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Aula 2 - Descrição estatı́stica de um sistema discreto

MÓDULO 1 - AULA 2

19 de Janeiro de 2015

Aula 2 - Descrição estatı́stica de um sistema


discreto

Meta
Apresentar os elementos básicos para a descrição estatı́stica de sistemas
fı́sicos discretos.

Objetivos
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

1. Reconhecer a diferença entre variáveis determinı́sticas e aleatórias.

2. Identificar eventos e espaço de amostragem.

3. Reconhecer e aplicar os conceitos de eventos exclusivos e independentes.

4. Reconhecer e aplicar os conceitos de média e desvio padrão.

5. Reconhecer e aplicar o conceito de distribuição discreta.

6. Identificar macro e microestados de sistemas fı́sicos discretos.

Pré-requisitos
Esta aula requer que você esteja familiarizado com os conceitos básicos
de probabilidade e distribuição binomial apresentados em Introdução à Prob-
abilidade.

Introdução
Como vimos na Aula 1, o estudo das propriedades dos materiais envolve
um número gigantesco de átomos. Para definirmos grandezas macroscópicas

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a partir das grandezas atômicas precisamos realizar médias, que serão asso-
ciadas às variáveis macroscópicas. O cálculo dessas médias envolve o conhe-
cimento da probabilidade de ocorrência de cada possı́vel valor da variável
observada, por isso vamos rever alguns conceitos básicos sobre probabili-
dades.
Vamos imaginar dois experimentos. No primeiro um carro está em
movimento retilı́neo uniforme com velocidade de 60 km/h durante 30 minu-
tos. Qual a distância percorrida? Neste caso a resposta é totalmente pre-
visı́vel, a distância será de 30 km. Dizemos que este é um experimento deter-
minı́stico. Na segunda experiência jogamos uma moeda para cima e queremos
saber que face cairá para cima: cara ou coroa. Em princı́pio poderı́amos pre-
ver o resultado de uma jogada de moeda. Para tanto terı́amos que verificar
a posição exata do centro de massa da moeda e calcular as forças que atuam
sobre a moeda durante a jogada, assim como durante seu movimento no ar
etc. Se realmente pudéssemos fazer todos esses cálculos, para cada jogada
de cada moeda, poderı́amos conhecer com uma precisão inalcansável, o seu
movimento e portanto prever se o resultado seria cara ou coroa. É claro que
isso não é viável por muitas razões. Em vez disso, preferimos classificar o
experimento como aleatório e buscar uma descrição probabilı́stica que nos
diga quais as chances de obter cada resultado. Para tanto, imaginamos o
experimento sendo repetindo N vezes, sendo N  1. Se chamarmos de hni
o número de caras que esperamos obter em N jogadas, temos

hni = pN , (2.1)

onde 0 < p < 1 é a probabilidade de se tirar cara. No caso de uma moeda


simétrica, esperamos que o resultado seja cara em metade das jogadas, assim
p = 1/2, o mesmo valendo para coroa.
Podemos encarar (2.1) como uma definição experimental de probabili-
dade, que pode ser escrita formalmente como

Nx
PX (x) = lim , (2.2)
N →∞ N

onde PX (x) é a probabilidade de obter o resultado x para a variável X e


Nx é o número de vezes que observamos X = x no total de N realização
da experiência. O limite N → ∞ tem um papel fundamental aqui. Se
jogarmos a moeda N = 2 vezes e obtivermos 2 caras, não achamos nada de
mais. Mas, se a jogarmos N = 100 vezes e obtivermos 100 caras, certamente
suspeitarı́amos que há algo de errado com a moeda. A única diferença entre

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as duas situações é o valor de N. Mas, quanto grande N deve ser para termos
os valores esperado e medido sejam próximos? O maior possı́vel. Veremos
mais tarde que a pergunta correta é : Que erro estamos cometendo ao usar
a definição (2.2) com N finito?
Uma outra possibilidade para a determinação de PX (x) é a construção
de um modelo que nos permita calcular a probabilidade de ocorrência de cada
resultado possı́vel. Nesse modelo certamente entrariam considerações sobre
a distribuição de massa da moeda (é homogênea ou não?), sobre a forma com
que é jogada e sobre o número de resultados possı́veis (devemos considerar a
possibilidade da moeda cair em pé?). Para a moeda, em geral, supomos dois
resultados possı́veis, já que cair em pé é muito raro. Também supomos que
cara e coroa são igualmente prováveis já que, em geral, não há razão para
se supor que uma face tenha prioridade sobre a outra. Assim, um modelo
razoável leva a p = q = 1/2 sendo q a probabilidade de dar coroa.

Eventos independentes e mutuamente exclu-


sivos
Vamos formalizar e estender as noções que desenvolvemos intuitiva-
mente na seção anterior. Usaremos alguns conceitos básicos de teoria de
conjuntos. Começamos com duas definições importantes:

espaço de amostral de um determinado experimento = o conjunto Ω


com elementos tais que qualquer resultado do experimento corresponde
a um ou mais elementos de Ω.

evento = subconjunto do conjunto Ω relativo a um experimento. A pro-


babilidade de um evento E pode ser encontrada seguindo o seguinte
procedimento:

1. Construa o espaço amostral Ω.


2. Designe probabilidades para cada elemento de Ω. O caso mais
simples é aquele em que Ω é composto por NΩ elementos todos
igualmente prováveis, neste caso designe a probabilidade 1/NΩ a
cada um.
3. Para obter a probabilidade P(E) de um evento E, some as prob-
abilidades designadas a todos os elementos do subconjunto de Ω
correspondente a E.

