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IDENTIFICAÇÃO HISTOQUÍMICA DE LIGNINAS, ALCALÓIDES E COMPOSTOS FENÓLICOS EM FOLHAS DE Myracrodruon

urundeuva Allemão (Anacardiaceae)


Introdução
Comumente encontrada nas matas secas calcárias e na caatinga arbórea da região do norte de Minas Gerais (BRANDÃO, 1994), a Myracrodruon urundeuva, conhecida popularmente como
aroeira do sertão, é uma espécie decídua, heliófita e seletiva xerófita, cujo porte pode chegar até 30 m de altura conforme área de ocorrência (LORENZI, 1992; ANDRADE et al., 2000; RIZZINI, 1971).
Esta espécie é uma das plantas medicinais mais utilizadas na região nordeste do país por apresentar atividade anti-inflamatória, cicatrizante e anti-úlcera (GALVÃO, 2018). Esta característica
torna interessante a investigação de seus compostos, como alcaloides, fenóis, lignina, dentre outros, que podem ser competentes à produção de medicamentos, inseticidas, corantes etc. (GARCÍA; CARRIL,
2009).
Parte deste potencial pode ser mensurado por meio da histoquímica, técnica usada para identificar e localizar, a partir da aplicação de pigmentos, compostos secundários em tecidos biológicos,
que são quantificados de acordo com a intensidade de coloração observada (SANTOS et al., 2009). Com este intuito, o presente estudo descreve a análise histoquímica das folhas de Myracrodruon
urundeuva na identificação da presença de ligninas, alcaloides e compostos fenólicos.

Materiais e Métodos
Folhas saudáveis de indivíduos adultos foram coletadas no Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais (ICA-UFMG), Montes Claros-MG, coordenadas
16°40’23.5”S e 43°50’29.6”W. No laboratório de Anatomia Vegetal (LAV), da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), foram realizadas incisões transversais da região central das folhas, corte
a mão livre, utilizando de lâminas Gillette, até a obtenção de cortes finos competentes à montagem das lâminas para observação. As amostras foram separadas e coradas respectivamente por floroglucina
ácida (JOHANSEN, 1940); reagente de Dittmar (FURR; MAHLBERG, 1981); e cloreto férrico (JOHANSEN, 1940) por 15, 10 e 30 minutos. Posteriormente, as amostras foram lavadas em água destiladas e,
montadas as lâminas, observadas em microscópio óptico, comparando-as ao grupo controle (sem corantes). O experimento foi realizado em triplicata.

Resultados e Discussão
A. Identificação de ligninas
A floroglucina ácida indicou deposição de lignina, cor-de-rosa, nas paredes dos elementos de vaso do xilema figura 1A e B. As ligninas são compostos fenólicos estruturais, especialmente,
depositados nas paredes celulares, que conferem às plantas resistência à compreensão. Evolutivamente, esta característica lhes permitiu expandir sua estrutura ao ponto de suportar maior superfície
fotossintetizante. Além disso, sua presença nas células condutoras do xilema facilita o transporte de água para a parte aérea, uma vez que aumenta a resistência das plantas superiores à corrente transpiratória.
Do ponto de vista ecológico, a lignina também participa da “cicatrização” dos tecidos, aumentando a resistência das plantas à ação mecânica ou enzimática de predadores (RAVEN; EVERT; EICHHORN,
2014).
B. Identificação de alcaloides
O reagente de Dittmar marcou idioblastos com deposição de alcaloides, cor castanho-avermelhado, tanto na região epidérmica da nervura central, quanto no parênquima paliçádico do limbo
foliar Figura 2A e B. Os alcaloides, compostos nitrogenados do metabolismo secundário das plantas, são de grande interesse à indústria farmacológica e médica, uma vez que apresentam efeitos fisiológicos
ou psicotrópicos. Como exemplo podem ser citados a cafeína, estimulante psicotrópico extraído de Coffea sp.; a morfina, anestésico obtido da Papaver somniferum; a cocaína e a nicotina, estimulantes
retirados respectivamente de Erythroxylum coca e das folhas de Nicotiana tabacum (RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2014). As funções metabólicas e ecológicas dos alcaloides nas estruturas vegetais são
diversas, mas não estão totalmente esclarecidas. A nicotina, por exemplo, é sintetizada nas raízes, em resposta à lesão, e transportada às folhas, onde será armazenada nos vacúolos e atuará como “repelente”
de insetos de animais herbívoros. A cafeína, presente em abundância nas plântulas de cafeeiro, pode tanto funcionar como composto tóxicos aos insetos, quanto ter atividade alelopática na inibição do
crescimento de espécies competidoras (RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2014).
C. Identificação de compostos fenólicos
O cloreto férrico revelou abundância de deposição de compostos fenólicos na epiderme e nos parênquimas do mesofilo Figura 3A e B. Os compostos fenólicos englobam dois grupos muito
conhecidos: os flavonoides e os taninos. Os flavonoides, pigmentos hidrossolúveis presentes nos vacúolos das células vegetais, são o maior e mais estudado grupo. Nas plantas, estes pigmentos coloridos,
dentre outras funções, podem atuar na atração de animais dispersores e/ou polinizadores, como as abelhas e os pássaros, ou como antioxidantes (RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2014). Os taninos, por sua
vez, são compostos que normalmente estão presentes em células epidérmicas e tem papel de proteger a planta contra a radiação ultravioleta, evitando que a alta intensidade da luz danifique o aparato
fotossintético. Para além, sua propriedade organoléptica é a adstringência (sabor amargo), o que repele os insetos, aves e outros mamíferos herbívoros, minimizando a predação (CUTLER; BOTHA;
STEVENSON, 2011; RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2014). Os compostos fenólicos são de grande interesse biotecnológico e médico. No caso da aroeira, já é descrito que o extrato hidroetanólico de sua
casca e caule, ricos em compostos bioativos como taninos, flavonoides e alcaloides, tem ação fungicida e bactericida contra os patógenos Staphylococcus aureus, Klebsiella pneumonia, Enterococcus faecalis
e Candida sp. O extrato etanólico de suas folhas, por sua vez, além de taninos e flavonoides, também apresenta saponinas, cumarinas e terpenos, que mostraram atividade contra o rotavírus (CECÍLIO;
SCORSOLINI-COMIN, 2016).

