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São Paulo
2011
Else Lemos Inácio Pereira
São Paulo
2011
ELSE LEMOS INÁCIO PEREIRA
COMISSÃO EXAMINADORA
_______________________________________________
Assinatura: _____________________________________
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Assinatura: _____________________________________
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Assinatura: _____________________________________
São Paulo
2011
AGRADECIMENTOS
À Profa. Dra. Elizabeth Saad Corrêa, pelo aprendizado de sempre e por sua presença marcante.
À querida Profa. Dra. Margarida Kunsch, pelo incentivo e estímulo para seguir estudando.
Palabras clave: comunicación digital integrada, mídias sociales, gestión de crisis, gestión de
controversias, planificación, relaciones públicas.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ... 09
Tags ... 40
4. GESTÃO DE CRISES E ASSUNTOS EMERGENTES NAS MÍDIAS SOCIAIS: POR UMA CATEGORIZAÇÃO
Por fim, nas considerações finais, apresentamos nossas observações gerais sobre o
estudo e possíveis caminhos futuros de investigação.
Capítulo
1: UMA SOCIEDADE EM REDE – DESAFIOS PARA A COMUNICAÇÃO DO SÉCULO XXI
Nosso pressuposto central é o de que, como resume Castells (p. 57), “as novas
tecnologias da informação estão integrando o mundo em redes globais de
instrumentalidade”, e, nesse sentido, “computadores, sistemas de comunicação,
decodificação e programação genética são todos amplificadores e extensões da mente
humana” (p. 69).
1
Ianni (1999) avalia o desenvolvimento do processo de globalização, das grandes navegações iniciadas no século XV, até o
final do século XX. Se, por um lado, o autor apresenta uma globalização que começou há muito tempo, por outro, reforça
que o aquilo que vivenciamos no presente é uma nova história: “As sociedades contemporâneas a despeito das suas
diversidades e tensões internas e externas, estão articuladas numa sociedade global. (...) o que começa a predominar, a
apresentar-se como uma determinação básica, constitutiva, é a sociedade global, a totalidade na qual pouco a pouco tudo
o mais começa a parecer parte, segmento, elo, momento.” (p. 39).
Numa perspectiva crítica, devemos atentar para a dinâmica de uma rede que também
exclui. Ao afirmar que vivemos a era da sociedade em rede, não podemos nos esquecer de
que é, também, uma rede de exclusão. A rede se confirma inclusive pela exclusão de grupos
e indivíduos cuja posição marginal com relação ao sistema prevalente alimenta o próprio
sistema. Falamos, portanto, de uma sociedade que compreendemos numa dimensão repleta
de ambiguidades, incertezas e exclusões.
Na mesma linha de Castells (2006), Bauman (2001; 2004) fala sobre uma modernidade
líquida que se confirma nas duas ‘camadas’ mencionadas por Castells – a superior,
conectada à comunicação global, e outra que fica na extremidade oposta e se constitui pelas
redes locais constantemente baseadas em formação étnica, e que se apoia em
características identitárias. Para Castells (2006), e também para Bauman (2004), o mundo
dessa segunda camada, ‘inferior’, vive em função dos assuntos locais, imediatos, ligados à
sua sobrevivência. Quanto à camada ‘superior’, vive desconectada de assuntos
“territorializados”, pois se percebe em um não-tempo, em um não-território – é flutuante.
12
2
O conceito de organizações líquidas é uma contraposição à ideia de organizações sólidas, ou seja, mais morosas e pesadas
(mais gordura que músculo). Esse debate ganha espaço à medida que as organizações precisam responder às demandas de
seus clientes e consumidores de forma mais rápida, ágil e assertiva. Mais sobre o tema em:
http://www.thelaunchfactory.com/The%20Liquid%20Organization.pdf. Acesso em maio de 2011.
Muitas organizações tomaram ou ainda tomam o paradigma da revolução digital como
base para pensar sua comunicação. Embora a discussão sobre o paradigma da convergência
tenha começado há um bom tempo3 e não seja em si algo novo – a comunicação e as
relações públicas sempre consideraram que há e podem conviver tantos instrumentos
quantos forem necessários para atender aos mais variados interesses e públicos -, o fato é
que muitas organizações investiram e estão investindo maciçamente em planos de
comunicação baseados em ‘novas mídias’ e prioritariamente com foco no consumidor. A
informação recentemente veiculada em blogs4 segundo a qual a PepsiCo “mudou o foco de
mídia da TV para mídias sociais” para divulgar as marcas Pepsi é um exemplo desse tipo de
decisão. Segundo o blog Brainstorm #9, foram US$ 20 milhões em prêmios que tiveram
como retorno 80 milhões de votos em ideias para melhorar o mundo, 3,5 milhões de fãs no
Facebook e cerca de 60 mil leitores no Twitter. Embora se mostre participativa e satisfatória
quanto aos números, a iniciativa não redundou em aumento nas vendas, o que relata o The
Wall Street Journal. Antes, as marcas perderam participação no mercado em 2010.
O conceito de empresas 2.0 - Enterprise 2.0 – reforça que o uso de novas ferramentas
14
de colaboração não está restrito a empresas da “nova economia”, nem àquelas
fundamentalmente compostas por representantes da chamada Geração Y. Segundo MacFee
(2006), os benefícios da Empresa 2.0 estão disponíveis a qualquer tipo de organização5. O
autor dá particular atenção ao uso das ferramentas de colaboração dentro das organizações,
enfatizando que as novas formas de compartilhamento de informação propiciam que haja
uma apropriação mais efetiva do conhecimento que os colaboradores se dispõem a trocar
entre si e com a própria organização.
3
Jenkins (p. 37) atribui a Ithiel de Sola Pool, em sua obra Technologies of Freedom, de 1983, a primeira abordagem do
processo de ‘convergência de modos’ nas indústrias midiáticas.
4
Informação inicialmente divulgada em http://adcontrarian.blogspot.com/2011/03/social-medias-massive-failure.html
(acesso em 31 de março de 2011) e replicada em http://www.brainstorm9.com.br/social-media/pepsi-decepcionada-com-
midias-sociais/ (acesso em 31 de março de 2011). Posts anteriores em Brainstorm #9 já informavam sobre a decisão da
PepsiCo: http://www.brainstorm9.com.br/diversos/pepsi-abandona-super-bowl-e-investe-em-projeto-social-online/
(acesso em 31 de março de 2011). Em matéria publicada no dia 18/03/11, o The Wall Street Journal aponta as perdas que a
marca enfrentou diante de seu maior concorrente. Disponível em
http://online.wsj.com/article/SB10001424052748703818204576206653259805970.html. Acesso em 31/03/2011.
5
O conceito de empresas 2.0 (Enterprise 2.0) foi inicialmente proposto por Andrew MacFee em 2006, em artigo publicado
na revista MIT Sloan Management Review. Disponível em: http://sloanreview.mit.edu/the-magazine/2006-
spring/47306/enterprise-the-dawn-of-emergent-collaboration/. Acesso em maio de 2011.
A nova lógica midiática está sendo experimentada pela sociedade global do século XXI
de forma nunca antes imaginada. A rápida ampliação do acesso a dispositivos móveis,
particularmente telefones celulares e smartphones, contribui, em larga escala, para a
inclusão digital, na medida em que mais pessoas passam a estar conectadas.
A convergência das mídias é mais do que apenas uma mudança tecnológica.
A convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias,
mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a
indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e
o entretenimento. Lembrem-se disto: a convergência refere-se a um
processo, não a um ponto final. Não haverá a caixa preta que controlará o
fluxo midiático para dentro de nossas casas. Graças à proliferação de canais
e à portabilidade das novas tecnologias de informática e telecomunicações,
estamos entrando numa era em que haverá mídias em todos os lugares. A
convergência não é algo que vai acontecer um dia, quando tivermos banda
larga suficiente ou quando descobrirmos a configuração correta dos
aparelhos. Prontos ou não, já estamos vivendo numa cultura da
convergência. (JENKINS, 2009, p. 43)
Numa sociedade em rede que está impregnada pela cultura da convergência, novos
desafios se impõem às organizações ao se relacionarem com seus públicos. Nesse sentido,
nossa reflexão se volta para tais relações em toda a sua complexidade.
15
6
Morin propõe uma nova forma de se contemplar os fenômenos, em suas relações e correlações multidisciplinares, pela
adoção de três operadores, a saber: 1) operador dialógico: juntar e entrelaçar coisas que estão aparentemente separadas
(ex.: razão x arte); 2) operador recursivo: a causa produz o efeito que produz a causa; 3) operador hologramático: não se
consegue dissociar parte e todo.
Vale atentar que, sob o prisma da complexidade, nos processos
identificatórios estão presentes os constantes movimentos de
abertura/fechamento, simpatia/antipatia, aproximação/afastamento,
aceitação/rejeição, assimilação/resistência, entre outros. Simbólica,
provisória e processual, a forma assumida pela identidade organizacional é
permanentemente atualizada nas complexas negociações realizadas nas
fronteiras culturas, ou seja, nos lugares em que a identidade cultural
(organização) relaciona-se dialogicamente com os “outros”, sejam as
identidades que estão fora dela e/ou as muitas vozes identitárias internas.
A grande mudança que se percebe hoje é, sem dúvidas, a postura das organizações
frente aos públicos. Como expressam várias das 95 teses do Cluetrain Manifesto7, as
empresas estão com medo de seus mercados e precisam se abrir para os diálogos que
acontecem dentro e fora delas, e às vozes de indivíduos que estão estabelecendo diálogos
sobre as organizações. Como afirma Baldissera (2007, p. 238):
... se, até pouco tempo, às organizações não importava muito o que os
públicos pensavam, necessitavam ou desejavam, atualmente, a tendência é
a de procurar atender suas mais particulares necessidades e desejos. Essa
tendência não contempla apenas o lugar dos públicos (como grupo), mas,
em alguns casos, chega ao nível de atendimento das necessidades
particulares de cada um de seus membros.
7
Disponível em http://www.cluetrain.com/portuguese/index.html. Acesso em 30 de março de 2011.
Os públicos são, portanto, a chave para as interações. As trocas entre organizações e
públicos constituem a identidade da própria organização, razão pela qual dedicaremos um
espaço para o entendimento dessa questão à luz da Comunicação Organizacional e das
Relações Públicas.
