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TEORIA_EXERC_D_C5_CURSO_2023_PORT_ZE.

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PORTUGUÊS

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Gramática FRENTE 1

MÓDULO 19 Pontuação I

A vírgula é usada para indicar a separação entre termos independentes entre si, quer no período, quer na oração.
Por indicar o que já está separado, a vírgula não pode ser empregada entre os termos que mantêm entre si uma
estreita ligação. Seria erro grave, portanto, colocá-la entre

✔ o sujeito e o verbo:

Cada instante da vida é um passo rumo à morte. (Corneille)

sujeito verbo

✔ o verbo e seu complemento:

A prosperidade faz poucos amigos. (Vauvenargues)

verbo complemento
verbal

✔ o nome e seu adjunto adnominal ou complemento nominal:

A mais nobre missão do ser humano é prestar sua ajuda ao semelhante... (Sófocles)

adjunto nome adjunto nome complemento


adnominal adnominal nominal

✔ a oração subordinada substantiva e a oração principal:

O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever. (Almirante Barroso)

oração principal oração subordinada substantiva

Quem não gosta do Brasil não me interessa. (Gilberto Amado)


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oração subordinada oração principal


substantiva

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1. USA-SE VÍRGULA PARA j) nas datas, o nome do lugar: 4. PONTO FINAL


SEPARAR: “São Paulo, 11 de dezembro de
1977.”; Usa-se para:
a) termos que exercem a — denotar maior pausa,
mesma função sintática: “Ela tem l) partículas e expressões de encerramento, períodos que
sua claricidade, seus caminhos, suas explicação, correção, continuação, terminem por oração que não seja
escadas, seus andaimes.” (Cecília conclusão, concessão: “Sairá interrogativa direta ou exclamativa:
Meireles); amanhã, aliás, depois de amanhã.”;
“O retrato mostra uns olhos re-
b) orações coordenadas as- m) para indicar, às vezes, a dondos, que me acompanham para
sindéticas: “Examinou o polvarinho e elipse do verbo: “Em frente, um todos os lados, efeito de uma pintura
o chumbeiro, pensou na viagem, gramal vastíssimo.” (Raul Pompeia). que me assombrava em pequeno.”
estremeceu.” (Graciliano Ramos); (Machado de Assis, Dom Casmurro).
2. DOIS-PONTOS
c) orações coordenadas sindé- 5. PONTO DE INTERROGAÇÃO
ticas, salvo as introduzidas pela Usam-se:
conjunção e: “Cessaram as buzinas, a) em enumerações expli- Usa-se:
mas prosseguia o alarido nas ruas.” cativas: “De vez em quando o olhar a) nas orações interrogativas
“O último (amor) é que é o verdadeiro, distraído esbarra numa novidade: ban- diretas: “Quem sou? Para onde vou?
porque é o único que não muda.” galô em construção, obras na calçada, Qual minha origem?” (Augusto dos
(Manuel Antônio de Almeida); ou apenas um papel na vidraça...” Anjos);
(Augusto Meyer);
d) aposto explicativo: “Conhe- b) no diálogo, sozinho ou
cia também o marido, seu Ramalho, b) para anunciar citações: acompanhado de exclamação para
sujeito calado, sério, asmático, “Murmura a relva: ‘que suave raio!;’ / expressar dúvida:
eletricista da Nordeste.” (Graciliano Responde o ramo: ‘como a luz é “– Conheceu, gente, o que é
Ramos); meiga!’” (Castro Alves); sangue de Peixoto?!” (Guimarães
Rosa).
e) pleonasmo, polissíndeto e c) para indicar esclarecimento,
repetições: “Tornou a andar, a andar, síntese, consequência do que foi 6. RETICÊNCIAS
a andar.” (Machado de Assis); dito: “Não és bom, nem és mau: és
triste e humano...” (Olavo Bilac). Usam-se para denotar hesitação,
f) Vocativo: “Dom Casmurro, interrupção do pensamento:
domingo vou jantar com você.” (Ma- 3. PONTO-E-VÍRGULA
“Sei que você fez promessa...
chado de Assis); mas uma promessa assim... não sei...
Usa-se:
Creio que, bem pensado... Você acha
g) orações subordinadas ad- a) para anunciar pausas mais
que, prima Justina?” (Machado de
jetivas explicativas: “Calçava fortes: “Os dois primeiros alvitres
Assis).
sapatos de duraque, rasos e velhos, a foram desprezados por impraticáveis;
que ela mesma dera alguns pontos.” Ernesto não tinha dinheiro nem
7. ASPAS
(Machado de Assis); crédito tão alto.” (Machado de Assis);
Usam-se para ressaltar expres-
h) orações intercaladas: “A b) para separar as adversativas,
sões ou apontar vocábulo com estran-
rosa, disse o Gênio, é a tua infância.” enfatizando o contraste: “Não se
geirismo ou gíria e nas citações:
(Augusto Meyer); disse mais nada; mas de noite Lobo
Neves insistiu no projeto.” (Machado – “Me passe” os cobres... é a
i) orações subordinadas ad- de Assis); fórmula de uma cobrança amigável.
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verbiais deslocadas: “Assim como a (Júlio Ribeiro).


abelha fabrica mel no coração negro c) para separar os diversos
do jacarandá, a doçura está no peito itens de enunciados enumerativos
do mais valente guerreiro.” (José de (em leis, decretos, portarias, regula-
Alencar); mentos etc.).

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Examine a tirinha do cartunista André Dahmer, para responder aos


Emprego da vírgula testes 2 e 3.

1. Faça a associação correta, considerando o emprego da vírgula, para


separar:
a) termos de mesma função (coordenados entre si, enumeração);
b) vocativo;
c) aposto explicativo;
d) adjunto adverbial deslocado;
e) complemento verbal anteposto e pleonástico;
f) palavras e expressões explicativas, corretivas;
g) as palavras sim e não no início da frase;
(André Dahmer. Malvados, 2019.)
h) elipse de verbo já empregado (zeugma).

2. (FGV-Econ.2022) – Para a construção de seu sentido, a tirinha


( c ) “O Pai, pequeno sitiante, lidava com vacas e arroz...”
mobiliza o seguinte recurso expressivo:
(Guimarães Rosa)
a) eufemismo.
( d ) “Na claridade do primeiro alvorecer, levantou-se.” (José b) paradoxo.
Saramago) c) antítese.
( b ) “D. Glória, a Senhora persiste na ideia de meter o nosso d) hipérbole.
Bentinho no seminário?” (Machado de Assis) e) personificação.
RESOLUÇÃO:
( g ) “Sim, ela estava mais elegante...” (Rubem Braga) Paradoxo, pois a oposição entre vida e morte colabora para
construir o sentido da tirinha.
( a ) “Quaresma convalesce longamente, demoradamente, Resposta: B
melancolicamente.” (Lima Barreto)

( h ) “A inocência é transparente; a malícia, opaca e tene-


brosa.” (Aníbal Machado)

( f ) “Será uma boa mãe de família segundo a doutrina de alguns


padres-mestres da civilização, isto é, fecunda e ignorante.”
(Machado de Assis)

( e ) “Os sinos, já não há mais quem os toque.” (Alexandre


Herculano)
3. (FGV-Econ.2022) – Verifica-se o emprego de pontuação para
( h ) “Poeta sou; pai, pouco; irmão mais.” (Manuel Bandeira)
assinalar a elipse de um verbo
( g ) “Não, não direi que assisti às alvoradas do romantismo...” a) no primeiro quadrinho, apenas.
(Machado de Assis) b) no segundo quadrinho, apenas.
c) no terceiro quadrinho, apenas.
( a ) “Nulo passado, escasso presente, tristíssimo porvir.”
d) no primeiro e no segundo quadrinhos.
(Machado de Assis)
e) no segundo e no terceiro quadrinhos.
( b ) “Não nos censures, piloto de má sorte, não se navegam RESOLUÇÃO:
corações como os outros mares deste mundo.” (Machado A elipse ocorre somente no 1º quadrinho, em que a vírgula é usada
de Assis) para omitir o verbo ser, como apontado na fala da personagem: “A
vida é um presente e a morte (é) um mistério.”
( d ) “A verdade é que, sem acomodações com o céu, este Resposta: A
mundo seria insuportável.” (Machado de Assis)
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4. (UNIP-2023) – Assinale a alternativa em que a vírgula é utilizada com 6. (UNESP-2023) – “o começo de toda virtude são a reflexão e a
a mesma função da vírgula presente no seguinte trecho: “No Chile, o deliberação, e seu fim e sua perfeição, a constância”.
deserto do Atacama abriga lixão tóxico da moda descartável do Nesse trecho, a segunda vírgula é empregada com a finalidade de
1.° mundo”. a) separar o vocativo.
a) “O deserto do Atacama no Chile abriga um gigantesco lixão b) indicar a supressão de um verbo.
clandestino de roupas que se descartam nos Estados Unidos, na c) separar dois objetos diretos.
Europa e na Ásia”. d) separar o sujeito de seu predicado.
b) “O consumo excessivo e fugaz de roupas, com redes capazes de e) indicar a supressão do conectivo “e”
lançar mais de 50 coleções de novos produtos por ano, tem feito RESOLUÇÃO:
com que o desperdício têxtil cresça exponencialmente no mundo”. A segunda vírgula está posicionada exatamente no lugar do verbo
c) “Nessa área de importadores e taxas preferenciais, comerciantes elíptico “ser”, assinalando uma zeugma (“[…] e seu fim e sua
perfeição [são], a constância”).
do resto do país selecionam os produtos para suas lojas e o que
Resposta: B
sobra não pode sair da alfândega nesta região de pouco mais de 300
mil habitantes”.
d) “A moda, como se vê, é tão tóxica quanto pneus ou plásticos”.
e) “A isso se somam hoje cifras devastadoras sobre seu imenso
impacto ambiental, comparável ao da indústria do petróleo”.
RESOLUÇÃO:
A vírgula usada na frase do enunciado separa um adjunto adverbial
que está no início de oração “No Chile”, o mesmo ocorre em
“Nessa área de importadores e taxas preferenciais”.
Resposta: C

Texto para o teste 7.

