste artigo, ainda que traga em seu cerne a formalização que se dá no modo específico do
fazer matemático, não se desliga de suas relações mundanas, pois nasce no solo do mundo-vida e dele
se nutre, sendo portanto histórica e culturalmente constituído em sua objetividade.
Assim, buscando pelas vivências e sentidos cotidianos presentes na produção do conhecimento
geométrico, foi realizado um curso de extensão junto a onze estudantes calouros de matemática de
uma universidade pública federal brasileira, que abordou a disposição de entes geométricos e as
relações espaciais entre eles, por meio da utilização de diferentes recursos materiais. O foco de nossa
atenção direcionou-se para os aspectos significativos das ideias geométricas abordadas nas atividades,
discutidas pelos estudantes em suas interações ao longo dos encontros, enfatizando as compreensões
e interpretações expostas, sem ter a preocupação com o tratamento formal dos conteúdos nem com
a utilização de uma linguagem axiomatizada, mas atentando para as manifestações de compreensões
prévias e possibilidades de desdobramentos para as ideias e conceitos geométricos.
A partir das descrições obtidas ao longo do trabalho de campo junto aos sujeitos significativos da
pesquisa, foi realizada a redução fenomenológica, buscando explicitar unidades de significado, à luz
da pergunta diretriz: “Como se dá o ensino e a aprendizagem da geometria assumida nos aspectos de
compreensões pré-predicativas e nos encaminhamentos que direcionam para uma produção
geométrica?”. Efetuando a análise ideográfica, foram identificadas cenas significativas que
convergiram, na análise nomotética, para cinco ideias nucleares, ou categorias, que dizem da
possibilidade da produção em geometria: manifestação de compreensões prévias e possibilidades de
desdobramentos para as ideias e conceitos geométricos; movimentação do corpo-próprio
expressando compreensão; modos de proceder e horizonte de aberturas; comunalização; e apoio no
material manipulável: possibilidades e limites.
Indagando pela estrutura da rede tecida ao longo da pesquisa, o estudo avançou por discussões quanto
à produção geométrica em seus aspectos humanos, ou seja, enquanto vivências que se dão na
temporalidade e espacialidade das relações intersubjetivas que ocorrem no ambiente do estudo, no
movimento intencional de busca de compreensão do outro e do entorno, realizado subjetiva e
intersubjetivamente na medida em que as interações aconteciam, revelando a riqueza do
conhecimento construído nas interações entre os sujeitos.
Destacaram-se, nas manifestações dos sujeitos, aspectos de suas experiências, escolares ou não,
matemáticas ou não, que dizem de compreensões, associações, relações etc., sugerindo fortes
entrelaçamentos com as ideias e conceitos geométricos formalmente considerados, mas que, em
princípio, podem ser considerados inadequados aos procedimentos da matemática. Entendendo que
tais aspectos destacam diversas significações e experiências concernentes à Geometria, as expressões
pré-predicativas expostas pelos estudantes direcionam para características, propriedades e
entendimentos que indicam possibilidades de exploração dos sentidos percebidos em um trabalho
pedagógico voltado para esses sentidos.
A manifestação de compreensões relacionadas aos significados matemáticos se apresentam, por
exemplo, na ênfase quanto à medida do ângulo determinado por duas retas perpendiculares, como
sendo reto ou de noventa graus; no destaque para a infinitude de uma reta ou de um plano; no uso de
palavras como área para dizer de uma região específica; na compreensão de um sistema de
coordenadas e de seus elementos; no uso das palavras conhecidas, como quadrante para dizer de
outro objeto matemático; na explicação de paralelismo como impossibilidade de intersecção; etc.
O termo distância, por exemplo, é usado pelos estudantes de modo inadequado para dizer sobre o
que é o ângulo, já que, matematicamente, a distância entre os dois lados de um ângulo é nula (pois
eles se interceptam). Porém, ao ser falado para dizer do ângulo, o termo distância se doa no sentido
das vivências cotidianas, destacando, juntamente com os gestos expostos pelos estudantes, a região

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interna aos lados do ângulo, sendo, portanto, passível de compreensão pelos demais e de
desdobramentos de entendimentos.
No estudo, ao se explicitarem as diversas expressões dos alunos e os conceitos aos quais remetiam,
foi possível avançar na discussão de possibilidades de compreensões mais abrangente, em direção aos
sentidos e significados presentes na matemática, tomada de uma perspectiva formal, em sintonia com
as compreensões prévias dos estudantes.
Estar junto aos estudantes, buscando compreender para além da vivência específica de uma atividade
de geometria, adentrando por análises quanto aos entendimentos e sentido expressos, solicita uma
abertura que dá destaque ao “ouvir”, ou seja, perceber dúvidas e reelaborar ações, visando que a
idealidade própria aos conteúdo geométrico, em sua formalidade ou não, seja vivificada pelo outro.
Muitas vezes, nos espaços de ensino, aquele que ensina pretende que o conteúdo faça, ao outro, o
mesmo sentido que faz pra ele. Mas, adentrar dialogicamente pelas possibilidades significativas de
determinada ideia geométrica revela um ir além de um sentido pontual e determinado. É a co-
presença eu-outro, que se expõe em um solo de experiências co-partilhadas, que sustenta a
compreensão do que o outro diz, permitindo que certa ideia também faça sentido para os colegas,
mesmo na complexidade da polissemia dos termos diante da impossibilidade de se aprisionar os
sentidos e significados em correspondência biunívoca com as palavras.
Os sentidos e significados evidenciados pelos sujeitos se presentificam por meio da linguagem e na
própria manifestação expressiva se vivencia um ato ativo e dinâmico de (re)elaboração daquilo que se
busca expressar. A expressão verbal carrega consigo sentidos dados culturalmente, mas que só dizem
na medida em que são significados subjetivamente, ou seja, vivificados pela consciência. Isso se dá
intersubjetivamente, ou seja, mediante sentidos e significados compreendidos e reelaborados na
medida em que se está com o outro, em um movimento de comunicação que ocorre pela empatia e
pela linguagem. A atenção em ouvir a exposição de uma ideia, a sintonia nas falas que se presentifica
no fluxo que movimenta a ação e os insights revelados ao outro indicam a constituição do espaço
intersubjetivo que permite que as (re)elaborações do sentidos e significados se deem.
A Geometria, enquanto uma área de conhecimento que trata de entes específicos por meio de uma
linguagem própria, é fruto das experiências intersubjetivas da comunidade de geômetras, trazidas e
reformuladas em sua objetividade, na história e na cultura. Por outro lado, tal Ciência, assim como
outras ciências teórico-formais, apesar de sustentar-se no mundo-vida, sofre um afastamento do seu
sentido na existência humana (Husserl, 2012). Ao voltar sua atenção para o conhecimento geométrico
prévio dos estudante, em uma postura fenomenológica, o estudo realizado apontou a importância dos
atos perceptivos no embasamento das ideias e conceitos, indicando que o professor pode destacar
atividades que valorizem os modos de expressão das compreensões de seus alunos e a exploração de
seu entendimento, buscando dar sentido ao conceito ou teoria que visa ensinar, por meio da atenção
aos atos intencionais e às vivencias das quais o conhecimento geométrico se origina.

4 Conclusões

Neste texto, buscamos apresentar o modo de conduzir a pesquisa em Educação Matemática segundo
a abordagem fenomenológica. Nossa intenção não foi a de apresentar “passos” que devem ser
estritamente traçados na pesquisa fenomenológica, mas apontar etapas importantes e caminhos do
pesquisar, bem como possibilidades de ação.
Dessa forma, abordamos aspectos imprescindíveis à pesquisa fenomenológica, destacando desde a
postura do pesquisador, frente aos dados, aos sujeitos investigados e ao campo no qual obtém seus
dados, até a análise dos dados obtidos.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Como educadores matemáticos, nos deparamos com diversos estudos e pesquisas que solicitam um
olhar cuidadoso e rigoroso diante dos dados e que permitam efetuar um salto entre o simples relato
de caso e a análise rigorosa que possibilite apontar os aspectos constituintes do fenômeno e uma
teorização sobre o investigado.
A pesquisa em destaque buscou explicitar a sintonia entre o foco de investigação e a postura
fenomenológica, indicando desdobramentos possíveis das compreensões dos estudantes em direção
à construção coletiva do conhecimento geométrico, em suas possibilidades de compreensão, e
respectivas materializações (por meio da linguagem, por exemplo), como o núcleo da constituição do
conhecimento geométrico intersubjetivamente construído.
Estar com o outro em situação de ensino é também mobilizar compreensões quanto àquilo que se
ensina e aos modos de abordá-lo. É compreender que as ideias geométricas são pré-predicativamente
dadas, podendo ser experienciadas nas mais diversas situações. Explorar as intuições advindas dessas
experiências abre um vasto horizonte para o ensino aprendizagem.
Refletindo em termos do que se destacou no estudo efetuado, e adentrando pela Educação
Matemática e seus inquéritos, considerando os diferentes conteúdos geométricos e distintos
ambientes de ensino, podemos indagar sobre aquelas situações que propiciam que a criatividade e a
imaginação auxiliem na construção do conhecimento e na exploração dos processos de elaboração e
reelaboração dos alunos. Conceber o espaço geométrico sem o estabelecimento de uma teoria prévia
axiomatizada, ou seja, o mais livre quanto possível de um modo único e predeterminado de interpretá-
lo e compreendê-lo, pode abrir possibilidade de se avançar tematizando os diferentes entendimentos
dos alunos, indagando sobre o que dizem da experiência espacial quotidiana (e vice-versa).
De modo similar, no âmbito das pesquisas em Educação Matemática, olhar para um fenômeno sem
teorias prévias tomadas como “porto seguro” da pesquisa conduz pelas perspectivas em que ele se
doa nas falas e nos gestos dos sujeitos, envolvendo afetividades, humores, ansiedades e
planejamentos. Tal postura pode possibilitar aberturas e compreensões amplas diante do interrogado.

Referências

Araújo, J. L.; Borba, M. C. (2004) Construindo Pesquisas Coletivamente em Educação Matemática. In:
BORBA, M. C.; ARAUJO, J. L. (Org) Pesquisa Qualitativa em Educação Matemática. Belo Horizonte:
Autêntica.

Bicudo, M.A.V. (2011) Pesquisa qualitativa segundo a visão fenomenológica. São Paulo: Cortez.

Bicudo, M. A. V. (2010) Filosofia da Educação Matemática: fenomenologia, concepções, possibilidades


didático-pedagógicas. 1 ed. São Paulo: Editora UNESP.

Bicudo, M.A.V. (2005) Fenomenologia: Confrontos e Avanços. São Paulo: Editora Cortez.
Bicudo, M. A. V. (1999), A contribuição da Fenomenologia à Educação. In: BICUDO, M. A. V.;
CAPPELLETTI, I. (Org.). Fenomenologia uma visão abrangente da educação. São Paulo: Olho
D’água.

Detoni, A. R.; Paulo R. M. (2000) A organização dos dados da pesquisa em cenas. In: BICUDO, M. A. V.
Fenomenologia: confrontos e avanços. São Paulo: Cortez.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Husserl,2012 E. (2002) Idee per una Fenomenologia pura e per uma filosofia fenomenológica.
Volume II. Tradução para o italiano de Enrico Filippini. Torino: Einaudi.

Merleau-Ponty, M. (1994) Fenomenologia da Percepção. São Paulo: Martins Fontes.


Kluth, V. S. (2001) Dos Significados da Interrogação para a Investigação em Educação Matemática.
Boletim de Educação Matemática, Rio Claro, ano 14, n. 15.

Martins, J. (1992) Um enfoque fenomenológico do currículo: educação como poíesis. São Paulo:
Cortez.

Martins, J.; Bicudo, M. A. V. (2005) A pesquisa qualitativa em psicologia: fundamentos e recursos


básicos. 5. ed. São Paulo: Educ/Moraes.

Paulo R. M. (2006) A compreensão geométrica da criança: um estudo fenomenológico. Dissertação


(Mestrado em Educação Matemática) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade
Estadual Paulista, Rio Claro.

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Os Avanços das Reformulações Curriculares nos Cursos Médicos do


Nordeste Brasileiro

Vicentina Esteves Wanderley¹, Rosana Brandão Vilela², Nildo Alves Batista³

¹Faculdade de Medicina Universidade Federal de Alagoas, Brasil. vicentinaw@yahoo.com.br


²Faculdade de Medicina Universidade Federal de Alagoas, Brasil. zanavilela@gmail.com
³ Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde Universidade Federal de São Paulo, Brasil.

nbatista@unifesp.br

Resumo. O estudo teve como objetivo reconhecer na prática das reformulações do curso médico, as
iniciativas de avanços no movimento de inovações curriculares, nas Faculdades Públicas de Medicina da
Região Nordeste do Brasil, que se inter-relacionam com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) 2001. Os
dados foram coletados por entrevista semiestruturada e submetidos a análise temática. Os sujeitos foram
gestores das escolas, a coleta dos dados foi de março/2014 a setembro/2016, com informações desde a
implantação das reformulações, período suficiente para identificação dos desafios e soluções. Houve por
unanimidade reconhecimento do atendimento ainda parcial das recomendações. As categorias revelaram:
importância da integração ensino-serviço, adequações nas propostas pedagógicas, organização e
administração dos projetos, ajustes no quadro de pessoal e infraestrutura, e democratização dos processos
de gestão. Conclui-se que apesar dos desafios encontrados, as escolas vêm se empenhando no sentido de
atenderem as DCN.
Palavras-chave: Curso Médico; Reforma curricular; Diretrizes curriculares; Gestão das escolas médicas.

The Advances of Curricular Reformulations in Medical Courses in the Northeast of Brazil


Abstract. The purpose of this study was to recognize in the practice of reformulating the medical course, the
initiatives of advances in the movement of curricular innovations in the Public Medical Faculties of the
Northeast Region of Brazil, which interrelate with the recommendations of the National Curricular Guidelines.
The data was collected by semi-structured interview and submitted to thematic analysis. The subjects were
the schools managers, the data collection was from March 2014 to September 2016, with information since
the implementation of the reformulations, with enough time to identify the challenges and solutions. There
was unanimity in the acknowledgment of the partial compliance with the recommendations. The revealed
categories showed the importance of teaching-service integration, adaptations and adjustments in
pedagogical proposals, in the organization and administration of projects, in personnel and infrastructure,
and the democratization of management processes. It is concluded that in spite of the challenges
encountered, schools have been working towards the meeting of the DCN.
Keywords: Medical Course; Curricular reform; Curricular guidelines; Management of medical schools.

1 Introdução

A inadequação da formação médica no século XX desencadeou uma série de avaliações dos cursos de
medicina, o que gerou o fechamento de várias escolas e mudanças curriculares de outras no mundo
inteiro. O profissional formado não atendia as necessidades de saúde da população e menos ainda aos
sistemas de saúde vigentes. Devido a constatação dessas deficiências na formação, vários movimentos
aconteceram, envolvendo órgãos de classe, instituições formadoras e o próprio governo, com a
finalidade de melhorar o perfil do profissional médico no Brasil.
Vários aspectos impulsionaram esses movimentos, como: a desenfreada velocidade com que o
conhecimento vem sendo produzido nas diferentes áreas; o imperativo ético de reorganizar o saber-
fazer no campo da saúde, considerando a integralidade do ser e do cuidado; a crescente relevância da
autonomia dos usuários do sistema de saúde; a urgência de rever a relação recursos/demandas em

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

saúde – com repercussões evidentes na otimização dos gastos, incorporados à tecnologia e a produção
do conhecimento; dentre outros (Lampert, 2012, p. 61-62). O reconhecimento pelas DCN 2001 para
os cursos médicos, das novas conformações no ensino aponta para a necessidade de resposta à
falência do modelo biomédico predominante na formação.
A questão da formação é ponto fundamental uma vez que, para uma boa formação do aluno torna-se
necessário, além de uma estrutura adequada, docentes e gestores com preparo específico para suas
funções, de modo a desenvolverem atitudes, habilidades e competências que lhes confira eficiência
no desenvolvimento de sua prática.
É preciso que se considere também que a implementação de novas diretrizes curriculares não é um
processo estático, apesar de garantido pela legislação, mas, ao contrário, é um processo dinâmico e
acidentado, intercalado por avanços e retrocessos, que precisa ser cotidianamente construído nos
diversos cenários de prática profissional, para o enfrentamento dos problemas que se apresentam na
realidade da prática.
As DCN, trazem recomendações que implicam em inovar, romper com o antigo e adotar um novo
modelo, que foge à hegemonia instituída por várias décadas, dentro dos cursos e no contexto social
que o circunda. As reformulações curriculares originam uma série de responsabilidades até então
inexistentes. Ultrapassar os muros da universidade, trabalhar em grupos de pessoas com diferentes
concepções sobre a saúde e estreitar os laços com a sociedade mais carente, cabe a todos os
envolvidos. Uma missão quase impossível.
A implantação das DCN se transformou em um grande desafio para as instituições formadoras e seus
atores. Esta situação nos instiga a investigar, sob a ótica da gestão acadêmica, como este processo
complexo e trabalhoso vem ocorrendo nas Universidades. Esta pesquisa tem por finalidade:
Reconhecer na prática das reformulações do curso médico, as iniciativas de avanços no movimento de
reformulação curricular, que se inter-relacionam com as recomendações das DCN 2001 nas
Faculdades Públicas de Medicina da Região Nordeste do Brasil, ocorridos entre a promulgação das DCN
2001 e o início de 2014, entendendo que este intervalo tenha proporcionado aos gestores
experiências suficientes que possibilitem a identificação dos desafios e de suas possíveis soluções.
Desta forma as questões direcionadoras foram: - As recomendações das DCN para as reformulações
dos cursos médicos, vêm sendo atendidas nas implementações dos novos currículos? - Quais as
sugestões das DCN que vêm sendo implementadas nas mudanças curriculares? - De que forma as
recomendações das DCN estão sendo incorporadas nos processos de reformulações curriculares?
Espera-se que esta pesquisa possa contribuir com a produção científica nessa temática, bem como
divulgar e disseminar as experiências acumuladas, para que elas possam servir de subsídio que
propiciem melhor viabilização das reformulações atuais das escolas médicas, agora novamente
desafiadas pelas DCN 2014.

2 Metodologia

Este artigo é parte de uma pesquisa mais ampla, de âmbito regional, tese de doutoramento, que
envolveu uma grande quantidade de dados para análise, intitulada: A gestão acadêmica da
reestruturação curricular do curso médico: uma análise, a qual foi realizada entre os anos de 2014 e
2016. Os dados aqui analisados têm por objetivo, o reconhecimento na prática das reformulações do
curso médico, das iniciativas de avanços no movimento de reformulação curricular, que se inter-
relacionam com as recomendações das DCN 2001, nas Faculdades Públicas de Medicina da Região
Nordeste do Brasil.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de caráter exploratório-descritivo.

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As pesquisas qualitativas são caracteristicamente multimetodológicas, isto é, podem usar uma grande
variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados (Alves-Mazzotti, Gewandsznajder,
2002). Este tipo de abordagem vem conquistando um espaço significativo no campo da saúde e das
ciências sociais, visto que se preocupa com a compreensão interpretativa da ação (Minayo, 2010).
O estudo abrange 10 cursos, distribuídos um ou dois por estado, exceto Piauí e Sergipe, que não
entraram em processo de reformulação curricular a tempo de serem incluídos na pesquisa. Os cursos
selecionados deveriam ter na época da reformulação curricular, turmas formadas por outros modelos
pedagógicos e que na época da pesquisa, já tivesse formado pelo menos uma turma no novo modelo.
Dos cursos participantes, todos de universidades públicas, oito são federais e dois estaduais.
Os dados foram coletados através de entrevista semiestruturada, com um roteiro elaborado a partir
do referencial teórico encontrado na literatura e de um núcleo direcionador: "relação entre as
reformulações curriculares do curso médico e as DCN."
Os dados foram produzidos entre os meses de março de 2014 a setembro de 2015, com a participação
de dezessete gestores, sendo um ou dois de cada curso, este número de respondentes foi determinado
pela repetição no conteúdo das respostas as entrevistas, o que não implicou em limitações aos
objetivos propostos.
Como procedimentos de análise, os dados foram submetidos a uma análise temática, uma das técnicas
de análise de conteúdo. Inicialmente, trabalhou-se na organização dos documentos selecionados e na
transcrição das entrevistas. Em seguida, foi realizada a leitura flutuante e a identificação do material
de análise, constituindo assim o corpus da pesquisa. Por fim, foram identificadas as unidades de
contexto com suas respectivas unidades de registro que deram origem às categorias que emergiram
do campo estudado (Minayo, 2006) e associando, a esse processo de análise, o olhar dos
pesquisadores e a fala dos gestores, mediados pelas reflexões sobre as inovações curriculares
implantadas e as recomendações das DCN.
A complexidade e a dinâmica do processo de inovação curricular do curso médico, foi um dos
determinantes da escolha do método, entendendo-se ser o melhor para a compreensão dos dado em
questão.
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp) – Plataforma Brasil e aprovado com o Parecer nº 513.714. Uma carta-convite, contendo
informações, e objetivos do estudo, foi enviada por meio dos endereços eletrônicos a cada escola e
aos sujeitos da pesquisa. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido. No sentido da preservação da identidade dos sujeitos, eles foram nomeados por letras e
números sequenciados (EG1, EG2,...) .

3 Resultados e Discussão

Após a análise temática dos relatos das entrevistas, permitiu-se a identificação de 78 unidades de
contexto nas falas, com 140 unidades de registro. Estas unidades possibilitaram a categorização das
respostas a duas questões: - a primeira se as reformulações desenvolvidas atendem às recomendações
das DCN? A segunda em caso de incorporação (mesmo que parcial) das DCN, como foi feita?
Nota-se claramente nas respostas dos entrevistados que as escolas vêm desenvolvendo esforços no
sentido de atenderem recomendações das DCN, variáveis conforme o tempo de implantação e o
contexto de cada uma delas. No entanto, por unanimidade, eles reconhecem uma incorporação ainda
parcial dessas recomendações:
“A reforma curricular da nossa escola ainda não atende a todas as demandas
das DCN não, atende parcialmente, muita coisa está para se construir [...] por

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mais que se tenha caminhado, mas ainda está longe do que é preconizado
pelas diretrizes.” (EG1)

Souza et al. (2011) comentam a percepção de que não estão ocorrendo mudanças significativas
estruturais nos currículos, pois a maioria das escolas, nas grandes áreas (Pediatria, Tocoginecologia,
Clínica Médica) destinam grande parte da carga horária à atenção secundária e terciária, ao contrário
do que orientam as DCN.
Almeida et al. (2007) ressaltam a existência de uma motivação para a inovação do ensino médico nas
escolas por eles estudadas, que se traduz em currículos idealizados com vários princípios inspirados
nas DCN. No entanto, entendem que os avanços precisam ocorrer para o desenvolvimento de
mudanças mais efetivas
Para a segunda questão emergiram seis categorias contidas na tabela 1.

Tabela 1. Categorias resultantes da análise de conteúdos das entrevistas com os gestores das escolas.

Categorias
1. Fortalecimento do papel das DCN como favorecedoras das discussões com os docentes;
2. Implantação / aprimoramento da integração ensino / serviço;
3. Adequações / ajustes nas propostas pedagógicas do currículo;
4. Adequações / ajustes na organização / administração do projeto pedagógico;
5. Adequações / ajustes no quadro de pessoal e na infraestrutura;
6. Democratização interna dos processos de gestão.

Os gestores apontam o papel de fortalecimento que traz as DCN, como favorecedoras das discussões
com os docentes.
“[...] a gente tem na verdade usado esse mecanismo da aproximação, da
sedução, mostrando que essa causa é importante, que o fato de estar escrito
nas DCN a cooperação entre os públicos envolvidos é fundamental.” (EG7)

A implantação / aprimoramento da integração ensino serviço


A maioria dos investigados concorda que nas mudanças curriculares, um dos principais desafios tem
sido gerenciar a relação ensino-serviço com a finalidade de priorizar atividades pedagógicas que
aconteçam nos diversos cenários de prática na rede, envolvendo docentes, estudantes, equipes de
saúde e os usuários do SUS. Para isso algumas recomendações merecem destaque:
Os programas de incentivo e que priorizam o binômia ensino/serviço (Promed, Pró-Saúde I e II, Pet-
Saúde e Pró-Ensino), apesar de contribuírem com a viabilização da implantação das DCN são ainda
atividades pontuais e pouco valorizadas no processo de reformulação curricular.
Flores et al. (2015) apontam que o PET-Saúde contribui significativamente para a formação integral do
aluno, contribuindo com o uso de ferramentas de facilitação e a integração multiprofissional
possibilitando aprender com pessoas de diferentes áreas de conhecimento.
As relações de cunho político, reconhecidas e recomendadas pela importância na relação ensino-
serviço, apontam para dificuldades que prejudicam a sustentabilidade das reformas curriculares, após
as DCN.
Estas dificuldades de cunho político aparecem com bastante frequência nas entrevistas:
"A influência política na relação ensino/serviço, nem sempre é positiva.
Porque quando mudam as coisas, mudam as cabeças.[...] pela fragilidade
dessa condução, dessa gestão na saúde atual, eu acho que a gente está num
momento muito crítico. É muita mudança. Então botam pessoas que não têm

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know-how. A gente vai recomeçar todo o processo, que nem sempre facilita,
infelizmente." (EG5)

Souza et al. (2012) concordam com a fala acima, referindo que é necessário levar em conta que muitos
programas e políticas públicas não têm continuidade devido a mudanças de direção administrativa e
eleitorais.
A importância do estabelecimento de parcerias sustentáveis com o serviço por meio da definição de
competências a serem desenvolvidas e o exercício mais efetivo das representações nas instâncias de
discussão da integração ensino serviço (CIES/CMS/Unidades básicas...). As falas demonstram variadas
formas dessa relação:
“[...] levar sempre notícias para o conselho municipal de saúde, prestar
contas, ser transparente, acho que dando esse retorno você fortalece a
relação e diminui um pouco o impacto político.” (EG1)

Cavalheiro e Guimarães (2011) considera que:


" A academia deve possibilitar a aproximação do serviço, onde todo o
produto e frutos são compartilhados, onde não há uma academia que
simplesmente se utiliza do serviço como local de estágio, nem um serviço
que se utiliza do estudante como mera “mão-de-obra”.
" Há necessidade das IES compreenderem que os serviços produzem
conhecimentos e que a parceria com a universidade qualifica esta produção".

O estabelecimento de cogestão como mecanismo de aprimoramento da integração ensino-serviço por


meio de planejamento participativo das ações, reconhecimento e certificação dos preceptores.
“[...] para que a escola tenha a possibilidade de gerenciar esse aspecto
ensino - serviço, eu não vejo outro caminho que não a co-gestão [...] só assim
eu entendo uma parceria e uma parceria sustentável.” (EG1)
“[...] até agora nós estamos penalizando o preceptor, atribuindo ao
trabalho do preceptor um caráter de voluntarismo caritativo, quando na
verdade estamos agregando trabalho, trabalho docente e que precisa ser
incentivado como uma forma de progressão, ou melhor ainda com financeiro
[...]” (EG2)
Demarzo et al. (2012) apontam do apoio as escolas médicas de forma objetiva e prática, na elaboração
de projetos político-pedagógicos no contexto da Atenção Primária à Saúde. Nelas ressaltam a questão
da formação e motivação para a preceptoria por meio de um programa de desenvolvimento
profissional contínuo e uma educação permanente para os docentes e médicos dos serviços
(preceptores), para serem desenvolvidos pelas IES em parceria com o gestor local de saúde.
O estabelecimento de convênios / contratos específicos e a instituição de equipe de integração e
supervisão ensino serviço são também avanços apontados como favorecedores da pactuação ensino-
serviço:
“[...] um contrato... não pode pensar em gerenciar em parceria baseado
apenas nas intenções, é preciso ter um contrato”. (EG2)
“Espero que agora, com os Coapes, isso se defina de forma mais clara.
(EG8)

Cavalheiro e Guimarães (2011) refere-se a parceria entre a universidade e a SMS fortalecida por um
instrumento formal tem contribuído na formação voltada para a implementação dos princípios e das
diretrizes constitucionais do SUS. Com o objetivo de fortalecer a relação entre as IES e o Sistema de

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Saúde conta-se com um Termo de Cooperação que prevê o desenvolvimento de atividades de ensino,
pesquisa e extensão nas unidades.
Mais recentemente, os Ministérios da Saúde e Educação instituiram, por meio de portaria
interministerial, as diretrizes para a celebração dos Contratos Organizativos de Ação Pública Ensino-
Saúde (Coapes) que visam o fortalecimento da integração ensino, serviços e comunidade no âmbito
do SUS.
As adequações / ajustes nas propostas pedagógicas do currículo são também apontadas pelos gestores
como possibilidades de incorporação das DCN nos processos de reformulação curricular, ressaltadas
de várias formas:
No aprofundamento da discussão sobre a formação do aluno:
"[...] porque eles vão para as unidades básicas de saúde, eles trabalham
com prevenção à doença e promoção à saúde, eles passam a ter atitudes,
digamos assim, de mais sensibilidade." (EG11)

Carabetta Júnior e Cury (2007) concordam com a necessidade do aprofundamento da discussão sobre
a formação do aluno, baseada na reflexão, orientação e redirecionamento da prática docente,
possibilitando instrumentalizar e ampliar os horizontes de atuação profissional num momento em que
se repensa a educação médica
A incorporação de novos modelos curriculares e de novas práticas pedagógicas foi também enfatizada,
pelos respondentes, com a priorização da atenção básica no processo formativo:
"[...] mudança na prática de alguns docentes, passaram a ter outras
práticas pedagógicas, com modelo não mais centrado no professor e sim no
aluno [...]" (EG3)
"[...] a criação do módulo interprofissional de todos os cursos, eu acho que
esse foi um grande passo, para poder trabalhar a questão da integralidade e
do trabalho em equipe." (EG5)
"[...] a implantação das metodologias ativas com a integração básico
clinico [...]" (EG2)

Para Masetto (2012), as novas organizações curriculares, em atendimento às transformações


tecnológicas da atualidade e as necessidades sociais, estruturam-se com a vivência de experiências
problematizadoras e sistematização do conhecimento produzido, contemplando o diálogo entre
distintas disciplinas do domínio do saber, substituindo a dos desenhos curriculares tradicionais.
Os projetos inovadores apontam para a necessidade de um currículo que
incentive a integração e a interdependência das disciplinas e das atividades
curriculares em função dos objetivos educacionais, buscando a superação do
isolamento das disciplinas, da fragmentação do conhecimento e criando
experiências de projetos de interdisciplinaridade. (Masseto, 2012).

Flores (2015) ressalta a importância do ensino na atenção básica quando se refere a integração
multiprofissional (integração entre alunos, preceptores, tutores; ajuda dos coordenadores e
preceptores; divisão em pequenas equipes e comissões; boa convivência com os colegas; satisfação
em trabalhar com pessoas).
Almeida e Batista (2011) enfatizam que é necessário reformular a efetividade da implantação e
desenvolvimento de currículos que utilizam métodos ativos de ensino-aprendizagem, buscando
estratégias integradoras e mais participativas.
A ampliação do tempo e aprimoramento da proposta do internato foram também bastante citados:

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"[...] outro ponto muito importante, eu acho que o internato de 1 para 2


anos, acho que isso foi fundamental, os alunos tem mais prática [...]" (EG9)
Outra categoria apontou para as adequações / ajustes na organização / administração do projeto
pedagógico diante da operacionalização do processo de reformulação, como de fundamental
importância. Nessa categoria destaca-se a criação do NDE, das coordenações de períodos e de
módulos, de ambientes virtuais de aprendizagem, do núcleo de apoio psicopedagógico, como também
a proporção professor/preceptor e alunos:
"[...] a gente criou o NDE e aí colocando tarefas que cabem ao NDE,
reativando câmaras da graduação, da extensão, o núcleo de educação
médica... " (EG13)
"[...] temos inclusive o ambiente virtual, temos o Avamed e as disciplinas
já estão funcionando com o Avamed, além de avaliações, portfólios, fazem
tutorias... [...]" (EG4)
"[...] a gente vem trazendo uma pedagoga e uma psicóloga para cá, nós
criamos um núcleo de apoio psicopedagógico, onde os alunos têm
acompanhamento dentro e fora da escola. " (EG17)

Diogo et al. (2016), considerando os ajustes na administração e na implementação de projetos


pedagógicos, referem um fator que deve estar sob controle da gestão, a proporção aluno/tutor e
concluem que o maior número de alunos por tutor leva à redução na qualidade do ensino e inibição
da aquisição de competências, o que consequentemente gera, baixa satisfação dos alunos com o
ensino.
As adequações / ajustes no quadro de pessoal e na infraestrutura são também apontadas pelos
gestores como inerentes a incorporação das DCN. Ressalta as necessidades de investimento no
desenvolvimento de pessoal de apoio da área de humanas, adequação da infraestrutura física,
aquisição, qualificação e desenvolvimento do quadro docente:
"[...] adequação da estrutura do prédio do curso, porque aí nós passamos
a ter onde trabalhar, montar um laboratório de web, ter um auditório para
reuniões científicas, tivemos que ter salas de reuniões de pequenos grupos
para discutir a tutoria [...]" (EG11)
"[...] os médicos também, precisam entender que não basta formação
médica, tem que ser uma formação pedagógica, ou seja, você está para
ensinar, transmitir aquilo de uma forma que o aluno aprenda [...]" (EG12)
"[...] vagas de professor, nós tivemos 30 novas vagas para substituir várias
aposentadorias, nós conseguimos subdividir os nossos módulos clínicos, a
propedêutica [...]." (EG17).

Almeida e Batista (2011), discutindo as demandas em um processo de reformulação curricular, dão


grande destaque à necessidade de investimento institucional como condição para a indução e a
sustentabilidade de processos de desenvolvimento docente, enfatizando-se o sentido político e
pedagógico destes programas.
A democratização interna dos processos de gestão, ressalta não apenas a gestão colegiada
institucional, mas também conta com a integração de outras instituições e serviços:
"[...] na gestão colegiada você vai encontrar provavelmente diferentes
experiências... está ligada diretamente: com o tipo da gestão e com a
capacidade de liderança de quem está a frente dela [...]" (EG15)
"A gestão colegiada interna institucional, ela é democrática, ela tem a
participação dos três grupos de atores docente, discentes e técnicos, no

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conselho da unidade e no colegiado do curso. No conselho da unidade tem a


representação do hospital universitário, das unidades acadêmicas que
apóiam o curso como a química, o Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde,
tem representação do município, do estado, do conselho de medicina." (EG2)

Merhy e Aciole (2003) recomendam a implantação de um modelo colegiado de gestão, do tipo misto,
composto por representações dos segmentos docente e discente e por representações das várias
unidades de produção que concretizam o fazer cotidiano da escola.
Entende-se que a gestão colegiada possibilita o trabalho em equipe, com discussão coletiva dos
interesses do curso, compartilhamento das decisões e preparo de novos líderes, na sucessão aos
cargos de gestão. Entretanto, uma parcela significativa dos respondentes considera que na sua escola,
a gestão colegiada no processo de reformulação do currículo tem sido pouco utilizada.

5 Conclusões

O conhecimento de como vem acontecendo as mudanças nas Escolas Médicas Brasileiras no sentido
de atender às recomendações das DCN (2001), mostra-se instigante e de extrema relevância. As
características e variações das atividades desenvolvidas num currículo de medicina, dentro de um
contexto de dificuldades políticas e socioeconômicas, levam a um alto grau de complexidade surgindo
como um desafio ímpar. Diante da necessidade de correlação, e enredamento das informações e dos
significados que emergem desta temática, a metodologia utilizada foi imprescindível para a
compreensão das mensagens e comparações textuais, uma vez que um determinado dado, conteúdo
de uma mensagem, deve necessariamente, estar relacionado a outro. Segundo os próprios gestores,
todos os aspectos aqui levantados têm relação direta com a qualidade dos cursos, que por sua vez está
diretamente relacionada com a qualidade da gestão. Entendendo que as reformulações curriculares
são processos dinâmicos em constantes mudanças, reflexões e iniciativas sobre os referidos aspectos
servem no aprimoramento do contexto como um todo.
Apesar da complexidade e obstáculos do contexto, a implantação e implementação das DCN já se
configura na prática como fato consumado, ainda que não se considere totalmente concretizadas, até
porque ajustes e reformulações são inerentes ao processo.
A análise das interrelações construídas entre as práticas das reformulações curriculares investigadas e
as recomendações das DCN, mostra: - o empenho na construção de novos modelos curriculares; - a
incorporação de novas práticas pedagógicas; - a ampliação do tempo e aprimoramento do internato;
- adequações de infraestrutura e de pessoal para atender à mudança; - o aprimoramento da integração
ensino-serviço com o estabelecimento de parcerias mais sustentáveis, a cogestão e criação de equipes
integradas; - a viabilização de convênios e contratos com outras instituições; - a democratização
interna dos processos e o estabelecimento de uma gestão colegiada que não vem sendo praticada
numa parcela significativa das escolas.
Espera-se que os resultados aqui apresentados, permitam auxiliar na compreensão da realidade que
envolve as escolas médicas e que possam provocar nos envolvidos diferentes leituras, bem como
apontar-lhes novas possibilidades de atuação no desempenho de suas funções, especialmente com a
promulgação e vigência das DCN 2014, que acrescentam outros desafios.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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331
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

O Mito da Neutralidade Científica e o Uso da Linguagem


Impessoal

Paulo de Tarso Oliveira1,


Maria Eunice Barbosa Vidal2
1 Centro Universitário Municipal de Franca – Uni-FACEF, Brasil. paulotarso@facef.br
2 Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, Brasil. mariaeunice.vidal@uftm.edu.br

Resumo. Este artigo – ainda inicial, porque representativo de uma pesquisa na fase exploratória – surgiu de
observações dos autores, decorrentes de sua experiência como professores de metodologia científica no
ensino superior. O objetivo é discutir a artificialidade do uso impessoal (tratamento na terceira pessoa dos
tempos verbais) com vistas à compreensão de uma linguagem adequada para os relatos de ciência tal como
concebida atualmente, ou seja, nos relatos de pesquisa científica em geral e, em especial, das pesquisas
qualitativas. O referencial teórico constitui-se de estudos que revelam as concepções positivistas e suas
contraposições, sobretudo no tocante à linguagem. Está ainda em construção e carece de
aprofundamentos. A metodologia utilizada envolve a análise interpretativa de documentos como trabalhos
de conclusão de cursos de graduação, dissertações e teses, além de manuais de orientação para
procedimentos metodológicos, elaborados por instituições universitárias. Os resultados serão apurados com
a conclusão da análise daqueles documentos.
Palavras-chave: pesquisa qualitativa; impessoalidade; ensino de metodologia.

The Myth of Scientific Neutrality and the Use of Impersonal Language


Abstract. This article - still initial, because it is representative of an exploratory phase research - arose from
the authors' observations, deriving from their experience as teachers of scientific methodology in higher
education. The aim it is to discuss the artificiality of impersonal use (third-person treatment of verbal
tenses) with view to understanding a language appropriate to the reports of science as currently conceived,
that is, in reports of scientific research in general and, in particular, of qualitative research. The theoretical
reference is constituted of studies that reveal the positivist conceptions and their contrapositions, especially
with regard to language. It is still under construction and needs deepening. The methodology used involves
the interpretative analysis of documents such as graduation papers, dissertations and theses, as well as
orientation manuals for methodological procedures, elaborated by university institutions. The results will be
verified upon completion of the analysis of those documents.
Keywords: qualitative research; impersonality; teaching of methodology.

1 Introdução

No passado e durante muito tempo, perdurou a ideia de que o tratamento na terceira pessoa
(linguagem impessoal) seria uma expressão ou mesmo garantia de uma neutralidade no estudo dos
diversos fenômenos ou objetos. Com isso, supunha-se que essa linguagem impessoal pudesse revelar
uma isenção do pesquisador como sujeito na apreensão do objeto de estudo.
Seria uma forma, por assim dizer, de manter nos relatos a isenção de qualquer contaminação do
sujeito-pesquisador sobre o objeto-pesquisado. Bem inserida nas concepções positivistas, essa noção
serviu ao conceito de neutralidade científica. De mais a mais, tem-se observado que essa noção
persiste até hoje e é acreditada por muitos integrantes do mundo acadêmico.
Os autores deste artigo têm observado, em muitas atividades de ensino e de pesquisa (notadamente
a participação em bancas examinadoras de teses, de dissertações e de trabalhos acadêmicos de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

graduação), a preocupação de pessoas nelas envolvidas de usar a linguagem impessoal e, até


mesmo, alguns integrantes de bancas examinadoras cobrarem o emprego da impessoalidade ao
criticarem eventuais situações em que se utilizou o tratamento na primeira pessoa do singular ou
plural.
Esse comportamento despertou o interesse dos autores do presente artigo em investigar relatos de
pesquisas (TCCs, dissertações, teses) para observar, naquelas pesquisas caracterizadas como
qualitativas, a (im)propriedade do uso do mencionado tratamento na terceira pessoa dos tempos
verbais e sua relação com a clareza enquanto qualidade requerida na redação do gênero científico.

2 Referencial teórico

2.1 Linguagem e exclusão do sujeito

Embora esta investigação necessite de aprofundamento teórico; por certo, merecem destaque
alguns autores já perfilhados na literatura pesquisada. Assim, Bortoni-Ricardo (2013 p. 15) ressalta,
entre os postulados positivistas, que a percepção do mundo “tem de estar dissociada da mente do
pesquisador que não se apresenta como sistema de referência. As categorias postuladas devem ser
livres de contexto, isto é, independentes das crenças e valores do próprio sujeito cognoscente e de
sua comunidade”.
Desse modo, é razoável supor que essa concepção revela uma crença na possibilidade da anulação
do sujeito no processo do conhecimento científico. A crença inclui a ideia de uma objetividade pura,
no processo de conhecimento, que traz, como consequência, o uso de uma linguagem compatível
com a anulação do sujeito. Esse mito da neutralidade científica é um expoente do paradigma da
modernidade que se encontra agora no limiar de significativas transformações. Logo, no âmbito
dessas transformações, a ideia de uma linguagem matemática para expressar a produção de
conhecimentos científicos é relegada.
Pensando nisso, Pourtois e Desmet (1999) consideram que, no bojo dessas transformações, uma
delas, talvez a principal, seja a da revalorização do sujeito, incluindo a participação dele no processo
do conhecer humano.
De resto, passa-se a perceber também que, por trás da decantada neutralidade, podem-se esconder
processos relacionados à dominação e a poder social, e a tal impessoalidade linguística serve como
uma aura a comportar os sentidos filosóficos embutidos naquelas concepções.
A esse respeito, Guelfi (2006, p. 75) – comentando Habermas – assinala que as “relações sociais
encontram-se historicamente situadas com seus antagonismos e contradições, visto que a linguagem
ao mesmo tempo em que possibilita a comunicação, também pode estabelecer um contexto de
legitimação das relações de dominação e de poder social”.
Ressalta-se também, como informa Minayo (1996, p. 216), o “pressuposto de que não há observador
imparcial nem ponto de vista fora do homem e fora da história”. Continua ainda Guelfi (1996, p. 76)
realçando o reconhecimento “que o real se revela e se esconde na comunicação e traz a marca de
seus construtores que se funde na trama das relações sociais”.
Vai nessa linha de raciocínio a afirmação de Koch (2009, p. 17) de que “o ato de argumentar, isto é,
de orientar o discurso no sentido de determinadas conclusões, constitui o ato linguístico
fundamental, pois a todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia, na acepção mais ampla do
termo”. E Koch acrescenta que “A neutralidade é apenas um mito: o discurso que se pretende
‘neutro’, ingênuo, contém também uma ideologia – a da sua própria objetividade”.

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Desse modo, o uso da linguagem impessoal se nos afigura como uma tentativa de convencer o leitor
de que aquele conhecimento produzido é totalmente objetivo, isento de qualquer influência
subjetiva.
Importante, ainda, destacar que Eco (2002, p. 120) assinala que “Escrever é um ato social”. De suas
concepções se depreende que há casos em que se deve recorrer a expressões mais impessoais, mas
que, em diversas situações, o uso de expressões pessoais é válido.
E até exemplifica que, quando o autor de um trabalho expõe opiniões pessoais, deva afirmar
“julgamos que”. Cabe aqui um comentário: que expressão esdrúxula seria se um autor, nas
circunstâncias de expor uma posição pessoal, usasse “julgou-se que” (afinal, quem julgou?).
Nas leituras iniciais de trabalhos acadêmicos, dissertações e teses, encontramos, por exemplo,
expressões como “eleborou-se um questionário”, “fez-se entrevistas”.
Nesse último caso, supomos que a preocupação em tornar impessoal a linguagem acabou por
contrariar a norma padrão da língua portuguesa. Aí se verifica a não flexão do verbo agregado ao
“se” apassivador. Para além desse equívoco gramatical, há um problema mais grave, a nosso ver, que
é a omissão de informações metodológicas relevantes: quem é o elaborador do questionário e quem
realizou as entrevistas.

2.2 Impessoalidade versus Clareza

Clareza é tradicionalmente conceituada como uma virtude do texto que não deixa dúvidas de
compreensão em seu destinatário. Fiel a esse conceito, caberá a quem deseja elaborar um texto
inteligível tomar algumas providências como, por exemplo, considerar o conhecimento que se tem
do destinatário e o contexto de interação, a fim de fazer escolhas linguísticas adequadas à
interpretação desejada.
Excetuando-se os textos enigmáticos e charadísticos, certos anúncios publicitários e alguns chistes
em que se investe, via de regra, na ambiguidade para provocar o efeito de humor, na maior parte
dos gêneros discursivos, incluindo-se os acadêmicos, a clareza é uma qualidade fulcral.
Esse tema enseja, como primeiro argumento de defesa, que escrever é uma competência cognitiva
visceralmente humana que deve ser desenvolvida na escola, o que já agrega responsabilidades.
Escrever com clareza, então, exige ainda mais responsabilidades de cunho educativo. Certas
habilidades deverão ser requeridas dos alunos tais como: selecionar ideias e ordená-las em
construções sintáticas compreensíveis.
Considerando-se, então, a clareza como uma qualidade para a linguagem científica, e, ainda,
considerando que a clareza, muitas vezes, exige o tratamento diverso do impessoal, menciona-se
aqui o caso do aluno que redigiu em seu trabalho: “penso que Piaget poderia ter explicado melhor as
passagens de uma fase para outra no desenvolvimento humano”. Ao revisar a redação, o professor-
orientador, seguindo o manual da instituição a que pertence, corrigiu o emprego de “penso” por
“pensa-se”. Com isso, promoveu a omissão de um dado importantíssimo da metodologia, ou seja, a
identificação de autoria de uma ideia.

2.3 O ensino da metodologia

Percebe-se facilmente que a questão aqui tratada tem muito a ver com o ensino / aprendizagem de
metodologia científica. É bastante comum a oferta de cursos ou disciplinas de metodologia nos
currículos universitários. Via de regra, esse ensino se faz sobre pesquisa e, não, com pesquisa. Não se
pode subestimar a importância desses cursos ou disciplinas, mas alguns equívocos têm sido
observados como, por exemplo: (i) a identificação da metodologia apenas como normas para
formatação de trabalhos; (ii) a condução, em certos casos, da disciplina por docentes que não fazem

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pesquisa e nem apresentam experiências anteriores significativas de realização de pesquisas; (iii) a


concepção de professores das demais disciplinas ditas de conteúdo de que não precisam praticar
pesquisas porque existe uma disciplina de metodologia específica para isso.
A propósito, Luna (2009, p. 11) chama a atenção para confusões que existem no tocante à função e
finalidade da disciplina de metodologia: “uma coisa é empregá-la para preparar o caminho de
iniciantes à pesquisa que estão continuamente sendo confrontados com a situação de pesquisa;
outra coisa é substituir a prática da pesquisa pela metodologia”. Em continuação, Luna explica: “Uma
coisa é promover, entre os alunos, a discussão teórico-metodológica sobre a realidade que eles
precisam aprender a representar para poder realizar; outra coisa é substituir o fazer pesquisa pelo
falar sobre pesquisa”.
Em razão de equívocos como esses, no próprio ensino da metodologia, pode estar sendo
repetitivamente reproduzido o antigo chavão da linguagem representando a neutralidade.

3 Procedimentos metodológicos

A proposta da pesquisa é de realizar um estudo em materiais escritos que mencionam


recomendações do uso genérico da linguagem impessoal (representada no tratamento pela terceira
pessoa do singular dos tempos verbais, incluindo a partícula “se” como forma de anular o sujeito).
Restringe-se, no entanto, a textos contidos em manuais de metodologia elaborados por instituições
universitárias e a textos de trabalhos acadêmicos de graduação e de pós-graduação, como
dissertações e teses.
Trata-se, portanto, de pesquisa documental. Entendemos aqui documento, tal como definido pela
Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT (2000, p. 2 apud Appolinário, 2009, p. 67):
“qualquer suporte que contenha informação registrada, formando uma unidade, que possa servir
para consulta, estudo ou prova. Inclui impressos, manuscritos, registros audio-visuais e sonoros,
imagens, entre outros”.
A opção por essa modalidade de pesquisa se justifica em razão de que os documentos, bem como
assinala Flick (2009), “devem ser vistos como uma forma de contextualização da informação. Em vez
de usá-los como ‘contêneres de informação’, devem ser vistos e analisados como dispositivos
comunicativos metodologicamente desenvolvidos na construção de versões sobre eventos”.
Como se pode verificar, os documentos a serem utilizados, nesta pesquisa, são escritos e disponíveis
na forma impressa e/ou eletrônica. A construção do corpus consta da elaboração de uma
amostragem tendo em vista que o universo de trabalhos acadêmicos é extremamante numeroso.
Para a constituição da amostragem, o procedimento será da seleção de textos de pesquisa
considerada qualitativa e com a utilização exclusiva da linguagem impessoal na sua redação, até
atingir o limite de dez trabalhos de conclusão de curso de graduação, dez dissertações de mestrado e
dez teses de doutorado, nas áreas de estudos humanos e sociais, e de manuais de orientação de
pesquisa nessas áreas.
A análise desses documentos será feita em busca da compreensão dos padrões de sua produção e
utilização em seus contextos, tendo como questionamento as eventuais contradições ou
inadequações da linguagem em relação à perspectiva qualitativa dessas pesquisas.
Convém mencionar que, na pesquisa qualitativa, deve ficar clara a inserção do pesquisador no
objeto. Tanto as suas motivações quanto a sua capacidade de observação e compreensão quanto,
ainda, a sua visão de mundo estão presentes na sua investigação, o que leva a uma visão influenciada
pelos significados que ele tem incorporados pelas suas práticas sociais.
Vale aqui a observação de Bortoni-Ricardo (2013, p. 32) de que o pesquisador “não é um relator
passivo, mas um agente ativo.” Esses aspectos todos carecem de ser levados em conta, tendo em

335
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

vista que a metodologia concentra-se na interpretação que busca entender fenômenos humanos
observados em um determinado contexto sociocultural.
Finalmente, é forçoso acrescentar que, além da análise interpretativa documental – metodologia que
responde bem às questões desta investigação –, também são importantes os dados compilados pelos
autores tais como: (i) registro de conversas e diálogos com outros docentes com que se relacionam
no seu fazer profissional cotidiano; (ii) anotações feitas durante a participação em simpósios e outros
eventos científicos; (iii) registro de discussões ocorridas em bancas examinadoras e mesmo em sala
de aula. Todos convergentes para o foco na questão de qual linguagem ou de que caracterísitcas de
linguagem são as mais adequadas para o relato de pesquisas qualitativas.

4 Conclusões

Os resultados ainda são incompletos e inconclusos em vista de coleta de dados ainda não concluída.
Claro está que o trabalho ainda tem como imprescindível uma complementação do referencial
teórico. Visto assim, esses aspectos se consolidam com as interpretações que se pretendem dar aos
documentos dentro dos contextos em que estão inseridos.
Destaque-se, neste ponto, a importância do caminho interpretativo constitutivo do método
hermenêutico que, com o seu viés dialético, procura superar a dicotomia sujeito / objeto das
concepções positivistas. Por fim, não nos parece descabido defender que os resultados deverão
refletir essa concepção levando tanto quanto possível à compreensão de percalços na produção do
conhecimento científico.

Referências

Appolinário, F. (2009). Dicionário de metodologia científica: Um guia para a produção do


conhecimento científico. São Paulo: Atlas.

Bortoni-Ricardo, S. M. (2013). O professor pesquisador: Introdução à pesquisa qualitativa. São Paulo:


Parábola.

Eco, U. (2002). Como se faz uma tese. São Paulo: Perspectiva.

Flick, U. (2009). Introdução à pesquisa qualitativa. (3ª ed.). Porto Alegre: Artmed.

Guelfi, D. C. (2006). Labirintos metodológicos: a caminho de uma hermenêutica. In Metodologias


multidimensionais em ciências humanas, 55-84. Rodrigues, M. L.; Cavalcanti, M. M. (orgs.).
Brasília: Liber Livro.

Koch, I. G. V. (2009). Argumentação e linguagem. (12ª ed.). São Paulo: Cortez.

Luna, S. V. (2009). Planejamento de pesquisa: Uma introdução. (2ª ed.). São Paulo: EDUC.

Minayo, M. C. S. (1996). O desafio do conhecimento – Pesquisa qualitativa em saúde. (4ª ed.). São
Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Abrasco.

Pourtois, J. P., & Desmet, H. (1999). A educação pós-moderna. São Paulo: Loyola.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Cuestiones críticas en la enseñanza y aprendizaje de la investigación


cualitativa

Ballesteros Velázquez, Belén1, Morentin Encina, Javier2

1
Departamento de Métodos de Investigación y Diagnóstico en Educación I, UNED, España.
bballesteros@edu.uned.es
2
Escuela Internacional de Doctorado, UNED, España. javiermencina@gmail.com

Resumen. Esta comunicación presenta una reflexión sobre el proceso de enseñanza-aprendizaje de la


metodología de cualitativa a partir del análisis de las aportaciones de los estudiantes en el blog Qualitas,
herramienta de comunicación virtual generado en el contexto de una asignatura obligatoria en dos másteres
impartidos a distancia. El análisis de contenido permite ver la necesidad de un marco docente que considere
la enseñanza y aprendizaje similares, en esencia, al desarrollo de la investigación cualitativa.
Palabras clave: epistemología; enseñanza-aprendizaje; constructivismo.

Critical issues in the teaching and learning of qualitative research


Abstract. This paper presents a reflection on the teaching and learning process of qualitative methodology.
based on the analysis of students’ contributions in the blog Qualitas, which is a virtual communicative tool
applied of a compulsory subject in two masters. The content analysis shows the need for a teaching
framework, where teaching and learning are similar share the same process to the development of qualitative
research.
Keywords: epistemology; training-learning; constructivism.

1 Introducción

El interés por profundizar en los procesos de enseñanza-aprendizaje de la metodología cualitativa


continúa en el debate actual, más aún si tenemos en cuenta la expansión de la investigación cualitativa
a nuevos campos de estudio, como el ámbito social, biomédico, económico o tecnológico. Desde la
proliferación de seminarios, congresos, cursos de verano y actividades de formación en línea
(webinars, MOOCs, blogs especializados, entre otros), se refuerza la necesidad de abordar algunas
cuestiones críticas que afectan a la práctica docente. Como señala Sandín (2003), poseer un
conocimiento profundo de la materia es una cuestión necesaria pero no suficiente, más si tenemos en
cuenta que ninguna disciplina científica está pensada inicialmente para ser enseñada.
Por otra parte, el interés emergente de algunas agencias y consultoras1 por la profesionalización de los
investigadores cualitativos, contribuye desde otra perspectiva a subrayar la importancia de reflexionar
sobre la formación necesaria.
La didáctica de la investigación cualitativa sugiere una cuestión inicial a partir de la cual articular la
reflexión: ¿la enseñanza de esta metodología requiere una forma diferente a la de otros métodos de
investigación? La respuesta a esta pregunta nos lleva a replantearnos un posicionamiento ante ella. A

1 MRS (The Market Research Society), AQR (Association of Qualitative Research), ESOMAR (European Society for Opinion
& Market Research), ICG (Independent Consultants Group), AURA (Association of Users of Research Agencies), APG
(Account Planning Group) and the SRA (Social Research Association), has validado una encuesta recientemente apliacada
en R.U. para conocer la opinion sobre la idea de disponer de una cualificación profesional aplicable a los investigadores
cualitativos

337
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

ese respecto, Breuer y Margrit (2007) señalan la necesidad de distinguir entre aspectos pragmáticos y
paradigmáticos; serían aspectos pragmáticos aquellos que inciden en el desarrollo de unas
competencias prácticas específicas para llevar a cabo alguna técnica o análisis concreto dentro de una
investigación, mientras que los aspectos paradigmáticos tienen que ver con una forma de
conceptualizar la realidad, concebir la construcción del conocimiento científico y desarrollar los
planteamientos y prácticas que permiten llevar a cabo investigaciones cualitativas.
Desde nuestro posicionamiento, la metodología cualitativa es diferente a un conjunto de técnicas.
Implica una visión de la realidad socialmente construida por la totalidad de la experiencia humana
vivida y una epistemología que toma como base del conocimiento social la interpretación de los
significados construidos y compartidos en un grupo humano, siendo el investigador un sujeto
posicionado, en relación dialéctica con este contexto (Ballesteros y Mata, 2014). Este tipo de
conocimiento no puede ser totalmente adquirido a través de los libros de texto únicamente. Supone
en buena parte de los casos un cambio radical respecto a un concepto de conocimiento supuestamente
objetivo, determinado y asumido. Esta ruptura es la que motiva la necesidad de repensar el significado
y práctica de una enseñanza que favorezca comprender la complejidad de esta forma de investigar.

2 El contexto donde surgen los intereses de investigación

Nuestro interés por analizar cómo orientar la enseñanza-aprendizaje de la investigación cualitativa se


contextualiza en la experiencia en la asignatura Metodología de Investigación Cualitativa, asignatura
obligatoria y común a dos másteres oficiales impartidos por la Facultad de Educación de la Universidad
Nacional de Educación a Distancia, (UNED).
El alumnado proviene de formaciones diferentes, con un recorrido y experiencia previa muy diversos
en cuanto a conocimiento y práctica de investigación y, concretamente, desde una perspectiva
cualitativa.
El reto, por tanto, consiste en orientar el programa, desarrollo y evaluación de la asignatura hacia la
movilización de preconcepciones sobre conocimiento científico, adquirido explícitamente a través de
la investigación cualitativa. Ello exige repensarla a través de su sentido (por qué) y forma (cómo), para
lo cual, desde el inicio de la asignatura, se da a conocer a través de la guía de estudio el
posicionamiento personal.

La investigación sobre cuestiones socioeducativas hace necesario el planteamiento y práctica de alternativas


metodológicas cualitativas para abordar problemas complejos y singulares, cuyo estudio permita construir
significados: descubrir nuevos conceptos, nuevas relaciones, nuevas comprensiones.
La mirada cualitativa permite describir y comprender los procesos sociales desde la perspectiva de sus protagonistas,
rescatando la singularidad de los hechos y estableciendo un diálogo intersubjetivo entre el investigador y la situación
que se estudia. El conocimiento que genera es una producción constructiva e interpretatia (Ballesteros, 2016: 2).

Al ser una universidad a distancia nuestra metodología se desarrolla a través de medios alternativos a
la presencialidad. Disponemos de la plataforma virtual aLF, que nos permite la organización de
contenidos (documentos, videoclases, programas de radio, enlaces a recursos en red), nos abre
distintas vías de comunicación (foros virtuales y chats) y nos ofrece la posibilidad de concebir la
evaluación de las actividades propuestas añadiendo el feed-back personalizado junto a las
calificaciones.
Conscientes de que la apertura a la investigación cualitativa para quienes se inician por primera vez
supone ampliar esquemas y lógicas de construcción científica, planteamos la necesidad de promover
una reflexión crítica sobre su base epistemológica y metodológica. Para ello, tanto la interacción
desarrollada en los foros de la asignatura dentro de la plataforma aLF como las contribuciones al blog

338
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

QUALITAS (https://qualitas.hypotheses.org/) se proponen como espacios de debate sobre cuestiones


esenciales en esta metodología.
En relación a estas contribuciones nos proponemos dos objetivos: por una parte, identificar en el
discurso del alumnado conceptos que ponen en tensión la comprensión y práctica de la investigación
cualitativa en relación a su esquema de ciencia; por otra, avanzar en la reflexión sobre cómo abordarlo
desde la práctica docente universitaria.

3 Metodología

El seguimiento de la asignatura por parte de estudiantes y docente pretende favorecer el debate y


compartir experiencias en el grupo. Por ello, se cuida especialmente la dinamización de la participación
a través de las herramientas virtuales de comunicación. Para cada uno de los temas que integran el
programa de la asignatura se propone un foro específico: sentido y forma de la investigación
cualitativa; investigación desde y para la acción transformadora: metodologías participativa;
introducción a la investigación etnográfica; investigación narrativa: las historias de vida; el estudio de
caso; análisis de contenido y discursos; introducción práctica a Atlas.ti.
Las intervenciones permiten ver buena parte de las preocupaciones, tensiones y dudas relacionadas
con las temáticas expuestas. Cada curso, de forma consensuada, seleccionamos aquellas que resultan
más significativas para el grupo, bien por la frecuencia con que aparecen o bien por la importancia de
profundizar en ellas para lograr una mejor comprensión de los principios epistemológicos de la
metodología cualitativa. Estas cuestiones son derivadas al blog Qualitas donde son debatidas en
abierto. Las contribuciones a este blog son el objeto de análisis en esta comunicación, siendo estas las
temáticas planteadas y los comentarios recibidos:

Tabla 1. Registro de la actividad del blog (https://qualitas.hypotheses.org/)

Entradas Nº de comentarios
· En torno a la objetividad vs. subjetividad en la construcción del conocimiento 51
· En torno a la validez de la investigación cualitativa 42
· Ética e investigación 55
· Finalidad de la investigación en el ámbito educativo. ¿Perspectivas según género? 88
· A vueltas con el relativismo 55
· La generalización. ¿Una forma de reduccionismo? 56
· Hacia una investigación socialmente comprometida 41
· Arte y ciencia 15

El análisis de contenido de estas intervenciones nos permite extraer significados de interés para la
práctica docente. Por razones de ajuste a la extensión vamos a centrarnos con más detalle en el análisis
de las aportaciones en torno al concepto de arte y su relación con la ciencia, que es una de las temáticas
que contribuye en gran medida a dar respuestas a las cuestiones planteadas en este estudio.

4 Resultados de investigación. Aportaciones de los estudiantes para la enseñanza-


aprendizaje

El conjunto de intervenciones en el blog nos sitúa en debates inacabados propios de la reflexión sobre
metodología cualitativa: la ruptura con el concepto de objetividad como garante de conocimiento
científico a favor de una intersubjetividad entendida como proceso y diálogo; el cambio de la

339
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

generalización a la necesidad de dar contexto y extraer conocimiento de lo particular; la consideración


de la ética como esencia en la construcción científica, lo que implica preguntarse qué propongo
conseguir y por la posibilidad de conseguirlo si no hacemos converger los intereses y la participación
de investigados e investigadores.
La exploración de las distintas perspectivas ante estas cuestiones nos hace ver desafíos y resistencias
que plantea la comprensión de la epistemología interpretativa, difíciles de asumir desde una
aproximación inicial a esta metodología. Como indicábamos, nos ocuparemos en este apartado del
análisis de las aportaciones en torno al binomio arte y ciencia. La pregunta propuesta para motivar el
debate es la siguiente: “¿Arte y ciencia pueden ir de la mano? ¿Puede haber creación en ciencia si no
hay arte, arte entendido como creatividad?” Los significados implícitos en las respuestas a esta
cuestión apuntan hacia las siguientes dimensiones categoriales: una, la conceptualización de arte y
creatividad; otra, sus implicaciones, diferenciadas en dos ámbitos estancos según los estudiantes:
ámbito docente y ámbito investigador. Encontramos así la tensión que surge al pensar la docencia-
investigación en términos dicotómicos. Se subraya la necesidad de realizar una investigación que
genere conocimiento socialmente útil para los problemas e intereses que se planteen en el aula,
coincidiendo así con lo indicado por Eisner (1991) en el marco de la investigación educativa; sin
embargo, no se llega a ver que la respuesta a ello sea precisamente la ruptura de esa relación
dicotómica entre investigación y docencia: “me he preguntado amargamente, cómo tanta
investigación no nos ha traído soluciones a las aulas”. La visión construida de arte y creatividad la
caracterizan como práctica comprometida socialmente, lo que permite situar dentro de ella tanto
docencia como investigación:

“El arte es la clave para capacitar a las generaciones capaces de reinventar el mundo heredado (…) La función
transformadora del arte es, por consiguiente, reconocida y se reivindica su necesidad para capacitar a la ciudadanía
del futuro. Así que la necesidad del arte, entendido como creatividad, es uno de los ejes para la evolución y desarrollo
de una sociedad.”

La reinvención sugiere oposición y, en muchos casos, sentimiento de soledad; la rutina puede asfixiar
o ser un confortable escenario donde acomodar nuestro pensamiento y acción de acuerdo a unas
reglas aceptadas:

“Existe un miedo muy profundo a ser diferente, a solucionar las problemáticas a las que nos enfrentamos cada día
con creatividad, salir un poco de lo “normal”, […] tenemos que atrevernos a equivocarnos”
“[…] para poder ser artista se debe estar dispuesto a ser un mal artista, darse el permiso de ser un principiante .”

La reflexión de los estudiantes sobre las implicaciones del arte y la creatividad en la docencia señalan
la necesidad de reconocerlo como un valor: es imposible o al menos realmente complicado, lograr que
los alumnos desarrollen competencias en creatividad si el propio docente no transmite esos valores.
Desde la perspectiva práctica, supone para el profesorado saber adaptarse a los diferentes modos de
aprendizaje del alumnado, lo que exige ser atrevidos en sus actuaciones, salirse de su rutina, pero
también ser cautelosos. Atrevidos para no tener miedo a equivocarse: “atreverse, tiene un poder que
no podemos ni imaginar”. Aprender de la experiencia y no dar soluciones fáciles, sino servir de guías y
hacer partícipe a su alumnado del proceso de enseñanza y aprendizaje:

“Podemos observar cómo los alumnos más pequeños, de los primeros cursos de la ESO se encuentran siempre
interesados en involucrarse en los temas de clase y en la resolución de problemas o participación en debates. No sé
qué es lo que se está haciendo mal, pero lo cierto es que según pasan los años, a los alumnos les cuesta más
participar, les es más difícil encontrar ideas originales o sugerencias creativas.”

340
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

“En el aula no se nos enseña a enfrentarnos a todas las situaciones que nos depara la vida pero sí debería hacer de
guía para fomentar la capacidad de pensar, razonar y permitirnos ser capaces de buscar las soluciones pertinentes
a cada problemática que se nos presente”.

Al mismo tiempo, junto con la osadía que se reclama al docente, advierten la necesidad de ser
cauteloso, contrastando, meditando y compartiendo esas actuaciones para evitar generar lo contrario
a lo pretendido. En ese sentido, se está reclamando la investigación como estrategia docente, aunque
las respuestas raramente planteen docencia e investigación como componentes de una misma
actividad. Citando a Betancourt (1999) subrayan algunas claves de esta relación: aprender a tolerar la
ambigüedad e incertidumbre; convertir las aulas en espacios para asombrarnos, experimentar e
investigar; el cuestionamiento como excelente indicador de que se está trabajando el pensamiento
creativo y crítico.
La visión que se tiene del investigador es la de alguien que interpreta la realidad social articulando
diferentes piezas, uniéndolas de una forma original obteniendo diferentes resultados mediante un
proceso en el cual ha sido necesario un planteamiento nuevo y único de hipótesis y posibles
respuestas. Y este sentido es un arte porque “desafía la habilidad del investigador para formular
categorías, plantear cuestiones, realizar comparaciones… y ciencia porque tiene que tener un rigor el
análisis”.
La creatividad en la investigación nos llevaría a situarnos en el contexto de lo cotidiano, vivirlo en su
complejidad, planteándonos nuevas preguntas ante lo supuestamente aprendido:

“La creatividad está basada en la realidad, no únicamente en fantasías como la gente habitualmente cree, sino que
esta misma nos permite enfrentarnos a la vida, a nuestros problemas de cualquier índole respondiendo de forma
ingeniosa y efectiva.”

“[implica] establecer relaciones de conocimiento, ver en dónde otros no ven, establecer nuevas preguntas, dar
respuestas originales…”

La investigación como arte recupera una dimensión emocional que a menudo queda silenciada:
“piensa en términos de magia, piensa en placer. Piensa en juego. No pienses en obligaciones. Haz todo
aquello que despierte tu curiosidad, investiga sobre todo aquello que te interesa: concéntrate más en
el misterio que en la Maestría”, (Cameron, 1994:56).

5 Conclusiones

A través de las aportaciones de los estudantes concluimos con la necesidad de articular la enseñanza-
aprendizaje de la metodología cualitativa como proceso de investigación. Esta comunicación es una
muestra de ello, pues refleja cómo el espacio de esta asignatura ha facilitado la producción de
información de base para fundamentar teorías pedagógicas; en otras palabras, el marco para la
docencia es considerar que enseñanza aprendizaje son similares en esencia al desarrollo de la
investigación cualitativa (Manson, 2002; Van der Maren, 2004).
El constructivismo, como indica Carvajal (2008), se propone como enfoque docente que permitirá la
enseñanza de la metodología cualitativa a través de la experiencia de participación en un proceso
investigador. En esta misma línea, las aportaciones de Breuer y Schreier (2007) y Hazzan y Nutov
(2014), ilustran cómo implementarlo, permitiéndonos ver en estas orientaciones un apoyo a la
información ofrecida anteriormente por nuestros estudiantes: reflexión integrada dentro del proceso
de aprendizaje, relaciones de confianza entre profesores y alumnos, debates que son moderados como

341
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

entrevistas, conciencia de las emociones y de su papel en la investigación, la enseñanza de los métodos


cualitativos como práctica cooperativa.

Referências

Ballesteros, B. (2016). Guía de estudio de la asignatura Metodología de investigación cualitativa.


https://2017.cursosvirtuales.uned.es/dotlrn/posgrados/asignaturas/23302193-17/portlet-
view?page_num=1375583, (acceso mediante autenticación).

Ballesteros, B. y Mata, P. (2014). Sentido y forma de la investigación cualitativa. En B. Ballesteros


(coord.) Taller de investigación cualitativa, 12-46. Madrid: UNED.

Betancourt, J. (2007). Creatividad en la educación: Educar para transformar. Educar: Revista de


Educación, 10. http://educar.jalisco.gob.mx/10/10educar.html.

Breuer, Franz & Schreier, Margrit (2007). Issues in Learning About and Teaching Qualitative Research
Methods and Methodology in the Social Sciences [46 paragraphs]. Forum Qualitative
Sozialforschung / Forum: Qualitative Social Research, 8(1), Art. 30, http://nbn-
resolving.de/urn:nbn:de:0114-fqs0701307.

Cameron, J. (2011). El camino del artista. Madrid: Aguilar.

Carvajal, D. (2008). (Ne pas) Enseigner les méthodes qualitatives et (ni) former aux logiciels d’analyse
des données qualitatives: une approche constructiviste de l’enseignement de la recherche
qualitative. Recherches qualitatives –hors série –. Logiciels pour l’analyse qualitative:i nnovations
techniques et sociales, 9, 181-195.

Eisner, E. W. (1991). The enlightened eye. Qualitative inquiry and the enhancement of educational
practice. New York: Macmillan.

Hazzan, O., & Nutov, L. (2014). Teaching and Learning Qualitative Research ≈ Conducting Qualitative
Research. The Qualitative Report, 19(24), 1-29. Retrieved from http://nsuworks.nova.ed/.

Mason, O. J. (2002) Teaching qualitative research methods: Some innovations and reflections on
practice. Psychology Teaching Review 10, 1.

Sandín Esteban, M.P. (2003). La enseñanza de la investigación cualitativa. Revista de Enseñanza


Universitaria 21, 37-52.

Van der Maren, J.M. (2004). Méthodes de recherche pour l’éducation. Montréal: Les Presses de
l’Université de Montréal De Boeck Université.

342
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A metodologia construtiva-interpretativa como expressão da


Epistemologia Qualitativa na pesquisa sobre o desenvolvimento da
subjetividade

Maristela Rossato – maristelarossato@gmail.com


Albertina Mitjáns Martínez – amitjans49@gmail.com

Universidade: Brasília

Resumo. O objetivo do artigo é apresentar e analisar a metodologia construtiva-interpretativa utilizada em


uma pesquisa sobre o desenvolvimento da subjetividade. A Epistemologia Qualitativa desenvolvida por
González Rey para o estudo da subjetividade numa perspectiva histórico-cultural é a base constitutiva dessa
metodologia, pois concebe a pesquisa como um processo de comunicação e diálogo, a singularidade da
produção do conhecimento científico e o conhecimento como um processo construtivo-interpretativo. A
metodologia constitui-se num contínuo processo de interpretação e construção do conhecimento a partir das
informações produzidas na realização dos instrumentos que tem a função de constituírem-se indutores da
expressão dos participantes. O processo de análise das informações produzidas é realizado ao longo de toda
a pesquisa, por meio da produção de indicadores que podem vir a constituir-se em hipóteses pela relevância
que assumem para o problema em discussão. O conhecimento produzido é consolidado pelas novas zonas de
sentido que a pesquisa possibilita abrir.
Palavras-Chave: Epistemologia Qualitativa, metodologia construtiva-interpretativa, desenvolvimento da
subjetividade.

The constructive-interpretative methodology as an expression of the Qualitative Epistemology in the


research on the development of subjectivity
Abstract. The purpose of this article is to present and analyze the constructive-interpretative methodology
used in a research on the development of subjectivity. The Qualitative Epistemology developed by González
Rey for study of subjectivity in a historical-cultural perspective is the constitutive basis of this methodology,
since it conceives research as a process of communication and dialogue, considers the singularity in the
production of scientific knowledge and recognizes knowledge as a constructive-interpretative process. The
methodology constitutes itself as a continuous process of interpretation and construction of knowledge. Such
construction is based on the information produced by the participants with the use of instruments that serve
as inducers of their expressions. The process of analyzing the information produced throughout the research
is based on indicators that may constitute relevant hypotheses to the problem under discussion. Knowledge
produced is finally consolidated by the new zones of meaning allowed to be opened by the research.
Keywords: Qualitative Epistemology, constructive-interpretative methodology, development of subjectivity.

1. Introdução
Este artigo tem por objetivo relatar e analisar a metodologia construtiva-interpretativa, fundamentada
pelos pressupostos da Epistemologia Qualitativa desenvolvida por González Rey (2002, 2003, 2005,
2011, 2015), que foi utilizada numa pesquisa sobre o desenvolvimento da subjetividade na trajetória
de superação das dificuldades de aprendizagem escolar em estudantes dos anos iniciais do Ensino
Fundamental (Rossato, 2009). Reconhecer no estudante um indivíduo em desenvolvimento e apostar
no desenvolvimento da subjetividade como caminho para a superação das dificuldades de
aprendizagem escolar possibilitou desconstruir a própria percepção dessas dificuldades e construir,
em bases mais sólidas, a compreensão da complexidade envolvida no processo de aprendizagem e
desenvolvimento (Rossato & Mitjáns Martínez , 2013, 2015).

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Os pressupostos gerais da Teoria da Subjetividade constituíram a base teórica da pesquisa, a saber: (1)
compreensão da subjetividade como sistema complexo, dinâmico e em permanente mobilidade; (2)
concepção do sujeito constituído na inter-relação tensa e contraditória entre a subjetividade individual
e a subjetividade social; (3) possibilidades de reconfiguração subjetiva e mudanças nos núcleos das
configurações subjetivas diante de novos sentidos subjetivos produzidos; (4) produção contínua de
sentidos subjetivos que se articulam às configurações subjetivas (González Rey, 2003a, 2005b, 2007).
Para o autor, o desenvolvimento é um dos atributos do funcionamento da psique, descrita como um
sistema complexo e organizado de forma processual e dinâmica, ancorada pelo seu caráter histórico.
Nesse sentido, sistema, organização, complexidade e processo são conceitos que estão na base da
compreensão de subjetividade e um dos desafios para a pesquisa constituiu-se na criação de recursos
produtores de informações que possibilitassem gerar inteligibilidade sobre as condições desse
movimento constitutivo contínuo.
A Epistemologia Qualitativa foi desenvolvida para a produção de conhecimento científico sobre a
subjetividade numa perspectiva histórico-cultural. Trata-se de um grande desafio epistemológico, pois
o pesquisador, no processo da pesquisa, depende de seu poder criativo e imaginativo para explicar o
fenômeno por meio de construções oriundas da articulação entre sua base teórica e as informações
produzidas no entre fenômeno/método.
Na implementação de uma pesquisa orientada pela Epistemologia Qualitativa o pesquisador necessita
ser um sujeito ativo, dialogando, construindo, interpretando e confrontando informações. Produzir
conhecimento no contexto da complexidade da sociedade contemporânea implica em resgatar o
pesquisador – cientista – do lugar de tabulador e processador de dados para o lugar de produtor de
conhecimento como resultado da articulação construção-interpretação no contexto teórico que
sustenta o fenômeno estudado. A Epistemologia Qualitativa tem como pressuposto principal a
legitimação do processo construtivo-interpretativo que leve à novos modelos teóricos em torno dos
objetos em estudo. “O conhecimento legitima-se na sua continuidade e na sua capacidade de gerar
novas zonas de inteligibilidade acerca do que é estudado” (González Rey, 2005a, p. 6).
A construção é sempre uma exploração, uma especulação, uma montagem que recria o fenômeno
estudado. A legitimação desse processo construtivo-interpretativo de produção do conhecimento
passa pelo desenvolvimento de zonas de sentido que se ampliam, gerando significação ao modelo em
construção. A legitimidade do conhecimento não existe em si mesma, mas está relacionada com o que
representa o conhecimento produzido em termos da “ampliação do potencial heurístico da teoria, o
qual permite acesso às áreas do real que resultavam inacessíveis em momentos anteriores” (González
Rey, 2002, p. 135). As zonas de sentido nos permitem conceituar novas áreas do real que se
materializam na produção teórica, mas sem se esgotarem em momento algum, como veremos a
seguir.

1. A Metodologia Construtiva-Interpretativa
A metodologia construtiva-interpretativa é um processo complexo e dinâmico de produção do
conhecimento que envolve ativamente os participantes, incluindo o pesquisador e, embora o caráter
construtivo e o caráter interpretativo sejam parte de um mesmo processo, em que um orienta e
complementa o outro, possuem particularidades que merecem atenção especial (González Rey, 2015).
O processo interpretativo é sempre a produção de um novo significado sobre eventos que, em seu
relacionamento, não tem significados a priori. A interpretação das informações ocorre ao longo de
toda a pesquisa e vai alimentando novas construções no processo. Cada pesquisador constrói e
reconstrói o problema de pesquisa tecido pelas suas vivencias e percepções sociais, históricas, culturais
e, principalmente, epistemológicas, que é o que possibilita reconhecer a existência de um problema
de pesquisa.

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O caráter construtivo pressupõe a capacidade do pesquisador, tendo como referência sua base teórica,
de produzir inteligibilidades em torno das informações geradas ao longo da pesquisa. Ainda, nesse
sentido, podemos considerar também o caráter construtivo-interpretativo na perspectiva das
informações que os próprios participantes vão produzindo ao longo da pesquisa, afinal, o que é
expresso por eles é resultado das reflexões produzidas a partir das induções e tensões geradas pelo
pesquisador, numa relação dialógica de empoderamento do outro para que possa falar de si e por si.
Os instrumentos, no curso da pesquisa, são compreendidos como indutores da expressão do outro,
representando uma fonte de produção da informação e não categorias em si mesmas. A interlocução
entre os instrumentos gera uma singularidade de informações que foge às regras padronizadas de
produção de conhecimento, uma vez que requerem a participação interpretativa e construtiva do
pesquisador ao longo de toda a pesquisa.

2.1 Instrumentos e Procedimentos da Pesquisa


Os instrumentos e procedimentos descritos a seguir tiveram como pressuposto principal serem
indutores da expressão do outro, numa relação dialógico-comunicacional entre pesquisador e
participantes. Além dos instrumentos com indutores escritos e não escritos, utilizamos como fonte de
informação as dinâmicas conversacionais, os momentos informais, a análise documental e a
observação, conforme veremos a seguir:

Dinâmicas Conversacionais
Instrumento citado por Gonzalez Rey (2005). Foi desenvolvido com objetivo de induzir o pesquisador
a se deslocar da posição de quem pergunta e produzir uma dinâmica com um clima favorável para a
produção da informação. Conforme o autor, possibilita que o participante seja conduzido a campos
significativos de sua experiência pessoal, expressando elementos da produção simbólico-emocional.
Trata-se de um processo ativo, que deve ser regido pela iniciativa e criatividade do pesquisador em
estabelecer indutores da expressão do outro, tanto na consecução dos instrumentos formais, como
nos momentos informais da pesquisa, conforme veremos adiante. Na pesquisa desenvolvida, as
Dinâmicas Conversacionais permearam todo o processo de produção das informações, desde a
constituição do cenário social que são as ações de aproximação do pesquisador com o campo.

Instrumentos Apoiados em Indutores não Escritos


Desenho Temático: Foi produzido como possibilidade de expressão de elementos subjetivos de forma
diferente da palavra e, na pesquisa, assim como os demais, esteve articulado a Dinâmicas
Conversacionais. Os participantes foram convidados a desenharem e, na sequência, descreverem
oralmente a produção realizada: “(1) Minha maior alegria na escola (2) Minha maior tristeza na escola”
(Rossato , 2009). Nesse momento, outras histórias, além da associada ao registro pictográfico também
foram solicitadas e registradas pelo pesquisador.

Como eu me Sinto: Foi construído para o estudante expressar sua produção subjetiva diante de
situações cotidianas da sala de aula. Todas as situações foram vivenciadas pela pesquisadora nos
momentos de observação, vividas por diferentes estudantes da turma. Foram produzidos dois
materiais: 10 frases onde o estudante ela levado, pela pesquisadora, a imaginar uma situação: “(1)
Imagine que mesmo depois da professora explicar várias vezes um conteúdo você ainda não tenha
entendido. Como você se sente? (2) Imagine que você perceba que está conseguindo fazer sozinho,
atividades que não conseguia fazer. Como você se sente?” (Rossato, 2009); 10 cartões com expressões
faciais, por meio de emotions, onde o estudante deveria escolher qual melhor representava seus

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sentimentos diante da situação escolhida e narrar histórias igual ou semelhantes vividas pelo mesmo,
caso houvesse.

Mudando Você: Foi construído como espaço para o estudante expressar alguma percepção negativa
que tivesse em relação a si mesmo, por meio de uma história que narrava o encontro do estudante
com um gênio e lhe concedia pedir três mudanças em si mesmo. “Imagine que você encontrasse um
gênio e tivesse a chance de pedir três mudanças em você, mas teria que convencê-lo da importância
dessas mudanças” (Rossato, 2009). O participante deveria escolher quais mudanças gostaria de fazer
e argumentar oralmente a respeito de suas escolhas.

Escolhas: Instrumento construído para possibilitar a expressão da percepção de si, suas ações e as
relações com o outro. Foram produzidos dois materiais nesse instrumento: 10 frases indutoras de
escolhas que o estudante deveria fazer, utilizadas pelo pesquisador, como: “Quem você escolheria?
(1) Para estudar junto (2) Para dividir seu lanche (3) Para ajudar a resolver problemas de matemática
(4) Para ser seu melhor amigo” (Rossato, 2009). As escolhas deveriam ser feitas entre 30 cartões com
imagens de pessoas (adultos, crianças, animações), todas dispostas em cima de uma mesa, no campo
de visão do estudante. Após cada escolha era levado a justificar sua escolha, além de argumentar os
motivos que o levaram a não escolher outros cartões para a realização da ação proposta, apontados
pela pesquisadora.

Complemento de Frases Ilustrado: Instrumento desenvolvido para identificar elementos que pudessem
expressar a constituição da subjetividade individual em crianças. Foi realizado por meio de 27 cartões,
produzidos pela pesquisadora, contendo frases que deveriam ser completadas oralmente. A atividade
foi desenvolvida em forma de jogo, com regras criadas pelo próprio estudante. “(1) Eu fico feliz
quando... (2) Os melhores momentos da minha vida são quando... (3) Eu me relaciono bem com... (4)
É difícil aprender quando...” (Rossato, 2009).

Linha da Vida Escolar: O instrumento foi produzido para que o estudante reconstruísse sua trajetória
escolar, demarcando os episódios que considerasse significativos em sua trajetória. Para a realização
da tarefa receberam um papel (30x100) e a orientação para que dividissem pelo número de anos que
já haviam frequentado a escola. Cada estudante construiu uma linha longitudinal no centro do papel
perpassando todos os anos de escolaridade e, com os recursos de sua escolha (desenho, colagem,
escrita, etc.), produziu cenas que foram posteriormente comentadas pelo mesmo.

Instrumentos Apoiados em Indutores Escritos


Redação: Foi desenvolvido para avaliar a expressão escrita do estudante, servindo de parâmetro para
a produção dos demais instrumentos. Em uma folha de papel, foram solicitados a escreverem a partir
da pergunta “Quem sou eu?” (Rossato, 2009).
Complemento de Frases: Instrumento criado por González Rey e Mitjáns Martínez (1989), com
objetivo de identificar elementos que possam expressar a constituição da subjetividade individual. A
quantidade e os indutores podem variar. Na pesquisa, foi utilizado com os professores contendo 77
indutores curtos, diretos e indiretos. A seguir poder ver alguns indutores indiretos: “(1) Eu gosto de...
(2) O tempo mais feliz... (3) Gostaria de saber... (4) Eu aprendo... (5) Lamento...”. Ao longo do
instrumento foram introduzidos também alguns indutores diretos, relativos ao tema, como: “(11) Sou
um professor... (19) Não esqueço da aula quando... (48) Gosto quando o aluno... (57) A sala de aula...”
(Rossato , 2009). A proposta é de que a expressão seja livre, com primeira ideia que ocorrer ao
participante.

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Exploração múltipla: Orientado para o estudo dos indicadores funcionais como a flexibilidade e a
capacidade de estruturação do campo de ação. Utilizou-se a adaptação feita por Mitjáns Martinez
(2003). É composto por seis indutores como o descrito a seguir: “Se você pudesse escolher os alunos
para compor sua turma, que alunos você escolheria? Faça uma lista das principais características dos
alunos que você gostaria de ter em sua sala de aula”.

Questionário Aberto: Foi desenvolvido com o objetivo de convidar os professores a manifestarem-se


livremente, sem ficarem restritos a uma pergunta para ser respondida, e manifestassem suas
impressões sobre cada estudante participante da pesquisa. Os professores foram convidados a
escreverem sobre: “Facilidades que o(a) aluno(a) encontra na escola – reação do(a) aluno(a);
Dificuldades que o(a) aluno(a) encontra na escola – reação do(a) aluno(a); Impedimentos na
aprendizagem do(a) aluno(a); Expectativa sobre sua participação na aprendizagem do(a) aluno(a);
Impressões sobre as condições de trabalho oferecidas que visam a superação das dificuldades de
aprendizagem do(a) aluno(a)” (Rossato , 2009).

Mudanças: Este instrumento foi desenvolvido para uma fase intermediária da pesquisa com o objetivo
específico de identificar como o estudante percebia as mudanças ocorridas dentro do período em que
a pesquisa estavas sendo desenvolvida. Como material, utilizamos uma folha impressa com um quadro
contendo cinco grupos sociais dos quais o estudante, dispostos na vertical – “(1) Minha Família (2)
Minha Escola (3) Meus Amigos (4) Minha Professora (5) Minha Sala de Aula” (Rossato , 2009) – e duas
colunas na horizontal, onde deveriam escrever sobre como percebiam cada um dos grupos em dois
momentos: no ano passado e no momento presente.

Momentos Informais
Pela dimensão comunicacional e dialógica da Epistemologia Qualitativa, as informações obtidas em
momentos informais são reconhecidas com a mesma legitimidade que aquelas que foram obtidas por
meio dos demais instrumentos. Ao longo da pesquisa muitas informações foram produzidas a partir
desses momentos, de modo especial participando dos horários de intervalo das aulas juntamente com
os professores. Os momentos informais tanto podem ser os criados a partir das relações espontâneas
com os participantes como os decorrentes da interação com os instrumentos da pesquisa, pelos
indutores diretos e indiretos ali contidos.

Análise Documental
Os documentos foram utilizados como fonte de informação na caracterização dos participantes, pois
contém o registro da história escolar. Vale lembrar que essas informações pontuais contribuem para
que o pesquisador possa compreender melhor as narrativas do estudante e possa identificar a
descrição de fatos, na versão do outro.

Pasta do Estudante: Conjunto de documentos de uso da secretaria da escola, contendo a história


escolar do estudante: cópia dos documentos pessoais, relatórios de aprendizagem de anos anteriores,
registro de ocorrências escolares, como advertências e sansões, fichas de encaminhamento para
profissionais especializados, diagnóstico de profissionais, entre outros.

Relatório do Estudante: Realizado pelos professores ao final de cada bimestre, de forma descritiva,
contendo informações sobre as conquistas e dificuldades do estudante naquele período.

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Cadernos do Estudante: Registro cotidiano das atividades desenvolvidas em sala de aula e em casa,
onde foi possível identificar a organização, o empenho na realização das atividades, a criatividade,
entre outros.

Ficha do Conselho de Classe: Preenchida pelo professor ao final de cada bimestre, com a identificação
dos estudantes que precisam de algum tipo de intervenção junto à família, profissionais especializados
ou mesmo no âmbito da escola.

Observação
Permite identificar comportamentos intencionais ou não-intencionais em seu contexto temporal-
espacial, independentemente da capacidade verbal expressiva dos sujeitos, possibilitando o confronto
com informações obtidas por meio dos instrumentos. A observação foi utilizada como recurso para
perceber o movimento dos sujeitos na relação com o outro (professores expressando suas opiniões
sobre os estudantes, professores conversando com estudantes, reação dos estudantes diante da
postura assumida pelo professor a seu respeito, reação dos estudantes diante da postura assumida
pelo professor diante dos colegas, reação dos estudantes na ausência dos professores, reação dos
estudantes junto aos colegas da escola, estudantes expressando sua opinião sobre os professores,
etc.), levantando e reforçando indicadores formulados no processo da pesquisa. A seguir, os
momentos em que foi realizada observação sistemática no cotidiano da escola. Todos os registros
foram realizados em Diário de Campo.

Conselho de Classe: Realizado bimestralmente entre os professores, direção e equipe pedagógica, para
indicar estudantes com dificuldades de aprendizagem, problemas de comportamento, entre outros,
bem como decidir quais as providências e responsabilidade das mesmas.

Reunião Pedagógica: Realizada semanalmente com os professores, para discussão com equipe
pedagógica sobre temas relevantes, informativos, etc.

Coordenação Pedagógica: Momento em que os professores estudam e organizam suas aulas, em


horário contrário ao dos estudantes (dois a três dias por semana).

Intervalo das Aulas: No pátio da escola e na sala dos professores.

Salas de Aula: No espaço regular das aulas, no laboratório de informática e na biblioteca.

2.2 Trilha de Objetivos no Processo da Pesquisa


A seguir, estão descritos os desdobramentos da pesquisa, destacando a trilha de objetivos que
envolveram cada atividade ao longo de 18 (dezoito) meses de investigação. Os quadros apresentados
contêm os desdobramentos realizados para a produção das informações, visando contemplar o
objetivo geral da pesquisa. A pesquisa está dividida em 3 (três etapas): Primeira Etapa – Seleção dos
Participantes; Segunda Etapa – Identificação e Análise da Constituição Subjetiva dos Estudantes;
Terceira Etapa: O Movimento da Subjetividade
Primeira Etapa – Seleção dos Participantes
Tabela 1: Identificação dos estudantes com dificuldades de aprendizagem

Recursos e Instrumentos Trilha de Objetivos


Dinâmica conversacional Identificar quem são os estudantes com dificuldade de aprendizagem em
com professores cada turma e como estas se manifestam, na opinião dos professores;

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Pasta do estudante Identificar informações sobre a história escolar dos estudantes como ano de
ingresso na escola, reprovações, mudança de escola, relatórios anteriores,
comunicados aos pais, entre outros, destacando elementos que caracterizem
suas condições anteriores de aprendizagem e ações desenvolvidas em
relação à mesma;
Caderno do estudante Analisar como as atividades propostas em sala são realizadas, considerando
seu envolvimento e esforço pessoal nas mesmas;
Ficha do conselho de Identificar as impressões do professor sobre a condição de aprendizagem do
classe estudante, bem como as decisões tomadas pelo Conselho de Classe;

Na Tabela 1 estão descritos os primeiros movimentos da pesquisadora para identificar os possíveis


participantes da pesquisa que, inicialmente, foram apontados pelos professores e, posteriormente,
analisados dentro do perfil necessário à pesquisa: estudantes que apresentavam dificuldades de
aprendizagem sem nenhuma causa orgânica.
Nessa abordagem inicial chegou-se a 30 (trinta) estudantes que, durante 3 (três) semanas, foram
acompanhados no contexto da escola. Depois dessa fase inicial, optou-se por continuar com 17
(dezessete) estudantes que demonstraram ser mais significativos, conforme os objetivos da pesquisa.

Segunda Etapa – Identificação e Análise da Constituição Subjetiva dos Estudantes


A segunda etapa da pesquisa foi marcada pelo trabalho direto com os 17 (dezessete) estudantes
selecionados utilizando recursos diversos, conforme descrito nas Tabelas 2 e 3 para identificar como
estava constituída da subjetividade. As atividades descritas na Tabela 2 possibilitaram a produção dos
indicadores iniciais dos elementos subjetivos que poderiam contribuir para explicar as dificuldades de
aprendizagem escolar. Essa etapa teve duração de aproximadamente 7 (sete) meses.

Tabela 2: Identificação dos elementos da subjetividade dos estudantes em relação à aprendizagem escolar

Recursos e Instrumentos Trilha de Objetivos


Desenho Identificar as relações de alegria e de tristeza que os estudantes
manifestam nas atividades escolares.
Redação Proporcionar espaço para que os estudantes se expressem livremente
sobre si mesmos e como acreditam que estão na escola.
Complemento de frases Produzir elementos que possam servir de indicadores da subjetividade
dos estudantes.
Pasta do estudante Identificar informações que possam contribuir na compreensão de
indicadores gerados pelos instrumentos já realizados com os estudantes.
Como me sinto Identificar elementos da subjetividade do estudante quando confrontado
com situações comuns em sala de aula (presenciadas previamente pela
pesquisadora) na relação com a aprendizagem, com o professor e com os
colegas.
Mudando você Identificar mudanças almejadas pelo estudante em relação a si mesmo,
investigando o nível de importância que as dificuldades na aprendizagem
têm em sua vida, a partir de uma sequência de temas pré-indicados e à
sua escolha.
Escolhas Verificar, por meio dos critérios de escolha de imagens, a partir de um
conjunto de temas e fichas com imagem, previamente escolhidas pela
pesquisadora, elementos da subjetividade do estudante relacionados às
suas dificuldades de aprendizagem.

Tabela 3: Identificação dos elementos da subjetividade dos estudantes em relação à escola.

Recursos e Instrumentos Trilha de Objetivos

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Como me sinto Identificar elementos da subjetividade social gerados no confronto com


situações comuns em sala de aula (presenciadas previamente pela
pesquisadora), na relação com a aprendizagem, com o professor e com
os colegas.
Observação da sala de aula Observar a posição assumida pelos estudantes com dificuldades de
aprendizagem perante os demais, bem como sua aceitabilidade no grupo,
identificando elementos da subjetividade social da aula.
Como me sinto Identificar elementos da subjetividade do estudante quando confrontado
com situações comuns em sala de aula (presenciadas previamente pela
pesquisadora), na relação com a aprendizagem, com o professor e com
os colegas.
Dinâmica conversacional com Identificar a posição assumida pela direção acerca dos motivos
direção envolvidos nas dificuldades de aprendizagem dos estudantes na escola.
Dinâmica conversacional com Identificar a posição assumida pela equipe pedagógica acerca dos
equipe pedagógica motivos envolvidos nas dificuldades de aprendizagem escolar dos
estudantes.
Conselho de classe Identificar as impressões do professor sobre a condição de aprendizagem
da turma.

Terceira Etapa: O Movimento da Subjetividade


Nessa etapa abordamos o ponto central da pesquisa: o movimento da subjetividade no processo de
superação das dificuldades de aprendizagem escolar. Nessa etapa final trabalhamos com 5 (cinco)
estudantes que, após um ano de investigação, apresentaram mudanças no desempenho escolar
qualitativamente significativa para a investigação. Destaca-se que a pesquisa não fez nenhuma
abordagem interventiva em relação às dificuldades de aprendizagem, apenas acompanhou a dinâmica
da escola e o trabalho que os professores foram desenvolvendo com os estudantes. Essa etapa final
teve duração de 6 (seis) meses.
Os 12 (doze) meses de atividades descritas na Primeira Etapa e Segunda Etapa, incluindo os intervalos
entre as etapas, possibilitaram criar uma base de informações e indicadores que, confrontados com a
produção da Terceira Etapa, geraram um conteúdo passível de análise do movimento – mudança e
desenvolvimento – da subjetividade. A seguir, na Tabela 4, temos a descrição dos recursos utilizados
para produzir informações em relação aos elementos subjetivos presentes no processo de superação
das dificuldades de aprendizagem escolar e articuladas às mudanças subjetivas identificadas no
processo.

Tabela 4: Identificação de elementos subjetivos que indicam o processo de superação das dificuldades de
aprendizagem escolar e mudanças subjetivas no estudante

Recursos e Instrumentos Trilha de Objetivos


Ficha do conselho de classe Identificar as impressões do professor sobre a condição de
aprendizagem do estudante.
Relatório do estudante Identificar as impressões do professor sobre a condição de
aprendizagem do estudante.
Caderno do estudante Analisar o processo de realização das atividades propostas em sala,
considerando seu envolvimento pessoal.
Dinâmica conversacional com Buscar informações sobre a história dos estudantes, condições atuais,
os pais impressões sobre a aprendizagem e expectativas sobre a contribuição
da escola.
Dinâmica conversacional com Identificar suas impressões acerca de sua condição atual de
os estudantes aprendizagem.
Dinâmica conversacional com Identificar se a família percebeu, e como percebeu, a mudança no(a)
os pais filho(a) e que análises explicativas faz sobre o ocorrido.
Mudanças Identificar mudanças que o estudante seja capaz de perceber que
ocorreu nos grupos sociais a que pertence.

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Complemento de frases Identificar elementos da subjetividade do estudante concernentes às


ilustrado suas mudanças em relação à aprendizagem.
Linha da vida escolar Possibilitar ao estudante um espaço para que possa manifestar
livremente elementos de sua subjetividade constituídos ao longo de
sua vida escolar.

2.3 Analise Construtiva-Interpretativa


A análise, no modelo construtivo-interpretativo, é um processo que necessita ser realizado ao longo
de toda a pesquisa, pois é o que possibilita ao pesquisador ir tecendo o caminho da mesma. O balizador
de todo o processo está na qualidade e na pertinência da informação produzida para o problema em
discussão e, principalmente, para a abertura de novas zonas de sentido dentro do modelo teórico em
discussão. A interpretação e a construção do pesquisador requerem um olhar sensível, capaz de se
movimentar na tessitura das informações desde as mais particulares até as mais gerais sem, contudo,
ficar preso aos fatos narrados e descritos pelos participantes, mas aproximando-se dos elementos
subjetivos produzidos nas vivências dos mesmos, sempre fruto da interpretação qualificada e
fundamentada pela base teórica do pesquisador.
Na pesquisa desenvolvida, o processo de análise das informações ocorreu ao longo de todo o período
de investigação, em três níveis de análise, com relativa recursividade entre eles: no primeiro nível de
análise realizou-se a produção de indicadores sobre a constituição da subjetividade dos estudantes.
Essa produção é um exercício interpretativo do pesquisador, construído pela tessitura da análise
integrada das informações. Os indicadores podem vir a constituir-se em hipóteses, quando se mantem
relevantes ao longo da pesquisa, ou mesmo serem refutados, se não houver elementos
suficientemente relevantes para sua manutenção.
No segundo nível de análise, a partir dos indicadores mais consistentes, foram produzidas hipóteses
sobre como a constituição da subjetividade se expressava nas dificuldades de aprendizagem e, ao
longo da pesquisa, no processo de superação das dificuldades de aprendizagem. Para cada caso
pesquisado e analisado, as hipóteses da trama entre subjetividade/dificuldades de aprendizagem num
primeiro momento e desenvolvimento da subjetividade/superação das dificuldades de aprendizagem
apresentaram-se com elementos próprios de cada participante, entretanto, todos contribuíram para
a construção das zonas de sentido que fundamentaram a tese em discussão.
No terceiro nível de análise, foram produzidas as zonas de sentido que são construções de modelos
teóricos decorrentes de todo o percurso da pesquisa, numa análise integrativa entre os casos
estudados (três). A título de exemplo, a pesquisa possibilitou construir novas zonas de sentido em
torno do problema investigado, sinalizando que as dificuldades de aprendizagem podem ser geradas
pela negação da expressão do sujeito, pela ausência de condições favorecedoras à produção de
sentidos subjetivos que promovam a aprendizagem escolar e pela existência de configurações
subjetivas geradoras de danos que comprometem a produção de sentidos subjetivos favoráveis à
aprendizagem escolar. Essas zonas de sentido deram sustentação à tese de que a superação das
dificuldades de aprendizagem requer o movimento da subjetividade (Rossato, 2009). A análise
construtiva-interpretativa é um processo marcado pela recursividade do processo analítico,
entretecida pela base teórica do pesquisador.

2. Considerações finais
O desenvolvimento da subjetividade pode ser caracterizado como mudanças subjetivas que ganham
certa estabilidade, originando outras mudanças, gerando novos níveis qualitativos de organização
subjetiva (Rossato, 2009; Rossato & Mitjáns Martínez, 2013; 2015). Pesquisar nesse movimento, sem
a pretensão de congelar a cena para que possa ser analisada, coloca os pesquisadores diante do desafio
da produção do conhecimento com fenômenos complexos. A pesquisa do desenvolvimento da
subjetividade implicou em assumir e enfrentar alguns desafios como o de representar fenômenos que

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estão em processos de mudança, reconhecendo que não há uma estabilidade que possa ser retratada,
mas categorias integradoras, como a subjetividade, que imprimem dinamicidade e complexidade
teórico-metodológica à pesquisa. Outro ponto de destaque na pesquisa do desenvolvimento da
subjetividade foi o papel do pesquisador que precisou converter-se também em sujeito ativo na
pesquisa e parte da realidade investigada. A ação ativa e criativa do pesquisador, numa relação
dialógica com os participantes, produziu um espaço dinâmico-comunicacional favorável para a
expressão dos sujeitos – pesquisador e participante –, condição essencial para a produção de
informações no contexto da metodologia construtivo-interpretativa. Por fim, vale destacar, que a
pesquisa também foi um agente promotor de dinâmicas de desenvolvimento e isso não pode ser
ignorado pelo pesquisador, pois, ao mobilizar a expressão dos participantes, eles foram sendo levados
a refletirem sobre processos vividos. A Epistemologia Qualitativa pressupõe que a informação é
produzida em interação com o pesquisador e, nessa interação, ambos estão em desenvolvimento.

Referências
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Martínez; M. Neubern & V. D. Mori (Orgs.). Subjetividade contemporânea: discussões
epistemológicas e metodológicas. Campinas SP: Alínea Editora, 13-34.
González Rey, F. (2007). Psicoterapia, Subjetividade e Pós-Modernidade. Uma aproximação histórico-
cultural. São Paulo: Pioneira Thomson Learning.
González Rey, F. (2005a). Pesquisa Qualitativa e Subjetividade: os processos de construção da
informação. São Paulo: Pioneira Thomson Learning.
González Rey, F. (2005b). O valor heurístico da subjetividade na investigação psicológica. In F. González
Rey (Org.). Subjetividade, complexidade e pesquisa em psicologia. São Paulo: Pioneira Thomson
Learning, 27-51.
González Rey, F. (2003a). Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning.
González Rey, F. (2003b). Epistemología Cualitativa y Subjetividad. São Paulo: EDUC.
González Rey, F. (2002). Pesquisa Qualitativa em Psicología: caminhos e desafios. São Paulo: Pioneira
Thompson Learning.
González Rey, F. & Mitjáns Martínez, A. (1989). La personalidad su educación y desarrollo. Ciudad de
La Habana, Cuba: Editorial Pueblo y Educación.
Mitjáns Martínez, A. (2003). El profesor como sujeito: Elemento esencial de la formación de profesores
para la educación inclusiva. Movimento, 7.
Rossato, M. (2009). O movimento da subjetividade no processo de superação das dificuldades de
aprendizagem escolar. Tese de Doutorado, Universidade de Brasília, Brasília, Brasil.
Rossato, M. & Mitjáns Martínez, A. (2015). A subjetividade dos estudantes no processo de superação
das dificuldades de aprendizagem: estratégias de ação. In A. A. Anache, B. J. L. Scoz & M. I. S.
Castanho (Orgs.). Sociedade Contemporânea: subjetividade e educação. São Paul: Menon, 33-53.
Rossato, M. & Mitjáns Martínez, A. (2013). Desenvolvimento da subjetividade: Análise de histórias de
superação das dificuldades de aprendizagem. Revista Semestral da Associação Brasileira de
Psicologia Escolar e Educacional, 17(2), 290-297.

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A percepção dos gestores sobre as tecnologias na escola: da gestão


pedagógica a administrativa

Ronaldo Nunes Linhares1, Marília Gabriele Melo dos Santos1, José Gomes da Silva 1

1 Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Tiradentes, Brasil.


gabi_1785@hotmail.com; ronaldo_linhares@unit.br; serginhoneb@hotmail.com

Resumo. A pesquisa teve como objetivo compreender a percepção do gestor nas escolas Municipais de
Educação Fundamental – EMEF de Aracaju, referente as tecnologias na gestão pedagógica e administrativa.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de caráter descritivo, com coletas dados bibliográficos e documental
que organizam a educação municipal, com entrevistas semiestruturadas realizada com 6 gestores. Quanto
aos procedimentos, utilizou-se estudo de caso múltiplo. Os dados obtidos foram analisados segundo a
técnica de análise de conteúdo de Bardin (2011). E utilizamos o software de apoio à análise de dados
qualitativos webQDA. A pesquisa aponta que as Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC), ainda não
estão inseridas nas práticas de gestão pedagógica e administrativa. Na gestão administrativa percebemos
um progresso em relação ao programa OI Educa e, já na gestão pedagógica ainda é ineficiente referente a
capacitação dos professores para o manuseio, planejamento e uso das TIC.
Palavras-chave: Gestão. TIC. Percepção. Escola.

The perception of managers on technologies in school: from pedagogical to administrative management


Abstract. The aim of the research was to understand the perception of the manager in the Municipal
Primary Education Schools - EMEF of Aracaju, referring to technologies in pedagogical and administrative
management. This is a qualitative research, with a descriptive character, with bibliographical and
documentary data collections that organize the municipal education, with semi-structured interviews
conducted with 6 managers. As for the procedures, a multiple case study was used. The obtained data were
analyzed according to the technique of content analysis of Bardin (2011). And we use the software to
support qualitative data analysis webQDA. The research points out that Information and Communication
Technology (ICT) are not yet included in pedagogical and administrative management practices. In
administrative management, we perceive progress in relation to the OI Educa program and, even in
pedagogical management, it is still inefficient regarding the training of teachers in the use of ICT planning
and use.
Keywords: Management. TIC. Perception. School.

1 Introdução

A incorporação das Tecnologia Informação e Comunicação (TIC), nas escolas estão cada vez mais
presentes tanto nos processos pedagógicos, quanto administrativos. Seu poder multiplicador e
disseminador das informações ajudam a construção do conhecimento, desenvolve o raciocínio e a
imaginação. A escola ocupa um lugar importante na formação dos sujeitos, e as TIC possibilita e
contribui a prepara-los para mercado de trabalho.
As TIC ao serem inseridas na escola facilitam o processo de ensino e aprendizagem e trazem
mudanças aos materiais instrucionais tradicionais que promovem a interação das linguagens (texto,
imagem e som) e criam praticas pedagógicas mais flexíveis fazendo com que o ensino e
aprendizagem sejam mais colaborativos. Essas tecnologias tornaram-se ferramentas importantes
para o acesso e troca de informações na atual sociedade, além de contribuírem para novas formas de
aprendizagem, expandindo as relações com os saberes e favorecendo as comunicações entre as
instituições e a sociedade.

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O Aporte teórico utilizado tem como base as contribuições de Almeida (2003), Almeida (2005),
Bardin ( 2011), Barroso (2012), Kenski (2007), Luck (2009), Moran (2003), Oliveira; Ferrete e Souza
(2015), Oliveira (2008). Este artigo procura avaliar as TIC na educação, principalmente aqueles de
cunho qualitativo, tem destacado a importância da gestão escolar como um dos elementos
dificultadores da inserção das TIC na educação. Questões como o modelo, as práticas e estratégias
de gestão das tecnologias, a concepção dos gestores sobre o lugar e a importância destas
tecnologias, assim como aquela relacionadas a manutenção, atualização, acesso, planejamento, uso
pedagógico, formação continuada e segurança constam nesses estudos.
Nesse contexto, justifica-se esta pesquisa pela relevância de contribuir com reflexões sobre a
importância do gestor para incorporação das TIC nos espaços escolares de escolas do município de
Aracaju. Neste artigo abordaremos a metodologia adotada, pensando a gestão com e para as TIC,
formação do gestor e incorporação das TIC, resultados e discussões da gestão pedagógica e
administrativa. Para inserção das TIC é preciso uma formação contextualizada dos profissionais que
fazem parte da escola, sendo aptos a reconhecer possíveis problemas e as necessidades ao uso, essa
formação intensifica o papel do gestor escolar na incorporação das TIC, para melhor articulação com
o uso pedagógico e o administrativo.

2 Entrevistas como aportes pessoais para uma metodologia qualitativa

Este artigo baseia-se em uma abordagem qualitativa, de caráter descritivo, a partir da pesquisa
bibliográfica e coletas de documentos que organizam a educação municipal de Aracaju direcionando
seu campo de pesquisa em 6 escolas da Rede Municipais de Educação Fundamental – EMEF de
Aracaju no estado de Sergipe. A opção por esta metodologia partiu do fato de que a pesquisa
qualitativa nos permite aprofundar o conhecimento da realidade, interpretando-a de acordo com os
próprios sujeitos que participam da situação, objetivando uma investigação marcada pela interação
entre o objeto de estudo e o pesquisador, acompanhada pelo registro de dados e a interpretação e
explicação do pesquisador.
Quanto aos procedimentos, utilizou-se estudo de caso múltiplo, procurando compreender a
incorporação das tecnologias na rede municipal de ensino de Aracaju, sob o ponto de vista dos
gestores das 6 unidades. Esses sujeitos possuem características sociais diferentes na sua unidade,
quanto a rede é múltipla na sua diversidade dos gestores e visão de mundo. Conforme Oliveira
(2008), este estudo utiliza mais de uma realidade para confrontar os dados, pretendendo procurar
explicações para os fenômenos que configuram o objeto de pesquisa.
Os dados obtidos foram analisados segundo a técnica de análise de conteúdo baseada nas
contribuições de Bardin (2011), pois compreendemos que essa técnica colabora para a compreenção
do processo de análise das informações coletadas. Sendo uma técnica de tratamento que visa a
interpretação do material de natureza qualitativa, proporcionando uma descrição objetiva,
organizada das falas dos colaboraodres. Que é organizada em torno de três pólos: a pré-análise, com
a organização dos dados, os objetivos propostos e a elaboração de indicadores que subsidiem a
interpretação; a exploração do material, com a codificação dos dados, e, por fim, o tratamento dos
resultados, a inferência e a interpretação que faz a busca pelo entendimento dos dados agrupando-
os em categoria.
A coleta de dados para a pesquisa foi realizada em duas etapas: a primeira, marcada pelo
levantamento bibliográfico e documental, no qual consultamos documentos oficiais, tais como:
legislações federais, estaduais e municipais (Município de Aracaju), no Plano Nacional de Educação
(PNE) - Lei n.º 10.172/2001/Lei. N.º 13.005/2014 e a Lei Complementar n° 121, referente ao Sistema
Municipal de Ensino de Aracaju. A segunda corresponde a pesquisa de campo relacionada as
entrevistas semiestruturada com 6 diretores Rede Municipais de Educação Fundamental – EMEF de

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Aracaju. As entrevistas, depois de transcritas, foram analisadas segundo os fundamentos teóricos,


motivando a interação entre os objetivos da pesquisa. Destacando duas categorias: da dimensão
pedagógica - dificuldades do uso das TIC, potencialidade das TIC. Dimensão Administrativa -
dificuldades do uso das TIC, potencialidade das TIC.
Como apoio a análise do conteúdo das entrevistas, utilizamos um software de apoio à análise de
dados qualitativos webQDA. É um software de análise de textos, vídeos, áudios e imagens que
funciona num ambiente colaborativo e distribuído com base na internet. O software, segundo Souza;
Costa e Moreira (2011) apresentam uma visão sucinta da organização estrutural e funcional por meio
de elementos organizados em i) Codificação, ii) Fontes, e iii) Questionamento. Após registrar a
proposta de pesquisa, foi utilizado o Sistema de Fontes que, consiste na inserção e organização dos
dados, dispostos de acordo com os objetivos da pesquisa. Com esse sistema de codificação foram
criadas as primeiras categorias da dimensão pedagógica e dimensão administrativa, depois os
indicadores, com a marcação das falas no software codificando as falas dos entrevistados em
dificuldades do uso das TIC e potencialidade do uso das TIC nas duas categorias.
Nesse aspecto, a interligação entre as Fontes e a Codificação disponíveis no WebQDA, nos permitiu
configurar as entrevistas e “codificar” os dados de forma estruturada e interligada. O sistema de
questionamentos como um conjunto de ferramentas, possibilitou questionar os dados com apoio na
configuração atribuída nos dois primeiros sistemas. A utilização desse software nessa pesquisa
contribuiu na fase de análise dos dados e sua interpretação. Nesse sentido, para este artigo, a partir
dos dados coletados, analisamos 2 categorias baseadas nas dimensões da gestão: a pedagógica e a
administrativa, que foram: dificuldades do uso das TIC, potencialidade das TIC. É importante salientar
que essas categorias identificadas nas falas dos colaboradores de acordo com os objetivos do artigo e
as entrevistas.

3 Pensando a gestão com e para as TIC

A gestão escolar é o ato a dinâmica cultural da escola, deve ser compromissada com as diretrizes e
políticas educacionais públicas para a implementação de seu projeto político-pedagógico, com os
princípios da democracia, com métodos que preparam e criam um espaço educacional autônomo,
participativo, compartilhado e de autocontrole (LUCK, 2009). Para Libâneo, Oliveira e Toschi (2012), a
gestão é a atividade pela qual são mobilizados meios e procedimentos para atingir os objetivos da
organização, envolvendo, basicamente, os aspectos gerenciais e técnico administrativos. Gestão é a
atividade que põe em ação o sistema organizacional.
No Brasil, nos anos 80 e 90 (século XX), vivenciou um processo de redemocratização, gerando uma
expectativa de estabelecer e concretizar a democracia como uma prática cotidiana em suas relações
políticas e sociais por meio da Constituição de 1988 que põe no campo da educação a gestão
democrática em seu artigo 206, inciso VI a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei”.
Sendo apoiada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96), que propõe no
seu Artigo 3° inciso VIII a “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação
dos sistemas de ensino”.
No começo dos anos 90, iniciava a era das novas tecnologias, e com os avanços tecnológicos na
educação, surgem dois grandes desafios que é a adaptação, o domínio e a apropriação crítica desses
novos meios (KENSKI, 2007). O importante dessas tecnologias no ambiente escolar é a forma de
como vai ser utilizada, de modo que, possibilite um ambiente de aprendizagem e troca de
conhecimento.
A tarefa de utilizar essas novas tecnologias em sala de aula no sentido de procurar novas formas para
que o aprendizado aconteça, torna-se um desafio de todos que fazem parte da escola. Nessa mesma

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

década são implantadas políticas públicas para inserção das tecnologias na educação. As TIC são
baseadas no desenvolvimento de máquinas e dispositivos para armazenar, processar e transmitir um
maior número de informações.

3.1 - Formação do gestor e incorporação das TIC

No que diz respeito a formação do gestor, desde 8 de fevereiro de 2013 a Lei Complementar n.º 121,
dispõe sobre a Gestão Democrática das Unidades Escolares da Rede Pública Municipal de Ensino,
todos os gestores passam pelo processo de escolha da direção que compete em três fases:
certificação, eleição e designação. E cada diretor eleito tem o mandado de dois anos permitindo a
recondução. O gestor antes de tudo é um educador e o PNE 2014/2024 discorre na sua meta 19, nas
estratégias 19.1 e 19.8, a nomeação dos diretores de escola, critérios técnicos de mérito e
desempenho, bem como a participação da comunidade escolar; desenvolver programas de formação
de diretores e gestores escolares com aplicação de provas nacional específica subsidiando critérios e
objetivos fortalecimento dos cargos.
Gestores com formação se tornam uma peça fundamental para desenvolvimento da escola e para a
incorporação das TIC. Esse gestor vai ter competência de mobilizar toda a comunidade escolar,
proporcionando para escola condições de uso com as TIC que contemple o ensino e aprendizagem.
Moran (2003) pondera que mesmo que a escola tenha dificuldades organizacionais estrutural, a
competência de um diretor escolar suprir essas deficiências, motivando, liderando procurando
soluções vencer possíveis problemas que apareçam na escola.
Apesar do curso de formação para gestor que é oferecido pela SEMED não contemplar as TIC
diretamente, ele proporciona para gestor competências de articular, incentivar e acompanhar o uso
das TIC nas atividades pedagógicas, organizando e disponibilizando recursos técnicos e pessoal para
cursos de formação incentivando os professores e funcionários. Almeida (2003) ainda complementa
a importância da formação de todos os profissionais que atuam na escola, favorece o fortalecimento
do papel da direção na gestão das TIC, na procura de condições para seu uso no ensino e
aprendizagem na gestão escolar.
A implementação das políticas públicas de inserção das TIC na educação no Brasil acontece desde a
década de 1980. Em Aracaju, a implementação das TIC na Rede Municipal ocorreu em 1998, quando
as escolas receberam os primeiros computadores por meio do PROINFO. De acordo com Oliveira;
Ferrete e Souza (2015), as escolas contempladas foram as escolas municipais de ensino fundamental
(EMEF) e essas máquinas integram os laboratórios procedentes do PROINFO, do Programa de
Informática na Educação Especial (PROINESP), do Programa Nacional de Inclusão de Jovens
(PROJOVEM). A formação dos professores ficou a cargo da Divisão de Tecnologia de Ensino (DITE), da
Secretaria de Estado da Educação de Sergipe.
Segundo as autoras, em 2006, com a criação do Núcleo Municipal de Tecnologia Educacional as ações
da Secretaria Municipal relativas à Política de Tecnologia Educacional nas escolas da Rede ficaram
mais sistematizadas. E foram oferecidos novos cursos aos professores como: Introdução à Educação
Digital, Tecnologias na Educação e Elaboração de Projetos, os três formatados pelo MEC.

4 Resultados e discussões

Apresentaremos os dados coletados e analisados com base nas entrevistas dentro das dimensões da
gestão pedagógica e administrativa baseada na obra de Luck (2009). Foram dividias em 2 categorias
de acordo com os objetivos da pesquisa, com as falas dos entrevistados seguindo a análise de

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conteúdo de Bardin (2011) e depois codificada por um software de apoio à análise de dados
qualitativos webQDA.
As análises dos dados seguirão a ordem das categorias: da dimensão pedagógica - dificuldades do
uso das TIC, potencialidade das TIC. Dimensão Administrativa - dificuldades do uso das TIC,
potencialidade das TIC. Com vistas a garantir uma melhor interpretação dos relatos dos sujeitos,
foram utilizados na identificação: Gestor 1, Gestor 2, Gestor 3, Gestor 4, Gestor 5, Gestor 6. O
número que acompanha a palavra Gestor indica os gestores de cada escola que participaram da
entrevista.
Quadro 1. Identificação das escolas entrevistadas.
Escolas Identificação Data das entrevistas
EMEF. Manuel do Bomfim GESTOR 1 Entrevista realizada em 22/03/2016
EMEF. José Carlos Teixeira GESTOR 2 Entrevista realizada em 18/07/2016
EMEF. Sabino Ribeiro GESTOR 3 Entrevista realizada em 09/03/2016
EMEF. Marechal Henrique Teixeira Lott GESTOR 4 Entrevista realizada em 23/03/2016
EMEF. Elias Montalvão GESTOR 5 Entrevista realizada em 18/07/2016
EMEF. General Freitas Brandão GESTOR 6 Entrevista realizada em 18/07/2016

Dos gestores entrevistados 3 são mulheres e 3 homens, a média de idades das mulheres são de
menos de 40; e média de idade dos homens são menos de 40 anos. Referente a experiência no cargo
como gestor, o gestor 6 é o seu primeiro ano, os gestores 1 e 4, tem de 1 a 5 anos de experiência, os
gestores 2 e 3 tem de 6 a 10 anos de experiência e gestor 5, mais de 20 anos de experiência. E o
tempo de experiência como gestor da sua atual escola, os gestores 4 e 6 são o seu primeiro ano. Os
gestores 1 e 2 tem de 1 a 5 anos, o gestor 3, tem de 6 a 10 anos, e o gestor 5, de 11 a 15 anos.
Todos os gestores participaram do curso de formação de gestor, de acordo com que é proposto pela
Lei Complementar n.º 121/2013. Esse curso de formação para gestor é um dos requisitos para
participar da eleição dos cargos de diretor e diretor-adjunto das Escolas da Rede Municipal de
Aracaju.

4.1 Dimensão pedagógica

A dimensão pedagógica de todas é a mais importante da gestão escolar, porque está diretamente
envolvida na principal essência da escola que é promover a aprendizagem e a formação dos alunos.
De acordo com Luck (2009), essa dimensão é o ponto de partida para todas as demais formas de
gestão. Por meio dela, articulam-se estratégias, métodos, conteúdos, esforço, ações, todos eles
vinculados para a transformação do processo social e da prática pedagógica, de modo que, envolva
os alunos, e eles consigam os melhores resultados.

4.2 Dificuldade no uso das TIC

No quadro 2, foram organizados os relatos dos gestores das maiores dificuldades com o uso das TIC
que as suas escolas enfrentam:
Quadro 2. Dificuldades nas falas dos gestores.
GESTOR 1 O problema é mais de conexão, a questão da internet.
GESTOR 2 Dificuldades a internet que quando cai [...] queda de internet e a quebra dos computadores [...].
GESTOR 3 É a queda do sistema e quando não funcionamento na hora, entraves que vão acontecendo né,
quem trabalha com máquina sabe que as vezes parece que tem vida própria.
GESTOR 4 Dificuldade de manter esses equipamentos de forma intacta dentro da escola por conta mesmo do
vandalismo da própria criminalidade. Dificuldades por conta do seu entorno [...] maior dificuldade é
manter esses equipamentos intacto por conta dos roubos da segurança. O laboratório de
informática sem utilização por falta de climatização.

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GESTOR 5 A maior dificuldade é com a internet da OI o sinal é muito ruim.


GESTOR 6 Dificuldade com o uso do OI Educa, que é o nosso diário eletrônico, uma ferramenta que está sendo
implantada, dificuldade com os professores que ainda não sabem utilizar. É no caso as capacitações
do professor, a resistência que alguns tem em utilizar alguns recursos. Dificuldades com poucos
professores articuladores e computadores. Assim os nossos problemas na maioria são internos e o
vandalismo.

Nas falas dos gestores destacam-se as dificuldades enfrentadas pelas escolas como a conexão da
Internet, as constantes quedas de conexão; os laboratórios de informática sem uso, falta de
climatização das salas e a capacitação dos professores, apontando a “falta de interesse” destes
professores em participar. Tem se tornado difícil desenvolver atividades com as TIC na escola com as
constantes queda de Internet, e para gestão escolar dificulta o andamento dos processos
pedagógicos e administrativos.
As dificuldades de articulação também foram citadas e o papel do articulador das salas de
informática em dar prosseguimento nas atividades. Com poucos computadores para a quantidade de
alunos, em muitas escolas, existindo apenas uma articuladora para os três turnos.
Se por um lado o professor articulador tem um papel importante na assistência do processo
pedagógico mediado pelas tecnologias, incentivando e mobilizando os professores da escola na
utilização das TIC no processo ensino-aprendizagem, por outro, suas ações podem afastar mais ainda
os professores de suas responsabilidades nas atividades mediadas pelas tecnologias, quando assume
a responsabilidade de orientar os alunos nas salas durante os horários de aula e com conteúdo
disciplinares de outros professores.
Identificamos na fala de 4 gestores, a preocupação com a incorporação das TIC nas escolas, e em
relação a formação do Professor para produzir aulas dinâmica mediadas pelas TIC. Em seus estudos,
Barroso (2012) comenta a necessidade de investimentos qualitativos na formação continuada dos
professores, favorecendo o aprimoramento da prática pedagógica com o uso dos recursos das TIC.
Nas entrevistas os gestores têm a percepção da importância da capacitação dos professores e as
dificuldades deles com o uso das TIC. Os gestores observam também, que esses cursos oferecidos
pela SEMED deviriam ter mais prática para professores desenvolverem habilidades e competências
de manuseio, planejamento e uso. Outro problema destacado foi o vandalismo nas escolas. Os
gestores 4 e 6 reclamaram de roubos e destruições dos aparelhos pelos próprios alunos, tanto pela
localidade que a escola se encontra, muitos relataram que a comunidade em que a escola se
encontra é difícil e perigosa.

4.3 Potencialidade das TIC

Destacamos nas falas dos gestores as principais potencialidades que as TIC trouxeram para gestão e
para aprendizado dos alunos.
Quadro 3. Maiores facilidades que as TIC trouxeram para gestão e a escola
GESTOR 1 O Oi Educa, ele veio para funcionar, ele facilita pra caramba, para a gestão é muito interessante essa
questão das TIC. (SIC). (Grifo nosso).
GESTOR 2 Na questões de disciplina que os professores usam as salas de informática também como meio
pedagógico então se os alunos estão indisciplinado os professores acabam por deixá-los fora da sala
de informática ficam fazendo atividades com os professores e não com articuladora de informática,
então melhora até a disciplina é na questão pedagógica também alunos que vem sem o dever de
casa feito e os professores e tem aula de informática naquele dia os professores usam o espaço do
horário da aula de informática para que eles façam o dever de casa. (SIC). (Grifo nosso).
A gente consegue partilhar mais o conhecimento, então a gente as vezes, tem conhecimento de
GESTOR 3 alguma coisa e partilha com o professor e aí vai multiplicando, o poder de multiplicação do
conhecimento é maior. (SIC). (Grifo nosso).
O sistema Oi educa, na questão do gerenciamento das informações dentro da escola. Então assim

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esse sistema ele vem na minha concepção ajudar bastante a enriquecer, qualificar melhor a nossa
GESTOR 4 escola, nosso ensino, as escolas do município, sem dúvida. (SIC). (Grifo nosso).
Ah acompanhar o mundo né a facilidade de tudo fica muito mais fácil. (SIC). Observação: Esse gestor
GESTOR 5 não soube informar as facilidades com as TIC na sua escola, e nem soube informar algum projeto com
as TIC, ficou procurando em vários papeis e não achou. Não conseguiu responder essa pergunta.
OI educa do diário eletrônico, ele dá uma gama de coisa que a gente pode fazer e otimizar o tempo
GESTOR 6 para a gente utilizar outras coisas. (SIC). (Grifo nosso).

Os gestores destacaram como potencialidade e facilidades do uso das TIC na escola o programa OI
educa, o relato positivo sobre esse programa foi quase unânime pelos gestores, que oferece para
gestão praticidade nas atividades pedagógicas e administrativas. Esse programa proporciona para os
professores agilidade para elaboração do planejamento, no lançamento das notas, chamada dos
alunos e na visualização e organização dos seus horários de aula. Moran (2003, p. 154), quando
afirma que “Um diretor, um coordenador, tem nas tecnologias, hoje, um apoio indispensável ao
gerenciamento das atividades administrativas e pedagógicas”.
Destacamos neste estudo a importância dos laboratórios de informática e o uso do celular, nas
questões do gerenciamento das informações dentro da escola. Enfatizamos o uso das salas de
informática para disciplinar alunos, os professores utilizam as aulas de informática, como meio de
punição excluindo da aula os alunos indisciplinados, utilizando o horário para fazerem as atividades
de casa. Para Almeida (2003), a importância do uso das TIC na escola principalmente com a Internet:

[...] contribui para expandir o acesso à informação atualizada, permite estabelecer novas
relações com o saber que ultrapassem os limites dos materiais dos materiais instrucionais,
favorecendo a criação de comunidades colaborativas que privilegiam a comunicação e
permite eliminar os muros que separam a instituição da sociedade (Almeida, 2003, p. 113).
Os gestores precisam ter a consciência da importância do seu papel para fomentar a incorporação
das TIC nas práticas pedagógicas e ao contexto das atividades e projetos que são elaborados na
escola. Em relação a lousa digital, os gestores entrevistados relataram pontos positivos e pontos
negativos na sua utilização.

“[..] essa questão da lousa digital, que falta mais é o professor utilizar mesmo”. (GESTOR 1,
2016).
“[...] a lousa digital é um instrumento riquíssimo. Então o que a gente vê que a Lousa é
meramente utilizada afim de reprodução de vídeos áudios nesse sentido”. (GESTOR 4, 2016).
“A lousa digital, nós não utilizamos, nos utilizamos instrumentos do laboratório”. (GESTOR
6, 2016).
Para estes gestores a Lousa digital, pode proporcionar aos professores e alunos mais interatividade e
interesse, além de despertar nos alunos, a curiosidade e a vontade de aprender. No entanto este tipo
de tecnologia traz dificuldades em relação a estrutura na sala de aula para sua instalação,
professores que não possuem o domínio e nem capacitação para utilizá-las de forma correta, usando
como, meros retroprojetores, reprodutores de vídeo.

4.4 Dimensão administrativa

A Gestão Administrativa é um conjunto de várias outras dimensões da gestão escolar, sendo assim,
zela pelos bens da escola fazendo o bom uso e contribuindo na manutenção, dando condições para
concretização de processos pedagógicos de qualidade. De acordo com Luck (2009), são indicadores
de qualidade dessa dimensão, desenvolver na escola a organização, atualização e correção de
documentos, escrituração, registro de alunos, diários de classe, estatísticas, legislação, de modo a
serem continuamente utilizados na gestão dos processos educacionais.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

4.5 Dificuldade no uso das TIC

De acordo com os 6 gestores as escolas da Rede Municipais de Educação Fundamental – EMEF de


Aracaju, avaliam a conservação e manutenção dos espaços como regulares e são os próprios que
podem buscar e disponibilizar recursos para essa manutenção. O gestor pode através de orçamento
planejado nas necessidades e demandas da comunidade escolar de ações educativas, criar no
cotidiano da escola uma consciência de conservação e manutenção dos espaços escolares (LUCK,
2009). Sua maior dificuldade é a questão financeira da escola para dar cobertura a essa manutenção.
Nas entrevistas, pergunto aos gestores se a escola oferece tempo para fazer o planejamento na
utilização das TIC, o Gestor 3 (2016), responde que “Não, o professor já traz planejada a aula que vai
usar e só nos informa quando vai usar para agendar e não haver choque”. Observamos que existe
uma incongruência em relação ao tempo necessário para o professor planejar suas atividades e
aquele que a escola disponibiliza para tal. Com a correria, horários apertados dos professores, o
GESTOR 4 destaca a rotina dos professores sendo um pesadelo, assim:
“[...] Hora de estudos eles tem, esse ano foi suspenso, esse primeiro semestre vai retomar
agora, mas as horas de estudos geralmente assim, o tempo é muito curto, não dá
para você parar, os professores as vezes já sai da escola cansado no final da tarde para hora
de estudo no turno da noite, então o tempo é muito escasso e compromete bastante esse
conhecimento, essa produção de conhecimento”. (GESTOR 4).
De acordo com Gestor 4, os professores tinham hora de estudos que foram suspensas, mas irá
retornar esse ano, e enfatiza a rotina corrida dos professores por trabalharem em várias escolas.
Percebemos nas entrevistas uma fragilidade nas escolas referente à elaboração dos planejamentos, a
interação entre gestores e professores, em que um não compreende o papel do outro. Também foi
perceptível a falta de planejamento no uso das TIC nas ações e práticas docentes e da gestão. Ao
perguntar aos gestores se os professores têm interesse no curso de capacitação e se é suficiente para
o uso das TIC, eles respondem:
“Alguns professores são mais resistentes, às vezes por terem a mentalidade de que vem
de cima para baixo, procuram não se envolver, temos alguns casos aqui, mas a maioria se
envolve porque percebe que é benéfico”. (GESTOR 3).
“A maioria não sente preparado, eles não conseguem na verdade administrar essas
ferramentas com propriedades, porque os próprios cursos que são oferecidos também não
dão condições”. (GESTOR 4).
“Não, não é. Não é mesmo porque tudo isso demanda prática né, e ainda a gente tem
pessoas que são meio reticentes quanto ao uso, mas usam com uma certa...[...] É no caso as
capacitações dos professores, essa resistência que alguns tem em utilizar os recursos”.
(GESTOR 6).

Percebemos uma insegurança dos professores diante do novo, daquilo que não faz parte de seu
domínio. Precisa-se que o professor se permita conhecer as possibilidades que as TIC têm e inclua os
alunos na pesquisa, no prazer da descoberta desenvolvendo sua capacidade de resolver individuais
ou coletivamente. Conforme Almeida (2003), outras dificuldades se fazem presentes, falta de
condições físicas, materiais e técnicas, também a postura de alguns dirigentes pouco familiarizados
com as tecnologias, tornando-se difícil assimilar toda potencialidade das TIC na qualidade do ensino
e aprendizagem, assim como na gestão escolar e na articulação entre as dimensões administrativa e
pedagógica, visando o desenvolvimento humano.

4.4 Potencialidade das TIC

De acordo com os 6 gestores utilizações dos equipamentos e instalações disponibilizado nas escolas
são boas, e as Escolas que disponibilizam um ambiente adequado, com bons usos dos espaços físicos.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Referente ao suporte técnico das TIC é feito pelo Departamento de Tecnologia da Informação – DTI e
pela Secretaria Municipal da Educação (SEMED). Conforme gestores:
“O DTI que vem fazer a manutenção dos computadores, a manutenção a gente não paga.
Pagamos a manutenção no caso da impressora, para repor cartucho, repor tinta, esse tipo de
coisa que fazemos com o dinheiro que vai entrando”. (GESTOR 3, Entrevista realizada em
09/03/2016). (SIC).
“Imediatamente comunica o setor especifico de informática da secretaria e fazem uma
avaliação, e se o reparo for mínimo, fazem o reparo na escola, levam o computador ou
algum outro meio tecnológico para secretaria, caso o defeito seja maior que não tenha
condições de concertar cabe a escola utilizar os recursos que tem, e colocar como uma das
prioridades de compra para substituir o aparelho”. (GESTOR 2, entrevista realizada em
18/07/2016). (SIC).

Os suportes que são oferecidos nas escolas municipais só fazem consertos básicos de alguns
equipamentos. No tocante as falas dos gestores só fazem conserto e manutenção dos computadores.
Nos outros equipamentos da escola, precisa colocar no orçamento e, juntamente com Conselho
Escolar, procurar encontrar a melhor solução. Conforme gestor 4 (2016), relata que “nós temos um
apoio muito presente da DTI todas as solicitações”. O gestor 6 (2016), também relata que o suporte
não demora para atendê-lo, “[...] a gente estava sem internet a um tempo desse, aí a gente liga para
lá abre um chamado e eles vêm”. Constatamos nas falas que a maioria deles está satisfeito com o
suporte técnico oferecido pela SEED.
Os gestores comentaram a importância do conselho Escolar nas tomadas de decisão na escola e
como é composto. Esse órgão colegiado proporciona uma interação entre a comunidade e a escola,
deixando a par das tomadas de decisões e ajudando a gestão escolar a enfrentar possíveis problemas
na escola, tais como: agressividade na escola, furtos, roubos e guarda e segurança. Nas entrevistas
perguntamos aos gestores como é a participação da comunidade na escola. Conforme o GESTOR 3
(2016), “A comunidade tem abertura para ir na escola quando necessitam, não precisa está
marcando hora, eles têm abertura para essa conversa”.
No que tange as escolas da Rede Municipal de Aracaju, a comunidade tem total liberdade de entrar
na escola e conversar com os funcionários da secretaria e com o gestor. Conforme Almeida (2003) as
TIC podem ser incorporadas na escola como apoio e suporte para comunicação entre os educadores
na gestão, na troca de experiência que realimenta a prática, nas atividades de troca colaborativa,
desenvolvimento de projetos associados com a gestão administrativa e pedagógica, na construção do
conhecimento dos alunos e na aprendizagem.

5 Conclusões

Os resultados apresentados no artigo têm o objetivo compreender da percepção do gestor nas


escolas Municipais de Educação Fundamental – EMEF de Aracaju, referente as tecnologias na gestão
pedagógica e administrativa. A colaboração dos autores presente neste artigo foram fundamentais
para as discussões e analises do artigo. A gestão pedagógica está diretamente envolvida com o foco
da escola que é o de promover aprendizagem e formação dos alunos. A gestão administrativa,
corresponde a um conjunto de várias outras dimensões da gestão escolar, sendo assim, zelam pelos
bens da escola fazendo o bem uso e contribuindo na manutenção dando condições para
concretização de processos pedagógicos de qualidade.
O que falta é laboratórios com mais computadores e salas climatizados. Um aspecto preocupante é o
vandalismo identificado pela pesquisa em algumas escolas, sofrendo roubos, destruição do
patrimônio. Outro aspecto apontado pelos gestores, a falta de interesse dos professores nos cursos
formação e pouca prática no uso. Os professores acabam utilizando as TIC como uma aula adicional,

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com reprodução de vídeo e apresentação de slides. Perdendo a oportunidade de propor novas


metodologias a partir das TIC, assim como as possibilidades pedagógicas que essas podem oferecer
quando alinhada a metodologias ativas que busquem contemplar as diferentes formas de aprender
dos estudantes.
Por fim, a pesquisa aponta que a que as TIC, ainda não estão integradas na gestão pedagógica e
administrativa na escola. Percebemos um avanço na gestão administrativa em relação ao programa
Oi educa, direcionados o trabalho do gestor e da secretaria da escola. Na gestão pedagógica
constatamos que o curso de formação para professor deveria oferecer mais prática prática para
professores desenvolverem habilidades e competências de manuseio, planejamento e uso das TIC. É
desenvolvido uma formação continuada na gestão administrativa, no pedagógico é ineficiente. No
entanto é necessário a percepção de que para interceder no processo de construção do
conhecimento as TIC devem estar inserida no espaço de ensino, que considere gestores, equipe
técnica e pedagógica como um terceiro elemento do tripé, juntamente com os alunos e professores
para o sucesso do uso das TIC em sala de aula e consequentemente do processo de ensinar e
aprender.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Educação e as Tecnologias de Informação e Comunicação: entre


descobertas e desafios na formação inicial de professores
Ronaldo Nunes Linhares1, Luiz Rafael dos Santos Andrade1
1
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Tiradentes, Brasil.
andrade.luizrafael@gmail.com; ronaldo_linhares@unit.br

Resumo. Este artigo discute os desafios que implicam a formação inicial de professores para o uso das
Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), a partir de um relato de experiência, de uma turma da
disciplina Educação e TIC, do curso de licenciatura em pedagogia, da Universidade Tiradentes (Unit). Para
isso são analisadas qualitativamente, a participação dos alunos durante e após as atividades pedagógicas
desenvolvidas nesta disciplina sobre uso das TIC na formação inicial de professores considerando como
fontes as produções e as avaliações sobre a experiencia mediante respostas de questionário. As respostas e
atividades contribuem com a visão de que os futuros docentes estão conectados no cotidiano por
dispositivos tecnológicos, no entanto enfrentam consideráveis desafios ligados a formação para o uso
dessas tecnologias na docência no que tange ao domínio de potencialidades comunicacionais de mediação
das TIC para as práticas docentes em sala de aula e fora dela.
Palavras-chave: Ensino superior; formação docente; tecnologias.

Education and Information and Communication Technologies: between discoveries and challenges in the
initial formation of teachers
Abstract. This article discusses the challenges of the initial training of teachers for the use of Information
and Communication Technologies (ICT), based on an experience report, a class of Education and ICT, the
undergraduate course in pedagogy, the University Tiradentes (Unit). To that end, the students' participation
during and after the pedagogical activities developed in this discipline on the use of ICT in the initial
formation of teachers, considering as sources the productions and the evaluations about the experience
through questionnaire responses are analyzed qualitatively. The responses and activities contribute to the
view that future teachers are connected in everyday life by technological devices, however they face
considerable challenges related to the training for the use of these technologies in teaching in what
concerns to the domain of communicational potentialities of ICT mediation for Teaching practices in and
outside the classroom.
Keywords: Higher education; Teacher training; Technologies.

1 Introdução

A evolução e as consequentes mudanças e transformações do desenvolvimento tecnológico, criadas


pelas redes digitais de informação e pela telemática tem afetado todos os campos da vida humana.
Acompanhar essa evolução tornou-se ao mesmo tempo uma necessidade e um desafio. Se vivemos
em sociedade é fundamental compreendermos o movimento e as forças que atuam nesta sociedade,
produzindo elementos para sua manutenção e/ou para sua transformação. Por outro lado,
acompanhar o movimento de transformação provocado pelas tecnologias tornou-se um grande
desafio para todos, principalmente para a educação.
Na educação e mais especificamente na formação de professores esse desafio torna-se muito mais
contundente, visto que, desde a modernidade foi a educação e a escola, mais especificamente, o
espaço responsável pela formação dos sujeitos tanto para o trabalho físico quanto para o intelectual.
Sob o domínio de uma informação produzida por especialistas, mediada pela tecnologia impressa,
baseadas no individualismo do leitor e na impressão da informação nas páginas do livro, dependente
do professor como intérprete e reorganizador destas informações a partir do que definimos como

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estratégias pedagógicas e praticas docentes. Instituição era responsável por definir o perfil, os
valores, os saberes e competências que os sujeitos deveriam construir para viver em sociedade.
Desde a segunda metade do século XX, com a intensificação do processo de globalização das
economias e mundialização das culturas e, mais especificamente na primeira década do século XXI,
ocorre uma verdadeira transformação dessa realidade. Tal qual a invenção da escrita e da prensa, a
invenção das primeiras mídias de massa, tecnologias analógicas de informação e comunicação como
o rádio, o cinema e a televisão e, o impacto provocado pelas tecnologias digitais, que trouxeram a
Internet, o ciberespaço, a cibercultura, as transmídias, multimídias, transformaram as formas de ler
este novo velho mundo, bem como acessá-lo e comunicar-se nele. Se são novos os suportes técnicos,
os dispositivos móveis são ubíquos, também são a construção dos códigos, as novas gramáticas e
possibilidades hipertextuais de (re) inventar as formas de codificar e decodificar, acessar, (co)
construir, apresentar, consumir e utilizar a informação.
Preparados para atuar com o impresso, mais especificamente com o livro, formar professores para
enfrentar esse contexto de domínio das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação tornou-se
uma necessidade contundente para as agências formadoras de professores. Estudos (Goes &
Linhares, 2012; Silva, 2012) demonstram que a formação inicial de professores ainda não contempla
o ensino sobre as mídias e suas possibilidades de mediação pedagógica, não prepara para uma
pedagógica da comunicação (Serres, 1998). Como enfrentar esse desafio? Como as agências de
formação podem preparar professores para atuar na formação de cidadãos para a sociedade da
informação e da comunicação? Quais estratégias pedagógicas podem ser desenvolvidas para esse fim
nos cursos de formação inicial de professores?
Este artigo discute os desafios que implicam na formação inicial docente, para o uso das Tecnologias
de Informação e Comunicação (TIC) na educação, tendo como as estratégias de formação inicial de
alunos de licenciatura em pedagogia, da disciplina de Educação e Tecnologias da Informação e
Comunicação, turmas 2016.2 da Universidade Tiradentes (Unit).

2. A formação de professores, dos impressos às Tecnologias digitais.

Desde o século XVI, o impresso adentrou a escola no suporte livro, mais tarde como livro didático,
livro para aprender conteúdos e não como uma tecnologia de informação e comunicação social. Se,
para a escola, o livro contribui para a formação social dos sujeitos, o mesmo não ocorre com outros
formatos de mídia impressa a exemplo das revistas e jornais, pouco inseridos nos processos de
aprendizagem formalizados pela escola.
Para Martín-Barbero (2000, p. 58), essa é uma questão cultural, a cultua livresca desconsidera a
cultura oral, e em se tratando da sociedade contemporânea, desconsidera a cultura do audiovisual.
Nesse sentido, o autor observa,

O problema está em saber se a escola vai ser capaz de ensinar a ler livros não só
como ponto de chegada, mas também de partida para outra alfabetização, a da
informática e das multimídias. Isso implica pensar se a escola está formando o
cidadão que não só sabe ler livros, mas também noticiários de televisão e
hipertextos informáticos.

Para a escola moderna o aluno sempre foi considerado uma página em branco, que seria preenchida
com um conjunto de valores e informações devidamente organizados na medida certa para o tipo de
cidadão que a modernidade devia ter. A responsabilidade de “alfabetizar” ou conduzir esta formação
é do professor, também preparado para esta função, centro do processo, exigente, considerando seu
papel e suas práticas como fundamentais.

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Para muitas crianças e adolescentes, até o surgimento dos chamados meios de comunicação de
massa e, em alguns casos mesmo depois deles, o acesso a informação, ou pelo menos uma
informação científica e corroborada pelo sistema, ocorre somente na escola , através do livro e do
professor. O acesso a esse conjunto de informações depende do domínio de habilidades
necessitarias, do domínio dos códigos linguísticos básicos apreendidos no processo de alfabetização
e letramento, comprovados com o domínio da leitura e escrita da língua mater.
Podemos afirmar que se o impresso contribuiu para organizar e ampliar o domínio da escrita como
possibilidade institucionalizada de leitura do mundo, com as mídias e, mais ainda, com as tecnologias
digitais, ultrapassamos esta linha, construída pelos códigos do alfabeto e fomos além. Ao
materializar as narrativas impressas, acrescentando a elas sons e imagens, criamos uma nova
linguagem e recriamos as estruturas do texto, as formas de narrativas, os processos e caminhos de
acesso, produção, distribuição e consumo da informação. Ainda com códigos, agora mais “multi” e
“hiper” textuais, profundos e plurais em sua formatação agora mais simples, ágeis, colaborativos e
conectivos em sua utilização.
Retomando Martín-Barbero (2000, p. 58),

O cidadão de hoje pede ao sistema educativo que o capacite a ter acesso à


multiplicidade de escritas, linguagens e discursos nos quais se produzem as
decisões que o afetam, seja no campo de trabalho como no âmbito familiar,
político e econômico.

Este contexto de uma sociedade de informação, comunicação, mídias digitais, exige dos sujeitos,
novas competências de leitura, não somente em conhecer os códigos, sua forma de organização para
produção de sentidos, mas principalmente em decodificá-los enquanto narrativa, discurso, texto,
forma de dizer, de ler e escrever o mundo. Novos dispositivos, novas práticas sociais e formas de
comunicar sentidos, novas formas e espaços de acesso, troca e produção de informação e
conhecimento, novas estruturas de poder, novos domínios e formas de dominar, novas formas de se
constituir o social, o coletivo e o ser social, novos espaços e formas de ensinar e aprender e, novos
objetivos e competências para educar.
Tudo isso aponta para a necessidade de construir um conjunto de competências básicas tanto para
professores como para alunos, voltadas para um aprendizado contemporâneo, inovador, criativo e
estratégico. Competências que, Bernheim (2008) descreve como: a) capacidade reflexiva e crítica; b)
capacidade de solução de problemas; c) capacidade de adaptação a novas situações; d) capacidade
de selecionar a informação relevante nas áreas de trabalho, cultura e exercício da cidadania, que lhe
permite tomar decisões corretas; e) capacidade de continuar aprendendo em contextos de mudança
tecnológica e sociocultural acelerada, com a permanente expansão do conhecimento; f) capacidade
de buscar espaços intermediários de conexão entre os conteúdos das várias disciplinas, de modo a
realizar projetos que envolvam a aplicação de conhecimentos ou procedimentos próprios de diversas
matérias; g) capacidade de apreciar a leitura e a escrita, o exercício do pensamento e a atividade
intelectual, de modo geral.
Estamos diante de dispositivos móveis e tecnologias multimodais que mixam escrita, som e imagem
para construir um novo texto, transmidiático. Um hipertexto aberto aos múltiplos contextos
socioculturais e as infinitas possibilidades de ler, compreender e comunicar o mundo. Como essas
tecnologias tornam-se dispositivos pedagógicos? Como contribuem e transformam os espaços e
formas de aprender e consequentemente de ensinar? Como podem contribuir na construção do
saberes docentes desde a formação básica?

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3 Processo metodológico e organização da disciplina Educação e as TIC

Avaliar experiências de práticas docentes em formação trazem uma dificuldade para além das outras
metodologias de pesquisa, pois são as duas concomitantes, o fazer e a avaliação ocorrem ao mesmo
tempo, exigindo do pesquisador cuidados sobre sua postura e distanciamento e/ou envolvimento no
processo. A abordagem dessa natureza tem produzido inúmeras possibilidades e caminhos
metodológicos dos quais destacamos as contribuições referentes a pesquisa multirreferencial
proposta por Ardoino (1998) e Alves (2015). Nossa concepção é de que a pesquisa, numa perspectiva
de formação multirreferencial mobiliza conhecimentos plurais e destaca um olhar especial as
itinerâncias dos sujeitos no cotidiano escolar.
Nesse exercício também destacamos a pratica da ação/reflexão e reflexão/ação (Schön, 1992), em
um percurso metodológico que privilegie o que Ribeiro e Santos (2016) definem saberesfazeres,
experiênciaformação e experiênciasaprendentes dentrofora da universidade. O processo de
construção aqui descrito para a disciplina, exercita a dinâmica do processo de
ler/pensar/fazer/avaliar1 como possibilidade de pratica docente de formação de professores para
pensar e usar as TIC como dispositivo pedagógico e que considere “A formação se dá em diferentes
contextos enredados nas práticas teorias da formação acadêmica, das políticas de governo, das
pedagogias cotidianas, dos movimentos sociais, das pesquisas em educação, da produção e usos das
mídias e de vivências nas cidades” (Ribeiros & Santos, 2016, p. 306).
A proposta procurou costurar teoria/pratica a partir das rodas de leitura, orientadora dos
fundamentos e reflexões inicias para as oficinas que descrevemos a seguir juntamente com as falas e
avaliações dos alunos; através do questionário e da avaliação dos produtos criado pelos alunos
durante as oficinas e postados no ambiente virtual de aprendizagem individual.
A experiência aqui analisada foi desenvolvida no período de 2016.2. A disciplina teve como objetivo
aprofundar as relações teórico-práticas entre a complexidade da sociedade contemporânea, a
educação e as TIC na docência, contemplando o contexto histórico das novas tecnologias, suas
implicações pedagógicas e sociais, bem como suas linguagens midiáticas.
Com carga horária de 80 horas, estruturada em 20 encontros presenciais, a disciplina foi organizada
para oferecer além das a) aulas expositivas dialogadas, b) atividades de pesquisa de campo
individuais e em grupo; c) leitura, análise e discussão de textos; d) atividades práticas com as mídias;
e) dinâmicas em grupo e produção de materiais de aprendizagem por meio de suportes digitais. Essa
estrutura disciplinar teve a finalidade metodológica de que, entre outras coisas, os alunos
compreendessem a dimensão e importância das práticas educativas com o uso pedagógico das TIC e
sua articulação de conhecimentos mediante a própria prática docente.
Nos primeiros encontros, a proposta da disciplina foi apresentada, discutida e acordada pelos alunos.
Foram 22 alunos, 20 do sexo feminino e 2 do sexo masculino. Logo em seguida foi sugerido um texto
para leitura acompanhado de um desafio, uma pesquisa de campo, uma visita diagnóstico, sobre as
TIC numa escola próxima para acompanhar a discussão do texto.
Como exemplo das experiências ocorridas na disciplina que possibilitaram uma relação de
aprendizagem por meio das TIC na vertente teórica e prática, destacamos o encontro 5, em que foi
possível além da discussão teórica sobre as ‘Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil’ (Brasil, 2009), uma apresentação feita pelos alunos dos resultados da visita/diagnóstico

1 Sobre este processo, Fischer (1997, p. 60-61) afirma “supondo-se aqui que os meios de informação e comunicação
controem significados e atuam decisivamente na formação dos sujeitos sociais. […] o qual se constrói através da
linguagem mesma de seus produtos; de que há uma lógica discursiva nesses materiais, que opera em direção à produção de
sentidos e de sujeitos sociais; e de que há uma mediação, na relação complexa entre os produtores, criadores e emissores,
de um lado, e os receptores e consumidores, de outro19, a qual é dada particularmente pelo modo como se estruturam os
"textos midiáticos".

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sobre o uso das TIC nas escolas da região, com o objetivo de após a discussão do texto proposto2,
perceber a partir dos dados recolhidos na visita as escolas como se constitui as diretrizes curriculares
nas instituições de educação, a presença, a relação com as TIC e seu uso.
As rodas de leitura e discussão, baseada num texto de fundamento, postado com antecedência no
espaço on-line da disciplina disponibilizado pela Universidade (Magister3) foram acompanhadas de
oficinas que buscaram desenvolver competências e habilidades técnicas para uso e produção de um
produto, objetos de aprendizagens, produzidos com varias linguagens midiáticas, e postado no
espaço virtual que cada aluno criou na rede social de aprendizagem e ensino digital Edmodo4.
Por se tratar de produções multimídiaticas de cunho didático e a sua inviabilidade em termos de
quantificação, avaliamos os conteúdos de forma qualitativa. Nesta metodologia de análise
triangulamos as respostas dos questionários com as produções multimidiáticas dos alunos no uso do
espaço virtual do Edmodo para postar e compartilhar essas experiências e os próprio produtos,
resultados da aplicação, na última aula da disciplina, de um questionário on-line com perguntas
abertas e fechadas, via Google Docs, que serviu de base, neste artigo, para entender o que os alunos
participantes entenderam do processo formativo proposto pela disciplina Educação e as TIC.

4. Uso das TIC na formação inicial docente: práticas de formação

A primeira oficina - alfabetização informacional - objetivou que os alunos compreendessem melhor


os mecanismos de acesso e uso da informação na Internet. Como proposta final dessa oficina, os
alunos tiveram que buscar na Internet informações sobre um tema especifico relacionado a sua
futura prática docente e iniciar a biblioteca on-line em sua sala de aula virtual criada individualmente
no Edmodo. Também foi proposto um desafio para a produção prática e também individual da
elaboração de um jornal digital, com temáticas e conteúdos vinculados à formação em pedagogia.
A produção dos jornais digitais, por cada aluno durante a oficina, teve como objetivo prático motivar
os futuros docentes de pedagogia a compreender a importância da pesquisa na internet, a seleção,
organização, produção/criação da informação cientifica e sua divulgação/apresentação desta num
material didático como estratégias e como atividades pedagógica envolvendo alunos e professor e a
escola. O jornal digital foi feito por meio do software Word, as fontes das informações pesquisadas
foram disponibilizadas no decorrer do material em formato hipertextual, sendo
disponibilizado/publicado, após finalizado, no formato PDF, também no Edmodo.

2 Texto discutido em aula disponível em: http://ndi.ufsc.br/files/2012/02/Diretrizes-Curriculares-para-a-E-I.pdf


3 Sobre o Magister, acessar: https://wwws.unit.br/Portal/Index.jsp
4 Sobre o Edmodo, acessar: https://www.edmodo.com/about

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Fig. 1. Print de um Jornal Digital produzido por um dos alunos do curso de pedagogia (Fonte: Registro da pesquisa).

Nessa primeira oficina, os alunos relataram (Quadro 1) no questionário sua posição sobre a oficina.
Para eles além de discutir as teorias em sala de aula sobre o uso das TIC, puderam e tiveram
condições de utilizar as TIC, pesquisar, organizar e elaborar um material didático e poderiam fazer
uso dessas produções com seus alunos em sala de aula na condição de docente. Esse processo de
empoderamento no uso das TIC na docência foi fundamental na construção da disciplina que se
propôs em aprofundar a relação teórico-prático entre educação e TIC.

Quadro 1. Relato de alunos sobre a primeira oficina.


Palavras-chave Relato do aluno Identificação
“descobrir que é fácil fazer uma jornal digital coisa que eu não sabia que
Aluno 2
existia”
Descoberta
“Foi ótima, porque descobrir como se faz um jornal e a internet nos
Aluno 7
ajuda muito para saber mais informações sobre o assunto desejado.”
Surpresa “Foi maravilhoso você mesmo produzir seu jornal. Amei” Aluno 3
“Foi muito proveito, pois foi algo que nunca tinha feito, gostei e usarei
Aluno 6
futuramente quando estiver lecionando”
Aplicabilidade
“A oficina da elaboração do jornal foi muito significante pois utilizarei
Aluno 18
com os alunos em sala de aula.”
“As pesquisas foram direcionadas e voltadas para nossa problemática.
Desafio O principal desafio era saber utilizar informações de fontes confiáveis, Aluno 12
permitindo uma olhar crítico dos conteúdos disponíveis na internet.”

No Quadro 1, as palavras-chave i) descoberta, ii) surpresa, iii) desafio e iv) aplicabilidade categorizam
os relatos dos alunos ao experienciarem ver/produzir com as TIC possibilidades trabalhadas no
cotidiano escolar. Esse despertar de percepção referente à relação teoria/prática pode ser melhor
compreendido em falas retiradas deste mesmo questionário. Quando questionados sobre o que
esperavam aprender, desde o início da disciplina, os alunos enfatizaram no final da disciplina que:

“Somente a parte teórica , mas aprendi muito mais” (Estudante 4)

“Achava que aprenderia somente as teorias” (Estudante 10)

“Conteúdos referentes as tecnologias, mas não imaginava que aulas fossem tão práticas”
(Estudante 12)

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Percebemos que a importância de interrelação entre teoria e prática no processo de aprendizagem


na relação educação e TIC, foi um fator positivo na aprendizagem dos alunos que destacaram esta
percepção e que se intensificou no decorrer dos encontros.
Na oficina de rádio, segunda oficina, precedida com a roda de discussão sobre o texto que
apresentava e refletia uma experiência de uso do radio na educação5. As atividades foram
direcionadas a fazer com que os alunos compreendessem a usabilidade do rádio em ambientes
digitais, bem como a praticidade em produzir conteúdo em áudio/rádio, podcast, com suporte do
smartphone e, a facilidade de compartilhamento e uso didático dos resultados dessa produção.
Após as informações básicas sobre o rádio, seu funcionamento, história, as principais características
de sua linguagem, técnicas de produção de roteiro e sua funcionalidade pedagógica em sala de aula.
O desafio dessa oficina foi a produção, em dupla, de um programa de radio. Com base na experiência
anterior, resultaram produções didáticas, também postadas e organizadas em salas de aula virtual
criada pelos alunos no Edmodo. Pensado o tema e estruturado o roteiro, os alunos gravaram a sua
primeira experiência com o rádio em smartphone e usaram o software audacity para edição e pós-
produção do programa, também postado em sua sala de aula no Edmodo.
No que se refere à experiência de produção do programa de radio, os alunos relataram:

Quadro 2. Relato de alunos sobre a segunda oficina.


Palavra-chave Relato do aluno Identificação
“Foi uma boa experiência pois pode perceber que o rádio é uma excelente
alternativa para se trabalhar vários assuntos com os alunos em sala de aula
Aluno 1
pois chama muito a atenção deles e requer concentração e elaboração de
textos e roteiros.”
Aplicabilidade “Incrível , e vai ser muito útil” Aluno 4
“Uma experiência nova; pois é uma forma de mostrar o conteúdo para os
Aluno 8
discentes”
“Legal, mim ajudou a descobri um novo meio de trabalha os conteúdos e
Aluno 10
como isso tem influência do meio.”
“A oficina foi muito significativa e prazerosa, aprendemos a utilizar a rádio
de forma simples, sem a necessidade muitos recursos, além, de proporcionar Aluno 12
Descoberta experiências colaborativas de aprendizagem.”
“foi interessante pois aprendi que não é tão dificultoso como imaginava.” Aluno 18
“Muito interessante o mais difícil e montar o esqueleto depois de pronto é
Aluno 3
só fazer a gravação.”

Antes mesmo de pensar a aplicabilidade do rádio na educação, vem a descoberta de sua facilidade
de produção e uso, (fala do aluno 18). Algo de fundamental importância das atividades práticas, no
processo de aprendizagem, é a possibilidade de construir uma aprendizagem, que até então estava
caracterizada em apenas teorizar sobre ela. A relação das TIC na educação desde sua formação
pressupõe, aprender teoria e prática e (re) construir como processo continuo de aprender sempre,
pode mudar algumas percepções sobre as dificuldades de uso das TIC na mediação da pratica
docente. Ademais, facilita o acesso à dissolução das dúvidas, no diálogo dos pares, entre alunos e
professores sobre o sentido do fazer e sua aplicabilidade pedagógica, antecipar ou mesmo diminuir
eventuais dificuldades didáticas.
Na terceira oficina de audiovisual, teve como objetivo trabalhar com os alunos a produção e edição
de objetos de aprendizagem audiovisuais, desde o conhecimento técnico básico para produzir um
vídeo, passando pela importância do roteiro e os suportes tecnológicos para este procedimento, até
as etapas de gravação e edição.

5 Texto discutido em aula disponível em: http://www.usp.br/nce/midiasnaeducacao/pdfs/CA_Oficina_Radio.pdf

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Com o término da disciplina, corroboramos a hipótese desde o primeiro dia de aula, durante a
apresentação do cronograma letivo, que foi essa oficina que mais gerou expectativa e surpresa nos
estudantes. A prática de gravar vídeos já era algo acessível e até rotineiro na vida de grande parte da
turma. Acreditamos que tenha sido a oficina sobre uso das TIC que mais se aproximou do cotidiano
dos sujeitos envolvidos. Dos 21 alunos matriculados na disciplina apenas dois afirmaram não saber
utilizar o smartphone para gravar vídeo. Dentre todos, destacamos os seguintes depoimentos:

Quadro 3. Relato de alunos sobre a terceira oficina.


Palavra-chave Relato do aluno Identificação
Dificuldade “Foi boa, apesar de estarmos acostumados a gravar vídeos tivemos um Estudante 1
pouco de dificuldade para fazer a edição”
Aplicabilidade “Essa foi a que eu mais gostei, pois pude dar vida aos personagens e usar Estudante 2
a imaginação, e o que mais me surpreendeu foi que as crianças adoraram”
Aplicabilidade “Essa experiência foi surpreendente sendo uma forma de desenvolver Estudante 8
atividades com os alunos.”
Descoberta “Nesta oficina pude entender a importância de contemplar todos os Estudante 12
recursos disponíveis para melhorar a compreensão e o aprendizado.”
Dificuldade “Foi interessante. Aprendi a fazer os vídeos e a editar , achei meio Estudante 15
complicado mas gostei”
Dificuldade “Confesso que fiquei um pouco nervosa de não acertar a fazer o vídeo.” Estudante 16
Dificuldade “Pois no começo fiquei um pouco nervosa. Mas depois fluiu tudo bem.” Estudante 20

A ação efetuada após as discussões técnicas e apresentações sobre como elaborar e editar um vídeo
que pudesse ser usado em sala direcionado ao público infantil, consistiu na gravação e edição, com
grupos de até 4 integrantes, sendo que, durante sua atividade, começaram a surgir dificuldades e
novas descobertas. Os vídeos foram todos gravados com smartphone. Do total de 7 vídeos
produzidos, apenas um foi editado no próprio smartphone por meio de aplicativo de edição
VivaVideo (uma iniciativa própria dos alunos), os demais foram editados no computador. Para
capturar o áudio foi utilizado um fone de ouvido com microfone.

Fig. 2. Alunos editando vídeo no computador durante a terceira oficina (Fonte: Registro da pesquisa)

Muitos dos alunos relataram, por meio dessa oficina, que é possível, como reforça a Estudante 12,
explorar as potencialidades dos recursos tecnológicos disponíveis para aprimorar o aprendizado.
Nessa experiência, o smartphone foi o recurso disponível mais utilizado; seja para gravar os vídeos ou
compartilhar via aplicativo WhatsApp com os demais alunos da turma.
Finalizada a produção e edição dos vídeos, ainda durante a aula, os alunos começaram a
compartilhar as produções com todos da turma, por meio de um grupo digital criado no WhatsApp
para a comunicação da disciplina, tornando naturalmente esse meio de comunicação um dispositivo
que ampliou a interação.

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Com o questionário, foi possível identificar algumas dificuldades no uso das TIC, apontadas pelos
alunos. Neste processo de empoderamento do uso das TIC na educação, o Estudante 15 afirma que
apesar de ter aprendido a fazer os vídeos e a editar, foi complicado. O Estudante 20 destaca seu
nervosismo no processo, reforçando a ideia de que o aprendizado com o uso das TIC na educação é
algo próximo e aplicável em nossas realidades, mas precisa ir além do simples domínio cotidiano,
para usá-lo como dispositivo pedagógico e potencializar as competências adquiridas no renovado
papel de docentes em formação no século XXI.
Chegado o momento final da disciplina, os alunos foram orientados à organizar as postagens com as
produções realizadas no decorrer das oficinas no ambiente on-line Edmodo.
Nesta etapa cada sala de aula foi avalizada, considerando os produtos ali postados destacando como
indicadores o tempo de postagem, o conteúdo e a informação de cada produto, as fontes e
caraterísticas da linguagem trabalhadas nas oficinas e a sua possibilidade pedagógica para as
indicações de ano/series proposta pelos autores.

5 A guisa de conclusões: formação inicial docente com as TIC

Esta experiência de pratica docente teve como objetivo aprofundar a relação entre as TIC e educação
voltada para desenvolver competencias e habilidades em alfabetização e letramento multimidiatico.
Buscamos durante os encontros fortalecer a relação teoria e prática, de forma que os alunos possam
compreender, contribuir e transformar os espaços e formas de aprender e consequentemente de
ensinar num contexto de sociedade de informação e comunicação.
Ao término da disciplina e com base no que foi dito pelos alunos sobre suas aprendizagens em sala
de aula, percebemos em sua conclusão, buscou se aproximar ao objetivo inicial do plano de
aprendizagem enunciado no início das aula de melhor nos aprofundarmos nas relações teórico-
práticas entre a complexidade da sociedade contemporânea, a educação e as Tecnologias da
Informação e Comunicação no processo de ensino e aprendizagem.
Todas essas descobertas, configuram-se em desafios ao professor, ao aluno, e neste caso,
diretamente à educação superior, que diante da atual sociedade e sua hiper fluidez do conhecimento
globalizado, cada vez mais imediato e mediado por meio das novas tecnologias, se ver diretamente
desafiada por essas descobertas, que como pudemos ver a exemplo desta pesquisa, estão
cotidianamente presentes nas relações sociais de cidadania e construção de conhecimento.
Durante as etapas deste estudo, prezamos para que o professor orientador (nosso papel) e os alunos
(futuros professores) aprimorem reflexões e práticas sobre as TIC convivendo com elas, com a
docência e a pesquisa. Com essa experiência, por meio dos instrumentos questionário, rodas de
discussão sobre as teorias e os produtos da sala de aula virtual no Edmodo, pudemos contribuir para
a nossa autoformação e a formação pluralizada dos alunos em uma processo multirreferencial em
que juntos desenvolvemos realizamos processos pedagógicos com um olhar especial às intinerâncias
dos sujeitos no cotidianos da educação e as TIC.

Agradecimentos: Agradecemos a Capes e a FAPITEC/SE pelo apoio em bolsa integral de pesquisa na


modalidade de mestrado, para o desenvolvimento deste estudo.

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Integralidade na Atenção Primária à Saúde: compreensão dos estudantes


de medicina e enfermagem

1
Thiago Luccas Correa dos Santos Gomes , Elza de Fátima Ribeiro Higa1, Antônio Henrique
Rodrigues Passos1 Márcia Oliveira Mayo Soares1 Márcia Aparecida Padovan Otani2 Bernardino
Geraldo Alves Souto3
1
Disciplina de Educação em Ciências da Saúde, Faculdade de Medicina de Marília – SP, Brasil.
gomesan@famema.br; hirifael@gmail.com; ahrpassos@gmail.com;mmayosoares@gmail.com
2 Disciplina de Enfermagem em Saúde Mental/Psiquiatria, Faculdade de Medicina de Marília – SP, Brasil.

mmotani@famema.br
3 Departamento de Medicina, Universidade Federal de São Carlos– SP, Brasil. bernardino@viareal.com.br

Resumo. Esta pesquisa analisou a compreensão sobre a Integralidade na visão dos estudantes de medicina
e enfermagem inseridos na Atenção Primária à Saúde. (APS). O pressuposto norteador é a necessidade de
compreensão da Integralidade na APS, seu impacto e relevância na formação de futuros profissionais de
saúde. Pesquisa do tipo Estudo de Caso, com abordagem qualitativa. Participaram oito estudantes, por meio
de entrevista e os dados foram interpretados pela Análise de Conteúdo na Modalidade Temática.
Emergiram três categorias temáticas: integração entre as unidades educacionais e o ensino-aprendizagem
do trabalho em equipe favorece a compreensão da integralidade; contexto comunitário e as fases do ciclo
de vida se aliam a integralidade por meio de compromisso, vínculo e olhar centrado na pessoa e na família e
inadequação da estrutura da UPP e das Unidades de Saúde prejudicam a aprendizagem da integralidade.
Vislumbra-se o ensino-aprendizagem tendo em vista o cuidado na perspectiva da integralidade.
Palavras-chave: Atenção primária à saúde; Integralidade em saúde; Educação em saúde; Gestão em saúde;
Assistência integral à saúde.

Comprehensiveness in Primary Health Care: understanding of medical and nursing students


Abstract. This research analyzed the understanding about the comprehensiveness in the vision of the
students of medicine and nursing inserted at Primary Health Care (PHC). The guiding assumption is the need
to understand the comprehensiveness in PHC, its impact and relevance in the training of future health
professionals. Case Study Type Research with qualitative approach. Eight students participated through an
interview and the data were interpreted by Content Analysis in Thematic Modality. Three thematic
categories emerged: integration between the educational units and the teaching-learning of teamwork
favors the understanding about comprehensiveness; The community context and the life cycle phases allude
to integrality through a commitment, a bond and a focus centered on the person and the family and the
inadequacy of the structure of the UPP and the Health Units hinder the learning of comprehensiveness. It is
hoped that teaching-learning will take place in the perspective of integrality.
Keywords: Primary health care; Integrality in health; Health education; Health management;
Comprehensive health care.

1 Introdução

O objeto desta pesquisa é a compreensão sobre a Integralidade na perspectiva dos estudantes dos
Cursos de Enfermagem e Medicina, inseridos na Atenção Primária à Saúde (APS) do Sistema Único de
Saúde (SUS), no Brasil. Ela surgiu da seguinte inquietação: como os estudantes compreendem a
integralidade dentro da APS?
O movimento de reforma sanitária brasileira propôs o estabelecimento dos direitos sociais na
Atenção à Saúde e culminou na elaboração da proposta de política pública do SUS que está
fundamentada em princípios e diretrizes, considerando o modelo de determinação social do

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processo saúde-doença (Brasil, 1988; Paim, Travassos, Almeida, Bahia, & Macinko, 2011). Dentre os
princípios preconizados, a integralidade está definida na Lei Orgânica de Saúde (LOS) nº 8080, de
1990, como “um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos,
individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do
sistema”(Brasil, 1990).
As crises macroeconômicas somadas às atuais transições demográficas e epidemiológicas colocam
em questão como um sistema de APS pode funcionar neste século. Nesse contexto, a compreensão
da integralidade na APS pode contribuir com a melhoria da qualidade do cuidado, respeitando as
necessidades de saúde da população. Dessa maneira, equipes de saúde e gestores devem
desenvolver suas ações possibilitando o cuidado centrado na pessoa e sua liderança capaz de
revolucionar esse processo (“Making primary care people-centred: a 21st century blueprint,” 2014;
Paim et al., 2011).
A APS é definida no Brasil por meio da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) como “um
conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange promoção e proteção da
saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde. [...] É o
contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde. Orienta-se pelos princípios da
universalidade, acessibilidade e coordenação do cuidado, vínculo e continuidade, integralidade,
responsabilização, humanização, equidade, e participação social”(Brasil, 2006).
Na literatura internacional Barbara Starfield (2002) define a APS como “a atenção de primeiro
contato, contínua, abrangente e coordenada que se proporciona à população sem distinção de
gênero, ou enfermidade, ou sistema orgânico”. Descreve também os atributos específicos: acesso,
porta de entrada, vínculo (longitudinality), elenco integral/abrangente de serviços
(comprehensiveness), coordenação (ou integração dos serviços), enfoque familiar e orientação para a
comunidade (Starfield, 2002).
Diversos países do mundo estão realizando esforços nos processos de reforma na saúde que visam
fortalecer seus sistemas para que atinjam os objetivos globais, regionais, nacionais e locais. Um dos
grandes desafios dos sistemas universais e integrais, como o SUS, é a formação de recursos humanos
(RH) para o atendimento das necessidades de saúde da população. Para isso é necessário
planejamento estratégico e investimento nessa formação, tendo em vista o alcance de uma
cobertura universal. O número de profissionais de APS deve ser adequado garantindo a ampliação e
o fortalecimento de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários a uma atuação competente
(Organização Pan Americana da Saúde, 2009).
A ordenação da formação de RH na área da saúde está explicitada na Constituição Federativa do
Brasil e os serviços de saúde devem servir de campos para o ensino e a pesquisa, local de integração
da assistência, gestão e formação em saúde. Nesse mesmo sentido, surgiu uma proposta conhecida
como Quadrilátero da Formação, que colocaria além dos serviços e da assistência, algumas
ferramentas de planejamento para a formação em saúde na lógica da educação em serviço e
educação permanente em saúde (Brasil, 1988, 1990; Ceccim & Feuerwerker, 2004).
A maioria das mudanças ocorridas na busca de inovações curriculares ocorre após a publicação das
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) em 2001 (Brasil, 2001) para os cursos de graduação na área
da saúde. A compreensão dos determinantes do processo saúde-doença e a importância da
promoção de saúde e prevenção de doenças são aspectos apontados em pesquisa com estudantes
que se inseriram nas Unidades de Saúde da Família (USF) (Ricardo, Marin, Otani, & Marin, 2014). A
articulação entre o ensino e o serviço têm se fortalecido em diversos municípios após a legislação
brasileira propor a criação de diretrizes para a celebração dos Contratos Organizativos de Ação
Pública Ensino-Saúde (COAPES) para o fortalecimento da Integração Ensino, Serviços e Comunidade
no âmbito do SUS (Brasil, 2015; Gomes, Higa, Passos, Otani, & Souto, 2016).

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No contexto da educação médica existem diversos movimentos voltados à construção de novos


perfis de competência profissional (Hafner et al., 2010). Uma Faculdade do interior do Estado de São
Paulo desenvolve a formação profissional em consonância com as diretrizes do SUS e com as DCNs
utilizando um currículo que tem como eixo direcionador o desenvolvimento de competência
profissional de acordo com os princípios de metodologias ativas de aprendizagem (Faculdade de
Medicina de Marília, 2015).
As duas primeiras séries dos cursos de medicina e enfermagem, que na Famema, nas atividades da
prática profissional caminham juntas, buscam desenvolver habilidades nas áreas do cuidado
individual, do cuidado coletivo, de gestão dos serviços de saúde e de iniciação científica (Faculdade
de Medicina de Marília, 2016). Estão fundamentados na lógica da vigilância em saúde, com ênfase na
APS. Para alcançarem os desempenhos propostos devem realizar uma série de tarefas articulando os
aspectos psicomotores, afetivos e cognitivos em cenários diversos da rede de cuidados à saúde.
A estrutura das séries é composta pelas Unidades de prática profissional (UPP), Unidade Educacional
Sistematizada (UES) e Unidade Educacional Eletiva (UEE). A UPP conta com o Laboratório de Prática
Profissional (LPP) onde são realizadas atividades de simulação da prática previamente organizadas
pelos docentes da série. As tutorias inseridas na UES são realizadas em pequenos grupos de
estudantes utilizando-se aprendizagem baseada em problemas e a UPP estimula a problematização
das situações desafiadoras enfrentadas na vida real e na simulação.
Esta instituição assumiu um relevante papel na transformação do ensino em saúde, pois atua em
grande parte do país liderando debates e discussões a respeito do processo de mudança, da missão e
dos valores institucionais relativos à formação e educação permanente na integração do ensino,
pesquisa e comunidade. Nos últimos anos tais ações incluem uma ampla revisão curricular, que visa à
identificação de necessidades de saúde do indivíduo, da família e da comunidade, assim como da
organização e gestão do trabalho em saúde na perspectiva da integralidade do cuidado (Faculdade
de Medicina de Marília, 2014).

2 Objetivos

Analisar a compreensão da integralidade na visão de estudantes de medicina e enfermagem


inseridos na Atenção Primária à Saúde.

3 Metodologia

Trata-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, fundamentada em Estudo de Caso, na qual
analisou a compreensão dos estudantes sobre a integralidade no contexto da APS.
O Estudo de Caso utiliza linguagem simples, representa diferentes pontos de vista, permite
mudanças em curso, o uso de diferentes fontes de informação, visa à descoberta e à interpretação
do contexto, tendo em vista o retrato da realidade de forma ampla (Gomes, 2015; Lüdke & André,
1986; Marconi & Lakatos, 2011; Minayo, 2012).
Segundo Yin (2005) estudo de caso é uma modalidade de pesquisa que investiga, de modo detalhado
no mundo real, um fenômeno contemporâneo, especialmente quando os seus limites não estão bem
definidos.
Os estudiosos apresentam quatro características essenciais do Estudo de Caso: 1. particularidade, na
qual, pode focar uma situação ou fenômeno em particular; 2. descrição, que organiza os dados
criteriosamente detalhados e completos da situação investigada; 3.heurística, em que se arquiteta a
ideia de que o estudo de caso beneficia a compreensão do leitor e pode tornar visível a descoberta

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de novos significados sobre o acontecimento estudado ou ratificar o que já era conhecido, e 4.


indução que indica prioritariamente, que o estudo de caso se desenvolve a partir dos fenômenos
particulares observados, podendo-se assim induzir uma verdade geral ou universal (Gomes, 2015;
Lüdke & André, 1986).
O estudo de caso se constitui dos seguintes elementos: pergunta ou definição do foco de pesquisa,
na qual se busca responder o como e o porquê determinado fenômeno comparece; unidade de
análise e sua pré-descrição, para apoiar o que será analisado; justificativa que considera a relevância
e o significado; preparação e elucidação das proposições sobre os aspectos abordados;
esclarecimento da lógica entre as proposições e a estruturação de critérios para a interpretação dos
dados (Denzin & Lincoln, 2006; Gomes, 2015). Assim sendo, compreender as estruturas relevantes e
os esquemas de referência relacionados a um determinado fenômeno; possibilitar exame minucioso
dos processos e das relações, bem como, o esclarecimento dos fatores que interferem nos processos
e apresentar modelos de análises replicáveis em situações semelhantes, podem se constituir nos
objetivos dessa modalidade de pesquisa (Gomes, 2015; Minayo, 2012).
Considerando que o Estudo de Caso é indicado quando se almeja saber o como e o porquê dos
fenômenos (Gomes, 2015; Yin, 2005) esta pesquisa buscou conhecer como os estudantes
compreendem a integralidade em seu contexto de atuação dentro da APS.
Participaram oito estudantes dos cursos de Enfermagem e Medicina, sendo cinco do curso de
medicina, com idade entre 21 e 28 anos; três do curso de enfermagem com idade entre 18 a 23 anos,
que atuaram nas Unidades de Prática Profissional (UPP) da primeira e segunda série no ano de 2014
inseridos na APS. Todos os estudantes foram representados pela letra E, pois a pesquisa tem como
critério fundamental ser estudante de um dos dois cursos da Famema. A amostra foi determinada,
intencionalmente e por conveniência. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista com
uma pergunta aberta norteadora: qual a sua compreensão sobre a integralidade no contexto da
Unidade de Prática Profissional e como ela se insere na aprendizagem? As entrevistas tiveram
duração média em torno de dez minutos, foram gravadas e transcritas pelo próprio pesquisador.
Os dados obtidos foram compreendidos pela Técnica de Análise de Conteúdo na Modalidade
Temática (Bardin, 2012), organizada em três etapas: pré-análise, categorização e interpretação dos
dados. O tema permite multiplicidade de relações, podendo ser concebido por um resumo, uma
frase, ou uma palavra. A análise temática visa encontrar os núcleos de sentido de uma comunicação
(Bardin, 2012; Soares, 2013).
Na pré-análise foi realizada a leitura minuciosa e a princípio, livre de orientações lógicas dos dados
coletados, tendo em vista o aprofundamento no conteúdo e a elaboração de pressupostos para
sustentação da análise. Nesta fase, foram sistematizadas as ideias iniciais, para o planejamento de
análise, revisitada a formulação dos pressupostos norteadores e a elaboração dos indicadores que
levariam à fundamentação da interpretação. Assim foi constituído um corpus de sustentação para as
respostas às questões abertas e deu-se início o processo de categorização. A regra da
homogeneidade contribuiu com a escolha dos mesmos critérios e cuidou das semelhanças de forma
atenta para garantir resultados globais; outra regra, a representatividade adequou à distribuição da
amostra e expressou o universo da pesquisa. Foi também considerada a regra de pertinência, que
delimitou o alinhamento dos dados para codificação dos registros da categorização, tendo em vista
os objetivos da pesquisa (Bardin, 2012; Soares, 2013).
A escolha das categorias é uma intervenção de classificação de uma mensagem com critérios
definidos, em consonância com o objeto de estudo, o problema de pesquisa, os objetivos e a
fundamentação teórica. Ainda qualificaram as categorias na pré-análise os seguintes critérios:
exaustão, que indicou a importância de inclusão de todos os dados obtidos, assim se um
determinado aspecto não se encaixou em uma categoria, deveria ser criado outra categoria para se
permitir a inclusão de todas as unidades de análise: exclusão mútua, na qual, cada elemento não

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pode existir em mais de uma divisão de categoria; pertinência, quando o corpus incorporou
possibilidades para reflexão sobre a intenção da proposta da pesquisa; objetividade e a
fidedignidade foi considerado para evitar a influência da subjetividade do pesquisador e garantir que
o leitor construa suas próprias conclusões; Concretude, visou a identificação de significado sem
dubiedades, e a produtividade, priorizou resultados capazes de dialogar com os índices de
inferências e de ampliar outras hipóteses (Bardin, 2012; Soares, 2013).
Na segunda etapa de exploração do material, foi realizada a categorização dos dados obtidos, por
meio da elaboração das unidades de registro e de contexto, que podem ser palavras, frases,
expressões significativas, personagem e temas considerados relevantes. A exploração do material
visa alcançar o núcleo de compreensão do texto. A partir dos núcleos de sentidos alinhados aos
objetivos do estudo, foi selecionada a unidades de análise e organizadas as unidades de contexto que
dão sustentação para se compreender a significação da unidade de registro (Bardin, 2012; Soares,
2013).
A terceira etapa interpretativa buscou a análise aprofundada e ampliada sobre os conteúdos
manifestos e latentes do conjunto do material. Neste processo, os dados obtidos foram relacionados
simultaneamente às estruturas semânticas (os significantes como agentes que propiciam observar a
forma das expressões) e às sociológicas (relativas aos significados das mensagens na perspectiva de
conteúdos) tendo em vista a articulação dos fatores determinantes em suas características. Desse
modo, a interpretação adveio da confluência entre as questões da pesquisa, dos resultados obtidos a
partir de sua análise e das perspectivas teóricas adotadas (Bardin, 2012; Soares, 2013).
Considerando o que se preconiza na Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde (Brasil,
2013), a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Faculdade de Medicina de Marília, sob o número de protocolo 513.764. Os participantes assinaram o
Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) antes do início da coleta de dados.

4 Resultados e Discussão

Da análise dos dados obtidos por meio das entrevistas emergiram três categorias temáticas
apresentadas na tabela 1.

Tabela 1. Compreensão dos estudantes de medicina e enfermagem sobre a Integralidade na APS. Marília, 2014.

Categorias temáticas
1 – Integração entre as unidades educacionais e o ensino-aprendizagem do trabalho
em equipe favorece a compreensão da integralidade
2 – Contexto comunitário e as fases do ciclo de vida se aliam a integralidade por
meio de compromisso, vínculo e olhar centrado na pessoa e na família
3 – Inadequação da estrutura da UPP e das Unidades de Saúde prejudicam a
aprendizagem da integralidade

Quando os estudantes apontaram a categoria “Integração entre as unidades educacionais e o


ensino-aprendizagem do trabalho em equipe favorece a compreensão da integralidade”,
expressaram-se da seguinte maneira:

“Ontem na tutoria, a gente estava estudando sobre humanização, que tem tudo a ver. A
integralidade é um dos pressupostos do SUS. Quando a gente estava estudando humanização,
falou sobre esse cuidado integral da pessoa. Hoje, na LPP, a gente teve dificuldade porque a

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gente não olhou o paciente com esse olhar de integralidade, de olhar pro aspecto físico, de
perceber os traços dele.” (E4)

“o SUS tem a equipe do NASF, na unidade, tem a enfermeira, o dentista, tem toda uma equipe
cujo objetivo é a promoção da saúde”. (E3)

Em relação à integração dos cenários educativos percebe-se a validade da diversificação e a


importância do contexto de cada vivência por parte dos estudantes. A primeira fala demonstra que
aquilo que foi discutido na tutoria deveria ser utilizado durante a simulação, nesse sentido a
aprendizagem significativa surge de maneira natural no mundo do trabalho, o que fica destacado na
segunda fala quando a estudante identifica o valor do trabalho em equipe multiprofissional para a
garantia da promoção da saúde (Gomes, 2015; Moreira, 2011).
Nos desempenhos da área de gestão e organização do processo de trabalho em saúde, o destaque é
para a importância do planejamento do processo de trabalho junto à equipe, aproximando os
estudantes dos princípios do SUS e da ESF (Gomes, 2015).
Na segunda categoria temática “Contexto comunitário e as fases do ciclo de vida se aliam a
integralidade por meio de compromisso, vínculo e olhar centrado na pessoa e na família”, os
estudantes se manifestaram em relação aos saberes necessários para o desenvolvimento da
integralidade:

“Tecnologia leve e o contexto da saúde primária seria o contexto [...] de compreensão da


família, prevenção e promoção de saúde.” (E1)

“É um conjunto de ações que você tem que olhar a pessoa como um todo, não só como uma
doença, é esse conjunto mesmo que busca olhar a pessoa como um todo [...] inserir a pessoa
no contexto. Em relação às famílias a gente tem um vínculo muito forte, aprende muito, criou
um vínculo com as famílias que não quer largar. Já pegou um compromisso do cuidar por causa
da nossa facilitadora.” (E4)

As falas revelam que a compreensão dos estudantes sobre um dos prismas da integralidade está
baseada na prática do vínculo, no uso de tecnologias relacionais ou leves, na compreensão da pessoa
e da família, inseridas em seu contexto de vida.
O conceito de saúde no modelo da Vigilância à Saúde aproxima as práticas da integralidade para o
desenvolvimento das competências necessárias no cenário de APS, especialmente no âmbito da
clínica (Anderson & Rodrigues, 2012), podendo ser desenvolvidas desde as séries iniciais (Marin et
al., 2010).
Sem vínculo e responsabilização com as famílias e a comunidade, a APS sofre sérios riscos de não
alcançar seus objetivos nos sistemas de saúde. Esses pressupostos da ação em saúde também
aparecem com destaque na PNAB (Brasil, 2012), pois além de abranger a adscrição de clientela, o
cuidado longitudinal oferece a oportunidade de estabelecimento de relações de confiança e
contínuas ao longo do tempo, sempre mediadas por subjetividades (Ayres, 2011; Cecilio, 2011).
Em relação à orientação familiar o ciclo de vida familiar se caracteriza pelo momento de maior
vulnerabilidade para o aparecimento de sintomas, o que torna esse reconhecimento como uma
ferramenta potente de cuidado na APS (Dias, 2012).
Na terceira categoria temática “Inadequação da estrutura da UPP e das Unidades de Saúde
prejudicam a aprendizagem da integralidade”, evidenciou-se que alguns estudantes indicam
fragilidades encontradas nesse cenário:

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“Se dependesse da USF, a gente já teria dado um “migué” de não estudar, mas como se criou
uma amizade muito boa entre o grupo, o mesmo quer mostrar mais e mais estudo. É uma ideia
muito legal na teoria, mas se não tiver um professor bom, qualificado, e uma USF que acolhe,
fica muito deficiente. Talvez não se tornasse um processo prazeroso. Torna-se um peso. Muitos
colegas criticam “sete meses na USF, eu vou lá e não entendo nada e vou embora. Eu preferia
ficar em casa”. (E3)
“Eu acho que funciona muito bem essa integralidade, mas algumas questões ficam um pouco a
desejar. Logo de início, no primeiro ano, quando a gente começa a fazer as visitas, não tem
muito conhecimento de nada do que é pra fazer na casa da família, acho que fica muito aberto,
que o vínculo pode ser feito de diversas formas. No primeiro contato, fica muito estranho, eu
não conheço a família e eu mesmo não sei o que eu estou fazendo lá.” (E7)

Considerando que esse trabalho foi realizado em uma das primeiras escolas a implementar
mudanças curriculares e a utilizar métodos de ensino–aprendizagem inovadores, as falas trazidas
pelos estudantes tornam-se extremamente significativas. Elas se referem a diversos obstáculos
existentes nos serviços de saúde quando estão mais voltados ao atendimento da população do que
aos processos de formação e capacitação. Enfatizam também que os docentes funcionam como
modelos de como colocar a teoria em prática, pois apenas estar na comunidade não favorece a
aprendizagem se os objetivos educacionais não estiverem claros e coerentes com a proposta da UPP.
Embora a mudança ocorrida pelo currículo orientado para o desenvolvimento da competência
profissional seja destaque no cenário nacional de reformas dos sistemas educacionais, o caminho da
aprendizagem deve ser trilhado pelos maiores interessados nessa mudança – docentes e estudantes.
Nesse sentido, a realidade da rotina – ações e serviços - nas Unidades de Saúde da Família é não
estruturada, impondo grandes desafios ao processo de ensino-aprendizagem (Tsuji & Aguilar-da-
Silva, 2010). Por outro lado ao se utilizar as propostas da educação permanente e o quadrilátero da
formação - “alicerçada numa adequada articulação entre o sistema de saúde, suas várias esferas de
gestão e as instituições formadoras”, a formação para a área de saúde agrega o desenvolvimento
individual e institucional, os serviços, a atenção à saúde e o controle social (Ceccim & Feuerwerker,
2004).
De acordo com a literatura, as limitações para maior integração entre a universidade e os serviços
ocorrem por conta de processos de trabalho distintos, de um lado a universidade seria o local onde
se produz conhecimento, “o saber”, e de outro os serviços voltados para a produção da assistência,
“o fazer” (Carvalho, Duarte, & Guerrero, 2015). Essa dicotomia leva a refletir sobre o "saber ser" e a
necessidade de integração de todos esses aspectos na formação de docentes e como o professor
pode se tornar qualificado para o desenvolvimento da integralidade na APS, cenário privilegiado de
ensino-aprendizagem.

5 Conclusões

Considerando o objetivo dessa pesquisa, é importante destacar o relevante papel da Teoria das
Representações Sociais, assim como a técnica de Análise de Conteúdo na modalidade temática,
ambas fundamentadas nos pressupostos da abordagem qualitativa, que permitiram ampliar o olhar
para compreensão da integralidade, no período inicial da graduação, em relação ao contexto da
Atenção Primária à Saúde.
Os estudantes compreendem e praticam a integralidade dentro do processo ensino-aprendizagem na
UPP, orientados por docentes qualificados e por unidades de saúde acolhedoras. A mudança
curricular e o perfil profissional orientado por competência demandam encontros regulares de

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Educação Permanente no sentido de proporcionar ainda maior integração ensino-serviço-


comunidade.
A compreensão da integralidade como um princípio do SUS apontados e desenvolvidos pelos
participantes revela a importância da prática no cenário de APS para a formação dos futuros
profissionais. Os resultados deste estudo demonstram a importância do trabalho em equipe
multiprofissional e a oportunidade do reconhecimento da integralidade para a melhoria do cuidado
prestado.

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Análise Do Ensino Sobre Saúde Do Idoso Em Um Curso De


Medicina

David C. Buarque1, Francisco José P. Soares1, Jorge Artur P. M. Coelho1

1
Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Alagoas, Brasil. davidbuarque@gmail.com;
franscisco_passos01@hotmail.com; jorge.coelho@famed.ufal.br

Resumo. O aumento da expectativa de vida e da população idosa é fenômeno mundial. No Brasil teremos
41,5 milhões de idosos em 2030, porém sequer metade das escolas médicas brasileiras incorporam
conteúdos sobre o envelhecimento humano. Objetivando o diagnóstico situacional do ensino da Geriatria e
Gerontologia em um curso médico, realizou-se análise documental no Projeto Pedagógico do Curso (PPC) e
planos de aula das disciplinas através da (1) definição de categorias de análise e unidades de registro, (2)
exploração documental e (3) análise e interpretação dos dados. As unidades de registro foram identificadas
nas diretrizes propostas pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG, 2014), totalizando 71
conteúdos mínimos a serem buscados no PPC. Houve previsão para abordagem de 13 dos 71 conteúdos,
apenas quatro com abordagem completa. Verificou-se, deste modo, grande lacuna no ensino de conteúdos
mínimos em geriatria e gerontologia em um curso médico.
Palavras-chave: Educação Médica; Geriatria; Gerontologia; Saúde do Idoso.

Analysis of geriatric skills teaching in a medical graduation course.


Abstract. Increase in life expectancy and elderly population is a worldwide phenomenon. Brazil will have
41.5 million seniors in 2030, but even half of Brazilian medical schools incorporate content on human aging.
Aiming the situational diagnosis of Geriatrics and Gerontology teaching in a medical course, a documentary
analysis was carried out in the Pedagogical Project of the Course (PPC) and lesson plans of the disciplines
through (1) definition of categories of analysis and registration units, ( 2) documentary exploration and (3)
data analysis and interpretation. The registry units were identified in the guidelines proposed by the
Brazilian Society of Geriatrics and Gerontology (SBGG, 2014), totaling 71 minimum contents to be sought in
the PPC. There was forecast to approach 13 of the 71 contents, only four with complete approach. Thus,
there was great gap in the teaching of minimum content in geriatrics and gerontology in a medical course.
Keywords: Medical Education; Geriatrics; Gerontology; Health of the Elderly.

1 Introdução
A expectativa de vida mundial vem aumentando nas últimas décadas. Hoje, pela primeira vez
na história, a maioria das pessoas espera viver até 60 anos ou mais1. Uma criança nascida no
Brasil em 2015 pode esperar viver 20 anos a mais que uma criança nascida em 1965, sendo as
consequências profundas para toda a sociedade1. Em 2010 havia 19,6 milhões de brasileiros
com mais de 60 anos e, em 2030, serão 41,5 milhões de idosos.
É crescente também o desafio dos cuidados em saúde com os idosos, que já consomem
parcela significativa de recursos humanos e financeiros. No Brasil, entre 2002 e 2011, no
Sistema Único de Saúde (SUS), apesar dos idosos corresponderem a 16% das internações
hospitalares, consumiram 36,5% dos recursos2,3. Nesse panorama as escolas médicas não
podem omitir de sua formação habilidades mínimas em geriatria e gerontologia, cada vez mais
requisitadas na rotina diária.
As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) brasileiras para o Curso de Medicina foram
publicadas em 2001 e atualizadas em 2014. Nelas, enfatiza-se que os conteúdos fundamentais

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devem contemplar o "diagnóstico, prognóstico e conduta terapêutica nas doenças que


acometem o ser humano em todas as fases do ciclo biológico", assim como a "promoção de
saúde e compreensão dos processos fisiológicos dos seres humanos (gestação, nascimento,
crescimento e desenvolvimento, envelhecimento e morte)" (Grifo nosso)4.
Apesar do exposto, menos da metade das escolas médicas brasileiras incorporam o ensino da
geriatria e gerontologia em seus projetos pedagógicos, sendo o percentual maior de incorporação
nas regiões Sul e Sudeste5.
Com a necessidade de padronização de conteúdos curriculares, a Sociedade Brasileira de Geriatria e
Gerontologia (SBGG) lançou, em 2014, diretrizes sobre conteúdos mínimos acerca do
envelhecimento para cursos de medicina no Brasil6. Um documento definindo o currículo europeu
também foi lançado no mesmo ano7, demonstrando a preocupação mundial com o tema.
Nos países em desenvolvimento, que atualmente experimentam as mais altas taxas de
envelhecimento populacional, o tema vem sendo debatido, porém algumas vezes de modo
incipiente. Em 2016 realizou-se um mapeamento do ensino de saúde do idoso na Índia, revelando
que, apesar da rápida transição demográfica, poucas opções de aperfeiçoamento foram encontradas,
com ensino insignificante de geriatria nos currículos de graduação em saúde8.
No currículo médico da Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL),
a despeito de existir uma disciplina de Saúde do Adulto e do Idoso, do 5º ao 8º períodos do curso,
não observamos formalmente a organização de conteúdos abordando o envelhecimento humano e
as competências mínimas necessários em geriatria e gerontologia. Faz-se, deste modo, necessário a
realização de um diagnóstico situacional do ensino de tais conteúdos na instituição.

2 Metodologia

Trata-se de pesquisa documental de caráter exploratório, do tipo descritiva-analítica, com


abordagem qualitativa, que visa descrever os conteúdos em geriatria e gerontologia presentes na
Matriz Curricular do Curso de Medicina da Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal
de Alagoas (UFAL). A pesquisa foi realizada em âmbito local, tendo como limite o curso de medicina
de uma universidade pública federal no Nordeste Brasileiro. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa da UFAL. A coleta de dados realizou-se de agosto a outubro de 2016.
A análise documental constitui uma técnica importante na pesquisa qualitativa, seja
complementando informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um
tema ou problema (Ludke e André, 1986). Pode-se definir análise documental como “um conjunto de
operações visando representar o conteúdo de um documento sob uma forma diferente da original, a
fim de facilitar num estado ulterior, a sua consulta e referenciação”9,10. A Análise de conteúdo tem
por objetivo a manipulação das mensagens, evidenciando indicadores que permitam inferir sobre
uma realidade que não a da mensagem principal9,10. Nesta pesquisa foi analisado não aquilo que o
PPC representa como documento, mas o que do PPC pode-se extrair de informações referentes ao
ensino da geriatria e gerontologia na FAMED/UFAL.
Foram utilizadas, como parâmetro para análise de conteúdos mínimos em saúde do idoso, as
“Diretrizes da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia sobre conteúdo de
disciplinas/módulos relacionados ao envelhecimento (geriatria e gerontologia) nos cursos de
medicina”, publicadas em 2014.
A análise de conteúdo restringiu-se ao Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de Medicina da
FAMED/UFAL, versão 2013, disponível através do site da referida faculdade
(http://www.ufal.edu.br/unidadeacademica/famed), e aos planos de aula com os conteúdos

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programáticos das disciplinas do corrente ano, que são cadastrados na plataforma on-line da
Universidade semestralmente.
Foram obedecidas as seguintes etapas cronológicas para a análise documental: (1) Definição de
categorias de análise, (2) definição de unidades de registro, (3) exploração documental em busca por
unidades de contexto que codifiquem unidades de registro, (4) tratamento dos resultados e
interpretação. Definem-se como “categorias de análise” grupamentos de conteúdos de interesse
(neste trabalho, em saúde da pessoa idosa) que se relacionam. “Unidades de registro” referem-se
aos conteúdos de interesse propriamente ditos, agrupados nas “Categorias de Análise”. “Unidades
de contexto” são definidas como trechos dos documentos em análise que permitam codificar as
“unidades de registro”, ou seja, que permitam verificar que as unidades de registro (conteúdos de
interesse) são contempladas pelo texto analisado.
Antes da análise de conteúdos mínimos em geriatria e gerontologia no PPC, foi realizada análise
estrutural do documento. Nessa fase, procurou-se verificar a existência de elementos suficientes
para embasar a importância do ensino em geriatria e gerontologia para a graduação médica. As
categorias de análise e Unidades de Registro foram determinadas previamente pelos pesquisadores,
sendo elaborado um instrumento para que, a partir desse ponto, o texto fosse explorado, com
posterior tratamento dos resultados e interpretação. O instrumento de avaliação estrutura do PPC
pode ser visualizado na tabela 1.

Tabela 1. Instrumento de análise estrutural do Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de graduação acerca de conteúdos de
interesse: embasamento e justificativa do ensino.

Categoria de Análise* Unidade de Registro& Unidades de contexto£ / Sugestões


Citações

* Categoria de análise: Categoria geral do conteúdo de interesse (Ex.: Envelhecimento humano)


& Categoria de Registro: Conteúdo de interesse a ser identificado no texto (Ex.: Transição demográfica)
£ Unidade de Contexto: Trechos do Projeto Pedagógico do Curso que permitam codificar unidades de registro

Passou-se, então, para a análise de conteúdos mínimos sobre o envelhecimento humano, com
elaboração de novos instrumentos para atingir os objetivos propostos. As categorias de análise e
unidades de registro foram estabelecidas nas Diretrizes da SBGG (Galera et al, 2014)3.
A partir das “categorias de análise” e “unidades de registro” determinadas, as “unidades de
contexto” foram buscadas no PPC e nos Planos de Aula das disciplinas determinando se as unidades
de registro eram contempladas, total ou parcialmente. Não sendo encontradas “unidades de
contexto” que pudessem decodificar as “unidades de registro”, considerou-se que o conteúdo não é
previsto na matriz curricular analisada. Os resultados obtidos passaram por fase de tratamento e
interpretação.
Para a roteirização e organização da fase de exploração documental, foram elaborados dois
instrumentos genéricos de avaliação de conteúdos de interesse em um Projeto Pedagógico do Curso.
Um deles refere-se à análise do ciclo teórico-prático do curso médico (1º ao 8º semestre), enquanto
o segundo instrumento contempla a análise do estágio supervisionado (internato, 9º a 12º
semestres). Os instrumentos podem ser visualizados nas tabelas 2 e 3.

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Tabela 2. Instrumento para análise documental do Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de graduação acerca de conteúdos
de interesse - ciclo teórico-prático.

Categoria Unidade Unidades Abordagem total Período Eixo de Disciplina / Passível de Observações
de Análise de de ou parcial?* ensino Módulo / abordagem / Sugestões
Registro contexto Setor ?&
envolvido

* Se há previsão na matriz curricular de abordagem total ou parcial da Unidade de Registro (conteúdo mínimo avaliado).
& Se o conteúdo mínimo avaliado (Unidade de Registro), não sendo encontrado na análise do PPC, pode ser incluído na

matriz curricular já existente;


Categoria de análise: categoria(s) geral(is) de conteúdo(s) de interesse(S) – baseada(s) em documento(s) auxiliar(es)
(diretrizes, currículos pré-existentes, consensos de especialistas, etc.)
Unidade de Registro: conteúdo(s) mínimo(s) de interesse necessário(s) à graduação – baseado(s) em domumento(s)
auxiliar(es) (diretrizes, currículos pré-existentes, consensos de especialistas, etc.)
Unidade de Contexto: Trechos da Matriz Curricular presente no Projeto Pedagógico do Curso que permitam codificar
unidades de registro específicas
Referência(s) adotada(s):

Tabela 3. Instrumento para análise documental do Projeto Pedagógico do Curso de graduação acerca de conteúdos de
interesse - estágio(s) supervisionado(s)

Categoria de Unidade de Unidades de Abordagem Período Estágio Passível de Obserações /


Análise Registro contexto total ou introdução? Sugestões
parcial?* &

* Se há previsão na matriz curricular de abordagem total ou parcial da Unidade de Registro (conteúdo mínimo avaliado).
& Se o conteúdo mínimo avaliado (Unidade de Registro), não sendo encontrado na análise do PPC, pode ser incluído na

matriz curricular já existente;


Categoria de análise: categoria(s) geral(is) de conteúdo(s) de interesse(S) – baseada(s) em documento(s) auxiliar(es)
(diretrizes, currículos pré-existentes, consensos de especialistas, etc.)
Unidade de Registro: conteúdo(s) mínimo(s) de interesse necessário(s) à graduação – baseado(s) em domumento(s)
auxiliar(es) (diretrizes, currículos pré-existentes, consensos de especialistas, etc.)
Unidade de Contexto: Trechos da Matriz Curricular presente no Projeto Pedagógico do Curso que permitam codificar
unidades de registro específicas
Referência(s) adotada(s):

3. Resultados e Discussão

3.1. Análise estrutural do PPC

Para a análise estrutural do PPC quanto à transição epidemiológica e demográfica da população


brasileira e suas consequências à sociedade e aos serviços de saúde, assim como a importância do
ensino de conteúdos relacionados ao envelhecimento na graduação médica, foi utilizado o
instrumento elaborado.
Ao aplica-lo, observamos alguns dados sobre envelhecimento populacional e transição demográfica e
epidemiológica. Os itens mais relevantes são mostrados a seguir:

Página 23: “Quando observada a população idosa pelo índice de


envelhecimento, verifica-se que há uma forte tendência de crescimento
significativo da população nessa faixa etária, observado tanto para o Brasil
(R2=0,918), quanto para o Nordeste (R2=0,899) e Alagoas (R2=0,818)";

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Página 22: "Alagoas, nos últimos cinco anos, vem apresentando valores
decrescentes na sua taxa de Natalidade”;
Página 23: "(...) no período de 2007 a 2011, verifica-se uma forte tendência
de declínio significativo (R2=0,900) no número de filhos/mulher.";
Página 33: “(...) a mortalidade infantil vem diminuindo e o coeficiente de
mortalidade infantil para 2009 foi de 14,16/1.000 nascidos vivos (NV),
apresentando uma leve tendência decrescente, em relação aos anos de 2004
a 2009(...)"; "Um indicador importante (...) foi o crescimento, em 2008, da
Expectativa de Vida ao Nascer, (...)."

O envelhecimento populacional brasileiro é acompanhado por transformações epidemiológicas e


sociais e suas consequências para a área de saúde são muito relevantes, já que há mudança nos
padrões de morbimortalidade e dependência de determinada população, havendo maior
necessidade de serviços de saúde com aumento dos gastos.1,2,3,11 Apesar das informações
encontradas, não há contextualização ou integração de tais conteúdos em relação a seus impactos na
assistência à saúde da população e, por conseguinte, nos desafios frente a uma população que
envelhece rapidamente.

Página 48: "Diagnosticar e tratar corretamente as principais doenças do ser


humano em todas as fases do ciclo biológico, tendo como critérios a
prevalência e o potencial mórbido das doenças, bem como a eficácia da ação
médica;" "Atuar na proteção e na promoção da saúde e na prevenção de
doenças, bem como no tratamento e reabilitação dos problemas de saúde e
acompanhamento do processo de morte”; "Realizar procedimentos clínicos e
cirúrgicos indispensáveis para o atendimento ambulatorial e para o
atendimento inicial das urgências e emergências em todas as fases do ciclo
biológico;" (Grifo nosso)

O texto deixa claro que a aquisição de competências inclui todas as fases do ciclo biológico, inclusive
o processo de morte, mas não há menção específica do impacto do envelhecimento na assistência
em saúde e a necessidade de aprendizagem de conteúdos mínimos em geriatria e gerontologia. O
rápido envelhecimento de nossa população define a urgência de formar médicos qualificados para as
especificidades desse grupo etário.5,12 Tais informações contextualizadas seriam fundamentais ao
Projeto Pedagógico, definindo o impacto social do envelhecimento populacional e a importância da
abordagem de conteúdos relacionados ao envelhecimento na matriz curricular.
Faltam maiores detalhes sobre o processo de construção da atualização do PPC. É provável que a
ausência de profissionais com formação gerontológica na comissão de atualização do PPC de 2013
tenha levado a falta do aprofundamento de tópicos relacionados ao envelhecimento populacional,
incluindo seu impacto no ensino médico e atendimento em saúde.

3.1. Análise de conteúdos mínimos de Geriatria e Gerontologia

Foram utilizados os instrumentos previamente elaborados para a análise documental do PCC sobre
conteúdos de interesse. As “categorias de análise” e “unidades de registro” foram identificadas nas
diretrizes da SBGG, que organiza os conteúdos mínimos em geriatria e gerontologia em seis
“Unidades” para o ensino teórico-prático (1º ao 8º período do curso) e oito “Unidades” para o
internato (9º ao 12º períodos), de acordo com a temática. Para o instrumento elaborado, as
“Unidades” foram utilizadas como “categorias de análise” e os conteúdos específicos de cada uma
delas como “unidades de registro”.

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Na fase de exploração, buscaram-se Unidades de Contexto no PPC que permitissem inferir as


Unidades de Registro determinadas. Os dados foram complementados pela análise dos conteúdos
programáticos dos planos de aula das disciplinas do curso médico da FAMED – UFAL.
Na análise do ciclo teórico-prático, foram identificadas seis (15%) unidades de registro, das 40
possíveis. Dessas, apenas duas (5%) com previsão de abordagem completa. No internato (9º a 12º
períodos), das 31 unidades de registro possíveis apenas sete (22,6%) foram encontradas, destas
apenas duas (6,5%) com previsão de abordagem total, porém sem menção específica a idosos. Os
conteúdos encontrados são apresentados nas tabelas 4 e 5.
Em resumo, das 71 Unidades de Registros (competências) buscadas na matriz curricular do curso de
medicina da FAMED/UFAL, através de Unidades de Contexto no PPC e Planos de Aula que
permitissem sua codificação, 13 (18,3%) foram encontradas.

Tabela 4. Conteúdos mínimos em envelhecimento humano previstos pelas diretrizes da Sociedade Brasileira de Geriatria
e Gerontologia (Galera et al, 2014) encontrados no Projeto Pedagógico e planos de aula da graduação médica da FAMED-
UFAL, 1º a 8º períodos.
Conteúdo encontrado Observações
Epidemiologia do No EAPMC, Disciplina de Saúde e Sociedade 2, segundo período. Encontrado nos planos de
envelhecimento aula da disciplina, não há menção na ementa presente no PPC. Conteúdo com abordagem
completa
Modificações Pequena abordagem prevista. No ETPI, plano de aula de psicologia médica, há o objetivo de
anatômicas, funcionais “Reconhecer e avaliar as próprias emoções diante da morte e do envelhecimento”, porém não
e psicológicas no encontramos conteúdo programático específico. No mesmo eixo, na disciplina de BMF 3 (3º
processo de período), encontramos menção à "Bioquímica do desenvolvimento, envelhecimento e
envelhecimento regeneração do sistema nervoso".
Incontinência No ETPI, Saúde do Adulto e do Idoso 2 (6º período), o plano de aula prevê abordagem de
Urinária e Fecal incontinência urinária (geral). Não há menção a incontinência fecal.
Insuficiência No Plano de Aula de Saúde do Adulto e do Idoso 2 (ETPI, 6º período), há menção a conteúdo
Cognitiva de demências. Em Psiquiatria de urgência (ETPI, 8º período) há abordagem de Delirium.
Insuficiência cognitiva é um tema mais amplo, assim consideramos abordagem parcial.
Eutanásia, Abordagem parcial no EDP, disciplina Ética e Relações Psicossociais 3 (3º período).
ortotanásia, Encontrado no Plano de Aula da disciplina.Não inclui mistanásia, mas aborda demais conceitos.
distanásia, mistanásia
Paciente com Conteúdo completo previsto no EDP, encontrado no Plano de Aula da disciplina Ética e
doença terminal Relações Psicossociais 3 (3º período)
EAPMC – Eixo de Aproximação à Prática Médica e Comunidade; ETPI – Eixo Teórico Prático Integrado; BMF – Bases
Morfo-Funcionais; EDP – Eixo de Desenvolvimento Pessoal

Tabela 5 – Conteúdos mínimos em envelhecimento humano previstos pelas diretrizes da Sociedade Brasileira de
Geriatria e Gerontologia (Galera et al, 2014) encontrados no Projeto Pedagógico do Curso (PPC) e planos de aula da
graduação médica da FAMED-UFAL, 9º a 12º períodos.
Conteúdo encontrado Observações
Diagnóstico e manuseio de Há menção a tratamento de "(...) Angina instável/Infarto agudo do
desidratação, BCP, ITU, Incontinência miocárdio(...), Pneumonia domiciliar(...) " no estágio de urgência e emergência
Urinária, síndrome coronariana aguda (9º período). Porém não menciona especificamente idosos, já quer busca-se
e crônica no idoso pela manifestação atípica destas patologias na população idosa. Certamente os
idosos estão contemplados no aprendizado, mas provavelmente não com suas
peculiaridades.
Definição e diferenças clínicas No estágio de Clínica Médica 2, 11º período, há abordagem de doenças
entre depressão, demência e Delirium degenerativas cerebrais. Delirium e depressão em idosos não encontramos
menção
Formulação de diagnóstico No estágio de Clínica Médica 2, 11º período, há abordagem de doenças
diferencial em um paciente que exibe degenerativas cerebrais. Delirium e depressão em idosos não encontramos
Delirium, depressão ou demência menção específica.
Tratamento não farmacológico de Encontrada abordagem apenas para doenças degenerativas cerebrais,
Delirium, demência e depressão estágio de Clínica Médica 2, 11º período

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Orientação preventiva geriátrica Encontra-se, entre os objetivos do Estágio Rural (12º período), "Estimular a
prática clínica voltada para ações de Promoção, Proteção e Recuperação da
Saúde". Porém, não explicita se há abordagem específica aos idoso e a
programas de atenção ao idoso
Manuseio das principais alterações Encontrado parcialmente, no estágio de Clínica Médica 2 (11º período),
cardiovasculares no idoso (HAS, abordagem a "Diabetes, transtornos da tireóide". Os outros conteúdos não são
Insuficiência coronariana aguda e explicitados no PPC.
crônica, insuficiência cardíaca,
Acidente Vascular Encefálico),
Diabetes Mellitus, dislipidemia e
hipotireoidismo clínico e subclínico
Critérios de internação de idosos Encontrado parcialmente, no estágio de Clínica Médica 2 (11º período) –
em Unidade de Terapia Intensiva terapia intensiva - "Conhecimento dos critérios de admissão e alta das unidades
de cuidados intensivos". Porém não há menção específica aos idosos.

Das seis Unidades de Registro encontradas no ciclo básico, cinco não encontraram correspondência
em Unidades de Contexto no PPC, sendo codificadas por informações dos planos de aula com
conteúdos programáticos das disciplinas. No internato as informações foram extraídas
exclusivamente do PPC, já que não há planos de aula para estágio prático.
O fato de menos da metade das escolas médicas brasileiras incorporarem em seus projetos
pedagógicos conteúdos de geriatria e gerontologia demonstra que, em sendo uma deficiência
nacional, há grande divergência no aprendizado de habilidades mínimas necessárias ao médico para
o atendimento desta população.5 O egresso da FAMED/UFAL, em vista aos dados coletados,
enquadra-se no grupo que recebe pouco aprendizado e, por conseguinte, atenderá a população
idosa sem o desenvolvimento de competências e habilidades específicas e necessárias para qualificar
a atenção a essa faixa etária.
Países em desenvolvimento apresentam deficiências semelhantes, ou mais aprofundadas. Em artigo
de 2016, Pati et al realizaram um mapeamento do ensino de saúde do idoso na Índia, demonstrando
pouquíssimas opções de aperfeiçoamento na área, com ensino insignificante de geriatria nos
currículos de graduação em saúde.8
As doenças nos idosos se agrupam em quadros sindrômicos próprios, as denominadas síndromes
geriátricas, havendo necessidade de estrutura específica de assistência, visando não apenas
reestabelecer a saúde, mas também preservar sua autonomia e independência. Desse modo,
preparar profissionais capazes de identificar as peculiaridades da pessoa idosa deve ser uma das
prioridades para o sistema educacional de países em desenvolvimento.12 As DCN para o curso médico
de 2014 são claras ao mencionar que os conteúdos fundamentais devem contemplar todas as fases
do ciclo biológico humano, trazendo textualmente o envelhecimento e a morte como parte dele.12(4)
Nesse sentido, além da inclusão de tais conhecimentos no projeto pedagógico e planos de aula do
curso ser urgente, é também um grande desafio, tendo em vista a grande quantidade de conteúdos
que ainda necessitam abordagem. Alguns são conteúdos mais específicos, os quais não encontrariam
espaço na matriz curricular vigente, com necessidade de reformulação de disciplinas.
O planejamento do ensino, organizado coletivamente, como deve ocorrer em qualquer mudança no
PPC exigida a partir das mudanças no perfil epidemiológico social, além de conferir compromisso e
responsabilidade por parte dos envolvidos na gestão do curso, amplia a participação do corpo
docente geral nas alterações propostas, permitindo o exercício da interdisciplinaridade, e
possibilidade de criação de espaços de ensino-aprendizagem multiprofissionais. Isso evitará também
mudanças operadas pontualmente, apenas por acréscimo, e interesse de especialistas em suas áreas
específicas de atuação.
Com os dados obtidos na fase de exploração, após análise e interpretação, elaborou-se um plano
executivo como sugestão para introdução dos conteúdos pesquisados na matriz curricular. Nele, foi

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demonstrado que, das 58 competências não previstas, 13 possivelmente necessitarão de


reestruturação curricular para que possam ser incluídas. As demais poderão ser contempladas na
matriz existente com as adequações previstas nas DCN e no PPC do curso.
Os conteúdos com previsão de ensino, parcial ou total, deverão ser avaliados quanto à sua
abordagem específica para idosos, informação esta que não pôde ser extraída das fontes
consultadas. O plano executivo será apresentado ao NDE da instituição, podendo ser discutido com
as demais instâncias administrativas da unidade acadêmica.

4. Considerações finais

Através da análise documental do PPC de Medicina FAMED/UFAL, complementada pela avaliação de


planos de aulas com seus respectivos conteúdos programáticos, observamos que há grande lacuna
no ensino de conteúdos em geriatria e gerontologia. Dentre as 71 competências elencadas (40 para o
ciclo básico e 31 para o internato), identificou-se a previsão para abordagem de 13 (18,3%), sendo
seis no ciclo básico e sete no internato.
Quanto à análise estrutural do PPC, poucos dados sobre transição epidemiológica e demográfica são
discutidos, não sendo correlacionados com seu impacto na assistência à saúde e na importância do
ensino de conteúdos relacionados ao envelhecimento humano.
Para melhor avaliação do internato médico provavelmente seria necessária entrevista
semiestruturada ou técnica Delphi com seus coordenadores, já que não há planos de aula específicos
de cada estágio. Tal estratégia não foi possível na presente pesquisa.
Acredita-se que os instrumentos de análise elaborados possam auxiliar outras pesquisas sobre
competências mínimas necessárias à graduação. Os resultados servirão de base para a adequação
curricular FAMED/UFAL, tornando o egresso mais capacitado para o atendimento global à saúde da
comunidade no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS).

5. Referências

OMS, Organização Mundial Da Saúde. Relatório mundial de envelhecimento e saúde. Genebra, Suíça:
[s.n.], 2015, 30 Disponível em:
<http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186468/6/WHO_FWC_ALC_15.01_por.pdf>
Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Tendências demográficas no período de
1950/2000. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2000/tendencias_demograficas/co
mentarios.pdf>
Silveira, R. E. D. et al. Gastos relacionados a hospitalizações de idosos no Brasil: perspectivas de uma
década. Einstein, São Paulo, v. 11, n. 4, 514-520, out./dez. 2013.
Brasil. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Institui Diretrizes Curriculares
Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Resolução CNE/CES
3/2014. Diário Oficial da União, Brasília, 23 de junho de 2014 – Seção 1, 8-11.
Brasil, V.J.W.; Batista, N.A. O Ensino de Geriatria e Gerontologia na Graduação Médica. Revista
Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro, v. 39, n. 3, 344-351, jul./set. 2015.
Galera, S. C. et al. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia sobre conteúdo de
disciplinas/módulos relacionados ao envelhecimento (geriatria e gerontologia) nos cursos de

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medicina. Geriatra & Gerontologia, Rio de Janeiro, v. 8, n. 3, 148-151, jul./set. 2014.


Masud, T. et al. European undergraduate curriculum in geriatric medicine developed using an
international modified Delphi technique. Age and Ageing, Londres, v. 43, n. 2, 695-702, mar.
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Pati, S. et al. Teaching of geriatric health in India: Mapping the terrain. Gerontology & Geriatrics
Education, [S.L], v. 38, n. 1, set. 2016.
Bardin, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977
Samara, E.M.; TUPY I.S.S.T. A leitura crítica do documento. In: História & documento e metodologia
da pesquisa. Belo Horizonte: Autêntica; 2007.
WHO, World Health Organization. Envelhecimento ativo: uma política de saúde. 1 ed. Brasília:
Organização Panamericana da Saúde: [s.n.], 2005, 62. Disponível em:
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/envelhecimento_ativo.pdf>
Galera, S.C.; Costa, E.F.A. Ensino Médico em Geriatria e Gerontologia. In: FREITAS, E.V.; PY, L.; NERI.
Tratado de Geriatria e Gerontologia - 4ª Edição. Grupo Editorial Nacional (GEN), 2016.

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Decisiones Metodológicas en el Desarrollo de una Investigación Educativa

Ángela Teresa Kaliniuk1


1
Departamento de Ciencias de la Educación, Facultad de Humanidades, Universidad Nacional del
Nordeste, Argentina. litakaliniuk@gmail.com

Resumen. En esta comunicación describiremos el conjunto de decisiones metodológicas adoptadas en el


diseño y la implementación de la investigación “Criterios de Evaluación de Aprendizajes en el Aula
Universitaria: ¿Práctica crítica compartida entre estudiantes y docentes?”. El fenómeno a estudiar como
hecho social educativo llevó a adoptar una lógica cualitativa basada en relatos biográficos, con la finalidad
de descubrir, interpretar y comprender la realidad para generar conocimiento científico sobre prácticas
evaluativas de docentes universitarios. Las técnicas de obtención de información empírica utilizadas fueron:
encuesta, entrevistas en profundidad, análisis de documentos. Los casos seleccionados fueron un portal
para ingresar por medio de los relatos de vida profesional a la intimidad del aula universitaria y descubrir
como algunos docentes se han propuesto trabajar con los estudiantes la evaluación de aprendizajes
mediante criterios, desde objetivos enmarcados en una perspectiva emancipadora, y contribuir a que estos
asuman el proceso de autoregulación de sus aprendizajes.
Palabras clave: decisiones metodológicas; investigación cualitativa; paradigma hermenéutico; análisis de
datos; prácticas evaluativas en la educación superior

Methodological Decisions in the Development of Educational Research


Abstract. In this communication we will describe the set of methodological decisions adopted in the design
and implementation of the research "Evaluation Criteria for Learning in the University Classroom: Shared
Critical Practice between Students and Teachers?". The phenomenon to be studied as an educational social
fact led to the adoption of a qualitative logic based on biographical accounts, with the aim of discovering,
interpreting and understanding reality to generate scientific knowledge about university teachers'
evaluative practices. The techniques used to of obtain empirical information were: survey, in-depth
interviews, document analysis. The selected cases which include professional stories were a portal to get
into the University classroom intimacy and to discover how some teachers have proposed to work with
students to evaluate learning through criteria, from objectives framed in an emancipating perspective, and
To help them to assume the process of self-regulation of their learning.
Keywords: methodological decisions; qualitative research; Hermeneutical paradigm; analysis of data;
evaluative practices in university education

1 Introducción
El objetivo principal en el estudio “Criterios de Evaluación de Aprendizajes en el Aula Universitaria:
¿Práctica crítica compartida entre estudiantes y docentes?” fue describir prácticas de docentes
universitarios que han adoptado el principio pedagógico de evaluación de aprendizajes por criterios
consensuados con estudiantes, y analizar si este principio tiene suficiente presencia institucional en
la Carrera de Ciencias de la Educación de la Facultad de Humanidades de la Universidad Nacional del
Nordeste (Argentina), además de estudiar cómo impacta en los procesos de formación de futuros
docentes. Así se generó conocimiento científico sobre la utilización que hacen algunos docentes
universitarios de los criterios de evaluación en diferentes prácticas evaluativas.
1.1 Perspectiva Teórico Metodológica en la que se Sustentó la Investigación
Hablar de la investigación educativa y su posible incidencia sobre la práctica, es plantear el problema
de la tan fácilmente detectada, distancia entre la teoría y la práctica, entre lo que se piensa, se

1 Ángela Teresa Kaliniuk: Magíster en Metodología de la Investigación Científica. Especialista en Investigación Científica y
Orientación. Docente Titular Cátedra Evaluación (Didáctica). Humanidades UNNE. Experta en Educación Superior,
Didáctica, Evaluación. Integra el Grupo CyFOD. Investigadora Categorizada. Directora del Proyecto “La evaluación
didáctica en profesores universitarios expertos de la UNNE”.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

escribe y se descubre, y lo que se hace y se puede hacer. Hablar de generar conocimiento en


educación, es también plantear cómo en la generación de conocimiento se filtra la realidad. Desde
esta mirada, se hace necesario abordar y poner atención sobre la formación del profesorado, las
prácticas en el aula y los procesos de investigación como articuladores que dan sentido a esa
formación y adoptar la perspectiva metodológica adecuada. La investigación “Criterios de Evaluación
de Aprendizajes en el Aula Universitaria: ¿Práctica crítica compartida entre estudiantes y docentes?”
se sustentó en el encuadre participativo que se asienta en el paradigma de la teoría social crítica
(Carr y Kemmis, 1998). Las ciencias de la educación, entendiendo la educación como acción social
intencional, deberían ser más claramente ciencias que se construyan “en la educación”, “desde la
educación” y “para la educación” “ciencia educativa crítica”, menciona Zoppi (2012).Esta perspectiva
se basa en la lógica cualitativa y el paradigma hermenéutico en las Ciencias Sociales. El tipo de diseño
de investigación que se siguió fue el cualitativo. Las preguntas y el problema planteado nos ubican en
un contexto socio-histórico particular que está requiriendo adentrarse en la realidad, explorarla,
interpretarla, para comprenderla desde su singularidad que orientaron hacia un contexto de
descubrimiento. Como señala Sirvent (2004): “El énfasis en el contexto de descubrimiento se centra
en la identificación de categorías y proposiciones a partir de una base de información empírica … Se
parte de ideas previas y supuestos de anticipación de sentido que orientan, pero no predeterminan
variables o hipótesis a verificar, buscando el terreno para construir conceptos que apoyen la
comprensión de un hecho social a partir de una base empírica … y se trabaja con un método que
posibilita la ida y vuelta de la realidad y la teoría para construir conceptos”
La intencionalidad científica fue la de generar teoría a partir de información empírica. Se pretendió,
desde una perspectiva de inducción analítica, comprender un hecho educativo en su singularidad, no
explicarlo para generalizar y comprobar hipótesis. Pero además, se buscó que el mismo proceso de
construcción de saberes, contribuyera a mejorar las prácticas evaluativas que se están desarrollando,
con intención educativa en aulas universitarias.El trabajo áulico junto a estudiantes en proceso de
formación, nos acercó a supuestos de anticipación de sentido de la situación problemática,
contextualizados en las características de esa Facultad y en el Profesorado en Ciencias de la
Educación de la Universidad Nacional del Nordeste, es decir, en relación a un contexto socio-cultural,
económico, político, singular. Este contexto es el que le dio anclaje al objeto/ problema de esta
investigación. Según Gadamer (1977) no se comprende desde la nada. El que está interpretando,
está elaborando el proyecto preliminar, va progresando en la comprensión, porque avanza en el
conocimiento de sus propios prejuicios. Heidegger señalaba: “que cada revisión del proyecto inicial
implica la posibilidad de diseñar un nuevo proyecto de sentido” y precisamente, allí donde se quiebra
el sentido, se requiere de la Hermenéutica” Díaz (2000). El desafío fue generar teoría a partir de un
proceso en espiral que fue de la empiria a la teoría y de la teoría a la empiria. Por lo tanto, un
elemento a tener en cuenta, es mi constitución como docente e investigadora tratando de atender a
una actitud de problematizar la realidad, y pararse desde la “ignorancia” para poder tener la
capacidad de pensar, preguntar, interpretar.

1.2 El objetivo: Situando el Problema


La investigación surgió de la preocupación por la utilización de los “criterios de evaluación de los
aprendizajes” en prácticas evaluativas de docentes universitarios en una unidad académica de la
UNNE, formadora de docentes. El planteo inicial de la situación problemática y las preguntas del
problema, orientan hacia un contexto de descubrimiento más que a un contexto de verificación de
teorías. El interés por el tema, nació alrededor del año 2006, con la lectura de diferentes escritos de
la especialista argentina Carmen Palou de Maté (2001) en sus publicaciones del Centro de Estudios
Didácticos del Comahue, dado el tratamiento que la misma da a los criterios de evaluación. A esto se
sumó, la perspectiva especial sobre criterios en la evaluación universitaria que aporta la Lic. Susana

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Celman (2003), con quien se participó en un curso para docentes de nuestra Universidad (UNNE), así
como también las propuestas desarrolladas por algunos autores españoles como Gimeno Sacristán
(2005), Álvarez Méndez (2001), Santos Guerra (2007) y Zabalza (2002).En la práctica, iniciamos con el
equipo de cátedra “Evaluación” algunas experiencias en el aula, a partir del año 2007 -en las cuales
se continúa trabajando– que fueron presentadas en las IV Jornadas Nacionales: Prácticas y
Residencias en la Formación Docente (Kaliniuk y Yarros, 2010) y en el III Congreso Internacional de
Educación: Construcción y Perspectivas. Miradas desde y Hacia América Latina. UNL (Kaliniuk y otros,
2009). El planteo del objeto del trabajo de esta investigación, se define de la siguiente manera: “El
principio de evaluación por criterios que deviene de concepciones alternativas en educación, no tiene
suficiente presencia institucional en las prácticas docentes universitarias. Esto se agrava si se tiene en
cuenta que en los procesos de formación de futuros docentes, esto es también una vacancia”. Esta
anticipación de sentido alude a la relación de los hechos de la situación problemática (Elliott, 2000) y
otros factores que operan en su contexto, además constituyen el eslabón necesario entre la teoría y
la experiencia empírica. Sostenemos, junto a Celman (2009), que la evaluación de los aprendizajes de
los alumnos es parte integrante de la propuesta pedagógica/didáctica de cada cátedra. Nos
preguntamos ¿Es común explicitar, acordar con los estudiantes y discernir respecto a la selección de
contenidos, propuestas metodológicas, criterios de evaluación con relación al conocimiento y la
enseñanza?El reduccionismo distorsionante está presente cada vez que se cursa una materia, se
toman parciales y después los finales, y el alumno/a aprueba o no aprueba, si sabe o no sabe. Se
menciona, en general, el bajo rendimiento académico del alumno universitario, pero se aprecia un
cierto vacío científico en la literatura respecto a la responsabilidad de los docentes en la evaluación
de los aprendizajes. Si bien a partir de las políticas de acreditación de las universidades, en los
últimos años, se va tomando conciencia y se considera el proceso de evaluación de aprendizajes
como proceso complejo, aunque a veces desnaturalizado.La respuesta a esta cuestión (el análisis de
las prácticas evaluativas en el aula universitaria) implica un estudio de los sujetos involucrados en
estos procesos: los profesores y los estudiantes. En efecto, son los docentes quienes construyen sus
propuestas didácticas, sus criterios de evaluación en un determinado campo disciplinar y también los
estudiantes, revisando cuál es grado de intervención de los mismos en dichas propuestas,
atendiendo a que se van a desempeñar como docentes.
1.3 Preguntas y Objetivos de Investigación
En términos metodológicos, la pregunta se liga al proceso de focalización, puesto que ayuda a
delimitar el objeto de estudio como ya lo señalaba Stake (1998) las preguntas de la investigación
permiten dirigirse a la obtención de información necesaria para la descripción del caso. En esta
investigación, algunas de las preguntas centrales fueron: ¿Se formulan criterios para comprender
cómo y por qué se han generado ciertos procesos de aprendizaje?, ¿qué y cómo han aprendido?, ¿Se
les comunica a los estudiantes los criterios de acuerdo con los cuales serán evaluados para contribuir
a un aprendizaje responsable?, ¿Participan los estudiantes en la elaboración de los criterios que se
utilizarán para evaluar los saberes aprendidos?; En la evaluación de aprendizajes, algunos docentes
¿incluyen los criterios?, ¿los tienen en cuenta al momento de evaluar?, ¿Qué razones motivan a los
docentes para trabajar con criterios de evaluación junto a sus estudiantes en el aula universitaria?.
Además se añadieron en el transcurso de la investigación: ¿Cuáles son las percepciones y opiniones
de los estudiantes sobre las evaluaciones de aprendizajes mediante la utilización de criterios
consensuados?, ¿Para qué se evalúan los aprendizajes del estudiante mediante criterios?
Las preguntas se orientan a la interpretación de un hecho social: las razones y el modo como los
docentes universitarios, de una carrera de formación docente, utilizan criterios de evaluación de
aprendizajes, en el contexto institucional de la Facultad de Humanidades de la Universidad Nacional
del Nordeste, en un aquí y ahora particular.
El propósito general de la investigación guarda coherencia con las preguntas antes expresadas, ya

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que trata de “generar conocimiento científico sobre la utilización que hacen los docentes
universitarios de los criterios de evaluación en las diferentes prácticas evaluativas”.
La intención general se desglosó en objetivos específicos:
- Generar conocimiento científico sobre el origen / el sentido del uso de los criterios (hacia el interior
de las cátedras) en coordinación o en tensión con mandatos institucionales.
- Construir categorías de análisis acerca de las intencionalidades de la utilización de criterios, en
distintas cátedras universitarias, que enriquezcan el campo de la evaluación educativa.
- Generar conocimiento respecto a si los docentes universitarios, en su trayecto de formación,
incorporaron el principio de evaluación por criterios, dando cuenta en sus prácticas que acuerdan y
discuten con sus estudiantes esos criterios.
- Analizar si las prácticas de evaluación de futuros docentes en la universidad, generan condiciones
para el desarrollo de modelos alternativos de evaluación.
- Derivar algunas reflexiones respecto a la utilización de la evaluación por criterios desde una postura
alternativa.
1.4 Decisiones sobre la Construcción y Lugar del Marco Teórico en el Proceso de Análisis
Las conceptualizaciones incluidas en el marco teórico fueron amplias y cumplieron la función de
mostrar el marco general de ideas desde las que se analizaron los datos empíricos. En especial, al
explicitar el enfoque y la postura ideológica asumida que orientó el proceso de comprensión y
estructuración de una teoría de base. Los conceptos analizados cumplieron la función de ser
conceptos generales y proposiciones amplias que ayudaron a focalizar el objeto y el problema. No
fue un cuerpo teórico exhaustivo que luego permita ser verificado en la realidad. La búsqueda y
sistematización de antecedentes y la construcción del encuadre conceptual contribuyeron a delimitar
las preguntas de la investigación y luego a la discusión de los resultados obtenidos.
Tomamos en consideración corrientes epistemológicas, teorías y conceptos, entre las cuales
destacamos las siguientes:
- Corrientes Epistemológicas: bases conceptuales que entroncan con la Epistemología Genética, la
Nueva Sociología, la Antropología y la Hermenéutica. Stake (1975), Mac Donald (1975), Stenhouse
(1984), Kemmis (1986), Stufflebeam y Shinkfield (1987), Elliot (1990), House (1994), Shepard
(2000), Lipman (1998), Allal (1980), Diaz (2000), Zoppi (2012).
- Teorías: Teorías cognitivas y constructivistas en Camilloni (2004), Litwin (2008), Perrenoud (2008),
Díaz Barriga (1994), Álvarez Méndez (1993, 2000, 2001 y 2003), Pérez Gómez (1989 y 2005).
- Conceptos centrales de evaluación desde diversas perspectivas: Álvarez Méndez (2001), Santos
Guerra (1998), Gimeno Sacristán y Pérez Gómez (2005), Zabalza (2002), Celman (2004), Palou de
Maté (2001 y 2003), Perrenoud (2008), Barbier (1999), Bain (2007).
- Conceptos respecto a criterios: Lipman (1998), Palou de Maté (1998, 2001 y 2003), Barbier (1999).
- Aportes de Investigaciones que sugieren el impacto de la evaluación de aprendizajes mediante
criterios: Palou de Maté (2001 y 2003), Muriete (2007), Camilloni (2000, 2004 y 2010), Steiman
(2008), Litwin (1998), Zabalza (2002), Santos Guerra (2007).
Inicialmente, la teoría nos permitió definir algunos conceptos que se incluyeron en el marco teórico,
los tomamos a partir de la revisión de las investigaciones antecedentes de este trabajo. A lo largo del
proceso de lectura y construcción del marco teórico encontramos algunas dificultades en la
adecuación al contexto local, de algunas corrientes provenientes del mundo educativo anglosajón,
como la consideración de la evaluación alternativa. También con respecto a la concepción “criterial”
y “criterios consensuados”, especialmente del pensamiento ibérico, que requirió adecuación y
reflexión al contexto local, de acuerdo a evaluación de aprendizajes por medio de criterios estándar.
Particularmente, ayudó a clarificar los conceptos el material obtenido de encuestas a estudiantes, las
descripciones que realizaron de la evaluación y de lo que se entendían por criterios, conceptos
ampliados en las entrevistas.Así nacieron los conceptos generales de los que se parte en el proceso

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

de “amasar” teoría y empiria, junto con las evidencias empíricas que se reunieron e interpretaron,
permitiendo hacer comprensivos estos datos. La teoría posibilitó en primer término definir
categorías, en el análisis de la información obtenida en entrevistas. En segundo lugar, a partir del
análisis de las entrevistas, se pudieron utilizar conceptos teóricos, como guía para agrupar categorías
analíticas más cercanas a la empiria. Esas dos grandes funciones, también, cumplió la teoría en el
análisis.
2 Metodología
2.1 Dimensión de las Técnicas de Obtención y Análisis de la Información
Asumida la perspectiva socio crítica, la investigación educativa se desarrolló parafraseando a Zoppi
(2012) desde una metodología que integró constructivamente la explicitación teórica y la
corroboración práctica. Las técnicas cuantitativas, las hermenéuticas, como en una espiral de fases
de descubrimiento e interpretación de hechos, planificación, implementación y evaluación
permanente, dando lugar al desarrollo de procesos que, a su vez, deben ser científicamente
controlados. El enfoque biográfico, utilizado para la indagación no estructurada de las historias
relatadas por los propios sujetos, cobró relevancia como consecuencia de la diversidad de sentidos
atribuidos por las personas entrevistadas -docentes y estudiantes- a los acontecimientos vitales por
los que han atravesado en un contexto social (socio-educativo) en el que primó la diversidad de
referencias. Las entrevistas ayudaron a penetrar el mundo de los docentes y de los estudiantes, a
penetrar en la experiencia de los otros (Woods, 1987).
También se realizó el análisis de los programas de las cátedras: “Didáctica I”, “Didáctica II”,
“Antropología Social y Cultural”, de los docentes entrevistados, revisando los componentes de la
planificación y las referencias a criterios de evaluación. Además se analizó el Régimen Pedagógico y el
Plan de Estudios de la Carrera Profesorado en Ciencias de la Educación.
2.2. Técnicas de Obtención de la Información
En el relevamiento de la información priorizamos aquellas técnicas de obtención de la información,
que nos permitieron capturar el nudo central y los elementos claves del fenómeno a estudiar, lo que
favoreció haber podido captar patrones implícitos y explícitos.
Las técnicas seleccionadas y que aplicadas -algunas de forma simultánea- aportaron la información
que se utilizó para la comprensión del objeto de estudio fueron:
a. Encuesta a Estudiantes.
b. Entrevista a Docentes y Estudiantes.
c. Recolección y análisis de material escrito: programas analíticos de cátedras, Plan de Estudios del
Profesorado en Ciencias de la Educación, Régimen Pedagógico de la Facultad de Humanidades;
Datos estadísticos del SIU-Guaraní proporcionados por la Dirección Gestión de Estudios, Facultad
de Humanidades, UNNE.
Estas técnicas, fueron los instrumentos con los cuales se construyeron los observables, es decir, la
base empírica de la investigación y, por lo tanto, orientaron sobre el tipo de información empírica
que se relevó.
a) Encuesta a Estudiantes
Preparación del cuestionario: Atento al objetivo que se quería lograr, se analizó el tiempo y la posible
población, definiendo el formato y la aplicación. Como bien lo señaló Woods (1987), se consideró al
cuestionario como un puente estratégico hacia datos más cualitativos. Se prepararon preguntas
simples para recolectar los datos. La primera pregunta cerrada (dicotómica) actuó de filtro, con
categorías de respuesta definida a priori. En la segunda pregunta, abierta, se permitía al estudiante
consignar más de una respuesta, ya sea en relación a los criterios como a las cátedras en las cuales
los mismos habían tenido la experiencia de ser evaluados con estos. En función del estudio que se iba
a realizar, se pensaron las posibles respuestas. Para lograr las mejores condiciones en la

396
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

implementación del instrumento y cumplir con el objetivo, antes de aplicarlo en la clase, se probó el
instrumento con las estudiantes avanzadas adscriptas a la cátedra. Este procedimiento para la
recogida de información de una población específica, a quienes se les realizó una consulta concreta
respecto a los criterios de evaluación en cátedras universitarias cursadas, se consideró como la mejor
opción. El instrumento fue impreso y autoadministrado.
Selección de los encuestados y objetivos de la encuesta: Se realizó una encuesta en forma personal
durante la clase inicial de la Asignatura Evaluación del ciclo académico 2012, a los 45 estudiantes que
asistieron a la misma. Los encuestados fueron estudiantes de tercer año del Profesorado
mencionado, con una edad promedio entre los 20 y 25 años, quienes constituyeron la población a
estudiar.
El objetivo era averiguar si en las prácticas evaluativas previas habían acordado criterios de
evaluación de aprendizajes con los docentes, cuáles eran las cátedras que habían propiciado esta
experiencia y con qué criterios habían trabajado a lo largo de su trayecto de formación en el nivel
universitario.
La encuesta permitió: distinguir tres cátedras de los primeros años de la carrera, que fueron
mencionadas reiteradamente. Las respuestas al instrumento nos mostraron que los criterios con los
que se trabajó en esas cátedras no fueron consensuados en general y la concepción de criterio de
evaluación de los jóvenes se presentó difusa. Al mismo tiempo, emergieron dos grupos de
respuestas, de acuerdo a la significación que los estudiantes le dieron a los “criterios”. Se consideró
realizar una entrevista en profundidad, sólo con un porcentaje significativo de los estudiantes
encuestados.
b) Entrevistas en Profundidad Semiestructuradas a Docentes y Estudiantes
Taylor y Bogdan (1992) caracterizan a las entrevistas cualitativas en profundidad como encuentros
cara a cara entre el investigador y los informantes, dirigidos hacia la comprensión de las perspectivas
que tienen los sujetos respecto de sus vidas, experiencias o situaciones, tal como las expresan en sus
propias palabras. Este tipo de entrevistas son flexibles, dinámicas y abiertas. Seguimos, en la
investigación, el modelo de una conversación entre iguales y buscamos la comprensión de las
perspectivas de los entrevistados, en el momento del acontecimiento. Como lo describe Bolívar
(2001) en las entrevistas podemos distinguir tres momentos: la entrevista como acontecimiento,
donde además del propio discurso se captan actitudes, gestos; la entrevista registrada: los registros
auditivos permitieron percibir entonaciones en el relato de algunos acontecimientos con relación a la
evaluación en sus respectivas historias y la entrevista-texto, donde la voz se convirtió en texto, que
permitió varias relecturas, análisis e interpretación.
Entrevista con Estudiantes: En el transcurso de los meses de octubre y noviembre de 2013
principalmente, se procedió a realizar una consulta telefónica con estudiantes, para solicitar las
futuras entrevistas, explicando el motivo de un encuentro cara a cara, el objeto de la investigación y
de la entrevista en profundidad.
El criterio de selección de los estudiantes a quienes se iba a entrevistar, fue: que hubieran cursado
Evaluación en el año 2012 (tercer año) y que estuvieran finalizando las Prácticas de Enseñanza en
2013 (cuarto año). El profesor de Práctica y Residencia en Instituciones proporcionó un listado de
alumnos que en el ciclo lectivo 2013, estaban terminando sus prácticas en instituciones educativas.
Se entrevistó a quienes habían aceptado por medio de la consulta telefónica (población de nueve
estudiantes: ocho de sexo femenino y uno de sexo masculino). Se acordó el día y horario del
encuentro. Estos nueve estudiantes representan aproximadamente el 25 % de aquellos que,
habiendo señalado oportunamente haber trabajado con criterios de evaluación en cátedras hasta 3º
año. La entrevista fue registrada por el entrevistador por medio de un grabador de voz y apuntando
algunos datos con lápiz y papel. El clima de las entrevistas fue placentero, algunos manifestaron que
se sentían emocionados, interesados por ser la primera vez que estaban siendo entrevistados. Todos

397
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

ofrecieron su correo electrónico para ampliar datos, en otra ocasión, si fuera necesario. La guía de
preguntas abiertas como instrumento, la convirtieron en entrevistas en profundidad.
Entrevista con Docentes: ¿Cómo fueron seleccionados los docentes? Al administrar el cuestionario
inicial a los estudiantes, en la pregunta abierta –como ya se mencionó- tenían que indicar las
cátedras en las que habían trabajado con criterios de evaluación. Cuando se procesó la información,
se tomó la decisión de entrevistar a los tres profesores que fueron indicados de manera más
frecuente. El diseño del cuestionario de la entrevista semi estructurada en profundidad con los
docentes, estuvo determinado por el procedimiento que se utilizaría para abordar la problemática de
acuerdo a categorías a priori. Para abordar a los sujetos docentes se utilizaron diferentes vías: correo
electrónico, vía telefónica y personalmente, explicando el objetivo de la entrevista y pactando el
lugar y el horario. En todos los casos las entrevistas se realizaron en la Facultad de Humanidades. Se
registraron por medio de un grabador de voz y además se tomaron notas. La duración promedio de
las entrevistas fue de una hora y media. Esta técnica –entrevista en profundidad a docentes y
también a estudiantes- es consistente con la estrategia general seleccionada, ya que, desde una
perspectiva hermenéutica, permite penetrar en los componentes del hecho social. La entrevista fue
el mejor modo de acceder a concepciones y perspectivas de los docentes, para conocer sobre sus
prácticas evaluativas. Nos introdujo en el universo de relaciones sociales primarias que se mantienen
entre docentes de un mismo centro al decir de Porta (2008) y facilitó la revisión de los objetivos de
investigación. La información que se obtuvo se advierte en el siguiente cuadro:

Cuadro Nº 1: Entrevistas en profundidad a docentes y estudiantes

Instrumento Población Qué se buscaba Observaciones


 Dos (2) Guías de  Se aplicó a docentes  Indagar sobre sus  Diversidad de
Preguntas abiertas responsables de experiencias en experiencias.
semiestructuradas asignaturas historias personales y  Importancia de los
diferenciadas de pertenecientes a los tres de aprendizajes, distintos trayectos
acuerdo al primeros años de la trayectos laborales y que conducen
destinatario de la carrera, que fueron de formación que, a actualmente a
entrevista identificadas su juicio, incidían en evaluar
reiteradamente en las el proceso de aprendizajes
respuestas de los conceptualización de mediante el
estudiantes a la los criterios de principio
encuesta. evaluación. pedagógico de
 3 docentes expertos.  Indagar sobre las evaluación por
razones que los llevan medio de criterios.
a evaluar los  Realizadas en
aprendizajes de sus diciembre 2013.
estudiantes mediante
la implementación de
criterios en las
prácticas áulicas.
 1 docente miembro del  Analizar las
equipo de cátedra de condiciones para
Prácticas y Residencia, al elaborar las
cual se aplicó un planificaciones en
cuestionario diferente. Práctica y Residencia,
y el lugar de la

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evaluación en las
mismas.
 Guía de Preguntas  Estudiantes que habían  Revisar sus historias  Diversidad de
abiertas participado de la personales y de experiencias a lo
semiestructuradas encuesta, indicando aprendizajes, su largo de los
criterios y cátedras conceptualización de trayectos de
donde los evaluaron y evaluación y de los formación, pero
que estaban finalizando criterios. con un eje común:
las prácticas de  Indagar si tuvieron la mirada de la
enseñanza en 2013. oportunidad de ver la evaluación.
 9 alumnos seleccionados implementación de los  Realizado en
(25 % de la muestra criterios de evaluación octubre y
inicial). en las prácticas noviembre 2013.
evaluativas.
Fuente: Elaboración propia
c) Materiales escritos
La utilización de materiales impresos o disponibles en páginas web constituye un apoyo, en la
medida que -para algunos estudiosos del tema- son instrumentos cuasi- observacionales y para
constituirse en una información útil, siempre han de ser contextualizados en las circunstancias de su
construcción. Los programas de las cátedras así como el Régimen Pedagógico, el Plan de Estudios y
los datos estadísticos proporcionados por la Unidad Académica fueron de gran ayuda para triangular
la información. La utilización de materiales documentales abrió vías interesantes en el análisis de
información, y permitió un trabajo cualitativo más detallado con las entrevistas y encuestas.
Análisis de Programas: En la medida que se procedía a desgrabar las entrevistas audio con los
docentes, se consideró de relevancia el análisis de sus propuestas de cátedra, en el programa que
administrativamente requiere la Unidad Académica y que es presentado para cada ciclo lectivo. Este
proceso se realizó con posterioridad a las entrevistas, enfocando la mirada en la inclusión de criterios
de evaluación explícitos o implícitos en los mismos. En los tres programas, se advirtió, desde la
fundamentación de la asignatura en el Plan de Estudios, la convicción de adoptar una postura
epistemológica desde teorías constructivistas y socio criticas en función del campo disciplinar. Se
tienen presentes las incumbencias del título y la construcción de aprendizajes teórico-prácticos de
los estudiantes, considerando su inserción en el medio socio-cultural como profesor en Ciencias de la
Educación. En coherencia con lo expresado en las entrevistas, se observa la consideración del alumno
como eje del proceso de enseñanza.
Análisis de Plan de Estudios, Régimen Pedagógico y Datos Estadísticos. Una de las cuestiones
emergentes en el trabajo en terreno a medida que se analizaban las entrevistas desgrabadas y los
datos que brindaban docentes y estudiantes respecto al cursado y aprobación de las materias, así
como la referencia a incumbencias profesionales futuras, condujo al análisis de otros datos. Teniendo
en cuenta el contexto socio-cultural, económico, político singular, que da anclaje al objeto/ problema
de esta investigación, el trabajo áulico con estudiantes en formación que se desarrolla en la carrera
de Ciencias de la Educación, en la Facultad de Humanidades de la Universidad Nacional del Nordeste,
consideré importante analizar el Régimen Pedagógico de la Facultad, así como el Plan de Estudios y
en especial las recomendaciones, así como también , fue oportuno revisar, en la Dirección Gestión de
Estudios, datos estadísticos proporcionados por personal no docente.
3. Algunos Resultados
Si bien el objetivo inicial de la investigación, fue generar conocimiento científico sobre la utilización
que hacen los docentes universitarios de los criterios de evaluación en las diferentes prácticas

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evaluativas, a partir de la indagación de la presencia del principio pedagógico de la evaluación por


criterios consensuados en las prácticas de los estudiantes de la Carrera Profesorado en Ciencias de la
Educación, de la Facultad de Humanidades de la Universidad Nacional del Nordeste, esbozamos otras
consideraciones que abren a temas que trascienden los interrogantes iniciales. Los docentes -
teniendo como base las corrientes alternativas y la Didáctica constructivista y crítica- se han
propuesto trabajar con los estudiantes y la evaluación, a partir de objetivos enmarcados en una
perspectiva emancipadora.Dichos propósitos surgen de la convicción que tienen estos profesores de
incluir la evaluación en el proceso de enseñanza y aprendizaje, como intención didáctica, centrando
su preocupación en que la evaluación es para el alumno un momento de aprendizaje, una
preparación para la vida democrática, un proceso de autoregulación y un camino para el mayor logro
de autonomía. Cuando los profesores extraordinarios evalúan –señala Bain (2007) – “Cuando
califican a sus estudiantes, lo hacen en parte para poner a prueba sus propios esfuerzos a la hora de
facilitar el aprendizaje. Cuando evalúan su docencia lo hacen mirando el aprendizaje, tanto los
objetivos como los resultados.”La Evaluación se presenta como otro componente didáctico, en todos
los programas analizados. Pese a que los profesores, a partir de las primeras experiencias escolares,
han internalizado otros modelos de evaluación, incluyen la evaluación en el desarrollo de su
disciplina. Alejados de conocimientos estereotipados, se permitieron dialogar con los estudiantes
respecto a las situaciones evaluativas Superan sus historias y se preocupan por introducir criterios
de evaluación y expresarlos en el desarrollo de un trabajo práctico, fuera o dentro de la institución,
en una clase, en una guía. La preocupación por el proceso de aprendizaje de los estudiantes,
concibiendo la enseñanza como creación de buenos entornos de aprendizaje, se muestra como una
constante en el desarrollo de las entrevistas, sin aceptar o claudicar ante las clases magistrales y la
transmisión.Los estudiantes reconocen que en el desarrollo de su carrera en la Facultad de
Humanidades, cuentan con docentes que se permiten una “enseñanza artesanal”, pensando en el
desempeño futuro que tendrán ellos como alumnos. En los docentes emerge el gran interés por
centrar la enseñanza y el aprendizaje en el estudiante, al considerar la evaluación desde una mirada
critica alejada del enfoque técnico. Enfatizan decisiones propias no homogéneas fundamentadas
conscientemente como expresa Rivas Flores (2007) “... Un proceso racional de evaluación debería,
por tanto, incluir la revisión y la crítica de los propios criterios ... en un ambiente democrático,
abierto y diverso” teniendo en cuenta que “... la comprensión es el único modo de conocer y esto
sólo se produce en un proceso de construcción colectiva en el que se aúnan y juegan las diferentes
intencionalidades ... se pretende ... ofrecer elementos para la transformación de la realidad desde la
aportación de todos los implicados. Ésta es una posición alternativa y políticamente
contrahegemónica ...”.
4. Consideraciones Finales
Atento a la lógica cualitativa, se trabajó con los procesos de validación y confiabilidad a partir de la
vigilancia epistemológica en todo el proceso de investigación. Se trató de buscar la coherencia entre
la naturaleza del problema y el objeto, la consistencia entre la problematización del objeto y los
objetivos propuestos, tratando de tener en claro qué se investiga y cómo se realiza. La obtención y
análisis de la información fueron tareas complementarias, simultáneas, continuas e interactivas que
se desarrollaron en el proceso espiralado ya mencionado. Con los casos seleccionados -coherente
con la lógica cualitativa escogida-, no se pretendió llegar a conocimientos generalizables, sino a
esquemas conceptuales que dieran cuenta del objeto. Se fueron relevando datos empíricos que, en
un ida y vuelta con elementos teóricos, permitieron procesos de comprensión respecto a cómo ha
sido resignificada esa práctica. Se buscó por esta vía, entender e interpretar por medio de la
descripción y del análisis el dinamismo del propio proceso, poniendo el acento en las posiciones
cualitativas y hermenéuticas, así como en la comunicación interpersonal, con docentes y estudiantes.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Desde esas posiciones, triangulando la información, luego del análisis realizado, señalamos que los
propósitos de la evaluación del aprendizaje, guardan coherencia con los de la propuesta formativa
general, de la cuál no se pueden escindir, en todas las cátedras de este estudio. Al terminar esta
etapa de la investigación, redimensiono mi compromiso con la docencia y la investigación en la
universidad, teniendo como convicción personal que la evaluación mediante criterios consensuados
entre docentes y estudiantes, es una práctica democrática y ética.
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Fundamentos epistemológicos da matriz institucional dos novos modelos


de Educação Superior no Brasil: uma abordagem qualitativa dos documentos
institucionais da Universidade Federal do ABC (UFABC)

1
Manuel Tavares, 1Sandra Gomes
1Professor
do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Nove de Julho
(UNINOVE)
manuel.tavares@outlook.com.br
1Mestranda em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Nove de

Julho (UNINOVE)
sandra.r.gomes@hotmail.com

Resumo. Pretendemos desvelar e discutir a estrutura institucional fundamentadora do modelo de educação


superior da Universidade Federal do ABC (UFABC). As universidades, tradicionalmente reservadas às elites,
abriram-se a novos estudantes, nas dimensões de gênero, etnia, classe social. Os desafios respeitam à
democratização da educação superior, inclusão social, epistemológica, promoção da interculturalidade,
descolonização das relações de poder e de conhecimento. No Brasil, a ação dos governos pós-neoliberais de
Lula e Dilma centrou-se, também, na criação de universidades populares, apresentando perfis diferenciados,
respondendo a objetivos de ação política. A pesquisa documental, de caráter qualitativo, aposta na análise
de discurso na perspectiva de Fairclough. O objetivo é inferir as linhas estruturantes do novo modelo de
educação superior, partindo dos fundamentos conceituais, modelo pedagógico e princípios reguladores da
prática pedagógica. Promovendo a interdisciplinaridade e inclusão social pretendemos saber os
fundamentos epistemológicos fundamentadores da matriz institucional que regulam a atividade académica
e relações com a sociedade
Palavras-chave: Fundamentos conceituais; modelo pedagógico; educação superior; educação superior
contra-hegemônica.

Epistemological foundations of the institutional matrix of the new models of Higher Education in Brazil: a
qualitative approach of the institutional documents of the Federal University of ABC (UFABC)
Abstract. We intend to unveil and discuss the institutional structure that supports the higher education
model of the Federal University of ABC (UFABC). Universities, traditionally reserved for the elites, opened up
to new students in terms of gender, ethnicity, and social class. The challenges relate to the democratization
of higher education, social inclusion, epistemology, promotion of interculturality, decolonization of relations
of power and knowledge. In Brazil, the actions of the post-neoliberal governments of Lula and Dilma also
focused on the creation of popular universities, presenting different profiles, responding to political action
objectives. Documentary research, of a qualitative nature, focuses on the analysis of discourse in
Fairclough's perspective. The objective is to infer the structuring lines of the new model of higher education,
starting from the conceptual foundations, pedagogical model and principles regulating the pedagogical
practice. Promoting interdisciplinarity and social inclusion we intend to know the epistemological
fundamentals of the institutional matrix that regulate academic activity and relations with societyt.
Keywords: Conceptual fundamentals; Pedagogical model; university education; Counter-hegemonic higher
education.

1 Introdução

Depois de séculos de domínio de um único modelo de universidade que produziu e disseminou um


único paradigma de conhecimento, e se afirmou pelo seu carácter excludente, surgem em países da

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América Latina e, especificamente, no Brasil, outros modelos de educação superior que se afirmam
pela ruptura com o paradigma tradicional de universidade. Entre esses modelos, analisamos a
universidade federal do ABC paulista, fundada em 2005. Por intermédio da análise documental
tomando como “campo empírico” o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) e o Projeto
Pedagógico Institucional (PPI), pretendemos inferir os princípios e fundamentos epistemológicos que
sustentam a sua matriz institucional e o novo modelo pedagógico. A democratização da
universidade, a sua abertura a novos públicos, historicamente excluídos do processo
civilizacional é uma exigência nas sociedades contemporâneas em que o capital
epistemológico representa uma das bases fundamentais do desenvolvimento social e da
afirmação de uma justiça cognitiva. A universidade, tal como a conhecemos, funciona na sua
organização de acordo com estruturas herdadas do colonialismo: a gestão centralizada, a
sua divisão em departamentos disciplinares, o modelo pedagógico tradicional sustentado
numa visão paradigmática monocultural, a exclusão de múltiplos setores da população do
direito a uma educação superior de qualidade e de excelência (pobres, indígenas, negros,
afrodescendentes, deficientes). As estruturas coloniais da universidade são, ainda, grandes
obstáculos à inclusão de outros saberes não considerados científicos.
A UFABC, possuindo como fundamentos conceituais a inclusão social e a interdisciplinaridade
apresenta, desde logo, uma nova perspectiva curricular e de abertura democrática que sustenta um
novo modelo pedagógico. A flexibilidade curricular tem implicações no modelo pedagógico que, na
sua relação com a pesquisa e a extensão, pretende superar a visão monocultural de educação
superior e do professor especialista que, de um modo magistral, reproduz o conhecimento. A
descolonização da educação superior, com os seus obstáculos, contradições, dilemas e paradoxos,
implica a dissolução de todas as estruturas de dominação “de longa duração” (Rivera, 2010) e a
aposta na multiculturalidade e interculturalidade (Walsh, (2012, 2013) como respeito pelas múltiplas
culturas existentes no cenário do ensino superior e, simultanemente, a prática do diálogo entre a
diversidade cultural. Superar o monoculturalismo não é, apenas, uma questão teórica. É, com
certeza, uma proposta de transformação que exige uma praxis transformadora e emancipatória e
uma consciência política de compromisso. Os teóricos que conosco refletiram numa perspectiva
contra-hegemônica e descolonial foram, essencialmente, Santos (2005, 2009), Mignolo (2003, 2010),
Walsh (2012, 2013), Quijano (2005, 2009) dentre outros. Do ponto de vista metodológico,
adoptamos uma abordagem qualitativa com o recurso à análise de discurso, na perspectiva de
Fairclough (2001), como técnica de análise de dados. As categorias de análise, construídas a partir
dos eixos estruturantes do PDI e PPI da instituição que constitui o universo de pesquisa, foram as
seguintes: fundamentos conceituais; inclusão da diversidade cultural e epistemológica; modelo
pedagógico; formação e prática pedagógica; ingresso e permanência.

2 Contextualização e fundamentação teórica

As universidades enfrentam, na contemporaneidade, ventos poderosos de mudança que trarão,


certamente, transformações fundamentais nas sociedades. A mais significativa mudança material
que sustenta o neoliberalismo no século XXI é a subida do peso relativo do conhecimento como
capital (Tunnerman; Chauí, 2003). Nesse ambiente, o papel do ensino superior na competição e
concorrência económicas assumiu ainda uma maior importância. A formação docente, inicial e
continuada, sobretudo da educação superior, é, com certeza, uma das dimensões fundamentais que
poderá contribuir para o reconhecimento e afirmação de novas racionalidades e para a
operacionalização dos projetos de inclusão da diversidade cultural e epistemológica que caracteriza,
na contemporaneidade, os espaços de educação superior, sobretudo, dos novos modelos de

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universidade.
A América Latina foi a primeira região onde as políticas neoliberais foram implementadas, após o
golpe militar do general Pinochet, no Chile, em 1973. Depois, nos anos 1980, em resultado da séria
crise das dívidas externas em vários países (Argentina, México, Brasil, entre vários outros países de
menor dimensão demográfica e expressão económica), verificou-se a intervenção do Banco Mundial
e do FMI, no sentido de reestruturar as suas economias e de reduzir o défice fiscal, seguindo a
tradicional ortodoxia dessas instituições: desvalorização da moeda, privatização das empresas
públicas, remoção das barreiras alfandegárias, diminuição acentuada das despesas públicas com
educação, saúde e habitação (Espinoza, 2002). Na educação, as políticas encetadas significaram
privatização do provimento de educação (particularmente na educação superior), descentralização,
avaliação, accountability e performatividade docente (Arnove, Franz, Malis; Torres, 2003; Gazzola;
Didriksson, 2008). Em muitos países da América Latina, a matrícula na educação superior em
instituições privadas ultrapassou os 60%, a maioria de carácter comercial e de muito baixa qualidade
científica – conhecidas como universidades “garagem” ou universidades “patito” (Fernandez
Lamarra, 2010).
O século XXI trouxe mudanças neste panorama. A eleição de governos progressistas e de esquerda
em alguns países latino-americanos, ligados em geral a movimentos sociais e étnicos com forte
implantação e grandes tradições de luta e resistência às políticas neoliberais, permitiu desenvolver
políticas de redistribuição de riqueza e de satisfação de necessidades básicas das populações mais
carenciadas. Ao mesmo tempo, em países com fortes comunidades indígenas, houve um
reconhecimento das culturas desses povos e o desenvolvimento de políticas interculturais (para o
caso da Bolívia, ver Teodoro; Mendizábal; Lourenço; Villegas, 2013). As universidades e a educação
em geral voltaram a ter mais recursos públicos, havendo, em diversos países, políticas de ação
afirmativa visando populações historicamente afastadas da educação superior (afrodescendentes,
comunidades indígenas, estudantes pobres).
Nos países outrora chamados de terceiro mundo, hoje apelidados países emergentes e ou países
periféricos e semiperiféricos, surgem experiências inovadoras, de caráter contra-hegemônico, cujos
projetos de educação superior se situam numa perspectiva de equidade e justiça sociais. Os
movimentos contra-hegemônicos têm contra si um conjunto amplo de estruturas de dominação de
longa duração (Rivera, 2010) de herança colonial e neocolonial, que se perpetuam e, no âmbito das
quais, se legitimam e reproduzem relações de dominação, subordinação e hierárquicas, próprias do
colonialismo. A colonialidade do poder (Quijano, 2005) invade todos os espaços institucionais e,
naturalmente, as universidades e o conhecimento produzido e transmitido. Por outro lado, a
educação superior se converteu, mais num ingrediente de competitividade do mundo mercantil do
que num direito humano e num instrumento essencial para a construção da cidadania. (Dias
Sobrinho, 2012).
Apesar de algumas contradições e crises que atravessam a educação superior, algumas políticas de
experimentação institucional merecem referência particular. No Brasil, a ação dos governos pós-
neoliberais de Lula e Dilma (Sader, 2013) também se centrou na criação de universidades
“populares”, apresentando perfis diferenciados e respondendo a objetivos específicos de ação
política. Umas, como a Universidade Federal da Fronteira Sul, resultaram de uma forte ligação aos
movimentos sociais em particular aos movimentos do campo. Outras, como a Universidade da
Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), ou a Universidade Federal da
Integração Latino-Americana (UNILA), correspondem a opções de natureza geoestratégica da política
externa brasileira. Outras ainda, como a Universidade Federal do Sul da Bahia, a profundas mudanças
na arquitetura curricular, na organização do tempo letivo e na ligação à escola pública e aos sectores
sociais mais pobres e marginalizados da região (quilombolas, populações indígenas, camponeses
pobres sem terra). A Universidade Federal do ABC, cuja matriz institucional constitui objeto de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

estudo no presente texto, com 10 anos de existência, representa, indiscutivelmente, o modelo para a
criação de outras universidades que se apresentam como outros modelos de universidade em
oposição às universidades clássicas ou tradicionais. No seu Plano de Desenvolvimento Institucional
(PDI, 2013-2022) refere-se que a missão da UFABC é “promover o avanço do conhecimento através
de ações de ensino, pesquisa e extensão, tendo como fundamentos básicos a interdisciplinaridade, a
excelência e a inclusão social.” (p. 11). Desde logo, salientamos dois fundamentos conceituais que
sobressaem nesta missão e que analisaremos posteriormente: a interdisciplinaridade e a inclusão
social. Do ponto de vista da sua organização, a instituição fundamenta-se numa concepção nova de
ensino superior, estabelecendo rupturas com paradigmas tradicionais:

A organização da UFABC está baseada numa nova concepção de ensino superior, na qual a
flexibilidade curricular se faz presente, assim como a atuação multicampus, o que
apresenta grandes desafios à gestão universitária. Também por ser uma Universidade
jovem, além de inovadora, a UFABC tem em suas mãos grandes desafios, que são sua
implantação plena, seu desenvolvimento e sua consolidação, criando, ao mesmo tempo,
novos paradigmas de ensino, pesquisa e extensão, assim como de gestão. (PDI, p. 133)

Indiscutivelmente, estamos perante a quebra de diversos paradigmas resultante das lutas dos
diversos grupos sociais que, historicamente, foram excluídos dos processos civilizacionais. A
expansão da educação superior, apesar dos obstáculos, tem sido indesmentível nas últimas décadas
do século XX e primeira do século XXI, resultado de políticas promovidas e incrementadas por
governos de caráter progressista. Em síntese, pode afirmar-se, de acordo com os dados disponíveis,
que “em nível mundial, em trinta e sete anos, a frequência da educação superior passou de 28,6
milhões, em 1970, para 152,5 milhões, em 2007, o que significa um crescimento de 4,6% anual no
período considerado.” (Teodoro et all. 2013, p. 15). Na América Latina e Caribe, no mesmo período, o
crescimento também tem sido considerável: o número de estudantes que teve acesso à educação
superior aumentou cerca de dez vezes totalizando, em 2007, 17,8 milhões de estudantes. De acordo
com dados da UNESCO (2010), o crescimento na educação superior nos países da América Latina
registou uma taxa de expansão de 6,8% ao ano, considerando a primeira década do século XXI. Uma
das forças motrizes dessa expansão foi o entendimento de que a investigação científica, a inovação
tecnológica e a qualificação das populações são fatores determinantes na geração de riqueza, da
qual dependem, em última instância, os sistemas de bem-estar social e de segurança cidadã. A
concorrência cada vez mais globalizada tem vindo a exigir um conhecimento novo e rapidamente
aplicável, tornando o ciclo de inovação tecnológica mais breve, em quase todas as áreas da produção
e da sociedade. O ritmo de produção de conhecimento científico, no princípio do século XXI, dobrava
a cada cinco anos, projetando-se que, em 2020, possa duplicar a cada 73 dias (Tunnerman; Chauí,
2003).
Os processos de democratização dos países, acompanhados de políticas direcionadas para o
investimento em novas instituições de educação superior, permitiu uma diversidade considerável no
que diz respeito aos novos públicos estudantis. As universidades, tradicionalmente reservadas às
elites, abriram-se a novos estudantes. Esta abertura criou desafios e expectativas no que diz respeito
à democratização da educação superior, à criação de novos modelos pedagógicos, à inclusão da
diversidade cultural e epistemológica, à promoção da interculturalidade e à descolonização das
relações de poder e de conhecimento. (Quijano, 2005; Mignolo, 2003, 2010; Walsh, 2012, 2013). As
novas propostas de educação superior, que surgem na contramão dos modelos clássicos
(humboldtiano e napoleónico) que ainda compõem o cenário brasileiro de Instituições Superiores,
pretendem estabelecer uma ruptura com os paradigmas tradicionais, quer no que diz respeito ao

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

acesso e permanência dos estudantes quer na sua organização acadêmica e na inclusão da


diversidade cultural e epistemológica.
O Brasil, tal como outros países da América Latina e Caribe, caracteriza-se por um claro fenómeno de
multiculturalismo e diversidade cultural. Todavia, não significa que as instituições de educação
superior tenham promovido e incluído essa riqueza cultural numa perspectiva intercultural
emancipatória e descolonizadora. Algum pessimismo atravessa o mundo acadêmico progressista, em
relação à continuidade e aprofundamento dos novos modelos de educação superior, pessimismo
gerado pela onda de direita que atravessa os países da América Latina, incluindo o Brasil, agravado
pela eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos.
As políticas são constituídas por ciclos, tal como defende Ball (1990; 1993), (Policy Cycle Approach),
funcionam de uma forma organizada, estruturada em etapas e, uma vez definida a agenda e
formulada a política, está em condições de ser incrementada e gerar os resultados esperados. O
incremento de uma política pública, especificamente no âmbito da educação superior, não se
caracteriza como uma fase posterior à formulação, que aplica uma política pronta à realidade, mas
sim como um processo de interação entre os diversos grupos de interesses, mediado pelas
institucionalidades e pelas questões colocadas pelo contexto da prática, que reformula,
permanentemente, a própria política. Assim acontece com as políticas que definiram novos modelos
de educação superior, no Brasil, de que a Fundação da Universidade Federal do ABC é um exemplo
paradigmático e que serve de modelo a outras instituições que surgiram entre 2003 e 2015.
A desigualdade e a exclusão têm sido entendidas como duas características dominantes nas
Instituições de Educação Superior (IES) da América Latina. Institucionalizar um projeto de educação
superior implica um elevado grau de colaboração entre pesquisadores de modo a identificar causas e
fatores determinantes da exclusão existente, e apresentar algumas propostas visando superar
processos e mecanismos que excluem da frequência (e do sucesso) na educação superior,
populações inteiras (grupos étnicos indígenas, afrodescendentes, pobres, portadores ou em situação
de deficiência, minorias). Exige-se, também, que os projetos de pesquisa sejam cada vez mais
interdisciplinares, transdisciplinares, interculturais e internacionais e que contribuam para alterar,
substancialmente, as práticas pedagógicas conservadoras.
A formação inicial e contínua dos professores é um dos desafios que se coloca às novas instituições
de ensino superior. Os professores têm estado presentes, ao longo da história, em todos os discursos
e narrativas sobre educação. Eternamente presentes nos discursos e, muitas vezes, ausentes das
práticas emancipatórias e transformadoras. Os novos tempos e as transformações que se têm
registrado nas universidades, decorrentes dos novos públicos que a frequentam, exigem uma nova
identidade do professor universitário, o que passa pela sua formação inicial e contínua. A
universidade deixou de ser o único espaço onde se constrói o conhecimento e, por isso, exige-se uma
nova relação com o conhecimento que passa por novas relações pedagógicas sustentadas numa
formação reflexiva e colaborativa.

3 Abordagem metodológica

O nosso objeto de reflexão neste texto é a estrutura institucional que sustenta um novo modelo de
educação superior, especificamente, na Universidade Federal do ABC (UFABC), universo e locus da
pesquisa. A abordagem metodológica, é de caráter qualitativo com o recurso à análise documental.
Os documentos em análise são o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) e o Projeto
Pedagógico Institucional (PPI). Faremos essa análise em função de algumas categorias, como:
fundamentos conceituais; inclusão da diversidade cultural e epistemológica; modelo pedagógico;
formação e prática pedagógica; ingresso e permanência. Considerando que o discurso presente nos
documentos institucionais possui uma dimensão essencialmente proposital e política, direcionado

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para a instituição e para a comunidade local, regional, nacional e internacional, tomamos como
referência teórica Norman Fairclough (2001) para a análise discursiva. Interessa-nos salientar as
dimensões ideológica e social presentes nos discursos institucionais e desvelar as contradições
decorrentes das intertextualidades presentes nesses mesmos discursos. Por um lado, um discurso
marcadamente ideológico e contra-hegemônico que promove práticas emancipatórias e inclusivas e,
por outro, um discurso marcadamente neoliberal, hegemônico, em consonância com algumas das
dimensões presentes nos discursos das agências reguladoras internacionais. “As hegemonias em
organizações e instituições e no nível societário, são produzidas, reproduzidas, contestadas e
transformadas no discurso.” (Fairclough, 2001, p. 28). A adequação das unidades discursivas às
categorias permitiu-nos responder à questão nuclear de pesquisa e a outras questões dela
derivantes: quais os fundamentos epistemológicos presentes na matriz institucional da UFABC que
regulam toda a atividade académica da instituição e suas relações com a sociedade? Qual o modelo
pedagógico e suas linhas estruturantes? Qual a política de ações afirmativas para a inclusão da
diversidade social? Como a instituição ajusta o princípio estruturante da interdisciplinaridade à
diversidade cultural e epistemológica? A resposta, ainda que provisória, a estas questões de
investigação permitiu-nos aferir algumas das contradições, dilemas e paradoxos presentes entre os
princípios e as práticas.

4 Análise do discurso documental

A UFABC, fundada em 2005 (Lei Federal nº 11.145), localizada em Santo André no grande ABC
paulista, apresenta-se como um novo modelo de educação superior em ruptura com os paradigmas
elitistas de universidade. Logo pela apresentação do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI,
2013-2022, p. XIV) se pode entender que o Projeto UFABC ultrapassa o âmbito local e regional.
Pretende ser uma referência de excelência e inovação tecnológica em níveis nacional e internacional
“a edição de um PDI para uma década se reveste de muitos significados. Através deste documento a
instituição se apropria do seu próprio projeto, ao qual imprime o seu próprio ritmo e direção de
maneira a assegurar-lhe conformidade com seus valores e missão. (...) No âmbito externo é através
do PDI que a Nação e a Região tomam conhecimento das perspectivas e rumos da UFABC, das
oportunidades que a universidade abre para os indivíduos que a ela se juntam e para a coletividade
que a sustenta. No âmbito interno, ela representa o acordo, provisório que seja, em torno do qual
servidores, docentes, técnico-administrativos e alunos uniremos nossas forças para avançar. Em
1822, o Brasil descobria a sua identidade como Nação.”
Do ponto de vista dos fundamentos conceituais, a UFABC defende “a excelência acadêmica,
interdisciplinaridade e a inclusão social”. Este tripé conceitual representa a diretriz de todo o
desenvolvimento da instituição. A excelência acadêmica abrange a pesquisa, ensino, extensão e
gestão. Ainda do ponto de vista dos fundamentos conceituais defende-se o princípio ético do
respeito acadêmico “como condição imprescindível para o convívio humano e profissional” e o
princípio da interdisciplinaridade como uma “efetiva interação entre as diversas áreas do
conhecimento”. O princípio da interdisciplinaridade dissolve os departamentos disciplinares como
forma de possibilitar e estimular “o livre trânsito e a interação entre todos os membros da
comunidade acadêmica.” A superação das barreiras disciplinares, permite, de acordo com o PDI, uma
“interpenetração entre ciência e sociedade” e a “inseparabilidade entre produção e transmissão do
conhecimento”. (p. 19).
O novo modelo pedagógico que serviu de exemplo a outras instituições criadas nos governos Lula e
Dilma, “visa revolucionar a estrutura acadêmica tradicional do ensino superior brasileiro, abrindo
caminho e disseminando os aspectos bem sucedidos de seu PDI por todo o país.” (PPI, p. 45). A
interdisciplinaridade, como referimos anteriormente, constitui um dos pilares do PDI da instituição.

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Ela é identificada como “a interação entre áreas e a integração de conhecimentos e apontada como
caminho para resolução das grandes questões do século XXI, que exigem a atuação e
intercomunicação de profissionais de diferentes formações e visões”(...). “Diferentemente das
universidades tradicionais, em que cada curso possui seu conjunto de disciplinas, na UFABC todas as
disciplinas ofertadas compõem um catálogo unificado.” (p.58). Os alunos de qualquer um dos cursos
existentes podem matricular-se em qualquer uma das disciplinas. Verifica-se, assim, que as matrizes
curriculares da instituição possuem uma flexibilidade que não se encontra nas universidades
tradicionais. Reconhece-se que a prática pedagógica ainda não se coaduna com estes princípios: as
técnicas didáticas são ainda tradicionais, as aulas expositivas e um excesso número de alunos por
sala. Faltam projetos de natureza interdisciplinar que ponham em prática e consolidem estes
princípios, “intercursos e intercentros que mobilizem a comunidade acadêmica para o exercício
destes princípios” estruturantes. Dado tratar-se de um projeto em construção, instituiu-se um
Observatório da Interdisciplinaridade que tem como tarefa a organização de formas de
acompanhamento e aprimoramento do projeto e das respectivas práticas pedagógicas.
No que diz respeito à categoria de ingresso e permanência, a UFABC criou políticas de ações
afirmativas com a intenção de “garantir as condições de acesso e permanência no ensino superior
público, gratuito e de qualidade a uma parcela da população que foi historicamente alijada desta
possibilidade.” (p. 70). Estas políticas de ações afirmativas têm o objetivo de reforçar o papel da
universidade pública na formação de cidadãos críticos, transformadores da sociedade e fazendo
representar no seu espaço de formação académica todos os segmentos sociais, étnico-raciais e
acelerar “a oportunidade de igualdade aos segmentos mais vulneráveis da população”. (p. 70). O
discurso institucional, para além da sua dimensão ideológica caracterizada pela clara tomada de
posição em relação à inclusão “dos mais vulneráveis socialmente” e de segmentos étnico-raciais,
promove uma das dimensões da identidade da instituição. Uma instituição que apresenta um
diferencial relativamente às universidades tradicionais, quer na sua organização e modelo
académicos, quer nas matrizes curriculares e na sua flexibilidade quer ainda no sistema
quadrimestral de ensino, que possibilita ao aluno maior dinâmica e variedade na escolha das
disciplinas, e, ainda, na gestão participada dos vários organismos que a constituem. Por outro lado,
nos documentos em análise encontram-se discursos que se cruzam, se contradizem sem horizontes
de consenso: a universidade adopta um discurso neoliberal e hegemônico no que diz respeito às
questões da qualidade e da excelência, querendo afirmar-se nos rankings nacionais e internacionais
como uma instituição de referência. “A UFABC pode e deve usar os rankings e as avaliações como
ferramentas na busca da excelência, mas sem abrir mão, (...) da sua individualidade e de seu perfil
único que a diferencia de outras universidades nacionais e internacionais.” (p. 28).
O discurso social e de inclusão, por sua vez, parece estar na contramão dessa hegemonia discursiva.
Como incluir as populações mais pobres, suas culturas e saberes no âmbito de um paradigma
epistemológico dominante? São estas intertextualidades que, parece-nos, nas suas contradições,
revelam uma enorme distância entre o que é a instituição, o que quer ser e o que realmente poderá
ser, encerrando as políticas institucionais em diversos dilemas difíceis de resolver. Isso mesmo se
revela na seguinte unidade discursiva:
“Para construir consensos sobre o perfil institucional é preciso guiar-se por respostas a algumas
grandes perguntas. Quais são os grandes temas que hoje representam os principais desafios a ser
enfrentados? A universidade deve ser um espaço de pluralidade de temas e de conhecimentos, ou
deve dar ênfase a grandes temas que representem os principais desafios do Século XXI? É possível
combinar as duas perspectivas? Como fazê-lo? Quais são as oportunidades e os constrangimentos
que o atual contexto do país em geral e da organização científica e universitária, em particular,
colocam para uma universidade em formação como a UFABC? No contexto brasileiro e no
enfrentamento destes temas situados na fronteira do conhecimento científico é possível conciliar a

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

necessária inclusão social com a busca pela excelência acadêmica? Há um dilema entre estas duas
perspectivas ou é possível conciliá-las?” É verdade que um dos princípios fundamentais da instituição
é a afirmação da diversidade e da pluralidade no ambiente acadêmico, quer de público quer de
culturas e saberes. Do ponto de vista discursivo, não da prática, parece não haver incompatibilidade
nem dicotomias entre a busca e afirmação da excelência em determinadas áreas científicas e
tecnológicas e a inclusão da diversidade. A fuga à excessiva especialização é um dos caminhos e a
relação dos projetos de pesquisa e extensão interdisciplinares com os problemas sociais e ambientais
parece ser outro percurso a trilhar: “A universidade deve dar conta das demandas sociais colocando
os valores académicos como a pedra angular da vida universitária.” (p. 22)
O cumprimento das metas estabelecidas no PDI exige profissionais qualificados e, sobretudo, que se
ajustem ao perfil da instituição. Reconhece-se que os professores, formados em instituições
tradicionais, atuam ainda no âmbito da sua especialidade disciplinar manifestando “alguma
dificuldade em atuar fora dos limites de seu tópico de estudo, ou mesmo em trabalhar na integração
de seu conhecimento com o de colegas de outras áreas.” (p. 46) Para além dos projetos de pesquisa,
em consonância com as determinações das agências financiadoras, os documentos analisados não
referem nenhum modelo institucional de formação contínua dos seus professores no sentido de
promoverem e se ajustarem, nas suas práticas pedagógicas e de pesquisa, aos princípios e perfil da
instituição. Construir um modelo inovador de educação superior exige a superação da contradição
enunciada.

5 Conclusões

A construção de um novo modelo de educação superior é uma tarefa gigantesca. Sobretudo quando
uma longa história de hegemonia de uma universidade elitista e conservadora pesa sobre essa
construção. Os discursos documentais analisados têm, indiscutivelmente, uma forte dimensão
política: eles definem as linhas políticas da instituição e são, até certo ponto, discursos apologéticos
da própria instituição e das suas tarefas académicas e sociais. O que se entende, em documentos que
pretendem ser os reguladores de todas as atividades da universidade. Consideramos que a UFABC
estabelece, formalmente, linhas de ruptura com os paradigmas tradicionais de ensino superior ao
dissolver, por exemplo, os departamentos disciplinares, verdadeiros centros de poder e micropoder
nas instituições académicas clássicas. A proposta, verdadeiramente estruturante, do princípio da
interdisciplinaridade aponta para o diálogo entre os vários discursos e narrativas disciplinares,
sugerindo uma prática colaborativa e dialógica entre os profissionais docentes das diversas áreas.
Todavia, sendo um novo modelo de educação superior que tem também como linha estruturante a
inclusão da diversidade, estranha-se que não tenha ultrapassado o próprio conceito de
interdisciplinaridade. Se refletirmos, esse conceito, parecendo embora representar uma abertura
epistemológica, continua prisioneiro dos saberes disciplinares. A contradição é, então, notória:
interdisciplinaridade e inclusão da diversidade, tal como as linhas paralelas, são conceitos que não se
encontram. Parece-nos, por isso, que a ruptura com a tradição deveria ser mais profunda propondo
outros conceitos mais ajustados à diversidade cultural e epistemológica presentes na instituição. Os
conceitos de interdiversidade de saberes e interculturalidade (não referidos nos documentos)
parecer-nos-iam mais ajustados a uma instituição que se afirma como nova, diferente, que rompe
com paradigmas e que tem como projeto contribuir para a inclusão social dos povos marginalizados
historicamente e impedidos do direito a uma educação superior de qualidade e de excelência.
Consideramos, neste aspecto, que os estudos de Walsh sobre interculturalidade crítica representam
bases teóricas consideráveis para a incrementação de um projeto mais inovador e mais descolonial
tal como propõem, também, Santos, Mignolo e Quijano. Os professores, embora não apenas eles,

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são, por certo, verdadeiros protagonistas da mudança. Todavia, os documentos salientam a


dificuldade da sua adaptação aos novos paradigmas instituídos, a sua dificuldade em ajustar a prática
pedagógica aos princípios inovadores da matriz institucional, mas nada referem sobre a necessidade
de formação contínua dos seus quadros profissionais. No que se refere às questões que enunciamos
como questões de pesquisa, consideramos que os documentos sugeriram algumas respostas, ainda
que provisórias, tendo em conta que o projeto da UFABC, pela sua curta história, é um projeto em
construção. Questionamos, assim, se o querer ser um novo modelo de educação superior o poderá
ser, tendo em conta os constrangimentos de caráter financeiro e político que, atualmente, estão
presentes na sociedade brasileira. Na ânsia de que a educação superior se altere profundamente e
represente o principal fundamento para uma transformação social verdadeiramente democrática,
numa perspectiva de equidade e justiça sociais e cognitiva, nos vamos situando entre a espera e a
esperança.

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Identidade e Saberes docentes do Campo: um estudo a partir das vivências


no estágio do Curso de Educação do Campo.

Adriana dos Santos Prado Sadoyama1,7, Leonardo Santos Andrade2, Maristela Vicente de
Paula3,
Neila Maria Mendes Borges , Geraldo Sadoyama Leal4,7, Vagner Rosalem5,7, Paulo Alexandre de
3

Castro6,7

1 Departamento de Educação, UFG/RC, Brasil. drisadoyama@gmail.com


2 Departamento de Química, UFG/RC, Brasil. ls_andrade@ufg.br
3 Departamento de Educação Física, UFG/RC, Brasil. maristela.vicente.paula@gmail.com,
neilam@ibest.com.br
4 Instituto de Biotecnologia, UFG/RC, Brasil. gsadoyama@gmail.com
5 Departamento de Administração, UFG/RC, Brasil. vagner@hotmail.com
6 Departamento de Física, UFG/RC, Brasil. padecastro@gmail.com
7 Mestrado Profissional em Gestão Organizacional Catalão-GO, Brasil

Resumo. Este trabalho apresenta e discute os resultados obtidos a partir de uma pesquisa qualitativa do tipo
descritiva com coleta via aplicação de um questionário especialmente elaborado para este fim. A análise dos
dados foi obtida com estudantes do ensino superior em Educação do Campo pertencentes a uma instituição
brasileira (Universidade Federal de Goiás-Regional Catalão). Os resultados obtidos permitiram compreender
a perspectiva dos estudantes sobre o desenvolvimento e a importância do estágio e sobre os saberes e
processo identitário desenvolvidos no estágio, um espaço de interação entre universidade e escola na qual
professores regentes, estagiários e professores supervisores podem atualizar e compartilhar conhecimentos
e dificuldades acerca da profissão docente, em particular na docência de escolas camponesas.
Palavras-chave: Educação do Campo; Saberes e fazeres na docência, Identidade docente.

Identity and Teaching Knowledge of the Rural Zone school: a study based on the experiences in the Rural
Education Course
Abstract. This paper presents and discusses the results obtained from a qualitative research of the descriptive
type with collection through application of a questionnaire specially elaborated for this purpose. The data
analysis was obtained with students of higher education in Field Education belonging to a Brazilian institution
(Federal University of Goiás-Regional Catalão). The results obtained allowed to understand the students'
perspective on the development and importance of the internship and on the knowledge and identity process
developed in the internship, a space of interaction between university and school in which teachers regents,
trainees and supervisors can update and share knowledge and difficulties about the teaching profession,
particularly in the teaching of Peasant Schools.
Keywords: Peasant education, Knowledge and practices in teaching; Teaching identity.

1 Introdução: por uma construção da identidade docente do Campo

Ao prefaciar o livro Identidade de Zymunt Bauman, Benedetto e Vecchi (2005, p. 13) convida os leitores
a refletir sobre o papel da identidade individual na codificação para uma identidade coletiva pautada
em uma convenção social. Um exemplo disso pode ser evidenciado a partir dos vários cenários de
fundamentalismos religiosos e seus desdobramentos na vida cotidiana humana. Bauman e Vecchi são
muito pontuais em alertar que estas ações se baseiam em transposições de identidade para uma política

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de trapaças em conduzir e ocultar verdades importantes. Por ser ambivalente, a identidade requer um
olhar profundo nas investigações científicas para que possam testar esta ambivalência. Ainda de acordo
com Bauman (2005) “...é sempre fundamental distinguir os polos gêmeos que os impõem à existência
social: a opressão e a libertação. Esse círculo precisa ser rompido”. No que se refere à formação dos
saberes e identidade de professores do Campo, em muitos momentos, existe esta dualidade,
principalmente, no espaço do estágio, onde permeiam discursos de opressão/libertação
concomitantemente.
Uma reflexão sobre a identidade em construção de professores do Campo remete, segundo Caldart
(2011, p. 149), que “...a Educação do Campo identifica uma luta pelo direito de todos à educação”. No
entanto, verifica-se que a construção desta identidade tem enfrentado inúmeros obstáculos, dentre
eles, a falta de escolas rurais como campo de estágio”. Na construção da identidade docente,
especificamente do Campo, Pimenta (2012, p. 61) apresenta uma reflexão de que o estágio seria o eixo
principal do currículo nos cursos de formação de professores, a criação de possibilidades de trabalho
para a construção da identidade docente. Ora, se pensarmos que é no estágio o principal processo de
formação docente e que nele são consolidadas as opções e intenções da profissão, então como
estabelecer este processo com tão poucas opções de espaço (local) de estágio diante de uma política
de fechamento das escolas das comunidades camponesas? A identidade profissional docente do Campo
deveria ser construída com vivências em espaços de formação relacionadas às práticas educativas da
Educação do Campo, pois todos têm direito a uma educação pensada nas especificidades da população
camponesa do Brasil.
Nesse sentido, o estágio possibilita um modelo de educação voltado para a transformação das
realidades de um povo oprimido por políticas e condições sociais que os desumanizam e acabam por
torná-los vítimas da opressão e da discriminação tanto do ponto de vista econômico e político como
cultural. Considerando-se ações para uma formação docente do Campo, a construção de projetos de
educação voltados para a humanização configura-se como uma importante estratégia para a inserção
crítica destes sujeitos na sociedade. Este pode ser o primeiro passo para o rompimento da dualidade na
construção de uma identidade libertadora e não opressora.
A propósito da construção da identidade docente Pimenta (2012. p. 67) afirma:

Uma identidade profissional se constrói, pois, a partir da significação da profissão, da revisão constante
da profissão, da revisão das tradições. Mas também da reafirmação de práticas consagradas
culturalmente e que permanecem significativas. Práticas que resistem a inovações porque prenhes de
saberes válidos às necessidades da realidade. Do confronto entre as teorias e as práticas, da análise
sistemática das práticas à luz das teorias existentes, da construção de novas teorias. Constrói-se,
também, pelo significado que cada professor, enquanto ator e autor, confere à atividade docente em
seu cotidiano a partir de seus valores, de seu modo de situar-se no mundo, de sua história de vida, de
suas representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do sentido que tem em sua vida o
ser professor. Assim como a partir de sua rede de relações com outros professores, nas escolas, nos
sindicatos e em outros agrupamentos.
Nesse sentido, alguns apontamentos se fazem necessários. Pimenta (2012) elenca que a construção da
identidade docente se estabelece a partir da significação de ser professor. Ora, ser professor do Campo
sem a possibilidade de vivência profissional em escolas das comunidades camponesas inviabiliza o que
ela chama de “revisão constante da profissão e da tradição”. A construção dos saberes a partir das
realidades destes sujeitos na consolidação de práticas significativas construídas nas especificidades
sócio culturais desta população camponesa fica fragilizada à medida que, não há opções de Escolas do
Campo e, quando há, não são suficientes. De modo geral, a construção identitária do docente do Campo
fragiliza-se com o descaso e o preconceito da sociedade com esta parcela da população brasileira. Ao
refletir sobre a identidade docente do Campo, seria prudente desenvolver uma educação “dos” e não
“para” sujeitos do Campo. Somente é possível esta formação identitária pelo estágio e, este, se faz
necessário acontecer em Escolas do Campo (Arroyo, Caldart & Molina, 2011).

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As vivências fora da universidade por meio do estágio possibilitam a construção da identidade docente.
Nas palavras de Pimenta (2012, pp. 67-68) “O estágio, ao promover a presença do aluno estagiário no
cotidiano da escola, abre espaço para a realidade e para a vida e o trabalho do professor na sociedade.”
Esta afirmação, do ponto de vista da a Educação do Campo, torna-se um desafio no sentido de se pensar
em políticas de formação docente do Campo a partir da construção de uma identidade de professores
do Campo e, principalmente, da atuação destes profissionais.

1.1 Construção dos saberes docentes do Campo na vivência do estágio.

Não há como negar que o estágio constrói questões básicas como o saber, o sentido da profissão, qual
o papel do professor perante a sociedade, a realidade dos alunos nas escolas. No estágio o aluno passa
pelo que se conhece como “rito de passagem”, onde ele reafirmará a escolha pela profissão. Muito tem
sido discutido sobre que o estágio não pode ser uma atividade meramente instrumental, desvinculada
da proposta do projeto pedagógico do curso. No caso da Educação do Campo, que tem como eixo
norteador a interdisciplinaridade, esta formação se torna muito complexa, dado que a sociedade atual
valoriza muito o conhecimento fragmentado como controle cultural.
Na construção da identidade docente, Tardif (2010, p. 11) aponta que está se dá através dos saberes
relacionados em vivências das práticas educativas construídas na escola. No caso da docência da
Educação do Campo, estas precisam ser estabelecidas em escolas do Campo nas relações com alunos
que irão, juntamente com este futuro professor, articular os aspectos sociais e individuais desta
realidade camponesa. De acordo com Silva (2015, p. 70):
Na formação inicial, o Estágio Supervisionado é um marco na vida do aluno, pois nele acontece a primeira
aproximação com o futuro campo de trabalho, um encontro com a realidade tal qual ela acontece no dia
a dia. Além de ser um momento de análise da própria formação, é um espaço, por excelência, da relação
dialética entre a teoria e a prática. Essa dialética é entendida no sentido de contraposição de ideias para
a construção de saberes. Dessa forma, através da prática, deve-se repensar a teoria e, ao mesmo tempo,
se voltar à teoria para aperfeiçoar a prática.
Nas reflexões sobre a prática, o estágio se torna o locus para o desenvolvimento de saberes e da
aceitação das incertezas e dos riscos. Tardif (2010) relata que a construção dos saberes e da identidade
docente são adquiridos no estágio. No caso da Educação do Campo, esta aquisição se torna complexa
quando não há escolas no Campo para o desenvolvimento de conhecimentos que serão testados e
acionados na experiência em salas com alunos das comunidades camponesas. O desenvolvimento dos
saberes deve estar próximo de um saber mais socialmente situado e localmente construído, no caso,
das especificidades das comunidades do Campo.
Muitas pesquisas apontam que o estágio nas licenciaturas se distancia da realidade concreta das
escolas. Em se tratando da Educação do Campo, com o fim das escolas das comunidades camponesas
esta realidade fica muito mais expressiva. A constituição dos saberes dos estagiários, de acordo com
Pimenta (2012, p. 102), se estabelece nas relações sociais historicamente formalizada com a escola. A
apropriação de instrumentos teóricos e metodológicos se faz na vivência do estagiário pelas atividades
desenvolvidas na escola. O próprio exercício de analisar, criticar e avaliar a condução de suas atividades
do estágio se estabelece pela rotina do estagiário no cotidiano escolar. Portanto, partindo-se da
premissa de que a reflexão da práxis docente se aprende com aqueles que já possuem experiência na
atividade de docência, a realidade do fechamento das escolas das comunidades camponesas
juntamente com a importância do estágio na formação dos alunos da Educação do Campo, foram os
principais aspectos que motivaram os objetivos desta pesquisa, a saber as questões de investigação
desta pesquisa: Como o docente da licenciatura em Educação do Campo percebe a importância da
construção identitária e dos saberes no estágio diante do cenário da impossibilidade de espaço (local)
de estágio na zona rural? Como motivar os futuros docentes em lutar por uma identidade docente do
Campo, quando a vivência dos saberes relacionados ao cotidiano das comunidades camponesas se torna

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inalcançável? A análise destas questões foi aprofundada considerando-se o ponto de vista dos
estagiários, os quais explicitaram suas opiniões sobre os desafios e as angustias para uma formação da
identidade da docência do Campo a partir de respostas dadas a um questionário especialmente
elaborado para este fim.

2 Método

Neste trabalho desenvolveu-se uma pesquisa de natureza qualitativa do tipo descritiva com coleta via
aplicação de um questionário. Trata-se de uma abordagem que possibilita compreender a perspectiva
dos participantes sobre o fenômeno, com base na análise de dados obtidos com estudantes do ensino
superior em Educação do Campo que pertencem a uma instituição brasileira.
A instituição escolhida para a realização deste trabalho foi a Universidade Federal de Goiás/Regional
Catalão (UFG/RC) a qual localiza-se no interior do estado de Goiás/Brasil. Trata-se de uma instituição
pública multicampi que atualmente oferece 26 cursos de graduação nas diversas áreas do
conhecimento. O critério principal de sua escolha como sede do estudo foi por ser a Instituição de
Ensino Superior (IES) que, no momento da escolha dos sujeitos, tem no estado o curso de graduação
em Educação do Campo. A pesquisa aqui desenvolvida e relatada contou com autorização formal da
Instituição bem como com a anuência da coordenação do curso.

2.1 Participantes

Em função da natureza da informação desejada, foi necessário que os participantes do estudo


possuíssem experiência de pelo menos cinco ou seis semestres frequentados em aulas do Curso. Essa
escolha deve-se ao fato de que estes períodos são os que os alunos estão vivenciando o estágio e, por
este motivo, permitiria a estes discentes ter uma visão ampla do tema. Da turma do 5º período
participaram 14 alunos matriculados e frequentes, do 6º período 15 e, todos se predispuseram a
responder. A faixa etária dos participantes variou de 25 a 58 anos para o 5º período, sendo 02 do sexo
masculino e 12 do feminino. Do 6º período a faixa etária dos participantes variou de 23 a 62 anos, sendo
02 do sexo masculino e 13 do feminino. Dos 29 participantes 10 vivem no campo e 19 na cidade. Pela
descrição dos indivíduos, é notória a variedade de idade e a predominância do gênero feminino o que,
segundo Franco (2012, p.12) expressam de forma adequada as representações sociais as quais
influenciam a avaliação do objeto pesquisado, no caso, o estágio, e nas categorias elaboradas para a
análise.
2.2 Materiais
Nesta pesquisa foram utilizados 02 instrumentos na coleta de dados, descritos a seguir:

i. Um questionário aberto contendo 10 perguntas abertas direcionadas em duas grandes


categorias: a primeira se refere ao desenvolvimento do estágio e a segunda sobre os
saberes e processo o identitário desenvolvidos no estágio.
ii. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE, de acordo com a Resolução CNS
466/2012 (Brasil, 2012).

O questionário continha um total de 04 perguntas relacionadas às dificuldades, importância e


aprendizagens desenvolvidas no estágio e 06 perguntas sobre os saberes e a construção identitária dos
futuros docentes da Licenciatura da Educação do Campo. Foi elaborada uma pergunta relacionada aos
motivos que levaram à escolha do curso com a intencionalidade de estabelecer um parâmetro de
respostas que influenciaria na categorização das inferências das respostas dadas à perguntas do

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questionário. Como o estágio é um importante passo no desenvolvimento destes saberes e na formação


desta identidade, as respostas dadas a esta pergunta direcionariam a todas subsequentes.
Para conhecer e analisar o impacto deste estágio na construção do processo identitário e dos saberes
docentes como promotor de mudanças no estudante do curso em Educação do Campo, objetivo
principal desta pesquisa, o uso do questionário com questões abertas mostrou ser a melhor
metodologia para a pesquisa, pois possibilitou a liberdade para expressão dos participantes, sem
direcioná-los a uma determinada opinião. Por tratar-se de um estudo inicial neste assunto, este tipo de
questionário permite maior variedade de respostas, dando aos participantes, grande margem do ponto
de vista de liberdade de expressão (Gil, 2008; Richardson et al., 1999). Além disso, o uso deste
questionário não expõe os participantes e elenca as possibilidades de analisar e de compreender.
Segundo palavras de Bardin (2011 p.38), torna-se possível “fazer inferências de conhecimentos relativos
às condições de produção”.
Por este motivo, a escolha de um questionário com questões abertas possibilita aos sujeitos
pesquisados expressar suas ideias e impressões em cada questão. No universo da análise de conteúdo
da metodologia escolhida para esta pesquisa, a análise das condições de produção das respostas dadas
às perguntas condiciona à inferências mais detalhadas. Pelas condições de produção da resposta, pode-
se avaliar se alguns respondentes apresentaram facilidade ou dificuldade na clareza das respostas.
(Richardson et al., 1999).
As perguntas elaboradas foram baseadas no estudo de Silva (2015) que trata do Processo identitário
e saberes docentes: um estudo a partir da prática de ensino no estágio do curso de Pedagogia da UFRN
(Universidade Federal do Rio Grande do Norte/Brasil).
2.3 Procedimentos de Coleta
Estabeleceu-se contato com as turmas por meio da Coordenação do curso e os professores regentes
das disciplinas de Estágio em Ciências da Natureza do Ensino Fundamental I e Educação de Jovens e
Adultos e de Química. O procedimento da aplicação do questionário bem como das autorizações
formais foi devidamente explicado aos participantes. A partir da autorização dos professores e da
Coordenação do Curso, a aplicação do questionário ocorreu em dois momentos: i) na aula de estágio
para a turma do 5º período com o tempo médio de 60 minutos para responder e ii) na aula de química
para a turma do 6º período com o mesmo tempo para respostas. Anexado ao instrumento de coleta
encontrava-se o termo de consentimento livre e esclarecido para os estudantes assinarem.
2.4 Análise dos Resultados
Para a análise dos resultados, adotou-se de forma criteriosa o mesmo modelo das fases da análise de
conteúdo desenvolvido por Bardin (2011, p.125), que consiste em um primeiro momento da pré-análise
seguido da exploração do material e, por fim, do tratamento dos resultados a partir de dados de
inferência e interpretação. Foi dada atenção à fala do estudante sobre as respostas dadas às questões
do questionário aplicado sobre Identidade e Saberes docentes do Campo: um estudo a partir das
vivências no estágio do Curso de Educação do Campo. A opção por esta metodologia se deu pela forma
de se descrever os dados de forma objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo das respostas dos
questionários, além de também analisar o material de forma qualitativa, extraindo os aspectos
considerados mais relevantes. Esta metodologia assegura uma rigorosa e precisa análise dos dados.
Segundo a autora (Bardin, 2011):
A análise de conteúdo pode ser considerada como um conjunto de técnicas de análises de
comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens [...] A intenção da análise de conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às
condições de produção e de recepção das mensagens, inferência esta que recorre a indicadores
(quantitativos, ou não) (Bardin, 2011, p. 38).

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O tratamento dos resultados, com inferências a partir das respostas fornecidas e interpretação do
discurso dos participantes, buscou categorizá-las. A inferência, base desta técnica, possibilitou a
comparação de resultados, uma vez que a informação puramente descritiva do conteúdo é de pequeno
valor (Franco, 2012). A comparação ocorreu entre os próprios discursos apresentados, com as
categorias estabelecidas na pesquisa, e a literatura utilizada. Dados estes organizados no quadro abaixo.

Quadro 1. Elaboração de categorias de análise.

TÓPICOS PERGUNTAS INFORMAÇÃO PRETENDIDA


A motivação da escolha do curso influencia o teor das
respostas dadas nas categorizações por critérios
Pergunta tema semânticos. Espera-se que o aluno que não fez a escolha do
O que o motivou a escolher o curso de
(unidade de curso como primeira opção apresentaria no conteúdo das
Educação do Campo?
registro) respostas muitas dificuldades na condução e vivências
epistemológicas no estágio em relação àquele que de fato
escolheu.

1) Como foi o estágio para você?  Pretendia-se que os alunos apontassem em suas
Qual o papel do estágio na sua respostas o que se chama de “rito de passagem” das
formação como futuro experiências na vivência no estágio.
professor?  Pretendia-se que os alunos descrevessem as
Categorização por
2) Qual foi a maior dificuldade? dificuldades e desafios na vivência do estágio e que
critérios
Que desafios se apresentaram e estratégias de superação foram desenvolvidas pelo
semânticos tema:
como superou? discente.
vivência no
3) Diante da dificuldade, como  Pretendia-se que os alunos apontassem estratégias e
estágio
tentou resolvê-la? resoluções de problemas relacionados à formação de
supervisionado.
4) O que você destaca como professores.
aprendizado mais significativo  Pretendia-se que o discente apontasse o
decorrente da sua experiência no desenvolvimento de fazeres e saberes docentes a
estágio? partir das vivências no campo de estágio.

 Pretendia-se que o aluno apontasse os saberes na


a) Que saberes você considera que
formação do professor do campo foram construídos na
construiu a partir da observação
vivência da docência no estágio.
no estágio?
 Pretendia-se que o aluno relatasse se o professor
b) Professor da escola auxiliou na
regente da escola campo estabeleceu parceria com o
sua observação e dúvidas? De
estagiário no desenvolvimento dos saberes e fazeres
que forma?
docentes.
c) Que mudança você percebe em
 A resposta dada a esta questão tem uma relação
si mesmo (a) antes e após o
intrínseca com a resposta dada pela opção do curso.
Categorização por estágio?
Esperava-se que aos que escolheram esta licenciatura
critérios d) Após este primeiro contato com
enumerasse as mudanças epistemológicas em ser
semânticos tema: a escola como estagiário pensa
professor. Por outro lado, os que não escolheram
observação e em assumir a profissão de
apontassem as dificuldades enfrentadas, ou se houve
desenvolvimento professor? Em investir na
uma mudança de paradigma após a experiência de
de saberes no continuidade dos estudos?
docência na escola.
estágio e) Que você pensava sobre ser
 Pretendia-se como resposta que os estagiários
supervisionado professor mudou com este
relatassem que mesmo diante de tantas adversidades
primeiro contato com o estágio?
na escola ainda assim, escolheriam a profissão de
O que pensava e o que pensa
docente.
agora?
f) Pensando no que vivenciou, o  Os estagiários deveriam relatar os sentimentos
vivenciados antes e depois do estágio.
que você destaca como
necessário o professor saber  Pretendia-se que os estagiários apontassem após as
para desenvolver bem a prática vivências no estágio quais são os saberes e fazeres
educativa na observação? docentes necessários na elaboração, execução das
práticas educativas na escola.

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Fonte: Adriana Sadoyama( 2017). Análise categorial

3 Resultados e Discussão

Em seu texto, Marcelo (2009, p. 4) aponta que “é através de nossa identidade que nós percebemos, nos
vemos e queremos que nos vejam. A identidade profissional é a forma como os professores definem a si
mesmos e aos outros”. Nesse sentido, é razoável afirmar que é no estágio que a manifestação desta
identidade docente, destes saberes e fazeres especificamente aos do Campo se estabelecem na
formação destes discentes.
Neste trabalho foi possível identificar e analisar a partir da pergunta tema dois momentos únicos desta
formação no estágio. Segundo Franco (2012, p. 13) “o sentido implica a atribuição de significado pessoal
e objetivado que se concretiza na prática social”. Posto isto, a motivação pela escolha do curso de
Licenciatura em Educação do Campo norteará todas as respostas dadas sobre o desenvolvimento do
estágio e o processo de formação da identidade e saberes do Campo, já que este simboliza o “rito de
passagem” e aponta uma prévia da profissionalização docente. A formação do professor do Campo
necessariamente perpassa pelas questões essenciais que diz respeito à condição humana tais como a
cultura e a vivência cotidiana das comunidades do Campo. Sendo assim, estes saberes e a construção
identitária da docência do Campo deverão, ao longo do curso, serem disponibilizados para a formação
do futuro professor que atuará em comunidades camponesas.
A análise das respostas dadas às perguntas dividiu-se em uma pergunta tema sobre a motivação da
escolha pelo curso e duas categorias semânticas sobre o desenvolvimento do estágio e do processo
identitário e dos saberes da docência da educação do Campo, a saber, entendendo que a escolha de
uma profissão sempre é medida por muitos fatores dentre eles econômicos, empregabilidade e status
no caso da docência, a empregabilidade foi o que favoreceu a escolha em um país onde o índice de
desemprego é altíssimo. Na pergunta tema, o que motivou a escolha pelo curso de Educação do Campo
revelou que dos 29 respondentes, 13 deles afirmaram que foi sua primeira escolha. Os 16 restantes
indicaram que o que os motivou foi a oportunidade de fazer um curso superior bem como a proposta
de alternância do Tempo Universidade e Tempo Comunidade, o que não atrapalharia a condução das
outras atividades.
De acordo com Pimenta (2012, p. 102), na pergunta tema por categorização semântica o
desenvolvimento do estágio, fornece a base formativa dos futuros professores, pois permite a
apropriação de instrumentos teóricos e metodológicos na compreensão do funcionamento da escola,
do sistema educacional e das políticas que regem a educação. Dos 29 sujeitos respondentes, apenas 13
revelaram em suas respostas terem no estágio aprimorado estas concepções. Os 16 restantes, apesar
de afirmarem dar continuidade no curso, não se veem como futuros professores e apontaram muitas
dificuldades tais como pânico, desorientação e impotência no convívio escolar. Este dado é muito
importante pois tem relação direta com a resposta dada à pergunta tema sobre a escolha do curso, o
que reforça a importância pela escolha em ser professor.
Na segunda pergunta tema por categorização semântica desenvolvimento do processo identitário e dos
saberes docentes todos apontaram que, apesar de muitas dificuldades e desafios decorrentes,
principalmente do número reduzido de escolas do Campo para a realização dos estágios, aprimoraram
o contato real com a situação das escolas das comunidades camponesas na região sudeste do estado
de Goiás. Além disso, perceberam a relação entre teoria e prática escolar bem como a ação dos
professores regentes a partir de seus hábitos, atitudes e atividades relacionadas ao cotidiano dos
professores. A organização da escola, a relação professor/aluno bem como com os professores
orientadores do estágio também foram de extrema relevância para o amadurecimento profissional na
formação dos estudantes.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Todos foram unânimes quando apontaram as dificuldades vivenciadas pelas comunidades camponesas
sobre realidade da Educação do Campo tais como: a precariedade de políticas públicas, ou quase
ausentes, na manutenção e permanência destas escolas no Campo, a baixa renumeração dos
professores, a inadequação do material didático, a estrutura física dos prédios escolares, as instalações
e equipamentos precários que resultam em uma aprendizagem insatisfatória. Evidentemente que para
além de aspectos tangíveis segundo Caldart (2011, p. 150) “a educação do campo se identifica pelos
seus sujeitos... em suas diferentes identidades e em sua identidade comum; ... A perspectiva da
educação do campo é exatamente de educar este povo para que se articulem, se organizem e assumam
a condição de sujeitos da direção do seu destino”.
Posto isto percebemos a importância do professor do campo como instrumento articulador desta
organização identitária destes povos camponeses. Para isto, a formação dos saberes docentes nos
estágios tem que ocorrerem em escolas nas comunidades camponesas. A afirmação deste traço
identitário sinaliza e desenha modelos de formação docente, bem como, de práticas educativas
específicas para desenvolver uma educação do campo que reconheçam as especificidades dos povos
camponeses como, nas palavras de Caldart (2011, p. 151) “ sujeito das ações e não apenas sujeito às
ações de educação, de desenvolvimento...”.
Freire (2015, p.42) nos aponta a importância da tarefa da prática educativa crítica no desenvolvimento
em propiciar condições nos estagiários de autocrítica para a condução da melhoria das metodologias
didático pedagógicas voltadas para as comunidades camponesas. Assumir-se como docente do campo
significa a assunção de sujeito social, ou melhor docente social, na elaboração de práticas educativas
que contemplarão as especificidades das comunidades camponesas.
É importante ressaltar que o curso de Licenciatura em Educação do Campo advém de lutas e demandas
sociais, políticas e culturais de homens e mulheres que buscam dignidade aos povos do campo na
assunção por uma solidariedade social e democrática tão ameaçada. Na análise das respostas dadas
pelos sujeitos pesquisados fica evidente esta fragilidade. No entanto é preciso evidenciar a importância
do estágio, principalmente que este aconteça em escolas do campo, para fazer valer a cotidianidade do
professor do campo dando a ele o peso significativo na formação política dos povos camponeses.
Freire (2011, p.107) ressalta a importância do diálogo como expressão de uma “ Educação como prática
da liberdade”. É preciso construir uma relação dialógica entre universidade e escolas como campo de
estágio. A busca em sistematizar a relação universidade/escola nos traz duas dimensões: ação e reflexão
das práticas educativas na construção dos saberes docentes. Especificamente na Educação do Campo,
esta relação deve ser construída em escolas que tenham seu funcionamento nas comunidades do
camponesas. Na avaliação dos alunos estagiários a inautenticidade destas vivências em escolas do
campo com características urbanas, tem sacrificado estas ações e reflexões.
Refletir sobre a formação da identidade docente do campo é alinhar as questões pedagógicas com as
especificidades destas comunidades do campo. É reconhecer que o campo como lugar que também
produza uma pedagogia do campo para a produção de uma educação ou de formação de professores
do campo.

4 Conclusão

O presente estudo possibilitou avaliar que no estágio é possível constatar que nas palavras de Pimenta
(2012, p. 11) citando Zabala (1998): “por trás das propostas metodológicas se escondem valores e ideias
em relação aos processos de ensinar e aprender e concepções de conhecimento e de ciência que
norteiam a prática pedagógica dos futuros professores”.
O estágio se torna um espaço de interação entre universidade e escola na qual professores regentes,
estagiários e professores supervisores podem atualizar e compartilhar conhecimentos e dificuldades

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acerca da profissão docente, principalmente na docência de escolas camponesas. É preciso levantar a


bandeira de luta na permanência e melhoria das Escolas do Campo no campo (na zona rural, em
comunidades camponesas). A formação do processo identitário e dos saberes docentes dos futuros
professores do Campo depende infinitamente de espaços que trarão vivências a respeito das diferentes
realidades do Campo. É na Escola do Campo (e no Campo) que discussões acerca das lutas sociais e
culturais desta população ganham voz e podem ser replicadas nos cursos de formação de professores
do Campo.
O estágio da Educação do Campo nas comunidades camponesas fortalecerá o desenvolvimento de um
currículo que vivenciará a realidade, à epistemologia e inserção dos alunos do Campo à uma formação
técnica, bem como, promoverá ao futuro professor uma formação humana para um trabalho voltado à
realidade destas famílias camponesas contribuindo para o seu desenvolvimento, resultando na
melhoria na qualidade de vida desta população.

Agradecimentos.
Pelo apoio para participar do 6º Congresso Ibero-Americano em Investigação Qualitativa (CIAIQ) e
apresentar este artigo no evento, agradecemos a Universidade Federal de Goiás (UFG), ao Programa de
Pós-graduação em Mestrado Profissional em Gestão Organizacional da UFG, a Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG), e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq).

Referências

Arroyo, M. G., Caldart, R. S., & Molina, M. C. (2011). Por uma Educação do Campo. 5ª ed.Petropólis,
RJ: Vozes.

Bardin, L. (2011). Análise de Conteúdo. Trad. Luís Antero Reto, Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições
70.

Bauman, Z. (2005). Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi/Zygmunt Bauman. Tradução, Carlos


Alberto Medeiros – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.

Brasil. (2012). Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466 de 12 dezembro de
2012. Disponível em
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html. (acessado em
09-03-2017):

Caldart, R. S. (2011). Educação do Campo. In: Caldart, R. S. (org.). Dicionário da Educação do Campo.
Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular.

Franco, M. L. P. B. (2012). Análise de Conteúdo. Brasília, 4ª ed. Liber Livro.

Freire , P. (2011). Pedagogia do Oprimido. 50ª ed.rev. e atual.Rio de Janeiro:Paz e Terra.

Freire , P. (2015). Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 52ª ed. Rio de
Janeiro: Pa e Terra.

Gil, A. C. (2008). Métodos e Técnicas de Pesquisa Social 6 ed. São Paulo: Atlas.

420
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Marcelo, C. (2009). A identidade docente: constantes e desafios. Revista Brasileira de pesquisa sobre
formação docente. Belo Horizonte, v. 01, n. 01, 109-131, ago./dez. 2009.Disponível em
http://formacaodocente.autenticaeditora.com.br. (acessado em 10/01/2017).

Pimenta, S. G., & Lima, M. S. L. (2012). Estágio e Docência. 7ª ed. São Paulo: Cortez.

Richardson, R. J et al. (1999). Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 3ª edição.

Silva, M. C. M. (2015). Processo identitário e saberes docentes: um estudo a partir da prática de ensino
no estágio do curso de pedagogia da UFRN. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Educação – Programa de Pós-graduação em Educação.
Disponível em ftp://ftp.ufrn.br/pub/biblioteca/ext/bdtd/MariaCFDR.pdf (acessado em
01/02/2017).

Tardif, M. (2010). Saberes docentes e formação profissional. 11ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes.

Zabala, A. (1998). A prática educativa Porto Alegre: Artmed.

421
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

El movimiento Maker como ecología de aprendizaje: estudio del caso


Gumiparty
Francisco-Ignacio Revuelta-Domínguez1 y Jorge Guerra-Antequera1

1 Departamento de Ciencias de la Educación. Universidad de Extremadura, España. fird@unex.es;


guerra@unex.es

Resumen. Como parte del Proyecto de Investigación «Ecologías de aprendizaje en contextos múltiples:
análisis de proyectos de educación expandida y conformación de ciudadanía (EDU2014-51961-P)» este
estudio de caso, presenta el evento Gumiparty como lugar de confluencia de individuos enmarcados en la
cultura Maker y sus variantes. Para ello, se presentan una descripción del concepto Maker y la filosofía
sobre la que está construido. Por otro lado, se hace una descripción del evento enlazando las áreas en las
que está dividido vinculadas con acciones que se desarrollan. Finalmente se presentan las técnicas e
instrumentos utilizados para la recogida y análisis de datos que se encuentra en proceso de realización. En
este caso de estudio se está realizando un análisis cualitativo de los datos hallados mediante la herramienta
informática NVivo en su versión 11.
Palabras clave: Movimiento Maker, ecología de aprendizaje, investigación cualitativa, estudio de caso

Maker movement as a learning ecology: case study abaut Gumiparty


Abstract. As part of the research project "Ecologies of learning in multiple contexts: analysis of projects
about expanded education and formation of citizenship (EDU2014-51961-P)" this case study presents the
Gumiparty event as a place of confluence of individuals framed in the Culture Maker. For this, a description
of the Maker concept and the philosophy on which it is built are presented. In the other hand, a description
of the event is made linking the areas in which it is divided and linked to actions when they are developed.
Finally, we talk about techniques and instruments used for the collection and analysis of data . In this case
study, a qualitative analysis of the data found using the NVivo software tool in its version 11 was carried out.
Keywords: Maker movement, learning ecology, cualitative research, case study

1. Introducción

Para la comprensión de las nuevas formas de aprendizaje en una sociedad altamente tecnologizada
debemos ampliar las perspectivas de acercamiento al problema de estudio. Entendiendo este
problema de estudio como las nuevas formas de aprendizaje generadas fuera de los contextos
clásicos de aprendizaje, se establece como un claro reto ante un fenómeno que debe ser
interpretado de forma holística e integrada.
Las formas actuales en las que se manifiestan los procesos educativos tienden a ser orientados hacia
la aceleración de los procesos de aprendizaje, que a su vez, se presentan bajo el supuesto de la
ineficacia del sistema educativo actual y cuyo referente en los estudios Universitarios no responden a
las formas sociales de entender el modelo de adquisición de aprendizaje actual. Así, llevan a pensar
en un modelo social en el que prima la filosofía dominante sea la cultura del instante (Polaino-
Lorente, 2011) y en la que la solución sea acelerada y la adquisición de las competencias también.
Pero, por el contario una corriente educativa en la que se ensalza el valor del tiempo y de la reflexión
torna como protagonista al proceso de ralentizar las formas de aprender para reflexionar en lo que
se está haciendo en cada momento y valorar lo conseguido o adquirido en ese momento. Este es el
movimiento Slow (Zavalloni, 2011).
Las coordenadas dicotómicas en el aprendizaje y cuyo límite definitorio sea el tiempo da lugar a
pensar en cantidad frente a calidad. Así, podemos articular el razonamiento hacia la idea en la que

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los objetivos de los espacios generadores de aprendizaje deben delimitarse por la visión holística e
integral frente a la visión cuantificadora y rápida, que se espera tras una análisis netamente
mercantilista de los procesos educativos en función del retorno de una inversión.
Saltando esta barrera clásica y con una visión excesivamente economicista de la educación y
derivando en un paradigma en el que la base se configura en la realización personal de los
aprendizajes adquiridos tiene cabida una explicación más general.
Cuando en los foros educativas basados en el emprendimiento como lugar y frente, que se convierte
en fuente de las nuevas economías, se visualiza al sujeto activo no como una máquina que tras su
formación devuelve a sus inversores (ya sean sociales, empresariales o de otra índole) su valor nos
encontramos con que dichos sujetos, ninguno es feliz (Nieto, 2016).
En estas coordenadas nace el movimiento maker que si bien es pronto para ser definido se
caracterizar por la unión de personas cuyo interés radica en aprender a crear conjuntamente,
disfrutando lo que se está haciendo y cuyo tiempo de ejecución se limita a los tiempos invertidos en
la resolución de los problemas que se plantean sobre la marcha. Siendo este un caldo de cultivo para
el movimiento emprendedor y generador de nuevas formas de aprender y nuevas economías
basadas en las industrias culturales.

1.1 Movimiento maker: la unión entre DIY, DIWO y DIT

El inicio del concepto Do it yourself (DIY) está basado en la filosofía de co-contruir, es decir, colabroar
con otros individuos para llegar a un fin. En base a esta filosofía surgen los movimientos Do it with
other (DIWO) o Do it together (DIT) (Hagel, Brown, & Davison, 2010). Siendo estos parte del conjunto
de ideologías que configuran el germen del movimiento maker (Ceccaroni & Piera, 2017).
Enmarcamos este movimiento como un grupo de personas, las cuáles según Martínez (2016) poseen
las siguientes características:

 Interés por hacer cosas por sí mismo (Do-It-Yourself – DIY), así como en colaboración con
otras personas (Do-It-With-Others – DIWO)
 Capacidad de uso de herramientas digitales de sobremesa desarrollar productos y desarrollar
prototipos.
 Cultura de compartir los diseños en la red y colaborar en comunidades online, para que
cualquiera pueda acceder a la información y crear los productos utilizando los manuales
correspondientes.
 Uso de archivos estándar de diseño que permitan a cualquiera mandar los diseños a servicios
de fabricación para producirlos en cualquier cantidad.

Para definir al movimiento maker recogemos una serie de acciones recopiladas por Hatch (2014) en
su Maker manifesto, las cuáles son: hacer, crear, dar, aprender, compartir, llenar la caja de
herramientas, jugar, cambiar, participar y apoyar. Estas premisas se traducen según Rifkin (2011) en
la tercera revolución industrial, la cual es una industrialización a pequeña escala de los individuos,
cuya filosofía se estructura en la versatilidad del diseño, la capacidad de aprender y compartir y el
establecimiento de metas comunes.
En base a ello, Dougherty (2016) señala que esta corriente bebe del Homo faber romano, indicando
que la esencia humana nace del interés de cambiar haciendo. Por ello, vehicula la filosofía Maker
dentro de la educación mediante el aprendizaje informal, manteniendo sus valores y promulgando
sus principios filosóficos: diseña, crea, aprende, comparte, mejora.

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El movimiento maker representa un cambio de valor de la competición a la colaboración, de lo


propietario a lo abierto, del poder institucional al empoderamiento individual, de la apatía a la
acción. (Dougherty, 2016, p. 262)

Fig. 1. Equipo de Cosplayers (Gumiparty2016) que ruedan una serie con sus propios medios y que son representantes de la
cultura maker.

Esta desestructuración de los medios de creación da lugar a teorías emergentes sobre los gérmenes
de movimientos sociales disruptivos, en este caso próximos a la cultura denominada popularmente
como freak. En la cual nos encontramos con un evento que podría considerarse nexo o punto de
encuentro de generación de experiencias vinculadas con el aprendizaje expandido, en el que la
cultura alternativa, aprendizaje con videojuegos (Revuelta y Guerra, 2012), aprendizaje socio-
emocional (Elias, 1997), soft-skills (Carblis, 2008), aprendizaje invisible (Cobo & Moravec, 2011) y
trialógico (Paavola, Lakkala, Muukkonen, Kosonen, & Karlgren, 2011), la implicación de las
inteligencias múltiples (Gardner, 2010), DIYers, juegos de rol y altas dosis de expresión mediática, y
cooperación constructiva, generan el prisma, desde una óptica compleja, que se plantea en este
estudio.

1.2 Descripción del Evento de Estudio: Gumiparty


Para el estudio de este evento se acudió a su 12ª edición, la cual se ha celebrado en 2016 reuniendo
a más 4800 personas del territorio nacional y América Latina. Este evento tiene lugar en la ciudad de
Plasencia (Cáceres) en el recinto ferial “El Berrocal”. Nace como una propuesta de ocio alternativa
para los jóvenes de la localidad. Fue fundado y está organizado por la asociación local Megagumi.
El recinto, lugar físico en el que desarrolla el evento, está separado en cinco áreas bien diferenciadas,
siendo estas:

1) Área de comercio y conferencias: es el área principal, la conectora de las demás. Contiene los
stands (merchandaishing, dulces, comida japonesa, comida americana, mods de PC, juegos de mesa,
videojuegos, etc.), los puntos de información y el escenario en que se realizan las conferencias y el
concurso de cosplay.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

2) Área de transición: esta área conecta todas las otras, es necesario pasar por ella para movernos
por el evento a las diferentes actividades. Es un área al aire libre en el que están incluidas algunas
actividades como:

Softcombat: combate con armas y armaduras de gomaespuma o FOAM.


Quidditch: deporte original de los libros de Harry Potter en el que dos equipos se enfrentan
para obtener puntos mediante la colocación de varios tipos de balones.
Graffiti: actividad artística al aire libre. Un grafitero estaba creando una obra en vivo durante
el evento.
Zona de relax y esparcimiento: es la zona done los participantes se relajaban y se establecían
algunas relaciones sociales. Podíamos observar los grupos y las asociaciones de
agrupamiento de estos.
Cine: en esta área se ubicaba una pequeña tienda en la que constantemente se emitían
películas del género anime.

3) Área LAN: esta zona está dividida en subparcelas como:

Zona LAN: zona en la que estaban ubicados los puestos para aquellos participantes que
desean pasar allí tres días por lo tanto tienen derecho a un puesto de ordenador.
Normalmente es una zona de juego e intercambio de archivos.
Bar: dada la larga estancia de los participantes que allí se han el bar está ubicado a la
izquierda del acceso a esta zona. Pudimos observar su constante funcionamiento, así como la
integración en el evento.
Zona Retro: situada a la derecha del acceso. Cuenta con un par de recreativas montadas con
emuladores y packs RaspberryPi que simulan videoconsolas antiguas.
Zona Consolas: comparten zona con las máquinas reto. Estas consolas son las utilizadas para
los torneos. Suelen tener mucha afluencia de público generalmente jóvenes. Los géneros de
los videojuegos preinstalados son: lucha, FPS (First Person Shooter); deportes (fútbol) y
casual (baile)
Zona Talleres: frente al acceso a esta zona podemos encontrar las mesas de dibujo y talleres.

4) Área de Juegos de mesa: Este área está situado en el extremo izquierdo del recinto. Contiene dos
espacios que son:
Zona de juego: en esta zona cualquier persona asistente al evento puede jugar a los juegos de mesa
que la organización guarda en un armario situado en el acceso.
Zona de competición: reservada a las competiciones y torneos que se desarrollen durante el evento,
véase Magic, Virus, Catan, etc.

5) Área de descanso: esta área comparte espacio con el área de juegos de mesa, pues es un apartado
anexo en el que encontramos las tiendas de campaña de todas las personas que han decidido asistir
al evento durante tres días continuados teniendo en ese lugar su área de descanso particular.

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Fig. 2. Plano evento Gumiparty.

2. Estudio de Caso

La necesidad de comprender el fenómeno estudiado hace necesario orientar el enfoque


metodológico hacia un enfoque cualitativo que nos ayudará a profundizar e interpretar lo que
sucede en las relaciones entre los participantes al evento. El método principal que hemos
seleccionado para este estudio ha sido el estudio de casos del que Simons (2011, p. 19) sostiene que
es “el análisis de lo singular, lo particular, lo exclusivo”. Lo define como un enfoque, puesto que el
estudio tiene una intención y se proyecta a través del contexto de la investigación científica. A parte
de tener un propósito metodológico, los cuales están afectados por las tipologias de recogida de
datos por parte del investigador, también se ha de señalar que la finalidad del estudio de casos es
detenerse en una singularidad, comparando, contrastando y contraponiendo diferentes casos pero
sin desviar su atención a su premisa principal, la cual se centra en la indagación, la explicación y el
análisis del caso singular. Así mismo, Merriam (1988) señala que el estudio de casos otorga una
perspectiva holística del objeto o fenómeno de estudio y les otorga rasgos particularistas,
descriptivos y heurísticos apoyando el acopio, la asimilación y el procesamiento de datos cuya
finalidad, tal y como resalta Simons (2011, p. 42), es “generar una comprensión exhaustiva de un
tema determinado […] para generar conocimientos y/o informar”.
Es por ello, que se utilizará el estudio casos múltiple, con el cual se valoran diferentes casos en pos de
la indagación y el análisis del problema. En otraspapabras, seleccionamos varios casos no iguales
pero que estén vinculados entre sí. En base a esta elección múltiple, se estudian y maximizan las
diferencias de los casos comparados. Es decir, en cuanto al contexto de desarrollo estos casos son
extremos siendo consciente el investigador de las diferencias que reportan entre ellos.

2.1.1 Acceso al campo de estudio


La relevancia del acceso al campo de estudio es crucial, pues se hace necesaria la plena colaboración
y la cohesión entre los integrantes el contexto y el investigador para la recogida de datos. De cara a
obtener un contacto cordial al contexto de estudio estudio Simons (2011) sugiere algunas pautas:

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Invitarlos participar en la investigación, señalando la oportunidad que se les brinda de dar sus
opiniones y defender sus intereses.
Dejar claro nuestro deseo de que participen en un dialogo abierto para compartir conocimientos e
interpretaciones.
Pensar en qué podemos ofrecer a cambio: trascripciones, informes breves, un resumen de las
conclusiones o del estudio de caso .
Por otro lado, Simons (2011) señala la conveniencia de agradecer la aprticipación de los sujetos
afianzando la relación con el contexto para llevar a cabo accesos ulteriores, con el fin de reevaluar
algún aspecto inconcluso de la investigación o para crear un seguimiento activo de los sujetos.

2.1.2 Técnicas de investigación


A continuación, enumeramos algunas de las técnicas que hemos seleccionado para realizar este
estudio:

1. Observación participante: esta técnica ubica al investigadoir dentro del contexto de


investigación con el rol de participante, es decir el investigador desempeña su tarea fundido
con los individuos del caso estudiado. Se tomará partido en distintas partidas para
comprender los mecanismos de aprendizaje desde dentro.
2. Análisis de la documentación: es una valiosa fuente de información ya que provee de
documentos a la investigación y así reforzar la fundamentación tanto teórica como
metodológica, además e las conclusiones que se establezcan tras el análisis de los datos. Será
necesario el análisis de documentación con el fin de recabar información para completar y
complementar el estudio de cara a integrarse con el resto de ecologías.
3. Cuestionario: siendo un instrumento que recopila información mediante una serie de
preguntas en las que el sujeto o sujetos de estudio proporciona información al investigador
en forma de respuesta. Se les pasará un cuestionario a los individuos integrados en los casos
seleccionados.
4. Entrevista: es un instrumento en el que se obtiene información de modo oral en torno a la
temática vinculante con la ecología estudiada. Con ella se valoraran actitudes, opiniones,
creencias y demás aspectos relacionados con el objeto de estudio.
5. Análisis de fotografías: se obtuvieron unas 500 fotografías. Con el análisis de imágenes nos
adentramos en dejar patente un momento en el que se vislumbran categorías específicas y
nos sirven para centrar y caracterizar a cada uno de los participantes a los que se les
entrevistó.
6. Análisis de redes sociales: El análsis de redes sociales permite en el macro caso establecer las
relaciones de significatividad de cada uno de los participantes que vinculados puede
ofrecernos una perpectiva relacional.

2.1.3 Análisis de datos


Para la fase de análsis de datos se está utilizado el software informático Nvivo11, el cuál nos permite
la integración de las diferentes técnicas descritas anteriormente. Además como soporte teórico
utilizaremos la Teoría Fundamentada (Glaser y Strauss, 1967 y Strauss y Corbin, 2002) para
interpretar los datos obtenidos mediante las técnicas anteriormente mencionadas. Lo cuál permitirá
que los investigadores puedan conformar teorías emergentes acerca de los procesos y/o mecanismos
de aprendizajes presentes en cada unos de los casos de estudio y que los sujetos identifican y
utilizan.

427
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Fig. 3. Mapa relacional de categorías (nodos) del caso Gumiparty.

3. Consideraciones finales

Dado el estado intermedio del proceso de análisis en el que se encuentra esta contribución, hemos
procedido a reflexionar y presentar este caso, dada la complejidad de afrontamiento que supone su
organización. Aún es pronto para presentar conclusiones definitivas pero en los avances del trabajo
podemos observar las tendencias sobre las cuales pensar y construir algunas conclusiones
preliminares. Una de las conclusiones macro del estudio de este evento se visumbra en los valores
compartidos propios de la cultura maker. Como mencionan Bordignon, Iglesias y Hahn (2016, p.73)
“los colectivos de makers, cuando evolucionan y se consolidan en una ciudad o zona, toman forma
propia en espacios físicos específicos.” Parece que en estos lugares, compartidos, solidarios y
creativos, la gente puede crear, prototipar, construir o fabricar a partir de ideas individuales o
colectivas (Hatch, 2014).
Es decir, en estos lugares confluyen espacios que fomentan la solidaridad, la creatividad y la filosofía
de compartir los conocimientos. Haciendo posible un aprendizaje por ósmosis en el que esta
pequeña revolución industrial se lleva a cabo mediante el juego y exploración, adquiriendo unas
prácticas de aprendizaje colaborativo que son los realmente enriquecedores de aprendizajes propios
y generadores globales de estategias emprendedoras.

4. Referencias

Bordignon, F. R. A., Iglesias, A. A., & Hahn, Á. (2016). Prácticas maker en la Escuela Secundaria.
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Formação acadêmica para busca de informação e sua relação com as


tecnologias digitais: resultados preliminares do caso do Brasil

Maria Aparecida Rodrigues de Souza1 , Renata Luiza da Costa1,


Beatriz Cebreiro López2.

1 Instituto Federal de Goiás, Brasil. mariaaparecida.rodriguesde@rai.usc.es; renata.costa@ifg.edu.br


2 Departamento de Didática Universidade Santiago de Compostela, Espanha. beatriz.cebreiro@usc.es.

Resumo. Visando descrever e interpretar como as universidades brasileiras preparam acadêmicos para o
processo de aquisição do conhecimento e seus impactos a partir do conhecimento das tecnologias digitais
de informação e comunicação, buscamos em documentos acadêmicos o que se diz sobre a (in)formação e
seu tratamento em nível universitário. Para tanto, partimos do pressuposto que os regulamentos
institucionais são base para construção dos currículos e, consequentemente, sua efetivação nos projetos
pedagógicos dos cursos. Selecionamos regulamentos relativos à organização didática de dez instituições de
ensino superior, no Brasil, para serem analisados. Foi utilizada uma abordagem qualitativa por meio de
análise de conteúdo. Os resultados mostraram que as instituições de ensino superior apresentam em seus
regulamentos indicativo de que a pesquisa, em sentido amplo, deve ser fomentada no universo acadêmico
por meio de recursos financeiros, tecnológicos e humanos.
Palavras-chave: Universidades; Currículo; Competência informacional; Investigação científica; Brasil.

Academic training to search for information and its relation with digital technologies: preliminary results
of the case of Brazil
Abstract. Aiming to describe and interpret how Brazilian universities prepare academics for the process of
acquiring knowledge, we seek in academic documents what is said about (in) formation and its treatment at
the university level. Based on the assumption that the institutional regulations are the basis for the
construction of curricula and, consequently, their effectiveness in the pedagogical projects of the courses.
We selected didactic organization regulations from 10 higher education institutions in Brazil to be analyzed.
A qualitative approach was used through content analysis. The results showed that higher education
institutions present in their regulations indicative that research must be fostered in the academic universe
through financial, technological and human resources.
Keywords: Universities; Curriculum; Informational competence; Scientific investigation; Brazil.

1 Introdução

O artigo apresenta resultados preliminares da investigação sobre o impacto das tecnologias digitais
de informação e comunicação (TDIC) no papel das universidades na formação de acadêmicos para
busca de informação. Este estudo apresenta componente metodológico com relevância ancorada na
importância do tema alfabetização informacional (Alfin) para a sociedade acadêmica, bem como no
estabelecimento de procedimentos didático-pedagógicos na formação de cidadãos críticos. O
problema investigado neste estudo se baseia nos conteúdos constituídos nos regulamentos relativos
à organização didática das universidades brasileiras acerca de formação para a busca da informação
e sua relação com as TDIC. O objetivo da pesquisa é descrever e interpretar a preparação dos
acadêmicos para a investigação científica, a partir do impacto das TDIC, no contexto das cinco
primeiras universidades brasileiras que estão no World University Rankings (CWUR-2015) e os cinco
primeiros institutos de educação científica e tecnológica inclusos nos dados do Índice Geral de Cursos
(IGC) de 2015. O índice leva em consideração o desempenho dos estudantes, a infraestrutura,

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formação dos professores e ainda indicadores da pós-graduação. Desse modo, tendo estudo
concluído, entende-se que será possível formular uma proposta de desenho didático-pedagógico que
atenda a sociedade do conhecimento no âmbito universitário.

2 Marco teórico

Os novos meios para acessar e apresentar o conhecimento demanda uma múltipla alfabetização que
culmina num novo modo de aprender, de ler e escrever que agrega às necessidades humanas mais
uma nova alfabetização: a alfabetização informacional (Alfin) (Cuervas, 2008). A Alfin implica em
ampliação das possibilidades do cidadão ter contato com a escrita, leitura e informação por meio das
redes de computadores. Sendo assim, o uso das TDIC nas práticas de Alfin torna-se parte das
atividades na educação do usuário para a informação.
A sociedade da informação trouxe uma nova abordagem sobre a questão da necessidade e utilização
da informação nos aspectos da vida educacional, profissional e social. Neste artigo, priorizamos o
aspecto educacional, elegendo os regulamentos de universidades e de institutos federais como
objeto para se perceber a formação para busca de informação para o aprendizado ao longo da vida.
No Brasil, ao longo dos anos, o acesso aos dados informacionais pelo cidadão tem avançado
gradativamente, segundo Trein e Vitorino (2015). No que se refere à transformação dos dados em
conhecimento ainda há um longo caminho, principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento
de competências informacionais. Ou seja, ainda é preciso avançar na formação de sujeitos capazes
de fazer uso adequado e assertivo da diversidade de dados disponíveis. Nesse sentido, Alfin é um dos
aspectos chave para o desenvolvimento do cidadão, embora sob este aspecto, o Brasil ainda carece
de investimento, formação e divulgação por parte da comunidade acadêmica.
De acordo com as diretrizes contidas no Livro Verde da Sociedade da Informação no Brasil: livro verde
(Takahashi, 2000, p. 45), educar em uma sociedade da informação significa, dentre outras coisas,
“[...] formar indivíduos para ’aprender a aprender’, de modo a serem capazes de lidar positivamente
com a contínua e acelerada transformação da base tecnológica”. Assim, “[...] os estudantes precisam
aprender a pensar racionalmente e criativamente, resolver problemas, localizar, administrar e
comunicar informação para estarem preparados para um mundo em constante mutação”
(Hatschbach, 2002, p. 11).

Uribe Tirado (2012) e Almeida (2014) constataram, em suas pesquisas, que três universidades
brasileiras, a Alfin foi incorporada de maneira comprometida, ofertando cursos atrelados à
aprendizagem para toda a vida com fins no desenvolvimento do pensamento crítico; cursos
específicos, imersos oficialmente nos currículos de distintos programas acadêmicos, para formar de
maneira transversal e disciplinar nessas competências. Diante da importância da temática surgiu a
preocupação de saber como a Alfin é tratada nos documentos acadêmicos de universidades e
institutos federais, conceituados no Brasil.

3 Metodologia

Foram consultados regulamentos disponíveis no sítio das dez instituições brasileiras de ensino
superior, selecionadas a partir dos critérios: ser pública e estar entre as cinco no ranking CWUR e/ou
no IGC. O conteúdo dos documentos foram analisados qualitativamente. A abordagem qualitativa se
constitui de um conjunto de técnicas de análise que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos
de descrição do conteúdo das mensagens (Bardin, 2011). Assim, a análise do corpus se desenvolveu
por meio de quatro fases interdependentes: pré-análise, exploração do material, tratamento dos

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resultados inferência e interpretação. Partimos da premissa que “[...] documentos são capazes de
oferecer um conhecimento mais objetivo da realidade” (Gil, 1996, p. 166). Portanto, esta pesquisa
exploratória se propõe a discutir, por meio uma análise qualitativa e descritiva, os corpus.

3.1 Análise e discussão

A formação para a busca de informação é um dos desafios mais atuais das universidades brasileiras
ante a possibilidade de acesso aos recursos de informação por meio digital (Almeida, 2014). Nesse,
cresce a necessidade de conhecer e aplicar critérios de seleção e avaliação da informação para
recuperar o que é pertinente e de maior qualidade. Frente a esta situação, as universidades têm, aos
poucos, incorporado esta formação, seja em programas oferecidos pela biblioteca ou mediante
inserção de disciplinas nos currículos (Uribe Tirado, 2012).
É com base no currículo que os professores devem se fundamentar para elaborar seus planos de
ensino. Então, na sociedade do conhecimento, para que o acadêmico receba formação para busca de
informação e ser capaz de operacionalizar as ferramentas computacionais, o currículo deve
contemplar o ensino das competências básicas de Alfin do tipo: buscar, identificar, selecionar
informação e produzir conhecimento.
Nesse sentido, buscamos, nos documentos acadêmicos, indícios de promoção de Alfin em
universidades brasileiras. Estes documentos têm sua importância na determinação da construção
dos currículos e propondo ao domínio de um conjunto de conhecimentos, métodos e técnicas que
devem conduzir os acadêmicos a uma progressiva autonomia na aquisição de informação. Na
concepção de Cebreiro (1999, p. 101, tradução nossa), “[...] os processos de ensino universitário
podem favorecer a construção de conhecimentos, destrezas, habilidades, atitudes, valores e,
contudo, a criticidade que permitam o desenvolvimento das pessoas como profissionais”. E mais,
pessoas capazes de utilizarem as TDIC para o longo da vida.
Tendo em vista que aos documentos acadêmicos competem guiar as ações dos docentes, analisamos
os regulamentos (Quadro 1) disponibilizados nos sítios das instituições de ensino superior
selecionadas. Devido ao grande quantitativo de instituições de ensino superior no Brasil, optamos
por analisar documentos de dez delas.

Quadro 1. Formação para busca de informação no Regimento Geral das Instituições selecionadas.

Instituição Citação
USP Artigo 198 - O docente em Regime de Turno Completo (RTC) deverá trabalhar vinte e quatro horas semanais
em atividades de ensino, pesquisa e extensão de serviços à comunidade.
http://www.leginf.usp.br/?post_type=resolucao&p=12843
UFRJ Art. 4º - Ao Chefe de Departamento compete: [...] V - zelar pela eficiência do ensino e pelo bom andamento das
pesquisas;
Art. 17 - A Câmara de Estudos Brasileiros compreenderá dois setores de atividades científicas e culturais,
destinadas ao debate e síntese. [...] Setor 2 - das pesquisas referentes ao progresso do conhecimento.
Art. 20 - A Superintendência de Difusão Cultural compreende: [...] 2 - Serviço de Documentação e Informação;
[...] Parágrafo único - No Serviço de Documentação e Informação inclui-se a Biblioteca Geral da Universidade.
Art. 29 - Ao Conselho de Ensino para Graduados compete: [...] 4- elaborar programas especiais [...] relativos a:
a) informações bibliográficas; [...] e) facilidades e melhorias das condições de infra-estrutura requeridas para a
execução de pesquisas.
Art. 282 - A pesquisa constituirá atividade obrigatória nas Unidades Universitárias, Museu Nacional [...].
Art. 284 - A participação ou execução de projetos de pesquisa, constituirá parte obrigatória nos programas dos
cursos para graduados [...]. https://www.iq.ufrj.br/arquivos/2014/08/Regimento_Geral_1970_atualizado.pdf
UNICAMP Artigo 27 - [...] carga horária de cada uma das disciplinas de graduação [...] abrangem as seguintes atividades:
[...] IV. Atividade Orientada [...] atividades semanais em que os alunos desenvolvem com autonomia seus
estudos, sem a presença do docente. [...] estão incluídas: [...] atividades em bibliotecas, [...], iniciação científica,

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[...]; http://www.dac.unicamp.br/portal/grad/regimento/
UFMG Art. 58. A pesquisa é atividade básica da UFMG, indissociável do ensino [...].
Art. 59. As atividades de pesquisa envolverão instrumentos de fomento, intercâmbio e disseminação, em
consonância com as diretrizes estabelecidas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
https://www2.ufmg.br/sods/Sods/Sobre-a-UFMG/Regimento-Geral
UFRGS Art. 67 - A pesquisa é o processo criativo que visa à produção do conhecimento.
Art. 76 - As atividades de pesquisa serão coordenadas por Comissão de Pesquisa, que exercerá as
competências definidas no Estatuto [...].
Art. 155 - A Universidade manterá mecanismos de desenvolvimento da pesquisa, cuja execução estará a cargo
das Unidades. http://www.ufrgs.br/consun/documentos/estatuto-e-rgu
IFMS [...] realizar e estimular a pesquisa aplicada, a produção cultural, o empreendedorismo, o cooperativismo e o
(Mato desenvolvimento científico e tecnológico; e promover qualificação de orientadores e estudantes em temas
Grosso do relacionados à pesquisa [...].
Sul) As políticas de pesquisa [...] fundamento nas premissas que buscam a integração e a articulação entre ciência,
tecnologia, inovação e conhecimentos específicos e do desenvolvimento da capacidade de investigação
científica, como dimensões essenciais à manutenção da autonomia e dos saberes necessários à formação de
um cidadão pleno e em exercício de atividade laboral.
Bolsas de Iniciação Científica [...] com a finalidade de fomentar a pesquisa científica e o desenvolvimento
tecnológico [...] visando à participação de servidores, docentes e técnico-administrativos, e estudantes, para
melhorar e consolidar a posição da Instituição junto à sociedade acadêmica e científica.
Disponibilização de revistas eletrônicas na rede integrada de computadores; - Disponibilização de links para
acesso a periódicos na rede integrada de computadores [...];
http://www.consultaesic.cgu.gov.br/busca/dados/Lists/Pedido/Attachments/473565/RESPOSTA_PEDIDO_pdi_i
fms_2014_2018_2edicao.pdf
IFTM Art. 3º. VIII. realizar e estimular a pesquisa aplicada, a produção cultural, o empreendedorismo, o
(Triângulo cooperativismo e o desenvolvimento científico e tecnológico;
Mineiro) Art. 12. VI. incentivar o trabalho de pesquisa e a investigação científica, contribuindo para a promoção da
ciência, da tecnologia e da cultura, bem como para o entendimento do homem e do meio em que vive;
Art. 187. A pesquisa, entendida como atividade indissociável do ensino e da extensão, visa à geração e à
ampliação do conhecimento, estando necessariamente vinculada à produção científica e tecnológica.
Unidade curricular: [...] 13. Tecnologias de informação e comunicação [...] tecnologia empregada: plataforma,
ferramentas específicas, recursos de multimídia, produção de material de apoio, atividades presenciais,
monitoria e outras informações relevantes.
http://iftm.edu.br/VIRTUALIF/DOCS/arquivos/decretos/decretos_2014-63_-_rod.pdf
IFRS Art. 62 As ações de pesquisa constituem um processo educativo para a investigação e o empreendedorismo,
(Rio visando à inovação e à solução de problemas sociais, científicos e tecnológicos.
Grande Art. 64 As atividades de pesquisa têm como objetivo formar recursos humanos para a investigação, a produção,
do Sul) o empreendedorismo e a difusão de conhecimentos culturais, artísticos, científicos e tecnológicos, sendo
desenvolvidas em articulação indissociável com o ensino e a extensão, ao longo de toda a formação
profissional. http://www.ifrs.edu.br/site/midias/arquivos/20107241783262regimento_geral_do_ifrs_05-08-
2010.pdf
IFFarroupi Art. 10. Os Cursos Superiores [...] estimularão a realização da pesquisa estimulando o desenvolvimento de
lha tecnologia, de forma criativa, e estendendo seus benefícios à comunidade [...].
http://w2.iffarroupilha.edu.br/site/midias/arquivos/2011123101934703reg_da_organizacao_didatica_dos_cur
sos_de_graduacao.pdf
IFS Art. 163. Constituem direitos do corpo discente: XIII. Ter acesso à biblioteca, laboratórios, sala de estudos e
(Sergipe) equipamentos destinados a estudos e pesquisas [...].
http://www.ifs.edu.br/images/1Documentos/Novembro12/rod.pdf
Fonte: Dados da pesquisa realizada em março/2017.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A partir dos dados do Quadro 1, observa-se que cinco universidades apresentam em seu
regulamento que o acesso e uso da TDIC é proporcionado para o desenvolvimento de pesquisa e
busca de informação; outras duas dizem que a infraestrutura para execução de pesquisa é viabilizada
pela instituição. Uma das universidades diz que o incentivo à iniciação científica é de
corresponsabilidade de toda comunidade científica, enquanto duas dizem ser prioritariamente do
docente; sete delas traz em seu regulamento a formação para busca de informação ser uma ação
setorial, seja da biblioteca, do laboratório de informática, do gerente de pesquisa, ou algo desse
gênero.
Pode-se observar que os institutos federais têm um regulamento diferente das universidades porque
apresentam maior preocupação com incentivo ao desenvolvimento de pesquisa científica e
tecnológico, suscitam a necessidade do domínio TDIC, conforme postulado por Cuervas (2008).
De maneira geral, observa-se que todas as universidades selecionadas regulamentam a iniciação
científica. Para tanto, a comunidade acadêmica necessita utilizar as TDIC para acessar as fontes
informacionais que lhes interessa. No entanto, somente três instituições apresentam, nos seus
regulamentos, orientações para utilizar as ferramentas e espaços do acesso à internet. Assim, se
confirma a teoria de Trein e Vitorino (2015): a educação superior carece de investimento em
infraestrutura e TDIC para efetivação da Alfin.
No regulamento de seis instituições é mencionada a oferta de curso de formação para uso de fontes
de informação, bem como atividades de orientação obrigatória para desenvolver pesquisa. No
entanto, a biblioteca como espaço de apoio à investigação e ao ensino ou de comunicação do
conhecimento, proposta por Dominguéz Aroca (2005), é citada somente em três documentos
analisados, não sendo possível a biblioteca universitária atingir o princípio de facilitar o acesso à
informação aos usuários (Hatschbach, 2002, Uribe Tirado, 2012). A não menção da biblioteca nos
documentos acadêmicos implica num déficit de formação acadêmica para a busca de informação por
meio da pesquisa e do acesso as TDIC. A citação pura e simples de incentivo ao desenvolvimento de
pesquisa acadêmica nos regulamentos de universidades, sem inserir a biblioteca e suas tecnologias
no universo pedagógico, dificulta a incorporação da Alfin comprometida.