8
Apresentamos essa mesma ideia em Lemos, 2011.
A nosso ver, o termo comunicação organizacional abarca todo o espectro
das atividades comunicacionais, apresenta maior amplitude, aplicando-se a
qualquer tipo de organização – pública, privada, sem fins lucrativos, ONGs,
fundações etc., não se restringindo ao âmbito do que se denomina
‘empresa’.
Nesse sentido, concordamos com Farias (2009, p. 55) quando afirma que a definição de
Kunsch para Comunicação Organizacional a coloca como um “elemento amplo, uma área na
qual se inserem os diversos escopos da ação comunicacional, incluindo-se aí as atividades
não necessariamente ligadas ao sentido institucional da organização”.
Segundo Lemos (2011, p. 155), “a divisão entre público interno e públicos externos
não explica, de maneira abrangente e completa, a comunicação organizacional” (...). França
(2004; 2009) fez ampla revisão da literatura sobre o tema, e afirma (2004, p. 79): “o foco
contemporâneo da relação situa-se não em critérios de proximidade (geográficos), mas no
do conhecimento, da qualificação e das competências das partes envolvidas”.
Um dos erros mais recorrentes nas organizações tem sido a assunção de que o
público interno está aprisionado pelos muros da organização. Na sociedade em rede e numa
cultura da convergência, não há muros. Como afirma Lemos (2011, p. 157),
Segundo Terra (2011, p. 274), “as relações públicas, por seu caráter estratégico, ajudam
a organização a construir relacionamentos de confiança e compreensão em longo prazo com
seus públicos.” A autora reforça que, “no caso de uma ação direcionada ao contexto virtual,
a interatividade é imediata, acarretando transformações consideráveis nas relações da
organização com os públicos”.
22
Capítulo
2. PLANEJAMENTO DA COMUNICAÇÃO DIGITAL INTEGRADA PARA MÍDIAS SOCIAIS
O ato de planejar é fundamental para uma iniciativa que se pretenda bem-sucedida. Isso
se aplica a diversas dimensões da vida: trabalho, estudos, lazer, vida pessoal. Quando há
planejamento, há também redução de incertezas, e aumentam as chances de acerto.
Para a autora (2003, p. 204), o planejamento “não é algo ‘solto’ e isolado de contextos.
Está sempre vinculado a situações e a realidades da vida de pessoas, grupos e das mais
diversas organizações e instituições da esfera pública e privada”. Além disso, também
segundo Kunsch (2003, p. 207), “... o planejamento não se restringe ao que fazer, de que
modo e com que recursos. É um processo complexo que exige conhecimentos, criatividade,
análises conjunturais e ambientais, além de aplicativos instrumentais técnicos.”
24
Como forma de responder aos desafios do ambiente contemporâneo e das novas
configurações que se esboçavam entre as décadas de 1950 e 1960, as organizações
adotaram as primeiras iniciativas do que se reconhece como planejamento estratégico. Esse
tema hoje tão familiar na ambiência organizacional teve sua origem, portanto, na área de
administração estratégica. Num contexto multidisciplinar, é importante reconhecer que as
mudanças nos macroambientes político, econômico, social, demográfico e tecnológico em
esfera global contribuíram para alterar a dinâmica das organizações, e as mudanças intensas
das décadas de 1970 e 1980 ganharam ritmo exponencial a partir da década de 1990. Neste
início de século XXI, planejar estrategicamente ganhou status de regra, condição para a
sobrevivência das organizações.
Para Kunsch (2003, p. 218-219), são doze as fases do planejamento (não cronológicas,
conforme indicação da autora):
1. Identificação da realidade situacional
2. Levantamento de informações
3. Análise dos dados e construção de um diagnóstico
4. Identificação dos públicos envolvidos
5. Determinação de objetivos e metas
6. Adoção de estratégias
7. Previsão de formas alternativas de ação
8. Estabelecimento de ações necessárias
9. Definição de recursos a serem alocados
10. Fixação de técnicas de controle
11. Implantação do planejamento
12. Avaliação dos resultados
A influência da filosofia de Relações Públicas fica evidente na análise das fases propostas
por Kunsch, pois a autora se preocupa em incluir, logo nas primeiras fases, a identificação
dos públicos envolvidos, mesmo fazendo alusão ao planejamento num contexto genérico.
Concordamos com Kunsch (2003, p. 245) quando afirma que “as organizações
modernas, para se posicionar perante a sociedade e fazer frente a todos os desafios da
complexidade contemporânea, precisam planejar, administrar e pensar estrategicamente a
sua comunicação.” O cenário hodierno é cada vez mais dinâmico e mutável, e as
organizações, inseridas num contexto de profundas e irreversíveis transformações, devem 25
estar atentas ao planejamento de sua comunicação. Como afirma Carneiro (2006, p. 52), a
comunicação deixou de ser um setor meramente operacional para assumir seu
protagonismo na gestão de processos de mudança e na constante busca de resultados de
negócios. O autor complementa: “se por um lado, este novo posicionamento confere
respeito e poder à Comunicação, por outro, lhe impõe crescentes responsabilidades”. Para
ele, a comunicação pode demonstrar competência técnica em diversas dimensões, mas se
não houver gestão estratégica, não terá alcançado o desempenho desejado, necessário e
pleno.
A criação de políticas internas para orientar os funcionários quanto à sua relação com as
mídias sociais, por exemplo, é uma tendência necessário que tem se fortalecido em todo o
mundo.9 No Brasil, algumas organizações já adotaram manuais e oferecem treinamento a
seus colaboradores, numa iniciativa que visa prepará-los para lidar com as mídias sociais10.
No entanto, não é ainda uma prática preventiva e considerada relevante para a maioria das
organizações. Solis (2010) menciona o estudo Digital Brand Expressions e reforça que menos
29
da metade das empresas avaliadas (45%) desenvolvem protocolos e políticas para a
comunicação corporativa em mídias sociais (incluindo diretrizes de como responder a
comentários negativos) e apenas 39% criam e distribuem aos funcionários orientações para
uso pessoal e profissional das mídias sociais.
9
Apenas como ilustração: no site Social Media Governance, Boudreaux reúne, atualmente, políticas de 176 organizações. As
terminologias variam enormemente: social media guidelines, social media user guidelines, social media policy, social media
use policy, blogging policy, online policy, online social media principles e digital participation guidelines são apenas alguns
dos títulos que as organizações dão aos documentos com diretrizes para uso pessoal e profissional de mídias sociais.
Disponível em: http://socialmediagovernance.com/policies.php. Acesso em maio de 2011.
10
Em geral, as multinacionais que operam no Brasil replicam as políticas globais. O exemplo da Intel é ilustrativo. Disponível
em: http://www.intel.com/sites/sitewide/en_US/social-media.htm. Acesso em maio de 2011. Algumas empresas publicam
suas políticas de uso das mídias sociais em seus websites. A Weg, por exemplo, divulga sua política numa lista que inclui as
políticas de saúde e segurança, de meio ambiente, de qualidade, de responsabilidade social, além do Código de Ética,
conferindo à política de uso das mídias sociais status semelhante ao dos demais documentos mencionados. Disponível em:
http://www.weg.net/var/ezflow_site/storage/original/application/2b9727f64706b65274e6c7e3ab234943.pdf . Acesso em
maio de 2011.
2.3. Planejamento de Comunicação para mídias sociais
Pode-se definir mídia social como aquela utilizada pelas pessoas por meio
de tecnologias e políticas na web visando ao compartilhamento de
opiniões, ideias, experiências e perspectivas. São consideradas mídias
sociais os textos, imagens, áudio e vídeo em blogs, microblogs,
comunidades, quadro de mensagens, fóruns de discussão on-line, podcasts,
wikis, vlogs e afins que permitem a interação entre os usuários.
As mídias sociais estão diretamente ligadas à Internet, mas não são necessariamente
uma característica da chamada Web 2.0, pois, como aponta Recuero, já havia na própria
internet (1.0) formas de compartilhamento como as listas de discussão. No entanto, é certo
que a Web 2.0 potencializou o alcance e a abrangência das mídias sociais.
Conversação: mídia social é conversação. Mais do que a mera participação, ela permite que
os atores possam engajar-se de forma coletiva, pela cooperação e, mesmo, pela
competição. Assim, a possibilidade de conversação síncrona ou assíncrona é uma
característica desse tipo de ferramenta. Por isso, mídia social é tão relacionada ao buzz das
redes.
Emergência de redes sociais: a mídia social possibilita a emergência de redes sociais por
meio de sua apropriação e conversação. Isso se deve ao fato de ela permitir que os rastros
31
da interação fiquem visíveis e permitam que a interação seja estendida no tempo. A mídia
social, assim, complexifica o espaço social, permitindo novas emergências de grupos. Esses
grupos podem constituir-se também como comunidades virtuais.
Emergência de capital social mediado: a mídia social possibilita que novas formas de capital
social surjam e sejam apropriadas. Ela permite também a criação de valores coletivos e
individuais mais facilmente perceptíveis pelos atores da rede. É por conta disso que a
apropriação pode ser modificada e reconstruída nesses espaços diante dos valores
concebidos pelos grupos. Esse capital tem o diferencial de ser independente da interação
direta: é possível ter acesso aos valores construídos por um grupo sem fazer parte dele, e
também é possível apropriar-se desse capital e transformá-lo em outro tipo de valor -
buscar uma informação altamente especializada, por exemplo. (RECUERO, 2008, com
adaptação).
Uma das mais expressivas manifestações desse novo modo de compartilhar, interagir e
estabelecer trocas são as redes sociais on-line, para as quais parece não haver limites. Há
todo tipo de rede social que se possa imaginar. Isso porque as redes sociais on-line são
apenas a transposição amplificada das muitas redes sociais que já tínhamos e temos em
nosso dia a dia para ambiências digitais.