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W W W

(a) (b) (c)

Figura 2.1: Representação gráfica de um espaço de amostragem Ω, e dos


subconjuntos relativos a eventos do tipo A e B. Em (a) A e B são eventos
mutuamente exclusivos, as regiões coloridas de cinza são proporcionais a
P(A) e a P(B); em (b) a parte cinza corresponde ao subconjunto A∩B, sendo
proporcional a P(A, B) = P(A ∩ B), e em (c) a área cinza é proporcional a
P(A ∪ B).

Quando E = Ω dizemos que o evento é certo. Se E = ∅ dizemos que o


evento é impossı́vel. Fica claro que P(Ω) = 1 e P(∅) = 0.

Exemplo 2.1
Seja o experimento em que um dado é jogado e o número da face voltada para
cima é anotado. Primeiro definimos o espaço amostral: o resultado será um
inteiro de 1 a 6, ou seja Ω = {1, 2, 3, 4, 5, 6} e NΩ = 6. Supondo que seja um
dado equilibrado, cada elemento de Ω pode ocorrer com igual probabilidade
que é 1/6. Considere os eventos A, B e C definidos como:
A = o resultado é um número par
B = o resultado é um número maior que 2
C = o resultado é um número múltiplo de 3
O subconjunto correspondente ao evento A é A = {2, 4, 6} e NA = 3, portanto
P(A) = NA /NΩ = 1/2. Já B = {3, 4, 5, 6}, NB = 4, e P(B) = NB /NΩ =
2/3. Finalmente, C = {3, 6}, NC = 2 e P(C) = NC /NΩ = 1/3.

Podemos agora relacionar probabilidades para diferentes eventos.

• P(A ∩ B), ou P(A, B) é a probabilidade de que ambos eventos A e B


ocorram como resultado de um experimento. É chamada de probabili-
dade conjunta.

• P(A ∪ B) é a probabilidade de que eventos A ou B ocorram como


resultado de um experimento.

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• A notação P(Ā) significa a probabilidade do evento A não acontecer.


é fácil de ver que P(Ā) = 1 − P(A).

Temos assim que

P(A ∪ B) = P(A) + P (B) − P(A ∩ B) (2.3)

Se dois eventos são mutuamente exclusivos então

P(A ∩ B) = 0 (2.4)
P(A ∪ B) = P(A) + P(B) regra da soma

Se Ω = A1 ∪ A2 ∪ . . . ∪ Am , sendo os eventos Ai mutuamente exclusivos,


então os m eventos formam uma partição do espaço de amostragem Ω em m
subconjuntos. Neste caso temos
m
X
P(Ai ) = 1 , (2.5)
i=1

uma relação que usaremos bastante como condição de normalização.


Uma das principais questões de todas as análises probabilı́sticas é a
determinação da independência de eventos. Dois eventos A e B são eventos
independentes se e somente se

P(A ∩ B) = P(A)P(B) regra da multiplicação (2.6)

Em fı́sica costumamos usar essa propriedade de trás para frente. Na análise


de uma determinado processo aleatório podemos supor que determinados
eventos são independentes, por razões fı́sicas, e formular a sua descrição em
função disso. Um exemplo comum é o das velocidades moleculares num gás.
Uma descrição simples, como a do gás ideal, supõe que as moléculas não inte-
ragem entr si, isso implica em dizer que cada molécula pode ter qualquer valor
de velocidade, independente dos valores de velocidade das outras. Também
supomos que as componentes das velocidades são independentes.

Exemplo 2.2
Vamos voltar ao exemplo anterior. Se designamos a obtenção de cada número
na jogada de dado como um evento, temos que esses serão eventos inde-
pendentes (cada jogada não depende de jogadas anteriores) e mutuamente
exclusivos (não é possı́vel obter dois números ao mesmo tempo). Temos,
também:

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• A ∩ B = {4, 6}, portanto P(A∩B) = 1/3. P(A∪B) = 1/2+2/3−1/3 =


5/6. Esse resultado poderia ser achado diretamente, já que apenas o 1
fica de fora.

• Se agora definimos o evento D como sendo tirar um número ı́mpar,


temos que D = {1, 3, 5}, P(D) = 1/2, P(A ∩ D) = 0 e A e D são
mutuamente exclusivos, em outras palavras, um número não pode ser
par e ı́mpar ao mesmo tempo.