4 Considerações para estudos futuros

A metodologia baseada em análise de documentos disponibilizados nos sites das instituições não foi
suficiente para afirmar se as dez instituições de ensino superior, consideradas de qualidade, pelos
indicadores do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ofertam
ou não Alfin. Neste sentido, em futuros estudos realizaremos pesquisa com os docentes e gestores
para gerar dados mais fidedignos do que acontece realmente nas instituições. O principal entrave
encontrado, até o momento, é que os regulamentos apontam a importância apenas de maneira
geral, seja por meio das bibliotecas ou pesquisas de maior âmbito na universidade, não
estabelecendo a necessidade do desenvolvimento da competência informacional também ao
trabalho pedagógico de maneira colaborativa e expressa no currículo.

Agradecimentos. À Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação do IFG pelo recurso financeiro disponibilizado a


esta pesquisa.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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Saúde Bucal Coletiva: o espaço pedagógico para o Sistema Único


de Saúde do Brasil

Irenilda Lemos¹ e Maria de Lourdes Vieira¹,

¹ Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Medicina. Programa de Pós-Graduação em


Ensino na Saúde. Brasil. irenildalemos@hotmail.com; vieiramlf@uol.com.br

Resumo. Este trabalho objetiva conhecer a percepção dos alunos sobre o aprendizado do/para o Sistema
Único de Saúde (SUS) na disciplina de Saúde Bucal Coletiva. O estudo é descritivo com abordagem
qualitativa, a partir de um grupo focal formado por alunos do curso de Odontologia de uma faculdade
privada no Nordeste. As categorias que emergiram foram: Aprendizagem sobre o SUS; Formação
profissional e Fragilidades e desafios. Os resultados apontam lacuna entre o plano de ensino e o
aprendizado do/para o SUS. Esse estudo proporcionou uma visão panorâmica da disciplina e os desafios
para transformar esse espaço pedagógico em um campo propício para o mercado atual.
Palavras-chave: Saúde Bucal; Educação Superior; Formação profissional; Educação em Odontologia; Sistema
Único de Saúde (SUS).

Collective Oral Health: the pedagogical space for the Unified Health System of Brazil
Abstract. This study aims to know the students' perception on learning about Unified Health System (SUS) in
the discipline of Public Oral Health. It’s a descriptive study with qualitative approach, from a focus group
formed by students of a private College in Brazil Northeast. The categories that emerged were: learning
about SUS; Vocational training and weaknesses and challenges. The results point to a gap between the
curriculum and the learning about SUS. This study provided a panoramic view of the discipline and
challenges to change this educational space in a field suitable for the current job market.
Keywords: Oral Health; Higher Education; Professional qualification; Education in Dentristy; Unified Health
System (SUS).

1 Introdução
A partir de 2002, as escolas responsáveis pela formação dos profissionais de Odontologia precisaram
adequar a sua matriz curricular, com o objetivo de atender aos novos desafios e demandas da saúde
bucal da população. Para isso, os Ministérios da Educação e da Saúde traçaram mudanças nos
processos formativos para os cursos da área da saúde, visando impactar de forma positiva as práticas
dos futuros profissionais (Ministério da Saúde, 2002).
O trabalho no Sistema Único de Saúde (SUS), as necessidades da atenção e cuidados em saúde bucal
da população exigem um profissional generalista, tecnicamente competente e com sensibilidade
social. Os ajustes necessários para adequar à formação dos graduandos de Odontologia, às
necessidades da população, refletiram diretamente no perfil desses profissionais (Brasil, 2002).
Assim, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) propõem avanços nos projetos pedagógicos,
valorizando, além da excelência técnica, a relevância social das ações de saúde, a partir do próprio
ensino (Morita & Kriger, 2004).
O Projeto Político Pedagógico (PPP) do curso de Odontologia deve nortear o processo formador dos
alunos, preparando o egresso com as competências exigidas para o atendimento no sistema de
saúde vigente no país. Deve estar aberto para que, de forma dinâmica, possa ser reavaliado e/ou

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reformulado mediante necessidades apontadas pelo contexto social/político e acadêmico em cada


Instituição de Ensino Superior (IES) (Ministério da Saúde, 2006; Cavalheiro & Guimarães, 2011).
As disciplinas sociais e, em especial, a Saúde Bucal Coletiva (SBC) devem ganhar força e significado no
intuito de consolidar transformações plenas no currículo e no campo de práticas do próprio ensino.
Essa disciplina favorece melhores possibilidades para o aluno enxergar o seu futuro profissional
inserido no SUS (Xavier, 2013).
A motivação dos professores universitários, as adequações nas matrizes curriculares para um
currículo integrado, organizado por linhas do cuidado e a inserção precoce dos alunos no serviço são
pontos estruturantes para uma melhor formação na área de saúde (Peixoto, 2013).
Analisar o espaço pedagógico para a formação do Cirurgião Dentista (CD), através da percepção dos
alunos, é oportuno e pode contribuir para a consolidação das mudanças necessárias. A necessidade
de identificar o conhecimento dos alunos sobre os princípios do SUS e sua aplicabilidade, assim
como, verificar se as competências elencadas pelas DCN para o egresso da Odontologia são
percebidas por eles exigem uma constante reflexão e justificam este estudo. Seu objetivo é conhecer
a percepção dos alunos de Odontologia sobre o aprendizado do/para o SUS na disciplina de Saúde
Bucal Coletiva.

2 Percurso Metodológico

O presente estudo foi estruturado como uma pesquisa exploratória descritiva de abordagem
qualitativa, utilizando-se a técnica de Grupo Focal (GF) para a coleta de dados. Este tipo de estudo
tem demonstrado vantagens para a compreensão da problemática educativa, no campo da saúde,
por permitir a reflexão de forma dinâmica e a discussão de uma temática que faz parte da vida das
pessoas ali reunidas. Portanto, o GF representa um avanço técnico para a coleta de dados (Westphal,
Bógus, & Faria, 1996). Tal técnica facilita as discussões em grupo sem fugir das perguntas
disparadoras, estimulando as reflexões sobre o tema da pesquisa: Saúde Bucal Coletiva como espaço
pedagógico para o SUS do Brasil.
O local da pesquisa foi uma faculdade de Odontologia de uma instituição privada no Nordeste
brasileiro. Os sujeitos foram os alunos da primeira turma da nova matriz curricular, matriculados no
8º período, tendo como critério de inclusão ter sido aprovado na disciplina de Saúde Bucal Coletiva
III e como critério de exclusão ser reprovado na mesma.
Dentre os 57 alunos do 8º período, foram sorteados 10 para compor o GF. Conforme sugere a
literatura, o número de participantes pode variar de seis a quinze, permitindo a participação efetiva
e a discussão apropriada do tema no grupo. Os participantes do GF foram comunicados e
esclarecidos sobre o estudo e a metodologia que seria aplicada (técnica de GF) e assinaram o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (Trad, 2009; Backes, D.S., Colomé, J. S., Erdmann, R. H., &
Lunardi, V. L. 2011).
Os dados deste estudo foram obtidos através das transcrições das falas dos sujeitos no grupo focal
com roteiro semiestruturado da discussão. Foi utilizado o referencial de análise de conteúdo para
organizar os discursos coletados, segundo Bardin (2011). A transcrição de todas as falas do grupo
focal foi realizada pela pesquisadora. Os dados coletados foram descritos segundo conjuntos de
categorias analíticas, conforme Bardin (2011), permitindo uma análise reflexiva que respondesse aos
objetivos propostos.
Cada participante recebeu uma codificação aleatória com a letra A (aluno) seguida por um algarismo
arábico em ordem crescente, de acordo com o aparecimento da fala no GF. E o texto foi adequado às
normas da American Psychological Association -APA conforme Lopes, C. (2013).
Este estudo foi aprovado pelo CEP/UFAL, parecer número 552224 (CAAE: 26216914.0.0000.5013).

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3 Resultados e Discussão

As repercussões da diversidade de trajetórias e como percebem o aprendizado sobre o SUS e seu


contexto na graduação serão aqui apresentadas.
Após inúmeras leituras flutuantes emergiram as seguintes categorias: Aprendizagem sobre o SUS;
Formação profissional e Desafios na formação.

3.1 Aprendizagem Sobre o SUS

A importância do aprendizado sobre o SUS, sistema de saúde com um alcance e uma complexidade
tão abrangentes, é reconhecida pela maioria dos alunos. No entanto, a superficialidade com a qual o
tema é tratado no GF nos faz refletir de que forma a disciplina de SBC e as metodologias utilizadas
por ela poderão contribuir para a saúde bucal nas comunidades, onde os futuros egressos exercerão
sua profissão.

“Eu acho que o SUS deveria ser um tipo de matéria que a gente visse do início do
curso até o final”. (A1)
“A gente vê muito superficial, muito superficial”... (A8).

Os novos espaços são fundamentais para a formação profissional. Como afirma Silveira (2004), o
processo de ensinar e aprender transcende os conhecimentos das ciências e das técnicas. O
professor de Odontologia precisa provocar reflexões para o pleno atendimento no SUS.
Para Carvalho, Ceccim (2006), a disciplina de SBC assume destaque como espaço propício para o
aprendizado sobre o SUS. Precisa estar integrada com os demais atores envolvidos no processo de
formação não apenas na academia, mas também no serviço/comunidade para, assim, potencializar
esse campo de produção de conhecimento e formação profissional.
Os sujeitos deste estudo, alunos do 8º período de uma matriz curricular de Odontologia, com
propostas de mudanças importantes na formação para o trabalho no setor público, apontam uma
distância entre o plano de ensino e o aprendizado dos princípios do SUS.
Ficou evidente a dificuldade dos alunos em identificar ou comentar sobre os princípios do SUS, que,
segundo Lucietto (2011), são considerados requisitos básicos para o exercício pleno da profissão,
fato preocupante, uma vez que esse aprendizado deve nortear a sua formação e favorecer o seu
desenvolvimento profissional.
Quando indagados sobre quais princípios do SUS eles observavam na prática da disciplina de SBC, o
silêncio descrito abaixo, para responder a essa pergunta norteadora, causou inquietação, conforme a
sequência das falas dos alunos, abaixo.

(Silêncio...) “Na teoria é evidente, está lá...” (A5).


“Fale!”. (A4).
“Na verdade tinha essa integralidade, multidisciplinaridade e os outros
profissionais de outras áreas. Era a integralidade que a gente viu na prática do
SUS, dos princípios do SUS” (A7).

O princípio da integralidade, aqui expressa, e compartilhada pela maioria dos alunos, parece estar
associado à prática do cuidado de forma multidisciplinar e não na integração dos processos de
trabalho, tendo como modelo de atenção integral à saúde. “Um modelo “integral”, portanto, é
aquele que dispõe de estabelecimentos, unidades de prestação de serviços, pessoal capacitado e

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recursos necessários à produção de ações de saúde que vão desde as ações de promoção da saúde
até ações de assistência e recuperação de indivíduos enfermos” (Teixeira, 2011).
A compreensão de que o paciente deve ser olhado de uma forma integral e que a integração entre os
profissionais deve existir é ponto de partida para a reflexão holística na atenção e no cuidado em
saúde (Domingos, Moratelli, & Oliveira, 2011).

“A gente aprende aqui uma coisa e se depara com a realidade totalmente


diferente [...] a gente passa e desaprende a teoria, porque a vida do dentista, ela é
muito prática” (A1).
O fato destacado pelo aluno 1, quando diz: “a gente passa e desaprende a teoria” reforça a
necessidade da utilização de metodologias que contribuam para a consolidação do conhecimento de
forma dinâmica, sedimentando a aprendizagem significativa de Novak, Cañas (2010). Aprender com
a realidade e solidificar o saber técnico-científico, adquirido ao longo da formação profissional,
fortalece a educação de adultos, estudada por Paulo Freire (1996).
Peixoto (2013) em sua pesquisa identificou o descontentamento dos egressos quando iniciam suas
atividades profissionais. Segundo esse autor, a formação acadêmica mais ajustada com as diretrizes
do SUS ligando teoria e prática deverá favorecer a concretização das mudanças esperadas para os
serviços de saúde.
3.2 Formação Profissional

O estudo sobre o perfil do CD brasileiro, da Estação de Pesquisa de Recursos Humanos em Saúde


Bucal da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo aponta aumento de 49% de
dentistas que atuam na rede pública do SUS (CFO, 2010).
Os alunos percebem que as mudanças curriculares do curso de graduação de Odontologia têm como
finalidade adequar a necessidade de recursos humanos para o trabalho no sistema de saúde vigente
no nosso país.

“O MEC, ele tem como eixo principal, a formação em Saúde Coletiva [...] por conta
do mercado... as coisas mudam com o tempo” (A6).

A Estratégia de Saúde da Família (ESF) funciona como porta de entrada para a Atenção Primária à
Saúde e segundo alguns autores, quando este nível de atenção está bem organizado, consegue
resolver aproximadamente 85% das necessidades de saúde da população. O fortalecimento da
Atenção Básica (AB), portanto resultará na diminuição das demandas nos níveis secundário e
terciário, o que representa diminuição dos altos custos com esse setor e, principalmente, um menor
dano à saúde da população (Paim, 2006; Lemos, Morita, & Carloto, 2014).
A inclusão da Equipe de Saúde Bucal na ESF foi uma das propostas mais importantes para a mudança
no funcionamento dos serviços e da atenção à saúde. Reorganizar as estratégias eficazes para lidar
com as demandas da sociedade exige novas habilidades e competências para a formação dos
profissionais do século XXI. “Art. 4º A formação do Cirurgião Dentista tem por objetivo dotar o
profissional das seguintes competências e habilidades: I - Atenção à saúde; II - Tomada de decisões;
III - Comunicação; IV - Liderança; V - Administração e gerenciamento e VI - Educação permanente”
(Brasil, 2002).
Observou-se que os alunos expressam preocupações com a formação generalista e com o mercado
de trabalho, principalmente quando egressos e ainda sem consultório montado.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

“Quando a gente sai, geralmente, a maioria das pessoas vai diretamente pro SUS
[...] precisa trabalhar no SUS. Não tem dinheiro para montar logo seu consultório
pra trabalhar e precisa trabalhar no PSF” (A2).

A expressão “precisa trabalhar no SUS” ecoa como uma exigência do contexto profissional e não
como uma opção ou escolha pessoal. Essa etapa é como um degrau para alcançar o almejado
consultório particular. Portanto, a ESF passa a ser vista como uma estação de passagem e não a
chegada. Isso, certamente afetará o seu comprometimento com a comunidade, equipe de trabalho e
planejamento das ações de promoção e prevenção em saúde.
Outro fato importante encontrado por vários pesquisadores sobre a formação para o SUS indica que
os alunos continuam sendo preparados dentro de uma concepção que privilegia a abordagem
individual e curativa, restrita ao atendimento em consultórios. E se sentem despreparados para
transcender esse espaço e propor intervenções, ações e diagnósticos para o coletivo. (Morita &
Kriger, 2004; Carvalho & Ceccim, 2006; Cavalheiro & Guimarães, 2011; Noro & Torquato, 2011; Reis
& Cicillini, 2011; Xavier, 2013).

“É muito fácil, tá cuidando do dente é maravilhoso, mas são realidades diferentes


[...] Eu acho que a gente devia ser melhor preparado...pra essa questão...de poder
ser um profissional de saúde, de educar no SUS..., e é melhor já começar na
faculdade” (A1).

Os alunos expressam estar disponíveis para acolher saberes e espaços, além da “boca”. Portanto, a
atenção à saúde centrada nos princípios que interferem na qualidade de vida, manutenção e
restabelecimento da saúde individual e coletiva pode favorecer o trabalho no SUS.

“...termos uma oportunidade de criarmos uma estratégia multidisciplinar. Nós


sentarmos juntos e planejarmos algum bem para a comunidade, independente de
qual situação nós estejamos”(A4).

Galassi (2006) diz que a sala de aula não pode ser entendida e se limitar a um espaço físico dentro da
IES. O aprendizado que tem um embasamento teórico sólido e a vivência em diversos espaços
pedagógicos facilitarão o desempenho nos mais diversos cargos e funções, que porventura possam
surgir na sua carreira profissional, inclusive gestão e planejamento, como revelam os alunos abaixo:

“Eu vou trabalhar numa prefeitura aí, da vida, ... ou convidada pra ser uma
Secretária da Saúde. Você vai ter que correr muito atrás pra saber desenrolar, pra
saber o que você vai fazer,... por onde você vai começar? Quais os instrumentos
que você vai utilizar? Entendeu? acho que falta isso.” (A1).

O fato é que os alunos não se sentem prontos para o exercício da profissão, no termino do curso. O
próprio mercado de trabalho pede que recebam essa qualificação no aprendizado, já na graduação,
como forma de minimizar as limitações no desempenho profissional para o atendimento na ESF. Essa
preocupação foi observada:

“Deveria ter um olhar diferenciado para o SUS, dentro da Faculdade. Quando a


gente se forma, começa a ser um profissional de saúde, aí complica” (A1).

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Quando questionados sobre o aprendizado relevante na disciplina de SBC para seu futuro
profissional, os alunos se referiram às competências recomendadas para sua formação, assim como
orienta as DCN.

“O que ficou aprendido pra mim foi isso... a equipe multidisciplinar” (A7).

A integração dos diversos atores da equipe multidisciplinar é fundamental para a resolução dos mais
diversos problemas de saúde. Para eles, o atendimento contínuo e integrado às demais instâncias da
rede proporcionam a resolutividade no âmbito individual.

“Aprender mais nessa matéria é com relação à referência e contra referência.


Trabalhar o paciente como um todo, né?” (A6).
“[...] como ele chega (paciente) e como vamos solucionar aquela necessidade.”
(A4).

Eles reconhecem alguns avanços na adequação da nova matriz curricular para a faculdade onde
estudam e aponta, principalmente, a integração das disciplinas na clínica, benéfica para a formação
do CD.

“As disciplinas devem ser integradas, então houve na verdade uma adaptação a
essa exigência do MEC” (A7).
“[...] suprir necessidades das grades antigas que era dividida. Nós tivemos a
vantagem de começarmos mais cedo na clínica” (A4).
“Eu acho que a gente teve um ganho, pois aumentou muito a questão da prática,
você também tem a clínica mais cedo. Acho que a gente ganhou com isso, nessa
questão” (A1).

Mesmo destacando a prática mais cedo na clínica, o que não deixa de ser uma visão tecnicista, os
alunos são favoráveis à integralidade na clínica e a vê adequada ao novo currículo. Vale destacar que
a formação para o SUS não tem por objetivo inviabilizar a ótica dos procedimentos técnicos na
odontologia. Xavier (2013) enfatiza que precisaremos realizar procedimentos odontológicos por
muito tempo, para sanar os problemas bucais pré-estabelecidos. Também afirma que o SUS enxerga
a necessidade das práticas especializadas e profissionais da Odontologia, com competências e
habilidades, em seus diferentes níveis de atenção no serviço público.

3.3 Desafios na Formação

Atualmente, um dos pilares da formação na graduação em Odontologia é educar o profissional com


perfil generalista. Porém, há uma inversão de aspirações para a formação, percebida na fala do aluno
6, ao reforçar a importância da especialização e fragmentação do aprendizado.

“O que é dado na faculdade tá ótimo... quem gostar mesmo tem que fazer um
curso decente em Saúde Coletiva. Tem que estudar, estudar e fazer uma
especialização... quem tiver afinidade e gostar tem que correr atrás e fazer
especialização” (A6).

Estudos sobre a formação para a Odontologia revelam que os alunos ainda buscam sua qualificação
dentro de uma expectativa pessoal, voltada para o atendimento individual e especializado na ação
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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

curativa, reparadora e tecnicista. O aprendizado e a tecnologia são disputados muito mais pelo seu
valor econômico, frequentemente, estimulado por professores da área (Villalba, Madureira, &
Barros, 2009; Noro & Torquato, 2011; Reis & Cicillini, 2011).

“[...] tem pessoas que não gostam, né? Tem que respeitar. Não, não gostam e
dizem: não quero trabalhar com essa parte da Saúde da Família” (A2).
“ Tem aquele que quer só ficar no consultório” (A1).

Cabe aqui uma reflexão para a equipe envolvida no processo de formação e escolas que implantaram
as mudanças curriculares. Estamos organizados para formar profissionais com ênfase para trabalhar
no SUS e seu contexto? Ou, para atender a expectativa pessoal, que privilegia a especialização e o
atendimento individual?

“É você olhar não só a boca do paciente...” (A10).

O aluno resume com essa frase a nova fase para a formação do profissional de Odontologia. Esse é
um desafio presente, tanto no meio acadêmico como também para os gestores da saúde. É
imprescindível que haja coerência entre a formação e as exigências esperadas para a atuação
profissional. O que implica, portanto, uma postura social e política para o trabalho em saúde
(Carvalho & Ceccim, 2006).
Lemos, Morita, Carloto (2014) destacam que as mudanças curriculares dos cursos de graduação não
foram suficientes para provocar, em grande parte dos alunos e professores, o reconhecimento da
saúde pública, como uma importante área de trabalho.
O aumento das especializações, segundo Carvalho, Ceccim (2006), não garante a satisfação da
população e melhoria do atendimento nos serviços de saúde. Eles afirmam que precisamos de
profissionais para gerir sistemas e serviços de saúde por terem domínio no campo da Odontologia e
não por serem administradores.
Esse ainda é um dos desafios do ensino para o SUS na formação básica. Portanto, entender a
dinâmica local das instituições, professores ou futuros egressos e como reagem às propostas de
mudanças é fundamental para a construção da formação profissional.

4 Considerações Finais

A realização desta pesquisa proporcionou uma visão panorâmica sobre a disciplina de Saúde Bucal
Coletiva e os desafios que os professores precisam enfrentar para transformar esse espaço
pedagógico em um campo propício para o mercado profissional atual, principalmente, no que se
refere às aproximações do aprendizado sobre o Sistema Único de Saúde na teoria/prática e
academia/comunidade local.
Observou-se que a maioria dos alunos reconhece a necessidade de uma formação generalista, com
competências e habilidades no atendimento individual e, principalmente, no coletivo. Porém, ainda
há uma distância entre a fala e o movimento em busca dessa preparação para o Sistema Único de
Saúde.
Conhecer a percepção dos alunos sobre o aprendizado no/para o Sistema Único de Saúde, traz
importantes discussões para os profissionais envolvidos na formação superior, dando subsídios para
os reajustes necessários na matriz curricular que se propõe a melhorar a qualidade da atenção à
saúde pelo futuro egresso.
Neste contexto, propõe-se que é necessário investir em metodologias de ensino-aprendizagem que
viabilizem o planejamento pedagógico instituído para o curso e que possibilite a realização de todas
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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

as etapas e procedimentos previstos para o aprendizado sobre o SUS, seus princípios e contexto,
tanto na disciplina de Saúde Bucal Coletiva como nas demais que integram o currículo.
Esta pesquisa remete para novos estudos qualitativos sobre o tema em foco, a fim de responder
muitos questionamentos suscitados na análise dos dados, já relatados na apresentação dos
resultados e discussão. Porém, a partir dos resultados encontrados, como exigência do Programa de
Pós graduação, é necessário desenvolver e aplicar um produto de intervenção. Então, foi
desenvolvido um produto educacional formado por uma programação de oficinas de planejamento
educacional e de metodologias ativas motivadoras que vêm transformando, para melhor, a formação
do CD para atender as demandas do SUS do Brasil.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Las “buenas prácticas evaluativas” desde la mirada de los


docentes pares en la universidad. Aporte de las encuestas en línea

Ángela Teresa Kaliniuk1, Gloria Santa Núñez1, Carolina Sandra Gabriela Bobadilla2, Rocío Mariel
Obez1, Lucrecia Emilia Ghione3,
1
Departamento de Ciencias de la Educación, Facultad de Humanidades, Universidad Nacional del
Nordeste, Argentina. litakaliniuk@gmail.com; glorian.nunez@gmail.com; rocio.obez@gmail.com
2
Facultad de Arquitectura y Urbanismo, Universidad Nacional del Nordeste, Argentina.
carito376@gmail.com;
3
Facultad de Ciencias Exactas y Naturales y Agrimensura, Universidad Nacional del Nordeste, Argentina.
lucreciaghione@yahoo.com.ar

Resumen. La comunicación se enmarca en el proyecto de investigación: “La evaluación didáctica en


profesores universitarios expertos de la UNNE” implementado en Unidades Académicas de la Universidad
Nacional del Nordeste, Argentina. La investigación se enmarca, desde el paradigma interpretativo
constructivista, en el enfoque cualitativo, pretende dar cuenta de la comprensión del conocimiento de los
profesores expertos y cómo han ido resignificando la evaluación de los aprendizajes en el conocimiento
profesional docente. En este informe de avance se discurre acerca de la implementación de encuestas en
línea, destinadas a “docentes pares”. Nuestro interés se centró en localizar y estudiar a los profesores de
dos unidades académicas, Ciencias Exactas y Humanidades, para aproximarnos a las concepciones y las
representaciones que subyacen en sus prácticas evaluativas. Así como también, explicar el impacto que tuvo
en la metodología, la implementación de un software, en la etapa de recopilación de datos.
Palabras clave: buenas prácticas evaluativas; docentes expertos; educación superior; encuestas en línea;
investigación biográfico-narrativa

"Good evaluative practices" from the perspective of peer educators in the university. What the online
surveys provide.
Abstract. The communication is part of the research project: "The didactic evaluation in university
professors experts of the UNNE" implemented in Academic Units of the Universidad Nacional del Nordeste,
Argentina. The research is framed, from the constructivist interpretive paradigm, in the qualitative
approach, aims to give an account of the understanding of the knowledge of the expert teachers and how
they have been reframing the evaluation of the learning in the professional teaching knowledge. This
progress report discusses the implementation of online surveys aimed at "peer educators". Our interest was
to locate and study the professors of two academic units, Ciencias Exactas and Humanidades, in order to
approach the conceptions and representations that underlie their evaluative practices. As well, to explaining
the impact that had on the methodology, the implementation of a software, at the stage of data collection.
Keywords: good evaluative practices; Expert teachers; University education; online surveys; biographical-
narrative research

1 Introducción

El presente trabajo se desarrolla en el marco del Proyecto de Investigación PI 008/15-SGCyT UNNE:


“La evaluación didáctica en profesores expertos de la UNNE”. El interés investigativo del proyecto se
centra en los procesos de construcción de "buenas prácticas evaluativas" de profesores universitarios
expertos. Dichos procesos se presentan de modo permanente como un complejo entramado de
concepciones y conocimientos formales y sistemáticos; prácticos y normativos.

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Se trata de conocer y comprender cómo docentes expertos, han incorporado la evaluación didáctica
en la enseñanza universitaria para favorecer en ellos y en los estudiantes el desarrollo de
competencias para la autorregulación de sus aprendizajes.
Con respecto a la evaluación de los aprendizajes, nos enfocaremos en la evaluación formativa en la
enseñanza universitaria que impregna todos y cada uno de los componentes didácticos (objetivos,
contenidos, relación profesor-estudiante, estrategias, etc.).
La mayoría de los integrantes del equipo de investigación han trabajado en estudios que abordan el
análisis de los procesos de construcción y las manifestaciones del Conocimiento Profesional Docente
(CPD) de profesores de Nivel Superior. Las entrevistas en profundidad, los relatos de docentes
expertos de amplia trayectoria, en las unidades académicas involucradas; permitirán un
acercamiento comprensivo a la construcción de categorías teóricas referidas a la buena enseñanza,
en carreras de grado de diferente filiación disciplinar. Nuestro interés consiste en indagar en una de
las categorías conceptuales que se desprende de la investigación sobre el conocimiento profesional
docente: las prácticas evaluativas.
Al ejercer la docencia en la Universidad en carreras de formación docente, una preocupación
constante es la formación docente continua y los procesos de evaluación, preocupación que impulsa
la investigación en diferentes unidades académicas.
El objetivo principal de la investigación es: caracterizar las "prácticas de evaluación didáctica"1 como
manifestaciones del conocimiento profesional docente, en función de las distintas áreas de
conocimiento y comunidades académicas de pertenencia de los profesores participantes en la
investigación. Para contribuir con la elaboración de orientaciones para la formación docente inicial y
permanente de los profesores universitarios de la Universidad Nacional del Nordeste.

2 Encuadre Teórico

La problemática que moviliza la presente investigación hunde sus raíces teóricas en los orígenes de la
evaluación desde la perspectiva cualitativa, desde la mirada de la racionalidad práctica. En efecto,
nos posicionamos en la evaluación de aprendizajes buscando apartarnos de “enfoques”, así
denominados por House (2000), preocupados por el rigor metodológico y la medida, como los que
incluiríamos en la racionalidad técnica: particularmente la pedagogía experimental y la pedagogía por
objetivos (Tyler, 1950; Mager, 1962; Bloom, 1956 y Popham, 1975), enraizados en la tradición
positivista. Esta tradición aparece claramente descripta en el texto de Stufflebeam y Shinkfield (1987)
que da cuenta de la Historia de la Evaluación Educacional hasta los 80´ en Europa y EE.UU., donde las
políticas evaluativas impulsadas desde organismos nacionales -que en nuestro país se aprecian en la
década del 90´- responden al concepto de evaluación como accountability o rendición de cuentas.
Distintos especialistas aportaron a la construcción de una perspectiva alternativa que se acerca al
enfoque de la evaluación en sentido amplio: evaluación auténtica, evaluación democrática,
evaluación iluminativa y otras denominaciones, que muestran el surgimiento en la evaluación
educativa de modelos diferentes. Estos enfoques se preocupan por la descripción e interpretación
puntual de los fenómenos que suceden en cada momento del proceso educativo, así como también,
por las consecuencias que conllevan las actividades evaluadoras concretas para los sujetos
involucrados.
Como señala Álvarez Méndez (2001) “…son modelos que se encuadran en lo que se ha dado en llamar
globalmente evaluación cualitativa, para distinguirlas de otras formas, y cuyas bases conceptuales

1 Entendida como “un proceso que permite a partir del conocimiento y comprensión de cierta información, emitir un juicio de valor en
relación con ciertos criterios acerca de las prácticas de aprendizaje y/o las prácticas de enseñanza”- Steiman, Jorge (2008:127).

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entroncan con la Epistemología Genética, la Nueva Sociología, la Antropología y la Hermenéutica”.


Aquí se distinguen autores como Stake (1975), Mac Donald (1975), Stenhouse (1984), Kemmis
(1986), Elliot (1990), House (1994) Shepard (2000) y más recientemente Álvarez Méndez (2001),
Santos Guerra (1998), Gimeno Sacristán y Pérez Gómez (2005), Zabalza (2002).
El planteamiento principal desde esta perspectiva, se refiere a la comprensión que genera el proceso
de análisis de la información recogida durante la evaluación. En efecto, el juicio de valor se efectúa
sobre la base de un conjunto de informaciones que el profesor recoge sobre el trabajo académico de
los estudiantes en vista a la toma de decisiones. Como afirma Camilloni (2004), se recogen evidencias
de la realidad y de ello se derivan medidas que no sólo afectan a los alumnos, sino a todo el proceso
de enseñanza y aprendizaje. Ese quehacer conjunto – del docente y del estudiante- orientado por
principios morales, por actuaciones deseables, distingue particularmente a este tipo de enfoque. La
evaluación, como proceso dinámico, abierto, contextualizado y desarrollado durante un lapso de
tiempo, actúa al servicio del conocimiento.
La evaluación de aprendizajes en el nivel superior universitario, añade a su estudio otras
complejidades porque adquiere un carácter crítico especial, debido a la responsabilidad por la
acreditación de competencias profesionales, desde la función social de la misma. El aprendizaje no es
un proceso lineal. Se lo piensa como un proceso espiralado en permanente construcción, lleno de
contradicciones y altibajos, a partir del cual el sujeto de aprendizaje se interrelaciona activamente
con el objeto a aprender, apropiándose de él y produciéndose entonces mutuas modificaciones. La
evaluación de los aprendizajes, será entonces, el proceso de comprensión del camino realizado.
Incluirá la acreditación, ya que al acreditar, al certificar conocimientos curricularmente previstos, se
permite la movilidad de los alumnos en la institución y se cumple con el requerimiento social e
interinstitucional, pero cumplirá múltiples funciones.
Al respecto Ken Bain (2007) en su estudio sobre “Lo que hacen los mejores profesores en la
Universidad” menciona que, en el enfoque basado en el aprendizaje, el docente para evaluar “En
lugar de preguntarse si el estudiante dijo algo en clase o si hizo cierto trabajo asignado y sacó
determinada nota … pregunta ¿Qué tipo de desarrollo intelectual y personal quiero que disfruten mis
estudiantes en esta clase, y qué evidencias podré obtener sobre la naturaleza y el progreso de este
desarrollo?” (170)
En el aula universitaria, como espacio de encuentro, desde la actitud crítica del profesor, el educando
podrá construir críticamente su pensamiento. Con este propósito es imprescindible convertir el aula
en espacio donde se dan los aprendizajes y donde “… evaluar es hacer referencia a cualquier proceso
por medio del que alguna o varias características de un alumno, un grupo de estudiantes (…)reciben
la atención del que evalúa, se analizan y valoran sus características y condiciones en función de unos
criterios o puntos de referencia para emitir un juicio que sea relevante para la educación” Gimeno
Sacristán (2005:338).
Los docentes expertos –como señala Bain- convierten el aula en espacio de encuentro y aprendizaje.
¿A quienes denominamos profesor experto? La categoría de profesor experto aparece como opuesta
a la de profesor novel o novato. Un docente experto es aquel que tiene acumulado un extenso y
vasto rango de experiencia situacional, a partir del cual puede adoptar decisiones inteligentes,
basándose más en la intuición que en el seguimiento de un modelo «racional» o en unas pautas de
acción «descontextualizadas» (Ángulo Rasco, 1999: 289-290). La experticia supone
fundamentalmente buena enseñanza, tanto por los logros de aprendizaje de los estudiantes como la
calidad de lo que se enseña. Experimentado no es sinónimo de profesor experto, la experticia refiere
a la acción docente altamente competente, basada en la excelencia académica del conocimiento
disciplinar y docente, que tiene un conocimiento extremo de su materia, una comprensión amplia de
la educación y de los procesos de aprendizaje.

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Cuando hablamos de docente experto inmediatamente pensamos en la buena enseñanza. Porta y


Álvarez (2008) mencionan estudios realizados por Fentermacher (1989), Fentermacher y Richarson
(2005) quienes argumentan que la enseñanza de calidad puede ser entendida como aquella
enseñanza que produce aprendizajes -en términos de logro- y que estos autores denomina como
exitosa.
Bain (2007) hace referencia a profesores que conseguían muy buenos resultados educativos y
ayudaban a sus estudiantes a aprender. La docencia, se inicia cuando el docente reflexiona sobre qué
es lo que debe ser aprendido, cómo aprende el estudiante y cómo será evaluado. La evaluación se
transforma en una oportunidad de aprendizaje socialmente valioso, coherente con la buena
enseñanza e implica un compromiso con el conocimiento, con la transposición didáctica y con el
alumno.
Como menciona Alcalá (2013) una de las caracterizaciones más relevantes del Conocimiento
Profesional Docente, es la distinción entre conocimiento formal y práctico de Fenstermacher (1994),
quien considera que son conocimientos epistemológicamente diferentes. Encontramos
conceptualizaciones que integran los aspectos formales y prácticos, como ser Gimeno Sacristán
(1997) afirma que “el profesor posee significados adquiridos explícitamente durante su formación y
también otros que son resultado de experiencias continuadas y difusas sobre los más variados
aspectos que podamos distinguir en un curriculum: contenidos, destrezas, orientaciones
metodológicas, pautas de evaluación”(212).
El desarrollo profesional implica además, interacción con los contextos espacio-temporal. Es decir al
ambiente social, organizativo y cultural en el que los docentes trabajan se une la dimensión temporal
o biográfica que va a influir fundamentalmente en la actitud del sujeto hacia el desarrollo
profesional.
En los últimos años han surgido en Argentina nuevas propuestas respecto de la función de la
evaluación y a la evaluación de los aprendizajes, en la educación superior, así como también el
interés de trabajar con criterios de evaluación en las aulas universitarias.
En efecto, una serie de cambios contextuales impactaron en la educación superior durante los
últimos treinta años y el campo de la evaluación de aprendizajes no es ajeno a esas
transformaciones, que se enmarcan en el proceso de evaluación institucional. Desde el análisis de
Graciela Giangia como (2005) quien menciona que entre representantes de las diferentes
universidades argentinas que participaron en encuentros y talleres, se advierte claramente cómo se
va instalando y transformando el sentido de la evaluación, desde un instrumento de garantía pública,
en un instrumento para mejorar la calidad de la educación, y como insumo fundamental para el
cambio.
Considerando la evaluación como parte del conocimiento profesional docente, en esta investigación,
también tenemos en cuenta los principales antecedentes respecto al Conocimiento Profesional
Docente (CPD) en docentes expertos universitarios, como son las investigaciones realizadas por la
mayoría de los miembros del equipo. Nos referimos específicamente a proyectos anteriores:
"Construcción del Conocimiento Profesional Docente en la Universidad" (2011) donde analizamos
seis casos de docentes expertos en cada una de las siguientes unidades académicas: Ingeniería,
Ciencias Económicas y Medicina. También constituye un antecedente el proyecto "El Rendimiento
Académico de estudiantes de la Facultad de Humanidades" (2010), “Concepciones sobre
conocimiento en profesores y estudiantes de carreras de formación docente” (2008), así como
también el proyecto de tesis de posgrado llevada adelante por la directora de este proyecto, en
cuanto a prácticas evaluativas de docentes universitarios.
El Conocimiento Profesional Docente acotado al ámbito de la enseñanza universitaria tiene ciertas
características particulares, es distinto a otros tipos de conocimientos profesionales porque es
esencialmente práctico y epistemológicamente diferenciado, señalan diferentes especialistas como

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Alcalá (2008) y Porta y Sarasa (2008). Su construcción es gradual y progresiva, a partir de las
concepciones de los profesores, sus obstáculos y sus posibles hipótesis de progresión que facilitan su
evolución (Porlán y Rivero, 1998).
El objeto de estudio de esta investigación es la evaluación didáctica entendida “como un proceso que
permite a partir del conocimiento y comprensión de cierta información, emitir un juicio de valor en
relación con ciertos criterios acerca de las prácticas de aprendizaje y/o las prácticas de enseñanza” en
profesores expertos, en un contexto académico e institucional con características que lo condicionan
y que posibilitan tomar decisiones referidas a las prácticas de referencia. Siguiendo a Steiman (2008),
entonces, este concepto de evaluación es mucho más abarcativo, ya que habitualmente se relaciona
con parciales, finales y notas, sin mencionarse que también el docente, la enseñanza es objeto de
evaluación. En este proceso de evaluación está incluida la acreditación, entendida como
reconocimiento institucional de los aprendizajes adquiridos por los educandos, que se constata por
medio de algunos instrumentos (exámenes escritos, exámenes orales, trabajos prácticos, otros).
Por lo expuesto se intentará comprender las singularidades del docente como sujeto, sus vivencias y
los procesos de pensamiento didáctico caracterizando su conocimiento profesional sobre la
enseñanza, el aprendizaje y la evaluación. Es también de interés comprender la interacción entre lo
individual y lo institucional así como los factores que influyen en ella y que hacen que el docente
vaya constituyendo su identidad.
En el presente estudio, se considera profesor experimentado a sujetos que tengan quince años de
ejercicio de la docencia. Los años de experiencia docente deben referirse al trabajo académico-
pedagógico en un mismo campo disciplinar, aunque se trate de diversas cátedras o asignaturas.
Otros criterios de selección de profesores expertos, en esta investigación, son:
- Profesores o docentes de cátedras de carreras de grado.
- Dominio del conocimiento disciplinar: expresado en la producción académica, la actualización de
los contenidos, conocimiento de la historia del campo disciplinar y sus principales discusiones,
docencia de posgrado, actividad científica reconocida públicamente por pares y estudiantes.
- Compromiso con la tarea docente: expresado en su interés y conocimiento de los procesos de
aprendizaje de los estudiantes en relación con la disciplina así como también su capacidad para
identificar los obstáculos pedagógicos y epistemológicos más frecuentes en el cursado de la
asignatura y actuar en consecuencia.
- Idoneidad didáctica: la capacidad para adecuar la evaluación de aprendizajes y la evaluación de la
enseñanza con las prácticas profesionales para las que prepara la carrera, los obstáculos de
aprendizaje antes mencionados; capacidad para elaborar propuestas de evaluación formativa.
- Reconocimiento de su actividad docente académica con relación a las prácticas evaluativas por
parte de estudiantes y docentes pares.
Atento a todo lo expresado, se propusieron los siguientes objetivos:
- Generar conocimiento científico sobre la utilización que hacen los docentes universitarios de los
criterios de evaluación en diferentes prácticas evaluativas, que contribuya a la reflexión respecto de
la evaluación de la enseñanza y del aprendizaje en el ámbito de la Universidad Nacional del Nordeste.
- Caracterizar las "prácticas de evaluación didáctica" como manifestaciones del Conocimiento
Profesional Docente, en función de las distintas áreas de conocimiento y comunidades académicas
de pertenencia de los profesores participantes en la investigación.
- Elaborar orientaciones y posibles dispositivos institucionales para la formación docente que
contribuyan a mejorar la formación de grado, referidos específicamente a la evaluación didáctica, en
el ámbito de la Universidad Nacional del Nordeste.
- Identificar y analizar las características que presentan las prácticas de evaluación didáctica y las
evaluaciones formativas de docentes expertos de la Universidad Nacional del Nordeste.

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3 Encuadre Metodológico

El objeto de estudio del proyecto se ubica en el ámbito de la Didáctica General y de la Didáctica de


Nivel Superior. Nos interesa indagar el conocimiento práctico-personal de los profesores respecto a
la evaluación de estudiantes y de su propia evaluación. En coherencia con lo anterior, planteamos la
investigación desde el paradigma interpretativo-constructivista.
Teniendo en cuenta la naturaleza del objeto de estudio, la investigación biográfica narrativa permite
dar una explicación científica y comprender un fenómeno social como es la enseñanza. El método
biográfico utilizado para la indagación no estructurada de las historias relatadas por los propios
sujetos en esta investigación, cobrará relevancia como consecuencia de la diversidad de sentidos
atribuidos por los profesores que serán entrevistados y los acontecimientos vitales por los que han
atravesado en un contexto socio-educativo en el que primó la diversidad de referencias.
El diseño inicial de la investigación preveía la selección de 10 casos en el ámbito de las siguientes
Facultades: Humanidades, Ciencias Exactas, Naturales y Agrimensura, Ciencias Económicas,
Ingeniería y Medicina. El objeto de estudio se indagaría a partir de la implementación de las
siguientes técnicas e instrumentos de recolección de información: Entrevistas semiestructuradas y en
profundidad para la construcción de los casos narrativos; Grupos de discusión; encuestas a
estudiantes (para la selección de los casos expertos); encuestas a pares docentes universitarios (para
la selección de los casos expertos). Se planificó que el análisis de la información incluyera: análisis
categorial de las entrevistas en profundidad y semiestructuradas; construcción de historias de vida
para los 10 casos narrativos; análisis documental (de los materiales curriculares y didácticos,
instrumentos de evaluación producidos por los dos casos docentes y de documentos personales que
aporten al estudio). En este contexto, las fuentes de datos a emplear serían: Transcripción de
entrevistas; documentos personales de los docentes expertos entrevistados; materiales curriculares
y producciones docentes.
En la etapa de la investigación en la que nos encontramos podemos informar que se trabajó con 67
respuestas vertidas por colegas de las Facultades de Humanidades y Ciencias Exactas y Naturales y
2
Agrimensura de la UNNE. Durante la recolección de datos se realizó el diseño e implementación de
los instrumentos y también el análisis de los resultados obtenidos. Los instrumentos utilizados
fueron:
a- Encuestas a estudiantes: las mismas nos permitieron reconocer su percepción con relación a las
prácticas docentes y a las prácticas evaluativas, además de ser una de las fuentes de información en
el proceso de selección de los docentes. Fueron aplicadas sobre estudiantes avanzados (de tres
unidades académicas), que al momento de integrar la muestra cursaban el 3° año de sus carreras.
b- Encuestas a docentes universitarios: Se empleó para la selección de los casos de estudio.
Brindaron una aproximación a las actividades que ellos asocian con buenas prácticas evaluativas y
cuáles son los docentes pares que las llevan a cabo.
3
Al incorporar elementos contextuales propios de esta Universidad se hace notorio que los
colectivos, docentes y estudiantes, cuyos aportes se pretende triangular, difieren en cuanto a

2 A partir de ahora se usa el acrónimo FACENA.


3 Tales como la distribución espacial de las Unidades Académicas de la UNNE; el predominio de auxiliares en la docencia –
Jefes de Trabajos Prácticos y Auxiliares Docentes de Primera- con dedicación simple (10 hs. Semanales, destinadas
principalmente a actividades académicas) en las diferentes carreras; donde los procesos de enseñanza – aprendizaje se
desarrollan en contextos de masividad, fuerte deserción y heterogeneidad en cuanto a la formación de base; con el
desarrollo de programas institucionales de formación docente y la disponibilidad de infraestructura tecnológica asequible
a los integrantes de los equipos docentes. Esto y otros aspectos son observados y vivenciados por los integrantes del
grupo de investigación en su labor cotidiana y en los resultados de los procesos de evaluación institucional llevados a
cabo en la UNNE.

461
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

modalidades de trabajo y disponibilidades de tiempo, entre otras características. Por ello, se


implementó con los estudiantes un cuestionario impreso auto-administrado, en presencia de
integrantes del equipo de investigación. Con los docentes, no sólo hubo que decidir qué preguntar y
cómo hacerlo, sino que también hubo que innovar en la forma de implementarlo.
En este cuadro de situación, el grupo de investigación consideró la utilización de otras herramientas,
a partir del análisis de ventajas y limitaciones de diferentes alternativas. La encuesta en línea
diseñada en el formulario de Google, se consideró la mejor opción, por las siguientes razones:
- Los formularios en línea están pensados para acercarnos a determinados aspecto del objeto de
estudio incluyendo a los destinatarios. Se debe hacer uso de los mismos tomando en consideración
los marcos de interpretación culturalmente aprendidos de los sujetos a encuestar y de quienes
están llevando a cabo la investigación.
- El propio sistema procesa los datos ingresados por los encuestados en función a cómo se plantea la
pregunta. Corresponde al equipo de investigación “ordenar” las categorías y observarlas desde la
teoría y el contexto.
- Las encuestas en línea ofrecen flexibilidad en cuanto al diseño y la implementación. La elección de
determinadas opciones -de las disponibles en el software- tiene directa relación con la información
que se va a recoger.
- La elección de una o más preguntas con carácter obligatorio, con lo considerado prioritario,
permitirá una aproximación al objeto de estudio y a las posibilidades del análisis a la luz de un
marco teórico específico.
- La inclusión de indicaciones entre la pregunta y las opciones de respuesta o el espacio para
consignar sus observaciones, permite tender puentes con el encuestado, para facilitarle una
interpretación adecuada del interrogante.
- La posibilidad de inclusión de un texto de presentación en el que se explicita el contexto en el que
se aplicará el instrumento -así como datos de contacto del grupo de investigación, para la recepción
de consultas e inquietud- tratan de tornar más amigable el instrumento e incidir en la reticencia a
completarlo.
- Además hay que considerar que el formulario de Google es un recurso libre de licencia y no limita el
número de respuestas posibles.
En la reconstrucción del proceso de investigación iniciado -que no fue lineal-, a los fines de este
relato identificamos la siguiente “secuencia” de actividades:

2.1 En relación con la planificación


Definición de los ejes de la temática a trabajar: se procedió a “recortar” la realidad a estudiar,
pretendiendo describir e interpretar las prácticas evaluativas en el contexto institucional. Los
lineamientos que resultaron de esta etapa determinaron a quienes se incluirá en el estudio y cómo
se identificarían los aspectos del fenómeno estudiado. Ahí tuvieron fuerte incidencia los elementos
contextuales propios de la universidad y las posibilidades de acceder a los colectivos sujetos de
estudio.
Selección de la muestra: la representatividad de la muestra está dada por la elección de las Unidades
Académicas en las que se realizó el estudio, los integrantes de dichas comunidades a los que se
4
enfatizó en el relevamiento y la determinación del mínimo de respuestas necesarias . Las 67
respuestas analizadas constituyen una muestra significativa para la generación de respuestas.
Diseño del instrumento de recolección de datos: los objetivos de la investigación fueron
determinantes respecto a los interrogantes del formulario a confeccionar.

4 El trabajo de investigadores-docentes en diferentes unidades académicas permitió conocer con anterioridad la


composición de dichas comunidades y seleccionar estrategias de difusión.

462
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2.2 En relación con la organización


Análisis de la realidad situada de quienes iban a ser encuestados: los docentes trabajan en campus
universitarios y extensiones áulicas distribuidas en dos provincias del nordeste argentino, con diversa
disponibilidad horaria para el desarrollo de actividades académicas, extensión, investigación y
gestión; ajustadas a la dedicación de su cargo, y presentan distintas competencias tecnológicas. Por
ello se tomó en consideración la existencia de conexión a internet en los ámbitos de desarrollo de las
actividades docentes, los canales de comunicación y las motivaciones para responder a la consulta
sobre una temática que les genera inquietud e incertidumbre.
Conversión de un cuestionario a formulario en línea: Se diseñó la encuesta contemplando las posibles
condiciones de los destinatarios de la encuesta, seleccionado el tipo de pregunta, atento al
procesamiento del software. Se optó por compartir el enlace de la encuesta a partir de correos
electrónicos.
Comprobación de su validez y confiabilidad: construido el formulario en línea, se procedió a su
administración entre los integrantes del grupo de investigación y otros docentes. A partir de la
sistematización de las experiencias de quienes completaron las encuestas, se mejoró el diseño inicial.

2.3 Aplicación de la modalidad de trabajo seleccionada


Pasos previos a la implementación: se informó de la propuesta de investigación a los responsables
académicos de las diferentes facultades, solicitando el apoyo para la difusión del instrumento y
requerimos las direcciones de correo electrónico de los docentes a los que se iba a enviar el enlace
de la encuesta. Complementamos esta acción con llamadas telefónicas, contactos personales,
mensajes de whatsapp a docentes conocidos a los efectos de motivar la recepción de respuestas.
La encuesta propiamente dicha: El instrumento de recolección de datos merece un apartado especial
en esta presentación atento a que normalmente se asocia a la lógica cuantitativa, por las ventajas
antes mencionadas, fue sumamente beneficioso su utilización en esta investigación cualitativa. Es
una encuesta de carácter exploratorio, porque permite una primera aproximación a las concepciones
de evaluación de los aprendizajes y de las “buenas prácticas evaluativas” de los docentes. Ella está
orientada a recoger las opiniones de estos docentes universitarios. Fue aplicada por medio de un
formulario en línea, y nos permitió identificar a los futuros casos de estudio.
La encuesta está compuesta de:
- Título, allí se deja constancia del público al que está destinado el instrumento.
- Presentación del proyecto en el que se enmarca la aplicación de la encuesta, que se realiza
intentando no orientar las respuestas de los docentes.
- Preguntas que permiten contextualizar la muestra, y que incluyen la carrera de pertenencia, cargo
que ocupa y nivel de la carrera en el que se desempeña con el cargo antes mencionado. Todas
estas preguntas son cerradas y politómicas. Para la primera de estas tres preguntas se decidió que
su modalidad fuera la de “casilla de verificación”, permitiendo al encuestado seleccionar más de
una opción de las disponibles. Esta decisión tiene que ver con que los docentes, en su mayoría con
dedicación simple, cumplen sus funciones en más de una carrera. Al indagar acerca del cargo que
ocupa y nivel de la carrera se decidió hacerlo bajo la modalidad de lista desplegable, que les
permite en cada uno de los casos seleccionar una única respuesta de entre las posibles. Todas estas
preguntas son obligatorias.
- Preguntas que atañen a la temática específica sobre la que se quiere indagar: son concretamente
las relacionadas con la caracterización de las buenas prácticas evaluativas y las de los docentes que
las llevan a cabo. Son preguntas cerradas de opción múltiple, que en el diseño del formulario se
determinó que fuera de carácter obligatorio y planteado desde la opción casilla de verificación. Las
opciones propuestas como posibles respuestas surgieron de la bibliografía recopilada sobre la

463
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temática y el orden en el que fueron consignadas en el instrumento guarda relación con la


experiencia en investigaciones cualitativas en educación superior.
- Preguntas de profundización: de tipo abierta, para que el encuestado pudiera consignar otras
características de las buenas prácticas evaluativas así como las cátedras y docentes que las llevan a
cabo. Se usó la opción párrafo - texto de respuesta largo del formulario, limitando la cantidad de
caracteres a 3000 pero sin señalar restricciones respecto del contenido.
Período de cierre de respuestas: la apertura del formulario se realizó durante un período de 30 días,
desde el 20 de noviembre y hasta el 20 de diciembre de 2016, que corresponde con el último mes del
ciclo académico para Argentina.

2.4 En relación con el análisis


Visualización de las respuestas: la elección del software permitió acceder a la representación gráfica
generada automáticamente, lo que implicó reducir el “tiempo” de procesamiento. El software
permitió acceder a vistas que proporcionaron diferentes de la información.
Opciones de análisis: permitió la identificación de otros aspectos del objeto de estudio. Entrecruzado
con la experticia de los integrantes del equipo de investigación, permite considerar la inclusión de
determinados aportes teóricos en futuras producciones.

4 Resultados

La información obtenida permitió tomar conciencia de los marcos de interpretación de los sujetos,
objeto de análisis, de nuestros propios marcos de interpretación culturalmente aprendidos, y de las
concepciones y representaciones que subyacen en las prácticas evaluativas que se llevan a cabo en el
aula universitaria.
Comunicamos que al procesar la información de las encuestas realizadas a docentes de FACENA y de
la Facultad de Humanidades, respectivamente, surgieron interesantes observaciones: las respuestas
de los docentes pares de ambas facultades guardan gran simetría entre sí, en el número de
respuestas así como en la composición, ya que aproximadamente el 50% de las respuestas
pertenecen a docentes de carreras formadoras de formadores (Profesorados de Ciencias de la
Educación, Geografía, Letras y Filosofía en el caso de la Facultad de Humanidades y Ciencias
Biológicas, Ciencias Químicas y del Ambiente, Física, Matemática en FACENA), que se desempeñan
5
como Profesores Adjuntos en las cátedras de sus respectivas carreras - y que están en cátedras,
tanto del tramo inicial como de los últimos años de las carreras mencionadas.
Al indagar acerca de las características de las “buenas prácticas evaluativas” que ponderan los
docentes encuestados, las opciones de respuesta del ítem en el instrumento eran:
-Muestran coherencia con el desarrollo de los procesos de enseñanza y aprendizaje.
-Explicitan con claridad los criterios de evaluación.
-Forman parte de los procesos de enseñanza y de aprendizaje, como un momento mas de los
mismos.
-Promueven la intervención y responsabilidad del estudiante generando la autoregulación de
aprendizajes.
-La devolución a los estudiantes, posterior a la evaluación, propicia nuevos aprendizajes.
- Generan espacios de participación democrática.

5Secorresponde con lo observado en las plantas docentes de ambas Facultades, donde en la categoría cargos profesorales,
predominan los profesores adjuntos por sobre los profesores titulares.

464
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Se puede observar que en ambas unidades académicas, geolocalizadas en campus de dos provincias
diferentes, con personal docente de formación académica en áreas disciplinares distintas,
respondiendo sobre las prácticas evaluativas de docentes, jerarquizan a las buenas prácticas
evaluativas valorando especialmente “Forman parte del proceso de enseñanza y aprendizaje, como
un momento más del mismo” y “Promueven la intervención y responsabilidad del estudiante
generando la autoregulación de aprendizajes”6.
Estos mismos docentes, ante la pregunta: Si no encuentra representada su opinión entre las opciones
de la pregunta anterior y/o desea agregar la o las características que señala como propias de las
"buenas prácticas evaluativas", consignaron:
En el caso de Humanidades: Propician un posicionamiento moral de los estudiantes con respecto al
valor social del conocimiento; permiten revisar los conocimientos incorporados por los estudiantes y
generar otras alternativas; posee buen manejo del contenido y lo expresa a través de ejemplificación
y actividades de resolución de actividades.
En el caso de FACENA: Formó parte del proceso de transferencia de herramientas y metodologías útiles
para futuros escenarios prácticos y/o laborales, en el campo de la docencia como en el de
investigación. El objetivo de las asignaturas es primar la aprehensión de métodos propicios para el
accionar de un profesional ante diversos niveles educativos, científicos y socio-culturales; recrea los
modos de vincularse con los objetos de la disciplina; es apasionado con la profesión, y al momento
de explicar algún contenido “nos hacía introducirnos en el tema y no llevaba de lo más sencillo a
comprender cuestiones complejas”.
Si se observa el siguiente cuadro, generado a partir de las respuestas del sistema, se puede advertir a
priori que características tienen las buenas prácticas evaluativas para los docentes de los
profesorados:

Cuadro 1. Características de los docentes que desarrollan "buenas prácticas evaluativas"

Unidad Académica: Facultad de Humanidades Unidad Académica: FACENA

- Considera a la evaluación como parte del - Se preocupa por el proceso de aprendizaje y la


proceso de enseñanza y aprendizaje: 31 comprensión más que por la memorización:
respuestas 34 respuestas
- Se autoevalúa constantemente: 29 respuestas - Considera a la evaluación como parte del
- Se preocupa por el proceso de aprendizaje y la proceso de enseñanza y aprendizaje: 33
comprensión más que por la memorización: respuestas
26 respuestas - Comunica y realiza devoluciones a los
- Comunica y realiza devoluciones a los estudiantes: 32 respuestas
estudiantes: 26 respuestas - Planifica sus situaciones evaluativas,
- Promueve un ambiente propicio para el anticipando a los estudiantes la modalidad
desarrollo de la situación evaluativa: 26 (escrita - oral - grupal - individual - otras): 31
respuestas respuestas
- Planifica sus situaciones evaluativas, - Se autoevalúa constantemente: 30 respuestas
anticipando a los estudiantes la modalidad - Promueve la reflexión sobre el proceso de
(escrita - oral - grupal - individual - otras): 25 evaluación: 27 respuestas
respuestas - Prepara sus situaciones evaluativas
- Prepara sus situaciones evaluativas anticipando el tipo de instrumento (prueba a
anticipando el tipo de instrumento (prueba a libro abierto - prueba objetiva - coloquio -

6“La evaluación forma parte de un continuum ... “ y “la responsabilidad de los alumnos consiste en tomar conciencia que
ellos son los responsables máximos de su propio aprendizaje”. en Álvarez Méndez, J.M. (2001). pág. 14 y 16.

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libro abierto - prueba objetiva - coloquio - cuestionario - otros): 26 respuestas


cuestionario - otros): 25 respuestas - Promueve un ambiente propicio para el
- Promueve la reflexión sobre el proceso de desarrollo de la situación evaluativa: 23
evaluación: 24 respuestas respuestas
- Permite a los estudiantes asumir - Permite a los estudiantes asumir
responsabilidades compartidas en los responsabilidades compartidas en los
procesos de evaluación (por ejemplo, procesos de evaluación (por ejemplo,
elaboración de criterios compartidos): 18 elaboración de criterios compartidos): 13
respuestas respuestas
Fuente: Elaboración propia sobre la base de las encuestas en línea.

Además de las observaciones que ayudaron a la construcción del cuadro precedente, nos permitimos
compartir otras ventajas propias de la introducción de la encuesta en línea en la investigación
cualitativa. En efecto, cada integrante del grupo de investigación pudo acceder a las respuestas en el
momento que el encuestado finalizaba y enviaba la encuesta; el procesamiento de los resultados por
parte del mismo software permitió acceder a una visión resumida de los mismos, sin perder la
posibilidad de volver a cada formulario; la configuración del envío y la aplicación de una “persuasiva”
estrategia de difusión incidió en los tiempos y volúmenes de respuestas; fue una solución sencilla y
adaptable a las necesidades y preferencias del equipo de investigación y de la población a encuestar;
permitió optimizar la alfabetización informacional de los docentes para la recolección de datos en
una investigación de carácter social.

5 Conclusiones

El análisis como proceso cognitivo de orden superior implica considerar fundamentalmente tres
niveles en la recolección de la información: la descripción, la comparación y la interpretación, éstos si
bien forman parte del mismo proceso, presentan matices diferentes si se tiene en cuenta la
complejidad de relaciones que requieren cada uno de ellos. El trabajo realizado da cuenta de lo
expresado precedentemente. La interpretación de la información obtenida nos permite sostener que
la práctica docente en general y la práctica evaluativa en particular, en tanto prácticas humanas y
sociales, se caracterizan por realizarse siempre a la luz de alguna concepción sobre lo deseable y lo
posible, en escenarios complejos atravesados por dos principios de la realidad: la contingencia y la
incertidumbre, que por un lado, mediatizan los escenarios y lo que en ellos acontece, y por otro,
configuran las citadas prácticas. El procesamiento de información realizado hasta el momento
permitió conocer: lo que dicen los estudiantes respecto de las prácticas evaluativas implementadas
en las aulas en los diferentes espacios curriculares de su carrera de pertenencia y de los docentes
responsables de las mismas, así como el ideario que han conformado respecto de las “buenas
prácticas evaluativas”. Las encuestas en líneas han proporcionado, antes de realizar las entrevistas en
profundidad, características de los docentes que llevan adelante “buenas prácticas evaluativas” en
particular, entendida éstas como prácticas singulares y complejas. Podemos inferir que los docentes
de la muestra, coincidente con las ideas de autores expertos en la temática, consideran que la
evaluación, además de certificar o acreditar los aprendizajes, tiene otros propósitos. La evaluación
contribuye a mejorar los aprendizajes de los estudiantes, promueve la participación, ya que le
permite, al estudiante, asumir su responsabilidad en el proceso. Esta clase de práctica da cuenta que
no sólo promueven los aprendizajes de los estudiantes, sino que también les brinda un espacio para
preguntarse sobre esos conocimientos, aprendizajes y sobre la vinculación entre ellos. Algunas

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prácticas evaluaticas de profesores universitarios permiten la autorregulación de los procesos de


aprendizaje de los estudiantes, ya que tanto los docentes de Ciencias Exactas como los de
Humanidades, “promueven la reflexión sobre el proceso de Evaluación”.

Referências

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prácticas de enseñanza y evaluación en la universidad. En Porta, L. (Presidencia). VII Jornadas
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contexto(s)”. Facultad de Humanidades-Universidad Nacional de Mar del Plata. ISBBN: 978-987-
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Sarasa, M. C. (comp.). Formación y desarrollo de la profesión docente en el profesorado: las
buenas prácticas y sus narrativas. Mar del Plata, Argentina: Universidad Nacional de Mar del
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San José, C.R.: EUNED. ISBN: 9968-31-172-3.

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Narrativas autobiográficas com crianças na pesquisa qualitativa em


educação: reflexões sobre procedimentos de análise

Maria da Conceição Passeggi1, Gilcilene Lélia Souza do Nascimento1, Roberta Ceres Antunes
Medeiros de Oliveira1, Senadaht Barbosa Baracho Rodrigues1, Vanessa Cristina Oliveira da Silva
1
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
mariapasseggi@gmail.com; lelianascimento@ufersa.edu.br; roberta_ceres18@hotmail.com;
senadaht@yahoo.com.br; vanvan_cristina@yahoo.com.br.

Resumo. Apresentamos procedimentos utilizados para a análise de narrativas autobiográficas, construídas


por crianças de 6 a 12 anos de idade, em três contextos escolares: zona rural, periferia urbana e classe
hospitalar. As pesquisas se inserem num projeto mais amplo, e se propõem a investigar os sentidos
construídos narrativamente pelas crianças sobre a escola. Após situar as narrativas autobiográficas como
fontes e método da pesquisa qualitativa em educação, apresentamos o protocolo comum utilizado e
discutimos, em seguida, os desafios da constituição do corpus e nossas aproximações para interpretar a
interpretação da criança, com o cuidado de preservar sua visão de mundo. As análises revelam diferentes
modos de perceber a escola em suas vidas; corroboram as potencialidades heurísticas e hermenêuticas da
palavra da criança, consideradas como sujeitos de direitos; e os grandes desafios com os quais nos
deparamos durante a realização da análise dessas narrativas.
Palavras Chave: Narrativas autobiográficas; Infância; Análise temática; Pesquisa qualitativa.

Autobiographical narratives in the qualitative research in education: reflections on the analysis procedure
Abstract. We present procedures used for the analysis of autobiographical narratives constructed by
children from 6 to 12 years of age in three school contexts: rural area, urban periphery and hospital class.
The research is part of a larger project, and aims to investigate the narrative constructs constructed by
children about school. After locating the autobiographical narratives as sources and method of qualitative
research in education, we present the common protocol used and then discuss the challenges of the
constitution of the corpus and our approaches to interpreting the child's interpretation, with the care of
preserving his vision of world. The analyzes reveal different ways of perceiving the school in their lives;
corroborate the heuristic and hermeneutic potentialities of the child's word, considered as subjects of
rights; and the great challenges that we face during the analysis of these narratives.
Keywords: Autobiographical narratives; Childhood; Thematic analysis; Qualitative research.

1 Introdução

Um dos grandes desafios da pesquisa qualitativa com crianças consiste em interpretar a


interpretação da criança sobre suas experiências. Contadas em micronarrativas, fortemente
sintéticas, porém densas de sentido, essas narrativas exigem ainda mais rigor para nos aproximarmos
da visão de mundo da criança. Em primeiro lugar, exigem que nos distanciemos de uma perspectiva
adultocêntrica, que nos faz olhar para suas interpretações como “coisas de crianças”, mas também
impõem a necessidade de não nos deixarmos envolver pelo óbvio. E, finalmente, que há de
considerar o desafio de que o espírito de análise e preocupações teóricas possam por em risco o
modo de pensar da criança. A ideia central dessa reflexão se inspira em Pierre Bourdieu (2003, p.
712) quando sugere que o pesquisador vise à democratização da postura hermenêutica de modo que
o leitor conceda às narrativas ordinárias “o acolhimento fervoroso que certa tradição de leitura
reserva às formas mais altas da poesia ou da filosofia”. Assim, pensamos com relação ao acolhimento
da palavra da criança.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Neste artigo, objetivamos refletir sobre os procedimentos que utilizamos para a constituição do
corpus com narrativas de crianças e para as análises dessas narrativas. Escolhemos para essa reflexão
um recorte, extraindo de nossos dados, de narrativas construídas em três contextos escolares
diferentes: uma escola rural, uma escola da periferia urbana e uma classe hospitalar. As pesquisas
têm como objetivo comum investigar os sentidos construídos narrativamente por crianças sobre a
escola, observando como elas vivenciam o tempo, a organização e o espaço da educação escolar.
Elas integram um projeto mais amplo, “Narrativas da infância: o que contam as crianças sobre a
escola e os professores sobre a infância?”, financiado pelo CNPq (Processo nº 462119/2014-9), e
desenvolvido pelo Grupo Interdisciplinar de Pesquisa, Formação, (Auto)Biografia, Representações e
Subjetividades (GRIFARS-PPGEd-UFRN-CNPq) 2.
Iniciamos nossas reflexões situando-nos na perspectiva da pesquisa (auto)biográfica com crianças,
visando justificar o interesse dessas narrativas como fontes e método de pesquisa qualitativa para o
campo das Ciências Humanas e Sociais, em geral, para a Educação, em particular. Apresentamos, em
seguida, o protocolo comum, utilizado para a construção das narrativas nos contextos estudados.
Finalmente, refletimos sobre o procedimento de constituição do corpus e os encaminhamentos que
nos inspiram na escolha da análise temática para o estudo dos sentidos atribuídos à escola pelas
crianças em suas narrativas. As análises revelam diferentes modos de perceber a escola em suas
vidas e corroboram as potencialidades heurísticas e hermenêuticas da palavra da criança,
considerada como sujeitos de direitos, sujeitos históricos e sujeitos de suas histórias. Em conclusão,
reconhecemos os desafios com os quais nos deparamos durante a realização da análise dessas
narrativas.

2 Narrativas autobiográficas e o protocolo das rodas de conversa

No campo epistemológico da pesquisa qualitativa interpretativista, as narrativas de si


(autorreferenciais) vêm se constituindo nos últimos trinta anos, indiscutivelmente, uma fonte de
pesquisa privilegiada para a investigação científica, nos mais diversos campos disciplinares das
Ciências Humanas e Sociais. Observa-se, também, que as pesquisas nem sempre tomam como objeto
de estudo as narrativas de crianças. É a partir dos trabalhos precursores de J. Bruner (1997), que a
narrativa da criança emerge no campo da psicologia cultural como objeto de investigação (Passeggi,
Nascimento & Oliveira, 2016; Passeggi et al, 2014; Passeggi, 2014; Passeggi, 2016), caracterizando-se
como uma vertente possível da investigação qualitativa. Em seus estudos, Bruner chama a atenção
para a potencialidade heurística das narrativas de crianças, desde a mais tenra idade, e de sua
importância para a (auto)compreensão do que lhes acontece, em função do que narram sobre suas
experiências subjetivas, socioculturais, históricas, relacionais e afetivas. A conquista da autonomia do
método biográfico, tão bem defendida por Franco Ferrarotti (2014), desde os anos 1980, chama a
atenção para os campos de mediações das narrativas nas ciências sociais para o interesse de grupos,
contextos e instituições. No âmbito da psicologia cultural, podemos admitir com Brockmeier e Harré
(2003) que as narrativas são formas inerentes ao nosso modo de alcançar conhecimentos, pois com

2 Projeto de pesquisa em andamento: «Narrativas da infância: o que contam as crianças sobre a escola e os
professores sobre a infância» (MCTI-CNPq/Edital Universal -14/2014 no. 462119/2014-9), reunindo pesquisadores
de seis universidades brasileiras (UFRN, UFRS, UNICID, Unifesp, UFRR, UFF) e da Universidade de Antióquia
(Colômbia). Aprovado pelo Comitê de Ética, parecer nº 168.818.

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elas estruturamos ao mesmo tempo nossa experiência do mundo e a nós mesmos. Para Bruner
(1997), é por volta dos três anos de idade que a criança aprende a utilizar a linguagem recém
adquirida, para conduzir as transações interpessoais necessárias à vida comunal. Nesse sentido, essas
narrativas não seriam apenas um modo de representação do mundo, mas de constituição da
realidade, e da própria subjetividade da criança. Para Christine Delory-Momberger (2012, p. 524-525,
grifos da autora), a pesquisa (auto)biográfica “alimentada por uma ampla tradição hermenêutica
(Dilthey, Gadamer, Ricœur) e fenomenológica (Berger, Luckmann, Schapo, Schütz), [...] estabelece
uma reflexão sobre o agir e o pensar humanos mediante figuras orientadas e articuladas no tempo
que organizam e constroem a experiência segundo a lógica de uma razão narrativa”.
Brockmeier e Harré (2003, p. 526) definem a narrativa, como “[...] um conjunto de estruturas
linguísticas e psicológicas transmitidas cultural e historicamente, delimitadas pelo nível de domínio
de cada indivíduo e pela combinação de técnicas sócio-comunicativas e habilidades linguísticas [...]”.
Entende-se, portanto, que a disposição humana para narrar e criar histórias constitui uma das
características biopsicossocial e cultural, inerentes ao humano e que ela se manifesta pela
necessidade de dar sentido às experiências, de se comunicar e interagir consigo mesmo e com o
mundo. De modo que, as relações construídas no ato de narrar entre os seres humanos, entre eles e
o mundo, independentemente de ser ele um adulto, um jovem ou uma criança, se concretiza como
um ato autopoiético, de reinvenção de si, concebendo-se e percebendo-se em auto(trans)formação
pelo ato de narrar a próprio experiência.
Nesse sentido, as narrativas das experiências vividas, narradas pelo próprio protagonista (adultos,
jovens, crianças) são fontes preciosas para a compreensão do humano. Ao narrar, a pessoa se coloca
no centro da história como personagem, como narrador, que podemos definir com Barthes (1966, p.
19), como “uma espécie de consciência total”, e como autor, ou seja, a pessoa a quem se pode
imputar o ato empírico de narrar. Os pesquisadores, nessa perspectiva, interrogam a historicidade do
sujeito e de suas aprendizagens. Nesse processo, considera como essencial os indícios da construção
do pensamento e da ação no ato de narrar, com a linguagem e pela linguagem.
Admite-se como hipótese, que é por meio da narrativa que damos sentido à nossa existência e que
podemos compreender os contextos mais globais nos quais elas se desenvolvem, daí a importância
de se estudar as narrativas de crianças sobre seus contextos de escolarização e sobre os entornos da
escola para compreendermos sua percepção sobre eles.
Como metodologia de recolha das narrativas, fizemos a opção pelas rodas de conversa. Nesse
sentido, buscamos superar a visão adultocêntrica de “dar voz” à criança, ela já a possui, e mesmo de
“ouvir a criança”, como uma dádiva de nosso tempo. Nas rodas de conversa, o que nos seduz é o
diálogo. Um diálogo o mais horizontal possível, entre o pesquisador e as crianças, e entre elas
mesmas. Adotamos para dinamizar esse diálogo, um protocolo comum introduzido num projeto
internacional ao qual essas pesquisas estão vinculadas (Lani-Bayle & Passeggi, 2014). As rodas de
conversa se realizaram, numa perspectiva lúdica, com grupos de no máximo 05 crianças, e no
mínimo 03, nas próprias escolas investigadas: na escola rural, com 34 crianças; com 14 crianças, na
escola da periferia urbana e com 03 crianças numa classe hospitalar. O protocolo previa a presença
de um pequeno alienígena, nomeado Alien, que vinha de um planeta onde não tinha escola. A ideia
era provocar o distanciamento necessário à imaginação e à reflexão crítica, de modo a possibilitar à
criança lidar com eventuais conflitos e envolvê-las no que diziam. Gravadas em áudio e/ou em vídeo,
as rodas de conversa foram estruturadas em torno de três momentos principais: a abertura
(momento da apresentação do Alien às crianças); a conversa (quando as crianças passam a dialogar
(simbolicamente) com o Alien e também com a pesquisadora; e o fechamento (quando a
pesquisadora anuncia o retorno do Alien ao seu planeta).
O protocolo foi utilizado com o prévio consentimento dos participantes e de seus responsáveis, e se
desdobra no cuidado ético com a construção e análises das narrativas, especialmente, no respeito à

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singularidade e legitimidade de sua voz. Nesse sentido, fizemos a escolha pelas rodas de conversa
por se apresentarem como um procedimento metodológico interativo, horizontal e dialógico.

3 Análise Temática: procedimentos utilizados para a constituição do corpus e interpretação


das narrativas autobiográficas

A leitura das transcrições das rodas de conversa revela como uma das características fundantes das
falas das crianças que elas se expressam, sobre suas experiências, com frases curtas, fortemente
sintéticas, porém densas de sentido. Observamos que esses pequenos fragmentos, que chamaremos
de micronarrativas, vão se encadeando no fio da conversa e terminam por se constituir sequências
narrativas, construídas coletivamente. A fala de uma criança vai complementando a fala de outra, o
que nos permitiu considerar essas sequências como narrativas produzidas por um sujeito coletivo. De
modo que, na constituição do corpus, consideramos então, por um lado, a concepção minimalista de
narrativa de vida, sugerida por Daniel Bertaux (2010). Para este autor, existe narrativa de vida desde
que haja descrição sob uma forma narrativa de um fragmento da experiencia vivida. Por outro lado,
emprestamos de R. Barthes (1966), uma ideia de narrativa, que se manifesta no nível da frase. Para
Barthes, a frase (afirmativa e negativa) pode ser considerada como esboço de uma pequena
narrativa. O corpus para a análise está assim constituído por trechos das transcrições desses
pequenos fragmentos vistos como um todo, pois as crianças vão atribuindo sentido coletivamente ao
que lhes acontece na escola, na medida em que a conversa avança. Esse ganho metodológico tem
demonstrado que essa opção permite investigar com base na construção de um discurso coletivo,
com momentos de escuta e de falas na interação. Durante os diálogos, as crianças discordam ou
concordam com a fala uma da outra, complementam o que se diz, ou simplesmente silenciam e
param para refletir.
No processo de transcrição, para preservar a identidade das crianças, escolhemos nomes aleatórios
para identificá-las como autoras de suas narrativas. E no processo de análise, quando optamos por
excertos coletivos, construídos por essas micronarrativas, apagamos os nomes das crianças.
Acreditamos que com esses procedimentos minimizamos os riscos de violência simbólica nesses dois
momentos da pesquisa: o da coleta das fontes nas rodas de conversa e na constituição do corpus,
conforme nos diz Bourdieu (2003), sobre princípios fundamentais na transposição da oralidade para
a escrita. Intentamos que os excertos analisados fossem capazes de “tocar e de comover, de falar à
sensibilidade, sem sacrificar ao gosto do sensacional” (Bourdieu, 2003, p. 711). As operações
envolvidas nessa transposição fazem do pesquisador um mediador entre o narrador e o leitor. Daí a
responsabilidade do pesquisador para criar as condições necessárias à compreensão e à
interpretação do que ele percebeu na voz, no olhar, nos movimentos das crianças no momento de
construírem suas narrativas.
De acordo com Delory-Momberger (2014), a compreensão da narrativa pelo próprio narrador se
realiza mediante uma hermenêutica prática. O seu aprofundamento demanda, no entanto, um
distanciamento crítico, que se realiza segundo a capacidade de “leitura” do narrador, que poderia ser
mais ou menos capaz de fazê-la sozinho, e espontaneamente. Ou seja, se a construção da narrativa já
se traduz, por si só, como um ato de interpretação autorreflexiva, o trabalho hermenêutico de
interpretação sobre o texto produzido se realiza como um exercício autobiográfico sobre si mesmo e
a própria compreensão de mundo. Quando pretendemos realizar a análise dessas narrativas como
uma atividade de interpretação, nos situamos no nível de uma meta-interpretação sobre a
interpretação que as crianças realizam nas narrativas.
Adotamos como princípio de base a opção por uma análise temática, tal como ela é proposta por
Poirier, Clapier-Vallandon e Raybaut (1996). Para os autores, a análise temática foi, durante muito

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

tempo, considerada como uma análise qualitativa oposta à análise quantitativa, vista então como
mais científica. Foi a psicocrítica literária que restabeleceu o seu direito de cidadania nas Ciências
Humanas. Para Poirier, Clapier-Vallandon e Raybaut (1996, p. 215), “no sentido clássico, o tema é
uma categoria semântica, objeto do discurso. A análise temática procura metodicamente as
unidades de sentido com base no que é dito pelo narrador, com relação aos temas”.3
Seguindo esse propósito, encontramos em Jovchelovitch e Bauer (2014) inspiração para buscar os
temas de modo mais sistemático, para os procedimentos de análises das narrativas que buscamos
explicitar aqui. Inicialmente, realizamos as transcrições das rodas de conversa na íntegra,
convertendo as falas do oral para a escrita. A busca dos temas segue um procedimento gradual de
redução da transcrição: passagens inteiras, ou parágrafos, são parafraseados em sentenças
sintéticas, e essas sentenças são parafraseadas em palavras-chave. Ambas as reduções operam com
generalização e condensação de sentido.

Quadro 1. Procedimento gradual de redução do texto

TEXTO 1ª REDUÇÃO 2ª REDUÇÃO


Transcrição literal de excertos da Sentenças sintéticas Palavras-chave
narrativa
Fonte: Jovchelovitch e Bauer (2014).

Seguindo esse modelo, colocamos em três colunas os três passos. Na coluna à esquerda a
transcrição, na íntegra, de cada roda de conversa, na coluna do meio a sentença sintética e na coluna
à direita a segunda redução ou palavra-chave. Realizamos várias leituras do texto integral para
identificar categorias recorrentes e fomos colorindo com cores diferentes os temas que iam
surgindo. As sentenças sintéticas, que já se traduzem como uma interpretação das narrativas, foram
surgindo na medida em que íamos encontrando na coluna da esquerda temas semelhantes, que
fomos transformando em sentenças sintéticas. A partir das sentenças sintéticas identificamos as
palavras-chave, que nos levaram às grandes categorias de análises. Citando Jovchelovitch e Bauer
(2014, p. 107), “o produto final constitui uma interpretação das entrevistas, juntando estruturas de
relevância dos informantes com as do entrevistador. A fusão dos horizontes dos pesquisadores e dos
informantes é algo que tem a ver com a hermenêutica”. A partir das categorias que emergiram desse
procedimento, seguimos com a escrita científica, trazendo reflexões interpretativas e propositivas
em torno da investigação proposta em cada pesquisa. No exemplo abaixo, fizemos a opção de apagar
no excerto a referência aos nomes dos participantes: Kelly, Gaspar, Jean e Marta, deixando apenas a
referência à pesquisadora.

Quadro 2. Exemplo do procedimento de redução das narrativas de crianças da escola rural

TEXTO 1ª REDUÇÃO 2ª REDUÇÃO

3 Texto original: “Au sens classique, le thème est une catégorie sémantique, c’est l’objet du discours. L’analyse thématique
recherche méthodiquement les unités de sens par l’intermédiaire des propos tenus par le narrateur, relativement à des
thèmes. L’analyse thématique a longtemps été considérée comme une analyse qualitative opposée à l’analyse
quantitative considérée comme plus scientifique. La psycho-critique littéraire a repris le terme d’analyse thématique, qui
retrouve le droit de cité en Sciences Humaines”.

472
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- Vocês já pararam para pensar como As crianças admitem que sem escola A escola, o caminho para ser alguém
seria a vida sem escola? não conseguiriam “ser alguém na na vida.
(Pesquisadora) - Nunca! Seria muito vida”, alcançar melhores condições no
ruim. A pessoa não aprenderia a ler, futuro. Sem escolas, só lhes restaria o
estudar. E assim, se não fosse pra duro trabalho da roça.
escola, a gente não ia arrumar um
trabalho também.
- E pra que é que a gente estuda
tanto? (pesquisadora) - Pra ser alguém
na vida, e arrumar um trabalho. [...]
Categoria: importância da escola.
Vocês acham que seria possível a vida
sem escola? (Pesquisadora) - Seria
horrível! Tinha que trabalhar na roça.
Não ia conseguir arrumar emprego.
[...] Se não tivesse escola, o que vocês
estariam fazendo agora?
(Pesquisadora) - Trabalhando. Estaria
na roça, metendo a foice pra cima.

Fonte: Banco de dados do GRIFARS, 2016.

Reunimos, no Quadro 2, os excertos de narrativas de quatro rodas de conversa realizadas com as


crianças da escola da zona rural. Agrupamos as narrativas a partir da questão hipotética que surgiu
durante a roda de conversa: como seria a vida sem escola? e que se tornou norteadora da
construção do discurso coletivo que nos levou, por meio da interpretação feita na primeira redução e
da síntese na segunda redução, à construção da categoria: importância da escola. É relevante frisar
que nesse processo, a interpretação é conduzida pelas mensagens emitidas pelas crianças, situadas
num contexto simbólico.

Quadro 3. Exemplo de redução das narrativas das crianças da escola urbana

EXCERTO 1ª REDUÇÃO 2ª REDUÇÃO


Um menino do 4º ano foi ao banheiro A agressão física e verbal são signos Brigas e ameaças na escola.
e arranjou uma briga lá. Deu um de violência e do poder contra os mais
bofete no olho do menino, e o menino jovens e “fracos”.
caiu, ficou lá. Ele era do 1º ano.
[...] Pra começo de história, as
meninas vieram me falar que Helena
tinha dito que iria me bater e eu,
como sou fraca, comecei a chorar.
Categoria: violência na Escola

Fonte: Banco de dados do GRIFARS, 2016.

Os excertos trazidos no exemplo acima se referem às narrativas de crianças da escola da periferia


urbana. A transcrição literal das narrativas possibilita, em uma primeira leitura, identificarmos o
tema norteador da conversa. Uma criança narra uma situação de agressão física, no banheiro, de
uma criança mais velha contra uma mais jovem, e outra se refere a ameaças. Ambas as situações
emergem como acontecimento corriqueiro no contexto escolar, o que nos leva a refletir sobre a
necessidade de pensar com as crianças possíveis estratégias de enfrentamento ao medo da ameaça,
da agressão verbal, que se expressam mediante o choro. A escola reproduz uma situação de cultura
do medo, existente na comunidade, de relações de poder em que quem agride e ameaça é sempre o
mais velho ou mais “forte”.

473
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Quadro 4. Exemplo de redução do texto a partir das narrativas de crianças da classe hospitalar

TEXTO 1ª REDUÇÃO 2ª REDUÇÃO


Só não gosto das provas de Dificuldades e conflitos da criança em Retorno à escola regular.
matemática [...] muito difíceis. tratamento de saúde no processo de
Guilherme colocou os pés para eu cair. (re)inserção na escola regular.
[...] A professora grita. [...] Eu não faço
nada, ela grita comigo às vezes.

Categoria: acolhimento na escola.

Fonte: Banco de dados do GRIFARS, 2016.

Os excertos exemplificados no Quadro 4 referem-se às narrativas de crianças que se encontram em


transição da classe hospitalar para a escola regular. São crianças, que acometidas por algum tipo de
doença crônica, tiveram que se afastar da escola regular para tratamento de saúde, passando o
período de tratamento e hospitalização, matriculadas em classes hospitalares. Em suas narrativas,
contam sobre como tem sido a inserção e o retorno à escola. Assumem o que não gostam – a
matemática; falam das situações desagradáveis e de conflitos no cotidiano escolar – o colega que
quer derrubá-lo, ou a professora que grita. Identificamos como sentenças sintéticas as dificuldades e
conflitos que surgem nesse processo de (re)inserção na escola regular.
A categoria de análise desencadeada nesse quadro, ou seja, aquilo que se sobressai na transcrição do
texto, na primeira redução, e em nossas interpretações investigativas é o acolhimento dessas
crianças nas escolas regulares. É relevante destacar que situações de conflitos, consideradas
corriqueiras no contexto escolar, podem ser cruciais para o processo de (re)adaptação e
continuidade da escolarização de crianças em tratamento de saúde, uma vez que elas estão
passando por transformações físicas, psicológicas, emocionais, e um grito da professora, por
exemplo, pode representar, nesse cenário, dor e sofrimento contrastante com o que elas esperam
nesse processo.
O procedimento de redução organiza os grandes temas que perpassam suas experiências nos três
contextos: a importância da escola, a violência na escola, o acolhimento na escola, e evidenciam a
necessidade de compreendermos com as crianças, as relações que elas estabelecem com o mundo
escolar e analisar como negociam os sentidos das instituições educativas que as acolhem.

3.1 Análise das narrativas das crianças – aproximações dos sentidos da escola

O processo de análise prossegue com a escrita do texto científico, que se encaminhará para a
divulgação da pesquisa. Os resultados devem ser, portanto, explicitados com o devido respeito à
pessoa que narra. (Bourdieu, 2003). Retomamos aqui os cuidados éticos que devem permear todo o
processo de pesquisa, do desenvolvimento das rodas de conversa ao procedimento de análise e
publicação. Trazemos aqui alguns resultados que extraímos de nossas análises como exemplos.
Ressaltamos que no processo de interpretação todo o contexto que envolve a pesquisa e seus
participantes são considerados na produção escrita do pesquisador. Nesse sentido, a qualidade da
transcrição e as informações do diário de campo do pesquisador se tornam relevantes para as
análises.
Observamos que as análises das narrativas construídas nas rodas de conversa, realizadas nos três
contextos escolares, evidenciam o quanto esses espaços são dotados de especificidades que lhe dão

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contornos peculiares e influenciam a produção da vida e a constituição das crianças como pessoas
que neles habitam. Nesse sentido, emergem das análises categorias diferenciadas em torno do
sentido da escola para as crianças.
No meio rural, as crianças encontram na escola a projeção de suas vidas relacionada à formação e a
conquistas de melhores condições de sobrevivência por meio de uma profissão, que se apresenta
como alternativa à difícil vida na roça. As crianças contam “para que vêm à escola”: “Pra estudar! Pra
aprender a ler! Pra quando ficar grande, arranjar um emprego! Pra ser um doutor! Pra tirar nota
boa! Pra se formar professora!”. Sabemos que se trata de uma narrativa comum entre crianças de
diferentes contextos, mas nos nossos estudos essa visão está ainda mais forte nas crianças da zona
rural. Como insiste Delory-Momberger (2014, p. 121), ao se referir à escola na França, “o que se faz
na escola não tem sentido em si mesmo, a escola só é ‘útil’ na perspectiva de uma profissão, de um
futuro ao qual daria acesso”. Essa função social da escola é o que é percebido como sua missão
primordial e o que a justifica em qualquer contexto. Nesse sentido, suas narrativas reproduzem o
sentido da escola como um lugar transitório, de passagem, mais numa perspectiva de futuro, do que
lugar de vida presente e plena na infância.
No contexto da escola urbana, destacam-se narrativas expressivas da violência que vivenciam na
escola e na comunidade onde moram. Os conflitos e situações de agressões narrados pelas crianças
emergem como alerta para o Alien em torno dos perigos existentes no bairro: “aqui, um dia, teve
uma guerra. Lá perto da minha casa, de frente, assim, minha tia morava. Lá perto da igreja, parecia
uma guerra, um bocado de policial contra um bocado de ladrão. Tinha até um helicóptero assim...
Isso é tiroteio. Uma mulher levou um tiro na barriga, nos peitos e na barriga”. No ato de contar, elas
vão construindo narrativas entrecortadas por gestos contraditórios: de risos, de silêncios; de medo,
mas também de uma banalização da violência.
O que conta Max (08 anos) para o Alien, no Quadro 3, é representativo de brigas e
desentendimentos entre as crianças na escola, revelando, desde cedo, a relação entre agressor e
vítima se estabelece como algo corriqueiro na escola. O que causa estranhamento para Max é que a
criança menor “ficou lá”, supostamente, sem reação e sem socorro. Os motivos das brigas são
variados, imprevisíveis, ou mesmo injustificáveis, talvez, por isso, considerados de pouca importância
para a narrativa. As ações se sucedem como parte de um encadeamento lógico que já faz parte do
enredo: “ele foi no banheiro e arranjou uma briga lá”, “deu um bofete no olho do menino”, que “caiu
e ficou lá”. Esse tipo de agressão acontece, quase sempre, fora da sala de aula, na hora do intervalo,
normalmente na quadra, no banheiro, no pátio, como espaços liberadores de incivilidades.
Mesmo sendo recorrente em suas narrativas, o fato de conviverem diariamente com a violência, seja
ela na forma física ou simbólica, as crianças apontam caminhos para se pensar uma escola diferente.
Na mensagem de despedida do Alien, Rita (11 anos) lhe diz como deve ser a escola em seu planeta:
“Alien, na sua escola tem que ter muitos amigos e muitas crianças para brincar, não pode ter briga e
na sua rua não pode ter bala, nem bandido”. Para essa criança, a escola que ela deseja se opõe à
escola que ela conhece e à realidade de uma comunidade que sofre com o problema da violência
urbana. Podemos concluir que as crianças projetam na escola seus anseios por uma cultura de paz.
Já no contexto de (re)inserção de crianças em tratamento de saúde na escola regular, o sentido da
escola também se apresenta com suas peculiaridades. A escola representa para uma criança em
tratamento um desejo partilhado entre ela, a família e os(as) professores(as) das classes hospitalares.
Por um lado, pela expectativa do sucesso do acompanhamento pedagógico nesses espaços,
enquanto garantia do direito à educação. Por outro lado, por representar uma melhora significativa
em seu estado de saúde. “A escola representa a cura”, como afirma a mãe de uma das crianças,
quando se refere ao retorno da filha à escola. Para a criança, esse retorno, possibilita, finalmente, o
retorno à normalidade a vida, a experimentarem a vida em sua totalidade, sua normalidade. Por mais
difícil que seja a adaptação desse processo de (re)inserção, a sensação dos participantes é que há

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uma renovação, uma esperança de retomarem suas projeções de vida antes do adoecimento, que
provocou a ruptura com a escola, os amigos, a vida, por essa razão esse retorno está tão marcado
simbolicamente.
Embora, os excertos do Quadro 4 (de duas crianças de 5 e 6 anos de idade) tragam situações comuns
às experiências no contexto escolar (não gostar da matemática, os conflitos entre colegas, um
professor que grita), elas nos remetem a uma preocupação com a acolhida dessas crianças, um
melhor conhecimento de seu diagnóstico e possíveis limitações de aprendizagens. Essas narrativas
evidenciam a necessidade de compreender com as crianças as relações que elas estabelecem com o
mundo escolar, dentro e fora do hospital, e a necessidade de estreitamento de diálogo entre a classe
hospitalar e a escola regular.
Nas três situações analisadas, o acolhimento à criança, em sua dimensão integral, é um ponto
essencial para que possam dar prosseguimento ao processo de escolarização, que para muitas
crianças se revelam como situações de traumas, de medo, de conflito, o que requer um olhar
sensível para a criança em suas singularidades, nem tanto no seu papel de “aluno” ou de “paciente”,
de quem se espera, ou se exige, um determinado comportamento, mas de uma criança ativa,
vivendo e sofrendo, no mundo da escola, e no mundo de onde vem e para onde vai, cotidianamente,
depois da escola.

4 Conclusões em aberto

As reflexões acima evidenciam como eixo comum, a importância e o papel que a escola desempenha
na vida das crianças nesses diferentes contextos. Elas expressam suas experiências cotidianas fora da
escola e que se reflete no cotidiano escolar: o anseio por melhores condições de vida por meio da
escola pelas crianças rurais; o anseio pela paz subsumida pela banalização da violência no entorno da
escola, que adentra a escola em conflitos e comportamentos agressivos entre as crianças; a alegria e
o desejo de continuar o processo de escolarização, que representa para crianças em tratamento de
saúde a conquista da normalidade da vida por meio da (re)inserção na escola.
Os resultados apresentados são apenas exemplos de como estamos realizando uma escrita
interpretativa das narrativas. Certamente, cada pesquisa aqui apresentada traz resultados muito
mais abrangentes, pois respondem a objetivos específicos de cada investigação, com clareza e
pertinência. Interessa-nos, finalizando este artigo, lembrar os desafios postos pelas análises.
Enfatizar os procedimentos desde a constituição das fontes, que se realizam adotando uma
dimensão dialógica, e de aprendizagens conjuntas, entre as crianças e as pesquisadoras. Observamos
que a fala de uma criança vai completando o sentido da fala de outra e que, muitas vezes, elas nem
falam, mas gesticulam e que seus silêncios estão carregados de sentido. Desse modo, gestos e
silêncios, que não podem ser traduzidos no processo de transcrição, são retomados nos vídeos das
rodas de conversa. Nossas opções para os processos de transcrição, consideram que as narrativas
das crianças, em geral, são construídas por frases curtas, mas ricas de sentido. Por essa razão,
reunimos as micronarrativas em sequências mais longas, e os excertos analisados foram, de fato,
produzidos coletivamente. A opção por uma análise temática no processo de análise e escrita
interpretativa é guiada pelo cuidado de evitar a violência simbólica, pelo respeito à palavra da
criança de modo que ela possa ser acolhida com o mesmo respeito da palavra do pesquisador.
Esperamos, com este artigo, ter contribuído de alguma forma com as reflexões em torno dos
procedimentos de construção e de análises de dados qualitativos, enriquecendo referenciais que
fortaleçam o uso de narrativas autobiográficas como fonte e método de pesquisa com crianças
como sujeitos de direitos, sujeitos sociohistóricos, sujeitos de sua história, capazes de narrar e

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refletir sobre suas próprias experiências escolares e de contribuírem com suas experiências e
percepções para os avanços da educação e da pesquisa educacional.

Referências

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Representação social da formação de profissionais para o cuidado


em instituição de longa permanência

Daniela Garcia Damaceno1, Carlos Alberto Lazarini1, Mara Quaglio Chirelli1


1 Faculdade de Medicina de Marília, São Paulo, Brasil. daniela.garcia22@yahoo.com.br,
lazarini@famema.br, marachirelli@gmail.com
Resumo. Esta pesquisa objetivou analisar as representações sociais dos profissionais de instituição de longa
permanência para idosos (ILPIs) sobre seus próprios processos de formação para o cuidado,
compreendendo, também, a visão dos gestores. Foram realizadas 33 entrevistas com gestores e
profissionais de uma ILPI, no ano de 2016. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas
semiestruturadas, e analisados pela técnica do Discurso do Sujeito Coletivo. Da pergunta sobre o que é
essencial para a contratação de profissionais, resultaram duas ideias centrais: características afetivas e
emocionais e capacitação técnica e cognitiva; e cinco ideias centrais sobre a contribuição da formação para
a prática profissional: a teoria é diferente da pratica, desenvolvimento de raciocínio crítico, embasamento
teórico, desenvolvimento pessoal, o aprendizado se dá pela prática. Os resultados evidenciam que o
método escolhido possibilitou identificar os olhares e necessidades do processo de formação na perspectiva
dos diferentes atores envolvidos no cuidado em ILPI.
Palavras-chave: instituição de longa permanência para idosos; cuidado gerontológico; formação
profissional.

Social representation of long-term care institutions professionals’ formation


Abstract. This research aimed to analyze the social representations of long - term care institution (LTCI)
professionals about their own formation processes for care, including the managers’ view. A total of 33
interviews were conducted with managers and professionals of a LTCI in 2016. The data were obtained from
semi-structured interviews, and analyzed by the technique of the Discourse of the Collective Subject. From
the question about what is essential for hiring professionals, two central ideas have emerged: affective and
emotional characteristics and technical and cognitive training; and five central ideas about the contribution
of training to professional practice: theory is different from practice, development of critical reasoning,
theoretical foundation, personal development and learning is by practice. The results demonstrated that the
chosen method allowed identify the sights and needs of the training process from the perspective of the
different actors involved in long - term care.
Keywords: long-term care institutions; gerontological care; professional qualification.

1 Introdução

É indiscutível que o envelhecimento populacional mundial é um fenômeno que não pode mais ser
ignorado. Segundo o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, 2012), hoje, em todo o mundo,
uma em cada nove pessoas é idosa, ou seja, apresenta 60 anos ou mais, e estima-se que até 2050
essa proporção aumentará para uma em cada cinco.
Este fenômeno é caracterizado pelo aumento da longevidade e da expectativa de vida associadas à
diminuição das taxas de natalidade (Tavares, Pelizaro, Pegorari, Paiva, & Marchiori, 2016) e vem
ocorrendo nas diferentes regiões do mundo, em países de diversos níveis de desenvolvimento
(UNFPA, 2012). Se por um lado em países desenvolvidos essa transição demográfica aconteceu de
forma lenta e gradual acompanhada de crescimento socioeconômico constante ao longo de várias
gerações, no Brasil, assim como em outros países em desenvolvimento esta transição ocorreu de
forma bastante acelerada, ocasionando complicações de ordem social, econômica e politica.
(Organização Mundial da Saúde [OMS], 2005; Silva & Figueiredo, 2012).

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Além do envelhecimento populacional, percebe-se, ainda, que a própria população de idosos está
envelhecendo, isto é, acima de 80 anos (World Health Organization [WHO], 2012). Dessa forma,
esses indivíduos são expostos por um período maior a doenças crônico-degenerativas, resultando em
um número crescente de idosos sujeitos às fragilidades da velhice (Camarano & Kanso, 2010). Assim,
paralelo à transição demográfica, o declínio fisiológico do envelhecimento provocou uma importante
modificação nos padrões de morbimortalidade no país (WHO, 2012).
Segundo Camarano & Kanso (2010), idosos que apresentam algum tipo de incapacidade funcional
são potenciais demandantes de cuidados de longa duração, seja no âmbito familiar ou em serviços
de cuidado formal público ou privado. Outro fator é a incapacidade de idosos em arcar com sua
própria sobrevivência devido à carência de renda (Del Duca, Silva, Thumé, Santos & Hallal, 2012).
As mudanças na sociedade pós-moderna, marcadas pelas modificações na composição familiar,
diminuição das taxas de natalidade, nupcialidade e o enfraquecimento dos laços de solidariedade e
vínculos intergeracionais, comprometem a oferta de cuidado familiar (Camarano & Kanso, 2010;
Carrara & Espírito Santo, 2016).
Assim, embora essa modalidade de cuidado ainda seja predominante na maioria dos países,
principalmente naqueles de cultura latina, a redução da capacidade das famílias em cuidar de seus
membros, o número crescente de pessoas envelhecendo sozinhas e o crescimento da população
idosa em idade mais avançada torna incontestável o aumento na demanda por cuidados formais de
longa duração (Marin, Miranda, Fabbri, Tinelli, & Storniolo, 2012; Camarano & Kanso, 2010).
Dentre as opções desses serviços, encontram-se as instituições de longa permanência para idosos
(ILPIs). Segundo a Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (2005), estas são destinadas a domicilio
coletivo de pessoas idosas e devem proporcionar o exercício dos direitos humanos em caráter de
liberdade, dignidade e cidadania, proporcionando atenção integral compatível com os princípios de
universalização, equidade e integralidade e respeitando as demandas e aspectos socioculturais dos
indivíduos e do território onde estão inseridas.
Para Gonçalves, Alvarez, & Santos (2013), a partir da perspectiva de integralidade, o cuidado
gerontológico deve considerar as diversas dimensões vivenciadas pelo idoso ao longo de sua história.
Assim, além de suprir as necessidades físicas, as ILPIs devem favorecer a sua compreensão acerca das
mudanças decorrentes do envelhecimento e facilitar sua adaptação a esta nova realidade.
Contudo, a precariedade de inúmeras instituições brasileiras e sua herança histórica como um
serviço de caridade mostra uma realidade de recursos limitados que não possibilitam a expressão da
individualidade de seus residentes (Born & Boechat, 2013).
Estudos realizados em diferentes regiões brasileiras mostram que a maioria das instituições são
filantrópicas (65,2%) e, seja por problemas financeiros e/ou inexistência de pessoal que tenha
conteúdos específicos para trabalhar no cuidado ao idoso na localidade na qual se encontra a
instituição, dispõem apenas de profissionais sem esse tipo de formação (Born & Boechat, 2013;
Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas [IPEA], 2011). Nesse sentido, observa-se a
predominância de profissionais de baixa renda, pouca escolaridade e sem condições teórico-práticas
para o cuidado gerontológico (Freitas & Noronha, 2010).
Dessa forma, o cuidado nestas instituições, geralmente, corresponde a ações técnicas automatizadas
que priorizam o atendimento as necessidades fisiológicas, relegando as demandas originadas na
singularidade, nas quais profissionais sem formação reproduzem procedimentos que anulam a
individualidade do sujeito (Santos et al, 2014; Casadei, Silva, & Justo, 2011; Born e Boechat, 2013).
Diante do exposto, as perguntas de pesquisa foram: Como ocorre o processo de formação destes
profissionais que atuam nas ILPIs para cuidarem dos idosos? Nestas instituições há valorização e/ou
condições para que ocorra a formação destes profissionais? Os dados qualitativos das entrevistas ao
serem processados pelo Discurso do Sujeito Coletivo favoreceu a análise de dados? Frente a tais
questionamentos, o objetivo do presente estudo foi analisar as representações sociais dos

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profissionais de ILPIs acerca de seus próprios processos de formação para o cuidado,


compreendendo, também, a visão dos gestores sobre esse processo e identificar quais são os
processos de análise de representação social nesta pesquisa e entre outros autores.

2. Teoria das Representações Sociais

Com o intuito de compreender profundamente como ocorre o processo de formação dos


profissionais de ILPIs e como é representado pelos mesmos e pelos gestores dentro do contexto
estudado, adotou-se como referencial a Teoria das Representações Sociais (TRS) elaborada por Serge
Moscovici na década de 60 (Collares-da-Rocha, Wolter, & Wachelke, 2016). Para o autor, uma
Representação Social (RS) é um sistema de valores, imagens, linguagens, ideias e práticas que tem as
funções de: estabelecer uma ordem para que as pessoas possam se direcionar no seu mundo
material e social e controla-lo; e possibilitar a comunicação ou troca de sentidos entre membros de
uma comunidade fornecendo-lhes um código comum (Moscovici, 2007).
Segundo Jodelet (2008) a abordagem das RSs enfatiza uma mediação da articulação entre estruturas
sociais e processos individuais. Para a autora, as RSs procuram delinear uma verdadeira psicologia
social "social" e o seu carácter inovador pode ser identificado por: seu foco no pensamento de senso
comum; seu papel na constituição de realidade, e sua complexidade (Jodelet, 2008).
A TRS entende que uma realidade social só é criada quando o novo ou o não familiar pode ser
compreendido como fenômeno, fornecendo o referencial interpretativo para que as representações
sejam manifestas, tomando-as como nítidas formas de prática social (Moscovici, 2007; Rocha, 2014).
A teoria trabalha com dois processos sociocognitivos diferentes que se relacionam de forma dialética
na formação das RSs: a ancoragem e a objetivação (Rocha, 2014). A ancoragem consiste na
aproximação do sujeito ao objeto, entre os indivíduos e os membros de determinado grupo,
fortalecendo a identidade coletiva e intervindo ao longo da formação das representações para
assegurar sua inserção ao social (Rocha, 2014; Jodelet, 2001). Já a objetivação é a transformação de
noções abstratas em concretas, reproduzindo o conceito de uma imagem ou ideia em realidade
levando em consideração o contexto histórico e social em que os indivíduos estão inseridos (Rocha,
2014).
Assim, estes dois processos são as formas com as quais as RSs estabelecem intercessões trazendo a
produção simbólica de uma coletividade para um nível quase material e dando conta da realidade
das RS na vida social (Jovchelovitch, 1995). Ao condensar (objetivar) os significados diferentes em
algo concreto, os sujeitos sociais ancoram o desconhecido em uma realidade conhecida, assim as RSs
emergem de um processo no qual forma e é formado da vida social de uma coletividade
(Jovchelovitch, 1995). Dessa forma, a TRS se conforma no estudo do pensamento do senso comum,
que considera o saber comum do individuo e de uma sociedade como fonte do conhecimento
legítimo e impulsor de transformações sociais (Rocha, 2014).

3 Método

Trata-se de uma investigação de abordagem qualitativa. O estudo foi realizado em uma ILPI privada
de caráter filantrópico de um município de médio porte do interior de São Paulo, com uma
população estimada de 216.745 habitantes, da qual 13,6% são idosos, sendo que destes 0,6%
residem em ILPIs filantrópicas do município (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE],
2012). A ILPI selecionada assiste a 54 idosos (26 homens e 28 mulheres), sendo 16 independentes, 22
com dependência grau I, 12 dependentes grau II e quatro dependentes grau III.

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Fez-se a escolha de entrevistar a população total de profissionais e gestores da instituição. A coleta


de dados se realizou entre outubro e dezembro de 2016, por meio de entrevista semiestruturada em
dias e horários previamente pactuados de disponibilidade dos profissionais, sendo várias vezes
remarcadas devido a intercorrências na instituição. O critério de inclusão foi trabalhar na ILPI por
pelo menos três meses, seja contratado ou em caráter voluntário. As entrevistas foram gravadas,
após consentimento dos profissionais, e depois de transcritas na íntegra, foram desprezadas. Os
questionários do projeto desta investigação foram submetidos a testes pilotos realizados com
profissionais da própria ILPI. Estes não compõem o material analisado.
Esta investigação compreende as seguintes perguntas: “O que você considera essencial na
contratação de profissionais para a assistência aos idosos da instituição?”, realizada aos gestores da
ILPI; e “Você percebe que a sua formação contribui para o seu dia a dia no trabalho? De que forma?”,
só foram consideradas as respostas dos profissionais que relataram ter formação técnica, superior ou
curso de cuidador de idosos.
Dentre os gestores entrevistados foram encontradas as seguintes funções: vice-presidente, 1º e 2º
tesoureiro e secretário; e foram consideradas profissionais as seguintes categorias: médico,
enfermeiro, assistente social, auxiliar de enfermagem, cuidador de idosos, serviços gerais,
cozinheiros, auxiliar administrativo, escriturário e motorista.
Os dados sóciodemográficos utilizados para a caracterização da população estudada foram: idade,
sexo, estado civil, formação técnica ou superior, presença de curso ou especialização na área de
cuidado ao idoso, tempo de atuação na instituição e experiência previa com idosos. Esses dados
foram apresentados na forma de frequência simples.
A análise e representação do material produzido foram realizadas mediante a técnica de Análise de
Discurso do Sujeito Coletivo (DSC).
O DSC é uma técnica de tabulação e organização de dados qualitativos que se fundamenta na TRS
que busca reconstruir as RSs preservando a articulação da sua dimensão individual e coletiva (Lefevre
& Lefevre, 2014). Nesse sentido, a análise do material verbal coletado nos depoimentos se deu
segundo os passos propostos por Lefevre & Lefevre (2005): 1) cada questão foi analisada
isoladamente, assim foi copiado o conteúdo de todas as respostas referentes à questão analisada; 2)
foram assinaladas e extraídas as Expressões-Chave (E-Ch) presentes em cada depoimento; 3)
identificaram-se as Ideias Centrais (IC) e Ancoragens (AC) presentes em cada expressão-chave; 4)
agruparam-se os fragmentos dos discursos individuais (E-Ch) similares (mesmas ICs/ACs); e 5) foram
construídos os DSCs. Para a construção do DSC propriamente dito, cada grupamento de Expressões-
Chave que continham o mesmo sentido (IC/AC), foi sequenciado através da introdução de conectivos
que asseguraram a coesão do discurso. Além disso, embora utilizado todo o material, foram
eliminados os particularismos e a repetição de ideias expressas do mesmo modo, palavra ou
expressão. Dessa forma, formaram-se depoimentos sínteses, na primeira pessoa do singular,
representando uma coletividade falando na pessoa de um indivíduo (Lefevre & Lefevre, 2005).
O projeto desta investigação foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de
Medicina de Marília, parecer nº 1.662.805, ligado ao Comitê Nacional de Ética em Pesquisa,
atendendo à resolução 466/2012 para pesquisas realizadas com seres humanos e apreciado pela
diretoria da ILPI estudada. Os profissionais e gestores, que por livre e espontânea vontade
participaram da pesquisa, assinaram previamente um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE).
Para a apresentação dos resultados os gestores foram codificados por G e os profissionais por P,
seguidos de sua sequencia numérica crescente (G1...G4; P1...P29).

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4 Resultados e Discussão

Dentre os 40 profissionais da instituição, foram realizadas duas entrevistas pilotos, dois profissionais
se recusaram a participar da pesquisa, um profissional encontrava-se de licença médica, um gestor se
desligou da instituição durante a coleta de dados e um profissional não se enquadrou no critério de
inclusão, resultando em 33 entrevistas realizadas. Dessas, quatro eram gestores e 29 profissionais.
Dos gestores entrevistados, todos são idosos (60 – 75 anos), em maioria do sexo feminino (75%),
casados, com pelo menos um curso superior (somente uma tem formação na área da saúde), sem
especialização ou curso na área de cuidado gerontológico e atuam na instituição, em caráter
voluntário, em media há 13 anos. Dentre os profissionais, a idade média encontrada foi de 39,7 anos,
a maioria são do sexo feminino (82,7%), casados (58,3%), sem experiência previa com idosos (51,7%),
cursaram ou estão cursando curso técnico ou superior (55,1%) e não fizeram curso ou especialização
relacionados ao cuidado com o idoso (68,9%), estando atuando na instituição por uma média de 4
anos e 9 meses.
O quadro 1 representa o que foi observado no discurso dos gestores em resposta a pergunta: O que
você considera essencial na contratação de profissionais para a assistência aos idosos da instituição?

Quadro 1 – Ideia central e Discurso do Sujeito Coletivo de quatro gestores sobre características de profissionais para a
assistência ao idoso, Marília, 2016

Ideias Centrais DSC


Características A parte humana, emocional, dedicação, porque aqui se você não
afetivas e tiver paciência para lidar com os idosos, não tiver amor ao
emocionais próximo, se você não gostar do que você faz, não aguenta ficar.
Muita gente já foi mandada embora porque fazia o serviço
automático. Porque tem que respeitar, não judiar, antes de por a
mão tem que por o coração. (G1; G2 e G4)
Capacitação O mais importante é que a pessoa tenha conhecimento, seja
técnica e capacitado profissionalmente, pois não é qualquer um que
cognitiva consegue trabalhar com o idoso e, além de ser tecnicamente
capaz, tem que saber lidar com as pessoas e ter um pouco de
dom para o serviço. (G3 e G4)

No presente estudo, o DSC aponta qualidades essenciais para a contratação de profissionais que o
sujeito coletivo tenha atributos como “dedicação”, “amor ao próximo”, o que pode ser explicado
pela RS da herança caritativa das ILPIs no país (Born & Boechat, 2013) e pelo fato da instituição
estudada ter caráter filantrópico e ser ligado a uma organização religiosa o que tende a fortalecer
sua “missão” de prover cuidado aos necessitados baseando-se na compaixão e na caridade
(Christophe & Camarano, 2010).
Para que essa modalidade de cuidado transponha essa realidade, deve-se romper com a ideia de ser
destinada a velhice desamparada, e passar a ter a missão de prestar assistência a idosos cujas perdas
funcionais o tornaram necessitado de cuidados institucionais, devendo funcionar em caráter sócio-
sanitário, possibilitando seus residentes a recuperar sua saúde e autonomia, estabelecer novos laços
afetivos e encontrar condições dignas de viverem até o final de seus dias (Born & Boechat, 2013).
Este sujeito coletivo ainda relata a necessidade de respeito à pessoa idosa “porque tem que
respeitar, não judiar”. Para Pereira & Caira (2014), o respeito pela opinião, história de vida e escolhas
do idoso é um dos saberes do profissional responsável pelo cuidado gerontológico e tem como
subjacente a preservação da autonomia, dignidade, liberdade individual e padrões culturais do idoso,
que são de extrema importância para a qualidade de vida do idoso institucionalizado. Assim, quando
o respeito não acontece o leva a situações de perdas rápidas de autoestima e autonomia.

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A ideia central “capacitação técnica e cognitiva” apresenta um sujeito coletivo que tem como RS a
preocupação com a formação dos profissionais para o cuidado ao idoso. O DSC, nesse caso, apontou
como essencial a formação, relacionando-a as particularidades do cuidado gerontológico, indicando
que “o mais importante é que a pessoa tenha conhecimento, seja capacitado profissionalmente, seja
bem formado”. Contudo, a realidade da instituição, mostra que estão em processo de
reestruturação, considerando que 58,6% dos profissionais já fizeram ou estão fazendo curso técnico,
superior e/ou profissionalizante, sendo que desses somente 52,9% possuem formação especifica
para cuidado ao idoso, realidade, também, encontrada em diferentes regiões brasileiras (Born &
Boechat, 2013; Cornélio & Godoy, 2013; Araújo, Lopes, Santos, & Junqueira, 2014). A realidade
nacional mostra que as instituições, principalmente as filantrópicas, não priorizam a contratação de
profissionais formados, geralmente, devido a fatores econômicos, porém, para Born & Boechat
(2013) falta, também, à diretoria destas instituições a compreensão acerca do processo de
envelhecimento e formação adequada para suas funções, o que perpetua sua visão assistencialista.
O quadro 2 representa o que foi observado no discurso dos profissionais, que responderam
afirmativamente à questão relacionada a formação profissional (curso técnico, superior ou
profissionalizante), em resposta a pergunta: Você percebe que a sua formação contribui para o seu
dia a dia no trabalho? De que forma?

Quadro 2 – Ideia central/Ancoragem e Discurso do sujeito coletivo de dezessete profissionais sobre as contribuições da
formação para a assistência ao idoso, Marília, 2016

Ideias DSC
Centrais/Anc
oragens
IC: Eu acho que contribuiu porque a maioria das coisas que eu aprendi
Embasament eu consigo colocar em prática e aproveitar bastante. Contribuiu
o teórico para enriquecer meu aprendizado, você começa a ter mais
conhecimento daquilo que não conhecia. Tem mais embasamento
nas coisas que você vai fazer, principalmente nas técnicas. Porque
se você não tiver uma formação você vai chegar aqui e você vai
ficar perdido. (P2; P8; P20; P23; P26; P27; P28; P29)
IC: Eu vim de um método que desde cedo tem contato com a prática e
Desenvolvim liberdade pra buscar recursos até cognitivo pra isso, então existe
ento de certa inquietação e é o que faz eu me motivar pra querer melhorar.
raciocínio Ajuda a ter um olhar diferenciado, porque muitas vezes vira tão
crítico rotina que você perde aquela essência. (P4 e P5)
IC: Contribuiu em questão de planejar mais as coisas. Depois do curso,
Desenvolvim também, vi que não existe só eu, que não é assim, todo mundo é
ento pessoal igual. Para mim esse curso foi um aprendizado. (P3 e P19)
AC: A teoria é Contribui, mas não muita coisa. Assim é importante, você tem
diferente da muito conhecimento, mas eu acho que é na pratica do dia a dia.
pratica Tanto que quando entra uma profissional tem que explicar todo o
serviço, porque o que você aprende é uma coisa e quando você
chega a pratica é completamente diferente. (P1; P18; P21 e P25)
IC: O Meu curso pra mim é a mesma coisa que nada. Eu fui mesmo fazer
aprendizado o curso pra ter um diploma, pra ter uma formação. Aqui não se
se dá pela trabalha com tudo que o curso proporciona é mais cuidado que não
pratica tanto o que aprende. Aqui acaba aprendendo mais, porque cada dia
de trabalho é sempre diferente. Assim, saber eu já sabia antes do
curso e eu sei das coisas porque eu faço. (P18; P20 e P24)

Nesta investigação, acerca das contribuições do processo de formação para o cuidado ao idoso a
primeira ideia central é “embasamento teórico”. O DSC traz a RS de que sem a formação este sujeito

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se sentiria desnorteado na sua prática profissional. Colenci & Berti (2012) encontraram, em
profissionais de enfermagem, que para alguns destes a formação teórica contemplou as
necessidades da sua pratica, uma vez que o real papel da instituição formadora seria de ensinar as
competências mínimas para o exercício da profissão.
Contudo, um estudo que analisou o perfil dos trabalhadores de ILPI do vale do Paraíba identificou
que uma grande parcela desses apresentavam dificuldades em definir conceitos básicos relacionados
ao cuidado, apontando precariedade de sua formação técnica que associado a recursos materiais
limitados caracteriza uma má qualidade da assistência (Araújo, Lopes, Santos, & Junqueira, 2014).
Outra contribuição encontrada está relaciona a ideia central “desenvolvimento de raciocínio critico”.
Segundo o DSC, este sujeito interliga esse modo de pensar ao processo de formação para a
inquietação na construção do saber. Ainda nesse sentido, a ideia central “desenvolvimento pessoal”,
mostra um sujeito coletivo que encontrou durante a sua formação um jeito de aprimorar
características individuais e transformar sua visão de mundo.
O pensamento crítico é um processo de raciocínio complexo, sistemático, dialógico, autodirigido e
orientado pela prática que tem a finalidade de buscar, com base nos processos cognitivos, empíricos
e intuitivos, as melhores soluções para os problemas encontrados na prática profissional. Assim, a
competência do pensamento crítico compreende o desenvolvimento de capacidade de análise e
síntese, capacidade crítica e autocrítica, gestão da informação, tomada de decisões e resoluções de
problemas o que é de extrema importância para os cursos da área da saúde (Becerril, Porras, Gómez,
Püschel, Rojas, & Ortega, 2016). Contudo, nem sempre as estratégias de ensino-aprendizagem
utilizadas pelas instituições de ensino possibilitam o desenvolvimento dessa competência, focando-
se nas habilidades técnicas e acúmulo de conteúdo teórico.
A ancoragem “A teoria é diferente da prática” confirma esse enfoque nos conteúdos teóricos, que
nem sempre se relacionam a prática, como apontado no fragmento do DSC em “o que você aprende
é uma coisa e quando você chega a prática é outra completamente diferente”, sendo o ensino
geralmente preconizado por ações no ideal não favorecendo o desenvolvimento da competência
pensamento crítico e marcando o descompasso entre o aprendido e a vivencia profissional (Colenci &
Berti, 2012). Dessa forma, esse sujeito não percebe muitas contribuições da sua formação para a sua
prática profissional.
Isso pode ser explicado, também, pela falta ou timidez da abordagem de assuntos relativos ao
envelhecimento nos cursos da área da saúde (Leite, Gonçalves, Battisti, & Hildebrandt, 2011). Para
que os profissionais possam realizar uma assistência ao idoso de qualidade necessitam de
conhecimentos próprios do cuidado gerontológico. Contrapondo esse olhar, estudo realizado em 20
municípios do Rio Grande do Sul, encontrou que dentre os profissionais que atuam na área da
enfermagem (enfermeiros e técnicos de enfermagem) 75,7% não cursaram disciplinas do campo da
geriatria e/ou gerontologia durante sua formação e 10,8% mencionaram que receberam estes
conteúdos em disciplinas que não possuíam o objetivo de tratar somente esse tema, como saúde
coletiva, saúde do adulto, saúde da comunidade e enfermagem clínica-cirúrgica (Leite, Gonçalves,
Battisti, & Hildebrandt, 2011). Fato esse, que mostra a necessidade de incorporação desse tema aos
currículos dos cursos na área da saúde. Uma análise sistemática realizada acerca da incorporação da
geriatria nos currículos dos cursos de medicina verificou que embora esteja presente na maioria dos
países desenvolvidos, nem sempre as disciplinas são ministradas por docentes com formação
específica na área, sendo que somente no Canadá e poucos países europeus o ensino vem
acontecendo de maneira sistematizada, o que explica, também, a baixa procura dos profissionais
pela área (Mateos-Nozal, Cruz-Jentoft, & Ribera Casado, 2014).
Esta investigação identificou, ainda, um DSC cuja ideia central é “o aprendizado se dá pela prática”.
Este sujeito coletivo traz a RS de que a formação não contribuiu em nada com a prática profissional e
que a fez somente para a obtenção de um diploma, ideias essas expressas nos fragmentos do DSC

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“meu curso pra mim é a mesma coisa que nada”, “Eu fui mesmo fazer o curso pra ter um diploma,
pra ter uma formação” e que as suas habilidades profissionais se deram a partir da prática “eu sei das
coisas porque eu faço”. O semelhante foi encontrado em um estudo realizado na cidade de Belo
Horizonte, no qual a maioria dos cuidadores de ILPIs filantrópicas do município relatou a aquisição de
suas habilidades profissionais no dia a dia da instituição (Ribeiro, Ferreira, Magalhães, Moreira, &
Ferreira, 2009). Neste estudo, mesmo os profissionais com curso superior ou técnico na área de
enfermagem, apontaram o trabalho diário na instituição como fundamental para a sua formação,
indicando que o ensino formal não lhes forneceu o embasamento suficiente para sua prática
profissional.
Segundo a literatura internacional, a utilização de métodos baseados nas RS possibilita a visualização
da interação entre contextos e grupos, com suas respectivas posições sociais, ao representarem
objetos da vida cotidiana, uma vez que estão atreladas as culturas e vivencias dos indivíduos e
grupos ao longo de sua existência, identificando como estas influenciam este sujeito coletivo a
conferir relevância ou valor a determinados assuntos e a agir frente a diferentes situações (Campos
& Lima, 2017, Len-Ríos, Bhandari, & Medvedeva, 2014). Em estudos que se fundamentaram na TRS,
foram encontrados diversos métodos de análise como: a semiótica discursiva, a teoria fundamentada
nos dados e a análise pragmática textual (Len-Ríos, Bhandari, & Medvedeva, 2014; Raynor,
Matthews, & Mayere, 2016; Juárez-Cedillo, Jarillo-Soto, & Rosas-Carrasco, 2013). Contudo,
considerou-se, nesta pesquisa, mais adequada a utilização do DSC, uma vez que possibilita visualizar
claramente RS do sujeito coletivo acerca do fenômeno estudado. Assim, utilização desse método
permitiu a identificação dos olhares e necessidades do processo de formação na perspectiva dos
diferentes atores envolvidos no cuidado em ILPI, identificando as diferentes representações sociais
presentes neste contexto, embora se perceba necessário explorar a visão dos idosos
institucionalizados, uma vez que estes são os protagonistas do cuidado.

5 Conclusões

Os gestores da ILPI estudada, além de características afetivas e emocionais encontradas nos


profissionais, conferem valor a suas formações técnicas e cognitivas para o cuidado gerontológico,
ainda que estejam em processo de reestruturação. Quanto aos profissionais, encontrou-se
divergências quanto às contribuições de suas formações para a prática profissional, identificando
tanto DSCs que as apontavam como fonte de embasamento teórico e fundamental para o
desenvolvimento pessoal e de raciocínio crítico, como DSCs em que o aprendizado se deu devido a
prática profissional, distanciando a formação técnica da realidade da ILPI.
Sabe-se que, no Brasil, a política de atenção à pessoa idosa, ainda está em processo de
implementação, necessitando de muitos impulsos do ponto de vista político, financeiro e de
formação para o cuidado gerontológico, e nas ILPIs essa lacuna é ainda maior. Contudo, é necessário
considerar a tendência pelo aumento da demanda desse tipo de cuidado. Dessa forma, propomos
realizar uma devolutiva para a instituição, por meio de processo reflexivo sobre a formação e o
cuidado aos idosos na ILPI e construir estratégias para superação dos problemas identificados.
Acredita-se, ainda, que o método utilizado contribuiu significativamente na profundidade dos dados
encontrados, possibilitando a expressão de sujeitos coletivos que representassem, em sua
totalidade, as diferentes perspectivas da formação no contexto estudado, assim, faz-se necessário
que novas pesquisas explorem a utilização do DSC na perspectiva de produção científica para um
diálogo em âmbito internacional, uma vez que possibilita a reconstrução das RS preservando a
articulação da sua dimensão individual e coletiva, pois não é, uma invenção ou criação do
pesquisador, mas sim uma reconstituição de um fato social, mesmo que de natureza simbólica.

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Sujeito que aprende nas escolas da compreensão: dimensão


subjetiva da aprendizagem na música

Teresa Cristina Siqueira Cerqueira1 e Nadja Ramos de Ávila2


Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, Brasil. teresacristina@unb.br;
teresacristinasc@gmail.com; Nadjaavila@gmail.com

Resumo. A necessidade de se compreender os processos de aprendizagem e de desenvolvimento de artistas


que expressam o aprender com produção subjetiva constitui um tema importante na área da educação. Foi
realizada uma pesquisa com um músico profissional, oboísta de formação que constituiu as bases teóricas e
metodológicas que dão corpo ao conteúdo desse estudo. A pesquisa buscou evidenciar as relações entre
educação e subjetividade. Buscou-se destacar o sujeito em seu processo de aprender e produzir sentido;
fez-se necessário recuperar o sujeito que aprende integrando a subjetividade como um aspecto desse
processo. A pesquisa teve como objetivo compreender o processo de emergência do sujeito considerando o
aprender como produção subjetiva nas escolas da compreensão ligadas à música. A pesquisa possibilitou a
emergência do sujeito em uma perspectiva cultural e histórica da compreensão da subjetividade que
implicou em considerar que os processos de emergência do sujeito não são uma sequência de positividades.
Palavras-chave: subjetividade; aprendizagem; música.; escola da compreensão.

Subject learned in schools of understanding: subjective dimension of learning in music


Abstract. The need to understand the processes of learning and development of artists who express
learning with subjective production is an important topic in the area of education. A research was carried
out with a professional musician, training oboist who constituted the theoretical and methodological bases
that give substance to the content of this study. The research sought to highlight the relationship between
education and subjectivity. It was sought to highlight the subject in his process of learning and making
sense; It became necessary to recover the learning subject by integrating subjectivity as an aspect of this
process. The research aimed to understand the emergence process of the subject considering learning as a
subjective production in the schools of understanding linked to music. The research made possible the
emergence of the subject in a cultural and historical perspective of the understanding of the subjectivity
that implied in considering that the processes of emergency of the subject are not a sequence of positivities.
Keywords: subjectivity; learning; music; School of understanding.

1 Introdução

A arte constitui uma das mais importantes formas de expressão humana. Desse modo, investigar os
processos de aprendizagem e desenvolvimento dos sujeitos que aprendem em universos artísticos e
culturais específicos ligados à música e ao cinema, considerando o aprender com produção subjetiva,
como uma ação singular do sujeito que aprende e produz sentidos subjetivos no curso de sua
aprendizagem, representa um desafio para a pesquisa na área da educação.
Nesse contexto, buscou-se destacar a emergência do sujeito em seu processo personalizado de
aprender e produzir sentido; para esse fim, fez-se necessário recuperar o sujeito que aprende
integrando a subjetividade como um aspecto importante desse processo, considerando as dimensões

1 Faculdade de Educação da Universidade de Brasília


2 Faculdade de Educação da Universidade de Brasília

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da aprendizagem que estavam para além dos aspectos puramente cognitivos, pois envolviam a
emergência de emoções e afetos que formavam uma teia simbólica, que animou a produção singular
desse sujeito.
Neste estudo, acolheu-se a ideia de que o itinerário de um aprendiz nas escolas da compreensão
possa acontecer ao longo de sua vida em distintos espaços educativos que possam abranger diversas
escolas e diversos mestres, em que o aprender com produção subjetiva desse sujeito possa
impulsioná-lo à busca de novos estágios de desenvolvimento nesse campo, em locais distintos, com
pares e mestres diferenciados.
A pesquisa realizada teve como objetivo central compreender o processo de emergência do sujeito
considerando o aprender com produção subjetiva nas escolas da compreensão ligadas à música. Os
objetivos específicos são: explicar os aspectos que convergem na relevância da escola da
compreensão para o desenvolvimento do aluno; e estudar o vínculo do aluno da escola da
compreensão com o outro na processualidade da emergência de elementos comunicativos que estão
na base do próprio vínculo.
Considerou-se importante destacar nesse estudo o valor da arte para a humanidade e a importância
da educação em uma perspectiva humanizadora que reflita a educação para a sensibilidade.
Percebeu-se na música possibilidades fecundas de desenvolvimento humano.

2 A Teoria da Subjetividade em um enfoque cultural e histórico

Para o desenvolvimento do estudo da subjetividade do sujeito que aprende nas escolas da


compreensão assumiu-se a Teoria da Subjetividade (1999a; 2003; 2004; 2005; 2007) de González Rey
como referencial teórico basilar para a pesquisa, uma vez que essa teoria tenta dar visibilidade às
formas complexas por meio das quais se expressa o psiquismo humano, a partir de uma perspectiva
histórico-cultural (Mitjáns Martínez, 2005).
O universo conceitual que compõe a Teoria da Subjetividade de González Rey e que responde à
definição do que seja a subjetividade, nessa perspectiva teórica, e o seu processo de constituição,
será exposto a seguir, com a conceituação de subjetividade, que será enriquecida com as categorias,
subjetividade social, subjetividade individual, sujeito, personalidade, sentido subjetivo e configuração
subjetiva.
A subjetividade é definida por González Rey (2001, p. 09) como um macroconceito orientado à
compreensão da psique como um sistema complexo, que, de forma simultânea, se apresenta como
processo e organização. A definição de subjetividade em uma perspectiva histórico-cultural proposta
por González Rey é a de “um sistema não fundado sobre invariantes universais que teria como
unidade central as configurações de sentido que integram o atual e o histórico em cada momento de
ação do sujeito nas diversas áreas de sua vida” (González Rey, 2005, p. 35).
A percepção da subjetividade em seu caráter histórico e dialético levou González Rey à construção
do conceito de subjetividade social, que apresenta a subjetividade como uma realidade que não diz
respeito apenas ao indivíduo, mas que se expressa e se constitui também no social. A ideia de
subjetividade social tem sido um dos conceitos centrais no desenvolvimento do posicionamento
teórico do autor, que, em suas palavras, representa:” A organização subjetiva dos diversos espaços
sociais, os quais formam um sistema configurado pela multiplicidade de produções que, em uma
determinada sociedade, faz parte de maneira diferenciada e parcial dos distintos espaços sociais nela
coexistentes” (González Rey, 2007, p. 146-147).
A subjetividade individual representa os processos e formas de organização dos indivíduos concretos.
Nela está constituída a história única de cada um dos indivíduos, história essa que, dentro de uma
cultura, se constitui em suas relações sociais, ou seja, a subjetividade individual se produz em

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espaços constituídos historicamente. Na subjetividade individual, existem dois elementos essenciais


que se relacionam entre si, de forma dialética, no curso do seu desenvolvimento: o sujeito e a
personalidade.
Segundo González Rey (2002, p. 32), “a categoria sujeito é indispensável para se compreender o
caráter processual da subjetividade, pois ela representa o indivíduo ativo, concreto, comprometido
de forma simultânea com sua história e com o momento de sua existência social”. O valor teórico
atribuído à categoria sujeito permite transitar nos desafios que o tema da subjetividade nos impõe.
(González Rey, 2007, p. 144).
González Rey assevera que a “emergência do sujeito” em qualquer espaço social é um elemento
constituinte desse espaço, um elemento gerador de novos sentidos subjetivos que são parte
inseparável da produção subjetiva desse espaço. A categoria sujeito mostrou-se como uma categoria
central para o curso da pesquisa sobre e emergência do sujeito que aprende nas escolas da
compreensão, mantendo um diálogo permanente com as outras categorias que configuram a
perspectiva cultural e histórica da subjetividade.
As configurações subjetivas representam a unidade do histórico e do atual na organização da
subjetividade, pois elas representam a expressão do vivido como produção subjetiva. Porém, essa
produção subjetiva é parte de toda a ação envolvida na vida presente do sujeito, sendo sensível a
múltiplos desdobramentos no curso dessas ações (González Rey, 2011, p. 34). As configurações
subjetivas são sistemas de elementos dinâmicos que se organizam e reorganizam entre si dentro do
conjunto de configurações que aparecem em cada uma das expressões concretas do sujeito
(González Rey, 1999c, p.127).
Cabe agora analisar a categoria sentido subjetivo, que representa a principal unidade constitutiva da
Teoria da Subjetividade (González Rey, 2003, p. 25). O sentido subjetivo é entendido como um tipo
de unidade auto-organizada da subjetividade que se caracteriza por uma integração de significados e
de processos simbólicos em geral e de emoções. Integração na qual um elemento não está
determinado pelos outros, embora tenha a capacidade de evocá-los.
Os sentidos subjetivos estão intrinsecamente associados às configurações subjetivas, às dinâmicas
que animam a produção de sentido e nutrem essas formas organizativas da personalidade e que
merecem ser estudadas em seu caráter recursivo e hologramático. Dessa constatação deriva a
importância de se estudar a subjetividade humana apoiada na investigação empírica de casos
singulares que permitam a reflexão e a construção de modelos de inteligibilidade que contribuam
para o desenvolvimento da teoria.

2.1 Subjetividade e Arte

Dentre as inúmeras indagações sobre o papel da arte em uma sociedade consumista e tecnicista
como a que vivemos (Arendt, 2010; Habermas, 2000; Fischer, 1987; Vigotski, 2001) figura a antiga
indagação sobre o caráter utópico da arte. Habermas (2000), em seu discurso sobre as cartas de
Schiller acerca da educação estética do homem, aponta que o autor, “valendo-se dos conceitos da
filosofia kantiana, desenvolve a análise da modernidade cindida e projeta uma utopia estética que
atribui à arte um papel decididamente social e revolucionário” (p.65). Ao criticar a sociedade
burguesa como o “sistema do egoísmo” e, no mesmo fôlego, o trabalho alienado, a burocracia e a
ciência intelectualizada e altamente especializada, Schiller aposta na força comunicativa, solidária,
fundadora de comunidade, e no caráter público da arte.
Vigotski (2001) afirmou que “a arte é a mais importante contribuição de todos os processos
biológicos e sociais do indivíduo na sociedade, é um meio de equilibrar o homem com o mundo nos
momentos mais críticos e responsáveis da vida”. Ainda para esse autor (2001, p. 315), a arte é o

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social em nós, e, se o seu efeito se processa em um indivíduo isolado, isso não significa, de maneira
alguma, que as suas raízes e essência sejam individuais. Para Vigotski, a arte é uma técnica social do
sentimento, um instrumento através do qual se incorpora ao ciclo da vida social os aspectos mais
íntimos e pessoais do nosso ser.
Esse pensamento encontra consonância com a ideia de arte como produção humana, como fonte de
identificação e de estranhamento, como forma de inquietação, modo de partilhar a cultura e de
gerar emoções e simbologias. Por mais que a arte na sociedade contemporânea tenha se orientado
para a lógica do consumo como forma de entretenimento, temos na expressão artística a
possibilidade de ampliação de horizontes, de visão de mundo, de expressão, de vivências de
experiências estéticas e de conhecimento.
A arte inaugura um campo específico do homem social, o campo do seu sentimento (Vigotski, 2001),
e encontra, na unidade sentimento-fantasia, uma dimensão importante que irá alimentar a utopia
como uma possibilidade filosófica de se pensar o mundo, de articular-se na vida em busca de um
lugar próprio compartilhado na cultura e que seja, ao mesmo tempo, espaço de celebração humana
e de afirmação da singularidade individual.

3. As escolas da compreensão

A ética da compreensão é uma das preocupações de Edgar Morin e figura como um dos capítulos
que compõem a terceira parte de sua obra Método 6: ética. Nele, o autor levanta dois importantes
questionamentos que podem nos levar a reconhecer a compreensão; são eles: 1) como, então,
compreender, compreender a si mesmo, compreender os outros? 2) como aprender a compreender?
No bojo das discussões de Morin sobre a ética da compreensão, encontra-se a sua argumentação
sobre a necessidade de escolas da compreensão humana. A palavra “com-preensão” indica que há
uma ação de envolvimento, algo que abraça, no sentido cognitivo do termo e no sentido afetivo
(Morin, 2007, p.143). Desse modo, a ideia de escolas da compreensão expressa por Edgar Morin
(2008) articula-se na argumentação do autor à ideia de escolas da vida. Nessa articulação, podemos
perceber o caráter humanístico de sua preocupação com a reforma do ensino. De acordo com Morin
(2007, p. 124): “Deveria ser possível ensinar a compreensão na escola primária e continuar na
secundária e na universidade.
A argumentação de Morin que visa destacar a importância da cultura das humanidades na educação
de crianças, adolescentes e adultos é construída em torno de escolas que são por ele denominadas
escolas da língua, que podem ser acessadas por meio do contato com a obra dos escritores e poetas;
escolas da qualidade poética da vida, que se relacionam com o deslumbramento estético do mundo;
escolas da descoberta de si, em que o adolescente possa reconhecer a sua vida subjetiva na vida das
personagens dos filmes e romances; escolas da complexidade humana, visto que em sua visão o
conhecimento da complexidade humana faz parte da própria condição humana; escolas da
compreensão humana, que seriam um convite à lucidez, fomentado pelo acesso à e pela vivência
profunda na vida cultural por meio da experiência estética e reflexiva.
O reconhecimento da necessidade de escolas da compreensão humana relaciona-se ao que Morin
(2007, p.168) denomina de vias regeneradoras que, em linhas gerais, teriam como missão civilizar a
humanidade em profundidade, sair da pré-história da mente humana e sair da barbárie civilizada.
Portanto, essa necessidade refere-se à urgência da reforma da sociedade (que comporta a reforma
da civilização), a reforma do espírito (que comporta a reforma da educação), a reforma da vida e a
reforma da ética.
Em relação à reforma/transformação da sociedade, Morin (2007) aponta que é importante tentar
substituir os modos de organização baseados na centralização e na hierarquia por modos

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combinando o policentrismo e o centrismo, a anarquia e a hierarquia, buscando-se a


desburocratização e a ruptura da esclerose da organização social.
A reforma do espírito/reforma da educação se impõe impelida pela necessidade da humanidade de
enfrentar os problemas globais da vida privada e da vida social. Para que a reforma ocorra, é
indispensável que aconteça a reforma dos sistemas educacionais, que encontram-se baseados na
separação dos saberes, das disciplinas e das ciências e produzem mentes incapazes de conectar os
conhecimentos, de reconhecer os problemas globais e fundamentais e apropriar-se dos desafios da
complexidade (Morin, 2007, 170).

4. Itinerário Metodológico
Neste estudo, assumiu-se a Epistemologia Qualitativa como concepção norteadora para o estudo da
emergência do sujeito que aprende nas escolas da compreensão. Essa concepção norteadora dos
estudos sobre a subjetividade visa a romper com a representação da psique como um conjunto de
entidades estáticas individuais e universais, estabelecendo um caminho congruente com as
investigações da subjetividade (González Rey, 1997a, 1997b, 2003, 2005, 2007, 2011). Elegeu-se o
método do estudo de caso como uma possibilidade de abordar o processo de emergência do sujeito
que aprende nas escolas da compreensão.
O participante deste estudo foi um jovem artista: um músico. Utilizou-se com o participante na
pesquisa os seguintes instrumentos: entrevista; observação; complemento de frase; momentos de
conversação; análise de material audiovisual; análise documental e diário de campo.
No intuito de atender ao desafio metodológico que implica na complexidade da pesquisa proposta,
propôs-se formas mais ativas de provocar os sujeitos a se expressar na pesquisa. Pensando nisso,
utilizou-se também, os seguintes instrumentos: fotos e frases, memória musical e apresentação de
instrumento musical/apresentação do oboé.
O processo de construção da informação empreendido nesta pesquisa esteve em consonância com
os princípios da Epistemologia Qualitativa. A apresentação iniciar-se-á com as principais informações
do participante; em seguida, destacar-se-á os instrumentos utilizados e, ao final, será apresentada
uma construção sobre a emergência do sujeito nas escolas da compreensão ligadas à música,
destacando os aspectos que convergiram na relevância da escola da compreensão para o
desenvolvimento do sujeito.

5. RaviShankar
Músico, oboísta, Ravi era um jovem de 28 anos, casado, pai de um filho, na época da realização da
pesquisa. Aos 15 anos e já um estudante do Ensino Médio, Ravi iniciou seus estudos de oboé na
Escola de Música de Brasília. Aos dezessete anos, Ravi ingressou na Universidade de Brasília como
estudante de música, ainda cursando a Escola de Música de Brasília, nesse ano Ravi tornou-se pai.
Em 2003, Ravi participou de seu primeiro festival de música na Alemanha, com apoio do CESPE –
UnB, onde estagiava. Ao término do curso superior, Ravi foi indicado por um professor, para quem
tocou em um festival, para ser monitor na Orquestra Experimental em São Paulo. Em 2008, Ravi foi
aprovado em concurso público para a Orquestra Sinfônica de Manaus, mas abriu mão da
possibilidade de um emprego público para atender ao convite de realizar um curso de
aperfeiçoamento de dois anos na Alemanha. Ravi partiu para a Alemanha para a realização do curso
sozinho; sua esposa e filho continuaram no Brasil nesse período. Em 2010, Ravi foi aprovado em
concurso público para a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais e mudou-se em março de 2011 para
Belo Horizonte - MG com sua esposa e seu filho.

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O desenvolvimento dos principais elementos da subjetividade individual constitutivos do processo de


emergência do sujeito que caracterizam o aprender na música com produção subjetiva de
RaviShankar:
5.1. A relação com a música como uma unidade subjetiva do desenvolvimento
O processo construtivo interpretativo desenvolvido na pesquisa possibilitou identificar a relação de
RaviShankar com a música como uma unidade subjetiva do desenvolvimento, ao representar uma
força motriz para o seu desenvolvimento como músico profissional e como pessoa. Durante a
pesquisa, Ravi relacionou a música a todas as suas conquistas, à constituição de sua família nuclear,
ao conhecimento de mundo adquirido por meio do processo de aprendizagem e profissionalização
musical, à conquista do emprego como instrumentista de uma renomada orquestra e aos planos
futuros. A música está imbricada em sua vida de uma forma muito profunda, o que corrobora a
hipótese de a música, nesse caso, se constituir como uma unidade subjetiva do desenvolvimento.
A história de Ravi com o oboé iniciou-se em sua adolescência; nessa época, Ravi residia com seus
avós em uma chácara em Goiás e fazia o Ensino Médio no Distrito Federal. Em suas memórias sobre
esse período, Ravi destaca as dificuldades financeiras, o fato de ter de limpar a casa da tia e ajudá-la
em sua barraca na feira aos domingos para ganhar a passagem de ônibus para a escola, o que o
impedia de participar do ensaio do coral que tanto apreciava e de ver sua namorada.
Percebe-se como a falta de recursos financeiros possibilitou ao jovem estudante de oboé a
mobilização de recursos subjetivos que o impulsionaram a buscar alternativas para o enfrentamento
de dilemas. Destaca-se aí a condição de sujeito, e a complexidade que passa por desdobramentos
simultâneos, que incidem em pontos de crescimento e de desenvolvimento que, por sua vez, tomam
forma em impactos simbólicos e emocionais.
Hoje, a música, e, mais precisamente, o oboé, ocupam em sua vida um lugar central; tocar oboé e
tornar-se um músico de excelência representa um projeto existencial desse sujeito que constela a
sua configuração subjetiva da música. Diversas frases do complemento de frases aparecem como
indicadores que demarcam significados que se movimentam na construção de nossa hipótese:Eu
gosto de tocar, ler, estar com os amigos; Trabalho é satisfação; O meu instrumento meu coração; A
música meu modo de viver; Não posso ficar sem música; Quando toco minha alma se equilibra; No
palco sou um eu potencializado; Dedico a maior parte do meu tempo à música; Meu oboé meu
amigo inseparável; A orquestra minha segunda família.

5.2 A vivência da paternidade precoce como uma força propulsora para novas conquistas e
ampliação de horizontes

“O Gabriel, acho que ele adiantou esse clique, acho que, de alguma forma, o caminho apareceu mais
cedo, assim, e eu acho também que o fato de ter um filho, e já ter praticamente casado, eu acho que
me ajudou muito a me manter na linha, ser mais centrado, estar mais focado, apesar das dificuldades
eu acho que contribuiu, assim, para eu poder estar mais centrado.” (A semente da vitória – Fotos e
frases).
A análise da informação permitiu a construção de indicadores de que a paternidade precoce
vivenciada por Ravi aos dezessete anos de idade transformou-se em uma força propulsora de novas
conquistas e ampliação de horizontes. O sofrimento vivido pela separação da namorada, que se
mudou para o Rio de Janeiro na época da gravidez, e a necessidade de sustentar uma família,
aparece configurado em termos ambivalentes que expressam a tensão vivida por Ravi nesse período,
quando pensou em desistir da música e escolher uma profissão que lhe desse um sustento imediato
para sua família.

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5.3 A relação com a esposa como uma unidade subjetiva do desenvolvimento


A análise das informações possibilitou identificar que Guta, a esposa de Ravi, representou para ele
um ponto de apoio para seguir investindo em sua carreira como oboísta, ao representar uma
importante força motriz para o seu desenvolvimento. É importante notar como a processualidade da
configuração subjetiva do relacionamento de Ravi com sua esposa acompanha o seu processo de
desenvolvimento na música e nutre sentidos que se desdobram em outras configurações. A esposa
apareceu espontaneamente em todos os indutores de informação utilizados. A maneira como Ravi
reflete sobre sua relação com a esposa, sobre as dificuldades vividas nos momentos de separação, o
nascimento do filho, as aprendizagens e momentos significativos que vivem e viveram juntos, os
conflitos e os planos futuros, os momentos de carinho e intimidade que são lembrados com
intensidade, ilustram a importância de sua esposa em sua constituição subjetiva.

5.4 A relação com o oboé e os elementos simbólicos e emocionais relacionados ao instrumento


A forma espontânea como as informações sobre o oboé apareceram no curso dos momentos de
conversação, a presença do instrumento em diversos momentos de pesquisa, o prazer em tocá-lo,
expô-lo e conversar sobre ele, as recordações repletas de elementos simbólicos emocionais da
aquisição de seu primeiro oboé; a troca do antigo instrumento que, segundo o oboísta, tinha um
sotaque muito bonito, alemão, por um instrumento novo, que apresenta um sotaque alemão com
uma leve sonoridade francesa, mais doce, mais flexível, que às vezes corre o risco de ficar meio
aberto, explosivo – o que, segundo ele lhe permite explorar mais as possibilidades do instrumento,
foram elementos que nos permitiram construir a configuração subjetiva do oboé, que está
organizada em três dimensões articuladas de maneira complexa na processualidade de sua vivência
com o oboé e se desdobra em variados sentidos subjetivos. São elas:
A dimensão estética: tal dimensão é simbolizada pelo gosto pelas coisas de boa qualidade, pela
beleza, pela organização, pelo refinamento. A vivência com o oboé lhe permitiu conhecer uma
estética diferente daquela com a qual convivia.
A dimensão lírica: a dimensão lírica da subjetividade de Ravi encontra expressão constante em sua
relação com o oboé. As vivências líricas constelam um sentido subjetivo da espiritualidade, de
transcendência, de um nível diferenciado de percepção que aparece espontaneamente e com muita
intensidade em momentos de conversação com Ravi, quando ele, em um período de muita
dificuldade em sua vida, quando ainda era aluno da Escola de Música de Brasília escutava,
constantemente, um concerto muito especial para ele, o Concerto para Oboé e Orchestra de Richard
Strauss. Ao ouvir esse concerto, Ravi imaginava um diálogo seu com sua namorada Guta, atualmente
sua esposa, em que ele era o oboé e Guta o violino. Percebemos no trecho abaixo a presença da
unidade imaginação-fantasia tratada por Vigotski (2001) na obra Psicologia da Arte, e como, na
perspectiva assumida nessa tese, imaginação e fantasia podem se converter em importantes
recursos subjetivos para o desenvolvimento do sujeito.
A dimensão social: toma forma na emoção de partilhar de um espaço social cosmopolita, da
possibilidade de conhecer, partilhar e conviver com outros músicos de diversas partes do mundo, de
ser valorizado socialmente e profissionalmente. Um aspecto importante da dimensão social que
marca a história de Ravi com o oboé aponta para o seu processo de aprendizagem na música e é
demarcado pela presença dos grandes músicos que lhe serviram e servem de inspiração, pelos
professores que encontrou e com quem conviveu ao longo de sua inserção nessa escola da
compreensão, pela participação em festivais e concertos.

5.5. A configuração subjetiva da mudança e a superação de desafios como uma unidade subjetiva
do desenvolvimento

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Quando Ravi mudou-se para a Alemanha para realizar o curso de aperfeiçoamento em oboé,
vivenciou uma intensa transformação em seu modo de vida, pôde se dedicar, pela primeira vez,
profunda e exclusivamente ao oboé; esse momento representou para ele a realização de um sonho.
González Rey (2011, p.39) define modo de vida como um sistema de configurações subjetivas em
desenvolvimento que ganham certas dimensões dominantes no espectro de comportamento
aparentemente diversos das pessoas; os pontos de congruência desses comportamentos em seus
desdobramentos simbólico-emocionais passam a ser momentos de hegemonia de umas dessas
configurações subjetivas sobre outras. A mudança para a Alemanha teve um impacto importante em
sua subjetividade; pela primeira vez se sentiu livre das pressões que experimentara precocemente no
entrelaçamento das condições objetivas de sua vida e sua paixão pelo oboé.
As mudanças em seu modo de vida que ficaram demarcadas pela experiência vivida na Alemanha
encontraram expressão nas escolhas que fez, tais como a opção de voltar para o Brasil, embora
tenha sido convidado por seu Professor na Alemanha a permanecer naquele país para realizar, sob
sua orientação, um curso de mestrado. Submeteu à audição um material seu tocando oboé e foi
aprovado no Concurso para a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, assumindo mais uma
importante mudança para o curso de sua vida.

6. Conclusões sobre o processo de emergência do sujeito na escola da compreensão,


considerando o aprender com produção subjetiva

No percurso em busca da compreensão do processo de emergência do sujeito na escola da


compreensão ligada à música e considerando o aprender com produção subjetiva, orientou-se a
compreensão na direção de entender como as condições sociais, culturais e históricas da vida do
sujeito estava presente nas configurações de sentido subjetivo.
Procurou-se compreender a trama simbólica e emocional em que o outro aparece na expressão
espontânea. Apresentaremos a seguir eixos que foram construídos procurando gerar inteligibilidade
sobre o estudado:
O primeiro eixo mostra como os casos estudados, sob a perspectiva cultural e histórica da
subjetividade compreendida por meio dos sentidos subjetivos e das configurações subjetivas,
apresentam como os processos de emergência do sujeito na música respondem a configurações
subjetivas muito diferentes, que integram a biografia da pessoa, e que não pressupõem
determinações; são, portanto, configurações de sentido subjetivo, singulares, que emergem na dor,
no sofrimento, na tensão, no desafio, na contradição, no conflito, naquilo que não se conseguiu
atingir, na alternativa, nos desdobramento desses aspectos na vida atual.
O segundo eixo de considerações aponta para o impacto diferenciado do outro no processo de
emergência do sujeito em seu processo de aprender com produção subjetiva. O outro pôde ser
percebido na emergência de elementos simbólicos e emocionais que tomaram forma na elaboração
expressiva espontânea do sujeito.
A pesquisa evidenciou o valor do professor no processo de emergência do sujeito na arte; no caso do
músico oboísta, fica claro como os mestres mencionados, com suas distintas formas de agir,
colaboraram para a aprendizagem e o desenvolvimento de Ravi, bem como para a sua ampliação de
horizontes e mudanças de atitudes.
Nos caso estudado ficou evidente o desenvolvimento de um espaço dialógico responsável,
favorecedor da emergência dos sujeitos estudado nas escolas da compreensão da qual faz parte.
Esse espaço dialógico converteu-se em um espaço facilitador da emergência do sujeito nessas
escolas. A existência de um espaço dialógico nas escolas da compreensão estudadas evidencia a
possibilidade da crítica, da autocrítica, da reflexão, do erro, da construção, que configuram uma

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possibilidade ética. Em consonância com González Rey (2004, p.36) o espaço dialógico escolar
salienta “o momento ativo-transformador, educa a audácia, a decisão e a implicação do educando no
processo de aprendizagem”.
O terceiro eixo de nossas considerações refere-se à forte relação entre produção de sentidos
subjetivos e experiências vividas pelo sujeito, considerando a não linearidade desse processo. Nos
caso estudado evidenciou-se a forte relação entre a produção de sentidos subjetivos e as
experiências vividas; no entanto, a não linearidade ficou patente, o que reforça o caráter singular das
configurações subjetivas, o que, por sua vez, reforça a ideia de que a condição pela qual vivemos o
mundo é uma condição subjetiva, na qual o exercício da condição de sujeito outorga a construção de
alternativas, a criação de rotas diferenciadas que não são previsíveis a partir da análise de aspectos
isolados. Nesse sentido, nossas construções corroboram com González Rey (2012, p.34) quando ele
afirma que “a subjetividade é uma produção do sujeito que tem como matéria prima sua vida social e
cultural, porém não existe nenhum tipo de relação direta entre o caráter objetivo de uma
experiência vivida e a forma em que ela influencia o desenvolvimento psíquico da pessoa. Esse
desenvolvimento psíquico está metamorfoseado por uma produção de sentidos subjetivos que se
define na configuração subjetiva da experiência vivida.”
Um exemplo é como Ravi assumiu a paternidade aos dezessete anos em um momento caótico em
sua vida, marcado por dificuldades de ordem financeira e familiar, e os desdobramentos simultâneos
que esse fato foi tomando em sua organização subjetiva. É interessante notar, como sentidos e
configurações subjetivas ligadas a outros contextos de vida dos participantes da pesquisa se
integraram em forma de sentidos subjetivos nas experiências de aprendizagem com produção de
sentido nos contextos formativos dos qual faz parte.
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A Teoria Fundamentada em Dados como ferramenta de análise


em pesquisa qualitativa

Angela Gilda Alves1, Cleusa Alves Martins2,


Eurides Santos Pinho1 e Gabriela Camargo Tobias1,
1
Departamentode Enfermagem da Faculdadade Sul-Americana. Goiânia, Brasil.
angelagildaalves@gmail.com; euridesenf@gmail.com; gabicamargo22@gmail.com
2
Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Goiânia, Brasil. cleusa.alves@gmail.com.

Resumo.Trata-se de um relato de experiência do uso da metodologia da Grounded Theory, traduzida para


português como Teoria Fundamentada nos Dados (TFD). Na coleta de dados foi aplicado um questionário
semiestruturado com 22 enfermeiros professores integrantes de seis instituições de ensino superior no
período de agosto a dezembro de 2015. A análise e a interpretação dos conteúdos transcritos foram
desenvolvidas de acordo com a proposta metodológica da TFD e utilizou-se o software ATLAS/ti como
suporte às interpretações e organização documental. A análise dos dados resultou em quatro subcategorias:
formação docente do enfermeiro; processo ensino-aprendizagem; metodologias e estratégias de ensino e as
interfaces das tendências progressistas – crítico social dos conteúdos. Este estudo permitiu concluir que o
método da TFD é relevante para a análise qualitativa, por seu rigor analítico e metodológico, e tem
contribuído significativamente para expansão do conhecimento a qual permite tratar a abordagem de forma
interpretativa e sistemática.
Palavras-chave: Análise de dados; ensino; pesquisa qualitativa; teoria fundamentada.

Theory Based on Data as a qualitative research analysis tool


Abstract. This is a report of an experiment of the use of the Grounded Theory methodology, translated into
Portuguese as Teoria Fundamentada nos Dados (TFD). In the data collection, a semi-structured
questionnaire was applied with 22 teaching nurses from six higher education institutions from August to
December 2015. The analysis and interpretation of the transcribed contents were developed according to
the GT methodological proposal. The ATLAS/ti software was used as support for interpretations and
documentary organization. The data analysis resulted in four subcategories: Nurses teacher-training;
Teaching-learning process; Teaching methodologies and strategies, and the interfaces of progressive trends
- social critical of content. This study allowed us to conclude that the GT method is relevant to the
qualitative analysis, due to its analytical and methodological rigor, and has contributed significantly for the
expansion of the knowledge that permits to treat the approach in an interpretative and systematic way.
Keywords: Data analysis; teaching; qualitative research; grounded theory.

1 Introdução

A Teoria Fundamentada nos Dados (TFD) foi desenvolvida pelos sociólogos Barney Glaser, da
Universidade de Columbia e Anselm Strauss, da Universidade de Chicago, na década de 1960,
portanto está fundamentada na Sociologia, com influência do Interacionismo Simbólico (IS) e do
pragmatismo. Sua utilização como método de pesquisa teve publicação a partir de 1967 e se estende
até atualidade (Costa, 2013; Glaser & Strauss, 1967).
Assim, teve origem a TFD, cuja sistematização técnica e procedimentos de análise capacitam o
pesquisador para desenvolver teorias sociológicas sobre o mundo da vida dos indivíduos, uma vez

499
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que alcança significação, compatibilidade entre teoria e observação, capacidade de generalização e


reprodutibilidade, precisão, rigor e verificação (Strauss & Corbin, 2008).
A versão straussiana oferece um método mais estruturado e um conjunto de ferramentas que ajuda
a sensibilizar o investigador para a descoberta de novos conceitos e é caracterizada pelo equilíbrio
entre a subjetividade e a objetividade (Freitas & Bandeira de Melo, 2012).
Esse constitui um processo que requer rigor metodológico que poderá resultar, desde a organização
de conceitos até a formulação de um modelo teórico, dependendo do nível de complexidade da
análise atribuída, no fenômeno em estudo. Dessa forma, compreende-se que a teoria proveniente
dos dados é agregada ou relacionada a outras teorias, podendo acrescentar ou trazer novos
conhecimentos à área do fenômeno (Cassiani, Caliri & Pelá, 1996).
A TFD tem enfoque qualitativo que concebe a ideia ou conceito baseado em um esquema lógico e
explicativo acerca dos fenômenos os quais apresentam relação entre os processos indutivos que
elaboram conceitos a partir dos dados e processos dedutivos através das hipóteses que se
relacionam aos conceitos (Strauss & Corbin, 2008).
A intenção dessa teoria é descobrir um modelo conceitual que explique o fenômeno a ser
investigado e possibilite ao investigador desenvolver e relacionar conceitos, cuja ênfase está na
compreensão do fenômeno tal como ele emerge dos dados e não no embasamento em conceitos e
teorias do pesquisador (Cassiani, Caliri & Pelá, 1996; Chenitz, 1986).
Complementando tais concepções, a TFD compreende a realidade a partir do conhecimento da
percepção ou significado que certo contexto ou objeto tem para a pessoa. Consiste em método para
construção de teoria com base nos dados investigados de determinada realidade, de maneira
indutiva ou dedutiva que, mediante a organização em categorias conceituais, possibilita a explicação
do fenômeno investigado (Strauss & Corbin, 2008; Cassiani, Caliri & Pelá, 1996).
A aplicação do método poderá iniciar-se pela microanálise, necessária para gerar as categorias no
estudo. Na sequência, as codificações são realizadas e passam a sugerir relações entre essas, em um
processo de constante comparação. A codificação é a parte central da análise dos dados e o processo
de codificação se organiza em três etapas: codificação aberta, codificação axial e codificação seletiva
(Costa, 2013; Strauss & Corbin, 2008; Bandeira de Melo, 2006).
A autora Kathy Charmaz (2009) afirma a abordagem mais recente da TFD, que recomenda três tipos
de codificação: ‘Codificação inicial’, a qual fragmenta os dados em palavras, linhas ou segmentos de
dados e implica em transcrever todo o material coletado e as frases analisadas e selecionar as
palavras-chave. Ao longo de todas essas fases são construídos os memorandos ou “memos”;
‘Codificação focalizada’ utiliza os códigos ou categorias iniciais mais significativas ou frequentes para
classificar, sintetizar, integrar e organizar quantidades enormes de dados; ‘Codificação axial’
especifica as propriedades e as dimensões de uma categoria, ao relacionar as categorias às
subcategorias e reagrupar dados que foram fragmentados durante a codificação inicial para dar
coerência à análise emergente.
Tem-se que a TFD é uma ferramenta relevante no processo de análise e significação dos dados. Por
permitir o reconhecimento de um tema ou teoria conceitual que justifique elemento investigado.
Com isso, esse trabalho tem como objetivo relatar a experiência da utilização da TDF no processo de
análise dos dados.
Levando-se em consideração as contribuições das práticas pedagógicas utilizadas pelos docentes, em
particular o curso de enfermagem, surgiu o seguinte questionamento: Como é a ação metodológica
priorizada pelos docentes na formação dos futuros enfermeiros à luz da teoria histórico-cultural?

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3 Metodologia

Trata-se de um relato de experiência do uso da metodologia da Grounded Theory, traduzida para


português como Teoria Fundamentada nos Dados (TFD) (Strauss & Corbin, 2008), como estratégia de
análise de dados de uma pesquisa realizada no período de agosto a dezembro de 2015. Foram
entrevistados 22 Enfermeiros Professores integrantes do Núcleo de Saúde Pública das disciplinas de
Saúde da Mulher, Saúde da Criança e Saúde Coletiva, de seis instituições de ensino superior.
Para a coleta de dados foi utilizado entrevista semiestruturado com questões abertas. A análise e a
interpretação dos conteúdos transcritos produzidos foram desenvolvidas de acordo com a proposta
metodológica da Teoria Fundamentada nos Dados.
A análise dos dados consistiu em uma fase central da TFD, para isso utilizou-se o software ATLAS/ti
como suporte às interpretações e organização documental, uma alternativa viável no
desenvolvimento da análise, principalmente, por permitir a análise e apresentação dos resultados e
possibilitar a construção de redes semânticas.
O percurso metodológico dividiu-se estrategicamente em três níveis: o primeiro nível, definido como
descrição, busca a identificação dos códigos que correspondeu à Microanálise - Codificação Aberta,
seguida de uma leitura criteriosa do tipo linha a linha das entrevistas, e os códigos considerados
relevantes foram construídos em grande escala, totalizando 102 códigos. Na Codificação Aberta os
dados foram resgatados às solicitações que provêm dos mesmos. Nesse prisma, é aberta no sentido
de que a codificação promoveu o despertar, abriu os dados e explorou partes das entrevistas para
emergir todos os significados possíveis que o texto pode originar. Desse modo, a codificação “in vivo”
das características e detalhes deram consistência às falas proferidas por professores participantes.
Os códigos selecionados e definidos pela pesquisadora foram cadastrados no software Atlas.ti e, a
partir desses, uma nova busca foi realizada, usando o código na íntegra e seus respectivos sinônimos
a fim de que nenhum dado fosse perdido.
No segundo nível, ocorreu o agrupamento dos códigos por semelhança e/ou proximidade e
originaram-se as subcategorias que reuniram o núcleo de sentido seguindo o ordenamento
conceitual dos códigos. Posteriormente, emergiram as categorias que deram sustentação para
facilitar a discussão da Codificação Axial, em que há predomínio da dedução. Pode-se dizer que a
conexão com as categorias classificadas, segundo o contexto, derivaram de interações e deram
sentido ao fenômeno.
Para o agrupamento no software, foram criadas as famílias que correspondem à codificação axial.
Todas as subcategorias foram vinculadas até obter-se a saturação dos dados, ou seja, refinamento e
interconexão, em que os códigos se repetiam e os semelhantes foram recodificados por meio de
análise minuciosa. Assim, o número de códigos se reduziu a 20 e, em alguns casos, foram
renomeados sem prejuízo da sua semântica para garantir um sentido condizente com os dados e
com as categorias emergentes. E, nomearam-se as categorias, utilizando a criatividade a qual
permite a TFD.
Para auxiliar no processo de codificações aberta e axial, os dados foram lançados no software
ATLAS/ti 7.0, em que se viabilizou a organização do grande volume de material transcrito permitindo
codificá-lo (codes) e visualizar os resultados em categorias (families) que foram interligadas, e
possibilitar o agrupamento dos códigos e categorias em redes semânticas. Os codes, identificados no
material transcrito, são as quotations que foram trechos dos relatos que apresentaram o code
definido.
De acordo com Silva, Souza, Moreira, Esperidião & Silva (2015) a utilização do software foi descrita
como instrumento para encontrar núcleos de sentido nos dados apresentados, como redes
semânticas, verificando sua frequência relacionada ao objetivo do estudo.

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Por fim, o terceiro nível, definido como teorização, importante para revelar a Codificação Seletiva e
consequentemente a Teoria Substantiva, advinda do refinamento, integração e inter-relação das
categorias, consiste o tema central que representa e remete aos dados analisados. Conceito
organizador principal de uma área da pesquisa identificado indutivamente seguindo a hierarquização
das categorias.
Nesse nível da Teoria surgiram os sinais de plasticidade, partindo para o plano abstrato e indutivo.
Caracteriza-se como uma fase não linear, feita de intuições baseadas nos dados. Nesse momento,
revisitou-se o banco de dados para confirmar e validar a teoria emergente verificou-se que o tema
central esteve presente desde a codificação aberta, persistindo em todos os níveis e refinamentos
realizados acerca da prática docente no ensino na saúde.
A categoria central é aquela capaz de reunir outras categorias para formar um todo explanatório a
qual formou um eixo temático único com informações dos participantes, a fim de subsidiar a
elaboração, execução e supervisão referentes à prática docente denominada categoria emergente.

4 Resultado e discussão

A coleta de dados na TFD, adotada neste estudo, ocorreu por meio de entrevistas e observações. A
entrevista permitiu flexibilidade para esclarecer pontos essenciais para a compreensão da realidade
investigada e avaliar a consistência dos relatos, mediados pela observação do comportamento não
verbal do participante, que permite compreender o que não é passível de expressão. Assim, à
medida que os dados foram coletados, foram submetidos à análise concomitante, em um processo
de comparação constante (Dantas, Leite, Lima & Stipp, 2009).
Existem na TFD, três níveis de análise, também aqui executados, no processo de construção teórico,
sendo: a descrição ou codificação aberta, o ordenamento ou codificação axial conceitual e a
teorização ou codificação seletiva (Strauss & Corbin, 2008). Os níveis das diretrizes da teoria
fundamentada descritos por Charmaz (2009) são as etapas do processo de pesquisa, que fornecerem
caminho para que se possa modelar e remodelar os dados coletados num processo de refinamento
dos dados.
No nível de descrição ou codificação aberta a partir dos discursos dos participantes, ocorreram a
análise criteriosa e a organização das informações segundo a Teoria Fundamentada nos Dados, para
refinamento dos códigos. Assim, a ‘descrição’ se deu a partir da elaboração de aspectos realidade de
maneira informativa e cuidadosa. Ao incorporar conceitos, os detalhes descritivos e pelo menos
implicitamente, não possui interpretações acerca do porquê, nem como o fenômeno ocorre (Costa,
2013).
Enquanto o ordenamento conceitual ou codificação axial é o nível considerado como precursor da
teorização, em que os dados são organizados em categorias (Strauss & Corbin, 2008). Nessa etapa os
dados provenientes da reflexão dos participantes quanto à prática docente cotidiana e os reflexos no
processo ensino na enfermagem, foram ordenados conceitualmente e refinou-se a categoria “A
prática docente do enfermeiro à luz da teoria histórico-cultural” da qual derivaram as subcategorias
intervenientes a essa prática. No processo de análise dos dados emergia teoria “A prática pedagógica
do docente distante do processo didático e dos contributos de Vigotski”, conforme apresentado na
Figura 1.

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Fig. 1. Apresentação da categoria, das subcategorias e da teoria que emergiram da TDF.

A ‘codificação aberta’ consiste na decomposição, análise, comparação, conceitualização e


categorização dos dados. Nessa etapa, os dados ganham vida a partir dos questionamentos que
emergem, são descobertas propriedades e dimensões das categorias, e os incidentes ou eventos são
agrupados em códigos, conceitos, através da comparação incidente– incidente. A intenção é realizar
amostragens teóricas suficientes e ter as evidências necessárias para formar uma categoria
conceitual fundamentada nos dados (Costa, 2013; Bandeira de Melo, 2006).
A partir da identificação de categorias conceituais pela codificação aberta, a ‘codificação axial’
examina as relações entre categorias e subcategorias. A categoria representa o fenômeno que
emerge, enquanto a subcategoria responde a questões do fenômeno. Explicitam-se causas e efeitos,
condições intervenientes e estratégias de ação, em proposições que devem ser testadas novamente
nos dados (Costa, 2013; Bandeira de Melo, 2006; Strauss & Corbin, 1998).
Tarozzi (2011) afirma que um bom sistema de análise é definiras relações hierárquicas entre as
categorias, para identificar subcategorias irmãs e subcategorias filhas. Assim, aquelas que
demonstraram relação de paridade hierárquica foram colocadas sob o guarda-chuva de uma
categoria conceitualmente mais extensa.
O processo envolve a identificação de itens nos dados, além de anunciar uma definição de acordo
com as suas características e dimensões. Essas classificações são analisadas de forma temática, por
estágios ou por tipos de pessoas e ações. A análise é fundamental para o nível ou diretriz
denominados teorização, pois uma teoria contém conceitos definidos de acordo com suas
características e dimensões. A organização de conceitos, contudo, pode constituir o objetivo
desejado em algumas investigações e não a integração desses conceitos em uma teoria (Strauss &
Corbin, 2008).

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Nesse sentido, a subcategoria Formação Docente do Enfermeiro por meio da organização dos
conceitos referidos pelos participantes demonstrou resultados que indicam que a formação do
enfermeiro docente pode permear diversos caminhos desde a graduação até ao constante processo
de agregar conhecimento ao longo da sua prática profissional. Ainda que existam recomendações
quanto à formação em licenciatura ou outros cursos formativos na área da docência, não há um
padrão definido ou um único caminho a ser seguido.
Seguindo a segunda subcategoria Processo Ensino-Aprendizagem surgiu a partir dos dados que
sinalizaram as características que o envolveram e que podem influir positiva ou negativamente. Esse
processo pode ser permeado de diversas maneiras e sofre inúmeras influências na visão do professor
enfermeiro. Os dados apresentados são reflexos da realidade do ensino em enfermagem e de suas
interferências.
Enquanto os códigos que orientaram a subcategoria Metodologias: Estratégias de Ensino-
aprendizagem, referem aos procedimentos de ensino e recursos didáticos, que foram descritos como
estratégias de ensino, por não estarem compreendidos no contexto de metodologia. As pontuações
referentes a metodologias e estratégias de ensino surgiram com número relevante de ocorrência nas
falas conforme a descrição dos professores.
A Interface das Tendências Progressistas, foi a subcategoria que discutiu a interface das tendências
progressistas crítico social dos conteúdos, a partir da vivência relatada pelos participantes. Em suma,
os dados pertinentes a essa discussão foram organizados, por ordem de ocorrência nas entrevistas
para direcionar a discussão até emersão da Teoria Substantiva em que consiste o nível de teorização.
A teorização caracteriza-se pelo conjunto de categorias ou conceitos inter-relacionados de forma
sistemática, através de enunciados de relação, formando um quadro que explica um fenômeno. Vale
ressaltar que se trata de um processo em construção que se inicia na transição e organização dos
conceitos para a elaboração da relação entre eles (Strauss & Corbin, 2008).
Finalmente, a ‘codificação seletiva’ refina todo o processo, identificando a categoria central da
teoria, com a qual todas as outras estão relacionadas. A categoria central deve ser capaz de integrar
todas as outras categorias e expressar a essência do processo social que ocorre entre os envolvidos.
O processo de codificação seletiva subsidiará a formação de um esquema organizacional maior, e os
resultados compõem a teoria. Ainda na codificação seletiva, categorias mal formuladas são revistas,
e falhas na lógica da teoria são resolvidas (Costa, 2013; Bandeira de Melo, 2006).
Como espera-se na TDF se faz necessário o movimento de ir e vir do pesquisador com os dados. Fato
que permite a ressignificação do sentido e compreensão das informações coletas até ser possível
chegar ao Núcleo Central da Categoria ou Teoria Substantiva.
O movimento caracterizado por ir e vir dos dados, tem objetivo final de saturar e delinear a teoria
por meio de processo analítico, e construir a teoria, dar o rigor metodológico necessário, auxiliar o
pesquisador a detectar os vieses, desenvolver fundamentos, a densidade, sensibilidade e a
integração necessária para gerar uma teoria (Strauss & Corbin, 2008).
O Núcleo Central da Categoria poderá ou não ocorrer segundo TFD. Nesse estudo, durante a análise
das entrelinhas dos discursos, após intima aproximação da pesquisadora com os dados com intuito
de extrair o significado da prática pedagógica do docente enfermeiro emergiu como essência, a
fragilidade no domínio da prática pedagógica docente, distante do processo didático e dos
contributos de Vigotski, denominando a categoria central “A prática pedagógica do docente distante
do processo didático e dos contributos de Vigotski”. Na verdade esta categoria embora não se tenha
sido planejada, despontou quase como uma validação dos dados discutidos.
Na teoria substantiva os discursos dos participantes selecionados evidenciaram conceitos primários
ambíguos que revelaram o desconhecimento de componentes singulares ao processo didático,
pertencentes aos componentes pedagógicos, ocorreram equívocos abundantes quando

504
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

mencionaram a sua performance profissional durante a práxis ensino-aprendizagem, por


vezes,distanciada do processo didático.
A análise dos dados e a escolha do caminho a ser percorrido são bastante subjetivas e dependem da
completude do objeto de estudo, assim, há várias comparações que podem ser construídas para
entender o que pode estar por trás do texto superficial. O pesquisador pode usar alguns para
atender aos objetivos de pesquisa (Strauss & Corbin, 2008).
Strauss & Corbin (1990) exemplificam técnicas que auxiliam o processo de análise:
Análise da palavra - expressão ou sentença, escolher uma palavra ou expressão que pareça
importante e listar seus possíveis significados;
Técnica da Inversão - comparar os extremos em uma dimensão em questão para descobrir
dimensões ou questões que não tinham sido consideradas antes;
Comparação Sistemática - utilizam-se perguntas hipotéticas para explorar todas as dimensões dos
dois fenômenos, isso pode estimular o pesquisador a reconhecer o que já existe;
Comparações Distanciadas - toma um elemento do conceito que está sendo examinado e propõe o
exemplo mais distante ou diferente de algum outro fenômeno que tenha algumas características em
comum. Depois repasse os outros elementos de ambos os fenômenos para esclarecerem algo
original. A razão da comparação é gerar mais códigos que forneçam dimensões, propriedades ou
aspectos da ideia original;
Agitando a bandeira vermelha - deve-se ser sensível a expressões: nunca, sempre, não pode ser
assim. Para descobrir o que aconteceria se essa situação fosse real;
Codificação linha por linha - recomendada como primeiro passo é a codificação linha por linha.
Há que se mencionar a Teoria Interpretativa, visto que essa é totalmente compatível com o
Interacionismo Simbólico, pois exige compreensão imaginativa do fenômeno estudado. Essa teoria
pressupõe: realidades múltiplas e emergentes, indeterminação, fatos e valores quando associados à
verdade como algo provisório e à vida social como processo (Silva, 2014).
A aplicação do método da TFD pode resultar um produto e ainda estabelecer modelos teóricos ou
reflexões teóricas. Recomenda-se aos pesquisadores que almejam trabalhar com tal referencial
metodológico o envolvimento com o objeto de estudo, disponibilidade de tempo, criatividade,
domínio dos preceitos da TFD, capacidade dedutiva e indutiva e sensibilidade teórica. Essa última
característica diz respeito à capacidade do investigador em perceber e compreender o significado
dos dados e as habilidades em discernir entre as informações relevantes ou não ao estudo (Dantas,
Leite, Lima & Stipp, 2009).
O método da TFD é relevante para a análise qualitativa, por seu rigor analítico e metodológico, em
áreas como Educação, Enfermagem, Psicologia e Sociologia, têm contribuído significativamente para
expansão do conhecimento a qual permite tratar a abordagem de forma interpretativa e sistemática
(Dantas, Leite, Lima & Stipp, 2009).

5 Conclusões

Este estudo caracteriza-se pela descrição da experiência da utilização da TFD na operacionalidade


dos dados obtidos em uma pesquisa qualitativa em que a prática pedagógica do docente distante do
processo didático e dos contributos de Vigotski emergiu como ponto central de reflexão e discussão.
Vale destacar a relevância de disseminar junto a comunidade acadêmica que a TFD pode ser usada
em pesquisa qualitativa com a finalidade de análise dos dados sem a pretencão necessária de gerar
teoria, mas para análise dos dados adotando com o rigor que exige o contexto pesquisado.

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Analisar os dados é um caminho subjetivo intrinsecamente ligado ao objeto de estudo, um processo


que envolve sensibilidade, dedicação e criatividade, visto que o olhar do pesquisador estará voltado
às entrelinhas a fim de identificar o que há por trás do texto descrito ou transcrito. Faz-se necessário
identificar o que foi dito, mas não foi codificado na escrita, o sentido que os participantes da
pesquisa abonam a realidade relatada.
Recomenda-se a utilização da Grounded Theory quando há na intenção do pesquisador o desejo de
desvendar um arquétipo conceitual que elucide a realidade ou aspecto dessa realidade investigado.
Pois, o método permite que o pesquisador relacione os conceitos e códigos desde a codificação
aberta até a codificação seletiva, enfatizando a compreensão dos aspectos investigados a medida
que vão emergindo dos dados, essa característica desabilita as inferências de conceitos e teorias
prévios do pesquisador, o dado assume papel de fundamentar a teoria e a análise da pesquisa.
O uso da TDF como instrumento de análise de dados, produziu experiência exitosa, permitindo que
os pesquisadores pudessem mergulhar no contingente de informações e realizar o contínuo
movimento de ir e vir nos dados para análise criteriosa, além de vislumbrar o surgimento da teoria
substantiva na codificação seletiva a partir da discussão das subcategorias.

Referências

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507
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Educação médica: a linguagem e o agir comunicacional

Antônio da Silva Menezes Junior1, Iria Brzezinski 2

1 Doutor em Ciências da Saúde pela USP, Doutor em Educação pela PUC- Goiás, Professor efetivo Adjunto

I da Escola de Ciências da Saúde, Farmacêuticas e Biomédicas e Professor efetivo do PPGE (Programa de


Pós-graduação Stricto Sensu em Educação) da PUC-Goiás; a.menezes.junior@uol.com.br

2 Doutora em Administração Escolar pela USP, Pós-doutora em Educação pela Universidade de Aveiro –

Portugal, Professora Titular da PUC Goiás e Professora efetiva do PPGE (Programa de Pós-graduação Stricto
Sensu em Educação) da PUC-Goiás; iriaucg@yahoo.com.br

Resumo. Neste artigo procura-se estabelecer críticas ao modelo tradicional do ensino de formação de
profissionais da área de saúde. É uma pesquisa qualitativa, teórica, com base na Teoria do Agir
Comunicativo de Habermas. As categorias analisadas são: a linguagem (construção coletiva de identidade) e
a ação comunicativa (razão comunicativa). As políticas de formação desses profissionais, oriundas de um
modelo desagregado do contexto social e cultural e voltadas ao mercado do trabalho, distanciam-se do
mundo subjetivo habermasiano. Distanciam-se também da formação omnilateral necessária para
transformação e inserção social no contexto de uma modernidade tardia. As políticas instituídas reforçam e
reproduzem o modelo neoliberal, quando, essencialmente não agregam a possibilidade de inclusão do
outro e não estabelecem a possibilidade do diálogo como processo de (re) construção das relações
humanas, em especial, da relação médico-paciente.
Palavras-chave: Educação médica; Linguagem; Ação comunicativa; Pesquisa qualitativa.

Medical education: language and communication action.


Abstract. This article attempts to criticize the traditional model of health professional’s preparation. It is a
qualitative, theoretical research, based on Habermas’ Theory of Communicative Action. The categories
investigated are: language (collective construction of identity) and communicative action (communicative
reason). The educational policies of these professionals, derived from a disaggregated model of social and
cultural context and focused on the labour market, are distanced from the Habermasian subjective world.
They also distance themselves from the omnilateral formation, considered essential for the social
transformation and the insertion in the late modernity context. The founded policies support and reproduce
the neoliberal model, when, essentially, they do not increase the inclusion opportunity of the other and do
not establish the dialogue possibility as a process of human relations (re) construction, especially the
doctor-patient relationship.
Keywords: Medical education; Language; Communicative action; Qualitative research.

1 Introdução

Neste artigo tem-se o propósito de apresentar a teoria do agir comunicativo de Jürgen Habermas
como relevante para as relações humanas. A teoria surge a partir da existência de estruturas de
racionalidade já desenvolvidas em nível cultural, além, das representações legais e morais, contidas
nas visões de mundo, e que permitem organizar os sistemas de ação configurados em novos níveis
de integração social.
Objetiva-se assumir o agir comunicativo como referencial teórico, visando refletir sobre o
distanciamento existente entre a formação humanista − Resolução CNE /CES n. 4, de 9 de novembro
de 2001 (Brasil, 2001) e Resolução nº 3, de 20 de junho de 2014 (Brasil, 2014) – e as políticas liberais
voltadas para a fragmentação do conhecimento profissional do médico requerido pelo mercado de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

trabalho. Esses profissionais deveriam estar inseridos no mundo objetivo-subjetivo do trabalho, na


busca de transformação, emancipação social, e, suspostamente, afastados do individualismo imposto
pelo sistema neoliberal.
A pesquisa é qualitativa, de caráter teórico com análise sustentada na Teoria do Agir Comunicativo.
As categorias analisadas são: a linguagem (construção coletiva de identidade) e a ação comunicativa
(razão comunicativa). Apesar de Habermas não abordar especificamente a Medicina, a sua escolha
como referência filosófica de análise se justifica pela aplicabilidade de seus conceitos acerca da
concepção de mundo, composto por subsistemas, nos quais operam a razão instrumental, a razão
estratégica e a razão comunicativa.
A prevalência da razão instrumental e do agir estratégico, nos meios políticos e econômicos,
acabaram por configurar um mundo colonizado (Habermas, 1987b, p.78) direcionado a fins
individuais. Nele, a formação e a prática médica, vinculadas ao mercado de trabalho, à pessoa do
médico, inscrita no contexto social e cultural, e às leis do Estado, desagregam verdades consolidadas
construindo novas perspectivas que se ajustam mais à conjuntura social e econômica vigente.
É nesta atmosfera que provém de ideias iluministas, do encontro com uma “razão pluralizada”, da
impossibilidade do retorno às velhas práticas e da possibilidade de se encontrar no diálogo uma
perspectiva integral do homem corpo e espírito, que se verificou em Habermas (1987c) um elo de
convergência entre a Medicina essencialmente humanista da antiguidade e a medicina cientificista
da atualidade.
Conceitos como iluminismo, racionalização, racionalidade, modernidade possibilitam a localização
temporal, o encadeamento de fatos históricos e, aos poucos, tecem as malhas que fornecem
sustentação à configuração do mundo sistêmico habermasiano (Freitag, 2005).
Stotz (1993) assegura que as profissões da área da saúde, em destaque, médicos e enfermeiros
atuam diretamente com seres humanos e convergem suas ações em prol deles, ao visar à prevenção
da saúde e a busca da cura para determinadas doenças. Para que isto ocorra esses profissionais
devem agir e interagir como sujeitos de sua própria vida e com domínio de suas práticas científicas
humanizadas, no intuito de transformar a cidadania no exercício de inclusão de cidadãos.
Ressalta-se, deste modo, que o ser humano não é apenas um produto biológico. É, sobretudo, um
agente no processo saúde-doença, que vive sua história concreta tendo suas condições de vida
determinadas pela sociedade em que se insere. Freire (1998) esclarece que os seres humanos
transcendem o biológico, pois são seres histórico-sociais capazes de comparar, valorar, escolher e
decidir, em razão de sua individualidade e de domínios cognitivos e culturais,
O profissional médico, a nosso ver, assume a responsabilidade histórica pelo engajamento com a
realidade que, consoante Paulo Freire, tem sua verdade na solidariedade, competência,
responsabilidade. O autor, Patrono da Educação Brasileira, ressalta:

Posso saber pedagogia, biologia como astronomia, posso cuidar da terra como
posso navegar. Sou gente. Sei que ignoro e sei que sei. Por isso tanto posso saber o
que ainda não sei como posso saber melhor o que já sei. E saberei tão melhor e
mais autenticamente quanto mais eficazmente construa minha autonomia em
respeito à dos outros (Freire, 1996, p. 94).

A análise da realidade e do contexto formativo dos futuros profissionais médicos revelam a notória
importância da reflexão sobre o ato comunicativo. Tal ato praticado entre esses atores sociais,
associado ao compromisso de compartilhar a assistência à saúde no País é entendido como um
processo de relações individuais, sociais, culturais no qual, os profissionais de saúde entrecruzam
suas distintas trajetórias.

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2 O giro linguístico epistemológico: o papel da produção, da linguagem e da comunicação.

O devir da razão instrumental subjetiva, reafirma Habermas, passa a existir em decorrência de


fatores e movimentos que permitiram a virada paradigmática da subjetividade com o Renascimento,
a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. A historicidade destes movimentos, aperfeiçoados
com outras vertentes filosóficas, representadas pelo nominalismo, empirismo, racionalismo foram
importantes para a formulação do princípio da subjetividade. Mediante o racionalismo e sua crítica,
filósofos como Hegel e Kant estabeleceram formas gerais de pensamento e conhecimento
(Habermas, 1987b).
No estabelecimento da lógica formal e a lógica transcendental, a primeira proposta por Hegel e a
outra por Kant, Marcuse (2004) aponta as diferenças, ao esclarecer que:

A Lógica de Hegel expõe a estrutura do ser-como-tal, isto é, as formas mais gerais


do ser. A tradição filosófica, desde Aristóteles, designa como categorias os
conceitos que compreendem estas formas mais gerais: substância, afirmação,
negação, limitação; quantidade, qualidade; unidade, pluralidade etc. A Lógica de
Hegel é uma ontologia, pois liga com tais categorias. Mas esta Lógica trata também
das formas gerais do pensamento, do conceito, do juízo e do silogismo e é, sob este
aspecto, “lógica formal”. Podemos compreender a razão desta heterogeneidade
aparente de conteúdo se nos lembrarmos de que também Kant se ocupou de
ontologia e de lógica formal na sua Lógica Transcendental, tratando ao mesmo
tempo das categorias de substancialidade, causalidade, comunidade
(reciprocidade), e da teoria dos juízos (Marcuse, 2004, p.65-66) (grifos nossos).

A distinção tradicional entre a lógica formal e metafísica geral (ontologia) não tem sentido dentro do
idealismo transcendental, que concebe as formas do ser como resultados da atividade do
entendimento humano. Os princípios do pensamento, portanto, são também princípios dos objetos
do pensamento. Neste processo de ruptura paradigmática com a racionalidade mítica e metafisica,
Habermas adota como principio de negação a lógica transcendental kantiana que ainda com Marcuse
(2004) fica bem distinta da lógica hegeliana formal ao assegurar que “a sua concepção desta unidade
difere da concepção kantiana. Ele rejeita o idealismo de Kant sob o fundamento de que este admitira
a existência de “coisas-em-si”, à parte dos “fenômenos”, aceitando que tais “coisas” fossem
inapreensíveis, pois, pela razão” (Marcuse, 2004, p. 66).
O conceito de razão comunicativa foi desenvolvido por Habermas numa tentativa de descobrir uma
concepção de razão situada historicamente ─ como algo “concretizado na história, sociedade, corpo
e linguagem” (Habermas, 1987b, p. 172) ─, mas que ao mesmo tempo, distancia-se das contingências
históricas, para criticá-las. Por isso, a racionalidade comunicativa é uma concepção puramente
processual da razão, que pressupõe que nenhuma perspectiva concreta pode ser privilegiada com
relação à sua racionalidade.
Habermas (1986) aponta novos caminhos para a razão que desloca o fundamento da razão
subjetivista para o da intersubjetividade ou dialogicidade. Se o modelo paradigmático da
racionalidade moderna tinha como conceito e discernimento a verdade incondicional e o êxito
funcional, definidos pela relação meios-fins, o modelo da razão comunicativa, proposto por ele,
assenta suas pretensões de verdade sobre o entendimento intersubjetivo. Assim, Habermas (1987a)

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assegura que o poder da razão/reflexão pode ser entendido à medida que os homens conseguirem
livrar-se da filosofia da Bewußtsein (consciência ou do sujeito) 1.
A propósito da recuperação da experiência esquecida de reflexão se faz necessária a análise da
pragmática do uso de linguagem na mediação da interação social. Essa análise tenta revelar “as
estruturas gerais da comunicação linguística” (Habermas, 1987b, p.137), que são universais e,
sobretudo, a possibilidade de uma reflexão crítica, ampliando a análise da razão, ao secundarizar a
unidade de razão teórica, incluindo as esferas moral-prática e estética. Ao deixar a verdade absoluta
subjetivista à busca de uma verdade exige o uso competente e honesto, daí as implicações ético-
morais e os processos argumentativos na busca do que se intitulam acordos consensuados.
De acordo com Habermas (1987b), as comunicações que os sujeitos estabelecem entre si se baseiam
em seus esforços de entendimento mútuo num sistema de referências composto de três mundos: o
objetivo, o social e o subjetivo. No mundo objetivo acontece a representação ou pressuposição de
estados e acontecimentos, com base na construção de saberes e conhecimentos. Deste mundo os
participantes da comunicação extraem suas interpretações (cultura). O mundo social é o lugar de
acontecimento da produção ou renovação de relações interpessoais, nele incluem-se as ordens
legítimas e a regulamentação da participação dos atores sociais em grupos sociais distintos
(sociedade). O mundo subjetivo é o lócus da manifestação de vivências e da auto-representação.
Nele são configuradas as competências de participação no processo comunicativo e a afirmação da
identidade dos atores sociais (personalidade).
Habermas (1987c) reafirma que a interação entre esses três mundos leva os participantes da
situação de comunicação ao entendimento do Mundo da Vida, que constitui o contexto no qual se
desenvolvem os processos de entendimento e os participantes da comunicação se movimentam. O
mundo da vida, como nível real do agir comunicativo exige interpretação. Ele é entendido a partir de
uma conjuntura de sentido não conhecido e, portanto com possibilidades de abertura a outros
horizontes no processo de entendimento. Este processo se fundamenta efetivamente, em seus
componentes estruturais vinculados à cultura, à sociedade e à personalidade. Esses componentes e
atualizam pela instauração dos processos de reprodução cultural, social e de socialização. Ao acervo
do saber representado pela cultura são acrescentadas as ordens institucionais da sociedade e as
estruturas de personalidade, visando à efetivação por “competência” frente à ação comunicativa na
totalidade de abordagens possíveis pelos participantes da interação.
Conforme Habermas (1987c), o Mundo da Vida “trata-se do saber concreto acerca da linguagem e do
mundo que permanece no lusco-fusco do elemento pré-predicativo e pré-categorial e que forma o
solo não problemático para todo o saber temático e tematizado-juntamente” (Habermas, 1987c,
p.87).
Para efetuar o trânsito entre a ação comunicativa e mundo da vida, Habermas utiliza-se do artificio
da situação de ação, que visa a delimitar as circunstâncias necessárias para que a ação comunicativa
possa acontecer, diminuindo o risco de fracasso do entendimento. Nas ações voltadas ao
entendimento é necessário que haja uma definição comum da situação entre os participantes. Esta
situação deve ser reconhecida intersubjetivamente como suposto contextual implícito que
permanece somente na área semântica em cada emissão linguística (Chennoufi, 2013).
Um tema relevante significa a sua saliência em relação a um horizonte de evidências e convicções.
Constitui uma situação que adquire significado no momento que se torna problematisch
(problemática), enquanto indica uma situação de Außenseiter (desajuste). Tal tema em determinado
no momento poderá ocupar um segundo ou terceiro plano, conforme emergirem novas situações
problemáticas que se sobreponham às anteriores. Esse momento quer evidenciar que a dimensão

1 Isto poderia significar uma mudança paradigmática dentro da própria filosofia, ainda que a sociedade, com
suas patologias, permaneça nas amarras da modernidade tardia.

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em que a situação se contextualiza é fluida, porosa, e se desloca conforme a circunstância. Nesse


sentido, a ação implica a articulação espaço-temporal do Mundo da Vida como pressuposto
necessário à ação comunicativa. Habermas enfatiza que

Diese Situation stellt ein Fragment der Lebenswelt begrenzt in Bezug auf ein Thema.
Ein Problem stellt sich im Zusammenhang mit Interessen und Ziele der Maßnahme
(mindestens) ein Teilnehmer, wahrscheinlich gering und wurde durch thematische
Pläne, dass die Teilnehmer auf der Grundlage der Interpretation der Situation
vorstellen, hervorgehoben worden sind, um ihre eigenen Zwecke“ ( Habermas,
1987c, p. 494)2.

Carrolo (1997) ao desenvolver estudos sobre a construção da identidade profissional evidencia que a
“ontogênese do indivíduo não é senão um permanente processo de interação comunicativa”
(Carrolo, 1997, p.26) e também recorre a contribuição habermasiana, que estabelece os
fundamentos, os mecanismos e as dimensões de um novo paradigma, que rompe com a razão
transcendentalizada, de formação entendida como socialização profissional, fundamentada na Teoria
do Agir Comunicacional, ao propor mudanças na operacionalização dos conceitos. Conforme Carrolo
(1997) o processo de socialização é:

constituído pela unidade dialética de três mediações entre o sujeito-ator e o objeto


mundo: 1º - o Processo de Trabalho (Agir Instrumental); 2º - a Representação
Simbólica (Linguagem); 3º - a Interação Recíproca (Agir Comunicacional) (Carollo,
1997, p.28) (grifos nossos)

Em face deste processo de socialização, Habermas (2013) afirma que em cada contexto social surge
uma nova forma de vida disposta e capaz de inclusão, caracterizada pela intersubjetividade, que
torna possível o agir comunicacional. O instrumento desta expressão de intersubjetivação é a própria
linguagem, que cria o sistema de orientação supra subjetiva dos indivíduos integrados à sociedade e
pertencentes às instituições sociais. Assim, Carollo declara que

o agir comunicacional distingue-se do agir instrumental, na medida em que não


visa apenas finalidades técnicas ou organizativas, mas estrutura a interação entre
os indivíduos numa relação global e completa: ação e comunicação. Embora
Habermas afirme a autonomia irredutível dos três mecanismos da socialização, só o
agir comunicacional permite a formação das identidades sociais, de que a
identidade profissional é caso específico (Carollo, 1997, p.28).

As identidades sociais como Lebenswelt (mundo vivido) não podem reduzir-se a sistemas de
trabalho, nem a sistemas de integração, embora estes sejam elementos constitutivos da socialização
e da legitimação da “competência” comunicativa.
Na contemporaneidade, no que se refere as relações do trabalho coletivo, o mundo vivido envolve
uma série de níveis, quais sejam: o campo de investimento de trabalho; a organização do
comportamento relacional e inter-relacional; os valores que surgem ou ressurgem da interação

2 uma situação representa um fragmento do mundo da vida delimitado em relação a um tema. Um tema surge
em conexão com interesses e metas de ação de pelo menos um participante. Esses interesses e metas são
suscetíveis de tematização e enaltecimento pelos participantes, que os concebem sob a base de
interpretação que fazem da situação, com o finalidade de atingir seus próprios objetivos ou metas
(Habermas, 1987c, p.494).

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comunicacional e a transmissão de conhecimentos ˗ processo de ensinagem3. Este processo de


integração social é a forma mais transformadora, que promove a socialização do sujeito com a
inserção social do “outro” (Habermas, 1987a). As articulações entre o trabalho coletivo, o mundo
vivido e subjetivo para alcançarem o pretendido consenso devem buscar as competências
comunicativas como base do processo de legitimidade.

2.1 Entendimento linguístico : possibilidades de mudanças no processo educativo

Habermas (1987c) estabelece como exercício da pragmática universal a identificação e a


reconstrução das condições universais do entendimento possível (Habermas, 1987c, p.299). Assim,
para realizar a proposta dos usos da linguagem como modelo de investigação alicerçado na
competência comunicativa, Habermas põe em evidência dois critérios: a competência e a realização.
O autor

entende inicialmente esses dois conceitos da seguinte forma: existe sentido em


investigar as propriedades fonéticas, sintáticas e semânticas das orações no marco
de uma reconstrução da competência linguística e deixar as propriedades
pragmáticas das emissões para uma teoria da realização linguística (Habermas,
1987c, p.321).

Esta competência comunicativa (Kompetenz und Realisierung) consiste no domínio não-reflexivo,


pré-teórico, de certas pressuposições que acompanham o entendimento linguístico. Por isso, pode
ser reconstruído racionalmente numa perspectiva universalista (Boufleuer, 2001).
Reafirmando a perspectiva universalista e transcendental, Boufleuer (2001) ressalta que:

Pelo agir comunicativo é possível transcender a consciência ingênua onde o saber


se apresenta como um conjunto de conhecimentos absolutos, abstratos com uma
relação apriorista com a realidade. Essa transcendência vai permitir que os sujeitos
educativos compreendessem o saber racional, criados por indivíduos enlaçados em
procedimentos indutivos, dedutivos e analógicos que se submetem
constantemente a um critério de verdade. Isto circunscreve sua historicidade uma
vez que incorpora o saber anterior enquanto etapa necessária de sua gênese. A
ausência de dogmatismos dado que é constantemente superado. Sua fecundidade
no sentido de que é sempre gerador de outro conhecimento (Boufleuer, 2001, p.3).

Na proposta habermasiana, a razão é procedimental, pois, serão racionais não as proposições que
correspondem à verdade objetiva, mas aquelas que foram validadas num processo argumentativo.

3 Para Anastasiou (2003) o processo de ensinagem envolve sujeitos em constante construção, seres
potencialmente em mudanças, relacionando-se uns com os outros em contextos históricos específicos, no caso
em análise, o espaço tempo da sala de aula, a prática pedagógica. Nessa perspectiva, o processo ensino-
aprendizagem vai ocorrer por meio de inter-relação - relação entre sujeitos, mediados por um objeto de
conhecimento - significativo - e por sistemas de comunicação. Esses sujeitos histórico-culturais estão em
permanente situação de trocas intelectivas e afetivas, em permanente socialização de experiências e saberes.
O sujeito mediador principal: o professor - ensinante - possibilitador das interações entre os alunos e entre
estes e o objeto do conhecimento.

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Quando o autor coloca o agir comunicativo diante de uma razão transcendentalizada aponta para a
capacidade de agir sem coações e de produzir consensos mediante a fala argumentativa, o que
permitiria que a linguagem estabelecesse o entendimento não só acerca dos objetos, mas também
sobre normas e formas de vidas que podem ser justas ou injustas. Deste modo, talvez haja a
possibilidade de uma saída para a razão outrora centralizadora, diante de uma consciência critica do
Mundo da Vida que pode significar caminho para a emancipação do sujeito (Habermas, 2013).
O ato educativo visa à emancipação do sujeito, como consequência de um processo dialético que
oscila entre o consenso e o dissenso, conforme a Teoria do Agir Comunicativo. Pressupõe-se, então,
que as atividades e dinâmicas existentes na instituição escolar podem ser ações correspondentes ao
agir orientado pelo produto (ação instrumental e ação estratégica) ou ações orientadas pelo
entendimento (ação comunicativa) (Habermas, 1987c). Essas ações são realizadas, no espaço escolar
pelos alunos e pelos professores na condição de participantes do processo educativo.
O homem como sujeito, para Habermas, só existe inserido em comunidade, de tal modo que seu agir
é sempre um agir individual e social. A conquista da educação do ser humano passa pela
configuração do mundo histórico capaz de gerar a autonomia: o homem se faz educado, construindo
mundos onde a educação se efetiva na configuração de suas relações intersubjetivas. Entre estas
relações, a relação médico-paciente é o eixo norteador das políticas de formação dos profissionais de
saúde.

O agir comunicativo na (re) definição da relação médico-paciente

Compreende-se que dentre os estudos desenvolvidos por Habermas, a razão destranscentalizada é


uma fonte fértil para as iniciativas de rompimento, de encorajamento de se (re) conceituação da
razão, como força ideológica e produtiva e, portanto a liberdade se colocaria centralizada e como
uma possibilidade de mudança paradigmática para superação da linguagem (Habermas, 1987a).
O diálogo, de acordo com o autor somente existe com o conhecimento das diferenças, que estão
ligadas ao fato de que cada um dos sujeitos desenvolvem suas reflexões em contextos diferentes de
vida, de reflexão e de ação. Habermas (2013) se refere ao desenvolvimento de mecanismos de ações
humanas capazes de promover a emancipação e a transformação social.
A comunicação e o diálogo se estabelecem entre aqueles atores sociais que não renegam uns aos
outros o direito de suas próprias palavras, pensamentos e decisões. Habermas (1987a) enfatiza que
o agir comunicativo é um processo circular, no qual um ator social é o iniciador que domina as
situações, por meio de suas ações, e produto das tradições, da cultura e dos processos de
socialização, entre eles o ato educacional.
A relação interativa estabelecida entre o médico e o paciente durante o ato médico4 e, seus
respectivos compromissos sociais, devem ser desenvolvidos com base no agir comunicativo. Neste
tipo de relação não poderá ocorrer o predomínio hegemônico de quem domina a ciência (o médico)
sobre o leigo (o paciente). Essa relação deve ser marcada pela ética profissional de mútuo respeito e
confiança entre ambos os sujeitos, de modo que impere a racionalidade comunicativa do médico

4 No Brasil, o ato médico ainda não é definido legalmente, ou melhor, sua definição carece de atualização. O
Projeto de Lei 7.703/06, que leva popularmente o nome de Ato Médico, prevê a nova regulamentação do
exercício da Medicina no país, que não é alterada desde 1931.

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com o paciente, consideradas as limitações deste, e não somente uma fala unívoca de quem detém o
conhecimento.
As práticas nas relações entre médico e paciente, de modo geral, são orientadas pela racionalidade
instrumental ou manipuladora, caracterizada, sobretudo, pela postura autoritária de quem detém o
poder, o saber e o direito de argumentar sem contra argumentação, enquanto que o “cliente”
(expressão própria do mercado), pacientemente ouve e recebe hipóteses diagnósticas e condutas
terapêuticas.
Habermas (1987c) explicita que as relações humanas sob a teoria do agir comunicativo devem ser
estabelecidas com vista à promoção da emancipação e participação social. O autor busca na
racionalidade assinalada anúncio da modernidade, por Kant e Heidegger (Marcuse, 2004),
rompendo, mas ao mesmo tempo rebuscando, conceitualmente, e embargado, historicamente, o
paradigma do objetivo e trazendo a possibilidade da intersubjetividade. E isto apreende o começo de
uma teoria que chega a nossa contemporaneidade fazendo uma conceituação mais aprimorada o
que se pode chamar de moderno.
O agir orientado pelo entendimento reside no fato de que o envolvimento dos sujeitos envolvidos no
processo não se faz pontualmente. Em face da dinamicidade do processo, os sujeitos já aprenderam
do ponto e vista cognitivo-formal a usar sua competência linguística, assim como, desenvolveram sua
capacidade para perceber a necessidade de coordenar as perspectivas recíprocas, bem como já
acreditam que a satisfação social, a compreensão ou a resolução dos problemas precisam ser
coordenadas para obter consenso legitimado e, portanto, eficaz.
A argumentação habermasiana nos indica que a análise dos diversos tipos de atividades realizadas
pelos professores e alunos em uma escola, como instituição educacional tem como objetivo
identificar elementos indicadores da existência de ações educativas, ou seja, na instituição
educacional são desenvolvidas ações cujo caráter se aproxima do agir comunicativo, do agir
orientado pelo entendimento que visa a obtenção do consenso. A imagem organizacional da escola
(Costa, 1996) como democrática e livre representa algo desejável, embora diante de uma
racionalidade transcendental e não crítica não se consegue ultrapassar o autoritarismo, o que se
alcança, de fato, é o agir instrumental manipulador.
Com efeito, a escola carrega junto de si uma dupla característica, ao mesmo tempo em que, por um
lado, é transformadora da realidade à medida que educa as novas gerações para buscarem no
mundo da vida novas formas coletivas de vivência, de experiências e de realizações pessoais e, por
outro, é coercitiva, pois como instituição social, muitas vezes adota uma gestão organizada e
estruturada com o objetivo de ser um espaço para realização de ações estratégicas típicas do mundo
sistêmico.
A instituição escolar e o ambiente hospitalar tem um importante papel no desenvolvimento das
aprendizagens necessárias para que, primeiro como indivíduo, e depois, como grupo social, o ser
humano possa atuar com um nível maior de racionalidade e com exercício da ética.
A ética do discurso, conforme Habermas apoia-se em outras ciências reconstrutivas, mesmo que
exclusivamente hipotéticas, para as quais é necessário buscar no futuro confirmações plausíveis.
Uma dessas ciências reconstrutivas é a teoria do desenvolvimento da consciência moral de L.
Koklberg (Habermas, 1987a). Para Habermas e de acordo com essa teoria:

o desenvolvimento da capacidade de julgar moral efetua-se da infância até a idade


adulta passando pela adolescência, segundo um modelo invariante; o ponto de
referência normativo da via evolutiva analisada empiricamente é constituído por
uma moral guiada por princípios: nela a ética do discurso pode se reconhecer sem
seus traços essenciais (Habermas, 1987b, p.143-144).

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A construção do mundo do aluno é uma reprodução do mundo realizado antes pelos docentes.
Ambos são mediados por um objeto que deve ser aprendido, esse objeto surgiu e é legitimado pela
razão monológica. Há um único saber válido e verdadeiro a elevar-se até ele, segundo as tendências
pedagógicas tradicionais, não críticas. Trata-se do primeiro e mais importante propósito da educação
escolarizada. Toda a tradição positivista na América Latina fundou desta maneira sua pretensão
civilizatória, estabelecendo um forte desnível na relação baseada nas desigualdades em colonizador
e colonizado, como principio de opressão e controle.
Habermas (2013) explica que se a relação do conhecimento fosse colocada no mundo da vida, na
continuidade de cada sujeito, não para permanecer nela, mas para, a partir dela, voltar criticamente
ao objeto, então a assimetria, a desigualdade entre os interlocutores desaparecia. Isto porque ambos
tomam como ponto de partida um universo de vivências, crenças, valores, normas morais que
constituem um Mundo da Vida compartilhado. Por isso, também, a relação dialógica e da educação
problematizadora, como a denomina Paulo Freire, consiste em:

uma educação na qual a relação educador-educando desaparece e é substituída


por uma relação entre iguais que visam, a partir de seu cotidiano, construir uma
visão crítica do mundo e alcançar finalmente o consenso. Essa ação está longe de
ser uma ação irracional, pois o diálogo implica a elaboração de argumentações
destinadas à construção do mundo e à transformação da realidade mediante a
práxis (Freire, 1998, p.55)
.

Considerações finais

É importante recolocar o problema da educação e especialmente da instituição escolar como o


espaço em que a ação comunicacional, por meio da relação dialógica, suscite uma nova subjetividade
e ao mesmo tempo gere uma reflexão crítica sobre a realidade que vise transformá-la.
O caminho a ser percorrido é o da valorização das relações, face a face, onde a razão do “outro”
possa expressar-se, como o espaço não colonizado, de modo que se realize um encontro pessoal de
“proximidade”, em que a dignidade do outro está na origem e constitui a própria possibilidade de
construir uma relação argumentativa.
Nas atuais circunstâncias, não é fácil abstrair-se da presença dos “outros”, dos pobres, dos
marginalizados, dos oprimidos. Pode-se, com clareza propor ações educacionais para formação
médica que visem atenuar as diferenças sociais em contextos sócio-políticos cada vez mais
diferenciadores.

Referências

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Boufleuer, J. P. (2001). Pedagogia da ação comunicativa: uma leitura de Habermas. Ijuí, R.S: Unijuí.

Brasil. (2001). MEC/CNE/CSE. Diretrizes Nacionais Curriculares do Curso de Graduação em Medicina.


Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES 4/2001. Diário Oficial da União, Brasília, 9 de
novembro de 2001. Seção 1, 38.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Brasil. (2014). MEC/CNE/CSE. Diretrizes Nacionais Curriculares do Curso de Graduação em Medicina.


Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES 3/2014. Diário Oficial da União, Brasília, 20
de junho de 2014. Seção 1, 38.

Carollo, C.L. (1997). Decadísmo e simbolismo no Brasil. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos.

Chennoufi, R. (2013). Habermas: la raison publique. Paris: Librairie Philosophique J. Vrin.

Costa, J. A. (1996). Imagens organizacionais da escola. Lisboa, Portugal: ASA Editores.

Freire, P. (1998). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro:
Paz e Terra.

Freire, P. (1999). Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

Freitag, B. (2005). Dialogando com Jürgen Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro.

Habermas, J. (1986). Autonomy and solidarity: interviews with Jürgen Habermas. London: Ed. Verso.

Habermas, J. (1987a). Técnica e ciência como ideologia. Lisboa: Edições 70.

Habermas, J. (1987b). Théorie de l’agir communicationnel. Tome premier: rationalité de l’agir et


rationalisation de la société. Traduit de l’allemand par Jean-Louis Schegel. Paris: Fayard.

Habermas, J. (1987c). Théorie de l’agir communicationnel. Tome second: critique de la raison


fonctionnaliste. Traduit de l”allemand par Jean-Louis Schegel. Paris: Fayard.

Habermas, J. (2013). Teoria e práxis : estudos de filosofia social. São Paulo : Editora Unesp.

Marcuse, H. (2004). Razão e revolução: Hegel e o advento da teoria social. São Paulo: Paz e Terra.

Stotz, E. N. (1993). Enfoque sobre educação e saúde. In: Valla, V.V. & Stotz, E.N. (orgs). Participação,
educação popular e saúde: teoria e prática. Rio de Janeiro: Relume-Dumará.

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Metodologia Ativa no currículo por competência: processo, facilidades e


dificuldades

Mara Quaglio Chirelli1, Julia Volpi Nassif1


1
Faculdade de Faculdade de Medicina de Marília, Brasil. marachirelli@gmail.com;
julianassif_@hotmail.com

Resumo. A adoção de metodologias ativas na formação dos profissionais de saúde faz-se necessária desde a
implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais no Brasil. Objetivou-se analisar o processo ensino-
aprendizagem na Unidade de Prática Profissional na perspectiva de professores de um curso de graduação
de Enfermagem. Utilizou-se na coleta de dados a entrevista semiestruturada com 20 professores (docentes
e preceptores) e Análise de Conteúdo, modalidade temática, na análise dos dados. Identifica-se que
realizam o ciclo pedagógico conforme o preconizado na instituição, considerando as capacidades dos
facilitadores em problematizar e se relacionar nos grupos. Há, porém, dificuldades de se trabalhar no
currículo integrado e na matriz dialógica de competência, principalmente pelos movimentos que ainda
precisam ser construídos e pactuados na integração ensino-serviço. Percebeu-se que ao se utilizar a Análise
Temática, há aproximação com autores internacionais, havendo também outras sistematizações por meio
de software. Há indicativo de novas pesquisas com a visão da comunidade.
Palavras-chave: pesquisa qualitativa; análise temática; metodologias ativas; educação em enfermagem;
educação baseada em competências.

Active Metodology in the Competence Curriculum: process, facilities and difficulties


Abstract. The active methodologies’ adoption in training of health professionals has become necessary since
the implementation of DCN in Brazil. The research’s objective was analyze teaching-learning process in UPP
from the Nursing undergraduate course teachers’ perspective. In data collection was used a semi-structured
interview with 20 teachers and preceptors and Content Analysis, thematic modality in the data analysis. We
identified that they execute the pedagogical cycle as recommended by the institution considering the
facilitators’ capacities to problematize and to relate themselves inside the groups but there are difficulties in
working in integrated curriculum and dialogic matrix of competence, mainly because of the movements that
still need to be built and agreed on the teaching-service integration. It was noticed that when using the
Thematic Analysis there is an approximation with international authors, however, there are other
systematizations by means of software. There is an indicative of a new research with the visual perception
of the community.
Keywords: qualitative research; thematic analysis; active methologies; nursing education; education based
on competences.

1 Introdução

O Curso de Enfermagem na Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) foi criado em 1980, sendo constituído o
Departamento de Enfermagem, no corpo do estatuto, em 1983. Nesse período, a organização curricular adotada
caracterizava-se como ensino tradicional. Nesse modelo de educação, denominada por Paulo Freire como bancária, o
ensino está centrado na exposição oral de conhecimentos pelo professor protagonista, responsável por transferir a
matéria, ou seja, seu conhecimento teórico aos alunos, sem a preocupação de que os conteúdos se relacionem com o
contexto escolar. O ensino da enfermagem também estava estruturado no modelo biomédico, centrava-se no hospital,

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distanciando o aspecto social do processo saúde-doença, da organização dos serviços e da própria prática de enfermagem.
Isso favorecia a fragmentação em relação ao que era normal e patológico. O currículo dividiu-se em ciclo básico e
profissionalizante (Faculdade de Medicina de Marília, 2008; Brighente & Mesquida, 2016; Prado, Velho, Espíndola,
Sobrinho, & Backes, 2012).
Visando à superação desse modelo, aos poucos foi se implementando a mudança da formação dos profissionais, de
acordo com as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais na Enfermagem (DCN) em 2001. Houve necessidade de
adoção de novos paradigmas de saúde e educação e do modelo assistencial. Passou-se a preconizar a formação de
enfermeiros com visão crítica, reflexiva e humanista, propondo a formação profissional relacionada com o mundo do
trabalho, pautada na ética professional para que atuassem no cuidado individual e coletivo, possibilitasse a universalização
e a equidade, favorecendo a autonomia do paciente, sabendo pensar o contexto e a cultura local antes de tomar decisões,
tendo, ainda, participação social nas ações realizadas (Lima, Feuerwerker, Padilha, Gomes, & Hortale, 2015; Rodrigues,
Rocha, Anjos, Cavalcante, & Rozendo, 2013). Desta forma, nesse contexto de mudanças no campo da saúde e educação, o
modelo de ensino tradicional vem sendo aos poucos substituído por novas tendências pedagógicas, que integram as
dimensões pessoal e profissional, estimulando, no estudante em formação, o desenvolvimento da sua capacidade para
compreender, global e sistemicamente, os problemas inesperados a serem enfrentados em diversos contextos. A
perspectiva é formar um profissional possuidor de cultura de cidadania, responsável, participativo e ativo na
transformação dos contextos de vida e de trabalho, minimizando injustiças e desigualdades percebidas na realidade social
do seu cotidiano (Prado, Velho, Espíndola, Sobrinho, & Backes, 2012).
A enfermagem brasileira representa um dos cursos de saúde que experimentam reformas curriculares, sendo que se tem
dado preferência aos referenciais de metodologias ativas, mais especificamente, à utilização da Metodologia da
Problematização. Dentre as metodologias ativas com enfoque problematizador, temos o registro mais recente da Espiral
Construtivista, a qual se fundamenta na teoria sociointeracionista da aprendizagem, enfocando a mediação entre o sujeito
e o objeto a ser aprendido. Na prática, traduz-se na pedagogia construtivista, estando conteúdos, cultura, fatores
hereditários e sociedade embricados no processo de aprendizagem (Lima, 2017).
A FAMEMA, que já vinha implementando um currículo inovador no âmbito dos cursos de Medicina e Enfermagem,
inscrito em um processo de mudança em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Unico de Saúde (SUS) ,
elaborou sua nova organização curricular no curso de enfermagem desde 1998, respondendo às exigências da Portaria nº
1721/94 do Conselho Federal de Educação (CFE) (Costa, Medeiros, Martins, Menezes, & Araújo, 2015; Messas, Leonello,
Fernandes, Gonçalves, Bucchi, & Mira, 2015; Lima, 2017). Hoje o curso tem um currículo integrado e orientado pela matriz
dialógica de competência, o que favorece a aprendizagem voltada para a excelência professional, articulando prática e
teoria. O referencial de competência abarca múltiplos conceits. São verificadas três principais abordagens sobre o tema: (i)
as tendências hegemônicas, principalmente, o condutivismo e o funcionalismo, considerados como uma coleção de
atributos pessoais; (ii) o construtivismo francês, que visa aos resultados observados/obtidos, por meio de tarefas realizadas;
e (iii) o modelo australiano, que confere à competência uma dimensão relacional entre levantamento das tarefas e
identificação de atributos, incorporando ética e valores como integrantes do desempenho competente (Faculdade de
Medicina de Marília, 2015).
A FAMEMA, como já mencionado, adotou o modelo de currículo integrado desde 1998. Nesse, o mundo do trabalho é o
ponto de partida para a educação. Depreende-se que é possível a construção do conhecimento relacionando e integrando
as disciplinas. Assim, a interdisciplinaridade constitui um dos pilares dessa forma de currículo.Morin, ao discutir a teoria da
complexidade, destaca que o conhecimento necessita estar articulado ao mundo. Aponta que as disciplinas, como têm
sido estruturadas nos currículos, tem isolado os objetos do seu meio, bem como isolam as partes de um todo. Com isso,
eliminam-se a desordem e as contradições existentes nos objetos para dar uma falsa sensação de arrumação desses. A
educação nesse referencial deve romper, portanto, com essas situações, apontando as correlações entre os saberes, a
complexidade da vida e dos problemas que ocorrem na realidade (Morin, 2005; Cruz, Araujo, Nascimento, Lima, França &
Oliveira, 2017).

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A partir de 2003, optou-se pela aplicação do currículo integrado e orientado pela competência na matriz dialógica nos dois
cursos da instituição (medicina e enfermagem) e de Metodologia Problematizadora na Unidade de Prática Profissional
(UPP). Desse período aos dias de hoje, na UPP, os discentes estão distribuídos em pequenos grupos , mediados por um ou
dois professores, de forma a integrar a prática e a teoria (Faculdade de Medicinade Marília, 2015; Faculdade de Medicina
de Marília, 2014). Esse ciclo pedagógico responde, então, pelo processo de ensino-aprendizagem na FAMEMA no
contexto do cenário da UPP. Nesse caso, o docente tem a função de orientar os discentes a desenvolverem juntos os
seguintes momentos: (a) vivência da prática: momento em que o discente com seus próprios conhecimentos, atitudes e
habilidades relaciona-se com o objeto de sua aprendizagem, isto é, com situações práticas e simuladas, nos cenários do
Laboratório de Prática Profissional (LPP) ou no Apoio à Prática Profissional (APP), as quais funcionam como disparadoras de
uma discussão que configura as outras etapas do ciclo pedagógico; (b) Síntese provisória: é o momento de
problematização para que os discentes reflitam sobre a narrativa reflexiva, identificando seus problemas e suas explicações
a partir de seus conhecimentos prévios. Diante disso, é possível que se percebam lacunas de conhecimento que, por meio
de questões de aprendizagem elaboradas em conjunto, se oriente a busca dos alunos pelos novos conhecimentos
identificados como necessidade de estudo; (c) Busca qualificada de informações: cada discente faz sua pesquisa norteada
pelas questões de aprendizagem, o que permite a construção de uma síntese individual. É válido ressaltar que, por mais
que exista essa liberdade, a confiabilidade das fontes precisa ser verificada, apresentando-se os descritores e a base de
dados utilizada na realização da pesquisa, sintetizando o material e referenciando as fontes consultadas dentro das normas
solicitadas pela instituição; (d) Nova síntese: na discussão realiza-se o debate das diversas fontes pesquisadas,
confrontando as ideias dos autores. Nesse momento, o discente retoma o(s) problema(s), bem como as hipóteses
identificadas, por meio dos novos conhecimentos construídos, buscando reconstruir a prática, o que configura o
movimento ativo de ação-reflexão-ação (Faculdade de Medicina de Marília, 2016; Lima, Feuerwerker, Padilha, Gomes, &
Hortale, 2015). Por fim, após cada atividade, ocorre o movimento de avaliação verbal individual e coletiva, visando
aprimorar o desempenho do discente no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem no ciclo pedagógico.
A utilização dessa Metodologia Ativa torna-se um desafio para os educadores: devem exercer uma práxis criadora, na qual
seja possível a formação de sujeitos crítico-reflexivos, corresponsáveis pela construção de seu próprio processo de
aprendizado ao longo da vida. Sua utilização implica não somente conhecer os modos de operacionalização, mas,
fundamentalmente, conhecer os princípios pedagógicos que a sustentam, ou seja, os princípios da pedagogia crítica
(Faculdade de Medicina de Marília, 2016; Prado, Velho, Espíndola, Sobrinho, & Backes, 2012; Sousa, Formiga, Oliveira,
Costa, &Soares, 2015). Em recente pesquisa sobre as atividades pedagógicas da UPP2, os estudantes destacaram, em
alguns momentos, desmotivação para realizar as atividades. Segundo eles, o LPP é importante mas não tem articulação
clara com a UPP e com a prática profissional porque os pacientes não têm uma queixa. Consideram, ainda, que o processo
pedagógico não tem sido desenvolvido de maneira adequada, com pouco conteúdo e de forma desestruturada (Higa,
Taipeiro, Carvalho, Aguilar,Tonhom, & Hafner, 2016). Considera-se, nessa pesquisa, como pressuposto, frente ao exposto,
que convivemos com diversas compreensões dos participantes acerca do processo ensino-aprendizagem, considerando a
visão dos referenciais teóricos que cada professor possa ter a partir do PPC, bem como da interpretação que possam
realizar sobre esses referenciais e traduzi-los nas ações do cotidiano da sua prática pedagógica.
Pretende-se, pois, questionar como os professores do curso de Enfermagem compreendem o processo de ensino-
aprendizagem em um currículo integrado e orientado por competência na matriz dialógica. O método de análise de dados
tem tido potencialidade para captar as ideias, os conteúdos e temas a serem abordados na pesquisa? Qual a melhor forma
a ser desenvolvida nessa pesquisa?
A pesquisa propõe-se a analisar o processo ensino-aprendizagem na Unidade de Prática Profissional na perspectiva de
professores de um curso de graduação em Enfermagem, bem como identificar como a análise temática oportunizou
desvendar a compreensão dos dados coletados.

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2 Metodologia

Trata-se de uma pesquisa realizada com abordagem qualitativa, de campo, do tipo exploratório e descritivo. A análise
qualitativa é uma forma de investigação social que visa explorar sentidos e significados, como valores, crenças, hábitos,
atitudes e opiniões da sociedade, dados pelas pessoas em relação às suas experiências e ao mundo em que vivem. A
escolha pela pesquisa de campo objetiva a construção de conhecimento acerca de um determinado assunto num cenário,
sendo que o estudo exploratório examina um tema pouco estudado para ampliar o conhecimento, e o descritivo colabora
ao descrever situações e acontecimentos, ou seja, especificar as características de pessoas, grupos ou fenômenos (Marconi
& Lakatos, 2010; Minayo, 2010; Holoway & Wheeler, 2010).
A FAMEMA localiza-se no município de Marília, situado no centro-oeste do estado de São Paulo, no Brasil. É instituição
pública e gratuita, oferece os cursos de Medicina e Enfermagem em que anualmente ingressam, respectivamente, 80 e 40
novos acadêmicos. O curso de Enfermagem, de turno integral, tem o prazo mínimo para sua conclusão de 4 anos. Possui
como nível acadêmico a graduação bem como o bacharelado. A modalidade de ensino é presencial (Faculdade de
Medicina de Marília, 2015).
No 1ª e 2º anos, as atividades na UPP são realizadas no território da Unidade de Saúde da Família (USF), em que os
acadêmicos são divididos em grupos de oito estudantes de medicina e quatro de enfermagem. Ocorrem em três períodos
a cada semana, das 14 às 17 horas, sendo que dois facilitadores (médico ou enfermeiro da FAMEMA e da USF)
coordenam o grupo (Faculdade de Medicina de Marília, 2015). Posteriormente, os estudantes dividem-se em pequenos
grupos de 2 a 3 componentes para realizarem atividades na USF, e em cenários simulados do LPP e APP.
Já o terceiro ano envolve em sua organização o Cuidado ao Indivíduo Hospitalizado, com LPP 3 e Unidade Educacional
Eletiva (UEE). O cenário de prática ocorre, pela primeira vez, desvinculado do curso de medicina e caracteriza-se pela
introdução dos estudantes no cenário hospitalar (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
O quarto ano é composto pela UPP 4, UEE e investigação científica. A UPP 4 acontece nos cenários dos Serviços de Saúde
da Rede Básica (ESF) e da Rede Hospitalar nas áreas de Unidade de Internação Clínica e Cirúrgica de Adultos, Pediatria e
Obstetrícia (Faculdade de Medicina de Marília, 2016).
Participaram desta pesquisa os facilitadores (professores e preceptores) da UPP do 1º ao 4º ano do curso de Enfermagem.
Os preceptores são profissionais enfermeiros ou medicos, tanto da FAMEMA como da Secretaria Municipal da Saúde
(SMS), enquanto integrantes da parceria ensino-serviço.
Não trabalharemos com todos os participantes das atividades da UPP, utilizaremos uma amostra. Minayo, em sua
discussão sobre amostragem, destaca que a amostra ideal deve refletir a totalidade de múltiplas dimensões do objeto de
estudo (Minayo, 2010). São considerados como participantes da pesquisa os facilitadores nos respectivos anos, ou seja,
tanto os professores como os preceptores do 1º ao 4º ano, totalizando 120.
Por se tratar de pesquisa qualitativa, trabalha-se com uma amostra por conveniência/intencionalidade, que tem como
preocupação o aprofundamento, a abrangência e a diversidade no processo de compreensão de uma dada
representação. A validade da amostra está em sua potencialidade de analisar o objeto em todas as suas dimensões
(Minayo, 2010). Como critérios de seleção, além da participação de 5 (cinco) facilitadores de cada ano, foram observados
os seguintes: ter variação da faixa etária e sexo em cada ano; considerar o tipo e o tempo de inserção no cenário de prática
pedagógica e no processo de mudança curricular na graduação e, ainda, estar participando das atividades acadêmicas,
como facilitador da UPP 1 a 4, há pelo menos um ano. Foram selecionados, portanto, 20 facilitadores. Foram excluídos do
processo os que não quiseram participar da pesquisa ou não estavam de acordocom os critérios estabelecidos.
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista semiestruturada. Nela há o encontro entre dois indivíduos com a
finalidade de um deles obter informações acerca de um determinado assunto ou problema mediante uma conversação,
de iniciativa do pesquisador, que se destina a construir informações acerca do objeto e de temas pertinentes (Gerhardt, &
Silveira, 2009, Minayo, 2010). Nesse tipo de entrevista, o pesquisador organiza um conjunto de questões a partir de um
roteiro sobre o tema que está sendo estudado, mas permite, e às vezes até incentiva, que o entrevistado fale livremente

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sobre assuntos que vão surgindo como desdobramentos do tema principal (Gerhardt, & Silveira, 2009). No roteiro
abordou-se questões sobre o desenvolvimento do ciclo pedagógico, as facilidades e dificuldades para sua realização e
sugestões para a superação das últimas. Começamos a pesquisa com um estudo piloto para a avaliação do instrumento
no mês de agosto de 2016. As questões do roteiro foram respondidas por facilitadores do Curso de Enfermagem da
FAMEMA e, a partir de algumas dificuldades percebidas, foi realizada uma discussão para a readequação de algumas das
questões norteadoras. A coleta de dados foi iniciada no mês de setembro e concluída em dezembro de 2016, sendo
realizada em diversas instalações do Complexo FAMEMA e nas Unidades da Saúde da Família (USF). Houve recusa de
somente 01 facilitador. O agendamento das entrevistas ocorreu por meio de solicitação dos contatos dos facilitadores à
FAMEMA para os docentes e, para os preceptores, o contato foi feito diretamente com eles nas USF. No geral, os
participantes colaboraram com o agendamento das entrevistas, que tiveram tempo de duração de 14 a 35 minutos, em
média de 32 minutos. Na realização das entrevistas, foi apresentado o projeto da pesquisa, seus objetivos e esclarecidas
algumas dúvidas quando necessário. Após, foi solicitado a todos os participantes que assinassem o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), e dessem autorização para que as atividades pudessem ter o registro em áudio
por meio de gravador, com posterior transcrição, para fidedignidade do material coletado.
O trabalho foi realizado após aprovação do projeto no Comitê de Ética e Pesquisa da FAMEMA, atendendo às exigências
da Resolução 466/2012 do Comitê Nacional de Ética em Pesquisa (Parecer nº 1.321.635).
Para análise dos dados, utilizou-se a Análise de Conteúdo na Modalidade Temática (Minayo, 2010; Bardin, 1979) por ser
um referencial que possibilita trabalhar com o tema na perspectiva de ser “um feixe de relações”, sendo possível
apresentá-lo por meio de palavras, frases ou de um resumo.
Minayo (2010) propõe três etapas operacionais na análise temática. A pré-análise é a tomada de decisão sobre o que se
pretende investigar. Essa fase consiste na determinação da unidade de registro e de contexto, forma de categorização e
modalidade de codificação. Os conceitos teóricos mais gerais orientam a análise. Realiza-se por meio de leitura flutuante,
constituição do corpus, considerando-se os critérios de exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência,
além de possibilitar formulação e reformulação de hipóteses e objetivos. Na segunda etapa, realiza-se a exploração do
material, por meio da classificação das falas, ou seja, das unidades de registro, que são frases ou texto, significativos nas
categorias para uma compreensão. Posteriormente, são elaboradas sínteses dessas falas e, por meio da compreensão
dessas, identificamos os seguintes núcleos de sentido: desenvolvimento do método a partir do ciclo pedagógico;
desenvolvimento do ciclo a partir do cuidado individual; desenvolvimento do ciclo a partir do cuidado coletivo e gestão;
capacidades do facilitador; formação em EP; dificuldades na realização do ciclo pedagógico e parceria/integração ensino-
serviço. Após a identificação da integração entre esses núcleos, elaboramos dois temas: 1) construção da metodologia
ativa a partir do cenário de prática; 2) facilidades e dificuldades na prática da metodologia ativa (Minayo, 2010). A terceira
etapa equivale ao tratamento dos resultados obtidos e à interpretação, a qual nasce da síntese entre as questões da
pesquisa, a análise dos resultados obtidos e as perspectivas teóricas adotadas (Minayo, 2010). Nesta pesquisa, analisamos
os dados a partir dos referenciais de educação emancipadora, currículo e competência dialógica. Na apresentação dos
dados, os participantes tiveram a sua identidade preservada, sendo as falas codificadas pelo número da entrevista (E1, E2,
E3, …E20).

3 Apresentação e Análise dos Dados

Segue a apresentação das duas temáticas: 1) Construção da metodologia ativa a partir do cenário de prática; 2) Facilidades
e dificuldades na prática da metodologia ativa. Pelos dados obtidos, temos facilitadores com variedade quanto ao sexo (16
mulheres e 4 homens), quanto a formação profissional (17 enfermeiros, dois médicos e um psicólogo) e quanto à
categoria em que é contratado (5 assistentes de ensino, 10 professores e 5 preceptores). Quando analisado o tempo de
atuação na UPP, a maioria (18 facilitadores) exerce atividades há mais de 5 anos nesse cenário.

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3.1 Construção da Metodologia Ativa a partir do Cenário de Prática

3.1.1 Desenvolvimento do método a partir do ciclo pedagógico

No desenvolvimento do método a partir do ciclo pedagógico, os facilitadores reconhecem o seguinte: “eu procuro seguir o
que é proposto pelo projeto político pedagógico daqui [FAMEMA], no sentido das recomendações do passo do ciclo[...]”
(E12); “[...] a partir da reflexão da prática que vem com uma narrativa, tendo em vista as áreas de competência de atenção
à saúde, quer seja as necessidades individuais, coletivas e a gestão [...] a gente problematiza a narrativa, identifica
problema, formula hipóteses e questões aprendizagem.”(E5) “Ele vai para um momento de estudo, retorna pra responder
às questões, nós estimulamos que ele volte às hipóteses levantadas, os problemas levantados, para fazer um exercício de
correlação com a prática ou com o problema da prática que gerou esse movimento de estudo.” (E19); “[...] a avaliação de
como foi a simulação, de como foi a atividade do grupo e como que foi a atuação na mediação, do professor na mediação
desse processo[...]” (E9).
No currículo organizado por competência, o ciclo pedagógico precisa contemplar todas as suas etapas, para que se faça
tanto como processo quanto resultado (Burgatti, Bracialli, & Oliveira, 2013; Tonhom, Moraes, Costa, Hamamoto, Braccialli,
& Almeida Filho, 2015).
“[...] A gente atua enquanto desenvolvimento de um processo de contato com os pacientes, da comunicação, da
realização de uma história, do exame psíquico [...]” (E10). Esse fato é destacado por Oliveira & Braga (2016) ao afirmarem
que os discentes de enfermagem necessitam, desde o início da graduação, ter contato com referenciais teóricos e
metodológicos da comunicação humana e interpessoal, para facilitar o desenvolvimento dos vínculos afetivos nos cenários
de saúde, bem como estabelecer relacionamentos efetivos e significativos em sua atividade profissional, além de saber
como atuar nessas diferentes situações. Para tanto, considera-se que o professor é um elemento primordial por estimular
as abordagens comunicativas, ensinar e orientar a comunicação interpessoal.
Os professores destacam, ainda: “[...] o que eu prezo muito no contato é o vínculo com os estudantes [...]” (E7). Sabe-se que
um currículo integrado precisa privilegiar a formação de vínculos entre as pessoas nos diversos cenários em que o
estudante se insere (Ide, Arantes, Mendonça, Silva, & Del Corona, 2014).

3.1.2 Desenvolvimento do ciclo a partir do cuidado individual

No desenvolvimento do método a partir do cuidado individual, os facilitadores demonstraram o conhecimento de que


“[...] a gente tenta problematizar a questão do exame físico dentro da visita [...]” (E6). Isso se articula com Chirelli, Pio &
Soares (2016) quando, após entrevistarem facilitadores da UPP do 2º ano de medicina e enfermagem da Famema,
elucidaram que o cuidado individual é realizado pelos discentes por meio do desenvolvimento de história clínica e exame
físico, possibilitando a identificação das necessidades de saúde para uma posterior elaboração de um plano de cuidados.
Nas unidades de saúde, “[...] escolhe as famílias pensando que não só na doença, mas é no indivíduo, na família e como o
contexto social dessas famílias, juntamente com toda a equipe, principalmente, com os agentes comunitários que
conhecem a realidade daquelas famílias e se essas famílias também aceitam os estudantes” (E3).
Percebe-se que, a prática professional, articulada ao ensino permite um cuidado integral, visa à singularidade da pessoa e
suas reais necessidades de saúde, e não a considera como um mero objeto de aprendizagem (Tonhom, Moraes, Costa,
Hamamoto, Braccialli, & Pinheiro, 2015; Tonhom, Moraes, & Pinheiro, 2016).

3.1.3 Desenvolvimento do ciclo a partir do cuidado coletivo e gestão

No desenvolvimento do método a partir do cuidado coletivo e gestão, os facilitadores esclarecem que “[...] a gente faz
toda uma abordagem da saúde coletiva, do perfil epidemiológico da população junto com eles [estudantes] verificando
dados, a parte informatizada, da produção prontuário eletrônico, o que é atendido pra reconhecer a área de abrangência e

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[...] eles [estudantes] vão fazer visita domiciliária [...]. Utiliza a metodologia do MAPP, que é o Método Altadir de
Planejamento Popular para também a gente tentar resolver os problemas da população.” (E3). Esse depoimento ratifica
que as atividades voltadas para o cuidado coletivo, como o levantamento das necessidades de saúde, a inserção em
reuniões de equipe para planejamento e execução, a identificação dos recursos disponíveis e o contato com os indicadores
epidemiológicos favorecem a inserção do aluno na gestão junto à equipe de saúde (Chirelli, Soares, & Pio, 2016).

3.2 Facilidades e Dificuldades na Prática da Metodologia Ativa

3.2.1 Facilidades para desenvolver o ciclo pedagógico

No movimento de implementação do ciclo pedagógico, os professores destacam, como facilidades para a realização do
processo pedagógico, algumas atitudes, dentre essas saber problematizar com os estudantes durante a prática
pedagógica e vivenciar a realidade auxiliando na capacidade de mediação reflexiva do ciclo: “[...] não tentando
responder dúvidas, mas tentando problematizar” (E6); “[...] conduzir os grupos, de problematizar, de provocar as reflexões
da prática” (E20); “você vivenciar a realidade junto com o estudante [...] e na hora que ele vem com o relato, no momento
de síntese provisória, facilita no sentido de você estar instigando-o mais. Eu acabo tendo um pouco mais de participação no
sentido de questionamentos, de ‘fazer eles’ refletirem mais, estimulando a questão do conhecimento prévio, mesmo na
hora que identifica lacuna, dúvida, o que realmente eles estão querendo naquele momento identificar [...].” (E4)
Becerril, Porras, Gómez, Püchel, Rojas, & Ortega (2016) são autores que destacam que o pensamento crítico é um
processo com raciocínio complexo, dialógico e sistêmico, realizado pelo indivídulo para uma determinada ação, tendo
como intenção escolher as melhores opções de respostas que favoreçam a resolução de problemas de Enfermagem, a
partir de contextos bem definidos, pautados em processos intelectuais e emocionais (cognitivos, experienciais e intuitivos),
considerando os princípios éticos da profissão.

Poder desenvolver avaliações a partir de competência “porque a gente faz em conjunto com os professores mesmo das
outras áreas também, por exemplo, a psicóloga que é do apoio, ela acaba que antes nem sempre a gente tinha esse apoio
para estar fazendo avaliação. [...] porque a gente consegue fazer isso conjuntamente e por competência. E às vezes, o
estudante, a gente vai preparando o estudante para ele conseguir visualizar a avaliação em processo.” (E3)

Estar aberto para o processo de partilhar a metodologia na medida que “tudo que eles oferecem de capacitações, de
reuniões pra pensar a formação dos estudantes, eu estou sempre pronta a participar e pensar junto. E a minha facilidade,
penso que é estar aberta a tudo isso.” (E7)
Participar de processos de formação e ter espaço de reflexão da prática pedagógica por meio da Educação Permanente
(EP), foram estratégias destacadas para que o ciclo pedagógico pudesse ser melhor trabalhado junto aos estudantes. Os
entrevistados destacam que “no ano de 2016, nós tivemos uma capacitação em relação a essa estratégia, [...] e isso trouxe
uma melhor adequação para que a gente pudesse vivenciar o método na prática.” (E19) e que “os encontros, as discussões
com os grupos, você discutir sua prática. [...] Mas eu tenho uma atuação na série no momento LPP e ali a gente tem a EP
que é um espaço que você está discutindo, muitas vezes, a sua prática e possibilita essas reflexões.” (E18)
A EP enquanto espaço de análise do cotidiano se mostra como estratégia de gestão potente na UPP para conduzir a
reflexão a partir do processo de trabalho. Slomp Junior, Feuerwerker, & Land (2015) mencionam que, com a mediação de
facilitadores ou apoiadores, expõem-se os desconfortos que ocorrem no cotidiano do trabalho, colocando-os em análise,
gerando autoanálise e autogestão.
3.2.2 Dificuldades na operacionalização do ciclo pedagógico
Há dificuldades que podem surgir no transcorrer desse processo tanto por parte do professor como do estudante. Os
participantes mencionaram, dentre essas, as relacionadas à operacionalização dos momentos do ciclo pedagógico, com

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os seguintes dizeres “nem sempre os confrontos experienciais serviram de disparadores pra discussão de nossos ciclos.
Talvez isso tenha desmotivado um pouco os alunos a notarem suas vivências, e mesmo até questionarem a validade das
vivências para outras etapas do ciclo pedagógico”(E19). Considera-se que, no início, não havia, ainda, muita
apropriação/esclarecimento do método. Além disso, destacam “a questão atitudinal das pessoas, [...] a pessoa precisa
gostar do que ela faz. Estudantes que não se encontraram dentro da escolha profissional é um aspecto que dificulta o
processo, porque ele não tem o desejo próprio pela sua formação” (E12).
Moreira (2012) sinaliza que há duas condições essenciais para a aprendizagem significativa: o material da aprendizagem
precisa ser potencialmente significativo e quem aprende deve mostrar-se com predisposição para o movimento da
aprendizagem. Essa segunda condição mostra-se como o maior desafio na construção do conhecimento, porque não se
trata de motivação ou de gostar do conteúdo, mas o sujeito que aprende deve se predispor a relacionar (diferenciando e
integrando) interativamente os novos conhecimentos à sua estrutura cognitiva prévia, provocando modificações,
enriquecendo-a, elaborando-a, dando-lhe os significados.

A avaliação não tem sido integrada entre UPP/LPP/APP, conforme se percebe pelos seguintes depoimentos: “não há
uma integração do professor da UPP com o professor do APP pra haver uma avaliação conjunta. Então, eu não sei como o
aluno é lá, como ele é aqui comigo eu sei. [...] porque a gente conversa algumas vezes de corredor, mas não temos uma
reunião própria pra discutir esses aspectos” (E13).

O facilitador não sabe qual o “limite” do que deveria ser trabalhado na ação pedagógica do currículo, dificulta sua ação
para “se você não tem tanta propriedade sobre o assunto, você não sabe o limite pra que você faça com que o aluno tenha
entendimento. [...] No primeiro ano você sabe o limite de onde ele tem que chegar e o que ele tem de competência para a
série. Agora como é um assunto desconhecido, eu sinceramente não sabia até onde o aluno deveria ir[...].” (E16)
É necessário reconhecer os desempenhos a serem construídos em cada momento da formação dos estudantes, para que
o facilitador tenha clareza de quais estratégias mobilizar, sendo favorecida essa prática quando o mesmo tem inserção no
cenário de prática, por meio de um projeto articulado ao serviço.

A integração ensino-serviço apresenta falhas, “dificulta o processo do nosso trabalho, porque a cada momento, a equipe é
variada, entram pessoas, saem pessoas e isso é uma constante aproximação” (E10); “o estudante na terceira série, ele
ainda não consegue mudar muito a realidade onde ele está trabalhando. Ele faz uma prática muito pontual, com um
paciente.” (E9) Por outro lado, há profissionais que destacam sua não inserção no cenário real, justificando que: “porque
como eu não tenho uma inserção no cenário real, eu tenho contato com as colegas que vão pro cenário real. Então tenho
alguma informação. Talvez se eu tivesse uma inserção poderia ser melhor” (E8). Também foi destacada a percepção crítica
do profissional do serviço sobre os professores, “por exemplo, esse ano, eu tive professores que têm um olhar pra
necessidades de saúde, pra história clínica ampliada, um olhar pro estudante, e eu tive professor que ficou comigo aqui que
é “medicocêntrico” total e embora tenha sido formado nessa metodologia, é mais tradicional que eu.”(E11) Por fim, esses
profissionais apontam que “assumir UPP 1, 2 e 4 na mesma Unidade, o que pra gente fica ruim. Você acaba tendo que
conseguir conciliar a unidade com a UPP.” (E1) Essa fala nos remete à analise de como os preceptores estão acolhendo e
trabalhando com a formação nos serviços de saúde, considerando que no SUS está garantido, por lei, que esse é um
sistema para formar futuros profissionais. Na integração ensino-serviço destacamos que, no currículo integrado e na matriz
dialógica de competência, torna-se essencial a formação a partir do mundo do trabalho, sendo decisiva essa articulação
com os serviços de saúde. Ao se conviver nos diversos cenários encontra-se uma multiplicidade de projetos, tanto
institucionais como pessoais, sendo necessário estabelecer, previamente, como trabalhar como essas possibilidades a
partir de um projeto em comum. Carvalho, Duarte & Guerrero (2015) destacam que essa articulação exige mediações
complexas, considerando que há desigualdades e contradições na relação academia, serviço e comunidade, pressupondo
contrução de projetos coletivos, com corresponsabilização, diálogo solidário e, acima de tudo, com negociação para que
esses projetos possam se constituir realmente em produção compartilhada.

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3.3 Diálogo entre os dados e a aplicação da Análise Temática


Destacamos que a Análise Temática proporcionou desvendar os valores e as crenças dos professores, suas práticas
pedagógica e agrupá-las em temas. Esse movimento foi possível desde a categorização até a identificação dos temas por
meio do uso de planilhas no excel, em que dividimos os dados por ano letivo, e os critérios usados para seleção dos
facilitadores (professores do LPP, APP e UPP) e preceptores que fazem parte do serviço. Há também a opção de se usar
software para sistematizar esses dados como o NVIVO (Melunsky, Crellin, Dudzinski, Orrell, Wenborn, Poland, Woods &
Charlesworth, 2015), WEBQDA (Franco, Bernardes, Boggian, Silva, Spíndola, & Morais Júnior, 2015) e MAXQDA (West,
Power, Hayward & Joy, 2017), os quais são um sistema de software profissional projetado para se trabalhar com a
sistematização de dados de métodos qualitativos e mistos. A análise temática também é apresentada de forma manual,
mas diferenciada no movimento de processamento por Eynon, O’Donnell & Williams (2016): segundo os autores, há seis
passos a serem desenvolvidos para a construção dos temas, que vão desde a transcrição e familiarização com o material,
sua codificação manual, agrupamento dos códigos em temas potenciais, construção de um mapa temático com os temas
e subtemas, devendo haver consenso entre os pesquisadores, estabelecimento de definições claras para cada tema e, por
último, a seleção de fragmentos consistentes e sua articulação com a questão de pesquisa. Os procedimentos para
validação são realizados por meio de transparência na coleta e na análise dos dados e por triangulação dos dados com
consenso entre os pesquisadores sobre os temas. Percebemos que, no movimento apresentado por Minayo (2010),
apoiado em Bardin, os momentos apresentados estão presentes nos passos, inclusive com a mesma preocupação
referente à validação dos dados.

4 Conclusões

Identificamos, pela análise dos temas, que os facilitadores têm operacionalizado o ciclo pedagógico por meio de reflexões
sobre a vivência da prática, identificando seus problemas e explicando-os, localizando as necessidades de aprendizagem.
No processo, os estudantes, ao realizarem a busca qualificada, discutem os conteúdos, articulando-os no momento da
nova síntese com as hipóteses e para resolver os problemas identificados. Em vista disso, algumas facilidades foram
destacadas. Dentre essas, o fato de o profissional estar aberto para os processos de mudanças, habilidades relacionais do
professor e habilidades para condução do grupo no processo de problematização e, ainda, trabalho de avaliação
compartilhada. Por outro lado, as dificuldades encontradas para se realizar o ciclo pedagógico com sucesso estão
relacionadas ao professor e aos estudantes na aprendizagem significativa. Nem sempre se garante um momento
integrado entre os cenários de prática para se fazer a avaliação. Além disso, na forma como se tem construído a integração
ensino-serviço, percebeu-se a necessidade de melhor articulação com negociação entre academia e serviço para se
desenvolver o currículo integrado a partir do cenário real. A metodologia aplicada para a análise temática levou as
pesquisadoras a desvendar os dados e, assim, à compreensão do processo ensino-aprendizagem no ciclo pedagógico. Foi
possível captar as potencialidades quanto ao perfil do professor e estratégias em seu processo de facilitação em
metodologia, havendo destaque às necessidades de mudanças, como a melhor articulação entre ensino e serviço.
Constatou-se, que as metodologias ativas têm avançado em sua prática, considerando que, no Brasil, com a
implementação das DCN, o referencial de competência tem exigido das escolas a mobilização para serem construídas
novas práticas pedagógicas. Além disso, a análise realizada apontou possibilidades de novas formas de utilização da Análise
Temática por meio de software, o que consiste em uma das tendências em pesquisa qualitativa. Novos estudos serão
necessários para acompanhar a implementação da prática pedagógica crítico-reflexiva a partir do mundo do trabalho,
destacando também a visão da comunidade.

Agradecimentos: à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pela concessão de bolsa, processo 2016/03078-9.

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Formação continuada e processo relacional-dialógico: uma ação


significativa para a prática profissional

Kátia Regina do Carmo Pereira

Faculdade de Educação da Universidadede de Brasília, Brasil. katiaregina.dcp@gmail.com

Resumo. O processo investigativo foi instaurado no contexto de espaço-tempo destinado à realização de


um curso para os profissionais que compõem o Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem – ofertado
pela Secretaria de Educação do Distrito Federal às escolas públicas, com o propósito de oferecer apoio
educacional especializado a estas instituições. O objetivo da pesquisa foi identificar as implicações que um
processo relacional-dialógico, sob a teoria da subjetividade na perspectiva histórico-cultural, instaurado no
espaço-tempo de formação continuada tem na prática profissional. Adotou-se a Epistemologia Qualitativa
para a produção de informações, com os seguintes instrumentos: dinâmicas conversacionais, complemento
de frases, memorial, resenha crítico-reflexiva, relato de experiência - desafiadora e exitosa. A análise
construtiva-interpretativa permitiu compreender que a articulação entre processo relacional-dialógico e
formação continuada favorece a análise crítico-reflexiva sobre o trabalho desenvolvido possibilitando a
inovação da prática profissional.
Palavras-chave: Formação continuada; subjetividade; processo relacional-dialógico; Serviço Especializado
de Apoio à Aprendizagem.

Continued education and dialogical relational process: a significant action for professional practice
Abstract. The investigative process was inserted in the context of the space-time intended to the
accomplishment of a course to the professionals that belong to the Specialized Service in Support of
Learning provided by the Federal District to the public schools in order to offer specialized educational
support to these institutions. The intention of this research was to identify the results of dialogical relational
process under the theory of subjectivity on the historic-cultural perspective organized in the space-time of
the continued education has in the professional practice. The qualitative epistemology was used to produce
information, with the following instruments: dynamic conversations, sentences with complement,
memorial, critic and reflective review and experience report. The interpretative and constructive analysis
opened a possibility to understand that the link between the dialogical relational process and the continued
education benefits the critical and reflective analysis about the developed work providing the innovation of
the professional practice.
Keywords: Continued education; subjectivity; dialogical relational process; Specialized Service in Support of
Learning.

1 Introdução
A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal1 (SEEDF) oferece nas escolas públicas o
Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem (SEAA). Este serviço é realizado por uma equipe
composta por profissionais formado em Pedagogia e Psicologia, tendo como finalidade oferecer
apoio educacional especializado às instituições educacionais.
O projeto foi inaugurado no ano de 1968 e foi sendo ajustado ao longo do tempo em função do
aumento da demanda, das alterações de concepções e das atualizações nas legislações. De forma

1 O Distrito Federal é a unidade federativa do Brasil que sedia a capital federal: Brasília.

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que apenas em 2008, com a promulgação da Portaria nº 254, é oficializado; e, em 2010, tem lançada
a Orientação Pedagógica (OP) que rege a sua atuação atualmente.
A Orientação Pedagógica do SEAA apresenta como objetivo norteador do trabalho a promoção da
melhoria da qualidade do processo ensino-aprendizagem por meio de intervenções avaliativas,
preventivas e instituicionais, especialmente nas unidades de ensino que ofertem Educação Infantil,
Ensino Fundamental (Anos Iniciais) e nos Centros de Ensino Especial (OP, 2010).
A orientação para uma atuação mais institucional – mesmo sendo uma proposta construída a partir
de um movimento de investigação iniciado por profissionais que atuavam na área (Neves, 2001;
Marinho-Araújo, 2003) – pode ser considerada uma questão inovadora, o que requer o
estabelecimento de um espaço de formação para os integrantes deste serviço.
A partir desta motivação, a SEEDF busca junto à Faculdade de Educação da Universidade de Brasília,
no ano de 2014, a parceria para instituir este espaço formativo. Esta confluência resultou na
estruturação do curso de extensão “Ação formativa: aspectos constitutivos das práticas do Serviço
Especializado de Apoio à Aprendizagem”.
Algumas questões surgem no momento de elaboração da proposta desta formação: Oferecer um
referencial teórico seria o suficiente para atender as necessidades do grupo? Quais dificuldades e
expectativas esses profissionais que participarão do curso têm em relação ao seu trabalho? Instituir a
participação ativa dos cursistas favoreceria o seu envolvimento nesse processo? O estabelecimento
de um espaço relacional poderia tornar o curso mais propositivo quanto ao aperfeiçoamento
profissional?
Resolve-se, então, estabelecer uma proposta diferenciada para a realização do curso, o qual
constituiu-se, concomitantemente, em um espaço de formação e de investigação.
O espaço de formação: O curso foi oferecido para os pedagogos e psicólogos que compunham as
equipes do SEAA. Como orientadores do curso havia um grupo formado por professores da UnB e
alguns de seus alunos e a coordenadora do Núcleo de Equipes Especializadas de Apoio à
Aprendizagem (NUEAA), da SEEDF e alguns profissionais do SEAA que compunham um grupo de
trabalho que visava demarcar a filosofia de atuação das Salas de Apoio à Aprendizagem (Alcântara e
Goulart, 2016). O período de realização se estabeleceu entre o 2º sementre/2014 e o 1º
semestre/2015, perfazendo um total de seis meses de duração, com encontros semanais. Tinha-se
como objetivo subsidiar teórico e metodologicamente as EEAA para contribuir a atuação institucional
no espaço escolar. Os encontros aconteciam em dias, horários e locais previamente acordados,
tendo como referencial teórico a perspectiva histórico-cultural do desenvolvimento humano
(Vigotski, 1984, 1991, 1995), com destaque à Teoria da Subjetividade proposta por González Rey
(2002, 2003, 2004, 2005ª, 2012).
O processo investigativo: Para a realização do curso havia a definição das metas, da carga horária, do
referencial teórico a ser adotado, entretanto, o planejamento dos encontros aconteciam a partir das
análises possibilitadas pelo movimento relacional-dialógico que se instituía no espaço de formação
entre os cursistas e os orientadores do curso. A dinâmica relacional-dialógico instaurada tinha como
meta conhecer as EEAA participantes do curso e a atividade realizada por elas. Assim, à medida que
se conhecia o grupo – suas potencialidades, fragilidades, expectativas, receios – estrututarava-se,
teórico-metodologicamente, o caminho a seguir em direção ao avanço da proposição de atuação das
EEAA. Esta dinâmica estabelecida exigia do corpo de orientadores do curso reuniões regulares para a
análise reflexiva dos encontros e elaboração do planejamento. Todo o transcurso investigativo foi
norteado, assim, pelo objetivo geral de identificar as implicações que um processo relacional-
dialógico, sob a teoria da subjetividade numa concepção histórico-cultural, instaurado no espaço-
tempo de formação continuada tem na prática profissional.

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Neste trabalho nos propomos a apresentar as análises construídas a partir da investigação instaurada
no momento de realização do curso de formação para as EEAA.

2 Referencial teórico e metodológico


Estabelecer um sistema investigativo no espaço/tempo da realização de um curso de formação
continuada implica na compreensão de que o profissinal participante é um indivíduo singular e
sujeito desta ação formativa – proposições defendidas pela perspectiva histórico-cultural.
2.1 A perspectiva histórico-cultural
A perspectiva histórico-cultural tem seu início marcado pelos estudos de Lev Semenovitch Vigotski
(1896-1934), o qual se contrapôs às teorias vigentes na época sobre o desenvolvimento humano ao
postular que o indivíduo constitui-se como tal quando imerso nas relações sociais e na cultura
(Vigotski, 1984, 1995, 2000). Assim sendo esta dinâmica se dá numa relação complexa, indissociável
e dialética entre os fatores biológicos, fisiológicos, afetivo, social, histórico, cultural.
Na base desse todo constitutivo está, segundo o mesmo autor, a aprendizagem, por engendrar a
área de desenvolvimento, uma vez que esta estimula e ativa na criança vários processos internos de
desenvolvimento no âmbito das inter-relações com outros indivíduos, processos que vão sendo
absorvidos pelo curso interior de desenvolvimento (Vigotski, 1991).
Ressalta-se que, contudo, a aprendizagem não é desenvolvimento em si, mas, sendo devidamente
organizada resulta em desenvolvimento mental, pondo em movimento vários sistemas de
desenvolvimento que não poderia acontecer de outra maneira.
Nesta concepção o desenvolvimento deixa, então, de ser visto apenas como um fenômeno
puramente biológico e passa a ser entendido como resultante de um movimento histórico, dialético,
complexo, interligado às condições objetivas da organização social, distanciado de uma sucessão de
etapas fixas e universais.
Fica instituída, assim, a singularidade do indivíduo. Singularidade que vem abarcada, segundo
González Rey (2005a, 2012b), pela subjetividade, que é o sistema de significações e sentidos
subjetivos em que se organiza a vida psíquica tanto do sujeito quanto da sociedade. Esta organização
“se produz sobre sistemas simbólicos e emoções que expressam de forma diferenciada o encontro
de histórias singulares de instâncias sociais e sujeitos individuais, com contextos sociais e culturais
multidimensionais” (González Rey, 2012b, p. 137).
A subjetividade, nesta concepção, constitui-se na inter-relação de sua dupla dimensão: a
subjetividade social e a subjetividade individual. Sendo a subjetividade individual a representação
dos processos de organização subjetiva dos indivíduos, na qual aparece constituída a história
singular de cada um; e a subjetividade social, o resultado dos processos de significação e sentido
caracterizadores dos cenários sociais em que está inserido (González Rey, 2005b). Faz-se necessário
enfatizar que essas dimensões (subjetividade social e subjetividade individual) são momentos
distintos de um mesmo sistema; estas duas instâncias da subjetividade funcionam como sistemas
processuais em desenvolvimento permanente, os quai se expressam através dos sujeitos que se
posicionam no curso desse desenvolvimento (González Rey, 2012b).
O sujeito, nesta concepção, já não é visto de modo universalizado, antes como “aquele indivíduo ou
grupo que legitima seu valor, que é capaz de gerar ações singulares e que mantém sua identidade
através dos vários espaços de contradições e confrontações que necessariamente caracterizam a
vida social” (González Rey, 2012b, p. 153).

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Entender o sujeito nessa perspectiva nos faz repensar o próprio processo de formação – não se pode
mais pensá-lo como um espaço destinado à transmissão de conteúdo de forma aleatória. Diante
desse contexto teórico, faz-se necessário compreender o espaço-tempo de formação continuada
como um momento relacional estabelecido entre sujeitos de sua ação, que amparados por uma base
teórica e sob uma base dialógica, se tornam capazes de refletir sobre a sua prática e buscar novos
rumos para ela.
Reside nessa proposição uma possibilidade de concretização de mudanças na prática profissional,
pois o movimento relacional que se estabelece compromete os envolvidos no sistema, cria vínculos
emocionais, permite a troca de conhecimento e favorece o diálogo. Alcântara e Goulart (2016, p. 40),
corroboram ao assinalar que à medida que esse movimento se consolida no transcorrer do espaço de
formação e os participantes começam a se posicionar ativamente enquanto sujeitos de suas práticas,
inicia-se o caminho de mudança, sem contudo implicar numa garantia de estabilidade desse sistema.
A partir desta fundamentação teórica e do objetivo estabelecido optou-se por adotar a
epistemologia qualitativa proposta por González Rey (2002, 2005a, 2014) como norteadora desta
pesquisa.
2.2 Epistemologia qualitativa
Diante da compreensão da complexidade constitutiva do ser humano, em que a cultura, o social, o
histórico, o subjetivo se relacionam de forma dinâmica e dialética, a pesquisa se distancia do modelo
positivista e avança para um modelo capaz de perceber os objetos de investigação inseridos nessa
multiplicidade. Em função desta nova perspectiva muitos modelos de pesquisa foram sendo
elaborados, os quais foram reconhecidos, de modo geral, como qualitativos.
O problema maior que envolve essa diversidade metodológica, entretranto, é que as aproximações
das formas qualitativas de construção do conhecimento, segundo González Rey (2002), não
fundaram uma produção epistemológica consistente, o que não as desvinculam de fato do modelo
positivista que a cercam, pois o que diferencia o modelo quantitativo do qualitativo não está na
estrutura instrumental ou metodológica adotados, antes está nas escolhas epistemológicas
assumidas. Assim, o referido autor propõe a epistemologia qualitativa, a qual será apresentada aqui
de forma suscinta por ser a norteadora do trabalho investigativo realizado.
Esta epistemologia é regida por três princípios que se articulam entre si, sendo eles: a legitimação do
processo de comunicação entre o pesquisador e o pesquisado; o conhecimento como produção
construtivo-interpretativa; a referência ao singular como instância de produção do conhecimento
científico.
A legitimação do processo de comunicação entre os sujeitos envolvidos na pesquisa implica no
entendimento do curso investigativo como um percurso fundamentalmente dialógico que se
converte em um espaço legítimo e permanente de produção de informação (González Rey, 2002,
2005a). O movimento de produção de conhecimento tem, assim, um caráter interativo.
A interação entre os sujeitos mediada pelo diálogo torna-se relevante por permitir conhecer tanto os
sujeitos quanto o espaço social em que se dá o fenômeno analisado. Neste sentido, González Rey
(2005a, 2014) ressalta a comunicação como o espaço privilegiado por permitir ao sujeito demonstrar
suas diferentes formas de expressão simbólica, as quais serão vias significativas para estudar a
subjetividade e favorecer o reconhecimento do universo das condições sociais objetivas que aparece
constituído nesse nível.
Esse princípio evidencia a pesquisa como um processo vivo no qual o pesquisador se integra nos
espaços que são próprios dos sujeitos pesquisados, possibilitando no decurso deste movimento a
produção de conhecimento.

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O princípio que indica o conhecimento como produção construtivo-interpretativa parte da


compreensão do conhecimento como uma construção e não mais como a apropriação de uma
realidade de modo linear (González Rey, 2005a). Esta construção do modelo teórico se dá mediante
a interpretação e a produção de hipóteses por parte do pesquisador – é este sujeito quem integra,
elabora, apresenta em construções interpretativas indicadores que não se apresentam de forma
explícita no espaço de pesquisa e que constituem as novas zonas de inteligibilidade acerca do que
está sendo estudado.
O singular como instância de produção do conhecimento científico é o princípio que reconhece o
valor do singular como realidade diferenciada na história da constituição subjetiva do indivídulo
(González Rey, 2005a). Distancia-se da referência do quantitativo de sujeitos para aproximar-se da
qualidade da expressão do sujeito envolvido na pesquisa. González Rey (2002) reitera que o caso
singular tem valor heurístico para a elaboração de conhecimento generalizado pelo significado da
produção teórica gerada a partir dele, a qual representa um momento congruente de um processo
intelectual em evolução na mente do pesquisador. O singular se legitima, assim, pelo que representa
para o modelo teórico.
Sob esse referencial epistemológico deu-se a pesquisa.
2.2.1 Cenário de pesquisa e sujeitos colaboradores
A pesquisa foi produzida no espaço/tempo de realização do curso de extensão “Ação formativa:
aspectos constitutivos da prática do Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem” realizado no
período entre o 2º semestre de 2014 e o 1º semestre de 2015, na Universidade de Brasília, a partir
da parceria estabelecida entre a SEEDF e a Faculdade de Educação desta universidade.
O público alvo do curso eram os profissionais que compunham as EEAA da SEEDF, sendo eles
pedagogos e psicólogos da rede pública de ensino. Estes cursistas tornaram-se, então, os sujeitos
colaboradores desta pesquisa.
2.2.2 Os instrumentos utilizados
Nessa concepção de pesquisa os instrumentos são tidos como recursos facilitadores da expressão
das pessoas. Para González Rey (2005a), a aplicação dos instrumentos tem como finalidade envolver
os sujeitos na expressão de trechos de informação comprometidos com sua vida e história. Assim,
optamos, no decorrer do curso, utilizar alguns instrumentos, tais como: dinâmicas conversacionais
(relatos abertos favorecedores da expressão do indivíduo), completamento de frases (conjunto de
indutores curtos a ser preenchido pela pessoa), memorial (redação sobre a trajetória profissional e
de vida), resenha crítico-reflexiva de textos alusivos à temática, relato de experiência desafiadora e
relato de experiência exitosa em sua área de atuação. A análise construtivo-interpretativa das
informações permitiram algumas compreensões significativas, compartilhadas abaixo.

3 Algumas análises possíveis


O modo de análise construtivo-interpretativo articula o movimento do que está sendo apresentado
pelo sujeito colaborador e o que está sendo percebido pelo pesquisador possibilitando a abertura de
novas zonas de inteligibilidade sobre o tema estudado (González Rey, 2002 e 2005a). Esse processo
não se constitui de forma estanque e linear, assim as análises que serão aqui apresentadas, muitas
vezes representas por trecho de falas ou percepções registradas, são resultantes de um complexo
trabalho de construção e interpretação de informações sob a base teórico-metodológica já
explicitada.

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Para registrar esses trechos de expressão dos sujeitos colaboradores optamos por não diferenciar
neste momento de análise a área de atuação específica do profissional (se pedagogo ou psicólogo)
por adotar a ideia de uma atuação em equipe de fato – o sujeito em questão será entendido como
um profissional da EEAA e suas falas serão identificadas pela letra P (significando Profissional)
seguida por uma letra do alfabeto (escolhida aleatoriamente, apenas para distinguir os sujeitos
colaboradores da pesquisa).
Realizaremos a apresentação deste momento análitico em dois blocos: 1) a percepção do sujeito
sobre o seu trabalho e 2) o processo relacional-dialógico e suas implicações no espaço-tempo de
formação.
3.1 A percepção do sujeito sobre o seu trabalho
A pesquisa instaurada nos permitiu conhecer melhor o profissional que compõe as equipes do SEAA
e o trabalho realizado por eles a partir de sua percepção.
Foi possível perceber que o SEAA, embora instituído a partir de 1968, está em um movimento de
consolidação no espaço escolar em função de suas constantes modificações – como mencionado
anteriormente – e ressaltado pelo PG no questionário reflexivo e propositivo ao falar sobre como a
EEAA é vista na sua escola de atuação: “Ainda aparece como um serviço indefinido. Não
conquistamos ainda a importância de fato. (...) Creio que veem a importância, mas não percebem
ainda a dimensão deste trabalho e demonstram receio de serem incomodados na rotina já
estabelecida”. Essa falta de entendimento por parte da escola sobre o real papel dessas equipes, faz
com que esta seja vista como “a salvadora da pátria no primeiro semestre e grande motivo de
frustração no segundo semestre” (reposta do PP à mesma questão), pois, explica ele, “ainda é muito
forte a perspectiva clínica e avaliativa e a expectativa do grupo escolar é frustrada quando não se
atribui um diagnóstico para os estudantes com dificuldades”.
Marcar a identidade desse serviço no espaço escolar, torna-se fundante, então, para garantir a sua
atuação de forma favorecedora da melhoria da qualidade do processo ensino-aprendizagem. Vale
ressaltar que nesse conjunto constitutivo da identidade “o outro” aparece como elemento
importante de significação, entretanto, não de maneira definidora; como enfatiza Tacca (2004, p.
103) “para dizer quem somos, não apenas temos em mente aquilo que nos comunicam sobre nós,
mas existe uma interpretação da própria pessoa que integra as diferentes devoluções que recebe, o
que a faz participar ativamente da construção da própria identidade”.
Nesse processo de constituição de identidade do SEAA foi possível perceber no trajeto da pesquisa
este movimento no qual os sujeitos apontam o que “o outro” (a escola, nesse caso) pensa sobre eles,
mas também se posicionando quanto ao que acreditam sobre o seu trabalho: “não temos que ter
respostas prontas e nem fórmulas mágicas, temos que em conjunto com os professores repensar
práticas, discutir métodos, formular estratégias.” (PV, na resenha crítico-reflexiva) – pensamento que
distancia a EEAA de uma atuação puramente clínica (esperado pela escola) e a aproxima de uma
atuação mais institucional (proposta atual do SEAA).
Esse percurso de consolidação da identidade do SEAA apresenta-se cercado por dificuldades e
expectativas que foram indicadas durante a investigação.
Entre as principais dificuldades elencandas estão: a) a incompreensão da função da EEAA por parte
da comunidade escolar e a demanda indevida, como explicita PH: “(...) o trabalho do psicólogo fica
resumido à avaliação. Nesse aspecto atrapalha em muito o trabalho institucional, pois não há o
engajamento deste profissional com a escola”; b) conquistar a confiança dos demais profissionais da
escola, como ressalta PM: “ Para mim um dos maiores desafios para que esse objetivo (qualidade de
aprendizagem do aluno) seja alcançado é o estabelecimento do vínculo de confiança com o

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professor, pois se ele não acreditar e confiar no nosso trabalho fica muito mais difícil alcançar esses
objetivos”; c) o não reconhecimento do serviço, como pode ser visto na fala do PE: “Acho que
precisamos trabalhar mais para que o setor seja reconhecido. Ainda escuto muito que a equipe não
resolve os problemas e me sinto fazendo ainda um trabalho sem efeito”; d) a falta de estrutura física
e institucional, como evidenciado por PG: “Não temos espaço físico adequado para as ações mais
individualizadas de escuta e intervenções pontuais. Não há também o espaço designado às ações
institucionais e ainda é preciso solicitar partes da coordenações, reuniões, eventos, para aos poucos
fazermos ossas intervenções”; e) as concepções biologizantes e culpabilizadora presentes no espaço
escolar, como indicado por PC: “Vejo como desafio contribuir na linha de assessoria ao trabalho
coletivo, na tentativa de transpor a resistência dos professores em relação às práticas atuais que
reforçam a reprodução e padronização dos processos de aprendizagem.” – todas as falas acima
foram extraídas do questionário reflexivo e propositivo.
Quase que em contrapartida às dificuldades arroladas estão as expectativas que estes profissionais
das equipes têm sobre o seu trabalho. Uma síntese destas expectativas pode ser obtida na resposta
de PJ à pergunta sobre o que poderia melhorar a atuação da EEAA: “a contratação de mais
psicólogos, acabando com a itinerância e possibilitando um trabalho verdadeiramente institucional;
maior conhecimento e reconhecimento sobre o serviço; mais integração no trabalho de pedagogos e
psicólogos; mudança na forma como a comunidade escolar encara o serviço, que ainda é sob uma
perspectiva clínica, de diagnóstico e tratamento de alunos.”
Pode-se perceber que as expectativas listadas estão fortemente atreladas à condição de ação do
outro para que sejam efetivamente alcançadas; essa dependência do outro as aproximam ainda mais
das dificuldades, quando não as tornam parte integrante desse quadro de problemas (Pereira, 2011).
Esta relação imbricada entre as dificuldades e expectativas que cercam o serviço especializado
terminam por culminar em um sentimento de incerteza e receio de que este não consiga alcançar o
seu objetivo maior: favorecer o sistema de ensino-aprendizagem – como registrou o PB em seu
relato de experiência desafiadora: “Durante todo o ano de 2014 eu argumentei sobre a importância
de trabalharmos mais próximos aos professores, usei argumentos práticos, teóricos e a OP, mas
infelizmente o sistema venceu... Acredito que enquanto não conseguirmos olhar o outro enquanto
sujeito que aprende e considerarmos a importância das variáveis do ambiente escolar no processo
de aprendizagem do aluno não estaremos prestando um serviço de qualidade para o discente,
muitas vezes poderemos estar contribuindo para reforçar uma visão que se preocupa com o rótulo e
não com o processo de aprendizagem e de desenvolvimento do outro.”.
Conhecer um pouco mais da realidade das EEAA pela ótica dos profissionais que delas participam
permitiu um movimento singular na trajetória do curso de formação que estava sendo realizado – ia-
se conduzindo as discussões, análises e reflexões de maneira articulada à realidade apresentada pelo
grupo, sob a base teórico escolhida, o que abria caminhos para repensar e/ou transformar a própria
prática.
3.2 O processo relacional-dialógico e suas implicações no espaço-tempo de formação
Assumir a integração do espaço relacional-dialógico com o de formação continuada das EEAA
revelou-se uma estratégia diferenciada favorecedora da análise crítico-reflexiva sobre o trabalho
desenvolvido, tornando-se uma via possibilitadora de transformação e inovação da prática
profissional.
Tal compreensão é resultante das análises que foram sendo construídas ao longo da trajetória da
pesquisa.

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No decurso foi possível perceber que o diálogo foi um elemento fundante para estabelecer uma
relação. Abrir-se para o diálogo no espaço-tempo da formção implicou dar voz ao cursista, o qual ao
perceber-se ouvido foi constituindo-se como sujeito no curso dessa formação. Ideia que pode ser
vista na avaliação realizada no decorrer do curso por PJ: “Avalio que o curso está sendo muito
proveitoso e bem sucedido em provocar reflexões. Sentia falta de trabalharmos mais referenciais
teóricos, mas esta sugestão já foi acatada na última aula (24/02/2015). Minha sugestão agora é que
busquem aliar os conteúdos trabalhados à prática profissional cotidiana”. O fato de se sentir ouvido
quanto à solicitação de se trabalhar mais referenciais teóricos, impulsionou o cursista a continuar
sugerindo mudanças, participando, assim, ativamente do seu processo formativo.
Esta relação dialógica estabelecida, também, permitiu maior interação entre os sujeitos participantes
(orientadores/cursistas/cursistas/orientadores). Essa interação envolveu estes indivíduos em um
contexto mais amplo de aprendizagem: para além do conteúdo encontravam-se outras experiências,
realidades diferentes, pensamentos similares e distintos.
O contato com essa diversidade, segundo Ibiapina (2007), favorece a procura não solitária de metas
para o aperfeiçoamento pessoal e profissional. Nesse momento de encontro em individual e coletivo
se cruzam impulsionam reflexões pertinentes sobre a própria prática fazendo com que os avanços
sejam uma possibilidade diante da colaboração instituída.
Esse movimento de construção colaborativa do curso apresentou-se como um diferencial dentro da
proposta de investigação. Entretanto, como elemento atípico no espaço de formação, esse
movimento provocou algumas inquietações sobre os participantes, como percebido nas respostas de
alguns deles no questionário reflexivo e propositivo: “Inicialmente considerei que estávamos
andando em círculo, no que se refere às reflexões, no momento de discussão em pequenos grupos.”
(PO); “Tenho gostado da maioria das atividades, porém estou com o sentimento de estar falando
muito sobre mim (memorial, complemento de frase e agora essa atividade) e entendo a importância
desse tipo de atividade, mas estou sentindo falta de atividades mais teóricas que possam me ajudar a
pensar a prática.” (PM). Em contrapartida, o relato de PK demonstra o entendimento da proposta: “A
partir dessa discussão podemos nos perceber historicamente em todos os sentidos da palavra.
Encontrar caminhos centrados na prática profissional através de ações inovadoras.” Esses momentos
de tensão, na perspectiva teórica adotada, são extremamente significativos, pois são eles que
possibilitam o desenvolvimento (González Rey, 2004).
Um momento de tensão também estabeleceu-se no que tange à questão da relação teoria-prática. O
processo relacional-investigativo demonstrou que os profissionais/cursistas partiam do princípio da
prevalência da prática sobre a teoria, ou da necessidade de uma aplicabilidade direta da teoria à
prática como possibilidade de melhoria da ação profissional. O que pode ser visto nas observações
feitas por PE: “Quando vi que no início era dinâmicas de grupo, relato de memorial e etc confesso
que fiquei muito desanimada. Passei a gostar mais quando tivemos a aula para apresentar os estudos
de caso e pudemos discutir mais cada ação. A minha sugestão é que pudéssemos discutir mais a
nossa prática.”; por PA: “O material trabalhado tem sido muito enriquecedor. Gostaria que fosse
trabalhado mais exemplos práticos de atuação.”; ou por PP: “Contudo a perspectiva teórica ainda
não está muito clara, ainda é difícil associá-la à prática”. Foi comum escutar nos momentos
conversacionais a questão: “Mas como vamos poder esta teoria na nossa prática?”
A discussão sobre a relação teoria e prática é ampla e complexa, queremos aqui apenas destacar que
a teoria é uma produção orgânica do pensamento, assim sendo, como ressalta González Rey (2002),
todo avanço no estudo de uma qualidade do problema é realizada mediante novos momentos de
desenvolvimento teórico. Fica posto que aliar teoria e prática, não de forma direta e linear, mas

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reflexiva e dinâmica, então, torna-se uma necessidade quando se pretende alcançar mudanças nos
cenários de atuação.
Esse modelo propositivo de formação permitiu-nos ainda vislumbrar algumas mudanças de
concepções e de atuação que ocorreram a partir do investimento teórico-metodológico
implementado – identificado por nós como um possibilitador de reflexão. Diante disso, PD
(questionário) afirma que “as teorias discutidas tem enriquecido as minhas ações nas várias
dimensões do serviço, tem acrescentado bastante à minha vida profissional, aguçando o meu olhar, a
minha escuta.”; PL (questionário) sinaliza que “esse curso está me permitindo refletir sobre meu
percurso de aprendizagem desde a infância e ressignificar alguns questionamentos. Estou muito feliz
por estar participando, as discussões me remetem ao meu fazer e fazem refazer melhor.”; e PT
(resenha) assevera que “todas essas questões e inquietações contribuem para que possamos ir atrás,
cada vez mais, de discussões teóricas como essa que nos ajudam a repensar os processos de
aprendizagem (...). Por fim, (...), a certeza, talvez a única, que fica é que, enquanto profissionais das
Equipes, devemos contribuir com uma prática que considere verdadeiramente o Sujeito que
aprende.”
O olhar para sua realidade, repensar sua ação, reconhecer pontos de avanços e rupturas necessárias
torna esse profissional um sujeito de sua ação formativa. Esse movimento reflexivo volitivo,
conforme Ibiapina (2007), amplia a consciência do profissional implicando-o em ações que conduzem
à transformação da prática instituída.

5 Considerações finais
A oportunidade de oferecer um curso de formação para as equipes que compõem o Serviço
Especializado de Apoio à Aprendizagem nos fez pensar numa proposição diferenciada de atuação.
Esse desejo emerge em função do referencial teórico norteador do trabalho, a Teoria da
Subjetividade proposta por González Rey a partir da perspectiva histórico-cultural.
Estabelece-se como eixo para esta formação o estabelecimento de um espaço relacional-dialógico, o
qual se abre, de diversas maneiras, para o diálogo entre os sujeitos participantes
(orientadores/cursistas/cursistas/orientadores) e para uma organização colaborativa do espaço-
tempo destinado ao curso. Dois processos distintos, complementares entre si, acontecem
concomitantemente nesse momento: a formação e a pesquisa.
A pesquisa, mediante o modo de análise construtivo-interpretativo, princípio resguardado pela
Epistemologia Qualitativa, permitiu entender que a instituição de um espaço relacional-dialógico no
decurso de formação continuada favorece a análise crítico-reflexiva sobre o trabalho profissional
realizado pelo sujeito/cursista possibilitando a inovação da sua prática.

Referências
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Análisis documental del perfil competencial del docente universitario en un


país latinoamericano de ingresos medios, mediante teoría fundamentada

Adriana Romero-Sandoval1,2,3, María Gabriela León1


1
Universidad Internacional del Ecuador, Ecuador. adromero@uide.edu.ec; maleon@uide.edu.ec
2
Departamento de Pedagogía Aplicada, doctoranda de Universidad Autónoma de Barcelona, España.
3
Grups de Recerca d Amèrica i d Àfrica Llatines (GRAAL).

Resumen. La potencialidad de aplicar una metodología de recogida y análisis de datos como es la teoría
fundamentada a aquellos documentos o textos escritos como la normativa y legislación producida desde
organismos estatales de un país latinoamericano de ingresos medios, en materia de funciones del docente
universitario, permitió identificar las competencias genéricas: instrumental, interpersonal y sistemática; y las
competencias específicas descritas por ámbitos: enseñanza, investigación, vinculación y gestión académica
que definen el perfil competencial del docente universitario. Considerando que siempre se puede identificar
cambios legislativos necesarios para que se produzca un mayor engranaje entre realidad social y norma
jurídica, de ello podemos concluir que las competencias pueden ser adquiridas a lo largo de toda la vida,
exigiendo consideraciones de flexibilidad y de adaptación a la evolución constante de las funciones, los
requerimientos y características propias de cada universidad.
Palabras clave: Educación superior; perfil competencial; Leyes sobre educación; Teoría Fundamentada.

Documentary analysis of the competence of university teachers in a Latin American country of middle-
income, using grounded theory
Abstract. This study applied a methodology for data collection and analysis, known as Grounded Theory, to
those written documents such as regulations and laws issued by state agencies of a Middle Income Country
in Latin America regarding faculty functions. It enabled us to identify core competencies: instrumental,
interpersonal, and systematic; as well as specific competencies described by areas: teaching, research,
community outreach, and academic management that define the profile of a university professor. Considering
that necessary changes can be applied to the law in order to produce a better a connection between the
reality and the legal norm, we can conclude that competencies can be acquired through life taking into
consideration some flexibility and adaptation to the constant evolution of functions, requirements and
characteristics of each university.
Keywords: higher education; competence profile; Laws on education; Grounded Theory.

1 Introducción
El grado de adecuación que existe entre los hechos sociales y el derecho, representa el grado de
pertinencia entre ambas dimensiones, considerando que siempre se pueden realizar cambios
legislativos conducentes a obtener un mayor engranaje entre realidad social y norma jurídica. El perfil
competencial del docente es la conjugación de conocimientos, habilidades y destrezas generales que
debería mostrar este actor de la educación; y los discursos subyacentes que se derivan de la normativa,
que guían a la consecución de tales metas (González, Mortigo, & Berdugo, 2014). Los esfuerzos por
identificar y seleccionar un mapa de competencias docentes pertinentes para mejorar la educación,
como un hecho social, en el contexto Latinoamericano, se presentan en varios estudios con enfoque
cualitativo, cuantitativo y mixto (Monereo & Domínguez, 2014). La utilidad de la aplicación de los
criterios de la teoría fundamentada en el análisis discursivo e ideológico contenido en la constitución,
leyes, reglamentos y cualquier otra norma del ordenamiento jurídico que rige el sistema de educación
superior en un país, por medio de un planteamiento inductivo, nos permite separarnos de los
presupuestos contenidos en tales objetos de estudio y examinar sus significados latentes y los alegatos

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paralelos existentes en la realidad social, es decir, determinar el perfil competencial del docente
universitario contenido en el discurso de las normas jurídicas que regulan la educación superior. El
objetivo del presente estudio fue reconocer elementos del perfil competencial del docente que se
encuentra en la normativa que regula la educación superior en un país latinoamericano de ingresos
medios, a través del análisis del discurso latente de la Ley.

2 Aproximación Teórica
2.1 La educación superior del Siglo XXI
Las reflexiones sobre la educación se atribuyen entre otros autores a la Organización de las Naciones
Unidas para la Educación, la Ciencia y la Cultura, por sus siglas en inglés UNESCO, que prescribe a la
educación como un instrumento indispensable para el progreso de la humanidad en camino hacia la
paz, la libertad y la justicia social; con una función esencial que es el desarrollo contínuo de la persona
y la sociedad (Delors, 1996).
El desarrollo de la sociedad marcó, en el último cuarto del siglo XX, importantes descubrimientos y
adelantos científicos, que permitieron a las sociedades salir de un estado de subdesarrollo y adquirir
ritmos diferentes de industrialización; pero también se han mantenido las desigualdades de desarrollo
con respecto al acceso a la educación superior, la investigación y los recursos para llevarla a cabo,
enfrentando a la educación a condiciones nuevas (Barba Álvarez & Lobato Calleros, 2012).
La educación superior del siglo XXI se presenta con una fisonomía de cambio que conlleva
características como: la masificación en la matriculación, el aprendizaje a distancia, la educación para
toda la vida, la tensión entre lo mundial y lo local, el dilema de la mundialización de la cultura, las
nuevas tecnologías de la información, la concentración en los problemas inmediatos, la competencia
y la igualdad de oportunidades, el desarrollo del conocimiento, la capacidad de asimilación del ser
humano, el respeto al pluralismo, la superación de sí mismo y la incertidumbre valorativa (UNESCO,
1998). La educación superior se enfrenta a desafíos y dificultades relativos a: financiamiento, igualdad
de condiciones de acceso a los estudios y permanencia en ellos, definición del perfil del docente, la
formación basada en competencias, mejoramiento y calidad en la enseñanza, investigación y
consultoría, pertinencia de los programas de estudio, la internacionalización de la universidad, el uso
de la tecnología como parte de la metodología didáctica en aula y demás características que responden
al cambio como una constante de momento (Argudín, 2009). Los modelos sociales, políticos y
económicos que han marcado el pasado inmediato son insuficientes, y en muchos casos obsoletos e
inadecuados para entender y actuar sobre el mundo actual. Los cambios sociales, culturales,
económicos, presentes demandan una permanente reconfiguración que incide en los planteamientos
educativos; la educación exige adaptarse cultural, social, laboral, profesional y personalmente al ritmo
del cambio y su velocidad, cifrado en nuevas claves de concepciones culturales, producción, relaciones
sociales, económicas e industriales (Brunner & Uribe, 2007).
2.2 Docente y perfil competencial
Dentro de los desafíos que plantea la educación superior del siglo XXI, el docente y su perfil
competencial constituyen elementos transversales en el proceso enseñanza-aprendizaje. Según el
diccionario de la Real Academia Española la docencia es la práctica y ejercicio del docente; y puntualiza
docente a perteneciente o relativo a la enseñanza. Para Tejada (2009) el término docente se refiere a
toda persona que tiene relación con la formación desde la óptica de la responsabilidad en la gestión,
la concepción de la formación y la realización de la misma. Detrás del término docente se encuentra
una variedad de profesiones que actúan en diferentes contextos y con diversos recorridos formativos
(Tejada Fernández, 2009). El concepto de competencia, al ser un término polisémico, para este estudio
se aborda desde una visión holística en un contexto profesional. La palabra competencia hace
referencia a saber los temas requeridos por la profesión, donde el ejercicio eficiente y efectivo de los

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conocimientos requiere un saber hacer y para responder a un mundo cambiante se necesita saber
estar y saber ser. En este concepto es determinante los dos primeros saberes que responden a la
profesión, saber y saber hacer y los dos últimos saberes, saber estar y saber ser que se denomina
competencia transversal (Echeverría Samanes, 2002). La competencia exige un saber entrar en acción,
una puesta en juego, un orden para resolver cosas, enfrentarse a tareas complejas en situaciones o
tareas variadas y definidas en un campo disciplinario determinado, con características de dominio,
habilidad adquirida, actuación eficaz haciendo frente a las labores (Ruiz Bueno, Mas Torelló, Tejada
Fernández, & Navío Gámez, 2008). La competencia va más allá que una acumulación de contenidos
(saber), está constituida por habilidades (saber hacer), actitudes y valores (saber ser y estar), así
también se desarrollan mediante la propia experiencia socio laboral. La competencia se relaciona con
la capacidad de utilizar conocimientos y habilidades, de manera transversal e interactiva, en contextos
y situaciones que requieran la intervención de conocimientos vinculados a diferentes saberes, lo que
implica la comprensión, reflexión y discernimiento teniendo en cuenta la dimensión social de cada
situación (Mas Torelló & Tejada Fernández, 2013). El desarrollo del perfil competencial del docente
debe tomar como referencia sus funciones, porque están establecidas en la ley y porque estas
funciones emanan directamente del contexto de actuación profesional. El papel del docente como
reproductor de conocimiento ha sido reemplazado por un rol orientador de los aprendizajes, y son los
estudiantes quienes deben saber buscar, procesar y utilizar el nuevo contenido aprendido en función
del conocimiento previo (Berro et al., 2010).
2.3 Marco legal y referente normativo: Reto en Ecuador
Ecuador, como uno de los países sudamericanos que ha pasado de ser considerado un país de bajos a
medianos ingresos en la última década, con una gran inversión pública en la educación superior. El
estado ecuatoriano ha asumido como el único posible regulador, a escala nacional, de la política
pública orientada a la búsqueda de la calidad académica, el incremento de la cobertura con equidad y
la regulación de la internacionalización de la educación superior (Teichler, 2009). Los nuevos desafíos
y exigencias que enfrenta la educación superior en el contexto global de una sociedad del
conocimiento, donde el incremento de la producción está asociada al componente del capital humano,
predomina la formación académica y profesional con visión científica y humanista, se demanda
investigación científica y tecnológica, innovación, promoción, desarrollo y difusión de los saberes y las
culturas (SENPLADES, 2009). El crecimiento del papel del Estado en la fiscalización, supervisión y
control de la educación superior que se da en Ecuador y en América Latina, en general, ha creado una
nueva tensión entre: autonomía universitaria y gobierno; autonomía y sistema; y competencia y
complementariedad. En la última década en Ecuador, como en los países de la región, la expansión de
los organismos reguladores sobre la educación superior, ha fijado estándares básicos para las
instituciones públicas y privadas, programas, carreras, formas de gestión, actividades del docente y la
garantía de los derechos estudiante (Rama, 2005). En este nuevo proceso las políticas públicas se
orientan a la construcción de una nueva institucionalización en la regulación, creando un sistema de
educación superior integrado por universidades y escuelas politécnicas, institutos superiores técnicos,
tecnológicos y pedagógicos; y conservatorios de música y artes, debidamente acreditados y evaluados.
En Ecuador el sistema de educación superior está regido por dos organismos públicos: Consejo de
Educación Superior (CES) y Consejo de Evaluación, Acreditación y Aseguramiento de la Calidad de la
Educación Superior (CEAACES).
La normativa que rige al sistema de educación superior se encuentra conformada principalmente por:
la Constitución, tratados y convenios internacionales, la Ley Orgánica de Educación Superior (LOES),
Reglamento general a la LOES, decretos, reglamentos y resoluciones.
La aplicación de la LOES ha generado atención y debate en los últimos diez años. Según Ortiz Lemos
(2014) la LOES se opone directamente a la obtención de la excelencia académica, dificulta la

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racionalidad de la misma. Por eso y no por otras razones la universidad es autónoma, la


responsabilidad no puede venir dictada por instancias extrañas sino por su misión y visión fundadoras
y por su compromiso con los saberes y la sociedad (Bolívar & Caballero, 2008).
Mientras que según Gallegos (2013) la LOES ha permitido una transformación de la educación superior
en Ecuador donde se exige al docente producción académica basada en el elemental cumplimiento de
requisitos principalmente ligados al nivel de formación mínima que debe tener un docente, trabajos
de investigación, dirección de tesis, experiencia, estudios de posgrado, movilidad del docente,
publicación en revistas indexadas y vinculación con la sociedad.
2.4 Teoría Fundamentada (Grounded Theory)
Para cumplir con el objetivo del estudio hemos utilizado la herramienta metodológica denominada
Teoría Fundamentada que según los autores Strauss y Corbin (2002) definen como una teoría derivada
de los datos recopilados de manera sistemática, donde el análisis responde a un proceso de
investigación; en este tipo de diseño cualitativo, la relación estrecha que hay entre la recolección de
datos y el análisis dan paso a la creación de la teoría. La investigación inicia con un área de estudio
para luego permitir que la teoría surja a partir de los datos. La teoría se parece más a un contexto
concreto desde la perspectiva de diversos participantes, por lo que es posible que genere
conocimientos, aumente la comprensión y proporcione una guía significativa para la acción.
La fundamentación de conceptos en los datos y la creatividad de los investigadores permiten promover
el pensamiento creativo, estar abierto a múltiples posibilidades, generar una lista de opciones,
explorar varias opciones antes de decidirnos por una, usar formas no lineales de pensamiento en un
tema para lograr nuevas perspectivas (Strauss & Corbin, 2002).
Las propiedades de la teoría fundamentada que alimentan el desarrollo del proyecto de investigación
son la construcción de la teoría en lugar de comprobarla, ser una herramienta útil para manejar gran
cantidad de datos brutos, considerar significados alternativos del fenómeno de estudio, ser
sistemático, por la naturaleza de los datos, y creativo al mismo tiempo, identificar, desarrollar y
relacionar los conceptos, elementos que constituyen la base de la teoría.
El proceso de “construir teoría” exige tener claro lo que constituye “construir teoría”, para esto es
necesario diferenciar entre describir, ordenamiento conceptual y teorización porque una teoría más
que comprender algo, da oportunidad de explicar y predecir acontecimientos proporcionando guías
para la acción (Gaete Quezada, 2014).
Tal como señalan Glaser y Strauss (2006), si se sigue el procedimiento de “teoría fundamentada”, se
puede elaborar una teoría sustantiva, que por lógica deberá ser comprobada y validada. Es de utilidad
cuanto las teorías disponibles no explican el fenómeno o planteamiento del problema o cuando no
cubre a los participantes, al contexto o muestra de interés, en el análisis de los textos legales y
normativas en materia del perfil competencial del docente de educación superior en Ecuador.

3 Metodología
El diseño de esta investigación se aborda desde el enfoque cualitativo utilizando el método
interpretativista del cual se seleccionó la teoría fundamentada. La pregunta de investigación planteada
fue ¿cuál es el perfil competencial del docente universitario a partir del marco normativo que rige al
sistema de educación superior? El ámbito de estudio es el contexto normativo ecuatoriano en materia
de educación superior. La selección de la muestra teórica consideró como fuente primaria los
documentos que norman las actividades que debe realizar un docente universitario y que incluyen 12
textos normativos, a saber: Constitución, Ley Orgánica de Educación Superior, Reglamento de la LOES,
Código Orgánico de la Economía Social de los Conocimientos, Creatividad e Innovación, cinco
reglamentos y tres normativas afines. Para establecer relaciones o tendencias provenientes del análisis
de la revisión documental se utilizó el soporte informático de la herramienta QDAMiner®, la

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recolección de los datos y el análisis se llevó de manera concurrente, se buscaron las ideas, conceptos
o elementos que permitan agrupar los fragmentos de discurso teniendo como criterios la relevancia,
es decir, información recurrente o asertiva respecto a la temática consultada; la pertinencia, esto es,
información que se refiere a la temática; la coincidencia, esto es que varios documentos opinan de
manera semejante o divergente. Para el tratamiento de datos emergentes se recurre a la comparación
constante (Luckerhoff & Guillemette, 2012).
Para este análisis se tomaron en cuenta los planteamientos sobre el perfil competencial del docente y
las actividades de enseñanza, investigación, vinculación y gestión; para finalmente tener de forma
extensiva, con comparación constante, una codificación que permitió organizar e interpretar la
información en categorías y subcategorías.
Las etapas ejecutadas para el análisis de discurso narrativo que subyace en la normativa y que
establece las funciones profesionales del docente, fueron primero la elaboración y desarrollo de una
base de datos con los textos legales acorde con las actividades que realiza un docente; en esta etapa
se decidió incluir varios términos relacionados a la palabra docente como son: profesor, profesora,
investigador, investigadora; por su aporte en la configuración del perfil competencial. Los criterios para
la selección de los textos fueron: la pertinencia con el tema, la relación con el objeto de estudio y el
rigor conceptual denotado en el texto. La búsqueda de los documentos se realizó a través de los sitios
web del CES (www.ces.gob.ec) y CEAACES (www.ceaaces.gob.ec).
La segunda etapa permitió la depuración y clasificación de los documentos, para esto fue necesaria la
asesoría de expertos en el tema para construir los códigos de clasificación de la información y que con
sus aportes el estudio pueda ser arbitrado en un marco referencial del Derecho.
La tercera etapa buscó aclarar conceptualizaciones operativas para el análisis y creación de categorías
y subcategorías que fueron utilizadas para desarrollar relaciones semánticas en la unidad de análisis.
Este análisis siguió en tres momentos: un primer momento la codificación abierta en el que los datos
se dividieron y codificaron en códigos y categorías. Para esto se formularon cuatro categorías:
enseñanza, investigación, vinculación y gestión, sirviendo como un referente para la clasificación de la
información. Un segundo momento la codificación axial, que permitiera reducir los documentos y
unidades analizables, esto es, fragmentos de texto con significado; para esto se comparó, ordenó y
relacionó las categorías entre sí. La codificación axial permitió habituarse con el lenguaje, la
terminología y los subtemas de los documentos, lo que sirvió para describir con mayor detalle la
información. Finalmente, se trabajó en un tercer momento de codificación selectiva de temas,
categorías y subcategorías, y categoría central en el que se integró, redujo y refinó la teoría sustantiva
del estudio y se desarrolló el tema central: perfil competencial del docente.
El control de calidad de la investigación está realizada por la triangulación teórica, donde se consideran
las diferentes corrientes teóricas que explican el objeto de estudio, evitando utilizar una única
perspectiva teórica; y la triangulación de investigadores, porque se combina el trabajo con otros
observadores en el campo de investigación con teorías que incrementan la calidad y la validez del
análisis ya que se cuenta con distintas perspectivas de un mismo objeto de estudio y se elimina el sesgo
de un único investigador; además de tener una interpretación más completa y comprensiva, y así dar
respuesta al objeto de estudio (Alzás García, Casa García, Luengo González, Torres Carvalho, &
Verissimo Catarreira, 2016).

4 Resultados
A través de las sucesivas comparaciones de los datos, se crearon niveles más abstractos de conexión
teórica, por lo que la teoría se construye inductivamente desde los estudios más avanzados del análisis
de datos. Por otro lado, la revisión de la literatura no aportó un marco interpretativo previo, sino que
se vinculó con laudables categorías a la teoría emergente.

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El análisis a partir de diferentes instrumentos jurídicos indica que éstos tratan de responder a las
necesidades normativas y administrativas de una nueva realidad del docente universitario. La
respuesta técnica a la necesidad técnica gira en torno a la consideración reflexiva de la normativa que
rige al sistema de educación superior, mostrando la responsabilidad del gobierno en este fenómeno
social.El contexto constitucional que implica una visión de la educación superior como derecho y a la
vez como deber ineludible e inexcusable del Estado, explica la configuración del perfil competencial
del docente universitario. La lógica del discurso en la legislación secundaria (leyes, reglamentos), se
centra mayoritariamente en el control social más en desmedro del fomento a la formación del
docente; control del que deriva los restantes significados y discursos.
La codificación que permitió desarrollar el tema central, perfil competencial del docente, considera en
la categoría docencia las características a las que el docente se enfrenta como persona a través de su
socialización, resultan ser los datos asociados a las competencias genéricas, que son aquellas
necesarias para su realización, desarrollo personal, ciudadanía activa, inclusión social y empleo. Por
otro lado, en materia de competencias específicas, se le exige al docente un nuevo proceso más
intenso que requiere un comportamiento determinado para la transformación de la educación
superior en Ecuador. Las categorías de enseñanza, investigación, vinculación y gestión permitieron
describir estas competencias específicas del profesor que están asociadas a los conocimientos teóricos
y procedimientos metodológicos propios de la profesión docente, donde el Reglamento de carrera y
escalafón del profesor e investigador del sistema de educación superior cobra un papel definitorio.
El perfil competencial del docente universitario precisa una concreción en torno a la formación de
calidad a los estudiantes, al cumplimiento de normas cívicas que no alteren el sistema, y al
cumplimiento de obligaciones con las instituciones de educación superior.
De los memos que surgieron en las discusiones previas, junto con los memos que con ayuda del
software se editaban en el transcurso de su codificación, se delimitó el contorno de la teoría, esto se
representa en la tabla 1. A partir de la categoría docencia se desarrollaron las competencias genéricas
del docente universitario.
Tabla 1. Competencias genéricas del docente universitario

Realizaciones profesionales
Capacidad de comprender, manejar ideas y pensamientos. Creación de espacios de análisis y discusión.
Competencia
Instrumental

Capacidad metodológica para manejar el contexto. Profesionalización, desempeño y méritos académicos.


Manejo de recursos. Disponibilidad de recursos para la docencia.
Habilidad tecnológica. Experiencia docente.
Destreza lingüística. Transmisión de instrucciones, interacción con actores.
Manejo de una segunda lengua.
Mantener una buena relación con los demás. Movilidad docente. Estabilidad laboral.
interpersonal
Competencia

Capacidad de expresar sentimientos, críticas y autocríticas. Evaluación y autoevaluación.


Capacidad de trabajar en equipo. Gestión de la práctica docente.
Compromiso social y ético. Respeto a valores y principios.
Liderazgo. Libertad de cátedra e investigación.
Aprendizaje autónomo. Formación pedagógica y académica del profesor.
Solución de problemas. Ser parte de actividades académicas y culturales.
Creatividad. Vinculación de la formación docente a la actividad
Competencia
sistemática

académica e investigativa.
Capacidad de adaptación a nuevas situaciones Actividad académica de calidad.
Pertinencia, integralidad, autodeterminación para
producción del pensamiento y conocimiento.
Participación en concursos de méritos y oposición.
Planificación, evaluación de conocimientos impartidos.

A partir de las categorías enseñanza, investigación, vinculación y gestión se desarrollaron las


competencias específicas del docente universitario que se resumen en la tabla 2.

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Tabla 2. Competencias específicas del docente universitario

Competencia específica Realizaciones profesionales


Programar la enseñanza y la interacción didáctica. Diseño y planificación del proyecto de aprendizaje.
Preparación, elaboración, aplicación y calificación de exámenes,
trabajos y prácticas.
Diagnosticar necesidades. Diseño, elaboración de libros, material didáctico, guías o sílabos.
Trabajar a partir de vivencias, sentimientos y Actividades de docencia en cursos de grado y posgrado.
experiencias de los estudiantes. Diálogo de saberes, pensamiento universal.
Desarrollar en los estudiantes competencias El componente de docencia se desarrolla en contacto directo in
transversales. situ y en tiempo real entre el profesor y los estudiantes.
Enseñanza

Enfoque didáctico integral que orienta el proceso de aprendizaje


al desarrollo de competencias profesionales.
Crear un clima favorable para mantener una Apoyo con trabajo tutorial.
comunicación e interacción positiva con los Aprendizaje colaborativo, práctico y autónomo.
estudiantes.
Evaluar los aprendizajes y el programa. Participación y organización de colectivos académicos de debate,
capacitación o intercambio de metodologías o experiencias de
enseñanza.
Ayudar a la socialización profesional de los Formación académica, profesional con visión científica y
estudiantes. humanista.
Liderar y gestionar trabajos de investigación. Ejecución de proyectos de investigación.
Asesoría, tutoría o dirección de tesis.
Identificar, plantear y formular problemas de Diseño, elaboración, puesta en marcha de metodologías,
investigación. instrumentos, protocolos, procedimientos.
Investigación

Presentar resultados de investigación. Difusión de resultado, beneficios sociales.


Planificar colaborativamente los temas y estrategias Recuperación, fortalecimiento y potenciación de los saberes
de investigación. ancestrales.
Velar por la incorporación de los resultados de la Uso pedagógico de la investigación y la sistematización como
investigación en la práctica. soporte o parte de la enseñanza.
Combinar el ejercicio de la cátedra y la investigación.
Incluir a los estudiantes en proyectos de Participación en el proceso de construcción, difusión y aplicación
investigación. del conocimiento.
Establecer la relación entre contenidos académicos Monitoreo, seguimiento de las prácticas preprofesionales.
Vinculación

y la práctica profesional.
Asesorar y supervisar el proceso de aprendizaje en Construcción de soluciones para los problemas del país.
la práctica.
Identificar, liderar y gestionar proyectos de Presentación de servicios en el entorno de influencia de la
vinculación con la sociedad. institución. Cursos de educación continua.
Promover intercambio entre instituciones. Diseño, gestión y participación en redes y programas de
enseñanza, investigación y vinculación.
Proponer y desarrollar políticas de calidad. Actividades de dirección en sociedades científicas o académicas
de reconocido prestigio.
Certificar y acreditar la formación. Dirección y gestión de los procesos de docencia e investigación
Gestión

en sus distintos niveles de organización académica e institucional.


Participación como evaluador de calidad.
Potenciar los grupos de investigación. Ejercicio de cargos directivos de carácter científico.
Coordinar el trabajo del equipo docente. Gestión institucional.
Dirección eventos académicos.
Mantener contacto con el sistema productivo, Representante docente al máximo órgano colegiado.
desarrollo tecnológico, formación para el empleo.

Las reformas que ha sufrido la normativa en estudio enfatizan insistentemente en la libertad de


cátedra, la experiencia, formación y capacitación, participación en concurso de méritos y oposición,
práctica de la ética y los valores, garantía de estabilidad laboral y reconocimiento a los docentes,
evaluación del desempeño docente, participación en investigación, en vinculación con la comunidad y

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en gestión administrativa; interacción profesor estudiante, revisión de metodologías, participación en


redes, investigación dentro de la estructura de la economía social de los conocimientos, creatividad e
innovación y solución de los problemas del país. En definitiva, estas reformas han intentado regular
funciones del docente que se contraponen con sus derechos concebidos constitucionalmente; a la par
de un Estado que ejerce las funciones clásicas de control y que al mismo tiempo responde a la ideología
del partido que ejerce el gobierno del país.

5 Conclusiones
El desarrollo del perfil competencial del docente universitario está motivado por cambios que plantean
nuevos retos y nuevas exigencias respecto a los roles que debe asumir el profesor universitario; lo cual
motiva la reflexión sobre las competencias que necesitará para ejercer con profesionalidad y calidad
su trabajo en el nuevo contexto determinado.
La utilización de la teoría fundamentada ha posibilitado el análisis de textos normativos y las sucesivas
reformas a lo largo de una década, cuestión que trasciende lo meramente descriptivo y permite
profundizar en lo conceptual. La observación documental con una guía de investigación flexible
potencia las formas de pensar, codificar, transmitir y desconectar los datos que se están analizando.
Los momentos del análisis permitieron la comprensión de la complejidad del perfil competencial que
descansa en el discurso de la normativa analizada, se supone que el docente ejecute un sin número de
actividades de manera casi simultánea, lo que denota un discurso que privilegia un control
administrativo en desmedro de la calidad académica.
Un docente, para no quedarse en la mera aplicación de saberes, debe pasar del saber a la acción a
través de una reconstrucción, donde la competencia es un proceso delante de un estado, no puede
reducirse a la aplicación directa de los principios o leyes que definen su ámbito profesional, en
consistencia con lo señalado por Mas Torelló y Tejada Fernández (2013) que se llega a ser competente
poniendo en práctica, en acción la competencia.
El discurso subyacente de la normativa estudiada contrasta con la teoría del perfil competencial del
docente que plantea la educación del siglo XXI. El control social influye en el perfil del docente al
delinear bajo esa línea discursiva a un profesional reproductor de conocimiento que debe responder
a un modelo de universidad y no a un orientador del aprendizaje como supone la tendencia actual en
materia de educación.
La competencia como un derecho es un concepto transdisciplinario, la actuación de los profesionales
está desarrollada en una base ética, con uno mismo, con los demás y con el entorno ambiental. El
Estado generará y garantizará las condiciones necesarias para su pleno reconocimiento y ejercicio. El
respeto a la autonomía, a la libertad de enseñanza, la libertad de cátedra en la educación superior y el
derecho de las personas de aprender en su propia lengua y ámbito cultural es un deber primordial del
Estado, esto convoca a nuevas investigaciones que tendrá el interés de estudiar la percepción que
tienen los docentes sobre el efectivo goce de sus derechos establecidos en la Constitución,
considerando que ninguna norma jurídica podrá restringir los derechos (Asamblea Constituyente,
2008).

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Avaliações aplicadas em uma Licenciatura em Ciências Biológicas:


dos agrupamentos categoriais hierárquicos a caminhos alternativos

Marcos Fernandes-Sobrinho1,a, Tiago Clarimundo Ramos1, Arthur Pires da Silva2, Ivandilson


Pessoa Pinto de Menezes2, Paula Silva Resende Fernandes3, Paulo Alexandre de Castro4,
Guilherme Malafaia2
1
Núcleo de Física Aplicada – Instituto Federal Goiano, Brasil. marcos.fernandes@ifgoiano.edu.br;
tiago.ramos@ifgoiano.edu.br
2
Núcleo de Biologia – Instituto Federal Goiano, Brasil. arthurp.sillvaa@gmail.com;
ivan.menezes@ifgoiano.edu.br; guilhermeifgoiano@gmail.com
3
Departamento de Física – Universidade Federal de Goiás, Brasil. padecastro@gmail.com
4
Núcleo de Linguística Aplicada – Instituto Federal Goiano, Brasil. paula.silva@ifgoiano.edu.br

Resumo. Analisaram-se 100 avaliações escritas (AE) relacionadas ao ensino de conceitos de Biologia,
elaboradas e aplicadas por professores atuantes em uma Licenciatura em Ciências Biológicas de uma
instituição pública de ensino superior, da região Centro-Oeste, no Brasil, no período de 2011 a 2014. A
validação do estudo se deu por meio de análise quali-quantitativa dessas AE, envonvendo dois docentes
especialistas na área. A dissimilaridade entre as AE analisadas foi estimada com base no coeficiente de
Jaccard, tendo sido construído um correspondente dendrograma, aos dados gerados e categorizados. Os
resultados sinalizam, entre os agrupamentos de categorias hierárquicas, predominância de perfil tradicional
de avaliação com forte apelo ao conhecimento enciclopédico e memorístico. Também verificaram-se AE que
possibilitam explorar as habilidades cognitivas dos estudantes e aspectos mais abrangentes, em
contraposição à aprendizagem mecânica do conhecimento científico. O estudo sugere haver necessidade ao
repensar caminhos alternativos aos modelos de avaliação comumente utilizados.
Palavras-chave: Educação em Ciências; Avaliação da aprendizagem; Avaliação da ensinagem; Ensino de
Biologia.

Assessments applied in a Degree in Biological Sciences: from hierarchical category groups to alternative
paths
Abstract. We analyzed 100 written evaluations (WE) related to the teaching of biology concepts, elaborated
and applied by teachers working in a Bachelor's degree in Biological Sciences of a public institution of higher
education in the Brazilian Central-West region in the period of 2011 to 2014. The validation of the study was
made through a qualitative-quantitative analysis of these WE, involving two assistant professor in the area.
The dissimilarity between the WE analyzed was estimated based on the Jaccard coefficient, and a
corresponding dendrogram was constructed, to the data generated and categorized. The results indicate,
among the groupings of hierarchical categories, predominance of a traditional evaluation profile with a
strong appeal to the encyclopedic and memory knowledge. WE has also been found that makes it possible
to explore students' cognitive abilities and broader aspects, as opposed to the mechanical learning of
scientific knowledge. This study suggests that there is a need to rethink alternative paths to the commonly
used assessment models.
Keywords: Education in Sciences; Learning evaluation; Teaching assessment; Teaching of Biology.

a Realiza estudos de Pós Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, na Faculdade de Ciências
da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (PPGEC/FC/Unesp/Bauru).

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1 Introdução

A avaliação educacional consiste de um instrumento largamente utilizado para a verificação da


aprendizagem (Guerra, 1995). Na esteira desse raciocínio, (Sant’Anna, 2014) apresenta três
categorias de avaliação: diagnóstica, formativa e classificatória. Na diagnóstica averíguam-se os
conhecimentos dos alunos. A formativa permite um acompanhamento mais próximo dos discentes
por parte do docente, o qual os auxilia no desenvolvimento de capacidades cognitivas e também,
fornece informações acerca de seu desempenho acadêmico. Já a avaliação classificatória, também
chamada de somativa, considera os alunos segundo o seu rendimento escolar, procurando um
resultado coletivo igualitário entre eles.
Conforme destacado por (Perrenoud, 1999, p. 18) “A avaliação tradicional, não satisfeita em criar
fracasso, empobrece as aprendizagens e induz, nos professores, didáticas conservadoras e, nos
alunos, estratégias utilitaristas”. Daí surge a necessidade da implantação da avaliação formativa, que
busca encontrar alternativas diferentes para o processo educativo, como por exemplo, metodologias
diversas que visem melhorar o ensino.
Nessa linha de pensamento, as avaliações formativas vêm alume para fazer frente à avaliação
tradicionalista em um processo de resiliência, que busca acabar com o mito de avaliação como
punição e levá-la a ser uma interação professor-aluno. A avaliação formativa, dentro da pedagogia
formativa, é uma tentativa de se conseguir abrir novos caminhos para a educação (Garutti, 2010).
Campos, Gomes, e Furtado (2013), afirmam que, em se tratando de avaliação, faz-se necessário
pensar em uma ação avaliativa com a finalidade de acompanhar o dia-a-dia do processo de
aprendizagem. A esse respeito, Hoffmann (2014) comenta que, a avaliação mediadora é um processo
que reclama a interação, o diálogo, o espaço de encontro e de dissonância de ideias entre o
educador e educando, na busca por patamares qualitativos do conhecimento. Representa uma das
várias funções da avaliação no espaço educacional.
Nesse contexto, parece-nos oportuno aproveitar as noções de Luckesi (2014) ao afirmar que, a
prática de avaliação escolar contemporânea não deve mostra-se excessivamente autoritária. Para o
autor, esse tipo de ação avaliadora apresenta-se demasiadamente selecionadora tornando-se
desnecessária no processo educacional. Em contrapartida, a discussão da construção de modelos
para redefinição do cotidiano escolar, caracteriza-se urgente e necessária, já que, a avaliação é uma
questão fundamental no processo do ensino-aprendizagem.
Nesse sentido, a análise dos instrumentos usados na avaliação da aprendizagem, em um contexto
sistemático e abrangente se faz necessário, de modo a instigar reflexões sobre a necessidade de
evitarmos que o método avaliativo se restrinja apenas à classificação dos estudantes. A partir dessas
análises é possível refletir, ainda, além da prática avaliativa docente, a significância do significado
acerca da avaliação da aprendizagem.
Isso posto, o presente trabalho objetivou propor possíveis agrupamentos de categorias hierárquicas
quanto aos diferentes perfis identificados, após serem analisadas 100 avaliações escritas (AE)
relacionadas ao ensino de conceitos de Biologia, elaboradas e aplicadas por professores atuantes em
um curso de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma instituição pública de ensino superior, da
região Centro-Oeste, no Brasil, no período de 2011 a 2014. Realizaram-se, por fim, reflexões com o
propósito de responder a seguinte questão de pesquisa pertinente: que aspectos [positivos e
negativos] dos instrumentos avaliativos analisados guardam relação com o processo de formação
inicial de professores?

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2 Material e métodos

Constitui objeto de análise documental, para o presente estudo, a seleção aleatória de 100 AE dentro
do escopo de disciplinas relacionadas ao ensino de conceitos de Biologia, aplicadas em diferentes
turmas e períodos de um curso de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma instituição pública de
ensino superior, da região Centro-Oeste, no Brasil, no período de 2011 a 2014. A validação do estudo
se deu por meio de análise quali-quantitativa dessas AE, envolvendo dois docentes especialistas na
área. O acesso e a coleta das AE, para fins de análise, deram-se por meio de professores
[elaboradores e aplicadores daquelas AE] e de estudantes do curso, pelo fato de, em geral,
colecionarem as AE de interesse, neste trabalho. A Tabela 1 apresenta o total de 100 AE, distribuído
entre as disciplinas que envolvem conceitos de Biologia e que estão presentes no referido curso.
Tabela 1. Quantidade de AE por disciplina no âmbito da amostra selecionada

Disciplinas Quantidade de AE
Biologia Celular 18
Biologia das Criptógamas 4
Organografia Vegetal 2
Anatomia Vegetal 1
Morfologia Vegetal 4
Zoologia dos Invertebrados I 4
Ecologia 5
Zoologia dos Invertebrados II 3
Sistemática Vegetal 3
Bioquímica 4
Histologia 2
Embriologia 7
Zoologia dos Vertebrados 4
Anatomia Comparada dos Vertebrados 2
Fisiologia Vegetal 4
Microbiologia Geral 3
Genética 9
Ecologia de Populações e Comunidades 2
Geologia e Paleontologia 2
Fisiologia Animal Comparada 1
Biologia Molecular 4
Evolução 2
Parasitologia Humana 8
Imunologia Básica 2
Total 100

Fonte: Elaboração nossa

Cada AE foi catalogada e analisada por dois avaliadores independentes, e para isso foi construído
roteiro de avaliação (cf. Quadro 1), elaborado com base na literatura científica relacionada à área
foco deste estudo. Quando a avaliação das AE apresentava divergência entre os avaliadores, estes
discutiam a respeito até atingirem consenso. Salienta-se que a avaliação de cada AE, de modo geral,
abrangia número de questões dos tipos objetivas e discursivas; se havia questões meramente
conteudistas [conteúdo pelo conteúdo apenas]; com apelo à memorização; se trabalhavam questões
reais do cotidiano dos estudantes; se exigia domínio de linguagem; compreensão de algum

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fenômeno; e também como eram classificadas, podendo ser do tipo: síntese; análise;
reconhecimento; julgamento; compreensão; aplicação, entre outros. Os nomes dos professores
regentes, quando identificados, foram codificados de sorte a torná-los anônimos aos leitores deste
artigo.
Quadro 1. Roteiro de avaliação da AE selecionadas
Curso e turma (série ou período) em que a prova foi aplicada:

Disciplina: Professor regente:


Ano e semestre de aplicação:
A prova tem um espaço adequado para a O valor da prova é explícito em seu cabeçalho?
identificação do estudante? ( ) Sim
( ) Sim ( ) Não
( ) Não
A prova contém orientações gerais claras e Qual o número de questões da prova?
suficientes para os estudantes resolvê-la?
( ) Sim
( ) Não
Critérios de avaliação Identificação da questão
As questões apresentam erros na língua portuguesa?
Existem questões são do tipo “objetiva”?
Quais questões são do tipo “discursiva”?
Existem questões são do tipo “autoavaliação”?
Existem questões são do tipo “memorização”?
Existem questões em que se observa a colocação de textos
que exijam a leitura, mesmo curta, e que provoquem respostas
argumentativas?
Existem questões que trabalham o conteúdo em contextos e
situação reais ou similares aos que o estudante pode encontrar
na vida real?
Existem questões despertem o espírito crítico do estudante e
avaliem habilidades como comparar, interpretar e relacionar?
Existem questões utilizam termos considerados subjetivos
(que dificultam a avaliação da aprendizagem), como “cite
exemplos”, “na sua opinião”, “comente” etc.?
Existem questões exigem do estudante:
a) Domínio de linguagem
b) Compreensão de fenômenos
c) Enfrentamento de problemas
d) Construção da argumentação
e) Elaboração de propostas
Existem questões que expõem os estudantes ao ridículo?
Anotar exemplo(s) de questão(ões) dessa natureza.
Existem questões são do tipo “pegadinha” ou “armadilha”?
Anotar exemplo(s) de questão(ões) dessa natureza.
Existem questões que utilizam elementos gráficos (tabelas,
quadros, esquemas, imagens, figuras, etc.)?
Existem questões em que esses elementos gráficos são de
qualidade (avaliar: escala, clareza, nitidez, coerência com a
questão, etc.)?
Existem questões no enunciado das perguntas que NÃO
explicita claramente o que os estudantes precisam fazer ou
responder?
Existem questões do tipo “análise”?
Existem questões do tipo “síntese”?
Existem questões do tipo “julgamento” ou “avaliação”?
Existem questões do tipo “reconhecimento”?
Existem questões do tipo “compreensão”?
Existem questões do tipo “aplicação”?
Fonte: Elaboração nossa, com base em: Sant’Anna (2014), Luckesi (2014), Guerra (1995) e sugestões dos autores deste
artigo

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O Quadro 2 foi construído com o propósito de servir como espécie de glossário, com alguns
conceitos e noções que foram considerados durante o desenvolvimento da leitura e da avaliação das
AE, partindo do pressuposto de que determinados termos presentes no roteiro de avaliação
proposto são potencialmente subjetivos.
Quadro 2. Conceitos e(ou) noções de termos presentes no formulário de avaliação

Termos Conceitos/noções presentes no roteiro de avaliação


Foram aquelas que exigiram do aluno respostas estruturadas com
Questões do tipo discursiva
suas próprias palavras, baseadas na norma padrão da língua materna.
Foram aquelas que possibilita o aluno se autoavaliar, permitindo o
Questões do tipo autoavaliação
estudante influenciar ou participar de sua própria avaliação.
Foram aquelas que exigiram do aluno menos raciocínio e capacidade
Questões do tipo “decoreba”
mental, elas apenas requereram memorização de conceitos e fórmulas.
Questões que expõem os estudantes ao Foram aquelas que deixaram os alunos constrangidos, intimidados
ridículo ou até mesmoexpunhamparticularidades dos alunos.
Foram aquelas que não diziam exatamente o que aluno deveria
Questões do tipo “pegadinha” ou
redigir, ou também aquelas questões que os deixam confuso quanto à
“armadinha”
resposta.
Enquadrou-se em questão que parte de um todo para compreensão
.Questões do tipo análise minuciosa de suas partes, pode ser aplicada por exemplo, em análise de
charges ou gráficos.
É o inverso da análise, relaciona diversas partes para estabelecer as
Questões do tipo síntese características de um todo, fazendo assim uma descrição abreviada de
um texto, por exemplo.
Exigiu do aluno maior de conhecimento de conteúdo, contendo nível
Questões do tipo julgamento ou avaliação de maior complexidade. Há emissão de juízo de valor, havendo
necessidade de apresentar justificativas ou argumentos.
Dentro os tipos de questões presente nas avaliações, esta exigiu
menor complexidade. Baseia-se na identificação das propriedades
Questões do tipo reconhecimento
fundamentais dos objetos, elas se caracterizam por nomear, citar,
assinalar, identificar, por exemplo.
Neste tipo além da identificação, existiu a indicação de elementos
Questões do tipo compreensão que dão significado ao objeto. Podendo conter no enunciado palavras
como apresente características, dê significados.
É caracterizada pela transposição da compreensão de um objeto de
conhecimento. Quando compreendida alguma fórmula ou conceito eles
são aplicados em situações e em problemas semelhantes. Há uma
Questões do tipo aplicação
situação-problema com parâmetros bem definidos e uma sequência
lógica a ser seguida, caracterizada no enunciado por exemplo, com base
no texto.

Fonte: Elaboração nossa, com base em: Sant’Anna (2014), Luckesi (2014), Guerra (1995) e sugestões dos autores deste
artigo

Visando avaliar os/as dados/informações de forma conjunta e identificar padrões comuns e(ou)
estruturados e(ou) hierarquizados, tomando-se os critérios avaliativos considerados na elaboração
das AE pelos professores, as informações obtidas e categorizadas foram, então, convertidas em
dados binários, atribuindo-se o dígito “1” para as respostas positivas, e “0” para as negativas, em
relação às questões constantes do roteiro de avaliação utilizado (Quadro 1).
A dissimilaridade entre as atividades avaliativas analisadas foi estimada com base no coeficiente de
Jaccard, utilizando-se o software DARwin v6.0.014 (Perrier & Jacquemoud-Collet, 2016). A relação de
dissimilaridade foi avaliada com o auxílio de um dendrograma construído com base no método de
agrupamento de UPGMA, usando o software MEGA 5.05 (Tamura et al., 2011). A qualidade gráfica
do dendrograma foi estimada pelo coeficiente de correlação cofenética e seu ajuste de acordo com o

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teste de Mantel para 9999 permutações. A decomposição da variação dentro e entre os professores
foi realizada com base na AMOVA, usando o software GenAlex v6.5 (Peakall & Smouse, 2012), com
9999 permutações.

3 Resultados e discussão

Por meio da matriz de dados construída, gerou-se o dendograma apresentado na Figura 1, no qual
nota-se o estabelecimento de oito agrupamentos categoriais (AC) distintos de AE, hierarquizados por
características similares.

Fig. 1. Relação de dissimilaridade entre as 100 AE avaliadas neste estudo, obtida à luz do coeficiente de Jaccard

Como exemplares são apresentados, neste artigo, alguns dos oito AC. O AC1 é estruturado por 21
provas (21% das AE analisadas), sendo elas constituídas basicamente por local para a identificação do
estudante, e por questões discursivas, porém sem apelo à “memorização”. Abrangem, ainda, a
colocação de textos em situações reais do cotidiano do estudante (Figura 2A) que,
consequentemente, aproxima o estudante dos conceitos trabalhados em sala de aula, contribuindo
com a sua aprendizagem. Quanto aos tipos de perguntas, esse grupo é constituído de AE que exigem

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domínio de linguagem, compreensão de fenômenos biológicos (Figura 2B) e solução de problemas.


Além disso, essas AE são do tipo análise (Figura 2C), reconhecimento e compreensão. A Figura 2
apresenta alguns exemplos de questões que foram enquadradas juntas, as quais são representativas
do perfil deste grupo.

Algumas pessoas apresentam dificuldades no metabolismo de alguns carboidratos, sendo altamente intolerantes
A a esses compostos. Entre essas disfunções no organismo, pode-se citar a FRUTOSEMIA. Com relação à
frutosemia, pergunta-se: pessoas com esse problema podem ingerir alimentos contendo sacarose? Justifique.
Podemos observar a evolução em pequena escala de tempo, isto é, verificar o poder de ação da seleção natural
em modificar as proporções de ocorrências de características em determinadas populações em um determinado
B ambiente e tempo. Demonstre de forma geral ou específica como a evolução pode ser observada
experimentalmente.
5. A seguinte genealogia é característica de uma condição hereditária conhecida como puberdade precoce
C masculina, em que os meninos afetados mostram sinais de puberdade aos quatro anos. Proponha uma
explicação genética desse fenótipo.

Fig. 2. Exemplos de questões de AE enquadradas no AC 1. (A) questão retirada de uma AE de Bioquímica (LM); (B)
Questão retirada de uma prova de Evolução (IM2) e (C) questão retirada de uma prova de Genética (IM3)

Sobre estes dados, destacam-se os tipos de questões semelhantes à exemplificada na Figura 2A,
muito presentes no AC1, as quais contemplam o cotidiano do estudante, o que torna viabiliza o
processo de ensinagem-aprendizagem, já que, para os estudantes não faz sentido aprender
determinados conceitos científicos deslocados de significados e(ou) da realidade dos estudantes, no
sentido de não favorecer a formação crítica. Nesse sentido, Freire (2011) salienta que, o professor
que busca contextualizar o conteúdo à realidade do aluno, consegue resultados satisfatórios no
processo de ensino-aprendizagem. Este autor enfatiza o papel do professor de instigar o aluno a
questionar, a buscar novos conhecimentos, proporcionando um conflito cognitivo entre o
conhecimento prévio e o cientifico fazendo, assim, a evolução da curiosidade ingênua para a
epistemológica.
Além disso, vale salientar que as AE do AC1 supracitado contemplam abordagens qualitativas, no
sentido de apresentar exigências que transcendam a simples e pura memorização de conceitos (sem
aplicação dos conteúdos memorizados), o que aponta para AE que auxiliam no processo de
ensinagem e de aprendizagem.
O AC2 é formado por 15 provas (15%) em que as questões não demonstraram orientação para o
estudante realizar a AE que, em sua maioria, foram constituídas de questões do tipo reconhecimento
e compreensão, não apresentando perguntas classificadas como síntese e julgamento. Além disso,
esse AC é constituído essencialmente de questões que exigem do estudante a capacidade de apenas
memorizar conceitos que, conforme a Figura 3, representam o perfil das AE desse AC.
Sobre avaliações que exigem que o estudante seja capaz apenas de decorar os conteúdos, Mizukami
(1986) explana que essas são realizadas com o intuito de reproduzir o conteúdo trabalhado em sala

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de aula. Comenta ainda que por meio delas, destacam-se a quantidade e exatidão que o estudante
consegue reproduzir.
Conforme Soistak e Pinheiro (2009), a memória basicamente é um processo de estocar informações,
essencial para a aprendizagem, não servindo para ser utilizada em apenas um momento.
Nesse contexto, a crítica não se refere às AE ou questões que exigem memorização de conteúdos,
mas sim àquelas em que a capacidade de memorizar conceitos não é explorada de forma
contextualizada ou problematizada.

Fig. 3. Exemplos de questões de AE enquadradas no AC2. (A) questão retirada de uma AE de Ecologia de População e
Comunidade (EM3); (B) e (C) Questões retiradas de uma AE de Sistemática Vegetal (MR3)

O AC3 é composto por apenas 2 AE (2%), em que a constituição dessas AE é por questões do tipo
objetivas (Figura 4A e 4B), além de não exigirem do estudante domínio de linguagem, compreensão
de fenômenos, tampouco construção da argumentação. Em suma, tais AE apresentam apenas
questões do tipo reconhecimento e compreensão. A Figura 4 apresenta alguns exemplares de
questões desse AC3 de AE.

Fig. 4. Exemplos de questões de AE enquadradas no AC3. (A) questão retirada de uma AE de Histologia (AS2); (B) Questão
retirada de uma AE de Zoologia de Invertebrados II (AC12)

Em outros AC foi possível observar que, independente do formato das questões (objetivas ou
discursivas), as AE não exigem habilidades mais complexas como, por exemplo, a de comparar e
compreender fenômenos biológicos. A ausência de problematização serve apenas para averiguar se

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o estudante sabe ou não reproduzir o conceito científico memorizado, o que é criticado por Romão
(1998).
Pode-se perceber que entre as AE analisadas, das diferentes disciplinas, ainda que ministradas pelos
mesmos docentes, em sua maioria, não há um padrão; o que parece sugerir que os professores
mudam o estilo de AE, a depender da disciplina ofertada por eles. A decomposição da variação
dentro da disciplina e entre os professores, realizada com base na AMOVA, sinaliza que 71% da
variação existente entre as AE se dá entre as AE, elaboradas pelo mesmo docente; e não [ao
contrário do que se possa imaginar] entre professores diferentes.
Tabela 2. Categorização das AE em “formativa” ou “tradicional”, de acordo com os AC

Categoria de AE Agrupamento categorial (AC)


Formativa 01
Tradicional 02, 03, 04 05, 06, 07 e 08

Fonte: Elaboração nossa

Entre as subcategorias de avaliações por AC, em maior número há aquelas que foram categorizadas
como tradicionais, como é possível depreender da Tabela 2.

4 Considerações

A análise de todas as AE da amostra permite inferir que as AE são predominantemente tradicionais, e


que este resultado pode estar associado à modalidade de formação dos professores [bachareis e
licenciados], devidamente identificados no levantamento realizado.
O papel da avaliação vai muito além da mera classificação. Ela deve servir para além da simples
coleta de informações acerca dos conceitos científicos apreendidos pelos educandos, também se
presta a avaliar as práticas pedagógicas dos professores.
Face ao exposto, propõe-se o (re)pensar nas formas de planejar, elaborar e aplicar as avaliações,
sobretudo pelo fato de, em geral, serem travestidas de elementos contitutivos dos processos de
ensinagem e de aprendizagem, em consonância ao que nos sugerem Campos, Gomes, e Furtado
(2013).
O estudo sinaliza problemas nas AE presentes nos agrupamentos categoriais hierárquicos e aponta
para a necessidade de reflexões acerca do avaliar, não como um fim e(ou) momento único, mas
como um meio para apontar possíveis caminhos alternativos rumo à melhora do processo de
formação inicial de professores. A classificação pela classificação dos alunos, aos moldes de uma
avaliação excessivamente autoritária (Luckesi, 2014), não contribui para avanços nessa discussão.
Ao longo do processo de desenvolvimento desta investigação, o presente trabalho aponta para o
entendimento de que a metodologia de pesquisa em educação não se deve limitar à simples
aplicação do que parecem sugerir os manuais de procedimentos e instrumentalização de pesquisa
(Fernandes-Sobrinho, Gonçalves, & Fernandes, 2017).
O presente estudo, para além de romper com a abordagem puramente positivista, realça a
importância da investigação qualitativa na medida em que permite aos autores inseridos em
contexto desconhecido, complexo e dinâmico, a conhecerem as respectivas especificidades [do
processo avaliativo, que envolve professores em formação] a valorizarem a perspectiva daqueles
atores.

Agradecimentos. O presente trabalho contou com suporte financeiro do Instituto Federal Goiano, da
Universidade Federal de Goiás, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e do Conselho

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Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O primeiro autor é bolsista do Programa


Nacional de Pós Doutorado, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/CAPES).

Referências

Campos, R. I., Gomes, I. C. P., & Furtado, W. W. (2013). Avaliação da aprendizagem no ensino de
Física: um olhar sobre as concepções dos professores licenciados em Física da cidade de
Inhumas, GO. Revista Polyphonía, 23(1).
Fernandes-Sobrinho, M. F., Gonçalves, E. A., & Fernandes, P. S. R. (2017). Percurso e diversidade
epistemológica da pesquisa em educação: tensionamentos e possibilidades. Cadernos de
Pesquisa, 23, 81.
Freire, P. (2011). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa (43o ed). São
Paulo: Paz e Terra.

Garutti, S. (2010). Discutindo avaliação formativa nas disciplinas de Ciências e Biologia. Revista
UNIANDRADE, 11(1), 37–52.
Guerra, M. Á. S. (1995). La evaluación: un proceso de diálogo, comprensión y mejora. In
Evaluación educativa (2o ed, p. 230). Granada: ALJIBE.

Hoffmann, J. (2014). Avaliação mediadora: uma prática em construção da (33o ed). Porto Alegre:
Mediação.
Luckesi, C. C. (2014). Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições (22o ed). São
Paulo: Cortez editora.
Mizukami, M. da G. N. (1986). Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: Editora Pedagógica e
Universitária.

Peakall, R., & Smouse, P. E. (2012). GenAlEx 6.5: genetic analysis in Excel. Population genetic
software for teaching and research--an update. Bioinformatics, 28(19), 2537–2539.
Perrenoud, P. (1999). Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens. Entre duas lógicas
(1o ed). Belo Horizonte: Artmed.

Perrier, X., & Jacquemoud-Collet, J.-P. (2016). DARwin. Dissimilarity, Analysis and Representation
for Wildows (Versão 6.0.014).
Romão, J. E. (1998). Avaliação, Diálogo, Desafios e Perspectivas. São Paulo: Cortez editora.

Sant’Anna, I. M. (2014). Por que avaliar? Como avaliar? Critérios e instrumentos. (17o ed).
Petrópolis: Vozes.

Tamura, K., Peterson, D., Peterson, N., Stecher, G., Nei, M., & Kumar, S. (2011). MEGA5: Molecular
Evolutionary Genetics Analysis Using Maximum Likelihood, Evolutionary Distance, and
Maximum Parsimony Methods. Molecular Biology and Evolution, 28(10), 2731–2739.

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Tramitação do Texto e Fixação dos Sentidos: a Lei Brasileira nº


12.711/2012 sobre cotas no ensino superior

Bruna Cruz de Anhaia1

1 Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil.
Departamento de Tradução e Ciências de Linguagem, Universidade Pompeu Fabra (UPF), Espanha.
Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
bruna.anhaia@ufrgs.br

Resumo. Este artigo analisou o processo de elaboração do texto da política de reserva de vagas (cotas) em
vigor nos institutos técnicos e universidades federais brasileiras, instituída pela Lei 12.711 de 2012. A análise
enfocou os tomadores de decisão (deputados federais, senadores e presidenta da República) e contemplou
todo o processo de tramitação da lei no Congresso Nacional, correspondendo a um período de 13 anos.
Documentos de autoria dos tomadores de decisão e áudios das sessões de votação do texto foram as bases
para a reconstituição do contexto de elaboração da lei. Através dela, buscou-se entender suas visões de
mundo a respeito da instituição universitária, do Estado brasileiro e de sua sociedade, elucidar o sentido
que atribuíam às suas ações e averiguar suas opiniões a respeito dos aspectos estruturantes desta ação
afirmativa. As análises foram orientadas pelos pressupostos da análise de discurso, com contribuições da
análise argumentativa e da análise deôntica.
Palavras-chave: cotas; universidade; tomadores de decisão; análise do discurso.

Text proceedings and meanings fixation: the Brazilian Law no. 12.711/2012 about quotas in higher
education
Abstract. This paper analyzed the drafting of policy on quotas in force in technical institutes and Brazilian
federal universities, established by law no. 12.711 of 2012. The analysis focused on the decision makers
(federal deputies, senators and president of the Republic), contemplating all legal drafting proceedings in
the National Congress, over a period of 13 years. Documents produced by decision makers and the audios of
voting sessions were the basis for the contextual reconstitution of the drafting of laws. By means of the
analysis aimed to understand the decision makers worldviews on the university institution, the Brazilian
state and its society, as well as shedding light on the meaning attributed to their actions and investigating
their opinions on the structural aspects of this affirmative action. The analysis was guided by theoretical
assumptions of discourse analysis, with contributions from argumentative and deontic analysis.
Keywords: quotas; university; decision makers; discourse analysis.

1 Introdução

A reivindicação de políticas inclusivas destinadas a grupos marginalizados historicamente (negros,


indígenas, mulheres etc.) é fator mobilizador de diversos movimentos sociais e políticos no Brasil. No
leque de iniciativas propostas para o abrandamento das desigualdades, citam-se as ações afirmativas
(AAs): medidas que implicam num tratamento diferenciado a certos grupos, tendo como intuito
contribuir para a sua promoção social.
A entrada do tema na agenda política do Estado brasileiro teve como um dos marcos a participação
do governo na III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e
Intolerância Correlata. Realizada em Durban, em 2001, a Conferência foi a ocasião em que se admitiu
que o Brasil é um país racista e se comprometia a adotar medidas para minorar esta situação. Apesar

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do compromisso assumido, somente anos mais tarde passaram a vigorar no campo da educação as
primeiras AAs de autoria do governo federal.
Este artigo analisou o processo de elaboração do texto de uma destas políticas, nomeadamente, a
reserva de vagas (cotas) nos institutos técnicos e universidades federais. Apresenta-se, aqui, parte
dos resultados de uma tese em elaboração sobre o tema.
Instituída pela Lei 12.711 de 2012, a política de cotas estabelece a reserva de 50% das vagas daquelas
instituições educativas para pessoas com baixa renda, negros e indígenas. A análise do processo de
formulação da Lei (contexto de elaboração do texto) (Ball; Bowe, 1992) enfocou os tomadores de
decisão (deputados federais, senadores e presidenta da República) (Howlett; Ramesh; Perl, 2013) e
buscou elucidar: o que orientou suas ações favoráveis ou contrárias às cotas; as definições e
interpretações sobre a universidade; e, os aspectos estruturantes da política.
O contexto de elaboração do texto foi reconstituído, sobretudo, através da leitura e análise de dois
tipos de materiais: documentos de autoria dos tomadores de decisão (projetos de lei, pareceres,
etc.) e áudios das votações dos textos no Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado).
Pautou-se pelos pressupostos da análise do discurso (AD) e dois tipos de análise foram empregados:
a análise argumentativa (Charaudeau, 2008) e a análise deôntica (Lyons, 1977; Almeida, 1988).

2 “Lentes” interpretativas do objeto

Este artigo abordou uma das etapas que compõem o ciclo das políticas públicas, especificamente, o
processo de formulação. Enfocou, então, o contexto da produção do texto: onde os textos políticos
tomam forma, sendo resultantes de disputas e acordos (Ball; Bowie, 1992). No caso em análise, ainda
que se reconheça que diversos atores tenham buscado influenciar o texto, dedicou-se a observar os
funcionários eleitos do Estado que atuaram favorável ou contrariamente a esta política no decorrer
de sua formulação, ou seja, os tomadores de decisão (Howlett; Ramesh; Perl, 2013).
Corresponderam, aqui, aos deputados federais e senadores e à presidenta da República.
Considerou-se, ainda, que o contexto de elaboração do texto é permeado por ações sociais levadas a
cabo por estes atores. Isso porque a ação social (incluindo a tolerância e omissão) é uma ação
orientada pelas ações dos outros, as quais podem ser passadas, presentes ou esperadas como
futuras. Os “outros”, por sua vez, podem ser individualizados e conhecidos, ou podem ser uma
pluralidade de indivíduos indeterminados e completamente desconhecidos (Weber, 2014).
Cabe destacar que a ação social, como toda ação, pode ser classificada em quatro tipos:
1) de modo racional referente a fins: [determinada] por expectativas quanto ao comportamento de objetos
do mundo exterior e de outras pessoas, utilizando essas expectativas como “condições” ou “meios” para
alcançar fins próprios, ponderados e perseguidos racionalmente, como sucesso; 2) de modo racional
referente a valores: [determinada] pela crença consciente no valor – ético, estético, religioso ou qualquer
que seja sua interpretação – absoluto e inerente a determinado comportamento como tal,
independentemente do resultado; 3) de modo afetivo, especialmente emocional: [determinada] por afetos
ou estados emocionais atuais; 4) de modo tradicional: [determinada] por costume arraigado (Weber, 2014, p.
15).
A análise das justificativas apresentadas pelos tomadores de decisão, no momento em que
propuseram, aceitaram ou rejeitaram elementos do texto da política de cotas, permitiu compreender
o sentido que atribuíram às suas ações e enquadrá-las nos tipos mencionados. Mais do que auxiliar
no entendimento do que orientou a ação destes políticos, este caminho contribuiu para
compreender a visão de mundo dos tomadores de decisão a respeito de seu papel e do Estado, assim
como a visão de mundo sobre a universidade, a sociedade brasileira e etc.
Tendo em vista que a política de cotas é destinada a atuar na instituição universitária, cabe também
conceituar o que se entendeu aqui por instituição. Pautando-se por contribuições do

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institucionalismo sociológico, entendeu-se que são “regras, procedimentos ou normas formais, mas
também os sistemas de símbolos, os esquemas cognitivos e os modelos morais que fornecem
‘padrões de significação’ que guiam a ação humana” (Hall; Taylor, 2003, p. 209). A instituição
universitária teria então uma dimensão objetiva e outra subjetiva. Ainda segundo o institucionalismo
sociológico, a origem e a mudança institucional são explicadas a partir de fatores culturais
relacionados à sua legitimidade social e de seus adeptos, a qual é definida pelo ambiente cultural
mais amplo (Hall; Taylor, 2003; Maia, 2010; Miller; Banaszak-Holl, 2005).
Adotou-se então a perspectiva da análise crítica do discurso (ACD), tendo em vista que se:
considerou os contextos sociais e políticos em que se inseriam os discursos sobre esta política;
buscou explicar os discursos em termos das propriedades de interação social e estruturas sociais em
que se deram; e, focou em como os discursos se estruturaram de modo a defender a conservação ou
mudança da instituição universitária no Brasil (Van Dijk, 2015).
Voltando-se aos tomadores de decisão, grupo que controla diretamente o discurso público e que
atua diretamente na definição de políticas no Estado brasileiro, buscou-se o entendimento de sua
cognição social a respeito da universidade, da política e dos elementos que a cercam. Portanto,
interessando saber os conhecimentos específicos, normas e valores compartilhados pelos membros
desta organização social (Van Dijk, 2015a).

3 Metodologia

A pesquisa documental foi a base para a reconstituição do contexto de elaboração da lei 12.711 de
2012. Os documentos, suportes com informação registrada que servem para consulta, estudo ou
prova (Appolinario, 2009), tratavam-se de documentos de autoria de deputados federais e senadores
ou da presidenta da República (projetos de lei, pareceres, requerimentos etc.) e áudios das ocasiões
de votação dos textos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
Os documentos eram provenientes de fontes oficiais e se tratavam de dados primários, originais, não
tendo recebido qualquer tratamento analítico anteriormente (Sá-Silva; Almeida; Guindani, 2009).
Todos os materiais foram obtidos através da consulta aos sites oficiais do governo federal ou da
requisição junto aos setores responsáveis. As principais fontes de informação foram os Portais da
Câmara dos Deputados e do Senado.

Fig. 1. Portal da Câmara dos Deputados.

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Reuniu-se: 12 projetos de lei (PLs), 1 projeto de lei da Câmara, 1 lei ordinária, 1 decreto, 1 portaria
normativa, 11 pareceres, 10 requerimentos, 2 ofícios, 1 recurso, 4 emendas ou subemendas e 1
veto.2 Além disso, analisou-se as transcrições de 4 votações realizadas no Congresso Nacional.3 O
período abrangido pela análise foi de 13 anos (1999 a 2012), contemplando os mandatos de 3
presidentes da República – quais sejam: Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma
Vana Rousseff.
Consultados os materiais, verificou-se que contribuíram de diferentes modos para o entendimento:
do contexto sociopolítico da elaboração da política de cotas; do sentido atribuído pelos tomadores
de decisão às suas ações; e, das visões de mundo a respeito da instituição universitária, da sociedade
brasileira e aspectos estruturantes desta ação afirmativa. No que tange ao sentido atribuído às ações
e tais visões de mundo, a análise foi centrada nos materiais que apresentavam algum tipo de
justificativa para a proposição apresentada – sobretudo, os PLs, pareceres e votos.
A análise do discurso como um método contribuiu porque trata da importância central do discurso
na construção da vida social, adota a perspectiva de que esta é caracterizada por versões de mundo
que competem entre si e que atuam no sentido de tentar fixar sentidos, constantemente ameaçados
de serem desconstruídos (Gill, 2002; Pinto, 2006). Decorre daí que o foco da análise incidiu sobre a
formação do discurso da política no contexto da elaboração do texto.
Os documentos relativos à tramitação do Projeto de Lei até seu texto final (PL 73/1999 a Lei
12.711/2012) tiveram sua análise pautada nos pressupostos da AD. Este tipo de análise rejeita a
“noção realista de que a linguagem é simplesmente um meio neutro de refletir, ou descrever o
mundo, é uma convicção da importância central do discurso na construção da vida social” (Gill, 2002,
p. 244).
Salienta-se que:
Diferentemente da análise da conversação, a análise de discurso vê a vida social como sendo caracterizada
por conflitos de vários tipos. Como tal, grande parte do discurso esta implicada em estabelecer uma versão
do mundo diante de versões competitivas. Isto fica claro em alguns casos políticos, por exemplo, estão
claramente tentando levar as pessoas a aderir a suas visões de mundo, e publicitários estão tentando nos
vender seus produtos, estilos de vida e sonhos - mas é também verdade para outros discursos. A ênfase na
natureza retórica dos textos dirige nossa atenção para as maneiras como todo discurso e organizado a fim de
se tornar persuasivo (Gill, 2002, p. 250).
A partir da AD, pretendeu-se averiguar o que orientou a ação dos tomadores de decisão no processo
de elaboração do texto da política de cotas e compreender a sua visão de mundo a respeito de seu
papel e do Estado, da universidade, da sociedade brasileira e etc. Para alcançar estes fins, dois tipos
de análise foram empregadas: a análise argumentativa e a análise deôntica.
O primeiro tipo de análise se pautou pelo uso de argumentos por parte dos tomadores de decisão na
tentativa de influenciar os interlocutores. Através da análise argumentativa, buscou-se compreender
como foram apresentados e organizados seus argumentos, bem como se estruturava o raciocínio
que orientou a defesa de seus pontos de vista (Charaudeau, 2008).

2 Tratam-se dos: (a) PLs 73 de 1999, 1447 de 1999, 1643 de 1999, 2069 de 1999, 615 de 2003, 373 de 2003, 1313 de 2003,
2923 de 2004, 3627 de 2004, 1330 de 2007, 1736 de 2007,14 de 2007 e 3913 de 2008; (b) PL da Câmara 180 de 2008; (c)
Lei 12.711 de 2012; (d) Decreto 7.824 de 2012; (e) Portaria Normativa 18 de 2012; (f) Pareceres emitidos pelas Comissões
Temáticas da Câmara dos Deputados (Comissão de Educação e Cultura – CEC, Comissão de Direitos Humanos e Minorias
– CDHM, Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – CCJC); (g) Requerimentos 1910 de 2004, 1989 de 2004, 2737 de
2005, 3780 de 2006, 242 de 2006, 234 de 2006, 1009 de 2007, 1285 de 2007, 1666 de 2007 e 3135 de 2008; (h) Ofícios P-
94 de 2000 e P-685 de 2000; (i) Recurso 265 de 2006; (j) Emendas e subemendas de autoria de deputados; e, (l) Veto
presidencial no texto da lei de 2012.
3 Dizem respeito às sessões realizadas na Câmara dos Deputados (CEC, em 21/09/2005; CDHM, em 14/12/2005; CCJC, em

08/02/2006) e no Plenário do Congresso Nacional, em 20/11/2008.