11
A campanha Chuva de Twix incluía ações de divulgação em blog, Facebook, Twitter e You Tube, e convidava os
internautas a conferir uma chuva de Twix na Av. Paulista, 1230, no dia 30 de maio de 2010. O blog da campanha,
http://chuvadetwix.com.br (acesso em junho de 2010), foi amplamente acessado durante o período de divulgação do
evento. No entanto, a falta de conexão entre o planejamento on-line e o planejamento off-line conduziu a uma série de
equívocos que repercutiram negativamente sobre a marca Twix. Os participantes frustrados com a ‘garoa’ de Twix
provocaram uma ‘enchente’ de posts em blogs e no You Tube, Facebook e Twitter, a maioria criticando a iniciativa da
empresa Mars. Posteriormente o blog foi retirado do ar. A revista Exame, respeitada publicação sobre o mundo dos
negócios, dedicou espaço para o debate sobre o descompasso no planejamento com consequências desastrosas. Disponível
em: http://portalexame.abril.com.br/marketing/noticias/chuva-twix-vira-garoa-gera-efeito-negativo-565056.html. Acesso
em junho de 2010.
12
Farmville® é marca registrada de Zinga®. Disponível em www.farmville.com. Integrado ao Facebook, o aplicativo
alcançou, em curto espaço de tempo, milhões de usuários ávidos por trocar presentes – animais, árvores, dinheiro e outros
mimos.
Fazer aqui uma lista de mídias sociais e redes sociais on-line seria limitar o fenômeno.
Novas mídias e redes surgem e morrem a todo instante. Algumas, por seus atrativos mais
‘democráticos’ e populares, crescem enormemente de um dia para o outro. São diversas as
motivações e finalidades para o surgimento de uma determinada mídia ou de uma rede
social on-line, e, entre os usuários de internet, estar integrado a alguma rede social é
praticamente obrigatório.
13
Em “O conteúdo morreu”, Marcelo Coutinho faz uma reflexão sobre este fenômeno. Disponível em:
http://www.cultura.gov.br/site/2006/09/28/o-conteudo-morreu-por-marcelo-coutinho/. Acesso em setembro de 2010.
34
14
The Conversation Prism. Por Brian Solis and Jesse Thomas, 2008.
Mas, afinal, que estratégias adotar num ambiente em que as interações se baseiam em
afinidades e interesses comuns que se constroem e se desfazem em curtos intervalos, mas
com consequências muitas vezes desastrosas? Embora seja uma tarefa cada vez mais difícil,
nunca foi tão importante pensar estrategicamente e planejar. Num ambiente tão volátil, isso 35
Brito elege como etapa inicial conhecer o cliente e seus clientes (como agência, usa essa
qualificação de ‘cliente’ para designar a empresa contratante dos serviços da agência e,
como objeto final das ações de comunicação em redes sociais on-line, os clientes dos
clientes), e não fala em públicos de forma abrangente. O termo adotado por ele na segunda
fase é ‘mapear os canais’. Brito também é inespecífico ao usar o termo ‘criar uma ação’.
Afinal, considerando-se o planejamento em sua função de precedência (deve acontecer
antes), a fase ‘planejar’ chama para si a responsabilidade de que a criação de ações seja uma
atividade plenamente alinhada ao próprio planejamento, e não uma fase de per si.
17
Iuri Brito é publicitário, fundador da agência digital Prumos e colunista do Webinsider. Disponível em
http://webinsider.uol.com.br/2010/04/19/planejando-a-sua-campanha-para-redes-sociais/. Acesso em junho de 2010.
18
Flávio Horta é publicitário e diretor do Digitalks. Disponível em http://flaviohortadigital.blogspot.com/2010/04/aula-de-
planejamento-em-redes-sociais.html. Acesso em junho de 2010.
Horta lista as etapas do planejamento de comunicação para mídias sociais começando
pela ‘produção de conteúdo’. Mas, afinal, para quem se produz o conteúdo? Portanto, aqui,
também, falta atenção à fase de diagnóstico. Como segunda etapa, Horta fala em ‘início do
diálogo’, novamente ignorando a identificação dos públicos envolvidos. Como iniciar o
diálogo sem identificar o público? E não reserva espaço para os objetivos. Enfim... planejar
para chegar a quê? A quem? Aonde? Outro equívoco está em considerar ‘agilidade nas
respostas’ parte do planejamento, e não uma característica inerente ao processo como um
todo, do planejamento em si à gestão cotidiana da Comunicação Digital.
Outra questão que não podemos ignorar é o caráter restritivo muitas vezes empregado
ao tratar o planejamento de comunicação em mídias sociais como um mero planejamento
de campanhas. Brito usa a expressão ‘planejar campanhas para mídias sociais’ [grifo nosso],
termo comumente adotado por profissionais da área, remetendo o conceito a uma atuação
meramente mercadológica. Em geral, percebe-se no mercado mais propensão para a
atuação pontual que para o planejamento estratégico em redes sociais on-line visando
construir relacionamentos.
19
Disponível em http://neigrando.wordpress.com/2011/04/05/planejamento-estrategico-de-campanhas-de-marketing-
para-midia-social/. Acesso em 22 de abril de 2011.
Os objetivos (o que você quer alcançar?)
Avalie seus recursos (tempo, $$$, pessoas, TI, …)
Identifique o público-alvo* (“ouça”, pesquise)
Analise os pontos fracos, fortes, oportunidades, ameaças (SWOT) e a concorrência
Escolha os meios de conversação, ou seja, as ferramentas de mídia social
Defina estratégias de design, conteúdo, promoção, engajamento e conversão para
cada meio escolhido
Planeje a implantação e a integração em ambiente de teste
Planeje o lançamento da campanha em produção e a divulgação
Identifique como serão medidos os resultados para análise e otimização *[grifo
nosso]
Muitas situações de crise envolvendo mídias sociais são fruto de falta de integração e
têm origem em todas as dimensões do planejamento: dimensão estratégica (por problemas
de natureza sistêmica, como a falta de integração entre as áreas ao definir o planejamento
global, ou mesmo pela indefinição quanto à relevância de se adotar um planejamento
estratégico para a atuação em mídias sociais), dimensão tática (pela falha no planejamento
das áreas em si, e, no caso das mídias sociais, por não se designar uma área diretamente
responsável pelo planejamento dessa atividade específica) e dimensão operacional (pela
falta de treinamento e de políticas claras de atuação em mídias sociais, tanto do ponto de
vista da atuação corporativa – incluindo-se como responder a comentários negativos, por
exemplo -, quanto na elaboração de instruções para os próprios colaboradores quanto ao
uso pessoal e profissional das mídias sociais).
40
O exemplo usado por Lauretti & Brandão (2010) é bastante ilustrativo para esclarecer o
tema. Os autores mencionam a matéria Greenpeace: governo é sócio de desmatadores,
divulgada no jornal O Globo em 31 de maio de 2009 (versão on-line) e 1º de junho de 2009
(versão impressa) como evento que desencadeia uma série de externalidades. Na linha fina,
o jornal afirma que o BNDES financia pecuaristas responsáveis por 80% da devastação da
Amazônia, e planeja duplicar a produção. Com a postura ativa do Greenpeace, logo o tema
se propagou pela rede, dando grande dimensão à denúncia.
Site de O Globo20
Site Amazonia.org.br21
20
Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/05/31/greenpeace-governo-socio-de-desmatadores-
756125358.asp . Acesso em março de 2011.
21
Disponível em: http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=314795 . Acesso em março de 2011.
Na Veja on-line, no mesmo dia, no blog Radar on-line, de Lauro Jardim, outra matéria:
Pão de Açúcar suspende compra de carne de áreas desmatadas, com a seguinte atualização
no rodapé: O Wal Mart e o Carrefour também seguirão a recomendação do MP. Ou seja, as
três maiores redes de supermercados do país aderiram.
43
Site do DCI23
22
Disponível em: http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/arquivo/brasilpao-de-acucar-suspende-compra-de-carne-de-
areas-desmatadas/. Acesso em março de 2011.
Em 22 de julho de 2009, O Estado de São Paulo trouxe a seguinte manchete: BNDES
aperta o cerco a produtores de carne bovina.
Site do Estadão24
Site do Greenpeace25
23
Disponível em: http://www.dci.com.br/Acoes-de-frigorificos-caem-apos-o-boicote-de-varejistas-13-289152.html. Acesso
em março de 2011.
24
Disponível em: http://www.estadao.com.br/economia/not_eco406721,0.htm. Acesso em março de 2011.
25
Disponível em: http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/timberland-exige-compromisso-d/. Acesso em março de
2011.
Blog Verde26, disponível em O Globo.
Num efeito cascata, públicos que não estavam participando do embate inicial (entre
Greenpeace – BNDES - frigoríficos) se veem pressionados a tomar medidas para se proteger
de uma crise de imagem. A rede varejista, preocupada, cancela pedidos de carne e de couro.
Em 13 de agosto de 2009, nova divulgação do Greenpeace: Bertin segue o exemplo da
Marfrig e se compromete com o desmatamento zero para pecuária na Amazônia. E ainda em 45
Site do Greenpeace27
26
Disponível em: http://oglobo.globo.com/blogs/blogverde/default.asp?ch=S&a=&pagAtual=2 . Acesso em março de 2011.
27
Disponível em: http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/bertin-segue-o-exemplo-do-marf/. Acesso em março de
2011.
Se o fenômeno da externalidade, como um efeito cascata - envolvendo diversos
públicos e com consequências sobre os negócios e a imagem das organizações -, já tem
grandes dimensões no mundo das mídias impressas, isso ganha proporções muito maiores
no contexto digital. E situações como essa, com impactos sobre a receita e sobre a operação
e resultados das organizações, são foco da gestão de riscos e da gestão de crises. Nesse
sentido, entende-se por gestão de riscos a atividade preventiva e por gestão de crises a
atividade reativa ligada ao gerenciamento de fatos que fogem do controle da organização e
representam riscos à sua operação e sobrevivência.
Para Neves (2000), uma questão muito importante é a própria imagem do RP nas
organizações. Diante disso, torna-se essencial que o relações-públicas compreenda seu
papel e a postura que deve assumir diante dos fenômenos comunicacionais e das questões
que podem impactar as organizações.
Para Neves (2000, p. 51), “Issue management é a orquestração de um processo que visa
proteger os negócios, reduzir riscos, criar oportunidades e tratar a imagem da empresa
47
como o seu mais valioso patrimônio”. Também segundo o autor, qualquer condição interna
pode vir a se tornar uma questão pública. Para Neves (2000, p. 51), “muitas crises
empresariais se criam nos porões da organização, outras crescem na sala de jantar, no nariz
dos administradores. (...) Um dia, a casa cai...”