AS DOZE CORES DO VERMELHO

Você volta para casa depois de ter ido jantar com sua amiga dos
olhos verdes. Verdes. Às vezes quando você sai do escritório você
quer se distrair um pouco. Você não suporta mais tem seu trabalho
de desenhista. Cópias plantas réguas milímetros nanquim compasso
360º. de cercado cerco. Antes de dormir você quer estudar para a
prova de história da arte mas sua menina menor tem febre e chama
5. (FAMERP-2023) – Verifica-se o emprego de vírgula para separar um você. A mão dela na sua mão é um peixe sem sol em irradiações
vocativo no seguinte trecho: noturnas. Quentes ondas. Seu marido se aproxima os pés calçados
a) “Virou, com êxito.” de meias nos chinelos folgados. Ele olha as horas nos dois relógios
b) “Venha depressa, estão nos chamando de outras galáxias!” de pulso. Ele acusa você de ter ficado fora de casa o dia todo até
c) “Bem, isso atualmente está difícil, José.” tarde da noite enquanto a menina ardia em febre. Ponto e ponta. Dor
d) “O certo é que nunca mais brilhará, na mata de Nanuque, aquele perfume crescente...
foguinho solitário.” (CUNHA, H. P. As doze cores do vermelho.
e) “Só se você for concursado, e houver vaga.” Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2009.)

RESOLUÇÃO:
“José” é vocativo, nome do personagem solitário e avesso à 7. A literatura brasileira contemporânea tem abordado,
civilização, que é forçado a viver em sociedade, com todos os seus
sob diferentes perspectivas, questões relacionadas
percalços, por seu interlocutor.
Resposta: C ao universo feminino. No fragmento, entre os
recursos expressivos utilizados na construção da narrativa, destaca-se a
a) repetição de “você”, que se refere ao interlocutor da personagem.
b) ausência de vírgulas, que marca o discurso irritado da personagem.
c) descrição minuciosa do espaço do trabalho, que se opõe ao da casa.
d) autoironia, que ameniza o sentimento de opressão da personagem.
e) ausência de metáforas, que é responsável pela objetividade do texto.
Resposta: B
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MÓDULO 20 Pontuação II

1. Faça a associação correta, considerando o emprego da vírgula, para 3. (FUVEST) – Considere a imagem abaixo, extraída da apresentação do
separar: filme A Amazônia, que faz parte da campanha “A natureza está falando”.
a) oração coordenada assindética;
b) oração coordenada sindética;
c) oração adverbial deslocada;
d) oração subordinada adjetiva explicativa;
e) oração reduzida;
f) oração intercalada;
g) polissíndeto.

( b ) “Não és filha, mas hóspede da terra.” (Olavo Bilac)

( a ) “Emagreceu, adoeceu, perdeu a mãe, enterrou-a por


subscrição...” (Machado de Assis)

( e ) “O alienista, vendo o efeito de suas palavras, reconheceu


que era amigo do Quincas Borba...” (Machado de Assis)

( c ) “Quando a cavalgada chegou à margem da clareira, aí


se passava uma cena curiosa.” (José de Alencar)
No áudio desse filme, a atriz Camila Pitanga interpreta o seguinte
( d ) “O retrato mostra uns olhos redondos, que me acompa- texto:
nham para todos os lados, efeito de uma pintura que me Eu sou a Amazônia, a maior floresta tropical do mundo. Eu
assombrava em pequeno.” (Machado de Assis) mando chuva quando vocês precisam. Eu mantenho seu clima
( g ) “Nem a física, nem a moral, nem a intelectual, nem a estável. Em minhas florestas, existem plantas que curam suas
política que julgava existir, havia.” (Lima Barreto) doenças. Muitas delas vocês ainda nem descobriram. Mas vocês
estão tirando tudo de mim. A cada segundo, vocês cortam uma das
( b ) “O último [amor] é que é o verdadeiro, porque é o único
minhas árvores, enchem de sujeira os meus rios, colocam fogo, e eu
que não muda.” (Manuel Antônio de Almeida)
não posso mais proteger as pessoas que vivem aqui. Quanto mais
( g ) “Mas, infelizmente, para a quietação do Silvério, Jacinto vocês tiram, menos eu tenho para oferecer. Menos água, menos
lançara raízes, e rijas, e amorosas raízes na sua rude curas, menos oxigênio. Se eu morrer, vocês também morrem, mas
serra.” (Eça de Queirós) eu crescerei de novo...

( f ) “— É a ânsia de combater o tupinambá que volve o passo


a) Por estar em primeira pessoa, o texto constitui exemplo de uma
do guerreiro para as bordas do mar, respondeu o cristão.”
determinada figura de linguagem. Identifique essa figura e explique
(José de Alencar)
seu uso, tendo em vista o efeito que o filme visa alcançar.
RESOLUÇÃO:
2. (IBMEC) – Compare estes períodos: O texto em primeira pessoa dá voz à floresta amazônica, o que
configura personificação ou prosopopeia. Seu discurso visa a
I. Os investidores que temiam ser vítimas da crise global financeira denunciar a destruição de seu ecossistema, sendo um expediente
abandonaram o mercado de ações. retórico que promove a empatia com o leitor, tentando persuadi-lo
a posicionar-se a favor da proteção desse bioma.
II. Os investidores, que temiam ser vítimas da crise global financeira,
abandonaram o mercado de ações.

A respeito do emprego de vírgulas, é correto afirmar:


a) Em I, a ausência de vírgulas cria o pressuposto de que ainda há
pessoas investindo na Bolsa de Valores.
b) Em II, a presença de vírgulas indica que somente alguns investidores
temiam ser vítimas da crise financeira.
c) A análise dos períodos permite afirmar que as vírgulas têm apenas
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a função de demarcar pausas na leitura.


d) Em I, subentende-se que todos os investidores deixaram de aplicar
seu dinheiro no mercado de ações.
e) Em II, as vírgulas foram usadas para destacar a ideia de restrição,
presente na oração subordinada adjetiva.
Resposta: A

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b) No referido áudio, é possível perceber, no final da locução da atriz, Texto para o teste 5.
uma entonação especial, representada na transcrição por meio de
reticências. Tendo em vista que uma das funções desse sinal de Muito do que gastamos (e nos desgastamos) nesse
pontuação é sugerir uma ideia não expressa que cabe ao leitor inferir, consumismo feroz podia ser negociado com a gente mesmo: uma
identifique a ideia sugerida, neste caso. hora de alegria em troca daquele sapato. Uma tarde de amor em troca
RESOLUÇÃO: da prestação do carro do ano; um fim de semana em família em lugar
As reticências são empregadas para suspender o pensamento e, daquele trabalho extra que está me matando e ainda por cima detesto.
nesse caso, têm a função de deixar subentendida a ideia de que o Não sei se sou otimista demais, ou fora da realidade. Mas, à
ser humano não sobreviverá sem a natureza. Ela, porém, tem a medida que fui gostando mais do meu jeans, camiseta e mocassins,
capacidade de se recuperar.
me agitando menos, querendo ter menos, fui ficando mais tranquila
e mais divertida. Sapato e roupa simbolizam bem mais do que isso
que são: representam uma escolha de vida, uma postura interior.
Nunca fui modelo de nada, graças a Deus. Mas amadurecer me
obrigou a fazer muita faxina nos armários da alma e na bolsa também.
Resistir a certas tentações é burrice; mas fugir de outras pode ser
crescimento, e muito mais alegria.
LUFT, L. Pensar é transgredir. Rio de Janeiro: Record, 2011.