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Considerou-se que:
[...] se o sujeito que argumenta se volta para o interlocutor na tentativa de persuadi-lo a modificar seu
comportamento, é necessário que na argumentação exista:
i) Uma proposta que provoque em alguém um questionamento, quanto a sua legitimidade;
ii) Um sujeito que desenvolva um raciocínio para demonstrar aceitabilidade ou legitimidade quanto a essa
proposta;
iii) Um sujeito que se constitua alvo da argumentação. Trata-se da pessoa a quem se dirige o sujeito que
argumenta, na esperança de conduzi-la a compartilhar a mesma convicção, sabendo que ela pode aceitar
(ficar a favor) ou refutar (ficar contra a argumentação) (Charaudeau, 2008 Apud Koch; Elias, 2016, p. 24).
Na situação em análise, estes elementos se configuram: (a) na polêmica em torno da legitimidade da
criação e implementação de cotas sociais e raciais no ensino superior brasileiro; (b) na existência de
atores políticos que atuam no processo de elaboração do texto da política; e, (c) nos demais
tomadores de decisão, a quem os proponentes buscam convencer para obter a aprovação da
matéria.
O segundo tipo de análise se pautou pelo uso das sentenças deônticas, em termos da noção de
obrigação e permissão. A noção de obrigação está relacionada à ideia de necessidade, enquanto a de
permissão está relacionada à de possibilidade (Lyons, 1977). Consideraram-se demarcadores de
obrigação as expressões “deve-se”, “é necessário”, “é preciso” e equivalentes. Consideraram-se
demarcadores de permissão as expressões “pode-se”, “é oportuno”, “é recomendável” e
equivalentes. Conforme Almeida (1988), as obrigações podem ser internas/morais (imposição da
consciência ou costumes arraigados, por exemplo) ou externas/materiais (exigências do mercado de
trabalho, por exemplo), já a permissão passa por valores como sugestão, concessão ou autorização.

4 Discursos em análise

Os PLs, pareceres e demais votos pronunciados frequentemente apresentavam dois elementos: um


diagnóstico sobre a situação na qual se pretendia intervir e um prognóstico com indicações mais ou
menos explícitas sobre as razões de se adotar dada solução. Quanto aos diagnósticos, verificou-se
que os tomadores de decisão detectavam a existência de três tipos de problemas na raiz da questão
das desigualdades de acesso ao ensino superior no país. Estes problemas seriam de natureza social,
educacional ou econômica – sendo a maior incidência observada no primeiro tipo.
Em diferentes diagnósticos, observou-se o uso de argumentos também empregados por outros
atores que debatem a temática da AA no Brasil (movimentos sociais, políticos etc.). Referem-se à
denúncia do mito da democracia racial, que difundiria a ideia de que existe a convivência harmônica
entre raças e cuja ampla aceitação teria contribuído para a dissimulação do racismo na sociedade
brasileira; à desvantagem competitiva de egressos de escola pública nos processos seletivos para as
instituições de ensino superior, decorrente da queda de qualidade do ensino na educação básica do
setor; e, às desvantagens cumulativas a que estão sujeitos dados grupos sociais (Anhaia, 2013;
Fernandes, 1989; Guimarães, 2006; Heringer; Ferreira, 2009).
Tendo em vista que os PLs em análise correspondem a proposições de políticas públicas, pode-se
afirmar que os autores compartilham do entendimento de que o Estado brasileiro deve ou pode
atuar no sentido de solucionar o problema das desigualdades de acesso ao ensino superior. Atribuir
um caráter de obrigação ou permissão à intervenção do Estado, entretanto, pode ser a implicação de
compreensões distintas a respeito de sua urgência e do compromisso de executá-la.
[1] É preciso pensar numa forma de distribuir mais equitativamente esses recursos destinados ao ensino
universitário, a fim de atender também à maioria, que vive excluída de seus benefícios (texto original do PL
1447/1999, autoria do Dep. Celso Giglio – PTB/SP).

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[2] O cumprimento deste dispositivo constitucional [CF 1988, art. 205: educação como direito de todos e
dever do Estado e da família] exige uma democratização do acesso à escola. E isto só se dá com o
rompimento das rígidas normas que regulam o ingresso dos alunos às instituições de ensino. [...] é
necessário reformular as normas que regem o ingresso dos alunos às instituições de ensino superior (texto
original do PL 2069/1999, autoria do Dep. Raimundo Gomes de Matos – PSDB/CE).
De maneira geral, enunciam-se como obrigações do Estado e dos tomadores de decisão: abrandar ou
eliminar os obstáculos no acesso a este nível de ensino, de modo a garantir um sistema educacional
mais equitativo e democrático, viabilizando a oportunidade de estudo e conquista do diploma
universitário a dados grupos populacionais.
Nestes e noutros trechos, observou-se que os tomadores de decisão se referem a obrigações de dois
tipos: internas/morais (decorrente dos princípios democráticos, de dignidade e etc.) e
externos/materiais (devido aos dispositivos da Constituição Federal, aos compromissos assumidos
com entidades nacionais ou internacionais e etc.) (Almeida, 1988). Pode-se dizer que ao se utilizar
destes argumentos os tomadores de decisão têm a expectativa que os outros se convençam da
legitimidade da proposição em virtude dos fins e dos valores que a norteiam (Weber, 2014).
A modalidade permissão, por outro lado, é menos empregada como recurso argumentativo nos
textos de justificativas dos PLs. Quando utilizada, assumia principalmente a função de demarcar
possibilidades, como ocorre nos trechos:
[3] Democratizando o acesso a todos, estaremos contribuindo para a experiência de um alunado com maior
diversidade socioeconômica e cultural. Isto permitirá uma maior inserção da sociedade na universidade
(texto original do PL 2069/1999, Dep. Raimundo Gomes de Matos – PSDB/CE).
[4] [...] parece-nos justo e oportuno oferecer a pessoas de mais idade, que há tempo deixaram de estudar, a
oportunidade de qualificar-se e de contribuir para a coletividade. Outrossim, julgamos conveniente deixar a
critério de cada instituição a definição do percentual mais adequado às condições da sociedade e da região
na qual está inserida (texto original do PL 373/2003, Dep. Lincoln Portela – PL/MG).
O uso das expressões sinalizadas pretendeu então indicar que: as cotas representavam uma
possibilidade de maior inclusão social na universidade (exemplo 3) e que havia condições de
possibilidade para a oferta de cotas àquele grupo populacional (exemplo 4).
Em diferentes manifestações, observou-se que se atribuiu um caráter processual à origem do
problema da desigualdade de acesso à educação superior e também à sua solução. É neste cenário
marcado por problemas sociais, educacionais e econômicos, cujas origens remontam a um passado
distante, que se justifica a adoção de políticas públicas emergenciais e focalizadas. As ações
afirmativas se mostram então adequadas, pois se destinam a atuar pontualmente e trazem em sua
concepção o mote de combater manifestações flagrantes de discriminação e também engendrar
transformações culturais e sociais relevantes (Gomes, 2001; Oliven, 2007).
Pode-se dizer que os tomadores de decisão recorreram a estratégias de convencimento que
consideram mais eficazes, uma vez que agem na expectativa de adesão dos outros aos seus
posicionamentos. Nos materiais analisados, observou-se o uso de recursos que buscavam conferir
mais legitimidade social às suas afirmações.
Entre os 12 PLs, verificou-se a incidência de 4 menções a estudos realizados por diferentes
instituições (Universidade de São Paulo, Fundação Nacional do Índio e Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística). A referência a estes e a outro estudo estatístico tinha por objetivo
apresentar números que auxiliassem a justificar seus posicionamentos – recurso argumentativo
denominado number-game (Van Dijk, 2015a). Foram também citadas autoridades científicas ou
políticas em 6 ocasiões (Darcy Ribeiro, como “professor-senador” ou “antropólogo” e a Organização
das Nações Unidas – ONU), bem como os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil na
adoção de AAs por 3 vezes.

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No que diz respeito aos votos declarados nas comissões e no Plenário, verificou-se a menção: (a) às
metodologias empregadas na elaboração da política; (b) os bons exemplos nacionais e internacionais
de medidas inclusivas; e, (c) o apoio já conquistado junto a alguns atores societais na busca de
conferir maior legitimidade social. Exemplifica-se com os trechos a seguir, respectivamente:
[11] É interessante ressaltar a racionalidade da proposição na medida em que estabelece critérios específicos
relativos às etnias com critérios universais de renda (voto do Dep. Carlos Abicalil – PT/MT, sessão da CEC).
[12] Quero referir a uma experiência muito positiva da cidade de Porto Alegre. Em Porto Alegre, uma lei
municipal de autoria do Poder Executivo, com apoio da sociedade, do movimento de negros e negras
estabeleceu para os concursos públicos cota específica... é... no que trata o ingresso na carreira pública e...
avalio que é muito possível estabelecermos para a nação brasileira (voto da Dep. Maria do Rosário – PT/RS,
sessão da CEC).
[13] [...] a aprovação desse Projeto hoje e desse substitutivo do deputado Carlos Abicalil traz encerrado em si
um grande apoio do movimento social, das organizações... né? De estudantes, de docentes, de servidores e
também do movimento social que busca inclusão dos afrodescendentes, dos negros construtores desse país,
dos índios e de todas as outras faixas da sociedade discriminadas, com as quais temos débito social (voto da
Dep. Alice Portugal – PCdoB/BA, sessão da CEC).
Depreende-se assim que, na interpretação dos tomadores de decisão, o ambiente cultural mais
amplo aceita como legítimas: as citadas formas de conhecimento (científico), autoridades (científicas
e políticas) e maneiras de proceder (racionalmente e cautelosamente, buscando bons
exemplos/referências e a simpatia de grupos). Ainda no que diz respeito ao conhecimento, observou-
se a pressuposição da existência de uma base comum (common ground) entre os parlamentares.
Nesta base, citam-se entre os acontecimentos e fatos: a participação do Brasil na Conferência de
Durban e os compromissos lá assumidos e também o reconhecimento da ONU como uma importante
entidade na luta por direitos humanos.
Buscando convencer os demais parlamentares, os propositores dos PLs apresentaram justificativas a
ações orientadas por valores e fins relativos à política de cotas. Pode-se dizer que as do primeiro tipo
podiam ser enquadradas em três valores, quais sejam: justiça, igualdade e diversidade. Quanto às do
segundo tipo, orientavam-se pelos seguintes fins: melhoria das condições de vida populacionais ou
das instituições, cumprimento de responsabilidades e capacitação da população.
As proposições analisadas partem do princípio que o acesso às universidades públicas federais é
desigual, sendo frequentadas, sobretudo, por pessoas com maior poder aquisitivo e brancas. Foram
atribuídas ainda a estas instituições: a excelência acadêmica e a alta exigência em processos
seletivos, decorrente da grande concorrência pelas vagas. Complementarmente, nas ocasiões em
que as universidades privadas foram mencionadas se percebeu distintas interpretações quanto a
qualidade de seu ensino (bom ou ruim). Portanto, verifica-se um imaginário que confere maior
prestígio às universidades federais, que lhe atribui legitimidade como instituição educadora e
formadora e que reconhece o valor simbólico de seus diplomas (Bourdieu, 2014; Cegarra, 2012).
Esse imaginário regulou a ação social dos tomadores de decisão no sentido de lutar por algumas
mudanças e defender algumas permanências. No que tange às mudanças, pode-se mencionar a
busca por democratizá-la: garantir o acesso de não brancos e pessoas de baixa renda às suas vagas e
a uma formação de qualidade. Entre as permanências, observou-se defesa do mérito, da excelência
acadêmica e da autonomia universitária.
[14] Note-se que o projeto de lei que apresentamos prevê a criação de novas vagas, para os indígenas que
conseguirem aprovação no processo seletivo. Assim, fica resguardado o sistema de mérito acadêmico e os
direitos dos demais candidatos aprovados (texto original do PL 615/2003, autoria do Dep. Murilo Zauith –
PSB/MS).
[15] O argumento utilizado de que a universidade, como centro de educação por excelência, deve ser
reservada para alunos bem preparados, ou seja, para aqueles que frequentaram escolas de 1º e 2º graus de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

boa qualidade nos parece falho, além de discriminatório. Pesquisas revelam que alunos oriundos de escolas
públicas e com desvantagens socioeconômicas confirmadas têm desempenho acadêmico estatisticamente
semelhante aos outros alunos (texto original do PL 2069/1999, autoria do Dep. Raimundo Gomes de Matos –
PSDB/CE).
[16] [...] é importante que nunca entremos na autonomia das universidades exatamente porque ali está a
criatividade do brasileiro, que é muito importante ser mantida (voto do Dep. Antenor Naspolini – PSDB/CE,
sessão da CEC).
Resguardado o princípio do mérito através da continuidade de exigência de aprovação em processos
seletivos; a excelência acadêmica com a observação da continuidade do desempenho acadêmico de
seus estudantes; e, a autonomia universitária, pode-se dizer que nem todos os aspectos da
universidade são postos em questão. É correto então afirmar que a adesão às AAs teria como
propósito não a reforma completa da instituição, mas o reajuste de apenas alguns elementos.

5 Conclusões

Este artigo analisou o processo de elaboração do texto da política de cotas vigente nos institutos
técnicos e universidades federais, a qual foi instituída pela Lei 12.711 de 2012. A análise enfocou os
tomadores de decisão e contemplou todo o processo de tramitação da lei no Congresso Nacional.
Buscou-se entender suas visões de mundo a respeito da sociedade e do Estado brasileiros e da
instituição universitária, elucidar o sentido atribuído pelos tomadores de decisão às suas ações,
assim como averiguar suas opiniões a respeito dos aspectos estruturantes desta ação afirmativa.
A opção pela abordagem da AD se mostrou adequada, pois contribuiu para desvelar as versões de
mundo que tentaram fixar sentidos no processo de elaboração do texto e influenciar o desenho da
política de cotas. Neste cenário, a análise argumentativa permitiu compreender como foram
apresentados e organizados os argumentos dos tomadores de decisão, assim como se estruturava o
raciocínio que orientou a defesa de seus pontos de vista.
Averigou-se que os PLs, pareceres e demais votos pronunciados continham frequentemente um
diagnóstico e um prognóstico. Quanto aos diagnósticos, pode-se dizer que centravam-se na
enunciação de problemas de natureza social, educacional ou econômica como raízes das
desigualdades de acesso ao ensino superior no Brasil. Os PLs surgiram então como resposta a esta
situação e apresentavam as obrigações e permissões ao Estado brasileiro. Ademais, a análise
argumentativa auxiliou no entendimento do sentido atribuído às ações dos tomadores de decisão –
orientadas por valores (justiça, igualdade e diversidade) ou fins (melhores condições de vida
populacionais e institucionais, cumprimento de responsabilidades e capacitação da população).
A análise deôntica, realizada através do uso de marcadores de obrigações ou permissões, auxiliou a
compreender aquilo que se tratava de um dever ou uma possibilidade do Estado brasileiro. Segundo
os tomadores de decisão, o Estado deveria diminuir ou eliminar os obstáculos no acesso a este nível
de ensino, então garantindo um sistema educacional mais equitativo e democrático. As cotas eram
vistas como uma oportunidade de maior inclusão de pessoas com baixa renda, negros e indígenas na
universidade, cuja oferta encontrava condições de possibilidade para ser realizada.
No que tange à instituição universitária, verificou-se através da AD que os tomadores de decisão
tiveram suas ações sociais reguladas por um imaginário da universidade federal como instituições
prestigiosas e cujos diplomas detinham reconhecido valor simbólico. Surge daí um movimento a
favor de mudanças e outro a favor de permanências: de um lado, defendendo a sua democratização,
visando a maior diversidade entre seus ingressantes e egressos; e, de outro, resguardando o
princípio do mérito, a excelência acadêmica e a autonomia universitária.

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Na continuidade desta investigação, pretende-se analisar o discurso dos implementadores da política


de cotas (aqueles que interpretam e operacionalizam o texto da lei). Espera-se captar suas versões
de mundo através de entrevistas e então traçar comparativos entre os propositores e
implementadores. Deste modo, espera-se contribuir para o entendimento de aspectos que podem
levar ao sucesso ou insucesso desta política nas universidades federais e, de maneira geral, auxiliar
na compreensão dos complexos processos de criação e implementação das políticas públicas.

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Imagens na Educação a Distância: percepção de um grupo de


autores de materiais didáticos para Educação de Jovens e Adultos

Jacqueline Ribeiro de Souza Mendes1


Gerson de Souza Mól2
Maria Helena da Silva Carneiro3
1 Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências Universidade de Brasília, Brasil. rsmjacqueline@gmail.com
2 Instituto de Química Universidade de Brasília, Brasil. gmol@unb.br
3 Faculdade de Educação Universidade de Brasília, Brasil. mhsilcar@unb.br

Resumo. Buscamos identificar a percepção de um grupo de 14 (n=14) professores de educação básica da


rede pública de ensino no Brasil, autores de materiais didáticos para educação de jovens e adultos em
ambiente virtual de aprendizagem, sobre a função das imagens nos materiais didáticos. Os dados foram
coletados por meio de um questionário com questões de respostas abertas e fechadas. Identificamos as
ilustrações, as fotografias e os ícones como as imagens mais utilizadas, com a intenção de explicar o
conteúdo e motivar o aluno. Os resultados indicaram que, embora os professores façam uso frequente das
imagens, eles não têm clareza quanto ao seu potencial em contextos de ensino e aprendizagem e quanto à
importância de considerar orientações teóricas na utilização da linguagem visual nos materiais didáticos
elaborados para a educação de jovens e adultos em ambientes virtuais de aprendizagem.
Palavras-chave: Imagem; Linguagem visual; Educação de Jovens e Adultos; Educação a Distância; Material
Didático.

Images on e-learning environments: Authors’ perception in the elaboration of e-learning content for
youth and adult education
Abstract. This study aimed to identify the perceptions of a group of 14 (n=14) Brazilian teachers, authors of
e-learning content, on the role played by images on the didactic material for youth and adult education.
Data were collected from a closed and open-ended questions questionnaire administered to the
participants. We identified illustrations, photos and icons as the most utilized images, with the role of
explaining the content and motivating students. The results imply that, despite the frequent use of images,
teachers lack the understanding of images’ potential in the teaching and learning process and the
importance of taking into account theoretical knowledge in the use of visual aid in e-learning.
Keywords: Images; Visual language; Youth and Adult Education; Distance learning; Didactic material.

1 Introdução

O texto escrito, na forma impressa ou digital, é um dos recursos para a veiculação de conteúdo de
cursos elaborados para a Educação a Distância – EaD. Por meio das linguagens verbal e visual usadas
em sua composição, os textos para EaD dialogam com seus leitores minimizando a lacuna de
interação direta entre professores e alunos nesta modalidade de educação.
Segundo Assis e Cruz (2007), a linguagem constitui-se em uma das principais ferramentas no
processo de construção e reconstrução do conhecimento pretendidas no processo de educação.
Dessa forma, deve-se buscar, na elaboração de materiais didáticos para EaD, a utilização de
linguagens que, além de favorecer a apropriação de saberes, promovam a interação entre o aluno e
o próprio material.
Há diferentes posicionamentos em relação à produção de materiais didáticos. Segundo Muñoz
(2001), não existem prescrições definitivas sobre a elaboração de textos educativos a não ser o
consenso acerca da necessidade de planejamento, desenvolvimento e produção. Manifestando-se

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em relação ao texto para EaD, Neves (2004) defende a ideia da objetividade e simplicidade, sem
prescindir da riqueza de conteúdo, devendo-se evitar ambiguidades e construções prolixas, de forma
a respeitar a inteligência do aluno e alcançar o seu nível cognitivo. Acrescentamos à ideia de Neves a
importância da dialogicidade nos textos para EaD.
Ao considerar a quantidade de informações que somos capazes de processar ao mesmo tempo, Assis
e Cruz (2007) alertam para o cuidado na produção do material didático para a EaD, de forma a evitar
a sobrecarga de informações excedentes e possibilitar a retomada dos conhecimentos prévios do
aluno.
Os textos elaborados para a EaD utilizam tanto a linguagem verbal quanto a visual (essa na forma de
gráficos, diagramas, esquemas, ilustrações e diferentes representações icônicas). Entretanto, apesar
de fazer uso de elementos visuais na composição textual, nem sempre o autor do material didático
possui a compreensão das potencialidades comunicativas da imagem. Desconhece também a
existência de uma gramática da imagem, no sentido exposto por Calado (1994) ao apontar para
elementos de sintaxe e de semântica, como as relações que se estabelecem entre fundo e forma ou
escala e proporção, entre outros. Dominar a gramaticalidade das imagens torna-se, dessa forma,
necessário para o uso adequado da linguagem visual, evitando a utilização equivocada de elementos
imagéticos que comprometam a clareza e a objetividade do texto.
Conforme destacado por Ribeiro e Provenzano (1997), as imagens (fotos, desenhos, gráficos, tabelas,
etc) têm importância fundamental, desde que colocadas adequadamente no texto. Devem focalizar a
atenção do aluno e convidá-lo para a leitura. Devem ter como funções auxiliar na compreensão do
texto lido, complementar conteúdos, além de contribuir para a sua leveza e motivação para ler.
É importante também salientar a posição de Filatro (2008, p. 74), em relação ao uso de imagens no
âmbito da educação, ao afirmar que “os alunos aprendem mais ou melhor quando textos (escritos e
falados) e imagens ilustrações, gráficos, mapas e fotos, ou gráficos dinâmicos, como animações e
vídeos) são combinados, em vez de apresentados separadamente”, com base em um princípio
denominado pela autora de princípio da multimídia.
Outro destaque deve ser dado ao que Filatro (2008) denomina de princípio da modalidade espacial.
Segundo esse princípio, textos e gráficos devem ser posicionados próximos, poupando ao leitor a
tarefa de reuni-los. Dessa forma, reduz-se a carga da memória de trabalho disponibilizando uma
capacidade maior dessa memória para a aprendizagem. No entanto, segundo outro princípio, o da
redundância, quando um texto e uma imagem podem ser entendidos separadamente, não devem
ser apresentados juntos sob o risco de sobrecarregar a memória de trabalho e interferir de forma
negativa na aprendizagem.
Sartori e Roesler (2005) manifestaram seu entendimento acerca da utilização de imagens no material
didático para EaD. Segundo as autoras, é preciso cuidado na escolha das imagens, atentando para
aspectos como cor, tamanho e resolução que, ao interferir na qualidade gráfica de todo o material,
consequentemente interferem na aprendizagem.
Considerando a importância da linguagem visual nos materiais didáticos, empreendemos uma
investigação que buscou identificar qual a percepção de professores autores de material didático
para um curso de Educação de Jovens e Adultos a Distância – EJA/EaD, em uma das redes públicas de
ensino no Brasil, sobre a função das imagens no material didático. A investigação foi norteada pelas
seguintes questões: (a) que tipos de imagens são mais utilizadas pelos professores na elaboração de
materiais didáticos?; (b) em que critérios se baseiam os professores autores para a utilização de
imagens nos materiais didáticos?; e (c) quais as funções atribuídas às imagens, pelos professores
autores de material didático para EJA/EaD virtual, no processo de ensino-aprendizagem?

2 Pressupostos Teóricos

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O termo imagem é polissêmico e seu uso, atualmente, alcança dimensões que vão da mídia à
psicologia, da religião à arte, das ciências da natureza às ciências humanas (Mendes, 2006). Em
referência a essa polissemia, Joly (2003) aponta para a dificuldade de uma definição que recubra
todos os seus empregos, justamente pela diversidade de significações sem vínculo aparente com a
qual a palavra imagem está relacionada.

De fato, essa amplitude de uso do termo imagem não facilita a sua definição, posto que a imagem,
analisada sob vários aspectos, pode vincular-se a diferentes teorias, que envolvem o estudo da
matemática, das artes e da psicologia, por exemplo.
Nesta investigação, utilizaremos o conceito de imagem cunhado por Cassiano, que teve como base
os estudos da semiótica Peirceana:

Entendem-se como imagem . . . signos icônicos ou simbólicos (ou uma combinação desses)
cujo significante (representamen) mantém uma relação analógica (para ícones) ou
convencional (para símbolos) com o referente. O referente pode ser um conceito, um objeto
(um ser, uma coisa) ou um fenômeno. Tais signos se apresentam em oposição ao texto
escrito e são compostos por figuras, fotografias, diagramas, gráficos, esquemas, desenhos e
imagens de arte. (2002, p. 22)

Com base no conceito apresentado, consideramos imagem, neste trabalho, representações visuais
tais como desenhos, ilustrações, mapas, esquemas, animações, infográficos, gráficos, fotografias e
ícones.
Diferentes classificações já foram apresentadas por pesquisadores da área com base em parâmetros
como o grau de iconicidade e os seus aspectos morfológicos e funcionais, por exemplo (Mendes,
2006). Sendo o objetivo deste estudo a função atribuída às imagens pelos autores de material
didático, apresentaremos apenas de forma sucinta os dois primeiros parâmetros para, a seguir,
explicitar aquele que é o foco deste estudo: a função da imagem.
Iconicidade, segundo Moles (1987), é uma magnitude oposta à abstração e representa a quantidade
de realismo contida em uma imagem. Considerando essa magnitude, Moles elaborou uma escala
composta por treze níveis decrescentes de iconicidade (do nível 12 ao nível 0) na qual o primeiro
nível corresponde àquele de maior iconicidade e, consequentemente, menor abstração
(representado pelo próprio objeto) e o último nível opostamente é o de menor iconicidade e maior
abstração (no qual encontram-se as equações, fórmulas e textos verbais).
Quanto aos aspectos morfológicos das imagens, são analisados os elementos gráficos que as
compõem como cor, tipo de desenho e outros. Destacam-se nesse sentido as tipologias elaboradas
por Fleming e por Knoweton (citados por Carneiro, 1997), por Jiménez, Prieto e Perales (1997) e por
Perales e Jiménez (2002).
A classificação das imagens quanto ao aspecto funcional analisa-as em suas relações com o texto.
Sob essa ótica, Duchastel (1980) estabelece três funções básicas que pode apresentar uma imagem:
(a) função motivadora (attention role) - a intenção é captar e manter o interesse do aluno; (b) função
explicativa (explicative role) -a intenção é auxiliar diretamente a compreensão pela apresentação
visual de uma ideia; e (c) função retencional (retentional role) – auxilia a retenção da informação pelo
fato de a imagem ser mais fácil de relembrar do que as informações verbais.
Ainda em relação à funcionalidade e a partir da contribuição de outros teóricos, Calado (1994)
estabeleceu doze funções a partir das quais a autora classificou as imagens no contexto educativo.
(a) função expressiva, presente nas imagens que transmitem mais do que a informação contida na
mensagem, pois transmitem o locutor por meio de seu forte apelo afetivo-emocional; (b) função
persuasiva, contida nas imagens que se propõem a motivar e a convencer; (c) função poética,

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desempenhada pelas imagens de arte, que apelam às emoções; (d) função decorativa, presente nas
imagens que buscam atrair o leitor; (e) função memorizadora, presente nas imagens que objetivam
facilitar a retenção dos conteúdos; (f) função de complemento, presente nas imagens que
acrescentam conhecimentos pertinentes àqueles já adquiridos; (g) função substitutiva, que pertence
às imagens autônomas, ou seja, que transmitem a mensagem independentemente de estarem
vinculadas a outras linguagens; (h) função dialética, por meio da qual a imagem impacta ao introduzir
uma ambiguidade na mensagem, estimulando a emergência de novos entendimentos; (i) função
representativa, na qual a imagem, pelo princípio da redundância, reforça as informações textuais; (j)
função organizadora, na qual a imagem confere coerência aos conteúdos informados no texto; (k)
função interpretativa, presente nas imagens que permitem melhor compreensão da informação pois
conferem a esta maior inteligibilidade; e (l) função transformadora , na qual a imagem, por meio da
recodificação, presta-se à retenção da informação ao valer-se de estratégias ordenadas de retenção
de conteúdos.
Amador e Carneiro (1999), a partir da análise do conteúdo evolução em livros didáticos portugueses
da educação básica, propuseram quatro funções didáticas desempenhadas pelas imagens: (a) função
explicativa, desempenhada pelas imagens que facilitam a compreensão e retenção da informação
veiculada no texto verbal, podendo também fornecer informação adicional; (b) função motivadora,
identificada nas imagens que incentivam a aprendizagem de determinados conteúdos, sem,
entretanto, estabelecer uma interação com o texto verbal; (c) função metalinguística, observada nas
imagens que se constituem na principal fonte de informação, adquirindo assim maior importância
que os conteúdos verbais; e (d) função catalisadora de experiências, desempenhada por imagens
cuja principal finalidade é a de possibilitar ao aluno o exercício de uma determinada atividade.
Não existe consenso em relação às funções das imagens que compõem textos didáticos e as
classificações são construídas pelos autores no curso de suas pesquisas e à medida que se tornam
necessárias para que as imagens sejam analisadas. Optamos, neste trabalho, pela classificação de
Amador e Carneiro (1999) por entendermos que as classes propostas pelas autoras sintetizam e
explicitam as funções identificadas nas classificações tanto de Duchastel quanto de Calado.

3 Metodologia

Trata-se de uma investigação de abordagem predominantemente qualitativa, com uso de dados


quantitativos de forma a possibilitar a triangulação metodológica.
Bogdan e Biklen (citados por Lüdke & André, 1986) apontam a pesquisa qualitativa como aquela que
tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal
instrumento.
A triangulação assegura maior abrangência metodológica na resolução de um mesmo problema de
pesquisa (Morse, 1991) ao permitir a associação de pelo menos dois métodos, no caso desta
pesquisa o qualitativo e o quantitativo

3.1 Participantes

Participaram do estudo 14 professores (n=14) de educação básica, atuando na rede pública de ensino
no Brasil, em exercício em um projeto de educação de jovens e adultos a distância via ambiente
virtual de aprendizagem. Os professores tinham como uma de suas atribuições a elaboração do
material didático das disciplinas integrantes das matrizes curriculares do segundo e terceiro
segmentos da educação de jovens e adultos.

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3.2 Instrumento

A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário composto de nove perguntas (três do
tipo resposta fechada e seis do tipo resposta aberta) contemplando os seguintes tópicos: conceito de
imagem, função atribuída à imagem utilizada nos materiais didáticos, tipos de imagens utilizadas,
frequência de utilização de imagens nos materiais didáticos; critérios para seleção e inclusão das
imagens nos materiais didáticos.

3.3 Procedimentos

Após um dos pesquisadores receber a autorização da coordenação geral do projeto de educação de


jovens e adultos a distância, via ambiente virtual de aprendizagem, realizamos contato com o grupo
de professores participantes para explicitar os objetivos, a forma de levantamento dos dados e a
participação voluntária na pesquisa. A seguir, enviamos o questionário por e-mail para 19
professores e professoras, sendo que destes 13 retornaram as respostas também por e-mail e um
questionário respondido foi entregue diretamente a um dos pesquisadores.

3.4 Tratamento dos Dados

Foi realizada uma leitura exaustiva das respostas às seis perguntas abertas, com os objetivos de
agrupá-las em categorias excludentes, emergentes a posteriori a partir dessa leitura, no intuito de
reduzir os dados e de minimizar efeitos de subjetividade na análise, confrontando-as com os
pressupostos teóricos apresentados. As respostas às três questões abertas foram tabuladas
manualmente, considerando o reduzido número de participantes. Foram analisadas em conjunto as
respostas às perguntas do questionário que se referiam à mesma questão de pesquisa.

3.5 Resultados e Discussão

Três questões de pesquisa foram investigadas neste estudo, cujos resultados obtidos apresentamos
a seguir.

Questão de Pesquisa 1: Que tipos de imagens são mais utilizadas pelos professores na elaboração do
material didático?

Por meio de uma pergunta de resposta fechada, foram apresentados os nomes de sete tipos de
imagens para que os respondentes assinalassem aqueles utilizados frequentemente na elaboração
do material didático: gráficos, fotografias, ícones, infográficos, ilustrações, esquemas e gifs
animados. Foi dada ainda a possibilidade para apontarem outro tipo de imagem não contemplada na
lista apresentada e permitida a marcação de mais de um tipo de imagem. Os resultados apontaram o
predomínio da utilização de ilustrações, escolha feita por 86% dos respondentes, seguida por
fotografia (78%), ícones (57%), gráficos (50%), gifs animados (35%), infográficos (21%) e esquemas
(7%).

Questão de Pesquisa 2: Quais os critérios nos quais se baseiam os professores conteudistas para a utilização
de imagens no material didático?

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Essa questão foi contemplada em quatro perguntas do questionário. Duas perguntas do tipo
resposta aberta identificaram os critérios de seleção e a disposição da imagem na página. Outras
duas perguntas, do tipo resposta fechada, identificaram o espaço ocupado pela imagem e o
posicionamento da imagem em relação ao texto.
Em referência à seleção das imagens, emergiram oito categorias, citadas em ordem decrescente de
registros: (a) relação com o conteúdo: seis registros; (b) despertar atenção: quatro registros; (c)
complementar informação: três registros; (d) facilitar a compreensão: dois registros; (e) motivação:
dois registros; (f) perfil do aluno: dois registros; (g) qualidade da imagem: um registro; e (h) fonte da
imagem: um registro.
Embora a categoria relação com o conteúdo tenha apresentado o maior número de registros, pouco
menos da metade dos professores consideraram esse quesito no momento da elaboração do
material e não foi possível identificar qual o tipo de relação. Analisando as respostas em relação às
funções propostas por Amador e Carneiro (1999), evidenciamos uma tendência de escolha de
imagens com as funções explicativa e motivadora.
É relevante observar que apenas dois professores consideraram o perfil do aluno ao selecionar as
imagens e que a qualidade da imagem foi apontada por apenas um dos professores como critério de
seleção. Sobre esse último quesito, Sartori e Roesler (2005) chamam atenção para a importância da
resolução da imagem para não comprometer o material nem a aprendizagem.
Analisando esses dois aspectos, é possível que não tenha sido dispensada à linguagem visual a
mesma atenção dada à linguagem verbal na produção do texto didático. O cuidado no uso das
diferentes linguagens deve permear o trabalho de construção dos textos, adequando-os ao perfil do
leitor, no caso alunos da educação de jovens e adultos.
Em relação à disposição da imagem na página, cinco categorias foram estabelecidas: (a) proximidade
com o texto: cinco registros; (b) ausência de critério: quatro registros; (c) sentido ocidental de leitura:
dois registros; (d) dimensão da imagem: um registro; e (e) complementação textual: um registro.
Como apontam os resultados, a categoria com o maior número de registros, ainda assim citada por
menos da metade dos respondentes, foi a proximidade com o texto. Aproximadamente um terço dos
respondentes não se vale de critérios para dispor a imagem, resultado que vem ao encontro de nossa
inferência anterior de que possivelmente não houve o mesmo cuidado em relação à utilização da
linguagem visual, em comparação à linguagem verbal. Vale destacar o alerta de Ribeiro e Provenzano
(1997), no qual as autoras apontam para a importância das imagens, desde que adequadamente
colocadas no texto, o que neste estudo diz respeito especificamente à página no ambiente virtual.
Outro aspecto considerado para responder a essa segunda questão de pesquisa foi abordado por
pergunta de resposta fechada, por meio da qual buscamos identificar em qual posição da página,
agora tendo o texto como referência, os respondentes posicionam a imagem. Identificamos que 38%
dos sujeitos da pesquisa não seguem um padrão para posicionar a imagem, tomando o texto como
referência. Posicionar a imagem à direita do texto ou entre textos é procedimento adotado por 32%
dos pesquisados (16% para cada posição), ao passo que as posições à esquerda; acima e abaixo; à
esquerda e à direita; e à esquerda, abaixo e entre textos foram, cada uma igualmente, apontadas
como posicionamento padrão adotado por 7,5 % dos sujeitos da pesquisa, perfazendo em conjunto
30% das escolhas.
A proximidade com o texto deve ser considerada ao posicionarmos uma imagem, seja em página
impressa ou virtual. Segundo o princípio da modalidade espacial, essa aproximação libera a memória
de trabalho do aluno para a aprendizagem, já que poupa a esse o esforço de reuni-las. Além disso, o
sentido ocidental de leitura, da esquerda para a direita, faz com que nosso olhar seja dirigido
primeiramente ao que está à esquerda da página. Isso deve ser levado em conta na escolha do local
da imagem, de acordo com a ênfase que se quer dar ao texto escrito ou à imagem.

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Embora tenhamos verificado grande variedade de respostas em relação à disposição, ao


posicionamento em relação ao texto e aos critérios para seleção das imagens, houve elevada
concordância quanto ao espaço ocupado por elas no material. A questão do tipo resposta fechada
que se referia a esse quesito apontou que 62% dos respondentes, ao elaborar o material didático,
ocupam de 10% a 30% do espaço da página com imagens. O espaço máximo ocupado, citado por 8%
dos respondentes, corresponde à faixa de 50% a 70% da página.
Esses percentuais de ocupação não são desprezíveis, o que nos alerta para a necessidade de um
maior cuidado na seleção dos recursos imagéticos, considerando a adequação da imagem ao objetivo
proposto para seu uso.
Comparando os dados obtidos por meio das quatro perguntas elencadas para responder à segunda
questão proposta para esta investigação, inferimos a inexistência de um projeto gráfico que oriente a
utilização das imagens na elaboração do material didático, o que pode resultar em uma subutilização
ou mesmo utilização inadequada deste recurso, acarretando um comprometimento na
aprendizagem.

Questão de Pesquisa 3: Quais as funções atribuídas às imagens, pelos professores elaboradores de material
didático para EJA/EaD virtual, no processo de ensino-aprendizagem?

Para responder a essa terceira questão de pesquisa, comparamos os dados obtidos a partir de três
perguntas do tipo resposta aberta entre si e com os resultados que apresentamos na seção anterior.
Em relação à pergunta do questionário que versava sobre os aspectos positivos e negativos da
utilização de imagens em contextos educativos, houve grande variedade de respostas, resultando no
estabelecimento das seguintes categorias, relacionadas aos aspectos positivos: (a) facilitar a
compreensão: oito registros; (b) ilustração do discurso: quatro registros; (c) conferir ludicidade:
quatro registros; (d) invocar lembranças: três registros; (e) motivar o leitor: três registros; (f)
promover interação leitor/texto: três registros; (g) complementar o discurso: três registros; (h)
possibilitar a memorização: dois registros; (i) contextualizar o discurso: dois registros; (j) imprimir
qualidade ao material: dois registros; e (K) avaliar a compreensão: um registro.
Quanto aos aspectos negativos, as categorias resultantes foram: (a) induzir ao erro: seis registros; (b)
dispersar a atenção: dois registros; (c) limitar a criatividade: dois registros; (d) não observa aspectos
negativos: dois registros; e (e) poluir o material: um registro. Embora a indução ao erro tenha sido a
categoria com o maior número de registros, comparando esse resultado com os critérios
identificados para a seleção das imagens apresentados na seção anterior nenhum respondente fez
referência à precisão dos dados ou informações presentes em uma imagem, o que seria esperado
uma vez que há a percepção da indução ao erro pela imagem.
Ainda, dois professores afirmaram não observar aspectos negativos na utilização da imagem, o que
alerta, mais uma vez, para a questão da falta de cuidado na seleção e utilização da linguagem visual.
Tal percepção pode levar o elaborador do material ao equívoco de subestimar a importância de
critérios como a qualidade e a correção da informação presente na imagem no momento da seleção
desse suporte informacional. Pode, ainda, promover a subutilização ou utilização em demasia dos
recursos imagéticos, com grande aporte de informações simultâneas, acarretando uma sobrecarga
prejudicial ao processo de aprendizagem.
As resposta à pergunta que buscou identificar os motivos pelos quais os elaboradores fazem uso de
imagens levaram-nos à elaboração de nove categorias, assim denominadas: (a) motivar para a
leitura: sete registros; (b) facilitar a compreensão: quatro registros; (c) ilustrar o conteúdo: três
registros; (d) imprimir estética ao texto: três registros; (e) imprescindível para a disciplina: dois
registros; (f) complementar a informação: dois registros; (g) facilitar a explicação: dois registros; (h)
facilitar a memorização: um registros; e (i) contextualizar a informação: um registro. Evidenciam-se,

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nessas respostas, as funções explicativa, motivadora e catalisadora de experiências, segundo a


classificação proposta por Amador e Carneiro (1999).
Na última pergunta do questionário, os professores foram indagados sobre quais seriam os impactos
da retirada das imagens do material didático e quais as justificativas para as respostas. Organizamos
a partir das respostas as seguintes categorias: (a) dificulta a compreensão do conteúdo: oito
registros; (b) empobrecimento do texto: sete registros; (c) desmotivação: três registros; (d) perda do
sentido do texto: dois registros; (e) impossível excluir: dois registros; e (f) não sei responder: um
registro. Também aqui é possível identificar as funções explicativa e motivadora da imagem,
subjacente às respostas apresentadas.
Comparando as categorias emergentes a partir das respostas às questões do instrumento de coleta,
observamos que embora oito professores tenham apontado facilitar a compreensão como um
aspecto positivo da utilização das imagens e o mesmo número tenha considerado que a retirada das
imagens teria o impacto de dificultar a compreensão do conteúdo, apenas quatro professores tem
nessa facilitação o motivo para usar as imagens e, ainda, apenas dois valem-se desse atributo como
critério para selecionar as imagens que irão compor o material didático.
Estabelecendo a mesma comparação, três professores apontaram motivar como um aspecto positivo
da utilização das imagens e igual número citou a desmotivação como impacto da retirada da imagem
do material didático. No entanto, um número consideravelmente maior de respondentes, sete,
justificou o uso das imagens pela capacidade de motivar, embora apenas dois usem esse atributo
como critério de seleção.
Reunindo os resultados das comparações estabelecidas, fica claro que os aspectos positivos
atribuídos às imagens não são determinantes para a sua utilização no material didático. Além disso, a
justificativa para a utilização das imagens não se constituiu como um critério para a seleção desse
recurso.
Há duas considerações importantes a partir dessas evidências: embora os professores percebam a
importância da linguagem visual no processo de aprendizagem, eles ainda não se apropriaram desse
recurso de maneira formal e sistemática. Isso então se reflete no processo de planejamento e
elaboração do material didático.

4 Conclusões

Por meio das respostas às questões - que tipos de imagens são mais utilizadas pelos professores na
elaboração do material didático, quais os critérios nos quais se baseiam os professores conteudistas
para a utilização de imagens no material didático e quais as funções atribuídas às imagens, pelos
professores elaboradores de material didático para EJA/EaD virtual, no processo de ensino-
aprendizagem? - buscamos, nesta investigação, identificar a percepção de um grupo de professores
elaboradores de material didático para um curso de Educação de Jovens e Adultos a Distância via
ambiente virtual – em rede pública de educação básica no Brasil sobre as imagens no material
didático.
Identificamos que as ilustrações, as fotografias e os ícones são os tipos de imagens predominantes no
material didático produzido pelos sujeitos da pesquisa, embora não tenha sido possível explicitar o
motivo pelo qual essas imagens sejam as mais utilizadas. Atribuímos a falta de esclarecimento sobre
essa questão a uma falha do instrumento de coleta de dados, que não possibilitou contemplar esse
quesito.
Embora um critério importante como a relação com o conteúdo tenha sido o mais citado, aspectos
de alta relevância como a qualidade da imagem e o perfil discente não se mostraram significativos
para os elaboradores. Some-se a isso o fato de inexistir um critério consensual quanto ao

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posicionamento da imagem nas páginas do material didático, o que evidencia a ausência de uma
identidade visual garantida por um projeto gráfico que considere orientações teóricas sobre o uso de
imagens em contextos educativos.
Focando na indagação sobre as funções atribuídas às imagens, não observamos consistência nos
dados que nos permitisse uma resposta conclusiva no âmbito desta pesquisa. A afirmação anterior é
respaldada pela comparação estabelecida entre dados como aspectos positivos da utilização das
imagens, motivos para utilizá-las, critérios para selecionar as imagens e impacto de sua retirada no
material didático.
Embora as funções motivadora e explicativa das imagens tenham sido as mais identificadas nas
respostas, o que por si já apontaria para a importância que se deve ter em relação à linguagem visual
em situações de ensino e aprendizagem, evidências levantadas neste estudo apontam para a
atribuição de um papel secundário à linguagem visual.
Centrando as conclusões na percepção dos professores sobre as imagens, foco deste estudo,
evidências levantadas apontam que, embora os professores conteudistas façam uso frequente das
imagens, não existe clareza quanto ao seu potencial em contextos de ensino e aprendizagem e
quanto à importância de considerar orientações teóricas na utilização da linguagem visual nos
materiais didáticos.
Entendemos que os resultados aqui apresentados não são passíveis de generalização mas servem de
ponto de partida para novos estudos, principalmente no que tange à adequação do instrumento de
coleta de dados aos objetivos propostos.

Referências

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Una Investigación Mediante Estudio de Casos en la Formación


Científica de Docentes de Educación Infantil

Mª Antonia López-Luengo1, Luis M. Torrego-Egido2, Cristina Vallés1


1
Departamento de Didáctica de las Ciencias experimentales, sociales y de la matemática Universidad de
Valladolid, Segovia, España. mlopez@dce.uva.es cvalles@dce.uva.es
2
Departamento de Pedagogía Universidad de Valladolid, Segovia, España. ltorrego@pdg.uva.es

Resumen. La docencia universitaria y la docencia en ciencias en la etapa de educación infantil son los
ámbitos menos desarrollados teóricamente por la Didáctica de las ciencias experimentales como disciplina.
El estudio de casos se muestra como una metodología adecuada para abordar el diseño, implementación y
evaluación de una asignatura de Didáctica de las ciencias experimentales en una nueva titulación
universitaria acorde con el Espacio Europeo de Educación Superior (EEES). Este trabajo aporta información
útil tanto para el profesorado novel como para el ya experimentado en esta disciplina y otras disciplinas
universitarias.
Palabras clave: Estudio de casos; Formación de profesorado; Educación científica; Educación Infantil.

A Case Study Research at Early Childhood Teacher Education


Abstract. University teaching and Early Childhood Science Education are the areas with less theoretic
development within Science Education. Case study research is shown as good methodology for the study of
the planning, implementation and assessment of a Science Education subject in a new grade adapted to the
European High Education Area (EHEA). This research supplies useful information for new teachers as well as
for experienced teachers of the subject or of other university disciplines.
Keywords: Case study research, Teacher education, Science Education; Early Childhood Education.

1 Introducción

El interés de la investigación aquí presentada se justifica por el contraste existente entre el exiguo
número de trabajos que informen sobre lo que realmente se hace en la universidad para formar
docentes y la trascendencia individual y social de la educación en las etapas iniciales (Confederación
de sociedades científicas de España COSCE, 2011; Eurydice, 2009) así como el reconocimiento de los
docentes como agentes de cambio curricular y variable fundamental para la calidad de la enseñanza
(COSCE, 2011; Mellado y González, 2000). Por otro lado, la formación del profesorado es una de las
líneas de investigación que han contribuido a la articulación de la Didáctica de las ciencias
experimentales (DCE) y sigue siendo una tendencia prioritaria en la investigación dentro de esta
disciplina. Sin embargo, la DCE -cuyo fin es resolver el problema de enseñar ciencia a estudiantes de
distintas edades y en distintos contextos, para que aprendan significativamente- tradicionalmente ha
descuidado la etapa de educación infantil.
La formación inicial de los profesionales de la educación infantil supone importantes retos, ha de
afectar tanto al campo ideológico como al teórico y al técnico. Respecto al campo ideológico, la
formación debe dirigirse hacia el desarrollo de la capacidad de reflexión y la autonomía, así como a
proporcionar criterios para la toma de decisiones. Respecto a los campos teórico y técnico, dadas las
metas de este profesorado, resulta conveniente tener en cuenta durante el proceso formación inicial
no solo las competencias profesionales, sino también las competencias básicas o claves para el
aprendizaje permanente. Entre estas últimas se encuentra la competencia científica. Según nuestra

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experiencia, refrendada por estudios en el ámbito internacional (Kavalari, Kakana, y Christidou, 2012;
Levitt, 2002; Maier, Greenfield, y Bulotsky-Shearer, 2013), durante el proceso de formación inicial es
necesario mejorar la relación establecida con las ciencias durante la educación secundaria;
reduciendo en lo posible miedos, complejos y rechazos, en todos los ámbitos científicos y también en
el tecnológico.

2 Problema y Preguntas de Investigación

El que aquí se relata es un problema educativo de tipo práctico. Consiste en describir y analizar qué
efecto tiene la implantación del EEES en el diseño e implementación de una asignatura de DCE propia
del tercer curso del grado universitario de Educación Infantil. Quienes impartían la asignatura y
quienes la cursaban fueron informantes de primera mano; el rol desempeñado en la investigación
fue fundamental dado su interés en comprender y transformar la realidad. Así pues, se aborda aquí
un análisis del equilibrio entre la práctica docente universitaria y la teoría pedagógica, dada la
abundante existencia de prácticas sin discurso (Sanmartí, 2008; Zabalza, 2007) y la necesidad de que
la investigación en educación elabore “principios y procedimientos metodológicos que emancipen a
los profesionales de su dependencia de la costumbre y de las tradiciones” (Carr, 2002, p. 15).
A continuación se concreta el enunciado del problema de investigación mediante cinco preguntas
específicas (Stake, 1998): 1.- ¿Cómo mejora el diseño de la asignatura “Las ciencias de la naturaleza
en el currículo de educación infantil” las motivaciones del alumnado hacia la ciencia? 2.- ¿Los
materiales elaborados por el profesorado responsable de la asignatura en el grado son adecuados
para la formación del alumnado? 3.- ¿Se alcanzan los objetivos propuestos en la asignatura? 4.-
¿Cómo repercute el trabajo realizado en la asignatura en el periodo de Practicum? 5.- ¿El alumnado
del grado de Educación Infantil se siente preparado para realizar un trabajo global que incluya la
educación científica? Tras cursar la asignatura, ¿su sensación de competencia es mayor que al inicio
de la misma? ¿Por qué?

3 Metodología

3.1 Diseño de la Investigación: Estudio de Casos

Ésta es una investigación de tipo interpretativo-naturalista, centrada en la enseñanza-aprendizaje de


las ciencias en un grado universitario de formación de profesorado y desde tal extremo se aproxima
al otro confín del sistema educativo, la educación infantil. Este acercamiento se realiza a través del
estudio de una asignatura, de las personas implicadas en ella y de la documentación de la práctica
realizada. La metodología más adecuada ante este desafío es sin duda el estudio de casos (Simons,
2011; Yin, 2009). No obstante, la participación requerida del profesorado y del alumnado para la
construcción conjunta de conocimiento aproxima este trabajo a la investigación-acción (Elliot, 1990;
McKernan, 2008) y a la metodología comunicativa crítica, que implica una espiral dialéctica entre la
acción y la reflexión (Gómez, Siles y Tejedor, 2012; Gómez, Latorre, Sánchez y Flecha, 2006).
Hay diferentes formas de estudio de casos. Podemos concretar más sobre el diseño de este trabajo
afirmando que se trata de un estudio de casos único (Stake, 1998; Yin 2009). Al mismo tiempo se
trata de un estudio de casos evaluativo (Merriam, 1998, citado por Rovira, 2004, p. 17) caracterizado
tanto por la descripción en un contexto real vivo como por la búsqueda de los porqués de lo que
sucede. Para terminar, puede ser considerado un estudio intrínseco de casos (Stake, 1998), ya que el
interés radica en la propia necesidad de aprender sobre este caso particular. No puede afirmarse que

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se trate de un caso instrumental pero, sin buscar la generalización, es posible que el estudio del caso
particular también ayude a entender algunos problemas planteados a la Universidad con la
construcción del EEES.

3.2 Participantes, Temporización, Estrategias e Instrumentos para la Obtención de Datos

Participantes. La realización de este estudio requirió la participación de todas las personas


directamente implicadas: el conjunto del alumnado de tercer curso del grado de Educación Infantil
de una universidad española en uno de sus campus durante dos cursos (160 estudiantes) y las 2
profesoras responsables de la asignatura en dicho campus durante tales cursos. Además se contó con
la colaboración de otras personas implicadas en el caso: 2 profesoras responsables de la asignatura
en otros dos campus diferentes de la misma universidad y 8 estudiantes de uno de ellos; además de
4 profesionales de educación infantil que ejercieron como tutores en el Practicum.

Temporización. La toma de datos en el campo se desarrolló durante dos cuatrimestres de la misma


asignatura, lo que corresponde a dos cursos académicos (2011-12 y 2012-13). Como señala Yin,
(2009) el estudio de casos es un proceso iterativo en el que se pueden replantear los pasos previos y
la necesidad de una nueva toma de datos. En esta investigación se decidió hacer una nueva toma de
datos casi otro curso después (segunda entrevista a tutores del Practicum y cuestionario abierto de
metáforas) para permitir una mejor triangulación de los datos, por lo que el estudio de casos se
prolongó casi tres cursos académicos.

Estrategias e Instrumentos. Como se aprecia en la Tabla 1, las estrategias de obtención de datos


fueron variadas, no exclusivamente cualitativas. Este estudio de casos se apoya fundamentalmente
en entrevistas: se realizaron un total de nueve entrevistas -dos entrevistas individuales y siete
entrevistas grupales semi-estructuradas (Kvale, 2011)-. Se realizó análisis de documentos (memorias
del Practicum del alumnado, actas de reuniones de los comités de titulación, memoria del grado,
materiales curriculares –trabajos del alumnado, exámenes, etc.-), se emplearon también
instrumentos de cuasi-observación como el diario del docente; cuestionarios abiertos y una escala de
valoración tipo Likert: la “Escala de valoración de la percepción de los estudiantes sobre
metodologías participativas y evaluación formativa (EMPEF)” utilizada por la Red Nacional de
Evaluación formativa (Castejón, Santos y Palacios, 2013). El interés del uso de datos cuantitativos
radicaba en averiguar si tales datos facilitan la comprensión del caso en cuestión, qué inferencias
podían hacerse a partir de ellos y cómo eran valorados por los participantes. De esta manera en
algunas de las entrevistas se incluyeron preguntas para confirmar e interpretar datos obtenidos de
las escalas de valoración.

Tabla 1. Personas implicadas en la investigación y técnicas e instrumentos utilizados

Personas Paralelo al proceso Complementarios para la


de observación elaboración del caso
Investigadora Anecdotario Cuestionarios, escalas y
entrevistas
Análisis de documentos

Profesoras Diario Entrevistas individuales


Informe estructurado del proceso

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de evaluación seguido en la
asignatura

Alumnado Cuestionarios abiertos Entrevistas grupales


Escalas
Trabajos de curso
Diario viajero

Maestros Entrevista grupal


tutores del
Practicum

Fuente: Elaboración propia

3.3 Metodología para el análisis de datos

La primera fase del análisis de los datos, el análisis descriptivo, consistió en la organización de todos
los datos recogidos en categorías temáticas extraídas de las preguntas de investigación. A
continuación se repasaron las notas de campo y se re-establecieron las categorías. Por último se
clasificaron los datos en las categorías establecidas y se decidió cómo presentarlos. Según señala
Angrosino (2012), consideramos que las declaraciones que surgen en una entrevista conversacional
al igual que las acciones y declaraciones que surgen espontáneamente a la salida o la entrada de
clase, durante excursión, etc. tienen más posibilidades de ser elementos reales (patrón compartido)
que aquellas que surgen tras una pregunta de una entrevista o un cuestionario; del mismo modo las
respuestas a las preguntas y los comportamientos en el aula podrían estar más próximos a patrones
que se consideran ideales (adecuados). Por ello, es necesario realizar un control de la validez
constante entre las dos perspectivas (los patrones percibidos por los participantes en la investigación
y la perspectiva del investigador interesado en comparar con otros contextos).
La segunda fase, el análisis teórico, comprendió a su vez dos pasos. En primer lugar, la consideración
de los patrones hallados desde las luz que aportan las publicaciones existentes. En segundo lugar
demostrar que nuestros hallazgos están relacionados positiva o negativamente con las aportaciones
de otros.

4 Respuesta a las preguntas de investigación

4.1 ¿Cómo mejora el diseño de la asignatura las motivaciones del alumnado?

La primera pregunta de investigación en realidad es doble; cuestiona el valor y la adecuación del


diseño de la asignatura lo cual incluye tanto la temporalización como los contenidos abordados y la
metodología seguida respecto a las actividades de aprendizaje y de evaluación. Al mismo tiempo,
cuestiona si el desarrollo de la asignatura mejora las motivaciones del alumnado hacia la enseñanza
de las ciencias en educación infantil. Sobre estas cuestiones podemos concluir lo siguiente:
Respecto a la temporalización. El alumnado participante en el estudio destacó que se abordaron
muchos contenidos, algunos de ellos complicados. Como docentes hemos de tomar conciencia de
que la contribución de una única asignatura cuatrimestral de 9 créditos a la formación del futuro
profesorado de educación infantil respecto de las ciencias y su aprendizaje en las primeras etapas es
bastante limitada. El alumnado del caso reclama en múltiples ocasiones que necesita tiempo, que las
actividades se realizan con prisa y sin suficiente reflexión, ponen de manifiesto la sensación de

583
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presión, de ir contrarreloj, especialmente en las actividades prácticas manipulativas o de laboratorio.


Por ese motivo consideramos que una distribución anual, en lugar de cuatrimestral, para los mismos
créditos sería más provechosa. Dada la estructura del plan de estudios nuestra propuesta sería dejar
6 créditos en un cuatrimestre y 3 en otro, de tal manera que se asegurase la continuidad a lo largo
del curso y la asignatura pudiera abordarse antes, durante y después del Practicum. De esta forma se
puede introducir mejor la metodología de trabajo por proyectos y pensamos que pueden obtenerse
aprendizajes más profundos y significativos.
Integración de aprendizajes y actividades realizadas. Se puede afirmar que la metodología
propuesta ha potenciado el trabajo colaborativo y los aprendizajes activos en un grado satisfactorio.
Las actividades llevadas a cabo durante el periodo que aborda el estudio de caso incluyeron trabajo
en grupo, trabajo cooperativo, evaluación y tutoría entre iguales y trabajo por proyectos (PAT), de
manera que se integraron de un modo adecuado el desarrollo de competencias genéricas y
profesionales con el desarrollo de competencias didáctico-disciplinares. Por otro lado, el alumnado
se implicó en su propio proceso de aprendizaje mediante el estudio individual y la discusión con las
compañeras tanto en el aula como fuera de ella durante la realización de los informes de las
prácticas y del PAT. Además cada estudiante realizó un ejercicio de revisión de su proceso personal
respondiendo a los cuestionarios y escalas de valoración de la asignatura. Sin duda esto se logró
gracias a que se planteó un proceso de evaluación continuo y formativo en lugar de final, ligado al
empleo de metodologías activas.
Las estrategias docentes se enfocaron al desarrollo del pensamiento crítico del alumnado, como
ciudadanos y como profesionales de la educación. Las actividades de autoevaluación y evaluación
entre iguales iban dirigidas en este sentido, así como las diferentes actividades prácticas propuestas
en los tres bloques de contenidos, tanto aquellas relacionadas con la comprensión de determinados
contenidos científicos, como las que se centraban en el análisis de experiencias docentes publicadas.
Los procesos de enseñanza-aprendizaje llevados a cabo en el aula y fuera de ella se apoyaron
fundamentalmente en ejercitar la comunicación, la discusión, el diálogo y la negociación lo que
implica el desarrollo de habilidades fundamentales para su futuro profesional como la comunicación
escrita y oral, aunque no se limitan a potenciar estas habilidades.
La generación de un clima de aula agradable y estimulante fue resultado de la posibilidad de
distintos agrupamientos (gran grupo, mediano y pequeño) y la actuación del profesorado ante
cuestiones que causaban tensiones como los horarios de los distintos subgrupos para las diferentes
actividades. La alternancia de actividades manipulativas y las salidas al entorno sirvieron no solo para
motivar, sino también para favorecer relaciones distendidas entre el alumnado. No obstante,
siempre resulta fundamental el propio talante de los miembros de los distintos grupos.
El caso estudiado e informado en esta memoria constata la efectividad de la evaluación formativa,
imbricada con las actividades de enseñanza-aprendizaje frente a una evaluación final meramente
calificadora que no redunda en un mayor y mejor aprendizaje. El alumnado pudo tomar conciencia
de sus dificultades y tuvo ocasión de solventarlas. En concreto la práctica de la autoevaluación y la
evaluación entre iguales resultaron especialmente apropiadas para favorecer la reflexión personal y
la toma de conciencia, no solo del aprendizaje de contenidos propios de la asignatura, sino también
del significado que debe tener la evaluación en educación superior.

4.2 ¿Los materiales elaborados por el profesorado responsable de la asignatura en el grado son
adecuados para la formación del alumnado?

Se elaboraron principalmente dos tipos de materiales: presentaciones como material de apoyo


teórico y fichas para las sesiones de práctica y seminario. Estas últimas incluían ejercicios o tablas

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para la autoevaluación del trabajo realizado y para la evaluación de la propuesta o, en otras palabras,
evaluación del trabajo de la profesora. Además se elaboraron cuestionarios abiertos para la
evaluación específica de conocimientos previos, percepción del aprendizaje y satisfacción con
respecto a la asignatura. Tras el análisis de todo ello puede afirmarse que el conjunto de materiales
fue útil y contribuyó al aprendizaje del alumnado, no solo de conceptos, sino fundamentalmente de
habilidades básicas y profesionales. Sin embargo es importante cuidar el equilibrio entre la búsqueda
de información y la sobrecarga que puede suponer para el alumnado responder a muchos
cuestionarios.

4.3 ¿Se alcanzan los objetivos propuestos en la asignatura?

En referencia a la tercera pregunta de investigación podemos afirmar que sí se consiguieron los


objetivos de la asignatura: 1 Conocer conceptos relacionados con la ciencia y la tecnología:
naturaleza, metodología, historia; 2 Desarrollar actitudes y procedimientos propios del trabajo
científico; 3 Fomentar conductas de respeto y sensibilización hacia el medio ambiente; 4 Comprender
conceptos relacionados con los fundamentos científicos y tecnológicos del currículo; 5 Saber aplicar
los conceptos científicos al contexto de la naturaleza, de la vida diaria y de la tecnología; 6 Analizar
cuestiones relevantes en la enseñanza y aprendizaje de las ciencias; 7 Conocer estrategias de
aprendizaje para esta etapa educativa; 8 Saber diseñar recursos didácticos para la enseñanza-
aprendizaje de las ciencias experimentales en educación infantil y 9 Saber emplear las TIC en el
proceso de enseñanza al alumnado de corta edad . No obstante, no fue uniforme el grado de alcance
de todos ellos, del mismo modo que no fueron igual de eficaces los distintos instrumentos
empleados para la evaluación de los objetivos. Aquellos con mayor grado de alcance fueron los
referidos directamente al desarrollo profesional, de manera lógica puesto que constituían los
aspectos hacia los que el alumnado se sentía más motivado. Aquel que se alcanzó en menor medida,
el 5, fue también al que menos tiempo se dedicó.
Es destacable el hecho de que la valoración de cada uno de los nueve objetivos se realizó mediante al
menos dos instrumentos. Se emplearon las calificaciones obtenidas en los informes de prácticas y en
las preguntas del examen, así como las valoraciones vertidas en los cuestionarios abiertos de final de
curso y en las escalas. Durante el primer curso pudo también hacerse una valoración aproximada del
logro de los objetivos a partir de la revisión de memorias del Practicum I.

4.4 ¿Cómo repercute el trabajo realizado en la asignatura durante el periodo de Practicum?

El primer curso, al menos una parte del alumnado, sí pudo aplicar los aprendizajes desarrollados en
la asignatura durante su primer periodo de prácticas escolares. Sin embargo, la mayor o menor
repercusión de la asignatura durante la estancia en las aulas de educación infantil estuvo mediada
también por las programaciones existentes en los centros y las dinámicas establecidas por las
maestras y maestros tutores. A partir del segundo curso, debido a la modificación del plan de
estudios, la asignatura se cursó después del Practicum I, esta modificación posibilitó múltiples
ocasiones durante el transcurso de la asignatura para el análisis y la re-interpretación de la
experiencia vivida por el alumnado en sus prácticas escolares. En concreto, se pudo constatar que
algunos grupos de estudiantes plantearon su propuesta didáctica –proyecto de aprendizaje tutorado-
a partir de las carencias que varios componentes del equipo habían observado en el aula de
educación infantil donde habían realizado el Practicum. También tuvo lugar una situación singular en
la que una alumna realizaba la asignatura simultáneamente al Practicum II, este hecho le impidió
cursar la asignatura de modo presencial, sin embargo aplicó directamente lo que veía en el aula de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

infantil a la asignatura y viceversa, lo que redundó en un alto grado de aprendizaje y muy buenas
calificaciones en ambas asignaturas.

4.5 Tras cursar la asignatura, ¿el alumnado del grado de Educación Infantil se siente preparado
para realizar un trabajo global que incluya la educación científica?

Puede afirmarse que el alumnado mejoró su compresión de lo que es la ciencia y aumentó su interés
por la alfabetización científica. Cada estudiante constató que la introducción de la ciencia en las aulas
de educación infantil no es imposible o complicadísima, sino que es posible y está a su alcance. Al
mismo tiempo, realizar programaciones de aula que, partiendo el principio de globalización, tuviesen
en cuenta la enseñanza-aprendizaje de las ciencias les resultó motivador, porque además de
acercarles a la labor profesional, favoreció el despliegue de otras capacidades como la creatividad
que habitualmente ni se potencian ni se valoran en el mundo académico. No obstante, parte del
alumnado no se mostró totalmente seguro ante la idea de enfrentarse a la enseñanza de las ciencias
durante esta etapa como puede deducirse de alguna de las metáforas empleadas para describir esa
situación (dibujo de un grano de arena en una playa). El caso estudiado ilustra sobre como en el
desarrollo de las competencias profesionales y en el alcance de los objetivos didácticos propuestos
es fundamental la participación activa del alumnado en tareas auténticas, atractivas y significativas.
Tareas que supongan un reto, que requieran la discusión con compañeros y la búsqueda de
información, que acerquen a la realidad de la práctica profesional, pero sobre todo, que permitan
disfrutar mientras se realizan, porque divierten y porque los resultados resultan satisfactorios,
disuelven los posibles miedos y los sentimientos previos de impotencia o incapacidad.

5 Conclusiones

Investigación educativa

Por el tipo de investigación que se trata cumple una serie de características ético-metodológicas que
permiten caracterizarla como “investigación educativa” (Elliot, 1990) puesto que los fines y
beneficiarios son claramente diferentes de la “investigación sobre la educación”. El profesorado
participante estableció un marco de trabajo colaborativo que redundó en la mejora de su práctica
docente. La existencia de un equipo docente y la confianza establecida permitió la participación de
todos sus miembros para aportar puntos vista, buscar soluciones a problemas encontrados, etc. lo
que a su vez permitió el crecimiento profesional de todos los miembros del equipo a partir del
proceso seguido y de los resultados obtenidos –elaboración de la guía docente, preparación de
materiales, búsquedas bibliográficas, etc.-. No obstante, hubo elementos importantes como la
evaluación llevada a cabo en los distintos campus que no se desarrollaron de un mismo modo y
requerirían una mayor reflexión por parte de las docentes. La limitación más importante del proceso
y de la dinámica establecida consistió en la ruptura del equipo de profesoras por falta de continuidad
de tres de las cuatro componentes.
El acercamiento a la realidad del caso requirió hacer explícitas las opiniones del alumnado, lo que nos
permite afirmar que el alumnado generó procesos de reflexión y comprensión de las experiencias
educativas vividas y de sus prácticas de aprendizaje. Estos procesos fueron posibles
fundamentalmente gracias a las tareas de autoevaluación propuestas como parte de cada práctica;
del trabajo en grupo durante las prácticas y las puestas en común; así como los debates que se
establecieron en el aula en las sesiones teóricas o de gran grupo; también contribuyeron a generar

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procesos de reflexión la elaboración del diario viajero por el grupo-clase y la respuesta a los
cuestionarios de evaluación inicial y final de la asignatura. Además, el alumnado participante en las
entrevistas pudo hacer un ejercicio más profundo de análisis de sus vivencias durante el desarrollo
de la asignatura y del conjunto de asignaturas del grado, lo que le permitió evocar sensaciones,
emociones, reflexiones y aprendizajes en un contexto de diálogo e intercambio con más estudiantes.
Entre las herramientas empleadas para conocer las opiniones y sentimientos del alumnado se
empleó el enunciado de metáforas lo que nos permite confirmar el valor de este instrumento, no
solo para obtener un mayor conocimiento del pensamiento docente, sino como puente entre lo
cognitivo y lo afectivo-emocional de modo que se favorezca el desarrollo del conocimiento didáctico
del contenido específico de didáctica de las ciencias experimentales.

Aportaciones al área didáctica de las ciencias experimentales

La aportación de este trabajo en el ámbito de la formación inicial de maestros se basa en tratarse de


una experiencia real (diseño, implementación y evaluación) y, dado el reducido número de
propuestas formativas disponibles para su consulta, supone la aportación de una propuesta de
utilidad; especialmente para el profesorado novel encargado de la formación inicial de maestras y
maestros de educación infantil, pero también para los formadores experimentados que quieran
renovar sus prácticas formativas.

Aportaciones sobre la implantación de los grados adaptados al EEES

El estudio de caso que aquí se presenta se llevó a cabo durante dos cursos en un momento único e
irrepetible, porque suponía la participación en la formación de la primera y la segunda promoción de
un nuevo grado universitario. De tal forma que permiten por lo tanto un mayor conocimiento de lo
que ha supuesto para la universidad española la adaptación al EEES.

Agradecimientos. A todas las personas implicadas directamente en la investigación, el alumnado y el


profesorado de los dos cursos en los que se realizó la toma de datos y a las maestras y maestros de prácticas
abrieron sus aulas y compartieron su tiempo para hablar del alumnado universitario y mostrarnos con ilusión
sus proyectos de ciencia y descubrimiento del entorno.

Referências

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Trayectorias de aprendizaje de Eraut y su revisión en el contexto


de las empresas de inserción social

María José Chisvert Tarazona1, Fernando Marhuenda-Fluixà1, Alicia Ros-Garrido1, Miriam


Abiétar-López1, Davinia Palomares-Montero1, José Luis Belver2
1
Departamento de Didáctica y Organización Escolar de la Universitat de València.
maria.jose.chisvert@uv.es; fernando.marhuenda@uv.es; alicia.ros@uv.es; miriam.abietar@uv.es;
davinia.palomares@uv.es.
2
Departamento de Ciencias de la Educación, Universidad de Oviedo. belverjose@uniovi.es.

Resumen. Las trayectorias de aprendizaje que propone Eraut en sus investigaciones tienen como referente la
noción de competencia profesional y han permitido definir el marco metodológico de la investigación que se
presenta. La descripción y análisis de los procesos de formación y aprendizaje en el seno de las empresas de
inserción social se materializa a partir de la observación y recogida de las prácticas educativas de
acompañamiento a personas en proceso de inserción. Entre las fortalezas del modelo destaca la introducción
de elementos de análisis competencial en tres ámbitos: técnico, social y personal. Entre las cautelas
metodológicas de este estudio se evidencia la certidumbre de que las trayectorias de aprendizaje de Eraut
fueron diseñadas para colectivos de formación superior. La adaptación de este modelo ha resultado clave
para conocer qué y cómo aprenden colectivos vulnerables en el contexto de las empresas de inserción.
Palabras clave: trayectorias de aprendizaje; competencia profesional; empresas de inserción; colectivos
vulnerables.

Eraut's learning and their revision in the context of work integration companies
Abstract. Learning trajectories are a construct proposed by Eraut in his research in order to overcome the
notion of professional competence and that has allowed us to devise the methodological strategy in the
research we present here. The description and analysis of the training and learning processes in Work
Integration Enterprises is provided upon a process of observation and registration of educational practices of
pedagogical accompaniment to people in their itineraries towards social inclusion. Among the strengths of
the model is the introduction of elements of analyses of competencies in three domains: technical, social and
personal. Among the methodological cautions in our study, Eraut’s learning trajectories were proposed for
people with higher education. Adapting his model to our research context has been a key in order to let us
know what and how vulnerable people learn in Work Integration Enterprises.
Keywords: Learning trajectories; professional competence; work integration enterprises; vulnerable
populations.

1 Introducción

El estudio que se presenta forma parte de un proyecto de investigación más amplio, denominado
“Procesos de formación, acompañamiento, cualificación y desarrollo personal en empresas de
inserción (EI): innovación en la inclusión social desde el empleo” (EDU2013-45919-R, EMPLEA). Esta
parte de la investigación tiene como objetivo principal conocer las prácticas de acompañamiento en el
puesto de trabajo y sus efectos sobre los procesos de desarrollo personal, formativo y profesional de
las y los trabajadores con contratos para la inserción en su tránsito al mercado de trabajo ordinario.
Para el cumplimiento de este objetivo se ha requerido el análisis de la relación pedagógica, se responde
al qué y cómo se enseña y se aprende a lo largo del periodo de contratación. De ahí la relevancia del
carácter longitudinal del estudio. Las EI monitorizan a las PTI desde el momento que entran en la

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empresa hasta la transición a una empresa ordinaria. También han sido analizadas las competencias
profesionales entendidas en toda su amplitud, competencias que incorporan a la mirada instrumental,
más habitual, la revisión de procesos de desarrollo, mejora, integración y humanización (Eraut, 2009;
Eraut & Hirst, 2007; Eraut et al., 2005; Eraut et al., 2004).
La metodología de investigación, de corte cualitativo, ha requerido de un análisis documental, de la
observación y del desarrollo de entrevistas a los agentes y sujetos que participan en los procesos de
enseñanza-aprendizaje. Los resultados de la investigación se han dirigido a proporcionar una
propuesta metodológica que se concreta en instrumentos y protocolos para la mejora de los procesos
de formación y aprendizaje de las personas trabajadoras de inserción (PTI) y su transición al mercado
de trabajo ordinario.
Esta comunicación pone la mirada en el modelo metodológico que fundamenta la investigación. Las
trayectorias de aprendizaje de Eraut y colaboradores (Eraut, 2009; Eraut & Hirsh, 20007; Eraut et al.,
2004, Eraut et al., 2005) nos aproximan al conocimiento personal que los trabajadores y trabajadoras
de inserción aplican a situaciones laborales para poder pensar, interactuar y desempeñar su trabajo.
El modelo de Eraut fue escogido por considerar que permitiría evidenciar el conocimiento tácito
adquirido de forma intencional en el ámbito del trabajo, facilitado por la existencia en las EI de un
propósito educativo. Este modelo también ha permitido obtener evidencias de cómo se enseñan y
aprenden las competencias personales y sociales, ampliamente valoradas en estas organizaciones.
El propósito de esta comunicación es dar a conocer la adaptación del modelo de trayectorias de
aprendizaje de Eraut realizada en esta investigación.
Teniendo como objetivos del presente trabajo: analizar el modelo teórico de Eraut; tener en cuenta
los resultados de investigaciones precedentes del equipo investigador; analizar las características
particulares de las empresas de inserción como contexto de investigación; adaptar el modelo teórico
de Eraut al contexto de las empresas de inserción; justificación de la mejora del instrumento de análisis
y su contextualización en el colectivo de personas vulnerables contratadas por las EI.
Para responder a este propósito y sus objetivos se introduce en el segundo epígrafe el sentido teórico
y la aplicabilidad del modelo de las trayectorias profesionales que proponen Eraut y colaboradores.
En el tercer epígrafe se describen las EI, haciendo mención explícita al perfil de las personas en riesgo
de exclusión social contratadas. En el cuarto epígrafe se describe la metodología de recogida y análisis
de la información y se describe el uso dado a los instrumentos utilizados. Los resultados de la validación
de las plantillas de recogida de información, en el quinto epígrafe, han permitido aproximar el modelo
al nuevo contexto de análisis. Las conclusiones se incluyen en el sexto epígrafe y se han dirigido a
ratificar la idoneidad de la adaptación sugerida al modelo de trayectorias de aprendizaje de Eraut.

2 El modelo de las trayectorias de aprendizaje en Eraut

Siguiendo a Eraut y Hirsh (2007) tanto el conocimiento como el aprendizaje pueden ser examinados
desde dos perspectivas, la individual y la social. Una mirada individual nos permitirá explorar lo que
una persona sabe, lo que puede hacer, qué y cómo aprende y las variaciones relativas a cómo esa
persona interpreta y utiliza lo que aprende. Una perspectiva social permitirá analizar la naturaleza
social de la mayoría de los contextos de aprendizaje, los orígenes sociales de los conocimientos
compartidos, transmitidos o desarrollados por grupos o por organizaciones empresariales, la amplia
gama de prácticas y productos culturales que proporcionan conocimientos y recursos para el
aprendizaje. El modelo de las trayectorias de aprendizaje aúna ambas perspectivas, factores
personales y contextuales que afectan al aprendizaje se analizan en el modelo, así como sus
interacciones.

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Si bien Eraut introduce como eje las trayectorias de aprendizaje individuales, desarrolla a través de su
modelo un análisis competencial en claro contraste con el discurso neoliberal hegemónico de las
competencias (Marhuenda, Bernad y Navas, 2010). Algunas de sus características más relevantes nos
permiten sostener esta afirmación:
- Las personas tienen valor en sí mismas y no como fuerza de trabajo, son el núcleo de la
investigación. Se definen por su sentido de transformación, de mejora, de humanización, de
emancipación. En esta línea definía Lundgren (1984) su presencia en el trabajo como un
constante hacer entre el deseo y la realidad.
- La dimensión colectiva de la competencia prima sobre su posesión individual (Boreman, 2004;
Eraut 2004).
- La práctica permite aprender no sólo competencias técnicas, sino también interpersonales,
cognitivas y de aprendizaje (Eraut et al., 1998).
- Los procesos de enseñanza-aprendizaje en el entorno de la empresa dotan de la oportunidad
de comprender el funcionamiento de contextos, organizaciones y personas.
En relación al contenido de los aprendizajes, qué se enseña, las trayectorias de aprendizaje de Eraut
permiten la descripción y análisis de muchas áreas de influencia y aprendizaje más allá de las
competencias técnicas específicas. Aunque son las tareas lo que se observa, el análisis se dirige a los
aprendizajes de la ocupación en su conjunto. Cuestión que se adapta bien a las EI, ampliamente
preocupadas por mejorar procesos sociales, humanos, por generar autonomía, y no sólo por garantizar
el aprendizaje de competencias técnicas.
Otra variable destacada de esta aproximación académica a los procesos de aprendizaje en el puesto
de trabajo es la diferencia que establece en los procesos de aprendizaje en atención a la intención
principal de producir o de aprender, reconociendo que en todos ellos puede haber aprendizaje.
Algunos elementos habían sido revisados del modelo de Eraut para la adaptación al estudio de las
trayectorias de PTI (Marhuenda & Bonavia, 2011; Marhuenda & Navas, 2013; FAEDEI & AERESS, 2014),
si bien se trata de cuestiones que durante el proyecto de investigación han requerido seguir siendo
mejoradas:
- Eraut alude a profesiones de alta cualificación en sus investigaciones, pero en el contexto de
esta investigación son ocupaciones de baja o muy bajo nivel de cualificación las que aproximan
a una trayectoria de aprendizaje.
- La noción de la empleabilidad en las EI, en detrimento de la inserción laboral, se relaciona con
potenciar los procesos de inclusión social (Córdoba, Llinares & Zacarés, 2013) y se adapta a
determinadas trayectorias de aprendizaje de Eraut, aquellas que integran las dimensiones
técnica, social, personal y contextual.
- Un elemento que Eraut no aborda en su modelo es la evaluación, elemento curricular que sí
que se incorpora en este proyecto de investigación.
- En línea con el modelo de las trayectorias de aprendizaje de Eraut preocupan los aprendizajes
positivos, si bien en este estudio se pretende también abordar problemas de aprendizaje.
Esta adaptación requiere del conocimiento del contexto en el que se lleva a término, las EI, descritas
en el siguiente epígrafe.

3 Las empresas de inserción como contexto de análisis

La misión de una EI es promover procesos formativos intencionales de carácter formal e informal en


personas con problemas de exclusión social. Estas organizaciones del tercer sector acompañan a las
personas trabajadoras de inserción (PTI) en el aprendizaje de un oficio y facilitan su incorporación al

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mercado laboral normalizado (Marhuenda, Bernad & Navas, 2010). Finalidad que consta en los propios
estatutos al ser condición necesaria para poder ser calificada como EI.
Cuatro perfiles profesionales encontramos sistemáticamente en las EI: gerencia, producción,
acompañamiento e inserción (FAEDEI & AERESS, 2014). Esta investigación, especialmente preocupada
por las relaciones pedagógicas, ha dirigido una mirada atenta hacia los procesos de producción y
acompañamiento. El personal técnico de acompañamiento es el que coordina, tutoriza y evalúa el
proceso formativo de las PTI. El personal técnico de producción es el encargado de formar
profesionalmente a las PTI, pero también es clave en el acompañamiento porque su supervisión es
directa y continuada en el puesto de trabajo.
Las PTI provienen de trayectorias desestructuradas y han superado múltiples problemáticas en el
pasado. Son personas desempleadas inscritas en los servicios de empleo de la provincia y su condición
de exclusión social la acreditan los Servicios Sociales, generales o especializados, de las
Administraciones Públicas. Estas circunstancias son las que les permiten acogerse a una relación
laboral con las EI que les da la oportunidad de disponer de un salario digno y de normalizar su relación
con el entorno socio-profesional.
La PTI tiene un contrato laboral en una EI con una duración regulada de entre seis meses y tres años.
Su itinerario formativo en estas empresas se protocoliza en tres fases desde su entrada en la EI: (1)
acogida y diagnóstico inicial; (2) desempeño laboral y mejora de la empleabilidad; y (3) transición al
mercado laboral ordinario. En los primeros meses de contratación se prima un contexto de enseñanza-
aprendizaje alimentado por el personal de producción y de acompañamiento. Según avanza el periodo
de contratación la PTI transita hacia un contexto de mayor autonomía, de mayor similitud con un
entorno de trabajo ordinario. Durante los últimos meses de contrato se procura que la PTI inicie la
búsqueda activa de un puesto de trabajo en empresas del mercado laboral ordinario. Finalizada la
relación contractual con la EI, se mantiene desde ésta el seguimiento y apoyo durante un máximo de
6 meses. Todo el proceso forma parte del itinerario de formación consistente en un plan de trabajo
individualizado que se revisa durante su estancia en la empresa. La condición temporal de esta
contratación se sostiene en el potencial transformador de un itinerario que secuencializa enseñanzas
y aprendizajes. De obviarse esta secuencia en beneficio de la producción, se podría cuestionar la
finalidad misma de estas empresas.
La existencia de las EI depende de su productividad, aunque tienen bonificaciones en la Seguridad
Social por la contratación de estos colectivos. Son empresas reguladas por la Ley 44/2007 y por la Ley
5/2011 de Economía Social. Parten de una doble finalidad que en ocasiones resulta paradójica: ser
productivas y proporcionar una formación que mejore la empleabilidad de personas con circunstancias
desfavorables o en desventaja laboral y social.
Las EI adoptan como marco operativo los procesos de transición al mercado de trabajo y dedican un
importante esfuerzo a elaborar itinerarios transicionales individualizados.

4 Metodología

La investigación que se presenta ha centrado el trabajo de campo en la recogida de datos sobre los
aprendizajes informales y en su relación con los procesos de capacitación y/o acompañamiento que
tienen lugar en las EI.
El foco, situado en el marco teórico e interpretativo de Eraut y colaboradores, busca obtener respuesta
a las preguntas relativas a qué y cómo se aprende.
Las trayectorias, actividades y factores de aprendizaje de Eraut que responden a la pregunta qué se
aprende escogidas en esta investigación se han categorizado a partir del desempeño de la tarea, la
conciencia y comprensión, el desarrollo personal, el conocimiento y destrezas académicas, el

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desempeño del rol y el trabajo en equipo. Así, se desglosaron a través de una plantilla de observación
que categoriza los ámbitos de observación y descripción:
- Qué se hace y a instancias de quién o fruto de qué interacciones: tipos de desempeño que se
observan y describen.
- Propósitos y método de las tareas que lleva a cabo el personal técnico de producción y
acompañamiento relativas al aprendizaje y la producción, especialmente las orientadas a
enseñar.
- Escala temporal que busca discernir la atención dedicada a cada tarea, en especial a las de
aprendizaje.
La respuesta a la pregunta cómo se aprende está en los procesos de capacitación y acompañamiento,
lo que Eraut denomina 'factores que afectan al aprendizaje en el puesto de trabajo'. Bajo ese marco
teórico e interpretativo, el material recogido incluye respuestas a cómo se enseña o instruye, tipos de
relación que se observan y describen en cada una de las fases y decisiones organizativas orientadas al
aprendizaje. Las categorías utilizadas y que responden a este modelo son: (1) procesos de trabajo en
los que el aprendizaje es un efecto colateral; (2) actividades de aprendizaje que tienen lugar en
procesos de trabajo y/o de aprendizaje; y (3) procesos de aprendizaje reconocidos como tales que
suceden en el puesto de trabajo.
Se han planificado tres visitas a cada empresa. En cada visita se realiza la observación de una jornada
de trabajo completa de cada PTI observado. A la finalización de la jornada de trabajo es entrevistada,
así como el personal de producción y acompañamiento más vinculado a su itinerario profesional. La
intención inicial era observar el desempeño profesional de cuatro PTI en cada EI en momentos distintos
del proceso de inserción, si bien no siempre ha sido posible. La participación en la investigación es
voluntaria, cada sujeto de investigación ha dado previamente su consentimiento para la obtención de
sus datos, tanto en la observación y la entrevista como en relación a disponer de su expediente
personal, elaborado y custodiado por la EI.
Hasta el momento se han analizado realizado análisis de primeras visitas en un total de doce empresas,
distribuidas en ocho comunidades autónomas del estado español. Están en proceso de recogida y
análisis de datos veintiocho PTI pertenecientes a estas empresas.
Para facilitar el acceso a esta información se utilizaron dos técnicas de recogida de datos: la
observación participante y las entrevistas.

4.1 Instrumentos de recogida de información

Desde el equipo de investigación se consideró relevante la recogida de narrativas detalladas que


resultaran fiables. Para elaborar ese documento se contó con los siguientes instrumentos: (1) plantilla
de observación de qué se aprende; (2) plantilla de observación de cómo se aprende; y (3) guiones de
entrevista adaptados a cada tipo de agente: personal de acompañamiento, de producción y de
inserción.
La narrativa permite explicar las condiciones de la visita a las EI y los datos más relevantes para situarla.
Se nutre también de las plantillas de vaciado de información (qué y cómo se aprende) que incorporan
los elementos de la observación y de las entrevistas. Esa narrativa la prepara la persona investigadora
que ha realizado la visita, pero es revisada por una segunda persona del equipo, lo que lleva a quien la
ha redactado a mejorar la información presentada.

Observación

Los sujetos de la observación son las PTI en su puesto de trabajo. Clarificar esta cuestión es relevante,
el equipo investigador era consciente de que esta observación no prioriza el conocimiento de la
organización o la gestión de los recursos humanos.

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El material de la observación busca proporcionar información suficiente para analizar interacciones


significativas entre la PTI y el personal de acompañamiento y producción. Los elementos a observar se
refieren a la carga de trabajo, los conocimientos y destrezas requeridas para el desempeño y las
actividades o interacciones específicas de enseñanza y/o aprendizaje.
Para la preparación de la visita se requiere una consulta previa de documentos donde obtener
información sobre el trabajo que vamos a observar y sus procesos. Se trata de informarse sobre el
contenido competencial de cualificaciones del Catálogo Nacional de las Cualificaciones Profesionales
próximas a las ocupaciones a observar, de revisar el convenio colectivo de aplicación en la EI y/o
consultar las definiciones de los puestos de trabajo de la propia empresa objeto de investigación.
La observación se realiza durante una jornada completa y al tratarse de un estudio longitudinal se lleva
a cabo en tres ocasiones a lo largo de todo el proyecto. El tiempo estimado entre visitas se sitúa en la
franja entre los 9 y 12 meses.
Las pautas a seguir por la persona investigadora durante la observación eran:
- Acercarnos a una PTI y no interferir en su tarea ni estar directamente en su ángulo de visión.
- Tomar nota de interacciones que se producen con otros colegas, con personal de
acompañamiento y de producción, con superiores, con la maquinaria.
- Aprovechar los tiempos de descanso para aclarar situaciones y sacar asuntos que nos han
generado dudas de comprensión sobre procesos en la conversación.
La observación, focalizada en las áreas y factores categorizados en las trayectorias de aprendizaje,
recoge información sobre el desempeño relativo a los siguientes elementos (Eraut & Hirsh, 2007):
- Entorno, contexto. Preocupa la recogida de información sobre condiciones, modos de
cognición en atención al tiempo consumido, antecedentes e indicadores de variaciones en el
conocimiento experto.
- Las áreas de aprendizaje. Aquellas que en la investigación se observan en mayor profundidad
por tratarse de entornos de baja cualificación son: desarrollo de las tareas, desarrollo personal,
trabajar con otros y desempeño del rol.
- Las tareas rutinarias, rutinas matizadas por decisiones rápidas, acciones planificadas con la
inclusión de revisiones del progreso. A través de su observación se accede al carácter tácito
del conocimiento, que tiene que ver con la comprensión de la situación, la toma de decisiones
intuitiva y los procedimientos rutinarios.
- Las situaciones en que la PTI debe realizar una evaluación de la situación: reconocimiento de
patrones, interpretación rápida, comunicación en el puesto de trabajo, diagnóstico, revisión,
discusión y análisis.
- Las situaciones en que la PTI gestiona el conocimiento y/o lo comparte.
- Personas de apoyo, referentes, equipos de trabajo.
- Los tipos de aprendizaje: tareas de aprendizaje explícitas y procesos de trabajo con el
aprendizaje como efecto colateral. Frecuencia y calidad de las tareas de ambas categorías.

Entrevista semiestructurada

Tras la observación, es relevante ordenar nuestras notas y preparar la entrevista para hacerla concreta
y referida a asuntos observados que no han quedado claros para quién realiza la observación. La
entrevista es entendida como un discurso descriptivo, no como un discurso de justificación. Se destina
a la discusión sobre lo observado por la persona investigadora durante la jornada de trabajo. Es
semiestructurada, se dispone de una guía o modelo para cada fase del itinerario formativo con objeto
de aproximar las preguntas al proceso de enseñanza-aprendizaje en atención al criterio temporal.
También se incluye un guión de entrevista diferente para cada figura que participa en la relación
pedagógica: personal de inserción, de acompañamiento y de producción.

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El objetivo de la entrevista es permitirnos establecer inferencias correctas sobre el conocimiento que


se aplica en cada situación y sobre lo que es necesario saber para acceder a ese conocimiento,
reconocerlo y emplearlo. El uso de ejemplos dotará de veracidad y autenticidad a la entrevista.
La entrevista en fase de acogida incluye preguntas sobre el entorno de la PTI, sus transiciones entre
educación (formal, no formal e informal) y empleo. Es importante indagar en esta fase sobre el proceso
de selección, la acogida que tuvo en la empresa, la preparación inicial para el desempeño. También
conocer en qué situaciones tenía conciencia de estar aprendiendo la PTI, sus expectativas dentro de la
EI y a la finalización de su relación contractual.
La entrevista a personas que ya han iniciado su desarrollo laboral ha permitido repasar temas
abordados en la primera entrevista, así como indagar sobre tareas novedosas que han tenido que
desarrollar. Es importante reparar sobre qué tareas consideran que dominan y cuáles son todavía un
reto. Se les solicita que reflexionen sobre lo que han aprendido a lo largo de este periodo para
desenvolverse en su puesto. Conocer si toma nota de la descripción de tareas que no domina con
objeto de recurrir a sus apuntes de ser necesario. Describir la frecuencia y contenido de las reuniones
mantenidas con la persona de acompañamiento (información que puede ser cotejada con la
documentación relativa a su expediente, itinerario y evaluaciones, en caso de haber accedido el equipo
investigador a estos documentos). Se comprueba también si ha habido periodos de estancamiento, de
falta de aprendizaje, de instalación en la rutina.
Y en la última fase, iniciada la transición al mercado laboral, las entrevistas buscan cubrir su historia de
aprendizaje, conocer en qué ámbitos se siente la PTI más capaz y competente y en cuáles ve que
necesita seguir buscando apoyos. Averiguar los hitos en términos de aprendizaje, los saberes más
importantes, aquellos que recupera en sus entrevistas de selección en empresas ordinarias.
En las entrevistas de segunda y tercera fase se recomienda el uso de tarjetas en las que se muestran
los aprendizajes de fases previas, con la intención de constatar avances.
El contenido de las entrevistas se volcaba en las plantillas de observación relativas a qué y cómo se
aprende, razón por la que la transcripción no se considero precisa.
Para sistematizar el análisis de los datos se ha utilizado el programa Atlas.ti en su versión 1.0.43 para
Mac. En este proceso, se creó un proyecto que recogía todas las plantillas de observación ya revisadas
por, al menos, dos miembros del equipo de investigación. Los documentos se organizaron por familias
profesionales, considerando la posible afinidad de las trayectorias en los mismos ámbitos laborales.
Las citas seleccionadas para el análisis corresponden a los textos incluidos en cada una de las rejillas
de observación, mientras que los códigos utilizados remiten a las categorías de cada una de las
trayectorias adaptadas del modelo de Eraut.

5 Resultados: la adaptación del modelo

Eraut desarrolla su modelo de trayectorias de aprendizaje en las áreas de la salud, la enseñanza, la


ingeniería, la contabilidad y el trabajo social, entre otras. El perfil de los sujetos de análisis es de
Educación Superior, y se sitúa en los inicios de sus carreras profesionales. La aplicabilidad de este
modelo en un contexto de trabajo dirigido a personas de escasa cualificación y en riesgo de exclusión
social ha requerido de adaptaciones.
En esta investigación se han analizado especialmente aquellas áreas en las que las PTI necesitan más
mejoras y acompañamiento en una situación de trabajo: el desarrollo social y personal. Las plantillas
de registro, documentos clave en el análisis de las trayectorias de aprendizaje de Eraut, sufren una
evolución profunda a lo largo de la investigación con objeto de adaptarse a la nueva realidad, la
adaptación es fruto de una revisión del equipo de investigación tras su cumplimentación en la primera
visita a las EI.

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Las plantillas de registro incluyen una parte inicial en la que se recogen datos generales: fecha y hora
de la visita, lugar de la visita y descripción, información relativa a quiénes están trabajando en ese
lugar, incidencias en la observación, ficha de realización de la entrevista e información detallada de las
PTI observadas y de las empresas.
En la Tabla 1 se evidencian las adaptaciones realizadas en la plantilla de observación Qué se aprende
en las EI. Mayoritariamente son adaptaciones que justifican la eliminación de elementos de análisis
por resultar redundantes o por no tener sentido en el contexto de ocupaciones de baja cualificación.
Si bien en algunos casos se valora la idoneidad de dejar elementos que quizás no tengan efecto en EI
con objeto de evidenciar esta circunstancia que podría ser revertida en un futuro.

Tabla 1. Adaptaciones en la plantilla de observación Qué se aprende en las EI

Categorías Elementos de análisis Adaptaciones realizadas


Desempeño en la tarea Velocidad y ritmo; complejidad de las tareas y
los problemas; aprenden una amplia variedad
de las habilidades requeridas para mejorar la
empleabilidad; comunicación relativa a la
tarea.
Conciencia y De otras personas; del contexto y la situación; Se eliminan los elementos: de la propia
comprensión de la propia organización; de problemas y organización (se incluye en situación y
riesgos; de prioridades y asuntos estratégicos; contexto).
de los valores de la organización.
Desarrollo personal Autoevaluación; autodirección; manejo de Pasa a ser la primera categoría. En los
emociones; habilidades sociales; disposición a elementos de análisis el infinitivo pasa a
atender otras perspectivas; disposición a ser gerundio. Se eliminan los elementos:
consultar y trabajar con otros/as; disposición a obtención de habilidades y conocimientos
aprender y mejorar de la propia práctica; relevantes. Se unen los elementos: (1)
obtención de habilidades y conocimientos disposición a aprender y mejorar de la
relevantes; capacidad para aprender de la propia práctica y (2) capacidad para
experiencia. aprender de la experiencia.
Trabajo con otros/as Trabajo colaborativo; facilitando relaciones En los elementos de análisis el infinitivo
sociales; resolviendo problemas y planificando pasa a ser gerundio. Se elimina el
juntos/as; capacidad para comprometerse y elemento trabajo colaborativo.
promover el aprendizaje mutuo.
Desempeño en el rol Priorización; alcance de la responsabilidad; Se transforma el elemento de priorización
apoyo del aprendizaje de otras personas; para clarificar su contenido: Aprende a
liderazgo; rendición de cuentas; rol de planificar su trabajo y a priorizar
supervisión; delegación; manejo de aspectos actividades, tareas. Se eliminan los
éticos; afrontamiento de problemas elementos: rol de supervisión; manejo de
inesperados; gestión de crisis; estar al día. aspectos éticos; afrontamiento de
problemas inesperados; gestión de crisis;
estar al día.

En la tabla 2 se introducen las adaptaciones realizadas en la plantilla de observación Cómo tiene lugar
el aprendizaje en las EI. Es quizás en los procesos de aprendizaje intencional dónde en mayor medida
se han eliminado elementos de análisis por no tener sentido en los procesos de enseñanza-aprendizaje
en las EI. Se valoró antes de su eliminación si, a pesar de no estar presentes, merecería la pena su
inclusión en un futuro, en cuyo caso se mantenían.

Tabla 2. Adaptaciones en la plantilla de observación Cómo tiene lugar el aprendizaje en las EI.

Categorías Elementos de análisis Adaptaciones realizadas


Procesos de Trabajar en equipo; consultar; asumir En los elementos de análisis el
trabajo con tareas y roles que suponen un desafío; infinitivo pasa a ser gerundio.

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aprendizaje como contribuir a solucionar problemas;


efecto colateral participar en experimentación o
innovaciones; consolidar, ampliar y
mejorar las destrezas; trabajar con
clientes.
Actividades de Preguntar y obtener información; En los elementos de análisis el
aprendizaje identificar a las personas con recursos; infinitivo pasa a ser gerundio. Se
incorporadas a escuchar y observar; reflexionar sobre lo amplía el primer elemento:
otros procesos acontecido; recapitular los errores para Escuchando y observando.
aprender de ellos; dar y recibir feedback, Preguntando y obteniendo
emplear herramientas para el información. Se eliminan los
aprendizaje. elementos: escuchar y observar. Se
unifican los elementos: (1)
reflexionar sobre lo acontecido; y (2)
recapitular los errores para aprender
de ellos.
Procesos de Estar bajo supervisión; tener un coach o En los elementos de análisis el
aprendizaje tutor; seguir a alguien en el desempeño infinitivo pasa a ser gerundio. Se
intencional de su trabajo; observar puestos de unifican los elementos: (1) Estar bajo
trabajo distintos al propio; participar en supervisión; y (2) tener un coach o
cursos o actividades de formación; tutor. Se eliminan los elementos:
participar en una master-class, participar en una master-class;
prepararse para presentarse a la estudiar. Se incluye un nuevo
acreditación de competencias; estudiar. elemento: gestionando su proceso
en la EI.

Las adaptaciones desarrolladas han dotado a las plantillas de observación de mayor agilidad en su
cumplimentación, además de evitar redundancias.

6 Conclusiones

Se ha optado por una investigación longitudinal, que a lo largo de cuatro años permitirá conocer las
relaciones pedagógicas en las EI. La preocupación que ha inspirado este modelo era reconocer qué
procesos de enseñanza-aprendizaje en el trabajo permiten avanzar y retroceder respecto a la inclusión.
La complejidad del trabajo de campo está dando sus frutos con resultados de interés para las EI,
representando un avance en las investigaciones relativas a la formación en el trabajo dirigidas a
colectivos vulnerables.
La revisión del modelo de trayectorias de aprendizaje propuesto por Eraut ha permitido una
reformulación satisfactoria. La combinación de documentación, observación y entrevistas permite la
investigación longitudinal y transversal. Se dispone en la actualidad de una gran cantidad de
información cualitativa de gran interés para analizar las relaciones pedagógicas establecidas.
Se ha llevado a cabo un sistema adecuado de codificación, manejo de datos, filtrado y análisis. El
modelo revisado es suficientemente flexible como para cubrir diferentes ocupaciones y temas
relevantes en términos de desarrollo de habilidades sociales y personales.
Se considera clave para participar en una investigación longitudinal el establecimiento de relaciones
de confianza con las empresas, así como la producción de informes durante la investigación que
pueden ser fructíferos para ellas con el fin de mejorar su trabajo.

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Referências

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Entrevista narrativa mediada no estudo do desenvolvimento


humano

Juliana Eugênia Caixeta1


Fabrícia Teixeira Borges2
1
Faculdade UnB Planaltina, Universidade de Brasília, Planaltina, Brasil, eugenia45@hotmail.com
2
Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento, Instituto de Psicologia, Universidade de
Brasília, Brasil, fabricia.borges@gmail.com

Resumo. O objetivo deste artigo é definir e caracterizar a entrevista narrativa mediada a partir das
experiências de pesquisas em desenvolvimento humano, realizadas pelo grupo de pesquisa em Pensamento
e Cultura, da Universidade de Brasília. Para tanto, foram analisados doze textos: quatro dissertações de
mestrado, cinco teses de doutorado e três artigos. A entrevista narrativa mediada é uma técnica de pesquisa
que favorece o estudo de fenômenos em desenvolvimento humano por permitir o aprofundamento das
narrativas, com a inclusão de novos personagens e relações entre eles; além de vozes e posicionamentos
específicos, gerados pelo contexto de interação do/a participante com o artefato mediador.
Palavras-chave: entrevista narrativa mediada; entrevista narrativa; psicologia do desenvolvimento.

The narrative interview mediated in the research in human development


Abstract. The purpose of this article is to define and characterize the narrative interview mediated from the
experiences of research in human development, carried out by the research group in Thought and Culture,
University of Brasilia. For that, twelve texts: four master's dissertations, five doctoral theses and three articles
were analyzed. The mediated narrative interview is a research technique that favors the study of phenomena
in human development by allowing the deepening of the narratives, with the inclusion of new characters and
relationships among them; In addition to specific voices and positions, generated by the interaction context
of the participant with the mediator artifact.
Keywords: mediated narrative interview; Narrative interview; Psychology of development.

1. Introdução
O objetivo deste artigo é definir e caracterizar a entrevista narrativa mediada a partir das experiências
de pesquisas sobre desenvolvimento humano realizadas pelo grupo de Pesquisa em Pensamento e
Cultura - GPPCULT, vinculado à Universidade de Brasília, Brasil.
Nosso grupo se interessa por estudar os fenômenos mentais socialmente construídos, especialmente,
os significados que as pessoas constroem sobre si e sobre o seu cotidiano em entrevistas narrativas.
Para tanto, nos últimos 15 anos de pesquisas sobre identidade, memória, inclusão, desenvolvimento
adulto, adolescente e infantil, nosso grupo tem desenvolvido um conjunto de estratégias
metodológicas que privilegiam o uso associado de diferentes tipos de entrevistas narrativas, dentre as
quais a entrevista narrativa mediada. Caracterizamos a entrevista mediada, como sendo uma
entrevista de caráter livre ou semi-estruturada em que a interação entre participante e entrevistado/a
está mediada por objetos, fotografias, filmes, vídeos, entre outros elementos, inclusive, por trechos
de outras entrevistas já feitas. Entendemos que toda relação com o mundo é mediada simbolicamente
(Vigotski, 2001), no entanto, a especificidade desta entrevista é o uso de um artefato que não é apenas
a linguagem, mas de um produto cultural, que orienta a entrevista em seus objetivos.

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2 A entrevista narrativa na pesquisa qualitativa sobre o desenvolvimento humano

Na abordagem qualitativa de pesquisa em desenvolvimento humano, a produção do conhecimento se


estabelece numa relação dialógica entre o/a pesquisador/a e o/a participante, onde, na interação,
eles/as produzem sentidos, que podem ser definidos como a compreensão que esses/as
interlocutores/as negociam durante o ato da fala, na semiosfera. A semiosfera é o espaço de
significação que compõe a cultura onde os/as interlocutores/as estão e que é compartilhado por
ambos, no caso do diálogo, ou por todos numa conversação mais ampla (Lotman, 1990). Assim, a
semiosfera é um espaço gerador de informações, inclusive, no sentido de apontar o que é adequado
ou não para aquela cultura (Barbato-Bloch, 1997). Portanto, é neste espaço de possíveis negociações
que as compreensões do que eu sei e do que eu penso e de como eu me posiciono em relação a você
é construído (Harré & Van Langenhove, 2003).
Na psicologia do desenvolvimento, as informações de pesquisa são resultados de construções sociais,
que expressam as transformações de processos psicológicos, em contínua criação. Portanto, a
metodologia de pesquisa precisa primar por descrever os processos de desenvolvimento que estão
acontecendo no momento da interação e não apenas o produto deste desenvolvimento (Valsiner,
1994; Mey, 2000).
Devido a esta especificidade interativa das informações construídas em pesquisas sobre o
desenvolvimento humano, desde meados do século XX, as técnicas de pesquisa que envolvem as
narrativas tem sido priorizadas. Diários, cartas e histórias orais (Mey, 2000) são técnicas de pesquisa
importantes, porque valorizam a reflexão no sentido apresentado por Crawford & Valsiner (2002), ou
seja, como um "processo psicológico de análise e avaliação que envolve trabalhar a experiência e
impressões, relacionando o self ao mundo social" (p.113). Por meio dos relatos, temos a oportunidade
de ter acesso aos significados preponderantes que a pessoa constrói sobre si no ato interativo e,
também, às dinâmicas que os produzem ao longo de sua história.
Dentre as diferentes técnicas para a construção de informações em pesquisa qualitativa sobre o
desenvolvimento humano, destacamos, neste texto, as histórias de vida, relatos de vida ou narrativas
autobiográficas, em um plano, e a entrevista narrativa mediada, em outro.

2.1. As histórias de vida e a pesquisa qualitativa

As histórias de vida se constituem uma técnica de pesquisa que é histórica, dinâmica e dialética, na
qual as informações são construídas por meio da relação de comunicação entre entrevistador/a-
entrevistado/a. A investigação social tem apresentado três variações principais da técnica de história
de vida, conforme apresentadas por Brioschi & Trigo (1987), a saber:
a) primeira variação: trata-se da entrevista totalmente aberta, na qual a pessoa entrevistada é
solicitada a dizer sua vida, através do comando: "fale de sua vida", havendo o mínimo de interferência
possível pelo/a entrevistador/a. A análise da narração se atém ao dito pela pessoa, considerando a
forma e o conteúdo como ela disse, suas categorias e ordem cronológica apresentada;
b) segunda variação: parece com a primeira exceto que se faz uma delimitação, ou seja, pede-se à
pessoa que narre sua história sobre um aspecto específico da vida, que pode ser o trabalho, a família,
o estudo, enfim, depende do objeto que se quer investigar. Um comando para esta variação seria: "fale
sobre o seu trabalho". A análise é idêntica à anterior;
c) terceira variação: neste caso, há um misto entre um relato mais livre e um mais diretivo porque se
pretende obter o testemunho, o relato da pessoa sobre sua vivência em alguma instituição. Assim, o
relato de suas vivências é livre, porém ele deve estar ligado a dados sobre as entidades. Esta técnica é
um misto de história oral com relato de vida. Um exemplo seria: "fale de suas vivências no sindicato
X".

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Todas as variações são válidas, sendo que o objetivo da pesquisa guiará a escolha de um ou vários
deles, a depender do delineamento da pesquisa. O uso de diferentes estratégias de construção de
informações na pesquisa qualitativa é valorizado porque possibilita a triangulação de informações,
técnicas e delineamentos (Flick, 2009) e, na pesquisa em desenvolvimento, esta valorização se dá pela
oportunidade que a pessoa entrevistada pode ter de se colocar em diferentes posicionamentos no
contexto da entrevista. Dessa maneira, por exemplo, em uma entrevista narrativa aberta, a pessoa
pode narrar sobre como brincava de ser professora na infância e, num segundo tipo de entrevista,
mais diretiva, ela pode narrar como compreende, atualmente, como se sente e atua como professora
(Gois, 2017).

3 A pesquisa bibliográfica

A pesquisa bibliográfica foi realizada a partir da seleção de quatro dissertações de mestrado: Caixeta
(2001), Forcione (2013), Silva (2017) e Gois (2017); cinco teses de doutorado: Borges (2006), Caixeta
(2006), França (2007), Carlucci (2008) e Sousa (2011) e três artigos Caixeta & Barbato (2001) e Alves,
Oliveira & Caixeta (2016), Borges (2012) de pesquisadoras e de pesquisadores participantes do Grupo
de Pesquisa em Pensamento e Cultura, que utilizaram e desenvolveram a técnica da entrevista
narrativa mediada.
Para a análise, considerou-se o uso das entrevistas narrativas mediadas por artefatos utilizadas nos
trabalhos acadêmicos listados.

4 Da entrevista Narrativa à Entrevista Narrativa Mediada

A partir do estudo e utilização da entrevista narrativa no início dos anos 2000, nosso Grupo de Pesquisa
em Pensamento e Cultura – GPCULT desenvolveu a entrevista narrativa mediada como uma técnica
de pesquisa que fomenta a narrativa do/a entrevistado/a a partir da interação dele/a com um artefato
mediador.
Inicialmente, nosso grupo fez a utilização do artefato mediador como um procedimento de pesquisa.
Por exemplo, na pesquisa de Caixeta (2001), sobre a identidade feminina, as mulheres participantes
foram convidadas a tirarem 3 fotografias sobre o que elas achavam sobre o ser mulher. A partir dessas
fotografias, elas eram convidadas a narrar os motivos que as levaram a tirar aquelas fotografias e quais
significados estavam concretizados naquelas imagens (Ver Caixeta, & Barbato, 2004). Neste método,
a situação problema: fotografe 3 situações/objetos sobre ser mulher apresentava um produto: a
fotografia, que era, novamente, utilizada para fomentar um outro procedimento: falar sobre as
fotografias.
Na geração de doutorandos de 2002-2006, o grupo estudou os delineamentos anteriores das pesquisas
feitas e, a partir do estudo de novos fenômenos, como: o olhar (Borges, 2006), a memória (Caixeta,
2006) e a identidade (França, 2007), percebeu que seria produtivo para a pesquisa em
desenvolvimento humano utilizar diferentes tipos de entrevistas narrativas, inclusive, entrevistas
narrativas que previssem a utilização de artefatos mediadores para a sua realização. O objetivo do
grupo, com a utilização dos artefatos mediadores, era e é construir contextos de interação que
possibilitem o/a entrevistado/a se posicionar de maneira específica no ato da conversação. Para tanto,
os procedimentos delineados para as pesquisas tanto poderiam incluir a solicitação para os/as
participantes escolherem e levarem os artefatos para o momento da entrevista (Caixeta, 2006; França,
2007), como eles poderiam ser escolhidos pelos/as pesquisadores/as responsáveis pela pesquisa
(Borges, 2006).

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Do ponto de vista das narrativas, o grupo percebeu que o uso de artefatos nas entrevistas narrativas
em pesquisas sobre o desenvolvimento humano permitem aprofundamentos da narrativa, que podem
ser sucessivos, a depender do delineamento dos procedimentos, de forma que o/a pesquisador/a, na
interação com o/a participante e, na análise das informações construídas, pode identificar os pontos
de mudança do processo de desenvolvimento, exemplo: casamento, nascimento e morte de filhos
(Caixeta, 2006; Gois, 2017) ou assinatura de contrato de trabalho (Góis, 2017), ou ainda, engajamento
em atuação religiosa (Silva, 2017). Tais aprofundamentos da narrativa são possíveis porque provocam
o/a entrevistado/a a pensar sobre si e sobre o seu cotidiano, em tempos passado, presente e futuro,
por meio de artefatos que vão além do próprio artefato. Assim, por exemplo, uma entrevistada,
guardiã da memória, na pesquisa de Caixeta (2006), escolheu uma roupa de batizado para mostrar e
para conversar sobre a peça. Nesse encontro, ela se lembrou de como os filhos estranhavam o fato de
terem sido batizados com roupas que lembram roupas de mulhres:
“Olga: Quando eu mostro pra eles, eles diz assim: - Mas mãe a gente batizava... a gente vestia era essas
roupinha de mulher? Eu falei: - É! Porque antigamente era tudo... a, os menino é...a parte era azul né?! As
menina, rosa. Mas era tudo igual. É, é, camisolinha, é! Era tudo assim. Hoje em dia não, cada... a... também
hoje em dia é, é assim. Cada um veste um macacãozinho, quando é menina veste rosa né?! (risos)” (Caixeta,
2006, p. 158).
Em síntese, o aprofundamento das narrativas diz respeito a/ao: a) aparecimento de novos
personagens nas narrativas; b) construção de novas relações entre os personagens das narrativas; c)
detalhamento de eventos narrados em entrevistas anteriores; d) construção de novas posições-EU no
processo de identificação; e) construção de novos significados para a história de si e para os próprios
artefatos mediadores e f) construção de novas emoções, afetos e valores no processo narrativo
(Caixeta, 2010).
Durante 15 anos de pesquisa, utilizando entrevistas narrativas mediadas, os/as pesquisadores/as do
grupo GPCULT concluíram que a entrevista narrativa mediada possibilita a construção de um
delineamento de pesquisa qualitativo que é multimétodo (Góis, 2017), ou seja, uma entrevista
narrativa pode gerar um produto, a fala, que pode ser utilizado, novamente, como artefato mediador
para outra entrevista narrativa; ou ainda, que a entrevista narrativa mediada pode e deve ser utilizada
associada a outros tipos de entrevistas, por exemplo, entrevista episódica (Flick, 2003; Caixeta, 2006;
Gois, 2017) ou semi-estruturada (Góis, 2017), ou ainda, com outras técnicas de pesquisa como diários
ou cartas (Forcione, 2013; Gois, 2017).
Do ponto de visto dos artefatos mediadores, eles são bem variados, podendo ser fotografias (Caixeta,
2001; 2006; Borges, 2006), objetos (por exemplo, caixas, roupas, bonecas etc) (Caixeta, 2006; França,
2007; Carlucci, 2008; Gois, 2017), filmes (Borges, 2006; França, 2007), trechos da própria entrevista
(França, 2007; Silva, 2017) e letras de RAP (Alves, Oliveira, & Caixeta, 2016). Mas, independente de sua
natureza, os artefatos, neste tipo de entrevista, tem a possibilidade de provocar narrativa, porque situa
a pessoa num contexto novo de resolução de problema: conte-me sua história sobre este objeto ou
esta fotografia, ou ainda, pode me explicar melhor sobre tal evento, ou ainda, o que esta letra de RAP
tem a ver com sua vida aqui na periferia? Os artefatos geram contextos específicos de fala e cada
contexto permitirá uma construção narrativa específica àquele momento específico (Brockmeier,
1999), perpassando pelo cronotopo passado, presente e futuro, a partir das lembranças e dos
posicionamentos dos/as participantes na interação (Bruner, 1987).
Quando, por exemplo, as participantes escolhem uma fotografia do álbum de família (Caixeta, 2006)
ou quando as próprias participantes produzem uma fotografia (Caixeta, 2001; Borges, 2006) e são
estimuladas a falar sobre elas, elas são colocadas num contexto de resolução de problemas porque
são estimuladas a falar de si, a construir significados por meio de imagens que se referem a sua própria
vida e, nesse momento, não é uma simples fotografia, é uma história que se concretiza e se sintetiza
na imagem impressa no papel fotográfico, mas que ganha novos contornos com a possibilidade da

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narrativa. Além disso, o próprio artefato mediador, como a fotografia, está presente em uma história
que faz parte da narrativa das entrevistadas. O ato de fotografar é em si um momento ontogenético e
filogenético, que compõe parte das narrativas. É ontogenético, pois aconteceu em um momento
vivenciado por aquela narradora; e filogenético porque existe uma história da fotografia que regula
comportamentos e valoriza o momento do fotografar, mudando conforme as épocas. Todo esse
entrelaçar de tempos e contextos gera significados importantes para a pesquisa em psicologia do
desenvolvimento humano.
As entrevistas narrativas mediadas contribuem para a inserção de artefatos mediadores que provocam
o/a participante a resolver, aparentemente, o mesmo problema: fale-me sobre sua vida, sobre seu
cotidiano, sobre a sua escola, por exemplo, mas em contexto diferente. A presença do artefato,
escolhido ou não pelo/a entrevistado/a, situa-o/a em um outro lugar de fala, que se relaciona àquele
objeto ou àquela fotografia ou àquela carta ou àquele trecho da entrevista. Assim, quando uma
participante, por exemplo, traz o sapato para uma entrevista de pesquisa e fala sobre a importância
dele na relação entre escola-trabalho (Carlucci, 2008), temos o sapato, não mais como instrumento
que a permite caminhar, mas como símbolo que engendra, em si mesmo, uma narrativa sobre o
significado de sapato na cultura e na vida daquela participante específica. O sapato deixou de ser
instrumento e passou a se tornar símbolo. Nesse contexto, a narrativa congrega um conjunto de vozes
que vem de diferentes posicionamentos e que nos permite, enquanto psicólogas e psicólogos do
desenvolvimento, construir redes complexas de significados que tecem identificações e
posicionamentos de diferentes pessoas e os resultados desses estudos nos permitem construir
indicadores de como podemos gerar contextos melhores de aprendizagem e de vida na escola (Gois,
2017; Silva, 2017), na universidade (Carlucci, 2008), no hospital (França, 2007), em grupos de mulheres
(Borges, 2006; Caixeta, 2006) e de voluntários (Sousa, 2011).
Com isto, temos que a entrevista narrativa mediada supõe um delineamento metodológico
multimétodos (Gois, 2017) ou multitécnicas, permitindo a triangulação de informações na pesquisa
qualitativa em desenvolvimento. Para Flick (2009), a triangulação é uma estratégia para se aprofundar
o estudo de determinado objeto. Dessa forma, os/as pesquisadores/as podem triangular teorias,
métodos de construção de informações e até eles mesmos no processo de construção de informações.
Em nosso grupo, utilizamos e valorizamos a triangulação dentro do método (Flick, 2009), ou seja,
usamos vários tipos de entrevistas, com uso de artefatos mediadores para que os/as participantes
possam aprofundar suas narrativas. O uso dos artefatos mediadores costuma trazer informações
imprevisíveis para o processo de investigação dos significados, como aconteceu no estudo de Borges
(2006), em que uma das participantes escolhe trabalhar com uma foto que queimou no ato da
relevação, mas cuja imagem-imaginária ou imagem-pretendida estava presente, para a participante,
no ato da narração de um evento da sua história em que aquela imagem (não)aconteceu. Ou ainda,
quando um participante traz um pincel de quadro branco e explica que aquele pincel representa a sua
voz, a sua voz como professor, que é seu instrumento de trabalho (Gois, 2017). Nestes casos, por
exemplo, os participantes se relacionam com um artefato que é não-artefato, ou seja, não é,
necessariamente, o que queriam interagir naquele momento, mas foi o que conseguiram compor para
a interação e nesta intencionalidade aprofundaram suas narrativas, tecendo novos significados de si
no estudo sobre os processos psicológicos socialmente construídos.
Na pesquisa qualitativa do desenvolvimento humano, a construção e a análise das informações devem
trazer a polissemia e polifonia das situações interativas (Bakhtin, 1992). Nesse sentido, os artefatos
mediadores são essenciais em nossas pesquisas por permitirem que os/as participantes possam
enunciar as diferentes vozes que os/as constituíram e os/as constituem e, também, construir, com as
pesquisadoras e os pesquisadores, novas possibilidades de significados de si e dos outros que os/as
rodeiam. A relevância de técnicas de pesquisa que possibilitem a polifonia está, certamente, no fato
de otimizarem os processos mentais das pessoas, na interação social e na interação consigo.

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A seguir, detalhamos exemplos de diferentes pesquisas narrativas mediadas desenvolvidas por


pesquisadoras do grupo GPCULT.

4.1 Entrevista narrativa mediada por fotografias e filme cinematográfico

A fotografia é, decididamente, um material produzido a partir de um tempo que ficou no passado. Ao


descrever a fotografia, estamos trazendo para o presente um fato passado. Ao rememorar o que
aconteceu, construímos novos significados que dizem respeito ao que foi e ao que ocorreu no
momento, mas também ao que está ocorrendo no presente, com a perspectiva do que poderá ocorrer
no futuro. A imagem funciona como mediadora de uma narrativa presente para um fato que esteve
no passado e, desse modo, colabora para a construção de novos significados sobre o que já havia sido
construído. Falar de algo que já foi indica uma construção dialética do presente, passado e futuro em
que cada fato possui novas representações diferenciadas e transforma constantemente o pensamento
verbal. Para Barthes (1984), o registro fotográfico é a presentificação do morto: “O efeito que ela
reproduz em mim não é o de restituir o que é abolido (pelo tempo, pela distância), mas o de atestar
que o que vejo de fato existiu.” (p.123). Nesse sentido, sua função é dialética, porquanto através do
registro do que já não existe, há a possibilidade de presentificação, de manter vivo o instante passado.
E, na captura do instante, capturam-se também emoções e episódios completos, pois toda foto tem
histórias e interpretações possíveis. O instante apreendido na foto é mediador de uma memória
abrangente e contextualizada do que é apresentado. “A imagem traz informações (visuais) sobre o
mundo que pode ser conhecido de diferentes formas, inclusive em alguns de seus aspectos não-
visuais” (Aumont, 1993, p.80).
Algumas pesquisas, feitas por nós, utilizam fotografias e filmes comerciais e/ou de arte como
mediadores na produção de informações, justamente pelo caráter polissêmico da imagem. No estudo
de doutorado de Borges (2006), sobre os significados do olhar de quatro mulheres de Goiânia,
percebemos que as fotografias que foram tiradas ganhavam novos sentidos quando nas situações de
interação das entrevistas. Nesta pesquisa, fizemos uma solicitação às participantes que fotografassem
como ‘viam o mundo’. O objetivo era de identificar os significados sobre o Olhar mediado por quatro
fotografias escolhidas por cada uma delas. Em um outro estudo sobre os significados do “ser
professora” (ver Borges, 2012), Joana, nossa participante, traz para nós uma fotografia sobre um
momento vivenciado na escola em que trabalha. Neste estudo, o objetivo era de identificar os
significados que as professoras possuíam em relação ao que entendiam de ser professor. Como
metodologia deste estudo, fizemos entrevistas narrativas de histórias de vida e, logo após, foi pedido
para que as participantes retratassem por meio da fotografia quais os significados do ser professor.
Escolhemos uma das fotografias de nossas participantes, Joana, para discutirmos como a fala mediada
pela presença da fotografia pode construir novos significados num jogo entre entrevistadora e
entrevistada, neste caso.
Uma das preocupações de se usar filmes e fotografias como mediadores em entrevistas é de se
entender que estes mediadores são culturalmente produzidos e, portanto, com significados e histórias
próprias. Assim, é importante que se compreenda como estes artefatos aparecem em cada cultura, e
como os grupos e os/as participantes interagem com estes significados.

4.2 Entrevista narrativa mediada por objetos

A primeira pesquisa desenvolvida no grupo GPCULT com a mediação de objetos foi a pesquisa de
doutorado de Caixeta (2006), que teve por objetivo compreender, por meio da oralidade, imagens e
de objetos guardados, como mulheres guardiãs da memória narram sua história de vida e constroem

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esta identidade, entendendo por guardiãs da memória mulheres que têm a prática de guardar objetos
que compõem os museus familiares (Barros, 1989; Gomes, 1996; Pereira, 2003), por exemplo:
desenhos, bonecas, terços, fotografias, boletins, umbigo, cachinhos de cabelo, entre outros.
A construção dos dados aconteceu em quatro encontros: a) no primeiro encontro, antes de se iniciar
qualquer conversa e gravação, foi lido o termo de consentimento para participação em pesquisa. Após
este procedimento e a aceitação formal da participante, demos início à construção dos dados
propriamente ditos, por meio da técnica do relato de vida. Neste momento, pedíamos a cada senhora
que nos contasse a sua vida, da forma como desejasse.
b) O segundo encontro foi destinado para a entrevista episódica, que tinha o objetivo de conhecer a
função de guardiã da memória da família e os guardados de cada senhora. Para tanto, foi utilizado o
roteiro de entrevista. Apresentamos, aqui, as perguntas realizadas: a senhora me disse que guarda
algumas coisas (como: fotografias, roupas, objetos, cartões, cachinhos de cabelo, citar, se necessário).
Que coisas a senhora guarda? A senhora pode me mostrar? (Caso a senhora faça coleção de fotografia,
será pedido que ela mostre o álbum, se possível, e escolha 10 fotografias para serem estudadas com
mais detalhamento); 2- Quando a senhora olha para o passado, a senhora se lembra de quando foi a
primeira vez que guardou essas coisas? A senhora pode me contar como foi?; 3 – A senhora pode me
dizer como é que escolhe se vai guardar ou não determinada coisa. A senhora pode relatar uma
situação em que teve que fazer essa escolha?; 4 – Com quem a senhora compartilha esses guardados?
A senhora mostra para alguém? Em que ocasiões?; 5 – A senhora gostaria de acrescentar alguma coisa?
Como a senhora está se sentindo?; 6 – A senhora quer passar esses guardados para alguém? Quem?
c) o terceiro encontro foi destinado à entrevista mediada propriamente dita. Nela, foi priorizada a fala
sobre as imagens e os objetos escolhidos. Neste momento, a pesquisadora pedia para que a guardiã
falasse das suas escolhas: por que este objeto/esta imagem e não outro/a? e, ainda, o que significa
este/a objeto/imagem, para você?
No último encontro, as guardiãs eram convidadas a acrescentar o que quisessem as suas narrativas e
processo de construção das informações com as guaridas era encerrado.
Para a análise das informações, utilizamos para a análise das fotografias: a análise dialógica da imagem
parada (Penn, 2003) e, para as informações linguísticas, a análise temática dialógica.
O procedimento de análise das entrevistas englobou os seguintes passos, que foram construídos a
partir das análises propostas por Barbato (2004), Caixeta (2001), Caixeta & Barbato (2004), Fávero &
Mello (1997), tendo em vista a compreensão dialógica da comunicação humana e de que a memória
se constitui numa rede de significados complexos. É importante compreender que cada passo está se
relacionando com o outro de forma que a construção de um mapa, por exemplo, pode exigir uma nova
leitura e re-leitura do material transcrito, que, por sua vez, pode demonstrar novos temas e assim por
diante. Os procedimentos para cada entrevista são: a) transcrição integral do material em áudio:
tradução do material de áudio para texto escrito; b) leitura intensiva: leitura e re-leitura do material
transcrito, atentando para as minúcias do texto, para obter detalhes; c) organização do texto em
temas; d) elaboração dos mapas de significação: os mapas constituíam representações gráficas de
relações e movimentos entre os significados construídos da leitura dos textos transcritos. e) escolha
do mapa de representação da narrativa: a construção continuada dos mapas permite um refinamento
de análise, possibilitando a construção de um último mapa, que, para nós, neste contexto específico,
foi escolhido como aquele que melhor representa as narrativas construídas por cada guardiã.

5 Conclusões

Considerando a entrevista como um momento privilegiado de construção de conhecimento sobre um


tema específico entre participante e pesquisador/a, defendemos o uso dos artefatos mediadores como

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elementos capazes de fomentar a reflexão e o posicionamento das pessoas sobre as diferentes


temáticas da pesquisa em desenvolvimento humano. Para isso, defendemos a entrevista mediada
como aquela que possibilita o aprofundamento das narrativas de si, porque problematizam a situação
narrativa, apresentando novos contextos que estimulam falar de si.
Além disso, entendemos que a técnica da entrevista narrativa mediada pressupõe o uso de diferentes
técnicas de pesquisa, garantindo a triangulação referente à utilização de uma variedade de estratégias
de construção de informações, o que favorece a construção de conhecimento em psicologia do
desenvolvimento.

Agradecimentos. GPPCULT, Instituto Bancorbrás de Responsabilidade Social, CNPq, Capes, Fapitec-Se.

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Ecologías de los procesos de formación en un MOOC, sistemas de


mediaciones y contextos de educación expandida

Ramón Montes-Rodríguez1, Rosario Isabel Herrada Valverde2, Juan Bautista Martínez


Rodríguez1

1 Departamento de Didáctica y Organización Escolar. Universidad de Granada, España.


ramontes@ugr.es, jbmr@ugr.es
2 Departamento de Didáctica y Organización Escolar. Universidad de Murcia, España. rherrada@um.es

Resumen. En esta investigación se presentan parte de los resultados de un estudio de caso sobre un MOOC
que fue realizado en el marco del proyecto I+D “Ecologías del aprendizaje en contextos múltiples: análisis de
proyectos de educación expandida y conformación de ciudadanía”. Desde una perspectiva metodológica
eminentemente cualitativa, se analizan los discursos de los agentes que forman el curso (participantes,
coordinadores y dinamizadores) para responder a varias cuestiones: a) De qué forma los aprendizajes se ven
sometidos a un sistema de mediaciones individuales sociales, institucionales y culturales; b) Qué tipo de
habilidades, saberes o conocimientos ponen los participantes en juego durante su desarrollo; y c) Cómo se
construye ciudadanía o saberes compartidos en estos espacios. Las evidencias obtenidas aportan luz sobre de
qué forma el conocimiento que se expande más allá de los muros de lo formal colabora en la tarea de formar
ciudadanos.
Palabras clave: Ecologías del aprendizaje, MOOC, Educación expandida, Estudio de caso, Ciudadanía.

Ecologies of the Training Processes in a MOOC, Mediations Systems and Expanded Education Contexts
Abstract. This research presents a part of the results of a MOOC case study that was carried out within the
framework of the Research & Development project "Learning ecologies in multiple contexts: analysis of
projects of expanded education and conformation of citizenship". From a qualitative methodological
perspective, the discourses of the agents of the MOOC (participants, coordinators and facilitators) are
analysed to answer several questions: a) In what way the learning is submitted to a system of individual,
institutional, social and cultural mediations?, b) What type of skills or knowledge put participants into play
during their development?, and c) How citizenship or shared knowledge is built in these spaces?. The
evidences obtained show us how the knowledge that expands beyond the walls of the formal education
collaborates in the task of build citizenship.
Keywords: Ecologies of learning, MOOC, Expanded Education, Case Study, Citizenship.

1. Introducción

En esta comunicación se presenta una visión global de un estudio de caso sobre un MOOC titulado
“Formación para formar: Innovación docente y metodologías de aprendizaje en red”, de una empresa
pública relacionada con el mundo de la formación en el ámbito de la salud, ubicada en la comunidad
autónoma de Andalucía. El estudio de caso forma parte del proyecto I+D "Ecologías del aprendizaje en
contextos múltiples: análisis de proyectos de educación expandida y conformación de ciudadanía", un
proyecto de investigación que surge ante la necesidad investigadora de seleccionar comunidades de
prácticas virtuales propagadas a través de la red, y que elige como caso uno de los novedosos cursos
en línea masivos y abiertos (MOOC) que ofrece la empresa que mencionábamos anteriormente.

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Se parte de la idea y de la convicción de que los principales problemas de una democracia no son tanto
problemas de voluntad política como de falta de conocimiento (Innerarity, 2010). Por lo tanto, nos
interesa saber en qué medida el conocimiento que se expande por la red colabora en la tarea de formar
ciudadanos.
Para abordar la investigación utilizamos la útil metáfora “ecologías de la formación”, tributo al
concepto más utilizado “ecologías del aprendizaje”, que nos orienta hacia la indagación de la
construcción del conocimiento, la composición de saberes y la adquisición de los aprendizajes,
interpretados desde distintas perspectivas como: a) ecologías personales de aprendizaje “a lo ancho
de la vida” (lifewide learning), a través de actividades en contextos múltiples y situaciones simultáneas
que permiten inflexiones y disrupciones de aprendizajes (Jackson, 2016) y cuyas narrativas hemos
identificado en las interacciones producidas en blogs, foros, redes, entrevistas, guías, contenidos y
dispositivos del MOOC donde se trabaja y se aprende conversando con otros, conectando espacios:
formación, hogar, ocio; b) ecologías cuyos componentes importantes son los recursos y su contexto
cultural y ambiental de uso (Scolari, 2008); c) ecologías compuestas por una comunidad mediada por
las vivencias, relaciones, culturas e interacciones de unos actores a través de variados tipos de
interacciones, que desempeñan roles como participantes, unidos por ciertos intereses u objetivos
comunes (Haythornthwaite, 2015); y d) una ecología de saberes en combinación con aquellos saberes
no reconocidos (Martín Barbero, 1987) que, tratando de forma ecológica u holística el conocimiento
nos permita poder crecer y desarrollar el mismo en el espacio común. La comunidad del MOOC que
hemos analizado se entiende, por lo tanto, como una comunidad ecológica cuya organización de
actividades afecta al propio aprendizaje y a cómo los individuos terminan situados en la red-
comunidad.
Se analiza, por consiguiente, el MOOC como proyecto y como experiencia formativa representativa de
las nuevas formas de entender la producción y difusión del conocimiento, así como se indaga en la
interacción de los aprendizajes formales, informales y no formales, focalizando el interés en los
procesos de construcción de ciudadanía relacionados con el intercambio de saberes, la identificación
de prácticas de mediación y la apertura y expansión del conocimiento. Para ello, se aborda la
identificación de los aprendizajes denominados invisibles (Cobo y Moravec, 2011), conocimientos
tácticos y saberes en relación, identificando las correspondientes habilidades blandas (soft skills)
(Buckingham, 2013). Así, entendemos el MOOC como una comunidad de prácticas en donde los sujetos
interactúan mediatizados institucionalmente a través de recursos, normas, escenarios e
interpretaciones; mediatizados socialmente por negociaciones y normas implícitas, así como en
contextos de relación donde se ponen en práctica las diferentes habilidades blandas; mediatizados
tanto por los recursos y sus usos culturales como por sus contenidos compartidos; y mediatizados
individualmente a través de motivaciones, esquemas mentales, construcción de roles de género,
posición social, conocimientos o saberes, patrones de relación, contextos y dispositivos en red que
constituyen una ecología del aprendizaje.
En concreto, la investigación explora: a) Las condiciones estructurales donde interactúan los agentes
que intervienen en la formación, así como el conjunto de normas/principios y ritos aplicados durante
el desarrollo del curso; b) Las formas, modos o códigos de relación e intercambio entre los agentes, es
decir, lo que entendemos como formas de mediación social que se producen a través de la
comunicación social; c) Las teorías de la formación propias de la cultura pedagógica y digital que están
dando nuevos sentidos al conocimiento práctico docente por su condición ubicua, tácita e informal en
el entorno colaborativo del MOOC y d) Las modalidades de participación, comunicación y formas de
implicación y compromiso que se desarrollan en el proceso de producción colectiva del conocimiento
en los diferentes contextos, y que generan elementos ciudadanos del “procomún” (Lafuente, Alonso y
Rodríguez, 2013). En esta breve comunicación nos centraremos en definir la cuestión metodológica así
como en explicitar brevemente parte de los resultados relacionados con el sistema de mediaciones

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que hemos observado, así como algunas de las distintas habilidades blandas que los participantes de
la plataforma dicen poner en juego.

2. Metodología

La metodología diseñada para este estudio de caso es eminentemente cualitativa, haciendo uso de
distintos procedimientos y técnicas de recogida de datos que facilitan la comprensión de la realidad a
estudiar, desde la particularidad y la complejidad de un caso singular (Stake, 2005):
- Observación no participante de las tareas y de las interacciones de los participantes en la
plataforma MOOC (actividades, interacciones en foros y PLEs): En particular, se han registrado
y analizado los discursos en las interacciones entre los usuarios en varias actividades
seleccionadas que tenían que realizar y en los distintos foros de la plataforma MOOC: Foro
Común de Dudas (FCD), Tablón de Anuncios (TA), Foro General (FG) y Foro de Consulta del
Proyecto Final (FPF). Se realizó también un análisis gráfico-visual de los PLEs producidos por
los participantes en una actividad optativa donde se les pide a los participantes que
representen gráficamente sus fuentes de información, estrategias, recursos, herramientas,
personas, redes

- Entrevistas en profundidad a nueve perfiles individuales seleccionados: De todos los


participantes del MOOC (más de 200), se seleccionaron a nueve de ellos para las entrevistas,
6 mujeres y 3 hombres (Fig. 1), que cumplían ciertos criterios de heterogeneidad. Para su
selección se realizó un proceso de seguimiento de su participación en las tareas del MOOC y
en los foros de la plataforma, de modo que estuvieran representados en las entrevistas
participantes con distinto nivel de proactividad durante el curso y con distinto nivel de
experiencia en lo técnico-digital. Algunos perfiles se identificaron utilizando un muestreo
pseudo bola de nieve, en el que los perfiles eran elegidos por sus interacciones con otros ya
seleccionados. La intención investigadora con las entrevistas en profundidad a los
participantes es la de analizar prácticas socioeducativas cotidianas que han experimentado
durante el transcurso del MOOC, y para ello utilizamos también la información obtenida en su
participación en la plataforma (tareas, foros de tareas, contestaciones y réplicas, foro de
dudas). En sus entrevistas se analiza el sentido que los participantes asignan al conocimiento
y a los saberes que ponen en juego para superar satisfactoriamente el MOOC. Saberes y
habilidades de tipo social o blando que son considerados como aprendizajes invisibles.

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Fig. 1. Perfiles seleccionados para las entrevistas en profundidad y sus profesiones. Las mujeres están representadas en
color amarillo y los hombres en color verde. Elaboración propia.

- Entrevista a los coordinadores de la plataforma MOOC: Al respecto, de entre todo el equipo


docente y de coordinación del MOOC, tres de los coordinadores de la plataforma fueron
entrevistados de forma conjunta en un aula de su espacio de trabajo, un par de meses después
de haber terminado el curso. Son los perfiles con más peso dentro de la coordinación del
MOOC, y cada uno de ellos procede de formaciones diferentes (salud, tecnologías, docencia),
aunque con un origen pedagógico y asistencia común a eventos significativos como EABE
(Encuentro andaluz de blogs educativos). Con la entrevista realizada a los coordinadores del
MOOC se pretende profundizar en el conocimiento acerca de cómo el curso es concebido
desde su origen, bajo qué situaciones nace, así como la forma en la que se ve condicionado
por la institucionalización que lo rige. Del mismo modo que con el análisis de los discursos de
los participantes, aquí nuestra intención es analizar las prácticas cotidianas socioeducativas
que se llevan a cabo en la plataforma MOOC desde su perspectiva.

- Etnografía virtual de las interacciones de los participantes en Facebook y en Twitter a través


del contacto con el perfil que dinamizaba el proceso formativo y el uso del hashtag que
promovían desde la organización: Para ello, se realizó un recorrido por los discursos de las
redes que nos da pistas para ver en qué vías, más allá del MOOC, se han expandido los procesos
de aprendizaje.

- Análisis de los documentos oficiales que marcan el proyecto educativo de este curso: Se
analizaron la guía didáctica y los contenidos de las ocho unidades que conforman la estructura
del MOOC, un formato de tareas y una relación de contenidos que suponen la mediación que
juega la cultura pedagógica existente a través de las actividades propuestas y los contenidos
que se mostraban en la plataforma. El documento colgado en el MOOC se caracteriza por una
estructura consistente en introducción, objetivos y competencias a desarrollar, organización
de contenidos, metodología, evaluación y Plan de Acción Tutorial. Igualmente, en dicho
documento se especifica que la dedicación para superar el mismo es de cinco horas semanales.

Por lo tanto, una de las finalidades que pretende esta investigación es analizar el sistema de discursos
(Conde, 2009) originado, tanto escrito como hablado, por los coordinadores y los participantes del
MOOC dentro de los foros, de las redes, en la plataforma y en las entrevistas mantenidas. Por lo tanto,
más que de técnicas o de fases, podemos hablar en esta investigación de un proceso dinámico que une
problemas, teorías y métodos de forma holística (Bryman y Burgess, 1994) y que sirve para profundizar
en los objetivos marcados por el proyecto I+D en el que se enmarca. En este proceso, se han ido
triangulando los discursos de los participantes en los distintos espacios (foros, actividades, entrevistas,
redes…) conjugando de este modo un sistema de discursos más real que el que puede analizarse desde
una única fuente de datos puntual.
Los datos cualitativos se analizaron mediante análisis de las temáticas del discurso, y la comparación y
triangulación constante entre los datos de todos los espacios analizados, siempre partiendo de la
categorización realizada en el análisis de las entrevistas (Tabla 1). Los procedimientos se han ajustado
a las propuestas de fragmentación y articulación de la teoría fundamentada (Glaser y Strauss, 1967;
Strauss y Corbin, 2002) mediante una estrategia circular, en espirales de profundización, retrocediendo
y avanzando durante todo el proceso. Un proceso que ha utilizado lógicas tanto deductivas como
inductivas, ya que, aunque se ha partido de objetivos marcados por el proyecto general (ECOEC), se
han identificado conceptos y se han generado nuevas articulaciones de los mismos desde la primera

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codificación de los datos, así como se han descubierto en los mismos propiedades y dimensiones que
no se contemplaban en el proyecto. Para facilitar el trabajo se han utilizado las prestaciones que nos
ofrece el software de análisis de datos cualitativos NVivo 11, que nos ha permitido clasificar y
categorizar los discursos de los participantes.

Tabla 1. Categorías principales que surgen del análisis de los discursos de las entrevistas

Categorías Nº de referencias
Uso de distintas herramientas y recursos (redes, aplicaciones…) (10 subcategorías) 212
Gestión de los tiempos y de los esfuerzos 123
Compartir conocimiento, lo común 86
Experiencia en otros cursos en línea 53
Dicotomía presencialidad-virtualidad 50
Experiencia como docente 37
Habilidades blandas explícitas (subcategorías) 36
Conocer gente, establecer redes 33
Relación con tutores y dinamizadores 30
Evaluación por pares 25
Infoxicación, bombardeo excesivo de información 25
Sensación de estar perdido ante el MOOC 24
El MOOC como herramienta para la formación permanente 22
Problemas técnicos, dificultades con las TIC 22
Organización y estructura del MOOC 20
Curación de contenido 19
La masividad del MOOC 16
Abandonos por parte de participantes 7
Otras categorías menos presentes …

A partir de esta categorización se ha entrado en un análisis del discurso producido en cada una de las
categorías por los distintos participantes, siguiendo las pautas marcadas por Strauss y Corbin (2002),
focalizando nuestra mirada tanto en los tópicos que surgían de forma emergente y natural en los
discursos como en aquellas cuestiones que previamente marcaba como objetivos el proyecto. Este
proceso de análisis en doble dirección nos permite realizar una primera categorización inductiva (en
vivo), para pasar en un segundo momento a su reorganización en torno a los tópicos que han ido
surgiendo de forma emergente, e incorporarlos a aquellas categorías previas que habíamos marcado
y que en cierto modo, condicionaron la semi-estructuración de las entrevistas.

3. Resultados y análisis del sistema de mediaciones individuales, sociales, institucionales y


culturales que se desarrollan en el MOOC.

Las mediaciones han sido conceptualizadas como aquellos lugares o instancias culturales en las que se
producen y se recrean los significados y los sentidos que se ponen en relación con otros agentes o
instancias sociales (Alonso, 2010). Componen por lo tanto, un conjunto de influencias procedentes de
sujetos o de contextos socioculturales como la familia, la escuela, la vida social o el escenario digital
(Orozco, 1997; Martín Barbero, 1992). Aquí se ha utilizado el concepto como soporte teórico que
permita aflorar categorías analíticas emergentes que analicen el sentido que se le da a la producción
y la difusión de conocimientos, a los nuevos modos de participar y de relacionarse en los nuevos
contextos digitales, y al conjunto de saberes y de habilidades no reconocidas que se pretende
identificar.

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Esta teoría, procedente del campo de la comunicación, nos permite abordar el campo de la formación
de formadores al conectar los agentes participantes en la formación, los contenidos y los materiales
utilizados con las interpretaciones individuales o comunitarias, así como con las producciones
culturales difundidas por los medios.
En nuestro caso, hemos considerado mediaciones individuales a aquellas producidas por los sujetos
que sienten y piensan, con representaciones y esquemas mentales desde las experiencias vinculadas
a su edad, clase social, cultura o sexo. Con mediaciones sociales entenderemos las producidas por
agentes que interaccionan con otros en un marco de reglas y normas implícitas, poniendo en
circulación conocimientos y saberes desde una comprensión aprendida de la concepción de la otredad.
Por mediaciones institucionales entenderemos las generadas en aquellos escenarios y contextos en
donde tienen lugar los proyectos, componiendo una comunidad en la que se producen y se comparten
comunidades de interpretación, con unos recursos aplicados y en unas condiciones organizativas que
imponen significados. Y por último, por mediaciones culturales entenderemos las producidas a través
de los medios, las redes, las actividades relacionadas con soportes culturales (textos, música, dibujos…)
y que contienen saberes, ideologías y lenguajes propios. Cabe destacar que se ha observado, tras el
análisis de los discursos de participantes y coordinadores del MOOC, que estas mediaciones concurren
y se entrelazan entre sí (Fig. 2).

Fig. 2. Sistema de mediaciones realizado tras el análisis y categorización de los discursos


de los agentes participantes del MOOC. Elaboración propia.

Podemos afirmar, que el estudio de caso como metodología nos ha permitido observar, tras la
triangulación de la información y la categorización de los discursos obtenidos a través de múltiples

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vías, de qué forma es mediada la formación y el conocimiento en el MOOC desde una perspectiva
ecológica.
Al identificar las mediaciones individuales que se experimentan por los agentes intervinientes en el
curso, hemos visto, teniendo en cuenta lo que narraban los participantes, que estas están relacionadas
con conceptos como, por ejemplo, el miedo, la motivación, la negociación de los tiempos y su gestión,
o su doble visión de la identidad docente/discente. Del mismo modo que observamos que más allá de
la mediación o mediaciones individuales, existen mediaciones sociales que se conforman en la idea o
concepción de grupo, en la propia participación de los agentes que intervienen y en la relación que se
produce entre pares.
En el MOOC además, como comunidad de prácticas online, se producen un conjunto de normas y
condiciones que componen un marco determinado, en el que interaccionan elementos de una cultura
pedagógica y de una cultura digital concreta que afectan al diseño, desarrollo y seguimiento del curso.
Estas mediaciones institucionales condicionan la acción que se realiza desde la coordinación, pero
también el currículum propiamente dicho del curso y los procesos de certificación y acreditación del
alumnado participante.
Se han observado también distintos posicionamientos en los participantes del MOOC ante la
tecnología, distintas respuestas y diferentes recursos en el discurso para apropiarse de lo digital o para
su repulsa. Vemos por lo tanto, que existen también una serie de mediaciones culturales que se ven
afectadas por lo digital, por el acercamiento a lo tecnológico de los participantes de MOOC. Un MOOC
con una cultura pedagógica y digital muy concreta que choca con la visión educativa de la que parten
algunos de los participantes, que provienen de entornos educativos más cerrados, directivos y
predecibles, que chocan frontalmente con los principios del aprendizaje conectivista según Siemens
(2004).
Este sistema de mediaciones confluye en varios puntos, tal y como hemos recogido de forma más
extensa en nuestro informe de investigación y que tratamos de resumir en esta comunicación. El
conocimiento, que es mediado por lo individual, lo social, lo institucional y lo cultural, se expande,
rompe las fronteras de lo formal, lo no formal y lo informal, convirtiéndose de esta forma, en
conocimiento colectivo o conocimiento ciudadano en estos espacios que facilita y habilita el MOOC (y
en otros nuevos que se crean). Los participantes dejan de ser consumidores de información y de
recursos para ser ellos mismos los protagonistas de su proceso formativo en tanto que prosumidores,
y durante todo este proceso se están desarrollando y activando, además, una serie de habilidades
blandas, habilidades de corte social y conocimientos de tipo tácito, que los participantes explicitan en
sus discursos. Algunas son reconocidas en las entrevistas de forma explícita, pero otras se deducen de
las tareas realizadas, las manifestaciones en el foro y los intercambios mantenidos. Entre dichas
habilidades podemos destacar las siguientes:

- Constancia, persistencia, tesón.


- Autonomía, independencia, autoaprendizaje.
- Orden, organización, capacidad de síntesis.
- Habilidad para atraer, para seducir, para dar visibilidad a un producto.
- Curiosidad, motivación, permeabilidad.
- Socialización de los profesionales en el acceso a las TIC.
- Creación de redes para compartir y para formarse.
- Apertura a la valoración y a la autovaloración.
- Supresión del miedo a la tecnicidad y a los recursos y aplicaciones nuevas.
- Sentimiento de pertenencia a un grupo que antes era ajeno.
- Formación de una comunidad de prácticas.
- Expansión o transferencia: "gente que se ha culturizado"

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- Experimentación de la curación de contenidos y gestión del talento.


- Manifestación de las emociones como un componente del aprendizaje.

Así pues, se percibe el hecho de que la organización del MOOC aporta innovaciones y sugerencias que
rebasan lo establecido explícitamente por lo institucionalizado, y que contrastan con limitaciones
aceptadas o con condiciones organizativas impuestas, pese a las diversas características
socioprofesionales del alumnado.

4. Conclusiones

En la presente comunicación se han presentado parte de los resultados obtenidos en el estudio de


caso del MOOC “Formación para formar: Innovación docente y metodologías de aprendizaje en red”,
en concreto la red que hemos observado en el sistema de mediaciones surgido de las interacciones en
la plataforma, y también aquellas habilidades más destacadas, de tipo blando o conocimientos tácitos,
que los participantes dicen adquirir o poner en juego durante su proceso formativo. Podemos decir
que la metodología cualitativa seguida en esta investigación nos ha permitido observar en los discursos
de los propios participantes, que es precisamente en el marco conectivista que facilita el MOOC donde
se suceden los procesos de mediación social entre los distintos agentes (dinamizadores, tutores y
participantes), un marco caracterizado por la predisposición a compartir el conocimiento, por el
fomento del “prosumo” de información y por la generación de dinámicas de expansión de los
aprendizajes, siendo un marco en constante frente abierto con las normas, condiciones y exigencias
que desde lo institucional se establecen. Y dichas estructuras institucionales pensamos que limitan una
enseñanza más abierta, una mejor ocupación de los tiempos de formación, así como el establecimiento
de relaciones entre participantes más libres, creativas y ricas.
Por otro lado, la naturaleza de implantación de los MOOC supone básicamente el cambio de cultura
de la adhesividad o adherencia (stickness) hacia la educación expansiva (spreadability) (Jenkins, 2008),
es decir, pasar de la adhesión a valores, procedimientos, criterios o principios tradicionales hacia la
formación o educación expansiva, la “propagabilidad” del conocimiento y los aprendizajes. Significa,
en concreto, evolucionar desde el carácter del compromiso obligado, centralizado, controlado,
inducido y orientarse hacia el carácter abierto, expandido y propagado de la educación. Esto supone
también un cambio de roles en los discentes, que pasarían de estudiantes consumidores de cursos a
profesionales activos que colaboran e inventan y producen recursos. En definitiva, el MOOC analizado
se enfrenta y también permite a su vez innovar, tanto en el modelo de formación clásico como en el
sistema de comunicación de conocimientos, así como en cuanto a los roles y formas de participación
en la vida profesional cotidiana.
Cabe destacar, además, que hemos observado que cuando el conocimiento se expande y se bifurca en
todas direcciones, aquellos participantes cuyo paradigma educativo proviene de enseñanzas de tipo
más vertical, unidireccional y cerrado se muestran perdidos e incapaces de encontrar su camino entre
el maremágnum de interacciones que es provocado por la masividad de la plataforma.
Por último, y a modo de resumen, podemos señalar que este MOOC, como estrategia formativa,
significa un intento de desapropiar la educación formal tradicional, poniendo en duda supuestos
clásicos, lugares o personas que se la apropian y la monopolizan, que la controlan y legitiman, con el
fin de abordarla en los espacios prácticos profesionales donde realmente se produce. En definitiva, y
en relación a la teorización que propone Garcés (2013), se pone en entredicho el concepto de
educación que se muestra a través de lo instituido y visible, ya que impone límites y desigualdades que
debieran corregirse. Esta investigación por lo tanto, puede dar otros significados más compartidos y

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liberadores que eviten convertir estos cursos MOOC en otros recursos para legitimar fábricas de
conocimiento.

Agradecimientos. Proyecto I+D financiado por el Ministerio de Economía, Industria y Competitividad, aprobado
en la convocatoria de 2014: “Ecologías del aprendizaje en contextos múltiples: análisis de proyectos de educación
expandida y conformación de ciudadanía”. Por otra parte, el autor Ramón Montes-Rodríguez se encuentra
realizando su investigación bajo la financiación de un contrato predoctoral FPU concedido en el año 2014 por el
Ministerio de Educación, Cultura y Deporte.

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A inclusão de estudantes que apresentam deficiência intelectual:


como acontece nas escolas?

Paulo Vitor Teodoro de Souza1, Elisabete Alerico Gonçalves 2, Lauryenne Camille Santana 3,
Paulo Alexandre de Castro4
1Departamento de Ciências, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano – Câmpus
Catalão, Brasil. Estudante de Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências na
Universidade de Brasília, Brasil. paulovitorteodoro@yahoo.com.br
2 Departamento de Educação, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano – Câmpus

Urutaí, Brasil. Doutoranda em Epistemologia da História da Ciência na Universidad Nacional Três de Febrero,
Argentina. elisabete.alerico@ifgoiano.edu.br
3 Licenciada em Química pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano – Campus

Urutaí, Brasil. lauryennecamille@hotmail.com


4 Departamento de Física, Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física, Mestrado Profissional em

Gestão Organizacional, Brasil. padecastro@gmail.com

Resumo. O presente texto discute a prática pedagógica de inclusão, na disciplina de química, de um


estudante com Deficiência Intelectual (DI). Realizamos a investigação em uma escola de educação básica
localizada no sudeste do Estado de Goiás, Brasil. O objetivo da pesquisa é analisar o contexto em que o
estudante com DI está inserido, considerando seu processo de aprendizagem. Inicialmente, realizamos uma
pesquisa teórico-bibliográfica; em seguida, observamos aulas do ensino médio, de um professor de química;
e, por fim, analisamos os questionários, como parte dos procedimentos metodológicos. Os resultados
mostraram a ausência de um trabalho conjunto entre o professor e os profissionais da escola. Consideramos
que a instituição de ensino se encontra distante da realidade da inclusão e que os métodos utilizados não
são adequados para atender o discente no processo de aprendizagem. Diante disso, percebemos que,
muitas vezes, a inclusão não acontece, sendo os estudantes excluídos na própria sala de aula.
Palavras-chave: Inclusão; Ensino de Química; Deficiência Intelectual.

The inclusion of students with intellectual disabilities: what happens in schools?


Abstract. This paper discusses the pedagogical practice of including a student with Intellectual Disabilities
(ID) in the chemistry discipline. We conducted research at a basic education school located in the southeast
of the State of Goiás, Brazil. The objective of the research is to analyze the context in which the student with
DI is inserted, considering his / her learning process. Initially, we conducted a theoretical-bibliographic
research; Then we observed high school classes, a chemistry teacher; And, finally, we analyzed the
questionnaires as part of the methodological procedures. The results showed the absence of a joint work
between the teacher and the professionals of the school. We consider that the educational institution is far
from the reality of inclusion and that the methods used are not adequate to attend the student in the
learning process. Given this, we realize that, often, inclusion does not happen, and students are excluded in
the classroom itself.
Keywords: Inclusion; Chemistry teaching; Intellectual Disability.

1 Introdução

O termo inclusão tem sido muito utilizado nas últimas décadas, especialmente nos discursos
educacionais, sociológicos e políticos. No âmbito educacional, aspecto principal desta pesquisa,
podemos considerar que a inclusão é o processo pelo qual possibilitamos a inserção de todos os
estudantes, de forma ativa, em todas as ações que a escola pode oferecer.

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É comum nas instituições de ensino, proposições em Ciências e Química, muitas vezes baseadas na
repetição de informações e na memorização (Souza & Amauro, 2015), isto é, propostas que não
tenham raízes nas experiências vividas pelo estudante e que são incapazes de mobilizar seu
raciocínio. Em relação ao ensino para estudantes com Deficiência Intelectual (DI), o que se percebe é
uma proposta educacional para “adaptar os alunos com deficiência mental às exigências da escola
comum tradicional” (Mantoan, 2008, p. 21). Ações dessa natureza, não reconhecessem no
estudante, que apresenta DI, um sujeito capaz de crescimento intelectual (Gomes, 2010).
Para superar essa visão empobrecida de um estudante especial, a escola precisa enxergar as
potencialidades desse universo de pessoas. O docente, por exemplo, precisa levar em consideração
as possibilidades de melhoria na qualidade do ensino e, nesse sentido, não pode se limitar a uma
única forma de metodologia. É necessário que, assim como a modernidade traz transformações na
vida das pessoas, o professor também precisa avançar nessas transformações. E, quando o professor
entende a necessidade de um trabalho em conjunto com a escola na busca de possibilidades de
intervenção para desenvolver no alunado, especial ou não, meios deles adquirirem a sua
emancipação intelectual, a inclusão começa a acontecer.
Ações que possibilitam a existência da inclusão efetiva nas escolas brasileiras são ainda almejadas
por pesquisadores da área de ensino/educação, já que inserir um estudante no espaço físico da
escola não garante a inclusão (Souza, Salles & Gauche, 2016); pelo contrário, acaba constituindo mais
uma via de exclusão. Compreender como acontece a inclusão de pessoas com Deficiência Intelectual
(DI), na rede regular de educação brasileira, se torna o campo da pesquisa a qual discutiremos neste
texto. Pensando nas possibilidades de inclusão de estudantes com DI, levantamos a seguinte
problemática: as metodologias utilizadas para o ensino de, na primeira série do ensino médio, em
classe regular das escolas brasileiras, são adequados para atender e incluir o estudante com
deficiência intelectual?
Para responder a esse questionamento, realizamos uma pesquisa com o objetivo de analisar como e
quais as formas que ocorre a inclusão, com estudantes que apresentam DI, na disciplina de química.
Desta forma, o presente texto busca apontar os resultados de uma pesquisa que investiga as
estratégias didático-pedagógicas inclusivas nas escolas no Estado de Goiás. Para tanto, iremos
mostrar, neste texto, como acontece a inclusão de pessoas com DI no ensino de Química, em uma
escola do estado de Goiás. Além disso, desvelaremos sobre as metodologias utilizadas, pelo
professor regente (PR) de Química, com um estudante que possui DI.

2 Metodologia

Esta pesquisa tem abordagem qualitativa e é de cunho exploratório, que de acordo com Gil (2002, p.
41), “têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo
mais explícito […]”. Além disso, buscamos apropriar da pesquisa teórico-bibliográfica, por conta da
necessidade da triangulação de dados para auxiliarmos compreender os resultados encontrados.
Para Marconi e Lakatos (2003, p. 158), “a pesquisa bibliográfica é um apanhado geral sobre os
principais trabalhos já realizados, revestidos de importância, por serem capazes de fornecer dados
atuais e relevantes relacionados com o tema”.
O levantamento que realizamos foi sustendo em resultados de pesquisas que discutem inclusão.
Selecionamos textos que apontem reflexões numa perspectiva inclusiva, especificamente sobre a
deficiência intelectual. Para Marconi e Lakatos (2003, p. 183), “a bibliografia pertinente oferece
meios para definir, resolver, não somente problemas já conhecidos, como também explorar novas
áreas onde os problemas não se cristalizaram suficientemente”. Além disso, os autores ainda
afirmam:

621
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A pesquisa bibliográfica tem por objetivo permitir ao cientista o reforço paralelo na análise de suas
pesquisas ou manipulação de suas informações. Dessa forma, a pesquisa bibliográfica não é mera repetição
do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou
abordagem, chegando a conclusões inovadoras (Marconi & Lakatos, 2003. p. 183).
Para o desenvolvimento da pesquisa, utilizamos como procedimento técnico, questionários com
questões abertas e fechadas, como forma de obter dados para a investigação. A pesquisa teve
andamento em uma escola pública, de Ensino Fundamental e Médio, no sudeste do Estado de Goiás,
Brasil. Participou da pesquisa um professor de Ciências/Química que trabalha com estudantes
especiais. Fizemos a imersão em uma turma do Ensino Médio, para verificar as metodologias
utilizadas pelo professor regente para trabalhar com o aluno DI.
De acordo com Marconi e Lakatos (2003):
Observação é uma técnica de coleta de dados para conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção
de determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas também em examinar
fatos ou fenômenos que se desejam estudar. A observação ajuda o pesquisador a identificar e a obter
provas a respeito de objetivos sobre os quais os indivíduos não têm consciência, mas que orientam seu
comportamento. Desempenha papel importante nos processos observacionais, no contexto da descoberta
e obriga o investigador a um contato mais direto com a realidade (Marconi & Lakatos, 2003, p. 191).
Posteriormente, aplicamos dois questionários ao professor regente. O primeiro teve o objetivo de
coletar dados sobre as ações inclusivas do professor em sua prática docente (veja no link
https://pcastro_fisica.catalao.ufg.br/up/551/o/Quadros_1_e_2_do_artigo_A_inclusao_de_estudante
s_que_apresentam_deficiencia_intelectual_como_acontece_nas_escolas.pdf, as questões do
primeiro questionário no Quadro 1).
Na sequência, aplicamos outro questionário ao Professor de Química (vide questionário no Quadro 2
do link acima). O instrumento teve objetivo de coletar dados sobre as expectativas do Professor,
quanto ao aspecto acadêmico do estudante com Deficiência Intelectual.

3 Resultados e discussões

As características pessoais do estudante com DI, analisado durante a pesquisa, são: possui dezoito
(18) anos de idade, tem acompanhamento neurológico desde os dez (10) e acompanhamento
pedagógico desde o início da vida escolar.
As observações realizadas permitiram verificar que o discente apresenta uma boa relação com os
colegas em sala de aula e que não há, por parte dos desses, nenhum tipo de discriminação. A
interação entre os colegas ocorre de forma habitual. No entanto, ao que se refere à sala de aula seu
comportamento muda, pois se difere um pouco em relação aos demais. Ele se mantém mais disperso
do conteúdo ministrado pelo Professor Regente.
Verificamos que a metodologia utilizada com o aluno DI, consiste em uma facilitação e não
necessariamente em uma adaptação, pois, o mesmo conteúdo trabalhado com os demais alunos é
trabalhado com discente especial, porém de forma mais fácil.
Para buscar solucionar um problema imediato da inclusão do aluno com Necessidades Educacionais
Especiais (NEE), algumas escolas utilizam como “soluções paliativas, todo tipo de adaptação: de
currículos, de atividades, de avaliação, de atendimento em sala de aula que se destinam unicamente
aos alunos com deficiência” (Batista & Mantoan, 2007, p. 17). Porém, essas soluções, por serem
voltadas exclusivamente para o aluno com NEE, “continuam reforçando o caráter substitutivo da
Educação Especial, especialmente quando se trata de alunos com deficiência mental” (Batista &
Mantoan, 2007, p. 17).

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Desta forma, a escola em que realizamos a investigação, utiliza o método tradicional de ensino com
todos os discentes, o qual ocorre por meio de apostila, aula verbal e exercícios de fixação. Sendo
assim, percebemos que os estudantes são avaliados em dois aspectos: bons receptores e
reprodutores de informações; ou desinteressado e que não gosta da escola.
Notamos, também, que a escola não fornece o Atendimento Educacional Especializado (AEE) para o
aluno com DI. O atendimento é feito exclusivamente durante as aulas com um Professor de Apoio
(PA). O PA fica próximo ao estudante na sala de aula, com o objetivo de colaborar com o seu
aprendizado, mas sim, facilita as suas avaliações. Talvez, seria interessante a existência de um
professor da Educação Especial para auxiliar o estudante mais profundamente.
A partir destas observações, foram utilizados questionários adaptados de Leão (2004), servindo como
base para obtenção de dados.

3.1. Análise do questionário relativo a formação do professor de química

Com a finalidade de conhecer os professores ligados ao processo de ensino e aprendizagem do aluno


DI na escola escolhida para a pesquisa, no quadro 3, apresenta-se a tabulação relacionada aos dados
da formação do professor regente.
TEMAS QUESTÕES
Tempo e orientação de atuação com o aluno D.I. 1–2
Preparação para trabalhar com o D.I. 3–4
Realização de Cursos 5
Opinião do professor sobre a aprendizagem do aluno D.I. 6–8
Apoio pedagógico na inclusão do aluno D.I. 7
Quadro 3. Formação do Professor para atuar com o DI.
Fonte: Adaptação de Leão, 2004.

A partir das respostas dos itens apresentados no quadro acima, que se refere à formação do
professor, verificamos que: o professor é graduado em Licenciatura em Química há
aproximadamente um (1) ano e atua como regente há menos de um (1) ano, sendo esta sua primeira
experiência na profissão. Em relação a ter trabalho em sala de aula inclusiva, respondeu que é a
primeira vez que tem contato com um estudante com NEE.
Quanto a sua prática em sala de aula, observa-se que o professor tem grande dificuldade na relação
com o aluno com DI. Pouco sabe acerca dessa deficiência. Além disso, não possui nenhum curso
específico na área da inclusão que a tenha capacitado para trabalhar com alunos inclusivos. O que
tem como base, são apenas as disciplinas relacionadas à formação docente, que ocorreram durante a
graduação, que esporadicamente tratavam do assunto “Educação Inclusiva”.
Isso reafirma o fato de que a formação dos professores é um ponto importantíssimo para a
concretização da educação inclusiva. Compreende-se que o professor não desempenha um trabalho
fácil, pois é necessário gerenciar limitações da sala de aula, que por vezes acontece por conta dos
problemas de infraestrutura da escola. A formação adquirida no ensino superior, geralmente não é
suficiente para prepará-lo para a realidade do cotidiano escolar. Atualmente, o docente assumiu o
papel de mediador do conhecimento, superando a ideia de transferência de informações. E, embora
tenha as dificuldades, o professor deve buscar ações para oferecer oportunidades reais de
aprendizado.
Nesse sentido, a partir da Declaração de Salamanca, documento considerado marco na história da
educação inclusiva no Brasil, foi atribuído aos governos o papel que “garantam que, no contexto de
uma mudança sistêmica, programas de treinamento de professores, tanto em serviço como durante
a formação, incluam a provisão de educação especial dentro das escolas inclusivas” (Declaração de
Salamanca, 1994). Além disso, sobre a obrigação de garantir a formação adequada dos professores

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nas escolas regulares, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) diz que as escolas
devem assegurar aos alunos com NEE “professores com especialização adequada em nível médio ou
superior, para atendimento especializado, bem como os professores do ensino regular capacitados
para a integração desses educandos nas classes” (LDBEN 9394/96). Porém, o que constatamos é que,
na prática, os professores estão chegando às classes regulares sem a devida formação e preparação
suficientes para desenvolver um trabalho baseado nas diferenças.
Em relação à orientação que a equipe gestora deve fazer aos professores novatos, o professor
participante da pesquisa ressalta ter sido comunicado sobre a presença do aluno com DI em sala de
aula. A direção da escola orientou, com explicações sobre as necessidades do aluno especial, pedindo
assim mais colaboração de sua parte, no sentido de estar mais atento ao estudante. Também
esclareceram que o trabalho realizado com o aluno com DI necessitava de adaptação e que ela
fizesse isso nas provas.
Essas adaptações na verdade, são questões similares às dos demais estudantes, porém, com um
conteúdo de menor nível de dificuldade. Então, o estudante realiza as provas com consulta, mas em
sala separada, acompanhado pelo professor.
Percebe-se aqui uma incoerência da escola em relação à adaptação da educação inclusiva.
Verificamos que a intenção da escola é adaptar o aluno com DI conforme as exigências da escola
tradicional e não a escola adaptar-se a ele.
Na Declaração de Salamanca encontram-se afirmações que esclarecem a obrigação do professor e
também da equipe gestora quando diz que, “os currículos devem adaptar-se às necessidades da
criança e não vice-versa. As escolas, portanto, terão de fornecer oportunidades curriculares que
correspondam às crianças com capacidades e interesses distintos” (Declaração de Salamanca, 1994).
Partindo da premissa que a Declaração de Salamanca traz a afirmação de que “as crianças com
necessidades especiais devem receber apoio pedagógico suplementar no contexto do currículo
regular e não um curriculum diferente” (Declaração de Salamanca, 1994), pode-se talvez justificar a
atitude da escola em adaptar as provas diminuindo os níveis de dificuldade das avaliações, na busca
de levar o mesmo conteúdo ao aluno com DI. Entretanto, esse posicionamento da escola acaba por
ferir os princípios da educação inclusiva que é o de garantir que todos os alunos tenham acesso à
educação de qualidade. Sabe-se que para incluir “o princípio orientador será o de fornecer a todos a
mesma educação, proporcionando assistência e os apoios suplementares aos que deles necessitem”
(Declaração de Salamanca, 1994). Portanto, o mais adequado é trabalhar com um currículo que
atenda todos.
Sobre a importância da educação inclusiva e o trabalho de inclusão, realizado com o aluno D I, o
professor ressalta que o trabalho é extremamente importante, no entanto, é necessário que se
tomem medidas para que não seja executado com desleixo. Quando isso ocorre, acaba se tornando
apenas um método para alcançar resultados quantitativos, onde o maior interessado – o aluno
inclusivo, não é levado em consideração. Dessa forma, essa perspectiva implica diretamente na
qualidade de ensino para esse discente e, sobre isso, o professor ressalta que: “É necessário, porém
se for feita com má vontade ou com um interesse acaba se tornando um simples método para
alcançar resultados para o governo, no fato de incluir mais uma aprovação e para um aluno com
necessidade especial” (Professor Regente, 2016).
Foi verificado que na opinião do Professor Regente, para que o aluno DI tenha um aprendizado igual
aos demais, precisa de apoio diferenciado, devido a forma com que obtém conhecimento. Considera
válido o apoio em tempo integral visando o aprendizado significativo, o que na escola em questão
não ocorre.
A participação da escola no processo de inclusão de alunos com NEE é um ponto crucial para o
sucesso do trabalho inclusivo, pois “a escola, para que possa ser considerada um espaço inclusivo,
precisa abandonar a condição de instituição burocrática, apenas cumpridora das normas

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estabelecidas pelos níveis centrais” (Goffredo, 1999, p. 45). Desse modo, entende-se que apesar da
escola passar por inúmeros problemas é da própria escola que devem surgir soluções, mas isso só
ocorre quando a mesma se “transforma num espaço de decisão, ajustando-se ao seu contexto real e
respondendo aos desafios que se apresentam” (Goffredo, 1999, p. 45). A escola considerada como
ideal é aquela “que não tenha medo de se arriscar, com coragem suficiente para criar e questionar o
que está estabelecido, em busca de rumos inovadores, e em resposta às necessidades de inclusão”
(Goffredo, 1999, p. 46).
A segunda parte do questionário foi elaborada a partir do modelo do questionário S.I.F.T.E.R.
(Anderson, 1989 apud Leão, 2004), utilizado para deficientes auditivos, modificado por Leão (2004) e
nesta pesquisa adaptado para a utilização com o aluno DI.

3.2. Análise dos dados em relação a expectativa do professor quanto a aprendizagem do estudante

No Quadro 4, serão apresentados os dados referentes às expectativas do professor regente em


relação ao aluno com D.I.
TEMAS QUESTÕES
Potencial e rendimento do aluno 1–3
Tarefas desenvolvidas e propostas 4–7
Compreensão da disciplina 8
Avaliações e notas 9
Desempenho quanto às metodologias 10
Expectativa quanto ao aluno 11
Quadro 4. Expectativa do Professor Regente quanto ao aspecto acadêmico do aluno com Deficiência Intelectual
Fonte: Adaptação de S.I.F.T.E.R. (Anderson, 1989 apud Leão, 2004)

No que diz respeito ao potencial e rendimento do aluno com DI, o professor acredita que o potencial
é “bom”. Porém, ao classificar o rendimento, em comparação aos demais, o docente afirma que ele
se encontra “abaixo da média dos demais”. Nesse sentido, o nível de dificuldade das avaliações
aplicadas para o aluno com DI, se encontra “abaixo dos demais”.
Sobre as tarefas aplicadas para o aluno com DI, o PR ressalta que o estudante se encontra “acima dos
demais” na realização adequada das atividades propostas em classe. Ela justifica sua resposta
afirmando que o mesmo realiza as tarefas de forma mais adequada em comparação aos demais, pois
sempre tem o apoio do PA. Além disso, as tarefas aplicadas a ele são todas com material de consulta.
Contudo, ressalta que o aluno com DI “raramente” realiza as mesmas tarefas propostas em classe e
extraclasse que os demais colegas. Diz que, “frequentemente” o aluno consegue finalizar as tarefas
sozinho, porque são adaptadas para sua melhor compreensão. Adaptação esta que, em muitos
casos, é considerada como facilitação.
Considerando o apoio durante as aulas e provas, realizado pelo PA, e considerando também que o
aluno com DI realiza todas as atividades com consulta, o PR ressalta que as notas do estudante com
DI se encontram “na média dos demais”. Em relação à compreensão da disciplina, o docente ressalta
que “raramente” este estudante necessita de mais explicações que os demais.
Quanto à expectativa do professor, em relação às metodologias de ensino utilizadas, o docente
considera como “razoável” o desempenho do aluno com DI. Todavia, ressalta que “frequentemente”
ele tem correspondido às suas expectativas e esforços.
Acreditamos que seja possível a educação inclusiva acontecer na escola, mas para isso é necessário
esforço de todos os profissionais da educação. Nesse sentido, torna-se necessário discutir a atuação
conjunta dos profissionais da escola, pois esta se consolida como um critério essencial para o
processo de ensino de alunos com NEE.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Entendemos que sem uma ação articulada visando à melhoria de todos os alunos da sala não é
possível que haja inclusão; ao contrário, cria-se uma exclusão dentro da própria escola. O
planejamento é uma dessas ações e deve ser elaborado pelo professor, pois como as metodologias
devem ser adaptadas, o conhecimento compartilhado é primordial.
Como o intuito da Educação Inclusiva é fazer com que todos os professores sejam regentes de turma,
sem atender exclusivamente o aluno com NEE, esse ponto é considerado como maior desafio.
Infelizmente, os docentes são formados para atender uma classe onde não haja diferenças. Nessa
concepção, todos conseguem receber o conhecimento com a mesma metodologia, que no caso é a
tradicional. No entanto, com ou sem estudante especial, cada um tem seu jeito de aprender e
necessita de métodos que os contemple efetivamente, com qualidade.
Nesse sentido, observa-se que a falta dessa ação conjunta prejudica muito o desempenho do aluno
com DI pelo fato de não considerar a sua forma individual de desenvolver. O método utilizado com
ele não propicia a sua emancipação intelectual pelo fato de “privá-lo” de provas, atividades e da
interação com os colegas (por não participar de atividades em grupo). Isso significa que nem sempre
os métodos e as avaliações utilizadas são suficientes para apropriar o que, de fato, foi adquirido pelo
estudante. Além disso, o esse não participa também das atividades em grupo na sala de aula,
dificultando a integração com os colegas.
A seguir, serão apresentadas as categorias e as variações de percentual que serviram como
parâmetro de tabulação dos dados obtidos por meio das diferentes questões.

3.3. Análise das respostas considerando o parâmetro utilizado


QUESTÕES
CATEGORIAS (%)
P.R.
Muito bom 90 a 100
Bom 70 a 89
1, 10 Razoável 50 a 69
Ruim 25 a 49
Péssimo Inferior a 25%
Muito acima da escala dos demais alunos 90 a 100
Acima da escala dos demais alunos 70 a 89
2, 3, 4 Na média da escala dos demais alunos 50 a 69
Abaixo da escala dos demais alunos 25 a 49
Muito abaixo dos demais alunos Inferior a 25%
Sempre 90 a 100
Frequentemente 70 a 89
5, 6, 7, 8, 9, 11 Às vezes 50 a 69
Raramente 25 a 49
Nunca Inferior a 25%
Quadro 5. Especificação das categorias de resposta do professor participante na pesquisa
Fonte: Adaptação da tabela de categorias de valores (Leão, 2004).

ASSUNTO QUESTÕES CATEGORIAS QUANTIDADE %

PR P.R. P.R.
Muito bom - --
1. Desempenho escolar do aluno
com DI 1, 10 Bom 1 50
Razoável 1 50
Ruim - --

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Péssimo - --
Muito acima da escala -- --
dos demais alunos
Acima da escala dos 1 33
demais alunos
2. Rendimento escolar em relação à Na média da escala -- --
2, 3, 4
realização adequada das tarefas dos demais alunos
Abaixo da escala dos 2 67
demais alunos
Muito abaixo dos -- --
demais alunos
Sempre 1 16
Frequentemente 2 34
3. Frequência em que o aluno com 5, 6, 7, 8, 9, 11 Às vezes -- --
DI, consegue realizar e finalizar as Raramente 2 34
atividades sozinho e sua Nunca -- --
compreensão da disciplina A questão nº 09 não foi 1 16
respondida pelo PR

Quadro 6. Média obtida a partir das categorias de resposta do professor participante


Fonte: Adaptação da tabela de categorias de valores (Leão, 2004).
Relacionamos a quantidade de questões respondidas calculando-se a média, em percentual, a fim de
fazer a verificação da classificação (%) que o aluno com DI se enquadra na visão do professor.
No primeiro (1) assunto que caracterizam “o desempenho escolar do aluno com DI”, referente às
questões (1,10) respondidas pelo PR, o percentual de respostas ficou em 50% e de acordo com as
categorias de respostas do Quadro 5, o aluno DI foi considerado “razoável”.
No segundo tópico (2), foram observadas as questões (2, 3, 4 – PR) aplicadas ao professor. Ele diz
respeito ao “rendimento escolar em relação à realização adequada das tarefas”. A média das
respostas ficaram entre 67% e 33%, o que significa, a partir da análise do Quadro 5, que o aluno com
DI obteve classificação entre “abaixo da escala dos demais” e “na média da escala dos demais” para
os dois professores.
Por fim, o terceiro tópico (3) referiu-se às questões relacionadas à “frequência em que o aluno com
DI consegue realizar e finalizar as atividades sozinho e sua compreensão da disciplina”. Dessas
questões (5, 6, 7, 8, 9, 11 – PR), o professor respondeu um total de cinco, considerando que a
questão 09 não foi respondida. Observamos que as questões respondidas pelo PR, tiveram média
entre 16% e 34 %. Os outros 16% corresponde à pergunta que não foi respondida. Desta forma,
verificamos que há uma grande divergência entre a teoria e a prática. Isso é percebido ao considerar
as notas do aluno com DI. O docente relata que ele se encontra com bom rendimento e na média dos
demais alunos. No entanto, segundo o professor, o estudante não desenvolve sozinho as suas
atividades.
Além disso, verificamos que ao analisar individualmente as respostas, encontramos em muitas
respostas com as alternativas “bom”, “muito bom” e “acima da escala dos demais” que foram
marcadas para analisar o desempenho do estudante. No entanto, ao realizar a média das respostas e
compará-las, percebe-se que ele não apresenta um bom rendimento.
Assim, nota-se que o trabalho do professor, talvez, não tenha sido efetivo, pois não permite que o
estudante consiga obter rendimento nem mesmo com o auxílio constante do PA. O que configura é
uma prática contrária ao que propõe a inclusão de forma geral e, principalmente na disciplina de
química, como veremos a seguir.

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4 Conclusões
Percebemos, durante a pesquisa, que a deficiência intelectual ainda é um desafio para os professores
da educação básica nas escolas brasileiras.
Apontamos resultados que evidenciam a dificuldade encontrada no trabalho inclusivo,
especialmente por ausência de condições dignas de trabalhos ao docente, assim como a falta de
formação continuada do professor. Infelizmente, a formação inicial não é suficiente para formar um
professor sensibilizado com a inclusão. Porém, é importante pontuar que todos os professores
precisam se capacitar para trabalhar com a diversidade, especialmente com estudantes com
necessidades educacionais especiais, uma vez que o professor é instrumento fundamental para a
emancipação dos discentes.
Observamos que outro grande entrave na inclusão do aluno com DI se refere ao fato de que a escola,
juntamente com a família, precisa se mobilizarem para que a inclusão aconteça. O fato é que,
inclusão, não é, somente, inserir o estudante no espaço físico da escola (Souza, Salles & Gauche,
2016).
Percebemos, na investigação, que o professor regente dificilmente consegue deixar de utilizar o
método tradicional de ensino, não porque ele não conheça outras possibilidades, mas porque suas
condições não permitem. O professor participante da pesquisa está em início de carreira, como
percebemos pelos dados coletados nos instrumentos, mas é fundamental que busque alternativas
para promoção da educação de estudantes com NEE.
As leis deixam claro que a escola não pode deixar de receber estudantes por terem quaisquer
necessidades. Diante disso, as instituições se consideram inclusivas, exatamente por ter que receber
todos os grupos de pessoas. Deste modo, reforçamos que há possibilidade de realizar a educação
inclusiva de forma eficaz na escola regular, mas os professores devem entender que cada aluno, tem
sua forma independente de aprender e cabe a ele reconhecer, em cada um, a sua capacidade. A
partir da pesquisa, entendemos que o próprio professor é quem deverá buscar as estratégias de
aprendizagem e formas de comunicação mais apropriada para seus alunos, que concretize a inclusão.
Entretanto, em uma pesquisa realizada por Souza (2014), foi constatado o difícil diálogo entre os
docentes e em formação continuada para que refletida, continuadamente, a sua prática docente.
Souza (2014) mostrou que, muitas vezes, os docentes trabalham em duas ou três instituições de
ensino, no Brasil, com quantidades exageradas de aulas semanais, para ter um salário digno. Diante
disso, como os professores poderão ter uma formação contínua para aprimorar a sua prática
pedagógica? O fato é que, enquanto não melhorar as condições de trabalho do professor,
dificilmente teremos uma educação que seja voltada para a formação integral de todos os
estudantes.
Ao analisar os questionários, aplicados aos professores, consideramos que a adaptação dos trabalhos
e provas, não se adequam a proposta de educação inclusiva na disciplina de química, pelo fato de
não estimularem o aprendizado efetivo e independente do aluno com DI; o contrário ocorre quando
a professora regente é orientada a elaborar provas com conteúdos mais fáceis para o aluno em
questão de conteúdos que não correspondem a sua área de formação.
Consideramos que é necessário unir esforços entre a comunidade escolar, a comunidade científica e
os órgãos públicos para que façamos, um dia, a inclusão acontecer, uma vez que os estudantes
possuem amparo legal que garante acesso à educação de qualidade. Constatamos, também, que há
uma dificuldade muito grande em encontrar bibliografias que tratem do atendimento de alunos com
necessidades educacionais especiais (Souza, Gauche & Salles, 2016), e principalmente se tratando do
DI. Mesmo que em algumas escolas brasileiras docentes se enveredam com propostas inclusivas – e
esses merecem todo o reconhecimento-, muitas vezes, não são refletidas e analisadas com vistas a
entender o impacto que as proposições podem gerar na escola. Desta forma é necessário refletir

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sobre as propostas metodológicas que vem sendo desenvolvidas nas escolas para que possamos
avançar no processo de inclusão.

Agradecimentos
Ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (IF Goiano), ao Programa de Pós-Graduação em
Educação em Ciências (PPGEduC) da Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Federal de Goiás (UFG).

Referências

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Ministério da Educação (Org). Atendimento Educacional Especializado em Deficiência Mental.
Curitiba: Cromos, 16-19.
Brasil. (1996). Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, - MEC, 1996.
Declaração de Salamanca. (1994). Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco). Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas
especiais. Brasília, 1994.
Gil, A. C. (2002). Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas.
Goffredo, V. L. F. S. (1999). A Escola como Espaço Inclusivo. In: Ministério Da Educação (Org). Salto
para o Futuro: Educação Especial: tendências atuais. 1999, 45-50.
Gomes, A. L. L. V. (2010). A pedagogia da negação. In: Ministério Da Educação (Org). A Educação
Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar. 2010, 7-8.
Leão, A. M. C. (2004). O processo de inclusão: a formação do professor e sua expectativa quanto ao
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Especial). UFSCar, São Carlos.
Mantoan, M. T. E. (2008). Colóquio: Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
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Biosfera, Centro Científico Conhecer, Goiânia, 11, (22), 91-99.
Souza, P. V. T., Gauche, R., & Salles, P. (2016). Apontamentos de um levantamento Bibliográfico,
sobre inclusão, na Revista Química Nova e Química Nova na Escola entre o período de 1995 a
2016. In: Anais do 36.º Encontro de Debates sobre o Ensino de Química (6.º Edeq), 2016,
Pelotas/RS. Anais…Pelotas/RS: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-
Grandense/ Universidade Federal de Pelotas.
Souza, P. V. T., Salles, P., & Gauche, R. (2016). Elementos para a elaboração de uma estratégia
didática para o ensino de química, destinada ao aprendizado de surdos e ouvintes, baseada em
Raciocínio Qualitativo. In: Anais do XVIII Encontro Nacional de Ensino de Química (XVIII Eneq),
2016, Florianópolis/SC. Anais…Florianópolis: Instituto de Química da Universidade Federal de
Santa Catarina, 2016.

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Comunicación digital y agenda cultural.


El caso de Facebook en la promoción de imaginarios urbanos

Alexander Buendía Astudillo1, Luis Eduardo Ruano2, Jaime Alejandro Gómez Cerón3.

Resumen. Se busca comprender cómo los espacios digitales (Facebook), se convierten en nuevas tribunas
de las organizaciones culturales, para proyectar una imagen de ciudad particular y cómo esa proyección está
estrechamente vinculada con el tipo de agenda cultural que se le propone a la ciudadanía. Son claves aquí,
el rastreo netnográfico y la perspectiva de etnografía virtual, por medio de las cuales se establece de qué
manera se configuran los discursos en la red. Como resultado se observa que, desde la agenda y la oferta
cultural para una ciudad, se transforma progresivamente la imagen que de ella se ofrece. Se recrea, por un
lado, un ejercicio de proyección de imaginarios urbanos, pero, también, se da un proceso educativo no
formal, en tanto que desde las organizaciones se enseña cómo es o debe ser concebida la ciudad.

Palabras Claves: Comunicación digital, agenda cultural, imaginarios urbanos.

Digital communication and cultural agenda. The case of Facebook in the promotion of urban imaginaries.

Abstract. It is important to understand how digital spaces such as (Facebook) become new spaces for
cultural organizations, to project a particular city image and how this projection is closely linked to the type
of cultural agenda that is given to citizens. These are key here, the netnographic tracing and the perspective
of virtual ethnography, by means of which it is established in what way the discourses in the network are
configured. As a result, it can be observed that, from the agenda and the cultural offer for a city, the image
that is offered is progressively transformed. One recreates, on the one hand, an exercise in the projection of
urban imaginaries, but, also, an informal educational process is given, while from the organizations it is
taught how the city is or should be conceived.

Key words: Digital communications, cultural agenda, urban imaginaries.

1. Introducción y referentes conceptuales

Las formas de interacción de la sociedad contemporánea en el mundo digital han dado origen a
estudios sobre las prácticas culturales que la digitalización propicia. Dichos estudios buscan
comprender cómo se dan las interacciones entre sujetos y cómo la sociabilidad se transforma en los
espacios virtuales. Este trabajo busca comprender cómo los espacios digitales a los que las
organizaciones culturales tienen acceso se convierten en nuevas tribunas para proyectar una imagen
de ciudad particular y cómo esa proyección está estrechamente vinculada con el tipo de agenda
cultural que se le propone a la ciudadanía.
La reflexión sobre los espacios de interacción social busca fundamentalmente entender a los sujetos
en escenarios construidos (Lamy, 2006). Complementariamente, vemos cómo las actuaciones de las
sociedades se mediatizan en espacios donde se desarrollan prácticas culturales que dinamizan el ser
y quehacer urbanos (Pereira, 2007; Hurtado, 2011; Buendía, 2014). En este sentido, es necesario
entender a la Internet como “un artefacto cultural, pero también [como] cultura; un tipo de cultura
con múltiples estratos” (Domínguez, 2007: 51).

1 Dr. Ciencias de la Educación, Mág. Estudios de la Cultura, Comunicador social-periodista. Prof Titular Depto Comunicación
Social, Universidad del Cauca. Popayán, Colombia. Grupo de Investigación ECCO. abuendia@unicauca.edu.co
2 Dr. Sociología. Mág. Métodos de Investigación en CC.SS. Profesor Investigador Titular, Universidad Cooperativa de
Colombia, UCC, programa de Psicología, Grupo de Investigación PSIEDU. Popayán, Colombia. luiseruano@gmail.com
3 Especialista en Comunicación Organizacional, Comunicador Social. Docente IE Nuestra Señora del Carmen, Popayán.
Estudiante de la Maestría en Educación (modalidad Investigación) Universidad del Cauca. Colombia.
alejandrogomezc@gmail.com

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Las prácticas y dinámicas ciudadanas, antes asociadas a procesos básicamente informativos, hoy se
ven inmersas en nuevos procesos comunicativos que tienden a estar ligados a los espacios que
ofrecen los medios digitales. En la actualidad, los sujetos —y las organizaciones— se relacionan y
socializan por medio de espacios digitales y soportes tecnológicos, haciendo de la comunicación
digital una práctica cotidiana. Esta comunicación no solo transforma las maneras de relacionarse,
sino que también cambia, en algunos casos, los contenidos y las dinámicas de comunicación.
Según Arango-Forero (2013) la comunicación digital puede asumirse como una dinámica que conecta
a la sociedad con nuevas estéticas, medios, usos, apropiaciones, audiencias y formas de ver e
interactuar a la ciudad. Scolari (2012), por su parte, señala cómo el mundo digital contribuye a la
creación de un escenario propicio para que se vivencie y experimente con las narrativas
transmediáticas. Una arista sumamente interesante por todo lo que implica en términos de piezas
comunicativas. La digitalización hoy en día apunta a la convergencia mediática y los discursos se
vuelven maleables ante estas nuevas posibilidades estéticas.
La ciudad, también vista desde lo digital, se presenta como “un objeto de consumo cultural” o como
un “acontecimiento de consumo cultural” (Guzmán Cárdenas, 1998), expuesta a cambios o
modificaciones en los imaginarios colectivos expresados por grupos sociales. La ciudadanía cultural
implica concebir que la ciudad presenta ofertas culturales, a las cuales los ciudadanos tienen acceso,
como consumidores, pero también como gestores y artífices del quehacer cultural urbano.
A propósito de los usos de la comunicación digital, sus dinámicas se relacionan directamente con
soportes digitales, vinculados por obvias razones con la conectividad por internet, condensando la
producción de las piezas comunicativas en bits y no en materiales análogos. Al respecto, Scolari
(2008) propone cinco características o aspectos diferenciadores para este modelo de comunicación:
la interactividad, la hipertextualidad, la digitalización, la reticularidad y la multimedialidad.
El mundo virtual, que permite la interacción directa e indirecta de los productores con los
consumidores, presenta nuevas formas de producir diferentes tipos de contenidos culturales que,
por su carácter, son asimilados, procesados y consumidos de maneras distintas por los ciudadanos
digitales. No obstante, si bien se trata de ciudadanos que tienen una activa participación en los
espacios digitales, se trata también de personas concretas que interactúan en el mundo digital, pero
que son los destinatarios y consumidores reales de la oferta cultural que se le propone a la ciudad.
En este sentido, dada la importancia actual de la visibilidad para las organizaciones, los productores
culturales tienden a concentrar sus esfuerzos en la aplicación de las tecnologías de la información y la
comunicación, para lograr una relación cercana con sus públicos; los cuales demandan la presencia
digital (sobre todo para informarse y estar al tanto de la oferta cultural de la ciudad) y la oportunidad
de interactuar con los productores de contenidos.
Entonces, los espacios digitales podrían suponer que se generan necesidades diferentes para los
productores y consumidores de contenidos. Amador (2010: 144) comprende las interacciones a
través de “hiperconexiones”, las cuales “hacen posible la redefinición de principios, ideas, prácticas y
formas de ser y estar en el mundo, esto es, un proceso evidente de mutaciones de la subjetividad
que transcurre en escenarios múltiples y heterogéneos”. Lo que está en juego, entonces, son las
nuevas maneras de estar juntos y las nuevas maneras de comunicar esa cercanía y conexión con los
otros a partir de aquellas cosas que se comparten como colectivo social.
La investigación que dio pie al presente trabajo se desarrolló en Popayán, una ciudad colombiana
intermedia, que carga con el peso de enunciarse como ciudad histórica, religiosa, hidalga y patricia,
en términos de Romero (1999). Otras perspectivas también la señalan como ciudad letrada (Rama,
2004). Whiteford (2008) y Crist (2008) señalan el importante legado histórico de la ciudad, y Buendía
(2014, 2016) afirma que Popayán posee una narrativa urbana tradicional que define sus rasgos
identitarios de una manera particular.

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Los orígenes de esta narrativa pueden ubicarse, entre otras fuentes, en el ensayo histórico y el
periodismo cultural que tuvo gran importancia en la ciudad durante buena parte del siglo XX. Dadas
las conexiones de la narrativa urbana con el periodismo cultural, se hace necesario seguir esta pista
investigativa en el sentido de determinar cuál es, hoy en día, el aporte del quehacer cultural en un
centro urbano que se enuncia, justamente, como ciudad cultural. La cuestión es que hoy en día los
promotores culturales ya no son, solamente, miembros pertenecientes a una élite ilustrada de la
ciudad, como pasó un siglo atrás. Hoy en día las organizaciones que proponen una agenda para la
ciudad son diversas, como varios son sus enfoques y sus propuestas.
Lo interesante en este nuevo panorama es que, gracias a los medios tecnológicos, tanto las
organizaciones como sus públicos pueden ser prosumidores de contenidos digitales (Arango, 2013).
Tanto los unos como los otros tienen la posibilidad consumir y generar contenidos lo que posibilita
que los imaginarios sobre la ciudad de Popayán, empiecen a pensarse en direcciones diferentes a las
que estaban históricamente establecidas.
Surgen entonces interrogantes sobre la permanencia y vigencia de los imaginarios sobre Popayán,
como territorio enraizado en la cultura y las élites letradas. A partir del surgimiento y consolidación
de algunas dinámicas que propicia la comunicación digital, vale preguntarse por los imaginarios de
ciudad que se proyectan desde las organizaciones culturales. Aquí entendemos los imaginarios
urbanos desde la perspectiva de Hiernaux (2009: 18), para quien “son fruto de la capacidad humana
para representar la ciudad a partir de las imágenes que se presentan de ella al individuo y a la
sociedad”. Es decir, los imaginarios, en este trabajo, deben entenderse como los discursos que se
concretan en actuaciones o prácticas sociales que se desarrollan en el espacio urbano.
En este punto resulta pertinente citar a Trilla (2004), quien hace referencia a los espacios donde se
pueden generar actividades o prácticas educativas, las cuales no están propiamente enmarcadas
dentro de un salón de clases o establecimiento educativo institucional, sino que es la misma ciudad
la que contiene en su naturaleza un carácter educativo. Además, hay necesidades educativas que son
complementadas por otros medios diferentes a las escuelas.
Así, las organizaciones culturales, a partir de la promoción de su agenda cultural, pueden originar
procesos educativos desescolarizados, que incentivan la reflexión sobre los imaginarios de la ciudad
de Popayán. En consecuencia, los medios de comunicación digitales permiten, a través de sus
espacios de interacción, la promoción de contenidos educativos de las organizaciones culturales, y
estos contenidos con seguridad superan el ámbito académico y trascienden hacia objetivos como el
ocio, la cultura o el entretenimiento.
Se podría pensar entonces que las oportunidades de conexión, anonimato, interacción y
subjetividad, entre otras, que tienen libremente los sujetos en internet, permiten que en las redes
sociales se creen otras miradas que reafirmen o desdibujen el imaginario de Popayán como ciudad
culta e hidalga. Además, surgen nuevos actores sociales con otros discursos que empiezan a
posicionarse y resulta pertinente conocer cuál es la idea de ciudad que se promueve desde la
comunicación digital a la que apelan. ¿Será que los contenidos generados en diferentes espacios de
interacción virtual pueden tener la suficiente información y promoción de una agenda cultural para
evidenciar unos cambios en los imaginarios históricos de ciudad? ¿Estos cambios de los imaginarios
se verán luego en un entorno por fuera del mundo digital?
Sobre las preguntas planteadas, las respuestas pueden ser variadas, pero es posible reflexionar en
algunos supuestos sobre lo que esté viviendo la ciudad. Gracias a los escenarios en donde se
desenvuelve la comunicación digital, se encuentra la ciudad experimentando el surgimiento de
nuevos o poco conocidos imaginarios, los cuales pueden ser diferentes a los hegemónicos. También
es posible que se estén expresando los mismos discursos de la narrativa histórica tradicional, pero
ahora soportados en plataformas digitales.

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2. Análisis descriptivo

El estudio consistió en revisar las publicaciones que cuatro organizaciones culturales4, realizan en la
red social Facebook. La revisión5 se hizo durante el año 2016 y se tuvo en cuenta, principalmente, lo
publicado en el espacio que la red social denomina actualización de estado en el muro. A
continuación, una breve descripción de las organizaciones culturales estudiadas:

Corporación Festival Corporación


de Música Religiosa de Gastronómica de Festival de Cine Corto
Popayán Cultural
Popayán Popayán de Popayán

Popayán Cultural
Espacio de comunicación cultural con un claro enfoque informativo, apoyado por varias empresas
privadas de la ciudad. En Facebook, esta organización publica con bastante periodicidad y
semanalmente se puede encontrar nuevos comentarios o publicaciones. La mayoría de eventos
culturales que se realizan en la ciudad tienen su espacio de promoción en Popayán Cultural. Además,
publica de otros medios temas locales o nacionales que traten el tema cultural o artístico.

Corporación Festival de Música Religiosa de Popayán


Surgió en 1964; desde entonces se encargó de mantener activa y sin interrupción la celebración del
Festival de Música Religiosa, que se realiza durante la Semana Santa. El nombre del festival cambió y
ahora se denomina Festival de Música de Popayán, con lo cual se nota el cambio del género musical;
por tanto, la música religiosa ya no es la única que hoy en día se interpreta en el Festival.

Corporación Gastronómica de Popayán


La Corporación es apoyada por algunas empresas regionales o nacionales para realizar su evento
central que es el Congreso Gastronómico de Popayán. La Corporación hace presencia en Facebook,
Twitter y en YouTube, en menor medida. En Facebook hay fotos de gran variedad de platos
preparados y publicaciones de eventos sobre cocina y fechas especiales.

Festival de Cine Corto de Popayán


Nace en 2009. Es un espacio para la presentación de producciones audiovisuales locales y nacionales.
El evento anual es organizado por la Corporación Cinematográfica del Cauca, con el apoyo de varias
organizaciones privadas. El objetivo es lograr un reconocimiento nacional e internacional para el
Festival de Cine. A la fecha se han realizado 8 ediciones del Festival y con él se ha consolidado de un
espacio cultural importante en Popayán.

4 Se estudian cuatro organizaciones culturales en virtud que estas son las más activas en cuanto a comunicación digital se
refiere. Un estudio inicial mostró 14 organizaciones con presencia en espacios digitales; sin embargo, una depuración
posterior permitió establecer que las cuatro aquí analizadas son las que más hacen presencia en la red social Facebook.
5 Para su caracterización se revisaron los contenidos de los espacios digitales de las organizaciones estudiadas. Las
imágenes fueron tomadas de sus páginas o perfiles en Facebook.

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Ahora bien, teniendo ubicadas las organizaciones, se procedió a revisar las publicaciones que cada
una de estas hizo en su respectiva Fan Page. Durante el año 2016, Popayán Cultural (PC) tuvo 163
actualizaciones, la Corporación Festival de Música Religiosa de Popayán (FESPO) tuvo 25
publicaciones, la Corporación Gastronómica de Popayán (CGP) actualizó su estado 71 veces y el
Festival de Cine Corto de Popayán (FCCP) publicó 216 veces en su muro.
De acuerdo con la metodología seguida, nos interesaba ver dos elementos: por una parte, queríamos
conocer qué tipo de uso se da a la comunicación digital por parte de las organizaciones culturales. De
otro lado, el interés se focalizó en establecer qué tipo de imagen de ciudad proyecta cada
organización y cuál es su oferta cultural. Con relación a la imagen proyectada de ciudad queríamos
saber si se proyecta o no una imagen tradicional, y en relación con la oferta cultural nos interesaba
determinar si dicha oferta responde a una concepción elitista de la cultura.
Una vez revisadas las publicaciones (Corbin & Strauss, 2002), pudo establecerse que las
organizaciones usan la comunicación digital de acuerdo con cuatro categorías de uso, así: 1. Uso
informativo/divulgativo; 2. Uso educativo; 3. Formación de públicos; 4. Generación de redes.
1. Uso informativo/divulgativo: aquí la comunicación está encaminada, básicamente, a dar cuenta de
lo que es y hace la organización. En términos de agenda cultural, este uso hace referencia a aquellas
actividades que la organización programa o las que ya realizó y se requiere de un registro que
muestre lo sucedido. En esta tipología de uso encontramos discursos que se refieren al quehacer de
la organización y a las actividades que desarrolla. Este uso nos lleva a inferir que las organizaciones
emplean la comunicación digital como una herramienta de promoción y socialización; como una
suerte de una tribuna. Bien puede resultar una concepción un tanto instrumental de la
comunicación, pero, en todo caso, se trata de una herramienta efectiva para darse a conocer.
El FESPO, por ejemplo, publicó lo siguiente: "Nos permitimos informarles que nuestro Festival tendrá
su concierto de apertura el sábado 19 de marzo a las 5 pm en el Teatro Guillermo Valencia, con un
recital lírico con la Mezzo-soprano Janeth López y el pianista Juan Coronado. Están cordialmente
invitados. ENTRADA LIBRE” (16/03/2016). Aquí es evidente el carácter informativo y divulgativo de la
publicación; por un lado, busca mostrar qué hay en el horizonte de las actividades por realizar y, de
paso, invitar a participar de la actividad —un recital, en este caso— que se ha programado.
En esta misma línea está Popayán Cultural cuando publica: “La Institución Universitaria Colegio
Mayor del Cauca, Unimayor, a través de su Centro de Estudios Urbanos, presenta el ciclo de
conferencias titulado ´De cómo la ciencia y la literatura convergen en un mismo camino. Tres autores,
tres miradas´ orientado por el Doctor en Geografía y profesor de la Universidad de Barcelona, Joan
Tort Donada” (17/05/2016). En esta publicación es claro que la organización no informa sobre una
actividad propia sino sobre un ciclo de conferencias que organiza una universidad. Esto, desde luego,
está en sintonía con los propósitos divulgativos de la organización, que se basan en dar a conocer
diferentes actividades de la agenda cultural que hay en la ciudad.
2. Uso educativo: Las organizaciones también emplean la comunicación digital como un medio
educativo. Cuando las actualizaciones de perfil y las publicaciones expresan una tendencia
instruccional, se evidencia que, de fondo, hay una intencionalidad educativa. Es decir, las
organizaciones buscan que sus seguidores adquieran conocimientos acerca de lo que ellas hacen o
promulgan. Si bien su carácter no es fundamentalmente formativo y por tanto su intención —en
primera instancia— no es generar habilidades o competencias, sí buscan que quienes tienen acceso a
la información que publican puedan conocer más sobre lo que hacen. Con ello, de alguna manera
garantizan que sus seguidores sean partícipes de un nicho —cultural o de mercado— que los
convierte en público cautivo que puede contribuir a difundir los propósitos de la organización.
“En el #8CineCorto no sólo ves cine, también puedes aprender cómo se hace. #MasterClass”
(12/11/2016). En esta actualización de estado del Festival de Cine Corto que promociona un espacio
formativo tiene también la clara intención de mostrar que el espacio cultural del festival no solo se

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dedica a la apreciación cinematográfica, sino que también hay espacios formativos. En consecuencia,
más allá de la promoción del taller lo que queda claro es que la organización propone como agenda
cultural para la ciudad no solamente una dinámica de apreciación y consumo cultural sino también
un proceso educativo: una “clase” sobre cómo se hace cine.
El Congreso Gastronómico publicó: “Con éxito se llevó a cabo el primer taller satélite en Puelenje,
chefs del SENA Cauca y el chef JG, enseñaron al público asistente, las bondades de optimizar los
recursos propios de la región” (06/09/2016). Si bien se cuenta cómo resultó un taller de formación
(exitoso), lo que la organización busca es explicitar que en el Congreso también se dan espacios
educativos. Gracias a ellos, la ciudadanía —en este caso de fuera del centro de la ciudad, porque se
trata de un “taller satélite”— tuvo la ocasión de aprender lo enseñado por los chefs que hacen las
veces de maestros instructores.
3. Formación de públicos: La formación de públicos está estrechamente ligada —casi que de manera
causal— con los usos previamente señalados. Por una parte, se forma públicos en la medida en que
estos conozcan qué hay en la agenda de cada organización. De otro lado, la formación implica una
dinámica instruccional que desarrolla contenidos y ofrece unas competencias básicas para
comprender, asimilar y disfrutar de la oferta cultural que se esté manejando. La formación de
públicos garantiza en buena medida la supervivencia de la organización, pues los públicos formados
serán aquellos que van a acoger la agenda que la organización promueva.
Con publicaciones como “Muestra del lanzamiento de la Orquesta de Cámara de Popayán”
(19/12/2016), o “Presentación del ensayo de la Orquesta de Cámara de Popayán” (14/12/2016) es
claro que la comunicación no se dirige necesariamente a un público formado y exigente. Se trata,
más bien, de mostrar cómo son las dinámicas de la producción y ejecución de la música clásica. Una
muestra y un ensayo no se presentan para un público exigente que busca un producto terminado; en
cambio sí puede dirigirse a nuevos públicos a los que se quiere llegar y cautivar. En este escenario el
nivel de exigencia de la ejecución es menor y se propende por acercarse a posibles nuevos
espectadores que aprendan a apreciar y a gustar de este tipo de música. Para ello es que se invita a
ver el “cómo se hace” (en el caso del ensayo). Los nuevos públicos se forman, justamente, a partir de
espacios no convencionales y de producciones no necesariamente terminadas, en cuyo caso, la
factura de las mismas está en proceso de perfeccionamiento.
El Festival de Cine Corto publicó: "Encuentro Municipal de Colectivos Audiovisuales Escolares,
Comunitarios y Ciudadanos en el Teatro Bolívar en el Marco del 8 Festival de Cine Corto de Popayán"
(12/11/2016). Aquí se pone en evidencia que las actividades del Festival no se enfocan
exclusivamente en la apreciación de producciones audiovisuales, también hay un espacio para
generar encuentros. En este caso se busca poner en diálogo a los colectivos audiovisuales del
municipio, y en particular a los colectivos, escolares, comunitarios y ciudadanos. El Festival es
entonces un espacio para que los nuevos públicos dialoguen entre sí con motivo del evento que
propicia el encuentro.
4. Generación de redes: Más que una tipología de uso, esta resulta una consecuencia lógica de las
dinámicas que propicia la comunicación digital desarrollada por parte de las organizaciones
culturales que proponen una agenda cultural para la ciudad. Al propiciar espacios de encuentro o
brindar talleres de formación, es claro que empieza a tejerse una red de relaciones que va más allá
del simple registro de asistentes. Esta red se vuelve dinámica e interactiva y los públicos empiezan a
ser interlocutores en la medida en que también se convierten en generadores de contenidos.
En primera instancia lo más lógico es que los consumidores de la información que generan las
organizaciones empiecen a ser los primeros en contribuir con la difusión (a manera de réplica) de
dicha información. Por otra parte, gracias a las lógicas de reticularidad e interactividad de la
comunicación digital (Scolari, 2008), estos destinatarios/consumidores de contenidos también
pueden ser productores de los mismos, así sea de manera parcial o puntual. Lo interesante aquí es

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ver cómo la comunicación que surgió en un punto específico puede volverse parte de otras redes de
comunicación que son dinamizadas por los usuarios/destinatarios primarios; estos, luego ponen a
circular dicha información por sus canales particulares, y de paso se convierten en prosumidores.
Un ejemplo de esa red imbricada de relaciones puede apreciarse en la siguiente publicación de la
Corporación Gastronómica: “Colombiana, gana concurso de Pintxos en el marco del IV Foro de los
Patrimonios en Hondarribia-España” (25/04/2016). Esta publicación (que incluía 4 imágenes) alcanzó
434 likes, 52 comentarios y fue compartida 222 veces. Estos números muestran que la información
trascendió los límites de los medios digitales que dinamiza la organización. La multiplicidad de veces
que fue compartida la publicación hace inferir que dicha información llegó a un número muy superior
de destinatarios de los que inicialmente se había previsto.
Situación similar pasó con la publicación del Festival de Cine Corto: "#DalePlay a nuestro promo
oficial. El cine se toma Popayán, no te quedes por fuera. #8CineCorto #PopayánDePelícula"
(01/11/2016). Esta obtuvo 575 likes, 14 comentarios y fue compartida 251 veces. La participación de
los públicos a través de las diferentes maneras que la red social permite, muestra que ya no se trata
de un público pasivo, sino que se constituye también en deliberante y que apuesta a constituirse —
en la medida de sus posibilidades— en generador de opinión y de información.
La generación y formación de redes opera, en el caso de las organizaciones culturales estudiadas,
como un escenario paralelo de comunicación digital que ya no depende de las organizaciones pero
que sí son propiciadas por ellas. Estas redes pueden replicar las mismas categorías de uso ya
señaladas o generar nuevas dinámicas comunicativas. Lo clave aquí consiste en observar que las
organizaciones apelan a las redes como un mecanismo que les garantice mayor visibilidad,
reconocimiento y posicionamiento social.
Más allá de los usos de la comunicación digital es importante establecer cómo esta comunicación
promueve —o no— nuevos imaginarios de ciudad cultural. En tal sentido, se procedió a calificar las
publicaciones de las organizaciones a partir de dos ejes de análisis. Por un lado, se analizó si las
publicaciones apuntaban a proyectar un imaginario tradicional de la ciudad. Por otra parte, se analizó
si a partir de los usos de la comunicación digital se promovía una agenda cultural que resultara
elitista para la ciudad.
De acuerdo con el análisis realizado, se procedió a ubicar a las organizaciones en un plano de
significación discursiva (Gutiérrez del Álamo, 2010; Ruano, 2015), que se puede sintetizar en el
siguiente gráfico.

Fig. 1. Plano de significación discursiva de cuatro las organizaciones culturales de la ciudad del Popayán.

Así las cosas, vemos cómo la organización que más promueve una imagen de ciudad tradicional es el
Festival de Música de Popayán, al mismo tiempo su oferta cultural corresponde a un carácter elitista

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de la cultura. En contraposición, encontramos a Popayán Cultural, que propone una imagen menos
tradicional de la ciudad y una oferta también menos elitista. Es decir, en la medida en que se
promueve un imaginario tradicional se presenta una oferta elitista, y viceversa, un imaginario menos
tradicional corresponde con una oferta menos elitista.
En otro eje, con un imaginario menos tradicional, pero con una oferta elitista se ubican las otras dos
organizaciones: la Corporación Gastronómica y el Festival de Cine Corto. La CGP proyecta una imagen
ligeramente más tradicional; el FCC, en cambio, proyecta una imagen menos tradicional (de hecho,
es la organización que promueve una imagen menos tradicional de las cuatro analizadas) pero
mantiene una oferta elitista. En este caso, se entiende el concepto elitista desde una perspectiva de
bagaje cultural, en el sentido de que la oferta del Festival está destinada a un público que debe ser,
cuando menos, conocedor del lenguaje cinematográfico.
El plano de significación discursiva también muestra que, en el eje de imaginario de ciudad
tradicional, pero con una oferta cultural menos elitista, no se ubica ninguna organización. Las cuatro
organizaciones estudiadas, así sea levemente, apelan a cierta concepción elitista de la cultura, pero
tres de ellas (CGP, PC y FCCP) apuntan a proyectar una imagen de ciudad menos tradicional.

3. Discusión

Las organizaciones culturales estudiadas —que además presentan una oferta cultural para la
ciudad— hacen uso de la comunicación digital. El espacio privilegiado donde esta comunicación se
despliega son las redes sociales, siendo Facebook un caso de sumo interés para su estudio y análisis,
pues gracias a esta red social las organizaciones llegan un público significativo y variado. Vemos
entonces que redes sociales y comunicación digital se constituyen en un fenómeno comunicativo que
implica nuevas dinámicas sociales que apenas estamos vislumbrando.
En los casos estudiados, pudimos establecer que el uso de la comunicación digital por parte de las
organizaciones culturales puede agruparse en cuatro tipologías que determinan la intencionalidad
comunicativa de los contenidos publicados. Estas permiten ver de qué manera las organizaciones
apelan a la comunicación digital como una herramienta altamente eficiente para proyectarse,
legitimarse y consolidarse socialmente como gestores culturales urbanos. Es decir, se trata de un
doble movimiento el que despliegan las organizaciones: por una parte desarrollan una agenda
cultural que busca ser atractiva y convocante, y por la otra buscan hacer presencia activa en
ambientes digitales que visibilicen su quehacer como organización cultural.
Paralelamente, nos dimos cuenta que los tipos de comunicación y la intencionalidad de los
contenidos determina qué clase de imaginario urbano está proyectando cada organización; así
mismo pudimos establecer qué tipo de oferta cultural se le está haciendo a la ciudad. El resultado es
que si bien hay una oferta cultural que tiende a ser elitista, el imaginario de ciudad que se proyecta
apunta ahora a ser el de una ciudad menos tradicional. Esto es sumamente importante pues el
imaginario de ciudad culta y letrada que tiene Popayán empieza a fracturarse, y la concepción de
ciudad histórica y tradicional que se tenía empieza a mostrar otros matices que hasta ahora eran
poco visibilizados.
En este trabajo fue clave el rastreo netnográfico (Turpo, 2008; Urraco, 2008), al igual que la
perspectiva de etnografía virtual, como la referencian otros autores (Corona, 2013; Domínguez,
2007). Esta búsqueda permitió establecer de qué manera se configuran los discursos en la red. Se
trata de discursos puntuales y focalizados, como lo demandan las dinámicas de la comunicación
digital, pero debe entenderse que, desde la perspectiva discursiva de las redes sociales, este tipo de
publicaciones operan como fuente.
Debemos resaltar la importancia y pertinencia del método netnográfico, pues este nos permitió
ubicar y comprender los discursos emergentes en torno a la ciudad. Esto, a la postre, nos permitió

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evidenciar de qué manera los discursos de las organizaciones culturales contribuyen con la
promoción de imaginarios urbanos con respecto a Popayán. En este sentido, el trabajo muestra que
la ciudad se sigue moviendo en unos referentes de hidalguía patriciado y tradicionalismo (Buendía,
2014, 2016), pero que más allá de ellos, a partir de la oferta cultural de las organizaciones, la imagen
de ciudad está girando hacia un estadio menos tradicional. No pasa lo mismo con la concepción de
cultura, pues esta todavía se ubica en un eje más elitista.
Otro aspecto que resulta pertinente subrayar es la manera como la etnografía virtual (Hine, 2004)
contribuyó a ubicar aquellos elementos de los imaginarios urbanos de “lo real” que son proyectados
en “lo virtual”, gracias a la comunicación digital ejercida por las organizaciones culturales. El análisis
de las dinámicas comunicativas que propicia la tecnología, permitió comprender de qué manera las
identidades compartidas o los patrones de comportamiento, se proyectan gracias a las conexiones
para el relacionamiento social que facilita la internet.
Tenemos entonces que las redes semióticas que se despliegan gracias a la comunicación digital son
configuradoras de imaginarios y procesos comunicativos. En nuestro caso, vemos cómo desde la
agenda y la oferta cultural para la ciudad se va transformando la imagen que de ella se ofrece. Allí
hay todo un ejercicio de proyección de imaginarios urbanos, pero, también, se da un proceso
educativo no formal (Trilla, 1993), en tanto desde las organizaciones se enseña cómo es o debe ser
concebida la ciudad.

Agradecimientos. A los grupos de Investigación ECCO de la Universidad del Cauca y PSIEDU de la Universidad
Cooperativa de Colombia, sede Popayán. Por su apoyo para la realización y presentación de este trabajo.

Referências

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O uso de videogravação como recurso para análise de interação


entre professora e alunos na contação de histórias

Renata Magalhães Naves¹, Silvana Goulart Peres¹, Flavio Ferreira Borges²

¹Departamento de Psicologia Escolar e Desenvolvimento - Instituto de Psicologia - Universidade de


Brasília, Brasil. renatanavespsico@gmail.com; sgperes@gmail.com
² UAE Ciências Exatas e Tecnológicas Regional Jataí – Ciências da Computação – Universidade Federal de
Goiás, Brasil. flavio@ufg.br

Resumo. O presente artigo tem como propósito apresentar a contribuição do uso de videogravação para
análise do processo interativo entre a professora e seus alunos no momento da contação de histórias. O
estudo se caracteriza como uma pesquisa de abordagem qualitativa em que foi utilizado o uso de uma
videogravação como recurso para análise das interações ocorridas no contexto de uma biblioteca escolar de
Educação Infantil . Participaram da pesquisa uma professora contadora de histórias e dezoito crianças, com
idade de 5 (cinco) anos. Foi relizada uma videogravação no momento da contação de histórias, o que nos
possibilitou analisar as informações pertinentes ao processo interativo a partir das atividades desenvolvidas
neste contexto de pesquisa. Conclui-se que o uso de videogravação se constitui como um recurso
preponderante por possibilitar assistir ao vídeo quantas vezes forem necessárias e identificar as minúcias
ocorridas nos eventos de interação.
Palavras-chave: Videogravação; Análise; Interação; Professora; Alunos.

The use of videorecording as a resource for interaction analysis between a teacher and her studens
in storytelling
Abstract. This article aims at presenting a contribution for the use of videorecording in the
interaction between a teacher and her students at the moment of storytelling. This paper is a qualitative
research in which there has been used videorecording as a resource to analyse all the interactions that
occurred in an early Childhood Education Library. The research's counted with the participation of one
storytelling teacher and eighteen five-year-old children. A videorecording was taken at the moment of the
storytelling, making possible the analysis of information related to that interactive process, basing the
research on activities that were developed in its context. The conclusion is that the use of videorecording
represents a major resource as it makes possible to watch the video as often as necessary and, hence, identify
all details that arose in the interaction events.
Keywords: Videorecording; Analysis; Interaction; Teacher; Students.

1 Introdução

Este trabalho tem por finalidade apresentar a contribuição do uso da videogravação para análise do
processo interativo entre a professora e seus alunos no momento da contação de histórias, pois o
vídeo como recurso metodológico é capaz de proporcionar aos pesquisadores maiores especificidades
de análises. Ao realizar a filmagem de um episódio há possibidade de ver o vídeo quantas vezes forem
necessárias e identificar os eventos importantes que ocorreram durante a atividade realizada.
As reflexões acerca da contribuição do uso de gravação em vídeo para análise do processo interativo
entre professora e alunos foram construídas a partir da experiência com o uso desse recurso em
pesquisa produzida por nós. A pesquisa a qual nos baseamos para a produção deste trabalho foi
realizada por meio do aporte teórico do desenvolvimento humano na perspectiva da Psicologia
Cultural com ênfase no contexto histórico-cultural e teve como objetivo analisar as interações

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ocorridas no contexto da Biblioteca Escolar entre a contadora de histórias e crianças que podem
favorecer o processo de significação em ser professora.
Os apontamentos descritos neste texto buscaram evidenciar os passos seguidos para a realização das
análises referentes ao material empírico construído a partir da escolha da videogravação como recurso
de construção de dados na pesquisa qualitativa. Na próxima seção, apresentamos uma revisão teórica
sobre os processos interativos e a gravação em vídeo. Em seguida, expomos a metodologia da pesquisa
e posteriormente a análise e discussão do processo de construção das análises de interação e,
finalmente, algumas considerações a respeito da contribuição deste recurso para análise das
interações.

2 Os processos interativos e a videogravação

Os processos interativos acontecem de forma dinâmica dentro de um contexto específico, pois a


constituição do ser humano ocorre na e pela relação que estabelece com o outro. Nesse sentido, a
partir desta relação os significados são construídos e compartilhados pelas atividades desenvolvidas.
Cada ser humano produz sua história nas interações, sendo um mecanismo bidirecional em que cada
relação é singular e única e que provoca desenvolvimento. O modelo bidirecional parte do pressuposto
que as pessoas transformam as mensagens culturais de modo ativo mediante a transmissão cultural
do conhecimento (Valsiner, 2012).
O centro organizador e formador da atividade mental do ser humano encontra-se na interação social.
Essa interação tem em sua base a linguagem, que constitui o sujeito enquanto ser histórico e social
(Bakhtin, 1929/2014; Vygotsky, 1984/2007), desde o nascimento e ao longo de seu desenvolvimento.
Desse modo, no plano das interações sociais e no desenvolvimento das pessoas, a interação verbal,
que ocorre por meio da palavra e do diálogo, é fundamental em narrativas que utilizamos desde a
infância, seja como ouvintes ou contadores, as quais carregam valores culturais que constituem o
sujeito como ser individual e social (Bakhtin, 1929/2014).
A constituição psicológica, social e cultural do humano demanda a compreensão de signos e
significados na perspectiva dialógica. Assim, no desenvolvimento humano, eles são o meio pelo qual
se apreende o contexto social e cultural. Desta forma as pessoas que estão em interação utilizam de
signos linguísticos e também de estruturas não verbais de ações em suas nuances como gestos,
expressões corporais e faciais, ritmos da fala, entonação da voz. Estes componentes nos auxiliam a
interpretar os sentidos que estão sendo dados e as relações estabelecidadas em determinados
contextos (Nunes & Branco, 2007).
Para a interpretação de dados provenientes de contextos interativos a videogravação possibilita captar
as nuances, citadas por Nunes e Branco (2007), que as pessoas utilizam para significar seus
posicionamentos. Assim, a videogravação representa um meio de registro da imagem que preserva
situações passadas que podem ser analisadas no presente. Ademais, com o surgimento de novas
tecnologias, a utilização de vídeos e filmes tornou-se uma possibilidade para realização de análises de
informações em pesquisas qualitativas, pois o “o vídeo tem uma função óbvia de registro de dados
sempre que algum conjunto de ações humanas é complexo e difícil de ser descrito compreensivamente
por um único observador, enquanto ele se desenrola” (Loizos, 2002, p.149).
Em determinados contextos de pesquisa o recurso da videogravação favorece as análises de forma
microgenética por apresentar minuciosamente as interações ocorridas. A análise microgenética é
frequentemente associada ao uso de videogravação, envolvendo o domínio de estratégias para a
filmagem e a atividade de transcrição (Góes, 2000). Este recurso permite que sejam feitas várias
revisões dos dados obtidos empiricamente. Para Eisenberg e Lemos (2010) em pesquisas relacionadas
a crianças em grupos vale ressaltar que há um intenso movimento de falas ao mesmo tempo,

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brincadeiras, gestos e diálogos no momento da observação. Sendo assim, alguns detalhes somente
podem ser captados e analisados mediante o uso da gravação em vídeo.

3 Metodologia

A metodologia pode ser descrita como a forma de produção do conhecimento científico e os diferentes
meios em que os conhecimentos são construídos pelos pesquisadores são perceptíveis na maneira
como eles escrevem sobre os acontecimentos de seu interesse (Valsiner, 2012). Assim, este estudo
adotou a metodologia qualitativa por aproximar-se das nossas intenções de pesquisa e ser um modelo
que nos possibilita compreender gradualmente o fenômeno social e nos coloca no contexto dos
participantes, ou seja, vemos os fenômenos sociais de maneira abrangente (Bauer & Gaskell, 2002;
Creswell, 2007).
A pesquisa qualitativa é apoiada a partir dos pressupostos e das estruturas interpretativas com
abrangência em algumas características como: (1) é construída em contexto natural e é comum os
pesquisadores terem interações com os participantes no decorrer da pesquisa; (2) o pesquisador é
uma ferramenta essencial para construção de dados; (3) podem ser utilizados múltiplos métodos como
entrevistas, observações, grupos focais para reunir dados relevantes para pesquisa; (4) envolve
raciocínio complexo na esfera entre o indutivo e o dedutivo; (5) o foco da pesquisa é engendrado na
perspectiva dos participantes a partir dos seus significados; (6) os dados emergem e evoluem a partir
da inserção do pesquisador no campo de pesquisa, não configura uma rigidez preestabelecida; (7) é
reflexiva interpretativa quando há um posicionamento do pesquisador; (8) apresenta uma visão
abrangente de uma determinada situação complexa (Creswell, 2007, 2014).
O estudo qualitativo é empreendido quando necessitamos de uma compreensão complexa e
detalhada da questão a ser analisada. Desta forma, esta pesquisa teve como intuito apresentar o
percurso proposto no levantamento da construção dos dados necessários e realizados a partir do uso
de videogravação para análise do processo interativo entre a professora e seus alunos no momento
da contação de histórias.
A videogravação foi utilizada como recurso metodológico para construção de dados ocorridos no
momento de contação de histórias com o propósito de melhor analisar as interações entre uma
professora contadora de histórias e as crianças no contexto da biblioteca escolar de uma instituição
de Educação Infantil da Secretaria de Educação do Distrito Federal. Este recurso foi escolhido por
permitir a captura do momento em que ocorrem as interações, bem como possibilitar inúmeras
revisões, a fim de melhor analisar o fenômeno pesquisado.

3.1 Contexto e participantes da pesquisa

O estudo foi desenvolvido em uma escola pública de Educação Infantil do Distrito Federal que possui
Biblioteca Escolar ativa desde 2011 e atende alunos, professoras, funcionários e também a
comunidade externa. Os participantes foram a professora contadora de histórias e 18 (dezoito)
crianças, sendo 10 (dez) meninos e 8 (oito) meninas, com idade de 5 (cinco) anos, de uma turma de 2º
período da Educação Infantil.

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3.2 Procedimentos de análise dos dados

A videogravação do momento da contação de histórias teve duração de 38:90’ e mostrou-se um


recurso de pesquisa produtivo por permitir resgatar posteriormente a organização do tempo e do
espaço, as cenas, as falas e interações entre a professora e as crianças, entre crianças e crianças e entre
crianças e o espaço exterior no contexto da contação de histórias na biblioteca. O registro em vídeo
permitiu conservar detalhes que a observação direta poderia ter deixado de registrar. O vídeo
produzido funcionou como uma memória audiovisual das atividades, possibilitando um registro mais
seguro, preciso e objetivo, captando comportamentos e nos mostrando fatos que só percebemos
quando assistimos às cenas repetidas vezes (Carvalho, 1996). É importante salientar que para a
apresentação da análise dos dados o texto do vídeo foi degravado e transcrito na íntegra.
As transcrições permitem ao pesquisador uma análise criteriosa a respeito de cada fala, ações e
expressões dos participantes da pesquisa. Assim sendo, enquanto fazíamos a transcrição da
videogravação percebemos o quanto as palavras, ações e gestos carregam significados diversos, a
depender do contexto de análise. A retomada da leitura nos proporcionava novas interpretações a
respeito do processo interativo que estava em estudo. Faz-se necessário destacar que assistir ao vídeo,
fazer as transcrições, lê-las e assistir novamente ao vídeo são estratégias muito valiosas que devem
estar entrelaçadas visando a qualidade das análises e discussões dos dados.
Uma vez que o objetivo do presente trabalho consiste em apresentar a contribuição do uso de
videogravação para análise do processo interativo entre a professora e seus alunos no momento da
contação de histórias. Elencamos nesta sessão discorrer sobre as análises e a discussão dos resultados,
a partir da transcrição dos dados organizados conforme veremos no quadro 1.

Quadro 1. Tópicos para organização dos dados transcritos

Tema Denominado a partir das atividades realizadas no contexto a ser analisado.


Tempo Duração, que determina o início e o fim da atividade referente ao tema.
Descrição Relato dos acontecimentos ocorridos que podem ser analisados visualmente
por meio da videogravação.
Fala Conversas, diálogos, monólogos que são estabelecidos nas interações.
Expressão gestual Exteriorização de gestos, expressões faciais e corporais apresentadas no
e corporal decorrer da atividade.

Foi construído um quadro detalhado das interações ocorridas no momento da contação de histórias,
contemplando os tópicos apresentados no quadro 1 a partir das interações estabelecidas entre a
professora e as crianças. Por interações consideramos os diálogos que foram transcritos de forma
literal para a construção de temas por meio de análise dialógica da conversação adaptada à Psicologia
(Pontecorvo, Ajello & Zuccermaglio, 2005; Caixeta, 2006). Após a análise dos temas, fez-se a seleção
de algumas passagens da conversação e procedeu-se a análise para identificar os processos interativos
nos turnos das falas dos participantes da pesquisa.
A transcrição de vídeos não se reduz somente em transformar o que se ouve em textos escritos, faz-
se necessário também organizar campos para descrever o que se vê e como são interpretados aquilo
que foi visto e transcrito. No quadro 2 apresentaremos um exemplo da análise de dados das interações
observadas no início da videogravação.

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Quadro 2. Análise de dados das interações observadas no início da videogravação

Tema Tempo Descrição Fala Expressão


Gestual e
corporal
Entrada 00:01 As crianças vieram da sala Prof.: Agora então vamos A professora da
das 02:08 de aula acompanhadas da sentar, um menino e uma biblioteca aponta
crianças professora regente. Elas menina. Ali, senta ali, um para as 10
na estão em fila, na porta da menino e uma menina. cadeiras que
biblioteca biblioteca. A professora Agora lá no chão, ali bem estão na posição
da biblioteca está na perto do Willian. Oh, quem de um
porta para recebê-las e tá sentado nas cadeiras é semicírculo.
pede para as crianças pra permanecer nas Quatro crianças
sentarem nas cadeiras e cadeiras. que estão
no chão. As crianças vão Carlos: Quem tá sentado no sentadas nas
entrando uma por uma e chão, é pra permanecer no cadeiras estão
vão se organizando chão. apontando para o
conforme o pedido da Prof.: Ok. Aqui Miguel, cenário e
professora (um menino, Miguel, Miguel tá bom meu discutindo o que
uma menina). Nesse meio amor senta mais pra cá. é. A professora
tempo as crianças estão Guilherme... Miguel, você abraça o aluno
olhando para o cenário e entendeu o que a tia falou que ela chama de
um menino diz.... Outras meu amor? O que a tia Miguel e pede
crianças falam sobre o pediu para você fazer, do carinhosamente
cenário e também sobre lado do Lucas, vem mais que ele sente do
fantoches. A professora para cá um pouquinho. Isso. outro lado onde
regente entra por último Tá bom, tá bom. as crianças estão
e senta em uma Paulo: É de mágico, não é? sentadas no chão.
cadeirinha atrás das José: É fantoche. Miguel senta
crianças. Paulo: Ele falou que é de onde a
mágico. professora
Joana: Gente, dá para ver indicou.
que não tem muito espaço
pra ficar ali de trais.
Artur: Eu tenho um
fantoche do Kiko e do
Chaves e também da
Chiquinha.

A construção do quadro, a partir dos tópicos para organização dos dados transcritos, permitiu detalhar
as atividades ocorridas e possibilitou interpretar que a sequência das ações organizadas pela
professora pode ser denominada como estratégias pedagógicas. Desta forma, foi possível construir
um diagrama intitulado por nós como “Estratégias Pedagógicas utilizadas pela professora contadora
de histórias no contexto da Biblioteca Escolar”, que será apresentado na figura 1.

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Chegada das
crianças na
biblioteca
Situando
Estratégias pedagógicas conhecimentos
utilizadas pela professora prévios das
contadora de histórias no crianças
contexto da Biblioteca Escolar
Charlote,
realidade
na Enigma da
biblioteca Discussão história “Quem
da história soltou o Pum?”

Fig. 1. Diagrama das estratégias pedagógicas utilizadas pela professora contadora de histórias no contexto da Biblioteca
Escolar.

Este diagrama das estratégias pedagógicas expõe de maneira clara e sucinta as atividades realizadas e
favorece de forma integral e detalhada a visualização da dinamicidade dos acontecimentos ilustrando
como a professora se organizou para fazer a contação de histórias. Associado a este tema, faz-se
necessário destacar a importância das estratégias pedagógicas pautadas nas relações sociais e
ressaltar que essas não podem ser consideradas apenas como um recurso externo. Deve-se ir além: a
perspectiva é que elas possam atuar para contribuir com o ensino-aprendizagem de forma ativa e
motivadora e que sempre esteja direcionada para a pessoa que aprende e não para o conteúdo a ser
aprendido (Tacca, 2006). Assim, podemos considerar que as estratégias norteiam, de maneira
interacional, o “professor na criação de canais dialógicos, tendo em vista adentrarem o pensamento
do aluno, suas emoções, conhecendo as interligações impostas pela unidade cognição-afeto” (Tacca,
2006, p. 48).
A partir da organização representada no diagrama, foi possível realizar a microanálise dos seis
episódios da contação de histórias. A microanálise se insere na análise microgenética, a qual se
apresenta como uma forma de construção dos dados que requer a atenção a detalhes e o recorte de
episódios interativos, sendo o exame orientado para o funcionamento dos sujeitos focais, as relações
intersubjetivas e as condições sociais da situação, resultando em um relato minucioso dos
acontecimentos (Góes, 2000).

3 Análise e discussão dos resultados

Para facilitar a leitura das análises e propiciar a discussão dos resultados apresentaremos na figura 2 o
mapa de significados das microanálises feitas a partir das estratégias pedagógicas utilizadas pela
professora para fazer a contação de histórias na Biblioteca Escolar. Os episódios foram apresentados
por meio de eventos, que são únicos, com o intuito de proporcionar ao leitor uma melhor apreensão
das interações ocorridas.

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Fig. 2. Mapa de significados da contação da história.

Elaborar o mapa de significados dos episódios de microanálises, bem como descrever os eventos,
revelaram como eixo norteador para as análises minuciosas dos processos interativos em um espaço
de construção de conhecimento, que pode ser dinâmico e dispor de possibilidades de expansão das
experiências e assim favorecer o desenvolvimento e a negociação de significados aos participantes
desse contexto.
Cada evento apresentado na microanálise ilustra as interações ocorridas, seja entre a professora e as
crianças, como também entre a criança e seus pares. E para enfatizar as interações ocorridas nos
turnos das falas dos participantes, elencamos um episódio de microanálises com seus respectivos
eventos para exemplificar o referido procedimento.

Microanálise do episódio Memória da história da semana anterior

Evento 1 – Bom dia!


Professora: Ok. Bom dia, crianças!
Crianças em coro: Bom dia!
Professora: Tudo bem com vocês?
Crianças em coro: Sim...

Evento 2 – Lembrando-se da bruxa Samanta


Professora: E a tia esqueceu da história da semana passada, eu não sei o nome.
Joana: foi a bruxa.
Artur: a bruxa, a Samanta!
Professora: Como é, Artur? Ah, mas faltou aí uma qualidade da Samanta.
Carmen: A Samanta era gordinha.

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Evento 3 – Ações da bruxa


Professora: Gorducha para ir ao baile das bruxas. E o que é que vocês aprenderam com aquela história?
Joana: Exercício.
Professora: Exercício? Que tipo de exercício, de escrever?
Crianças: ahãm! Não!
Joana: De nadar. Eu me lembro...
Pedro: de nadar...
Professora: nadar.
Pedro: correr...
Professora: correr...
Pedro: de bicicleta.
Professora: andar de bicicleta.
Marcelo: Comer legumes...
Professora: Comer legumes, que mais?
Pedro: Beber água.
Professora: Beber água, mais? Ah, hábitos saudáveis, não foi?
Pedro: Sim.

Evento 4 – Hábitos Saudáveis


Professora: Aiiiii, aquela historinha é muito bacana, heim? Hábitos saudáveis incluem o que: tomar água, fazer atividade
física, comer legumes, frutas, verduras, arroz, feijão, carninha. E sanduíche?
Pedro: Nãaao!
Professora: E doce?
Pedro: Não!
Professora: Aquele biscoitinho que vocês trazem num saquinho?
Marcelo: Chocolate
Carlos: Chocolate não pode.
Manoel: Eu como bolo de chocolate.
Pedro: Não!
Professora: E aquele salgadinho?
Artur: Tia, sabia que ontem, eu peguei, eu levei um, eu comi um salgadinho que ele era bom, ele era saudável. Eu comprei
no mercadinho ali com minha mãe, que nesse mercadinho só tem coisas saudáveis.
Professora: Ele era saudável, Artur? Ai que bom! Bacana! É reflexo do que se diz aqui.
Professora: Olha, um falando de cada vez.
Artur: E tem barra de cereal que é pra ficar que é pra ficar magro.
Marcio: que é saudável
Risos da Professora.
Professora: Diga, meu amor!
Tatiana: Às vezes meu pai sempre traz pra mim uma melancia...
Professora: Melancia, e você gosta de melancia?
Tatiana: Uhummm!
Professora: a Magali também gosta.
Tatiana: Magali! (criança dá risada).
Professora: Então, tá bom! Vamos falar da história de hoje? Eu vi que a história da Samanta foi joia! E vocês aprenderam
um monte de coisas com a Samanta Gorducha vai ao Baile das Bruxas.

Ao cumprimentar a turma, o tom da fala, os gestos, o olhar da professora convoca as crianças a


participarem das interações verbais de forma amistosa e afetiva. Desta forma, refletimos que a
receptividade da professora é um fator que possibilita o bom desempenho das crianças no ambiente
educativo. Para Pinto e Branco (2009), na educação formal, os objetivos referentes à cognição e
disciplina são claros, enquanto que os objetivos sociais, afetivos e morais são ocultos no currículo
formal e perceptíveis a partir das interações entre professor e alunos no cotidiano escolar. Assim,
percebemos que os objetivos sociais e afetivos ocorreram mediante vivências e experiências que
aconteceram na comunicação entre as crianças e a professora no início do episódio.
Para dar início às memórias da história contada na semana anterior e apresentadas no evento 2:
“Lembrando-se da bruxa Samanta”, a professora simulou, usando expressões faciais e gestos, ter

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esquecido a história. As crianças, estimuladas pela professora, reagiram à sua estratégia, de forma
responsiva ativa, uma vez que, para Bakhtin (1979/2011), “toda compreensão é prenhe de resposta, e
nessa ou naquela forma a gera obrigatoriamente: o ouvinte tornar-se falante” (p. 271). Assim, notamos
que as crianças se envolveram por meio de uma ação concreta dotada de intencionalidade ao interagir
e reportar às lembranças da história contada.
No evento 3 – Ações da bruxa, quando a professora lançou um questionamento sobre as características
da personagem contada na semana anterior, houve interesse das crianças. Elas ficaram empolgadas,
começaram a imaginar e recorreram à memória para listar os exercícios realizados pela “bruxa”,
protagonista da história. Conforme Vygotsky (2009), a imaginação está muito arraigada ao conteúdo
de nossa memória por estar entrelaçada na nossa experiência. Elas narraram a partir das lembranças
da experiência vivenciada sobre a história da bruxa na semana anterior.
No evento 4 – Hábitos Saudáveis –, a professora, em sua enunciação, teve uma entonação verbal e
uma expressão gestual que aguçaram as crianças a falarem sobre hábitos saudáveis, e, concordando
com Bakhtin (1929/2014), a palavra do locutor produz uma intencionalidade com sentido. Assim,
percebemos que a professora tinha a intenção de proporcionar momentos para uma reflexão das
crianças acerca dos lanches que fazem parte dos seus cotidianos. Quando falou sobre doces e
salgadinhos, a professora mudou sua entonação de voz, usou gestos de negação e expressão, ao
mesmo tempo, instigando a narrativa das crianças acerca do que sejam alimentos saudáveis.
Consideramos que as intervenções da professora na condução da memória passada também são
influenciadas por pensamentos que são narrados pelas próprias crianças: “as repetições e as
reformulações tendem a ser precedidas por réplicas elaboradas por uma criança” Orsolini (2005, p.
132). Quando utiliza as repetições das falas das crianças, a professora, de certa forma, encoraja os
interlocutores a avançar os discursos. Orsolini (2005), a esse respeito, esclarece que ao repetir ou
estender a informação introduzida por uma criança, o/a professor/a torna o conteúdo semântico do
discurso mais elaborado e mais compreensível para todos os participantes. Isso se deve à
probabilidade de que a informação trazida por uma criança esteja ao alcance das demais crianças.
Nesta microanálise foi possível percebermos que a estratégia de mediação utilizada pela professora
possibilitou que as impressões adquiridas na história passada pudessem ser rememoradas a partir da
linguagem verbal e não verbal.

4 Conclusões

As interações estabelecidas no contexto da biblioteca favoreceram o desenvolvimento tanto das


crianças quanto o da professora, pois esse espaço está permeado por múltiplas linguagens. Nesta
perspectiva, consideramos que a videogravação como recurso para análise de dados das interações
em pesquisa qualitativa foram preponderantes para realização do estudo.
As transcrições, a organização dos dados por meio de tópicos e a elaboração do diagrama contribuiram
de forma relevante para a pesquisa por possibilitar interpretações minuciosas acerca das atividades
da professora relacionadas às suas ações, pois a videogravação nos apresentou dados precisos e nos
permitiu manter detalhes que na observação direta poderiam não ser captados.
Para finalizar, acreditamos que este trabalho possa contribuir e dialogar com pesquisas qualitativas
que tem o intuito de utilizar a videogravação como recurso para análise de interações, apresentadas
neste trabalho a partir da descrição dos procedimentos. Este percurso metodológico nos propiciou
realizar uma microanálise das interações, que consideramos pertinente para realização de pesquisas
em Ciências humanas, em nosso caso específico no enfoque da Psicologia do Desenvolvimento.

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Referências

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Análise das interações entre docentes do Ensino Superior


em uma CoP online
1
Anna Cecília Bezerra ,
Francislê Neri de Souza2,
1
Autarquia do Ensino Superior de Garanhuns (AESGA), Brasil. acbs35@gmail.com
2Universidade de Aveiro, Portugal. fns@ua.pt

Resumo. A comunicação mediada por computadores tem sido largamente empregada em diversas áreas,
inclusive com bastante expressão na formação para o trabalho. O objetivo central deste artigo é analisar a
qualidade das interações na construção partilhada do conhecimento dos intervenientes através do modelo
proposto por Hou e Wu (2011). Para isso, desenvolvemos uma pesquisa explicativa. Os dados foram
selecionados dos textos resultantes das interações vivenciadas em três sessões de formação mediadas por
ferramentas TIC,com professores da Autarquia do Ensino do Ensino Superior de Garanhuns (AESGA),
propostas através da CoP Online, realizadas em 2013. A análise dos dados foi realizada com o uso do
software de análise qualitativa WebQDA.Conclui-se que os resultados obtidos nessa experiência repetem os
resultados apresentados pelos autores do modelo de análise utilizado, demonstrando que as CoP Online
podem influenciar beneficamente na construção das competências do docente, através da partilha de
saberes em um ambiente virtual harmonioso.
Palavras-chave: CoP Online, Competências docente, aprendizagem continuada.

Analysis of interaction between teachers from Higher Education in a PCo Online


Abstract. Computer-mediated communication has been widely implanted on several areas, including with
enough expression on continuous professional development. The objective of this article is to analyze the
quality of the interactions on shared construction of knowledge of the mediators through the model
proposed by Hou and Wu (2011). For that, we developed an explanatory study. The data were selected from
texts resulting of the interactions experienced in three sections of training mediated by TIC tools, with
teachers from the Autarquia do Ensino Superior de Garanhuns (AESGA), proposed through the PCo Online
held in 2013. The data analyses were made with the use of the qualitative analysis software WebQDA.
Concluding that in this experience repeated the results presented by the authors of the model used in this
analysis, demonstrating that the PCo Online can influence beneficially on the construction of the teacher’s
competences, through the share of knowledge, in a virtual harmonious environment.
Key-words: PCo Online, teacher’s competences, continued learning.

1 Introdução

A adesão ao uso de ferramentas informáticas tem ampliado os espaços de interação entre pessoas
que têm interesses comuns. A comunicação mediada por computador tem sido largamente
empregada em diversas áreas, inclusive com bastante expressão na formação para o trabalho
(Recuero, 2009). Nesta dinâmica, as Comunidades de Prática (CoP online)apresentam-se como uma
alternativa de incentivar a formação contínua do profissional, integrando-o aos seus companheiros
de trabalho numa perspectiva de fomento à aprendizagem.
As CoP online têm a vantagem de ultrapassar a barreira de espaço para promover a interação entre
os participantes. Além disso, podem facilitar a integração de novos membros e divulgar boas
práticas, além de fomentar a inovação dos processos de produção. Contribuem também como um
meio mais rápido de resolver problemas, uma vez que a discussão em busca das possíveis soluções

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pode ser feita através de ferramentas de comunicação síncrona ou assíncrona, permitindo as


contribuições mais diversas (Costa, 2005; Filipe, 2008).
Neste artigo analisamos as interações de professores numa CoP, através de sessões de formação
online. O objetivo central desta investigação é analisar a qualidade da interação na construção do
conhecimento dos intervenientes através do modelo proposto por Hou e Wu (2011). Para isso,
desenvolvemos uma pesquisa explicativa (Gil, 2009), selecionando trechos das interações resultantes
de três sessões de formação propostas através da CoP Online, realizadas em 2013. Para análise dos
dados, foi utilizado o software de análise qualitativa WebQDA. Os resultados foram analisados numa
abordagem mista, utilizando dados quantitativos e qualitativos para entender a dinâmica de
interação estabelecida na CoP Online.
Inicialmente, apresentamos uma breve fundamentação sobre o desenvolvimento das CoP,
nomeadamente daquelas cujo ambiente de desenvolvimento é virtual. Em seguida, apresentamos a
CoP Online AESGA, ambiente criado para o desenvolvimento de competências docentes. Por fim,
apresentamos as reflexões acerca do potencial das interações desenvolvidas nestes ambientes para a
promoção de microaprendizagens.

2. Características das Comunidades de Prática (CoP)

As TIC apresentam um potencial de dinamização das comunidades, mediando interações,


dispensando a presença física dos intervenientes, e, preservando a essência da filosofia deste tipo de
formação que é a partilha e a aprendizagem colaborativa. As CoP online são alternativas exequíveis,
pois ultrapassam a barreira tempo-espaço, não sendo necessário marcar excessivos encontros
presenciais para promover situações de aprendizagens entre profissionais.
Em relação ao desenvolvimento de competências pedagógicas dos professores,conforme as
investigações de Clark e Hollingsworth (2002), as CoP devem desenvolver atividades que
contemplem os domínios quatro domínios distintos: a) Domínio pessoal (conhecimentos crenças e
atitudes do professor), b) Domínio da prática profissional, c) Domínio da consequência (resultados) e
d) Domínio externo (fontes de estímulo, informação e apoio). Esse modelo é importante, pois nos
mostra a fundamental eficácia da formação em serviço, pois é do domínio pessoal e profissional que
a mudança se opera.Ou seja, é na relação com o mundo escolar que se transformam as concepções
profissionais do professor. A introdução de novas metodologias de aprendizagem deve ser feita
aproveitando a sinergia do grupo, onde todos crescem e renovam suas práticas, apoiando-se
mutuamente.
Portanto, as CoP online apresentam-se como uma alternativa a ser explorada para a construção
destas competências, uma vez que são formadas por pessoas que estão engajadas na aprendizagem
de um domínio específico do conhecimento. São profissionais que discutem práticas, compartilham
experiências e buscam soluções para problemas em comum.

2.1 As interações através das CoP Online

Para promover a formação através das CoP online é preciso ter em mente que a aprendizagem está
situada no campo das interações, onde todos aprendem com todos. Portanto, conforme Au, Reiner e
Urbanowski (2005), as CoP online fundamentam-se em: i) em crenças, em valores e visão comum; ii)
em liderança compartilhada; iii) em aprendizagem coletiva; iv) em condições favoráveis, nos aspectos
estruturais e relacionais, e, v) em partilha da prática pessoal. Para tanto é fundamental adquirir a
confiança dos membros, que irão participar mais ativamente, partilhando seus conhecimentos e
experiência. Para alcançar este intento, conforme Wenger (2000), cinco desafios precisam ser
enfrentados para incentivar a criação e implantação de comunidades de prática nas organizações: 1)

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legitimar a participação, 2) negociar seu contexto estratégico, 3) discutir os problemas a partir de


práticas reais, 4) estar em sintonia com a organização e, 5)fornecer suporte, no caso das CoP online,
suporte tecnológico para o seu desenvolvimento. Trata-se, portanto de um desafio coletivo no
aproveitamento do potencial das TIC para a formação do profissional que envolve todos os setores
da instituição educacional para promoção do desenvolvimento equitativo do docente em serviço.
Na aprendizagem online é fundamental o estímulo a conversação entre os participantes, reforçando
o espírito colaborativo (Giordan & Dotta, 2006). Como a interação através dos computadores ou
dispositivos móveis dependem majoritariamente das trocas textuais,apresenta-se a vantagem de
disponibilizar o registro das interações para análises posteriores, e utilização destes em momentos
diversificados do processo de ensino e de aprendizagem (Ferreira & Santos, 2008).
Huges (2010) enfatiza a educação em comunidade como uma alternativa à educação tradicional,
podendo se apropriar da popularidade das redes sociais para a promoção da aprendizagem em rede.
Através dosoftware social é possível promover uma aprendizagem situacional, conforme os
pressupostos das CoP(Wenger, et al., 2002). Nesta plataforma, os utilizadores partilham suas rotinas
diárias e colaboram na resolução de problemas comuns. A partilha de vivências e as discussões
destas decorrentes são características intrínsecas das CoP. Kabilan et al (2010) expõe que no uso
educativo dos softwares sociais, os utilizadores são capazes de: i) Aumentar suas competências, ii)
Aumentar o seu autoconhecimento, iii) Valorizar a aprendizagem ao longo da vida, iv) Melhorar as
habilidades sociais, v) Desenvolver a autoconfiança.

3. Metodologia

A comunicação mediada por computadores tem sido amplamente analisada em diversos aspectos. A
análise do corpus de dados resultantes das interações tem possibilitado um olhar múltiplo sobre o
uso destes recursos. Através das ferramentas informáticas, a comunicação síncrona ou assíncrona
tem contribuído para a criação de ambientes virtuais de aprendizagem, cuja principal característica é
a colaboração entre os intervenientes deste processo. Neste estudo, propomos uma pesquisa
explicativa que, de acordo com Gil (2009, p. 42) “tem como preocupação central identificar os
fatores que determinam ou contribuem para ocorrência dos fenômenos.” Utilizamos o modelo de
análise das interações proposto por Hou e Wu (2011). Estes autores utilizam um modelo de análise
das mensagens, conseguidas através da interação com o uso de ferramentas síncronas, como os
textos base das mensagens instantâneas e as vídeo conferências. Neste modelo, os autores
classificaram as mensagens decorrentes das interações como dentro do tema(on topic) ou fora do
tema (off topic). Apesar de caracterizar um desvio do tema central da discussão, os autores
defendem que as discussões fora do tema contribuem para a solidificação de um ambiente amistoso
e amigável.
Neste estudo, as interações analisadas decorreram de três encontros de formação, com professores
da Autarquia do Ensino Superior de Garanhuns (AESGA). Estas interações foram desenvolvidas com o
auxílio do Skype, uma vez que a formadora estava em Aveiro (Portugal) e os participantes da
formação em Garanhuns (Pernambuco, Brasil). Optamos por este modelo por acreditar que as
ferramentas síncronas favorecem a partilha de conhecimentos e posterior feedback, aumenta a
tomada de decisão negociada e favorecem as habilidades de brainstorming, bem como desenvolve
as habilidades de questionamento e argumentação (Chou, 2002; Hsieh & Tsai, 2012). Os textos
resultantes foram analisados com o software WebQDA (Neri de Souza et.al, 2012) tendo a
mensagem como unidade de texto, preservando assim o contexto onde ocorreram. Este software
facilita a classificação dos excertos em categorias, formando árvores conceituais, que podem ser
transformados em matrizes de análise dos conteúdos, tanto facilitando o trabalho do pesquisador,
quanto preservando a fidedignidade dos dados.

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4. Resultados e discussão

Com a emergência dos softwares sociais tornou-se possível formar grupos com pessoas dispersas no
espaço, cuja interação fundamenta-se no interesse mútuo, na convivência regular, ultrapassando-se
a territorialização, característica essencial ao conceito tradicional de comunidade (Costa, 2005). A
popularidade destes meios de comunicação social despertou-nos o interesse quanto ao seu
aproveitamento para atividades educativas, nomeadamente para a formação continuada de
professores, no modelo de CoP. Para viabilizar a Comunidade de Prática dos Professores da AESGA
(CoP online/AESGA), optamos por criar uma página para a comunidade no software social Facebook.
A CoP online/AESGA foi construída e disponibilizada aos docentes desta Instituição no dia 20 de Abril
de 2012.Optamos por um grupo fechado, para que os membros se sentissem mais à vontade para
partilhar suas dúvidas, ideias e sugestões. Atualmente, a CoP conta com 70 membros, sendo que
destes, 61 ativou seus perfis ao fazer ao menos um acesso à CoP online/AESGA, correspondendo a
67,77% do total de docentes em exercício na instituição.

4.1 Análise das sessões online

Para dinamizar as atividades da CoP Online AESGA, delineamos três encontros de formações online,
que decorreram no período de 07 de fevereiro a 08 de março de 2013, com os seguintes objetivos: I.
Conhecer a Plataforma ArguQuest como instrumento de ensino e de aprendizagem através do
questionamento e da argumentação. II. Verificar as potencialidades das aplicações pedagógicas do
ArguQuest. III. Discutir as possibilidades de construir, através da plataforma, uma prática de ensino
ativo aplicada aos cursos presenciais, centrada do estudante.
O ArguQuest foi criado em 2012 na Universidade de Aveiro, no âmbito das propostas educativas do
Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF) em parceria com
o Laboratório de Conteúdos Digitais (LCD). É uma plataforma online num modelo web social, de
operação intuitiva, que visa promover a aprendizagem ativa e pensamento crítico num ambiente
colaborativo e distribuído. Embora existam alguns softwares que lidam com as competências de
argumentação, nenhum deles estimula a discussão argumentativa despoletados pelo
questionamento, em um ambiente virtual, alinhado ao cloud computing e aplicando as ferramentas
usualmente utilizadas nas redes sociais, a exemplo dos chats. Neste ambiente virtual, as atividades
são organizadas em projetos e as interações ocorrem em sete fases consecutivas, com ênfase na
colaboração e interação entre os pares, com os professores, e com a plataforma para construir um
pensamento mais elaborado (Neri de Souza, et al., 2010). A comunicação mediada por computadores
tem sido amplamente analisada em diversos aspectos. Atualmente a troca de mensagens entre os
participantes através de uma rede de computadores é uma prática comum ao curso de EaD, bem
como recurso de ampliação do tempo didático em cursos presenciais, em uma lógica b-learning. A
análise do corpus de dados resultantes das interações tem possibilitado um olhar múltiplo sobre
recursos. Através das ferramentas informáticas, a comunicação síncrona ou assíncrona tem
contribuído para a criação de ambientes virtuais de aprendizagem, cuja principal característica é a
colaboração entre os intervenientes deste processo. Destacamos a seguir alguns modelos
reconhecidos na análise das aprendizagens conseguidas a partir da interação online, sejam síncronas
ou assíncronas.

4.2 Natureza das mensagens: dentro do tema ou fora do tema

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Ao analisar os textos resultantes das interações nos encontros síncronos, identificamos um grande
percentual de mensagens fora do tema, ou seja, que não se relacionavam diretamente com o tema
da discussão. Na análise e compreensão dos resultados é preciso levar em consideração a duração da
interação. A primeira sessão foi mais longa do que as duas posteriores, na qual obviamente
verificamos maior quantidade de discussões. Na primeira sessão, analisamos 202 mensagens, na
segunda sessão 63, e na terceira sessão, 92 mensagens. Através do critério classificador das
mensagens em: i) dentro do tema e 2) fora do tema, obtivemos o resultado exposto no gráfico 1:
Percentual de mensagens dentro do tema e fora do tema
Dentro do tema Fora do tema

Sessão 1 (N= 202) 55,40%


44,60%

Sessão 2 (N=63) 57,10%


42,90%

Sessão 3 (N=92) 31,50%


68,50%

Gráfico 1: Percentual de diálogos dentro do tema e fora do tema das sessões online

Fonte: Da autora, 2014.

Os resultados repetem àqueles obtidos por Hou e Wu(2011) na análise das atividades online através
de ferramentas síncronas com estudantes do secundário. No quadro 1, temos exemplos de
mensagens classificadas como dentro do tema e forma do tema, identificados nas sessões de
formação.

Quadro 1: Exemplo de mensagens Dentro do tema e fora do tema


Mensagem Classificação Sessão de
Formação
[05/02/2013 15:33:39] A. C.: Pronto. Então, vejam: estão com o Fora do tema Sessão 1
PPT?
[05/02/2013 15:33:50] O. L.: Estou.
[05/02/2013 15:33:50] M. M.: G. não respondeu.
[05/02/2013 15:34:03] A. C.: será que ela caiu?
[22/02/2013 14:28:37] A.C.: O título da página é LISTAGEM DE Dentro do Sessão 3
PROJETOS. Cliquem em CRIAR PROJETOS tema
[22/02/2013 14:28:56] M. M.: poor favor questão de ordem Sra.
Presidente! nós vamos hoje então partir para a fase de
administrador antes de percorrer todos os caminhos da discussão
inicial não é?
[22/02/2013 14:29:15] W. L.: ok. cliquei

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[22/02/2013 14:30:18] A. C.: Vamos para a parte de


administrador, e depois, como estamos em fases diferentes, vou
ajudando a medida que precisarem nas fases da discussão. Certo,
M.?
Fonte: Da autora, 2014.

À medida que as sessões se sucedem observamos a redução das mensagens fora do tema, uma vez
que os participantes já estavam socializados e já conheciam a dinâmica de trabalho nos encontros.
Além disso, os compromissos assumidos nas vivências presenciais ensejaram a redução das
mensagens fora do tema, utilizando com maior eficiência o pouco tempo disponível para estas
sessões. Apesar disso, as conversas fora do tema são um indicador importante quanto ao ambiente
virtual construído para a interação. Quando mais confiantes as pessoas se sentem no ambiente de
aprendizagem, maior é a tendência de participar, e com isso expor seus pensamentos com menor
reserva.

5 Conclusão

O ciclo de formações online foi organizado em três sessões através do Skype, que apesar das
dificuldades, resultaram positivamente. Nestas sessões, apresentamos o software aos participantes,
introduzindo as discussões com perguntas acerca de suas percepções das estratégias que
comumente utilizavam em sala de aula. Enquanto construíam suas compreensões da estratégia de
ensino e de aprendizagem e acerca da operação da plataforma, os professores partilhavam suas
experiências e questionavam-se quanto ao uso do sistema nas aulas presenciais. Em seguida,
focamos as discussões na operação do ArguQuest e passamos a trabalhar nesta plataforma.
O resultado apresentado repete os resultados obtidos nas investigações dos autores do modelo de
análise escolhido. Além disso, e reforçando o aspecto positivo dos resultados alcançados com a
experiência realizada com professores do ensino superior, diversos autores indicam que as
interações virtuais são construtivas. Portanto, entendemos que as atividades de formação
continuada através duma comunidade de práticas devem ser mescladas, ou seja, devem se realizar
tanto em ambiente virtual, quanto através de contatos presenciais, aproximando mais os
intervenientes e reforçando os sentimentos de pertença.
Em resumo, a par dessas exigências sócio educacionais, percebemos que a formação em serviço é
uma alternativa possível à construção de novos conhecimentos e integração aos conhecimentos
prévios do professor. A partir das experiências vivenciadas no exercício do magistério, os
profissionais podem partilhar problemas, dúvidas e buscar soluções em conjunto para
enfrentamento das questões específicas de seu contexto, bem como desenvolver competências
através de micro aprendizagens. A formação das Cop. é, comprovadamente, uma estratégia de
sucesso do desenvolvimento de competências profissionais nas grandes empresas. Além de prover
aprendizagens, reforça o sentimento de pertença e delineiam a cultura da organização, contribuindo
para a formação da identidade profissional coletiva. Com e através das TIC estas formações podem
ultrapassar as barreiras do espaço e do tempo, através da comunicação online. As Cop. online são
estruturas inovadoras que apostam na comunicação mediada por computadores para a circulação de
informação e construção de conhecimento. A adaptação destes modelos de interação à formação
continuada dos professores gradativamente solidifica-se como mais um espaço integrador de
competências pedagógicas.
A aprendizagem online caracteriza-se pela colaboração entre os intervenientes, que mesmo
dispersos no espaço podem interagir e construir conhecimentos. Através de ferramentas disponíveis

655
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online, as interações podem ocorrer de modo síncrono, em tempo real, ou assíncrono, quando os
internautas não estão ao mesmo tempo conectados. A aprendizagem decorrente das interações
pode ser estruturada e analisada, com o objetivo de perceber como aprendem e qual o grau de
construção do conhecimento produzido pelos intervenientes. De acordo com a abordagem,
investigadores estruturaram modelos para analisar as mensagens, buscando indícios de
aprendizagem. Existem inúmeras ferramentas disponíveis que oferecem imensas possibilidades de
aprendizagem, que podem ser utilizadas eficazmente na formação continuada de professores. Um
campo vasto para investigações que contribuirão positivamente para a melhoria da qualidade de
ensino e de aprendizagem das novas gerações.

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Deficientes intelectuais, por que não estão nas Universidades?

1
Mário Sérgio Pereira de Aguiar , Juliana Eugênia Caixeta, Raimunda Leila José da Silva 1
Paulo França Santos2
1
Faculdade UnB Planaltina, Universidade de Brasília, Planaltina, Brasil. mariiosergioaguiar@gmail.com;
eugenia45@hotmail.com
2
Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação, Salvador, Brasil. pfrancaster@gmail.com

Resumo. Nesta pesquisa, identificamos os motivos que levam estudantes com deficiência intelectual a não
ingressarem na educação superior. A relevância desta pesquisa se centra na certeza de que a educação
superior possibilita ao indivíduo a continuidade do processo de escolarização na perspectiva da
profissionalização. Para a construção de dados, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com
estudantes universitários, professores e estudantes da Educação de Jovens e Adultos Interventivo do Ensino
Médio. Estes tinham diagnóstico de deficiência intelectual (DI). A análise de conteúdo permitiu organizar os
significados das falas em três motivos: a) preconceito; b) falta de informação e c) falta de formação de
professores. Esta pesquisa indica que o processo de inclusão escolar, na educação superior, precisa ser
questionado, uma vez que é na diversidade que vamos combater preconceitos e gerar novas possibilidades
de atuação na sociedade e nas universidades.
Palavras-chave: deficiência intelectual; motivos; ingresso; educação superior.
Abstract. In this research, we identified the reasons intellectual disabilities students do not join higher
education. This research relevance focus in the certainty that higher education grant to student the
possibility of studies continuity in a professionalization way. To build the data, semi-structured interviews
were conducted with university students, professors and students from Adult and Young Education Program
from High School level diagnosed with intellectual disabilities. The analysis of the interviews divided the
meanings of the speeches in three reasons: a) prejudice b) lack of information c) lack of professor formation.
This work indicates that school inclusion, in higher education, must be questioned, once is in the diversity
that we combat prejudice e generates new possibilities of actuations in society and higher education.

Keywords: intellectual disabilities, reasons, enter, higher education

1. Introdução

Mesmo com a existência de leis e diretrizes, como a Constituição Federal (Brasil, 1988) e a Lei de
Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (Brasil, 1996), que garantem o direito e o acesso à
educação para todos, vemos que, na educação superior, no Brasil, poucas são as pessoas com
deficiência que tem conseguido ingressar, permanecer e concluir um curso de graduação.
De acordo com o Censo da Educação Superior (Brasil, 2015), o Brasil registrou cerca de 7 milhões e
300 mil estudantes matriculados em Instituições de Ensino Superior (IES); destes, apenas 0,41%
apresentavam alguma deficiência e/ou transtorno. Dada esta problemática, esta pesquisa versa
sobre a percepção de estudantes universitários e de estudantes com deficiência intelectual, que
cursam o ensino médio no Programa de Educação de Jovens e Adultos Interventivo (EJAI), e seus
professores sobre o ingresso de estudantes com deficiência intelectual na universidade.
O programa EJAI foi implementado pela Secretaria de Educação do Distrito Federal com o objetivo de
garantir escolarização para estudantes com deficiências e/ou transtornos que não se adaptaram ao
processo inclusivo em sala regular (Governo do Distrito Federal, 2014). No caso desta pesquisa,
foram entrevistados professores e estudantes, com diagnóstico de deficiência intelecutal,
matriculados no ensino médio, primeiro ano, em uma classe especial da escola Flor de Liz, uma

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escola regular do Distrito Federal, Brasil. O objetivo desta classe especial é prover contextos
educacionais que prevejam estratégias pedagógicas de adaptações curriculares, aulas práticas e
vivenciais que podem favorecer o processo de inclusão escolar e social deles (Lima, Rodrigues, Alves,
Aguiar, Caixeta, Salla, Jesus, & Silva, 2017). Esta classe foi escolhida por ser a primeira classe de
Educação de Jovens e Adultos a avançar para o ensino médio. Portanto, há uma proximidade, de
fato, desses estudantes com a finalização do ensino médio e, portanto, uma possibilidade de
interesse pela educação superior.

2. Fundamentação Teórica

O artigo 205, da Constituição Federal Brasileira (Brasil, 1988), define que o acesso à educação é um
direito de todo e qualquer cidadão, sem restrição e independentemente das diferenças e limitações
que apresentem, sejam elas de natureza física, motora ou cognitiva. Porém, quando fazemos uma
análise de Leonel, Leonardo e Garcia (2015), Silva, Souza, Prado, Ribeiro, Lia e Carvalho (2012) e
Simionato (2011), sobre a realidade da educação superior no Brasil, evidenciamos que há matrículas
de estudantes com deficiência visual e física, mas pouca ou nenhuma matrícula de estudantes com
deficiência intelectual. Na pesquisa de Leonel e colaboradores (2015), por exemplo, dentre os
estudantes com deficiência matriculados na Universidade Estadual de Maringá, 54% dos/as
estudantes com deficiência apresentavam deficiência visual parcial, necessitando apenas de óculos
para a correção e nenhum estudante com deficiência intelectual.
A relevância de pesquisas que investigam o acesso e permanência de estudantes com deficiência, em
geral, e com deficiência intelectual, neste caso, se centra na certeza de que a educação superior é um
direito de todos que possibilita ao indivíduo, com ou sem deficiência, sua inclusão social, pela
continuidade do processo de escolarização na perspectiva da profissionalização. Portanto, as
possibilidades de aprendizagem se referem a conhecimentos científicos, culturais, tecnológicos e
humanísticos que permitirão a construção de novos posicionamentos de si, especialmente,
relacionados à atuação profissional, que constrói identidade (Sousa, Caixeta, Santos, 2011).
Se por um lado, sabemos que a deficiência intelectual se caracteriza por “limitações significativas,
tanto no funcionamento intelectual quanto no comportamento adaptativo, expressas nas
habilidades adaptativas, conceituais, sociais e práticas, originando-se antes dos dezoito anos de
idade” (American Associati on Mental Retardation – AAMR, 2002, p. 8), por outro, defendemos que
as interações sociais, intencionalmente organizadas nos espaços formais de aprendizagem, são
capazes de criar contextos ricos para a compensação das deficiências biológicas. Isto significa que a
deficiência intelectual não pode ser compreendida como um fenômeno biológico, apenas, mas como
um fenômeno social, tal como proposto por Vigotsky (1995). Em outras palavras, a teoria de Vigotsky
(1995), baseada no interacionismo, explica que as interações sociais permitem a superação das
deficiências biológicas, ou seja, a pessoa com deficiência pode compensar sua deficiência biológica
por meio de estimulações, empreendidas nas interações, que favorecem o desenvolvimento das
funções mentais superiores: atenção voluntária, pensamento verbal, memória lógica, etc. (Silva,
Mendonça, & Mieto, 2015; Silva, Ribeiro, & Mieto, 2010). Para Vigotsky (2011), “o desenvolvimento
cultural é a principal esfera em que é possível compensar a deficiência. Onde não é possível avançar
no desenvolvimento orgânico, abre-se um caminho sem limites para o desenvolvimento cultural
(p.17)”.

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As implicações da teoria de Vigotsky (1995; 2011) são evidentes. Para a Psicologia e Sociologia,
evidencia que a deficiência não está no corpo da pessoa deficiente, mas no contexto sociocultural,
que a exclui. Com isto, ele não nega a deficiência, o prejuízo orgânico da pessoa, mas entende que a
deficiência pode ser superada pelas relações sociais. Para a educação, a escola é espaço privilegiado
de inclusão social, portanto, as pessoas com deficiência devem estar na escola regular, inclusive, na
universidade, devidamente matriculados e registrados como estudantes, como regem os variados
documentos internacionais, como a Declaração de Salamanca (Unesco, 1994), por exemplo.
A inclusão escolar contempla a universidade como espaço eficaz para a construção de justiça social e
para a superação das limitações das deficiências, especialmente, as sociais, que estão ligadas ao
preconceito, à discriminação e à estigmatização, ou seja, aos rótulos que marcam as pessoas com
deficiência, especialmente, aquelas que possuem deficiência intelectual (Silva, Mendonça, & Mieto,
2015; Silva, Ribeiro, & Mieto, 2010).
O desafio das Instituições de Educação Superior, assim como das instituições de ensino formal, é
desconstruir a idéia de que a pessoa com deficiência intelectual é ineficiente, incompetente, incapaz.
As crenças da comunidade acadêmica são um importante desafio para o ingresso e permanência da
pessoa com deficiência na educação superior (Simionato, 2011). Ao contrário de impedimentos, há
que se construir possibilidades de ingresso, por meio de adaptações curriculares, com uso de
linguagens, metodologias e instrumentos diversos que permitam a educação da pessoa em nível
superior.
A deficiência deve ser entendida como um desafio que exige soluções criativas que passam: 1º. pela
modificação das crenças e 2º. por atividades sociais que ajudem a pessoa a contornar as barreiras da
deficiência e atinjam as metas culturais colocadas para todos.
Portanto, o ingresso de estudantes com deficiência intelectual na educação superior é condição
necessária para que essas pessoas continuem avançando em seu desenvolvimento biopsicossocial,
especialmente, por ser a instância educacional responsável pela formação profissional, que congrega
a aprendizagem de competências técnicas, éticas e estéticas, o que amplia a possibilidade de atuação
da pessoa na sociedade (Sousa, Caixeta, & Santos, 2011).

3. Metodologia

De acordo com Godoy (1995), são várias as possibilidades de se estudar fenômenos sociais através
da pesquisa qualitativa "considerando que a abordagem qualitativa, enquanto exercício de pesquisa,
não se apresenta como uma proposta rigidamente estruturada, ela permite que a imaginação e a
criatividade levem os investigadores a propor trabalhos que explorem novos enfoques” (p.23). Neste
trabalho, enfocamos a percepção de professores e estudantes do EJAI, que têm deficiência
intelectual, e estudantes universitários sobre o ingresso de estudantes com deficiência intelectual na
universidade. Portanto, nosso interesse se centra nos significados que são construídos por estas
pessoas sobre o fenômeno estudado, entendendo que elas estão imersas em um contexto
sociocultural contraditório em que a inclusão escolar convive com atitudes de exclusão social.

3.1. Participantes

Participaram deste estudo


 Oito estudantes universitários, do curso de Licenciatura em Ciências Naturais, os quais estavam
cursando entre o quinto e o sétimo semestre.

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 Três professores da Educação Básica da rede pública de ensino do Distrito Federal, com
atuação no programa EJAI
 Nove estudantes com diagnóstico de deficiência intelectual, ensino médio, matriculados em
turmas do EJA interventivo.

3.2. Técnica e Instrumento de pesquisa

Utilizamos a entrevista como método para a construção de dados devido a sua característica de
possibilitar a obtenção de informações subjetivas dos entrevistados. Dentre as mais variadas formas
de entrevistas, optamos por aplicar entrevistas semi-estruturadas, pela sua flexibilidade que confere
mais dinamismo para o diálogo, facilitando o espaço narrativo para os/as participantes e, também,
pelo seu direcionamento, por permitir um roteiro com perguntas que expressam os objetivos prévios
e a dimensão das informações que deveríamos obter “(...) este tipo de entrevista colabora muito na
investigação dos aspectos afetivos e valorativos dos informantes que determinam significados
pessoais de suas atitudes e comportamentos” (Boni, & Quaresma, 2005, p.75).
O roteiro para a entrevista foi construído com base no objetivo da pesquisa e na literatura estudada.
Assim, foi construído um roteiro para cada grupo participante, de modo que as perguntas focavam
no objetivo da pesquisa para cada grupo específico. Assim, por exemplo, foi perguntado para os
estudantes universitários: “Na sua jornada acadêmica, nesta Universidade, você já teve contato com
algum estudante com DI? Se sim, o considera com a mesma capacidade de aprendizagem que você?
“; para os professores do programa EJAI: “Você considera que seu trabalho tem possibilitado esses
alunos ingressar na universidade?” e para o estudantes do programa EJAI: “Já pensou na ideia de
continuar seus estudos? Entrar em uma faculdade particular ou Universidade pública, como a UnB,
onde estudo por exemplo? Pode me conversar comigo sobre isto, por favor?”

3.3. Procedimento de Construção de dados

Inicialmente, os/as participantes foram convidados/as a conhecer a pesquisa e, caso aceitassem


participar, eles/as deveriam assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para Participação
em Pesquisa ou levar o Termo para assinatura dos pais ou responsáveis, procedimento que ocorreu,
principalmente, com os/as estudantes do EJAI. Neste termo, os pesquisadores registravam o objetivo
da pesquisa bem como seu método, o caráter sigiloso e voluntário da participação.
No caso dos/as participantes do EJAI, a consulta inicial foi feita por WhatsApp ou pela visita à escola.
No caso dos/as estudantes universitários/as, a consulta foi feita presencialmente.
Realizamos as entrevistas semi-estruturadas, de acordo com a disponibilidade de cada participante.
Em todas elas, havia o agradecimento pela participação do/a estudante ou professor/a ao final.

3.4. Procedimento de Análise de Dados

As entrevistas foram todas gravadas e transcritas. Após a transcrição dos dados, as entrevistas foram
organizadas em eixos temáticos, a partir do corpus teórico estudado. Para interpretação dos
fenômenos, utilizamos o método da Análise de Conteúdo, de Bardin (1997).
A análise de conteúdo se constitui como um método para análise de dados capaz de ressignificar as
informações obtidas ao longo da pesquisa, por ter seu foco de interesse nos núcleos de significados
que são construídos repetidamente pelos participantes e que expressam ideias, ideologias e
argumentos de quem fala sobre o que se fala (Moraes, 1999).

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Uma das etapas essenciais da análise de conteúdo é a categorização, que consiste em agrupar os
dados em categorias de acordo com o fator comum existente entre si. Para Moraes (1999, p. 7), “as
categorias devem ser válidas, exaustivas e homogêneas”, ou seja, “devem ser coesas e significativas
conforme os objetivos do artigo; serem capazes de classificar e organizar todos os dados relevantes;
e as categorias devem apresentar os mesmos critérios de classificação” (Moraes, 1999, p. 32).

4. Resultados e Discussão

A análise de conteúdo permitiu organizar os significados das falas dos três grupos de participantes
em três motivos: a) preconceito; b) falta de informação e c) falta de formação.

4.1. Preconceito

Esta categoria preconceito se refere a uma construção social que posiciona quem pode ou não
ingressar na graduação, configurando os limites da ação de si, de si em relação ao outro e do outro.
Neste sentido, tanto professores quanto estudantes apontaram que o preconceito tem sido o maior
impedimento de ingresso de estudantes com DI tanto na escola, quanto na família, uma vez que os
membros familiares também não esperam que seus filhos ou irmãos avancem para a educação
superior. Por outro lado, a ausência de expectativas com relação a este ingresso, justifica a falta de
informação sobre o que é a educação superior e sobre como se deve proceder para ingressar e
permanecer em uma IES. Desta maneira, as informações sobre formas de ingresso, por exemplo:
vestibular, ENEM e PAS, não circulam no espaço da EJAI, contexto desta pesquisa.

“A própria pessoa que tem essa deficiência, às vezes, ela não se sente capaz de cursar a Universidade.
Ela mesmo tem preconceito, com ela mesma. Talvez isso aconteça por algum fato que eles tenham
vivido! Porque, assim, pode acontecer de pessoas com deficiência já terem convivido com outras
pessoas que não acreditassem no potencial delas! Então, ao invés de colocar a autoestima dele pra
cima, só faziam o contrário. Ela acredita, ela cresceu acreditando que não seria capaz” (Estudante
Universitário).

Notadamente, 87,5% dos/as estudantes universitários/as relataram não terem estudado com um
estudante com DI na IES da qual fazem parte. Na opinião dos/as entrevistados/as, o baixo percentual
de estudantes com DI no ensino superior está relacionado à própria Universidade: estrutura física,
currículo e formação docente. Para eles/as, os caminhos de entrada na Universidade,
principalmente, o vestibular, não se adaptam às necessidades individuais de estudantes com DI. Este
fato foi corroborado por um estudante do programa EJAI:
“Pra mim (Universidade) é... tem que ser faculdade especial. Para poder acompanhar o
desenvolvimento dos alunos. Não pode ser... essas faculdades “normal”, não serve!” (Estudante do
EJAI).

Mesmo existindo o sistema de cotas em algumas IES, estudantes com DI concorrem com deficientes
físicos, os quais possuem limitações diferentes, se comparadas às limitações cognitivas de um/a
estudante com DI, a depender de cada quadro clínico, é claro.
“Eu que acho que é... a falta de incentivo público. Eu tenho um filho especial, e, ele está no 1°ano e
eu não sei se o poder público vai colocar ele em igual condição na hora de fazer um vestibular.
Porque aí, eu não sei qual será o futuro dele como universitário” (Estudante Universitária).

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Em relação aos/às professores/as do programa EJAI, ao perguntar sobre as possíveis causas para o
percentual abaixo de 1% de alunos com DI em IES, percebemos que há pensamentos baseados na
teoria inatista, onde o ser humano é determinado pelas suas heranças genéticas, o fator biológico:
“Eu acho que esse 1% que estão chegando nas faculdades, se deve principalmente pela questão do
cognitivo, sabe?! Ou seja, as faculdades e universidades não estão suficientemente preparadas e
adaptadas para receber esses deficientes!”. (Professor do EJAI).

Novamente, este argumento do déficit cognitivo se contrapõe ao ideal sociointeracionista, em que o


meio social e suas interações são determinantes para o desenvolvimento humano (Vigotsky, 1995).
Vigotsky (1995; 2011), Leonel, Leonardo e Garcia (2015), Silva, Souza, Prado, Ribeiro, Lia e Carvalho
(2012), Simionato (2011), Silva, Mendonça e Mieto (2015) e Silva, Ribeiro e Mieto (2010) são autores
e autoras que discutem o estigma e o preconceito como elementos provocadores de exclusão social
e escolar, porque cristalizam a posição da pessoa em um determinado lugar social que a limita e a
impede de atuar livremente.

4.2. Falta de informação

Esta categoria foi construída para contemplar a fala recorrente dos/as estudantes do EJAI sobre a
falta de informação sobre o que é a educação superior, seus objetivos, missões e formas de ingresso.
Quase que em sua totalidade, os/as estudantes do EJAI consideram uma universidade/faculdade
idêntica à escola, provavelmente, porque a educação superior ainda não é abordada na escola para
estes participantes.

“Eles nunca me falaram nada não. Eu tô pensando ainda, em como superar minhas necessidades,
passar por tudo, por cima das barreiras” (Estudante do EJAI).

A falta de informação e proximidade com IES leva à construção de um sentimento de não


pertencimento do/a estudante com DI a este espaço, o que é contrário à filosofia da escola inclusiva
e à Constituição Federal Brasileira (Brasil, 1988).
A escola deve ter uma importante atuação, inclusive, motivacional para que esses/as estudantes,
mesmo com suas dificuldades, continuem seus estudos após o ensino médio. Ao ingressarem em
uma IES, terão oportunidade de participar de projetos com orientação tendo em vista sua
profissionalização em nível superior (Sousa, Caixeta, Santos, 2011). A atuação da pessoa na educação
superior pode impactar sua identidade de maneira a ampliá-la, possibilitando novas formas de ser e
de agir no mundo do trabalho e nos demais espaços sociais.

4.2. Falta de formação

Com relação à formação, os/as participantes enunciaram que os professores, tanto das IES, quanto
das escolas, tem formação insuficiente para atuarem com a diversidade em sala de aula. Eles/as
comentaram que é difícil um estudante com DI se manter em cursos de graduação, porque os
professores não vão saber como lidar com as especificidades da deficiência. Com isto, temos que o
foco do processo deixa de ser a pessoa e passa a ser a deficiência. Novamente, é o problema da
deficiência como um fenômeno social e não biológico, apenas, como defendido por Vigotsky (1995).
Para justificar esta ausência de formação especializada, os/as estudantes universitários/as
enunciaram que 75% deles/as não cursaram, até o presente momento, disciplinas que abordam a

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temática da deficiência intelectual e metodologias de ensino voltadas para compensar as


características da deficiência.
“Geralmente as disciplinas que têm esse foco da necessidade especial, não são disciplinas
obrigatórias do currículo! Ou é um projeto de extensão, que eu fiz muito na UNB, ou o estágio
supervisionado, eu que pedi, porque nem tinha! Eu que pedi uma autorização pra fazer o estágio
supervisionado lá no CAU, que é uma escola própria para deficientes auditivos. Meu estágio
supervisionado foi feito lá, então toda essa parte de necessidade especial a gente procura por fora.
Ou no projeto de extensão ou em disciplinas optativas. A responsabilidade eu acho que está mais
nesse sentido, de incluir disciplinas como obrigatórias na grade. Eu não sei como está a grade agora,
porque eu me formei na UNB já faz dez anos.”(Estudante Universitário).

Sobre esta questão da formação de professores, Santiago (2004) e Mantoan (2008) explicam que não
é curso de formação que vai garantir uma atuação inclusiva de professores, mas uma formação ética
e humana, como defendem Caixeta, Sousa e Santos (2015); Sousa, Caixeta e Santos (2017), de
preferência, no desenvolvimento de projetos educacionais inclusivos, pela metodologia qualitativa
com delineamento de pesquisa-ação.

“Infelizmente não, nenhuma ainda. Eu acho que, no campo profissional faz uma diferença muito
grande um professor que está preparado para todos os tipos de alunos que a gente possa vir a
trabalhar. E eu acho que é uma deficiência de ensino, de grade mesmo! Deveria ter matérias,
disciplinas abordando esse assunto de uma forma mais... inclusiva. Se preparando melhor para o
campo de trabalho” (Professora do EJA Interventivo).

Os resultados analisados evidenciam que, mesmo as políticas de inclusão escolar tendo sido
empreendidas, no Brasil, desde 1994, elas ainda não conseguem assegurar o ingresso de pessoas
com deficiência, especialmente, com deficiência intelectual. na educação superior. A política pública
específica para pessoas com deficiências, entre elas, para as pessoas com deficiência intelectual, no
que se refere à educação superior, é pouco difundida entre as escolas, profissionais e estudantes.

5. Considerações Finais

Os resultados deste estudo evidenciam a necessidade de se superar a distância entre as políticas


públicas existentes e a realidade da Educação Inclusiva na educação superior. O processo de inclusão
escolar, na educação superior, precisa ser questionado, uma vez que é na diversidade que vamos
combater preconceitos e gerar novas possibilidades de atuação social nos diferentes espaços sociais,
incluindo, aqueles que são típicos de atuação das Instituições de Ensino Superior.
Na legislação, estudantes com DI recebem amparo legal que lhes asseguram as adaptações
necessárias para que tenham possibilidades de continuar seus estudos. Entretanto, dados do Censo
de Educação Superior (Brasil, 2014) e das pesquisas aqui apresentadas evidenciam que a existência
da legislação não garante, por si mesma, o acesso dos/as estudantes com deficiência intelectual à
educação superior. É preciso um esforço conjunto entre escolas, Instituições de Ensino Superior e
Poder Público para que esse direito seja garantido de fato. Conhecer o que é uma Instituição de
Educação Superior, seus objetivos, missão e formas de ingresso é oportunizar informações básicas
sobre este nível educacional. Outras informações relevantes dizem respeito às adaptações de provas,
considerando conteúdo e tempo para estudantes com deficiência intelectual.
A formação de professores/as da educação superior foi apontada, nesta pesquisa, como insuficiente
para o acolhimento de estudantes com deficiência, especialmente, com deficiência intelectual. Este

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fato nos leva a questionar a matriz curricular dos cursos de graduação, especialmente, os de
Licenciatura no Brasil. Será que as IES realmente preparam estudantes de licenciatura para que
sejam mediadores, não apenas de conhecimento, mas do próprio desenvolvimento humano de
estudantes com tamanha peculiaridade?
Destacamos as contribuições da metodologia utilizada para alcançarmos os resultados obtidos,
possibilitando delinear os motivos para a ausência de pessoas com DI em IES no Brasil e, assim,
buscar soluções para esta problemática.
Enfatizamos a relevância dessa pesquisa, não apenas para a nossa formação acadêmica, bem como
para o nosso próprio desenvolvimento humano e social, por ser um tema que envolve diferentes
realidades, mundos, famílias e indivíduos que são julgados incapazes não apenas pela sociedade, mas
como vimos nesta pesquisa, por aqueles que são responsáveis pela mediação do conhecimento, seus
próprios professores.

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Infância e Tecnologia: um Panorama Metodológico das Pesquisas


Qualitativas na Área

1
Larissa Krüger Fernandes e Jane Farias Chagas-Ferreira1

1 Instituto de Psicologia Universidade de Brasília, Brasília. larissakf54@gmail.com; janefcha@gmail.com.

Resumo. Este artigo tem como objetivo oferecer um panorama da produção científica na interface entre
infância e tecnologia, enfatizando os aspectos metodológicos das pesquisas qualitativas. Para isso, foram
consultadas as bases de dados disponíveis no Portal da Capes Periódicos utilizando as palavras-chave:
infância + tecnologia e childhood + technology (2010 - 2016). Por causa do foco de análise, artigos que não
abordassem os temas infância e tecnologia em conjunto foram desconsiderados. Os resultados
demonstraram uma maioria de pesquisas empíricas, sendo elas qualitativas, quantitativas ou de métodos
mistos, seguido por artigos teóricos e de revisão de literatura. As pesquisas qualitativas se concentraram em
áreas como Psicologia, Educação e Sociologia. Dentre os tipos de pesquisa foram identificados estudos de
caso, pesquisa-ação e pesquisa documental. Os procedimentos metodológicos mais utilizados foram
entrevistas, seguido de observação e análise documental e, por fim, diário de campo, aplicação de
questionários, métodos visuais e grupo focal.
Palavras-chave: infância; tecnologia; metodologia qualitativa.

Childhood and Technology: a Methodological Overview of Qualitative Research on the Area


Abstract. This article aims to offer a general overview of the scientific production in the joint area of
childhood and technology, emphasizing the methodological aspects of the qualitative research. For this
purpose, the keywords infância + tecnologia and childhood + technology were searched in the data bases
Portal da Capes Periódicos (2010 – 2016). Due to the focus of analysis, articles which didn’t address both
areas were disregarded. The results showed a majority of empirical research, qualitative, quantitative and
mixed methods approach, followed by theoretical articles and articles based on literature review. The
qualitative research centered around areas such as Psychology, Education and Sociology. The types of
research identified were case study, action research and documentary research. The methodological
procedures mostly used in qualitative research were interviews, followed by observation and documentary
analysis and, finally, field journals, surveys, visual methods and focus group.
Keywords: childhood; technology; qualitative methodology.

1 Introdução

O cenário contemporâneo traz desafios para as ciências em geral. Fenômenos de alcance planetário
têm impactado a vida e o dia-a-dia das pessoas impondo maneiras de ser e estar no mundo que se
diferenciam das lógicas da modernidade (Sibilia, 2016). A globalização se configura de variadas
maneiras - desde a aldeia mais isolada à metrópole – pela possibilidade de fluxo quase imediato de
informação e o crescente acesso às tecnologias da informação e comunicação (Hall, 2006). Todos
esses fenômenos caracterizam a contemporaneidade e lançam desafios às formas de entender como
as pessoas se desenvolvem neste ambiente cada vez mais hiperconectado (Chagas-Ferreira, 2014;
Levy, 1996).
___________________________
Este trabalho recebeu financiamento (para ser apresentado no evento) da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Distrito Federal (FAPDF) e do Decanato de Pós-graduação da Universidade de Brasília, aos quais prestamos os
merecidos agradecimentos.

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Na vida das crianças isso não se dá diferente. Logo após seu nascimento, elas já são inseridas em um
espaço tecnológico, desenvolvendo-se nesse ambiente povoado por aparatos digitais. Couto (2013)
aponta alguns fatores que têm transformado a infância, como: o acesso a manifestações culturais
diversas; as complexas transformações da cidade, da família e dos modos de interação com as
tecnologias móveis; formas de brincar e divertir-se caracterizadas pelo hibridismo entre o tradicional
e novo; o lúdico relacionado aos jogos eletrônicos, redes sociais e conectividade; entre outros. Esses
fatores deslocam a criança para um outro lugar nos sistemas de significação e representação cultural
múltiplos que caracterizam esse cenário.

1.1 Infância, Contemporaneidade e Tecnologia

A categoria infância provém de uma construção histórica de acordo com Ariès (1981). Segundo esse
autor, a construção dessa categoria envolveu um processo de produção de representações sobre as
crianças, a estruturação de suas rotinas e da criação de instituições sociais para elas. A infância como
fase da vida só vai aparecer no fim do século XVII, início do século XVIII, o que se deu concomitante à
constituição da família nuclear, do Estado Nação e à reorganização do trabalho produtivo decorrente
da Revolução Industrial.
Já Postman (1999) relaciona a criação da prensa tipográfica com a invenção da infância como fase de
vida. Para ele, a maior acessibilidade aos textos escritos vai ressaltar uma cisão entre os que sabem
ler e os que precisam passar por um processo de letramento. Ganha destaque assim a escola, tendo
como função garantir que as crianças tenham acesso aos conhecimentos que circulam no mundo
adulto e diferenciando essas fases de vida. Seguindo o mesmo raciocínio, esse autor relaciona a
televisão e as mídias eletrônicas com o desaparecimento da infância.
Numa perspectiva contemporânea, Buckingham (2007) aponta a interação das crianças com as
tecnologias como modificadoras das relações sociais, do funcionamento mental e das formas de
conhecimento, impactando nos modos de ser das crianças e numa reconfiguração das concepções de
infância. O autor entende que as tecnologias digitais são caracterizadas pela interatividade
oferecendo às crianças esse contato interativo com diferentes formas de cultura, potencializando o
vínculo entre mensagens e imagens, fomentando novos modos de linguagem e de representação.
Sarmento (2004) entende que as mudanças características da contemporaneidade - marcadas por
rupturas com as ideias centrais da modernidade – definem um novo lugar social para as crianças, o
que ele chama de reinstitucionalização da infância na 2ª modernidade. O autor aponta algumas
mudanças, como: a reentrada da criança na economia, não só como trabalhadora, mas também
como consumidora e a mudança na escola que antes era instrumento de socialização para coesão
social e passa a ser lugar de trocas e conflitos culturais. As mudanças ocorrem também no âmbito da
família, que passa por transformações estruturais com o aumento da monoparentalidade, das
famílias reestruturadas e dos lares sem criança em países do norte e centro da Europa, assim como a
gravidez precoce em vários países do hemisfério sul, Inglaterra e Portugal. Outra mudança, com
impacto direto na infância, é o crescimento do mercado de produtos culturais para as crianças
(desenhos animados, jogos, cinema, etc) que, por serem – muitas vezes - de alcance global, dão a
falsa impressão de que existe somente uma infância homogênea.
É neste cenário que as crianças contemporâneas se desenvolvem e se tornam construtoras ativas de
seu lugar na sociedade acrescentando “...elementos novos e distintos aos seus comportamentos e
culturas.” (Sarmento, 2004, p. 18). Dentre os aspectos emergentes que impactam o desenvolvimento
dessas crianças, o autor destaca alguns que podem indicar a configuração de um futuro. São eles: a
interatividade expandida pelos sistemas de informática que configuram lógicas menos lineares e de
expressividade distinta; as culturas de resistência entre as crianças e seus pares, culturas essas que

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fogem do controle dos adultos; o alcance do lúdico não só mais à vida infantil, mas também à vida
adulta e a consolidação de uma indústria do jogo; e a apropriação de valores e causas políticas pelas
crianças, principalmente nas áreas como ambiente, segurança, políticas urbanistas e lazer, o que leva
ao reconhecimento das crianças enquanto protagonistas de ações potencializadoras da
democratização social.
Como foi exposto nos parágrafos anteriores, a concepção de infância é sempre localizada cultural e
historicamente e constitui o lugar no qual as crianças se desenvolvem. De acordo com Cohn (2013):
as ações voltadas às crianças e o lugar que lhes é destinado são definidos por
concepções de infância na mesma medida em que o modo como as crianças atuam e o que
elas pensam do mundo acontece a partir (mesmo que contra) desta posição que lhes é
oferecida e que elas conhecem e reconhecem. (p. 241)
Por isso, pesquisas que tratem do tema ou que tenham crianças como participantes sempre estarão
atravessadas por uma noção de infância que deve ser considerada na construção e na interpretação
da pesquisa. Sendo assim, as pesquisas que se propõem estudar a infância não necessariamente têm
crianças como participantes. Porém, ressalta-se a importância de contemplar as vozes das crianças
sobre este lugar que elas habitam em seu desenvolvimento enquanto sujeitos.
Segundo a Convenção sobre os Direitos das Crianças (CDC), realizada pela ONU em 1989, são
consideradas crianças todos os seres humanos com menos de dezoito anos de idade, exceto aqueles
que obtiveram, em caráter excepcional, a concessão da maioridade antes dessa idade. No contexto
brasileiro, o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) figura como a legislação vigente e considera
como crianças as pessoas de até doze anos de idade incompletos, bem como, considera adolescentes
aquelas pessoas que têm entre doze e dezoito anos de idade. Para este artigo, optamos por adotar a
definição da ONU, porque compreendemos que essa definição possui um entendimento alargado de
criança. Dessa forma, quando nos referimos à criança, compreendemos os participantes menores de
dezoito anos de idade.

1.2 Pesquisas sobre Tecnologia com Crianças

As pesquisas conduzidas na interface entre infância e tecnologia durante muito tempo se


concentraram na interação da criança com o computador enfatizando os aspectos pedagógicos de
tais tecnologias. Um levantamento de estudos publicados entre 1975 e 2004 nesta área foi
conduzido por McCarrick e Xiaoming (2007) considerando somente pesquisas empíricas conduzidas
com crianças em idade pré-escolar. Quatro eixos foram estabelecidos para o agrupamento das
pesquisas: desenvolvimento socioemocional, desenvolvimento cognitivo, desenvolvimento da
linguagem e motivação. As pesquisas se utilizavam principalmente de métodos de observação em
contexto de sala de aula – majoritariamente em aulas de informática – focalizando frequência de
interações entre as crianças e comparando momentos de utilização dos computadores com
momentos de não-utilização. Além da observação, as autoras indicaram a aplicação de testes
cognitivos, como de raciocínio abstrato, vocabulário, coordenação visuo-motor e planejamento de
comportamento. A maioria das pesquisas foram conduzidas a partir de metodologia quantitativa.
Estudos mais recentes passaram a considerar a interação com os objetos digitais de tela touchscreen.
Geist (2012) analisou as interações de bebês (2-3 anos) com tablets em uma turma de pré-escola.
Tratou-se de uma pesquisa qualitativa que se utilizou de observação considerando tanto os
comportamentos quanto as falas das crianças. A autora ressalta a interface intuitiva dos aparelhos
touchscreen, que permitem que bebês interajam produtivamente com os mesmos. Isso se dá porque
a tela interativa remove barreiras para o acesso dos conteúdos virtuais, como mouse e teclado, os
quais exigem habilidades motoras e cognitivas mais avançadas para serem manipulados.

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Outras pesquisas ainda têm se utilizado de métodos visuais para captar os momentos das rotinas das
crianças em que as tecnologias aparecem. Em uma pesquisa conduzida por Plowman e Stevenson
(2012), diários telefônicos (mobile phone diaries) foram feitos pelos pais com o objetivo de ter
acesso à rotina da criança enfocando o momento de brincadeira e procurando entender como as
Novas Tecnologias aparecem nesse momento. Para isso, foi pedido que os pais tirassem fotos das
crianças durante um dia (sábados) em intervalos de aproximadamente 2 horas das 9h da manhã às
17h da tarde. Foram feitos três turnos que ocorreram nos meses de dezembro de 2008, maio de
2009 e outubro de 2009. A pesquisa contou com a participação de 11 famílias.
As fotos, que eram acompanhadas por uma legenda escrita pelos pais, compuseram o que as autoras
chamaram de amostras de experiência, criando uma narrativa de um dia na vida da criança. O
procedimento foi considerado condizente com a perspectiva ecocultural (Weisner, 2002),
possibilitando que as condições naturais de interação das crianças sejam preservadas ao máximo. No
entanto, as autoras frisaram que o registro das imagens feitas pelos pais e as respectivas legendas
não devem ser vistos como um relato fiel do momento real, mas sim como mais um momento de
construção de dados em que a realidade é interpretada. Elas ainda afirmaram que a forma como os
pais escolheram retratar as crianças é também um dado importante para as pesquisadoras, já que os
valores dos pais têm impacto nas escolhas das crianças.
Foi constatado que as crianças experienciam uma grande variedade de vivências de diferentes tipos
durante o momento de brincadeira, sendo que não há uma prevalência de interação com aparelhos
eletrônicos. Isso vai de encontro a uma crença de que o brincar tem se tornado mais homogêneo
com a presença das tecnologias.
Pode-se perceber que as pesquisas nessa interface começam a serem conduzidas primeiramente no
ambiente escolar tendo como objeto principal de interação o computador e vão alcançando outros
espaços e abrangendo outros aparelhos. Ressalta-se também os desafios que esses outros espaços e
aparelhos vão trazendo para a metodologia de pesquisa que tem que ser pensada nessas novas
condições.

2 Método

Para atender aos objetivos desta pesquisa foram consultadas as bases de dados disponíveis no Portal
de Periódicos da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) utilizando
os descritores: infância + tecnologia e childhood + technology. A partir dessa primeira pesquisa,
foram selecionados os artigos que tratassem de infância e tecnologia descartando-se os artigos que
não atendessem a esse critério. Os artigos foram, então, classificados de acordo com o seu tipo –
baseados em pesquisa empírica ou teóricos – e categorizados quanto ao tipo de pesquisa. Por fim,
aprofundou-se na questão metodológica dos artigos baseados em pesquisa qualitativa,
considerando-se, para isso, os procedimentos metodológicos utilizados, os temas abordados, o
contexto de pesquisa, a quantidade e a caracterização dos participantes.

3 Resultados

Foram encontrados 39 artigos com os descritores infância + tecnologia, sendo que somente 14
atendiam aos critérios de seleção. Com os descritores childhood + technology, foram encontrados 24
artigos, sendo 12 compatíveis com os critérios adotados. Os resultados demonstraram uma maioria
de pesquisas empíricas - 16 no total - sendo elas qualitativas, quantitativas ou de métodos mistos,
seguido por artigos teóricos e de revisão de literatura como é demonstrado na tabela abaixo.

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Tabela 1. Quantidade e porcentagens de artigos em relação aos seus tipos e aos tipos de pesquisa.

Quantidade %

Qualitativos 6 23%
Quantitativos 7 26,9%
Métodos mistos 3 11,5%
Teóricos 7 26,9%
Revisão de Literatura 3 11,5%

Total 26 100%

As pesquisas qualitativas se concentraram nas áreas da Psicologia, Educação e Sociologia. Dentre os


tipos de pesquisa foram identificados estudos de caso, pesquisa-ação e pesquisa baseada em análise
documental. Os procedimentos metodológicos mais utilizados em pesquisas qualitativas foram
entrevistas, tanto estruturadas como semi-estruturadas, individuais e em grupo; seguido de
observação - assim como observação participativa - e análise documental e, por fim, diário de campo,
aplicação de questionários, métodos visuais e grupo focal.

Procedimentos Metodológicos Utilizados nas


Pesquisas Qualitativas

Entrevista
Observação
Análise Documental
Diário de Campo
Aplicação de Questionário
Métodos Visuais
Grupo Focal

Fig. 1. Gráfico do proporção de procedimentos metodológicos utilizados nos artigos baseados em pesquisas qualitativas
selecionados para a revisão.

A pesquisas tratavam de temas como: demandas da vida escolar e da sociedade tecnológica (Martins
& Castro, 2011), ludicidade e cultura da infância (Lima & Lima, 2014), rotinas da infância mediadas
por tecnologia (González-Patiño, 2011), inserção de tecnologias na sala de aula na prática de leitura
(Minelli-de-Oliveira, Camacho & Gisbert, 2014), publicidade em jogos online (Martí-Pellon & Uchoa-

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Craveiro, 2015) e cyberbullying (Monks, Mahdavi & Rix, 2016). A maioria das pesquisas teve como
contexto o ambiente escolar, sendo que somente uma ocorreu em ambiente familiar (González-
Patiño, 2011).
Quanto aos participantes, como a maioria das pesquisas ocorreu em ambiente escolar, elas
incluíram os professores e profissionais da escola como participantes além dos alunos. Uma delas
não teve crianças como participantes, mas sim pais, professores e outros profissionais da escola
(Monks, Mahdavi & Rix, 2016). Outra pesquisa teve somente crianças como participantes, mas
apenas com o intuito de selecionar conteúdos acessados por elas, analisando assim somente o
conteúdo selecionado (Martí-Pellon & Uchoa-Craveiro, 2015). Apenas uma pesquisa se restringiu à
criança como participante, apesar de recorrer a uma entrevista com os pais para maiores
informações (González-Patiño, 2011).

4 Discussão

Pode-se observar que apesar de um dos descritores utilizado na revisão metodológica ser infância,
nem todas as pesquisas tiveram crianças como seus/suas participantes e a maioria incluiu adultos –
pais, responsáveis e professores. No entanto, ressalta-se a importância de ter crianças como
participantes dessas pesquisas, levando em consideração ser esse um tema que as coloca como
atores centrais.
Pesquisar crianças traz algumas implicações para o desenho metodológico do estudo. Faz-se
necessário considerar as peculiaridades dessa fase de desenvolvimento que se caracteriza por uma
lógica de pensamento diferente da do adulto. Além disso, algumas barreiras culturais e sociais que
localizam crianças e adultos em lugares e papéis muito diferenciados e até mesmo opostos marcam a
relação do pesquisador com seus participantes. Esses fatores não podem ser ignorados quando o
pesquisador está elaborando seu método de pesquisa, sendo imprescindível a disposição do mesmo
em se deslocar de seu lugar de adultice.
Cada vez mais tem se discutido a importância de se ouvir as crianças como sujeitos de pesquisa em
diversas áreas. O campo da sociologia da infância tem como objetivo considerar crianças como
atores sociais plenos apresentando assim um desafio teórico-metodológico para as pesquisas
conduzidas com crianças. Nesse sentido, uma das questões-chave é “...que tipo de rede produz um
tipo particular de infância ou criança.” (Delgado & Müller, 2005, p. 352) Para tanto, os métodos
adotados em pesquisas tem de ser pensados de forma a possibilitar que as crianças tenham sua voz,
olhares e ponto de vistas contemplados de preferência em contextos reais de sua experiência.
Nesse sentido, Friedmann (2011) argumenta que a percepção dos direitos e das vozes infantis trazem
desafios em relação aos métodos utilizados, principalmente à escuta, ao registro e à observação
desses atores sociais. Sobre isso, a autora menciona algumas formas de pesquisa que têm sido
utilizados na área da Antropologia da Infância como: a observação participante, coleta de desenhos e
histórias elaboradas pelas crianças, assim como registros audiovisuais.
O dar a voz às crianças é, não apenas permitir a elas o momento de se expressarem, mas colocá-las
em um espaço enquanto sujeitos da pesquisa. Espaço que elas terão a autonomia para construir
juntamente com o pesquisador.
Os artigos selecionados na revisão de literatura trouxeram algumas contribuições para pensarmos
métodos de pesquisa quando os participantes são crianças. Martins e Castro (2011) em seu artigo
Crianças na Contemporaneidade: entre as demandas da vida escolar e da sociedade tecnológica
ressaltam a importância da convivência com os alunos dentro do cotidiano escolar para que “...os
sentidos construídos coletiva e individualmente relativos à realidade escolar frente ao mundo fora da
escola...” (p. 622) fossem desvelados. Dessa forma, a pesquisadora se valeu da observação

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participante e de um diário de campo que a acompanhou em dezenove encontros (duração de 5


horas) ao longo de três meses. Os momentos em que as crianças tinham algum tempo livre foram
utilizados para que a pesquisadora as entrevistasse fazendo perguntas relacionadas aos eixos de
análise, os quais foram estabelecidos a partir das primeiras observações da turma (25 alunos e a
professora de uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental em uma escola particular). Segundo a
autora essas primeiras observações foram necessárias para mapear o funcionamento do grupo
levando em consideração o comportamento em sala de aula e nos horários livres, a socialização e
comunicação do grupo, as brincadeiras, assim como os aspectos comportamentais e a questão da
aprendizagem.
Outra pesquisa que foi conduzida no contexto escolar (Lima & Lima, 2014) teve como objetivo
investigar o eixo ludicidade na cultura da infância. Tratou-se de uma pesquisa-ação conduzida
durante um período de três anos em duas Escolas Municipais de Educação Infantil. A pesquisa-ação é
definida como um tipo de pesquisa participante engajada, a qual tem como característica a
intervenção “...na prática de modo inovador já no decorrer do próprio processo de pesquisa e não
apenas como possível consequência de uma recomendação na etapa final do projeto.” (Engel, 2000,
p.182). Sendo assim, a pesquisa citada buscou problematizar concepções e práticas relacionadas à
ludicidade para propor ações que configurem avanços relativos às atividades que coloquem a
infância como categoria social e as culturas da infância como identidade cultural. Para isso, os
pesquisadores lidaram com um planejamento flexível baseado em um plano de ação elaborado por
todos os participantes em conjunto.
Os primeiros procedimentos metodológicos utilizados foram explicitação e discussão do tema da
pesquisa e a relização do diagnóstico ou definição do problema. A partir disso, foram propostos
seminários com a equipe pedagógica sobre o tema da ludicidade e, mais adiante, observação das
intervenções com anotações em diários de campo, análise documental do Plano Diretor, de
filmagens e fotos das atividades, assim como análise de documentos do MEC. Por fim, foram
aplicados questionários e realizadas entrevistas com as educadoras, gestoras e com as crianças, os
quais foram registrados em vídeo.
A pesquisa conduzida por González-Patiño (2011) em Madrid teve como foco as rotinas mediadas por
tecnologia de uma pré-adolescente de 12 anos de idade de classe econômica alta e que era
conhecida por ter a sua disposição uma variada quantidade de tecnologias da informação e
comunicação. Ressalta-se que o autor optou por se referir à participante como pré-adolescente,
mesmo seu objeto de estudo sendo as rotinas da infância urbana mediadas por tecnologia. É possível
que o autor tenha se embasado em um entendimento de infância alargado como expusemos
anteriormente neste artigo. A pesquisa se configurou como um estudo de caso de corte qualitativo-
interpretativo que se valeu de duas séries de fotografias tiradas pela participante, duas entrevistas
semi-estruturadas com a pré-adolescente e uma com os pais, compilação de material documental e
visual, assim como a adoção de um diário de campo. As fotografias tiradas pela participante
ocuparam um lugar central na pesquisa servindo para identificar os dipositivos de uso mais frequente
da pré-adolescente e os lugares onde se localizavam esses dispositivos. Além disso, as fotografias
serviram como ponto de partida das entrevistas possibilitando que a participante tomasse a iniciativa
em momentos-chave expondo sua visão sobre as práticas e usos infantis da tecnologia.
A utilização de métodos visuais se mostra como uma opção interessante para pesquisas com
crianças, oferecendo alternativas diferenciadas de produção de informações que contemplem não
somente a oralidade, mas também a linguagem visual. Borges e Linhares (2008) argumentam que na
tentativa de estudar a sociedade contemporânea não se pode ignorar a expansão da imagem como
forma de comunicação, sendo imprescindível considerar essa característica atual nos desenhos
metodológicos das pesquisas.

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Em um estudo de caso conduzido por Minelli-de-Oliveira, Camacho e Gisbert (2014) sobre a


percepção de uma turma (estudantes e professor) de Educação Primária acerca de um livro
eletrônico foram adotados três fontes de recolha de dados: gravação de vídeo e notas de observação
da aula; entrevistas em profundidade com o grupo; e a própria plataforma do livro eletrônico.
Percebe-se uma preocupação do entendimento da percepção dos alunos e professor considerando
não apenas sua fala sobre o tema, mas também seus comportamentos durante as aulas mediadas
por esse dispositivo semiótico. Além disso, a análise do dispositivo em si que mediava a aula – o livro
eletrônico – também se fez necessária, afinal as características desse dispositivo em específico
perpassam as falas e comportamentos dos participantes. A triangulação dos métodos adotada nesse
estudo de caso levaram ao cruzamento das informações compondo um quadro mais completo sobre
a percepção dos participantes quanto ao uso do livro eletrônico em sala de aula.
Segundo Bauer e Gaskell (2010), a triangulação é uma prática na pesquisa qualitativa, na qual
diversos métodos ou teorizações sobre o mesmo problema são empregados podendo conduzir à
evidência contraditória contribuindo assim para um maior entendimento do objeto de estudo.
Podemos observar essa prática na maioria das pesquisa qualitativas selecionadas para a revisão.
Somente duas pesquisas (Martí-Pellon & Uchoa-Craveiro, 2015; Monks, Mahdavi & Rix, 2016) se
ativeram a apenas um procedimento metodológico.
No artigo sobre exposição infantil a anúncios em sites de jogos do Brasil e da Espanha, os
pesquisadores Martí-Pellon e Uchoa-Craveiro (2015) fizeram análise de conteúdo de uma amostra de
sites acessados por crianças – de 9 a 11 anos - em aulas de informática na escola. Por fim, o artigo
acerca da emergência do cyberbullying na infância (Monks, Mahdavi & Rix, 2016) levou em
consideração as perspectivas de pais, professores e profissionais da escola utilizando-se de grupos
focais sobre o assunto.

5 Conclusões

A revisão de literatura revelou um pequeno número de artigos baseados em pesquisas empíricas que
abordam os temas infância e tecnologia em conjunto. Isso demonstra uma lacuna na área, apesar
das preocupações concernentes à crescente integração das tecnologias às vidas das crianças e os
possíveis desdobramentos desse uso precoce para o desenvolvimento humano, para o campo da
educação, entre outros.
Apesar disso, os artigos baseados em pesquisas qualitativas analisados demonstram uma riqueza
metodológica, explorando diferentes caminhos de pesquisa para tratar do tema em questão.
Destacam-se os usos das próprias tecnologias e de conteúdos audiovisuais no processo de produção
de informações na pesquisa como alternativas coerentes com os modos de expressão na atualidade,
permitindo que questões relacionadas à interação com essas tecnologias também possam ser
consideradas.
Quanto aos participantes, advoga-se a necessidade de ouvir as crianças, considerando ser esse um
tema que as coloca como atores centrais. Isso requer propostas metodológicas diferenciadas que se
configuram como um desafio para as pesquisas em geral, tendo em mente que ter crianças como
participantes em pesquisa implica sempre em uma concepção de infância que as localiza em certo
lugar no processo de produção do conhecimento científico. Além disso, contemplar as vozes das
crianças se mostra como um compromisso ético de enxergá-las como sujeitos ativos, não só nas
pesquisas, como também em suas vidas.
Concluímos que os temas aqui abordados são relevantes na sociedade contemporânea e merecem
maior atenção dos pesquisadores, possiblitando dessa forma maior conhecimento sobre o assunto,
assim como refinamento metodológico para as pesquisas na área.

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Pesquisa sobre educação estética: um percurso a/r/tográfico

Cristiane Herres Terraza; Lina Frazão de Castro; Tereza Bernardette Salles Ramos

Instituto Federal de Brasília, Campus Samambaia, Brasília, Brasil. cristiane.terraza@ifb.edu.br


Instituto Federal de Brasília, Campus Brasília, Brasília, Brasil. lina.castro@ifb.edu.br
Instituto Federal de Brasília, Campus São Sebastião, Brasília, Brasil. tereza.ramos@ifb.edu.br

Resumo. O presente artigo trata da metodologia adotada na investigação de práticas educacionais que
buscam o desenvolvimento da educação estética no contexto do ensino técnico e profissional do Instituto
Federal de Brasília. Tal metodologia tem adotado procedimentos qualitativos para identificar recursos
pedagógicos e processos formativos no ensino da arte. A pesquisa inclui a voz dos atores envolvidos,, tanto
pesquisadores como pesquisados e concilia o levantamento de dados qualitativos e quantitativos com a
pesquisa qualitativa, mais especificamente a a/r/tografia em consonância com a prática pedagógica em
artes.
Palavras-chave: educação estética, a/r/tografia, pesquisa qualitativa, prática pedagógica em artes.

Research on Esthetic Education: a/r/t/ographic Path


Abstract. This article deals with the methodology adopted in the investigation of educational practices that
seek the development of aesthetic education in the context of technical and professional education of the
Federal Institute of Brasília. Such methodology has adopted qualitative procedures to identify pedagogical
resources and formative processes in the teaching of art. The research includes the voice of the actors
involved, both researchers and researched, and reconciles qualitative and quantitative data collection with
qualitative research, more specifically a / r / tography in line with pedagogical practice in the arts.
Keywords: Aesthetic education, a / r / tography, qualitative research, pedagogical practice in the arts.

1 Introdução
Pensar educação estética é também se alicerçar nos pensamentos do teórico alemão Friedrich
Schiller (1759-1805), que entende a sensibilização do indivíduo como importância primordial na
constituição integral do mesmo. A educação estética, segundo Schiller, seria um processo
de formação voltado para o apuramento da sensibilidade aliada à razão com o intuito de emancipar
o sujeito. Em sua obra intitulada “Cartas sobre a Educação Estética do ser Humano” (1791-1793), o
filósofo alemão declara uma cisão no ser humano entre a razão e o sensível, por esse pensamento,
uma instância se oporia a outra. Percebida esta separação entre os polos que abarcam o universo do
sensível e do racional, a educação estética seria uma possibilidade de emancipação do indivíduo
através da unificação destes pólos, em que a arte seria capaz de “harmonizar e equilibrar as
tendências do ser humano cindido” (Sussekind, 2011: 15).
Pesquisar sobre educação estética significa investigar de modo a gerar entendimento sobre as
relações entre os sujeitos envolvidos - seus contextos e expectativas - e a atual realidade estetizada,
bem como as configurações contemporâneas das conexões entre o racional e o sensível. Quando nos
referimos especificamente à educação estética no âmbito do ensino da arte na educação formal, o
campo subjetivo se amplia. A essa tessitura, soma-se o contexto específico da educação profissional
pública no Brasil, com sua historicidade e composição de experiências, fortemente marcados pela
segmentação social, pelo princípio de treinamento dos sujeitos para a repetição e pela continuidade
da parcelarização do mundo produtivo.
Este artigo trata das discussões e das justificativas sobre a adoção de determinados percursos
metodológicos que, no momento, estruturam a investigação sobre a educação estética efetuada

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atualmente no âmbito do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília – IFB,


instituição de ensino técnico, tecnológico e profissional, pública e gratuita no Brasil. A Rede Federal
de Educação Profissional e Tecnológica criada pela Lei nº 11.892 de 29/11/2008, estabeleceu os
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e caracterizou-os como estabelecimentos de
ensino, pesquisa e extensão específicos para o oferecimento “de educação profissional e tecnológica
nas diferentes modalidades de ensino, com base na conjugação de conhecimentos técnicos e
tecnológicos com as suas práticas pedagógicas (...) formando e qualificando cidadãos com vistas na
atuação profissional nos diversos setores da economia” (Brasil, 2008).
Tal investigação encontra-se em sua etapa inicial, nesse sentido as questões aqui discorridas
possuem um caráter problematizador e contingente, apresentando-se fértil às reflexões sobre a
adoção de determinadas estratégias e métodos mistos no universo da pesquisa qualitativa. Sendo
esta pesquisa conduzida por três professoras que atuam no ensino da Arte no citado Instituto e que
possuem em sua prática pedagógica o compromisso com a educação estética, compreende-se que a
a/r/tografia seja, de fato, o percurso mais adequado, uma vez que 1) proporciona o estudo relacional
no qual os próprios investigadores se submetem como parte do corpo a ser investigado; 2) possibilita
a colaboração entre investigados e investigadores na elaboração do conhecimento produzido pela
pesquisa; 3) afirma a interdependência entre teoria e prática; e 4) oportuniza diferentes formas de
produção visando à divulgação de percursos empreendidos, das problematizações e dos resultados
obtidos. Deste modo, intentamos por meio de tais estratégias dar a conhecer as práticas efetuadas
no contexto da instituição, seus objetivos e princípios, bem como sua consonância à legislação que
norteia o ensino profissional brasileiro e o projeto político institucional do IFB, de modo a trabalhar
para a estruturação de práticas pedagógicas mais afetas ao desenvolvimento de uma educação
estética emancipadora, importante demanda da contemporaneidade. Também por essa perspectiva,
esperamos realizar conjuntamente uma autorreflexão sobre as nossas práticas docentes, objetivando
expandir nosso corpo teórico, nossa práxis e nossa própria poiesis.

2 Educação estética no âmbito profissional – um entendimento


No Brasil, a educação profissional seguiu, durante muitos anos, o modelo de uma educação de
“segunda linha”, pois tinha como principal objetivo o treinamento para as vagas demandadas pelo
mercado de trabalho. Nessa educação, os filhos da classe trabalhadora, classe que possui
tradicionalmente uma atividade mais voltada para a execução e não para a gestão da atividade
produtiva, recebiam uma formação de modo a perpetuar o dualismo entre gestão e execução, a
divisão do trabalho, a segmentação social. Assim, a educação profissional voltava-se às habilidades
mecanicistas, numa “separação entre concepção e execução e de parcelarização e repetitividade do
trabalho” (Picanço, 1995: 92). Entretanto, a partir de 2008, a educação profissional vinha sendo
revisada, estabelecendo o desenvolvimento da percepção e análise da realidade e do mundo do
trabalho como um dos princípios de geração de bem estar tanto individual como da coletividade em
que o sujeito está inserido. Para isso, se fez imprescindível o investimento em uma educação que
promovesse a percepção dos sujeitos sobre a realidade e que propiciasse a análise, inclusive, dos
meandros do processo produtivo, de modo a promover a emancipação, a autonomia de ações, o
empreendimento de novas soluções tanto no âmbito coletivo como individual.
Nessa perspectiva, uma educação estética na educação profissional deve debruçar-se sobre a
geração de um olhar complexo e multidisciplinar, que abrigue as contradições próprias da
atualidade, empreendendo uma compreensão da relação dialética da realidade na qual o indivíduo
se insere, enfatizando o mundo do trabalho e as ações que possibilitem uma emancipação desses
sujeitos às resignações das condições cotidianas.
O termo emancipação diz respeito à consciência sobre os processos que estruturam as realidades. Há

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que se trabalhar, portanto, uma formação omnilateral, conceito trabalhado a partir do pensamento
marxista e que diz respeito à educação do indivíduo, desenvolvendo “todo o seu potencial e não
como ser fragmentado, pois só assim ele poderá se encontrar objetivado como ser total diante de si
mesmo.” (SOUSA JUNIOR, 2009).
Emancipar-se, portanto, não se refere simplesmente a fazer oposição às estruturas que compõem o
sistema atual, mas a empreender ações no sentido do entendimento das contradições e disfunções
que compõem as realidades. Nesse sentido, uma educação que pretenda emancipar os indivíduos,
tanto docentes como discentes, não pode ser estruturada de modo a repetir os discursos
hegemônicos que só acentuam a manutenção histórica das estratificações sociais.
Diante disso, a pesquisa que vem sendo efetuada visa empreender esforços no sentido de entender
as práticas pedagógicas em Arte realizadas no âmbito do IFB, estruturando aquilo que diz respeito a
uma educação estética emancipadora, bem como promover a elaboração de proposições de ação
pedagógica que proporcione aos estudantes “a experiência estética e artística necessárias ao
desenvolvimento das suas capacidades sensíveis e de reflexão crítica.” (IFB, 2012).
Considerando que a pesquisa qualitativa nos oferece a possibilidade de entendimento dialético,
compreendendo o investigador em sua realidade social e em sua atuação sobre o mundo, tendo em
conta a pluralidade dos sistemas culturais atuais e, ainda, a necessidade da crítica às relações de
poder e coerção, previmos o uso de tal metodologia associada ao levantamento de dados
quantitativos de modo que resultasse no conhecimento em profundidade das proposições realizadas
no IFB, além de apontar ações a serem efetuadas visando o desenvolvimento de proposições
pedagógicas mais afetas ao que dispõe os documentos norteadores do ensino na Instituição, como
no artigo 54 de seu Estatuto.
O currículo no IFB está fundamentado em bases filosóficas, epistemológicas, metodológicas,
socioculturais e legais, expressas no seu Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) e no seu
Projeto Pedagógico Institucional (PPI), e se norteia pelos princípios da estética, da sensibilidade, da
política de igualdade, da ética, da identidade, da interdisciplinaridade, da contextualização, da
flexibilidade e da educação como processo de formação na vida e para a vida, a partir de uma
concepção de sociedade, trabalho, cultura, educação e tecnologia.
Pelo processo da pesquisa-ação pretende-se a inclusão dos sujeitos participantes, como docentes,
gestores e discentes, de modo que o conhecimento construído processualmente pela investigação
seja instrumento de reflexão e formação para todos. Considerando que o conhecimento construído
pode ser concebido como um “instrumento de poder e controle” (Chizotti, 2011: 96), busca-se por
meio da participação a análise das realidades atuais e a adequação das práticas pedagógicas em Arte
de modo a promover tanto o que está previsto no citado Estatuto, como também uma educação que
alcance mais plenamente a emancipação dos discentes e docentes.

3 Metodologia
Esta pesquisa adota uma perspectiva a/r/tográfica por entender que, tanto os pesquisadores
propositores da investigação como os sujeitos nela envolvidos, possuem caráter prospectivo,
minucioso. O viés a/r/tográfico contempla a ação do sujeito envolvido com a aprendizagem, sem
discriminar sua instância docente, investigativa e artista. Assim, o trabalho docente compõem-se de
todos os outros aspectos do sujeito considerando-o como um criador: o trabalho de pesquisa de um
docente se assemelha à pesquisa do artista, uma vez que suas análises e envolvimento com o
processo de criação remetem à sua própria subjetividade em relação à realidade em que está
inserido, sem se esquecer dos objetivos de seu exercício, tanto docente, quanto artístico. Exemplo
disso pode já ser observado durante o estudo da arte sobre o conceito de educação estética, quando
do início da realização da investigação, visto que, sendo nós, as pesquisadoras, também atuantes

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como docentes em arte do IFB, nossas práticas pedagógicas foram objeto de minuciosa reflexão,
desenvolvendo, assim, maior consciência sobre as estratégias e procedimentos efetuados.
Tais reflexões tiveram como fundamentos iniciais as colocações de Hume (2004) sobre a formação do
gosto. O autor aponta que é no desenvolvimento da percepção que o indivíduo pode mais
propriamente assumir a condição de estar aberto à composição das formas que constroem o belo. “A
capacidade de perceber da maneira mais exata os objetos mais diminutos, sem permitir que nada
escape a atenção e a observação, é reconhecida como a perfeição de cada um dos sentidos e
faculdade”, observa Hume, pode levar o indivíduo a uma autonomia crítica, uma vez que pelo
exercício de contemplação e percepção desenvolve-se o discernimento necessário ao julgamento
sobre um determinado objeto. Assim, pensamos que tal objeto pode ser tanto uma obra de arte ou
um trabalho expressivo como um fato da realidade que o cerca.
Tal exercício de contemplação e percepção pode ser norteado por aquilo que Ferry (2003) descreve
em relação à criação do artista na contemporaneidade:
[a obra de arte é] pura e simples expressão de individualidade: estilo absolutamente singular que em
nada já se quer espelho do mundo, mas criação de um mundo, no interior do qual cada artista se
move, mundo no qual nos é decerto permitido entrar, mas que de maneira nenhuma se nos impõe
como universo a priori comum. (p. 28)
Do mesmo modo que a criação, a fruição também passa a consistir como expressão de uma
singularidade. O sujeito espectador busca em suas referências e memórias a estrutura que permitirá
sua aproximação da obra e uma consequente interpretação. A experiência da arte é,
definitivamente, estruturada por meio de uma relação entre as subjetividades: naquilo em que a
obra consiste e naquilo em que o espectador funda-se. E para que esta experiência aconteça, como
coloca Dewey (2010), o indivíduo deve vivenciar os mais diversos acontecimentos, não só os
artísticos, mas os “acontecimentos e cenas que prendem o olhar e o ouvido atentos do homem,
despertando seu interesse e lhe proporcionando prazer ao olhar e ouvir” (p. 60).
Porém, ao proletariado e aos seus filhos, maior público atendido no IFB, o desenvolvimento da
percepção é precarizado, pois a educação técnica, como já nos referimos, por muito tempo efetuou
apenas um treinamento para habilidades específicas de atividades demandadas pelo mercado de
trabalho. Assim, tal educação cumpria o que Ranciére observou em seu livro “A partilha do sensível”
(2005) sobre quem pode tomar parte, ou seja, a quem é dada a oportunidade de perceber e ser
percebido, de ouvir e falar, de entender e se manifestar. Segundo o autor, o proletariado não pode
disso participar, uma vez que “não tem tempo para se dedicar a outra coisa que não seja seu
trabalho. Eles não podem estar em outro lugar porque o trabalho não espera.” (Ranciére, 2005: 16
[grifo do autor]). A muitos deles, restam apenas os produtos e as realidades construídas pela
estetização da economia que provoca a criação de produtos estéticos para a massa, cujo objetivo é
incrementar ainda mais a lógica do consumo e a manutenção de discursos hegemônicos. Como
aponta Lipovetsky, “a estética se tornou um objeto de consumo de massa [... de] uma cultura
degradada em show comercial sem consistência, numa vida fagocitada por um consumismo
hipertrofiado” (2015: 421-422).
Entretanto, ao observarmos essa realidade, recorremos ao pensamento de Read em seu livro “A
educação pela arte”, lançado em 1963, no que tange à função da educação:
O objetivo da educação, portanto, só pode ser o de desenvolver, juntamente com a singularidade, a
consciência social ou reciprocidade do indivíduo. Ela [a singularidade] pode ser uma maneira única de
ver, pensar, inventar, expressar a mente ou a emoção – e, neste caso, a individualidade de um homem
pode constituir um incalculável benefício para toda a humanidade. (READ, 2001: 6)
Deparamo-nos, ainda, com a legislação já aqui especificada e que se reverbera tanto no Projeto
Político Institucional, como também no Regimento Geral da Instituição, e que preconizam um ensino
em que a estética da sensibilidade seja princípio norteador das escolhas e ações pedagógicas.
Portanto, a análise dos dados da supracitada pesquisa também deve ser realizada à luz de tal

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legislação.
É de enorme importância uma investigação que se norteie pela escuta atenta aos envolvidos no
processo pedagógico do ensino da Arte nos vários Campi do IFB, não se furtando ao levantamento de
dados quantitativos, objetivando não só a descrição das práticas atualmente efetuadas, mas também
possibilitando aos envolvidos uma maior reflexão sobre educação estética e a possível necessidade
de revisão dessas práticas.
Na visita inicial aos Campi desenvolvemos, além do levantamento dos dados quantitativos, três
atividades: uma roda de conversa com alunos que se disponibilizam a participar dessa atividade, uma
entrevista com os docentes de Arte e uma entrevista com a gestão de ensino do Campus. Na
execução das três atividades, utilizam-se entrevistas semi-estruturados, a fim de entender a
dinâmica efetuada no Campus no que diz respeito ao ensino da arte, bem como entrevistas não
estruturadas, de forma que o entrevistado possa manifestar todo seu interesse e entendimento
sobre o assunto - a educação estética e sua prática na educação profissional. Tal etapa, visa coletar
as informações relevantes de modo a “alcançar um conhecimento mais amplo [...], esclarecendo
questões pertinentes e, sobretudo, instruindo ações posteriores” (Chizzotti, 2011: 135).
Ainda nesta etapa do trabalho, os entrevistados são convidados a participarem de rodas de conversa
com os entrevistados de outros Campi de modo a aproximar em diálogo e ampliar o conhecimento
sobre os diversos caminhos adotados na instituição no que se refere à prática do ensino da Arte.
Assim, objetiva-se incrementar as reflexões e “esclarecer os indivíduos sobre uma situação dada e,
para isso, propor uma ação consequente e eficaz para o problema enfrentado” (Chizzotti, 2011: 81).
Pretendemos, ainda, realizar um segundo encontro, em que os participantes, reconhecidamente
atores na construção do conhecimento a ser gerado pelo processo investigatório, possam propor
alternativas à resolução de problemas comuns a todos no exercício da prática pedagógica dos
componentes referentes ao ensino da arte no IFB. Almejamos por meio dessa proposição, analisar os
dados recolhidos, de forma a promover maior conscientização sobre o tema abordado - educação
estética - e sua importância específica para uma educação profissional emancipadora, e provocar os
enfrentamentos que tal educação exige.
Como o processo de entrevistas e levantamento de dados já foi iniciado, observamos a necessidade
de uma discussão aprofundada sobre o que vem a ser e quais os objetivos da educação estética. Para
auxiliar nessa discussão, prevemos a realização de um encontro dos agentes participantes da
pesquisa com pesquisadores e teóricos reconhecidamente especializados no tema, de modo a
incrementar a compreensão e alargar as possibilidades de ação. Assim, “todo o processo de pesquisa
é concebido como um aprendizado educativo e todas as atividades consideradas como ocasião de
ampliação e conhecimento da realidade” (Chizzotti, 2011: 96).

4 Conclusões
O empreendimento da investigação descrita neste artigo possui como princípio o reconhecimento da
experiência humana, no que tange seus processos de formação e educação. Assim, julgamos que
uma coleta qualitativa de dados seria necessária, porém insuficiente ao conhecimento mais dinâmico
e fluido, próprio da ação humana, bem como da apreensão dos processos pedagógicos para a
educação estética na instituição abordada. Assim, recorremos às possibilidades estratégicas
consolidadas pela pesquisa qualitativa, nomeadamente da a/r/tografia, cujos princípios se adequam
aos da pesquisa na ação.
A análise de conteúdos por “freqüenciamento ou quasiquantitativa (repetição de conteúdos
comuns à maioria dos respondentes)” (Campos, 2004: 614), já em curso, se mostrou bastante
adequada como estratégia de estudo dos dados obtidos, devido à finalidade de composição de
proposição de metodologia a ser adotada pelos professores envolvidos na pesquisa.

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Como resultados esperados no processo de investigação já iniciado, pretendemos a construção de


proposições pedagógicas que atendam às necessidades percebidas no contexto do ensino técnico e
profissional e que estabeleçam diálogos com as realidades materiais e culturais do Instituto Federal
de Brasília. Mais especificamente, uma prática pedagógica em arte que permita refletir sobre a
relação indivíduo/coletividade na contemporaneidade, na sociedade da hipercomunicação e no
mundo da produção entendendo as forças que transversalizam a criação atual que se constitui de
modo complexo e dinâmico. Além destes pontos, percebe-se também que uma efetiva educação
profissional somente se realizará na imbricação dos saberes técnicos necessários ao exercício da
profissão com o desenvolvimento de práticas pedagógicas que promovam o entendimento do
indivíduo como ser social, constituído e constituinte da sociedade, e cujo desenvolvimento crítico e
estético possa ser a garantia de uma ação emancipatória em relação aos sistemas generalizantes.
Por fim, há também a intenção de publicar os resultados da pesquisa realizada em artigo acadêmico,
na Revista Eixo, que é um periódico de acesso aberto produzido pelo Instituto Federal de Brasília e
voltado principalmente para divulgação das pesquisas e estudos técnico-científicos em geral.

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A investigação qualitativa como metodologia compreensiva da


dimensão interpessoal/social de um projecto de mediação de
conflitos

1 2 1
Elisabete Pinto da Costa , Juan Carlos Torrego e Alcina de Oliveira Martins
1
Universidade Lusófona do Porto, CeiED, Portugal, elisabete.pinto.costa@ulp.pt, amom@ulp.pt
2
Universidade de Alcalá, Espanha, juancarlos.torrego@uah.es

Resumo. Este estudo teve por base um Projeto de Mediação de Conflitos (PMC), realizado no centro de
Portugal. A análise focalizou o impacto da intervenção do projeto, nos alunos e professores que
participaram ativamente no mesmo, indagando os seus efeitos e benefícios nas relações interpessoais e na
convivência escolar. Na pesquisa, foi selecionada uma investigação qualitativa, que privilegiou as
representações, os significados e as práticas em torno do PMC. Os resultados apontam para a eficácia do
PMC, na prevenção e resolução de conflitos, assim como na promoção da sociabilização. Na opinião dos
professores, o pessoal não docente foi o que menos acompanhou a dinâmica do projeto. Em contraste, é
significativa a formação específica de alunos e professores, pois concorreu para o desenvolvimento de
valores e princípios, essenciais à convivência colaborativa.

Palavras-chave: mediação de conflitos; projeto de intervenção; dimensão interpessoal/social; investigação


qualitativa.

The Qualitative Research As A Comprehensive Methodology For The Interpersonal/Social Dimension Of A


Conflict Mediation Project
Abstract. This study was based in a Conflict Mediation Project (CMP), carried out in the center region of
Portugal. The analysis focused on the impact of the project intervention, in the students and teachers who
participated actively in the projetc, investigating its effects and benefits in interpersonal relationships and in
school life. In the study, a qualitative research was selected, which privileged the representations, meanings
and practices about the CMP. The results point to the effectiveness of CMP in the prevention and resolution
of conflicts, as well as promotion socialization. In the opinion of the teachers, the non-teaching staff was the
one who least followed the dynamics of the project. In contrast, the specific training of students and
teachers is significant, because it contributed to the development of values and principles, essential to
collaborative coexistence.
Keywords: conflict mediation; intervention project; interpersonal/social dimension; qualitative
investigation.

1 Introdução

O presente artigo centra-se num projeto de mediação de conflitos (PMC) implementado numa Escola
Básica de 2º e 3º ciclos, da zona centro de Portugal, considerada Território Educativo de Intervenção
Prioritária, num período longitudinal, efetuado entre os anos de 2009 e 2014. Atendendo à
amplitude dos projetos de mediação de conflitos pode definir-se três dimensões de sustentação: i)
dimensão processual, referente ao processo de implementação do PMC e ao cumprimento de cada
etapa predefinida. Trata-se aqui de compreender a mecânica e a dinâmica próprias dos projetos
desta natureza; ii) a dimensão interpessoal/social, que se reporta à aquisição e/ou ao estímulo de
atitudes e de comportamentos favoráveis a uma sã convivência. Relaciona-se a aprendizagem dos

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princípios, valores e habilidades de mediação pelos indivíduos com o crescimento e o


desenvolvimento pessoal, assim como com a melhoria do contexto relacional e social escolar; iii) a
dimensão organizacional, relativa às condições institucionais necessárias para o bom funcionamento
das estruturas e procedimentos de mediação, e, sobretudo, à integração da mediação na estrutura
formal e nos processos sociais, que a legitimam e lhe conferem reconhecimento. Ao influir desta
maneira na cultura relacional, social e orgânico-cultural de escola, almeja-se que aí emirja uma
cultura de mediação. Considerando a dimensão deste artigo, focaliza-se análise aqui vertida na
dimensão interpessoal/social do projeto e nesse contexto visa-se saber quais as mais valias da
implementação de um projeto de mediação de conflitos em contexto escolar. Para o efeito,
considera-se adequado um estudo de caráter qualitativo, assente em processos compreensivos da
realidade, através das representações, dos significados, das crenças e das práticas em torno do PMCE
na dimensão identificada.

1.1 A mediação de conflitos implementada pela metodologia de projeto

A mediação em contexto escolar é reconhecida como uma metodologia de intervenção com forte
potencial educativo e capacitador, e como área a explorar para a formação de habilidades sociais
basilares para a vida em comunidade, proporcionando um universo de potencialidades geradoras de
mudanças e melhorias. Esta socialização traduz o esforço de transmissão, através da apropriação de
normas e regras de comportamento necessárias à vida em comunidade, sendo que a articulação das
normas, valores e saberes adquiridos refletem esse quadro de vida social (Almeida, 2004). Contudo,
as dissensões e as ruturas relacionais, que se revelam nos índices de indisciplina, de conflitualidade e
de violência, constituem tanto uma fratura à normatividade escolar, como colocam em causa a
cultura disciplinar, que se espera que aí exista (Quaresma, 2010).
O tipo de projeto adotado neste estudo, assenta em quatro principais vertentes da mediação na
escola: como técnica de intervenção na gestão e resolução dos conflitos; como metodologia de
prevenção; como ferramenta de desenvolvimento pessoal e social e como estratégia de melhoria.
Dadas as exigências inerentes à implementação do PMC, requerem-se mudanças, tanto a nível
interpessoal, como a nível organizacional. Trata-se de uma intervenção em termos de escola, em que
indivíduos e organização apre(e)ndem novos procedimentos, usufruem de novas estruturas e
beneficiam de processos de melhoria.
Em Portugal, os PMC, são recentes, remontando ao ano de 2000. São apontados como boas práticas,
em função dos resultados confirmados, por estudos estrangeiros que têm marcado a agenda da
investigação (Johnson & Johnson, 1996; Souquet, 1999; Bonafé-Schmitt, 2000; 2004; Smith, Daunic,
Millar & Robinson, 2002; Galán; Mas & Torrego (2008); Torrego & Galán, 2008). À imagem das
críticas apontadas por Torremorell (2002), face ao ponto de situação da investigação estrangeira,
também em Portugal são precisas investigações que convençam a comunidade científica e a escola
da utilidade deste tipo de projetos.

2 Metodologia

2.1 Objetivos

Com vista à construção de um esquema de análise interpretativa, que valorize o conhecimento


investigativo estabeleceu-se dois principais objetivos específicos, interrelacionados com a dimensão
de análise do PMC: i) analisar o impacto da intervenção naqueles que participam ativamente no

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projeto; ii) indagar os efeitos e benefícios do projeto nas relações interpessoais e na convivência
escolar. Associados a esses objetivos definiram-se duas questões norteadoras: i) em que medida o
projeto permite a promoção de habilidades na gestão dos conflitos e das relações interpessoais?; ii)
qual o impacto do projeto na melhoria relacional e social da escola? Nestes objetivos e questões
remarca-se a opção pelo estudo de caráter qualitativo, assente em processos compreensivos da
realidade em análise e em avaliação, através das representações, dos significados, das crenças e das
práticas em torno do PMC.

2.2 Participantes

O processo de constituição dos participantes na investigação assumiu-se dinâmico e sequencial,


tendo sido ajustado à medida que o estudo foi evoluindo para completar ou contrastar os dados
recolhidos e em função da natureza do projeto de investigação - intervenção. Nesse sentido, optou-
se por organizar três entrevistas na fase mais adiantada do funcionamento do projeto. Assim,
entrevistaram-se dois professores mediadores, sendo um coordenador do TEIP e outro coordenador
da equipa de mediação. Ambos os entrevistados acompanharam o PMC desde o início, apresentando
um envolvimento com a mediação de cerca de cinco anos. Entrevistou-se também um grupo de 10
alunos, na modalidade de Entrevista de Grupo Focal, respeitando os indicadores numéricos referidos
na literatura (Amado & Ferreira, 2013), 6 do sexo feminino e 4 do sexo masculino, selecionados de
acordo com os seguintes critérios: 1) ligação ao projeto como mediadores; 2) disponibilidade pessoal;
3) diferença de anos de participação no projeto; 4) consenso entre a coordenadora da equipa de
mediação e a investigadora. Estes apresentavam idades compreendidas entre os 12 e os 15 anos de
idade, distribuídos da seguinte forma: 1 com 11 anos, 4 com 13 anos, 4 com 14 anos e 1 com 15 anos
(1 do segundo ciclo e 9 do terceiro ciclo do ensino regular e do ensino vocacional). Diferiam no
número de anos como mediadores: 4 com 3 anos, 5 com 4 anos, 1 com 1 semana. Nessa seleção
atendeu-se então aos critérios de uniformidade (perfil) e de diversidade (idade, sexo e anos de
participação no projeto) do grupo, numa relação de equilíbrio (Galego & Gomes, 2005).

2.3 Método e procedimento

A entrevista foi a opção metodológica adotada para obter informação para a pesquisa. Partindo
deste pressuposto decidiu-se realizar três entrevistas semiestruturadas a sujeitos considerados como
estratégicos para revelarem mais informações sobre o PMC, tendo em conta que decorria o quarto
ano do projeto. Respeitando a tipologia da entrevista adotada, o guião compreendeu três tipos de
perguntas (Flick, 2005): perguntas abertas, perguntas impulsionadas pela teoria e/ou orientadas
pelas dimensões e subdimensões e perguntas confrontativas. Realizou-se também uma Entrevista de
Grupo Focal (EGF) aos alunos mediadores. Neste tipo de entrevista, o investigador observa a
espontaneidade em relação ao tópico discutido e envolve-se na determinação e na manutenção
desse tópico em discussão. A EGF está associada à riqueza de informação que a interação dos
elementos do grupo pode proporcionar por comparação à entrevista individual, o que foi potenciado
através de um guião igualmente adaptado a uma entrevista semiestruturada. Como aponta Amado e
Ferreira (2013, p. 226), através de um conjunto de questões abertas de auscultação visou-se “(…) dar
conta da experiência, das atitudes, dos sentimentos e das crenças dos participantes acerca do tema
em causa”. Foi também elaborado, longo do procedimento da análise de conteúdo, um mapa das
áreas temáticas e do sistema de categorias, prévias e emergentes. Em síntese, o recurso às três
entrevistas proporcionou uma multiplicidade de informação qualitativa sobre o PMC sobre os pontos
de vista de indivíduos implicados no projeto.

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3 Análise e discussão dos resultados

3.1. Da apropriação de habilidades ao desenvolvimento pessoal

Nesta categoria de análise, denotou-se nos discursos dos dois professores coordenadores, uma
mudança na forma como estes se relacionavam com os alunos, conseguindo uma melhor satisfação
em relação a necessidades pessoais e profissionais:
“Inclusivamente no meu trabalho de diretora de turma, a forma como eu
perceciono as questões, e as próprias respostas e os pedidos que ia fazendo aos
meninos (…)” (CEM).
“(…) Eu aqui tento ser uma pessoa diferente com eles” (CPTEIP).
A mudança de postura foi, todavia, mais notória entre aqueles professores que tiveram
oportunidade de colaborar no gabinete de mediação, corroborando assim os benefícios da
aprendizagem experiencial, pois estes tendem a tornar-se mais aptos na gestão dos conflitos:
“Os [professores da equipa] que têm formação são mais confiantes, mais
tranquilos. (…)” (CPTEIP)
Esta nova forma de encarar o conflito acabou por seduzir os restantes professores: “Numa espécie de
osmose. Sim, sim. Para já com o convívio com professores que são professores mediadores. Sobretudo
perguntam muito como é que funciona, como é que é e depois…” (CPTEIP).
Na perspetiva do coordenador do TEIP, a promoção de habilidades de mediação foi mais reduzida
nos assistentes operacionais.
“Sinto que os funcionários estão mais distantes nessa perceção das coisas(…) isso
porque não se apropriaram das técnicas certas, não se muniram dessa
ferramenta. (…)” (CPTEIP).
Em relação aos alunos mediadores, os professores reconheceram ter havido mudança. Ambos os
entrevistados afirmaram haver uma melhoria a este nível, porquanto “(…) já dominam o conceito!
Eles já percebem. É diferente porque ouviam falar e estiveram envolvidos (…)” (CEM), e isso resulta
das aprendizagens adquiridas: “(…) Os que tiveram formação, sim. Esses ficam com outra
sensibilidade. É diferente, falarmos para um aluno que teve, ou uma turma que teve formação e uma
turma nova” (CPTEIP). Esta mudança foi confirmada em outros estudos sobre as aprendizagens
adquiridas pelos alunos mediadores (Bonafé-Schmitt, 2004; Domingos, 2007). Por exemplo, pela
análise dos discursos dos professores entrevistados, denotaram-se as seguintes características nos
alunos mediadores: i) uma atitude de atenção e de comprometimento: “O que eu vejo é o interesse e
a importância que eles dão. E acho que quando eles me interpelam, “ó professora isto é um caso para
mediação”. É porque ficou lá alguma coisa! Eles reconhecem que a mediação ajuda” (CEM); ii) uma
postura de intervenção: “Eu sei que alguns faziam mediações informais, até porque, “ó professora, já
ajudei”; “ó professora vou ali ajudar um colega a resolver um conflito”. (CEM); iii) uma atuação
preventiva de situações mais graves: “E temos alunos, que (…) conseguiram evitar uma situação de
conflito, porque, entretanto, tomaram as rédeas da situação e puseram os colegas a conversar. (…)”
(CPTEIP). Em suma, a afirmação de jovens comprometidos com o seu contexto é a uma marca
caraterística da mudança nos alunos mediadores: “(…) eles envolvem-se muito (…)” (CEM). Foram
sobretudo os alunos mediadores entrevistados que estabeleceram a associação entre a
aprendizagem adquirida pela mediação e o crescimento pessoal. Quatro desses alunos apontaram as
seguintes mudanças pessoais: i) maior consciencialização na atuação com os colegas: “(…) depois da
formação nós chegamos à conclusão que a maneira como nós atuávamos não era a mais correta e se
calhar estava na altura de (…) começarmos a resolver as coisas de forma mais correta” (EGAMdor5);
ii) mais autoconfiança: “Depois da formação dá aquela: ok, quero ser mediadora, eu vou utilizar isto”
(EGAMdor10); iii) mais autocontrolo: “(…) depois de fazer a formação percebi que consegui começar

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a falar mais com ele, a resolver melhor as coisas. Às vezes ainda expludo, mas não tanto como
explodia” (EGAMdor6); iv) mais empatia: “Acho que sim, mudou. Também a perceção que eu tenho
das pessoas (…). Mudou muito a personalidade das pessoas que eu via. Mudou a forma de eu chamá-
las à razão” (EGAMdor2). Acresce o testemunho de um dos alunos mediadores que resumiu da
seguinte maneira a perceção sobre como sente que a mediação contribui para o seu crescimento:
“Acho que nos faz crescer mentalmente (…)” (EGAMdor), “O gabinete de mediação fez-me ver o
mundo com outra perspetiva” (EGAMdor6).
Em síntese, constatou-se que a mediação contribuiu para uma mudança no desempenho na gestão
dos conflitos e na forma como os professores e alunos mediados se relacionavam com os demais,
percecionando um crescimento pessoal. De acordo com a literatura revista, os mediadores são
aqueles que mais ganham com o envolvimento em projetos de mediação de conflitos (Nascimento,
2003; Pinto da Costa & Barandela, 2010).

3.2. A promoção do clima relacional e social escolar

A literatura refere que projetos como estes melhoram o clima social da escola (Barnet, Adler, Easton
& Howard, 2001; Baginsky, 2004; Bickmore, 2002; Cohen, 2005; Torremorell, 2007). Na escola em
estudo, embora o projeto estivesse em funcionamento desde 2009, para os professores
entrevistados ainda era difícil avaliar se a mediação tinha contribuído efetivamente para a melhoria
da convivência escolar: “Não posso ainda afirmar, não posso ainda afirmar” (CEM). “(…) Não tenho
dados para precisar isso (…)” (CPTEIP). Todavia, havia uma perceção de melhoria das relações
interpessoais. Como referiu a coordenadora da equipa: “(…) Mas, as relações têm vindo a melhorar”
(CEM) e, segundo o coordenador do TEIP, assistiu-se ao efeito do gabinete de mediação na melhoria
dos relacionamentos entre alunos e professores e entre alunos entre si:
“(…) eu vejo o respeito por passarem a cumprimentar quando me veem na escola
(…). Fazem até questão” (CPTEIP). “(…) alguns dos alunos depois de passarem pelo
gabinete e de terem hipótese de conversar, de resolver o seu conflito, tornam-se
alunos mais meigos, mais respeitadores e isso acontece especialmente em relação
aos professores que estiveram envolvidos na mediação” (CPTEIP). “Os diretores de
turma (…) dizem: “Olha, que ele está mais calmo”. “Já não anda sempre às turras
com a colega (…)” (CPTEIP).
Em específico na relação entre professor – aluno, o coordenador do TEIP destacou especialmente
uma lógica de respeito:
“(…) primeiro os alunos respeitam a mediação e respeitar a mediação implica
também respeitar os professores mediadores. Havendo ou não acordo, não
interessa, eles vêm sempre o professor, como o professor do gabinete de
mediação. (…) E de maneira que a relação com esses alunos, que muitas vezes não
conheço, é de respeito” (CPTEIP).
Um dos alunos mediadores mencionou também que a mediação facilitava os relacionamentos e
promovia amizades:
“Inclusivamente quando nós resolvemos um conflito, por exemplo: há duas
raparigas que não se dão nada bem. Depois quando tentamos interferir no
conflito, as raparigas até passam a ser amigas e a conhecerem-se melhor e a
perceberem que afinal têm um grande futuro à frente e uma grande amizade. Isso
acontece muito” (EGAMdor8).
As sessões de mediação eram, na opinião dos alunos entrevistados, favoráveis à melhoria do
ambiente escolar: “Normalmente é sempre bem-sucedida” (EGAMdor5). “Tem um efeito positivo,
depois” (EGAMdor4). Em sintonia, o coordenador do TEIP referiu-se aos efeitos das mediações

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formais da seguinte forma: “Curiosamente, funciona um pouco como um tranquilizante (…)” (CPTEIP).
Foram as melhorias de comportamento: “Olha, falei com a mãe do aluno x e ela está a notar um
comportamento diferente do filho, depois de ter feito o processo de mediação (…)” (CPTEIP), assim
como a abertura para abordar os conflitos de forma pacífica: “Depois quando nos encontram no
recreio, “ó professora eu não me esqueci!”, “ó professora, está a resultar!”, ou o inverso: “ó
professora, então ele não está a fazer nada daquilo!” Está bem, precisas de voltar, voltas lá. (…)”
(CEM), que acabaram também por ir contribuindo para a melhoria relacional e social na escola.
Os alunos mediadores entrevistados sustentaram uma apreciação favorável da mediação sobre as
relações interpessoais graças aos efeitos que esta tinha sobre os alunos envolvidos, mas também à
germinação de uma lógica de apoio e de entreajuda, decorrente da ação dos mediadores na
construção de pontes de comunicação e de entendimento. Por exemplo, nos discursos analisados
verificou-se: i) tanto a aceitação dos mediadores, como pacificadores: “As pessoas começam a falar.
Começam, depois da nossa atuação. Cada vez que têm um conflito têm aquela intuição de nos
procurar (…)” (EGAMdor5); ii) como a aceitação da mediação como um meio menos desgastante para
resolver conflitos: “(…) depois da primeira mediação já se começa a procurar mediadores, já sabem
que é muito mais fácil e rápido” (EGAMdor4); iii) a mediação proporcionava confiança entre os
alunos: “Sentem-se seguros e confiantes quando nós ajudamos. Sabem com quem podem contar,
porque nós estamos aqui é para ajudar as outras pessoas” (EGAMdor8); iv) permitiu recuperar
amizades quebradas: “(…) por norma acabaram bem. As pessoas ficam amigas” (EGAMdor6); v) e
reforça os laços de amizade entre alunos: “Já aconteceu uma vez eu ter feito uma mediação e o meu
colega ficou a confiar mais em mim (…)” (EGAMdor2). Anteviu-se, assim, destes discursos uma nova
forma de interação social, não adversarial, que se foi afirmando na escola por força da presença dos
alunos e professores mediadores.
Encarada como um elemento perturbador da convivialidade e do processo de ensino e
aprendizagem, a indisciplina constituiu para o coordenador do TEIP uma área fundamental para o
sucesso da mediação na melhoria do ambiente relacional e social escolar:
“E nós temos diminuído as situações de indisciplina, em parte, também pela
atuação do gabinete de mediação (…)” (CPTEIP). “(…) muitos dos casos que nós
aqui conseguimos resolver em termos de mediação, quer formal, quer informal, se
não houvesse gabinete, podiam ter disparado as situações de indisciplina (…)”
(CPTEIP).
Neste estudo de caso, fruto de reduzidos índices de violência manifesta, a indisciplina assumiu-se
como um dos principais fatores justificativos da adoção de projetos de mediação. O coordenador do
TEIP, mais ciente institucionalmente das necessidades e da avaliação da escola, reforçou a perceção
positiva dos efeitos do PMCE sobre a indisciplina, numa perspetiva preventiva, ao afirmar que:
“Houve uma alteração para melhor. E ela tem resultados concretos que é nas
situações depois a montante, de indisciplina, que são menores, têm vindo a reduzir
gradualmente e é consensual saber que o gabinete de mediação tem um papel
nisto. (…). As pessoas sabem qual o trabalho feito pelo gabinete e sentir que as
pessoas sentem isso, é bom (…)” (CPTEIP).
Em suma, a mediação oferecia à escola e aos indivíduos novas formas de relacionamento que
fortaleciam, dia a dia, um clima de convivência positiva, alicerçado na prevenção do conflito, da
indisciplina e da violência.