Para Neves (2000, p. 115), “Crise empresarial é definida como uma situação inesperada
que foge ao controle dos administradores e cujo desdobramento vai prejudicar a atuação
normal da empresa. Em certo sentido, ela é um issue. Um issue sangrando.” Segundo o autor
(2000, p. 115), “a relação entre crises empresariais e Questões Públicas é direta”, sendo que
as grandes crises empresarias geralmente estão ligadas a:
Em The Crisis Manager: facing risk and responsibility, Lerbinger (1997, p. 4) define crise
como um evento que leva, ou tem o potencial de levar uma organização ao descrédito, e
põe em risco sua futura lucratividade, crescimento e, possivelmente, sua própria
sobrevivência28. Como base para o entendimento do termo crise, optamos pela definição de
Otto Lerbinger (1997), também adotada por Oliveira (2007, p. 165), de cuja tradução nos
28
[Do original: “an event that brings, or has the potential for bringing, an organization into disrepute and imperils its future
profitability, growth, and, possibly, its very survival.].
apropriamos: “um evento que traz ou tem potencial para trazer à organização uma futura
ruptura em sua lucratividade, seu crescimento e, possivelmente, sua própria existência”.
Oliveira (2007) apresenta a tipologia proposta por Lerbinger (1997) em seu artigo ‘O
papel essencial das relações públicas no gerenciamento de crises’. Por se tratar de uma
tradução adequada para o entendimento das ideias de Lerbinger, optamos por apresentar os
conceitos de cada tipo de crise conforme descritos por Oliveira (2007) (com adaptação):
- Crises naturais – fenômenos da natureza, não há culpa humana. Fatalidades. Exemplos:
terremotos, tsunamis.
- Crises tecnológicas – causadas pelo homem, como resultado de manipulação dos
A tipologia proposta por Lerbinger (1997) não é a única disponível, mas tem sido
comumente adotada por autores da área. Em geral, percebe-se que há uma preocupação em
identificar a origem das crises. Observa-se que há questões de origem interna (questões
internas) e origens externas (questões públicas), sendo esta última mais conhecida como
issue management. As questões internas têm sempre o potencial de se tornar questões
públicas, sendo, portanto, objeto do issue management.
Independentemente de sua origem (se interna ou externa), as crises trazem grandes
impactos para as organizações, e a má gestão da crise e da comunicação de crise pode
comprometer a reputação organizacional e, em alguns casos, a continuidade dos negócios.
51
Em todas as etapas do gerenciamento de questões (internas ou públicas), o relações-
públicas é peça-chave. Sua contribuição começa no planejamento e segue até às ações de
controle e monitoramento, sendo contínua.
Aqui, mais uma vez, podemos observar que a comunicação é inerente ao processo de
elaboração de um plano de contingência, pois, da identificação de riscos e vulnerabilidades,
passando aos alertas e estabelecimento de núcleo ou centro de comunicação de crise,
identificação de públicos, e por fim, ao preparo de recursos humanos e materiais para o
contato com a mídia e formadores de opinião em geral, todas as etapas supõem a presença
e a participação ativa de um profissional de comunicação/relações públicas.
Ao falar sobre a importância de uma postura proativa por parte de quem está à frente
do processo de gerenciamento de crises (“seja como executivo responsável pela área de
assuntos corporativos ou como consultor de comunicação empresarial”), Lucas (2004, p. 39)
apresenta “dez passos que, em momentos de crises, podem aproximar ou afastar uma
companhia de seus objetivos”:
29
Disponível em http://www.slideshare.net/marthagabriel/gesto-de-crises-em-mdias-sociais-by-martha-gabriel. Acesso em
20 de abril de 2011.
Martha Gabriel, se não for necessária uma mudança, a situação não é de crise, mas uma
falha ou incidente.
Martha Gabriel faz uma diferenciação entre gestão de riscos – avaliação de ameaças e
formas de evitá-las – e gestão de crises – que lida com desastres depois que acontecem. A
professora lista diversos tipos de crise, alguns das quais coincidentes com a classificação de
Lerbinger (1997): desastres naturais; tecnológica; confrontação; malevolência; crise de
gestão negligente; crise de erro de gestão (que entendemos englobar a categoria anterior –
gestão negligente); crise de má conduta; crise de violência no trabalho; rumores.
Quando se fala em crises nas mídias sociais, tem-se em mente que o público-alvo passa
a ser, também, mídia e gerador de conteúdo. No contexto de rápido compartilhamento e
disseminação de informações que experimentamos hoje, os impactos negativos por meio
das redes sociais on-line são indiscutíveis. Segundo Martha Gabriel, as crises de evento
(ligadas a ocorrências do mundo físico) tornam-se mais visíveis e as crises informacionais
“tornam-se mais prováveis de acontecer e de ganhar visibilidade”. Como afirma, a conexão
favorece a agilidade na disseminação, a descontextualização e a fragmentação favorecem os
mal-entendidos, e a velocidade não permite averiguar fatos, potencializando boatos.
Para aprofundarmos nosso pensamento a esse respeito, propomos uma reflexão sobre a
distinção entre crises no contexto das mídias sociais. Percebe-se que toda crise que seja
agravada pela rápida disseminação em mídias sociais é objeto de palestras e menções sob a
distinção genérica de case de crise em mídias sociais. A nosso ver, tal forma de interpretar o
fenômeno não contribui para o desenvolvimento de estratégias mais claras para cada
situação. Cada crise tem peculiaridades quanto à sua origem ou motivações iniciais, o que
pode ser determinante para as ações durante e após o evento. 56
Para Martha Gabriel, as mídias sociais podem afetar uma crise tanto negativamente
quanto positivamente. Negativamente, se houver falhas quanto à frequência (vácuo
informacional), velocidade (monitoramento), minimização de alcance (local afeta
globalmente), visibilidade (requer transparência) e permanência (posicionamento em
posições relevantes nas ferramentas de busca, como o Google, por exemplo). Positivamente,
pela mensuração, diálogo contínuo e duração curta.
Em nossa percepção, as mídias sociais não apenas afetam uma crise. Nossa proposta,
aqui, é refletir sobre os conceitos de gestão de crises nas mídias sociais sob uma perspectiva
complexa, como propõe Morin (2006) e como avalia Baldissera (2007; 2009) ao tratar da
complexidade no contexto organizacional.
1. Dar origem a uma crise – esse entendimento está mais ligado às situações que
começam nas mídias sociais, geralmente por um mau uso das ferramentas ou por
falta de planejamento adequado. Há diversos relatos de campanhas de marketing
nas mídias sociais que acabam por dar início a crises.
2. Afetar uma crise – acepção comum em aulas, palestras, seminários e fóruns de
discussão, entende-se que as mídias sociais, por sua própria natureza, potencializam
os efeitos de uma crise, já que a disseminação das informações ganha proporções 57
Em todos esses casos, tem-se que as mídias sociais podem fazer a diferença, dando
início ao processo, fomentando-o e/ou ajudando a resolvê-lo. Em termos de planejamento,
essa abrangência requer decisões estratégicas, táticas e operacionais assertivas e o
permanente monitoramento dos ambientes digitais.
De acordo com Rosa (2007, p. 64),
Nesta nova sociedade digital em que passamos a habitar, a palavra
convergência assumiu as dimensões de um mantra. (...) Mais tecnologia, na
prática, significa ser capaz de expor tudo em níveis de detalhes cada vez
menores. (...) A tecnologia é, antes de tudo, um ambiente social: até nossas
artérias estão mais expostas. Expostas ao mundo todo. Não são apenas os
líderes e organizações que estão mais expostos. Não são apenas as
reputações. Tudo está mais exposto, para o bem ou para o mal. Inclusive
nossas entranhas.
Disponível em www.briansolis.com
No cenário 2.0, tem-se que a maioria das crises em potencial podem ser evitadas por
meio de uma atenção proativa às conversações dos públicos. Ou seja, o fluxo de
gerenciamento de crises começa pela atuação ativa para ouvir, observar, conversar,
aprender e planejar, além de contínua adaptação e engajamento, sendo, portanto, um fluxo
circular em que se busca permanentemente identificar os potenciais problemas.
Disponível em www.briansolis.com
A seguir, apresentamos as fontes por meio das quais selecionamos os doze casos
64
avaliados neste estudo. Estes casos serão objeto de estudos neste módulo, uma vez que
alinhar a dimensão teórica à prática favorece o entendimento dos fenômenos à luz da
literatura revisada, proporcionando uma visão reflexiva sobre o tema.
1. A Revista Exame de 4/5/2011 trouxe em sua matéria de capa o título “Em Guerra
com o Consumidor”. Segundo a reportagem, de Agostini e Meyer (2011), o ambiente
2.0 trouxe muitos estragos para grandes empresas que não souberam gerenciar seus
canais de atendimento adequadamente. Entre as marcas mencionadas por grande
exposição negativa no YouTube, estão: Renaut (16 de março de 2011); Lamborghini
(16 de março de 2011); Whirlpool (20 de janeiro de 2011) e United Airlines (6 de
julho de 2009).
2. O blog Globalizar S/A (HENRIQUE, 2010) aponta cinco grandes #fails (fracassos,
erros) de marketing durante o primeiro semestre de 2010, nesta ordem: 5º lugar:
Devassa/Bem Misteriosa e o Twitter; 4º lugar: Twix e o YouTube; 3º lugar: Visa e o
Twitter; 2º lugar: Locaweb e o Twitter; 1º lugar: Fiat e o Formspring. Por trazer casos
recorrentes em debates e fóruns sobre o tema, particularmente Locaweb e Fiat,
optamos por adotar a lista sugerida pelo blog31; os casos Twix, Locaweb e Fiat
também fazem parte da lista Infotrends/Exame de grandes fracassos na web.
3. Consideramos, também, dois casos acontecidos no Brasil no primeiro semestre de
2011: Arezzo e a coleção Pelemania, e o Churrascão da gente diferenciada – Estação
Angélica do metrô. Por fim, o caso de boicote sofrido pela Domino’s Pizza em abril
de 2009 nos EUA, pela ampla repercussão em todo o mundo.
31
HENRIQUE, Cleber. Top Five Marketing #Fail nas mídias sociais. Disponível em:
http://globalizarsa.blogspot.com/2010/06/top-five-marketing-fail-nas-midias.html. Publicado em 1º de junho de 2010.