Exemplo 2.3
Voltando ao exempo da moeda. Nossa experiência agora consiste em jogar
duas moedas que serão rotuladas inicialmente como a e b. Suponha que p
seja a probabilidade de dar cara.
(a) Qual a probabilidade de se obter duas caras como resultado da ex-
periência?
Neste caso, sendo A o evento“obter duas caras”,
Ω = {(caraa , carab ) , (caraa , coroab )) , (coroaa, carab )) , (coroaa, coroab ))} e NΩ =
4.
A = {(caraa, carab )}e NA = 1.
Como Ω é equiprovável, P(A) = NA /NΩ = 1/4.
Também, podemos pensar direto do ponto de vista das jogadas indi-
viduais. Como as jogadas são independentes

1
P(A) = P(duas caras) = P(cara ∪ cara) = P(cara)P(cara) = p2 = .
4
(b) Agora, qual a probabilidade das duas moedas terem o mesmo resultado?
Neste caso podemos ter duas coroas também. Portanto,
B = {(caraa, carab ) , (coroaa , coroab )} e NB = 2

NB 2 1
P(iguais) = = = = P(cara ∪ cara) + P(coroa ∪ coroa) .
NΩ 4 2

Atividade 1
(Objetivos 1, 2 e 3)
Um certo tipo de motor elétrico falha se ocorrer uma das seguintes situações:
emperramento dos mancais, queima dos rolamentos, desgaste das escovas.
Suponha que o emperramento seja duas vezes mais provável do que a queima,
esta sendo quatro vezes mais provável do que o desgaste das escovas. Qual
será a probabilidade de que a falha seja devida a cada uma dessas cir-
cunstâncias?

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deixar 5cm

Resposta comentada
Sejam os eventos:

• E = emperramento

• Q = queima

• D = desgaste

Do enunciado temos que P (E) = 2P (Q) e P (Q) = 4P (D). Além dessas


relações temos que P (E) + P (Q) + P (D) = 1 já que essas são todas as formas
de falha que podem ocorrer. Dessas três relações tiramos que P (E) = 8/13,
P (Q) = 4/13 e P (D) = 1/13.

Distribuições discretas
Chamamos de variável aleatória a variável cujo valor só pode ser deter-
minado através de uma experiência. Usaremos aqui a seguinte notação: em
letras maiúsculas teremos o nome da variável (ex: X é resultado da jogada
da moeda), e em minúsculas, o seu valor (ex: podemos fazer a associação
x = 0 para cara ou x = 1 para coroa).
Seja X uma variável aleatória definida no espaço de amostragem Ω
que pode tomar um número contável (finito ou infinito) de valores, ou seja,
X(Ω) = {x1, x2, . . .}. Sabendo a probabilidade para cada valor xi pode-
mos definir a distribuição de probabilidade, fX (xi ) ≡ P(xi ) satisfazendo as
seguintes condições
fX (xi) ≥ 0 , (2.7)
e
X
fX (xi ) = 1 , (2.8)
i

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onde a soma é sobre todos os valores possı́veis da variável X.


A determinação de fX (xi ), permite o conhecimento completo de um sis-
tema aleatório mas, em geral, não é uma tarefa trivial obter essa informação.
Pode-se obter a forma fX (xi ) através de observações experimentais, de ex-
pansões em potências, ou pela resolução de equações diferenciais. Na prática,
muitas vezes usamos argumentos fı́sicos para supor uma determinada forma
para a distribuição, por isso é muito importante conhecer as propriedades de
algumas delas.
Os momentos de uma distribuição são grandezas muito importantes
porque definem a forma da distribuição e também porque são diretamente
relacionadas com observáveis fı́sicos. O n-ésimo momento de X é definido
como
X
Mn = hxn i = xni fX (xi) . (2.9)
i

Alguns momentos tem nomes especiais devido a sua frequente utilização.

primeiro momento → M1 = hxi = média ou valor esperado

segundo momento → M2 = hx2i


O segundo momento em geral aparece combinado com o primeiro na
forma
σ 2 = M2 − M12 = hx2 i − hxi2 . (2.10)

A grandeza σ 2 é denominada variância e mede o quanto os resultados de são


diferentes entre si.
De uma forma geral, a média de uma função de X é dada por
X X
hg(x)i = g(xi )fX (xi ) ≡ g(xi )PX (xi) (2.11)
i i

Distribuição uniforme
A distribuição mais simples é a uniforme, ou seja, aquela em que todos
os elementos do espaço amostral tem igual probabilidade de ocorrer. Um
exemplo de sistema com distribuição uniforme é dado equilibrado. Se X é o
número tirado, então x1 = 1, . . . , x6 = 6. Todos os valores tem probabilidade
1/6 de ocorrer, portanto f(xi ) = 1/6. Neste caso dizemos que o espaço
amostral é equiprovável. Uma ilustração desta distribuição pode ser vista na
figura 2.2.

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(a) (b)
Figura 2.2: (a) Dado equilibrado com seis possı́veis resultados (b) Se o dado
for correto, todos os números serão igualmente prováveis dando origem a
uma distribuição uniforme

Distribuição binomial
A distribuição binomial é muito importante na Fı́sica Estatı́stica po-
dendo ser utilizada para resolver diversos problemas. Você deve ter apren-
dido sobre ela no colégio, em alguma aula de Matemática. Seu nome vem
exatamente do binômio porque ela dá os termos do desenvolvimento binomial
(p + q)N . Observe as expressões da expansão binomial para alguns valores
de N.