5. (Digital-2021) – Nesse texto, há duas ocorrências


de dois-pontos. Na primeira, eles anunciam uma
enumeração das negociações que podemos fazer
conosco. Na segunda, eles introduzem uma
a) opinião sobre o uso de jeans, camiseta e mocassins.
Texto para o teste 4. b) explicação sobre a simbologia de sapatos e roupas.
c) conclusão acerca da oposição entre otimismo e realidade.
O OURO DO SÉCULO 21 d) comparação entre ostentação e conforto em termos de vestuário.
e) retomada da ideia de negociação discutida no primeiro parágrafo.
Cério, gadolínio, lutécio, promécio e érbio; sumário, térbio e RESOLUÇÃO:
disprósio; hólmio, túlio e itérbio. Essa lista de nomes esquisitos e Os dois-pontos, na segunda ocorrência, introduzem uma explicação
pouco conhecidos pode parecer a escalação de um time de futebol, sobre o que simbolizam o sapato e a roupa: “uma escolha de vida,
uma postura interior”.
que ainda teria no banco de reservas lantânio, neodímio, praseodímio,
Resposta: B
európio, escândio e ítrio. Mas esses 17 metais, chamados de terras-
raras, fazem parte da vida de quase todos os humanos do planeta.
Chamados por muitos de “ouro do século 21”, “elementos do
futuro” ou “vitaminas da indústria”, eles estão nos materiais usados Texto para o teste 6.
na fabricação de lâmpadas, telas de computadores, tablets e
celulares, motores de carros elétricos, baterias e até turbinas eólicas. Quem procura a essência de um conto no espaço que fica entre
Apesar de tantas aplicações, o Brasil, dono da segunda maior reserva a obra e seu autor comete um erro: é muito melhor procurar não no
do mundo desses metais, parou de extraí-los e usá-los em 2002. terreno que fica entre o escritor e sua obra, mas justamente no
Agora, volta a pensar em retomar sua exploração. terreno que fica entre o texto e seu leitor.
SILVEIRA, E. Disponível em: www.revistaplaneta.com.br. OZ, A. De amor e trevas.
São Paulo: Cia. das Letras. 2005 (fragmento).
Acesso em: 6 dez. 2017 (adaptado).

6. A progressão temática de um texto pode ser


4. (2021) – As aspas sinalizam expressões metafó-
estruturada por meio de diferentes recursos
ricas empregadas intencionalmente pelo autor do
coesivos, entre os quais se destaca a pontuação.
texto para
Nesse texto, o emprego dos dois pontos caracteriza uma operação
a) imprimir um tom irônico à reportagem.
textual realizada com a finalidade de
b) incorporar citações de especialistas à reportagem.
a) comparar elementos opostos.
c) atribuir maior valor aos metais, objeto da reportagem.
b) relacionar informações gradativas.
d) esclarecer termos científicos empregados na reportagem.
c) intensificar um problema conceitual.
e) marcar a apropriação de termos de outra ciência pela reportagem.
d) introduzir um argumento esclarecedor.
RESOLUÇÃO:
As expressões “ouro do século 21”, “elementos do futuro” e e) assinalar uma consequência hipotética.
“vitaminas da indústria”, apresentadas entre aspas, são utilizadas RESOLUÇÃO:
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no texto para reforçar a importância desses metais para a Os dois pontos introduzem um argumento que esclarece o erro
economia nacional. Diante disso, pode-se afirmar que elas são apontado pelo autor.
empregadas para enaltecer o valor desses metais. Resposta: D
Resposta: C

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MÓDULO 21 Colocação Pronominal

A colocação do pronome átono está relacionada à harmonia


CASOS DE ÊNCLISE
da frase. A tendência do português falado no Brasil é o uso
Verbo no início da oração, desde que não esteja no futuro
do pronome antes do verbo – próclise. No entanto, há casos
do indicativo.
em que a norma culta prescreve o emprego do pronome no
Trago-te flores.
meio – mesóclise – ou após o verbo – ênclise. Verbo no imperativo afirmativo
De acordo com a norma culta, no português escrito não se Amigos, digam-me a verdade!
inicia um período com pronome oblíquo átono. Assim, Verbo no gerúndio, desde que não esteja precedido pela
se na linguagem falada diz-se Me encontrei com ele, na preposição em.
linguagem escrita, formal, usa-se Encontrei-me com ele. Saí, deixando-a aflita.
Verbo no infinitivo impessoal regido da preposição a. Com
Sendo a próclise a tendência, é aconselhável que se fixem
outras preposições é facultativo o emprego de ênclise ou próclise.
bem as poucas regras de mesóclise e ênclise. Assim, sempre
Apressei-me a convidá-los.
que estas não forem obrigatórias, deve-se usar a próclise, a Estava para dizer-lhe a verdade. /
menos que prejudique a eufonia da frase. Estava para lhe dizer a verdade.

CASOS DE PRÓCLISE

Palavra de sentido negativo


CASOS DE MESÓCLISE
Não me falou a verdade.
É obrigatória somente com verbos no futuro do presente
Advérbios sem pausa em relação ao verbo
ou no futuro do pretérito que iniciam a oração.
Aqui te espero pacientemente.
Dir-lhe-ei toda a verdade.
Havendo pausa indicada por vírgula, recomenda-se a ênclise. Far-me-ias um favor?
Ontem, encontrei-o no ponto do ônibus.
Se o verbo no futuro vier precedido de pronome reto ou de
Pronomes indefinidos qualquer outro fator de atração, ocorrerá a próclise.
Ninguém o chamou aqui. Eu lhe direi toda a verdade.
Tu me farias um favor?
Pronomes demonstrativos
Aquilo lhe desagrada.
Orações interrogativas
Quem lhe disse tal coisa? COLOCAÇÃO DO PRONOME ÁTONO NAS
Orações optativas (que exprimem desejo), com sujeito LOCUÇÕES VERBAIS
anteposto ao verbo Verbo principal no infinitivo ou gerúndio
Deus lhe pague, Senhor! Se a locução verbal não vier precedida de um fator de próclise,
o pronome átono deverá ficar depois do auxiliar ou depois
Orações exclamativas
do verbo principal.
Quanta honra nos dá sua visita!
Devo-lhe dizer a verdade.
Orações substantivas, adjetivas e adverbiais, desde que Devo dizer-lhe a verdade.
não sejam reduzidas.
Havendo fator de próclise, o pronome átono deverá ficar
Percebia que o observavam. antes do auxiliar ou depois do principal.
Este é o homem que te procura. Não lhe devo dizer a verdade.
Caso me ausente, cuide dos nossos negócios. Não devo dizer-lhe a verdade.
Verbo no gerúndio, regido de preposição em. Verbo principal no particípio
Em se plantando, tudo dá. Se não houver fator de próclise, o pronome átono ficará
depois do auxiliar.
Verbo no infinitivo pessoal precedido de preposição.
Havia-lhe dito a verdade.
Seus intentos são para nos prejudicarem.
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Se houver fator de próclise, o pronome átono ficará antes do Observação


auxiliar. Não se deve omitir o hífen nas seguintes construções:
Não lhe havia dito a verdade. Devo-lhe dizer tudo.
Estava-lhe dizendo tudo.
Haver de e ter de + infinitivo
Havia-lhe dito tudo.
Pronome átono deve ficar depois do infinitivo.
Hei de dizer-lhe a verdade.
Tenho de dizer-lhe a verdade.

1. (UNISAL) – A gramática normativa determina que os pronomes 3. (FGV-Econ) – Assinale a alternativa que atende à norma-padrão de
oblíquos átonos (me, te, se, o, a, lhe, se, nos, vos) apareçam antes do colocação pronominal.
verbo quando houver palavras negativas, advérbios, conjunções subordi- a) Vai-se o sertanejo no êxodo para a costa, para as serras distantes –
nativas, pronomes relativos, indefinidos ou demonstrativos antes dele. esvazia-se o sertão, ainda que a saudade acompanhe o retirante.
Verifique a aplicação dessa regra nas frases seguintes: b) Quando acaba-se o flagelo, é como se todos os problemas fossem
esquecidos, e tudo se reestabelecesse como antes.
I. Luís jamais me olhou de novo. c) Por fim, o sertanejo se dobra e, depois de tantos retirantes à sua
II. Nós esperávamos que nos dissessem toda a verdade. porta, rapidamente amatula-se em um daqueles bandos.
III. Agora escute-me, por favor. d) Ainda que o flagelo tenha ameaçado-o, o sertanejo volta ao sertão,
IV. Avisaram-me sobre o acidente. movido pela saudade por estar meses longe de sua casa.
e) Se vê, com assombro, a primeira turma de retirantes atravessar o
Estão corretas, segundo a gramática normativa, as frases: terreiro, e depois outras seguem-se nos dias posteriores.
a) I e IV. RESOLUÇÃO:
b) I, II, III e IV. Ambos os pronomes oblíquos átonos estão em ênclise por ser
c) I, II e IV. início de oração. Em b, “quando se acaba”; em c, “rapidamente se
d) I, II e III. anula”; em d, “tenha-o ameaçado”; em e “Vê-se... e depois outras
se seguem”.
e) III e IV.
Resposta: A
RESOLUÇÃO:
No item III, o correto é: Agora me escute...
Resposta: C

4. (ESPM) – A colocação pronominal foge ao que se recomenda para


o padrão culto em:
a) Não se sabia ao certo, sem os resultados da pesquisa, quantos
beneficiariam-se com a distribuição de alimentos.
b) Tratava-se de um procedimento normal, informou a secretária, pois
2. (FGV) – Assinale a alternativa em que a posição dos pronomes áto-
a dispensa de funcionários decorria da queda de arrecadação.
nos, na frase, está de acordo com a norma-padrão do português escrito.
c) Quem se dispuser a trabalhar em benefício das pessoas carentes da
a) A respeitosa atitude de todos e a deferência universal que cercavam-no...
comunidade deve apresentar-se ao coordenador, amanhã cedo, no
b) As obscuras determinações das coisas acertadamente o haviam
Centro de Solidariedade.
erguido até ali.
d) Não houve quebradeira de empresas e de bancos, porque já se sabia
c) Ele julgava-se e só o que parecia-lhe grande entrava nesse julgamento.
dos riscos de uma desvalorização e as companhias se protegeram,
d) ... uma chusma de sentimentos atinentes a si mesmo que quase
falavam-lhe. comprando dólares.
e) As obscuras determinações das coisas, acertadamente, mais alto e) Presumo que o erro foi causado pelo fato de muitos economistas
levariam-no. terem deduzido que a história se repete, e não foi o que se observou,
RESOLUÇÃO: nesse caso.
Nas demais alternativas há ênclises indevidas: em a e c porque os
verbos são antecedidos por pronomes relativos; em d porque antes RESOLUÇÃO:
vem um advérbio; em e porque se trata de futuro do pretérito. Na passagem ...quantos beneficiariam-se... existe um erro de
Resposta: B colocação pronominal, porque o pronome interrogativo quantos
atrai o pronome se para antes do verbo, havendo assim próclise:
PORTUGUÊS D

“...quantos se beneficiariam com...”