Acesso em junho de 2011.
que afetam a operação; questões puramente técnicas e, no caso específico da
Comunicação Digital, o trabalho de agências digitais que atuam nessa dimensão;
5. Abordagem quanto ao uso das mídias sociais: iniciaram a crise, afetaram a crise
e/ou ajudaram a resolver a crise.
4.2.1. Renault
Descrição do evento:
Insatisfeita por ter seu Renault Mégane parado na garagem há cerca de quatro anos, a
consumidora Daniely Argenton criou em fevereiro de 2011 um site
(www.meucarrofalha.com.br), um perfil no Twitter (@meucarrofalha), além de usar o
mesmo apelido em um perfil no Orkut e em uma página no Facebook, tudo como forma de
registrar seu protesto contra a
montadora. Os dois vídeos gravados
pela consumidora também foram
postados no YouTube em março de
2011, e mostram o carro
empoeirado na garagem de casa.
Daniely relata que a empresa não se
dispôs a resolver os problemas
técnicos que o carro apresentou desde sua aquisição, apesar de a consumidora ter recorrido
inclusive à Justiça. Os vídeos foram vistos cerca de 800 mil vezes. A empresa propôs um
acordo, oferecendo-se para reembolsar a consumidora por todos os gastos com consertos, e
doou um Renault Clio zero Km a uma instituição de caridade a pedido da cliente (AGOSTINE
& MEYER, 2011, p. 44). A postura da empresa foi reativa e não houve manifestação por meio
de mídias sociais. A justiça determinou que a consumidora retirasse os conteúdos do ar,
alegando que ela “cometeu abuso do seu direito de liberdade de expressão, podendo causar
danos à imagem da empresa”32. A Renault emitiu comunicado à imprensa, desculpando-se
pelo problema e apresentando solução33.
Origem do evento:
A crise da Renault teve origem em uma questão de atendimento insatisfatório ao
consumidor. Pode-se considerar que foi uma questão interna que, por seu gerenciamento
ineficiente, tornou-se uma questão pública.
Tipologia:
67
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), o evento é uma “crise de decepção” (expectativa
frustrada quanto ao produto ou serviço adquirido).
Dimensões do planejamento:
A crise da Renault revela deficiências, sobretudo, nas dimensões estratégica (por indefinição
quanto à relevância de se adotar um planejamento estratégico para a atuação proativa em
mídias sociais e pela falta de integração entre diversas áreas da empresa, como SAC,
Marketing, Comunicação e Jurídico) e tático-operacional (pela falha no próprio serviço de
atendimento e assistência técnica).
Com relação ao evento mencionado, a organização não se preparou para abrir o diálogo por
meio das mídias sociais e recorreu ao discurso jurídico. Apenas posteriormente houve uma
32
Para mais informações, acesse http://www.sequelanet.com.br/2011/03/meu-carro-falha-daniely-argenton-
versus.html#ixzz1QLGDENHx. Acesso em junho de 2011. O site Meu Carro Falha está disponível em
http://www.meucarrofalha.com.br . Acesso em junho de 2011.
33
Mais informações em http://info.abril.com.br/noticias/internet/renault-e-meu-carro-falha-fazem-acordo-23032011-
7.shl . Acesso em junho de 2011.
ação mais ativa para dar resposta favorável à solicitação da consumidora. Observa-se que as
falhas em nível estratégico afetam as demais dimensões do planejamento, e a empresa
perde sua agilidade para responder assertivamente e em tempo hábil.
4.2.2. Lamborghini
68
Descrição do evento:
Um grupo de chineses destrói um modelo Lamborghini Gallardo a marretadas, a pedido de
um consumidor indignado porque o carro deixou de dar partida apenas dois meses após sua
aquisição. A iniciativa do consumidor contou com a cobertura da imprensa local, e um vídeo
que registrou o evento foi postado no YouTube em 16 de março de 2011, tendo sido visto
mais de 600 mil vezes até o momento. A Lamborghini limitou-se a emitir comunicado
afirmando ter solucionado o problema do cliente (AGOSTINE & MEYER, 2011, p. 44). A
empresa não recorreu às mídias sociais
para esclarecer o problema,
prevalecendo, portanto, a versão do
consumidor. Em todas as buscas que
realizamos no Google e no Bing, não
foi possível localizar a resposta da
empresa, mas identificamos milhares
de links para o vídeo publicado e
replicado no YouTube.
Origem do evento:
A crise da Lamborghini teve origem em uma questão de atendimento insatisfatório ao
consumidor. Pode-se considerar que foi uma questão interna que, por seu gerenciamento
ineficiente, tornou-se uma questão pública.
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), o evento é uma “crise de decepção” (expectativa
frustrada quanto ao produto ou serviço adquirido).
Dimensões do planejamento:
A crise da Lamborghini revela deficiências, sobretudo, nas dimensões estratégica (por
indefinição quanto à relevância de se adotar um planejamento estratégico para a atuação
proativa em mídias sociais e pela falta de integração entre diversas áreas da empresa, como
SAC, Marketing e Comunicação) e tática (pela falha no próprio serviço de atendimento e
69
assistência técnica).
Com relação ao evento mencionado, a organização se limitou a emitir nota que, pela própria
divulgação – muito tímida -, não é facilmente localizável. Observa-se que as falhas em nível
estratégico afetam as demais dimensões do planejamento, e a empresa perde sua agilidade
para responder assertivamente e em tempo hábil.
Descrição do evento:
Após sucessivas tentativas de diálogo com a
Whirlpool por conta de uma geladeira Brastemp
com problemas, o consumidor Oswaldo Borelli
gravou um depoimento que registrava sua história.
No vídeo, postado no YouTube em 20 de janeiro de
2011, Borelli relata que sua família estava comendo
fora há três meses em virtude de defeito em seu refrigerador, o que já tinha sido reportado
à empresa, sem sucesso. Depois de tentar resposta satisfatória por meio do serviço de
assistência técnica, o consumidor resolveu divulgar sua história nas mídias sociais. O vídeo
foi assistido aproximadamente 800 mil vezes e a empresa enviou nova geladeira à casa do
cliente quatro dias após a postagem no YouTube. A empresa divulgou uma carta com pedido
de desculpas34, mas a repercussão foi bem mais modesta que a do vídeo – a carta foi vista
70
apenas 20 mil vezes até maio de 2011 (AGOSTINE & MEYER, 2011, p. 44).
Origem do evento:
A crise da Whirlpool teve origem em uma questão de atendimento insatisfatório ao
consumidor. Pode-se considerar que foi uma questão interna que, por seu gerenciamento
ineficiente, tornou-se uma questão pública.
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise
motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), o evento é
uma “crise de decepção” (expectativa frustrada
quanto ao produto ou serviço adquirido).
34
Disponível em: http://www.brastemp.com.br/Home/comunicado29012011 . Acesso em junho de 2011.
Dimensões do planejamento:
A crise da Whirlpool revela deficiências, sobretudo, na dimensão estratégica, pela falta de
integração entre diversas áreas da empresa, como SAC, Marketing, Assistência Técnica e
Comunicação, e tático-operacional (pela falha no próprio serviço de atendimento e
assistência técnica). Observa-se que a Whirlpool já estava presente nas mídias sociais
(Facebook, Twitter, YouTube e Flickr), tendo subdimensionado a repercussão que aquelas
têm na divulgação de falhas no atendimento.
Observa-se que a Whirlpool usou a própria rede para oferecer resposta à questão, embora
71
tenha sido uma reação relativamente demorada se considerarmos que o tempo das mídias
sociais é urgente.
Descrição do evento:
Em 2008, a companhia aérea United Airlines quebrou
o violão de um dos integrantes da banda Sons of
Maxwell durante o transporte da bagagem. Após um ano de tentativas para conseguir
reembolso pelo acidente, os músicos postaram um vídeo com uma música que relatava a
experiência com a empresa. Publicado em 6 de julho de 2009 no YouTube, o vídeo recebeu
mais de 10 milhões de visitas e tornou-se um dos mais famosos casos de repercussão por
meio das mídias sociais (AGOSTINE & MEYER, 2011, p. 44).
Origem do evento:
A crise da United Airlines teve origem em uma questão de atendimento insatisfatório ao
consumidor. Pode-se considerar que foi uma questão interna que, por seu gerenciamento
ineficiente, tornou-se uma questão pública.
72
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), o evento é uma “crise de decepção” (expectativa
frustrada quanto ao produto ou serviço adquirido).
Dimensões do planejamento:
A crise da United Airlines revela deficiências, sobretudo, nas dimensões estratégica, pela
falta de integração entre diversas áreas da empresa, como SAC, Marketing, Comunicação,
Recursos Humanos e Operações Logísticas) e tática (pela falha no próprio serviço de
atendimento e no treinamento de operações logísticas), com impactos diretos sobre a
dimensão operacional. A letra da música expressa o difícil e improdutivo diálogo com a
atendente do SAC e mostra a imperícia operacional durante o embarque de bagagens. Ao
longo da narrativa, fica clara, também, a morosidade da empresa para lidar com a
reclamação. A United Airlines não se apropriou das mídias sociais com a mesma habilidade
de seu consumidor, o que potencializou a repercussão negativa sobre a questão.
Abordagem quanto ao uso das mídias sociais:
Na crise da United Airlines, as mídias sociais iniciaram, afetaram a crise e ajudaram a
resolver a crise. É importante notar, no entanto, que o mau gerenciamento de uma questão
que até então estava circunscrita à própria organização passou a ser uma questão pública
graças à iniciativa do próprio consumidor que, insatisfeito, levou o assunto a público. Não se
trata, portanto, de uma crise iniciada por uma campanha de comunicação em mídias sociais
promovida pela própria organização, mas por ação externa. A United Airlines não se
apropriou rapidamente das mídias sociais para oferecer resposta à questão, o que favoreceu
a repercussão negativa prolongada sobre o tema. Após mais de 2 milhões de visitas ao vídeo
e cerca de uma semana após sua publicação, a empresa se manifestou de forma mais
assertiva e informou que as solicitações do músico foram atendidas e que seus processos e
protocolos estavam sob revisão. A empresa reconheceu que não havia desculpa para o
problema: “we’re sorry”.