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4 Conclusão

Sobre a dimensão interpessoal e social do PMC estudada, segundo uma abordagem metodológica
qualitativa, intentou-se perceber como o projeto influiu na relação entre os indivíduos, nos
indivíduos per si e no ambiente relacional e social da escola.
Em jeito de conclusão orientamo-nos pelas questões norteadoras identificadas no início deste artigo.
Assim, sobre em que medida o projeto permite a promoção de habilidades na gestão dos conflitos e
das relações interpessoais, da análise de conteúdo das entrevistas dos dois professores, verificou-se
que estes afirmaram ter desenvolvido uma forma mais atenta, mais confiante, mais tranquila, mais
empática e educativa de tratamento dos conflitos. Reconheceu-se também que a capacitação não se
verificou de maneira idêntica em todos os professores e alunos. Por exemplo, somente os
professores que passaram pelo gabinete de mediação tiveram oportunidade de consolidar as
aprendizagens, exercitar as técnicas e confiar nos resultados da aplicação do método. Os alunos
demonstraram uma nova forma de estar perante as controvérsias, dominando o conceito de
mediação e apresentando-se bastante interventivos na gestão dos conflitos entre pares. Por sua vez,
os professores entrevistados consideraram não se verificar a consolidação dessas aprendizagens nos
assistentes operacionais. Dito de outra forma, depreendeu-se da análise que professores e alunos
com formação em mediação e com pouco ou nenhum envolvimento na prática da mediação,
demonstraram menor domínio das aprendizagens. Por isso, inferiu-se que a formação deveria ser
reforçada e beneficiada com a participação nas estruturas de mediação, de forma a melhorar o
desempenho dos alunos e dos professores mediadores, assim como dos assistentes operacionais.
Em resposta à questão norteadora sobre qual o impacto do projeto na melhoria relacional e social da
escola, reconheceu-se que tanto as estruturas de mediação como os alunos mediadores passaram a
exercer uma “pressão positiva” (Nascimento, 2003) no seu contexto, colocando em prática
mecanismos de qualificação das relações interpessoais. A metodologia da mediação proporcionou o
restabelecimento de pontes de diálogo e de entendimento entre alunos, a resolução de situações
problemáticas ocorridas na sala de aula e a aquisição de uma postura proativa e positiva de
abordagem aos conflitos e às relações interpessoais. Este indicador representa a melhoria do
ambiente e clima social da escola. Contudo, estas constatações não permitiram atestar que a cultura
de escola tenha sido invadida pela cultura de mediação. Presenciou-se uma manifestação de cultura
de escola, no que respeita à mediação, entre o tipo diferenciadora e (uma tendência para) o tipo
integradora (Torres, 2014), porque constatamos um elevado grau de partilha de valores, costumes,
rotinas e rituais no seio do grupo de participantes no projeto e, especialmente, nos participantes no
estudo. Resta esperar que a cultura de escola e a cultura de mediação se desenvolvam no tempo
para apresentar um grau mais elevado e generalizado de partilha e de identificação pelos sujeitos e
pela organização. Em todo o caso, o PMC contribuiu para edificar as bases para a emergência da
cultura de mediação, em virtude da sua gradual (mas ainda difícil) afirmação nos âmbitos
interpessoal e social. Embora, os primeiros resultados de um projeto de mediação só sejam
conhecidos, no mínimo, ao fim de dois anos de intervenção, não há qualquer previsão de tempo
necessário para a afirmação da mediação como cultura de cada indivíduo e do coletivo, na medida
em que tal dependerá da predisposição de ambos. Em suma, o PMC revelou-se um meio essencial
para o desenvolvimento de valores, princípios, dispositivos e atitudes de uma convivência sã,
colaborativa e de cidadania. Assim, está em construção uma realidade simbólica partilhada
(Torremorell, 2008), a partir de novos conhecimentos e práticas de gerir as relações interpessoais e
os conflitos (Munné & Mac-Cragh, 2006), despontando uma nova forma de viver e conviver na
escola.

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Pesquisa qualitativa em Educação: um ensaio paradigmático

1 1 1
Raquel Martins Fernandes Mota , Marco Aurélio Bulhões Neiva , Felicissimo Bolivar da Fonseca ,
Jair Aniceto de Souza2, Paulo Alves de Oliveira3, Rodney Mario de Almeida4

1 Diretoria de Ensino do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso Campus Bela Vista, Brazil.
raquel.mota@blv.ifmt.edu.br; marco.neiva@blv.ifmt.edu.br; felicissimo.fonseca@blv.ifmt.edu.br;
2 Diretoria de Ensino do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso Campus Avançado Sinop,
Brazil. jair.souza@snp.ifmt.edu.br
3 Diretoria de Ensino do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso Campus São Vicente, Brazil.
paulo.alves@svc.ifmt.edu.br
4 Centro Universitário de Várzea Grande, Mato Grosso, Brazil. rodney_mario@hotmail.com

Resumo. O presente artigo tem o propósito de apresentar algumas reflexões sobre o viés epistemológico da
pesquisa qualitativa. Sua produção é o resultado de debates e intervenções críticas realizadas no percurso
dos pesquisadores do Grupo de Pesquisa Humanidades e Sociedade Contemporânea. Concentra-se,
inicialmente, no esforço de construção da autonomia epistemológica e metodológica das ciências humanas,
realizado por Dilthey, Weber e Merleau-Ponty. Esse esforço possibilitou a ruptura epistemológica com o
dualismo sujeito-objeto que está na base das ciências naturais. Apresenta aspectos do debate que se
instalou nas ciências humanas e na educação quanto à pertinência, adequação ou inadequação dos
métodos quantitativos e qualitativos nos processos de validação de suas pesquisas. Concebendo a oposição
simplificadora entre o quantitativo e o qualitativo como produtora de um falso dualismo, acolhe a ideia
kantiana de que “a quantidade é, em si mesma, uma qualidade do objeto, assim como a qualidade é um dos
elementos da quantidade”.
Palavras-chave: ensino; educação; ciências humanas; pesquisa qualitativa; fenomenologia.

Qualitative Research In Education: Paradigmatic Essay

Abstract. The present article has the purpose of presenting some reflexions on the epistemological about
qualitative research. Its production is the result of debates and critical interventions carried out in the
course of the researchers of the Research Group of Humanity and Contemporary Society. Focuses into ally
in the effort to construct the epistemological autonomy of human sciences carried out by Dilthey, Weber
and Merleau Ponty. This confrontation with the conception made possible the epistemological rupture with
the subject-object dualism. Then present aspects of the debates that have taken place in the human
sciences and education as to the pertinence, adequacy or inadequacy of the quantitative and qualitative
methods in the process is validating their research. Conceiving the simplifying opposition between
qualitative and quantitative as the producer of a false dualism, welcomes the kantian idea that the
“quantitative and in itself, a quantitative of the object, as well as the quality”.

Keywords: teaching; education; human society; qualitative research; phenomenology.

1 Introdução

O presente artigo tem o propósito de apresentar algumas reflexões sobre o viés epistemológico da
pesquisa qualitativa, considerando também os elementos sócio-políticos e estéticos da dimensão
educativa. Sua produção é o resultado de debates e intervenções críticas realizadas no percurso dos
pesquisadores do Grupo de Pesquisa Humanidades e Sociedade Contemporânea do Campus Cuiabá
Bela Vista do IFMT (GPHSC-IFMT).
O GPHSC, fundado desde 2008, conta com pesquisadores das várias áreas das ciências humanas e
sociais e busca interpretar a sociedade contemporânea a partir de diferentes concepções teóricas e

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autores, descrevendo e analisando de diferentes ângulos os mesmos fenômenos. Em outros termos,


o GPHSC, coerente com sua estrutura multidisciplinar, produz diferentes recortes de um mesmo
sujeito pesquisado, buscando encontrar, na diversidade de experiências e visões teóricas de seus
pesquisadores, os conceitos e métodos adequados a uma compreensão interdisciplinar desse objeto.
Mas, para além da multidisciplinaridade que nos informa em direção a experiências interdisciplinares
de produção de conhecimento, a perspectiva que orienta o grupo é transdisciplinar, ou seja, parte do
pressuposto epistemológico de que a realidade social é constituída por diferentes níveis em
coexistência, sendo a mente humana o meio de conexão entre esses diferentes níveis de realidade.
Conforme Galeffi (2009, pp. 28-29), a complexidade com que o real se manifesta na existência
concreta do ser humano não pode ser apreendida apenas pela linguagem matemática, exigindo uma
compreensão articulada que passa pela construção de imagens, afetos, metáforas, conceitos e juízos.
No que se refere especificamente a este artigo, o interesse direciona-se para o processo de
construção da autonomia epistemológica e metodológica das ciências humanas face às ciências da
natureza, assim como para o processo de construção do objeto de pesquisa em educação a partir da
perspectiva fenomenológica. Essa perspectiva, segundo a qual o sujeito pesquisado é um ser de
representações, tem entre suas implicações específicas enquanto metodologia qualitativa, a recusa
da construção de uma oposição radical entre o quantitativo e o qualitativo. A pesquisa a ser
apresentada, metodologicamente se constitui de um júri de especialistas; ou seja, parte do resultado
de várias outras pesquisas realizadas pelos autores, bem como, de reflexões e debates nas reuniões
de pesquisa e nos eventos participados. Este júri de especialistas foi constituído visto ser possível
através do trabalho já realizado por estes especialistas ter uma possível referência para compreender
o tema em questão. Esta metodologia utilizada em outras pesquisas e publicações (Fernandes, 2002;
Andrade, 2007) se baseia na noção de partilha, de Hannah Arendt (2001), cujo exercício da
reflexibilidade permite um movimento intrapessoal e interpessoal que permite a pluralidade e o
diálogo num “duplo movimento relativo à cristalização dos sentidos e à circularidade do conceito”
(Andrade, 2007, p. 83). Utilizou-se também de pesquisa documental bibliográfica, de cunho
fenomenológico, em termos da abordagem de apreensão do real.

2 A construção da autonomia epistemológica e metodológica das ciências humanas

Como produto do século XIX, as ciências humanas1 surgem num contexto em que as ciências da
natureza já estavam constituídas, tinham definido uma concepção de cientificidade e dos métodos
adequados a essa concepção e, dada a sua capacidade de explicar e intervir na natureza, tinham
alcançado um enorme prestígio social. Era natural, então, que entre os fundadores das ciências da
sociedade, se encontrassem aqueles que, como Auguste Comte, procurando constituir a ciência do
social em bases rigorosas, objetivas e neutras, adotassem a concepção de cientificidade das ciências
naturais, juntamente com seus pressupostos epistemológicos, seus métodos e procedimentos
técnicos2. Seguindo os passos de Comte, mas aproximando-se do discurso organicista da biologia do
século XIX, Émile Durkheim também buscou a fundamentação da ciência da sociedade nas bases
supostamente objetivas e neutras das ciências naturais. Na obra As regras do método sociológico,
definiu que os fatos ou fenômenos sociais fossem estudados como “coisas” objetivas e exteriores aos
1 Também chamadas de ciências sociais, ciências da sociedade e, na época, especialmente na Alemanha, eram ainda
chamadas de ciências do espírito ou de ciências da cultura.
2 Inspirando-se no modelo da física newtoniana de busca das leis universais que regem o movimento, Auguste Comte, ao
buscar a fundamentação da ciência da sociedade em base objetiva e neutra, concebeu que esta deveria buscar as leis
universais que regem o movimento das sociedade. Física Social foi o nome que Comte atribuiu inicialmente à ciência que
buscava fundar.

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indivíduos, de modo que o conhecimento do social não se perdesse na produção de um discurso


subjetivo.
Por outro lado, na segunda metade do século XIX e início do século XX, outros pensadores, também
interessados na constituição das ciências humanas, se perguntavam se aquele modelo de
cientificidade poderia ser transposto literalmente para o estudo do ser humano, sem que daí
resultassem grandes prejuízos na compreensão daquilo que lhe é específico. Compreendendo o
homem como um ser singular em face da natureza e, portanto, recusando a transposição literal do
conceito de cientificidade das ciências naturais para as ciências sociais, Dilthey e Max Weber erigiram
o enorme esforço inicial na construção da autonomia epistemológica e metodológica das ciências
sociais frente às ciências da natureza. Dilthey procurou fundamentar essa autonomia partindo da
natureza histórica do sujeito e do objeto das ciências do espírito. No entendimento desse autor, essa
característica singular – a historicidade do humano - exigia das ciências do espírito o afastamento dos
procedimentos de experimentação e matematização típicos das ciências da natureza, dando lugar à
descrição, à análise daquilo que é particular à cada época histórica, com suas visões de mundo, seus
sentidos e significados específicos. Dilthey adotou a distinção entre explicar e compreender,
afirmando que as ciências da natureza objetivam a “explicação” dos fenômenos por meio de suas
conexões causais e que as “ciências do espírito” objetivam a apreensão dos sentidos e significados
que os seres humanos atribuem às suas ações, sendo, por isso, baseadas na “compreensão”. Para
este pensador, cada época possui sua própria visão de mundo e deve ser compreendida em suas
causalidades específicas. Por sua vez, Max Weber procurou aprofundar as reflexões iniciadas por
Dilthey e se esforçou para dar às ciências sociais uma constituição metodológica e epistemológica
que as definissem como ciências rigorosas, porém afastadas do sentido de rigor matemático que
caracterizou as ciências da natureza desde as suas origens. Weber, reconhece a historicidade do
humano e constrói uma teoria da ação social em bases intersubjetivas, compreensiva e
interpretativa.
Do exposto até aqui, pode-se concluir que, durante o século XIX e em princípios do século XX, dois
movimentos se constituíram no processo mesmo de construção das ciências sociais. O primeiro
concebeu os princípios epistemológicos e metodológicos das ciências da natureza como universais à
todo conhecimento científico e o segundo erigiu seus esforços no sentido de fundamentar a
construção da autonomia e singularidade das ciências da sociedade - frente às metodologias e
concepções epistemológicas que impregnavam o campo de produção de conhecimento das ciências
naturais. Nesse sentido, se o rigor no campo científico estava ligado, inicialmente, às ciências físico-
matemáticas e à quantificação, os pensadores que procuraram estabelecer a autonomia das ciências
sociais frente às ciências da natureza, tiveram que construir e estabelecer novos critérios e/ou
parâmetros para atender às exigências da construção de uma ciência do homem autônoma e
rigorosa. O resultado desse processo foi a ampliação do próprio estatuto epistemológico da ciência.
Em outras palavras, o esforço daqueles pensadores levou à ampliação das bases sobre as quais se
entende atualmente o que é fazer ciência e como o conhecimento científico é produzido.
A construção da autonomia e especificidade das ciências humanas teve na fenomenologia um dos
seus mais importantes momentos de consolidação, promovendo uma ruptura epistemológica com o
dualismo sujeito-objeto que está na base das ciências naturais. Segundo Chauí (2015, p. 307), ao
propor uma diferenciação rigorosa entre o que constitui a essência natural e a essência humana, a
fenomenologia garantiu legitimidade e validade aos projetos de construção de áreas específicas do
conhecimento científico do mundo humano, tais como sociologia, antropologia, história, linguística,
entre outras. A psicologia positivista, por exemplo, considerando-se uma ciência natural, estudava o
campo do psiquismo analisando fatos diretamente observáveis do comportamento como resultados
ou efeitos externos de causas fisiológicas, físicas, químicas e anatômicas. Para essa ciência, não
existiria, de fato, um objeto denominado “psiquismo”, tratando-se apenas de “efeitos psíquicos de

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causas não psíquicas”. A psicologia como ciência humana, isto é, como ciência do psiquismo, só se
tornou possível quando, partindo de uma perspectiva fenomenológica, definiu-se “um conjunto de
fatos ligados à consciência (...) como dotados de significação objetiva própria”. Ainda segundo Chauí:
Antes da fenomenologia, cada uma das ciências humanas desfazia seu objeto num agregado
de elementos de natureza diversa do todo, estudava as relações causais externas entre esses
elementos e as apresentava como explicação e lei de seu objeto de investigação. A
fenomenologia garantiu às ciências humanas a existência e a especificidade de seus objetos
(Chauí, 2015, p. 306).
Na concepção de conhecimento da fenomenologia, sujeito e objeto não são concebidos como
entidades separadas. O lema fenomenológico de que a consciência é sempre consciência de alguma
coisa nos obriga a concluir que a consciência não se refere a um eu que pensa a si mesmo
independente de seu pertencimento ao mundo. A consciência não existe voltada para si mesma; ela
sempre está voltada (dirigida, intencionada) para algo fora dela, está sempre referida a algum objeto
que não se confunde com ela mesma, mas que ao mesmo tempo a constitui como consciência de
alguma coisa. Todo pensamento (consciência) é pensamento sobre alguma coisa, sobre algum objeto.
É impossível pensar sem que o pensamento se refira a algo, sem que se refira a alguma experiência
do mundo. Consciência (pensamento) e mundo são inseparáveis: como seres conscientes estamos
desde sempre mergulhados no mundo, mundo esse que aparece à consciência e que no seu aparecer
se manifesta como experiência fenomênica. Portanto, sujeito (consciência/pensamento) e objeto (as
coisas do mundo, o algo a que se refere o pensamento) são inseparáveis. É essa característica que
define a intencionalidade da consciência e que permite afirmar a inseparabilidade do sujeito e do
objeto.

2.1 Subjetividade e intersubjetividade na fenomenologia de Merleau-Ponty

Segundo Merleau-Ponty: “eu sou tudo aquilo que vejo, sou um campo intersubjetivo” (1994, p. 515),
não podendo me separar do meu corpo e nem da situação histórica na qual efetivamente existo.
“Estamos presos ao mundo e não chegamos a nos destacar dele para passar à consciência do
mundo.” (Idem, ibidem, p. 26). A intersubjetividade é interpretada no processo fenomenológico
enquanto teoria e método: “O Cogito deve revelar-me em situação, e é apenas sob essa condição
que a subjetividade transcendental poderá, como diz Husserl, ser uma intersubjetividade.” (Merleau-
Ponty, 1994, p. 09). “O mundo fenomenológico (...) é, portanto, inseparável da subjetividade e da
intersubjetividade que forma sua unidade pela retomada das minhas experiências passadas em
minhas experiências presentes, da experiência do outro na minha” (idem, ibidem, p. 18).
Nesse sentido, a ênfase da fenomenologia na subjetividade não conduz o pesquisador para um “eu”
que se retira do mundo objetivo em direção a uma busca introspectiva de si mesmo, a uma busca de
seu “eu interior”. Pelo contrário, a subjetividade relaciona-se ao mundo do qual temos consciência,
isto é, relaciona-se à consciência subjetiva de como, na experiência concreta do mundo no qual
estamos desde sempre inseridos, as coisas aparecem a nós. É importante ressaltar que a
fenomenologia não pode ser interpretada como um método introspectivo. Não se trata, assim, de
um método que, possibilitando um mergulho no interior das nossas mentes, vasculha à procura de
conceitos, ideias inatas ou de verdades universais anteriores a qualquer experiência. Também a
fenomenologia não está interessada ou preocupada em descrever como o mundo objetivamente é.
Fosse assim, ela não seria diferente de qualquer ciência empírica-positiva voltada para a explicação
da realidade a partir da construção de conceitos e teorias baseadas na observação e na
experimentação. O estudo de como as coisas aparecem à consciência não se confunde, portanto,

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com o estudo de como são objetivamente as coisas do mundo exterior. Trata-se de pesquisar,
partindo da experiência humana compartilhada, como as coisas aparecem a nós subjetivamente.
Partir da experiência humana compartilhada significa recusar a ideia da existência de um sujeito
separado do mundo, de um sujeito que basta a si mesmo e que, dotado de uma essência pensante
imutável, existe como consciência independente de qualquer relação com o mundo exterior. Para
Merleau-Ponty (1994), a consciência de mim mesmo como sujeito me obriga a reconhecer a
presença e a existência de outros sujeitos no mundo. Nenhum “eu” pode existir sem referência a um
“você”, sem referência a um “outro” e sem referência a um mundo no qual o “eu” compartilha
experiências com os “outros” sujeitos. O mundo é o lugar onde se fundem os horizontes, onde
diferentes sujeitos experienciam e compartilham as suas experiências. Cada subjetividade constrói
suas experiências no mundo e é o mundo que dá sentido às experiências do sujeito. Se a consciência
se constitui como consciência de alguma coisa, isso significa que nenhuma subjetividade
(consciência) pode romper seus laços com o mundo. Assim, nenhum sujeito (vale dizer, nenhuma
consciência) está fora do tempo e do espaço. Somos todos essencialmente sujeitos corporificados e
historicamente situados no mundo. Para Merleau-Ponty, portanto, o sujeito não pode ser pensado
fora do tempo, não existindo a possibilidade da existência de uma consciência isolada, autônoma e
não situada temporalmente e espacialmente face ao mundo.
Uma consequência fundamental da concepção fenomenológica de inseparabilidade do sujeito e do
objeto, aqui apresentada na versão de Merleau-Ponty, foi a superação da dicotomia instaurada por
Descartes quando da fundamentação da ciência e, posteriormente, reafirmada pelas concepções
positivistas como base da produção de conhecimento tanto nas ciências da natureza quanto nas
ciências da sociedade. A fenomenologia, aprofundando o debate em torno da cientificidade do
conhecimento do mundo humano, redefiniu o estatuto da ciência, colocando-a sobre novas bases
epistemológicas, objetivo esse que já vinha sendo desenvolvido desde os argumentos rigorosos por
Dilthey e Max Weber sobre a singularidade humana face ao mundo natural.

2.2 Do quantitativo e do qualitativo nas ciências sociais e na educação

No contexto das ciências humanas e da educação há um intenso debate quanto à pertinência,


adequação ou inadequação dos métodos quantitativos e qualitativos no processos de validação de
suas pesquisas. O que levou à construção de metodologias qualitativas - em oposição à busca de
regularidades estatísticas e às tentativas de descoberta de leis objetivas e universais que
determinariam a história dos eventos humanos - foi a compreensão de que os fenômenos humanos
são marcados pela subjetividade, que os significados que os seres humanos atribuem às coisas,
incluindo suas ações e interações, são produzidos intersubjetivamente e que qualquer definição de
humano deve passar pelo reconhecimento de sua historicidade.
Um aspecto importante, e frequentemente ressaltado por distintos autores, quanto às diferenças
entre a pesquisa quantitativa e a pesquisa qualitativa é que, na primeira, o pesquisador parte de um
plano previamente estabelecido, com hipóteses e variáveis claramente especificadas e definidas
(Godoy, 1995). A medição, a quantificação e a busca da precisão pressupõem que o sujeito trabalha
com certo nível de segurança, controle e objetividade em relação aos dados e informações por ele
recolhidos, assim como em relação à sua análise. Quanto à pesquisa qualitativa, longe de produzir
medições, enumerações e estatísticas, tem no contato direto do pesquisador com a comunidade ou a
situação estudada a sua característica mais marcante. Partindo do contato direto com os sujeitos
estudados (o objeto) - contato esse que pode alcançar um tempo relativamente longo, como
acontece com grande frequência no trabalho etnográfico dos antropólogos - é que o pesquisador
constrói sua descrição sobre a comunidade, sobre o que as pessoas fazem e dizem, sobre como

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interagem umas com as outras e sobre sua interação com elas, sobre os lugares e as situações que
vivencia durante o tempo em que está mergulhado em sua pesquisa de campo participante. Os
pesquisadores de campo supõem que o mergulho que realizam na cultura do outro por meio da
pesquisa de campo os tornam capazes de reconhecer as categorias de pensamento, os conceitos e os
valores que as pessoas do grupo pesquisado mobilizam em suas ações cotidianas e na compreensão
da realidade na qual estão inseridos. O objetivo é a compreensão das categorias de pensamento e de
ação que movem os atores sociais nos diferentes contextos sociais de que participam e estão
situados, ou seja, busca-se a compreensão da lógica cultural interna que possibilita a ação coerente
das pessoas no grupo pesquisado.
Segundo Ollaik & Ziller (2012, p. 233), não se pode simplesmente transferir os critérios ou a lógica de
validação das pesquisas quantitativas para aquelas de caráter qualitativo, ou vice-versa. Elas
possuem critérios distintos de validação, possuem objetivos distintos, constroem caminhos distintos
e chegam a resultados distintos. Se as pesquisas quantitativas objetivam a explicação, a
generalização e a previsão dos fenômenos sociais partindo de procedimentos estatísticos e de outras
formas de quantificação, as pesquisas qualitativas possuem um caráter compreensivo e
interpretativo, sua capacidade de generalização estendendo-se apenas às situações e aos fenômenos
similares e possuem caráter descritivo e narrativo.
Descrever, narrar, contextualizar, analisar, compreender, interpretar seriam, nesse sentido, os
conceitos mais adequados para a caracterização da pesquisa qualitativa. Discutindo as concepções
de validade na pesquisa qualitativa, essas autoras afirmam que “nesta perspectiva, a validade estaria
relacionada com a coerência interna da pesquisa” (Idem, p. 233). Em outras palavras, as pesquisas
qualitativas enfatizam os aspectos relacionados à coerência do processo de construção da pesquisa,
enquanto a pesquisa quantitativa procura a sua validação pelos resultados alcançados, a validação
externa. Ainda segundo essas autoras, “para verificar a validade externa de uma pesquisa qualitativa,
a opção por adotar, sem adaptações, a concepção positivista, verificando a capacidade de replicação
e generalização dos resultados, redundaria em um esforço com poucas perspectivas de sucesso”
(Ibidem, p. 234).

2.3 Sobre a pesquisa em Ciências Humanas e Educação e o falso dualismo

No contexto das pesquisas em ciências humanas e em educação, vários autores tem chamado a
atenção para a existência de um falso dualismo na contraposição já tradicional entre pesquisa
quantitativa e pesquisa qualitativa. Para Bogdan & Biklen (1994, pp. 49-51), não existe a
possibilidade de compreender esse dualismo como real, uma vez que, ao colocar em primeiro plano
a coleta e análise dos dados, escamoteia-se a questão principal referente às diferenças de natureza
dos objetos das ciências sociais em relação aos objetos das ciências da natureza, ou seja, diferenças
epistemológicas.
Outro autor, Gamboa (2003), ao chamar a atenção para a necessidade de conhecimento dos
pressupostos epistemológicos que subjazem a esses dois tipos de pesquisas, afirma que as suas
diferenças não podem ser reduzidas à quantificação ou à sua ausência no tratamento dos dados e
informações da pesquisa:
Essas formas de elaboração do conhecimento científico, embora igualmente válidas, contêm
pressupostos históricos-filosóficos muito diferentes que o pesquisador em educação não
pode ignorar. Cada uma dessas abordagens científicas desenvolve procedimentos, oferecem
técnicas e instrumentalizam a pesquisa, elaboram explicações e interpretações pautadas por
uma lógica implícita que se articula com pressupostos epistemológicos, teorias do
conhecimento e formas de ver o mundo (cosmovisões). Daí que a escolha de um

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determinado método ou técnica de pesquisa esconde opções teóricas, epistemológicas e


filosóficas que precisam ser explicitadas (Gamboa, 2003, p. 395).
Howard S. Becker (2014, p. 186), pesquisador oriundo da Escola de Sociologia de Chicago, também vê
com estranheza a construção de um dualismo radical entre as pesquisas qualitativas e quantitativas.
Do seu ponto de vista, os dois modos de pesquisa são interdependentes e haveria mais semelhanças
entre eles do que diferenças, de modo que “os mesmos argumentos epistemológicos sustentam
ambos os métodos”.
Partir de uma oposição simplificadora entre o quantitativo e o qualitativo pode levar o pesquisador
qualitativista, segundo esses autores, a perder de vista aspectos importantes da realidade social que
pretende descrever. Isso porque, partindo do falso dualismo que situa estes termos como oposições
absolutas, passaria a recusar a incorporação em suas pesquisas de toda e qualquer relação
quantitativa, interpretada como tomada de uma posição epistemológica empirista e positivista. Para
Gamboa (1995, p. 100), “a proporção de utilização de fatores quantitativos ou qualitativos,
subjetivos e objetivos, dependem da construção lógica que o pesquisador elabora, nas condições
materiais, sociais e históricas que propiciam ou permitem o trabalho de pesquisa”.
Minayo (2013, p.43), referindo-se à obra Matemática Transcendental, afirma que Kant desenvolve ali
a ideia de que “a quantidade é, em si mesma, uma qualidade do objeto, assim como a qualidade é
um dos elementos da quantidade”. Nesse sentido, afirmar que o objeto das ciências sociais é
essencialmente qualitativo não significa recusar a incorporação, no processo de pesquisa, de
aspectos e relações de quantidade que, pertencentes ao objeto, poderiam, se fossem apresentadas,
contribuir para a percepção de certas regularidades no próprio dinamismo da vida social, cuja
totalidade o pesquisador qualitativo almeja compreender. Conforme as palavras de Minayo: “A
possibilidade de enumeração dos fatos é uma qualidade do indivíduo e da sociedade que contêm,
em si, elementos de homogeneidade e regularidades” (Minayo, 2013, p. 42).
Também Merleau Ponty poderia concordar com essa afirmação, pois, para ele, a percepção não é
fragmentada, sujeito e objeto se intercruzam, participando de um mesmo mundo. Nesse sentido,
não se separa o sujeito do objeto percebido, a natureza e a cultura, o corpo e a mente, a quantidade
e a qualidade. Tanto a quantidade quanto a qualidade são propriedades do fenômeno que se
manifesta na consciência. A riqueza e a complexidade da realidade social, para as quais clamamos a
necessidade de tanta atenção nas pesquisas qualitativas em educação, pode tornar-se menos rica e
menos complexa do que gostaríamos se nos recusamos a perceber aspectos relacionados à
magnitude dos fenômenos. A realidade sobre a qual se detém a pesquisa qualitativa é, a um só
tempo, objetiva, subjetiva e intersubjetiva.
Para Merleau-Ponty, a qualidade não é um elemento da consciência, mas uma propriedade
do objeto. “Em vez de nos oferecer um meio simples de delimitar as sensações se nós a
tomamos na própria experiência que a revela, ela é tão rica e tão obscura quanto o objeto
ou quanto o espetáculo perceptivo inteiro.” (1994, p. 25). O puro sentir ou termos absolutos
para o sentir ou a qualidade pura, negam as percepções de fato e redundariam em nada
sentir. Segundo Merleau-Ponty, estes seriam os enganos em relação à qualidade: - supor que
ela é um elemento da consciência, sendo que é objeto para a consciência; tratá-la como não
dotada de sentido ou como se este sentido seja pleno e determinado; - ou ainda, ter um
prejuízo do mundo, onde o campo visual é limitado pelo fragmento do mundo – uma
imagem que construímos, pela ótica e pela geometria, enquanto que ao restante estamos
como de olhos fechados. Sendo assim, para o autor não é possível deixar de perceber a
qualidade, pois ela está dada no objeto percebido e não pode ser limitada a categorias
subjetivas definidas pela consciência do pesquisador (Fernandes & Passos, 2010, p. 04).
Mesmo que se utilize dados quantitativos, a compreensão dos mesmos já configura a percepção de
suas qualidades. Diferentemente da epistemologia positivista, acredita-se ser possível entender os

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fenômenos em profundidade, fazer emergir aspectos da extensividade que podem nos ajudar na
interpretação das dimensões complexas de intensividade nas quais mergulhamos em nossas
pesquisas qualitativas. Podemos realizar pesquisas qualitativas, de característica
predominantemente etnográfica ou com entrevistas orientadas por questões abertas,
complementando com outros procedimentos de pesquisa, como os estatísticos, os iconográficos, os
documentais, entre outros, que podem ser úteis para a construção da visão do todo que
pretendemos descrever. A mera quantificação em si, pode levar a uma compreensão superficial das
coisas, contribuindo para fixar meras aparências. Ultrapassar as aparências, no caso, significa atingir
os significados nos lugares, relações, situações e contextos onde eles emergem, sendo esse o
objetivo da pesquisa qualitativa.
Quanto à oposição simplificadora entre quantidade e qualidade, e que, favorável à quantificação,
confirmaria a “objetividade” dos números, estamos acostumados a ouvir, ler e aceitar que os
números não mentem. Entretanto, os números não falam por si próprios, como costuma imaginar o
senso comum estatístico, assim como uma imagem não vale por mil palavras, doutrina também
aceita e propagada pelo senso comum. Números e imagens estão sempre inseridos em contextos
determinados e, para que se tornem produtores de sentidos e significados, eles necessitam ser
compreendidos e interpretados nesses contextos. O que dizem os números?, pergunta-se
recorrentemente. Sabemos, entretanto, que sozinhos, sem a ação compreensiva e interpretativa de
um sujeito (o pesquisador), eles nada dizem. Os números (e os dados em geral) só passam a
constituir-se em informação, e de informação em conhecimento, na medida em que um sujeito
consegue situá-los num contexto significativo, interpretando-os. Sobre os números, assim como em
todas as formas de dados e informações, temos que nos perguntar pela sua qualidade e pertinência
para as respostas às questões/problemas que construímos quando elaboramos um projeto e
desenvolvemos uma pesquisa científica. Assim, podemos perguntar, de forma legítima, sobre a
qualidade das relações quantitativas que produzimos nas nossas explicações sobre o mundo, seja o
mundo natural ou o social. Da mesma forma perguntamos sobre a qualidade das informações,
técnicas, métodos, relações, descrições, narrativas, intuições, compreensões, críticas, interpretações,
etc. que construímos nas nossas tentativas de conhecer cientificamente o mundo social. Formular
essa pergunta e tentar dar a ela uma resposta nos coloca em cheio na problemática do rigor nas
pesquisas das ciências da sociedade.
Para Bauer & Gaskell (2002, p. 24), este recorte de qualidade pode ser qualificável (enumerado) ou
não conforme recursos empregados. A partir daí o problema não estaria dentro do recurso utilizado,
porém na possibilidade ou não de fazer o recorte oferecido (enumerável ou não) e na posição desse
recurso (métodos e técnicas) o que é plausível na proposta dada. Cabe assim um pluralismo
metodológico conforme necessidade metodológica. Observado que há uma postura crítica por parte
do pesquisador, o qual mostra qual seria a atitude mais emancipatória, em relação à escolha da
técnica a ser usada baseando-se apenas em um obscurantismo epistemológico sobre o dilema
quantitativo/quantitativo (Bauer&Gaskell, 2002, pp. 28 e 35).
Sem dúvida, o reconhecimento de que os critérios de validação são distintos na pesquisa qualitativa
e na pesquisa quantitativa, reconhecendo também suas especificidades, nos obriga a reconhecer
também certa relativização naquilo que tradicionalmente tem sido entendido como verdade
científica. Isso não implica, no entanto, que quaisquer critérios possam validar como científica uma
pesquisa, nem que qualquer discurso produzido sob o nome de ciência possa ser aceito como
realmente científico. A relativização a que fazemos referência é consequência intrínseca ao processo
de ampliação do conceito de ciência operado quando da constituição da autonomia epistemológica e
metodológica das chamadas ciências da sociedade, processo que tem Dilthey, Max Weber e os
pensadores do campo da fenomenologia como figuras de destaque. O que pretendemos destacar é
que, tratando-se das ciências humanas, ao se estudar um objeto que é um sujeito com

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representações, a pesquisa se torna qualitativa, independente de utilizar-se da quantificação; pois há


um fluxo de intencionalidades entre o sujeito pesquisador e o sujeito pesquisado, que não pode ser
ignorado. A produção de sentidos nas ciências humanas vai além da reprodução de um método e de
uma universalização pela quantificação.

2.4 Da qualidade das pesquisas qualitativas e dos critérios de validação

Thomas Kuhn (2010), no livro A estrutura das revoluções científicas, desenvolve a ideia de que a
atividade científica é intrinsecamente comunitária, ou seja, que é constituída por um grupo de
praticantes em torno de um objeto ou especialidade determinada. Através de uma iniciação
científica comum, por meio da resolução de problemas exemplares, pela leitura e pela aquisição de
uma linguagem comum, os cientistas, em sua formação, vão adquirindo uma visão comum sobre o
que é a realidade e como ela funciona. Envolvidos com problemas semelhantes, falando a mesma
língua e entendendo-se com facilidade acerca de determinados problemas, os cientistas possuem,
portanto, uma existência coletiva que extrapola sua existência individualizada.
Zantem (2004), seguindo de perto essa definição de comunidade, afirma que uma pesquisa só faz
sentido na medida em que acrescenta algo novo ao conhecimento historicamente acumulado por
uma determinada tradição científica. Todo trabalho científico se inscreve num campo de produção
científica determinado. Nesse sentido, o fazer ciência exige do pesquisador sua inserção numa
tradição e, por consequência, numa comunidade científica que se forma a partir dessa tradição.
Qualquer conhecimento, antigo ou novo, remete-se a um campo de produção de conhecimento e a
uma comunidade nos quais busca ser reconhecido como contribuição. Nas palavras da autora:
Deve-se levar em conta que se a investigação não faz senão demonstrar o que já existe, não
interessa fazê-la. Toda investigação verdadeira aponta algo novo ao campo total do
conhecimento. Aquelas que não apontam algo novo não são investigações (Zanten, 2004, p.
36).
Nesse sentido, o primeiro critério estabelecido pela comunidade de pesquisadores a respeito da
pertinência e da validade dos novos conhecimentos é o de se eles acrescentam algo (ou se não
acrescentam) ao conhecimento já acumulado na área de conhecimento em torno da qual a
comunidade é constituída.
A questão da validação ou da não validação dos procedimentos da pesquisa científica possui,
portanto, relação com as formas de organização das comunidades acadêmicas e científicas e,
naturalmente, com a distribuição desigual de poder entre elas. Galeffi (2009, 53), ao tratar do rigor
nas pesquisas qualitativas, afirma que por detrás dos processos de validação de pesquisa há sempre
“uma relação de poder”, constituindo-se um jogo de forças entre as distintas áreas do conhecimento,
assim como no interior de cada área e de cada linha de pesquisa. Esse jogo de forças afeta e, ao
mesmo tempo, é afetado pela política de distribuição dos recursos financeiros promovida pelas
agências oficiais de fomento à pesquisa científica. As áreas de conhecimento, as escolas teóricas e
tendências no interior de cada área, os textos e pesquisas exemplares, o prestígio das instituições
acadêmicas nas quais os pesquisadores estão inseridos, a existência de revistas especializadas e sua
classificação em formas estratificadas em termos de prestígio3, a publicação de artigos em revistas
de maior ou menor prestígio, a publicação de livros e o poder econômico das editoras que os
publicam, suas relações com determinadas universidades e setores da produção do conhecimento,

3 No Brasil, a classificação oficial das revistas científicas por meio de conceitos A, B, C e sua subdivisão tem contribuído para
reforçar tendências teóricas e linhas de pesquisa, conferir prestígio desiguais a universidades, revistas e autores. Aliás, as
políticas voltadas para a pesquisa no país “medem” a qualidade da pesquisa a partir da sua capacidade de incrementar a
produção capitalista.

700
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

os personagens fundadores e os de destaque nas áreas e linhas específicas de pesquisa; enfim, todos
esses aspectos acabam por contribuir nas formas hierarquizadas de atribuição de valor, de validação
e certificação da pesquisa científica. Nas palavras de Galeffi, “cada área de conhecimento tem seu
universo próprio, sua linguagem apropriada, suas artimanhas de certificação e de controle de
qualidade” (Idem, p. 54).
De acordo com Macedo (2009), a construção do rigor nas ciências da sociedade e da educação não
pode ser confundida com a construção de “uma forma exata de pensar” (p. 76). Ao contrário, o rigor
exige que se ampliem, cada vez mais, “as discussões epistemológicas, metodológicas, éticas,
políticas, estéticas e culturais” (p. 84), de modo que os processos de validação das pesquisas
ultrapassem a oposição simplificadora entre quantidade e qualidade, assim como as concepções de
pesquisa que pressupõem uma neutralidade ingênua do pesquisador, exigindo dele uma posição
apolítica. Além disso, é preciso investir contra a banalização/simplificação de que não há necessidade
de rigor nas pesquisas qualitativas ou de identificar como rigoroso apenas o modo quantitativo de
pesquisar. Quando falamos de rigor, também não podemos nos ater ao sentido convencional
encontrado nas pesquisas que aplicam burocraticamente e acriticamente certos métodos e técnicas,
acabando “por confundir rigor com rigidez e neutralismo” (p. 77). Para este autor, o rigor fecundo
deve ser “epistemológica, social e politicamente referenciado” (p. 80). Aliás, as ciências humanas,
desde o seu nascimento, encontraram nas discussões epistemológicas, éticas e políticas o modo de
atenderem às suas necessidades de justificação e validação. Trata-se de uma característica própria e
específica das ciências humanas, contribuindo fortemente para a construção de sua identidade e da
sua diferença em relação às ciências da natureza e que diz respeito à natureza do seu objeto de
estudo: sujeitos que também realizam representações.

5 Conclusões

O propósito desse artigo foi o de sintetizar algumas discussões sobre cientificidade e sobre pesquisa
qualitativa que vem sendo realizadas no percurso das experiências dos pesquisadores do Grupo de
Pesquisa Humanidades e Sociedade Contemporânea do Campus Cuiabá Bela Vista do IFMT (GPHSC-
IFMT).
O debate se concentrou, inicialmente, no esforço de construção da autonomia das ciências humanas
em relação às ciências da natureza no que se refere ao método e às concepções epistemológicas. O
resultado desse esforço foi a ruptura epistemológica com o dualismo sujeito-objeto que está na base
das ciências naturais, garantindo legitimidade e validade aos projetos de construção de áreas
específicas de conhecimento científico do mundo humano. Nesse sentido, do confronto com a rigidez
dos conceitos de cientificidade e de método científico oriundo das ciências físico-matemáticas
emergiu também um conceito ampliado de cientificidade e do que significa fazer pesquisa científica.
Sobre o debate que se instalou nas ciências humanas e na educação quanto à pertinência,
adequação ou inadequação dos métodos quantitativos e qualitativos nos processos de validação de
suas pesquisas, acolhemos a ideia kantiana, também defendida por outros autores, de que o
quantitativo e o qualitativo são inerentes à própria manifestação dos fenômenos na consciência.
Tomando, portanto, como referência um grupo específico de pesquisadores foi possível observar que
a oposição entre a pesquisa quantitativa e a pesquisa qualitativa constitui-se em um falso dualismo.

Referências

Arendt, Hannah. (2001). A Condição Humana. 10º ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária.

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Trad.: Pedrinho Guareschi. Petropólis/RJ: Vozes.
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Aprendizaje rizomático en investigación cualitativa:


de la comprensión a la transformación y transferencia del
conocimiento en educación
1
Almudena Ocaña Fernández , Mª Luisa Reyes López 1,

1Departamento de Didáctica de la Expresión Musical, Plástica y Corporal. Universidad de Granada.


aocafer@ugr.es; mlreyes@ugr.es

Resumen. En este trabajo realizamos una análisis de un proceso de investigación educativa realizada en un
contexto de aprendizaje musical no formal integrado en el proyecto de I+D “Ecologías del aprendizaje en
contextos múltiples: análisis de proyectos de educación expandida y conformación de ciudadanía”
(EDU2014-51961-P). Exponemos los dilemas metodológicos que han surgido durante el proceso y cómo se
han ido resolviendo provocando cambios en el enfoque de la investigación, las técnicas utilizadas y la
manera de presentar los hallazgos. Este cambio provoca un salto cualitativo en el propósito de la
investigación, que pasa de centrarse en la comprensión del caso para asumir un paradigma crítico
generando la transformación del espacio investigado y la transferencia del conocimiento. Esta reflexión en
espiral genera un proceso de aprendizaje rizomático que permite identificar fortalezas y debilidades,
implementar acciones de mejora e innovaciones metodógicas.
Palabras clave: Transferencia del conocimiento; investigación transformativa; estudio de caso;
investigación-acción.

Rhizomatic learning in qualitative research: from understanding to the transformation and transfer of
knowledge in education
Abstract. In this work we analyse an educational research process carried out in a context of non-formal
musical learning integrated in the research project "Ecologies of learning in multiple contexts: analysis of
projects of expanded education and conformation of citizenship" (EDU2014-51961-P). We expose the
methodological dilemmas that have arisen during the process and how they have been solved causing
changes in the research focus, the techniques used and the way of presenting the findings. This change
brings about a qualitative leap in the purpose of the research, which goes from focusing on the
understanding of the case study to assume a critical paradigm generating the transformation of the space
investigated and the transfer of knowledge. This spiral reflection generates a rhizomatic learning process
that allows us to identify strengths and weaknesses of the research, implement improvements and
methodological innovations.
Keywords: Transfer of knowledge; transformative research; case study; action-research.

1 Introducción

Investigar dentro del paradigma cualitativo significa asumir una posición ético-política comprometida
que tenga presente cuestiones relacionadas con la justicia social, la equidad, la no-violencia, y los
derechos humanos universales. Denzin y Lincoln (2005) dando un paso más indican que la clase, la
etnicidad y el género configuran el proceso de indagación cualitativo devolviéndole su carácter
político. Para estos autores la investigación cualitativa en la actualidad está caracterizada por poner
continuamente a los investigadores y las investigadoras ante una serie de elecciones
desconcertantes, ya que nos encontramos en un momento de descubrimiento y re-descubrimiento,
con nuevas formas de ver, interpretar, argumentar y escribir.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Como investigadoras somos conscientes de que en la investigación cualitativa la subjetividad no debe


ser vista como un fallo sino como la asignación de significados diferentes para una misma realidad.
Stake (2010) señala que es una ciencia singular basada en la experiencia, en la que el contexto juega
un papel fundamental y donde la comparación no tiene cabida ya que las personas, las situaciones,
los aprendizajes y las vivencias no son en absoluto comparables; sin embargo, todas estas cuestiones
en educación deben ser compartidas. Para nosotras hacer investigación cualitativa no se puede
enfocar desde una perspectiva positivista, neutral u objetiva.
Cuando investigamos en los contexto educativos observamos que tradicionalmente se ha
consolidado tradicionalmente la opción de conjugar en tercera persona lo que para Gimeno y Blanco
(2004) significa excluir al profesorado de la legitimidad de la investigación tanto como posibilidad de
realizarla como de que sus resultados se puedan convertir en un referente académico. Desde las
instituciones educativas no se está fomentando la necesidad de desarrollar un lenguaje que permita
a los educadores comprender el nexo entre los espacios educativos y las relaciones sociales
entendidas como las necesidades y competencias que los estudiantes portan y que son producto de
la historia (Giroux, 1997).
Los programas de formación del profesorado se centran en materias que suelen olvidar el
aprendizaje de la reflexión sobre los principios básicos que estructuran la vida y la práctica del aula y
parecen negar la necesidad del pensamiento crítico. En este contexto muchos docentes ponen en
duda su capacitación para llevar a cabo una investigación que dé respuesta a sus preguntas sobre la
enseñanza. Frente a esta realidad las ideas de John Elliott cobran de nuevo actualidad pues la
práctica de la investigación-acción daría lugar a que el profesorado desarrolle una cultura reflexiva
tanto enfocada a la mejora de su práctica como a la consecución de la transformación social que le
corresponde liderar a la escuela del siglo XXI (Sancho y Hernández, 2004). Estos planteamientos nos
llevan a reflexionar sobre cuál es nuestro posicionamiento como investigadoras por lo que hemos
llevado a cabo un proceso aprendizaje rizomático dentro del proyecto en el que actualmente
trabajamos.

2 Metodología

El trabajo que presentamos se enmarca en un proyecto I+D que se titula “Ecologías del aprendizaje
en contextos múltiples: análisis de proyectos de educación expandida y conformación de ciudadanía”
(EDU2014-51961-P) y parte de la idea de que la mayoría de los aprendizajes se llevan a cabo sin
enseñanza explícita, siendo invisibles para la educación formal aunque son el resultado de la
exploración activa del aprendizaje a través de la práctica (Buckingham, 2008). Para la comprensión
de estos aprendizajes nos basamos en los trabajos en torno al reconocimiento y validación de
aprendizajes informales de Bjornavold (2000) con su iniciativa para desarrollar esquemas de
reconocimiento combinado entre el contexto formal e informal y con las propuestas de Conner
(2009) y sus distintos tipos de aprendizaje. La investigación que se encuentra en su fase final opta por
una metodología con estudios de caso (Yin, 1994; Stake, 1998; Simons, 2011) y en este trabajo
reflexionamos sobre algunos de los dilemas actuales en investigación cualitativa en educación
surgidos en el transcurso del proceso de investigación de uno de estos casos, el proyecto
“Gorgoritos1”.

1 Para más información sobre el caso que permitirá entender mejor las reflexiones sobre el proceso metodológico
https://gorgoritosartandmusic.com

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3. Reflexiones sobre el proceso metodológico.

3.1. Sobre el consentimiento informado

Una de las singularidades del caso que favorece especialmente los procesos de investigación
cualitativa es la vinculación que en él se produce entre docencia, innovación e investigación. La
investigación en el contexto “Gorgoritos” es inherente a su propia esencia dada su vinculación con la
Universidad de Granada y esto facilita la comprensión de las familias sobre el proceso y su
implicación en el mismo. Esto nos permite contar desde el primer momento con el consentimiento
informado de las mismas, cuestión imprescindible para el proceso de investigación con sujetos
infantiles. En una reunión inicial se explican de forma detallada las dinámicas de trabajo del aula y
todo el proceso investigador que se realiza en torno al proyecto. En ese espacio comunicamos cuáles
son los objetivos de la investigación, las técnicas de recogida de información que utilizamos y el
protagonismo que ellas tienen en el proceso, haciéndoles partícipes de qué tipo de colaboración
requeriremos en diferentes momentos (participación en entrevistas y grupos focales, aportación de
grabaciones de vídeos en los contextos externos al aula, lectura de informes y asistencia a
conferencias y el “feedback” correspondiente sobre los mismos entre otros). Una vez que las familias
dan su consentimiento informado se hace partícipes a los niños y niñas de que durante las clases
siempre va a haber una cámara grabando y también algunos adultos observando pues lo que hacen
es muy interesante y merece la pena pensar qué pasa, cómo ellos cantan, escuchan… para mejorar
las clases y que sean mucho más divertidas. De alguna manera con este intercambio pretendemos
hacerlos partícipes a ellos también por una cuestión ética y para que vivan con naturalidad la
incursión de la cámara de vídeo y los observadores externos.

3.2. Sobre las técnicas de recogida de información

En este espacio vamos a reflexionar sobre las técnicas que a priori nos suponían mayor
incertidumbre pues no habíamos trabajado con anterioridad en un espacio investigador de estas
características donde la edad de los sujetos participantes va de entre los 0 a los 65 años.
Uno de los elementos fundamentales para la recogida de la información era la grabación en vídeo
que nos ha permitido analizar todos y cada uno de los procesos desarrollados en la clase.
Comenzamos con el uso de una cámara fija que nos permitía tener una visión global de los
acontecimientos pero poco a poco nos dimos cuenta de que aparecían muchos detalles en el devenir
de cada sesión que nos demandaban un observador externo que pudiera poner el foco en cuestiones
específicas para profundizar en la recogida de información. En ese momento se incorpora una
investigadora novel formada en la metodología de enseñanza de la música que recoge primeros
planos de los hechos más significativos lo que nos permite observar con mayor detalle los procesos.
El hecho de que tanto la cámara fija como la móvil estén siempre en clase no provoca ningún cambio
en el comportamiento de los niños y niñas para los que la presencia de estos elementos es
totalmente natural porque es algo constante y prolongado en el tiempo.
Incluso, en algunos momentos, aparecen observadores externos que se integran sin problema en el
aula y que después de ser presentados a los niños y niñas no generan ningún tipo de distracción. La
existencia de observadores externos se debe a que el proyecto supone un espacio de observación
para estudiantes de los diferentes grados de educación e incluso para investigadores interesados en
la temática que vienen a observarnos.
En diferentes ocasiones y según los “issues” del proyecto hemos elaborado técnicas específicas
diseñadas para fines muy concretos a los que hemos denominado “artefactos” y que nos han

705
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

permitido obtener información de los más pequeños con los que las entrevistas o la generación de
narrativas convencionales no funcionaban.
En algunos de los momentos del proceso investigador hemos necesitado dar voz a los beneficiarios
del programa. La observación y las aportaciones de sus familias nos han ofrecido mucha información
sobre cómo viven su experiencia dentro del aula pero necesitábamos conocer algunas cuestiones de
primera mano en relación a sus percepciones, intereses y dificultades.
Hacer entrevistas grupales con niños de entre 3 y 5 años no es tarea sencilla y presenta, a nuestro
juicio dos grandes retos. Por una parte, lograr que las preguntas estén formuladas de forma tan clara
que conduzcan al niño al hallazgo de la respuesta y por otra, que las respuestas de uno no
contaminen las del resto del grupo.
La actividad principal de este “artefacto” consistió en plantear un juego de intercambio de secretos
donde la consigna principal fue la confidencialidad. La actividad se tituló “vamos a contar secretos” y
para que no se produjera una desvinculación del contexto estaba articulada en torno a la música.
Consistía en proponer un juego de movimiento libre mientras la música sonaba, y en el momento de
su cese tenían que decir al oído de un compañero la respuesta a la pregunta que se había formulado.
En un segundo momento se ponían en común las respuestas sin especificar el nombre de quién la
había proporcionado. Las preguntas que considerábamos que eran más incómodas de responder se
fueron intercalando con las más amables o con otras de carácter más divertido para poder así crear
el clima de complicidad más apropiado. De este modo pudimos acceder al conocimiento de las
actividades que gozaban de mayor éxito entre los pequeños, de las actitudes de las docentes que les
resultaban más menos agradables y de algunos detalles de las relaciones que se habían establecido
entre los niños.
Otro “artefacto” construido consistió en diseñar una serie de actividades a lo largo de un curso
escolar que nos permitieran ofrecer a los niños la posibilidad de expresar de forma guiada las
estructuras musicales que se habían fijado en su memoria con la intención de conocer cuáles eran las
músicas que eran significativas para ellos. En primer lugar se les pidió que cantaran su canción
favorita en una ronda de clase. En otro momento con objeto de observar cuáles eran sus elecciones
musicales a la hora de crear de forma cooperativa, los organizamos en pequeños grupos dándoles la
consigna de que debían preparar una actuación para mostrar a sus compañeros. En esta actuación
cada grupo cantaría una canción acompañada por una serie de instrumentos que tenían a su
disposición para la exploración. De este modo pudimos saber cuál de las melodías tenía para ellos
una función estructurarte.
Sin duda, una de las fortalezas en relación al proceso de recogida de información es la gran
implicación de las familias en el desarrollo de la actividad que nos permite acceder de lleno a los
contextos familiares, tanto a través de las entrevistas formales e informales como de los documentos
videográficos en los que los niños se expresan musicalmente en su vida cotidiana.

3.2. Sobre la redacción del informe

La redacción del informe de una investigación debería ser diferente en función de las diversas
audiencias a las que vaya dirigido ya que no debemos olvidar que si los resultados de una
investigación quedan en la Universidad y en sus círculos más próximos, estaremos desaprovechando
la posibilidad de transformación social que, en definitiva, debiera ser uno de los propósitos
principales de cualquier estudio empírico. No será lo mismo el lenguaje que utilicemos para transferir
el conocimiento a la academia, que al colectivo de docentes interesados en el tema o a los
participantes de la investigación. Por eso en nuestro estudio estamos presentado mucha atención a
la redacción del informe “académico” pero también al “divulgativo”, el formato y el lenguaje difieren
pero el rigor en la presentación de las evidencias científicas queda intacto.

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La propia naturaleza de los datos analizados (la gran mayoría son audiovisuales) está demandando la
construcción de un informe en el que el elemento audiovisual sea el protagonista. Como contamos
con el consentimiento para la difusión de las grabaciones en las que aparecen menores hemos
decidido realizar una presentación audiovisual e interactiva en la que la aproximación al informe no
sea lineal sino que permita la interacción con el lector o lectora que irá “transitando” por él en
función de sus propios intereses. Con este propósito hemos diseñado un esquema de partida en el
que hay un espacio para la presentación del caso y sus elementos y otros para el desarrollo de los
diferentes “issues” de la investigación. En cada uno de esos espacios se insertan vídeos que incluyen
textos explicativos a modo de subtítulos o comentarios realizados por las investigadoras y
participantes en el proyecto. También se incluyen algunos textos y mapas conceptuales que ayudan a
la comprensión. Este tipo de informe pretende, de un lado, facilitar la comprensión y llegar a
audiencias interesadas que no participan de las lecturas de los artículos en revistas de impacto a
través de la difusión en redes sociales y entornos virtuales. Y de otro, la posibilidad de que el lector
complete y enriquezca la interpretación de los datos aportados como si de un cuadro impresionista
se tratara. El investigador ofrece su visión de la realidad a través de un cuadro construido con
diferentes trazos, figuras, colores… y es el lector el que en base a esa información puede también
construir su propia interpretación del cuadro. Por un lado, el lector puede encontrar aspectos que
sean familiares a su propia realidad produciéndose lo que Stake (1998) denomina generalización
naturalista, pero a la vez podrá hacer su particular interpretación teniendo en cuenta su trayectoria y
las “gafas” con las que está mirando esa imagen.

3.3. Sobre la “dEvolución” del informe

Otra de las cuestiones que estamos teniendo en cuenta para responder a dos aspectos importantes
de la investigación como son la triangulación y la ética, será el proceso de devolución del informe(s).
Tal y como apunta Simons (2011:p.184) “la validación del respondiente se refiere al análisis con los
implicados de la exactitud, la adecuación y la imparcialidad de las observaciones, las
representaciones y las interpretaciones de la experiencia”. Este proceso se produce en diferentes
momentos, no es necesario llegar al final de la investigación para realizarlo. El hecho de que en
nuestro caso la comunidad que participa en la investigación sea intergeneracional supone todo un
reto porque no es lo mismo explicar algo a un niño de 3 años, que un estudiantes de 20 ni que a un
familiar de 40 o más edad. Por esta razón estamos trabajando en esos procesos de “dEvolución”
desde hace un año. Escribimos “dEvolución” de esta manera porque queremos señalar cómo el
proceso en el que los participantes reciben el informen y emiten un “feedback” sobre el mismo
supone una evolución de la propia investigación.
Este planteamiento nos ha llevado a la creación de vídeos-resumen con textos explicativos en los
subtítulos, conferencias divulgativas, recopilación de materiales sonoros provenientes de las clases
que posibilitan el intercambio verbal entre familias y equipo investigador.

5 Conclusiones

Esta investigación ha supuesto un reto para las investigadoras, ya que su implicación en ella va más
allá de las labores propias de la investigación, pues ambas somos parte del equipo docente e, incluso,
una de ellas asiste con sus hijas a algunas de las clases. Esta circunstancia ha generado la necesidad
de separar muy bien los roles dentro de la investigación con el propósito de respetar los aspectos
relacionados con la calidad, obligándonos a hacer visible en todo momento desde dónde hablamos y
desde dónde intrepretamos. Pero por otro lado, esta integración de roles está permitiendo una

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mayor profundización en la comprensión del caso y un avance, un cambio de enfoque metodológico.


Aunque, a priori, la metodología de la investigación era interpretativa a través del enfoque de
estudio de caso, hemos progresivamente entrado en un enfoque de investigación-acción, pues la
reflexión sobre el caso ha incidido y modificado nuestras prácticas docentes. Esto pone de manifiesto
una vez más que la investigación educativa cualitativa es un proceso vivo que se construye de forma
situada y contextual y que, en todo momento, tiene que atender a las demandas del espacio
investigado por lo que habrá que asumir las necesidades de cambio que vayan apareciendo.
En el momento en que comenzamos a mirar nuestro espacio de trabajo con la Eduación Musical
Temprana desde la perspectiva del proyecto I+D anteriormente referido no éramos conscientes del
alcance de la transformación que se iba a generar en el proyecto “Gorgoritos”. Gracias a esta
perspectiva hemos transformado nuestra forma de conceptualizar e interpretar la experiencia
musical consiguiendo una perspectiva más amplia desde los procesos de educación expandida y
ecologías de aprendizaje. Nuestra mirada se ha trasnformado desde una concepción de la música
básicamente instrumental a una concepción de la música como mediación, tanto en referencia a los
procesos comunicativos como a la generación de los aprendizajes. Al observar el modelo de trabajo
que veníamos desarrollando donde se producía un cruce entre distintos escenarios de aprendizaje
formal y no formal hemos comprendido que el espacio “Gorgoritos” supone un modelo de
transferencia del conomiento educativo generado a partir de la investigación y la innovación.

Referências

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O cinema no livro didático de história- reflexões sobre as mídias


nos livros do 6º e 7º do ensino fundamental maior 2014 à 2016

Daniel Bramo Nascimento de Carvalho,1 Ronaldo Nunes Linhares2, Valéria Pinto Freire3

Resumo: O presente artigo buscar analisar qualitativamente as indicações de mídias digitais nos livros
didáticos de história do ensino fundamental maior das escolas públicas municipais da cidade de
Aracaju/SE, Brasil. Para esta análise, busca-se um foco nos livros utilizados pelos 6º e 7º anos do ensino
fundamental, examinando duas coleções entre as nove distribuídas pela rede de vinte e uma escolas no
município, dando ênfase aos filmes indicados ao final de cada capitulo, utilizando também da abordagem
quantitativa neste texto. Busca-se também, compreender a conexão pré-existente entre os filmes
indicados e os conteúdos trabalhados em cada capítulo dos livros a parti da observação da ficha técnica
dos filmes abordadas pelos livros e se propõem estratégias de utilização em sala de aula.
Palavras Chaves: Mídias Digitais; Livro Didático; Filmes.

The Cinema In The Didactic Book Of History- Reflections On The Media In The Books Of The 6th And 7th
Of Major Fundamental Teaching

Abstract: This article aims to qualitatively analyze the indications of digital media in the textbooks of the
history of elementary school major of the municipal public schools of the city of Aracaju / SE, Brazil. For
this analysis, a focus on the books used by the 6th and 7th years of elementary school is examined,
examining two collections among the nine distributed by the network of twenty-one schools in the
municipality, emphasizing the films indicated at the end of each chapter, using The quantitative approach
in this text. It also seeks to understand the pre-existing connection between the indicated films and the
contents worked on in each chapter of the books, starting with the observation of the technical file of the
films covered by the books and proposing strategies of use in the classroom.

keywords: Digital Media; Didatic Book; Movies.

1 Introdução
Utilizar as mídias em sala de aula tornou-se mais comum do que possamos imaginamos, tanto em
escolas públicas como em escolas privadas e até em espaços não formais ou informais de
aprendizagem. Promover o uso de tais dispositivos - a exemplo do cinema - entre os professores e
alunos vem sendo objeto de estudos e pesquisas publicados em eventos promovidos por
instituições como Associação Nacional de Professores Universitários de História (ANPUH),
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (INTERCOM), Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação ANPED) entre outras; em relatórios de

1 Licenciado em História. Aluno bolsista Capes do programa de Pós-Graduação em educação- PPED- da Universidade
Tiradentes. Membro do Grupo de Pesquisa Educação, Comunicação e Sociedade CNPQ/UNIT- GECES. E-mail:
historiadobramo@gmail.com
2 Doutor em Ciências da Comunicação pela USP e Pós-doutor em Educação e Comunicação pela Universidade de Aveiro.

Professor Titular I do Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu em Educação na UNIT. Coordenador do Grupo de pesquisa
Educação, Comunicação e Sociedade CNPQ/UNIT- GECES- e do Simpósio Internacional Educação e Comunicação. Professor
da Rede pública do estado de Sergipe. E-mail: nuneslinhares.ronaldo8@gmail.com.
3 Mestre em Educação (UNIT), Especialista em Educação Estética Semiótica e Cultura(UFBA), Especialista em Tecnologias

Educacionais (UNIT), Diretora/Coordenação Pedagógica do Instituto Luciano Barreto Junior-ILBJ. Vice coordenadora do
Grupo de pesquisa Educação, Comunicação e Sociedade CNPQ/UNIT- GECES. E-mail: valeria@ilbj.org.br

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pesquisas de mestrado e doutorado como os trabalhos de Soares (2012)4, Silva (2012)5 e Junior
(2011)6.
Encontramos também, pesquisas sendo desenvolvidas e publicadas em periódicos - a exemplo dos
periódicos da Capes- que buscam analisar o lugar do cinema no ensino básico e no superior nas
escolas e universidades do Brasil. Pesquisadores como Berle e Murillo (2011)7, Viegas8 e Souza
(2017)9 são exemplos de pesquisas realizadas e aplicadas com a intenção de analisar como o cinema
cria condições mais favoráveis para aprendizagem e pode vir a contribui de forma positiva na
educação básica.
Quando ainda no fim do século XIX, os irmãos Lumier na França criam o Cinematógrafo, aparelho
capaz de captar e de armazenar a imagem em movimento, eles tinham em mente utilizar esta
invenção com fins puramente científicos e acadêmicos, como forma de registrar todo avanço e
invenção que a ciência posteriormente viesse apresentar à sociedade (Ferro, 1992). Logo o cinema,
tornou-se um produto cultural destinado ao entretenimento da massa, comercializado em grande
escala, sendo utilizado para registrar tudo que a câmera apontasse. Segundo o historiador Ferro
(1992), a câmera capturava tudo aquilo que ela apontava, a depender de que segmento da
sociedade que a pessoa responsável pelo seu manuseio quisesse registrar, seja a chegada do trem
na França ou então a realeza na Inglaterra.
Assim como o cinema, várias outras mídias nasceram no sistema econômico capitalista. Segundo
Setton,
A cultura da mídia é uma realização da sociedade capitalista. Sua emergência e seu
desenvolvimento estão profundamente ligados a uma nova ordem política e econômica específica
da modernidade. Ou seja, nasce como produto da industrialização, surge como desdobramento das
necessidades de uma sociedade urbana, com grande concentração de grupos sociais de diferentes
procedências. (Setton, 2010. p. 32)

O avanço das tecnologias digitais, tornou muitas mídias (jornais, rádio, cinema, televisão e etc.) mais
acessíveis e as difundiu por longas distâncias geográficas. Antes dessa difusão, estas mídias tinham
um limite espaço-temporal, restritas ao seu local de produção sendo de difícil acesso para outras
localidades. No século XX, com o surgimento da transmissão via satélite e a digitalização de
informação através da internet, a informação em forma de entretenimento passa a outro nível de
difusão e consumo. A TV, o rádio, a internet e várias outras tecnologias mudaram a forma das
pessoas se comunicaram, de trocarem informações, de comprar, de vender, utilizar e de incitar
novas culturas (a exemplo dos brasileiros que possuem acessos a produções animadas japonesas)
entre a sociedade.
Ser um produto do capitalismo, fez com que as mídias digitais se tornassem mais acessíveis em
diferentes âmbitos culturais. O processo de comercialização contribuiu para a difusão desses

4 “Cinema e Ensino de História: O impacto dos PCN’s (1998) - Novas Perspectivas? ” – Dissertação de mestrado defendida
na Universidade Federal de Uberlândia, em 2012.
5 “O uso escolar do filme no currículo do estado de São Paulo” - Universidade do Oeste Paulista, em 2012.
6 “Educação Audiovisual: uma proposta para a formação de professores de ensino fundamental e de ensino médio no

Brasil”- Tese de doutorado defendida no Programa de Meios e Processos Audiovisuais da Escola de Comunicações e Artes
da Universidade de São Paulo, em 2011.
7 “A linguagem audiovisual como prática escolar”- Texto publicado na revista Signo- Santa Cruz do Sul, v. 36 n.61, p. 422-

439, jul.- dez., 2011.http://online.unisc.br/seer/index.php/signo/index.


8 “África como pretexto: um ensaio de História e Cinema- Texto publicado na revista Espaço Acadêmico- nº 103- dezembro

de 2009. http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/index.
9 “Cinema, imaginário e educação: recensão de Cinema e Educação”- Texto publicado na revista Espaço Acadêmico- nº

178- 03/2017 http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/index.

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agentes sociais/culturais, influenciando o cotidiano dos consumidores de tais mídias. Mas, como
podem estes agentes auxiliarem o professor em sala de aula e ao aluno em seu processo de
aprendizagem?
Partindo das observações de Setton (2010), podemos considerar todos estes dispositivos midiáticos,
agentes sociais e culturais, ligados de forma imbricada a toda sociedade, alvo da educação, seja
educação formal, não formal ou informal. Se tais dispositivos possuem fácil acesso no mercado,
sendo difundido de forma ampla e disponibilizado a grande parte da sociedade, os sujeitos estão
sendo alvos de um segmento cultural transmitido por aquela mídia.
Com o advento das tecnologias digitais, levar as mídias até a escola se tornou mais fácil,
fortalecendo a proposição de uma educação para, com e pelas mídias, voltada principalmente a
compreender como estas mídias podem auxiliar no processo de aprendizagem.
O objetivo deste texto é identificar e descrever que dispositivos cinematográficos são sugeridos nos
livros didáticos de História. Distribuídos nas escolas da rede municipal de Aracaju, acredita-se que
esses dispositivos são utilizados em sala de aula pelos professores do ensino básico. Destacamos as
indicações de filmes nas coleções, a “História nos dias de hoje” e a coleção “Histórias, Sociedade e
Cidadania” dos 6º e 7º anos do ensino fundamental da educação básica.

2 Procedimentos metodológicos

O escopo desta pesquisa, traz elementos de abordagem qualitativa e quantitativa. Quantitativo


quando propõe levantar, organizar e quantificar com o propósito de subsidiar melhor os resultados
qualitativos, nesta perspectiva a construção dos dados nos possibilitará a explicação do fenêmeno
que intencionamos compreender. Qualitativo, quando analisa os conteúdos das sugestões
midiáticas propostas pelos autores de livros didáticos de História, neste sentido, busca descrever os
modos pelos quais estas indicações chegam até o professor, como este professor se apropria e
analisa criticamente tais sugestões e as adapta à sua realidade e dos seus alunos do ensino básico,
tendo em vista dar sentido e significado as propostas dos autores. Quanto ao objetivo procura
descrever o fenômeno pesquisado e identifica os fatores que determinam e/ou contribuem para
sua ocorrência. Como procedimentos da pesquisa bibliográfica, se utiliza dos livros didáticos como
fonte principal, apoiando-se também nos procedimentos da pesquisa de levantamento, pois
trabalha com uma amostra específica destes materiais.
As fontes foram duas coleções de História utilizadas nas escolas públicas da rede municipal de
Aracaju, capital do estado de Sergipe localizado na região Nordeste do Brasil, identificando nos
materiais midiáticos a relação com o conteúdo curricular de História, procurando compreender
como estas indicações são sugeridas no livro, em que conteúdos elas são mais trabalhadas e se
propõem estratégias de utilização em sala de aula.
O critério para escolha destas coleções/livros considerou a quantidade de escolas que optaram por
utilizá-las(os). A coleção “História nos dias de hoje” foi indicada por seis escolas10, enquanto a
coleção “Histórias, Sociedade e Cidadania” indicada por uma única escola da rede11. O período de
levantamento e de análise destes materiais ocorreu entre junho e setembro de 2016, ano em que
se utiliza o livro nas aulas de História.
A primeira coleção – “História nos dias de hoje” - foi escolhida por um maior número de professores
e adotada pelo maior número de escolas da rede. A segunda coleção - “Histórias, Sociedade e
Cidadania” - foi, juntamente com mais três coleções escolhida por uma única escola. As duas
coleções aqui analisadas, foram escolhidas e trabalhadas por escolas que se localizam no mesmo

10 Coleção utilizada por um maior número de escolas na rede municipal de ensino.


11 Coleção utilizada pelo menor número de escolas na rede municipal de ensino.

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bairro da cidade (Bairro América)12 zona oeste de Aracaju , selecionadas por estarem dentro dos
critérios de escolha o que facilitou em agilidade e deslocamento dos pesquisadores. O quadro
abaixo ilustra as coleções utilizadas na rede municipal de ensino analisadas na presente pesquisa.

Quadro 1- Livros selecionados pelas escolas da rede municipal de Aracaju/SE

DISCIPLINA TÍTULO UNIDADE DE ENSINO Editora Autores (as)


HISTÓRIA 1- História nos 1 EMEF J.K Leya Flávio de Campos;
Dias de Hoje 2 EMEF Florentino Menezes Regina Claro;
3 EMEF José Antônio da Costa Melo Miriam Dolhnikoff.
4 EMEF Santa Rita de Cássia
5 EMEF Alcebiades Melo Vilas Boas
6 EMEF Profº Laonte Faria da Silva

2-Histórias 1- EMEF Profª Maria Thétis Nunes FDT Alfredo Boulos Júnior
Sociedade e
Cidadania
Fonte: Dados obtidos na secretária de Educação de Aracaju/SE, Brasil.

Para a análise das indicações cinematográficas, nestas coleções os filmes foram organizados a partir
das seguintes categorias: tempo das produções indicadas (longa, média, curta metragem), a origem
(Brasil, Estado Unidos da América, Inglaterra, China, França entre outros) e ano de lançamento.
Também foram considerados o levantando as possíveis dificuldades de acesso destacando a: i)
aquisição do filme e ii) disponibilidade em mídia on-line.
Consideramos então, se a duração dos filmes indicados está de acordo com a da aula, ou seja, estão
dentro dos 50 minutos?; a nacionalidade de produção do filme condiz com a realidade do conteúdo,
por exemplo, um filme que busca tratar sobre as cruzadas foi produzido por países europeus?; em
que ano o filme foi produzido, procurando observar o que ocorreria na época e como o conteúdo
do filme era tratado no ano em que foi produzido?
3 Filme Na Educação Para As Mídias

As possibilidades da introdução do cinema enquanto dispositivo pedagógico midiático em sala de


aula são inúmeras, ponderando-o como um produto cultural, pode contribuir na construção de um
sujeito critico no espaço socioeducativo. Enquanto arte pode cumprir várias funções a exemplo da
ilustração, aprofundamento temáticos ou tão somente entreter, enquanto linguagem pode ser lido
e enquanto audiovisual pode ser visto e ouvido por todos que são acometidos pela sua projeção,
auxiliando a professores de todas as áreas, no processo de construção e interação entre aluno e
conhecimento.
Considerando o livro didático a mídia mais utilizada pelos professores na sala de aula e sendo este
produzido para dar suporte ao professor nas aulas ministradas, o livro didático tornou-se um
dispositivo indispensável para a construção das aulas de qualquer disciplina escolar.
O livro didático, servidor e intercessor da instrução, primeira mídia da escola, é certamente a
própria imagem da legitimidade do conhecimento. Assim, não é surpreendente que ele seja o foco,
com a mesma força, das rejeições ou ao contrário de um apego quase religioso aos ritos da
instituição. (Gonnet, 1997. p. 38)

12As escolas visitadas para recolhimento do material analisadas, localizadas no mesmo bairro são a EMEF Santo Rita de
Cássia e a EMEF Maria Thétis Nunes.

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O livro didático muitas vezes, torna-se a única tecnologia acessível para o professor - ou a de mais
fácil acesso. Segundo Gonnet (1997), devemos pensar não em mídias para educação e sim uma
educação para as mídias. As mídias estão na escola, são utilizadas pelos alunos, nada mais
compreensível do que fazer amplo uso pedagógico destas, para otimizar os processos de
aprendizagens e possibilitar estratégias didáticas que visem mobilizar o discente para o aprender. É
por meio destes dispositivos que os alunos interagem com o mundo, é sobre estes, que eles mais
tratam em seus momentos de interação, falando sobre a foto postada em sua página na web, a
música que ouviu ontem na rádio, o filme que assistiu na tv na semana passada entre outras ações
que fazem parte de seu cotidiano.
O professor se torna o principal condutor dessa relação educação e mídias, estas últimas
consumidas pelos alunos no dia a dia. Para tanto, ele deve estar preparado para atender a essas
exigências da educação, onde o modelo analógico não consegue atender sozinho, a todas as
linguagens que a cultura contemporânea pode oferecer aos alunos.
Portanto, o professor se torna o principal agente mobilizador em sala, com o comprometimento de
conduzir os alunos a pensar como aquele dispositivo apresentado, pode auxiliar na construção do
seu saber histórico, na construção do seu conhecimento e quais os cuidados necessários para uma
leitura mais eficaz de uma interpretação histórica, seja qual for a mídia utilizada como fonte de
pesquisa e estudo.
O cinema não pode ser tratado apenas como um suporte ou um instrumento complementar da
prática docente, como reforço ou ilustração de um determinado conteúdo ou complemento do
livro. O cinema pode e deve ser tratado como um dispositivo pedagógico, um documento histórico
capaz de produzir no aluno, reflexões que outros documentos não conseguem por suas limitações
(por exemplo os livros, jornais e cartazes que são apenas visuais ou a música que se limita na
sonoridade). Com sua capacidade de trabalhar tanto o visual quanto o sonoro, permite ao professor
e ao aluno, refletir para além do conteúdo do livro aproximando-os da cultura imagética
contemporânea.
Assim, desenvolver situações de aprendizagens em sala tendo filmes como mediadores da
aprendizagem dos alunos pode torna-se uma prática rica e atrativa. Segundo Ferreira (2017) o
cinema é capaz de realizar o confronto com outras fontes, com outros documentos - revistas,
jornais, músicas, etc. e com o livro didático, auxiliando o professor a desenvolver com os seus
alunos, autonomia durante o processo de aprendizagem, favorecendo a problematização de
interpretações históricas mesmo fora da escola.
4 Apresentação e análise dos dados
Nesse item, apresentamos e analisamos os dados obtidos nos livros de História do 6º e 7º ano do
ensino fundamental. Analisando os filmes, observamos os cuidados dos autores com relação às
sugestões, em semelhança ao conteúdo/ano/série e as condições de exibição deles para os alunos,
pois, trabalhar o cinema como documento histórico para alunos do ensino fundamental II, exige do
professor um cuidado com as interpretações que serão apresentadas por tais filmes.
4.1 6º ano: coleções 1 e 2
Em relação a duração dos filmes podemos notar que filmes de longa-metragem, são mais
recorrentes em todos os livros analisados, possuindo poucos exemplos de outras temporalidades,
como documentários, animações e curta-metragem. O quadro abaixo, comprova que não há
indicações de filmes do gênero curta nas duas coleções analisadas.
Tabela 1- Audiovisual (6º ano)

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Filmes(longa/média) Filmes(curta) Documentários Animação


Livro 1 (FDT) 26 0 6 3
Livro 2 (LEYA) 17 0 0 3
Fonte: Dados retirados dos livros didáticos analisando no presente texto.

Trabalhar filmes longa-metragem em aulas do ensino fundamental traz algumas dificuldades


relacionadas, principalmente ao tempo de duração da aula. Quando falamos em aula de História, os
problemas se agravam ainda mais. O currículo de História na educação básica, descreve que sejam
dadas entre duas e quatro aulas de cinquenta minutos cada, por série/ano da educação básica. Dos
filmes indicados nas duas coleções para o 6º ano, apenas três filmes indicados caberiam no
tempo/aula como indica o quadro abaixo.

Quadro 2- Filmes com duração média de uma aula

Filme/Direção/País Duração Coleção


Daniel na Cova dos Leões (James L. Conway, 1978- EUA) 42 minutos LEYA
Segredos dos Exércitos Imperiais Chineses ( Discovery Channel, 2003- EUA) 50 minutos FDT
Construindo o Império Bizantino (History Channel, 2006/ EUA) 52 minutos FDT

Fonte: Dados retirados dos livros didáticos analisando no presente texto.

A maioria dos filmes indicados, possuem mais que cem minutos, o que seria o tempo de duração de
duas aulas conjugadas - ou seja 1 hora e 40 minutos de aula. Mesmo que houvesse com a
possibilidade de unir dois horários seguidos com a mesma turma, não haveria como trabalhar a
maioria dos filmes indicados pelos livros destas coleções. , a exemplo dos filmes Furia de Titãs
(Desmond Davis, 1981- Inglaterra) que possui 1h58min de duração, A Múmia (Stephen Sommers,
1999- EUA) que tem duração de 2h05min ou o filme Cleópatra (Joseph Mankiewicz, 1963- EUA) que
possui o tempo de duração de 4h11min. Exibir filmes apressadamente e possibilitar a participação
dos alunos sobre os fatos e a narrativa cinematográfica pode reduzir a riqueza pedagógica do
cinema na educação cultural dos alunos.
Podemos perceber no quadro abaixo, a presença de quatro filmes nacionais em uma das coleções,
no entanto, trabalhar com filmes nacionais no 6 ano, relacionado a história antiga, exige cuidado,
pois não temos no Brasil uma historiografia ligada a Antiguidade ou Idade Média (onde se trabalha
história da África e da Europa) trabalhadas nas escolas.
Tabela 2- Nacionalidade dos filmes (6º ano)

Livro 1 (FDT) Livro 2 (LEYA)


Brasil 4
Estados Unidos 25 13
Itália 1
Inglaterra 3 1
França 2 6
Total 35 20
Fonte: Dados retirados dos livros didáticos analisando no presente texto.

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O elevado número de filmes estrangeiros indicados nas duas coleções se torna relevante,
justamente pelo fato dos conteúdos abordados nos livros, serem conteúdos eurocêntricos. No
entanto, analisando as indicações, percebemos que os filmes indicados não são de países Europeus,
e sim filmes norte-americanos, mais especificamente, filmes hollywoodianos.
Percebemos a supremacia dos filmes americanos. Se contabilizarmos todos os filmes indicados nas
duas coleções trabalhadas, temos no 6º ano um total de 55 filmes, destes, treze filmes são
produzidos em países europeus, quatro foram produzidos no Brasil e 38 nos Estados Unidos. Nos
livros para o 7º ano- analisados no item abaixo- a diversificação da nacionalidade é maior.
Conteúdos que tratam da história oriental, história africana, americana, etc. Já trazem produtos
filmados na China, África do Sul, Afeganistão e Brasil.
4.2 7º ano: coleções 1 e 2
Nas coleções trabalhadas pelo 7º ano, encontramos produções que foram transmitidas em canal de
televisão aberta- A Muralha13. A reprodução de um fato histórico exibido por este veículo de
comunicação, deve ser trabalhado com cautela pelo professor de História, analisando o material
antes da exibição em aula, observando a fundamentação em outros documentos e fontes para sua
construção. Mesmo sendo uma ficção que busca entreter o telespectador, o fato histórico está
presente o que o torna um dispositivo importante a ser trabalhado em aula.
De qualquer modo, a ficção perece habitar um mundo fascinante e diferente do real palpável: o da
criação do reino da fantasia e da imaginação. Com isso, desfruta de uma liberdade extraordinária e
invejável, pois se situa em um universo que não está condicionado às exigências do mundo
concreto, não está subordinado aos limites da realidade visível. (Bulhões, 2009. p. 17 e 18)
Mesmo que a ficção não tenha compromisso com a realidade e com o fato histórico, o cinema de
ficção é a construção de uma realidade feita por sujeitos que pensaram em conjunto, que não
devem ser descartados pelos professores que pretendem utilizar o cinema como dispositivo
pedagógico. Todas as produções audiovisuais, indicadas nas coleções analisadas, apresentam uma
narrativa histórica/ficcional que podem ser trabalhadas juntamente ao conteúdo dos livros.
A presença maciça de filmes Longas/Médias metragem nas coleções do 7º ano, assim como
animações e a presença de uma minissérie, nos faz pensar em que espaço de tempo o professor
trabalharia estes documentos com os alunos, como demonstra o quadro abaixo.
Tabela 3- Audiovisual (7º ANO)

Filmes(longa/média) Filmes(curta) Documentários Animação Minissérie


Livro 1 (FDT) 31 0 1 2 1
Livro 2 (LEYA) 21 0 1 3 1
Fonte: Dados retirados dos livros didáticos analisando no presente texto.

Considerando que o aluno do ensino fundamental é um consumidor destes dispositivos e tem


acesso aos filmes fora da escola, as possibilidades de trabalho e análise no momento da aula,
permitiria que o professor exibisse apenas recortes do filme, momentos primordiais para a
discussão daquele conteúdo.
A discussão e análise crítica tem suma importância para a compressão entre a relação do filme e do
conteúdo proposto. Todas essas questões devem ser levadas em consideração pelo professor antes
e após a exibição, uma vez que as indicações dos livros, pretendem contribuir para a aprendizagem.

13
Minissérie transmita em canal de televisão aberta entre Janeiro e Março do 2000.

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Uma boa discussão, legitima o cinema enquanto dispositivo pedagógico, afirmando a importância
das mídias no processo educacional.
Outro item a ser considerado está relacionado ao acesso da escola e do professor ao filme indicado.
Nas duas coleções e nem nos manuais de uso destas mídias que acompanham os livros, trazem
informações em relação ao acesso aos filmes de forma gratuita ou paga para que o professor ou
qual política deve recorrer para acessar e utilizá-los. É de responsabilidade da escola adquirir os
filmes? O professor pode exibir o filme que está na internet? Estes filmes indicados possuem licença
para serem exibidos em público, mesmo que seja para fins educativos?
Para tanto, se os cuidados necessários não foram tomados pelos autores dos livros aqui descritos,
cabe ao professor procurar resolver essas questões para as exibições dos filmes. Um dos cuidados
a serem tomados, é observar a nacionalidade dos filmes - indicados no quadro abaixo - indicados
para cada conteúdo (o filme indicado para trabalhar Revolução Francesa, é francês?; o filme
indicado para Independência dos Estados Unidos é norte-americano ou britânico?).
Tabela 4- Nacionalidade dos filmes (7º ano)

NACIONALIDADE Livro 1 (FDT) Livro 2 (LEYA)


Brasil 6 9
Estados Unidos 17 8
Itália 2 1
Reino Unido/Inglaterra 2 4
Afeganistão 1
Espanha 1
África do Sul 1
China 1
Alemanha 2 2
Suécia 1
Portugal 1
França 1
Fonte: Dados retirados dos livros didáticos analisando no presente texto.

Por fim, devemos destacar o papel do cinema como produto cultural de seu tempo. O professor
deve atentar para os elementos que os filmes trazem em relação ao momento da produção.
Indicado no livro da editora FDT do 7º ano relacionado ao conteúdo da colonização portuguesa
“Anchieta, José do Brasil” de 1978 dirigido por Paulo César Saraceni, deve incluir uma análise crítica
sobre os elementos ideológicos contidos na narrativa influenciados pela época de sua produção no
regime militar, trazendo mais elementos do regime militar que o conteúdo para o qual ele foi
indicado, colonização portuguesa.
Isso ocorre, pelo fato do cinema, ter a capacidade de transmitir mais da época em que foi filmado,
produzido e comercializado do que a própria época em que quer retratar (Ferro, 1992). Mesmo que
seja brasileiro, para falar sobre a história do Brasil, sabemos que não trará os elementos apenas do
conteúdo em que foi indicado. Neste caso, com o devido cuidado, o filme pode ilustrar como a
historiografia dos filmes pensavam a colonização portuguesa no período de regime militar.
Nesse sentido concordamos com Fabris (2008, pag. 120), quando afirma que,
O cinema como uma produção cultural que não apenas inventa histórias, mas que, na
complexidade da produção de sentidos, vai criando, substituindo, limitando, incluindo e excluindo
“realidades”. Portanto, passei a tomar os filmes como produções datadas e localizadas, produzidos
na cultura, criando sentidos que a alimentam, ampliando, suprimindo e/ou transformando
significados.

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A incursão inicial sobre as sugestões de filmes nos livros didáticos de história nos aponta outros
tantos caminhos a serem analisados. O que se segue nos leva a algumas considerações não
conclusivas sobre esse tema.

Conclusão
O presente artigo, teve como proposta analisar as propostas fílmicas indicadas ao final de cada
capitulo dos livros didáticos do ensino fundamental maior, trabalhados entre nos anos de 2014 e
2016 nas escolas públicas da cidade de Aracaju, Sergipe, Brasil. É importante quantificar estas
indicações para percebemos a número elevado de filmes que possibilitam a introdução do cinema
nas aulas de história e analisa-las para compreender a importância que o cinema possui no processo
de ensino aprendizagem na educação enquanto dispositivo pedagógico.
As duas coleções aqui analisadas, nos permitem entender a forma que o cinema vem chegando nas
salas de aula destas escolas, percebendo que existe uma preocupação com a inserção das mídias
nos meios socioeducativos do nosso sistema público de ensino.
Essas contribuições trazem reflexões de como este documento pode ser utilizado para um trabalho
mais efetivo e fazer com que os alunos alvos deste dispositivo pensem de forma mais crítica em
relação ao conteúdo que está sendo trabalhado, procurando confrontar com outras fontes além dos
livros didáticos.
O cinema pode ser trabalhado em sala de aula e quando se trata do ensino de História, o cinema
como documento histórico torna-se ainda mais promissor, pois possui a competência de reconstruir
fatos que não mais se encontram de forma materializada em nossa sociedade. Exibir estes fatos em
forma de som e imagem provoca no aluno a sensação de estar presenciando o momento que ele
está estudando em sua aula, fazendo-o com que pense de forma mais clara e crítica do conteúdo
que está sendo trabalhado pelo professor.
Referências
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Escuela Y Fuera De Ella. Barcelona: Laertes, S.A. De Ediciones.

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Aprendizagem significativa por descoberta: uma reflexão da


problematização sob a abordagem de Ausubel

Simone Carvalho Neves1,1, Luciana Miranda Rodrigues1,2, Paulo São Bento1,3, Simone Aguiar
Maranhão1,4, Ivan Neves Junior1,5

1,1 Fundação Técnico Educacional Souza Marques-Escola de Enfermagem Souza Marques /Pós Graduação

em Saúde da Mulher e da Criança IFF-FIOCRUZ, Brasil. simone.neves@ftesm.edu.br; scneves23@gmail.com


1,2Fundação Técnico Educacional Souza Marques-Escola de Enfermagem Souza Marques /Instituto

Federal de Traumaortopedia (INTO), Brasil. lucianamir@gmail.com


1,3 Fundação Técnico Educacional Souza Marques-Escola de Enfermagem Souza Marques /Instituto

Nacional em Saúde da Mulher Fernandes Figueira - FIOCRUZ, Brasil. saobento@iff.fiocruz.br


1,4Fundação Técnico Educacional Souza Marques, Brasil. coordenacaoacademica@souzamarques.br
1,5 Fundação Técnico Educacional Souza Marques/Fundação Oswaldo Cruz, Brasil.

Ivanneves23@gmail.com

Resumo.A Teoria da Aprendizagem Significativa leva em consideração que os conhecimentos prévios dos
alunos sejam valorizados em sua estrutura cognitiva. Objetivou-se realizar uma reflexão acerca da
aprendizagem por descoberta com vista à problematização baseado no livro de Ausubel‘Aquisição e Retenção
de Conhecimentos: Uma Perspectiva Cognitiva’ (2000).Trata-se de uma pesquisa documental realizada com
um livro clássico no campo da aprendizagem significativa, nas versões impressa e digital. Esse estudo foi
desenvolvido no período de julho de 2014 até dezembro de 2016. A expressão ‘resolução de problemas’ se
apresentou expressiva em todo o conteúdo literário. O autor não menciona em seu livro que a abordagem de
ensino varia em função do profissional, seja a área da saúde, humanas ou tecnológica, que se pretende
formar. Ainda assim, são válidas as abordagens de Ausubel, mas provavelmente não podem ser utilizadas em
todas as disciplinas e nas práticas de algumas profissões.
Palavras-chave: aprendizagem significativa; aprendizagem por descoberta; problematização; construção do
conhecimento; resolução de problemas.

Meaningful learning by discovery: a reflection of questioning under the approach of Ausubel


Abstract. The Theory of Meaningful Learning takes into account that the prior knowledge of students is valued
in its cognitive structure. The objective of this study was to conduct a reflection about the learning by
discovery with a view to solving based on the book of Ausubel 'Acquisition and Retention of Knowledge: A
Cognitive Perspective' (2000). It is a documentary research conducted with a classic book in the field of
meaningful learning, in print and digital. This study was developed in the period from 2014 until 2016. The
term 'Troubleshooting' was expressive in all the literary content. The author does not mention in his book
that the approach of teaching varies as a function of the professional, be it in the area of health, human or
technological, that is to build. There are valid approaches of Ausubel, but probably they cannot be used in all
disciplines and practices of some professions.
Keywords: meaningful learning; learning by discovery; questioning; construction of knowledge; resolution of
problems.

1 Introdução

Atuar como docente no ensino superior é um grande desafio, visto a grande diversidade de
informações e avanços tecnológicos no mundo atual. Diante de nós, encontram-se os alunos que
precisam ser preparados para o mundo profissional. Como atrair esses alunos para o desejo de

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aprender, refletir e questionar? Como fazer com que os conteúdos sejam significativos? É nesse
momento que devemos parar, refletir e oferecer ao aluno o despertamento para a aprendizagem, para
a curiosidade e para os novos conhecimentos.
Dentro dessa expectativa, podemos nos apoderar da teoria da aprendizagem significativa onde o
processo de ensino-aprendizagem é focado no aluno e permite liberdade para aprender. A
aprendizagem pode ser definida pela mudança na vida do indivíduo com um todo onde o professor
atua como o mediador e facilitador nesse processo onde são valorizadas as experiências prévias dos
alunos. Proporcionar ao aluno situações que permitam construir novo conhecimento de modo a
conquistar sua autonomia intelectual (Lemos, 2005).
Na aprendizagem significativa podemos mencionar os três requisitos que são fundamentais para o
processo de aprender, como: os conhecimentos anteriores relevantes devem ser relacionados com os
novos, o material significativo onde os conhecimentos a serem apreendidos dever ser relevantes e o
aluno deve escolher aprender significantemente e deve escolher, consciente e intencionalmente e
relacionar os novos conhecimentos com outros (Novak, 2000).
Na aprendizagem significativa, o aluno interage com a cultura sistematizada de forma ativa, como
principal ator do processo de construção do conhecimento. O ensino de novos conteúdos deve
possibilitar que se sinta desafiado a avançar nos seus conhecimentos, nas novas descobertas. Para que
tenhamos resultados promissores nesse sentido, é necessário um trabalho de continuidade, o
conteúdo novo deve apoiar-se numa estrutura cognitiva já existente, o que exige do professor,
previamente, verificar o que o aluno sabe, para que possa já fazer um breve diagnóstico, relacionar os
novos conteúdos à experiência do aluno a continuidade e de outro, provocar novas necessidades e
desafios pela análise crítica, encorajando o aluno a avançar na sua experiência prévia (Cyrino
&Toralles-Pereira, 2004).
Nessa dinâmica do aprender e ensinar, cinco elementos são fundamentais e são indissociáveis para
que tudo ocorra harmoniosamente no contexto educativo, tais como: o aluno, o professor, o
conhecimento, o contexto e a avaliação (Novak, 2000). Estaremos inserindo aqui o sexto elemento que
é a pesquisa para solidificar o complexo processo de aprender e ensinar. Uma preocupação por parte
dos educadores é que o avanço do conhecimento na área não está refletindo em melhoria de
qualidade do processo educativo, otimizar o tempo garantido que as ideias centrais de uma pesquisa
construtivista sejam compartilhadas por diferentes atores envolvidos no processo de ensino e pesquisa
(Lemos, 2005).
O objetivo desse artigo foi realizar uma reflexão acerca da aprendizagem por descoberta com vista à
problematização baseado no livro de Ausubel“Aquisição e Retenção de Conhecimentos: Uma
Perspectiva Cognitiva”

1.1 Conceitos e princípios fundamentais sobre a teoria da aprendizagem significativa


Para entender a teoria da aprendizagem significativa é necessário se apropriar de alguns conceitos e
princípios já estabelecidos. Dentre eles: o que significa subsunçor, diferenciação progressiva,
reconciliação progressiva, material potencialmente significativo e a linguagem.
Primeiramente, iniciaremos com a definição de subsunçor que se trata de uma situação em que o
indivíduo ao entrar em contato com o novo conteúdo se modifica, se envolve mais amplamente e há
a possibilidade de captar novas informações.
De acordo com o princípio da diferenciação progressiva as ideias mais gerais e inclusivas devem ser
apresentadas em primeiro lugar, sendo progressivamente diferenciadas em ideias menos inclusivas.
Na reconciliação integradora o professor deverá evidenciar as semelhanças e diferenças entre o
conteúdo novo e o que o aluno já sabe. Isso é importante para que o aluno perceba as relações entre
ideias aparentemente divergentes.

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O material potencialmente significativo é aquele que cujas partes se relacionam com a experiência
prévia do aluno de forma não arbitrária. No entanto, para que o material tenha potencial e com a
possibilidade de ser significativo, são necessários dois pré-requisitos. Primeiro no que se refere a
natureza do próprio material, ou seja, condutor de conhecimento. O segundo se refere à presença do
conteúdo significativo na estrutura cognitiva do indivíduo que também dependerá da natureza do
conhecimento prévio do aluno (Lemos, 2012).
Outro conceito de suma importância se refere à linguagem. A linguagem é um importante facilitador
da aprendizagem significativa por recepção e pela descoberta desempenhando um papel integral e
operativo no raciocínio.

1.2 A Aprendizagem significativa por descobertaversus aprendizagem por recepção

A aprendizagem por descoberta apresenta-se ao aprendiz de forma mais ou menos final e com recurso
expositivo e o conteúdo principal daquilo que o mesmo deve aprender. O aluno que aprende deve
reorganizar um conjunto de informações e integrá-las ao conhecimento que já possui para resolver
problemas.
Ausubel mostra que tanto a aprendizagem por recepção como por descoberta pode desenvolver-se
de modo significativo ou repetitivo (mecânico). Para ser significativo, o conteúdo deve relacionar-se a
conhecimentos prévios do aluno, exigindo deste uma atitude favorável capaz de atribuir significado
próprio aos conteúdos que assimila, e do professor, uma tarefa mobilizadora para que tal
aprendizagem ocorra.
Por outro lado, é repetitiva quando o aluno não consegue estabelecer relações do conteúdo novo com
anteriores porque carece dos conhecimentos necessários para que tais conteúdos se tornem
significativos ou não está mobilizado para uma aprendizagem ativa.
O aprendizado é um processo complexo; não acontece de forma linear, por acréscimo, como se
bastasse somar alguns novos elementos ao que sabíamos antes.
Na aprendizagem por recepção, o conteúdo total do que está por aprender apresenta-se ao aprendiz
em forma acabada. A tarefa de aprendizagem não envolve qualquer descoberta independente por
parte do mesmo. Ao aprendiz apenas se exige que interiorize o material que lhe é apresentado de
forma a ficar disponível numa data futura, não permite ao aluno a liberdade de se expor e mostrar o
que já sabe.
Assim, a primeira fase da aprendizagem pela descoberta envolve um processo bastante diferente do
da aprendizagem por recepção. O aprendiz deve organizar uma determinada quantidade de
informações, integrá-las na estrutura cognitiva existente e reorganizar ou transformar a combinação
integrada, de forma a criar um produto final desejado ou a descobrir uma relação meios-fim ausente.

1.3 Metodologia de ensino baseada na problematização


A estratégia problematizadora trabalha com a construção de conhecimentos a partir da vivência de
experiências significativas e por processos de aprendizagem por descoberta, os conteúdos de ensino
não são oferecidos aos alunos em sua forma acabada, mas na forma de problemas, cujas relações
devem ser descobertas e construídas pelo aluno, que precisa reorganizar o material, adaptando-o à
sua estrutura cognitiva prévia (Prosser & Sze, 2013).
A utilização da problematização como estratégia de ensino privilegia discussões em torno da temática
levantadas juntos aos alunos, através de debates, de resoluções de problemas e extraídas da própria
realidade sociocultural. Esse recurso tem sido utilizado para romper com a estrutura tradicional de
ensino. O ensino baseado na aprendizagem por descoberta e significativa valoriza o aprender a

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aprender fornecendo liberdade para o aluno se expressar e fazer reflexões (Longhi, Bermudez,
Abensur& Ruiz-Moreno, 2014).
A educação problematizadora fundamenta-se na relação dialógica, que possibilite a ambos
aprenderem juntos, por meio de um processo emancipatório. Trabalha a construção do conhecimento
a partir de vivências de experiências significativas apoiada nos processos de aprendizagem por
descoberta em oposição aos de recepção em que os conteúdos são oferecidos ao aluno em forma final
(Longhi,Bermudez, Abensur& Ruiz-Moreno, 2014).
A educação não é, nem nunca foi, um processo de autoinstrução completo. A própria essência deste
reside na seleção, organização, interpretação e disposição sequencial conscientes dos materiais de
aprendizagem por pessoas experientes em termos pedagógicos (Ausubel, 2000).

2 Método do estudo
Trata-se de uma pesquisa documental com abordagem qualitativa realizada com um livro clássico no
campo da aprendizagem significativa, nas versões impressa e digital com o título ‘Aquisição e Retenção
de Conhecimentos: Uma Perspectiva Cognitiva’, do autor David Paul Ausubel (2000). A pesquisa
qualitativa trabalha com significados que tem se estendido nas áreas de psicologia e educação
(Minayo, 2012). Além disso, visa a objetivação de um fenômeno afim de descrevê-lo, compreendê-lo
e explicá-lo (Silveira & Córdova, 2009). Esse estudo foi realizado no período de julho de 2014 até
fevereiro de 2016. No primeiro momento o livro foi lido de maneira aleatória, livre e em sua inteireza.
A partir de então, foram selecionadas as palavras-chave que serviram para identificação de questões
abordadas pelo autor no que diz respeito ao tema ‘problematização’.
Sendo assim, uma segunda leitura do material foi empreendida e balizada pelas seguintes palavras-
chave: aprendizagem por descoberta, construção do conhecimento, problematização e problematizar
e resolução de problemas. Esta leitura exigiu um tempo maior e cautela por parte dos pesquisadores
no sentido de mapear a referência estudada.
Foi realizada uma conferência do número de palavras-chave encontradas no livro, tarefa que foi
alcançada com brevidade no formato digital, através do link ‘pesquisar’. Com o material escrutinizado
os autores construíram uma tabela (Tabela 1) para observar e organizar o número de ocorrências e
localização das palavras.
A discussão foi realizada com base na ausência de expressões-chave no campo da aprendizagem
significativa, ou seja, palavras que são caras para o universo das metodologias ativas, exaltando qual
o valor destas expressões para esta discussão.

3 Resultados e Discussão

A pesquisa qualitativa não tem o objetivo de expressão numérica de forma expressiva, mas, sim, com
o detalhamento da compreensão de um fenômeno (Silveira & Córdova, 2009). A análise das palavras
pesquisadas revelou que a expressão ‘resolução de problemas’ se apresentou expressiva 48 vezes por
todo o conteúdo literário. A Tabela 1 mostra ainda que a expressão ‘aprendizagem significativa por
descoberta’ se apresenta de forma reduzida (n=3) quando comparada com a expressão citada
anteriormente.

Tabela1. Sinópse das palavras segundo ocorrência no livro de Ausubel (2014-2016)

Palavras pesquisadas Número de ocorrências Páginas onde foram encontradas as palavras-chave


(n)
Aprendizagem significativa por 03 20, 112, 191
descoberta

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Construção do conhecimento Não encontrada Não encontrada


Problematização Não encontrada Não encontrada
Problematizar Não encontrada Não encontrada
Resolução de problemas 48 14,18, 21,22, 23,38, 44, 52, 54, 57, 58, 61, 62, 63, 64, 65,
66, 67, 68, 69, 70, 71, 73, 76, 77, 80, 83, 112, 113, 115,
116, 118, 130, 146, 147, 159, 165, 166, 167, 171, 174,
191, 192, 210, 211, 215, 238, 241

“Na pesquisa qualitativa o sujeito e o objeto encontram-se ao mesmo tempo tornando o


desenvolvimento da pesquisa imprevisível. O objetivo da amostra é de produzir informações
aprofundadas e ilustrativas; seja ela pequena ou grande, o que importa é que seja capaz de produzir
novas informações” (Silveira &Córdova, 2009, p. 32).
O estudo de Ausubel (2000) mostra que a aprendizagem por descoberta oferece ao aluno a
possibilidade de posse verdadeira de conhecimento uma vez que se precede a resolução dos
problemas como forma de solução dos mesmos. O que corrobora com Longhi, Bermudez, Abensur&
Ruiz-Moreno (2014) quando se referem a problematização como estratégia de ensino que facilita a
resolução de problemas através de debates e ainda, Fonseca (2002) aponta a importância do
direcionamento na interpretação do objeto como foco da pesquisa qualitativa.
Os autores Silveira & Córdova (2009) enfatizam o subjetivo na abordagem qualitativa como meio de
compreensão e interpretação das experiências mais do que focalizar em conceitos específicos. No livro
de Ausubel não foram encontradas as palavras construção do conhecimento, problematização e
problematizar. Não encontrar estas expressões num clássico da aprendizagem significativa é
preocupante sob o ponto de vista daquilo que o próprio objeto se propõe, isto é, na perspectiva de
metodologias ativas é necessário problematizar.
Na aprendizagem significativa é o conhecimento prévio do aluno que deverá ser levado em
consideração para o desenvolvimento do processo educativo. Ausubel aborda a aprendizagem por
descoberta e faz comparação em todo momento com a aprendizagem por recepção, deixando de certa
forma dúvidas devido a algumas contradições onde o autor assume que o ensino não é uma
autoinstrução com relação as duas aprendizagens.
A problematização contempla uma dimensão, que vai além da pedagogia, por isso contribui para
aumentar a capacidade de percepção crítica do sujeito.

4 Conclusão

O ensino superior é um aprendizado direcionado à profissão escolhida pelo aluno e assim, necessita
de conteúdos específicos que deve ter para que a partir deste conhecimento prévio possa ofertar um
conjunto de habilidades específicas que o caracterizam como um profissional. O autor não menciona
em seu livro que a abordagem de ensino varia em função do profissional que se pretende formar. Por
outro lado, há uma grande dificuldade para o docente cumprir todos os prazos no período letivo, tão
pouco permitir aos discentes construírem um conhecimento de forma individualizada.
O ensino em turmas e não de forma individualizada, com planejamento de curso e planos de aula
exigidos em forma de Lei em cumprimento às Diretrizes Curriculares estabelecidas pelo Ministério da
Educação do Brasil é um grande desafio para todo o corpo docente e coordenadores de cursos.
Além disso, no Brasil, os alunos e as instituições são avaliados dentro de um contexto programático
com avaliações trienais com abrangência nacional. Contudo, mediante toda a pesquisa realizada, são
válidas as abordagens de Ausubel, mas provavelmente não podem ser utilizadas em todas as
disciplinas e nas práticas de algumas profissões.

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Referências

AUSUBEL, D. P. (2000). Aquisição e Retenção de Conhecimento: Uma Perspectiva Cognitiva (1a ed.).
Lisboa: Paralelo Editora.

CYRINO, E. & TORALLES-PEREIRA, M. (2004). Trabalhando com estratégias de ensino-aprendizado por


descoberta na área da saúde: a problematização e a aprendizagem baseada em problemas. Cad.
Saúde Pública, 20(3), 780-788.

FONSECA, J. J. (2002). Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: Editora UEC.

LEMOS, E. S. (2005). (Re) Situando a Teoria de Aprendizagem Significativa na Prática Docente, na


Formação de Professores e nas Investigações Educativas em Ciências. Revista de Pesquisa em
Educação em Ciências, 5(3).

LEMOS, E. S. (2012). Enseñanza e el Hacer Docente: Reflexiones a la Luz de la Teoria del Aprendizaje
Significativo. Aprendizagem Significativa em Revista, 23-41.

LONGHI, A. L., BERMUDEZ, G. M., ABENSUR, P. L. & RUIZ-MORENO, L. (2014). Una estrategia didáctica
para la formación de educadores de salud en Brasil: la indagación dialógica problematizadora.
Interface - Comunicação, Saúde, Educação, 18(51), 759-769.

MINAYO, M. S. (2012). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: HUCITEC
Editora.

NOVAK, J. D. (2000). Aprender, Criar e Utilizar o Conhecimento (1a ed.). Lisboa: Pátano Edições
Técnicas.

PROSSER, M. & SZE, D. (2013). Problem-based learning: student learning experiences and outcomes.
Clin Linguist Phon, 28(1-2), 131-141.

SILVEIRA, D. T. & CÓRDOVA, F. P. (2009). A pesquisa científica. Em T. E. GERHARDT, & D. T. SILVEIRA,


Métodos de pesquisa, 120. Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil: Editora UFRGS.

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Concretização de um Projeto transversal de leitura no ensino


básico

Resumo. Este estudo focaliza a concretização de um Projeto, realizado em monodocência coadjuvada,


visando o desenvolvimento de competências transversais de leitura, de alunos dos primeiros anos do ensino
básico, nas disciplinas de Português e Matemática. A investigação qualitativa incidiu na análise de
entrevistas, com recurso à aplicação webQDA, a professores e membros da Direção de um agrupamento de
escolas do norte de Portugal. A pesquisa comprovou que o Projeto Aprender a Crescer desenvolveu, nos
alunos, melhores competências transversais de Língua, em especial de compreensão leitora, de enunciados
e textos, e mais consciencialização docente, quanto à aplicação de estratégias de leitura. Como
constrangimentos, destacam-se as lacunas dos alunos na descodificação de vocabulário e a dificuldade de
alguns professores em trabalhar colaborativamente.
Palavras-chave: Projeto transversal de leitura; Português e Matemática; monodocência coadjuvada; ensino
básico; investigação qualitativa.

Implementation of a transversal reading Project in basic education


Abstract. This study presents the implementation of a Project under the model of assisted mono-teaching.
Its objective was the development of transversal skills amongst schoolchildren of the first years of basic
education, in the disciplines of Portuguese Language and Mathematics. Qualitative research, with the help
of the webQDA application, focused on the analysis of interviews of teachers and board members of a
settlement of schools in northern Portugal. Research proved that the Learning to Grow Project improved
the transversal skills of the students in the Language area, especially in what concerns reading
comprehension of both exercise instructions and texts, and teacher awareness regarding the application of
reading strategies. As constraints, there is evidence of gaps in the capacity of students for decodifying
vocabulary and in the ability of teachers to work collaboratively.
Key-words: Transversal reading project; Portuguese and Mathematics; assisted mono-teaching; basic
education; qualitative research.

1 Introdução

A compreensão da leitura emerge como questão central, no início da escolaridade obrigatória,


preocupando pais e professores de alunos do ensino básico, porquanto a apropriação de
competências comunicativas, em especial de leitura, em Português, Língua Materna, constitui a base
da aquisição dos demais conhecimentos curriculares e sociais, no ensino formal. Em relação à
compreensão leitora, pesquisas realizadas anteriormente, em diversos anos de escolaridade (Gomes,
2013; Simões & Oliveira, 2015; Martins & Sá, 2011), comprovam que muitos alunos portugueses,
desde os anos iniciais, têm vindo a revelar, em avaliações internas e externas, dificuldades
preocupantes, no que concerne à leitura e interpretação de textos, a que, normalmente, se
acrescentam problemas na escrita e na resolução de problemas matemáticos. Em 2014/15, os
resultados da prova final de Português do 1.º ciclo, a nível nacional (MEC, 2015), evidenciaram que
bastantes alunos do ensino básico ainda não haviam adquirido competências linguísticas essenciais,
particularmente de leitura. Esta situação agudiza-se em Portugal, dado tratar-se do país europeu
com mais retenções anuais, ao longo da escolaridade obrigatória (Pereira & Reis, 2014; CNE, 2015).
Assim, o tema norteador escolhido focaliza a concretização do Projeto Aprender a Crescer, visando o
desenvolvimento transdisciplinar da leitura, em monodocência coadjuvada, no 1º ciclo do ensino
básico. Na pesquisa foi privilegiada a investigação qualitativa, centrada em inquéritos por entrevista,

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a professores e membros da Direção de um agrupamento de escolas do 1º ciclo do ensino básico. As


entrevistas foram analisadas com recurso à aplicação webQDA, atendendo à complexidade da
realidade educativa em estudo.

1.1 Ensino e aprendizagem da leitura em transversalidade curricular

O reforço da aprendizagem da Língua Materna constitui uma questão prioritária, a nível de políticas
educativas e propostas curriculares, ao longo da escolaridade obrigatória. O desenvolvimento das
capacidades do aluno, no domínio da compreensão e produção de enunciados, orais e escritos, é
fundamental, não só na disciplina de Português, mas, transdisciplinarmente, em todas as áreas
curriculares (Sim-Sim, 2007). Desde o início da escolaridade, importa desenvolver a aquisição da
literacia nos alunos, aperfeiçoando competências de leitura determinantes para a sua formação
plena, como profissionais e cidadãos. Neste sentido, a criança deverá, progressivamente,
transformar a informação disponível em conhecimento, através da compreensão leitora e da
expressão escrita, tendo em conta conhecimentos prévios e capacidades literácitas, previamente
adquiridas em família e em sociedade (Giasson, 2004; Jolibert, 2003; Schleppegrell, 2004). Essa meta
apenas poderá ser atingida se os professores, das diversas áreas curriculares, trabalharem em
conjunto, na aplicação de estratégias comuns, adaptadas à especificidade de cada disciplina.
No que se refere à transversalidade linguística entre Português e Matemática, focalizada no estudo,
é recorrente o insucesso de muitos alunos a Matemática, devido a dificuldades na descodificação de
vocabulário específico, a que acresce a compreensão parcelar ou incorreta das tarefas solicitadas nos
enunciados matemáticos. O domínio progressivo da linguagem matemática pode desenvolver não só
a aprendizagem a Matemática, mas, cumulativamente, aprofundar o conhecimento da Língua, por
via do enriquecimento lexical, da prática de estruturas gramaticais e do alargamento da Língua a
campos semânticos específicos (Gomes, 2013; Lacanallo et al., 2011; Silva, 2013).
Assim sendo, compete aos professores reforçar o ensino e aprendizagem da leitura, em
transversalidade curricular. Uma das possibilidades recentes é a docência com dois professores em
sala de aula, no 1º ciclo do ensino básico. Com a publicação do Despacho Normativo n.º 6/2014, o
Ministério da Educação e Ciência (MEC) veio alargar a coadjuvação, a “disciplinas estruturantes em
qualquer nível de ensino e especialmente no 1.º ciclo, por professores do agrupamento” (idem,
preâmbulo), “por forma a colmatar as primeiras dificuldades de aprendizagem dos alunos (idem, artº
4a). Contudo, apesar da progressiva generalização, no 1º ciclo, da monodocência coadjuvada, a
mesma não é condição única para a alteração significativa e a melhoria das práticas docentes
(Roldão, 2000). No trabalho colaborativo entre docentes, a forma como o trabalho se processa é
determinante, para o sucesso dos objetivos a atingir. Assim, Glickman, Gordon e Ross-Gordon (2014)
e Pawlas e Oliva (2007) defendem que o processo de formação de grupos de professores, os projetos
de intervenção pedagógica, a supervisão entre pares e a reflexão sobre a ação são fundamentais, em
todo o processo de trabalho colaborativo docente. Nesta perspetiva, há que atender à especificidade
da monodocência coadjuvada, a qual se encontra muito dependente da identidade profissional, bem
como da orgânica pedagógica das escolas, por via da associação ao trabalho colaborativo em
comunidade.

2 Metodologia

O estudo tem por objetivo averiguar de que forma o Projeto Aprender a Crescer (PAC), realizado em
monodocência coadjuvada, favorece o desenvolvimento de competências transversais de Língua,

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relacionadas com a compreensão leitora, dos alunos do 1º ciclo do ensino básico, nas disciplinas de
Português e Matemática. Trata-se de uma investigação qualitativa, centrada na concretização de um
Projeto, coordenado pela investigadora, no contexto de um agrupamento de escolas. A pesquisa
qualitativa foi selecionada por possibilitar a compreensão de comportamentos e perceções dos
sujeitos a investigar, visando a transformação da realidade e a resolução de problemas, inscritos na
complexidade das interações sociais (Amado, 2014; Stake, 2012).
Atendendo à extensão do percurso investigativo, que se desenrolou de 2014 a 2016, e englobou
diversas vertentes de investigação, tendo como sujeitos participantes 36 professores e 814 alunos,
optou-se por uma apresentação parcial, focalizada nas entrevistas. A escolha deste instrumento de
recolha de dados deve-se à vantagem de ser adequado ao registo e à análise de representações e
dinâmicas sociais. Em conformidade com a vertente da pesquisa selecionada, apresentam-se as
questões norteadoras: (i) Quais os fundamentos do Projeto Aprender a Crescer, em monodocência
coadjuvada, no agrupamento de escolas em análise? (ii) Quais os fatores potenciadores de
constrangimento e melhoria, de um Projeto transversal, visando o desenvolvimento da compreensão
da leitura, a Português e Matemática, no ensino básico? De acordo com as questões formuladas, as
seis entrevistas estruturadas, realizadas em 2016, a quatro professores da equipa do Projeto
Aprender a Crescer (PAC), que coadjuvaram professores titulares de turma, e a dois elementos da
Direção do agrupamento de escolas, no qual decorreu a pesquisa, obedeceram a um guião
estruturado. As entrevistas foram gravadas em áudio, e posteriormente transcritas, de forma a
selecionar as informações, contidas no corpus textual, após análise do conteúdo discursivo (Bardin,
2011; Edwards & Holland, 2013). Desta forma, as categorias e subcategorias, embora pensadas a
priori, emergiram a posteriori do discurso semântico analisado. Na formulação categorial foram tidos
em conta estudos e conceções teóricas sobre a problemática, de autores referidos na revisão teórica.
Na análise de conteúdo utilizou-se a aplicação webQDA em português, um programa de análise
qualitativa de dados (Costa, 2012). No software inseriram-se, primeiramente, os dados, importados
para o Sistema de Fontes (Fontes Internas, Fontes Externas e Notas). Posteriormente, foram criadas
e organizadas as categorias, através de codificação (Códigos Livres, Códigos Árvore, Descritores e
Classificações) dos segmentos semânticos do corpus textual. Esta informação foi cruzada no
questionamento, através da realização de matrizes numéricas, o que permitiu, de acordo com o
objetivo da investigação, pesquisar e contabilizar palavras e textos. As matrizes numéricas
evidenciam o número de fontes, palavras e referências, com valor percentual da unidade de sentido
do discurso, relativamente a cada entrevistado. Em acréscimo, a webQDA, enquanto aplicação de
análise qualitativa, possibilitou visualizar, filtrar, editar, acrescentar e eliminar informação, em cada
um dos sistemas: Fontes, Codificação e Questionamento (Freitas, Neri de Souza & Costa, 2016).

3 Análise e discussão dos resultados das entrevistas

No agrupamento de escolas onde decorreu o estudo, os 6 docentes entrevistados apresentam um


tempo médio de serviço de 23,5 anos, como professores do 1º ciclo do ensino básico. Destes, 2
professores são do sexo masculino, 5 têm licenciatura e 1 mestrado.
Na tabela seguinte, e na procura de respostas para a primeira questão norteadora, apresentam-se os
resultados quanto à categoria fundamentação do Projeto, englobando as perceções dos
entrevistados sobre causas e fatores, e objetivos, que estão na base da concretização do Projeto
Aprender a Crescer (PAC).

Tabela 1 – Fundamentação do Projeto em monodocência coadjuvada

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Professores Entrevistados
Categoria Subcategorias
Sub Prof. Prof. Prof. Prof. Total
Diretora
diretora PAC1 PAC2 PAC3 PAC4 Refs.
Causas e fatores 8 10 5 5 2 3 33
Fundamentação
do Projeto Objetivos 15 12 8 6 4 10 55

Legenda: Refs. – Referências.

Conforme se pode verificar, a entrevistada, que mais se destacou, na subcategoria causas e fatores,
foi a Subdiretora, com 10 referências, logo seguida da Diretora, com 8. Ambas as entrevistadas
referem causas e fatores, que constituíram a razão de ser e o ponto de partida do Projeto. Assim, a
Diretora destaca “(…)a leitura e interpretação de textos (Ref.1); “Depois do diagnóstico e da
assimilação dos pontos a melhorar, e com uma legislação que deu hipótese à monodocência
coadjuvada, estávamos na posse dos elementos básicos, para arrancar com um projeto.” (Ref.8);
Quanto à Subdiretora, realça que “muitas das dificuldades de aprendizagem dos conteúdos
matemáticos prendiam-se com a falta de compreensão da leitura dos enunciados e desafios da
Matemática (Ref.1); muitos alunos não davam respostas assertivas, por não compreenderem o
significado de alguns vocábulos matemáticos e, ainda, por não saberem distinguir o essencial e o
acessório num texto.” (Ref.8) Nos discursos transcritos é evidente a preocupação com as dificuldades
linguísticas dos alunos e, sobretudo, com as consequências da falta de compreensão leitora dos
alunos. Para as entrevistadas, a compreensão da leitura de textos e enunciados está na base da
incompreensão das tarefas solicitadas, indo ao encontro do propósito da implementação do PAC, em
monodocência coadjuvada. Ainda em relação à subcategoria causas e fatores, os professores da
equipa do Projeto Aprender a Crescer (PAC), com referências diversas, destacam, igualmente, a
importância da implementação do Projeto, face às lacunas linguísticas demonstradas pelos alunos.
“Muitas dificuldades no domínio da Matemática, na resolução de problemas e, no que respeita ao
Português, na interpretação e na escrita de textos. Estes problemas estão associados à dificuldade
dos alunos em compreender o que lhes é pedido nos enunciados (...) muito notório na disciplina de
Matemática, quando os alunos dão uma resposta que nada tem a ver com o que é pedido no
enunciado.” (Prof. PAC3, Ref.1).
Analisando a categoria objetivos, verifica-se que a entrevistada, que mais enfatizou a pertinência de
objetivos motivadores, subjacentes à implementação do PAC, foi a Diretora, com 15 referências.
Destas, destaca-se a referência que representa mais conteúdo, e valor percentual correspondente
(3,26%), respeitante ao PAC: “contribuiu substancialmente para o rumo que queremos seguir, um
rumo de aprendizagem e de melhoria contínua, procurando ações integradoras, colaborativas e de
cumplicidade de todos os elementos da comunidade educativa, e que se incorpora totalmente nas
metas e finalidades priorizadas no Projeto Educativo deste agrupamento de escolas.” (Diretora,
Ref.11). A Diretora testemunha a importância do PAC, para a concretização das metas e o
cumprimento das finalidades constantes do Projeto Educativo do agrupamento. Em contraste, a
entrevistada que menos aludiu aos objetivos foi a Prof. PAC 3, com 4 referências. A seguir,
transcreve-se a referência mais elevada (1,67%), registada no webQDA, no discurso desta docente:
“As principais prioridades centram-se, exatamente, no investimento dos docentes na renovação das
suas práticas, na estimulação e motivação dos alunos, melhorando as suas aprendizagens,
desenvolvendo as suas competências leitoras e de raciocínio, uma vez que estas são transversais a
todos os domínios do currículo.” (Ref. 2, PAC3). Para esta entrevistada, os objetivos principais
centram-se não só no sucesso escolar dos alunos, mas, similarmente, no investimento dos docentes,
que, com o PAC, renovaram as suas práticas, num processo de autoformação. Estes resultados vão
ao encontro de outros estudos, nos quais é associado o ensino e aprendizagem do Português, com o

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desenvolvimento de competências transversais curriculares (Rodrigues & Duarte, 2011; Sá 2012),


interligando o desenvolvimento dos alunos com a formação contínua docente.
Passando à categoria concretização do Projeto, e na procura de respostas para a segunda questão
norteadora, apresentam-se, na tabela seguinte, os resultados. No discurso dos entrevistados,
identificaram-se perceções respeitantes aos fatores potenciadores de constrangimento e de
melhoria, de um Projeto transversal de leitura.

Tabela 2 – Concretização do Projeto Aprender a Crescer

Categoria Professores Entrevistados


Subcategorias Sub Prof. Prof. Prof. Prof. Total
Diretora
diretora PAC1 PAC2 PAC3 PAC4 Refs.
Fatores potenciadores
Concretização de constrangimento 6 9 6 5 5 6 37
do Projeto Fatores potenciadores
de melhoria 18 27 26 14 19 33 137
Transversalidade da leitura 24 28 32 22 21 31 158
Legenda: Refs. – Referências.

Relativamente à subcategoria fatores potenciadores de constrangimento, por ordem crescente,


registam-se 5 referências dos Profs. PAC2 e PAC3, 6 da Prof. PAC 4, e igual número do Prof. PAC 1 e
da Diretora. Com 10 referências, sobressai a Subdiretora. Como principal constrangimento, é de
destacar a resistência em aceitar outro professor na sala de aula. De facto, é possível entrever
alguma cristalização socioprofissional dos professores coadjuvados, uma vez que “a monodocência,
para o melhor e para o pior, é a estrutura de ensino secular em vigor” (Prof. PAC2). Esta situação é
reforçada por algumas perceções, que atingem um valor percentual elevado (2,3% e 2,7%), e que a
seguir se transcrevem. Na opinião de um elemento da Direção: “Nós, muitas vezes, estarmos
renitentes à mudança (…) nós temos a mania que somos donos da sala, temos medo da partilha,
estou a fazer mal, não quero que me vejam, ou então sou muito bom, mas isso não é para partilhar
com ninguém é só para os meus alunos (…) Com o tempo houve modificação nas atitudes.” (Ref.7,
Subdiretora). As palavras de um docente, que exerceu funções como coadjuvante, confirmam esses
receios: “No primeiro ano de implementação do Projeto senti que a coadjuvação, nas disciplinas de
Português e Matemática, deixou alguns docentes titulares de turma um pouco apreensivos. Uns
porque estavam habituados a trabalhar de um modo um pouco isolado, na sua sala de aula, outros
porque consideravam que não necessitavam de qualquer apoio para lecionar.” (Ref.1, Prof. PAC1).
Estas reflexões revelam a recorrência de termos como “medo”, “mudança”, “hábito”, “solidão” e
“isolado”, relativamente a esta subcategoria, destacando a negatividade de um profissionalismo
cerrado em si mesmo. Na essência destas palavras é possível identificar a reprodução de um ensino
tradicional, fechado. Apesar da consciencialização das vantagens de uma maior abertura ao trabalho
colaborativo e à partilha em comunidade aprendente, ainda subsistem, nos docentes, hábitos de um
trabalho individual e isolado, pelo receio do erro e da crítica (Glickman et al., 2014).
Passando à análise da subcategoria fatores potenciadores de melhoria, com 137 referências,
observa-se, por ordem decrescente, a Prof. PAC4 com 33 referências, a Subdiretora com 27, o Prof.
PAC1 com 26, a Prof. PAC3 com 19, a Diretora com 18 e, por fim, o Prof. PAC2 com 14. Os
entrevistados focam o seu discurso num trabalho dinâmico, diferenciado, mais centrado no aluno,
uma vez que “estimulou os alunos a solicitarem esclarecimento de dúvidas com mais frequência”
(Prof. PAC4). Desta forma, a comunicação, a colaboração e a interação proporcionam a troca de
“experiências para cada um poder melhorar a sua prática pedagógica” (Subdiretora). Fazendo eco
das perceções dos seus pares, o Prof. PAC2 ressalta um “ensino mais dinâmico para as crianças

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«nativas digitais», ao contrário do professor que cresceu numa outra era” (Ref.1), e, por sua vez, a
Diretora refere que a melhoria “assenta na ação e na reflexão, cujo papel principal é a comunicação,
uma vez que permite estabelecer a ligação entre as pessoas” (Ref.17). No discurso analisado,
interligam-se conceitos como “colaboração”, “supervisão” e “desenvolvimento profissional”, numa
Escola (re)construída pela reflexão e apropriação de um clima e cultura próprias (Alarcão, 2007;
Moreira, 2009). Acresce um ensino mais centralizado no aluno, focalizado nas motivações intrínsecas
do discente, inserido no meio tecnológico (Roldão, 2013).
Por último, a subcategoria transversalidade da leitura é a que agrega mais referências (158),
distribuídas da seguinte forma: Prof. PAC1 (32); Prof PAC4 (31); Subdiretora (28), Diretora (24); Prof.
PAC2 (22) e Prof. PAC3 (21). Essa transversalidade assenta na proficiência leitora, nomeadamente
quanto ao domínio de linguagens específicas, incluindo o vocabulário, uma dificuldade acrescida para
muitos alunos. Neste entendimento, os docentes assumem que o “Português ocupa um lugar
privilegiado, ao contribuir para o desenvolvimento de competências de literacia” (Prof. PAC4, Ref.21),
uma vez que a aplicação de “estratégias que não são muito utilizadas pelo professor, faz com que os
alunos aprendam e queiram saber mais, investigar mais, ter mais curiosidade” (Subdiretora, Ref.8).
Essa curiosidade é essencial para uma aprendizagem da Língua, alicerçada, desde muito cedo, na
aquisição gradual de hábitos de leitura, na expansão de vocabulário e no domínio de estruturas
sintáticas. Além disso, os sujeitos entrevistados afirmam que, na implementação de um Projeto
transversal de leitura, é fulcral reforçar uma intervenção diferenciada, por forma a promover a
diferença do que é habitual, dinamizando “uma abordagem pedagógica mais dinâmica e interativa,
na sala de aula, dando mais realce à participação e produtividade de cada aluno” (Diretora, Ref. 18).
Os docentes reiteram que é preciso repensar procedimentos e atitudes, considerando a
transversalidade da Língua Materna e a formação para a cidadania. Estas perceções convergem com
estudos referidos por vários autores, como Figueiredo e Palhares (2005), Rodrigues e Duarte (2011) e
Sá (2012), entre outros, que valorizam a transversalidade curricular. Além disso, o discurso dos
professores permite entrever que, quando se perspetiva a conceção de um Projeto transdisciplinar
em equipa, é determinante equacionar a capacidade de interação e empatia do professor
coadjuvante, em relação a alunos e professores, a que acresce a flexibilidade em se adaptar ao
contexto, promovendo a mudança de um ensino compartimentado, para “uma perspetiva de ensino
e aprendizagem pluridisciplinar e transversal” (Prof. PAC1, Ref.5), potenciadora de aprendizagens
significativas.

4 Conclusões

A investigação qualitativa, relativamente à implementação do Projeto Aprender a Crescer, em


monodocência coadjuvada, evidenciou que, na comunidade educativa em análise, o Projeto foi
percecionado, pelos professores do ensino básico, como essencial para superar as dificuldades
transversais de Língua dos alunos do 1º ciclo, em especial de leitura, numa perspetiva
interdisciplinar. Em primeiro lugar, na fundamentação do Projeto referem-se, como causas e fatores,
as dificuldades de compreensão leitora dos alunos, de textos e enunciados, nas disciplinas de
Português e Matemática, afetando o sucesso escolar dos alunos. Assim, os objetivos do Projeto
apontam rumos de melhoria, através de uma ação conjunta, centrada no desenvolvimento da
literacia dos alunos e das suas aprendizagens, bem como no aperfeiçoamento do profissionalismo
docente, em práticas de monodocência coadjuvada, enquanto oportunidade de autoformação. Em
segundo lugar, no que concerne aos fatores potenciadores de constrangimento e melhoria, ressalta,
quanto aos alunos, o problema do vocabulário específico das disciplinas em análise. Apesar dos
progressos alcançados, alguns alunos ainda não dominam o vocabulário essencial, que lhes facultaria

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uma compreensão leitora mais eficaz, de enunciados e textos. Todavia, é de assinalar um ensino
centralizado nos alunos, que revelam mais motivação e empenho, nas tarefas propostas, no âmbito
do Projeto. Em interligação, os professores demonstram mais consciencialização, relativamente à
aplicação de estratégias de leitura, transversais e diversificadas, planificadas e aferidas em trabalho
colaborativo. Em contraste, foi assinalada alguma resistência inicial, à abertura da sala de aula a um
trabalho de pares reflexivo, alicerçado num percurso supervisivo de monodocência coadjuvada.
Como nota final, importa referir que, no decurso da análise qualitativa, aquando da procura das 100
“Palavras mais frequentes”, no software webQDA, surgiu, em primeiro lugar, a palavra “Projeto”,
com 279 repetições. Neste contexto, o referente é o Projeto transdisciplinar Aprender a Crescer, o
qual foi planeado e concretizado, enquanto estratégia de ensino e aprendizagem, a fim de
aperfeiçoar o desenvolvimento transversal da leitura, nas áreas curriculares de Português e
Matemática. Há ainda outras palavras que predominam, como “trabalho colaborativo” e “sucesso
educativo”. A primeira traduz as preocupações dos professores, no seu trabalho profissional, a
propósito da concretização do Projeto e da efetivação da monodocência coadjuvada. A segunda
evidencia a preocupação constante, por parte de docentes e membros da Direção, com o sucesso
educativo dos alunos e a qualidade das aprendizagens, especificamente quanto à melhoria da
capacidade de compreensão da leitura, interligando duas disciplinas curriculares, Português e
Matemática. Não obstante não ser possível a generalização de resultados, face à natureza da
investigação qualitativa e, em especial, do próprio estudo, circunscrito a um único agrupamento de
escolas, fica a certeza de que a implementação do Projeto de leitura, a transversalidade curricular e a
monodocência coadjuvada, pedras basilares desta pesquisa, abriram possibilidades de novos
caminhos educativos, mais dinâmicos, inovadores e autónomos, essenciais à construção da
comunidade reflexiva e aprendente do agrupamento.

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733
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A pesquisa-ação no âmbito de práticas pedagógicas da Educação


Básica

1
Iolanda Mendonça
Maria de Fátima Gomes2
1
Universidade de Pernambuco,Brasil. iolanda.ms@hotmail.com
2
Universidade dePernambuco, Brasil. fatimamaria18@gmail.com

Resumo. O estudo aqui apresentado evidencia resultados de uma pesquisa-ação realizada no Mestrado em
Educação da Universidade de Pernambuco-Brasil, que teve como objetivo principal identificar formas de
vivência da interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Este
recorte evidencia a metodologia da pesquisa-ação. O presente estudo ancorou-se nas ideias de Dick (2003);
Silva (2009); Thiollent (2011); Richardson & Rodrigues (2013), entre outros. Esta investigação utilizou como
principal instrumento para a coleta de dados a técnica de grupo focal. Os resultados permitiram concluir
que a pesquisa-ação pode significar um processo de transformação de sentido ou de ressignificações do que
fazemos e pensamos. As ações desencadeadas no âmbito desta investigação possibilitaram às professoras sujeitos
desta pesquisa, adentrar num processo contínuo de revisão da própria prática na perspectiva da
interdisciplinaridade, o que lhes possibilitou o desenvolvimento de ações interdisciplinares que resultaram
na melhoria da qualidade da educação oferecida a estudantes dos anos iniciais da Educação Básica.
Palavras-chave: Pesquisa-ação; Interdisciplinaridade; Prática pedagógica.

Action research in the framework of pedagogical practices of Basic Education


Abstract. The study presented here evidences the results of an action research carried out in the Master's
Degree in Education of the University of Pernambuco-Brazil, whose main objective was to identify ways of
experiencing interdisciplinarity in the pedagogical practices of the initial years of Elementary Education. This
clipping evidences the action-research methodology. The present study was anchored in the ideas of Dick
(2003); Silva (2009); Thiollent (2011); Richardson & Rodrigues (2013), among others. This research used the
focal group technique as the main instrument for data collection. The results allowed us to conclude that
action research can mean a process of transformation of meaning or re-signification of what we do and
think. The actions triggered in this research enabled the teachers subject to this research to enter into a
continuous process of reviewing their own practice in the perspective of interdisciplinarity, which enabled
them to develop interdisciplinary actions that resulted in the improvement of the quality of the education
offered to students of the years Initials of Basic Education.
Keywords: Action research; Interdisciplinarity; Pedagogical practice.

1 Introdução

Este estudo focaliza a pesquisa-ação, evidenciando-a como um recurso metodológico de investigação


das práticas pedagógicas de professoras dos anos iniciais da Educação Básica. Reitera-se que o viés
aqui apresentado enfatiza a importância desse tipo de metodologia para a melhoria das práticas
pedagógicas. Nesse sentido, buscou-se identificar conjuntamente soluções alternativas para
situações problemáticas da prática pedagógica das professoras investigadas.
A opção pela pesquisa-ação neste estudo deve-se, entre outras coisas, ao fato de esta forma
metodológica permitir um processo de construção coletiva entre pesquisador e participantes. A esse
respeito refere Thiollent (2011: 20) que a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa “[...] realizada em
estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os

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pesquisadores e os participantes representativos da situação e do problema estão envolvidos de


modo cooperativo ou participativo”. Foi, portanto, nessa perspectiva do que afirma Thiollent, que
nesta pesquisa as ações decorreram coletivamente de modo que as professoras, supervisoras e a
técnica da secretaria de educação, sujeitos desta pesquisa, se engajaram num processo coletivo para
a elaboração de planos coletivos de trabalho, fundamentado na concepção de interdisciplinaridade
histórico-dialética (Silva, 2009), sob o aspecto enquanto postura ou opção de mundo. Esses planos
coletivos de trabalho objetivaram trabalhar temáticas sociais de interesses dos estudantes e
situações de protagonismo que evidenciassem a ação ativa do sujeito.
Com relação à organização textual deste trabalho, é de referir que para além desta breve introdução
este artigo está subdividido em quatro partes. Na primeira parte intitulada, para uma
conceptualização da pesquisa-ação, apresentam-se conceitos sobre a pesquisa-ação. Seguidamente,
apresenta-se a metodologia da pesquisa-ação utilizada no âmbito da investigação e descrevem-se as
intervenções realizadas no âmbito da pesquisa-ação nas práticas pedagógicas dos anos iniciais da
Educação Básica. Por fim, apresentam-se as conclusões a que se chegou com a realização desta a
pesquisa-ação.

2 Para uma conceptualização da pesquisa-ação

A pesquisa-ação pode ser considerada como um trabalho científico que possui dois objetivos, a ação
e a pesquisa. “A ação para produzir mudanças em alguma comunidade, organização ou programa.
Pesquisa para aumentar o entendimento por parte do pesquisador ou cliente, ou ambos (e
comumente alguma comunidade mais abrangente)” (Dick, 2003: 10). Assim, considera-se que a
pesquisa-ação é uma forma de pesquisa que tem por objetivo propor transformações e elevar o nível
de compreensão dos sujeitos participantes sobre o objeto que se investiga.
Ainda de acordo com Dick (2003), a pesquisa-ação pode ser considerada como cíclica, pois apresenta
a ação, a intenção e a revisão como elementos que fundamentam sua metodologia. A formação
cíclica da metodologia da pesquisa-ação exige a intenção procedente à ação. Logo depois da ação é o
momento de fazer a revisão, a crítica sobre o que foi realizado. “O ciclo da pesquisa-ação, consiste no
mínimo de intenção de planejar antes de agir, e depois revisar ou criticar” (Dick, 2003: 11).
Por outro lado, mas ainda a propósito da pesquisa-ação, Barbier (2002), refere que pesquisa-ação é
uma ação estruturada que cientifiza a prática a partir de princípios éticos. Ou seja, o pesquisador ao
vivenciar a pesquisa-ação utiliza uma ação concreta, a qual permite que a prática seja estruturada
em elementos da ciência, desfazendo um pragmatismo relacionado ao conhecimento empírico. É
relevante apontar que na pesquisa-ação, a estrutura e as ações que devem ser elaboradas pelo
princípio da coletividade. Isso implica um processo de interação no qual se inferem como resultados,
mudanças no sujeito participante sobre si e sobre o mundo, pois como aponta Barbier (2002: 67), a
pesquisa ação é “uma arte de rigor clínico, desenvolvida coletivamente, com o objetivo de uma
adaptação relativa de si ao mundo o que implica uma mudança do sujeito, indivíduo ou grupo com
relação à sua realidade”.
Nesse sentido, é preciso considerar alguns aspectos importantes durante o processo de investigação
respaldado na pesquisa-ação. É preciso evitar que durante o processo haja muita participação sem
ter relação com o conhecimento científico. É necessário manter algumas exigências relativas ao
conhecimento “associadas ao ideal científico, que, contrariamente a certa opinião corrente, não se
confunda com o positivismo ou qualquer outra circustância ideológica da ciência” (Thiollent, 2011:
26).
Noutra perspectiva, Franco (2005) refere que a pesquisa-ação pode ser compreendida sob a ótica de
três conceituações, a saber: pesquisa-ação colaborativa, quando os sujeitos da pesquisa solicitam a

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transformação de um problema e o pesquisador tem o papel de cientificizar o processo de mudança


solicitado pelos sujeitos; pesquisa-ação crítica, quando a transformação é definida pelos sujeitos e
pelo pesquisador, numa relação coletiva, sustentada pela reflexão crítica, com vistas à emancipação
dos sujeitos e a pesquisa-ação estratégica, onde a transformação é previamente planejada pelo
pesquisador, sem ter a participação dos sujeitos na tomada de decisões e das ações propostas. O
pesquisador nesse tipo de pesquisa acompanha as ações realizadas pelos sujeitos e avalia os efeitos
destas.
Para Lewin, apud Mailhiot (1970: 46), a pesquisa-ação deve ser realizada a partir de uma situação
social concreta a modificar. Ela deve se inspirar nas transformações e nos elementos novos que
surgem durante o processo e sob a influência da pesquisa. Nessa ótica, “[...] os fenômenos sociais
não podem ser observados do exterior, do mesmo modo que não podem ser observados em
laboratório, de modo estático”. O pesquisador que se propõe a utilizar a pesquisa-ação deve assumir
dois papéis complementares, ou seja, pesquisador e participante do grupo. Além disso, o
pesquisador só pode propor uma modificação na dinâmica de um grupo, a partir do consentimento
explícito dos participantes.
Uma síntese conclusiva dessas ideias veiculadas a propósito da pesquisa-ação, permite afirmar que
esse tipo de pesquisa propicia uma transformação ou ressignificação das ações desenvolvidas pelos
sujeitos. Exige tomada de decisão coletiva, inserção do pesquisador no grupo de pesquisa e um rigor
científico para a realização das ações propostas.

3 A metodologia da pesquisa-ação utilizada no âmbito desta investigação: o diagnóstico, a


ação, a reflexão e a avaliação

Considerando a metodologia da pesquisa-ação, Lewin (1946) destaca algumas etapas para o


desenvolvimento deste tipo de pesquisa, a saber: o diagnóstico, a ação, a reflexão e a avaliação.
Sobre essas etapas Richardson & Rodrigues (2013), apresentam o seguinte detalhamento:
O diagnóstico: esta é uma etapa fundamental na pesquisa, na qual implica observações por parte do
pesquisador, delimitando aspectos teóricos iniciais acerca da possibilidade de produção do
conhecimento e a percepção do grupo de reflexão, (Richardson & Rodrigues, 2013). Com base nessa
exposição, destaca-se que nessa fase procurou-se por meio da técnica de grupo focal, estabelecer
uma interação com os sujeitos participantes, tendo por objetivo diagnosticar se as professoras
vivenciavam a interdisciplinaridade em suas práticas pedagógicas. Para isso, identificou-se uma
problematização sobre a vivência da interdisciplinaridade referente às práticas pedagógicas das
professoras investigadas, a qual permitiu-nos compreender que as professoras já tinham vivências
pedagógicas interdisciplinares, pois o município em que esta pesquisa foi realizada adotava uma
proposta de planejamento que contemplava a temática em questão. Para diagnosticar essa vivência,
procurou-se fazer observações de caráter participante, in loco, com o objetivo de conhecer como a
interdisciplinaridade estava presente na prática pedagógica das professoras e de que maneira a era
vivenciada. Foi com base nesses elementos que se realizou o diagnóstico, primeira etapa da
metodologia da pesquisa-ação.
A ação: nesta etapa é necessário analisar diversas possibilidades de ações que podem contribuir para
a solução do problema, pois na pesquisa-ação, o papel fundamental do pesquisador ou da equipe de
pesquisa é ajudar o grupo no processo de pensar, agir, refletir e avaliar (Richardson & Rodrigues,
2013). Tomando por base estas proposições, é de referir que nessa fase procurou-se discutir com o
grupo soluções para melhorar a vivência da interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas. Para isso,
foi proposto às quatro professoras sujeitos da pesquisa, que apresentassem no grupo necessidades

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práticas para a melhoria das práticas pedagógicas na perspectiva da interdisciplinaridade. Assim, as


professoras expuseram que suas maiores necessidades consistiam na construção de uma proposta
pedagógica que viesse a dirimir algumas situações problemáticas que aconteciam nas salas de aula.
Ou seja, elas almejavam construir uma proposta pedagógica que ajudasse a melhorar a participação
dos estudantes, o engajamento, a fala, o comportamento, a aprendizagem e a própria relação entre
estudantes e professores. Foi, portanto, com base nessas necessidades que as referidas professoras
se propuseram a elaborar coletivamente no âmbito do grupo focal, planos coletivos de trabalho
orientados pelo primeiro aspecto da concepção histórico-dialética da interdisciplinaridade, ou seja,
da vivência desta enquanto postura ou opção de mundo (Silva, 2009).
A avaliação: nessa etapa é necessário realizar análises, interpretações e conclusões, avaliando o
cumprimento dos objetivos formulados e das ações que foram executadas, (Richardson & Rodrigues,
2013). Nessa perspectiva, se realizou uma avaliação acerca de todo processo, bem como das ações
intervencionistas. Quanto à avaliação do processo, buscou-se apontar, por meio do grupo focal, os
acertos e desacertos, a percepção e as expectativas das professoras acerca das discussões do objeto
teórico desta pesquisa, a interdisciplinaridade. Ou seja, foi proposto às professoras que falassem
sobre as percepções que tinham acerca da interdisciplinaridade e refletissem sobre formas de
construir uma prática pedagógica nessa perspectiva. Foi também solicitado às professoras que
relatassem no grupo, o aprendizado que tiveram com as discussões realizadas a propósito do tema
proposto.
Quanto à avaliação das ações, procurou-se observar, in loco, como as atividades referentes aos
planos de trabalhos foram aplicadas no âmbito das práticas pedagógicas. Para isso, realizou-se uma
entrevista com as professoras, com o objetivo de conhecer os resultados adquiridos com a vivência
das atividades. Procurou-se ainda, identificar junto às professoras, a participação dos estudantes, a
construção da aprendizagem e a relação com os outros estudantes por meio do protagonismo e de
ações ativas, elementos importantes para a vivência de uma prática pedagógica interdisciplinar que
tenha por princípio uma postura ou opção de mundo.
A reflexão: a etapa da reflexão é especialmente no momento de avaliar o aprendizado dos
participantes e os resultados teóricos (Richardson & Rodrigues, 2013). Nessa perspectiva, se
procurou avaliar com o grupo os resultados sobre a vivência do aspecto enquanto postura ou opção
de mundo da concepção histórico-dialética da interdisciplinaridade. Indagou-se às professoras se o
conhecimento construído com base nessa experiência permitiu atingir os objetivos delimitados.
Também se procurou perceber se as professoras compreenderam a vivência do objeto sob o aspecto
enquanto postura ou opção de mundo, o qual consiste no estudo de elementos sociais no processo
de ensino-aprendizagem que incitem a criatividade e a ação ativa dos estudantes em todo o processo
pedagógico e proponha situações que não se limitem apenas a trabalhar no âmbito das práticas
pedagógicas saberes puramente disciplinares e atividades que não levam em conta a historicidade
dos estudantes.

4 A pesquisa-ação nas práticas pedagógicas dos iniciais do Ensino Fundamental da


Educação Básica

A intervenção realizada no âmbito da pesquisa-ação nesta investigação foi planejada numa das
sessões com o grupo focal e teve como objetivo a elaboração de planos coletivos de trabalho, os
quais surgiram de dificuldades práticas enfrentadas pelas professoras referentes à vivência da
interdisciplinaridade. A construção destes planos baseou-se na concepção de interdisciplinaridade
histórico-dialética (Silva, 2009). Dessa forma, os planos coletivos de trabalho foram construídos com

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base no aspecto enquanto postura ou opção de mundo, aspecto este já mencionado no âmbito deste
trabalho. Os planos coletivos contemplaram temáticas que emergiram de aspectos sociais, pois a
vivência da interdisciplinaridade sob este aspecto exige a construção de um trabalho por parte dos
professores que aprofunde a compreensão dos fatos socais.
As atividades dos planos coletivos procuraram aprofundar a realidade social dos estudantes, com
base em temáticas da realidade escolar. Em outras palavras, a elaboração de cada plano de trabalho
buscou tratar temáticas sociais que estavam associadas à vida escolar, a aspectos que implicavam
uma relação com a comunidade educativa e com os espaços onde os estudantes estavam inseridos.
As temáticas vivenciadas nas ações intervencionistas foram: a violência escolar, a indisciplina
escolar, problemas matemáticos envolvendo dinheiro e a oralidade. Refere-se que os planos
coletivos que foram realizados como uma das ações no âmbito da pesquisa-ção, permitiram-nos
vivenciar de forma coletiva e participativa novas possibilidades para a vivência da
interdisciplinaridade.
A participação coletiva dos sujeitos na resolução do problema é uma das proposições detalhada por
Thiollent (2011), para a realização da pesquisa-ação. Neste caso, a tomada de decisão para a escolha
das temáticas que estavam associadas à vida escolar dos estudantes e aos aspectos que implicaram
numa relação com a comunidade educativa e com os espaços onde os estudantes estavam inseridos,
ocorreu de modo participativo e coletivo, permitindo às professoras dialogar e propor elementos que
subsidiaram as atividades propostas.
Reitera-se que os planos coletivos de trabalho partiram do princípio da coletividade e da ação
conjunta, uma vez que na pesquisa-ação a estrutura e as ações devem ser elaboradas, partindo do
princípio da coletividade (Barbier, 2002). Nessa ótica, para que ocorresse a elaboração dos planos
coletivos, houve um processo de interação entre as professoras, em que estas puderam pensar nos
aspectos da realidade social dos estudantes, pois como refere Barbier (2002: 67), a pesquisa-ação é
“[...] desenvolvida coletivamente, com o objetivo de uma adaptação relativa de si ao mundo, o que
implica uma mudança do sujeito, indivíduo ou grupo com relação à sua realidade”.
Relata-se ainda que os planos coletivos foram inseridos na segunda etapa da pesquisa-ação. Pelo que
refere Richardson & Rodrigues (2013), na segunda etapa, a da ação, é necessário analisar diversas
possibilidades que podem contribuir para a solução do problema. Como já foi anteriormente
referido, as professoras expuseram que suas maiores necessidades eram de propostas pedagógicas
que viessem a dirimir algumas situações problemáticas que aconteciam nas salas de aula. Ou seja,
propostas pedagógicas que ajudassem a melhorar a participação dos estudantes, o engajamento, a
fala, o comportamento, a aprendizagem e a própria relação entre estudantes e professores. Foi,
portanto, a partir dessas necessidades que as professoras se propuseram a elaborar coletivamente e
de modo participativo os planos coletivos de trabalho.
Nessa ótica, o plano de trabalho que abordou a temática da violência escolar foi vivenciado por
estudantes de uma turma do 3º ano do Ensino Fundamental da Educação Básica. A escolha dessa
temática se deu pelo fato dos estudantes estarem imersos “num ambiente familiar violento e isso
reflete dentro da sala de aula com brigas e discussões constantes, sem a participação deles na
realização das atividades” (Professora 4).
O objetivo estabelecido para a vivência da temática era o de sensibilizar os estudantes sobre a
disciplina e fortalecer a relação família e escola, tendo em vista a minimização da indisciplina escolar.
Para isso, utilizaram-se atividades de contação de história, vídeos educativos, oficinas e apresentação
teatral com a participação dos pais e da comunidade educativa.

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Tabela 1. Plano de Trabalho – Diga não a violência.

Objetivos Atividades Procedimentos


metodológicos
Sensibilizar os Exibição de vídeos educativos Encenação teatral com
alunos sobre a Contação de histórias a participação da
disciplina, através Dramatização família.
de vídeos Família na escola (realizar uma Apresentação de vídeos
educativos. encenação teatral com a educativos,
Trabalhar temas participação da família). relacionados à
relacionados à indisciplina escolar.
indisciplina escolar, Contar histórias com
através de contação temáticas relacionadas
de histórias. à indisciplina escolar.
Fortalecer a relação
família e escola,
tendo em vista a
minimização da
indisciplina escolar,

Percebe-se que a vivência da interdisciplinaridade sob o aspecto enquanto postura ou opção de


mundo da concepção histórico dialética, permitiu a ação ativa do sujeito e o aprofundamento dos
fatos sociais. No que toca a ação ativa do sujeito, esta se deu na realização das atividades propostas,
onde os estudantes foram imersos em situações de protagonismo, dramatizando histórias infantis. O
aprofundamento dos fatos sociais ocorreu na abordagem da temática da violência escolar.
O segundo plano coletivo de trabalho relacionado à temática da indisciplina escolar foi vivenciado
por estudantes de uma turma do 1º ano do Ensino Fundamental. A escolha dessa temática para a
vivência da interdisciplinaridade se deu, porque segundo relato das professoras, “os alunos são
desobedientes, não têm concentração durante as aulas, às vezes gostam de bater no coleguinha e
adoram brincar. Tudo para eles é brincadeira. Isso é resultado da falta de acompanhamento dos pais,
que em casa deixam eles livres” (Professora 3). Conforme a professora 3 relata, os estudantes da
turma do 1º ano eram indisciplinados, gostavam de brincar e isso gerava uma falta de concentração
para a realização das atividades escolares. Esses fatores motivaram a elaboração do plano de
trabalho, na perspectiva de aprender brincando, pois como se constata na fala da Professora 3: “os
alunos gostam de brincar. Tudo pra eles é brincadeira”.
Os objetivos pretendidos com a vivência dessa ação intervencionista eram desenvolver a
concentração e disciplina, resgatar a cultura do brincar e trabalhar diversos gêneros temáticos. Para
isso, realizaram-se atividades como jogos (dado silábico, caça-palavras, boliche, quebra-cabeça,
bingo), cantigas de roda e a hora do cinema. Estas atividades desenvolvidas no âmbito das ações
intervencionistas foram realizadas pelos estudantes, estimulando neles uma ação ativa, a diversidade
e a criatividade, pois estes estavam imersos em situações concretas, estabelecendo a cooperação, a
autonomia ampliando sua percepção sobre a realidade e construindo novos conhecimentos.

Tabela 2. Plano de Trabalho – Aprender brincando.

Objetivos Atividades Procedimentos


metodológicos
Desenvolver a Jogos Realização de jogos.
concentração e Cantigas de roda Reescrita e vivência das
disciplina; A hora do cinema cantigas de roda.
Resgatar a cultura Apresentação do
do brincar, através cinema pelas crianças

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das cantigas de uma vez por semana.


roda;
Trabalhar diversos
gêneros temáticos,
através do cinema.

Neste plano coletivo de trabalho, pode-se perceber que a vivência do aspecto enquanto postura ou
opção de mundo da concepção de interdisciplinaridade-histórico dialética permitiu a ação ativa do
sujeito e o aprofundamento dos fatos sociais. A ação ativa do sujeito ocorreu quando os estudantes
foram imersos em situações concretas, estabelecendo a cooperação, a autonomia, através das
brincadeiras ampliando sua percepção sobre a realidade e construindo novos conhecimentos. Já o
aprofundamento dos fatos sociais se deu a partir da temática da indisciplina escolar vividos pelos
estudantes.
O plano coletivo de trabalho que teve por temática, problemas matemáticos envolvendo dinheiro,
foi vivenciado por outra turma do 3º ano do Ensino Fundamental. A escolha para essa temática
refere a professora da turma que se deu em função dos estudantes “apresentar (sic) muita
dificuldade em operar situações que envolvessem o sistema monetário” (Professora 1). E isso
segundo ela, “atrapalha a construção do conhecimento, porque quando os alunos acompanham os
pais para o supermercado ou para à feira livre não sabem efetuar as operações envolvendo o valor
dos alimentos, para fazer o pagamento, somar, subtrair” (Professora 1).
Com base no fragmento do discurso da Professora 1, observa-se que a escolha da temática implica
aspectos de âmbito social dos estudantes, o qual compromete a construção do conhecimento e a sua
atuação na própria realidade. Daí a necessidade de vivenciar a interdisciplinaridade histórico-
dialética enquanto postura ou opção de mundo no âmbito de sua prática pedagógica. Para isso, se
buscou desenvolver atividades que permitissem os estudantes a resolver problemas matemáticos,
relacionados à compra e venda de mercadorias; levantar preços de produtos, em supermercados,
padarias e feira livre. Para, além disto, os estudantes atuaram na Barraca do Zé, estratégia criada
pela professora para simular situações de compra e venda. Na estratégia utilizada, os alunos foram
motivados a participar em situações concretas que lhes permitiram total autonomia para resolver as
situações desafiadoras no que concernia à compra e venda.

Tabela 3. Plano de Trabalho – Barraca do Zé.

Objetivos Atividades Procedimentos


metodológicos
Resolver problemas Resolução de problemas A barraca do Zé
matemáticos, matemáticos, através de situações Visita a supermercados
relacionados à relacionadas à compra e venda. e padarias.
compra e venda de Realização de levantamentos de
mercadorias. preços em supermercado, padarias,
Levantar preços de etc.
mercadorias, em Construção de tabelas e gráficos de
supermercados, produtos mais e menos vendidos.
padarias, etc.
Aprender a ler e
interpretar gráficos
e tabelas.

Neste plano coletivo de trabalho, pode-se perceber que a vivência do aspecto enquanto postura ou
opção de mundo da concepção de interdisciplinaridade histórico- dialética permitiu a ação ativa do
sujeito e o aprofundamento dos fatos sociais. A ação ativa do sujeito ocorreu quando os estudantes

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

foram motivados a participar em situações concretas que lhes permitiram total autonomia para
resolver as situações desafiadoras no que concernia à compra e venda. O aprofundamento dos fatos
sociais se deu em operar valores em situações concretas do dia a dia.
O último plano coletivo de trabalho, fundamentado na concepção de interdisciplinaridade histórico-
dialética, abordou a temática da oralidade e foi vivenciado na turma do 2º ano do Ensino
Fundamental da Educação Básica. O motivo para a escolha dessa temática, conforme relatou a
Professora 2, se deu porque “os alunos apresentam muita dificuldade em se expressar, têm
vergonha de falar para outras pessoas ouvirem e isso dificulta a relação com os colegas da turma e
comigo mesma”.
Como pode perceber-se, a escolha da oralidade como temática para embasar as ações do plano de
trabalho, teve embasamento nas dificuldades apresentadas pelos estudantes no que toca sua
socialização e comunicação entre os colegas e a professora. Para trabalhar a interdisciplinaridade no
aspecto enquanto postura ou opção de mundo, levando em conta a temática escolhida, foram
vivenciadas no âmbito das práticas pedagógicas atividades que viessem a dirimir a problemática da
oralidade entre os estudantes. As atividades realizadas objetivaram desenvolver a capacidade de
comunicação oral e o estímulo em proferir opiniões oralmente. Para isso, a professora promoveu
seminários, debates e dramatizações com os estudantes, onde estes participaram eficazmente da
proposta desenvolvida.

Tabela 4. Plano de Trabalho – Trabalhando a oralidade.

Objetivos Atividades Procedimentos


metodológicos
Desenvolver a Emitir opiniões oralmente através da Dramatizações
capacidade de leitura de imagens. relacionadas a diversas
comunicação oral. Dramatização. temáticas.
Programa de auditório. Promoção semanal de
Leitura de imagens. um programa de
auditório.
Leitura de imagens
sugestivas de temáticas
diversas.

Neste plano coletivo de trabalho, pode-se perceber que a vivência do aspecto enquanto postura ou
opção de mundo da concepção de interdisciplinaridade-histórico dialética permitiu a ação ativa do
sujeito e o aprofundamento dos fatos sociais. A ação ativa do sujeito ocorreu quando os estudantes
foram engajados a participar de situações dialógicas que lhes permitiram expressar-se e ouvir o
outro, situações desafiadoras como o debate, seminários e a dramatização. O aprofundamento dos
fatos sociais se deu na importância da comunicação e do diálogo entre as pessoas.
Em suma, é de referir que essas atividades de intervenção desenvolvidas sob a perspectiva da
concepção histórico-dialética enquanto postura ou opção de mundo, possibilitaram aos estudantes
uma percepção do contexto social que os cerca, estimulando-lhes e os inserindo em situações de
protagonismo.
As proposições acerca dos resultados com base nas ações intervencioncistas foram percebidas
durante a observação participante e na avaliação, terceira etapa para a realização da pesquisa-ação,
onde é necessário realizar análises, interpretações e conclusões, avaliando o cumprimento dos
objetivos formulados e das ações que foram executadas, (Richardson & Rodrigues, 2013). Para
realizar a avaliação quanto às ações, fez-se uma entrevista semiestruturada para verificar as
atividades vivenciadas no âmbito da interdisciplinaridade histórico-dialética sob o aspecto enquanto

741
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

postura ou opção de mundo. Conforme foi anteriormente referido, promoveu-se um diálogo com as
professoras, com a intenção de conhecer os resultados adquiridos com a vivência das atividades.
Ao entrevistar as professoras para identificar a participação dos estudantes e ação ativa quanto à
construção da aprendizagem relativa aos objetivos dos planos coletivos de trabalho, a Professora 1
relatou que “os alunos estavam motivados a participar da Barraca do Zé. Percebi que o fato deles
operarem em situações concretas facilitou a construção da aprendizagem sobre as situações
problemáticas Percebi também que quando tinha algum coleguinha que tinha dificuldade, os outros
que sabiam, ajudavam dando dicas pra ajudá-los. Cada um seguiu caminhos diferentes para resolver
as situações de compra e venda” (Professora 1).
Já a Professora 2 afirmou: “meus alunos se sentiram bem entrosados nas atividades que realizei. Nas
leituras de imagens e nas rodas de conversa eles conversavam entre si. Houve ajuda para que
expusessem na oralidade as imagens que entreguei. As atividades em grupo e as dramatizações
facilitaram que cada um desenvolvesse a oralidade ao seu tempo, do seu jeito. Foi muito proveitoso”
(Professora 2).
A Professora 3 relatou: “meus alunos melhoraram a disciplina. Nas cantigas de roda e nas
brincadeiras que realizei, deu pra notar o entrosamento, a atenção, a escuta e a ajuda aos
coleguinhas. Sempre tive dificuldade pra (sic) que meus alunos parassem pra(sic) prestar atenção na
aula, eles eram muito desconcentrados, mas quando realizei as brincadeiras e as cantigas de roda,
por exemplo, eles se engajaram e realizaram tudo direitinho” (Professora 3).
Por último a Professora 4 afirmou: “minha turma teve dificuldades pra parar e participar das
atividades propostas. Mas, depois que fomos conversando sobre a temática da violência escolar e os
seus danos eles começaram a participar melhor das atividades. Pararam para ouvir melhor as
contações de histórias e conseguiram dramatizar uma história para a apresentação que teve com as
famílias. No limite deles, eles avançaram” (Professora 4).
A Supervisora 2 ainda destacou que quando estava conversando com alguns estudantes eles
disseram que “foi bem melhor compreender situações de compra e venda quando tia trouxe a
Barraca do Zé. A gente ajudou os colegas e entendemos melhor como comprar e vender”.
Portanto, com bases nesses relatos sobre a vivência da interdisciplinaridade enquanto postura ou
opção de mundo em que foram destacadas ações ativas dos sujeitos e o aprofundamneto dos fatos
sociais, bem como no depoimento das professoras e da supervisora sobre os resultados adquiridos
quanto à aprendizagem construída, a criatividade e o protagonismo dos estudantes, infere-se que os
planos coletivos serviram como um suporte para a criação de novas possibilidades quanto à vivência
da interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas. O fato de inserir nas propostas desenvolvidas
elementos da realidade dos estudantes e aspectos que incentivassem o seu protagonismo e ações
ativas, possibilitou a experimentação de novos construtos no âmbito das práticas pedagógicas das
professoras investigadas, ou em outras palavras, representaram neste estudo, “[...] formas
metodológicas conflitantes e antagônicas de apreensão da realidade e de construção do
conhecimento [...]” (Silva, 2009: 87).

5 Conclusões

Os resultados permitiram concluir que a pesquisa-ação por ser um processo de transformação de


sentido ou de ressignificações do que fazemos e pensamos, permitiu às professoras sujeitos desta
pesquisa, adentrar num processo contínuo de revisão da própria prática na perspectiva da
interdisciplinaridade, o que lhes possibilitou o desenvolvimento de ações de viés interdisciplinar no
âmbito da prática docente que resultaram na melhoria da qualidade da educação oferecida aos
estudantes dos iniciais da Educação Básica. A utilização da pesquisa-ação na investigação realizada

742
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

possibilitou às professoras condições de investigar a própria prática de forma crítica e reflexiva, uma
vez que a pesquisa-ação propõe transformações e eleva o nível de compreensão dos sujeitos sobre o
objeto que se investiga (Dick, 2003).
Na qualidade de investigadoras da própria prática, as professoras tiveram voz ativa na elaboração de
novas hipóteses para a realização de práticas pedagógicas na perspectiva da interdisciplinaridade.
Para além de estarem engajadas num processo de reflexão nas sessões com o grupo focal, estavam
também dispostas a aprender e compreender a relação dialética entre sujeito e objeto, teoria e
prática.
Conclui-se ainda, que a pesquisa-ação é relativamente importante para estudos qualitativos em
educação, uma vez que permite ao pesquisador tornar-se participante do grupo de pesquisa
mediado por relações interativas. Para além disso, permite criar junto com o grupo, novas
possibilidades para a resolução de situações problemáticas.
Relativamente à utilização da pesquisa-ação nesta pesquisa, é de referir que esta assumiu grande
relevância e contribuiu sobremaneira para a melhoria das práticas pedagógicas das professoras, pois
permitiu reflexões críticas sobre situações problemáticas da prática pedagógica e possibiliotu o
desenvolvimento de ações fundamentadas no princípio da coletividade e da emacipação dos sujeitos.
Para, além disso, pode-se compreender que a utilização dessa metodologia de pesquisa, assumiu um
caráter de Pesquisa-ação crítica (Franco, 2005), uma vez que a transformação foi definida pelos
sujeitos e pelo pesquisador, numa relação coletiva sustentada pela reflexão crítica, com vistas à
emancipação dos sujeitos.

Referências

Barbier, R. (2002). A pesquisa-ação. Brasília: Plano.

Dick, B. (2003). Como conduzir e relatar a pesquisa-ação. In: Richardson, R. J. Pesquisa-ação


Princípios e Métodos, João Pessoa: Editora Universitária/UFPB

Franco, M. A. S. (2005). Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, 31, 483-502.

Lewin, K. (1946). Action research and minority problems. Journal of Social Issues, 2, 34-36.

Mailhiot, G. B. (1970). Dynamique et genèse des groupes. Paris: Édition de l’Épi.

Richardson, R. J., & Rodrigues. L. A. R. (2013). Investigação e intervenção na gestão escolar.


Metodologia do Trabalho Científico. In: Curso de Especialização em Gestão e Avaliação da
Educação Pública, Módulo III, Recife.

Silva, M. F. G. (2009). Para uma ressignificação da interdisciplinaridade na gestão dos currículos em


Portugal e no Brasil. Portugal: Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Thiollent, M. (2011). Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Medición con WebQDA de la prueba piloto del uso de Digital


Storytelling en las Ingenierías de Educación Superior

Rafael Martin1, Juan Arias1, Manuel Traver1 y Ricardo Luengo2


1 Departamento de Ingeniería de Sistemas Informáticos y Telemáticos, Centro Universitario de Mérida,
Universidad de Extremadura, España. rmartin@unex.es; jarias@unex.es; mtraver@unex.es
2 Didáctica de las Ciencias Experimentales y Matemáticas. rluengo@unex.es

Resumen. En este artículo se detalla la experiencia desarrollada en una asignatura de educación superior,
Seguridad de la Información, basada en el diseño y creación por parte de los alumnos de un relato digital o
Digital Story sobre un concepto técnico de alto nivel de dificultad, para valorar la validez como técnica de las
nuevas formas de aprendizaje basado en el desarrollo de competencias. La investigación se basa en la
utilización de herramientas de análisis cualitativo como webQDA para la obtención de evidencias del proceso
de aprendizaje, analizando, categorizando y midiendo el índice incremental de conocimiento que los alumnos
adquieren durante todo el proceso de creación de los trabajos, innovando respectos a los estudios realizados
hasta el momento basados en rúbricas y cuestionarios de valoración entre los docentes y alumnos sobre el
uso de la técnica Digital Storytelling en las aulas. Se describe asimismo el marco de trabajo definido para llevar
a cabo las mediciones sobre la efectividad en el aprendizaje de determinadas técnicas y tecnologías en las
aulas, un entorno que elimina componentes exógenos e incide sobre la representación neutra del cono-
cimiento de los alumnos.
Palabras clave: Digital Storytelling; webQDA; análisis cualitativo; Teoría de Conceptos Nucleares (TCN).

Measurement with webQDA of learning variables in a pilot experiment when using Digital Storytelling in
Higher Education Studies of Engineering
Abstract. This article details the experience developed in a subject of higher education, Information Security,
based on the design and creation by students of a digital story about a hard to understand technical concept,
to assess a complete technique for the development of competencies. The research is based on the use of
the qualitative analysis tool webQDA to obtain evidence of the learning process, measuring the incremental
index of knowledge that students acquire during the process of creation of the works, without using the
standard rubrics or evaluation questionnaires on the technique. It also describes the framework de-fined to
carry out the measurements on the effectiveness in learning of other techniques in the classroom in an
environment that eliminates exogenous components and put emphasis on the neutral representation of
students' knowledge.
Keywords: Digital Storytelling; webQDA; qualitative research; Nuclear Concepts Theory (NCT).

1 Introducción
Mucho se ha investigado sobre la implantación de las nuevas tecnologías en las aulas en todos los
niveles, aunque en menor medida en la enseñanza universitaria, donde se asume mayor libertad de
docentes y alumnos a la hora de elegir el medio sobre los que estructurar la enseñanza-aprendizaje.
Sin embargo, el desarrollo del Espacio Europeo de Educación Superior y la correspondiente
armonización del aprendizaje por competencias han evidenciado una pobre implantación de modelos
de enseñanza que alineen el uso de las nuevas tecnologías y los procesos de aprendizaje (Youssef &
Dahmani, 2008). Digital Storytelling es una técnica idónea para alcanzar este objetivo, en la medida en
que los alumnos despliegan múltiples capacidades que se exhiben en un resultado final que muestra
la síntesis del aprendizaje en el tema desarrollado (Fasi, 2011). Nuestro objetivo con esta experiencia
es medir el nivel incremental de conocimiento que se adquiere con Digital Storytelling, detallando la
experiencia desarrollada en el aula de la asignatura Seguridad de la Información de grado universitario.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Se puede situar el inicio de DigitalStorytelling como concepto en los finales de la década de los ochenta
en California, cuando en el ámbito de las artes escénicas emergió como una forma de registrar las
obras de teatro y su difusión (Lambert, 2009). Si bien desde entonces, y a través del Centro de Digital
Storytelling, se han realizado estudios en diversos ámbitos: mejoras que aporta en el ámbito educativo,
implantación en las aulas, desarrollo de modelos de implantación, etc... (Robin, 2008), todos concluyen
que los beneficios de DigitalStorytelling en educación son amplios, máxime cuando se aborda el análisis
de un enfoque constructivista, en la medida en que ¨fomentan la resolución creativa de problemas
basados en la colaboración y la comunicación entre iguales¨ (Dakich, 2008). De modo que existe cierto
consenso en que Digital Storytelling es una herramienta que desarrolla en diferentes medidas diversas
competencias o capacidades (Barret, 2005):
- Reflexión o aprendizaje reflexivo
- Motivación
- Compromiso
- Competencia Tecnológica
- Colaboración
Profundizando aún más, (Robin, 2008), asegura que cuando los estudiantes realizan sus propios
Digital Stories ponen en juego las siguientes habilidades:
- Habilidad de investigación: buscando información relevante
- Habilidad de escritura, desarrollando el punto de vista y el script
- Habilidades organizativas, gestionando el proyecto, los tiempos y los recursos
- Habilidades tecnológicas
- Habilidades de presentación, diseñando cómo presentar las ideas a la audiencia
- Habilidades de entrevistador, buscando fuentes a las que entrevistar y las preguntas a
realizar
- Habilidades interpersonales, trabajando en un grupo y asignando roles individuales
- Habilidades de resolución de problemas, aprendiendo a tomar decisiones y superar
obstáculos en cualquier etapa del proyecto
- Habilidades de evaluación, adquiriendo experiencia en la crítica de su propio trabajo y de
los demás.
Existen numerosos estudios que avalan este extremo, como (Londoño-Monroy, 2013), (Villalustre
Martínez & Del Moral, 2013), (Kordaki & Psomos, 2015) (Malita & Martin, 2010) y otros muchos,
basando sus investigaciones en las encuestas de valoración o la evaluación de los trabajos mediante
rúbricas y determinando las competencias que desarrollan desde la perspectiva de los estudiantes y
de los profesores. Si bien lo anterior puede resultar hasta cierto punto evidente, puesto que, los
alumnos, al desarrollar un Digital Story, requieren desarrollar actividades de investigación, síntesis,
discusión, comunicación, reflexión, trabajo en grupo entre otras, es obvio que se precisa una mayor
investigación que aporte mayores evidencias del progreso del alumno de forma comparada y, más
concretamente en la educación superior, donde los estudios escasean y, cuando existen, suelen
enmarcarse en titulaciones afines a las letras (enseñanza de idiomas, formación de profesorado, etc..).
Nos proponemos, por tanto, abordarlo en titulaciones técnicas, donde incluso la denominación suele
provocar cierto recelo y resistencias para utilizar estas herramientas (Clarke & Adam, 2012). Es nuestro
objetivo profundizar en los medios que facilitan o vehiculan el aprendizaje por competencias en la
educación superior en España y por extensión en Europa, sin perder de vista el objetivo último, que es
la transmisión de conocimientos. En efecto, con la introducción de los títulos de Grado en la Eduación
Superior bajo el amplio abanico de la Comunidad Económica Europea y el proceso de Bolonia, son
muchas las innovaciones docentes que están teniendo lugar en cada una de las universidades
europeas, y no menos en las españolas. Este trabajo se enmarca dentro de este amplio espectro y
pretende medir si la introdución de Digital Storytelling en el proceso de enseñanza-aprendizaje en la

745
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

educación superior puede ser beneficioso para la mejora de la calidad docente y, en definitiva, para la
mejora en la adquisición de las competencias tanto específicas, generales y transversales que tiene
cada uno de los títulos. La experiencia que se describe a continuación se ha llevado a cabo en la
asignatura de Seguridad de la Información (Arias Masa, Ficha 12 de Seguridad , 2017) que se imparte
simultáneamente en el tercer curso de Grado en Ingeniería Informática en Tecnologías de la
Información (GIITI) y en el cuarto curso del Grado de Ingeniería Telemática (GIT) del Centro
Universitario de Mérida de la Universidad de Extremadura. Se trata de una con una distribución de 4,5
créditos teóricos, 1,5 prácticos y 0,3 de actividades de seguimiento, tutorías programadas o tutorías
“ECTS” (European Credit Transfer System). Estas últimas se corresponden con 3 horas presenciales
para cada grupo de trabajo formado, de los que se hablará más adelante. Aunque la proporción de
créditos asignados a la actividad ECTS es pequeña, sin embargo se debe advertir que esta cifra sólo se
corresponde con las sesiones presenciales de tutorías. En estas sesiones se realiza la propuesta de
trabajo a los diferentes grupos, el seguimiento de las actividades y la aclaración de las dudas que
surgen durante el desarrollo. No obstante, en el ámbito de nuestra experiencia, este tiempo presencial
se ha materializado elaborando un esquema de trabajo en grupo que coadyuve al desarrollo efectivo
de los trabajos, instruyendo acerca de cómo abordar proyectos de forma colaborativa completando el
Cuaderno de Equipo que se le suministró. La mayor parte del trabajo grupal e individual se realiza de
forma no-presencial, por lo que este documento es esencial para la evaluación por parte de los
profesores de la asignatura (Cuadrado Salinas, y otros, 2012).
Una enumeración de los contenidos que se imparten en dicha asignatura son los siguientes:
1. Módulo I. Principios de Seguridad/Introducción
2. Módulo II. Criptografía
a. Tema 3. Introducción a la Criptografía.
b. Tema 4. Criptografía de Clave Privada.
c. Tema 5. Criptografía de Clave Pública.
d. Tema 6. Funciones Resumen.
3. Módulo III. Seguridad en las Redes: Internet
De estos contenidos anteriormente expuestos, el tema que se ha abordado para el desarrollo de un
relato digital es “Cifrado por Bloques”, cuyos conceptos se imparten en el tema 4 denominado
“Criptografía de clave privada”. Cabe decir en este punto que, al contrario que en experiencias
precedentes, donde los alumnos deben seleccionar un tema sobre el que quieren expresar su punto
de vista con una gran carga emocional (Robin B. , 2006), en esta experiencia se les está imponiendo la
restricción del tema en cuestión; más aún, el tema pertenece al desarrollo curricular de la asignatura
y, por sus características, limita la expresión personal del alumno, hecho éste considerado clave en
numerosas investigaciones previas (Yuksel, 2011).

2 Objetivos
El objetivo fundamental de este estudio ha sido verificar si es posible y en qué medida existe aporte
significativo con la introducción del Digital Storytelling en educación superior para mejorar el proceso
de enseñanza-aprendizaje. Para ello, se ha realizado una prueba piloto en la citada asignatura de
Seguridad de la Información durante el curso 2016-17 en el primer semestre que ya ha concluido.
Conviene decir que en estos momentos se encuentra en marcha otra experiencia similar, con las
mejoras detectadas, en una nueva asignatura del segundo semestre. Actualmente, estamos revisando
todos los procesos realizados en la de asignatura de Seguridad de la Información y validando las
modificaciones que debemos hacer respecto a lo realizado para lograr una mayor constatación de las
hipótesis.
Metodología

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Nuestro interés en esta experiencia que se ha llevado a cabo era introducir el Digital Storytelling dentro
de las actividades ECTS de la asignatura Seguridad de la Información y medir el incremento del
conocimiento que se produce en el conjunto de los alumnos. Para ello, se ha seguido un diseño de
investigación mixto exploratorio (NV Ivankova, 2007), en el que la recolección, análisis y hallazgos se
proponen en una etapa cualitativa, para continuar con la interpretación del fenómeno a partir de la
etapa cuantitativa. Así mismo, se ha medido la progresión de los conocimientos de los alumnos acerca
del tema ¨Cifrado por Bloques¨ antes, durante y después del trabajo de creación del Digital Story, en
un espacio temporal de 4 meses. Esta medición de conocimiento se ha llevado a cabo de la siguiente
manera:
 Para evitar cualquier interacción del equipo investigador, la recolección de datos se ha
realizado a través de los textos introducidos por los alumnos como respuesta a una pregunta
abierta: “Comente todo lo que conozca de Cifrado de Bloque”. De esta manera el alumno es
libre de conectar las ideas y conceptos sin ningún tipo de restricción.
 Posteriormente, se ha realizado una codificación para registrar las palabras claves más
utilizadas: cifrado, división, bloque, algoritmo, concatenación, etc...
 Una vez codificados todos los textos en las tres etapas de medición, se ha analizado la
evolución en la riqueza de conceptos, aquellos más utilizados que evidencian una mejor
conceptualización del término ¨Cifrado por Bloque¨.
 Posteriormente se ha realizado un análisis de segundo nivel, donde se codifica la estructura de
la exposición: Definición, Características, Tipos, Algoritmos utilizados, etc... Con esta segunda
codificación se persigue ahondar en la estructura de conocimiento, esto es, comprobar que en
las diferentes fases, el alumno va consiguiendo complementar las ideas y asentarlas en una
estructura lógica del concepto.

Fig. 1. Fases de la realización del Digital Storytelling en Educación Superior

Hemos seguido el esquema de la Fig. 1, donde podemos ver los tres hitos ECTS, o sesiones presenciales
de alumnos y equipo docente en el aula, que se desarrollaron a lo largo del semestre. El primer hito
(ECTS 1), llamado Planificación, se ha desarrollado en la tercera semana del curso y, aunque los detalles
concretos se explican más adelante, resumidamente podemos decir que es donde se imparten todas
las instrucciones necesarias para la puesta en marcha de la actividad por parte de los alumnos, una
breve formación en el trabajo en equipo y en el diseño y creación de relatos digitales. La fase 2,
Monitorización (ECTS 2), tenía como objetivo verificar el estado de los trabajos hasta ese momento,
revisar los scripts o guiones, reorganizar objetivos si procede y, sobre todo, motivar al alumnado a
continuar en la búsqueda de la meta perseguida, comentando y debatiendo acerca de las dificultades
encontradas hasta ese momento. Finalmente, en el tercer hito (ECTS 3), que se ha realizado en la
penúltima semana del curso es donde se llevó a cabo la Validación y Acreditación del trabajo
desarrollado por los alumnos. En cada una de las fases hemos evaluado el conocimiento de los alumnos
respecto del tema de interés y con diferentes herramientas, tanto a través de análisis de similaridad

747
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con Redes Asociativas Pathfinder (Arias Masa, 2008), cuestionarios de satisfacción y mediante el
análisis cualitativo de las evaluaciones de pregunta abierta, objeto de este trabajo, con el objetivo final
de poder triangular los resultados obtenidos y verificar la validez de los mismos, en su caso. Hemos
definido las categorías más relevantes que han quedado reflejadas en ellas, que nos permitirán en
futuros trabajos representar gráficamente la evolución de las estructuras cognitivas de los alumnos
por la asociación de los conceptos, según la Teoría de los Conceptos Nucleares (Casas-García, Luengo-
González, & Godinho-Lopes , 2011)

3 Resultados
Se ha realizado un análisis cualitativo de los textos abiertos que los alumnos han redactado en las 3
sesiones o tutorías ECTS que el profesorado compartió con ellos, sin aviso previo, pues se intentaba
que emergieran los conceptos que tuvieran en ese momento sin estudio orientado y los relacionaran
en la forma en que estimaran, sin temor a una penalización en la calificación final. Este aspecto es
sumamente importante, pues la introducción de una evaluación clásica fijada con antelación
corrompería los resultados de forma sustancial y no permitiría extraer conclusiones acerca del trabajo
bajo investigación. De hecho, se proyectarán los resultados de nuestro análisis y las calificaciones
finales de los alumnos, de forma que se analice si la mejora obtenida en las tareas asociadas a Digital
Storytelling es de alguna manera transversal a todo el alumnado, independientemente de su
calificación global.

Fig. 2. Categorías de primer Nivel.

Para acometer este análisis, se ha realizado una categorización en dos niveles: en un primer nivel se
propone una estructura de contenidos adecuada a la pregunta ¨Comente todo lo que conozca de
Cifrado de Bloque¨, en el que se disponen las categorías observadas y coincidentes con una exposición
detallada del tema. En los textos, como es obviamente previsible, se observa una amplia gama de
expresiones y formas de redacción que nos han llevado a configurar las categorías que aparecen Fig. 2,
añadiendo características que eviten la equivalencia de expresiones incompletas o erróneas con otras
que los investigadores consideran correctas o completas. Por ejemplo, en la definición de cifrado de
bloque se muestran las diferencias entre definiciones del tipo (estudiante 10): ¨En el cifrado en bloque
se encripta el texto en claro primero estableciendo bloques y encriptando cada bloque por separado¨,
que se categoriza como Parcial, u otras como (estudiante 13) ¨El cifrado en bloque es una técnica de
cifrado que consiste en realizar la operación de cifrado de un texto de manera dividida, es decir
separando el mensaje a codificar en diferentes bloques de 64 o 128 bits, dependiendo del tamaño
elegido, a diferencia del cifrado en flujo que va cifrando bit a bit de manera continuada.¨ De esta forma
queremos ahondar en una estructura de categorías que refleje de manera más próxima los conceptos
que sustentan los escritos de los alumnos. Del mismo modo, se categorizan de forma distinta las
enumeraciones o listado de modos de aquellos otros que llevan aparejada una descripción del

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funcionamiento de los mismos, ofreciéndonos una visión mucho más próxima a las expresiones del
conocimiento asociado que ostentan los alumnos.
Por tanto, se han identificados y categorizado los textos que los alumnos han introducido y se ha
realizado un análisis en los 3 momentos del período de desarrollo de la Digital Storytelling. Conviene
destacar que, previamente a la primera tutoría, los alumnos no habían recibido instrucción alguna
acerca de Cifrado de Bloque, posteriormente se impartió la teoría completa antes de la segunda
reunión presencial y desarrollaron el trabajo completo de Digital Storytelling antes de su presentación
final en la tercera tutoría. Obviamente, la diferencia entre el primer test y el segundo debía ser
significativa, aunque la gran incógnita reside en las diferencias que se pudieran apreciar con el tercer
y definitivo test.
Tabla 1. Evolución de los conceptos redactados por los alumnos

Matriz (E) Columna 1 ECTS 1 ECTS 2 ECTS 3 Matriz (E) Columna 2 ECTS 1 ECTS 2 ECTS 3
Definición de Cifrado de
Bloque Algoritmos de Cifrado
- Parcial 7 6 4 - Enumeración 0 4 9
- Completa 5 5 11 - Descripción 0 1 8
- Errónea 3 0 1 Comparativa
Funcionamiento - De Modos 4 1 3
- Parcial 4 5 4 - De cifrados 2 0 2
- Completa 0 3 6 - Ventajas 2 2 3
Tipos o Modos de
operación Desventajas 1 1 3
- Definición de Modo 0 3 1
- Enumeración 0 2 12
- Descripción
o Parcial 2 1 4
o Completa 0 0 5

Como se puede apreciar, existe una evolución clara en la inclusión de conceptos y aspectos relevantes
del Cifrado de Bloques, a la vez que las definiciones que son parciales, sesgadas o erróneas van dando
paso a definiciones más completas y rica en elementos a medida que la experiencia se va
desarrollando.
Tabla 2. Tabla de términos

Matriz (E) Columna 1 ECTS 1 ECTS 2 ECTS 3 Matriz (E) Columna 2 ECTS 1 ECTS 2 ECTS 3
Cifrado de Bloques 14 10 15 DES 0 4 12
Cifrar 15 10 14 Cifrado Simétrico 0 2 6
Operación División 11 10 11 AES 0 2 7
Comp_Bloques 13 11 15 CTR o Modo contador 1 2 8
Texto claro sin cifrar 16 11 14 Indicador de Bits Relleno 0 3 2
Mensaje cifrado o
criptograma 5 4 8 Componentes 0 0 0
Tipo1 Independencia 8 3 10 CFB 0 0 7
Operación Unión 2 3 3 Funciones con Bloques 0 0 1

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Comp_Registro de
Longitud de Bloque 2 5 11 Desplazamiento 0 0 1
Tipo2 Retroalimentación o
cadena 9 3 7 Comp_Salida de Operación 0 4 4
Tamaño Fijo 7 4 10 Algoritmos 0 4 6
Descifrar 3 1 7 Longitud Clave 0 4 7
Tipos de Modos de
Operación 8 6 12 RED Feistel 0 0 1
Relleno de Bloque 3 4 6 Iteraciones 0 3 3
Error de Cifrado 1 1 6 Subclaves 0 4 4
Valora Seguridad del
Método 1 2 7 IDEA 0 3 3
Clave 5 9 16 Contador 0 0 3
Comp_Vector de
inicialización 3 4 5 Cifrado en Flujo 2 0 6
Comparación acceso a
bloques 1 0 3 Carácter ASCII 0 0 1
Modos de Operación 1 3 7 Transformación Clave 0 1 3
- ECB 0 2 11 OCB 0 1 0
- CBC 0 2 10 Tres-DES 0 1 1
- OFB 0 2 9 Tiempo de Ejecución 0 0 1
- XOR 1 2 11
Seguridad 0 0 0
Confidencialidad 0 1 1
Integridad 0 1 1
EAX 0 1 0

De la observación de la siguiente tabla, la Tabla 2, se extraen nuevas revelaciones. En efecto, si bien el


primer nivel parte de una estructura del contenidos predefinida o coincidente con una exposición del
tema al uso, el análisis en un segundo nivel da una visión mucho más rica de conceptos que los alumnos
han utilizado para detallar y completar estos aspectos, evidenciando no sólo una ganancia neta de
conceptos nuevos sino también una clara asociación de los mismos, ofreciendo una estructura de
conocimiento mucho más completa de la que inicialmente se podría esperar a tenor del proceso de
aprendizaje que se extrae de las exposiciones del profesor de teoría. Como se puede comprobar en
dicha tabla, los términos más utilizados apenas varían en la medida en que forman parte de la
definición principal y refleja un conocimiento base del concepto Cifrado de Bloque, incluso deducible
del propio término. Sin embargo, la aparición de nuevos términos entre la primera prueba y la última
es muy intensa y variada referente a los detalles del Cifrado de Bloque. Se aportan claramente
términos nuevos con una descripción mucho más rica en elementos sustanciales, como son los
algoritmos, los modos de operación entre bloques y los métodos de cifrado.Además de las matrices
de categorías y los tres test de recolección de datos, webQDA nos permite elaborar búsquedas de
términos relacionados, de forma que se puede ahondar en las definiciones o asociaciones que los
alumnos hacen, que si bien son relaciones semánticas, pueden predecir los resultados que se
obtendrían al extraer las matrices de similaridad y la correspondiente Red Asociativa Pathfinder. En
efecto, webQDA nos permite diseñar matrices para cruzar datos y categorías diversas, filtrando por las
clasificaciones que se hayan realizado previamente de las fuentes. De esta manera, hemos procedido

750
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a cruzar las categorías de primer nivel que definen aquellos textos que reflejan la estructura
fundamental de un documento explicativo, esto es, Definición, Funcionamiento, Modos de operación
o tipos, Algoritmos de cifrado y Comparativa con otros métodos de cifrado, con sus subcategorías
correspondientes, con las otras categorías semánticas básicas de los conceptos definidos en el segundo
nivel de análisis (bloque, longitud, clave, dividir, cifrar, concatenación, etc..) de forma que el resultado
nos permite comprobar la riqueza de las descripciones y las asociaciones de términos. Si además los
analizamos en las tres fases o pruebas que hemos diseñado (ECTS1, ECTS2 y ECTS3), los datos arrojan
los siguientes resultados:
Categorías utilizadas para describir los Modos
de Operación de Cifrado en Bloque
120
100
80
60
40
20
0
Enumeración

Enumeración

Enumeración
Parcial

Parcial

Parcial
Definición de
Definición de

Definición de
Completa

Completa

Completa
Modo

Modo

Modo
ECTS1 ECTS2 ECTS3

Fig. 3. Categorías utilizadas para describir los Modos de Operación de Cifrado en Bloque.

Es fácil ver la sorprendente evolución de las enumeraciones y descripciones de los modos de operación
entre las tres tutorías, debiendo aclarar que no son precisamente términos sencillos de recordar (los
modos de operación hacen referencia a la forma en que se gestionan los bloques y las claves en un
sistema de cifrado y existen varios: ECB, CBC, CTR, CFB, etc... cada uno de ellos con peculiaridades,
ventajas y desventajas). En efecto, mientras que en la ECTS2 se puede observar que apenas hay
enumeraciones y no hay descripciones, tan solo la afirmación de la existencia y definición de los modos
de operación, en la ECTS 3 hay unas enumeraciones y descripciones muy ricas en términos, evidencia
de un gran dominio de la temática. Incluso, en otra dimensión aún resulta mucho más evidente la
mejor y mayor asimilación de conceptos y el dominio de los mismos, puesto que no se les exigía que
lo incluyeran (no existía guion) y fueron los mismos alumnos los que decidieron incluir en sus textos
las descripciones. En la Fig. 4 se muestra claramente el resultado.

Número de Categorías utilizadas para


describir los Algoritmos de Cifrado
60
50
40
30
20
10
0
Enumeración

Descripción

Enumeración

Descripción

Enumeración

Descripción

ECTS1 ECTS2 ECTS3

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Fig. 4. Número de categorías utilizadas para describir los Algoritmos de Cifrado


Se observa nuevamente como si bien en la segunda tutoría los alumnos eran capaces de enumerar
los algoritmos, apenas detallaban el funcionamiento. Sin embargo, a medida que las tareas de
desarrollo del Digital Story evolucionaron, fueron asimilando los conceptos de forma mucho más
sólida, consiguiendo detallar el funcionamiento con gran número de términos técnicos.

4 Conclusiones
En esta experiencia piloto se ha comprobado la validez de Digital Storytelling como metodología
docente con la que los alumnos asientan un aprendizaje significativo, profundo en la medida en que
son ellos los que deben buscar la información relevante, sintetizarla, debatirla con los compañeros y
mostrarla en público para ser coevaluados en el aula. No deja de ser sorprendente el nivel apreciable
de los textos objeto de análisis de esta experiencia, el incremento del número de apariciones de
términos importantes y la homogeneidad de los textos de los diferentes alumnos, con incrementos
muy significativos (superiores al 100%) en las categorías utilizadas para las descripciones y las
enumeraciones. Y todo, teniendo presente que se han realizado de forma imprevista y carente de guía
o patrón que pudiera haber influido en la redacción. Se puede decir que se trató de un ejercicio de
memoria pura y a tenor de los resultados, con profusión de siglas y detalles del funcionamiento del
cifrado de bloque, se infiere una estructura cognitiva asentada, nada casual, de las características y
funcionamiento de este tipo de cifrado. Se propone para futuros trabajos la correlación de estos
resultados con otras medidas de análisis, como las Redes Asociativas Pathfinder o los cuestionarios de
satisfacción, que permitan revelar los aspectos más positivos de la tarea de diseño y creación de una
Digital Storytelling. Así mismo, una línea futura de investigación se propone establecer los niveles de
conocimiento de forma comparada entre grupos de alumnos que realicen trabajos bajo el modelo de
Digital Storytelling con grupos del mismo entorno que realicen tareas distintas, de manera que se
pruebe de forma clara las ventajas e inconvenientes de este tipo de experiencias. Asimismo, respecto
a la medición con WebQDA se debería ahondar en la incidencia que tiene la expresión lingüística del
alumno en la mejor o peor obtención de resultados, al precisar la prueba de recolección de una buena
capacidad expresiva.
Agradecimientos. En primer lugar a los alumnos de Seguridad de la Información y en segundo lugar proyecto
Irnet («Home | IRNet», 2017) que nos ha incitado a desarrollar estas técnicas y herramientas y poder probar su
efectividad en el aula. Finalmente, al software WebQDA que nos ha permitido hacer una análisis cualitativo con
suma facilidad.

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Fazer falar papéis silenciados: a pesquisa com cartas das princesas


Isabel e Leopoldina

Jaqueline Vieira de Aguiar1


Maria Celi Chaves Vasconcelos2
1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Brasil. profajaqueaguiar@gmail.com
2
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Brasil.
maria2.celi@gmail.com

Resumo. O presente trabalho tem como foco apresentar os procedimentos metodológicos relativos a uma
pesquisa qualitativa, com abordagem histórico-documental, sobre a educação das princesas Isabel e
Leopoldina, cujas principais fontes utilizadas foram egodocumentos, como cartas e bilhetes, trocados entre
a Família Imperial brasileira durante o século XIX, pertencentes a diferentes arquivos e acervos. O
referencial bibliográfico utilizado dialoga com autores que fazem uso de métodos e técnicas aplicados à
análise e interpretação de documentos históricos e egodocumentos, bem como pesquisadores que estudam
cartas em suas possibilidades autobiográficas. Conclui-se que os egodocumentos são fundamentais para a
recomposição histórica, possibilitando múltiplos olhares sobre um mesmo objeto, neste caso, a educação
das futuras soberanas e herdeiras do trono, as princesas Isabel e Leopoldina.

Palavras-chave: Egodocumentos; Pesquisa histórico-documental; Princesas Isabel e Leopoldina; História da


Educação; Escrita (Auto)biográfica.

Making silent papers speak: the research with letters of the princesses Isabel and Leopoldina
Abstract. The present work aims to present the methodological procedures related to a qualitative
research, with historical-documentary approach, on the education of Isabel and Leopoldina princesses. The
main sources used were egodocuments, such as letters and notes, from correspondences of the brazilian
Imperial Family during the 19th century, which are found in different archives and collections. The
bibliographical reference, which was used, is treated according to authors who use methods and techniques
applied to the analysis and interpretation of historical documents and egodocuments, as well as of
researchers who study letters in their autobiographical possibilities. In this case, it has concluded that
egodocuments are fundamental for historical reconstruction, allowing multiple views on the same object:
the education of the future sovereigns and heirs of the throne, that is, the princesses Isabel and Leopoldina.
Keywords: Egodocuments; Historical-documentary research; Princesses Isabel and Leopoldina; History of
Education; Biographical (Auto) Writing.

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1 Introdução

D. Pedro II, imperador do Brasil no período de 1840 a 1889, apesar de ter tido dois filhos varões,
nenhum deles sobreviveu à infância, deixando a coroa brasileira sem herdeiro do sexo masculino.
Como não havia, de acordo com a Constituição de 1824 (Brasil, 1824), nenhuma restrição à sucessão
feminina ao trono, após a morte dos infantes, as duas princesas filhas do imperador, passaram,
respectivamente, à linha de sucessão do trono, primeiro a mais velha Isabel, e na falta dessa, ou até
que tivesse herdeiros aptos a governar, a caçula Leopoldina.
Segundo Aguiar (2015, p. 53), como não havia mais nenhum herdeiro varão e sendo Isabel a filha
mais velha, ela se tornou a herdeira presuntiva da coroa e recebeu o título de “princesa imperial”, o
que mudou radicalmente as expectativas sobre a sua educação e sua formação. Com apenas quatro
anos de idade, foi reconhecida como “sucessora de D. Pedro II no Trono e na Coroa do Brasil”, para
dar continuidade à dinastia fundada por seu avô, D. Pedro I.
A partir de sua definição como princesa herdeira do trono, D. Pedro II passa a se preocupar com a
educação da filha que um dia iria se tornar a governante da nação. Nessa perspectiva, o imperador
contratou os melhores professores disponíveis naquele tempo e contexto, a fim de ensinar diversas
disciplinas às princesas, que iam do desenho à álgebra, da geografia à religião, mas, sobretudo,
escolheu uma mulher reconhecidamente culta, inteligente e recomendada por sua irmã, a princesa
Francisca, para ocupar o lugar de “governante” principal da educação das princesas.
A condessa de Barral, Luísa Margarida Portugal de Barros, nascida no Brasil, mas educada na Europa
e casada com um nobre francês foi a escolhida para ser a encarregada da educação das duas
princesas. Aguiar sinaliza que “o Imperador sabia da importância de ter uma preceptora para
coordenar os estudos das filhas, pois ele mesmo havia passado por esta experiência com a Condessa
de Belmonte1” (Aguiar, 2012, p. 35).
Assim, as duas princesas foram, a partir dos dez e nove anos de idade, educadas pelos melhores
mestres do Império do Brasil, sob a supervisão da condessa de Barral, que fez uso de uma vasta
correspondência com os pais das meninas para dar notícias sobre o adiantamento e aproveitamento
delas.
O presente trabalho trata-se de uma pesquisa qualitativa, cujo escopo é um recorte sobre os
procedimentos metodológicos utilizados para a investigação de egodocumentos, relativos aos
conhecimentos e as práticas aplicadas na educação das princesas Isabel e Leopoldina, que embora
fossem mulheres, foram formadas na perspectiva de um dia assumirem o governo do Império.
Para tanto, são apresentados os principais percursos da pesquisa qualitativa realizada, com ênfase na
abordagem histórico-documental, que buscou como fontes conteúdos epistolares existentes nos
arquivos e nos acervos das casas de guarda e patrimônio.
O método empregado para leitura, análise e interpretação das fontes remete aos referenciais
teórico-metodológicos de autores que tomam egodocumentos como objeto de investigação,
especialmente cartas de cunho pessoal, entre eles, Flexor (1990), Bastos, Cunha e Mignot (2002),
Sierra Blas (2003, 2004) e Gomes (2004).
Na mesma linha, o objetivo do trabalho é demonstrar a utilização de egodocumentos, sobretudo, as
cartas na pesquisa qualitativa de cunho histórico-documental, e suas múltiplas possibilidades para
evidenciar o objeto de estudo.

1 Mariana Carlota de Verna Magalhães Coutinho (1779-1855) foi aia e governanta de D.Pedro II, desde o seu nascimento
até a sua coroação, em 1841. Com a morte da imperatriz Leopoldina, a aia assumiu, como uma mãe, a criação do príncipe
herdeiro e suas irmãs (Lyra, 1977, p.176).

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As cartas tomadas como fontes de pesquisa foram lidas e analisadas utilizando-se das referências,
métodos e conceitos sugeridos nas obras que tratam da temática relativa à escrita de
egodocumentos e/ou (auto)biográfica.
Além disso, ao longo da pesquisa não foi considerado apenas o conteúdo das cartas trocadas entre as
princesas, seus pais, seus mestres e seus familiares mais próximos, mas também se buscou analisar a
materialidade das cartas, no que se refere a itens como o papel, a escrita do texto, tinta usada,
marcas, símbolos, margens, desenhos, cores, espaços em branco, datação, tratamentos,
fechamentos, colocação das assinaturas e pós-escrito.
Segundo Sierra Blas (2004, p.59), principiar a criança na arte epistolar como projeto educativo era
uma forma de doutriná-la também para o uso da comunicação escrita na vida cotidiana. Para a
autora, exercitar a redação com a escrita de epístolas servia para ampliar a “competência gráfica da
criança”, de forma que ela pudesse se desenvolver “com êxito no seio da sociedade, nas relações
com os outros e [...] no conhecimento de si mesmo”. Gomes (2004, p. 9), corrobora o pensamento de
Sierra Blas (2004), ao afirmar que a técnica de escrita a partir de cartas remete a procedimentos
apreendidos na escola, que evidenciam o contexto e a época de seus protagonistas. De acordo com a
autora, há um protocolo a ser seguido pelo missivista, como a escolha do papel, a caligrafia, a
datação, a localização de onde se escreve, o tratamento dado a determinado destinatário, as formas
de despedida e a assinatura, que são objetos da cultura material capazes de dizer muito sobre a sua
elaboração.
Outro importante código a ser decifrado no estudo de egodocumentos, como cartas datadas do
século XIX, refere-se à diversidade de caligrafias pertencentes aos diferentes sujeitos/remetentes das
epístolas que, nesse período, eram manuscritas e faziam uso de muitas abreviaturas. Assim, para
realizar a leitura dos manuscritos foram empregados os métodos e técnicas provenientes da obra de
Flexor (1990), que pode ser considerada um manual sobre abreviaturas usadas no Brasil entre os
séculos XVI e XIX, facilitando a compreensão das epístolas no contexto histórico, cultural e linguístico
do período abordado.
Cabe descartar ainda que as cartas oitocentistas possuíam regras impostas por outro ritmo de
tempo, no qual as distâncias eram maiores, fazendo com que as missivas custassem a chegar, e
também demorassem para retornar, provocando, no seu destinatário, expectativas em relação às
notícias, que não raro, encontravam o destinatário muito tempo depois de terem ocorrido. É neste
universo que a pesquisa qualitativa está inserida.

2 Desvendando cartas: uma análise da correspondência das princesas

O costume de escrever cartas remonta aos primórdios da civilização e da origem da escrita. Esta
prática nasceu da necessidade de comunicação entre pessoas distantes. As correspondências
atingiram “o auge na Europa Ocidental, como forma de escrita pessoal, durante os séculos XVIII e
XIX, e como consequência do processo maciço de alfabetização” (Lyons apud Bastos, Cunha, Mignot,
2002, p. 5).
No século XIX, as epístolas seguiam todo um protocolo a ser empreendido que facilitava o
entendimento da mensagem, antes mesmo da leitura de seu conteúdo. Entre os símbolos
encontrados, percebe-se que quando as cartas pretendiam informar o falecimento de alguém, o luto
já era expresso no papel por meio de bordas pretas2 (Barral, 1856). Caso o objetivo fosse comunicar
um episódio alegre, como cumprimentar pelo aniversário do destinatário, usava-se um papel de

2Na carta com tarja preta, a viscondessa de Barral fala da morte de seu pai.

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carta especial com flores ou bordado3 (Leopoldina, 1858). Mas, se a finalidade era homenagear
alguém ou amenizar uma saudade sentida, colocava-se uma mecha de cabelo no conteúdo da
missiva4 (Isabel, 1860).
Nas cartas das princesas Isabel e Leopoldina observa-se essa variedade de detalhes relacionados aos
costumes da época e a utilização dos protocolos epistolares, aprendidos pelas meninas com seus
mestres, no espaço doméstico da “casa” (Vasconcelos, 2005), nos Paços de São Cristóvão e de
Petrópolis, locais onde estudavam sob a supervisão da preceptora, sempre presente junto a suas
pupilas.
Segundo Sierra Blas (2003, p. 130), a forma como uma carta se apresenta pode revelar muito do seu
autor, visto que por meio deste objeto da cultura escrita é possível perceber, em suas características
explícitas e implícitas, a configuração da identidade e da transformação da personalidade do
missivista. Nesta perspectiva, “o sujeito da escrita se constrói para o leitor de forma inconsciente”
(Sierra Blas, 2003, p.27).
Assim, ao analisar as características físicas e o conteúdo das cartas das princesas, foi possível
conhecer não só a trajetória educacional das meninas, mas também a construção de suas
identidades ao longo dos anos.
As cartas estudadas demonstram que suas autoras faziam uso de papéis delicados, decorados e
ilustrados. Alguns papéis trazem o monograma com o símbolo da Coroa Imperial do Brasil e o nome
da princesa em alto-relevo. Quanto às dimensões das cartas, não havia um padrão, pois escreviam
em papeis de vários tamanhos: 18,2 x 11,4 cm, 20,8 x 13,5 cm, 20,6 x 13,3 cm, 17,2 x 11,3 cm, 18,8 x
12,4 cm, entre outros.
Os papéis não contêm pistas sobre seus fabricantes ou comerciantes, mas acredita-se que fossem
comprados em uma loja na Rua do Ouvidor, no centro do Rio de Janeiro. Esta rua concentrava casas
comerciais especializadas em objetos importados e Isabel, em diversas missivas, solicita aos pais
produtos das lojas ali localizadas. Alguns cadernos do mesmo período, também investigados, trazem,
por exemplo, a etiqueta do comerciante: “Rua do Ouvidor nº 85 - Agra e Irmão - Mercadores de
Papel, livros em branco e impressos, objetos d´escriptorio e de dezenho – Rio de Janeiro”5, podendo-
se supor que os papéis de carta foram comprados no mesmo endereço.
Entre as cartas das princesas selecionadas para a pesquisa, a maioria foi escrita com tinta preta em
papel de cor branca e sem pauta. Todas apresentam marcas de dobradura, provavelmente para
acondicionamento em envelope, e exibem variações ao longo dos anos, em relação ao tratamento,
fechamento, assinatura e pós-escrito.
No Quadro 1, a seguir, demonstram-se as formas em que esse ritual epistolástico mais se repete nas
cartas das princesas:

Quadro 1 – Formas de tratamento, fechamento, assinatura e pós-escrito nas epístolas das Princesas Isabel e Leopoldina
no período de 1854-1862.

PRINCESA ISABEL TRATAMENTO PRINCESA LEOPOLDINA TRATAMENTO


Cartas da Princesa Isabel “Minha Cara Cartas da Princesa Não foram
enviadas à mãe até o Maman” Leopoldina enviadas à mãe encontradas cartas
ano de 1855 até o ano de 1855 desse período
Cartas da Princesa Isabel “Minha querida Cartas da Princesa “Minha querida

3 Na carta, a princesa Leopoldina cumprimenta o pai pelo dia do seu aniversário.


4 No conteúdo da carta foi encontrada uma mecha de cabelo da princesa Isabel sendo oferecida a sua mãe em
“lembrança”.
5 Cf. Caderno da Princesa Isabel nº. 19. AGP.

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enviadas à mãe após o Mamãe” Leopoldina enviadas à mãe Mamãe”


ano de 1855 após o ano de 1855
Cartas da Princesa Isabel “Meu Caro Papá” Cartas da Princesa Não foram
enviadas ao pai até o Leopoldina enviadas ao pai encontradas cartas
ano de 1855 até o ano de 1855 desse período
Cartas da Princesa Isabel “Meu querido Cartas da Princesa “Meu querido
enviadas ao pai entre os Papae”/ Leopoldina enviadas ao pai Papae”/
anos 1856-1862 “Caro Papae” entre os anos 1856-1862 “Caro Papae”
Cartas da Princesa Isabel enviadas no período
de 10/1859 a 01/1860 - Viagem dos “Meus Caros Paes”
Imperadores ao “Norte” do Brasil
FECHAMENTO DA PRINCESA ISABEL E DA PRINCESA LEOPOLDINA
“Adeus Meu querido Papae/ Minha querida Mamãe/ Meus Caros Paes, deitem a sua benção e aceitem
um abraço de sua filha do coração”
PÓS-ESCRITO DA PRINCESA ISABEL
“Mª Rosa, Domitilia, Condessa, Mlle Templier, Totonha, Chica, Francisca, Dominique, Bernarda, D.
Anna, Almeida, Luiz Carlos, Madeira, Monsenhor, Valdetaro, Valadão e Borges lhe beijão a mão”
PÓS-ESCRITO DA PRINCESA LEOPOLDINA
“Mª Rita, Bebé, Chica, Totonha, Condessa Mlle, Dominique, Francisca e todos lhe beijão a mão.
Saudades a Josefina Gegé e ao Visconde de Sapucahy”
ASSINATURA DA PRINCESA ISABEL
Até o ano de 1859 - “Isabel Christina” Após o ano de 1859 - “I.C.”
ASSINATURA DA PRINCESA LEOPOLDINA
“Leopoldina Thereza”.
Fonte: Quadro elaborado pelas autoras.

Por meio do Quadro 1 é possível compreender a forma como as princesas se dirigiam aos pais por
meio das escritas epistolares que, certamente, eram orientadas e supervisionadas por seus mestres.
Ainda, no Quadro 1, destacam-se as variações no tratamento conforme elas cresciam. Durante a
viagem dos imperadores ao “Norte” do Brasil, realizada entre os meses de outubro de 1859 a janeiro
de 1860, as cartas de Isabel estão catalogadas no arquivo de guarda como enviadas a D. Pedro II, mas
são dirigidas tanto ao pai quanto a mãe, e o tratamento usado é: “Meus caros Paes”. Tal fato, tornou
necessário uma maior atenção às cartas enviadas pelas princesas, no período informado, para
separar e analisar, distintamente, os trechos em que elas se dirigem ao pai e à mãe, pois os assuntos
tratados com ambos são marcados por especificidades.
Na correspondência, as princesas geralmente obedeciam à margem e também registram o local, a
data e, às vezes, até a hora em que escreviam. A letra é sempre cursiva, havendo a presença de
algumas abreviaturas, principalmente na datação, no fechamento e no pós-escrito. Quanto ao
fechamento do texto das cartas, as princesas sempre pediam a benção aos seus pais, um costume
muito usado naqueles anos no Brasil.
Havia ainda ao final da carta o pós-escrito, que se resumia a informar ao pai e/ou a mãe as pessoas
que estavam em sua companhia durante a escrita, e as quais “beijavam-lhes a mão”, como no
exemplo exposto no Quadro 1. Entre as pessoas citadas pelas meninas estão, notadamente, a
preceptora, os mestres, as damas e os médicos das princesas. Desta forma, os imperadores eram
prestigiados e também tomavam conhecimento daqueles que estavam com suas filhas, “cuidando”
ou “educando-as”.
A assinatura de Isabel sofreu alterações com o tempo, pois até o ano de 1859 ela costumava assinar
“Isabel Christina”. A partir do ano seguinte, é possível encontrar também “I.C.”, iniciais de seu nome.
De acordo com os estudos realizados, verifica-se que a intensidade das disciplinas estudadas pelas
meninas foi aumentando com o passar dos anos e, talvez, por esse motivo Isabel tenha sentido
necessidade de ganhar tempo, economizando com a assinatura. Ao contrário, a irmã, Leopoldina,

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não apresentou alterações em sua assinatura entre os anos de 1856 a 1861, possuindo o constante
hábito de assinar “Leopoldina Thereza”.
Sierra Blas (2003, p. 129), chama a atenção também para a importância da caligrafia que define “a
estética da carta e causa a primeira impressão ao destinatário”. Ela argumenta que uma das
primeiras características que uma carta deve ter é a de facilitar a leitura – afinal, só pode ser lida e
entendida adequadamente se for bem escrita. Em relação às cartas escritas pelas princesas, estas
eram rascunhadas, corrigidas pelos mestres e depois copiadas em papéis geralmente ornamentados.
Este procedimento era adotado porque as cartas não só informavam ao pai o andamento do
aprendizado das meninas, mas também o expressavam concretamente. Quando o imperador recebia
as cartas, analisava desde a caligrafia até o seu estilo e o teor e, para passar por este escrutínio, as
missivas precisavam estar perfeitas.

3 Arquivos e acervos: o longo caminho entre o Brasil e a Europa

Diante do vasto acervo de cartas adormecidas nos arquivos de casas de guarda e patrimônio, para
estudar a educação das princesas por meio dessas informações registradas, fez-se necessário
delimitar temporalmente a utilização das fontes, para, posteriormente, selecionar e analisar os
documentos.
O período escolhido para a seleção e análise foi de 1850 a 1864. Isto porque a educação formal das
princesas se inicia a partir do reconhecimento de Isabel como “Princesa Imperial” em 1850 (Vieira,
1989), perdurando até o casamento das duas, fato ocorrido no ano de 1864. Num universo de mais
de cinco mil cartas, foram selecionadas 339, que forneciam dados significativos à recomposição da
formação educacional daquelas que foram preparadas para, um dia, governar o país6. As fontes
principais contemplam, particularmente, as cartas das princesas sobre sua formação educativa,
trocadas entre elas e seus pais, selecionadas e catalogadas de acordo com a autoria, o período e o
assunto.
A maioria das cartas estudadas faz parte do acervo do Arquivo Grão Pará (AGP). Esse arquivo
pertence aos descendentes da Família Real e Imperial do Brasil, o qual foi depositado no Arquivo
Histórico do Museu Imperial, na cidade de Petrópolis, onde se encontra desde 1999, em regime de
comodato. O AGP é responsável pela guarda, conservação e disponibilização dos documentos aos
pesquisadores. A solicitação de autorização por escrito se faz necessária para reprodução integral de
textos e imagens de documentos em quaisquer publicações que os citem. O diretor do Arquivo para
o qual devem ser encaminhadas as solicitações é o próprio príncipe D. Pedro Carlos de Orleans e
Bragança.
Mas como esses documentos chegaram ao Museu Imperial onde hoje se encontram disponíveis para
a pesquisa? De acordo com Fráguas (2016), após o banimento da Família Imperial do Brasil e já no
regime republicano, os documentos ficaram nos “palácios da família, sobretudo em Petrópolis”.
Algum tempo depois, o conde D’Eu, marido da princesa Isabel, enviou do exílio ao Brasil uma carta
solicitando a devolução dos documentos à família que se encontrava na França, mais precisamente
no Castelo D’Eu. Na época, o governo provisório compôs uma comissão para separar os documentos
oficiais dos de caráter privado. Os enviados ao Castelo D’Eu na Europa foram àqueles considerados
de caráter privado e que hoje, após terem retornado, formam o Arquivo Grão Pará e o Arquivo da
Casa Imperial do Brasil (POB). Os identificados como oficiais foram depositados em outras casas de
guarda como o Arquivo Nacional e o Itamaraty, localizados na cidade do Rio de Janeiro. Fráguas
(2016) lembra ainda que no período da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a documentação
esteve em risco de extermínio, devido a ameaça de que o Castelo D’Eu fosse bombardeado. Após o

6 Sobre o assunto ver Aguiar (2015).

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fim da guerra e com a revogação da Lei do Banimento no Brasil, teve início um movimento para que
esta documentação “retornasse” ao país. Em 1930, o historiador Alberto Rangel foi contratado por
Pedro de Alcântara de Orleans e Bragança, príncipe do Grão Pará, filho primogênito da princesa
Isabel e neto de D. Pedro II, para inventariar os documentos. Dez anos depois, o Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro (IHGB), aprovou uma moção apelando para que estes documentos fossem
trazidos para o Brasil. Finalmente, após a criação do Museu Imperial, em 1940, com sua inauguração
e abertura ao público em 1943, o Arquivo da Casa Imperial do Brasil (POB) foi doado ao recém-criado
Museu, em 1948, por Pedro Gastão de Orleans e Bragança, bisneto de D. Pedro II7.
O Arquivo Grão Pará, por sua vez, foi depositado sob a custódia do Arquivo Histórico do Museu
Imperial, em regime de comodato, apenas no ano de 1999. O AGP é formado basicamente pela
correspondência íntima dos membros da Família Imperial, além de fotografias e outros documentos
bastante significativos do período monárquico. Já o POB compõe-se pelos demais documentos, entre
eles a correspondência do imperador com cientistas e intelectuais, como políticos, militares e
diplomatas, minutas de documentos oficiais, resumos das reuniões do Conselho de Estado, além dos
diários da imperatriz Teresa Cristina e os de D. Pedro II (Fráguas, 2016).
No AGP estão catalogadas também 1487 cartas da princesa Isabel enviadas aos pais e referentes ao
período de 1854 a 1891. Das 339 cartas selecionadas, 225 são das princesas e abrangem um período
que vai de 1855 a 1862. Também neste arquivo encontram-se 14 cartas da princesa Leopoldina
escritas aos pais entre os anos de 1856 a 1867. Dessas últimas, foram selecionadas 8 cartas, relativas
ao período de 1856 a 1862.
No contato com o acervo do Arquivo Grão Pará, foi constatado que as cartas da princesa Leopoldina
estão em menor número em relação as da princesa Isabel, o que não comprometeu a pesquisa, pois
Isabel possuía o hábito de mencionar as atividades educacionais realizadas também pela irmã, o que
muito auxiliou a análise do processo de formação das duas herdeiras do Trono.
As epístolas das princesas selecionadas para o estudo apresentado pertencem ao Arquivo Grão Pará,
porém, os demais documentos pertencem ao Arquivo da Casa Imperial do Brasil, ao Arquivo Nacional
e a Biblioteca Nacional, todas instituições localizadas no Estado do Rio de Janeiro.

4 Conclusões

Vasconcelos (2010) sinaliza que empreender investigações que têm como ênfase circunstâncias e
processos educativos ocorridos em determinado tempo e lugar, posicionar-se sobre eles e arriscar
prognósticos, requer entender o papel do pesquisador diante da história, como alerta Raoul Girardet
(1987, p.139), é preciso ter presente “a precariedade da recordação, a fragilidade do testemunho”.
Mesmo cartas que registram experiências tomadas como vividas podem conter apenas uma
descrição daquilo que se pretendia informar, ou aquilo que o destinatário gostaria de ler. Nenhum
testemunho documental, entre eles os egodocumentos, está isento de uma memória forjada, de
uma situação criada, de uma vida inventada.
O costume das princesas Isabel e Leopoldina de escreverem cartas, resguardadas em seus quartos
para elaborar as missivas, está dentro do contexto histórico e social do século XIX, uma vez que a
escrita de cartas era uma atividade muito desempenhada pelas mulheres letradas (Gomes, 2004).
Elas que, por diversos motivos, possuíam restrições para frequentar os espaços públicos
oitocentistas, recolhiam-se ao local que lhe era designado: o espaço privado de seu lar, no qual, com

7 As negociações para a doação tiveram início em 1947 e foram concluídas em 1949, conforme processos 675/1947 e
anexos 123/1949 (Fráguas, 2016). Alessandra Bettencourt Figueiredo Fráguas é pesquisadora, historiadora, socióloga e
trabalhou no Museu Imperial em Petrópolis no período de 2008 a 2015.

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papel, pena e tinta, podiam registrar o cotidiano. Era neste lugar que sua mente viajava para além
dos espaços permitidos, por meio da escrita de cartas, cujo ato aproximava-as de tantas outras
meninas e mulheres oitocentistas, que tinham nos seus escritos, embora censurados, os únicos
momentos de relativa privacidade.
Os egodocumentos escritos no espaço privado e adormecidos por tanto tempo nos arquivos
possuem muitas histórias silenciadas que esperam o olhar atento de um pesquisador para decifrá-
los, interrogá-los, torná-los fontes capazes de preencher as lacunas deixadas pela historiografia
tradicional.
Nossa pesquisa buscou enfrentar alguns dos desafios de trabalhar com egodocumentos,
particularmente com cartas esquecidas há quase dois séculos, em papéis manuscritos por mulheres
que, embora fossem diferentes pela sua condição social, igualavam-se em sua meninice, sonhos e
brincadeiras, como qualquer outra criança de seu tempo.
As conclusões a que chegamos remetem, a priori, as múltiplas possibilidades da investigação
qualitativa em documentos pessoais, que se revelam fundamentais para a recomposição histórica,
permitindo que o historiador, ainda que não possa dominar totalmente seu objeto, tenha uma visão
mais intimista dos personagens que pretende retratar.

Referências

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Princesas Isabel e Leopoldina. Dissertação de Mestrado em Educação, Universidade Católica
de Petrópolis, Petrópolis, Rio de Janeiro, Brasil.
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Brasil.

Barral, C. (1856). Carta da Viscondessa de Barral a Paulo Barbosa - Mordomo da Casa Imperial do
Brasil. Arquivo Paulo Barbosa. São João (Bahia), 26 de março de 1856, Arquivo Paulo Barbosa -
Tombo 2861/97.

Bastos, M. H. C, Cunha, M. T. S., Mignot, A. C. V. (2002). (Orgs.). Destinos das letras: história,
educação e escrita epistolar. Passo Fundo: UPF, Brasil.

Brasil. Constituição (1824). Constituição Política do Império do Brasil, elaborada por um Conselho de
Estado e outorgada pelo Imperador D. Pedro I, em 25 de março de 1824. Recuperado em 10,
janeiro, 2017, do http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm

Flexor, M. H. O. (1990). Abreviaturas: manuscritos dos séculos XVI ao XIX. 2ª ed. aum. São Paulo:
Arquivo do Estado, Brasil.

Fráguas, A. B. F. (2016). Entrevista. Entrevistadora: Jaqueline Vieira de Aguiar. Arquivo enviado por e-
mail, datado de 30 de setembro de 2016.

Girardet, R. (1989). A sombra da guerra. In: Nora, P. et al. Ensaios de ego-história. Lisboa: Edições 70,
Brasil.

Gomes, A. de C. (2004). (Org.). Escrita de si, escrita da história. Rio de Janeiro: Editora FGV, Brasil.

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Isabel, P. (1860). Caderno da Princesa Isabel nº 19 - AGP.

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1858, AGP-XLVIII-1.

Lyra, H. (1977). História de D. Pedro II, Itatiaia/Edusp: Belo Horizonte, Brasil.

Sierra Blas, V. (2003). Aprender a escribir cartas: Los manuales epistolares en la España
contemporânea (1927-1945). Gijón: Ediciones Treal, S. L., España.

Sierra Blas, V. (2004). “As cartas e a escola": los manuales epistolares para ninos en Ia Espana del
siglo XX. História da Educação. ASPHE/PAE/UFPel. Pelotas, n.16, p.59-77. Recuperado em 26
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Vasconcelos, M. C. C. & Faria, L. C. M. Histórias de pesquisa na educação / Pesquisas na história
da educação. Rio de Janeiro: Quartet, Brasil.

Vieira, H. (1989). A Princesa Isabel, uma vida de luzes e sombras. São Paulo: GRD, Brasil.

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Métodos de Ensino Aplicados no Curso de Ciências Contábeis:


percepção de alunos da Universidade Federal do Tocantins (UFT)

1
Raiane da Silva Ferreira , Janaína Borges de Almeida1, Wilde Gomes Araújo1

1Curso de Ciências Contábeis da Universidade Federal do Tocantins, Brasil.


raianedasilvaferreira@gmail.com;
janainaborges@uft.edu.br; wilde@mail.uft.edu.br

Resumo. O objetivo geral desta pesquisa é demonstrar a percepção dos alunos do Curso Ciências Contábeis
da UFT sobre os métodos de ensino aplicados no curso. A metodologia desta pesquisa é bibliográfica,
estudo de caso, por meio de entrevistas aplicadas a 13 alunos do 1º, 5º e 8º período do referido curso. A
análise de conteúdo das entrevistas permitiu categorizar temáticas relacionadas aos métodos de ensino
aprendizagem, através da abordagem qualitativa. Na visão dos alunos os métodos mais utilizados pelos
professores são a aula expositiva e o trabalho em grupo, e os que mais contribuem e despertam interesse
no processo de ensino aprendizagem são as aulas práticas/laboratório, debate, aula expositiva dialogada e
trabalho em grupo. Enfim é recomendável que os professores dêem preferência às aulas práticas, pois
assim, melhor contribuirão para o aprendizado do aluno.
Palavras-chave: Métodos de Ensino; aprendizagem; Contabilidade; Percepção.

Teaching Methods Applied in the Course of Accounting Sciences: perception of students of the Federal
University of Tocantins (UFT)
Abstract. The general objective of this research is to demonstrate the students' perception of the
Accounting Sciences Course of UFT on the teaching methods applied in the course. The methodology of this
research is a bibliographical, case study, through interviews applied to 13 students of the 1st, 5th and 8th
years of the referred course. The content analysis of the interviews allowed to categorize topics related to
teaching methods of learning, through the qualitative approach. In the view of the students, the methods
most used by the teachers are the expository class and the group work, and the ones that most contribute
and arouse interest in the process of teaching learning are the practical classes / laboratory, debate,
expository classroom and group work. Finally, it is recommended that teachers give preference to practical
classes, as this will better contribute to student learning.
Keywords: Teaching Methods; learning; Accounting; Perception.

1 Introdução

O processo de ensino aprendizagem depende de vários elementos e um deles é o método de ensino,


é a partir dele que são traçadas estratégias para alcançar os objetivos propostos na disciplina.
Existem diferentes métodos de ensino, alguns são indicados com maior constância por estudiosos na
área da educação, tais como: aula expositiva; leituras e estudo dirigido; discussões e debates;
trabalhos em grupos; aulas práticas e de laboratório (Gil, 2002; Masetto, 2003). Ao utilizar os
métodos de ensino, é importante averiguar os objetivos de cada um deles no processo de
aprendizagem do referido conteúdo (Borges & Leal, 2015). A universidade deve despertar a
capacidade de criar, inovar e desenvolver novas técnicas nos alunos. Cabe ao professor instigar o
alcance dos objetivos traçados para a disciplina ministrada.
Além dos métodos de ensino, outros fatores influenciam a aprendizagem, por exemplo, as
habilidades de cada aluno, o meio social e econômico em que vive, os recursos instrucionais que a
universidade disponibiliza para tornar a aula mais agradável, entre outros.

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Com vistas a trazer debates sobre os métodos de ensino esta pesquisa visa demonstrar qual a
percepção dos alunos do Curso Ciências Contábeis da UFT sobre os métodos de ensino aplicados no
curso. Busca levantar os métodos de ensino aplicados no referido curso e demonstrar a percepção
dos alunos sobre os que melhor contribuem para o processo de ensino aprendizagem.
Utiliza-se a abordagem qualitativa por meio da pesquisa bibliográfica e do estudo de caso, o
levantamento ocorreu por meio de entrevistas aplicadas a 13 (treze) alunos do Curso de Ciências
Contábeis da UFT-Brasil. Para as entrevistas utiliza-se a análise de conteúdo.
Ao longo deste trabalho, reforça-se a máxima de que é fundamental ter-se métodos que façam do
aluno não só um expectador da aula exposta, mas um crítico em relação ao conteúdo, permitindo
que dúvidas e problemas de aprendizagem sejam sanados. A pesquisa justifica-se por contribuir com
a discussão sobre a temática proporcionando aos gestores, professores e acadêmicos, possibilidades
de análises sobre as estratégias de ensino aplicadas no curso de Ciências Contábeis da UFT.
Este artigo se divide em cinco seções sendo elas: introdução, fundamentação teórica, metodologia,
resultados e análises e por fim as conclusões.

2 Fundamentação teórica

É importate que o professor ao planejar uma disciplina pense sobre os métodos de ensino (Plebani &
Domingues, 2008) que irá utilizar. É preciso também definir aspectos relacionados ao objetivo,
conteúdo e métodos de avaliação (Plebani & Domingues, 2008). Os autores acrescentam que os
métodos são apresentados pelo professor, em seu plano de disciplina, de uma forma geral, com o
intuito de informar como os objetivos traçados serão alcançados.
Método de ensino, “é o conjunto de momentos e técnicas logicamente coordenados, tendo em vista
dirigir a aprendizagem do educando para determinados objetivos. Dele faz uso o professor para levar
o educando a elaborar conhecimentos, a adquirir técnicas ou habilidades e a incorporar atitudes”
(Néreci, 1997, p. 255). Os métodos de ensino possibilitam que o conhecimento seja constituído de
formas diferentes, e devem enfocar a formação de uma ou mais habilidades (Plebani & Domingues,
2008). Portanto, podem surgir resultados diferentes se métodos diferentes de ensino forem
utilizados (Plebani & Domingues, 2008). Ressalta-se que não existem métodos de ensino melhores ou
piores, mas os que são usados corretamente para se obter determinado objetivo (Nereci, 1997).
Nesta pesquisa são abordados os seguintes métodos de ensino: aula expositiva, trabalho em grupo,
seminário, debate, aulas práticas em laboratório, estudo de caso e estudo dirigido.
A aula expositiva é um dos métodos tradicionais utilizados com maior frequência no ensino
universitário (Gil, 1998). Ela pode ser restrita e não promover a interação dos alunos, para que isso
não ocorra, é preciso a junção de outros métodos, tais como a discussão em grupo, questionamento,
hipóteses, levantar problemas entre outros (Peblani & Domingues, 2008).
O estudo dirigido é o método que “o professor oferece um roteiro de estudo previamente elaborado
para que o aluno explore o material escrito de maneira efetiva: lendo, compreendendo,
interpretando, analisando, comparando, aplicando, avaliando e elaborando” (Veiga, 2003, p. 81).
Cuja finalidade é melhorar aspectos como reflexão, criticidade e criatividade (Veiga, 2003).
O debate tem por objetivo o confronto de pontos de vista (Castanho, 2003). Possibilita “ao aluno
expressar-se em público, apresentando suas ideias, reflexões, experiências e vivências, ouvir os
outros, dialogar, respeitar opiniões diferentes das suas, argumentar e defender suas próprias
posições”( Masetto, 2003, p. 100). Pode ser utilizado em qualquer área do conhecimento, cujo nível
de complexidade pode ser aumentado a depender do conhecimento do professor e do grupo
envolvido (Miranda, Leal & Nova, 2012).

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O seminário ocorre em grupos de estudos, cuja discussão e debate versam sobre um ou vários
temas, apresentados por alunos (Veiga, 2003, p.107). Permite o desenvolvimento de habilidades
como pesquisa, comunicação, organização de ideias fundamentadas, produção de relatórios e de
conhecimento em grupo (Masetto, 3003). No seminário “as ideias devem germinar ou ser semeadas”
(Anastasiou & Alves, 2004, p. 90). Como técnica de ensino o seminário “implica em debates,
discussão, trabalho em grupo, estudo dirigido e exposição ”(Miranda et al., 2012, p. 7).
O estudo de caso consiste em trabalhos de grupos que são treinados, e ao longo do tempo evoluem
(Peblani & Domingues, 2008). São privilegiados aspectos como interação, ação, trabalho em equipe,
negociação, análise e tomadas de decisões (Peblani & Domingues, 2008). Ao simular realidades os
alunos se identificam com tomadores de decisões e com os problemas enfrentados (Lowman, 2004).
No ensino em pequenos grupos a turma é separada em grupos, isso facilita a discussão; busca-se
despertar a iniciativa de pesquisa e a descoberta do que se precisa aprender (Petrucci & Batiston,
2006). Em conjunto com o método grupo de verbalização e observação, os alunos são divididos em
dois grupos, um observa e o outro verbaliza, exige-se análise, interpretação, crítica, organização de
dados, comparação, resumo, observação e contato anterior com o tema (Anastasiou & Alves, 2004).
O ensino em laboratório visa a fixação do aprendizado acompanhado do conteúdo teórico (Masetto,
2003). A integração da realidade profissional com a teoria torna a aprendizagem mais interessante e
motivadora (Masseto, 2003). As aulas práticas tornam-se interessantes, pois fazem a ponte entre a
teoria e a prática, isso é relevante para o curso de Ciências Contábeis (Miranda et al. 2012).
As estratégias de ensino não são absolutas, nem imutáveis, podem ser adaptadas, modificadas, ou
combinadas pelo docente, conforme julgar conveniente ou necessário (Petrucci & Batiston, 2006).
Portanto, cabe ao professor escolher as que alcancem melhor os objetivos propostos.
Os métodos de ensino tem sido objeto de pesquisa nos cursos de Ciências Contábeis (Mazzioni, 2009;
Oliveira et al. 2011; Madureira, Succar Júnior & Gomes, 2011; Miranda et al. 2012; Nganga et. al.;
2013; Borges &Leal , 2015), a seguir são abordados estudos anteriores sobre a temática.
Mazzioni (2009) verificou as estratégias de ensino mais consideráveis na percepção dos alunos e as
mais usadas pelos docentes do curso de Ciências Contábeis. Os resultados apontaram que a aula
expositiva dialogada, resolução de exercícios e seminários estão entre as preferidas dos alunos e as
mais utilizadas pelos professores.
Oliveira et al. (2011) observaram que os docentes utilizam de várias técnicas e métodos de ensino
como: seminários, aulas expositivas, palestras, aulas orientadas e estudos de caso, para deixar a aula
mais dinâmica. Porém, a parte prática que levaria o aluno mais perto da realidade não é muito
desenvolvida, assim como o uso de internet e laboratório que também precisa melhorar.
Madureira, Succar Junior e Gomes (2011) pesquisaram sobre os métodos de aprendizagem ativa, e
os resultados demonstram que os professores utilizam mais os métodos tradicionais do que os
ativos. Os alunos preferem métodos tradicionais como aula expositiva, seminários entre outros.
Miranda et al. (2012) demonstraram que a aula expositiva, o trabalho em grupo, seminários, estudo
de caso, aulas práticas em laboratório, debates, ensino com pesquisa, discussões, leitura, estudo
dirigido e ensino com pesquisa são as mais importantes para o curso de Ciências Contábeis.
Nganga et. al. (2013) identificaram os métodos mais utilizados e que os professores consideram mais
eficientes são eles: aula expositiva; leitura/estudo dirigido; trabalhos em grupo/seminário; estudo do
meio; discussões/debates; aulas práticas e de laboratório; estudo de caso; ensino com pesquisa;
ensino com projetos, dentre outros.
Borges e Leal (2015) em pesquisa sobre estratégias e métodos aplicados no ensino da Contabilidade
Gerencial, verificaram que os métodos tradicionais são mais utilizados como aulas expositivas,
aplicação de exercícios, estudos de caso, debates, seminários, estudo dirigido e trabalho em grupo.

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3 Metodologia

A metodologia é o estudo do método e de suas técnicas. Constitui o caminho que deve seguir toda
investigação científica para que o conhecimento científico seja gerado (Oliveira, 2011). O método é o
“caminho para se chegar a determinado fim. E método científico o conjunto de procedimentos
intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento”(Gil, 2008, p. 8).
Nesta pesquisa são utilizados livros, artigos, e outros materiais que tratam sobre o tema em questão.
Isso caracteriza a pesquisa como bibliográfica (Gil, 2008; Oliveira, 2011). A pesquisa bibliográfica é
base para a revisão da literatura, cujo enfoque versa sobre os métodos de ensino.
A pesquisa é de caráter exploratório/descritiva, por tornar conhecidos os métodos de ensino
adotados no curso de Ciências Contábeis da UFT. As pesquisas descritivas “têm como objetivo
primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou, então, o
estabelecimento de relações entre variáveis”(Gil, 2008, p. 28). Já a “pesquisa exploratória busca dar
uma visão geral a respeito de determinado assunto, geralmente é utilizada quando o tema estudado
é pouco explorado” (Gil, 2008, p. 27).
Cervo e Bervian (1996, p. 49), asseveram que: “[...] a pesquisa descritiva procura descobrir, com a
precisão possível, a frequência com que um fenômeno ocorre, sua relação e conexão, com os outros,
sua natureza e características, correlacionando fatos ou fenômenos sem manipulá-los”.
Acrescentando Collins e Hussey (2005) apontam que a pesquisa descritiva tem por objetivo o exame
de um problema avaliando e descrevendo suas características.
É também um estudo de caso, pois aborda empiricamente o fenômeno em seu ambiente real (Yin,
2003), o curso de contabilidade. Para Goode e Hatt (1969), “o estudo de caso corresponde a uma
maneira de organizar dados em torno de uma unidade escolhida”. Conforme Gil (2002, p. 58): “o
estudo de caso é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um, ou de poucos objetos, de
maneira a permitir seu conhecimento amplo e detalhado”. Oliveira (2011, p. 94) classifica o estudo
de caso como“ um método qualitativo de pesquisa. O que não impede que, em seu
desenvolvimento, sejam utilizadas também técnicas quantitativas”.
Também é utilizado um survey, já que os dados e informações sobre o objetivo da pesquisa, foram
coletados por meio de entrevista. Segundo Oliveira (2011): a entrevista é muito utilizada na área de
Ciências Sociais Aplicadas. Já o survey é utilizado quando se deseja encontrar aspectos sobre atitudes
e opiniões sobre certas questões (Collins & Hussey, 2005). Além disso, os autores acrescentam que
são aplicados ao survey, instrumentos de coleta de dados como entrevistas e questionários. “As
pesquisas deste tipo se caracterizam pela interrogação direta das pessoas cujo comportamento se
deseja conhecer. Basicamente, procede-se à solicitação de informações a um grupo significativo de
pessoas acerca do problema estudado” (Gil; 2008, p. 55).
Nesse sentido, o survey permite levantar e descrever os métodos de ensino utilizados no curso de
Ciências Contábeis da UFT. Isso foi possível através de entrevistas, realizadas no mês de outubro de
2016, com os alunos do 1º, 5º e 8º períodos do Curso de Ciências Contábeis. Optou-se por essa
seleção em função das experiências dos alunos nos períodos iniciais, intermediários e concluintes.
Foram entrevistados 13 alunos, nove do gênero masculino e quatro do feminino, com idade entre 17
e 36 anos. Estes são protagonistas do processo ensino aprendizagem, logo é relevante dá voz a eles
para que haja a compreensão sobre a percepção dos mesmos quanto aos métodos de ensino
adotados no curso. Todas as entrevistas foram gravadas com um aparelho celular e posteriormente
degravadas e analisadas.
Após a degravação foi utilizado o método de análise de conteúdo, criando categorias por temas.
Bardin (2002, p.105) explica que “fazer um análise temática, consiste em descobrir os <<núcleos de
sentido>> que compõem a comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição podem significar
alguma coisa para o objectivo analítico escolhido”. Buscou-se nas narrativas temas que

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identificassem métodos de ensino apontados pela literatura, tais como: aula expositiva, trabalhos em
grupo, leitura, estudo de caso, seminário, debates, trabalhos individuais, pesquisa, aulas práticas,
estágio, palestras, entre outros. Depois seguindo a mesma forma de categorização, buscou-se os
métodos apontados pelos alunos como os mais contributivos para a aprendizagem e os que
despertam maior interesse. Isso foi possível por meio da junção das respostas dos entrevistados.
Para cada questão respondida foi criado um documento como uma ficha, isso permitiu a análise
conjunta de todas as respostas de cada questão. As respostas agrupadas permitiram extrair os temas
pertinentes ao objeto da pesquisa, os mesmos foram expostos em tabelas, apresentados por meio
de frequências de respostas para cada tema e pelos períodos em que se encontram os alunos que os
apontaram. Além das tabelas foram apresentados trechos relevantes das falas dos alunos, que
identificam a percepção acerca dos objetivos propostos na pesquisa. Por questões éticas não serão
identificados os nomes dos participantes das entrevistas, os mesmos foram tratados por letras.
A análise dos dados é de natureza qualitativa e Richardson (1999) explica que a pesquisa qualitativa é
marcada pelo emprego de qualificação tanto na coleta e análise de dados. Para Oliveira (2007, p. 82)
os “estudos com metodologia qualitativa podem descrever a complexidade de determinado
problema, analisar a interação de suas variáveis entre si e com o todo”. “A análise qualitativa
depende de muitos fatores, tais como a natureza dos dados coletados, a extensão da amostra, os
instrumentos de pesquisa e os pressupostos teóricos que nortearam a investigação”(Gil, 2002, p.
133).

3 Resultados e análises

Nesta seção são apresentados os dados coletados através das entrevistas, realizadas com os alunos
do curso. Na primeira pergunta o intuito é compreender os métodos de ensino adotados no curso.
Ficou evidente nas respostas que a aula expositiva é o método mais utilizado, seguida do trabalho
em grupo, leitura, seminário e laboratório. As percepções dos alunos sobre este assunto podem ser
constatadas nos trechos de entrevistas expostos a seguir: “aula expositiva onde o professor fala sem
parar, tem dois professores que tem a aula expositiva com a participação do aluno (Aluna A)”;
“trabalho em grupo, aula expositiva, laboratório (Aluno G)”; “aula expositiva, leitura, trabalho em
grupo, aulas práticas e laboratórios, estágio, grupo de verbalização, ensino com pesquisa (Aluno M);
“os métodos são aula expositiva, debate, trabalho de grupo, cada professor desenvolve um método
diferente (Aluna E)”; “aula expositiva, algumas vezes discursos, debates, trabalho em grupo, poucas
vezes estudo de caso (Aluno J)”. Na tabela 1 estão expostos os métodos utilizados no curso.
Tabela 1 – Percepções dos alunos sobre os métodos de ensino adotados
Períodos Períodos Períodos
Métodos Métodos Métodos
1º 5º 8º T 1º 5º 8º T 1º 5º 8º T
Expositivo 4 4 5 13 Seminário 2 1 3 Pesquisa 1 1
Leitura 2 1 3 Debate 1 1 2 Palestras 1 1
Estudo de Trabalhos
1 1 2 1 1 2 Aulas práticas 1 1
caso individuais
Estudo
2 2 Laboratório 2 1 3 Estágio 1 1
dirigido
Trabalho Produção Grupo de verbalização
2 4 5 11 1 1 2 2
em grupo de artigo e observação
Fonte: Autora da pesquisa (2016)
O resultado apontado na tabela 1, sobre a aula expositiva, corrobora com outras pesquisas que a
expõe como método mais utilizado no ensino superior (Gil, 1998; Mazzioni, 2009). Se esse método
for utilizado em conjunto com outros pode melhorar os resultados obtidos (Peblani &Domingues,
2008). Os achados desta pesquisa corroboram com a ideia de que professores utilizam mais os

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métodos tradicionais em detrimento dos ativos (Madureira, Succar Junior & Gomes, 2011). Uma
explicação a isso é o fato dos métodos novos requererem que professores replanejem suas aulas.
Na tabela 2 são demonstrados os resultados sobre os métodos de ensino que contribuem para o
processo de ensino aprendizagem, na percepção dos alunos.
Tabela 2 –Métodos que contribuem para o processo de ensino aprendizagem.
Períodos Períodos Métodos Períodos
Métodos Métodos
1º 5º 8º T 1º 5º 8º T 1º 5º 8º T
Expositivo 4 5 Seminário 1 1 2 Palestras 0
Aulas práticas /
Leitura 1 1 Debate 3 1 2 6 3 3 1 7
Laboratorio
Estudo de Trabalhos
1 1 1 3 1 1 Estágio 1 1
caso individuais
Estudo Produção
1 2 3 0 Grupo de
dirigido de artigo
verbalização e 1 1
Trabalho
2 2 4 Pesquisa 1 1 observação
em grupo
Fonte: Autora da pesquisa (2016)
Os alunos citaram aulas práticas/laboratório, debate, aula expositiva dialogada e trabalho em grupo
como os métodos mais eficazes para o processo de ensino aprendizagem. As percepções dos alunos
sobre este assunto podem ser constatadas nos trechos de entrevistas exibidos a seguir: “eu gosto
muito de discussões, debates, leituras e estudo dirigido e penso que aulas práticas também seriam
uma boa forma de aprender (Aluno C)”; “aulas práticas, estudos de caso e debate dependendo da
matéria (Aluno D)”; “aula expositiva dialogada, estudo de caso, seminários, aulas práticas (Aluno H)”;
“laboratório pra mim é o melhor (Aluno G)”. “Grupo de verbalização e observação, aula expositiva
dialogada, estágio (Aluno M)”; “aulas expositivas com feedback entre aluno e professor (Aluna N)”;
“trabalho em grupo é o que eu mais me identifico (Aluno F)”; “aulas práticas é o melhor (Aluno A)”.Na
tabela 2 pode ser constatado que a utilização de aulas práticas melhora o aprendizado dos alunos do
curso, assim como, a utilização de laboratório, trabalho em grupo e aula expositiva dialogada. A
ponte entre a teoria e a prática é percebida pelos alunos o que corrobora com outras pesquisas
como a de Miranda, Leal e Nova (2012) e de Masseto (2003).
Na tabela 3 são demonstrados os métodos que despertam maior interesse no curso.
Tabela 3 –Métodos que despertam maior interesse no curso
MÉTODOS PERÍODOS MÉTODOS PERÍODOS MÉTODOS PERÍODOS
1º 5º 8º T 1º 5º 8º T 1º 5º 8º T
Expositivo 1 1 2 Trabalhos individuais 1 1 Estágio 1
Trabalho em
3 3 Laboratório 1 2 3 Projeto 1
grupo
Seminário 3 1 4 Pesquisa 1 1 Simulações 1
Grupo de
Debate e
2 2 Aulas práticas 1 2 1 4 verbalização 2
discussões
e observação
Fonte: Autora da pesquisa (2016)
As percepções dos alunos sobre este assunto podem ser evidenciadas nos trechos de entrevistas
expostos a seguir: “aulas práticas, pois leva o aluno a vivenciar a realidade” (Aluna A); “gosto de
discussões e debates por que assim temos a oportunidade de observar opiniões diferentes e
adquirindo mais conhecimento” (Aluna C); “simulações, projeto, aulas práticas e debate” (Aluna D);
“laboratório, chama mais a atenção, pois não fica apenas no professor falando, o aluno participa da
aula e trás a realidade da contabilidade” (Aluno G). Sobre esse assunto o Aluno I diz que “os
métodos que despertam mais interesse são aqueles que envolvem mais a prática da contabilidade,
laboratório, estágio”; Para o Aluno L a “pesquisa em si é a que mais desperta interesse ela vai ser
capaz de demonstrar ou mostrar de certa forma o futuro profissional nosso, pesquisando áreas onde

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a gente atua e conversando com pessoas da área. Laboratório também, porque vai incentivar e trazer
a realidade do trabalho em si”.Para o Aluno M “grupo de verbalização é bom por que faz a gente
pensar, e refletir sobre a ideia que cada um tem sobre determinado assunto”. Acrescentando o Aluno
N expõe que “aulas expositivas com debates, grupo de observação e grupo de verbalização, por que
torna a aula mais dinâmica e que todos participam com mais interação".
De acordo com os resultados expostos na tabela 3, para os alunos do curso, os métodos que
despertam um maior interesse coincidem com os métodos que contribuem para o processo de
ensino aprendizagem e são eles: aulas práticas, laboratórios, seminários e trabalho em grupo, esses
foram os mais citados. As percepções dos alunos vão de encontro com a pesquisa de Miranda et al.
(2012) que demonstra que a aula expositiva, trabalho em grupo, seminários, estudo de caso, aulas
práticas em laboratório, debates, ensino com pesquisa, discussões, leitura, estudo dirigido e ensino
com pesquisa são as mais importantes para o curso de Ciências Contábeis.
Os alunos do curso foram questionados sobre o que deveria ser melhorado com relação aos métodos
de ensino adotados no curso. As percepções dos mesmos podem ser observadas nos trechos das
entrevistas a seguir: “os professores devem melhorar os métodos de ensino nos primeiros períodos,
pois muitos sofrem por ser algo fora da nossa realidade e os professores passam muitas coisas e
cobram também de uma realidade que a gente nunca vivenciou (Aluna A)”. A Aluna H relata que:

[...] acredito que os métodos deveriam ser diferentes nos primeiros períodos tendo em vista o índice de reprovação de básica
1 e básica 2 isso não é normal, não acredito que seja só desinteresse do aluno acredito que seja uma dificuldade mesmo de
assimilar o conteúdo. Acho que essa dificuldade é por conta da distância do que é ensinado na sala e a realidade do aluno,
de repente seja necessário influenciar os alunos a aprender as leis que regem nosso curso por que elas são importantes, me
vi muitas vezes tendo que decorar mais não sabia porque que eu estava aprendendo aquilo. Acho que básica 2 deveria ser
desmembrada em duas matérias, por que o professor sofre com tanto conteúdo e o aluno sofre com aquele monte de
informação, o tempo é pouco, acaba frustrando muitos alunos, muitos ficam atrasados outros desistem do curso. O estudo
de contabilidade é muito técnico e a gente não sabe por que estamos fazendo aquilo.

Nos primeiros períodos nota-se que há uma dificuldade de entender o conteúdo, é muita matéria
para pouco tempo, o que é ensinado está longe da realidade dos alunos o que acaba aumentando o
índice de reprovação e desistência do curso. Marion (1996) descreve que o ensino da contabilidade
deve ser dinâmico, relevante, estimulante, isso tornaria o curso mais atraente para os estudantes.
Outro aspecto observado é a falta de interação entre aluno e professores. O Aluno B diz que é
preciso “ter aulas mais dinâmicas”. Já para o Aluno D “nas aulas expositivas alguns professores
deveriam abrir espaço para ouvir a opinião dos alunos, temos professores que só falam”. “As aulas
deveriam ser mais dinâmicas, não apenas conteúdo e os professores falando, alguns professores
deveriam buscar melhorar as formas de ensino (Aluno C)”; “Alguns professores deveriam melhorar os
métodos para que os alunos sintam vontade de estudar, infelizmente alguns professores não são
acessíveis, e por já serem doutores se acham superiores aos alunos, tratando assim com arrogância
(Aluno E)”. O Aluno J expõe que: “existem alguns docentes que tem métodos muito monótonos
deixando assim os alunos desanimados, usando apenas aulas expositivas falando e falando, e acaba
não despertando tanto interesse dos alunos se a disciplina fosse aplicada com outros métodos”. A
falta de interação e a forma de exposição do conteúdo são apontadas pelo Aluno M: “primeiro parar
com as aulas que o professor apenas lê, para ter uma maior interação com os alunos e com o
assunto”. Pois, “quando o professor apenas lê não explica sem muita didática torna a aula monótona,
os alunos não conseguem absorver muita informação (Aluna N)”.
As falas dos alunos mostram aspectos que devem ser repensados pelos professores, por exemplo, a
falta de participação dos alunos durante as aulas torna a aula monótona. Outro ponto é ligar a teoria
com a prática. Os alunos devem deixar de ser meros expectadores e passarem a serem participantes
ativos do ensino. A meta central é tornar os alunos “pensadores-críticos” e o processo de
aprendizagem mais dinâmico (Marion, 1996). O ponto básico é que o professor e os alunos são

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responsáveis pelo processo de aprendizagem, o professor é apenas um facilitador e o aluno tem a


liberdade de escolher, expressar-se e agir (Marion, 1996). Gratz, Fonseca e Gomes (2013) reforçam a
ideia do professor facilitador ao enfatizar que em métodos de ensino ativos o professor interage com
os seus alunos, o conhecimento é bilateral, fluindo entre professor e alunos. A aula expositiva com a
participação do aluno questionando, respondendo, é um método que supera o tradicional, o aluno
passa a ser ativo, isso torna a aprendizagem mais dinâmica e melhora o ensino e a aprendizagem.
Os professores devem tratar os alunos com simpatia, compreensão e entusiasmo, afirma Nereci
(1981). “O papel do professor nessa tarefa é decisivo, pois depende dele, da sua liderança e
compenetração, o bom ou mau andamento dos trabalhos escolares” (Nereci, 1981, p. 40). Mager
apud Marion (1996, p. 31) diz que “quando o ensino modifica um aluno numa direção indesejável
(isto é se tem um efeito colateral desnecessário ou prejudicial, tais como reprimir a motivação), esse
não é considerado eficaz, e sim danoso ao ensino”.
A quantidade de aulas práticas também é um ponto a ser repensado pelos gestores do curso, assim
como pelos professores. Diferentes alunos apontam sobre as atividades práticas: “deveria se ter mais
aulas práticas, pois temos muita teoria (Aluno F)”; “está faltando a prática no curso, fora da sala de
aula, temos uma incubadora que não funciona (Aluno G)”. Para o Aluno I “seria melhor se os
universitários pudessem ter mais contato com a prática podendo ver como funciona a contabilidade
fora da universidade”. O que os alunos ressaltam sobre as aulas práticas é relevante, afinal elas
contribuem para o processo de ensino aprendizagem, além de despertarem interesse nos alunos. O
estudo de caso é um método onde os estudantes aprendem a aplicar teoria e conceitos para diversos
problemas, jogos de empresas e o uso de laboratórios são modelos de estratégias para melhorar o
ensino (Marion, 1996). A incubadora de empresas seria uma forma de aplicar atividades práticas.
Sobre a problemática das aulas práticas corrobora Marion (2001, p. 31) ao relatar que os alunos “não
estariam preparados para assumir a contabilidade de uma empresa”. Entende-se que muitas vezes
os alunos do curso de Ciências Contábeis não se sentem confiantes quanto ao exercício da profissão
que escolheram, a universidade deveria tentar incluir em sua grade curricular mais disciplinas
práticas, mostrando o mundo real da contabilidade (Oliveira et. al., 2011). Ferreira e Santos (2005)
apontam que ausência de aplicação da teoria leva a conclusão do curso sem noção profunda da
aplicação do que foi estudado nas disciplinas.
Percebe-se que os métodos de ensino aplicados no curso de Ciências Contábeis deveriam ser
melhorados de forma a contribuírem na formação dos alunos e futuros profissionais da
contabilidade. Não basta implantar mudanças se o aluno não deixar de ser agente passivo e passar a
ser agente ativo na aprendizagem. Por fim, os alunos foram questionados se queriam acrescentar
algo mais na entrevista, todos responderam que não. Cabe aos protagonistas do processo ensino
aprendizagem o debate sobre os métodos de ensino aplicados e se os objetivos propostos por meio
deles são alcançados. Afinal o objetivo da existência do ensino é o alcance da aprendizagem.

5 Conclusões

A pesquisa realizada teve como objetivo demonstrar a percepção dos alunos do Curso de Ciências
Contábeis da UFT sobre os métodos de ensino aplicados no curso. Durante o levantamento
bibliográfico foram identificados diferentes métodos de ensino, entre eles: aula expositiva,
seminário, trabalho em grupo, estudo de caso, estudo dirigido, laboratório, debate, aulas práticas,
dentre outros.
As entrevistas propiciaram a compreensão da percepção dos alunos sobre os métodos de ensino
aplicados no curso de Ciências Contábeis da UFT, os mesmos relataram os métodos que contribuem
para o processo de ensino aprendizagem, e os que mais despertam interesse no curso, além do que

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deveria ser melhorado. As metodologias de ensino que melhor contribuem para o processo de
ensino aprendizagem, segundo a percepção dos alunos são: aulas práticas, pois assim o aluno ligará a
teoria com a prática, aulas expositivas com diálogo entre professor e aluno, seminários, debate e
trabalhos em grupos foram os mais citados.
Embora as atividades práticas tenham sido citadas como contributivas ao processo ensino
aprendizagem, diferentes alunos apontaram a necessidade de melhoria. Tanto na forma como são
adotadas como na quantidade de atividades práticas. A forma como as atividades práticas estão
sendo aplicadas não supre os anseios dos alunos.
A presente pesquisa visa contribuir empiricamente ao apresentar a realidade de um curso superior
no que tange aos métodos de ensino adotados, para que haja o repensar das práticas docentes.
Portanto, é recomendável que os professores debatam sobre os resultados apontados pelos alunos e
busquem melhorias para suas práticas docentes, de modo a contribuir para o aprendizado do aluno.
Os professores são responsáveis pela formação do aluno, por esse motivo é aconselhável que os
profissionais se qualifiquem pedagogicamente.
Este trabalho se limita às percepções dos alunos, logo são necessários estudos que dêem voz aos
professores do curso, sobre suas opiniões quanto às metodologias de ensino adotadas. Isso daria um
panorama mais vasto, ou seja, um cenário que permite o cruzamento das informações e percepções
de alunos e professores. Além disso, pesquisas que fossem realizadas em outros períodos do curso
também são oportunas. O levantamento de cenários de outras Instituições de Ensino Superior e a
adoção de outros métodos de pesquisas também são viáveis.

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Eu, professora de EAD? A entrevista narrativa de uma professora


sobre sua experiência docente 1

1
Gleice Paixão , Lídia Rios1, Fabrícia Borges1,

1 Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília. gampaixao@gmail.com; lidiarios9@gmail.com


fabrícia.borges@gmail.com

Resumo. Este trabalho apresenta a entrevista narrativa de uma professora sobre sua experiência docente e
suas expectativas em relação à Educação a Distância. Optamos pelo uso de entrevista narrativa por
entendemos que por meio da narrativa de história de vida podemos ter acesso à experiência do outro, com
foco em sua própria interpretação. Destacamos a entrevista narrativa como um instrumento importante
para a Pesquisa Qualitativa, uma vez que se ocupa do que é pessoal/subjetivo e, ao mesmo tempo, daquilo
que é cultural/coletivo. Analisamos a entrevista narrativa sob a perspectiva da análise temática porque
acreditamos que é um método de análise flexível e útil para o tratamento dos dados que foram construídos
nesta pesquisa. A partir da análise da entrevista, percebemos a identidade da professora sendo construída
por suas relações presenciais e, por conseguinte, observamos sua dificuldade em se identificar com a
modalidade à distância.
Palavras-chave: Entrevista Narrativa; Identidade Docente; Educação a distância.

Me, a distance education teacher? The narrative interview of a teacher about her teaching experience
Abstract. This article presents the narrative interview of a teacher about her teaching experience and her
expectations regarding Distance Education. We chose the use of narrative interview because we understand
that through the narrative of lifestory we can have access to the experience of the other person, focusing on
their own interpretation. We emphasize the narrative interview as an important instrument for Qualitative
Research, since it deals with what is personal / subjective and at the same time of what is cultural /
collective. We analyzed the narrative interview from the perspective of the thematic analysis because we
believe it is a flexible and useful method of analysis for the treatment of the data. The results showed that
the teacher’s identity is built based on her in-person relationships, hence her difficulty in identifying with
the distance education modality.

Key-words: Narrative interview; Teacher’s Identity; Distance Education.

1 Introdução
As histórias de professoras, além de fazerem parte de uma coletividade, participam das construções
da atividade de professora e do seu percurso de vivência da feminilidade. Quando abordamos a
história de vida, fazemos em dois sentidos: a) como parte de uma coletividade e b) como construtora
de cada indivíduo. Desta forma podemos dizer, de acordo com Bruner (2001), que somos as histórias
que contamos e também as que ouvimos e interpretamos a partir de realidades vivenciadas e
sentidas.
A história coletiva, ainda que não seja separada das histórias individuais, é destacada por Benjamin
(1987, p.229) como o “objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo e vazio, mas

1 Este trabalho recebeu financiamento (para ser apresentado no evento) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Distrito
Federal (FAPDF) e do Decanato de Pós-graduação da Universidade de Brasília, aos quais prestamos os merecidos
agradecimentos.

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um tempo saturado de ‘agoras’. E ressalta que, a “[...] tradição dos oprimidos nos ensina que o
‘estado de exceção’ em que vivemos é na verdade a regra geral. Precisamos construir um conceito de
história que corresponda a essa verdade” (Benjamin, 1987, p.228). Nesse sentido, a história não é
construída pelos grandes fatos, que vigoram na ‘grande história dos vencedores’, mas em uma
história que acontece a cada momento nos segundos da vida.
Nesse trabalho, apresentamos a narrativa de uma professora sobre sua experiência docente em uma
disciplina de graduação de uma universidade pública da região central do Brasil. A disciplina foi
estruturada no formato semipresencial, com uso de recursos da modalidade de Educação à Distância
(EAD). A EAD tem sido largamente utilizada na educação após ter sua previsão legal afirmada na
atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil, 1996) e por ter sido recebida pela
sociedade como a solução para a falta de acesso aos cursos presenciais. Cabe destacar que, mesmo
antes da previsão legal amparar a EAD, sabe-se que essa modalidade já era praticada em cursos
supletivos. Assim, devemos entender que a linguagem, no caso a narrativa em especial, adquire uma
importância fundamental. Primeiro, porque o enfoque histórico-cultural (Vigotski, 2000, 2001), que
aqui adotamos, destaca a linguagem como um dos principais atributos de construção do ser humano;
e segundo porque através da linguagem podemos entender como se dá esta constante
transformação do indivíduo.
A partir da emergência do paradigma qualitativo na pesquisa científica, percebe-se que a entrevista
narrativa se apresenta como um instrumento valioso de produção de dados, porque é a partir dela
que a coincidência entre a produção oral e o pensamento é expressa na relação dialógica entre
entrevistado e participante. É, principalmente, por meio de narrativas que podemos ter acesso ao
que o outro pensa sobre si e sobre os fenômenos sociais de que faz parte, em uma organização da
oralidade em endereçamento ao entrevistador.
A EAD traz consigo muitos questionamentos, sobretudo sobre a (in)existência da formação docente
para atuar na modalidade. Ainda assim, é uma política educacional fortemente observada na
educação superior e que vem tendendo a se expandir até a educação básica, por meio de sua
inserção na educação profissional no ensino médio. Mas, se a EAD está aumentando seu leque de
atuação, como estaria a atuação do professor nessa modalidade? Amparada legalmente no Brasil pós
1996, a EAD tem sido recebida de que forma pelos professores que nela atuam?
Evidenciar a narrativa de uma experiência docente na EAD tem como foco mostrar como pensa um
profissional que atua na área e quais os conflitos que surgem na hora de ensinar por meio do uso de
tecnologias por quem não teve sua formação pautada por elas.

2 Narrativas como instrumento da Pesquisa Qualitativa


A forma como pensamos não segue uma construção lógica ou argumentos indutivos, mas segue
ritmos como o da contação de histórias ou de narrações (Bruner, 2004) e não há experiência humana
que não possa ser expressa em forma de narrativa (Jovchelovitch e Bauer, 2000). Partindo dessas
premissas, acreditamos que os relatos de uma professora sobre sua experiência docente na
educação à distância, narrados por ela mesma, nos mostram o quanto as narrativas de história de
vida são extremamente suscetíveis a influências culturais, interpessoais e linguísticas (Bruner, 2004).
Nas narrativas, como o narrador e a figura central são a mesma pessoa, certos dilemas de cunho
metodológico são gerados. Dilemas que se desdobram frente à fidedignidade do conteúdo da
narração, atributo deveras perseguido pela cientificidade em geral. Ademais, há muito tempo se
considera que aquilo que as pessoas falam não é necessariamente aquilo que elas fazem. Bruner
(1997, p.27) critica essa afirmação ao asseverar que separar o que a pessoa diz daquilo que ela faz é
“fazer má filosofia, má psicologia e leis impossíveis”. Para o autor, dizer e fazer compõem uma
unidade funcionalmente inseparável e tentar dissociá-las é trabalho estéril.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A busca pela racionalização na ciência tendeu a suscitar dúvidas sobre a veracidade das informações
obtidas por meio de narrativas, porque estas não seriam passíveis de verificação, validação e
conformação sob a perspectiva objetiva. Contudo, essa é uma visão de ciência que a pesquisa
qualitativa vem contrapor e, de antemão, estabelecer que os pontos de vista subjetivos são o
primeiro ponto de partida para essa abordagem (Flick, 2009) e isso, por si só, já vai de encontro à
objetividade reinante nas pesquisas científicas.
Bruner (2004) afirma ainda que, com as narrativas, podemos perceber não com o narrador é, mas
como ele constrói a si mesmo. Quando alguém nos conta a sua vida é sempre uma realização
cognitiva, ressalta Bruner, e nunca é um recital de algo tão claro como um cristal. As questões de
fidedignidade, se tomadas como sinônimo de literalidade, não são perseguidas, pois o que se busca é
compreender como o narrador pensa sobre si, e o quê ele pensa sobre si. Concordamos com o que
afirmam Silva e Trentini (2002, p. 426), “Narrativas são sempre versões editadas do que aconteceu,
não são descrições objetivas e imparciais, pois a pessoa sempre faz escolhas sobre o que quer
contar”. Em suma, literalidade não é a questão central quando se trata de pesquisa com técnica de
entrevista narrativa.
Diante do anteriormente exposto, consideramos que as narrativas são importantes instrumentos de
pesquisa qualitativa, porque é por meio delas que podemos ter acesso à experiência do outro, ainda
que de modo indireto, pois a pessoa traz sua experiência até nós da maneira como ela a percebeu,
isto é, da maneira como a interpretou. A pessoa que narra sua história, já a narra do ponto de vista
do agora, tecendo reconstruções do passado com a sua compreensão atual. Dessa forma, ela se
pauta no presente, entretanto tem como referência o passado reconstruído e ambos, passado e
presente, são usados para gerar expectativas sobre o futuro (Silva & Trentini, 2002).
Outro aspecto das narrativas que merece destaque é que elas não se resumem ao produto de uma
experiência individual, pois são construídas dialogicamente e utilizam formas culturais populares
para descreverem experiências que são compartilhadas (Silva & Trentini, 2002). Mulayert et al (2014)
acreditam que os processos que ocorrem na sociedade são formados por ações individuais e que as
entrevistas narrativas podem evidenciar aspectos desconhecidos da realidade social a partir dos
discursos individuais e, além disso, a narrativa, para estes autores, coincide com uma perspectiva de
movimento na sua qualidade teórica, pois, por meio da narrativa é possível acessar novas questões
que podem acarretar em nova orientação da área em estudo.

3 O método

A pesquisa foi realizada no contexto de uma disciplina desenvolvida no formato semipresencial em


um curso de graduação. Segundo o plano da disciplina, houve a intenção de fazer com que
momentos presenciais e à distância dialogassem continuamente. A disciplina foi organizada em 4
módulos no formato semanal e a apresentação da disciplina enfatiza, de antemão, que as disciplinas
semipresenciais são semelhantes às presenciais quanto às exigências acadêmicas e ressalta, ainda, a
obrigatoriedade de horário de estudo e das atividades a cumprir. Realizou-se entrevista narrativa
com uma das professoras da disciplina que estava atuando como docente pela primeira vez com o
formato semipresencial e, por conseguinte, com a modalidade EAD. Cabe destacar, que a referida
disciplina era realizada anteriormente de forma totalmente presencial e era a primeira vez que
acontecia com o formato reformulado.
Ressaltamos que a opção pelo uso da entrevista narrativa se deu em razão de considerá-la como uma
forma de entrevista não estruturada, de profundidade e com características específicas. Como
destacam Jovchelovitch e Bauer (2000), o surgimento da entrevista narrativa foi motivado por uma
crítica ao esquema pergunta-resposta aplicado em grande parte das entrevistas. Portanto,
consideramos que para fomentarmos a narrativa de uma experiência, a entrevista narrativa

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conseguiria abarcar a profundidade do relato e trazer à tona dados de extrema relevância para a
compreensão da identidade docente.
Destacamos que a entrevista realizada com a professora teve como intuito fazer com que a
entrevistada narrasse sua experiência docente na disciplina organizada sob o formato
semipresencial, sobretudo ao tocante a sua experiência com a modalidade à distância e o impacto
desta experiência no desenvolvimento de sua identidade como docente. Seguindo a metodologia do
uso de entrevistas narrativas, a iniciação se deu a partir de um tópico inicial a respeito da sua
experiência docente com a intenção de que a entrevistada discorresse sem interrupção. Após as
codas, isto é, sinais de finalização dados pela entrevistada (Jovchelovitch & Bauer, 2000), a
entrevistadora utilizou-se de perguntas com a finalidade de compreender alguns aspectos da
narração, porém evitou o uso de perguntas que indicassem referência a atitudes ou que pudessem
suscitar discussões sobre as contradições presentes na narrativa.
É importante que o entrevistador não faça interferências diretas no momento de narração do
entrevistado para que não se prejudique o fluxo de pensamento (Greenhalgh et al, 2005). Se ocorrer
a interferência, existe o perigo da produção da informação ser mais do pesquisador e não tanto do
entrevistado. Muylaert et al (2014) ressaltam que é a colaboração entre entrevistador e entrevistado
por meio da interação que faz suscitar o processo de acesso às reminiscências da memória em
articulação com o entrevistador que se expressa pela característica dialógica da entrevista. Ainda
Muylaert et al (2014), aportados em Benjamin (1987), consideram a narrativa como uma forma
artesanal de se comunicar e enfatizam que ela não estaria a favor de transmitir informações de
maneira exacerbada, mas tem a intenção de transmitir conteúdos a partir dos quais as experiências
possam ser repassadas a outros. Portanto, o momento da entrevista se estabelece como um
cronotopo, em que tempo e espaço da relação participante-pesquisador coincidem-se e promovem o
encontro. Um encontro dialógico, em que a construção da história narrativa é também de uma
mediação e interação com o entrevistador, portanto uma construção de ambos, sobre um evento do
participante (Bakhtin, 2006).
A entrevistadora partiu de uma questão exmanente para as questões imanentes. As questões
exmanentes são as que são trazidas para a entrevista pelo entrevistador, tais questões são
elaboradas no momento de planejamento que antecede a entrevista propriamente dita. Já as
questões imanentes são as que surgem no decorrer da entrevista a partir da narrativa do
entrevistado (Jovchelovitch & Bauer, 2000).
Após a transcrição da entrevista, foram levantados os temas que emergiram da narrativa e separados
os subtemas também. A partir disto, analisamos tematicamente a narrativa da professora, pois
concordamos com Muylaert et al (2014) quando expressam que as entrevistas narrativas podem ser
analisadas de diferentes formas após a captação e a transcrição dos dados por se apresentarem
como uma contação de história.
Quanto à análise temática, para Clarke e Braun (2016), ela fornece uma ferramenta de pesquisa
flexível e útil, que potencialmente pode providenciar um conjunto de dados rico, detalhado e
complexo. Tais autores definem a análise temática como um método que identifica, analisa e relata
padrões (temas) dentro de dados. Por sua vez, Martins e Ferreira (2016) observam que a análise
temática é um método que consiste na construção de um referencial de codificação com uso de
procedimento de redução do texto qualitativo até chegar às palavras-chave e, seguidamente,
desenvolve-se um sistema de categorias em que os textos podem ser codificados. Chamamos esta
redução como redução a temas e subtemas, por acreditarmos que tais termos se aproximam mais da
proposta da análise e por nos aportarmos na perspectiva bakhtiniana que entende tema como um
sistema de signos dinâmico e complexo o qual procura se adaptar às condições de um dado
momento (Bakhtin, 2006).

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4 A narrativa da professora: parte dos dados produzidos com a entrevista

Antes de iniciarmos os temas emergidos da entrevista, é necessário frisar que seguimos o conceito
bakhtiniano que afirma que tema, diferentemente de significação, é concreto e histórico e tende ao
fluído e dinâmico, recriando e renovando incessantemente o sistema de significação, ainda que parta
deste sistema (Cereja, 2014). Também consideramos a máxima bakhtiniana de que não há tema sem
significação, assim como não há significação sem tema. É impossível designar a significação de uma
palavra isolada sem fazer dela o elemento de um tema, sem construir uma enunciaçao, sem dar um
exemplo (Bakhtin, 2006). Com base nisso, após a transcrição da entrevista e sua redução a temas e
subtemas, elencamos os três temas principais que apresentamos logo abaixo:

4.1 Tema 1: Experiência docente

É fato que a construção da identidade docente é um processo complexo e amplo e tem seu início já
nos primeiros anos da educação formal ou, até mesmo, nas primeiras manifestações da cultura
escolar. A escola, os professores, os alunos e todos os elementos que a compõem fazem parte de um
jogo dramático que se chama educação (Borges, Araujo &Amaral, 2016). Não tendo como se furtar a
essa realidade, na narrativa da entrevistada fica evidente que a construção de sua identidade de
professora foi pautada nas experiências vivenciadas ao longo da vida e que, inclusive, tais
experiências remontam a ações ocorridas ainda durante a sua infância:
“Eu já sou professora desde os seis anos. Minha mãe conta que eu pegava
as criancinhas da rua, principalmente aquelas que eram bem pobrezinhas,
levava pra casa, dava banho, dava as minhas roupas, a mamãe preparava
lanche e eu ia ensinar pra elas.”
Já no início da entrevista a professora demostra relação muito próxima com a educação, tanto
quando se refere a sua experiência na musicalização, quanto quando se atém às aulas na teologia
(duas das três formações acadêmicas que a professora possui). A entrevistada afirma que aos treze
anos de idade já era monitora na educação infantil. Percebemos, com a narrativa, que a docência
atravessou sua história desde cedo.
As experiências de dar aula surgem como uma brincadeira infantil e vão se aperfeiçoando e tomando
um caráter mais profissional a partir de sua prática e da busca por formação profissional. Para
Vigotski é através da atividade humana que o ser humano transforma o contexto social no qual está
inserido e nesse processo constitui a si próprio como sujeito, isto é, constitui o seu psiquismo
(Zanella, 2005).
Um destaque que podemos fazer é que, com base na experiência da docente, a aula deve ser
dinâmica para conquistar o aluno e, por isso, ela faz coisas que gostaria que as pessoas fizessem por
ela também:
“Eu tenho aquela teoria de que eu tenho que conquistar o aluno para mim,
não pro que eu dou. Se eu conquistá-lo pra mim, tudo o que eu der vai ser
bom.”
“Coisas assim que eu acho que são interessantes e que eu gostaria que
fizessem comigo. Eu amo dar aula, amo dar aula, sempre preparo as aulas
com esmero. Gosto muito de preparar [a aula].”
A família da entrevistada tem um destaque importante na formação de sua identidade docente.
Ações sutis da mãe e do avô da professora, constantes em sua narrativa, mostram um subsídio ao
exercício docente desde cedo:
“A mamãe preparava lanche e eu ia ensinar pra elas [crianças].”
“Meu avô falava que se me desse o microfone pronto né?”

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A sua identificação como professora se sobressai na fala que segue:


“Eu sempre fui professora. Eu nunca tive problema com público, nunca tive
problema em ensinar.”
Iza et al (2014) afirmam que a identidade do professor se baseia em um equilíbrio singular entre as
características pessoais e os percursos profissionais construídos ao longo da história de vida, isto
ficou bastante evidente na narrativa da entrevistada.

4.2 Tema 2: Formação profissional

Borges, Araújo e Amaral (2016) observam que vivemos em um mundo construído por nossas
relações sociais que não são isentas de ideologias e de uma base cultural. Ademais, os autores frisam
que o desenvolvimento humano se dá nesse meio cultural e ideológico e por isso, relacionado à
educação, o desenvolvimento humano entrelaça-se com a educação formal. Como aqui estão em
pauta a professora e sua identidade, compreendemos que os cursos de formação de professores se
configuram como momentos basilares para indicar ao futuro professor que sua formação pode ser
capaz de lhe propiciar habilidades para atuar como docente. Entretanto, tornar-se professor de uma
modalidade de educação em que não há tradição de formação profissional se mostra, ainda, um
desafio.
No caso em tela, a narrativa da professora sobre sua formação docente enquanto professora
presencial é bem sólida. Ela descreve sua trajetória na faculdade de música e de teologia e afirma
que a escolha por essas duas formações foi baseada nas suas vivências, pois já trabalhava com
musicalização e teologia antes da formação acadêmica:
“Quando eu entrei na faculdade pra fazer música, eu já sabia muita coisa e
eu entrei meio que pra me pautar. E a teologia também sempre me
encantou muito, então eu queria também estudar”.
Nota-se que a docência esteve fortemente presente em sua vida. Inicialmente fez especialização em
docência, depois sentiu a necessidade de fazer a formação em pedagogia. A busca por formação na
área educacional se mostrou preemente na narrativa da professora.
“Eu fiz uma especialização em educação, em docência. Mas aí depois eu
senti a necessidade de estudar um pouco a pedagogia, aí eu fiz pedagogia
depois da especialização”.
Cabe destacar que ser professor é uma construção obtida a partir de um longo processo, sendo
necessário tempo para apreender a formação, para saber como agir frente às dificuldades que
possam surgir na prática docente, e para tomar decisões a respeito dos melhores caminhos a seguir.
Tal construção se dá por meio das formações: escolar, inicial e continuada. Entretanto, as diversas
experiências pessoais e as influências sociais também impactam nessa construção. Constituir-se
como professor é processo permanente e está fortemente atado à cultura e às demandas que se
apresentam na sociedade (Iza et al, 2014).
Tratando-se da EAD, apesar da formação em docência, a entrevistada menciona que não teve
experiências com a modalidade à distância. Essa lacuna na formação reflete a insegurança sobre
como agir enquanto professora desse formato de educação. Ao longo da fala sobre a disciplina à
distância, ela demonstrou não entender como iria se dar o processo.
“Eu não tô entendendo ainda exatamente como vai ser o processo. E eu
nunca participei de aula à distância”.
As inseguranças da entrevistada com a modalidade à distância são encontradas em vários
professores brasileiros. Ainda há carência de formação e prática nesse cenário em que a modalidade
vem se expandindo. Acreditamos que revelar a narrativa de uma professora sobre a temática possa
contribuir para se discutir sobre as necessidades de formação profissional para a modalidade EAD.

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4.3 Tema 3: Diferenças entre a modalidade presencial e à distância

A modalidade EAD, apesar de não ser uma modalidade nova em termos de existência, só foi
amparada legalmente no Brasil a partir da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB
9394/96). Concomitante à promulgação da Lei, percebeu-se um incremento das Tecnologias da
Informação (TIC’s) que proporcionaram a difusão da EAD, pois, a partir delas, se ampliou o leque de
atuação da modalidade que antes ficava restrita a ações de rádio, tv e correios.
Dentro da modalidade EAD, se observa a presença da figura do tutor que é o docente que atua com
os alunos, mas ao mesmo tempo não é considerado como professor. Brust e Bohana (2014)
destacam que a docência na EAD não está devidamente profissionalizada e que o sistema de tutoria
ainda é visto de maneira negativa e, além disso, é depreciada se comparada à docência presencial.
Pela falta de experiência na modalidade à distância, a entrevistada se identifica como professora
presencial:
“Sinceramente eu me penso professora presencial, eu amo esse
envolvimento, eu acho que ele faz toda a diferença”.
Observa-se na narrativa que as palavras envolvimento e interação estão associadas à modalidade
presencial. Pressupõe-se, então, que a entrevistada vê a modalidade à distância como algo que
afasta as pessoas uma das outras e que a troca de saberes fica prejudicada pela diminuição do
contato presencial:
“Eu achei muito ruim. Assim… eu, particularmente, eu sei que é uma boa
oportunidade, é uma boa possibilidade pra aqueles que têm dificuldade.
Mas eu gosto muito do envolvimento, eu gosto muito da interação, da
troca, eu acho que é muito importante. Sobretudo nos dias atuais, né?
Todo mundo é muito distante.”
Com base na fala da entrevistada, pudemos observar que a principal diferença que ela destaca entre
a modalidade presencial e a distância é o envolvimento dos alunos com os professores. Cabe a nós
destacarmos que algumas pesquisas feitas (Borges, Almeida & Mozzer, 2014; Borges, Linhares &
Caixeta, 2011) têm demonstrado que a identidade e o posicionamento do professor amparam-se e
constituem-se, principalmente, a partir de sua interação com o aluno (Borges, Araujo &Amaral,
2016). Portanto, a questão da relação professor-aluno merece destaque na formulação de políticas
educacionais, além de maior debate frente à expansão da EAD.

5 Conclusões

O objetivo dessa pesquisa foi analisar, por meio de entrevista narrativa, a construção da identidade
docente em relação à modalidade à distância. Concordamos que as experiências de vida podem ser
expressas em forma de narrativa e, por esta não se configurar em um relato literal do
acontecimento, há espaço para reflexão e mudança de posicionamento em relação ao objeto de
estudo.
Com a narrativa da entrevistada, pudemos perceber como ela se constrói como professora ao falar
de si e de suas experiências. Na entrevista, notou-se que a entrevistadora foi uma mediadora do
processo de construção da narrativa e do próprio pensar sobre o assunto. Para nós, a entrevista fez
a professora refletir sobre a modalidade à distância e sobre suas inseguranças. Essa reflexão sob
novas perspectivas foi proporcionada pela mobilidade da narrativa. Reiteramos que compreendemos
que o que ocorreu foi um encontro dialógico, em que a construção da história narrativa foi também a
construção de uma mediação e interação com o entrevistador. Foi, enfim, uma construção de ambos,
sobre um aspecto que antes era específico da entrevistada (Bakhtin, 2006).

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Ao apresentarmos os resultados, observamos que a identidade docente da entrevistada foi


construída desde a infância, por meio de brincadeiras e posicionamentos de professora. A família
teve papel facilitador nesse processo, incentivando-a e dando recursos para o desenvolvimento da
habilidade de ensinar. Esses recursos foram se desenvolvendo em habilidades reais e refletiram na
forma da entrevistada atuar como docente.
Pela narrativa fica claro que, para a participante, a aula precisa de dinamismo e novidade e que ela
não vê a modalidade à distância como promotora de envolvimento dos alunos com os professores.
Considerando os resultados obtidos, a narrativa da história de vida nos esclareceu os motivos pela
qual a entrevistada não se identifica como professora da modalidade à distância. Em toda a sua
história de vida, ela teve experiências presenciais e o fato de dar aula desde os seis anos de idade –
numa época em que a tecnologia digital, hoje tão cara à EAD, não era acessível - constrói o
entendimento de que o envolvimento com o aluno necessita de contato físico para se estabelecer.

Referências

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Validação de modelo teórico: conhecendo o processo experencial


de professores médicos a partir da Teoria Fundamentada nos
Dados

1
Danielle Abdel Massih Pio1, Sílvia Cristina Mangini Bocchi2, Mara Quaglio Chirelli , Juliana
Ribeiro da Silva Vernasque1
1
Faculdade de Medicina de Marília, Brasil. danimassihpio@hotmail.com; marachirelli@gmail.com;
juribeiro@usp.br
2 Universidade Estadual Paulista, Campus Botucatu, Brasil. sbocchi@fmb.unesp.br

Resumo. Tem-se como objetivo apresentar a validação de um modelo teórico pautado em um estudo sobre
o processo experiencial do professor médico com a formação profissional do estudante de Medicina.
Utilizou-se a Teoria Fundamentada nos Dados como referencial metodológico. A apresentação do modelo
aos participantes da pesquisa foi realizada em dois momentos, para que a maioria pudesse ler e comentar
como parecia se ajustar aos seus casos. Os participantes validaram a experiência positivamente,
acrescentando a possibilidade que uma pesquisa qualitativa traz no sentido da tradução da realidade. O
momento mobilizou gratidão para os participantes, por despertar reflexão para outras leituras do processo
pedagógico. A técnica comprovou-se como valiosa para as pesquisas qualitativas, ao confirmar o modelo
teórico representativo da experiência.
Palavras-chave: Estudos de validação; Pesquisa qualitativa; Educação médica; docentes; Educação.

Theoretical model validation: getting to know medical professors experiential process through grounded
theory
Abstract: The aim of this work is to present the validation of a theoretical model based on a study about the
experience of medical professors with the professional formation of Medicine students. The methodology
we used was the grounded theory. The presentation of the model to the participants of the research was
carried out in two different moments, so that the greatest part of them were able to read it and comment
on the way it seemed to fit their cases. The experience was validated by the participants, who added to it
the possibility that is brought by a qualitative research concerning the translation of reality. The participants
felt grateful for the moment, because the reflection for other readings related to the pedagogical process
was evoked. The technique was verified as valuable for qualitative research, since it validated the
theoretical model that represents the experience.
Key words: Validation studies; Qualitative research; Medical education; Professors; Education.

1 Introdução

A validação nos estudos qualitativos vem se consolidando como um momento importante nas
pesquisas ao evidenciar a capacidade de captar ou revelar um dado fenômeno (Backes, Erdmann,
Buscher & Backes, 2011; Souza & Silva, 2011; Barbosa, 2013). Contribui para verificar a
representatividade e dimensão de cada categoria dentro da experiência investigada, evidenciando
que as interpretações do pesquisador são correspondentes à realidade.
Para Strauss e Corbin (2008), embora alguns dados possam ser quantificados, como no caso do censo
ou de informações históricas sobre pessoas ou objetos estudados, o grosso da análise é
interpretativa. Na verdade, o termo “pesquisa qualitativa” pode ter outros significados, a depender
dos contextos. Alguns pesquisadores reúnem dados a partir de entrevistas e observações, técnicas

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normalmente associadas aos métodos qualitativos. Porém, eles codificam os dados de uma forma
que permitam que sejam estatisticamente analisados. Esses são, na verdade, dados qualitativos
quantificados. Ao falarem sobre análise qualitativa, referem-se não a quantificação de dados
qualitativos, mas, sim, ao processo não matemático de interpretação, feito com o objetivo de
descobrir conceitos e relações nos dados brutos e de organizar estes em um esquema explanatório
teórico (Strauss & Corbin, 2008).
Segundo Minayo (2010), pesquisar revela uma atitude e uma prática teórica de constante busca e,
por isso, sua característica é do acabado provisório e do inacabado permanente. A aproximação da
realidade nunca se esgota, fazendo uma combinação singular entre teoria e dado, pensamento e
ação.
Teorias fundamentadas, por serem baseadas em dados, tendem a oferecer discernimento, melhorar
o entendimento e fornecer um guia para ação. A análise é realizada por meio da interação entre o
pesquisador e o dado. É um exercício de ciência e criatividade, pelo rigor e capacidade de nomear
categorias, fazer perguntas, comparações e extrair um esquema inovador integrado, frente à massa
de dados brutos desorganizados (Strauss & Corbin, 2008).
Lasch et al. (2010) ao realizarem comparação entre abordagens da pesquisa qualitativa, trazem a
Grounded Theory ( Teoria Fundamentada) como referencial metodológico que assegura o significado
do conceito nas palavras e ações dos participantes desde o início, não da aplicação de uma teoria ou
conceitos a priori.
Os procedimentos de codificação envolvem identificar, desenvolver e relacionar os conceitos, que
são os blocos de construção da teoria. As categorias (subprocessos) são abstrações do fenômeno
observado nos dados e formam a principal unidade de análise da Teoria Fundamentada nos Dados
(TFD). A teoria se desenvolve por meio do trabalho realizado com as categorias, que faz emergir a
categoria central, sendo geralmente um processo, como consequência da análise (Strauss & Corbin,
2008) .
Quando se fala em validação do modelo teórico, se pensa na representação da realidade, a partir da
interpretação abstrata realizada. Ou seja, à medida que a teoria surgiu a partir dos dados, no
momento da integração, ela representa uma interpretação dos dados brutos. Dessa forma, é
importante determinar como a abstração se ajusta aos dados brutos e também verificar se algo
importante foi omitido do esquema teórico (Strauss & Corbin, 2008).
Há várias formas de validar o modelo teórico. Uma forma é voltar e comparar o esquema com os
dados brutos e, outra forma, é contar a experiência configurada aos informantes ou pedir a eles que
leiam e comentem como parece se ajustar aos seus casos (Strauss & Corbin, 2008).
Memorandos e diagramas permitem aos pesquisadores manter um registro do processo analítico,
com representações visuais das relações entre os conceitos (Strauss & Corbin, 2008). O uso de
memorandos e comparação constante dos dados (Leite, 2015) auxilia no desenvolvimento da
pesquisa, oferecendo um modelo teórico que permite nova compreensão de um fenômeno, com
grande possibilidade de auxílio em determinadas áreas, como Tierney, Seers, Tutton & Reeve (2017)
discutem no caso de uma pesquisa em saúde.
Em uma etapa seguinte, o pesquisador pode testar o esquema com os participantes da pesquisa,
mostrar o modelo teórico e solicitar seu feedback. Usar o feedback dos participantes auxilia na
revisão da teoria e pode levá-la à sua forma final (Grossoehme, 2014).
Outra forma de validar é realizar a apresentação do modelo aos informantes ou pedir a eles que
leiam e comentem como parece se ajustar aos seus casos. Vale esclarecer que o esquema elaborado
não vai se ajustar em todos os aspectos de todos os casos, pois a teoria é uma redução dos dados.
Mas, em um sentido mais amplo, os participantes devem ser capazes de se reconhecer na
experiência contada (Strauss & Corbin, 2008) .

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Neste sentido, este trabalho tem como objetivo apresentar a validação de um modelo teórico
pautado em um estudo sobre o processo experiencial do professor médico com a formação do
profissional de medicina. O trabalho original encontra-se fudamentado no seguinte problema de
pesquisa: Como se configura o processo experiencial do professor médico com a formação do
estudante de Medicina de 1a e 2a séries e 5a e 6a séries da Faculdade de Medicina de Marília
(FAMEMA)? Os objetivos, relacionados ao estudo original, foram: Compreender o processo
experiencial do professor médico com a formação profissional do estudante de Medicina de 1a e 2a
séries e 5a e 6a séries do curso e elaborar um modelo teórico representativo desse processo
vivenciado.
Para responder a questão, foi realizado o processo de construção da teoria por meio da Grounded
Theory, porém neste trabalho trataremos do momento da validação teórica aos particpantes, que foi
de grande auxílio para o refinamento da teoria.

2 Metodologia

O estudo que originou o modelo foi conduzido em uma instiuição de ensino superior, com
professores médicos do curso de medicina, atuantes no curso de graduação, critério esse para
inclusão na pesquisa. Foram considerados para coleta dos dados apenas os professores das 1a e 2a
séries do curso e das 5a e 6a séries, respectivamente, cenários em que se predomina a prática na
atenção primária e no cenário hospitalar, caracterizados os primeiros pela integração entre os cursos
de medicina e enfermagem.
Ressalta-se que, desde a criação dos cursos até a década de 90, teve-se uma organização curricular
pautada no ensino tradicional, centrado no desenvolvimento de técnicas e voltado para o cenário
hospitalar, com ênfase no conhecimento transmitido pelo professor. O início de novos projetos
educacionais para os cursos de Medicina e Enfermagem ocorre, respectivamente, em 1997 e 1998
(Francisco & Tonhom, 2012).
Com o início do processo de mudanças pedagógicas, houve grande necessidade de capacitação
docente para possibilitar a implementação e dar sustentabilidade aos novos métodos (Faculdade de
Medicina de Marília, 2008). O esforço de capacitação docente foi visto sob a perspectiva de
alavancar as mudanças e desenvolver permanentemente o currículo, entendido como construção
social que representa a totalidade das interações e das situações de aprendizagem vivenciadas por
docentes e estudantes na prática educativa (Lima, Komatsu & Padilha, 2003).
Partiu-se da interrogação dos autores acerca do caminho percorrido pelo professor, considerando
sua singularidade e o cenário educacional, devido a percepção da baixa participação de professores
médicos em algumas atividades curriculares e nas atividades de Educação Permanente (EP)
promovido pelo Programa de Desenvolvimento Docente (PDD) institucional.
O estudo teve parecer consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de
Medicina de Marília sob n. 259.123. Participaram do estudo original os professores médicos das
Unidades de Prática Profissional - UPP (que utilizam o método da problematização) dos 1º, 2º, 5º e
6º anos e das Unidades Educacionais Sistematizadas - UES (que utilizam a Aprendizagem baseada em
Problemas) dos 1º e 2º anos. Professores de outras categorias profissionais não foram incluídos no
estudo devido à intencionalidade de explorar a natureza da experiência do professor médico.
Os professores foram convidados e informados sobre o objetivo da pesquisa, por meio da leitura do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido de Participação na Pesquisa (TCLE). As entrevistas foram
realizadas em locais que assegurassem o anonimato e o sigilo das informações e foram
audiogravadas, tendo duração média de 40 minutos. Com o intuito de preservar o anonimato dos
participantes, cada professor foi identificado com uma letra, entre parênteses, ao final dos trechos
das entrevistas. A representação inicial “T” foi utilizada para os tutores (das UES) e “F” para os

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facilitadores (das UPP). Havia professores que exerciam papéis como tutores e facilitadores no
mesmo ano ou em anos diferentes. Por isso, após a (s) letra (s), foi diferenciado o ano dos
professores. Quando utilizado “TF2a F6a”, por exemplo, significa ser este professor, tutor do segundo
ano e facilitador da UPP do sexto ano.
A amostra foi intencional, constituída por saturação teórica, ou seja, por meio de coleta e análise
concomitante, segundo os passos propostos pelo referencial metodológico, finalizado com a
construção e validação do modelo teórico com os próprios dados e com os participantes. Dessa
forma, os participantes foram convidados por cenário educacional e por série para integrar a
amostra, até que a saturação teórica fosse alcançada. A saturação se deu na 19a entrevista. Isso
significou até o momento em que: (a) nenhum dado novo ou relevante surgiu em relação a uma
categoria, (b) a categoria estava bem desenvolvida em termos de propriedades e dimensões,
demonstrando variação, e (c) as relações entre categorias foram bem estabelecidas e validadas
(Strauss & Corbin, 2008). Mediante o realinhamento dos componentes (categorias, subcategorias e
elementos) que formaram os subprocessos, pôde-se descobrir uma categoria designada central que
os abarcasse, constituindo então o processo da experiência, denominado: “Entre aproximações,
encontros, desencontros e reencontros do professor médico com métodos ativos de ensino-
aprendizagem: gestão e formação permanente como mediadoras do desenvolvimento docente”.
Elaborou-se, asssim, um diagrama, que foi capaz de explicar a maioria dos dados e a experiência
configurada, conforme uma das maneiras recomendadas por Strauss e Corbin (2008). Já tendo feito a
primeira forma de validação, optou-se também pela apresentação dos resultados e do modelo
teórico aos participantes da pesquisa.
Uma vez que se tenha a ideia de como as categorias estão reunidas, a classificação é importante
porque é passo final para o processo analitico. Memorandos e diagramas permitem aos
pesquisadores manter um registro do processo analítico. Os diagramas são representações visuais
das relações entre os conceitos (Strauss & Corbin, 2008). Com essa finalização, o pesquisador pode
testar o esquema com os participantes da pesquisa, como realizado no referido estudo.
O intuito da validação foi identificar se o que os professores vivenciavam estava expresso no modelo
teórico construído, englobando a experiência do professor médico com métodos ativos de ensino-
aprendizagem. Foi verificado se os componentes estavam descritos como haviam apresentado nas
entrevistas ou se gostariam de acrescentar algo à experiencia descrita ou ao modelo.
Foram convidados para participar da validação do modelo 17 dos 19 professores participantes, uma
vez que dois haviam se desligado da instituição, o que inviabilizou o contato com eles.
Primeiramente, realizou-se convite por e-mails e pessoalmente, foi feita a consulta aos professores
sobre viabilidade de duas datas a serem agendadas, assim como de horários de participação da
validação do modelo teórico, representativo de suas experiências.
Apesar de todos professores manifestarem interesse em participar, a dificuldade de se ausentarem
dos cenários assistenciais e/ou de ensino, foi o principal impedimento para se realizar a validação em
um único encontro e com todos.
Assim, compareceram, na primeira data agendada, cinco professores, além da pesquisadora e uma
relatora, em uma sala previamente reservada na Unidade de Educação da FAMEMA. Iniciou-se com a
apresentação da atividade e de sua intencionalidade, além do papel da relatora, com solicitação de
consentimento para sua inclusão e para gravação do conteúdo discutido no encontro.
Iniciou-se a apresentação do trabalho com a explicação dos objetivos da pesquisa e da validação,
explicitando os referenciais metodológicos e teóricos utilizados. Sequencialmente, foi permitido aos
presentes o conhecimento dos subprocessos, da experiência configurada, culminando no modelo
téorico.

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Em seguida, foi aberto para que pudessem expressar o que achavam, assim como dúvidas,
solicitando para que comentassem como percebiam sua experiência nesse modelo e se algo não
estava representado.

3 Resultados

O modelo teórico foi bem acolhido pelos presentes que validaram a experiência positivamente,
demonstrando inicialmente, de modo não verbal, que estavam gostando do que estava sendo
apresentado, por meio de sorrisos e expressão corporal afirmativa. Validaram também verbalmente,
conforme algumas colocações registradas:“No que foi a entrevista, eu me encontrei no processo, nos
subprocessos, ficou muito bacana” (TA2º F6º). A mesma professora acrescenta com entusiasmo o
alcance de uma pesquisa qualitativa:“Sou fascinada por pesquisa qualitativa, fico admirada com a
possibilidade de tradução.” (TA2º F6º).Outra professora afirma:“Acho que é por aí mesmo.” (TB2º).
falou sorrindo.
Outro professor refere:“Me senti representado no trabalho! Representa o que é genuíno nosso”
(FC2º). E completa: “[...] esse trabalho auxilia internamente e externamente” (FC2º), referindo-se à
escola e a outras instituições/faculdades médicas.
Um dos professores interagiu com a pesquisadora durante a apresentação. Enfatizou, de forma
reflexiva, a colocação de que: “Cada professor, na dependência do seu perfil, pode vivenciar no
mesmo contexto, experiências que o vinculam ou o afastam do modelo pedagógico proposto” (TD1º).
E sugere que o desenvolvimento docente e a gestão educacional possam trazer o resgate e a garantia
da continuidade da formação docente, ressaltando que ambos os elementos devem estar presentes
na experiência formativa do professor.
Este mesmo professor sugeriu algumas mudanças nas cores do modelo para que pudesse ser melhor
visualizado pelos professores e, coloca: “Há uma lógica legal, o modelo teórico, a construção está aí.
Está bem feito, está interessante!” (TD1º).
Ao final do primeiro encontro, todos despediram-se agradecendo o momento e parabenizando a
pesquisa pela capacidade de representação da experiência e do processo vivenciado por eles.
Seguiu-se ao próximo dia de apresentação, em que estiveram presentes apenas duas professoras.
Uma professora comunica, por telefone, esquecimento da atividade, e outra justifica estar em
avaliação de discentes no momento da devolutiva/validação.
Da mesma forma da primeira reunião, foi conduzida a segunda, com a apresentação do modelo
teórico já com a mudança das cores, sugerida pelo ator do primeiro encontro.
Após o término da apresentação, as professoras se colocaram, mostrando-se satisfeitas com o
resultado e com o modelo. Afirmaram ter gostado, especialmente acrescentando o fato de terem
sido chamadas para a apresentação, enfocando a importância das devolutivas para os participantes
de diversas pesquisas.
Uma delas pronuncia: “Eu me vi lá” (FE2º).
Logo depois, a outra inicia uma reflexão sobre a importância da gestão no processo de
desenvolvimento docente, afirmando que poucos docentes estão envolvidos em muitas coisas na
faculdade: “A gestão é muito importante” (TF2º F6º). E, acrescenta, o quanto tem poder.

4 Discussão

Chegar a um modelo teórico que representasse a experiência dos atores foi passo importante para
simbolizar suas vivências. Mas o singular do processo foi a construção de uma coerência no trabalho,
que culminou na apresentação do modelo aos participantes, mesmo que não estivessem todos

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presentes. A experiência de compartilhar com os atores traz a reflexão sobre a importância de criar e
recriar os processos e sentir que são sujeitos em constante mudança e transformação.
O modelo teórico descoberto sinaliza que todo o movimento do professor deve ser valorizado pelos
espaços de desenvolvimento docente e de gestão educacional. Os professores participantes da
pesquisa sugerem que sejam repensados os espaços de formação e de gestão educacional para que o
encontro/reencontro com a proposta curricular seja favorecido.
A pergunta na atualidade, segundo Gomes e Rego (2014) é como fazer, a fim de que se tenham
objetivos e métodos adequados. A resposta está na criação de espaços, para que os atores do
processo possam organizar reflexivamente o pensamento.
Ferreira, Fiorini & Crivelaro (2010) discutem a necessidade de se vencer a resistência dos educadores
quando se propõe uma inovação curricular. Diante de novo paradigma da integralidade, espera-se
que professores e estudantes construam uma formação baseada em processos de reflexão e
motivação para a busca de informações e que favoreça a construção de conhecimentos compatíveis
com a solução de problemas, em uma perspectiva ampla e humana. Por isso, do ponto de vista da
prática docente, propõe que sua inserção no processo ensino-aprendizagem seja feita em meio a
capacitações permanentes.
Vieira e Tamousauskas (2013) defendem a importância de identificar as resistências às mudanças, de
onde elas partem, para trabalhar com a questão motivacional.
O ambiente escolar deve favorecer as mudanças. Nesse sentido, é importante que a convivência seja
interpretada como democrática, dialógica, de construção coletiva de saberes (Gomes & Rego, 2014).
Colela e Rolin (2014) referem-se à relação entre um processo de comunicação deficiente e a
dificuldade de efetivação de um modelo democrático de gestão. Discutem que, para a implantação e
o desenvolvimento de mudanças institucionais consistentes, é necessário o domínio de estratégias
por parte dos gestores, incluindo a escuta para negociação, planejamento e estabelecimento de
propostas.
Ao se instituir Programas de Desenvolvimento Docente, a consideração dos atores é fundamental.
Deve-se pensar nas resistências às mudanças e também na possibilidade de vínculo. Neste sentido,
Creswell (2013) refere-se ao termo reciprocidade, trazendo a troca com os participantes como forma
de inclusão, minimizando sentimentos de abandono ao serem incluídos de forma real no processo da
pesquisa.
O que a Grounded Theory (Strauss & Corbin, 2008) ensina é que a experiência não se configura em
apenas um subprocesso, ou seja, em aproximações, encontros, desencontros ou reencontros
isolados; a experiência é dinâmica, fluida, passível de mudança.
Neste sentido, a teoria derivada dos dados tende a se parecer mais com a realidade, ao serem
realizados de forma próxima entre si, a coleta, a análise e sua eventual teoria. Segundo Strauss e
Corbin (2008), há procedimentos para ajudar a garantir padronização e rigor ao processo. Os
objetivos compreendem: 1) construir em vez de testar a teoria; 2) fornecer aos pesquisadores
ferramentas analiticas para lidar com a massa dos dados brutos; 3) auxiliar os analistas a considerar
significados alternativos para os fenômenos; 4) ser sistemático e criativo simultaneamente; 4)
identificar, desenvolver e relacionar os conceitos que são os blocos de construção da teoria.
Quando se fala em validação, não se refere ao sentido quantitativo da palavra. A teoria surgiu a
partir dos dados, mas no momento da integração, ela representa uma interpretação abstrata dos
dados brutos. Dessa forma, é importante determinar como a abstração se ajusta aos dados brutos e
também se algo foi omitido do esquema teórico (Strauss & Corbin, 2008).
A análise do processo de validação, pôde demonstrar que os achados da investigação para além de
um ordenamento conceitual, estabeleceu relações, como expresso pelos participantes. Esta
perspectiva foi discutida no estudo realizado por Souza e Silva (2011), que apontam que a teoria
denota um conjunto de categorias bem construídas, temas e conceitos relacionados de maneira

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sistemática, para formar um marco explicativo de um fenômeno social. Os autores trabalham com
os critérios centrais de ajuste, compreeensão e generalização teórica para validação do modelo.
No estudo não foram utilizados estes critérios, porém pode-se dizer que as pessoas os contemplaram
ao perceberem que o que estava representado no modelo expressava sua experiência pessoal,
apresentaram compreensão do modelo apresentado, olhando para seus componentes e a
generalização téorica, a medida em que houve a fala de sua aplicabilidade em diferentes contextos.
Assim, considerou-se o modelo teórico representativo da experiência dos professores participantes
da pesquisa.
Creswell (2013) aposta em estratégias de validação da pesquisa qualitativa incluindo a confirmação,
correção e revisão pelos participantes, além de defender o emprego de outros estudos para revisar
suas produções. A partir da avaliação do processo, houve o reconhecimento da importância da
validação do modelo teórico, porém há ainda uma escassez de materiais bibliográficos que tragam
este foco como análise.

5. Considerações finais

O modelo teórico abstraído da experiência permitiu aprofundar a compreensão dos subprocessos


vivenciados pelos professores médicos, assim como sinalizar necessidades de reavaliações e
implementação de estratégias, em atendimento às necessidades da formação docente no método
ativo.
O momento de validação foi considerado de grande valia e significado. Os professores demonstraram
atenção, confiança, disponibilidade, gratidão e credibilidade dada ao trabalho realizado por se
reconhecerem dentro do modelo proposto. Por isso, comprovou-se como uma técnica valiosa para
as pesquisas qualitativas, ao confirmar o modelo teórico representativo da experiência.
A consideração dos atores é fundamental! Esses são os caminhos da cogestão: poder se abrir a ouvir,
identificar necessidades, planejar, propor soluções. E acreditar que é possível efetivá-las. Mas essa
efetivação não acontece em uma perspectiva individual. Ela se dá no coletivo, pelo coletivo, junto de
outros atores que, em suas alteridades, trazem suas experiências e itinerários de formação, pessoal e
profissional.

Referências

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Argumentación del tutor de educación superior sobre su práctica


y experiencia en el contexto del trabajo colaborativo

Ana Cecilia Macías1, Teresa de Jesús Cañedo1, Daniel Eudave1, David Alfonso Páez1,2, Margarita
Carvajal1
1
Departamento de Educación, Universidad Autónoma de Aguascalientes, México.
acmacias@correo.uaa.mx; tjcanedo@correo.uaa.mx; deudave@correo.uaa.mx; mcarvaja@correo.uaa.mx
2 Programa de Cátedras, CONACyT, México. dapaez@correo.uaa.mx

Resumen. En esta comunicación presentamos los argumentos y las reflexiones de un grupo de tutores de
Educación Superior sobre su práctica y experiencia en un trabajo colaborativo. Para el análisis de datos se
retomaron las competencias docentes y el Modelo para Desarrollo y Evaluación de Competencias
Académicas (M-DECA), pues este último es una propuesta cualitativa que propicia el trabajo colaborativo
para la mejora de la práctica docente. Se implementó un programa para la formación de tutores en la
plataforma educativa GADEE para que los participantes, en equipos de tres integrantes, discutieran y
argumentaran su quehacer. El análisis fue mediante categorías centradas en la reflexión sobre la experiencia
en el programa de formación. Los resultados muestran que los tutores toman conciencia y enfatizan la
importancia de tener competencias para ejercer su profesión, además consideran que el trabajo
colaborativo es un medio ideal para propiciar la reflexión y desarrollar nuevas competencias.
Palabras clave: Argumento; reflexión; tutor; experiencia; trabajo colaborativo.

Argumentation of tutor higher education on their practice and experience in the context of collaborative
work
Abstract. In this paper we report the arguments and reflections of a group of higher education tutors about
their own practice and experience in a collaborative work. For the analysis of data, we consider the teacher
competences and the Model for Development and Assessment of Academic Competences (M-DECA) which
is a qualitative proposal that encourages collaborative work for the improvement of teaching practices. A
tutor training course was implemented on the GADEE learning platform in which participants were asked to
work in triads in order to discuss and argue their academic tasks. The analysis involved the design of
categories about focused on reflection on the experience in the training program. Results reveal that tutors
become aware and emphasize the importance of having competences. Furthermore, they consider
collaborative work as an ideal means to reflect and to develop new competences.
Keywords: Argumentation; reflection; tutor; experience; collaborative work.

1 Introducción

A partir de las innovaciones curriculares generadas recientemente en Educación Media Superior y


Educación Superior, la tutoría en México ha cobrado mayor relevancia en los procesos de formación
de los estudiantes y, ante las exigencias actuales de la sociedad, es considerada fundamental en la
práctica docente (Robles & Arredondo, 2013). El profesor, en su rol de tutor, debe ayudar al
estudiante a determinar y seguir sus objetivos personales, académicos y profesionales (Araiza, 2012;
Lobato, Arbizu, & del Castillo, 2005); sin embargo, la mayoría de los que imparten clases en esos
niveles se enfrentan a un gran reto, pues requieren de una sólida formación pedagógica y didáctica
para implementar estrategias de intervención que favorezcan el desarrollo integral del estudiante.
En México, la plantilla docente de las Instituciones de Educación Superior (IES) está conformada,
principalmente, por profesionales con un amplio conocimiento de los contenidos a enseñar, pero

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carecen de una formación previa en docencia y tutoría. En ocasiones, esta formación es producto de
experiencias o creencias acerca de cómo se debe enseñar y aprender (Guzmán, 2001). Ante los
grandes retos de abatir los altos índices de rezago y deserción escolar, se requiere de profesionales
con habilidades en pedagogía e intervención para contribuir a la calidad de la educación (Giner &
Puigardeu, 2008).
La tutoría implica procesos de comunicación y de interacción por parte del profesor que permiten el
acompañamiento cercano al estudiante para la toma de decisiones y para su estabilidad en la
universidad (Lobato, Arbizu, & del Castillo, 2005; Moreno, 2011). Por ello, al docente se le exige tener
competencias específicas para ejercer, de manera adecuada, la acción tutorial. De acuerdo con
Robles y Arredondo (2013), “las reformas en la educación serán realmente efectivas […] sólo
mediante cambios efectivos en la práctica docente cotidiana de las entidades académicas y en las
interacciones de los actores educativos” (p. 149).
A pesar de la existencia de documentos oficiales que norman e indican las acciones esperadas por
parte de los tutores en la IES, se sabe que los programas de tutoría adquieren rasgos diversos en
distintos contextos y carreras universitarias, además, su implementación se dificulta al no existir una
definición conceptual clara sobre el perfil y funciones del tutor. Para Romo (2004), el significado
concreto de tutoría está en función de su inserción en el nivel educativo y de la política educativa. En
este sentido, cada IES define los alcances de la función tutorial, la forma de ejercerla y cómo
capacitar a sus profesores para llevarla a cabo.
Aunado a lo anterior, se han realizado diversos estudios en México que enfatizan el impacto de la
tutoría en el proceso educativo del estudiante y la falta de atención inmediata para implementar
mejoras en la práctica del tutor (Reveles, 2007); por ejemplo, Macías y Valdés (2014) concluyen que
se requieren programas de formación donde se tomen en cuenta los intereses y las necesidades
reales de los profesores, y que recuperen de manera sistemática sus experiencias y conocimientos
previos para lograr cambios significativos que impacten en los estudiantes y en el sistema educativo
de la IES. Asimismo, faltan propuestas en las que el trabajo colaborativo juegue un rol importante en
el proceso de sistematizar la práctica (Guzmán, Marín, & Inciarte, 2014), pues éste le ofrece al tutor
involucrarse en una comunidad profesional para estudiar y reestructurar su quehacer.
Tomando en cuenta los antecedentes, en el presente documento planteamos la siguiente pregunta
de investigación: ¿qué reflexiones surgen en los tutores universitarios al tomar como objeto de
estudio su práctica mediante el trabajo colaborativo? Para responder esta pregunta también se ha
planteado el siguiente objetivo: identificar los argumentos que tienen estos actores en relación con
su experiencia de discutir con otros colegas el quehacer de la tutoría.

2 Marco teórico

Para analizar la reflexión y la argumentación del tutor en el trabajo colaborativo, en esta


investigación se tomaron en cuenta dos referentes teóricos: las competencias en la práctica de
tutoría y la formación promovida en el Modelo para Desarrollo y Evaluación de Competencias
Académicas (M-DECA). A continuación se describe cada uno ellos.

2.1 Competencias del profesor tutor

La tutoría es una actividad compleja y, por ello, es fundamental que el docente adquiera competencias
relacionadas con esta labor. El profesor debe tener un sistema de competencias que incluya la
comunicación eficaz, el manejo de conflictos, la participación y el trabajo en equipo (Castaño, Blanco,

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& Asensio, 2012). Desde la perspectiva de Braslavsky (1998), “los profesores que trabajan
actualmente y que deseen continuar en roles vinculados con la mediación con los conocimientos en
proceso de proliferación y en el contexto del presente cambio civilizador, deberán tener cinco
competencias” (p. 28), las cuales son: pedagógico-didáctica, político-institucional, productiva,
interactiva y especificadora. Las dos primeras se refieren a la resolución de problemas o desafíos más
coyunturales; en cambio, las competencias productiva e interactiva están relacionadas con la
habilidad de comunicarse con los otros (actores profesionales que conformar el sistema educativo) y
estimular el aprendizaje en el estudiante; la última se refiere al proceso de especialización y
orientación de la práctica docente.
Además de tener competencias, se espera que el profesor sea un profesional reflexivo de su práctica
a través de comunidades (Schön, 1983). Al participar en grupos de discusión, el docente tiene la
posibilidad de identificar problemas que son comunes entre sus compañeros, aprender de los demás,
buscar mejoras en su práctica de enseñanza y desarrollar competencias; asimismo, es un medio
idóneo para reforzar o adquirir nuevas competencias sobre tutoría y docencia. Un propuesta valida
es el Modelo para Desarrollo y Evaluación de Competencias Académicas (M-DECA), el cual tiene
como característica principal el trabajo colaborativo como un espacio apropiado para mejorar la
práctica docente y desarrollar competencias (Guzmán, Marín, & Inciarte, 2014).

2.2 Modelo para desarrollar competencias tutoriales en el profesor universitario

El M-DECA pone atención a la formación y evaluación de docentes de Educación Superior desde la


perspectiva del trabajo colaborativo, y lo hace a través de cuatro componentes que interactúan entre
sí: conceptual, de formación, de evaluación y de investigación. A saber, el componente:
 conceptual se refiere a la posición que tomarán los participantes acerca de la noción de
competencia. Además, es el punto inicial para establecer una necesidad que relacione el
concepto de competencia, práctica docente y evaluación; en otras palabras, que permita la
vinculación de los procesos de formación y evaluación.
 de formación está centrado en el desarrollo de competencias docentes, tomando como base los
problemas de la práctica real del profesor de Educación Superior. Para Guzmán et al. (2014),
éstas surgen cuando el profesor se “[enfrenta] con los problemas que la profesión docente le
plantea o bien mediante los diferentes desempeños que se dan en la diversidad y complejidad
de interacciones pedagógicas cotidianas en las que participa” (p. 28).
 de evaluación implica determinar si los profesores desarrollaron competencias en el
componente anterior y valorar el nivel de logro. Para ello, se requiere observar y recopilar
evidencias de su desempeño para analizarlas e interpretarlas. La perspectiva que se toma en
este componente es la de “evaluar el proceso de ejecución y el realismo de la tarea que se
propone” (Guzmán et al., 2014, p. 45), con el propósito de que el profesor reflexione sobre su
práctica al afrontar situaciones reales (Schön, 1983).
 de investigación se refiere a estudiar el modelo, métodos y técnicas que sustentan las acciones
formativas implementadas en los componentes anteriores. La metodología utilizada es el trabajo
colaborativo y es visto como un proceso de sistematización y reflexión entre los participantes
que abordan un interés o necesidad común.
Para el trabajo colaborativo, el componente de investigación implica tres etapas: co-situacional, co-
operacional y de co-producción. El estudio aquí descrito sólo abarca la primera etapa.
De acuerdo con sus características, la etapa co-situacional es fundamental para realizar las otras dos
y está integrada por tres módulos, los cuales se orientan por los contenidos a trabajar en cada uno de
ellos llamados Objetos de Estudio. Asimismo, esta etapa corresponde al proceso de investigación que

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acompaña o se deriva de la implementación de la co-operacional y de co-producción. Los productos


esperados en la etapa co-situacional son dos tipos de reflexión colectiva: a) sobre las competencias y
el modelo de formación usado, y b) sobre la pedagogía de la integración, la evaluación auténtica y el
diseño de la docencia por competencias. A partir de estos productos cobra importancia el proceso
que se desarrolla a lo largo de los tres módulos, pues dan cuenta de la toma de conciencia de los
profesores sobre su actuar cotidiano y eventual transición hacia la aceptación y construcción de
nuevas propuestas educativas orientadas a la formación de competencias tutoriales.

3 Metodología

El presente estudio es de carácter exploratorio (Cohen, Manion, & Morrison, 2007) y da cuenta de la
experiencia que tuvo el tutor de Educación Superior al reflexionar junto con otros colegas sobre su
quehacer. Para ello, un grupo de investigadores implementó una propuesta de trabajo colaborativo
con el propósito de sistematizar la experiencia de los participantes y brindar acciones para una
continua retroalimentación colectiva. La propuesta se diseñó tomando como referencia el M-DECA
(Guzmán et al., 2014), ya que ofrece la oportunidad de generar espacios de discusión sobre la
práctica tutorial, promueve en los participantes la construcción de un plan de intervención y permite
la toma de conciencia –reflexión– sobre ese quehacer docente través del trabajo colaborativo.
A partir de las características del componente de investigación del M-DECA, los ejes de
sistematización en la propuesta fueron dos: a) Fortalezas y debilidades de la experiencia formativa
observadas por el tutor, e b) Identificación de prácticas y estrategias exitosas de tutoría. Para
desarrollar el trabajo colaborativo, la propuesta incluyó tres módulos de aprendizaje: 1)
Competencias Docentes y Acción Tutorial, 2) Herramientas de apoyo a la Acción Tutorial y 3)
Evaluación auténtica y diseño del Plan de Acción Tutorial (PAT). Cada modulo estuvo determinado
por un número de Objetos de Estudio y un conjunto de actividades diseñadas previamente por
expertos en tutoría (véase Tabla 1).

Tabla 1. Programa para la formación de tutores en las IES

Módulos Objetos de Estudio


a) La acción tutorial como competencia docente.
1.
b) Tipos y modalidades de Acción Tutorial.
a) Reconocimiento de mi PAT.
2. b) Herramientas de apoyo a mi PAT.
c) Materiales y recursos web para la Acción Tutorial.
a) Evaluación Auténtica de la Acción Tutorial.
3.
b) Diseño del PAT.

La implementación del programa fue en un periodo aproximado de ocho meses y abarcó tres
acciones: diseño curricular, validación e implementación. En cuanto a la última acción, la modalidad
del programa fue semi-presencial a través de la plataforma GADEE. Como parte de la metodología, y
respetando las características del trabajo colaborativo descritas en el M-DECA, en cada módulo de
aprendizaje se siguieron tres momentos: trabajo individual (a partir de una situación-problema), en
tríadas y grupal. Es importante notar que en los tres momentos se priorizó la recuperación y análisis
de la experiencia como tutor y la construcción colaborativa de aprendizajes.
En el estudio participaron 13 tutores que laboran en el Centro Regional de Educación Normal del
Estado de Aguascalientes (CRENA), institución de Educación Superior dedicada a la formación de
docentes para los niveles obligatorios de educación en México. El motivo que llevó a trabajar en esta
institución son los resultados que se han obtenido actualmente en diversos estudios; por ejemplo, el

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CRENA (2014) reportó que existe la necesidad en los tutores de mejorar su práctica profesional al
concluir que "más del 50% de los tutorados considera entre regular y mala la tutoría que se les ha
brindado [...], la mayoría contestó que 12 de los tutores no tienen un interés por brindar este servicio
[…] [y] les falta sensibilización en su práctica"(p. 11).
Las técnicas utilizadas para la recopilación de datos fueron dos: a) Cuestionario con preguntas
abiertas para generar una reflexión acerca de la utilidad de los contenidos del programa de
formación, formas de abordarlos, actividades, productos solicitados y trabajo en equipo; b) Análisis
de documentos, productos del diseño e implementación de la experiencia formativa, para identificar
aspectos cognitivos, actitudinales y valores que cobraron relevancia durante la intervención. Con
estas dos técnicas se buscó recabar información para “entender el mundo desde la perspectiva del
entrevistado, y desmenuzar los significados de sus experiencias” (Álvarez-Gayou, 2003, p. 109).
Con el propósito de “hacer comprensible el sentido que algo tiene para otro” (Echeverría, 1993, p.
36), el análisis estuvo centrado en las actividades y los comentarios que dieron los participantes en la
plataforma GADEE; en especial, éste se hizo mediante categorías para identificar los argumentos que
reflejaran una reflexión individual o colectiva sobre el quehacer de los tutores y como producto de su
experiencia en el programa de formación (Miles & Huberman, 1994). Las categorías emergieron de
las diferentes respuestas de los participantes y de los productos obtenidos del programa. Partiendo
del marco teórico, en el diseño de las categorías, la argumentación y la reflexión del profesor se vio
como un proceso de “mirar hacia atrás sobre la enseñanza y sus consecuencias” (Conwey, 2001, p.
44); es decir, se consideraron las experiencias recordadas o anticipadas de los participantes.
Coincidimos con Conwey que “mirar hacia atrás, en el sentido reflexivo, es obtener cierta distancia
reflexiva para comprender mejor el significado de la experiencia vivida” (p. 90).

4. Resultados y discusión

Se reconocieron fortalezas del programa de intervención, mismas que se verificaron con la opinión
de los tutores una vez que se implementó el programa de formación. Entre los aspectos que fueron
valorados resaltan los temas y materiales, la estructura de los Objetos de Estudio, la atención y
seguimiento que se brindó durante la implementación.
Los profesores enfatizaron la utilidad y la importancia del trabajo colaborativo para enriquecer su
acción tutorial. En este sentido, la actualización en su quehacer es una necesidad prioritaria que
tienen como tutores; por ejemplo, un participante determinó la relevancia de los materiales usados
para tomar consciencia y afrontar las dificultadles sobre la acción tutorial: "los temas fueron en su
totalidad interesantes y pertinentes, y los materiales muy ricos y siempre al alcance de las
necesidades que tuvimos como participantes". Los profesores avalaron el programa como un medio
ideal para transformar la práctica de la tutoría en el sentido de mejorarla e impactar en el estudiante.
Esa relevancia se adjudica a los tres módulos del componente de investigación; por ejemplo, de
acuerdo con los argumentos dados en la última sesión de trabajo, uno de los participantes tiene la
creencia de que el programa le permitirá mejorar su quehacer: "tanto los temas como los materiales
que se utilizaron en el curso me parecieron interesantes, sobre todo porque creo que nos van a ser
muy útiles para realizar, de mejor manera, nuestras tareas como tutores".
La metodológica de los tres módulos del programa, los temas y las herramientas fueron relevantes y
tuvieron un impacto positivo en los tutores. Para los participantes, el trabajo colaborativo les
permitió analizar su práctica desde la discusión grupal y el uso de situaciones que reflejan la realidad
en la que ellos se encuentran; por ejemplo, un profesor menciona: "nunca habíamos evaluado la
tutoría". Además, este participante destaca la relevancia que tuvo el programa en su rol como tutor:
"a mí me gusta mucho la propuesta […]. Parte de una situación problemática identificas cuáles son

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los limitantes [cómo tutor], tus fortalezas, haces algún diálogo con los autores acerca de estas
problemáticas y como las podrías resolver y, a partir de hacer una propuesta de intervención, haces
el análisis de reflexión de que tanto mejoras en torno a esa problemática".
Los profesores identificaron que, en la implementación del programa, ellos toman el rol de
aprendices para estudiar su propia práctica como tutores. Al verse como estudiantes tienen el
espacio para analizar lo que hacen como tutores y mejorar. En relación con esto, un participante
menciona que "el modelo detona mucho la experiencia del sujeto como tutor y como el mismo
sujeto, es decir, la persona que participa en la investigación de su propia experiencia".
Los tutores expresaron una valoración positiva de las actividades, pues señalan la pertinencia de
"elevar poco a poco el nivel de complejidad". Para ellos, "analizar, reflexionar [y] pensar les deja
aprendizajes significativos y propicia el salir del área de confort... Esto conlleva a mejorar y
transformar mi práctica como docente". Lo anterior se corrobora con los comentarios incluidos al
final de cada Objeto de Estudio, donde los profesores afirman que ha sido un espacio para motivar la
reflexión, análisis, discusión y colaboración entre todos los participantes, y se dan cuenta que han
transformado su quehacer al diseñar el Plan de Acción Tutorial: “hemos avanzado en la adquisición
de conocimientos teóricos y experienciales; reconocemos que falta mucho por hacer pero lo mejor
es que estamos dispuestos a incluir todo lo aprendido en el Plan de Acción Tutorial. Hoy ya no somos
los mismos que cuando iniciamos con esta experiencia de las competencias tutoriales, nos hemos
transformado para seguir avanzando y lograr los objetivos planteados en el PAT”.
El uso de espacios para compartir los productos de cada tríada facilitó la socialización de
experiencias, el reconocimiento a la labor que se realiza como tutores y al enriquecimiento de las
diferentes propuestas: “es significativa la concordancia en las fases de construcción; asimismo, en los
elementos que las integran, evidencia sistematicidad e intencionalidad; en contraste, se infiere
flexibilidad en lo planificado. Se descubre, además, el predominio del enfoque humanista que le
otorga un valor agregado”. En este sentido, se le da importancia al trabajo de los tutores valorando la
sistematicidad y el enfoque que se utiliza al realizar la acción tutorial; por su parte, otros
participantes aprovechan el trabajo colaborativo para generar un aprendizaje entre todos los tutores
participantes: "concebimos el portafolio y el cuaderno de evidencias como técnicas de evaluación y
estás se pueden evaluar por medio de un instrumento como una rúbrica, sin embargo coincidimos en
que son aspectos que ayudan a la evaluación de los aprendizajes obtenidos".
La discusión y trabajo en equipo los lleva a identificar elementos novedosos de la tutoría que ellos
pueden incorporar a su práctica. Si bien varios de los profesores son conocedores del tema, no
habían precisado los posibles uso de la evaluación diagnóstica en la acción tutorial: "efectivamente
un aspecto que es necesario tomar en cuenta al iniciar el trabajo tutorial con un nuevo grupo de
alumnos es el de incorporar la evaluación diagnóstica como una actividad permanente en los
procesos de enseñanza y aprendizaje. Planificar la evaluación diagnóstica construyendo variedad de
herramientas que impliquen favorecer la autorregulación del aprendizaje y la retroalimentación
formal e informal mediante tareas complejas de altas demandas cognitivas".
Los profesores, al reflexionar sobre quehacer como tutores, reconocen necesidades de formación no
sólo como tutores, sino también como docentes: "Lo que comparten en el cuadro de herramientas,
nos parecen novedosas, atractivas y muy útiles para mejorar nuestra función como tutores, el reto
está en saber utilizarlas, a decir verdad nos damos cuenta que requerimos estar al tanto en los
avances sobre su uso". Este tipo de reflexión es relevante en la implementación del M-DECA, ya que
una de las competencias que se desea fomentar es el desarrollo de la formación continua, y el paso
inicial para lograr esta competencia es identificar y sentir la necesidad de aprender para resolver una
situación particular (Macías & Valdés, 2014). La experiencia formativa despertó en los participantes
el interés por conocer e incorporar herramientas tecnológicas a su acción tutorial.

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Como parte de la reflexión en la experiencia del trabajo colaborativo, los profesores argumentaron
sobre la forma de entender y operar la tutoría en la institución donde laboran, surgiendo varias
propuestas para modificar su PAT vigente, enfatizando la importancia del trabajo colegiado para
llegar a un entendimiento común de lo que representa esta función y poder colaborar para proponer
estrategias atractivas y pertinentes para los alumnos: "considero ineludible una reunión presencial
en la que, después de presentar los argumentos correspondientes, tratemos de acrecentar las
semejanzas y acortar las diferencias para darle sentido al proyecto común de la institución",
asimismo los participantes enfatizan que "todo este trabajo que hemos hecho podríamos compartirlo
con los tutores del mismo semestre, y puede servir para modificar y enriquecer el Manual de
tutorías". Esto da evidencia de que el programa resultó significativo e impacto en los participantes en
el sentido de aportar elementos para enriquecer la acción tutorial a nivel institucional.

5 Conclusiones

Los resultados nos llevan a confirmar la pertinencia del M-DECA, particularmente el énfasis en la
reflexión y argumentación de los tutores participantes sobre la propia práctica y el fundamento en la
investigación-acción que propicia la transformación de la propia práctica. Los resultados y
fundamentos del M-DECA nos remiten a la investigación-acción, al aprendizaje colaborativo y a la
práctica reflexiva y transformadora (Guzmán et al., 2014). También nos muestran que el trabajo
colaborativo y el M-DECA fueron fundamentales para promover la reflexión y un aprendizaje
significativo en los participantes. Esto destaca el rol que tiene el trabajo colaborativo, donde los
profesores al analizar con ayuda de sus colegas les permite tomar conciencia de aspectos relevantes
de su práctica y la del resto del equipo.
La argumentación y la reflexión del profesor muestran que la tutoría requiere un perfil particular que
abarque competencias que permitan atender integralmente a los estudiantes, pero sobre todo
requiere el interés y, por qué no, la vocación de los profesores a quienes se les designa ese rol. Esto
también se ha reportado en otras investigaciones en las cuales los estudiantes afirman que el tutor
debería ser una persona atenta, comprensiva, amables, inspirar confianza y comprometa con su
quehacer, con disponibilidad de tiempo y con constancia para llevar a cabo la acción tutorial (Macías,
Eudave, & Carvajal, 2016). Aun cuando existen diversas propuestas de intervención, estas actitudes,
conocimientos y habilidades son difíciles de lograr al no existir un compromiso de los tutores y
dejando de lado la discusión y reflexión de la realidad de estos actores. El trabajo colaborativo juega
un rol importante al dar espacio para aprender entre los diferentes participantes.
El desarrollo de una acción tutorial, que interesa por mejorar la situación de los estudiantes y
enriquecer la formación del tutor, pasa por factores relacionados con características personales y
condiciones institucionales. Estos factores deben ser considerados en el diseño e implementación de
un proceso formativo para lograr que los aprendizajes que de él se deriven puedan ser transferidos.
La reflexión y argumentación de los participantes, sobre su experiencia en el trabajo colaborativo,
muestra que aún falta mucho por hacer en el campo de la formación y actualización de la tutoría.

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História de vida do professor formador e os desafios da inserção


na docência universitária: um novo campo para a pesquisa
educacional

Sebastião Silva Soares1 e Selva Guimarães2


1
Universidade Federal do Tocantins, Brasil. sebastiaokenndy@yahoo.com.br
2Universidade Federal de Uberlândia, Brasil. selva@ufu.br

Resumo. O presente artigo refere-se a uma investigação cujo objetivo foi compreender as percepções e
significados que uma professora formadora iniciante apresenta da sua trajetória formativa de pessoal e
profissional. A metodologia do estudo foi constituída por uma entrevista oral com roteiro previamente
composto por questões relacionadas à história de vida, formação escolar, acadêmica e profissional, tendo
em vista o referencial da Historia Oral de Vida de Professores (Guimarães, 2006), (Bolivar, 2016) e a
Pesquisa Narrativa (Connelly e Clandinin, 1995). À luz da pesquisa qualitativa (Bogdan e Bikklen, 1994)
buscamos desenvolver uma análise das percepções e significados atribuídos pela colaboradora ao objeto de
estudo. Os resultados nos direcionam para as dificuldades e possibilidades do início da carreira enquanto
professora formadora no ensino superior. Por outro lado, nos permite analisar brevemente o início da
carreira na universidade como uma fase de descoberta, superação e limitações.
Palavras-chave: Professor formador iniciante; história de vida; trajetória formativa; docência universitária.

Life's history teacher trainer and the challenges of insertion in university teaching: A new field for
research educational
Abstract. Article refers to an investigation whose objective was to understand the perceptions and
meanings that a beginning trainer teacher presents of her formative trajectory of personnel and
professional. The study methodology consisted of an oral interview with a script previously composed of
questions related to life history, academic, academic and professional training, in view of the Oral History of
Life of Teachers (Guimarães, 2006), (Bolivar 2016) and Narrative Research (Connelly and Clandinin, 1995). In
the light of qualitative research (Bogdan and Bikklen, 1994) we seek to develop an analysis of the
perceptions and meanings attributed by the collaborator to the object of study. The results point us to the
difficulties and possibilities of the beginning of the career as a teacher in higher education. On the other
hand, it allows us to briefly review the beginning of the university career as a phase of discovery,
overcoming and limitations.
Keywords: Beginning trainer; life's history; formative trajectory; university teaching.

1 Introdução

O campo da pesquisa sobre a história de vida dos professores, segundo Nóvoa (2000), advém de um
longo histórico da racionalização do processo educacional no qual exige da educação um fim para a
transformação econômica e social, em especial na década de 1980. A figura do professor foi
apresentada apenas como mero executor das atividades de ensino, deixando de lado a pessoa do
professor e seus saberes na organização do fazer pedagógico.
D´avila e Sonneville (2012), afirmam que ocorre nesse contexto uma valorização do sujeito da
pesquisa, pois o objetivo maior do estudo é mais compreender e emancipar as vozes dos sujeitos,
onde são autores e personagens da sua história, do que propriamente narrar os acontecimentos.
Para Souza (2008), as histórias de vida assumem um caráter de formação e investigação, pois no

800
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exercício do reviver as lembranças do passado o sujeito tem a condição e oportunidade de construir


e reconstruir saberes de um passado presente.
Segundo Dominicé (2010), a abordagem de história da vida no campo da educação nos permite
entender uma perspectiva em que devemos considerar a vida enquanto espaço de formação, pois a
história de vida do indivíduo é perpassada de diversos contextos, ações e sujeitos, “é mais destinado
a compreender o que sucede à educação nos processos de formção dos adultos, e em consequência
a acrescentar momentos educativos ao contexto histórico mais vasto do seu significado” (Dominicé,
2010, p. 202).
Para Guimarães (2006), na história oral de vida não é privilegiado apenas uma complementação de
informação sobre um determinado aspecto da pesquisa. Para a autora a história oral de vida valoriza
as experiências dos sujeitos inseridos num contexto histórico-social, logo “as experiências dos
homens, constitutivas de suas trajetórias, rememoradas, reconstruídas e registradas a partir do
encontro de dois sujeitos: narrador e pesquisador” (Guimarães, 2006, p. 39). Na história oral de vida,
construimos narrativas sobre as concepções, desejos e experiências do sujeito sobre a sua vida.
Bolivar (2016, p. 251) argumenta que a história de vida é uma abordagem que permite as pessoas
reviver o passado e construir perspectivas para o futuro. Para o autor, a história de vida é um
espaço/tempo de socialização e construção de identidade “ Las historias de vida posibilitan la
construcción de sentido del proyecto de una vida, construir una identidad (personal y profesional), a
partir de ordenar el bagaje de acontecimientos, vivencias y aprendizajes a lo largo de la vida”.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho é analisar a trajetoria formativa de uma professora formadora
iniciante no curso de Pedagogia numa instituição pública de ensino no Brasil. Esta pesquisa faz parte
de uma pesquisa de doutoramento, cujo propósito é analisar a trajetoria de professores formadores
iniciantes dos cursos de Licenciatura em Universidades Federais na região Norte do Brasil.
Compreendemos por professor iniciante, o professor em fase inicial da carreira profissional com até
cinco anos de trabalho na docência superior.
Para a literatura, a fase inicial da carreira docente é um momento de construção e reconstrução do
ser e estar docente. Os professores são direcionados assumirem posições e atitudes na figura de
professor e não mais enquanto aluno. Entre erros e acertos, os professores iniciantes são
direcionados a buscarem ações que correspondem às demandas institucionais no âmbito da gestão e
os desafios encontrados no fazer docente (Garcia, 2008).
Para Tardif (2014), o início da carreira do professor pode apresentar um elo de equilíbrio ao
desespero, uma vez para o autor essa fase pode dizer muito sobre quem será o professor e como
desenvolverá seu trabalho em sala de aula. Nesta perspectiva, o início da carreira é um
espaço/tempo em que o professor tem de se reconhecer como profissional, assumir as
responsabilidades da docência, acreditar que a escola vai além do que foi ensinado e teorizado nos
livros e leituras acadêmicas.
Rodrigues (2010) afirma que a docência enquanto processo complexo só aumenta para o professor
em inicio de carreira, visto que as dificuldades enfrentadas pelo professor na fase inicial da carreira
nem sempre são compartilhadas com seus pares, professores experientes. A falta de interesse dos
alunos pelo processo de aprendizagem torna-se também um obstáculo para o professor iniciante,
visto que a superação do mesmo deve ir além dos conhecimentos obtidos nas disciplinas
pedagógicas dos cursos de formação.
Cerezer (2015, p.235), argumenta que a fase inicial da docência representa para o professor um
momento de expectativas e medos, particularmente o contexto da sala de aula, no qual exige do
professor a construção de novos saberes que ultrapassam as aprendizagens construídas enquanto
aluno. Para o autor, a sala de aula enquanto espaço/território é um dos principais desafios dos
professores iniciantes, pois aparentemente, “conhecido” transforma-se em “desconhecido”, às vezes
assustador e desestabilizador.

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No caso dos formadores, são considerados formadores de professores neste estudo, os docentes que
atuam em processos formativos de ensinar e aprender nas licenciaturas, isso porque “o termo
formador de professores apresenta uma relação ambígua, principalmente pelo caráter de um ofício e
função não identificada” (Altet; Paquay & Perrenoud, 2003, p. 11). Para os autores, a maioria dos
formadores de professores foram antes professores, porém isso não permite definir um perfil único
de formadores, já que cada contexto os formadores apresentam perfis variados e heterogêneos.
Para Garcia e Vaillant (2012), os formadores de professores são os profissionais responsáveis por
desenvolver um currículo que contribua com o processo de ensinar e aprender de novos professores.
Isso porque “a formação inicial do professor de níveis iniciais é o primeiro ponto de acesso ao
desenvolvimento profissional contínuo”. (Garcia e Vaillant, 2012, p. 64). Os autores ressaltam a
importância de o formador conhecer o tipo de docente que está formando, bem como o contexto
formação e atuação futura desse professor.
Ambrosseti e Calil (2016), afirmam que o professor formador é o profissional responsável por
organizar situações de aprendizagem do adulto em formação. Para as autoras, o formador de
professores não ocupa o lugar de transmitir saberes, pois tanto o professor quanto os alunos devem
ser sujeitos ativos do processo de aprendizagem. De acordo com Imbernón (2009), o formador de
professores deve possuir um papel de colaborador reflexivo, de modo a permitir que os professores
em formação encontrem um projeto formativo que os ajudem na organização e execução do fazer
do docente. Para o autor, o professor formador deve mediar a formação do professor, pois “a prática
educativa muda apenas quando o professorado quer modificá-la e não quando o (a) formador (a) diz
ou apregoa” (Imbernón, 2009, p. 105). Assim, o formador além de mediar a formação de um novo
professor, é responsável pela construção do seu próprio formativo, fato que não justifica a falta de
políticas públicas para os formadores e projetos visando o desenvolvimento profissional ao longo da
sua carreira.

2 Metodologia

A abordagem metodológica e analítica do estudo vincula-se ao campo da pesquisa qualitativa em


educação. Para Bogdan e Bikklen (1994), a pesquisa qualititiva possui algumas características
fundamentais que possibilitam ao pesquisador uma análise profunda do seu objeto de estudo,
dentre elas: o ambiente natural, a dimensão processual e os significados.
Por meio da pesquisa qualitativa o pesquisador pode compreender os sentimentos, crenças, valores,
lembranças e vivências dos sujeitos “o que corresponde a um espaço mais profundo das relações,
dos processos e dos fenômenos” (Minayo, 2001, p. 22). Assim, na análise qualitativa, o pesquisador
pode buscar concepções dos sujeitos, explícitas e implícitas sobre a problemática do estudo,
inseridos num contexto histórico-social.
Assim, esperamos não apenas capturarar dados, mas as experiências de vida narradas oralmente,
transcritas e textualizadas, visto que a construção da investigação narrativa está embasada nas
experiências vividas pelos sujeitos, “é uma abordagem que estuda, como nós, seres humanos
experimentamos o mundo” (Connelly e Clandinin, 1995, p. 11). Sobre isso, a literatura demonstra
que o conceito de experiência tem sido desafiador para a pesquisa em educação. Para Larrosa,
inspirado em Benjamin (2002, p. 21) “a experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos
toca”.
Segundo o autor, para que essa experiência aconteça no tempo presente, o ser humano precisa
pensar, escutar, observar de modo devagar, captar a essência das ações. É preciso ser um sujeito
disposto a enfrentar os medos, as angústias, dores e alegrias, pois a “experiência é a passagem da
existência, a passagem de um ser que não tem essência ou razão ou fundamento, mas que

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simplesmente “ex-iste” de uma forma sempre singular, finita, imanente, contingente” (Larrosa, 2002,
p. 25).
Desse modo, entendemos que a experiência e narrativa são saberes interligados às histórias vividas,
de sujeitos históricos e singulares. Experiência e narração são elementos inseparáveis, pois como nos
ensinou Benjamin “o narrador retira da experiência o que ele conta: sua própria experiência ou a
relatada pelos outros” e incorpora as coisas narradas à experiência dos seus ouvintes (BENJAMIN,
1985, p. 201).
As experiências narradas tornam-se fontes de saberes ricos e vivos de um povo, de um homem e/ou
cultura, pois diferente da informação que só tem valor no tempo presente, a narrativa se renova e se
reproduz num espaço/tempo. “Ela – a narrativa não está interessada em transmitir o “puro em-si da
coisa narrada como uma informação ou um relatório. Ela mergulha a coisa na vida do narrador para
em seguida retirá-dele” (Benjamin, 1985, p. 205).
Sendo assim, a tecnica e instrumental do estudo foi constituido por pesquisa bibliografica e uma
entrevista oral com roteiro previamente composto por questões relacionadas à história de vida,
formação escolar, acadêmica e profissional no ensino superior. Tendo em conta os princípios éticos
da pesquisa qualitativa empregamos nome ficticio a formadora iniciante, além da confiabilidade de
dados instutucionais. Procedemos a análise dos dados a partir de categorias pré-estabelecidas (perfil
pessoal, formação docente, desenvolvimento profisisonal e prática pedagógica) com o suporte da
hermeneutica-dialética, abordagem que permite o pesquisador compreender o discurso e os
processos de contradição e mudanças de dada realidade social (Minayo, 1996). Descrevemos neste
artigo a história de vida de uma professora que possuía no momento da pesquisa 48 anos de idade,
naturalizada da região Sul do Brasil. Filha de produtor rural e dona de casa. É casada, mãe de quatro
filhos. Formada em Pedagogia e Geografia, com mestrado em Educação, com 18 meses de
experiência profissional na docência do ensino superior.

3 Resultados e Discussão

Os dados produzidos por meio da narrativa na pesquisa enfocaram que o processo de escolarização
da formadora iniciante pesquisada foi marcado por pontos positivos e negativos, principalmente com
o incentivo de alguns professores ou pelas ações de coerção de outros,

Tive uma professora a partir da 5º série que me incentivava muito a leitura, era uma coisa
muito bacana. Era uma professora de Português, todas as semanas ela levava livros para nós
na sala de aula, era uma coisa que a gente não tinha acesso em casa.
Quando entrei na escola, já entrei alfabetizada. Sempre levava bilhetes para casa elogiando. E
eu tinha colegas que eram ridicularizados porque eles não sabiam. A professora pedia para eles
irem à frente escrever no quadro, e como eles não sabiam, era colocado chapéu de burro, era
para turma toda chamar de burro.

Além disso, essa fase foi marcada pela dificuldade que a colaboradora apresentava na disciplina de
História, visto que o ensino era descontextualizado e sem significado. A professora formadora é
formada em Pedagogia e Geografia, embora seu interesse fosse realizar o curso de Psicologia. No
curso de Pedagogia descobriu o interesse pela educação e amor pela docência. Seu ingresso na
docência da educação básica ocorreu durante o curso.
A colaboradora afirma que não houve influencia da família para a docência, contudo, possua duas
irmãs que são professoras na rede pública. Na época da escolarização básica já tinha cursado
também o curso de Magistério.

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Acerca da prática dos seus formadores no ensino superior, afirma de modo positivo as metodologias
aplicadas nos dois cursos, porém ressalta a falta de compreensão de alguns professores frente ao
problema de saúde que vivenciou no momento de conclusão do curso de Pedagogia “fiquei com uma
nota baixa no meu TCC porque, segundo a Banca, não consegui defender o tanto que estava na
escrita”.
Junto a isso, manifesta a falta da relação teoria e prática durante os dois cursos “lançavam teorias, te
mostravam coisas muito bonitas e, na hora, às vezes, uma prática escorregadia”. A professora
formadora iniciante assevera também a importância do trabalho colaborativo de alguns professores
durante o curso de Geografia, diferente do curso de Pedagogia, em que percebia certo
distanciamento dos docentes.
No caso específico do estágio, a colaboradora narra que foi uma fase tranquila nos dois cursos,
todavia o episódio com a turma da EJA. Durante a sua formação houve pouco incentivo dos
professores para ingressar na pesquisa, bem como não teve ajuda de custo pelas instituições. Sobre a
formação continuada a colaboradora afirma que buscou realizar diversos cursos entre mestrado e
especializações, visando seu desenvolvimento profissional.
Segundo a mesma, a prática dos professores formadores não distanciava muito da realidade
vivenciada na formação inicial, visto que a maioria era professores da universidade. O ingresso na
docência do ensino superior ocorreu com atuação em um curso na modalidade EAD, com o incentivo
do orientador. Ao solicitarmos a colaborada narrar sobre sua fase inicial na docência, enquanto
professora formadora iniciante manifestou:

Meu primeiro dia de docência na universidade, lá eu tive momentos distintos. Tive momentos
de fazer aula à distância. Sempre a gente fica muito ansioso porque queríamos fazer o melhor,
ser bem visto, bem acolhido.

E quando eu cheguei aqui na instituição, quando fui ministrar a primeira aula foi muito tenso.
Parecia que eu tava entrando a primeira vez em sala de aula. Ansiedade, muita ansiedade, mas
acho que no final até rolou. Mas, estava realmente muito ansiosa, porque é uma cultura
totalmente diferente. Tu está fora do teu chão, tu tem noção que tu tá fora do teu chão.
Assim, esse primeiro momento da docência na universidade, aqui foram de altos e baixos. Tem
hora que dá um desespero, e tem horas que é muito gratificante. Tem algumas coisas que para
mim ainda são muito complicadas.

As afirmações direcionam sobre as dificuldades e dilemas que a professora formadora iniciante passa
no contexto do ensino superior. É demonstrada a preocupação da profissional para desenvolver um
bom trabalho, apesar da insegurança no seu contexto de atuação. A falta do conhecimento da
cultura institucional e da região provoca um sentimento de não pertencimento, isolamento para o
professor formador iniciante também. Nessa mesma direção, Garcia (1999, p. 114) a partir dos
estudos de Johnston e Ryan menciona que a inserção na docência para muitos professores pode ser
uma fase de possibilidade ou desconhecimento, nas palavras dos autores,

No seu primeiro ano de docência, os professores são estrangeiros num mundo estranho, um
mundo que lhes é simultaneamente conhecido e desconhecido. Ainda que tenham passado
milhares de horas nas escolas a ver professores e implicados nos processos escolares, os
professores principiantes não estão familiarizados com a situação específica em que começam
a ensinar.

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A formadora destacou também a falta de informação, problema na área dos recursos tecnológicos e
a falta de apoio institucional enquanto dilemas nesse período de iniciação da docência, “a gente se
quebra tanto para descobrir alguma coisa que alguém poderia te dizer: “ó, faz assim”. Acho que a
negação de informação é algo que para mim foi o mais difícil, o maior desafio”. Apesar dessas
limitações, a colaboradora afirmou que pretende desenvolver sua carreira docente na instituição.
Desse modo, ao avaliar o processo de início da docência na universidade a mesma destaca: “Assim, a
socialização para o professor iniciante formador é de extrema importância. Procuro fazer isso com os
que foram chegando depois de mim. Procuro fazer isso, porque é muito difícil mesmo quando se sente
sozinha, complicado”.
Isaía e Bolzan (2007, p. 170) apontam que o processo da socialização é fundamental para o professor,
pois “a interação favorece o desenvolvimento das capacidades cognitivas, do equilíbrio pessoal, da
relação institucional e da atuação em diferentes espaços”, mas para que isso aconteça é necessário
investimento em atividades, recursos e criação de espaços que favoreçam a construção desse
processo. Por outro lado, o processo de socialização não é algo estanque, mas construido nas
relações sociais e institucionais “es un proceso continuo que pasa por diferentes fases, así en los
inicios se produce una preocupación por la imagen que se va a proyectar, preocupaciones por la
enseñanza y también toda una serie de inquietudes que se centran en los Estudiantes” (Murillo
Estepa, 2016, p. 59).
Outra questão avaliada pela professora formadora nesse momento de inserção a docência no ensino
superior, é a falta de articulação da universidade com a comunidade, principalmente na formação do
professor, além da influência dos aspectos históricos, geográficos e sociais da região na formação dos
mesmos. Ao questionarmos sobre a sua identidade profissional enquanto formadora, a colaborada
destaca:

Sobre ser formador, sim. Não, eu fiquei pensando porque eu acho que assim o formador em
formação o tempo inteiro. Ah, eu não sei como viu. Eu não sei responder isso. Mas, assim,
estou sempre buscando mostrar para eles e levar eles, primeiro, provocar para eles irem para o
chão da escola. E provocar eles também no sentido de mostrar que: “olha, não fica fazendo
fantasia aí, achando que só o que sabe é que vale, que o professor que está lá na ponta que ele
não sabe nada”. Vai olhar. Vai observar as práticas. Dispõe-te a aprender sempre. Eu me
disponho a aprender sempre, acho que é nesse sentido sou uma formadora de professores,
incentivadora da aprendizagem. Eu penso que sim. Eu espero que sim.