Resposta: A

8–
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Texto para a questão 5. Texto para a questão 7.

A colocação pronominal é a posição que os pronomes pessoais Se conhecêssemos a verdade, vê-la-íamos; tudo o mais é
oblíquos átonos ocupam na frase em relação ao verbo a que se sistema e arredores. Basta-nos, se pensarmos, a incompreensibi-
referem. São pronomes oblíquos átonos: me, te, se, o, os, a, as, lhe, lidade do universo; querer compreendê-lo é ser menos que homens,
lhes, nos e vos. Esses pronomes podem assumir três posições na porque ser homem é saber que não se compreende.
oração em relação ao verbo. Próclise, quando o pronome é colocado PESSOA, Fernando. O livro do desassossego.
antes do verbo, devido a partículas atrativas, como o pronome São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 117.
relativo. Ênclise, quando o pronome é colocado depois do verbo, o
que acontece quando este estiver no imperativo afirmativo ou no
7. (UFAL) – Assinale a alternativa correta em relação aos aspectos
infinitivo impessoal regido da preposição “a” ou quando o verbo
formais da língua padrão culta.
estiver no gerúndio. Mesóclise, usada quando o verbo estiver
a) O termo “vê-la-íamos” é traduzido por “vimos a verdade”.
flexionado no futuro do presente ou no futuro do pretérito.
b) O termo “Basta-nos” pode ser substituído por “Nos basta”.
c) A expressão “não se compreende” pode ser substituída por “não
5. A mesóclise é um tipo de colocação pronominal raro compreende-se”.
no uso coloquial da língua portuguesa. No entanto, d) O ponto e vírgula utilizado após a expressão “vê-la-íamos” pode ser
ainda é encontrada em contextos mais formais, como substituído por um ponto, sem causar mudança de sentido ao texto.
se observa em: e) O trecho “ser homem é saber que não se compreende” pode ser
a) Não lhe negou que era um improviso. reescrito da seguinte forma: “ser homem é saber, que não se
b) Faz muito tempo que lhe falei essas coisas. compreende”.
c) Nunca um homem se achou em mais apertado lance. RESOLUÇÃO:
d) Referia-se à D. Evarista ou tê-la-ia encontrado em algum outro autor? Pode ocorrer a substituição porque a oração seguinte “Tudo o mais
e) Acabou de chegar dizendo-lhe que precisava retornar ao serviço é sistema e arredores” é independente (coordenada).
Resposta: D
imediatamente.
RESOLUÇÃO:
Temos, em tal alternativa, o verbo flexionado no futuro do
pretérito, o que justifica a mesóclise (pronome no meio do verbo)
do pronome pessoal oblíquo átono.
Resposta: D

6. (TOLEDO) – Para as questões seguintes, assinale:


A) quando somente a I estiver correta;
B) quando I e II estiverem corretas.

a) I. O gado ia finar-se, até os espinhos secariam.


II. O gado ia-se finar, até os espinhos secariam.
b) I. Compadre, eu não lhe quero dizer coisa alguma.
II. Compadre, eu não quero dizer-lhe coisa alguma.
c) I. Preciso contar, senhor delegado, como se foi formando entre nós
esse espírito de briga.
II. Preciso contar, senhor delegado, como foi formando-se entre nós
esse espírito de briga.
d) I. As visões da caatinga tinham-se dissipado.
II. As visões da caatinga tinham dissipado-se.
(Graciliano Ramos. Vidas secas. Ed. Martins, pp. 30, 36.)
Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta.
a) B / B / A / A
b) A / B / A / B
c) B / B / B / A
d) A / A / A / B
PORTUGUÊS D

e) B / A / A / A
RESOLUÇÃO:
A frase As visões da caatinga tinham dissipado-se está errada
porque não se prende pronome oblíquo átono ao particípio.
Resposta: C

–9
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MÓDULO 22 Estudos Linguísticos VII

Para responder às questões de 1 a 3, leia a letra da canção “Deus lhe


pague”, do compositor Chico Buarque (1944- ), composta em 1971.

Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague

Pelo prazer de chorar e pelo “estamos aí”


Pela piada no bar e o futebol pra aplaudir
Um crime pra comentar e um samba pra distrair
Deus lhe pague

Por essa praia, essa saia, pelas mulheres daqui


O amor malfeito depressa, fazer a barba e partir 2. (UNESP) – Considere as definições dos seguintes conceitos:
Pelo domingo que é lindo, novela, missa e gibi 1. Autonomia: direito de um indivíduo tomar decisões livremente;
Deus lhe pague independência moral ou intelectual; capacidade de governar-se
pelos próprios meios.
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir 2. Heteronomia: sujeição de um indivíduo a uma instância externa
Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir ou à vontade de outrem; ausência de autonomia.
Pelos andaimes, pingentes, que a gente tem que cair
Deus lhe pague Qual dos conceitos mostra-se mais adequado para descrever a
existência retratada pela letra da canção? Justifique sua resposta, com
Por mais um dia, agonia, pra suportar e assistir base no texto.
Pelo rangido dos dentes, pela cidade a zunir Considerando o contexto histórico-social em que a canção foi composta,
E pelo grito demente que nos ajuda a fugir a quem ou a que se refere o pronome “lhe” em “Deus lhe pague”?
Deus lhe pague RESOLUÇÃO:
A existência retratada pela letra define-se pelo conceito da
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir heteronomia, uma vez que o eu lírico descreve uma vida à mercê
das vontades e permissões de outrem, “ a concessão pra sorrir /
E pelas moscas-bicheiras a nos beijar e cobrir
por me deixar respirar / por me deixar existir”.
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir A música foi composta em 1971, durante o regime militar, sendo
Deus lhe pague uma forma de protesto contra os abusos da ditadura então vigente.
(www.chicobuarque.com.br) De forma irônica, portanto, o “lhe”, objeto indireto do verbo
“pagar”, refere-se aos governantes.
1. (UNESP) – “Deus lhe pague”: pedido a Deus para que abençoe
alguém por algo bom que esse alguém praticou.
(Carlos Alberto de M. Rocha e Carlos Eduardo P. de M. Rocha.
Dicionário de locuções e expressões da língua portuguesa, 2011.)

Considerando a definição da expressão “Deus lhe pague”, é correto


afirmar que o compositor se apropriou ironicamente dessa expressão
em sua canção? Justifique sua resposta, valendo-se de três versos da
letra da canção.
RESOLUÇÃO:
A expressão “Deus lhe pague” é uma apropriação irônica de uma
expressão coloquial, que foi usada como estribilho na letra da
música de Chico Buarque, composta em 1971, durante a ditadura
militar. A ironia da expressão se deve ao fato de que a letra
denuncia a situação de miséria do povo “pão pra comer, por esse
chão pra dormir”, a repressão em “concessão pra sorrir”, a política
do pão e circo em “piada no bar e o futebol pra aplaudir”, entre
outros exemplos de situações de penúria e de restrição à liberdade
PORTUGUÊS D

por que passava o povo brasileiro, sendo o agradecimento uma


zombaria dirigida às autoridades da época.

10 –
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3. (UNESP) – O eufemismo consiste em atenuar o sentido b) Explique o significado, no texto, da expressão “cortando as
desagradável de uma palavra ou expressão, substituindo-a por outra, asas antes do voo”.
capaz de suavizar seu significado. RESOLUÇÃO:
(Celso Cunha. Gramática essencial, 2013. Adaptado.) A expressão metafórica “cortando as asas antes do voo” refere-se
à atitude por parte do editor para conter o ímpeto de supercorreção
do “autor de primeira viagem”, que não era “nenhum Bruxo do
Transcreva o verso em que se verifica a ocorrência de eufemismo.
Cosme Velho”.
Justifique sua resposta.
Reescreva, em linguagem formal, o trecho destacado do seguinte verso:
“Pelos andaimes, pingentes, que a gente tem que cair”.
RESOLUÇÃO:
Um exemplo de eufemismo está em “e pela paz derradeira que
enfim vai nos redimir”, em que a ideia de paz e redenção atenua a
ideia de morte.
Reescrevendo o verso em linguagem formal, tem-se: 5. (Albert Einstein-2023) – Examine a tirinha de Fernando Gonsales,
“Pelos andaimes, pingentes, de que (dos quais) nós temos de (que) publicada na conta do Instagram “Depósito de Tirinhas”, em
cair.” 23.04.2020.