73
4.2.5. Bem Misteriosa e o Twitter - #bem misteriosa
Descrição do evento:
Para promover o lançamento da cerveja Devassa, a agência contratada pelo Grupo
Schincariol resolveu aguçar a curiosidade do público e criou um hotsite com uma fechadura
e uma pessoa ‘Bem Misteriosa’ atrás. Vinculada
ao Twitter, quanto mais a tag #BemMisteriosa
fosse twittada, mais a imagem se revelaria. Mas
a demora em revelar quem era a tal misteriosa
fez com que a tag #BemMisteriosaFail logo
surgisse, tornando-se a primeira no Trending
Topics. O público ficou irritado e a partir daí
mensagens criticando a campanha eram
publicadas em status do Twitter, Facebook,
posts em blogs e outros (TOP FIVE, 2010).
Origem do evento:
A crise da Schincariol/Devassa teve origem em uma falha de planejamento de campanha em
mídias sociais. Trata-se de uma iniciativa da própria empresa que ganhou dimensão pública
por sua própria natureza, pois consistia em ação promocional.
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), esse evento é uma “crise de decepção” (expectativa
frustrada quanto ao produto ou serviço adquirido). Esta crise não diz respeito ao produto
Devassa em si, mas à própria estratégia promocional como fonte de frustração e decepção.
Dimensões do planejamento:
A crise da Schincariol/Devassa revela deficiências, sobretudo, na dimensão tática (pela falha
no dimensionamento da ação em termos de mercado e avaliação prévia da possível
repercussão da ação), com impactos diretos sobre a dimensão operacional (site lento demais
74
para uma audiência ágil e ansiosa demais).
Descrição do evento:
Mencionado anteriormente (p. 32), o
caso Twix (um produto da Mars) ganhou
ampla repercussão nas mídias sociais em 30 de maio de 2010. Após convocar os apaixonados
pela marca por meio de ações integradas com o YouTube e um hotsite exclusivo para a
campanha Chuva de Twix, que prometia uma chuva do chocolate, o tão esperado flash mob
do Twix foi um fracasso, pois as milhares de pessoas que foram presenciar a chuva de
chocolate depararam com uma “garoa” de papel picado e alguns chocolates. Durante e após
o evento, no Twitter, já era possível ver o resultado desastroso da ação, e no YouTube, onde
tudo começou, o encontro marcado tornou-se alvo de gozação em vários vídeos (TOP FIVE,
2010).
Origem do evento: 75
A crise da Mars / Twix teve origem em uma falha de planejamento de campanha em mídias
sociais. Trata-se de uma iniciativa da própria empresa que ganhou dimensão pública por sua
própria natureza, pois consistia em ação promocional.
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), esse evento é uma “crise de decepção” (expectativa
frustrada quanto ao produto ou serviço adquirido). Esta crise não diz respeito ao produto
Twix em si, mas à própria estratégia promocional como fonte de frustração e decepção.
Dimensões do planejamento:
A crise da Mars / Twix revela deficiências, sobretudo, na dimensão tática (pela falha no
dimensionamento da ação em termos de público e avaliação prévia da possível repercussão
da ação), com impactos diretos sobre a dimensão operacional (o evento foi mal planejado e
incompatível com a abrangência da própria ação de divulgação em mídias sociais).
Abordagem quanto ao uso das mídias sociais:
Na crise da Mars/Twix, as mídias sociais iniciaram e afetaram a crise. Trata-se de evento
iniciado por uma campanha promocional em mídias sociais promovida pela própria marca
(dimensão de produto, e não corporativa), com grandes equívocos quanto à sua
operacionalização. A ação foi eficiente para cativar os internautas, atraindo milhares de
participantes. Mas do ponto de vista de sua operacionalização, o evento não correspondeu
às expectativas dos convidados. A Mars/Twix não se apropriou rapidamente das mídias
sociais para oferecer resposta à inquietação dos internautas, o que favoreceu a repercussão
negativa imediata sobre a campanha. Houve manifestação da empresa por meio de breve
comunicado à imprensa. O site/blog promocional da campanha foi retirado do ar e, hoje, o
comunicado está disponível apenas em blogs que replicaram a mensagem 35.
76
Descrição do evento:
Em março de 2010, a Visa mobilizou os usuários do
Twitter a usarem a hashtag
#juntospelodescontoVisa, prometendo que, ao
atingir os 5 mil twittes com a tag, o jogo Guitar
Hero 5 (com guitarra) para PlayStation 3 seria
vendido por apenas R$ 189 no site do Wal-Mart, para pagamentos com o cartão Visa.
Entretanto, o estoque era de apenas 50 unidades e se esgotou em menos de 35 minutos.
Com isso, a hashtag que prevaleceu foi outra: #fudidospelodescontovisa.
Origem do evento:
A crise da Visa teve origem em uma falha de planejamento de campanha em mídias sociais
(e falha de planejamento de vendas). Trata-se de uma iniciativa da própria empresa que
ganhou dimensão pública por sua própria natureza, pois consistia em ação promocional.
35
O PaperBlog é um dos que registraram a nota: http://pt-br.paperblog.com/chuva-de-twix-30669/. Acesso em março de
2011.
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “produtos e serviços com
problemas”. Para Lerbinger (1997), esse evento é uma “crise de decepção” (expectativa
frustrada quanto ao produto ou serviço adquirido). Esta crise não diz respeito ao produto
Visa/Cartão ou ao Walmart, parceiro da ação, mas à própria estratégia promocional como
fonte de frustração e decepção.
Dimensões do planejamento:
A crise da Visa revela deficiências, sobretudo, na dimensão tática (pela falha no
dimensionamento da ação em termos de mercado e avaliação prévia da possível
repercussão da ação).
Descrição do evento:
Em março de 2010, o diretor
comercial da Locaweb,
patrocinadora do São Paulo,
expressou sua paixão pelo
Corinthians por meio de seu perfil
no Twitter. O executivo publicou
ofensas aos torcedores do São
Paulo e os comentários repercutiram rapidamente nas mídias sociais, obrigando a empresa a
se manifestar oficialmente em seu blog, esclarecendo que se tratava de um posicionamento
pessoal, e não corporativo.
Origem do evento:
A crise da Locaweb teve origem em uma manifestação pessoal de um executivo da empresa
por meio do microblog Twitter. Trata-se de uma iniciativa particular que ganhou dimensão
pública, envolvendo o nome da organização Locaweb em uma discussão que estava fora de
seus planos, sobretudo por ser a patrocinadora oficial do time que foi objeto das ofensas.
Tipologia:
Segundo Neves (2000), trata-se de uma crise motivada por “escândalo envolvendo alto
executivo”. Para Lerbinger (1997), esse evento é uma “crise de má administração”. Em
ambas as classificações, observa-se que em geral essas crises envolvem corrupção, fraudes,
atos ilegais ou atos imorais. Como não identificamos uma categorização plenamente
78
satisfatória, optamos por manter essa classificação.
Dimensões do planejamento:
A crise da Locaweb revela deficiências, sobretudo, nas dimensões estratégica (pela falta de
posicionamento claro e integrado quanto à gestão da marca Locaweb, que, como
patrocinadora oficial do São Paulo Futebol Clube, não definiu claramente sua expressão
oficial internamente ou por meio de mídias sociais), e tático-operacional (pela falha na
orientação e capacitação de um executivo para lidar com as mídias sociais e pela aparente
ausência de uma política norteadora do comportamento do público interno nas mídias
sociais).
Descrição do evento:
Em maio de 2010, a Fiat realizou
uma série de ações integradas
para lançar o Novo Uno, e uma
dessas ações envolvia o
Formspring, uma mídia social que
permite ao usuário cadastrado
responder perguntas de outros
79
usuários, cadastrados ou não. A ideia era fazer uma grande coletiva de imprensa, e havia
três categorias de respostas: Engenharia, Marketing e Happy Hour. As respostas da
engenharia eram relativas a questões técnicas; as de marketing, relativas aos atributos
distintivos do produto e às estratégias de marketing; por fim, na categoria Happy Hour, as
respostas deveriam ser leves ou engraçadas. Mas quando um dos internautas perguntou por
que no Brasil não havia a possibilidade de personalizar os carros com cores berrantes como
o rosa, a resposta Happy Hour foi: “Chegamos a conclusão que rosa é cor de são paulino, por
isso preferimos fazer entre outras o Vermelho Alpine, Amarelo Citrus, Azul Búzios e Azul
Splash. Certeza que ela não vai nem lembrar que rosa existe quando ver (sic) estas cores
incríveis!”. A ofensa gratuita à torcida são-paulina obrigou a Fiat a publicar no próprio
Formspring um pedido de desculpas a todos os ofendidos.
Origem do evento:
A crise da Fiat/Novo Uno teve origem em uma ação de promoção e relações públicas (“A
maior entrevista coletiva do mundo”) promovida pela Fiat (dimensões corporativa e de
produto), e começou com uma manifestação de um profissional responsável pela
atualização do Formspring. Trata-se de uma “brincadeira” que ganhou repercussão e
envolveu o nome da organização Fiat em uma discussão que estava fora de seus planos. A
Fiat pediu desculpas36 a todos os que se sentiram ofendidos com a questão, mas quando o
fez, era tarde e muita gente já tinha replicado a informação, que repercutiu amplamente na
rede.
Tipologia:
Não há uma categorização plenamente satisfatória para esse tipo de crise, motivado por
mau planejamento tático-operacional e pela falta de treinamento para falar em nome da
empresa (capacitação de porta-vozes). A classificação mais próxima seria a de crise motivada
por falha humana (NEVES, 2000), e crise de confronto (LERBINGER, 1997), já que afetou
grupo organizado (no caso, torcedores de time) e simpatizantes.
Dimensões do planejamento:
A crise da Fiat revela deficiências, sobretudo, nas dimensões tática (pela falha na orientação
80
da agência quanto às diretrizes para expressar opiniões nas mídias sociais) e operacional
(pela imprudência com que a coletiva de imprensa foi conduzida, considerando-se uma
dimensão “cômica” que trazia grandes riscos para a marca).
36
Disponível em: http://www.formspring.me/fiatbr/q/508659385. Acesso em junho de 2011.
4.2.10. Arezzo e a coleção Pelemania
Descrição do evento:
Em abril de 2011, a Arezzo, marca de calçados e acessórios de moda, sofreu um revés em
razão de sua coleção Pelemania, que suscitou a ira dos ativistas, e até de não ativistas, que
aderiram ao coro. A controvérsia rapidamente ganhou relevância nas mídias sociais, e gerou
uma sequência de retratações por parte da indústria da moda, com particular atenção para a
reação das marcas Iódice37, Colcci38 e Le Lis Blanc39, vítimas da externalidade.