Percebemos um distanciamento na dimensão conceitual do termo professor formador para a


colaborada, mas no decorrer da sua própria narrativa a mesma se reconhece formadora de
professores, em especial pela busca constante de contribuir com a aprendizagem dos alunos. Assim,
para a colaboradora a identidade enquanto formador é um processo contínuo, é construída com
base nas relações pedagógicas com os alunos, no saber e fazer diário,

A identidade profissional constrói-se pelo significado que cada professor, enquanto ator e
autor, confere à atividade docente no seu cotidiano, com base em seus valores, em seu modo
de situar-se no mundo, em sua história de vida, em suas representações, em seus saberes, em
suas angústias e anseios, no sentido que tem em sua vida o ser professor (Pimenta &
Anastasiou, 2005, p. 77).

No campo do ensino, a professora formadora iniciante já trabalhou com diversas disciplinas, além de
atuação em um programa do governo federal promovido no âmbito da Universidade. Nesse
momento, ressalta que as aprendizagens advindas do seu período de graduação servem de base para

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a prática em sala de aula. O planejamento da professora é realizado com um diagnóstico da sua


última aula.
No que diz respeito à pesquisa e extensão a mesma manifestou que prática da pesquisa enquanto
formadora é desenvolvida a partir dos trabalhos de orientação na instituição. A extensão está
articulada com as ações que buscou realizar com a Secretaria de Educação e outros órgãos públicos
da cidade. No entanto, ela menciona a dificuldade que tem de desenvolver seu trabalho enquanto
formadora iniciante com determinados alunos, além da dificuldade de acesso com as comunidades
locais, principalmente com os povos tradicionais, visto que a formação socio-histórica da região é
marcada pela presença de descendentes de quilombolas e povos indígenas,

[...] mas, também aqueles que estão muito viciados. E que acham que pelo simples fato de
estar na universidade, estão aprovados. Ou está na universidade e, porque está presente, está
aprovado, ou nem precisa vir, mas, se faz os trabalhos também está aprovado. No âmbito da
pesquisa acho que nós temos muitas possibilidades de pesquisa aqui. Tem um universo de
possibilidades. Porque tem muitas coisas a se estudadas aqui em Arraias. Mas, acho que as
nossas maiores dificuldades são dificuldades de acesso.

Desse modo, a prática da professora formadora iniciante direciona para a complexidade da docência
no ensino superior, principalmente quando tratamos da relação professor-aluno. Zabalza (2004)
ressalta que essa complexidade vai além do domínio de um conteúdo, para o autor:

Ensinar é uma tarefa complexa na medida em que exige um conhecimento consistente acerca
da disciplina ou das suas atividades, acerca da maneira com os estudantes aprendem, acerca
do modo como serão produzidos os recursos de ensino a fim de que ajustem melhor às
condições em que será realizado o trabalho, etc (Zabalza, 2004, p. 111).

A ser questionada sobre o uso das tecnologias na sua prática formativa, a professora formadora
afirma que sempre buscou inserir as tecnologias no ensino, porém percebe algumas limitações, em
especial à falta de conhecimento básico na área da tecnologia por parte de alguns alunos. Nesse
ponto, manifesta a importância do uso das mídias na formação do novo professor e dos outros
professores formadores do curso, ponto mencionado por Masetto (1998, p. 22) quando discorre que
um “profissional da docência hoje necessita ter um domínio da tecnologia educacional, no tocante a
sua teoria e a sua prática”. Nesse ponto, além de uma ferramenta educacional Murillo Estepa (2016)
aponta que a tecnologia tornou-se um recurso importante de socialização, principalmente no
fomento de novas práticas linguísticas e conectividade entre o professor e alunos.
Visando superar os obstáculos de inserção a docência na universidade, a colaborada busca
desenvolver reflexões em âmbito da sala de aula e da universidade, principalmente em relação ao
distanciamento da teoria e prática na formação do professor, embora reconheça a complexidade
dessas ações. Ao ser indagada sobre os saberes da profissão docente e sua mobilização salienta que:

Os saberes que mobilizo em sala de aula eles vêm de todos os lados. Acho que não tem como.
Vem da carga que a gente vem trazendo teórica, da carga prática, vem do que a gente vem
aprendendo todos os dias com esses meninos em sala de aula. Tenho aprendido muito com
eles.

Nesse caso, os saberes da docência são decorrentes da sua trajetória pessoal e profissional,
especificamente das situações vivenciadas na sala de aula com os alunos. Em outras palavras, “o
saber está relacionado com a pessoa e a identidade do professor, com a sua experiência de vida e

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com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e com os outros
atores escolares na escola” (Tardif, 2014, p. 11). Logo, para a colaboradora a formação do professor
formador se desenvolve de modo contínuo, pela prática da leitura e da formação continuada. Frente
à formação do professor formador iniciante a mesma destaca:

Já no caso específico do professor formador iniciante é lidando. É no dia a dia. É quebrando a


cara. Por exemplo, com essa menina quebrei a cara mesmo. Porque ela perdeu um semestre
dessa disciplina, que talvez tenha ganho porque ela tá fazendo agora, novamente, mas, eu tive
a oportunidade de me dar conta que aquilo que tava tão claro para mim ainda não tava claro
pra ela.

As ideias da colaboradora direcionam que a aprendizagem da docência enquanto formadora e sua


formação são realizadas por meio da prática em sala de aula. É na interação com os alunos. Mizukami
(2005-2006, p. 16) compreende que “a formação do formador é baseada num processo continuado e
autoformação”. A formação do formador para a autora vai de encontro com a narrativa enunciado
pela colaborada, visto que o aprender da docência se faz por meio das relações individuais, coletivas
e organizacionais. No que diz respeito às possibilidades e dificuldades na formação de um novo
professor, a professora formadora iniciante menciona a falta de interesse pela docência da maioria
dos alunos após o contato com o estágio,

Eles ficam muito tempo só na teoria, e quando eles vão para a prática é um estranhamento. É
pouco tempo também na escola. Penso que é mais é uma coisa assim doida, mas penso que
esse estranhamento eles tiveram da prática, porque foi logo que eles vieram do estágio. O
estágio causou um estranhamento muito grande

Ao questionarmos sobre pontos que considerava importante sobre a atuação do formador na


licenciatura, a formadora ressalta a necessidade do diálogo enquanto prática de reflexão e formação
tanto do aluno quanto do professor. Em relação às expectativas do curso a mesma ressalta as
possíveis consequências para educação com o atual governo no país, embora acredite que o curso
tem fortalecido, “eu penso que vem qualificando, porque, de um lado, nós estamos exigindo mais
deles. E, de outro lado, a gente tá tendo mais respostas a isso”. Em outro ponto a colaborada afirma
a importância de desenvolver metodologias formativas que articule a teoria e prática na formação do
professor, além de fortalecer o debate em torno da educação inclusiva no contexto da formação dos
professores, pois a mesma já tem experiência na área e sente um distanciamento da universidade
nessa questão. Assim, os dados da pesquisa direcionam olhar a trajetória formativa do formador
iniciante numa perspectiva de identidade crítica e narrativa (Bolivar, 2016), visto que a identidade do
professor formador é fruto de um largo processo textual entre a vida pessoal e profisisonal.

4 Conclusões

Assim, a multiplicidade dos relatos da professora formadora iniciante nos direciona para as
dificuldades e possibilidades do início da carreira enquanto professora formadora no ensino superior.
Por outro lado, nos permite analisar brevemente o início da carreira na universidade como uma fase
de descoberta, superação e limitações, já que mesmo que tenha atuado na educação básica, o
ensino superior apresentou a professora formadora iniciante outro contexto de trabalho e novas
exigências de formação. Desse modo, a oportunidade de escutar os professores formadores
iniciantes possibilitará criar um quadro analítico das experiências de vida e profissional dos

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formadores a partir da abordagem da história oral de vida e a pesquisa narrativa, metodologias tão
necessária na compreensão e valorizaçao da identidade humana no campo da pesquisa educacional
(Connelly e Clandinin, 1995). A finalidade não é apenas entender a prática pedagógica, mas acima de
tudo registrar as maneiras como vêm se constituindo como formadores, como constroem e
reconstroem significados das suas próprias trajetórias formativas (Bolivar, 2016) atuando nos cursos
de licenciaturas. Portanto, o desejo de compreender a trajetória formativa de vida e profissional do
professor formador iniciante foi aberto e necessita de maiores aprofundamentos tanto no campo da
pesquisa quanto da publicação. Esperamos nas próximas narrativas ampliar essa visão da inserção da
docência na universidade e sua articulação com a história de vida dos formadores, pois entendemos
que cada professor formador é singular e histórico, detentor de uma memória individual e social.

Agradecimentos: Ao apoio institucional na realização desta pesquisa, a CAPES/Brasil pelo apoio financeiro e
concessão de bolsa do doutorado sanduíche na Espanha, e a Universidade do Tocantins pelo afastamento de
qualificação profissional e a Universidade Federal de Uberlândia ambiente de construção e reformulação da
pesquisa de doutorado.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A Leitura da Constituição Federal do Brasil na Discussão em Sala


de Aula

Nelson Natalino Frizon¹, Jucelia Appio², Liliane Canopf³

¹ União de Ensino do Sudoeste do Paraná (UNISEP) e Secretaria de Educação do Estado de Santa Catarina,
Brasil. nfrizon@gmail.com
² Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Campus
de Francisco Beltrão-PR, Brasil. juceliaappio@yahoo.com.br
³ Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Campus
de Pato Branco-PR, Brasil. lilianec@utfpr.edu.br

Resumo. O estudo tem como objetivo relatar a experiência de inclusão do texto constitucional nas aulas de
Sociologia por um professor do magistério público do Estado de Santa Catarina, Brasil. Apresenta
abordagem qualitativa, privilegiando essencialmente, a narrativa do sujeito da investigação dentro de um
contexto histórico. A interação com os estudantes visou conceituar e fundamentar a cidadania no estado
democrático de direito brasileiro e tendo acompanhado o ciclo de proposição da atividade e o resultado de
sua execução, permite-lhe ponderar sobre a necessidade do estudo do texto constitucional na escola, em
especial, na parte dos princípios, objetivos, fundamentos, direitos e deveres do indivíduo e da coletividade.
Palavras-chave: Magistério Público; Formação Escolar; Carta Constitucional.

The Reading of the Federal Constitution of Brazil in the Discussion Classroom


Abstract. The present text intends to report the experience of inclusion of the constitutional text in
Sociology classes by a professor of public teaching in the State of Santa Catarina, Brazil. It presents a
qualitative approach, privileging essentially the narrative of the research subject within a historical context.
The interaction with students aimed at conceptualizing and substantiating citizenship in the democratic
state of Brazilian law and having followed the cycle of proposition of the activity and the result of its
execution, allows him to ponder on the necessity of studying the constitutional text in the school, especially,
In the part of the principles, objectives, foundations, rights and duties of the individual and of the
collectivity.
Keywords: Public Mastership; Scholar Formation; Constitutional Letter’s.

1 Introdução

O presente trabalho relata a experiência de um professor, da rede estadual do ensino médio no


Estado de Santa Catarina/Brasil. O professor durante o trabalho no magistério estadual atuou em
diversas unidades escolares de diferentes regiões geográficas e culturais do Estado de Santa
Catarina. Tais circunstâncias permitem que o mesmo possa relatar sua experiência e também possa
fazer a análise de conjuntura. A interação com os estudantes visou conceituar e fundamentar a
cidadania no estado democrático de direito brasileiro. Tendo acompanhado o ciclo de proposição da
atividade e o resultado de sua execução, permite-lhe ponderar sobre a necessidade do estudo do
texto constitucional na escola, em especial, no período da educação básica. O projeto de estudo do
texto constitucional, que ocorreu nas aulas de sociologia, demonstrou-se eficiente na formação
educacional dos estudantes. A ação envolveu a participação ativa dos estudantes como sujeitos
protagonistas no processo educativo e permitiu ao docente inúmeras possibilidades de ações em
prol de uma educação mais dinâmica e menos pautada no simples acúmulo de informações ou na
memorização (Simões & Silva, 2013), e com o acesso as informações, acredita-se que, os estudantes

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tiveram a possibilidade de refletir sobre a mediação discursiva, de modo que eles possam ampliar
seu mundo para além da esfera imediata (Bonini et al., 2014).
Neste texto, apresenta-se primeiramente a metodologia em seguida a contextualização e por fim as
conclusões.

2 Metodologia

O estudo apresenta abordagem qualitativa, privilegiando essencialmente, a narrativa do sujeito da


investigação dentro de um contexto histórico.
A abordagem qualitativa de pesquisa busca ressaltar a natureza socialmente construída da realidade
estudada, buscando soluções para as questões que realçam o modo como a experiência social é
criada e adquire significado (Denzin & Lincoln, 2006). Pesquisas com abordagem qualitativa utilizam-
se de muitos métodos e técnicas de análise para responder ao objetivo de pesquisa, dentre os
principais métodos estão a etnografia, a etnometodologia, a Pesquisa Histórica, a hermenêutica, A
Groud Theory, os estudos de caso, a fenomenologia e a pesquisa-ação. As técnicas de análise mais
comumente disseminadas são a análise de narrativa, do conteúdo, do discurso, de arquivos e até
mesmo de estatísticas, tabelas e gráficos numéricos. Todos esses métodos e técnicas podem oferecer
importantes insights para alcançar ao proposto pelos estudos.
No caso presente optou-se pelo método da Pesquisa Histórica com foco na narrativa do sujeito
entrevistado (Schwarcz, 2001). O estudo da história permite ao homem compreender e incorporar,
em um sistema coerente, tudo o que ele cria, faz e transforma, na produção e na explicação de sua
existência. A história permite ao homem interrogar e refletir sobre sua existência (Curado, 2001).
A narrativa se desenvolve sob a ótica de um professor da rede estadual do ensino médio no Estado
de Santa Catarina/Brasil, e busca valorizar a ação de inclusão da leitura do texto constitucional nas
escolas da rede pública. A narrativa não visa julgar e sim compreender os motivos pelos quais o texto
constitucional não faz, no geral, parte do cotidiano dos estudantes. A narrativa foi coletada em
entrevista e transcrita com a finalidade de proporcionar a interpretação social do discurso, buscando
a compreensão e articulação da ação (Ricoeur, 1989). Se uma ação pode ser narrada, ela está
simbolicamente mediada (Ricoeur, 1997), portanto, compartilha de uma articulação com o público:
uma inter-ação (Campos & Furtado, 2008). Nesse trabalho, a narrativa seria uma mediação entre
ação e linguagem em um contexto histórico.

3 Contextualização

O professor relata que iniciou suas atividades do magistério, no ano de 1999, na Escola de Educação
Básica Dom João Becker, em Brusque-SC, Brasil. Brusque é uma cidade do vale do Itajaí, um pólo da
indústria têxtil e metal mecânico, com um dos melhores IDH - Índice de Desenvolvimento Humano –
do Estado. Fator que não impediu que na unidade escolar que trabalhou encontrasse estudantes do
ensino médio com grandes dificuldades para fundamentar o conceito de cidadania. Preocupado com
as orientações da proposta curricular do Estado de Santa Catarina, bem como as Diretrizes para a
Educação Básica do Ministério da Educação, quando da elaboração do plano de ensino priorizou
trabalhar o tema transversal “cidadania” e como instrumento, para concretizar a ação, colocou a
leitura do texto constitucional. Neste aspecto afirma que, delineando o pensamento dos iluministas,
destacou que o caminho que leva à construção de uma sociedade cidadã implica num processo
complexo de educação, e não apenas a educação entendida no sentido da transmissão do
conhecimento, mas no sentido da formação da cidadania (Oliveira, 2000).

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Segundo o professor, quando passou a desenvolver a atividade proposta no plano de ensino,


especialmente nas aulas de Sociologia, teve como bibliografia básica a Constituição Federal do Brasil
de 1988. Por falta de exemplares, da CF/88 na biblioteca da escola, optou-se pelo estudo dos artigos
1º ao 14º, os quais foram transcritos em uma apostila. Observou que o contato como a literalidade
do texto despertou a curiosidade dos estudantes de saber o porquê naquele texto se encontravam
tais princípios de lei. E, com o fundamento no próprio Preâmbulo da CF/88, que diz que a Assembléia
Constituinte foi criada para “instituir um Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e
a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos [...]”
(Brasil, 1988, p.01), destacou que para a Assembléia Constituinte produzir tal texto fora necessário
estudos e discussões sobre a sociedade ideal e a sociedade existente à época. O texto constitucional
promulgado elenca em seus fundamentos, no artigo 1º incisos II e III, a cidadania e a dignidade
humana, respectivamente. Ambas possíveis de ser alcançadas quando a sociedade, como um todo,
prioriza a Educação.
A leitura do texto constitucional originário tem relevância para comprensão de onde estão definidos
os princípios de uma sociedade e é reforçada no Art. 2° da Lei N° 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
onde enfatiza que “a educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e
nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (Brasil, 2005, p.07).
Considerando tal fundamentação, o professor relata que, ao fazer as primeiras abordagens sobre
cidadania e dignidade da pessoa humana, os estudantes até expressavam opiniões sobre estas, mas
não conseguiam fundamentá-las ou mesmo referenciar como estas estariam garantidas na sociedade
em um Estado Democrático. Destaca ainda que, sendo estudantes de ensino médio, nível que
encerra a educação básica, a não referência ou fundamentação na Constituição, dos fundamentos de
cidadania e dignidade humana, do Estado Democrático causava preocupação com a forma de
educação dada por este Estado, a qual deveria ter como finalidade o pleno desenvolvimento do
educando.
No ano de 2000, foi ministrar aulas na Escola de Educação Básica João XXIII, na cidade de Maravilha,
no Oeste do Estado. Realidade econômica e social voltada à agroindustria. Na escola observou a
mesma dificuldade na unidade escolar anterior, falta de exemplares da constituição na biblioteca
bem como falta de manuseio e leitura do texto constituicional dentro da escola.
Na entrevista, o professor evidencia que foi a partir de então que surgiu a ideia de efetivar o acesso
ao texto constitucional de forma mais sistematizada, daí que se desenvolveu a campanha “escreva ao
senador ou deputado e peça um exemplar da constituição”. A campanha foi exitosa, em parte, na
medida em que muitos receberam dos congressistas exemplares via correios.
No ano de 2004, o professor solicitou transferência de trabalho, para continuar sua formação
acadêmica, indo para a Escola de Ensino Médio Victor Meirelles, na cidade de Itajaí – SC. Na escola,
quase centenária e referência de representantes políticos do Estado de Santa Catarina, esperava
encontrar estudantes com mais domínio sobre as temáticas que envolviam o exercício da cidadania.
Tão logo que passou a ministrar aulas observou que a capacidade dos estudantes de conceituação e
fundamentação sobre a temática não destoavam da realidade cultural das escolas que antes
trabalhara. Então, continuou com a campanha, de solicitar os exemplares da Constituição junto aos
congressistas, e com a leitura e discussão nas aulas de Sociologia, dos primeiros artigos do texto
constitucional.
Em 2008, com a transferência para o Centro de Educação de Jovens e Adultos - CEJA, veio a
motivação de educador em manter o projeto junto aos estudantes do CEJA de Itajaí – SC. Por
encontrar estudantes que, em sua maioria, já possuiam relação formal de trabalho, jovens e adultos

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

que haviam se afastado dos estudos por este motivo, foi que sentiu o estímulo pedagógico de
aprofundar o estudo do texto constitucional.
Nesta unidade escolar, o estudo da Constituição despertou maior motivação nos estudantes,
produzindo discussões aprofundadas e relacionadas com seu cotidiano e, ao final do estudo, foi
possível perceber a produção de conceitos mais coerentes com os fundamentos estabelecidos no
texto constituicional.
Quando questionado sobre os fatores que poderiam ter influenciado os estudantes do CEJA a ter
maior compreensão sobre o tema, destaca que junto ao CEJA, havia estudantes de faixa etária acima
dos 20 anos de idade e a maioria com ralação de trabalho diária, circunstância que contribuía para
que estes se inteirassem de seus direitos e deveres e soubessem onde fundamentá-los. O professor
também destacou que se sentiu desafiado a lhes demonstrar que o texto constituicional fazia parte
das ações do dia a dia de cada um.
No início de 2015, quando iniciou as atividades nas cidades de Palma Sola e Anchieta, no extremo
oeste de Santa Catarina, o projeto continuou com jovens e adultos.
Após ter trabalhado, em diferentes unidades escolares, com o estudo do texto constituicional os
estudantes passaram a fundamentar e comprender que a cidadania não se limita ao instante
periódico do voto, ao direito de votar e ser votado e à faculdade de ocupar cargos públicos, ela está
vinculada à concretização dos direitos fundamentais. O conceito de cidadania deve ser entendido
como meio concreto de realização da pessoa humana que se concretiza na soberania popular. Assim,
o exercício da cidadania compreende uma variedade de direitos que se opõem à ação dos poderes
públicos que tragam prejuízo para a sociedade, inclusive, o da “desobediência civil” na afirmação de
Frizon (2009).
Este moderno conceito de cidadania, considerando a concepção histórica, tem seu início no
denominado século das luzes culminando com a proclamação da Declaração Universal de 1948, e
reiterado na segunda Conferência de Viena, em 1993. No Brasil, esse processo, tem seu apogeu na
Constituição Federal de 1988, que em seu texto assegurou aos cidadãos direitos e garantias
fundamentais mínimas.

4 Conclusões

Os estudantes, no caso deste relato, a partir do projeto proposto desenvolveram reflexões e


discussões que os levaram a compreenderem que não precisam tornar-se cidadãos, pois o são. O que
necessitavam era estudar os fundamentos e princípios que constam no texto constitucional. Pois,
ainda que na Constituição Federal não se encontre, de forma clara, um conceito universal de
cidadania, têm-se os princípios de direitos e deveres dos cidadãos que norteiam o agir humano. E, a
partir dos fundamentos constitucionais os estudantes passam a buscar um conceito abrangente. Um
conceito mais abrangente se encontra no campo filosófico, pois não é possível alcançar um termo
universal em stricto sensu. Cumpre destacar que a discussão puramente filosófica não satisfaz o
ideário social, pois a sociedade no dia-a-dia necessita experimentar a convivência cidadã. Mas, para
que ocorra a convivência cidadã há necessidade de se ter conhecimento dos direitos e deveres. Estes
são encontrados no texto que organiza um Estado, ou seja, encontram-se na Constituição.
E, então, é possível comprender que a cidadania não se limita ao instante periódico do voto, ao
direito de votar e ser votado e à faculdade de ocupar cargos públicos, ela está vinculada à
concretização dos direitos fundamentais. O conceito de cidadania deve ser entendido como meio
concreto de realização da pessoa humana que se concretiza na soberania popular. Assim, o exercício
da cidadania compreende uma variedade de direitos que se opõe à ação dos poderes públicos que

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tragam prejuízo para a sociedade, inclusive, o da “desobediência civil”, na afirmação de Frizon


(2009).
Com base nessa reflexão é que o projeto de trabalho com o texto constitucional move o exercício do
magistério junto aos estudantes do ensino médio e corrobora a afirmação de Cury (2002), ao dar
ênfase a relação que se estabelece entre professor e aluno, relação esta que é de tal natureza que os
conteúdos e os valores, ao serem apropriados, não se privatizam. Quanto mais processos se dão,
mais se multiplicam mais se expandem e se socializam. A educação, com isto, sinaliza a possibilidade
de uma sociedade mais igual e humana.
Com a narrativa da prática do professor-narrador, em um constexto histórico, faz-se emergir formas
de articulação do cotidiano. Essa colocação aproxima-se de Ricoeur em que a narrativa emerge como
resultado da inter-relação das forças sociais e caracterizam equacionamentos possíveis do fluxo
histórico e social (Campos & Furtado, 2008), fazendo ressignificar os sentidos da formação escolar e a
compreensão do sentido da ação, porque conforme Ricoeur (1989) toda ação exige uma
objetividade.
A formação humana com busca a cidadania seria mais completa se, ainda nos primeiros anos da
formação básica, os estudantes fossem introduzidos à leitura do texto constitucional. Em especial, na
parte dos princípios, objetivos, fundamentos, direitos e deveres do indivíduo e da coletividade.

Referências

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Linguagens. 1. Ed. Curitiba: MEC/UFPR/Setor de Educação, v. IV, 47.

Brasil. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: promulgada em 5 de outubro


de 1988. Brasilia, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 292. Educação nacional. Lei de diretrizes
e bases da educação nacional, Brasília, Senado Federal.

Brasil. (2005). Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional. Lei de diretrizes e bases da educação nacional, Brasília, Senado Federal.

Campos, R. T. O. & Furtado, J. P. (2008). Narrativas: utilização na pesquisa qualitativa em saúde. Rev.
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Curado, I. (2001). Pesquisa historiográfica em administração: uma proposta metodológica. In. Anais
do II Encontro de Marketing da ANPAD – EMA: Rio de Janeiro: Campus.

Cury, C. R. J. (2002). Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. Cadernos de


Pesquisa, 116, 245-262. Educação nacional. Lei de diretrizes e bases da educação nacional,
Brasília, Senado Federal.

Denzin, N. K. & Lincoln, Y. S. (Orgs.). (2006). O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e


abordagens. 2. ed. Porto Alegre: Artmed.

Frizon, N. (2009). A fundamentação da desobediência civil em “Uma teoria da justiça” de John Rawls.
Dissertação (Mestrado em Filosofia). Universidade Federal da Santa Catarina. Programa de Pós-
Graduação em Filosofia.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Oliveira, I. de A. R. de. (2000). Sociabilidade e direito no liberalismo nascente. Lua Nova [online]. 50,
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Ricoeur, P. (1989). Da Interpretação. In: Do Texto à Ação. Ensaios de Hermenêutica II. (trad. de Alcino
Cartaxo e Maria José Sarabando). Porto: Rés.

Ricoeur, P. (1997). Tempo e Narrativa. Trad. Roberto Leal Ferreira. Campinas: Papirus.

Schwarcz, L. M. (2001). Prefácio. In: Bloch, M. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 7-14.

Simões, C. A., & Silva, M. R. (Org.). (2013). Formação de professores do ensino médio, etapa I -
caderno III: o currículo do ensino médio, seu sujeito e o desafio da formação humana integral.
1. Ed. Curitiba: MEC/UFPR/Setor de Educação, v. III, 49.

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Exergames em aulas de Educação Física: Triangulação entre a


percepção do professor, do aluno com deficiência física e sua turma

Fernanda Carolina Toledo da Silva1, Lígia Maria Presumido Braccialli2


1
Discente do Programa de pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista - UNESP,
Brasil. nanda_tol@hotmail.com
2
Docente Departamento de Educação Especial da Universidade Estadual Paulista - UNESP, Brasil.
ligiapresumido@hotmail.com

Resumo. Os exergames são uma nova ferramenta educacional que podem servir de recurso de auxílio aos
professores de Educação Física. O objetivo deste estudo foi verificar por meio da triangulação de dados, a
opinião do professor de Educação Física, do aluno com deficiência física e dos demais alunos de sua turma
sobre um programa de atividades com uso do vídeo game. Participaram do estudo um professor de
Educação Física e todos os alunos de uma turma, com e sem deficiência. Foi implementado um programa
com vídeo game e depois foram triangulados os dados do diário de campo, filmagens e entrevistas. Para o
professor de Educação Física, houve melhora da socialização dos alunos; para o aluno com deficiência física,
o vídeo game favoreceu sua habilidade manual e o motivou a fazer todas as atividades das aulas; e para a
turma, as aulas motivaram, pelo uso do vídeo game e pelo circuito.
Palavras-chave: Exergames; Programa de Atividades; Aluno com Deficiência Física; Triangulaçao de Dados.

Exergames in Physical Education classes: Triangulation between the perception of the teacher, the
student with physical disability and his class
Abstract. The Exergames are a new educational tool that can serve as a resource to help Physical Education
teachers. The objective of this study was to verify, through the data triangulation, the opinion of the
Physical Education teacher, the student with physical disability and the other students of his class about a
program of activities with use of the video game. A Physical Education teacher and all students in a class,
both disabled and non-disabled, participated in the study. A video game program was implemented and
then triangulated to the field data, filming and interviews. For the Physical Education teacher, there was
improvement in the students' socialization; for the physically handicapped student, the video game favored
his manual ability and motivated him to do everything as class activities; and for the class, the classes
motivated them, for the use of the video game and the circuit.
Keywords: Exergames; Activities Program; Student with Physical Disability; Data Triangulation.

1 Introdução

Os vídeo games estão cada vez mais presentes no cotidiano de adolescentes (Moura Jr, 2006), e os
jogos eletrônicos têm sido utilizados como entretenimento por jovens em diversos locais (Vaghetti &
Botelho, 2010).
Os exergames, games desenvolvidos para a prática de atividade física, combinando exercício físico
com game, possibilitam um aumento no nível de atividade física, quando comparados aos
sedentários vídeo games tradicionais (Vaghetti & Botelho, 2010).
Os vídeo games com interação corporal são envolventes e motivadores, além de apresentarem
desafios ao usuário. O vídeo game era visto como uma atividade que poderia gerar problemas como
lesões, introversão social, agressividade, sedentarismo, obesidade, mas, à medida que os vídeo
games evoluíram, possibilitando interatividade corporal, essa visão foi se alterando. Além disso, o

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vídeo game pode ser considerado uma ferramenta educativa, uma vez que jogo Wii Fit influenciou
positivamente seus usuários, conscientizando-os da prática de atividade física regular e alimentação
saudável (Finco & Fraga, 2012).
Os exergames são uma nova ferramenta educacional, principalmente para a Educação Física, devido
ao movimento humano ser característica desses jogos e eles podem servir de recurso de auxílio aos
professores de Educação Física, que, muitas vezes têm dificuldades de incluir alunos com deficiência
nas atividades propostas (Vaghetti & Botelho, 2010). Tais recursos associados a estratégias de ensino
bem planejadas podem possibilitar ao aluno com deficiência a experiência de sensações e emoções
do jogo, e podem contribuir para a motivação e participação de todos os alunos nas aulas (Baracho,
Gripp, & Lima, 2012).
Na pesquisa de Rodrigues Júnior e Sales (2012) foi verificada a opinião dos professores quanto ao uso
dos jogos eletrônicos e aceitação dos alunos quanto ao uso nas aulas de Educação Física, sendo que e
a maioria dos professores se posicionou favoravelmente à utilização destes jogos como conteúdo
pedagógico, por acharem uma interessante possibilidade.
Com o intuito de discutir as perspectivas da utilização dos exergames na Educação Física Escolar, a
partir do relato de jovens alunos de uma escola que vivenciaram um jogo em ambiente real e virtual,
foi constatado que, após vivenciarem o jogo de baseball do Wii Sports e o jogo de baseball no
gramado da escola, os alunos consideraram que a prática real foi boa, mas cansativa e com baixo
êxito, enquanto que a prática virtual foi divertida, original e diferente do habitual (Baracho et al.,
2012). Também foi discutido nesta pesquisa, que a inserção dos exergames nas aulas de Educação
Física pode ser um caminho para que se recupere o interesse de alunos que não gostam de esportes
ou de alunos que não participam das aulas de Educação Física.

2 Objetivo

Verificar, por meio da triangulação de dados, a opinião do professor de Educação Física, do aluno
com deficiência física e dos demais alunos de sua turma sobre um programa de atividades com uso
do vídeo game.

3 Metodologia

O presente estudo trata-se de uma pesquisa qualitativa descritiva, do tipo estudo de caso, que
utilizou da técnica de triangulação de dados baseada em (Triviños, 1987).

3.1 Aspectos Éticos

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade sob o parecer número
0470/2012. Para realizaçãoda pesquisa, foi contactada a Secretaria Municipal de Educação, que após
autorizar a realização do estudo, informou o número de alunos com deficiência física no ensino
fundamental I. Foi, então, realizado contato com as escolas para seleção de uma escola que tivesse
um aluno com deficiência física matriculado regularmente e que o mesmo frequentasse as aulas de
Educação Física. A direção autorizou a participação da escola no estudo, assim como o professor de
Educação Física aceitou participar. Todos os alunos da turma do aluno com deficiência física e seus
responsáveis legais foram informados sobre a pesquisa e seus filhos convidados a participar da
mesma. Por fim, o professor de Educação Física e os pais/responsáveis pelos alunos que aceitaram
participar da pesquisa assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

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3.2 Participantes

Participaram do estudo um professor de Educação Física que ministrava aulas no 4º ano do ensino
fundamental ciclo I, em uma escola da rede municipal de uma cidade do interior do Estado de São
Paulo/Brasil, que tinha um aluno com paralisia cerebral matriculado, e todos os alunos da turma,
com e sem deficiência.
O aluno com deficiência física participante era do gênero masculino, tinha 9 anos, diagnóstico de
Paralisia Cerebral Diparética Espástica. Nos sistemas de classificação de Função Motora Grossa (Gross
Motor Function Classification System - GMFCS) e de Habilidade Manual (Manual Ability Classification
System - MACS) foi classificado no nível II, e não apresentava alteração de fala e linguagem
significativa.
O professor de Educação Física era graduado em Educação Física e aluno do segundo ano do curso de
Pedagogia. Ele tinha experiência com uso de recursos tecnológicos, tais como computador, internet,
redes sociais e jogos, além de video game. O professor tinha experiência com jogos de estratégias
como Role-Playing Game (RPG), e com jogos virtuais, e identificava o video game como um recurso
com muitas capacidades e possibilidades de uso nas aulas de educação física, porém nunca havia
utilizado esse recurso na escola.

3.3 Local e período

O estudo foi realizado em uma Escola Municipal de Ensino Fundamental I da rede regular de ensino
em uma cidade no interior do Estado de São Paulo/Brasil. Os dados foram coletados no segundo
semestre letivo, momento em que os alunos já estavam acostumados com a rotina das aulas.

3.4 Instrumentos e Equipamentos de Coleta de dados

Os instrumentos e equipamentos utilizados no presente estudo foram: roteiros de entrevista


semiestruturada, diário de campo e filmadora.

3.5 Procedimentos para coleta de dados

A pesquisa foi desenvolvida em quatro etapas: 1) elaboração dos instrumentos para a coleta de
dados; 2) planejamento de um programa de atividades com uso do vídeo game e do protocolo de
instrução dos jogos, em conjunto com o professor de Educação Física; 3) desenvolvimento do
programa de atividades com uso do vídeo game durante as aulas de educação física com registro em
diário de campo, filmagem e entrevistas coletivas e 4) realização de entrevistas com o professor de
Educação Física e com o aluno com deficiência física.
Na primeira etapa foram elaborados três roteiros de entrevista semiestruturada para serem
utilizados com o professor de Educação Física, com o aluno com deficiência física após
implementação do programa e com toda a turma ao término de cada aula.
A segunda etapa consistiu na parceria entre a pesquisadora e o professor de Educação Física para
elaborarem o planejamento do programa de atividades com uso do vídeo game, composto por
atividades que foram desenvolvidas em seis aulas, e o protocolo de instrução dos jogos do vídeo
game que foram utilizados durante o programa.
A terceira etapa caracterizou-se pela implementação do programa. Nesta etapa, as atividades
desenvolvidas no programa foram registradas em diário de campo e filmadas por três câmeras, e ao
final de cada aula, os alunos respondiam a uma entrevista coletivamente, indicando o que gostaram

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e o que não gostaram na aula, para identificar a percepção dos alunos sobre as aulas Educação Física
com uso do vídeo game.
Na última etapa, o professor e o aluno com deficiência física, separadamente, foram entrevistados e
informaram sua percepção sobre as aulas do programa em que foi usado o vídeo game.

3.5.1 Implementação do programa de atividades com uso do vídeo game

As seis aulas do programa seguiram a estrutura do planejamento do programa de atividades com uso
do vídeo game. Dessa maneira, ao início de cada aula as atividades foram explicadas e demonstradas.
Em seguida, em cada aula, os alunos foram divididos em três grupos para realizarem as atividades
que estavam distribuídas em um circuito de três estações, que foram desenvolvidas
simultaneamente. A estação 1 foi a que os alunos puderam vivenciar os exergames por meio do
vídeo game e nas outras duas estações, os alunos vivenciaram, nas três primeiras aulas, atividades
relacionadas ao voleibol e nas três últimas, ao futebol. Para realizar todas as estações de cada aula,
ao término de cada atividade, sob orientação do professor e da pesquisadora, os alunos realizaram
um rodízio entre as estações de atividades, e assim, todos os alunos participaram de todas as
atividades. Ao final de cada aula, os alunos avaliaram as atividades vivenciadas.

3.5.2 Registro em Diário de Campo e filmagem

Durante a realização das aulas com utilização do vídeo game, foi feito registro dos acontecimentos
em diário de campo. Este registro foi realizado por uma auxiliar de pesquisa, que foi instruída para tal
tarefa. As anotações no diário de campo foram realizadas em um protocolo previamente
desenvolvido que continha as informações que deveriam ser registradas, como data da aula, número
da aula realizada, conteúdo da aula, indicação das atividades de cada estação da aula, descrição das
instruções iniciais, descrição do desenvolvimento e intercorrências que ocorreram em cada uma das
três estações. Juntamente ao registro do diário de campo, foram acrescentadas, no diário,
informações faltantes, advindas das filmagens das aulas do programa.

3.5.3 Entrevistas com a turma

Ao final de cada aula em que o vídeo game foi utilizado, foram distribuídos crachás com os nomes
dos alunos, para facilitar a identificação e interação entre os alunos e a pesquisadora, e então, foram
realizadas entrevistas coletivas com os alunos que participaram das aulas.
Para a realização das entrevistas coletivas, os alunos se arrumaram em roda e respondiam às
perguntas na ordem em que estavam organizados na roda, para que todos os alunos opinassem,
possibilitando que cada um falasse em sua vez.
Para realização da entrevista coletiva, denominada aos alunos como roda de conversa, a primeira
pergunta do roteiro, realizada pela pesquisadora, era respondida por cada um dos alunos e, assim,
seguia para a próxima pergunta, até que as quatro perguntas do roteiro fossem respondidas por
todos. As entrevistas foram gravadas em áudio e vídeo e duraram cerca de 3 a 9 minutos,
dependendo da interação dos alunos no dia.

3.5.4 Entrevistas com o aluno com deficiência física e com o professor

Ao término do programa de atividades com uso do vídeo game, foram realizadas as entrevistas
semiestruturadas com o aluno com deficiência física e com o professor de Educação Física. As
entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente seu conteúdo foi transcrito.

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Para realização da entrevista com o aluno com deficiência física, foi acertado com o professor de sala
regular um dia e horário que o aluno pudesse se ausentar da aula por alguns minutos para realizar a
entrevista. A entrevista com o aluno, que teve duração de 12 minutos e 40 segundos, foi então
realizada em uma sala na qual não havia alunos para que não ocorressem interferências do ambiente
na interação da pesquisadora com o aluno, assim como no registro do áudio.
A entrevista com o professor de Educação Física foi marcada para se realizar conforme sua
disponibilidade. A entrevista aconteceu em dois dias, uma vez que não foi finalizada no primeiro
encontro, havendo, então, a necessidade de continuar a coleta de informações com o professor. No
primeiro encontro, a entrevista durou 18 minutos e 55 segundos, e no segundo encontro, teve
duração de 11 minutos e 52 segundos.

3.6 Procedimentos para análise de dados

A análise dos dados foi realizada por meio de triangulação dos dados. Os relatos transcritos das
entrevistas com a turma, com o professor de Educação Física e com o aluno com deficiência física
foram complementados com as informações advindas do diário de campo e das filmagens e realizada
a Triangulação dos Dados proposta por Triviños (1987).
A triangulação dos dados possibilita abranger a máxima amplitude na descrição, explicação e
compreensão de um tema estudado, conforme aponta Triviños (1987). A coleta e análise de dados é
uma etapa no processo de pesquisa qualitativa e se retroalimentam constantemente, pois na
perspectiva da triangulação, “qualquer idéia do sujeito, documento, etc. é imediatamente descrita,
explicada e compreendida, à medida que isso seja possível” (Triviños, 1987, p. 139).
A técnica de triangulação de dados caracteriza-se pela origem de um documento único gerado por
meio de diferentes instrumentos de pesquisa (TRIVIÑOS, 1992 apud Rocha, 2013). Assim, as
informações obtidas por meio do diário de campo, das filmagens e das entrevistas foram organizadas
a partir da análise proposta.

4 Resultados e discussão

A partir do relato das entrevistas, das anotações do diário de campo e das filmagens, foram
compilados os dados em um quadro relacionado às atividades desenvolvidas com o conteúdo
voleibol (Quadro 1) e um quadro com o conteúdo relacionado ao futebol (Quadro 2).

Quadro 1 – Triangulação dos dados do diário de campo, das filmagens e das entrevistas das aulas de voleibol
Número da aula Aulas 1 a 3
Conteúdo Voleibol nas três primeiras aulas.
Estação 1 Game de vôlei de praia nas três primeiras aulas.
Estação 2 Atividades relacionadas ao voleibol: aula 1 bobinho; aula 2 três toques (com bexiga); e aula 3 rede
humana.
Estação 3 Atividades relacionadas ao voleibol: aula 1 passes ou toques; aula 2 rede móvel; e aula 3 manter a
área livre (com bexigas).
Orientações/ A primeira aula do programa se iniciou com a leitura das instruções do game de vôlei de praia que foi
Instruções iniciais utilizado no vídeo game. O game de vôlei de praia podia ser jogado simultaneamente por 4 alunos.
Antes de começarem as atividades, o professor de Educação Física e a pesquisadora explicaram como
aconteceria a dinâmica da aula, e como as atividades seriam realizadas em cada estação, sendo
realizada demonstração de cada atividade da aula. Na primeira aula, foi explicado que através do
comando verbal do professor aconteceria o rodízio dos alunos pelas estações.
No início de cada aula foi realizada a divisão dos alunos em grupos com cerca de sete a oito alunos em
cada, para organização nas estações e início das atividades.
O professor de Educação Física ficou responsável pelo desenvolvimento da estação 3 e a

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pesquisadora da estação 1. A estação 2, em algumas aulas foi desenvolvida sob orientação do


professor, em outras, da pesquisadora.
Realização das A estação 1 foi realizada por quatro alunos ao mesmo tempo.
atividades: início Aula 1: os alunos trabalharam de maneira organizada ao realizarem a primeira estação de seus
da atividade grupos, e todos participaram.
Aula 2: houve dificuldade do primeiro grupo compreender a atividade da estação 2, mas após sanadas
as dúvidas, foi realizada organizadamente.
Aula 3: a estação 1 iniciou com atraso, após ser resolvido problema com as pilhas do controle do
vídeo game. Na estação 2, os alunos compreenderam as regras da atividade de maneiras diferentes,
mas a pesquisadora ajudou para que todos jogassem harmoniosamente, mesmo assim, dois alunos
não quiseram participar desta atividade. Na estação 3 o professor de Educação Física precisou repor
as bexigas na atividade.
Realização das Aula 1: os alunos se confundiram no momento de trocar de estação, mas foi logo resolvido o engano
atividades: e eles realizaram bem as atividades.
primeiro rodízio Aula 2: ao realizarem o primeiro rodízio, os alunos foram para atividade errada, mas foram
organizados nas atividades corretas. Havia uma professora substituindo o professor de sala, a qual
orientou e realizou com os alunos a atividade da estação 2; uma aluna não realizou a atividade da
estação 2, e outra aluna parou de realizá-la quase ao final da atividade.
Aula 3: mais uma vez houve confusão no momento de trocar de estação de atividade. Na estação 2
houve desentendimento e duas alunas deixaram de participar da atividade. Na estação 3, as bexigas
foram repostas à medida que estouraram.
Realização das Aula 1: ao fazer o segundo rodízio, o aluno com deficiência física se confundiu e foi para uma estação
atividades: que já tinha realizado, mas foi orientado a seguir para a estação correta. Houve desentendimento na
segundo rodízio atividade da estação 2, e mesmo com orientação da pesquisadora, a atividade foi interrompida várias
vezes.
Aula 2: após o segundo rodízio, houve desentendimento com dois alunos na estação 1 que queriam
logo jogar o vídeo game, o problema foi resolvido, porém após terem jogado, esses dois alunos foram
participar de outra estação de atividade; logo foram orientados a permanecerem na estação de seu
grupo e observaram seus colegas jogarem. Na estação 2, a atividade foi realizada com bexigas que
foram repostas conforme a necessidade. Na estação 3, o professor de Educação Física auxiliou o
aluno com deficiência física a participar da atividade.
Aula 3: após os alunos estarem organizados em suas estações, três alunas da estação 1 sentaram-se
pois não queriam jogar vídeo game. A estação 2 aconteceu sem problemas, e na estação 3 o aluno
com deficiência física ficou com receio de não conseguir realizar a atividade, mas o professor de
Educação Física o motivou e o auxiliou a participar, o que fez com êxito.
Avaliação das Pontos positivos das aulas de voleibol: gostaram das aulas, da experiência com o vídeo game, pois dá
aulas/ Percepção emoção ao jogá-lo. Acharam as aulas legais, interessantes, divertidas, com existência de muitas
dos alunos sobre brincadeiras legais, diferentes devido ao vídeo game e às atividades novas, que mudam a cada aula.
as aulas Relataram que eles aprendem mais com brincadeiras que eles gostam, além de ser bom para a saúde
realizar exercícios físicos. Todos conseguiram jogar tanto o vídeo game quanto as demais atividades
do circuito.
Pontos negativos: alguns alunos não gostaram das aulas por motivos como não conseguirem realizar
algumas atividades, pois alguns alunos não davam oportunidades a outros, por não ter gostado do
vídeo game pois acharam as demais atividades mais legais, ou por não gostarem de bexigas que
foram utilizadas em duas das atividades.
Sugestões para as Pontos que poderiam ser modificados nas aulas: separar os alunos por estatura para que eles
aulas conseguissem realizar as atividades, alterar o jogo do vídeo game, trocar por outro vídeo game ou até
mesmo retirá-lo. Alguns alunos relataram que as aulas não precisavam de modificações.
Percepção do O aluno considerou que o game de vôlei de praia foi seu preferido no programa, uma vez que foi mais
aluno com fácil de jogar.
deficiência física
Fonte: Elaborado pelas autoras.

Quadro 2 – Triangulação dos dados do diário de campo, das filmagens e das entrevistas das aulas de futebol
Número da aula Aulas 4 a 6
Conteúdo Futebol nas três últimas aulas.
Estação 1 Game de futebol nas três últimas aulas.
Estação 2 Atividades relacionadas ao futebol: aula 4 condução de bola; aula 5 chute ao gol; e aula 6 condução

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de bola.
Estação 3 Atividades relacionadas ao futebol: aula 4 deslocamento entre cones; aula 5 bobinho com os pés; e
aula 6 cobrança de pênaltis.
Orientações/ A quarta aula do programa iniciou com a leitura das instruções, dessa vez do game de futebol que foi
Instruções iniciais utilizado no vídeo game. O game de futebol foi jogado por 2 alunos em cada partida.
Antes de iniciar as atividades da quarta aula, o professor de Educação Física explicou e demonstrou
como as atividades seriam realizadas em cada estação. Nas aulas 5 e 6, as estações foram explicadas
no momento em que os alunos foram realizá-las.
Ao início de todas as aulas, houve a divisão dos alunos em grupos para organização nas estações. O
professor de Educação Física ficou responsável pelo desenvolvimento da estação 2 e a pesquisadora
ficou no comando do desenvolvimento da estação 1. A estação 3, em algumas aulas foi desenvolvida
sob orientação do professor, em outras, sob orientação da pesquisadora.
Realização das Na estação 1 os alunos jogaram o vídeo game em duplas.
atividades: início Aula 4: iniciou com atraso devido à realização de atividade que estava sendo finalizada na sala de
da atividade aula, o que levou à permanência dos alunos menos tempo em cada estação do circuito. O professor
de sala organizou a estação 2, porém duas alunas pararam de participar. Na estação 3, um aluno
parou de participar pois uma aluna não estava realizando a atividade conforme foi proposta, depois
foi resolvido como a atividade deveria ser realizada.
Aula 5: na estação 1 uma aluna sentou-se pois não estava se sentindo bem. Na estação 2, os alunos se
organizaram para pegar a bola que chutavam ao gol. Na estação 3 uma aluna não participou,
observando a atividade e o aluno com deficiência física teve auxílio de um colega para participar.
Aula 6: na estação 1 o aluno com deficiência física foi da primeira dupla a jogar, logo que acabou sua
vez, foi observar outra estação do circuito, a pesquisadora chamou várias vezes os alunos para
voltarem à estação 1. Na estação 2 houve desentendimento entre os alunos, que achavam que os
demais alunos estavam trapaceando, logo foram organizados, depois começaram a realizar a
atividade de maneira incorreta, mas o professor de sala estava os observando e solicitou que
realizassem corretamente. Na estação 3 a atividade estava sendo realizada em duplas e houve
necessidade do professor de Educação Física participar.
Realização das Aula 4: após realizar o primeiro rodízio, o aluno com deficiência física foi para a estação 1 e teve
atividades: auxílio para jogar o vídeo game, e no momento que já havia jogado e deveria observar seus amigos
primeiro rodízio jogarem, foi até a estação 3 e pediu que a pesquisadora o deixasse realizar o comando de início da
atividade.
Aula 5: após o primeiro rodízio na estação 1, uma aluna sentou-se na arquibancada depois que jogou
o vídeo game, o aluno com deficiência física observou e fez gestos enquanto a primeira dupla jogava,
ele foi da segunda dupla e teve ajuda da pesquisadora para jogar; depois de jogar o vídeo game, o
aluno com deficiência física foi observar a estação 2. Na estação 2, os alunos realizaram a atividade
motivados. Na estação 3 o professor de Educação Física chamou a atenção dos alunos diversas vezes
pois estavam chutando a bola muito forte.
Aula 6: depois do primeiro rodízio, vários da estação 1 e da estação 2 não permaneceram em seus
grupos, sendo chamados diversas vezes para retornarem a suas estações. Na estação 2, o aluno com
deficiência física demonstrou realizar a atividade com dificuldade, mas mostrou que estava se
divertindo. Na estação 3 um aluno foi derrubado e ficou sentado esperando o rodízio seguinte, os
demais alunos continuaram a atividade.
Realização das Aula 4: quando foi realizado o segundo rodízio, as atividades das 3 estações aconteceram muito
atividades: rapidamente devido ao adiantado da hora da aula, e nem todos os alunos que estavam na estação 1
segundo rodízio jogaram o vídeo game.
Aula 5: no segundo rodízio, os alunos que foram para a estação 1 já começaram a jogar, antes da
pesquisadora explicar, e os alunos deste grupo ficaram dispersos enquanto seus colegas jogaram o
vídeo game, sendo que a pesquisadora teve que pedir diversas vezes para os alunos retornarem à sua
estação. Na estação 2, o grupo realizou a atividade com animação e na estação 3, o professor, logo ao
iniciar a atividade alertou não haver necessidade de chutar a bola com muita força.
Aula 6: após o segundo rodízio, alunos de outras duas turmas foram chegando na quadra para irem
embora, mas ficaram no canto para não atrapalhar. Na estação 1 houve desentendimento entre os
alunos depois que a primeira dupla jogou o vídeo game pois não conseguiam definir qual dupla seria a
próxima a jogar. Na estação 2 os alunos realizaram a atividade sem problemas. Na estação 3 o aluno
com deficiência física permaneceu no gol por várias jogadas, e depois a atividade aconteceu
normalmente, sendo cobrados os pênaltis por duplas.
Avaliação das Pontos positivos das aulas de futebol: gostaram das aulas, consideraram legais, “iradas”, divertidas,

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aulas/ Percepção interessantes, por haver brincadeiras legais e diferentes, que eles nunca haviam realizado, e por
dos alunos sobre sempre mudar a atividade das aulas, havendo a oportunidade de aprenderem cada vez mais
as aulas brincadeiras novas. Aprendem mais com brincadeiras novas. Gostaram do vídeo game, obtiveram
sucesso ao jogá-lo, e conseguiram realizar as demais atividades do circuito.
Aspectos negativos: não gostaram de algumas atividades ou acharam difíceis, além de terem
discutido com colegas em algumas aulas.
Sugestões para as Sugestões de modificações: retirar as atividades que não gostaram ou que foram difíceis, retirar os
aulas alunos que discutiram nas aulas e que a pesquisadora não parasse de realizar o programa de
atividades com uso do vídeo game. Outros alunos relataram que nada deveria ser modificado.
Percepção do O aluno achou um pouco difícil jogar o game de futebol por ser necessário utilizar dois controles,
aluno com porém, mesmo tendo necessitado de ajuda para jogar, ele gostou e conseguiu jogar. Além disso, não
deficiência física gostou muito da atividade de bobinho com os pés, pois muitos alunos não passavam para ele nem
para outros colegas de turma.
Fonte: Elaborado pelas autoras.

Após a implementação do programa de atividades com uso do vídeo game, foi possível verificar a
percepção do professor de Educação Física e do aluno com deficiência física com relação ao
programa.
O aluno com deficiência física gostou muito das aulas do programa e relatou que jogou os dois
games e realizou todas as atividades do circuito. Além disso, ele observou que sua mão foi “soltando
um pouco” quando estava jogando. Ele jogou os games facilmente, e quando precisou de ajuda, no
game de futebol, uma amiga o ajudou a jogar, fazendo-o se sentir parte integrante do grupo, assim
como ocorreu em outras pesquisas (Cassiano & Gomes, 2003; Falkenbach, Diesel, & Werle, 2011;
Palma & Lehnhard, 2012) em que os alunos incentivaram e auxiliaram os alunos com deficiência a
participar das atividades.
O professor de Educação Física considerou a possibilidade de ter disponível um vídeo game no
ambiente escolar e realizar um projeto que vá além do programa de atividades com uso do vídeo
game. Rodrigues Júnior e Sales (2012) afirmaram que os jogos eletrônicos podem ser utilizados como
recurso didático para trabalhar ludicidade, lazer, desenvolvimento cognitivo e outras habilidades.
Mas esta questão deve ser discutida, pois na pesquisa de Silveira e Torres (2007), um dos professores
de Educação Física já havia pensado em utilizar os jogos eletrônicos em suas aulas, mas não recebeu
apoio da escola para isso.
Para o professor de Educação Física, o uso do vídeo game no programa de atividades foi apropriado
por ser, ele próprio, usuário de vídeo game e acreditar em seu potencial. Além de gerar benefícios
aos alunos como aproximá-los dessa tecnologia, pode levar a estes alunos uma experiência que
talvez não tenham vivenciado antes. Em contrapartida, o aluno com deficiência física informou que
joga vídeo game em sua casa e que joga para se distrair, assim como afirmou Moura Jr (2006) que os
jogos eletrônicos estão cada vez mais presentes no cotidiano dos jovens.
Segundo a opinião do professor de Educação Física, o vídeo game auxiliou na participação do aluno
com deficiência física nas aulas, devido à motivação gerada pelo vídeo game, percebendo seu aluno
mais feliz e realizado. Nesse sentido, Baracho, Gripp e Lima (2012) apontaram que os exergames,
integrados a estratégias de ensino bem planejadas, podem possibilitar ao aluno com deficiência a
experiência de sensações e emoções do jogo e contribuir com a motivação e participação de todos os
alunos nas aulas.
O professor também considerou que o vídeo game pode auxiliar a ensinar aos alunos, regras,
conteúdos, fundamentos, manutenção da atenção e promoção da socialização entre eles. Além
disso, ele ponderou que todos os alunos aprenderam juntos no programa e não houve distinção
entre os alunos com ou sem deficiência, além de não haver problemas com rótulos nem relacionados
à execução das atividades, acrescentando que tanto o vídeo game quanto a realização das atividades
em circuito com rodízios auxiliaram na socialização entre os alunos. Rodrigues Júnior e Sales (2012)

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consideraram mais e apontaram que os jogos eletrônicos, além dos aspectos sociais, possibilitam que
o aluno desenvolva habilidades como raciocínio rápido, precisão, coordenação motora.
Foi notado que, quando necessário, o professor de Educação Física realizou adaptações nas
atividades. Assim, ele auxiliou o aluno com deficiência na aula 2, permitiu que ele realizasse a
atividade de maneira diferente na aula 3, pediu que algum colega o auxiliasse na aula 5 e permitiu
que ele realizasse uma atividade diversas vezes na aula 6. Da mesma maneira, na pesquisa de
Falkenbach, Diesel e Werle (2011), o professor auxiliava seu aluno com deficiência quando havia
necessidade e fazia adaptações nas atividades para incluí-lo nelas.
Conforme notado nas descrições das aulas, os alunos realizaram-nas motivados, pois tinham
atividades novas e sabiam que as aulas seriam divertidas, pela utilização do vídeo game e pela
realização das atividades diversificadas no circuito. Neste sentido, a professora de Educação Física da
pesquisa de Martins e Freire (2013) fez a seleção de atividades diversificadas para estimular a
participação dos alunos nas aulas.
No entanto, alguns alunos consideraram pontos negativos das aulas, pois sentiram-se incomodados
com a presença de bexigas nas estações, ou sentiram dificuldades em realizar algumas atividades, e
não realizaram outras, pois não queriam aguardar sua vez de jogar ou por discussões geradas nas
atividades. Bezerra (2010) alertou que o circuito promove esse exercício de esperar o seu momento
de executar, entender o ritmo do outro, o direito de errar, de acertar, de refazer.

5 Conclusões

A partir da realização do programa de atividades em circuito com uso do vídeo game é possível
concluir que o programa motivou os alunos e, além de incentivar, permitiu a participação de todos.
Segundo a percepção dos alunos, além de legais e divertidas, as aulas os motivaram, tanto pelo uso
do vídeo game quanto pela realização das atividades em circuito, que eram novas para eles. O relato
do aluno com deficiência física apontou que o vídeo game favoreceu sua habilidade manual, o
motivou a fazer todas as atividades das aulas, mesmo as que foram necessárias pedir ajuda para
conseguir realizar. Considerando a opinião do professor de Educação Física, ele percebeu que houve
melhora da socialização dos alunos e eles ficaram animados em realizar as aulas e que seu aluno com
deficiência ficou motivado a participar de todas as atividades.

Agradecimentos. Ao CNPq pelo apoio financeiro.

Referências

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Finco, M. D., & Fraga, A. B. (2012). Rompendo fronteiras na Educação Física através dos videogames
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Martins, A. B. R., & Freire, E. D. S. (2013). O Envolvimento Dos Alunos Nas Aulas De Educação Física:
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colaborativo entre profissionais da saúde e educação. Tese Doutorado em Educação -
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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Contributos da pesquisa qualitativa na identificação de


efeito(s) retroativo(s) em questões de Espanhol de um
exame de alta relevância no Brasil

Paula Silva Resende Fernandes1,a, Marcos Fernandes-Sobrinho2,b, Tiago Clarimundo Ramos2,


Paulo Alexandre de Castro3,c, Karolina Martins Almeida e Silva4, Vanessa Borges de Almeida5,d
1
Núcleo de Linguística Aplicada - Instituto Federal Goiano, Brasil. paula.silva@ifgoiano.edu.br
2
Núcleo de Física Aplicada - Instituto Federal Goiano, Brasil. marcos.fernandes@ifgoiano.edu.br;
tiago.ramos@ifgoiano.edu.br
3
Departamento de Física - Universidade Federal de Goiás, Brasil. padecastro@gmail.com
4
Curso de Biologia Universidade Federal do Tocantins, Brasil. karolina.martins@uft.edu.br
5 Instituto de Letras - Universidade de Brasília, Brasil. borgesalmeida@unb.br

Resumo. Neste artigo descrevemos o percurso metodológico de uma pesquisa caracterizada como
qualitativa e interpretativista, de tipo etnográfico. Investigamos se os itens de Espanhol (E/LE), presentes
nas edições de 2011 a 2015 de um exame nacional de alta relevância de nível médio no contexto
educacional brasileiro, influenciam a prática de uma docente de língua espanhola, que atua nessa etapa de
escolarização em uma instituição pública da região central do país, provocando o que denominamos em
Linguística Aplicada de efeito retroativo. Os dados gerados, por meio dos instrumentos de coleta, foram
triangulados e submetidos à Análise de Conteúdo (AC) proposta por Bardin (2011). Os resultados sinalizam
vários efeitos retroativos no contexto observado, que corroboram a hipótese de Alderson e Wall (1993) de
que testes com consequências importantes causam efeito retroativo no ensino que o precede.
Palavras-chave: Pesquisa qualitativa; Efeito Retroativo; Prática docente de E/LE; E/LE no Enem; Formação
de Professores de E/LE.

Contributions of the qualitative research in the identification of washback in Spanish questions of a high-
stake exam in Brazil
Abstract. In this article we describe the methodological course of a research characterized as qualitative and
interpretative, of an ethnographic type. We investigated whether the items in Spanish (E/LE), present in the
2011 to 2015 editions of a national high-stake exam in the Brazilian educational context, influence the
practice of a Spanish teacher who works in this stage of schooling in a public institution in the central region
of the country, provoking what we call in Applied Linguistics of washback. The data generated, through the
collection instruments, were triangulated and submitted to the Content Analysis (CA) proposed by Bardin
(2011). The results point to several washback in the observed context, which corroborate the hypothesis of
Alderson e Wall (1993) that tests with important consequences cause washback on the education that
precedes.
Keywords: Qualitative research; Washback; Spanish teaching practice; Spanish in Enem; Spanish teacher
training.

a Programa de Pós-Graduação em Linguística do Instituto de Letras da Universidade de Brasília (PGLA/UnB).


b Realiza estudos de Pós Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, da Faculdade de Ciências
da Universidade Estadual Paulista (PPGEC/FC/Unesp/Bauru) e é bolsista do Programa Nacional de Pós Doutorado, da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/CAPES).
c Docente e orientador no Programa Nacional de Mestrado Profissional em Ensino de Física (MNPEF) da Universidade

Federal de Goiás – Regional Catalão (MNPEF/UFG/RC).


d Docente e orientadora no Programa de Pós-Graduação em Linguística do Instituto de Letras da Universidade de Brasília

(PGLA/IL/UnB).

826
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1 Introdução

A inserção do Espanhol (E/LE), em 2010, no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), exame externo
de alta relevância nacional, no contexto educacional brasileiro, colocou em evidência essa língua no
país e, consequentemente, contribuiu para que possíveis efeitos retroativose desse exame fossem
constatados nas salas de aula do Ensino Médio (EM).
Na tentativa de verificar esses efeitos, no presente artigo apresentamos parte dos resultados da
dissertação de mestrado da primeira autora, orientada pela última [autora] em que desenvolvemos
uma pesquisa qualitativa-interpretativista, de tipo etnográfico, que objetivou por meio da
observação de um cenário natural, em que dados são coletados e, posteriormente analisados,
detectar possíveis efeitos retroativos dos itens de E/LE do Enem na prática de uma professora de EM
pesquisada, buscando: 1) identificar elementos que sinalizem a influência dos itens de E/LE do Enem
na prática da professora pesquisada.
Diante de tais objetivos, elaborou-se a seguinte pergunta orientadora da pesquisa: 1) Que
indicador(es), oriundo(s) das discussões dos dados da pesquisa, são indícios de efeito retroativo dos
itens de E/LE do Enem?
De acordo com Denzin e Lincoln (2006, p. 17), a pesquisa qualitativa pode ser definida como:
[...] uma atividade situada que localiza o observador no mundo. Consiste em um
conjunto de práticas materiais e interpretativistas que dão visibilidade ao mundo.
Essas práticas transformam o mundo em uma série de representações, incluindo as
notas de campo, as entrevistas, as conversas, as fotografias, as gravações e os
lembretes. Nesse nível, a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem naturalista,
interpretativa, para o mundo, o que significa que seus pesquisadores estudam as
coisas em seus cenários naturais, tentando entender, ou interpretar, os fenômenos
em termos dos significados que as pessoas a eles confere.
Até a década de 1990, as pesquisas sobre efeito retroativo possuíam limitações metodológicas, por
não incluírem evidências reais sobre contextos de ensino-aprendizagem. E no que tange ao efeito
retroativo, foi somente após a publicação do artigo de Alderson e Wall (1993) que começaram a ser
desenvolvidos estudos de natureza etnográfica, e passaram a empregar o método da triangulação de
dados, na identificação das variáveis explicativas para esse complexo e abrangente fenômeno.
Para ser considerada de tipo etnográfico, a pesquisa deve atender alguns requisitos da etnografia,
que se baseia em observar as ações humanas e sua interpretação, a partir do ponto de vista das
pessoas que praticam a ação. Os dados são gerados pelo pesquisador de acordo com as visões que os
participantes têm dos fatos, mesmo que não possam articulá-la. Para conseguir captar esse sentido,
as ações do pesquisador e pesquisados devem ser analisadas de maneira idêntica, logo todo
processo é interpretativo (Teis & Teis, 2006, p. 1).
Desse modo, percebemos que, de fato, tem-se realizado uma adaptação da etnografia à educação, o
que é denominado, segundo André (2005), como estudos do tipo etnográfico e não etnografia no seu
sentido estrito, vez que esta requer uma longa permanência do pesquisador em campo, o contato
com outras culturas e o uso de amplas categorias de análise, adequados aos estudos antropológicos,
mas inadequados para as pesquisas da área educacional.
Watanabe (1996) também concorda que a pesquisa etnográfica é a que melhor se adapta aos
estudos sobre efeito retroativo de exames. O autor propõe-se a investigar as dimensõesf do

e O termo é utilizado em Linguística Aplicada, segundo (Scaramucci, 2011, p. 109) para referir-se ao impacto ou influência
que exames externos de alta relevância (como o Enem) podem exercer no ensino, na aprendizagem, no currículo, na
elaboração de materiais didáticos e nas atitudes das pessoas (alunos, professores).
f especificidade, intensidade, extensão, intencionalidade e valor.

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fenômeno, com vistas a identificar os elementos necessários na determinação do efeito e as


evidências que nos permitem dizer se há ou não efeito retroativo.
Outro aspecto imprescindível para a condução de nossa pesquisa foi a adoção de uma postura ética,
vez que devemos ter postura profissional e estarmos atentos aos eventos sociais, demonstrando
respeito, admiração e estima pelo modo de vida das pessoas pesquisadas (Fetterman, 2010).
Para o desenvolvimento dessa pesquisa qualitativa bem como para a veiculação de seus resultados,
asseguramos o anonimato dos participantes, mediante a obtenção de Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido (TCLE).

2 Instrumentos utilizados na coleta de dados da pesquisa qualitativa

Com o propósito de investigarmos e caracterizarmos o perfil da professora pesquisada, obtermos


informações a respeito de seus conhecimentos sobre os itens de E/LE do Enem e sobre as possíveis
alterações ocorridas em sua prática docente, confeccionamos um questionário misto, contendo
questões abertas e fechadas, como um dos instrumentos de coleta de dados, proporcionando, assim,
uma certa abertura para a professora pesquisada expor sua opinião.
Durante a observação das aulas de E/LE ministradas pela professora pesquisada, utilizamos as notas
de campo, com o objetivo de registrarmos os fatos relevantes dos momentos de interação, entre
professora e alunos e, principalmente, observar a prática de ensino da docente, a fim de investigar se
os itens de E/LE presentes no Enem exerciam alguma influência no ensino em sala de aula.
As entrevistas constituíram mais um importante instrumento de coleta de dados. Elaboramos e
realizamos uma entrevista semiestruturada com a professora participante da pesquisa. O roteiro da
entrevista foi previamente elaborado buscando contemplar as questões vinculadas aos objetivos da
investigação e as dúvidas ou informações imprecisas do questionário foram esclarecidas por meio da
utilização desse instrumento.
Acreditamos que o gravador também foi uma ferramenta valiosa durante o processo de coleta de
dados, pois auxiliou e facilitou no desenvolvimento de nosso trabalho de campo, vez que deixando
de anotar, com o uso do papel e da caneta, todos os eventos que ocorriam durante a aula, pudemos
manter um contato mais próximo com os participantes da pesquisa.
Nesse sentido, decidimos gravar em áudio as notas de campo e entrevista semiestruturada realizada
com a professora pesquisada e, posteriormente, transcrevê-la integralmente.
Para Ludke e André (2012, p. 38) “a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de
abordagem de dados qualitativos além de complementar as informações obtidas por outras técnicas
de coleta".
Com base nessa afirmação, analisamos os itens de E/LE presentes nos cadernos de provas de LCT
(Linguagens, Códigos e suas Tecnologias) de cada edição do Enem, de 2010 a 2015, a fim de
compreender os conteúdos avaliados pelos itens, os gêneros textuais que são apresentados em cada
item bem como as habilidades da competência de área 2 da MR avaliadas por eles, com o objetivo de
verificar se há efeito retroativo na prática pedagógica da professora observada em nossa pesquisa.
Quanto aos materiais docentes, analisamos alguns materiais docentes disponibilizados pela
professora, tais como: planos de aula, atividades trabalhadas em sala e provas avaliativas, que foram
aplicadas durante o período de observação das aulas.

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3 Procedimentos para análise dos dados da pesquisa qualitativa

Analisamos os dados coletados por meio das notas de campo, questionários e material docente pelo
método da triangulação de dados.
Bortoni-Ricardo (2009, p. 61), numa explicação mais detalhada, afirma que a triangulação:
é um recurso de análise que permite comparar dados de diferentes tipos com o
objetivo de confirmar ou desconfirmar uma asserção. Pode-se construir também
uma triangulação combinando as perspectivas de diversos atores em uma ação. Por
exemplo, a perspectiva do professor obtida em uma entrevista; a perspectiva do
próprio pesquisador ou de outro participante obtida pela observação. Ao comparar
concordâncias ou discrepâncias nas diferentes perspectivas, o pesquisador terá
mais recursos para construir e validar sua teoria.
No que se refere à análise dos itens de E/LE do Enem e a entrevista da professora, optamos pelo
método da Análise de Conteúdo (Bardin, 2011). Segundo a autora, o termo análise de conteúdo (AC)
designa:
um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando a obter, por
procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,
indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos
relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas
mensagens (Bardin, 2011, p. 47).
A AC proposta perpassa por três fases consideradas fundamentais, a saber: 1) pré-análise, 2)
exploração do material e 3) tratamento dos resultados (inferência e interpretação).
A pré-análise é considerada a etapa de organização do material a ser analisado. De acordo com
Bardin (2011), compreende normalmente: a) a leitura “flutuante”, contato superficial com os
documentos, a fim de conhecer o texto, por meio de nossas impressões e orientações; b) a escolha
dos documentos, consiste na definição do corpus da análise e delimitação dos documentos
utilizados, com base em regras de exaustividade , homogeneidade , representatividade e pertinência
(Bardin, 2011, p. 42); c) a formulação das hipóteses e dos objetivos, conjunto de perguntas intuitivas,
que podem surgir ou não nessa etapa, como reitera Bardin (2011, p. 128), “algumas análises
efetuam-se às “cegas” e sem ideias pré-concebidas”.; d) a referenciação dos índices e a elaboração
dos indicadores, indicam quais são os índices, as unidades de codificação a serem analisadas e os
indicadores , por meio dos recortes realizados após a seleção do material de análise; e) a preparação
do material, basicamente uma edição, nem sempre necessária, do documento a ser analisado, como
a transcrição da entrevista, por exemplo.
A segunda fase, exploração do material, consiste na codificação das mensagens, em categorias
previamente definidas e compreendeu a escolha da unidade de codificação, a explicitação da regra
de categorização e a escolha das categorias de acordo com os objetivos da pesquisa. A unidade de
codificação é subdividida em unidade de registro e unidade de contexto. A unidade de registro é o
recorte da análise considerado unidade base, que pode ser uma palavra, frase ou tema, visando à
categorização. Já, a unidade de contexto, com dimensão superior, serve de unidade de compreensão
para codificar a unidade de registro.
A regra de enumeração ou regra que leva à categorização tem o objetivo de indicar como as
unidades de registro serão contadas na mensagem, se por presença (ou ausência), frequência ou
ordem. Em seguida, é realizada a categorização, ou seja, etapa de aplicação do processo de
contagem escolhido nos elementos do corpus, a fim de fornecer uma representação simplificada dos
dados brutos. Essa etapa ocorre a partir de categorias pré-definidas, nas quais se classificam os
elementos do corpus de acordo com a regra escolhida, ou ao contrário, classificam-se os elementos

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de acordo com a regra e, posteriormente, definem-se as categorias, sempre se baseando nos


critérios de exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objetividade e fidelidade e
produtividade(Bardin, 2011, p. 149).
A terceira e última fase da organização da AC é composta pelo tratamento dos resultados obtidos e
interpretação. Os resultados brutos são tratados de forma a serem significativos e válidos e, a partir
desse tratamento, são propostas inferências e interpretações que estejam relacionadas com os
objetivos propostos na pré-análise.

3.1 Análise dos itens do Enem pelo método da AC

Em se tratando dos itens de E/LE do Enem, no processo de codificação fizemos o recorte da


informação, que culminou com a escolha da unidade de registro e da unidade de contexto.
Preliminarmente, realizamos a leitura flutuante das 40 questões de E/LE que integravam os cadernos
de provas de LCT das edições do Enem de 2010 a 2015, incluindo as duas aplicações ocorridas nesses
respectivos anos, a fim de encontrar elementos que pudessem contribuir na seleção das questões.
Essa pré-análise teve como objetivos principais: (1) identificar, dentre as habilidades que integram a
competência de área 2 da MR do exame, aquelas que foram abordadas nos itens de E/LE de todas as
provas de LCT das edições do Enem, de 2010 a 2015; e (2) identificar o gênero textual predominante
em cada um dos itens que compõem as provas de LCT do exame.
Nossa unidade de registro está diretamente ligada aos itens de E/LE que estão relacionados ao
gênero “reportagem”, visto que foi esse o mais frequente nas edições do Enem, segundo dados da
pré-análise.
A codificação da unidade de registro, que representa o gênero reportagem, foi constituída pelo ano
da prova, aplicação (se houvesse mais de uma), cor da prova, seguido do número do item e da
alternativa correta. Nesse caso, a unidade de registro “2010.2.A.95.E” era composta por um item de
E/LE do Enem que abordava uma reportagem e estava representada pelos códigos: edição do Enem
(nesse caso 2010), número da aplicação (o número 2 representou a 2ª aplicação da prova, visto que
aconteceram duas aplicações para a mesma edição), cor da prova consultada “A” (para Azul),
número da questão (95) e alternativa correta (representada pela letra E).
Em se tratando de unidade de contexto, Bardin (2011) a considera como um segmento da
mensagem, com dimensões superiores às da unidade de registro, a fim de compreender a
significação exata da unidade de registro. Sendo assim, o item de E/LE analisado foi considerado uma
unidade de contexto, a fim de possibilitar o entendimento da unidade de registro.
A categorização, conforme Bardin (2011) tem como objetivo inicial fornecer uma representação
simplificada dos dados brutos e compreende dois processos distintos. Em nossa análise decidimos
empregar o processo em que estabelecemos as categorias e subcategorias de análise e alocamos, da
melhor maneira possível, os elementos à medida que foram sendo encontrados.
Nesse sentido, iniciamos a análise categorial definindo os seguintes elementos: a) corpus da análise:
todos os itens de E/LE da área de LCT dos cadernos azuis presentes nos exames de 2010 a 2015,
perfazendo um total de 40 questões; b) unidade de registro: palavra, que nesse caso referia-se ao
gênero textual; c) regra de enumeração: frequência, que consistiu na quantidade de vezes em que o
gênero ou habilidade aparecia nos itens; d) unidade de contexto: o item de E/LE; e) categorias e
subcategorias: dados gerais do item, análise do texto-base, dos enunciados, da alternativa correta e
dos distratores, análise da habilidade da competência de área 2 da MR requerida bem como os
potenciais efeitos retroativos (positivos) em sala de aula.

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A partir da definição do gênero e habilidades predominantes nos itens de E/LE do exame, iniciamos o
processo de codificação dos itens analisados. Construímos alguns quadros com unidade de registro,
unidade de contexto, categorias e subcategorias de análise.

3.1.1 Análises relacionadas às edições válidas do Enem

A representação dos dados relativos aos itens de E/LE do Enem é realizada empregando-se alguns
elementos advindos da AC proposta por Bardin (2011).
Com base na regra de enumeração, constatamos que a habilidade da competência de área 2 da MR
do exame de maior incidência em todos os itens de E/LE das provas de LCT é a H7, ou seja, relacionar
um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e seu uso social, ao longo das edições do
exame, conforme dados da Tabela 1, seguidas pela H5 e H6, que apresentam a mesma frequência e,
por fim, a H8, a de menor incidência.

Tabela 1: Frequência das habilidades requeridas nos itens (Enem 2010-2015)

Habilidade requerida Frequência de incidência


Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM
ao seu tema 10
Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus
mecanismos como meio de ampliar as possibilidades de
acesso a informações, tecnologias e culturas 10
Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas,
sua função e seu uso social 11
Reconhecer a importância da produção cultural em
LEM como representação da diversidade cultural e
linguística 9
Total 40

Fonte: Elaborada pela autora, a partir dos dados da pré-análise.

10 9
Frequência de ocorrência do gênero,

9
8
7 6 6
6 5
5
4 3
nos itens

3 2 2
2 1 1 1 1 1 1 1
1
0

Gêneros textuais identificados

Fig. 1: Frequência de ocorrência do gênero textual presente nos itens (Enem 2010-2015)
Fonte: Elaborada pela autora, a partir dos dados do Enem.

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De acordo com os dados da Figura 10, o gênero textual com maior número de ocorrências nos itens
de E/LE, ao longo das edições do exame, foi o gênero jornalístico, com destaque para a reportagem.
Mediante o resultado de nossa pré-análise, optamos por analisar os nove itens de E/LE das edições
do exame de 2010 a 2015 que versam sobre o gênero reportagem.
De modo geral, podemos afirmar quanto a Categoria 1 “Dados Gerais do Item” que muitos dos
textos-base não apresentam título e fazem referência à publicações de apropriação pública, tais
como jornais online (El País, Agência Peruana de Notícias, NAPA, Sinc) e revistas (Hola, Punto y Coma,
Revista Ñ). Todos os textos presentes nas edições até o momento são adaptados, conforme a
redação no original, com a citação da fonte ao final do texto, como recomenda o Guia de Elaboração
de Itens do Enem (Brasil, 2012). Por isso, os textos-base não são extensos, possuindo entre dois e
quatro parágrafos no máximo, e abordam temas atuais e variados, como: Tabagismo e saúde;
tourada; roteiros turísticos como o “Caminho da Língua” na Espanha, o turismo no Peru, falhas em
softwares de uso médico como ameaça à saúde pública, escavação arqueológica no Peru, a Língua
Espanhola no século XXI, violência contra as mulheres e a assimetria no tratamento da língua
espanhola nos Estados Unidos.
No que se refere à Categoria II “Análise do texto-base e enunciado do item” percebemos, ao longo
das edições do exame, a presença na parte inicial do item, constituída pelos textos-base do gênero
reportagem, as principais informações que o leitor necessita para responder ao comando do item. Os
textos geralmente apresentam uma linguagem simples e clara, permitindo que o leitor compreenda,
com certa facilidade, a ideia central. Quanto aos enunciados dos itens analisados, podemos afirmar
que são constituídos, em sua maioria, por mais de uma oração, vez que apresentam ao leitor a ideia
principal discutida no texto e, em seguida, o comando ou instrução expressa por uma frase a ser
completada. Os itens solicitam ao leitor basicamente: localização da informação/argumento no
texto; o entendimento do texto a partir de vocábulos ou expressões espanholas; identificação do
tema do texto; associação entre título e tema; inferência do tema/informação a partir da
compreensão do texto em sua integralidade; a função/intenção do gênero textual.
A maioria dos itens analisados requer do leitor a mera localização da informação ou extração de
ideias do texto, somente em algumas questões presenciamos a necessidade do entendimento do
texto em sua integralidade, o conhecimento do código linguístico, o acionamento de conhecimentos
prévios, a formulação de inferências, a fim de que seja capaz de identificar o tema ou de realizar
associações entre tema e título, por exemplo, ou seja, observamos a predominância dos modelos de
leitura ascendente e descendente. Dessa forma, destacamos o que asseveram Scaramucci (2005) e
Zirondi e Nascimento (2006):
Ler, da mesma forma que escrever, pressupõe uma produção que extrapola a
decodificação e a mera localização ou recuperação de informações; construir e
negociar sentidos pressupõe um leitor ativo, que traz para a situação de produção
da leitura seu conhecimento prévio, valores e crenças (Scaramucci, 2005, p. 43).
O texto que constitui a Prova espera que o candidato (Zirondi & Nascimento, 2006)
direcione e canalize a sua reflexão para os propósitos e objetivos expressos nos
enunciados de comando da Prova. Ou seja, antes de responder a uma questão,
pressupõe-se que os estudantes, além de terem que compreender o texto que dá
origem à questão como uma prática social no contexto particular de produção,
circulação e recepção e serem capazes de reconhecer as características de sua
infraestrutura textual, possam extrapolar essas capacidades para buscar a função
do texto desencadeador da questão em relação aos objetivos dos enunciados de
comando da Prova, o que exige do indivíduo avaliado a captura de uma nova
dimensão do contexto de produção que agora os constitui (Zirondi & Nascimento,
2006, p. 291).

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Ainda no tocante a leitura subjacente aos textos, apesar da predominância do gênero jornalístico no
exame, concordamos com Kanashiro (2012) ao afirmar que o ensino e a aprendizagem de E/LE não
devem se restringir à mera leitura de fragmentos ou adaptações de textos jornalísticos. O professor
deve propor aos alunos um ensino pautado na compreensão de textos dos mais variados gêneros,
vez que verificamos na Figura 1 que o exame também explora a leitura de anúncios publicitários,
charges, história em quadrinhos, poemas, dentre outros.
A Categoria III “Análise da alternativa correta e distratores” refere-se às cinco alternativas
apresentadas em cada item de E/LE do exame. As alternativas dividem-se em gabarito, exposto de
forma clara, e não mais atrativo que os distratores que, de maneira geral, apresentam-se plausíveis,
com paralelismo sintático e semântico, extensão equivalente e coerência com o enunciado, não
identificamos erros grosseiros e nem alternativas absurdas, vez que não repetem palavras que
aparecem no enunciado e não são capazes de induzir o leitor ao erro, por meio de “pegadinhas”. As
justificativas elaboradas para explicar o acerto ou o erro de cada alternativa apontam argumentos
consistentes e coerentes à temática do texto. De acordo com o Guia de Elaboração de Itens do Enem
(Brasil, 2012, p. 12), “as justificativas deverão informar exatamente os motivos pelos quais cada uma
das alternativas representa ou não a opção correta de resposta, de modo que não serão aceitas
justificativas tautológicasg”.
Outro fato interessante e que diz respeito aos enunciados e alternativas, relaciona-se a redação em
língua portuguesa. Todos os itens presentes nas edições trazem os enunciados e alternativas em LP.
Nesse sentido, alguns autores como Kanashiro (2012) argumentam que se o texto é redigido em
espanhol e se, por exemplo, o enunciado solicita ao aluno um título para esse texto, seria mais
coerente as alternativas, que apontam os possíveis títulos, apresentarem-se em E/LE. Porém, de
acordo com Quevedo-Camargo, Gimenez, & Furtoso (2014) a discussão é mais complexa e
independente da língua utilizada na elaboração dos enunciados e alternativas, vez que o grau de
discriminação do item tende a ser maior quanto maior for o grau de complexidade do enunciado e
suas alternativas.
Quanto a Categoria IV “Habilidade requerida na MR (competência de área 2)” podemos afirmar que
os itens presentes nas edições do exame estão configurados em uma unidade de proposição, nas
quais percebemos coerência e articulação entre texto-base, enunciado e alternativas explicitando um
único comando e uma abordagem homogênea de conteúdo. Além disso, constatamos que cada
edição do exame contempla a maioria das habilidades constantes da competência de área 2 da MR
do exame, H5, H6, H7 e H8. Importante salientar que cada item aborda uma única habilidade.
Em relação à Categoria V “Potenciais efeitos retroativos (positivos) do item”, pensamos aqui em
propor possíveis formas de abordar os itens de E/LE do Enem em sala de aula, vez que a maioria dos
professores promove um estreitamento de currículo ao usar os itens de E/LE de edições anteriores
do exame, para treinar os alunos para o mesmo em detrimento ao ensino dos conteúdos propostos
no plano de ensino, abandonando práticas importantes para o aprendizado pleno da língua. Dessa
forma, nessa categoria, para cada um dos itens analisados, sugerimos um aprofundamento na
temática abordada por cada texto-base, a fim de explorarmos não só a habilidade de leitura em E/LE,
mas desenvolver atividades diferenciadas, que envolvam a realização de projetos em grupos e em
associação com outras disciplinas do currículo, objetivando o trabalho com a escrita, a audição e a
fala, além de apresentar aos alunos, por meio da leitura, aspectos linguísticos e coesivos do texto.

g Termo que deriva de um vocábulo grego e que se refere à repetição de um mesmo pensamento através de
expressões diferentes. Uma tautologia, para a retórica, é uma afirmação redundante. Disponível em: <
http://conceito.de/tautologia#ixzz41zhnfxEi > Acesso em: 28 fev. 2016.

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4 Considerações

Apresentamos no decorrer deste artigo, o percurso metodológico de uma pesquisa qualitativa de


tipo etnográfico, que objetivou detectar alguns possíveis efeitos retroativos dos itens de E/LE do
Enem na prática de ensino de uma professora do EM regular de uma escola pública estadual da
região Centro-Oeste.
Para que nosso intento fosse alcançado, optamos por analisar os itens de E/LE presentes nas edições
do Enem (2010-2015), a fim de conhecermos melhor a concepção de leitura que fundamenta a
elaboraçao dos itens, seus enunciados, comandos e alternativas, os gêneros e habilidades da MR do
exame mais requeridos, os conteúdos curriculares exigidos, a fim de contrastarmos com as
atividades elaboradas, conteúdos ensinados e avaliações aplicadas no contexto investigado e, dessa
forma, identificar os possíveis efeitos retroativos dos itens de E/LE do exame. Cabe mencionar que
levamos em consideração na análise, a concepção de leitura em LE proposta nos documentos oficiais
e utilizamos a AC (Bardin, 2011) como método de análise dos itens.
De acordo com nossa análise, entendemos que a concepção de leitura que predomina na maioria dos
itens de E/LE analisados não é condizente com a sugerida pelos documentos oficiais. As OCEM-LE
sugerem uma concepção de leitura como prática social (o modelo interativo). Os itens de E/LE do
exame são elaborados, em sua maioria, com base em uma concepção de leitura como simples
extração ou localização de informações no texto, predominando os modelos ascendente e
descendente de leitura.
Na análise de campo coletamos dados por meio de questionário aplicado aos alunos, a fim de
traçarmos o perfil da turma e as percepções dos discentes sobre os itens de E/LE do Enem e à
professora, para obtermos dados sobre o perfil acadêmico-profissional da docente bem como ter
acesso as percepções que ela tem sobre os itens de E/LE do exame, visto que é o sujeito principal da
pesquisa. As perguntas do questionário aplicado à professora foram complementadas pela
entrevista, pelas notas de campo, obtidas nas aulas observadas e gravadas em áudio, e pela análise
de alguns materiais docentes (planos de aula, atividades e avaliação), que nos foram disponibilizados
pela professora, para que assim pudéssemos investigar em sua prática de ensino aspectos associados
às influências dos itens de E/LE do Enem.
Após analisarmos e triangularmos os dados coletados, constatamos que os itens de E/LE do exame
provocam efeitos retroativos na prática da professora observada. Sendo assim, identificamos e
descrevemos esses efeitos, caracterizamos cada um com base em teóricos e pesquisadores que
investigam o fenômeno, com o objetivo de classificá-los em positivos e negativos bem como obter
resultados suficientes para retomar e responder as nossas perguntas de pesquisa.
O efeito retroativo do exame é percebido a) no conhecimento que a professora tem e faz dos itens
de E/LE presentes no exame, vez que prioriza um ensino pautado em leituras e interpretações de
textos de variados gêneros b) na consulta aos itens de E/LE do exame no momento de planejar suas
aulas; c) provas avaliativas elaboradas aos moldes dos itens de E/LE do Enem, com textos de gêneros
diferentes e questões de múltipla escolha semelhantes.
Importante mencionar que nossa pesquisa não teve apenas a intenção de identificar a natureza dos
efeitos retroativos presentes na prática da professora, mas fazer com que alunos, professores e
elaboradores do exame se atentem para os construtos e conteúdos avaliados, buscando aprimorar o
exame e sua MR. Também acreditamos que fatores como a importância de ser admitido em um
curso superior, a motivação de professores e alunos afetam as dimensões dos efeitos retroativos.
Ao longo do processo de desenvolvimento desta investigação qualitativa, o presente trabalho aponta
para o entendimento de que a metodologia de pesquisa em contextos educacionais não se deve
limitar à simples aplicação do que parecem sugerir os manuais de procedimentos e
instrumentalização de pesquisa (Fernandes-Sobrinho, Gonçalves, & Fernandes, 2017).

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Agradecimentos. O presente trabalho contou com suporte financeiro do Instituto Federal Goiano, da
Universidade Federal de Goiás, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Referências

Alderson, J. C., & Wall, D. (1993). Does Washback Exist?, 14, 115–129.
André, M. E. D. A. de. (2005). Estudo de caso em pesquisa e avaliação educacional. Brasília: Liber
livros.
Bardin, L. (2011). Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70.
Bortoni-Ricardo, S. M. (2009). O professor pesquisador: introdução à pesquisa qualitativa (2o ed). São
Paulo: Parábola Editorial.
Brasil. (2012). Ministério da Educação. INEP. Enem: guia de elaboração de itens.
Denzin, N. K., & Lincoln, Y. S. (Orgs.). (2006). Introdução: a disciplina e a prática da pesquisa
qualitativa. In O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens, 2o ed,15–41. Porto
Alegre: Artmed.
Fernandes-Sobrinho, M. F., Gonçalves, E. A., & Fernandes, P. S. R. (2017). Percurso e diversidade
epistemológica da pesquisa em educação: tensionamentos e possibilidades. Cadernos de
Pesquisa, 23, 81. https://doi.org/10.18764/2178-2229.v.23n.especial/p81-91
Fetterman, D. M. (2010). Ethnography: step-by-step, 3o ed, Vol. 17. USA: Sage.
Kanashiro, D. S. K. (2012). As linhas e as entrelinhas: um estudo das questões de língua espanhola no
Enem (Doutorado em Educação). Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação. São
Paulo.
Quevedo-Camargo, G., Gimenez, T., & Furtoso, V. B. (2014). Itens em Português ou na língua alvo na
avaliação da compreensão escrita em Língua Estrangeira: Um estudo preliminar. Revista
Contexturas, 23, 125–148.
Scaramucci, M. V. (2005). Prova de redação nos vestibulares: educacionalmente benéfica para o
ensino/aprendizagem da escrita? In V. do N. et. al. Flores (Org.), A redação no contexto do
Vestibular 2005 – a avaliação em perspectiva, 37–57. Editora UFRGS.
Scaramucci, M. V. (2011). Validade de consequências sociais das avaliações em contextos de ensino
de Línguas. Linguarum Arena: Revista do Programa Doutoral em Didáctica de Línguas da
Universidade do Porto, 2, 103–120.
Teis, D. T., & Teis, M. A. (2006). A abordagem qualitativa: a leitura no campo de pesquisa. Biblioteca
On-line de Ciências da Comunicação, 1, 1–8.
Watanabe. (1996). Does grammar-translation come from the entrance examination? Preliminary
findings from classroom-based research., 13(3), 318–333.
Zirondi, M. I., & Nascimento, E. L. (2006). Os Enunciados de Comando da Prova do ENEM e sua
Relação com Competências e Capacidades para a Resolução de Situações-Problema. Signum:
Estudos da Linguagem, 9(2), 289–315.

835
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Indisciplina em sala de aula: concepções, interação social e ação


docente - uma análise qualitativa
1
Socorro Lima

Programa de Pós-graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade de Brasília, Brasil.


smartinsl@hotmail.com

Resumo. O trabalho tem o objetivo de analisar a indisciplina em turmas de 1º ano do Ensino Fundamental
destacando o papel do professor, das interações sociais e das concepções das professoras acerca do tema. A
metodologia foi qualitativa, por meio da observação direta e da gravação em vídeo da interação em sala de
aula e de entrevistas com quatro professoras de escolas públicas do Distrito Federal. A análise dos dados
baseou-se nos aspectos qualitativos do discurso das educadoras e confrontada com a prática registrada nas
gravações em vídeo e na observação direta. Os resultados apontaram peculiaridades na forma como elas
enfrentavam a indisciplina. As estratégias que melhor conduziram os alunos aos resultados esperados foram
as que buscavam a negociação, o estabelecimento de regras claras, a explicação da necessidade de
colaboração e as consequências desta colaboração.
Palavras-chave: Indisciplina; Aluno; Prática Pedagógica; Professor.

Indiscipline in the classroom: conceptions, social interaction and teaching action - a qualitative analysis.
Abstract. The objective of this study is to analyze the indiscipline in first year classes of Elementary School
highlighting the role of teachers, social interactions and teachers' conceptions about the theme. The
methodology was qualitative, through direct observation and video recording of classroom interaction and
interviews with four teachers from public schools in the Federal District. The analysis of the data was based
on the qualitative aspects of the discourse of educators and confronted with the practice recorded in video
recordings and direct observation. The results pointed out peculiarities in the way they faced indiscipline.
The strategies that best led the students to the expected results were those that sought negotiation, clear
rules, an explanation of the need for collaboration, and the consequences of this collaboration.
Keywords: Indiscipline; Student; Pedagogical practice; Teacher.

1 Introdução: Os antecedentes e o problema de pesquisa

A indisciplina figura como um dos problemas que perturbam o dia a dia na escola, conduzindo a
preocupações e à busca de alternativas que ofereçam respostas efetivas para enfrentá-la. Nas
reclamações presentes na escola, crianças indisciplinadas figuram entre as que não prestam atenção
à aula, não cuidam dos materiais, não fazem tarefas de classe e tendem a apresentar problemas de
rendimento escolar. A indisciplina é na opinião de Costa (2005) um ato que não obedece às normas
da escola, que imprime uma desordem no prescrito, produzindo uma contradição. Compreendida
dessa forma, ela se reporta ao descumprimento das normas, ensejando desordem e desequilíbrio
nas relações sociais na sala de aula, um jogo de forças e interesses, revelando posições antagônicas
entre o que o professor propõe e o que o aluno faz. Outras situações que também aparecem são as
conversas paralelas entre os alunos, a falta de atenção, a desobediência, a movimentação que
produz barulho e “bagunça” explicita os conflitos nesse contexto. Parece haver uma distância entre o
planejado, o selecionado pelo professor e o que acontece em sua ação, em relação ao
comportamento dos alunos, que se configura indesejado. Aquino (1996) diz que a disciplina não deve
ser considerada apenas como o silêncio e a ordem, nem como um "pré-requisito para a ação
pedagógica, [mas sim como] um dos produtos ou efeitos do trabalho cotidiano de sala de aula" (p.
202). Nessa direção, muitas atividades são planejadas pelos professores visando encorajar a

1 Doutoranda em Educação pela Universidade de Brasília – UnB. E-mail:smartinsl@hotmail.com

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participação dos alunos e exigem que se movimentem pela sala e por outros espaços da escola, que
interajam com seus pares, o que termina por causar agitação. Entretanto, nem sempre o professor
encara essas situações como decorrentes do seu planejamento e contraditoriamente, espera um
clima de silêncio. Tais situações são comumente associadas à indisciplina “quando o aluno deixa de
corresponder ao que a escola espera [...] passa a ser visto como desinteressado, ausente e
‘indisciplinado’, e passa a ser alvo de preocupação e crítica na medida em que atrapalha o desenrolar
da aula” (Lima, 2000, p. 3). Esses sentimentos nem sempre são considerados pelo professor que está
mais focado nos resultados que os alunos devem alcançar. Nessa direção os professores, então,
encaram como rebeldia intervenções divergentes das respostas esperadas dentro dos conteúdos
propostos. Assim ocorre em relação ao comportamento dos alunos, deseja-se sua participação desde
que não se distancie de determinados padrões. O silêncio, a obediência, o cumprimento de regras
exigidos na escola nem sempre significam participação que conduz à aprendizagem. Por outro lado, o
barulho e outras situações que perturbam o clima da escola nem sempre ensejam problemas. Eles
carregam sentidos que demandam investigação, antes dos alunos serem classificados como
portadores de dificuldades e encaminhados a outras instâncias para acompanhamento das equipes
de apoio à aprendizagem. Neves-Pereira & Branco (2015) defendem que o professor pode, muitas
vezes, enganar-se com relação à sua própria prática e não perceber que está atuando no sentido
oposto ao desejado, envolvido que está com as demandas que o trabalho na sala de aula lhe
reivindica. Nessa direção, conhecer as interações que se desenvolvem na sala de aula, as concepções
do professor a respeito do que vem a ser indisciplina e o papel desempenhado frente a episódios de
indisciplina torna-se relevante para fazer frente ao problema. Nessa direção, estabeleceram-se como
objetivo geral Analisar a relação da indisciplina e do controle de classe, em salas de aulas de 1º ano
do Ensino Fundamental destacando o papel do professor e das interações sociais. E como objetivos
específicos verificar os tipos de interações sociais que se desenvolvem no espaço da sala de aula e
conhecer as concepções de indisciplina das professoras, a ação docente que desenvolvem frente a
episódios de indisciplina.
2 Aspectos teóricos
Neste item abordaremos as expectativas frequentemente encontradas na escola acerca dos alunos.
Pensa-se em um aluno com certas características que nem sempre encontramos em nossas salas de
aula. Depois discutiremos sobre os encontros e desencontros que acontecem entre professor e
alunos na dinâmica da sala de aula. Por último, apresentamos alguns aspectos relevantes acerca do
desenvolvimento humano, indispensáveis para conhecer e compreender a criança em cada momento
do curso de sua trajetória de desenvolvimento, o que contribuirá para o planejamento de uma ação
docente com mais chances de sucesso.
2.1 As expectativas a respeito dos alunos
Os estudos sobre o tema estão voltados para a descrição dos comportamentos indisciplinados; a
compreensão das concepções, sentidos e significados construídos sobre a indisciplina; as formas
como ela é enfrentada na escola; a influência da postura do professor nessas ocorrências e à não
aprendizagem, a apatia, a turbulência, a conflitos velados e ameaças de vários tipos (Aquino, 1996;
Amaral, 2000; Lima, 2000; Zenni, 2014; Albuquerque, 2011).
Aquino (1996) esclarece que, muitas vezes, os alunos sequer chegam a ter conhecimento e clareza
sobre as regras, definidas na escola uma vez que elas nem sempre se encontram formalizadas em
documentos suficientemente divulgados e acessíveis a todos que fazem parte da comunidade
escolar. Entretanto, são elas que regulam as relações sociais que se desenvolvem nesse contexto,
sendo indispensáveis ao funcionamento da instituição.

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O fracasso escolar não deve ser atribuído exclusivamente ao método de ensino, mas também aos
conteúdos curriculares e às formas de ministrá-los, que muitas vezes não estão voltados para o aluno
real com o qual o professor se depara (Patto, 2000). Pouco se investiga na escola sobre aquilo que o
aluno traz de seu contexto de vida, seus interesses, motivações e necessidades. Das crianças são
esperados na escola comportamentos que nem sempre condizem com os padrões culturais de sua
comunidade, embora a sociedade brasileira seja diversa e cheia de contradições. A melhor forma de
lidar com a diversidade que elas trazem é explicitando-as, compreendendo-as e respeitando-as como
diferenças que enriquecerão o grupo. A escola deve estar a serviço de todas as crianças que ali
ingressam e só será capaz de fazê-lo quando incorporar esta diversidade à sua cultura. É preciso
lembrar que o desconhecimento e o distanciamento do contexto social dos alunos também pode ser
um fator para o descumprimento das regras. Elas precisam estar claras e fazer sentido para que os
alunos possam compreendê-las e cumpri-las, pois a falta de clareza quanto ao que lhe é exigido
termina por contribuir para o não cumprimento. Esses estados emocionais do aluno nem sempre são
suficientemente considerados na escola. O foco das preocupações recai prioritariamente nas
consequências negativas desses estados em seu comportamento, no caso, a indisciplina. Os
resultados do estudo de Silva Neto (2011) demonstram que a dificuldade de aprendizagem também
é um dos fatores que contribui para a ocorrência da indisciplina, tendo em vista que quando o aluno
não consegue estar envolvido nas atividades da aula cria formas de participação que podem se
constituir diferentes daquelas esperadas pelo professor.
2.2 Encontros e desencontros professor-aluno
Desencontros entre professor e aluno também acontecem, pois segundo Tacca (2008) na dinâmica
da sala de aula quando os canais dialógicos entre professor e aluno são interrompidos as atividades
propostas pelo professor também podem ficar comprometidas na medida em que não promovem o
envolvimento do aluno. E com isso, acabam gerando descompassos e contribuindo para a ocorrência
de problemas de diferentes naturezas, pois o aluno se sente excluído destas dinâmicas pedagógicas e
passa a agir por sua própria iniciativa por meio de comportamentos que atrapalham o trabalho
pedagógico desenvolvido na turma, assim se encaixando num perfil de indisciplina. Entendemos a
importância de o professor enfatizar os aspectos relativos à emocionalidade, aos interesses e às
motivações dos alunos para criar canais dialógicos e trabalhar para inseri-los na dinâmica interativa
da sala de aula. E é nesse contexto que surgem preocupações relacionadas à inclusão dos alunos na
escola, pois o que acontece quando eles são segregados pela indisciplina ou por outros
comportamentos que acabam por dificultar sua participação na dinâmica da sala de aula é uma
exclusão. Assim, pouco a pouco eles vão sendo excluídos da dinâmica da aula em função do
agravamento de problemas disciplinares ou de aprendizagem e vão sendo encaminhados de uma
instância a outra do sistema escolar, em busca de soluções para essas manifestações que lhes são
atribuídas como problemas que “lhes” pertencem e comprometem seu sucesso escolar. As
dificuldades em lidar com essas manifestações podem estar relacionadas a fatores como a falta de
clareza acerca das origens desses comportamentos, o pouco domínio sobre processos que
acontecem no aluno, e também àquilo que Foucault (2012) descreve como o que foge ao comum, ao
conhecido, ao valorizado tendo em vista que o diferente provoca estranheza, desconfiança e medo.
De acordo com Vigotski (1997) é preciso focar a atenção em como se dá o desenvolvimento da
pessoa e não em sua insuficiência, seu déficit. Ao invés de mirar no que eles deixam de fazer ou no
que fazem de errado é preciso olhar para as situações em que os estudantes conseguem envolver-se
e participar como condição para sua aprendizagem. Assim, a escola precisa voltar sua atenção em
como se dá o desenvolvimento do aprendiz em suas singularidades e não em suas insuficiências,
limitações, lacunas ou faltas. Ao invés disso, deveria olhar para as situações conflituosas e mesmo
indesejadas, vendo-as como insuficiências a serem compreendidas, trabalhadas e desenvolvidas.

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2.3 A compreensão dos processos de desenvolvimento do aluno


Segundo Valsiner (1989) o ambiente escolar tem um forte impacto sobre o desenvolvimento
humano, visto que ele está repleto de significados simbólicos, que atuam para guiar o pensamento
da criança na direção esperada. A educação deve preocupar-se com o que a criança é e planejar sua
prática a partir dessa condição para atingir os objetivos pedagógicos a que se propõe. A Psicologia
sozinha não é capaz de definir a prática pedagógica, pois “a elaboração de fins educativos pressupõe
a tradução dos objetivos sociais em termos pedagógicos, tradução que é esclarecida e depurada pelo
conhecimento da psicologia da criança” (Charlot, 1979, p. 227). Nessa direção a psicologia, conforme
lembra o autor “pode nos ajudar a traduzir os fins sociais da educação em fins propriamente
pedagógicos, mas não pode fundar os fins da educação” (Charlot, 1979, p. 229).
Os resultados do trabalho realizado por Luria (1990) sob a orientação de Vygotsky na Ásia Central
com grupos de camponeses analfabetos que haviam se instalado na União Soviética no final da
década de 20, mostraram mudanças nítidas entre adultos expostos a diferentes contextos de
trabalho e a níveis mínimos de educação. Esse estudioso diz que a criança distingue e estabelece
objetivos para seu comportamento sob a influência da linguagem do adulto; ela repensa as relações
entre objetos e imagina novas formas de relação criança-adulto; reavalia o comportamento dos
outros e depois o seu, desse modo, desenvolve novas respostas emocionais e categorias afetivas,
que se tornam, através da linguagem emoções generalizadas e traços de caráter. Assim, para que a
escola seja eficiente na instrução é preciso que entenda como as crianças desenvolvem os conceitos.
Estes não são absorvidos mediante a sua assimilação e compreensão, pois um conceito é muito mais
do que um hábito mental, não pode ser ensinado através de treinamento. O aprendizado na escola
induz a um tipo de percepção que é generalizante e, dessa forma, exerce um importante papel na
conscientização dos processos mentais da criança. Os estudos de Luria (1990) confirmaram que o
desenvolvimento das bases psicológicas para o aprendizado de um conteúdo não precede tal
aprendizado, mas que se desenvolve numa interação contínua com ele. O percurso do
desenvolvimento intelectual e as diferentes matérias escolares interagem contribuindo com ele, cada
uma facilitando o aprendizado das outras. Quando uma criança apresenta certa aprendizagem, na
verdade ela apenas começou a desenvolver este conceito, uma vez que com o auxílio de alguém mais
experiente, ela pode atingir um nível de desenvolvimento superior ao que é capaz de realizar
sozinha. Assim, a imitação e o aprendizado desempenham importante função no alcance de novos
níveis de desenvolvimento. “Os anos escolares são, no todo, o período ótimo para o aprendizado de
operações que exigem consciência e controle deliberado; o aprendizado dessas operações favorece
enormemente o desenvolvimento das funções mentais psicológicas superiores” (Vygotsky, 1993, p.
90). A escola como um microssistema faz parte do contexto, mas não tem uma força determinante
exclusiva no desenvolvimento (Bronfenbrenner, 1996). É importante que as condições do contexto
escolar, como microssistema que é, sejam analisadas levando-se em conta não apenas o ambiente
físico, mas as interações e a afetividade que ocorrem neste importante espaço desenvolvimental.
Cumpre destacar o papel da escola, por meio da ação do professor, para auxiliar a criança a alcançar,
com sucesso, as metas educacionais. Propiciar ao educando condições para torná-lo atuante no meio
em que vive; enriquecer seu processo de socialização para que ele interaja com seus pares, constitui-
se tarefa do professor. Desse modo, torna-se imprescindível que o professor busque melhor
conhecer as características do aluno pensante, ativo e que se constitui no espaço e no tempo. É
fundamental, pois, que o professor obtenha informações e conhecimentos acerca da trajetória
desenvolvimental de seus alunos, com o auxílio dos avanços empreendidos pela Psicologia do
Desenvolvimento. Muitas vezes, os professores explicitam certas incompreensões e inseguranças
acerca do seu trabalho com os alunos, sem compreender que suas propostas pedagógicas são
contraditórias e podem, ao invés de favorecê-lo, dificultá-lo. É fundamental que se conheça a origem
e a realidade destas crianças, suas representações, vínculos, dificuldades, histórias, rotinas,

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interesses, os valores de vida de sua família, colegas, etc., para que se saiba compreender suas
atitudes e melhor orientar o trabalho pedagógico desenvolvido no contexto escolar. É preciso que se
entenda que as pessoas vêm, processam e elaboram o mundo de formas diferentes. Do mesmo
modo, na escola, crianças e professores vivem em um mesmo ambiente, mas lidam com ele de modo
particular, original, relacionado às suas experiências familiares e culturais, através das quais
elaboram a realidade, e desenvolvem motivações específicas para as suas ações. Nesse contexto uma
abordagem não individualista, voltada para a realidade sociocultural do educando, constitui uma
condição para a compreensão do papel social da escola e para a construção de uma alternativa com
vistas à uma nova prática docente. Assim, o estudo das interações sociais tem relevante papel no
estudo da indisciplina em sala de aula.

3. Questões metodológicos
Considerando os objetivos dessa investigação, o emprego da metodologia qualitativa, na medida em
que dá ênfase ao processo de organização do fenômeno por meio da utilização de formas variadas
de conhecimento da realidade oferece possibilidades de explicações mais aproximadas ao
esclarecimento do tema. Considerando a ideia de que a pessoa constrói sua cultura pessoal no
processo de vida, organizado pelo mundo social no qual vive torna-se relevante o emprego de uma
metodologia que possa dar conta da dinamicidade deste processo. Esta metodologia tem base na
etnografia uma vez que o observador passa a tornar-se parte do contexto, inserindo-se nele para
investigar suas práticas. Assim, torna-se mais viável estudar aspectos relacionados às interações
sociais por meio de uma metodologia que não empregue métodos quantitativos e categorias
definidas a priori, o que dificultaria o acesso à riqueza de informações fundamentais para a
compreensão do fenômeno. É importante que haja uma melhor adequação do processo de pesquisa,
com a utilização de metodologias mais coerentes com os objetivos a serem investigados no estudo, e
que possibilitem observar de modo cuidadoso as diversas formas em que o sistema humano se
desenvolve. Na construção da interpretação, o investigador tanto emprega um discurso guiado pelos
seus condicionamentos culturais, como conversa com o sujeito investigado para a construção e/ou
reconstrução das informações através dos processos interpretativos de ambos, produzindo
constantemente novas compreensões e interpretações. O que vai definir a qualidade da pesquisa
qualitativa é muito mais a postura adotada pelo pesquisador em termos de interpretação das
informações do que o método ou técnica empregado. Com base nestas convicções optou-se por
analisar as interações sociais na sala de aula, através da observação direta (registros escritos e
gravação em vídeo) e da entrevista. A entrevista foi a técnica escolhida para registrar as falas das
professoras acerca do aluno e da sua indisciplina, uma vez que possibilita interpretações por parte do
entrevistador. Esta técnica permite que o sujeito construa sua própria interpretação da pergunta e
explicite a resposta que ele constrói em sua imagem introspectiva, evocando novas interpretações,
uma vez que “os processos interpretativos de ambos participantes da interação estão
constantemente produzindo novas compreensões” (Branco & Valsiner, 1997, p. 47). Foram realizadas
também gravações de episódios interativos na sala de aula, bem como observações diretas sem a
gravação em vídeo, que auxiliaram a contextualizar tanto o discurso das professoras durante a
entrevista, quanto os episódios gravados nas sessões em que a câmera foi utilizada. A observação em
situação natural foi escolhida por ser uma modalidade que possibilita o contato com o objeto de
estudo de modo direto, na forma como tende a se apresentar no dia-a-dia das experiências,
oportunizando, igualmente, maior acesso à dinâmica das mudanças que vão ocorrendo ao longo do
tempo. O trabalho de pesquisa foi precedido por um estudo preliminar durante o qual foram
delimitados os objetivos, estabelecidos os critérios para a seleção dos sujeitos e desenvolvidas uma
série de discussões e definições com relação aos procedimentos que poderiam fornecer maiores
subsídios para a análise do fenômeno.

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O estudo piloto ocorreu através de quatro sessões de observação direta, com duração entre uma e
duas horas cada. As observações diretas foram registradas, em protocolo específico, contendo
campos para informações quanto a data, tempo, local e ocorrência de episódios interativos, entre
professora e alunos, que envolvessem a questão da indisciplina. As sessões de gravação em vídeo
tiveram duração de uma hora e meia, cada. Com base na análise dos dados obtidos na fase
preliminar, foram decididos e elaborados os procedimentos que seriam utilizados na pesquisa,
propriamente dita. Utilizou-se uma ficha de informação dos professores para o registro de dados
relativos à formação, tempo de atuação no magistério/na série que leciona, outros cursos realizados.

3.1 O estudo propriamente dito


O trabalho de pesquisa foi iniciado com a seleção das professoras, utilizou-se o critério de aceitação
e disposição para participar de todas as etapas do trabalho. Foram selecionadas pelas diretoras das
escolas, duas classes consideradas mais calmas e duas mais agitadas, com a concordância das
professoras. Participaram da pesquisa quatro professoras do 1º ano (daqui por diante denominadas
P1, P2, P3 e P4), de quatro escolas públicas de Brasília, sendo três localizadas na Asa Norte e uma na
Asa Sul. Todas possuíam curso de Magistério, de nível médio. P1 é graduada em Processamento de
Dados e as demais em Pedagogia. Outro critério para a seleção, foi ter mais de dois anos de prática
docente. Das professoras que se propuseram a participar, duas tinham mais de vinte anos de
trabalho e duas menos de dez. Os dados referentes às quatro professoras selecionadas foram
preenchidos com base nas informações da Ficha de Informação do Professor, aplicada nos primeiros
contatos com elas. As gravações foram feitas nas salas de aula e as entrevistas na sala de
professores, na biblioteca, na diretoria e na sala de aula. Os instrumentos utilizados foram o
Protocolo de Observação e o Roteiro de Entrevistas. Os equipamentos empregados foram câmera de
vídeo JVC-VHS, gravador de áudio e aparelho para a transcrição de fitas (transcriber), marca Sanyo
TRC 8030. A pesquisa foi desenvolvida em três etapas sequenciais: observações diretas (registro
escrito); gravações em vídeo e entrevistas, conforme descritas a seguir. A observação direta foi
realizada nas salas de aula, nos meses de abril a agosto. Esta etapa foi realizada em um total de 22
sessões que variaram de 40 minutos a 1 hora e 55 minutos, sendo quatro sessões de gravação na sala
de P1, P2 e P3 e duas de observação direta, totalizando seis sessões em cada uma das classes. Na
turma de P4 foram realizadas três sessões de gravação e uma de observação. Ao todo, foram 11
horas e 25 minutos de observação direta e 16 horas, 23 minutos e 26 segundos de gravação em
vídeo, totalizando 27 horas, 48 minutos e 26 segundos de observação e gravação. O período de
permanência na escola ultrapassou esse total, uma vez que, até as sessões serem iniciadas, havia
momentos de espera. As entrevistas tiveram o objetivo de analisar as concepções das professoras
acerca do conceito de indisciplina. Marcou-se com antecedência, de acordo com as conveniências
das professoras e em espaços disponíveis da escola, naquele horário, tendo sido gravadas em áudio e
depois transcritas verbatium, com o auxílio do Transcriber. Foram realizadas com a utilização de um
geral, com questões pertinentes a todas as professoras, e o outro elaborado especificamente para
cada entrevistada e tiveram por base uma prévia análise dos episódios registrados.

4. Os Resultados apontam convergências e divergências nas práticas pedagógicas


investigadas
Constatou-se que as professoras com mais experiência de magistério utilizavam, na sala de aula,
estratégias que conduziam à maior colaboração dos alunos. As menos experientes utilizavam
estratégias que conduziam menos à criação de clima de descontração, facilitador do bom andamento
dos trabalhos (ambas queixaram-se de dificuldades em lidar com as crianças). Observando-se tal
tendência, levantou-se a suposição de que elas poderiam estar agindo de forma diferenciada em
decorrência de sua maior ou menor experiência em sala de aula. Em termos gerais, esta constatação

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parece indicar que o curso de formação para o magistério não vem se dedicando o suficiente a
trabalhar questões relacionadas às atitudes do professor frente aos alunos, no que se refere a
favorecer a participação das crianças nas aulas, e ainda, ao cumprimento de regras que facilitam a
obtenção de resultados positivos quanto à aprendizagem e à motivação. Tudo indica que é, portanto,
a partir do empirismo que elas acabam descobrindo a melhor maneira de lidar com as crianças.
Apesar das divergências nas práticas pedagógicas, verificou-se que cada uma delas possía uma
maneira bastante peculiar de interagir com os alunos. P1 e P3 se encaixam nas mesmas
preocupações, insistem na manutenção das crianças sentadas, em silêncio, não permitindo que
brinquem durante a aula. Para elas, as crianças precisam estar envolvidas com o conteúdo que está
sendo ensinado. Elas possuem tempo aproximado de experiência no magistério, 6 e 9 anos
respectivamente e são mais jovens que P2 e P4. Muitas estratégias empregadas se assemelham,
embora cada uma tenha características particulares. Uma diferença interessante entre P1 e P3 foi
que P3 tem regras estabelecidas e acertadas desde o início com as crianças e P1 parece não tê-las
definido antes, deixando as crianças confusas. Talvez por isso, P1 apresente dificuldade em controlar,
e principalmente em compreender as características das crianças quando participam da aula,
respondem, ficam eufóricas e falam todas de uma só vez, chegando a demonstrar muita irritação
com o barulho. Nesses momentos ela não consegue ver possibilidades de efetiva aprendizagem na
situação, devido ao alto nível de excitação das crianças. O uso do imperativo e a reprovação com
gestos e olhares quando da participação das crianças, mesmo em situações que estas estavam
auxiliando um colega a responder o exercício no quadro. A demonstração de impaciência com o
barulho foi frequente. Além disso, P1 fixava-se mais no que as crianças não faziam corretamente do
que em valorizar o que eram capazes de realizar. P3, por sua vez, demonstra um pouco mais de
confiança nos alunos, mas também exerce um forte controle sobre seus comportamentos: em 13
episódios da gravação em vídeo solicitou que as crianças fizessem silêncio, também em 13 situações
mandou as crianças sentarem, reclamou em 5 momentos que as crianças estavam em pé, e algumas
vezes reclama da conversa, da falta de atenção, da falta de educação, embora sem demonstrar raiva
em sua fala. Comenta que muitos colegas não gostam de trabalhar com crianças dessa idade porque
elas chegam ainda muito imaturas, só querendo brincar devido aos seus pais as colocarem em muitas
atividades concomitantes. E, nesse ano, elas não têm mais tempo para brincar, pois têm muito
conteúdo a aprender. Assim, ela apresenta semelhanças com P1 na medida que, de acordo com a
sua opinião, a criança na 1ª série não pode mais “perder tempo com brincadeiras” e insiste para que
ela permaneça sentada ou em silêncio. Para P3, aprender significa estar ouvindo, quieto, ou seja, a
aprendizagem é algo que vem de fora, e não que a criança elabora na interação com os outros. Uma
maior aceitação das diversas modalidades de participação da criança no contexto das atividades
precisa ser colocada em prática pelo professor. De acordo com Leal e Roazzi (1996) a situação
educacional oferecida pela escola desempenha um importante papel nas primeiras fases da
aquisição da leitura e da escrita, sendo importante que as práticas pedagógicas passem a atribuir
mais significado àquilo que as crianças já sabem ao invés de centrar sua atenção no que a criança não
sabe. A prática docente deve então estar embasada no respeito e valorização das atitudes das
crianças (Branco, 1989; Branco & Mettel, 1995), incentivando-as e motivando-as a participar, sem
ridicularizá-las quando apresentam atitudes destoantes de modelos padronizados.
P2 e P4 possuem 21 e 30 anos na atuação com crianças de 1º ano, respectivamente. Elas foram
agrupadas em função da experiência e do emprego de estratégias de condução dos trabalhos que
promoviam a participação e a colaboração das crianças. Observou-se que estas professoras não
insistiam no cumprimento de uma ordem rigorosa, que as crianças não fossem capazes de
compreender. Suas orientações eram claras e explícitas quanto ao comportamento esperado delas.
P2 demonstra flexibilidade com as crianças: permite que se movimentem pela sala; que vão ao
banheiro, sempre que sinalizam necessidade. Quando uma criança atrapalha, ela diz que procura

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explicar a importância de sua colaboração. Aodemonstrar flexibilidade, principalmente em relação à


satisfação de necessidades fisiológicas, ela está demonstrando compreender a capacidade de
autocontrole fisiológico da criança. As estratégias ela utilizava para conduzir ao silêncio e controlar o
movimento das crianças foram: “Psiu!, Por favor!, Vai sentar, vai! (em tom de voz suave). Às crianças
que fazem algo mais sério (agredir o colega, por exemplo) ela pede para ficarem em pé no ‘cantinho
do pensar’. Diz que não fala que é castigo, mas que é para que o aluno reflita se deveria ou não ter
feito o que fez, e depois conversa com ele para ver se ele entendeu. Pergunta se ele já pensou; e
sobre o que estava pensando, aí propõe que peça desculpas ao colega. Diz que negocia a regra de
reciprocidade no início do ano: “Se você é bonzinho, a tia é boazinha, se você age mal, deve ‘pensar’
sobre o assunto”. Diz que as regras devem ser combinadas com as crianças, pois, assim, fica mais fácil
que elas as cumpram. Pede-lhes que sentem para ouvir a explicação. Na sua opinião, é querer muito
que eles fiquem sentados durante quatro horas, e alerta que o professor deve conversar mais e gritar
menos. Estas falas demonstram tolerância e compreensão da capacidade de entendimento da
criança em cada momento do seu processo de desenvolvimento, levando em conta os componentes
cognitivos e afetivos da comunicação. P2 negocia com as crianças e lhes mostra porque devem
colaborar através de justificativas e explicações, conforme o episódio a seguir: “CA você vai ficar
quietinha para não atrapalhar”, ou “Vocês não vão me atrapalhar, vão?” ou ainda: “Psiiuuu! Vamos
ficar quietinhos para ouvir”. Assim ela demonstra buscar formas de fazer a criança ir compreendendo
os motivos e a necessidade de colaboração e parece obter maior colaboração das crianças que P1
quando altera o tom de voz ao falar com as crianças. E, quanto mais demonstra irritação, angústia e
impaciência sua classe fica ainda mais agitada em resposta à sua conduta.
P4, assim como P2, apresenta postura de descontração com as crianças, está sempre alegre,
cantando e conversando com elas. Apesar de ter uma postura aberta, não deixa de exigir o
cumprimento de regras. O clima em sua classe é descontraído, as crianças se movimentam,
conversam, realizam atividades em conjunto, se expressam livremente, participam o tempo todo da
aula. Quando concluem uma tarefa e lhes sobra tempo, pegam jogos, brincam juntas, e leem
revistas, sentadas em carteiras ou no chão. P4 é alegre e usa estratégias para atrair a atenção e a
colaboração das crianças, puxa conversa com as crianças a respeito das suas experiências fora da
escola, sobre o que gostam, e de igual forma, as crianças fazem com ela.
P4, por sua vez, repreende as crianças de modo descontraído. Combina com elas atividades e
brincadeiras. Nas gravações foram registradas falas do tipo em que pede permissão a eles para dar
prosseguimento às atividades: “Posso continuar? Posso apagar? Ou então avisa: “Daqui a 5 minutos
vamos corrigir”. Quando as crianças estão conversando muito, ela diz: “Vamos controlar a
boquinha!........Olhe! Tem criança conversando…”. Estimula o aluno que não está conseguindo
realizar determinada tarefa com frase do tio: “Você é capaz, vocês são todos inteligentes!” e sempre
lhes oferece ajuda.
Na entrevista, P4 diz que o bom desempenho do aluno depende da família, e quando as crianças
apresentam dificuldades, procura conversar com os pais para que a ajudem a ter melhor
desempenho na escola. No entanto, o que muitas vezes o professor não leva em conta é que os pais,
em geral, não recebem orientação da escola quanto à forma de auxiliá-los no dever. Quando os
professores não se sentem capazes de resolver determinada situação é frequente transferir a culpa
para a família ou mesmo para o aluno. As estratégias que se revelaram mais eficazes para o bom
andamento das atividades foram: o estabelecimento de regras claras no início do ano letivo; a
negociação conjunta das regras, pois as crianças parecem colaborar mais quando estão envolvidas
em seu estabelecimento, reconhecendo sua importância e seu sentido. Se algo não fizer sentido para
o aluno, dificilmente ele se empenhará em aprendê-lo ou em colaborar com o professor naquilo que
ele solicita.

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A necessidade do estabelecimento de uma relação de confiança entre a professora e os alunos,


expressa através de formas de comunicação que traduzem respeito pelas crianças foram
confirmadas pelas professoras que obtiveram melhores resultados quanto à participação dos alunos.
Partindo do enfoque teórico que privilegia a bi-direcionalidade dos processos de ensino-
aprendizagem e de comunicação, buscou-se a identificação das dificuldades na prática docente
quanto a interação professor-aluno. Foi possível identificar situações que resultam da falta de
compreensão do professor quanto às características do aprendiz, e como essas ações dificultam a
sua atuação. Essas constatações fornecem subsídios para o aperfeiçoamento de formação acadêmica
e serão úteis para o planejamento de ações mais efetivas de capacitação, podendo ser importante
instrumento para reflexão individual e coletiva dos professores acerca de sua prática.
Seria desejável que o professor analisasse o conceito de “bagunça” e “desordem”, sempre em
relação ao contexto e à atividade proposta aos alunos, tendo em vista que é importante levar em
conta as capacidades, características e motivação dos alunos nessa idade, além dos objetivos
acadêmicos daquela série.As interações professor-aluno tanto podem favorecer a auto-confiança e
auto-estima do aluno quanto inibi-la (Shavelson e Bolus citados em Seco, 1993; Maldonado, 1994;
Vasconcelos, 1995; Oliveira, 1996). Quando relações de confiança são estabelecidas em sala de aula,
o aluno se sente mais à vontade para expressar dúvidas, descobertas, participar da aula e,
consequentemente, aprender. Por outro lado, uma relação problemática, em que o aluno não
percebe cumplicidade e respeito à sua participação, iniciativa, respostas e erros pode gerar
sentimentos de insegurança, dúvidas, medo e hostilidade com o professor e os colegas.
Esses resultados demonstram que a preocupação com o clima interacional da sala de aula pouco tem
sido objeto de ação intencional dos educadores. O planejamento privilegia preocupações com os
conteúdos de disciplinas específicas como Português, Matemática, Estudos Sociais e Ciências,
reforçando a ênfase no ser humano enquanto indivíduo “intelectual”, relevando suas dimensões
socioemocionais.
Com base em Vygotsky (1993) e McDermott (1977) concluímos que deve ser dada atenção à
interação do adulto com a criança e à construção do vínculo entre professor e aluno, de modo a que
estas interações venham a ocorrer de modo a favorecer o desenvolvimento. Atenção especial deve
ser dada também à questão da disciplina na sala de aula, pois muitas vezes esta pode ser confundida
com comportamentos de obediência e acomodação, comprometendo as iniciativas e tentativas do
estudante em elaborar o seu pensamento, expressar-se melhor e, assim, apreender um determinado
objeto ou conteúdo.
O professor, ao interagir com a criança, deve estar atento não apenas ao aspecto cognitivo, mas
também ao aspecto afetivo porque:
os processos emocionais e cognitivos se desenvolvem simultânea e integralmente
ao longo do desenvolvimento infantil, mesmo quando ambos mantêm uma
relativa autonomia em seu aspecto funcional [...] e a criança pequena é
particularmente sensível em seus estados emocionais, reagindo mais ao tom de
voz do adulto que ao próprio conteúdo que eles expressam em sua relação com
ela (González Rey & Martínez, 1989, p. 34).
Destaca-se então que deve ser dada bastante atenção aos vínculos construídos com as crianças no
decorrer de todo o processo educativo, para exercer poder, autoridade, liderança ou outras formas
de relação sem excessos, porém sem negligência.

5. Conclusões
Podemos destacar então a importância de inserir mudanças pertinentes à reelaboração da prática
pedagógica enquanto transformação permanente. A capacitação do professor, para contribuir de
modo mais efetivo no desenvolvimento do aluno, impõe que “nas atribuições/funções do professor

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esteja previsto um tempo para estudo, discussão, aprofundamento, cursos, etc.” (Leal, Lima,
Machado e Solano, 1996, p. 43), não só ao nível da formação, mas também no cotidiano da escola. É
necessário, ainda, que tais capacitações envolvam conteúdos de formação de uma consciência social
do seu papel e de aspectos que promovam a reflexão acerca do seu próprio “eu”, para que ele
valorize a construção do outro. Assim, sugerimos que o acompanhamento e apoio ao professor seja
realizado de modo prioritário e constante através de reuniões de grupos de professores,
acompanhados por um profissional capaz de oferecer-lhes subsídios teóricos para superarem as
indagações e conflitos presentes em sua prática. Nelas haveria a oportunidade de discutir com os
colegas que vivenciam problemas similares, e refletir sobre eles, sobre si próprios, elaborando
respostas para as suas dificuldades e favorecendo a reflexão e avaliação de suas próprias ações. É
recomendável que o professor ao planejar sua atividade pedagógica leve em conta o aluno real, a
partir de sua condição social e psicológica, revendo suas concepções acerca da indisciplina. O que é
necessário para transformar situações aparentemente negativas quanto à interação entre as crianças
em situações que contribuam para a aprendizagem. A utilização de uma metodologia qualitativa com
procedimentos variados e em diferentes momentos do processo educativo contribuiu de modo
particular para o alcance das informações dos participantes em sua dinâmica na situação de sala de
aula. O que não teria tido a mesma riqueza se tivessem sido empregados métodos quantitativos.

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Contribuições do materialismo histórico-dialético para as


pesquisas em Mestrados Profissionais na área de ensino de
humanidades

1
Priscila de Souza Chisté Leite

1 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo, Brasil. pchiste@ifes.edu.br

Resumo. O artigo tem como objetivo apresentar as contribuições do materialismo histórico-dialético para as
pesquisas em mestrados profissionais na área de ensino de humanidades. Para tanto, evidencia os
pressupostos do materialismo histórico-dialético estabelecendo diálogo entre esse método e os
pressupostos das pesquisas aplicadas, em especial, aquelas de cunho participativo. Discorre também sobre
as especificidades dos mestrados profissionais no Brasil exemplificando esta abordagem a partir de algumas
pesquisas desenvolvidas em um mestrado profissional na área de ensino de humanidades.
Palavras-chave: Materialismo histórico-dialético; Pesquisa Participante; Mestrado Profissional; Ensino de
Humanidades.

Contributions of historical-dialectical materialism to the researches in Masters Professional in the area of


humanities education
Abstract. The article aims to present the contributions of historical-dialectical materialism to the researches
in professional masters in the area of humanities education. In order to do so, it highlights the assumptions
of historical-dialectical materialism by establishing a dialogue between this method and the presuppositions
of applied research, especially participatory research. It also discusses the specificities of professional
masters in Brazil, exemplifying this approach based on some research developed in a professional master's
degree in the area of humanities education.
Keywords: Historical-dialectical materialism; Participant Research; Professional Master's Degree;
Humanities Teaching.

1 Introdução

O materialismo histórico-dialético é um método de interpretação da realidade considerado como a


teoria do conhecimento do marxismo originário. Ele se contrapõe aos dualismos dicotômicos
próprios da lógica formal ao seguir os preceitos da lógica dialética. Defende a superação da
dicotomia sujeito-objeto, pois infere que sujeito e objeto são dois aspectos de uma mesma realidade
em contradição e em unidade indissolúvel dos opostos. Assim, a unidade sujeito/objeto do
conhecimento exige a compreensão concreta de ambos e fortalece a necessidade de entendermos
que vivemos em uma sociedade essencialmente alienada/alienante que precisa ser superada. O
processo dialético parte da análise de polos contraditórios que em um confronto superam o
momento anterior, produzindo, através da própria ação sobre a realidade, uma nova realidade
pensada. Essa realidade encontra-se em movimento e é constituída por contradições, do mesmo
modo que a consciência é dinâmica e se encontra em movimento pelas mesmas contradições. O
método compreende que a realidade objetiva é histórica e para explicá-la cabe revelar sua dimensão
diacrônica (ocorrida ao longo do tempo), permitindo, assim, observar essa realidade como processo
em desenvolvimento. Sabemos que muitas teorias pós-modernas hegemonizam o ideário e o
imaginário coletivo da sociedade capitalista, esboçam reflexões superficiais sobre o capitalismo e
consideram o materialismo histórico-dialético ultrapassado. É importante ressaltar que, por meio de

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teorias pós-modernas, o real é apresentado mediante indicadores e discursos que manipulam e


escondem as verdadeiras contradições da sociedade. Nesse sentido, busca-se explicar e resolver os
problemas sociais por meio da elaboração de novas narrativas abstratas que negam a luta de classes
inerente à sociedade capitalista. Vislumbramos outras repercussões do ideário pós-moderno no
campo da metodologia de pesquisa, a saber: a valorização de teorias do discurso e de linguagem que
consideram a realidade como múltipla e possível de ser explicada de acordo com o ponto de vista do
pesquisador; o entendimento que a realidade é difusa e existe para cada sujeito conforme sua
experiência e forma de se aproximar do conhecimento; a ideia de que o conhecimento científico é
equivalente ao senso comum, provocando depreciação da ciência; a fragmentação e o isolamento do
objeto de conhecimento, deslocando-o da realidade concreta multifacetada; e a desvalorização da
memória histórica e do conhecimento socialmente construído e acumulado.
Como forma de contribuir para a análise crítica do atual quadro histórico, social, político e
econômico, acreditamos que o materialismo histórico-dialético possa fomentar reflexões acerca da
realidade e, em especial, colaborar com o modo de conduzir pesquisas no campo da educação
realizadas em âmbito stricto sensu e, de modo específico, nos mestrados profissionais na área de
ensino1.
Diante desse quadro, o artigo que segue apresenta um pequeno recorte sobre o assunto e está
organizado a partir das seguintes seções: inicialmente, apontamos as especificidades dos mestrados
profissionais brasileiros reforçando a importância de se evidenciar nesses espaços as relações entre
teoria e prática - a práxis -, configurada como categoria fundamental do materialismo histórico-
dialético. A seguir, discorremos sobre possíveis diálogos entre essa abordagem teórica e os
pressupostos das pesquisas participantes, apresentando como exemplo algumas pesquisas
desenvolvidas no Mestrado Profissional em Ensino de Humanidades do Instituto Federal do Espírito
Santo, Brasil. Destinamos este texto aos pesquisadores da área da educação que buscam
compreender a realidade pesquisada de modo integral, sem dissociar teoria e prática, com vistas a
revelar as contradições do fenômeno investigado a partir do movimento histórico e dialético do
objeto de pesquisa.

2 Mestrados profissionais brasileiros na área do ensino

Na história da educação brasileira, a Educação Profissional foi pensada com a finalidade de treinar
uma parcela da população para o desempenho de atividades manuais consideradas de nível
intelectual inferior. Visava também atender às demandas da indústria e beneficiar os grupos sociais
desfavorecidos economicamente. No início, as políticas educacionais para educação profissional
buscavam contemplar os níveis mais básicos do ensino. Contudo, recentemente, ampliaram os seus

1 A área de ensino foi constituída por decisão do Conselho Superior da Capes pela Portaria nº 83, de 6 de junho de 2011. De
acordo com o Comunicado Conjunto nº 001/2013 das áreas de Ensino e de Educação: perspectivas de cooperação e
articulação, publicado em 28 de junho de 2013, existem delimitações entre essas duas áreas de pesquisa na pós-graduação
stricto sensu no Brasil. Conforme esse documento os Programas da Área de Educação da Capes se organizam em diferentes
propostas, constituindo linhas de pesquisa específicas e priorizando a produção de conhecimento educacional. Já os
programas da Área de Ensino focam as pesquisas em ensino de determinado conteúdo, buscando integração com as áreas
geradoras dos conteúdos a serem ensinados. Seus cursos de pós-graduação têm como objeto a mediação do conhecimento
científico, a integração entre conhecimento disciplinar e conhecimento pedagógico, construir pontes entre diferentes áreas
e processos educativos. Destinam-se principalmente a professores da educação básica e/ou profissionais de ensino formal
ou não formal vinculados a diferentes campos de conhecimento. No caso do Mestrado Profissional em Ensino de
Humanidades do Instituto Federal do Espírito Santo, Brasil, o público-alvo são professores das áreas de Ciências Humanas,
Letras e Artes.
...

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objetivos iniciais ao avançarem para o nível superior e atingirem o nível stricto sensu, sob a forma do
mestrado profissional. Segundo Melo (2002), a criação dos mestrados profissionais possui influência
internacional e aproxima-se da estrutura norte-americana de pós-graduação, que visa à aplicação e à
extensão de conhecimentos a finalidades profissionais ou vocacionais, tais como a Master of Business
Administration, Master of Arts in Education, Master of Engineering e Master of Arts in Teaching. Ao
mesmo tempo, acata regulamentações de agências internacionais de financiamento, como o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (Bird). Em 1995, essa instituição apresentou documento
intitulado “O ensino superior: as lições derivadas da experiência” que expunha orientações para
políticas educacionais que reforçavam a necessidade dos governos redefinirem suas funções relativas
ao ensino superior; propunham a implementação de programas de cooperação interinstitucionais e
pós-graduações à distância, bem como a aproximação da Universidade e setor produtivo, com
prioridade na criação de cursos stricto sensu, atendendo à nova dinâmica de mercado; e sugeriam a
flexibilização do sistema de pós-graduação, tornando-o receptivo a novas formas de capacitação de
recursos humanos. Diante das demandas associadas à experiência americana e às políticas de
articulação internacional, os mestrados profissionais foram instituídos no Brasil em 1995, pela
Portaria nº 47, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes2), e pela
subsequente regulamentação feita pela Portaria nº 80/1998, do Ministério da Educação. O
argumento desses documentos respalda-se na necessidade de flexibilização do modelo de pós-
graduação stricto sensu diante das demandas sociais oriundas das mudanças tecnológicas, das
transformações econômico-sociais e do aumento da procura por profissionais com perfis de
especialização distintos dos tradicionais. Conforme Ribeiro (2005), a principal diferença entre o
mestrado acadêmico e o profissional é o resultado almejado. No mestrado acadêmico, pretende-se a
imersão na pesquisa, isto é, formar, a longo prazo, um pesquisador. Já no mestrado profissional, o
objetivo é formar alguém que, no campo profissional externo à academia, saiba localizar,
reconhecer, identificar e, sobretudo, utilizar a pesquisa de modo a agregar valor a suas atividades
pessoais ou sociais. Outra peculiaridade do mestrado profissional refere-se à preocupação com a
formação especializada para profissionais “em serviço”. Barros, Valentim e Melo (2005) ressaltam
que o mestrado profissional é destinado a um público externo à academia e se volta para a gestão,
produção e aplicação do conhecimento orientado para a pesquisa aplicada, a solução de problemas,
a proposição de novas tecnologias e o aperfeiçoamento tecnológico. As autoras destacam que os
mestrados profissionais possuem como alvo a capacitação de recursos humanos para a prática
profissional e transformadora, preservando a vinculação ensino versus pesquisa. Sobre a relação
teoria e prática nos mestrados profissionais e acadêmicos, Ostermann e Rezende (2009) apontam
que o mestrado acadêmico forma pesquisadores e docentes, enquanto o profissional qualifica para o
mercado de trabalho. É forte a dicotomia que sustenta todos os níveis de formação profissional no
Brasil: de um lado os que pensam e, do outro, os que executam. Esse fato fica evidenciado na própria
orientação trazida pela Capes, na Portaria Normativa nº 17/2009, que dispõe sobre os objetivos do
mestrado profissional voltados para questões da prática profissional. Em seu artigo 4°, regulamenta
que um dos objetivos do mestrado profissional é capacitar profissionais qualificados para o exercício
da prática profissional, visando ao atendimento das demandas sociais, organizacionais ou
profissionais e do mercado de trabalho. Compreendemos que os mestrados profissionais não
precisam estimular à utilização do conhecimento de modo pragmático. Ao contrário disso,
necessitam promover a relação indissociável entre teoria e prática. Sabemos que na antiguidade
grega a filosofia ignorou e repeliu o mundo prático, considerado como indigno aos homens livres e
próprio dos escravos. Essa ideia perdurou por vários séculos, mesmo que travestida em outras
2 Fundação vinculada ao Ministério da Educação (MEC) do Brasil que atua na expansão e na consolidação da pós-
graduação stricto sensu em todos os estados do país.

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aparências.
Contudo, a dicotomia teoria e prática toma nova forma a partir da concepção marxiana de práxis. A
práxis é para Marx uma prática sempre fundamentada teoricamente. Desse modo, para a prática se
desenvolver, necessita da teoria e precisa ser iluminada por ela. A práxis é uma atividade material
humana transformadora do mundo e do próprio homem. Uma atividade real, objetiva e ao mesmo
tempo, ideal, subjetiva e consciente (Vázquez, 1968). Ela é teórica e prática - prática, na medida em
que a teoria, como guia da ação, molda a atividade do homem - e teórica, na medida em que essa
relação é consciente. Portanto, podemos pensar que, apesar de serem inseparáveis, a prática tem
primado sobre a teoria, na medida em que é ela que se constitui como origem, e a teoria é dela
originada. Mesmo que as normativas apresentadas pela Capes regulamentem que o objetivo é a
modificação da prática do aluno do mestrado profissional, é inviável afirmar que isso ocorrerá sem
colocar em evidência a relação indissociável entre teoria e prática, pois, alijando um aspecto em
detrimento do outro, impossibilitamos a melhoria do trabalho profissional e o aprofundamento do
objeto em estudo, visto que passariam a se distanciar do princípio que rege as mediações humanas:
a práxis. Por isso, cabe aos Programas de Pós-Graduação voltados aos mestrados profissionais
colocar em foco essa discussão de modo a pressionar os órgãos legisladores a modificarem suas
normativas e a contemplarem em suas leis as relações intrínsecas entre teoria e prática. No caso
específico da metodologia de pesquisa, a teoria pode colaborar para que a ação do pesquisador seja
mais aprofundada. Assim, entendemos que as teorias relacionadas com o campo das metodologias
de pesquisa tendem a colaborar com a ação do pesquisador, de modo a orientar a sua atividade de
pesquisa e dando um novo sentido à prática, principalmente nas pesquisas aplicadas que demandam
participação coletiva.
A partir do exposto, consideramos que o materialismo histórico-dialético possa contribuir com o
entendimento epistemológico que abarca as investigações sobre práticas e espaços educativos, pois
suas dimensões ontológicas, axiológicas e gnosiológicas integram uma filosofia da transformação que
visa, por meio da análise histórica e dialética da realidade, alcançar sínteses que retomem, em outra
dimensão, o conhecimento inicial e que visem, em última estância, a transformação social e coletiva.

3 Pressupostos do Materialismo Histórico-dialético

De acordo com Martins (2008) poucos são os escritos de Marx que dizem respeito diretamente aos
pressupostos do materialismo histórico-dialético. Esse sociólogo alemão não se dedicou muito a essa
delimitação, apesar de reconhecer a importância de fazê-lo, pelo fato de estar convencido que era
mais urgente empregar o seu método científico-filosófico na análise e compreensão da estrutura do
capitalismo, buscando “[...] elucidar sua gênese e desenvolvimento, para conhecer as suas
tendências imanentes e também para lhe imprimir outros desdobramentos [...]”, que pudessem lhe
determinar novas perspectivas econômicas, sociais, políticas e culturais (Martins, 2008, p. 18).
Segundo Vázquez (1968), o materialismo histórico-dialético é uma concepção, um modelo de
interpretação e de ação no mundo vinculado conscientemente a práxis revolucionária, ou seja, a uma
filosofia que pode guiar uma transformação humana radical ao desvendar contradições e evidenciar
mecanismos de dominação. Nesse sentido, compreende que o conhecimento é social, pressupõe o
outro, sendo sua apropriação necessária para a constituição do sujeito. Diferente das abordagens
pós-modernas que consideram a realidade como um texto com múltiplas possibilidades
interpretativas, o materialismo histórico-dialético reconhece que a realidade não pode ser explicada
de infinitas formas, pois compreende que a essência do objeto não muda, à medida em que a
matéria conserva sua propriedade independente do sujeito (Rodriguez, 2014). Por consequência, o
que faz o mundo ser como é, o que o produz em todas as dimensões, são as relações materiais que

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se estabelecem em sua dinâmica cotidiana. É por causa dessas relações que a sociedade, e o homem
individualmente em seu interior, desenvolve-se e, mediante a um processo histórico, pode ser
superada por um novo modelo que comporta um novo tipo de homem. Por meio desse humanismo-
materialista, o materialismo histórico-dialético considera que o homem é o maior artesão da
realidade que se constitui a partir das relações que a humanidade estabelece entre si e entre a
natureza. Por meio da crítica ao idealismo, o materialismo histórico-dialético afirma que o mundo
não é fruto exclusivo do pensamento, nem obra de um ser transcendental que por bondade intervém
na realidade ou inspira o homem a agir sobre ela. Tal método parte dos dados empíricos que se
apresentam na realidade de forma global e difusa, para logo realizar uma desagregação desses dados
e estabelecer diferentes relações que permitem fazer uma interconexão, possibilitando verificar as
múltiplas determinações que se estabelecem entre os dados singulares e os universais. O real
concreto, por conseguinte, só terá sentido quando a análise a ser realizada sobre ele identificar suas
múltiplas determinações. Desse modo, os fatos sociais não estão isolados, há uma relação dinâmica e
dialética entre o singular, o universal e o particular. Para Martins (2006), o fenômeno revela, em sua
expressão singular, o que é imediato; já em sua expressão universal, revela suas complexidades, suas
conexões internas e a sua totalidade histórico-social. Contudo, Martins (2006) infere que nenhum
fenômeno se expressa apenas de maneira singular ou universal. Ele se manifesta também em sua
configuração particular, assumindo especificidades de uma dada realidade. Desse modo, é impossível
construir qualquer conhecimento objetivo sobre indivíduos ou sobre a totalidade social sem a análise
dialética dessas três dimensões do fenômeno (objeto de conhecimento). Em diálogo com Martins
(2006), Oliveira (2005) destaca a importância de se caracterizar a relação singular-particular-universal
no âmbito da investigação científica, afirmando tal relação como requisito para a compreensão do
objeto em suas múltiplas relações e, acima de tudo, para a superação de falsas dicotomias (do tipo
indivíduo-sociedade), muito presentes nas ciências humanas. Martins (2008) propõe que devam ser
percorridos três passos para se alcançar o conhecimento do objeto estudado de modo a desvelar a
realidade: (1) a tomada de consciência das partes da totalidade a ser conhecida, abstraindo-as do
todo; (2) o conhecimento detalhado dessas partes pelo processo da análise; (3) a superação da visão
analítica, buscando conhecer as mediações que se estabelecem entre as partes, das partes com o
todo e deste para as partes, de modo a produzir uma síntese da realidade, que reproduz no
pensamento o concreto, o real, com todos os seus movimentos, suas determinações e significações,
tornando-se um concreto pensado. Martins (2008, p. 137) explica esses três passos ao apontar que o
conhecimento do real ocorre processualmente, “[...] passa pela abstração do que empiricamente se
apresenta de forma desorganizada, avançando para a análise das suas partes constituintes,
decompondo o todo caótico, até chegar à síntese [...]”, quando se volta o olhar sobre a totalidade da
realidade, mas tendo dela uma visão de suas articulações internas, de suas contradições, de suas
determinações mais complexas e das mediações que aí se estabelecem, produzindo no pensamento
uma representação daquilo que é a realidade. Portanto, para se conhecer o real é preciso dar conta
de todos os nexos que atravessam o fenômeno estudado, cercar o objeto de tal forma que se consiga
compreendê-lo em sua concretude, em seu movimento de gênese e de desenvolvimento em suas
relações reais. Além desses pressupostos, é importante ressaltar que o materialismo histórico-
dialético concebe o objeto do conhecimento não como algo dado, estático, somente limitado ao
tempo presente em sua análise, mas como um elemento dinâmico, caracterizado pela diacronia do
tempo histórico e que mantém múltiplas relações com o que está a sua volta. Inserido em uma
realidade dinâmica o conhecimento não pode ser traduzido como resultado de um processo
acabado, mas de um processo incorporado em uma realidade que é sempre mais rica do que a ideia
que construímos dela e que pressupõe não apenas interpretar o mundo de diferentes maneiras
conforme teorias pós-modernas defendem, mas transformá-lo. Assim, o materialismo histórico-
dialético constitui-se como uma abordagem teórica imprescindível no trato metodológico-

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investigativo, pois impulsiona o pesquisador a analisar de modo aprofundado seu objeto de pesquisa
e a buscar, de modo coletivo, transformar, mesmo que de forma sútil e processual, a realidade.
A partir do que colocamos, consideramos que cabe apresentarmos, na seção que segue,
pressupostos da metodologia de pesquisa participante, pois consideramos que dentre suas
diferentes abordagens existem aquelas que se embasam no materialismo histórico-dialético e, de
certo modo, sistematizaram modos coletivos de investigação que podem, em tese, contribuir para a
conscientização e a transformação social de coletivos subjugados pela sociedade desigual em que
vivemos.

3.1 Materialismo histórico-dialético e as pesquisas participantes

Diante dos pressupostos apontados é possível inferir que metodologias de pesquisas que
possibilitam a participação coletiva podem favorecer o desvelamento do real e, de certo modo,
contribuir com o seu processo de transformação. Porém, é necessário ter em mente os limites que
toda investigação possui, pois sabemos que muitas são as interferências que incidem sobre ela. Feita
essa ressalva, compreendemos que o materialismo histórico-dialético influenciou a sistematização de
alguns métodos de investigação, dentre eles a pesquisa participante. Faz-se necessário ressaltar que
existem vários tipos de pesquisa participante e alguns deles se distanciam dos pressupostos do
materialismo histórico-dialético. De acordo com Brandão (2015) as teorias e ações de estudiosos
como Mahatma Gandhi, Franz Fanon, Paulo Freire, Camilo Torres, Gustavo Gutierrez, João Bosco
Guedes Pinto, Leonardo Boff e Orlando Fals Borda, difundiram algumas propostas de participação
popular como formas originais e contestatórias, diante das diferentes propostas de desenvolvimento
social agenciadas pela Europa e pelos Estados Unidos da América que, na maioria das vezes,
implementavam investigações ditas participantes, mas que, na verdade, funcionavam apenas como
versões de antigas práticas sociais de vocação neocolonizadora. Na América Latina, em fins da
década de 1960, a pesquisa participante manteve-se ligada a ideias e ações sociais de tendência
emancipatória, ao mesmo tempo que fundamentavam e instrumentalizavam a educação popular, a
teologia da libertação e os movimentos sociais populares. Brandão (2015) aponta que a pesquisa
participante surgiu à margem das universidades e de seu universo científico, embora parte de seus
principais teóricos e praticantes provenha delas e nelas trabalhem. Paulatinamente e com
resistências, algumas teorias e práticas da pesquisa participante ingressaram no mundo universitário
latino-americano pela via de estudantes, professores ativistas de causas sociais, os chamados
militantes da educação popular. Para Brandão (2015, p. 08), a pesquisa participante na América
Latina buscava, em sua origem, a transformação de ações sociais populares a partir de uma
elaboração sistemática de conhecimentos pela via de pesquisas sociais postas “[...] a serviço de
experiências coparticipadas de criação solidária de saberes, a partir do enlace entre profissionais
e/ou militantes agenciados e as pessoas, grupos e comunidades populares”. O autor ainda considera
que a pesquisa participante não se relaciona, desde sua origem, às totalizações complexas e
holísticas dos paradigmas emergentes pós-modernos, representados por autores que seguem essa
tendência. Quanto as origens da pesquisa participante, “[...] sua fonte é marxista e, em vários
documentos, ela aparece como uma abordagem dialética” (Brandão, 2015, p. 15). Contudo, sabemos
que atualmente essa abordagem metodológica vem sendo apropriada por vários pesquisadores,
independente da base epistemológica que sustenta suas propostas de pesquisas. As pesquisas
participantes desenvolvidas no Brasil na década de 1980 acompanharam o movimento de
redemocratização desse país. A volta de Paulo Freire ao Brasil após o exílio, contribuiu para a
sistematização de vários eventos relacionados à educação, como, por exemplo, a Conferência
Brasileira de Educação. Tais ações ampliaram as discussões sobre métodos de pesquisa participativos

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no campo da educação. Houve, nesse momento, a sistematização de produções importantes: as


obras de Carlos Brandão – Pesquisa participante (1984) e Repensando a pesquisa participante (1986);
a tradução da obra de René Barbier – Pesquisa-ação na instituição educativa (1985); e as publicações
de Michel Thiollent, principalmente o livro Metodologia da pesquisa-ação (1985). Segundo Fals Borda
(1984, p. 43), a pesquisa participante refere-se à pesquisa da ação voltada para às necessidades de
populações que “[...] compreendem operários, camponeses, agricultores e índios – as classes mais
carentes nas estruturas sociais contemporâneas – levando em conta suas aspirações e
potencialidades de conhecer e agir”. É a metodologia que, ao invés de se preocupar somente com a
explicação dos fenômenos sociais depois que eles aconteceram, visa, por outro lado, favorecer a
aquisição de um conhecimento e de uma consciência que possibilitam, a um determinado grupo,
assumir de forma crítica e autônoma seu papel de protagonista e ator social. Para Freire (1984), essa
seria uma alternativa de realizar pesquisa como ato de conhecimento, contando com pesquisadores
profissionais e grupos populares que juntos desvelariam a realidade concreta. De acordo com Falz
Borda (1984), alguns princípios metodológicos necessitam ser seguidos para se realizar pesquisas
dessa natureza: (1) compreender o espaço intelectual e técnico do pesquisador apresentando o seu
compromisso com a causa popular; (2) evitar copiar tendências sem levar em conta o meio cultural
em que a pesquisa está inserida; (3) ouvir as bases de forma organizada e sem arrogância intelectual;
(4) sugerir o que será investigado de modo participativo; (5) promover o conhecimento teórico e
metodológico contribuindo para a independência das lideranças na realização de outras pesquisas;
(6) observar no campo investigado as aplicações concretas dos princípios da pesquisa, mantendo
ação e reflexão constantes no trabalho de campo; (7) utilizar técnicas de produção de dados que
promovam o diálogo, rompendo com a assimetria das relações sociais geralmente impostas por
alguns pesquisadores; (8) ter em mente que os problemas sociais contemporâneos exigem, para
explicação e solução, níveis complexos de análise que ultrapassam qualquer área especializada.
Complementando tais pressupostos, Freire (1984) sugere alguns passos essenciais para se realizar
pesquisas de cunho participativo: (1) analisar os estudos já realizados sobre o tema; (2) delimitar a
pesquisa; (3) visitar o campo a ser investigado; (4) apresentar proposta de pesquisa para a
comunidade e lideranças; (5) em caso de aceite, explicar detalhadamente a pesquisa; (6) reunir
lideranças da comunidade parceira e demais representantes populares para dar encaminhamento à
proposta; (7) apresentar, após as discussões, documento com os problemas elencados; (8) convidar
especialistas para ajudar a compreender o discurso popular; (9) organizar um pré-projeto em
colaboração com os grupos populares; (10) implementar o projeto; (11) realizar novas pesquisa
analisando o projeto implementado. Tanto os pressupostos de Fals Borda (1984) quanto os passos de
Freire (1984) visam nortear as ações do pesquisador para que ele se distancie de perspectivas
investigativas que colocam em evidência relações dicotômicas e opressoras entre sujeito-objeto.
Ao se aproximarem das prerrogativas do materialismo histórico-dialético devido, principalmente, ao
foco que possui na transformação social, as pesquisas de cunho participativo, a partir do viés que
estamos apresentando, reafirmam-se como um caminho investigativo que visa empoderar os
participantes dando-lhes a oportunidade de ampliar suas consciências de modo a agirem sobre o
mundo desvelando-o a contrapelo.

4 Pesquisas desenvolvidas em um mestrado profissional na área de ensino de


humanidades

Com o objetivo de exemplificar uma possibilidade de diálogo do materialismo histórico-dialético com


pesquisas participantes, em especial aquelas realizadas no Mestrado Profissional em Ensino de
Humanidades do Instituto Federal Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (Ifes), Brasil,

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discorreremos acerca da proposta de curso de formação de professores realizada pelo Grupo de


Estudos e Pesquisas sobre Educação na Cidade e Humanidades (Gepech3) que integra o mestrado
mencionado. Sabemos que os estudos sobre a cidade se apresentam como importante temática no
campo da educação e, consequentemente, do ensino, pois podem contribuir com a práxis do
professor ampliando sua compreensão de aspectos históricos, políticos, sociais, culturais, filosóficos
e econômicos referentes ao desenvolvimento contraditório e dialético do fenômeno urbano. O
Gepech, formado por mestrandos e professores do Ifes, começou suas atividades em março de 2016,
momento também do início do referido mestrado, visando alcançar os seguintes objetivos: 1) discutir
relações entre a cidade e a educação a partir de áreas do conhecimento ligadas às humanidades; 2)
planejar, executar e avaliar formações de professores da educação básica que contribuam com
reflexões sobre os espaços da cidade; bem como 3) sistematizar materiais educativos que discutam e
apresentem propostas contra-hegemônicas de se conhecer, em especial, as cidades do Estado do
Espírito Santo. Como forma de atingir o primeiro objetivo do Gepech, a partir de alinhamento teórico
com autores inseridos no materialismo histórico-dialético, o grupo participou de atividades que
buscaram ampliar o conhecimento dos participantes: visitas a espaços educativos da cidade,
entrevistas com estudiosos da área e discussões sobre teóricos de base marxiana. Para atender ao
segundo objetivo, o grupo sistematizou uma série de formações de professores de acordo com os
objetivos das pesquisas que cada mestrando estava desenvolvendo. Relataremos neste artigo o
curso de formação de professores intitulado “Educação na Cidade: estudos sobre o processo de
modernização de Vitória”, que integra a pesquisa de três mestrandos do Gepech, os quais, por
afinidade temática, propuseram-se a realizar um único curso de formação de professores com
diferentes abordagens sobre o tema central. O curso teve como público-alvo professores dos anos
finais do ensino fundamental e do ensino médio, licenciados nas áreas de Arte, Filosofia, Geografia,
História e Sociologia, e em exercício em sala de aula na rede pública de ensino no ano de 2017. Foi
realizado na modalidade semipresencial no período de 16-05-2017 a 04-07-2017, com 60 horas de
atividades, distribuídas em encontros de estudos presenciais, atividades não presenciais por
intermédio da Plataforma Moodle, visitas mediadas a espaços da cidade de Vitória e, ao final do
curso, apresentação de relatos de experiências de atividades pedagógicas desenvolvidas na escola a
partir dos estudos realizados no curso. Durante o curso, os professores participantes discutiram e
avaliaram três materiais educativos produzidos pelos mestrandos e seus respectivos orientadores, a
saber: “Educação na cidade: o processo de modernização da cidade de Vitória em debate”; “Parque
Moscoso4: espaço-memória da cidade de Vitória” e “O entorno da Vale5 na perspectiva da Educação
na Cidade”. Esses materiais foram elaborados a partir dos pressupostos do materialismo histórico-
dialético e buscaram apresentar o processo de modernização da cidade de Vitória em diferentes
aspectos. Desse modo, o processo de discussão e avaliação de tais materiais pode contemplar o
terceiro objetivo do Gepech. Além de procurarmos abarcar os pressupostos da pesquisa participante
durante os encontros e atividades do Gepech, buscamos também, com relação ao curso de formação
de professores, assegurar que tais pressupostos fossem contemplados. Planejamos, executamos e
avaliamos de forma conjunta os momentos do curso de formação de professores, dando
oportunidade a todos de acompanharem e atuarem na implementação da proposta. Durante o curso

3 Os dados referentes as ações, os cursos, os textos e os integrantes do Gepech podem ser acessados em
https://gepech.wordpress.com/integrantes-2/.
4 O Parque Moscoso foi inaugurado em 1912 e é um parque urbano característico da cidade de Vitória.
5 A Companhia Vale do Rio Doce foi criada em 1942 como empresa estatal. Atualmente, é uma multinacional e uma das

maiores produtoras de minério de ferro do mundo. Em 2015 a empresa foi responsável por crime ambiental que destruiu
um importante rio responsável pelo abastecimento de água nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo. No Espírito Santo
a Companhia está sediada na orla da Praia de Camburi em Vitória e é responsável pela emissão de excessivos poluentes no
ar da região chamada de Grande Vitória que abarca vários municípios do estado do Espírito Santo.

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de formação de professores objetivamos proporcionar, por meio do diálogo, o acesso ao


conhecimento crítico sobre o processo de modernização da cidade de Vitória. A proposta foi desvelar
as contradições que não poderiam ser percebidas sem as lentes do materialismo histórico-dialético.
Propusemos, por conseguinte, o conhecimento da história da cidade de Vitória a partir de um viés
contra-hegemônico. Para avaliar o curso, buscamos ouvir os participantes e a cada etapa refletimos
sobre nossas ações de modo a reorganizar os caminhos trilhados e definir novas rotas a partir das
experiências vivenciadas. Utilizamos técnicas de produção de dados que estimulassem o diálogo
entre os professores participantes e os organizadores do curso, com vistas a evidenciar o
conhecimento de todos os envolvidos. Para tanto, recorremos a vídeo-gravações, fotografias, rodas
de conversas, produção de textos escritos e relatos de experiência como modo de registrar e, na
sequência, analisar os diálogos estabelecidos entre os participantes e os estudos teóricos mediados.
Cabe novamente reforçar que cada um dos mestrandos que organizou o curso de formação de
professores está desenvolvendo pesquisa no Mestrado em Ensino de Humanidades que visa, por
meio do materialismo histórico-dialético, refletir, a partir de enfoques geográficos, ambientais,
culturais e históricos sobre a cidade de Vitória, promovendo modos de conhecer o fenômeno
estudado em sua concretude. Desse modo, compreendemos que o curso de formação de professores
constituiu-se como um objetivo do Gepech, mas também integrou os objetivos das pesquisas
realizadas pelos mestrandos. Além disso, consideramos que tanto o curso quanto o material
educativo disponibilizado estimularam os professores participantes a assumirem, de forma crítica e
autônoma, funções de protagonismo e autoria social, fato que ficou destacado nos relatos de
experiência apresentados por esses profissionais no final do curso. Do mesmo modo, reconhecemos
que como organizadores do curso e coordenadores do Gepech pudemos ampliar nosso
conhecimento sobre o espaço urbano e aprimorar nossos modos de convivência com o outro.

Considerações Finais

Como apontamos, o objetivo deste artigo foi apresentar as contribuições do materialismo histórico-
dialético para as pesquisas em mestrados profissionais na área de ensino de humanidades. Além de
discorremos sobre os pressupostos deste método e da pesquisa participante, comentamos as
especificidades dos mestrados profissionais no Brasil e reafirmamos a importância de se contribuir
com a indissociabilidade entre teoria e prática nesse tipo de mestrado. Elencamos também ações do
Gepech como forma de exemplificarmos algumas atividades de pesquisa realizadas a partir do
materialismo histórico-dialético e da pesquisa participante.
Inferimos que a pesquisa participante, sob a luz do materialismo histórico-dialético, pode se
constituir como um método contra-hegemônico, um caminho investigativo que potencializa
pesquisadores e demais participantes a ampliarem suas consciências, visando a transformação social.
Entendemos que desvelar as condições de reprodução social impostas pelo capital incide na
ampliação do olhar dos participantes da pesquisa, estimulando a compreensão de sua classe social,
de seus direitos e de suas potencialidades. Vislumbramos que tais métodos teórico-investigativos
possam favorecer a sistematização de processos educativos que favoreçam a criação de projetos
emancipadores e reveladores dos mecanismos opressores adotados pela classe dominante com
vistas a instigar a participação coletiva no processo de construção de uma sociedade igualitária.

Referências

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Jogo Trinca dos Invertebrados: uma experiência na mediação de


conceitos de ciências com alunos videntes e com baixa visão

Raimunda Leila José da Silva1; Juliana Eugênia Caixeta1


Paulo França Santos2

1 Faculdade UnB Planaltina, Universidade de Brasília, Planaltina, Brasil. raimundaleila@gmail.com;


eugenia45@hotmail.com
2 Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação, Salvador, Brasil. pfrancaster@gmail.com

Resumo. Na presente investigação, o objetivo foi desenvolver e verificar a eficácia de um recurso


pedagógico destinado a ensinar alunos do 7º ano do ensino fundamental conceitos relacionados ao Reino
dos Animais Invertebrados tanto a alunos com baixa visão quanto a alunos videntes de uma escola da rede
pública do município de Formosa/GO. A metodologia utilizada foi a pesquisa qualitativa e o procedimento
de construção dos dados aconteceu em quatro etapas: (i) construção do jogo; (ii) testagem do tamanho da
fonte e das imagens, (iii) aplicação do jogo “Trinca dos Invertebrados” e (iv) verificação da viabilidade do
jogo. Os resultados demonstraram que o recurso desenvolvido exerceu um importante papel na mediação
com alunos videntes e alunos com baixa visão por criar condições de ensino-aprendizagem focadas na
valorização da diversidade e no engajamento de todos participantes, promovendo uma visão despida de
preconceitos, baseada em princípios éticos, favorecedora do contínuo desenvolvimento dos alunos.
Palavras-chave: Ensino de Ciências, Inclusão, Jogo Trinca dos Invertebrados.

Game Three of the Invertebrates: an experience in mediation of science concepts with psychics and
students with low vision
Abstract. In the present investigation, the objective was to develop and verify the effectiveness of a
pedagogical resource designed to teach elementary school students concepts related to the Realm of
Invertebrate Animals to both low vision students and sighted students of a public school system.
Municipality of Formosa / GO. The methodology used was the qualitative research and the data
construction procedure took place in four stages: (i) construction of the game; (Ii) testing the size of the
source and images, (iii) applying the game "Invertebrate Crack" and (iv) verifying the viability of the game.
The results demonstrated that the resource developed played an important role in mediating with sighted
students and students with low vision for creating teaching-learning conditions focused on valuing diversity
and engaging all participants, promoting a principled and biased view of prejudices Ethics, favoring the
continuous development of students.
Keywords: Science Teaching, Inclusion, Invertebrate Tripping Game.

1 Introdução

A escola para a diversidade é aquela que possibilita contextos de aprendizagem, inspirados nos
princípios da celebração das diferenças, porque compreende o desenvolvimento humano como um
processo sociocultural de transformação que é enriquecido pela convivência com diferentes pessoas,
considerando suas características individuais e sociais. A partir desta concepção e atuação, a escola
compreende que pessoas com ritmos diferentes de aprendizagem podem requerer atuações
coletivas e individuais que favoreçam, tanto, o desenvolvimento de suas potencialidades e o
atendimento de suas especificidades. Para tanto, é preciso uma atuação focada, ao mesmo tempo,
na pessoa, no grupo e nos seus diversos contextos socioculturais.

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A presente investigação consistiu em desenvolver e verificar a eficácia de um recurso pedagógico


destinado a ensinar alunos do 7º ano do ensino fundamental de uma escola pública da cidade de
Formosa/GO, conceitos relacionados ao Reino dos Animais Invertebrados tanto a alunos com baixa
visão quanto a alunos videntes.

2 Sobre Jogos, Inclusão e Ensino de Ciências

No campo educacional, a inclusão da pessoa com deficiência traz desafios que dizem respeito a sua
acessibilidade aos recursos pedagógicos, especialmente, no ensino de ciências, que é uma área do
conhecimento que aborda fenômenos abstratos, cujas grandezas ou são muito macro ou muito
micro. Neste contexto, o desafio do ensino de biologia perpassa a construção de recursos
pedagógicos adaptados que permitam os alunos com deficiência visual terem acesso a estes
recursos: “muitas vezes é preciso realizar as adaptações necessárias para a participação e inclusão de
todos” (Brainer; Telles; Leal & Cavalcante, 2012, p. 7).
Entendendo por recursos didáticos aqueles que trazem alternativas capazes de contribuir para o
processo ensino e aprendizagem, focamos neste artigo a construção e avaliação do uso do jogo
Trincas de Invertebrados para a mediação de conceitos relativos ao Reino dos Animais Invertebrados
tanto para alunos com baixa visão, como para alunos videntes.
O jogo foi escolhido, porque, enquanto recurso didático pode ser considerado importantes aliados
no processo educativo, ampliando a construção do conhecimento e a elaboração de conceitos por
meio da interação entre os jogadores e entre eles e o objeto de conhecimento. Segundo Cunha
(2012), os jogos nos contornos educacionais podem ser classificados em jogo educativo e jogo
didático sendo assim definidos:
O primeiro envolve ações ativas e dinâmicas, permitindo amplas ações na
esfera corporal, cognitiva, afetiva e social do estudante, ações essas
orientadas pelo professor, podendo ocorrer em diversos locais. O segundo
é aquele que está diretamente relacionado ao ensino de conceitos e/ou
conteúdos, organizado com regras e atividades programadas e que mantém
um equilíbrio entre a função lúdica e a função educativa do jogo, sendo, em
geral, realizado na sala de aula ou no laboratório (Cunha, 2012, p. 95).

Neste estudo, defendemos o jogo na perspectiva do jogo didático devido ao caráter tendencioso de
proporcionar a formação de conceitos acerca do conteúdo Reino dos Animais Invertebrados. Os
animais são estudados pela zoologia – campo da ciência cujo nome origina-se da língua grega: zoon
significa “animal”, e logia, “estudo” (Pereira; Santana & Waldhelm, 2009, p.119).
Os animais compõem um reino com mais de um milhão de espécies. Portanto, para estudá-los, foi
preciso dividi-los em classificações, como: animais vertebrados e invertebrados O grupo dos animais
invertebrados é formado por aqueles que não possuem coluna vertebral (Pereira; Santana &
Waldhelm, 2009) e foi o tema escolhido para investigação devido à grande variedade de espécies
conhecidas, “de cada 100 espécies animais conhecidas, mais de 95 são de invertebrados” (Canto,
2009, p. 107) e também por ser um conteúdo que envolve conceitos abstratos, por se tratar de
organismos que, na maioria, não fazem parte do cotidiano dos alunos.
Caixeta (2007) explica que as atividades lúdicas geram zona de desenvolvimento proximal, ou seja,
constroem espaços de aprendizagem. Nessa concepção, compreendemos que o jogo gera
possibilidades de ser e de atuar no mundo a partir da interação social com os outros jogadores e com
o próprio jogo que poderiam não ser possíveis sem a mediação do jogo e da interação social
construída no contexto da sua aplicação.

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2.1 Deficiência Visual e Baixa Visão

Para Sampaio (2013, p. 6), “entende-se por deficiente visual (DV) os indivíduos que têm dificuldade
de perceber estímulos luminosos, sendo divididos em cegos e pessoas com baixa visão. Mais
importante que identificar o que uma pessoa DV não consegue perceber, é identificar suas
capacidades residuais”. Para o Ministério da Educação, os alunos com Baixa visão são aqueles que:

[...] utilizam seu pequeno potencial visual para explorar o ambiente,


conhecer o mundo e aprender a ler e escrever e, cegos os alunos que não
têm visão suficiente para aprender a ler em tinta, necessitam, portanto,
utilizar de outros sentidos (tátil, auditivo, olfativo, gustativo e sinestésico)
no seu processo de desenvolvimento e aprendizagem. O acesso à leitura e
escrita dar-se-á pelo sistema Braille (Brasil, 2002, p. 13).

Considerando, portanto, a ideia de compensação (Vygotsky, 2011), isto é, que os deficientes devem
compensar suas limitações, utilizando os sentidos remanescentes, a escola tem a importante função
de possibilitar a participação da pessoa deficiente visual no contexto escolar e, portanto, deve prever
a mediação através dos outros sentidos e do desenvolvimento deles, além do estímulo da visão
residual, em caso de baixa visão. Para tanto, a equipe da escola deve estar atenta às possibilidades
residuais dos estudantes com baixa visão: no contexto educacional, caracteriza-se como baixa visão
a capacidade potencial de utilização da visão prejudicada para atividades escolares e de locomoção,
mesmo que após tratamento ou máxima correção óptica específica, tenha necessidade, de utilização
de recursos educacionais adaptados (Raposo & Carvalho, 2011).
Os recursos educativos adaptados também conhecidos como recursos de tecnologias assistivas são
todo e qualquer tipo de instrumento ou estratégia que permite a acessibilidade da pessoa com
deficiência aos bens culturais, artísticos, científicos e/ou sociais. De acordo com Cavalcante (2012, p.
10), as tecnologias assistivas “são recursos ou estratégias que auxiliam na promoção de
acessibilidade às pessoas com deficiência”. Em outras palavras, são instrumentos que facilitam a
vivência plena do indivíduo na sociedade.

2.2 Caracterizando o Jogo “Trinca dos Invertebrados”

O jogo é composto por trinta e duas (32) cartas impressas em papel NogPel A-4, gramatura de 140
g/m, o tamanho da fonte utilizado foi quarenta e oito (48), destacado em negrito e as imagens
tiveram medidas de 14cm/16cm, sendo que para obter melhor resultado na cor das imagens usou-se
lápis de cor preto para reforçar a tonalidade das gravuras.
As regras do jogo foram impressas em duas versões, sendo que uma teve o tamanho da fonte
ampliada para a fonte quarenta e oito (48), destacada em negrito e a outra versão, tamanho doze
(12), ambas com fonte Times New Roman (ver figura 1).

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Fig. 1. (Imagem das cartas do Jogo Trinca dos Invertebrados).

3 Pressupostos Metodológicos

Tomando por base os objetivos desta investigação, optou-se pela pesquisa de abordagem qualitativa
por entender que esta permite, por meio do tripé: pesquisadores-participantes-fenômeno
investigado, interpretar e construir os significados nas e pelas interações sociais (Sampieri, Collado, &
Lucio, 2013; Minayo, 2010).
Nesse sentido, fenômenos sociais investigados por meio da pesquisa qualitativa permitem ao
pesquisador propor trabalhos com enfoques diversos, explorando a capacidade de imaginação e de
criatividade, não sendo, portanto, uma proposta rigidamente estruturada (Godoy, 1995), o que a
nosso ver, permite profundidade na interpretação dos fenômenos investigados.
A técnica utilizada para coleta de dados foi a observação sistemática que se “caracteriza pelo contato
mais direto com a realidade e é utilizada para obter informações sobre determinados aspectos a
serem estudados de forma planejada, estruturada e realizada em condições controladas”
(Mendonça, 2008, p. 49).

3.1 Participantes

Participaram dessa investigação quatro (4) alunos do 7º ano do Ensino Fundamental, com faixa etária
de 13 anos de idade, sendo que um estudante tinha baixa visão e três eram videntes. Entendemos
por videntes aquelas pessoas capazes de perceber estímulo visual, ou seja, capazes de ver com seus
próprios olhos ou com ajuda de óculos convencionais.

3.2 Procedimentos de construção de dados

Para a construção dos dados da pesquisa, que ocorreu em uma escola da rede pública do município
de Formosa/GO, inicialmente, pediu-se autorização à diretora da escola, que foi prontamente
concedido.

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Posteriormente, houve um momento destinado a conhecer os alunos participantes da pesquisa.


Nesse momento, a pesquisadora convidou os alunos a participarem da investigação e explicou quais
seriam os procedimentos utilizados. Em seguida, os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido
para Participação em pesquisa (TCLE) foram entregues aos alunos para que os pais ou responsáveis
pudessem autorizar a participação de cada um na pesquisa.
A construção dos dados aconteceu em três etapas. A primeira etapa foi a construção do jogo. A
segunda etapa foi destinada a testar o tamanho da fonte e o tamanho das imagens, nesse caso, a
professora investigadora apresentou as cartas do jogo com fontes de tamanho trinta e seis (36) e
quarenta e oito (48) e ao aluno participante com baixa visão para que ambas fossem adequadas às
suas necessidades. Nessa etapa, as cartas foram impressas em folha simples. Na terceira etapa, já
confeccionado na versão final, impresso em papel NogPel A-4, gramatura de 140 g/m e plastificado o
jogo “Trinca dos Invertebrados” foi utilizado para mediar o diálogo inicial sobre o Reino dos Animais
Invertebrado e em seguida as cartas e as regras do jogo foram entregues aos alunos para que
pudessem jogar algumas partidas. Enquanto os alunos jogavam, o papel da pesquisadora foi observar
e registrar o comportamento dos alunos. Na quarta etapa, para verificar a viabilidade do jogo para a
mediação de conceitos relacionados aos filos dos reinos dos animais invertebrados e, também, à
possibilidade de o jogo ser utilizado com grupos de estudantes deficientes visuais, baixa visão, e
videntes, os alunos organizaram as cartas em seus respectivos filos.

3.3 Procedimentos de análise dos dados

Para analisar os dados, optou-se pela Metodologia de Análise de Conteúdo com recorte para a
análise temática proposta por Bardin (2009), que consiste em um conjunto de técnicas sistemáticas e
objetivas empregadas com a finalidade de identificar os significados manifestados nas comunicações
através da presença ou a frequência que as unidades de significado aparecem levando em
consideração o objetivo delimitado. Para a mesma autora, “fazer uma análise temática consiste em
descobrir os “núcleos de sentido” que compõem a comunicação e cuja presença, ou freqüência de
aparição, pode significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido” (Bardin, 2009, p. 135).
Os dados foram obtidos mediante a aplicação do jogo que ocorreu em uma sala de aula com a
presença da pesquisadora e dos alunos participantes. A ação pedagógica, que incluiu a aplicação do
jogo gravação de vídeos e os diálogos entre os estudantes e entre estudantes e pesquisadora, foi
cuidadosamente observada e registrada em diário de campo “que nada mais do que um caderninho
de notas, em que o investigador, dia por dia, vai anotando o que observa e que não é objeto de
nenhuma modalidade de entrevista (Minayo, 2010, p. 295). Em seguida, os dados foram organizados
em categorias.

4 Resultados

Os resultados evidenciaram que o jogo “Trinca dos Invertebrados” é um recurso viável para a
promoção da interação entre alunos videntes e alunos com baixa visão e eficaz no processo de
construção do conhecimento no que se refere às características marcantes de cada grupo que
compõe o Reino dos Animais Invertebrados. Desta forma, temos as seguintes categorias:

Interações possíveis
A utilização do jogo Trinca dos vertebrados permitiu vislumbrar dois tipos de interações: a) interação
aluno com baixa visão-alunos videntes e b) alunos e professora-pesquisadora. Para uma melhor
compreensão da descrição dos resultados, serão utilizados nomes fictícios para nomear os

861
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participantes da pesquisa: Beatriz, Marcos, Laryssa e Ronaldo, sendo este último o aluno com baixa
visão.
Apesar de ser um jogo em que cada participante determinava suas próprias estratégias para formar
as trincas, a aplicação do jogo evidenciou o diálogo entre aluno com baixa e alunos videntes e vice-
versa para: a) pedir ajuda acerca da confirmação se as trincas formadas no ato do jogo realmente
designavam o mesmo filo. Exemplo desta interação pode ser comprovado no episódio A:
EPISÓDIO A:
Aluno Marcos: Beatriz me ajuda aqui, essas cartas forma a trinca dos
equinodermos?
Aluna Beatriz: Forma aí é do grupo dos animais marinhos, da estrela-do-
mar.
Aluno: Ronaldo: Deixa eu ver, legal, formo um a trinca.
Aluno Marcos: Valeu.
Houve também a interação dos alunos participantes e a professora investigadora: b) essa interação
pôde ser evidenciada por meio da gravação dos vídeos e descrita no episódio B, quando o aluno
Marcos pergunta a colega Laryssa se as cartas que estão na mão realmente formavam a trinca dos
anelídeos.
EPISÓDIO B:
Aluno Marcos: Laryssa, com essas cartas eu formei a trinca dos anelídeos
né?
Aluna Laryssa: Acho que formou, mas estou com dúvida nessa aqui,
pergunta pra professora.
Aluno Marcos: Professora, com essas cartas forma essa trinca?
Professora: Tem alguém no grupo que pode tirar a dúvida do colega?
Aluno: Ronaldo: Calma aí, vamos lembrar das características dos animais
desse grupo.
Tá certo, formou.
Aluno: Marcos: Legal, formou professora.
Professora: Muito bem.
Nesta dimensão, a interação entre os participantes foi uma das possibilidades que o recurso testado
mostrou ser eficaz. Do ponto de vista do uso do jogo como recurso pedagógico, este resultado era
esperado, considerando a utilização dos jogos favorece a compreensão dos conteúdos envolvendo-
os em uma atmosfera de entretenimento.

Processo de formação de conceitos sobre o Reino dos Animais Invertebrados


Nessa categoria, para verificar a eficácia do recurso, após a mediação com o jogo pediu-se que os
participantes organizassem coletivamente todas as cartas nos seus respectivos filos. Nessa etapa, o
participante Ronaldo rapidamente agrupou as cartas do filo moluscos, o participante Marcos, com a
ajuda da participante Beatriz agrupou o filo equinodermos e em seguida, o participante Marcos
agrupou as cartas do filo artrópodes. Tiveram dúvidas em agrupar as cartas dos filos cnidários,
poríferos, platelmintos e nematelmintos. Nesse momento, houve a intervenção da professora
pesquisadora, relembrando por meio de uma comunicação dialógica, as características gerais dos
animais que compõem cada filo.
Em seguida, o participante Ronaldo agrupou as cartas dos filos platelmintos e nematelmintos.
Observou-se nessa etapa, que os alunos organizaram as cartas, demonstrando domínio satisfatório
sobre o conteúdo.
Fala do aluno Ronaldo ao agrupar as cartas dos platelmintos e nematelmintos: Olha, é parecido com
esse daqui. Referindo-se à carta que apresentava a imagem do ciclo da lombriga e da tênia. Nesse

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

momento, os alunos comparavam as características representadas em cada imagem para então


agrupar as cartas.
Nessa categoria, evidencia-se que o jogo favoreceu a compreensão dos conceitos básicos como
características dos animais, locomoção, habitat e reprodução dos animais que compõem o Reino dos
Animais Invertebrados.
Por último, observam as semelhanças entre as palavras cnidários e cnidócitos. Participante Laryssa
com as cartas nas mãos: Cnidócitos, lembra? É o que libera aquela coisa que queima como as águas-
vivas.
O participante Marcos pega as cartas restantes e comenta: Essas são todas dos poríferos, aí olha,
poríferos, poros, esponjas.
Vale salientar que o objetivo principal do jogo foi promover a aprendizagem do conteúdo tanto para
alunos videntes quanto para o aluno com baixa visão, destacando que é possível adequar recursos
pedagógicos que favorecem tanto a interação entre alunos videntes e alunos com baixa visão,
quanto um melhor entendimento dos conteúdos científicos.

5 Discussão

Os resultados obtidos corroboram com as diferentes teorias que sustentam a apropriação dos jogos
educacionais como instrumentos potencializadores dos processos educativos. Nas palavras de
Kishimoto (1996, p. 37) “a utilização do jogo potencializa a exploração e a construção do
conhecimento, por contar com a motivação interna típica do lúdico”. O jogo cria um ambiente de
motivação e entretenimento conforme explicita o aluno Marcos: A gente nem precisa estudar para
aprender, aprende brincando e fica mais fácil aprender a matéria.
É importante salientar sobre o que nos informa Mrech (2008), citado em Brainer & Teles (2012, p.
23), “brinquedos, jogos e materiais pedagógicos não são objetos que trazem em seu bojo um saber
pronto e acabado. Ao contrário, eles são objetos que trazem um saber em potencial. Este saber em
potencial pode ou não ser ativado pelo aluno”. Nesse caso, a mediação do professor no processo de
construção do conhecimento é indispensável para que os objetivos propostos sejam alcançados ao
escolher um jogo para trabalhar um conteúdo específico. Essa mediação também se faz necessário
ao utilizar o jogo didático Trinca dos Invertebrados.
Em síntese, pontua-se que o jogo por si não permite a aprendizagem, mas, mediado, adaptado para
as necessidades de todos os alunos é um recurso que favorece a consolidação e a apropriação de
novos conhecimentos.

6 Conclusões

A investigação visou à construção e análise da viabilidade do jogo Trinca dos Invertebrados como um
recurso didático adaptado que pudesse ser usado na mediação de conceitos básicos sobre o Reino
dos Animais Invertebrados tanto para alunos videntes quanto para alunos com deficiência visual.
Para isso, o jogo foi aplicado para quatro estudantes, um com baixa visão e três videntes. Todos do
7º ano do Ensino Fundamental.
Os resultados evidenciaram que o jogo é viável para ser utilizado em sala de aula para mediar
conceitos de animais invertebrados, por que: a) permite que o aluno com deficiência visual tenha
acesso às cartas do jogo; b) permite que alunos videntes e alunos com deficiência visual joguem
juntos; c) favorece a interação social entre os alunos videntes e deficiente visual para a resolução do
problema proposto para o jogo: construção de filos de animais invertebrados. Isto se dá por meio de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

diálogos entre os alunos entre si sobre os conceitos evocados e construídos a partir da ação de jogar
a Trinca dos Invertebrados; d) permite a interação entre alunos e professora, na medida em que,
como jogo, fomenta o diálogo e a troca de saberes, inclusive, com a confirmação sobre o
desenvolvimento de trincas certas ou a problematização de trincas que foram feitas
inadequadamente e e) permite a sistematização do conhecimento relacionado a alguns filos do reino
animal invertebrado a partir da organização das cartas, que contêm imagens, exemplos dos animais e
suas características.
Com estes resultados, assume-se que o jogo Trinca dos Invertebrados, adaptado para pessoas com
deficiência visual, apresenta-se como um recurso didático rico para o processo de ensino-
aprendizagem de animais invertebrados, podendo ser modificado para a mediação de outros
conteúdos em zoologia, biologia ou outras áreas das ciências da natureza. O fato de as cartas
conterem informações variadas sobre o conceito a ser trabalhado, juntamente com o fato de elas
serem adaptadas, permite o acesso delas a diferentes alunos, que tenham ou não deficiência visual
ou intelectual ou múltipla, gerando possibilidades interacionais no ato do jogo que, para Vygotsky
(1994) tem a ver com o processo de construção de conhecimentos e de conceitos, neste caso, em
ciências.
Por fim, a utilização da metodologia de abordagem qualitativa contribuiu para o entendimento de
que a utilização dos jogos adaptados aconteçam sempre que necessários, para permitir o
protagonismo dos estudantes na construção de conceitos em biologia, nas ciências e nas diferentes
áreas do conhecimento científico, afinal, o protagonismo implica em participação na construção de
hipóteses, na observação dos fenômenos, na comparação dos elementos, no diálogo possível em sala
de aula e na sistematização do conhecimento.

Agradecimentos. Fundo de Amaparo à Pesquisa do Distrito Federal Brasília/Brasil; Secretaria Municipal de


Educação de Formosa/Goiás/Brasil.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Fútbol Callejero:
Processos Educativos Des-Velados A Partir De Uma Sistematização
De Experiências Em Interface Com A Fenomenologia
Ddo. Maurício Mendes Belmonte1, Dr. Luiz Gonçalves Junior1, Dr. José M Pazos-Couto2

1 Universidade Federal de São Carlos-SP (Brasil). mauriciobelmonte014@gmail.com; luizgj7@gmail.com


2 Universidade de Vigo. Chema3@uvigo.es

Resumo. O Fútbol Callejero surgiu na Argentina, na província de Buenos Aires, em meados de 2001. Sua
prática consiste na realização de uma partida de futebol que é sustentada por três princípios. A saber:
Respeito, Cooperação e Solidariedade. Para o desenvolvimento da presente investigação utilizamos o método
investigativo de orientação qualitativa, a Sistematização de Experiências. Para tanto, após inserção junto à
comunidade participante do projeto de extensão Vivências em Atividades Diversificadas de Lazer e a
respectiva aprovação junto ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, demos início à coleta de
dados, por meio de notações em Diários de Campo. Para a análise dos dados buscamos aportes de inspiração
fenomenológica, procedendo à identificação de unidades de significados e posterior formação de Categorias.
Por ora, enquanto uma análise preliminar são apresentadas e descritas três categorias: A) Cuidados com
outrem; B) É divertido!; C) Ecologia das Motricidades.
Palavras-Chave: Processos Educativos; Fútbol Callejero; Educação Popular; Motricidade Humana

Abstract. Fútbol Callejero appeared in Argentina, in the province of Buenos Aires, in the middle of 2001. Its
practice consists in the accomplishment of a football match that is sustained by three principles. Namely:
Respect, Cooperation and Solidarity. For the development of the present research hand in method of
qualitative research, the Systematization of Experiences. To do so, after insertion with the participant
community of the project Experiences in Diversified Activities of Leisure and the respective approval to the
Committee of Ethics in Research with Human Beings, we began to collect data, through notations in Field
Journal For the analysis of the data we looked for contributions of phenomenological inspiration, proceeding
to the identification of units of meanings and later formation of Categories. For the moment, while a
preliminary analysis is presented and described three categories: A) Care of others; B) It's fun !; C) Ecology of
Motricity.
Keywords: Educational Processes; Fútbol Callejero; Popular Education; Human Motricity

Introdução

No presente artigo nos debruçamos na apresentação e análise de uma prática de Educação Popular
denominada como “Fútbol Callejero” que vem sendo desenvolvida no contexto das ações da parceria
intitulada “Vivências em Atividades Diversificadas de Lazer e Mais que Futebol” (VADL/MQF) junto à
crianças e adolescentes com idade entre 7 e 17 anos. Esta prática educativa foi originalmente
concebida no contexto latino-americano e busca, através de sua vivência, desencadear nos/nas jovens
praticantes processos educativos ligados a assunção de uma postura dialógica e proativa para que
possam protagonizar a luta por seus direitos e interesses na/para transformação de suas realidades
(Rossini, Serrani, Welbel & Wainfeld. 2012). Nossa investigação parte da inquietação por saber quais
os processos educativos emergem da prática do Fútbol Callejero que é desenvolvido no contexto da
parceria VADL/MQF?. Diante desta problemática, nosso objetivo central é de identificar e compreender
os processos educativos que emergem da prática do Fútbol Callejero que é desenvolvida no contexto
da parceria VADL/MQF. Cumpre destacar que os dados apresentados ao longo deste artigo decorrem

866
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

uma análise preliminar de pesquisa de doutorado que está em desenvolvimento1 junto ao Programa
de Pós-Graduação em Educação da UFSCar (PPGE/UFSCar), realizada em colaboração com a Facultad
de Ciências de la Educación y del Deporte da Universidade de Vigo (UVigo – Campus Pontevedra)
possibilitada pelo Programa Doutorado Sanduíche no Exterior e com o aporte financeiro do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). Iniciaremos pela apresentação da
origem e a didática do Fútbol Callejero, de modo a apresentar também o contexto da parceria no qual
são desenvolvidas suas ações. Em seguida detalhamos nossa trajetória metodológica, alicerçada na
perspectiva qualitativa, cujos preceitos da Sistematização de Experiência (Jara-Holliday, 2006) em
sinergia com a Fenomenologia (Garnica, 1997 & Bicudo, 2011; Merleau-Ponty, 2015), iluminaram
nossa inserção, registro e análise dos dados, respectivamente. Esta trajetória metodológica culminou
com a identificação e formação de 3 categorias temáticas que serão devidamente descritas. Por fim,
marcando o encerramento de um ciclo preliminar de investigação e contemplando os preceitos da
Sistematização de Experiências, comunicamos nossas considerações decorrentes da análise e
interpretação crítica da experiência sistematizada, de modo a trazer para o bojo das discussões
científico-políticas o Fútbol Callejero, bem como nossa própria práxis de investigação implementada
na busca por identificar e compreender os processos educativos emergentes da prática de Fútbol
Callejero que é desenvolvida no contexto da parceria VADL/MQF.

Fútbol Callejero: origem e intencionalidade político-metodológica.


O Fútbol Callejero (FC) surgiu em meados de 2001 no bairro de Moreno, periferia empobrecida de
Buenos Aires, Argentina. Tal território fora acometido pela alta vulnerabilidade social de sua população
expresso por diferentes manifestações de violência, tais como: exposição e/ou assédio do tráfico,
violência de gênero, consumo de drogas ilícitas, empobrecimento e marginalização de sua
comunidade, para citar algumas (Rossini, Serrani, Welbel & M Wainfeld, 2012). Neste contexto Fábian
Ferraro, ex-jogador de futebol e educador popular, vislumbrou o FC como sendo uma prática de
Educação Popular cujo horizonte apontava para a possibilidade de mobilização da juventude para o
enfrentamento das dificuldades sociais que assolavam o “ser jovem” na Argentina durante década de
1990 e início dos anos de 2000, de tal modo que Rossini et al. (2012) afirmam:
La Argentina de esos años sufría las consecuencias de la desindustrialización que se manifestaba en la falta
de empleo, la ruptura de los lazos de solidaridad, la debilidad de las organizaciones sociales y un
individualismo y consumismo exacerbado, siendo los jóvenes que no estudiaban ni trabajaban
(sarcásticamente llamados “nini”) los principales perjudicados. (p.20)
Os autores citados anteriormente apresentam que Fabián Ferraro, liderança juvenil e co-fundador da
Associación Defensores del Chaco – clube de futebol e associação civil situado no bairro de Moreno –
observou que durante as partidas de futebol organizadas por jovens integrantes de facções/gangues
rivais tinham seus conflitos suspensos e o jogo se passava a partir de um código tácito de paz. Diante
deste fenômeno, o educador decidiu promover mais encontros/jogos entre estes jovens. Todavia,
gozando de seu status social de liderança bairrial propôs partidas desenvolvidas em 3 tempos (1º, 2º
e 3º Tempo) na qual não havia a figura de um árbitro ou arbitra; os/as jogadores/as deveriam decidir
autonomamente e por meio de acordos quais seriam as regras da partida; as equipes deveriam ser
mistas, ou seja, formadas por meninos e meninas; por fim, para além dos gols as equipes seriam
avaliadas e receberiam pontos ligados a prática da cooperação, solidariedade e respeito que são

1
A referida pesquisa está com o título provisório de “Fútbol Callejero e Educação Popular: processos educativos
desvelados a partir de uma sistematização de experiências”, foi iniciada em Março de 2015 e possui aprovação
junto ao Comitê de Ética de Pesquisa em Seres Humanos (CEP/UFSCar) com parecer nº 1.565.644. A pesquisa
conta com apoio financeiro da Capes, atribuído ao pesquisador/autor Maurício Mendes Belmonte/Programa
Doutorado Sanduíche no Exterior/Processo Nº 88881.133888/2016-01.

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valores chamados de “pilares”, durante a prática do jogo. Rossini et al. (2012) justifica que a escolha
pelo futebol se fez devido o grande potencial que tal prática corporal possui em “atraer la atención y
vincular a los participantes desde una experiencia que recogiera sus intereses y gustos” (p. 12).
Naquilo que tange o desenvolvimento de uma partida em 3 tempos é previsto que durante o 1º Tempo
os/as jogadores/as se disponham em um grande círculo para dialogarem e estabelecerem acordos
acerca das regras que constituirão a partida. Somente os/as participantes de cada equipe é que
poderão sugerir regras. Neste momento o/a mediador/a apenas toma nota das regras que foram
acordadas.
Após o estabelecimento das regras é iniciado o 2º Tempo, ou “Tempo de bola rolando”. Momento em
que ocorre uma partida de futebol balizada pelos acordos anteriormente estabelecidos. O mediador
ou mediadora deverá apenas observar o jogo e fazer anotações de atitudes e ações que dialoguem
diretamente com as regras que foram combinadas. Por exemplo: contagem de pontos, situações onde
foi manifestado (des)respeito, cooperação, solidariedade.
Decorrido o tempo de jogo do 2º tempo - que também foi previamente combinado no diálogo do 1º
tempo - é iniciado o momento final da partida, ou seja, o 3º Tempo ou “Mediação”, na qual é
novamente formado um círculo para a realização da contagem dos gols que foram convertidos por
cada equipe e conseguinte avaliação dos pilares/valores (Respeito, Cooperação e Solidariedade). Esta
ocorre a partir da problematização de cada um destes valores, buscando o estabelecimento de um
consenso acerca da atribuição, ou não, de pontos afetos à cada um deles. O final da partida é marcado
pela contabilização dos pontos junto com os/as participantes, permitindo que o resultado se revele a
partir de um censo de justiça entre todos/as participantes das equipes.
A partir desta dinâmica metodológica o FC procura possibilitar a vivência de processos educativos
ligados a adoção de uma postura dialógica para a convivência com o mundo e com outrem,
estimulando seus/suas participantes à dialogarem para resolução de conflitos e para a tomada de
decisão. Havendo um grande esperançar de que os/as jovens sejam protagonistas do processo de
(re)produção de conhecimentos e de novas culturas juvenis. Tencionando a hodierna condição de
mero consumidores/as ao qual o sistema-mundo capitalista impõe para a(s) juventude(s). Esta
percepção tem balizado as críticas de Rossini et al. (2012):
En estos tempos donde las juventudes son desvalorizadas y deslegitimadas cada vez más por los discursos
hegemónicos, interpelados casi exclusivamente como consumidores o usuarios, y muy escasamente como
ciudadanos; el Fútbol Callejero los y las invita a recuperar su voz, a reconocer su potencial y protagonizar sus
vidas desde una perspectiva emancipadora. El Fútbol Callejero los invita a ser ciudadanos de sus comunidades
y de este mundo, a contraponerse a la exclusión y la injusticia. Y nos invita, a todos y todas, a luchar por
nuestro derecho a vivir una vida digna. (p. 15)
Concebido como prática de educação popular (Rossini et al. 2012), ou como ferramenta social que
busca superar os valores e práticas desportivas muito arraigadas à uma perspectiva meramente
comercial-mercadológica e competitiva (Sanchez & Salermo, 2012), a prática de Educação Popular
nomeada como FC tem a juventude como público alvo.
Chamamos a atenção do leitor, ou leitora, explicitando que no caso específico de nossa pesquisa
lançamos um olhar focal para o contexto da parceria estabelecida entre o projeto de extensão
universitária “Vivência em Atividades Diversificadas de Lazer” (VADL), do Departamento de Educação
Física e Motricidade Humana (DEFMH/UFSCar) com o projeto “Mais que Futebol” (MQF), da
Associação Desportiva, Educacional e Social dos Metalúrgicos de São Carlos (ADESM), que tem
desenvolvido ações junto à crianças e adolescentes com idade entre 7 e 17 anos moradoras de bairros
periféricos e empobrecidos do município de São Carlos. Tal parceria, que doravante chamaremos de
VADL/MQF, tem possibilitado um trabalho interdisciplinar a partir da ação de estudantes bolsistas das
áreas da Educação Física, Música, Pedagogia, Biblioteconomia/Ciência da Informação e estudantes de
pós-graduação em Educação, nível de mestrado e doutorado.

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Os primeiros diálogos entre o professor responsável2 pelo projeto de extensão com a diretoria da
ADESM ocorreram em dezembro de 2012. A diretoria desta associação sinalizou seu interesse em
ofertar outras práticas corporais (jogos, danças, lutas, atividades teatrais jogos de tabuleiro, para citar
algumas) para além dos treinos de sua “escolinha de futebol” que é voltada para formação de atletas
para atuação no cenário do futebol de alta performance. Tal diálogo procurou explicitar a intenção da
ADESM em ampliar a oferta de atividades e aprofundar a dimensão educativa de suas ações, daí
decorre o nome “Mais que Futebol”. Nesta feita, em outubro de 2013 foi concretizada a parceria com
o efetivo início de trabalho da equipe pedagógica do VADL/MQF junto à crianças e adolescentes com
idade de 7 à 17 anos, tendo como espaço de desenvolvimento de suas ações o clube de campo dos
metalúrgicos de São Carlos, de maneira a atender gratuitamente e no período contrário ao horário
escolar crianças e adolescentes moradoras/es de bairros periféricos e empobrecidos do citado
município (Jardim Gonzaga, Cidade Aracy, Antenor Garcia, Zaváglia, Residencial Eduardo Abedelnur e
região do grande Santa Felícia). Para tanto, contou com a oferta de transporte coletivo e gratuito,
fornecido pela ADESM, para o deslocamento dos/as participantes residentes dos bairros mais
afastados do Clube dos Metalúrgicos de São Carlos.
Os encontros do VADL/MQF são desenvolvidos às terças e quintas-feiras no período da manhã (8h às
11h) e da tarde (14h às 17), de modo a atender seus/suas participantes no período do contra turno
escolar. A prática do FC passou a integrar as atividades da parceria em fevereiro de 2014 a partir de
convite feito pela associação civil Ação Educativa, entidade que no Brasil possui a chancela da
metodologia e foi uma das responsáveis pela organização do “Mundial de Fútbol Callejero” organizado
em julho de 2014. Enquanto uma prática de Educação Popular que que possui interfaces com o
lazer/ócio, salientamos que o FC que é desenvolvido pelo VADL/MQF é o objeto da presente
investigação, de maneira específica, a partir da análise dos encontros ministrados com a turma de
participantes do período da tarde. Passaremos, então, para a apresentação de nossa metodologia,
seguida pela análise dos dados e apresentação das categorias temáticas que emergiram de nosso
estudo.

Metodologia
A presente investigação está ancorada na abordagem qualitativa da Sistematização de Experiências
(Jara-Holliday, 2006). Sem embargo, procuramos possibilitar um olhar ampliado acerca de nossa práxis
investigativa buscando destacar a coerência e sinergia de nossa cosmovisão fenomenológica de
inserção no mundo-vida (Garnica, 1997; Bicudo, 2011; Merleau-Ponty, 2015). Acerca da
Sistematização de Experiências Jara-Holliday (2006) apresenta:
A sistematização é aquela interpretação crítica de uma ou várias experiências que, a partir de seu
ordenamento e reconstrução descobre ou explicita a lógica do processo vivido, os fatores que intervieram no
dito processo, como se relacionaram entre si e porque o fazem desse modo (p.24).
Este método apresenta como premissa a participação na experiência, pois, “só podem sistematizar
uma experiência aqueles que tenham tomado parte dela e que não é possível que uma pessoa
totalmente alheia à experiência pretenda sistematizá-la" (Jara-Holliday, 2006, p.74). Em observação a
este princípio básico nos inserimos junto à equipe de educadores e educadoras que compõem o
quadro pedagógico da VADL/MQF e participamos juntos ao desenvolvimento de suas atividades:
preparação dos materiais e espaços, participação nas reuniões de planejamento e avaliação do
projeto, mediação dos momentos de roda inicial e final, entre outras atividades.

2Prof.Dr. Luiz Gonçalves Junior é o coordenador do VADL e professor titular do Departamento de Educação Física e
Motricidade Humana (DEFMH) da UFSCar. O projeto teve início em 1999 e pode desenvolver suas atividades em diferentes
contextos do município de São Carlos: 1999 – Campus da UFSCar de São Carlos; 2000 – E.E.P.G. Esterina Placco; 2001 – Casa
Aberta e Centro Integrado da Criança e do Adolescente Dário Placeres Cardoso Júnior; 2002 – Estação Comunitária do Jardim
Gonzaga, local onde desenvolveu atividades até o final de 2012.

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O período de inserção e de registros que compõem a presente investigação decorrem dos encontros
desenvolvidos no período de agosto a dezembro de 2016, às terças feiras (período da tarde,
exclusivamente). Para efeito da Sistematização de Experiências os registros foram concretizados a
partir da confecção de Diários de Campo (DCs) que, de acordo com Bogdan e Biklen (1994) envolvem
registro de aspectos descritivos e reflexivos. Foram gerados e analisados 9 DCs que estão identificados
por algarismos romanos em ordem cronológica e crescente (I, II, III, IV...). Ainda em observação ao
registro da experiência, foram realizadas filmagens dos momentos de diálogo empreendidos durante
a Roda Inicial, a prática do Fútbol Callejero (1ª e 3ª Tempo), para posterior transcrição na íntegra das
falas dos/das participantes. Buscando evidenciar o processo intersubjetivo de interpretação dos dados
e falas dos/as participantes, em alguns casos compreendemos haver a necessidade de apresentar
junto a expressões ou falas desconhecidas por nós, a palavra correlata entre parênteses, contudo,
mantendo a fala original do/a participante.
Para a fase de análise e interpretação crítica dos dados, encontramos consonância entre o método
utilizado com os aportes da “redução fenomenológica” (Martins e Bicudo, 1989; Bicudo, 2011). Deste
modo, foram realizadas diversas leituras dos DCs permitindo a identificação de “unidades de
significado” (apontadas por algarismos arábicos 1, 2, 3, 4...). A cada novo diário, a identificação e
contagem era reiniciada. As unidades de significado se configurou como um momento de análise
ideográfica de autêntico movimento intersubjetivo de interpretação dos registros dos DCs que
mantinham relação direta com o objetivo central da pesquisa. Posto que, nas palavras de Martins e
Bicudo (1989):
como é impossível analisar um texto inteiro simultaneamente, torna-se necessário dividi-lo em unidades... as
unidades de significado são discriminações espontaneamente percebidas nas descrições dos sujeitos quando
o pesquisador assume uma atitude psicológica e a certeza de que o texto é um exemplo do fenômeno
pesquisado... As unidades de significado... também não estão prontas no texto. Existem somente em relação
à atitude, disposição e perspectiva do pesquisador. (p. 99)
O momento de análise ideográfica ocorre, de maneira equiprimordial e concomitante ao da análise
nomotética. Esta comunica que diferentes discursos, de um/a mesmo/a participante ou de diferentes
participantes, podem apontar para compreensões convergentes. Tal convergência possibilitou o
agrupamento das unidades de significado em categorias temáticas que buscaram sintetizar a
intencionalidade central dos discursos que as compuseram dando origem a Matriz Nomotética3.
Passaremos agora para a apresentação e descrição das categorias que emergiram durante o processo
de análise dos dados. Salientamos que todos os nomes dos/as participantes foram substituídos por
nomes fictícios, sendo mantido apenas o nome do pesquisador/autor principal deste estudo (Maurício,
educador-pesquisador).

Categoria A - Cuidado com Outrem


Esta categoria emergiu com a identificação de ações que ora foram empreendidas pelas crianças
participantes, ora pelos educadores ou educadoras do VADL/MQF, pondo em destaque aquelas que
conotam cuidado de uns-com-Outrem durante nossa convivência no projeto (DC.VI-7; 22). Em tal
contexto a expressão do cuidado pode ser expressa em apoio para com um/a participante, como
ocorreu em ocasião que o participante Everaldo citou ter vergonha de usar a piscina porque teve a
experiência de ser desrespeitado ganhando o indesejável apelido "gordinho" (DC.III-20), ou como na

3
Trata-se de um quadro contendo todas as unidades de significado que foram identificadas, bem como o
apontamento dos respectivos DCs e categoria ao qual a unidade está situada. A Matriz Nomotética está
itencionada para a apresentação de dados estatísticos, embora seja possível tal observação. Ela busca
originalmente contribuir com a visualização do movimento de convergência, ou não, entre as unidades de
significados. Não apresentamos a matriz nomotética devida a necessidade de adequação do número.

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situação na qual o participante Mauro sinalizou estar descontente com o próprio desenho que
produziu, outras crianças procuraram dar-lhe apoio:
Mauro: eu não gostei do jornalzinho. Maurício: você não gostou do jornalzinho? E porque você não gostou?
Mauro: porque eu acho que meu desenho ficou muito feio! Maurício: você achou que seu desenho ficou
muito feio? Eu não vi, quem mais viu o desenho que o Mauro fez? Roni: eu! Maurício: e o que ele fez? Roni:
fez a “escóia” (entenda-se “escola”). Maurício: uma escola? Roni: a dele né? “A nossa” (essa frase ele falou
em voz baixa, como indicando que ambos estudavam na mesma escola). Maurício: o que é que você achou
da escola que ele fez? Você achou feia? Você achou bonita? O que é que você achou? Roni: bonita. Maurício:
você achou bonita? E você Laura? Você viu o desenho que ele fez? Você achou feia, ou achou bonita? Laura:
eu achei bonita. Maurício: bonito ué! (ao dizer esta frase direcionei meu olhar para o participante Mauro,
tentando expressar que as pessoas tinha uma percepção diferente de seu desenho). Vanessa: eu vi! Maurício:
e o que você achou? Vanessa: ah, eu achei bonito Maurício: bonito? (DC.V-15)
Também chamamos a atenção para gestos de cuidado com outrem entre os pares educadores/as-
educadores/as em situações de auxílios no e para o desenvolvimento de atividades:
Comentário Maurício: O desenvolvimento da Mediação não é difícil, mas envolve alguma complexidade.
Desde a dinâmica de anotação, até a problematização dos eventos e atitudes ocorridas durante uma partida
envolve saberes e experiências pedagógicas que auxiliam no processo dialógico para o estabelecimento de
acordos e reflexão acerca das atitudes que ocorreram durante o 2º Tempo. Em sendo sua primeira mediação
a educadora Mariana requisitou meu auxílio diversas vezes. Possibilitando que eu sugerisse desde o modo de
fazer as marcações dos pontos, até o como fazer a pergunta problematizadora. De maneira geral ela “deu
conta do recado”. (DC.III-12)
A citada categoria emerge da identificação da potencialidade libertadora e inventiva que o FC lança a
seus/suas participantes, interferindo positivamente na criação de laços de convivência que apontam
para uma humanização das relações, convidando seus/suas participantes ao exercício de um constante
refletir e (re)inventar o jogo, de maneira a acolher outrem, conforme observamos nas falas de Melissa
e Roberto (12 e 13 anos, respectivamente):
Maurício: Pessoal o time sem colete. Qual regra que vocês gostariam de propor? Melissa: acho que não
excluir os menores na hora de jogar. Maurício: E aí como isso virou uma regra na hora de jogar? (...) Então a
regra é não excluir os menores. Roberto: É. Maurício: Sugerido pelo time sem colete. Como que a gente vai
fazer isso no jogo? Roberto: Tocando para eles. Melissa: Tocar para todos. (DC.VI-25)
Ao movimento de cuidado com outrem reconhecemos a busca pela transcendência (Sérgio, 1999), ou
ainda, pela superação dos fatores que condicionam, ou limitam o processo de nos tornarmos humano
e humanizar nossas relações com o mundo e com outrem ecoando em ações que implicaram em
atitudes e gestos benfazejos de uma convivência cuidadosa (DC.III-5, 6, 9; DC.VI-26), conforme
também podemos observar na fala da participante Laura (7 anos):
Maurício: Você quer sugerir regras? (perguntei para Laura). Diga Laura. Laura: Não pode dar carrinho.
Maurício: Isso, não pode dar carrinho. Mas, hoje é importante, assim como nós fizemos na última terça que
nós jogamos Callejero, falar o porquê. Porque não pode dar carrinho? Fala bem alto. Laura: Porque machuca.
(DC.III-7)
Apresentamos aqui nossas percepções acerca das atitudes e falas que conotam o cuidado com outrem.
Passaremos agora para a apresentação da próxima categoria.

Categoria B - É divertido
No movimento de inserção e engajamento junto as vivências da parceria VADL/MQF, nos permitimos
brincar junto/com a comunidade participante. Esta convivência brincante aliada a escuta atenta
possibilitou a percepção de que o FC tem possibilitado a criação de um espaço-tempo dialógico (Freire,
2003) intencionado para manifestação da alegria dos/as participantes proporcionando satisfação e
divertimento, conforme podemos observar na fala de Everaldo (11 anos):

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Everaldo: Se bater na trave vale ponto. Maurício: Se bater na trave vale ponto? Dener: Quanto? Everaldo:
Um ponto. Maurício: Um ponto. Mas por que que você quer sugerir essa regra? Everaldo: Porque é mais
divertido. (DC.III-8)
Esta asserção põe em destaque que os/as participantes ao proporem, ou ao instituírem regras no FC
puderam, intencionalmente, tornar a prática do jogo divertida, a seus gostos e interesses. Junto com
o FC, que para o participante Rodrigo possibilitou um "jogo mais equilibrado", outras experiências
(DC.V-13, 14; DC.VI-33; DC.VIII-10), também contribuíram para tornar a convivência mais alegre.
Rodrigo: Eu gostei mais do Fútbol Callejero hoje. Maurício: E porque você gostou mais? Rodrigo: Estava mais
equilibrado. Maurício: As equipes? Rodrigo: É. Maurício: Legal! Rodrigo: Também a gente caiu bastante na
areia. Maurício: Então Felix, o que o Rodrigo está dizendo, é muito importante. Às vezes a gente acha legal
porque a gente ganhou, mas o fato de estar equilibrado é que tornou pra ele o jogo legal. Não adianta você
ter uma super equipe e a outra ser fraca. A gente não tem desafio se for assim. Alguém mais quer comentar
alguma coisa? Vanessa: Hoje o dia foi legal porque eu tomei um banho de areia. E pra outras pessoas um
banho de chuva (potencialmente indicando o pessoal que estava no treino de futebol). Maurício: Porque
você tomou um banho de areia. Vanessa: E as outras... Maurício: Um banho de chuva. (DC.VI-32)
Para além dos momentos e atividades que as próprias crianças comunicaram ser divertidas e legais,
também compuseram esta categoria a momentos que registraram sorrisos (DC.III-3; DC.IV-8), ou
aplausos (DC.IV-7; DC.V-9; DC.VII-2). Estes últimos, geralmente eram solicitados mediante a
observação de uma atitude positiva expressa por algum/a participante, ou educadores/as:
Comentário Maurício: O garoto dançou de modo a não demonstrar constrangimento/vergonha. Sua dança,
anunciada como "Passinho do Romano" tinha muita movimentação com os braços, ombros, pelves e muito
rebolar do quadril em sincronia com o joelho. A dança é intencionalmente exótica, pois o pouco que conheço
de sua origem, remonta a história de um rapaz que dançava de um modo muito peculiar. Por duas vezes ele
reproduziu um movimento na qual ele tirava somente o pé direito do chão flexionando o respectivo joelho,
projetando a pelves para frente, fazendo um vai-e-vem com os braços (paralelos) à frente do corpo. Roni
finalizou sua pequena apresentação fazendo um movimento na qual ele ajoelhava no chão e projetava seu
tronco para trás, em extensão. Mauro: "Mór da hora" (entenda-se "muito legal") o Roni. Maurício: Aê... uma
salva de palmas para o Roni! (DC.VII- 11)
Percebemos, com isso, existir uma convergência e complementaridade nas dimensões éticas e
estéticas durante o movimento de formar-se para a vida, na qual “... ensinar e aprender não podem
dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria” (FREIRE, 2009, p.90). Nesse sentido,
compreendemos que durante a fruição do VADL/MQF foram possibilitadas a manifestação da
boniteza, da alegria, do sentimento de entusiasmo e de satisfação.

C - Ecologia das Motricidades


Os saberes que alicerçam esta categoria estão, como nas anteriores, em construção. Por ora, ainda
que aqui incipiente e incompleto, procurou destacar e descrever os momentos nas quais as crianças
participantes do VADL/MQF comunicaram e compartilharam seus saberes com outras crianças
participantes, bem como, com os educadores e educadora do projeto de extensão (DC.V-23; DC.VII-4).
Everaldo apresentou seus saberes e contribuiu com as reflexões que estavam emergindo ali, naquele
instante:
Everaldo: A joaninha também! Maurício: Qual? Everaldo: A joaninha come por dia 20 pulgões. Maurício:
Pulgões?! Então ela (a joaninha) é boa para planta! Você sabe o que é pulgão? Everaldo: Pulgão é aquele que
come as folhas das plantas. Maurício: Olha, uma salva de palmas pro Everaldo! É muita sabedoria num
menino só! Todas as crianças aplaudiram o Everaldo. Maurício: O pulgão é um bichinho minúsculo,
branquinho. Educadora Marisa: Nem dá pra enxergar! Maurício: E aí voltando para Minhoca, que você
chamou de minhoca... A minhoca vive geralmente debaixo da terra. Mas aí ela pode... (fiz uma breve pausa
para escolher melhor as palavras, mas fui interrompido pelo participante Roni que tentou intuir minha fala).
Roni: Saí! Maurício: Ela pode sair, mas se você... Alguns... ela vive embaixo da terra. E aí ela faz buraquinhos
na verdade. Aí ela começa a ventilar, deixar areado. E ela, de tudo o que ela se alimenta... Eu vou falar uma
palavra que é as “excretas”... Excretas é o cocô da minhoca. É chamado de húmus... Roni: Então ela come!

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Maurício: Minhoca não come o húmus. Minhoca faz cocô produzindo húmus. Mauro: Ah... Húmus é o negócio
que tem que ter para a planta nascer... (DC.VII-4)
Nas Rodas finais, quando ocorreram a avaliação das vivências desenvolvidas, eleição das vivências da
semana seguinte e distribuição do lanche, mais do que somente a troca de saberes, também
possibilitaram a afirmação daquilo que cada um ou cada uma havia ensinado para seus/suas colegas
(DC.VII-16; 17):
Maurício: Mas, eu vou aproveitar que boa parte de vocês que chegaram agora “tão” participando do Fútbol
Callejero. Então, estou aqui com o Everaldo. O Everaldo, você sabe dizer alguma coisa que você aprendeu
aqui? Everaldo: Bom, não! Maurício: Não? Everaldo: Não. Maurício: Tá! E você sabe dizer alguma coisa que
você ensinou aqui hoje? Everaldo: Sim, sobre os animais e da minhoca... Maurício: Olha, e que animais você
ensinou? Everaldo: Minhoca... (houve uma breve pausa em sua fala... e Laura interviu auxiliando o colega).
Laura: Da joaninha. Everaldo: Joaninha. Everton: Teve os microbinho? Laura: Que come as folhinhas.
Everaldo: Não, não falei sobre eles, eu falei sobre as minhocas. Maurício: Não, a joaninha come alguma coisa.
O que que é que a joaninha come? Everaldo: vinte pulgões por dia. Maurício: Vinte pulgões por dia! Até a
quantidade... (expressei espanto pela apresentação de detalhes destes saberes) ... masas, você falou de um
bicho que corre muito também. Everaldo: O guepardo. (DC.V-18)
Após uma vivência de FC o educador Roger também pode compartilhar sua experiência de
desenvolvimento desta prática junto à uma turma de estudantes do curso de Educação Física da
UFSCar:
Maurício: Agora eu acho que é interessante pra nós aqui... é... tem um colega que fez com adultos. Como
que foi você fazer lá na faculdade? Foi igual aqui? Educador Roger: foi bem diferente. Foi mais diferente em
relação a ser mais competitivo assim. A cooperação ficar muitas vezes de lado por causa da competição que
eles têm entre eles. Às vezes eles esquecem de tocar, ou quando tocam é pra mesma pessoa, porquê… Tipo,
eles vão… As pessoas aparecem (educador sinalizou com as mãos uma espécie de círculo, ou aglomeração de
pessoas, indicando certa bagunça sobre a bola), e quem não fica muito assim vai pra trás… Aí em certos
momentos eles disseram que é uma tática né? Deixar algumas pessoas na defesa. E aí eles disseram que é
uma tática né? É… Mas, eram solidários, isso depois do jogo, foram bem solidários. Respeito também:
Respeitaram as regras, e pelo tempo também que a gente tinha o jogo ficou um pouco mais difícil assim, um
pouco mais corrido. Mas, deu pra mostrar um pouquinho o que que é o futebol. Porque muitos lá não
conheciam. (DC.III-17)
Percebemos que o movimento possibilitado pela Ecologia das Motricidades é um importante elemento
para o aprendizado da valorização dos saberes de outrem, do protagonismo e da própria dialogicidade.
Aprender a dizer sua palavra é um importante elemento para a autonomia do pensar, refletir e
comunicar a própria experiência. a possibilidade de ensinar e aprender com outrem, em especial
quando feito e percebido pelas próprias crianças as crianças. Percebemos, de maneira ainda muito
incipiente, a conexão entre os saberes: Tudo está conectado a tudo, um tema se liga a outro, e estas
interconexões se mostram muito enriquecedoras para compreender a complexidade na qual tudo e
todos nos encontramos em relação.
Neste nosso movimento inicial de lançar um olhar atento e crítico para os dados coletados junto ao
contexto das práticas do VADL/MQF, pudemos identificar que a ecologia de motricidade foi
possibilitado a partir de gestos de generosidade, gentileza e solidariedade de uns-com-outrem,
apontando para a manifestação que expressam construções solidárias de convivência cuja
identificação de atitudes, gestos ou falas que nos possibilitaram intuir a ocorrência da incorporação
dos pilares-valores do Fútbol Callejero por parte das crianças participantes em diferentes momentos
da prática do VADL/MQF:
... apresentamos um possível exemplo, indicando que uma pessoa mais habilidosa poderia, em um gesto de
solidariedade, não realizar o arremesso em uma pessoa menos habilidosa quando esta estivesse próximo à
linha onde ficam posicionados/as os/as jogadores/as que irão fazer o arremesso (para queimar um/a
adversário/a). Apresentei tal possibilidade salientando que se tratava de um exemplo de solidariedade.
Diante destes nossos esclarecimentos e exemplo, foi sugerido pelo participante Everaldo. Everaldo: Quando

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

a bola estiver dentro do campo de quem está montando, poder pegá-la. Maurício: Poder pegar? Vocês topam
turma? Ronaldo: Não! (Respondeu de maneira bastante efusiva). Maurício: Porque Ronaldo? Ronaldo: Por
causa que... não pode entrar no campo que estão montando as latinhas. Maurício: Mas ele (o Everaldo) está
dizendo agora que seria um gesto solidário que a equipe de quem está montando a lata permitir que o
adversário entre (na cancha do adversário). Mas eu posso queimar o adversário? (Esta pergunta direcionada
ao Everaldo, propositor da regra) ... é só pra pegar a bola? Daí eu me afasto até a linha? Everaldo: Sim (no
sentido de que só poderia queimar o adversário somente após ultrapassar a linha). Maurício: Olha... achei
legal hein? Roni: Eu topo! (Disse o participante de maneira espontânea e com excitação, chegando a levantar
do assento da cadeira). (DC.V-4)
Por outro lado, os diálogos e identificações, por parte dos/as participantes, de gestos de solidariedade
foram os que demandaram um maior diálogo e explanação acerca de possível significação daquilo que
vem a ser o significado de solidariedade:
Maurício: Então vejam que vocês podem o tempo todo, ser solidário uns com os outros quando compartilham
saber. Uma sabedoria. Eu vou falar um exemplo de solidariedade meu: Lá na corrida dos escravos, teve
momentos que eu podia pegar alguém, eu preferi não pegar pra que outro colega pegasse. E aí essa pessoa
que tava fugindo, que era, no jogo meu adversário, foi beneficiado com isso, porque eu não peguei de
imediato. Eu acho que foi um ato solidário da minha parte. Eu não sei se as pessoas entendem desse jeito.
Comentário Maurício: Prestando melhor a atenção na construção textual desta minha fala junto às crianças,
percebo que ficou muito mais explicita uma postura cooperativa do que solidária. Embora minha
intencionalidade tenha sido devida a diferença de idade e a minha suposta maior habilidade em correr.
Quando fui expressar houve um descompasso, ficando, no momento concreto da roda final, em maior
destaque uma possível ajudar meu colega de equipe. Somente agora, no momento da escrita deste diário
percebo que minha ação aparente possibilita essas interpretações. Por algum motivo que não consigo ainda
compreender, talvez seja atenção, o participante Mauro compreendeu o “não dito, mas feito”, me deixando
mais tranquilo. Mauro: Ah... entendi, você não pegou ele porque você era mais habilidoso do que ele, e
deixou outro pegá. Maurício: Muito bem Mauro. É isso aí! (DC.VII-22)
A incorporação da solidariedade, respeito e cooperação encontra ressonância com os anúncios e
intentos da pedagogia dialógica. Ambas sugerem a necessidade e importância de cada um dizer a sua
palavra para defender seus direitos e interesses e, com isso, transformando a realidade concreta.

Considerações

Em nosso movimento de investigação buscamos identificar e compreender os processos educativos


que emergem da práxis do Fútbol Callejero (FC) que é desenvolvido no contexto da parceria do
VADL/MQF. Neste movimento destacamos três categorias que apontam para tais processos. Assim, ao
desvelar o “Cuidado com outrem” (Categoria - A), compreendemos que a práxis do FC possibilita que
a dimensão competitiva não sobreponha a necessidade de uma convivência solidária e cuidadosa com
outrem, contrapondo-se, desta forma, com a exacerbada perspectiva competitiva muito presente no
contexto do esporte e demais espaços-tempos da sociedade.
Também foi possível compreender que jogar “É Divertido” (Categoria - B). Todavia a diversão não se
manifesta imanente ao jogo, ela é uma busca construída intencionalmente desde a proposição de
regras. Ou seja: a diversão, a satisfação se faz com esperançar, que em medida alguma significou
espera, mas sim, uma busca ativa exigindo participação e construção de ações para que a alegria e
satisfação se concretize.
Outro processo educativo identificado aponta para ao que chamamos de “Ecologia das Motricidades”
(Categoria – C). Nesta ganhou relevo a possibilidade de atitudes solidárias estarem extrapolando a
prática do FC. Neste primeiro movimento de investigação, compreendendo a intencionalidade
educativa do VADL/MQF, compreendemos que a dinâmica de desenvolvimento da metodologia do FC
incrementou a práxis dialógica que já vem balizando o desenvolvimento das atividades da parceria
desde a sua concepção. Com isso, nos pareceu intensificar processos de troca de saberes oriundos de

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

diferentes fontes que as crianças e adolescentes procuraram sinalizar. Mais do que estratégia
pedagógica para conhecer os mundos-vidas dos participantes, que por si só é muito valiosa, esta
categoria sinaliza para a necessidade do cuidado de garantir/construir intencionalmente e
sistematicamente espaços de para a fala e para a escuta atenta dos/as participantes. Tal ação traduz,
com autenticidade a valorização dos saberes que as crianças e adolescentes comunicam, permitindo
aprendizagens em horizontalidade.
Ao oportunizar que os/as participantes criem regras, que avaliem a qualidade das relações que
estabeleceram uns-com-outrem (3º tempo) durante o tempo de bola rolando (2º tempo) e que a
qualidade da convivência interfira no resultado final da partida, tudo isso a partir de uma perspectiva
de corresponsabilidade na medida em que propõe para seus/suas participantes o desafio de a um só
tempo, na integralidade inerente à condição de ser humano (Sérgio 1999), jogar e olhar para condição
de co-implicação no mundo (Merleau-Ponty, 2015), o FC vivenciado no contexto das ações do
VADL/MQF tem possibilitado à toda gente participante compreender a importância da alteridade, de
pensar coletivamente para a construção de um jogo que seja desafiador, divertido, cooperativo e
solidário para todos e todas. Consideramos, com isso, que o FC não deve ser visto apenas como um
jogo: trata-se de movimento intencional para ser mais (Freire, 2003), para transcender! Uma potente
oportunidade de aprendermos sobre nossa condição de entrelaçamento com o mundo e com outrem,
uma autêntica práxis de educação libertadora.

Referências

Bicudo, M. A. V. (Org.) (2011). Pesquisa qualitativa segundo a visão fenomenológica. São Paulo: Cortez.
Bogdan, R. & Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos
métodos. Porto: Porto Editora.
Freire, P. (2003). Pedagogia do oprimido. 36ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Freire, P. (2009). Pedagogia da autonomia. 40ª ed. São Paulo: Paz e Terra.
Garnica, A. V. M. (1997). Algumas notas sobre pesquisa qualitativa e fenomenologia. Interface:
Comunicação, saúde, educação, 1(1), 109-122.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-32831997000200008.
Jara-Holliday. O. (2006). Para sistematizar experiências. 2ªed. Brasília: MMA.
Martins, J.; Bicudo, M. A. V. (1989). A pesquisa qualitativa em psicologia: fundamentos e recursos
básicos. São Paulo: Moraes.
Merleau-Ponty, M. (2015). Fenomenologia da percepção. 4ªed. São Paulo: Martins Fontes.
Rossini, L.; Serrani, E.; Welbel, M.; Wainfeld. (2012). Fútbol Callejero: Juventud, liderazgo y
participación: Trayectorias juveniles en organizaciones sociales de América Latina. Ciudad
Autónoma de Buenos Aires: FUDE.
Sánchez, L.; Salermo, J. (2012). El fútbol callejero, un deporte inclusive en Chos Malal, Provincia del
Nelquén. EFDeportes.com. Buenos Aires, 17(175), 1-7. Disponível em
http://www.efdeportes.com/efd175/el-futbol-callejero-en-chos-malal.htm.
Sérgio, M. (1999). O sentido e a acção. Lisboa: Instituto Piaget.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A Produção Do Conhecimento Em Educação Matemática Em


Grupos De Pesquisa: Uma Abordagem Qualitativa Fenomenológica

1 2
Anderson Afonso da Silva , Maria Aparecida Viggiani Bicudo

1 Departamento de Educação Matemática da UNESP/Rio Claro, Brasil. mariabicudo@gmail.com


2 Departamento de Educação Matemática da UNESP/Rio Claro, Brasil. anderafonso2@gmail.com

Resumo. Neste artigo apresentamos procedimentos e concepções da pesquisa fenomenológica, trazendo


como objeto de análise os modos de produção do conhecimento em Educação Matemática entre membros
de grupos de pesquisa. A metodologia assumida para a realização da investigação foi a da Pesquisa
Qualitativa Fenomenológica, percorrendo o caminho em busca do sentido do fenômeno estudado, qual
seja, a produção do conhecimento em Educação Matemática em grupos de pesquisa, e, também do
entendimento de nós mesmos, abrindo, assim, possibilidades de compreender o próprio ser humano. Nesse
caminhar fomos orientados pela interrogação como se dá a produção do conhecimento de educação
matemática em grupos de pesquisa? Para darmos conta dessa interrogação, estudamos textos de autores
da área da Educação Matemática e da Filosofia que tratam dos temas relacionados à produção de
conhecimento em um coletivo ou na comunidade e ouvimos coordenadores de grupos de pesquisa que
trabalham na área da Educação Matemática.
Palavras-chave: Educação Matemática. Filosofia da Educação Matemática. Antropologia Filosófica.
Fenomenologia. Grupos de Pesquisa.

The production of knowledge in mathmatics education research groups: a phenomenological qualitative


approach
Abstract. In this article we present the procedure and conceptions of the phenomenological research,
tracing as an object of analysis the modes of knowledge production in Mathematics among the members of
research groups.The methodology assumed to carry out the research was the Phenomenological
Qualitative Research, walking the path in search of the meaning of the phenomenon studied and also the
understanding of ourselves, thereby opening up possibilities to understand the human being. In this walk
we were guided by the question “how is the production of Mathematics Education knowledge in research
groups?”. To achieve this question we had studied texts of authors belonging to the area of Mathematics
Education and to the area of Philosophy, dealing with issues related to the production of knowledge in a
collective or in a community and we had heard coordinators of research groups working in the field of
Mathematics Education. We interviewed ten researchers leading research groups established in Brazil for
more than ten years, who have already guided doctoral students.
Keywords: Mathematics Education. Philosophy of Mathematics Education. Philosophical Anthropology.
Phenomenology. Research groups.

1 Introdução

Neste texto referimo-nos à produção do conhecimento como processo pelo qual o conhecimento é
constituído e, ao ser expresso e compartilhado pelos sujeitos e cossujeitos que convivem em uma
comunidade, torna-se um bem comum, posto à disposição de práticas vivenciadas no cotidiano de todos
em conjunto e de cada um, individualmente. Com isso queremos deixar claro que, embora o
conhecimento possa sim se tornar um bem de consumo e ter um valor econômico, nosso foco incide
sobre o modo pelo qual ele vai sendo gerado ao se estar com o outro em grupos de pesquisa. Para isso
nos voltamos a autores que se dedicam à Filosofia Antropológica. Entendemos que nesse campo as

876
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

questões sobre a formação ou a constituição da pessoa, da comunidade e da sociedade são estudadas


de modo aprofundado, possibilitando que se compreendam, de maneira ampla, as exposições trazidas
pelos autores de Educação Matemática sobre pesquisas efetuadas em grupo, em um coletivo, formado
pelos membros do grupo de pesquisa, em princípio.
A investigação foi realizada na perspectiva de autores fenomenólogos. A postura fenomenológica é
assumida por entendermos que nossa preocupação se coloca em como compreender o modo pelo qual
a produção do conhecimento se dá para a pessoa, olhada em sua individualidade, e para a comunidade.
Percebemos que não nos aquietávamos com explicações que assumiam as características da
objetividade - da sociedade, por exemplo - e da subjetividade - do indivíduo, por exemplo - como já
postas em estudos que tratam da construção do conhecimento. Vimos ser preciso compreender a
própria constituição da pessoa que, sem perder sua singularidade ao estar em uma associação junto a
outras pessoas, produz conhecimento. À medida que fomos entrando em contato com trabalhos de
autores fenomenólogos, deparamo-nos em seus escritos explicitações disso que buscávamos e que,
para nós, foram fazendo sentido.
Entendemos que a investigação sobre a produção do conhecimento em grupos de pesquisa, solicita
iniciar pelo modo de viver cotidianamente das pessoas, quando de imediato se percebe um jogo entre a
individualidade e o coletivo, ou seja, como se costuma ingenuamente falar, o da oposição entre pessoa
e sociedade. Isso porque compreendemos que na constituição do conhecimento os entrelaçamentos da
sensação, percepção, cognição e atos julgadores se impõem junto aos modos de o indivíduo estar - com
os outros, constituindo e produzindo conhecimento.
Adentrando pelo caminho investigativo no entorno da pessoa e das suas diferentes formas de
associação no estar–com–o-outro no mundo, entendemos que para realizar a explicitação da produção
do conhecimento que, conforme compreendemos, se constitui nos modos de proceder e de entrelaçar
momentos da vida envolvendo a pessoa em diferentes comunidades, necessitamos ir em direção ao
aprofundamento de explicitações antropológicas sobre o fenômeno pessoa. Com este estudo, fazendo
um movimento de maior aprofundamento ainda, enfatizamos a importância de dois aspectos da vida
cotidiana: o da individualidade e o coletivo, isto é, a singularidade da pessoa expressa também na
dimensão de sua subjetividade e o da intersubjetividade que está nas raízes do coletivo.
A estrutura da pessoa segundo uma perspectiva fenomenológica foi aprofundada nos estudos de obras
de Edith Stein, que expõe sua compreensão sobre as características dos seres humanos, constituída por
um entrelaçamento composto pelo corpo vivente, os atos de reação e de impulso e a capacidade
reflexiva, expressada pela palavra alemã Geisten. Ainda, sabemos que o corpo, a psique e o espírito se
manifestam pelas vivências humanas, ou seja, não são separados delas, sendo, portanto, carnais. A
interpretação fenomenológica sobre o corpo vivente abrange o espírito, isto é, a capacidade reflexiva,
pois, como salientado nas obras husserlianas, todos os seres humanos vivenciam experiências e delas
podem se dar conta.
Visando a uma abertura de perspectivas sobre os modos de produção do conhecimento em Educação
Matemática em grupos de pesquisas, realizamos estudos de trabalhos de autores que atuam nessa área
e que tratam desse tema, buscando compreender como eles se expressam sobre as características dos
modos de realizarem-se pesquisas efetuadas em um coletivo. Sendo assim, esta investigação
apresentou como objetivo compreender os modos pelos quais se dão a produção do conhecimento em
Educação Matemática entre membros de grupos de pesquisa em programas de Pós-Graduação, que se
dedicam aos estudos dessa área. Para tanto, fizemos uma incursão na literatura à disposição na
comunidade desses pesquisadores, onde também nos inserimos, destacando os autores que são mais
visíveis, por serem mais citados em estudos que fazem referência a esse assunto. O lido e interpretado
dos textos dos autores estudados não foi tomado como um a priori para a análise dos discursos obtidos
nas entrevistas que serão descritas, mas foi tomado tão somente como perspectivas em que o

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fenômeno foi a nós se mostrando. A perspectiva de que olhamos para as falas de nossos sujeitos
significativos é a de destacar suas vivências no interior dos grupos que coordenam.

2 Assumindo uma postura fenomenológica em pesquisa qualitativa

O entendimento de fenomenologia exposto na Introdução deste artigo sustenta a investigação que


realizamos a respeito de como se dá a produção do conhecimento em grupos de pesquisa em educação
matemática. Esse como diz do modo pelo qual os pesquisadores, que trabalham em grupo, percebem-se
e ao grupo, produzindo conhecimento em Educação Matemática.
A compreensão do próprio movimento de conhecer focado em estudos de Husserl solicita a referência à
análise das estruturas intencionais da consciência, por ele entendida como fonte doadora originária de
sentido, isto é, como fonte de significado para o mundo; ou seja, os atos da consciência geram o
fazimento de sentido às coisas mundanas. Consciência entendida como um movimento, como um fluxo
que enlaça o intencionado e que o traz para si.
As vivências são registradas pela capacidade de dar-nos conta dos sentidos. O percebido apresenta-se
como resultado da percepção e esse dar-se conta é a consciência1 de algo, por exemplo, a consciência
de tocar alguma coisa. Essas sensações são vivências registradas pelos sujeitos que delas podem tomar
ciência. Assim, a consciência significa que podemos, enquanto tocamos e/ou olhamos para um
determinado objeto, darmo-nos conta do tocar e/ou olhar. Ou seja, a consciência é a dimensão que nos
possibilita darmo-nos conta de estar vivenciando alguma atividade.
Darmo-nos conta de é um ato crucial para que se possa realizar pesquisa qualitativa segundo um
enfoque fenomenológico. Isso porque este ato diz da reflexão, do voltar-se sobre o percebido na
dialética do perceber-percebido ou do ver-visto ou da noesis-noema. O ato de perceber é um
movimento que nos põe em contato com as coisas desse mundo e que abre possibilidades de sentir e de
expressar, de constituir e compreender o significado das coisas que estão em nosso campo de
percepção.
A percepção ocorre no movimento do correlato ver-visto, que, de acordo com Husserl2, é a síntese
noesis-noema, ou seja, do ato do sujeito que percebe e o percebido, sendo sujeito e objeto
compreendidos como constitutivamente ligados. A percepção acontece no agora da realização do
próprio ato de perceber. O percebido é deslocado para o fluxo da lembrança, podendo ser elaborado
em atos da consciência, de maneira que se vá processando a compreensão e a interpretação, articuladas
e passíveis de serem expressas em linguagem. Sendo assim, apenas se pode falar do par percepção-
percebido mediante a descrição disso que foi percebido e elaborado intencionalmente, solicitando que
a descrição do que se mostrou seja analisada e interpretada, atentando-se para a ambiguidade própria
da linguagem pela qual é exposta, dada a densidade de sentidos que ela transporta.
Com esse entendimento, caminhamos para ouvir nossos sujeitos significativos a respeito de suas
compreensões sobre a constituição, manutenção e permanência do grupo de pesquisa do qual
participam. O relato expresso pelos sujeitos significativos diz das vivências de que se dão conta, ou seja,
das quais têm consciência.
Desse modo colocamo-nos em busca de indícios dessa produtividade e por quem a realiza. Para chegar
até esses grupos de pesquisa, balizamo-nos a partir da institucionalização desses junto ao diretório de
grupos de pesquisa do CNPq. Mediante essa busca detectamos e pré-selecionamos 438 grupos que
dizem, a partir das descrições cadastradas nesta plataforma, realizar investigações no âmbito da

1 ALES BELLO, 2006, p. 31.


2 Cf. Husserl, 1980.

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Educação Matemática. Tendo em vista a intenção da pesquisa explicitada em sua interrogação,


perguntamo-nos desse universo quais seriam os sujeitos significativos para contribuir com esta
investigação. Desse modo, focamos nos grupos de pesquisa que possuíam um tempo vivido superior a
dez anos e que já apresentavam trabalhos com orientações de mestrado e de doutorado finalizadas.
Sendo assim, foram pré-selecionados 24 sujeitos significativos e obtivemos resposta favorável dos
seguintes pesquisadores: Dario Fiorentini (UNICAMP3); Célia Maria Carolino Pires (PUC-SP4); Marcelo de
Carvalho Borba (UNESP5); Claudia Lisete Oliveira Groenwald (ULBRA6); Bernadete Barbosa Morey
(UFRN7); Antonio Roazzi (UFPE8); Maria Tereza Carneiro Soarez (UFPR9); Siobhan Victoria Healy
(Bandeirantes10); Lourdes de la Rosa Onuchic (UNESP); Sérgio Roberto Nobre (UNESP).
Assim, foram realizadas dez entrevistas com os pesquisadores supracitados. Nessas entrevistas focamos
os relatos dos entrevistados, refletidos sobre os seus dar-se conta de se perceberem, em suas
lembranças, agindo em seus grupos de pesquisa, expressos em seus depoimentos pela linguagem falada
e gravada.
O movimento fenomenológico de buscar pelos sentidos e significados do dito que transcende o
individual e avança, buscando por núcleos de ideias que entrelaçam, em todos mais abrangentes,
aqueles sentidos e significados. A transcendência do individual é crucial no processo investigativo, pois é
nesse movimento que a teorização sobre o investigado pode se dar.

3 O movimento de análise das entrevistas

Uma vez constituídos os dados da pesquisa, mediante a realização de dez entrevistas, iniciamos o
movimento de tratamento desses dez relatos do dito pelos sujeitos significativos. O primeiro passo, a
transcrição, foi realizado da gravação em áudio das entrevistas. Mediante esse procedimento,
obtivemos um texto que expõe o discurso de cada entrevistado, tendo-se obtido, desse modo, dez
textos escritos. Estes textos foram os relatos analisados e interpretados.
O movimento de análise envolveu dois momentos distintos: um da análise ideográfica, e outro da
análise nomotética. O primeiro, da análise ideográfica tem por meta esclarecer os sentidos e
significados presentes nos discursos dos depoentes, entendidos como individuais no todo das
entrevistas realizadas. O texto da entrevista é trazido em sua totalidade, porém já com destaques das
Unidades de Sentido (US) que expressam o sentido que o dito pelo entrevistado faz para o pesquisador,
tomando como princípio orientador a pergunta. Elas são apresentadas na linguagem do depoente. Das
unidades de sentido são destacadas passagens entendidas importantes para abertura da compreensão
do sentido, avançando no movimento de compreensão de significados; bem como com a explicitação do
respectivo enxerto hermenêutico, que é a interpretação do dito pelo depoente, à luz da totalidade do
texto obtido com a transcrição da entrevista, com o significado explicitado no ambiente de pesquisa em
Educação Matemática sobre o tema, com explicitação da polissemia de palavras passíveis de destaques
pela sua importância no texto; das unidades de significado (USg) que são as unidades de sentido escrita
na linguagem do pesquisador, incluindo a compreensão possibilitada pela análise hermenêutica; e do o

3 Universidade Estadual de Campinas


4 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
5 Universidade Estadual Paulista
6 Universidade Luterana do Brasil
7 Universidade Federal do Rio Grande do Norte
8 Universidade Federal de Pernambuco
9 Universidade Federal do Paraná
10 Universidade Bandeirantes Anhanguera

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

que é dito que expressa uma articulação dos sentidos e dos significados compreendidos pelo
pesquisador trazida na mensagem da unidade de significado.
Durante a análise realizada pelos pesquisadores, foram efetuadas as interpretações de cada unidade de
significado; essa ação foi realizada a partir da linguagem explicitada pelos sujeitos. Sempre que sentem
necessidade, os pesquisadores voltam e relêem toda a entrevista, visando à compreensão do dito. As
unidades de significado são consideradas as lentes direcionadoras que dizem da compreensão das
experiências vivenciadas pelos sujeitos significativos.
Os quadros ideográficos, como exposto a seguir, são entendidos como organizadores do texto analisado,
e nos auxiliou na exposição de passagens significativas do dito. Neste trecho, é exposto parte do relato
da entrevista realizada com o pesquisador Dario Fiorentini (DF).

Unidades de DF: [...] do desenvolvimento profissional da pesquisa do professor sobre a própria prática e a
sentido identidade docente e a profissionalidade docente são aspectos que vão se desdobrando e
que vão ganhando mais força dentro desse grupo de pesquisa. Alguns contextos de prática
formativa ou de desenvolvimento profissional vão sendo intuídos. Os grupos colaborativos,
por exemplo, ganharam destaque sobretudo no final, durante a primeira década do ano
2000 até 2009 foi muito forte, então o grupo queria compreender como acontece a
aprendizagem docente e o desenvolvimento profissional nesse contexto de grupos
colaborativos, com o que essa colaboração de fato contribui para o desenvolvimento
profissional, para a formação do professor e para a transformação da maioria das práticas. É
um grupo colaborativo mais voltado à escola, então, em que sentido esses grupos fazem
transformações das práticas escolares, do currículo escolar e qual a relação disso com o
próprio processo de constituição do professor.
Enxerto Identidade: segundo o dicionário Houaiss (2001), refere-se ao estado do que não muda, do
Hermenêutico que fica sempre igual. Refere-se, no contexto da entrevista, às características do grupo de
pesquisa. Grupos colaborativos: refere-se à caraterística do grupo, de modo que todas as
ações que envolvem as articulações do grupo sejam constituídas coletivamente, em uma
relação de igualdade entre os pesquisadores participantes.
Unidades de DF7: Segundo o depoente, os aspectos desenvolvimento profissional da pesquisa do
significado professor sobre a própria prática e a identidade e a profissionalidade docente foram se
desdobrando e ganharam força dentro do grupo de pesquisa. Alguns contextos de prática
formativa ou de desenvolvimento profissional foram sendo intuídos. Os grupos
colaborativos, por exemplo, ganharam destaque durante a primeira década do ano 2000, em
que o grupo almejou a compreensão de como a aprendizagem docente e do
desenvolvimento profissional acontecia no contexto de grupos colaborativos e em que
sentido esses grupos fazem transformações nas práticas escolares, do currículo escolar e a
relação disso com o próprio processo de constituição do professor.
O que é dito CDDF7: Das características de investigação do grupo de pesquisa.

Finalizada a análise ideográfica, adentramos o movimento de transcender os dados, caminhando em


direção a articular ideias que abrangem as compreensões do dito pelo pesquisador, mediante reduções
sucessivas que conduzem às articulações, cada vez mais abrangentes, evidenciando o movimento que
vai do individual ao geral, ou seja, da análise ideográfica para a nomotética. Fenomenologicamente, essa
transcendência do individual se dá por meio das compreensões realizadas, em que os pesquisadores se
atentam às convergências e divergências de sentido e significados articulados, avançando em direção à
compreensão e exposição dessas articulações pela linguagem.
Nesta etapa de movimento investigativo, caminhamos procedendo a um pensar que realiza teorização,
na medida em que entrelaçamos as falas dos depoentes, as ideias abrangentes, as ideias nucleares e as
nossas compreensões dos estudos realizados.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

As Ideias Nucleares foram organizadas e assim expostas:


1) Trabalho em Grupo;
2) O movimento de ser do grupo de pesquisa: constituição, permanência e modificação;
3) Geração da temática;
4) e Produção e autoria das investigações
Compreendemos que assim podemos expor o movimento do modo de ser dos grupos, o de como foram
constituídos, o de como permaneceram e se modificaram no decorrer do tempo; da geração da
temática de pesquisa que se mostrou como uma ação complexa e que se realiza de maneiras diferentes
nos diversos grupos; da própria vida do grupo produzindo de diferentes modos e com diferentes
arranjos os temas investigados.
Na interpretação dessas convergências, apresentamos articulações a respeito de compreensões sobre a
produção de conhecimento em Educação Matemática, trazendo para esse movimento de articulação
um diálogo entre estudos da antropologia filosófica, trabalhos de autores significativos sobre esse tema
e depoimentos dos entrevistados, orientado pela interrogação que norteou a investigação.

4 Interpretando as ideias nucleares

Caminhamos, desse modo, em direção a articular ideias que abrangem sentidos e significados mediante
reduções sucessivas que conduzem as articulações realizadas pelo pesquisador cada vez mais
abrangentes, evidenciando o movimento que vai do individual ao geral em que se buscam as
características essenciais do fenômeno, assim, a análise de uma entrevista realizada foi constituída por
três movimentos de redução, que destacaram quatro núcleos de ideias abrangentes.
A primeira Ideia Nuclear nos permitiu compreender o Trabalho em Grupo como um modo de os
pesquisadores darem conta de seu sentimento de solidão, ou seja, de não terem com quem dialogar
sobre suas ideias, leituras e projetos. Em sua gênese há uma disponibilidade solidária para com o outro,
escolhido entre os profissionais de sua área, em virtude da proximidade de interesses por temas a
serem pesquisados. Instala-se uma disposição explícita de abrir espaço para que os membros do grupo
compartilhem experiências entre si. De uma discussão consequente acabam por se efetivar
esclarecimentos metodológicos e realizados aprofundamentos teórico de temas estudados. Essa
disponibilidade solidária conduz à aprendizagem de ouvir o outro, de atentar para as tendências das
questões e de conseguir organizar o trabalho a ser realizado pelo grupo.
O movimento de ser do grupo de pesquisa: constituição, permanência e modificação, a segunda Ideia
Nuclear, evidencia as características existentes entre os membros constituintes dos grupos de pesquisas
cujos coordenadores foram entrevistados, e também, o movimento de ser dos grupos, como foram
constituídos, como permaneceram e se modificaram no decorrer do tempo. Compreendemos que criar
um grupo de pesquisa exige liderança para reunir pessoas e para intuir questões abrangentes e
importantes que possam unir os diferentes em torno de estudos e de discussões de determinados
assuntos, mas, ao mesmo tempo, permitir que haja liberdade de as pessoas se exporem em sua
singularidade. Essa liderança se mostra no modo de condução dos trabalhos, na pré-visão do que é
preciso fazer para que o grupo não se cristalize, mas percorra seu trajeto que vai se impondo pela
dinâmica de sua vida. Esta é realizada pela entrada de novos membros, pela saída de antigos ou pela sua
manutenção. Neste último caso, modificando sua posição no grupo. Essa dinâmica também se dá pela
modificação de interesses, pela expansão de fronteiras, pelo acolhimento de outros grupos. Mostra-se,
principalmente, na convivência com profissionais do mesmo porte, acolhendo sugestões, modificando
modos de proceder e, mais do que isso, de estar-com-o-outro visto como igual, pois profissional em
movimento de produzir. Assumir o outro como igual não quer dizer que todos realizem a mesma tarefa

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

ou, se a realizarem, compreendam o que fazem do mesmo modo. O grupo de pesquisa se impõe pelo
seu perfil que se delineia na sua historicidade.
A terceira Ideia Nuclear, a geração da temática dos grupos de pesquisa, se mostrou sendo uma ação
complexa e que se realiza de maneiras diferentes, delineada pelo modo de proceder do coordenador
junto ao grupo e pela própria vida do grupo. Dá-se no fluxo das realizações do próprio grupo, em que os
diferentes membros estão uns com os outros de modo solidário e responsável, trabalhando de modo
coletivo. Entretanto a intuição do tema que articula as diferentes investigações e atividades do grupo, e
que se mostra suficientemente forte para manter o grupo sendo, é uma ação complexa que não se deixa
expor de modo linear e que não se aprisiona em paradigmas previamente delineados. A materialização
dessa intuição em projetos é um dos modos pelos quais o líder exerce sua liderança. Não se trata de
uma atividade imposta em decorrência de posição assumida, mas ela se dá no movimento do pensar
responsável daqueles para quem o grupo é vivenciado como importante e como um projeto de vida
profissional.
A quarta Ideia Nuclear, a produção do grupo de pesquisa é destacada de diferentes modos e com
diferentes arranjos, interpretando os depoimentos dos líderes dos grupos analisados. Compreendemos
que nos grupos de pesquisa a produção é gerada no interior de sua comunidade, uma vez que seus
membros estão uns com os outros em um ambiente de solidariedade, de respeito e em que há
liberdade de escolha da pessoa por estar ou não ali. Entretanto, esse estar junto tem em vista a
disposição para estudar e produzir em torno de temas comuns ao grupo. Dada à vivência dos valores
que subjazem à prática dos grupos de pesquisa, há colaboração mútua entre seus componentes, bem
como, estudos, debates, análise de textos escritos por eles próprios, evidenciando uma produção
coletiva. Contudo, mesmo sendo coletiva essa produção do/a, dos/as autor/es, autora/s são específicos.
Muitas vezes apenas um nome aparece como do/a responsável pela produção, como é o caso de
dissertações e teses, por exemplo; em artigos, um, dois, três autor/a, autores/as, conforme o caso. No
interior do grupo as escolhas dos/das autores/autoras, ainda que sejam realizadas de modo diverso,
incidem sobre as pessoas que mais presentes estiveram em relação à determinada produção, quase que
a assumindo como líder responsável.

5 Conclusões

Neste texto, buscamos apresentar o modo de conduzir a pesquisa em Educação Matemática segundo a
abordagem fenomenológica. Entendemos que o movimento de análise e tematização das Ideias
Nucleares nos possibilitou responder nossa pergunta de pesquisa. A complexidade da temática
investigativa exposta no desenvolvimento da pesquisa faz com que essa resposta seja anunciada
também em um movimento constituído por diferentes aspectos significativos que, como
compreendemos, dizem de como se dão os modos de produção do conhecimento em Educação
Matemática em grupos de pesquisa. Assim, entendemos que a produção do conhecimento em Educação
Matemática em Grupos de Pesquisa se dá:
 na comunidade dando sustentabilidade à vida de um grupo de pesquisa;
 com o grupo se delineando como tal antes de ser comunidade;
 na solidariedade entre os membros do grupo;
 no coletivo, quando a intencionalidade é dirigida a um tema ou a um interesse
específico;
 de modo coletivo ao estudar, apresentar, discutir e investigar temas;
 na presença de pesquisadores e alunos, ex-alunos e outros externos ao grupo;

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

 e na institucionalização do grupo e na produção do conhecimento do grupo como


uma escola de formação de pesquisadores.

Compreendemos que a produção do conhecimento é gerada em um movimento complexo que envolve


todas as ações do grupo de pesquisa, envolvendo com isso todos seus membros constituintes. Ainda,
que singularmente, cada membro desenvolva ações particulares, essas são diretamente ligadas à força
que conduz o grupo ativo, produzindo. De modo que exista no grupo um ambiente acolhedor, que
respeite a liberdade individual e propicie ajuda solidária reciproca entre os membros, que estão juntos
pelo desejo e disposição em estudar, debater e produzir em torno das temáticas comuns ao grupo.
Dada a vivência dos valores que subjazem a vivência investigativa do grupo de pesquisa, entendemos
existir uma colaboração mútua entre seus membros, bem como, a realização de grupos de estudos,
debates, análise de textos escritos por eles próprios, evidenciando um movimento constitutivo da
produção coletiva. Entretanto, mesmo existindo esse movimento de produção coletiva do grupo, a
publicação, produto desse movimento é apresentada em nome de autores específicos. Em muitos casos
apenas o nome de um autor especifico aparece como responsável pela produto publicado, como é o
caso de dissertações e teses, por exemplo. No grupo, durante o movimento investigativo, as escolhas
pelos autores acontecem, de modo diversos, incidindo sobre aqueles pesquisadores que mais estiveram
presente em relação a determinada produção, assumindo uma postura de líder responsável pelo
trabalho.
Esse aspecto é relevante, pois vem ao encontro de nossa interrogação: se é produzido em grupo, não é
o grupo o autor do produto? Entendemos que sim é e, ao mesmo tempo, não é. Não se trata de uma
contradição, mas da complexidade do coletivo e do individual, ou seja, da comunidade e da
subjetividade. Está-se sempre com o outro, sendo-se. Está-se no grupo, produzindo o conhecimento
coletivamente, de modo colaborativo, pois solidário. Porém, a força do tema que traz o grupo unido,
também se sustenta pela força das questões das pessoas entendidas em sua singularidade e pelo modo
de elas serem e se posicionarem em relação à dinâmica e à estrutura do grupo, responsavelmente. Essas
singularidades se materializam em projetos específicos ligados ao interesse de todos e em produtos que
apresentam compreensões e teorizações diversas, sobre um mesmo assunto.

Referências

Ales, B. A. (2006). Introdução à Fenomenologia. Trad. Ir. Jacinta T. G. e Miguel M. Bauru: Edusc.

Bicudo, M. A. V. (2014). Meta-análise: seu significado para a pesquisa qualitativa. REVEMAT: revista
eletrônica de educação matemática. v. 9, n 1, 7-20.

Bicudo, M. A. V. Pesquisa qualitativa segundo a visão fenomenológica. São Paulo: Cortez, 2011.

HUSSERL, E. Investigações lógicas: sexta investigação: elementos de uma elucidação fenomenológica


do conhecimento. Tradução de Z. Loparic e A. M. Campos Loparic. São Paulo: ed. abril cultural,
1980.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

O proceso de emancipação humana e o PROEJA

1
Adriana de Almeida

1
Departamento de Educação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro; adryanaalmeida@gmail.com.

Resumo. Este artigo problematiza os vínculos estabelecidos entre os Cursos Técnicos do PROEJA e o
processo de emancipação humana. O objetivo da pesquisa foi problematizar como os jovens e adultos
compreendem o processo formativo e como se apropriam da prática pedagógica relacionando-a com a
emancipação humana. Notou-se tanto nas entrevistas como nos grupos focais que a associação entre
educação e emancipação é recorrente nos discursos e, frequentemente, vem articulado às metodologias
utilizadas pela escola e pelos professores. A metodologia de natureza qualitativa priorizou a análise das
reflexões coletivas dos sujeitos. Para a coleta de dados foram realizadas entrevistas e grupo focal. Concluiu-
se que apesar de transformações individuais significativas na vida dos sujeitos, o PROEJA não conseguiu
garantir que as forças individuais se tornassem forças sociais e políticas tanto para a emancipação humana
como para a educação integral.
Palabras clave: Adultos. Curso técnico. Emancipação humana. Jovens. PROEJA.
The process of human emancipation and PROEJA
Abstract. This article problematizes the established links between the PROEJA Technical Courses and the
process of human emancipation. The objective of the research was to problematize how young people and
adults understand the formative process and how they appropriate pedagogical practice and relate it to
human emancipation. It was noted in both interviews and focus groups that the association between
education and emancipation is recurrent in discourses and often articulates with the methodologies used by
the school and teachers. The methodology is qualitative in nature, prioritizing the collective analysis of the
subjects. For data collection, interviews and focus group were carried out. It was concluded that despite
significant individual transformations in the subjects' lives, PROEJA failed to ensure that individual forces
became social and political forces for both human emancipation and integral education.
Keywords: Adults. Technical course. Human emancipation. Young. PROEJA.

1 Introdução

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Brasileira (LDB) n.º 9394/96 veio atender às
necessidades formativas do contexto de um mundo configurado em novas necessidades de vida e de
trabalho. A educação profissional e a educação de jovens e adultos, orientadas por interesses
econômicos e políticos, em 1990, passaram por reformas que modificaram os princípios e a estrutura
destas modalidades de ensino.
A integração do Ensino Médio e da Educação Profissional em nível médio, uma opção no âmbito do
Decreto n.° 5.154/04, incorporado à LDB n.º 9.394/96 pela Lei n.º 11.741 de 16 de julho de 2008,
retoma o desafio de se construir uma articulação orgânica entre trabalho como princípio educativo e
a ciência como criação/ recriação pela humanidade de sua natureza e cultura, como síntese de toda
produção e relação dos seres humanos com seu meio (FRIGOTTO, CIAVATTA, RAMOS, 2005). Para
integrar dimensões que historicamente sempre estiveram separadas - conhecimento científico e
conhecimento técnico -, é necessária uma reflexão sobre a representatividade da política
educacional e do lugar ocupado por essas modalidades de ensino, cada uma a sua vez, na formação
do trabalhador. Portanto, envolve um conjunto de situações desafiadoras que exigem cuidados
especiais em relação à metodologia e organização teórica, estrutural e temporal do currículo, uma

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

vez que muitas escolas apresentam uma limitada estrutura, tanto em termos de recursos humanos
quanto físicos.
O Programa de Integração da Educação Profissional à Educação Básica na modalidade de Educação
de Jovens e Adultos (PROEJA) é instituído como programa educacional brasileiro pelo Decreto n.°
5.840, de 13 de julho de 2006. Sendo assim, estabelece como eixo o trabalho como princípio
educativo, na tentativa de romper com a dicotomia entre educação geral e educação técnica.
Realizar esse processo implica perceber, na escola, um espaço para o desenvolvimento de estudos
significativos e superar a visão de uma escola desvalorizada e hipertrofiada, conforme indica Saviani
(1996).
Outro princípio pensado pela proposta do PROEJA indica levar o jovem e o adulto à emancipação
humana. O Documento Orientador do Proeja aponta, no Item 4.1 dos “Fundamentos Político-
pedagógicos do Currículo”, que em síntese constituir-se-á um dos fundamentos principais que
norteiam a organização curricular para cumprimento do Programa: “A escola formadora de sujeitos
articulada a um projeto coletivo de emancipação humana” (BRASIL, 2007, p.47). Nas investigações
realizadas pela pesquisa, observou-se que houve um investimento por parte do governo federal e
dos governos estaduais na promoção de formação de professores para o PROEJA, tanto em cursos de
especialização como na formação continuada de professores. No entanto, verificou-se que a
preocupação dos docentes centralizou-se na constituição da matriz curricular e do perfil profissional
de cada curso técnico. No que diz respeito, a incorporação dos princípios na prática pedagógica dos
cursos, houve a tentativa de realização de oficinas para esclarecer os eixos e fundamentação teórico-
metodológica proposta pelo Programa. Nessas oficinas, notou-se que os jovens e adultos associavam
a eficácia do curso à metodologia dos docentes e a emancipação era compreendida como as
dinâmicas entre a sala de aula e sua relação com a profissão. Nesse sentido, questiona-se: quais os
vínculos estabelecidos entre o PROEJA e a emancipação humana? Como a metodologia e prática
pedagógica, por si só, pode ser instrumento eficaz para a melhoria na condição de vida dos sujeitos?
Diante do exposto, este artigo problematiza os vínculos estabelecidos entre os Cursos Técnicos do
PROEJA e o processo de emancipação humana. O objetivo da pesquisa foi problematizar como os
jovens e adultos compreendem o processo formativo e como se apropriam da prática pedagógica e a
relacionam com a emancipação humana. Notou-se tanto nas entrevistas como nos grupos focais que
a associação entre educação e emancipação é recorrente nos discursos e, frequentemente, vem
articulado às metodologias utilizadas pela escola e pelos professores.
Os dados apresentados compõem os estudos da pesquisa realizada no doutorado em educação e
investigou 45 (quarenta e cinco) jovens e adultos que concluíram o PROEJA, no período de 2010 a
2013. A metodologia de pesquisa de natureza qualitativa utilizou-se de entrevistas e grupo focal com
jovens e adultos de cinco instituições de ensino públicas. A entrevista buscou identificar por meio da
concepção de emancipação humana elaborada por Marx (2010, p.54) em que medida o jovem e
adulto individual em sua vida empírica, em seu trabalho individual e as suas relações individuais,
reconhece e organiza suas “forces propres” (próprias forças) como forças sociais. A partir dessa
análise os jovens e adultos foram convidados a participar do grupo focal, por compreender que é na
experiência coletiva, por meio da abertura para a realidade, que a força individual pode se tornar
força social e força política, em uma concepção dialética da realidade.
O grupo focal, nessa perspectiva, foi utilizado para compreender diferenças e divergências,
contraposições e contradições (GATTI, 2005). Assim, a concepção dialética ganha força, ao considerar
que a contradição é a essência propulsora para o desvelamento do real, da apreensão do real. Essa
dimensão traz à tona o reconhecimento dos sujeitos como reflexivos que, em suas ações repõem,
continuamente, o movimento da história. Para Thompson (2000): “a experiência surge,
espontaneamente, no ser social, mas não surge sem pensamento. Surge porque homens e mulheres
(e não apenas filósofos) são racionais, e refletem sobre o que acontece a eles e ao seu mundo”

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(p.16). Nesse sentido, entende-se que a emancipação humana situa-se na perspectiva da totalidade,
da essência humana, a transformação da sociedade; portanto, não é uma necessidade de
manifestação livre de si, para o sujeito contemporâneo; é, sobretudo, assegurar a existência da
humanidade. Esse processo demanda uma educação que retorne à função de elevar as
subjetividades, uma educação que não seja a justificadora da perenização dos limites da sociedade
atual, mas que se efetive como questionadora da atual ordem social.

2 O processo de emancipação humana e os cursos técnicos do PROEJA

O PROEJA foi construído a partir das discussões do período de 2003 a 2006 entre um grupo de
professores, pesquisadores de diversas Universidades brasileiras e pela Secretaria de Educação
Profissional do Ministério da Educação. A princípio, o propósito do Programa era garantir a
integração entre escolarização básica, profissionalização e elevação do nível de escolaridade dos
jovens e adultos. Para Amorim (2007), no início da implantação do Proeja, já havia a necessidade de
ir além das fronteiras restritas do acesso a escola, sendo necessário alargar a concepção de direito à
educação. Para o autor a visão e modo como os jovens e adultos são pensados condicionaria esse
projeto de educação para o seu êxito ou o seu fracasso.
A ampliação das possibilidades de atendimento aos trabalhadores, aqueles que historicamente
ficaram sem acesso à escolarização e à formação profissional, foi entendida como uma forma de
desafio para o Proeja. Essa característica, ao mesmo tempo em que amplia e renova as possibilidades
de atendimento ao público excluído da escolarização e formação profissional, também revela o seu
potencial de desafio, justamente por favorecer uma epistemologia da formação de jovens e adultos
no país.
Nos documentos e na literatura elaborada para a educação de jovens e adultos e para o PROEJA é
constante a relação entre escolarização, trabalho e a expectativa de melhoria de vida, a exemplo da
defesa do ex-diretor geral da UNESCO, Koïchiro Matsuura, na introdução do Relatório global sobre a
sobre a aprendizagem e educação de adultos:

A educação de adultos é mais importante do que nunca na era da globalização, caracterizada por
mudanças rápidas, integração e avanços tecnológicos. A aprendizagem emancipa os adultos, dando-
lhes conhecimentos e competências para melhorar suas vidas. Mas também beneficia suas famílias,
comunidades e sociedades. A educação de adultos desempenha um papel crucial na redução da
pobreza, na melhoria da saúde e da nutrição e na promoção de práticas ambientais sustentáveis
(UNESCO, 2010, p.8, grifos meus).

A emancipação descrita neste trecho, não é a mesma defendida nesse estudo, pois está relacionada
ao fato de o jovem e o adulto serem os responsáveis por sua aprendizagem e por desenvolver
competências técnicas para o “aprender a aprender”; isto significa, que o sujeito é responsável por
sua pró-atividade. Esse conceito está diretamente relacionado ao fato de o ser humano adequar-se
às novas demandas das chamadas habilidades para o Séc. XXI. A sistematização do conhecimento
científico deixa de ser a protagonista no processo de ensino e aprendizagem e passa a ser
secundária, pois a ênfase volta-se para os processos que envolvem as habilidades para o
desenvolvimento socioafetivo, a capacidade em lidar com estresse, o relacionamento interpessoal.
Luria (2003) explicita que a escola por si mesma não gera mudanças radicais na sociedade por não
ser independente das relações econômicas e sociais; por outro, revela a essencialidade da educação
formal para transformação e elevação da consciência, para o aprimoramento dos instrumentos do

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pensamento, para o desenvolvimento das potencialidades e dos sentidos humanos. Gramsci destaca
que a natureza e a individualidade são tecidas pela materialidade concreta do conjunto de relações
sociais historicamente possíveis. Abstrair o ser humano das relações sociais ou distinguir o mundo da
necessidade do mundo da liberdade é afirmar uma posição idealista de ser humano. Para tanto, é
importante que na ação educativa sistemática se construa uma ação comprometida em formar o
trabalhador como sujeito capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige
(GRAMSCI, 2000, p.49).
A relação “trabalho e educação” também está associada à inflexibilidade dessas instituições formais
de ensino compreenderem a realidade dos jovens e adultos. Nos grupos focais, os jovens e adultos
descreveram as seguintes situações:

E4 – Você precisa ser muito determinado para não parar de estudar, para não sair da escola, porque a
gente não tem como estudar, como conciliar trabalho e estudo.
E5 – Eu chego à escola cansado e com fome. Às vezes estou só com o almoço, fico sem comer nada.
Temos 11 matérias, é difícil demais e ainda tínhamos semana de provas. Nessa semana é complicado,
o Curso não deveria ser assim, fica puxado.
E7 – Não temos como repor as aulas que faltamos, quando o aluno faltava, ele reprovava.
E8 – Em contrapartida se as aulas começassem mais tarde, sairíamos mais tarde e quem mora longe,
chegaria em casa 1 ou 2 horas da manhã.
E9 – Se saíssemos antes, não teríamos férias, fazer o curso foi complicado por conta disso.
E10 – É, nós somos flexíveis, mas o sistema não é.

Nessa rigidez da estrutura escolar, um dos primeiros objetivos do Proeja, torna-se destituído de
significado, pois, a finalidade era construir uma política perene que garantisse o alargamento de
matrículas, a permanência, o sucesso e a aprendizagem de jovens e adultos: “o horizonte que se
almeja aponta para a perenidade da ação proposta, ou seja, para sua consolidação para além de um
programa, sua institucionalização como uma política pública [...]” (BRASIL, 2007, p.13). Assim,
afirmam as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, como primeiro princípio para o Proeja:

O primeiro princípio remete ao compromisso com a inclusão da população nas ofertas educacionais e
precisa ser compreendido não apenas pelo acesso dos ausentes do direito à escola, mas questionando
também as formas como essa inclusão tem sido feita, muitas vezes promovendo e produzindo
exclusões dentro do sistema, quando não assegura a permanência e o sucesso dos alunos nas
unidades escolares (PARANÁ, 2010, p.20).

Em seguida, a diretriz destaca que é fundamental que a Educação Profissional seja ofertada com
qualidade e de forma pública, gratuita, atendendo às necessidades dos jovens e adultos excluídos do
sistema educacional ou que a ele não tiveram acesso, e que, portanto, precisam de uma escola, e
que tenha o trabalho na perspectiva da formação emancipatória dos sujeitos envolvidos (PARANÁ,
2010, p.20). A primeira contradição evidenciada nas falas dos jovens e adultos é a dificuldade em
conciliar o trabalho e a frequência às aulas no Proeja. Marx (2005, p.152) na “Crítica ao direito de
Hegel” define que: “não basta que o pensamento procure realizar-se; a realidade deve, igualmente,
compelir ao pensamento”.
A segunda contradição derivada dessa afirmativa, apontada como sendo essencial no documento, é
que querem viabilizar o processo de emancipação humana por meio de um processo educativo que
exige a obrigatoriedade de 11 disciplinas em um semestre, e ainda obriga os alunos a realizarem
semanas de provas, agregando a esse instrumento de avaliação, além da “nota maior do semestre” –

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um peso emocional e psicológico como requisito para ingresso no próximo semestre. Tal situação
constitui-se como aniquilamento das frentes de qualquer tipo de emancipação. Esse movimento,
sobretudo, expressa a adesão aos processos produtivos e enquadra-se nas demandas do capitalismo
contemporâneo.
Convém dizer ainda que o desenvolvimento do capitalismo potencializou a necessidade de se pensar
a educação na perspectiva dos reais interesses do mundo do trabalho sendo ela direcionada a uma
nova condição de produtor de mercadorias por meio da venda de sua energia física e mental.
Marx (1989) reitera que a emancipação humana demanda que os homens se reconheçam além de
suas individualidades, isto é, como forças sociais capazes de promover mudanças estruturais na
sociedade. Assim, a emancipação humana requer a superação dos obstáculos impostos à vida
individual e coletiva pela alienação do trabalho no modo de produção capitalista. A emancipação
humana, portanto, evidencia-se pelo controle do homem coletivo sobre as condições sociais de
produção da existência (MARX, 1989; RUMMERT, 2008).
Entende-se por meio da dialética que as iniciativas para uma educação na perspectiva da
emancipação humana envolvem as subjetividades e interesses dos jovens e adultos, a organização e
consciência dos grupos, classe e luta de classes, instrumentos concretos de legitimação e de
contestação da ideologia dominante. Sendo assim, é importante compreender os vínculos entre o
Proeja e a emancipação humana.
Tal como define Iasi (2011), compreendemos que a emancipação humana exige que a humanidade,
reconhecendo a história como sua própria obra, possa decidir dirigi-la para outro caminho,
“diferente do beco sem saída para o qual a sociedade capitalista mundial levou a espécie. Nos
termos de Marx, assumir de forma consciente e planejada o controle do destino humano” (Idem,
p.59). Essa afirmativa nos permite conhecer que o fundamento da emancipação humana, para Marx,
é a possibilidade de os seres humanos assumirem o controle da história de maneira consciente e
planejada. A ideia de uma sociedade emancipada e esclarecida, livre da crença e da ignorância, está
presente desde o Iluminismo. Para toda a sociedade moderna, pós Revolução Francesa (1789), a
autonomia do sujeito é um princípio muito importante. Isso significava que o sujeito, fazendo bom
uso de sua racionalidade, poderia superar a menoridade e construir o conhecimento científico, sem
influência de crenças ou preconceitos, a fim de dominar e quantificar toda a realidade.
No entanto, o projeto de sociedade moderna, fundamentado no sujeito autônomo e na
independência do Estado, não favoreceu a emancipação humana. Para a Teoria Crítica, em especial
com Theodor Adorno (1985), a emancipação pode relacionar-se ao contexto educacional. O que
Adorno propõe é superar a concepção idealista e individualista de emancipação (enquanto
autonomia do indivíduo) e ampliá-la a toda a sociedade, a fim de construir coletivamente um
conhecimento objetivo que supere a instrumentalidade e fragmentação científica, sendo possível
assim desvelar os mecanismos de dominação e de alienação social. Para isso, pontua que a
emancipação humana está relacionada à observação do real e, também, de seu processo de
transformação. Sendo assim é preciso conduzir a observação efetiva e concreta de uma mesma
realidade, reportar-se a ela e nela reconhecer e identificar, e assim perceber aquelas circunstâncias
nela presentes a fim de submetê-las à sua análise.
O processo de emancipação humana, portanto, faz com o que o homem se reconheça em sua
humanidade. Thompson (1981) em a Miséria da Teoria afirma que a teoria não pode se constituir
uma coisa mecânica, mas traduzir os movimentos de homens e mulheres que constroem a sua
própria história. Enquanto processo histórico a teoria e as evidências oriundas dos processos
investigativos de pesquisa são provisórios e não se constituem verdades únicas e absolutas. Para o
autor, a educação e o processo de escolarização em si, também é permeado por uma tensão que
promove impactos na vida individual e coletiva dos jovens e adultos. Dessa maneira, é importante
destacar a escola e a educação como um espaço de contradições entre valores e diferentes visões de

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mundo, formuladas a partir da experiência vivida em que homens e mulheres são capazes de
interrogar seus próprios valores e tradições, bem como as questões políticas e intelectuais.

3 Metodologia da pesquisa

A pesquisa realizada ancora-se em uma abordagem qualitativa, pois teve como intenção o contato
direto e prolongado com os sujeitos da pesquisa. Lüdke e André (2015) esclarecem que a pesquisa
qualitativa prioriza o estudo aprofundado de um determinado problema e verifica como ele se
manifesta nas atividades, procedimentos e nas interações cotidianas. Assim, foram realizadas
entrevistas exploratórias e grupo focal com 45 jovens e adultos concluintes do PROEJA. Uma questão
essencial a ser observada na pesquisa de campo refere-se à mudança do cenário político e
educacional encontrado no período da implantação do programa. A pesquisa foi realizada na capital
do Estado do Paraná. O critério de escolha para esse município deve-se ao fato de que foi um dos
primeiros estados a implantar o PROEJA e também, por ofertar a Especialização em nível de pós-
graduação para os professores dos cursos técnicos ofertados nessa modalidade.
Há uma constante divergência de dados no sistema operacional de registro, bem como nos registros
das instituições investigadas. Esses dados também divergem nas pesquisas já realizadas sobre o
Proeja com citações de mesma fonte e origem.
No que se refere ao Proeja na Rede Federal, a dificuldade do acesso às informações, devida à
mudança de Coordenação e diretorias de Departamentos, impediu a realização uma pesquisa
criteriosa sobre os dados do Programa. O Proeja, nos corredores e departamentos parece uma
instância desconhecida em meio a tantas outras ações realizadas pela Instituição de Ensino. Mesmo
com o auxílio da Coordenação dos Cursos de Engenharia, do Departamento de Educação
(responsável pelo Curso de Especialização) e dos funcionários da Biblioteca não foi possível localizar
todos os documentos e produções acadêmicas realizadas na Universidade.
Com relação ao local da pesquisa, as cinco instituições de ensino estão situadas em Curitiba, Paraná,
em bairros periféricos da Capital. Cinco instituições de ensino pertencem à rede estadual e ofertam a
Educação Básica, 2º segmento do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Médio Integrado; uma
delas oferta o Curso Normal de Formação de Docentes e ainda cursos subsequentes de Educação
Profissional. Outra escola caracteriza-se como Centro de Educação Profissional por ofertar somente
esta modalidade de ensino; já outra escola constitui-se Centro de Educação de Jovens e Adultos.
Quatro instituições de ensino estaduais e uma federal já tinham experiência com Educação
Profissional, mas nenhuma experiência com a oferta na modalidade EJA.
O quantitativo de jovens e adultos que concluíram o Proeja em Curitiba, de 2010 a 2013, soma 120
jovens e adultos. Os Cursos em que os sujeitos concluíram os estudos foram: edificações (estadual e
federal), eletromecânica, administração, informática, nutrição e segurança do trabalho. Os grupos
focais envolveram 37,5% dos jovens e adultos que concluíram o Proeja (2010-2013).
A aproximação teórica com os estudos de Marx, Engels, Gramsci e Thompson deram suporte à
pesquisa de campo que consistiu em ouvir os jovens e adultos que concluíram o Proeja a partir de
seus relatos e experiências, considerando as lógicas estruturais nas quais se inserem as suas
experiências práticas.
O Grupo Focal foi realizado no segundo semestre de 2013 e no primeiro semestre de 2014, por
considerá-lo como mais um caminho para perceber as experiências vividas e incorporadas pelos
jovens e adultos sobre as propostas de formação, ancoradas na emancipação humana.
Essa técnica de pesquisa amplia o horizonte do pesquisador no sentido de ajudá-lo a compreender as
diferentes e semelhantes perspectivas que os jovens e adultos têm sobre a sua formação continuada

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

e em serviço e como essa proposta de formação coletiva influencia o processo de emancipação


humana.

O trabalho com grupos focais permite compreender processos de construção da realidade por
determinados grupos sociais, compreender práticas cotidianas, ações e reações a fatos e eventos,
comportamentos e atitudes, constituindo-se uma técnica importante para o conhecimento das
representações, percepções, crenças, hábitos, valores, restrições, preconceitos, linguagens e
simbologias prevalentes no trato de uma dada questão por pessoas que partilham alguns traços em
comum, relevantes para o estudo do problema visado (GATTI, 2005, p.11).

Foi construído um roteiro para encaminhar os propósitos da pesquisa, e de certo modo orientando a
discussão, mas tendo sempre em vista a flexibilidade de seu uso, já que o roteiro depende dos rumos
que os participantes dão às suas interações discursivas. O grupo focal foi composto 45 participantes,
cuja escolha por parte da pesquisadora levou em conta o grau de relevância e de afinidades que os
componentes demonstraram em relação à proposta de trabalho. O grupo focal foi formado pelos
alunos que concluíram o Proeja em Escolas Estaduais e na Universidade Tecnológica Federal do
Paraná, localizadas em Curitiba. A adesão à proposta foi voluntária, considerando convite da
pesquisadora, que não detalhou a temática para evitar que os participantes chegassem ao grupo já
com ideias e formulações pré-definidas sobre o tema, visto que essas deveriam emergir das
discussões no grupo.
Num primeiro momento, as etapas da pesquisa incluíram visitas à Secretaria de Estado da Educação
do Paraná, ao Núcleo Regional de Educação de Curitiba e ao Departamento de Educação e Pós-
Graduação da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Após, a autorização dessas instâncias, foi
feito o contato telefônico com os jovens e adultos e diretores de cada escola; visita às escolas e
entrevista presencial com os coordenadores e os diretores. As informações sobre endereço e
telefone dos egressos foram obtidas no sistema online de registro escolar de educação, na ficha de
matrícula de cada aluno. Pelo tempo transcorrido desde a matrícula, muitos telefones, endereços e
locais de trabalho haviam sido trocados, o que ocasionou certa dificuldade inicial; porém, a partir dos
primeiros contatos obtidos com sucesso, os próprios alunos concluintes e os coordenadores
auxiliaram fornecendo informações sobre outros jovens e adultos concluintes dos cursos.
Em diversos momentos durante a realização dos grupos focais, muitos jovens e adultos afirmaram
esconder de familiares, colegas de trabalho, em entrevistas de emprego que realizaram um Curso
Técnico na modalidade EJA. Segundo as observações dos jovens e adultos, as indústrias “desejadas”
e locais de trabalho considerados importantes na cidade de Curitiba priorizam a origem “escolar” da
formação técnica.
Os grupos focais foram formados após a aplicação das entrevistas exploratórias com jovens e adultos
e, também, entrevistas realizadas com professores, coordenadores, representantes do Fórum EJA e
sindicatos nos anos de 2011 a 2013. No entanto, o convite para participação foi feito a todos os
alunos concluintes do Proeja, mesmo para aqueles que não haviam participado das entrevistas
anteriores. Foram realizados três grupos focais com 15 participantes em cada grupo. É importante
ressaltar que a realidade sócio-histórica constitui uma totalidade, e nesse aspecto o Proeja nasce em
uma conjuntura de alterações políticas e econômicas na educação brasileira, em que os processos de
profissionalização em nível médio ganham centralidade.
Isto significa uma supervalorização tanto da certificação quanto da conclusão dos estudos em
processos aligeirados, em detrimento de uma educação fomentada em uma política pública efetiva
para a Educação de Jovens e Adultos. No entanto, entende-se que tal afirmativa pode ser limitada e
parcial, por isso carece de maiores aprofundamentos e investigações.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

4 A emancipação humana e a relação entre metodologia e prática pedagógica na visão dos


jovens e adultos do PROEJA

A emancipação humana fazia parte das categorias e fundamentos pedagógicos do Proeja na primeira
versão do Documento Orientador, o qual serviu de Diretriz Curricular nos anos de 2008 e 2009. Em
2010, é publicada uma versão oficial das Diretrizes Curriculares do Proeja, a emancipação humana
passa a ser uma expressão citada apenas na apresentação, sem constituir-se num fundamento do
Programa em rede nacional. Porém, na versão oficial das Diretrizes do Proeja do Estado do Paraná, a
relação trabalho e educação e emancipação humana permanecem como objetivos essenciais do
Programa.
Todas as alterações e inconstância de dados comprometem a legitimidade e, consequentemente,
comprometeram as ações formativas do Proeja no Estado do Paraná. Em Curitiba, lócus desta
pesquisa, essa discussão é acentuada. A capital do Estado tem uma fonte diversa de dados e
alterações de planos de curso, orientações às escolas e rotatividade de professores. Em uma das
escolas pesquisadas, a equipe de professores da área técnica já havia sido substituída três vezes em
um único semestre, e situação semelhante ocorreu com professores da base comum. Entre as
justificativas para essa ausência, destacam-se: a demora na efetivação de professores concursados
(aguardando nomeação); a burocratização no processo de seleção de professores temporários;
licenças médicas; licenças para a realização dos cursos PDE, entre outras.
Na interação com o grupo uma aluna fez questão de enfatizar que os professores envolviam os
alunos, disse que ela já havia voltado a estudar e parado várias vezes, e com a metodologia utilizada
pelos professores do Proeja ela se sentiu motivada a continuar e conseguiu concluir os estudos.
Mas essa não era uma opinião consensual entre o grupo; alguns jovens e adultos salientaram que o
Proeja não teve retorno bom para a escola; e ao se referirem aos professores afirmaram: “os outros
professores ficavam enrolando, não davam a matéria, a gente percebia. O que a gente veio fazer
mesmo não tinha professor. Os professores eram defasados. É triste, muita gente saiu...” (coletivo)
Concluíram que essa “enrolação” era percebida quando os professores conversavam sobre outros
assuntos, ou ficavam pedindo apenas a opinião, alegando que o importante era a experiência deles e
ouvir o que eles tinham como saberes da vida. Assim, davam trabalhos em grupo e não davam aula.
Em algumas ocasiões, jovens e adultos tiveram dificuldades em responder e interagir, mas após o
momento de diálogo, realizaram algumas conclusões acerca do Curso Técnico Proeja:

Os professores dão o máximo, principalmente os técnicos, procuram dar apoio, procuram tentar
entender. Nós também procurávamos interagir, procurar a direção. A direção e a coordenação não
têm muito o que fazer para resolver os problemas, porque sempre estão seguindo memorandos, o
único apoio que tínhamos de verdade era o conselho de classe porque cada um tem um potencial
diferenciado (coletivo Grupo Focal 1).

Pareceu consensual nos três grupos focais uma associação entre emancipação, transformação e
melhoria nas condições de vida com a metodologia desenvolvida pelos professores e a prática
pedagógica realizada pelas escolas. Assim, a relação escolar ainda é percebida de forma arcaica
pensada em uma relação unilateral entre professor e aluno, em que o primeiro exerce autoridade
sobre o segundo. Em linhas gerais, os jovens e adultos possuem intrínseca uma relação pedagógica
que tem como premissa conduzir as classes subalternas a interiorizarem a concepção de mundo e de
educação propagada pela mídia e pelos governantes e ignoram a realidade e as necessidades de sua
classe social.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

É importante dizer que no contexto brasileiro não se constituiu como predominante uma transição
para o trabalho depois de finalizada a escolaridade básica, diferentemente do que ocorre em alguns
países. No Brasil, a relação entre escola e trabalho, especialmente, para os jovens e adultos da classe
trabalhadora, se caracteriza pelo ingresso precoce no mercado de trabalho e pela conciliação ou
superposição de estudo e trabalho, conforme os depoimentos nos grupos focais.

5 Conclusão

A EJA e o Proeja no Brasil e no Paraná são estigmatizados pela aceleração dos ciclos, a fragmentação
dos conhecimentos científicos e conhecimentos técnicos, e pela banalização dos conteúdos
(simplificação). Em todas as ocasiões nos três grupos focais, e nas entrevistas exploratórias com
professores, diretores, coordenadores e alunos, foi possível perceber que a discussão do currículo do
Proeja restringiu-se ao “enxugamento” da matriz curricular, definida em quantidade de horas e
redução de conteúdo; assim, constituiu-se a gênese dos métodos e das formas de gerenciamento do
processo de formação pedagógica para implantação do Programa.
Gramsci (1989) enfatiza que, para além da concepção dos envolvidos com o processo educativo, a
emancipação humana perpassa a compreensão e a percepção de toda a sociedade dessa importância
do vínculo da educação com a transformação da realidade.
Não se pode negar que esse tipo de escolarização profissionalizante, em certa medida, promoveu a
ascensão pessoal e profissional de alguns jovens e adultos. A Secretaria de Educação do Paraná
mantém um vasto relatório a esse respeito com depoimentos dos alunos e suas conquistas pessoais.
No entanto, os êxitos particulares e individuais precisam ser analisados em uma perspectiva
ampliada de análise que garanta a todos, sem exceções, alterações concretas nas condições de vida e
produção da existência da humanidade.
Entende-se que o acesso à escolarização permitiu o avanço na democratização do ensino.
Entretanto, é preciso analisar que apesar da alteração nos textos das propostas governamentais para
explicitar trabalho e emancipação, parece-nos que essas categorias são incorporadas de maneira
fragmentada e descontextualizada de suas raízes teóricas e práticas. Sob esse argumento, a
investigação sobre a formação escolar do trabalhador exige uma análise comprometida com as
categorias trabalho e emancipação, o que significa uma investigação que esteja voltada para
apreender o alcance dessas proposições de seu ponto de partida, ou seja, o jovem e o adulto da
classe trabalhadora.

Referências

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Janeiro. Jorge Zahar.

Brasil (2006). Congresso Nacional. Decreto nº 5.840. Brasília.

Brasil (2007). Ministério da Educação. Documento base - programa de integração da educação


profissional técnica de nível médio ao ensino médio na modalidade de educação de jovens e
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Gatti, B. A. (2005). Grupo focal na pesquisa em ciências sociais e humanas. Brasília.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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8.ed. Rio de Janeiro.Civilização brasileira.

Gramsci. A. (2000). Caderno 12: apontamentos e notas esparsas para um grupo de ensaios sobre a
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Paraná. (2010). Secretaria de Estado da Educação. Departamento de Educação e Trabalho. Educação


Profissional integrada à educação de jovens e adultos: PROEJA. Curitiba.

Saviani. D. (1996). Escola e democracia: a teoria da curvatura da vara. In: SAVIANI, D. Escola e
Democracia. 4. ed. São Paulo. Cortez, 40-61.

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Thompson. E. P. (1981). Miseria de la teoria. Traducción castellana de Joaquim Sempere. Barcelona.


Crítica.

UNESCO. (2010). Relatório da reunião educação para o século XXI. Paris. n. 26. Disponível em
http://ns1.dhnet.org.br/dados/relatorios/a_pdf/r_unesco_educ_tesouro_descobrir.pdf.
Acesso: 08 de março de 2010.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Uma leitura fenomenológica hermenêutica de obras de Pablo


Picasso

1
Sueli Teresinha de Abreu Bernardes , Leonora de Abreu Bernardes2
1
Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade de Uberaba, Brasil.
abreubernardes@terra.com.br
2
Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia, Brasil. leonora.bernardes20@gmail.com

Resumo. Com o objetivo de compreender a obra artística de Pablo Picasso, em uma atitude interdisciplinar,
realiza-se uma leitura fenomenológica hermenêutica de pinturas do artista. A partir da observação do
constante vir-a-ser da criação artística do mestre espanhol, e de conceitos de Heráclito, infere-se que
permanece uma unidade: o retratar da condição humana. Reflete-se, também, na educação da sensibilidade
no processo educacional O exercício do pensamento é realizado na perspectiva teórica de Gaston Bachelard
e com aportes de Viggiani Bicudo.
Palavras-chave: Arte; Fenomenologia bachelardiana; Interdisciplinaridade; Processo educacional.

A hermeneutic phenomenological study about the works of Pablo Picasso


Abstract. In order to understand the artistic work of Pablo Picasso, in an interdisciplinary attitude, a
hermeneutic phenomenological reading of paintings by the artist is carried out. From the observation of the
constant coming-to-be of the artistic creation of the spanish master, and of Heraclitus's concepts, it is inferred
that a unity remains: the portrayal of the human condition. It is also reflected in the education of the
sensibility in the educational process. The exercise of the thought is realized in the theoretical perspective of
Gaston Bachelard and with contributions of Viggiani Bicudo.
Keywords: Art; Bachelardian Phenomenology; Interdisciplinarity; Educational process.

1 Introdução
“Que céus se puseram ali no lago interior dessas rosas abertas. Mal podem elas caber em si mesmas,
muitas, repletas, transbordaram de espaço interior nesses dias que terminam numa plenitude vasta,
sempre mais vasta, até que todo o verão torne-se um quarto, um quarto num sonho”, diz Rilke em
Elegias de Duino (2013, p 47).
São tantos os exemplos que expressam esse traço de delicadeza do poeta em sua abertura ao canto
das coisas! Num de seus poemas se diz assustado com as palavras dos homens, tão arrogantes em sua
pretensão de clareza. O movimento dessas palavras mostra que o poeta almejava criar uma poesia
que de fato pudesse pertencer ao mundo das coisas, capaz de adentrar as superfícies vivas. Bem na
linha de uma mística do cotidiano, Rilke busca com vigor captar e fazer ecoar a dinâmica do instante.
Suas palavras tornam-se minhas e transformam-se na metáfora para o que busco neste texto: fazer
ressoar minhas impressões e reflexões a partir da obra de Pablo Picasso.
Sempre procurei trazer a beleza para dentro de mim. E em todas as aproximações com a arte sinto
apreender tudo o que é belo, como se meu interior transformasse tudo em imagens de devaneio. O
encontro com a arte de Picasso e a intenção de realizar uma pesquisa tendo por objeto a sua invenção
artística é consequência natural das aproximações com a arte ao longo de nossa vida. Neste texto,
reflitimos a partir de obras de Picasso e de conceitos de Heráclito, na busca de compreender o sentido
da mudança na criação artística do pintor espanhol.
Este estudo abrange tentativas de eliminar limites disciplinares. Pensar a filosofia por meio de Picasso
é um caminho que, se parece estranho e inseguro para alguns, para mim é uma experiência de abrir a

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mente ao entendimento, em que me aventurei a interagir pensamentos e imaginação. “Ocorre sempre


assim: na ordem da filosofia, só se persuade sugerindo sonhos fundamentais, restituindo-se aos
pensamentos suas avenidas de sonhos.” (Bachelard, 1960, p. 4). A opção por duas formas de
expressões humanas diferentes, a conceitual e a artística, por caminhos diversos, porém, em torno de
um mesmo núcleo temático, permite-me colocar em pauta a possibilidade de fazer afluir expressões
e formulações de saberes, para o melhor entendimento do sentido de mudança na obra de um artista.
A convergência de olhares e de linguagens, a construção de um pensamento mais totalizante e
integrativo, parece-me amplamente oportuno. Nessa acepção integradora, Nietzsche, em A filosofia
na época trágica dos deuses (1974, p. 44), apresenta um questionamento: “será que este mundo está
cheio de culpa, de injustiça, de contradições e de sofrimento? Sim, grita Heráclito, mas só para o
homem limitado que vê as coisas separadas umas das outras e não no seu conjunto”. Um olhar
interessado permeia a busca dessa a visão de conjunto. Para essa afirmação, baseio-me em eixos que
norteiam a pesquisa realizada: nela, de certa maneira, procuro confrontar uma lógica racionalista com
minha intuição, afeição e sensibilidade. Ao indagar o sentido do fluir, da transitoriedade, da mudança
na obra de Picasso, deixo que a sensibilidade aponte para um refletir diferente. O compromisso crítico
com o pensar não me fez deixar de lado a emoção. Isso porque penso que dentro de mim tudo se
integra: a afeição, a intuição, a lógica, a inteligência, os instintos, os impulsos e os saberes. Vários
pensadores têm acentuado a necessidade de que eduquemos nosso olhar para a percepção de um
horizonte aberto, no qual cada área de conhecimento seja vista como um universo, cujo centro pode
deslocar-se segundo a indagação de quem o focaliza. Não é uma tentativa de abarcar o máximo de
extensão possível num mesmo olhar, mas um contemplar que faz convergir o movimento de vários
territórios do saber, aqueles que se abrem à aventura desse encontro. No caso dessa pesquisa, trata-
se de buscar essa postura investigativa de abrir um espaço de respiração para a circulação de ideias e
de emoções, uma atitude de ampliação de horizontes e uma re-leitura de conceitos.
Ao relatar a experiência de pensar a partir da emoção sentida diante da beleza da criação artística,
procuro não somente a experiência de superar fronteiras, mas aproximar-me do mundo que nasce dos
sonhos: a arte. Desejo percorrer o caminho do prazer, que tanta falta faz na motivação do ambiente
escolar. E, nesse contexto, quero compreender o sentido da mudança contínua na inventividade do
mestre espanhol ao longo de sua vida. Analiso suas obras, o que elas me dizem, o que se transformava
nas múltiplas telas, esculturas, gravuras, desenhos e outras manifestações artísticas. O olhar
investigativo às múltiplas expressões que a imaginação de Picasso compôs deixa-me mais interessada
no trajeto temático, na viagem imaginária do pintor espanhol, do que na criação final das obras que
ele cunhou. Reflito que em nossa sociedade o sentido da experiência artística é encontrado sobretudo
na obra final, desconsiderando-se totalmente os processos de invenção, já que o “produto” pode
tornar-se mercadoria e distanciar-se de seu autor, reduzindo-se a um objeto a ser negociado, enquanto
a composição em si é liberdade. Entretanto, criar é essencialmente um processo, um caminho de
crescimento para aprender, conhecer, e ainda compreender-se e realizar-se naquilo que cada um traz
de melhor em si como potencialidade singular.

2 A metodologia
Na pesquisa que origina este texto, a obra de Picasso abarca a mim, pesquisadora, quando eu deixo
de me ocultar e de me dissimular, tentando uma objetividade e uma neutralidade. Baseada nesses
princípios, a subjetividade é assumida como forma de construir um conhecimento. Optei por uma
leitura fenomenológica hermenêutica, com aporte em Bicudo (2011) e Bachelard (1960). Essa é uma
modalidade de pesquisa qualitativa em que observador e observado interagem, comunicam-se e criam
conhecimento. Segundo Bachelard (1960), para apreender o sentido da imagem poética, é preciso
assimilar o devaneio criante do artista. E Bicudo (2011) autoriza-me a dizer que o fenômeno só existe

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quando recebe o olhar intencional, interpretativo e vivo do observador, de forma a reconhece-lo


existente e dar-lhe sentido conforme o valor individualizado de quem lhe observa. Estou partindo de
uma análise buscando compreender obras de Picasso e, nesse sentido, a descrição é de grande
importância. Mas essa atividade não se satisfaz com seus resultados. Assim, realizo interrogações
contínuas ao fenômeno, procurando o seu sentido e buscando o elemento integrador que Bicudo
(2011) conceitua como o encontro entre o ver e o visto, entre o pesquisador e o fenômeno.
[...] a palavra “vivido” é, com frequência, uma palavra que reivindica. É escrita então contra outros
filósofos que, julgados um pouco precipitadamente, não tocam o “vivido”, se contentam com o jogo
fácil das abstrações; afirma-se que eles desertaram a “existência” para se consagrar ao pensamento.
[...] O vivido conserva a marca do efêmero se não puder ser revivido [...] (Bachelard, 1988, p. 40).
Parto, assim, da compreensão do meu viver e do diálogo com a arte, a eles acrescentei reflexões e
conceitos e procurei novos sentidos, para desvelar como a poiésis da criação artísticas e apresenta a
mim e não como é a sua realidade.

3 Diálogo entre Heráclito e Picasso


Em visitas a museus com obras de Picasso em Madri e Barcelona, chamou-me a atenção a figura
humana presente de modo predominante em diferentes modelos, técnicas, cores e formas, os quais
se alternavam e se modificavam em um vir-a-ser constante. Essas observações levaram-me a refletir
sobre o sentido do devir. Li fragmentos de Heráclito e alguns comentadores, como transcrevo a seguir:
A imagem do rio presente no fragmento do filósofo de Éfeso “para os que entrarem nos mesmos rios,
outras e outras são as águas que por eles correm... Dispersam-se e ... reunem-se... juntas vêm e para
longe fluem ... aproximam-se e afastam-se” (Diels, 1954, apud Kirk e Raven, 1994, p. 202). Para esses
autores, esse fragmento tem sua interpretação mais remota em Platão, também aceita e desenvolvida
por Aristóteles. Segundo os filósofos pós-socráticos, a metáfora do rio foi utilizada por Heráclito para
enfatizar a total continuidade da mudança: pànta rei, tudo flui, tudo se move sem cessar. Heráclito
preocupa-se com o real, ele busca explicar a realidade. Sua concepção, típica da visão grega de seu
tempo, é cosmológica. A realidade é o fluxo contínuo dos opostos; a estabilidade é ilusória, o devir, a
multiplicidade em mudança é o real. O que importa é a própria existência que sem cessar flui e o
entendimento de que todas as coisas se reduzem à unidade, pois o um é afinal o múltiplo. O mundo
aparentemente múltiplo e em discórdia é um só, a unidade é a própria multiplicidade. Heráclito
anuncia: “Dando ouvidos, não a mim, mas ao Logos, é avisado concordar em que todas as coisas são
uma” (Fr. 50, Hipólito Ref. IX, 9, 1, apud Kirk & Raven, 1994, p. 193). Em Crátilo lê-se: “Heráclito diz
algures que tudo está em mudança e nada permanece imóvel, e, ao comparar o que existe com a
corrente de um rio, diz que se não poderia penetrar duas vezes no mesmo rio” (Platão, 1994, apud Kirk
& Raven, 1994, p. 202).
Nietzsche, contudo, não exclui a ideia da medida e da regularidade na mudança ao também afirmar
que o fluxo contínuo dos seres não ocorre de modo caótico, pois sob os contrários em luta, sob o devir,
está essa unidade, e que opera por medidas. O que torna possível essa unidade do múltiplo e a
multiplicidade do uno? A phýsis, por apresentar-se como a própria revelação visível da unidade-
múltipla do vir-a-ser, sendo o fogo — que Heráclito também denomina de lógos — o “elemento”
constitutivo de todas as coisas. O mundo é lógos, ou seja, inteligível, racional, porque o fogo age por
medidas (Abreu-Bernardes, 2000, p. 57). O que reflito a partir de uma leitura cruzada Heráclito-
Picasso? Entendo que as cosmovisões do artista e do filósofo diferem, e o próprio conceito de devir
possui, portanto, conotações diferentes. O pintor espanhol não está preocupado em traduzir, como
Heráclito, o processo cósmico das transformações, mas em expressar as nuances da realidade que o
seu olho vê. Se o devir de Heráclito refere-se ao cosmos, o entendimento que está presente no tempo
de Picasso é o ver que apreende todos os possíveis fragmentos e mudanças do espaço. O mestre das

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artes volta-se para o movimento do ver, para a percepção. Ele não está preocupado em traduzir a ideia
do real, mas em expressar a apreensão do real de todas as formas possíveis.
3.1 O olhar para a criação artística
Pergunto-me o que vejo na criação artística de Picasso. Por que a olho como pessoa ávida de reflexões
que já se deixa render ao que vê. Além da beleza, qual é o saber sobrante que me encaminha para
uma direção onde tem sentido a pergunta reflexiva? Além do belo, o que de sabedoria, o que de sophia
ensinam-me os desenhos? O que me instruem as suas telas e as esculturas? Sei que deveria olhar
profundamente, não apenas as aparências, a visibilidade, a combinação, a composição, os traços, as
linhas, as oposições cromáticas e as somações estéticas que a obra contém em si, mas, igualmente,
lançar perguntas ao próprio tema. Estou certa de que preciso dialogar com as invenções do mestre
espanhol para, em seguida, formular a minha questão de um modo a alcançar o próprio artista que as
criou. Sentir a arte e não procurar o seu significado por meio de algo exterior a ela; buscar
compreender o que a criação do artista diz diretamente a minha sensibilidade, eis o que procuro
realizar ao pesquisar as obras de Picasso. Não recorro, portanto, ao que me dizem as teorias sobre a
arte, mas procurei vivenciar pessoalmente a arte como o que me diz algo, por meio de abrir-se ao
poder da tradução direta de minha sensibilidade diante dela. Segundo esses princípios metodológicos,
o que testemunho na múltipla criação de Picasso? Vejo o homem sofrido, a mulher abraçando o filho,
o saltimbanco, a vítima da guerra, a mulher chorando, o toureiro, o velho solitário, a mulher sonhando.
Dos rostos, dos gestos, das cenas e cenários observados, concluo que uma das leituras possíveis da
criação desse artista é que o vir-a-ser, a meu ver antropológico, ou mais precisamente existencial, dos
seus temas, estilos, modelos, cores e técnicas expressa esteticamente uma obsessão pela pessoa ou
pelo sentido do humano. Picasso usa suas criações artísticas para traduzir seu comprometimento com
a condição do homem. Essa é a unidade que existe sob a multiplicidade de sua obra (Abreu-Bernardes,
2008). Observo que as criações do pintor espanhol expressam ora um ver político, um ver solidário e
humanista, ora um assistir de um espectador deslumbrado pelo mundo e criador de novas realidades
e de novos sentidos. A arte, assim como sua vida, é variada, surpreendente e afoita. É o signo plástico
de uma existência vivida intensa e criativamente até os noventa e um anos de idade. Penso, no
entanto, que “seria um erro ver a obra de Picasso apenas como uma autobiografia pintada. Isso porque
ele sempre transcendeu o pequeno domínio de suas aventuras pessoais, dos acontecimentos
históricos e dos grandes amores vividos, elevando-os ao atemporal e universalmente humano” (Abreu-
Bernardes, 2000, p. 37). A arte que eu aprecio expressa o fluir de sentimentos diante de fatos, pessoas,
acontecimentos, sem sucumbir a uma interconexão mecânica entre o mundo em que o mestre
espanhol viveu e sua expressão artística."
3.2 Imaginação e razão
Ao analisar como Pablo Picasso concedia à imaginação todos os meios de expressão, todas as imagens
materiais que se produziam em seus devaneios, aproximei-me do estudo do conceito de imaginação
material de Gaston Bachelard. Imaginação e razão constituem, para esse filósofo, o pensamento
filosófico-científico e poético em sua tencionalidade dinâmica. E se a via racional propõe uma cisão
entre as ideias, os conceitos e o imaginário, pela via onírica eles se tangem, se unem mutuamente, não
são sobrepostos, mas complementares em suas diferenças. O filósofo da imaginação criadora percorre
o universo dos sonhos e devaneios buscando apreender o ser em sua originalidade, iluminar a
consciência e registrar a polifonia dos sentidos que despertam e se harmonizam no devaneio poético.
Nesse sentido, uma concepção do real que não se interessar pelo onírico, despoja-se de alguns dos
interesses que conduzem ao conhecimento.

4. O devaneio e o processo educacional

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E ao meditar sobre essas leituras, indago: e o educador, como concebe seu trabalho de formação do
homem? Há aproximações com o labor do artesão, com a lida dos poetas, dos pintores, dos músicos,
dos escultores e dos dançarinos? O que o professor aprende com os artistas? Existem intelectuais que
se envergonham das mãos e das atividades laboriosas. O artista, ao contrário, desconsidera os
preconceitos e pelo seu artefazer testemunha vivencialmente o significado humano do trabalho. Os
gestos das mãos dos artistas, alçados à dimensão do símbolo, representam a consciência do fazer e do
criar a partir de um devaneio. Há uma sabedoria manual na experiência única do artista que engendra
a beleza e que me traz um amplo campo de reflexão. É a expressão da liberdade e da transgressão. O
professor que se aproxima da dimensão estética por meio do diálogo com a linguagem baseada na
experiência dos próprios artistas, modifica o gesto pedagógico? Após um encontro mais íntimo com
Dionísio, demuda-se o campo educacional que não é apenas educativo, e muito menos escolar?
Transforma-se o trabalho do educador que observa o gesto transgressor e sensível do artista?
Toda a experiência vivida durante o processo de criação da pesquisa, todas as leituras e o convívio
artístico tornam-se estímulo para embasar essas questões que se aprofundam e que emergem das
reflexões construídas. Tais perguntas referem-se às interações arte e educação, à compreensão da arte
como conhecimento e ao sentido da educação da sensibilidade, dimensão minimizada no ato
educativo em nossas escolas. É comum a compreensão da arte como ilustração do gesto pedagógico,
como distante e separada da ciência, como deleite e êxtase ou como doadora de status de erudição.
Fayga Ostrower (1996, p. 20) comenta que é comum encontrar em nossa sociedade uma atitude
contraditória diante da criação artística. De um lado, há o seu reconhecimento como algo significante
financeiramente. De outro lado, há uma apreciação do fazer artístico como algo improfícuo, mero
entretenimento dispensável. Não se reconhece o processo de criação de uma obra de arte como um
trabalho, um labor; como a realização de um imperativo social e de uma necessidade educativa.
Historicamente é sabido que, a partir da escola nova e de seu desdobramento, a educação no Brasil
seguiu uma trajetória em que o foco foi profundamente político. São manifestações muito próximas
desse enfoque, por exemplo, a Pedagogia Libertadora, iniciada nos anos de 1960 no Brasil, a qual fazia
da opressão e suas causas, resultando daí o engajamento do homem na luta por sua libertação; a
Pedagogia Crítica que vê o ensino como prática emancipadora; e a Pedagogia Histórico-Crítica, que se
expressa na metodologia dialética de construção sócio individualizada do conhecimento.Há nelas, de
alguma maneira, toda uma discussão sobre a formação do homem também ético. Até, talvez,
retomando um pouco o sentido grego da palavra, o homem da polis, o homem das relações do
cotidiano. E, então, pergunto: o homem é apenas um ser político, um ser ético, um ser relacional? E a
dimensão artística? E a questão da sensibilidade, da beleza e de outros valores que a arte expressa,
como são considerados pelo educador? Não se trata de fragmentar, de ver o homem em aspectos
distintos, e nem de menosprezar o imperativo da formação e da atuação política e ética. Ao contrário,
significa retomar a pessoa em sua integridade, considerando toda a condição humana e, não apenas,
algumas dimensões de sua existência. Discutir a formação humana e a formação do educador sem
considerar o desenvolvimento da sensibilidade, a vivência emocional, imaginativa, criadora e intuitiva,
significa tentar decompor o que existe como unidade.

5. Considerações finais
O conhecimento construído a partir da obra de Picasso talvez possa resumir-se na afirmação de que a
arte é um outro modo de conhecer a realidade, e o trabalho do educador poderá tornar-se mais denso,
mais criativo, mais sensível e mais amplo se alcançar esse sentido da criação artística e apreender seus
valores. O contato com a arte e o sentimento estético trouxe um resultado transcendental. Ele é a
beleza, e hoje eu a reconheço não apenas nas criações dos poetas, dos músicos, dos escultores, dos
bailarinos ou dos fotógrafos, mas a encontro no próprio ato de criação humana.

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Além disso, a criação do pintor espanhol questiona e estimula a indagação. Nesse contexto, o artista
ensina a constante busca, a atitude crítica, inovadora, transgressora e de ruptura. Quando penso em
uma universidade crítica e não produtivista, devo lembrar os ensinamentos dos artistas. Se a
universidade que formar professores que superem a mera transmissão de informações, a erudição
formal e distante, a transposição de conhecimentos, e sejam educadores que estimulem o pensar e o
sentir, é preciso uma aproximação aos que, em uma dimensão mais humanista, expressam não só a
beleza, mas os valores densos, ambivalentes e polissêmicos que a arte proporciona.
Sobre o método de análise utilizado, pontuo que a fenomenologia bachelardiana, da qual me
aproximei neste trabalho, não é uma descrição empírica dos fenômenos, mas é um modo de apoderar-
se do vigor da experiência individual para realizar a descrição. O fenomenólogo, ajudado pelo que
traduz em versos as emoções e os saberes, deve intervir para vivenciar a “intencionalidade poética”,
para encontrar a abertura consciencial do texto poético. A fenomenologia é o método da imaginação
criadora, a que pode perceber além dos fenômenos visíveis, a que vai ao âmago do ser. A imagem não
tem causalidade, ela é produto da alma, da emocionalidade do ser e, sendo assim, apenas uma
fenomenologia da alma é capaz de alcançar as imagens originárias.
Bachelard tornou-se leitura constante, pois em seus livros começo a compreender um modo de
apreensão da realidade por meio do devaneio poético. Aliado a isso, a investigação, cruzando campos
de saber e áreas de conhecimento, traz um conhecimento que faculta um olhar mais ampliado e mais
denso do objeto pesquisado. Daí o interesse em buscar fundamentos para as perguntas sobre as
aproximações entre o processo educacional e a criação artística.

Agradecimentos. Ao Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq e à Fundação de Amparo à


Pesquisa do Estado de Minas Garais- FAPEMIG, do Brasil, pelo apoio à elaboração deste trabalho.

Referências
Abreu-Bernardes, S. T. (2008). A poética na formação humana: leitura de uma educadora, 2008, 230.
Tese (Doutorado em Educação) -Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás.
Bachelard, G. (1960). La poétique de le réverie. Paris: Les Presses Universitaires de France.
Bachelard, G. (1966). Le rationalisme appliqué. Paris, Presses Universitaires de France, 1966.
Bachelard, G. (1988). Fragments d’une Poétique du Feu. Établissement du texte, avant-propos et notes
par Suzanne Bachelard. Paris: Les Presses universitaires de France.
Bicudo, M. A. V. (2011). Filosofia da Educação matemática segundo uma perspectiva fenomenológica.
São Paulo: Cortez.
César, C. M. (1996). A Hermenêutica francesa: Bachelard. Campinas, SP: Alínea.
Kirk, G. S., RAVEN, J. E. & SCHOFIELD, Malcom (1994). Os filósofos pré-socráticos: história crítica com
seleção de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
Nietzsche, F. (1974). A filosofia na época trágica dos deuses. NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. A filosofia
na época trágica dos deuses. Obras incompletas. Seleção de textos de Gérard Lebrun. Tradução
e notas de Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Abril Cultural.
Ostrower, F. (1996). Universos da arte. 10. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1996.
Rilke, R. M. (2013). Elegias de Duino. 6a ed. São Paulo: Biblioteca Azul.

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Educação das relações de gênero na escola: a perspectiva de


professoras e professores de educação física

1
Denise Aparecida Corrêa , Ingrid Camoiço Rego1

1 Departamento de Educação Física da Universidade Estadual Paulista UNESP, Bauru/SP, Brasil.


decorrea@fc.unesp.br; ingridcamoicorego@hotmail.com

Resumo. O objetivo desta pesquisa foi analisar os processos educativos relacionados à educação das
relações de gênero na Escola na perspectiva de professores/as do componente curricular Educação Física.
Com abordagem pautada na pesquisa qualitativa realizamos entrevistas com seis docentes de Educação
Física da Rede Pública Estadual de São Paulo e da Rede Pública Municipal de Macatuba/SP, as quais foram
submetidas à análise de conteúdo, na qual destacamos duas categorias: A) “Mas só existe Futebol?”
desconstruindo estereótipos e preconceitos de gênero na escola; B) “É o que podemos fazer?” perspectivas
para a Educação das Relações de Gênero na Escola. Consideramos que é imprescindível que os/as docentes
tenham espaços garantidos para ações formativas, de modo a serem preparados/as para problematizarem
situações de discriminação e preconceito relacionados a gênero e que a escola viabilize a participação dos
mesmos em cursos de atualização para o aprimoramento de suas ações no ambiente escolar.
Palavras-chave: Gênero; Escola; Docentes; Educação Física

Education of gender relations in schools: the perspective of physical education teachers


Abstract. The objective of this research was to analyze the educational processes related to the education
of the gender relations in the School in the perspective of teachers of the curriculum component Physical
Education. With a qualitative research approach, we conducted interviews with six Physical Education
teachers from the São Paulo State Public School Network and the Macatuba Municipal Public School
Network, which were submitted to content analysis, in which we highlight two categories: A) "More Is there
only Football? "Deconstructing gender stereotypes and prejudices in school; B) "What can we do?"
Perspectives for the Education of Gender Relations in the School. We believe that it is imperative that
teachers have guaranteed spaces for formative actions in order to be prepared to problematize situations of
discrimination and prejudice related to gender and that the school makes possible their participation in
refresher courses for the improvement of Their actions in the school environment.
Keywords: Gender; School; Teachers; Physycal Education

1 Introdução

A problematização da educação das relações de gênero no espaço escolar tem demarcado um lugar
de urgência diante dos debates em torno das questões que perpassam a educação brasileira e que
colocam a Escola como lugar de enfrentamento às formas de opressão e dominação de gênero, bem
como, de luta por uma sociedade mais justa e equânime.
Diante dessa situação e entendendo a Educação Física como um dos componentes curriculares que
pode e deve contribuir para o diálogo e reflexão da diversidade cultural, propomos o estudo acerca
da temática gênero, entendendo essa categoria na relação com outros marcadores sociais da
diferença como raça e classe social, que atuam no sentido de desfavorecer o processo educacional
equitativo para todos/as nas aulas de Educação Física na Escola.
Ao longo do percurso histórico da educação física escolar, o tema gênero foi foco de estudos e
pesquisas na tentativa de problematizar as estratégias metodológicas, conteúdos e a prática
pedagógica dos/as professores/as deste componente curricular na escola.

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No período da segunda guerra mundial, diante de um iminente confronto bélico e inspirado pelos
preceitos eugenistas, a educação física escolar tinha objetivos muito distintos para meninos e
meninas, pois enquanto aos primeiros se pretendia a preparação do cidadão-soldado, tornando-os
fortes e aptos a defenderam o país, às meninas era destinado aulas mais suaves, prioritariamente os
exercícios ginásticos, sendo privadas de atividade esportiva, consideradas intensas e inapropriadas
para aquilo a que estavam predestinadas: uma maternidade saudável para gerar filhos saudáveis à
nação (Castellani Filho, 1988).
A herança histórica das turmas separadas por sexo no processo de escolarização, cujo apogeu se deu
na década de 1940, no governo ditatorial Vargas e intensificada no Estado Novo, teve especialmente
na Educação Física Escolar, um papel preponderante para a desigual apropriação dos conteúdos das
aulas entre meninos e meninas. Isto porque, atualmente, mesmo décadas após o fim do regime
ditatorial e do fim da regulamentação que instituiu as aulas separadas por sexo, ou seja, ainda que
tenhamos as aulas de educação física realizadas em turmas mistas, ainda prevalece a participação
mais intensa de um dos gêneros nas aulas: o masculino.

[...] Desde seus inícios, a instituição escolar exerceu uma ação distintiva. Ela se incumbiu de
separar os sujeitos — tornando aqueles que nela entravam distintos dos outros, os que a ela
não tinham acesso. Ela dividiu também, internamente, os que lá estavam, através de
múltiplos mecanismos de classificação, ordenamento, hierarquização. A escola que nos foi
legada pela sociedade ocidental moderna começou por separar adultos de crianças, católicos
de protestantes. Ela também se fez diferente para os ricos e para os pobres e ela
imediatamente separou os meninos das meninas (Louro, 1997, p. 57).

Buscando investigar a temática gênero na prática pedagógica da educação física na escola, o objetivo
desta pesquisa foi analisar os processos educativos relacionados à educação das relações de gênero
na Escola na perspectiva de professores/as do componente curricular Educação Física.
Como procedimentos metodológicos, realizamos revisão de literatura e pesquisa de campo com a
abordagem pautada na pesquisa qualitativa, utilizando como instrumento de coletas de dados
entrevistas semiestruturadas, com seis docentes de Educação Física da Rede Pública Estadual de São
Paulo do município de Bauru e da Rede Pública Municipal de Macatuba/SP.
Após a realização das entrevistas, as mesmas foram submetidas à análise de conteúdo, na qual
destacamos duas categorias: A) “Mas só existe Futebol?” desconstruindo estereótipos e preconceitos
de gênero na escola; B) “É o que podemos fazer?” perspectivas para a Educação das Relações de
Gênero na Escola.

2 Gênero, Corpo e Educação

A identidade de gênero é algo que se constrói ao longo de nossa existência e que, portanto não é
dada a partir do momento em que nascemos, ou seja, não é previamente decidida, portanto não é
biológica. Isso nos pressupõe a entender que essa identidade de gênero é produzida na e pela cultura
e que, portanto, masculinidade e feminilidade são construções sociais (Goellner; Figueira, 2002).
Este conceito de gênero encontra seu suporte teórico nas abordagens feministas pós-estruturalistas
que, baseadas nas teorizações de Michel Foucault e Jacques Derrida, privilegiam a centralidade da
linguagem como um local de produção das relações que a cultura estabelece entre corpo, sujeito,
conhecimento e poder (Goellner; Figueira, 2002).

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Em contraposição à noção de corpo fragmentado como propõe a ciência cartesiana através do


pensamento de seu proponente René Descartes, entendemos o corpo como sendo uma construção
cultural e histórica:

No corpo estão inscritos todas as regras, todas as normas e todos os valores de uma
sociedade específica, por ser ele o meio de contato primário do indivíduo com o ambiente
que o cerca. Mesmo antes da criança andar ou falar, ela já traz no corpo alguns
comportamentos sociais, como o sorrir para determinadas brincadeiras, a forma de dormir, a
necessidade de um certo tempo de sono, a postura no colo (Daólio, 2005, p. 39).

Ainda segundo o autor, os homens e as mulheres assimilam os valores, as normas e os costumes


sociais por meio de incorporações, ele destaca a palavra inCORPOração no sentido de mostrar que é
através de gestos, danças, forma de andar, de rir, de comportar-se que nós aprendemos a cultura
que estamos inseridos:

Mais do que saber que os corpos se expressam diferentemente porque representam culturas
diferentes, é necessário entender quais os princípios, valores e normas, que levam os corpos
a se manifestar de determinada maneira. Enfim, é preciso compreender os símbolos
culturais que estão representados no corpo (Daólio, 2005, p. 40).

Entende-se aqui que o corpo é construído culturalmente de acordo com a sociedade em que ele esta
inserido, dessa maneira, suas posturas e movimentos representam os valores e os princípios de uma
determinada cultura. Portanto, aquele ou aquela que pretende atuar no corpo, deve se atentar, pois
estará atuando sobre a sociedade na qual esse corpo está inserido. A Educação Física, assim como
outras práticas (educativas, recreativas, reabilitadoras, etc) atua sobre o corpo e, portanto deve se
atentar para que sua prática não seja reducionista e sim, que compreenda e considere o homem
como sujeito da vida social (Daólio, 2005).
Não é raro ouvirmos em nossas casas, escolas, comunidades religiosas, supermercados, entre outros
lugares do cotidiano, frases como “isso é coisa de menina”, “homem não chora”, “seja mais
delicada”, entre outros jargões populares. Entretanto, por que existe à ideia de que as mulheres são
delicadas e frágeis enquanto os homens são corajosos e fortes?

Em nossa sociedade – denuncia a Psicóloga Daisy Wainberg – a mulher é seu corpo, é a


especificidade de menstruar, engravidar, parir, amamentar. Assim cria-se um espelho onde
todas se devem mirar. Se a mulher está definitivamente ancorada a um corpo natural, nada
mais normal que ela seja passiva, doce, franca, maternal, bela, sedutora, tudo por natureza
[...] (Castellani Filho, 1988, p. 59).

Nota-se que o autor na citação anterior faz referência ao “corpo natural”, ou seja, nos possibilita
compreender como o aspecto “biológico” ou o corpo biologizado historicamente conformou o
estereótipo de gênero feminino.
Segundo Goellner (2012), compreendemos que a linguagem e tem o poder construir estereótipos e
preconceitos dependendo da forma que é utilizada.

O corpo é também o que ele diz e aqui estou a afirmar que o corpo é construído, também,
pela linguagem. Ou seja, a linguagem não apenas reflete o que existe. Ela própria cria o
existente e, com relação ao corpo, a linguagem tem o poder de nomeá-lo, classifica-lo,

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definir-lhe normalidades e anormalidades, instituir, por exemplo, o que é considerado um


corpo belo, jovem e saudável (Goellner, 2012, p. 29).

Esse aspecto foi observado no estudo de Rael (2012), no qual analisa desenhos da Disney e alguns
discursos de personagens onde muito diretamente determinam as funções de feminino e masculino,
como demonstra o seguinte trecho da canção da bruxa Úrsula no filme A pequena Sereia:

O homem abomina tagarela Garota caladinha ele adora Se a mulher fica falando O dia inteiro
fofocando Homem se zanga, diz adeus e vai embora Não vá querer jogar conversa fora Que
os homens fazem de tudo para evitar Sabe quem é a mais querida? É a garota retraída E só
as bem quietinhas vão casar (Rael, 2012, p. 164).

Observamos a construção de representações acerca dos lugares, valores e comportamento que as


meninas devem ter para que consigam se casar e, por conseguinte, o comportamento que os
meninos devem esperar das meninas.

Representações estas que não são universais e nem mesmo fixas. São sempre temporárias,
efêmeras, inconstantes e variam conforme o lugar/tempo onde este corpo circula, vive,
expressa-se, produz-se e é produzido. E também onde se educa porque diferentes marcas se
incorporam ao corpo a partir de distintos processos educativos presentes na escola, mas não
apenas nela, visto que há sempre várias pedagogias em circulação (Goellner, 2012, p. 29).

Concordando com a autora, perspectivamos que a Educação das Relações de Gênero na Escola deve
considerar os discursos que permeiam o mundo vida das crianças, dentro e fora da escola, cujos
processos educativos perpassam nos discursos e mensagens presentes nos conteúdos dos filmes, das
histórias infantis, das músicas e canções de modo a orientar nossa prática pedagógica na escola, para
além de não reproduzirmos ou reforçarmos tais discursos, promovermos o diálogo que aponte as
contraposições e que coloque tais estereótipos em debate.

3 Metodologia

A pesquisa tem abordagem pautada na pesquisa qualitativa, a qual, segundo Negrine (1999: 61), “se
centra na descrição, análise e interpretação das informações recolhidas durante o processo
investigatório, procurando entendê-las de forma contextualizada”. Nesse sentido, as informações se
referem a um contexto particular não sendo possível generalizá-las.
Como procedimentos metodológicos foram realizados: revisão de literatura acerca das temáticas:
gênero e corpo; gênero e atuação docente; educação das relações de gênero bem como, pesquisa de
campo em escolas da Rede Pública Estadual e Municipal, utilizando como instrumento de coleta de
dados o questionário envolvendo: Dados Pessoais; Trajetória de Formação e de Atuação na Educação
Física Escolar e Cursos de Formação Continuada, com o objetivo de realizar o perfil dos/as
participantes da pesquisa e entrevista semi estruturada, a qual envolveu roteiro de perguntas
previamente definidas pelo pesquisador permitindo maior liberdade para o entrevistado dissertar
sobre o tema (Negrine, 1999).
A composição dos/as participantes da pesquisa teve como critérios: formação acadêmica em
licenciatura em Educação Física e atuação como professor/a de Educação Básica no componente
curricular Educação Física na Rede Pública Estadual ou Municipal há no mínimo dois anos. Os
participantes são seis professores/as de educação básica do componente curricular Educação Física

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atuantes na Rede Pública Estadual (São Paulo) e Municipal (Macatuba - SP), sendo três mulheres e
três homens identificados/as nesta pesquisa, pela sigla P1 a P6 com a indicação da letra M no caso
das mulheres e H no caso dos homens. A faixa etária é entre 27 e 50 anos, o tempo de formação
mínimo é de 7 anos e máximo de 14 anos e têm entre 4 e 10 anos de atuação na Educação Básica.
Seguindo os preceitos éticos exigidos, as/os participantes da pesquisa foram solicitados a
autorizarem a concessão de entrevista, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE).
Após a realização das entrevistas as mesmas foram transcritas literalmente e submetidas à análise de
conteúdo de natureza qualitativa, cuja técnica nomeada como análise categorial temática, conforme
proposição de Gomes (2011) permite encontrar respostas para questões formuladas a partir do
processo de categorização originado do agrupamento de ideias e expressões oriundas das falas de
cada sujeito nas entrevistas, utilizando para isso, procedimento sistemático de descrição do
conteúdo das mesmas, que permitam articular o conteúdo descrito nos enunciados com as variáveis
do contexto cultural. Essa análise consiste em descobrir os “núcleos de sentido” que compreendem
os enunciados em sua relação com o objetivo da pesquisa. Deste processo, emergiram duas
categorias, a saber: A) “Mas só existe Futebol?” - desconstruindo estereótipos e preconceitos de
gênero na escola; B) “É o que podemos fazer?” - perspectivas para a Educação das Relações de
Gênero na Escola, as quais serão discutidas a seguir.

4 Discussão dos resultados

A) “Mas só existe Futebol?” - desconstruindo estereótipos e preconceitos de gênero na Escola


Nesta categoria os processos educativos voltados para a desconstrução de esterótipos e
preconceitos de gênero na Escola, os quais têm sido mantidos seja entre os/as próprios/as alunos/as
nas aulas de educação física; seja pelos/as professores/as de outros componentes curriculares e
funcionários/as.
Nos relatos dos/as professores/as, encontramos inferências a comentários estereotipados e
preconceituosos seja no recreio ou outros espaços da escola:

Já, já teve um caso assim, de um menino que dançava muito bem, e assim, as meninas
estarem dançando na hora do recreio e um menino chegar e dançar muito bem, e alguém
comentar assim, “nossa, ele dança melhor que as meninas”, como se homens não pudessem
dançar bem, né? [...] É, também quando apresenta alguma característica masculina, a
menina apresenta, ou o menino apresenta alguma característica feminina “nossa, mais isso
não é coisa, não é jeito de menino se comportar”, isso acontece, é no ambiente escolar [...]
(P1M)

[...] eu já vi muitas professoras falando né? Quando elas levam as crianças na casinha que o
menino só quer brincar com boneca, o menino só quer brincar de casinha, a menina está
brincando de bola, a menina está correndo com os meninos, aquela menina que só corre é
uma maria-moleque. Isso tem muito (P5M)

No tocante às situações envolvendo os/as alunos/as, na aula de educação Física, o relato de P1M
exemplifica as falas pejorativas comuns dos meninos em relações às meninas, como “[...] ah
professora, ela é maior fracote, elas são fraquinhas, tem medo da bola”.
O contexto dos meninos reclamarem que as meninas “têm medo da bola” remete a construção social
e cultural que temos em relação ao nosso corpo, portanto em relação às experiências corporais que

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temos dentro do que se espera cultural e socialmente (Daólio, 2005). Dessa maneira, entendemos
que as meninas realmente têm medo da bola, pois esse elemento não fez parte de sua cultura lúdica,
de seus costumes, ou, se fez parte, foi em um grau bem inferior comparado aos meninos e, portanto,
há discrepância das habilidades entre gêneros, com nítido desfavorecimento das meninas
especialmente nas práticas esportivas que tenham como implemento a bola.
Encontramos relatos que fazem referencia aos meninos inferiorizarem as meninas como destacam os
relatos de P6H quando diz que: “Quando eu comecei inserir as meninas nos campeonatos, montando
as equipes femininas, seja no handebol ou no futebol, os meninos sempre falavam, ‘a gente é
melhor, a gente é melhor’” e de P2H “Sim. Eu tenho uma sala no 6º ano e lá que tem muito conflito
[...] e lá existe muito disso, o menino falar do cabelo da menina, do corpo da menina”.
Entendemos aqui a questão cultural evidenciada em uma sociedade patriarcal como a nossa, e faz
com que as próprias meninas e mulheres se considerem inferiores e assumirem essa inferiorização
como “natural”:

[...] Por exemplo: “ah é menina, ela é fraca”, “ele é menino, é um grosso”, “não dá pra jogar
com os meninos”, até no dia que eu soltei pipa com eles: as meninas: “ah, não dá certo, só
eles vão conseguir subir a pipa”, “só eles vão saber”, elas reclamaram. Elas conseguiram,
algumas, aí uma que conseguiu subiu pra um monte de meninas e elas ficaram toda toda
(P5M).

A comunidade escolar deve ficar atenta pois:


A corporeidade tem como referência estereótipos ligados à imagem e ao desempenho
corporais, que, não raro, são reproduzidos e perpetuados pela escola. Portanto, para muitas
pessoas, as atividades corporais, quer sejam lúdicas ou desportivas, são vistas diferenciadas
por sexo, ou seja, pular corda e jogar queimado ou vôlei é para menina, e jogar futebol e
soltar pipa é para menino (Pereira e Mourão, 2005, p. 206).

Atuando como um movimento contra corrente, notamos a intensa mobilização dos/as


professores/as em problematizar e fomentar o diálogo, como observamos nos relatos que seguem:

Então, quando eu entrei na escola, eu percebi isso. Por exemplo: o outro professor dava
futebol, a quadra era dos meninos e o que sobrava era das meninas. Eu comecei a perceber
isso e comecei a colocar essa discussão pra eles: “Mas porque que você tem usar quadra e as
meninas não?” – “ah, mas as meninas não jogam futebol” – “Mas só existe futebol?” (P2H).

[...] se é uma mais tímida elas às vezes guarda pra elas, mas eu nunca deixo passar, se tem
um problema desse eu paro, converso, tem um aluno específico que eu tenho que ficar em
cima, ele já melhorou bastante, hoje ele para pra pensar mais, mas eu fico em cima, não
deixo acontecer muito (P1M).

Interessante notar nos relatos a seguir, a preocupação dos/as professores/as com o debate e com a
reflexão a partir de situações concretas vivenciadas em aula, de modo a fazer um debate e assim
construir um novo conhecimento, uma nova visão para determinada situação:

Eu observo, de primeiro momento eu interfiro, aquele aluno que faz muito, eu espero para
ver se ele percebe o que ele ta fazendo que não ta sendo legal, e aí eu converso com ele e
geralmente ele vê que está errado e pede desculpa, então [...] eu quero que o aluno perceba
que ele está cometendo, tendo uma atitude errada, né? (P1M)

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Aconteceu. Para tudo, vamos formar um circulo e a gente debate. Tem que conversar.
Porque você vai deixando, às vezes uma coisa tão pequena que é pra mim assim, a pessoa
falar, mas pra uma criança é diferente, ela vai guardando [...] (P2H).

Interfiro. Porque assim, eu busco fazer com que eles se coloquem no lugar. Essa coisa de dar
autonomia pro aluno, trazer o aluno pra ser protagonista do processo, eu gosto muito [...]
todo final de aula a gente tem uma roda de conversa, onde a gente expõe às coisas que
acontece na aula, e como a gente poderia fazer o que já foi resolvido ali [...] (P6H).

As intervenções didáticas que os/as professores/as realizam em suas aulas para promover a
educação das relações de gênero para além do diálogo e reflexão, envolvem também um constante
repensar as estratégias metodológicas, dentre elas, proporem intervenções durante as atividades
com mudança de regras e de materiais:

Depende do jogo, às vezes quando eu percebo que só os meninos estão jogando eu paro o
jogo e falo “vou por uma regra nova agora, pra fazer o gol ou pra fazer o ponto, tem q passar
pra uma menina, depois a menina passa pra você e faz o gol”. Às vezes eu tenho que
inventar uma regra. Senão fica só os meninos, as meninas começam a reclamar e param
(P1M).

A preocupação com as mudanças de regras não era apenas em relação às meninas, mas também
com outros/as alunos/as que por algum motivo ficam a margem da turma, ou por serem mais
gordinhos/as, por possuírem alguma necessidade especial ou por serem menos habilidosos(as):

Desde o começo eu não coloco, tento colocar depois assim, mas não só especificamente pras
meninas, porque os meninos excluem outros meninos, que às vezes são mais gordinhos, que
não conseguem fazer de tudo, então eles excluem também, ai eu tenho que colocar regra
conforme vai precisando (P5M).

Um dos professores menciona que não altera as regras do jogo quando coloca meninos e meninas
para jogarem juntos. A maneira que esse professor encontrou para não impor regras, pode minimizar
ideias estereotipadas em relação a homens e mulheres, uma vez que, estão criando regras
coletivamente para um todo:

Não. Porque eu trabalho a construção né. Eu to seguindo uma linha de esporte educacional
onde a construção do jogo, em si, das regras é toda por eles mesmos, né? Eu apenas medio
essa construção. Então o que acontece é, eles mesmos perceberem quais adaptações que
eles buscam. Então isso me facilitou o trabalho com relação à inserção de todos, em comum.
Eu não consigo mais ver isso, se você pegar uma aula hoje eu não consigo ver mais se é
menino ou menina. Ainda há alguma ou outra reclamação na questão da força, né? Mas eu
busco minimizar o máximo possível (P6H).

Os relatos trouxeram a tona que é premente trabalhar para a educação das relações de gênero de
forma que as meninas se sintam fortalecidas e não mais inferiores aos meninos para reivindicar
igualdade de oportunidades e direitos na escola e fora dela e os meninos se percebam importantes
nesse processo e se aliem a elas. Para além das crianças, a comunidade escolar também precisa ser
reeducada e estar atenta aos posicionamentos e falas preconceituosas no espaço da Escola.

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B) “É o que podemos fazer?” - perspectivas para a Educação das Relações de Gênero na Escola
Nesta categoria tem relevo o suporte para a educação das relações de gênero se efetivar na escola
tanto no campo da formação docente (inicial e continuada) como no âmbito das ações da escola
nessa direção.
Pode ser observado nessa análise, que todos(as) entrevistados(as) julgam extremamente importante
a temática gênero estar presente no cotidiano dos alunos e alunas de forma a contribuir para a
educação das relações de gênero:

Sem dúvida, eu acho extremamente importante trabalhar esse tema porque a gente vive
numa sociedade que divide os gêneros, né? Em relação a que menina só pode dançar e
menino só pode jogar bola. Então a gente tem que quebrar essa questão porque a sociedade
ela é um pouco machista [...] então acho importante a gente estar trabalhando com as
crianças para elas perceberem que não importa se você, se o menino gosta de dançar, não
quer dizer que ele tenha opção por coisas de menina só não, acho que a gente tem que estar
mostrando que o que importa é o que ele gosta, o que ele se sente bem [...] (P1M).

Por outro lado, P5M mencionou que acha importante o trabalho de gênero na escola, mas não se
sente preparado para realizar um trabalho sistematizado, pois como ele diz “[...] eu não sei como
abordar, assim [...] surge ai a gente discute, mas eu não sei como seria estruturar isso” (P5M).
Esse relato mostra a relevância dos programas de formação continuada para Educação das Relações
de Gênero e que se efetivem como políticas de educação para todo o quadro da Educação Básica.
Podemos constatar na fala de P2H, que tais ações acabam por se tornarem pontuais, com iniciativas
isoladas por parte de alguns memebros da comunidade escolar:

Então, atualmente, acho que precisa trabalhar sim, porque, lá na minha escola até a gente
fez uma atividade de gênero [...] e tava havendo muito conflito, e a coordenação resolveu
fazer uma atividade com um Drag Queen [...] ela ia dar uma palestra, [...] explicou a vida
dela, começou a conversar, porque na escola havia muito preconceito com isso, assim toda
escola tem. [...] por exemplo, hora de ir no banheiro [...] se ele é homossexual, eu to no
banheiro, ele também ta [...] ah você tava no banheiro com fulano. [...] É o preconceito né?
(P2H).

Diante deste discurso, entendemos que é muito importante que a temática Gênero seja inserida no
projeto político pedagógico de forma permanente e envolvendo todos os componentes
curriculares,pois quando ficam no plano da eventualidade, as ações pontuais se não forem
retomadas, podem perder o sentido de construção de conhecimento e de valores e assim ficar sem
contexto para os alunos e alunas.

5 Conclusões

Esta pesquisa teve por objetivo, analisar e compreender as questões de gênero na prática
pedagógica da Educação Física escolar, de modo a investigar a perspectiva de professores e
professoras acerca da educação das relações de gênero na escola. Os resultados permitiram
constatar que existe a preocupação por parte dos docentes nas aulas de educação física com as
desigualdades entre gêneros, os quais procuram intevir sempre em favor de questioná-las ou
revertê-las quando ficam evidentes em alguns conteúdos, como por exemplo, jogos, esportes e

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dança. Dessa maneira, entendemos que os(as) docentes se esforçam continuamente para a
educação das relações de gênero, entretanto, é preciso que sejam preparados para trabalhar com
esse tema, uma vez que é complexo e decorrente de um contexto cultural patriarcal que reforça
estereótipos. Por isso a necessidade de um direcionamento das ações dos docentes quanto as
discussões e orientações referentes a temática gênero com seus alunos e alunas, no sentido de
problematiz´-las enquanto contruções culturais que podem ser transformadas. Outro aspecto
observado é o reforço da comunidade escolar em relação aos estereótipos de gênero.
Funcionários/as, professores/as, alunos/as fazem cotidianamente comentários discriminadores, uma
vez que esse tema não faz parte das discussões que permeiam a comunidade escolar.Destacamos a
relevância do direcionamento de políticas públicas para a educação das relações de gênero,
envolvendo particularmente o incremento, estímulo e viabilização de cursos de formação continuada
para toda comunidade escolar, pois é imprescindível que os/as docentes tenham espaços garantidos
para ações formativas, de modo a serem preparados/as para problematizarem situações de
discriminação e preconceito relacionados a gênero e que a escola viabilize a participação dos
mesmos em cursos de atualização para o aprimoramento de suas ações no ambiente escolar.
Reiteramos a relevância do aprofundamento nos estudos e pesquisas de natureza qualitativa acerca
da temática gênero, que tragam à cena as experiências da comunidade escolar, sejam docentes
como no caso desta pesquisa, mas também, os/as discentes e seus familiares, de modo que tais
experiências possam iluminar as políticas públicas que valorizem a Escola como propulsora da
educação das relações de gênero.

Referências

Castellani Filho, Lino. (1988). Educação física no Brasil: a história que não se conta. Papirus Editora.

Daolio, Jocimar. (2005). Da cultura do corpo. Campinas: Papirus.

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Goellner, Silvana V. (Orgs.). Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo na
educação. Petrópolis: Vozes.

Goellner, Silvana V.; Figueira, Márcia L. M. (2002). Corpo e gênero: a Revista Capricho e a produção
de corpos femininos. Motrivivência, 1(19), 1-13.

Gomes, Romeu. (2011). A análise de dados em pesquisa qualitativa. In Minayo, Maria C. S. (Org.).
Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes.

Louro, Guacira L. (1997). Gênero, sexualidade e educação - uma perspectiva pós-estruturalista.


Petrópolis: Vozes.

Negrine, Airton. (1999). Instrumentos de coleta de informações na pesquisa qualitativa. In Molina


Neto, Vicente; Triviños, Augusto N. S. (Org.) A pesquisa qualitativa na educação física:
alternativas metodológicas. Porto Alegre: Editora Universidade/ UFRGS/ Sulina.

Pereira, Sissi A. M.; Mourão, Ludmila. (2005). Identificações de gênero: jogando e brincando em
universos divididos. Motriz, Rio Claro, 3 (11), 205-210.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Rael, Claudia C. (2012). Gênero e sexualidade nos desenhos da Disney. In Louro, Guacira Lopes;
Felipe, Jane; Goellner, Silvana V. (Org.) Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo
na educação. Petrópolis: Vozes.

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Conhecimentos produzidos
a partir da Pesquisa Narrativa em Educação Musical
Leda de Albuquerque Maffioletti1
Maria Helena Menna Barreto Abrahão2

1Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. leda.maffioletti@gmail.com


2Faculdadede Educação, Universidade Federal de Pelotas, Brasil. abrahaomhmb@gmail.com

Resumo. Este artigo situa-se no campo Pesquisa Narrativa em Educação Musical, que encontra na
abordagem (auto)biográfica os fundamentos do seu método. Analisa quatro dissertações de mestrado com
o objetivo de compreender de que modo os pesquisadores narrativos expressam as aprendizagens que
realizaram e o que foi formador em seu percurso. Com base na discussão do método empregado, os
resultados mostram que as estratégias de análise, em sintonia com os objetivos propostos, favoreceram o
movimento reflexivo na busca de compreensão do fenômeno estudado. As leituras direcionadas aos
aspectos teórico-metodológicos do método possibilitaram destacar ideias-chave que conectam os fios da
coerência que imprimem sentido à pesquisa como um todo; a análise do processo formativo capturado a
partir das narrativas de seus autores tornaram visíveis os significados atribuídos às aprendizagens
realizadas, destacando-se o valor das reflexões e ressignificações próprias da pesquisa (auto)biográfica
como abertura para as aprendizagens do saber-fazer pesquisa no campo da Educação Musical.
Palavras-chave: Método (auto)biográfico; educação musical; percurso metodológico

The knowledge produced from the Narrative Inquiry in Music Education


Abstract. This article is part of the field of Narrative Inquiry in Music Education, whose method is based in
the (auto)biographical approach. It looks into four Master’s dissertations in order to understand how
narrative researchers express the learnings they experienced and the educational elements in their
trajectory. Based on the discussion about the method employed, the results show that the strategies of
analysis, which are in line with the proposed objectives, favored reflexive movement in order to understand
the phenomenon under study. The readings directed to the theoretical-methodological aspects of the
method allowed us to point out key ideas that connect the threads of coherence that ascribe meaning to
the research as a whole; the analysis of the educational process captured from authors’ narratives showed
the meanings ascribed to learnings, highlighting the value of reflections and re-interpretations typical of
(auto)biographical research as an opening toward learnings of research know-how in the field of Music
Education.
Key words: (auto)biographical method; music education; methodological trajectory.

1 Introdução

Os cursos de pós-graduação, enquanto espaço de produção do conhecimento, dedicam-se à


formação de profissionais qualificados para o exercício das atividades de ensino, pesquisa e
extensão. Para garantir a eficácia dos seus objetivos, conta com a produção de conhecimentos
advindos de pesquisas nas mais diversas áreas do conhecimento. Embora seja um objetivo também
dos cursos de Graduação, o investimento em pesquisa é mais decisivo na pós-graduação, inclusive
como objetivo prioritário. Na sequência, professores e graduandos necessariamente se envolvem em
processos investigativos, para os quais precisam conhecer as exigências epistemológicas,
metodológicas e técnicas (Severino, 2009). Conforme defende Gatti (2001, p. 75), para fazer ciência É
fundamental o conhecimento dos meandros filosóficos, teóricos, técnicos e metodológicos da
abordagem escolhida.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A presente investigação se insere no campo da pesquisa (auto)biográfica1, explicitando a


especificidade desse tipo de abordagem, principalmente o conceito de narrativa vinculado às
experiências culturais, conforme Bruner (2008). O autor entende que as pessoas não participam do
mundo da cultura conectando-se aos eventos um a um, mas enquadram esses eventos em estruturas
mais amplas, a partir das quais apreendem o contexto interpretativo para os significados que ela
abarca. A forma típica de esquematizar as experiências vividas no mundo da cultura são as
narrativas. Elas são consideradas veículo natural de nossas crenças, suposições e modos de
compreender o mundo; apresentam a duplicidade de ser ao mesmo tempo uma ação sobre o mundo
real e um evento mental na consciência do narrador. A ação sobre o mundo real é a motivação que
impulsiona as narrativas, transformando o ato de narrar em experiência mental que faz a mediação
entre o mundo da cultura e o mundo das crenças desejos e esperanças humanas (Bruner, 2008).
Assim consideradas, as narrativas, o contexto e a temporalidade da experiência são elementos
inseparáveis, razão pela qual as narrativas recebem um tratamento diferenciado no âmbito da
pesquisa (auto)biográfica. A especificidade da abordagem (auto)biográfica se distingue por sua
posição ética e epistemológica ao abordar questões ligadas ao conhecimento; por deixar explicita a
sua posição ontológica no modo de questionar o eu e sua posição no mundo; e por seu recorte
hermenêutico no modo de considerar a subjetividade (Bolívar, 2014).
Semelhante ao que acontece em outras áreas do conhecimento, a área de Artes tem se dedicado ao
estudo de narrativas na perspectiva (auto)biográfica. Em levantamento realizado sobre a presença
da área nos Congressos de Pesquisa (Auto)biografia (CIPA I, III, e V), foi constatado que os estudos
biográficos e autobiográficos de obras artísticas e os estudos que envolvem memórias e práticas de
formação no campo da música e educação têm sido foco de interesse. A contribuição dessa área ao
campo (auto)biográfico pode ser observada nas articulações teóricas que os pesquisadores criam
para dar conta de suas indagações. No que se refere especificamente à área de Educação Musical, os
pesquisadores se interessam principalmente pelos estudos sobre a memória, histórias de vida e
práticas de formação (Maffioletti, 2016).
A inserção dos pesquisadores brasileiros da área de Educação Musical no campo da pesquisa
(auto)biográfica ocorre pela adoção do seu referencial teórico-metodológico, embora não haja
uniformidade no modo de se referir às suas áreas de atuação. Por exemplo, Abreu (2011) refere-se à
abordagem (auto)biográfica em educação musical, Alves (2014) refere-se a narrativas biográficas nas
pesquisas em educação musical. Já Cunha (2013) refere-se ao campo biográfico- narrativo, conforme
sugerem os autores Bolívar; Domingo; Fernándes (2001); também se refere ao campo específico da
Educação Musical como Pesquisa Narrativa em Educação Musical, tal como defendem Barrett e
Stauffer (2009), os autores do presente texto (Maffioletti e Abrahão, 2014).
Dentre os trabalhos brasileiros que seguem a abordagem (auto)biográfica podemos citar Torres
(2003), Loro (2004), Loro; Teixeira: Raposo (2014), Seródio (2007), Abreu (2011), Dourado (2013)
Glauke (2014), Silva (2014), Cardoso (2014), , entre outros. Voltadas aos estudos das histórias de
vida, e/ou a episódios de histórias de vida envolvendo a música, podemos citar Garbosa (2008 )
Anzei; Garbosa (2013), Lima (2013) Cunha (2014), Maffioletti (2010), Maffioletti e Abrahão (2016) e
Santana, 2016.
Ainda com relação à revisão da literatura sobre o tema, examinamos trabalhos que enfocam
trajetórias metodológicas de pesquisas de mestrado e doutorado. Encontramos a pesquisa de
Arruda; Joly (2016), que analisa sete dissertações de mestrado e uma de doutorado, ligadas à linha
de pesquisa Práticas Sociais e Processos Educativos, do Programa de Pós-Graduação em Educação do
Universidade Federal de São Carlos. A pesquisa teve por objetivo discutir os conceitos mais

1 O termo (auto)biográfico inclui parênteses para chamar a atenção sobre dois tipos de fontes nas pesquisas educacionais: as
biografias e autobiografias. (Passeggi, 2010, p. 108)

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significativos abordados em contextos de práticas e ensino musicais coletivos e sistematizar as


escolhas metodológicas feitas para estes estudos. As primeiras discussões buscaram responder as
seguintes questões: como as pessoas se educam?, onde?, e em que relações?. As análises revelaram
que algumas palavras foram mais constantes que outras e estavam presentes em todos os trabalhos.
Elas fazem referência ao aporte teórico adotado na pesquisa e remetem à compreensão do
significado das aprendizagens obtidas por seus autores. Arruda e Joly consideram que os contextos
nos quais as pesquisas foram desenvolvidas têm forte conexão com as vidas e modos de pensar dos
pesquisadores. A convivência entre os sujeitos e o pesquisador no ambiente da pesquisa são
aspectos fundamentais para as pesquisas em educação musical que adotam a abordagem
humanizadora.
Observamos nas pesquisas analisadas a estreita conexão entre a abordagem adotada e caminho
percorrido pelo pesquisador. A teoria adotada, enquanto dimensão mais ampla que dá sustentação
aos procedimentos, fornece o contexto a partir do qual os dados são compreendidos.

2 Método

O objetivo da presente pesquisa é compreender de que modo os pesquisadores narrativos


expressam as aprendizagens que realizaram e o que foi formador em seu percurso. O corpus
analisado é um material já existente, acabado e publicado no repositório LUME da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Trata-se de quatro dissertações de mestrado que apresentam em
comum a temática ligada área da Educação Musical, no âmbito da pesquisa (auto)biográfica, e o fato
de terem sido produzidas no mesmo período de tempo e orientadas pelo mesmo orientador, no
caso, a primeira autora do presente artigo. As reflexões orientam-se pela seguinte questão: de que
modo os pesquisadores expressam o que aprenderam ao realizarem suas pesquisas? O que foi
formador nesse percurso?
Projetamos, dois planos de análise: o primeiro, ligado aos processos de aprender-fazer pesquisa,
procura identificar os parâmetros que caracterizam a abordagem (auto)biográfica; o segundo,
mediante descrição densa e narrativa, busca encontrar, no caminho percorrido pelos autores
analisados, os significados das experiências e aprendizagens obtidas. Juntos, os dois planos de análise
tornam explícitas a potência teórica e riqueza explicativa na pesquisa narrativa em educação musical.
Atendendo aos limites deste artigo, será apresentado o percurso de um dos autores das dissertações
analisadas.