N = 2 → (p + q)2 = p2 + 2pq + q 2
N = 3 → (p + q)3 = p3 + 3p2 q + 3pq 2 + q 3
N = 4 → (p + q)4 = p4 + 4p3 q + 6p2 q 2 + 4pq 3 + q 4

Para um valor qualquer de N podemos escrever


N
X
N
(p + q) = CN,n pN −n q n .
n=0

Os coeficientes CN,n podem ser facilmente determinados se adicionarmos um


ı́ndice a cada fator do produto. Por exemplo, para N = 2 terı́amos

(p + q)2 → (pa + qa)(pb + qb ) = pa pb + pa qb + qapb + qa qb


|{z} |{z} |{z} |{z}
1 2 3 4
→ pp + pq + qp + qq
= p2 q 0 + 2p1 q 1 + p0 q 2

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Os quatro termos aparecem porque colocamos os ı́ndices a e b identificando


os fatores. Se abolimos esses ı́ndices os termos 2 e 3 tornam-se equivalentes
levando ao coeficiente 2 para o termo em pq. Para calcular a forma genérica
para qualquer N imaginamos que temos N caixas rotuladas por letras levando
a N! sequências possı́veis. Cada caixa pode receber uma letra extra, p ou q.
Chamando de n o número de caixas do tipo p temos que N −n caixas serão q.
Se agrupamos sequências com relação ao valor de n teremos várias sequências
que se tornarão equivalentes. Vamos ver um exemplo. Seja N = 4. As caixas
são numeradas de a a d. Duas das sequências possı́veis são abcd e badc entre
as 4! = 24 sequências. Podemos escolher p para as duas primeiras caixas e
q para as duas seguintes, nas duas sequências de caixa. Seriam os termos
pa pb qc qd e pb pa qd qc , que são termos idênticos e não deveriam ser contados
separadamente. Assim, das N! sequências devemos excluir as que diferem
entre si apenas por permutações das letras, em cada grupo p ou q. Sendo
assim,

N
X N!
(p + q)N = CN,npN −n q n onde CN,n = . (2.12)
n=0
n!(N − n)!

Os coeficientes CN,n são a combinação de N objetos n a n, ou o número de


escolhas distintas de n objetos num total de N.
Para entender melhor a contagem vamos verificar todas as possibili-
dades para o caso de N = 4 caixas, como indicado na tabela 2.1. O ı́ndice J
corresponde aos termos já agrupados pela eliminação dos rótulos temporários
a, b, c e d. Já o ı́ndice j numera os estados com as caixas ainda rotuladas.
Podemos usar o desenvolvimento acima para estudar o problema da
moeda. Para isso associamos p à probabilidadede se obter cara em uma
jogada e q a de se obter coroa. Sendo cara e coroa as únicas possibilidades de
resultado, temos que p + q = 1, que é a condição de normalização definida na
equação (2.5). Podemos interpretar N como número de moedas ou número
de jogadas de uma única moeda. Voltando ao caso N = 4, temos que a
probabilidade de obter uma dada sequência de jogadas com n caras é pn q 4−n
já que cada jogada é independente da outra (regra da multiplicação). O
número de sequências equivalentes é dado por C4,n (regra da soma). Assim
a probabilidade de se obter n caras numa jogada de 4 moedas, ou jogando 4
vezes a mesma moeda é P(4, n) = C4,npn q 4−n . Para um número N qualquer
temos que a probabilidade de se obter n caras numa jogada de N moedas,

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J j a b c d n C4,n
1 1 p p p p 4 1
2 p p p q
3 p p q p
2 4 p q p p 3 4
5 q p p p
6 p p q q
7 p q p q
8 p q q p
3 9 q p p q 2 6
10 q p q p
11 q q p p
12 q q q p
4 13 q q p q 1 4
14 q p q q
15 p q q q
5 16 q q q q 0 1

Tabela 2.1: Coeficientes de (p + q)4.

ou jogando N vezes a mesma moeda, é

N!
P(N, n) = CN,n pn q N −n = pn q N −n (2.13)
n!(N − n)!

A expressão (2.13) define o que chamamos distribuição binomial.


A condição de normalização para as N jogadas pode ser escrita como

N
X
P(N, n) = (p + q)N = 1 , (2.14)
n=0

já que p + q = 1 neste problema.


Temos também que
N
X
CN,n = 2N . (2.15)
n=0

já que 2N é o numero total de sequências.

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Cálculo do valor esperado hni

O valor esperado para n na distribuição binomial pode ser facilmente


calculado usando-se as expressões (2.14) e (2.13). Pela definição de valor
esperado, equação (2.9) com n = 1, temos que:

N
X
hni = nP(N, n) . (2.16)
n=0

Agora note as seguintes igualdades:


N N
d X d X
P(N, n) = CN,n pn q N −n
dp n=0 dp n=0
N
X
= CN,n n pn−1 q N −n
n=0
N N
1 X 1X
= CN,n n pn q N −n = n P(N, n)
p n=0
p n=0
1
= hni
p

Fazemos então
N N
X d X d
hni = nP(N, n) = p P(N, n) = p (p+q)N = pN(p+q)N −1 = pN
n=0
dp n=0 dp
(2.17)
N −1
onde usamos que a equação 2.14 e também que (p + q) = 1, já que
p + q = 1.