Origem do evento:
A crise da Arezzo começou com a divulgação do lançamento de sua nova coleção,
denominada Pelemania, com itens que incluíam artigos feitos de peles de animais. Quando a
informação foi identificada por grupos de ativistas, rapidamente se disseminou por mídias
sociais diversas, sobretudo Twitter e Facebook.
81
37
A notícia foi amplamente divulgada em blogs e sites de notícias. Um exemplo está no site Closet on line. Disponível em
http://www.closetonline.com.br/noticia/jornalismo+de+moda/-%20Todas%20-
/5190/Depois+da+Arezzo,+a+I%C3%B3dice+bane+tamb%C3%A9m+pele+animal+de+suas+cole%C3%A7%C3%B5es . Acesso
em junho de 2011.
38
Selecionamos nota publicada em http://modaspot.abril.com.br/news/colcci-se-pronuncia-sobre-uso-de-peles-depois-de-
sofrer-represalias . Acesso em junho de 2011.
39
A Le Lis Blanc foi a terceira empresa a sofrer os impactos da crise da Arezzo. Disponível em:
http://economia.ig.com.br/empresas/depois+da+arezzo+le+lis+blanc+e+alvo+de+polemica+no+twitter/n1596933930113.h
tml . Acesso em 2011.
Tipologia:
Segundo Lerbinger (1997), trata-se de uma crise de confronto, pois envolve a atuação de
grupos civis, organizações não governamentais, ativistas, consumidores e grupos
organizados. Na classificação de Neves (2000), pode-se considerar que esta é, também, uma
crise ligada a produtos e serviços com problemas, o que remete a falhas no desenvolvimento
de produtos que não correspondem às expectativas dos grupos organizados e de ativistas
em geral.
Dimensões do planejamento:
A crise da Arezzo revela deficiências nas dimensões estratégica (pela ausência de
sensibilidade e preparo para lidar com a controvérsia que cerca o tema do uso de peles de
animais), tática (pelo planejamento de comunicação focada no Marketing, usando as mídias
sociais exclusivamente para promover os produtos) e operacional (pela dificuldade de
82
oferecer respostas claras às demandas dos consumidores e interlocutores).
Descrição do evento:
Em maio de 2011, a controvérsia em torno da construção de uma estação do metrô no
bairro de Higienópolis mobilizou milhares de pessoas nas mídias sociais40, e o agendamento
de um Churrascão da ‘gente diferenciada’ se concretizou com a reunião de centenas de
pessoas na Av. Higienópolis, em São Paulo, como forma de protesto contra o grupo de
moradores que se opõe à construção e, principalmente, contra a decisão do governo de São
Paulo, que anunciou a mudança de endereço da obra alegando questões técnicas. O termo
‘gente diferenciada’, atribuído a uma moradora que assim teria se referido às pessoas que
frequentam ou ficam próximas às estações do metrô, gerou grande controvérsia e motivou
também muitas piadas e manifestações preconceituosas.
Origem do evento:
O anúncio do governo de São Paulo sobre a mudança de endereço da obra motivou a 83
imprensa a ouvir opiniões de moradores, entre os quais uma entrevistada pelo jornal Folha
de S.Paulo, que, segundo o jornal, teria afirmado ser contra a construção porque esse tipo
de obra atrai “drogados, mendigos, uma gente diferenciada..." Foi o suficiente para que a
expressão “gente diferenciada" ganhasse a internet e desse nome ao "churrasco", cujo
convite foi disparado por meio do Facebook: cerca de 50 mil pessoas aceitaram o convite
virtual e mais de 600 pessoas compareceram ao churrascão. O tema é de interesse público e
afetou de forma direta o governo de São Paulo, que se viu obrigado a oferecer resposta à
população / aos interessados. O Metrô também se pronunciou oficialmente sobre o
episódio, e a Associação Defenda Higienópolis foi igualmente iniciadora da contestação e
alvo de manifestações.
40
Para mais informações, consultar:
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/churrasco+de+gente+diferenciada+reune+centenas+de+pessoas+em+sp/n15969
52519276.html . Acesso em junho de 2011.
Tipologia:
Segundo Lerbinger (1997), trata-se de uma crise de confronto, pois envolve a atuação de
grupos civis e grupos organizados. Também pode ser caracterizada como uma crise de
distorção de valores administrativos, uma vez que a decisão do governo está muito ligada ao
interesse de um de seus públicos em detrimento de outros. Os insatisfeitos deram origem à
crise.
Dimensões do planejamento:
A crise de Higienópolis/Churrascão revela deficiências, sobretudo, nas dimensões estratégica
e tática, pois o governo de São Paulo não considerou todos os grupos de interesse ao definir
mudanças no traçado da linha e também ao
fazer o anúncio sobre mudanças na obra. A
postura da Folha repercutiu negativamente
na rede, uma vez que o veículo propôs
matéria41 com base nas opiniões de cinco
84
depoentes (moradores da região), tendo um
título tendencioso (Moradores de
Higienópolis, em SP, se mobilizam contra estação de metrô) e intertítulo (“Gente
diferenciada”) supostamente baseado em opinião de uma entrevistada apenas. A moradora
posteriormente afirmou estar sua afirmação equivocada, embora de fato seja contra a
construção da nova estação na Av. Angélica42.
41
A matéria está disponível em http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/782354-moradores-de-higienopolis-em-sp-se-
mobilizam-contra-estacao-de-metro.shtml. Acesso em junho de 2011.
42
Para mais informações, consultar http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/05/psicologa-nega-ter-dito-que-metro-
atrai-mendigos-gente-diferenciada.html. Acesso em junho de 2011.
4.2.12. Domino’s Pizza
Descrição do evento:
Funcionários da rede Domino’s Pizza postaram um vídeo no YouTube em que um deles filma
o outro intencionalmente espirrando em um sanduíche, colocando o queijo em seu nariz e
manipulando a comida de forma não higiênica antes de entregá-la. Em poucas horas, o vídeo
tinha sido visto milhões de vezes e as referências a ele estavam em cinco de 12 resultados
para a busca da palavra Dominos, já na primeira página do Google. A discussão se alastrou
rapidamente pelo Twitter. A rede Domino’s reagiu rapidamente e criou um apelido no
Twitter (@dpzinfo), além de usar o próprio YouTube para responder de forma direta ao
vídeo publicado pelos funcionários. O presidente da rede Domino’s nos EUA, Patrick Doyle,
foi o porta-voz, reconhecendo a dimensão e o impacto da crise para a reputação da
empresa. No pronunciamento43, a linguagem é clara e simples, e demonstra que a empresa
está tão frustrada quanto seus consumidores. Em vez de mostrar frustração pelo fato de o
vídeo ter sido visto milhões de vezes, Doyle agradece à comunidade das mídias sociais por
85
alertar a Domino’s sobre o acontecimento e anuncia uma mudança de práticas que
envolvam contratação, políticas de qualidade, e tudo o que diz respeito aos processos de
produção e atendimento da rede Domino’s, além de informar sobre as medidas contra os
funcionários que deram início à crise44.
Origem do evento:
A crise da Domino’s teve origem em comportamento inadequado de funcionários da rede,
configurando-se como um boicote à marca no tocante às suas práticas de controle de
qualidade. Trata-se de uma iniciativa particular em ambiente profissional que ganhou
dimensão pública, envolvendo o nome da organização.
43
Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=s-gvs2Y2368&feature=player_embedded#at=24. Acesso em junho de
2011.
44
Em seu blog Media deluge, Cristhian Anderson faz uma retrospectiva sobre o caso Domino’s, avaliando de que forma a
empresa explorou as mídias sociais para recuperar a confiança na marca. Disponível em:
http://www.mediadeluge.com/post/96978048/dominos-responds-to-brand-crisis-through-social-media. Acesso em junho
de 2011.
Tipologia:
Segundo Lerbinger (1997), esse evento é uma “crise de malevolência” que acaba por causar
uma “crise de decepção”. Na classificação de Neves (2000), é uma crise envolvendo
“produtos e serviços”.
Dimensões do planejamento:
A crise da Domino’s revela deficiências nas dimensões estratégica e tática (pela falta de um
relacionamento previamente estabelecido com a “comunidade das mídias sociais”), e, em
nível operacional, pela falta de segurança e controle de qualidade em uma de suas lojas (o
que pode ter sido ampliado/generalizado na interpretação dos consumidores). Em termos
de reação, a empresa mostrou competência estratégica, tática e operacional, retomando o
protagonismo no diálogo com os públicos de interesse.
Toda situação de crise em mídias sociais deve ser avaliada quanto à sua origem, que
poderá ser uma questão (interna ou externa), ou, também, resultado de uma ação
promocional intencional em mídias sociais. Com relação ao planejamento, as crises nas
mídias sociais podem ser avaliadas quanto à(s) dimensão(ões) do planejamento que melhor
representam o problema. De acordo com a leitura vislumbrada no capítulo 2, entendemos
que o planejamento poderá ter uma dimensão estratégica global, outra dimensão
estratégica de comunicação, e uma dimensão estratégica de comunicação digital, sendo que
esta última, em um plano tático e operacional, se concretizará por uma atuação clara em
ambientes digitais, particularmente em mídias sociais. Também nas dimensões tática e
operacional, é importante ressaltar que o bom ou mau planejamento de outras áreas
organizacionais tem impactos diretos sobre as crises em mídias sociais. É possível perceber
que, com base na identificação da origem de determinada crise, certas dimensões do
planejamento se revelam como fragilidades mais relevantes.
Em outros casos, a origem é interna, mas não formal ou oficial, como é o caso das crises
em que funcionários dão início ao processo pela divulgação de informações, percepções ou
mesmo boicotes em mídias sociais. Um recente caso de agressão sofrido por cliente
transexual em uma lanchonete da rede McDonald’s em abril de 2011, filmado e divulgado
por um funcionário45, é um exemplo desse tipo de circunstância. A situação vivenciada pela
Domino’s pizza, com a viralização do vídeo produzido por funcionários da rede mostrando
um processo ‘escatológico’ de produção de pizzas46, levou a rede a conduzir (internamente)
e se submeter (externamente) a um processo de investigação. O caso Locaweb também se
encaixa nessa categoria, pois a crise começou internamente e por uma manifestação pessoal
de um executivo da companhia. Esse tipo de crise revela falhas nas dimensões estratégica,
tática e operacional, e exigem da organização um posicionamento claro e imediato com
relação às suas práticas, políticas ou processos. Em geral, casos que envolvam boicote ou
dilemas éticos têm grandes impactos sobre a reputação da organização, sobretudo se
88
envolver um questionamento sobre as práticas organizacionais e sobre o que ela entrega à
sociedade. No caso Domino’s, a dúvida sobre o controle de qualidade poderia evoluir para
uma profunda rejeição pela marca e, eventualmente, para seu fim.