2.1 Instrumento de análise e procedimentos

As dissertações foram analisadas tomando-se como referência os parâmetros que constituem um


plano de pesquisa. Inspirados nas investigações do Grupo de Pesquisa Profissionalização Docente e
Identidade: narrativas na primeira pessoa (GRUPRODOCI)2, foi construída uma ficha de leitura
abrangendo os seguintes parâmetros: objetivos da pesquisa, principais autores referidos no corpo do
trabalho, tipo de abordagem, forma de construção das fontes de pesquisa, forma de análise, relação
com o campo teórico-metodológico e principais resultados.
A abordagem trabalhada refere-se ao enquadramento metodológico que seu autor define:
(auto)biografia, história oral, história de vida, etnobiografia, narrativa de vida, biografia educativa ou

2
Publicado em: Abrahão, Maria Helena Menna Barreto; Frison, Lourdes Maria Bragagnolo; Barreiro, Cristhianny Bento.
(Orgs). A Nova Aventura (Auto)Biográfica - Tomo I, Porto Alegre: EDIPUCRS. 2016, p. 415-447. ISBN do livro impresso: 978-
85-397-0836-9; ISBN do e-Book: 978-85-3970835-2

922
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narrativa de formação, investigação-formação, ateliês biográficos, ou a expressão exata como o


próprio pesquisador a empregou. O parâmetro forma de construção das fontes de pesquisa informa
o modo como o pesquisador obteve as informações de sua pesquisa: entrevista; escritas de si;
consulta a documentos prévios ou já existentes, ou outros dispositivos não previstos. O modo como
o autor leu e interpretou os dados de sua pesquisa pode ser apreciado a partir do parâmetro forma
de análise: análise de discurso; análise hermenêutica ou outra. Com base nesse conjunto de
informações, foi possível compreender o tipo de relação que a dissertação estabelece com o campo
da pesquisa (auto)biográfica, momento que possibilitou concluir se esta apresenta ou não um
diálogo específico com a pesquisa/formação (auto)biográfica; se o referencial teórico foi construído a
partir de outros campos de estudo, mas busca na abordagem (auto)biográfica contribuições teóricas
e/ou metodológicas; ou se foi construído a partir das referências teórico-metodológicas do campo
(auto)biográfico. Por fim, analisamos os principais resultados da pesquisa.
A fichas foram preenchidas a partir do que foi encontrado nas dissertações, desse modo obtivemos
uma síntese detalhada de cada trabalho analisado e os conhecimentos que os pesquisadores
mostram ter se apropriado, tanto sobre o aprender-fazer pesquisa, como os conhecimentos novos
produzidos pela pesquisa. O passo seguinte foi o estudo comparativo das pesquisas entre si. Para
viabilizar as articulações envolvendo simultaneamente todas as dissertações, criamos um quadro
geral onde todas as informações foram registradas. Esse procedimento favoreceu a identificação das
singularidades e particularidades, assim como o estabelecimento de relações comparativas e
associativas necessárias aos processos de interpretação e compreensão dos resultados. Por exemplo:

Quadro 1 - Quadro geral das sínteses para estudo comparativo (não preenchido)
Dissertação Objetivo Abordagem Principais Construção das Forma de Relação c/campo Principais
autores fontes análise (auto)biográfico resultados

Por fim, as reflexões foram discutidas a partir do quadro teórico de referência.

2.2 Dissertações analisadas.

1. Anders, Fernanda (2014). Dançar na aula de música: Dá gosto de vir para o colégio. Porto Alegre,
116p. Programa de Pós-graduação em Educação (Dissertação de Mestrado) Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. Porto Alegre.

2. Lopes, Mariana Fonseca (2014). As dores e amores de tornar-se professora: minhas memórias de
professora iniciante. Porto Alegre, 104p. Programa de Pós-graduação em Educação (Dissertação de
Mestrado) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre.

3. Rasslan, Simone Nogueira (2014). O sujeito-ator e a música na constituição de si: Uma perspectiva
narrativo-biográfica. Porto Alegre, 162p. Programa de Pós-graduação em Educação (Dissertação de
Mestrado) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre.

4. Soares, Iuri Correa. Significados das aulas de música na escola: um estudo narrativo com duas
estudantes do ensino médio. Porto Alegre, 146p. Programa de Pós-graduação em Educação
(Dissertação de Mestrado) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2014.

2.3. Resultados das análises

A partir dos parâmetros eleitos, apresentamos a síntese dos resultados encontrados:

923
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Anders, F: Objetivo: Compreender o significado atribuído à dança nas aulas de música. Principais
autores: Jean Clandinin e Michael Connelly (2008), Dornelles e Bujes (2012), Strazacappa (2001),
Schiller e Meiners (2012). Abordagem trabalhada: pesquisa com crianças. Forma de construção das
fontes: Grupo de discussões e entrevistas individuais; Forma de análise: Análise temática e de
contexto; Relação com o campo (auto)biográfico: Construído a partir do referencial do campo.
Principais resultados: O contexto escolar, familiar e social estão presentes nas narrativas das
crianças, sendo a dança reconhecida nesses espaços como importante forma de interaçao ̃ . O
significado de dançar nas aulas de música está relacionado ao prazer vivido com o corpo e às
sensações de alegria, satisfação e leveza que o movimento propicia. As crianças consideram que
dançando é possi ́vel conhecer outras culturas, entender melhor o ritmo das músicas e tocar flauta
doce com maior facilidade.

Lopes, M: Objetivo: Compreender o que foi realmente transformador e significativo na constituição


do ser-professora em início de carreira; Principais autores: Souza (2007, 2011); Abrahão (2011),
Passeggi (2006, 2008) e Josso (2004, 2010) Abordagem trabalhada: Narrativas de formação; Forma
de construção das fontes: elaboração de memoriais; Forma de análise: análise temática e de
contexto; Relação com o campo (auto)biográfico: Construído a partir do referencial do campo.
Principais resultados: O estudo tornou visível para sua autora o compromisso social e politico que
caracteriza sua atuação profissional nos diferentes momentos narrados. As transformações mais
significativas foram aquelas em que o seu modo de agir foi questionado e a compreensão
momentaneamente desestabilizada. Ao final dessa trajetória, entende que voltar-se para si mesmo é
um movimento necessário ao desenvolvimento pessoal e profissional.

Rasslan, S: Objetivo: Compreender os modos de subjetivação pelos quais atores tornam-se sujeitos
de sua prática musical; Principais autores: Jerome Bruner (2002; 2000) e Michel Foucault;
Abordagem trabalhada: narrativas autobiográficas; Forma de construção das fontes: entrevistas
individuais e coletivas; Forma de análise: Análise inspirada na perspectiva arqueológica foucaultiana;
Relação com o campo (auto)biográfico: Construído a partir do referencial do campo e campos afins;
Principais resultados: A constituição musical do ator é condição inevitável para sua prática
profissional; igualmente, que a subjetividade inscrita na apropriação da experiência musical, ao longo
da vida, ocorre como cuidado de si e prática de si, e se torna fundamental para o aperfeiçoamento
do ofi ́cio do ator e para a constituição de si mesmo.

Soares, I: Objetivo: compreender os significados que as participantes atribuem à s experiências que


tiveram nas aulas de música da escolar; Principais autores: Boli ́var (2012), Abrahão (2004), Connelly
e Clandinin (1990, 2006) Abordagem trabalhada: Episódios de vida, memórias: Forma de construção
das fontes: Entrevistas; Forma de análise: análise narrativa, temática contextualizada; Relação com o
campo (auto)biográfico: Construído a partir do referencial do campo; Principais resultados: A aula é
caracterizada como agradável pelo modo animado como o professor atua, pela autonomia dos
estudantes na realização das tarefas, pelo aspecto socializador e pelo resultado esteticamente bonito
da prática musical. Há relação entre a caracterização da aula de música como experiência agradável e
̃ como momento de aprendizagem musical. Essa relação passa pelo modo como
sua não significaçao
os espaços de aprendizagem são constitui ́dos pela cultura escolar.

3 Discussão

Os trabalhos analisados mostram atenção especial ao marco conceitual referente à metodologia


empregada. A literatura sobre o tema afirma que a constituição do marco teórico conceitual do

924
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método de pesquisa é essencial, para que a intencionalidade não se perca em detalhes supérfluos
em detrimento do que é relevante. A base conceitual da pesquisa pode organizar uma sequência
coerente de ações, no quadro polifônico, com sentido (Bolívar; Domingo, Fernandez, 2001, e Bolívar,
2012).
Observamos que a forma de construção das fontes (entrevista individuais ou em grupo, escrita de
memoriais) decorre ou ajusta-se claramente ao tipo de conhecimento que se pretende obter. A
temática da pesquisa, os autores e a literatura escolhida demarcam a especificidade do campo onde
as discussões se situam. Por exemplo, autores diferenciados fizeram parte das discussões de Anders,
devido à inserção de sua temática na área da dança. Da mesma forma, sentimos a presença das
ideias de Michel Foucault no enfoque de Rasslan sobre a subjetividade enquanto constituição do ser
musical do sujeito ator. A abordagem de Lopes, do tipo Narrativas de Formação, distingue-se das
demais por envolver elaboração de memoriais pelo próprio pesquisador, enquanto que as outras três
dissertações o material de análise são narrativas produzidas pelos participantes da pesquisa. Assim,
entendemos o valor formativo das reflexões na formação dos pesquisadores, sendo no caso de
Lopes, um momento especial no desenvolvimento de suas identidades pessoal e profissional.
As articulações entre as tramas narrativas capturadas por Soares, tornam visíveis o modo como as
experiências musicais das participantes nortearam a produção de significados atribuídos às aulas de
música na escola. Os resultados de sua pesquisa conectam as experiência, os significados atribuídos a
elas e a produção do conhecimento sobre a música na escola.
Dentre os princípios metodológicos empregados para articular sentido (Bolívar; Domingo; Fernandez
2001), destacamos a mediação feita pelos pesquisadores entre a história individual narrada pelos
participantes e a história social de outras pessoas e outros eventos do contexto cultural, como via de
acesso ao conhecimento social propiciado pelas práticas musicais.
O conjunto das informações levantadas permitiu traçar o fio de coerência entre os objetivos das
pesquisas, métodos de análise e resultados, expressando relações de interdependência mútua,
ressaltando-se a importância da formulação adequada da questão de pesquisa como requisito
essencial para sua inserção no âmbito da pesquisa (auto)biográfica.
Considerando tais constatações, parece razoável admitir que os pesquisadores apropriaram-se dos
fundamentos epistemológicos, filosóficos e antropológicos da abordagem (auto)biográfica e, a partir
deles, configuraram seus objetos de estudos e as formas de compreensão e interpretação dos
fenômenos estudados.
Semelhante ao que foi encontrado na pesquisa de Maffioletti (2016), observamos que a abordagem
metodológica da pesquisa narrativa em educação musical comporta diferentes enfoques, podendo
acolher pesquisa com crianças, narrativas de formação, análise de memoriais; episódios de histórias
de vidas capturadas a partir de entrevistas individuais ou em grupo, registros em cadernos de
memórias e diários de campo do pesquisador.
Em contraste com a teorização a respeito do método (auto)biográfico, a diversidade das abordagens
encontradas pode encontrar explicação no texto da Passeggi (2010) quando mapeia os estudos e
pesquisas autobiográficas em dois eixos: um eixo horizontal e um eixo vertical (no formato de cruz).
No eixo horizontal situam-se as práticas de formação, consideradas de um lado as práticas de
formação de adultos (professores, profissionais ou gestores), e de outro as práticas de formação dos
formadores (a pessoas que acompanha o adulto em formação. No eixo vertical situa-se no alto o
método de pesquisa e na base os modos de (auto)biografar. Vistas desse modo, os direcionamentos
da pesquisa (auto)biográfica podem se ampliar em pelo menos quadro direções.
A atendendo aos limites do presente artigo, passamos a analisar o caminho percorrido por um dos
autores, Fernanda Anders, com o objetivo de elucidar seu modo peculiar de produzir conhecimentos
acerca de si mesmo e sobre o seu objeto de pesquisa. Assumimos a perspectiva interpretativa que
emerge das leituras sucessivas e da descrição densa das experiências de aprendizagem registradas na

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dissertação analisada. A autora será referida pelo primeiro nome, estabelecendo-se assim maior
proximidade com narrativa que se desenrola.

3.1 As aprendizagens do pesquisador narrativo

Fernanda inicia-se na profissão no ano em que concluiu o curso de Licenciatura em Música (2005).
Um aspecto importante no seu trabalho é que os sujeitos de sua pesquisa são seus próprios alunos.
Considerando que muitos deles foram seus alunos em anos anteriores, ela considera que Esse
detalhe é significativo para mim, por imaginar que eles devem estar percebendo que modifiquei a
maneira de conduzir as aulas. (Anders ,p.16).
No quadro dinâmico dos saberes adquiridos, destacam-se as aprendizagens de saberes práticos
construídos na sala de aula, com um profundo investimento pessoal nas interações com os alunos.
Mostra entender que dessa relação dependem as negociações de sentidos que se estabelecem na
classe.
Fernanda precisou aprender a transitar do espaço da sala de aula, no espaço da instituição onde
trabalha e no espaço das famílias. Porque a cultura dos diferentes espaços ou contextos se
encontram na sala de aula. A cultura sugere, até mesmo determina, as relações dentro da sala de
aula.
É comum observar nas escolas uma grande preocupação em relação ao domínio que o
professor deve ter da turma. Atividades que envolvem movimento e que geram agitação,
barulho como a dança e as improvisações musicais, muitas vezes podem ser entendidas
como professor sem domínio de classe. Assim, minha preocupação com o que a direção e
as minhas colegas pensariam, fazia com que algumas vezes nem cogitasse realizá-las.
(Anders p. 22)
A solução encontrada por Fernanda exigiu dela um empenho muito especial junto à direção e aos
pais: Foi preciso criar atividades como saraus, reuniões com pais e direção, para explicar que aquele
barulho e tumulto gerados no início era produtivo, pedagógico e importante para o aprendizado
musical. (Anders, p. 22)
Apoiando-se em Tardif (2002, p.50), Fernanda reconhece que a atividade docente ocorre numa rede
de relações com outras pessoas, razão pela qual passou a buscar a parceria dos pais no aprendizado
de seus filhos, informando-os sobre o processo de aprendizagem.

3.2 De onde provém as reflexões

É a partir do momento presente que Fernanda lança seu olhar para a professora que foi no inicio da
carreira. As reflexões sobre sua trajetória deixam transparecer os sentimentos que acompanharam
suas experiências, o modo como ela se reconhece nas experiências pelas quais passou, as
aprendizagens e formas de compreensão que permitiram a ela compreender-se como pessoa em
processo de formação.
[…] fui experimentando diferentes metodologias, escolhendo e construindo um
programa baseado na experiência do que funcionava bem em sala de aula, no que era
importante para o aluno durante o processo de aprendizagem. Essas escolhas mudavam
conforme as turmas e os alunos envolvidos. (Anders, p.14.)
Se por um lado penso que teria sido muito bom trabalhar com a dança lá no início da
docência, por outro lado não consigo me imaginar segura suficientemente para realizar
naquela época as atividades que realizo hoje (Anders, p. 15).
Em consonância com os estudos de Marcelo (2001), Fernanda percebe que a escola não tem
respostas prontas aos desafios da prática docente Inicialmente, suas preocupações giravam em torno

926
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do planejamento e da gestão da classe. Somente mais tarde é que passa a tirar proveito dos
momentos em que os acontecimentos da aula escapavam da lógica prevista, e lhe exigia criatividade
e a rapidez para pensar.
No início da minha docência, a dança não era contemplada no meu planejamento diário.
Muitas atividades empolgantes eram realizadas, jogos musicais, brincadeiras, que às
vezes aconteciam de improviso quando as atividades planejadas não davam certo.
Algumas vezes, as aulas mais legais eram aquelas em que nada planejado dava certo. E
haja criatividade e rapidez para pensar e reorganizá-las no momento da aula. (Anders,
2014, p. 17).
Apoiada em Josso (2010a) ela acreditou nos efeitos das reflexões sobre suas aprendizagens e
atividades educativas. Conscientemente vasculhou seus primeiros anos de docência, revivendo
sentimentos e iniciativas que deixaram marcas significativas. O sentimento de segurança que hoje
experimenta acerca do seu trabalho não emerge no vazio. Ele é fruto de reflexões sobre si mesma,
auxiliadas pelas leituras de autores que, a partir de outras culturas, oferecem um novo registro para
pensar suas experiências. As leituras foram uma demanda sua necessárias à compreensão das
experiências vividas ao longo de sua trajetória de professora, e como fonte de compreensão das
narrativas das crianças. Como defende Josso (2010b) os saberes teóricos e experienciais coexistem
harmoniosamente, se entrecruzam e se articulam, preservando ainda a autonomia de cada um.
Vistas por esse ângulo, a trajetória de Fernanda dialoga com a literatura internacional sobe o tema
formação de professores ao longo da vida.
Voltar-se para a criança para aprender com elas o significado de suas experiências tornou-se possível
devido ao novo espaço de reflexão sobre as minhas próprias experiências (Anders, p. 15).
Na contramão dos discursos sobre a falência da escola enquanto instituição cultural e dos
professores como agentes na transmissão da cultura, as aprendizagens de Fernanda mostram a
presença no contexto escolar de um certo modo de pensar, de se comportar, de estar com os outros,
que caracterizam a cultura familiar, cultura escolar e suas articulações com a cultura pessoal de
Fernanda.
A cultura do contexto sociocultural está presente tanto nos valores que promovem o vínculo, de
estar junto, de conviver, de dançar, brinca e se divertir , aprender com o outro, quanto nas práticas de
educação musical criadas para expressar esse vínculo.
Inclui-se aqui o respeito à cultura da criança, expressa no trabalho de Fernanda pelo valor do jogo e
da brincadeira. É nesse contexto que a prática de dançar na aula de música encontra seu significado
mais profundo enquanto atendimento às características da infância.
Em todos esses casos, a cultura como matéria-prima (ou patrimônio) é aquilo que já
existe. E aquilo que já existe serve para forjar a relação consi- go mesmo e com o outro.
Daí o sentimento, após tais experiências, de sermos diferentes ou de saber melhor quem
somos, de que maneira preferimos estar com os outros e na vida em geral, de que
maneira preferimos falar, vestir- nos, alimentar-nos, trabalhar, viver (Mellouki; Gauthier,
2004, p. 542)
O caminho metodológico adotado por Fernanda relata as dificuldades que enfrentou para definir as
dimensões das análises. Do mesmo modo como estava costumada agir na sala de aula, Haja
criatividade e rapidez para pensar, criou um jeito próprio de garimpar significados, que chamou de
dimensões coloridas – conforme suas palavras, (p. 76), referindo-se ao colorido empregado para
identificá-las. A partir de então, passou a enxergar o que parecia escapar da lógica usual das análises.
Reorganizou todo o material novamente, revisou examinando a coerência interna, por fim, admitiu
que poderia dedicar-se à descrição detalhada do fenômeno e à interpretação contextualizada do
material recolhido.

927
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4. Conclusão: Conjecturas sobre o modo que os pesquisadores narrativos expressam as


aprendizagens que realizaram e o que foi formador em seu percurso

As questões iniciais de Fernanda Quais conteúdos devem ser priorizados na organização do plano de
ensino? O que focar: aula centrada na performance instrumental, criação musical, apreciação musical
e debates sobre a obra musical de diferentes períodos e estilos? Ou, fazer de tudo um pouco sem
prioriza nenhum? (Anders, p. 13), não podem ser respondidas prontamente. Porque são muito
complexas, contraditórias e impossíveis de serem superadas – são próprias da profissão docente.
Segundo o pensamento de Mellouki; Gauthier (2004), Tardif (2012), Marcelo Garcia (2010) e Josso
(2004), o saber docente é complexo, não se reduz aos conteúdos ou aos métodos de ensino. Nas
palavras de Josso (2004, p. 241) Aprender não é apenas aprender isso ou aquilo; é descobrir novos
meios de pensar e de fazer diferente; é partir à procura do que poderá ser este diferente. Esse
trabalho supõe transitar em diferentes contextos culturais (contexto sala de aula, da instituição,
contexto da cultura pessoal) construindo significados uns a partir dos outros; supõe, como defende
Josso, gerir de forma coordenada a lógica pessoal e a dimensão social do desempenho profissional.
Em vez de responder à questões inicias, observamos que Fernanda modificou o quê e quais pela
compreensão dos significados das aprendizagens das crianças, a partir delas mesmas. A
transformação no modo de questionar coloca a pesquisadora diante de problemas novos,
conceituações novas e novos meios de investigação. Movimento idêntico aconteceu no campo da
pesquisa qualitativa, quando os pesquisadores lutaram para encontrar maneiras de situarem a si
mesmos e a seus sujeitos em textos reflexivos (Denzin; Lincoln, 2006, p. 17)
Nossa suposição é que boa parte das aprendizagens de Fernanda tem a ver com a nova direção de
suas questões de pesquisa.

Referências

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conceitos conceitos e metodologias. In: Atas Congresso Ibero-Americano em Investigação

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(21).

929
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El docente y su relación con la investigación e innovación


educativa: estudio con docentes del Instituto Politécnico Nacional

1 1 2
María Eugenia Ramírez-Solís , Liliana Suárez-Téllez , José Luis Torres-Guerrero
1
Instituto Politécnico Nacional – CGFIE, México. meramire@ipn.mx; lsuarez@ipn.mx
2
Instituto Politécnico Nacional - CECyT 7, México. jeluistg@gmail.com

Resumen. El deseo de innovar en la práctica docente se fundamenta en un profundo compromiso por


mejorar la enseñanza y el aprendizaje considerando los aportes del contexto. Se reconoce que la
investigación educativa aporta a la innovación elementos conceptuales y procedimentales para programar,
desarrollar y evaluar las innovaciones, lo que lleva a fortalecer las fases del proceso innovador. En el estudio
realizado se identifica que algunos docentes del Instituto Politécnico que realizan prácticas innovadoras, no
han hecho consciente las relaciones entre investigación e innovación, pero reconocen la necesidad de
integrar algunos elementos que les permitan consolidar su práctica docente. Con miras a fortalecer los
procesos de consolidación de las innovaciones se propone un modelo sencillo para integrar algunas etapas
de la investigación a los procesos formativos y algunas recomendaciones para fortalecer al profesor
innovador.
Palabras clave: Innovaciones didáctica; fases de la innovación educativa, relación investigación-innovación

The teacher and his relationship with research and educational innovation: study with teachers of the
Instituto Politécnico Nacional
Abstract. The desire to innovate in the teaching practice is based on a deep commitment to improve
teaching and learning considering the contributions of the context. It is recognized that educational
research contributes to innovation conceptual and procedural elements to program, develop and evaluate
innovations, which leads to strengthen the phases of the innovative process. In the study carried out, it is
identified in the teachers who carry out innovative practices, they have not consented to the relations
between research and innovation, but they recognize the need to integrate some elements that allow them
to consolidate their teaching practice. With a view to strengthening the processes of consolidation of
innovations, a simple model is proposed to integrate some stages of the research to the formative processes
and some recommendations to strengthen the innovative teacher.
Keywords: Didactic innovations; educational innovation phases, research-innovation relationship

1. Introducción

Ante las demandas del contexto en un mundo globalizado y en los procesos de reforma educativa, es
imprescindible la implementación de innovaciones en los diferentes ámbitos y componentes del
sistema educativo: el currículo, las metodologías, las relaciones entre unidades de aprendizaje, la
evaluación e incorporación de tecnologías, entre otros muchos. Algunas de estas innovaciones son
orientadas desde las propuestas institucionales, como el caso de las tutorías o del “Proyecto Aula” en
el bachillerato del Instituto Politécnico Nacional del IPN, y otras más son impulsadas por los docentes
en las aulas y con sus estudiantes. Estas últimas, conocidas como innovaciones didácticas (Barraza
2014; Rivas 2000), han sido interiorizadas a partir de las diferentes motivaciones propias del docente:
el interés por atender las necesidades de los alumnos, la necesidad de mejorar la práctica docente y
la autorrealización profesional.

930
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Innovar, entendido como un cambio que produce mejoras de tipo cualitativo en los aprendizajes de
los estudiantes, se encuentra fuertemente asociada a la investigación, ya que ésta permite orientar
de manera formal el proceso mismo de innovar antes, durante y después. Sin embargo, los maestros
han utilizado de manera intermitente algunos productos de las investigaciones reconocidas en las
teorías compartidas en diferentes programas de formación y a través de aproximaciones a las
herramientas y etapas de la investigación.
Para el desarrollo de este trabajo se consideran los criterios y fases de la innovación propuestas en el
Modelo de Innovación Educativa para el IPN (Ortega Cuenca, y otros, 2007); las relaciones de la
investigación con la docencia y la innovación (Oviedo, 2011) (Ramírez, Suárez & Ortega, 2010) y los
programas de formación docente que de manera específica vinculan la investigación y la docencia,
como es el caso de los Seminarios Repensar1, así como la participación de los docentes en diferentes
programas de formación y/o actualización.

1.1 Planteamiento del problema

En el ejercicio cotidiano de la docencia, observamos prácticas distintas entre los docentes que
atienden un mismo grupo y que en ocasiones son contrarias. Los profesores tradicionales persisten
en nuestra comunidad, pero también hay un buen número de profesores que llevan a cabo
innovaciones de distintos tipos. Algunas de estas innovaciones son generadas a partir de prácticas
aisladas e individuales que emergen de las referentes institucionales, la influencia del contexto, como
el caso del uso de las TIC o los aportes referidos a los programas de formación.
La vinculación de la investigación educativa y la innovación son reconocidas como una necesidad
para fundamentar, guiar y evaluar el impacto de las mismas a fin de gestionar el cambio en la
institución. Es por ello que esta investigación se planteó la siguiente pregunta: desde la mirada del
docente, ¿cómo se conceptualiza la incorporación de la investigación educativa en las fases de la
innovación?, en particular, en la fase cero, la decisión de innovar ¿cómo se vincula la investigación al
gestar la innovación a partir de sus protagonistas-docentes?

2. Marco Teórico

Para transformar las prácticas escolares tradicionales, las innovaciones educativas están cada vez
más presentes en la comunidad escolar, particularmente en el microcosmos del aula en donde
profesores y alumnos participan de cambios y mejoras. Estos ocurren como consecuencia de la
reflexión, análisis, diseño e instrumentación cuidadosa de quienes diseñan e implementan las
innovaciones. Los supuestos, criterios y fases que caracterizan a las innovaciones en el MIE (Ortega et
al. 2006) permiten identificar y promover las innovaciones en el IPN (Suárez, Ortega, Ramírez &
Torres 2016). Los criterios propuestos: intencionalidad, novedad, pertinencia, creatividad,
permanencia y anticipación, entre otros, permiten garantizar su naturaleza, y, junto con las ocho
fases, guían el proceso de innovar.
La innovación y la investigación guardan estrecha relación. Las investigaciones buscan comprender y
resolver un problema, mientras que las innovaciones se apoyan de estas para realizar acciones para
transformar la práctica educativa. La investigación está presente antes, durante y después del

1 Los Seminarios Repensar son un proyecto de innovación educativa en el ámbito de la profesionalización docente
propuesto por una red académica del IPN, para vincular los resultados de la investigación educativa con la práctica
docente e impulsar innovaciones educativas.

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proceso de innovación (Schmelkes, 2001) (Ramírez, Suárez & Ortega, 2010). Antes de innovar, las
investigaciones aportan los marcos teóricos y contextuales que favorecen la comprensión del
problema que se quiere resolver; durante el proceso, puede estudiar aspectos vinculados con la
implementación de la innovación y después de la innovación, investigar sobre la innovación y su
impacto.

3. Metodología

Para esta investigación se definió la metodología de corte cualitativo, ya que da respuesta al análisis
de los datos de contenido y no de cantidad. Entre otras cosas permite libertad al investigador para
profundizar en el objeto de estudio, regresar a etapas previas, interpretar resultados, realizar
entrevistas y plantear nuevos problemas; una libertad que permite dar respuesta a las necesidades
de la propia investigación y su desarrollo. Es útil cuando se pretende conocer la perspectiva de
individuos a los que se va a estudiar en cuanto a las actividades que desarrollan en el campo o
contexto motivo de la investigación.
La metodología de la investigación cualitativa permite realizar el proceso de investigación en forma
interactiva o recurrente, es decir, “las etapas en realidad son acciones para adentrarnos más en el
problema de investigación y la tarea de recolectar y analizar datos es permanente” (Sampieri, 2010).
Esta característica permite que se comprenda y profundice, tanto como se quiera, en el
conocimiento de la cuestión a investigar y que no se limite a la investigación con los datos
encontrados a través de un instrumento.
El muestreo en la investigación cualitativa se determinó a partir de la observación del fenómeno: las
prácticas innovadoras en su contexto. Considerando que la metodología cualitativa no basa sus
resultados en la probabilidad ni la estadística y tiene como objetivo conocer las características,
condiciones y momento del fenómeno, se decidió realizar como tipo de la muestra el estudio de
casos que sean representativos de la naturaleza del fenómeno; por la misma razón, no se determinó
el número de profesores entrevistados de forma específica sino de acuerdo a las observaciones
realizadas y con base en la experiencia de los entrevistadores (Hernández R. 2010).
La información recaba para esta investigación consideró la opinión de alumnos y profesores para
identificar la muestra. Sus testimonios orientaron la definición de la muestra estudiada; sus
narraciones permitieron integrar una ficha de identificación: datos de identificación del profesor, los
criterios de innovación visibles en la práctica docente, el ámbito de la innovación, los procesos
formativos vinculados con actualización e incorporación de investigaciones. Para este estudio se
realizaron fichas de caracterización de la innovación y entrevistas a profundidad, que permitieron
indagar acerca del fenómeno en forma lógica y libre, un tanto intuitiva y basada en la experiencia del
investigador, recabando la información conforme fue evolucionando el estudio, tratando de
entenderlo desde todas sus dimensiones.
En un segundo momento se desarrolló una entrevista a profundidad como una de las técnicas que
complementan a la investigación cualitativa. Las entrevistas a profundidad se realizan a partir de
preguntas bases que permiten conocer acerca de la forma innovadora de la práctica docente; sin
embargo, en el desarrollo de las mismas fueron agregándose preguntas para profundizar en el
entendimiento de cada caso y enriquecer la información obtenida.

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3.1 Características de la población objeto de estudio.

Este estudio se desarrolló con nueve docentes del Instituto Politécnico Nacional, que laboran en
algunas de las Unidades Académicas de Nivel Medio Superior y Superior de la institución.
a. Criterios para la identificación
 Docentes que los estudiantes consideran innovadores. Cuando se cuestionó a los
estudiantes si consideraban que sus profesores eran innovadores, consideraron a
aquellos que implementaban actividades o recursos diferentes a otros profesores.
 Profesores que son reconocidos por los colegas como innovadores. Entre colegas hay un
reconocimiento hacia los docentes que comunican sus experiencias de manera formal e
informal y en los que se reconocen buenas prácticas.
 Profesores que han participado en proyectos de innovación e investigación educativas.
Se consideraron a aquellos que han participado en acciones de innovación educativa
como congresos y foros o que realizan diversos proyectos de investigación con registro
en la Secretaría de investigación y Posgrado.
 Criterios de la innovación. Los casos se caracterizaron por los criterios de novedad,
intencionalidad, pertinencia y creatividad.
b. Características de la población
 Unidades académicas: la población objeto de estudio estuvo conformada por cinco
profesores del Nivel Medio Superior, tres profesores de Nivel Superior y un profesor
imparte en ambos niveles.
 Campo disciplinar: Comunicación, diversas disciplinas del área de formación para el
trabajo y Matemáticas. Cuatro de ellos imparten materias del área Humanística, otros
cuatro del área de materias Básicas, y un profesor del área tecnológica.
 Experiencia o relación con la investigación. Cinco profesores han participado en
proyectos de investigación como directores o participantes.
 Edad y sexo de los participantes. El rango de edad está entre los 34 y los 56 años; cinco
son mujeres y cuatro hombres.
 Tiempo de contratación docente en el IPN
 Las hora de contratación oscilan entre 9 y 40 horas, por lo que la condición
administrativa de horas de contratación para la dedicación a la docencia no
es un impedimento para innovar
 Las horas que pasan frente a grupos van entre 6 y 21 horas. La antigüedad
docente en el IPN es de entre los 6 y los 38 años.

4. Análisis y discusión de los resultados

Para codificar la información obtenida en la entrevista, se definieron categorías de análisis: aporte de


la investigación en la identificación de la problemática a mejorar; relación de la investigación con el
marco teórico y aplicando elementos de la metodología de análisis del discurso en las
caracterizaciones de las innovaciones y en las entrevistas realizadas a los docentes.

4.1 De los factores impulsores, los ámbitos, criterios y las fases de la innovación

Lo que detona la necesidad de cambio y mejora con la intención de impactar favorablemente en los
aprendizajes de los estudiantes, se reconoce como factores impulsores (Rivas 2000). En el caso de las

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innovaciones estudiadas encontramos que responden tanto a la necesidad intrínseca de la vocación


(mejorar la enseñanza) como a factores intrainstitucionales.
 Mayor impulso a la participación del estudiante en su propio aprendizaje
L…para activar la participación de los estudiantes.
AR… hacer algo diferente que llamara la atención de los estudiantes y que mejorara sus
evaluaciones…
 La incorporación de los aportes de las investigaciones educativas
JL... En los SRM …[las investigaciones]… tratan la importancia del pensamiento estadístico y
la pertinencia de modificar los enfoques que tienen algunas escuelas del bachillerato...
AL… El conocimiento de las investigaciones [en el SRM] me daban oportunidad de aplicar
nuevas cosas, eligiendo lo que consideraba adecuado... los investigadores proponían el uso
de tecnologías, las actividades didácticas para enfrentar los obstáculos.
 La inaplazable influencia de las tecnologías de la información y la comunicación (TIC) en los
procesos educativos.
T...Las empecé a utilizar -Facebook- por novedad, principalmente porque soy “creyente” que
si los alumnos se encuentran en ellas nosotros como docentes debemos acercarnos a su
mundo y tiene un plus…
JA… considera que la incorporación de estos recursos atrae la atención de los estudiantes al
ser más visual con los temas que tiene que tratar…
JL… Las adecuaciones de infraestructura son incentivos para las innovaciones con tecnologías,
los salones cuentan con cañón, para proyectar imágenes de computadora…
T…Ésta es una oportunidad para incluir actividades que antes no se consideraban……con las
tabletas y teléfonos inteligentes, ahora pueden aplicarse…

Los ámbitos de la innovación en los casos estudiados, se centraron principalmente en el contexto del
aula por lo que se abordan diferentes intervenciones en el ámbito didáctico del proceso de
aprendizaje y enseñanza. Aluden principalmente a elementos procedimentales en la conducción de
las clases, sus recursos y la evaluación.
 El uso de las TIC principalmente como herramienta para la comunicación y el aprendizaje:
Uso de Facebook y actividades automatizadas, referidas a la evaluación de los aprendizajes
(L, T, AR, JA).
 Estrategias lúdicas que favorecen la participación y mantienen la motivación de los
estudiantes para aprender.
G…por ser un poco más atractivo y motivador para el estudiante.
2
 Estrategia de aprendizaje holísticas , concretamente con el uso de estrategias basado en
problemas y el diseño de proyectos que favorecen el desarrollo de aprendizajes complejos y
la contextualización para la práctica en la vida profesional y como ciudadanos (JL,AL).
 Estrategias para la evaluación de los aprendizajes, basado en el uso de videos (AR).

Las innovaciones didácticas identificadas son generadores de ambientes de aprendizaje que


promueven acercamientos al conocimiento, interacciones entre pares, procesamiento y
comunicación de ideas en la construcción colectiva del conocimiento y que son acordes a los
principios que rigen el modelo educativo institucional.

2 Entendemos como estrategias holísticas aquellas que propician procesos cognitivos, actitudinales, valorales y emocionales
en el proceso de aprendizaje y socialización. Algunos tipifican esta estrategia como favorecedoras para la toma de
decisiones.

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Si bien las innovaciones deben satisfacer un conjunto de criterios, las innovaciones propuestas por
los docentes estudiados cumplen con algunos criterios citados por Ortega et al. (2007) como son:
novedad, creatividad, intencionalidad, sistematicidad y pertinencia, principalmente.
Para los docentes la novedad representa la inserción de tareas, recursos y proceso, como los de
evaluación, que no son aplicados por otros profesores y que aportan cambios que favorecen
aprendizajes.
La intencionalidad es reconocida como el foco para resignificar los aprendizajes:
JL …cambiar en los estudiantes el sentido de aprendizaje, para relacionarlos con su vida
personal y profesional, de tal suerte que no solo memoricen o mecanicen los procedimientos,
sino que puedan decidir cuándo y cómo usarlos. Los docentes se proponen un cambio que sea
congruente con el modelo educativo institucional.
Las innovaciones no se refieren a invenciones, sino a procesos creativos que permitan redefinir el
problema, la capacidad para identificar mejoras e introducir novedades viables y congruentes con el
presente y futuro que se visualiza y desea.
G … el docente posee iniciativa y disposición para seleccionar problemas que a través de
juegos los estudiantes van dando solución, de igual forma, el docente tiene metas fijas que a
partir de su experiencia en la modalidad virtual aprovecha su experiencia y recursos.
La pertinencia de las innovaciones didácticas son reconocidas por los propios profesores y sus
colegas, porque es acorde a las características de los estudiantes, por la cualidad de favorecer las
necesidades y problemas del contexto, sin embargo es importante considerar que algunas
innovaciones no son pertinentes en contextos diferentes a los que les dio origen.
JL… La incorporación de la contextualización permite a los estudiantes dar solución a
problemas definidos considerando contextos diversos y cambiantes.
T… Si es cuestión de innovar es necesario utilizar aquello que los chicos consideran viable.
L…Ahora es común encontrar que casi todos usan las redes sociales.
La sistematización de la innovación implica “una acción planeada y sistemática que involucra
procesos de evaluación y reflexión crítica acerca de la práctica y la innovación misma” (Ortega, et al,
2007). En el grupo investigado, es considerada por algunos profesores como la experiencia replicada
y la generación de notas y bitácoras que permiten documentar la experiencia.
T… Utilizo un blog llamado maestra Mayte donde los alumnos suben sus comentarios acerca
de alguna película o reseñas de los libros que están leyendo. El registro se realizó en una hoja
de cálculo de Excel.
Aun cuando hay indicios de implementar una sistematización, aún es necesario reconocer que el
proceso mismo de innovador requiere de tiempo para consolidarse, para convertirse en la nueva
normalidad, que permee en las actitudes para transformar la cultura del aula hasta convertirse en
una cotidianeidad. Por ello sistematizar la innovación requiere de continuidad en su implementación,
pero además documentar y evaluar el proceso para contar con información, y procesar los datos,
reflexionar sobre ello para adecuar los procesos y tomar decisiones fundamentadas.

4.2 La investigación educativa en las fases de la innovación

En la literatura (Schmelkes, 2001; Morales, 2010; Ortega Cuenca, et al, 2007, Ramari, s/f), se
reconoce la importancia de la investigación para las innovaciones, pero en la práctica real, el deseo
de innovar y la posibilidad de realizarlo no está acompañada en todos los casos por investigaciones
formales. En el informe de Boyer (Morales, 2010) se declara que los profesores están más
interesados en la docencia que en la investigación rigurosa.
En la muestra estudiada, solo pudo indagarse las relaciones de la investigación en las primeras fases
de la innovación, ya que en las fases de instrumentación, evaluación y gestión el cambio, no se

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cuenta con experiencias de evaluación, ni sistematización de la situación, por lo que no puede


constatarse si se cumplen las previsiones y si el sentido de la innovación lleva a cambios sustanciales
en los aprendizaje.

De la relación de la innovación con la investigación antes de su implementación


a. La comprensión del proceso de innovación. En las primeras fases del proceso de innovar se
identifican el uso de algunos elementos de la investigación asociados con la identificación de una
necesidad a partir de observaciones y reflexiones del entorno escolar y de los estudiantes
(comentarios de estudiantes, estadísticas de aprovechamiento, experiencia docentes anteriores,
ente otros), permitiendo dibujar el planteamiento inicial del problema a resolver. A partir de este
diagnóstico se diseña la propuesta de mejora.
B …la prueba PLANEA refleja el desempeño de los estudiantes en el área de la comunicación y
la necesidad de atender el desarrollo de competencias comunicativas
Al preguntar a los docentes ¿cómo identificaron la necesidad que los llevó a la propuesta de
innovación?, ¿qué datos formales favorecen la descripción de la situación actual?, aluden a datos
empíricos como la observación, la experiencia recogida a través de los años y la complejidad que los
docentes mismos atribuyen al campo disciplinar.
T …observo a mis estudiantes e identifico que no les gusta preguntar en clase…
L …es necesario facilitar la comprensión de los conceptos relacionados con la unidad de
aprendizaje
A …consideré los aprendizajes [que tienen los estudiantes] en cuanto a tecnología.
Otros docentes reconocen las aportaciones de las investigaciones educativas, como marco de
referencia que permite una nueva compresión del contexto y una reconstrucción conceptual sobre la
enseñanza y el aprendizaje. Los aportes de las investigaciones fueron obtenidos a través de
programas de formación como maestrías en educación, los Seminarios Repensar, diplomados en
docencia y cursos de actualización que aportaron información precisa sobre las metodologías y
conocimiento de tecnologías para el aprendizaje.
JL… se identificó a partir de los estudios de maestría, en algunas actividades. Se reconoce
que para la estadística no se requiere ciertos conocimientos de matemáticas que sí lo son
para los matemáticos, pero para los estudiantes de bachillerato no lo es (estos conocimientos
actualmente se encuentran en los programas de estudio).
Al… el hecho de que en algunas de las investigaciones que se dieron en el seminario y viendo
mi práctica docente, me animo a tratar de vincular la matemática que yo daba, aterrizada a
las distintas actividades que se tienen….… los investigadores proponían el uso de tecnologías,
las actividades didácticas para enfrentar los obstáculos. Me daban la idea de dónde buscar
para adaptar lo que se discute entre el investigador y los profesores.
B…Una de las sesiones que fue relevante para la realización del proyecto es la planeación, con
la videoconferencia de Sergio Tobón en el Seminario Repensar las Matemáticas. Da referencia
de los elementos necesarios que debe cubrir la secuencia didáctica y la importancia de
implementar los instrumentos de evaluación. Las competencias de los estudiantes y el trabajo
en equipo.
b. En el análisis de las características del entorno, que puede referirse tanto a las fases de
comprensión de la innovación como del análisis de la información, los docentes dan indicios de la
información que posee del contexto.
JL…ahora contamos con la tecnología disponible (calculadoras y software) que permite
identificar que es viable trabajar este enfoque.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

R…se recupera la diversidad de elementos cotidianos. Se les pide observen las construcciones
durante el trayecto a la escuela como el aeropuerto, el metrobus, elsegundo puente del
periférico o incluso obras cercanas a su casa. Se les pide que escriban lo observado.
c. La fase de establecimiento de las prioridades se asoció con el planteamiento del problema. Al
preguntar sobre éste algunos docentes comentaban que no lo plantearon inicialmente pero que
podían expresarlo:
JL… la dimensión matemática no solo tiene que atender los aspectos académicos y para
formar en una profesión, también para ejercer su ciudadanía a plenitud y sobresale el
pensamiento estadístico que está ausente en los planes de estudio del bachillerato
AL… plantear actividades en donde el alumno pudiera hacer uso del software para que fuera
más visible el tema que se analiza, en este fue las series de Fourier.
AR… el examen teórico no alcanza a dar cuenta de los aprendizajes, no solo el manejo de la
información, sino su capacidad de utilizarla o ampliarla.
La ausencia de problema claro antes de diseñar la innovación y en consecuencia una hipótesis que lo
resuelva y permita visualizar la innovación, puede correr el riesgo de limitarse a una buena práctica
que puede ser efímera pero que no sigue con certeza los caminos firmes para la transformación.
d. La visualización de la situación. En esta fase se trata de que la propuesta de innovación podamos
describir cómo acontecerá el cambio, caracterizando la situación, para lo cual la vinculamos con
la fase de generación de hipótesis descriptivas en la investigación.
AR… El problema es, los exámenes objetivos no permiten dar cuenta de la totalidad de los
aprendizajes de mis estudiantes, entonces, voy a implementar una propuesta diferente, una
evidencia diferente, una evidencia que va a incorporar muchas cosas, para profundizar el
conocimiento, ser creativos, libertad de decisión les ayuda a esta capacidad de toma de
decisiones.
Las hipótesis planteadas miran dos aspectos, que de si están interrelacionados, pero el énfasis que
ofrecen nos permitió definirlas como dirigidas a mejorar el aprendizaje o incidir en la mejora de la
enseñanza.
Algunas de las innovaciones rebasan el solo ofrecer experiencias agradables a los estudiantes, sino
fortalecer la significatividad, el aprendizaje complejo y funcional.
JL… El curso no permanece como conocimiento sin significado, permite cambiar el enfoque
sobre la matemática que solo pocos pueden entender y que tiene poca aplicación en la vida
cotidiana.…
G…las estrategias lúdicas favorecen las interacciones personales para la generación de
aprendizaje.
AR… Lograr interés por parte de los alumnos en obtener un mejor resultado en sus
evaluaciones, no solo de memorización, sino de la reflexión y la generalización del
conocimiento.
En cuanto a la mejora de la enseñanza, existen cambios orientados a la modificación de la enseñanza
tradicional, conceptualizando un enfoque holístico y a la necesaria actualización en uso de
tecnologías.
Los docentes si conciben el cambio deseable en los estudiantes, sin embargo no es visible la
participación de la investigación, por ejemplo, para identificar indicadores que permitan medir los
aspectos prioritarios o la caracterización de los cambios a partir de estos indicadores. En el 80 % de
los casos se hacía referencia más bien a una visión simple de la situación por lo que tampoco
visualizaban la fase de la definición de la estrategia que considere la mejores condiciones para la
transformación, anticipando resistencias y obstáculos
e. Fase de instrumentación del plan. Es poco usual, en los casos investigados, que los docentes
documenten el proceso de innovación y sus resultados. De manera informal éstos son

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

presentados a la comunidad en cursos y charlas informales, y se ha reportado que las


evaluaciones de los estudiantes retroalimentan al docente para hacer ajustes pertinentes.
Algunos profesores han llevado algunos registros en bitácoras, pero no se han sistematizado;
otros son retroalimentados por los estudiantes al término de las sesiones o de las actividades y
esto les permite tomar decisiones para ajustar la propuesta.
También se reportó para este rubro la dificultad para llevar este tipo de registro, además de
todas las actividades administrativas que deben de cubrir (planeaciones diarias,
retroalimentación para la evaluación continua, entrega de calificaciones, asesorías extra clase,
entre otras) ya que algunos de los docentes tienen un número excesivo de grupos.
Las innovaciones que realizan los profesores individualmente pueden generar avances en sus
estudiantes, pero al no estar armonizados con otros cursos que se llevan a cabo simultáneamente o
continúen en otros semestres, los logros obtenidos corren el riesgo de debilitarse.
Es necesario considerar para la implementación de las innovaciones acciones colegiadas que
favorezcan la participación en la toma de decisiones, con libre discusión de los problemas. Para
avanzar en la solución de problemas tan complejos como los que enfrenta un sistema educativo se
necesita reconocer que no es el individuo sino el cuerpo académico (docente, directivo, de
investigación, de personal de apoyo), organizado según el modelo profesional, el protagonista de las
transformaciones del sistema (Ortega Cuenca, y otros, 2007).

5. Conclusiones

El análisis de las entrevistas y las categorías definidas permitieron identificar que los docentes que
practican innovaciones didácticas están más interesados en las posibles mejoras que en la relación
de éstas con la investigación.
Algunos docentes no hacen consciente la participación de la investigación en su práctica innovadora
y consideran más importante desempeñar de la mejor manera su docencia. Sin embargo, se
identificó que el marco teórico que sustenta la innovación y orienta las acciones de su
implementación se relaciona con la formación de los profesores en acciones como posgrados en
educación, diplomados en docencia y cursos de actualización que aportan información precisa sobre
las metodologías y conocimiento de tecnologías para el aprendizaje. Estos programas aportan el
sustento teórico para la innovación. Conveniente incluir en los procesos formativos algunas
herramientas (observación, problematización, generación de hipótesis, por ejemplo) que favorezcan
la sistematización de la investigación. Hay una intención explícita por provocar cambios y
transformaciones en las prácticas pedagógicas que por el momento se sustentan en datos empíricos
obtenidos de la experiencia.
La complejidad de las innovaciones, por ejemplo para su sistematización y gestión del cambio,
resaltan la importancia de colaborar en redes para analizar desde una mirada crítica el proceso de
innovar para hacerlas evolucionar.
Es inminente que las innovaciones producidas en el aula, muestran la reflexión sobre el quehacer
docente en la búsqueda de la trasformación en el aula. Se evidencia que se está dejando atrás la
visión disciplinaria, enciclopedista y memorística, accediendo a construcciones más holísticas en la
comprensión de la realidad educativa. Por ello es muy probable que la investigación acción sea el
tipo de investigación que pueda superar las distancias entre la investigación y la innovación
educativas, ya que favorece la reflexión sobre la situación y se realiza en el ambiente cotidiano,
propiciando cambios.
Se tiene un grupo de docentes que, al percibir que la práctica docente tradicional no es suficiente
para el logro de aprendizajes necesarios en los alumnos, buscan, exploran e implementan prácticas

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innovadoras. Es pertinente un acompañamiento institucional para que estas prácticas se conviertan


en innovaciones educativas útiles a la institución.

Agradecimientos. Esta investigación se realizó con los apoyos otorgados por la Secretaría de Investigación y
Posgrado del Instituto Politécnico Nacional.

Referências

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Barraza, A. (2015). Proyecto de innovación didáctica para la mejora de la práctica educativa. México:
Instituto Universitario Anglo Español.

Briones, G. (2000). Tendencias recientes de la investigación en pedagogía. Memorias del Simposio


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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

As Questões de Gênero e suas Inter-relações com a Formação


e a Prática Reflexiva do Professor

1 2 3
Eliane Araújo Aquino, Marilene Batista da Cruz Nascimento, Marilia Costa Morosini
1
Curso de Pedagogia Universidade Federal de Sergipe eliane.tati10@hotmail.com
2
Departamento de Educação Universidade Federal de Sergipe nascimentolene@yahoo.com.br
2
Programa de Pós-graduação em Educação Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
marilia.morosini@pucrs.br

Resumo. Este estudo tem como objetivo descrever o trabalho desenvolvido pelos/as docentes de uma escola
básica acerca da abordagem de gênero nas aulas, considerando a relação dessa categoria com o currículo e a
aprendizagem. Trata-se de uma investigação teórico-empírica, de natureza qualitativa, desenvolvida a partir
do método dialético norteado pela relação tese-antítese–síntese. Aplicou-se um questionário com os/as
professores/professoras e os dados coletados foram trabalhados à luz da análise textual discursiva (ATD). Os
resultados indicaram que inserir a categoria de gênero na prática educativa contribui para a ressignificação
do espaço da escola a partir do respeito à diversidade cultural presente significativamente na sociedade
contemporânea, bem como corrobora para uma prática reflexiva na sala de aula.
Palavras-chave: Gênero; Currículo; Aprendizgem; Formação de professor; Prática reflexiva.

Gender Issues and their Interrelationships with Teacher Training and Reflective Practice
Abstract. This study aims to describe the work developed by the teachers of a basic school about the gender
approach in class, considering the relation of this category to the curriculum and learning. It is a theoretical-
empirical investigation, of a qualitative nature, developed from the dialectical method guided by the thesis-
antithesis-synthesis relation. A questionnaire was applied with the teachers, and the data collected were
worked in the light of the discursive textual analysis (DTA). The results indicated that inserting the category
of gender study in the educational practice contributes to the re-signification of the school space from the
respect to the cultural diversity present significantly in the contemporary society, as well as corroborates for
a reflexive practice in the classroom.
Keywords: Genre; Curriculum; Learning; Teacher training; Reflective Practice.

1 Introdução

Esta pesquisa tem como tema a categoria gênero no espaço da escola básica. Para Ferreira (2001, p.
345), “[...] gênero é a forma como se manifesta, social e culturalmente, a identidade sexual dos
indivíduos ou a categoria que classifica os nomes em masculino, feminino e neutro”. Há profissionais
no campo da educação com um conhecimento restrito sobre esse termo. Essa realidade implica na
inserção dessa discussão nas aulas. Outros/as professores/professoras preferem não trabalhar as
questões sobre masculino/feminino e adotam a atitude da não inclusão na prática pedagógica.
O trabalho com gênero requer argumentos com vistas a evitar controvérsias. Estudos investigativos
sinalizam que a formação inicial de professor não tem abordado no currículo as implicações de gênero
na escola de educação básica. Essas questões contribuem para a permanência da desigualdade, bem
como diminuem as possibilidades de redução (e porque não afirmar a erradicação) de preconceitos e
discriminação.

940
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Cabe aos/às docentes atentar-se para não continuar fortalecendo esse cenário. Faz-se necessário
insistir em práticas pedagógicas reflexivas que propaguem o respeito mútuo sem distinção de gênero.
As atividades humanas podem ser desenvolvidas por pessoas de diferentes sexo (homem ou mulher)
ou gênero (masculino, feminino e outro). O enfrentamento dessas questões contribui para diminuir o
silêncio que

[...] ainda é muito presente quando se refere à diversidade de gênero e sexual, pois, de maneira
geral, os gestores e educadores não consideram importante dialogar sobre estas questões ou não
se acham capazes de discutir estes temas com seus educandos. Com isso, contribuem, de certa
forma, para que a violência na escola persista. (Dias, 2014, p. 19).

Conhecer o trabalho docente a respeito do gênero, em especial, na Escola Municipal José Secundo
Filho, localizada no povoado Garangau no Município de Campo do Brito, em Sergipe/Brasil, torna-se
fundamental para relacionar o termo gênero com a prática educativa sem receio ou estranhamento.
O “[…] conceito de gênero está relacionado [...] aos significados que são atribuídos a ambos os sexos
em diferentes sociedades. Homens e mulheres constituem-se mergulhados nas instâncias sociais em
um processo de caráter dinâmico e contínuo” (Meyer, 2013, p. 33).
As questões de gênero ainda envolvem indiferenças. A sociedade faz separação entre as atividades
feitas pelo homem e pela mulher. Cabe aos/às professores/professoras dialogar e trabalhar com
seus/suas discentes em sala de aula com vistas a desenvolver o respeito à diversidade. Esclarecer a
relevância dessa temática para a aprendizagem dos estudantes via currículo é uma necessidade. A
escola não deve silenciar diante dessa realidade, mas sim aprender a respeitar as diferenças do outro.
Meyer (2013, p. 39) defende que

[...] educadores e educadoras precisam estar em constante processo de atualização para que
possam ter a possibilidade de assumir atitudes e posições reflexivas em relação às situações que
acontecem cotidianamente nos espaços educacionais, em relação a gênero, à sexualidade, à raça,
à etnia, dentre outros.

As discussões de gênero na escola exigem uma atitude diferenciada dos/das professores/professoras


diante do planejamento das aulas. Precisa-se pensar e desenvolver aulas em que os conteúdos
específicos de cada disciplina sejam trabalhados a partir do respeito às especificidades relacionadas
aos contextos históricos, socioculturais e geográficos. Trata-se, assim, de contemplar o currículo formal
e oculto. Moreira (2007) afirma que os fatores socioeconômicos, políticos e culturais influenciam a
compreensão sobre o currículo formal. Dependendo do cenário histórico e dos diferentes modos de
se entender a educação surgiram várias concepções:

[...] a) os conteúdos a serem ensinados e aprendidos; (b) as experiências de aprendizagem escolares


a serem vividas pelos alunos; (c) os planos pedagógicos elaborados por professores, escolas e
sistemas educacionais; (d) os objetivos a serem alcançados por meio do processo de ensino; (e) os
processos de avaliação que terminam por influir nos conteúdos e nos procedimentos selecionados
nos diferentes graus da escolarização. (Moreira, 2007, p. 18).

Quanto ao currículo oculto, o autor assegura que tem relação com “[...] atitudes e valores transmitidos,
subliminarmente, pelas relações sociais e pelas rotinas do cotidiano escolar. Fazem parte do currículo
oculto, assim, rituais e práticas, relações hierárquicas, regras e procedimentos, modos de organizar o
espaço e o tempo na escola [...]” (Moreira, 2007, p. 18).

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Incorporar o currículo formal e oculto, independentemente de posição teórica, contribui para o


processo de desconstrução dos preconceitos entre a masculinidade e a feminilidade no ambiente da
escola. Quando não se tem argumentos e conhecimento sobre as questões de gênero, a estranheza e
a indiferença promovem o distanciamento dessa temática na prática educativa. O/A docente precisa
buscar caminhos para trabalhar com consistência as desigualdades de gênero, inclusive, para superar
deficiências oriundas da formação.
Nessa configuração, esta investigação tem como objetivo descrever o trabalho desenvolvido pelos/as
docentes da Escola Municipal José Secundo Filho acerca da abordagem de gênero nas aulas,
considerando a relação dessa categoria com o currículo e a aprendizagem, no período letivo de 2016.
Justifica-se esta pesquisa pela sua relevância em se discutir as questões de gênero na escola básica
haja vista ser uma instituição que “[...] delimita espaços. Servindo-se de símbolos e códigos, ela afirma
o que cada um pode (ou não pode) fazer, separar e instituir. Informa o ‘lugar’ dos pequenos e dos
grandes, dos meninos e das meninas” (Louro, 1997, p. 58). Estudos que tratam sobre o termo gênero
corroboram para a ruptura de visões etnocêntricas relacionadas ao masculino e feminino.

2 A Pesquisa em Questão

Esta pesquisa, quanto à natureza dos dados, adotou a abordagem qualitativa com a finalidade de
entender os registros dos sujeitos, preocupando-se “[...] com a compreensão, a interpretação do
fenômeno, considerando o significado que os outros dão às suas práticas” (Gonsalves, 2011, p. 70).
Assim, trata-ase de um estudo de cunho teórico-empírico que tem o intuito de observar como os/as
professores/as professoras da educação básica, da rede municipal, compreendem as questões de
gênero no ambiente escolar, bem como relacionam essa categoria com o currículo (formal e oculto) e
a aprendizagem dos seus discentes.
Para tanto, adotou-se como método de interpretação o dialético na busca de se refletir acerca das
questões de gênero no cotidiano da escola. A dialética permite entender “[...] as contradições da
realidade, o modo de compreendermos a realidade como essencialmente contraditória e em
permanente transformação” (Konder, 2004, p. 7).
Quanto aos objetivos, trata-se de uma pesquisa descritiva que visa caracterizar o objeto de estudo.
Entre “[...] esse tipo de pesquisa estão as que atualizam as características de um grupo social, nível de
atendimento do sistema educacional, como também aquelas que pretendem descobrir a existência de
relações entre variáveis” (Gonsalves, 2011, p. 67).
O lócus deste estudo foi a Escola Municipal José Fecundo Filho, fundada em 1950, no governo do
General Eurico Gaspar, por Manoel Secundo Filho que nomeou a instituição em homenagem ao seu
pai. A diretora atual tem formação em Pedagogia e pós-graduação lato sensu. Essa escola, localizada
no Povoado Garangau, na cidade de Campo do Brito, em Sergipe/Brasil, iniciou as suas atividades com
apenas duas salas de aula, sendo que um desses espaços era a moradia da primeira educadora a Sra.
Maria de Lourdes Alves Secundo, juntamente com seus familiares.
Essa unidade escolar tem trajetória significativa para a comunidade do povoado pelos 60 (sessenta)
anos de contribuição. Trata-se de uma escola que atende aos filhos das pessoas que vivem do campo
(trabalhadores rurais), oportunizando os primeiros contatos com a educação sem que eles precisem
se deslocar para a cidade sede. Tem 05 (cinco) funcionários, 07 (sete) professores/professoras e 140
(cento e quarenta) alunos/alunas. As modalidades de ensino ofertadas são educação infantil – 02
(duas) turmas – e ensino fundamental do 1° ao 5° ano – 05 (cinco) turmas.

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Os docentes são profissionais formados em Pedagogia com pós-graduação lato sensu, sendo
contratados como efetivos pela Secretaria Municipal de Educação de Campo do Brito. Os/As
professores/professoras recebem formação continuada em serviço pelo Plano Nacional de
Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Esse programa tem o objetivo de alfabetizar “[...] em Língua
Portuguesa e Matemática, até o 3º ano do ensino fundamental, todas as crianças das escolas
municipais e estaduais, urbanas e rurais, brasileiras” (PNAIC, 2012, não paginado).
Atualmente, a escola enfrenta dificuldades com os livros didáticos recebidos por estarem fora da
realidade do contexto da comunidade do povoado e, portanto, dos/das alunos/alunas que estão
matriculados. Esse fator ocasiona prejuízos para o desenvolvimento cognitivo e social das crianças.
Outro problema é a repetência, principalmente nos anos iniciais. Também tem evasão escolar
relacionada ao trabalho infantil. Há estudantes que precisam abandonar os estudos para ajudar seus
pais na roça.
O planejamento de ensino e aprendizagem da escola é elaborado pelo/as professores/professoras a
partir das atividades que se pretende desenvolver. O documento contém objetivos e metodologias de
ensino, recursos, estratégias de avaliação e bibliografia.
Os sujeitos desta pesquisa foram 06 (seis) docentes dos anos iniciais do ensino fundamental. Esse
quantitativo representa uma amostra de 87,7% do universo da população da pesquisa. Apenas 01
(uma) docente da educação infantil (12,3%) optou em não participar. No público-alvo investigado há
uma predominância do sexo feminino com 05 (cinco) docentes e 01 (um) do sexo masculino. Essa
distribuição demostra uma participação maior das mulheres no curso de Licenciatura em Pedagogia.
Quanto à faixa etária, os dados evidenciam que a maioria dos docentes está entre 36 e 40 anos (66,7%).
Apenas (02) pesquisados (33,3%) pertencem a faixa etária correspondente entre 41 e 45 anos.
Aplicou-se um questionário organizado em 03 (três) etapas. A primeira visou identificar o perfil dos/das
professores/professoras; a segunda envolveu as questões de gênero na prática educativa; e a terceira
foi um espaço aberto para os investigados registrarem suas certezas sobre a categoria gênero. Cabe
mencionar que os/as docentes concordaram em assinar um termo de consentimento livre esclarecido
(TCLE), assumindo a posição de voluntário deste estudo.
A coleta de dados iniciou-se com uma visita de observação à unidade de ensino. Alguns dias, voltou-se
à escola para aplicar o questionário. Após a devolução foi feito um processo de codificação dos sujeitos.
Ver tabela:

Tabela 1. Critérios para Codificação dos Sujeitos

EXEMPLO CÓDIGO IDENTIFICAÇÃO


P Professor
Professor
M M para mulher (H para homem)
PM50
50 Idade

Os dados coletados foram trabalhados à luz da ATD de Moraes e Galiazzi (2007) que sistematiza a
análise em três etapas. O esquema (figura 1) explicita o ciclo da ATD a desconstrução/unitarização do
material textual a partir do dados coletados nos questionários (unidades de análise); a categorização
das unidades de análise com vistas à valorização dos significados para identificar as categorias da
pesquisa; e, por fim, a construção do metatexto que representa, propriamente, os resultados da
análise.
A desconstrução/unitarização (etapa 1) estabeleceu as condições para a categorização (etapa 2), com
a manifestação de novos sentidos e significados. Para Moraes e Galiazzi (2006, p. 125), “[as] categorias

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vão emergindo, inicialmente imprecisas e inseguras, mas gradativamente sendo explicitadas com rigor
e clareza”. Longe de ser um processo automático e ágil, esse movimento exigiu

[...] uma pluralidade de olhares, tanto concorrentes quanto eventualmente mantidos unidos por
um jogo de articulação que vai especificar melhor essa abordagem. Não somente os diferentes
sistemas de referência, reciprocamente, mutualmente outros, interrogam o objeto a partir de suas
perspectivas e de suas lógicas [...]. (Ardoino, 2002, p. 554).

Tratou-se, então, de um processo recursivo e recorrente demandando intensa participação na


compactação de ideias fragmentadas que estimularam e oportunizaram o surgimento do novo
(Moraes; Galiazzi, 2007). Entende-se que as categorias não se originaram prontas. Pelo contrário,
exigiu um retorno cíclico em que se precisou avaliar a validade e pertinência. Essas ideias não
procederam “[...] da simples observação dos fatos, mas sim de especulações que [...]” (Lecourt, 2002,
p. 526) emergiram da integração de conceitos referentes às questões de gênero. Ver detalhamento
seguir:
Figura 1. Etapas da Análise Textual Discursiva

Morin (2010) descreve esse movimento como um pensamento que capta as relações, as inter-relações
e as implicações mútuas em condições multidimensionais. “Cada categoria representa um conceito
dentro de uma rede de conceitos que pretende expressar novas compreensões” (Moraes, Galiazzi,
2006, p. 125). Para tanto,

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[...] o processo de categorização precisa investir na definição e explicitação do núcleo das


categorias emergentes, deixando que se estabeleçam entrelaçamentos na superposição das
fronteiras, garantindo-se desta forma a constituição de um todo integrado. A superação da
fragmentação na ATD implica não pretender estabelecer limites precisos entre as categorias.
(Moraes, Galiazzi, 2006, p. 125).

A combinação da unitarização e da categorização resultou em uma espiral formada pela ordem e pelo
caos. A primeira concebe o caos pela desorganização de verdades estabelecidas. A segunda indica um
movimento construtivo de uma ordem diferente da original. A etapa 3 da ATD surgiu da construção de
um metatexto em que emergiram as seguintes categorias de estudo: escola e sociedade; diversidade
cultural; formação de professor; e prática reflexiva. Essas categorias transformaram-se em objetos de
estudo das próximas seções.

3 Escola e Sociedade: um estudo no contexto de gênero e diversidade cultural

Esta seção aborda a inter-relação entre a escola e a sociedade no contexto da categoria gênero e da
diversidade cultural, bem como as implicações dessas discussões para o currículo e a aprendizagem.
A sociedade tem relação direta com a construção de uma escola democrática que envolve a
diversidade de cultura em cenários aproximados. Não se pode pensar o ambiente escolar e a sociedade
separadamente, porque ambos se completam. Para Libâneo (2013, p. 14), “[a] educação – ou seja, a
prática educativa – é um fenômeno social e universal, sendo uma atividade humana necessária à
existência e funcionamento de todas as sociedades”. Assim, a sociedade pode corroborar para a
“[...] formação dos indivíduos, auxiliar no desenvolvimento de capacidades físicas e espirituais,
prepará-los para a participação ativa transformadora nas várias instâncias da vida social. Não há
sociedade sem prática educativa nem prática educativa sem sociedade” (p. 15).
Há tantas diversidades sociais na composição da comunidade escolar que exige uma ressignificação
das práticas educativas com vistas à construção de um mundo mais acolhedor e democrático. Para
tanto, a escola pode estreitar as relações de parceria com a família. O professor PM44 afirma que “[a]
escola precisa ser parceira das famílias e tentar amortecer o impacto das descobertas feitas em outros
meios, hoje há uma necessidade urgente de que as famílias tratem os seus de maneira igualitária,
exigindo respeito às diversidades”.
Diante da padronização cultural construída pela sociedade,

[...] a escola, o currículo e a docência são obrigados a se indagar e tentar superar toda prática e
toda cultura seletiva, excludente, segregadora e classificatória na organização do conhecimento,
dos tempos e espaços, dos agrupamentos dos educandos e também na organização do convívio e
do trabalho dos educadores e dos educandos. É preciso superar processos de avaliação
sentenciadora que possibilitam que as crianças, adolescentes, jovens, e adultos sejam respeitado
em seu direito a um percurso continuo de aprendizagem, socialização e desenvolvimento humano.
(Gomes, 2007, p. 14).

Essa configuração implica na inserção das questões que envolvem a igualdade entre o masculino e o
feminino. A escola e a sociedade deve avançar para além de um “[...] democrático de justiça e
igualdade, de garantia dos direitos sociais, culturais, humanos para todos. Mas ainda há indagações
que exigem respostas e propostas mais firmes para superar tratos desiguais, lógicos e culturais
excludentes” (Gomes, 2007, p. 14).

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Para Moreira (2007, p. 21), “[...] uma educação de qualidade deve propiciar ao/à estudante ir além dos
referentes presentes em seu mundo cotidiano, assumindo-o e ampliando-o, transformando-se, assim,
em um sujeito ativo na mudança de seu contexto”. Atualmente, as exigências

[...] com relação à forma como a escola lida com a diversidade em seu cotidiano, no seu currículo,
nas suas práticas faz parte de uma história mais ampla. Tem a ver com estratégias por meio das
quais os grupos humanos considerados diferentes passaram cada vez mais a destacar
politicamente as suas singularidades, cobram que as mesmas sejam tratadas de forma justa e
igualitária, desmistificando a ideia de inferioridade que paira sobre algumas dessas diferenças
socialmente construídas e exigindo que o elogio à diversidade seja mais do que um discurso sobre
a variedade do gênero humano. (Gomes, 2007, p. 22-23).

Os grupos considerados fora do padrão exigido pela sociedade lutam por equidade de direitos e
cobram que sejam tratados de forma igual a partir das suas diferenças. Torna-se preciso que a escola
esteja prepara para acolher os excluídos. “Trabalhar questões de gênero é mostrar que pode existir
igualdade e respeito na sociedade e na escola” (PM39). Além disso, a inserção na prática educativa do
termo gênero “[...] auxilia os alunos na construção de sua própria identidade e na relação com os
demais colegas [...]” (PM40).
As atividades desenvolvidas na escolar, a partir de um currículo que contemple a diversidade cultural
e de gênero, permitem acreditar em uma formação humana que apresenta

[...] diferenças: de gênero, raça/etnia, idades, culturas, experiências, entre outros. E mais, somos
desafiados pela própria experiência humana a aprender a conviver com as diferenças. O nosso
grande desafio está em desenvolver uma postura ética de não hierarquizar as diferenças e entender
que nenhum grupo humano e social é melhor ou pior do que outro. Na realidade, somos diferentes.
(Gomes, 2007, p. 22).

Estudar sobre as desigualdades de gênero permite compreender à diversidade humana, bem como
enfrentar o desafio de fazer com que as pessoas sejam aceitas com suas diferenças e não privadas de
exercer sua cidadania. Em síntese, isso significa entender o termo gênero à luz de uma igualdade
baseada na diversidade cultural. Para os sujeitos investigados gênero é

[...] um agrupamento comum [...]. Ao caso, as escolhas feitas, particularidades, respeitando às


diversidades. (PM44).
[...] agrupamento dos indivíduos nos dias de hoje, agindo por igual. (PH41).
[...] aquilo que identifica ou diferencia os indivíduos, de acordo com a identidade adotada. (PM40).
[...] uma construção que se dá durante toda a vida. Isso acontece em diferentes instituições e
práticas sociais entre homens e mulheres em um processo que não tem fim, nem se completa.
(PM37).
[...] algo que o indivíduo se identifica, a opção sexual de cada um. (PM38).

As narrativas apresentam entendimentos diversos. Para Louro (1997, p. 23), “[...] as concepções de
gênero diferem não apenas entre as sociedades ou aos momentos históricos, mas no interior de uma
dada sociedade, ao se considerar os diversos grupos (étnicos, religiosos, raciais, de classe) que a
constituem”.
O sujeito PM38 afirma que gênero é “[...] a opção sexual de cada um”. Para além dessa concepção, a
compreensão do lugar e das “[...] relações de homens e mulheres numa sociedade importa observar
não exatamente seus sexos, mas sim tudo o que socialmente se construiu sobre os sexos” (Louro, 1997,
p. 21). Nessa perspectiva, “[...] os sujeitos também se identificam, social e historicamente, como

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masculinos e femininos e, assim, constroem suas identidades de gênero” (p. 26). Ou seja, as questões
sobre o masculino e o feminino têm relação para além de um conjunto de diferenças.

Ao entrarmos nesse campo, estamos lidando com a construção histórica, social e cultural das
diferenças a qual está ligada as relações de poder, aos processos de colonização e dominação.
Portanto, ao falarmos sobre a diversidade (biológica e cultural) não podemos desconsiderar a
construção das identidades, o contexto das desigualdades e das lutas sociais. (Gomes, 2007, p. 41).

Nota-se, então, que se precisa estar sempre em constante transformação, de acordo com a construção
das identidades de cada pessoa, no qual é preciso que a escola esteja preparada para dar suporte aos
seus, para construírem seus próprios caminhos e formarem suas opiniões com base no que realmente
acreditam. A “[…] escola precisa estar sempre preparada para apresentar não uma verdade absoluta,
mas sim uma reflexão que possibilite aos alunos e às alunas compreenderem as implicações éticas e
políticas de diferentes posições sobre o tema e construírem sua própria opinião nesse debate”
(Carrara, 2009, p. 14).
Essa perspectiva avança para além do pensamento de grupos que tentam impor a sua visão de mundo
etnocêntrica. Essa forma de dominação acaba por impedir a convivência de culturas diferentes. Cabe
à escola repensar seu currículo para além de um padrão social desejado.

4 Formação de Professor e Prática Reflexiva

“A democratização do ensino passa pelos professores, por sua formação, por sua valorização
profissional e por suas condições de trabalho [...]” (Pimenta; Lima, 2008, p. 12). Essas questões
sinalizam para uma formação contínua de valorização identitária1. A legislação determina que a
formação do professor seja ofertada

[...] nos cursos de habilitação ao magistério em nível de ensino médio e superior. Compõe-se de
um conjunto de disciplinas coordenadas e articuladas entre si, cujos objetivos e conteúdos devem
confluir para uma unidade teórico-metodológica do curso. A formação profissional é um processo
pedagógico, intencional e organizado, de preparação teórico- científica e técnica do professor
para dirigir competentemente o processo de ensino. (Libâneo, 2013, p. 26).

Por mais que a legislação normativa determine uma formação profissional pedagógica, intencional e
organizada, de preparação teórico-científica e técnica, “[...] o currículo normativo das escolas e a
separação entre a pesquisa e a prática não deixam espaço para a ‘reflexão-ação’, criando, assim, um
dilema entre o rigor e a relevância para educadores, profissionais e estudantes” (Schön, 2000,
prefácio).
Quando os/as docentes conseguem firmar rupturas nesse campo com vistas a sustentar “[...] uma
conversação reflexiva com os materiais de suas situações, eles refazem parte de seu mundo prático e
revelam, assim, os processos normalmente tácitos de construção de uma visão de mundo em que se
baseiam toda a sua prática (Schön, 2000, p. 39).

1 “Essa formação identitária é epistemológica, ou seja, reconhece a docência como um campo de conhecimentos específicos
configurados em quatro grandes conjuntos, a saber: 1) conteúdos de diversas áreas do saber e do ensino, ou seja, das ciências
humanas e naturais, da cultura e das artes; 2) conteúdos didático-pedagógicos, diretamente relacionados ao campo da
pratica profissional; 3) conteúdos ligados mais amplos do campo teórico da prática educacional; 4) conteúdos ligados à
explicitação do sentido da existência humana individual, com sensibilidade pessoal e social. E essa formação identitária é
também profissional, ou seja, a docência constitui um campo específico de intervenção profissional na prática social”
(Pimenta; Lima, 2008, p. 13).

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Esse cenário aplicado às questões de gênero na escola favorece práticas reflexivas com modos de
pensar e de agir que se respeite às diferenças na sala de aula e traz ciclo de mudanças. Nas práticas
pedagógicas dos professores/das professoras investigados, o trabalho com a categoria gênero ocorre
por meio “[…] de debates, histórias, músicas infantis, textos, conversas informais, brincadeiras
diversificadas, enfatizando o respeito mútuo (PM40). Para o sujeito PM44, a igualdade de gênero é
apresentada com “[...] textos, brincadeiras e outras atividades”. Já o PM38 trabalha através de “[...]
vídeos, músicas, diálogo e outras atividades”.
No tocante à formação acadêmica, uma parte dos docentes afirmou que em sua graduação houve
diversas atividades com abordagem das questões de gênero, como “[...] disciplinas que tratavam sobre
a diversidade de gênero, através de debates, pesquisas acadêmicas, estudos de teóricos, seminários,
cursos etc.” (PM40). Essa condição de “[...] formação profissional do professor implica em uma
contínua interpenetração entre teoria e prática. A teoria vinculada aos problemas reais postos pela
experiência prática e a ação prática orientada teoricamente” (Libâneo, 2013, p. 27).
Teoria e prática são fundamentais para que o processo reflexivo aconteça e o/a docente possa refletir
acerca das soluções adequadas para os problemas do cotidiano da escola e da sala de aula. Para o
sujeito PM44, “[...] tudo que se discute em sala de aula requer reflexão e ação. Então, firmamos
opinião”.
Para Libâneo (2013, p. 26), “[a] formação profissional para o magistério requer […] uma sólida
formação teórico-prática”, capaz de estimular um processo de reflexão-ação-reflexão a partir de ações
cotidianas que aproxime o estudante e as diferenças inerentes ao mundo.
As questões de gênero, na escola básica, exigem que professores/professoras dominem “[...] as bases
teórico-científicas e técnicas e sua articulação com as exigências concretas do ensino [...]” (Libâneo,
2013, p. 26) e estabeleçam ressignificações na direção de uma prática reflexiva, consolidando sua
formação inicial e continuada.

5 Considerações Finais

Esta investigação teve como objetivo descrever o trabalho desenvolvido pelos/as docentes de uma
escolar básica acerca da abordagem de gênero nas aulas. Os significados das narrativas revelaram
peculiaridades sobre essa temática na prática educativa, bem como uma inclinação à epistemologia
sustentada na diversidade cultural. Entretanto, há dificuldades à inserção dessa realidade no currículo
escolar que apresenta concepções variadas.
Torna-se fundamental a adoção de um currículo que abranja o cotidano com vistas a oportunizar ao/à
docente a busca, o conhecimento e a familiarização com o desconhecido. A incorporação dos temas
gênero e diversidade cultural na formação do professor é um caminho possível para um mundo mais
plural e democrático. Por consequência, a prática educativa será reflexiva, permitindo aos estudantes
vivenciar diferentes crenças e culturas. Aproximar a diversidade, a sala de aula e o cotidiano, inserindo-
se novas aprendizagens é determinande para uma formação humanizada.
Os docentes investigados têm a preocupação em trabalhar as questões relacionadas ao gênero para a
promoção do respeito às diferenças, sendo pertinente que se considere os diversos contextos sócio-
culturais com vistas à superação de padrões que estimulam as desigualdades.
Por fim, este estudo sugere um projeto de formação continuada em serviço aos/às
professores/professoras desta pesquisa com vistas à promoção de ressignificações teórico-práticas
sobre o termo gênero com a finalidade de contribuir para uma prática reflexiva, como também para o
coletivo da escola.

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Referências
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Investigação qualitativa e métodos mistos em Manuais Escolares:


um estudo comparativo europeu

Cristina Maia1
1EscolaSuperior de Educação do Politécnico do Porto Investigadora do CITCEM – Faculdade de Letras da
Universidade do Porto Investigadora do InED – Instituto de Inovação e Educação da ESEPP, Portugal.
cristinamaia.hist@gmail.com

Resumo. O nosso artigo aborda as várias áreas de investigação a que se prestam os manuais escolares e,
consequentemente, daí emanam um conjunto de categorias de análise que se enquadram em metodologias
qualitativas de análise de conteúdo, de análise de discurso, donde destacamos a narrativa histórica, e de
métodos mistos. Esta abordagem parte de um estudo comparativo europeu de grande abrangência: manuais
escolares de 17 países de três áreas geográficas europeias bem diferenciadas – Europa Ocidental, Europa de
Leste e Europa Nórdica – serviram de mote para compreender o ensino da Guerra Fria entre o período final
da Guerra Fria e o pós-Guerra Fria. O objetivo deste trabalho é o de apresentar o desenho de uma investigação
com um processo inovador de análise qualitativa e quantitativa de dados, um método misto, embora com
prioridade à abordagem qualitativa, e que beneficiou da aplicação de software específico. O estudo revelou
que este tipo de investigação pode tirar grandes vantagens da combinação destas duas perspetivas
metodológicas, evidenciando o interesse em desenvolver métodos mistos em investigação com manuais
escolares.

Palavras-chave: manuais escolares; estudo comparativo europeu; Guerra Fria; categorias de análise;
métodos mistos.

Qualitative research and mixed methods in textbook research: the example of a European comparative
study
Abstract. Our article discusses the various areas of research that textbooks provide and, consequently,
emanate a set of categories of analysis that fit into qualitative methodologies of content analysis, discourse
analysis, where we highlight the historical narrative, and mixed methods. This approach is based on a wide-
ranging European comparative study: textbooks from 17 countries from three well-differentiated European
geographic areas - Western Europe, Eastern Europe and Nordic Europe - served as a basis for understanding
the teaching of the Cold War between the final period of the Cold War and the post-Cold War. The objective
of this work is to present the design of an investigation with an innovative process of qualitative and
quantitative data analysis, a mixed method, although with priority to the qualitative approach, and which
benefited from the application of specific software. The study revealed that this type of research can take
great advantage of the combination of these two methodological perspectives, evidencing the interest in
developing mixed methods in textbook research.
Keywords: textbooks; european comparative study; Col War; categories of analysis; mixed methods.

1 Introdução

O desenvolvimento da investigação em manuais escolares tem sido um tema recorrente nas últimas
décadas em estudos ligados à educação e à Escola (Magalhães, 2007). De facto, justifica-se
amplamente o desenvolvimento do interesse por este campo de investigação que, no âmbito
específico da investigação historiográfica, se enquadra na História da Educação e na Educação
Histórica, sobretudo se pensarmos na importância que o manual escolar adquire no espaço escolar e,
consequentemente, na formação do indivíduo. O manual escolar adquire uma enorme relevância no
impacto que tem sobre a educação uma vez que também é um veículo ideológico e cultural, sobretudo
quando estudamos manuais de a História, e como tal, adquire uma grande influência na formação das

1672
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competências históricas que possam conduzir à formação de verdadeiros cidadãos. Apple e Christian-
Smith (1991) chegam mesmo a afirmar que os manuais participam na construção de ideologias e
ontologias, uma vez que o currículo escolar não é neutral, pois este debate-se por legitimar um
conhecimento que resulta de uma complexa rede de relações de poder e que luta com aspetos como
a classe, a raça, o género e os grupos religiosos. Também Mikk (2000, 15) afirma o seguinte:
“Students have been acquiring knowledge, attitudes and developing a value system from
textbooks. […] Good textbooks are a bonanza for any nation.”

A própria UNESCO e as suas Comissões Nacionais têm vindo continuamente a organizar e a apoiar a
realização de seminários e de conferências na área da investigação em manuais escolares, numa
perspetiva multilateral, e o Conselho da Europa tem-se envolvido na melhoria destes instrumentos
pedagógico-didáticos e na promoção do ensino da História.
Magalhães (1999, 279) afirma o seguinte sobre as tendências de investigação historiográfica nesta área
de pesquisa:
“A historiografia do manual escolar, como a historiografia do livro em geral, tem-se
desenvolvido a partir de três grandes linhas de orientação: uma entrada pela história económica
e social; uma entrada a partir de uma etno-história do livro; uma entrada a partir da história
cultural. Três linhas de orientação que se cruzam e complementam, mas que contêm reforços
diferenciados de algumas valências e dimensões objectuais. Três olhares que se desenvolvem
sob lógicas interpretativas diferenciadas.”

Embora muitos dos estudos sobre manuais tenham uma perspetiva sociológica, atualmente também
se constata cada vez mais o desenvolvimento de investigações sobre manuais de História que incidem
sobre a imagem que transmitem do “outro” e a construção de identidade nacional associada a
mecanismos de inclusão e de exclusão; a memória histórica e a construção de identidades locais,
nacionais e globais; a diversidade cultural e social; o multiculturalismo e pluralismo cultural; as
conceções metodológico-didáticas inscritas no manual (Choppin, 1992). Também tem-se vindo a
descobrir a importância da realização de estudos comparativos internacionais (Choppin, 1999, 14):
“Le manuel scolaire y est abordé sous des perspectives diverses, mais complémentaires:
historique, typologique, économique, éditoriale, institutionnelle, comparative. [...] la dimension
historique et la comparaison internationale sont privilégiées afin de relativiser les
représentations que les stagiaires ont été amenés à se forger d’un objet aussi familier que le
manuel scolaire.”
Importa, ainda, referir toda recente investigação que a Universidade de Aveiro tem vindo a
desenvolver na área dos manuais escolares, sobretudo ligada ao seu Departamento de Educação, no
desenvolvimento de teses de mestrado e de doutoramento, mas também a Faculdade de Letras de
Universidade do Porto, os Institutos de Educação da Universidade do Minho e da Universidade de
Lisboa.
Ao termos como objeto de estudo o manual escolar também não podemos deixar de ter em
consideração toda a política educativa em seu torno no sentido de controlar a sua importância e
estatuto. Atualmente em Portugal, os manuais são aprovados por legislação específica (Lei nº 47/2006
de 28 de Agosto) com a definição de critérios de escolha e adoção, até à regulamentação da sua
utilização e vigência, mas nem sempre assim foi no contexto nacional e até no contexto internacional
com muitos casos de períodos históricos onde a política de livro único, totalmente controlado pelo
Estado, foi uma realidade também constatada no nosso estudo.

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2 Principais tendências da investigação em Manuais Escolares

As obras “History and Social Studies – Methodologies of Textbook Analysis” do Georg Eckert Institut e
“Guidebook on Textbook Research and Textbook Revision” da UNESCO continuam a ser as principais
obras de referência a nível internacional em torno das metodologias de investigação desta área de
investigação e, por isso, estas servem-nos de base nas nossas fundamentações teóricas.
A reflexão em torno da hermenêutica que fundamenta este tipo de investigação circula pelas
tendências de investigação, onde se distinguem as centradas no processo, outras no produto e outras
ainda na utilização do manual escolar por professores e alunos, áreas que nos remetem para
considerações sobre as várias dimensões ou categorias de análise: dimensão da “teoria do
conhecimento”, dimensão do “design”, dimensão do “conteúdo” e dimensão da “metodologia de
ensino da disciplina” (Weinbrenner, 1992; Choppin, 1992). Por um lado, a tendência de investigação
orientada para o processo procura explorar todo o ciclo de vida do manual – conceção, aprovação,
difusão, adoção, utilização e abandono. Por outro lado, as investigações orientadas para o produto
desenvolvem a perspetiva do manual como um recurso de ensino-aprendizagem e um instrumento de
comunicação visual, recorrendo a uma análise de conteúdo. Nesta última tendência de investigação,
o manual é analisado do ponto de vista das conceções ideológicas e dos valores que procura veicular
e também a linha metodológico-didática que privilegia. Por fim, temos as investigações orientadas
para a receção do manual junto dos professores e dos alunos, descortinando os seus critérios da
adoção, a forma como é utilizado e as opiniões sobre este, de pais e associações de pais, partidos
políticos e sindicatos, uma vez que representam formas de reação a certos manuais escolares. O
quadro que se segue, da autoria de Weinbrenner (1992), resume todas as dimensões analíticas do
manual escolar.

Quadro 1. Dimensões e categorias da investigação em Manuais Escolares (focalizada nos Manuais Escolares e não na
sua forma de utilização) (Weinbrenner, 1992, 24)

Dimensions Categories
Theory of knowledge - Epistemological research interests
- Statement analysis
- Concept formation
- Value judgments
- Ideologies
Design - Outer design
- Typography
- Colour
- Graphics
Subject content - Factual correctness
(general level of social sciences) - Current state of subject based content and change of curriculum
models
- Controversiality
- Methods
Subject theory and methods - Approach of subject theory and methods
- Approach to achieving educational targets
- Structuring and sequencing
- Simplification and interpretation
- Problem-orientation
- Types of guidance offered
Educational theory - Paradigm of educational theory
- Schoolbook type
- Didactic functions
- Methodological functions Text types, structure and intelligibility
- Forms of communication and interaction

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Importa, também ainda, apresentar outras categorias de análise do manual, segundo Hummel (cit. em
Santo, 2006): formato (capacidade do manual estimular o aluno para a aprendizagem, por exemplo
destacando nesta análise as ilustrações e a sua qualidade gráfica); conteúdo (o que dá sentido às
aprendizagens do aluno e o motiva a “aprender a aprender”); legibilidade (elemento que facilita a
compreensão do aluno); abordagem metodológica (as experiências de aprendizagem).
Contudo, verifica-se que a investigação em manuais carece de vários aspetos ligados a limitações
teóricas pela falta de uma reconhecida “teoria do manual escolar”; dificuldades empíricas, pois ainda
existe pouca investigação sobre a forma como os manuais escolares são utilizados por alunos e
professores e, finalmente, limitações metodológicas uma vez que ainda não há um conjunto de
métodos e instrumentos de medida e de avaliação das investigações para o desenvolvimento das
necessárias categorias (Weinbrenner, 1992,22):

“Relations between quantitative and qualitative schoolbook research; relations between


empirical and hermeneutic (interpretative) schoolbook research; relations between explicit and
implicit schoolbook content; relations between status quo analyses and deficit analyses; criteria
for assessment of investigations in the field of schoolbook research.”

De facto, o estudo dos Manuais presta-se a pesquisas de natureza diversificada, o que demonstra a
complexidade deste tipo de estudo.
No entanto, as metodologias de investigação dos manuais escolares têm evoluído de forma a
responder às diferentes dimensões de análise que apresentamos acima, ou seja, desde a análise de
conteúdo do texto informativo do manual (ideias subjacentes e afirmações proferidas), às perspetivas
didáticas ou à descoberta do curriculum oculto (Pingel, 1999). Como tal, importa apresentar a lista de
critérios de análise do manual escolar adotada pela UNESCO e elaborada por Pingel (1999, 41).

Quadro 2. Lista de critérios de análise dos Manuais Escolares (Pingel, 1999, 41)
List of criteria for analysis
1. Textbook sector components
- education system
- guidelines/curricula
- adoption procedures
- structure of publishing houses
2. Formal criteria
- bibliographic references
- target group (school level, type of school)
- dissemination
3. Types of texts/mode of presentation
- authors’ intentions (if specified)
- descriptive author’s text (narrative)
- illustrations/photos/maps
- tables/statistics
- sources
- exercises
4. Analysis of content
- factual accuracy/completeness/errors
- up-to-date portrayal
- topic selection/emphasis (balance)/representativeness
- extent of differentiation
- proportion of facts and views/interpretation
5. Perspective of presentation
- comparative/contrastive approach

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- problem-oriented
- rationality/evocation of emotions

Estes critérios são os aspetos fundamentais de análise dos manuais e, como tal, devem ser
considerados como categorias muito gerais, gerando a necessidade de cada estudo estabelecer as
categorias adequadas aos objetivos da sua investigação.

3 Um estudo comparativo europeu em investigação qualitativa e métodos mistos de


Educação Histórica

O exemplo do estudo comparativo europeu que aqui trazemos teve como preocupação central a
análise da formação das competências históricas através do tratamento do tema da Guerra Fria em
manuais escolares europeus entre as décadas de 1980 e de 1990. Para isso, essa investigação foi
estruturada de forma a dar resposta aos seguintes objetivos específicos: rever criticamente as
perspetivas sobre a Guerra Fria que os manuais apresentam para o nível de ensino correspondente ao
atual 3.º Ciclo do Ensino Básico Português; identificar os modelos pedagógicos utilizados no ensino da
Guerra Fria, através dos quais se consegue desenvolver a Educação Histórica e as competências
históricas; analisar a qualidade técnica e gráfica do manual como elementos fundamentais da sua
adequação à faixa etária a que se destina e reveladores da orientação metodológico-didática impressa
no manual. Os critérios de seleção do corpus documental foram os seguintes: Manuais e Programas de
História dentro do mesmo ciclo de estudos, correspondente do 3.º Ciclo do Ensino Básico português;
a diversidade geográfica e a diversidade política europeia com a intenção de aferir, ou não, a existência
de contrastes no tratamento do conteúdo Guerra Fria; a delimitação temporal do estudo situa-se entre
o período final da Guerra Fria (década de 1980) e no pós Guerra Fria (década de 1990) e também
justifica-se pela pertinência do próprio tema; o volume de informação sobre a Guerra Fria nos manuais
escolares para inferir os tratamentos dedicados ao conteúdo programático, permitindo fornecer
consistência ao objeto de estudo; finalmente, a diversidade editorial. As nossas fontes foram
sobretudo recolhidas no Georg Eckert Institut: 62 manuais distribuídos por três áreas geográficas e por
17 países - 9 países da Europa Ocidental, 2 países da Europa do Norte e 6 países da Europa de Leste.
Apresentamos, de seguida, um gráfico com a distribuição geográfica e quantitativa dos manuais para
cada uma das décadas de 1980 e de 1990.

5
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5 Década de 1980
1
0,5 Década de 1990
0
Itália

Hungria
Holanda
Inglaterra

Suécia
Finlândia

Roménia
RDA

URSS/Rússia
Portugal

Alemanha

Polónia
Espanha

Suíça
França

Fig. 1. Distribuição quantitativa dos Manuais Escolares versus distribuição geográfica entre as décadas de 1980 e de
1990

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Para procedermos à análise de conteúdo dos manuais construímos uma tipologia, organizada a partir
da definição de categorias. Bell (1997, 160) afirma a importância da organização da informação por
categorias:
“Os dados em bruto, provenientes de inquéritos, esquemas de entrevistas, listas, etc.,
têm de ser registados, analisados e interpretados. Uma centena de pedaços soltos de
informação interessante não terá qualquer significado para um investigador ou para um leitor
se não tiverem sido organizados por categorias.”

Estas categorias de análise permitiram-nos uma codificação do levantamento da informação através


de uma análise temática. Bardin (1979, 103-104; 105) explica este processo:
“Tratar o material é codificá-lo. A codificação corresponde a uma transformação –
efectuada segundo regras precisas – dos dados brutos do texto, transformação esta que, por
recorte, agregação e enumeração, permite atingir uma representação do conteúdo, ou da sua
expressão, susceptível de esclarecer o analista acerca das características do texto. […] Fazer
uma análise temática, consiste em descobrir os «núcleos de sentido» que compõem a
comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição podem significar alguma coisa para o
objectivo analítico escolhido.”

Ora, para realizar a análise temática é fundamental estabelecer uma categorização (Bardin, 1979, 119):
“A partir do momento em que a análise de conteúdo decide codificar o seu material, deve
produzir um sistema de categorias. A categorização tem como primeiro objetivo (da mesma
maneira que a análise documental), fornecer, por condensação, uma representação simplificada
dos dados brutos. […] A análise de conteúdo assenta implicitamente na crença de que a
categorização (passagem de dados brutos a dados organizados) não introduz desvios (por
excesso ou por recusa) no material, mas que dá a conhecer índices invisíveis, ao nível dos dados
brutos.”

A nossa análise de conteúdo dos manuais foi realizada a partir da definição de uma tipologia vertida
em três níveis de análise – descritiva, interpretativa e reflexiva -, sendo que cada uma foi organizada a
partir da definição de categorias, vertidas numa base de dados construída em FileMaker Pro. Por outras
palavras, a base de dados comporta esses vários campos, uns de natureza identificativa, outros
descritivos e finalizando com um campo de carácter interpretativo, ou seja, esta contém todas as
categorias de análise do estudo e suas subcategorias. A grande vantagem da utilização deste software
específico esteve em que os dados registados relativamente a cada uma das categorias de análise que
criámos, puderam ser comparadas mais facilmente pelo possibilidade de tratamento quantitativo de
alguns desses dados dos três níveis de análise, podendo-se, assim, identificar evoluções em termos de
conteúdos, recursos, propostas de experiências de aprendizagem, etapas metodológico-didáticas do
processo ensino-aprendizagem sugeridas no manual escolar, a sua organização interna e a sua
qualidade gráfica e técnica.
As categorias de análise do manual foram as seguintes: do ponto de vista descritivo - identificação das
fontes; qualidade gráfica e técnica; organização interna; do ponto de vista interpretativo -
caracterização do manual escolar para o conteúdo Guerra Fria; do ponto de vista reflexivo - apreensão
das perspetivas sobre a Guerra Fria, dos modelos pedagógico-didáticos subjacentes e dos critérios que
estiveram presentes na conceção de cada manual.
Apresentamos, de seguida, um printscreen da base de dados que organizamos para o estudo. Apesar
de esta imagem não ter leitura, decidimos inclui-la, pois esta revela-nos a sua grande dimensão e a
complexidade de informação que contém.

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Fig. 2. Printscreen da base de dados de análise dos conteúdos dos manuais escolares em FileMaker Pro

De facto, esta ferramenta foi de grande utilidade uma vez que esta nos permitiu sistematizar bem a
recolha e tratamento da informação, chegando mesmo a possibilitar a quantificação de dados, por
exemplo, em relação às seguintes categorias de análise. Ora, vejamos:

a) quanto à qualidade técnica e gráfica do manual – para o corpo dos caracteres


comportando as variáveis “adequabilidade à faixa etária” (sim/não), “grau de legibilidade”
(boa/fraca) e “clareza de hierarquia” (sim/não); para a seleção iconográfica (variada; pouco
variada; equilibrada versus os conteúdos da página; não equilibrada versus os conteúdos da
página) para aferir a relação entre texto informativo e fontes na sua distribuição nas duplas
páginas, conseguindo apercebermo-nos de eventuais desequilíbrios na estrutura do conteúdo
apresentado, por exemplo, ao verificarmos se as fontes se encontram ou não bem sequenciadas

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

de acordo com o desenvolvimento do conteúdo no texto informativo; finalmente, a qualidade


da seleção iconográfica (boa; razoável; fraca);
b) para a organização interna do manual – com itens de análise para recolha de dados de
resposta “Sim/Não” - introdução; índice; apresentação do manual ao aluno; apresentação de
ficha de avaliação diagnóstica; apresentação das ideias básicas que recordam os últimos
conteúdos do nível de escolaridade anterior; abertura de Tema; abertura de Unidade;
apresentação de biografias de personagens históricas; bibliografia -, tudo isto para fundamentar
a coerência interna do manual relativamente às etapas metodológicas de ensino-aprendizagem
apresentadas e, assim, avaliar a sua qualidade metodológico-didática; ainda itens de análise
como texto de autor extenso ou sintético; e, por fim, os dados de natureza temporal e os dados
de natureza espacial com variáveis como “frequência” (regular; irregular; não possui) e
“qualidade” (boa; razoável; fraca);
c) relativamente à análise do conteúdo programático Guerra Fria no manual – número
de páginas do conteúdo Guerra Fria e sua percentagem no total do número de páginas do
manual; qualidade das fontes sobre a Guerra Fria (ilustrativa; informativa;
reflexiva/interpretativa) para aferir sobre a sua potencialidade de desenvolvimento de
competências históricas; tipo de fontes para o estudo da Guerra Fria (documentos iconográficos;
documentos escritos; mapas; barra cronológica ou cronologia, gráficos/tabelas/quadros;
esquema, documentos musicais; excertos de filmes históricos e/ou documentários e outros); a
classificação dos documentos escritos (documentos historiográficos, documentos históricos;
documentos didatizados, por exemplo, poemas, canções); os recursos sugeridos para o processo
ensino-aprendizagem (utilização do caderno diário; quadro negro; materiais audiovisuais;
recursos multimédia; Internet; manual; caderno de atividades; outros); o tipo de propostas de
experiências de aprendizagem para o estudo da Guerra Fria (análise oral e/ou escrita das fontes
do manual; debate; visita de estudo; trabalho de pesquisa; construção de mapa e/ou barra
cronológica; redação de texto argumentativo; redação de síntese; jogo lúdico; dramatização;
visualização de excerto de filme histórico/documentário; audição de músicas/canções; outros);
a adequação das propostas de experiências de aprendizagem para o nível etário dos alunos
(adequadas; inadequadas; não possui); e, por fim, vários itens de análise para recolha de dados
de resposta “Sim/Não” - promove um trabalho de diferenciação pedagógica; promove a
autonomia do aluno com orientações específicas para o seu trabalho; apresenta um resumo das
ideias básicas da Unidade; apresenta um esquema-síntese da Unidade; apresenta páginas para
suscitar no aluno o “quer saber mais”; apresenta ficha de avaliação formativa em cada
Unidade/Tema; apresenta bibliografia sobre a Guerra Fria.

Apesar de esta investigação ser eminentemente qualitativa, conseguimos aliar a dimensão de análise
quantitativa uma vez que este programa permite quantificar dados de vários itens de análise e até
transformá-los em gráficos, permitindo, assim, uma melhor comparabilidade entre as décadas em
estudo e entre as várias áreas geográficas, sobretudo para as categorias de análise “Caracterização do
manual escolar” e “A Guerra Fria no manual escolar”. Por exemplo, um aspeto significativo de estudo
quantitativo foi a identificação das proporções de conteúdos sobre a Guerra Fria no conjunto de cada
manual. No entanto, como dissemos acima, o nosso estudo comparativo europeu apresenta uma linha
essencialmente qualitativa, através da análise de conteúdo do texto informativo dos manuais
escolares, ou seja, das narrativas. Essa análise de conteúdo, também vertida na base de dados, passou
por um nível interpretativo do conteúdo da Guerra Fria através da análise das ideias veiculadas e do
grau de aprofundamento do tema nas narrativas para, desta forma, chegarmos até uma revisão crítica
das perspetivas sobre a Guerra Fria nos manuais, através dos seguintes itens de análise:

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- principais ideias veiculadas no texto informativo sobre a Guerra Fria;


- conceitos que são destacados;
- citações que recolhemos do texto informativo do manual e que nos ajudam a fundamentar as
nossas interpretações;
- outros aspetos relevantes que merecem destaque no manual, por exemplo elementos ligados à
sua estrutura didática, tais como rubricas diversas, organização da narrativa do autor e das fontes.

A nossa última categoria de análise, “Aspetos que chamaram mais à atenção na análise do manual”
tem um carácter reflexivo, onde desenvolvemos a nossa interpretação sobre cada um dos manuais: os
princípios que presidiram à conceção de cada manual e a forma de tratamento do conteúdo da Guerra
Fria, para concluirmos sobre as perspetivas que cada manual emite acerca da Guerra Fria e, ainda,
sobre o seu modelo pedagógico-didático.
O desenho desta investigação permitiu-nos chegar com sucesso a conclusões sobre a forma como foi
ensinada a Guerra Fria e o discurso ideológico em torno deste tema em diferentes países de distintas
áreas da Europa e entre estes dois períodos - o período final da Guerra Fria e a primeira década do pós
Guerra Fria. As nossas questões analíticas passaram por averiguar ideologias e a questão do “nós” e
dos “outros” bem patente nos manuais de distintas áreas geográficas e políticas. Concluímos que o
manual escolar contribui para o desenvolvimento de competências históricas, ora numa perspetiva
mais crítica e, portanto, procurando apresentar a História de forma multiperspetiva, sobretudo na
Europa Ocidental, e de forma mais isenta na Europa Nórdica, para as duas décadas em análise, sendo
que para a Europa de Leste apenas se comprovou isso para a década de 1990; ora numa perspetiva de
defesa da ideologia que se advoga na Europa de Leste para a década de 1980. Podemos afirmar que a
imagem que cada um de nós tem acerca dos outros povos e nações encontra-se associada à História
que nos foi ensinada, em que o manual escolar detém um papel fulcral pela sua importância enquanto
um dos principais recursos de ensino-aprendizagem.

4 Conclusões

Concluímos, por toda a revisão de literatura de metodologia de investigação em manuais escolares,


que de alguma forma permanece a tentativa de distinção entre análises qualitativas e quantitativas,
empíricas ou interpretativas. Verifica-se, ainda, que os métodos qualitativos versus quantitativos
continuam a ser mais utilizados neste tipo de investigação, pela formulação das dimensões e categorias
de análise de natureza qualitativa, estando também isso presente neste estudo. A discussão entre as
vantagens e desvantagens de utilização de metodologias de carácter quantitativo e outras de carácter
qualitativo é sempre algo que se aflora quando o investigador tem de tomar opções, sabendo à partida
que ambas se completam. O investigador pode mesmo tirar vantagens das duas perspetivas
metodológicas, combinando-as na sua utilização.
A metodologia de investigação em manuais escolares apesar de ter características eminentemente
qualitativas, de análise de conteúdo e de análise de narrativas, também pode beneficiar com a
mobilização de métodos mistos com apoio de software específico. A utilização do software FileMaker
Pro teve impacto no nosso estudo ao conseguir potenciar a qualidade de investigação e da análise.
Desta forma, salientamos o interesse em desenvolver métodos mistos de investigação em Educação
Histórica, no âmbito dos manuais escolares, onde apesar da investigação qualitativa sobressair, não
omite a investigação de análise quantitativa, facto que lhe confere a possibilidade de triangulação de
diversos dados: características técnicas e de design do manual; aspetos organizativos da estrutura
didática e análise de conteúdo das narrativas. Podemos, assim, concluir que a nossa investigação foi
desenhada através da aplicação de uma metodologia mista, mas com prioridade à abordagem

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

qualitativa. Consideramos que o nosso estudo apresenta um processo inovador de análise qualitativa
de dados numa investigação de grande espetro geográfico, possível por todo o desenho de análise,
traçado em categorias que nos permitiram chegar aos objetivos traçados pela investigação e, ainda,
potencializados pela articulação de itens de análise e sua triangulação em diversas fontes de dados.

Referências

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History and Social Studies – Methodologies of Textbook Analysis, Report of the Educational
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Zeitlinger B.V.

Bardin, L. (1979). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70.

Bell, J. (1997). Como realizar um projecto de investigação – Um guia para a pesquisa em Ciências Sociais
e da Educação. Lisboa: Gradiva.

Choppin, A. (1992). Les Manuels Scolaires: Histoire et Actualité. Paris: Hachette Education.

Choppin, A. (dir. de) (1995). Les manuels scolaires en France de 1789 à nos jours – Bilan des études et
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Choppin, A. (1999). Les Manuels Scolaires de la Production aux modes de Consommation, in R. Vieira
de Castro, A. Rodrigues, J. Silva, M. Sousa (org.), Manuais Escolares – Estatuto, Funções, História.
Braga: Instituto de Educação e Psicologia Universidade do Minho, 3-17.

Magalhães, J. (1999). Um apontamento para a história do manual escolar entre a produção e a


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Estatuto, Funções, História. Braga: Instituto de Educação e Psicologia Universidade do Minho,
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Magalhães, J. (2007). O Manual Escolar no Quadro da História Cultural – Para uma historiografia do
manual escolar em Portugal, in http://sisifo.fpce.ul.pt/?r=1&p=10, visitado em 21.04.2007.

Mikk, J. (2000). Textbook: Research and Writing. Frankfurt: Peter Lang Europäischer Verlag der
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Pingel, F. (1999). UNESCO Guidebook on Textbook Research and Textbook Revision. Georg Eckert
Institut/United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization.

Santo, E. (2006). Os manuais escolares, a construção de saberes e a autonomia do aluno. Auscultação


a alunos e professores. Revista Lusófona de Educação, 8, 103-115.

Weinbrenner, P. (1992). Methodologies of Textbook Analysis used to date. In History and Social Studies
– Methodologies of Textbook Analysis, Report of the Educational Research Workshop held in
Braunschweig, 1990, 21-34. Amesterdão: Conselho da Europa, Swets & Zeitlinger B.V.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Etnografia com crianças pequenas na escola: transformando o


‘jardim’ em campo

Míghian Danae Nunes1

1 Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Brazil. mighiandanae@yahoo.com.br

Resumo. Embora as crianças tenham estado presentes em estudos etnográficos desde o início do século XX,
apenas com o surgimento de estudos sociais da infância no final do século é que foram reconhecidas como
participantes na sociedade e agentes sociais. Este artigo discute as possibilidades e limites das etnografias
com crianças pequenas, a fim de problematizar a ideia atual de que as crianças, assim como as "plantas",
estão no "jardim" da infância para se tornarem membros ativos da sociedade. Essa ideia negligencia o fato de
que as crianças, mesmo em tenra idade, podem ser agentes sociais de mudança no mundo em que vivem.
Palavras-chave: sociologia da infância; etnografia; crianças negras

Ethnography with young children in school: transforming the 'garden' into the field
Abstract. Although children have been present in ethnographic studies since the beginning of the twentieth
century, it was not until the emergence of social studies of childhood at the end of the century, were they
recognized as participants in society and social agents. This article discusses the possibilities and limits of
ethnographies with young children, in order to problematize the current idea that children, like 'plants', are
in the' garden 'of childhood to grow into active members of the society. This idea overlooks the fact that
children, even at an early age can be social agents of change in the world in which they live.
Keywords: sociology of childhood; ethnography; black children.

1. Introdução
Este artigo surgiu da etnografia realizada por dez meses durante o ano de 2015 com meninas e
meninos negros de 4 e 5 anos numa turma de educação infantil da escola municipal Malê
Debalê, em Itapuã, Salvador-BA. Assente na sociologia da infância e nas discussões sobre
relações raciais (Trinidad, 2011; Paula, 2014) e interseccionalidade (Crenshaw, 1989; Ribeiro,
2015), esta pesquisa pautou-se pelo interesse em escutar as crianças sobre o modo como
produzem suas culturas; para tal empreendimento, a etnografia mostrou-se “particularmente
útil” (James, Prout, 1990). Ao final da pesquisa, percebi ser importante trazer para o debate
algumas situações específicas das relações entre adultos/as e crianças que demonstram como o
adultocentrismo vem a tornar-se o “obstáculo dos obstáculos” (Ferreira, 2002, p. 65) na
pesquisa com crianças.
Segundo Márcia Gobbi, o adultocentrismo

aproxima-se aqui de outro termo bastante utilizado na antropologia, o etnocentrismo: uma visão de
mundo segundo a qual o grupo ao qual pertencemos é tomado como centro de tudo e os outros são
olhados segundo nossos valores, criando-se um modelo que serve de parâmetro para qualquer
comparação. Nesse caso o modelo é o adulto e tudo passa a ser visto e sentido segundo a ótica do adulto,
ele é o centro (GOBBI, 1997, p. 26).

1682
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Ao incluir a palavra jardim no título do artigo, tento provocar uma reflexão sobre se a forma como as
crianças são vistas nesta idade – seres em desenvolvimento e que irão “florescer” na idade adulta –
não acaba por atrapalhar a visão proposta pela sociologia da infância, aquela que afirma que as
crianças são agentes ativas nas construções de culturas próprias, sendo assim partícipes da sociedade.
A escola de educação infantil como um jardim de infância – do alemão kindergarten – deriva da
proposta pedagógica criada por Friederich Fröbel (1782-1852) onde, grosso modo, as crianças para
desenvolverem-se, precisariam ser cultivadas e cuidadas, assim como as plantas. Proponho então, que
este jardim possa se tornar um campo de pesquisa, terreno de possibilidades que abrigue ideias que
acolham as experiências das crianças como seres que, ao estarem se tornando, também são. A crítica
ao termo jardim, portanto, não reside na sua relação com o mundo “natural”, mas tão somente na
relação com a ideia de que as crianças, por estarem em desenvolvimento, não devem ter suas vozes
consideradas nas análises sobre aquilo que lhes interessam. Para transformar o ‘jardim’ em campo, é
importante repensar as relações entre as crianças e os/as adultos/as partícipes à pesquisa. Faz-se
necessário, assim, observar de que maneira os adultocentrismos podem vir a atuar nas relações
constituídas no campo.

2. Questões metodológicas:

A partir de agora, apresento algumas situações do campo que demonstram de que modo o
adultocentrismo presente em nossas relações com as crianças pode tornar invisível sua participação
na pesquisa etnográfica. Neste artigo, escolhi apresentar alguns dos adultocentrismos percebidos 1)
nas exposições de pontos de vista; 2) nas ações das crianças e 3) em atitudes/comportamentos
pessoais.

1) Exposição de pontos de vista:

a) Reforçar o que a professora dizia:


As professoras, em algumas situações, ao dirigirem-se às crianças, pediam que as/os demais adultos/as
presentes reforçassem o que elas diziam; pareciam fazer isso para que as crianças soubessem que não
apenas ela pensava assim, mas seu pensamento era apoiado por outras pessoas adultas ali presentes.
Às vezes, apenas um “é...” ou um meneio com a cabeça bastava para as crianças compreendessem que
eu concordava com o que as professoras diziam. Nesses momentos percebi que, ao concordar com
elas, assumi uma posição que, mesmo que não fosse de professora, reforçava minha adultez. Às vezes,
a professora também solicitava que outras crianças concordassem com o que ela dizia quando ralhava
com alguma criança. Apesar de não ser fácil a negociação com a professora, com o passar dos meses,
passei a emitir menos opinião quando solicitada, esquivando-me de uma posição de autoridade.

b) Emitir opiniões desnecessárias:


Em outros momentos, expressei minha opinião de modo desnecessário, indo além do simples meneio
com a cabeça. Esses momentos ocorreram no início do campo, quando eu estive preocupada em
confirmar o consentimento dado pela professora titular; assim, inicialmente, centralizei minha atuação
na correspondência de um modelo de pesquisadora que agradasse à professora, em primeiro lugar,
deixando as crianças em segundo plano, já que eu dependia que a professora me aceitasse na sala
para continuar a pesquisa; com essa ação, que mostrou-se impossível de ser cancelada completamente
durante todo o campo, penso ter tornado mais difícil para as crianças identificarem minha posição no
campo como alguém que gostaria de aprender com elas e me aproximar dos seus mundos.

2) Interferências nas ações das crianças

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a) Brigas
Situações em que as crianças brigaram e eu tive medo de que machucassem outras crianças
aconteceram muito pouco, mas, ainda assim, sempre me fazia pensar sobre como agir. Num estudo
etnográfico, entendo que a intenção deve concentrar-se em observar mais e agir menos, mas isso não
significa não agir nunca. Assim como Carvalho (1991) – que em sua etnografia com “meninos de rua”
muitas vezes tomou atitudes como comprar comida e guardar dinheiro para as crianças – e Gottlieb
(2013) – que na sua visão ocidental, cuidou de crianças que morreriam se não tivessem cuidados
médicos – em suas etnografias, algumas situações pedem respostas, respostas estas que não temos
como empregar as análises já realizadas sobre o tema. Nas poucas brigas que ocorreram no início do
ano em que eu estive sozinha com as crianças, eu normalmente chamava a atenção delas dizendo que
“a professora estava chegando” para contê-las; apesar disso, crianças apanharam e bateram nesses
momentos. Com passar do tempo, adotei outras posturas:

I. Se haviam crianças mais velhas na sala, elas lidavam com o problema e eu apenas observava;
II. Se as crianças estavam brigando, eu levantava da cadeira, o que chamava alguma atenção às
vezes, servindo para dispersá-las;
III. Quando nenhuma das opções adiantava, eu me colocava entre elas e as afastava uma da outra
sem nada dizer. Normalmente, as crianças que não estavam participando da briga organizavam grupos
para defender quem estava brigando, o que acabava por retardar a briga em alguns minutos, o
suficiente para a chegada da professora ou algum/alguma outro/a adulto/a;

Um dos problemas de não conter as brigas das crianças, mesmo que elas não representassem um
perigo real é que, quando a professora chegava, o cenário era sempre o de uma bagunça generalizada,
o que poderia representar que eu não tinha “domínio de classe”, algo que, apesar de não ter me
comprometido a ter, era esperado pelas professoras quando estas saíam e me deixavam com as
crianças. Não ter “domínio de classe” foi sempre considerado quase um insulto à profissão desde que
fiz o magistério em 1996, ou seja, nenhuma professora quer ser vista como alguém a quem lhe falta
essa “qualidade”. Mesmo que como professora de crianças eu mesma já tenha criticado a validade
dessa “qualidade”, ainda assim foi preciso algum tempo no campo para me desprender desta
expectativa em relação a mim.

b) Perigos:
Em momentos de perigo, a tomada de decisão deveria ser rápida. Ainda assim, era certo que a análise
de se as crianças corriam ou não perigo era relacionado àquilo que eu considerava perigo e talvez não
o que se configurasse perigo para elas. Estes eventos, assim como os de briga entre elas, foram poucos.
Nesses momentos, eu interferia retirando-as da atividade – subir no parapeito da janela, pular entre
mesas que estivessem muito afastadas, correr e bater-se nas cadeiras ou em outras crianças, pendurar-
se na escada à entrada da sala –; ao analisar as notas de campo, percebo que nos momentos em que
aconteceram estes eventos, eu sempre dizia algo que remetia ao fato de que estava fazendo aquilo
porque “tinha receio da professora brigar com elas”. Eu assumia que tinha receio da professora brigar
e omitia que também tinha receio delas se machucarem, porque assumir que elas poderiam se
machucar poderia parecer que eu estivesse subestimando suas competências. Entre a preocupação de
proteger e a de não parecer que as julgava incapazes, imagino que minha posição como pesquisadora
era sempre posta em questão.
Compreendo que cair ou se machucar não seja uma prova de incompetência, mas, no ato de proteger,
em nossos termos adultos, a mensagem parece implícita. Desse modo, para que não ficasse alguma
dúvida sobre o que eu pensava sobre elas, eu omitia minhas preocupações pessoais e falava apenas
que a professora não ia gostar. Ocorre que este argumento não as fazia demover da ideia ‘perigosa’,

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porque elas comumente enfrentavam as ordens da professora, seja quando esta estava presente à
sala ou não.

3) Atitudes/comportamentos

a) Pedir beijo ou abraço às crianças


Logo que cheguei à escola, meu desejo era abraçar e beijar todas as crianças que encontrava pela
frente. Normalmente, quando eu conheço crianças, eu peço beijos e abraços; com o passar do tempo,
algumas delas se sentem mais à vontade e passam a fazer isso porque sabem que gosto. Mas há
também aquelas que não gostam e foi pensando nelas que comecei a perceber que minha atitude de
pedir beijos, abraços e cafuné, mesmo que elas pudessem ter direito de dizer não, poderia ser um
tanto quanto impositiva, já que entendo a relação entre crianças e adultos/as no campo da pesquisa
como desigual. Ao ler os pedidos que fiz nas notas de campo, penso que talvez seria mais acertado
esperar essa reação das próprias crianças. É certo que eu não pedia beijo a todas as crianças, apenas
aquelas que foram mais próximas e é certo que algumas delas, assim como eu, me procuravam para
isso. A reflexão surge não para afirmar que está errado fazer isso mas para fazer refletir: eu era uma
pesquisadora, esta era minha identificação no campo. Pedir beijos, abraços e cafuné, em nossa
sociedade, tem a ver com uma relação de proximidade que, se não era proibida em mim e as crianças,
também não era o objetivo da pesquisa. Assim sendo, qual era a intencionalidade do pedido?
Analisando como e quando realizei os pedidos, percebo que eles funcionavam para mim como uma
confirmação do assentimento dado pelas crianças no primeiro dia. Sendo este um processo dinâmico,
eu necessitava de confirmação da aceitação delas à minha presença. Se elas recusassem, para mim
seria um sinal de que não estavam à vontade. Ocorre que dizer sim ou não nem sempre significava
aceitar-me ou não na turma, já que houve algumas que me abraçavam e beijavam quando eu chegava,
mas também irritaram-se comigo e outras que nunca me beijaram tiveram comigo uma ótima relação.
Essas sensações atravessadas acabaram por demonstrar que a intenção inicial de confirmar
assentimentos talvez não pudesse ser realizada por esta via.

b) Demonstrar irritação/raiva de algumas atitudes das crianças


Algumas atitudes das crianças deixavam-me com raiva ou irritavam-me sobremaneira; sei que eu não
poderia controlar isso completamente, mas aprendi a demonstrar menos que algumas coisas me
afetavam. Quando elas não comiam toda a comida que pediam para repetir, quando batiam em
alguém, eu tentava controlar minha vontade de dizer ou fazer coisas. Apesar disso, num episódio em
que uma delas matou uma lagartixa eu não consegui controlar a chateação; acabei por indicar, com a
minha chateação, que tinha sido um dos meninos que matou o réptil; a professora passou a ralhar com
ele e senti-me envergonhada; ele não pareceu perceber que fui sua “dedo-duro” e, assim como eu,
pareceu surpreso com a irritação exacerbada da professora. Nesse dia, apesar de já saber que eu
deveria fazer o possível para não interferir no curso dos acontecimentos, tive uma comprovação do
quanto a demonstração do que eu sentia poderia alterar o curso das ações tanto das professoras como
das crianças.

c) Ordenar às crianças algum tipo de comportamento


Quando as professoras pediam que eu ficasse com as crianças, eu precisava ditar certas regras, para
conseguir que, ao menos quando a professora entrasse na sala de volta, visse a turma num clima
parecido com aquele que ela deixou quando saiu. Eu não reclamava se elas levantavam para conversar,
dançar ou brincar, mas chamava-lhes a atenção quando manifestavam o desejo de sair da sala, pular
das mesas e cadeiras, subir na janela, balançar no corrimão da escada da entrada, visitar o irmão ou
irmã em outra sala, coisas que a professora não permitia que elas fizessem.

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Eu estava mais preocupada com o julgamento da professora com relação ao que tinham me pedido e
menos preocupada com a segurança delas, porque elas sempre demonstraram serem capazes de
executar todas as tarefas descritas com muita desenvoltura. Isto aconteceu em muitos momentos
durante o campo, porque constantemente a professora pedia favores como este; como já sinalizado,
era difícil dizer não, pelo interesse em continuar a fazer a pesquisa, por estar na sala “sem fazer nada”,
por ser adulta e ter “naturalmente” o controle sobre elas...

3 Considerações Finais:

Os episódios relatados mostram algumas das situações em campo em que pude analisar de que modo
os adultocentrismos presentes na relação adulto-criança podem se manifestar. Não são os únicos e,
em diferentes espaços, estas versões podem ser diferentes. A sala de aula de uma escola de educação
infantil – o ‘jardim’ – como campo de pesquisa é apenas mais um dos lugares controlados por
adultos/as em que, se desejarmos diminuir a força do adultocentrismo, necessitamos observar mais,
realizando uma “entrada reativa (Corsaro, 2005); na situação artificial que a pesquisa provoca, importa
também não repetir modelos de aproximação considerados “típicos” (Corsaro, 2005) de adultos/as
que querem “saber coisas” sobre as crianças. Esta aproximação poderá trazer novas problematizações
às experiências intergeracionais nas pesquisas com crianças.
As análises apresentadas demonstram alguns dos limites e possibilidades que uma pesquisa
etnográfica com crianças pequenas pode trazer. Não são previsíveis e nem controlados, mas, quando
expostos, nos põe em contato com um universo de pesquisa pouco apresentado a nós,
pesquisadoras/es. Além disso, é importante notar que, numa pesquisa com crianças numa escola,
dificilmente estaremos apenas com elas, o que demonstra que necessitamos compreender o campo
como resultado das nossas relações não apenas com as crianças, mas também com os/as adultos/as
que delas são responsáveis no espaço escolar. Ao enxergar as crianças como agentes sociais partícipes
da sociedade em que vivem, pode-se haver um choque de pensamento com relação àquele
hegemônico na escola em que estamos presentes, o que pode, sob alguma perspectiva, ter impacto
na recepção da pesquisa por parte dos/as adultos/as. Assim, lidar não apenas com nossos
adultocentrismos, mas também com os de outras pessoas será sempre uma das tarefas do campo as
quais as/os pesquisadoras/es não poderão rejeitar.

Referências
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Etnográficos Com Crianças Pequenas. Educ. Soc., Campinas, Vol. 26, N. 91, 443-464, Maio/Ago.
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Método (auto) biográfico e a pesquisa formação

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Jeronimo Jorge Cavalcante , Edilania de Paiva Silva , Fabiana Lopes Cavalcante

Resumo. O presente artigo apresenta o método (auto) biográfico, a pesquisa formação, e analisa um
Trabalho Final de Conclusão de Curso – TFCC do Programa de Pós-Graduação em Educação e Diversidade
(PPED), da Universidade do Estado da Bahia – UNEB – Campus IV – Jacobina – BA, sobre autoria de Charles
Maycon Mota (2016), intitulado: “Conhecimento de si, práticas pedagógicas e diferenças na docência rural”.
Verificou-se que o trabalho analisado teve como base os princípios da investigação qualitativa, utilizando o
método auto (biográfico), a pesquisa-formação e os seguintes dispositivos de coleta de informações: análise
documental, entrevista narrativa, oficinas formativas e narrativas (auto) biográficas. O referido estudo
rompe com o distanciamento dos espaços e dos sujeitos que produzem os conhecimentos, verificando que
na pesquisa formação se valoriza a subjetividade e os sujeitos se compreendem como agentes de mudança
e construtores do conhecimento.
Palavras-chave: Método autobiográfico; Pesquisa; Formação.

(Self) biographical method and research training


Abstract. The present article presents the (self) biographical method, the research training and analyzes a
Final Work of Completion of Course - TFCC of the Graduate Program in Education and Diversity (PPED),
University of the State of Bahia - UNEB - Campus IV - Jacobina - BA, authored by Charles Maycon Mota
(2016), entitled: "Knowledge of self, pedagogical practices and differences in rural teaching". It was verified
that the work analyzed was based on the principles of qualitative research, using the auto (biographical)
method, research-training and the following devices of information collection: documentary analysis,
narrative interview, training workshops and narratives (self) Biographical This study breaks with the distance
between the spaces and the subjects that produce the knowledge, verifying that in research training is
valued subjectivity and the subjects are understood as agents of change and builders of knowledge.

Keywords: Self-biographical method; Research;Training.

1 Introdução

Esse artigo é fruto da interpretação de um Trabalho Final de Conclusão de Curso (TFCC):


“Conhecimentos de si, Práticas Pedagógicas e Diferenças na docência rural”, do Programa de Pós-
Graduação em Educação e diversidade (PPED), de autoria do Mestre Charles Maycon Mota (2016),
para que se tenha um aprofundamento teórico do percurso metodológico, da abordagem, do
método e dos dispositivos utilizados pelo autor na realização da sua pesquisa e da construção do seu
TFCC.

1 Pós-Doutor em Educação e Professor Permanente do Programa de Pós-graduação em Educação e Diversidade,


Departamento de Ciências Humanas, Universidade do Estado da Bahia - UNEB, Campus IV – Jacobina- Bahia,
Brasil. Email: jorgeazul53@gmail.com
2 Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação e Diversidade, Departamento de Ciências Humanas, da
Universidade do Estado da Bahia - UNEB, Campus IV – Jacobina- Bahia, Brasil. E-mail: edipaivasn@hotmail.com
3 Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação e Diversidade, Departamento de Ciências Humanas, da
Universidade do Estado da Bahia-UNEB, Campus IV, Jacobina-Bahia, Brasil. fabianacavalcante08@hotmail.com

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A abordagem utilizada por Mota (2016) foi a pesquisa-formação atrelada ao método (auto)
biográfico, por estar relacionada à ideia de aproximação entre o pesquisador e os colaboradores da
pesquisa e constitui-se como uma estratégia de autoformação quando os professores-colaboradores,
a partir de suas narrativas e as narrativas dos outros, deixam aflorar as vivências, experiências de
vida e itinerários de cada um para juntos produzirem conhecimento, caracterizando a pesquisa-
formação como um momento de interação e espaço de formação.
O método (auto) biográfico surgiu para relacionar com a proposta da pesquisa–formação, porque no
entendimento do autor o movimento das narrativas abre espaços para os docentes colaboradores de
sua pesquisa se interessarem por tecer os conhecimentos sobre si, as narrativas de vida, a fim de
possibilitar um viés diversificado para as oficinas realizadas pelo autor, caracterizando, assim, a
pesquisa-formação.
O trabalho de Mota (2016) na pesquisa-formação visa compreender como os envolvidos na pesquisa
poderiam refletir sobre sua prática a partir de suas experiências de vida, como foco epistemológico
da pesquisa qualitativa apresentando a realidade do espaço de vivências para uma interação entre os
participantes e o pesquisador. Estas características são advindas das bases filosóficas da
fenomenologia e da hermenêutica para melhor compreensão dos dados investigados.
A vertente traçada na fenomenologia e na hermenêutica foi utilizada para buscar elementos que
possibilitasse o trabalho com as subjetividades e experiências de vida dos sujeitos. Por isso, a
pesquisa, na ótica qualitativo-fenomenológico–hermenêutico, foi traçada sobre as ideias de Abreu
(2013), Fazenda (2002), Heidigger (2002), acreditando que precisamos reeducar e reorientar nosso
olhar para compreender a relação sujeito-objeto e compreender como as identidades culturais
possam ser vivenciadas no contexto escolar.
Para coleta das informações inerentes ao seu trabalho, o autor supracitado fez uso da análise
documental, das entrevistas narrativas e narrativas (auto) biográficas, bem como das oficinas
formativas construídas a partir da proposta dos ateliês biográficos. Para a realização desse trabalho,
a colaboração da Secretaria de Educação foi muito importante, pois a participação dos professores
acontecia nos dias das Atividades Complementares - ACs, os quais puderam participar ativamente
das oficinas sem comprometer as demandas exigidas pela escola. Para interpretar as oficinas, Mota
(2016) tratou-as como veredas em que foi abordado o processo metodológico apresentado,
totalizando três veredas.
Assim, esse artigo apresenta o método, a abordagem e os instrumentos que foram utilizados pelo
autor na construção de seu Trabalho Final de Conclusão de Curso - TFCC traçados por um viés (auto)
biográfico, para a construção da pesquisa-formação, tecendo o viés metodológico em uma
dissertação do Programa de Pós-Graduação em Educação e Diversidade (PPED). Diante disso, tivemos
a oportunidade de conhecer os desafios e possíveis soluções para desenvolver um trabalho nas
escolas do campo, onde o investimento para uma educação de qualidade deve partir da formação
continuada dos professores a partir das realidades vividas, para que possam construir uma proposta
de trabalho que venha garantir a aprendizagem significativa de seus alunos.

2 O método (auto) biográfico na pesquisa

A ciência moderna esteve sempre impregnada de racionalidade que apoiada em métodos e lógicas
decorrentes das ciências naturais definiu os pressupostos da objetividade, neutralidade científica,
análise de dados quantificáveis e a crença de que somente aquilo que pudesse ser comprovado
cientificamente era verdadeiro. Esta herança histórica da tradição positivista e a influência exercida
pelos métodos experimentais desenvolvidos no âmbito das ciências físicas e biológicas definiram a
história das ciências humanas, por muito tempo, marcado pelo distanciamento entre o objeto de

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pesquisa e o pesquisador, bem como pelo teste e verificação de hipóteses, entre outras
características.
Pelo fato dos pressupostos positivistas serem inadequados para o estudo dos fenômenos sociais e
para os modos novos de conceber a própria ciência, gerou um movimento de rupturas e mudanças
paradigmáticas no campo das ciências sociais no decorrer do século XX, pondo em questão os
princípios da ciência clássica. As investigações científicas no campo das ciências humanas consideram
a ciência como prática social que ocorre em condições históricas marcadas por teorias e métodos
que dependem das escolhas teóricas e metodológicas do pesquisador. Para Ghedin & Franco (2011,
p.53), “a ciência, como fenômeno social e político, carrega as marcas de um tempo histórico e
incorpora em seu fazer as representações e valores do momento”.
Nesta perspectiva, autores como Chizzotti (2006), Ghedin & Franco (2011), Fazenda (2002) e André
(1983) sinalizam que, diante da complexidade do estudo dos fenômenos educativos, novas formas de
pesquisa e atitudes metodológicas vão sendo exigidas e incorporadas ao fazer científico, tanto na
concepção epistemológica como no método utilizado. Dentro dessa proposta, a abordagem (auto)
biográfica como método/técnica de pesquisa surge na Alemanha no final do século XIX.
De acordo com Bueno (2002), essa perspectiva metodológica foi aplicada nos anos 1920 e 1930,
pelos sociólogos americanos da Escola de Chicago, dentro da pesquisa qualitativa, com a busca de
alternativas à sociologia positivista, desencadeando importantes embates teóricos no decurso de sua
evolução para o reconhecimento de seu estatuto científico.
Na década de 80, com a emergência de estudos sobre a formação docente que colocam o professor
no centro dos debates educativos e das problemáticas de investigação, veio favorecer o
aparecimento de um grande número de obras e estudos sobre a vida e formação dos professores, a
exemplo da publicação do livro “O método (auto) biográfico e a formação” por A. Nóvoa & M. Finger,
no contexto europeu.
Para Freitas & Ghedin (2015), “método (auto) biográfico” ou “histórias de vida” são considerados
como sinônimos, pois compartilham os mesmos princípios. Já Dominice & Josso (2014) consideram
“Biografias educativas” como uma narrativa centrada na formação e nas aprendizagens do seu autor,
que não é classificada de “auto” na medida em que o iniciador da narrativa é o investigador, dentre
outras denominações utilizadas.
Na intenção de mostrar a especificidade do método biográfico, Ferrarotti apud Bueno (2002, p.43)
apresenta os dois tipos de materiais que podem ser utilizados:
Os materiais biográficos primários, isto é, as narrativas ou relatos autobiográficos recolhidos
por um pesquisador, em geral através de entrevistas realizadas em situação face a face; e os
materiais biográficos secundários, isto é, os materiais biográficos de toda espécie, tais como:
correspondências, diários, narrativas diversas, documentos oficiais, fotografias, etc.
Dessa forma, as narrativas (auto) biográficas se constituem importantes instrumentos de
investigação sobre a formação de professores, pois evidenciam a questão da subjetividade do
sujeito, sua trajetória de formação e experiências de vida, fatores que têm desencadeado, cada vez
mais, a busca e a adesão de pesquisadores a estes métodos, especialmente no âmbito das ciências
sociais. Para Santos & Garms (2014), a utilização desse método visa não apenas colaborar com a
ciência da educação trazendo novas dimensões e conhecimentos, como também colocar o sujeito na
posição de protagonista de sua formação e do processo de investigação.
Santos & Garms (2014) apresentam algumas possibilidades que as pesquisas (auto) biográficas
permitem realizar. Em situações de formação de professores, podemos destacar variados tipos de
narrativas, tais como: a) Narrativas de crítica social: visam, a partir da experiência profissional,
discutir e compreender o papel histórico da escola e de seus profissionais diante das injustiças
sociais. b) Narrativas de aprendizagem: possibilitam aos professores iniciantes tomar conhecimento
a respeito da profissão que ingressa. c) Narrativas de práticas reflexivas: que se baseia na capacidade
dos professores de refletir, questionar e transformar sua prática diária. d) Narrativas sobre

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trajetórias: esse tipo incorpora todos os outros tipos de narrativas, uma vez que estimula o professor
a refletir sobre seu passado e projetar-se no futuro. e) Narrativas de esperança: lembram aos
professores o significado e o propósito da educação que é mudar a vida de outras pessoas. f)
Narrativas de liberdade: lidam com a capacidade de promover mudanças nas práticas convencionais
de ensino para alcançar objetivos que antes pareciam inalcançáveis.
Mota (2016) aborda em seu trabalho que as narrativas (auto) biográficas se tornam a condição da
reflexividade formativa, desencadeando um processo de formação, autoformação e ecoformação, e
parafraseia Pineau apud Bragança (2011) sobre:
A teoria tripolar da formação humana que envolve: auto, hetero e ecoformação. A
autoformação é a dimensão pessoal de reencontro reflexivo em que as questões do
presente levam-nos a problematizar o passado e a construir projeto sobre o futuro; a
heteroformação aponta para a significativa presença de muitos outros que atravessam nossa
história de vida, pessoas com quem aprendemos e ensinamos; a ecoformação aborda nossa
relação com o mundo, o trabalho e a cultura (Bragança, 2011, p. 159).
Nesta perspectiva, Mota (2016) desenvolve o trabalho de pesquisa-formação buscando os
fundamentos nas concepções que destacam as narrativas (auto) biográficas como uma proposta de
formação que considere o sujeito, sua subjetividade e considerando que a abordagem (auto)
biográfica pode possibilitar ao sujeito a tomada de consciência de si e de suas aprendizagens a partir
das experiências de vida e reflexão sobre suas práticas na busca da ressignificação das trajetórias de
formação.

3 Pesquisa-formação atrelada ao método (auto) biográfico

A partir do século XX muitos pesquisadores despertaram o interesse de conciliar pesquisa e formação


de professores estabelecendo os pontos de encontro e os entrecruzamentos existentes entre essas.
A pesquisa-formação ressurge, a partir do movimento biográfico, com base nas discussões de Pineau
apud Mota (2016) entre os anos de 1983 a 1985, como uma proposta metodológica que enfatiza o
compromisso do pesquisador com sua prática, focalizando uma mudança individual e coletiva, em
que há uma corresponsabilidade entre o pesquisador e os colaboradores da pesquisa, no
desenvolvimento da investigação, de maneira colaborativa.
A pesquisa-formação está atrelada à ideia de aproximação entre o pesquisador e os colaboradores
da pesquisa e constitui-se como uma estratégia de auto formação quando os professores-
colaboradores, a partir de suas narrativas e as narrativas dos outros, deixam aflorar as vivências,
experiências de vida e itinerários de cada um para juntos produzirem conhecimento, caracterizando
a pesquisa-formação como um momento de interação e espaço de formação.
Com base nisso, a pesquisa-formação é articulada ao método (auto) biográfico sendo definida como
uma metodologia que rompe com o distanciamento de espaços e de quem produz os
conhecimentos, pois todos são sujeitos em formação, tanto os investigadores como os demais
colaboradores que nela se envolvem com o propósito de formação. É através desse movimento, que
valoriza a subjetividade, que acontece a possibilidade de mudança das práticas, compreendendo-se
como sujeitos de mudança que intervêm nas realidades vividas e como construtores do
conhecimento.
Segundo Mota (2016), o método (auto) biográfico potencializa o processo de autoformação, por
possibilitar que os sujeitos se coloquem como protagonistas desse processo formativo, com vistas a
um pensar sobre sua própria prática. Considerando tais aspectos, Josso (2014, p.78-79) menciona
que essa compreensão de formação do sujeito nos faz desembocar na perspectiva de recolocar o
sujeito no lugar de destaque que lhe pertence, para tornar-se um ator que se autonomiza, tornando,
assim, um sujeito mais consciente no momento em que é capaz de intervir no seu processo de
aprendizagem e de formação para favorecê-lo e para reorientá-lo.

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Para Souza:
Através da abordagem biográfica o sujeito produz um conhecimento sobre si, sobre os
outros e o cotidiano, revelando-se através da subjetividade, da singularidade, das
experiências e dos saberes. A centralidade do sujeito no processo de pesquisa e formação
sublinha a importância da abordagem compreensiva e das apropriações da experiência
vivida, das relações entre subjetividade e narrativa como princípios, que concede ao sujeito
o papel de ator e autor de sua própria história (Souza, 2008, p. 45).

Pineau (2006) e Bueno (2002) afirmam que a abordagem (auto) biográfica prioriza o papel do sujeito
na sua formação e prioriza a autonomia docente a partir do conhecimento de si e de reflexões e
compreensões feitas das trajetórias de formação, o que quer dizer que a própria pessoa se forma
mediante a apropriação de seu percurso de vida, ou do percurso de sua vida escolar.

4 Metodologia utilizada em uma pesquisa sobre práticas pedagógicas e diferenças na


docência rural

Traçar o caminho metodológico para um projeto de pesquisa é a angústia de todos os pesquisadores


iniciantes, Ghedin e Franco (2011) falam que esse desconforto é referente aos conceitos construídos
a respeito do que seja a metodologia, pois há pesquisadores que inferem a metodologia apenas
como os instrumentos para coletar os dados da pesquisa, não adentram no sentido epistemológico
da palavra. Assim, o método torna-se um acessório à pesquisa e deixa de ser seu elemento fundador
e organizador das reflexões construtoras do conhecimento pretendido. Diante da importância da
metodologia para o projeto de pesquisa, traçaremos um viés para compreensão do Trabalho Final de
Conclusão de Curso - TFCC, apresentado ao Programa de Pós Graduação em Educação e Diversidade
(PPED) sobre autoria de Charles Maycon Mota (2016).

4.1 – Método (auto) biográfico

O método autobiográfico no campo da pesquisa educacional traz como marco dessa corrente a
história de vida, biografias educativas, narrativas de formação, vistas por Nóvoa (2010) como
sinônimos. Em seu TFCC, Mota (2016) destaca que o método (auto)biográfico surgiu para relacionar
com a proposta da pesquisa–formação, pois no entendimento do autor, o movimento das narrativas
abre espaços para os docentes colaboradores de sua pesquisa se interessarem por tecer os
conhecimentos sobre si, as narrativas de vida, como propostas integrantes do método
(auto)biográfico, a fim de possibilitar um viés diversificado para as oficinas realizadas pelo autor, que
aborda como características da pesquisa-formação, a interação entre os participantes e a construção
dos conhecimentos como fruto das experiências dos próprios sujeitos.
Para Mota (2016), as narrativas (auto)biográficas implicam no processo de (re)construção de
sentidos e significados do fazer docente, pois estas auxiliam a formação de professores em qualquer
espaço educativo, sendo que no presente trabalho visou a prática pedagógica no espaço rural, vista
pelo autor como a colaboração para o rompimento da mera reprodução dos conteúdos, auxiliando-o
no rompimento das diferenças existentes tanto nas escolas como no contexto cultural, por isso a
necessidade de uma abordagem que considere os sujeitos a partir de suas subjetividades.
O método (auto) biográfico contribui para o que Souza (2006, p. 95) considera como parte das
“experiências formadoras, as quais são perspectivas a partir daquilo que cada um viveu e vive, das
simbolizações e subjetivações construídas ao longo da vida”. Mota (2016) fala que as experiências
dos outros retoma o lugar da escuta sensível e da valorização da história de vida dos envolvidos no
referido trabalho, a escola no espaço rural, e a autobiografia é fundamental para o processo

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formativo da docência, pois os sujeitos terão a oportunidade de narrar sobre si e para si, criando
maneiras de coexistências entre os outros membros da localidade.
A (auto) biografia, pautada na relação de vida de professores, produz uma nova formação continuada
dos professores em exercício. É considerada hoje como uma formação que promove momento de
troca de experiências, incluindo história dos mais experientes, marcada pelo conhecimento adquirido
ao longo do percurso profissional. Nóvoa (2000) fala que as histórias de vida têm dado origens às
práticas e reflexões fertilizadas pelo cruzamento de várias disciplinas e pelo enquadramento
metodológico.
Para que o método (auto) biográfico seja eficaz para a compreensão e interpretação da realidade e
experiências do sujeito pelo pesquisador, a partir das histórias e narrativas de vida e formação, a
seguir teceremos sobre a abordagem que fundamentou o TFCC em estudo: abordagem da pesquisa-
formação, caminhando por uma vertente fenomenológica e hermenêutica com os princípios da
pesquisa qualitativa.

4.2 – A pesquisa-formação

O trabalho de Mota (2016) concentrou na pesquisa-formação por compreender que os envolvidos na


pesquisa pudessem refletir sobre sua prática a partir de suas experiências de vida. Esse trabalho
parte de um projeto de pesquisa com foco epistemológico na pesquisa qualitativa que enfatiza mais
o processo do que o produto e apresenta a realidade do espaço de vivências para uma interação
entre os participantes e o pesquisador. Estas características são advindas das bases filosóficas da
fenomenologia e da hermenêutica para melhor compreensão dos dados investigados.
Na perspectiva fenomenológica e na hermenêutica considera-se necessário buscar elementos que
apropriem o trabalho com as subjetividades e experiências de vida dos sujeitos. Por isso, a pesquisa
na ótica qualitativo-fenomenológico–hermenêutico traz que o conhecimento é um fenômeno e o ser
humano assume-se como centro das discussões sobre o conhecimento. É através da fenomenologia
que as experiências vividas no cotidiano precisam ser analisadas cuidadosamente pelo pesquisador,
que segundo Abreu (2013), este deve buscar ser neutro para que a pesquisa contemple a análise do
fenômeno investigado.
A fenomenologia para Fazenda (2002) caracteriza-se pela ênfase ao mundo da vida cotidiana pelo
retorno daquilo que ficou esquecido, encoberto pela familiaridade, pelos usos, hábitos, linguagens
do senso comum. Por isso, essa vertente trará ao contexto escolar as identidades culturais/pessoais
que compõem a identidade do campo e aproximará ao máximo a prática pedagógica ao cotidiano
dos alunos.
No campo empírico, a fenomenologia é o caminho que leva nosso existir simplesmente como ele se
mostra. Heidigger (2002) acredita que precisamos reeducar nossos olhos e reorientar nosso olhar
para compreender a relação sujeito-objeto e também compreender como as identidades culturais
possam ser vivenciadas no contexto escolar.
De acordo com as visões dos autores citados, a pesquisa-formação acontece mediante
interpretações das informações coletadas a partir das narrativas autobiográficas e das histórias de
vida dos colaboradores da pesquisa. Mota (2016, p. 28) traz um quadro com o perfil biográfico
elaborado a partir das informações coletadas através das narrativas, para poder constituir as oficinas
formativas.
Contudo, para efetivação de um projeto de pesquisa eficaz, não podemos esquecer a contribuição
dos instrumentos utilizados para adquirir as informações básicas para construção do trabalho final.
Assim, discorreremos sobre os dispositivos para coleta de dados, visando um viés pertinente de
informações. No TFCC em análise, trata-se de quatro instrumentos, tais como: análise documental,
entrevista narrativa, oficinas formativas e narrativas autobiográficas.

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4.3 - Dispositivos de coleta

No exercício de buscar informações para a construção de um trabalho ou projeto é preciso pensar


em mecanismos que forneçam dados para descrição teórica que não se dirija a um único público
leitor, e que forneça a este várias possibilidades de leituras e interpretações. Para isso, os
instrumentos para adquirir as informações precisam trazer um contexto sucinto para que o
pesquisador possa concentrar nas potencialidades e perspectivas criativas de construção que tragam
ao leitor uma compreensão transparente dos significados culturais. O viés desse trabalho consiste
em compreender a importância da análise documental, das entrevistas e das oficinas para projetos
de pesquisa, e apresentar como o autor do trabalho em análise utilizou desses instrumentos para
obter as informações necessárias para fundamentação de suas categorias teóricas.

4.3.1 - Análise documental

A análise dos documentos tem valorização de objetividade, indelével para os pesquisadores, no que
tange as manifestações artístico-culturais, pois incluem processo histórico. Ludke & André (1986)
salientam que os documentos na pesquisa qualitativa são fundamentais como aporte para a pesquisa
de campo, que se torna indispensável devido a maior parte das fontes escritas serem quase sempre a
base do trabalho de investigação.
Mota (2016) usou a análise documental para visualizar, a partir das fichas dos alunos, os
encaminhamentos feitos ao Centro de Referência e apoio Pedagógico, onde ele pode perceber que a
maioria dos alunos atendidos nesse Centro eram alunos da roça. Foi a parte da pesquisa que,
segundo o autor, trouxe relevância pois, a partir da análise dos documentos, foi possível selecionar
os colaboradores da pesquisa.
Contudo, ao utilizarmos os documentos na definição por um instrumento de investigação, os
escolhemos por estarem diretamente relacionados à natureza e aos objetivos da pesquisa, assim
como também às condições estruturais que nos auxiliarão a responder às questões de investigação e
apreender o objeto de estudo. Devemos buscar fazer uma tessitura coerente em todo o
delineamento do planejamento e execução de estudo.

4.3.2 - Entrevista narrativa e narrativas autobiográficas

No sentido real, a entrevista narrativa caracteriza-se pelo método de analisar algum conceito, serve
de suporte para análise de dados que desejamos obter durante todo o processo da entrevista. Para
Almeida (2001, p. 147), “nada melhor do que ouvir as pessoas, escutar suas lembranças, comparar
suas falas, percebendo diferenças e semelhanças entre elas”.
A entrevista narrativa desenvolvida por Mota (2016) foi realizada após a pesquisa-formação, foi a
forma que o autor encontrou para buscar complementar as narrativas apresentadas nas memórias
de formação. Foi o caminho encontrado para preencher as lacunas a respeito das concepções dos
professores da roça.
Diante a aproximação de professores e pesquisador no momento das entrevistas e da reflexão sobre
a prática vivenciada em sala de aula, Mota fala que as narrativas (auto) biográficas oferecem para
formação docente, no que se refere à sala de aula, a capacidade transformadora ao mobilizar
experimentos do ser e do fazer. É por esse caminho que se faz acontecer a humanização, o
entrecruzamento das culturas presentes no meio escolar.
As narrativas (auto) biográficas apresentadas por Mota (2016) foram a possibilidade encontrada para
que ele pudesse perceber qual o caminho formativo seria significativo para as ações dos docentes na
escola rural ou da roça como ele trata no seu trabalho. Bertaux (2010) fala que:

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A utilização das narrativas se mostra particularmente eficaz, pois essa forma de coleta de
dados empíricos se ajusta à formação das trajetórias; ela permite identificar por meio de que
mecanismos e processos os sujeitos chegam a uma dada situação, como se esforçam para
administrar essa situação e até mesmo para superá-la. (Bertaux, 2010, p.27).

Os conhecimentos da teoria referentes às narrativas por meio das entrevistas e das narrativas (auto)
biográficas possibilitaram ao pesquisador perceber as vivências formativas dos colaboradores de sua
pesquisa, e contribuiu para construção da etapa seguinte que foi as oficinas formativas construídas a
partir dos ateliês biográficos.

Considerações finais

As oficinas formativas possibilitaram a Mota (2016) produzir a proposta de formação para os


docentes das escolas rurais em colaboração com a secretaria Municipal de Educação. As formações
por ele realizadas aconteceram nos espaços destinados às atividades complementares - ACs, sem
comprometer as reuniões já estabelecidas pelos participantes da pesquisa.
Em seu trabalho, Mota (2016, p. 29) traça como aconteceram as oficinas formativas, pois a
“perspectiva de formação que quer enfatizar nesse contexto emerge das relações de
intersubjetividade que acontecem a partir dos sentidos e significados que se dão nas inter-relações
dos sujeitos”. Ele faz uma comparação das oficinas com um “bordado onde se laça para um tecer que
exige nós”, é sem dúvida um processo formativo que precisa ser bem alinhavado e amarrado, para
que se construa uma prática pedagógica reflexiva e duradoura, que tenha significados para os
docentes e que favoreça a aprendizagem crítica e reflexiva dos alunos.
Na trama do tecer as oficinas, Mota (2016) enumera as etapas das formações como Veredas. Foram
vinte e sete horas de formação divididas em três veredas que constituíram o “Plano de formação
docente: uma construção coletiva”.
Na primeira vereda o pesquisador apresentou a proposta da oficina formativa, explicando passo a
passo como seria a dinâmica do trabalho. Ele usou o método autobiográfico para fundamentar o
processo de formação das histórias de vida, como referência teórica usou Deliry-Mamberger (2006,
p. 32), que contribuiu ao falar que “o objetivo do ateliê é precisamente dar corpo a essa dinâmica
intencional, reconstruindo uma história projetiva do sujeito e extraindo a partir dela projetos
submetidos aos critérios de exequibilidade”. Caminhando nessa vereda para encontrar a prévia do
trabalho, tecendo questionamentos sobre a formação continuada, as dificuldades de trabalhar com a
diversidade em sala de aula.
A segunda vereda foi a socialização das narrativas (auto) biográficas, em que os próprios
participantes eram eleitos escribas para anotar as narrativas e as intervenções feitas pelos mesmos.
Foram discutidas nesse momento as questões referentes à identidade e diferença, em que as
concepções de Tomás Tadeu da Silva (2011) foram significativas. Os participantes foram instigados a
ler o texto de Candau (2011) “Diferenças Culturais, cotidiano escolar e práticas pedagógicas” para
socialização e encerramento da vereda.
Para a terceira e última vereda o pesquisador Mota (2016) dividiu em momentos para socialização
das impressões dos professores colaboradores a partir da realização do painel: intersecção das
diferenças com os alunos, em que os professores colaboradores enfatizaram a importância da
atividade, assim puderam conhecer melhor seus alunos. A partir dessas reflexões foi construído de
forma colaborativa o “Mosaico Cultural: sujeitos de se/fazer/viver”, para compreensão da
importância cultural, sendo uma atividade a ser trabalhada em sala de aula, que no encontro
seguinte os professores socializaram com o pesquisador a importância da atividade. E aproveitando o
ensejo, apresentaram o panorama que as oficinas trouxeram para a prática pedagógica no espaço

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rural, fazendo um apanhado dos pontos que teceram o bordado, dando os nós corretos em cada
laçada para que a trama ficasse firme e tivesse prosseguimento, pois no bordado da educação não há
ponto final.
Diante da análise realizada no TFCC podemos constatar a importância das oficinas formativas e das
narrativas (auto) biográficas para a pesquisa-formação, usadas como um caminho para compreender
o processo de educação e formação dos professores das escolas da roça, no seu duplo desafio de
ensinar em turmas multisseriadas, e conhecer a importância da valorização da identidade cultural
que forma a identidade do aluno.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

O Projeto Aluno Monitor da Sala de Informática nas Escolas da Rede


Municipal de Santa Maria: Reflexos de Uma Formação
Eunice Pereira-Azenha1, Maritê Medianeira Moro-Neocatto1, Guilherme Giuliani1,
Karla Marques-da-Rocha2, Luiz Ernani Bonesso-de-Araújo2
1 Alunos do Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede-PPGTER, Universidade Federal de Santa
Maria-UFSM, Brasil. eunice.azenha@gmail.com; mmmneocatto@gmail.com;
guilherme.giuliani@unipampa.edu.br
2 Professores Orientadores do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Educacionais em Rede-

PPGTER, Universidade Federal de Santa Maria-UFSM, Brasil. karlamarquesdarocha@gmail.com;


luiz.bonesso@gmail.com

Resumo. Este artigo trata de uma pesquisa cuja abordagem é a integração das Tecnologias Educacionais em
Rede nas práticas pedagógicas dos professores municipais, a partir da implementação do Projeto Aluno
Monitor da Sala de Informática pelo Núcleo de Tecnologia Educacional Municipal (NTEM). É um projeto com
oficinas de formação, embasado nos procedimentos da pesquisa-ação, que analisou e interpretou as
percepções dos participantes nos fóruns do Moodle, através do WebQDA. A tabulação dos dados do
experimento, realizado em 2015, apresentou resultados expressivos, gerando o projeto de Dissertação em
Tecnologias Educacionais em Rede/UFSM com a proposta de formação do Aluno Monitor com perfil
protagonista e incentivador da integração das tecnologias educacionais, contribuindo para a cultura da
aprendizagem colaborativa na escola. Assim, corrobora-se os resultados do WebQDA, demonstrando no
ciclo da ação e avaliação da proposta, a possibilidade de multiplicar a formação para toda a rede municipal
de ensino de Santa Maria/RS.
Palavras-chave: Monitor; Protagonismo; Aprendizagem; Tecnologias; WebQDA.
The Monitor Student Project of the Computer Room in the Santa Maria Municipal Schools network:
Reflections of a Formation
Abstract. This paper is about a research which approach is the integration of Networked Educational
Technologies in the municipal teacher’s pedagogical practices based on the implementation of the project
Computer Room Monitor Student Project by the Municipal Educational Technology Center (NTEM). This is a
project with training workshops, based on the Research-Action procedures that analyzed and interpreted
the participants' perceptions in the Moodle forums by WebQDA. The experiment data tabulation
undertaken in 2015, presented expressive results, generating a Thesis project in Networked Educational
Technologies / UFSM by a training proposal of the Student Monitor with a protagonist and incentive profile
of the integration of the educational technologies, contributing to the culture of collaborative learning in
school. Thus, the results of the WebQDA are confirmed, demonstrating in the action cycle and the
evaluation proposal, the possibility of multiplying the training for the entire Santa Maria’s / RS municipal
education system.
Keywords: Monitor; Protagonism; Learning; Technologies; WebQDA.

1 Introdução
Não há como negar que a inserção das tecnologias da informação e comunicação (TIC) na sociedade
contemporânea afetou diversos setores, sendo a educação uma área que não conseguiu ficar imune
às transformações que aconteceram em todo o mundo. Para Castells (2009), o homem transita por
todo o planeta sem mesmo sair fisicamente do lugar. A sociedade deixa de ser local e passa a ser
mundial, uma sociedade em rede. As TIC permitem a interatividade com potencial para mudar nossa
cultura, num processo irreversível. Nesse contexto de alta competitividade, globalizado e em
constante transformação tecnológica, o autor coloca que a educação tem o seu papel repensado e
pode ser considerada um dos sustentáculos essenciais da vida em sociedade em virtude das novas
competências, habilidades e atitudes exigidas. Assim, as necessidades de formação diferenciada e
continuada do indivíduo, inseridas numa dimensão de aprendizagem ao longo da vida, exigem novas
concepções de educAção (educação constituída na ação), sendo estas alicerçadas pelas Tecnologias

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Educacionais em Rede. Seguindo as mudanças ocorridas globalmente, que trataram a informática na


educação como fator determinante para promover o desenvolvimento econômico, o Brasil também
buscou incorporar as novas tecnologias nos setores de produção, inclusive na área educacional, o
que se pode verificar pelas políticas implementadas. O governo brasileiro criou e manteve o
Programa Nacional de Tecnologia Educacional (ProInfo) como política para inserir as TIC nas escolas
de educação básica, implantando ambientes tecnológicos equipados com computadores e recursos
digitais, complementado pelo Programa Nacional de Banda Larga na Escola (PBLE), que disponibiliza,
no mínimo, 2 Mbps de internet gratuita para todas as instituições vinculadas ao ProInfo. Em
contrapartida, estados e municípios deveriam garantir a infraestrutura de apoio com a criação e
manutenção de núcleos tecnológicos dotados de equipamentos e pessoal qualificado para promover
a formação dos professores para a utilização das tecnologias recebidas pelas escolas. No município
de Santa Maria, no estado do Rio Grande do Sul (RS), Brasil, foi criado o Núcleo de Tecnologia
Educacional Municipal, doravante chamado NTEM, com a finalidade de orientar, implantar,
acompanhar, avaliar e certificar a utilização das TIC na rede municipal de ensino. E, contribuir para a
inclusão digital de profissionais da educação, possibilitando reflexões sobre o impacto das
tecnologias na sociedade e sua utilização na prática pedagógica. Há, no município, sob a
responsabilidade do NTEM, 50 escolas de ensino fundamental, entre urbanas e rurais, que possuem
as salas de informática oriundas do ProInfo, com um número razoável de computadores e outras
mídias educacionais como projetor multimídia, lousa digital, notebook, câmera digital e equipamento
para a rádio escola, por exemplo. Após a criação do NTEM, a Prefeitura Municipal (mantenedora)
procurou adequar a legislação através do Decreto Municipal nº 313, de 20 de dezembro de 2007, que
define assessoramento pedagógico nos termos da Lei Federal 11.301/06, em seu artigo 1º, $ 1º,
reconhecendo como função de Assessor Pedagógico o professor de informática educativa, abrindo,
portanto, a possibilidade para a sua legitimação nos quadros escolares. Porém, a partir de 2009, a
mantenedora reformulou seus quadros de servidores e retirou a maioria desses multiplicadores dos
laboratórios de informática, colocando-os nas salas de aula regulares. Iniciou-se, nesse momento, a
precarização do atendimento tecnológico no ambiente das escolas, dificultando o uso das
tecnologias existentes, coincidindo com a obsolescência dos equipamentos, bem como com a
dificuldade no upgrade de software e hardware. No período de 2009 a 2015, esses ambientes
informatizados vinham sendo subutilizados, e o apoio ao trabalho formativo foi descontinuado,
considerando que em 2014 não havia nem mesmo uma equipe de apoio lotada no NTEM. Essa
equipe foi constituída em 2015 com apenas três professores formadores, dentre os quais estão as
pesquisadoras, para dar conta da demanda de toda a rede municipal de ensino. Um dos maiores
obstáculos alegados pelos professores para a utilização das tecnologias é o desconhecimento do
sistema operacional Linux Educacional, utilizado pelo governo federal nas máquinas que fazem parte
do ProInfo, acrescido da dificuldade de acessar os equipamentos (tempo investido para logar todas
as máquinas) ao mesmo tempo em que atendem sozinhos uma turma expressiva de estudantes,
além da excessiva carga horária frente aos alunos, que dificulta o tempo necessário para a dedicação
e para o estudo das possibilidades do uso das TIC, entre outros. Essas situações desestimulam a
fluência tecnológica nas escolas, apesar da estrutura sediada pelo governo. Então, para estimular o
uso desses recursos, o NTEM buscou inovar suas ações formativas e inseriu, pela primeira vez em
2015, a figura do aluno monitor como forma de intervenção, buscando minimizar os obstáculos ao
uso das tecnologias educacionais pelos professores e manter em atividade os ambientes tecnológicos
do ProInfo nas escolas municipais urbanas. A partir dessa ação e do ingresso das pesquisadoras no
mestrado profissional em Tecnologias Educacionais em Rede do Programa de Pós-Graduação em
Tecnologias Educacionais em Rede (PPGTER) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),
constituíram-se os principais objetos desta pesquisa. O principal objeto refere-se à observação do
papel exercido pelo aluno monitor, ou seja: Em que medida os alunos monitores, formados pelo

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NTEM, contribuem para a integração das Tecnologias Educacionais em Rede à prática pedagógica dos
professores das escolas municipais a partir da implementação do projeto Aluno Monitor da Sala de
Informática? Como a formação transforma o aluno monitor e o professor, que aprendem e ensinam
em uma relação circular e em contextos escolares/educacionais, e também como transforma a
escola que acolhe o projeto? Partindo desse princípio, o projeto apoia-se na relevância da integração
das Tecnologias Educacionais em Rede à prática pedagógica dos professores a partir da
implementação do projeto Aluno Monitor da Sala de Informática como estratégia para transposição
de desafios de ensino-aprendizagem e para o manuseio das tecnologias existentes nas escolas,
alicerçado em uma abordagem qualitativa e nos procedimentos da pesquisa-ação. A formação de
alunos monitores pode auxiliar na integração das tecnologias à prática dos professores e na
introdução da aprendizagem colaborativa na sala de informática da escola. Destacam-se a
necessidade e a importância da formação de alunos com perfil protagonista, incentivadores do uso
das TIC como prática cotidiana, incluindo digitalmente professores e alunos da rede municipal de
ensino. A formação específica deve ser capaz de proporcionar competências, habilidades e atitudes
para que o aluno monitor consiga transpor os desafios do ensino-aprendizagem de professores e
colegas, constituindo-o em colaborador e mediador entre seus pares para o uso dos recursos
tecnológicos existentes na escola. Portanto, o principal objetivo define-se em integrar as Tecnologias
Educacionais em Rede à prática pedagógica dos professores a partir da implementação do projeto
Aluno Monitor da Sala de Informática, visando contribuir para a cultura da aprendizagem
colaborativa na escola, para a inclusão digital e para a multiplicação da ação a toda rede municipal de
ensino de Santa Maria, RS. O objetivo secundário, embora com importância significativa, refere-se às
possíveis contribuições que o software WebQDA pode trazer para o desenvolvimento da continuação
do projeto já implementado. O projeto Aluno Monitor da Sala de Informática está inter-relacionado
ao protagonismo e à monitoria voluntária dos alunos na aprendizagem colaborativa e na integração
das Tecnologias Educacionais em Rede à prática pedagógica dos professores municipais como
elementos teóricos e conceituais.
2 Aluno Monitor
A figura do aluno monitor está imbricada numa metodologia que vem sendo muito estimulada em
países europeus como a Espanha, que usa o termo tutor para esse aluno (Duran; Vidal, 2007) de
forma que ele auxilie os professores na transmissão de conceitos que se aproximam da compreensão
dos alunos como estratégia para a realização de atividades que visem a objetivos de aprendizagem
em que os resultados esperados serão mais facilmente alcançados se puderem ser experimentados
pelos iguais, ou seja, pela mediação de outro aluno, que está mais próximo da compreensão prévia,
da linguagem e até do ritmo dos colegas de turma, observados e conduzidos, estrategicamente, pelo
professor, caracterizando a escola com tendência inclusiva. Monereo (2007, p. 02) diz que “aprender
entre iguais e com iguais remonta à teoria de Vygostsky (1988) e ao conceito, definido por ele, de
zona de desenvolvimento proximal (ZDP), tratando-se de um formato interativo marcado por
distâncias curtas”, em que é possível a construção conjunta do conhecimento na interação que se dá
quando são proporcionadas intervenções educativas entre alunos sob a mediação de professores,
alicerçadas em métodos de aprendizagem colaborativa como recurso pedagógico. As relações e os
conhecimentos que se estabelecem no ato do aluno ensinar seus pares e também professores, as
transformações que decorrem entre eles e neles são focos deste estudo, uma vez que as
pesquisadoras fazem parte dessa realidade, pois são também formadoras do aluno monitor como
parte da equipe de apoio do NTEM. A ação propõe que o aluno monitor possa, de maneira
autônoma, ser capaz de usar os subsídios da formação recebida para fazer a ponte entre a sala de
informática e o professor regente dos anos iniciais do ensino fundamental, tornando-se um
facilitador e potencializador do uso desse espaço, contribuindo para a integração das Tecnologias

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Educacionais em Rede às práticas pedagógicas. Uma cultura de aprendizagem colaborativa na escola,


a partir da implementação do projeto Aluno Monitor da Sala de Informática, inclui desafios que
abrangem outros contextos como a possibilidade de implementá-lo também nas escolas rurais.
2.1 Aprendizagem Colaborativa
Aprendizagem colaborativa diz respeito a uma proposta pedagógica na qual estudantes ajudam-se
no processo de aprendizagem, atuando como parceiros entre si e com o professor, com o objetivo de
construir conhecimento sobre um dado objeto. Para Torres (2004, p. 50), uma proposta colaborativa
caracteriza-se pela “participação ativa do aluno no processo de aprendizagem; mediação da
aprendizagem feita por professores e tutores; construção coletiva do conhecimento, que emerge da
troca entre pares, das atividades práticas dos alunos, de suas reflexões”, oportunizando a interação
entre professores e alunos, a flexibilização dos papéis no processo das comunicações e das relações a
fim de permitir a construção coletiva do saber; o que favorece o desenvolvimento da autonomia do
aluno no processo ensino-aprendizagem. Tendo em vista que os pressupostos construtivistas e
interacionistas são os que mais dão suporte aos ambientes de aprendizagem colaborativa, as teorias
de Piaget (1987; 2007) e de Vygotsky (1988), no que tange ao aspecto da construção do
conhecimento (cognição) em Piaget e ao sociointeracionismo em Vygotsky, corroboram o aprender a
aprender de professores e alunos conjuntamente. Aliada à aprendizagem colaborativa, a tecnologia
potencializa situações em que professores e alunos pesquisem, discutam e reflitam e, individual e
coletivamente, mudem suas ações. Por observar que crianças e adolescentes têm facilidade no uso
das tecnologias, pode-se dizer que possuem habilidades notórias ao ponto de serem considerados
uma nova geração de pessoas, que Tapscott (2000) denominou de geração digital. Dessa forma,
apostou-se nessa parceria com os alunos através da implementação dessa proposta, que potencializa
o protagonismo jovem no assessoramento dos professores de anos iniciais do ensino fundamental no
acesso às mídias/tecnologias educacionais existentes nas escolas do município.
2.2 Protagonismo
Além do compromisso ético, a opção pelo desenvolvimento de propostas baseadas no protagonismo
juvenil exige do educador uma clara vontade política no sentido de contribuir, através de seu
trabalho, para a construção de uma sociedade que respeite os direitos de cidadania e que aumente
progressivamente os níveis de participação democrática da população. Para Costa (2000, p. 179), o
protagonismo juvenil “(...) é a criação de espaços e condições capazes de possibilitar aos jovens
envolverem-se em atividades direcionadas à solução de problemas reais, atuando como fonte de
iniciativa, liberdade e compromisso”, sendo uma modalidade de ação educativa. Um espaço
privilegiado é a escola que pratica e vivencia a educação para a cidadania, sendo um ambiente de
descobertas e experimentações sociais. Assim, entende-se esse escopo como lugar privilegiado de
aprendizado da cidadania, e a adolescência, a etapa do despertar para o social e o universal, o
momento ideal para a participação na solução de problemas concretos de interesse coletivo. Ao
acolher o projeto Aluno Monitor da Sala de Informática, as escolas municipais abrem-se para a
interAção, para as mudanças de ações entre professores, alunos e comunidade, possibilitando a ação
protagonista de seus estudantes através da atividade de monitoria voluntária para o uso das
Tecnologias Educacionais em Rede.
2.3 Tecnologias Educacionais em Rede
A sociedade, nesta era virtual, passa a exigir nova maneira de conceber a educação, mais
especificamente, as particularidades do ensinar e do aprender. Segundo Castells (2009), estamos em
um processo de transformação estrutural multidimensional associado ao surgimento de um novo
paradigma tecnológico, com base nas TIC. Vivemos um tempo da velocidade instantânea, em que
novos estilos de vida e formas sociais de convivência se instalam a cada momento, o que o autor

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define como uma sociedade em rede conectada pela tecnologia. Seu imbricamento na educação e a
aparente necessidade de mudança de paradigma sugerem a integração dos recursos tecnológicos
nas metodologias de sala de aula. Considerando-se que o fluxo tecnológico não para e que os países
mais desenvolvidos trabalham com acesso à banda larga com grandes velocidades de conexão, não
se pode prescindir da tecnologia, principalmente na formação e qualificação para o trabalho
atualmente. Concordando com esse tema, Braga (2015) ressalta a urgência das conexões de internet
nas escolas para que sejam adequadas o suficiente para suportar a circulação de bens culturais como
vídeos produzidos e a comunicação entre os integrantes das comunidades educativas. Sem a fluência
digital, um contingente de pessoas, especialmente jovens, mesmo com formação escolar regular,
apresenta-se desqualificado para o mundo do trabalho nos mais diferenciados setores da sociedade.
Além disso, Braga (2015, p. 21) afirma que “construir uma compreensão interdisciplinar sobre os
modos de apropriação das tecnologias por grupos sociais diversos é ressaltar a existência de
iniciativas preocupadas em explorar esses novos recursos para ampliar a participação de grupos
socialmente desfavorecidos”. Fatores como esses contribuem para que a formação no ensino
superior e na sua estrutura curricular seja tanto questionada e principalmente instigada para abarcar
a inovação na fluência tecnológica que se faz necessária. Kenski (2014) afirma que, para a
consolidação dessa fluência, é necessária uma reestruturação no processo educacional das
Instituições de Ensino Superior (IES) em todas as suas instâncias, que fundamentalmente sejam
propostas inovações no ensino de graduação, dando ênfase ao uso de tecnologias e às amplas
possibilidades das TIC, presentes na sociedade tecnológica contemporânea. Tais mudanças
interferem nas metodologias de sala de aula, desafiando profissionais da educação a criarem
alternativas que motivem o ensino/aprendizado através das tecnologias. Para tanto, na rede
municipal de ensino de Santa Maria, RS, foi estimulada a integração das tecnologias educacionais em
rede através do projeto Aluno Monitor da Sala de Informática, que apresenta como alguns objetivos
a utilização dos equipamentos enviados pelo governo federal através do ProInfo, os quais estavam
subutilizados nas escolas, para proporcionar a convivência tecnológica aos alunos monitores, a fim
de alcançar e multiplicar a fluidez no ambiente escolar.
3 Metodologia
Caracterizado como uma pesquisa-ação, este projeto estrutura-se em etapas ordenadas, organizadas
em três fases (Tripp, 2005; Thiollent, 2011) na prática da investigação, caracterizando uma sequência
ou ciclo, refletindo mudanças na prática e na ação: a) Planejamento de uma mudança na prática e da
avaliação de resultados da investigação: o planejamento está caracterizado ao longo do projeto
especialmente nos processos dedicados à especificação das oficinas de formação pedagógica. A
avaliação de resultados da investigação será feita durante as observações da ação, nas atividades
propostas via Moodle1 e nos encontros previstos com o grupo para avaliação do processo e para
apresentação de relato de experiências. b) Implementação da mudança na prática e da produção de
dados da investigação: trata-se da ação propriamente dita, sendo que a implementação da mudança
na prática acontecerá ao longo das etapas de formação através das oficinas ministradas. A
implementação da produção de dados da investigação abrange o procedimento de coleta dos
mesmos através da observação e da análise das atividades realizadas ao longo do ciclo da ação
implementada. c) Avaliação da mudança da prática e do processo de investigação-ação: trata-se de
monitorar e descrever os efeitos da ação após o procedimento da coleta dos dados através da
observação e análise das atividades realizadas, avaliando os resultados da ação para o ajuste e
retomada da mesma. Com as análises decorrentes dos dados coletados, foi possível refletir/avaliar
sobre as contribuições da integração das Tecnologias Educacionais em Rede à prática pedagógica dos

1 Plataforma de ensino/aprendizagem virtual. Disponível em: https://moodle.org/

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professores municipais a partir da implementação do projeto Aluno Monitor da Sala de Informática


pelo NTEM, de Santa Maria, RS, contribuindo para introdução da cultura da aprendizagem
colaborativa na escola, da inclusão digital de alunos e professores e da multiplicação da proposta de
formação para toda a rede municipal de ensino. A pesquisa-ação e suas diversas variantes
participativas, cooperativas e colaborativas são consideradas como fazendo parte da investigação
qualitativa, pois:
(...) é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e
realizada em estreita associação com uma ação ou com uma resolução
de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes
representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo. (THIOLLENT, p. 20, 2011)
Thiollent (2016) coloca que, nesse tipo de pesquisa, a ênfase está na ação. As ações são discutidas,
analisadas, deliberadas e decididas com consenso do grupo. Essas são significativas para os atores
em situações específicas. O autor ainda diz que elas são interpretadas pelos pesquisadores com base
em diferentes referenciais. São ações portadoras de aprendizagem e conhecimento mútuo, com
interações entre observadores e observados, corroborando com a que gerou este projeto. Para
tanto, a proposta foi realizada ao longo do ano letivo através de oficinas de formação continuada
para alunos monitores com o propósito de integrar as Tecnologias Educacionais em Rede à prática
pedagógica dos professores, de forma a instigar nesses alunos o perfil protagonista para a utilização
das tecnologias existentes na escola como prática cotidiana de aprendizagem colaborativa. O
experimento empírico, ocorrido em 2015, permitiu a estruturação deste estudo com interpretações
parciais, resultantes de alguns dados coletados a partir dos fóruns do Moodle, em uma amostra
representativa de 14 escolas urbanas, 70 alunos e 14 professores, que participaram desse início das
formações. As instituições participantes selecionaram até cinco alunos dos anos finais do ensino
fundamental e um professor, que fez a formação junto aos alunos, responsabilizando-se pelo grupo
de monitores dentro da sua escola, pela organização dos horários de estudo e de trabalho do grupo
na sala de informática e pelo compartilhamento das informações entre os sujeitos envolvidos. O
desenvolvimento da proposta ocorreu em três etapas: a primeira etapa começou com um encontro
nas escolas que aderiram ao projeto e serviu para os alunos e o professor selecionado conhecerem
os objetivos do projeto e as funções dos envolvidos. A segunda etapa teve seguimento com as
oficinas presenciais de formação para o aluno monitor no NTEM, que foram organizadas em dois
momentos. O primeiro momento foi constituído por três oficinas: Primeira oficina: Conhecimentos
técnicos básicos sobre hardware e software (Linux Educacional) − De forma a capacitar os alunos e
professores para o uso dos recursos tecnológicos, proporcionando uma visão das tecnologias e suas
potencialidades, foram ministrados os conhecimentos técnicos básicos como ligar e desligar o
computador: HARDWARE (rede elétrica, estabilizador, fonte do computador, interruptores);
SOFTWARE (contas e login no sistema operacional e aplicativos: categoria de Menus, gerenciamento
de arquivos e pastas: acesso às mídias removíveis); Internet (rede wireless, cabeada e
provedor/operadora − contato, placa de rede ethernet, configurações básicas quando falhar a
conexão: conferir cabos e conexões, reiniciar a autenticação do IP, reiniciar modem); Segurança e
conservação dos equipamentos e periféricos (periféricos e respectivas conexões, cabos de segurança;
disjuntores, conforto do ambiente); Configurações de rotina (layout do teclado, energia do monitor,
instalação do projetor multimídia), habilitando os alunos para que possam dar acesso à sala de
informática autonomamente. Segunda oficina: Acesso ao Moodle − Ferramentas de interação,
especialmente o fórum, fortalecendo a noção de aprendizagem colaborativa e conhecimento do
Moodle com apropriação dos conteúdos da formação. De acordo com Sabbatini (2007), a filosofia
educacional do Ambiente Virtual de Ensino-Aprendizagem (AVEA) Moodle é o construcionismo, em
que o conhecimento, ao invés de ser transmitido sem mudanças a partir de livros, aulas expositivas

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ou outros recursos tradicionais de instrução, é apreendido pelo estudante através da investigação e


do trabalho colaborativo entre alunos e professores. Terceira oficina: Aplicativos do Linux
Educacional − As salas de informática nas escolas municipais de Santa Maria foram equipadas pelo
ProInfo com o sistema operacional Linux Educacional, na versão 4.0. Dentre os vários programas
educacionais que compõem o Linux Educacional, optou-se por explorar, especificamente, o
multidisciplinar da série educacional GCompris − um conjunto de jogos educacionais infantis que têm
como característica principal a descoberta e a ludicidade, em que os alunos aprendem brincando.
Após o primeiro momento de formação, houve um encontro com os grupos de escolas participantes
para análise da ação e esses grupos solicitaram o aprofundamento da formação, gerando a
continuidade da mesma em um segundo momento, sendo oferecidas outras cinco oficinas
presenciais com as seguintes mídias específicas: Primeira oficina: Apresentações com o Impress −
Esta oficina baseia-se na construção de conhecimentos e linguagens da mídia-educação (BELLONI;
BÉVORT, 2009), enfocando o uso do Impress (LibreOffice) na elaboração de slides para
apresentações, recurso significativo para todas as disciplinas. Segunda oficina: Rádio Escola − Para
Freire (1996), a comunicação transforma seres humanos em sujeitos na medida em que é vista como
um processo de construção partilhada do conhecimento, mediada por relações dialógicas entre os
homens e o mundo. A implantação da rádio, na escola, visa proporcionar um instrumento
pedagógico que possibilite o desenvolvimento da criatividade, oralidade, autoria, escrita de textos,
senso crítico, uma troca entre emissor e receptor, uma vez que os alunos irão fazer essa
permutabilidade de papéis, produzindo programas de maneira interdisciplinar que integram
professores, alunos e comunidade escolar em geral. As escolas receberam os equipamentos para a
implantação da rádio escolar na política federal de inserção das TIC na educação. Portanto, o uso
desses equipamentos justifica essa oficina de formação. Terceira oficina: Produção de Vídeos −
Oficina para elaborar e produzir vídeos, especialmente os fotodocumentários, para utilização em sala
de aula, objetivando instigar a troca de conhecimentos, a criação de roteiros/conteúdos
significativos, possibilitando integrar essa ferramenta à prática pedagógica dos professores ao
estimular a autoria dos alunos na edição da ferramenta e na criação de situações reais ou fictícias.
Quarta oficina: História em Quadrinhos (HQ) − As histórias em quadrinhos, ou simplesmente HQs,
normalmente estão associadas à narração, apresentando texto e imagem que estabelecem uma ideia
de complementaridade. A HQ serve para trabalhar a elaboração de textos, roteiros e argumentos a
partir de conteúdos curriculares, de forma lúdica, atraindo a atenção dos alunos para as diferentes
formas de leitura. A oficina trabalha as HQs com os alunos monitores para que esses possam
estimular a sua criação, valendo-se das tecnologias existentes na escola. Quinta oficina: Lousa Digital
− Como parte da política do ProInfo/MEC, as escolas receberam a lousa digital para ser instalada no
projetor multimídia − Computador Interativo Diebold. Com a lousa, o professor pode preparar
apresentações de slides em programas comuns de computador, complementar com links, sites e
navegar pela internet. Essa oficina possibilita aos alunos monitores manusearem a lousa digital e
auxiliarem os professores para o uso dessa ferramenta em sala de aula. A terceira etapa ocorreu no
final da formação e culminou com a realização de um seminário de relatos orais de experiências
entre todos os participantes, que compartilharam atividades significativas realizadas nas escolas de
origem, utilizando os recursos abordados.A metodologia da pesquisa-ação pode ser demonstrada
através do organograma representado na Figura 1:

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Fig. 1. Organograma das fases da Ação.


Os dados coletados nesse ciclo de ações formativas foram oriundos de dois fóruns, disponibilizados
no Moodle para alunos e professores, através de depoimentos sobre o processo de formação
implantado, também através de expectativas, dificuldades e do registro da caminhada, enfim por
meio das percepções sobre o projeto Aluno Monitor. Para qualificar as análises dos depoimentos,
utilizou-se o software WebQDA2, ferramenta online que possibilitou uma experiência inicial, a partir
dos fóruns identificados como: primeiro Fórum de Apresentação/Acolhimento e segundo Fórum de
Registro da Caminhada. Seus conteúdos alimentaram o sistema de dados do WebQDA, designado
como Fontes. A codificação dos dados possibilitou o desenvolvimento da Matriz Fórum X Expectativa
para análise e interpretação dos mesmos. O primeiro Fórum de Apresentação/Acolhimento foi
proposto no início da formação como forma de avaliar as expectativas dos participantes em relação à
formação oferecida. Foi codificado na sessão Códigos Árvores como Expectativa ao Projeto, com as
subcategorias Muita Expectativa, Alguma Expectativa e Pouca Expectativa. Já o segundo Fórum de
Registro da Caminhada teve o objetivo de registrar a opinião dos participantes quanto à formação
propriamente dita, às experiências, aos desafios e possibilidades futuras. Foi codificado como
Avaliação do Processo, com as subcategorias Muito Bom, Bom e Deixou a Desejar. Foram
classificadas, em ambos os instrumentos, as manifestações de alunos e professores, destacando que
o número de professores é menor que o de alunos, pois, para cada grupo de cinco alunos
participantes por escola, havia um professor responsável. Assim, foi interpretado o número de
referências identificadas nas subcategorias, sendo possível que, no cruzamento das matrizes de
categorias, houvesse duplas codificações tanto nas categorias principais quanto nas subcategorias,
reforçando a interpretação e a análise dos conteúdos e caracterizando, assim, uma versatilidade
positiva do software. As análises, quanto à Expectativa ao Projeto, mostram 57 referências indicando
que os participantes tinham Muita Expectativa – nove professores e 48 alunos − em relação à
formação oferecida; 12 referências apontam Alguma Expectativa – dois professores e dez alunos; e
somente uma apontou Pouca Expectativa − um aluno. Quanto à Avaliação do Processo, 56
referências apontam que consideraram o processo formativo Muito Bom − oito professores e 48
alunos, seis referências consideraram o processo como Bom − seis alunos − e nenhum fez referência
que o processo de formação Deixou a Desejar, o que pode ser demonstrado na Figura 2 abaixo:

2 O WebQDA é um software de apoio à análise de dados qualitativos num ambiente colaborativo e distribuído. Site:
www.webqda.net

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Fig. 2. Matriz Fórum X Expectativa - Referências.


Os resultados apresentados na Figura 2 vêm ao encontro das redes de conversação dos professores,
quando o P1 (professor número 1) diz que: “Consideramos super positivo o curso para aluno
monitor, amplia nosso uso da sala de informática e faz com que nossos alunos sejam mais
comprometidos com o patrimônio da escola”. O P2 acrescenta que “os cursos atualmente oferecidos
pelo NTEM têm colaborado muito para o meu aperfeiçoamento, e a ajuda do aluno monitor veio no
momento certo para que ocorra a autonomia das salas de informática! Os jovens estão
entusiasmados e sentem-se responsáveis pelo laboratório, participando assim do trabalho edificante
que as novas tecnologias proporcionam”. Outro docente, o P3 relata que “Estou acompanhando os
alunos monitores na formação continuada. Tardes de muito conhecimento”. E, ainda, o P4 diz que
“Estou coordenando a equipe de alunos monitores deste curso. Estamos com uma grande
expectativa para que esse programa se efetive e amplie com mais alunos habilitados para o uso das
TCI”. Os alunos, identificados por A acrescido de um número identificador, manifestaram-se dizendo
que: “O curso está, para mim, sendo extremamente ótimo, agora que estamos aprendendo novas
atividades estou ansiosa para mostrá-las aos professores” (A1). O A2 expressa-se dizendo que “Estou
bem feliz por estar no projeto, é uma experiência ótima estou bem feliz por estar podendo ajudar
meus colegas... Tudo isso que estou aprendendo vou levar pra vida toda, obrigado, bom tudo!”.
Também é possível analisar a satisfação nos depoimentos do A3: “Gostei muito do curso, quero
aprender o máximo sobre informática, afinal, o mundo hoje em dia gira em torno da informática.
Minhas expectativas são em aprender e ensinar aos outros e claro; caso haja algum problema com
meu computador eu possa resolvê-lo. Quero ajudar os professores com suas turmas na SI (sala de
informática). Obrigado pela oportunidade”; e do A4: “Estou adorando este curso, pois estou
aprendendo mais coisa que pensei que pudesse, queria agradecer por essa oportunidade que estão
me dando, com esse curso poderei aprender e passar um pouco do meu conhecimento para os
outros…”. Dessa forma, percebe-se que os depoimentos demonstram que a proposta de formação
do aluno monitor, implantada pelo NTEM, abrangeu além das expectativas dos participantes, o que
valida/legitima a sua multiplicação para todas as escolas da rede municipal de ensino de Santa Maria,
RS, conforme a Figura 3:

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Fig. 3. Codificações na ferramenta WebQDA.

Em relação à experiência do uso do software WebQDA como recurso tecnológico de análise


qualitativa de dados, um outro ponto interessante a considerar é que, a partir das codificações
realizadas, pode-se ressaltar as palavras que mais aparecem nas referências selecionadas, gerando
um conjunto dessas palavras em forma de nuvem (desenho/imagem resultante da tecnologia), em
que as ideias mais representativas emergem como a pintura de uma tela, em que o artista expressa
seu sentimento interior. Nesse caso, a imagem construída pelo software, designando a subjetividade
qualitativa da ferramenta tecnológica, reforça que os alunos e professores participantes perceberam
a formação do Aluno Monitor para a Sala de Informática como uma oportunidade de aprender mais
e participar das atividades no ambiente, o que demonstra o potencial significativo da integração
entre educação e informática, perpassando além dos muros da escola, conforme a Figura 4:

Fig. 4. Nuvens destacando as palavras mais frequentes.

4 Conclusões
Esta experiência piloto (2015) gerou o projeto de dissertação do Mestrado Profissional em
Tecnologias Educacionais em Rede − UFSM, a ser desenvolvido em 2017 e 2018. A ampliação da
proposta para todas as escolas municipais que possuem salas de informática oriundas do ProInfo,
incluindo as escolas da área rural de Santa Maria, RS, possibilita a formação do aluno monitor para a
integração das Tecnologias Educacionais em Rede (TIC) à prática pedagógica dos professores
municipais e, com isso, visa a instigar um perfil protagonista no(s) grupo(s) envolvido(s). Com o
software WebQDA, foi possível visualizar os cruzamentos feitos, o que facilitou a análise qualitativa
dos dados. A ferramenta auxilia a organização e a inserção dos dados coletados em uma pesquisa,
tanto nas Fontes Internas como Externas, bem como na sessão de codificações, possibilitando
marcações simples e dinâmicas e permitindo, na sessão Questionamento, um relacionamento
elaborado dessas informações como códigos e dados no formato de matriz. Devido ao fato de o
conhecimento dos pesquisadores em relação ao software ser iniciante, perceberam-se algumas
dificuldades principalmente na geração de gráficos, forma visual muito utilizada que expressa
resultados concatenados e intuitivos. Sugere-se que a ferramenta possibilite a apresentação dos
cruzamentos não só na tela inicial do projeto. Da mesma forma, seria interessante outras
possibilidades de formatação e exportação dos resultados referente às tabelas. Como diferencial, o
WebQDA está disponível na Internet, com acesso compartilhado entre os participantes, dispensando
a necessidade de instalação do software, simplificando e facilitando seu uso. Como a pesquisa terá
continuidade, e as discussões serão aprofundadas na dissertação, será interessante planejar
instrumentos variados de coleta de dados e, posteriormente, analisá-los em sua totalidade no
WebQDA como forma de cruzar informações já existentes e de ampliar o conhecimento sobre a
ferramenta. Quanto ao projeto, deseja-se que este estimule a utilização das tecnologias,

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perpassando pela apropriação e pelo aprimoramento de competências, habilidades e atitudes que


resultam de mudanças na ação não só do aluno no papel de monitor, mas também do Ser Humano
que aprende-ensina-reflete-reaprende. Espera-se que as atividades propostas através desta
pesquisa-ação e de sua metodologia de análise de dados capacitem o aluno monitor a utilizar os
subsídios da formação recebida no decorrer do projeto a fim de que ele consiga estabelecer a rede
entre sala de informática e professor regente dos anos iniciais, tornando-se um facilitador e
potencializador do uso desse espaço. Espera-se contribuir para o desenvolvimento de uma cultura de
aprendizagem colaborativa no espaço escolar, mediada pelas tecnologias educacionais em rede,
embasada na inclusão digital e na multiplicação da ação para toda a rede municipal de ensino de
Santa Maria, RS.
Referências
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que é Moodle? Disponível em http://www.ead.edumed.org.br
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Tecnologia e Formação dos Professores das Séries Iniciais. UnB, Brasília, julho de 2000.
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de investigação com a esfera da ação sob a perspectiva da pesquisa-ação. In: Atas - Investigação
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Torres, P.L. (2004). Laboratório on-line de aprendizagem: uma proposta crítica de aprendizagem
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446. São Paulo.
Vygotsky, L. S. (1988) A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes.

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Significados das avaliações do ensino pelos estudantes: relato de


um processo de análise qualitativa

Maria Beatriz Gomes Bettencourt1, Maria de Lourdes Sá Earp1

1 Faculdade Cesgranrio, Rio de Janeiro, Brasil. beatrizbettencourt@yahoo.com; malusaearp@gmail.com

Resumo. Esta comunicação tem o objetivo de descrever o processo de tratamento de dados qualitativos
realizado na pesquisa “As Avaliações do Ensino pelos Estudantes” (AEE) que ocorre no contexto da disciplina
“Prática de Avaliação Organizacional em Instituições de Ensino Superior” ministrada em um Programa de Pós-
Graduação strictu sensu. A sua relevância reside na explicitação de como os estudantes podem apreender as
características e as exigências da metodologia qualitativa, participando ativamente no processo de coleta e
análise de dados, no decurso de uma pesquisa real. Depois de descrita a fundamentação da pesquisa e as
questões a que ela deve dar resposta, segue-se a narração do percurso formativo dos mestrandos, desde a
fase de coleta de dados até a atual fase de análise qualitativa. Essa comunicação tem como foco a metodologia
de análise dos dados, em especial, o processo de categorização e como foram criadas novas categorias a partir
da análise.
Palavras-chave: processo de análise qualitativa; categorização; avaliações do ensino pelos estudantes.

Meanings of the student’s evaluation of education: description of a qualitative data analysis process
Abstract. This paper aims to describe the process of qualitative data analysis carried out in the research
“Student's Evaluations of Teaching´(SET) that occurs in the context of the subject "Practice of Organizational
Evaluation in Higher Education Institutions" of a postgraduate course. Its relevance lies in the explanation of
how students can perceive the characteristics and requirements of the qualitative methodology, actively
participating in the process of data collection and analysis, in the course of an actual research. After describing
the rational of the research and the questions to which it must answer, the paper describes the formative
path of the masters, from the data collection phase until the current phase of qualitative analysis. The focus
of this paper is the process of categorization, how we create some new categories and how the ICT helped
this process.
Keywords: Qualitative data analysis; categorization; student’s evaluation of teaching.

1 Introdução do projeto de pesquisa

A AEE é uma prática social que tem como propósitos definidos fornecer informação, ao professor e à
administração, para ser utilizada na melhoria do ensino, dos cursos e das instituições e na gestão da
carreira dos docentes. É uma realidade consolidada nos EUA e no Canadá, onde se pratica há mais de
meio século (Hativa, 2008) e tem sido objeto de numerosas pesquisas (só na base de dados Eric
podemos encontrar cerca de 3.000) que têm tido por objeto, fundamentalmente, determinar quais os
fatores que influenciam as respostas dos estudantes e medir o enviezamento dos resultados em
função desses fatores. Elas têm permitido chegar a algumas conclusões: foi possível verificar algum
viés associado a características do professor, como sexo, idade, grupo étnico, que refletem
discriminações e preconceitos existentes na sociedade.
Como prática social, a AEE tem sido objeto de crítica por muitos elementos do meio acadêmico, por
ter efeitos nocivos, nomeadamente a inflação das classificações dos estudantes (Davidovich e Soen,
2009). Assim, a hipótese de que a avaliação que os estudantes fazem do ensino seja um reflexo das
classificações que obtiveram na disciplina tem também sido testada e várias investigações comprovam

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a existência de uma correlação entre as AEE de uma disciplina e as classificações que os estudantes
nela obtêm (Marsh, 2007; Richardson e Slater, 2007). Contudo, esta correlação é moderada (média de
.20, segundo Davidovich e Soen, 2009) e a literatura não permite a validação da hipótese, pois são nela
são apontadas explicações contraditórias (Abrami, d’Apollonia e Rosenfield, 2007).
Cabe aqui ressaltar que, para além da diversidade de fatores relacionados com o estudante, a atividade
de ensinar é multi facetada e os contextos de ensino introduzem muitos fatores de diferenciação. Os
questionários de AEE não podem medir todas estas dimensões.
Daí a necessidade de triangular os resultados das AEE com outros indicadores (taxas de sucesso,
avaliação externa dos programas, empregabilidade dos diplomados, avaliação pelos diplomados),
porque só uma abordagem mais complexa permite avaliar a qualidade das formações e do ensino
universitário que, para além da satisfação dos estudantes, visam outros objetivos sociais (Abernot, Y,
2013).
Com todas estas ressalvas, as AEE continuam a ser fortemente utilizadas no ensino superior, em todo
o mundo, pois elas continuam a ser consideradas medidas válidas de qualidade do ensino, em muitos
dos seus aspectos. As pesquisas compiladas por Romainville (2004) evidenciam a elevada correlação
existente entre avaliações realizadas por meio de questionários diferentes e mesmo entre avaliações
feitas por estudantes e por colegas professores
Contudo, e paradoxalmente, os efeitos das AEE na melhoria do ensino, na profissão e trabalho
docente, a nível institucional e social têm sido pouco pesquisados. Existem alguns estudos pontuais,
nomeadamente, sobre o impacto do processo de avaliação institucional na cultura das IES, referente
à realidade canadense (Bettencourt, 2005) ou sobre o seu efeito transformador no trabalho
universitário, no contexto da universidade francesa (Younès, 2015).
No Brasil, tal como em muitos países, a realização de avaliações do ensino pelos estudantes é uma
prática inscrita no processo de auto avaliação institucional que as instituições de ensino superior
devem levar a cabo, no âmbito do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior brasileiro
(Sinaes). Este sistema permite às instituições decidir sobre o modo como os estudantes participam na
avaliação do ensino, existindo grande diversidade nos instrumentos utilizados e nas formas adotadas
para divulgação e uso dos resultados.
A presente pesquisa propõe-se compreender os significados destas AEE e seu impacto nas práticas de
ensino e na cultura institucional no ensino superior, respondendo às seguintes questões: a) Que
condicionantes influenciam as respostas dos estudantes às AE e quais os seus significados? B) Como é
que as AEE são localmente apropriadas e que efeitos produzem?

2 Enfoque metodológico

A abordagem utilizada é de cunho qualitativo na medida em que se pretende conhecer o como e o


porquê das ações de agentes envolvidos no processo de AEE. Consideramos este estudo de caso como
instrumental (Stake,1995), pois o caso desempenha um papel de suporte para o estudo em
profundidade de outro fenômeno: as AEEs, suas condicionantes políticas e institucionais e seus efeitos.
Trata-se também de um estudo de caso múltiplo (Yin, 1984), pois são vários os locais estudados para
que a análise incida sobre realidades diferenciadas que, pela variedade, permitam compreender
melhor o fenômeno estudado.
A pesquisa foi desenvolvida em nove IES do Estado do Rio de Janeiro - três públicas e seis privadas – e
uma IES privada de Minas Gerais. Cada IES foi assumida por um membro da equipe de investigação
segundo escolhas pessoais. Alguns preferiram estudar a própria instuição por nela trabalharem, outros
escolheram instituições cuja entrada foi facilitada por uma pessoa “de dentro” e outros a escolheram
pela proximidade geográfica de sua residência.

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Como o campo de investigação são Instituições de Ensino Superior, tipo de organização familiar a todos
os envolvidos na pesquisa, foi necessário construir um outro olhar sobre uma realidade que se acredita
conhecida em função da vivência dos membros da equipe. Nesse sentido, todos foram levados a
realizar suas observações tendo como meta a tarefa de “estranhar o familiar” (Da Matta, 1978).
A primeira etapa de trabalho de campo se centrou na observação. A equipe de pesquisa entrou nas
IES, munida de cadernos de campo, para registro de descrições dos espaços físicos, de como os
estudantes utilizam esses espaços, bem como de diálogos e cenas, enfim, de informações sobre o que
os atores fazem, o que pensam sobre o que fazem, o que falam sobre o que fazem (Malinowski, 1978).
Um momento importante dessa etapa foi a discussão e análise dos cadernos de campo dos membros
da equipe de pesquisa, em que as observações foram compartilhadas no sentido de que o olhar de
cada investigador fosse ampliado pelos olhares dos demais. Como sugere Vianna (2003), diversas
pessoas a partir de suas experiências podem ver o mesmo objeto de perspectivas diferentes. O objeto
é o mesmo, o que muda é a organização mental de quem observa.
No decurso das observações, os investigadores estabeleceram contato com um dirigente da IES ligada
ao processo de avaliação institucional, a ser posteriormente entrevistado, com o objetivo de conhecer
como se desenvolveu o processo de AI, como foram elaborados e aplicados os instrumentos e o que é
feito com os resultados das avaliações. Essas entrevistas se deram a partir de um roteiro previamente
elaborado, tendo sido entrevistados membros da Comissão Própria de Avaliação (CPA) das IES 1, 2, 3,
8, 9 e 10 e membros da equipe de direção das IES 4, 5, 6 e 7.
Na etapa seguinte, a equipe entrou no fulcro do trabalho de campo: a entrevista a estudantes das IES.
Os entrevistados foram estudantes que responderam ao questionário de avaliação institucional. Os
roteiros de entrevista eram constituídos de uma parte comum a todas as IES e de uma parte elaborada
a partir do questionário da instituição; em cada IES foram entrevistados (dois) estudantes que
anteriormente responderam ao questionário institucional. A entrevista destinou-se a saber como
chegaram ao instrumento, como responderam às questões, como as compreenderam e se dariam ou
não a mesma resposta nas circunstâncias atuais e por quê. Também se pedia a opinião dos estudante
sobre a importância destes questionários, quais os efeitos que esperavam e quais os impactos
observados.
No final do processo de recolha dos dados, cada investigador redigiu um relatório com informações
sobre a IES estudada, a descrição do processo de AI, a forma como os estudantes participam nesse
processo e a transcrição das entrevistas.

3 O processo de análise dos dados

Nesta etapa, atualmente em curso, realiza-se ao tratamento e análise dos dados coletados nas dez IES.
O material recolhido das IES foi lido exaustivamente (Minayo, 1996) por toda a equipe, no sentido de
contextualizar as entrevistas dos estudantes.
Num segundo momento, a equipe de pesquisa se dedicou às entrevistas com os estudantes que foram
lidas, exploradas e discutidas coletivamente. Cabe ressaltar que, também nessa fase, o esforço da
equipe foi o de entender os discursos na perspectiva dos entrevistados:
“Um dos critérios para se avaliar se foi realizada uma leitura de boa qualidade é a capacidade de
descrever as falas, as ações e os fatos a partir da perspectiva dos atores. Para isso, como lembra
Minayo (2002, 2004), é de fundamental importância se colocar no lugar deles, em seu tempo, em suas
circunstâncias.” (MINAYO; ASSIS; SOUZA, 2005, p. 205).
Durante a leitura procuramos registrar algumas ideias, expressões ou palavras relevantes, frente aos
objetivos do estudo, como sugerem BOGDAN; BIKLEN (1994), que indicam como interessante, durante

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o momento da leitura, que se comece a desenvolver uma lista preliminar de possíveis categorias de
codificação.
Discutimos, em seguida, a categorização, adotando a seguinte definição do conceito:
“Uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação, e
seguidamente, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com critérios previamente definidos.
As categorias são rubricas ou classes, as quais reunem um grupo de elementos (unidades de registro)
sob um título genérico” (Bardin, 2011, p. 117).
Chegamos então a um primeiro conjunto de categorias, que também têm em conta as questões se
pesquisa e que apresentamos, resumidamente: (i) Motivação - as razões alegadas pelo estudante a
desejar responder ao questionário de avaliação; (ii) Modo de administração do questionário e seu
suporte: a forma como o instrumento foi apresentado ao estudante e os modos informacionais de
preenchê-los; (iii) Razões para mudar as respostas ao questionário: as diferenças entre o que o
estudante respondeu no questionário institucional e aquilo que ele, no meomento da entrevista,
considerou ser a sua opinião e as justificativas afirmadas; (iv) Condicionantes intrínsecas às perguntas
e padrões de resposta do questionário:opinião dos estudantes sobre as opções de resposta, sua
suficiência ou não para expressarem suas apreciações, o que acham que é importante e não é
perguntado); (v) Divulgação dos resultados (como são divulgados, interna e externamente, os
resultados das AEE); (vi) Os efeitos da avaliação (opinião dos estudantes sobre a AI e sobre sua utilidade
e efeitos).
Em seguida os estudantes assinalaram, manualmente, nas falas, os trechos relacionados com as
categorias previamente elaboradas, assim como trechos que não coubessem em nenhuma das
categorias, mas que considerassem importantes
Enquanto as anteriores categorias surgiram das perguntas da pesquisa, outras categorias foram criadas
a a partir da análise do material de pesquisa. De acordo com Duarte (2002, p. 152):
“As muitas leituras do material de que se dispõe, cruzando informações aparentemente desconexas e
interpretando respostas, notas e textos integrais que são codificados em “caixas simbólicas”,
categorias teóricas ou “nativas” ajudam a classificar, com certo grau de objetividade, o que se
depreende da leitura/ interpretação daqueles diferentes textos.”
A categoria – obrigatoriedade - foi construída porque constatamos que o preenchimento do
questionário foi assumido como obrigatório por alguns estudantes. Ora, se o estudante pensa que o
ato de responder ao questionário deriva de uma imposição, é de prever que tal condicione as suas
respostas. Nas duas IES em que o preenchimento dos questionários pelos estudantes é visto como
obrigatório as taxas de resposta atingem os 100%. Nestes dois casos, verifica-se também que existiram
diferenças acentuadas entre as respostas que os estudantes deram no questionário institucional,
muito positivas, e as opiniões menos positivas, que, posteriormente, expressaram na entrevista. As
causas apontadas pelos entrevistados para essas divergências são variadas: receio de represálias (IES
1 e 2), falta de confiança no caráter confidencial das respostas (IES 1 e 2), não querer penalizar a
instituição (IES 2), não querer que o ranking da instituição e do curso o venha a penalizar (IES 2).
Quando o preenchimento do questionário não é considerado obrigatório pelos estudantes, as taxas
de resposta encontram-se em patamares bem menos elevados. Os respondentes indicam, como
motivações para a sua participação: a crença na importância da avaliação; o desejo de criticar algum
professor (IES 9, 6 e 4); ou de elogiar (IES 3, 5, 7 e 8); a vontade de reclamar sobre insuficiências de
equipamentos, da estrutura física, da biblioteca (IES 5,7 e 9) ou dos laboratórios (IES 3, 5, 7 e 10). Existe
nestes casos uma intencionalidade no ato de avaliar que não está presente quando a resposta é
obrigatória.
A categoria - anonimato – também emergiu da análise efetuada, pois partiamos do princípio que todos
os questionários seriam anónimos. De fato, o suporte informático do questionário torna muitas vezes
possível a identificação dos respondentes, sempre que o preenchimento em linha do questionário é

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atrelado à conta do aluno. Verificou-se que, em alguns destes casos, os alunos pensam que o
anonimato das respostas não está garantido e que podem ser (ou mesmo que são) identificados. A
estrutura computacional em que o questionário se apresenta pode implicar a identificação, como
vemos nesta fala:
P: “Como respondeu ao questionário, o local, a forma de aplicação?
R: Foi on line. No email eles davam um link. Você entrava na página do questionário e se cadastrava.
Mesmo sendo anônimo, você se cadastrava com a matrícula e tudo mais e lá vinha todo o questionário
para você responder e já ficava armazenado on line mesmo” .
O que examinámos, em seguida , foi se a questão do “anonimato” estava presente de forma intensa
nos relatos, como condicionante das respostas dos estudantes no sentido de se adotar como nova
categoria ou como subcódigo da categoria - modo de administração do questionário -, tendo em conta
que “para desenvolver subcódigos, decida primeiramente quais os códigos principais (...). Se o código
consistir em material que se pode dividir para manipular de forma mais conveniente, desenvolva
subcódigos para levar sua análise mais longe (Bogdan; Biklen, 1994, p.234).

3 Considerações finais

Cabe registrar que, pela abordagem qualitativa adotada, foi possivel elaborar categorias a posteriori,
que se constituirão, provavelmente, em “achados da pesquisa”, como nos parece ser o caso da questão
da obrigatoriedade e do anonimato das respostas.
Pretendemos, neste artigo, descrever o processo de análise da dados focando na metodologia de
coleta de dados e na categorização do material levantado a partir das entrevistas. O grupo de pesquisa
se encontra na fase de mapeamento das entrevistas, classificando as falas dos estudantes nas
categorias elaboradas, o que permitirá visualizá-las e organizar possíveis articulações entre elas. É de
realçar que esse trabalho está sendo realizado em conjunto, de forma a que todos acompanhem a
classificação dos dados de todas as entrevistas, tendo presentes os significados das categorias. Esse
processo está sendo realizado com a ajuda de um programa de análise de dados qualitativos, de forma
a que toda a equipe não só interiorize o processo, como também exercite o uso do programa
informático como ferramenta para incrementar a qualidade da análise.

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Perry e J C. Smart (Ed.) (2007). The Scholarship of Teaching and Learning in Higher Education: An
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“Projeto ou circunstância”: tipologia da escolha de estudantes


pelo curso de Pedagogia

Maria de Lourdes Sá Earp1, Priscila Rodrigues2, Cecília Maria Marafelli2


1 Fundação Cesgranrio, Brazil. malusaearp@gmail.com
2 UFRJ, Brazil. priscilaapri@gmail.com, cmmarafelli1@gmail.com.

Resumo. Este estudo faz parte de uma pesquisa sobre Cursos de Pedagogia na cidade do Rio de Janeiro.
Este paper teve como foco a análise das motivações que levaram estudantes a estes cursos. As escolhas dos
estudantes foram classificadas em uma tipologia denominada de “Projeto ou circunstância”. A análise
mostrou que nem todos os estudantes desejam ser professores; que entre os que desejam ser professores
há um grupo cuja escolha foi antes do curso, “escolha precoce”, e outros que a fizeram durante o curso,
“escolha tardia”. Há estudantes que não desejam ser professor nem pedagogo. O “dom para o magistério”
não é a razão exclusiva que leva estudantes ao Curso de Pedagogia. Entretanto, a questão do dom ainda é
citada por todos que pretendem ser professor, seja os que fizeram sua escolha anterior ao curso e seja pelos
que a fizeram posteriormente, configurando no que denominamos de mito do dom.
Palavras-chave: Escolha docente; Magistério; Cursos de Pedagogia; Tipologia da escolha pelo Curso de
Pedagogia.

"Project or circumstances": typology of students' choice of education for undergraduate course


Abstract. This study is part of a research on Undergraduate Courses in Education in city of Rio de Janeiro.
This paper focuses on the analysis of motivations that led students to that courses. The students’ choices
were classified into a typology named “project” or “circumstances”. The analysis showed that among those
who wish to be teachers there is a group whose choice was made before the course, which we name “early
choice”, and others who did it during the course, which we call “late choice”. There is a group of students
who do not wish to be teachers or pursue another educational career. The study revealed that the “gift for
teaching” is not the exclusive reason that leads students to the Undergraduate Course in Education.
However, the issue of gift is mentioned by all students who intend to be teachers, configuring what we
denominate the myth of gift.
Keywords: We would like to encourage you to list your keywords in this section, separated by semi-collon
(;), up to the maximum of 5.

1 Introdução

Nos últimos anos, a principal questão da pauta das políticas educacionais tem sido a melhoria na
educação e um dos fatores determinantes para essa qualidade é a formação docente. Nesse sentido,
estudos sobre Cursos de Pedagogia têm sido realizados no sentido de construir explicações sobre a
qualidade da formação docente e consequentes problemas de ensino aprendizagem dos estudantes.
A pesquisa da qual esse estudo faz parte tem como finalidade avaliar características de cursos em
universidades do Rio de Janeiro, condições de formação, perfis, trajetórias escolares e hábitos de
estudo dos graduandos. Este artigo, um recorte dessa pesquisa, tem como objetivo específico é, a
partir de parte da empiria, analisar de forma qualitativa as motivações que levaram estudantes ao
Curso de Pedagogia.
As questões de investigação que nos orientaram foram: Que representações têm os estudantes que
fazem o curso de Pedagogia de suas escolhas pelo curso? Em que medida as escolhas dos estudantes
se alinham com os resultados das pesquisas? Qual a razão de alguém hoje escolher o curso de
Pedagogia, em que pesem o desprestígio da carreira de professor de séries iniciais e os baixos

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salários? Em que medida as exigências da atual legislação (LDB/96) levam professores com cursos
normais a ingressar nos cursos de Pedagogia? Para conhecer as razões e motivações que levam
estudantes ao curso de Pedagogia nos remetemos a estudantes de IES que faziam parte do survey da
pesquisa em andamento e os indagamos.
Gatti (2010), Valle (2006), Tarduce et. al.(2010), Nogueira e Pereira (2010) ajudaram a analisar as
respostas dos graduandos, na medida em que descrevem e discutem as principais motivações para a
escolha da docência e permanência na profissão.
Uma das principais teses no campo da Sociologia da Educação é que as aspirações e expectativas
subjetivas estão moldadas pelas condições objetivas nas quais os atores são socializados (Nogueira e
Nogueira, 2015). A escolha profissional de um indivíduo é sempre resultado de uma adaptação dos
agentes às condições sociais objetivas (Bourdieu, 1989). Os elementos estruturais de ordem
econômica, política, educacional pesam sobre as opções de cada um e acabam por prescrever o
futuro no mais longo termo, orientando a escolha pessoal e exercendo forte influência sobre o
itinerário profissional Valle (2006).
Como ressalta Bourdieu (1989), as escolhas profissionais não são fruto de uma decisão consciente
realizada por um sujeito racional, mas de uma operação, freqüentemente obscura, de um senso
prático da posição no campo, orientada pela estrutura interiorizada que produziu toda a história
anterior e que ainda conduz o presente. Toda escolha, portanto, é uma escolha do possível e o leque
de opções vai ser mais ou menos determinado pelas condições objetivas em que inserem os agentes.

2Breve contexto histórico do curso de Pedagogia

Por muitos anos a formação das professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental (a antiga
“professora primária”) foi oferecida nas Escolas Normais – mais tarde denominadas Cursos de
Magistério - em nível secundário ou de 2º grau. Posteriormente, a formação desses professores foi
assumida pelo ensino superior. Essa mudança ocorre a partir do momento em que se passa a
perceber que a tarefa do professor é complexa e exige, inclusive a partir da Educação Infantil,
profissionais com formação superior. Esta visão foi consolidada pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (BRASIL, 1996).
As Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia foram homologadas pelo Ministro da Educação
e publicadas no Diário Oficial da União em 15 de maio de 2006, conhecida como Resolução CNE/CP
n.1/06 (BRASIL, 2006). As DCN definem que o Curso de Pedagogia formará profissionais para o
magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, além de para as matérias
pedagógicas no Curso Normal de nível médio e de cursos da Educação Profissional e ainda assegura a
formação de profissionais da educação prevista no artigo 64 da Lei n. 9394/96 (BRASIL, 1996).
Consequentemente, o curso de Pedagogia, na sua atual formulação legal, configura-se, não única,
mas principalmente, como o lócus de formação de professores para a Educação Infantil e os anos
iniciais do Ensino Fundamental. Interpretações da lei nos primeiros anos da promulgação impeliram
o professor formado pelo Curso Normal a ingressar em um curso de graduação em Pedagogia, seja
por exigência das escolas particulares ou dos concursos públicos.
Que representações têm os estudantes de cursos de Pedagogia de suas escolhas pelo curso? Em que
medida as escolhas dos estudantes se alinham com os resultados das pesquisas? Para conhecer as
razões e motivações que levam estudantes ao Curso de Pedagogia nos remetemos a estudantes de
IES que faziam parte do survey da pesquisa em andamento e os indagamos.

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3Metodologia

O corpus de análise é composto por 82 relatos de estudantes de dois cursos de Pedagogia, de uma
instituição pública e outra privada. Na primeira instituição, os relatos dos estudantes foram
solicitados a partir da aplicação de um questionário realizado na ocasião da pesquisa de doutorado
de uma das integrantes do grupo de pesquisa. A equipe solicitou e-mail ou telefone dos
respondentes para que futuros contatos de pesquisa fossem realizados. A partir deste contato, foi
pedido a esses estudantes que comentassem por escrito dois aspectos de sua trajetória no Curso de
Pedagogia: “Como você chegou ao curso de Pedagogia?”; e “Como está sendo sua experiência de
aluno?”. Montamos uma pequena base em plataforma da internet dedicada a este tipo de trabalho,
utilizando a ferramenta do Google drive. Após três solicitações, obtivemos um total de 57
respondentes.
Na instituição privada, outra integrante do grupo de pesquisa, professora da instituição, solicitou a
suas alunas do curso de Pedagogia, turno noturno, ao final de uma aula da disciplina Metodologia da
Alfabetização, em que a maioria cursava o 4º período, que escrevessem, em uma folha padrão da
universidade, sobre as seguintes questões: “Como e por que ingressei no curso de pedagogia” e
“Minhas expectativas em relação ao curso”. Deveriam colocar a idade e a atual ocupação
profissional. Todos optaram por identificar-se, colocando o nome completo.
A turma era composta de 34 alunos; no dia da aplicação estavam presentes 25 estudantes, 24 do
sexo feminino e 1 do sexo masculino. Todos demonstraram interesse na tarefa solicitada e muitos
disseram que aquela era uma boa oportunidade para refletirem sobre sua escolha e sua caminhada
dentro do curso até o momento.
A primeira etapa da análise dos dados foi proceder a uma leitura exaustiva para compreendermos
todo o material que dispúnhamos. Para isso, os relatos da segunda instituição foram digitados e
impressos, assim como os da primeira instituição.
Partimos também da ideia de que as categorias devem ser exaustivas, de forma a abarcar todo o
material analisado; exclusivas, no sentido de que um determinado aspecto do material não possa ser
classificado em mais de uma categoria; concretas, na medida em que não devem ser expressas de
forma abstrata; adequadas, de maneira que a categorização seja pertinente ao conteúdo e ao
objetivo do estudo (Minayo, 1996).
Começamos examinando as respostas dos estudantes de uma das universidades. Nessa fase,
procuramos registrar algumas ideias, expressões ou palavras relevantes, frente aos objetivos do
estudo, como sugerem BOGDAN; BIKLEN (1994), que indicam como interessante, durante o
momento da leitura, que se comece a desenvolver uma lista preliminar de possíveis categorias de
codificação.
Analisando o material, percebemos que os relatos traziam outras razões para que os estudantes
chegassem aos cursos de Pedagogia: ser professor não era a única explicação dessa escolha.
Além dos que escolheram Pedagogia para se tornar professor, havia estudantes que escolheram essa
graduação para adquirir ou aperfeiçoar conhecimentos; para fazer um curso de pós graduação;
porque precisavam de uma certificação por já atuarem na área de Educação ou porque queriam fazer
concurso; outros escolheram Pedagogia por terem recebido bolsa; e havia aqueles que queriam fazer
um curso superior. Também nos deparamos com um tipo de explicação que aludia à escolha do curso
de Pedagogia ao fato de terem feito o Curso Normal no passado. Discutimos, em seguida, quais
categorias adotar, entendendo categorização conforme a definição de Bardin (2011): “as categorias
são rubricas ou classes, as quais reunem um grupo de elementos (unidades de registro) sob um título
genérico” ( p.117). Chegamos , então, nas categorias: pedagogo - conhecimento; pedagogo-graduado
e pedagogo-professor.

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Procedendo a leitura do conjunto de respostas da segunda universidade, percebemos de forma mais


clara que as razões alegadas pelos estudantes do primeiro grupo se repetiam; entretanto, de forma
mais intensa, verificamos que assim como no primeiro grupo, alguns estudantes escolheram cursar
Pedagogia por razões ocasionais: por ser um curso mais fácil; por ter um ingresso facilitado por ter
recebido bolsa; por sugestão de um familiar ou conhecido, ou mesmo de um professor. Percebemos
que nesse grupo também havia estudantes que resolveram se tornar professor ao realizarem o
curso: por diferentes razões, esses estudantes declararam que ao longo do curso de Pedagogia
decidiram ser professores, realizando uma escolha a posteriori.
Percebemos que razões, relacionadas mais ou menos ao repertório profissional, poderiam definir um
nível anterior de classificação, já que aquelas razões explicadas mais pelas circunstâncias começaram
a dar forma a um tipo de motivação, diferente daquelas que faziam menção de uma escolha pelo
curso de Pedagogia pelo aspecto profissional. Pensamos que seria possível descrever as escolhas,
primeiramente, a partir de duas lógicas: uma escolha pautada em razões profissionais e a outra
baseada em razões circunstanciais. Importante ressaltar que não se trata de um tipo de escolha
superior a outra, e sim de diferentes motivações. Valle (2006) nos ajudou a pensar ao afirmar que a
carreira docente resulta de dois tipos de escolha:
1) A escolha do magistério resulta de uma decisão consciente ou
inconsciente tomada durante a escolarização média, ou até mesmo
antes dela, em razão da atração que a carreira docente exerce sobre o
jovem estudante. Este se investe, então, na realização de seu
projetoprofissional, colocando em prática múltiplas estratégias (...)
2) A escolha do magistério pode, por outro lado, ser provocada pela
impossibilidade de concretizar um outro projeto profissional, seja devido
a circunstâncias diversas de ordem pessoal (...) (Valle, 2006).
Cabe registrar que ao analisarem o processo de escolha do curso de Pedagogia por alunas de perfil
social mais elevado, Nogueira e Pereira (2010) sinalizaram que a manifestação do gosto pela carreira
poderia ser mais ou menos favorecida por contingências específicas. Os autores realizaram uma
classificação das escolhas tendo em vista “o grau de antecedência com que o curso foi realizado, as
razões pelas quais a decisão pelo curso foi mais ou menos adiada e o gosto maior ou menor
manifestado pela profissão” (p.28). Era a chave que precisávamos para completar nossa própria
classificação das escolhas pelo curso de Pedagogia tendo em vista as respostas que obtivemos nas
duas instituições de ensino superior.

4“Projeto” ou “Circunstância”: as escolhas pelo curso de Pedagogia

Após analisarmos todos os relatos, chegamos então a uma tipologia que denominamos “Projeto ou
Circunstância”. Como se trata de categorias definidas por nós, é importante descrever o que está
sendo considerado em cada uma.
Na categoria “Projeto”, agregamos relatos cujas razões estavam baseadas em uma decisão tomada a
priori, antes da entrada no curso, escolhas descritas com argumentos relacionados a um repertório
profissional. Tarduce (2010) ajudou a construirmos um entendimento desse tipo de escolha: “Os
sujeitos da pesquisa possuem um projeto de futuro que inclui o ingresso, em algum momento, na
universidade e a maioria demonstra vontade de trabalhar e estudar. (Tarduce, 2010, p.454).
Na categoria “Circunstância”, classificamos escolhas que demonstram a chegada no curso de
Pedagogia por razões de acaso ou descarte: “em geral considera-se que a escolha se dê por descarte,
por se tratar de cursos gratuitos ou baratos, aligeirados, de fácil acesso, portanto, viáveis não só do
ponto de vista econômico, mas também das exigências acadêmicas” (Tarduce, 2010, p.470). Algumas
falas exemplificam esses dois tipos de escolha:

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“Projeto”
“No ensino médio optei por fazer o Curso Normal, pois sempre sonhei em ser
professora. Após o fim do curso procurei a faculdade de Pedagogia com o objetivo
de aprofundar meus conhecimentos na área”. (Universidade pública).
Durante muito tempo tinha como sonho trabalhar na área de educação, mas com
os percalços da vida me vi fazendo curso na FUNENSEG e me formando, hoje como
já tenho uma vida emocional e financeira um pouco mais estabilizada, pude fazer
do sonho um início da realidade. (Universidade privada).

“Circunstância”
“Optei por Pedagogia porque na verdade não conseguiria passar para Direito, que
ainda continua sendo meu sonho, porém deixarei mais para o futuro porque
pretendo concluir Pedagogia, e até mesmo fazer um mestrado na mesma área.
Durante o ano do meu vestibular, analisava muito as relações candidato/vaga.
Conforme a minha nota no 1º exame de qualificação, fui redirecionando meus
passos. Foi questão de estratégia, pois com a idade que tinha, não poderia ficar
mais esperando pela minha graduação em nível superior”. (Universidade pública)
“Quando acabei o ensino médio não tinha passado em nenhuma faculdade pública
e apareceu o BOLSÃO da UCAM com o curso de Pedagogia, e soube sobre a área
empresarial que decidi fazer”. (Universidade privada).

5“Projeto”: “Escolha precoce de ser professor” e “Escolha de ser pedagogo não-professor”

Estabelecido o primeiro nível da tipologia, procuramos ir além. Separamos os relatos classificados na


categoria “Projeto”, percebemos uma tendência em relatos de estudantes que declararam a escolha
do curso por querer ser professor: chamamos esse tipo de motivação de “escolha precoce de ser
professor”.
Os relatos desse grupo indicaram que muitos estudantes realizaram uma escolha inicial antes do
curso para ser professor em especial por terem atuado na área, em creches ou escolas, ou por vezes
terem trabalhado com crianças em ambientes informais, como nos religiosos. Muitos associam sua
opção por terem alguma inclinação para ensinar.

“Iniciei minha opção pela docência aos 14 anos de idade, quando comecei a dar
aula de explicação particular em casa e percebi que tinha muita facilidade em
ensinar e promover novas formas de aprender aos meus alunos”. (Universidade
pública)
“Ingressei no curso de Pedagogia por ter trabalho em uma creche-escola que me
fez perceber o quanto tinha o dom de ensinar. Ao ver o que as professoras faziam,
procurava fazer o melhor de mim para aprender e fazer até melhor do que elas,
então resolvi me inscrever no curso para ter um conhecimento mais amplo de tudo
o que via e aprendia”.(Universidade privada)

Deve-se notar que dentro da subcategoria “Escolha precoce de ser professor”, encontramos diversos
relatos com justificativas relacionadas ao fato de já terem feito o Curso Normal, como se percebe nas
falas a seguir:

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

“Eu já tinha uma formação na área da educação. Meu ensino médio foi formação
de professores. Quis cursar Pedagogia para dar continuidade a formação”.
(Universidade pública)
“Desde pequena dava aula para as bonecas, sempre tive a vontade de ser
professora. Então, no meu ensino médio fui cursar o “normal- formação de
professores” no Colégio Julia Kubitschek. Foram quatro anos de muito estágio e
paixão. Comecei a faculdade de Pedagogia para uma melhor especialização e
continuar os estudos na área que iniciei no ensino médio”. (Universidade privada)

Percebemos que a maioria dos que cursaram o ensino médio na modalidade normal opta pelo curso
de Pedagogia a fim de dar continuidade à preparação para a docência, “querendo especializar minha
experiência de ser professora” ou por se sentir “despreparada para atuar”, buscando, assim,
aprofundar os estudos na área da docência.
Por outro lado, cabe considerar a necessidade de certificação docente, especialmente a partir da
LDB/96, que criou uma demanda para o profissional que deseja manter-se ou progredir no mercado
de trabalho, uma espécie de imposição para fazer curso de Pedagogia, bem como a atual exigência
de concursos públicos na área de Educação no estado e na cidade do Rio de Janeiro.
Dentro do grupo “Projeto”, percebemos relatos de estudantes que escolheram o curso para ser
pedagogo e atuar em outros espaços educacionais, dentro e fora da escola. São aqueles que estão
realizando o curso de Pedagogia, mas não pretendem atuar no magistério; sua escolha estaria mais
baseada na decisão de atuarem na área de educação, com coordenação, gestão, ou mesmo com
pedagogia empresarial. Entre os relatos desse grupo,. Denominamos essa motivação como “escolha
de ser pedagogo-não professor”. As falas a seguir exemplificam essa categoria:

“Na época do vestibular eu já sabia que queria atuar como RH. Tinha 3 opções:
Administração, Psicologia ou Pedagogia. Administração tem cálculo e eu não iria
me dar bem. Psicologia tem anatomia e eu não consigo ver sangue. Então a opção
que restou foi Pedagogia”. (Universidade pública)
“Se fosse escolher hoje o meu curso, com certeza escolheria outro, pois o professor
está cada dia mais desvalorizado. Como estou “quase” terminando, o que me resta
é a área empresarial e é isso que pretendo quando terminar a Pedagogia’.
(Universidade privada)

Esses estudantes, ao vislumbrarem outras possibilidades dentro da formação por eles vivenciada,
parecem realizar “estratégias de reconversão” (Bourdieu, 2011, p. 105) de sua escolha profissional,
que se apresenta como desvalorizada, numa tentativa de se enquadrar em outras possíveis áreas de
atuação mais vantajosas, não apenas financeiramente, mas que lhes apresentem uma maior
valorização de seu trabalho.

5 “Circunstância” : “Escolha tardia de ser professor” e “Escolha de não-professor e não-


pedagogo”

Percebemos que algumas falas classificadas na categoria “Circunstância” apontavam para um tipo de
escolha em que os estudantes declaravam afinidade com o magistério pelo reconhecimento de uma
“vocação”, muitas vezes descrito por eles quase como um “chamado” durante o curso de Pedagogia.
São estudantes que resolveram se tornar professores após ingressado no curso, criando uma certa
identificação com a profissão docente a partir das vivências durante o curso, realizando o que
chamamos de “escolha tardia de ser professor”. Seguem exemplos de falas dessa subcategoria:

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“Entrar na pedagogia de início não foi a realização de um sonho ou algo assim, mas
com o tempo descobri que era a minha vocação e tenho muito orgulho da minha
graduação”.(Universidade pública)
“Nunca havia pensado em fazer um curso de pedagogia até fazer um concurso
público onde a criança era o público alvo a atender me encontrei ao lidar
diretamente com o ser humano e suas idiossincrasias e resolvi ir mais a fundo,
conhecer o que havia por traz de um ser tão especial. O olhar de uma criança. Já
tive meu filho ainda garota. A questão é que me apaixonei pelo que já era
apaixonada, gente! O ser humano a criança o aluno o saber, saber ensinar lidar
com diversidades. Penso que achei minha vocação. O insight pode ter chegado
tarde, mas chegou!” (Universidade privada)

É possível que o curso de Pedagogia tenha “cooptado” esses estudantes, ou mesmo, quando os
estudantes mencionam que se apaixonaram pelo curso, pode significar que eles são conduzidos a
“ter gosto daquilo a que, de qualquer modo, estão condenados” (Bourdieu, 2011, p. 169). Na leitura
de Bourdieu, gosto é “amor fati, escolha do destino embora forçada, produzida por condições de
existência que, ao excluir qualquer outra possibilidade como se tratasse de puro devaneio, deixam
como única escolha o gosto pelo necessário” (idem).
A necessidade impõe um gosto por necessidade que implica uma forma de adaptação à necessidade
e, por conseguinte, de aceitação do necessário, de resignação ao inevitável, disposição profunda que
não é, de forma alguma, incompatível com uma intenção revolucionária. (Bourdieu, 2011, p. 350)
Observamos que “o gosto como necessidade tornada virtude” pode explicar por que os estudantes
decidam permanecer não apenas no curso de Pedagogia, mas também na profissão de professor, ao
“tomarem gosto pelo ensino”, afinal, já houve um grande investimento e se exigiria mais tempo para
reiniciar uma nova formação no ensino superior.
Ainda no grupo “Circunstância”, alguns relatos dos estudantes trazem evidências de um tipo de
escolha que não se alinhava com as demais. São estudantes que não pretendem atuar na área de
educação. Eles permanecem no curso de graduação, alguns mesmo com certa insatisfação.
Classificamos essa explicação em um tipo que chamamos de “escolha de não-professor e não
pedagogo”:

“Cheguei no curso de Pedagogia sem na verdade querer exatamente Pedagogia.


Embora não seja a área que eu queira trabalhar especificamente, a área de
administração é onde eu realmente quero estar. Eu estou cansada de ser da
Pedagogia, não vejo a hora de deixar de ser da Pedagogia pra buscar novos rumos”.
(Universidade pública)
Meu desejo, na verdade, é realizar pós-graduação em Psicopedagogia e, mais
tarde, buscar graduação em Psicologia. (Universidade pública)

Geralmente, a decisão de mudar de curso é tomada no primeiro ano do curso (Coulon, 2008; Lopes&
Costa, 2007). Os estudantes em questão já decidiram permanecer no curso, e pretendem
futuramente, realizar outra graduação em outra área, como observamos em seus relatos. Gatti e
Nunes (2008) ressaltam que nestes casos, Pedagogia parece ser uma espécie de “seguro
desemprego”.
Os estudantes sabem que precisa da instituição escolar para conseguir melhores empregos. Segundo
Neri (2009), mais anos de escolarização representam uma possibilidade de maior empregabilidade,
bem como ganhos salariais. O curso de Pedagogia desponta como este caminho, especialmente pela
abertura que o diploma de nível superior proporciona para o exercício de futuras atividades
profissionais.

1721
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Por outro lado, a opção de concluir este curso e, em futuro próximo, reingressar em nova formação
universitária (em qualquer instituição de ensino superior sem a realizar novo vestibular e sim uma
prova específica da área) pode parecer como mais viável para quem precisa, na maioria dos casos,
trabalhar para estudar. Mais uma vez, a permanência no curso de Pedagogia aparece como a
“estratégia mais razoável”. A conclusão do curso superior pode acarretar de imediato o aumento de
capital simbólico e social na vida destes estudantes.
O gráfico a seguir descreve a tipologia Projeto ou Circunstância.

Escolha pelo
magistério

Projeto Circunstância

Escolha de ser Escolha de não-


Escolha precoce de Escolha tardia de ser
pedagogo não- professor e não-
ser professor professor
professor pedagogo

Fig. 1. Tipologia do Projeto

6 Conclusões

Os motivos que levam estudantes a escolherem, hoje, o curso de Pedagogia, é a temática central
deste trabalho. Inicialmente esperávamos que majoritariamente os estudantes de Pedagogia
tivessem escolhido este curso para serem professores e descobriríamos as razões da escolha de ser
professor. Entretanto, acabamos constatando, conforme vários estudos apontam: Tarduce (2010);
Gatti (2009), que nem todos os estudantes fazem Pedagogia como curso de formação de professor.
Muitos estudantes estão cursando Pedagogia por outras razões profissionais ou ocasionais. Essa
constatação gerou o primeiro nível da tipologia: “Projeto” e “Circunstância”. Passamos a nos
debruçar, então, nas motivações declaradas nos relatos de ambos os grupos e percebemos
tendências que se manifestavam com mais intensidade; isso nos levou ao segundo nível da tipologia.
Pode-se pensar que se o primeiro nível da tipologia pode ser aplicado a escolhas de estudantes de
qualquer graduação, na medida em que estudantes de graduação, incluindo aqui os de Pedagogia,
escolhem seus cursos por razões mais profissionais ou mais circunstanciais. Entretanto, o segundo
segundo nível da tipologia trata-se de escolhas típicas de nosso conjunto: estudantes de cursos de
Pedagogia.
A análise aprofundada do conjunto de respostas revelou que a opção pelo magistério não é a razão
exclusiva que leva estudantes ao curso de Pedagogia. Entretanto, apesar de ultrapassada tanto pela
psicologia quanto pela sociologia, a idéia do “dom para o magistério” – como algo inato, que se

1722
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

revela ou que se descobre - ainda é citada por muitos estudantes que pretendem ser professores,
seja os que fizeram sua escolha anterior ao curso, seja os que a fizeram posteriormente,
configurando o que denominamos “mito do dom”.
A representação do magistério como “vocação” e a premissas da tendência natural feminina para
desempenho de uma atividade “maior” e superior às demais profissões trouxe uma enorme
ambiguidade para a formação dos professores do 1o segmento do ensino fundamental (antigo
primário). A ideia do “dom para o magistério e da “vocação feminina“ para lidar com as crianças
conecta-se a uma percepção de capacidade natural, que se distancia da percepção da importância da
dimensão científico-técnica da formação profissional. O autodidatismo aliado à vocação/motivação
intrínseca para a atividade não contempla as exigências de conhecimentos das ordens científicas e
técnica para lidar com a complexidade das sociedades, a densidade e diversidade da população que
habita as cidades, nem os desafios dos sistemas escolares em relação à pluralidade cultural e
estratificação social da população que atende.
A tipologia proposta foi fruto da análise qualitativa escolhida para casos em que se buscam opiniões,
crenças e valores (Minayo, 1996). Cabe comentar que comparando a quantidade de relatos
classificados segundo os quatro tipos de escolha, as falas alinhadas com a escolha não-professor e
não-pedagogo representam um número menor de relatos, entretanto afirmados com intensidade
suficiente para justificar a constituição de uma categoria.

Referências

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Carreira Docente No Brasil. Cadernos De Pesquisa, V.40, N.140, Maio/Ago.

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Estudos Pedagógicos Brasília. V. 87, N. 216, 178-187, Ago.

1724
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Contribuições das pesquisas participativas na Formação de


educadores de Jovens e Adultos

Maria Clarisse Vieira1


1
Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, Brasil. mclarissev@yahoo.com.br

Resumo. Este artigo apresenta contribuições das metodologias participativas, em especial a pesquisa-ação,
no contexto da formação de educadores e educação de Jovens e Adultos (EJA). O texto retoma a experiência
desenvolvida no interior do grupo de ensino, pesquisa e extensão em Educação Popular e Estudos Históricos
culturais – Genpex/UnB, com ênfase nas ações de formação de educadores de EJA. A partir do conceito de
comunidade de práticas (Lave & Wenger,1991), o artigo traça algumas contribuições das metodologias
participativas e seu potencial na formação de professores da educação popular e EJA, com base na voz de
educadores e estudantes envolvidos na experiência. O artigo conclui que a pesquisa-ação possibilita ao
futuro professor a vivência e o desenvolvimento de uma prática pedagógica pautada na escuta sensível e no
diálogo. Incorpora vivências de situações formativas que outras abordagens de pesquisa não permitem, ao
aliar produção de conhecimento cientifico concomitante à transformação social.
Palavras-chaves: Metodologias participativas; formação de professores; Educação de Jovens e Adultos

Contributions of participatory research in the training of youth and adult educators


Abstract. This article presents contributions from participatory methodologies, especially action research, in
the context of educator training and in youth and adult education (EJA). The text resumes the experience
developed within the teaching, research and extension group in Popular Education and Cultural Historical
Studies - Genpex / UnB, with emphasis on the training actions of EJA educators. From the concept of
community of practices (Lave & Wenger, 1991), the article outlines some contributions of participatory
methodologies and their potential in teacher training in popular education and EJA, based on the voice of
educators and students involved in the experience. The article concludes that action research enables the
future teacher to live and develop a pedagogical practice based on sensitive listening and dialogue. It
incorporates, the experience of formative situations that other approaches of research do not allow, allying
the production of scientific knowledge concomitant to the social transformation
Keywords: Participatory methodologies; teacher training; Youth and Adult Education.

1 Introdução

A emergência de abordagens participativas de pesquisa está relacionada a inserção em lutas sociais.


Contrariamente às pesquisas de abordagem positivista que se restringem a descrever, explicar e
prever os fenômenos, de maneira neutra e objetiva, a pesquisa-ação situa-se na ótica da mudança
social. Tem a marca de um compromisso com a interpretação, mas, sobretudo, visa transformar a
realidade problematizada.
Ainda que suas origens sejam distintas e remotas é importante mencionar que as primeiras
experimentações com a pesquisa-ação são atribuídas ao filósofo John Dewey , nos anos 20, e a Kurt
Lewin, nos anos 1940, nos EUA. Por sua vez, a vertente latino americana, conhecida como pesquisa
participante, tem seu início nas práticas conscientizadoras e na teoria da libertação, desenvolvidas na
América Latina, a partir dos anos 1950/60, associadas ao legado do educador Paulo Freire e ao
trabalho do sociólogo colombiano Falls Borda. Em conformidade com a tradição brasileira e Latino
americana, a emergência de pesquisas de caráter participativo relacionam-se a razões de caráter
social, político e epistemológico. Ou seja, a pesquisa-ação e a pesquisa participante estão associadas

1725
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

a uma concepção emancipatória, tanto no contexto rural como no urbano, bem como vinculadas a
projetos de educação popular ou de comunicação social. As desigualdades e a realidade social
injusta, em muitos países na América latina, impulsionaram essa configuração, dada a peculiaridade
desses contextos. O compromisso de luta frente às questões sociopolíticas conflituosas motivou o
desenvolvimento de modalidades participativas de pesquisa, com forte vinculação a educação
popular e movimentos sociais.
É intenção deste artigo refletir sobre as potencialidades das metodologias participativas, em especial
a pesquisa-ação, no contexto da formação de educadores e na educação de Jovens e Adultos (EJA). A
Educação de Jovens e Adultos é uma modalidade da Educação Básica cujo público é constituído por
pessoas que durante a infância ou adolescência não tiveram o acesso e/ou permanência na escola,
em idade que lhes era de direito, e retornam aos bancos escolares, buscando o resgate desse direito.
Esses sujeitos, ao mesmo tempo em que vivenciam processos de exclusão social, materializados em
processos de segregação cultural, espacial, étnica e econômica, experimentam, cotidianamente, o
abalo de seu sentimento de pertença social e o bloqueio de perspectivas de futuro social. No estudo
em tela, a formação inicial do educador ocorre no curso de Pedagogia, mediante a oferta de
diferentes disciplinas teórico-práticas que compõem o eixo pedagógico. Uma das áreas presentes no
currículo é a Educação de Jovens e Adultos, que é tratada em espaços curriculares específicos e
também em disciplina optativa do curso. Este artigo retoma a experiência de formação inicial em EJA
desenvolvida no interior do grupo de ensino, pesquisa e extensão em Educação Popular e estudos
históricos culturais – Genpex/UnB, da Faculdade de Educação –FE, da Universidade de Brasília. A
partir das vozes de estudantes e educadores envolvidos nessa experiência, o artigo traça algumas
contribuições das metodologias participativas e seu potencial na formação de professores, na
educação popular e EJA, com base no conceito de comunidades de práticas (Lave & Wenger, 1991).
Os dados foram construídos a partir da análise de diários de bordo e relatórios elaborados pelos
estudantes no período de 2015 a 2016, como também pela observação participante. No tocante aos
aspectos éticos, os trabalhos citados foram autorizados pelos estudantes de Pedagogia a serem
publicados neste artigo, preservando-se o anonimato dos sujeitos.

2 Origens do Genpex e sua atuação na alfabetização de jovens e adultos

A origem do movimento popular na cidade do Paranoá surge, no início da década de 1960, a partir da
ação de trabalhadores responsáveis pela construção da barragem do Lago Paranoá que, após o
término dos trabalhos, ocuparam as casas e barracos existentes nos canteiros de obra. Nas décadas
seguintes, a área ocupada se expandiu com a vinda de novos imigrantes em busca de melhores
condições de vida. A luta em prol da posse definitiva da terra se estrutura e torna-se sistematizada, a
partir dos anos 1970 e 1980, por meio da mobilização de um grupo de jovens, ligados à igreja
católica, que inicia um trabalho político pastoral de conscientização da comunidade. Este grupo se
organiza em uma associação de moradores e passa a pressionar, de forma mais efetiva, o poder
público pela fixação da população e o fornecimento de serviços básicos, como educação, saúde,
água, luz, esgoto, segurança e transporte.
É neste contexto, que percebem a necessidade da Educação de Jovens e Adultos, como forma de
fortalecer a luta e fixação da população na cidade, visto que a maioria dos moradores não era
alfabetizada. Inicialmente, procurou-se apoio da igreja católica local. Mas para que o trabalho se
expandisse, necessitavam de apoio pedagógico. Como naquele momento, esse apoio era negado
pelo Estado, foram buscá-lo, em 1986, na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília. Desde
então, a UnB desenvolve em parceria com o Movimento Popular - Centro de Desenvolvimento e
Cultura do Paranoá (Cedep), trabalho educativo voltado à Educação e formação de educadores (as)

1726
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de Jovens e Adultos na Região administrativa do Paranoá/Itapoã. Como desdobramento desta


parceria é criado em 2000, com registro no Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico e
Científico – CNPq, o Genpex. O objetivo deste grupo é contribuir pedagogicamente com o processo
de alfabetização e formação de alfabetizadores de jovens e adultos do Paranoá e Itapoã e, também,
com o processo de formação dos (as) pedagogos(as) e demais licenciados da Universidade de
Brasília.
O referencial práxico do Genpex traz como fundamento a perspectiva histórico-cultural que
considera a constituição do sujeito parte intrínseca do desenvolvimento humano. Vigotski (2008)
afirma que as características tipicamente humanas resultam da interação dialética do homem com os
seus pares e com o seu meio social, ou seja, ao mesmo tempo em que transforma o seu meio, é por
ele transformado. O sujeito, portanto, se constitui e é constituído pelas relações sociais.
As relações sociais do indivíduo e seu contexto cultural, que viabilizam a tessitura dessas redes,
entretanto, não ocorrem de forma direta, mas sim a partir de processos de mediação simbólica,
efetuados através de instrumentos e signos constituídos historicamente.
O trabalho pedagógico do Genpex é composto pelos seguintes eixos: o acolhimento (amorosidade),
a discussão de situações-problema-desafios e o uso de textos coletivos.
Um dos diferenciais do processo de alfabetização desenvolvido com o Cedep é o acolhimento, a
“amorosidade” com que os alfabetizandos (a) são tratados (Freire, 1996). Parte-se do pressuposto
que quando se atua com pessoas as quais foi negado o acesso à escola e a própria língua escrita,
trabalha-se com pessoas excluídas de várias formas e que não têm como habitual tal acolhimento.
Ser acolhido no processo de alfabetização garante o bem estar do educando e consequentemente a
permanência do mesmo no ambiente escolar. Ao longo de suas trajetórias, os educandos da EJA
passaram por diversas situações de constrangimentos e negações onde não tiveram sua voz
respeitada, o que faz com que muitos cheguem a escola silenciados. A amorosidade tem o papel de
acolher e respeitar esses sujeitos, os quais são seres humanos com bagagem histórica permeada de
saberes. A amorosidade envolve dois aspectos: é preciso saber ouvir, mas também ser ouvido.
A situação-problema-desafio se refere “às necessidades amorosas/afetivas, econômicas, financeiras,
sociais e culturais. Essas necessidades caracterizam o cotidiano vivido/enfrentado pelos moradores
do Paranoá” (Vieira, Reis, & Sobral, 2015,. p. 18). Elas são constituídas por propostas político-
pedagógicas que vão ao encontro das necessidades levantadas pela comunidade. São “escolhidas
com discussão, defesa de posição, votação com maioria simples ou absoluta. Tornam-se o eixo dorsal
de referência do processo alfabetizador” (idem, p. 20). A partir das discussões surgem os
encaminhamentos individuais e coletivos com o propósito de superar essas questões.
O texto coletivo é um processo de transcrição da palavra oral em texto escrito. A construção do texto
coletivo contribui com a desinibição e favorece o empoderamento coletivo dos
alfabetizandos/alfabetizadores/UnB. O processo ocorre por meio do registro e sistematização do
debate e diálogo entre os educandos da EJA, educadores e estudantes da Pedagogia. A partir desses
registros oriundos da oralidade são desenvolvidas as atividades da aula, as quais envolvem a língua
portuguesa, matemática, história, geografia e outros conteúdos. O intuito é valorizar a voz dos
educandos, trabalhar a partir de questões propostas por eles mesmos e que dizem respeito a sua
realidade e encaminhar soluções a esses problemas vividos na comunidade.

3 Desdobramentos do trabalho na atualidade: a socioeducação

Os projetos de educação popular desenvolvidos na região administrativa do Paranoá desafiaram os


membros do Genpex a estender suas ações à Socieoducação. O grupo foi motivado pela presença
significativa de adolescentes e jovens que apresentam defasagem idade-série e que se encontram

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em cumprimento de medidas socioeducativas, aspecto que reforça a condição de exclusão a que


estão submetidos. Além disso, um grupo de estudantes de Pedagogia da UnB solicitou ao Genpex
que fosse criada essa frente, dada a lacuna existente no curso de Pedagogia no tocante à essa área
formativa. Assim, em 2008, o Grupo inicia sua atuação na área da Socioeducação. O trabalho é
realizado por graduandas (os) em Pedagogia junto a adolescentes que cumprem medidas
socioeducativas em uma Unidade de Atendimento em Semiliberdade. (Uast) Taguatinga Sul - DF.
A política de socioeducação é pautada no seguinte marco legal: Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA)/Lei Nº 8.069/1990 e Sistema Nacional de Socioeducação (Sinase)/Lei Nº 12.94/2012. Esses
textos preveem a garantia de direitos aos adolescentes, independentemente de sua condição social,
cultural ou étnico-racial.
Com base nessa legislação é possível afirmar que a socioeducação é uma política pública que resulta
de um processo no qual o Estado e a sociedade civil buscam “meios para a promoção pessoal, social,
educacional, cultural e política de adolescentes autores de atos infracionais, que estando em conflito
com a lei, foram determinados pelo poder judiciário a cumprir uma medida socioeducativa,
conforme dispõe o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA)” (Silva, 2012, p.107).
A política de socioeducação proporciona, portanto, o atendimento socioeducativo a adolescentes
que cumprem medidas educativas. Dentre estas medidas destacam-se aquelas que visam
“desenvolver ações de promoção pessoal e social, trabalho de orientação, educação formal,
atividades pedagógicas, de lazer, esportivas, de profissionalização, bem como demais questões
inerentes ao desenvolvimento do sujeito frente aos desafios da vida em liberdade”(idem, p.107).
A vivência/convivência do grupo na Unidade de Semiliberdade no DF- Casa, a relação social/afetiva
observada, entre graduandos (as) de diversas licenciaturas e adolescentes/gestores da Casa, indicam
o início de um trabalho pautado na amorosidade, confiança e lealdade entre todos (Reis, 2011).
Destaca-se a relevância do Projeto por privilegiar jovens em cumprimento de medidas
socioeducativas em Unidade de Semiliberdade na Cidade de Taguatinga Sul-DF, identificada pelo
grupo como “Casa”, em associação à ideia de família, de aconchego, de amparo, expressão da
compreensão das especificidades desses jovens e adolescentes. A finalidade do cumprimento dessas
medidas, de acordo com as Diretrizes Pedagógicas da Escolarização na Socioeducação da Secretaria
de Estado de Educação do Distrito Federal (2014) é educar para o convívio social, ajudar o
adolescente a ser e conviver de outras formas, haja vista que, como sujeitos em desenvolvimento,
demonstram com o ato infracional quadros de riscos e vulnerabilidades. Em síntese, as atividades
levadas a cabo pelo Genpex junto à socioeducação colaboram para desenvolver um conjunto de
ações socioeducativas que contribuem na formação do menor “de modo que venha a ser um cidadão
autônomo e solidário, capaz de se relacionar melhor consigo mesmo, com os outros e com tudo que
integra a sua circunstância e sem reincidir na prática de atos infracionais” (Brasil, 2006, p.46).

4 Desafios do movimento de educação popular na rede pública de ensino do Paranoá

Até 2015, as atividades de educação e formação em processo de educadores de jovens e adultos do


Genpex eram realizadas nos espaços comunitários. No entanto, a partir de um processo avaliativo
realizado pelo Genpex e Cedep constatou-se a necessidade de continuar o acompanhamento de
egressos da alfabetização do Cedep na rede pública de ensino. A aproximação do espaço da escola
pública teve como pano de fundo algumas questões: como constituir na escola pública o ideário da
educação popular, com base na experiência acumulada em leituras, vivências e experimentações? É
possível superar a concepção cartorial, aligeirada e compensatória da EJA, em favor de uma
experiência que se paute na constituição de sujeitos de amor, poder e saber? (Reis, 2011)

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A partir destas indagações, em março de 2015, decorrente de uma articulação interinstitucional


entre Movimento Popular, UnB e Escola Pública, foi implantado em Escola do Paranoá, Projeto de
inclusão digital para os estudantes do primeiro segmento do Ensino Fundamental da Educação de
Jovens e Adultos. Foram iniciadas atividades no laboratório de informática com vistas a integrar as
linguagens de Português e matemática, com a linguagem informática e a proposta da Educação
Popular, historicamente construída no Cedep, que envolve: o acolhimento dos educandos e
educadores, o trabalho com a situação problema-desafio vivido pelos educandos da EJA e a
construção de textos coletivos, que são eixos do Genpex.
O trabalho desenvolvido no laboratório de informática envolve as quatro turmas do primeiro
segmento da EJA e é coordenado por um grupo de estudantes do Genpex vinculados a universidade
de Brasília. A maioria dos educandos da EJA que participa das atividades afirma que nunca teve
contato com o computador, a não ser para limpar a máquina ou comprar o computador para os
filhos/netos. Neste aspecto, além do trabalho educativo de alfabetização e integração das linguagens
de matemática e Português, o grupo realiza a inclusão digital. Segundo Coelho e Cruz (2008, p.14)
deixar de oferecer aos sujeitos da EJA “a possibilidade de adquirir os conhecimentos necessários a
este novo código de comunicação da sociedade tecnológica, é negar-lhes o direito à plena cidadania,
dada a penetração generalizada das tecnologias digitais na vida contemporânea”. Ou seja, sem o
acesso a esse conhecimento, “terão limitadas oportunidades de acessar informações em sites de
órgãos governamentais,sindicais, de ONGs, informações das quais dependem muitos de seus
interesses como pessoas, como trabalhadores, como cidadãos (Coelho & Cruz, 2008, p. 14).
A práxis que estrutura e sedimenta todas as propostas político-pedagógicas desenvolvidas no
planejamento no laboratório de informática está fundamentada na situação-problema-desafio.
Portanto, a proposta político-pedagógica é construída com base no respeito às histórias de vida e
saberes diversos dos educandos.
No item a seguir, analisamos, com base no conceito de comunidades de práticas (Lave &Wenger,
1991) algumas contribuições das metodologias participativas e seu potencial na formação de
professores, na educação popular e EJA. Com base nos eixos do Genpex, problematizam-se as
significações atribuídas às experiências formativas vivenciadas no contexto da alfabetização de
adultos e na socioeducação.

5 A pesquisa-ação como alternativa de formação e produção de conhecimento: vozes de


educadores em uma comunidade de práticas.

A opção pela pesquisa-ação parte do reconhecimento da necessidade de superar investigações que


se limitam a uma perspectiva diagnóstica e descritiva. De acordo com Michel Thiollent (1985), a
pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica, concebida e realizada em estreita
associação com uma ação “ou com uma resolução de um problema coletivo, e no qual os
pesquisadores e os participantes representativos da situação ou problema estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo” (Thiollent, 1985, p. 14).
Esta concepção de pesquisa vai ao encontro da ideia de Comunidade de Práticas. Este movimento,
que, nos últimos anos ganha espaço no âmbito educacional, nasce fora do domínio educacional e
busca reconceituar os centros educativos como organizações que aprendem e que criam a sua
memória da aprendizagem organizacional.
O termo Comunidades de Práticas teve início com o trabalho de Ethienne Wenger (1998). Segundo
ele, a aprendizagem é uma prática social, no qual o sujeito participa de maneira ativa nas práticas
das comunidades e sustenta o compromisso mútuo na ação; por meio do compartilhamento de
recursos históricos e sociais, que implicam na construção de identidades em relação a essas

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comunidades (Wenger, 1998). Esta teoria tem suas raízes ligadas às ideias de Vigotski, para o qual o
pensamento e a consciência são determinados pelas atividades realizadas com outras pessoas em
um meio social determinado. Um conceito central a esta teoria é o de legitimidade da participação
periférica, cuja ideia básica segundo Bronfman (2011, p.58) é que :

“para un principiante el aprendizaje de un oficio o profesión pasa inevitablemente por la


participación en una comunidad de personas que ejercen ese oficio o profesión
(practitioners). Y esa participación consiste, en lo ideal, en un viaje desde la periferia
hacia el centro de la comunidad y sus prácticas: primero se observa a los veteranos sin
decir nada, luego se aplica lo que enseñan, después se participa activamente en las
conversaciones, finalmente se forma parte parte del núcleo de veteranos que enseñan
(adrede o no) a los nuevos principiantes.

Ao traduzir estas ideias para as relações desenvolvidas no âmbito da formação inicial universitária e
do Genpex, percebe-se que uma comunidade pode ter como prática, por exemplo, o engajamento
coletivo e popular de educadores da própria comunidade para alfabetizar jovens e adultos. Outro
exemplo de comunidade de práticas é o trabalho desenvolvido por jovens universitários junto a
entidade que atua na Socioeducação, bem como o desenvolvimento de estratégias de
enfrentamentos para resolução de problemas pertinentes aos membros de uma escola pública. A
prática formativa desenvolvida pelo Genpex inclui o acompanhamento pelo estudante de Pedagogia
em classes de alfabetização, inclusão digital e socioeducação, atividades as quais visam estimular a
participação coletiva dentro de um grupo cujo repertório de experiências é variado e diverso. O
grupo é formado por professores universitários, estudantes de graduação e pós-graduação, bem
como educadores populares. Para Lave e Wenger (1991, p. 14), esse modo de organização é
denominado de Comunidades de Prática, que “consistem na membresia e dependem dela, incluindo
as biografias /trajetórias, relações e práticas que as caracterizam”. Ou seja, a prática requer um
modo de falar de recursos históricos e sociais compartilhados, dos sistemas ou quadros de
referências e perspectivas que possam sustentar o compromisso mútuo na ação da Comunidade, em
que a continuidade das atividades se define como buscas valiosas e a participação dos membros é
reconhecida como competente, pois há uma identidade própria na e da Comunidade de Prática
(Wenger, 1998).
É estimulada a reflexão e ação na e sobre a prática, bem como o registro das vivências em um diário
de bordo, que é um dos instrumentos de avaliação do processo formativo no grupo. Ao analisar esse
material produzido pelos estudantes percebem-se diferentes formas de aproximação com o exercício
docente na educação de jovens e adultos. Uma das estudantes consegue captar na estrutura da
proposta o vínculo forte com a educação popular. Para ela,
A proposta desde o início (...) foi a construção de um trabalho pedagógico com os
educandos dentro de uma perspectiva de Educação Popular, baseada nos pressupostos
metodológicos específicos, onde as ações estão alicerçadas pelas práxis Freiriana.
Metodologias, conteúdos e intervenções pedagógicas foram centradas e articuladas com
os educandos, sua voz, experiências, anseios, particularidades, relatos cotidianos e
silenciamentos serviram de base para construção de uma proposta pedagógica de
aprendizagem replicada na prática diária, que resultaram na produção de um saber
autônomo e crítico.
A afirmação da estudante traz à tona a intencionalidade da proposta do Genpex: trabalhar com
pessoas excluídas, reconhecendo-as como sujeitos de poder, amor e saber (Reis, 2011). Partir de
uma concepção humanizadora de Pedagogia, tal como preconiza Freire, na qual ao invés de me
“sobrepor aos oprimidos e continuar mantendo-os como quase “coisas”, com eles estabeleço uma

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relação dialógica permanente” (Freire, 2014, p. 77). Ela também percebe o vínculo do trabalho
pedagógico com os princípios da educação popular. Para Brandão (2008), a educação popular não é
uma escola pedagógica, nem uma proposta datada e situada em um tempo específico. Ela é uma
vocação da educação, um instrumento político e cultural de força pedagógica a serviço das classes
populares. Em consonância com o pensamento de Brandão, autores, como Lave e Wenger (1991) da
teoria da aprendizagem situada, afirmam que a educação e a aprendizagem não podem ser
confundidas com a noção de localismo, obrigatoriedade e limitações de um tempo com tarefas
determinadas. Pois, compreendem que a educação e aprendizagem, “(...) é parte integral da prática
social geradora no mundo em que se vive” (Lave & Wenger, 1991, p. 4)
Também segundo Brandão (2008), essa proposta educativa pode ser viabilizada a partir de duas
posturas distintas e não antagônicas: por um lado, com ênfase no seu viés político para preparar as
classes populares para algum tipo de transformação social, subordinada a uma tomada de poder e à
instauração de uma alternativa socialista à sociedade capitalista e opressora; e de outro, com ênfase
no seu viés cultural, como forma de elevar, de uma maneira justa e não supletiva, a qualidade de
vida dos excluídos, a começar pela oferta de um tipo de educação que instaure a plenitude da pessoa
cidadã. Ou seja, é o “entendimento compreensivo que compromete a pessoa na totalidade, em lugar
da ‘recepção’ de um corpo de conhecimento fatual sobre o mundo, e na proposta de que a pessoa, a
atividade, e o mundo se constituem mutuamente uns aos outros” (Lave & Wenger, 1991, p. 4).
Brandão (2008) também argumenta que, ao mesmo tempo em que é necessária a ampliação de
experiências autônomas de uma educação realizada a partir da iniciativa dos movimentos populares,
é também fundamental a redefinição da escola pública de modo a que ela venha a se transformar em
uma educação oferecida pelo Estado, mas que incorpora os anseios, interesses e necessidades das
classes populares.
Outra aluna vinculada ao projeto da Socioeducação afirma que:
(...) As nossas atividades realizadas lá eram muito voltadas para a auto reflexão como: o
que leva o menino infrator a estar ali? O que motiva a sair de lá? Qual era os seus
sonhos, metas, planos antes de parar na Semi?, Sempre buscávamos fazer atividades
que resgatassem o que de melhor ele tinha. Esforçamos-nos muito para levar atividades
que realmente provocassem uma reflexão e esperávamos fazer a diferença na vida
desses garotos (...). Foram dias bem puxados, muitos dias difíceis, sofremos muito com a
falta de transporte, orientação, mas ao final sempre conseguíamos resultados
satisfatórios.
É importante reiterar que em 2015, o Genpex iniciou trabalho de acompanhamento na Escola do
Paranoá, utilizando a informática e a voz dos estudantes como estratégia de intervenção pedagógica.
Com base na partilha e em um trabalho interativo, buscou-se construir o planejamento de
metodologias que pudessem dialogar com a realidade percebida e vivida por cada educando.
No início, foram encontradas algumas dificuldades no desenvolvimento das atividades, pois alguns
professores da escola resistiram à proposta por acreditarem que o conteúdo curricular seria
prejudicado. Não obstante, os estudantes tentaram manter uma perspectiva dialógica e propositiva.
Ao avaliar esse processo, uma estudante assim se manifesta:

Nós da Pedagogia, ficamos responsáveis por essa turma do primeiro horário de segunda-
feira (...) Pude acompanhar a turma e ver o crescimento de muitos, mas também a
frustração de alguns por não conseguirem achar as letras no teclado, ou clicar com o
mouse, e aprendi como é importante nessas horas a figura do professor que motiva e
acredita no potencial do aluno. Muitos queriam desistir, mas quando nós insistíamos e

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eles tentavam mais uma vez e conseguiam realizar o exercício, o que para nós poderia
ser pouca coisa, para eles era uma grande vitória. Foi assim todos os dias, cada um a seu
tempo avançando.

Percebe-se que tanto a prática pedagógica desenvolvida na Escola do Paranoá, quanto a atuação na
socioeducação, é marcada pela escuta sensível das histórias de vida dos educandos, pelo diálogo e
negociação com os gestores e professores acerca da importância do projeto para a aprendizagem e
desenvolvimento dos educandos jovens e adultos. Esse processo é salutar para o reconhecimento e
ressignificação de suas concepções e preconceitos em torno da EJA, processo que ultrapassa o
âmbito das salas de aulas da universidade, e que instaura no educando/futuro professor convicções
acerca das suas opções profissionais.
O semestre mudou muito em mim e naqueles que estão ao meu redor porque foi
perceptível a minha alegria por estar no projeto e por ele ser na EJA, e também a minha
posição com relação a outros assuntos.[...] consegui quebrar muitos preconceitos que
tinha com relação ao Paranoá e o seu povo, e isso só aconteceu por meio das nossas
conversas, dos relatos das vertentes e pela experiência/prática que tive na Escola 03 do
Paranoá.

As afirmações acima revelam que a aprendizagem é um processo que ocorre de forma coletiva e
situada. O desenvolvimento profissional ocorre por meio da interação e do trabalho em grupo, de
modo que o espaço comunitário e as reflexões realizadas no coletivo se tornaram qualificadores do
percurso formativo. Como afirma Bronfman (2011, p.58) “ ante un problema concreto, un individuo
no se limita a pensar en una solución, diseñar un plan y luego ejecutarlo. Al contrario, es en la
situación concreta que encuentra los recursos necesarios”.
A ação educativa no Genpex sinaliza que a pesquisa-ação não é constituída apenas pelo caráter
participativo, mas inclui uma dimensão de produção de conhecimento, útil não apenas para a
coletividade considerada na investigação, mas para um público mais amplo. Participar de atividades
ligadas à pesquisa-ação torna os futuros educadores mais sensíveis aos processos produtores de
desigualdades na sociedade brasileira. Um estudante relata que reencontrou “sentido na educação
através de um dos seus segmentos mais frágeis e ricos: a educação de jovens e adultos”. Ele afirma
que, no grupo Genpex, aprendeu o que é “ dar voz a quem é silenciado, a dar carinho a quem não
conhece o sentido da palavra, a acolher e conquistar através do coração pessoas que desejam mudar
suas vidas”.
Em direção semelhante, outra estudante de Pedagogia relata que se surpreendeu ao presenciar o
dessilenciamento dos educandos. “È bonito demais ver aquelas pessoas sabendo que têm voz”. Ela
nos conta que “ficava admirada com questões de política, direitos, história e muito mais. Aquelas
pessoas possuem um conhecimento muito rico e somente agora que elas estão se dando conta
disso”. Esta estudante reflete sobre os saberes que estes sujeitos constroem ao longo da sua vida, o
que traz à baila a necessidade dos alfabetizandos terem voz, vez e decisão. Para isso, é preciso que
percebam que não são sujeitos que nada sabem, condição na qual eles mesmos se descrevem
quando buscam ou são levados à alfabetização, mas que se vejam como protagonistas de suas
próprias histórias (Reis, 2011).
Uma vez que foram silenciados, “a língua, a palavra são quase tudo na vida humana” (Bakhtin, 2003,
p. 324) encontrar pessoas (alfabetizadoras) que estão dispostas a ouvi-los com amorosidade e
atenção facilita muito a apreensão da alfabetização num sentido amplo, uma alfabetização
transformadora e libertadora. Além de perceber a importância do acolhimento e dessilenciamento,
os estudantes de Pedagogia tornam-se sensíveis às condições desumanas presentes na negação do
direito à educação.Os estudantes de Pedagogia reconhecem que a alfabetização e a escolarização de

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jovens e adultos é algo transformador para os sujeitos da EJA, pois ao se apropriarem da leitura e da
escrita o alfabetizando passa por um processo de mudança pessoal que afeta vários aspectos de sua
vida: “ Tudo muda... suas posturas, de cabisbaixas e silenciosas, até mesmo envergonhadas, para
pessoas mais felizes e sorridentes” (estudante)

6 Considerações finais

Nesse artigo buscamos traçar algumas contribuições das metodologias participativas e seu potencial
na formação de professores, na educação popular e EJA, com base no conceito de comunidades de
práticas. Nossa pretensão não foi a de esgotar as informações acerca desse tema, mas constituir uma
reflexão acerca das possibilidades formadoras da pesquisa-ação. Percebe-se no desenvolvimento do
trabalho do Genpex a intencionalidade de construir uma formação inicial em EJA com base nos
pressupostos da educação popular. Para tanto, a pesquisa-ação possibilita ao futuro professor a
vivência e o desenvolvimento de uma prática pedagógica pautada na escuta sensível, no diálogo, na
amorosidade e no respeito mútuo. As falas dos estudantes revelam que a pesquisa-ação, além de
método de pesquisa, possibilita, no contexto da formação de professores, a vivência de situações
formativas que outras abordagens de pesquisa não permitem.
No contexto da formação, a pesquisa-ação emerge como problematização da realidade ou na
identificação de problemas sociais que atingem determinados grupos sociais. No entanto, para além
da mera identificação, o grupo se reúne para discutir as questões geradoras ou situações desafios
que lhes afligem e a melhor forma de superá-las. Tais situações-problemas são discutidas e
analisadas entre estudantes da Pedagogia, jovens da socioeducação, alfabetizadores e educandos da
Educação de jovens e adultos. Por meio dessa vivência, o grupo intenta romper a clássica dicotomia
entre pesquisa e ação, no qual percebe ser possível aprender e conhecer enquanto transforma, e,
transformar enquanto se conhece e aprende.
A análise das falas revela indícios de que a experiência em uma pesquisa participativa com sujeitos
da EJA forja no estudante uma sensibilidade/compromisso em relação a essa realidade. Formação,
ação e produção de conhecimento são constituídos no cotidiano escolar e no contato com os
educandos e alfabetizadores da EJA. As convicções e preconceitos arraigados são revistos,
propiciando ao futuro educador da EJA uma formação humana, integral e transformadora. Neste
aspecto, o conceito de comunidades de práticas apresenta chaves hermenêuticas à compreensão do
processo formativo de educadores no contexto universitário e prático, ao situar a aprendizagem no
contexto da prática coletiva, histórica e situada. O percurso formativo dos graduandos no
Cedep/Genpex indica mudanças de concepções, de transformações pessoais, bem como das
pretensões profissionais, em função também, da compreensão do processo histórico da comunidade,
da constituição de sua identidade, ou seja, das características próprias que definem a prática/ação do
Genpex, assim como, da compreensão das histórias de vida dos sujeitos envolvidos na alfabetização
e do movimento coletivo que organiza a educação e a aprendizagem, para que ocorra de modo
continuado e coletivo ( Lave & Wenger, 1991).

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Referências

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A pesquisa-ação na formação continuada de professores

Márcia Castilho de Sales¹


Renato Hilário dos Reis²
1
Faculdade de Educação Universidade de Brasília, Brasil. hilarioreis@uol.com.br
² Faculdade de Educação Universidade de Brasília, Brasil. mcastilhosales@gmail.com

Resumo. O artigo apresenta uma experiência de formação continuada numa instituição pública federal, que
acontece na cidade de Brasília-DF, Brasil, no período de 2016/2017, envolvendo os professores do Curso
Técnico em Administração integrado a Educação de Jovens e Adultos. A metodologia utilizada foi a
pesquisa-ação de base marxista, fundamentada nos princípios de Barbier (2005) e Thiollent (2011) foi criada
a partir de uma demanda de formação sobre o currículo integrado. Foram pactuadas uma organização de
procedimentos e avaliação no sentido do grupo se constituir enquanto pesquisadores coletivos e agentes de
transformação da realidade. No período desenvolvido, várias temáticas surgiram como demandas de
formação e como resultado obtivemos a construção de uma proposta integradora entre a Educação
Profissional e a Educação de Jovens e Adultos.
Palavras-chave: Investigação qualitativa; pesquisa-ação; formação continuada; currículo integrado;
educação profissional.

Action research for continuous teacher improvement


Abstract. This article aims to introduce a continuous improvement experience in a public federal institution,
which takes place in Brasilia, Brazil, in the 2016/17 school year, with teachers from Business Technician
Course integrated with Youth and Adult Education. The methodology chosen was marxist-based action-
research, based on the gorunds of Barbier (20055) and Thiollent (2011), and created from a formation
demand in integrated curriculum. Procedures and evaluations were arranged and agreed upon so as to
establish the group as collective researchers and reality transformation agents. During the researching
period, several themes were brought up as formation demands and, as a result, the construction of an
integrating proposal between Professional Education and Youth and Adult Education was obtained.
Keywords: qualitative investigation; action-research; continuous improvement; integrated curriculum;
professional education.

1 Introdução
A pesquisa-ação é uma metodologia de pesquisa que tem sua origem na metade desse século, tendo
como percurssor o Psicólogo Alemão Kurt Lewin (1890-1947), naturalizado norte-americado. Nascia,
assim, uma proposta de pesquisa que tinha a ação como promotora de uma reflexão autocrítica e
objetiva, passando o pesquisador a ser um interventor e um agente de mudança, ora num contexto
macro, ora num micro, objetivando uma transformação de atitude filosófica do pesquisador
envolvido sobre sua própria relação com o mundo.
A pesquisa-ação pode ser desenvolvida em vários espaços sociais que desejam uma intervenção a
partir de um diagnóstico realizado. Ela tem como ponto de partida um problema revelado e o grupo
passa a pesquisar formas de solução. Portanto, ela é uma ação deliberada e que visa uma mudança
no mundo real. Sob essa perspectiva, a pesquisa-ação implantada numa instituição escolar,
trabalhada nas reuniões docentes, pode contribuir muito para que o grupo promova uma autocrítica
e lance mão de estratégias pensadas de solução dos problemas.
Por consequência, essa metodologia foi utilizada numa instituição pública de ensino profissional, em
Brasília-DF, no segundo semestre de 2016, procurando resolver o problema de um curso técnico cuja
integração entre a educação básica e a educação profissional não era promovida, apesar de ter sido

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concebido para esse objetivo. Foi a partir dessa demanda que a pesquisa-ação entrou na instituição
como promotora de reflexões e conhecimentos.

2 A pesquisa-ação existencial de base marxista


Para Thiollent (2011, p. 7 e 8) a pesquisa-ação consiste “em elucidar problemas sociais e técnicos,
cientificamente relevantes” através de pesquisadores, membros ou parceiros interessados na
resolução de problemas ou na solução dos problemas levantados, formulando respostas sociais,
educacionais, técnicas ou políticas em sintonia com o processo desenhado. Para ele, a pesquisa-ação
é um método, ou seja, “um caminho ou um conjunto de procedimentos para interligar conhecimento
e ação, ou extrair da ação novos conhecimentos”.
Diferente da pesquisa participante, a pesquisa-ação vai além da participação, supondo uma forma de
ação planejada de caráter educacional, que nem sempre se encontra em propostas de pesquisa
participante. O objeto da pesquisa é a elaboração da dialética da ação num processo coletivo e único
de reconstrução racional pelo ator social. Pretende-se, no processo, aumentar o grau de
conhecimentos dos envolvidos sobre o tema e o nível de consciência das pessoas e grupos
considerados.
Na pesquisa qualitativa em educação, a pesquisa-ação se propõem a transformação de conceber e de
fazer pesquisa em ciências humanas. Segundo Barbier (2007, p. 36), ela é uma “ação deliberada
visando a uma mudança no mundo real, engajada numa escala restrita, englobada por um projeto
mais geral e submetendo-se a certas disciplinas para obter efeitos de conhecimento ou sentido”.
Para ele, a pesquisa-ação serve à educação do homem cidadão preocupado em organizar a existência
coletiva da cidade e ela torna-se existencial por passar a perguntar sobre o lugar do homem na
natureza e sobre uma ação organizada para dar-lhe sentido, pois as questões são as da coletividade e
não as de uma amostra representativa. Ela tem como base o marxismo pelo reconhecimento que
vivemos em uma sociedade divididos por classes sociais que foram constituídas historicamente em
diferentes modos de produção. Marx (2016) pensa na perspectiva de que a produção existe para o
trabalhador e que as forças das ciências e do conhecimento científico precisam se colocar a serviço
dos trabalhadores, e não ao contrário. Ele defendia então uma educação voltada para o
conhecimento profundo dos conteúdos, ou seja, a compreensão da totalidade do processo
produtivo, permitindo que os estudantes possam produzir conhecimentos e possibilitar o
engajamento social para promover as transformações no sentido de sua emancipação social.
Na pesquisa-ação emancipatória existem os seguintes pressupostos: que os pesquisadores e técnicos
percebam o processo educativo como um objeto passível de pesquisa; percebam a natureza social e
as consequências da reforma em curso e compreendam a pesquisa mesmo como uma atividade
social e política, portanto ideológica. Através dessa metodologia, é possível investigar sobre
situações, exigindo um longo trabalho de grupos, reunindo interessados, pesquisadores e
educadores numa ação deliberada, visando uma mudança no mundo real, engajada numa escala
restrita, englobada por um projeto mais geral e submetendo-se a certas disciplinas para obter efeitos
de conhecimento ou sentido.

2.1 A pesquisa-ação na formação continuada de professores

A formação de professores é a área de conhecimentos, investigação e de propostas teóricas e


práticas que, no âmbito da Didática e organização escolar, estuda os processos dos quais os
professores – em formação ou exercício – se implicam individualmente ou em equipe, em
experiências de aprendizagem através dos quais adquirem e melhoram seus conhecimentos,
competência e disposições e que lhes permitem intervir profissionalmente no desenvolvimento do

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seu ensino, do currículo e da escola, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação dos seus
estudantes e do seu aprendizado como desenvolvimento humano de professores e professoras.
Como atividade coletiva, a formação continuada pode ser compreendida como um processo que
propicia o desenvolvimento profissional do professor, que ao refletir sobre o que sabe, o que sabe
fazer, tem a oportunidade de troca com seus pares, criando condições efetivas de mudanças com e
nas práticas político-pedagógicas.
A fim de que o cotidiano escolar se torne um espaço significativo de educação profissional, é
importante que a prática pedagógica seja práxica no sentido de identificar problemas e resolvê-los e,
acima de tudo, seja uma ação coletiva, construída por professores (as) e grupo de professores(as) de
uma determinada escola, em que todas e todos são cúmplices e igualmente responsáveis por ela.
A proposta de implantação da pesquisa-ação na formação continuada de professores é fruto da
compreensão de que o espaço de encontros de professores para planejamento do ensino é um
espaço de pesquisa, pois nos diversos diálogos emergem problemas de ensino e aprendizagem que
afligem cotidianamente nossas instituições de ensino. Muitos desses problemas são recorrentes,
exigindo do corpo docente, técnico administrativo, discente e da comunidade, análise aprofundada
de suas múltiplas determinações, com encaminhamentos e exercitação de superação. O grupo pode
ainda não conseguir romper o senso comum, por falta de aprofundar o olhar sobre o fato. Também
acontece com muita frequência de um fato acontecer na escola repetidamente e ele ser
naturalizado, passando a ser tratado como algo que não pode ser alterado. Dessa forma, a formação
continuada na escola deve acontecer nos momentos de coordenação pedagógica ou de
planejamento de ensino, fazendo com que todos possam contribuir refletindo e tomando posição
sobre as estratégias de superação que serão escolhidas. Esta questão coloca a idéia da pesquisa
como um princípio educativo fundamental na formação de professores, como um pilar da maior
importância na perspectiva de construção de modelos de formação docente.

3 Metodologia
Em 2016, uma instituição pública de ensino de Brasília-DF demandou para a universidade pública a
preocupação sobre o fato de que no curso técnico desenvolvido para integrar educação profissional
com a educação de jovens e adultos, a integração não acontecia, uma vez que o currículo estava
sendo desenvolvido de forma desarticulada, não promovia o diálogo entre e com educação básica e
educação profissional, não alcançando, em decorrência, os objetivos de integração a que se
propunha.
Em função desse problema identificado, propomos ao grupo a metodologia de pesquisa-ação, do
tipo: a ação pesquisa (Barbier, 2007). Este tipo de pesquisa-ação pressupõe que o pesquisador esteja
intervindo e desenvolvendo mudanças requeridas no contexto de realidade da pesquisa. A ênfase
aqui é no processo, e não no resultado.
Cabia ao grupo de professores, a partir da negociação realizada para a organização dos tempos,
espaços e discussões, encontrarem de forma compartilhada e em parceria as soluções mais efetivas.
O objetivo maior é que resulte da investigação uma ação crítica-libertadora.
Como consequência, alguns cuidados foram tomados para que a pesquisa-ação fosse concluída de
forma exitosa na organização do processo. Busca-se a essência do objeto e não se trabalha com
interpretações de racionalidade, de objetividade e de verdade. Assim, as ideias interpretativas
deformadas eram desconsideradas. Como o a elaboração da dialética da ação é coletiva e pessoal, a
pesquisa-ação deve assumir a dimensão filosófica da existência humana qualificada.

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O processo de pesquisa-ação decorre de uma avaliação permanente que está expressa na seguinte
espiral:

Fig. 1. O processo da pesquisa-ação existencial de base marxista.

Na pesquisa-ação a sistematização (teorização) decorre de uma permanente avaliação, como no


processo de espiral expresso na figura acima. A partir de uma situação problema/desafio, o grupo
define um planejamento para investigação e promove a ação (intervenção, prática etc.) que é
avaliada, surgindo uma sistematização do vivido e experimentado. Isso permite uma retroação sobre
o problema, promovendo outro planejamento e mais uma ação, avaliando-se os procedimentos e
avançando na compreensão do objeto para as mudanças necessárias. A pesquisa-ação, muito mais
do que outra pesquisa, suscita mais questões do que as resolve. Isso justifica o movimento em
espiral.

3.1 Procedimentos da pesquisa-ação no espaço de formação continuada

A proposta metodológica de pesquisa-ação nessa instituição partiu de um problema evidenciado


pelo grupo no processo de desenvolvimento do curso, uma vez que para implantá-lo, existiu uma
oferta de formação aos docentes sobre a concepção do currículo integrado na educação profissional.
Diante dessa constatação, o grupo no primeiro momento (2015) tentou adequá-los, definindo mais
estratégias de intervenção que não lograram êxito. Dessa forma, evidenciou-se que quanto mais
procuravam reformar o curso, mais se afastavam da concepção de currículo integrado. Assim,
reunidos numa conversa dialógica/dialética, foram estabelecidos pelo grupo os seguintes
procedimentos metodológicos:
1) Identificação do problema: a partir de uma dialogia com os docentes, procurar definir o problema,
o objeto. Os pesquisadores coletivos levantaram o seguinte problema: Como desenvolver uma
formação integrada da educação profisional? Como desenvolver um currículo integrado na formação
técnica? Em vista disso, tendo o grupo a clareza do que desejamos alcançar, passamos então a
contratualização;
2) Contratualização da pesquisa coletiva: no processo de pesquisa, a negociação é permanente e
primordial. Todo o consenso bem como todos os conflitos devem ser compreendidos nas suas
dimensões, não dissimulando os verdadeiros problemas. Definiu-se um processo permanente de
avaliação, que permitiu a elaboração de agendas, definição de pautas e prazos para o alcance dos
objetivos propostos. Observa-se que o processo parte do objeto abordado (problema identificado),
vai para o objeto construído (problema visto na sua totalidade) e finaliza no objeto constatado ou

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construído (problema em processo de intervenção). Dessa forma, ficou definido na nossa


contratualização:
• Encontros coletivos semanais;
• Escrita coletiva do diário de itinerância;
• Definição de tarefas e prazos para os pequenos grupos;
• Recuperação do encontro anterior no início das reuniões faríamos;
• Avaliação ao final do encontro;
• A metodologia de trabalho para resolução do problema ficou assim definida:
✓ Diálogo com o grupo sobre levantamento de hipóteses e soluções;
✓ Desenvolver a reflexão/ação na ação;
✓ Análise dos resultados, avaliação, teorização e retroplanejamento;
✓ Comparação de experiências semelhantes;
3) Técnicas de pesquisa: todas as técnicas usuais das ciências sociais são suscetíveis, pois podem
contribuir com a resolução do problema. No nosso caso, utilizamos a pesquisa documental, os dados
de evasão e repetência do curso e depoimentos de estudantes. Esses dados embasaram a decisão do
grupo no sentido de promover as mudanças necessárias à integração curricular e obter maior
permanência e aprendizagem das/os estudantes.
4) Observação participante: para que o pesquisador externo se torne efetivamente um pesquisador
coletivo nessa metodologia, ele deverá ser aceito pelo grupo ou fazer parte dele. Ele assume o papel
de mediação do grupo, tendo através da escuta sensível, a oportunidade de pontuar situações ou
temáticas necessárias para construção de uma sintese pelo grupo. Responsabilidade e solidariedade
são capacidades necessárias para o trabalho de investigação coletiva.
5) Diário de itinerância: ele é um instrumento de investigação que tem dupla função: a primeira de
promover a reflexão coletiva e os registros construídos pelo grupo, a segunda por promover uma
autocritica, pois o sujeito pode avaliar sua tragetória na pesquisa. Dessa forma, desenvolvemos o
diário do pesquisador coletivo e outro diário elaborado por cada pesquisador e socializado no grupo a
cada encontro. Com efeito, a elaboração do diário coletivo era realizado por membro do grupo eleito
no encontro, promovendo um rodízio de contribuições e olhares diversos. Cada participante podia
também socializar no grupo o que aquele encontro lhe rendeu outro significado, o que promoveu
nele uma mudança de comportamento ou visão. Assim, todos construíram resignificados e
desenvolveram as mudanças necessárias. No caso deles, a decisão foi de construir um novo plano de
curso que possibilitasse a integração entre a educação profissional e a educação básica de forma
efetiva.
6) Teorização (sistematização), avaliação e publicação dos resultados: a pesquisa-ação propõe um
movimento na instituição e entre seus atores que exige uma avaliação permanente, pois a
construção de planejamentos interventivos e o feedback dessas estratégias deverão ser socializadas
e avaliadas em grupo, ou seja, pelo pesquisador coletivo. O resultado de todo o processo foi
sistematizado no plano de curso construído pelo grupo ao longo de seis (6) meses.

A construção de uma nova proposta de formação integrada objetiva constatar que a antiga proposta
não desenvolvia plenamente uma formação humana e integral, não alcançando pela instituição os
anseios da comunidade e sociedade.

4 As dimensões da pesquisa-ação atendidas na formação continuada de professores


Uma das dimensões mais trabalhadas na pesquisa-ação existencial é a do coletivo. Ao contrário da
pesquisa tradicional, que procura no espaço investigado os dados para desenvolver sua análise, a
pesquisa-ação só é desenvolvida se for acolhida pelo grupo e desenvolvida de forma colaborativa. Na

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formação continuada ela é um fator de dialogia determinante, pois legitima a parceria e a construção
coletiva. Os pesquisadores coletivos passam a buscar soluções para algo que importa a todos, e não a
um grupo reduzido. Compreende que a escola é uma instituição constituída pela atuação do coletivo,
e ela expressa as concepções do grupo, portanto, os problemas devem ser resolvidos por todos e o
ganho e resultados positivos chega para docentes, discentes e comunidade. Assim, amplia-se a
compreensão que a escola é de todos, deve estar articulada aos anseios da comunidade e produzir
conhecimentos que sejam transformação das/os estudantes, das/os professoras/es, gestores, e do
conjunto da comunidade.
Transformar os sujeitos da escola como protagonistas é um desafio. Ao contrário de se permitir
investigar, transformando-se em ratos de laboratório, os docentes passam a difundir conhecimentos,
na busca permanente de sua emancipação. Eles incorporam o hábito de promover uma ação-
reflexão-ação permanente do seu fazer pedagógico. A práxis é o critério de verdade, pois o grupo
sabe melhor o que precisa para avançar. Dessa forma, a pesquisa-ação existencial de base marxista
permite uma certa flexibilidade, abrindo para situações de improvisação, criatividade e intuição,
pontos tão pouco considerados na pesquisa tradicional e muito explorados na definição de
procedimentos e estratégias pelo grupo. Ela também não abre mão da implexidade, pois o
pesquisador coletivo está presente com todo seu emocional, sensitivo, axiológico e na pesquisa ele
forja o seu ser dubitativo, metódico, crítico e mediador. A escuta sensível é uma habilidade que
necessariamente precisa ser constituída pelo grupo. Compreender o interior do outro exige
sensibilidade, desprendimento e afetividade. É a partir do acolhimento do outro que se promove a
confiança de partilhar problemas e soluções.

5 Conclusões
A formação continuada de professores é ainda um espaço pedagógico pouco explorado. Em muitas
instituições educacionais que dedicam o tempo para o professor desenvolver o planejamento
coletivo, observa-se que eles direcionam suas atividades para os afazeres individuais, ou mesmo que
estejam reunidos, recebem as demandas pedagógicas e as encaminham automaticamente, sem
refletir sobre suas decisões e práticas. Vão assim, constituindo rotinas e perpetuando práticas que ao
contrário de provocar as mudanças qualitativas, se somam ao senso comum e as reformas
educacionais.
A pesquisa-ação é uma ação coletiva de um conjunto de pessoas (pesquisadoras/es coletivos) que
pressupõe mudança de atitudes, comportamentos, situações, organização e funcionamento
societário. Se questiona uma ordem estabelecida e os consensos de uma maioria. O conflito é
inerente a pesquisa-ação, mas é um conflito criador e produtor de vida.
Esse é o desafio posto nos dias atuais. Romper com lógicas de formação, onde o estudante apenas
recebe a informação já está superada. A proposta também de formar docentes com cursos de
capacitação, especialização e extensão nem sempre muda o contexto da escola, onde os problemas
continuam a existir de forma estrutural. A pesquisa-ação é a possibilidade dos docentes
mergulharem nos seus próprios problemas e avançarem nas soluções reais e concretas do seu fazer
pedagógico.

Referências
Barbier, R. (2007). A Pesquisa-ação. Brasília: Liber Livro Editora.
Marx, K. e Engels, F. (2016) Educação, ensino e marxismo. São Paulo: Edições Iskra.
Thiollent, M. (2011). Metodologia da pesquisa ação. São Paulo: Cortez.

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Pedagogia dialógica de Paulo Freire e pesquisa qualitativa em


Educação Musical: compartilhando aprendizagens

1 2
Denise Andrade de Freitas Martins , Luiz Gonçalves Junior
1
Universidade do Estado de Minas Gerais, Brasil / PDSE-CAPES. deniseafmartins@outlook.com
2
Universidade Federal de São Carlos, Brasil. luiz@ufscar.br

Resumo: Neste artigo, descrevemos os processos de Metodologia de Intervenção (procedimentos


relacionados à construção da Música Geradora a partir da Pedagogia Dialógica de Paulo Freire) e
Metodologia de Pesquisa (procedimentos de coleta e análise de dados da citada intervenção pautados na
Fenomenologia), realizadas junto à comunidade participante de um projeto de extensão universitária
intitulado Projeto Escrevendo o Futuro (PEF) – (Re) cortando papéis, criando painéis, no qual é realizada a
prática social de educação musical. No PEF participam pessoas de diferentes origens socioeconômicas,
culturais, étnico-raciais e que têm em comum o interesse pelo ensinar e/ou aprender música. As categorias
que emergiram com base na análise dos dados coletados na intervenção foram: A) Fortalecimento da
identidade; B) Respeito ao outro; C) Desejo de ser mais.
Palavras-chave: Processos Educativos; Educação Musical; Pedagogia Dialógica.

Dialogical pedagogy of Paulo Freire and qualitative research in Music Education: sharing learning.
Abstract: In this article, the intervention Methodologies (procedures related to the construction of
Generating Music from the Dialogical Pedagogy by Paulo Freire) and Research Methodology (procedures for
collecting and analysing data of the previously cited intervention in accordance with Phenomenology) are
described, carried out cohort with the participating community in a university extension named Writing the
Future Project (WFP) - (Re) cutting papers, creating pannels, in which the social practice of musical
education is performed. In the WFP people from different social-economic, cultural and ethnic-racial
backgrounds participate and who have the interest in teaching and/or learning music in common. The
categories which emerged based on the analysis of the data collected in the intervention were: A) Identity
strengthening; B) Respect for others; C) Wish for improving.
Key words: Educational Processes; Musical Education; Dialogical Pedagogy.

1 Introdução

Neste artigo, descrevemos os processos de Metodologia de Intervenção (procedimentos


relacionados à construção da Música Geradora a partir da Pedagogia Dialógica de Paulo Freire) e
Metodologia de Pesquisa (procedimentos de coleta e análise de dados da citada intervenção
pautados na Fenomenologia), realizadas junto à comunidade participante de um projeto de extensão
universitária intitulado Projeto Escrevendo o Futuro (PEF) – (Re) cortando papéis, criando painéis, no
qual é realizada a prática social de educação musical.
Em acordo com Martins (2015) o PEF é um projeto de extensão da Universidade do Estado de Minas
Gerais (UEMG), Unidade Ituiutaba, criado em 2007, em parceria com o Conservatório Estadual de
Música Dr. José Zóccoli de Andrade, cujas intervenções envolvem atividades artísticas e musicais
(eventos sonoros, excursões culturais e oficinas artísticas) realizadas junto aos/as estudantes de uma
escola de educação básica, a Escola Estadual Governador Bias Fortes, localizada na cidade de
Ituiutaba, Minas Gerais, Brasil, os quais integram a Educação Integral1.

1 A Educação Integral é um programa de intervenção pedagógica da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais,
Brasil (SEE/MG/BR), cujo objetivo é recuperar alunos/as com dificuldades de aprendizagem.

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No ano desta intervenção, 2012, participavam do PEF estudantes da citada escola (de nove a doze
anos), seus responsáveis (pais, mães ou responsáveis) e educadores/as (da escola sede, da
universidade e da escola de música, a saber: estudantes-bolsistas, professores/as, coordenadores/as,
supervisores/as, vice-diretores/as, diretores/as, funcionários/as). Assim, a comunidade participante
do PEF foi organizada em três grupos: estudantes, responsáveis, educadores/as. Os estudantes foram
chamados de participantes colaboradores/as, já que a participação de cada um/a deles/as nas
atividades era sempre voluntária e não obrigatória, mesmo sendo uma prática realizada em
ambiente escolar. As pessoas responsáveis por esses estudantes foram chamadas de responsáveis, e
as demais pessoas com as quais eles/as conviviam semanalmente no desenvolvimento das atividades
foram chamadas de educadores/as (Martins, 2015).
Em suma, no PEF participam pessoas (estudantes, educadores/as e responsáveis)2 de diferentes
origens socioeconômicas, culturais, étnico-raciais e que têm em comum o interesse pelo ensinar
e/ou aprender música.
Na convivência destas pessoas participantes do PEF há, como princípio, o exercício assegurado da
interculturalidade, a qual assumimos a perspectiva explicitada por Santos e Meneses (2010) que
observa “[...] o reconhecimento recíproco e a disponibilidade para enriquecimento mútuo entre
várias culturas que partilham de um dado espaço cultural” (p.16), que é construída no processo
mesmo de reconhecer a reciprocidade e a riqueza que essa experiência pode fomentar, com a
necessária crítica e diálogo simétrico entre os envolvidos (Candau, 2008; Freire, 2008; Silva, 2000).
Por Educação Musical, compreendemos ser todo fazer musical que ultrapasse a noção de pura
instrumentação e teorização musical, abarcando outras dimensões do saber fazer, como questões
sociais, políticas e culturais (Souza, 2014; Kater, 2004). Prossegue Souza (2014) que a educação
musical é multidimensional principalmente em projetos sociais, já que inclui as dimensões acústicas,
estruturais e emocionais, promovendo envolvimento das pessoas e sentimento de “eu posso”.

2 Metodologia de pesquisa

De natureza qualitativa, a metodologia de pesquisa constou de procedimentos de coleta e análise de


dados inspirados na Fenomenologia em uma intervenção junto a um projeto de extensão
universitária envolvendo a prática social de educação musical, sendo o procedimento central da
coleta de dados o registro em diários de campo das observações do dia a dia da intervenção.
Em acordo com Bogdan e Biklen (1994), diário de campo “[...] é o relato escrito daquilo que o
investigador ouve, vê, experiencia e pensa no decurso da recolha e reflectindo sobre os dados de um
estudo qualitativo” (p.150). Para o autor e autora:

[...] as notas de campo consistem em dois tipos de materiais. O primeiro é


descritivo, em que a preocupação é a de captar uma imagem por palavras do local,
pessoas, ações e conversas observadas. O outro é reflexivo – a parte que apreende
mais o ponto de vista do observador, as suas ideias e preocupações (p.152).

Após diversas leituras dos registros dos diários de campo (DC, seguidos de algarismos romanos
conforme ordem crescente do registro em diários), ao percebermos unidades significativas (US,
representadas por algarismos arábicos), estas foram agrupadas em categorias temáticas
(representadas por letras alfabéticas maiúsculas) conforme inspiração na Fenomenologia (Martins &

2 Todos os nomes são fictícios e foram escolhidos pelos próprios participantes da pesquisa. A investigação foi aprovada
pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de São Carlos conforme Parecer
N°.050/2012.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Bicudo, 1989; Gonçalves Junior, 2008), objetivando movimento intencional em busca da essência do
fenômeno pesquisado.

3 Metodologia de intervenção

A Metodologia de Intervenção foi construída com base na Pedagogia Dialógica do educador brasileiro
Paulo Freire (1967, 2005, 2008), cujos procedimentos se relacionam à Música Geradora,
compreendida como o passo a passo do processo de construção-reconstrução de uma possibilidade
dialógica e intercultural de educação musical realizada junto à comunidade participante no PEF. Dela
constaram dois momentos: o levantamento, onde foram adotados os procedimentos de intervenção
(questionário, entrevistas, reunião) e o desenvolvimento (encontros, criação de partitura, viagem,
apresentação musical).
A metodologia de intervenção (realizada após assinados os termos de consentimento livre e
esclarecido - TCLE) foi realizada no período de maio a dezembro de 2012, contando com um total de
67 (sessenta e sete) pessoas: 31 (trinta e um) participantes colaboradores/as; 29 (vinte e nove)
responsáveis; 7 (sete) educadores/as. Inicialmente foi aplicado um questionário aos participantes
colaboradores/as, para saber o seu gosto musical, e, em seguida, para aprofundar conhecimentos
acerca dos gostos musicais, foi aplicada uma entrevista à comunidade participante no PEF, por
considerarmos que todos/as deveriam decidir o que, com quem, quando, como e onde fazer, ou seja,
não apenas os educadores/as. Esse é um exercício inspirado na Pedagogia Dialógica do educador
brasileiro Paulo Freire (1967, 2005, 2008), nas quais as pessoas envolvidas escolhem e decidem
conjuntamente, em comunhão, em reconhecimento e respeito à diversidade e diferenças entre as
pessoas.

3.1 Por que Música Geradora?

Paulo Freire (1967, 2005, 2008), estudioso e comprometido com o povo brasileiro e a educação, vista
como sendo uma prática libertadora, propôs um método de alfabetização para adultos na década de
1960, na cidade de Recife, capital do estado de Pernambuco, Brasil, onde o diálogo foi a condição
fundamental. Reunidos em círculos de cultura, estudantes e educador/a conversavam sobre as coisas
do mundo e da vida, da concretude da realidade vivida. O papel do educador/a se reservava a mediar
as situações de aprendizagem, oferecendo os instrumentos necessários para tal, colaborando e não
impondo conteúdos.
Esse método tem como ponto de partida as chamadas palavras geradoras, que, de acordo com
Freire (1967), “[...] são aquelas [palavras] que, decompostas em seus elementos silábicos, propiciam,
pela combinação desses elementos, a criação de novas palavras” (p.111). Tomando como referência
o termo palavra geradora de Freire, é que se propôs o termo Música Geradora, de modo a
representar o processo e resultados da pesquisa realizada, a partir da convivência entre as pessoas
participantes com base no diálogo, respeito e colaboração, cujas situações vivenciadas geraram ao
que chamamos de processo de construção-reconstrução de uma possibilidade dialógica e
intercultural de educação musical.
Na compreensão de Freire (1967), cultura é, em um primeiro momento, subsistência. Da
comunicação mediada entre as pessoas, do encontro entre consciências, temos um mundo
transformado e humanizado por essas pessoas, onde se ratifica o conceito de cultura. Cultura são as
coisas da natureza transformadas pelo ser humano. Assim, o termo gerador apresenta outras
dimensões da realidade, que são as necessidades fundamentais, aspectos esses fornecidos pela
discussão. Em situações como essas, investigador/a e pessoa investigada são, ambos, sujeitos da
investigação. O método dá mostras de que contém um sentido catártico, porque possibilita a

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apreensão de vários aspectos advindos das discussões de situações existenciais. As pessoas,


primeiro, descrevem a realidade, como simples observadores/as, para depois passarem à análise da
situação. É a passagem da pura descrição para a problematização da situação.
Nesse sentido, Gonçalves Junior (2009) observa que uma pedagogia dialógica, libertadora, pressupõe
o diálogo a partir das perguntas feitas pelo próprio educador/a (o que, com quem, onde) em relação
ao seu trabalho. Não se trata de vez ou outra dar voz aos estudantes. Assim, Gonçalves Junior (2009)
apresenta a pedagogia dialógica de Freire em três momentos (equiprimordiais e inter-relacionados),
que são: Investigação temática: “[...] descobrir o que as pessoas já sabem, que leitura fazem do
mundo e qual assunto/temática lhes afeta e interessa (proporcionam tema gerador). Descobrindo o
que sabem aprimoramos juntos os conhecimentos, educando e nos educando, partindo do saber de
experiência feito” (p.705); Tematização: “[...] o educador é aquele que incentiva e motiva a partir da
palavra, do tema gerador. O diálogo se faz necessário para percebermos posturas, posições, pontos
de vista distintos, modos de perceber o mundo, e, de modo igualitário, compartilhar conhecimentos”
(p.705); Problematização: “[...] momento do engajamento, do compromisso emancipador solidário
daquele conhecimento, da construção-reconstrução do mundo lido, da transformação das condições
de vida, da libertação” (p.705).
Para Ribeiro (2009), o uso de metodologias baseadas no método de alfabetização de Freire propicia
que as experiências realizadas sejam sublinhadas do “[...] aspecto coletivo de um exercício
construído a partir de diferentes saberes e práticas musicais” (p.108); um saber plural. Ainda,
práticas como essas encontram no pensamento de Freire a fundamentação adequada para se refletir
sobre “[...] a necessidade de a prática educativa [...] estar aberta à diversidade e aos diferentes
contextos sociomusicais em que os estudantes estão envolvidos” (p.109).

3.2 Momentos da pesquisa: investigação temática, tematização, problematização

No que se refere à Metodologia de Intervenção, construída com base na pedagogia dialógica de


Paulo Freire (1967, 2005, 2008), a partir do termo Música Geradora (o passo a passo do processo de
construção-reconstrução da práxis musical dialógica intercultural realizada junto à comunidade
participante no PEF), compartilhamos com Gonçalves Junior (2009) a ideia de que as atividades
foram realizadas em três momentos (interdependentes e equiprimordiais): Investigação Temática:
inserção na escola, encontros com professores/as e diretores, levantamento do universo musical-
cultural das pessoas envolvidas (aplicação de questionário) e aprofundamento do gosto musical
(aplicação de entrevista)3, encontro com a comunidade participante para apresentação dos
resultados dos dados coletados, elaboração de proposta de intervenção e solicitação de autorização
para realização da pesquisa; Tematização: decisão compartilhada do passo a passo da intervenção
(estudo, leitura e transposição musical, escrita e recriação das músicas e canções, brincadeiras e
dramatizações, definição do cronograma de atividades – datas/locais); Problematização: construção-
reconstrução compartilhada da intervenção (dia a dia problematizador dialogando sobre
possibilidades, recursos, aprendizagens, dificuldades, significações, transformações).
No momento da Investigação Temática, os estilos musicais mais citados pelos/as participantes da
pesquisa foram música infantil, sertanejo, música de igreja e sertanejo universitário, além de funk e
música folclórica. No entanto, a escolha do repertório a ser realizado não se pautou nos indicadores
numéricos dos estilos citados pela comunidade participante, mas em decisão compartilhada a partir

3 As entrevistas foram realizadas uma a uma, ao longo dos meses de junho e julho de 2012, em forma de visita nas casas
dos/as participantes colaboradores/as, visitas de observação (Freire, 2005, p.122), e/ou nas escolas onde trabalhavam as
pessoas envolvidas (Escola Bias Fortes, Conservatório, UEMG/Ituiutaba), obedecendo-se dias e horários previamente
agendados, combinados entre as pessoas. Observamos que as falas foram mantidas na íntegra, inclusive quando com
eventuais erros gramaticais e de concordância do ponto de vista da língua portuguesa padrão.

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de novo encontro, assim: sertanejo universitário, sertanejo, música de igreja, canção de domínio
público e canções infantis. Seria a pedagogia do encontro, em Fleuri (s/d), compreendida como um
verdadeiro desafio metodológico, já que pesquisas em Educação, envolvendo pessoas de diferentes
culturas em práticas musicais interculturais, oferecem desdobramentos e/ou resultados
imprevisíveis.
No momento da Tematização três grandes dificuldades se colocaram à vista: a reduzida garantia de
fidelidade de material musical disponível em sites de pesquisa; a necessidade de transposição
musical do material recolhido, em função da extensão e qualidade vocal dos/as participantes
colaboradores/as (nove e doze anos de idade), além dos instrumentos musicais disponíveis (em sua
maioria, xilofones diatônicos, nos quais só se poderiam executar músicas em três tonalidades, a
saber: Dó maior, Lá menor e Fá maior); e pela reduzida literatura (impressa ou eletrônica) disponível,
ainda hoje, do estilo sertanejo e sertanejo universitário, muito em voga na região sudeste do Brasil.
O momento da Problematização, marcado de muitas realizações, mas também conflitos (vivenciados
e negociados culturalmente, socialmente e politicamente no dia a dia da convivência), não
promoveram uma educação de mão única, de transmissão de um conhecimento acabado, imutável e
formal, ao contrário, deram lugar a uma multiplicidade de conhecimentos em permanente
construção, mutáveis e dinâmicos pela própria diversidade cultural das pessoas envolvidas (Candau,
2008).

3.3 Compartilhando aprendizagens

Da Metodologia de Pesquisa, realizada com base na anteriormente descrita intervenção emergiram,


com base nas análises, as seguintes categorias: A) Fortalecimento da identidade; B) Respeito ao
outro; C) Desejo de ser mais. Na categoria A, Fortalecimento da identidade, o reconhecer-se de cada
pessoa envolvida e o fortalecimento das identidades, aconteceu no exercício dialógico subjetividade-
intersubjetividade, estabelecendo redes de conexão e interatividade, tanto em relação aos gostos e
estilos musicais, como pelo interesse compartilhado por canções, objetos, artefatos e instrumentos
musicais.
No encontro do dia dezesseis de outubro, cantando-se a canção sertaneja Pare, de Zezé de Camargo
e Luciano (2011), a participante colaboradora Peti cantou: Pare, agora, senhor juiz, pare, agora.
Perguntada onde tinha ouvido essa canção, respondeu: Eu vi na televisão em um comercial de DVD.
Tratava-se de um trecho da canção Pare o casamento, de Wanderléa (1992). Nesse momento, a
educadora Josy sugeriu a inserção do trecho da canção Pare o casamento de Wanderléa na canção
Pare de Zezé de Camargo e Luciano. Todos gostaram da ideia, passando a trabalhar em forma
fusionada, com a seguinte sequência: Pare, Zezé de Camargo/Pare o casamento, Wanderléa/Pare,
Zezé de Camargo (DC V A-5). Ainda, criou-se uma intervenção teatral, na qual Josy usaria no dia da
apresentação da Música Geradora uma peruca de cabelos longos e louros, relembrando a cantora
Wanderléa (DC XXIV C-5), e tudo era motivo de muita risada e alegria.
Na categoria B, Respeito ao outro, observou-se o quanto os/as participantes colaboradores/as se
envolveram nas atividades, respeitando e reconhecendo os saberes do outro, ensinando e
aprendendo uns com os outros, tocando, cantando, montando equipamentos, fotografando, criando
a partitura da Música Geradora (registro das canções, textos, falas e brincadeiras, como resultado do
processo de cooperação criativa ao longo dos encontros). O novo despertou interesse e curiosidade,
aprender e ensinar de modo horizontal, de igual para igual, mostrou ser interessante e motivador de
novos encontros. Cabe destacar que conflitos existiram, situações de preconceitos foram
externalizadas, tanto relativas à raça-etnia, como aparência ou vestimenta das pessoas, e mesmo
referente ao gosto/preferência de uma ou outra pessoa em relação ao estilo musical. O estilo
musical sertanejo, por exemplo, era ao gosto dos/as participantes colaboradores/as e suas famílias,

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mas não de duas das educadoras. Tais conflitos se deram particularmente a partir de pessoas adultas
e não das crianças. Porém, conforme afirma Freire (2008), é justamente a possibilidade do conflito,
quando mediado pelo diálogo entre culturas diferentes, que pode promover a resolução destes, pois
é “[...] a tensão a que se expõem por ser diferentes, nas relações democráticas em que se
promovem. É a tensão de que não podem fugir por se acharem construindo, criando, produzindo a
cada passo a própria multiculturalidade que jamais estará pronta e acabada” (p.156).

3.3.1 A canção A Professorinha

No momento do Levantamento do tema, a canção A Professorinha, de Corrêa (2012), interpretada


por Pepe Moreno, não integrava o repertório escolhido pela comunidade do PEF. No entanto, no
momento da Problematização, processo de construção-reconstrução da Música Geradora, a
insistência dos/as participantes colaboradores/as em executar essa canção foi grande,
particularmente o participante colaborador João Kiko, quando insistiu: Vamos ouvir a Professorinha?
(DC VI B-9). As educadoras se assustaram com a sugestão, devido à letra pornográfica da canção,
mas, ao invés de proibir, dialogaram, avançando nas discussões, negociando, assim: juntos, decidiu-
se ouvir a canção, mediante uma escuta atenta e criteriosa em relação à letra e seu significado.
Desse modo, procedeu-se à leitura, em voz alta, parando a cada verso e tentando discutir o que se
compreendia do texto, a partir da relação professorinha/aluno/escola. Logo no início da escuta da
canção, os/as participantes colaboradores/as acompanhavam-na, dançando e cantando. Mas, pouco
a pouco, começaram a dar sinais de que algo não ia muito bem. As meninas começaram a trocar
olhares entre si e os meninos riam, fazendo brincadeiras de mãos, até que começaram os
comentários (DC VI B-9).
No verso que dizia:

Na escola do meu filho,


Tem uma professorinha,
Ela é muito educada,
Ela é muito safadinha,
Ela usa minissaia,
Miniblusa de alcinha,
Ele está apaixonado,
Por essa professorinha.

Os/as participantes colaboradores/as discutiram: Lili: Ela tem a saia curta, mostra as partes íntimas
da professora. Minotauro: Já cantou para um milhão de pessoas, porque que a gente não pode
cantar? Educadora: Se Caroline chegá aqui de saia curta vocês iam achar legal? João Kiko: Não! Eu ia
mandar ela embora. Minotauro: Ah! A professora deve ser bonitinha! João Kiko: Nada bom! Chaves:
Mostra a parte íntima. Educadora: O que é a parte íntima de uma professora? Vê: Não pode falar!
João Kiko: O pai e a mãe não tá gostando disso. A música é engraçada. Mariazinha: Temos que
pensar no significado. João Kiko: O Minotauro já ficou assanhado por uma professora, ele ficou atrás
dela assim (fez o gesto de quadril para frente e para trás), aí eu contei para a Lili (educadora).
Outro verso:

Cinco anos na escola,


Meu filho não sabe ler,
Ele é interessado,
Aula não quer mais perder,
Agora eu descobri,

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O interesse do bacana,
Ele fica no banheiro,
Descascando a banana.

Os/as participantes colaboradores/as: Mariazinha: A gente tem que estudar, ser inteligente!, Lili: Tô
preocupada. Cinco anos na escola e não sabe lê. João Kiko: Se eu fosse o pai desse menino eu tiraria
meu filho da escola e ía naquele lugar lá que denuncia. Minotauro: Nú! Ele fica nú! Lipe: Ele tava com
tesão na professora! João Kiko: Fica batendo punheta, goza. Minotauro: Vai que ela vai sem calçinha,
pode cê! Lipe: Lá na Escola do Municipio tem uma professora que vai assim. Cherosa: Tem gente que
quer se formar para professora e vai de short curtinho e de blusinha assim (mostrou a barriga), e os
menino fica apaixonado nelas! Lipe: Mostrando os peitão! Lili: Quando nóis fô cantá essa música
alguns pai não vai gostá. João Kiko: Vai! quem não gostá não canta! Minotauro: Uai, se não a gente
canta Carrossel! Madruva: Votação. Vamo fazê uma votação!
Alguns votaram a favor outros contra, até que os/as participantes colaboradores/as foram mudando
de opinião e, ao final, foi consenso geral: Não para a canção A professorinha. Cherosa disse: Num vô
mais nem ouvi essa música! (DC VI B-9). As orientações e indicações de leitura e discussão da letra da
canção configuram-se em um procedimento forte e potente como estratégia metodológica, onde o
diálogo aberto e amoroso ocupou lugar de importância na Educação Musical; proposta de discussão
da vontade manifesta confrontando-a com a possibilidade de sua realização enquanto procedimento
pedagógico adequado e constitutivo de aprendizagens significativas.
Na categoria C, Desejo de ser mais, consideramos que a prevalência da afetividade e amorosidade, da
flexibilidade dos processos didático-pedagógicos, do exercício de autonomia, da fruição do lúdico, da
valorização do individual e do coletivo possibilitaram relações cooperativas e solidárias ao ser mais
de cada um/a. Música Geradora foi assim, na fala da participante colaboradora Negrinha Poderosa:

Ah! eu me senti uma pessoa muito diferente, porque eu não fazia nada na escola.
Agora quando esse projeto entrou, mudou a minha vida inteirinha, porque eu
ficava só aqui na escola escrevendo, mas quando o projeto entrou, mudou!, mudou
meu ritmo de ser, eu ficava só na rua..., aí eu agora fiquei só nas música! [grifos
nossos] (DC XXXII C-12)4.

4 Considerações

Tendo em vista que neste artigo nos propusemos a descrever os processos de Metodologia de
Intervenção (procedimentos relacionados à construção da Música Geradora a partir da Pedagogia
Dialógica de Paulo Freire) e Metodologia de Pesquisa (procedimentos de coleta e análise de dados da
citada intervenção pautados na Fenomenologia), realizadas junto à comunidade participante de um
projeto de extensão universitária e, com base no referencial teórico apresentado, principalmente nos
conceitos de práticas sociais e interculturalidade, podemos considerar que a prática social em
Educação Musical, inspirada na pedagogia dialógica, exigem de quem as realiza compromisso e
responsabilidade, busca permanente de conhecimentos e habilidades, interação criativa e
cooperativa na convivência das diferentes culturas, mostrando-se potentes na revelação de modos
de ser e de existir de cada pessoa envolvida. Os processos educativos decorrentes da construção-
reconstrução da Música Geradora revelaram-se fortemente marcados pelo espírito de co-laboração,
de com-vivência, de solidariedade, de respeito e reconhecimento de outrem. Tais resultados revelam
que pesquisa comprometida atrelada a intervenção comprometida promovem um movimento

4 Essa fala foi recolhida junto a uma participante colaboradora na pesquisa, por ocasião de aplicação de uma pergunta
aberta que dizia: Fale de sua experiência no projeto PEF.

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permanente de se pensar o fazer com vistas a melhorar o saber-fazer, de modo a promover uma
educação humanizadora e transformadora. Ainda, de romper com as assimetrias de poder, professor
e aluno, valorizando permanente diálogo crítico, emancipador e engajado, como estratégia de uma
educação capaz de promover aprendizagens significativas e transformadoras, possíveis apenas
quando se tem, conforme Freire (2005), o sendo-uns-com-os-outros como imperativo e condição de
oportunidade de acontecimento e realização da própria Educação, na condição e dependência do
inacabamento do ser humano em todo o seu processo histórico de ser, de ser com outrem, de ser
mais em comunhão, na “[...] solidariedade dos existires” (p.86).

Referências

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Prática docente de enfermagem no ensino superior: Intervenção


para a promoção da saúde mental do professor

Claudia Maria Messias1 Geilsa Soraia Cavalcanti Valente2

1Doutora em Enfermagem. Professora da Universidade São Camilo e Castelo Branco. Rio de janeiro (RJ).
Brasil. E-mail: cmmessias@hotamil.com

2Pós-Doutora em Enfermagem. Professora da Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa,

Universidade Federal Fluminense – UFF. Niterói (RJ). Brasil. Email: geilsavalente@gmail.com

Resumo. O estudo teve como objetivo: analisar o significado da prática docente para os enfermeiros
professores e a percepção acerca da sua saúde mental. Pesquisa de abordagem qualitativa realizada
durante estágio de pós doutoramento, com a metodologia do Grupo Focal (GF). Evidenciou-se que os
docentes são vulneráveis ao risco de sofrimento mental com diferenciadas matizes e sintomas. Ao aplicar a
intervenção inspirada nas ideias de Grupo Focal, constatou-se que além de favorecer a coleta de dados, esta
técnica caracterizou-se como um excelente espaço de formação docente a partir da reflexão que cada
pesquisado fez sobre a própria concepção, trazendo contributos significativos para a promoção da saúde
mental.
Palavras-chave: docente; enfermagem; saúde mental; professor.

Nursing teaching practice in higher education: intervention to promote teacher mental health
Abstract. The purpose of the study was to analyze the meaning of the teaching practice for teaching nurses
and the perception about their mental health. Qualitative approach research carried out during the post-
doctoral stage, using the methodology of The Focal Group (GF). It has benen shown that teachers are
vulnerable to the risk of mental suffering with different shades and symptoms. In applying the intervention
inspired by the ideas of the Focus Group, it was found that in addition to favoring data collection, this
technique was characterized as an excellent space for teacher training based on the reflection that each
researched did on the own conception, bringing contributions mental health promotion.
Keywords: teacher; nursing; mental health; teacher nursing.

1 Introdução

Os indícios de comportamento alterado da saúde física e mental do trabalhador docente são


elevados, porém, as instituições governamentais e os próprios trabalhadores ainda não buscam
estratégias de tratamento quando se apresentam patológicos, mesmo quando estes estão
remanejados ou afastados de suas atividades, o que poderia colaborar ainda mais para o
agravamento do estado mental dos docentes (Farias.; Zeitoune, 2010 )
Aponta-se que a saúde mental dos docentes de Instituições do ensino superior é de extrema
relevância para lidar com as atividades do cotidiano em sala de aula e no contexto acadêmico, pois o
que se percebe é que nos dias atuais, que há um desgaste mental, que em alguns estudos
epidemiológicos descrevem estes docentes como diagnosticados com saúde mental prejudicada
(Azevedo, Ferreira Filha ,2012), situação esta, que atribui um efeito na educação, dificultando a
interação professor-aluno, na qual existe uma interferência prejudicial, que deve ser diagnosticada e
tratada, para que o docente venha a participar das atividades diárias da escola de forma motivada

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com o intuito de envolver o aluno em todas as atividades, fortalecendo sua prática docente.
(Pena,2011)
O docente na sua atividade cotidiana pode influenciar nas respostas psicofísicos, tendo como
predisposição e reforçando essa condição a modernidade, competitividade e capitalismo. Incertezas
políticas e econômicas viabilizam e aumentam a insegurança e ansiedade do profissional docente,
influenciando nas suas expectativas de acontecimentos em futuro próximo (Moreno, et al 2011).
Na relação dos trabalhadores docentes com sua saúde mental, observa-se que ainda permeia o
estigma de doenças em que os indivíduos devem ser isolados ou vistos como incapazes. Considera-se
que as mudanças na educação superior, ocorridas nos últimos anos, como a mercantilização das
atividades do ensino, pesquisa e extensão, condições de trabalho divergentes das propostas da
ergometria, como a aceleração dos ritmos laborais, preponderam sobre o percentual crescente de
doenças psiquiátricas do grupo docente. (Ceballos, 2011)
Decorrente das mudanças na política educacional relacionados ao ambiente de trabalho e as
condições sob o qual é realizado, o docente pode desenvolver o chamado mal-estar docente,
favorecendo ao desgaste psíquico. Ademais, ao conhecer o significado da docência referida pelos
docentes de enfermagem no ambiente laboral, assim como, a saúde mental, de acordo com as reais
condições de vida, espera-se que a pesquisa contribua na ampliação de escolhas saudáveis por parte
dos docentes, buscando uma melhor interação no local onde passam a maior parte do dia, ou seja, o
local de trabalho.
A relevância deste estudo desenvolvido durante o estágio pós-doutoral, reside na diminuta
quantidade de pesquisas e publicações a respeito da temática existente na literatura vigente acerca
do “significado da prática e a saúde mental do docente do ensino superior de enfermagem”. Apesar
disso, observa-se que existem estudos que analisam o processo de adoecimento dos docentes
relacionados à atividade ocupacional e já se sabe que diversos fatores interferem neste processo.
Para tanto, buscou-se responder a seguinte questão: Qual o significado de ser docente e como
percebe sua saúde mental na prática docente no ensino superior? Por conseguinte, delineou-se
como objetivo: Analisar o significado da prática docente e a percepção do enfermeiro professor
acerca da sua saúde mental.

2 Metodologia

Tratou-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, utilizando a técnica do Grupo Focal (GF)
para a coleta de dados. Uma técnica de discussão não diretiva em grupo, que reúne pessoas com
alguma característica ou experiência comum para discussão de um tema ou área de interesse. Tendo
em foco um determinado assunto, a discussão não busca o consenso, mas levantar as diferentes
opiniões, atitudes, pensamentos e sentimentos, expressos verbalmente ou não, em um tempo
relativamente curto. (Dias, 2016)
As atividades do Grupo Focal (GF) foram desenvolvidas com 28 docentes participantes, que atuam
em duas instituições de ensino superior de enfermagem, localizadas no Rio de janeiro, Brasil. Foram
realizadas três sessões de GF com dois grupos distintos de 14 docentes de cada universidade
participante, que atuavam na graduação de enfermagem e outros cursos da área de saúde. O
trabalho de campo decorreu entre os meses de junho a novembro de 2016.
Para coleta de dados, foi utilizado também um formulário com 2 blocos de questões. O primeiro
bloco continha informações como características de identificação, ocupacionais e tempo de trabalho.
No segundo bloco procurou investigar 3 questões relativas a percepção sobre docência, atividade
laboral e sua saúde mental.

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Inicialmente, foram distribuídos papel e caneta para anotações, crachás para identificação e foi
explicado que a identidade de cada participante, na presente pesquisa, seria mantida em sigilo. A
seguir realizou-se uma breve apresentação acerca da investigação e esclarecendo os objetivos do
encontro, bem como os critérios de escolha dos participantes e a forma de registro − gravação em
áudio, com o que todos os participantes autorizaram. Nestes encontros, a pesquisadora,
desempenhou o papel de mediadora.
Vale salientar que mesmo que surgissem, durante os encontros, diferentes pontos de vista, nesta
técnica, não se estava em busca de consensos, pois todas as opiniões interessavam e não havia
resposta ou posicionamento certo ou errado, nem bom ou mau argumento. Este fato também foi
devidamente esclarecido aos participantes da pesquisa.
Além disso, foi esclarecido que não se tratava de um diálogo com as investigadoras, mas com o
grupo. Assim, não precisavam atuar como se estivessem respondendo à mediadora, pois o GF não se
caracteriza como uma entrevista coletiva, mas como uma conversa que deve acontecer entre os
membros do grupo. Após os procedimentos descritos, o encontro foi iniciado com a apresentação
dos participantes. Em seguida, foi dado um tempo para que os participantes, em duplas, discutissem
sobre a seguinte tarefa proposta: pensando na sua prática profissional. A discussão que se seguiu
girou em torno dos significados emergidos dos grupos e apresentadas, posteriormente, aos demais
componentes do GF.
Os docentes estavam tímidos no começo, cada um esperando que o outro iniciasse a participação,
mas, depois da rodada de apresentação, foi quebrado o gelo, mostraram-se bem à vontade na
interação e atenderam ao pedido da mediadora quanto à necessidade de cada um falar por vez, para
que as gravações não fossem prejudicadas. Embora sempre houvesse docentes mais comunicativos
que outros, neste primeiro encontro, todos participaram, dando suas opiniões. As interações fluíram
de forma cooperativa, apesar dos contrapontos e divergências, o que manteve o debate aceso em
toda a sua duração. O grupo levou a técnica a sério, demonstrando interesse pelo tema que estava
em foco.
Os cenários de pesquisa foram duas Instituições de ensino superior com total de 20 cursos de
graduação nas várias áreas de atuação, dentre elas a de enfermagem. Os três encontros de GF
aconteceram em salas de reuniões das universidades selecionadas pela pesquisa nas zonas central e
oeste do Rio de Janeiro/RJ. Esses cenários foram escolhidos por serem locais de trabalho da
pesquisadora, independente disso foi encaminhado uma solicitação a reitoria para de uso do espaço
para realização da atividade.
Quanto aos aspectos éticos, o projeto de pesquisa foi submetido e aprovado no comitê de ética em
pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense, Niterói/Rio de Janeiro-
Brasil, sob nº CAAE 33733014.9.00005243.

Tabela 1. Caracterização dos participantes segundo as variáveis sócio- demográficas

Variáveis Frequência Percentil


Sexo n=28
Masculino 22 78.57
Feminino 6 21.43

Anos de Profissão como docente


1-10 13 46.42
10-20 09 32.14
20-30 04 14.28
30-40 02 7.14

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Idade
20-30 01 3.57
30-40 10 35.71
40-50 10 35.71
50-60 05 17.85
60-70 02 7.14

Experiência Profissional na Docência


Área de Graduação 21 75
Pós-graduação 06 21.42
Especialização 01 3.57
Mestrado 01 3.57
Doutorado 00 00

3 Resultados e discussão

Categoria 1 A sua saúde mental durante a prática docente em enfermagem

Acredita-se que a capacidade de um indivíduo para controlar situações potencialmente estressantes,


pode ter profundos efeitos sobre suas funções vitais. Como desde nossa concepção enfrentamos
mudanças continuamente e a manutenção de vida depende justamente da capacidade de nos
adaptarmos a essas mudanças. (Brum, 2012)
A prática docente, a longo prazo, pode levar, a várias patologias músculo esquelética e psicológicas,
muitas vezes relacionadas, com absenteísmo. A docência vem sofrendo constantes alterações no
decorrer de sua história, embora o professor não tenha tido condições de criar meios para se adaptar
às mudanças, o que levou ao surgimento de desequilíbrios na estrutura corporal (Bernardo, 2010).
Evidenciou-se que o cansaço, a falta de motivação, a ausência de incentivo e os baixos salários são
fatores que promovem o descontentamento e o adoecimento desses profissionais. Sabendo-se que a
ação educacional é um processo que exige o preparo do docente. Sabendo-se que os docentes estão
sobrecarregados de trabalho e acabam, muitas vezes apresentando patologias físicas ou psicológicas
(Bernardo, Garbin, 2011).
As respostas acerca dos significados da pratica docente e a saúde mental dos docentes, ficaram
assim classificados, tendo em vista as respostas dos participantes da pesquisa:

Tabela 2. A saúde mental durante a prática docente


Percentil %
Variáveis Frequência n=28
Desmotivação 2 7.14
Desânimo 4 14.28
Cansaço 18 64.28
Preocupação com o sustento 1 3.57
Feliz 1 3.57
Disposta 1 3.57
Memória (branco/ esquecimento) 1 3.57

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Em estudo realizado por Arbex, Souza, Mendonça. et.al, ( 2013), assegura-se que existe um
desconhecimento a respeito do processo de trabalho docente universitário e das condições
materiais que ele realiza. Constatou-se que essa dimensão invisível do trabalho acadêmico possui
uma interface com o sentimento de não reconhecimento social por parte dos docentes, podendo
ocasionar ressonâncias no seu quadro psíquico.
A saúde mental do trabalhador deve ser entendida como um processo no qual as agressões dirigidas
à mente pela vida laboral são confrontadas pelas fontes de vitalidade e saúde representadas pelas
resistências de natureza múltiplas, individuais e coletivas, que funcionam como preservadoras da
identidade dos valores e da dignidade dos trabalhadores docentes (Carvalho, 2014).

Categoria 2 O Exercício da docência e o comportamento do docente relacionado ao ambiente


laboral. Estado mental/físico dos docentes

A categoria evidenciou que, em meio às concepções que os docentes possuem a respeito da sua
prática, certas questões mostraram-se mais recorrentes. Essas questões dizem respeito tanto às
dificuldades que o professor enfrenta no trabalho com esses discentes, como suas expectativas
quanto às possibilidades profissionais, de sua independência e autonomia.

Tabela 3. O Exercício da docência e o comportamento do docente relacionado ao ambiente laboral.

Variáveis Frequência Percentil% n=28


Desafio 02 7.14
Sofrimento 03 10.71
Dificuldade na relação aluno-professor 04 14.28
Irritação 01 3.57
Repetição das atividades 07 25
Reflexão “eu” de forma egoísta sem planejar 01 3.57
práticas positivas. 03 10.71
Incertezas 02 7.14
Preocupação e ansiedade 02 7.14
Dificuldades preocupação com a formação do aluno 02 7.14
Desconforto 01 3.57

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Tabela 4. Ambiente institucional/Significados dos docentes.

Variáveis Frequência Percentil% n=28


Frustração: Capacitação desenvolvimento acadêmico/ trabalho sem
10 35.71
recompensas política de plano de cargos e salários.
Desenvolvimento de trabalhos docentes sem prazer respondendo
07 25
as demandas institucionais
Frustração: muito estudo sem impacto financeiro ou nas atividades 01 3.57
Trabalho sem recompensas 01 3.57
O ambiente institucional interferindo no cotidiano de trabalho 05 17.85
Aluno como motivo de descontentamento 03 10.71
Perda da autonomia como docente
Status Social em baixa 01 3.57

Entretanto, no decorrer da pesquisa, identificou-se que a saúde mental do docente está


consideravelmente comprometida, uma vez que o aumento das demandas do seu cotidiano, como
participar de outras atividades além da sala de aula, planejamento e tarefas que envolvem a sala de
aula, ainda precisa disponibilizar-se para fazer parte de outros afazeres acadêmicos, sejam elas
atribuídas pela própria universidade ou pelos alunos, além dos seus deveres familiares e sociais.
Christophe Dejours, psiquiatra e psicanalista francês, afirma que “quando o rearranjo da organização
do trabalho não é mais possível, quando a relação do trabalhador com a organização do trabalho é
bloqueada, o sofrimento começa: a energia pulsional que não acha descarga no exercício do trabalho
se acumula no aparelho psíquico, ocasionando um sentimento de desprazer e tensão”.
(Dejours,2007)
Um sofrimento patogênico surge quando todas as possibilidades de transformação, aperfeiçoamento
e gestão da forma de organizar o trabalho docente já foram tentadas e só restam as pressões fixas,
rígidas, repetitivas e frustrantes, configurando uma sensação generalizada de incapacidade.
Identificou-se ainda, que o número de docentes que apresentam sintomas de exaustão emocional,
cansaço mental, esquecimento e outros sintomas relacionados ao trabalho docente é
consideravelmente expressivo = 64.28%. Vale ressaltar que aproximadamente um quarto dos
docentes (35.71%) descreveu sentimentos de frustações diante da falta de incentivo a capacitação,
sem a perspectiva de políticas de plano de cargos e salários. A própria atividade docente foi descrita
por 14,28% como a dificuldade na relação aluno-docente.
O trabalhador docente vive uma relação de ambiguidade com os sujeitos de sua ação, culpando-os
pela não eficácia de sua atuação, ao mesmo tempo em que é complexo quantificar e qualificar a sua
assimilação por parte dos alunos. Ainda que se considere a diversidade dos problemas na relação
pedagógica, essas situações podem produzir uma sensação de esvaziamento e descontentamento
com a atividade. (Osvaldo,2010)

Categoria 3 Método de intervenção praticada pelo docente

Os docentes participantes desse estudo buscam dentro de si, em seu contexto e em sua bagagem de
conhecimento, estratégias para reorganização física e mental, diante dos eventos estimuladores do
mal docente. Apontam que as práticas no âmbito da saúde mental, ainda estão direcionados para

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patologias e não a intervenção precoce e a prevenção, pois durante a pesquisa ficou claro nas
variáveis descritas.

Tabela 5. Métodos de intervenção praticada pelo docente.


Percentil%
Variáveis Frequência N=28
Válvula de escape: Não se integra com as atividades de forma efetiva 01 3.57
Fuga/ Nada me incomoda, deixar de lado angústias e viver o momento presente 09 32.14
Reinventar: Rever conceitos 10 35.71
Conservado/sem mudanças físicas ou mentais 10 35.71

Diante disso, se faz necessário retomar alguns aspectos da relação do docente com o trabalho e a
saúde mental, com a inserção de atividades preventivas no cotidiano laboral. Por outro lado, os
entrevistados se sentem satisfeitos com o trabalho e há somente uma parcela que se mostra pouco
satisfeita ou insatisfeita. Mesmo que não seja a satisfação ou insatisfação com a atividade que
determine a existência do sofrimento psíquico a priori, a satisfação com a atividade pode criar
maiores possibilidades de superação e até uma forma de prevenção.

4 Conclusão

Conclui-se com este estudo que o perfil da saúde mental dos docentes é plural. Evidenciou-se que os
docentes tornam-se vulneráveis ao risco de sofrimento mental, com diferenciadas matizes e
sintomas. Ao aplicar a técnica inspirada nas etapas de Grupo Focal em uma pesquisa qualitativa, cujo
objetivo foi identificar as concepções que os participantes tinham sobre o significado da docência e a
saúde mental em uma IES, constatou-se que a técnica do Grupo Focal, além de favorecer a coleta de
dados, caracterizou-se como um excelente espaço de formação docente a partir da reflexão que cada
pesquisado fez sobre a própria concepção.
A coleta de dados teve como uma de suas maiores riquezas a formação de opinião e atitudes durante
a interação com os indivíduos, resultando em uma intervenção autodirigida para a promoção da
saúde mental dos docentes. Essas interações possibilitaram a captação de significados para a prática
e possibilidades de implementação de melhorias no que concerne a qualidade do tempo em que os
pesquisados permanecem no seu local de trabalho.
Os docentes da pesquisa consideraram que as interações propostas pela metodologia GF foram
importantes momentos de troca de experiências e reflexão da própria prática como aprendizagem
para o grupo, trazendo contribuições significativas para a prática docente de enfermagem.

Referências

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La Comunicación Digital. El Póster Como Actor Pedagógico En La


Difusión Cultural Y Formación De Público En Las Organizaciones
Culturales.

1 2 2
Luis Eduardo Ruano , Alexander Buendía , Marcelo Mamian
1
Dr. Sociología. Mág. Métodos de Investigación en CC.SS. Profesor Titular, Universidad Cooperativa de
Colombia, UCC, programa de Psicología, Grupo de Investigación PSIEDU. Popayán, Colombia,
luiseruano@gmail.com
2
Dr. Ciencias de la Educación, Mág. Estudios de la Cultura, Comunicador social-periodista. Prof Titular
Depto Comunicación Social, Universidad del Cauca. Popayán, Colombia. Grupo de Investigación ECCO,
abuendia@unicauca.edu.co
3
Especialista en Educación multicultural, Maestro en Artes Plásticas, Estudiante de la Maestría en
Educación (modalidad Investigación) Universidad del Cauca. Colombia. fabian.marcelus@gmail.com

Resumen. Se aborda el análisis de pósteres de cuatro organizaciones culturales de Popayán Cauca en


Colombia. Se basa en el análisis visual coherente con la metodología planteada por Erwin Panofsky y
examina la existencia de una agenda cultural presente, de la cual se derivan posiciones discursivas sobre los
imaginarios culturales de ciudad. Como resultado se plantea un análisis que da cuenta de tres momentos de
análisis: l) el asunto primario, ll) el asunto secundario y lll) el de significación intrínseca, a partir de tres
elementos: el acto de interpretación, el bagaje para la interpretación y el principio correlativo de la
interpretación.
Palabras Claves: Comunicación digital, póster, actores culturales, formación de públicos.

Digital communication. The poster as a pedagogical actor in cultural diffusion and public training in
cultural organizations
Abstract. The analysis of posters of four cultural organizations of Popayán Cauca in Colombia is discussed. It
is based on the coherent visual analysis using the methodology proposed by Erwin Panofsky and examines
the existence of a present cultural agenda, from which discourse positions are derived on the cultural
imaginaries of the city. As a result, an analysis is presented that gives account of three moments of analysis:
1) the primary issue, ll) the secondary issue and lll) that of intrinsic significance, from three elements: the
act of interpretation, the baggage for interpretation And the correlative principle of interpretation
KeyWords: Digital communication, Poster, Cultural acts, Public Formations

Introducción

Lo que subyace en este interés no es solo ver la relación de las sociedades con los espacios
construidos (Lamy, 2006) sino también cómo estos espacios se constituyen en escenarios de
prácticas culturales que dinamizan el ser y quehacer urbanos (Pereira, 2007; Hurtado, 2011; Buendía,
2014). Resulta clave ver cómo las dinámicas urbanas apelan a nuevos medios y procesos
comunicativos para dotar de sentido aquello que las vivifica.
Así, la relación ciudad – prácticas culturales si bien no es nueva, con la aparición y emergencia de la
comunicación digital, cobra nuevas formas, estéticas y posibilidades. Bien señala Arango-Forero
(2013) que la comunicación digital implica nuevas narrativas, nuevos medios, nuevos usos y
apropiaciones y también, desde luego, nuevas audiencias.
Scolari (2008), señala que el modelo de comunicación digital, es más que emergente y podría
considerarse ya como un nuevo paradigma— se basa en su carácter digital, la hipertextualidad, la
reticularidad, la interactividad y la multimedialidad. En este orden de ideas, las prácticas y los

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productos culturales se enfrentan a un escenario de convergencia mediática que evidencia el


carácter tecnosocial de la comunicación digital (Rosseti, 2007), lo que se traduce en que las formas
de producir y, sobre todo, de informar y comunicar sobre los bienes culturales se están
transformando, tal como también han cambiado las maneras de producir, circular y consumir
información.
Pero ¿qué suponen estos cambios en términos del quehacer cultural y los bienes que producen y
difunden? ¿Se trata solamente de un cambio de soportes o las herramientas digitales implican
también un cambio en las estéticas y los imaginarios que proyectan?. Estas preguntas resultan
pertinentes cuando las planteamos en un contexto puntual como lo es la ciudad de Popayán, la
misma, carga con la fama de ser una ciudad culta o cultural. Pero más allá del realce que tuvo
durante la época de la colonia, en la actualidad lo cultural de la ciudad parece diluido más en el
pasado que una dinámica viva del presente.
La Popayán contemporánea se ha estudiado poco. Salvo los trabajos Whiteford (1963, 2008 y Crist,
2008), que se refieren básicamente a la ciudad de mediados del siglo XX, no hay mayores datos. Más
recientemente podemos encontrar a Tocancipá (2006) y García (2013), quienes se refieren al orden
social de la ciudad y su estatuto colonial, respectivamente. En términos de narrativa urbana es
Buendía (2014, 2016), quien evidencia que Popayán posee una rica y sólida narrativa, que se ancla y
fundamenta en el pasado remoto de la ciudad. Pero esta narrativa no es en sí misma del pasado sino,
más bien, una construcción social que se consolidó, entre otras cosas, gracias al quehacer de la
intelectualidad culta de Popayán del siglo XX.
Ahora bien, ¿qué pasa con la ciudad culta y letrada después de la aparición de los medios y soportes
digitales? ¿Cuál es el tipo de ciudad que se difunde y proyecta hoy en día a través de estos medios y
apelando a esta comunicación (la digital)? ¿Es Popayán todavía una ciudad culta? ¿Cómo se evidencia
esto? ¿La agenda cultural de la ciudad es lo suficientemente rica y variada como para seguir
sosteniendo que esta es una ciudad cultural?
Frente a estos interrogantes bien podrían plantearse algunas hipótesis: a) la ciudad sigue teniendo
una narrativa hegemónica y esta simplemente está migrando hacia los soportes digitales; b) la
aparición de la comunicación digital de alguna manera “democratiza” las dinámicas comunicativas y
en consecuencia permite la presencia de nuevos actores culturales que emergen con nuevos
discursos urbanos; c) la agenda cultural de la ciudad es más variada pero sigue existiendo una fuerte
tensión entre prácticas culturales tradicionales hegemónicas y prácticas emergentes; d) las dinámicas
propias de la comunicación digital logran transformar los lenguajes de la cultura urbana y estamos
ante un nuevo panorama que todavía está en proceso de construcción y falta mucho para su
consolidación.
Este trabajo aborda el análisis de pósteres de cuatro organizaciones culturales que proponen una
agenda cultural para la ciudad. Las propuestas de las organizaciones estudiadas son sólidas y
reconocidas en la ciudad, gozan de un gran nivel de aceptación y participación por parte de la
ciudadanía y tienen activa presencia en medios digitales, bien sea a través de páginas web o en la red
social Facebook. A continuación, se describen brevemente los perfiles por organización.
Popayán Cultural: Espacio de enfoque informativo. Tiene página web, Facebook e Instagram.
Promociona la mayoría de eventos culturales y académicos que se realizan en la ciudad. Publica de
otros medios, temas locales o nacionales que traten el tema cultural o artístico.
Corporación Festival de Música Religiosa de Popayán: Nació en 1964, se encarga la celebración
anual del Festival de Música Religiosa, durante la Semana Santa. El nombre del festival cambió a
Festival de Música de Popayán. Comunica en sus plataformas digitales (página web y Twitter),
artistas invitados y escenarios de su evento central.
Corporación Gastronómica de Popayán: Su evento central es el Congreso Gastronómico de Popayán.
La Corporación hace presencia en Facebook, Twitter y en YouTube. Se concentran en la información

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referente al Congreso, sus retos, presentaciones y concursos.


Festival de Cine Corto de Popayán: Nace en el año 2009. El evento anual es organizado por la
Corporación Cinematográfica del Cauca. Con presencia en su página web y Facebook, el objetivo es
lograr un reconocimiento en la escena cinematográfica nacional.

Metodología

Se basa en una técnica de análisis visual (Pérez, 2014 y Panofsky, 1983), que examina la existencia de
una agenda cultural presente y constante, de la cual se derivan de manera clara unas posiciones
discursivas (Gutiérrez del Álamo, 2010) sobre los imaginarios culturales de ciudad. Se entiende que
cada forma de análisis conlleva una definición de discurso, por lo que siempre se regresa a la
intención inicial, donde los objetivos marcan el tipo de análisis y técnicas. Hablamos de discurso (oral
o visual), como una práctica social (Gutiérrez del Álamo, 2010).
El corpus documental (Valles, 2009), se compone de fuentes visuales (3 pósters promocionales y 1
portada de magazine), que se convierten en material de insumo para formar el cúmulo de
antecedentes contextuales, determinar el concepto pedagógico y el carácter educativo
desescolarizado (formación de públicos).
Para examinar simultáneamente los documentos teóricos y visuales (microanálisis) (Corbin y Strauss,
2002)), se parte del análisis de un código teórico medular con el software cualitativo Atlas.Ti 7,
referente al concepto de “lo educativo”, ligado a sus dimensiones “educación desescolarizada” y
“formación de públicos”.
Persiguiendo el código “nuevas alfabetizaciones”, se rastreó información mediante la web (Facebook
y páginas de organizaciones. Al tener la recopilación de la información visual, en el marco del análisis
teórico, se asume para el tratamiento de los textos, la propuesta metodológica de Erwin Panofsky
(1983) de donde se extrae la definición de tres códigos deductivos importantes, para el desarrollo del
análisis visual de las organizaciones culturales (preiconografía, iconografía e iconología).
La preiconografía es un punto de partida que el autor describe desde el concepto del
reconocimiento, porque asume la lectura de la imagen desde el color, la forma y sus líneas, sin
importar realmente lo que es. “Los objetos y acontecimientos cuya representación por medio de
líneas, colores y volúmenes constituye el universo de los motivos, pueden ser identificados, como ya
vimos, sobre la base de nuestra experiencia práctica” (Panofsky, 1983. 52).
Por su parte, la iconografía “se ocupa del asunto o significación de las obras de arte, en
contraposición a su forma. Probemos, pues, de precisar la diferencia entre asunto o significación, por
un lado, y forma por el otro” (Panofsky, 1983. 45). En este orden de ideas, vale la pena precisar que
con el trabajo de los póster de las entidades culturales, se trata de indagar sobre la significación de
las imágenes planteadas, las cuales dan forma a la manera como impactan y educan la sociedad de la
capital del departamento del Cauca, por tal motivo, este trabajo de análisis parte del hecho de que
“…la iconografía constituye una descripción y clasificación de las imágenes (…) nos informa sobre
cuándo y dónde determinados temas específicos recibieron una representación visible a través de
unos u otros motivos específicos” (Panofsky, 1983. 52).
Contando con la información encontrada en la web, podemos aplicar estos conceptos y crear un
paralelo entre la información de la agenda cultural de la ciudad y los pósters de los eventos que se
difunden en el medio. Se trata de develar a partir del póster, unos símbolos que para determinado
grupo de consumidores culturales van a ser comunes.
Finalmente, la iconología “es un método de interpretación que procede más bien de una síntesis que
de un análisis” (Panofsky, 1983. 51). Hace referencia, además, al descubrimiento y la interpretación
de valores simbólicos, valores que dejan de estar establecidos en el autor de la imagen y pasan a ser
manejados desde las individualidades de cada persona. Muchas veces los pósteres de los eventos

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llegan cargados de estilos, esquemas, colores, caligrafía y soporte, que permanecen en las personas,
tienen un eco en el tiempo y se convierten en íconos.
Asumiendo estos tres conceptos que dentro de nuestro análisis operan como códigos, podemos
establecer que la preiconografía gira en torno al reconocimiento; la iconografía constituye un
carácter descriptivo y la iconología busca un reconocimiento y lugar en la historia. Así, el análisis
visual de las organizaciones culturales a partir de su póster, se realizará asumiendo la propuesta
descrita y apuntará al análisis de los afiches de sus eventos en tres momentos. Se describe a
continuación la ruta de análisis que se tuvo en cuenta a partir de los planteamientos que desarrolla
(Panofsky, 1983), a partir de la siguiente matriz.

Tabla 1. Se establecen tres momentos de análisis: l) el asunto primario, ll) el asunto secundario y lll) el de significación
intrínseca. Teniendo estas brechas visuales, se comienza por dar cuenta de cada póster, a partir de tres elementos: el acto
de interpretación, el bagaje para la interpretación y el principio correlativo de la interpretación. Panofsky (1983).

PRINCIPIO CORRECTIVODE LA
OBJETO DE ACTO DE BAGAJE PARA LA
INTERPRETACION (HISTORIA DE LA
INTERPRETACION INTERPRETACION INTERPRETACION
TRADICIÓN)
I. Asunto primario o Descripción pre- Experiencia práctica Historia del estilo (estudio sobre la
natural: a) fáctico, y b) iconográfica (y (familiaridad con objetos y manera en que, en distintas
expresivo, que análisis acontecimientos condiciones históricas, los objetos y
constituyen el universo de pseudoformal) acontecimientos fueron expresados
los motivos artísticos mediante formas).

II. Asunto secundario o Análisis iconográfico Conocimiento de las fuentes Historia de los tipos (estudio sobre la
convencional, que literaria (familiaridad con temas manera en que, en distintas
constituyen el universo de y conceptos específicos) condiciones históricas, los temas o
la imágenes, historias y conceptos específicos fueron
alegorías expresados mediante objetos y
acontecimientos).
III. Significación intrínseca Interpretación Intuición sintética (familiaridad Historia de los síntomas culturales, o
o contenido, que iconológica con las tendencias esenciales de símbolos en general (estudio sobre la
constituye el universo de la mente humana), condicionada manera en que, en distintas
los valores simbólicos por una psicología y una condiciones históricas, las tendencias
“Weltanshauug” (cosmovisión o esenciales de la mente humana
visión del mundo) fueron expresadas mediante temas y
concepto específicos.

Análisis Visual De Los Póster De Las Organizaciones Culturales

Fig. 1. Tapa del Magazine de Popayán Cultural (2015)

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El magazine cultural Popayán Cultural, llega a la edición No. 42 en el mes de mayo de 2015, a partir
de esta fecha se suspende la distribución mensual, se tiene en cuenta para este trabajo por su valor
informativo y educativo en la formación de públicos.
DESCRIPCIÓN PREICONOGRAFICA: Portada de un magazine cultural de la ciudad de Popayán, en
formato rectangular, puesto de manera vertical y trabajada en una monocromía donde aparecen dos
segmentos importantes: en la parte superior sobresalen unas letras y datos de publicación y en la
parte inferior una imagen fotográfica que pesa compositivamente al lado derecho. Es una forma
humana que sugiere movimiento dada la posición en la que se encuentra la forma. La superficie
sobre la que se encuentra la figura humana deja ver una textura visual en una tonalidad gris que se
extiende sobre toda la zona rectangular del formato.
DESCRIPCIÓN ICONOGRÁFICA: La fotografía de una presencia masculina, remite a una imagen de un
hombre que camina sobre una calle empedrada, llevando consigo dos bolsas, una más grande que la
otra. La superficie de piedra nos remite a una calle o a un parque por donde atraviesa el hombre la
ciudad colonial. El hombre da la espalda al espectador dando la sensación de desequilibrio por las
bolsas que lleva en cada mano. La sombra que proyecta su cuerpo nos ubica más o menos hacia el
mediodía. El personaje viste con tonos oscuros, porque la mayor parte de la figura está en negro,
destaca el sombrero que lleva sobre su cabeza y remite a que el personaje no vive en una ciudad muy
grande por la manera como viste.
DESCRIPCIÓN ICONOLÓGICA: En su página de Facebook, aparece en el ítem de historia la siguiente
información: “Estrategia de comunicación cultural en Popayán, que incluye impreso mensual, web,
aplicación para dispositivos móviles y redes sociales. Una ayuda para gestores, artistas y espacios
culturales para que el público se agende y participe. Gratuito para gestores y público”.
Es precisamente el objeto de su creación lo que se debe considerar, porque se trata de un medio que
posibilita la circulación, difusión y publicidad de eventos, así como de organizaciones culturales. Su
trabajo de diseño, pensado para un grupo social que consume eventos culturales,
independientemente de estratificación social y de formación académica, llega a todos los individuos
de manera indistinta, abarcando diferentes manifestaciones del arte y la cultura.

Fig. 2. Poster del Festival de Música Religiosa de Popayán (2016).

El Festival de Música de Popayán FESPO, por su parte generó un afiche en el año 2016, en formato
horizontal y evocando la ciudad colonial.
DESCRIPCIÓN PREICONOGRÁFICA: El formato del póster es rectangular y se ubica de manera
horizontal, es un motivo diseñado en varios colores, lo que supone una impresión a varias tintas, el
colorido pasa del azul al marrón, con una buena porción de blanco en su esquema compositivo. El
diseño se divide en dos franjas verticales muy bien definidas y en la parte superior aparece una
caligrafía que da cuenta del evento.

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DESCRIPCIÓN ICONOGRÁFICA: Impacta en primera medida la fotografía en perspectiva de la


Catedral Basílica de la ciudad de Popayán y su palacio arzobispal. Esta estructura arquitectónica
emerge sobre el póster mostrando el peso de una ciudad colonial que ha resistido al paso del
tiempo. Al lado derecho se mezcla y sobresale de una penumbra un instrumento de cuerda, propio
de la música clásica, sobre el que reposa el logotipo de la corporación del festival. El cielo que
aparece sobre el complejo arquitectónico (Torre del Reloj como elemento histórico de
representación de la tradición religiosa) evoca la noche.
DESCRIPCIÓN ICONOLÓGICA: En la misión del evento, publicada en su página web, se puede leer:
“Velar porque se mantenga el ya tradicional Festival de Música Religiosa de Popayán (Patrimonio
Cultural de la Nación, según Ley 891 de 2.004), factibilizando su realización anual cada vez con
mejores niveles artísticos y con enriquecedoras muestras de otras culturas.”
Al tener el evento una trayectoria de más de 50 años, es pertinente ver el sentido tradicionalista del
mismo evento. Se puede observar la Catedral Basílica de la ciudad, con el complejo del palacio
arzobispal, y en la parte de atrás de la foto se levanta erguida la torre del reloj, representando uno de
los sitios arquitectónicos más importantes de la ciudad. El festival al igual que la ciudad, llevan
inmerso el pasar del tiempo, los años han permitido consolidar una tradición musical. A la derecha,
sobresale un instrumento de música clásica, remitiéndonos a la razón de ser de dicho evento, un
estilo de música que no es popular y que tiene un carácter clásico, en otras palabras, se denomina
música culta. El carácter que se le imprime al ser oficialmente reconocido como patrimonio cultural,
sitúa este evento dentro de un circuito cultural de corte nacional e internacional por la calidad y
trayectoria de músicos que viene a participar de éste festival

Fig. 3. Poster del Congreso Gastronómico de Popayán (2016).

El Congreso Gastronómico por su parte, presenta un modelo de afiche que remite al país invitado,
aparecen unos vasos de cerveza que evocan las tonalidades de la cerveza, en esta 14 versión del
evento el país invitado es Bélgica y la región colombiana es el departamento del Huila.
DESCRIPCIÓN PREICONOGRÁFICA: El formato del póster encaja en un cuadrado, es un motivo
diseñado en varios colores, lo que supone también una impresión a varias tintas, los colores que
conforman la composición son el azul oscuro, marrón y amarillo, el fondo recrea una textura visual,
que da la sensación de arrugas. Sobre la franja inferior y superior aparece una caligrafía que informa

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acerca del evento. En medio de éstas franjas, aparecen 3 formas cilíndricas que estabilizan la
composición y el diseño. La propuesta grafica nos muestra una composición en donde las formas nos
remiten a una acción comestible.
DESCRIPCIÓN ICONOGRÁFICA: El cuadrante que tiene la imagen del póster, entra a determinar la
importancia gastronómica del país invitado, en este caso los vasos que contienen cerveza informan
acerca de la importancia que tiene esta bebida en el país invitado, así como los mejillones con las
papas fritas, como una delicia gastronómica de ése país. La variedad de color de los vasos nos
remonta a una maestría cervecera de Bélgica, que puede ir desde cervezas fuertes a cervezas livianas
realizadas con diferentes tipos de ingredientes y técnicas. Destaca además en la imagen chocolates
belgas, y postres típicos. El póster presenta de manera puntual las características gastronómicas del
país, remonta a un país de un alto disfrute de la comida y bebida. Vale la pena mirar la caligrafía
utilizada para el póster, que parte de una escritura en letra cursiva que hace una acción envolvente
en la parte superior del formato, haciendo que llevemos nuestro punto de atención, a las imágenes
de comida que nos presenta esta versión del congreso, juega con las texturas para llevarnos a
experimentar sensaciones gustativas y olfativas.
DESCRIPCIÓN ICONOLÓGICA: En la página de Facebook del congreso dice lo siguiente en la pestaña
de información: “El Propósito es darles a los amantes de la cocina, un espacio para debatir sobre los
alcances de las prácticas gastronómicas de Popayán y el mundo”.
Lo interesante del póster está centrado en el carácter gastronómico como un aspecto que se impone
sobre el espectador, este evento rompe una línea de tradición en la ciudad, y en cambio, busca
arraigarse en la sociedad payanesa. El estilo de la imagen un tanto provocadora, juega con los
sentidos del espectador, al punto de hacerlo sentir completamente olores y sabores, posee la
característica de jugar con el imaginario de un público.
Cabe anotar que este evento se crea desde una elite social para una ciudad, en donde buena parte
de la población, es un estrato bajo y medio, que emerge para escalar posiciones. La buena
gastronomía impone un estatus social, buscando que sus participantes disfruten de la buena mesa y
cocina. Además, pone en evidencia que la ciudad de Popayán no es solamente empanada de pipián,
sino que ya sobrepasa un estándar de comidas típicas, llevando a los cocineros y chefs locales, a
ingresar un mercado gastronómico global.
A pesar de ser un evento con invitado internacional, también es necesario observar que se tiene un
invitado nacional, en este caso diferentes departamentos de Colombia; quiere decir esto, que la
comida local y nacional, cobra importancia y tiene un espacio en un evento de características
internacionales, denota en la organización del evento un aspecto de inclusión que en versiones
pasadas casi no se tuvo en cuenta

Fig. 4. Poster del Festival de Cine Corto (2016).