Cálculo da variância σ 2

Além do valor esperado, uma grandeza importante para caracterizar


o resultado de um experimento é a variância, σ 2 . Esta grandeza pode ser
calculada de forma muito simples no caso da distribuição binomial. Se hni
é o valor esperado então dn = n − hni dá a distância com relação ao valor
esperado. Por exemplo, se temos N = 20, p = 0,5 e q = 0,5 o valor esperado
é hni =0,5 20 = 10. O valor n = 5 está a uma distância −5 com relação a hni.
O sinal negativo apareceu porque examinamos um valores de n menor que
o esperado, mas o que importa realmente é o valor absoluto dessa distância,
por isso vamos usar o seu valor quadrático. Podemos, assim, calcular o valor
médio dessas diferenças ao quadrado e extrair a raiz para obter uma medida

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do afastamento médio. Temos


N
X
hd2 i ≡ h(n − hni)2 i = P(N, n)(n − hni)2 (2.18)
n=0

Para prosseguir com o cálculo de σ 2 primeiro notamos o seguinte:

hd2 i ≡ h(n − hni)2 i = hn2 − 2nhni + hni2 i


= hn2 i − 2hnihni + hni2
= hn2 i − 2hni2 + hni2
= hn2 i − hni2
= M2 − M12 ≡ σ 2 (2.19)

Já sabemos que M1 = hni = pN, vamos agora calcular M2 = hn2 i usando
a definição de probabilidade binomial (equação (2.13)) e a definição de dis-
tribuição binomial (equação (2.12))
N
X
2
hn i = n2 P(N, n)
n=0
N
X N!
= n2 pn q N −n
n=0
n!(N − n)!
 2 XN
d
= p P(N, n)
dp n=0
 2
d
= p (p + q)N = pN + (pN)2 − p2 N .
dp
Finalmente,

σ 2 = hn2 i − hni2 = pN − p2 N = pN − p(1 − q)N = Npq . (2.20)

Assim, para dados valores de p e q, quanto maior o valor de N, maior a


variância, ou seja, maior é a diferença quadrática média dos valores de n com
relação ao valor esperado. Esse resultado parece paradoxal: quanto maior o
número de jogadas ou repetições, maior a dispersão do valores encontrados. A
questão é que a grandeza realmente importante é o valor relativo da dispersão.
Podemos calculá-lo com relação ao número total de jogadas:

σ Npq
= = (qp)1/2N −1/2 , (2.21)
N N
ou com relação ao valor médio
√ r
σ Npq q −1/2
= = N , (2.22)
hni pN p

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Figura 2.3: PN (n) para N = 20, gráfico (a), e N = 40, gráfico (b). Para
os dois valores de N estão representados os valores correspondendo ao caso
simétrico (sı́mbolos sólidos) e assimétrico (sı́mbolos vazados). Todas os val-
ores estão representados em função de n − hni.


ou seja, σ/N, ou σ/hni, diminui com N quando N aumenta. Logo, quanto
maior o valor de N, menor será a flutuação relativa, menor será a chance
de se obter um valor muito diferente do esperado como resultado de uma
medida. Dizemos que o valor médio ou esperado fica melhor definido quanto
maior for o valor de N. Veremos mais tarde que este será o papel do limite
termodinâmico na Fı́sica Estatı́stica: fazer com que grandezas macroscópicas
provenientes de médias sobre grandezas microscópicas sejam bem definidas.

Forma da distribuição binomial

Usando a expressão (2.23) podemos calcular P(N, M) para diferentes


valores de N e p. A figura 2.3 mostra o comportamento de P(N, M) para
N = 20 e 40, para dois casos: simétrico (p = q = 0,5) e assimétrico (p = 0,8
e q = 0,2). Os parâmetros de cada distribuição podem ser vistos na tabela
2.2.

N p hni σ σ/N
20 0,5 10 2,2 0,1
20 0,2 4 1,8 0,09
20 0,5 20 3,2 0,08
20 0,2 8 2,5 0,06

Tabela 2.2: Parâmetros referentes aos gráficos da figura 2.3.

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Em primeiro lugar notamos a forma geral da distribuição: existe um


máximo em n = hni = Np e os valores de P(N, n) diminuem muito à medida
que nos distanciamos do máximo.
Atividade 2
(Objetivos 1, 2, 3, 4 e 5)
Considere um gás com N moléculas contido num volume V0 . Considere um
certo subvolume v, como esquematizado na figura.
(a) Calcule a probabilidade de que exatamente n moléculas estejam em v,
não interessando quais sejam.
(b) Calcule a dispersão relativa, definida como R = σ 2/hni2 , e explique o
comportamento de R quando v  V0 e v ≈ V0 .
diagramador: deixar 5cm

Resposta comentada

(a) Considerando que as moléculas do gás estejam uniformemente distribuı́das


em V0 , a fração de moléculas em v é dada por v/V0 . Supondo que V0 seja
macroscópico (se não este problema não tem sentido...), a probabilidade p de
que cada molécula, individualmente, esteja no subvolume v é dada por essa
fração, ou seja, p = v/V0 . A probabilidade de que n moléculas especı́ficas
estejam em v é pn . Como podemos escolher quaisquer n moléculas, a proba-
bilidade pedida é dada pela distribuição binomial:
 n  N −n
N! v V0 − v
P(N, n) = .
n!(N − n)! V0 V0
(b) O número médio hni em v é
Nv
hni = Np =
V0

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A dispersão relativa R = σ 2/hni2 pode ser calculada como