45
Na situação relatada, um funcionário da rede McDonald’s filma o episódio e distribui a informação.
Disponível em: http://colunas.epoca.globo.com/mulher7por7/2011/04/24/transexual-espancada-no-
mcdonalds-conta-seu-drama-e-funcionario-que-filmou-e-demitido/ . Acesso em 24 de abril de 2011.
46
De acordo com a matéria divulgada pela WTNC, o vídeo divulgado pelos funcionários da rede Domino’s pizza
gerou um processo de avaliação sanitária e amplo debate sobre a produção de alimentos por redes de fast
food. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=OhBmWxQpedI. Acesso em 24 de abril de 2011.
problemas da organização, e a atuação da comunicação nesse tipo de circunstância requer
absoluta eficiência para rever diversos processos, da cadeia de suprimentos ao atendimento
ao cliente e à assistência técnica. Não basta um pedido de desculpas ou a solução pontual da
questão – algo muito maior está por trás das fragilidades expostas e a organização precisa se
mobilizar para a mudança em toda a sua estrutura e na forma como quer conversar com seu
consumidor.
Quanto à origem externa, é possível identificar que algumas situações de crise emergem
do debate sobre questões controversas. Grupos organizados e ativistas são os principais
iniciadores desse tipo de crise, mas é importante destacar que, em geral, o debate surge
porque houve algum evento ligado a uma determinada organização. No caso do Churrascão
da ‘gente diferenciada’, por exemplo, uma decisão do governo de São Paulo e a atuação da
imprensa foram decisivas para dar início à discussão. E embora o caso Arezzo tenha tido seu
início em uma ação de marketing promocional nas mídias sociais, não foi uma falha da
própria ação que motivou a crise (como foi o caso do Twix, da Devassa, da Visa e da Fiat);
antes, o que realmente caracterizou a crise foi a reação de ativistas e grupos de
89
consumidores que se manifestaram contrariamente ao lançamento da coleção Pelemania. A
ação de divulgação da nova coleção envolveu divulgação no site da empresa, no Facebook e
no Twitter. A empresa já havia incorporado as mídias sociais ao seu planejamento de
comunicação, priorizando a divulgação de novas coleções, a resposta a consumidores e a
divulgação de vagas de trabalho. Em linhas gerais, pode-se afirmar que a marca já tinha uma
estratégia definida para as mídias sociais. No entanto, diante da divulgação do lançamento
da coleção Pelemania, constituiu-se um assunto emergente que não fora antevisto pela
empresa, o que oportunizou um amplo debate entre participantes das mídias sociais
mencionadas e mesmo entre não participantes das mídias sociais. Aqui, embora o
planejamento de comunicação contemple as mídias sociais, não considerou o potencial de
controvérsia que o tema oferece. Nesse sentido, consideramos que a origem desta crise é
externa e fruto de uma controvérsia latente que se apropriou das mídias sociais para gerar
repercussão negativa sobre a marca. Os casos relatados revelam falhas nas dimensões
estratégica e tática, o que oportunizou sua ampla repercussão na imprensa e nas mídias
sociais.
Observa-se, portanto, que para compreender a natureza de cada tipo de crise iniciada
ou potencializada por mídias sociais, é fundamental que se determine a origem e a que
dimensão do planejamento a situação diz respeito. Por exemplo, nas crises de origem
externa, a questão do planejamento não pode ser adequadamente avaliada em sua
dimensão operacional, mas pode-se considerar que há falhas no planejamento estratégico,
pois a organização não se mostra atenta para o ambiente em que atua e para o debate
latente sobre questões controversas, além de não se mostrar preparada para atender
satisfatoriamente às demandas sociais e de seus públicos. Já nos casos das crises de origem
interna, as dimensões de planejamento da comunicação nos âmbitos tático e operacional
estão mais passíveis de avaliação, pois demonstram maior fragilidade.
Grande parte das situações de crise envolvendo organizações e mídias sociais surgem
como consequência de manifestações espontâneas de consumidores acerca de sua
insatisfação com produtos e serviços, ou seja, têm sua origem em problemas de ordem
interna. Nesses casos, falhas no atendimento ao consumidor, um dos erros mais comuns das
empresas, são a principal fonte do problema. Temos, portanto, um problema sistêmico que
90
afeta a organização e abre espaço para que o consumidor expresse suas opiniões contrárias
nas mais variadas mídias sociais. O Reclame Aqui47 é a prova de que o consumidor
contemporâneo não está mais disposto a calar e, portanto, é fundamental que as
organizações atentem para um consumidor que usa as mídias para produzir, divulgar e
disseminar conteúdo, favorável ou desfavorável.
Embora não tenhamos recorrido a uma pesquisa quantitativa, podemos observar que as
crises de decepção (LERBINGER, 1997) e relativas a produtos e serviços com problemas
(NEVES, 2000) são muito comuns. São os casos Renault, Lamborghini, Whirlpool, United
Airlines, Domino’s e Arezzo. Há, também, os casos de crises de decepção ligados às ações de
marketing e comunicação em si (Twix, Visa, Fiat). As crises de confronto, distorção de valores
47
O Reclame Aqui é um site de reclamações e registra comentários e avaliações de consumidores,
constituindo-se em um amplo banco de dados sobre o atendimento ao consumidor nas empresas com atuação
no Brasil. Disponível em http://www.reclameaqui.com.br/
administrativos, má administração e malevolência (LERBINGER, 1997) alternam-se quanto à
origem interna (Locaweb, Domino’s) e externa (Arezzo, Higienópolis/Churrascão).
Por fim, nota-se que as crises externas baseadas em controvérsias ou questões públicas
(crises de confronto, naturais, tecnológicas, conforme Lerbinger, 1997) objeto de nossa
análise geraram ampla repercussão, mas não podemos afirmar que os impactos
institucionais foram “mais dispersos”, dado o interesse público na questão. O caso Arezzo
provocou questionamentos sobre a postura da empresa diante de um tema controverso
institucionalizado e, segundo pudemos observar até o fim da coleta de dados para este
estudo, pelo menos três outras empresas foram impactadas pelo caso Arezzo. Quanto ao
caso Higienópolis, o governo de São Paulo e o Metrô tiveram que discutir a questão e chegar
a uma solução que efetivamente respondesse às inquietações populares. Em geral, todos os
envolvidos tiveram impactos institucionais consideráveis.
4.3.3. Avaliação quanto ao uso das mídias sociais
Infelizmente, em muitos dos casos avaliados, não houve atuação ativa durante ou no
pós-crise. Os casos mais críticos foram o da Renault e o da Lamborghini, pois as empresas
não recorreram à defesa da marca de forma clara e imediata. A maioria das empresas fez
algum tipo de ação usando mídias sociais (como foi o caso da Whirlpool, da United Airlines, 92
da Locaweb, da Fiat e da Arezzo), mas consideramo-las incipientes diante da repercussão
negativa a que foram expostas. Nos casos de falhas em ações de marketing, as empresas
oscilaram entre silêncio (Visa, Devassa/Schincariol) e alguma movimentação (Twix/Mars),
mas nada de fato relevante. O caso Higienópolis é peculiar pelo fato de ter mobilizado um
razoável número de pessoas interessadas na solução d a questão, mas observa-se que as
manifestações do governo de São Paulo e do Metrô privilegiaram a imprensa.
Não pudemos avaliar a atuação das empresas no pré-crise, mas acreditamos que isso
Poderia contribuir para uma análise mais crítica e plena dos casos avaliados. No caso Arezzo,
verificamos que a empresa vinha atuando nas mídias sociais há algum tempo, com foco na
divulgação mercadológica, no atendimento ao consumidor e no recrutamento de talentos.
Embora a comunicação nas mídias sociais estivesse aparentemente estruturada, não houve
sinergia entre comunicação, planejamento e pesquisa e desenvolvimento de produtos. Sabe-
se que o tema “pele de animais” é controverso e objeto de oposição em todo o planeta, mas
isso não foi adequadamente dimensionado pela empresa.
Entendemos que planejamento e atuação prévia e constante nas mídias sociais pode
contribuir para identificar questões emergentes; contudo, não garante o sucesso do
gerenciamento da comunicação de crises por si só, pois que requer atuação proativa durante
e após a crise.
93
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observamos que, embora haja situações mais críticas e outras cujo impacto é apenas
momentâneo e circunscrito a ações de marketing de produto, todo esforço voltado para a
gestão de riscos e prevenção de crises é igualmente relevante em ambas circunstâncias ao
planejar a comunicação em mídias sociais.
Concordamos com Gabriel (2001) quando afirma que nunca foi tão fácil para as pessoas
95
se organizarem, e controlar é um mito. A autora menciona a relevância de se levantar
cenários críticos possíveis, tanto internamente (“telhados de vidro”) quanto na área de
negócios em que a organização atua. Também, reforça que é fundamental fazer o
mapeamento social, identificando laços fortes e fracos internos e externos, bem como os
pontos de influência internos e externos.
As crises mais passageiras e, de certa forma, ‘alegóricas’, são as que têm origem em
iniciativas de comunicação mercadológica proativas e mal planejadas, e algumas chegam a
parecer anedotas. É certo que ações de marketing mal planejadas podem ser desastrosas e
repercutir muito mal, mas os desvios no cumprimento da missão organizacional e no
oferecimento de produtos e serviços de qualidade são os mais críticos.
96
Há grande espaço para a pesquisa nessa área. Entendemos que nosso estudo dá apenas
subsídios iniciais para esse campo, que merece ser explorado com rigor. Outras variáveis,
como valor da marca, impactos sobre a reputação organizacional, avaliação do
comportamento da organização nas mídias sociais a curto, médio e longo prazo, antes,
durante e depois de crises são apenas algumas das questões que podem subsidiar novos
estudos sobre crises em mídias sociais.
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