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El Festival de Cine Corto de Popayán en su octava versión, presenta un modelo ilustrado con el estilo
que caracteriza el evento, las piezas robóticas que se suplantan por partes de una cámara, muestran
una alternativa más plana en dibujos y colores.
DESCRIPCIÓN PREICONOGRÁFICA: El formato del póster es rectangular, el sentido espacial del
diseño está ubicado horizontalmente, es un motivo diseñado en dos colores, lo que supone también
una impresión a varias tintas, los colores que conforman la composición son el azul oscuro, y el gris,
el fondo recrea una textura visual, que da la sensación de un mosaico de pequeños baldosines. Sobre
la franja inferior se encuentra la mayor parte de texto que informa acerca del evento. Las formas
tienen la característica de terminar en puntas agudas, presentando, además, figuras circulares. El
póster presenta diversos planos secuenciados con una lógica de armado.
DESCRIPCIÓN ICONOGRÁFICA: Las partes con la cuales se constituye el modelo para armar de una
especie de androide, que el festival siempre presenta en sus pósteres. En esta versión del festival, el
diseñador juega con la perspectiva y la construcción de cada una de las vistas: frontal, lateral
derecha, lateral izquierda, superior. Con ese juego de vistas presenta un modelo para armar, que el
público perfectamente puede recortar y llevarlo a un modelo tridimensional. Los colores planos del
diseño, permite focalizar la información respectiva del evento y el tipo de fuente utilizado convoca a
un tipo de público juvenil, enfocado a estudiantes universitarios y que gustan del audiovisual.
DESCRIPCIÓN ICONOLÓGICA: En su página de Facebook en la ventana de información se expresa:
“Festival Especializado en el Cortometraje Colombiano que lleva a cabo procesos de formación del
sector, formación de públicos y espacios de intercambio de conocimientos”. Además, se expresa en
su objetivo “Fortalecer la capacidad de formación, producción, exhibición de cine en el
departamento del Cauca a través del desarrollo del Festival de Cine de Popayán”.
El evento difunde la imagen audiovisual local, regional, nacional e internacional, por medio de
talleres, clases magistrales y muestras de audiovisuales. Por su organización y buena acogida, este
certamen lleva 8 versiones y año tras año crece, apoyado por un público universitario. La posibilidad
de sobreponer en las paredes del sector histórico la imagen en movimiento es un punto propositivo
que afecta el espacio público. La concepción imaginaria de una ciudad blanca, inmaculada e
incólume, pierde legitimidad cada vez que se proyectan sobre sus paredes las películas que nos
ofrece este festival. El evento es interesante en la medida en que logra afectar e intervenir por medio
de colores, sonoridades y un sinfín de emociones la ciudad.

A Manera De Conclusión

Probablemente el ejercicio pueda extenderse mucho más, pero lo que cuenta en este punto es
visibilizar un proceso de lectura del póster. Aquí se reafirma la idea según la cual esta herramienta
comunicativa puede reforzar, transformar o construir imaginarios culturales. Desde esta óptica es
claro que los pósteres se encargan de recrear un aspecto pedagógico, que es precisamente el de
educar y formar a un público por medio de nuevas alfabetizaciones visuales.
Como se puede apreciar, la imagen en estudio revela el sentido íntimo de unas relaciones de poder
que las mismas organizaciones avalan desde sus propuestas culturales, ya que presentan eventos
que buscan un determinado tipo de público. En este sentido, se puede dimensionar un concepto de
cultura que cada organización defiende desde su quehacer, debido a las relaciones que los eventos
mantienen con el público, en la forma en que unos se abren a la ciudad y otros se cierran a
estructuras más íntimas.
El proyecto de Popayán Cultural, en este sentido, cobra una vitalidad inédita, porque emerge hacia
todas las audiencias, mira a sus públicos desde una horizontalidad, todos reciben el mismo trato;
mientras que el Festival de Música de Popayán (FESPO), se arraiga en un pequeño grupo que disfruta

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de la música clásica en sus distintas expresiones, situándolos en una relación de verticalidad y


concepción hegemónica de la cultura.
El Congreso Gastronómico de Popayán es un evento que surge en una clase prestante de la ciudad,
para una élite de personas de clases sociales favorecidas, pero con el transcurrir de las versiones tuvo
que abrirse camino hacia todas las clases sociales para buscar un sentido de arraigo y pertenencia en
la ciudad; se manejan entonces relaciones de poder verticales y horizontales, procurando un sentido
de democratización de su oferta cultural.
El Festival de Cine Corto de Popayán nace en el seno de un grupo de personas amantes del
audiovisual, que busca en un público fundamentalmente universitario -es decir, letrado, en cierto
sentido- constituirse como un evento de trayectoria en la ciudad; el tipo de relaciones que surgen
son de horizontalidad y verticalidad, dado que hay un público conocedor del lenguaje
cinematográfico y otro que disfruta del audiovisual.
Las organizaciones estudiadas pugnan por la realización de eventos que procurar nutrir la agenda
cultural de la ciudad, cada una quiere establecer una línea de tradición, que en ocasiones solo la
pueden otorgar los apellidos y abolengos de una ciudad colonial. Si nos remitimos al póster como
pieza comunicativa y educativa, lo podemos observar en la forma en que publicitan sus eventos,
puesto que llevan implícita una estética, una idea de ciudad que se quiere.
Por ahora es importante dimensionar el carácter y la fuerza que tienen las imágenes en nuestra
cotidianidad, y aún más, las imágenes que surgen a partir de las organizaciones culturales locales. Lo
interesante es ver como las imágenes que promueven la agenda cultural se abren camino en una
ciudad que vive la tensión dual de, por un lado, ufanarse como ciudad cultural, y, por el otro, el decir
de muchos de sus habitantes que afirman que “en Popayán no hay nada para hacer”. La tensión
también se evidencia en la versión que supone que la ciudad no posee una rica y variada agenda
cultural y, en contraste, algunos gestores señalan que no hay público para los espectáculos o eventos
culturales.
Lo cierto es que la evidencia muestra que sí hay una oferta cultural pero muchas veces esta no es
suficientemente conocida o apropiada. La comunicación digital a la que las organizaciones culturales
apelan trata de subsanar la situación y con el póster estas organizaciones buscan una suerte de
posicionamiento que contenga también elementos pedagógicos sobre su quehacer cultural. A
propósito de las consideraciones finales, afín al tipo de análisis, proponemos una iconografía que
resume los puntos principales de análisis.

Agradecimientos. A los grupos de Investigación ECCO (Universidad del Cauca) y PSIEDU (Universidad
Cooperativa de Colombia), por su apoyo para la realización y presentación de este trabajo.

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Limites e possibilidades para implementação da modalidade EAD


na Universidade Federal de Goiás – Regional Jataí

Patrícia Moraes Veado ¹, Andrea Cristina Versuti ²

1Programade Pós-Graduação em Educação Universidade Federal de Goiás, Brasil.


patriciamoraesv@gmail.com
2Departamento de Métodos e Técnicas Universidade de Brasília, Brasil. andrea.versuti@gmail.com

Resumo. Este texto objetivou verificar os limites e possibilidades existentes para a implementação da
modalidade de Educação a Distância na Universidade Federal de Goiás em sua Regional Jataí. Para tanto, foi
realizada uma pesquisa qualitativa por meio de uma análise documental do Plano de Desenvolvimento
Institucional, orientadas a partir das seguintes categorias: EAD, TIC, UFG/REJ. Também foram analisados os
dados contidos no site do Centro Integrado de Aprendizagem em Rede e do Relatório de Autoavaliação
Institucional da UFG. Como resultado, verificamos que existem possibilidades para a implementação da
modalidade por meio das metas do PDI, entretanto, os demais dados demonstram que existem limites para
essa implementação, como as discrepâncias no desenvolvimento da modalidade entre as regionais da UFG,
por haver carências nos recursos tecnológicos e na disponibilidade de conexão de internet adequada.
Palavras-chave: Educação a distância; Universidade Federal de Goiás/REJ; Análise Documental.

Limits and possibilities for the implementation of the distance education modality at the Federal
University of Goiás – Jataí Regional
Abstract. This text aimed to verify the limits and possibilities for the implementation of the Distance Education
modality at the Federal University of Goiás in its Jataí Regional. For that, a qualitative research was carried
out by means of a documentary analysis of the Institutional Development Plan, oriented from the following
categories: EAD, TIC, UFG / REJ. Also analyzed were the data contained in the website of the Integrated Center
for Network Learning and the UFG Institutional Sef-Assessment Report. As a result, we verified that there are
possibilities for the implementation of the modality through the goals of the IDP, however, the other data
demonstrate that there are limits to this implementation, such as the discrepancies in the development of
the modality between the regional of the UFG, due to the lack of resources and the availability of adequate
internet connection.
Keywords: Distance Education; Universidade Federal de Goiás/REJ; Documentary Analysis.

1 Introdução

O presente texto foi produzido a partir dos resultados de uma pesquisa de mestrado, realizada na
Universidade Federal de Goiás sobre a modalidade de Educação a Distância. Tal pesquisa deu-se pelo
fato de haver um desenvolvimento exponencial da modalidade no Brasil a partir do ano de 2009, o que
pode ser verificado através dos dados dos CENSO EAD.BR 2009 e 2015. Assim, em 2009 tivemos o
número de 528.320 alunos matriculados, em 2013 o número chegou a 4.044.315, o que representa
um aumento de sete vezes o número de 2009. Na última pesquisa, de 2015, este Censo contabilizou
5.048.912 alunos, ou seja, um aumento de 1.004.597 (Abed, 2016).
Ao verificarmos essa expansão notamos que o mesmo não ocorre na Universidade Federal de Goiás
na sua Regional de Jataí, cidade localizada no sudoeste do estado de Goiás, o qual também tem
desenvolvido a modalidade EAD em menor escala quando comparado com os demais estados,
principalmente os das regiões sul e sudeste do país, o que também pode ser verificado nos Censos
supracitados acima. Ainda se tratando de divergências do desenvolvimento da modalidade,

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verificarmos que existem disparidades nas ações que envolvem essa modalidade entre a UFG –
Regional Goiânia e UFG/ REJ. Essa disparidade é verificada ao analisar os dados do Centro Integrado
de Aprendizagem em Rede da Universidade Federal de Goiás (CIAR/UFG), órgão responsável por apoiar
e incentivar as práticas que envolvam as TIC, tanto na modalidade presencial, quanto a distância.
Assim, ao fazermos os primeiros levantamentos dos dados da modalidade EAD na UFG/REJ notamos
que nenhuma ação estava sendo desenvolvida no ano de 2016, bem como não havia, até aquele
momento, nenhum estudo da modalidade nesta regional. Sendo assim, realizamos essa pesquisa com
o objetivo de verificar e discutir quais são os limites e possibilidades existentes para a implementação
da modalidade EAD na UFG/REJ.

2 Metodologia
Uma pesquisa torna-se relevante à medida que, por meio de um rigor científico, sistematização e ética,
encontra respostas a determinadas questões que irão contribuir para a compreensão de determinada
situação, aperfeiçoamento de ações, respostas aos problemas. O movimento da pesquisa, que busca
de forma exaustiva explicação para os fenômenos em questão, irá contribuir para o conhecimento da
realidade e desenvolvimento do ser humano (Richardson, 2014).
Por haver uma diversidade de enfoques, técnicas e métodos, utilizados nas pesquisas para a análise
de dados, bem como de todo o desenrolar da pesquisa, entendemos a importância de limitar o
presente estudo e classificá-lo, conforme aponta Gil (2010), considerando os objetivos, o ambiente da
pesquisa, a abordagem teórica e análise de dados.
Sendo assim, nossa opção metodológica faz-se pela pesquisa de cunho qualitativo, como uma análise
documental. Por se tratar de uma particularidade, um objeto de estudo que não pode ser
compreendido fora do seu contexto, a qual não é possível uma análise em laboratório ou mesmo
passível de ser analisado de forma isolada, entendemos que se trata, ainda, de um estudo de caso, tal
como foi retratada por Yin (2005).
Sobre a pesquisa qualitativa, Goldenberg (2004, p. 50) enfatiza que “o pesquisador qualitativo buscará
casos exemplares que possam ser reveladores da cultura em que estão inseridos. O número de pessoas
é menos importante do que a teimosia em enxergar a questão sob várias perspectivas”. Assim,
compreendemos que a análise exaustiva (qualitativa) dos dados, de forma sistematizada, explicará a
importância deste estudo.
Wilhelm Dilthey e Max Weber foram os primeiros pesquisadores que propuseram uma nova forma de
investigação, nos séculos XVII e XIX, que contrapunha os métodos das ciências físicas e naturais,
portanto, as concepções positivistas, que predominavam até o momento e que se fartavam de uma
ciência baseada na mensuração, divisão da realidade (sujeito versus objeto) e isolamento dos dados,
valendo-se unicamente das questões de explicação causal. Esses pesquisadores se atentaram para a
importância de compreender os significados que são construídos pelos sujeitos a partir de um
contexto, por meio de uma visão holística dos fenômenos, o que resulta num estudo mais detalhado
e completo (Gatti & André, 2013).
Assim, entendemos que a pesquisa qualitativa se tornou uma importante forma de pesquisar nas
Ciências Sociais, bem como na Educação, uma vez que, a partir dessa visão holística, que se atenta
para as particularidades e para como os fenômenos são construídos, pôde-se compreender melhor os
processos escolares. Sobre isso, Gatti e André (2013) assinalam quatro contribuições:

A incorporação, entre os pesquisadores em Educação, de posturas investigativas mais flexíveis e com


maior adequação para estudos de processos micro-sócio-psicológicos e culturais, permitindo
iluminar aspectos e processos que permaneciam ocultados pelos estudos quantitativos;

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A constatação de que, para compreender e interpretar grande parte das questões e problemas da
área da Educação, é preciso recorrer a enfoques multi/inter/transdisciplinares e a tratamentos
multidimensionais;
A retomada do foco sobre os atores em educação, ou seja, os pesquisadores procuraram retratar o
pondo de vista dos sujeitos, os personagens envolvidos nos processos educativos;
A consciência de que a subjetividade intervém no processo de pesquisa e que é preciso tomar
medidas para controlá-la (Gatti e André, 2013, p. 34).

Assim, a abordagem qualitativa proporciona uma pesquisa na qual os fenômenos estudados serão
analisados com mais profundidade, o que oportuniza a descoberta de novos caminhos, soluções, que
não seria possível apenas com a pesquisa quantitativa. Tal fato, justifica a nossa escolha por esta
pesquisa qualitativa.
Sendo assim, a escolha pela pesquisa qualitativa neste trabalho deu-se pelo fato de buscarmos uma
maior compreensão dos limites e possibilidades para a implementação da modalidade EAD na
UFG/REJ, uma vez que foi constatado que a mesma não vem se desenvolvendo como nas demais
regiões do país e até mesmo na Regional Goiânia. Objetivamos, nessa perspectiva, contribuir com
novas informações, aprofundadas e ilustrativas, opondo assim à ideia de mensurar e quantificar os
valores e as trocas simbólicas, para que essa implementação seja possível.
De forma mais específica, o presente estudo trata-se, ainda, de um estudo de caso, o que, segundo Yin
(2005), é uma importante estratégia metodológica para a pesquisa em Ciências Humanas, pois permite
ao investigador um aprofundamento e desvelamento das minúcias do fenômeno a ser investigado, a
partir de uma visão holística e sistêmica.
Conforme sugere Yin (2005), num estudo de caso devemos atentar para que haja uma definição dos
limites da pesquisa, em que o pesquisador se empenhe ao máximo na coleta das evidências relevantes,
considerando ainda o tempo para a execução da pesquisa. Logo, podemos considerar que cada “caso
é um caso”, o que justifica um estudo profundo e detalhado de uma determinada situação, a
considerar suas particularidades. O autor também ressalta a importância das fontes de dados, como
documentos e entrevistas. O material coletado a partir da fonte de dados será importante para avaliar
as evidências, uma vez que as informações obtidas nos documentos nem sempre condizem com a
realidade encontrada. Assim, Yin (2005) sugere a triangulação dos dados, portanto, a utilização de
várias fontes de evidências, como estratégia de validação.
Isso demonstra, portanto, que a UFG/REJ possui um caráter singular, por haver uma diferença da
UFG/REJ em relação às demais IES do Brasil, às regionais da UFG e em relação ao que está imposto nos
documentos oficiais.
A análise documental, segundo Bardin (1977, p. 45), consiste numa “operação ou um conjunto de
operações visando representar o conteúdo de um documento sob uma forma diferente da original, a
fim de facilitar num estado ulterior, a sua consulta e referenciação”. A referida autora afirma que essa
análise tem por objetivo transformar as informações de forma a facilitar o seu acesso para o
observador, proporcionando-lhes assim, um maior número de informações.
Bardin (1977) explica que a análise documental permite fazer uma indexação-classificação das
informações, categorizando as palavras-chave, descritores ou índices. Com isto, torna-se possível uma
condensação das informações e a posterior elaboração de um documento secundário, em que as
informações pertinentes da temática em foco estejam presentes.
Bardin (1977, p. 46), destaca que esse tipo de tratamento das informações é análogo às técnicas da
análise de conteúdo: “A operação intelectual: ventilação em categorias segundo o critério da analogia,
representação sob forma condensada por indexação, é idêntico à fase de tratamento das mensagens
de certas formas de análise de conteúdo”. Entretanto, elas se diferem no seguinte:

A documentação trabalha com documentos; a análise de conteúdo com mensagens (comunicação).

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A análise documental faz-se, principalmente por classificação-indexação; a análise categorial


temática é, entre outras, uma das técnicas da análise de conteúdo.
O objectivo da análise documental é a representação condensada da informação, para consulta e
armazenagem; o da análise de conteúdo, é a manipulação de mensagens (conteúdo e expressão
desse conteúdo), para evidenciar os indicadores que permitam inferir sobre uma outra realidade
que não a da mensagem (Bardin, 1977, p. 46).

Diante disto, realizamos uma análise objetivando elucidar informações importantes diante de
documentos institucionais. Para tanto, fez-se necessária a categorização, que consiste em agrupar
elementos constitutivos de um conjunto (Bardin, 1977). As categorias eleitas nesta análise partiram
do objetivo da pesquisa, que buscou verificar e discutir os limites e possibilidades da modalidade EAD
na UFG/REJ, sendo elas: modalidade de Educação a Distância (EAD), Tecnologias da Informação e
Comunicação (TIC) e Universidade Federal de Goiás – Regional Jataí (UFG/REJ).
São justamente estes procedimentos que deram forma à análise documental desta pesquisa. Esta
análise partiu da necessidade de elucidar quais são as informações contidas nos documentos legais da
UFG que contribuiriam para a implementação da modalidade EAD na UFG/REJ. Esta análise será
apresentada a seguir.

3 Análise da modalidade EAD na Universidade Federal de Goiás – Regional Jataí

3.1 Dados da modalidade EAD/UFG no CIAR

A modalidade de EAD teve suas primeiras atividades desenvolvidas na Universidade Federal de Goiás,
oficialmente, no ano 2000, com a criação do Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação a
Distância – UFG Virtual, regulamentado pela Resolução CONSUNI, nº 05/2000, com o objetivo de
promover a modalidade na UFG. Porém, em 2007, foi implementado o Centro Integrado de
Aprendizagem em Rede (CIAR), regulamentado pelo CONSUNI, nº 02/2007, e, com a implantação deste
sistema, a UFG Virtual foi extinta, passando o CIAR a ser o órgão responsável por atender as
necessidades e demandas no âmbito do uso das TIC na modalidade presencial e à distância. Entretanto,
não mais no sentindo da promoção da modalidade, mas para implementar e dar apoio à todas as
atividades que se desenvolverem nesse âmbito na UFG, funcionando de acordo com as políticas
públicas implantadas pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) e pela UFG relativas a EAD.
Conforme consta nos dados do site do CIAR1, até 2014, os números eram de 5.179 alunos formados,
distribuídos em diferentes níveis: Aperfeiçoamento (914); Especialização (1.225); Graduação (834);
Extensão (2.162); Mestrado (44). Em 2015 houve um acréscimo de formandos e os números passaram
para o total de 8.781, distribuídos em: Aperfeiçoamento (1.203); Especialização (2.102); Graduação
(834); Extensão (4.598); Mestrado (44) (CIAR, 2016). Nota-se que em apenas um ano houve um
acréscimo relevante no total de alunos formandos, principalmente no nível da Extensão (2.436).
Entretanto, notamos que a cidade de Jataí, cidade que possui uma Regional da UFG, teve um número
inferior, de 97 do total de alunos formados, quando comparado com outros municípios do estado,
como as cidades vizinhas Mineiros, com 113 formandos, e Rio Verde, com 186 formandos. No gráfico
a seguir fica ainda mais evidente esta discrepância. Além disso, atualmente, no ano de 2016, não há
nenhuma turma com polo em Jataí em andamento, como também, até a conclusão deste texto, não
há previsão de cursos para esta cidade, conforme anuncia o site do CIAR2. Isso demonstra que não

1 Disponível em: http://www.ciar.ufg.br/dadoseadufg. Acesso em: 30 jun. 2016.


2 Disponível em: http://www.ciar.ufg.br/dadoseadufg#sintese. Acesso em: 10 nov 2016.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

estão ocorrendo ações específicas da modalidade na UFG/REJ. Esse fato pode ser confirmado no
gráfico3 abaixo que ilustra os municípios que têm polos com turmas em atividades.

Gráfico 1: Turmas em atividade ano 2016 na modalidade EAD UFG. Fonte: Disponível em:
http://www.ciar.ufg.br/dadoseadufg#sintese

Portanto, os dados contidos nesses gráficos nos dão margem para uma interpretação de como a
modalidade está sendo implementada e desenvolvida na UFG. É notória a discrepância das ações que
envolvem a modalidade entre as regionais ao observarmos no gráfico um que o número de formandos
no polo da UFG/REJ é inferior a Regional Goiânia, a Catalão, cidade, que assim como Jataí, também
possui uma Regional, a Rio Verde e Mineiros, cidades vizinhas. Por fim, no gráfico dois, notamos a
ausência desta Regional nas atividades desenvolvidas no ano de 2016, o que confirma que nenhuma
ação da modalidade aconteceu neste ano. Com isto, constatamos que a modalidade não tem se
desenvolvido na UFG/REJ da mesma forma que nas demais cidades que atuam como polo da EAD/UFG.
Sendo assim, com intuito de verificar quais são as possibilidades que existem para a implementação
da modalidade EAD na UFG/REJ realizamos a análise documental do PDI desta instituição, que será
detalhada a seguir.

3.2 Análise do Plano de Desenvolvimento Institucional da Universidade Federal de Goiás

O Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI4) da UFG é um documento que tem como principal
objetivo planejar as ações da instituição, dentro do período de abrangência estabelecidos, de forma a
sinalizar as atividades a serem desenvolvidas, ainda serve como instrumento para avaliar a progresso
da instituição e, grosso modo, este documento representa a identidade da universidade.
O último PDI da UFG refere-se aos anos de 2011 a 2015 e foi aprovado em Reunião Ordinária do
Conselho Universitário da UFG no dia 06/05/2011. Este documento deve estar em conformidade com
os princípios do Estatuto da Universidade Federal de Goiás. Dentre os oito princípios, destacamos ao
6º e 7º que prezam o seguinte:
[...]VI. O compromisso com a democratização da educação, no que concerne à gestão, à igualdade
de oportunidade de acesso, e com a socialização de seus benefícios;
VII. O compromisso com a democracia e com o desenvolvimento cultural, artístico, científico,
tecnológico e socioeconômico do país; [...] (UFG, 2011, p. 13).

3 Disponível em: http://www.ciar.ufg.br/dadoseadufg. Acesso em: 05 jul. 2016.


4 Disponível em: https://prodirh.ufg.br/n/5163-publicacao-on-line-do-pdi-2011-2015-da-ufg Acesso em 27 jun. 2016.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Ao interpretarmos esses princípios, com foco a modalidade EAD, inferimos que a modalidade está
contemplada nestes itens. Isso pode ser considerado uma vez que a modalidade proporciona
elementos necessários para a democratização da educação, capaz de alcançar pessoas desprivilegiadas
geograficamente, que não teriam acesso à educação, contribuindo, ainda, para o desenvolvimento
cultural, artístico, científico, tecnológico e socioeconômico do país.
Verificamos que a modalidade EAD é inserida e discutida no decorrer do PDI, quando dispõe ações
dessa modalidade, tanto para os cursos presenciais, quanto para os cursos a distância, em vários
capítulos. Em suma, ela é contemplada no capítulo 3 “Políticas Institucionais”, nos tópicos: Política de
Graduação; Política de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação; Política de Extensão e Cultura; Política de
Administração, Planejamento e Gestão de Pessoas. Porém, há tópicos específicos que abordam a
modalidade EaD, no capítulo 5 – “A graduação na UFG: aspectos didático-pedagógicos” e “Políticas e
Práticas de Educação a Distância”, já no capítulo 6 – “As atividades Institucionais, abrangendo o tema:
Educação a Distância” (UFG, 2011).
Outro enunciado importante revelado no PDI é o fato da UFG considerar relevante as mudanças que
vêm ocorrendo na sociedade, no que diz respeito, principalmente, ao desenvolvimento tecnológico.
Desta forma, a instituição em questão tem consciência da irreversibilidade do mundo tecnológico
digital que estamos inseridos e o analisa da seguinte forma no tópico “Política de Administração,
Planejamento e Gestão de Pessoas”:
No atual cenário de desenvolvimento tecnológico, a política de informática ocupa um lugar de
destaque. A ferramenta computacional adquiriu tal dimensão e relevância nas atividades
acadêmicas e administrativas que torna-se indispensável o fortalecimento da área, tanto do ponto
de vista organizacional, como do ponto de vista de pessoal e de infraestrutura (UFG,2011, p. 38)
Este item propõe, portanto, novos desdobramentos que considerem as atuações e envolvam as
tecnologias (digitais), fortalecendo-as, tanto por meio de políticas que ampliem essas atuações, como
através de recursos financeiros favoráveis e adequados para o desenvolvimento dessas atuações,
almejando, por meio do uso das tecnologias digitais, novas alternativas que favoreçam o desempenho
da universidade em âmbito educacional e administrativo pelo concurso das seguintes ações:
[...]Possibilitem ao Centro de Recursos Computacionais (CERCOMP) condições para integrar os
serviços de desenvolvimento de sistemas, gerência de redes, manutenção de hardware, treinamento
em informática.
Criem condições para o uso de tecnologias de computação em grade e de alto desempenho, em
conjunto com o Centro Nacional de Processamento de Alto Desempenho PDI 2011 -2015
(CENAPAD), e para a construção de salas de teleconferência e de um laboratório de visualização
científica e de informações.
Implantem medidas que facilitem a integração dos professores, servidores técnico-administrativos
e alunos da UFG, por meio da criação de grupos de discussões pela UFGNet.
Regulamentem e incentivem o uso de software livre, bem como estabelecer um plano de
investimento em hardware.
Promovam uma contínua revisão e modernização dos instrumentos legais da UFG, de modo a
adaptá-los à realidade atual da instituição, promovendo a adequação de procedimentos e rotinas
administrativas com o objetivo de proporcionar o gerenciamento mais eficiente dos recursos
humanos e materiais, além das ações acadêmicas e administrativas [...] (UFG, 2011, p. 39, 40).
No quinto capítulo, intitulado “A graduação na UFG: aspectos didáticos-pedagógicos”, a modalidade
ganha destaque em “Políticas e Práticas de Educação a Distância”. Aqui, a modalidade é inserida por
uma descrição conceitual e histórica desta, na UFG, e por uma apresentação do CIAR. Descreve-se
também a intenção que a UFG tem de desenvolver políticas para a modalidade de Educação a
Distância, a fim de democratizar o ensino, eis um trecho: “A UFG tem como propósito desenvolver
políticas de educação a distância que favoreçam sua atuação como instituição que promove a
democratização do ensino” (UFG, 2011 p.61). Neste capítulo, enuncia-se o tema “Práticas pedagógicas

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inovadoras” que contemplam o sistema de tutoria e aprendizagem em rede, que são elementos da
modalidade EAD.
Ainda neste capítulo, estabelece-se que os cursos da universidade, presenciais e a distância, devem
elaborar um Projeto Pedagógico do Curso (PPC) e que este deve estar em consonância, entre outras
legislações, com a LDB, as Diretrizes de cada curso, o Regimento e Estatuto Interno da UFG, o
Regulamento Geral da UFG, além deste próprio documento em análise, o PDI. Tal projeto deve dispor
as diretrizes políticas e metodológicas de cada curso, de modo a demonstrar o perfil do curso em
questão, passando, ainda, por uma avaliação dos Conselhos das Unidades Acadêmicas ao término de
sua elaboração.
No sexto capítulo, intitulado “As atividades Institucionais”, a modalidade EAD é novamente abordada
dentro do tema: “Educação a Distância”. Neste tópico, são discutidos os avanços que a modalidade
vem tendo nos últimos anos no Brasil e a forma como ela acontece na UFG, referenciando-se o
incentivo da UAB em parceria com prefeituras para a implementação dos polos, cujo órgão responsável
pela modalidade nessa instituição é o CIAR.
Posteriormente, o PDI é estruturado em nove eixos5, a estabelecer o total de 137 metas, designadas
várias ações para cada meta, para o período de 2011 a 2015. A modalidade EAD está contemplada de
forma direta em quatro metas e designada em 13 ações para essas metas. De modo geral, as metas
sugerem: implementação de políticas, expansão, consolidação do órgão responsável, o CIAR, ações de
divulgação e debates, busca de parcerias para estruturação de polos em diversos municípios do estado,
apoio às unidades acadêmicas, para que seja possível inserir aspectos da modalidade.
A modalidade EAD ainda é contemplada em mais 13 metas, quando as ações se referem à modalidade
presencial e a distância. Essas metas propõem: expansão dos cursos na UFG, revisão da estrutura
acadêmica, ampliação de disciplinas de núcleo livre, avaliação dos cursos, aumento de vagas para
ingressos, crescente número de concluintes dos cursos, preenchimento de vagas remanescentes,
revisão das matrizes curriculares (tendo em vista a inclusão de aspectos da modalidade), avaliação de
políticas de estágio, ampliação de atividades que envolvem o fórum permanente de graduação,
acréscimo do número de laboratórios e núcleos de ensino e apoio para a pós-graduação lato sensu.
Por fim, as TIC que perpassam a implementação efetiva da modalidade, também são contempladas
em nove metas, prevendo a inserção dessas tecnologias no âmbito geral da UFG. Essas metas
estabelecem: discussão sobre o uso das TIC na Educação; desenvolvimento das tecnologias para apoiar
os cursos, tanto presencial, como a distância; produção de diferentes formas de ensino que
contemplem as mídias; investimento nas TIC para estabelecimento de comunicação entre os campus
da UFG; uso das TIC para aumentar o número de concluinte dos cursos; adequação das salas para o
uso das TIC; incentivo para o uso de canais colaborativos; concepção do Plano Diretor de Tecnologias
da Informação (PDTI); criação de equipes específicas e capacitadas para gerenciar o uso das diversas
tecnologias na UFG.
Em síntese, estas são as ações políticas previstas no PDI que contemplam a modalidade EAD.
Consideramos que essas metas podem criar possibilidades para que a implementação da modalidade
EAD ocorra na UFG/REJ.
Por outro lado, com o intuito de verificar como tem ocorrido o processo de ensino e aprendizagem na
UFG/REJ e se esta tem inserido aspectos da modalidade EAD em suas atividades, realizamos uma
análise do Relatório de Autoavaliação Institucional de 2013- 2014 da UFG, a qual será exposta a seguir.

5Eixo 1 – Finalidades, Estrutura, Expansão, Integração com a Sociedade, Mobilidade e Interdisciplinaridade; Eixo
2 – A Graduação na UFG; Eixo 3 – A Pesquisa, a Pós-Graduação e a Inovação na UFG; Eixo 4 – A Extensão e a
Cultura na UFG; Eixo 5 – Planejamento, Administração e Gestão de Serviços e Pessoas; Eixo 6 – A Comunicação
na UFG; Eixo 7 – As Relações Internacionais na UFG; Eixo 8 – O Social na UFG e Eixo 9 – O Esporte e o Lazer na
UFG (UFG, 2011, p. 89)

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3.3 Dados do Relatório Autoavaliação Institucional 2013- 2014 da UFG

O Relatório Autoavaliação Institucional é um documento elaborado pela Comissão Própria de


Avaliação (CPA) no âmbito da UFG é denominada de Comissão de Avaliação Institucional (CAVI)
conforme Resolução do Conselho Universitário (CONSUNI) no. 14/200916, no relatório essa comissão
é tratada de CPA/CAVI. Neste documento estão expostos a autoavaliação dos cursos da UFG, tanto da
graduação, como da pós-graduação, em suas modalidades presencial e à distância, das regionais:
Catalão, Cidade de Goiás, Goiânia e Jataí, bem como dos Núcleos de Gestão.
A despeito do uso das TIC no processo de ensino e aprendizagem o documento ressalta a importância
de fazer o uso dessas tecnologias no âmbito educacional da UFG, visando um rompimento com os
modelos de aula tradicional, modelos esses que estão desconexos com a realidade do aluno. Ainda há,
neste documento, a afirmação da importância da oferta de cursos, tanto na modalidade presencial
como à distância, o qual visa uma socialização plena do conhecimento entre os indivíduos, bem como
a inserção destes na sociedade. Isto justifica a expansão da instituição nos últimos anos e que deve
justificar também, a expansão da modalidade EAD.
Entretanto, no decorrer do documento, no item 4.7 que denominado de “Infraestrutura física, para
ensino, a pesquisa e a extensão”, alguns problemas são revelados, que direta ou indiretamente
poderão interferir na implementação da modalidade EAD na UFG/REJ, tornando-se os limites dessa
implementação. Sobre essas problemáticas o documento expõe:

As respostas obtidas nessa dimensão mostram a valorização e a importância dada, pela comunidade
acadêmica, às condições de infraestrutura. São constantes os argumentos apontando a carência
material e, como regra geral, prevalece a tendência de se destacar os aspectos negativos da
infraestrutura e de se pontuar o material que ainda não se tem ou é insuficiente (UFG, 2015, p. 45).

Nesse trecho do documento há um apontamento das condições físicas, que podem ser escassos em
vários setores da UFG, desde a biblioteca, com estrutura insuficiente para atender a demanda, setores
administrativos, iluminação, e o que mais nos interessa, como a sala de aula e os recursos tecnológicos,
como computadores e internet.
No item 5.5 que trata da “Análise da percepção dos discentes da Regional Jataí”, verificamos nas
respostas uma possível realidade da Regional, bem como os limites existentes para o desenvolvimento
da modalidade EAD. É importante ressaltar que na maioria das respostas um percentual de 30% dos
alunos não respondeu as questões. Entre as várias respostas, abordamos as que de certa forma
interverem no desenvolvimento da modalidade, que diz respeito a técnica de estudo, material usado
em sala de aula, avaliação e disponibilidade do professor.
A maioria dos alunos, 50,67%, responderam que a técnica de estudo que predomina são as expositivas
com participação do aluno. Já 11,59% respondeu que aulas expositivas sem a participação do aluno
acontecem e um percentual menor de 3,17% e 2,07% responderam ter trabalhos em grupos e aulas
práticas, respectivamente, como técnica de estudo.
No que se refere ao tipo de material usado em sala de aula, as respostas foram as seguintes: 34,85%
para livros-textos e/ou manuais; 16,67% cópias de trechos ou capítulos de livros; 11,91% apostilas e
resumos; 4,61% artigos e periódicos especializados; 1,63% anotações manuais e cadernos de notas.
Sobre a avaliação utilizada pelos professores obteve-se como respostas: 36,33% utilizam prova escrita
discursiva e objetiva; 26,91% prova escrita discursiva.

6Disponívelem:<http://sistemas.ufg.br/consultas_publicas/resolucoes/arquivos/Resolucao_CONSUNI_2009_0014.pdf>.
Acesso em: 01 jan. 2017.

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Quanto à disponibilidade dos professores para orientação extraclasse: 28,88% responderam que a
maioria dos professores têm disponibilidade; 13,87% todos têm disponibilidade; 13,64% a metade dos
professores têm disponibilidade; 11,77% a minoria tem disponibilidade e 0,94 não têm disponibilidade.
Sobre a infraestrutura, no que diz respeito ao acesso às ferramentas computacionais, 21,99%
responderam que a unidade acadêmica disponibiliza de forma limitada, mas satisfatória, já 19,38%
respondeu que a disponibilidade acontece de forma ilimitada e satisfatória. Um percentual de 15,26%
respondeu que viabiliza de forma limitada e insatisfatória. 8,02% diz ser ilimitada e insatisfatória.
Essas respostas, mesmo havendo 30% de abstenções, nos levam a pensar como o processo de ensino
e aprendizagem tem ocorrido na UFG/REJ. Como foi verificado, não há um percentual de ações que
envolvem as TIC nesse processo, sugerindo que, ações de atividades que visem romper com o modelo
de aula tradicional, como recomendado nesse próprio documento (Autoavaliação), no PDI, no CIAR e
no que se tem discutido sobre a educação no cenário educacional, não tem ocorrido nessa Regional.

4 Conclusões

Diante do exposto, compreendemos que a UFG tem se atentado para o uso das TIC na Educação,
porém, ainda não há as condições necessárias para o pleno desenvolvimento deste uso, evidenciando
as limitações para a implementação da modalidade EAD, principalmente na UFG/REJ onde há poucas
ou nenhuma ação ocorrendo que envolva a modalidade, o que fica evidente ao observarmos os
gráficos do CIAR e as respostas do Relatório de Autoavaliação.
Consideramos que, se as ações que contemplam a modalidade EAD previstas no PDI, caso fossem
efetivadas, criariam possibilidades com elementos primordiais para implementação da modalidade
EAD na UFG/REJ, entretanto, como vimos, existem limitações verificadas por meio das análises deste
trabalho, como pode haver outras limitações que ainda não foram verificadas, que dificultam essa
implementação. Ao analisar o Relatório de Autoavaliação da UFG (2013-2014) verificamos algumas
dessas limitações, como a falta de conexão de internet adequada, com velocidade de banda larga e de
fácil acesso, a infraestrutura insuficiente, carência de material, principalmente no que diz respeito aos
recursos tecnológicos como o computador e condições de uso deste.
Posto isto, verificamos que existem possibilidades de implementações através das ações previstas no
PDI, ou seja, o documento mostra que a UFG se preocupa e reconhece a importância do uso das TIC
na Educação, porém, a realidade da UFG/REJ demonstra que existem muitas limitações que
impossibilitam, o ano de 2016, essa implementação.
Notamos, portanto, que a forma como a UFG vem desenvolvendo a modalidade, demonstra que as
ações de expansão são concentradas na capital Goiânia e não são praticadas da mesma forma em suas
demais regionais, isto fica notório ao verificar que o número de polos e formandos é maior na capital,
bem como, nenhum curso foi ofertado no ano de 2016.
Isso demonstra a necessidade premente de ações, provenientes de políticas públicas, que visem
incentivar a implementação da modalidade EAD na UFG/REJ com qualidade. Importante haver um
movimento que atente para questões dessa modalidade de forma significativa, a fim de estimular um
desenvolvimento da modalidade nessa Regional, entendendo que, o mundo está em transformação e
que as práticas pedagógicas fundamentadas num modelo tradicionalista podem não ser mais
suficientes para o aluno do século XXI que vive conectado.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Referências

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Aprendizagem a Distância no Brasil 2015. (2016). Curitiba: Ibpex. Disponível em:
<http://abed.org.br/arquivos/Censo_EAD_2015_POR.pdf> Acesso em 10 out. 2016.

Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antero Reta e Augusto Pinheiro Lisboa: Edições
70.

Gatti, B & André, M. A relevância dos métodos de pesquisa qualitativa em Educação no Brasil. In:
WELLER, W.; PFAFF, N. (Orgs.) (2013). Metodologias da pesquisa qualitativa em Educação. 3. ed.
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Gil, A. C. (2010). Como elaborar projetos de pesquisa. 3. ed. São Paulo: Atlas.

Richardson, R. J. (Org). (2014). Pesquisa Social: métodos e técnicas. 3. ed. São Paulo: Atlas.

UFG. CIAR –. Centro Integrado de Aprendizagem em Rede. Site institucional. Disponível em:
<www.ciar.ufg.br>. Acesso em: 28 abr. 2015.

UFG. Prodirh. (2016). Plano de Desenvolvimento Institucional 2011 – 2015. Goiânia: UFG/Prodirh,
2011. Disponível em: <https://www.prodirh.ufg.br/up/64/o/PROJETOPDI_04_06_12.pdf>
Acesso em: 26 jun. 2016.

UFG. CPA/CAVI. (2015). Relatório de Autoavaliação Institucional 2013 – 2014. Goiânia: UFG/CPA/CAVI.

Yin, R. K. (2005). Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Infância, crianças e pátios de instituições de Educação Infantil:


desafios metodológicos de pesquisas com dados qualitativos

1
Anelise Monteiro do Nascimento
2 3
Leonor Pio Borges de Toledo , Sonia Kramer
1
Departamento de Educação e Sociedade UFRRJ, Brasil. anelise.ufrrj@yahoo.com.br;
2
Departamento de Educação da PUC-Rio, Brasil. leonorptoledo@gmail.com;
3
Departamento de Educação da PUC-Rio, Brasil. sokramer@puc.com.br.

Resumo. Apresentamos os desafios metodológicos enfrentados por pesquisadores brasileiros ao optarem


pela análise qualitativa de material de campo produzido por grupo interinstitucional de pesquisa sobre
infância e educação infantil. Dentre os resultados dessa pesquisa interinstitucional estão duas teses de
doutorado que servirão de base para a discussão que propomos. As duas teses têm em comum o fato de
utilizarem como campo empírico dados que foram coletados por vários pesquisadores dentro de Projeto
que buscava, originariamente, conhecer as interações entre crianças e adultos em creches e escolas. Os
objetivos foram alterados, os dados revisitados e tendo a filosofia de Benjamin como referência outras
perspectivas de análises foram encontradas. Como conclusão destaca-se que a qualidade dos dados
encontrados pelas duas teses demonstra que é interessante a revisita a campos empíricos realizados para
pesquisas anteriores, trazendo novas produções de sentido a um acervo que foi olhado por outros ângulos
teórico-metodológicos e por vários pesquisadores.
Palavras-chave: pesquisa qualitativa, infância, pátios escolares, educação infantil.

Children, Childhood and Early Childhood education school yards: methodological challenges in qualitative
researches
Abstract. This paper discusses methodological challenges presented to brazilian researchers who have
chosen to qualitatively analyze the empirical field produced by interinstitutional research group, focused on
childhood e early childhood education. Among the results of the interinstitutional research are two thesis,
which are the bases of the discussion here presented. Both thesis had, as empirical field, data collected by
several researchers, participants of a project that, originally, looked to know interactions between children
and between children and adults in early childhood schools. Objectives have been changed, data revisited
and, supported by the philosophy of Benjamin, the two theses have found other possible analyses. As
conclusion, it can affirmed that to revisit good quality empirical material of previous researches is an
interesting strategy, and can enable the construction of new meaningful production to a collection that,
initially, was investigated by several researchers and through different theorical and methodological lenses.
Keywords: Childhood, early childhood education.

1. Introdução

Para ele [o colecionador] não só livros, mas também seus exemplares têm
seu destino. E, neste sentido, o destino mais importante de todo exemplar é
o encontro com ele, o colecionador, com sua própria coleção. E não estou
exagerando: para o colecionador autêntico a aquisição de um livro velho
representa o seu renascimento. E justamente neste ponto se acha o
elemento pueril que, no colecionador, se interpenetra com o elemento
senil. Crianças decretam a renovação da existência por meio de uma prática
centuplicada e jamais complicada. Para elas colecionar é apenas um
processo de renovação; outros seriam a pintura de objetos, o recorte de
figuras e ainda a decalcomania e assim toda a gama de modos de
apropriação infantil, desde o tocar até dar nome às coisas. Renovar o mundo

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

velho – eis o impulso mais enraizado no colecionador ao adquirir algo novo,


e por isso o colecionador de livros velhos está mais próximo da fonte do
colecionador que o interessado em novas edições luxuosas. (Benjamin,
1995:229).

Este trabalho tem por objetivo apresentar os desafios metodológicos enfrentados por pesquisadores
brasileiros ao optarem pela análise qualitativa de material de campo produzido por um grupo
interinstitucional de pesquisa sobre infância, educação infantil, formação de professores e cultura.
Dentre os resultados dessa pesquisa estão duas teses de doutorado que servirão de base para a
discussão que traremos nesse artigo. A primeira tese investigou a experiência da infância em vinte e
uma instituições de Educação Infantil de uma capital brasileira, tomando como fonte cadernos de
campo que foram elaborados por diferentes pesquisadores e a segunda, estudou os pátios (espaços
externos destinados às brincadeiras das crianças) de escolas públicas de Educação Infantil de
municípios da Região Metropolitana do mesmo Estado. Nesse caso, o material de análise foram
fotografias que, assim como os cadernos de campo, também foram tiradas por diferentes
observadores, pesquisadores do mesmo grupo de pesquisa.
Em síntese, o que motiva a escrita desse trabalho é evidenciar as estratégias encontradas na
elaboração dessas duas pesquisas de doutorado diante de um campo empírico que foi construído
dentro de um grupo de pesquisa. Como parte do acervo do banco de dados do grupo, os cadernos de
campo e as fotografias que fazem parte de nossas análises trazem sobre tudo a perspectiva de vários
observadores no ato de seus registros. Cabe destacar também que o objetivo original das
observações não era investigar propriamente a experiência de infância ou os pátios, como foi o
recorte das teses, o objetivo do projeto institucional era conhecer práticas de crianças e adultos
dentro das creches e escolas de um grande estado brasileiro.
Assim, foi em Walter Benjamin que encontramos inspiração para superar os desafios que tal opção
metodológica nos impunha, especialmente na ideia de “renovação da existência” uma vez que
optamos por novas apropriações de elementos da “coleção” aqui entendidas como as informações e
os registros do banco de dados do grupo de pesquisa. A renovação que, segundo Benjamin, para as
crianças poderia partir da “pintura de objetos, o recorte de figuras e ainda a decalcomania” para as
pesquisadoras, parte da experiência que descrevemos ao longo do texto.
Esse artigo está dividido em duas seções, na primeira apresentação as duas teses, seus objetivos,
recortes, referenciais e principais conclusões, na segunda, tratamos dos desafios metodológicos.

“Sua Própria Coleção”: Marcas, Vestígios e Experiência

A primeira pesquisa “Infância e Experiência: ser criança no cotidiano das instituições educacionais”
(Nascimento, 2013) teve como objetivo investigar a experiência da infância nas instituições,
apoiando-se, nos estudos: da filosofia, especialmente no trabalho de Walter Benjamin e seu conceito
de infância e de experiência; na sociologia da infância, campo marcado pelo reconhecimento da
infância como construção social, componente da cultura/ sociedade, forma estrutural que não
desaparece, e as crianças, atores, produto e produtoras dos processos sociais; e na análise do
contexto político que envolve as práticas de institucionalização das crianças, tendo como inspiração
os referenciais analíticos propostos por Ball e Mainardes (2001, 2011).
O campo empírico, como dito na introdução, foi construído a partir dos Cadernos de Campo de vinte
e uma instituições de Educação Infantil de uma capital brasileira. A metodologia para análise dos
dados teve como ponto de partida a leitura do fragmento “Porcelanas da China” de Benjamin,

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

a força da estrada do campo é uma se alguém anda por ela, outra se a


sobrevoa de aeroplano (...) quando voa vê apenas como a estrada se
insinua através da paisagem, e, para ele, ela se desenrola segundo as
mesmas leis que o terreno em torno. Somente quem anda pela estrada
experimenta algo de seu domínio e de como, daquela mesma região que,
para o que voa, é apenas a planície desenrolada, ela faz sair, a seu
comando, a cada uma de suas voltas, distâncias, belvederes, clareiras,
perspectivas, assim como o chamado do comandante faz sair soldados de
uma fila.” (Benjamin, 1995, p: 15-16)

Utilizamos então as imagens alegóricas da “caminha” e do “sobrevoo”. A opção pelo sobrevoo levou
ao que o filósofo chamara de “livre reino aéreo do devaneio”, enquanto a caminhada conduziu às
nuances percebíveis apenas “através da floresta virgem interior que sempre volta a adensar-se” (p.
16). O início se deu com a leitura de todo o material do banco de dados do projeto interinstitucional
e, nesse sobrevoo, as crianças e suas experiências, as relações de poder e os desafios de
pertencimento a um grupo se mostraram evidentes, demonstrando que revisita e a composição de
uma nova coleção, tendo como orientação a experiência de infância era possível.
Como resultado dessa etapa da pesquisa constatou-se que independentemente do formato de
institucionalização das crianças (se frequentam creches, pré-escolas ou turmas de pré-escola em
escolas de ensino fundamental) a experiência de infância se dá no encontro entre os processos
individuais e coletivos resultantes das relações das crianças com seus pares, com adultos, com os
objetos, com a cultura/história, com a sociedade e com a natureza. Pode ser percebida através da
observação das crianças e suas formas de apropriações, reproduções e reinvenções do mundo, assim
como de seus modos próprios de interpretá-lo e de se relacionarem entre si, através da criação de
regras, normas e expectativas que conduzem não só as ações pessoais, como o contexto em que
estão inseridas.
O segundo movimento, teve como orientação a “caminhada”, na qual se buscou outra perspectiva de
leitura e apropriação dos dados. Nela, o objetivo foi o enquadramento das situações que envolveram
crianças e adultos em uma modalidade de atendimento educacional específica, para tal o contexto
selecionado foi o das Pré-escolas exclusivas. Como conclusão destaca-se que a experiência de
infância das crianças das pré-escolas observadas se materializa (1) na construção da identidade de
ser criança, que ocorre em diálogo com o que concebem como ser adulto. (2) na aprendizagem do
ofício do aluno (3) e no desafio do pertencimento a um grupo, pertencimento provocado pela
inclusão das crianças um espaço público, compartilhado, onde desenvolverão suas culturas de pares.
A segunda pesquisa originou a tese intitulada “Entre o exposto e o escondido, marcas e vestígios de
pátios de escolas de Educação Infantil” (Toledo, 2014) pesquisou a situação dos pátios de escolas
públicas de Educação Infantil em municípios da Região Metropolitana. As fotografias também
compõe o banco de dados da pesquisa. Foram selecionadas 113 imagens de nove escolas de oito
municípios. Como o campo da tese está em um território geograficamente conciso e com
aproximações históricas, sociais e políticas, é possível afirmar que a escola escolhida de um
município poderia fazer parte das redes de escolas dos outros. Nesse sentido, a tese compreende os
municípios como coleção. Ao mesmo tempo, compreende cada um deles como contexto, com sua
história e perfil. Assim, fica explicitada a possibilidade de ver a instituição, para além do município
em que ela está situada, tornando possível descontextualizar o objetivo o que na prática significou
sua não identificação e a criação de uma numeração alheatória, como metodologia para análise do
campo.
Na interlocução teórica com Benjamin (1994, 1995), as análises consideraram não somente o
aparente e exposto das características físicas dos espaços escolares, mas também o avesso e as

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

dobras (dos lugares, da história), os vestígios (deixados como marcas dos que ali estiveram), e os
esconderijos (possibilidades percebidas pelas crianças ao atribuírem novos significados aos espaços e
objetos). Os pátios foram analisados em dois movimentos: primeiro, em sua singularidade e
contexto, incluindo dados sobre o atendimento à Educação Infantil desses oito municípios
selecionados para a tese e o segundo, em comparação com três documentos brasileiros que dispõem
sobre como deve ser o atendimento à Educação Infantil, são eles: “Critérios para um Atendimento
em Creches que Respeite os Direitos Fundamentais das Crianças” (Campos e Rosemberg, 2009), os
“Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil” (Brasil, 2006) e as
“Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil” (Brasil, 2009).
A tese destaca, nas conclusões, (1) a precariedade das condições das instituições; (2) as poucas
marcas e vestígios das crianças nos pátios, indicando que são espaços dos quais elas pouco se
apropriam e transformam; (3) a distância entre os pátios e os documentos, evidenciando que a
realidade das escolas está longe do que, hoje, é considerado ideal; e (4) a necessidade da tomada de
ações nos âmbitos da gestão municipal, da formação e supervisão de professores.
“Um Processo de Renovação”: Outros Diálogos, Novos Sentidos

No processo de construção das pesquisas, em diferentes momentos nos deparamos com desafios
metodológicos: todos eles significaram parada na escrita e mergulho no campo. Os dados foram
descontextualizados, sem perder a referência, e novas lentes foram utilizadas para olhar essa
“enciclopédia” (Benjamin, 2006:249). Assim, desconstruímos o objeto, distanciando os dados de seus
objetivos iniciais e os recolocamos em novas coleções, onde encontramos outros sentidos e
interpretações. Em comum, como já anunciamos, as duas teses lidaram com o desafio de trabalhar
com dados colhidos por vários pesquisadores. Se por um lado, a subjetividade de cada observador
nos oferecia um campo sem uma referência única, por outro, um banco de dados com tal
abrangência só pode ser construído coletivamente. Tendo em vista essas considerações, optamos
por fazer das inquietações, perplexidades, surpresas e escolhas de nossos colegas pesquisadores
nosso material de campo, assumindo que um ponto de vista pode ser um ponto de partida para
outras formas de ser ver. Dessa maneira, as duas teses foram escritas convidando os leitores a
comporem suas próprias coleções. Os eventos em que as crianças apontam suas experiências de
infância escolarizada foram retirados desse contexto, mas como prática social, a escolarização é uma
realidade na vida das crianças brasileiras, o mesmo pode-se dizer das fotografias dos pátios. Essas
são de instituições da Região Metropolitana, mas espaços de atendimento a crianças existem em
todas as cidades, assim instigamos o leitor a, ao olhar nossa coleção, ir para além dela.
Com relação à especificidade de cada pesquisa, tendo como empiria os Cadernos de Campo
resultado de observações em vinte e uma instituições de educação infantil, sendo dezesseis delas
escolas públicas, duas creches comunitárias e duas escolas privadas, o primeiro desafio da pesquisa
“Infância e Experiência: ser criança no cotidiano das instituições educacionais” (Nascimento, 2013)
foi a composição da coleção. Partimos dos fragmentos do livro “Rua de mão única” no qual Benjamin
(1995) apresenta uma memória que vai além da experiência pessoal, para encontrar nas crianças da
rede de educação infantil da capital, suas formas de significar a experiência de infância “a saudade
que em mim desperta o jogo das letras prova como foi parte integrante de minha infância. O que
busco nele na verdade, é ela mesma: a infância por inteiro...” (Benjamin, 1995:105), nessa

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perspectiva ps cadernos de campo foram relidos, as categorias iniciais abandonadas e uma nova
coleção de eventos1 veio à tona.
No contraponto com os fragmentos de Benjamin, vimos que as crianças também são atraídas pelos
detritos e por aquilo que eles lhes apresentam como possibilidade de atuação. Elas não reproduzem
diretamente o mundo dos adultos, mas sim estabelecem uma nova e “incoerente” relação com o que
o mundo lhes apresenta, e com isso “formam o seu próprio mundo de coisas, um pequeno mundo
inserido no grande” (Benjamin, 2002, p. 104).
O segundo desafio foi perceber como a institucionalização se torna experiência na vida das crianças e
impacta suas infâncias. Para tal os estudos da sociologia da infância foram de grande importância.
Nossa coleção “ganhou um contexto”. Optamos por uma modalidade específica de atendimento,
lembramos que a pesquisa interinstitucional que originou a escrita do campo empírico dessa tese se
deu em creches, onde o atendimento é de 0 a 3 anos, e em turmas de pré-escolas, com turmas de
crianças de 4 a 6 anos. Para essa etapa da pesquisa abandonamos os cadernos de campo das creches
e nos dedicamos somente aos cadernos de campo das pré-escolas, nosso objetivo foi perceber como
viver uma infância escolarizada aparece nos discursos e ações das crianças de escolas exclusivas de
Educação Infantil. Cabe mencionar ainda, que no Brasil, após o ano de 2013 a entrada obrigatória das
criança na escolarização básica passou a ser a partir dos quatro anos.
Já para a tese “Entre o exposto e o escondido, marcas e vestígios de pátios de escolas de Educação
Infantil” (Toledo, 2014), o primeiro desafio foi escolher as fotografias que iriam compor a coleção da
tese. Mesmo após a seleção das escolas ainda havia muitas imagens, cerca de 150. Diante de
tamanha avalanche, do perigo de não enxergar nada diante de tanto a ser visto, foi preciso um
esforço no sentido fazer com que algumas imagens adquirissem relevo, como escreve Jobim e Souza
(2000) inspirada em Ítalo Calvino. As perguntas surgiam: o que essa fotografia desperta? Que
sentimentos, que pensamentos, que curiosidades? Algumas fotografias, tão instantaneamente
quanto o clique que as fixou no tempo, despertaram inúmeras questões. Outras quase passaram
despercebidas. Nesse processo flanêur, tais perguntas foram norteando a escolha das fotografias,
considerando a impressão estética (Evangelista, 2003; Oswald, 2011; Pereira, 2011) e os indícios de
que seria possível dialogar e construir sentidos sobre elas (Jobim e Souza, 2000). À medida que as
fotografias iam sendo escolhidas, novas perguntas brotavam. Este processo, ao afetar a pesquisadora
e alterar as formas de percepção do objeto de estudo, foi configurando a pesquisa como experiência
estética (Pereira, 2011). Por fim, foram selecionadas 113 fotografias.
O segundo desafio metodológico enfrentado foi: como criar uma coleção de fotografias que pudesse
ser organizada e reorganizada, segundo diversos critérios de análise, assumindo a forma acadêmica
esperada para uma tese - a linearidade da narrativa, com um único fio condutor? Uma vez delineado
o contorno deste desafio a saída encontrada foi assumir as fotografias em sua materialidade. Elas
foram, então, impressas, na aposta de que tê-las em mãos seria fundamental para o exercício de
combinação e recombinação das peças da coleção, e sua consequente análise.
O terceiro desafio surgido em decorrência da estratégia metodológica escolhida foi o da autoria das
imagens. Segundo Guimarães (2008:115), “o ato de fotografar congela momentos, recorta o fluxo da
história, constrói uma possível versão dela. O olho da câmera produz realidades diferentes das que o
olho do pesquisador poderia capturar sozinho”. Mas, e quando não é o olho do pesquisador que
captura as imagens, como no caso da tese? As imagens das escolas foram tiradas por colegas do
grupo de pesquisa, exceto de uma escola que foi fotografada pela própria autora. Esta opção
metodológica suscitou questões: Como lidar com a multiplicidade de olhares, de subjetividades

1
Corsaro (1985) define eventos de interação na Educação Infantil como sequências de ações compartilhadas
que começam com o conhecimento da presença de dois ou mais atores que se relacionam em alguma área e
com suas tentativas de constituir um sentido comum.

1782
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envolvidas, mesmo que todas as fotos sejam de pátios escolares? Ou seja, como lidar com o fato de
que cada fotógrafo é uma pessoa diferente e única e, portanto, cada fotografia foi tirada a partir de
seu também diferente e único olhar, tempo e ângulo?
Benjamin (1995) forneceu argumentos para que essa multiplicidade de olhares e subjetividades não
fosse um impeditivo metodológico. No fragmento “Desempacotando minha biblioteca”, qualificando
a relação do colecionador com os objetos de sua coleção, Benjamin afirma que “os grandes
fisiognomonistas – e os colecionadores são os fisiognomonistas do mundo dos objetos – se tornam
intérpretes do destino. Basta observar um colecionador manuseando os objetos em seu mostruário
de vidro. Mal os segura em suas mãos, parece inspirado a olhar através deles para os seus passados
remotos” (Benjamin, 1995:228). Se o colecionador benjaminiano é um fisiognomonista do mundo
dos objetos, ele necessariamente estabelece um diálogo com esses objetos, olha-os
detalhadamente.
O último desafio metodológico enfrentado pela tese foi a construção do capítulo que procurou
analisar as escolas considerando sua proximidade e/ou distância dos critérios de atendimento à
Educação Infantil apresentados documentos brasileiros. A princípio a autora procurou deixar que
adquirissem relevo os aspectos desses três documentos relacionados direta ou indiretamente aos
pátios escolares. Para organizar os extratos2 levantados nos três documentos foi construído um
quadro, e a eles somaram-se outras três colunas: uma, para relacioná-los às escolas da coleção;
outra, para relacioná-los aos desafios que se arrastam do passado e se referem a conquistas ainda
não efetivadas na realidade ou a desafios do futuro, para uma educação sustentável, que se impõem
ao presente; e a última, para comentários.
O quadro foi impresso com finalidade instrumental e, aos poucos, foi sendo preenchido, se tornando
um início de arquivo ao reunir observações pessoais e de campo aos destaques dos documentos. Foi
comentado e rabiscado. Os itens foram sendo relacionados aos demais, agrupados, identificados e
percebidos em que medida se reforçavam ou se distanciavam. Os rabiscos começaram a formar
imagens, que remeteram ao trabalho das Passagens e a descrição dele por Bolle como “um painel
com milhares de lâmpadas” (Benjamin, 2006:1141). Remeteram também ao tema da constelação,
presente na obra de Benjamin em diversos momentos: as ideias se relacionando com as coisas como
as constelações com as estrelas. Nas constelações, as estrelas relacionadas entre si formam mais do
que um conjunto, formam uma imagem à qual se pode atribuir significados. As imagens formadas
pelas estrelas, ou constelações, não são imagens naturais, mas sim culturais: são produção do olhar
humano, que vê as estrelas que se destacam e estabelece relações entre elas.
As constelações estão presentes na obra de Benjamin tanto em conteúdo como em forma. Seu
próprio texto é constelar: sua lúcida leitura de mundo, que conecta aspectos que aparentemente não
têm relação, extrapola a linearidade do texto tradicional. É constelar também na medida em que é
fragmentado, interrompido, que traz as mesmas coisas em contextos diferentes e verticaliza temas.
Atravessa-os, rompendo com o texto linear. O quadro trouxe, afinal, a possibilidade de estabelecer
relações entre os itens e agrupá-los, passando de instrumento a metodologia. Os itens que o
compunham foram compreendidos como estrelas e estas, ao se conectarem entre si, formaram
constelações. Em cada uma das oito constelações uma imagem, em cada imagem uma faceta da
situação da Educação Infantil na Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro. Assim, o capítulo
tomou um rumo que não havia sido planejado: a análise foi se construindo na e pela escrita, o
caminho levou aonde não se havia pensado ir.

Considerações Finais

2
Optou-se por usar a palavra extrato pelo significado de “aquilo que foi extraído”, por serem trechos
transcritos dos documentos escolhidos.

1783
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Este trabalho, que focaliza os desafios metodológicos enfrentados por duas teses, procurou mostrar
como pode ser interessante a revisita a campos empíricos realizados para pesquisas anteriores,
trazendo novas produções de sentido a um acervo que, inicialmente, foi olhado por outros ângulos
teórico-metodológicos e por vários pesquisadores.
Foi isso que pudemos ver na tese “Infância e Experiência: ser criança no cotidiano das instituições
educacionais” (Nascimento, 2013) quando, ao nos depararmos com os cadernos de campo que
buscam registrar as interações entre crianças e adultos nas creches e escolas, encontramos, para
além desse objetivo original, a possibilidade de ver que os registros indicam mais, indicam novos
elementos, entre eles: (1) que a experiência de infância das crianças dessas instituições observadas é
construída socialmente através da narrativa que é compartilhada entre os pares, (2) que a
socialização horizontal favorece importantes trocas de informações, formando e informando as
crianças sobre o que é ser criança e sobre como essas relações se estabelecem dentro da sua
categoria e no diálogo com as outras categorias sociais, (3) uma forte valorização na Educação
Infantil da aprendizagem do “ofício de aluno” que indica que, uma vez institucionalizadas, as crianças
passam por um aprendizado que cercará toda a sua trajetória escolar, aprendizado esse que envolve
determinadas características como a rapidez, desembaraço, prontidão, esforço, obediência, interesse
e perseverança, (4) que em contextos como o brasileiro no qual a escolarização obrigatória ocorre
cada vez mais cedo, as crianças vivem o desafio do pertencimento ao grupo, que enquadra e regula
suas vidas, viver a experiência de infância no grupo de pares mostrou-se como um desafio para os
sujeitos da pesquisa, que se evidencia no exercício de aceitação de si e do outro e nos ajustes
necessário para manutenção do grupo.
Entre as conclusões da tese “Entre o exposto e o escondido, marcas e vestígios de pátios de escolas
de Educação Infantil” (Toledo, 2014) está a evidência de que independentemente do olhar do
observador ou do que se busca captar, as condições das instituições de Educação Infantil não são
boas. A precariedade se dá a ver já na escolha dos terrenos ou imóveis, cujas características quase
sempre são inadequadas ao funcionamento de escolas de Educação Infantil. Os pátios das escolas
são diversos no que diz respeito ao tamanho, elementos e organização, numa diversidade positiva e
coerente com a multiplicidade de contextos, mas que não significa que os pátios ofereçam boas
condições para as crianças. Mais que o tamanho, os elementos presentes e sua organização
influenciam para que convidem as crianças a lá brincar e permanecer ou não, pela falta de
brinquedos, cantinhos, bancos e sombra. Embora haja diferenças entre os pátios das escolas
planejadas e construídas para serem escolas e os das escolas que funcionam em imóveis adaptados,
a coleção de fotografias mostra que pode haver pátios de escolas adaptadas maiores e com mais
brinquedos que pátios de escolas construídas. Esta constatação, porém, não significa apoiar a
estratégia adotada pelos municípios de instalar escolas em imóveis adaptados. Pelo contrário: o
pátio é escola tanto quanto a edificação, e ambos devem ser adequados às especificidades da
Educação Infantil. Em comum, os pátios mostram poucas marcas e vestígios das crianças. O que se vê
de sua presença é mais acidental que intencional, indicando que são espaços dos quais elas pouco se
apropriam e transformam. Os elementos mais característicos dos pátios das escolas são os
brinquedos fixos, embora não estejam presentes em todos. As poucas casinhas de boneca
encontradas evidenciam que a brincadeira, especialmente o faz de conta, não é prioridade da
Educação Infantil. Por fim, a tese conclui que os pátios das escolas apresentam uma grande distância
em relação aos documentos orientadores (Brasil, 2006, 2009; Campos e Rosemberg, 2009), ou seja, a
realidade das escolas está longe do que, hoje, é considerado ideal pela política brasileira.
Assim, uma vez descritos os desafios e o que essa opção metodológica nos possibilitou chegamos a
conclusão de que, como a escrita das duas teses, esse texto também é um exercício de criação de
novos sentidos, uma vez que, ao descontextualizar os resultados de cada uma das pesquisas e

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colocá-los em diálogo, encontramos outras possibilidades de análises que não eram as previstas
pelas autoras quando optaram por trabalhar com um banco de dados de pesquisa composto por
informações coletadas por mais de um pesquisador. Apresentamos então para os leitores nosso
esforço no sentido da realização de pesquisa qualitativa no campo da educação e convidamos a
todos para o debate.

Referências Bibliográficas

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revisão pessoal das políticas educacionais e da pesquisa em política educacional. IN: Ball, S.;
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1785
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Infancia, Sordera Y Psicofármacos. Propuesta Metodológica Desde


Los Encuentros Creativos Expresivos

María Noel Miguez Passada1


1Facultad de Ciencias Sociales de la Universidad de la República, Uruguay;
marianoel.miguez@cienciassociales.edu.uy

Resumen. La presente ponencia da cuenta de parte del proceso de investigación que se ha llevado adelante
durante un año y medio, el cual hoy día transita en una fase de extensión universitaria, y cuyo tema versó
en los procesos de sociabilidad de la infancia sorda en el Uruguay mediados por el consumo de
psicofármacos. La hipótesis operativa desde la cual se partió redundó en que los procesos de sociabilidad en
los primeros años de vida de niños y niñas sordos/as nacidos en hogares oyentes se complejizan
sustancialmente en torno a la (in)comunicación que se genera, lo cual se traslada al ámbito educativo,
fundamentalmente en los primeros años de inserción escolar. De allí que uno de los dispositivos de
resolución de esta temática haya sido en los últimos años la utilización de psicofármacos. El proceso teórico-
metodológico llevado adelante fue el de los Encuentros Creativos Expresivos (ECE) de la Sociología de
Cuerpos/Emociones latinoamericana.
Palabras Clave: Sordera, Infancia, Psicofármacos, Cuerpos, Emociones.

Childhood, Deaf and Pshychotropic drogues. Methodological proposal from the Creative-Expressive
Meetings
Abstract. The present work it’s about an investigation made during 1.5 year. In this moment is transiting the
intervention period. It was about deaf childhood sociability processes and their medication with
psychotropic drogues in Uruguay. The operative hypothesis it was about the complexity of the
sociabilitation of this deaf childhood born in non deaf families. The main problem in this sociabilitation is
due to the (in)communication between these deaf childhood and their families non deaf. This problem of
communication is reproduced also in the education institution the first years of their insertion. One of the
solutions of this problems, seen as bodies in movements, is the medication with psychotropic drogues. The
theoretical and methodological processes was done by the Encuentros Creativos Expresivos (ECE) from the
Bodies/Emotions Sociology in latin America.
Keywords: Deaf, Childhood, Psychotropes, Bodies, Emotions.

1. Introducción

Ser y estar en estas sociedades hace a poder desenvolverse, exteriorizar lo interiorizado en el


proceso de sociabilidad. Pero, ¿qué sucede cuando el proceso de sociabilidad fue dado en la
(in)comunicación, cuando las interiorizaciones se fueron haciendo como duras aprehensiones de un
mundo vivido lejano, ausente, impertérrito a sensaciones y percepciones construidas y devenidas en
el más absoluto silencio? Haber nacido sordo y/o haber adquirido la sordera previamente a la
adquisición del lenguaje ubica a esta infancia en una complejidad que, por lo general, lleva a su
vulneración más absoluta cuando los adultos referentes y sustanciales en los primeros años de la
sociabilidad son oyentes, se les ha aconsejado formas de “normalizar” a sus hijos/as, y reciben las
miradas constantes y los “consejos” desde la reproducida ideología de la normalidad1. Ser y estar en

1
Por ideología de la normalidad se entiende a la producción y reproducción de componentes interioridades en la vida

1787
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estas sociedades mediadas por la norma estadística, donde todo lo que está “por fuera” debe estar
dentro para seguir estando, no hace más que producir y reproducir formas del deber ser
hegemónico, líneas demarcatorias precisas y, de ahí, sus distinciones. Ser sordo/a en estas
sociedades, en lugar de ser sentido como una potencialidad singular y familiar, es vivenciado, la
mayor de las veces, como una contingencia sufrida por los oyentes y, por ende, difícil de procesar.
Así, la sociabilidad inicial, la fundamental para la producción y reproducción de sujetos autónomos y
reconocidos en su singularidad, marca sustancialmente a esta infancia sorda, en sus interiorizaciones
y exteriorizaciones.

2. Aspectos Metodológicos

Para la delimitación del presente objeto se planteó el siguiente Objetivo General: Generar insumos
para comprender los procesos de sociabilidad en la infancia sorda mediados por el uso de
psicofármacos. Para el logro del mismo, se formularon los siguientes objetivos específicos: a) Realizar
un proceso analítico de lo metodológico a partir de la Sociología de Cuerpos/Emociones a través de
la recuperación de los diversos actores directamente implicados reconociendo de forma “no
tradicional” sensaciones y percepciones. b) Analizar los procesos de sociabilidad en niñas/os
sordos/as en familias con adultos referentes oyentes. c) Estudiar los procesos de medicación con
psicofármacos en la infancia sorda, atendiendo particularmente a las tres instituciones medulares de
la sociabilidad: familia, educación, salud.
Los ECE se realizaron en la Escuela Especial de Discapacidad Auditiva Nº 197, de la ciudad de
Montevideo (Uruguay), con docentes, niños/as sordos/as medicados/as con psicofármacos y sus
familias. Los ECE “han sido diseñados como espacios para que los sujetos puedan manifestar e
interpretar sus emociones en el contexto de una investigación social. (…). En este trabajo, la
creatividad es tomada como punto de partida para producir experiencias de expresividad donde los
sujetos “comparten” e “interpretan” con el investigador y con los otros sus sensaciones y emociones,
en condiciones sociales de existencia particular”. (Scribano, 2013: 83)
Se parte de concebir que la aprehensión del mundo es a través del cuerpo y lo que éste en cuanto
sensaciones, emociones y percepciones habilita percibir a cada singularidad en su entramado con lo
genérico humano. Eso hace al “capital corporal” de cada sujeto en su dialéctica de cuerpo social2,
cuerpo individuo3, cuerpo subjetivo4. El autor plantea una segunda procesualidad dialéctica, que es la
surgida a partir del engranaje entre los mecanismos de soportabilidad social5, los dispositivos de
regulación de las sensaciones6 y el dolor social7. En esta conjunción de procesualidades dialécticas,

cotidiana de los seres singulares y colectivos con relación a las líneas demarcatorias que definen a los sujetos en “normales”
y “anormales”, mensurando las formas de ser y estar en sociedad según un “ideal”, un sujeto “único”, “uno”.
2
El cuerpo social hace al mandato institucional e institucionalizado que media las formas de representación de una
sociedad en un tiempo dado, por lo que se lo comprende como un proceso que contiene y expande cada una de las
individualidades. (Scribano, 2007)
3
El cuerpo individuo, tal como lo plantea Scribano, hace al conjunto de sensaciones generadas y receptadas por un cuerpo
materializado, ya sea individual o colectivamente
4
El cuerpo subjetivo, es aquel que contiene la subjetividad como centro de gravedad de cada sujeto, donde “se produce la
reflexividad que constituye el eje por donde gira la “experiencia””. (Scribano, 2007: 123)
5
Los mecanismos de soportabilidad social son un conjunto de prácticas tendientes a evitar el conflicto, donde “la vida
social “se-hace” como un-siempre-así”. (Scribano, 2007: 124)
6
Para que estos mecanismos de soportabilidad social logren interiorizarse se generan dispositivos de regulación de las
sensaciones, los que predeterminan lo socialmente habilitado en el plano de las sensaciones, percepciones y acciones, en
tanto “consisten en procesos de selección, clasificación y elaboración de las percepciones socialmente determinadas y

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las sensaciones, percepciones y emociones habilitan a conocer las sensibilidades y de ahí desplegar
este dispositivo metodológico. Desde este marco teórico de la Sociología de los cuerpos/emociones
se pueden conocer y reconocer los “patrones de dominación” que se despliegan en cada sociedad,
analizando las distancias que ésta pone entre los cuerpos, cómo los marca y cómo dispone de sus
“energías sociales”.
Así, se apunta a indagar lo social mediante la creación y la expresión a través de encuentros de
sujetos implicados en una temática concreta. Se disponen los marcos para que los colores y
emociones afloren en las formas de representar contenidos que, por lo general, generan dolores
sociales que impactan en la sociabilidad del cuerpo subjetivo y redundan en la dialéctica del cuerpo
individuo y cuerpo social. Los ECE no sólo deben plantear con claridad el problema de investigación y
los objetivos que se proponen, sino nutrirlos de datos cuantitativos y cualitativos que habiliten a
articular los diversos herramentales metodológicos. Por otra parte, lejos de ser una forma de
conocer procesos desde la psicología, las ciencias sociales han estudiado la conjunción de los colores
y las emociones desde sus marcos analíticos, sustancia básica de análisis en los ECE. La potencia de
los ECE se encuentra en recuperar estos aspectos singulares y colectivos en el despliegue de la
creatividad, del disfrute de una metodología distinta y distendida, que habilita a sentir y sentirse, a
pensar y pensarse con uno y con los otros en el espacio societal en el cual se encuentre cada cuerpo
subjetivo.
Los ECE se distinguen en tres unidades organizativas, a saber: a) Momentos de expresión: buscan
desplegar la expresividad de forma individual y colectiva (grupal) de manera que los sujetos expresen
sus “estructuras del sentir”; b) Componentes expresivos: hacen a los materiales que se utilizan para la
expresividad como “flujos de acción” de estos espacios; c) Estrategias de registro: son los
procedimientos que nuclean la materialidad y procesualidad de la acción -fotos, videos, sonidos, etc.-
. (Scribano, 2013)
Más allá en la investigación se realizaron ECE con los tres actores sustanciales mencionados de este
proceso, para los fines presentes se deconstruirá el análisis de lo surgido en el ECE con los docentes
de forma de explicar esta propuesta teórico-metodológica a partir del trabajo de campo y su análisis
reflexivo.

3. Trabajo De Campo Y Análisis Reflexivo Del Ece Con Docentes

El ECE con las maestras de la EE ° 197 (Montevideo) se llevó adelante en el mes de octubre de 2015.
Luego de varias entrevistas con la Dirección de la EE N° 197, así como un encuentro formal con el
equipo de maestras que participarían del ECE se realiza el primer ECE con estas últimas. Ante la
negativa de una de ellas, y “solidaridad de grupo” de las otras cuatro, decidieron que no se haría
registro visual ni de audio, por lo que se debió realizar todo en un cuaderno de campo con registro a
lápiz. Con esta primera y significativa limitante, se les planteó que escribiesen singularmente sus
sensaciones sobre la medicación con psicofármacos en la infancia sorda que concurre a la EE N° 197.
Las respuestas fueron las que siguen:

• Maestra 1: “De sentir, me puse en esa situación, y si bien la medicación en los niños tiene buenos
resultados también está el tema de los que están mal medicados, que sufren por la medicación,
tienen altibajos, ansiedad. Eso me produce ansiedad a mí también.”

distribuidas”. (Luna y Scribano, 2007: 26)


7
El dolor social se entiende como sufrimiento percibido desde la interiorización de diversos mecanismos de soportabilidad.

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• Maestra 2: “Hay niños que muchas veces las gotitas no les hace nada. Muchas veces tenemos
padres que se oponen a la medicación y es todo un tema ese.”

• Maestra 3: “La sensación primera es que en casos que da resultado les da contención (…), se
producen aprendizajes, cambia la interacción en aula con otros compañeros, sus vivencias, cambia
la situación.”

• Maestra 4: “Hace tres años que un niño viene a la escuela, es sordo y algo más, tiene 4 años ahora.
No logro que el niño se siente y establezca un vínculo. Yo tengo que andar a rastras con el chiquilín.
(…). Además está perjudicando a los demás niños.”

Los procesos de medicalización y los actos de medicar con psicofármacos en la infancia sorda
aparecen como una tecnología de los cuerpos y de las almas, abarcando todos los espacios de la vida
social. Todo lo que salga de la norma, como cuerpos con movimientos exacerbados, se etiqueta, se
clasifica y se califica en la dualidad salud–enfermedad. La reproducción de las líneas demarcatorias
de la infancia sorda que es medicada con psicofármacos genera una doble etiqueta, ya no sólo la de
la “deficiencia auditiva”, sino ahora la de los “trastornos conductuales”. El posicionamiento de la
institución educativa en torno a esta temática es fundamental para la potenciación o restricción de
estos dispositivos medicalizadores. En este comienzo del ECE afloran los discursos más restrictivos en
torno a la temática, a cómo es visualizada esta infancia sorda y los espacios de intersubjetividad con
las familias.
A partir de esta pregunta disparadora que la debían responder singularmente y posteriormente
compartirla en el grupo, luego de la lectura de las respuestas se generó un debate donde las
temáticas que se fueron trabajando se detallan:

Relación maestras – familias - medicación:

• Maestra 1: “Y ahí pienso: “qué bueno que ya está medicado”. Toma trabajo convencer a la familia
sobre la medicación.”

• Maestra 2: “Muchas veces es necesaria. Se nota cuando están bien o mal medicados o les falta la
medicación.”

• Maestra 4: “Los niños de las familias que se resisten a medicarlos te lleva a la impotencia por no
poder llegar a más.”

Si esto se analiza desde los procesos de medicalización y los actos de medicar en la infancia,
pareciera que el saber/poder médico traspasó las barreras propias de su disciplina, generando
argumento y convencimiento en el saber/poder pedagógico en un enlace de soluciones donde dar
químicos a esta infancia para aquietar sus movimientos sería casi que la única solución. Por otra
parte, en esa dualidad de instituciones entra la tercera, la familia, como sustancial en la sociabilidad
de esta infancia. En ese sentido, la relación familia–maestras aparece permeada por la mirada
médica de las segundas y las resistencias a dar respuestas lineales para sus niños/as de las primeras.
De todas maneras, desde el discurso docente se decanta la temática en que la responsabilidad que
esta infancia no estén bien en la escuela es por las familias que no siguen las instrucciones de
concurrir a psiquiatría y medicar a sus niños/as. Aparece así un cuerpo individuo -maestras de la EE
N°197 con alumnos/as medicados/as con psicofármacos-, mediado por un cuerpo social que instituye
el deber ser desde una lógica medicalizadora y se orienta en su concreción desde un cuerpo subjetivo
que se involucra con los cuerpos de la infancia sorda a partir de componentes ideológicos de la

1790
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normalidad.

Relación maestras – institución educativa:

• Maestra 2: “También hay presiones del sistema. Es una EE, por lo tanto tenemos niños especiales y
el sistema no lo contempla. Las expectativas son absolutamente irreales.”

• Maestra 4: “Hay un doble discurso de las autoridades, hay desconocimiento.”

Resulta sustancial que la relación de los docentes con sus pares y autoridades sea favorable para que
no se generen desgastes que lleven a la reproducciones de acciones -u omisiones- que respondan a
cuestiones vinculadas a las relaciones entre los adultos y que lejos tengan que ver con el alumnado
en concreto -sobre el cual, de todas maneras, se deposita gran parte del sufrimiento institucional-.
En este sentido, se hace pertinente remitirse a los planteos de Déjours (1992) en torno a la
psicopatología del trabajo, en cuanto a la relación psíquica que se genera en estos espacios y el
desgaste mental que puede llegar a causar en quienes comparten tantas horas del día a día. Este
autor plantea que dicho entramado puede generar relaciones nefastas (patógenas) o favorables
(estructurantes). Y para ello identifica tres puntos, a saber: a) Organización del trabajo: tales
relaciones patógenas o estructurantes resultan primordiales en su producción y reproducción en la
división de tareas y en cómo se estructuran los roles -control, jerarquías, responsabilidades, etc.-; b)
Sufrimiento: es el que resulta de un estado de equilibrio inestable, donde se confrontan los factores
patógenos de la organización del trabajo y los procesos defensivos de los trabajadores, siendo estos
últimos los que evitan posibles descompensaciones psiquiátricas en estos ámbitos laborales; c)
Placer: cuando priman los factores estructurantes, el espacio laboral se torna como potenciador y
garante de la salud de los trabajadores. Desde esta perspectiva analítica, la organización del trabajo
es entendida como una relación social de trabajo, que habilita a decidir cómo debe realizarse el
mismo, con cuáles componentes de expansión o restricción -en torno a la imaginación, la inventiva,
la creatividad, etc.- y cómo se sustancializa singular y colectivamente tal proceso. Es importante
comprender las lógicas de acción de este cuerpo docente con relación a los demás actores
implicados y sus sensaciones y percepciones de esta institución como un potenciador de factores
patógenos o estructurantes. Ejemplos como los que se remiten en los discursos precedentes, darían
pistas para comprender que, al menos en las circunstancias actuales, se trataría de un espacio con
mayores factores patógenos que estructurantes.
A partir de la frase disparadora y lo que generó, se les volvió a proponer que expresaran su sentir en
torno a la temática. En la descomposición discursiva de estas palabras, las distintas maestras

plantearon:

Fig. 1. Sensaciones singulares sobre la temática

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• Maestra 1: “Ayuda es la primer palabra. Es una búsqueda constante de ayuda y medicar hace a
veces de ayuda. Es necesario buscar ayuda. Pero me genera dudas. Diálogo es la otra palabra.
Diálogo con los niños, con las familias, para buscar compromiso, con los médicos para que nos
digan, porque a veces el niño es medicado porque la maestra pide ayuda.”

• Maestra 2: “El niño es el reflejo de las familias, y las familias están descontroladas.”

• Maestra 3: “Preocupación. Está bueno cuando el padre es receptivo y lo lleva y lo trata. Y una ve
que el chiquilín va cambiando y también va cambiando la actitud de los padres.”

Como discurso fenoménico aparece la absoluta naturalización y legitimación de la medicación con


psicofármacos como dispositivo para mejorar conductas y atenciones. El discurso médico
patologizante está tan interiorizado que pareciera no haber margen para la duda de la reproducción
de estos procesos medicalizadores en la infancia sorda como la única solución posible. No se
registran consecuencias corporales, dolores que quedan dentro sin poder salir -haciendo llaga en la
subjetividad de esos cuerpos-. La preocupación es exteriorizada hacia las familias que no responden,
en lugar de ser un dato para analizar por qué esta infancia está así hoy día, por qué en esta población
se exteriorizan más los movimientos corporales, por qué se cree que patologizar/medicar es “la”
solución. Se entiende que más allá que la cuestión con esta infancia en movimiento sea parte de la
problemática que encuentran, eso solapa cuestiones que aparecerían más de fondo y que sería más
complejo para este colectivo exteriorizar. En este sentido, se vuelve a Déjours (1992) en tanto
plantea que aparecen procedimientos defensivos específicos que no tienen por qué dar cuenta
directamente de la problemática de fondo pero que habilitan a la exteriorización de los factores
patógenos en la estructura organizacional. El autor plantea: “Podemos, así, poner en evidencia las
defensas que fueron esencialmente utilizadas por los individuos y las defensas construidas por los
grupos de trabajadores. A estas últimas se las llama "defensas colectivas"”. (1992: 152) Tales
defensas colectivas habilitan al grupo de trabajadores a luchar contra las formas de sufrimiento que
los media en su cotidianeidad y, específicamente, contra el miedo que ello les origina.
En la procesualidad del ECE, se propone a continuación trabajar conjuntamente la Línea del Tiempo.
A partir de esta técnica se apunta a que puedan analizar su sentir en torno a la temática desde su
devenir y proyección, apuntando a un “antes, ahora y después” que les permita analizarla en su
complejidad. Según Scribano (2013), por lo general, aparece un antes/ayer con prevalencia de
colores oscuros (negro, marrón, gris) señalando un pasado con cuestiones a olvidar en cuanto
sensaciones y percepciones; aparece un hoy/ahora confundido con un mañana/después con
predominio del color verde y tonos azules vinculados con la existencia y la esperanza; el
mañana/después, por lo general tiene colores como el amarillo, el blanco, el rosa y el naranja,
evocando la luz, la prosperidad, un estar mejor. Resulta sustancial comprender el uso metafórico de
la cromaticidad para poder analizar los procesos de estructuración social desde esta perspectiva. En
este sentido, no se trata sólo de dar cuenta de su carácter metodológico-instrumental, sino que
apunta, fundamentalmente, a un análisis de lo social desde la cromaticidad de colores en tanto
sensaciones y percepciones. Por un lado, esto se materializa en la necesidad científica de
aprehensión de la realidad a través de analogías; pero, también, en relación a la posibilidad de
producir una estructura simbólica capaz de dar cuenta de dicha realidad, trascendiendo los aspectos
más fenoménicos de la misma. Se presenta a continuación el trabajo conjunto realizado por estas
cinco maestras en su sentir con relación a la temática de la medicación con psicofármacos en la
infancia sorda, desde una perspectiva de procesualidad (pasado – presente – futuro) y tonalidad
(cromaticidad de los colores).

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Fig. 2. Línea del tiempo

• Maestra 3: Pasado: Amarillo. “Débil, pidiendo ayuda”; Presente: Naranja. “Va a estar mejor”;
Futuro: Violeta. “Desarrollo de la persona como ser humano”.

• Maestra 5: Pasado: Rojo, “Se necesita ayudar al niño”; Presente: Lila, “Que los padres ayuden no
sólo con la medicación sino también con psicomotricistas, psicólogos”; Futuro: Verde, “De eso
oscuro, feo, se llega al cambio con la ayuda de un equipo, no sólo pastilla o gotitas”.

• Maestra 2: Pasado: Negro y marrón, “Yo tenía el preconcepto que fui cambiando, yo era anti
medicación antes, pero al entrar a ver otras realidades vi que era una herramienta que puede
ayudar a niños y sus familias”; Presente: Varios colores oscuros, “Nunca dejo de remarcar las líneas
negras. Veo avances y retrocesos en las familias y en los niños”; Futuro: Varios colores un poco más
claros, “Aspiro que el futuro sea mejor. Un acercamiento a las familias, más luces, más claridad”.

• Maestra 1: Pasado: Verde, “Falta madurez. Es un camino hacia”; Presente: Rojo, “Quiero un
cambio, tranquilidad, armonía, equilibrio”; Futuro: Azul, “Lo vinculo conmigo misma, con mi vida,
yo quiero un cambio por eso la manzana”.

• Maestra 4: Pasado: Verde, “Antes había más niños sordos que con otras enfermedades”; Presente:
Amarillo y marrón, “Ahora son sordos con otra discapacidad”; Futuro: Marrón.,“No sé, si no le
hincamos el diente yo tengo mis dudas que esto salga adelante. Los maestros acá damos todo,
pero con los maestros solo no hacemos nada”.

El pedido de “ayuda” vuelve a ser casi una constante en las experienciaciones de sensaciones de la
mayoría de estas maestras, ubicando una situación problemática ya no sólo visualizándola en la
punta del iceberg -el niño/a sordo/a que se mueve con exacerbación-, sino en la complejidad que
media la realidad de cada niño/a, su situación familiar, espacio territorial, las respuestas del espacio
educativo, las posibilidades de pensarse y repensarse en sus prácticas pedagógicas, la fuerza que
como colectivo adquieren para sortear estas complejidades. En la mayoría de los papeles aparece un
futuro con tonalidades de verde (esperanza) y azules (seguridad), con la potencialidad de superar la
situación actual y trabajar colectivamente para dejar a un lado las tensiones del hoy día que se
expían en los cuerpos infantiles de esta infancia sorda que se mueve más de lo “normal”.
En el discurso de una de las maestras surge una cuestión que resulta fundamental traer a colación:
en el pasado había sólo niños/as sordos/as, ahora ya tienen otras “patologías asociadas”. En realidad,
habría que cuestionarse cuánto hay de “patologías asociadas” y cuánto de “patologías creadas” por
la medicalización de estos cuerpos desde edades tan tempranas. Se pueden generar brechas
insondables si se reduce a “patologías asociadas” las discursivamente “creadas”. La confusión entre
sordera y límites en el aprendizaje y/o problemas conductuales no hace más que llevar a un
reduccionismo tal que el “audismo” trunca cualquier potencialidad del proceso de enseñanza-
aprendizaje. La reproducción de la ideología de la normalidad se hace aquí presente con todas sus

1793
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galas.
En la procesualidad del ECE, se pasó a la realización de la Técnica del Collage. Ésta llega en un
momento en la cual las racionalidades y discursos desde el pensar absoluto comienzan a volcarse en
recuperar percepciones y emociones singulares y colectivas como superación de ciertas lógicas
organizacionales iniciales, lo cual le permitió a la mayoría de las maestras desplegarse desde sus
sensaciones. Según plantea Scribano (2013: 39), un dibujo en la dinámica de los ECE implica una
“cartografía de las posiciones de los sujetos”. Así, “el dibujo es la totalidad, los componentes son
pistas” de una conjunción de singularidades que aportan desde sus sensaciones y emociones con
miras a una expresión colectiva. La Técnica del Collage en la procesualidad de los ECE potencia
espacios de expresividad que en otro marco serían inusuales.
Se les solicitó formaran dos grupos, dividiéndose automáticamente: Maestras 1, 3 y 5, por un lado;
Maestras 2 y 4, por el otro. Del trabajo en los subgrupos con la misma consigna del comienzo surgió
lo que sigue a continuación.

Fig. 3. Collage Maestras 2 y 4

• Maestra 4: “Hay que estar las 9 horas acá! Cuando entré a los años se empezó a jubilar gente. Yo
veo que la gente de acá se va mal. Con los años tenes que ser muy fuerte y no dejar que las cosas se
te entren para seguir más o menos clara. Acá hay gente que se ha enfermado, que se ha suicidado,
aunque era una persona psiquiátrica. El maestro que queda muchos años acá tiene que tener claro
de no enfermarse. Yo me jubilo el año que viene”.

• Maestra 2: “Hicimos un entrelazado en nuestro collage porque hay situaciones entrelazadas que
hay para elaborar y trabajar todos juntos porque es un tema de todos”.

Más allá este collage fue realizado por las maestras que desde el comienzo en sus discursos traían
con mayor énfasis elementos patógenos, comienza a develarse que ya no parecería haber tampoco
tanto acuerdo entre ambas para analizar la temática en lo que ha sido el transcurrir del ECE.
Asimismo, resulta sustancial retomar nuevamente el discurso de una de las maestras y mediarlo
teóricamente con los planteamientos de Déjours (1992), ya no sólo con relación a los elementos
patógenos, sino sustancialmente en torno al sufrimiento en el trabajo. Llegar al punto de plantear un
dolor tal en la lógica organizacional que lleva a enfermedades, problemas psiquiátricos, suicidios, da
pistas para analizar la singularidad de esta maestra en su sufrimiento en la lógica organizacional y su
imposibilidad de encontrar espacios para superarlos. La temática de la medicación con psicofármacos
en la infancia sorda pasa a un plano secundario en este grupo de maestras que develan cada vez con
mayor claridad el sufrimiento que las atraviesa en el día a día en sus prácticas pedagógicas, en las
cuales se cruzan con cuerpos de la infancia sorda que se mueven excesivamente. Y ante la
potencialidad de generar flujos de exteriorizaciones que evidencien sus sufrimientos, se los atribuyen
a esta infancia y se insta a que sean medicados para mantener un orden y un control organizacional
que, al menos en su sentir, pueden ellas manejar.

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Fig. 4. Collage Maestras 1, 3 y 5

• Maestra 1: “Nosotras hicimos, por acá dos personas que centralizan la escucha. Y también vimos
que la educación y la prevención están abiertas”. “Cómo elegir?”. “Mi cuerpo, mi desarrollo”. “La
vocación, porque nos gusta lo que hacemos”. “Relax, colores, se necesita bajar la presión”. “La luz,
porque lo único que nos salva es el amor. Tener un buen vínculo, empatía con los alumnos y ayuda
de la familia”. “También tenemos que aprender a valorar los logros, sino es imposible”.

• Maestra 3: “Además, hablar con los padres cuando tienen stress crónico… Porque muchas veces
terminan en separaciones y madres solas. Nosotras también vemos el desborde y estamos en
soledad, ellos, nosotros. Entonces, ¿cómo salimos?”. (Maestra 1 responde): “Juntos! Solos no
podemos”.

Aparecen con total soltura las posturas estructurantes en la lógica institucional, rescatando el valor y
la potencialidad de las prácticas pedagógicas con relación a esta temática, su haber elegido la carrera
por vocación, el gusto por la actividad realizada, y el darse cuenta de las situaciones familiares
complejas que hacen a la vida cotidiana de esa infancia sorda que les llega hoy día a la escuela. Se
entiende que la síntesis de “Juntos! Solos no podemos”, le da una potencia de cierre a esta última
etapa del ECE que habilita a pensar y repensar nuevas formas de interpelar esta temática y otras de
mediar la lógica organizacional, tomando la fortaleza en lo grupal y en lo que como colectivo pueden
reproducir como factores estructurantes para dejar a un lado el sufrimiento organizacional.
De esta manera, se da por cerrado el ECE realizado con las maestras, con el acuerdo de hacer una
devolución y trabajar con ellas a partir de lo surgido. En el mes de noviembre de 2015 se hizo la
primera devolución a este grupo de maestras, quedando como propuesta poder generar espacios de
reflexión colectiva para seguir trabajando sobre esta temática y otras que fueran surgiendo una vez
finalizada toda la investigación en el año 2017.

Reflexiones Finales

Se quiere destacar la potencialidad de los ECE a la hora de generar no solamente insumos de mayor
densidad, sino por el trabajo intersubjetivo que se realiza entre quienes lo llevan adelante y quienes
son invitados a desplazarse por los contenidos de esta metodología. Se trata de una nueva
metodología donde lo cualitativo del sentir y percibir engalana el proceso investigativo y habilita a
rodeos teórico-metodológicos hasta ahora poco incursionados. Se propuso la realización de un
proceso analítico de lo metodológico a partir de la Sociología de cuerpos/emociones, lo que se
entiende se fue logrando a partir de la deconstrucción del trabajo de campo en sus diversas formas.
Se presentó la puesta en marcha y análisis de la metodología llevada adelante con las maestras de la
EE Nº 197, de manera de desandar presupuestos, caminos trillados en lo metodológico, implicancias
singulares y colectivas. A partir de la información recabada en todo este proceso empírico, se fue
analizando reflexivamente en torno a los procesos de sociabilidad en niños/as sordos/as. El análisis

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de los cuerpos y corporalidades se entendió pertinente para poder deconstruir prenociones y


generar un pienso reflexivo desde la propuesta de diversos autores. La dialéctica del cuerpo social,
cuerpo individuo y cuerpo subjetivo, se entiende nutrió las potencialidades de desplegar este
reconocimiento en su devenir y procesualidad.
Los ECE como sustancia metodológica para recabar las sensaciones y percepciones que se generan
en torno a una temática álgida como la medicación con psicofármacos de la infancia sorda se
entiende genera una apertura tal que los sujetos que van transitando por este marco de trabajo van
pasando del pensar al sentir con especial riqueza. Lo que en sus comienzos no hace más que
repetirse una y otra vez lo que se piensa, a lo largo de la deconstrucción del proceso del ECE van
aflorando aspectos del sentir que nutren el posterior análisis reflexivo de la temática.
Para los fines de esta ponencia se presentó solamente el ECE realizado con las maestras de la EE Nº
197. Resultaron también en su singularidad y luego en su generalidad los contenidos que fueron
apareciendo en los ECE con la infancia sorda medicada de dicho espacio escolar y los ECE con sus
familias.
Se trata de un nuevo desafío metodológico en lo cualitativo que se invita a conocer y transitar.

Referencias

Déjours, Ch. (1992). Trabajo y desgaste mental. Buenos Aires: Humanitas.

Heller, A. (1987). Sociología de la vida cotidiana. Barcelona: Península.

Pellion, F. (2011). Soigner la surdité et faire taire les Sourds. Essai sur la médicalisation du Sourd et de
sa parole. Revue ESSAIM, N° 27, Paris: ERES, 127-134.

Scribano, A. (2013). ECE. Buenos Aires: Estudios Sociológicos Editora.

Scribano, A. (Comp.), (2007). Mapeando Interiores. Cuerpo, Conflicto y Sensaciones. CEA—CONICET-


Universidad Nacional de Córdoba: Jorge Sarmiento Editor.

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A qualidade da escola pública e o reencontro dos professores com


a multidimensionalidade do fenômeno educacional

1
Mara Regina Lemes de Sordi , Geisa do Socorro Cavalcanti Vaz Mendes2, Margarida
Montejano da Silva3
1
Faculdade de Educação, Unicamp, Brasil. maradesordi@uol.com.br;
2
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Sapucaí, Minas Gerais, Brasil.
geisavaz@gmail.com;
3 Prefeitura Municipal de Campinas, São Paulo, Brasil. margmon@uol.com.br

Resumo. O reducionismo das políticas regulatórias da qualidade das escolas brasileiras prejudica os
estudantes pela sonegação de aprendizagens necessárias para seu desenvolvimento humano omnilateral.
Este estudo, financiado pelo OBEDUC – CAPES (2013-2016) buscou conhecer como os professores de
uma3rede de ensino percebem o trabalho que protagonizam e sua aderência aos princípios da qualidade
social para problematizar dimensões essenciais e inerentes à formação humana, desprezadas pelos exames
externos. Observação etnográfica intensiva, entrevistas individuais e grupo focal subsidiaram a proposição
de matriz avaliativa multidimensional que originou um questionário aplicado aos professores da rede. A
escuta dos professores explicitou inúmeras dimensões de qualidade como compromisso social, práticas
pedagógicas, trabalho coletivo, participação e acesso e permanência e propiciou encontros formativos nos
quais a interpelação das práticas, sob a forma de comunidades interpretativas, impactou os processos
decisórios locais remetendo-os aos interesses legítimos das crianças em detrimento das metas de
desenvolvimento, fixadas externamente, de cunho mercadológico.
Palavras-chave: avaliação externa; formação humana; qualidade social; comunidades interpretativas;
responsabilização participativa

The quality of the public school and the multidimensionality of the educational phenomenon
reintroduced to teachers
Abstract. The reductionist aspect of the regulatory quality policies of Brazilian schools impairs students by
omiting necessary learnings for their omnilateral human development. This study funded by OBEDUC -
CAPES (2013-2016) aimed to understand how teachers of an education network perceive their own work
and their adherence to social quality principles in order to problematize essential dimensions that are
inherent to human education but neglected by external evaluation. Ethnographic observation, individual
interviews and focal group supported the development of a multidimensional evaluative matrix that
originated a questionnaire applied to the schools’ teachers. Listening to teachers revealed numerous quality
dimensions such as social commitment, pedagogical practices, collective work, engagement and access and
permanence. The meetings fostered formative spaces in which the assessment of educational practices, by
interpretative communities, impacted local decision making processes regarding Children's legitimate
interests to the detriment of development goals, which are set externally and have a marketing nature.
Keywords: external evaluation; human education; social quality; interpretative comunities; participative
accountability

1 Introdução

O delineamento das reformas no cenário educacional, iniciadas nos anos de 1980, por meio de
políticas públicas, reflete uma tendência geral nas democracias ocidentais em que se utilizam do
argumento do necessário controle do trabalho escolar em busca de melhorar a eficiência e eficácia
do ensino (Simons, 1999). Nessas reformas, a ação da gestão escolar e dos professores está sob
regulamentação e controle de agentes externos, sujeitas a um julgamento de valor com base no

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desempenho competitivo dos estudantes advindos dos resultados dos sistemas de avaliação.
Instaurou-se processos de responsabilização dos atores das escolas, em particular, pelos maus
resultados como sinônimo de indicadores de qualidade de tais políticas.
Para alguns estudos há, nessas reformas, tentativas de regulação e controle baseados na lógica do
mercado, via Estado Mínimo (Afonso, 2012; Correia & Maroto, 2010; Freitas, 2012; Simons, 1999).
Críticas são feitas a esse formato avaliativo por se utilizar dos mesmos parâmetros para avaliar
contextos sociais distintos, por exemplo, no caso brasileiro em que se tem um cenário fortemente
marcado por desigualdades regionais, estaduais, municipais e locais, e por uma grande quantidade
de redes e normas nem sempre articuladas, os dados são tratados sem considerar a diversidade que
os conforma (Dourado & Oliveira 2009). Dada essa complexidade tais avaliações não traduzem as
especificidades da ação educativa de cada escola, nas diferentes redes de ensino.
Refletir sobre essas questões nos remete a assumirmos que os dados das avaliações externas são
indicativos de parte do trabalho escolar, porém não são suficientes para ‘medir’ tudo o que se realiza
no ambiente educacional, a escola está envolvida em relações sociais mais amplas que interferem
nesse processo, tais como: questões macroestruturais (renda familiar, emprego, desigualdade
social); condições de trabalho docente, formação e profissionalidade docente; organização da gestão
escolar; organização do trabalho pedagógico; acesso e permanência dos estudantes; relação
professor-aluno e o afeto que as perpassa dentre outras, que nos provocam nesta pesquisa a tentar
elucidar a seguinte questão: “O que a escola faz que considera expressão de qualidade do seu
trabalho e que não é captado pelos exames externos”?
Este estudo situa um recorte de pesquisa longitudinal, realizado em uma rede municipal do interior
de São Paulo, Brasil, no período de 2013 a 2016. Buscou-se construir uma matriz de avaliação
formativa multidimensional, assentada em princípios da formação humana forjada a partir da escuta
sensível das vozes dos professores e gestores da escola quando instigados a pensar a partir de
questão disparadora que os mobilizou a refletir sobre seus fazeres e saberes alinhados com a
produção de qualidade na escola pública em uma perspectiva contestatória aos vieses da avaliação
em larga escala.

2 Avaliação da escola pública: outras qualidades possíveis sob a ótica dos atores sociais

O contexto social, político e econômico têm revelado que os resultados das avaliações sistêmicas,
instauradas nos cenários nacionais e internacionais nas últimas décadas, têm sido usados muitas
vezes para fins meritocráticos, conjugados com o ranqueamento das escolas sem considerar a
complexidade da ação educativa, das funções sociais que a escola exerce, e a diversidade de
contextos e sujeitos imersos nas relações entre o saber historicamente produzido e a sua
apropriação.
Estudos advogam que essa limitação, tendo em vista a metodologia utilizada, materializa-se por as
avaliações reduzirem as aprendizagens dos estudantes aos índices alcançados por meio da
proficiência em apenas duas ou três disciplinas escolares: língua materna, matemática, e em algumas
casos ciências; reduz-se os conhecimentos construídos a aferição de desempenho cognitivo dos
estudantes (Afonso, 2012; Freitas, 2016). Nesses formatos avaliativos, deixa-se de lado outras
aprendizagens que o processo de ensino e aprendizagem valoriza, os quais reúnem dimensões
voltadas à formação humana mais ampliada, além de desconsiderar as condições objetivas em que
se concretiza o processo educacional. Assim, a avaliação assume centralidade como meio de exercer
esse controle, responsabiliza-se os atores locais por meio dos índices alcançados. Por conseguinte, a
escola apropria-se desses indicadores, de tal modo, que o reconhecimento de sua qualidade passa a

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

depender de um olhar exterior para que se ateste a qualidade da educação por ela desenvolvida.
Para Correia e Maroto (2010, p. 2)
Este efecto de la simbolización de la educación es por lo menos paradójico en
la medida en que, como reconocen los profesionales de la educación y la
investigación educativa, las dimensiones más importantes de la acción
educativa son reconocibles sólo desde su interior, escapando en gran parte a
la mirada de las evaluaciones externas.

No caso brasileiro, a avaliação externa, implementada há mais de 25 anos, traz uma concepção de
qualidade atrelada as notas alcançadas nos exames do Sistema de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), com base nos resultados da Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc), denominada
de Prova Brasil, que avalia os conhecimentos em língua portuguesa e matemática. A partir desses
dados classificam-se as escolas por meio de um ranking, o qual é divulgado amplamente na mídia
televisiva e impressa. A localização da escola, no ranking, é interpretada pela sociedade, por
governantes e instituições como atestado de certificação de qualidade ou da não qualidade do
serviço prestado. A partir de 2007, com a criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB), pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), a
qualidade educacional é definida em metas a serem alcançadas que reúnem os dados do SAEB e da
Prova Brasil; e as taxas de aprovação, reprovação e evasão, constantes dos dados do Censo da
Educação Básica. Portanto, a proficiência em duas disciplinas e a taxa de aprovação, por escolas,
seriam representativos da eficiência e da eficácia do sistema escolar (Freitas, 2016; Souza, 2014).
Em sentido contrário a esse, assumimos que os dados dessas avaliações são indicativos de parte do
trabalho escolar, porém não são suficientes para medir tudo o que se realiza no ambiente
educacional. Assim, o conceito de qualidade por nós defendido compreende que
a qualidade da educação envolve dimensões extra e intraescolares e, nessa
ótica, devem se considerar os diferentes atores, a dinâmica pedagógica, ou
seja, os processos de ensino-aprendizagem, os currículos, as expectativas de
aprendizagem, bem como os diferentes fatores extraescolares que
interferem direta ou indiretamente nos resultados educativos” (Dourado &
Oliveira, 2009, p. 205).
Ademais, cabe a escola buscar, com seu coletivo organizado, instrumentos de autoavaliação que os
permita localizar nos tempos e espaços escolares as potencialidades e fragilidades que permeiam as
ações didático-pedagógica, de gestão, de relações com o contexto macro e microestrutural que
afetam diretamente a aprendizagem dos seus usuários. Cabe reconhecer que a educação se articula
a diferentes dimensões e espaços da vida social, estabelecidas interna e externamente, essas
relações são constitutivas e constituintes de entrelaçamentos de diferentes saberes envolvendo
dimensões culturais, políticas, econômicas e sociais próprias de uma dada sociedade. Tal
complexidade tem sido penalizada pelos modelos de avaliação sistêmica que reduzem a qualidade a
dimensões mais facilmente mensuráveis e que acabam introduzindo nas escolas a naturalização de
que resultados dos alunos nos testes estandardizados são suficientes para traduzir a missão da
escola pública.

3 Metodologia

A rede municipal de ensino, cenário desta investigação, desde os anos de 2002 vem buscando
desenvolver processos participativos junto a comunidade interna e externa, em uma ação articulada
com a universidade pública, culminando com a formulação de uma “Carta de Princípios”, em que se
defende princípios ético-epistemológicos de avaliação que superem a mera medição do rendimento
escolar centrada no aluno, articulado ao projeto pedagógico. Fortalecida nesse processo, em 2008, a

1799
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rede encontra instrumentos para fazer frente a determinações políticas verticalizadas, vindas de
olhares externos, assim apresenta reações contrarregulatórias, por meio da instituição de uma
política de Avaliação Institucional Participativa (AIP), iniciada nas escolas de ensino fundamental e
centros de educação de jovens e adultos, posteriormente nas escolas de educação infantil. A
implementação da AIP ocorre por meio de Comissões Próprias de Avaliação (CPA) composta por
todos os segmentos da comunidade educacional. Tal política emerge como modo de impulsionar
avanços na direção da qualidade social da escola pública, tem incorporado os valores da
participação, da gestão democrática e se vale da categoria da negociação (Bondioli, 2004) inter
atores e instâncias governamentais em nível meso e macro.
Coerente aos princípios defendidos nessa política, a pesquisa, financiada pelo Observatório da
Educação - OBEDUC-Capes (2013-2016) objetiva investigar “O que a escola faz que considera
expressão de qualidade do seu trabalho e que não é captado pelos exames externos?
Cabe destacar que o grupo de pesquisadores é composto por professores de duas universidades
públicas, três universidades sem fins lucrativos, estudantes de doutorado, mestrado e graduação,
especialmente, tem a participação de seis pesquisadoras que são docentes especialistas em
educação da própria rede de ensino. A participação das pesquisadoras da rede traz para o projeto
contribuições muito importantes, tendo em vista que as discussões, debates e embates que
envolvem todo o processo da pesquisa, se entrelaçam a partir da vivência de um ator que atua
diretamente na escola de educação básica com os aportes da academia.
A opção metodológica abrange várias técnicas de coleta de dados, observação etnográfica (Ludke &
André, 1986) em oito escolas da rede previamente selecionadas, análise documental (Projeto
Pedagógico da escola, Plano de Avaliação da Escola; legislação dentre outros); entrevistas individuais
com membros das equipes gestoras; grupo focal com os professores(as) inter escolas e observação
dos espaços coletivos com os de Trabalho Docente Coletivo (TDC), reuniões das Comissões Próprias
de Avaliação (CPA) e aplicação de questionários em toda a rede.
Os dados foram submetidos a análise qualitativa por triangulação de métodos e análise de conteúdo
(Bardin, 2006) constitui o corpus da pesquisa estudado, analisado exaustivamente pelos
pesquisadores, na busca de perceber suas regularidades para construir as categorias que expressam
os significados atribuídos pelas escolas a qualidade social. As regularidades incorporam aspectos que
remetem à ações educacionais que forjam dimensões que remetem ao construto qualidade social.
Esse processo impulsionou a construção de uma matriz de avaliação que pudesse dar visibilidade ao
trabalho escolar realizado pelas escolas mas não medido e valorizado pelos exames externos.
A medida que a análise dos dados avança e os encontros com as escolas se intensificam, emerge a
necessidade de explicitar mais detalhadamente qual o conceito de qualidade a que se vincula a
matriz recém criada.
A análise qualitativa das contribuições dos professores resultou em 23 dimensões, a saber: práticas
pedagógicas implicadas com as aprendizagens de todas as crianças; organização coletiva do trabalho
escolar; práticas comprometidas com a permanência de todas as crianças na escola; formação
ampliada; afetividade; inclusão social; relação corresponsável entre escola e família; respeito a
diversidade (alunas/os); solidariedade; cultura; aprendizagem: ética, política e cognitiva; criatividade;
valores dentre outras. A etapa seguinte configurou o exercício de refinar os dados para elaboração
de categorias e levou a aglutinação de dimensões que abarcavam significados semelhantes.
Privilegiou-se seis dimensões pactuadas como primeira aproximação da rede de ensino a uma
avaliação de suas escolas a partir do construto qualidade social. São estas: 1 - Compromisso com a
aprendizagem de todos; 2 – Trabalho Coletivo; 3 – Participação; 4- Práticas Pedagógicas; 5 – Acesso e
Permanência; e, 6 - Relação escola comunidade. Cada uma dessas dimensões envolve indicadores de
qualidade social. Para promover certo afinamento conceitual, optou-se pela formulação de um
glossário, validado pelo coletivo de pesquisadores conforme ilustrado no Quadro 1.

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Quadro 1. Glossário das dimensões


Compromisso com a aprendizagem de todos – CAT - Ações pedagógicas promovidas pela escola voltadas para
atender as necessidades de aprendizagem de todos os alunos a partir dos conhecimentos que estes já
possuem; iniciativas da escola que consideram as singularidades e as dificuldades individuais dos alunos
identificadas pelos docentes nas avaliações do cotidiano escolar.
Trabalho Coletivo – TC -ação desenvolvida com intencionalidade por grupo/segmento de sujeitos da escola
(professor, aluno, equipe gestora, funcionários, família) que se organiza para o acompanhamento, a
avaliação, e o (re)planejamento dos trabalhos educativos, norteados por objetivos consensuados no Projeto
Político Pedagógico. Efetiva-se por meio de discussões, reflexões e apresentação de ideias, em que se
considera o direito à voz dos diferentes sujeitos da escola e à garantia da escuta e do respeito aos mesmos e
aos diferentes pontos de vista em defesa da qualidade do ensino e da aprendizagem. Pode ocorrer intra e
inter segmentos, estabelecendo novas parcerias com partilha de responsabilidades e compromissos.
Participação – PA -ação de integrar se a um grupo; um coletivo de pessoas que está envolvido num projeto,
comprometido com o seu desenvolvimento. Diz respeito à escuta, diálogo, tomada de posição, reflexão e
respeito às ideias dos diversos integrantes do coletivo, em que cada sujeito é protagonista ao partilhar
pontos de vista e decisões, produzindo conhecimento social em permanente construção/ (re)construção de
aprendizagem política.
Práticas Pedagógicas – PP- ações intencionais tomadas pelo professor, com olhar atento para as
peculiaridades dos alunos, visando a promover seu desenvolvimento integral na construção do
conhecimento e na transformação da realidade. Isso significa trabalhar com as múltiplas dimensões da
formação humana: a dimensão dos valores (solidariedade, respeito, cooperação etc.), relacional, afetiva,
política/social, cognitiva, cultural.
Acesso e Permanência – AP -Ações ligadas à matrícula, ao acolhimento das crianças, adolescentes e jovens na
escola e à garantia das mesmas de frequentar todo o ano letivo com possibilidade de aprender.
Oferecimento, por parte da escola, de propostas de trabalho pedagógico coletivo que garantam o ensino, e a
aprendizagem a todos, a partir dos conhecimentos que estas já possuem; e, para a garantia da permanência
com qualidade, buscam parceria com as famílias e/ou com outras instituições.
Relação escola comunidade – REC- envolvimento, preocupação e atuação da escola em relação ao entorno
social, buscando afetar em questões que dizem respeito ao bem-estar da sociedade/coletividade. Ter
compromisso social implica desempenhar uma atuação responsável quanto às questões de convivência, de
meio ambiente, de enfrentamento da desigualdade social, dentre outros.
Fonte: Dados da pesquisa (2016)

A construção dessa matriz contribuiu para a última fase da pesquisa. Essa consistiu na elaboração de
um questionário, composto por 40 questões. Para responder as questões o docente é convidado a
analisar indicadores de qualidade e sinalizar a opção mais aproximada do trabalho escolar em uma
Escala de Likert, com os seguintes rótulos: nunca, raramente, às vezes, geralmente, sempre. Essa
análise pretende confirmar ou não a pertinência dos indicadores que deem visibilidade à outras
dimensões da qualidade da escola pública. Houve a adesão de 841 professores, de um total de 1298,
correspondo a 65,18% da rede. Os dados foram submetidos ao método de extração das
componentes principais, com a rotação ortogonal Varimax, por meio do software SPSS - Statistical
Package for the Social Science (Dalben, 2016). Aliado a isso, realizou-se uma comparação das
respostas dos docentes com as médias das proficiências padronizadas em Língua Portuguesa e em
Matemática obtidas na Prova Brasil de 2013. Para maior facilidade na interpretação dos dados as
médias foram convertidas para uma escala que varia de 0 a 5. Essa representação foi feita para os
resultados encontrados no 5º ano (Proficiência Média 5o. Ano – PM5) e também, quando existentes,
para o 9º ano (Proficiência Média 9o. Ano – PM9). O gráfico a seguir apresenta os valores médios,
mínimos e máximos encontrados entre as escolas que participaram da pesquisa, explicita a
percepção dos professores respondentes acerca da Qualidade Social. Para a interpretação dos
resultados encontrados, os valores têm o seguinte significado: 1-Nunca; 2- Raramente; 3- Às vezes; 4-
Geralmente; 5- Sempre.

1801
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Fig. 1. Resultado Geral das escolas


Legenda: PP – Práticas pedagógicas; TC – Trabalho Coletivo; AP –Acesso e permanência; PA- Participação; REC – Relação
Escola-Comunidade; CAT - Compromisso com a aprendizagem de todos; PM5 – Proficiência média 5o. ano; PM9 -
Proficiência média 9o. ano.

Após a compilação desses dados, organizou-se a oficina: “Indicadores da qualidade social – uma
análise sob o olhar dos professores da Rede Municipal”, com o objetivo de apresentar às escolas os
dados da pesquisa, especificamente do questionário aplicado em 41 escolas e possibilitar um diálogo
entre universidade e professores acerca de seu fazer profissional e as implicações no futuro dos
estudantes. Essa oficina tinha como propósito ainda possibilitar à escola reconhecer as múltiplas
dimensões da qualidade que privilegia à luz dos compromissos pactuados no projeto educativo e os
impactos nefastos quando o trabalho escolar é reduzido ao que é mensurável deixando de lado os
aspectos subjetivos da qualidade que envolvem valores tais como ética, cidadania.
Destaca-se a potência dessa ação pois incitou o debate entre os especialistas (gestores das escolas e
pesquisadores), no que tange à busca dos sentidos e significados para os índices de qualidade social
apresentados sob a forma de gráficos radiais que induziu leitura tecida em conjunto para
compreender/apreender/analisar os índices de qualidade social expressos nos relatórios. Evidenciou-
se nas falas dos presentes a necessidade de ampliar os elementos indicadores de qualidade, a saber:
Discutir esses indicadores de qualidade social com as Comissões Próprias de Avaliação (CPA); Estudar
e problematizar os indicadores de cada escola pela equipe gestora para posterior socialização com os
profissionais da escola; ampliar os ambientes de aprendizagem na escola, de espaços e tempos
coletivos; ampliar o debate sobre questões objetivas tais como: jornada, recursos materiais,
aprendizagem, dentre outros. Esse espaço coletivo reflexivo permitiu vivenciar momento singular de
qualificação das relações entre a escola pública e a universidade, entre escolas e os especialistas,
cada um contribuindo com o seu olhar a partir do seu lugar, ou seja, das suas condições objetivas.

5 Conclusões

A metodologia adotada nesta pesquisa contribuiu significativamente para que os atores locais,
envolvidos diretamente com o trabalho de formação das crianças, adolescentes e jovens, da rede,
assumissem o protagonismo no momento de refletir sobre a ação educativa que realizam. O
reencontro com suas práticas, fez emergir novas significações e reacendeu certa coragem cívica
(Afonso, 2014) para se pronunciarem sobre as aprendizagens necessárias para as novas gerações. Os
dados em cada etapa da pesquisa corroboram nossa tese de que o conceito de qualidade da
educação é multidimensional não podendo ser subsumido por políticas públicas que reduzem a
qualidade ao que pode ser medido, induzindo concepção de qualidade rasa, porém nefasta dada a

1802
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

alta capacidade de ingerência na vida escolar. Os princípios da pesquisa qualitativa subsidiaram um


desenho metodológico engenhoso e eticamente implicado. Logrou-se associar ao processo de coleta
de dados, uma feição formativa, pedagógica e política, favorecida pela relação sujeito/sujeito, na
qual avaliador e avaliado estão superpostos, na qual pesquisador e pesquisado se complementam no
esforço de dar visibilidade aos aspectos mais subjetivos da qualidade social já existentes na realidade
das escolas, e que tem sido subliminarmente desperdiçadas pelas políticas regulatórias de cunho
objetivista e pretensamente neutras.
Cabe esclarecer que a matriz avaliativa não esgota toda a multidimensionalidade do processo
educacional, porém, fornece elementos substanciais para anunciar aos formuladores de políticas
públicas educacionais, que quaisquer ações que se pretenda avaliar a escola, requer que a olhe de
forma a enxergar sua função social em relação com outras dinâmicas, tais como: as questões sociais,
econômicos, políticas, as práticas pedagógicas, a cultura entre outras. Conclui-se que as mudanças
ocorridas no espectro político do atual contexto nacional e local, que ora revelem avanços ora
retrocessos, nos fortalece a defender ações pautadas em princípios participativos, pois elas têm
favorecido a organização das forças progressistas da escola, ampliam o seu protagonismo em direção
a responsabilização participativa que se referenciam ao ideário da qualidade social se confrontando
com os interesses mercadológicos que subjazem os processos de avaliação externa nacionais e
internacionais.

Referências

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A (im)pertinência das teorias pedagógicas no ensino de Ciências


Exatas no Ensino Superior
Paulo A. Castro 1,2, Adriana Sadoyama 2, Geraldo Sadoyama 2, Marcos Fernandes Sobrinho 3,
Paulo Vitor Souza 4, Serigne Ababacar Cisse Ba 2, Susana Sá 5, Lisete Mónico 6, Thays Santos Souza
2
1 Departamento de Física; Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão, Brasil.
padecastro@gmail.com
2 Mestrado em Gestão Organizacional; Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão, Brasil.

padecastro@gmail.com;
3 Instituto Federal Goiano – Câmpus Urutai, Brasil. marcos.sbf@gmail.com
4 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (IF Goiano), Brasil.

paulovitorteodoro@yahoo.com.br
5 Centro de Investigação de Estudos da Criança da Universidade do Minho, Portugal.

susanaemiliasa@gmail.com
6 Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Portugal.

lisete.monico@fpce.uc.pt

Resumo. Neste trabalho avaliamos a percepção da relevância do conhecimento pedagógico formal em


docentes de Física, Química e Matemática da Universidade Federal de Goiás, Regional Catalão (UFG/RC),
Goiás-Brasil. Comparamos a percepção destes docentes de acordo com sua área de atuação
(formação/conhecimento), sua formação pedagógica, sua titulação e seu tempo de experiência docente. Os
resultados indicam que, de maneira geral, os docentes não percebem como relevante possuir conhecimento
formal de modelos e concepções pedagógicas. Apresentam-se e discutem-se os fatores percebidos como
mais importantes para a prática destes docentes.
Palavras-chave: teorias pedagógicas; ensino; ciências exatas; Ensino Superior; docência.

The (im)pertinence of the pedagogical theories in the teaching of Exact Sciences in Higher Education
Abstract. In this article, we evaluate the perception of the relevance of formal pedagogical knowledge of
teachers of Physics, Chemistry and Mathematics of the Federal University of Goiás, Regional of Catalão
(UFG/RC), state of Goiás-Brazil. We compared the perception of teachers according to their area of
expertise (training / knowledge), their pedagogical training, their titles and their time teaching experience. It
was found that in general teachers do not see the relevance of formal knowledge models and pedagogical
concepts and were detected the factors perceived as most important to the practice of these teachers.
Keywords: pedagogical theories; education; exact sciences; higher education; teaching.

1 Introdução
No Brasil, a aquisição de habilitações superiores de cursos das ciências exatas, tanto ao nível do
Bacharelado quanto da Licenciatura, apresenta dificuldades diversas. As áreas de Física, Matemática
e Química são tradicionalmente apontadas como difíceis, o que pode ser especialmente notado pela
alta evasão dos estudantes nestes cursos. A percepção generalizada de dificuldades no aprendizado
das Ciências Exatas reflete-se também nos outros níveis de ensino (Biggs, 1999). Em geral, são tidos
como exemplos de profissionais de sucesso nessas áreas docentes de instituições públicas de nível
superior, dedicados à pesquisa, à extensão de conhecimentos e, especialmente, ao ensino. São estes
profissionais que, em última análise, são responsáveis pela formação da próxima geração de
docentes dessas disciplinas. O processo de formação de um professor das áreas de ciências exatas é
longo e complexo. No caso particular de um docente do Ensino Superior, inúmeras variáveis
influenciam e competem para culminar no profissional almejado, que reuniria conhecimento técnico-
científico refinado, criatividade, capacidade de ensino, entre outras tantas. A pluralidade destes
fatores permite uma ampla variedade de formações dos docentes das áreas de ciências exatas, que

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

incluem tanto os bacharéis, quanto os licenciados. O objetivo deste trabalho é identificar a


percepção que os docentes do Ensino Superior das áreas de ciências exatas, têm das teorias,
métodos e modelos pedagógicos. Em outras palavras, pretendemos verificar qual o nível de
treinamento pedagógico que os docentes das áreas de ciências exatas – em especial Física, Química e
Matemática – receberam, qual a sua opinião acerca deste treinamento, qual a relevância deste
treinamento para sua prática docente e quais pontos seriam mais relevantes para sua atuação em
sala de aula. Evidentemente que se trata de uma questão complexa e multifacetada, para a qual de
maneira alguma este trabalho pretende dar uma resposta definitiva. O que se pretende é alertar
para a sua relevância, e que se bem resolvida pode nos permitir saber em quais áreas e temas
devemos melhor preparar os docentes do Ensino Superior nas áreas de ciências exatas. Esta não é
uma questão puramente regional, como debatido por Snow (1995), onde, já em 1959, o autor
argumentava que a qualidade da educação no mundo estava em declínio. A tese de Snow debruça-se
sobre a perda de diálogo entre as duas culturas da sociedade moderna, i.e., entre as ciências exatas e
as ciências humanas. Esta perda de diálogo é um dos problemas centrais para resolver as dificuldades
em educação. O termo duas culturas, cunhado por Snow, designa dois comportamentos distintos: 1)
ponto de vista científico, que acredita que um observador possa realizar objetivamente observações
imparciais e não determinadas culturalmente sobre a natureza, e; 2) a visão construtivista do mundo
que tem dominado as ciências humanas, na qual o método científico é visto como um produto
influenciado pela linguagem e aspectos culturais. Esta dicotomia é um ponto central a ser
considerado na formação de um docente de nível superior, em especial quando discutimos a
contribuição da pedagogia, uma ciência humana por excelência, na formação dos docentes. Como
veremos, essa ausência de diálogo entre as ciências humanas e as exatas é um dos grandes
obstáculos para que as concepções, teorias e métodos educacionais desenvolvidos pelos
pesquisadores da Educação sejam absorvidos pelos docentes de Ciências Exatas. Esta ausência de
diálogo leva a uma percepção generalizada dentro dos departamentos de ciências exatas de que um
grande número de métodos, modelos e teorias pedagógicas, bem como de muitas áreas de ciências
humanas, não passam de imposturas intelectuais, como discutido por Sokal e Brickmont (2006). É
preciso, em primeiro lugar, esclarecer que há uma diferença tácita entre o que se entende por uma
teoria pedagógica formal e o conhecimento pedagógico. Quando se fala de conhecimento
pedagógico, muitas vezes nos referimos a todo um conjunto de conhecimentos necessários para se
ministrar uma boa aula. Portanto, muitos conhecimentos e habilidades, que não são formalmente
codificados, estão implícitos na expressão conhecimento pedagógico como o conhecimento formal
do próprio objeto sobre o qual se deseja lecionar, conhecimento da realidade e especificidades dos
alunos, capacidade de comunicação, capacidade criativa, capacidade de improvisação, entre outros.
O que é entendido por teorias pedagógicas formais é fundamentalmente diferente. Uma teoria
pedagógica postula como os assuntos devem ser ensinados e/ou como fazer com que uma pessoa
aprenda um determinado assunto. De fato, em geral, essas teorias são baseadas nas chamadas
teorias de aprendizagem, ou seja, são baseadas em hipóteses e modelos de como o ser humano
aprende e daí derivam as concepções de como elaborar estratégias de ensino-aprendizagem. Como
veremos mais adiante, essa dicotomia é compreendida pelos docentes de ciências exatas. O
problema da pertinência que pretendemos explorar aqui visa, sobretudo, entender o papel das
teorias pedagógicas formais para um docente da área de Ciências Exatas; mais ainda, procura
mensurar a importância relativa do aprendizado dessas teorias frente a outros saberes pedagógicos
como a cultura geral, a criatividade e a capacidade de comunicação. Especificamente no caso do
Ensino Superior, a questão da pertinência das teorias pedagógicas toma contornos mais claros,
devido a possibilidades de formação de um docente da área de Ciências Exatas. Em um extremo,
temos os Bacharéis que, em geral, não possuem nenhuma formação pedagógica e são uma parte
considerável do corpo docente das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), inclusive nos

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

cursos de Licenciaturas. No outro lado, temos os Licenciados que frequentaram enquanto estudantes
diversas centradas nas teorias pedagógico-formais (Brasil, 2000), o que em muitos casos força que
sejam suprimidas diversas disciplinas técnico-científicas. Sobretudo hoje, com a atual expansão do
Ensino Superior e o crescente número de novos docentes, o problema do espaço das teorias
pedagógicas no ensino de Física, Química e Matemática no Ensino Superior ganha destaque, com as
IFES buscando criar programas para capacitar seu novo pessoal a realidade docente (Ementa do
curso de docência no Ensino Superior-Estágio Probatório, 2009). Face ao exposto, colocamos a
questão se seria pertinente nesses espaços discutir as práticas e as dificuldades da docência à luz das
teorias pedagógicas atuais.

2 Método
Este é um estudo preliminar, de caráter descritivo-exploratório e de abordagem quali-quantitativa,
que pretende levantar a questão da pertinência do conhecimento pedagógico formal para os
docentes de Física, Matemática e Química da Universidade Federal de Goiás, Regional Catalão
(UFG/RC), Goiás-Brasil.
2.1 Participantes
Os participantes são professores de um dos cursos de Ciências Exatas (Física, Matemática ou Química)
da Regional Catalão da Universidade Federal de Goiás. Somados os docentes dos três cursos, 44
receberam o convite para participar do estudo. Contudo, dos 44 apenas 24 docentes assinaram o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e responderam ao questionário utilizado para a
coleta de dados. Dentre os respondentes, 72% são do sexo masculino e 28% são do sexo feminino. A
faixa etária dos participantes variou entre 27 a 47 anos, inclusive. O valor médio do tempo
(experiência) de docência foi de 6.4 anos.
2.2 Materiais
Nesta pesquisa foi utilizado como instrumento de coleta de dados um questionário autoaplicável,
composto por 13 perguntas, entre questões de escolha múltipla e de respostas aberta. O questionário
continha instruções sobre o preenchimento e perguntas sobre os dados sociodemográficos dos
participantes e sobre a formação acadêmica do docente (com disciplinas de ordem pedagógicas) e a
influência dessa na formação dos discentes.
O primeiro conjunto de perguntas visava caracterizar o docente:
• Formação Acadêmica, especificamente foi questionada a qual o curso de Graduação, de
Especialização, de Mestrado, de Doutorado e Outros, bem como a instituição responsável e o
ano de conclusão;
• O Curso e/ou Departamento onde atua e as disciplinas ministradas
• O tempo de experiência como docente e tempo de experiência como docente na UFG/CAC e
as disciplinas ministradas nos dois últimos semestres;
• Tempo de experiência do docente nos diversos níveis do ensino: Monitorias, Ensino
Fundamental, Ensino Médio, Ensino Técnico, Ensino Superior Público, Ensino Superior
Privado, Ensino a Distância, Pós-graduação Lato Sensu, Pós-graduação Stricto Sensu;
• Como o docente avalia a relação profissional com seus alunos (negativa, indiferente, positiva,
muito positiva);
• A frequência de preparação de suas aulas.
Esse grupo de questões visou sobretudo identificar grupos similares dentro do conjunto de docentes
pesquisados. O segundo grupo de questões pretendeu identificar qual a formação pedagógica formal
do docente. Foram feitas duas questões de escolha múltipla a respeito da carga horária em
disciplinas pedagógicas e do conteúdo dessas disciplinas:

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A. Como você avalia a carga horária destinada as disciplinas pedagógicas em sua formação?
(opções de resposta: Não cursei disciplinas pedagógicas em minha formação; A carga horária
foi insuficiente; A carga horária foi adequada; e A carga horária foi excessiva).
B. Como você avalia o conteúdo das disciplinas pedagógicas em sua formação? (opções de
resposta: Não cursei disciplinas pedagógicas em minha formação; O conteúdo foi insuficiente
ou inadequado; O conteúdo foi insuficiente, mas adequado; O conteúdo foi adequado; O
conteúdo foi excessivo, e inadequado; e O conteúdo foi excessivo, mas adequado).
Um terceiro conjunto de perguntas visou caracterizar se (e como) o docente percebe que as
disciplinas pedagógicas poderiam melhorar o seu desempenho enquanto docente:
C. Como você avalia o papel das teorias pedagógicas na preparação de suas aulas atualmente?
(opções de resposta: Completamente irrelevantes; Pouco relevante; Relevantes; Muito
Relevantes; e Inteiramente Relevantes).
D. Como você avalia o benefício de um aprofundamento nas teorias pedagógicas em sua prática
docente? (opções de resposta: Não haveria nenhum benefício expressivo; É possível que
hajam benefícios marginais; Seria benéfica em um grau apreciável; Seria bastante benéfica; e
Seria indispensável para melhorar meu desempenho como docente).
E. Como você avalia a influência de um conhecimento mais profundo das teorias e modelos
pedagógicos na melhoria de sua relação com seus alunos? (opções de resposta: Seria de uma
influência negativa; Seria irrelevante; Seria importante, mas existem outros mecanismos
mais relevantes; e Seria fundamental para aprimorar minha relação com os alunos).
O quarto conjunto de perguntas visou identificar quais os fatores mais influentes para a prática dos
docentes, para sua preparação e execução de aulas. Foi questionado:
F. Como você avalia a carga horária destinada as disciplinas pedagógicas em sua formação?
(opções de resposta: Não cursei disciplinas pedagógicas em minha formação; A carga horária
foi insuficiente; A carga horária foi adequada; e A carga horária foi excessiva).
G. Como você avalia o conteúdo das disciplinas pedagógicas em sua formação? (opções de
resposta: Não cursei disciplinas pedagógicas em minha formação; O conteúdo foi insuficiente
ou inadequado; O conteúdo foi insuficiente, mas adequado; O conteúdo foi adequado; O
conteúdo foi excessivo, e inadequado; e O conteúdo foi excessivo, mas adequado).
A seguir, o terceiro conjunto de perguntas visava caracterizar como o docente percebe que as
disciplinas pedagógicas poderiam melhorar seu desempenho como docente:
H. Foi solicitado ao docente que classificasse, de 1 a 6 (sendo 1 o mais importante e 6 o menos
importante), o papel que cada um dos domínios de formação desempenha em sua prática
docente. Os itens eram: Conhecimento técnico-científico específico; Conhecimento
pedagógico formal; Experiência adquirida em sala de aula; Cultura Geral; Capacidade de
Comunicação; Capacidade Criativa e/ou de Improvisação.
I. Foi solicitado ao docente que indicasse quais eram suas principais influências na preparação
de suas aulas, e sugerido que ele marcasse todos os itens que acreditasse serem pertinentes.
As opções eram: A forma como meus próprios professores ministraram a disciplina; Modelos
e concepções pedagógicos formais; A integração da disciplina com as demais disciplinas do
currículo; A integração da disciplina com a pesquisa; Minhas próprias de ciências quando
estudante da disciplina; Minhas experiências anteriores como docente.
J. Foi solicitado ao docente que indicasse quais eram suas principais influências na execução de
suas aulas, e sugerido que ele marcasse todos os itens que acreditasse serem pertinentes. As
opções eram as mesmas do item anterior.

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O questionário era ainda composto por mais dois grupos de questões que visavam compreender qual
a tendência de cada docente para cada modelo ou teoria pedagógica atual. Esse grupo de questões
não será tratado aqui, sendo discutido em trabalhos posteriores.
2.3 Procedimentos
Foi distribuído o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE, de acordo com a Resolução CNS
466/2012 (Brasil, 2012), devidamente assinado pelos docentes, após termos fornecido as instruções
de preenchimento e garantido o anonimato e a confidencialidade das respostas individuais. O
questionário foi distribuído na Universidade Federal de Goiás a todos os docentes juntamente com o
termo de esclarecimento livre e esclarecido.

3 Resultados
Os dados obtidos foram comparados de acordo com a área em que os docentes atuam (curso de
Física, Química ou Matemática), com seu tempo de docência, com sua titulação e com sua formação
pedagógica. A partir destes parâmetros delinearemos qual a importância relativa que cada um dos
grupos de docentes dá para o estudo ou conhecimento formal das teorias pedagógicas. Em primeiro
lugar debrucemo-nos sobre a percepção dos docentes sobre a importância de vários fatores que
influenciam sua prática docente (o que corresponde ao terceiro conjunto de perguntas mencionado
acima). Esses resultados estão apresentados e resumidos nas Figuras de 1 a 4.

Fig. 1. Grau de importância na prática docente dos diversos domínios de formação (questão H) em função do tipo de
formação pedagógica dos docentes entrevistados.

A Figura 1 mostra claramente que as teorias pedagógicas formais são consideradas pelos docentes o
fator menos influente na sua prática docente; docentes que não tiveram nenhuma formação
pedagógica tendem a considerar as teorias pedagógicas menos relevantes, sendo que docentes com
alguma formação pedagógica tendem a creditar uma relevância um pouco maior a essas teorias, mas
ainda em um grau de importância menos significativo que os outros fatores. Note também que para
docentes sem formação pedagógica o fator mais importante para a prática docentes foi o seu
conhecimento técnico-científico; os fatores experiência docente, cultura geral, capacidade de
comunicação e capacidade criativa ficaram mais ou menos empatados, sendo considerados mais
importantes que o conhecimento pedagógico formal. Os docentes com alguma formação pedagógica
também consideraram estes fatores mais importantes que o conhecimento pedagógico formal; estes
docentes apontaram que a experiência docente, a cultura geral, a capacidade de comunicação e a
capacidade criativa são tão importantes quanto o conhecimento técnico- científico. Resultados
semelhantes podem ser observados na distribuição dos docentes por área de conhecimento, como
vemos na Figura 2. Verificamos ainda que docentes dos 3 cursos (área de conhecimento) atribuem a

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menor importância ao conhecimento pedagógico formal. A maior relevância das teorias pedagógicas
formais é apontada pelos docentes do curso de Matemática, onde se registou o maior número de
docentes licenciados e/ou com pós-graduação em áreas de ensino. Importante registrar que o curso
de Matemática, que foi criado em 1998, é de longe o mais antigo dos três cursos pesquisados, o que
sugere uma explicação para a grande importância dada à experiência docente. Esse comportamento
também é observado quando os docentes são separados por tempo de docência, como mostra a
Figura 3.

Fig. 2. Grau de importância na prática docente dos diversos domínios de formação (questão H) em função da área de
conhecimento (curso) dos docentes entrevistados.
Observando a Figura 3, note que há pouca diferença entre os docentes que exercem a atividade por
mais de nove anos e os docentes mais novos. Ambos dão pouca importância para as teorias
pedagógicas formais e importâncias semelhantes à cultura geral, à capacidade de comunicação e à
criatividade. Os docentes mais experientes tendem a dar mais importância ao conhecimento técnico
científico e à experiência docente.

Fig. 3. Análise da questão H, levando em conta o tempo de docência (experiência) dos docentes entrevistados.

Por fim, na Figura 4, analisamos qual a importância de cada um destes fatores de acordo com a
titulação dos docentes. Dividimos os docentes entre aqueles que possuem o título de Doutor e os
que não possuem esse título. Observamos que os Doutores são os que mais atribuem importância ao
conhecimento técnico-científico e à experiência como docente. Doutores e não-doutores atribuem
baixa importância ao conhecimento pedagógico formal; os demais fatores recebem níveis de
importância semelhantes.

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Fig. 4. Grau de importância na prática docente dos diversos domínios de formação (questão H) em função do grau de
titulação dos docentes entrevistados.
Vamos analisar agora quais as principais influências dos docentes na preparação e execução de suas
aulas. Esses resultados são apresentados e discutidos nas Figuras de 5 a 8.

Fig. 5. Principais influências na preparação das aulas (questão I) em função do nível de formação pedagógica dos docentes
entrevistados.
Na Figura 5 vemos que as duas influências predominantes em ambos os grupos são as experiências
anteriores como docente e os próprios alunos. Apenas cerca de 30% dos docentes sem nenhuma
formação pedagógica não apontaram este como uma influência para a preparação ou execução das
aulas. Além disso, quase 80% dos docentes sem formação pedagógica apontaram que a forma como
os seus professores ministraram a disciplina foi uma influência importante para o modo como eles
ministram suas aulas. Cerca de 70% dos docentes que consideram sua formação pedagógica
insuficiente e de 60% dos docentes que consideram ter uma formação pedagógica adequada
também apontam o exemplo dos docentes que os ensinaram. Novamente os modelos e concepções
pedagógicas foram os menos apontados, sendo indicados somente por cerca de 20% dos docentes
que consideraram sua formação pedagógica insuficiente.
Vemos, na Figura 6, como essas influências são percebidas de acordo com a área de conhecimento
(curso) dos docentes entrevistados. Verificamos que apenas 30% dos docentes da Física não
consideraram suas experiências anteriores como docentes uma das influências mais importantes na
execução ou planejamento de suas aulas.

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Fig. 6. Principais influências na preparação das aulas (questão I) em função da área de conhecimento (curso) dos docentes
entrevistados.
De forma análoga, apenas cerca de 30% dos docentes da Química não apontaram os alunos como
sendo um fator influente. Os docentes das áreas de Química e de Física, (dois cursos novos na
UFG/RC) foram os que com mais frequência (cerca de 70%) apontaram o exemplo de seus próprios
professores como uma influência relevante, contra menos de 50% dos docentes da Matemática (um
dos cursos mais antigos). Os docentes da Física são os que consideram mais influente a integração da
disciplina com as demais disciplinas do currículo, enquanto os químicos são os que consideram mais
influente a integração da disciplina com a pesquisa. Tanto os físicos quanto os químicos apontam
com igual frequência a memória das próprias de ciências quando alunos como uma influência
relevante; os docentes da Matemática apontaram esse fator com uma frequência duas vezes e meia
menor. Apenas docentes da Matemática apontaram os modelos e concepções pedagógicas com
influentes para a execução ou preparação de aulas.

Fig. 7. Principais influências na preparação das aulas (questão I) em função do tempo de docência (experiência) dos
docentes entrevistados.
As diferenças entre os docentes dos cursos mais novos (Física e Química) e do curso mais antigo
(Matemática) sugerem que o tempo de docência é um fator relevante para a mudança de
comportamento dos docentes na preparação e execução de suas aulas. Na Figura 7 notamos que os
docentes mais experientes apontam com uma frequência quase 3 vezes menor a influência dos
próprios professores no planejamento e execução de suas disciplinas e com um grau ligeiramente
maior a experiência como docentes. Mais ainda, nenhum docente com mais de nove anos de
docência apontou a memória das próprias aulas de ciências como discente, contra mais de 70% dos

1812
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docentes com menos de nove anos. Ainda, nenhum docente com mais de nove anos julgou os
modelos e concepções pedagógicas como uma influência relevante. Na Figura 8 podemos ver como
os docentes se comportam de acordo com a sua titulação. Verificamos também que grande parte dos
docentes de Física, Matemática e Química tendem a usar modelos e concepções pedagógicas ainda
não possuam o título de Doutor, mas que mesmo tendo um conhecimento formal dos modelos e
concepções pedagógicas o exemplo de seus professores é uma de suas principais influências.
Nenhum dos Doutores apontou uma influência dos modelos e concepções pedagógicas na sua forma
de preparar ou ministrar uma aula.

Fig. 8. Principais influências na preparação das aulas (questão I) em função do grau de titulação dos docentes entrevistados.

Por fim, transcrevemos algumas das falas mais representativas e contundentes sobre a percepção da
importância (ou não) de formação pedagógica.
“Nunca senti necessidade e sempre notei despreparo de professores dessas áreas”, declaração de
um docente sobre a carga horária de disciplinas pedagógicas em sua formação. (Relativo a questão
H, Figuras 3 e 4).
“Com exceção da primeira e da última, é difícil de avaliar a importância, todos parecem ser
igualmente relevantes”, declaração de um docente sobre CH de disciplinas pedagógicas em sua
formação. (Relativo a questão H, Figuras 3 e 4).
“A profissão “professor” precisa de mais suor do que filosofias...”. (Desabafo, num dos campos de
comentários do questionário, de um dos docentes entrevistados).

4 Discussão e Conclusões
Neste trabalho avaliámos a percepção da relevância do conhecimento pedagógico formal em
docentes de Física, Química e Matemática da Universidade Federal de Goiás, Regional Catalão
(UFG/RC), Goiás-Brasil.Percecionámos uma variedade de idades dos docentes não tão extensa e uma
predominância do gênero masculino que, segundo Franco (2012), expressa de forma adequada as
representações sociais destes docentes, as quais influenciam a avaliação do objeto pesquisado. Os
resultados mostram que uma das principais influências dos docentes entrevistados na preparação e
execução de suas aulas é a forma com que eles mesmos foram ensinados. Estes resultados podem
sugerir para alguns que os professores de Física, Química e Matemática estejam simplesmente
reproduzindo os métodos e técnicas de ensino anteriores. Para Libâneo (2005), essa concepção
equivocada pode ser vista em muitos trabalhos. Sobretudo, é preciso lembrar que é impossível
reproduzir de maneira absolutamente fiel uma forma de ensinar e que cada docente irá modificar os
exemplos de como ministrar uma aula de acordo com todo o seu repertório de exemplos, de

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deficiências, experiências pessoais e habilidades. Essa é uma provável explicação de por que os
docentes mais experientes que foram entrevistados apontaram com menor frequência o exemplo de
seus próprios docentes e com frequência ainda menor os modelos e concepções pedagógicas. Os
resultados obtidos mapearam a realidade particular dos departamentos de Matemática, Física e
Química do UFG/RC, mas é possível, e até mesmo provável, que resultados similares sejam obtidos em
outros departamentos das áreas de Ciências Exatas, visto a diversidade de origens acadêmicas dos
docentes do UFG/RC. Isso pode sugerir que os cursos de Bacharelado, Mestrado e Doutorado não
deveriam se preocupar em fornecer aos seus alunos uma preparação pedagógica formal, uma vez que
esta não será utilizada pelos egressos destes cursos. Mais ainda, as disciplinas ditas pedagógicas que
compõem o currículo dos cursos de Licenciatura nas áreas de Ciências Exatas não têm conseguido
influenciar os alunos a ponto de influir na importância que eles atribuem ao conhecimento passado
para eles nestas disciplinas. Concluímos que, na grande maioria dos casos, os docentes de Ciências
Exatas da UFG/RC não possuem treinamento formal nas teorias pedagógicas. Concluímos também
que, mesmo nos casos onde os docentes tiveram este treinamento, a influência destas teorias é muito
pequena. Os aspectos mais influentes na prática docentes foram o Conhecimento Técnico-Científico e
a experiência como docente; os aspectos mais influentes na preparação e execução das aulas foram a
experiência como docente, os alunos e a forma como os próprios docentes tiveram a disciplina
ministrada quando alunos. De maneira preliminar, isso sugere que docentes experientes e com um
alto nível de conhecimento técnico-científico irão produzir bons docentes. Esses resultados sugerem
também que os atuais docentes seriam beneficiados com novos programas de aperfeiçoamento à
docência que incidissem na troca de experiência entre os docentes e não em concepções pedagógicas.
Resumindo, perante a questão se seria pertinente discutir as práticas e as dificuldades da docência à
luz das teorias pedagógicas atuais, os resultados mostram evidências de que não, que está é uma
ferramenta pouco relevante para os docentes. Ainda mais, sugerem em que cursos de Física,
Matemática e Química com habilitação de Bacharelado, e em programas de pós-graduação
acadêmicos (como Mestrado e Doutorado) dessas áreas, não precisariam se preocupar em fornecer
aos seus alunos uma preparação pedagógica formal, uma vez que que esta não será utilizada pelos
egressos destes cursos; em alternativa, deveriam promover situações onde os alunos adquiram
experiência docente prática. Por fim, lembramos que este é um trabalho em aberto. É crucial que o
número de docentes entrevistados seja ampliado, de forma a que possamos confrontar docentes de
diferentes instituições de ensino e de diferentes regiões.

Referências
Biggs, J. (1999). Teaching for quality learning at university. Philadelphia: Open University Press.
Brasil. (2000). Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Médio/Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio.
Brasil. (2012). Ministério da Saúde, Conselho nacional de Saúde. Resolução nº 466 de 12 dezembro
de 2012. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
Ementa do curso de docência no Ensino Superior-Estágio Probatório. (2009) - Universidade Federal
de Goiás/Campus Catalão. Documento não publicado.
Libâneo, J. C. (2005). Pedagogia e Pedagogos, para quê?. São Paulo: Cortez, 200p. (8. ed.).
Snow, C. P. (1995). As Duas Culturas e uma segunda leitura: Uma Versão Ampliada das Duas Culturas
e a Revolução Científica, EDUSP.
Sokal, A. D., & Brickmont, J. (2006). Imposturas Intelectuais - O Abuso Da Ciência Pelos Filósofos Pós-
Modernos, Editora Record.

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El rol de la gestión de las comunicaciones para la acreditación de


instituciones universitarias: el caso de la Universidad Nacional de
San Martín, Perú, en el 20161

Fiorella Robles1, Lessly Fernandez2, Marta Tostes3


1
Facultad de Gestión y Alta Dirección, PUCP, Perú. a20126000@pucp.pe
1
Facultad de Gestión y Alta Dirección, PUCP, Perú. lessly.fernandez@pucp.pe
3
Departamento Académico de Ciencias de la Gestión PUCP, Perú. mtostes@pucp.edu.pe

Resumen. La presente investigación tiene por objetivo analizar el proceso de gestión de comunicaciones a
cargo de la oficina de imagen institucional de una universidad pública y su incidencia en el aseguramiento de
calidad educativa universitaria, tomando como referencia el rol de la Oficina de Imagen Institucional de la
Universidad Nacional de San Martín, Perú, en la mejora de la calidad educativa. La metodología aplicada en
la investigación recoge información de tipo cualitativa (entrevistas) y cuantitativa (encuestas) de acuerdo al
modelo de acreditación institucional universitaria vigente usado en el gobierno peruano. Este análisis
permitió identificar las dificultades para que la gestión de las comunicaciones en esta universidad pueda
cumplir un rol más activo, así como proponer una línea base para mejorar su desempeño en posteriores
iniciativas.
Palabras clave: Gestión de comunicaciones, calidad educativa, educación universitaria

The role of communications management for accreditation of university institutions: the case of the
Universidad Nacional de San Martín, Perú, in 2016
Abstract. This article titled, “The role of the communications management for the university institutions
accreditation: the case of the Universidad Nacional de San Martin, Peru, in 2016”, aims to analyze the process
of communications management by the office of institutional image of a public university and its incidence in
the assurance of university educational quality, taking as reference the role of the Office of Institutional Image
of the National University of San Martín, Peru, in improving the quality of education. The methodology applied
in the research includes information of qualitative type (interviews) and quantitative type (surveys) according
to the valid university institutional accreditation model used in the Peruvian government. This analysis made
it possible to identify the difficulties for the management of communications in this university to play a more
active role, as well as to propose a baseline to improve its performance in subsequent initiatives.
Key words: communications management, educational quality, university education

1 Introducción
Según datos del Banco Mundial, la educación universitaria juega un papel muy importante para la
creación de una base sólida de capital humano y un sistema eficaz de innovación, contribuyendo a que
los países logren economías competitivas a nivel mundial, mediante el desarrollo de mano de obra
calificada, productiva y flexible, así como la creación, aplicación y difusión de nuevas ideas y
tecnologías (Banco Mundial, 1999).
Sin embargo, desde la década de 1960 el Perú atravesó por un proceso de expansión de universidades
privadas, la cual se acentúo aún más en la década de 1990, aunque este proceso de expansión de

1
Esta investigación se basa en la Tesis de Licenciatura de título “Gestión de las comunicaciones para el
aseguramiento de la calidad educativa: el caso de la Oficina de Imagen Institucional de la Universidad Nacional
de San Martín en el 2016”. Se agradece los aportes del grupo de investigación sobre Innovación para el desarrollo
sostenible del Instituto de Ciencias de la Naturaleza, Territorio y Energías Renovables (INTE) de la Pontificia
Universidad Católica del Perú.

1815
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

oferta educativa no se vio acompañado de medidas que garanticen la calidad del servicio. Dado este
contexto, en las últimas décadas, el sistema de educación superior peruano ha experimentado una
rápida expansión, contando al 2015 con más de 140 universidades, más de 1000 institutos superiores
no universitarios y, adicionalmente, los perfiles académicos de las instituciones también se han
diversificado de manera extrema (MINEDU, 2015).
Esta situación ha generado un sistema universitario segmentado y estratificado, según la capacidad de
pago de las diferentes y heterogéneas demandas, donde “la movilidad, oportunidad de acceso, calidad
y equidad de la oferta educativa son limitadas para amplios sectores de la población, constituyéndose
así una situación de evidente ausencia de justicia e igualdad en la provisión del servicio educativo
universitario”. (MINEDU, 2015, pág. 8)
Frente a esta situación, el sistema de educación superior peruano atravesó por una serie de cambios.
En este contexto, la introducción del “Sistema Nacional de Evaluación, Acreditación y Certificación
Educativa” (SINEACE) en el año 2006, fue el primer paso para superar las debilidades presentadas por
el sistema de educación superior peruano. Para ello, se ha tenido en cuenta el avance del entorno
internacional en relación a los estándares de calidad académica, cada vez más importantes y mejora
continua (MINEDU, 2015). De este modo, SINEACE estuvo compuesta por tres unidades orgánicas,
aunque ahora estas están fusionadas nuevamente como una sola organización representada por
SINEACE.
Una de estas unidades fue la Comisión Nacional de Evaluación y Acreditación Universitaria (CONEAU),
la cual en el año 2010, desarrolló un modelo de evaluación de calidad institucional para universidades
tanto públicas como privadas. Este modelo cuenta con 03 dimensiones, 10 factores, 14 criterios y 80
indicadores, donde las dimensiones permiten diferenciar los niveles de actuación y facilitan su
aplicación sin restarle importancia a cada factor, que se evalúa a través de estándares establecidos a
partir de los indicadores del modelo. (CONEAU, 2010)
Uno de los ejes transversales identificados en el modelo es el de la Gestión de Comunicaciones, que es
importante para todo tipo de organizaciones, pues no solo trata de la difusión interna y externa de
información, sino que también busca que este intercambio de información sea eficaz y
multidireccional, asegurándose que la información se internalice y genere el involucramiento de los
distintos grupos de interés. Este proceso incide en la cultura organizacional y esta en la generación de
una identidad que, a través de su difusión, permita un posicionamiento objetivo, que refleje el
funcionamiento óptimo de la organización y más aún tratándose de una universidad.
El presente artículo busca entender el rol de la gestión de las comunicaciones en el marco del proceso
de aseguramiento de calidad educativa superior universitaria, para lo cual se tomó como caso de
estudio la labor realizada por la Oficina de Imagen Institucional (OII) de la Universidad Nacional de San
Martín (UNSM) en el departamento de San Martín, Perú, para estimar su contribución para alcanzar la
acreditación de calidad institucional.
En ese sentido, la metodología utilizada consistió en la creación de una rúbrica de evaluación en base
al modelo de acreditación desarrollado por la CONEAU, vigente durante el estudio. Para ello, el primer
paso fue estudiar el marco teórico y el estado del arte para establecer la hipótesis de investigación, la
cual afirma que la deficiente gestión de las comunicaciones por parte de la Oficina objeto de estudio,
no contribuye adecuadamente a la obtención de la acreditación institucional. Así, de los 80 estándares
contenidos en el modelo orginal, se seleccionaron los que se referían a la gestión de las
comunicaciones, lo cual dio como resultado 15 estándares vinculados a la temática que se ajustaron al
ámbito de esta oficina.

1816
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

A continuación, se realizó un proceso de concertación con especialistas e involucrados en el caso para


desarrollar una rúbrica de evaluación que asignarar puntajes al cumplimiento de cada estándar y, de
esta manera, obtener una medición objetiva de la influencia de la gestión de las comunicaciones en la
calidad educativa. Posteriormente, se procedió al levantamiento de información cualitativa y
cuantitativa en base a las fuentes de verificación sugeridas en el modelo. La investigación no solo
obtuvo datos concluyentes de la influencia de la gestión de las comunicaciones en la calidad educativa
ofrecida por toda la institución, sino que también permitió evaluar el avance obtenido hasta el
momento en miras de una posterior acreditación por parte de la UNSM.

2 Marco Teórico
La investigación se basa en la intersección de dos temáticas: gestión de las comunicaciones y calidad
educativa. Para el Project Management Institute (PMI), la gestión de comunicaciones “incluye los
procesos requeridos para asegurar que la planificación, recopilación, creación, distribución,
almacenamiento, recuperación, gestión, control, monitoreo y disposición final de la información del
proyecto sean oportunos y adecuados.” (PMI, 2013, pág. 286). De esta manera, la gestión de
comunicaciones se encarga que los objetivos de comunicación de una organización se cumplan a
cabalidad, garantizando una comunicación eficaz entre la alta dirección, los miembros del equipo y
otros interesados, tanto internos como externos. En eset contexto, son tres los procesos de gestión de
las comunicaciones: planificar la gestión de comunicaciones, gestionar las comunicaciones y controlar
las comunicaciones. La planificación es el primer paso y es una etapa fundamental, pues se
determinará las actividades a seguir para comunicarse adecuadamente, y más importante aún, se
definirá la asignación de recursos necesarios para realizar dichas actividades. La segunda etapa,
gestionar las comunicaciones, trata de asegurar que la información comunicada a los interesados haya
sido generada de una manera adecuada, así como recibida y comprendida de la misma manera. Por
último, el proceso de control incluye el monitoreo de las comunicaciones a lo largo de todo el ciclo de
vida del proyecto para monitorear que se satisfaga las necesidades de información de los interesados.
En ese sentido, para Rivera (2005), las instituciones de educación superior deben controlar y dirigir las
comunicaciones emitidas, en la medida que se constituye como un factor de vital importancia para el
cumplimiento de las metas trazadas. Así, el departamento de comunicaciones será el ente encargado
de asegurar que la comunicación interna y externa de la universidad se realice de una manera
adecuada, usando las herramientas más acordes al público al que se dirige, garantizando que las
comunicaciones se gestionen de una manera óptima y eficaz de acuerdo a los objetivos de la
organización.
El segundo tema consiste en la calidad educativa. En el Perú, “la definición adoptada en la política de
aseguramiento de la calidad de la educación superior universitaria es la referida a calidad como
adecuación a propósitos” (SUNEDU, 2015, pág. 15). En este marco, se señala que la calidad en la
educación superior puede ser definida como el “grado de ajuste entre las acciones que una institución,
programa académico o carrera pone en marcha para dar cumplimiento a las orientaciones emanadas
desde su misión y propósitos institucionales y los resultados que de estas acciones obtiene» (Marco
de referencia para el proyecto ALFA, 2009 citado en Lemaitre & Zenteno, 2012, p. 97). Al hablar de
aseguramiento de calidad, se usa este término como una denominación común para una diversidad
de mecanismos tendientes a controlar, garantizar y promover la calidad de las instituciones de
educación superior. Los procesos de aseguramiento de calidad de la educación superior pueden
concentrarse en mecanismos que verifiquen el cumplimiento de estándares mínimos de calidad,

1817
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

previamente validados, o en comprender procesos internos de mejoramiento continuo dentro de este


tipo de organizaciones. Así, la búsqueda y aseguramiento de la calidad se puede asociar a conseguir
un mínimo de calidad en un momento del tiempo y también a alcanzar un mejoramiento continuo y
permanente de calidad (UC, 2011). Este caso se refiere a la calidad en la educación superior
universitaria nacional, cuyos modelos que sirven como referentes fundamentales son: el modelo de
calidad para la Acreditación Institucional Universitaria (AIU) y el modelo de licenciamiento que busca
asegurar las Condiciones Básicas de Calidad (CBC). Es importante mencionar a modo de preámbulo
que en el marco del sistema de aseguramiento de calidad peruano, la acreditación y el licenciamiento
se definen como procesos distintos, pero complementarios, de evaluación de la calidad. “Así, mientras
que la acreditación es voluntaria, el licenciamiento es un requisito obligatorio para el funcionamiento
de universidades. Además, las CBC del licenciamiento constituyen un primer nivel para ofrecer un
servicio de calidad, mientras que la acreditación se encuentra en un nivel superior, puesto que supera
las condiciones mínimas de calidad y posee una dinámica orientada hacia la excelencia académica”
(SUNEDU, 2015, pág. 5).
3 Caso de estudio
El caso sobre el que se aplica la metodología es la Oficina de Imagen Institucional de la UNSM. La UNSM
de Tarapoto, Perú, fue creada por D.L. Nº 22803 el 18 de diciembre de 1979 en la ciudad de Tarapoto,
como consecuencia de los esfuerzos de la región San Martín por obtener una institución educativa con
nivel universitario. De este modo, el 18 de diciembre de 1980, se inicia las actividades oficiales de la
Comisión de Gobierno de la UNSM, ya nombrada para ese entonces, con sede provisional en Lima. De
acuerdo al Plan Estratégico institucional (PEI) 2014-2021, la visión de la universidad al 2021 es la de ser
“ una universidad líder en la Amazonía peruana, con calidad educativa al servicio de la sociedad”.
Además, esta es encaminada por su misión universitaria, la de ser “una universidad dedicada de formar
profesionales competitivos basados en la investigación científica, tecnológica y humanística, en
proceso de acreditación, comprometida con el desarrollo sostenible y ambiental” (UNSM, Plan
Estratégico Institucional, 2014, pág. 10).
Por su parte, la Oficina de Imagen Institucional (OII) es un órgano de apoyo cuya finalidad es la de
fomentar, coordinar y mantener las actividades de difusión interna y externa de la universidad, así
como de proyectar la imagen institucional ante la comunidad local, regional, nacional e internacional
(UNSM, MOF de la Oficina de Imagen Institucional, 2013). Las funciones que desarrolla la OII se basan
en procesos continuos de difusión y emisión de mensajes informativos, proyectando la imagen
institucional para toda la comunidad universitaria, local, regional, nacional e internacional. Con la
revisión del papel de una oficina de comunicaciones e imagen institucional, seguido del marco de
acreditación institucional y finalmente, el rol que la OII cumple dentro de la UNSM, se concluye que
esta oficina, aunque en su nomenclatura solo hace referencia a “imagen institucional”, se encarga de
labores que van más allá de la difusión y proyección de la imagen institucional, al abarcar
responsabilidades correspondientes a una oficina de comunicaciones propiamente dicha. Se observa
que la OII tiene a su cargo la generación e implementación efectiva de un sistema de información y
comunicaciones, lo cual se le asigna desde el Plan Estratégico Institucional. Asimismo, es la responsable
de lograr un posicionamiento y relacionamiento eficaz de la entidad y que la representa frente a todos
los actores involucrados en todos los niveles (local, regional, nacional e internacional). De esta forma,
la OII juega un rol importante en el proceso de acreditación institucional, pues está a cargo de todo un
sistema de comunicación, que facilita la relación con los involucrados, por lo cual es evaluado por los
criterios establecidos en el modelo de acreditación.

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4 Metodología aplicada
Para realizar la investigación se utilizó la metodología de estudio de caso, dado que esta se puede
definir como “un método de aprendizaje acerca de una situación compleja; se basa en el
entendimiento comprehensivo de dicha situación, el cual se obtiene a través de la descripción y análisis
de la situación que son tomados como un conjunto y dentro de su contexto” (Morra, 2001, pág. 2). En
base a lo anteriormente señalado, esta investigación pretende analizar la incidencia de la gestión de
comunicaciones de la OII de la UNSM en la acreditación de calidad educativa institucional de dicha
entidad. Para esto ha sido necesario conocer el estado del arte para centrar la investigación en el caso
específico de la OII dentro el contexto en el que se desenvuelve, analizando las particularidades
específicas de dicha oficina y su funcionamiento.
De este modo, la presente investigación tendrá principalmente un enfoque cualitativo pues en su
mayoría las variables son evaluadas mediante este tipo de herramientas, como entrevistas a
profundidad, revisión documentaria propia de la UNSM y OII; además de encuestas, las cuales, si bien
es cierto, se procesaron de forma cuantitativa, contenian preguntas abiertas, las que permitieron
también un analisis cualitativo. Cabe resaltar que para lograr hacer esta evaluación se utilizó un modelo
de evaluación basada en la creación de una rúbrica concertada por los actores involucrados y por
consulta a especialistas en la materia. La rúbrica se constituye como una herramienta de evaluación
que provee una descripción detallada de los niveles aceptables o no aceptables de desempeño para
cada área a evaluar.
Inicialmente, se realizó dos entrevistas a profundidad al personal de la OII, una al Jefe de la OII y otra
a la Jefa de Protocolo, quienes estan más involucrados en las actividades diarias; con el propósito de
obtener un breve diagnóstico inicial acerca del desempeño de la oficina y de sus posibles falencias, así
como de determinar cuales serían las posibles fuentes de verificación más adecuadas para cada
estandar; así mismo, estas entrevistas permitieron luego, definir mejor las preguntas contenidas en las
encuestas aplicadas a los estudiantes y docentes, incluyendo personal administrativo2.
Así mismo, se tomó referencias de fuentes primarias en base a las entrevistas realizadas con los
especialistas del área de la Dirección de Evaluación y Acreditación de Educación Superior Universitaria
del SINEACE; y el coordinador del componente 1, Desarrollo de capacidades del sistema de
aseguramiento de la calidad, en el Proyecto Mejoramiento de la Calidad de la Educación Superior,
PROCALIDAD.
En este punto es importante mencionar que la elección del modelo de acreditación vigente se ha
basado, principalmente a que este obedece a una certificación de calidad no obligatoria para las
instituciones de educación superior universitaria, contándose con estándares superiores a los del
modelo de licenciamiento, los cuales son los mínimos establecidos para el funcionamiento de una
entidad. De esta manera, al evaluar en base al modelo de acreditación, se asegura que la entidad
cumpla no solo con estos criterios míninos de calidad, sino que se garantice un servicio de calidad a
los usuarios. En ese sentido, en un primer momento se revisó cada uno de los 80 estándares del modelo
acreditación, independientemente de la dimensión, factor y criterio en el que se priorizó aquellos que
se vincularan directa o indirectamente con gestión de las comunicaciones. Es así como se seleccionó a
15 estándares que cumplían con esta condición, distribuidos de la siguiente manera: 11 estándares
correspondientes a la dimensión de gestión institucional, 2 al proceso de desarrollo institucional, y 2 a

2
Las entrevistas se realizaron los días 21 y 22 de junio de 2016 en el local de la UNSM, en la ciudad de
Tarapoto, y se usó guías de entrevistas para organizar la información de manera adecuada.

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servicios de apoyo al proceso de desarrollo institucional. Una vez seleccionados estos 15 estándares,
estos se ajustaron de manera que se adapten para evaluar el funcionamiento de una oficina,
específicamente de la Oficina de Imagen Institucional de la UNSM, dado que el modelo está diseñado
para toda una institución. Para este ajuste se contó, una vez más, con el juicio del experto de
PROCALIDAD.
Posteriormente, se procedió a la preparación del trabajo de campo para realizar el levantamiento de
información complementaria. Con respecto a las fuentes secundarias, la investigación se basó en los
documentos de gestión de la UNSM (PEI y POI) y de la oficina en sí (Plan Operativo Anual -POA,
Reglamento de Organización y funciones-ROF, Manual de Organización y Funciones-MOF, e informes
de consultorías).
En cuanto a las encuestas para la alta dirección y docentes, se aplicó un total de 45 encuestas en todas
las sedes, 36 a la Alta dirección y 9 a docentes. En lo que respecta a la alta dirección, se contempló
encuestar a decanos, directores de escuelas y de oficinas, presidentes de las Comisiones
Organizadoras, vicerrectores y coordinadores. Para ello, se formuló un cuestionario, conteniendo
preguntas tanto abiertas como cerradas, con el objetivo de evaluar la comunicación entre la
universidad y estos actores de acuerdo a los criterios del modelo y con miras a elaborar una serie de
recomendaciones en base a la comparación entre la situción actual y las expectativas de estos,
información recogida a traves de la encuesta. Para el caso de la encuesta aplicada a la OII, esta se aplicó
a todo el personal (4 personas), con la finalidad de profundizar aún más en el diagnóstico inicial dado
por las entrevistas y de evaluar los criterios presentados en el modelo empleado para esta
investigación.
Finalmente, para la encuesta aplicada a los estudiantes de la UNSM, se seleccionó una muestra
representativa de la población estudiantil, para lo cual utilizó un muestreo probabilístico aleatorio. En
este caso, se ha considerado un universo de 5417 alumnos matriculados en el semestre 2016 – 1, según
datos de la última encuesta universitaria, proporcionado por la rectoría de la universidad3. Es
importante resaltar las dificultades en términos de acceso hacia la sede de la UNSM ubicada en la
ciudad de Tocache, aunque ello no comprometió la fiabilidad de los resultados finales del estudio, pues
también se entrevistó sus autoridades y algunos docentes que estaban en Tarapoto. Por otra parte, las
preguntas de la encuesta se referían a la gestión de la comunicación en el marco de la política de
aseguramiento de calidad educativa superior y los estándares del modelo empleado en esta
investigación. En ese sentido estas se formularon con una estructura tanto cerrada como abierta,
buscando no solo obtener la percepción de estos sino también las razones de esta y sus expectativas4.
5. Resultados
En base a lo anteriormente mencionado, en la tabla 1 se presenta los medios de verificación utilizados
para la evaluación de cada uno de los estándares seleccionados; así como los niveles de cumplimiento
de cada estándar en base a la evaluación individual de cada uno de estos, tomando como referencia la
rúbrica realizada.

3
El valor del nivel de confianza considerado fue 95% con un margen de error de 7%, con lo cual se obtuvo una
muestra de 334 encuestas.
4
Cabe resaltar el tratamiento ético de la investigación, pues tanto las encuestas como las entrevistas
estuvieron aprobadas mediante la firma de consentimientos informados. La aplicación de la encuesta se realizó
al interior de los locales de la UNSM en las ciudades de Tarapoto, Lamas, Moyobamba y Rioja; los días 22 y 23
de junio de 2016.

1820
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Tabla 1. UNSM: Estándares de evaluación del rol de la gestión de la comunicación en la calidad educativa según los medios
de verificación y resultados por estándar, 2016

Medios de Nivel de
Estándar
verificación cumplimiento
E1. Más del 75% de los estudiantes conoce la información
contenida en el PEI (relacionada a cultura: visión, misión y EE Cumple = 1
valores)
E2. Más del 75% del personal de la OII conoce información
EOII Cumple = 1
contenida en el PEI.
E3. PEI contiene políticas orientadas al AC con respecto a la En desarrollo =
Revisión de PEI
labor de la OII. ¼
E4. Más del 75% del personal de la OII conoce su POA. EOII Cumple = 1
Revisión POI, POA,
E5. Las actividades de la OII están coordinadas para
MOF, ROF; EE, ED, No cumple = 0
asegurar el desarrollo del POI.
EA, EOII
E6. La Universidad tiene un sistema de gestión de la calidad EOII, Documentos de
No cumple = 0
implementado a nivel de la OII. sustento
E7. La OII evalúa sus actividades y realiza actividades de En desarrollo =
POA OII
mejora. ½
E8. La Universidad tiene políticas, normas y procedimientos
promovidas por la OII que contribuyen a internalizar la En desarrollo =
EE, ED, EA, EOII
cultura organizacional entre los integrantes de sus 1/3
unidades académicas y administrativas.
EE, EA, ED,
E9. La Universidad tiene un sistema de información y En desarrollo =
Documentos de
comunicación implementado por la OII. ½
sustento
E10. La Universidad tiene un posicionamiento eficaz a nivel
EOII, Documentos de
nacional e internacional, articulado al sistema de No cumple = 0
sustento, Rankings
información y comunicación promovido por la OII.
E11. La Universidad, a través de la OII, cuenta con políticas, Revisión POA,
normas y procedimientos para su vinculación eficaz con el Estatuto UNSM, Si cumple = 1
medio nacional e internacional. MOF, ROF; EOII
E12. A través de la OII se facilita la difusión de la mayoría
EE, EOII No cumple = 0
de los resultados de las investigaciones que se realizan.
E13. A través de la OII se facilita la difusión de los
resultados de la labor de extensión universitaria y EOII No cumple = 0
proyección social.
E14. La mayoría de los estudiantes, docentes y
EOII No cumple = 0
administrativos conocen los programas de bienestar.
E15. A través de la OII se asegura la vinculación entre los En desarrollo =
EE, ED, EA, EOII
grupos de interés y sus procesos. 1/4
Donde:
EE: Encuesta a los estudiantes
EOII: Encuesta a los miembros de la OII
ED: Encuesta a Docentes
EA: Encuesta a los miembros de la Alta Dirección
De esta manera, se obtiene que, de los 15 estándares presentados, la OII cumple a cabalidad con 4,
tiene 5 en desarrollo en diferentes niveles, y no cumple con 6. De acuerdo a la rúbrica validada, se

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podría evaluar a la OII con un puntaje de 5.84, el cual tiene una ponderación de 6.7%, por lo que se
podría decir que la OII tiene establecida una gestión de comunicaciones adecuada al 38,8% para lograr
alcanzar los estándares de calidad educativa establecidos en esta área. Esto no quiere decir que su
gestión en sí sea ineficiente, sino que las acciones de la gestión de comunicaciones de la OII no están
contribuyendo de una manera adecuada a cumplir con los estándares de calidad educativa de la UNSM,
lo que comprueba la hipótesis inicialmente planteada para la investigación.
Los motivos de esta baja evaluación pueden ser diversos, y muchos de ellos se fueron explicando en el
análisis de cada estándar, como la inadecuada selección de herramientas, medios o forma de
comunicación. Asimismo, se ha señalado una incongruencia entre los planes de la universidad y los
planes de la oficina en sí, existiendo una deficiencia desde la planificación de la universidad. Sin
embargo, también se puede deber a una falta de apoyo de parte de la alta dirección de la universidad
a la oficina, pues como se determinó en las entrevistas, al momento la OII está funcionando con un
déficit de personal. Independientemente de los motivos, el fin de la presente investigación era
determinar el nivel de la OII en su gestión de comunicaciones e identificar aspectos de mejora. Estos
aspectos solo podrán subsanarse con un trabajo conjunto entre todos los actores involucrados:
alumnos, alta dirección y docentes, en conjunto con los miembros de la OII, serán los responsables de
generar el cambio adecuado para lograr la calidad educativa en su casa de estudios.
5 Conclusiones
Al realizar la presente investigación se llegó a una serie de conclusiones, tanto teóricas como aplicadas
al caso en sí, las cuales se detallan a continuación.
En cuanto a la metodología empleada, la aplicaciión del enfoque cualitativo fue crucial para el
desarrollo de esta investigación, pues sin este no se habría obtenido un diagnóstico inicial tan
aproximado a la realidad, que fue siendo validado con diversas herramientas de análisis. Así mismo,
este enfoque permitió construir un modelo válido a través de la interacción directa con personas
directamente involucradas en el caso de estudio y temática. Finalmente, al ser una herramienta de
involucración directa, permitió profundizar más en la percepción y expectativas de los diferentes
actores involucrados en el estudio, lo cual facilitó el establecimiento de retroalimentaciones sobre los
resultados obtenidos.
Es importante destacar, en base a la revisión bibliográfica realizada, que la gestión de comunicaciones
es un proceso transversal importante para todo tipo de organizaciones y más aún para una
organización social, pues impacta directamente en el bienestar de sus usuarios, como es el caso de
una universidad pública.
Por otro lado, no existe una única definición para calidad en educación y, por ende, tampoco para
calidad en la educación superior universitaria, pues esta depende de una serie de dimensiones a partir
de las cuales se da forma al concepto, que puede tener diferentes interpretaciones dependiendo de
las características del contexto en el que se aplique. Ello es positivo, pues no todos los sistemas
educativos están rodeados de un mismo entorno ni tienen las mismas capacidades y características.
Ahora bien, la gestión de calidad involucra tres procesos: planificación, aseguramiento y control; sin
embargo, para el caso de calidad en educación se da énfasis principalmente del proceso de
aseguramiento de calidad. Esto es válido pues se refiere a un conjunto de mecanismos a través de los
cuales se puede generar un mejoramiento continuo. Por su parte el control busca garantizar la calidad
en la educación superior a través de la verificación del cumplimiento de ciertos estándares de calidad,
los cuales serán determinados en función al propósito y capacidades de la institución de educación
superior.

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Por lo tanto, se encontró en la revisión de la literatura que existe una relación entre la gestión de
comunicaciones y el aseguramiento de la calidad educativa superior universitaria, la cual también se
evidenció en en el caso analizado, en la medida que se incluye la gestión de comunicaciones de manera
transversal y también específica dentro de los estándares de calidad en los diferentes modelos de
evaluación de calidad educativa en nuestro país, sea el modelo de licenciamiento o como el de
acreditación universitaria.
Todo lo anterior se evidencia en el caso de la Oficina de Imagen Institucional de la UNSM. De acuerdo
a la evaluación realizada de dicha oficina en los estándares de calidad educativa referentes a gestión
de comunicaciones, basada en el modelo de acreditación ajustado para el caso de estudio, se obtiene
que la universidad requiere trabajar en ciertas áreas para lograr ofrecer un servicio de calidad superior
a sus interesados. Se requiere resaltar que al realizar el estudio, se encontró que varios aspectos a
evaluarse ya se encontraban controlados, y que algunos otros estaban trabajándose de una manera
adecuada. Sin embargo, existen otros aspectos que se encuentran deficientes, y esto no solo es
responsabilidad de la OII, sino también de la UNSM como institución, pues se requiere fortalecer esta
oficina, dotándola de los recursos y capacidades necesarias para su buen desempeño, de tal forma que
pueda contribuir de manera más decisiva a la mejoría de la imagen institucional y para el cumplimiento
de los criterios de calidad.
Como conclusión, se validó de manera conjunta con los interesados los aspectos en los que se requiere
mejorar:

• No existe dotación suficiente de capacidades y recursos desde la Institución para el buen


desempeño de la OII.
• No existe una articulación adecuada de la OII con el plan operativo de la UNSM, lo cual es
importante para que la OII alinee sus acciones con los objetivos de la universidad.
• No existe un sistema de gestión de calidad implementado a nivel de la OII, el cual es necesario para
trabajar con procesos adecuados, que debe revisarse periódicamente en vista de una mejora
continua.
• La OII no presenta iniciativas adecuadas para internalizar la cultura organizacional dentro de la
UNSM y esto da como resultado que no exista uniformidad en la forma de transmitir (y recibir) los
mensajes.
• Existen algunos temas que no son adecuadamente difundidos por la OII, especialmente en lo que
se refiere a investigaciones académicas, actividades de proyección social y programas de bienestar
del alumno. De esta manera, existe una falla en la vinculación entre la universidad y sus diversos
grupos de interés.
• Todo lo anterior contribuye a que la universidad no se encuentre posicionada eficazmente, tanto
nacional como internacionalmente, y esto se evidencia dado que no aparece en los rankings más
importantes del medio.

De esta manera, existen áreas de mejora para la OII sobre las que pueden trabajar para alcanzar los
estándares de calidad que las instituciones de educación superior deben cumplir. Finalmente, se debe
resaltar que existe un interés de parte de la OII y de las autoridades de la UNSM para mejorar en este
sentido. En este sentido, se entendió este estudio como una auto evaluación para lograr establecer las
prioridades para generar un plan de mejora continua. Con ello, se busca mejorar los aspectos
deficientes para ofrecer un servicio de calidad a sus alumnos y ampliar su contribución efectiva al
desarrollo sostenible de este entorno territorial.

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Representações De Programas De Tutoria A Partir Da Metodologia


Do Dsc- Discurso Do Sujeito Coletivo
Francione Charapa Alves1, Meirecele Calíope Leitinho2, Isabel Magda Said Pierre Carneiro3
1
Programa de pós-Graduação em Educação Universidade Estadual do Ceará-UECE, Fortaleza,Ceará,
Brasil. Fortaleza, Brasil. francionecharapa@gmail.com.
2
Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira. Universidade Federal do Ceará-UFC, Fortaleza,
Ceará, Brasil. meirecelecaliope@terra.com.
3
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará- IFCE; Programa de Pós-Graduação em
Educação Universidade Estadual do Ceará-UECE, Fortaleza,Ceará, Brasil. isabelmsaidyahoo.com.br.

Resumo.O objetivo deste artigo é explanar a metodologia do Discurso do Sujeito Coletivo-DSC, utilizada em
uma investigação de doutorado que teve como objeto de estudo a ação tutorial na Educação
Superior,intitulada Ação tutorial na educação superior em dois programas: PET/Brasil e PTM23/Portugal, na
qual fizemos uma análise de dois Programas de tutoria. O DSC se fundamenta na Teoria das Representações
Sociais para tratamento dos dados do tipo depoimentos coletados em discursos verbais ou escritos. O resgate
dos discursos ocorreu em dois momentos: no Brasil, em que realizamos entrevistas semiestruturadas com
tutores e entrevistas grupais com tutorandos do PET. E em Portugal, fizemos entrevistas semiestruturadas
com os atores sociais do PTM23. A análise foi realizada partir da criação de eixos discursivos organizados por
grupos de atores sociais com base nas ancoragens para a criação dos DSCs. Esta metodologia nos permitiu
aprofundar os conhecimentos sobre as tutorias investigadas.
Palavras-chave: Discurso do Sujeito Coletivo (DSC); Tutoria; Programa de Educação Tutorial (PET); Educação
Superior; Programa de Tutoria Maiores de 23 (PTM23).
Representations Of Tutoring Programs From The Methodology Of Dsc- Speech Of The Collective Subject
Abstract: The objective of this article is to explain the methodology of the Discourse of the Collective Subject-
DSC, used in an investigation of doctorate that had as object of study the tutorial action in Higher Education,
titled Action tutorial in higher education in two programs: PET / Brazil and PTM23 / Portugal, in which we did
an analysis of two tutoring programs. The DSC is based on the Theory of Social Representations for the
treatment of data of the type testimonials collected in verbal or written speeches. The rescue of the speeches
occurred in two moments: in Brazil, where we conducted semi-structured interviews with tutors and group
interviews with student-tutors of the PET. And in Portugal, we did semi-structured interviews with the social
actors of the PTM23. The analysis was made from the creation of discursive axes organized by groups of social
actors based on the anchorages for the creation of the DSCs. This methodology allowed us to probe the
knowledge about the tutorials investigated.
Keywords: Collective Subject Discourse (DSC); Tutoring; Tutorial Education Program (PET); Higher Education;
Tutoring Program Major of 23 (PTM23).

1 Introdução
Este artigo tem como objetivo explanar a dinâmica da metodologia utilizada na investigação de
doutorado, realizada em 2016 no Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira da Unviersidade
Federal do Ceará- UFC, intitulada Ação tutorial na educação superior em dois programas: PET/Brasil e
PTM23/Portugal que teve como objetivo compreender como se constitui a ação tutorial exercida no
Programa de Educação Tutorial (PET) da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e o Programa de
Tutoria Maiores de 23 (PTM23) da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa (FP/UL) em seus
aspectos teórico-práticos e político-pedagógicos. Para atender a este objetivo utilizamos a
metodologia do DSC que foi criado pelos pesquisadores Fernando Lefevre e Ana Maria Cavalcanti
Lefevre e vem sendo desenvolvido na Universidade de São Paulo desde o ano de 1990 para pesquisas
de opinião, de representação social ou mais genericamente de atribuição social de sentido que tenham
como base depoimentos ou outros suportes de material verbal como matérias de revistas, jornais,
artigos.

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2 Fundamentação teórico-metodológica do Discurso do Sujeito Coletivo-DSC: Teoria das


Representações Sociais e Teoria da Reprodução Social
De acordo com Lefevre e Lefevre (2005a; 2005b; 2010), o DSC se fundamenta em duas abordagens
teóricas: a Teoria das Representações Sociais, de Serge Moscovici (1978) e a Teoria da Reprodução
Social, de forma bem mais específica nos conceitos de esquemas sociocognitivos e habitus, formulado
essencialmente por Pierre Bourdieu (1988). O conceito de representações sociais foi inicialmente
trabalhado por Émile Durkheim na sua obra As regras do método sociológico (1895), sendo
denominado de “representações coletivas”, que “constituíam uma classe muito genérica de
fenômenos psíquicos e sociais” (Moscovici, 1978, p. 42). Durkheim “quis assim designar a
especificidade do pensamento social em relação ao pensamento individual” (Moscovici, 1978, p.25).
Porém, em 1978, Serge Moscovici trabalha esse conceito sob outra perspectiva em sua obra A
representação social da Psicanálise (1978). Moscovici (1978) defende que a representação social deve
ser encarada “tanto na medida em que ela possui uma contextura psicológica autônoma como na
medida em que é própria de nossa sociedade e de nossa cultura” (Moscovici, 1978, p. 45). Assim, a
representação social possui duas dimensões, sujeito e sociedade, e situa-se “na encruzilhada de uma
série de conceitos sociológicos e de uma série de conceitos psicológicos” (Moscovici, 1978, p. 41),
tornando-se um conceito difícil de apreender. Representação Social se refere a um fenômeno
produzido e partilhado coletivamente e que contribui para a construção social da realidade,
orientando comportamentos e comunicações e permitindo interpretar os acontecimentos do
cotidiano (Crusoé, 2004). Assim, fica claro que as representações não são criadas por um indivíduo de
forma isolada, elas são objeto de um permanente trabalho social, no e através do discurso, de tal modo
que cada novo fenômeno pode ser sempre reincorporado dentro de modelos explicativos e
justificativos que são familiares e, consequentemente, aceitáveis (Moscovici, 2004, p.216).Ainda
buscando definir as representações sociais, Moscovici (1978) declara que: elas “circulam, se
entrecruzam e se cristalizam continuamente, através duma palavra, dum gesto, ou duma reunião em
nosso mundo cotidiano. Elas impregnam a maioria de nossas relações estabelecidas, os objetos que
nós produzimos ou consumimos e as comunicações que estabelecemos” (p. 41). As representações
podem ser vistas, portanto, como um importante recurso de análise de aspectos sociais, uma vez que
nos ajudam a compreender como o indivíduo se constitui a partir de suas relações. Desta forma, a
Teoria das Representações Sociais recupera o sujeito que, através de sua ação e relação com o mundo,
constrói o mundo e a si próprio e ainda, nessa relação, constrói saberes sociais. Sobre isso, Lefevre e
Lefevre (2010) afirmam que, de modo geral, as representações sociais de um determinado grupo
sociocultural ou são semelhantes ou apresentam algo em comum, o que o faz ser diferente de outro
grupo. Assim, o DSC encontra o seu suporte em uma visão socioantropológica da realidade social e no
pensamento dos sujeitos de determinada formação sociocultural representada pela concepção e ação
dos sujeitos, formação essa concebida como “um sistema de troca (diálogo, conflito, conciliação,
confronto etc) de ideias, e para que elas possam ser trocadas precisam ter algo em comum” (Lefevre
& Lefevre, 2010, p. 30). Lefevre e Lefevre (2005b) justificam a adoção da visão socioantropológica para
compreender opensamento de uma coletividade afirmando sobre um dado tema, afirmando que ele
pode ser visto como “um conjunto de discursos, ou formações discursivas, ou representações sociais
existentes na sociedade e na cultura sobre esse tema, do qual, segundo a ciência social, os sujeitos
lançam mão para se comunicar interagir, pensar, Bourdieu fala a respeito dos habitus como esquemas
sociocognitivos (Lefevre & Lefevre, 2005b, p. 16). Os sistemas simbólicos, e dentro deles as
representações sociais, portanto, não se dão no vazio, eles sofrem uma grande influência do contexto
sócio-histórico em que determinados grupos estão inseridos. Assim sendo, “os indivíduos não pensam
ou tem ideias, opiniões sobre qualquer coisa, mas sempre sobre temas social ou coletivamente
compartilhados” (Lefevre & Lefevre, 2010, p. 22). Por outro lado, os sujeitos também influenciam as
relações sociais, culturais, políticas, deste mesmo contexto em que vivem e, consequentemente, as

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representações são influenciadas pelos atributos ou lugares de onde falam. Essa discussão da relação
entre pessoa e sociedade encontra seu fundamento na Teoria da Reprodução Social de Bourdieu e de
Passeron, cuja categoria base é o habitus, conceito que já fora utilizado por muitos teóricos antes de
Bourdieu. Entretanto, construir a noção de habitusque para ele significava compreendê-la como um:
Sistema de esquemas adquiridos que funciona no nível prático como categorias de percepção e
apreciação, ou como princípios de classificação e simultaneamente como princípios organizadores da
ação, significava construir o agente social na sua verdade de operador prático de construção de objetos
(Bourdieu, 1988, p. 26).
Nesse sentido, o individual, o pessoal e o subjetivo são ao mesmo tempo sociais e coletivamente
orquestrados. O habitus é, então, uma subjetividade socializada (Bourdieu, 1992). Bourdieu afirma que
o cientista social “pode descobrir a necessidade, a coação das condições e dos condicionamentos
sociais, até no íntimo do sujeito” (Bourdieu, 1988, p. 27). Através da forma do que ele denomina de
habitus.Compreendemos que cada grupo social mediante e em função das condições objetivas que
caracterizam sua posição na estrutura social constitui um sistema específico de disposições e de
predisposições para a ação, gerando assim o habitus incorporado pelos indivíduos (Nogueira &
Nogueira, 2004). É importante ressaltar que os indivíduos podem agir de duas formas: em
conformidade com o habitus de um determinado grupo ou classe social, seja de forma voluntária, ou
podem ser coagidos por algum tipo de violência simbólica. À luz dessas teorias, que nos trazem os
conceitos de Representações Sociais e de habitus é que fomos buscar a compreensão do Discurso do
Sujeito Coletivo (DSC) presente nos discursos dos sujeitos envolvidos nos programas de tutoria
investigados, pois eles apreendem essa realidade com mais propriedade por estarem mergulhados
nesse contexto.
3 Método Discurso do Sujeito Coletivo (DSC): princípios básicos e conceitos fundamentais
No que concerne ao método, a nossa opção foi pela metodologia do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC),
que pode ser definida como um conjunto de procedimentos destinados a conformar, descritivamente,
os discursos de uma dada coletividade como produto quantiqualitativo, mas que também pode ser
utilizada em pesquisas puramente qualitativas, o qual propõe uma análise que contemple uma
explicação sociológica, antropológica, ética, política e pedagógica do fenômeno investigado,
entendendo o depoimento discursivo como: “manifestação linguística de um posicionamento diante
do tema, composto por uma ideia central e seus respectivos conteúdos de argumentos” (Lefevre &
Lefevre, 2005 a, p. 13). O DSC permite a construção de um pensamento coletivo, expressado e relatado
individualmente, e constituído como forma de representação social de um sujeito coletivo. Por isso, o
DSC pode ser visto como um “eu ampliado”, ou seja, como uma tentativa de reconstruir um sujeito
coletivo que, como (primeira) pessoa coletiva, esteja veiculando uma representação ou um discurso
como conteúdo ampliado. Apresenta-se, no entanto, como um discurso individual composto na
primeira pessoa do singular (Lefevre & Lefevre, 2005 a). O “eu ampliado” do DSC,
relacionado a uma determinada opinião, que pertence a um universo de opiniões possíveis da
comunidade estudada, num determinado tempo histórico é compreendido, assim, por agregar em um
discurso uno os vários depoimentos com sentido semelhante em um discurso. Dessa maneira,
possibilita que boa parte do conteúdo seja uma opinião compartilhada socialmente pelos sujeitos que
participaram da pesquisa. O DSC permite, por meio de uma pesquisa social e empírica, resgatar o
pensamento de uma coletividade sobre determinado tema, que no caso, subsidia a organização de um
painel de depoimentos discursivos (p. 58).
Para elaborar os DSC os autores criaram as seguintes figuras metodológicas:
Tabela 1. Figuras metodológicas do DSC
FIGURA
DEFINIÇÃO SIGLA METODOLÓGICA

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As expressões-chave são pedaços, trechos ou transcrições literais do discurso, que


devem ser sublinhadas, pelo pesquisador, e que revelam a essência do
depoimento, do conteúdo discursivo dos segmentos em que se divide o ECH Expressões-chave
depoimento (que em geral, correspondem às questões da pesquisa). As
expressões-chave são uma prova discursivo-empírica da verdade das ideias
centrais e das ancoragens e vice-versa.
A ideia central é um nome ou expressão linguística que revela e descreve, da
maneira mais sintética, precisa e fidedigna possível, o sentido de cada um dos
discursos analisados e de cada conjunto homogêneo de ECH, que vai dar IC Ideias Centrais
nascimento, posteriormente, ao DSC. Ela não é uma interpretação, mas uma
descrição do sentido de um depoimento ou de um conjunto de depoimentos.
Algumas ECH remetem não a uma IC correspondente, mas a uma figura
metodológica que sob a inspiração da teoria da representação social, denomina-
se ancoragem, que é a manifestação linguística explícita de uma dada teoria, ou AC Ancoragem
ideologia, ou crença que o autor do discurso professa e que, na qualidade de
afirmação genérica, está sendo usada pelo enunciador para “enquadrar” uma
situação específica.
É um discurso-síntese redigido na primeira pessoa do singular e composto pelas DSC Discurso do
ECH que têm a mesma IC ou AC. Sujeito Coletivo
Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras.
3.1 Metodologia: resgate dos discursos dos atores sociais
O Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) é uma metodologia quantiquali de coleta e de análise de dados
centrada no discurso dos sujeitos. Para a análise há o programa Qualiquantisoft que pode ser utilizado
como instrumento facilitador da organização do material a ser analisado pelo pesquisador quando a
pesquisa for qualiquantitativa. Ressaltamos que a nossa abordagem foi somente qualitativa o que a
metodologia permite sem o uso do software.
Semelhante a outras metodologias, o DSC exige um rigor metódico em todo o percurso. Seguimos
todos os passos que o DSC aponta para a preparação do projeto de investigação, conforme
apresentamos a seguir: a) Identificação de temas e problema de pesquisa; b) Construção do campo
social que envolve a definição dos atores/ agentes sociais; do campo social e do número de sujeitos da
pesquisa; c) Resgate do pensamento coletivo e análise.
A pesquisa ocorreu em dois campos sociais. O Campo social I, realizado em Fortaleza, Ceará, Brasil,
nos sete cursos da Universidade Estadual do Ceará- UECE que tinham tutoria do PET: Serviço Social,
História, Ciências Sociais, Computação, Geografia, Enfermagem, Ciências Biológicas. O campo social II,
em Lisboa, Portugal, na Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa, com alunos Maiores de 23
do Mestrado Integrado em Psicologia.
Na etapa I, no Brasil, realizamos entrevistas semiestruturadas com sete (07) Professores tutores dos
grupos PET e com duas (02) Interlocutoras (a atual e a ex-interlocutora) e Grupos de discussão (GD)
com sete grupos de tutorandos, totalizando 68 alunos. Na etapa II da investigação, em Portugal,
realizamos entrevistas semiestruturadas com 13 sujeitos: as coordenadoras do Programa de Tutoria
PTM23 e do GAPE-Gabinete de Apoio Psicopedagógico (C1 e C2) e uma professora que realiza sessões
temáticas (P1) ; duas tutoras (TP-1, TP-2); e oito alunos Maiores de 23, dois do terceiro ano (A7, A8)
que foram mentores e seis do primeiro ano, ingressantes em 2015 (A1, A2, A3, A4, A5, A6) , com faixa
etária em uma amplitude de 24 a 52 anos.
3.2 Análise dos discursos coletivos
A análise do material resgatado a partir dos discursos dos atores sociais da pesquisa foi realizada da
seguinte forma:
Primeiramente, realizamos a Limpeza do discurso que consiste em fazer leituras sucessivas para retirar
os particularismos, informações pessoais de identificação dos atores sociais, como: identificação do
curso, área de estudo, funções que ocupa na universidade exceto a tutoria, dentre outras
particularidades. Esse processo é denominado de desparticularização. Também se faz necessário

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retirar palavras e frases que se repetem. Esse é um trabalho exaustivo, pois requer muita atenção e
movimentos constantes de retorno ao texto considerando mais a forma do discurso, sem esquecer o
conteúdo. Um segundo passo foi a criação de eixos e subeixos discursivos de análise que foi a
organização e classificação dos discursos, tomando por base as questões investigativas, os objetivos
da pesquisa e os discursos resgatados.
O terceiro passo foi a Organização dos discursos nos Instrumentos de Análise dos Discurso-IAD a partir
dos eixos e com os elementos que a metodologia do DSC exige, conforme o exemplo:
Tabela 2. Modelo do Instrumento de Análise dos Discursos - IAD
EIXO DISCURSIVO: TUTORIA NO PET
SUB-EIXO DISCURSIVO: CONCEPÇÕES DE TUTORIA
EXPRESSÕES-CHAVEDSC IDEIAS CENTRAIS ANCORAGENS DSC
ECH:.... IC1 ...ICn A1:...An DSC1... DSCn
Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras.

Na primeira linha do IAD colocamos o eixo discursivo e abaixo dela o subeixo. Na sequência, na
primeira coluna das expressões-chave (ECH) trouxemos todos os discursos dos atores sociais referentes
ao eixo e subeixo, com identificação. Na segunda coluna as ideias centrais (IC); na terceira coluna as
ancoragens (A) e, na última, o Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) propriamente dito referente a cada
ancoragem e ideia central. Ressaltamos que as expressões-chave vêm indicadas por sujeito ou ator
social, já as ideias centrais (IC) não mais têm identificação e nem os DSC. O quarto passo foi a criação
das ideias centrais (IC) e das ancoragens (A) que ocorre também por uma leitura analítica atenta ao
conteúdo do discurso. Por vezes, necessitamos rever as nossas IC, reagrupá-las e renomeá-las, pois
aparecem algumas muito semelhantes em outros discursos, assim também é preciso muita perspicácia
no momento da percepção das ancoragens. Lembrando que “as ideias centrais são descrições do
sentido presente nas expressões-chave e não interpretações” (Lefevre & Lefevre, 2005b, p. 52),
enquanto as ancoragens (A) podem ou não ter a mesma descrição, depende da ideia a que ela remeter.
A diferença entre ideias centrais (IC) e ancoragens (A) é que a primeira remete tanto ao sentido mais
direto, descritivo, contido nas expressões-chave (ECH), como também remete ao sentido mais indireto
representado pela ancoragem, que diz respeito a uma teoria, uma ideologia ou uma crença subjacente
no discurso. Tanto as ideias centrais (IC) quanto às ancoragens (A) foram elaboradas com base nos
discursos das expressões-chave (ECH), agrupadas de forma que tivessem o mesmo sentido ou sentido
complementar. Às vezes, algumas ideias centrais (IC) e ancoragens (A) têm o mesmo nome, o que
facilita o processo. Logo abaixo, a tabela 3, apresenta bem esta disposição dos elementos do DSC. No
quinto passo, a numeração dos elementos do DSC, gerando uma correspondência, A1 para IC1 que
gera o DSC1, e sucessivamente, para facilitar a identificação do texto nos IAD no momento de escrever
a redação final da análise e até mesmo para facilitar para o leitor encontrar os DSCs correspondentes.
No sexto passo, ocorreu a construção do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) propriamente dito, que
consiste em transpor todas as expressões-chave (ECH) do mesmo agrupamento de ideias centrais (IC)
para colocá-las na coluna do DSC e, depois, discursivar ou sequenciá-las de modo que tenha começo,
meio e fim, a fim de atribuir uma coerência ao texto. Além disso, faz-se necessário também o uso de
conectivos que proporcionam a coesão do discurso. A disposição do DSC pode ser de diversas formas,
desde que não prejudique o sentido atribuído pelos atores sociais. Assim, a metodologia permite que
o pesquisador escolha a configuração que quer dar ao texto. O DSC propriamente dito consiste na
principal figura metodológica, porque traz uma crítica ao procedimento tradicional de categorização,
porque em vez de particularizar, coletiviza as opiniões que podem ser convergentes, divergentes ou
complementares. Logo abaixo na tabela 3, podemos ver um exemplo do Instrumento de análise para
o Eixo Discursivo: Concepções de tutoria.
Tabela 3. Instrumento de Análise dos Discursos 1 – IAD1

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Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras.


Por fim, no sétimo passo realizamos a análise dos discursos coletivos por eixos discursivos com base na
apresentação direta das ancoragens (A). A construção dos DSC que apresentamos aqui está organizada
ora sobre cada uma das ancoragens, ora um discurso síntese que integra mais de uma ancoragem
quando for possível. Ressaltamos que, no momento de analisar, não trouxemos todos os discursos na
íntegra, que constam nos apêndices da tese, optamos por tratar com excertos dos discursos coletivos.
Realizamos a análise dos discursos nas sequências das duas etapas da pesquisa. Primeiramente, a
etapa I, realizada no Brasil, fizemos uma análise dos discursos dos tutores e interlocutores, depois dos
tutorandos. No tocante à etapa II, realizamos uma análise aproximada àquela realizada na primeira
etapa, entretanto, não realizamos comparação entre as duas tutorias, pois não se trata de uma
pesquisa comparativa. Trata-se de dois programas de tutoria diferentes, em todos os seus aspectos,
objetivos, público alvo, etc. A etapa I, no Brasil, proporcionou a coleta de um volume muito extenso
de informações, devido ao número de cursos, de atores sociais investigados e ao tempo da pesquisa.
A etapa II, em Portugal, foi realizada em um curto período de tempo e com um número bem menor de
sujeitos, por se tratar da tutoria recente e que existe em um só curso. Após essas etapas,
fundamentando-se nos discursos coletivos, realizamos o oitavo passo que consistuiu na elaboração de
um texto síntese na primeira pessoa a partir de eixos interpretativos, o “eu ampliado” que é uma
reconstituição da representação coletiva dos atores sociais. As representações dos atores sociais
investigados foram organizadas da seguinte forma, primeiramente dos tutores e depois dos
tutorandos e ao final, uma análise conjunta. Os DSCs geraram os eixos discursivos de análise que
denominamos de: concepções de tutoria, prática, formação, perfil do tutor, aspectos institucionais e
normativos, tríade: ensino, pesquisa e extensão, currículo e avaliação. Vejamos na figura abaixo:

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Fig. 1. Eixos e subeixos discursivos de anxemplo da legenda de uma figura.


Fonte: Esse gráfico foi elaborado pelas pesquisadoras com o auxílio de um programa para elaboração de mapas conceituais.
Mindomomo. Conferir: <https://www.mindomo.com/pt>.

A partir dos subeixos, foram analisadas todas as ancoragens pertencentes a cada um subeixo,
trabalhando a relação entre essas ancoragens geradas tomando por base as ideias centrais, e por fim,
analisando as representações que daí emanaram.

3.4. Concepções de tutoria (Tutores e Interlocutores do PET)


Exemplificamos a análise do Eixo discursivo: Concepções de tutoria no PET em que os discursos dos
tutores e interlocutores geraram quatro ancoragens que podemos ver na figura 2:

Fig. 2. Eixo das concepções de tutoria no PET com suas ancoragens.


Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras.

Dessas ancoragens, foram gerados quatro discursos coletivos. Apresentaremos os discursos e no final,
faremos uma análise. O DSC1 se baseia na A1 que tem como ideia principal a orientação, conforme
podemos perceber no excerto do discurso abaixo:
[...] o tutor é aquele professor que vai orientar numa formação mais amiúde do
tutorando, ele tem essa função de ajudar os estudantes a enfrentar seus casos, para
[...] que eles, futuramente, possam resolver sozinhos e ir em frente. Assim, a tutoria
tem um papel de acompanhamento, de organização e avaliação de atividades, de
direcionamento [...]. Nós direcionamos, acompanhamos, orientamos [...] mas é uma
aprendizagem deles, para eles. Então, o tutor [...]estaria lá para ajudar para dar
suporte, para apoiar essas atividades que precisam ser feitas de forma muito
autônoma pelo aluno.(DSC1)
O DSC2 com base na A2 apresenta a tutoria como uma atividade pedagógica, entretanto, o discurso
deixa claro que essa atividade é diferenciada das outras experiências vivenciadas pelo professor, seja
com seus alunos na sala de aula, seja com os grupos de pesquisa ou de iniciação à pesquisa.
A ação tutorial é uma experiência pedagógica que me permite educar no processo.
[...] ela é uma atividade diferenciada daquela que regularmente um docente faz na
sua relação com os alunos. Em que ela se diferencia, aliás, das outras práticas
pedagógicas que eu vejo, é esse estímulo à autonomia do aluno que, na verdade é
um processo, que passa a ser conjunto, entre o tutor e o aluno.(DSC2)
O DSC3 é muito semelhante ao segundo, pois remete à atividade docente e tem como base na A3 que
traz a tutoria é uma prática que promove a formação integral do aluno.
A tutoria é uma experiência pedagógica muito interessante porque nós vamos
acompanhando o aluno na sua formação integral, tanto as dimensões do que seja a
atividade acadêmica, do ponto de vista do conhecimento, do tripé da universidade:
ensino, pesquisa, extensão; como também a relação emocional e afetiva durante
um processo de formação, e na questão da formação do sujeito crítico, que tenha
autonomiae reponsabilidade. Então, eu vejo a tutoria também como um processo de
formação humana do aluno, nós vamos formá-los para eles serem críticos da própria
realidade e que ele seja um cidadão, responsável e autônomo, […]Por fim, a tutoria
é uma prática que permite que eu veja esse diferencial, ela permite o protagonismo
e autonomia do aluno, e ao mesmo tempo aproveitarmos os potenciais de cada

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um[...]. Temos um papel deformadores, ampliando no que podemos [...]o potencial


do formando. [...] Também acabamos fazendo um papel meio de mãe e pai,
psicólogo(a), porque tem sempre essas questões, um grupo nunca funciona sem
atrito, temos que fazer essas mediações [...]. (DSC3)
Por fim, a tutoria do DSC4 que destaca a tutoria é uma ação construída e não imposta.
A tutoria é uma ação mediada, acho que pode até falar assim, porque ela não é uma
prática que seja imposta pelo tutor, mas vejo que ela é construída nesse coletivo, que
permite essa ação mais autônoma, mais protagonista do aluno, [...] Nós discutimos
as soluções coletivamente, mas em muitas situações são eles próprios que
descobrem e isso, acho, que é fazer tutoria. Fica uma ação muito compartilhada.
(DSC4)
Analisando os discursos, percebemos que eles não trazem concepções pré formuladas de autores ou
referências teóricas para conceituar o termo tutoria, mas conceituam tomando como base a prática
que vivenciam e que constroem o seu pensamento sobre a ação tutorial. Conceituar a tutoria é algo
complexo, isso ocorre porque é uma atividade que está presente em diversos contextos e com
diferentes objetivos. De acordo com Veiga Simão et al. (2008) as ações tutoriais são um caminho
encontrado pelas instituições para atender as necessidades dos estudantes. As autoras ainda afirmam
que “devido ao seu âmbito e às suas possibilidades de intervenção, a função tutorial encerra traços e
características que apontam para a sua amplitude e diversidade”(Veiga simão et al., 2008, p.75). O PET
é um programa que nasceu, em sua primeira versão, em um modelo de Educação Superior que fora
traçado pela Reforma Universitária de 1968 que tinha como objetivo “a prática integrada de extensão,
ensino e pesquisas científicas, buscando inovação no meio acadêmico” (Silva et al, 2010, p.111). Assim,
a tutoria exercida no PET passa pelo princípio da indissociabilidade dessa tríade Explica-se que os
tutores concebam a tutoria com base na sua prática, pois é esta que eles têm conhecimento de causa.
O Manual de Orientações Básicas (MOB) do PET, quando traz a concepção filosófica do Programa,
caracteriza o grupo e define método tutorial:
Um grupo tutorial se caracteriza pela presença de um tutor com a missão de
estimular a aprendizagem ativa dos seus membros, através de vivência, reflexões e
discussões, num clima de informalidade e cooperação. O método tutorial permite o
desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas e pensamento crítico
entre os bolsistas, em contraste com o ensino centrado na memorização passiva de
fatos e informações, e oportuniza aos estudantes tornarem-se cada vez mais
independentes em relação à administração de suas necessidades de aprendizagem
(MOB, 2006, p. 6).
Um elemento que perpassa todos os DSCs sobre tutoria e que é uma representação social muito forte
observada na própria definição do MOB é a questão da autonomia do estudante que a tutoria deve
respeitar. O tutor é aquele que estimula a aprendizagem autônoma do estudante, provocando nele
uma autoregulação de sua aprendizagem. Frison (2013) afirma que atualmente as IES investem na
qualidade do ensino que ofertam e que há uma preferência por um ensino ativo e interativo, com a
finalidade de estimular o desenvolvimento dos estudantes, e a tutoria é apontada como uma das
estratégias para atingir tal fim. Retomando os DSCs, o discurso dos tutores DSC2 se refere à tutoria
como uma prática pedagógica diferenciada das outras que é exercida por eles, enquanto o discurso
DSC70 dos alunos vai afirma que o faz essa tutoria diferenciada é justamente a tríade ensino, pesquisa
e extensão. Mesmo que muitas vezes haja predominância ou deficiência de um desses pilares, mas
continua havendo integração. O importante é compreender em que consiste cada um deles. De acordo
com Laffin (2007),
as atividades de ensino, pesquisa e extensão desenvolvidas e analisadas na
graduação, exigem níveis diferenciados de apropriação e de internalização de
saberes, considerando a particularidade do projeto e concomitantemente a
diversidade de alunos envolvidos num programa comum. Portanto, favorece a

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superação da compreensão e operacionalização das distintas atividades como


individuais e fragmentadas e em procedimentos distintos. (p.27)
A tutoria no PET seria, pois, uma atividade pedagógica, que difere das outras atividades docentes, que
promove a formação integral do aluno, destacando os aspectos pessoal, afetivo, profissional e
acadêmico, desenvolvendo o seu potencial cognitivo, de análise crítico-social e principalmente sua
autonomia. É uma ação mediada e compartilhada, que não havendo espaço para a imposição, mas que
as decisões são tomadas no coletivo. Sebastián Rodríguez (2010) aponta o desenvolvimento integral
do estudante nos seus diferentes âmbitos: intelectual, afetivo, pessoal e social como sendo uma das
características da tutoria na formação universitária e isto ocorre devido a uma intervenção essencial à
tutoria que é a orientação, apontada no DSC1.

4 Conclusões
Na metodologia do DSC o pesquisador é um interpretante que, em face dos DSCs que apenas
descrevem o pensamento coletivo, as representações sociais, passa, como base no referencial teórico
adotado, a tecer comentários interpretativos sobre o pensamento descrito (LEFÈVRE; LEFÈVRE,
2005b). Partindo desse pensamento é que elaboramos o discurso síntese da investigação. O DSC nos
permitiu lançar um olhar fundamentado na literatura investigada sobre os DSCs produzidos a partir
dos discursos dos atores sociais sobre a ação tutorial, a formação e prática do tutor e aprofundar os
conhecimentos sobre esta prática na Educação Superior. Muito embora, investigadores já tenham se
debruçado sobre o tema da tutoria, reconhecemos que as discussões realizadas por eles e as que
realizamos nesta investigação não abrange todas as questões que surgem nesse campo. Por isso se faz
necessário que haja cada vez mais estudos sobre as experiências de tutoria. Somente assim os
resultados contribuirão para quem exerce essa prática e para quem dela usufrui, bem como para
aqueles que querem compreendê-la melhor.Esta metodologia nos fez perceber que muito embora os
programas de tutoria investigados quanto outras experiências que existem ainda precisam crescer
cada vez mais. De certa forma, olhando pelo ângulo das políticas educacionais institucionalizadas, as
tutorias ainda constituem uma “elite” no sentido de dizer que poucos têm acesso a benefícios como
estes, não é democrático. A tutoria proporciona ao tutor uma melhoria de qualidade na sua prática,
tendo em vista que esta ação leva a uma reflexão sobre o fazer pedagógico, e consequentemente isto
reverbera sobre a aprendizagem discente e sobre o perfil formativo de um curso ou programa, ou seja,
em sua estrutura e organização curricular. A melhoria da qualidade do ensino e a realização dos
currículos estão relacionadas ao aperfeiçoamento docente. Não existe política mais eficaz de
aperfeiçoamento do professorado que aquela que conecta à nova formação àquele que motiva sua
prática diária: o currículo. Portanto, a ação tutorial é uma atividade vinculada ao currículo
compreendido aqui como uma construção sócio-cultural. Todos os envolvidos na tutoria, nessa
concepção, são atores que fazem parte da sua construção social desse e também da sua avaliação.
Independente de qual seja a tutoria, consideramosextremamente importante avaliá-la para saber o
que está dando certo e o que não, o modo como ela é exercida e se atinge realmente os seus objetivos,
daí a importância dessa metodologia que traz as representações coletivas de quem está envolvido na
ação tutorial. Esperamos que as reflexões que foram realizadas a partir das concepções dos atores
sociais envolvidos na ação tutorial dos programas investigados, tragam contribuições para as
instituições investigadas (UECE-Fortaleza, Ceará/Brasil e Faculdade de Psicologia-FP/UL,
Lisboa/Portugal), principalmente no tocante à compreensão da tutoria na sua perspectiva curricular,
como currículo em ação, e para uma maior reflexão sobre a ação tutorial nos referidos programas por
parte dos sujeitos que colaboraram com a investigação: professores tutores, alunos tutorandos,
interlocutores, coordenadores dos programas de tutoria presenciais investigados. Servirá de
instrumento reflexivo e avaliativo sobre as práticas neles desenvolvidas. E também temos como
expectativas que este texto desperte novas pesquisas com o uso da metodologia do DSC.

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Agradecimentos. Aos Programas PNPD/CAPES e PDSE/CAPES, por proporcionar o financiamento que nos
possibilita a realização de pesquisas no Brasil e no Exterior.

Referências
Brasil. MEC. Manual de Orientações Básicas (MOB) – Programa de Educação Tutorial. Ministério da
Educação. Fundação. Secretaria de Educação Superior- SESU. Departamento de Projetos
Especiais de Modernização e Qualificação do Ensino Superior – DEPEM - Brasília, DF, 2006.

Bourdieu, P. (1988). Lições de aula: aula inaugural profesira no Collège de France em 23 de abril de
1982. São Paulo: Ed. Ática.

Bourdieu, P.(1992). O poder simbólico. 3. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

Crusoé, I. M. C. C. (2004). A teoria das representações sociais em Moscovici e sua importância para
a pesquisa em educação. Aprender - Cad. de Filosofia e Pisc. da Educação, Vitória da Conquista,
Ano II n, 2, 105-114.

Frison, L. M. B. Tutoria: uma prática de ensino autorregulada utilizada no ensino superior. Revista
Reflexão e Ação. v. 21, n. esp., Santa Cruz do Sul: jul./dez. 2013, 66-81. Disponível em:
<http://online.unisc.br/seer/index.php/reflex>. Acesso em: 5 jul. 2016.

Alves, F. C. (2016) Ação tutorial na educação superior em dois programas: PET7Brasil e


PTM23/Portugal. (Tese de doutorado). Disponível em:
http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/21841. Acesso em: 6 mai. 2017.

Lefevre, F.&Lefevre, A. M. C. (2005a). Depoimentos e discursos: uma proposta de análise em pesquisa


social. Brasília, DF: Líber.

Lefevre, F.&Lefevre, A. M. C. (2005b). O discurso do sujeito coletivo:um novo enfoque em pesquisa


qualitativa (desdobramentos). 2. ed. Caxias do Sul: Educs.

Lefevre, F.&Lefevre, A. M. C. (2010). Pesquisa de representação social: um enfoque qualiquantitativo:a


metodologia do discurso do sujeito coletivo. 2. ed. Brasília, DF: Liber livro.

Moscovici, S.(1978). A representação social da psicanálise. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar
Editores.

Nogueira, M. A. & Nogueira, C. M. M. (2004). Bourdieu e a Educação. Belo Horizonte: Autêntica.

Sebastián Rodríguez, E. (Coord.) Manual de Tutoría universitaria. Recursos para la acción. Barcelona:
Octaedro/ICE-UB, 2010.

Veiga Simão et al. Tutoria no Ensino Superior: concepções e práticas. Sísifo: Revista de Ciências da
Educação. n. 7, set/dez.2008, 75-88. Disponível em: <http://sisifo.fpce.ul.pt>. Acesso em: 5
mar.2016.

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Sala de recursos multifuncionais sob a ótica dos gestores


educacionais do Distrito Federal

Simone Uler Lavorato1, Gerson de Souza Mól1

1 Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências – PPGEduC. Universidade de Brasília – UnB.


simone.lavorato@gmail.com; gersonmol@gmail.com

Resumo. A inclusão é fruto de árduas lutas sociais ao longo da história da humanidade. No processo inclusivo,
o respeito à diversidade é requisito essencial para a transformação de uma sociedade tradicionalmente
pautada pela exclusão e as salas de recursos multifuncionais constituem estratégia relevante. Portanto, faz-
se necessário entender qual a percepção dos gestores educacionais sobre dos trabalhos desenvolvidos nessas
salas. Essa pesquisa valeu-se de análise qualitativa, utilizando o instrumento da entrevista semiestruturada
com a finalidade de rastrear e traçar um recorte acerca da visão dos gestores. Ou seja, identificar a relevância,
ou não, das salas de recursos como promotoras da inclusão educacional de pessoas com deficiência. Destaca-
se que essa análise da prática vivenciada pode ser transformada a partir dos resultados obtidos nesse
trabalho. Sendo assim, essa análise pode contrastar a situação real e ideal da inclusão educacional em salas
de recurso multifuncionais no Distrito Federal, oportunizando processos de aprimoramento.
Palavras-chave: Sala de recursos multifuncionais; Inclusão; Gestores educacionais.

Multi-functional resouce rooms and the perception of the educational managers on the Distrito Federal
Abstract. Inclusion is the result of social struggles throughout the history of mankind. When it comes to the
inclusion process, respect towards diversity is fundamental for the transformation of a society that has
traditionally been guided by exclusion, and multi-functional resource rooms play a relevant role in this
process. Therefore, it is necessary to understand what the educational managers think about the work that is
developed in these rooms. This research adopted a qualitative analysis and used semi-structured interviews
with the aim of identify and categorize the educational manager’s perceptions. In other words, the study tried
to identify the relevance (or lack thereof) of the resource rooms as a tool to promote the educational inclusion
of disabled people. It is also important to acknowledge that this analysis of the social practice can be
transformed by the results found in this paper. In this sense, this analysis can confront both the real and the
ideal situation of educational inclusion on multi-functional resource rooms on the Distrito Federal, allowing,
thus, for improvements.
Keywords: Multi-functional resource rooms; Inclusion; Educational managers.

1 Introdução da Educação inclusiva

Pode-se entender por educação inclusiva um processo que envolve a transformação do sistema de
ensino para atender a todos educandos, independentes de suas diferenças. Destaca-se que este
processo requer necessariamente o engajamento dos educandos, profissionais da educação, projeto
político-educacional, estrutura física e material das escolas, apoio familiar, social e cultural. Nessa
perspectiva, essa ação transformadora deve propiciar um ambiente educacional democrático, como
forma de promover a inclusão.
No cenário educacional, a inclusão assume papel fundamental na produção e disseminação do
conhecimento, seja na educação formal ou na informal, pois o indivíduo é visto na sua integralidade.
No entanto, requer que o processo de ensino e de aprendizagem ocorra de forma efetiva. A
oportunidade de aprendizado, empodera e integra a sociedade, mas pode ser também fonte de
desintegração, exclusão social e pobreza, quando não ocorre de forma equitativa.

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Ao falar de inclusão educacional é essencial resgatar que ao longo dos anos, os termos que definem a
deficiência foram sofrendo transformações e acompanhando o desenvolvimento da sociedade. O
cuidado com a linguagem também expressa o respeito em relação às pessoas com deficiência e a não
discriminação. Na contemporaneidade, o termo mais adequado a ser utilizado é: Pessoa com
Deficiência.
Este termo consta no texto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,
aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU, em 2006, assinada por
diversos países, inclusive pelo Brasil em 2007 e ratificada em 2008, com status de emenda
constitucional por meio do Decreto 6.949 de 25 de agosto de 2009.
A carga semântica da palavra acumulada ao longo do tempo é suficiente para expressar preconceito,
e, portanto, alguns desses termos, que inclusive já foram oficiais, como "deficientes", “pessoas
deficientes", "portadoras de deficiência" ou "portadoras de necessidades especiais" persistem ainda
hoje. Ainda constam termos como estes sendo utilizados na legislação e até como títulos de entidades
civis e governamentais. Acredita-se que em função da burocracia ainda não foram atualizados. Como
exemplo identifica-se a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – Apae, Associação dos
Portadores de Necessidades Especiais – APNEN, e a Associação Brasileira de Pessoas Portadoras de
Necessidades Especiais –ABRAPP, dentre outras.
O Programa Educação Inclusiva, criado pelo Ministério da Educação, em 2003, garante o direito à
diversidade, com o objetivo de transformar os sistemas de ensino em sistemas educacionais inclusivos,
proporcionando o direito de acesso de todos à escolarização com acessibilidade e atendimento
educacional especializado. O Ministério Público Federal publicou, em 2003, o documento intitulado ‘O
acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular’ (Brasil, 2003), com o
objetivo de reafirmar o direito da escolarização de educandos com e sem deficiência em turmas
comuns do ensino regular.
O Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, de 2007, estabelece a implementação da sala de
recursos, onde sejam disponibilizados instrumentos necessários às necessidades específicas dos
educandos com deficiência, com a disponibilização de tecnologias assistivas para a promoção do
desenvolvimento escolar, tais como: softwares, livros em braille, recursos ópticos e não ópticos,
mobiliário adequado, entre outros.
As salas de recursos multifuncionais podem ser consideradas como ambientes transformadores, pois
podem apresentar condições mais favoráveis ao desenvolvimento de competências e de habilidades
específicas que ficam limitadas ao ambiente da sala de aula regular, compartilhadas por alunos com
diferentes necessidades específicas.
Os trabalhos desenvolvidos nas salas de recursos complementam as atividades realizadas nas salas de
aula regular. Ao dimensionar os impactos propiciados pelas práticas educativas realizadas nas salas de
recursos busca-se identificar a efetividade, ou não, do processo inclusivo.
Na lógica da inclusão, as diferenças individuais são reconhecidas e aceitas na construção de uma nova
práxis pedagógica. Rodrigues (2003) afirma que, nessa nova abordagem, não há mais lugar para
exclusões ou segregações e todos os educandos, com e sem deficiências, participam efetivamente.
Pois, a palavra de ordem no princípio da educação inclusão é equidade; a escola inclusiva é aquela em
que todos têm o direito de frequentá-la.

2 Processo de aprendizagem

As pessoas aprendem de formas diferentes e isso deve ser respeitado no momento de se conceber
uma ação educacional. Esse aspecto não difere pessoas com e sem deficiência; é amplo e não pode ser

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padronizado, sendo necessário considerar as especificidades e individualidades. Nenhum indivíduo é


igual a outro e o importante é motivar e facilitar a compreensão ou objeto de aprendizado.
Segundo Vygotsky (2001), o potencial humano é desenvolvido mediante a interação com o ambiente
físico e social, o indivíduo constrói o conhecimento, de forma ativa, a partir dos conhecimentos que
traz consigo. Nesse sentido, o processo de interação com o meio e com as outras pessoas é construído
individualmente, de forma diferente.
Nuernberg (2008) relata que o período pósrevolução de 1917 trouxe consigo a situação de milhares
de crianças em condição de vulnerabilidade e muitas delas com deficiência. E na tentativa de
responder adequadamente a essa demanda social, o governo soviético envolveu Vigotski na
elaboração de propostas educacionais coerentes com o contexto político e social vigente. Nesse
contexto, para atender às necessidades educacionais das crianças com deficiência, Vigotski criou, em
1925, um laboratório de psicologia. Este originou, em 1929, o Instituto Experimental de Defectologia,
local no qual foi desenvolvida parte das pesquisas realizadas.
Quando o indivíduo é uma pessoa com deficiência, esse processo pode ser dificultado por barreiras
comunicativas e atitudinais, criadas muitas vezes pela falta de conhecimento ou não disponibilização
de recursos ou tecnologias assistivas.
É essencial desenvolver estratégias que proporcionem situações de aprendizagem que estimulem na
pessoa com deficiência, os sentidos remanescentes, a iniciativa e a participação ativa. O processo de
aprendizagem deve incentivar o comportamento exploratório e a experimentação para a construção
de uma percepção global, que é essencial ao processo de análise e de síntese. Da mesma maneira, não
podem ocorrer discriminações e determinadas atitudes, tais como fragilização ou superproteção,
devem ser combatidas no processo de ensino e de aprendizagem.

3 Perspectivas das Salas de Recursos

Na visão de Kassar e Rebelo (2011), existe dupla conotação de atendimento educacional especializado:
apoio concomitante ao ensino visando substituir a escolarização dos alunos com deficiência, podendo
ser prestado em “classes especiais, escolas especiais, classes hospitalares e atendimento domiciliar”.
Kassar e Rebelo (2011) apontam que, nos últimos dez anos, a política proposta pelo Governo Federal
começa a desconsiderar a possibilidade de oferecimento escolar fora do sistema comum de ensino.
O instrumento utilizado para definir legalmente essa garantia foi o Decreto nº 6.571 de 17 de setembro
de 2008 que admite a realização de atendimento educacional especializado apenas
complementarmente ou de forma suplementar e não mais substitutiva. Ou seja, as instituições
especializadas devem se organizar como centros de atendimento educacional especializado,
oferecendo ações complementares ou suplementares aos espaços escolares comuns.
Conforme a Constituição Federal de 1988 às pessoas com deficiência tem o direito à educação
realizada em classes comuns e ao atendimento educacional especializado complementar ou
suplementar à escolarização, que deve ser realizado preferencialmente em salas de recursos na escola
onde estejam matriculados, em outra escola, ou em centros de atendimento educacional
especializado.
Conforme Corrêa (2012), apontam o atendimento educacional especializado é uma forma de garantir
que sejam reconhecidas e atendidas as particularidades de cada aluno com deficiência, altas
habilidades ou superdotado.
Nesse sentido, uma Sala de Recursos Multifuncionais constitui-se em um espaço organizado com
materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos e profissionais com formação para o atendimento às
necessidades educacionais especiais, promovendo a construção e a disseminação do conhecimento.

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Corrêa (2012) destacam que uma mesma sala de recursos, conforme cronograma e horários, pode
atender alunos com deficiência, altas habilidades/superdotação, dislexia, hiperatividade, déficit de
atenção ou outras necessidades educacionais especiais.

Há uma grande variedade de materiais e recursos pedagógicos que podem ser


utilizados para o trabalho na Sala de Recursos Multifuncionais ou até na sala de aula
regular, entre eles destacam-se: os jogos pedagógicos que valorizam os aspectos
lúdicos, a criatividade e o desenvolvimento de estratégias de lógica e pensamento;
os jogos adaptados, como aqueles confeccionados com simbologia gráfica, utilizada
nas pranchas de comunicação correspondentes à atividade proposta pelo professor;
livros didáticos e paradidáticos impressos em letra ampliada, em Braille, digitais em
Libras, livros de histórias virtuais, livros falados; recursos específicos como reglete,
punção, soroban, guia de assinatura, material para desenho adaptado, lupa manual,
calculadora sonora, caderno de pauta ampliada, mobiliário adaptados e muitos
outros. (Corrêa, 2012)

Para todos os educandos, as atividades realizadas devem desenvolver a iniciativa e a autonomia,


propiciando prazer e motivação na aprendizagem, uma vez que um ambiente favorável à construção
do conhecimento deve encorajar a participação ativa. A autoconfiança contribuirá para a efetividade
no processo de aprendizagem. Nessa perspectiva, a sala de recursos é essencial na promoção do
desenvolvimento humano.

4 Metodologia

Este trabalho constituiu-se como uma pesquisa de campo, uma investigação empírica e in loco com
enfoque qualitatito. Devido ao objetivo de identificação de percepção dos gestores educacionais do
Distrito Federal, foi escolhido para realização desta pesquisa o método qualitativo de análise de
conteúdo.
Esta análise segue os princípios de Bardin (1977), uma vez que seu foco buscou qualificar as vivências
do sujeito, bem como suas percepções sobre determinado objeto e seus fenômenos. Foram utilizadas
divisão de categorias de análise na construção das questões.
Minayo (2007, p. 406) aponta que a partir dessa categorização, o analista “propõe inferências e realiza
interpretações, inter-relacionando-as com o quadro teórico desenhado inicialmente ou abre outras
pistas em torno de novas dimensões teóricas e interpretativas, sugerida pela leitura do material”.
O público participante desta pesquisa foi composto por dez gestores educacionais de escolas públicas
localizadas em Brasília, capital do Brasil, no Distrito Federal que desempenhavam suas atividades em
escolas que possuem salas de recursos multifuncionais e concordaram em contribuir com essa
investigação.
Para assegurar o anonimato dos entrevistados na pesquisa, as identidades foram preservadas e seus
nomes substituídos por palavras relevantes utilizadas na inclusão educacional.
O quadro 1 apresenta informações sobre os participantes. Essa representação contribui para o melhor
entendimento e análise dos dados discutidos e apresentados. Conhecer dados como idade, gênero,
experiência em gestão, números de alunos atendidos e quantidade de professores lotados nas salas
de recusos ajudam a entender a complexidade da temática.
Mesmo se tratando de uma análise qualitativa os números ajudam a evidenciar a realidade do contexto
educacional no qual foi desenvolvida a pesquisa, pois os dados são complementares e dentro de uma
visão sistêmica compõem o todo.

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Quadro 1 – Síntese dos dados coletados

Experiência Alunos Professores na


Gestor Idade Sexo
em gestão atendidos sala de recurso

Inclusão 47 anos Masculino 7 anos 1.800 2

Barreiras 40 anos Feminino 8 anos 1.500 2

Equidade 38 anos Feminino 12 anos 900 1

Diversidade 51 anos Feminino 9 anos 900 1

Pluralismo 61 anos Masculino 9 anos 1.000 2

Mobilidade 50 anos Feminino 3 anos 370 1

Ação Afirmativa 51 anos Feminino 3 anos 370 1


Tecnologia
46 anos Feminino 3 anos 500 1
Assistiva
Desenho
31 anos Masculino 6 anos 1.600 6
Universal
Adaptação
55 anos Masculino 2 anos 1.300 2
Razoável
Fonte: a autora, 2016.

Para realizar esta pesquisa, foi utilizado a entrevista como técnica e como instrumento foi
desenvolvido um roteiro semiestruturada.
A entrevista foi semiestruturada e adotou os seguintes critérios:
• Finalidade: construir dados que expressassem a percepção dos gestores educacionais sobre
do trabalho realizado nas salas de recursos.
• Definição das perguntas: as perguntas semiestruturadas foram elaboradas e agrupadas com
base em um raciocínio lógico e encadeadas para que possam evidenciar a percepção dos
entrevistados.
• Classificação das perguntas: foi adotada a associação de perguntas abertas com possibilidade
de contemplar também questões subjetivas apresentadas pelos entrevistados, haja vista a
necessidade de se verificar a percepção individual.

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5 Descrição de Conteúdo

Após as entrevistas, os dados obtidos foram sistematizados, compilados e categorizados. Neste


contexto, as categorias serão apresentadas na mesma sequência utilizada na entrevista. A partir da
descrição de conteúdos evidenciaram-se as seguintes percepções:
Gestores – Dentre os gestores entrevistados, apenas o denominado “Pluralismo” não exerceu
atividade de professor antes de assumir a gestão escolar. Os demais foram professores antes de
assumir a gestão. Inclusive a gestora denominada “Tecnologia Assistiva” foi professora da sala de
recursos por seis anos antes de assumir a gestão da escola. Foi apontado pelos gestores que a
experiência anterior como docente subsidiou a atuação como gestor escolar consideraram essa
vivência importante para obter uma visão mais realista do contexto escolar.
Estudantes – Evidenciou-se que em todas escolas entrevistadas, os gestores afirmam que a sala de
recursos está disponível para o atendimento de todos alunos com alguma deficiência ou transtorno.
No entanto, esse atendimento, em nenhuma das escolas pesquisadas, atende a Educação de Jovens e
Adultos – EJA. Foi ressaltado que seria importante ampliar o atendimento dessas salas contemplando
também os jovens e os adultos que não tiveram oportunidades educacionais na idade adequada, mas
que não estão livres da necessidade de um atendimento especializado.
Turno de atendimento – Dentre as escolas contempladas na pesquisa, apenas uma escola atende
prioritariamente no mesmo turno da aula regular. O gestor denominado “Adaptação Razoável” afirma
que essa medida foi adotada para que os alunos pudessem permanecer com o outro turno livre para
frequentar fisioterapias e atendimento médico complementar. As outras escolas atendem
prioritariamente no turno inverso. Na fala dos gestores evidenciou-se que o atendimento é
individualizado, com duração aproximada de cinquenta minutos, com a frequência de um atendimento
semanal. O gestor “Desenho Universal” foi o único a afirmar que o aluno tem atendimento com
frequência de duas vezes na semana. Sendo o atendimento na sala de recurso uma estratégia para
complementação e suporte à aprendizagem. O adequado é que este atendimento fosse ofertado no
contraturno. Uma vez que nem sempre isso é possível. Seja por limitação escolar ou por limitações das
famílias que não podem levar o aluno nos dois turnos.
Acompanhamento – No quesito acompanhamento, apenas os gestores “Inclusão”, Equidade” e
“Mobilidade” afirmaram que realizam acompanhamento direto com os professores que atuam na sala
de recursos e os demais realizam esse acompanhamento com intermediação dos orientadores,
supervisores e coordenadores pedagógicos. Todos afirmam que as decisões são tomadas em conjunto
e com a participação dos gestores. A gestão democrática, que pauta as relações educacionais no
Distrito Federal e que constituem regra geral para todos estabelecimentos educacionais demanda que
o processo decisório seja tomado em conjunto e considerando a melhor opção para o educando.
Quantitativo de professores – Dos gestores entrevistados, apenas o “Desenho Universal” relatou não
ter problemas quanto ao número de professores na sala de recursos, sendo que essa escola é a única
que oferta o atendimento individualizado duas vezes por semana. Todos os demais gestores relatam
diversas dificuldade que possuem com falta de profissionais qualificados para atuarem na sala de
recurso. Alegam que a cada dia surgem novos laudos e o número de aluno que requer esse
atendimento aumenta, apesar de a escola não dispor de profissionais para atendê-los. Apontam ainda
que a demanda é muito além das condições de atendimento. Essa realidade, no Distrito Federal e em
todo o país, não é exclusiva da sala de recursos, mas como um todo. Faltam professores para
contemplar a quantidade de alunos existentes. A demanda é muito maior que a oferta, acarretando
em turmas grandes gerando dificuldade de atuação para os docentes.
Relevância da sala de recursos – Todos gestores entrevistados ressaltaram a importância da sala de
recursos para o alcance de melhores resultados escolares e pessoais dos alunos atendidos e da
interação com os demais alunos. Na escola administrada pelo gestor “Pluralismo” utiliza-se a sala de

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recursos também para a realização de curso de Língua Brasileira de Sinais – Libras para todos alunos
da escola, com a finalidade de que alunos ouvintes possam interagir com alunos surdos. O projeto é
um exemplo de inclusão e um sucesso na escola. Foi necessário criar uma lista de espera para que os
alunos ouvintes pudessem realizar o curso de Libras, devido à grande demanda e à falta de professores
qualificados que pudessem ministrar o curso. Esse é também um exemplo de como a sala de recursos
pode desenvolver atividades que contemplem todos alunos, independente de deficiência ou não.
Demanda – Infelizmente esse aspecto foi levantado por todos gestores, no sentido de que a cada dia
aumenta a demanda de atendimento da sala de recursos, não tendo como aumentar as vagas para
atendimento. Seja por falta de profissionais, de recursos financeiros e físicos. A maior parte das salas
de recursos funciona em cubículos que não comportam uma sala de aula regular e, por isso são
destinadas a sala de recurso. Outro ponto levantado pelos gestores, foi a dificuldade de receber um
laudo sobre as necessidades de cada aluno, que muitas vezes demoram até dois anos para serem
elaborados. Diante de tanta demora, com a ajuda da família, os profissionais da sala de recurso
começam a atender o aluno, mesmo sem o laudo. Destaca-se que o laudo seria fundamental para que
o profissional selecionasse metodologias e técnicas mais adequadas àquele aluno.
Resultados – Os gestores apontam que mesmo diante de tantas dificuldades para manter as salas de
recurso funcionando adequadamente, eles não desistem, porque os resultados excelentes obtidos são
visíveis. Os professores da sala de recurso desenvolvem adaptações curriculares personalizadas,
ajudando o desenvolvimento dos alunos na sala de aula regular. Nessa perspectiva, os gestores
relatam que o trabalho dos professores da sala de recurso é essencial na promoção da inclusão escolar.
Mensagem aos governantes – Os gestores apresentaram uma visão real de como funciona uma sala
de recursos e como ela deveria funcionar. Sendo assim, nas mensagens aos governantes sugeriram:
capacitação continuada para os professores, investimento em equipamentos tecnológicos, material
didático adequado, tecnologia assistiva, espaço físico suficiente para desenvolver as atividades e maior
participação no dia a dia das escolas, pois assim poderiam desenvolver políticas públicas mais próximas
da realidade escolar e não a partir de uma visão romântica vista por indivíduos trancados em gabinetes.
Mensagem aos professores de sala de recurso – Neste aspecto os gestores foram enfáticos em
ressaltar o bom trabalho desenvolvido por esses profissionais. Alguns gestores apontam que somente
a vontade de ajudar o próximo que esses profissionais possuem é que explica o trabalho de excelência
desenvolvido diante de tantas dificuldades e carências. Parabenizaram os profissionais e destacaram
que a motivação desses professores é responsável pelo trabalho desenvolvido. Apontam ainda que
esses profissionais buscam por conta própria se desenvolver, capacitar e buscar soluções para um
trabalho efetivo. Portanto, é mérito desse profissional os resultados alcançados. Sob a ótica dos
gestores, esses profissionais fazem a diferença nos resultados da escola e na vida dos educandos.
Reflexões – Durante as entrevistas, algumas falas representam a lacuna que existe entre a teoria e a
prática da educação inclusiva. Soa como um pedido de ajuda repleto de significados:
“Inclusão não é brincadeira, o governo finge que tem inclusão, mas é apenas uma fala bonita para a
mídia”.
“Dizer que o aluno é da Secretaria de Educação é mentira, ele é do professor e o professor tem que se
virar para dar conta de ensinar”.
“O trabalho não é feito só com giz e pincel, precisamos de recursos”.
“Na escola pública o pai não sabe nem o nome da professora do filho, veja se na escola particular isso
acontece. Lá o pai paga e cobra resultado”.
“Temos que esperar em média dois anos por um diagnóstico e nesse tempo como fica o aluno? ”.
“Para comprar material para sala de recurso fazemos festas e até rifas”.
“Compro material para a sala de recurso com dinheiro do meu bolso”.
“Que os professores da sala de recurso sejam persistentes, pois as dificuldades são muitas”.

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Evidencia-se assim, o esforço dos docentes para desempenhar um bom trabalho apesar da falta de
infraestrutura e investimento na educação. Nesse sentido, faz-se necessário muito mais que docentes
bem intencionados para que possa se desenvolver processos de aprendizagem inclusivos que atendam
a demanda social de forma efetiva, propiciando a formação de sujeitos autônomos e protagonistas de
suas próprias histórias.

5 Considerações Finais

Diante da realidade constatada e do objetivo desse trabalho em entender qual a percepção dos
gestores educacionais sobre dos trabalhos desenvolvidos nessas salas de recurso multifuncionais pode
ser evidenciado por meio de uma análise qualitativa com a finalidade de rastrear a traçar um recorte
acerca da realidade educacional do Distrito Federal.
As salas de recursos são percebidas como oportunidade de concretização da inclusão educacional de
pessoas com deficiência. Sendo responsável por mediar esse processo, munindo o aluno de recursos
que facilitem seu aprendizado e munindo o professor de alternativas para promover o ensino.
A sala de recurso requer um olhar diferenciado dos gestores, mas acima de tudo um olhar diferenciado
dos governantes que criam as políticas públicas. Caminha-se na estrada da inclusão, mas ainda muito
distante do destino.

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Violência Escolar No Brasil: Desafios Em Curso Na Educação Do


Século XXI

Cleide Ester de Oliveira1, Veralúcia Guiamarães de Souza2, Francisco Carlos de Oliveira3,


Vanessa Gonçalves da Silva 4
1 Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil,
cleide.oliveira@blv.ifmt.edu.br; cleidester@hotmail.com
2Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil,

veralucia.souza@blv.ifmt.edu.br
3Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil, f.oliveira@hotmail.com
4Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil,

Vanessa.silva@blv.ifmt.edu.br

Resumo. Neste artigo busca-se apresentar o recorte de uma pesquisa que está sendo realizada, no Estado
de Mato Grosso, em quatro cidades e seis escolas. Tem-se como objetivo geral analisar as ocorrências de
bullying, no ambiente escolar. Dentre as questões, pontuamos as seguintes: Como se materializam as
práticas discursivas dos alunos vítimas do bullying? Que efeitos de sentido produzem os discursos que
humilham o outro por conta das diferenças? Tomamos como embasamento teórico a arqueogenealogia
formulada por Michel Foucault para compreender as categorias teóricas: discurso, poder/saber/verdade e
normatização. Adotou-se a abordagem qualitativa tendo como corpus para a análise os textos produzidos
pelos estudantes do ensino médio no Brasil. Pôde-se perceber que as práticas discursivas dos participantes
desta pesquisa se materializam em discursos de intolerância em relação aos que não se enquadram em
padrões estabelecidos pela sociedade produzindo efeitos de sentido de autodesvalorização que afeta a
autoestima e provoca sofrimento psíquico que pode trazer consequências graves.
Palavras-chave: violência escolar; bullying; discursos; exclusão; normatização.

Scholar Violence: Current Challenges In The Education Of The 21st Century In Brazil
Abstract. In this article, we present a survey that is being carried out in the State of Mato Grosso, in four
cities and six school. It has as general aim to identify and analyze the occurrences of bullying in a scholar
context. Among the the research questions, we punctuate: How do the discursive practices of students who
are victims of bullying materialize? What effects of meaning do the discourses that humiliate the other
because of differences produce? We take as theoretical basis an archaeogenealogy formulated by Michel
Foucault to understand the theoretical categories: discourse, power / knowledge / truth and normatization.
A qualitative approach was adopted for analyzing the corpus, the texts produced by high school students in
Brazil. It was possible to notice that the discursive practices of the participants of this research materialize in
discourses of intolerance in relation to those that do not fit in established standards by the society
producing effects of sense of self-devaluation that affects the self-esteem and causes psychic suffering that
can bring serious consequences.
Keywords: scholar violence; bullying; discourses; exclusion; normatization.

1 Introdução
A escola é, depois da família, o mais importante ambiente de socialização, sendo o espaço onde as
crianças e os jovens passam boa parte do tempo e a sua função é educar, proteger e aprimorar seus
estudantes no que se refere aos valores, ao respeito e ao exercício da cidadania e do direito de
todos. No entanto, esse é um desafio que não tem sido fácil de enfrentar, já que os índices de
violência, de norte a sul do país, são cada vez maiores no contexto da escola brasileira.
É visível como os casos de violência nas escolas tem sido destaque na imprensa em todo o Brasil. As
atitudes de violência no ambiente escolar afetam a integridade física e psíquica contribuindo para

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um mau aprendizado e às vezes trauma por toda a vida na pessoa que sofreu ou ainda sofre essas
agressões.
Fazendo uma retrospectiva, um estudo realizado pelo MEC em parceria com a UNESCO, no ano de
2003, mostrou que a violência no ambiente escolar foi crescente até então. Os atos delituosos e as
pequenas e grandes demonstrações de incivilidades nas escolas chamam a atenção e provocam um
sentimento de insegurança na comunidade escolar (Abramovay & Castro, 2003). Para esta autora, a
escola, já naquela época, não representava um espaço seguro de integração social, de socialização,
pois deixou de ser um espaço resguardado, uma vez que se tornou cenário de ocorrências violentas.
O estudo intitulado Bullying em escolares brasileiros (Malta et al., 2012) que teve como objetivo
descrever a vitimização e a prática de bullying em escolas brasileiras, analisou dados da Pesquisa
Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde.
Participaram da PeNSE escolares do 9º ano (8ª série) do ensino fundamental de escolas públicas e
privadas do Brasil. Os autores do referido estudo enfatizam que:
O bullying não deve ser considerado como uma característica normal do desenvolvimento das
crianças e dos adolescentes, mas sim um indicador de risco para a adoção de comportamentos
violentos mais graves, incluindo o porte de armas, agressões e lesões frequentes. A vivência do
bullying expõe as crianças e os adolescentes à condição de vulnerabilidade. O bullying entre
estudantes é, em geral, encontrado na maioria das escolas, independentemente das características
sociais, culturais e econômicas de seus alunos. Estudos demonstram que se trata de um problema
mundial, comum a diversos países e escolas.
Por isso, considera-se de grande relevância estudar sobre o tema e procurar respostas para as
questões da violência escolar que cotidianamente se vê nos noticiários. Já no início deste século,
segundo Abramovay & Castro (2003), a violência escolar era um fenômeno preocupante porque
atinge a todos os envolvidos: agressores, vítimas e os que assistem a essa violência e, sobre tudo,
retira da escola o seu objetivo principal que é a promoção de conhecimento, de formação do ser, de
educação, como veículo, por excelência, do exercício e aprendizagem, da ética e da comunicação por
diálogo e, portanto, antítese da violência.
Neste artigo busca-se apresentar um recorte de uma pesquisa que está sendo realizada no Estado de
Mato Grosso, em quatro cidades e seis escolas (uma escola em Sinop, uma escola em Pontes e
Lacerda, uma escola em Santo Antonio de Leverger e três escolas em Cuiabá). Dessa forma, este
trabalho apresenta dados de uma escola que se localiza em Cuiabá por serem os primeiros coletados.
Procura-se analisar um fenômeno que não é novo nas escolas, mas que vem ganhando contornos
bem expressivos e chama a atenção para as relações humanas e sociais que se desenvolvem entre os
pares – o bullying. Dentre as questões, pontuamos as seguintes: Como se materializam as práticas
discursivas dos alunos vítimas do bullying? Que efeitos de sentido produzem os discursos que
humilham o outro por conta das diferenças?

1.1 O conceito de violência escolar


Para que possamos aprofundar, primeiro devemos entender o conceito de violência. A violência na
escola é um tema abrangente, pois sua tipificação e bem variada. Abramovay e Castro (2006)
definem violências como atos reais que são visíveis, pois sangram, afetam órgãos, ressoam gritos e
resultam em pessoas desfiguradas, ou seja, provocam dor, porém, de acordo com a autora nem
todas as dores são físicas e, não necessariamente, todos sentem a dor com a mesma intensidade e
da mesma maneira, pois em cada época e em cada sociedade as representações e os sentimentos
em relação à violência variam. E o mais complexo, em certos contextos, o que é terrível a um olhar
estrangeiro, embasado em princípios de ética universal, não são tidos como violências pelos que dela

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padecem, pois faltariam parâmetros, condições materiais, conhecimentos possíveis sobre outros
horizontes, como a possibilidade de ser sujeito de direitos (p. 3).
Por isso, não só no Brasil, mas em diversos países, os pesquisadores buscam conceituar a violência
levando em conta a população alvo, ou seja, os jovens e o lugar da escola como instituição. Sendo
assim, resumidamente, pode-se dizer que a violência “é todo ato que implica a ruptura de um nexo
social pelo uso da força. Nega-se, assim, a possibilidade da relação social que se instala pela
comunicação, pelo uso da palavra, pelo diálogo e pelo conflito” (Abramovay & Castro, 2006).
Nessa perspectiva, Williams e Pereira (2010) afirmam que definir violência escolar não é uma tarefa
fácil, uma vez que o que se caracteriza por violência depende de aspectos culturais, históricos e
individuais, porém, as autoras apontam que a violência escolar engloba tanto a forma mais visível da
violência, como agressão entre indivíduos, quanto a violência simbólica que se caracteriza por meio
das regras, normas e hábitos culturais de uma sociedade desigual.

1.2 O Bullying
Convém refletir neste estudo, o termo bullying, já que este será o recorte desta pesquisa. Embora
não seja um fenômeno novo, pois é do conhecimento de todos que sempre existiu dentro da escola,
o termo pertence à língua inglesa, passou a ser usado no Brasil recentemente e tem sido objeto de
estudos acadêmicos. O vocábulo só se tornou conhecido no Brasil por conta dos estudos acadêmicos
iniciados nos Estados Unidos, nos anos 70. O significado da palavra bullying está relacionado com
situações de abuso e intimidação que ocorre dentro ou fora da escola, ou seja, se refere a todas as
formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas com o objetivo de
intimidar ou agredir outra pessoa sem que este tenha a possibilidade ou capacidade de se defender.
Ocorre em uma relação desigual de forças ou poder (Eljach, 2011).
Lemos (2007) explica que dentro da escola essa forma de agressão é dissimulada e tem
consequências graves, pois os danos na vida dos envolvidos são irrecuperáveis e podem “destruir-
lhes a saúde psicológica e física, além de consequências como rebaixamento da autoestima,
depressão e marginalização, pode estimular desejos e (atitudes) de suicídio e assassinatos” (p. 68). O
agressor, segundo a autora, costuma estar em uma relação frente à vítima e dirigindo-lhe “ameaças,
intimidações, apelidos maldosos, gozações, ofensas, intrigas, xingamentos, agressões físicas,
discriminação, constrangimentos, perseguições, chantagem, dentre outros” (p. 72).
Considerando a gravidade do problema, em 2011, a UNICEF publicou um estudo sobre violência
escolar na América Latina e no Caribe onde mostra que a violência psicológica contra crianças e
adolescentes e entre pares foi intensificada nos últimos tempos, principalmente as formas de
violência relacionadas aos usos da tecnologia da comunicação e informação. O referido estudo
evidencia o Brasil como um país onde o bullying é uma ocorrência comum.
Uma pesquisa realizada por Ferrari (2010), na cidade de Juiz de Fora, mostrou como a humilhação
surge nas definições de classe, raça e gênero e como ela serve para construir a noção da diferença e
do diferente, a noção de pertencimento e de grupo como algo que configura a distinção entre o
“nós” e “eles”. Para esse autor, as situações que relacionam violência e humilhação ao gênero, raça
e classe no contexto da escola, nos proporcionam uma boa oportunidade para problematizar a
formação desses conceitos, a hierarquização instaurada e como isso está na própria constituição
dessas categorias e sujeitos.

2. Teorização

Discurso

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No edifício teórico da análise do discurso, é ponto fundamental trazer os conceitos formulados por
Michel Foucault (2008) no plano discursivo, uma vez que o autor deixa claro que o discurso luta pelo
poder na sociedade, além de traduzir as lutas ou os sistemas de dominação, e é também a luta pelo
poder do qual se quer apoderar.
Nesse sentido, o que está na base desse conceito é a ideia de que em toda sociedade há um certo
número de procedimentos que controlam, selecionam, organizam e redistribuem simultaneamente a
produção do discurso (Foucault, 2008). A função desses procedimentos é a de “conjurar seus
poderes e perigo, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível
materialidade” (p. 9). Em nossa sociedade existem procedimentos de exclusão, sendo que a
interdição é apontada por Foucault (2008) como a mais conhecida. A palavra proibida, a segregação
da loucura e a vontade de verdade são os três sistemas de exclusão que afetam o discurso. Porém,
para dar legitimidade a esses sistemas de exclusão, a vontade de verdade foi a mais enfatizada
(Foucault, 2008) e tanto ela quanto outros sistemas de exclusão têm como apoio as instituições, pois,
através de um conjunto de práticas, dentre elas a pedagogia, os sistemas de livros, as bibliotecas, as
sociedades antigas e os laboratórios de hoje os reforçam e os reconduzem simultaneamente. Além
disso, segundo o autor, esse sistema é reconduzido, também, pela forma como o saber é
administrado em uma sociedade, como é valorizado, dividido e de certa maneira distribuído.
O presente estudo tem como pressupostos teóricos e metodológicos a Análise do Discurso (AD). No
livro Arqueologia do Saber, Michel Foucault (2008) concebe que é preciso acolher o discurso em sua
dimensão de acontecimento, isto é, cada texto, cada palavra, por mais que se aproximem de outros,
nunca são idênticos aos que os precedem.
A análise arqueológica focaliza na dimensão de exterioridade dos discursos e busca suas condições
de existência nas práticas discursivas, que são também práticas sociais. As práticas discursivas
produzem saberes de diferentes tipos que as caracterizam e delimitam suas especificidades
(Foucault, 2008).
De acordo com esse autor, para compreender por que apareceram em certo tempo e lugar uma
ciência, uma teoria, um conceito, valores, verdades, etc., é preciso atentar para as relações sociais
que os tornaram discursos enunciáveis e visíveis, ou seja, situá-los em determinadas relações de
poder. Nesse sentido, o saber se liga ao poder. Em síntese, analisar discursos significa, de acordo com
Gregolin (2007), “tentar compreender a maneira como as verdades são produzidas e enunciadas” (p.
15).
Nessa perspectiva, a análise enunciativa é uma análise histórica e só pode se referir às coisas ditas,
ao que foi pronunciado ou escrito, às performances verbais realizadas, pois a análise é feita no nível
de sua existência e só se pode descrever as coisas ditas porque foram ditas (Foucault 2008).
O conceito de discurso carrega em seu bojo a ideia de práticas discursivas, pois é nelas que o discurso
se materializa. Foucault chama de práticas discursivas um conjunto de regras anônimas, históricas e
determinadas no tempo e no espaço, que definem, em uma época dada, as formas como se devem
enunciar os discursos.

3. Metodologia

Nesta pesquisa, adotou-se a abordagem qualitativa, uma vez que, segundo Minayo (2010), essa
abordagem “se aplica ao estudo da história, das relações, das representações, das crenças, das
percepções e das opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a respeito de como
vivem, constroem artefatos e a si mesmos, sentem e pensam” (p. 57). De acordo com essa autora, o
método qualitativo é o que se adapta às investigações de grupos e segmentos delimitados e
focalizados, de histórias sociais sob a ótica dos atores, de relações, de discursos e de documentos.
Assim, este trabalho é recorte de um projeto de pesquisa em andamento no estado de Mato Grosso,

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( uma escola em Sinop, uma escola em Pontes e Lacerda, uma escola em Santo Antonio de Leveger e
três escolas em Cuiabá). Dessa forma, o recorte deste trabalho apresenta dados de 480 alunos de
uma escola pública de ensino médio que se localiza em Cuiabá e se caracterizam como
descritivos/interpretativos, balizados com instrumentos de geração de dados primários.
Adotou-se esta metodologia porque ela possibilita o estudo do fenômeno para compreender a
realidade de forma complexa e contextualizada por meio da subjetividade dos sujeitos-participantes
da investigação e, pela possibilidade de retorno para os sujeitos participantes, uma vez que, na
pesquisa qualitativa, é de praxe o retorno para a comunidade que participa do evento da pesquisa.
Neste caso, para a análise das práticas discursivas dos alunos, foram utilizadas somente as questões
abertas do questionário aplicado. Ressalta-se que dados primários, segundo Andrade (2003, p. 125),
são aqueles coletados “diretamente no local de ocorrência dos fenômenos”, ao passo que os dados
secundários provêm de outras fontes.
A pesquisa qualitativa, segundo Deslandes (1994, p. 22), “trabalha com o universo de significados,
motivos, aspirações, representações, valores e atitudes”. Isso implica estudo do mundo dos
significados das ações e relações humanas, não tão perceptíveis e não tão captáveis com outro
método de pesquisa. Assim, essa metodologia de pesquisa concebe a linguagem, as práticas e as
coisas como inseparáveis, pois procura trabalhar com a vivência, com a experiência, com o dia a dia,
com a compreensão das estruturas e instituições como resultantes da ação humana, tais como, a
prática de bullying no contexto escolar.
André (1995, p. 17) define pesquisa qualitativa como “o estudo do fenômeno em seu acontecer
natural”, levando em consideração todos os componentes de uma situação em suas interações e
influências recíprocas. Isso endossa a importância da pesquisa qualitativa para o estudo de
representação discursiva e social de alunos de ensino médio que sofrem ou sofreram bullying.
Nesse caso, Deslandes (1994), ao professar os pensamentos de Lévi-Strauss, argumenta que “numa
ciência onde o observador é da mesma natureza que o objeto, o observador, ele mesmo, é uma
parte de sua observação”. Deslandes deixa clara a existência de uma identidade entre sujeito e
objeto, pois “a pesquisa nessa área lida com seres humanos que, por razões culturais, de classe, de
faixa etária, ou por qualquer outro motivo, têm um substrato comum de identidade com o
investigador, que os torna solidariamente imbricados e comprometidos” (Deslandes, 1994, p. 14).
Afirmar que o pesquisador é neutro dentro desse contexto de pesquisa é negar a capacidade
humana que o retrata em seu percurso diário. Sua ideologia está presente em suas ações. Dessa
forma, o olhar que se dá ao objeto veicula interesse e visões de mundo, historicamente construídos
pelos atores sociais, participantes e pesquisador, considerados, neste trabalho, como colaboradores.
O trabalho de investigação pautado na pesquisa qualitativa promove um grande debate na academia
acerca de validade e de controle de variáveis, pois parece começar, segundo Denzin & Lincoln (2006,
389), “pelo distanciamento das narrativas e dos paradigmas únicos, de maior abrangência,
ontológicos, epistemológicos e metodológicos”. Esse distanciamento ocorre porque alguns
pesquisadores que trabalham com a pesquisa qualitativa acreditam em uma política de libertação.
Assim, procuram estudar o mundo a partir da perspectiva dos indivíduos ou dos grupos que foram
marcados pelas forças ideológicas, econômicas e políticas de uma sociedade ou de um momento
histórico (Denzin & Lincoln, 2006, p. 390).
Diante desse contexto, Denzin & Lincoln (2006, p. 389) esclarecem que os praticantes da pesquisa
qualitativa “são suscetíveis ao valor da abordagem de múltiplos métodos, tendo um compromisso
com a perspectiva naturalista e a compreensão interpretativa da experiência humana”, por isso ela é
definida por uma série de tensões e contradições. Afirmam os dois autores (p. 391) que, no presente,
a pesquisa qualitativa continua com quatro pontos principais em discussão: primeiro, “o pesquisador
qualitativo não é um observador objetivo, oficial, politicamente neutro, que está fora ou acima do
texto”. Segundo, os estudos de Bruner (1993, p. 1) asseveram que “o pesquisador qualitativo tem

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uma posição histórica e situa-se localmente [como] um [observador] extremamente humano”.


Terceiro, ainda, a partir das discussões de Bruner, veem que o “significado é plural, aberto e a
política perpassa todo relato”. Quarto, “uma maneira correta de conceituar a investigação qualitativa
é como um projeto cívico, participativo, colaborativo, que faz com que o pesquisador e os
pesquisados envolvam-se em um diálogo moral contínuo”.
Nessa perspectiva, Bauer & Allum (2003, p. 19) defendem a necessidade de o pesquisador distinguir
quatro dimensões que descrevem o processo de pesquisa.
Primeiro, é necessário o delineamento da pesquisa de acordo com seus princípios estratégicos.
Segundo, há os métodos de coleta de dados, tais como, a observação, a entrevista e a busca por
documentos. Terceiro, há os tratamentos analíticos dos dados, tais como, a análise de conteúdo,
a análise retórica, a análise de discurso e a análise estatística. Finalmente, os interesses do
conhecimento referem-se à classificação de Habermas sobre o controle, a construção de
consenso e a emancipação e “empoderamento”.
Primeiro, o delineamento da pesquisa perpassa a descritivo/interpretativa. Segundo, o método de
coleta é questionário com questões fechadas e abertas, por ora usadas apenas as questões abertas.
Terceiro, os dados são tratados sob o olhar da Análise de Discurso. Quarto, os interesses em todo
esse conhecimento referem-se às categorias teóricas: discurso, poder/saber/verdade e
normatização. Após a conclusão da pesquisa, há o retorno para a comunidade que participou da
pesquisa. Neste trabalho, especificamente, a comunidade será contemplada com palestras de
psicólogos e com ações diretas com os alunos para mitigar a presença de bullying no contexto
escolar.

3.1 O corpus
Este trabalho apresenta o recorte de uma pesquisa que está sendo realizada em cinco escolas de
ensino médio no estado de Mato Grosso ( uma escola em Sinop, uma escola em Pontes e Lacerda,
uma escola em Santo Antonio de Leveger e três escolas em Cuiabá). Foram selecionados os textos
produzidos pelos alunos do questionário aberto apenas de uma das escolas que se localiza em
Cuiabá. Assim, pôde-se observar os discursos que emergem das práticas discursivas dos estudantes
que sofreram ou sofrem bullying no contexto desta escola.
O projeto de pesquisa está registrado no Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE: 60165016.
0.0000.5165|) com o termo de autorização e de consentimento aprovado, encontra-se em
andamento desde agosto de 2016 e encerrará em agosto de 2018. Antes de aplicar o questionário,
foram lidos os termos com o respectivo objetivo da pesquisa, bem como a explicação quanto à
utilização dos dados gerados.

3.2 Procedimentos
Após a aplicação de um questionário com perguntas fechadas e duas abertas, apresentadas a seguir
somente as perguntas abertas porque são as de interesse neste trabalho.
1.Você já sofreu ou viu alguém sofrer Bullying na escola? Relate o ocorrido.
2.Você tem alguma sugestão para acabar com Bullying?
Escolheram-se os textos que mais representavam o universo do contexto por ora estudado,
separando-os pelas categorias mais recorrentes nas vozes dos alunos.
Em seguida, os textos foram transcritos sem identificação e em sua originalidade, sem efetivar
quaisquer alterações, sejam de norma, sejam de conteúdo.

3.3 Participantes

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Os participantes são 480 alunos de Ensino Médio do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de
Mato Grosso – Campus Cuiabá Bela Vista (IFMT), na faixa etária entre 16 e 18 anos, em sua maioria,
pertencentes à classe média.

3.4 Análise de dados


Para analisar as práticas discursivas de ocorrência de bullying em contexto escolar, utilizou-se a AD
proposta por Foucault (2008), a partir das categorias teóricas: discurso, poder/saber/verdade e
normatização. O presente estudo tem a finalidade de analisar as práticas discursivas dos estudantes
que sofreram ou sofrem o bullying na escola e os efeitos de sentido produzidos pelos discursos que
humilham o outro por conta das diferenças. São essas as questões que norteiam a identificação dos
sentimentos de aversão, rejeição e exclusão.

4. Analisando os dados

A referida análise partiu do objetivo da pesquisa, identificar e analisar as ocorrências de bullying, a


partir das práticas discursivas dos estudantes que o sofreram ou o sofrem no contexto da escola.
Procurou-se confrontar os diálogos entre teóricos e o que a literatura trata a respeito do tema, em
busca das suas correlações. Assim, pôde-se constatar que a prática de bullying relacionada à
aparência física, classe social e sexualidade são as mais recorrentes entre os adolescentes.
As práticas discursivas desses alunos nos apontam a existência de uma vontade de verdade que tem
como suporte as instituições que fomentam e disseminam tais conceitos para alimentar um sistema
que tem por finalidade a exclusão. Essa constatação vem ao encontro do que aponta Foucault (2011),
pois a vontade de verdade foi um dos sistemas de exclusão mais enfatizado por esse autor, uma vez
que tem como apoio as instituições e, através de um conjunto de práticas, dentre elas a pedagogia,
os sistemas de livros, as bibliotecas, as sociedades antigas e os laboratórios de hoje reforçam e
reconduzem esses sistemas simultaneamente.
Vê-se, a partir dos enunciados, um ritual que determina propriedades singulares e papéis
preestabelecidos para os sujeitos que falam, seja no discurso racista, no discurso elitista, no discurso
de padrão de beleza ou no discurso homofóbico, eles possuem a função de produzir, conservar e
distribuir esses discursos (Foucault, 2008). Assim, apresentamos a seguir o quadro 1 que resume as
categorias discursivas presentes nos discursos dos alunos:

Quadro 1 – Resultado parcial dos questionários aplicados com questões fechadas e abertas

Tipos de discursos Ocorrências


Discurso de 145
padrão de beleza
Discurso 115
homofóbico
Discurso racista 103
Discurso elitista 64
Outros 53

A partir dos dados acima, colocou-se como foco para análise das práticas discursivas a questão: Você
já sofreu ou viu alguém sofrer Bullying na escola? Relate o ocorrido. Foram escolhidos os textos que
mais representavam o universo do contexto por ora estudado, separando-os pelas categorias mais
recorrentes nas vozes dos alunos. Vejamos os excertos abaixo:

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Excerto 1
Eu já sofri bullying. Sempre fui um pouco acima do peso e isso fez com que alguns alunos da escola
começaram a inventar apelidos de mal gosto e isso acabou me deixando um pouco mal. Tenho às
vezes alguns distúrbios alimentares e nunca confio em mim mesmo.

Excerto 2
Já vi minha irmã sofrer bullying. Por ser gordinha e porque usava tampão, e com isso as crianças
chamavam ela de pirata, de bujão, de tantas coisas que ela chegava chorando em casa falando que
não iria mais, nisso ela ficou 2 meses sem ir pra aula.

Chama-nos a atenção nas falas acima, a questão relacionada ao padrão de beleza imposto,
atualmente, por diversos meios de comunicação: revistas, jornais, programas de televisão, rádio,
cinema, Internet e também nas relações cotidianas. Percebe-se em nossa sociedade, um interesse
exacerbado de homens e mulheres em busca do “corpo ideal”. O que marca a diferença, neste caso,
é o fato das vítimas estarem acima do peso. Os agressores assimilam o discurso, cujo sentido que se
constrói sobre determinado padrão de beleza, é o de que ser belo significa ser magro e que o
indivíduo que foge a esse padrão merece ser humilhado. Esses discursos passam ter um valor de
verdade sobre o que é ser belo.
Por outro lado, observa-se no excerto abaixo, que há um limite também para a magreza. A vítima,
nesse caso, era humilhada por ser muito magra e alta, ou seja, o padrão ideal estabelece também
um limite para a magreza. Vejamos:

Excerto 3
Fazem bullying comigo quando eu era mais nova, porque eu era muito magra e alta daí me
chamavam de vários apelidos, perna longa, e sempre faziam mesmo quando eu pedia para parar.
Diziam que era brincadeira, mas eu não achava isso nem um pouco legal.

Pode-se constatar que estar fora do padrão normativo em relação ao peso, muito gordo ou muito
magro, estabelece uma forma de desigualdade que coloca o outro em uma posição inferior. A
afirmação por parte dos agressores que era uma ”brincadeira” é uma forma de legitimar ou
naturalizar a violência corroborando com a definição de Bordieu e Passeron (1975) sobre o conceito
de violência simbólica como uma forma de violência que se expressa de forma dissimulada.
São construídos discursos normativos sobre o corpo. Foucault (2008) explica que há uma ordem no
discurso e para entrar nela há certas exigências, dentre as quais quatro regras são destacadas pelo
autor: os rituais da palavra, as sociedades do discurso, os grupos doutrinários e as apropriações
sociais, pois existe um ritual que determina propriedades singulares e papéis preestabelecidos para
os sujeitos que falam. Assim, para que o controle funcione, é preciso uma “Sociedade do Discurso”
que carregue a função de produzir, conservar e distribuir os discursos de acordo com as regras
estritas. Nos excertos abaixo temos o bullying de cunho racial:

Excerto 4
Nunca sofri, não que eu me lembre, mas várias vezes vi pessoas olhando feio para pessoas com pele
escura e até mesmo negros.
Excerto 5
Maltrataram um colega por conta da sua raça/cor.
Excerto 6

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Sim. Devido a minha característica física, principalmente, no que diz respeito ao meu cabelo e nariz,
muitos “colegas de classe” não me deixavam concentrar na sala de aulaao som de apelidos
acompanhados de objetos atirado na minha pessoa pelos mesmos.
Pode-se perceber que, embora haja uma luta contínua para eliminar ou pelo menos mitigar os
conflitos raciais na nossa sociedade, os reflexos dessa desigualdade refletem na escola. A cor da pele,
o tipo de cabelo, o formato do nariz que caracterizam a raça negra, serve de pano de fundo para
marcar a desigualdade. Os agressores se colocam na condição de superioridade por conta da cor da
pele mais clara em relação aos outros de pele escura. Esses discursos de inferioridade das pessoas de
pele escura foram historicamente construídos. As condições históricas de construção dos discursos
sobre os negros como raça inferior tem sua origem no sistema escravocrata que fez parte da nossa
história, de forma que esse grupo, de maneira geral, foi rebaixado à categoria de “mercadoria” e
mesmo de “coisa”, num processo de “coisificação” que atingiu profundamente os negros e, mesmo
com o passar dos anos, essa visão não foi abolida da realidade social na contemporaneidade.
O excerto abaixo marca a presença do bullying homofóbico:

Excerto 7
Já vi alguém sofrer bullying na escola por conta da sua opção sexual.

O bullying homofóbico caracteriza-se como um dos problemas mais complexos na sociedade atual.
Conforme Borillo (2010), a homofobia é uma prática que está arraigada na nossa sociedade e
configura-se como uma forma de exclusão legitimada por instituições no campo religioso,
educacional, jurídico e social, constituída dentro de uma lógica perversa sustentada por discursos
historicamente construídos. Uma pesquisa realizada em 2009 pela Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) apontou que, no Brasil, 87%
da comunidade escolar – sejam alunos, pais, professores ou servidores – têm algum grau de
preconceito contra homossexuais (UNESCO, 2011). Ainda hoje, vivenciamos casais de gays sofrerem
violência física, e muitas vezes, essa violência parte de próprios familiares.
Nos excertos abaixo, percebe-se também o bullying por problemas físicos, poder aquisitivo e por
vestimenta que caracteriza o caipira, como se a pessoa pudesse escolher somente qualidades e fosse
proibida de usar a vestimenta que se sente bem, conforme segue:

Excerto 8
Quando mais nova, eu tinha um problema na formação nas pernas, assim não me permitiam fazer
nenhum exercício físico, assim meus colegas riam de mim, e colocavam apelidos maldozos.

Excerto 9
Sim, nesse ano vi alguns meninos da sala querendo crescer emcima de outros só porque veio do
interior e vestia bota e fivela...
Outra situação são zoeiras nas redes sociais que houve ano passado onde falaram dos dentes de uma
caloura e mentiram sobre um professor.

Excerto 10
Sim com uma amiga estavam agredindo-a verbalmente apenas porque não tinha um celular com
redes sociais, achei muito besta o que estavam fazendo e acabei entrando na conversa e defendendo
minha amiga aí elas pararam.

Essas falas relacionam agressão, discriminação por fatores diversos e que marcam as diferenças por
questões relacionadas problemas físicos, diferenças geográficas, classe social e poder aquisitivo que

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estão permeando o cotidiano escolar. Nesses momentos, vêm à tona aspectos da pessoa como, por
exemplo, a situação financeira das famílias, sendo utilizada em alguns momentos como motivos para
agressão e mesmo para diferenciar uns dos outros.
A relação da posição do sujeito com os lugares institucionais, conforme explica Foucault (2008), é
que define o sujeito, ou seja, o lugar de onde fala, entendendo lugar não no sentido geográfico, mas
como um espaço em que se implicam mutuamente as relações de saber/poder/verdade (Foucault,
2008).
O lugar discursivo de onde os sujeitos falam remete a duas situações, ou seja, temos o sujeito que
pratica o bullying na escola e o sujeito que o sofre. O lugar social de onde os estudantes que sofrem
o bullying falam não é um lugar de empoderamento, mas de fragilidades, já que como adolescentes
estão em um momento de formação da personalidade e, por isso, internalizam facilmente os
discursos sobre padrões estabelecidos pela mídia e pela sociedade em geral como o ideal, o que faz
eles se sentirem à margem de outros grupos. Isso se constata nos excertos abaixo:

Excerto 12
Eu já sofri bullying durante o ensino médio. Eu era excluído e as pessoas não gostavam de ficar perto
de mim e quando eu chegava perto delas, elas se retiravam ou fazião que eu saísse. Isso começou
porque um dia de educação física, eu avia esquecido de passar desodorante e devido a isso fiquei com
um odor um pouco forte. Por causa disso eu sofri bullying por quase um ano.
Depois disso não conseguir fazer amigos com facilidade. Atualmente não sofro mais bullying , sofro
apenas as conseqüências.

Excerto 13
Já sofri durante todo meu ensino fundamental. Tive que fazer acompanhammento com psicólogo. O
tratamento com o psicologo juntamente com apoio de calmante.
Sento-me rejeitado dentro da sala de aula, queria até sair da escola, algumas pessoas fazem com que
outras se afastem de mim, o motivo não sei.
Recebo agressões verbais, e as pessoas (alguns colegas de sala) só ficam comigo, quando precisam de
algo.
Pode-se perceber que as práticas discursivas dos participantes desta pesquisa se materializam em
situações humilhantes que se traduzem em angústia e produzem um efeito de sentido de
autodesvalorização que afeta a autoestima e provoca sofrimento psíquico que pode trazer
consequências graves.
Conclusões
Com este estudo, pôde-se comprovar que vivemos em uma sociedade normalizadora. As vítimas do
bullying são geralmente descritas como pessoas que apresentam alguma diferença em relação ao
grupo, como uma característica física, ou portadora de alguma limitação física ou mental, não possuir
objetos de consumo que indicam status socioeconômico superior e estar fora do padrão
heteronormativo.
Nesses relatos, percebe-se que essas formas de violência trazem um prejuízo emocional e psicológico
tão ou mais grave quanto à violência física e devem ser combatidas na escola com a mesma força
que qualquer outro tipo de violência.
Percebe-se uma relação de poder/saber que se materializa nas práticas discursivas dos estudantes
que praticam o bullying como discursos de verdade sobre padrões pré-estabelecidos. Os que
humilham os seus pares assumem a posição de sujeitos “normais” enquanto as vítimas, que estão no
lugar do humilhado, são os “anormais”, ou seja, muito magros, muitos gordos, pele escura, defeitos
físicos, sexualidade, odores, baixo poder aquisitivo. Sendo assim, pode-se dizer que os discursos que

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resultam na prática do bullying se inscrevem em uma formação discursiva que produz um efeito de
sentido em que se reconhecem as diferenças e promovem a exclusão de indivíduos e/ou grupos e, de
certa forma, naturalizam os atos de humilhação. Conforme explica Foucault (2011), os discursos que
sustentam essa ideia operam de uma forma estratégica com mecanismos de controle e de
normatização.
A constatação desse estudo é a de que a discriminação é o pano de fundo do bullying entre pares.
Esse é um dos maiores desafios na luta pelos direitos humanos e um problema que acreditamos ser
de todos. É possível que as atitudes discriminatórias das crianças e jovens sejam imitadas e
aprendidas no mundo adulto, no ambiente em que eles se desenvolvem onde vivenciam situações de
abuso de poder e de desigualdades.
Nesse sentido, acreditamos que é preciso pensar em um modelo educacional que deixe de
reproduzir a lógica de exclusão, pois o bullying no contexto da escola compromete a inclusão
educacional e a qualidade de ensino, já que os conflitos referentes às diferenças ganham contornos
mais expressivos no espaço da escola. É no ambiente escolar, depois do ambiente familiar, que
ocorre o processo mais importante de socialização, sendo também um lugar de embates e
enfrentamentos em relação à aceitação das diferenças. O ambiente escolar deve buscar alternativas
para que deixe de ser reprodutor de injustiças para ser um espaço de transformação.
As sugestões dos alunos pesquisados para acabar com o bullying na escola são as mais variadas. Vão
desde punições mais severas para os que o praticam até a promoção de debates, rodas de conversas,
reuniões com os pais, palestras e jogos interativos.
Enfatizamos que o papel da escola na luta contra a intolerância é fundamental e diz respeito a todos
os cidadãos.
Várias podem ser as limitações deste estudo: poderia ter se expandido mais com a identificação dos
alunos que sofreram o bullying em contexto escolar para, em seguida, solicitar uma narrativa de vida
deles para compreender melhor o fenômeno. Com as questões abertas, foi possível identificar as
ocorrências de bullying, mas não a compreensão mais verticalizada da ocorrência do fenômeno. Ao
aplicar o questionário, os alunos não foram avisados, assim teve-se que voltar várias vezes na sala de
aula para obter o questionário do aluno que não estava presente. Pode ser que ao dar o retorno para
a comunidade escolar, não haja espaço físico suficiente para as palavras com a psicóloga, uma vez
que as escolas públicas de Mato grosso, em sua maioria, não possuem auditório.

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Quadros de experiência pré-adolescente convocados por Poema


da Violência

Judite Zamith-Cruz1, Alice Lopes1


1Centro de Investigação em Educação Universidade do Minho, Portugal. juditezc@ie.uminho.pt;
lopes.alice@hotmail.com

Resumo. O recreio favorece a elaboração de significados sobre experiências de violência e bullying).


Debateram-se representações simbólicas e visuais de pré-adolescentes, que recriaram O Poema da
Violência de Bertolt Brecht. O objetivo geral foi fomentar um saber crítico sobre o que afete jovens, sendo
discutida a comunicação oral e visual. Tiveram-se dois objetivos específicos: (1) captar o contexto escolar de
pré-adolescência; (2) analisar o discurso com textos mistos (desenho e escrita) de jovens, mediante um
guião, que separou desenhos visuais (de espectadores) e não visuais (de intervenientes), contextos e figuras
humanas caracterizadas. O estudo realizou-se numa turma de Ensino Básico (Território de Intervenção
Prioritário). Os desenhos com balões de fala manifestam queixas mútuas, na perspetiva de género.
Registaram-se as sequências de imagens, com/sem finalização dos enredos de bullying, em que pares se
agridem, evidenciada coação, protesto, ameaça, revolta e vingança.
Palavras-chave: Recreio; Pré-adolescentes; Bullying; Representações visuais.

Visual Representations of pre-teens who performed a visual creation of the Poem of Violence
Abstract. The playground favors the development of meanings about experiences of violence and bullying.
We discussed symbolic and visual representations of pre-teens who performed a visual creation of the Poem
of Violence by Bertolt Brecht. The main objective was to foster a critical knowledge about what affects
young people, being discussed oral and visual communication. The specific objectives were two: (1) to
capture the school context for pre-adolescence; (2) to analyze the speech with mixed texts (drawing and
writing) of young people, with a script, which separated visual drawings (observer) and non-visual drawings
(of actors), contexts and characterized human figures. The study was conducted in a class of Basic Education
(Territory of Priority Intervention). The drawings with speech bubbles manifest multiple complaints, the
gender perspective. The sequences of images were collected, with/without finalizing the plots of bullying.
Classmates attack each other, with an expression of duress, protest, threat, anger and revenge.
Keywords: Playground; Pre-teens; Bullying; Visual representations.

1. Introdução

A palavra “obedecer” tem uma conotação tradicional e antiquada: Cala-te!; - Não faças isto!; - Não
mexas aí!; - Isso não se faz!
Na educação autoritária, a transmissão é o processo que conduz à obediência, em que se aprende
através dos que antecedem em idade, partindo da premissa de que os pais e os professores “sabem
do que se necessita” aprender.
Os discursos educativos podem (ou não) ser centrados nessa perspetiva dominante até meados dos
anos sessenta do século passado, quando se desenrolavam experiências educativas, “libertárias” e
artísticas (Le Mouvement de l'École moderne, Summerhill School, Reggio Emilia…).
Todavia, persistem ainda modos de educar para obedecer (Maouri, 2005, 2008), não tão excessivos
no autoritarismo e, nessa base não consensual, o condicionamento educativo é tido por “vertical”. É
aprendido na dependência e submissão, levando à revolta.
Mas tal como o amor, a autonomia não se transmite, mas sobretudo aprende-se, na via da relação
recíproca ou de troca, entre modalidades experienciadas em que se educa sem punir (Gordon, 2003;

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Coenen, 2004). Por conseguinte, insiste-se que é possível ter um mundo pessoal e dar-se regras
pessoais, quando os educadores são atentos e recetivos, afetuosos, sem deixarem de ser
supervisores. Na educação para a autonomia se defende que a transcendência da autoridade não
tem que ser substituída por outra “verticalidade”. As aprendizagens são ativas e as escolhas são
individuais desde a infância, mais acompanhada. No regime participativo, pode definir-se a
autonomia por educação democrática, em que o lugar conferido à obediência heteronómica é
menor, tendo mais sentido fornecer autonomia na segurança, num ambiente “favorável” à viagem
personalizada e não uma viagem organizada (Signy, 2010, p. 63). A segurança coloca-se no velar para
que a criança/jovem não seja confrontada com demasiados riscos com o pretexto de partir à
autodescoberta, através do mundo arriscado. Já um ambiente favorável leva o educando a descobrir
o sentido das regras e, dentro destas, as que se adequam melhor a si próprio, num referencial
educativo proposto, com limites temporais e espaciais: «O que quero e quando o quero… posso ir…».
A visibilidade do bullying pode ampliar-se por ameaça, insulto, dizer mal de outro/s, perseguir,
agredir, excluir e desrespeitar. “Opressão” é a primeira palavra abrangente que nos ocorre para um
sinónimo de coação entre pares, que alude ao que a pessoa experimenta negativamente, por efeito
de crueldade por parte de pessoa/s e grupos com poder.
Apresenta-se um trabalho pedagógico e o seu relato, em que não foi antecipado o que veio a ser
representado visualmente, em 2016: retratos de bullying, no recreio (Smith & Sharp, 1994). Os
estudantes eram oriundos de meios limítrofes à cidade de Braga.
Para a análise de discurso (Iñiguez-Rueda, 2007), efetuou-se a leitura silenciosa e oral de um poema -
O Poema da Violência, de Bertolt Brecht (1898-1956): Do rio que tudo arrasta / Se diz que é violento /
Mas ninguém diz violentas / As margens que o comprimem. Seguiu-se o debate sobre a condição
humana de opressão. Propôs-se a recriação de narrativas visuais.
Tiveram-se os seguintes objetivos específicos: (1) captar os contextos de vida de pré-adolescência, na
sua (esperada) rejeição do controlo, norma e disciplina; (2) analisar o discurso (Iñiguez-Rueda, 2007)
nos textos mistos (visuais), sendo criado um guião de trabalho; (3) diminuir o hiato entre mentes de
adultos e de jovens, ampliando a mudança dos mais velhos, e atendendo a que “a atividade da mão
na arte desenvolve a mente” (Kellogg, 1979, p. 5), uma valorização artística.
Na adolescência, a identidade vem a ser construída por oposição, na medida em que para que o/a
jovem se defina, tenha que se opor a algo ou a alguém?
Sobre o grupo etário que iria desenvolver um projeto visual (11-12 anos), considerava-se a etapa de
desenvolvimento, nos faria ter em atenção diferenças de género.
Brent Wilson (1997, p. 81) explicitou que a interpretação de objetos e de eventos seja uma forma de
“arte”, quando “de 1-2 anos a 15 anos, aproximadamente, os adultos (e crianças que são
influenciadas por eles) classificam de arte, porque olham essas produções a funcionarem, com
frequência, na forma das coisas concebidas e criadas por adultos”. Como o afirmou John Berger
(1972, p. 7), também em relação aos mais pequenos, “o olhar vem antes das palavras”. Antes de
escrever, o ser humano desenha e pinta contextos e figuras, recorrendo a diversos tipos de
linguagem que se vem a tornar “realistas”, “(pós)esquemáticas” e “ideográficas”.
O que se vê nas representações visuais dos pré-adolescentes? Vêem-se claramente os desenhos que
são “visuais”, em que se amplia a simbolização com a idade, o aumento de pormenores. Por
conseguinte, na fase piagetiana das operações abstratas, evidencia-se além do pseudo-naturalismo,
a autocrítica, com o fim da “espontaneidade”, na atividade plástico-visual. Acresce dizer, sobre o
nível etário, ter sido por observação direta, que George-Henri Luquet (1927) se tornou o primeiro
investigador a identificar a fase de realismo visual (ou realismo nascente de Lowenfeld e Brittain),
depois dos 12 anos ou, por vezes, desde os 8 ou 9 anos. A intencionalidade dos mais novos impera,
ainda que com submissão à perspetiva, de forma mais ou menos “feliz” alcançada, no entendimento
de um adulto.

1867
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Outro relevo foi dado à “arte” dos mais jovens na escola, onde docentes tenderem a perpetuar
imagens “realistas” (no “ensino” de como desenhar algo “bem feito”). Efland (1976) esclareceu que a
estereotipia seja “a arte da escola”, porquanto o estilo resulte internacional, com base em temas
convencionais, figuras de livros escolares, entre outros modelos. Como contrastar então um desenho
“visual” (objetivo, realista) com o desenho “não visual”? Herbert Read (1893-1968) focou o “não
visual”, no quadro estético (Read, 2001, p. 8), acima do âmbito ótico, no espaço subjetivo. O desenho
“visual” atende a que há um espectador/autor, aparentando o trabalho de arte ter sido inspirado
pelo estímulo (na situação, um poema) e como se decorresse num palco. No modo “não visual” é
apreendida a experiência subjetiva e cultural do/a autor/a, que interpreta a condição de violência,
com ressonância emocional marcada em si mesmo. Os significados passavam a ser tomados no
processo sequencial das imagens em narrativas gráficas. Nessa nova perspetiva cruzada parece ser
concebível tanto o que é visto (a visão descritiva), como o modo como algo é visto, o que se alia à
mais recente noção de “abrangência” dos modos subjetivos de ver.

2. Metodologia

A mais antiga abordagem social em Etnometodologia enquadrou uma forma de “intertextualidade”,


encontrada nas teorias de Bakhtin e Kristeva. Um discurso recorre a outros discursos “para o
compreender através da multiplicidade de formas que se podem nele articular” (Rose, 2005, p. 136),
o que vai mais além da Literatura Comparada.
Neste artigo o relevo é conferido à “segunda vertente” de Análise de Discurso (Potter & Wetherell,
1987, 1994), em que se enforma a autoridade e o domínio (de saber) instituído.
A investigação em Estudo de Caso refere-se a um caso documentado (Yin, 1984; cit. por R. Tesch,
1990: 64), sendo mais significativa a sua qualidade (detalhada), em detrimento da quantidade de
textos mistos (Tonkiss, 1998: 253).
Introduzindo o “método”, com Michel Foucault (1926-1984), importa não deixarmos de colocar entre
parêntesis o que se sabe ou julgue saber. Na presente investigação qualitativa parte-se de ouvir os
estudantes, de ler, ver e significar, para a análise dos textos visuais (Rose, 2005). A descrição, uma
forma centralidade visual, dará lugar à interpretação guiada por cenários numa obra – uma produção
cultural.
Com a Análise Crítica de Discurso (Ibáñez & Íñiguez-Rueda, 1997; Iñiguez-Rueda, 2007) visa-se ainda
“mostrar” como se opera nas práticas quotidianas (habituais, como roteiros diários), desvelando os
processos sociais de dominação/opressão e de exclusão social.
Garfinkel (1967, p. 1) esclareceu o empenho da escrita na sua então inovadora proposta de pesquisa
social (Etnometodologia), quando explicitou (o implícito), em que não distinga entre o dizer e o fazer:
“nas atividades realizadas pelos membros [competentes da comunidade], para produzirem e
manejarem as situações da sua vida organizada no dia-a-dia, se sabem fazer [reflexividade], sabem
comunicar [v. accountability]”. Noutros termos associados, existir é agir, quando o sentido do ator
social se orienta por escrever ou desenhar e fazer pensar.
Acresce dizer, que segundo uma regra proposta por Jonathan Potter (1996, pp. 138-139), também
“assimilamos” facilmente um discurso (verbal, o “nosso”), mas temos dificuldade em o acomodar
(em perspetivas diversas) e em integrar o discurso contrário (visual, o “deles e delas”), estranho à
crítica sistematizada de roteiros desenhados.

2.1. Amostra

1868
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O estudo exploratório realizou-se numa turma de instituição de Ensino Básico, denominada de TEIP,
por atender crianças e jovens com problemáticas associadas a risco/perigo, devido a condições
ambientais (familiares e sociais). A turma em questão era constituída por 17 estudantes oriundos de
meios limítrofes à cidade de Braga. Duas raparigas fixaram momentos de bullying no recreio, sendo
essas duas narrativas visuais a apresentam-se adiante. Os nomes das figuras animadas são fictícios,
tal como os de intervenientes.

2.2. Procedimento

Uma primeira fase de discussão do projeto em colaboração decorreu com a participação da autora e
de duas docentes, que ponderaram e programaram as suas propostas educativas e atividades.
Ambas contribuíram com conhecimentos de práticas integradas, com atenção à gestão do tempo e
aos recursos materiais utilizados. Na sala de 2º ciclo, foi discriminado um acontecimento jornalístico
(na precisão da notícia tal como a hora, o local da ocorrência) de um acontecimento sugerido na
forma metafórica, no poema não explícito de Bertolt Brecht, acima enunciado. Efetuou-se a leitura
silenciosa e oral do poema, não comentado. Depois foram criadas as obras em que as metáforas
visuais destacassem “situações do conhecimento e/ou de experiência dos pré-adolescentes”,
esperadas alusivas ao poema.

2.3. Instrumento

O instrumento para a análise de textos visuais foi um guião (Zamith-Cruz et al., 2015), discriminador
dos seguintes fatores:
- Género (M ou F) e Nº de ordem, eliminado o nome de autor/a.
- Conteúdo/Título – Síntese da ocorrência focada na mensagem com base nas palavras da criança
(categorias in vivo).
Descrição da narrativa visual - Início, desenvolvimento e finalização, incluindo a síntese de cenário(s)
e personagens; cenário exterior/interior?; Elementos naturais, utilitários e/ou simbólicos no
desenho?
Interpretação do desenho:
- Situação internalizada pelo/a autor/a?
- Ação/interação? Quem age na narrativa visual? Quem reage?
- Que inferência/s pode/m retirar-se da finalização – a moral da história?
- O desenho é “visual” ou o desenho é “não visual”?
- Género (M ou F) e Nº de ordem, eliminado o nome de aluno/a.
- Conteúdo/Título – Síntese da ocorrência, focada na mensagem, com base nas palavras do/a jovem
(categorias in vivo).

3. Análise de discurso

Nessa análise da comunicação visual, identificaram-se palavras (in vivo nos títulos) e temas-chave
(nos resumos adiante explicitados), para unidades de significado dos 17 textos mistos.
Segue-se uma explicitação temática, nos seguintes termos elaborada:

1869
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M1 – Cão faz represália vingativa por viver aprisionado: Ação de fuga de um cão da casota, em que
destrói por vingança o jardim, devido a privarem-no de liberdade. No texto visual, pode ler-se o que
o cão diz: «vou - me embora… vou dar cabo do jardim.».
M2 – Privado de ver procissão por ser pequeno: Uma figura de rapaz encontra-se entalada e com
limitação da visão do ritual religioso, junto de adultos apinhados na rua. Pode ler-se o comentário:
«isto parece ‘as pedras’ a apertarem-me.»
M3 – Trânsito em hora de ponta ou descongestionado: O rapaz “vê” pressão (stressante) na
intensificação do trânsito automóvel, por comparação com a mesma estrada sem carros (adiante
debatido).
M4 – Ameaça de morte em casa: No aperto e aflição, no mal-estar causado por regras
sociofamiliares, um rapaz anseia sair de casa, o que, na inviabilidade, leva à ameaça de se matar
(«quero sair se não [saio] mato-me.») (adiante debatido).
M5 – Preguiça, por normas fracassadas na educação de pais: A comunicação entre os pais do
preguiçoso e a culpabilização deles coloca-se, na medida em que o jovem retratado não foi ensinado
a trabalhar, quando o pai o acusa de não ajudar em tarefas agrícolas.
F6 - Cala-te! Cala-te!: Coação na expressão verbal, no diálogo entre mãe e filha, revelador da reação
de tristeza desta por não poder falar (adiante debatido).
F7 – Oposição consumada à escolha do noivo por mãe: Imposição de um marido velho à filha e
rejeição desta, que o troca, fugindo e casando com outro, novo, seguido do feliz regresso a casa.
F8 – Não poder fazer nada com a mãe ou poder fazer tudo com a amiga: Quando a menina não pode
fazer “nada” em casa, muda-se para perto da amiga (adiante debatido).
F9 – Doença impeditiva de brincar por norma imposta: Doente e sozinha, a rapariga permanece na
cama, onde comenta a circunstância: «quem me dera poder ir lá para fora brincar. Mas como estou
doente não posso.».
F10 – Bufar um balão: Uma menina sopra um balão que acaba por rebentar - «tanto que bufei que
rebentou [o balão].».
F11 – Ponteiro com que a professora bate por regra quebrada de silêncio: A docente bate («toma so
[só] por estares a falar para o lado», dentro de sala de aula, com aluno/as paralisados/as nas
carteiras.
F12 – Garrafa – Poc!: Por pressão [de açúcar], à garrafa tapada salta a rolha.
F13 – Brinquedos proibidos são alcançados: Reprimenda da mãe pelo uso de brinquedos guardados,
a que a menina acedeu, pedindo a chave de casa à vizinha, em ausência da progenitora.
F14 – Orfanato e morte: Após lamento em “Orfanato”, por falta de visita de pai, a menina morre,
debaixo de comboio.
F15 – Ser má e mentirosa justifica a acusação: Denúncia entendida justa, já que tanto a mãe como o
irmão acusam a rapariga de ser má e mentirosa, o que é reforçado por amigas da escola (sonhada,
em balão de pensamento).
F16 – Violência física por cobardia de rapaz: Uma rapariga que chama nomes [a quem?] é batida por
um rapaz, mas também ela lhe bate, frente a outras colegas, depois de ver a professora a admoestá-
lo e a bater-lhe, vindo ele a ser chamado de cobarde, na perspetiva de uma quarta menina presente.
F17 – Rapazes e raparigas batem-se: Depois de serem perseguidas por dois rapazes, duas meninas
ameaçam agredi-los, fazendo-os chorar.
Posteriormente, efetuou-se uma análise descritiva desses trabalhos.
Apresentam-se dois com os códigos F16 e F17, por serem de duas raparigas, cujos trabalhos foram
aleatoriamente numerados (16 e 17).
As professoras insistiram para que cada estudante realizasse, como em outras ocasiões, um trabalho
“personalizado”, donde não “copiarem”, encontrando-se distantes.

1870
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Em relação à representação identificada F16, o seu conteúdo é sintetizado: uma rapariga, cujo nome
fictício é Ana, “chama nomes” e é batida por um rapaz – Bernardo, mas também lhe bate, durante a
circunstância em que vê a professora Carla fazê-lo, vindo aquele a ser “cobarde”, na perspetiva de
uma quarta menina - Deolinda.

Fig. 1. Desenho F16 – Cobardia (desenho completo).

Segue-se a descrição do desenho F16, cuja análise se segue. Numa base descritiva, são cinco as
situações, no interior da escola. A circunstância ingrata desenrola-se, no recreio, concebido com uma
base de pedras azuladas. A situação aparece disposta em três barras. Na primeira barra, está escrito
que uma rapariga, vestida com bata e com calças (Ana), chama a um rapaz (Bernardo) “seu palerma”
e “seu burro”. Na segunda cena, Bernardo empurra-a para o chão (e aparenta estar a bater-lhe),
dizendo-lhe: “toma não tinhas nada que me chamar nomes”. Ana chora. Na terceira prancha, outra
figura, a professora, com saia (Carla), tem um pau na mão (elemento visual e simbólico). Está pronta
a bater em Bernardo e dirige-se-lhe, nos seguintes termos: “és um atrevido um malcriado”. Na
quarta imagem, é Ana que diz a Bernardo: “toma lá que até agora também me bateste por eu te
chamar nomes”. Por fim, no quinto cenário, uma terceira figura feminina, com saia e de cabelos
compridos (Deolinda), frente a Ana, critica novamente Bernardo, em balão de fala: “agora é que nós
vimos o cobarde que tu és”.

1871
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Sobre o desenho F17, a representação visual, com comentários escritos, ilustra outro conteúdo: a
agressão de duas meninas (Eva e Fernanda) a dois rapazes (Gil e Hélder), que são elas a fazer chorar,
quando anteriormente eram eles a persegui-las.

Fig. 2. Desenho F17 – Bater (desenho completo).

De forma idêntica ao formato de apresentação suprarreferido, a descrição do desenho F17 antecede


a sua análise/interpretação. No desenho F17 retrata-se, num esquema, a agressão física por duas
raparigas a dois rapazes, com a intenção de lhes baterem, por serem (ou se sentirem) perseguidas
por eles.
Observam-se duas imagens em formato de banda. Na primeira, estão colocados de frente dois
rapazes (Gil e Hélder) e duas raparigas, vestidas com saia (Eva e Fernanda). Essas personagens são
claramente definidas pelo estereótipo de roupa e corte de cabelo, associado a género. Uma rapariga
(Eva) comenta: “andam sempre atrás de nós”. Na segunda cena, a outra (Fernanda) sugere à
primeira: “vamos-lhes bater”, tendo cada uma um pau na mão.

4. Conclusão

No conjunto das representações, as figuras de jovens explicitam desejos de fuga, maldades e


mentiras. Nos textos mistos (visuais e escritos) enunciaram-se rebeldias, desavenças de
(co)protagonistas (mães, outros adultos e colegas), com emoções negativas dominantes, incluindo o
menosprezo, o medo, a culpa, a represália/vingança, a cobardia, a preguiça e o desconforto por
apertos físicos.
Em termos de interpretação da produção cultural, distinguiram-se dois desenhos que são conotados
como “agressivos” e “não visuais”. No desenho F16, aprecia-se que ser “cobarde” é o que se chama a
um rapaz, que bate por lhe “chamarem nomes” (“palerma”, “burro”), quando seja agredido por

1872
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professora e por colega, a quem previamente bateu. A ser explorada a narrativa visual
(interpretação), evidencia-se que a professora (Carla) bate no rapaz (Bernardo), com um pau (além
de lhe chamar nomes, “atrevido”, “malcriado”). Vinga-se dele, de forma idêntica a Ana? A finalização
da narrativa visual indica também que a professora (Carla) e a aluna (Ana) devam bater no “cobarde”
(Bernardo), acusado por Ana e Deolinda? Não se vê uma resolução adequada do problema, no
entendimento dado a “cobardia”. A ação é repreensível. No chamar nomes e na interação, Bernardo
empurra para o chão e/ou bate em Ana. No movimento há um momento de dinamismo das figuras –
na segunda cena, na ação figurada «toma não tinhas nada que me chamar nomes». Regista-se a
relação de pares e a docente bate, junta-se na disputa. De uma ação desagradável a situação pode
ser externa à autora (observada) ou interna, se participante na agressão a rapazes.
Por sua vez, no desenho F17, no sentido de finalização para a situação de bullying, observa-se nova
interação de género. Quando a perseguição de raparigas seja entendida por estas “em demasia”,
pode observar-se a tendência à reação contra os rapazes, por vezes, forte (batendo-lhes com um
bastão). No quotidiano, parece ser inviável a resolução do problema de perseguição por via de
violência física, que se representa no exterior – o recreio empedrado na escola, tendo por únicos
elementos de agressão os dois bastões. Por conseguinte, na ação de perseguir, que na visão da
autora parte deles é uma reação da parte delas, uma vez que falam dos colegas, propondo-se usar de
força. Assim, o movimento – dinamismo de figuras encontra-se nas duas raparigas que aparecem na
parte de baixo do desenho, em que diz à outra o seguinte: «vamos-lhes bater.» Essa interação é
conotada por diferença de género que, de desagradável passou à condição de represália, aos olhos
da autora. Possivelmente, a circunstância não é externa, mas ainda comum na escola.
Em termos de considerações finais, elucida-se que o silêncio sobre a obediência e a transmissão das
sociedades ocidentais, situadas depois da industrialização, pelo filósofo francês Jacques Rancière
(2005), são como sintomas, mas sintomas socioculturais em que a pessoa é “convidada” a prostrar-se
“no seu lugar”, lugar já destinado. Nas práticas culturais e sociais correntes, será que não se
tornaram pessoas, cidadãos de direito (Signy, 2009)?
Foi com preconceções que se partiu para uma autoconstrução de ideias de autonomia, ao levar à
aula O Poema da Violência.
As condições de bullying, sem serem precipitadas por visões prévias, além do estímulo metafórico
suscitado por um poema, não se registaram em desenhos de rapazes. Mas a professora chega a ser
implicada na cena de violência retratada.
As docentes entenderam e detetaram, com a autora, as problemáticas de uma orientação para a
obediência, infringida nas imaginações e representações, em ingrata idade de mudança.
A ira, o desgosto, o protesto e a ameaça esclarecem o estímulo emocional negativo de que as duas
jovens partiram, sem reverterem as imagens em emoções positivas (envolvimento, alegria,
inspiração), além da ambição de represália pontuada.
Ainda a escutarmos um escritor português do século XX, Vergílio Ferreira (1959, p. 237), poder-se-á
acompanhar as trajetórias de estudantes de uma interrogação existencial: “De que segredos se faz
uma vida? De que pressões, escolhos, sacrifícios?”
A criação de condições de dialogar sobre episódios e atividades visualmente textualizadas, com vista
a "fixar" identidades sociais na infância, implicou a prévia constatação de condições de exclusão na
cultura predominante (semi)rural. Dito de outro modo, importou-nos sublinhar um diferencial entre
regimes de obediência e autoridade, testemunhados ou conhecidos na cultura regional, em um
Território Educativo de Intervenção Prioritária (escola TEIP) com contrato de autonomia.

6. Referências Bibliográficas

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1875
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Mediação Tecnológica: ferramentas interativas utilizadas no curso


profissionalizante em Manutenção Automotiva

Ilka Márcia Ribeiro de Souza Serra¹, Eliza Flora Muniz Araújo² e Rita de Cassia Tesseroli³

¹Núcleo de Tecnologias para Educação da Universidade Estadual do Maranhão, Brasil.


ilka.tt@gmail.com
²Núcleo de Tecnologias para Educação da Universidade Estadual do Maranhão, Brasil.
eliza.uemanet@gmail.com.
³Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná – IFPR, Brasil.
tesserolirita@gmail.com

Resumo. O avanço das tecnologias tem sido algo evidente no desenvolvimento do processo da
aprendizagem em todos os níveis de ensino. Alunos e professores encontram-se diante de uma sala de aula,
inserida no Ambiente Virtual de Aprendizagem, rico de possibilidades de interações e colaborações on-line.
O trabalho objetiva desenvolver reflexões sobre mediação tecnológica no Curso Técnico em Manutenção
Automotiva, da Universidade Estadual do Maranhão, na perspectiva de exercitar estudos e produção de
conhecimentos no processo ensino-aprendizagem, gerando como resultados, indicadores relevantes para
subsidiar as políticas de formação profissional, notadamente, dos cursos técnicos ofertados na modalidade
a distância. Apresenta um estudo de caso, de abordagem qualitativa, cujo método possibilitou o exame da
realidade concreta, mediante a observação, descrição e análise do Ambiente Virtual de Aprendizagem e
suas ferramentas. Realizou-se entrevistas com os principais sujeitos do processo: alunos, tutor e professor.
Os resultados apontaram diferentes modelos de mediação, os quais implicam em interações.
Palavras-chave: Mediação tecnológica; ambiente virtual de aprendizagem; curso profissionalizante;
modalidade de educação a distância.
Technological Mediation: interactive tools used in the Automotive Maintenance professional course

Abstract. The advancement of technology is something amazing for the development of the learning
process at all levels of education. Students and teachers are facing a new classroom – the Virtual Learning
Environment – rich in possibilities of online interactions and collaborations. The present work aims to
develop reflections on technological mediation in the Technical Course of Automotive Maintenance, of the
State University of Maranhão, in a perspective of exercise studies and production of knowledge in the
teaching-learning process, generating as results, relevant indicators to support professional training policies,
in particular, of the technical courses offered in distance modality. It consists in a case study, with a
qualitative approach, which method allowed the examination of the concrete reality, through observation,
description and analysis of the Virtual Learning Environment and its tools. Interviews were conducted with
the main subjects of the process: students, tutor and teacher. The results showed different models of
mediation, which implies interactions.
Keywords: Technological mediation; virtual learning environment; professional course; distance education
modality.
1 Introdução
Com o aparecimento das tecnologias digitais interativas surgem também diferentes formas de
ensinar e aprender, ou seja, outras maneiras de relação se estabelecem no processo ensino-
aprendizagem, por meio da mediação tecnológica. É evidente que a educação no Brasil vive um
momento de expansão propiciada pelo uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC),
contribuindo para transpor as barreiras geográficas e temporais até então existentes, especialmente,
quando se trata de cursos ofertados na modalidade a distância. Segundo a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB, 1996):
[...] a educação a distância (EaD) é uma atividade pedagógica caracterizada
por um processo de ensino e de aprendizagem realizado com a mediação
docente por meio da utilização de recursos didáticos sistematicamente

1876
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organizados, apresentados em diferentes suportes tecnológicos de


informação e comunicação, os quais podem ser utilizados de forma isolada
ou combinadamente, sem a frequência obrigatória de alunos e professores
(Art. 47, § 3º).
Na EaD as ferramentas interativas geram inúmeras possibilidades de desenvolvimento da
mediação. Essa ação de mediação ocorre entre professores e alunos, por meio dos processos
de comunicação e interação, com o auxílio das mídias e das tecnologias digitais. Logo, cursos
que envolvem a modalidade EaD necessitam inserir em suas propostas educativas, uma
discussão consistente sobre o uso da tecnologia e seus impactos, especialmente no que diz
respeito a dinâmica da significação social do conhecimento. O presente trabalho objetiva
identificar e analisar as formas de mediação adotadas no processo ensino-aprendizagem no
Curso Técnico em Manutenção Automotiva da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA),
por meio do Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), ferramenta que possibilita a
construção compartilhada de conhecimentos, criado a partir da proposição de seu idealizador
Dougiamas (2009). Dentre as suas funcionalidades destaca-se as características de ser um
software livre em ambiente online, desenvolvido com intenção de ser um ambiente de
aprendizagem colaborativa. A UEMA na época da pesquisa utilizava a plataforma Moodle com
a versão 2.8. O AVA vem sendo comumente utilizado de forma ativa como um espaço de
compartilhamento, troca de informações, discussões e construções coletivas, desmistificando
assim, o mito do distanciamento temporal e geográfico na educação mediada pelas
tecnologias. A escolha do tema justifica-se por ser a mediação tecnológica uma estratégia
inovadora em cursos da área técnica. Esses cursos por suas caracteristicas eminentemente
práticas exigiam suas ofertas na modalidade presencial. Dai então, surgiu a inquietação de
conhecer o funcionamento de um curso dessa natureza na modalidade EaD e como ocorre o
processo de mediação com a utlização de ferramentas tecnológicas de forma a facilitar o
processo ensino-aprendizagem.O artigo encontra-se organizado em cinco partes, iniciando-se
pela introdução ao tema da pesquisa. Na segunda parte, segue-se com o marco teórico, cuja
abordagem enfoca, notadamente a mediação tecnológica, numa perspectiva de mudanças de
paradigmas educacionais em função do uso da TIC. Na terceira parte, descreve-se o percurso
metodológico trabalhado na construção da pesquisa, com a apresentação do objeto de estudo
e sua aplicação. Na quarta parte, apresentam-se os procedimentos da coleta e análise dos
dados, mediante pesquisa de natureza qualitativa, realizada com os principais atores do
processo: alunos, professor e tutor do Curso Técnico em Manutenção Automotiva, e
observações no AVA. Por último, apresentam-se as considerações finais, com base no processo
de planejamento, desenvolvimento e análise do objeto em estudo. É oportuno registrar que o
estudo contemplou a análise das ferramentas tecnológicas adotadas como mediadoras no
processo ensino-aprendizagem do curso em referência, em especial, o fórum, por ser o espaço
interativo mais utilizado no curso.
2 Marco Teórico
A oferta de cursos a distância no Brasil cresceu muito nos últimos dez anos, em todos os níveis
de ensino. No âmbito da diversidade de cursos e de instituições formadoras surge também um
conjunto de ferramentas e de profissionais capacitados para estimular a participação dos
aprendizes, ou seja, fazer a mediação da aprendizagem, na perspectiva de atender as
exigências que o processo ensino-aprendizagem requer. No que diz respeito à mediação com o
uso das tecnologias, faz-se oportuno refletir sobre o pensamento de Freire (2007), quando faz
referência ao nosso compromisso com o homem concreto, com a causa da humanização e da
libertação, ou seja, torna-se inevitável abstrair-se da ciência e da tecnologia. Para Freire é por

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meio da “ciência e tecnologia” que as pessoas se instrumentalizam para melhor lutar pela
causa da educação, compreendida assim, como instrumento a serviço da democratização para
formar pessoas participantes, pelas suas vivências comunitárias nos grupos sociais e no
diálogo. Seguindo a mesma linha de pensamento de Freire, Masetto complementa a ideia de
mediação, numa perspectiva mais didática, quando assim coloca:
Por mediação pedagógica entendemos a atitude, o comportamento do
professor que se coloca como um facilitador, incentivador ou motivador da
aprendizagem, que se apresenta com a disposição de ser uma ponte entre o
aprendiz e sua aprendizagem – não uma ponte estática, mas uma ponte
“rolante”, que ativamente colabora para que o aprendiz chegue aos seus
objetivos (Masetto, 2008, p. 144).
Assim, com base em Freire (2007) apreendeu-se que o processo de mediação se dá nas
diferentes formas de comunicação e nas relações que se estabelecem entre os seres humanos,
ou seja, o processo de mediação se constrói a partir da nossa cultura, do nosso trabalho e das
experiências de vida, implicando numa releitura crítica do mundo. A partir de Masetto (2008),
o entendimento de mediação passa por uma relação pedagógica professor – aluno, em ações
conjuntas, no diálogo aberto, de relações de empatia e confiança no aprendiz. No contexto das
mediações tecnológicas aplicadas à educação, o AVA se apresenta como um espaço dinâmico,
possibilitando discussões, troca de experiências e a socialização do conhecimento entre os
participantes. Nesse sentido, Filatro corrobora ao afirmar que esses ambientes “[...] refletem
mais apropriadamente conceitos de ‘de sala de aula on-line’, em que a ideia sistema eletrônico
está presente, mas é extrapolada pelo entendimento de que a educação não se faz sem ação e
interação entre as pessoas”. (Filatro, 2008, p. 120). Dai pensar-se que num ambiente de EaD a
aprendizagem não pode acontecer de forma receptiva, uma vez que as interações são
fundamentais para que o processo de conhecimento se desenvolva de forma colaborativa. Há
de se convir que a interação acontece significativamente quando a afetividade está articulada
ao processo ensino-aprendizagem, pois a realização da aprendizagem é imprescindível para a
construção de vínculos na relação pedagógica entre todos os envolvidos. Nessa perspectiva,
entende-se que um AVA para proporcionar interação, autonomia e aprendizagem
colaborativa, deverá permitir diferentes estratégias de aprendizagem, de forma a atender o
maior número de estudantes, mas também, a individualidade de cada um, considerando o
interesse, a familiaridade com o conteúdo, a motivação e a criatividade. Nesse sentido,
importa a seguinte reflexão:
Desse modo, espaços de aprendizagens que visam a construção de
conhecimentos significativos devem considerar as vivências e experiências,
o repertório cultural e os aspectos subjetivos exteriores ao sujeito,
relacionando às situações sociais de desenvolvimento em que o mesmo está
envolvido. (Cruz e Souza, 2014, p. 8).
Esse pensamento converge para Coll e Monereo que destacam a importância da internet neste
começo de século, uma vez que tem alterado significativamente os cenários e as finalidades da
educação, valendo até mesmo dizer que tem sido responsável pela redefinição do espaço e o
tempo de educar, tudo de maneira muito peculiar. (Coll e Monereo, 2010, p. 21).
Portanto, o Ambiente Virtual de Aprendizagem traz novas oportunidades educacionais,
permitindo dentre outras vantagens, possibilidades de mediações entre professores e alunos
de modo a serem capazes de tomar decisões no compromisso do seu próprio aprendizado.
3 Percurso Metodológico
De acordo com Minayo (2008) a pesquisa é a atividade fundamental da ciência no que diz
respeito a sua indagação e construção da realidade. Para esta autora é a pesquisa que dá

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sustentação a atividade do ensino, atualizando-o diante da dinâmica do universo. Portanto,


embora a pesquisa seja uma prática de natureza teórica, vincula-se à vida prática, pois,
congrega pensamento e ação. Assim, ela se refere ao conceito de metodologia no âmbito da
pesquisa, como sendo:
[...] o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da
realidade. Ou seja, a metodologia incluiu simultaneamente a teoria da
abordagem (o método), os instrumentos de operacionalização do
conhecimento (as técnicas) e a criatividade do pesquisador (sua experiência,
sua capacidade e sua sensibilidade).(Minayo, 2008, p. 14).
Fundamentado nessa concepção, este trabalho apresenta-se numa abordagem de natureza
qualitativa, cujo método possibilitou o exame da realidade concreta. Os dados coletados são
apresentados de forma descritiva, com depoimento e comentários individuais dos sujeitos da
pesquisa. Feita a opção por essa abordagem, decidiu-se, então, pelo estudo de caso, com o
intuito de investigar com profundidade um determinado objeto, dentro do contexto real. O
estudo de caso é adotado em muitas conjunturas na perspectiva de contribuir com o
conhecimento que se tem dos fenômenos individuais, grupais, organizacionais, sociais e
políticos, bem como de outros fenômenos relacionados (Yin, 2005, p. 22). Assim sendo, a
estratégia do Estudo de Caso como método de pesquisa requer a apresentação rigorosa dos
dados e a delimitação teórica prévia. A utilização de métodos qualitativos busca explicar o
porquê das coisas, traduzindo o que deve ser feito, sem quantificar valores e nem tampouco as
trocas simbólicas. Para o referido autor, adotar o método do estudo de caso para fins de
pesquisa ainda é uma questão desafiadora no âmbito das ciências sociais. Esclarece ainda, que
o estudo de caso é favorável quando se quer investigar acontecimentos contemporâneos em
que não se pode controlar comportamentos considerados relevantes. Assim sendo, o presente
estudo de caso foi realizado de forma contextualizada, o que permitiu revelar a multiplicidade
de dimensões presente na mediação, facilitando assim, a observação mais abrangente dos
fatos. No que diz respeito ao locus da pesquisa, esta se realizou em uma turma do Curso
Técnico em Manutenção Automotiva, ofertado na modalidade EaD, da UEMA situada em São
Luís, capital do Estado do Maranhão, Brasil. A escolha da referida turma efetivou-se em função
de, no conjunto de oito cursos técnicos ofertados pela UEMA, ser essa a única turma do Curso
Técnico em Manutenção Automotiva, constituída de 18 alunos. Esse curso tem 25% de sua
carga horária destinada à prática profissional, o que significa dizer que do total de 1.440 horas,
360 horas são exclusivas para a realização de atividades práticas. Ressalte-se que embora
essas atividades sejam realizadas em diferentes espaços: laboratórios, oficinas, empresas, etc.,
são todas socializadas no AVA. Além de o curso exigir muitas aulas práticas, outro critério
adotado deve-se ao fato da turma pertencer ao Polo Paulo VI, de fácil acesso viabilizando
assim, os deslocamentos para efetivação do trabalho de campo. Para a realização desta
pesquisa, foi efetuada consulta à Coordenação Geral do Núcleo de Tecnologias para Educação
– UEMANET, havendo, portanto, permissão por parte da referida Coordenação, bem como da
Coordenação do Curso. No que tange à permissão para o acesso ao trabalho de campo,
importa refletir sobre as seguintes recomendações:
A relação com as pessoas deve ser constantemente negociada ao longo da
pesquisa e não apenas uma vez. [...] Pode-se notar aqui a ambigüidade da
noção de entrada ou de acesso ao campo: esse termo “entrada” tanto
designa a permissão formal quanto diz respeito ao momento em que é
adquirida a confiança dos membros que aceitam se abrir realmente ao
pesquisador. (Lapassade, 2005, p. 70).
No que diz respeito aos participantes da pesquisa, foram escolhidos um professor, um tutor e
cinco alunos. Ressalte-se que os participantes desta pesquisa foram escolhidos de forma

1879
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espontânea e muito embora o quantitativo seja pequeno, estes colaboraram com dados e
informações bastante significativas para a compreensão dos fatos observados. A despeito
disso, cabe enfatizar que na pesquisa qualitativa o objetivo da amostra é produzir informações
aprofundadas e ilustrativas: seja ela pequena ou grande, o que importa é que seja capaz de
produzir novas informações (Deslauriers, 1991, p. 58). É importante registrar que do universo
de 18 alunos apenas cinco participaram de forma efetiva da entrevista. Todavia o convite foi
extensivo a todos, mas a maioria não se disponibilizou a participar. Em relação ao tutor, a
turma possui um tutor presencial e um a distância, mas somente o tutor a distância aceitou o
convite, e, considerando que o objetivo principal da pesquisa era conhecer como se dá a
mediação no ambiente virtual por meio das ferramentas interativas, o tutor a distância é ator
fundamental. No caso da seleção do professor, foi escolhido o da Prática Profissional por ser
este professor que acompanha o aluno em toda a sua trajetória durante o curso. Na
delimitação do objeto deste estudo, estabeleceu-se como espaço o Ambiente Virtual da
Plataforma Moodle, com destaque a feramenta fórum, considerada nesta pesquisa, a
ferramenta interativa mais utilizada para a mediação tecnológica no Curso Técnico em
Manutenção Automotiva, por seu grande potencial de mediação no processo de construção
coletiva do conhecimento. Além disso, são utilizados com menor frequência: wiki, chat,
webconference, dentre outras interfaces.
3.1 Procedimentos da coleta e análise dos dados
A metodologia deste estudo tomou como base os elementos mais adequados para o alcance
dos objetivos da pesquisa, tendo em vista a mediação tecnológica. Dessa forma buscou-se
coletar os dados e informações de forma direta e indireta, pautando-se em dois momentos
distintos: o primeiro, nas observações feitas no AVA, e o segundo nas entrevistas realizadas
com um professor, um tutor e cinco alunos. Para coleta de dados, trabalhou-se considerando
um dos critérios de classificação de pesquisa proposto por Vergara (1990), ou seja, no que diz
respeito aos meios, uma vez que se buscou sustentação nos registros sobre o assunto no
ambiente virtual do curso (plataforma moodle) e nos depoimentos dos próprios atores do
processo ensino-aprendizagem. Em relação às observações, montou-se um roteiro de
observação sobre as ferramentas do AVA, de modo a serem identificados os aspectos que
pudessem facilitar ou dificultar o processo de mediação, tais como: estruturação do ambiente,
apresentação dos conteúdos e atividades, as formas de interações adotadas e a criatividade,
entre outros aspectos. Como já abordado anteriormente, na EAD o AVA se constitui um
importante espaço potencializador dos processos de mediação para as atividades on-line. Para
cada curso da UEMA existe uma sala virtual, provida de ferramentas para facilitar a
comunicação síncrona ou assíncrona, oportunizando assim, a troca de saberes e a construção
de conhecimentos de maneira interativa, de forma que os alunos, independentemente do
tempo e do espaço, possam tornar-se agentes de sua aprendizagem. A despeito disso, vale
proceder à seguinte reflexão:
[...] educação a distância está relacionado à utilização de algum recurso
tecnológico e didático para mediar a comunicação entre professores e
alunos, em espaço e tempos distintos. Deste modo, essa modalidade
educacional é responsável por romper com os paradigmas educacionais
tradicionais na medida em que torna possível, através das Tecnologias de
Informação e Comunicação (TICs), estabelecer a relação de ensino e
aprendizagem. (Silva e Figueiredo, 2012, p. 3).
Cabe ressalvar que o ambiente do Curso Técnico em Manutenção Automotiva é rico em
possibilidades de aprendizagem, pela forma como se apresenta. Ao acessar o AVA, o aluno
depara-se com um conjunto de recursos, tais como: Guias e Manuais, Biblioteca Virtual,

1880
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Secretaria Virtual, Bloco Ranking e Espaço de Convivência. Cada um desses recursos congrega
vários outros elementos, contendo informações e orientações que possibilitam situar o aluno
no contexto de um curso na modalidade EaD. A seguir, a figura 1 apresenta o print da página
inicial do AVA, apresentando os icones dos principais elementos contidos na sala virtual do
Curso Técnico em Manutenção Automotiva, a fim de uma melhor compreensão das midias
adotadas que implicam mediações e consequentemente permeiam reflexões e enriquecem as
discussões.

Fig. 1. Tela inicial da Sala Virtual do Curso Técnico em Manutenção Automotiva – UEMA

Além dos recursos que tratam da parte mais informativa, mencionados anteriormente,
existem os módulos. A matriz curricular do Curso Técnico em Manutenção Automotiva
contempla quatro módulos, e, na ocasião da pesquisa, os alunos encontravam-se concluindo o
segundo módulo. Nos Módulos, encontram-se inseridas as disciplinas com seus respectivos
Planos de Ensino, Roteiros de Estudo, os Roteiros das Práticas e os Cadernos de Estudo, sendo
este último, considerado o material indispensável do aluno. Além disso, existem os materiais
complementares (textos, vídeos, games, sites indicativos), as atividades e as avaliações. Dentre
as principais atividades realizadas no ambiente estão os fóruns de discussões, as web
conferências e as aulas práticas em laboratórios e oficinas. De acordo com os recursos
disponíveis no AVA foram feitas as observações, na perspectiva de identificar de que forma as
relações ocorrem através desses instrumentos para que se pudesse conhecer melhor o seu
funcionamento. Percebeu-se nas observações, que a mediação realizada no AVA por meio dos
fóruns pelo professor, tutor e alunos revela que são utilizados também outros recursos
didáticos, como consulta ao caderno de estudos, pesquisa em sites, e outros, de forma
conjunta, demonstrando a dinamicidade dessa ferramenta, assim como nível de aceitação e
familiaridade dos participantes. Como pode ser constatada ainda, a seguir, nas entrevistas,
essa forma de mediação vem fortalecer a relação pedagógica sob o ponto de vista que a
modalidade de EaD pode contribuir muito para expansão da oferta de cursos dessa
natureza.No que diz respeito as entrevistas, estas foram realizadas com um professor, um
tutor e cinco alunos, cujas questões foram elaboradas no sentido de avaliar, especificamente,
o fórum, considerando ser este recurso o mais utilizado no desenvolvimento do curso. Na
opinião do Professor o fórum se constitui a principal ferramenta do AVA para mediação do
processo ensino-aprendizagem. Segundo o Professor:

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Essas ferramentas possibilitam a construção do conhecimento, através do


diálogo em tempo real. É mediante os fóruns que ocorrem efetivamente as
interações, tanto por parte do professor com os tutores, quanto dos tutores
com alunos e, entre os próprios alunos. (Fala do Professor).
Para o tutor, o fórum é realmente uma ferramenta poderosa de interação, no entanto, poderia
ser mais bem explorado. Ele sugere que o fórum aguce maior participação, e, para isso, precisa
ser bem planejado e que a abertura seja feita com uma mensagem clara, objetiva e
questionadora, advertindo ainda, que em alguns fóruns os alunos não dialogam, apenas
emitem sua opinião. No entanto, coloca que isso não é uma regra geral, depende de cada
disciplina e de cada professor. E ainda complementa:
Quando o fórum é bem elaborado, a mensagem de abertura é bem
contextualizada e os alunos são devidamente orientados sobre o assunto, a
discussão se processa normalmente, os alunos se sentem motivados a
interagir com os seus pares e com certeza a mediação ocorre de forma
satisfatória. Compreendo também que a nossa participação, enquanto tutor
a distancia é imprescindível para fortalecer o debate, mas compreendo
também que o nosso papel é incentivar a interação entre os alunos. (Fala do
Tutor).
Nesse sentido, a opinião do tutor parte do princípio de que a forma como a discussão é
proposta no fórum é que vai contribuir para estimular a participação do aluno. Em EaD deve-se
propor atividades em que o aluno realize mesmo estando só, ou com um pequeno grupo de
colegas virtuais. O fórum deve potencializar a interatividade, de modo que a construção do
conhecimento seja feita de maneira colaborativa, para que o aluno não se sinta isolado no
tempo e no espaço (Horn, 2014, p. 122-123). No que tange a função do tutor:
Recomenda-se que a atuação do tutor junto ao fórum seja dialógica, para
que os cursistas não percebam essa ferramenta, apenas como mais um local
de entrega de tarefas (como acontece na ferramenta Tarefa), mas sim, um
espaço de diálogo constante, de novas indagações, questionamentos, e de
contribuições dos demais colegas para uma determinada questão ou fato.
(Grossi; Moraes; Brescia, 2013, p. 85).
Quanto à opinião dos alunos sobre as formas de mediação utilizadas nos fóruns, obteve-se as
seguintes respostas:
Questões Respostas Quant.
Alunos

Quem coordena as discussões O professor da disciplina. 05


dos fóruns?

O que você entende por A forma como a gente se comunica no Ambiente 03


mediação? Virtual de Aprendizagem;
O processo de troca de informações e 01
conhecimentos na educação a distância;
A comunicação on-line entre os alunos, professores e 01
tutores.

Como se dá interação do Sim, pois ajuda muito na comunicação escrita, além 01


Professor com os alunos no de mostrar as diferentes opiniões dos colegas;

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fórum? Sim. Mas que depende muito do professor da 01


disciplina. Tem professor que não se preocupa com o
aprendizado do aluno, apenas quer cumprir com o
programa da disciplina;
01 aluno disse que sim, pois através dos fóruns 02
podem tirar suas dúvidas tanto com o professor
quanto com os colegas;
Sim, uma vez que o fórum complementa os 01
conteúdos abordados durante as disciplinas e
incentiva a discussão com os colegas.

De que forma o tutor interage O tutor apenas faz o monitoramento para saber 01
com o aluno nos fóruns. quem está participando e faz contato com aqueles
que ainda não se manifestaram a participar do
processo de discussão;
O tutor é o maior incentivador do aluno nos fóruns, 02
ele ajuda muito não só nos fóruns como em outras
atividades;
Tanto o professor quanto o tutor auxiliam os alunos 01
no fórum tirando dúvidas e motivando a
participação;
O tutor não acrescenta quase nada sobre o 01
conteúdo, portanto o seu papel é apenas não deixar
o aluno de fora da discussão.
Quadro 1 – Consolidação das opiniões dos alunos do Curso Técnico em Manutenção Automotiva na entrevista
sobre mediação.

Pelo que se pode perceber na fala dos alunos quanto ao entendimento sobre mediação, estes
demonstraram ter clareza do que é, de como deve ser feita e quem deve conduzi-la.
Compreendem perfeitamente que é tarefa do professor incentivar e facilitar o processo de
aprendizagem, mas, assinalam que nem todos os professores assumem o seu papel, deixando
muitas vezes por conta do tutor e dos próprios alunos. Ou seja, essa compreensão que eles
têm sobre o papel do professor como mediador, aproxima-se da visão de Masetto (2008),
abordada anteriormente, que concebe o professor como uma espécie de elo entre o aluno e
sua aprendizagem, numa interdependência autônoma e dinâmica, que aguça, provoca,
estimula e coopera para facilitar o aprendizado do aluno. Moran (2000) também corrobora
com essa ideia quando assevera que:
Alunos curiosos e motivados facilitam enormemente o processo, estimulam
as melhores qualidades do professor, tornam-se interlocutores lúcidos e
parceiros de caminhada do professor-educador. Alunos motivados
aprendem e ensinam, avançam mais, ajudam o professor a ajudá-los
melhor. (Moran, 2000, p.17)
No que diz respeito à importância do fórum como ferramenta básica no processo de mediação
tecnológica, todos os entrevistados foram unânimes em dizer que sim, inclusive, ressaltando a
importância que tem essa ferramenta para o exercício da comunicação escrita e do diálogo.
Tal compreensão associa-se a ideia de que “o diálogo é o encontro entre os homens,

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

mediatizados pelo mundo, para designá-lo”. (Freire, 2007, p. 69). Isso implica dizer que o
diálogo entre o professor e o aluno é essencial no processo ensino-aprendizagem, pois
somente através dele o professor tem condições de conhecer o pensamento do aluno e pode
auxiliá-lo em suas dúvidas e inquietações. Quanto ao tutor, estes demonstraram que têm a
compreensão de que o mesmo é um auxiliar do professor, notadamente, no sentido de
monitorar o aluno quanto ao cumprimento das atividades. Mas percebem também, a
importante contribuição no sentido de estimulá-los, incentivá-los, não os deixando fora das
discussões nos fóruns e em outras atividades demandadas pelo professor. Deixam claro,
portanto, que o importante papel da mediação no processo ensino-aprendizagem é do
professor, as ferramentas tecnológicas são suportes. Convém ressaltar que de acordo com a
literatura estudada existem diferentes formas de mediação na EaD, e, que todas implicam em
interações. No entanto, neste estudo de caso, constatou-se que a mediação se processa com
maior ênfase no Ambiente Virtual de Aprendizagem, sobretudo, por meio dos fóruns, na
relação entre professor – aluno e aluno-aluno. O Tutor aparece como coadjuvante no
processo, mas, não se configura como a ponte principal entre o aluno e o conhecimento.
5 Considerações Finais
O estudo do processo de mediação tecnológica nesta pesquisa tomou como referência as
ferramentas utilizadas no AVA, mais especificamente, o fórum. Porém, importa registrar a
relevância que todos os recursos exercem no contexto dos cursos a distância. Esse
entendimento trouxe à tona, o interesse de no futuro, complementar a pesquisa, tornando o
estudo mais abrangente. A análise sobre as formas de mediação em EaD é complexa,
especialmente, quando se trata de análise do espaço virtual, onde o pesquisador não tem a
oportunidade de vivenciar todos os momentos da prática pedagógica. Neste estudo, por
exemplo, fez-se um percurso pelo ambiente, mas, muito mais para conhecimento das
ferramentas do que propriamente para vivenciar o dia a dia das relações que ocorrem nesse
espaço. Convém destacar que, as principais percepções registradas neste artigo foram
adquiridas a partir das informações dos entrevistados, fundamentadas com a visão dos
autores estudados. Assim, pode-se conceber a mediação tecnológica no processo ensino-
aprendizagem como as relações que se materializam virtualmente, tomando como referência
as experiências docentes e discentes. As ideias dos autores propiciaram fazer o contraponto
com o material colhido na pesquisa e possibilitaram compreender melhor o papel das
interações sociais, uma vez que o diálogo virtual é fundamental no processo de aprendizagem
entre os participantes, que na visão de Freire se constitui uma prática libertadora. Isto porque
na compreensão do referido autor o aluno não é um depósito que deva ser preenchido pelo
professor, mas, cada um, juntos, pode aprender e desvendar novas possibilidades de
aprendizagem. Dessa forma, entende-se que na educação, seja a tradicional ou a virtual,
existem diferentes formas de mediação. E que o mais importante no processo ensino-
aprendizagem não é este ou aquele modelo, ou aquela ferramenta, mas, o respeito ao aluno
como ser único que constrói o seu aprendizado. Cabe, então, ao Professor e todos os agentes
que trabalham em função desse processo, a capacidade e sensibilidade de possibilitar meios
para que o aluno encontre a melhor maneira para construir os seus conhecimentos. Por outro
lado, não adianta ter um ambiente virtual com um bonito layout , uma variedade de
ferramentas e atividades, se não houver um bom planejamento e profissionais comprometidos
e capacitados para interagirem utilizando e potencializando, eficientemente, as ferramentas
disponibilizadas por esse mundo tecnológico fascinante. Desse modo, busca-se fomentar o uso
dessas ferramentas tecnológicas de forma crítica, registrando a importância do papel do
professor e do tutor na construção do conhecimento a partir das informações partilhadas.

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Professores de Matemática: entrelaçar de vidas entre o pessoal e


o profissional

1 2
Thiago Batista Assis , Flomar Ambrosina Oliveira Chagas
1
Mestrando no Programa de Mestrado Profissional em Educação para Ciências e Matemática do IFG-
Câmpus Jataí, Brasil/ Bolsista FAPEG.thiagobatista2001@yahoo.com.br;
2
Docente no programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação para Ciências e Matemática do
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás/IFG, Câmpus Jataí, Brasil
flomarchagas@gmail.com

Resumo. Esta pesquisa em andamento teve início no segundo semestre de 2015, no Programa de mestrado
profissional em Educação em Ciências e Matemática do IFG/Câmpus Jataí. Tendo por objetivo identificar o
sentido e os sentimentos dos professores de Matemática em relação à profissão docente a partir da
narrativa de sua história de vida. São interlocutores dessa pesquisa cinco professores de Matemática,
efetivos, do ensino médio de escolas públicas de Jataí, Goiás, Brasil. Espera-se com este trabalho aprofundar
estudos teórico-metodológicos sobre uso da história de vida de professores como metodologia, visando
responder a seguinte pergunta: Qual a influência das histórias de vida sobre as práticas pedagógicas dos
professores de Matemática do ensino médio? Numa abordagem qualitativa, propõe-se relacionar as
memórias dos professores com suas práticas pedagógicas.
Palavras-chave: História de vida; Memórias; Professores de matemática; Ensino médio.

Mathematics teachers: interweaving the personal and professional lives


Abstract. This ongoing research has began in the second semester of 2015, in the Professional Master's
Program in Science and Mathematics Education at IFG / Jataí Campus. The aim of this study was to identify
the meaning and feelings of Mathematics teachers in relation to the teaching profession from the narrative
of their life history. Five teachers of Mathematics, effective, of the high school of public schools in Jataí,
Goiás, Brazil, are interlocutors of this research. It is hoped that this work will deepen theoretical-
methodological studies on the use of teachers' life history as a methodology, aiming to answer the following
question: What is the influence of life histories on the pedagogical practices of high school mathematics
teachers? In a qualitative approach, it is proposed to relate teachers' memories to their pedagogical
practices.
Keywords: life's history; memoirs; Math teachers; high school.

1 Introdução

O trabalho com histórias de vida tem sido relevante nas pesquisas educacionais, sobretudo no que se
refere à formação de professores e a compreensão das práticas docentes. Estas narrativas
possibilitam a compreensão das identidades dos professores, em meio a um contexto histórico e
principalmente pela ideia de relacionar a vida privada com a vida profissional.
Nóvoa (2013) conceitua e apresenta o uso da história de vida como instrumento para o estudo sobre
professores, estabelecendo que o processo de constituição do indivíduo se dá entre o pessoal e o
profissional, sem a possibilidade de desvinculação entre os dois. Este autor propõe o uso da história
de vida como metodologia para compreensão da prática docente. Nessa perspectiva, é crescente o
uso das histórias de vida na educação, especialmente no campo da formação docente.

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Outros autores que também pesquisam sobre formação de professores, como Marcelo-Garcia
(2013), Pimenta e Anastasiou (2010) e Tardif (2014) corroboram ao afirmar que a formação docente
se inicia antes da licenciatura e vai além dela, sendo permanente.
Com o aprofundamento teórico dessa temática, almeja-se ampliar o conhecimento sobre quem são
os professores efetivos que lecionam a disciplina de Matemática no Ensino Médio das escolas
públicas de Jataí Goiás, região Centro-Oeste do Brasil, bem como entender os motivos que os
levaram a escolher a profissão docente, suas angústias, suas conquistas e suas perspectivas sobre a
docência. Nesse sentido, a questão-problema que se colocada é a seguinte: Qual a influência das
histórias de vida sobre as práticas pedagógicas dos professores de Matemática do ensino médio?

2 Aporte Teórico

As pesquisas acerca da vida cotidiana devem ser tomadas como um vasto campo para a investigação
científica. Essa temática não é mais objeto de estudo somente da Sociologia, da Antropologia ou da
História. Outras áreas do conhecimento, também adotaram o uso da história oral no gênero história
vida como metodologia para abordagens teórico-metodológicas, possibilitando o conhecimento de
realidades múltiplas, portadoras de minúcias muitas vezes ignoradas. Meihy e Salgado Ribeiro (2011)
afirmam que a história oral de vida é um gênero em crescente ascensão na comunidade acadêmica,
pois possibilita a compreensão de diversos fenômenos sociais a partir de experiências pessoais.
As histórias de vida como metodologias de investigação científica na área de Educação ganharam
visível impulso no Brasil na década de 1990, com a criação da Associação Brasileira de História Oral
(1994) e com realização de seminários e de divulgação de estudos na área. A utilização dessa
abordagem compõe uma linha de pesquisas que favorecem a busca por uma nova metodologia de
formação de professores.

De fato, ao analisarmos as tendências atuais da pesquisa sobre docência e


as preocupações de investigação, ação e formação nelas embutidas,
podemos perceber o crescimento dos estudos que focalizam a vida ou
desenvolvimento pessoal dos professores, carreiras e percursos
profissionais, profissionalização e identidades docentes, ciclos de vida e
experiência docente, memórias, relação entre o universo profissional e
outros universos socioculturais (Burnier et al, 2007, p. 344.)
As memórias dos professores não são mais consideradas apenas relatos em uma perspectiva de
pesquisa etnosociológica, mas como um campo de experiências e um instrumento de formação.
Nóvoa (2013), Goodson (2013) e Guedes-Pinto (2008) dentre outros, ilustra bem essa tendência,
oferecendo subsídios para o uso das histórias de vida na pesquisa educacional.
Goodson (2013), afirma que a origem sociocultural dos professores exerce forte influência sobre sua
dinâmica profissional. O modo de vida dos professores dentro e fora do ambiente escolar, suas
identidades e culturas interferem na sua prática educativa. Desse modo, a maneira como os
professores lidam com as suas carreiras está intimamente ligada à sua história de vida.
Assim sendo, é importante identificar o processo de profissionalização do professor, como e porque
os indivíduos tornaram-se professores e se a sua ação pedagógica é influenciada por suas
características pessoais e pelas experiências profissionais vivenciadas: “a maneira como cada um de
nós ensina está diretamente dependente daquilo que somos como pessoa quando exercemos o
ensino” (Nóvoa, 2013, p. 17).

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Nessa linha de pensamento, acredita-se que o uso das histórias de vida possibilita a produção de
conhecimento único sobre os professores, mais realista, que possibilita a compreensão dos sujeitos
como pessoas e como profissionais.

3 Aporte Metodológico

A condução desta pesquisa pauta-se nos pressupostos teórico-metodológicos qualitativos, utilizando


a metodologia história oral de vida. Os sujeitos, não foram pré-escolhidos, são interlocutores que
aceitaram participar da pesquisa, após envio de correspondência, após a realização de um Chá
matemático, no qual explicitamos os objetivos da pesquisa e metodologia a serem utilizados, apenas
cinco professores concursados, que ministravam aula no ensino médio, de escolas púbicas estaduais,
dispuseram-se, democraticamente a participar da pesquisa. Três deles são do sexo feminino; têm
experiência igual ou inferior a dez anos de docência, os outros têm entre 10 a 30 anos; apenas uma é
Mestra em Matemática Pura. Sendo a educação contínua, importante para o exercício da prática
pedagógica, na pesquisa, também será analisado o sentimento e o sentido dos professores em
relação à profissão docente.
Assim, uma pesquisa de abordagem qualitativa como esta implica em compreender o objeto de
estudo, numa perspectiva dialética. Entre as principais características da abordagem qualitativa,
destacam-se: a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta de dados e o
pesquisador como seu principal instrumento; os dados coletados são predominantemente
descritivos; a preocupação com o processo é muito maior do que com o produto; o significado que as
pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo pesquisador e a análise dos
dados tende a seguir um processo indutivo.

Isso é possível em pesquisa qualitativa e provável de acontecer quando


tratamos de Histórias de Vida, porque mobilizamos lembranças,
recontamos histórias, refletimos sobre a própria vida. Ao fazer isso, não
sustentamos a imparcialidade, temos uma subjetividade que aparece e se
permite ser vista. Isso é possível em pesquisa porque o encontro entre
investigador e investigado é intersubjetivo, ou seja, mobiliza os sujeitos,
muito embora o investigador se detenha ao processo do outro, às suas
análises e conclusões. (Soares, 2010, p. 39)

Bogdan e Bicklen (1994) entendem que a apropriação de qualquer ideia por parte do pesquisador é
influenciada por sua visão de mundo. O modo como utiliza a abordagem teórica é determinado pelos
paradigmas que lhe servem de sustentação para o estudo dos fenômenos sociais.
Acerca do instrumento de coleta de informações, utilizamos entrevista aberta que prioriza os relatos
orais dos pesquisados. A entrevista aberta possibilita o detalhamento das questões e dos conceitos
relacionados ao objeto de pesquisa. Sua estruturação permite que o entrevistado discorra livremente
sobre o tema proposto, com o mínimo de interferência do entrevistador, conforme orientações de
Meihy e Salgado Ribeiro (2011).
Para o alcance dos objetivos propostos, a presente pesquisa foi dividida nas seguintes fases: coleta
de informações, tratamento dos dados e análise. A etapa de coleta de informações, já foi realizada e
procedeu-se da seguinte forma:
a) Pesquisa documental: antes do primeiro encontro com os professores, buscamos
informações preliminares de cada professor com a colaboração da Subsecretaria Regional de
Educação de Jataí. Acessamos o Sistema de Gestão Escolar (SIGE–GO). Nesta plataforma

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

tivemos acesso aos seguintes dados dos professores: nome completo, data de nascimento,
naturalidade, estado civil, data de posse como servidor público, formação acadêmica, cursos
de pós-graduação, local de trabalho e nível de classificação na carreira docente no Estado de
Goiás. Ainda buscamos informações na Plataforma Lattes, a fim de localizar o currículo dos
participantes, porém somente uma professora possui cadastro neste sistema.
b) Entrevistas abertas: foram realizadas a partir de um roteiro para direcionamento dos
participantes, abordando os seguintes momentos: vivência escolar e familiar, formação e
exercício profissionais, sentido e sentimentos sobre a profissão docente. Nesta etapa,
focalizamos na constituição dos sujeitos, levando em consideração sua trajetória de vida e a
relação com a docência, observando as diversas formas de pensar ao longo da vida,
acontecimentos importantes e pessoas que marcaram suas vidas de forma positiva ou
negativa. As entrevistas foram realizadas de forma múltiplas em dois encontros
consecutivos, com intuito de se complementarem, conforme aponta os escritos de Meihy e
Salgado Ribeiro (2011). Estes encontros foram devidamente registrados por meio de recursos
audiovisuais. A partir das entrevistas surgiram as categorias por meio de análise
textual discursiva.
O processo de tratamento dos dados foi subdivido em três fases conforme preconiza Meihy e
Salgado Ribeiro (2011), transcrição (já realizada), textualização (em andamento) e transcriação (em
andamento). Segundo estes autores, a transcrição é uma fase relevante para a pesquisa uma vez que
a partir da textualização do oral que ocorrerá análise, portanto a transcrição deve ser fiel a gravação,
mantendo erros e vícios de linguagem, referências a ruídos externos e interferências do pesquisador.
Porém os autores alertam que somente a transcrição, não é capaz de traduzir a realidade da
narrativa, pois lágrimas, gestos e expressões não podem ser transcritas. Assim, por meio da
textualização o texto é estruturado para leitura, os vícios de linguagens, repetições e titubeações são
retirados. É acrescida ao texto a pontuação e as normas gramaticais necessárias para torná-lo
adequado a leitura. Contudo, nesta etapa não há interferências das ideias e percepções do autor
pesquisa. Pois é na transcriação que o pesquisador expõe ao leitor o contexto em que a entrevista
foi realizada ao elaborar um texto em que insere suas anotações do caderno de campo e percepções
obtidas durante os depoimentos. Prosseguindo, após a conclusão dessas etapas, sob perspectiva
sociológica evidenciada por Bourdieu (1980) se iniciará o processo de análises das entrevistas.
De acordo com as pressuposições teóricas, os pesquisadores que objetivam compreender trajetórias
de indivíduos, devem considerar uma série de variáveis, as quais Boudieu (1980) denominam de
habitus. Desse modo, o habitus pode ser descrito como o conjunto de fatores que influenciam o
processo de socialização dos indivíduos: espaço social, fatores econômicos, cultura, dentre outros.
Portanto, para as análises os discursos dos professores serão assim categorizados: trajetória
estudantil, trajetória profissional e trajetória social.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

4 Produto Educacional

Nesta pesquisa, em andamento, propomos como produto educacional1, o desenvolvimento de um


documentário contendo as narrativas dos professores participantes. Tem por objetivo conduzi-los a
uma autorreflexão sobre suas práticas pedagógicas, mediante o resgate de suas memórias e fatos
significantes de sua trajetória.
Assim, espera-se que por meio das narrativas coletadas ao longo dessa pesquisa, seja possível a
análise de valores, perspectivas subjetivas e interpretação sobre a vida dos professores de
matemática. Kossoy (2001) afirma que a imagem é um testemunho visual, no qual se pode detectar
uma série de dados que jamais poderiam ser mencionados pela linguagem escrita da história.
Um documentário permite a construção e a divulgação do conhecimento e possibilita o
desenvolvimento dos participantes. Desde sua origem, no início do século XX, os documentários,
abordam a realidade de fatos ou de pessoas.
O documentário leva-nos a uma experiência única, com os sons e imagens
organizados de tal forma que representa mais do que simples impressões
passageiras. Passa a representar conceitos abstratos, e de acordo com a
bagagem cultural do espectador, se terá um determinado ponto de vista
que pode ser ou não o que se quis expor (Nichols, 2016, p. 98).

Nessa concepção, propõe este documentário na expectativa de contribuir com o processo de


formação continuada dos professores participantes, uma vez que promoverá aos professores, a
reflexão como indivíduo e como profissional, levando-os a repensarem atitudes e práticas. Também
se espera contribuir com o processo de formação de novos professores, uma vez que o espectador se
deixa conduzir pelas emoções, experimentando uma verdadeira vivência em torno da história
contada. Os documentários são importantes instrumentos para a compreensão da realidade
apresentada. Diante dessa perspectiva, acredita-se que este trabalho permitirá a interpretação e a
compreensão acerca dos perfis socioeconômicos e profissionais dos professores de Matemática das
escolas públicas de Jataí, Goiás, Brasil.

5 Conclusões

Os estudos sobre história de vida, não buscam comprovações de fatos ou verdades, o que se almeja
nesta vertente é a compreensão dos sujeitos em sua totalidade. A expectativa em torno desses
trabalhos não se restringe ao estabelecimento de padrões e comparações, seu valor está no
fornecimento de subsídios capazes de possibilitar a interpretação de identidades, fundamentos
primordiais das pesquisas qualitativas.
O torna - se professor, é um processo que envolve família, infância, relações, acontecimentos e
configurações do ambiente social, econômico e cultural. Com certeza este dialogo será feito com

1O Produto Educacional é uma proposta de ensino ou de formação de professores desenvolvida e analisada pelo
mestrando e seu orientador mediante pesquisas realizadas. A elaboração do produto faz parte das exigências para
obtenção do título no Mestrado Profissional em Educação para Ciências e Matemática do IFG – Câmpus Jataí. Além da
dissertação, o mestrando desenvolve e aplica um produto educacional.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

vários autores, em particular aqueles que se dedicam a formação de professores, de forma mais
específica com aqueles que se dedicam à educação Matemática e sua prática.
O que se pretende, portanto com este estudo, é entender o sujeito professor de Matemática,
observando seus valores, cultura e visões de mundo. E a partir dos resultados obtidos poder
contribuir com a formação de professores por meio do produto educacional proposto.

Referências

Bogdan, R.; Biklen, S. K. (1994). Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos
métodos. Portugal: Porto.

Bourdieu, P. (1980). Le Sens Pratique. Paris: Les Éditions de Minuit.

Burnier, S. Cruz; R. M. R.; Durães, M. N., Paz, M. L., Silva; A. N. Silva, I. M.M. (2007). Histórias de vida
de professores: o caso da educação profissional. In: Revista Brasileira de Educação, v. 12, n. 35,
343–358. Recuperado em 09 de março de 2017 de
http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v12n35/a13v1235.pdf.

Gil, A. C. (2011). Métodos e técnicas de pesquisa social. (6. ed.) São Paulo: Atlas.

Guedes-Pinto, A. L., SILVA, Leila C.B. da e Gomes, G. G. (2008). Possibilidades, versões e trabalho. In:
Memórias de leitura e formação de professores. Campinas: Mercado de Letras.

Goodson, I. F. (2013). Dar voz ao professor: as histórias de vida dos professores e o seu
desenvolvimento profissional. In: NÓVOA, António (org.) Vidas de professores. (2. ed.). Portugal:
Porto Editora.

Kossoy, B. (2001). Fotografia e História. (2 ed.) rev. São Paulo: Ateliê Editoral.

Marcelo Garcia, C. (1999). Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto
Editora.

Meihy, J.C. S. B., Salgado Ribeiro, S. L. (2011). Guia Prático de história oral. São Paulo: Contexto.

Nichols, B. (2016). Introdução ao documentário. (6. ed.) São Paulo: Papirus.

Nóvoa, A. (2013). Os professores e as Histórias da sua vida. In: NÓVOA, António (org.) Vidas de
professores. (2. ed.) Portugal: Porto Editora.

Pimenta, S. G.; Anastasiou. L. G. C. (2010). Educação, Identidade e profissão docente: docência no


ensino superior. (4. ed.). São Paulo: Cortez Editora.

Soares, Fernanda Vieira. (2010). Subjetividade, história de vida e formação docente: sentidos do ser
professor. (Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual do Ceará). Recuperado em 09 de
março de 2017 de
http://www.uece.br/ppge/dmdocuments/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Fernanda. pdf.