Npq Np(1 − p) 1−p V0 − v


R= = = = .
(pN) 2 (pN) 2 pN Nv
Se v  V0 , R será um número muito grande. Isso significa que, se tomamos
um subvolume desse tamanho e realizamos várias medidas do número de
moléculas dentro dele, os valores encontrados serão bastante diferentes entre
si. Numa situação extrema, se v . V0 /N, que é o volume médio por molécula,
podemos ter até mesmo hni = 0 em alguma medição. Por outro lado, se
v → V0 , R ≈ 0, os valores dessa medida serão muito semelhantes entre si, ou
seja, hni será bem definido.
Fim da atividade

Aplicações fı́sicas da distribuição binomial


A distribuição binomial tem inúmeras aplicações em Fı́sica Estatı́stica.
Vamos ver duas muito importantes: o paramagneto uniaxial e o caminho
aleatório. Os dois problemas são muito diferentes embora tenham a mesma
descrição básica. Tudo é uma questão de como interpretar as variáveis em
cada sistema.
Nos dois problemas é mais significativo e conveniente trabalhar com a
diferença entre as quantidades de cada tipo, que definimos como M. Podemos
reescrever a distribuição binomial (2.13) em termos de M como
N +M N −M
P(N, M) = CN,M p 2 q 2 , (2.23)

onde
N!
CN,M = N +M
 N −M  , (2.24)
2
! 2
!
sendo
N +M N −M
n= e N −n= . (2.25)
2 2
Aproveitamos os exemplos para apresentar duas definições importantes:
micro e macroestados. O microestado é o estado do sistema levando em conta
o detalhamento microscópico. O macroestado é o estado levando em conta
a visão macroscópica apenas. Na maior parte dos casos o macroestado é
determinado pela energia do sistema e a situação mais comum é a de se
ter muitos microestados levando a um mesmo macroestado. Como se de
longe não pudéssemos perceber certos detalhes pequenos. Chamamos de
multiplicidade, g, ao número de microestados num dado macroestado.

CEDERJ 36
Aula 2 - Descrição estatı́stica de um sistema discreto
MÓDULO 1 - AULA 2

Paramagneto uniaxial

Um dos sistemas mais simples para um estudo estatı́stico é o formado


por átomos paramagnéticos, cujos momentos magnéticos estejam sempre ao
longo de um eixo, com orientação positiva ou negativa. Esta é uma “ca-
ricatura” que descreve com boa aproximação o comportamento magnético
de uma série de materiais. Veremos mais sobre este assunto na Aula 8. A
observação macroscópica neste caso será uma medida do momento magnético
total do sistema, ou de sua energia, por isso vamos entender como essas
grandezas estão relacionadas com variáveis microscópicas do sistema.
Nosso sistema é sólido, os átomos não têm movimento de translação e,
embora sejam idênticos, são distinguı́veis pelas suas posições. O momento
magnético de cada partı́cula está sempre paralelo a um eixo, sendo a ori-
entação ao longo dele definida pela variável σ, que pode ter os valores +1 ou
−1, como ilustrado na figura 2.4.

s=+1 s=-1

Figura 2.4: Possı́veis orientações do momento magnético num sistema para-


magnético uniaxial, com relação à orientação do campo magnético aplicado,
~
B.

Podemos usar diretamente a distribuição binomial na forma (2.23). Em


vez de moedas, átomos e em vez cara e coroa temos as possibilidades σ =
±1. Suponha que o sistema contenha N átomos. Temos aqui um total
de 2N configurações distintas, dependendo das escolhas do valor de σ para
cada átomo. Essas configurações definem os microestados do sistema. Se os
átomos têm momentos magnéticos unitários, o momento magnético total de
um dado microestado é dado por
N
X
M= σi = (N+ − N− ) , (2.26)
i=1

sendo N+ (N− ) o número de átomos com σ = +1(σ = −1) no microestado.


~ define a direção do eixo de
A presença de um campo magnético externo, B,
alinhamento dos momentos magnéticos. De acordo com nossa definição de σ,

37 CEDERJ
Aula 2 - Descrição estatı́stica de um sistema discreto
Física Estatística e
Matéria Condensada

temos σ = +1 quando o momento for paralelo ao campo, e σ = −1 quando


for antiparalelo. A energia de um dado macroestado pode ser escrita como

E = −BM = −B(N+ − N− ) = −B(2N+ − N) . (2.27)

Na última igualdade usamos que N = N+ + N− . A última expressão para


a energia mostra que ela fica definida pelo valor de N+ apenas, se valores
de N e B são especificados. A figura (2.5) mostra alguns dos possı́veis mi-
croestados para um sistema com N = 7 e N+ = 3. Todos eles levam ao
mesmo valor de energia e são idênticos do ponto de vista de uma observação
macroscópica. Em alguns poucos casos é possı́vel calcular exatamente o valor

Figura 2.5: Exemplos de possı́veis microestados do paramagneto uniaxial.


Neste caso N = 7, N+ = 3, N− = 4 e M = −1.

da muliplicidade g, este é um deles. A multiplicidade é dada pelos coefientes


CN,M (equação (2.24)), ou seja,
N!
g(M, N) = CN,M = N +M
 N −M  . (2.28)
2
! 2
!