QUAL
O SENTIDO
DA
VIDA?

Texto para a questão 4.

A REINVENÇÃO DA VÍRGULA

No começo de 1902, Machado de Assis ficou desesperado por


causa de um erro de revisão no prefácio da segunda edição de suas
Poesias completas. Dizem que chegou a se ajoelhar aos pés do
Garnier implorando para que o editor tirasse o livro de circulação. O
O
aristocrático e impoluto Machado, quem diria. Mas a gralha era
mesmo feia. O tipógrafo trocou o E por A na palavra cegara, o revisor
TATO!
deixou passar, e vocês imaginam no que deu.
No nosso caso, o erro não foi nada de mais, nem erro foi para
falar a verdade, apenas um acréscimo besta de pontuação, talvez
dispensável, ainda que de modo algum incorreto. Vai o revisor, fiel à
ortodoxia da gramática normativa, e espeta duas vírgulas para isolar
um adjunto adverbial deslocado, coisa de pouca monta, diria alguém,
mas suficiente para o autor sair bradando aos quatro ventos que lhe
roubaram o ritmo da sentença. Um editor experiente traria um
cafezinho bem doce, a conter o ímpeto dramático do autor de
primeira viagem, talvez caçoando, “deixa de onda”, a lembrá-lo – Para obter seu efeito de humor, a tirinha explora o seguinte recurso
valha-me Deus! – que ele não é nenhum Bruxo do Cosme Velho*. E expressivo:
assim lhe cortando as asas antes do voo. a) eufemismo: o emprego de palavra ou expressão no lugar de outra
palavra ou expressão considerada desagradável.
* Referente a Machado de Assis. b) ambiguidade: a presença, num texto, de uma unidade linguística que
pode significar coisas diferentes.
(Disponível em: c) hipérbole: a ênfase resultante do exagero na expressão ou na
https://jornal.usp.br/artigos/areinvencaodavirgula/. Adaptado.) comunicação de uma ideia.
d) antítese: a oposição, numa mesma expressão ou frase, de duas
palavras ou de dois pensamentos de sentidos contrários.
4. (FUVEST-2020)
e) sinestesia: a aproximação, na mesma expressão, de sensações
a) Qual o sentido da palavra “espeta”, destacada no texto, e
percebidas por diferentes órgãos dos sentidos.
qual o efeito que ela produz?
RESOLUÇÃO:
RESOLUÇÃO:
PORTUGUÊS D

Na pergunta “Qual o sentido da vida”, a palavra “sentido” é


A palavra “espeta” foi empregada em sentido figurado: “incluir,
ambígua, pode tanto ser um questionamento existencial, uma
inserir”. O termo foi empregado em uma alusão à reação de
dúvida metafísica, quanto referir-se aos órgãos de sentido, que foi
contrariedade do autor que se sentiu desrespeitado por ter o seu
o entendimento da companheira, que escolhe o “tato”
texto “corrigido” pelo revisor.
(aconchegando-se ao interlocutor) como o órgão sensorial mais
importante.
Resposta: B

– 11
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Texto para às questões de 6 a 9. 8. (FUVEST-Transferência-2021/22) – No verso “O meu dia foi bom,


pode a noite descer.”(v.6), as duas orações poderiam estar unidas, sem
Consoada prejuízo de sentido, por uma conjunção:
Quando a Indesejada das gentes chegar a) conclusiva.
(Não sei se dura ou caroável), b) adversativa.
Talvez eu tenha medo. c) concessiva.
Talvez sorria, ou diga: d) temporal.
– Alô, iniludível! e) condicional.
O meu dia foi bom, pode a noite descer. RESOLUÇÃO:
(A noite com os seus sortilégios.) A segunda oração exprime a conclusão do raciocínio expresso na
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa, primeira oração. Dessa forma, as conjunções coordenativas
conclusivas unem adequadamente as duas orações: “O meu dia
A mesa posta,
foi bom, portanto (por isso, por conseguinte, logo) a noite pode
Com cada coisa em seu lugar. descer”.
(Manuel Bandeira – Opus 10.) Resposta: A

6. (FUVEST-Transferência-2021/22) – Leia as seguintes afirmações a


respeito do poema:
I. O vocativo “iniludível” retoma a personificação da morte, tratada por
“a Indesejada das gentes”.
II. Os adjetivos participiais “lavrado”, “limpa”e “posta” reforçam a
ideia de trabalho finalizado e missão cumprida.
III. As palavras “dia”e “noite”podem ser interpretadas conotativamente
referindo-se, respectivamente, à vida e à morte.
Está correto o que se afirma em 9. (FUVEST-Transferência-2021/22) – Assinale a alternativa em que
a) I, apenas. as duas palavras exercem no texto a mesma função sintática.
b) II, apenas. a) “Indesejada”(v.1), “medo”(v.3).
c) I e II, apenas. b) “campo”(v.8), “lugar”(v.10).
d) I e III, apenas. c) “dia” (v.6), “mesa”(v.9).
e) I, II e III. d) “Indesejada”(v.1), “dia”(v.6).
RESOLUÇÃO: e) “gentes” (v.1), “noite”(v.6).
Em I, a morte foi personificada, já que foram atribuídas a ela RESOLUÇÃO:
características de seres animados. Em II, há ideia de trabalho Em d, tanto “indesejada” quanto “dia”exercem função sintática
concluído em “o campo está lavrado, a casa está limpa e a mesa está de sujeito. Em a, “indesejada” é sujeito e “medo”, objeto direto;
posta”. Em III, as palavras “dia” e “noite” são metáforas para “vida”e em b, “campo”é objeto direto e “lugar”, adjunto adverbial; em c,
“morte”. Todas as afirmações estão corretas. “dia”é sujeito e “mesa”, objeto direto; em e, “gentes” é adjunto
Resposta: E adnominal e “noite”, sujeito.
Resposta: D

7. (FUVEST-Transferência-2021/22) – As palavras “consoada”(título),


“caroável” (v.2) e “sortilégios”(v.7) poderiam ser substituídas, sem
prejuízo de sentido, respectivamente por:
a) “cantiga”, “ruidosa”, “destinos”.
b) “ceia”, “afável”, “feitiços”.
c) “refeição”, “agressiva”, “mistérios”.
d) “balada”, “triste”, “malefícios”.
e) “sopa”, “maldosa”, “encantos”.
RESOLUÇÃO:
O substantivo “consoada”significa “ceia, refeição noturna”; o
adjetivo “coroável”, em oposição a “dura”, “afável, amável”; o
substantivo “sortilégios”, “feitiços, magias”.
Resposta: B
PORTUGUÊS D

12 –
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MÓDULO 23 Estudos Linguísticos VIII

Leia o trecho inicial do artigo “Artifícios da inteligência”, do físico b) Cite dois termos empregados em sentido figurado no primeiro
brasileiro Marcelo Gleiser (1959- ), para responder às questões 1 e 2. parágrafo do artigo.
RESOLUÇÃO:
Considere a seguinte situação: você acorda atrasado para o São exemplos de termos empregados em sentido figurado:
trabalho e, na pressa, esquece o celular em casa. Só quando “engavetado”, metáfora que se refere a estar preso no
congestionamento, e “navegar”, também metáfora, referindo-se a
engavetado no tráfego ou amassado no metrô você se dá conta. E
passar de um sítio para outro na internet.
agora é tarde para voltar. Olhando em volta, você vê pessoas com
celular em punho conversando, mandando mensagens, navegando
na internet. Aos poucos, você vai sendo possuído por uma sensação
de perda, de desconexão. Sem o seu celular, você não é mais você.
A junção do humano com a máquina é conhecida como
“transumanismo”. Tema de vários livros e filmes de ficção científica,
hoje é um tópico essencial na pesquisa de muitos cientistas e filósofos.
A questão que nos interessa aqui é até que ponto essa junção pode
ocorrer e o que isso significa para o futuro da nossa espécie.
Será que, ao inventarmos tecnologias que nos permitam ampliar
nossas capacidades físicas e mentais, ou mesmo máquinas
pensantes, estaremos decretando nosso próprio fim? Será esse nosso
destino evolucionário, criar uma nova espécie além do humano?
É bom começar distinguindo tecnologias transumanas daquelas
que são apenas corretivas, como óculos ou aparelhos para surdez.
Tecnologias corretivas não têm como função ampliar nossa
capacidade cognitiva: só regularizam alguma deficiência existente.
A diferença ocorre quando uma tecnologia não apenas corrige
uma deficiência como leva seu portador a um novo patamar, além da
2. (UNESP)
capacidade normal da espécie humana. Por exemplo, braços
a) De acordo com o físico, nós já podemos ser considerados
robóticos que permitem que uma pessoa levante 300 quilos, ou
transumanos? Justifique sua resposta.
óculos com lentes que dotam o usuário de visão no infravermelho.
RESOLUÇÃO:
No caso de atletas com deficiência física, a questão se torna bem Segundo o autor, o transumanismo, “hibridismo entre tecnologia
interessante: a partir de que ponto uma prótese como uma perna e biologia”, já está ocorrendo. Marcelo Gleiser considera que os
artificial de fibra de carbono cria condições além da capacidade seres humanos estão ampliando sua capacidade por meio de
humana? Nesse caso, será que é justo que esses atletas compitam tecnologias que os redefinem de modo que as pessoas já não são
as mesmas, caso percam o acesso aos aparelhos eletrônicos, tal
com humanos sem próteses?
como acontece no caso do celular.
Poderia parecer que esse tipo de hibridização entre tecnologia e
biologia é coisa de um futuro distante. Ledo engano. Como no caso
do celular, está acontecendo agora. Estamos redefinindo a espécie
humana através da interação – na maior parte ainda externa – com
tecnologias que ampliam nossa capacidade.
Sem nossos aparelhos digitais – celulares, tabletes, laptops – já
não somos os mesmos. Criamos personalidades virtuais, ativas
apenas na internet, outros eus que interagem em redes sociais com
selfies arranjados para impressionar; criações remotas, onipresentes.
Cientistas e engenheiros usam computadores para ampliar sua
habilidade cerebral, enfrentando problemas que, há apenas algumas
décadas, eram considerados impossíveis. Como resultado, a cada
dia surgem questões que antes nem podíamos contemplar.
(Folha de S.Paulo, 01.02.2015. Adaptado.)

