Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
BARRA DO GARÇAS - MT
2022
LIDIANE BASTOS SILVA
BARRA DO GARÇAS - MT
2021
FICHA DE APROVAÇÃO
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Conceito:______________________________________________________________.
DEDICATÓRIA
INTRODUÇÃO...........................................................................................................10
2.4. Carolina Maria de Jesus por ela mesma: análise de fragmentos da obra nos
quais a autora se apresenta
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................36
INTRODUÇÃO
Por isso é importante observar, discutir e refletir sobre o papel dessas mulheres
negras numa sociedade que passou por processos fortemente patriarcais e escravocratas.
Ser mulher e negra, sem dúvida mostra que a cor adquire um significado importante,
pois traz consigo uma marca e que tem na sua base a desigualdade ligada às
discriminações, preconceitos e subalternização da mulher negra. Outro aspecto
importante é refletir sobre o papel positivo dessas mulheres, suas experiências e
contribuições, enquanto trabalhadoras que viviam, na época de Carolina Maria de Jesus
e ainda hoje, boas parte delas vem sendo discriminadas, violentadas e agredidas.
Os estudos históricos sobre escravidão não revelam tudo sobre as mulheres
negras, camuflam muitas realidades e violências contra elas na escravidão e pós-
abolição e sobre isso, escreve Florestan Fernandes: “aos escravos foi concedida à
liberdade teórica sem qualquer garantia de segurança econômica ou de assistência
compulsória” (FERNANDES, 1965, p.147). As mulheres negras são exemplos de luta,
inteligência e superação das dificuldades, para elas liberdade significava o direito de ir e
vir, ficar com seus filhos sem vê-los ser vendido como mercadorias, livrarem-se de
todos os tipos de violências praticadas pelos seus senhores, terem autonomia de
trabalho, habitação, salário.
Mesmo libertas, na condição de não escravizadas, as mulheres negras foram
condicionadas à violência, discriminação e ao cárcere privado, se viram sem moradia,
alimentação, sem condições de sobreviver e caiam mais uma vez na escravidão, mas
agora na escravidão sexual, pois necessitavam se prostituir em troca de dinheiro,
comida. Ou acabaram por se tornarem mão de obra barata sem direito algum, vindo à
tona a continuidade da divisão racial e sexual, da discriminação e violência.
Uma mulher negra, favelada, mãe solteira de três filhos, que vive de
catar detritos nas ruas de uma megalópole latino-americana, consegue
produzir e publicar um diário contando a história de sua vida e do
local em que vive. É um fato extraordinário, um marco para aqueles
que trabalham com a literatura de testemunho [ou marginal-
periférica]. (AMARAL, 2003, p. 51).
2.3. Carolina Maria de Jesus por ela mesma: análise de fragmentos da obra nos
quais a autora se apresenta.
Minha mãe respondia com polidez. Minha mãe era do ventre livre e
dizia que os brancos é que são os donos do mundo. Ela aprendeu a
dizer aos brancos apenas:
[...]
Ela permaneceu dois dias fora. Quando regressou, encontrou-me de
plantão à sua espera, mas fiquei decepcionada. Ela não trazia pacotes.
Então ela enganou-me. Pensei nos seis meses que trabalhei para ela
sem receber um tostão. Minha mãe me dizia que o protesto ainda não
estava ao dispor dos pretos. Chorei. (JESUS, 2014, p. 136-137)
É visível em toda a obra que o Brasil da época não estava disponível, nem
acessível para os negros, percebendo que a abolição da escravatura ainda não tinha sido
concretizada completamente, que a transição de ex-escravizado para um sujeito
nacional, um cidadão com todos os direitos e atribuições não havia se tornado real.
Carolina mostra isso quando ela reflete sobre a opressão racial continuada sobre o
negro. Isso nos lembra o trocadilho feito por Franz Fanon no título de sua obra Peles
Negro, Máscaras Brancas porque embora o Brasil não se fizesse mais uma país
escravocrata.