Já que podemos usar apenas N+ e N para identificar um macroestado,


vamos simplificar a notação, usando n no lugar de N+ daqui para frente.
Sejam p e q as probabilidades de cada momento magnético ter orientação
positiva ou negativa, respectivamente, na presença do campo externo, sendo
p+q = 1. De acordo com a expressão (2.27), o menor valor de energia (o mais
negativo) corresponde ao macroestado com todos os momentos magnéticos
paralelos ao campo externo, ou seja, todos com σ = +1. Queremos considerar
também a possibilidade de ter momentos antiparalelos (σ = −1) e saber qual

CEDERJ 38
Aula 2 - Descrição estatı́stica de um sistema discreto
MÓDULO 1 - AULA 2

a chance de se obter um macroestado com momentos antiparalelos também.


Como cada momento magnético é independente do outro, a probabilidade de
ocorrência de um dado microestado com n momentos positivos é pn q N −n . Na
Aula 8 veremos que p está relacionada com o valor de B e com a temperatura
B

na forma p = exp κT onde κ é a constante de Boltzmann.

Atividade 3
(Objetivos 1, 2, 3, 4, 5 e 6)
Preencha a tabela abaixo e classifique os microestados de acordo com o
macroestado a que pertence. De o valor de energia de cada microestado,
supondo que o campo aplicado seja B.

microestado M E
(a) {+ + + + + + + + ++}
(b) {+ − + − + − + − +−}
(c) {+ + + + + − − − −−}
(d) {− − + + − − + + −−}
(e) {+ − − − + + − − −+}
(f) {− − − − − − − − −−}

Resposta comentada

microestado M E
(a) {+ + + + + + + + ++} 10 -10B
(b) {+ − + − + − + − +−} 0 0
(c) {+ + + + + − − − −−} 0 0
(d) {− − + + − − + + −−} -2 2B
(e) {+ − − − + + − − −+} -2 2B
(f) {− − − − − − − − −−} -10 10B

Os microestados (b) e (c) pertencem ao macroestado com energia E = 0 e


os microestados (d) e (e), ao macroestado de energia E = 2B.
Fim da atividade

Atividade 4
(Objetivos 1, 2, 3, 4, 5 e 6)
Encontre os macroestados e suas multiplicidades para um paramagneto uni-
axial com N = 4.
diagramador: deixar 10cm

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Física Estatística e
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Resposta comentada
Temos um total de 2N = 24 = 16 microestados. n varia entre 0 e 4, ou M
entre −4 e 4, levando a 5 macroestados. Podemos usar a equação (2.28) para
calcular as multiplicidades. A tabela abaixo mostra os 24 = 16 microestados
do sistema, classificando-os de acordo com os rótulos de macroestado n ou
M. J e j são ı́ndices arbitrários que identificam os macro e microestados,
respectivamente.

J j a b c d n M g(M, 4)
1 1 + + + + 4 4 1
2 + + + −
3 + + − +
2 4 + − + + 3 2 4
5 − + + +
6 + + − −
7 + − + −
8 + − − +
3 9 − + + − 2 0 6
10 − + − +
11 − − + +
12 − − − +
4 13 − − + − 3 −2 4
14 − + − −
15 + − − −
5 16 − − − − 0 −4 1

Fim da atividade

Caminho aleatório unidimensional

Um problema relacionado com o do sistema paramagnético uniaxial é


o do caminho aleatório em uma dimensão. Nesse problema, uma partı́cula
caminha ao longo de uma reta, dando passos para a direita ou esquerda
aleatoriamente. Cada passo é independente do anterior e todos os passos
tem o mesmo tamanho, `. Seja p a probabilidade da partı́cula dar um passo
para a direita. A relação com a distribuição binária é clara, podemos dizer
que cada passo é dado após a jogada da moeda, se for cara o caminhante
vai para a direita, se for coroa, para a esquerda. Este modelo, que pode

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MÓDULO 1 - AULA 2

ser estendido para o espaço tridimensional é extremamente importante na


descrição dos processos de difusão, a mudança de direção aparecendo pela
colisão aleatória da partı́cula sendo examinada com outras do meio.
A grandeza importante neste problema é a distância que o caminhante
está após uma sequência de N passos aleatórios. Essa distância é dada pela
diferença entre o deslocamento total para a direita e o deslocamento para a
esquerda. Assim, basta interpretar N+ e N− como o número de passos para
a direita e esquerda, respectivamente. M passa a ser o número lı́quido de
passos para a direita. Se M > 0 a partı́cula terminou à direita depois dos
N passos, se M < 0, terminou à esquerda. O macroestado é identificado por
M, assim, há vários caminhos que levam ao mesmo macroestado. O número
de trajetórias com um dado M, para um certo número N de passos é dado
pela multiplidade da distribuição binária, equação (2.28).
Atividade 5
(Objetivos 1, 2, 3, 4, 5 e 6)
Suponha que uma partı́cula realiza um caminho aleatório ao longo de uma
linha.
(a) Se uma partı́cula dá 10 passos, qual a probabilidade de que esteja a uma
distância d = 8` do ponto de partida? Suponha p = 0,5
(b) Qual o valor esperado para d, se a partı́cula dá 10 passos e p = 0,5? E
se p = 0,3?
diagramador: deixar 5cm