1. (UNESP)
a) Para o físico Marcelo Gleiser, o que distingue as tecnologias
PORTUGUÊS D

transumanas daquelas apenas corretivas? Justifique sua resposta.


RESOLUÇÃO:
Segundo o texto, as tecnologias corretivas regularizam deficiências
físicas existentes, não têm como objetivo a ampliação de
características cognitivas, como é o caso do transumanismo.

– 13
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b) Dêiticos: expressões linguísticas cuja interpretação depende da b) Substitua os dois-pontos do trecho “Vale dizer que o usuário
pessoa, do lugar e do momento em que são enunciadas. Por contabilizou apenas mortes relevantes à história: só entraram na
exemplo: “eu” designa a pessoa que fala “eu”. planilha vítimas que tinham, pelo menos, nome antes de baterem as
(Ernani Terra. Leitura do texto literário, 2014.) botas” por uma conjunção e indique qual a relação de sentido
estabelecida por ela?
Cite dois dêiticos empregados nos dois primeiros parágrafos do RESOLUÇÃO:
Os dois pontos introduzem uma explicação sobre a condição que
texto.
Tom95 leva em conta para que uma morte seja considerada
RESOLUÇÃO: relevante na Saga Vingadores: ter-se abatido sobre uma
O pronome de tratamento “você” foi empregado em sentido personagem que tenha nome. Dessa forma, esse sinal de
generalizante, pois não se refere a uma pessoa em particular, mas pontuação pode ser substituído por uma conjunção explicativa
a todos os que já vivenciaram as situações descritas no primeiro como pois, porque.
parágrafo. No segundo parágrafo, o pronome pessoal oblíquo
“nos” refere-se ao próprio autor do texto, é usado como plural de
modéstia. O pronome possessivo “nossa” refere-se à espécie
humana.

Examine a tira de André Dahmer para responder às questões de 4 a 6.

Texto para a questão 3.

Tio Ben cravou pouco antes de falecer: “grandes poderes nunca


vêm sozinhos”. E não há responsabilidade maior do que tirar a vida
de alguém. Isso, no entanto, não significa que super-heróis tenham
a ficha completamente limpa. Na verdade, uma olhada mais atenta
nos filmes sobre os personagens confirma uma teoria não tão
inocente – a grande maioria deles é homicida.
Foi pensando nisso que um usuário do Reddit, identificado como
T0M95, resolveu planilhar os assassinatos que acontecem nos filmes
da Marvel. Nos 20 longas, que saíram nos últimos 10 anos, foram 65
mortes – e 20 delas deixaram sangue nas mãos dos mocinhos.
Vale dizer que o usuário contabilizou apenas mortes relevantes à
história: só entraram na planilha vítimas que tinham, pelo menos,
nome antes de baterem as botas. Nada de figurantes ou bonecos
criados em computação gráfica só para dar volume a uma tragédia.
Ficaram de fora, por exemplo, as centenas que morreram durante a
batalha de Wakanda, em “Vingadores: Guerra Infinita”, ou a cena de
“Guardiões da Galáxia” que se consagrou como o maior massacre da
(Malvados, 2008. Adaptado.)
história do cinema.
(https://super.abril.com.br/cultura/quantosassassinatoscadaheroievilaodamarv
4. (UNIFESP) – A fala “Demora, mas eles aprendem.” (3.o quadrinho)
elcometeunoscinemas. Adaptado.)
sugere que o anjo, a propósito das afirmações do personagem retratado
nos dois primeiros quadrinhos,
a) não tem uma opinião formada sobre elas.
3. (FUVEST)
b) concorda com elas.
a) Qual o sentido das palavras “cravou” e “planilhar” destacadas no
c) nota uma contradição entre elas.
texto e qual o efeito que elas produzem?
RESOLUÇÃO: d) não dá importância a elas.
O verbo “cravar” indica, no contexto, “afirmar categoricamente”; e) considera-as pessimistas.
o verbo “planilhar” tem o sentido de “organizar dados de maneira RESOLUÇÃO
padronizada”. O primeiro apresenta uma constatação de que os A fala do anjo no terceiro quadrinho concorda com o ponto de vista
super-heróis, para atingir seu objetivo, acabam provocando descrente da personagem dos quadrinhos anteriores. Essa
também a morte de inocentes. O segundo comprova essa ideia, personagem, por intermédio da leitura, chega a uma conclusão
por meio de um levantamento de dados numéricos feito com 20 cética sobre a condição humana.
longas de super-heróis.
PORTUGUÊS D

Resposta: B

14 –
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5. (UNIFESP) – Assinale a alternativa em que se verifica a análise As questões de números 7 a 10 baseiam-se na música da dupla
correta de um fato linguístico presente na tira. sertaneja Alvarenga e Ranchinho.
a) Em “Viu, Senhor?” (3.o quadrinho), o termo “Senhor” exerce a
função sintática de sujeito do verbo “viu”. Trabalha, trabalha, trabalha
b) Em “um cão nervoso correndo em círculos, amarrado ao poste da Trabalha, trabalha, trabalha
ignorância” (2.o quadrinho), a oposição entre os termos “correndo” Só no fim do mês recebe
e “amarrado” configura um pleonasmo. Paga, paga, paga, paga
c) Em “A humanidade é isso” (2.o quadrinho), o termo “isso” retoma Tudo o que deve
o conteúdo de um enunciado expresso no quadrinho anterior.
d) Em “Ele vai voltar atrás, você vai ver” (3.o quadrinho), a expressão No domingo eu vou na missa,
“voltar atrás” constitui uma redundância. Não posso trabalhar
e) Em “Ele vai voltar atrás, você vai ver” (3.o quadrinho), a expressão Segunda-feira preguiça,
“voltar atrás” pode ser substituída por “se arrepender”. Preciso descansar
RESOLUÇÃO: Terça-feira é dia santo,
A expressão “voltar atrás”, dada pela personagem Deus, equivale Se eu trabalho é pecado
a “se arrepender”, porque fica implícito que haverá represália Quarta-feira eu tô doente,
divina à personagem que considera a humanidade “uma piada de Quinta-feira é feriado
mau gosto de Deus”.
Não trabalho na sexta, que é dia de azar
Resposta: E
Sábado é fim de semana
Tenho que descansar.

7. (UNIFESP) – Os cinco versos iniciais da música mostram que o eu


nela presente vê a relação entre trabalhar e pagar como
a) equilibrada, ainda que se precise de muita dedicação ao trabalho para
cumprir os compromissos financeiros.
b) compatível com o esforço dedicado ao trabalho, o que o torna
atraente em razão das vantagens econômicas.
c) desigual, não se configurando o trabalho como atividade
financeiramente vantajosa nem prazerosa.
d) paradoxal, decorrente de uma remuneração alta em razão do trabalho
realizado.
e) justa, já que se recebe por aquilo que é trabalhado e se paga pelo que
6. (UNIFESP) – Verifica-se o emprego de vírgula para assinalar a
é consumido.
supressão de um verbo
RESOLUÇÃO:
a) no segundo e no terceiro quadrinhos. O excerto apresenta o trabalho como atividade cujo único fim é a
b) no segundo quadrinho, apenas. obtenção de recursos para pagar contas.
c) no terceiro quadrinho, apenas. Resposta: C
d) no primeiro e no terceiro quadrinhos.
e) no primeiro quadrinho, apenas.
RESOLUÇÃO:
Ocorre zeugma, supressão de termo mencionado, no trecho “a
televisão é o analista despreparado dos pobres”.
Resposta: E