Tardif, M. (2014). Saberes docentes e formação profissional.(17. ed.).Petrópolis/RJ: Vozes.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Contributos da pesquisa qualitativa no mapeamento e ampliação


de possibilidades textuais às discussões sociocientíficas em livros de
Física e exames nacionais brasileiros

Marcos Fernandes-Sobrinho1,a, Tiago Clarimundo Ramos1, Paula Silva Resende Fernandes2,


Paulo Alexandre de Castro3, Karolina Martins Almeida e Silva4
1
Núcleo de Física Aplicada Instituto Federal Goiano, Brasil. marcos.fernandes@ifgoiano.edu.br;
tiago.ramos@ifgoiano.edu.br
2
Núcleo de Linguística Aplicada Instituto Federal Goiano, Brasil. paula.silva@ifgoiano.edu.br
3
Departamento de Física Universidade Federal de Goiás, Brasil. padecastro@gmail.com
4
Curso de Biologia Universidade Federal do Tocantins, Brasil. karolina.martins@uft.edu.br

Resumo. Neste artigo apresentamos parte dos resultados de uma pesquisa de doutorado do primeiro autor
que identificou, selecionou e analisou novas fontes de gêneros textuais presentes em questões de Física em
sete edições de um exame nacional brasileiro e em 14 coleções de livros didáticos de Física, com o propósito
de apoiar ações letivas [e pedagógicas] pautadas na perspectiva da educação Ciência-Tecnologia-Sociedade
(CTS), em especial, das discussões de questões sociocientíficas (QSC). O estudo sinaliza a importância das
análises documental e de conteúdo na perspectiva qualitativa, que possibilitam o entendimento de
especificidades presentes nos registros e(ou) nos documentos, independentemente de serem utilizadas
como método autônomo ou, ainda, como oportunidade de ampliar e aprofundar as análises em
investigações.
Palavras-chave: Investigação qualitativa; Educação CTS; Temas controversos; Física no Enem; Livros
didáticos de Física.

Contributions of the qualitative research in the mapping and extension of textual possibilities to the
socio-scientific discussions in books of Physics and national examinations
Abstract. In this article we present part of the results of a PhD research of the first author that identified,
selected and analyzed new sources of textual genres present in Physics issues in seven editions of a Brazilian
national exam and in 14 collections of Physics textbooks, with the Purpose of supporting educational and
pedagogical actions based on the Science-Technology-Society (CTS) education perspective, in particular, on
socio-scientific issues (QSC). The study indicates the importance of documentary and content analysis in the
qualitative perspective, which allows the understanding of the specificities present in the records and (or) in
the documents, regardless of whether they are used as an autonomous method or as an opportunity to
broaden and deepen the analyzes In investigations.
Keywords: Qualitative research; STS education; Controversial issues; Physics in the Enem; Physics textbooks.

1 Introdução

Como importantes formas de análise, atualmente presentes na pesquisa qualitativa, destacamos a


documental e a de conteúdo no desenvolvimento de um trabalho mais amplo – tese de
doutoramento do primeiro autor – que identificou, selecionou e analisou novas fontes de gêneros
textuais para apoiar ações letivas [e pedagógicas] inseridas na perspectiva da educação CTS, em
especial, das discussões de questões sociocientíficas (QSC).
a Realiza estudos de Pós Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, na Faculdade de Ciências
da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (PPGEC/FC/Unesp/Bauru).

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Neste artigo reforçamos a ideia de que a inserção da educação CTS: (1) na sala de aula; (2) nos livros
didáticos de Ciências Naturais (Física, Química e Biologia); (3) no contexto da sala de aula de Ciências
Naturais (CN); e (4) em questões relacionadas a estas CN, possibilita superar concepções ingênuas
sobre a neutralidade científica. Em larga medida, cremos que essa inserção poderá implicar
ampliação do interesse, por parte do estudante, para aprender conceitos científicos e, por
decorrência, auxiliá-lo no desenvolvimento crítico e reflexivo, frente aos aspectos de cunho social e
pessoal.
Realçamos a importância do livro didático (LD) para o desenvolvimento de atividades de ensino de
Ciências, enquanto material de apoio ao professor e ao aluno. De acordo com Echeverría, Mello, e
Gauche (2011), o LD é o instrumento didático mais utilizado pelos professores como ferramenta para
o ensino de ciências. Além disso, os autores apontam que se trata de uma importante fonte de
informação no espaço escolar, dado que as diretrizes curriculares nacionais (DCN), bem como as
proposições curriculares direcionam os aspectos conceituais a serem trabalhados nos LD e, por
conseguinte, nas avaliações. Imbricados a esse aspecto do LD, no Brasil, encontram-se os atuais
propósitos do Enem, entre os que destacamos o fato de o exame convergir para forma alternativa – e
cada vez mais adotada – de acesso ao ensino superior brasileiro.
Sublinhamos, também, a considerável relevância de se formar cidadãos críticos, e que se revela
amplamente defendido nos documentos curriculares oficiais educacionais brasileiros (Strieder, Silva,
Fernandes-Sobrinho, & Santos, 2016), incluam-se os que orientam o Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD) e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), além do que apontam pesquisas em
educação em Ciências, não apenas no Brasil, sobre a importância de se levar para as salas de aula,
discussões a partir temas sociocientíficos (TSC) e(ou) controvertidos, do ponto de vista científico.

2 Procedimentos da investigação qualitativa

Neste artigo, desenvolvemos um estudo no escopo teórico e no empírico, satisfeitas as condições


concretas de contextos reais. O objetivo geral foi, então, verificar e identificar, nos 14 livros didáticos
de Física (LDF) aprovados pelo PNLD/2015 e em itens (ou questões) de Física, das edições válidas do
Enem de 2009 a 2015, potencialidades para se trabalhar discussões sociocientíficas (DSC), em salas
de aula de Ciências. Nesse sentido, ampliamos o número de fontes e de gêneros textuais, dessa
natureza, como alternativas viáveis (e de fácil e livre acesso) ao professor e ao estudante (Fernandes-
Sobrinho, Ramos, & Santos, 2016), como perspectiva de contribuirmos na direção de uma
implementação mais efetiva das discussões de QSC, no ensino de Física, em contraposição à
dificuldade dessa implementação (Martínez-Pérez & Carvalho, 2012).
Estruturamos a análise desenvolvida para cada objeto de pesquisa (Enem e o LDF) e sua relação com
as correspondentes questões, de sorte a estabelecermos conexões necessárias e suficientes ao
atingimento de nossos propósitos.
As pesquisas qualitativas trabalham com significados, motivações, crenças e valores; e todos esses
elementos são impossibilitados de ser reduzidos a meras questões quantitativas, vez que respondem
a noções bastante peculiares. No entanto, os dados qualitativos e os quantitativos se complementam
em uma pesquisa (Minayo, 2010).
A motivação em pesquisar o tema deste artigo, emergiu de nossa própria curiosidade com as dúvidas
acerca de um problema [ou de um fenômeno] associado às dificuldades de se trabalhar DSC, em
salas de aula de Ciências. Entretanto, a partir do instante em que definimos o objeto de pesquisa, em
certa medida, preocupamo-nos em desmistificar a nossa neutralidade em relação à investigação. Isso
se deve ao fato de que, muitas vezes, a definição do objeto guarda relação com o pesquisador e, por

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isso, revela nossas preocupações científicas, ao selecionarmos os dados que foram


coletados/gerados, assim como as formas de coletá-los e(ou) gerá-los.
De qualquer maneira, a determinação acerca do que investigarmos, não foi fácil. Pesquisar
pressupõe certos conhecimentos anteriores e, não menos importante, uma metodologia pertinente
ao correspondente problema. Nesse sentido, por mais elementar ou ingênuo que pudessem ser as
nossas objetivações, quaisquer estudos de objetivo da realidade social exigiram orientação com base
em um arcabouço teórico e também a explicitação da nossa escolha do objeto. Exigiram, também, os
demais passos, resultados empíricos e teóricos auferidos ao longo do estudo (Becker, 1999).

2.1 Da dinâmica emergente ao desenho metodológico da pesquisa

Assumimos a seguinte questão de partida: “que indicadores nos itens do Enem, em textos dos LDF, e
no discurso de professores de Física, permitem-nos identificar e sistematizar possíveis articulações
de discussões de TSC, no contexto da sala de aula?”, que surgiu com base em um levantamento de
dados/informações. A fim de fazermos esse levantamento, inicialmente, realizamos uma pesquisa
bibliográfica. Em momento posterior, observamos fenômenos para conseguirmos maiores
informações; em um terceiro momento, coletamos dados/informações, junto à Secretaria de Estado
de Educação (SEE) de uma unidade federativa, localizada na Região Centro-Oeste, do Brasil.
No presente estudo, nossa preocupação não se limitou ao registro descritivo dos fatos/elementos,
apesar de haver descrições ao longo de toda a sua construção. A partir do entrelaçamento empírico-
teórico, procuramos avançar a um patamar de compreensão e de explicação, relacionando teoria-
dados como fundantes em nossas reflexões.
Desenvolvemos o desenho metodológico da pesquisa em meio a uma dinâmica emergente, no
sentido de se tratar de processo elaborado no transcorrer do estudo, notadamente marcado por
avanços e retrocessos, conceituações, definições, ajustes e reestruturações. Tudo isso, em uma
lógica de descoberta progressiva; espécie de lógica indutiva (Strauss & Corbin, 2008). Nesse aspecto,
mudanças metodológicas foram introduzidas, em consonância ao que nos ensinam Ketele e Roegiers
(1999, p. 248), ao apontarem que “o investigador deve, em todos os momentos, conciliar criatividade
e rigor, adaptando-se continuamente ao contexto e à evolução da investigação”.

2.2 O caráter exploratório e descritivo da pesquisa

Assim, adaptações generalizadas das denotações foram necessárias dado que em nosso estudo,
apresentamos características dos tipos de pesquisa identificados, no sentido de configurá-la como de
caráter exploratório, além de descritivo. Com efeito, nem toda a totalidade dos critérios sugeridos
pelos autores em seus tipos, foi identificada neste trabalho. A título de exemplo, citamos os “critérios
de generalização, repetibilidade e valor prioritário” no tipo descritivo, apontado por Ketele e
Roegiers (1999, p. 120-121).
O estudo possui caráter exploratório, dado seu aspecto heurístico, de descoberta, de observação, de
interpretação e de reflexão. Esse caráter nos possibilitou concluir por inferências e tomar como
assertivas a partir de outros possíveis e novos estudos de aparência dedutiva, com possibilidade de
generalizações, por ventura, provenientes desta [ou não considerados nesta] pesquisa. Também é
descritivo, na medida em que tivemos sim, o propósito de descrever, analisar e interpretar acerca de
falas, pautadas em práticas, condutas, perspectivas e perfis de formação e atuação profissionais, no
discurso dos sujeitos, para o contexto da sala de aula. Além disso, as falas guardam relação com os
nossos interesses que, aliás, poderão motivar novas pesquisas, no futuro.

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2.3 A perspectiva qualitativa-interpretativista da pesquisa

Em outra vertente do trabalho de pesquisa, cujo propósito foi o de identificar e analisar possíveis
efeitos indutivos dos itens do Enem e dos LDF, ocorridos no contexto da pesquisa, optamos pela
perspectiva qualitativa em dois enfoques, que se desdobram em duas frentes de trabalho: uma
vinculada à relação do Enem e do LDF com a prática pedagógica do professor, por meio de seu
discurso (ao responder o questionário e durante a entrevista); e a outra a partir da identificação de
itens e de textos com potencial para se trabalhar TSC, por meio de discussões de QSC, em salas de
aula de Ciências. Os 13 professores de Física [sujeitos] convidados a participarem de eventos
relacionados à pesquisa [seis do sexo feminino e set, masculino, com faixa etária de 22 a 42 anos]
receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e toda a pesquisa foi iniciada, após
aprovação por meio de parecer consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) - IF Goiano
Protocolo: 030/2014 (Fernandes-Sobrinho, 2016). Todos os sujeitos trabalham em seis escolas
públicas estaduais distintas e situadas em cidades, também diferentes, da microrregião a que as
escolas pertencem.
Para identificarmos a relação do Enem e do LDF com a prática pedagógica do professor, optamos
pela perspectiva qualitativa-interpretativista, por entendê-la como a abordagem metodológica mais
apropriada. Esta perspectiva considera e possibilita descrever o contexto sociocultural em que a
pesquisa se desenvolveu. Permite, também, integrar as perspectivas dos diferentes atores, ali
presentes. Nesse sentido, Chizzotti (2006, p. 70) sugere: “parte do fundamento de que há uma
relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o
objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito”.
Assim, ao pesquisarmos cenários naturais precisamos atentar, observar e interpretar os eventos
sociais que ocorrem naquele contexto. Nos dizeres de Bortoni-Ricardo (2009), a pesquisa qualitativa
procura entender, interpretar fenômenos sociais inseridos em um contexto.
Os procedimentos metodológicos da investigação, empregados nesta pesquisa qualitativa,
apresentam-se no escopo de pesquisa de análise documental (Bardin, 2011). Recordamos a parte de
nossa pesquisa que envolveu professores e professoras. Nesta fase, os questionários e a realização
das entrevistas ingressam como documentos. Situamos esta fase da referida tese de doutoramento –
aliás não central em nosso estudo – como pesquisa de depoimentos (ver, por exemplo, André, 2001).
Na outra frente de trabalho, na pesquisa em comento, identificamos e analisamos os itens do exame
e os textos do LDF e, para isso, lançamos mão da metodologia da análise de conteúdo (AC) proposta
por Bardin (2011).

2.4 Etapas da pesquisa

Recorremos a uma metodologia que nos permitiu alcançar os objetos estudados e, não menos
importante, que atendeu a critérios claramente definidos frente aos pretensos objetivos. Pensamos
em uma metodologia capaz de sinalizar uma trajetória rumo ao que pretendíamos, partindo da ideia
de que a existência intelectual de um problema deve ter sido, antes, um problema da vida prática
(Minayo, 2010).
Nesse sentido, inicialmente estabelecemos critérios que nos possibilitaram identificar e delinear o
percurso metodológico, com o propósito de atingirmos os objetivos da pesquisa, enfatizando,
sobretudo, os sujeitos; o cenário, revestido do campo da pesquisa; as técnicas utilizadas para coletar
e gerar os dados (informações), que se configuraram como etapas desenvolvidas no desenrolar do
estudo.

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De acordo com Lüdke e André (2012, p. 38) “a análise documental pode se constituir numa técnica
valiosa de abordagem de dados qualitativos além de complementar as informações obtidas por
outras técnicas de coleta".
Assim, para respondermos, com embasamento documental, as primeiras questões de pesquisa
referentes ao Enem e aos LDF: “(1) Que itens de Física do Enem (2009-2015), e de que forma, podem
potencializar discussões, a partir de TSC, no ambiente da sala de aula?; (2) De que forma, os LDF
aprovados pelo PNLD/2015 atuam como veiculadores de TSC?”, optamos por analisar mais
objetivamente os cadernos de Ciências da Natureza e suas Tecnologias (CNT), com foco maior
voltado aos itens de Física do Enem, para as edições válidas de 2009 a 2015. Além disso, analisamos,
também diretamente, os capítulos devidamente selecionados, de todos os 14 LDF aprovados no
PNLD/2015.
Diante da extensão de material analisado do Enem, adotamos como critério de delimitação amostral
a desconsideração das edições relativas às segundas aplicações do exame, quando constatadas –
aquelas edições geralmente destinadas às pessoas privadas de liberdade (PPL).
Aproveitamos para sublinhar que, no presente estudo, não enfatizamos os documentos do
PNLD/2015 (Editais e Guias do LDF) e do Enem. Por outro lado, necessariamente os visitamos, além
de consultar trabalhos (artigos, dissertações e teses) a eles relacionados, apenas como uma etapa
inicial da triagem dos documentos de interesse e relevância aos objetivos da educação Ciência-
Tecnologia-Sociedade (CTS).
O propósito maior deste procedimento foi o de nos auxiliar na identificação de itens de Física com
potencial para se trabalhar discussões a partir de TSC. Isso também nos permitiu construir roteiros e
guias de elaboração para o “questionário semiaberto”, a “entrevista semiestruturada” e a “ficha-guia
de orientação” para análise dos LDF [cf. Apêndices A.1, B.2, A.2, B.3 e C.2, presentes em Fernandes-
Sobrinho (2016)].
Para a identificação e análise dos itens de Física do Enem e dos textos constantes de LDF, com
potencial para se trabalhar TSC, optamos pela utilização de elementos da Análise de Conteúdo e da
Análise Documental (Bardin, 2011). Isso se deveu pelo fato de entendê-los como suficientes e
devidamente sistematizados, para nos auxiliar no tratamento e análise dos documentos levantados.

2.5 Análise documental e Análise de Conteúdo: breves considerações que as distinguem

Para evitarmos confusões conceituais quanto à escolha do método para análise de dados, diante do
escopo da pesquisa, dentro do aspecto qualitativo, três possibilidades de análises surgiram: a de
conteúdo, a documental e a do discurso. Esta última, por não ter relação com os propósitos deste
estudo, não discutiremos. Cumpre-nos, então, fazer uma breve explanação das outras duas técnicas
de análises.
A Análise Documental (AD) pode se apresentar como uma técnica valiosa de tratamento de dados,
seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvendando novos detalhes
de um tema ou problema Lüdke e André (2012). A utilização da AD se deu por meio de associação a
outras técnicas que derivam da utilização de instrumentos como questionário, entrevista, entre
outros (Moreira, 2005).
Bardin (2011, p. 51) define a AD como sendo “Uma operação ou um conjunto de operações visando
representar o conteúdo de um documento sob uma forma diferente da original, a fim de facilitar,
num estado ulterior, a sua consulta e referenciação” (Bardin, 2011, p. 51).
Nesse sentido, a AD consiste de uma representação do conteúdo de um documento, sob uma forma
diferente da original, mas com propósitos de facilitar a sua consulta e referenciação, posteriormente.
Laville e Dione (1999), assim como Bardin (2011), apresentam a AD como a operação de

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padronização do formato, considerando como análise o ato de atribuir um código (ou quando se
associa a uma categoria), a realização da catalogação e a elaboração de um resumo ou de uma
indexação.
Já a Análise de Conteúdo (AC), inicialmente tratada como uma metodologia para analisar e
interpretar textos conquistou status de “cientificidade” ao longo do último século, passando a ser
utilizada em várias ciências, inclusive nas sociais. Em pesquisas na área de educação em Ciências,
identificamos vários trabalhos (teses, dissertações, artigos e publicações em anais e atas de eventos
científicos) que utilizaram a AC proposta por Bardin (2011).
A partir da década de 1980, os planos metodológico e teórico abordaram a questão da inferência,
que passou a ser o destaque da AC, sobretudo com a publicação do manual de Análise de Conteúdo
de Laurence Bardin, em 1977.
Segundo Bardin (2011, p. 48), AC se configura como
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos
e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis
inferidas) dessas mensagens.
Como é possível depreender, há nuances das duas técnicas (AD e AC) que se entremeiam, porém há
também sutilezas que as diferenciam em suas essências. De acordo com Bardin (2011, p. 48)
A documentação trabalha com documentos; a análise de conteúdo com mensagens (comunicação). A
análise documental faz-se, principalmente, por classificação-indexação; a análise categórica temática
é, entre outras, uma das técnicas da análise de conteúdo. O objetivo da análise documental é a
representação condensada da informação, para consulta e armazenamento; o da análise de conteúdo
é a manipulação de mensagens (conteúdo e expressão desse conteúdo) para evidenciar os indicadores
que permitam inferir sobre uma outra realidade que não a da mensagem (Grifo da autora).
Dado que a AD se configura como uma técnica complementar à AC, no sentido de organização dos
dados a serem analisados, ao nos referirmos à análise de itens do Enem e de textos dos LDF, que são
documentos e que, portanto, estaríamos a fazer inicialmente uma AD, neste trabalho, por
comodidade de expressão, doravante denotaremos essas análises de AC. Neste caso, as
diferenciações entre uma técnica e outra será (poderá ser) feita a partir do contexto da análise [se
analisamos entrevistas; ou se analisamos documentos (Enem ou LDF)].
Diante do esquema de Bardin (2011), seguimos, inicialmente, o percurso representado pela figura 1
(abaixo), a fim de criarmos as categorias de análise.
Quantificar
Identificar
Definição

Escolha

Material Categorias
Fazer

Fazer

Ocorrência
Unidade de que Leitura Transcrição (à priori e
das
Análise Compõe o Flutuante dos Textos à
categorias
Corpus posteriori)

Fig. 1: Percurso para realizar a AC


Fonte: Elaboração nossa

O procedimento de análise das entrevistas se deu por meio da AC. Iniciamos pela definição da
unidade de análise (registro e contexto), da escolha do material que compôs o corpus, seguida de
leitura flutuante, transcrição na íntegra das falas, identificação de categorias a priori e de possíveis a
posteriori para, finalmente, identificarmos a ocorrência das categorias nos textos analisados.

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Segundo Bardin (2011, p. 147), a


categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por
diferenciação e, em seguida, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com os critérios
previamente definidos. As categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos
(unidades de registro, no caso da análise de conteúdo) sob um título genérico, agrupamento esse
efetuado em razão das características comuns destes elementos.
Entre os critérios apontados por Bardin (2011), para realizarmos a categorização (semântico,
sintático, léxico e expressivo), optamos na maioria das vezes pelo semântico, dado que nossa
intenção foi a de identificar temas (explícitos ou implícitos) nos itens ou nos textos analisados.
Junto aos professores das escolas selecionadas, realizamos um estudo interpretativo que nos
permitiu buscar compreender como eles se apropriam, utilizam e discutem conceitos e materiais
(itens do Enem e LDF), em seus registros. Recorremos, assim, à AC por se tratar de um instrumento
de análise interpretativa que busca o(s) sentido(s) de um texto (Bardin, 2011). Por meio dessa
abordagem “desconstruímos” e “construímos” a transcrição de cada entrevista, com o propósito de
nos apontar indícios de relação do Enem e do LDF com a sua prática, permitindo-nos realizar
inferências do tipo: o que o sujeito fez? Por que fez dessa maneira?
O escopo dessa metodologia é apresentado em quatro movimentos. No primeiro, fazemos uma
breve contextualização histórica dos objetivos da AC, de acordo com o proposto por Bardin (2011).
Em seguida, no segundo movimento, discutimos a metodologia utilizada a fim de estabelecermos as
bases da análise do material. No próximo movimento, apresentamos os critérios metodológicos para
codificarmos e categorizarmos o corpus – conjunto dos documentos que foi submetido à análise, o
que pressupõe, por vezes, escolhas, seleções e regras [do estudo]. Por fim, no quarto e último
movimento, discutimos a partir de hipóteses, possíveis interpretações e inferências.
Bardin (2011) se refere à AC como um conjunto de instrumentos metodológicos que se aperfeiçoa
constantemente e que se aplica a discursos diversificados. Vale ressaltar que, nesta tese, não
pretendemos apresentar a AC como uma metodologia sob pena de passarmos uma impressão
reducionista sobre ela. Por outro lado, enfatizamos apenas o seu caráter metodológico, não
discutindo, portanto, outros de seus aspectos. Desse modo, consideramos esse caráter da AC, dado
que ela não consiste de um esquema específico, mas de um esquema geral em que nos foi possível
identificar um conjunto de técnicas utilizadas no tratamento dos dados e na análise do conteúdo dos
mesmos.
Para Bardin (2011, p. 31), a AC não se restringe a um único instrumento, mas um “leque de
apetrechos; ou, com maior rigor, um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade
de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações”, podendo inclusive
permitir o desenvolvimento de pesquisas quantitativas.
Para esta autora, o método da AC consiste do tratamento da informação a partir de um determinado
roteiro. Inicia-se com (a) a pré-análise, fase em que os documentos são selecionados, formulam-se
hipóteses e objetivos para a pesquisa, (b) a exploração do material, em que são aplicadas as técnicas
específicas, em conformidade com os objetivos e (c) o tratamento dos resultados, seguidos de
interpretações. Em cada etapa desse roteiro há regras bem específicas, incluam-se as possibilidades
de sua utilização em pesquisas qualitativas e em quantitativas.
Na fase (a) da pré-análise, Bardin (2011, p. 126-130), descreve as seguintes subfases: (i) Leitura
flutuante; (ii) Escolha dos documentos; a. Regra da exaustividade; b. Regra da representatividade; c.
Regra da homogeneidade; d. Regra da pertinência; (iii) Formulação de hipóteses e dos objetivos; (iv)
Referenciação dos índices e a elaboração de indicadores; (v) Preparação do material.
Na fase (b), da exploração do material, são feitas as “operações de codificação, desconto ou
enumeração, em função de regras previamente formuladas”. Na fase (c), do tratamento dos

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resultados obtidos e suas interpretações, relacionam-se os resultados obtidos para o escopo teórico,
além de permitir o encaminhamento às conclusões da pesquisa e eventuais perspectivas futuras à
área.

3 Metodologia

No primeiro momento, objetivamos identificar fontes. A partir e dentro delas, pré-selecionamos


documentos pertinentes às objetivações da pesquisa, ainda que inicialmente, sem preocupação em
analisá-los adequadamente. Nessa ocasião, o interesse foi, basicamente, encontrarmos
materiais/informações constantes de publicações em anais de eventos científicos relacionados à área
de interesse, em periódicos nacionais e internacionais, em bancos de dissertações e teses, além de
outras fontes documentais relacionadas aos descritores: Enem, LDF e temas ou aspectos ou questões
de cunho sociocientífico, como: leis, documentos oficiais (PCN, DCNEM, Enem, PNLD, outros). Ainda
nesta fase, “percorremos” os materiais disponíveis (cadernos de provas do Enem e os LDF), conforme
mencionamos antes.
Apesar de, durante essa fase, não haver preocupação com o desenvolvimento de análises mais
apuradas, as informações foram armazenadas em arquivos nos formatos de suas publicações,
geralmente em Portable Document Format (pdf), nomeados de acordo com termos que nos
permitissem identificar, em outras ocasiões e durante o desenvolvimento da tese, a fonte, o tema, o
ano da publicação e os autores. Além disso, os arquivos foram colocados em pastas, cujos nomes
serviram também de filtro para revisitação daqueles documentos ou daquelas informações. Tabelas
do Excel 2010 foram construídas com o intuito, também, de nos prestar auxílio na organização da
coleta e armazenamento desses dados preliminares.
A partir da análise das entrevistas semiestruturadas transcritas, questões do Enem e fragmentos
textuais dos LDF, quadros foram construídos com síntese das análises que nos permitiram
estabelecer categorias, levando-se em consideração critérios propostos por Bardin (2011). Entre as
diferentes possibilidades analíticas (análise temática; características associadas ao tema central; e
análise sequencial), foi possível identificar, nas unidades de registros, registros, alguns temas que nos
auxiliaram nessas construções.

4 Considerações

Apresentamos, no presente artigo, uma possibilidade de realizar investigação qualitativa.


Descrevemos características, discutimos aspectos conceituais e procedimentais da análise
documental e da análise de conteúdo, em geral tratadas como sinônimos em trabalhos, e
apresentamos etapas do desenvolvimento da pesquisa documental. A descrição deste estudo indica
a importância das análises documental e de conteúdo na perspectiva da pesquisa qualitativa, que
possibilitam o entendimento de especificidades presentes nos registros e(ou) nos documentos,
independentemente de as utilizarmos como método autônomo ou, ainda, como oportunidade de
ampliar e aprofundar as análises em investigações.
Entre as limitações da pesquisa, consideramos: (1) que na análise das questões do exame, nosso
escopo contemplou apenas um componente curricular das CNT, Física; (2) o escopo restrito aos livros
didáticos de Física (LDF). Apesar disso, o estudo sobre o mesmo tema, também permite ser aplicado
aos demais componentes, Química e Biologia, do Enem e do LD.
Para a inserção da abordagem da educação CTS no contexto educacional, algumas ações devem ser
planejadas diante da diversidade de maneiras de se ensinar Ciências que, embora, muitas vezes

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cristalizadas diante do currículo presente nas formações iniciais de professores de Ciências Naturais
(Física, Química, Biologia e Geociências), em décadas passadas, aos poucos vêm ganhando contornos
reflexivos, diante da produção acadêmico-científica pertinente ao assunto em tela.
No caso do Enem, identificamos um conjunto de competências [aquelas marcadamente explícitas em
seus documentos balizadores e que se refletem nos itens de Física], ao tempo em que outras
competências se encontram ausentes. A título de exemplo, sentimos falta de itens que busquem
claramente aspectos da justiça social e que avancem na discussão sobre a sustentabilidade. Há um
discurso mais voltado a uma economia verde, mas que não se preocupa em garantir um ambiente
equilibrado para que as futuras gerações possam usufruir de uma vida digna (Nascimento, 2012).
Pensamos que o ideal seria que os elaboradores de itens, não apenas de Física, para o Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), passem a atentar e a contemplar
essas competências.
Os capítulos analisados das 14 coleções de LDF apontam para um conceito de “cidadão” que, muitas
vezes, aproxima-se de “consumidor”; não mais um cidadão, na condição de sujeito praticante da
efetiva cidadania, no sentido de praticante de ações políticas. Mas um consumidor situado no plano
individual, embora haja a dimensão coletiva. Parece haver um distanciamento da dimensão política,
presente no conceito de cidadania, em detrimento do apelo ao campo individual.

Agradecimentos. O presente trabalho contou com suporte financeiro do Instituto Federal Goiano, da
Universidade Federal de Goiás, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O primeiro autor é bolsista do Programa
Nacional de Pós Doutorado, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/CAPES).

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Ensino de física por investigação e a metodologia qualitativa com


delineamento de pesquisa participante

Mateus Reis Fróes Pereira¹, Maria Clara Colonna dos Santos Vasconcelos ¹, Juliana Eugênia
Caixeta¹
Rodrigo Alves Xavier²

¹ Faculdade UnB de Planaltina, Universidade de Brasília, Brasil. pmateusr@gmail.com;


colonacla74@gmail.com; eugenia45@hotmail.com
² Secretaria do Estado da Educação – DF, Brasil. rodrigoax2006@gmail.com

Resumo. Este artigo apresenta e analisa o Projeto de Ciências “Introdução à Física Mecânica”, desenvolvido
em uma escola pública do Distrito Federal, Brasil, a partir da metodologia de pesquisa qualitativa com
delineamento de pesquisa-participante. Participaram 28 estudantes e 3 professores-mediadores. Foi feita
uma análise de conteúdo do relatório dos mediadores e de 28 questionários e 28 produções livres, dos/as
estudantes. A análise originou três categorias de análise: conceitos de física; ensino de física por investigação
e pesquisa participante. Os resultados evidenciaram que o projeto Introdução à Física Mecânica foi efetivo
para o grupo de estudantes envolvidos no projeto e, também, para seus mediadores, porque gerou contextos
de ensino e de aprendizagem ricos em interação e colaboração.
Palavras-chave: ensino de física; ensino por investigação; metodologia qualitativa; pesquisa participante.

Teaching physics through research and the qualitative methodology analyzed with a participatory research
design

Abstract. This article presents and analyzes the science project "introduction to mechanical physics",
developed at a public school in the federal district, brazil, based on a qualitative research methodology with
a research-participant design. 28 students and 3 mediator teachers participated. A content analysis of the
mediators report and 28 questionnaires and 28 free productions were done, as students. Three areas were
analyzed: concepts of physics; teaching physics through participatory research, and; research. The results
showed that the introduction to mechanical physics project was effective for the group of students involved
who did not already have a project and also for their mediators, because it generated teaching and learning
contexts rich in interaction and collaboration

Keywords: physics teaching; research teaching; qualitative methodology; participant search

1 Introdução
Este artigo apresenta e analisa o Projeto de Ciências “Introdução à Física Mecânica”, desenvolvido em
uma escola pública do Distrito Federal, Brasil, a partir da metodologia de pesquisa qualitativa com
delineamento de pesquisa-participante. O uso deste delineamento de pesquisa é relevante, porque
permite: 1. que todos/as os/as envolvidos/as no processo de intervenção educacional sejam
protagonistas da ação pedagógica, num contexto de colaboração e 2. possibilita a implementação do
ensino por investigação que prevê as seguintes etapas: contextualização, problematização e teorização
(Xavier, 2016).

2 O ensino por investigação e a metodologia qualitativa


O ensino investigativo é uma abordagem que prevê um conjunto diverso de atividades pedagógicas,
fundamentadas em situações problemas, entendido como uma situação que não tem solução

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imediata, mas que pode ser resolvido, por meio do enfrentamento de tal situação (Silva, Nuñes, &
Ramalho, 2001; Silva, & Núñes, 2002; Xavier, 2016). Portanto, as atividades apresentam contextos para
constantes questionamentos, de maneira que a linha de raciocínio da experiência pedagógica seja
protagonizada pelos/as estudantes e não pelo professor (Carvalho, 2013).
A relevância de um ensino pautado na problematização é explanada por Piaget (1976) como
indispensável para a construção do conhecimento, uma vez que a utilização de problemas, ao mediar
processos educacionais, permite identificar as mudanças de conceitos. A partir da teorização de Piaget
(1976), podemos compreender que, quando instruídos a resolver um problema, os/as estudantes são
expostos a um contexto de desequilíbrio cognitivo, o que os/as leva a desenvolver estratégias de
resolução do problema, para alcançar um novo estado de equilíbrio, seja por meio da assimilação, seja
por meio da acomodação, ou, em outras palavras, seja pela utilização de conceitos prévios aplicados
à situação problema, seja pela construção de novos conceitos que permitirão resolver a situação
problema.
Carvalho (2013) concorda com Piaget (1976) sobre os problemas gerarem desequilíbrios cognitivos,
mas pondera que a resolução perpassa, também, pela interação social. Portanto, Carvalho (2013) se
vale de dois pressupostos importantes de Vigotsky (2001): o primeiro se refere à construção do
conhecimento por meio de interações sociais e o segundo, à mediação da aprendizagem, para explicar
que as situações de desequilíbrio, propostas por Piaget (1976), são resolvidas por meio de interações
com outros mediadores que dominem os conteúdos envolvidos na atividade desenvolvida. A partir
desta compreensão, teríamos que o desequilíbrio cognitivo precisa ser resolvido no espaço da inter-
ação, ou seja, na interação entre o conhecimento, quem o protagoniza e os outros sociais que atuam
no contexto.
Compreender que a aprendizagem é um fenômeno social parece essencial para o desenvolvimento de
projetos educacionais fundamentados na pesquisa qualitativa, com delineamento da pesquisa-
participante, porque o conceito central, neste delineamento, é o de colaboração, que implica em
reciprocidade, no fazer coletivo (Silva, 2016). A implicação desta compreensão para o ensino de
ciências e, mais especificamente, para o ensino de física, objeto deste trabalho, é a construção de
contextos pedagógicos que permitam diferentes tipos de interação entre estudantes, professores e
objetos de conhecimento. Portanto, um projeto de ensino, em ciências, que se qualifique como
investigativo, deve ser realizado com planejamento e intencionalidade, de modo a gerar contextos que
possibilitem aos/às estudantes a reflexão, de maneira crítica e racional, quanto a um fenômeno,
problema ou situação (Prado, Mota, Silva, & Caixeta, 2017; Costa, Caixeta, Silva, & 2017). Para isso, as
atividades da aula devem partir do questionamento da turma sobre o fenômeno estudado.
O questionamento implica em diálogo e em atuação protagonista, tão necessária a pesquisas
qualitativas, com delineamento de pesquisa participante. Assim, o ensino por investigação prevê as
seguintes etapas para acontecer: contextualização, problematização e teorização (Xavier, 2016).
A contextualização é o espaço institucional de diálogo, onde professores geram o ambiente necessário
para a apresentação do tema da aula e, também, para a identificação dos saberes prévios dos/as
estudantes, de maneira a perceber como os/as estudantes comunicam o que sabem sobre aquela
temática.
O momento de problematização envolve a construção de perguntas que são capazes de gerar
desequilíbrio cognitivo nos/as estudantes e, também, espaços de interação. A problematização, em
geral, é desenvolvida por meio de perguntas-problemas. A problematização também pode ser
desenvolvida por meio de atividades práticas como experimentos, uso de modelagem, entre outras
ações (Prado, Mota, Silva, Caixeta, & 2017).
A teorização é o espaço de sistematização do conhecimento científico. É o momento em que
professores e estudantes, juntos, constroem um espaço de interlocução que possibilita a
sistematização dos conceitos aprendidos a partir do tema inicial da aula. Esse espaço de analisar,

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perceber os resultados e tentar entendê-los, move os/as estudantes a se tornarem curiosos/as,


potencializando processos de ensino e aprendizagem com caráter autônomo, evidenciando que cada
um é sujeito da própria aprendizagem, não aceitando tudo o que lhe é apresentado, mas duvidando
das explicações dos fenômenos e possibilitando o desenvolvimento dos conceitos científicos.
O ensino por investigação exige, portanto, a participação ativa de todos/as os/as participantes nas
etapas da investigação, tornando todos/as colaboradores/as do processo de aprendizagem. Neste
sentido, a atuação do/a professor/a deve ser de elo promotor (Carlucci, 2012) entre o conhecimento,
os/as estudantes e as interações possíveis entre eles.

3 O projeto Introdução à Física Mecânica


O projeto foi realizado em uma escola pública de Planaltina, Distrito Federal, Brasil, onde um dos
professores-pesquisadores ministrava a disciplina de Ciências Naturais. Participaram do projeto 28
estudantes do nono ano do ensino fundamental e seus mediadores: 1 professor de ciências Naturais,
com mestrado em Ensino de Ciências e dois estudantes de graduação em Licenciatura em Ciências
Naturais.
A estratégia pedagógica que orientou o desenvolvimento do projeto foi o ensino por investigação
(Xavier, 2016; Silva, Nuñes, & Ramalho, 2001; Silva, & Núñes, 2002; Prado, Mota, Silva, Caixeta, & 2017;
Costa, Caixeta, Silva, & 2017), a partir do delineamento da pesquisa qualitativa participativa (Silva,
1986; Silva, 2016). Assim, a sequência didática se centrava no constante diálogo com os/as estudantes:
seja para identificar os saberes prévios deles/as sobre a temática da aula, seja para problematizá-los.
Portanto, a sequência didática foi desenvolvida em três aulas de ciências, tendo em vista dois temas:
os fenômenos estudados pela física e a medida desses fenômenos. Para tanto, os mediadores
desenvolveram, em cada aula, as três etapas do ensino investigativo: contextualização,
problematização e teorização.
A título de exemplificação, a tabela 1 apresenta parte da sequência didática da aula 1, extraída do
relatório dos pesquisadores.

Tabela 1. Apresenta excerto da sequência didática da aula 1.

AULA 1: Fenômenos da Física


Objetivo da aula: Mediar o conceito de física como área do conhecimento da ciência.
Para começar o Projeto Introdução à Física Mecânica, utilizamos a pergunta-problematizadora: o que é física. A pergunta foi
problematizadora, porque as respostas dos/as estudantes se referiam à física como uma disciplina da escola ou uma matéria
que tem cálculos, mas não como uma área do conhecimento que estuda fenômenos físicos, que têm impactos na vida social.
A partir das respostas, os mediadores conduziram uma aula expositiva dialogada sobre os fenômenos estudados pela física,
por meio da pergunta: quais coisas são essas que vocês acham que a física mede? Os/As estudantes responderam: objetos,
peso e temperatura, por exemplo. De posse destas respostas, os mediadores, junto com os/as estudantes, classificaram os
fenômenos em dois: matéria e energia.
Esta organização permitiu a construção do conceito de física mecânica como aquela área da física que trabalha com a matéria
e suas propriedades.

Para a problematização, os mediadores usavam perguntas, experimentos e pesquisas teóricas. Um


exemplo de problematização a partir de experimentos é apresentado no excerto do relatório dos
pesquisadores, disponível na tabela 2.

Tabela 2. Apresenta excerto da sequência didática da aula 2.

AULA 2: Fenômenos e medidas em Física


Objetivo da aula: Mediar os conceitos de movimento, velocidade e tempo

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Na segunda aula , nós usamos as respostas dos/as estudantes sobre movimento para construir uma atividade prática. Já que
para uma coisa se movimentar, ela tem que mudar de lugar, pedimos a um voluntário que fizesse um movimento na sala.
Então, explicamos que essa mudança de posição se chama deslocamento. Nós marcamos a posição inicial e a posição final do
movimento no chão e, pelas marcações, pudemos verificar o deslocamento do voluntário. Perguntamos se era possível medir
esse deslocamento. Os/As estudantes disseram que sim. Eles/as pegaram uma fita métrica e mediram o deslocamento. Neste
momento, introduzimos o conceito de velocidade como uma medida de movimento ligada à quão rápida essa mudança de
posição pode acontecer. Para tornar clara a definição, perguntamos: como podemos saber se a mudança de posição efetuada
por um aluno é mais rápida que por outro aluno? Em debate, a turma concluiu que era o tempo que cada um gastava para
realizar o movimento que determinaria a rapidez. Com a ajuda de um cronômetro, eles/as conseguiram medir o tempo do
deslocamento dos voluntários. Com o tempo e a distância, apresentamos a razão que permite calcular a velocidade.
Velocidade é a razão entre o deslocamento e o tempo, que representa, segundo os/as estudantes: quanto eu ando em
comprimento em tanto tempo.

4 Análise do Projeto Introdução à Física Mecânica


Para realizar a organização e a análise dos dados, foi utilizada a técnica de análise de conteúdo. A
análise de conteúdo é definida como um método de leitura e interpretação de dados, dividido em
cinco etapas gerais, sendo eles: 1. preparação das informações; 2. transformação dos conteúdos em
unidade; 3. classificação das unidades em categorias; 4. descrição e 5. interpretação (Bardin, 2009;
Moraes, 1999).
É importante explicar que as categorias emergiram dos discursos analisados.

4.1. Corpus de análise

Análise de conteúdo foi feita a partir de:


• 28 produções livres feitas pelos/as estudantes na primeira aula.
Para a construção dessas produções, foi solicitado, ao final da primeira aula, que cada estudante
expressasse, de qualquer maneira: desenho, texto corrido ou poesia, o que ele/a entendia por
movimento.
• 28 questionários.
O questionário continha perguntas dissertativas e também perguntas de múltipla escolha. Ao todo, o
questionário continha X perguntas, sendo elas:
1. No projeto, você conseguiu construir algum conceito que ainda era difícil de entender? Qual/Quais?
2. Alguma atividade do projeto foi desconfortável ou desinteressante para você? Descreva esse
momento.
3. Há alguma atividade que você gostaria de ter feito durante o projeto?
4. Escreva, brevemente, sobre o que você achou do projeto. Escreva sobre o que pode ser melhorado,
o que mais gostou e o que menos gostou.
5. Dos seguintes conceitos, quais você conseguiria explicar para algum colega? a) dimensão b) unidade
de medida c) grandezas físicas d) referencial e) posição f) deslocamento g) intervalo de tempo h)
movimento uniforme i) movimento acelerado j) velocidade k) aceleração l) inércia m) força n) ação e
reação.

• 1 relatório do Projeto.
O relatório foi realizado pelos mediadores, estudantes de graduação, após a finalização do Projeto.

4.2. Categorias de análise

Foram construídas três categorias de análise: conceitos de física; ensino de física por investigação e
pesquisa participante.

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4.3. Apresentação dos Resultados

Os resultados serão apresentados e discutidos, considerando cada categoria que emergiu da análise
de conteúdo.
a) Conceitos de Física: esta categoria evidencia que tanto os mediadores quanto os/as estudantes
usaram as mesmas subcategorias para apresentar o que ensinaram e o que aprenderam,
respectivamente. Assim, os conceitos de Física podem ser subdivididos em: i) fenômenos: como
energia, movimento, força; b) grandezas: como tempo, deslocamento e c) medidas: quilômetros,
metros, segundos.
Os conceitos de física que foram escolhidos para serem ensinados estavam explícitos no relatório dos
mediadores, como pode ser lido do excerto a seguir:
“A última etapa consiste em uma conceituação importante a respeito da mecânica, esses conceitos são
os de movimento retilíneo uniforme (MRU) e movimento uniformemente variado (MRUV). Ao propor a
análise da palavra uniforme, surgiram respostas com associações a algo que não se altera, para
construir o entendimento que em um movimento uniforme os alunos entenderam a velocidade é
sempre constante.” [Trecho do relatório].
Percebe-se, no relatório, uma preocupação dos mediadores em utilizar, ao mesmo tempo, a
nomenclatura típica da física: movimento retilíneo uniforme e movimento retilíneo uniformemente
variado com construções realizadas pelos/as estudantes a partir do experimento da aula 2 (ver tabela
2).
Sobre os conceitos aprendidos, os/as estudantes evidenciaram, igualmente, fenômenos, grandezas e
medidas. Apresentamos exemplos das produções deles/as, usando nomes fictícios.

“Eu entendi que a dimensão é aquilo que se pode medir. A unidade é a forma que se mede. Então tudo
que existe e a agente pode ter contato ou seja tocar e que tem comprimento, massa e tempo, é uma
dimensão.” [Produção livre do estudante Carlos].

Fig. 1. Produção livre do estudante Rafael..

Os exemplos de textos e imagens evidenciam que os/as estudantes apresentaram termos da física
(massa, tempo, dimensão), instrumentos que permitem a mensuração das grandezas (cronômetro) e,
também, as unidades de medida. Esta utilização dos nomes corretos dos fenômenos, instrumentos e
medidas nos levam a crer na apropriação dos conceitos ensinados pelos mediadores por meio da
estratégia de ensino por investigação, o que, também, pôde ser verificado nos excertos a seguir,
extraídos dos questionários respondidos pelos/as estudantes:

“No projeto, você conseguiu construir algum conceito que ainda era difícil de entender? Qual/quais?
Sim. Deslocamento, pois eu confundia com posição. Dos seguintes conceitos, quais você conseguiria

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explicar para algum colega? a) dimensão b) unidade de medida c) grandezas físicas d) referencial e)
posição f) deslocamento g) intervalo de tempo h) movimento uniforme i) movimento acelerado j)
velocidade k) aceleração l) inércia m) força n) ação e reação. A) B) C) D) E) F) J) K) M) N)” [Resposta
do estudante Lucas]

“Dos seguintes conceitos, quais você conseguiria explicar para algum colega? a) dimensão b) unidade
de medida c) grandezas físicas d) referencial e) posição f) deslocamento g) intervalo de tempo h)
movimento uniforme i) movimento acelerado j) velocidade k) aceleração l) inércia m) força n) ação e
reação. A) D) E) F)” [Resposta da estudante Gisele]

Ainda que nem todos/as os/as estudantes tenham reconhecido terem aprendido todos os conceitos,
a maioria, 89% deles/as, manifestaram, pelo questionário, a aprendizagem de mais de 50% dos
conceitos listados na questão 5 do questionário.

b) Ensino de Física por investigação: a estratégia pedagógica de ensinar física por meio do ensino por
investigação foi qualificada positivamente tanto pelos/as estudantes, quanto pelos mediadores. Os
questionários e o relatório foram os registros que permitiram evidenciar a avaliação de todos/as os/as
participantes da pesquisa sobre a estratégia pedagógica, pautada na contextualização,
problematização e teorização (Xavier, 2016). Três subcategorias foram construídas para analisar o
ensino de física por investigação: envolvimento, explicação e efetividade.
O envolvimento diz respeito à motivação e à interação. A motivação foi percebida, especialmente, no
relatório dos mediadores, quando trataram a vontade de participar dos/as estudantes:
“Eles mostraram gostar da mediação pautada em perguntas. Eles gostavam de responder as perguntas
que eram feitas algumas vezes com tons de indução ou algo assim” [Trecho do relatório].
“Eles participaram com empolgação das atividades. Quando propusemos medidas e outras atividades
práticas, logo eles se voluntariavam [Trecho do relatório].

A interação foi ressaltada como um significado nuclear da proposta pedagógica. O termo diálogo ou
dialógico foi presente no relatório e parecia demonstrar a preocupação dos mediadores em gerarem
contextos de protagonismo entre os/as participantes. A interação, entendida como a inter-ação ,
aconteceu expressamente como a ação de uma pessoa, interferindo na outra. No caso do projeto, a
ação de um/a participante tinha potencial para interferir e mediar a aprendizagem do/a outro, como,
por exemplo, no caso da participação dos voluntários:

“Os alunos mostraram entender que a velocidade se dá a partir da relação entre deslocamento e
intervalo de tempo. Com os dados de deslocamento e intervalo de tempo recolhidos na
experimentação, os alunos puderam medir qual foi a velocidade média do colega naquele movimento
realizado entre as duas posições.” [Trecho do relatório]

Sobre a interação, é importante acrescentar que esta categoria também esteve presente nas
produções dos/as estudantes, como pode ser verificado no exemplo a seguir:

“Eu gostei quando todos começaram a interagir e a fazer perguntas”. [Resposta do estudante Marcus
Vinicius].

Ainda sobre a subcategoria interação, é preciso pontuar que a timidez, advinda de não conhecerem
dois dos mediadores do projeto com intimidade, foi presente tanto nos relatórios dos mediadores
quanto nas respostas dos/as estudantes ao questionário.

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“A investigação é uma maneira alternativa de ensino, como os alunos estão acostumados com o
método tradicional, ficam retraídos e com vergonha de responder as perguntas, de interagirem. Os
alunos já tinham convívio com o professor regente, ao terem o primeiro contato com os pesquisadores,
que ministraram o curso, ficaram retraídos.” [Trecho do relatório].

“O que eu menos gostei foi quando vocês entraram e nós ficamos retraídos pois já estávamos
acostumados com os professores do dia-a-dia.” [Resposta do estudante Marcus Vinicius].

A efetividade do curso foi evidenciada pelos significados de aprendizagem dos conceitos construídos
pelos/as estudantes. Esta aprendizagem foi expressa no questionário e, também, nas produções livres
e no relatório. É importante ressaltar que por efetividade estamos entendendo a percepção da pessoa
sobre o impacto do projeto para si mesma/o e outros (Manfredi, 2013).

“O curso foi uma boa experiência, pois aprendi coisa que não sabia” [Resposta da estudante Mariana].
“Eu gostei muito, achei bem interessante, o que eu gostei mais foram os exemplos, deu para entender
bastante” [Resposta da estudante Helena].

A subcategoria explicação aborda os significados relativos às contradições expressas pelos/as


estudantes e mediadores sobre o ensino por investigação. É uma estratégia que traz benefícios
reconhecidos pelos/as estudantes, mas que traz incertezas, por se tratar de um conjunto de atividades
que não exige, obrigatoriamente, cálculos; mas reflexões. Assim, tanto estudantes quanto mediadores
registraram o estranhamento da metodologia:
“Analisando os questionários, percebemos que eles gostaram das atividades propostas, porém alguns
poucos sentiram falta dos cálculos” [Trecho do relatório]

“Foi desconfortável porque eu estou acostumado com um tipo de explicação e vocês explicam de
modo diferente” [Resposta do estudante Marcus Vinícius].

c) Pesquisa participante: esta categoria permitiu analisar as contribuições da metodologia qualitativa,


com delineamento de pesquisa participante, para o desenvolvimento do projeto educacional
Introdução à Física Mecânica.
A participação foi entendida a partir de dois significados: protagonismo e possibilidade.
Como protagonismo, a participação emergiu como a atuação propriamente dita do/a estudante e dos
mediadores no processo de ensinar e aprender. Relaciona-se à posição de fala que cada pessoa
participante do projeto e o conjunto delas construiu. Por serem protagonistas, as pessoas expressavam
suas opiniões e apresentavam seus centros de interesse no processo mediacional, por meio de suas
falas, de suas escritas e de sua atuação na sala de aula.

“(...) as estratégias metodológicas devem propiciar a imersão do aluno no ambiente de aprendizagem,


onde ocorra a interação disciplinar, a significação dos conceitos integrando saberes científicos e
saberes do cotidiano (XAVIER, 2016, p.08)”. [Trecho do relatório].

A participação como possibilidade se relaciona à mediação, ou seja, às escolhas que os mediadores


fizeram de construir contextos em que os/as estudantes se posicionassem como pessoas com voz e
vez. A mediação, ou seja, a ação desenvolvida com e entre os/as participantes do projeto foi pautada
no diálogo e na troca de percepções e certezas sobre os fenômenos investigados.

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“Essa lei[Terceira Lei de Newton] foi trabalhada com uma atividade simples, atirar uma bola de vôlei
na parede,usando, para problematizar, a seguinte questão: por que a bola bate na parede e volta?
Rapidamente, os alunos conversaram, trocaram idéias e concluíram que alguma força estaria
empurrando a bola de volta. Os professores mediaram a discussão até o entendimento de que a bola
bate na parede com uma certa força, e a parede bate na bola com uma força de mesma intensidade,
porém com uma direção contrária, lembrando que força possui além de módulo, direção e também
sentido.” [Trecho do relatório].

5 Discussão
Os resultados evidenciaram que o projeto Introdução à Física Mecânica foi efetivo para o grupo de
estudantes envolvidos no projeto e, também, para seus mediadores, porque gerou contextos de
ensino e de aprendizagem ricos em interação e colaboração. As etapas do ensino investigativo,
contextualização, problematização e teorização, propostas por Xavier (2016), foram possíveis de
serem executadas e geraram interesse e atenção por parte dos/as estudantes.
A utilização do ensino investigativo no ensino de física, numa pesquisa participante, fomentou a
participação dos/as envolvidos/as numa concepção que envolve a interação (Vigotsky, 2001), o
protagonismo (Pires, & Branco, 2012) e a mediação (Carvalho, 2013; Vigotsky, 2001 ). A interação se
relaciona ao estar disponível para trocas de saberes num espaço em que nem eu tenho o saber
completo e nem tu tens o saber completo, mas, juntos, vamos tecendo o conhecimento num espaço
de encontros, confrontos e de negociação de significados sobre os fenômenos naturais a partir,
também, da minha vivência sociocultural (Vigotsky, 2001). O protagonismo se relaciona à capacidade
de analisar o contexto, tomar decisões e atuar, considerando, também, os outros envolvidos e o
ambiente (Pires, & Branco, 2012). E, por fim, a mediação se refere, neste contexto, a duas dimensões:
1. à ação pedagógica intencional dos mediadores de usar instrumentos e símbolos para gerar espaços
de aprendizagem, que Vigotsky (2001) nomeou de zona de desenvolvimento proximal, ou seja, espaços
em que a ação de alguém mais experiente provoca contextos de aprendizagem mais elaborados para
que o outro tenha acesso a informações mais complexas e sistematizadas e 2. à ação dos/as
próprios/as participantes de, também, problematizarem as respostas uns/umas dos/as outros/as, a
partir do diálogo que a metodologia permite.
O projeto evidenciou que utilizar o ensino investigativo e a metodologia qualitativa com delineamento
de pesquisa participante acarreta desequilíbrios nos/as participantes (Piaget, 1976) ao mesmo tempo
em que possibilita a construção colaborativa do conhecimento, o que pode permitir avanços nos
processos de ensino e aprendizagem de ciências.
Considerando a escolha da metodologia qualitativa com delineamento participante para este projeto,
defendemos que esta escolha metodológica não se refere apenas a ela ser corriqueira em pesquisas
em educação, mas, para além disso, ela foi escolhida por permitir: a) que os contextos sociais em que
os/as participantes estão inseridos/as fossem levados em consideração para uma análise integral do
fenômeno investigado (Ludke, & André, 1986; Silva, 1986); b) a imersão no contexto da sala de aula
para desenvolver o projeto educacional; c) por permitir uma ampla construção de informações, uma
vez que cada expressão gerada a partir da interação entre as pessoas envolvidas se torna significativa
para uma análise posterior (Godoy, 1995) e d) alcançar uma mudança no contexto em que a pesquisa
é desenvolvida, onde todos/as os/as participantes são responsáveis pelos processos de construção de
conhecimento, integrados à ação. Por isto, a participação das pessoas envolvidas na pesquisa não deve
ser limitada apenas a atividades guiadas e estabelecidas por um mentor, mas sim uma participação
colaborativa, a qual todos são responsáveis pelo conhecimento produzido (Silva, 1986).

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6 Considerações Finais
A escolha por analisar a efetividade do projeto Introdução à Física Mecânica, elaborado por meio da
pesquisa qualitativa com delineamento de pesquisa participante, tendo como estratégia pedagógica o
ensino por investigação, se deu pela necessidade de uma mudança no processo de ensino dos
conceitos de física na escola. Para realizar o projeto, a interação, a mediação e o protagonismo foram
elementos chaves para o desenvolvimento de um ensino de física contextualizado, problematizado e
teorizado.
A ação conjunta entre estudantes e mediadores permitiu identificar os saberes prévios dos/as
estudantes e, partir deles, para construir espaços de diálogo, observação e criação que favorecessem
a construção dos conceitos científicos em física mecânica. Para tanto, o projeto utilizou de aulas
expositivas dialogadas, experimentos e perguntas problematizadoras que permitiram, primeiro, os/as
estudantes entenderem os fenômenos físicos, para, num segundo momento, entenderem os cálculos
matemáticos e seus significados.
A prática pautada no ensino por investigação favoreceu o envolvimento e a imersão dos/das
estudantes no processo de ensino e aprendizagem por meio da ação voluntária e intencional,
viabilizada, inclusive, pela metodologia da pesquisa qualitativa com delienamento de pesquisa
participante. Este delineamento metodológico concedeu a estrutura flexível necessária para a imersão
e atuação de pesquisadores e participantes, com vistas à promoção de mudanças, a partir da
colaboração entre eles.

Agradecimentos. Escola Vale do Amanhecer, Universidade de Brasília, Instituto Bancorbrás de Responsabilidade


Social.

Referências

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Carvalho, A.M.P. (2013). O ensino de ciências e a proposição de sequências de ensino investigativas.
In: Carvalho, A. M. P. (Org.) Ensino de ciências por investigação: Condições para implementação
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Costa, B.C.A. da, Caixeta, J.E.,& Silva, R.L.J. (2017). Química dos Polímeros: uma proposta de
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Godoy, A. S. (1995). Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. Revista de Administração


de Empresas, 35(2), 57-63.
Ludke, M., & André M. (1986). Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU.
Manfredini, C. A. F. (2013). A efetividade dos códigos de ética empresarial na percepção do executivo
brasileiro de empresas nacionais sujeitas à lei Sarbanes-Oxley – Uma análise exploratória baseada
no modelo de Singh. Dissertação [Mestrado]. Escola Brasileira de Administração Pública e de
Empresas. Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro.
Moraes, R. (1999). Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, 22(37), 7-32.
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Prado, O. A. M., Mota, I.J. de A., Silva, L.T.C. da, & Caixeta, J.E. (2017). Ensino de Ciências, perguntas e
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Silva, M. O. (1986). Refletindo a pesquisa participante. São Paulo: Cortez.
Silva, R.L. J. da. (2016). Tema água: uma contribuição para o desenvolvimento de percepções,
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Silva, S. F. da, Núñez, I. B., & Ramalho, B.L. (2001). O pensamento do professor: o trabalho com
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Disponível em: http://abrapecnet.org.br/atas_enpec/iiienpec/Atas%20em%20html/o86.htm.
Acessado em 04.05.2017.
Silva, S. F. da, & Núñez, I. B. (2002). O ensino por problemas e trabalho experimental dos estudantes:
reflexões teórico-metodológicas. Química Nova, 25(6b), 197-
1203. https://dx.doi.org/10.1590/S0100-40422002000700023.
Vigotsky, L. S. (2001). A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes.
Xavier, R.A. (2016). O ensino por investigação, favorecendo o desenvolvimento de atitudes e
procedimentos: uma proposta didática aplicada em sala de aula. Dissertação [Mestrado].
Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências. Universidade de Brasília, Brasília.

893
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Prácticas y discursos de la investigación formativa en Instituciones


Educativas de nivel medio

Luis Eduardo Ruano1, Andres Torres Cap2, Ernesto Congote2


1
Profesor Investigador. Programa de Psicología, Universidad Cooperativa de Colombia, Sede Popayán,
luiseruano@gmail.com
2
Investigadores Programa de Psicología, Universidad Cooperativa de Colombia, Sede Popayán,
ernesto.congote@hotmail.com; andretocap@hotmail.com

Resumen. El artículo caracteriza y describe posiciones discursivas asociadas a la investigación formativa en


Instituciones Educativas de nivel medio en la ciudad de Popayán-Colombia; a partir del método de análisis
sociológico del sistema de discursos y basado en entrevistas estructuradas, se presentan cuatro categorías
tipológicas (Aventajada, Dotada, Empírica, Desprovista), que evidencian la relación entre las categorías de
análisis (percepción, práctica, disposición institucional y currículo académico) y la disposición de las
instituciones frente al desarrollo de procesos investigativos. Pretende aportar al reconocimiento de la
investigación formativa como base para realizar investigación científica, así como reafirmar el rol de las
instituciones educativas, en la formación de sujetos capaces de emplear diferentes perspectivas teóricas y
metodológicas, para comprender, estructurar, estudiar y resolver los diferentes problemas y fenómenos que
afronta la sociedad.
Palabras clave: investigación formativa; investigación científica; pedagogías de la investigación.

Practices and discourses of formative research in middle level educational institutions Practices and
discourses of formative research in middle level educational institutions
Abstract: This article characterizes and describes discursive positions associated with formative research in
intermediate educational institutions in the city of Popayán-Colombia; Based on the method of sociological
analysis of the discourse system and based on structured interviews, four typological categories are presented
(Outcome, Endowed, Empirical, Deprovided), which show the relationship between the categories of analysis
(perception, practice, Academic curriculum) and the disposition of institutions towards the development of
investigative processes. It aims to contribute to the recognition of formative research as a basis for conducting
scientific research, as well as reaffirming the role of educational institutions in the education of subjects
capable of using different theoretical and methodological perspectives to understand, structure, study and
solve different problems And phenomena towards society
Key words: Formative investigation, scientific investigation; research Pedagogies.

1 Introducción

Durante los últimos años, la investigación científica, se ha constituido como un componente


importante en el desarrollo de los países, los cuales, a partir de estudios teóricos y aplicados
formulados desde distintas disciplinas, construyen conocimientos y resuelven necesidades relevantes
en su contexto. Desde esta perspectiva, la educación, se presenta como un medio efectivo a través del
cual, se practican y entrenan habilidades relacionadas con la investigación, como el planteamiento y
resolución de problemas, búsqueda y recolección de información, formulación de hipótesis, diseño de
estrategias metodológicas, uso de herramientas tecnológicas y desarrollo de técnicas que promuevan
la comprensión de determinado fenómeno o contribuyan a la resolución de necesidades relevantes
social y disciplinariamente (Sampieri, 2010).
Actualmente, diferentes contextos (académicos, laborales, sociales, entre otros) requieren la
presencia de profesionales que –independiente de su disciplina—sean investigadores; esto significa,

1968
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que además del conocimiento disciplinar, los mejores profesionales deben saber desarrollar procesos
sistemáticos, críticos y empíricos, que evidencien el conocimiento del método y su aplicación
coherente, para analizar y resolver los diferentes problemas y situaciones que se presentan en su
entorno.
En el caso de las instituciones educativas, la enseñanza de la investigación se ha convertido en un
indicador de calidad académica; de este modo, “las instituciones educativas buscan diferenciar a sus
alumnos del resto y por ello hacen un mayor énfasis en la investigación (…). No saber respecto a los
métodos de investigación implicará rezagarse” (Sampieri, 2010 P. XXVI). Sin embargo, como refiere
Rojas, la implementación de la investigación formativa es una cuestión relativamente nueva, por lo
que las instituciones de educación media, enfrentan el reto de disponer y diseñar estrategias y
escenarios adecuados para llevar a cabo procesos incluyentes y significativos de aprendizaje (2009).
Así, las instituciones y sus docentes son los principales responsables de moldear percepciones y
posiciones que promuevan la enseñanza y práctica de la investigación, incluso desde los niveles
iniciales de educación; en este sentido, el concepto de investigación formativa, conlleva una profunda
transformación en la manera de educar a los sujetos (Rojas, 2009).
La investigación científica como meta superior de la investigación formativa, está rodeada de “mitos”
o percepciones erróneas que obstaculizan su ejecución (Sampieri, 2010; Ruano, 2016). En este sentido,
el primer reto que deben asumir las instituciones educativas para formar investigadores es analizar sus
propias actitudes y disposición hacia la investigación, considerando herramientas, conocimientos y
estrategias para llevar a cabo procesos eficaces de enseñanza, que modelen una nueva generación de
estudiantes-investigadores capaces de interpretar, resignificar y transformar la realidad.

2 Aproximación teórica

La investigación, exige un modelo de enseñanza con miras a establecer una reformación significativa
de la vida humana, a partir de una nueva concepción en la relación del sujeto con el conocimiento, y a
partir de la conversión del sujeto como investigador acérrimo, haciendo uso de la historicidad,
temporalidad y lingüísticidad hermenéutica del conocimiento. De este modo, investigar conlleva “la
búsqueda del sentido, articulación de las ideas y desarrollo de argumentaciones”, esto significa
cuestionar y cuestionarse, así como plantear interrogantes sustanciales en procesos de ensayo y error
(Rico de Alonzo, 1996.4).
Según el Centro Nacional de Acreditación (CNA, 1998) citado por Restrepo (2002) la investigación
formativa plantea tres acepciones del término ligadas a su aplicación. Una primera acepción de la
investigación formativa sería la investigación exploratoria que se refiere a la búsqueda de necesidades,
problemas e hipótesis, y poblaciones relevantes para estructurar o refinar proyectos de investigación
cuando no están claros ni en metodología, ni en datos. En esta, el aprendiz realiza sondeo en artículos,
documentos e investigaciones terminadas, para plantear problemas relevantes y pertinentes, o
soportar explicaciones tentativas de los mismos.
Una segunda acepción se refiere a la formación en y para la investigación, lo cual se hace a través de
actividades que no necesariamente hacen parte de un proyecto concreto de investigación. Su
intención es familiarizar con la investigación, con su naturaleza como búsqueda, con sus fases y
funcionamiento. Se trata de la formación del estudiante, no de dar forma al proyecto de investigación,
lo que se busca es enseñar al estudiante a que aprenda la lógica y actividades propias del investigador
y la investigación científica, establecido en el aprendizaje basado en los problemas y en solución de
problemas.
La tercera acepción, concibe a la investigación como elemento de trasformación en la acción y práctica,
siendo un tipo de investigación realizada para aplicar sus hallazgos sobre la marcha, para afinar y

1969
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mejorar los programas mientras están siendo desarrollados, para servir a los interesados como medio
de reflexión, y aprendizaje sobre sus programas y usuarios.
En suma, “la investigación formativa sirve como posibilitador de la transformación en la práctica, sin
que pueda considerarse en estricto sentido como investigación científica, pues dista de ella en la
profundidad, criterio metodológico y la configuración de las líneas de estudio” (Rodríguez, 2009 p.28).
Es importante resaltar que la investigación formativa en el terreno pedagógico de la investigación,
cuenta con métodos y prácticas de docencia investigativa ensayados por las instituciones y sus
docentes. Estos, además de promover la familiaridad del estudiante con métodos y metodologías, se
orienta al propio aprendizaje de los modelos de investigación (Rojas, 2009).
Para el caso colombiano, desde la década de los 90 el CNA planteó el concepto de investigación
formativa como un proceso necesario entre el docente y el estudiante, en el marco de desarrollo del
currículo de un programa y que es propio de la dinámica de la relación con el conocimiento. Este
proceso es necesario en todas las dinámicas académicas tanto en el aprendizaje por parte de los
estudiantes, como en la renovación de la práctica pedagógica por parte de los docentes. Es una
generación de conocimiento menos estricta, menos formal, menos comprometida con el desarrollo
mismo del nuevo conocimiento o de nuevas tecnologías (Restrepo 2002).
Entre tanto, como afirma Stenhouse citado por Rojas & Méndez, (2013), más allá de la formalización
legal de la investigación formativa en las instituciones de nivel medio, debe asumirse como una actitud
problematizadora y crítica del aprendizaje, destinada a la producción y el uso del conocimiento de
manera particular y contextual, muy cercana a los participantes. Es importante tener en cuenta que la
calidad de la formación en ciencia e investigación descansa en la índole misma de la docencia, en la
construcción en el aula de un ambiente interactivo que propicie un proceso compartido, de
construcción del conocimiento. Siendo así, la investigación en el aula y de aula, juegan un papel muy
importante en la construcción del saber científico, ya que son estrategias de enseñanza participativas,
que hacen posible afirmar una pedagogía de la investigación, como proceso intencionado de
formación, asumiendo que el mayor peso de su realización descansa en el docente, que debe
desarrollar un recorrido científico a la par de un proceso de educación (Rojas & Méndez, 2013).
Sin embargo, como lo plantean Rojas y Méndez (2013), existe una profunda desmotivación entre los
estudiantes y docentes hacia el tema de investigación formativa, pues no es clara la vinculación entre
las instituciones educativas y la docencia, ni el aporte que mutuamente deben generar. Por el
contrario, la investigación científica puede estar en un nivel institucional y académico diferenciado y
aislado de los procesos de formación, y la docencia se muestra como un elemento muy estable como
para sostenerlo a los campos investigativos. Por eso se plantea que la formación de investigadores es
un problema pedagógico que debería constituirse como una necesidad social de alto impacto.
Entonces en las instituciones de nivel medio debe iniciarse con una inducción investigativa que sea un
proceso integral y sistemático, abierto a diferentes situaciones y sujetos de investigación, flexible a las
competencias cognitivas, afectivas y comportamentales del estudiante. Este proceso debe tener un
sólido contenido científico-académico, para adquirir información innovadora, relevante y de calidad
que permitan transitar por diversos espacios teóricos, metodológicos, creadores de conocimiento
específico que conlleve a establecer relaciones con investigadores, recursos materiales y equipos
tecnológicos necesarios para la acción docente en la investigación y la futura acción investigadora de
los estudiantes (Malo, 2007. P. 20).
Finalmente, es importante tener en cuenta que Colombia se encuentra inmerso en un proceso de
globalización, es por esto que el país en la actualidad apunta al desarrollo investigativo en ciencia y
tecnología, buscando posicionarse competentemente a la par de naciones de primer orden. No
obstante, la baja preparación científica existente en el país, deriva de un modelo educativo que apunta
a educar ciudadanos que son competitivos operacionalmente en el ámbito laboral, pero que en el

1970
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

desarrollo de sus actividades de pensamiento académico han tenido un pobre avance. (Peña 2013 P.
1).

3 Metodología

Se presenta un ejercicio metodológico propio del enfoque cualitativo, mediante el análisis sociológico
del sistema de discursos, como técnica pragmática que redunda en una clara exposición de, por
ejemplo, los distintos tipos y niveles de análisis del discurso, así como de sus unidades de análisis
(Gutiérrez del Álamo, 2010 y Ruano, 2015). Se analiza un corpus documental, compuesto por 20
entrevistas estructuradas (6 estudiantes, 10 profesores y 5 directivos) de cinco instituciones educativas
de nivel medio de la ciudad de Popayán – Colombia (Valles, 2009). El análisis se realiza en el entendido
de que cada forma de análisis conlleva una definición de lo que se entiende por discurso, por lo que
siempre se regresa a la intención inicial, donde los objetivos marcan el tipo de análisis y técnicas. Basta
con la constante referencia a la consideración del discurso como una práctica social y basada en
ejemplificantes procesos, mediante los que se exponen los resultados del análisis en las prácticas de
los discursos analizados (Gutiérrez del Álamo, 2010).

4 Modelo Central

El modelo propuesto, constituye el elemento central que orienta los resultados de la investigación. Se
exponen cuatro tipologías de Instituciones Educativas (IIEE) de nivel medio: aventajada, dotada,
empírica y desprovista. Estas presentan posiciones discursivas y actitudes relativas a cada estilo de
docencia, permitiendo su identificación con uno o más ejes (conocimiento, práctica, disposición
institucional, currículo académico). El esquema sugiere el interés como elemento catalizador que
promueve el proceso de investigación.
En la parte superior del esquema se sitúan las IIEE, en las que sus docentes manifiestan tener
conocimiento acerca de la investigación formativa (dotada y aventajada) caracterizadas por reconocer
la importancia que tiene la investigación formativa en el proceso de aprendizaje de los estudiantes. En
la parte inferior, se encuentran las IIEE que poseen limitados conocimientos en cuanto a la
investigación científica (Desprovista y empírica), caracterizados por la poca disposición institucional
respecto al apoyo financiero e infraestructura necesaria para llevar a cabo la investigación formativa.

1971
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Fig. 1. Tipología de Instituciones Educativas, cada tipo se correlaciona con uno o más ejes. El eje X representa el currículo
y la práctica, el eje Y representa la disposición institucional y el conocimiento.

5 Análisis

Se realiza una aproximación a cada tipología, como una forma de caracterizar y distinguir las posiciones
discursivas asociadas a cada una. Los datos que se presentan, surgen de la información recabada de
las entrevistas realizadas a profesores, estudiantes y directivos de IIEE.
Institución Aventajada: es aquella institución en la que la investigación formativa representa una parte
importante del currículo, posee tanto la infraestructura, como el interés y conocimientos por parte de
los docentes, para la formación de los estudiantes, realiza proyectos para llevar a la práctica la
investigación y formar en los estudiantes un pensamiento crítico e innovador.
Institución Dotada: es la institución educativa que cuenta con la infraestructura y el apoyo financiero
para la realización de proyectos de investigación, los docentes cuentan con los conocimientos
adecuados para su realización, pero la investigación formativa no es tenida en cuenta y no asume como
un elemento importante dentro del currículo educativo. De igual manera, es mínima la práctica
investigativa que los docentes llevan a cabo, limitándose a su enseñanza teórica.
Institución Empírica: es la institución que incluye la investigación formativa en su currículo académico,
no cuenta con una infraestructura adecuada para la realización de proyectos de investigación
científica, en general los docentes no tienen dominio de conocimientos idóneos para enseñar la
investigación, entre tanto, se esfuerzan por llevar a la práctica los procesos investigativos, e incluir
activamente a sus estudiantes.
Institución Desprovista: es la institución en la cual no hay infraestructura ni apoyo financiero para
realizar investigación, la misma no se asume como un tema importante del currículo académico, los
docentes no la perciben como un tema relevante en sus asignaturas y no la transmiten a sus
estudiantes ni de modo teórico, ni práctico.

6 Pares sémicos y ejes estructurantes

En esta sección se propone diferenciar características asociadas a cada tipología, a partir de la


identificación de citas textuales de las entrevistas (Valles, 2009); las cuales se transcribieron
literalmente y de manera detallada, con el objetivo de comprender el discurso de la posición social,
liberado de su producción experimental (Gutiérrez del Álamo, 2010). De este modo, se obtiene la vida
propia del discurso, de la producción lingüística de aquellos pares sémicos (Gutiérrez del Álamo, 2010),
que presentan mayor oposición e incorporan de mejor forma el resto de códigos (Corbin & Strauss,
2002). Se ubican en la primera parte de la lista a modo de referencia el par (Aventajada-Desprovista),
por ser las tipologías que se contraponen de forma más incisiva en el modelo central, a diferencia de
las tipologías (Dotada, Empírica) que pueden ser consideradas de transición.

Tabla 1. Pares Sémicos y Ejes Estructurantes

Ejes Conocedor Explorador

Percepción de “La investigación científica es una herramienta que “Yo lo digo desde mi óptica; la investigación
la nos ha permitido tanto en el área de ciencias científica es un elemento en el que hay que hacer
investigación naturales como en los proyectos llevar al trabajo con los estudiantes para que se motiven a
estudiante a la búsqueda del conocimiento no hacer observaciones preguntas hipótesis y hacer

1972
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desde la parte teórica como tal como se hace en la experimentación, sin embargo, la investigación
educación tradicional, sino que trascendemos y científica es algo bien complejo de hacer con los
buscamos unos espacio ya no desde el aula, sino estudiantes que se va aprendiendo con el
desde espacios abiertos utilizando la investigación transcurso del tiempo.” (Docente 6, IE 3,
como una metodología que permita llegar a Entrevista 10)
mejores aprendizajes y alcanzar un conocimiento “A los estudiantes se les puede enseñar a observar
más próximo del tema de estudio” (Docente 1, IE 1 y buscar, porque ya la investigación científica
Entrevista 2) como tal tiene requerimientos muy rigurosos y
“Es gratificante trabajar con la investigación, obviamente requiere de información más
cumplir con la labor académica de llevar al avanzada si quiere análisis de preguntas
aprendizaje, pero no ese aprendizaje que da la complejas requiere de aparatos muy sofisticados
escuela tradicional, es un aprendizaje que va más y test bastante complejos.” (Docente 6, IE 3,
allá, es aprehender, es innovar, es volver a ser Entrevista 10)
maestro y hacer escuela de forma distinta. Que nos
deja muchas enseñanzas y es necesario buscar
otras estrategias y formas para aprender”
(Docente 2, IE 1, Entrevista 2)
Tipos de “Estamos trabajando la investigación científica “Internamente cada docente busca sus diferentes
práctica desde dos partes, una al interior del aula como tal, metodologías o desarrolla diferentes propuestas
y la otra a través de los proyectos que se tienen en sus respectivas asignaturas en ciencias sociales
como transversales. Entonces aquí la estamos el profesor en 10 y 11 les inculca algo de
manejando en el proyecto al interior del aula en la investigación, la profesora del área de
que los maestros trabajan la investigación a partir emprendimiento los manda a investigar para
de las temáticas que están desarrollando, y fuera desarrollar un buen producto en una feria
del aula en el proyecto transverso, con el proyecto empresarial. Aunque no hay una integración entre
(nombra el proyecto), que abordan la investigación las propuestas” (Docente 6, IE 3, Entrevista 10)
como tal”. “Los docentes no motivamos a los estudiantes a
(Docente 2, IE 1, Entrevista 2) que investiguen más sobre el tema.” (Docente 5,
IE 3, Entrevista 10)
Apoyo “Se apoyan proyectos a nivel nacional y a nivel “No hay la suficiente capacitación y unificación y
Institucional local, tenemos la posibilidad de tener una planta la falta de apoyo de instituciones o entidades que
física que tiene espacios ideales, espacios que hagan un seguimiento y un apoyo permanente
pueden llegar a prestarse para esa labor para que se unifique el proceso de investigación.”
investigativa. Uno de los proyectos más (Coordinador 1, IE 3, Entrevista 11)
interesantes es el de -aprendiendo con las “No hay espacios donde puedan hacerse
estrellas-, es un proyecto que se realiza en prácticas, porque hay como mucha delincuencia
compañía y bajo la supervisión de ellos y también por fuera, los alrededores de la institución
bajo un proyecto que se conoce como (nombra el entonces, es difícil que el docente salga con sus
proyecto)” (Directivo 1, IE 1, Entrevista 5) alumnos porque es mucho riesgo sacar los
estudiantes”.” (Administrativo 1, IE 3, Entrevista
8)
Importancia “En mi área que es de las ciencias naturales “No está del todo establecido en el plan curricular
en el currículo siempre busca explicaciones a los fenómenos pero lo que se busca es que vaya acorde a cada
naturales que se observan… es primordial y una de las asignaturas, que implique un beneficio
necesario llegar a la implementación de la para los estudiantes, básicamente se enfoca en las
investigación científica por eso en la asignatura áreas de las ciencias naturales para las cuales se
que yo trabajo que es la física reproducimos la les da un grado de importancia para que el de
mayaría de fenómenos en el laboratorio y damos aporte a estas áreas.” (Coordinador 1, IE 3,
cuenta de eso para llegar a las explicaciones y Entrevista 11)
contrastar con lo que dice la teoría lo que
verdaderamente lo podemos vislumbrar en el
proceso de la práctica.” (Coordinador 1, IE 3,
Entrevista 11)

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7 Oposiciones estructurantes

Se han ubicado en la primera parte de la lista las cuatro tipologías de instituciones académicas con sus
respectivas características, en relación con las categorías inductivas halladas en el microanálisis o
análisis línea por línea (Corbin & Strauss, 2012) a partir del Software Atlas.ti7, sobre las entrevistas
estructuradas (Valles, 2009). Se observan en la matriz de manera detallada, las características
fundamentales de cada tipología identificando sus respectivas similitudes y diferencias. El orden para
el análisis de discursos empíricamente producidos, toma en cuenta que el análisis con respecto al
corpus, es intergrupal más que intragrupal, constituye un orden interno o intrínseco a la lectura, ese
orden interno se atraviesa con la estructura social que dio origen al diseño de las entrevistas, se parte
de la literalidad del texto y distingue entre expresión espontánea y expresión referida (por el
moderador de las entrevistas), con prioridad analítica para la primera (Gutiérrez del Álamo, 2010).
Para dar continuidad al análisis, se plantea de manera conjunta un análisis comparativo de las
categorías para cada perfil, a través de una Matriz de Oposiciones Estructurantes, allí se extraen
aquellas unidades de sentido que representan los discursos predominantes de cada categoría.

Tabla 2. Oposiciones estructurantes.

Ejes Aventajada Dotada Empírica Desprovista


Poseen un Poseen un Tienen poco Tienen mínimo
conocimiento conocimiento conocimiento, no conocimiento, la
profundo y lo exponen amplio, no es obstante, investigación no es
Percepción de la como elemento asumido como perciben la relevante en la
investigación indispensable en la elemento esencial investigación, formación académica.
formación académica. en la formación como elemento
académica. fundamental en
la formación
académica.
La ponen en práctica Práctica mínima, se Se esfuerzan por No se realiza práctica
en distintos limita a su llevar a cabo un investigativa.
escenarios, la incluyen enseñanza y proceso
Tipos de práctica activamente en la recopilación teórica. investigativo, e
realización de incluir en el
proyectos, con sus proceso a los
estudiantes. estudiantes.
Posee la Cuenta con la No cuentan con No cuenta con
infraestructura y el infraestructura, pero las instalaciones instalaciones, ni el
interés institucional no hay un interés adecuadas, ni con interés institucional para
Apoyo institucional para la realización de institucional los recursos, implementar procesos
los procesos manifiesto, hacia la aunque hay el de investigación.
investigativos. investigación. interés por
realizar procesos
investigativos.
Es parte esencial del El currículo no No existe en el No es tenida en cuenta
currículo académico. cuenta con currículo, no como un elemento
Importancia en el elementos de obstante, se relevante en el currículo
currículo investigación. realizan algunos académico.
ajustes para
insertarla.

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8 Matriz de relaciones estructurantes

De manera seguida, tomando como base las trascripciones de las entrevistas, se presenta un ejercicio
de fragmentación del análisis (Corbin y Strauss, 2012), en el que se extraen aquellas unidades de
sentido, producto den Análisis Sociológico del sistema de discursos (Ruano, 2015) donde se
representan a parte de los ejes y tipologías, las posiciones discursivas predominantes y posibles flujos
entre tipologías. Así, el concepto de sistema queda redirigido al diálogo entre discursos, en otras
palabras, se propone un sistema donde los discursos se deben a la existencia de otros discursos, la
lucha y el conflicto entre discursos como fuerza vertebradora del sistema, núcleo fundamental de la
teoría del análisis sociológico propuesto por Gutiérrez del Álamo.

Fig. 2. – El esquema presenta las posiciones discursivas que identifican a las Instituciones Educativas al interior de las
tipologías.

En la matriz se observa que las tipologías (Aventajada y Empírica), comparten una un elevado interés
por la investigación formativa, a diferencia de las tipologías (Dotada y Desprovista), que presentan un
bajo nivel de interés por la investigación formativa, esto se representa gráficamente en la figura 2; el
área blanca representa un bajo interés y área gris un mayor interés.
La migración de las instituciones de una tipología a otra, se produce de acuerdo a los niveles de
aprovechamiento, accesibilidad, y ejercicio de la investigación. Así, la institución “Aventajada”, puede
convertirse en “Dotada”, si no aprovecha a plenitud los recursos físicos y materiales de que dispone,
dejando a un lado la práctica de la investigación formativa y excluyéndola del currículo académico. La
institución “Dotada”, puede pasar a la posición “Aventajada”, si demuestra mayor interés en la
investigación formativa, madurando los recursos con los que cuenta e implementando un su currículo
académico la práctica de la investigación. No obstante, la institución “Dotada” por su falta de práctica
en la investigación formativa y la ausencia de la misma en el currículo escolar, podría perder
accesibilidad a los recursos de apoyo, convirtiéndose en una institución “Desprovista”.
La institución “Desprovista” al mostrar mayor interés e implementar un ejercicio práctico en sus
actividades curriculares, puede convertirse en “Empírica”. Si la institución “Empírica”, formaliza sus
conocimientos de investigación formativa, tendrá mayor acceso al apoyo institucional convirtiéndose
en una institución “Aventajada”. Si por el contrario la institución “Empírica” malgasta el interés por
realizar práctica investigativa, se volverá “Desprovista”.

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9 Consideraciones Finales

La investigación se presenta como un medio eficaz para lograr la calidad y excelencia académica; sin
embargo, su inclusión en las instituciones educativas de nivel medio, continúa dependiendo de la
disposición de las mismas hacia ella, por tanto, la presencia de procesos investigativos se relaciona
directamente –aunque no exclusivamente-- con la percepción e importancia que cada institución le
concede.
En este sentido, para la institución Aventajada la investigación formativa es un elemento fundamental
del currículo académico, por lo que se designa infraestructura, interés y apoyo para su realización; sus
docentes y directivos conocen acerca de la investigación científica y se sienten identificados con sus
prácticas, lo que repercute en el interés de los estudiantes que tiende a ser muy alto.
La institución Dotada no incluye la investigación formativa como elemento importante en el currículo
académico, a pesar de contar con la disposición institucional y la infraestructura adecuada para su
implementación; sus docentes mantienen un discurso magistral, alejado de la práctica, lo que limita
la interiorización de los estudiantes respecto a la misma y ocasiona un menor interés de los mismos;
debido a que no visualizan la utilidad real de la investigación o no la relacionan con sus vidas.
La institución Empírica, incluye la investigación formativa como elemento importante en el currículo
académico, sin embargo, no cuenta con la infraestructura y la disposición institucional para la
realización de la investigación científica. Sus docentes se muestran recursivos, y aunque no cuentan
con un amplio repositorio conceptual, intentan incluir la investigación en sus asignaturas y procuran
llevarla a la práctica, realizando proyectos de investigación en los que puedan incluir activamente a los
estudiantes y que provocan un mayor interés por parte de los mismos.
Por su parte, la institución Desprovista no cuenta con el apoyo institucional ni con la infraestructura
adecuada para realizar procesos investigativos, además no incluye la investigación formativa como un
elemento importante en el currículo académico. Sus docentes se muestran apáticos y consideran la
investigación como algo inalcanzable o por lo menos difícil de realizar; debido a esto, se abstienen de
realizar prácticas investigativas en las que puedan incluir a los estudiantes, lo que disminuye las
posibilidades de encontrar estudiantes interesados en la investigación en este tipo de contextos.
A lo largo de la investigación se evidenció un discurso recurrente en las instituciones Desprovista y
Empírica por resaltar el apoyo gubernamental insuficiente para realizar procesos de investigación
científica; sin embargo, a diferencia de la primera, los participantes de la institución Empírica
argumentaron que, si una persona o institución desea hacer investigación científica, puede hacerlo a
pesar de las dificultades y desventajas del entorno si se preocupa por adquirir conocimientos y
habilidades investigativas que puedan ser transmitas a los estudiantes, aunque no se cuente con
recursos de última tecnología para reforzarlos en la práctica.
Finalmente, se sugiere que todas las instituciones educativas independientemente de las
características con que se representen, se benefician al generar y fortalecer procesos de investigación
formativa. Si bien, existen diferentes estrategias para incluir la investigación en los currículos y
prácticas académicos, se propone comenzar por resignificar el concepto de investigación científica,
desligándolo de la visión inmaculada del investigador como alguien con habilidades excepcionales que
requiere de complejos y costosos instrumentos para hacer ciencia (Ruano, 2016), y considerar en su
lugar, al estudiante como un investigador innato, que requiere de determinados estímulos para
potencializar sus habilidades naturales. Así, implementando la enseñanza de la investigación como eje
transversal en las instituciones, los estudiantes desarrollaran un pensamiento crítico, que mejorará su
disposición hacia el aprendizaje, despertará su curiosidad, les permitirá preguntar y hacerse preguntas,
complementar y profundizar en los conocimientos, e indagar en nuevas formas de concebir la realidad;
en este sentido, parafraseando a Ossa (2005) no hay formación sin pensamiento crítico.

1976
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Agradecimientos. Al grupo de Investigación PSIEDU del programa de psicología de la Universidad Cooperativa


de Colombia, sede Popayán. Por su apoyo y gestión para la realización, presentación y publicación de este
trabajo.

Referencias
Malo, D. (2007). Inducción a la investigación desde la educación básica como proyección a la educación
superior. Colombia. ISSN 1909 0366

Ossa, J. (2005). Educar es enseñar a indagar la investigación como proceso de formación. Educação,
Vol. XXVIII. Núm. 3, 525-533.

Peña, G. (2013). ¡PENSAR CIENTÍFICAMENTE!: La estabilización de la cultura investigativa, principio de


la innovación tecnológica. Colombia. Universidad Jorge Tadeo lozano.

Restrepo, B. (2002). Conceptos y Aplicaciones de la Investigación Formativa, y Criterios para Evaluar la


Investigación científica en sentido estricto. Colombia. Fundación Universitaria Católica Del Norte.

Rico de Alonzo, A. (1996). Investigación en la Universidad Colombiana: Contexto y Estrategias.


Colombia. Universidad Central ISSN: 0121-7550.

Rodríguez, Y. (2009). La formación de docentes investigadores: lineamientos pedagógicos para su


inserción en los currículos. Colombia. Revista TEORÍA Y PRAXIS INVESTIGATIVA, Fundación
Universitaria de Área Andina.

Rojas, M & Méndez, R. (2013). Como enseñar a investigar. Un reto para la pedagogía universitaria.
Colombia. Universidad de la Sabana, 95-108. ISSN: 0123-0194.

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Humanidades. Vol. 37, No. 2, 107-122 ISSN 0120-095X

Ruano, L. (2016). Elementos para repensar la enseñanza y el aprendizaje de la investigación en la


educación básica. Investigación cualitativa en educación, Atas CIAQ. Portugal.

Sampieri, H. Fernandez, C. Baptista, L. (2010). Metodología de la investigación. Quinta edición.


Editorial McGrawHill: México

Zuñiga, W. (2012). Breve historia de la investigación en sociología en el contexto de Colombia.


Fundación Universitaria Luis amigó.

1977
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Questionário Digital Na Pesquisa Com


Profissionais De Educação Infantil

Márcia de Oliveira Gomes Gil ¹


Maria Ignez Ferreira Campos²
Vera Maria Ramos de Vasconcellos³

¹Universidade do Estado do Rio de Janeiro- PROPED/UERJ, Brasil. marciagil@globo.com;


²Universidade do Estado do Rio de Janeiro- PROPED/UERJ, Brasil. mariignez66@gmail.com;
³Universidade do Estado do Rio de Janeiro- PROPED/UERJ, Brasil. vasconcellos.vera@gmail.com

Resumo. Este texto apresenta os resultados de duas pesquisas: uma de mestrado concluída e outra de
doutorado em andamento, relativas às políticas públicas de Educação Infantil ao longo da última gestão
municipal da cidade do Rio de Janeiro (2009-2016). A primeira analisou o perfil dos professores de Educação
Infantil. A segunda, avaliou o impacto do PROINFANTIL nas ações e produção de práticas pedagógicas em
creches e EDI, a partir das narrativas de ex-cursistas. As pesquisas abordaram a operacionalização e a
análise dos dados produzidos a partir de questionários digitais enviados para o público alvo de cada estudo,
organizando a seguir grupos focais. O objetivo foi observar as consequências das mudanças legais e
políticas, nas propostas de ações pedagógicas de Agentes Auxiliares de Creche e Professores de Educação
Infantil, analisando as modalidades pedagógicas expressas por tais profissionais. Os trabalhos privilegiaram
a perspectiva teórica de Lev Vygotsky para o delineamento metodológico.
Palavras-Chave: Educação Infantil; Políticas Públicas;Questionário digital

Digital Research Questionnaire With Child Education Professionals


Abstract. This text presents the results of two researches: one of master's degree completed and another
one of doctorate in progress, related to the public policies of Early Childhood Education during the last
municipal administration of the city of Rio de Janeiro (2009-2016). The first analyzed the profile of the
teachers of Early Childhood Education. The second one evaluated the impact of PROINFANTIL on the actions
and production of pedagogical practices in day care centers and EDI, based on the narratives of ex-students.
The surveys addressed the operationalization and analysis of data produced from digital questionnaires sent
to the target audience of each study, and then organized focus groups. The objective was to observe the
consequences of legal and political changes, in the proposals of pedagogical actions of Auxiliary Agents of
nursery and Teachers of Infant Education, analyzing the pedagogical modalities expressed by such
professionals. The work focused on the theoretical perspective of Lev Vygotsky for the methodological
design.
Keywords: Early Childhood Education; Public policy; Digital questionnaire

1. Introdução

A constatação de um divórcio entre o proposto nas políticas educacionais e sua materialização nos
espaços educativos tornou-se lugar comum nas pesquisas e produções acadêmicas nacionais e
internacionais. Percebe-se uma contradição entre o dito (retórica dos proponentes), o escrito
(legislação e outros documentos) e o feito (a efetivação nas escolas), ( Zanetti, 2012).
As políticas públicas de Educação Infantil da cidade do Rio de Janeiro são o loci principal das
pesquisas aqui apresentadas. Elas focam as investigações nos diferentes profissionais que
compartilham o espaço de creche – professores e agentes de educação infantil - seus conflitos e sua
formação. Em um país com dimensões geográficas e populacionais extensas, a cidade do Rio de
Janeiro tem impacto significativo, por ter o maior número de instituições publicas de Educação

1856
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Infantil das cidades brasileiras, muitas vezes servindo de modelo para sistemas de ensino de cidades
menores.
Iniciamos, convidando os leitores a refletir que, para além das belezas naturais da cidade, o Rio de
Janeiro tem encantos e desencantos nas políticas públicas locais. A rede municipal carioca de
Educação é uma das maiores do país1. São 1.534 unidades, delas 518 de Educação Infantil (creches
públicas e Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDI) com 59.776 crianças matriculadas na creche e
83.108 na pré-escola; 5.114 Professores de Educação Infantil e 5.501 agentes de Educação Infantil.
Este quantitativo é fruto de muita luta, histórias e políticas.
Os estudos aqui retratados refletem ações que se iniciaram em 2009, quanto à transição das creches,
antes sob a tutela da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, já se encontravam sob a
responsabilidade da Secretaria Municipal de Educação. As duas pesquisas tomam por referencial os
estudos da psicologia sócio- histórica-cultural de Vygotsky (1998).
O objetivo comum das pesquisas - uma de mestrado concluída e outra de doutorado em andamento
- consistiu em observar e registrar as consequências das mudanças legais e políticas, nas propostas
de ações pedagógicas para as diferentes infâncias, a partir da visão das educadoras, no que tange ao
cumprimento da tarefa de oferecer ambientes educacionais de qualidade para crianças da Educação
Infantil. Para tal, as diferentes pesquisas tiveram objetivos específicos: (i) investigar o perfil formativo
dos professores de Educação Infantil da cidade do Rio de Janeiro (Gil, 2013) e (ii) avaliar os efeitos da
implementação do PROINFANTIL,2 analisando o quanto a formação influenciou na profissionalização
dos alunos do programa, à medida que suas práticas revelam ou não concepções trabalhadas no
curso (Campos, 2016-2019)3
O artigo está dividido em duas partes, a primeira apresenta quem são os primeiros profissionais
concursados para o trabalho com as crianças, o Agente Auxiliar de Creche4 e a segunda descreve o
perfil dos primeiros Professores de Educação Infantil do município concursados. O eixo comum são
as questões do questionário relativas à formação dos profissionais da creche, envolvendo o
Programa de Formação Inicial para Professores em Exercício na Educação Infantil – PROINFANTIL.
A cidade do Rio de Janeiro apresenta uma história peculiar no que diz respeito à formação do quadro
de profissionais de creche. Após um longo período de negociação (Rocha, 2010), o primeiro concurso
realizado foi para Agentes Auxiliares de Creche- AAC. Cercado de equívocos e desrespeitando a
legislação nacional (LDBEN 9.394/96, artigo 62),5 que embora priorizasse a formação em nível
superior para o exercício do magistério na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do Ensino
Fundamental, admitia a formação em nível médio: modalidade normal.6 Ocorre que, para este cargo
foi solicitada apenas a formação em nível fundamental; essa situação já merece um olhar

1 Dados da Secretaria Municipal de Educação http://www.rio.rj.gov.br/web/sme/conheca-a-secretaria - acesso em


28/02/2017.
2 O PROINFANTIL é um Projeto do Ministério da Educação brasileiro, criado em 2004, em parceria com duas Secretarias a
de Educação Básica e a Distância. É um curso que foi ministrado em todo território nacional, em parceria com os Estados e
Municípios. Na cidade do Rio de Janeiro, o PROINFANTIL foi operacionalizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Governo do Estado e do Município. Objetivou qualificar professores em exercício na Educação Infantil sem habilitação, no
caso: os Agentes Auxiliares de Creche (AAC).
3 Estudos iniciais do trabalho de doutorado “PROINFANTIL no município do Rio de Janeiro: da formação inicial aos dias de
hoje”
4 Edital conjunto SME/SMA nº 08 de 24/07/2007. Profissionais sem habilitação de magistério, com a formação mínima do
Ensino Fundamental.
5 LDBEN/96 - BRASIL, 2006, v 2., il - “no mínimo diploma de nível médio modalidade Normal e, preferencialmente, de nível
superior (pedagogia)”
6 No Brasil, a Educação Básica é formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio. O nível seguinte diz respeito
à Educação Superior. A formação dos professores também é prevista a nível médio-técnico, nos chamados Curso Normal.

1857
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

investigativo. A primeira razão é que, embora o cargo assumisse a expressão “auxiliar”, na estrutura
da creche não havia a quem auxiliar. Faziam parte das unidades as figuras de um professor diretor e
outro Professor Articulador, responsável pela gestão pedagógica do trabalho com as crianças de
todas as turmas. Isto acabava por exigir do profissional recém- concursado e sem formação
especifica, uma atuação além de suas possibilidades. Após muita pressão dos Agentes Auxiliares de
Creche- AAC, em 2010, o Ministério Público, determinou que a prefeitura reparasse o erro. Foi criado
então o cargo de professor de Educação Infantil7- PEI, de acordo com a legislação; isto é, com
exigência de formação mínima em Curso Normal.
As pesquisas analisadas proporcionaram olhares críticos à política educacional municipal, tanto na
formação dos professores quanto na própria elaboração da política. As questões sobre a formação se
tornam evidentes através de conflitos que surgem no encontro dos dois profissionais no mesmo
espaço e em trabalho cooperativo. Os AAC, que tiveram que aprender o ofício de educar crianças
pequenas, sem formação prévia, sendo oferecida a eles a formação pelo PROINFANTIL e os
Professores de Educação Infantil- PEI formados na modalidade normal ou em curso superior. Dois
profissionais, dois caminhos formativos distintos é o que investigamos.
Os estudos partilharam algumas escolhas metodológicas. A aplicação de um questionário digital,
seguido de uma análise quantitativa dos resultados, para em seguida iniciar as análises qualitativas
através de outra estratégia metodológica: o Grupo Focal.
Nestes estudos, consideramos a singularidade dos indivíduos, mas também os processos de
transformação que se incitam no convívio grupal. Para Lev Vygosty o homem é constituído numa
relação dialética com o social e a história de seu tempo. O objetivo principal da teoria sócio-histórica
do desenvolvimento, proposta pelo autor (1998, p. 21) é “caracterizar os aspectos tipicamente
humanos do comportamento e elaborar hipóteses de como essas características se formaram ao
longo da história humana e como se desenvolveram durante a vida do indivíduo”. Para ele, todo
organismo é ativo e está em contínua interação com as condições sociais.
A partir de Vygotsky (2001) compreendemos que, ao mesmo tempo em que o indivíduo é único,
singular, sua constituição e formação só se realiza na relação interativa (com o outro) e nesse
processo atua também como produtor de novas realidades sociais. Nelas, a Educação é um dos
principais espaços dialéticos de mediação na formação de sujeitos singulares e históricos. Todo
conhecimento é mediado na interação e, a vivência em sociedade é essencial para a transformação
filo e ontogenética do homem, de ser biológico em ser humano pertencente a um meio sócio-cultural
(Santos & Vasconcellos, 2015). O sujeito não é apenas ativo, mas interativo, porque forma
conhecimentos e se constitui a partir de relações intra e interpessoais. Para Newman e Holzman
(2002, p. 56):
Como seres humanos, todos nós vivemos simultaneamente na história (a
totalidade contínua, sem fim, da existência) e em sociedade (o nome dado a
um específico arranjo técnico-temporal institucional “dentro” da história);
todos vivemos em história/sociedade.

Ao se buscar conhecer aspectos formativos dos profissionais, os dados quantitativos não foram
suficientes. Nossos trabalhos buscaram interpretar os dados a partir de análise dos contextos, onde
foram produzidos, recorrendo para isso às informações dos próprios sujeitos envolvidos.

2. Metodologia

7 Projeto de lei nº 701/2010, cria no quadro permanente do poder executivo do Município do Rio de Janeiro a categoria
funcional de professor de Educação Infantil.

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A escolha metodológica anuncia as concepções que orientaram as pesquisas. Desta forma


apresentamos os percursos metodológicos adotados por cada estudo, criando as interlocuções
possíveis. O primeiro voltou-se para as Agentes Auxiliares de Creche8 (AAC) participantes do
PROINFANTIL (Campos, 2014). O segundo (Gil, 2013) analisou o perfil dos Professores de Educação
Infantil (PEI) oriundos do 1º concurso público para PEI, realizado em 2010, na cidade do Rio de
Janeiro. Neste segundo foi criado um questionário online, que buscou levantar o perfil dos novos
profissionais. Nessa pesquisa, para complementar os dados produzidos pelo questionário, foram
realizados dois Grupos Focais com os professores que o haviam respondido, utilizando como recurso
de análise o Corpógrafo IV9·. Este mesmo questionário virtual foi utilizado para o estudo de
doutoramento de Campos (2016-2019). Desta vez em follow-up, buscando compreender a proposta
pedagógica realizada pelas ex-cursistas (PROINFANTIL), após 5 (cinco) anos da conclusão do curso.
Os dois estudos apoiam-se na premissa de que pesquisas de cunho social investigam sujeitos e
contextos; portanto, a partir de dados quantificáveis e objetivos, é possível tecer análises que
traduzam aspectos subjetivos da realidade. (Minayo, 2010) A oposição entre pesquisa quantitativa
e/ou qualitativa foi e ainda é tema de debates das ciências humanas, com pensamentos favoráveis e
contrários a ambas. Identificamo-nos com aqueles que entendem a complementaridade
oportunizada pelo uso associado de ambas, principalmente em se tratando de trabalhos que
discutem políticas públicas não só com membros da academia, mas e, principalmente, com gestores
públicos que tomam decisões que afetam diretamente a vida de todos os envolvidos – crianças, pais,
professores e sociedade.
Entendemos que a pesquisa social quantitativa é a forma tradicional de legitimar dados, ancorada
em premissas das ciências positivistas, que mensuram realidades quantificáveis e delas expressam
categorizações e determinações (Campos & Vasconcellos, 2016). Em seus estudos Minayo (2010, p.
56) afirma “O uso de métodos quantitativos tem o objetivo de trazer à luz dados, indicadores e
tendências observáveis ou produzir modelos teóricos de alta abstração com aplicabilidade prática.”
A pesquisa em educação de cunho qualitativa permite investigações que envolvam histórias de vida
(acadêmica e pessoal), crenças e valores, relações e representações. Nela são utilizados como
referência os próprios sujeitos e os sentidos e significados por eles produzidos (Vygotsky, 2001).
Nesta perspectiva, dimensões precisam ser consideradas que tragam os sujeitos para ao centro das
investigações e a partir daí, analisar discursos, produções e relações. Utiliza para isso a empiria e a
sistematização progressiva de conhecimento até a compreensão da lógica interna do grupo ou
processo estudado (Minayo, 2010).
Os dados quantitativos trouxeram os aspectos mensuráveis em relação à formação inicial,
experiência profissional, local de trabalho, entre outros. A articulação desses dados com os aspectos
contextuais, políticos e com o discurso dos próprios agentes e professores permitiu um sentido mais
completo das investigações e estão pautadas numa perspectiva vygotskyana. Isso significa valorar e
creditar importância a atividade em si, a criação e a transformação que ela propicia nos seres
humanos. De acordo com Vygotsky (1998, p.90):

Pesquisadores têm concentrado seus estudos no tempo de reação das


respostas, e não nos processos de aprendizado ou no conteúdo da própria
reação (...). Assim, o que se procura é a uniformidade, de tal forma que
nunca é possível captar o processo em andamento, ao contrário, os
pesquisadores desprezam os tempos críticos do aparecimento das reações.

8 Hoje Agentes de Educação Infantil (AEI)


9 Corpógrafo é uma plataforma publicamente disponível na internet que se destina à análise e ao trabalho sobre registros
orais e escritos na língua portuguesa

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Foi intenção das pesquisas aqui retratadas, desde a criação dos questionários, a realização dos
grupos focais, até as análises finais, considerar as respostas a partir da premissa de que ali se
encontravam aspectos relacionados a indivíduos que estão construindo a sua própria história, ao
mesmo tempo em que contribuem para a construção da história da Educação Infantil da cidade
(Vasconcellos, 2015). Não há, portanto, linearidade, uma vez que as histórias não são lineares e a
relação de cada indivíduo com sua história é sempre única. Nesta perspectiva, a escolha de
metodologias que entendam “instrumento e resultado” (Newman; Holzman, 2002), como elementos
de um mesmo todo, traz implicações para todos os envolvidos, desde sua concepção à sua análise.
Em outras palavras, a criação do instrumento/questionário, vista como atividade, é transformação.
Isto coloca o pesquisador como elemento da própria análise.
Utilizou-se a plataforma Google Docs10 para o envio do questionário nas duas pesquisas. Entendemos
que a linguagem digital é hoje utilizada pela maioria da população, permitindo facilitar o acesso ao
questionário.
A plataforma permitiu que o questionário fosse enviado por e-mail, através da criação um link. Ao ser
aberto, pode ser acessado e preenchido. Na pesquisa de Gil (2013), considerou-se a dificuldade de
obter o e-mail pessoal dos professores11· Para obedecer a hierarquização seguida pela Secretaria
Municipal de Educação, optou-se por enviá-lo às CRE - Coordenadorias Regionais de Educação,
solicitando que fossem direcionadas às unidades de Educação Infantil. Essa escolha também foi
motivada por questões de cunho ético, já que a pesquisa foi possível a partir de autorização
concedida pela Secretaria Municipal de Educação (via Comissão de Ética/SMS). Coube a nós,
pesquisadoras, respeitar as formas de atuação presentes, em especial no que se refere ao repasse de
informações e comunicados. Para tanto, a transparência dos objetivos e do percurso de pesquisa
foram partilhados e acordados previamente, sendo a ética o eixo central de todas as ações.
Ainda em Gil (2013), junto ao questionário foi enviada também uma carta de apresentação assim
como cópia digital de autorização para a pesquisa concedida pela Secretaria Municipal de Educação.
Nessa abordagem, contamos com o auxílio das Coordenadorias e do gestor de cada unidade para que
o e-mail com o link do questionário fosse reenviado e divulgado ao público alvo daquela pesquisa-
Professores de Educação Infantil, que trabalhassem com crianças de 6 meses a 3 anos, oriundos do
primeiro concurso. Este formato permitiu que mesmo os professores que não tivessem o necessário
suporte tecnológico para responder o questionário em suas residências, pudessem fazê-lo no próprio
local de trabalho. Dessa forma, os resultados obtidos puderam ser entendidos como amostragem do
conjunto total de professores de Educação Infantil.
A pesquisa de Gil (2013) teve por objetivo analisar as políticas de criação de cargos para a atuação
em creches e em Espaços de Desenvolvimento Infantil no município do Rio de Janeiro, além de
delinear o perfil do profissional que atua nesse segmento de ensino. O estudo defendeu que
conhecer o perfil dos PEI era importante para a consolidação de um processo identitário que incluía a
especificidade e as características do trabalho em creche. Nesse sentido, foi importante investigar
quais as mudanças vivenciadas em suas práticas pedagógicas, tendo em vista que muitos deles
tinham sido AAC antes de assumirem a nova função.
A análise foi realizada a partir dos 325 questionários respondidos, do universo de 1000 professores
de Educação Infantil oriundos do primeiro concurso. Os dados apontaram as seguintes características
do grupo: 97% são mulheres, com idade acima dos 35 anos. Quanto à formação, 74% fizeram o curso

10 Esta plataforma foi ampliada e seu nome alterado para Google Drive 2012.1 O Google Drive é considerado uma
"evolução natural" do Google Docs (uma vez ativado substitui a URL docs.google.com por drive.google.com).
http://pt.wikipedia.org/wiki/Google_Drive acessado em 18 de abril de 2013
11 Solicitado à Coordenadoria de Recursos Humanos, que informou não ter esta relação de endereços eletrônicos.

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Normal, 60% têm graduação em Pedagogia, em sua maioria oriunda de instituição privada. Em
relação à experiência, 20% foram AAC e boa parte das demais professoras já haviam tido experiência
em pré-escola. O motivo que as levou a fazer novo concurso e vivenciarem a transição do cargo de
AAC para PEI foi por entenderem essa passagem como ascensão funcional, porém nas discussões nos
grupos focais foi dito que a realidade lhes mostrou que as condições de trabalho eram as mesmas e
as ações de AAC e PEI não se distinguiam. A diferença estava na carga horária semanal e no salário.
Assim mesmo, na busca de um salário mais digno, a maioria das professoras teve que aderir a “dupla
regência” 12 ou ter uma segunda matrícula no ensino fundamental. Elas estavam lotadas
majoritariamente no maternal II e a análise das falas nos grupos focais destaca que a escolha pelo
grupamento nem sempre é delas, muitas vezes há a imposição da direção. Mesmo assim, o maternal
é o grupo de preferência, pois elas revelam muita insegurança e desconhecimento em relação ao
trabalho no berçário. Apontam para a falta de formação específica para o trabalho com bebês, tanto
na modalidade Normal, quanto nos cursos de Pedagogia. Indagadas sobre as condições para a
melhoria da prática, a maioria aponta os cursos complementares, o aumento salarial e a diminuição
do quantitativo de crianças por turma13. Há uma necessidade de investimentos na valorização
profissional através de espaços de formação e reflexão, que facilite a construção de uma identidade
profissional comprometida com os direitos das crianças.
Para a outra pesquisa (Campos, 2016-2019), o envio do questionário deu-se de forma mais direta, já
que os sujeitos envolvidos haviam feito parte da dissertação (Campos, 2014) e o vínculo estabelecido
com a pesquisadora, era estreito. O questionário digital foi enviado e respondido de acordo com a
autorização concedida pela Plataforma Brasil nº do parecer 1.661.13014. Junto ao questionário foi
enviada, também, uma carta de apresentação assim como cópia digital do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE).
Os relatos preliminares dessa pesquisa a partir dos dados do questionário digital enviados às ex-
cursistas do PROINFANTIL (CAMPOS, 2016-2019), confirmam a presença feminina no universo da
Educação Infantil. GIL (2013) registrou a presença feminina entre os profissionais de Educação
Infantil na cidade do Rio de Janeiro. Os dados regionais coincidem com dados nacionais do Censo
Escolar de 2007, que indicam que 97% dos professores que atuam em Educação Infantil são
mulheres (BRASIL, 2009). Das 44 AAC, participantes da pesquisa anterior (Campos, 2014), somente
25 responderam ao questionário.
Os resultados analisados as descrevem na faixa de 33- 42 anos, a maioria já possuía experiência de
trabalho anterior ao concurso de 2007. Quanto ao aprimoramento profissional, algumas ex-cursistas
declaram empenho para aprimorar seu próprio conhecimento, através de graduação em Pedagogia e
de cursos livres na área de Educação Infantil. Os dados apontam que o PROINFANTIL pode ter
impulsionado-as a buscar mais formação, pois 75% delas terminaram a graduação após o termino do
curso. Foi perguntado sobre a formação profissional do PROINFANTIL, as respostas foram de
extrema importância para a compreensão dos próximos passos do doutoramento, pois registram o
que ficou da formação na prática cotidiana e nos fazeres pedagógicos das ex-cursistas. Iniciamos
perguntando sobre o que elas diriam sobre o curso na tentativa de entendê-lo como uma política
pública de formação, 96% afirmou que o curso ajudou na formação profissional, validando-o. Mesmo
passados cinco anos, o curso parece ser referência em suas vidas profissionais, impulsionando-as a
progredir na carreira e nos estudos.

12 Duplicação da carga horária de trabalho original. Modalidade utilizada pela SME para minimizar a falta de professores.
13 A realidade carioca é de turmas com 25 crianças independente da idade
14 Vasconcellos, 2016 - Políticas Educativas para Crianças de 0 a 3 anos nos municípios do Rio de Janeiro. FAPERJ/Cientista
de Nosso Estado E-26203.093/2016)

1861
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Diante dos resultados do questionário (follow-up) da pesquisa, foi proposta uma pergunta sobre a
satisfação com a própria prática. As respostas foram diversas, mas chama atenção que 28%
registraram insatisfação consigo mesma e com o trabalho. Quanto aos aspectos que poderiam
contribuir para melhor atuação do profissional da Educação Infantil, a primeira resposta foi a
diminuição do número de crianças por sala (40%), seguida de cursos de formação em serviço (24%).
Na perspectiva dos achados sobre a formação, os dados produzidos com os PEI evidenciam aspectos
positivos como o número de professores graduados, o que traz para os espaços de formação inicial
uma responsabilidade acentuada no desafio de promover a construção de conhecimentos sólidos e
flexíveis, que traduzam, de fato, a Educação Infantil, seus sujeitos e suas características singulares. Os
dados dos questionários nos dão clara indicação de que a prática pedagógica na Educação Infantil é
uma questão que merece maior atenção e elaboração de políticas públicas específicas. As
professoras e as agentes de educação infantil demonstraram não possuir suficientes elementos
teóricos que as auxiliem no planejamento de suas ações práticas. A partir deste dado, podemos
inferir que conhecimentos sobre os processos de desenvolvimento infantil e sobre o trabalho
pedagógico com crianças mais novas precisam ser ampliados. As significações do cuidar e educar não
são claras para as professoras. Percebemos ainda grande confusão e até mesmos menos valia às
situações que envolvem os cuidados e a higiene com os pequenos. A fim de seguir as orientações
legais a este respeito, precisamos de maior esclarecimento e debates a cerca do binômio: cuidar-
educar. As crianças crescem rápido! É preciso pensar não apenas no futuro, mas no presente, das
que estão hoje na creche. As ações precisam ser urgentes e, ao mesmo tempo constantes.
Diante da complexidade apontada pelas pesquisas, consideramos que o incentivo a continuação das
investigações, ajude a facilitar a formação inicial e o investimento na formação continuada dos
professores, em especialmente os da creche, como forma de ampliar a qualificação profissional dos
mesmos.

3. Conclusões

Nossa escolha pela plataforma Google Docs, naqueles momentos facilitou a praticidade,
confiabilidade e acessibilidade dos professores e AAC ao questionário. Pensando no universo a ser
pesquisado, entendemos ser sempre mais viável coletar e armazenar dados em meio digital, do que
em papéis, o que coaduna com as práticas de sustentabilidade.
Um dos aspectos que contou positivamente na escolha do veículo digital foi a rapidez no
recebimento das informações e a facilidade de acessá-las a qualquer tempo. Com isso, foi possível
acompanhar o número de questionários respondidos durante todo o período de aplicação, além da
capacidade de armazenamento das informações em banco de dados com processamento e análise
ágeis. Avanços nas esferas da ciência e da tecnologia têm provocado profundas mudanças e efeitos
sobre a sociedade e sobre a Educação. O uso das tecnologias vem transformando os sujeitos e os
processos nos quais os mesmos se encontram, inclusive e especialmente, o acadêmico.
As dificuldades encontradas ao longo do processo de envio do questionário aos professores (Gil,
2013) (passagem pela CRE, pelas creches até chegar ao professor) é o outro lado da moeda. Alguns
professores relataram não ter tido acesso ao questionário com facilidade. Nesse caso, não podemos
culpar a tecnologia em si, mas o mau uso ou desvalorização dos documentos que chegam por via
digital.
Observando o questionário como primeira etapa da pesquisa de doutoramento de Campos (2016-
2019), vemos que os resultados apresentados foram apenas possibilidades de busca de novas
investigações e que no movimento das palavras, os sentidos e significados que foram construídos nos
Projetos de Estudos – trabalho final do curso - e as vivências delas após cinco anos fizeram efeitos

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nas experiências e nos fazeres das AAC formando um repertório singular para cada sujeito. Para os
novos estudos, pretendemos usar um novo software MAXQDA12 que permite uma organização mais
eficiente das categorias previamente definidas, no coletivo do grupo de pesquisa, facilitando a
elaboração de mapas conceituais e esquemas, à medida que essa ferramenta possibilita um processo
integrado de registro em áudio/ vídeo e o registro digita. Será possível explorar “processos de
partilha e colaboração sem barreiras temporais e espaciais” (Zamith-Cruz ,Lopes & Carvalho 2016, p.
359).
Entendemos que refletir sobre a utilização dos recursos tecnológicos, como veículo para pesquisas
compartilhadas sugere seu uso como instrumento dialógico de interação e mediação vai além dos
modelos tradicionais e ajuda a superar barreiras, inclusive a dificuldade de entendimento dessa
linguagem. As ferramentas tecnológicas que dão suporte às analises favorecem o trabalho
colaborativo, mesmo quando se trata de grande volume de informação, como quando o foco são as
políticas publicas de educação. Isto se dá, tanto nos aspectos quantitativos, quanto nos qualitativos,
quando as funcionalidades ficam ainda mais evidenciadas (Costa, Souza & Souza 2016). Nesta
perspectiva, acreditamos que disseminar as ferramentas computacionais às aprendizagens faz-se
necessário ao contexto acadêmico atual, na mesma medida em que precisamos valorizar os aparatos
tecnológicos e o software como ferramentas facilitadoras do trabalho de análise dos dados.
O novo software MAXQDA12 facilitará a organização, sistematização e analise dos dados das
pesquisas do grupo, além de promover a utilização dos mesmos por vários investigadores
simultaneamente, o que acabará por influenciar a melhora da competência analítica de seus
membros. Acreditamos que o software nos ajudará na busca mais clara de respostas para as
questões de investigação, junto e em diálogo com os pares locais (cada creche). Dessa forma,
enfatizaremos a reflexão sobre a necessidade de formação continuada para os profissionais
(incumbência do município do Rio de Janeiro). Com os processos analíticos normatizados, com o uso
do novo software, o diálogo das pesquisas universitárias com o município e os cursos de formação
inicial, poderão se tornar mais flexíveis e transparentes, valorizando os desafios encontrados pelos
profissionais e os cenários conflituosos entre as diferentes categorias profissionais, facilitando a
possibilidade de trabalhar de modo colaborativo.
O novo software MAXQDA12 nos permitirá: “i) gestão dos dados mais rápido e eficaz; ii) maior
possibilidade de lidar com um volume maior de dados; iii) contextualização da complexidade; iv)
técnica e rigor metodológico e sistematização” (Costa, Souza & Souza 2016, p. 111). A especificidade
de nosso tema precisa garantir o acesso a conhecimentos e práticas pertinentes ao universo da
Educação Infantil. Para tanto, é preciso considerar as crianças, seus contextos e suas culturas. Mas é
necessário também conhecer os profissionais (professores e agentes) que com elas atuam. Neste
sentido, o conhecimento sobre o perfil dos profissionais se torna contribuição significativa para se
pensar uma qualificação que dê suporte ao enfrentamento dos desafios cotidianos.

4. Referências
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Básica.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

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1865
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Análise Qualitativa Comparativa entre o Método PBL e o


Tradicional na Educação Profissional Tecnológica de Nível Médio
para Jovens e Adultos

Helaine Reis1, Jofre Vitalino1


1
Pós-graduação em Educação Profissional Tecnológica do Instituto Federal do Espírito Santo, Brasil.
helaine@ifes.edu.br; jofre.jcv@gmail.com

Resumo. Este estudo faz uma Análise Qualitativa Comparativa (AQC) entre o método de ensino-
aprendizagem Aprendizagem baseada em problemas/Problem based learning (ABP/PBL) e o Método
Tradicional, na Educação Profissional e Tecnológica de Nível Médio do Instituto Federal do Espírito Santo no
campus Vitória. Os procedimentos metodológicos envolveram a Pesquisa de Campo e a aplicação da técnica
de Grupo Focal, tendo como sujeitos os alunos da Educação de Jovens e Adultos. Os instrumentos utilizados
foram o questionário, diário de bordo, material de aula e caderno de atividades com simulacros em
Laboratório Virtual de Química em 3D. Os resultados em categorias de análise mostraram que as estratégias
do PBL potencializaram o ensino-aprendizagem dos alunos, promoveram sua autonomia, interação e
pensamento crítico-reflexivo e motivaram os estudos. Na visão discente, os seus professores utilizam
mormente o Método Tradicional, com poucas aproximações ao PBL, conquanto seu aprendizado por esse
método se torna mais eficiente.
Palavras-chave: Aprendizagem baseada em problemas; Educação Profissional Tecnológica; Educação de
Jovens e Adultos; Análise Qualitativa Comparativa.

Comparative Qualitative Analysis between the PBL Method and the Traditional Method in Higher
Education Professional Technological Education for Young People and Adults
Abstract. This study makes a Comparative Qualitative Analysis (CQA) between the teaching-learning method
Aprendizagem Baseada em Problemas/Problem-Based Learning (ABP/PBL) and the traditional Method in the
Middle Level of Technological Professional Education at the “Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Espírito Santo” in campus Vitória-ES. The methodological procedures involved Field Research
and the application of the Focal Group technique, with students of Youth and Adult Education. The
instruments used were the quiz, daily board, classroom materials, activities notebook and exercises with
simulacra in Chemistry Virtual Laboratory in 3D. The results in categories of analysis showed that PBL
strategies potentiate the teaching and learning of students, promote their autonomy, interaction, critical
and reflective thinking and motivates the studies. In view students, their teachers mainly use the traditional
Method, with few approaches to PBL, though their learning by this method become more efficient.
Keywords: Problem Based Learning; Technological Professional Education; Youth and Adult Education,
Comparative Qualitative Analysis.

1 Introdução
A prática pedagógica tradicional ainda convive em um mesmo contexto escolar com outras práticas
de apreensão crítica dos conteúdos, apesar de que análises contrárias ao papel passivo, com ação
minimizada, assumido pelo aluno, estejam há décadas em pauta, em um planejamento educacional
pouco propício à execução de atividades que o auxiliem em trajetórias futuras. Vê-se evidente
distanciamento entre o conteúdo que é estudado em sala de aula e o que é vivenciado pelo aluno em
sua realidade, dificuldades em se implementar um currículo interdisciplinar e também incoerência no
lugar do professor como provedor do conhecimento na escola tradicional em detrimento de aulas
mais participativas pelo alunado. “A referida escola, além de não conseguir realizar seu desiderato de
universalização ... ainda teve de curvar-se ante o fato de que nem todos os bem-sucedidos se
ajustavam ao tipo de sociedade que se queria consolidar” (Saviani, 2012, p. 6).

1892
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Nesse cenário escolar, por sua vez, o professor fica refém de um currículo fechado, conteudista, com
horários arrochados, o que acarreta poucas oportunidades para realizar um trabalho antagônico à
homogeneização do ensino e avesso à transmissão e repetição de informações predefinidas. Tais
questões, que vão em direção à reflexão sobre a diversidade naturalmente traçada nas raízes do
alunado das escolas, sobretudo das públicas, e ao caráter aberto do currículo, exigem o pensamento
crítico-reflexivo praticado pelo sujeito dentro do processo e não como quem o olha da superfície,
como mero observador. Portanto, cabe à escola a responsabilidade de oportunizar, promover e
realizar essa educação. Mas, como?
Essa pergunta conduziu para o problema desta pesquisa: quais medidas pedagógicas podem ser
tomadas para potencializar o ensino-aprendizagem dos alunos da Educação Profissional e
Tecnológica (EPT) de Nível Médio no Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), campus Vitória,
principalmente aqueles do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a
Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja) matriculados no Curso
Técnico Integrado em Segurança do Trabalho?
Nessa tessitura, destaca-se o Método Aprendizagem baseada em problemas/Problem based learning
(ABP/PBL), que se propõe a debater, em sala de aula, problemas constituídos por situações reais, que
propiciem a reflexão crítica pelo ensino-aprendizagem centrado no aluno, em que o professor os
estimula à reflexão, à pesquisa, ao diálogo, ao questionamento e à interação, conforme os estudos
de Ribeiro e Mizukami (2004) e Melo (2013).
Na EPT de Nível Médio, portanto, vislumbra-se que o ensino-aprendizagem juntamente com as
estratégias do Método PBL em processos ativos, integrados, construtivos e influenciados por fatores
sociais e contextuais criem caminhos para o aluno participar do processo ativamente e desenvolver
sua reflexão crítica na solução de problemas (Stanford University, 2001). Com isso, esta pesquisa
propôs analisar o ensino-aprendizagem na EPT de Nível Médio, com simulacros em Laboratório
Virtual de Química em 3D (LVQ3D) no locus investigado, tomando como abordagem a análise
Qualitativa Comparativa (AQC) entre o Método PBL e o Método Tradicional, a fim de estabelecer
relações de causalidade e levantar as que resultam em bons direcionamentos em potencializar o
ensino-aprendizagem no ambiente estudado.

2 O Método PBL do Tradicional ao Crítico-Reflexivo


No PBL, o conhecimento em construção, ao longo do tempo, mescla conceitos, habilidades e atitudes
por meio de descobertas realizadas pelo aluno com suporte da equipe. Nesse sentido, os alunos
aprendem com a prática e assimilam melhor ao descobrirem por si mesmos (Gentry, 2015), de forma
diferente dos métodos tradicionais, cuja prática é a transmissão/recepção de conhecimentos
“imutáveis”, entregues prontos e acabados para simples memorização, guarda e arquivamento, o
que a pedagogia freiriana chamou de “educação bancária” (Freire, 1991).
Para Ribeiro e Mizukami (2004) e Melo (2013), o PBL busca a problematização e o diálogo, com vistas
à formação do pensamento crítico, diferindo-se também de pedagogias contrárias à pedagogia
tradicional, como as escolanovistas, e outras classificadas como pedagogias do “aprender a
aprender”, como o construtivismo, a pedagogia das competências, a pedagogia dos projetos, a teoria
do professor reflexivo e o multiculturalismo, que dizem respeito ao currículo regulado em princípios
relativistas e não universais (Duarte, 2008). Isso nos permite a reflexão de que o conhecimento
contextualizado aprendido na escola, em aplicações teórico-práticas motivadas pelo quotidiano,
exige, nas pedagogias dominantes, a validação de contextos específicos, pontuais, práticos ou
mergulhados no indeterminismo cultural dos conteúdos curriculares; então, significa dizer que
Em primeiro lugar trata-se de um relativismo epistemológico: o conhecimento seria sempre
dependente do ponto de referência espacial e temporal a partir do qual o sujeito procura

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compreender os fenômenos naturais e sociais. Se o ato de conhecer depende inteiramente


das particularidades do ponto de referência no qual se situa o sujeito cognoscente e se é
impossível situar-se para além dessas particularidades, então estariam inevitavelmente
comprometidas a universalidade e a objetividade do conhecimento. Em segundo lugar trata-
se de um relativismo cultural. (Duarte, 2008, p. 2)
Apesar dessas pedagogias combaterem algumas práticas tradicionais de ensino, elas o fazem dentro
de um pragmatismo induzido, sem criticidade; são, por essa razão, incapazes de transpor as
condições impostas pela Educação Tradicional. O PBL, porém, projeta mudanças quanto ao currículo,
organização das aulas, aos atores e ao uso de tecnologia (Melo, 2013), conforme indicado
comparativamente ao método tradicional na Tabela 1.

Tabela 1. Comparativo entre o Método Tradicional e o Método PBL/ABP

Critério Método Tradicional Método PBL/ABP


Papel do aluno Passivo/receptivo Parte ativa do processo de ensino-aprendizagem ao
definir objetivos e meios para alcançá-los
Papel do professor Gerencia todo processo de Tutor/facilitador. Estimula aos alunos à reflexão, à
aprendizagem pesquisa, ao diálogo e à interação
Objetivos Aprendizado de disciplinas isoladas na Aprendizado contextualizado, interdisciplinar e
educacionais ótica do currículo problematizado. Uso da crítica com vista à autonomia
Organização dos Sala organizada em fileiras, com alunos Alunos organizados em equipes, que interagem
alunos em aula apenas ouvintes durante a atividade: pesquisam/dialogam/questionam
O problema na O problema é apresentado após a O problema é apresentado no início da exposição para
aprendizagem exposição da teoria. Em geral é teórico edar suporte à teoria. É contextualizado à realidade;
revisa o conteúdo revisa e gera novos conhecimentos
Avaliação É somativa: apura a memorização do É processual: uso de análise crítica do conteúdo,
conteúdo em testes de múltipla escolha, trabalhos em grupo, relatórios parciais e final,
verdadeiro/falso etc. autoavaliação etc.
Encerramento das A critério do professor Entrega do relatório das atividades, discussão dos
atividades resultados e apresentação da teoria
Nota. Elaborada a partir de Gentry (2015), Melo (2013) e Ribeiro e Mizukami (2004).

É importante esclarecer que a apropriação dos instrumentos e dos meios de produção desenvolve,
também, um amplo conjunto de capacidades nos indivíduos, mas para utilizarmos o método em uma
pedagogia crítica é preciso entender que o alvo pedagógico não está nas relações professor-aluno ou
aluno-aluno, “a questão central da pedagogia está nas relações que professor e alunos estabelecem
com o conhecimento objetivado nos produtos intelectuais da prática social humana em sua
totalidade” (Duarte, 2008, p. 9).

3 As Perspectivas do Método PBL na EPT e no Proeja com o Laboratório Virtual


O método PBL surgiu na década de 60 nas universidades de McMaster, no Canadá, e em Maastricht,
na Holanda, inicialmente no curso superior de Medicina. Com o passar do tempo, aos poucos, foi
acumulando experiências nas demais áreas, em variados cursos e níveis educacionais (Ribeiro &
Mizukami, 2004). A ampla utilização desse método na educação de nível superior pode estar ligada à
sua origem, no entanto, observa-se o potencial de sua implantação na EPT, apesar de ser ainda
incipiente no Brasil (Lopes, Silva Filho, Marsden, & Alves, 2011). Fato é que o PBL propõe a formação
de indivíduos mais críticos e autônomos, formados em ambiente educativo que trabalha, por meio
do “problema gerador”, questões do contexto profissional, simulando situações reais, que requerem
soluções originais para além da memorização do conteúdo (Gentry, 2015; Melo, 2013).

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Para o público do Proeja, é transparente a adequação ao Método PBL, por se entender que o
programa busca a integração curricular da educação profissional à educação básica pela
compreensão histórica da educação como “totalidade social” e assume o trabalho como princípio
educativo pela superação da dualidade trabalho manual e intelectual, na sua perspectiva “criadora e
não alienante” (Brasil, 2007; Ciavatta, 2005). Além disso, no programa Proeja, soma-se a busca de
metodologias e estruturas de assistência ao estudante, o que favorece a sua aprendizagem,
autonomia e permanência na escola, características encontradas nas propostas do PBL.
Por outro lado, o PBL sugere o uso de tecnologias (Gentry, 2015; Melo, 2013), o que oportuniza a
aplicação de novos processos, técnicas e plataformas no ensino. Nesse ensejo, a instituição
investigada possui o Laboratório Virtual de Química “Yenka Chemestry” (YK), que simula experiências
laboratoriais em ambiente computacional local ou on-line em 3D, por aquisição de nosso Grupo de
Pesquisa em Tecnologias Educacionais, registrado na Plataforma Lattes do Conselho Nacional de
Pesquisas (CNPq). É importante destacar o material de apoio direcionado a docentes e discentes já
produzido, com informações básicas de uso na instituição e no módulo residencial, constando,
inclusive, várias experiências e cadernos de exercícios concebidos para uso na escola.
O LVQ3D, então, representa para a escola a oportunidade de melhorias, democratização e
universalização do ensino, possibilitando desenvolver experimentos de forma virtual, sem os custos e
restrição de espaço e tempo dos laboratórios convencionais. Do mesmo modo, essa plataforma
simula situações reais para as “atividades de aprendizagem”, como as planejadas pelo PBL, em que
os alunos protagonizam e desenvolvem projetos sobre fenômenos verdadeiros, valida Gentry (2015).

4 O Percurso Metodológico na Abordagem de Análise Qualitativa Comparativa (AQC)


O conjunto de procedimentos necessários para aplicar o Método PBL a uma formação mais crítica
dos sujeitos ante os problemas a eles apresentados pela escola, pelo trabalho e pela vida, em
práticas de pesquisa, resolução de problemas e discussão do método proposto, para possíveis
melhorias no processo de ensino-aprendizagem na EPT de Nível Médio no Ifes, campus Vitória,
compõe a metodologia desta investigação.
Desta forma: a) levantaram-se as estratégias de aula utilizadas pelo Método PBL a serem aplicadas a
situações-problema simuladas no LVQ3D; b) foram elaborados o planejamento das aulas, o caderno
de aula e de atividades para os alunos; e c) aplicou-se o Método PBL no LVQ3D com especificidades
do grupo de alunos participantes. Em um grupo focal d) pontuaram-se as diferenças do Método
Tradicional e PBL como também e) levantaram-se opiniões do grupo sobre o contexto
vivenciado/discutido pela tática de informar, refletir e questionar. Por fim, f) categorizaram-se as
opiniões; g) e para sua análise, optou-se por uma abordagem pertinente com a AQC, tomando por
base os critérios comparativos entre o Método Tradicional e o PBL dados pela revisão de literatura
como variáveis qualitativas relevantes ao problema, de forma a ser possível construir relações de
causalidade entre essas e os fenômenos sociais (Dias, 2011).
Segundo Rangel e Matta o AQC analisa a realidade social na perspectiva de que os dados obtidos
criteriosamente nas investigações traduzem-se “em registros de pertencimento a um determinado
grupo; as relações entre os fenômenos sociais são modeladas em termos de relações entre
conjuntos; e os resultados são apontados em termos de condições de necessidade e suficiência, com
ênfase na complexidade causal (2016, p. 8).
Utilizou-se procedimentos técnicos e científicos da Pesquisa de Campo na coleta de dados, a partir
das aulas no laboratório de informática em aplicação do PBL no LVQ3D, como também observação
direta, registro em diário de bordo e respostas dos alunos no questionário de informações pessoais
básicas e no caderno de atividades, assim como na transcrição e análise das discussões geradas a
partir da técnica de grupo focal com alguns dos alunos participantes.

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As atividades contextualizadas no conteúdo curricular aplicado na escola e motivadas por interesses


provenientes da prática cotidiana e profissional ancoraram a investigação sob o ponto de vista da
pedagogia crítica, para a formação de sujeitos capazes de analisar a realidade vigente, o que exigiu
estudos prévios e sistemáticos sobre o Método PBL, que possibilitassem o planejamento das aulas
com situações-problema simuladas no LVQ3D.
Essas ações foram norteadas pela hipótese de que, se implementássemos o Método PBL nesse
arranjo, potencializaríamos o ensino-aprendizagem dos alunos na EPT de Nível Médio, mesmo
aqueles com características específicas e com maior dificuldade de aprendizado. “As hipóteses
traçadas pela pesquisa, tratadas como sentenças verbais das variáveis analisadas, após coletas dos
dados, são transformadas em termos de conjuntos como pertencentes ou não aquele grupo” (Rangel
& Matta, 2016, p. 8). Nesta pesquisa, escolheu-se a AQC mais simples, a saber, a "crisp set".
Assim, os sujeitos convidados para a pesquisa foram alunos do programa Proeja, vinculados ao Curso
Técnico Integrado em Segurança do Trabalho, matriculados no 2º módulo, por estarem retornando à
escola após terem perdido o tempo regular de ensino, por questões familiares, sociais e/ou
financeiras. No universo de 32 alunos convidados para a aula no LVQ3D, um grupo amostral de 14
estudantes aceitou participar das aulas voluntariamente e sete deles, do grupo focal.
As aulas foram elaboradas para vivenciar com os alunos um modelo de condução do ensino-
aprendizagem segundo o Método PBL, cujo planejamento pedagógico envolveu o conteúdo
programático curricular de condutividade de compostos iônicos, covalentes e metálicos, em três
aulas de 50 minutos. Essa planificação incorporou objetivos de aprendizagem, para além do
conteúdo, abrangendo aspectos desse método, como: identificar de modo contextualizado os
conceitos básicos do conteúdo estudado; vincular teoria e prática; desenvolver habilidades de
pesquisa e de trabalho em equipe; exercitar o registro de atividades em relatório; praticar
autoavaliação e avaliação aos pares.
A primeira aula se caracterizou pela apresentação do problema, prática de pesquisa, uso de
tecnologia no LVQ3D, uso do caderno de atividades e trabalho em equipes. A segunda aula se
distinguiu com o compartilhamento das descobertas sobre a solução do problema, com interação e
diálogo dentro do grupo, e oportunizou ao professor a verificação de alcance de resultados, ajustes e
orientação, exercendo o seu papel de facilitador. A terceira aula trouxe o encerramento das
atividades, com debates, exposição da teoria e realização das avaliações.
Em um modelo dinâmico, o próprio processo de elaboração do caderno de atividades retroalimentou
o planejamento pedagógico das aulas, em troca recíproca nas bases da metodologia PBL. A escolha
da experiência no LVQ3D, exigiu cobrir todas as lacunas dos objetivos educacionais em frente a uma
lista com 137 experiências on-line e 56 em diretório local, considerando o currículo do curso para a
matéria Química, pois o PBL deve ser trabalhado integrado ao currículo. Assim, a experiência
escolhida fomentou, junto aos alunos, o conhecimento aplicado de Química, dentro de problemas
discutidos no reduto do técnico em Segurança do Trabalho, sobre riscos no ambiente de trabalho.
Nessa conjuntura, utilizando o LVQ3D, os alunos deveriam: verificar os compostos que conduzem ou
não eletricidade e as condições dessa condução; identificar possíveis riscos para os empregados de
dada empresa; criar orientações que previnam acidentes no manuseio e armazenamento desses
compostos; e responder à pergunta-problema: “Quais as orientações para prevenção de acidentes
no manuseio e armazenamento de compostos covalentes, iônicos e metálicos diante dos riscos
encontrados para o trabalhador? (Figura 1).

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Fig. 1. Figura comparativa do software Yenka Chemestry (à esquerda) e estudos de Física (à direita).

O material de apoio às aulas destinava locais para registro de observações, atividades e


responsabilidades para membros e líderes dos grupos, assim como o resultado consensual da equipe
em um relatório final, com descrição sumária das impressões sobre o aprendizado do grupo na
execução das tarefas e pesquisa. Nele constava a autoavaliação de cada aluno quanto ao seu
empenho e contribuição nas tarefas, como reflexão sobre seu aprendizado e sua responsabilidade
nessa ação. Propôs, ainda, a avaliação aos pares. Esperava-se, por meio desses instrumentos,
estimular o pensamento crítico e avaliar para além da memorização.
Já o planejamento do grupo focal teve como um dos principais objetivos “identificar percepções,
sentimentos, atitudes e ideias dos participantes” (Dias, 2000, p. 3) a respeito das atividades e do
método, sendo guiado por um roteiro na sua aplicação. Nessa técnica, a unidade de investigação é o
grupo, pelo qual se busca entender o meio pesquisado, o que confirmou que “a sinergia entre os
participantes leva a resultados que ultrapassam a soma das partes individuais” (Dias, 2000, p. 4).
Assim, dentro dos critérios de representatividade estabelecidos, o grupo foi composto pelo
moderador (pesquisador), professor auxiliar e sete alunos participantes, considerando os seguintes
itens: apresentação do moderador do grupo; explicação do objetivo/finalidade do encontro;
esclarecimento das regras de identificação por codinomes; permissão do grupo para gravar a sessão;
e, por fim, leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Ademais, por meio de
questionário buscou-se obter informações básicas dos alunos (idade, sexo, tempo de itinerário
interrompido), para levantar o perfil desses sujeitos.
As informações levantadas foram utilizadas para elaborar a matriz analítica, em conformidade com
as categorias de análise e descritores que insurgiram do processo de transcrição, interpretação e
análise das informações, o que configura a sistematização das informações; sendo as categorias
concomitantemente “independentes e exaustivas”, para manifestar “a sistematização como
validade, relevância e objetividade” (Brzezinski, 2014, p. 81) e minimizar o processo de subjetivação.

5 A análise comparativa dos dados


Após as aulas, foi realizado o grupo focal, que trouxe aos participantes da pesquisa informações do
Método PBL, em comparação com o Método Tradicional, a partir da vivência/sensibilização das aulas
no LVQ3D, e motivou o debate por um tempo médio de 1h40min de trabalho, em que a discussão
somente se esgotou quando todos os participantes se manifestaram sobre os tópicos abordados.
O grupo pesquisado era composto de maioria feminina, seis alunas e um aluno, e a grande diferença
de idade, de 19 a 52 anos, e tempo de itinerário interrompido, de zero a 30, mostra que a instituição

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deve ser capaz de balizar a formação desses sujeitos, considerando a diversidade existente, nas
variadas experiências de vida, vivências escolares e ritmos de aprendizagem no mesmo ambiente.
Tais sujeitos debateram as categorias de análise, definidas pelo pesquisador no planejamento tático
"Informar – refletir – questionar”, e foram motivados a tecer opiniões sobre o seu aprendizado pelo
Método PBL em comparação com o Método Tradicional para: 1) o problema; 2) a organização da sala
de aula; 3) as relações aluno-aluno e aluno-professor; 4) a avaliação e encerramento das atividades;
5) as conclusões sobre o método e para além do método (Tabela 2).

Tabela 2. Categorias de análise balizadas pela discussão do grupo focal

Discussão Informar Questionar


O problema A estrutura; o momento de exposição; o O suporte à teoria, a contextualização, novos
tempo de solução em sala de aula saberes, e tempo de solução do problema no PBL
convencional e pelo PBL no LVQ3D
A organização da As organizações da sala de aula (tradicional A contribuição das equipes no aprendizado,
sala de aula ‒ fileiras; PBL ‒ equipes) situações exemplos para as percepções
As relações aluno- Os papeis do aluno e do professor; as Influência dos papéis na aprendizagem (PBL/
aluno e aluno- relações aluno-aluno e aluno-professor Tradicional); relações e contextos de vida;
professor responsabilidades; vivências na equipe
Avaliação e Avaliação somatória e individual (Método Houve análise crítica? Como isso pôde ajudar?
encerramento das Tradicional) e processual (PBL); Pontos positivos e negativos do processo no
atividades encerramento das atividades encerramento das atividades
Conclusões sobre Análise sobre a aprendizagem dos alunos O ensino foi além da memorização? Os docentes
o método e para comparando os Métodos PBL e Tradicional utilizam práxis mais próximas do PBL ou do
além do método Método Tradicional? Qual método é mais
adequado ao aluno no Proeja? Por quê?
Nota. Elaborada pelos autores.

Na categoria que analisa o Problema, os alunos mostraram clareza na compreensão da diferença


entre o Método PBL e o Tradicional, quando expressaram seu posicionamento:
O Método Tradicional é interessante também, mas acho que é um processo mais demorado
de aprendizado para nós, que não temos conhecimento prático ainda. Acredito que no PBL
foi mais rápido para entender como fazer o experimento de uma forma clara e rápida, e a
partir deste momento se conseguiu fazer muito mais testes, experiências, do que se fosse
pelo Método Tradicional. Isso, para o nosso grupo, foi muito interessante, porque em poucos
minutos começamos a compreender a ação proposta ali. (Aluno)
Outra perspectiva do método notada pelo grupo é que o problema “está pautado no pressuposto de
que o conhecimento é construído em vez de simplesmente memorizado e acumulado” (Escrivão
Filho & Ribeiro, 2009, p. 24). Uma compilação de vozes discente mostra que o problema no PBL “Não
é um padrão, que vem escrito: faz isso, isso e aquilo, acabou ali; pode ir fazendo e usar na vida; pode
ousar, fazer, errar, tentar de novo; ir aprendendo e pesquisando e ter curiosidade de aprender mais”.
Os alunos perceberam que um ponto crucial no PBL é o que vincula o problema à realidade no
âmbito das variáveis curriculares, sociais e ambientais próprias do contexto, e que se deve trabalhar
ao mesmo tempo com conceitos, habilidades e posturas na sala de aula, como atestam Escrivão Filho
e Ribeiro (2009), Melo (2013) e Ribeiro e Mizukami (2004). Nesse ponto, um dos participantes relata
que nas pesquisas que fizeram havia contexto com a realidade e diz: “descobrimos várias coisas que
até então eu, com 40 anos, não sabia. Vamos colocar assim: ‘brincamos com as misturas’. Isso deve
ser levado para a sala de aula, pois foi interessante e mais fácil para apropriação dos conteúdos”.
No que concerne à categoria “organização da sala de aula”, os sujeitos revelaram que o trabalho em
equipe facilita a discussão/solução do problema: “enquanto um aluno pesquisa uma coisa, outro

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investiga outra, depois é só juntar e discutir. O trabalho torna-se prazeroso, os pontos contrários
ajudam a tomar decisões mais rápidas e opiniões distintas e favoráveis contribuem para o consenso”.
De fato, observamos que a discussão no grupo despertou o interesse dos alunos, colaborou para a
solução do problema, fez com que os estudantes tirassem dúvidas entre si e ajudou aos mais tímidos.
Na voz de um sujeito: “Tenho muita dificuldade de perguntar. Fico lá quietinha, no meu canto.
Quando se trabalha em grupo, se tem liberdade, sendo mais fácil de entender os acontecimentos. Eu
gostei muito desse método, porque, ao se trabalhar em equipe estamos juntos”.
Já na categoria “aluno-aluno” e “aluno-professor”, os participantes ressaltaram o papel do professor
“não como protagonista do conhecimento; ele auxiliou a equipe”. Um deles afirmou que “isso
contribuiu muito mais do que no Método Tradicional”. A organização das relações instigou a
“colaboração”, o “diálogo” e o “interesse”, o que motivou, conduziu e facilitou a participação. Na
visão discente, “o papel de um representante no grupo conduz o processo passo a passo e a equipe
acaba assumindo a postura de divisão de tarefas ... ter um representante deixou o grupo seguro”.
Os alunos mencionaram nunca terem trabalhado com alguns colegas de turma e viram vantagem, na
aproximação propiciada pelo PBL, o que nos permite afirmar que foram geradas novas relações
durante a práxis. Nesta categoria registrou-se que “os discentes são engajados como intervenientes
(stakeholders) ativos diante da situação-problema sob estudos/análise” (Melo, 2013, p. 573).
Na categoria “avaliação e encerramento das atividades”, analisaram o processo como positivo,
idêntico a Ribeiro e Mizukami (2004) e elucidaram que a autocrítica, proporcionada pelo sistema de
avaliação do PBL (Escrivão Filho & Ribeiro, 2009), amparou-se na contextualização/aproximação do
problema teórico à prática associada à realidade profissional. Para uma aluna: “Este tipo de avaliação
e busca de conhecimento é melhor do que no Método Tradicional. Precisa-se do olhar técnico para
lidar com a vida e saúde do ser humano. É preciso se autocriticar, se autoavaliar e avaliar o outro”.
Os participantes distinguiram o Método Tradicional e o PBL por meio de experiências vividas em sala
de aula no Ifes, identificando os seus professores que se utilizam desses métodos e/ou de métodos
parecidos e afirmaram que a maioria utiliza o Método Tradicional. Por fim, manifestaram maior
aprendizagem via métodos parecidos ao PBL. Como exemplo, citaram um caso em Matemática, cuja
professora separava os alunos em grupos para responderem algum questionamento com pesquisa e
relataram: "Isso acelerou nosso aprendizado, mesmo com as dificuldades em Matemática. Neste
semestre, ‘o novo professor’ entrou com o Método Tradicional e nós entramos em pânico”.
Os alunos afirmaram que o ensino foi além da simples memorização, com o auxílio da
contextualização das atividades na área de interesse do curso, o que ratifica a relevância de inserir
no contexto do problema estudado aspectos do exercício profissional (Escrivão Filho & Ribeiro, 2009;
Lopes et al., 2011). E concluíram que o PBL é mais adequado a sua aprendizagem: “para nós, que
somos Proeja, este método é o melhor, porque aqui temos várias faixas de idade. Ensina a trabalhar
em equipe, tem diálogo e mesmo você conversando com os colegas, o professor está ali de suporte”.
Por fim, ao analisarem as “conclusões sobre o método e para além do método”, os participantes do
grupo focal entenderam que a “experiência supriu as expectativas” e/ou foi “além das expectativas”,
acreditando que “no Método Tradicional, a gente fica ligado a uma situação única, mas, no Método
PBL, consegue ter interesse de ir além do que estava se vendo ali”. Portanto, com esse método, os
alunos se motivam com o conteúdo e com a resolução dos problemas (Gentry, 2015).
Para realizar a AQC foi necessário buscar a relação causal que se presume existir entre a variável
dependente F, que mensura a qualidade do método ensino-aprendizagem do grupo por meio dos
resultados do grupo focal, e as variáveis independentes, a saber: Critérios A (Problema), B
(Organização da sala), C (Relações interpessoais em sala de aula), D (Avaliação e encerramento das
atividades), E (Conclusões das aulas). Na operacionalização do procedimento, os critérios não citados
ou citados negativamente pelos alunos no grupo focal receberam o valor 0 (zero), os citados como

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uma ação afirmativa receberam o valor 1 (um) e com o conjunto dos dados elaborou-se a Tabela
Verdade Comparativa (TVC) dos Métodos em estudo (Tabela 3), orientada pela sentença lógica:

Se (A.B.C.D=1) + (A.B.C.E=1) + (A.B.D.E=1) + (A.C.D.E=1) + (B.C.D.E=1), então (F=1), senão (F=0).

Em outras palavras, para existir qualidade no método de ensino-aprendizagem para o grupo


investigado, (F=1), pelo menos quatro dos cinco critérios devem confluir em ações afirmativas na
visão dos alunos (Critérios=1).

Tabela 3. Tabela Verdade Comparativa dos métodos PBL e Tradicional balizadas pela discussão do grupo focal

Aluno Método Critério A Critério B Critério C Critério D Critério E Produto Respostas Suficiência
problema organização relações avaliação e conclusões F positivas (R) (R/Ncritérios)
da sala interpessoais encerramento
PBL 1 1 1 0 1 1 4 0,8
1
Tradicional 0 1 1 0 0 0 2 0,4
PBL 1 1 1 0 1 1 4 0,8
2
Tradicional 0 0 0 0 0 0 0 0,0
PBL 1 1 1 1 1 1 5 1,0
3
Tradicional 0 0 1 0 0 0 1 0,2
PBL 1 1 1 1 1 1 5 1,0
4
Tradicional 1 0 0 0 1 0 2 0,4
PBL 1 1 1 1 1 1 5 1,0
5
Tradicional 0 0 0 0 0 0 0 0,0
PBL 1 1 1 1 1 1 5 1,0
6
Tradicional 0 0 0 0 0 0 0 0,0
PBL 1 0 0 0 0 0 1 0,2
7
Tradicional 0 0 0 0 0 0 0 0,0
Nota. Elaborada pelos autores.

A TVC deve refletir suas condições de “necessidade” e “suficiência”, com ênfase na complexidade
causal. As condições de necessidade de cada variável, em conjunto e/ou isoladamente, foram
avaliadas e elencadas aquelas referentes ao produto F=1 com consistência de pelo menos 90% dos
casos quando o critério foi igual a 1 (um), conforme orientações de Marx, Rihoux e Ragin (2013, p. 6).
Nesse problema, a consistência implicou na coerência da fala de cada aluno sobre dado critério.
Ao verificar a consistência é possível delinear em dada combinação de condições a sua suficiência, “o
grau ao qual uma combinação de condições constitui um subconjunto de um resultado" (MARX,
RIHOUX e RAGIN, 2013, p. 12), o que se representou pela razão entre o total de respostas positivas
(R) e o total de critérios analisados (Ncritérios).
A combinação de critérios deve ser consistente e suficiente para a ocorrência de um resultado de
interesse e embora os extremos 0 e 1 sejam totalmente consistentes e 0,5 totalmente inconsistente,
recomenda-se apenas valores superiores a 0,8 para demonstrar suficiência, segundo Marx, Rihoux e
Ragin (2013) e Rangel e Matta (2016). No grupo investigado, 85,7% dos alunos (1, 2, 3, 4, 5 e 6)
acreditam que os critérios do Método PBL reforçam o ensino-aprendizagem dos alunos do Proeja,
em resultados com suficiência maiores ou iguais a 0,8, embora 42,9% deles também enfatizassem
pontos positivos no Método Tradicional.
O Documento Base do Proeja expõe a “EJA como um campo de conhecimento específico”, onde se
devem investigar “as reais necessidades de aprendizagem dos sujeitos alunos ... como
produzem/produziram os conhecimentos que portam, suas lógicas, abordagens e táticas de resolver
situações e enfrentar desafios” (Brasil, 2007, pp. 35-36). Ao investigar e aplicar métodos mais

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adequados às experiências dos alunos, como os desta análise, que potencializaram o ensino-
aprendizagem no recorte estudado e motivaram a continuidade do estudo, procura-se minimizar
conflitos e introduzir métodos apropriados a uma realidade concreta e não abstrata.

6 Conclusões
O Método PBL trouxe em si um suporte evidente para o desenvolvimento de ações focadas na
pedagogia crítica, o que resultou na proposta de melhorias para o processo de ensino-aprendizagem,
assim como na reflexão das práxis que emergem das novas tecnologias, advindas da experiência
proposta no LVQ3D com as estratégias utilizadas.
Na percepção dos alunos participantes do grupo focal, as estratégias do PBL devem ser aplicadas ao
aluno jovem e adulto na EPT de Nível Médio no ambiente estudado, tendo promovido sua
autonomia, interação e pensamento crítico-reflexivo e motivado a busca de soluções ao problema,
provocado pela novidade e pela condução da teoria em contextos profissionais próximos à realidade,
o que os leva à formação profissional para além da teoria, sem o que ela se torna limitada. Além
disso, informaram ser o Método Tradicional, com poucas aproximações ao PBL, o mais utilizado na
escola, conquanto o aprendizado por esse método se torne mais eficiente.
A abordagem metodológica AQC utilizada permitiu concluir que as variáveis escolhidas como
critérios, podem refletir em escolhas metodológicas para as salas de aula que promovam melhorias
na qualidade do ensino-aprendizagem no programa Proeja da educação profissional tecnológica no
Ifes. Apesar de nenhum critério ser isoladamente suficiente para definir um método, o conjunto
implicou em combinações necessárias e suficientes para melhores resultados educacionais, sendo o
PBL mais adequado para o grupo investigado.
É imprescindível que a Educação Profissional e Tecnológica esteja comprometida com novas
tecnologias e práticas pedagógicas adequadas aos alunos que atende, pois não tão somente agrega
valores ao ensino-aprendizagem, como também deflagra um processo de intervenção social no/pelos
sujeitos, pela autonomia, consciência crítica e conjunto de atitudes e conceitos adquiridos, em
perspectiva de formação e emancipação social, política e humana.

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Perfil do Professor no Ensino Superior em Cursos de Educação a


Distância no Brasil: avanços e prospecções

1 2
Marcia Alves de Carvalho Machado , Marilene Batista da Cruz Nascimento , Josevânia Teixeira
3
Guedes
1
Universidade Tiradentes. mac_machado@hotmail.com
2
Departamento de Educação da Universidade Federal de Sergipe. nascimentolene@yahoo.com.br
2
Curso de Licenciatura em Química da Faculdade Pio Décimo. josevaniatguedes@gmail.com

Resumo. Este trabalho tem como objetivo descrever o perfil requerido no Brasil para atuação do professor
na educação a distância (EaD), no ensino superior, à luz das regulamentações legais e propostas de políticas
acerca de indicadores de qualidade. A perspectiva teórico-metodológica utilizada foi a Sociologia da
educação crítica. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de cunho bibliográfico, com destaque para a análise
das competências definidas pelos Referenciais de Qualidade para EaD (2007). Os dados coletados foram
trabalhados à luz da Análise Textual Discursiva (ATD). Defende-se que a formação nesse campo seja em
licenciatura, haja vista caracterizar-se um trabalho docente. Evidencia-se a necessidade das instituições de
ensino superior dos cursos de formação inicial de professores reavaliaram essa situação. Considerando, que
os professores podem atuar na função de professor e tutor (a distância e presencial), este estudo propõe
ressignificações quanto à diferenciação na atuação do professor e do tutor com vistas a evitar a
precarização da profissão docente.
Palavras-chave: Educação a Distância. Marco Regulatório. Perfil do Professor. Qualidade.

Profile of the Non-Higher Education Teacher in Distance Learning Courses in Brazil: advances and
prospects
Abstract. This work aims to describe the profile required in Brazil of teacher's role in distance education
(EaD), in higher education, in light of legal regulations and policy proposals on quality indicators. The
theoretical-methodological perspective used was the Sociology of critical education. It is a qualitaty
research, of bibliographic, as a highlight for the analysis of the competencies defined by the Quality
Guidelines for EaD (2007). The data collected were analyzed in light of the Discursive Textual Analysis
(ATD). It is argued that the training in this field is in a degree, given the characterization of a teaching
work. It is evident that the need for higher education institutions in initial teacher training courses re-
evaluated this situation. Whereas, that the teachers can act in the role of teacher and tutor (distance and
presential), this study proposes resignifications regarding the differentiation in the performance of the
teacher and the tutor with a view to avoiding the precariousness of the teaching profession.
Keywords: Distance Education. Regulatory Framework. Teacher Profile. Quality.

1 Introdução

A formação de professores1 está presente nas discussões relativas às perspectivas e desafios da


qualidade da educação no Brasil. A partir da década de 1990, esse debate passou a ser mais enfático.
Consequência das exigências da população em virtude das conquistas obtidas frente aos direitos
sociais garantidos pela Constituição Federal (CF) de 1988, em especial, o art. 206, inciso VII, que
assegura a garantia do padrão de qualidade do ensino. O art. 3º, inciso IX, da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB), n.º 9.394 de 1996, também faz referência a esse direito. Além disso, as

1
Nesta pesquisa, as autoras consideram os termos professor e docente como sinônimos. Entretanto, nas políticas, aqui,
estudadas nota-se ambivalência.

1903
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normativas legais tendem a atender as orientações de organismos internacionais que estabelecem


acordos bilaterais há décadas. Entre esses acordos estão os de parcerias técnicas e econômicas, a
exemplo da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial (BM). Destaca-se entre esses
organismos, a UNESCO pela ênfase no acompanhamento quanto aos projetos desenvolvidos pelo
Governo Federal na área educacional, mediante acordos de cooperação técnica, no âmbito de
consultoria, considerados, nesta investigação, importantes fontes para estudos e pesquisas, em
particular, àqueles estabelecidos com diversos setores do Ministério da Educação (MEC).
Entre as ações adotadas pelo Brasil, oportuniza-se a oferta de formação inicial de professores em
nível superior, na modalidade a distância, para os profissionais que se encontravam em exercício nas
redes públicas, mas que não possuíam licenciatura, como também cursos para a melhoria das
habilidades técnicas dos professores. É nesse contexto que os cursos superiores em educação a
distância (EaD) iniciam sua expansão e interiorização.
De acordo com os dados da Sinopse Estatística da Educação Superior de 2000, divulgada pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), foram oferecidos sete
cursos, apenas por Instituições de Ensino Superior (IES) públicas – federal e estadual, e todos na área
de educação, ou seja, cursos voltados à formação de professores, perfazendo total de 5.287 alunos
ingressantes (Brasil, 2001). Em 2014, também segundo o Inep, foram ofertadas 1.365 vagas nessa
modalidade, o que representa uma expansão de 19.500% sobre o total de cursos de 2000. Essa
oferta contemplava todas as áreas da modalidade presencial (Educação, Humanidades e Artes;
Ciências Sociais, Negócios e Direito; Engenharia, Produção e Construção; Agricultura e Veterinária,
Saúde e Bem-Estar Social, e Serviços). Na ocasião, os cursos foram promovidos por IES públicas e
privadas, sendo 69% oferecidos na rede privada. Foram 1. 341.842 matrículas nos cursos de EaD
nesse respectivo ano (Inep, 2014).
Essa expansão vertiginosa da EaD trouxe como consequência desafios, entre eles a construção de
um novo perfil profissional docente requerido para a modalidade. Um perfil diferenciado dos
formadores que já atuavam no campo de trabalho e dos egressos recém-formados pelos cursos de
licenciatura. Verifica-se na atualidade que esses desafios, quanto à formação para docência na EaD,
persistem, seja na formação inicial ou continuada.
Diante do exposto, cabe questionar: qual o perfil requerido na atualidade para os professores da EaD
no Brasil? Nessa perspectiva, este estudo tem como objetivo descrever o perfil profissional para
atuação do professor na EaD, no ensino superior, à luz das regulamentações legais e propostas de
políticas baseadas nos indicadores de Referenciais de Qualidade, com vistas à identificação da
concepção de atual de EaD e das competências necessárias para o professor. Pretende-se, assim,
contribuir para o entendimento das determinações legais, bem como apresentar uma análise
qualitativa no campo da educação superior.

2 Metodologia Aplicada ao Estudo

No desenvolvimento desta investigação, utilizou-se a perspectiva teórico-metodológica da Sociologia


Crítica, efetuando-se uma análise dos determinantes políticos, considerada por Morrow e Torres
(1997), como um dos momentos do exame integrado das políticas educativas. Essa opção
[...] não se limita à desconstrução analítica das políticas educacionais ou à desocultação das
ambiguidades e contradições que as atravessam, mas assume, em simultâneo, um compromisso
ético e político explícito, procurando e valorizando o confronto tenso e instável entre a
objectividade pretendida pela prática científica e a politicidade inerente a toda a acção humana
(Afonso, 2003, p. 36).

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Essa postura compromete-se com uma explicação empírica que faz o investigador assumir valores e
visões do mundo que defende. “Trata-se de uma atitude epistemologicamente mais complexa, que
opta por confrontar crítica e profundamente as realidades (sociais e educacionais) e as suas
especificidades sem cair na tentação de importar mimeticamente as agendas de investigação
dominantes” (Afonso, 2003, p. 36).
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, entendida como um processo de produção de conhecimentos
que permite a compreensão e interpretação da realidade. Quanto ao tratamento dos dados, optou-
se pela análise textual discursiva (ATD) de Moraes e Galiazzi (2006, 2007) que parte de textos
existentes para o aprofundamento acerca da apropriação dos fenômenos investigados. A intenção é
a (re)construção do conhecimento sobre o objeto investigado. Para tanto, utilizaram-se a análise
documental e as fontes bibliográficas que permitiram o contato direto com leis e normatizações
sobre a temática. Foram examinados textos legais que regulamentam os cursos de EaD e sua
qualidade, bem como os documentos finais da consultoria Conselho Nacional da Educação (CNE),
órgão colegiado integrante do MEC, com a UNESCO, referidos nessa investigação como Produto 1 do
Projeto CNE/UNESCO 914brz1142.3 e Produto 2 do Projeto CNE/UNESCO 914brz1142.3.
Cabe destacar que a ATD é entendida por Moraes & Galiazzi (2007, p. 7) como “[...] uma metodologia
de análise de dados e informações de natureza qualitativa com a finalidade de produzir novas
compreensões sobre os fenômenos e discursos”. Essa técnica insere-se entre a análise de conteúdo e
de discurso, representando um movimento interpretativo de caráter hermenêutico. Esse processo
apresenta três ciclos: a) desmontagem dos textos; b) estabelecimento de relações; c) captação do
novo emergente. Essas etapas relacionadas compõe um processo auto-organizado.
A ATD trabalha com significados (re)construídos a partir de um conjunto de textos denominado
corpus que deve ser delimitado para depreender-se de resultados válidos e confiáveis. Na fase de
desconstrução ou unitarização, realizou-se um processo de decomposição, no qual os textos foram
desmontados ou desintegrados. Destacam-se seus elementos constituintes, o que representa colocar
o foco nos detalhes e nas partes. Na categorização ocorreu o “[...] processo de comparação
constante entre as unidades definidas no momento inicial da análise, levando a agrupamentos de
elementos semelhantes. Conjuntos de elementos de significação próximos constituem as categorias”
(Moraes & Galiazzi, 2007, p. 19). A etapa emergente corresponde a produção de metatextos
[...] que se inicia com um movimento de desconstrução, em que os textos do ‘corpus’ são
fragmentados e desorganizados, seguindo-se um processo intuitivo auto-organizado de
reconstrução com emergência de novas compreensões que, então, necessitam ser comunicadas e
validadas cada vez com maior clareza nas produções escritas (Moraes & Galiazzi, 2007, p. 41).
Isso significa “[...] abandonar-se aos processos auto-organizados e emergentes da análise textual
discursiva [...]” (Moraes & Galiazzi, 2006, p. 122), sendo esse um processo recursivo continuado que
amplia a qualificação do conhecimento produzido. Trata-se de um “[...] processo integrado de análise
e de sínteses que se propõe fazer uma leitura rigorosa e aprofundada de conjuntos de materiais
textuais, com o objetivo de descrevê-los e interpretá-los no sentido de atingir uma compreensão mais
complexa dos fenômenos e dos discursos [...] (Moraes & Galiazzi, 2007, p. 114).
Nessa perspectiva, os documentos analisados foram decompostos com vistas a destacar seus
elementos, categorizados visando realizar a comparação, em especial, quanto à concepção da EaD no
que concerne aos requisitos do perfil do professor, buscando-se atribuir sentidos e significados que
fizeram emergir as seções a seguir.

3 Ressignificação da Concepção da Educação a Distância nos Dispositivos Legais

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A formalização legal nas políticas educativas no Brasil ocorreu com a aprovação da LDB/1996. No art.
80, a lei define que o Poder Público deve incentivar o desenvolvimento e a veiculação de programas
de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades, e de educação continuada; sua organização
com abertura e regime especial ofertados por instituições credenciadas pela União, responsável pela
regulamentação dos requisitos para a realização de exames e registro de diploma.
O Decreto n.º 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, que regulamenta esse art. 80, define esse tipo de
educação como “[...] uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de
recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de
informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de
comunicação” (Brasil, 1998, p. 1).
Esse decreto sinaliza, ainda, a preocupação com o padrão de qualidade do ensino na EaD. O
parágrafo 5º estabelece que a avaliação, quanto ao credenciamento de instituições e autorização, de
cursos deve obedecer procedimentos, critérios e indicadores de qualidade definidos em ato próprio,
a ser expedido pelo MEC (Brasil, 1998). Esse aspecto aponta para definição de referenciais de
qualidade. Estes são relevantes para a criação de elementos, como, por exemplo, a definição do
corpo docente. O parágrafo 6º enfatiza que a falta de atendimento aos padrões de qualidade, bem
como a ocorrência de irregularidade de qualquer ordem podem ser objetos de fiscalização passível
de processo e até de descredenciamento da IES.
Em abril de 2003, a Diretora de Política de Educação a Distância do MEC lançou uma proposta para
os Referenciais de Qualidade para EaD. Verificou-se que a qualidade para curso ou programa a
distância deveria ser inserida nos propósitos da educação escolar – abrangendo a educação básica
(educação infantil, ensino fundamental e médio) e a superior. Ou seja, cursos a distância para todos
os níveis de ensino. A concepção de EaD emerge, então, a partir da diferenciação dessa em relação à
educação presencial, pela qual se verifica a ampliação na proposta da LDB. Isso indica que
[...] o aluno constrói conhecimento – ou seja, aprende - e desenvolve competências, habilidades,
atitudes e hábitos relativos ao estudo, à profissão e à sua própria vida, no tempo e local que lhe
são adequados, não com a ajuda em tempo integral da aula de um professor, mas com a
mediação de professores (orientadores ou tutores), atuando ora a distância, ora em presença
física ou virtual, e com o apoio de sistemas de gestão e operacionalização específicos, bem como
de materiais didáticos intencionalmente organizados, apresentados em diferentes suportes de
informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados através dos diversos meios de
comunicação (Brasil, 2003, p. 3).
Posteriormente, o Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005, alterou o art. 80. A EaD passou a
caracterizar-se como uma modalidade da educação nacional “[...] na qual a mediação didático-
pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias
de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas
em lugares ou tempos diversos” (Brasil, 2005, não paginado). Em agosto de 2007, a proposta de
atualização dos Referenciais de Qualidade da EaD tem como base de reflexão a elaboração de
referenciais específicos para os todos os níveis educacionais que podem ser ofertados a distância.
Nesse texto não houve a preocupação em caracterizar a EaD, mas sim, dar ênfase ao ponto focal da
educação superior, em qualquer modalidade ou combinação. Apontou-se, então, para uma
modalidade com “[...] características, linguagem e formato próprios, exigindo administração,
desenho, lógica, acompanhamento, avaliação, recursos técnicos, tecnológicos, de infra-estrutura e
pedagógicos condizentes [...]” (Brasil, 2007, p. 7).
O documento final do Produto 1 do Projeto CNE/UNESCO atenua para essa mesma evidência e
destaca explicitamente que os referenciais de 2007 enfatizam a concepção de um currículo
condizente com as especificidades da EaD. Fato inexistente na versão de 2003. O Marco Regulatório
da EaD, aprovado pela Resolução CNE/CES n.º 1, de 11 de março de 2016, estabelece Diretrizes e

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Normas Nacionais para a Oferta de Programas e Cursos de Educação Superior na EaD. No art. 2º, o
entendimento anterior foi ampliado e passou-se a considerar que essa modalidade deve se
desenvolver a partir da mediação e de processos com a utilização das Tecnologias de Informação e
da Comunicação (TIC). Para tanto, deve contar
[...] com pessoal qualificado, políticas de acesso, acompanhamento e avaliação compatíveis, entre
outros, de modo que se propicie, ainda, maior articulação e efetiva interação e complementariedade
entre a presencialidade e a virtualidade “real”, e o local e o global, a subjetividade e a participação
democrática nos processos de ensino e aprendizagem em rede, envolvendo estudantes e profissionais
da educação (professores, tutores e gestores) [...] (Brasil, 2016, p. 1).
Percebe-se a necessidade em determinar que os profissionais tenham qualificação adequada. Esse já
era o entendimento do Decreto nº 5.622/2005 que estabelecia como requisitos para credenciamento
de instituição um corpo docente qualificado. No entanto, a última regulação ainda não obriga que os
profissionais sejam qualificados, especificamente, na modalidade EaD, o que indica a inexistência de
formação específica, principalmente, no caso de professores e tutores. Essa constação merece
atenção não só dos órgãos que discutem e elaboram as políticas educacionais no país, mas também
das próprias IES que formulam propostas de cursos superiores e da sociedade civil, em especial, dos
professores da modalidade e das entidades que os representam, destaca-se, aqui, a Associação
Nacional pela Formação dos Profissionais de Educação (ANFOPE) e a Associação Brasileira de
Educação a Distância (ABED). Reforça-se, ainda, a necessidade de efetivação da EaD quanto às
dicotomias atenuadas, quer sejam presencial e virtual, local e global, incorporando uma a preparação
para o exercício da cidadania fundamentada na CF/1988 e referendada pela LDB/1996.
Cabe mencionar que a concepção de EaD configurada no citado documento ainda não alcança àquela
sugerida pelo Produto 2 do Projeto CNE/UNESCO. Esta proposta avança para a compreensão de uma
prática social-educativa-dialógica, como trabalho coletivo – com autoria e colaboração – articulada à
arquitetura pedagógica e de gestão, sendo integrada ao uso das TIC e voltada à formação crítica,
autônoma e inovadora, com base na interação dos atores envolvidos (CNE/UNESCO, 2014). A
alteração ainda evidencia pela primeira vez, na forma da lei, a divisão existente na estrutura
hierárquica dos cursos da modalidade, quando menciona os profissionais da EaD (professores,
tutores e gestores).

4 Perfil do Professor do Esino Superior na Educação a Distância

A permanente dinâmica do desenvolvimento das tecnologias impulsiona o trabalho docente na


educação presencial e a distância para o enfrentamento de constantes desafios. A concepção de EaD
foi ressignificada ao longo das últimas décadas. O perfil dos professores para a EaD também foi
redefinido, denotando um dos desafios da área. As políticas que tratam da EaD ainda não avançaram
frente a esse desafio. Nota-se, assim, que os
[...] problemas educacionais gerais são bem conhecidos e de difícil solução. Somam-se a eles, na
perspectiva da educação tecnológica, alguns novos impasses. A sociedade contemporânea, por
sua vez, enfatiza a relevância da educação permanente e de qualidade para todos. O governo e o
setor privado investem maciçamente na informatização das escolas, no treinamento rápido de
professores, mas o essencial ainda carece ser feito (Kenski, 2003, p. 85).
Entre esses desafios insere-se a formação do professor. Em um mundo de rede, a qualidade do
professor brasileiro depende da “[...] reorganização estrutural do sistema educacional, da
valorização profissional da carreira docente e da melhoria significativa de sua formação, adaptando-o
às novas exigências sociais e lhe oferecendo condições de permanentes aperfeiçoamento e
atualização” (Kenski, 2003, p. 94). Para além de uma década dessas constatações, os desafios quanto

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à formação inicial e continuada dos professores que atuam na EaD permanecem. Tem-se atrelado a
esse aspecto a relação de diferenciação professor e tutor que ainda suscita dúvidas e parece atenuar
a precarização do trabalho docente, não só na esfera privada como indica o Produto 1 do Projeto
CNE/UNESCO, mas também na pública.
O Produto 2 do Projeto CNE/UNESCO – documento técnico que contém estudo analítico referente
aos cursos de formação de professores nas IES públicas e privadas – aponta a necessidade de o Brasil
desenvolver procedimentos visando à melhoria da qualidade da EaD no ensino superior. Entre essas,
ressalta-se a formação da equipe profissional, responsabilidade das IES, que deve considerar a
existência de profissionais, com estabilidade e plano de carreira.
A melhoria da qualidade da EaD também é de responsabilidade do Estado, em especial do Governo
Federal. Muito embora o parágrafo 3º, do art. 80 da LDB/1996, já mencionado, determinar que “[...]
as normas para produção, controle e avaliação de programas de educação a distância e a autorização
para sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e
integração entre os diferentes sistemas” (Brasil, 1996, não paginado), o Decreto nº 5.622 ainda
definir no art. 16 que “[...] o sistema de avaliação da educação superior, nos termos da Lei nº 10.861,
de 14 de abril de 2004, aplica-se integralmente à educação superior a distância” (Brasil, 2005, p. 8).
Cabe, assim, à União avaliar os programas de educação a adistância e nesse sentido sua qualidade.
O Decreto n.º 2.494/1998 estabeleceu que a avaliação das instituições e dos cursos de EaD
obedeceria a procedimentos, critérios e indicadores de qualidade definidos em ato próprio, expedido
pelo MEC. Um desses documentos, o Decreto nº 5.622 de 2005, institui, no art. 12, que o pedido de
credenciamento deverá “[...] apresentar corpo docente com as qualificações exigidas na legislação
em vigor e, preferencialmente, com formação para o trabalho com educação a distância [...]” (Brasil,
2005, p. 6). O texto legal que oferecia subsídio ao decreto mencionado eram os dos Referenciais de
Qualidade para EaD de 2003. Nele encontra-se a referência aos professores como orientadores e
tutores e, ainda, como docentes especialistas, ao tratar da Equipe Profissional Multidisciplinar
(EPM)2. Nota-se a ambivalência de termos que dificulta o entendimento do perfil específico do
profisisonal. Além da menção aos professores especialistas das disciplinas específicas, menciona-se
ao tratar da EPM parceiros no coletivo do trabalho político-pedagógico e a profissionais das
diferentes áreas da TIC, sem, no entanto, esclarecer quais profissionais estão nessa categoria.
Verifica-se que em 2003 não havia uma inferência política que diferenciasse o perfil de cada
profissional envolvido na equipe, de maneira a determinar a qualidade dos serviços desenvolvidos
por cada um deles. Constatou-se na proposta de Referenciais de Qualidade para EaD (2003), em
relação aos profissionais, a definição das funções uma vez que a IES era obrigada a comprovar em
termos de qualificação o currículo dos diretores, coordenadores, professores, tutores,
comunicadores, pesquisadores e outros profissionais integrantes da EPM. Nesse aspecto, encontra-
se diferenciada a divisão da equipe, mas não há clareza quanto à formação de cada membro.
O respectivo documento determina que os cursos já deveriam contemplar um desenho de processo
contínuo de avaliação relativo às práticas educacionais dos professores ou tutores. Torna-se
relevante registrar a recomendação de que as instituições preparem seus profissionais para o
desenho do projeto nos itens de acompanhamento, tutoria e avaliação. Essa condição pode até
denotar preocupação com relação à formação, mas também aponta para uma formação posterior à
seleção dos profissionais. O ideal não seria já contratar pofissionais qualificados para suas respectivas
funções na EaD?
Nos Referenciais de Qualidade para Educação Superior a Distância de 2007, avança-se em direção de
uma das principais características da EaD: a flexibilidade. Esse documento explicita que os modelos
de EaD são diversificados, não existindo um único. Os programas poderiam ter diferentes desenhos e

2 Item básico merecedor de atenção para as IES que ofertam cursos e programas a distância.

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múltiplas combinações de linguagens e recursos educacionais e tecnológicos, sendo definidos pela


natureza do curso e pelas demandas dos estudantes. Os modos de organização também poderiam
ser diferentes, necessitando apenas ter em comum a concepção de educação. Apesar de toda essa
flexibilidade, os referenciais evidenciam que a equipe multidisciplinar (EM)3 deve ter funções de
planejamento, implementação e gestão dos cursos a distância com três categorias de profissionais:
docentes, tutores e pessoal técnico-administrativo (Brasil, 2007). Essa legislação apresenta um
avanço em termo de definição das funções e direcionamento das tarefas da EM. A referência ao
professor passa a ser como docente e tutor (presencial ou a distância), em uma clara distinção dessas
funções, inclusive diferenciando as tarefas de cada um e definindo as competências para os
profissionais que compõem a EM. O quadro 1 apresenta as competências da função de cada
profissional:

Quadro 1. Competências Requeridas para Docente e Tutor na Educação a Distância no Nível Superior
DOCENTE (PROFESSOR) TUTOR
▪ Estabelecer os fundamentos teóricos do projeto. A Distância
▪ Selecionar e preparar todo o conteúdo curricular ▪ Esclarecer dúvidas através fóruns, de discussão pela
articulado a procedimentos e atividades pedagógicas. internet, pelo telefone.
▪ Identificar os objetivos referentes a competências ▪ Participar de videoconferências, entre outros, de
cognitivas, habilidades e atitudes. acordo com o projeto pedagógico.
▪ Definir bibliografia, videografia, iconografia, ▪ Promover espaços de construção coletiva de
audiografia, tanto básicas quanto conhecimento.
complementares. ▪ Selecionar material de apoio e sustentação teórica aos
▪ Elaborar o material didático para programas a conteúdos.
distância. ▪ Participar dos processos avaliativos de ensino e
▪ Realizar a gestão acadêmica do processo de ensino e aprendizagem, junto com os docentes.
aprendizagem, em particular motivar, orientar,
acompanhar e avaliar os estudantes. Presencial
▪ Avaliar-se continuamente como profissional ▪ Auxiliar os estudantes no desenvolvimento de suas
participante do coletivo de um projeto de ensino atividades individuais e em grupo.
superior a distância. ▪ Fomentar o hábito da pesquisa.
▪ Esclarecer dúvidas em relação a conteúdos específicos,
bem como ao uso das tecnologias disponíveis.
▪ Participar de momentos presenciais obrigatórios, tais
como avaliações, aulas práticas em laboratórios e
estágios supervisionados, quando se aplicam.
▪ Manter permanente comunicação tanto com os
estudantes quanto com a equipe pedagógica do curso.
Fonte: Autoria própria com base nos Referenciais de Qualidade para Educação Superior a Distância (2007).

Verifica-se que as competências são bem distintas para o perfil das funções descritas. Para a função
docente (professor) exige-se, de maneira mais acentuada, atividades didático-organizativas,
enquanto para os tutores são tarefas eminentemente didático-práticas. Essa constatação permite
discutir sobre a diferenciação docente e tutor na modalidade e, inclusive, levantar o
questionamento: o tutor necessita de formação em curso de licenciatura ou apenas em curso
idêntico ao que atua?
Essa questão deve ser ampliada em vista do entendimento quanto ao perfil dos professores, no
Marco Regulatório da Resolução n.º 1/2016, do CNE/CES. O texto delimita, de forma clara, as funções
dos profissionais da EaD: professores, tutores e gestores. Entretanto, há ambivalência nas
denominações, haja vista os Referenciais de Qualidade da EaD (2007) não empregarem os mesmos
termos. A resolução, especificamente no art. 8º, § 2º, explicita como tutor “[...] todo profissional de

3 Nos Referenciais de Qualidade para a EaD (2007), a EPM passou a ser denominada de Equipe Multidisciplinar.

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nível superior, a ela vinculado, que atue na área de conhecimento de sua formação, como suporte às
atividades dos docentes e mediação pedagógica, junto a estudantes, na modalidade de EaD [...]”
(Brasil, 2007, p. 4). Isso significa não existir a obrigatoriedade da licenciatura e até a exigência de uma
formação no mesmo curso em que se exerce a tutoria. Exige-se apenas que o profissional seja
formado na mesma área. Esse cenário é compreendido, aqui, como um risco para a categoria
docente. Tanto em termos do seu reconhecimento como da própria precarização do trabalho, pois o
que se verifica é uma fragmentação do fazer e ser professor.
Nesse cenário, os referenciais de 2007 mencionam a denominação “docente” na estrutura da equipe,
explicando que são professores e que na EaD eles passam a ter a expansão de suas funções, aspecto
que requer profissionais qualificados. Essa perspectiva da profissão docente aponta para a
necessidade de cursos de formação inicial e continuada que incluam em seu desenho curricular
elementos para esse tipo de qualificação. Cursos que deveriam ser ofertados pelas IES, públicas e
privadas, e não apenas deixado a cargo da oferta interna das próprias IES. Se de fato a EaD contribui
para a expansão das funções docentes, torna-se recomendável que todos os interessados, nesse
sentido qualquer membro da sociedade civil, tenham a possibilidade de usufruir dessa situação com
postos de trabalho dignos que reflitam a valorização do professor.
A defesa da expansão da formação de professores nas etapas inicial e continuada conduz à
necessidade de que os cursos existentes de licenciatura passem por uma reformulação do seu
desenho curricular, permitindo que sejam incorporadas demandas que elevem o magistério. Nota-se
que os termos do currículo têm sido incorporados de forma obrigatória ou até optativa na formação
inicial pelas IES, sem a devida observância dos conhecimentos teórico-práticos que favoreçam o uso
das TIC na prática docente, o que se dirá no caso de incluir no currículo elementos para as práticas
demandadas pela docência e tutoria da EaD. Esses são elementos para investigações futuras.

5 Conclusões

Neste estudo, percebeu-se que a concepção da EaD nas políticas educacionais sofreu avanços em
concomitância com as atualizações legais, o que possibilitou a EaD tornar-se uma modalidade que
incorpora processos de ensino e aprendizagem em rede com vistas a envolver seus atores
(estudantes e profissionais da educação) em práticas presenciais e virtuais, exigindo qualificação dos
profissionais que atuam nesses processos. No entanto, faz-se necessário, ainda, progredir em direção
a uma prática social-educativa-dialógica que permita a formação crítica, autônoma e inovadora,
possível pela qualificada interação dos seus atores.
Na análise da legislação, corroborada pelos documentos finais da consultoria CNE/UNESCO,
descreveu-se o perfil dos professores requerido para atuação nos cursos da EaD. Há ambivalência de
termos que denominam os profissionais e suas respectivas funções. De acordo com os Referencias de
Qualidade (2007), podem atuar na EaD: professor especialista da disciplina e o autor de material
didático; tutor à distância e presencial. Defende-se, aqui, que todos os profissionais requeridos para
essas funções tenham formação em licenciatura, uma vez que as competências determinadas
caracterizam a docência e apontam para a necessidade de atualização dos cursos de formação inicial
e continuada de professores pelas IES. Entende-se que a contratação em cursos na EaD deve prever
profissionais qualificados desde a formação inicial e não apenas realizar a formação após
contratação.
Compreende-se até a viabilidade da divisão de funções para a organização dos processos de ensino
eaprendizagem. Entretanto, acredita-se ser contraditório o Estado, ao mesmo tempo em que define
as competências para as funções, conceder às IES autonomia para as questões da política de pessoal.
Essa flexibilidade acentua a discussão sobre a diferenciação entre professor e tutor.

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O Marco Regulatório da EaD (2016), fundamenta-se nos Referenciais de Qualidade da EaD (2007) e
define que o tutor tenha apenas formação na área do curso em que atua, favorecendo tão somente a
exigência de uma formação inicial paara a função de docente. Cabe uma discussão sobre a categoria
profissional na perspectiva de que sejam analisados os riscos ao reconhecimento da profissão e à
precarização do trabalho docente.
Além do contributo para ampliação de análises das políticas públicas em EaD, buscou-se demonstrar
que os produtos finais relativos às consultorias MEC e UNESCO, face aos acordos técnicos e
financeiros, constituem-se em relevantes objetos de pesquisas qualitativas na área de educação.

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Processo de Avaliação: Elaboração do Programa Educativo


Individual
Maria de Guadalupe Comparada Almeida1, José Morgado2
1
Instituto Politécnico de Beja, Portugal. guadalupe.almeida@ipbeja.pt;
2
Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Portugal. jmorgado@ispa.pt

Resumo. A educação inclusiva recomenda o acesso a uma educação de qualidade para todos, que permita a
apropriação do conhecimento e o desenvolvimento de competências, orientando os indivíduos de acordo
com respostas adaptadas às exigências sociais. A escola pública é o garante de respostas de qualidade à
diversidade sociocultural, física ou mental do individuo. O objetivo deste estudo vai ao encontro do que é
sugerido pelas diretivas nacionais e internacionais para uma escola inclusiva, e pretende analisar qual o
processo de avaliação que as equipas multidisciplinares elegem para o desenho do Programa Educativo
Individual (PEI). A recolha dos dados será realizada através de questionários e entrevistas a equipas
multidisciplinares de educação especial, de 3 agrupamentos escolares. Os resultados preliminares apontam
para que apesar de todos terem por base a legislação, cada agrupamento organiza-se de forma própria, não
existindo uma uniformização nos processos.
Palavras-chave: processo de avaliação; educação especial; programas educativos individuais; educação
inclusiva; políticas educativas.
Evaluation Process: Elaboration of the Individual Educational Program
Abstract. Inclusive education recommends access to quality education for all, allowing the appropriation of
knowledge and the development of skills, guiding individuals according to responses adapted to social
demands. The public school is the guarantor of quality responses to the socio-cultural, physical or mental
diversity of the individual. The objective of this study is to meet what is suggested by the national and
international directives for an inclusive school, and intends to analyze the evaluation process that the
multidisciplinary teams elect for the design of the Individual Educational Program (PEI). Data collection will
be done through questionnaires and interviews with multidisciplinary special education teams from 3 school
groups. The preliminary results point out that although all are based on dec-Law 3/2008, each grouping is
organized in its own way, and there is no uniformity in the processes.
Keywords: Evaluation process; special education; Individual educational programs; inclusive education;
Educational policies.

1 Introdução
O presente artigo revela uma parte do trabalho de investigação no âmbito do desenvolvimento de
uma tese de doutoramento em Ciências da Educação na área das Necessidades Educativas Especiais
(NEE), centrando-se no processo de avaliação para a elaboração do programa educativo individual
(PEI). A principal motivação para o desenvolvimento do estudo em causa prende-se com o facto de a
investigadora ter desenvolvido a sua atividade profissional, durante vários anos integrada numa
equipa multidisciplinar, com crianças com NEE em idade escolar. Com este estudo pretendemos, não
só alargar o nosso leque de conhecimentos, mas também contribuir para a melhoria das boas
práticas no âmbito das NEE. Este, poderá constituir-se como um contributo para a valorização e
reconhecimento das práticas educativas dos docentes que trabalham com crianças com NEE. O
trabalho empírico utilizou como metodologia um estudo de caso múltiplo. Pretendeu-se fazer uma
descrição e análise em profundidade sobre o processo de avaliação que é implementado pelas
equipas de Educação Especial (EE), aquando da avaliação inicial das crianças com NEE para a
elaboração do PEI. A investigação decorreu em três agrupamentos escolares de diferentes distritos
do País. A avaliação é usualmente percecionada como um regulador das práticas, sendo elementar
em qualquer fase do processo educativo (Fernandes, 2009). No caso das crianças com NEE toma
especial relevância pois é a partir desta que se vai desenrolar todo o processo educativo do aluno, e

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o comprometimento e o impacto que poderá vir a ter aquando da elaboração do PEI (Idol, 2006;
Watkins, 2007). A avaliação em educação é também um dos tópicos mais difíceis e mais polémico,
sendo considerada por alguns professores como a tarefa mais complicada e desagradável da
docência (Rodrigues, 2013). Correia (2008) refere inexistência de uniformidade no modelo e no
processo de avaliação. A existência de uma referência, suficientemente flexível, que servisse de
suporte ao processo de avaliação, seria uma base de trabalho para as equipas multidisciplinares de
EE se capacitarem para respostas educativas eficazes. A legislação refere-se sempre ao processo de
avaliação de forma vaga, e tem como objetivo a recolha de informação que permita a identificação
de NEE de caráter permanente no aluno, sem nunca esclarecer concretamente a efetivação do
processo a adotar. Foi a partir desta necessidade de compreensão de como se processa a avaliação,
qual o processo que é eleito e qual a perceção da sua eficácia que as equipas têm do processo, que
surge esta proposta de realização de estudo.

Contextualização teórica
O problema de partida para este estudo tem por base o processo de avaliação inicial dos alunos com
NEE, pelas equipas pedagógicas, para posterior elaboração dos PEI. Pretendemos compreender como
são avaliados os alunos com NEE, como está organizado todo o processo, quem intervém, quem o
conduz; como é que as equipas se organizam para a avaliação, se na forma como se decide têm em
conta todos os elementos da equipa; qual a perceção de eficácia do processo de avaliação dos
intervenientes no processo (pais, professores e técnicos); como é feita a avaliação, quais os
instrumentos utilizados, quem faz a sua aplicação, como é efetuada a seleção dos instrumentos,
materiais e atividades a serem aplicados; como é que a avaliação suporta a tomada de decisão. O
sistema português de ensino público preconiza o acesso igual para todos a escolas de ensino regular
tal como também Vygotsky anuiu (Gaitas & Morgado, 2010; Gredler,2012), acreditando na inclusão
de pleno direito das crianças com NEE. As crianças com NEE, para poderem ter um acesso igual à
educação, necessitam de uma avaliação que reflita o seu conhecimento e as suas reais necessidades
e capacidades para que possam usufruir de uma pedagogia diferenciada. Tendo em conta que a
escola é um espaço de transformação social, esta tem que garantir que não será a própria a
promover exclusão educativa e, consequentemente, o abandono escolar, potenciando a exclusão
social (Correia, 2004; Morgado, 2009). A legislação elaborada para dar resposta a esta nova forma de
perceber a educação, fez com que a regulamentação preconizasse, e a própria sociedade exigisse, do
sistema educativo equidade no acesso a uma educação de qualidade para todos (Ainscow, 2005a,
2005b; Correia, 2007; Sanches & Teodoro, 2006). A educação deve permitir a todos os alunos a
apreensão do conhecimento e a possibilidade de desenvolver competências com que possam dar
respostas adaptativas às exigências sociais a que todos estamos sujeitos. A diversidade deve ser
valorizada como uma característica positiva e não como um atributo negativo que somente alguns
possuem (Rodrigues, 2006); ser vista como um processo enriquecedor dos processos educativos e
sociais da escola; e o objetivo primário desta deverá ser que a aprendizagem seja com todas as
crianças juntas, independentemente das diferenças individuais (UNESCO, 1994). Morgado (2009)
refere vários estudos sobre a avaliação do impacto da educação inclusiva nos alunos com NEE e seus
pares, e as equipas confirmam os benefícios destes modelos, desde que se assegurem a eficácia e
eficiência dos processos envolvidos. As crianças com NEE devem ter a oportunidade de se
desenvolverem em contextos socio educativos significativos e junto dos seus pares (Correia, 2013,
2003; Morgado, 2003; Rodrigues, 2006). Segundo Rodrigues (2013) tanto as crianças com NEE têm
direito a aprender junto dos seus pares como as crianças sem NEE têm o direito a não serem privadas
de conhecer, conviver e interagir com crianças que apresentem qualquer tipo de disfunção no seu
dia-a-dia. O ambiente inclusivo aumenta as suas competências de socialização e de aprendizagem, e
a apreensão de valores, estratégias e conteúdos enriquecidos (Pinto & Morgado, 2012). Para os

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alunos sem NEE as diferenças individuais reforçam as capacidades de cooperação, aceitação e


tolerância, e neles desenvolvem atitudes positivas sobre a diversidade (Correia, 2003). Morgado
(2009) defende que neste contexto a educação inclusiva é um impulsionador do desenvolvimento da
escola com qualidade a todos os níveis. A educação inclusiva, entende-se como uma comunidade
aprendente e reflexiva que defende a diferenciação pedagógica, a participação dos alunos, a
reestruturação de culturas para resposta à diversidade, o respeito pelo ritmo de aprendizagem de
cada um, a potencialização de capacidades para que aqueles que necessitam de apoios os possam
receber efetivamente (Morgado, 2003, 1999).As escolas inclusivas devem estar habilitadas para
poderem dar resposta às necessidades dos seus alunos, acomodando os seus ritmos e estilos de
aprendizagem (Fonseca, 2007). Sendo capazes de o fazer através de uma flexibilização de um
currículo apropriado, de autonomia organizacional, diferenciação no ensino, do trabalho em
cooperação com os diferentes atores educativos e com os recursos físicos e humanos necessários
(Perrenoud, 2003). Os compromissos sociais e políticos sobre as políticas educativas emanados, tanto
de documentos nacionais (ME, 2008) como internacionais (UNESCO, 1994), deverão ser postos em
prática para que possa existir uma verdadeira educação inclusiva. Uma das funções do processo de
avaliação é ser o fio condutor, tem um papel de orientador, organizador que nos guia por forma a
não nos descentrarmos dos objetivos e metas, o que orienta também a progressão da avaliação
(Fernandes, 2009). Com a avaliação pretende-se identificar, compreender, clarificar e sistematizar
todos os elementos de que dispomos e fazer uma análise cuidadosa das relações estabelecidas para
que se possa obter uma conclusão (Fernandes, 2009). Isto permite definir os objetivos de
aprendizagem da criança de acordo com as suas necessidades específicas e com o seu contexto
ocupacional (Correia, 2008, 2007; Morgado, 2009). Esta deve ser vista como valorização de algo que
é adquirido - é o processo de dar valor ao conhecimento e ao desempenho alcançado por cada aluno
- e não com o intuito de classificar alunos (Correia, 2013; Fernandes, 2010). Todo este processo
implica que sejam claras, para todos os que nele participam, as etapas que deverão ser seguidas e
qual a sua sequência (Fernandes 2009) entendendo-se o processo como um conjunto de medidas
tomadas para atingir um fim, que poderão funcionar como regulador da aprendizagem (Perrenoud,
1996).Diversos autores (Correia, 2007, 2004, 2003; Gredler, 2012; Morgado, 2009; Rodrigues, 2013,
2006; Sanches, 2005; Perrenoud,1996) consideram que uma avaliação orientada e contextualizada,
melhora a aprendizagem do aluno e a sua plena inclusão socioeducativa. A avaliação deve ser vista
como um processo contínuo e sistemático, funcional, orientador e integral. Todos estes aspetos só
poderão ser assegurados se os profissionais que fazem a avaliação estiverem devidamente
preparados para desenvolverem o processo de avaliação (Fernandes, 2011, 2013). Também segundo
este autor não se devem referir “modelos de avaliação” dado que por si só o conceito de modelo é
conceptualmente muito complexo, obrigando a determinados parâmetros que limitam o âmbito da
própria avaliação.

Metodologia
Os participantes o nosso estudo são os sujeitos pertencentes às equipas multidisciplinares de NEE de
três agrupamentos escolares. O paradigma empírico utiliza métodos específicos de recolha e análise
de material que integram os estudos de caso. O estudo de caso baseia-se num exame detalhado de
uma situação, sujeito ou acontecimento e é dos métodos mais comuns em investigação qualitativa
(Bogdan & Biklen, 1999). Neste estudo optou-se por uma metodologia qualitativa recorrendo ao
estudo de casos múltiplos numa perspetiva interpretativa e compreensiva, em que se pretendem
estudar três situações de forma aprofundada. Tentaremos compreender a variedade de processos
que poderão ocorrer nos diferentes ambientes (Aires, 2011; Bogdan & Biklen, 1999). Através do
estudo de caso poder-se-á estabelecer uma relação de causa efeito, sendo que uma das suas maiores
qualidades é poder-se observar os seus efeitos em contexto real, Bogdan e Biklen (1999) e

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Bronfenbrenner (1994) defendem que o contexto tem uma influência significativa no


comportamento de cada interveniente no processo. Este tipo de investigação, recorre a fontes de
informação diversa, utilizando dados com base em técnicas diferentes, cujo cruzamento permitirá
perceber a complexidade do estudo em análise (Fortin, 2009; Quivy & Capenhoudt, 1992). As
técnicas de recolha de dados a serem analisados neste estudo serão de tipo direto e indireto. Nos
dados diretos a opção recairá em entrevistas qualitativas e questionários, nos dados indiretos recairá
sobre a pesquisa documental (avaliações, PEI, registos pessoais, etc.). O processo de recolha de
dados inerente à abordagem dos estudos de caso multiplos, levou-nos a que a recolha dos mesmos
seja realizada através de entrevistas semi-estruturadas e questionários. O acesso à informação
pretendida será feito através do próprio sujeito da ação e na sua própria linguagem (Bogdan &
Biklen, 1999). Desta forma o investigador compreenderá como é que cada um dos atores perceciona
as suas experiencias enquanto participante do processo através da forma como cada um relata a
sequência das diferentes fases/etapas e tarefas do processo de avaliação. A opção metodológica
recai sobre o facto de querermos perceber o como e por que (Yin, 2010) os docentes desenvolvem
um determinado conjunto de procedimentos e tarefas em fases sucessivas que visam atingir a
avaliação do conhecimento que o aluno detém sobre determinadas matérias educativas. Ao termos
tomado esta opção vai permitir que nos apropriemos de fenómenos individuais dentro de um
contexto social complexo, como é a escola (Stake, 2009). A entrevista semiestruturada permite-nos
obter dados comparáveis entre vários sujeitos, embora possa ocorrer perda de dados sobre a forma
como os sujeitos organizam a questão (Bogdan & Biklen, 1999). Ainda assim, este instrumento irá
permitir uma recolha e aprofundamento de informação sobre a forma como decorre o processo de
avaliação (dinâmicas, conceção, perceções de eficácia, representação da sua própria prática) (Aires,
2011; Fortin, 2009; Quivy & Capenhoudt, 1992). A construção da entrevista teve por base uma
análise aprofundada de artigos, livros e legislação relacionados com o tema em apreço, partindo das
questões orientadoras da investigação. Após esta fase foi realizado um focus group para determinar
a validação das questões a serem colocadas aos participantes e seguidamente a sua validação por
parte de investigadores especialistas na área (Almeida & Freire, 2008; Kind, 2004). As entrevistas
foram gravadas para poderem ser transcritas e sujeitas a uma análise detalhada. O processo de
recolha de dados é demorado pela necessidade de transcrição das entrevistas, análise e
categorização da informação registada nos diferentes instrumentos de investigação utilizados. A
análise dos dados será feita de acordo com a análise de conteúdo, tal como descrita por Bardin
(2009) como um conjunto de técnicas de análise da comunicação tendo em conta a definição de
categorias, das unidades de significado, unidades de registo e de contextos, bem como todos os
procedimentos enumerados pela autora para que se mantenha o rigor científico. A análise
documental será suportada pelo mesmo processo, e de acordo com documentos apresentados e de
outros que forem surgindo no desenrolar do estudo que se julguem pertinentes e que sejam
disponibilizados pelos participantes do estudo. Os métodos utilizados para compreensão dos dados
recolhidos serão a análise exploratória, onde se vão elencar as categorias de análise, seguida de
interpretação e por fim a conclusão e apresentação dos resultados do estudo. Serão elaborados
fluxogramas para podermos compreender as opções de cada equipa/elemento de equipa,
referenciando o ponto-chave para a execução do processo.Da análise grosseira das entrevistas
pressupõem-se uma grande diversidade de diferenças no processo de avaliação. Em alguns casos
denota-se um elevado grau de autonomia das equipas relativamente ao processo avaliativo havendo
mesmo alguns casos em que esta mesma avaliação dentro da mesma escola não é uniformizada e é
dependente do docente que a realiza. Contudo, todos referem o trabalho colaborativo entre os
diferentes intervenientes no processo para a elaboração do relatório técnico pedagógico e respetivo
PEI. A avaliação inicial dos alunos com NEE revela-se de um caráter extremamente importante pois é
a partir da mesma que se vão desenvolver as aprendizagens. O docente deverá implementar

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estratégias diferenciadas e diferenciadoras que permitam a superação das aprendizagens com uma
melhoria significativa na aquisição das aprendizagens.

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1918
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Consulta De Enfermagem Com Abordagem Sindrômica:


Desenvolvimento De Habilidades E Competências

Claudia Maria Messias1, Ann Mary Machado Tinoco Feitosa Rosas2, Patricia Salles de Matos3

1 Departamento Materno Infantil da Universidade Castelo Branco. cmmessias@hotmail.com


2 Departamento de Metodologia. Escola de Enfermagem Anna Nery. EEAN UFRJ. annmaryrosas@hotmail.com
3 Centro de Estudos Hospital Maternidade Fernando Magalhães. patriciasallesd@gmail.com

Resumo. O objetivo deste estudo foi compreender o significado do ensino da consulta de enfermagem com
abordagem sindrômica a graduando e pós graduandos. Pesquisa qualitativa, sustentada no referencial da
Fenomenologia Social, realizada com 19 enfermeiros docentes/assistenciais de quatro hospitais universitários da
região metropolitana do Rio de Janeiro. Emergiu a categoria concreta do vivido: Oportunizar o desenvolvimento
de habilidades e competências para realização da consulta de enfermagem com abordagem sindrômica.
Constatamos que os Enfermeiros se vêem como “seres docentes”, sendo esse comportamento determinante de
suas ações, independente da sua formação acadêmica, pois se pautam em sua ação intencional de ensinar,
apreendida na intersubjetividade da relação face a face com os graduandos e pós-graduandos.
Palavras-chave: Ensino, Educação, Consulta, Enfermagem.

Nursing concultation with syndroromic approach: skills and competences development


Abstract. The purpose of this study was to understand the meaning of the teaching of the nursing consultation
with syndromic approach graduating and graduate students. Qualitative research, based on the Social
Phenomenology, carried out with 19 teaching / care nurses from four university hospitals in the metropolitan
region of Rio de Janeiro. The concrete category of the lived one emerged: Opportunize the development of
abilities and competences to perform the nursing consultation with syndromic approach. We find that nurses
see themselves as "teaching beings", being this behavior determinant of their actions, independent of their
academic formation, because they are based on their intentional action to teach, apprehended in the
intersubjectivity of the face-to-face relationship with undergraduate and post- Graduating
Key words: Teaching, Education, Consultation, Nursing.

1 Introdução

O docente como mediador, deve instigar o aluno a refletir sobre formação profissional e a realidade em
que está vivendo, não atendendo apenas a capacidade dos alunos para recordarem ou reproduzirem
informações. Em vez disso, o docente trata alterando a compreensão dos alunos, ou seja, demonstrando
envolvimento para uma mudança qualitativa na realidade dos alunos. As estratégias que permitam aos
estudantes desenvolverem habilidades de enfermagem, resolverem problemas e desenvolverem o
pensamento reflexivo e crítico são necessários nos cursos de graduação em enfermagem. Deste ponto
de vista, o conhecimento sobre os aspectos que impactam na aprendizagem de enfermagem dos alunos
é preciso (Westin, Sundler, Berglund, 2015).
Assim, a aproximação docente-assistencial constitui-se em elemento construtor e facilitador do ensino,
já que possibilita os sujeitos compartilharem e refletirem sobre as experiências em comum, com vistas a
uma aprendizagem que valorize o envolvimento do docente, do enfermeiro assistencial, do aluno e do

1919
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

cliente, considerados integrantes ativos do processo de construção do conhecimento (Merighi, Jesus,


Domingos, Oliveira, Ito, 2014).
Esse fato está em consonância com as demandas de problemas de saúde no Brasil com suas realidades e
complexidades, inquirindo-nos a pensar o perfil dos profissionais de saúde voltados para um mercado de
trabalho exigente, que vem sofrendo constantes mudanças, ressaltando a necessidade de romper com
modelos que somente firmam na formação de enfermeiros para repetição do fazer, impedindo a
manifestação da proatividade para reinventar e reelaborar sua profissão.
É neste panorama atual, e histórico, que a atividade assistencial Consulta de Enfermagem é tida como
uma prática pedagógica com capacidade de promover mudanças na formação de enfermeiros, e
praticada nos diversos programas de saúde normatizados pelo Ministério da Saúde, caracterizando-se
como uma estratégia na prestação de assistência de saúde para os diversos grupos da população.
Um apontamento histórico que merece ser destacado, pois está relacionado com a prática da consulta
que deve ser desenvolvida junto a todos os grupos humanos, foi o fato de que, desde 1993, o Ministério
da Saúde passou a recomendar o conceito de abordagem sindrômica inserido nas consultas, tendo como
objetivo a brevidade da identificação de sinais e sintomas para, então, manejá-los com intervenções
imediatas, visando a resolutividade das necessidades dos indivíduos (Gottems, Alvarez, Almeida, 2014).
Desta forma, a ação abordagem sindrômica se faz executada, mas não denominada, incorporando-se ao
Processo de Enfermagem/ Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), conforme Resolução
COFEN-359/2009, subsidiando o enfermeiro que realiza a Consulta de Enfermagem em uma prática
resolutiva de casos de primeiro e subsequente contato do indivíduo com o sistema de saúde, com maior
cobertura, facilitando em níveis primário e secundário, para ações que propiciem medidas de promoção
de saúde, diagnóstico e tratamento.
Neste sentido, criou-se uma expectativa em desvelar as possíveis abordagens de ensino praticadas por
enfermeiros, assistenciais e docentes, favorecendo o conhecimento sobre o ensino da consulta de
enfermagem com o uso da abordagem sindrômica. O que subsidiou identificar a pergunta que norteou a
presente investigação: o enfermeiro relaciona o ensino da consulta de enfermagem com abordagem
sindrômica como meio para oportunizar o desenvolvimento de habilidades e competências ao
graduando e pós-graduando de enfermagem.
Quanto ao objetivo deste estudo, se delimitou em: compreender o significado do ensino da consulta de
enfermagem com abordagem sindrômica oportunizando o desenvolvimento de habilidades e
competências ao graduando e pós graduando de enfermagem.
Durante a consulta, é importante que o enfermeiro busque saber o estilo de vida de cada indivíduo, pois
isso interfere diretamente no processo de saúde-doença. É essencial ressaltar que a partir disso ensinar
aos discentes enfermeiros essa perspectiva favorecerá uma formação com alcance de estratégias de
saúde mais eficazes (Catafesta, Klein, Silva, Canever, Lazzari, 2015).
Investigações desse tipo propiciarão contribuições para a formação dos enfermeiros, pela possibilidade
de ampliação da assistência e apoio na tomada de decisões por parte desses profissionais, com vistas a
alcançar a qualidade da assistência prestada.

2 Metodologia

Trata-se de uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa fenomenológica, visando a


compreensão do significado dado pelo enfermeiro à Consulta de Enfermagem com Abordagem

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Sindrômica como uma possibilidade de contribuição para o ensino de enfermagem. Assim sendo, adotar
a perspectiva compreensiva de Alfred Schütz é trazer para a enfermagem a possibilidade de vislumbrar o
homem como sujeito livre, ser que é contextualizado em sua realidade concreta, e que vivencia
socialmente uma relação intersubjetiva.
Trilhando o caminho da dimensão compreensiva e interpretativa da ação social, segundo as idéias
preconizadas por Alfred Schütz, este estudo foi voltado para compreender o que se mostra da relação
vivida concretamente pelos enfermeiros na Consulta de Enfermagem com Abordagem Sindrômica,
transcendendo a explicação e as relações causais do fenômeno, focalizando o contexto de significados
frente à ação do ensino desta abordagem durante a referida atividade de enfermagem (Schutz, 2012).
Desta forma, o estudo foi realizado em quatro hospitais universitários na cidade do Rio de Janeiro onde a
Consulta de Enfermagem é desenvolvida, sendo hospitais públicos de ensino e assistência. A pesquisa foi
aprovada por quatro comitês de ética, Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF/UFRJ) e CEP nº
168/11, Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE/UERJ) e CEP nº 3069/11, Hospital São Francisco de
Assis (HESFA/UFRJ) e CEP nº071/11 e Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP/UFF) e CEP nº
3008/11.
Os participantes deste estudo foram os enfermeiros assistenciais / docentes 19 que praticam o ensino
da Consulta de Enfermagem com Abordagem Sindrômica para graduandos e pós-graduandos de
enfermagem nos hospitais universitários de ensino selecionados.
Foram considerados como critérios de inclusão o Enfermeiro estar inserido nas Consultas de
Enfermagem na prática docente/assistencial, com tempo mínimo de 2 anos, e que desejassem relatar o
vivido da ação intencional do ensino da Consulta de Enfermagem com Abordagem Sindrômica.
A Visita de ambientação conforme Silva, (2012), este é o momento de estabelecer relações com as
pessoas que se encontram no local, tanto com os profissionais do serviço, quanto com os participantes.
Além disso, busquei vivenciar a dinâmica e o funcionamento das atividades diárias interagindo com os
profissionais.
Nas quatro regiões de inquérito foram disponibilizadas salas reservadas, o que facilitou o
desenvolvimento da entrevista. Após a organização da sala, o estudo foi apresentado aos participantes,
assim como seus objetivos. Com a expressa manifestação da disponibilidade do enfermeiro para o
encontro fenomenológico, consentindo voluntariamente em ser entrevistado, recebia o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para leitura e assinatura, além de esclarecimentos, assim
viabilizando o início da entrevista. Em consonância aos aspectos éticos atendendo à Resolução nº 466/12
do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Na coleta de dados a técnica utilizada para a coleta de dados foi a
entrevista aberta, utilizando o roteiro de entrevista com de cinco questões sobre a situação biográfica,
com três questões na busca do vivido e uma questão em vista da ação. Para a análise de dados
utilizamos a trajetória metodológica referida por ‘Parga Nina,(1976) (as cited in Tocantins, (1993),
Rodrigues, (1996), Mereghi, (2003) e Domingos, (2011) qual seja:

1º Passo: Leitura atentiva e criteriosa de cada depoimento na íntegra, procurando identificar e


apreender o sentido global da ação social;
2º Passo: Releitura de cada depoimento com o objetivo de identificar aspectos comuns, que expressam
os conteúdos;
3º Passo: Agrupamento dos aspectos comuns conforme a convergência de conteúdos, para composição
de categorias concretas;
4ª Passo: Análise das categorias concretas para compreensão da ação social;

1921
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5ª Passo: Construção do tipo vivido a partir do conjunto de motivos expressos na análise das categorias
concretas.
6ª Passo: Discussão do tipo vivido à luz da Fenomenologia Social de Alfred Schutz.

3 Resultados

Por meio da análise dos dados, emergiu a categoria concreta do vivido, ou seja, as experiências do
homem a partir da compreensão de sua totalidade, que está engajado em um mundo, em uma realidade
originada a partir de suas motivações, é ela oportunizar o desenvolvimento de habilidades e
competências para realização da consulta de enfermagem com abordagem sindrômica.
Ao analisar as falas, identificou que os enfermeiros docentes/assistenciais, através das suas bagagens de
conhecimentos, destacam a necessidade de ensinar aos graduandos e pós-graduandos de enfermagem a
aprender a “escutar” as falas dos sujeitos envolvidos nesta relação face a face, que acontece durante a
consulta de enfermagem com abordagem sindrômica, nos respectivos cenários dos hospitais de ensino.
No que concerne à formação acadêmica, é indubitável sua importância para o desenvolvimento do
profissional enfermeiro preparando-o para a atuação na prática em saúde. São necessárias múltiplas
competências para a atuação de enfermeiros. Dentre elas, competência que envolve outras, como
trabalhar numa perspectiva interdisciplinar, intersetorial e multiprofissional, desenvolver atividades
gerenciais. (Dantas , Santos, Tourinho, 2016)
Destacam os significados atribuídos ao ato de ensinar do enfermeiro, que ocorre em um contexto de
relações entre a profissão, a profissionalidade e a formação do ser enfermeiro, ou seja, é um contexto de
significados, singularidades e intersubjetividades em compartilhamento. Incluem ainda, como pontos
significativos, o exercício reflexivo acerca do ensinar, da valorização da prática docente, os saberes
adquiridos através das práticas científicas e das vivências por meio do trabalho coletivo executado no
hospital de ensino enquanto espaço de formação contínua e permanente.

O que se tem em vista é escutar, o profissional precisa aprender a escutar o que o


sujeito trouxe, você fica muito preso às questões que tira delas e não ouve muito bem
o que ele quer dizer. Então, passamos isso para os formandos, que eles têm que ouvir.
(Gugalanna)
Assim, o que eu tenho em vista é justamente preparar, especialmente o aluno para
essas questões para desenvolver essas habilidades, que são habilidades humanas que
não estão nos manuais, é claro. Eu tenho em vista formar profissionais que dêem
conta (Acruz)

Para os enfermeiros, faz-se necessária uma relação específica no ensino, que seja humanizada, despida
de pressupostos, para que haja empatia entre os sujeitos e aconteça a intersubjetividade.

Eu acho que o grande desafio hoje pelo menos, para a enfermagem, ele se constitui na
questão de fazer com que esse aluno saiba sua realidade. (Canopus)
Dividir conhecimento. Eu não tenho medo de dividir nada com ninguém, porque o que
é meu é meu, o que eu sei, eu sei, ninguém me rouba. (Ares)

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

Nota-se aqui, que a troca de experiências é fundamental, a necessidade não só de uma reflexão
individual, mas sim, de uma reflexão coletiva com o intuito de socializar e integrar os conhecimentos
produzidos entre docentes e discentes. (Souza, 2014)
Os entrevistados afirmam ser importante demonstrar a realidade da profissão de ser enfermeiro no
contexto de saúde, e que os discentes passam pelo setor por um período, sem o compromisso de voltar,
mas o conhecimento adquirido fica, é próprio e singular, só o sujeito pode dar significado às suas ações,
e através delas o constructo do saber em Enfermagem é o que os sujeitos apontam a seguir.

A gente espera que eles consigam ter uma visão de que a consulta de enfermagem
não visa ver a patologia, a gente quer ver o paciente como um todo no ambiente
social, no psicológico. (Hadar)
[...] Então, sempre no final do turno de atendimento, eu abro a discussão para que
eles falem não só das questões técnicas, das habilidades que são exigidas pela
profissão de enfermeiro, saber fazer, saber identificar, saber escrever, saber
transcrever, essa outra habilidade como ele abordou, como ele interpretou, o que ele
reparou no discurso, valorizar aquilo que às vezes não foi dito. (Pollux)

Na promoção da autonomia, a atenção deve ser transversal, multiprofissional e interinstitucional. Dessa


maneira, a garantia da validação e sustentabilidade da dignidade existencial humana sobrepõe o modo
de sobrevida biológica, a atitude e a atenção humana precedendo a competência e habilidade técnica,
mas não as excluindo. (Van Manen, 2014)
Carvalho (2013) pontua que, o docente deve considerar, também, que o ensino socializado permitirá o
contato interpessoal, a comunicação de ideias, o surgimento de valores e a revelação de maneiras de ser
dos alunos, que serão mais bem evidenciados por meio da interdisciplinaridade. Depreende-se assim,
que esses entrelaçares do conhecimento, farão em um determinado momento, o ponto de convergência
para a integralização do ensino-aprendizagem, pois a possibilidade de se olhar um objeto sob várias
dimensões é que se permite aproximar do seu todo. Acredita-se que, essa contribuição de olhares é de
suma importância, para integralizar os conhecimentos teóricos e os práticos

4 Conclusão

Os Enfermeiros docentes/assistenciais elucidam que uma vivência de ensino com pessoas com diferentes
bagagens de conhecimentos, como graduandos e pós-graduandos, propicia, primariamente, conhecer
suas subjetividades dando conta de que, assim como há diferentes formas de aprender, devem ser
diferentes as formas de ensinar.
Ainda, cabe destacar que, na atualidade, a consulta de enfermagem se apresenta e representa um
espaço e uma tecnologia constituída e imbuída dos desafios enfrentados pela profissão. Também sofre
influência das relações de poder que permeiam a equipe de saúde e das políticas e programas
governamentais da área, bem como das exigências atuais com relação ao aumento de qualidade na
prestação dos serviços de saúde à população. (Gomes,2013)
Constatamos que os Enfermeiros se vêem como “seres docentes”, sendo esse comportamento
determinante de suas ações, independente da sua formação acadêmica, pois se pautam em sua ação
intencional de ensinar, apreendida na intersubjetividade da relação face a face com os graduandos e

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pós-graduandos, possibilitando à sua consciência o reconhecimento da prática do ensino da Consulta de


Enfermagem como única e fundamentada.
Vislumbrou-se, assim, com o presente estudo, contribuiu para o ensino da enfermagem e da temática
Consulta de Enfermagem, no que se refere à formação dos profissionais, não apenas do ponto de vista
técnico, mas também ético, emocional e político, comprometidos com princípios de solidariedade,
justiça, respeito, dignidade e integralidade, buscando, assim, transformações sociais.
O ofício docente que permite a reflexão crítica de nossas atividades nos leva a enxergar que somos e
sempre seremos seres inacabados. E que é a partir dessa dialética entre os sujeitos que se efetiva as
competências docentes, integralizando conhecimentos partindo de um de um referencial para balizar as
discussões, porém, entende-se que esta apreensão não se esgota nele.
Neste sentido para contribuir na formação de alunos competentes, teremos de ir além do ensino para a
memorização de conceitos abstratos, além daquilo que os conteúdos de livros propõem, inserir a cultura
social atual no contexto da sala de aula, promovendo a integralização por meio da realidade que
estamos vivenciando. Assim, estaremos favorecendo uma aprendizagem repleta de sentido, que vai
contribuir para a formação de um profissional crítico, reflexivo, atualizado e competente.

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1925
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Videoanálise na pesquisa e na formação inicial de professores de


Física
Glauco Silva1, Marcos Correa1
1Núcleo de Atividades e Pesquisa em Ensino de Física (NAPEF)/CEFET/RJ-Campus Petrópolis, Brasil,
glauco.silva@cefet-rj.br, marcos.silva@cefet-rj.br

Resumo. O objetivo deste artigo é apresentar algumas considerações sobre o uso da videogravação e
videoanálise na formação de professores de Física, no contexto do estágio supervisionado de um curso de
licenciatura em Física de uma universidade federal localizada no interior do Estado do Rio de Janeiro, Brasil.
A videogravação é usada como metodologia da disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado, na
medida em que as aulas ministradas pelos estagiários na escola de educação básica são filmadas e depois
assistidas pelos próprios estagiários, recortando-se alguns episódios para análise crítica.
Palavras-chave: Formação docente, Videoanálise, Ensino de Física, Estágio Supervisionado.

Video analysis in research and physics teacher education


Abstract. In this paper we report our first findings of an ongoing research that has been carried on for the
past two years on the field of teacher education. Especially in the context of the supervised practicum. Thus
the objective is to present video analysis as the teaching methodology of an undergraduation course named
Practices of Teaching as the pre-service teachers have videotaped their supervised classes taught at the
High School. Afterwards, they had to cut off an episode of their own class in order to analyze it.
Keywords: Teacher education, Video analysis, Physics teaching, Supervised practicum

1 Introdução
Na história da formação docente levanta-se a questão relacionada à formação prática do professor,
isto é, "da necessidade de preparar o futuro professor para a parte pedagógica surgiu a ideia de uma
prática de ensino durante o período de formação, associada a um estágio durante o qual o aluno
[licenciando] entraria em contato com uma turma e poderia acompanhar um processo real de
ensino" (GOULART, 2002, p.78). No estágio busca-se a aproximação do licenciando com a realidade
escolar como uma forma de profissionalização docente, aonde se poderia vivenciar através de
situações reais de ensino a relação entre a teoria e a prática pedagógica.
No ambiente do estágio se estabelece, então, o encontro entre diferentes sujeitos, cujos espaços de
atuação específicos faz com que carreguem concepções próprias acerca da prática e de sua relação
com a teoria. São esses sujeitos: o professor da escola de educação básica (supervisor), o licenciando
(estagiário) e o professor universitário (orientador). A atividade de estágio traz, portanto, uma
tensão própria, provocada pelas diferentes visões dos sujeitos acerca da docência. Como captar essa
tensão e mobilizá-la com a finalidade de promover a reflexão dos atores do estágio, permitindo que
seus participantes possam reconhecer os papeis que desempenham? Essa é a questão que mobiliza o
uso da videogravação e videoanálise como instrumento de formação no estágio supervisionado.
Consideramos como unidade de análise as construções discursivas dos sujeitos acerca de sua prática.
Dessa forma, estamos interessados nos significados atribuídos por esses sujeitos às atividades
desenvolvidas no estágio. Nosso olhar está orientado para o processo, nossa observação é
naturalista e sem controle, visto que nos posicionamos como pesquisadores participantes, pois
afetamos e somos afetados pelos processos vividos. Essas são as principais marcas que caracterizam
nossa pesquisa como uma invetsigação qualitativa.
Dessa forma, o objetivo deste artigo é apresentar algumas considerações sobre o uso da
videogravação e videoanálise na formação de professores de Física, no contexto do estágio

1926
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

supervisionado, de um curso de licenciatura em Física de uma universidade federal localizada no


interior do Estado do Rio de Janeiro, Brasil.

2 Procedimentos metodológicos
A videogravação e outras técnicas para registros de eventos por meio eletrônicos são amplamente
usadas nas pesquisas em Ensino de Física. Giordan (2006), ao revisar a literatura, afirma que o uso de
"equipamentos de registro de áudio e vídeo pelos pesquisadores alterou a forma como se realiza
pesquisa em sala de aula" (p.214). Além da precisão e qualidade do registro, o uso desses recursos
tecnológicos possibilita o melhor armazenamento dos dados coletados bem como o
compartilhamento com outros grupos de pesquisa. O autor também indica que uma das vantagens
do registro em vídeo é o "engajamento prolongado do pesquisador sobre os dados, que pode
revisitar o cenário de investigação [sala de aula] diversas vezes e coligir as observações extraídas do
meio audiovisual com outros registros obtidos na situação de investigação" (ibid, p.215).
A título de exemplos de pesquisa nessa perspectiva, encontramos dois trabalhos que se assemelham
em vários aspectos às nossas investigações. Goto (2014) analisa como a colaboração emerge na
formação inicial de professores quando licenciandos, professores e pesquisadores atuam em prol de
uma tarefa em comum. A autora usa amplamente a videogravação como técnica básica de coleta de
dados e a Teoria da Atividade como referencial teórico-metodológico. Ichiyanagi (2014) também faz
uso da videogravação para analisar as ações de pequenos grupos de aprendizado durante as aulas. A
investigação busca entender a relação cooperação/colaboração entre os alunos de acordo com a
maneira que a tarefa é proposta.
No campo da pesquisa em Ensino de Física de uma forma mais ampla, percebe-se o aumento de
trabalhos que fazem uso das videogravações para investigar os eventos e situações ocorridas em sala
de aula. Por exemplo, Brophy (2004), que organiza um livro com trabalhos sobre o uso de vídeos na
formação docente; Derry et al (2010) apresentam um extenso trabalho sobre a pesquisa com vídeos
para o ensino de Ciências salientando os aspectos operacionais do processo. O Video Mosaic
Collaborative1 (VMC) é outro exemplo de pesquisas relacionadas ao uso da videogravação para
formação de professores, na medida em que é um tipo de banco de dados com vídeos de aulas
gravadas em situações concretas de ensino e aprendizado, os quais professores e pesquisadores
podem usá-las em aulas como as de Prática.
Em outros campos do conhecimento, podemos citar a obra de Knoblauch et al (2012) em que os
autores indicam elementos metodológicos para videogravação e a videoanálise nas investigações em
sociologia. Nesse sentido, em um dos capítulos dessa obra, Schubert (2012) afirma que "a videografia
como um método é ainda recente e não tem regras fixas de como filmar e analisar situações da vida
real. Como forma de observação, a videografia tem seu ancestral na tradição da pesquisa
etnográfica, mas as gravações em vídeo são necessariamente diferentes em escopo e foco das
observações feitas a olho nu" (p. 115).

2.1. As disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado

O curso de licenciatura em física em questão foi iniciado em meados de 2008 e as primeiras turmas
se graduaram a partir de 2013 e, desde então, mesmo com a alta evasão de alunos do curso,
nenhuma turma deixou de se graduar. O estágio supervisionado tem um papel importante na
formação docente e compreende um total de 400 horas que devem ser cumpridas em escolas de
educação básica sob a supervisão de um professor da escola, a partir da segunda metade do curso.
Do total de horas de estágio, 130 correspondem às disciplinas de Oficinas de Projeto de Ensino de

1 http://videomosaic.org/home

1927
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Eletromagnetismo e de Física Moderna, relacionadas ao ensino desses conteúdos específicos. As


outras 270 horas se distribuem nas disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado I e II
(doravante Prática I e II) para os licenciandos do último ano do curso.
Os primeiros licenciados começaram a cursar as disciplinas de estágio em meados de 2011. Porém,
foi a partir de 2014 que iniciamos uma forma de trabalho mais específica para as disciplinas de
Prática I e II, apresentado em um artigo de nossa autoria (CORREA & SILVA, 2014). Passamos a utilizar
a videogravação como metodologia da disciplina para filmar as aulas dos licenciandos durante o
estágio e sua posterior análise pelos próprios licenciandos.
A pesquisa relatada neste artigo foi desenvolvida nas disciplinas de Prática I e II, realizadas no ano de
2015 A disciplina contempla dois loci, as aulas no CEFET/RJ e as aulas na Escola de Educação Básica,
que é o estágio propriamente dito. De forma sucinta, podemos descrever a metodologia da disciplina
por: (i) as aulas na Escola são filmadas em momentos específicos em que o supervisor está atuando
ou quando os estagiários desenvolvem alguma atividade docente. O orientador acompanha os
estagiários na escola; (ii) os vídeos das aulas são assistidos pelos estagiários e o orientador no
CEFET/RJ; (iii) os estagiários selecionam trechos dos vídeos para analisar segundo o instrumento
proposto por Mortimer & Scott (2002); (iv) ao final do semestre os estagiários entregam um trabalho
final com uma análise de um trecho de suas próprias aulas.
Assim, os procedimentos da disciplina contribuem para a coleta de dados, na medida em que a
pesquisa e a própria disciplina não se separam. É importante ressaltar que os estagiários concordam
em participar desse processo e toda filmagem na Escola é previamente avisada aos alunos e lhes são
explicados os objetivos. Os participantes das disciplinas de Prática I e II 2015 eram oito estagiários,
entre eles a estagiária K e o estagiário E; o professor orientador, responsável pelas disciplinas; os
professores supervisores, bem como os alunos da escola.

3 Dois exemplos de análise


Vamos apresentar dois exemplos do processo de autoanálise dos estagiários a partir dos recortes dos
episódios de suas próprias aulas, da estagiária K e do estagiário E, respectivamente, no primeiro e no
segundo semestre de 2015. Como parte do cenário empírico, é importante ressaltar que chegada à
escola, local de realização do estágio, foi feita após o cumprimento de todas as etapas burocráticas.
Porém, antes da entrada em sala de aula, os estagiários e o orientador já tinham procurado os
respectivos supervisores para iniciar os planejamentos. Em geral, como o professor orientador estava
presente na escola, nos intervalos das aulas era possível planejar junto com o supervisor e os
estagiários os procedimentos para o estágio. Os supervisores sempre possibilitaram que os
estagiários e mesmo o orientador atuassem durante as aulas, por exemplo, auxiliando-os em
trabalhos em grupo.

3.1 A estagiária K

Conforme indicado no item (iv) da subseção anterior, a estagiária K entregou um trabalho escrito
como requisito da disciplina de Prática I. Na introdução do seu trabalho ela relata:
Neste trabalho será apresentada a análise de eventos pedagógicos ocorridos nas turmas 2013 e 1018 nos dias
11 e 18 de junho de 2015, nas quais desenvolvemos durante o primeiro semestre deste ano um trabalho que
configura prática de estágio vinculado ao curso de licenciatura em física (...). As aulas foram filmadas com
autorização do professor AC, supervisor do estágio, em suas turmas de 1º e 2º ano do ensino médio noturno,
em aulas semanais às quintas- feiras. Os eventos escolhidos para serem analisados foram selecionados dos
demais por conterem algum momento relevante para o aprendizado discente na prática de estágio. Elementos
como clima emocional da turma, atenção aparentemente dispensada pelos alunos, soluções de situações
imprevistas, erros conceituais, discurso dos estagiários e prática de codocência (...).

1928
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A aula do dia 18 de junho versou sobre a lei da gravitação universal de Newton. A estagiária
menciona que houve uma dificuldade de sua parte de explicar a relação matemática entre a força e o
inverso do quadrado da distância. Nesse momento, o professor AC sugeriu que a estagiária utilizasse
um trecho de um vídeo que fora utilizado anteriormente. Enquanto o professor ia passando e
pausando o vídeo, a estagiária usava a lousa para explicar aos alunos. Em seu trabalho, a estagiária K
transcreve as falas desse momento:
K: Olha só, já que a gente não tem quadro. Só pra gente entender então ... O que acontece, se eu tiver a uma
distância de um metro da aluna D, qual vai ser o valor da força da gravidade?
Turma: Um sobre um é um!
K: Se eu tiver a dois metros da aluna D, dois ao quadrado, quatro. Um sobre quatro! Agora, ... se eu tiver a três
metros de distância da aluna D, três ao quadrado dá quanto?
Alguns alunos: Um sobre nove (alguns discordaram e começaram a discutir sobre a resposta)
Outros alunos: seis ... um sobre seis!
K: Três ao quadrado dá quanto? Três ao quadrado é quanto?
Aluna 1: seis
K: três vezes três é nove, então, um sobre nove. Então, os três valores que a gente apresentou pra vocês aqui
são um, um sobre quatro, um sobre nove (pausa) Qual é o número que é menor?
Turma: um sobre nove
K: é um dividido pra nove. Imagina que eu tenho uma barra de chocolate dividir pra nove pessoas, eu vou ter
pedacinhos minúsculos.
K: Agora, se eu me afastar quatro metros da aluna D, quatro ao quadrado?
Aluno 2: Doze
K: quatro vezes quatro, dezesseis!
K:Um sobre dezesseis avos. Olha só, como ela não diminui com uma proporção de um pra um ou uma
proporção de múltiplos de dois. Ela vai diminuir sempre com o quadrado da distância que eu tiver, e isso vai
aumentando cada vez mais. Por quê? Se eu tiver a cinco metros, quadrado de cinco? Vinte e cinco. Se eu tiver a
seis metros, quadrado de seis?
Turma: trinta e seis
Ao final desse episódio recortado pela própria estagiária K, ela conclui:
A análise deste evento aponta que as estagiárias conseguiram contornar uma situação que havia instaurado
um clima desconfortável por gerar dúvidas nos alunos e falta de confiança na realização de seu discurso. È
importante que imprevistos venham a ser considerados e que sejam desenvolvidas habilidades por parte do
professor para contorná-las, esse desenvolvimento é adquirido muitas vezes pela prática, o que fica evidente
com a sugestão do professor supervisor de utilizar o vídeo.

3.2 O estagiário E

O estágio de E ocorreu na mesma escola da estagiária K, porém em contexto diferente. O seu


supervisor era o professor LA e turma era do módulo 4 da Nova Educação de Jovens e Adultos
(NEJA), portanto, no período noturno (19h às 22h). Nas escolas estaduais do Rio de Janeiro, as
turmas de NEJA possuem material próprio, organizado em módulos semestrais, cujos conteúdos de
Física são ensinados nos módulos 2 e 4, equivalentes à primeira e parte da segunda e terceira séries
do Ensino Médio, respectivamente. Da mesma forma, o estagiário E escreveu um trabalho como
requisto da disciplina de Prática I, no qual inicia relatando que:
Este trabalho tem por objetivo lançar um olhar crítico sobre um momento de codocência ocorrida numa aula de
Física no Colégio. Esta atividade foi desenvolvida para uma turma de NEJA, que frequenta as aulas no turno da
noite (...). Seguindo o conteúdo programático do NEJA, a aula deste dia deveria ter como assunto norteador as
Máquinas Térmicas. Após conversas e trocas de e-mails, decidimos que deveríamos contextualizar
historicamente as máquinas térmicas e, se possível, utilizar a Revolução Industrial como pano de fundo para
mostrar o impacto da ciência na paisagem que eles tanto conhecem: a nossa cidade.

1929
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Então, o estagiário E identificou um trecho da aula em que prevalecia o diálogo com os alunos cuja
transcrição apresentamos a seguir:
E: E aí chegada da estrada de ferro vai provocar alguma coisa grande na cidade né? A movimentação de
pessoas era, basicamente, feita a cavalo e agora pode começar a ser feita de trem. E o que vocês acham que
isso causou em nossa cidade?
Aluna A: Eu tenho uma foto [a aluna mostra o celular com duas fotos antigas da cidade]
E: Ah! Você tem uma foto? [risos] (...) Mas o que é que tem de diferente de uma foto para outra?
Aluna A: Muita coisa, né? Esse trem aqui era muito feio [risos] não tinha muito poste na rua, a rua não era
asfaltada...
Aluna B: As pessoas poderiam vir mais pra cidade.
E: Exatemente, agora a viagem para [a nossa cidade] pode ser feita muito mais rápido.
Aluno C: Claro, antes era a cavalo
E: Exatamente ... imagina só: A Aluna B falou que as pessoas poderiam vir mais a Petrópolis. O que é
absolutamente verdade, né? Porque assim, se você estivesse que vir a Petrópolis a cavalo, quantas horas você
iria demorar?
Aluno C: Muito tempo
E: Máquinas, perfeito. Isso ajuda a explicar porque [a nossa cidade] cresceu tanto na indústria têxtil. E agora,
além de ter máquinas, tem como escoar a produção. A produção pode sair da cidade mais fácil. Por causa do
trem.
LA:Esse escoamento era feito da estação no Alto da Serra [bairro de Petrópolis], de onde você podia ir pro
interior do Estado do Rio (...) ir para [Estado de] Minas. Ou descer pro Rio [cidade] e ir para Região dos Lagos,
por exemplo. Podia ir para São Pedro da Aldeia, onde tem estação até hoje ... tudo de trem. Muito mais fácil,
muito melhor. E mais econômico também.
O estagiário E concluí:
Interessante observar a grande participação dos alunos. Apenas no trecho transcrito, houve participação
frequente de quatro alunos. Vale ressaltar também que a intenção dessa atividade era construir um ambiente
de diálogo e interação. E isso bastante explícito na classificação dos discursos. (...) De maneira geral, o objetivo
da aula foi alcançado. Houve boa participação dos alunos e eles pareceram ver que a ciência é uma construção
humana e que, como tal, está incluindo num momento histórico e numa sociedade. Demonstrar como um
elemento criado pela ciência pode modificar a paisagem e a vida das pessoas num cenário que eles já
conhecem foi, não só prazeroso, um exercício de exploração e conhecimento do espaço em que se vive. E, por
que não de autoconhecimento.

4 Considerações
Ao final de suas análises sobre as interações discursivas na perspectiva apontada por Mortimer &
Scott (2002), os estagiários teceram considerações sobre a prática docente, as quais destacamos
como dados que demonstram sua prática reflexiva. Considerações acerca do trabalho realizado
frente ao trabalho planejado, modelos de aula, o papel desempenhado pelos diferentes tipos de
interação, de acordo com as intenções do professor foram algumas das conclusões dos estagiários
após a análise de suas próprias aulas.
Nos dois exemplos, a videoanálise se mostrou como um instrumento de reflexão dos próprios
licenciandos. Os recortes dos episódios revelam como eles perceberam suas próprias aulas. No caso
da estagiária K, há o destaque da ajuda do professor AC diante de uma dificuldade dela em explicar o
conteúdo. O estagiário E destaca o momento de maior dialogicidade de sua aula, mostrando a
interação com os alunos e professor LA. De alguma forma, nos dois casos, há uma valorização do
professor supervisor, indicando sua influência na formação inicial dos professores. Para Vigotski
(OLIVEIRA, 1997), por exemplo, o aprendizado se dá como um processo de reconstrução dos
significados que são transmitidos por um grupo cultural. E nesse processo, o mecanismo de imitação
se torna importante. "Imitação, para ele, não é mera cópia de um modelo, mas reconstrução
individual daquilo que é observado nos outros. (...) criação de algo novo a partir do que observa no

1930
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

outro. Vigostski não toma a atividade imitativa, portanto, como um processo mecânico, mas sim
como uma oportunidade de a criança realizar ações que estão além de suas próprias capacidades".
(Oliveira, 1997, p. 63). Ao compartilhar dos diversos aspectos do trabalho docente, principalmente,
quando atua em sala de aula junto com o professor supervisor, a vivência dessa relação de parceria
na aula se torna algo intenso o suficiente para fazer com que alguns processos de desenvolvimento
profissional que seriam despertados ao longo da carreira docente possam se antecipar por meio da
imitação, isto é, um processo de reconstrução individual capaz de fazer o estagiário avançar em seu
desenvolvimento. Dessa forma, o uso das videogravações permitiu aos estagiários observar
retrospectivamente o seu trabalho e o do outro (supervisor), detonando um processo de reflexão
que se apoiou em elementos discursivos. Os vídeos não apenas serviram como desencadeadores da
reflexão como proporcionaram aos estagiários a experiência de atuar como pesquisadores da própria
prática.

Referências
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Derry, S. J. et al. (2010). Conducting Video Research in the Learning Sciences: Guidence on
Selecetion, Analysis, Technology, and Ethics. Journal of the Learning Sciences, 19(1), 3-53.
Correa, M. & Silva, G. S. F. (2014). A perspectiva da codocência na prática de ensino de física e no
estágio supervisionado. In: IV Congresso Internacional sobre Professorado Principiante e
Inserção Profissional à Docência Curitiba-PR. Atas Congreprinci, 2014, v4, 1-10.
Giordan, M. (2006). Algumas questões técnicas e metodológicas sobre o registro da ação na sala de
aula: captação e armazenamento digitais. In Santos, F. M. T.; Greca, I (orgs). A pesquisa em
ensino de ciências no Brasil e suas metodologias. Ijuí-RS: Unijuí, 213-237.
Goto, I. (2014). Attempt of "emergence collaboration" in teacher education. In: Paper Presented to
the 4th ISCAR Congress, Sydney, Australia.
Goulart, S. M. (2002). A prática de ensino na formação de professores: uma questão (dês) conhecida.
Revista da Universidade Rural, Série Ciências Humanas. UFFRJ, 24(1-2), 77-87.
Ichiyanagi, T. (2014) How does the worksheet mediate problem solving in the small group?: the role
of the method of distribution. In Paper Presented to the 4th ISCAR Congress, Sydney, Australia.
Knoblauch, H. et al (2012). Video Analysis: Methodology and Methods Qualitative Audiovisual Data
Analysis in Sociology. 3rd, revised edition. Frankfurt am Main, Berlin, Bern, Bruxelles, New York,
Oxford, Wien: Peter Lang.
Mortimer, E. & Scott, P. (2002) Atividade discursiva nas salas de aula de ciências: uma ferramenta
sociocultural para analisar e planejar o ensino. Investigações em Ensino de Ciências. v.7, n3,
283-306.
Oliveira, M. K. (1997) Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio – histórico, São
Paulo, ed. Scipione.
Schubert, C. (2012). Video Analysis of Practice and the Practice of Video Analysis: Selecting field and
focus in videography. In: Knoblauch, H. et al. Video Analysis: Methodology and Methods
Qualitative Audiovisual Data Analysis in Sociology. 3rd, revised edition. Frankfurt am Main,
Berlin, Bern, Bruxelles, New York, Oxford, Wien: Peter Lang.

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A Zona De Desenvolvimento Proximal (Zdp) Como Fonte De


Analise Para Um Problema De Aprendizagem Na Física

1
Marcos Vinícios Rabelo Procópio , Raquel Marra de Madeira Freitas2, Leandra Vaz Fernandes
31
C. Procópio
1
Unidade Especial de Educação Universidade Federal de Goiás – Reg. Catalão, Brasil.
quanticis@gmail.com;
2
Departamento de Educação Pontifícia Universidade católica de Goiás, Brasil. raquelmarrammail.com;
apfel@gmail.com; gunther@hotmail.com
3
Facultad de Psicología - Universidad Autónoma de Madrid, España. leandracprocopio@gmail.com

Resumo. A presente investigação, baseada em uma pesquisa de pós-doutorado, está centrada no


desenvolvimento de um estudo que procura conhecer a formação dos acadêmicos de Física no âmbito
universitário no contexto português e brasileiro. O estudo tem como objetivo conhecer o nível de
desenvolvimento real que os discentes apresentam ao entrar na universidade assim como compreender
como se desenvolve a zona de desenvolvimento proximal quando o acadêmico é colocado junto a um par
mais experiente. Neste sentido, foram realizadas duas etapas de uma pesquisa exploratória e transversal
tendo cada uma com quatro fases distintas de acordo com as questões do instrumento proposto em 24
acadêmicos. Observou-se que o conhecimento real dos acadêmicos se apresenta aquém do esperado para o
contexto universitário e que a experiência de um par mais experiente colabora ativamente na aquisição de
um processo cognitivo eficaz para as aprendizagens dos conteúdos da física.
Palavras-chave: ZDP, Física, Fracasso Universitário.

The Proximal Development Zone (Zpd) As Source Of Analysis For A Physics Learning Problem

Abstract. The present research, based on a postdoctoral research, is centered on the development of a
study that seeks to know the training of physics academics in the university context in the Portuguese and
Brazilian context. The study aims to know the level of real development that the students present when
entering the university as well as to understand how the zone of proximal development develops when the
academic is placed next to a pair more experienced. In this sense, two stages of an exploratory and
transversal research were carried out having a four different phases according to the questions of the
instrument proposed in 24 academics. It was observed that the real knowledge of the academics presents
below the expected for the university context and that the experience of a more experienced pair
collaborates actively in the acquisition of an effective cognitive process for the learning of the contents of
the physics.
Keywords: ZDP, Physics, University Failure.

1 Introdução

O processo investigativo, quando decorre das experiências acadêmicas do pesquisador, possibilita a


continuidade dos estudos, favorecendo o enriquecimento de conhecimento sobre o tema
investigado. Vinculada a este propósito, a escolha do tema desta investigação se deu em razão de
uma vivencia pessoal de experiência acadêmica, seja como ex-aluno do curso superior de Física,
concluído em 2004, seja como docente, nas disciplinas de Física no ensino superior, ou como

1 Por favor tome nota de que o editorial do CIAIQ/ISQR parte do pressuposto de que todos os autores utilizam a convenção
ocidental de atribuição de nomes, com os nomes a precederem os sobrenomes. Tal determina a estrutura dos nomes nos
cabeçalhos e no índice de autores.

1932
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

investigador tendo em contexto de doutoramento percebido um elevado índice de reprovação nos


dois primeiros anos principalmente nas disciplinas de Cálculo e Física. Neste âmbito também foi
percebido que o capital cultural adquirido anteriormente à entrada do acadêmico no ensino
superior está diretamente relacionado com a dificuldade de aprendizagem, que as atitudes
pedagógicas dos professores não favorecem a comunicação e a atividade cognitiva dos alunos e que
os alunos com melhor desempenho são aqueles que conseguem desenvolver estratégias de estudo
e de aprendizagem assim como interagem de forma ativa em busca do conhecimento.
Estes dados nos possibilitou compreender que é essencial conhecer e ter vivido de forma
experiencial o pesquisado (Friedrich, 2009), portanto também concordamos com Martins e Bicudo
(2005, p. 80-81) quando esclarecem que:
Falar do mundo como sendo um real vivido é propor, ao mesmo tempo, duas
teses. É afirmar – esta é a primeira tese – uma oposição a qualquer proposta
centralizada em qualquer teoria que sustente a existência de dados
sensoriais, isolados e sem sentido em si mesmo (...). O mundo pré-reflexivo
é coerente e precisa ser reconstruído a partir da interpretação e do
julgamento (...). É afirmar – esta é a segunda tese – que a ênfase é posta na
experiência viva, no mundo como ele é vivido. Nas experiências vividas
combinam-se memórias, percepções e antecipações a cada momento. Essa
unidade nunca é estática ou final. O mundo experiencial precisa ser
continuamente restabelecido no curso da experiência.
Logo, é possível considerar que perceber a relação entre o vivido e o proposto pode dar ao
investigador mais maturidade, entendendo aqui o proposto como a parte que representa o
problema a ser investigado e o vivido como o lócus de onde se origina o problema. Desta
perspectiva, o investigador que busca compreender a relação entre o vivido e o proposto tem
condições de extrair de sua própria experiência as percepções necessárias para colocar em questão
o que se pretende investigar. Este pressuposto é ampliado por Charlot quando afirma que, "a
característica do pesquisador é a de questionar a questão que lhe é feita, interrogar os termos nos
quais ela é formulada" (Charlot, 2000, p. 15).
O segundo motivo desta escolha investigativa decorre de uma constatação em fase de
doutoramento em que se buscava compreender a dificuldade de aprendizagem dos conteúdos da
Física e que em muitos casos acarreta nos elevados índices de reprovação. Este fato pode ser
constatado pela quantidade de abandonos, trancamentos e o grande número de reprovações, uma
vez que da amostra total de 215 acadêmicos portugueses e brasileiros, 78,6% (cf. tabela 1), dos
acadêmicos acumulavam de duas a sete reprovações durante o curso.
Tabela 1 - Frequência de reprovação

Validade Percentual
Frequência Percentual
Percentual Cumulativa
ABANDONOU 25 11,6 11,6 11,6
TRANCOU 11 5,1 5,1 16,7
REPROVOU 169 78,6 78,6 95,3
NENHUMA 10 4,7 4,7 100,0

Total 215 100,0 100,0

Fonte: Procópio (2014)

Investigações como o de Almeida (2007), Chamorro-Premuzic e Furnham (2008), O´Connor e


Paunonen (2007) constataram o alto índice de insucesso dos acadêmicos em determinadas

1933
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disciplinas em vários países, assim como Almeida et al (2012) também verifica o fracasso no curso
superior dos discentes tanto no Brasil quanto em Portugal pelo elevado número de reprovação nas
disciplinas.
Então, avaliar a permanência levando em consideração as dificuldades de aprendizagem dos
acadêmicos, seja ele de qualquer curso, levando em consideração apenas os critérios de aprovação
e reprovação resulta, na maioria das vezes, em um levantamento estatístico que demonstra o fluxo
dos alunos nos cursos universitários2, mas não nos permite explicitar os nexos do processo.
Logo, compreender o que leva aos acadêmicos do curso de Física apresentarem dificuldades de
aprendizagem, utilizando apenas alguns critérios como os de aprovação e reprovação, reduz o
ensino e a aprendizagem a uma ação mecanizada com base em uma formação fundamentada na
racionalidade técnica, impossibilitando explicitar o problema para além de sua aparência, ou seja,
não permite transformar o dado em evidência.
Portanto, a dificuldade de aprendizagem na Física é o resultado de um processo iniciado muito antes
dos fracos resultados obtidos pelo aluno após sua entrada no ensino superior e, neste sentido, todas
as etapas do seu processo de formação devem ser consideradas pelos investigadores desta temática.
Assim, visto que o processo de formação do aluno do curso superior de Física tem pouca tradição na
produção de estudos que contemplem as dificuldades de aprendizagem desta ciência, faz-se
necessário um debruçar profundo em estudos que permitam tomar como base o nível de
conhecimento do acadêmico de Física ao entrar no curso, dentro da vertente do nível de
desenvolvimento real de Vygotsky.
Sendo assim, a dificuldade de aprendizagem da Física sempre fica velada por temas mais evidentes
que são decorrentes dela como a evasão, o abandono, o desligamento, a desistência, a transferência
para outros cursos, as baixas notas ou a reprovação pode ser significativo para determinar o
percurso acadêmico dos alunos, mas não é suficiente para revelar o que leva esses discentes a
permanecerem nessa situação.
O conhecimento real se revela por meio do processo de construção da aprendizagem realizado pelo
aluno, sendo este processo uma decorrência das suas condições socioculturais e da sua interação
com o curso, com os professores e com os colegas. Em outras palavras, o processo de formação do
aluno está vinculado às suas interações sociais, a partir das trocas simbólicas que estabelece com
seus pares. Para Vygotsky (2007) é justamente a colaboração de pares mais capazes na solução de
problemas que faz com que o aluno possa sair do nível de desenvolvimento real em que se
encontra.
Dizendo de outro modo, é por meio das relações que o aluno estabelece com os conhecimentos
científicos que integram o currículo do curso e das relações que estabelece para desenvolver seu
processo de aprendizagem e de formação profissional que se torna possível analisar a dificuldade de
aprendizagem da Física nos acadêmicos do curso de Física.
Então, analisar as relações entre os pares dos acadêmicos de Física considerando as dificuldades de
aprendizagem durante sua estadia no Ensino Superior em Física é condição para que a universidade
estabeleça medidas preventivas que lhe permitam cumprir com a sua parcela de responsabilidade
em relação à evasão universitária.
Sendo assim, enfatizar as tomadas de decisão do acadêmico ao inferir sobre como pensar a Física e
como escolher as estratégias de aprendizagem que minimizem as dificuldades que estes apresentam
durante sua passagem pelo ensino superior, são problemas inerentes também ao Ensino Superior.
Dessa forma, a ligação entre como esse acadêmico pensa a transposição dos conteúdos curriculares

2Ver a este respeito, Peixoto, M. C. L.; Braga, M. M.; Bogutchi, T. F. A evasão no ciclo básico da UFMG. Porto Alegre: Rev.
Bras. de Política e Administração da Educação, 1999,15.(1), jan/jun, p.49-59.

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

e a própria Física, e entre o nível real de desenvolvimento que esse aluno apresenta e o que o
professor acredita que o discente tenha, pode ser feita por meio do esforço investigativo que
possibilite o diálogo e as interações discursivas entre os principais representantes da cultura
acadêmica, ou seja, o próprio aluno e o professor. Pois, para que haja ensino é necessário que
“ocorra à ligação entre os objetivos e conteúdos propostos pelo professor e as condições de
aprendizagem dos alunos” (Libâneo, 1991, p. 152).
Dentro desta perspectiva da dificuldade da aprendizagem da Física, mesmo que seja evidenciada a
permanência do acadêmico, pode-se inferir que não é possível conceber pelo menos parte das
condições que levam a essa situação sem que se questione, porque a Física possui uma
característica em praticamente todas as universidades de diferentes países, a dificuldade de
aprendizagem.
Entretanto, a realização de uma investigação dentro desse pressuposto discutido faz-se necessária,
levando em conta que tal não tem a pretensão de esgotar a discussão sobre o tema na intenção de
levantar todas as situações que levem ao acadêmico a permanecer e a superar sua situação
dificuldade de aprendizagem e sim apurar, refletir, avaliar, analisar e debater o problema.
Nessa perspectiva, investigar como os alunos entram no curso superior de Física, frente às
dificuldades encontradas, bem como compreender o que leva esses a se manterem em uma
situação de dificuldade de aprendizagem da Física que permeiam o processo de sua formação é
mister, a fim de definir propostas alternativas de solução frente a tal realidade.

2 Metodologia
Esta investigação foi realizada no Brasil e será no ano de 2017 aplicada em Portugal, não com o
propósito de um estudo comparado, mas sim com o intuito de caracterizar a ocorrência do mesmo
problema, em dois países diferentes. Por esse fato serão aqui discutidos nesse estudo apenas os
dados referentes ao Brasil, então compreende-se está como uma investigação em curso. Embora a
dificuldade da aprendizagem da Física por parte dos acadêmicos no curso superior de Física seja um
problema presente em quase todas as universidades ocidentais, a permanência dos acadêmicos
neste curso merece um debruçar mais aprofundado, então estudar dois destes países permitirá
ampliar a análise e facilitar a compreensão de totalidade, necessária para explicitar o problema.
2.1 Escolhas metodológicas
A investigação aqui proposta tem por escolha metodológica uma pesquisa exploratória do tipo
transversal a ser realizada por meio da aplicação em dois instantes de um instrumento com 4
questões elaboradas pelos pesquisadores, onde têm o objetivo de aferir num primeiro instante
(primeira etapa) os conhecimentos básicos da física adquiridos no decorrer do ensino
médio/secundário e em outro momento (segunda etapa) como a relação com um parceiro mais
capaz pode diminuir a dificuldade de aprendizagem da Física dos acadêmicos ingressantes do curso
de física. Então, o primeiro momento o instrumento foi aplicado apenas aos alunos do primeiro
semestre do primeiro ano de forma isolada e em um segundo momento esse instrumento foi
aplicado aos mesmos alunos sendo estes acompanhados por um acadêmico do último ano, ficando
uma proporção de um par mais experiente para dois iniciantes.
Este estudo, portanto, implica também em uma pesquisa de campo do tipo exploratória e os dados
coletados serão analisados mediantes os critérios metodológicos da análise de conteúdo que,
segundo Lakatos e Markoni tem “[...] o propósito de produzir categorias conceituais que possam ser
operacionalizadas em um estudo subsequente” (Lakatos e Markoni, 2003, p. 188).
Sendo assim, a organização e a análise dos dados serão baseadas na análise de conteúdo, o que se
caracteriza segundo Bardin, como:

1935
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Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por


procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,
indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos
relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas
mensagens. (Bardin, 1977, p.42)
Para análise dos dados que serão obtidos por meio da aplicação do instrumento nas universidades
definidas como campos desta investigação, serão utilizados para a análise dos dados qualitativos o
WebQDA (Software de apoio à análise qualitativa) que possibilita a análise dos dados de natureza
qualitativa com a possibilidade de transcrição de textos apoiando a construção de uma teoria mais
complexa, além de ajudar na elaboração de categorias e no cruzamento de dados.
Outro fato é que o caráter qualitativo da pesquisa pode ser encontrado nas informações levantadas
em estudos que contemplem questões essencialmente quantitativas (Richardson, 1989) e no próprio
instrumento, apoiando-se no WEBQDA. Isto posto, os pesquisadores podem e devem fazer
combinações de procedimentos. Não há um conjunto-padrão de métodos igualmente útil para cada
passo da pesquisa, e nem sempre é útil usar as mesmas técnicas específicas para todos os passos de
todos os projetos de pesquisa, (Creswell, 2007).
2.2 Amostra
Este estudo teve como base inferencial uma amostra de 24 acadêmicos do primeiro ano do curso de
Física. Do total, 15 eram do sexo masculino e 9 do sexo feminino. A idade foi compreendida entre os
17 e os 30 anos. Quanto ao estado civil, a amostra apresentou apenas 3 integrantes casados, sendo
o restante de solteiros.
2.3 Instrumento
Optou-se como instrumento pela elaboração de uma atividade que para sua resolução exigiria
habilidades técnica e mecânica básicas, permitindo assim que se conhecesse os conhecimentos
elementares da Física que os alunos trazem do ensino médio/secundário para a Universidade. A
decisão pela aplicação de um instrumento desta natureza se dá por reconhecer que este tipo de
atividade é de uso corriqueiro nas salas de aula há pelo menos 30 anos sem se questionar a
necessidade de mudança e, portanto, devem ter sido facilmente utilizadas em contexto de sala de
aula. A referida atividade conta com uma estrutura que contempla duas partes: uma de caraterização
sócio demográfica com as seguintes questões fechadas: idade, sexo, estado civil. A segunda parte é
composta por 4 perguntas abertas, sobre aceleração média com o objetivo de extrair do acadêmico
não a resolução do problema em si, mas sim as funções cognitivas que o aluno utiliza no decorrer da
resolução do problema.

2.2 Procedimentos
O instrumento foi aplicado pessoalmente em sala de aula e no horário de aula matutino em duas
etapas distintas. As aplicações dos instrumentos foram gravadas e posteriormente transcritas
utilizando o software. Para maior evidenciamento, na primeira etapa o instrumento foi aplicado em
24 alunos do 1º semestre do primeiro ano do curso de Física onde as questões tinham como
verdadeiro objetivo buscar a compreensão dos processos cognitivos utilizados pelos alunos na
resolução de um problema que exigia conhecimentos relacionados a física. Neste caso o conteúdo
referido foi o de aceleração média. Em um segundo momento (segunda etapa) esses alunos foram
separados em duplas sendo convidado um aluno que cursava o último ano do curso para cada dupla
perfazendo um total de 12 alunos que fariam o papel do par mais experiente. Os objetivos da
pesquisa assim como as instruções foram lidas tanto para os alunos experientes quanto para os que
estavam como sujeitos da pesquisa.

1936
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3. Apresentação e Discussão dos Resultados

Os resultados levam em consideração as duas etapas da pesquisa que contou com quatro fases cada
uma. Uma vez que a investigação tem como o intuito de perceber a ZDR (Zona de Desenvolvimento
Real) dos alunos ao entrarem no curso de física e em um momento posterior como a exposição de
acadêmicos menos experientes a pares mais experientes pode ajudar a se romper com a dificuldade
da aprendizagem da Física, utilizando como base a teoria da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)
de Vygotsky, organizou-se a presente investigação dentro das seguintes etapas.
Primeira etapa
A perceção básica desta etapa se deu na observação dos 24 acadêmicos do curso de Física do
primeiro semestre do primeiro ano ao realizarem as quatro atividades a qual o instrumento
propunha. As questões referentes ao conteúdo de aceleração média exigiam do aluno mais do que a
simples resolução dos cálculos como normalmente é exigido do discente.
A cada questão o nível de exigência era complementar sendo que se dividiam da seguinte forma:
1º Era explorado a consciência do acadêmico em relação a teoria que envolve a aceleração
média;
2º A exigência se dava no nível de o acadêmico demonstrar esquematicamente como
resolveria uma questão de aceleração média e não a resolver em si;
3º O acadêmico resolve a questão;
4º O nível desta questão se dá ao exigir do acadêmico que ele explique o que conseguiu
abstrair da questão.
Dentro da teoria de Zona do Desenvolvimento Proximal deve-se ter com clareza que todos os
procedimentos explicativos abstratos acompanham a característica de determinados períodos de
idade, porém as implicações concretas dessas devem ser descobertas e caracterizadas levando em
consideração a singularidade de cada conteúdo respeitando cada faixa etária. Então levando em
consideração que esta ideia debatida por Vygotsky seja levando em consideração o desenvolvimento
de crianças e o sujeito aqui estudado está no ensino superior pode-se recorrer ao estudo da
periodização por Elkonin (1987) em que determina que no período da adolescência é onde o sujeito
passa a ter condições de dominar a estrutura das atividades relacionadas ao estudo.
Da mesma forma, Vygotsky (1996) aponta que nessa mesma fase o adolescente passa a ter uma
transformação cognitiva mais significativa, onde consegue elaborar conceitos mais refinados.
Partindo desse pressuposto e que cada período em que o sujeito se encontra existe uma atividade
guia que pode ser “[...] fonte de desenvolvimento no interior daquele período” (Vygotsky, 1967, pp.
15-16), de onde baseamos a aplicação deste instrumento.
O evidenciamento das questões respondidas apontou em um primeiro momento que os 24
acadêmicos do curso de Física do primeiro semestre do primeiro ano demonstraram que estão na
primeira fase de desenvolvimento quanto ao contato inicial com o conteúdo de aceleração média
apresentou as seguintes inferências:
1ª Fase - Era explorado a consciência do acadêmico em relação a teoria que envolve a
aceleração média – dos 24 acadêmicos 58% destes não conseguiram expressar a teoria sobre
aceleração média que é comprovadamente necessária para a resolução de qualquer atividade
relacionada a este conteúdo, 25% demostraram confusão quanto a teoria apontando para uma outra
que abordava o conteúdo de velocidade média e 17% expressaram sem nenhum significado a teoria
demonstrando total desconhecimento.

1937
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Tais implicações se refletem diretamente no processo de continuidade da aprendizagem da Física por


parte destes acadêmicos de forma que a próxima fase do instrumento se refere a desenvolver
esquematicamente a resolução de uma questão relacionada a aceleração média, de forma que, os
acadêmicos apresentem um esquema na intenção de perceber a clareza que os discentes têm
previamente à resolução da atividade proposta de aceleração média.
2ª Fase - Dos 58% dos acadêmicos que apontaram na primeira fase desconhecimento sobre a
teoria conceitual não conseguiram esboçar a linha do raciocínio em forma esquemática, os outros
25% elaboraram linhas do raciocínio em que não os permitiria chegar a estruturar a atividade para
resolvê-la e por último os 17% também não conseguiram esboçar uma linha do raciocínio
esquematicamente como os 58%. Podendo assim, inferir que a teoria é essencial para uma
elaboração prévia do exercício a ser resolvido, levando assim a elaboração de uma linha de raciocínio
por meio de acessos aos “princípios explicativos abstratos” (Vygotsky, 1988, p. 189) responsáveis por
caracterizar o período em que se encontra o discente de onde se partirmos para uma compreensão
psicológica dos processos pode-se focar nas inter-relações das funções psicológicas em detrimento de
considerar as funções de forma isoladas.
3ª Fase - Já para o prosseguimento da observação em que os acadêmicos na próxima etapa
do instrumento teriam que apresentar a resolução matemática da atividade que leva em
consideração um problema sobre aceleração média o mesmo que na segunda etapa tinha como
objetivo a apresentação da linha de raciocínio na forma esquemática. Dessa forma, essas três etapas
permitem a seguir os passos de Vygotsky (1982) de buscar compreensão do desenvolvimento não
como uma forma linear focada em suas extremidades de causa e efeito e sim em um processo aspiral
completo caracterizado durante os novos estágios de desenvolvimento, não permitindo assim
evidenciar apenas funções específicas.
4º - Na última fase do instrumento representada pela quarta questão apresentada no
instrumento o nível de exigência se centrava no fato de que os acadêmicos deveriam fazer abstrações
relacionadas ao entendimento do que a atividade sobre aceleração média após sua resolução
respondia, porém como as fases anteriores não foram cumpridas em 100% dos acadêmicos
investigados esta fase não apresenta condições de ser analisada, não tendo sido respondido pelos
sujeitos da pesquisa.
Neste sentido, o que se observa é que os acadêmicos do curso de Física entram na universidade para
o correspondente curso em um nível real de desenvolvimento diferente do nível de desenvolvimento
esperado levando em consideração ao conteúdo explorado, aceleração média, que se encontra nos
livros do ensino fundamental e médio anteriores ao ensino superior. Assim, a próxima etapa irá
apresentar a exploração das consequências da interação social entre os acadêmicos do curso no
desenvolvimento do mesmo do mesmo instrumento.
Segunda etapa
Esta etapa se completa usando a interação entre os 24 acadêmicos da primeira etapa com os 12 que
são discentes do último ano do curso de Física convidados para participar voluntariamente da
pesquisa, sendo estes considerados os pares mais experientes. Considerando que cada estágio exerce
uma nova formação relacionadas as quais funções psicológicas desenvolverão (VYGOTSKY, 1998)
pode-se inferir que os acadêmicos aos quais foram aplicados o instrumento na primeira etapa
apresentem contradições em suas habilidades atuais no desenvolvimento das questões do
instrumento podendo se manifestar nas funções psicológicas desenvolvidas.
Assim, ao colocar esses acadêmicos com seus pares considerados mais experientes o que se pode
observar foi um engajamento maior dos 24 discentes investigados na primeira etapa levando a um

1938
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resultado de enriquecimento das funções já existentes.


1ª Fase – Nesta etapa como os 24 acadêmicos do primeiro semestre do primeiro ano estavam
acompanhados de um parceiro mais experiente do último ano do curso de Física o resultado foi mais
homogêneo quando observado que esses mesmo alunos conseguiram expressar a teoria conceitual
relacionada ao conteúdo de aceleração média. Porém, é importante ressaltar que os discentes mais
experientes não ajudaram na elaboração de nenhuma das etapas e sim entraram como instigadores
dos académicos do primeiro período levando ao amadurecimento das funções psicológicas destes.
Observando que os acadêmicos envolvidos na primeira etapa foram levados a formar novas funções
estruturais apontando para um enfrentamento das contradições descritas por Vygotsky (1998) como
sendo uma contradição entre as capacidades atuais de um sujeito o que permite uma mudança nas
estrutural na organização das funções.
2ª Fase – Dos 24 acadêmicos do primeiro semestre do primeiro ano 79% (20) conseguiram
representar esquematicamente como resolveriam a atividade proposta relacionada a aceleração
média de onde pode-se inferir que o que deve-se observar e compreender não é resolução em si da
atividade, mas o fato de que nesse momento os acadêmicos acabam se deparando com ações
determinadas por essas atividades e sustentadas pelos pares mais experientes que ajudam a
desenvolver as funções psicológicas necessárias as atividades propostas pelo instrumento. Os outros
21% também expuseram um esquema, mas não conseguiram completar a linha de raciocínio tendo
sido observado que o tempo referente a uma aula destinado para a realização das questões não foi
suficiente.
3ª Fase – A constatação de que os 21% (5) acadêmicos não conseguiram completar o exigido
na segunda fase tendo como explicação o tempo se confirma pelo fato de que nesta fase onde os
discentes são expostos a resolverem um exercício relacionado a aceleração média foi atingindo por
96% (23) dos alunos submetidos. Pode-se utilizar a ideia de Vygotsky de que o desenvolvimento real
de um sujeito pode ser determinado por uma fase que esteja ocorrendo no interior em um dado
período (idade) pelo qual este esteja sendo submetido em um determinado momento (VYGOTSKY,
1998).
4ª Fase – Diferente da primeira etapa, 83% (20) acadêmicos conseguiram abstrair o
significado por meio da resolução na terceira fase do instrumento, demonstrando conhecimento
suficiente que levou a perceção de que mais do que um resultado numérico a atividade propõe a
compreensão de um fenômeno que ocorre e pode ser explorado de forma mais aprofundado gerando
generalizações em que apenas a repetição de um gesto mecânico na resolução de atividades pode
apontar, um valor de mensuração. Assim, pode-se inferir que a associação de pares menos
experientes com pares mais experientes podem levar as funções em desenvolvimento a mudar as
estruturas internas de acordo com cada período (Vygotsky, 1998), de forma que pudesse observar a
Zona de Desenvolvimento Proximal em relação ao estado em que os acadêmicos se encontravam na
primeira etapa para a segunda etapa.
Então o observado nestas duas etapas será apresentado esquemáticamente em um quadro a seguir:
Quadro 1 – Apresentação das duas etapas para compreensão do desenvolvimento da investigação

Percepções
Fases 1ª Etapa 2ª Etapa
Os acadêmicos em sua maior parte
Os acadêmicos em grande parte
podem passar a expressar
1ª não conseguiram expressar
compreensões sobre a teoria
compreensão a teoria conceitual.
conceitual.

1939
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

79% dos acadêmicos conseguiram


Os acadêmicos em diferentes níveis desenvolver a linha de raciocínio
não apresentaram uma linha de que levasse a um esquema de

raciocínio que levasse a resolução resolução e os outros não
da atividade proposta. conseguiram por não terem tempo
suficiente.
96% dos acadêmicos responderam
Todos os acadêmicos não as atividades confirmando que dos
conseguiram resolver a atividade 21% (5) que não responderam a

proposta nessa fase por depender segunda fase o fizeram pelo fator
das compreensões anteriores. tempo, pois 4 destes atigiram o
objetivo desta fase.
83% dos acadêmicos conseguiram
abstrair mais do que o resultado
Não houve resposta, todas foram
4ª numérico expressando assim o
entregue em branco.
fenômeno de forma mais
generalizada.

4 Conclusão
Pode-se assim concluir que se faz importante novos estudos sobre a Zona de Desenvolvimento
Proximal em contexto também universitário e que esta temática ganhe a preocupação de várias áreas
de estudo principalmente as que se referem ao ensino e aprendizagem, uma vez que esta discussão
atrai não somente por sua questão conceitual teórica, mas também por sua possibilidade de
compreensão de caminhos a serem seguidos no entendimento de problemas relacionados a práticas
educacionais. Este estudo possibilita compreender que as relações sociais entre os pares de um
mesmo composto acadêmico podem ser o caminho para que muitos discentes superem as lacunas
existentes no conhecimento real sobre a física no âmbito dos primeiros contatos com as disciplinas da
física em contexto universitário.
Desta forma, chega-se a dois impasses um de que os professores precisam ter clareza de que o
discente ao entrar não possui o nível real de desenvolvimento que os docentes acreditam que ele
tem e outro de que a interação com pares mais experientes podem levar a maturação de funções
psicológicas permitindo que os discentes cheguem à próxima etapa com maior êxito, observando
assim como o acadêmico que acaba de entrar no curso é levado a mudanças estruturais na
organização de suas funções no momento em que estes se envolvem em tarefas específicas.
Assim, pode-se inferir que a valorização das relações entre os pares pode ser um caminho a amenizar
os problemas de dificuldade da aprendizagem da Física tendo como base o aporte da Zona de
Desenvolvimento Proximal. Pode-se constatar que tanto a didática como as metodologias dos
professores de Física em contexto universitário precisam levar em conta a zona de desenvolvimento
real dos alunos quando iniciam as disciplinas, assim, como a importância que as monitorias e grupos
de estudos com alunos mais experientes possam ter para o sucesso das aprendizagens da física,
evitando o elevado número de reprovações e evasão nos cursos de física ou que tenham disciplinas
da física em sua construção curricular.
5 Referências
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1941
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El cuestionamiento de los criterios de cientificidad desde las


historias de vida:
el sentido de utilidad para las personas.

Ana Arraiz Perez1, Fernando Sabirón Sierra1, Magdalena Suárez-Ortega2


1
Departamento de Ciencias de la Educación de la Universidad de Zaragoza, España. aarraiz@unizar.es;
fsabiron@unizar.es
2
Departamento de MIDE Universidad de Sevilla, España. msuarez@us.es

Resumen. Se presenta el sentido de credibilidad, transferencia, dependencia, confirmación y utilidad como


criterios de cientificidad en investigación cualitativa. Se presentan los criterios partiendo del sentido clásico
de validez, exponiendo y razonando el cambio. Se detalla cómo se han aplicado en una investigación sobre
emprendimiento con método narrativo. Para la discusión, se presenta el sentido atribuido y cómo se ha
resuelto: a) respecto a la credibilidad, la construcción compartida del relato; b) para la transferencia, la
trayectoria vital de la persona informante; c) la dependencia, en relación con el análisis categorial; d) la
confirmación con la restitución del relato y resultados a la persona informante; y e) la utilidad, por el análisis
estructural que permite las historias de vida. A modo de conclusión, se indaga sobre este último criterio,
sobre el cómo, en qué sentido y con qué compromiso resultan útiles las historias de vida para la formación
de las personas.
Palabras clave: Investigación etnográfica; historias de vida; cientificidad; utilidad; emprendimiento.

The questioning of the scientificity criteria from the life stories: The sense of usefulness to people.
Abstract. The sense of credibility, transference, dependence, confirmation and utility as scientific criteria in
qualitative research are presented. Criteria are exposed based on the basis of the classical sense of validity,
exposing and reasoning the change. Details on how they have been applied in a research on
entrepreneurship with the narrative method are specified. For the discussion, the attributed sense is
exposed as well as how it has been resolved: a) about the credibility, the shared construction of the
narrative; (b) for the transference, the vital career of the reporting person; (c) the dependency, in relation
with the categorial analysis; (d) the confirmation with the restitution of the story and the results to the
reporting person; and, e) the utility, by the structural analysis that allows the life stories. As a conclusion, it
is investigated this last criterion, about how, in what sense and commitment to what are useful for life
stories for the people’s training.
Keywords: Ethnographic research; life stories; scientificity; utility; entrepreneurship.

1 Introducción

En la anterior edición CIAIQ2016, se presentaba una comunicación sobre el cuestionamiento de la


investigación etnográfica desde las historias de vida, planteando una cuestión para la discusión,
¿pueden los informantes cuestionar los referentes epistemológicos y axiológicos de la etnografía?
(Sabirón, Arraiz, Suárez, & Gálvez, 2016). De una investigación en curso, y a partir –básicamente– del
análisis de diez historias de vida de emprendedores1, emergían cuatro dilemas: a) en relación con el

1 Proyecto I+D sobre Diseño de la carrera y gestión del talento emprendedor Financiado por el Ministerio de Economía y
Competitividad de España en la convocatoria de 2013 Plan Estatal 2013-2016 Excelencia, con Referencia: EDU2013-
45704-P, Coord. Magdalena Suárez-Ortega, Universidad de Sevilla. Web http://transitions.careers/. En síntesis,
recuérdese que: “El proyecto se desarrolla en tres fases encaminadas a la delimitación de las necesidades formativas y
factores motivacionales en el emprendimiento: Una primera, de carácter extensivo, que recoge información
fundamentalmente cuantitativa (encuestación, indicadores). En la segunda fase, se realiza una aproximación más

1952
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

compromiso ético de la investigación etnográfica, los “outsiders” (los “sin voz”) que seguían
excluidos por el tema de estudio (las historias de vida de emprendedores excluye a los no-
emprendedores); b) respecto al acercamiento del investigador a la narración del investigado, se
seguía produciendo una comunicación entre desiguales (el conocimiento teórico del tema, el propio
juego de roles, etc. imponía una “desigualdad” comunicativa entre el informante y el investigador); c)
el análisis temático y categorial limitaba el potencial de cambio de las historias de vida (finalmente,
es el investigador quién establece la categorización); y por último, d) la escritura, la difusión, bajo
unos academicismos reñidos –en nuestro caso– con el relato de la persona que nos cuenta su vida.
Basándonos en la continuidad del proyecto, incorporando nuevas historias de vida, y analizando los
criterios de cientificidad, de nuevo las historias de vida matizan el sentido de la propia cientificidad
del estudio contemplada desde las reglas de la investigación cualitativa y etnográfica.

2 Los criterios de cientificidad en investigación cualitativa y etnográfica

Conforme a lo largo del siglo pasado se han ido conjugando en plural los diferentes métodos,
metodologías y modalidades de investigación, el sentido de cientificidad ha ido evolucionando en
paralelo (tabla 1).

Tabla 1. La evolución de los criterios de cientificidad (Sabirón & Arraiz, 2014)

Cientificidad clásica: Cientificidad alternativa: Cientificidad educativa:


el rigor el rigor y la honradez el rigor, la honradez y la
ética
Validez interna Credibilidad
(coherencia) (verosimilitud)
Validez externa Transferencia
(isomorfismo) (contextualización) Utilidad
Validez estadística Dependencia (praxis)
(significación) (estabilidad) Compromiso
Validez de constructo Confirmación (personas)
(representatividad) (prevalencia del dato)

Certeza Veracidad
(replicabilidad) (relativa)
Objetividad Subjetividad
(prevalencia del método) (prevalencia del proceso)
La Complejidad
Pensamiento (dialéctico)
Comportamiento (dialógico)

Los parámetros clásicos establecían los cánones científicos y de demarcación disciplinar desde la
experimentación, la explicación causal, la predicción y generalización. El criterio científico por
excelencia se condensaba en el rigor de los resultados caracterizados por la posibilidad de replicar la
demostración, pero sobre todo por la atribuible objetividad de los mismos. El proceso de

intensiva y focalizada, con una perspectiva cualitativa, a las trayectorias de emprendedores consolidados y en transición,
que permita completar el conocimiento de los factores motivacionales y relacionados con la gestión de la propia carrera.
La tercera y última fase pretende diseñar, aplicar y monitorizar una propuesta de intervención proponiendo un modelo
para el desarrollo de la carrera y la gestión del talento emprendedor. Las historias de vida constituyen la parte sustancial
de la segunda fase” (Sabirón, Arraiz, Suárez, & Gálvez, 2016, pp. 807-808).

1953
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

investigación quedaba salvaguardado por los diferentes tipos de validez-invalidez (Cohen, Manion, &
Morrison, 2001): de la inicial distinción entre validez interna y externa, a la validez estadística, o
validez de constructo. Bajo estos criterios, las historias de vida y cualquier modalidad de
investigación próxima a los datos cualitativos quedaba o bien invalidada, o bien recluida a saber
científico residual. En nuestro ámbito socioeducativo, sin embargo, la «objetividad» como criterio de
cientificidad resulta no-pertinente a la naturaleza eminentemente subjetiva de los temas de
investigación, como la generalización se opone a la singularidad de las personas, sujeto central en
nuestro campo. Tan es así que, a los criterios clásicos de validez, se incorporan –a través de la
«validez ecológica» como puente– sentidos complementarios de cientificidad (Sabirón & Arraiz,
2014). Primero, se regula la naturaleza y el tratamiento cualitativo de los datos a través de los
criterios de «dependencia» y «confirmación». El estudio de caso logra el reconocimiento científico
con los criterios de «credibilidad» y «transferencia». La «certeza» científica deja paso a la
«veracidad» de los resultados, y la prevalencia del método se sustituye por la prevalencia del proceso
en el que las personas son protagonistas, en tanto que investigadoras e investigadas. Las historias de
vida, bajo estos criterios, recobran el valor científico de origen vinculado a la Escuela de Chicago. Esta
«cientificidad alternativa» da pie a una mayor concreción de la «cientificidad educativa»: la
«utilidad» vinculada al «compromiso» y la implicación del investigador para con las personas
(Lapassade, 1995); así como el papel relevante de la ética añadido al rigor y la honradez. Las historias
de vida son un ejemplo paradigmático de estos criterios científicos, hoy en día ya difíciles de
cuestionar (Arraiz, Azpillaga, & Sabirón, 2016). En el proyecto sobre emprendimiento, las historias de
vida resultan paradigmáticas porque hacen chirriar el rigor clásico, en tanto que ejemplifican la
honradez y la ética de la persona, transmutada en ciencia formativa y comprometida.
La Complejidad, finalmente, con la vertebración entre pensamiento y acción que supone el
“pensamiento complejo” (Morin, 1998), realza la vertiente formativa de las historias de vida en
investigación, por la utilidad y el compromiso con la formación de la persona a lo largo de la vida. Las
historias de vida ejemplifican y nos enseñan la dimensión humanista en educación. El valor humano
del testimonio que ofrecen las historias de vida; más allá de la cientificidad, del método, del análisis,
de los resultados, está la complicidad personal que se trama, a lo largo de la construcción de una
historia de vida, entre personas que dialogan. El aforismo de cómo la narración compartida
construye una realidad intersubjetiva (Berger & Luckman, 1991) se reifica con cada historia de vida.

3 Los matices en el sentido de utilidad para las personas.

La cuestión epistemológica, metodológica –pero también ética– que se plantea en la investigación


sobre emprendimiento es qué ocurre cuando se incorporan las historias, en una de las fases del
proyecto, y junto a otro tipo de diseños (encuestación, por ejemplo)2: ¿cumplen las historias de vida,
y sobre todo en qué sentido, los criterios comunes al conjunto de la investigación?; es decir,
¿resultan transferibles los criterios de cientificidad de la investigación cualitativa y etnográfica al
método narrativo?, ¿introducen las historias de vida matizaciones en el sentido de cientificidad
etnográfica?; y si así fuere, ¿qué plus añaden tales matizaciones? (tabla 2). Para indagar sobre estas
dudas, se ha seguido una secuencia metodológico-evaluativa, a lo largo del proceso, y diferenciada
en tres momentos progresivos: 1) En primer lugar, la aplicación de los criterios de cientificidad
consolidados para la investigación cualitativa, y en particular, la dependencia y confirmación, propios
del análisis categorial a partir de la “teoría fundamentada en los hechos” (Glasser, 1992). 2) En
segundo término, se trataba de profundizar sobre uno de los criterios más cuestionados, el relativo a

2 Véase la nota anterior.

1954
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1

la credibilidad. 3) Por último, el paso más complicado, la indagación sobre el plus, sobre el valor
añadido por las historias de vida a la investigación en, por y para la educación; en concreto, y en
nuestro caso, las matizaciones, al criterio de utilidad.
Respecto al criterio metodológico de dependencia, el texto construido a lo largo de la historia de vida
narrada, se somete a distintos ciclos de categorización siguiendo las pautas establecidas por el
“método comparativo constante”, hasta concluir el análisis categorial (intra e inter). La única
salvedad, en las historias de vida, está en reforzar un sentido de saturación no tanto por la cantidad
de registros, sino por el significado intersubjetivo del relato construido y entre las distintas historias
(Arraiz, Azpillaga, & Sabirón, 2016). En el caso del emprendimiento, la dependencia se confirmaba
con la trayectoria emprendedora que revelaba el análisis temático de la persona informante
vinculada, en los hitos, con las categorías emergentes del análisis.
La confirmación viene dada por la restitución al informante que, en las historias de vida, se realiza
tanto a lo largo del proceso de entrevistas, como en la versión final del texto elaborado; así como por
la devolución y valoración final de las categorías emergentes del análisis, y del texto que se hace
público. En nuestro caso, la narración de la historia de vida se desarrollaba en tres tandas de
entrevistas en profundidad: una primera abierta y centrada en la narración de la trayectoria; la
segunda tanda, semiestructurada y centrada en el perfil del emprendedor; y la tercera, tras la
redacción del relato por parte del equipo investigador, abierta de restitución y contraste del relato.
Esta última garantiza la credibilidad3.

Tabla 2. La aplicación de los criterios de cientificidad en historias de vida (elaboración propia)

Criterio Técnicas habituales Aplicación en historias


de vida
Credibilidad: grado de – presencia continuada campo CONSTRUCCIÓN DEL
confianza en la verdad – triangulación fuentes RELATO
y verosimilitud de los – contraste informes
datos e informaciones – significado intersubjetivo
Transferencia: de – detallada definición del contexto TRAYECTORIA VITAL
procesos y resultados – registro meticuloso proceso
investigación
Dependencia: valor – tipología de relaciones entre ANÁLISIS CATEGORIAL
que entiende de la categorías
capacidad para – inclusión máximo información
establecer relaciones residual
entre las distintas – consideración presupuestos
categorías investigador)
Confirmación: – triangulaciones y contrastes. RESTITUCIÓN
corroboración – diario investigador
Utilidad: para la – intrínseca ANÁLISIS ESTRUCTURAL
personas – adecuación
– motivar acción
– conocimiento práctico
– potencial de cambio

Respecto a la transferencia, la detallada descripción del contexto que resulta uno de los imperativos
aceptados para lograr este criterio en estudios de caso, se concreta, en las historias de vida, con la

3 Cuando se hace pública la historia de vida, en nuestro caso, y más allá de las condiciones éticas y de anonimato, se
reincide sobre el criterio de confirmación entregando a las personas informantes el texto del artículo. Así se hizo, por
ejemplo, en una investigación análoga a ésta, con historias de vida sobre ciudadanía (Arraiz, Azpillaga y Sabirón, 2016).

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descripción-interpretación de la persona informante. La descripción al detalle que el informante


realiza de las circunstancias existenciales, las decisiones, los significados vitales son ejemplarizantes
y, en este sentido, transferibles; estableciendo una analogía, la persona informante realiza una
“descripción densa” (Geertz, 1988) de las circunstancias y coyunturas que facilitan la comprensión
por un tercero.
Quedan dos criterios, el de credibilidad y utilidad, cuya clave de éxito reside en la construcción del
relato en las historias de vida. Pasar de la transcripción de las entrevistas en profundidad realizadas
con la persona informante que dan pie al relato es un proceso de confianza mutua, incluso de
complicidad, sobre la evidencia constante, por parte del investigador, de cómo el poder lo tiene la
persona que nos narra su vida; y en consecuencia, el formato, los ritmos, el contenido, etc., lo
imprime el informante.
Es el relato de la historia de vida así construido el que confiere credibilidad. La credibilidad en
relación con la complicidad entre la persona que cuenta y el investigador que le da forma. La
complicidad comunicativa a lo largo de las distintas entrevistas en profundidad necesarias para
elaborar una historia de vida, implican una elaboración compartida del relato, del texto narrado, que
da pie al análisis temático y categorial. A lo largo del proceso, los juegos de poder, la negociación de
lo expresado, del sentido atribuido, de los intereses entre los interlocutores, persona informante e
investigador, mejoran la veracidad de los datos, y en consecuencia la credibilidad.
La misma clave en el relato potencia la utilidad de las historias de vida para con las personas. En el
caso que nos ocupa, para con la personalización del emprendimiento, visualizada en una evidencia
emergente: la trayectoria del emprendedor, parte, se desarrolla y evoluciona desde la autoría, desde
la persona y no desde el proyecto más o menos empresarial. Se trata de una personalización
contextualizada, “situada” en términos de aprendizaje (Lave & Wenger, 1991) a la vez que escuchado
por el investigador implicado en desarrollar conocimiento práctico sobre el tema objeto de estudio
(Hernández & Aberasturi, 2014).
El relato de la historia de vida introduce, en este sentido de conocimiento práctico, un último matiz a
la utilidad al permitir interpretar la historia de vida más allá del análisis temático y categorial. Se trata
de comprender el enfoque dramático del relato (Gibbs, 2012), con la puesta en valor de la
escenificación que supone la narración. En nuestro caso, se pretendía indagar para comprender el
significado y el estilo que tiene la identidad emprendedora; cómo enfoca su vida (trama,
hipertextualidad, …); el tipo de discurso (de orgullo por lo que he conseguido, de felicidad y todo me
va bien, el planificador-reflexivo, el aventurero, …); ¿quiénes son los grandes personajes de la
historia?, ¿qué sentido tienen? (padre-hijo, el control absoluto, …). El relato de la historia de vida
recupera así el sentido de ejemplaridad en la cotidianidad de las personas y, en consecuencia,
potencia la utilidad para el día a día, en una coyuntura determinada y bajo unas circunstancias
transmitidas por el sentido de las vivencias implícitas a la trayectoria personal-profesional, que le
aproximan a los referentes de la complejidad.

Conclusión

El argumento transversal sobre el cuestionamiento de los criterios de cientificidad desde las historias
de vida ha sido “el sentido de utilidad” de la investigación con historias de vida para las personas.
Tras revisar los criterios y ahondar en la utilidad, cabe concluir que el plus que las historias de vida le
añaden a una genérica utilidad de la investigación aplicada (como es, en nuestro caso, al
emprendimiento) está en cómo la persona da sentido a su propia trayectoria, con proyección de
futuro. En la historia de vida, la persona informante selecciona, conecta y comunica experiencias. La
expresión, reflexión y reflejo de esas experiencias en el texto narrativo, y en diálogo con la persona
investigadora, facilita la emergencia del sentido conferido. A su vez, este “dar sentido” permite

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elaborar una teorización emergente transferible a contextos, procesos y vivencias análogas;


reflejando, por su carácter holístico, la complejidad de las personas.

Referencias

Arraiz, A., Azpillaga, V., & Sabirón, F. (2016). El aprendizaje de la ciudadanía a lo largo de la vida: un
estudio narrativo desde historias de vida. Pedagogía social. Revista interuniversitaria, 28, 189-
201.

Berger, P., & Luchman, T. (1991). La construcción social de la realidad. Buenos Aires: Amorrortu.

Cohen, L., Manion, L., & Morrison, K. (2001). Research Methods in Education. London: Routledge
Falmer (5.ª ed.).

Geertz, C. (1988). La interpretación de las culturas. Barcelona: Gedisa.

Glasser, B. (1992). Basics of Grounded Theory Analysis. Mill Valley: Sociology Press.

Gibbs, G. (2012). El análisis de datos cualitativos en investigación cualitativa. Madrid: Morata.

Hernández, F, & Aberasturi, E. (2014). Las historias de vida como alternativa para visibilizar los relatos
y experiencias silenciadas de la educaciónn. Tendencias pedagógicas, 24, 133-144.

Lapassade, G. (1995). In Campo. Lecce: Prensa Multimedia.

Lave, J., & Wenger, E. (1991). Situated Learning. New York: Cambridge University Press.

Morin, E. (1998). Introducción al pensamiento complejo. Barcelona: Gedisa.

Sabirón, F., & Arraiz, A. (2014). Compléxité et recherche en éducation. In L. & R. Marmoz (ed.), La
recherche en éducation: pluralité et compléxité, 31-42, Paris: L'Harmattan.

Sabirón, F., Arraiz, A., Suárez, M., & Gálvez, R. (2016). El cuestionamiento de la investigación
etnográfica desde las historias de vida: ¿pueden los informantes cuestionar los referentes
epistemológicos y metodológicos de la investigación etnográfica? In Actas 5º Congreso
Iberoamericano de Investigación Cualitativa, 3, 807-811. Universidade do Porto, Portugal.

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Aprovechamiento de las inteligencias y competencias de


estudiantes: Posibilidades para la investigación formativa en el
entorno universitario.
Luis Eduardo Ruano1, Ernesto Congote1, Andres Torres1, Fabio Castaño1, Yina Tocoche2
1
Programa de Psicología, Universidad Cooperativa de Colombia, Sede Popayán, luiseruano@gmail.com;
ernesto.congote@hotmail.com; andretocap@hotmail.com; Fabio.castano@ucc.edu.co
2
Programa de Administración de Empresas, Universidad Cooperativa de Colombia, Sede Popayán,
yina.tocoche@campusucc.edu.co

Resumen. Empleando los grupos de discusión y el análisis sociológico del sistema de discursos, se identifican
categorías tipológicas de estudiantes, que dan cuenta de la relación entre el aprendizaje de las competencias
disciplinares y la presencia de inteligencias manifiestas en los sujetos de aprendizaje. Tomando la
investigación formativa como eje transversal en la educación superior, se sugieren estrategias pedagógicas
orientadas al reconocimiento y enseñanza de habilidades asociadas a la adquisición, comprensión,
transmisión y generación del conocimiento.
Palabras clave: Inteligencias múltiples; inteligencia emocional; competencias disciplinares; estilos de
aprendizaje; modelos de enseñanza.

Use of the intelligences and competences of students: Possibilities for the formative research in the
university environment.
Abstract: Using discussion groups and the sociological analysis of the discourse system, the identification of
typological categories of students, these account for the relationship between the learning of disciplinary
competences and the presence of manifest intelligences in the subjects. Taking formative research as a
transversal axis in higher education, we suggest pedagogical strategies oriented to the recognition and
teaching of skills associated with the acquisition, understanding, transmission and generation of knowledge.
Key Words: Multiple Intelligences, Emotional Intelligence, Disciplinary Competences, Learning styles,
teaching models.

1 Introducción

Se caracterizan las alternativas de aprovechamiento de las inteligencias múltiples e inteligencia


emocional, en estudiantes universitarios de primer ciclo de formación, identificando tipologías de
estudiantes, que dan cuenta de la relación entre el aprendizaje de las competencias disciplinares y la
presencia de determinadas inteligencias manifiestas en los sujetos de aprendizaje, para el caso expreso
de dos programas de educación superior en una Universidad Colombiana.
De acuerdo con Jerome Bruner (1973), a través de la educación, las sociedades enseñan lo que
consideran importante que aprendan los individuos; es decir, aquellos conocimientos, métodos y
técnicas que puedan ser utilizados para resolver problemas o conservar la estructura social. De este
modo, la educación está sujeta al contexto social, y la inteligencia, aunque es propia del individuo, se
cultiva en la sociedad.
“La Universidad tiene la obligación de rescatar su esencia como espacio para el debate, la formación,
la investigación y la proyección de su saber científico y cultural a la sociedad” (Corredor, 2010, p. 41).
Es importante tener presente, que las distintas inteligencias que poseen los jóvenes son
fundamentales en la adquisición de nuevo conocimiento y es pertinente proponerlas como parte de
una estrategia educativa, que reconoce no solo la importancia de la investigación en los nuevos

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profesionales, sino la multiplicidad de inteligencias a favor de la investigación científica en estudiantes


universitarios.
El artículo presenta cuatro categorías tipológicas (Conocedor, Perplejo, Moldeable y Explorador), que
caracterizan a los sujetos-estudiantes, según las competencias disciplinares e inteligencias
emocionales y múltiples que poseen. Al relacionar las capacidades de los estudiantes con los
requerimientos de su disciplina de estudio, se sugieren estrategias pedagógicas orientadas al
reconocimiento y enseñanza, desde la singularidad discursiva manifiesta en cada tipología.

2 Aproximación teórica

De acuerdo con Howard Gardner (2001), la inteligencia se define como la capacidad que posee un
sujeto para razonar en forma crítica, resolver problemas y tomar decisiones que se le presentan en los
diferentes contextos en los que se desenvuelve. El mismo, propuso cambiar el enfoque tradicional con
el que muchos educadores se enfrentan al proceso de enseñanza/aprendizaje, al reconocer que cada
estudiante posee habilidades e inteligencias únicas, las cuales influyen en su disposición para el
aprendizaje.
La teoría de Gardner parte de dos principios básicos: la idea de que todas las personas poseen al menos
ocho formas diversas de inteligencia, y la posibilidad que tiene cada persona para potencializar sus
inteligencias sobresalientes (manifiestas), para fortalecer otras que se encuentran en un estado menos
avanzado (dinámicas). De este modo, afirma que “La inteligencia es multifacética y dinámica y se
expande más allá de la capacidad lingüística y lógica que tradicionalmente son probadas y evaluadas
en las escuelas” (Inciarte y Gonzales, 2012. Pág. 182).
Según el análisis de la multiplicidad del intelecto, todos los seres humanos son capaces de conocer el
mundo a través del lenguaje, el análisis lógico matemático, la representación espacial, el pensamiento
musical, uso del cuerpo para resolver problemas, la comprensión de los otros, la reflexión interna y el
contacto con la naturaleza. De este modo, en la teoría de las Inteligencias Múltiples, Gardner plantea
ocho tipos de inteligencias, específicas e independientes, que las personas pueden desarrollar en
mayor o menor medida a través de la práctica recurrente. Considerando las características de una, es
posible categorizar las inteligencias propuestas en tres grupos: inteligencias básicas (lingüística, lógico
matemática, naturalista), inteligencias complementarias (musical, corporal-kinestésica, viso-espacial),
e inteligencias transversales o emocionales (interpersonal e intrapersonal).
Las inteligencias básicas, ocupan un lugar relevante en todos los niveles educativos, debido a que
posibilitan la adquisición y uso del lenguaje, el razonamiento lógico y la consciencia ambiental,
necesarias para desarrollar los contenidos de diferentes disciplinas. Las inteligencias complementarias,
se desarrollan paralelamente a las inteligencias básicas, aunque se practican con menos frecuencia,
debido a que las habilidades relacionadas, varían su importancia dependiendo del objeto de estudio,
el énfasis de las instituciones de educación y la disposición natural de los sujetos hacia ellas. Las
inteligencias transversales o emocionales, posibilitan las habilidades sociales y el autoconocimiento,
están siempre presentes en los sujetos y aunque requieren de la práctica para consolidarse, se
desarrollan naturalmente en el proceso de interacción con los otros.
Paralelo al planteamiento de las inteligencias múltiples, Daniel Goleman (1996), introduce el concepto
de Inteligencia Emocional, al evidenciar que las emociones tienen un papel preponderante en la
existencia del ser humano, considerando que las habilidades que cada persona poseen en el
conocimiento y control de sus emociones, influyen en su éxito o fracaso futuro. Para Goleman, la
inteligencia emocional es la habilidad que posee cada sujeto para percibir, asimilar, comprender y
regular las propias emociones y las de los demás, promoviendo un crecimiento emocional e intelectual;
para él, este proceso se caracteriza por desarrollar la automotivación, la tolerancia a la frustración, el

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control de impulsos, la regulación de los propios estados de ánimo, así como la capacidad de generar
empatía y confianza con los demás.
Como refieren Inciarte y Gonzales (2012), la teoría de la inteligencia emocional de Goleman, guarda
relación con las inteligencias intrapersonal e interpersonal propuestas por Gardner, en el sentido de
que los dos autores aceptan la diversidad en las capacidades intelectuales que las personas poseen;
enfatizan la necesidad de fortalecer las inteligencias menos sobresalientes, armonizando las
inteligencias manifiestas que cada sujeto posee; y manifiestan la posibilidad de cada persona de
conocer y manejar adecuadamente sus emociones.
Contrario a lo que se esperaría –considerando el papel que desempeña la inteligencia emocional en la
vida de las personas--, es ampliamente conocido, que las instituciones de educación media y superior,
tradicionalmente, se enfocan en la inteligencia académica, asociada al coeficiente intelectual, el cual,
en palabras de Goleman, tiene poco que ver con la vida emocional (1996). Más allá de este hecho,
existen formas de influir en las inteligencias que los estudiantes desarrollan en su proceso de
formación, sobre todo en lo referente a la inteligencia emocional, entendiendo que el contexto
despliega la mente (Bruner, 1982), y la práctica estimula el incremento de la capacidad. Así; la
inteligencia emocional, además de estar presente en los estudiantes de todos los niveles educativos,
ejerce una influencia significativa en la motivación, socialización y establecimiento de mentas, que
podría determinar el éxito o fracaso de los mismos.
Reflexionando sobre el papel que desempeñan las instituciones educativas en la formación de los
estudiantes, se plantea que “La cuestión más importante de la universidad actual es su adaptación a
los cambios que la sociedad exige, tanto en relación a las enseñanzas que imparte como a la
investigación que realiza” (Josep Bricall citado por Arango, 2004). Así, la educación se convierte en una
forma de profundización del saber, donde el objetivo principal, consiste en fortalecer las capacidades
o inteligencias manifiestas en los estudiantes, procurando la adquisición de conocimientos y
competencias disciplinares específicas; de este modo, los estudiantes generarán una mayor
disposición y compromiso frente al proceso de enseñanza-aprendizaje.

3 Metodología

Se presenta un estudio de corte cualitativo, desarrollado a partir del Análisis Sociológico del Sistema
de Discursos (Gutiérrez del Álamo, 2010). El corpus de análisis, está compuesto por 4 grupos de
discusión mixtos con moderación no directiva, en los que participaron estudiantes de 1 y 2 semestre,
de los programas de Psicología e Ingeniería de sistemas de la Universidad Cooperativa de Colombia.
Una vez transcritos los grupos, se procedió a una primera revisión por parte de los investigadores, que
realizaron apuntes y comentarios, un primer análisis manual (Valles, 2009). Seguidamente haciendo
uso del software de análisis cualitativo Atlas.Ti 7, se aplicó la técnica de microanálisis, un detallado
análisis, línea por línea, necesario al comienzo del estudio para generar categorías iniciales (con sus
propiedades y dimensiones) y para sugerir las relaciones entre ellas; combinación entre codificación
abierta y axial (Corbin & Strauss, 2002).
Mediante el software (Atlas.Ti 7) se realizó la lectura y codificación en cada uno de los grupos de
discusión, cada cita se vincula respectivamente en el texto con uno o varios de los códigos deductivos.
Seguido a la codificación abierta, se plantea la codificación axial que enlaza las categorías en cuanto a
sus propiedades y dimensiones, en este sentido, se busca que los datos obtenidos en la codificación
deductiva puedan ser reagrupados, analizados y relacionados en busca de explicar la relación entre
categorías (percepción, conocimiento del entorno de aprendizaje, reconocimiento emocional y
solución de problemas).

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Las categorías, son analizadas individualmente, para posteriormente reagruparlas a partir de familias
y redes semánticas de sentido (Atlas.Ti), estas permiten interconectar las citas de las categorías, darles
sentido y sustentarlas teóricamente en tipologías. La identificación de tipologías que responden a
diferentes espacios de la estructura educativa, posibilita la obtención de una muestra de tipo
estructural que representa distintas posiciones discursivas. Se busca una representatividad estructural
que no tiene como propósito la generalización de resultados. Entre tanto, desde esta perspectiva, se
explora “la reconstrucción del sentido de los discursos en su situación micro y macro social de
enunciación”.
Considerando que este análisis parte desde unos niveles más básicos de interpretación hasta unos
niveles más complejos de reconstrucción del sentido de los discursos, como veremos a continuación,
se parte de un modelo central que considera ejes y perfiles, pasando posteriormente a un análisis
semiótico-estructuralista, que luego se complementa en una dimensión más bien pragmática o
interpretativa del contexto, condensada en una matriz de relaciones estructurantes.
El modelo de análisis constituye el componente central que orienta los resultados de la investigación.
Se presentan cuatro tipologías de sujetos-estudiantes de educación superior, estas describen
posiciones discursivas y actitudes asociadas con las inteligencias múltiples, inteligencia emocional,
competencia emocional y competencias disciplinares con las que cuenta cada sujeto para solucionar
problemas y desarrollar eficazmente su proceso de formación académica.
En la parte superior del esquema se sitúan los sujetos que poseen una serie de inteligencias múltiples
y competencias emocionales (Perplejo y Conocedor), caracterizados por reconocer sus capacidades y
disponer de sus habilidades emocionales para solucionar problemas. En la parte inferior del esquema,
se encuentran los sujetos que poseen pocas inteligencias múltiples y desconocen sus competencias
emocionales (Explorador y Moldeable), abiertos a descubrir sus inteligencias a partir de estímulos
externos y experimentar mayores dificultades para solucionar problemas en el entorno de aprendizaje.
El eje horizontal de izquierda a derecha propone observar de menor a mayor, la presencia de
inteligencias múltiples y comprensión de competencias disciplinares.

Fig. 1.

Fig. 1. Tipología de inteligencias y competencias para la investigación, cada tipo se correlaciona con uno o más ejes. El
eje X representa la inteligencia emocional y las competencias disciplinares, el eje Y representa las inteligencias múltiples y
las competencias disciplinares.

Seguidamente se plantea una Matriz de Pares sémicos y Ejes estructurantes. Esta parte del análisis,
propone diferenciar las características asociadas a cada tipología, de tal modo que permita identificar
aquellos pares sémicos que incorporan de mejor forma el resto de los códigos de oposición. Se ha
ubicado en la primera parte de la lista a modo de referencia, el par Conocedor-Explorador, por ser las

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tipologías que se contraponen de forma más radical en el modelo central, a diferencia de los tipos
Moldeable y Perplejo que pueden ser considerados de transición. Así, el resto de oposiciones creadas
a partir de esta distinción inicial, formarán parte de las propiedades que caracterizan cada tipología.
Luego de la revisión de las oposiciones estructurales más importantes en relación a cada categoría de
análisis, se determina que los pares sémicos que mejor representan al conjunto de oposiciones son:
Sujeto Conocedor (a) _______ (b) Sujeto Explorador.

Tabla 1. Pares Sémicos y Ejes Estructurantes

Ejes Conocedor Explorador

Percepción de las Considera que las inteligencias que posee, son la base para Desconoce las inteligencias que
inteligencias aprehender otras relacionadas con las competencias posee e ignora cuáles son las
disciplinares requeridas en su carrera. competencias disciplinares
requeridas en su proceso de
formación académica.
Conocimiento del Elige su carrera universitaria con base en el conocimiento Elige su carrera sin conocimiento
entorno de previo del objeto de estudio. Identifica los contenidos y del objeto de estudio. Su criterio de
aprendizaje exigencias del programa, así como las áreas en las que elección se fundamenta en la
podría desempeñarse profesionalmente. Fortalece las posibilidad de continuar sus
inteligencias para las que tiene una disposición natural y estudios en cualquier disciplina sólo
desarrolla otras que demandan esfuerzo, pero son para obtener un título profesional.
indispensables en su campo de formación.
Reconocimiento Conoce sus fortalezas y debilidades, tiene claridad sobre lo Desconoce sus emociones, no
emocional que desea profesionalmente, lo que le permite orientar y encuentra alternativas para
mantener su motivación, así como superar las adversidades. sobrellevar situaciones frustrantes,
se muestra ambivalente y cambia
de parecer conforme las
circunstancias del contexto.
Solución de Resuelve sus problemas de manera sistemática; Toma decisiones impulsivas de
problemas considerando las alternativas, consultado diferentes fuentes acuerdo a las emociones del
y evaluando los resultados de sus decisiones. momento, emplea la técnica de
ensayo y error, puede equivocarse
muchas veces antes de identificar el
origen del problema.

Para dar continuidad al análisis, se plantea de manera conjunta un análisis comparativo de las
categorías para cada perfil, a través de una Matriz de Oposiciones Estructurantes, allí se extraen
aquellas unidades de sentido que representan los discursos predominantes de cada categoría.

Tabla 2. Posiciones estructurantes.

Ejes Conocedor Perplejo Moldeable Explorador


Percepción de Desarrolla las Fortalece sólo las Desarrolla sólo No conoce sus
inteligencias inteligencias que posee y inteligencias que posee algunas inteligencias y se le
adquiere otras ignorando otras que inteligencias dificulta desarrollar
fundamentales en su son fundamentales en indispensables en competencias
formación académica. su formación su formación asociadas a su
académica. académica. formación
académica.
Conocimiento Conoce con anticipación Conoce Se entera de las No tiene claro cuál
del entorno de el objeto de estudio, sus superficialmente el competencias es el objeto de
aprendizaje inteligencias principales objeto de estudio. Sus disciplinares, estudio de su
se relacionan con las inteligencias durante el proceso carrera, ni las
competencias principales no se de formación e competencias

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disciplinares requeridas relacionan intenta adquirir disciplinares


en su carrera. completamente con las inteligencias requeridas para su
competencias acordes. formación.
disciplinares.
Reconocimiento Identifica los factores Identifica algunos de Reconoce los Desconoce cuáles
emocional emocionales que lo los factores factores son sus emociones
afectan su rendimiento emocionales que emocionales que e ignora la relación
académico e intenta afectan su rendimiento afectan su que existe entre las
superarlos. académico, pero se rendimiento mismas y las
resiste a generar un académico, pero no dificultades
cambio. sabe cómo lidiar académicas.
con ellos.
Solución de Soluciona sus problemas Soluciona sus Busca la orientación Soluciona sus
problemas sistemáticamente, problemas valiéndose y apoyo de otras problemas por
considerando diferentes de su experiencia e personas para ensayo y error.
alternativas, intuición. solucionar sus
perspectivas y problemas.
conocimiento del
problema.

Finalmente, la Matriz de Relaciones Estructurantes, constituye el esquema que permite dar cuenta en
primer lugar, de la capacidad explicativa que tienen las categorías de análisis, que se sugieren a priori
como esquema inicial, las cuales permiten acoplar de forma coherente el sistema de relaciones
discursivas observadas.

Fig. 2. El esquema presenta las posiciones discursivas que identifican a los sujetos al interior de las tipologías

En el esquema a partir de las categorías, se definen tipos discursivos por tipología. En la migración
discursiva, el sujeto perplejo que revela un discurso de selectividad, puede tornarse conocedor si utiliza
sus competencias emocionales y sus inteligencias múltiples para fortalecer su inteligencia emocional
y sus competencias disciplinares; el sujeto conocedor que se representa por medio de un discurso de
autonomía, puede convertirse en sujeto moldeable, si descuida su inteligencia emocional y sus
competencias emocionales, e ignora cómo seguir desarrollando sus inteligencias múltiples; el sujeto
moldeable que representa un discurso de dependencia, puede asumirse como explorador si pierde de
vista sus competencias disciplinares, y finalmente, el sujeto explorador con discurso de ambivalencia,
puede transformarse en un sujeto moldeable si descubre sus competencias disciplinares. La práctica
de las inteligencias y competencias a través de la investigación formativa, aparece como un elemento
catalizador para el aprendizaje.

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4 Análisis

Considerando las categorías de análisis (percepción, conocimiento del entorno de aprendizaje,


reconocimiento emocional y solución de problemas), se realiza una aproximación a cada una de las
tipologías, para caracterizar y distinguir las posiciones discursivas asociadas a cada una. Los datos que
se presentan, corresponden a la información recabada en los grupos de discusión.
Los conocedores, poseen diversas inteligencias múltiples, que se relacionan con las competencias
disciplinares requeridas en su entorno de aprendizaje; reconocen el papel que sus emociones
desempeñan en el éxito o fracaso académico, y disponen de sus competencias emocionales para
solucionar problemas. Conocen a profundidad el objeto de estudio de su disciplina antes de ingresar a
ella, se interesan por complementar los conocimientos adquiridos a lo largo de su proceso de
formación, mostrándose reflexivos, responsables y autónomos en sus aprendizajes.
El fragmento que mejor representa la tipología se obtiene del Sujeto 2, del segundo grupo de discusión.
“Creo que los estudiantes somos los principales responsables de nuestro aprendizaje, el profesor es
sólo, sólo un orientador, y su función es identificar las capacidades de sus estudiantes para reforzar
aquello en lo que somos fuertes, y fortalecer aspectos en los que somos débiles; sin embargo, estas
capacidades deben estar orientadas a la carrera. Antes de entrar a estudiar, yo ya sabía que me gustaba
la ingeniería de sistemas, hice un técnico en sistemas y en mi tiempo libre diseñaba cosas simples en
mi computadora”.
Los sujetos conocedores, prefieren desempeñar un papel activo en su proceso de aprendizaje, las
actividades relacionadas con investigación formativa despiertan su interés, pues les motiva resolver
problemas, complementar los conocimientos que poseen y descubrir nuevas formas de mejorar sus
habilidades. En este sentido, los estilos de enseñanza con los que generan una mayor disposición
provienen de la teoría del constructivismo y el aprendizaje por descubrimiento.
De acuerdo con la teoría constructivista de Piaget (1976), el aprendizaje es un proceso interno de
construcción, donde el individuo participa activamente adquiriendo estructuras cada vez más
complejas, a los que este autor denomina estadios. Sus postulados se basan en que el aprendizaje es
un proceso activo, en el cual los aprendices construyen nuevas ideas o conceptos basándose en
conocimientos previos. Desde el enfoque de formación en investigación, el docente debe procurar
insertar a este tipo estudiante en actividades donde deban seleccionar y transforma la información,
construir hipótesis y tomar decisiones, amparados en una estructura cognitiva. La estructura cognitiva
se constituye de esquemas o modelos mentales, que conceden significado y organización a las
experiencias, y permiten al individuo ir más allá de la información dada (Bruner, 1973).
Por otro lado, el aprendizaje por descubrimiento, se desarrolla a través de un proceso significativo de
resolución de problemas; se fundamenta en la disposición intencional del sujeto hacia la comprobación
de hipótesis que incorporen una comprensión de la relación medios-fin. Desde esta perspectiva, el
aprendizaje no procede por secuencias inductivas derivadas de la observación, sino a través de un
proceso constructivo de comprobación de teorías, basado en la coordinación de acciones que el sujeto
ejerce sobre la situación problemática planteada (Ausubel, 1983).
Los Perplejos, poseen diversas inteligencias múltiples, a partir de las cuales desarrollan su proceso de
aprendizaje; adquieren sólo las competencias disciplinares que se relacionan directamente con sus
inteligencias manifiestas, se les dificulta reconocer el papel que sus emociones desempeñan en su
éxito o fracaso académico, y recurren a competencias emocionales limitadas para solucionar
problemas. Tienen un conocimiento parcial del objeto de estudio de su disciplina, y profundizan sólo
en los conocimientos que perciben cómo indispensables de acuerdo a sus intereses personales; se
muestran selectivos e inflexibles frente al aprendizaje de conocimientos distintos a sus inteligencias
manifiestas.

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El fragmento que mejor representa la tipología se obtiene del Sujeto 5, del segundo grupo de discusión.
“Creo que los profesores deben conocer las capacidades de los estudiantes, y enfocarse en desarrollar
aquellos aspectos en los que son más fuertes, para que alcancen su potencial máximo. Pienso que, si
me concentro en fortalecer mis debilidades, voy a terminar descuidando aquello en lo que soy fuerte
y al final no seré ni bueno ni malo. Antes de entrar a la carrera, yo había hecho un curso de animación
digital, a mí me gustaba mucho dibujar y modelar personajes y mi hermano me convenció de que la
ingeniería de sistemas era más o menos así, luego llegué acá y descubrí que era totalmente distinto
(guarda silencio), en las clases relacionadas con diseño soy muy bueno, en otras relacionadas con
desarrollo de software o cálculo no tanto… (risas) pero ya estoy aquí y tengo que seguir adelante.”
Los sujetos perplejos, recurren a sus repositorios mentales, para adquirir otros conocimientos; debido
a esto, asocian los conceptos nuevos con sus inteligencias manifiestas y experiencias previas. El estilo
de enseñanza con el que los sujetos perplejos generan mayor disposición proviene del aprendizaje
significativo, el cual, según David Ausubel (1983), es un proceso de adquisición de conocimientos,
donde el estudiante constantemente reajusta, reconstruye y relaciona la información que se le
presenta, con aquella que posee con anterioridad.
El proceso de aprendizaje, debe incorporar elementos de investigación formativa donde sea posible
un proceso de representación, se requiere enfatizar los aspectos más relevantes de los conceptos que
se pretende enseñar, relacionarlos con situaciones conocidas para el estudiante y generar situaciones
que permitan evidenciar la utilidad (el sentido o lógica) que el aprendizaje tiene para sus vidas.
Los Moldeables, se esfuerzan por adquirir las inteligencias indispensables en su entorno de
aprendizaje; están abiertos a descubrir sus capacidades, se les dificulta reconocer el papel que
desempeñan sus emociones en su éxito o fracaso académico, así como recurrir a sus competencias
emocionales para solucionar problemas. El conocimiento que tienen del objeto de estudio antes de
ingresar a una disciplina, se limita a sus expectativas personales; su aprendizaje depende
principalmente de estímulos externos, por lo que adquieren conocimientos en la medida en que se les
brinda herramientas, motivaciones y pautas para hacerlo.
El fragmento que mejor representa la tipología se obtiene del Sujeto 7, del segundo grupo de discusión.
Pienso que aparte de lo que (los profesores) tienen que enseñarnos, (deberían enseñar otras cosas);
no solamente tratar de enseñarnos diciendo “a través de esto se llega a este resultado”, sino también,
como con el hecho de motivarnos, con algo como …ehh…(silencio)… “muchachos si ustedes logran ser
buenos profesionales van a tener la posibilidad de cambiar el mundo”. Entonces el hecho de pensar
más allá de simplemente “vas a graduarte y van a pagarte por tu trabajo”, pensar más allá que uno
sólo puede montar una empresa o ser empleado de las personas te hace sentir que puedes hacer
grandes cosas”.
Los sujetos moldeables, requieren mayor dirección en su proceso de aprendizaje, los procesos de
investigación formativa solo producen efectos positivos en ellos, si favorecen estilos de enseñanza
colaborativos, donde se realizan actividades grupales, presentación de ejemplos concretos que van de
lo simple a lo complejo, trabajos de campo y prácticas recurrentes sobre los conceptos que
representan mayor dificultad. Desde la teoría de la Zona de Desarrollo Próximo/Potencial, propuesta
por Vigotsky (1931), el aprendizaje es principalmente una construcción social, donde cada sujeto posee
conocimientos propios que construye y reconstruye en su interacción con los otros.
El papel del maestro juega un rol fundamental en la formación de los moldeables, pues el contacto
que estos sujetos tienen con otro mejor instruido en determinado conocimiento o actividad, promueve
su adquisición del conocimiento, facilita la resolución de problemas y permite la generalización del
aprendizaje; así, aquello que requiera un esfuerzo considerable para un sujeto, al interiorizarse,
posibilita realizar la misma actividad --y otras similares, con menor supervisión o apoyo en el futuro.
Los Exploradores, desconocen las capacidades que poseen, así como las competencias disciplinares
requeridas en su entorno de aprendizaje; se les dificulta reconocer el papel que desempeñan sus

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emociones en el éxito o fracaso académico, e ignoran cuáles son las competencias emocionales que
deben desarrollar para solucionar problemas. Ingresan a su entorno académico sin conocer las
dimensiones del objeto de estudio, pueden migrar a diferentes disciplinas antes de encontrar una en
la que se sientan cómodos, se muestran ambivalentes, distraídos, conformistas o desinteresados; su
aprendizaje se enfoca en la memorización y repetición de determinados conceptos, limitando la
interiorización y entendimiento profundo de los mismos.
El fragmento que mejor representa la tipología se obtiene del Sujeto 9, del segundo grupo de discusión.
“No conocía nada acerca de la carrera hasta que llegué, yo quería estudiar algo relacionado con
deporte o educación física… siempre he sido deportista, me considero un atleta de alto rendimiento
(risas); se me presentó la posibilidad de entrar aquí, me presenté y vi que no había muchos requisitos
para entrar y yo necesitaba estudiar algo (los demás participantes realizan gestos de asombro y
guardan silencio). Algunas materias se me han dificultado bastante, incluso el semestre pasado perdí
varios cortes de cálculo (se ríe), pero pienso seguir estudiando y ver qué pasa”.
En inicio, puede suponerse que los sujetos exploradores, desempeñan un papel pasivo en su proceso
de aprendizaje, pues se les dificulta generar y mantener su motivación, así como resolver problemas.
No obstante, como se ha podido observar en los grupos de discusión, el estilo de enseñanza con el que
generan mayor disposición es el tradicional o memorístico; desde esta perspectiva, autocrática o
directiva, se establecen metas de aprendizaje específicas, que se estructuran en el currículo y se
reafirman con procesos cuantitativos de evaluación. En este sentido, más que insertarlos de manera
directa en procesos de investigación formativa, las instituciones y personal tutor, deben brindarle
alternativas que, desde los métodos tradicionales, les permita asumir tareas que permitan fortalecer
las distintas inteligencias y competencias. La labor principal del docente en este caso, es despertar en
el estudiante la capacidad de asombro y deseo por el conocimiento, se recomiendan el análisis de
experiencias exitosas en temas disciplinares y laboratorios con gran capacidad demostrativa.

5 Consideraciones Finales

Para fortalecer el proceso de inserción a procesos de investigación formativa de los sujetos


conocedores, debe promoverse continuamente la presentación de nueva información y nuevos
problemas de investigación que impulsen el autodescubrimiento de las habilidades que posee el
estudiante, así como reforzar las habilidades orientadas al adecuado desarrollo de su carrera. Los
docentes deben orientar las competencias de los sujetos y promover la libre expansión de sus
habilidades.
La forma en que los docentes desempeñan su trabajo en la educación del sujeto Perplejo, en muchos
casos limita la adquisición de nuevas capacidades, por lo general se enfocan en instruirlos en material
superfluo en el desempeño de su carrera, esto lleva a desvirtuar el objeto de estudio. La metodología
de enseñanza para el estudiante perplejo debe enfocarse en la presentación de la información
necesaria que lleve a conocer a profundidad la carrera que ha elegido, además debe procurar orientar
al sujeto en el reconocimiento de sus emociones y el fortalecimiento de la inteligencia emocional,
siendo el docente el encargado de fortalecer el autoconocimiento tanto de habilidades manifiestas
como complementarias, impulsándolo a fortalecer sus debilidades sin descuidar sus destrezas.
La forma en que los docentes universitarios desempeñan su trabajo, limita las habilidades del
estudiante explorador debido a que presentan información demasiado teórica, que en principio no
tiene mucha relación con las experiencias de vida de los estudiantes. La metodología que debe
implementarse en la enseñanza del estudiante explorador es más directiva; sin embargo, se debe
brindar una asesoría complementaria que facilite descubrir tanto las inteligencias manifiestas, como
las inteligencias dinámicas o menos desarrolladas. El primer paso para trabajar con exploradores,

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consiste en integrar los contenidos disciplinares con las experiencias personales de los estudiantes, sin
que ello signifique abandonar las actividades enfocadas en la de memorización de conceptos que
deben ser aprendidos para alcanzar el éxito en la disciplina. La realización de actividades de interacción
con otros, en su zona de desarrollo próximo, estimulan habilidades de representación y generalización
de la información, lo que dota sus aprendizajes de significado y facilita su interiorización.
En el caso de estudiantes exploradores, generalmente, el problema de base se estructura antes de
ingresar a la universidad, no obstante, un número significativo de docentes universitarios refuerzan
los errores de pensamiento, mostrando poco interés en enseñar algo más que los contenidos
curriculares a sus estudiantes, resaltando sólo algunas capacidades ideales y descuidando otras
complementarias o transversales, y presentando contenidos apartados de la realidad del estudiante,
que no guardan sentido o lógica suficiente como para ser aprendidos.
Finalmente, debe aclararse que las tipologías y categorías expuesta, pueden no expresarse de manera
pura en las realidades escolares, más bien constituyen un ejercicio de representación en el cual las
instituciones pueden inspirarse para reconocer las prácticas y discursos presentes en sus estudiantes,
lo cual a su vez contribuye de manera directa a repensar escenarios investigativos y de aprendizaje,
que estimulen el aprovechamiento de las diferentes inteligencias y competencias que conviven en el
aula de clases.

Agradecimientos. A la Universidad Cooperativa de Colombia, Sede Popayán. Por su gestión, para la realización,
presentación y publicación de este trabajo.

Referencias

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Bruner, J.S. (1973). Beyond the information given: Studies in psychology of knowing. Norton, Nueva
York.

Piaget, J. (1976). Psicología e Pedagogía. Rio de janeiro: Forense-Universitária.

Gardner, H. (2001). Las inteligencias múltiples. España, Madrid. Ed. Paid0s ISBN: 0-465-02510-2

Goleman, D. (1996). Inteligencia emocional. New York. Ed. Kairós, ISBN 84-7245-376-5

Inciarte, I. & Gonzales, O. (2012). Inteligencias múltiples en la formación de investigadores. Venezuela,


Universidad de Zulia. ISSN: 1317-2255

Macias, M. (2002). Las múltiples inteligencias. Colombia, Universidad del Norte. ISSN: 0123-417X

Gutiérrez del Álamo, Fernando Conde. (2010). Análisis Sociológico del Sistema de Discursos. CIS.
España.

Valles. Miguel S. (2009). Técnicas Cualitativas de Investigación Social. Síntesis Sociología. España

Corbin, Juliet & Strauss, Anselm. (2002). Bases de la Investigación Cualitativa. Técnicas y
Procedimientos para desarrollar la Teoría Fundamentada. Editorial Universidad de Antioquia.
Colombia.

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Processos Criativos e Modelagem: uma Investigação Qualitativa

Zulma Elizabete de Freitas Madruga¹ Valderez Marina do Rosário Lima²

¹ Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC, Brasil. betefreitas.m@bol.com.br


² Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, Brasil. valderez.lima@pucrs.br

Resumo. Este artigo apresenta uma pesquisa qualitativa que objetiva verificar as formas como se expressam
as pessoas durante processos criativos, analisando suas relações e comparando-as com os processos de
modelagem matemática. Para isso, utilizaram-se como procedimentos metodológico o mapeamento na
pesquisa educacional, conforme Biembengut (2008), o qual consiste em entender fatos e questões, servir-se
do conhecimento produzido e reordenar setores deste conhecimento. Como resultado apresentam-se as
categorias: Intenção – momento em que há a escolha da temática a ser desenvolvida; Projeção –
familiarização com o assunto, busca por subsídios, quando os primeiros modelos mentais começam a
emergir na mente do criador; Criação – elaboração dos primeiros esboços e, posteriormente, criação,
propriamente dita, do ‘produto’ e/ou modelo; e Produto – momento em que ocorre a validação e avaliação
do modelo criado. Etapas estas similares aos processos de modelagem matemática.
Palavras-chave: Pesquisa qualitativa; processos criativos; modelagem; diferentes culturas.

Creative Processes and Modeling: a Qualitative Research


Abstract. This article presents a qualitative research that aims to verify the ways in which people express
themselves during creative processes, analyzing their relationships and comparing them with the
mathematical modeling processes. For this, the mapping in educational research was used as
methodological procedures, according to Biembengut (2008), which consists of understanding facts and
questions, using the knowledge produced and reordering sectors of this knowledge. As a result, the
following categories are presented: Intention - moment when there is the choice of the theme to be
developed; Projection - familiarization with the subject, search for subsidies, when the first mental models
begin to emerge in the mind of the creator; Creation - elaboration of the first sketches and, later, creation,
properly speaking, of the 'product' and / or model; Product - when the validation and evaluation of the
created model occurs. These steps are similar to the mathematical modeling processes.
Keywords: Qualitative research; Creative processes; modeling; different cultures.

1 Introdução

A valorização das diferentes manifestações culturais é uma indicação dos documentos oficiais para
toda a Educação Básica. Cultura, segundo dicionários de Língua Portuguesa, é considerada um
sistema de ideias, conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes
que caracterizam determinada sociedade. Giroux (1986) afirma que a cultura é um construto para
compreensão das relações complexas entre a escolarização e a sociedade. White e Dillingham (2009)
consideram que o ser humano e a cultura são inseparáveis.
Para Godoy (2015) a cultura, em termos sociológicos, ideológicos e tecnológicos é dependente da
simbolização, que, por sua vez, é dependente do discurso articulado. “A origem da cultura foi
consequência do exercício da capacidade humana de atribuir significado aos símbolos (simbolizar)”
(Godoy, 2015, p. 88). O comportamento cultural trata-se de uma expressão que origina as artes e as
técnicas como manifestações do fazer, integrando à realidade “artefatos e, por outro lado, as ideias,
tais como religião, valores, filosofias, ideologias e ciência como manifestações do saber, que se
incorporam à realidade na forma de ‘mentefatos’” (D'Ambrosio, 1986, p. 47).

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Há pessoas que têm um potencial ou senso criativo inerente, sendo esse expresso em seus fazeres,
fruto de suas origens culturais Diversos autores conceituam processos criativos e criatividade. No
entanto, é comum a ideia do ‘formar’, ‘criar algo novo’. A criatividade é a capacidade de realizar uma
produção que seja simultaneamente nova e adaptada ao contexto na qual se manifesta (Lubart,
2007); (Barron, 1988). Criar é dar forma a algo novo, afirma Ostrower (2004).

Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se, nesse ‘novo’, de novas coerências que se
estabelecem para a mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e compreendidos
em termos novos. O ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender; e esta, por
sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar. (Ostrower, 2004, p.9).

Para Gardner (1999b), uma pessoa criativa resolve problemas, molda produtos ou proporciona a
emersão de novas questões em determinado campo de uma forma inicialmente incomum, mas que
posteriormente são aceitas em seu grupo cultural.
As pessoas têm, em suas raízes culturais e na criatividade, o impulso para realização de seus
trabalhos. A criação de algo acontece em todos os momentos, nas mais diversas profissões. A arte,
uma atividade humana relacionada às manifestações de ordem estética, é expressa não somente nas
manifestações populares, mas em todas as profissões.
A arte e os processos criativos são constantes em vários ramos profissionais. As diferentes
manifestações artísticas podem contribuir com os processos educacionais nas mais diversas
disciplinas. O estudo de distintos processos criativos, por exemplo, permite ao estudante inteirar-se
de conceitos de diferentes áreas do conhecimento e, ao mesmo tempo, conhecer e valorar a cultura
de cada grupo social.
Diversos profissionais expressam seu senso criativo em suas profissões, processos de suas mentes
que conduzem estas pessoas a criarem transformando seus modelos mentais em produtos,
processos, objeto, conhecimento. E, assim, segundo Kolb e Whishan (2002), essa característica
notável da mente humana propicia desenvolver uma cultura rica e criativa, processos e
conhecimentos que são transmitidos a outrem. Conforme Gardner (1999), a mente humana busca
encontrar significados em toda parte, transformar a experiência constantemente para revelar novos
sentidos e gerar novas criações. Dessa forma, teve-se como objetivo investigar as formas como se
expressam as pessoas durante processos criativos analisando suas relações e comparando-as com os
processos de modelagem matemática.
Segundo definições de Biembengut (2007, 2014) e Bassanezi (2010), modelagem (matemática) é a
arte de formular, resolver e elaborar expressões matemática que valham não apenas para solução
particular, mas que também sirvam, posteriormente, como suporte para outras aplicações e teorias.
Trata-se de um conjunto de procedimentos, similares aos da pesquisa científica, para efetuar um
modelo. A noção de modelo se faz presente em todas as áreas do conhecimento.

2 Metodologia

Para atingir o objetivo proposto, adotou-se o mapeamento como princípio metodológico, o qual:

Trata-se de um conjunto de ações que começa com a identificação dos entes ou dados
envolvidos com o problema a ser pesquisado, para, a seguir, levantar, classificar e organizar tais
dados de forma a tornarem mais aparentes as questões a serem avaliadas, reconhecer padrões,
evidências, traços comuns ou peculiares, ou ainda características indicadoras de relações
genéricas, tendo como referência o espaço geográfico, o tempo, a história, a cultura, os valores,
as crenças e as ideias dos entes envolvidos – a análise. (Biembengut, 2008, p. 74).

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De acordo com Biembengut (2008), o mapeamento visa possibilitar a formação de imagens da


realidade, viabilizando assim o sentido de informações, captação de características e traços
relevantes, representando-as e explicitando-as para que possam interessar, agir e imiscuir-se sobre a
realidade.
A primeira etapa do mapeamento, conforme Biembengut (2008), é a elaboração do Mapa de
Identificação. Esta etapa baseou-se na identificação dos documentos e das teorias e no
reconhecimento do campo de pesquisa − entes, fontes e sequências de ações. Assim, a primeira
etapa consistiu na identificação de leis e diretrizes educacionais que expressam e orientam os sensos
criativos estéticos nas diferentes culturas. Na sequência, há o reconhecimento das pessoas
(colaboradoras da pesquisa), 10 profissionais que criam nas mais diversas áreas, bem como o
reconhecimento de seus trabalhos a partir de entrevistas. Esses colaboradores foram: carnavalesco,
figurinista, escultor, coreógrafo, compositor, designer de unhas artísticas, arquiteta, modista,
pesquisador de ciências humanas e pesquisador de ciências exatas. As entrevistas foram realizadas,
em sua maioria, nos lugares onde essas pessoas atuam.
Posteriormente, foi elaborado o Mapa Teórico, o qual permite “ter uma visão do que existe sobre o
tema” e serve como fonte para reconhecimento e análise de dados, propiciando certo domínio sobre
o conhecimento produzido na área investigada, (Biembengut, 2008). Para a autora, a compreensão
de teorias e conceitos que constituem o mapa teórico é fundamental para a identificação das
categorias de análise.
De acordo com Biembengut (2008), o Mapa de Campo é o terceiro passo na realização de um
mapeamento. Este consiste no levantamento, na organização e na classificação de um conjunto de
dados junto aos colaboradores, pessoas fonte da pesquisa (carnavalesco, figurinista, escultor,
coreógrafo, compositor, designer de unhas artísticas, arquiteta, modista e pesquisadores). Para
Biembengut (2008), o mapa de campo

[...] consiste em estabelecer previamente um maior conjunto possível de meios e instrumentos


para levantamento, classificação e organização de dados ou informações que sejam pertinentes e
suficientes, considerando pontos relevantes ou significativos e que valham como mapa para
compreender os entes pesquisados. (Biembengut, 2008, p. 101).

O mapa de campo compõe-se de duas fontes: pessoas e documentos. A fonte desta pesquisa é
oriunda principalmente das pessoas, 10 profissionais que atuam em diferentes áreas. Destas,
advieram: 1) as entrevistas, que perfizeram um total de aproximadamente 40 horas de gravação; 2)
os dados coletados por meio de cerca de 60 visitas de observações das pessoas no processo de
criação; e 3) os documentos e produções por elas fornecidas. Dessa forma, para melhor explicitar,
organizaram-se os dados coletados em: entrevistas, observações e documentos.
As entrevistas, por meio de narrativas, foram realizadas na maioria dos casos nos locais de trabalhos
dos entrevistados, onde cada profissional narrou seu processo de criação, assim como histórias de
vida. Em alguns casos, foi necessário mais de um momento de entrevista. Em um primeiro momento,
o profissional falou sobre suas experiências e seu trabalho e, em outro momento, foi realizada uma
entrevista mais direcionada, em que algumas perguntas foram feitas pela pesquisadora de modo a
facilitar a análise do processo de cada uma das pessoas colaboradoras da pesquisa.
A entrevista por narrativa foi utilizada para compreender o entrevistado em seu contexto. O uso de
narrativas na pesquisa qualitativa fundamenta-se na convicção de que contar histórias é dar sentido
a percursos e experiências. Segundo Larrosa, o “sentido do que somos depende da história que
contamos e das que contamos a nós mesmos” (Larrosa, 1994, p.48).

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As observações foram realizadas nos espaços de trabalho, criação e produção de cada um dos dez
profissionais entrevistados. Cinco deles têm relação direta com a manifestação cultural Carnaval, por
se tratar de um ambiente rico em criações e também por fazer parte do cotidiano da pesquisadora.
Os outros cinco colaboradores foram também pessoas que, de uma forma ou de outra, fazem ou
fizeram parte das relações interpessoais da pesquisadora, e por tratarem-se de pessoas que criam
em seus ramos profissionais. Estas observações foram importantes para o entendimento dos dados.
Os documentos analisados nesta pesquisa advieram de duas fontes: oriundos de busca teórica
realizada pela pesquisadora e fornecidos pelas pessoas colaboradoras. Esses documentos
basicamente consistem em: modelos e esboços, fotografias diversas (tanto de esboços como da
produção finalizada), projetos e apostilas. Segundo Biembengut (2008, p. 104), “a possibilidade de
conhecer ou identificar as motivações das pessoas envolvidas na produção de um documento, [...]
pode trazer resultados mais fidedignos e evitar conclusões equivocadas”. Após dispor destes
documentos, foi preciso identificá-los e relacioná-los com outros dados para obter argumentos para
análise.
O foco desta pesquisa encontra-se no entendimento e na interpretação dos dados e, a partir das
narrativas dos profissionais, colaboradores em todo seu fazer, na inserção e na interação com seu
ambiente sociocultural e natural. Portanto, a pesquisa é de cunho qualitativo, pois se estudam os
padrões da expressão (oralidade) manifestados pelos entrevistados em sua rotina profissional, ou
mesmo em contexto interativo entre eles.
Na última etapa, Mapa de Análise, procurou-se perceber e compreender a estrutura e os traços dos
entes ou fenômenos da pesquisa, na busca por interpretá-los e avaliá-los criteriosamente.
Biembengut (2008) afirma que explicitar as significações dos dados coletados necessita de percepção
e compreensão dos mesmos, bem como de interpretação e avaliação do contexto e das pessoas
envolvidas e, especialmente, de um julgamento do que é relevante e seu de grau de relevância.
Para efetuar a análise dos dados dessa pesquisa, apreciaram-se e avaliaram-se as narrativas dos
profissionais colaboradores, dividindo-as conforme sua relevância, ou seja, categorizando e
identificando os principais elementos, tanto constantes como variáveis. Na análise do entorno dos
dados levantados, procurou-se compreender a articulação entre os diversos fatores envolvidos, para
que fosse possível identificar os efeitos que caracterizassem um fato que poderia ser considerado
relevante para atingir o objetivo proposto, com a expectativa de possibilitar, desta forma, a
interpretação e apreciação dos entes pesquisados, bem como o estabelecimento de pontos-chave
pertinentes para a análise.
A análise, realizada em coerência com Bogdan e Biklen (1994) e Lincoln e Guba (1991), teve como
foco entender e interpretar dados e discursos, envolvendo pessoas, no caso, os colaboradores da
pesquisa. Bicudo (2004) afirma que o qualitativo sugere a ideia do subjetivo, passível de expor
sensações e opiniões, e que o significado atribuído a essa concepção de pesquisa engloba também
noções a respeito de percepções de semelhanças e diferenças de aspectos comparáveis de
experiência. Assim, procurou-se interpretar a realidade das pessoas entrevistadas observando,
registrando e analisando suas interações com a estrutura do lugar onde atuam, ao mesmo tempo em
que se procurou identificar conceitos, ideias e entendimentos a partir dos fazeres e do contar destas
pessoas.

2.1 Tipo de pesquisa

Para Bogdan e Biklen (1994), a pesquisa qualitativa possui cinco características: a) o ambiente natural
é a fonte dos dados e o investigador é o instrumento principal – nesta pesquisa, caracterizou-se pelas
visitas aos lugares de trabalho dos entrevistados; b) descritiva - coleta de dados que se deu

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principalmente por meio de entrevistas narrativas além da utilização de outros instrumentos como
documentos fornecidos por estes profissionais, além de fotografias e/ou vídeo feitos nos locais de
atuação dos sujeitos de pesquisa; c) interesse pelo processo - houve um interesse maior no processo
do que simplesmente pelos resultados ou produto, pois as narrativas foram analisadas levando em
consideração as histórias de vida dos entrevistados, bem como todo processo criativo por eles
realizado, sendo basicamente este o foco desta investigação; d) análise de dados de forma indutiva -
procurou-se perceber quais foram as questões mais importantes. As categorias de análise,
estabelecidas a priori, foram detectadas por meio das observações e das entrevistas com os
profissionais entrevistados; e) importância do significado - o processo de condução desta
investigação reflete um diálogo entre a autora e os sujeitos entrevistados. Após as transcrições das
entrevistas e os primeiros esboços, há uma análise feita pelos entrevistados em que eles verificam se
a visão compreendida pela autora tem o mesmo significado que os sujeitos procuraram transmitir.
Além de esta pesquisa ser considerada qualitativa, pois contempla as cinco características definidas
por Bogdan e Biklen (1994), pode ser considerada como estudo de casos múltiplos. O caso destaca-se
por se constituir numa unidade dentro de um sistema mais amplo. O estudo de caso trata-se de um
tipo de pesquisa que tem um forte cunho descritivo, no qual o pesquisador não pretende intervir
sobre a situação, mas tentar compreendê-la assim como se apresenta, fazendo um estudo
meramente descritivo. Para Yin (2005), o estudo de caso é uma investigação empírica que investiga
um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites
entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos. Para o autor, o estudo de caso é
utilizado para contribuir com o conhecimento que se tem de fenômenos individuais, organizacionais,
sociais, políticos, de grupo, entre outros. “O estudo de caso permite uma investigação para se
preservar as características holísticas e significativas dos acontecimentos da vida real” (Yin, 2005,
p.20). Dessa forma, esta pesquisa utiliza o estudo de casos múltiplos, considerando-o como variação
do estudo de caso único (Bogdan &Biklen, 1994; Yin, 2005), o que implica possuir as mesmas
características.

3 Resultados

Nesta pesquisa assumiram-se as categorias a priori, com base em uma análise preliminar. Essas
categorias emergiram de uma pré-análise realizada, na qual verificou-se que os entrevistados
apresentaram tendências em organizar seus trabalhos em etapas. Todavia, adotar categorias a priori
deveu-se, principalmente, pelo longo tempo de permanência em campo, ou seja, pelo fato da
pesquisadora observar em campo a tendência dos profissionais em organizar o trabalho por meio de
fases. A análise por meio das observações in loco permitiu à pesquisadora identificar as categorias no
trabalho dos entrevistados, pois todos convergem de maneira similar para um processo de criação no
qual há uma intencionalidade para, posteriormente, se planejar ou projetar o que será feito, seguido
por um processo de criação e avaliação do objeto ou modelo criado, ou seja, do produto.
Para facilitar o entendimento das similaridades entre o trabalho dos entrevistados e as etapas de
modelagem, foi proposto um esquema, conforme a figura 1, o qual indica que as categorias de
análise (intenção, projeção, criação e produto) são um possível desmembramento das etapas de
modelagem de Biembengut (2014) expressas na figura 1 a seguir como: 1ª fase (percepção e
apreensão); 2ª fase (compreensão e explicitação); e 3ª fase (significação e expressão).
O esquema sugere um ir e vir em relação às etapas, um processo que pode assumir diversas
configurações dependendo do resultado, incluindo uma forma cíclica se necessário, como bem
afirma Blum (2007). Este fluxograma será apresentado posteriormente no início da análise de cada

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uma das categorias, com destaques para a que estará sendo analisada como forma de melhor
visualização.

Fig. 1. Síntese das categorias intenção, projeção, criação e produto.


Fonte: Madruga (2016).

De posse das narrativas dos 10 profissionais colaboradores da pesquisa e das anotações registradas
em diário de campo durante a coleta de dados, oriundas das muitas observações realizadas pela
pesquisadora nos espaços de trabalho de cada um dos profissionais entrevistados, foi possível
determinar as categorias mencionadas acima.
Os resultados mostraram que as pessoas fazem uso de representações e utilizam modelos para
produzir produtos que podem gerar conhecimento para muitas pessoas. Johnson-Laird (1990) afirma
que os processos mentais se dão por meio de símbolos, ou seja, modelos, e que a aprendizagem
depende de associações. A mente humana seleciona, filtra e classifica as percepções e informações
captadas, processando aquilo que interessa ou que está disponível para gerar ideias, compreensões e
entendimentos, que são, por sua vez, singulares em cada pessoa (Biembengut, 2003). Depois de
compreendida, uma informação adquire significados, de variadas complexidades, habilitando a
pessoa a expressar e comunicar a outras o que sabe, pensa e entende daquilo que internalizou sobre
o mundo que a cerca.
A partir daí, há uma busca para representar ou traduzir as informações. Essas representações são
feitas por meio de modelos, e tais representações mentais podem ser internas ou externas. As
representações internas são aquelas que a pessoa constrói na mente e não expressa, por diversas
razões. E as externas são as que a pessoa consegue expressar, produzindo por meio de modelos,
desenhos, escrituras, esculturas, vocalizações e outras expressões corporais.
Quando uma compreensão passa a ser significativa para a mente, pode-se dizer que se transformou
em conhecimento, ou seja, ocorreu a aprendizagem. Conforme Johnson-Laird (1990), as principais
tarefas realizadas pela mente são: perceber o mundo; aprender, recordar e controlar ações; pensar e
criar novas ideias; controlar a comunicação com outros; e criar a experiência dos sentimentos, das
intenções e da autoconsciência. Johnson-Laird (1990) afirma que processos mentais são os vários
números de percepções, ideias, crenças, hipóteses, pensamentos e recordações.
Essas representações internas (modelos mentais) e externas (modelos físicos) analisadas por meio
das narrativas dos profissionais colaboradores da pesquisa mostraram que, embora singulares, os
processos por eles desenvolvidos apresentam similaridades.
Esse processo parte da escolha de determinada temática, ou problema, e passa: pela busca por
subsídios ou levantamento de dados; pela construção (na maioria dos casos) de modelos mentais;
por esboços, rascunhos e/ou protótipos; por modelos físicos expressos por meio de desenhos e/ou
esquemas; e pela construção (quando necessário) do material que será apresentado às pessoas para
avaliação e validação. A avaliação é feita não apenas no momento final, mas no decorrer de todo
processo, e, caso haja necessidade, volta-se à(s) fase(s) anterior(es) para reformulações e/ou
adaptações. Estes procedimentos utilizados para criar um produto, são similares aos processos de
modelagem matemática. Sintetizando estas relações, tem-se:

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- Intenção – o que se pretende fazer, uma ideia, um plano ou aquilo que uma pessoa espera que
aconteça. De acordo com Japiassú e Marcondes (2008), intenção é um propósito, sentido, direção,
finalidade ou objetivo que determina certa ação. Dessa forma, não há ação, ou criação, sem
intenção. Para que a produção de algo ocorra, em qualquer setor profissional, deve-se ter a intenção,
o propósito de que aquilo ocorra. Para Ostrower (2004), “o ato criador não nos parece existir antes
ou fora do ato intencional, nem haveria condições, fora da intencionalidade, de se avaliar situações
novas ou buscar novas coerências” (Ostrower, 2004, p.11). Comparando com a modelagem
matemática, trata-se da escolha do tema (Bassanezi, 2010); (Burak & Klüber, 2011); reconhecimento
da situação-problema – delimitação do problema (Biembengut, 2007); percepção e apreensão
(Biembengut, 2014).

- Projeção – é a ação ou efeito de projetar. Projetar é formar um projeto, plano ou desígnio, idear,
planejar. A projeção é um processo de criação que faz a intenção gerar um produto, algo real que
possa ser posteriormente validado e avaliado. A categoria ‘projeção’ é considera a etapa anterior à
execução, é uma fase de planejamento, de apropriação e ‘imaginação’ do produto que será exposto
e validado pela própria pessoa que cria, bem como pelas demais envolvidas ou não no processo. Na
modelagem é a familiarização do assunto – coleta de dados e formulação de modelos (Bassanezi,
2010); pesquisa exploratória e levantamento dos problemas (Burak & Klüber, 2011); familiarização
com o assunto a ser modelado – referencial teórico e matematização – formulação do problema –
hipóteses (Biembengut, 2007); percepção e apreensão (Biembengut, 2014); compreensão e
explicitação (Biembengut, 2014).

- Criação – Criação é o ato de criar, ou seja, poder dar forma a algo novo. Ostrower (2004, p.53)
compreende “que todos os processos de criação representam, na origem, tentativas de estruturação,
de experimentação e controle, processos produtivos onde o homem se descobre, onde ele próprio se
articula à medida que passa a identificar-se com a matéria”. Nesta etapa de ‘criação’ é o momento
em que as ideias dos profissionais, seus modelos mentais, se externaram por meio de desenhos,
processos e esquemas, elaborados a partir da compreensão e do entendimento. Transformam-se em
físicos, tridimensionais e passíveis de serem vistos, apreciados e entendidos por muitas pessoas. Na
modelagem é a formulação do problema e resolução (Bassanezi, 2010); matematização – formulação
do modelo matemático – desenvolvimento e resolução do problema a partir do modelo – aplicação
(Biembengut, 2007); resolução dos problemas e desenvolvimento do conteúdo matemático no
contexto do tema (Burak & Klüber, 2011); compreensão e explicitação (Biembengut, 2014);
significação e expressão (Biembengut, 2014).

- Produto – é o resultado de uma produção ou, no caso, da fase anterior de ‘criação’. Nesta etapa,
não necessariamente a última, mas apenas uma do processo de ‘engrenagem’, ocorre a
interpretação da solução e validação e avaliação do modelo (produto) (Bassanezi, 2010). É quando
ocorre a expressão do que foi criado, quando o modelo é validado e avaliado por todas as pessoas
(Biembengut, 2014). Se o produto for satisfatório, esta etapa é considerada a final. Se for
insatisfatório, retorna-se à etapa anterior − ‘criação’ − ou até mesmo às etapas de ‘projeção’ e
‘intenção’, conforme necessidade. Na modelagem é chamada de validação e avaliação (Bassanezi,
2010); modelo matemático – interpretação da solução e validação do modelo – avaliação
(Biembengut, 2007); análise crítica das soluções (Burak & Klüber, 2011); significação e expressão
(Biembengut, 2014).

De acordo com a análise, pode-se afirmar que os procedimentos utilizados pelos profissionais
entrevistados na execução de seus trabalhos criativos, expressos pelas categorias intenção, projeção,

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criação e produto, são realmente similares aos procedimentos utilizados por diversos autores na
modelagem matemática.

4 Considerações Finais

Esta pesquisa teve como objetivo geral investigar as formas como se expressam as pessoas durante
processos criativos analisando suas relações e comparando-as com os processos de modelagem
matemática. Por meio da análise, foi possível a identificação das três fases do processo de
modelagem matemática utilizadas para solucionar ou compreender uma situação-problema ou um
fenômeno. Segundo Biembengut (2003), as pessoas em seu trabalho de criação recebem vários tipos
de informação de fontes diversas que, uma vez selecionadas e reorganizadas, podem gerar novos
conhecimentos frente a novas necessidades impostas pelo meio, sejam econômicas, sociais,
históricas ou culturais. Citando Biembengut (2003, p.10),

Assim sendo, vimos que nosso processo cognitivo é essencialmente simbólico ao formar imagens
e/ou símbolos  modelos  para entender o mundo. Modelos esses que são também
modificados a partir de novas percepções e novos interesses. Modelos anteriores que
influenciam os modelos subsequentes, graças à percepção e ao devido entendimento das
representações simbólicas.

Em suma, os modelos que os profissionais expressam de diferentes formas são representações de


seus pensamentos a respeito de algo, seja real ou imaginário, pois a mente humana manipula
símbolos e procura de uma maneira ou de outra imitá-los e, assim, criar modelos das situações com
as quais interage, possibilitando sua interpretação, entendimento e até previsão sobre a situação ou
evento modelado (Biembengut, 2003).
Entende-se que tanto os processos de modelagem prescritos por Bassanezi (2010, 2015) e
Biembengut (2003, 2007, 2014), quanto o “aprender com modelagem”, descrito pelas categorias
apresentadas neste capítulo − ‘intenção’, ‘projeção’, ‘criação’ e ‘produto’ −, não são disjuntos, ou
seja, não se tratam de processos lineares que consistem na superação de etapas. Contrariamente,
trata-se de um processo análogo a uma engrenagem, no qual as ‘correias’ se juntam e trabalham em
sintonia. Isso quer dizer que há um entrelaçamento entre as etapas que possibilita um ‘ir e vir’
conforme necessidade. A figura 2 apresenta esta ideia:

Intençã o
Projeção

Produto Criação

Fig. 2. Entrelaçamentos do “aprender com modelagem”.


Fonte: Madruga (2016).

O senso criativo, inerente às pessoas e proveniente, principalmente, de seu patrimônio e contexto


humano, social e cultural, necessita de estímulo, e o mais indicado seria estimulá-lo na pessoa

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enquanto estudante. O desenvolvimento do senso criativo e a incitação para que o estudante


expresse sua criatividade devem ser feitos desde os anos iniciais da Educação Básica.
Pois as pessoas se percebem e se reconhecem naquilo que criam, transformando algo, dando-lhe
sentido, significado. E, quando algo se transforma, as pessoas também se transformam. Por isso, é
dever da escola proporcionar condições para que o estudante se reconheça como parte de sua
cultura. “Os valores transmitidos pelo ambiente cultural estimulam ou refreiam a atividade criativa,
em particular, conforme a importância dada ao indivíduo ou à coletividade” (Lubart, 2007, p.85).
Dessa forma, e conforme o exposto, se as pessoas utilizam essas etapas em seus fazeres, parece-nos
claro que a escola também possa utilizar-se destas fases no processo de ensino e aprendizagem. A
proposta em questão é trabalhar com qualquer modelo, e não apenas com modelos matemáticos, e
que possam ser utilizados por qualquer pessoa. A pesquisa mostrou que as pessoas recorrem a
modelos e produzem algo que será avaliado e apreciado por diversas pessoas. Cada pessoa traz
consigo valores culturais. E cabe à educação formal fazer essa ponte entre a modelagem e a cultura.
É preciso que a escola, por meio do planejamento dos professores, preocupe-se em fomentar a
criatividade nos estudantes trabalhando com a modelagem e a cultura, pois, ao integrar à educação
escolar as questões do dia a dia, pode-se inclusive identificar diversas ações com fins de contribuir
para aprendizagem dos estudantes. Os elementos culturais podem contribuir no desenvolvimento
dos programas escolares de uma forma diferenciada e motivadora. De acordo com Mosé (2015,
p.82), “a escola, cada vez mais, deverá ser um espaço aberto, e a educação inevitavelmente
vinculada à cultura”.

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