Resposta comentada
Como a distância está dada em unidades de `, d = 8` significa que temos
M = 8. Como o número total de passos é N = 10, usando a definição de n
em termos de M e N, equação (2.25), temos n = 9.
(a) Usamos a equação (2.23) com N = 10, n = 9 e p = q = 0, !5:
 9  1  10
10! 1 1 1 10
P10(9) = = 10 = = 9, 8 × 10−3
9!1! 2 2 2 1024
(b) O valor esperado para d é hdi = hMi`. Da relação entre n e M temos
que M = 2n − N, portanto
hMi = (2hni − N) = (2Np − N)` = N(2p − 1) ⇒ hdi = N(2p − 1)` .
Se p = 0,5, hdi = 0. Claro, a partı́cula dá passos para a direita e esquerda
com igual probabilidade, em média termina no ponto inicial.

41 CEDERJ
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Física Estatística e
Matéria Condensada

Se p = 0,3, hdi = 10(2 × 0, 3 − 1)` = −4`. Aqui a probalidade de ir para a


direita é menor, em média a partı́cula termina à esquerda da origem.
Fim da atividade

Conclusão
Podemos usar distribuições de probabilidades para descrever sistemas
fı́sicos discretos do ponto de vista estatı́stico. As principais grandezas nesse
contexto são o valor esperado, ou valor médio, e a variância. O valor espe-
rado, como indica o nome, é o que se espera obter como resultado de uma
experiência, quando a mesma for repetida um número infinito de vezes. Sendo
assim, realizando a experiência uma vez, ou um número finito de vezes, cer-
tamente obteremos valores diferentes do esperado. A variância é a grandeza
que nos permite quantificar essa dispersão de valores obtidos, com relação
ao valor esperado. Quanto maior o número de repetições da experiência,
menor será a dispersão relativa, fazendo com que o valor esperado seja uma
grandeza bem definida para a quantidade que está sendo medida.

Atividade Final
(Objetivos 1, 2, 3, 4, 5 e 6)
Um sólido contém N núcleos que não interagem entre si. Cada núcleo pode
estar em qualquer um de três estados quânticos, rotulados pelo número
quântico m, que pode ter os valores 0 e ±1. Devido a interações elétricas
com campos internos ao sólido, núcleos nos estados m = 1 ou m = −1 tem
a mesma energia  > 0, enquanto que a energia do estado m = 0 é zero.
Calcule a multiplicidade g(E, N) do macroestado de energia E.
Dica: Escreva a energia como E = (N −N0 )ε, onde N0 é o número de núcleos
com m = 0. Agora você pode usar que (N − N0 ) = E/ε.
Resposta comentada
Como a energia pode ser escrita em termos de N e N0 , são essas as variáveis
que rotulam o macroestado, não importando o estado dos núcleos com m 6= 0.
A primeira contribuição para a multiplicidade vem de como escolher os
núcleos com m = 0. Dados N e N0 , há CN,N0 maneiras de fazer essa es-
colha. Para cada uma delas temos a liberdade de escolher quais núcleos com
m 6= 0 terão m = +1 ou −1, sem que a energia seja alterada. Por exemplo,

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MÓDULO 1 - AULA 2

considere N = 5, N0 = 3. Uma possibilidade de escolha de núcleos com


m = 0 é:
a b c d e
0 0 0

Agora podemos considerar todas as possibilidades para os núcleos b e e.


Temos assim:
a b c d e
0 + 0 0 +
0 + 0 0 -
0 - 0 0 +
0 - 0 0 -

Uma determinada escolha de núcleos com m = 0 gerou 22 = 4 possibilidades.


No caso geral, terı́amos 2N −N0 possibilidades. Assim, a multiplicidade total

N!
g(N0, N) = 2N −N0
(N − N0 )!N0!
Escrevendo em termos da energia, fica
N! E
g(E, N) = E  E
 2ε
ε
! N− ε !

Resumo
Nesta aula aprendemos como usar uam distribuição discreta para descr-
ever um sistema fı́sico. Em particular estudamos a distribuição binária, que
é usada com muita frequência na modelagem de sistemas fı́sicos. Aproveita-
mos para rever os conceitos de probabilidade, distribuição, valor esperado e
variância em sistemas discretos. Calculamos essas grandezas para o sistema
binário, analisando o comportamento da variância relativa com o número N
de componentes do sistema. Com isso, verificamos que o limite N → ∞
leva a distribuições muito centradas em torno do valor esperado. Aprende-
mos, também, as definições de macroestado, microestado e multiplicidade,
analisando as configurações possı́veis de um sistema binário.

Informações sobre a próxima aula


Na próxima aula continuaremos com a descrição estatı́stica de sistemas
fı́sicos, mas considerando sistemas descritos por variáveis reais obedecendo a

43 CEDERJ
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Física Estatística e
Matéria Condensada

uma distribuição contı́nua. Em particular veremos como obter a distribuição


gaussiana a partir do limite N → ∞ da distribuição binomial.

Leitura complementar
• P. L. Meyer, Probabilidade-Aplicações à Estatı́stica, primeira edição,
LTC editora.

• S. R. A. Salinas, Introdução à Fı́sica Estatı́stica, primeira edição, São


Paulo, EDUSP, capı́tulo 1.

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