PORTUGUÊS D

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8. (UNIFESP) – Dizer “só no fim do mês recebe” é diferente de “no 10. (UNIFESP) – Considere o trecho da música:
fim do mês recebe”, pois, no primeiro caso, é flagrante a ideia de
a) intensidade. b) demora. c) tempo indefinido. Não trabalho na sexta, que é dia de azar
d) rapidez. e) probabilidade. Sábado é fim de semana
RESOLUÇÃO: Tenho que descansar.
No trecho destacado, o advérbio só equivale a “somente” ou
“apenas” e enfatiza a demora da chegada do pagamento. Sobre a ocorrência da palavra que, é correto afirmar que ela
Resposta: B
a) poderia ser substituída, no primeiro caso, por no qual, e por qual, no
segundo.
b) tem valor de conclusão nos dois casos, podendo ser substituída por
então.
c) poderia ser substituída por quando no primeiro caso e por logo que,
no segundo.
d) tem valor causal no primeiro caso e equivale a no entanto, no
segundo.
e) tem valor explicativo no primeiro caso e equivale à preposição de, no
segundo.
RESOLUÇÃO:
Em sua primeira ocorrência, o que é conjunção explicativa e
poderia ser substituído por porque. No último verso, o que
substitui a preposição de da expressão ter de, que equivale a dever.
9. (UNIFESP) – Na música, para cada dia da semana há uma situação Resposta: E
impeditiva ao trabalho. Considerando as frases

I. O trabalho enobrece e dignifica o homem.


(dito popular)

II. Pra mim vai ser domingo todo dia, / pois é essa alegria de todo
trabalhador.
(Golden Boys)

III. Deus ajuda quem cedo madruga.


(dito popular)

IV. Todo mundo gosta de acarajé / O trabalho que dá pra fazer que é
/ Todo mundo gosta de acarajé / Todo mundo gosta de abará /
Ninguém quer saber o trabalho que dá.
(Dorival Caymmi)

é correto afirmar que a relação do homem com o trabalho, conforme


apresentada na música de Alvarenga e Ranchinho, é incompatível
apenas com o sentido expresso por
a) I e II. b) II e III. c) I, II e III.
d) I, III e IV. e) II, III e IV.
RESOLUÇÃO:
Na música de Alvarenga e Ranchinho, há justificativas para a
ausência ao trabalho em todos os dias da semana. Portanto, apenas
o excerto da música dos Golden Boys (II) é compatível com a relação
entre homem e trabalho apresentada na música da dupla sertaneja.
Resposta: D
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Literatura / Análise de Texto FRENTES 2/3

MÓDULO 37 Semana de Arte Moderna


1. Antecedentes UVI STRELLA • 1917: Publicação de livros de
Nos primeiros anos do século XX, estreia de futuros participantes da
Che scuitá strella, né meia strella!
iniciou-se em São Paulo o processo Semana:
Vucê stá maluco! e io ti diró intanto,
de industrialização do País. Produzi- Chi pra iscuitalas moltas veiz livanto, – Há uma Gota de Sangue em
ram-se, além de manufaturados, con- I vô dá una spiada na gianella. Cada Poema, de Mário de Andrade,
tingentes de trabalhadores operários: protesto pacifista contra a Primeira
I passo as notte acunversáno c’oella, Guerra Mundial.
homens, mulheres e crianças, que, Inguanto che as otra lá d’un canto
submetidos às condições mais aviltantes – Cinza das Horas, de Manuel
Sto mi spiano. I o sol come un briglianto
de trabalho, ocupavam as fileiras das Nasce. Oglio p’ru çeu — Cadê strella?! Bandeira, “queixume de um doente de-
linhas de produção. Enquanto isso, a senganado”, segundo o próprio autor.
Direis intó: — Ó migno inlustre amigo! No seu livro seguinte, Carnaval (1919),
decadente elite do café, já deficitária, O chi é chi as strellas ti dizia
ostentava um alto padrão de vida, apareceria o poema satírico “Os Sapos”,
Quanto illas viéro acunversá contigo?
sustentado pela política dos gover- que seria recitado na segunda noite da
nadores, que, para evitar a queda do E io ti diró: — Studi pra intendela, Semana de Arte Moderna.
preço do produto, compravam os Pois só chi giá studô Astrolomia – Moisés e Juca Mulato, de
É capaiz de intendê istas strella. Menotti del Picchia.
excedentes, socializando apenas os (Juó Bananere,
prejuízos. A grande paralisação de – Nós, de Guilherme de Almeida,
La Divina Increnca)
operários, em 1907, a Revolta dos 18 ainda parnasiano e decadentista.
do Forte de Copacabana, o Tenen- – A Frauta de Pã, de Cassiano
O satírico aparece em estágios Ricardo, com sonetos parnasianos.
tismo, em 1922, somados aos ecos da complexos e saturados de vida urba-
Primeira Guerra Mundial (1914-18), na; momentos em que a consciência
evidenciavam o esgotamento da Outros eventos
do homem culto já se rela com as
estrutura de poder no primeiro quarto contradições entre o cotidiano real e • Na música erudita, Villa-Lobos
do século XX no Brasil. os valores que o enleiam. E a paródia, compõe o balé Amazonas, incluindo
Junto com a estrutura sociopolítica, “canto paralelo”, só se faz possível elementos do folclore brasileiro,
esgotara-se também a arte que ela quando uma formação literária e um influenciado por Stravinsky; na música
sustentava, de modo que, conco- gosto, outrora sólidos, entram em popular, é pela primeira vez gravado
mitantemente àqueles acontecimentos, crise, isto é, sobrevivem apesar do em disco um samba, Pelo Telefone,
os próprios artistas denunciavam a crise cotidiano, sobrevivem como disfarce, de Donga.
da cultura e da arte brasileiras e a como véu ideológico. • Exposição de 53 quadros de
necessidade de sua transformação. (Alfredo Bosi) Anita Malfatti (1917), que provocou a
Assim, antes mesmo da Semana de 22, dura crítica “Paranoia ou Mistifica-
são notáveis os seguintes eventos: • 1913: Lasar Segall realiza a pri- ção?”, de Monteiro Lobato, em
• 1912: Oswald de Andrade volta meira exposição de pintura moderna O Estado de S. Paulo (20/12/1917).
da Europa e começa a divulgar o em São Paulo. Expõe quadros expres- Segue-se trecho da crítica:
Futurismo, de Marinetti, e a técnica do sionistas e é totalmente ignorado.
verso livre. Já no ano anterior fundara, • 1914: Anita Malfatti faz sua pri- (...) Estas considerações são pro-
com Emílio de Meneses, o jornal meira exposição de pintura não aca- vocadas pela exposição da Sra. Mal-
humorístico O Pirralho, em que Juó dêmica. Uma série de artigos sobre o fatti, onde se notam acentuadíssimas
Bananere (Alexandre Marcondes Futurismo sai em O Estado de tendências para uma atitude estética
Machado) parodiava, no português S. Paulo. forçada no sentido das extravagâncias
dos ítalo-paulistanos, poemas célebres • 1915: Fundação da revista de Picasso e companhia. Essa artista
PORTUGUÊS D

do Romantismo e do Parnasianismo. Orpheu, que introduz o Modernismo possui talento vigoroso, fora do
No seguinte poema, Juó Bananere em Portugal. Ronald de Carvalho, que comum. Poucas vezes, através de
satiriza o famoso soneto XII de participaria da Semana, e Luís de uma obra torcida para má direção, se
Via-Láctea, de Olavo Bilac (“Ora, Montalvor organizam no Rio o primeiro notam tantas e tão preciosas qualida-
direis, ouvir estrelas…”): número da revista. des latentes. (...)

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Nos anos seguintes, houve o sur- Na segunda noite, há a conferên- técnica, da velocidade, da experimen-
gimento de Victor Brecheret, a publicação cia de Menotti del Picchia, ilustrada tação de uma linguagem nova, e a
de Carnaval, de Manuel Bandeira, a com vários textos, entre os quais “Os primitivista, chegada ao expressionismo
exposição de Di Cavalcanti, a publicação Sapos”, de Manuel Bandeira, vaiados e à exploração do folclore brasileiro.
dos artigos “Mestres do Passado”, em todos pelo público. Segue-se um Dividida entre a ânsia de
que Mário de Andrade analisa e critica, trecho da conferência: modernização do Brasil e a convicção
duramente, a poesia parnasiana. de que nossas raízes indígenas e ne-
Queremos lua, ar, ventiladores,
gras precisavam de tratamento esté-
aeroplanos, reivindicações obreiras,
tico adequado, a revista, incongruente
idealismos, motores, chaminés de fá-
na aparência, é o fundamento de
bricas, sangue, velocidade, sonho na
obras como Macunaíma, Pau-Brasil,
nossa arte. E que o rufo do automó-
Cobra Norato, Martim Cererê, Revista de
vel, nos trilhos de dois versos, espan-
Antropofagia, Memórias Sentimentais
te da poesia o último deus homérico,
de João Miramar etc.
que ficou, anacronicamente, a dormir
e a sonhar, na era do jazz band e do
䊏 Estética
cinema, com a frauta dos pastores da
A revista Estética, dirigida por
Arcádia e dos seios de Helena!
Sérgio Buarque de Holanda e Prudente
Mário de Andrade, sob vaias, lê de Morais Neto, foi lançada em 1924 e
poemas que constituiriam o livro A Es- teve três números fartos de material
Pietá (déc. 1910), Victor Brecheret, madeira, crava que não é Isaura. Renato de Al- teórico. Nessa revista, a disputa era
40 x 50 cm. meida critica o Parnasianismo e entre “arte interessada” e “arte
Villa-Lobos entra no palco de chinelos autônoma”.
(pois teria um calo no pé) e guarda-
2. A Semana de Arte Moderna
chuva, indignando o público. 3. As correntes modernistas
A terceira noite tem apenas
Patrocinada pela elite letrada dos
programa musical e Villa-Lobos rege 䊏 Corrente nacionalista
quatrocentões paulistanos, a Semana
composições conhecidas do reduzido Representada pelos grupos
público, que aplaudiu, sem escândalos. “Verde-Amarelo” (1924), “Anta” (1929)
foi, ao mesmo tempo, o ponto de
e “Bandeira” (1936), reunia-se
encontro das várias tendências
principalmente em torno de Menotti
modernas que desde a I Guerra se
del Picchia, Cassiano Ricardo e Plínio
vinham firmando em São Paulo e no
Salgado. Tinha visão ufanista e
Rio, e a plataforma que permitiu a
propunha a exaltação da terra, do
consolidação de grupos, a publicação
homem, do folclore e dos heróis
de livros, revistas e manifestos, numa
nacionais. Aproximava-se do Inte-
palavra, o seu desdobrar-se em viva
gralismo, doutrina que defendia um
realidade cultural. (Alfredo Bosi,
regime político totalitário, corpora-
História Concisa da Literatura
tivista e nacionalista. Os manifestos
Brasileira)
dessa corrente estão em Curupira e o
Carão, de Plínio, Menotti e Cassiano, e
Ocorreu em três noites, 13, 15 e
no Nhengaçu Verde-Amarelo. Martim
17 de fevereiro de 1922, no Teatro
Cererê, de Cassiano Ricardo, é a
Municipal de São Paulo.
melhor realização poética dos
Na primeira noite, Graça Aranha,
ideais dessa vertente:
que, como membro da Academia
Brasileira de Letras, conferia ao Capa do primeiro número da revista Klaxon. NHENGAÇU VERDE-AMARELO
evento um ar de respeitabilidade, pro- (trechos)
fere a conferência “A Emoção Estética 䊏 Klaxon
da Arte Moderna”, ilustrada com A revista Klaxon, Mensário de Arte A descida dos tupis do planalto central
PORTUGUÊS D