Conclusão
Neste estudo, foi possível identificar a presença de deposição de lignina na parede dos elementos de vaso do xilema; a presença de idioblastos com compostos fenólicos ou alcaloides, tanto na
epiderme da nervura central, quanto no parênquima paliçádico (mesófilo) do limbo foliar de Myracrodruon urundeuva. No entanto, ressalta- se a necessidade de extração, identificação e testes destes
compostos, a fim de elucidar as potencialidades da espécie o que, além de lhe agregar valor, apoiaria políticas públicas de preservação.

Agradecimentos
Agradecimentos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior pelo apoio financeiro.

Referências
ALVES, J. J. A.; ARAÚJO, M. A.; NASCIMENTO, S. S. Degradação da Caatinga: uma investigação ecogeográfica. Revista Caatinga, v. 22, n. 3, p. 126-135, 2009. ANDRADE, A. C. S. et al. Germinação de sementes de jenipapo: temperatura, substrato e morfologia do desenvolvimento pós-
seminal. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 35, p. 609-615, 2000.
BRANDÃO, C. R. Os caminhos cruzados: Formas de pensar e realizar a educação popular na América Latina. 1994.
CECÍLIO, M. S.; SCORSOLINI-COMIN, F. Parentalidades adotiva e biológica e suas repercussões nas dinâmicas conjugais. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 36, p. 171- 182, 2016.
FURR, M.; MAHLBERG P. G. Histochemical analyses of laticifers and glandular trichomes in Cannabis sativa. Journal of Natural Products, v. 44, p. 153-159, 1981.
GALVÃO, W. R. A. AVALIAÇÃO DO POTENCIAL FARMACOQUÍMICO DE BROTOS DE Myracrodruon urundeuva ALLEMÃO (AROEIRA-DO-SERTÃO) COMO INSUMO FARMACÊUTICO. Orientador: Profa. Dra. Mary Anne Medeiros Bandeira. 2018. 173 p. Tese (Doutor em
Ciências Farmacêuticas) - Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018. GARCÍA, A. A.; CARRIL, E. P. Metabolismo secundário de plantas. Reduca (Biologia): Série Fisiologia Vegetal, v. 2, n. 3, p. 119-145, 2009. Disponível em:
https://eprints.ucm.es/id/eprint/9603/1/Metabolismo_secundario_de_plantas.pdf. Acesso em: 16 maio 2023.
JOHANSEN, D. Plant microtechnique. New York: Mc Grow Hill Book Company, Inc., 1940 LORENZI, H. Árvores brasileiras: Manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. São Paulo: Plantarum, 1992. v. 1.
RAVEN, P. H.; EVERT, R. F.; EICHHORN, S. E. Biologia Vegetal. 8ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.
RIZZINI, C. T. Árvores e arbustos do cerrado. Rodriguésia, n. 38, p. 63-77, 1971.
SANTOS, M. C. A. et al. Anatomia e histoquímica de folhas e raízes de vinca (Catharanthus roseus (L.) G. Don). Revista de Biologia e Ciências da Terra, v. 9, n. 1, 2009. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/500/50016921004.pdf. Acesso em: 17 maio 2023.
SÁ-SILVA, J. R.; ALMEIDA, C. D. D.; GUINDANI, J. F. Pesquisa documental: pistas teóricas e metodológicas. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, v. 1, n. 1, p. 1-15, 2009.
Figura 1. Corte transversal da região central da folha de Myracrodruon urundeuva pigmentado por Floroglucina ácida. A, a nervura central está nítida, com presença de colênquima (co), parênquima fundamental (pf), idioblastos
(id) na região do mesófilo, tricomas (tr) tanto na porção adaxial quanto abaxial; B deposição de ligninas, em rosa, nas paredes dos elementos de vaso do xilema (xi).

Figura 2. Corte transversal da região central da folha de Myracrodruon urundeuva tingido por Dittmar. Percebe-se a presença de idioblastos (id) de coloração castanho-avermelhada, que armazenam alcaloides em A, na região da
epidérmica, e em B, no parênquima paliçádico (pp), região do mesófilo.

Figura 3. Corte transversal da região central da folha de Myracrodruon urundeuva tingido por cloreto férrico. Presença de idioblastos (id) com compostos fenólicos não estruturais, cor preta, tanto na região epidérmica, quanto no
mesófilo, em A e B.

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