Notamos aqui a violência verbal presente nos discursos do juiz e de seu filho
assim como no uso que faz das forças do Estado para punir aqueles que ele considerava
inferiores. Nota-se que Carolina tem consciência da discriminação racial e de classe
vigente na sociedade brasileira porque ela se refere a Hubertinho como “um branco”,
“filho de juiz” e ela explicita sua consciência ao juiz ao citar Rui Barbosa. É ainda
interessante notar que ela toca também nas questões de gênero ao tratar dos abusos
sexuais a mulheres reclusas ao se propor a discutir com o juiz de “homem pra homem”.
A honestidade era uma característica importante para Carolina, mesmo em face
da fome que a fazia ter atitudes como pular o muro para pegar frutas no quintal da
vizinha, tal atitude lhe incomodava a consciência.
Carolina reflete sobre o valor do dinheiro e o modo como ele dá poder a uns e a
outros não, eles tem consciência de que vive em uma sociedade capitalista e, embora
saiba, do modo como ela funciona, também deseja ter uma casa e os bens que o dinheiro
pode comprar, sempre questionando a divisão social imposta por tal modelo
econômico.Ela teve certa melhoria em sua qualidade de vida quando foi vista pelo
jornalista Audálio Dantas que se interessou pela história da mulher negra e pobre que
escrevia sua vida em meio à precariedade, o que resulta de sua paixão pela escrita e
leitura só aumentava, registrava seu dia a dia na favela.
Ao ler “Diário de Bitita” e buscar saber mais sobre Carolina Maria de Jesus
percebemos que ela faz parte de um pedaço da sociedade do Brasil da época que vai se
transformando aos poucos e que reflete diretamente na atualidade, se tornou uma das
porta-vozes da mulher negra e pobre de um Brasil não tão distante. Carolina relata suas
vivências de fatos de violência, discriminação, fome, pobreza, e diversos outros temas
em seus diários, tudo isso usando como exemplo a família e as experiências que ela
vive. “Diário de Bitita” é uma obra que traz em seu contexto a visão de uma mulher
negra, pobre e desfavorecida de uma sociedade que falhou com ela de diversas formas,
mas que se tornou um caso exemplar de que, quando se têm acesso ao conhecimento,
um novo mundo se abre.
Carolina deu voz a quem era invisível e silenciado e até hoje sua voz ecoa
cada dia mais forte,fato que fez com que muitas mulheres negras usassem suas obras
como escudo e instrumento de força, resistência e empoderamento. O seu legado hoje é
usado pelos movimentos feministas negros, que estão na luta por espaço,
reconhecimento e pelo fim das violências e discriminações que são cometidas contra
essas mulheres, que historicamente foram submetidas à servidão, aos abusos e à solidão.
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo (1949). Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1980.
BERTH, Joice. Empoderamento. São Paulo: Selo Sueli Carneiro, Pólen, 2019.
FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. 48. ed., São Paulo: Global, 2003
JESUS, Carolina Maria de. Diário de Bitita. São Paulo: SESI-SP Editora, 2014.
MEIHY, José Carlos Sebe Bom; LEVINE, Robert M. Cinderela negra, a saga de
Carolina Maria de Jesus. Rio de Janeiro: UFRJ, 1994. Bibliography.232 pp. Paper
PERROT, Michelli. Minha história das mulheres. -1. ed.1ª reimpressão. São Paulo:
Contexto. 2008
REIS, Maria Firmina dos. Úrsula. Florianópolis: Mulheres: PUC Minas, 2009
RIBEIRO, Djamila. Quem tem medo do feminismo negro? Editora Companhia das
Letras, 2018.
SANTOS, Joel Rufino dos. Carolina Maria de Jesus: uma escritora improvável, Rio
de Janeiro: Garamond; Fundação Biblioteca Nacional,2009.
RIBEIRO, Djamila. Quem tem medo do feminismo negro? Editora Companhia das
Letras, 2018.