poemas declamados por Guilherme Moderna, durou de maio de 1922 a no rumo do Atlântico foi uma fatalidade
de Almeida e Ronald de Carvalho, fevereiro de 1923. Reunindo os histórica pré-cabralina, que preparou o
acompanhados por Ernâni Braga ao modernistas da fase heroica, não ambiente para as entradas no sertão pelos
piano, executando, de Eric Satie, a sobreviveu à divisão entre a corrente aventureiros brancos desbravadores do
paródia da Marcha Fúnebre de Chopin. dinamista, adepta do futurismo, da oceano. (…)

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Os tupis desceram para serem MANIFESTO ANTROPÓFAGO


absorvidos, para se diluírem no sangue da (trechos)
gente nova. Para viver subjetivamente e
transformar numa prodigiosa força a Só a antropofagia nos une. Social-
bondade brasileira e o seu grande mente. Economicamente. Filosoficamente.
sentimento de humanidade.
Seu totem não é carnívoro: Anta. É •
este animal que abre caminhos, e aí
parece estar indicada a predestinação da Única lei do mundo. Expressão mas-
gente tupi. (…) carada de todos os individualismos, de
todos os coletivismos. De todas as
䊏 Corrente primitivista religiões. De todos os tratados de paz.
Representada pelos grupos
“Pau-Brasil” (1924) e “Antropofagia” •
(1928), tinha a liderança marcante de
Oswald de Andrade e a participação Tupi or not tupi, that’s the question.
de Tarsila do Amaral, Raul Bopp,
Antônio de Alcântara Machado (só na
(...) Retrato de Oswald de Andrade (1923), de
“Antropofagia”) e de Mário de Andra-
Tarsila do Amaral (1886-1973). Óleo sobre
de, na fase de Macunaíma e Clã do Ja-
Nunca fomos catequizados. Vivemos tela, 60 x 50 cm, Museu de Arte Brasileira
buti. Os ideais da corrente foram – FAAP, São Paulo.
através de um direito sonâmbulo. Fizemos
expressos no Manifesto Antropófago,
Cristo nascer na Bahia. Ou em Belém do
publicado no primeiro número da Re-
vista de Antropofagia, em 1928. Essa
Pará. 䊏 Definição e características
da linguagem modernista
revista foi publicada em duas “denti-
ções”: de maio de 1928 a janeiro de •
1929, mensalmente, e de março a • Rejeição das normas e
agosto de 1929, semanalmente. Mas nunca admitimos o nascimento estéticas consagradas
Pretendendo “reintegrar o homem da lógica entre nós. – antiacademismo, anticonfor-
na livre expansão dos seus instintos vi- mismo;
tais”, essa corrente propunha, não uma – perseguição incessante de três
(...)
aceitação passiva do legado europeu à princípios:
1. direito à pesquisa estética;
cultura brasileira, mas a devoração
Somos concretistas. As ideias tomam 2. atualização da inteligência
crítica desse legado e sua trans-
conta, reagem, queimam gente nas artística brasileira;
formação em algo novo, com identidade praças públicas. Suprimamos as ideias e 3. estabilização de uma cons-
própria e alcance universal. as outras paralisias. Pelos roteiros. ciência criadora nacional.
Acreditar nos sinais, acreditar nos
instrumentos e nas estrelas. • Inovações na linguagem
poética
(...) – novos ritmos: versos livres,
novo fraseado;
– aproximação entre poesia e
Contra a realidade social, vestida e prosa;
opressora, cadastrada por Freud — a – nova concepção do mundo e do
realidade sem complexos, sem loucura, homem (civilização moderna, o
sem prostituições e sem penitenciárias do cotidiano, o nacional, o sub-
matriarcado de Pindorama. consciente) — surgimento de
novos temas;
PORTUGUÊS D

OSWALD DE ANDRADE – irreverência, humorismo — o


Em Piratininga “poema-piada”;
Antropofagia (1929), de Tarsila do Amaral
Ano 374 da Deglutição do Bispo Sardinha. – síntese, simultaneísmo, ima-
(1886-1973). Óleo sobre tela, 126 x 142 cm,
Fundação José e Paulina Nemirovsky, (Revista de Antropofagia, gens vívidas, fusão de elemen-
São Paulo. Ano I, n. 1, maio de 1928) tos diversos, expressão elíptica.

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Em ronco que aterra, Longe dessa grita,


TEXTOS
Berra o sapo-boi: Lá onde mais densa
— “Meu pai foi à guerra!” A noite infinita
POÉTICA — “Não foi!” — “Foi!” — “Não foi!” Verte a sombra imensa;

Estou farto do lirismo comedido O sapo-tanoeiro, Lá, fugido ao mundo,


Do lirismo bem comportado Parnasiano aguado, Sem glória, sem fé,
Do lirismo funcionário público com livro de Diz: — “Meu cancioneiro No perau profundo
[ponto expediente protocolo e É bem martelado. E solitário, é
[manifestações de apreço ao sr. diretor.

Vede como primo Que soluças tu,


Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no Transido de frio,
Em comer os hiatos!
[dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo Sapo-cururu
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos. Da beira do rio…
Abaixo os puristas (Manuel Bandeira,
Todas as palavras sobretudo os barbarismos Carnaval, 1919)
O meu verso é bom
[universais
Frumento sem joio.
Todas as construções sobretudo as sintaxes Observações
Faço rimas com
[de exceção
Consoantes de apoio.
“Os Sapos”, poema declamado
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
por Ronald de Carvalho na segunda

Vai por cinquenta anos


noite da Semana de Arte Moderna,
Estou farto do lirismo namorador
Político Que lhes dei a norma: em 15 de fevereiro de 1922, satiriza a
Raquítico Reduzi sem danos preocupação parnasiana com as rimas,
Sifilítico A fôrmas a forma. com a métrica, com o vocabulário
De todo lirismo que capitula ao que quer precioso. Aproxima-se, parodistica-
[que seja fora de si mesmo. Clame a saparia mente, do poema “Profissão de Fé”,
Em críticas céticas: de Olavo Bilac:
De resto não é lirismo Não há mais poesia,
Será contabilidade tabela de cossenos Mas há artes poéticas…” Invejo o ourives quando escrevo
[secretário do amante exemplar com
Imito o amor
[cem modelos de cartas e as diferentes
Urra o sapo-boi: Com que ele, em ouro, o alto relevo
[maneiras de agradar às mulheres, etc.
— “Meu pai foi rei” — “Foi!”
Faz de uma flor.
— “Não foi!” — “Foi!” — “Não foi!”
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados O sapo-tanoeiro (v. 9) é uma
Brada em um assomo
O lirismo difícil e pungente dos bêbados alusão a Bilac (tanoeiro é o artesão
O lirismo dos clowns de Shakespeare O sapo-tanoeiro:
que, com martelo, enverga a madeira,
— “A grande arte é como
para a construção ou barricas). O sa-
— Não quero mais saber do lirismo que não Lavor de joalheiro.
po-cururu simboliza a poesia autêntica,
[é libertação.
Ou bem de estatuário.
despida de artificialismo.
(Manuel Bandeira,
Libertinagem, 1930) Tudo quanto é belo, Nos versos 23 e 24 — “Reduzi sem
Tudo quanto é vário, danos / A fôrmas a forma” —, há um
OS SAPOS Canta no martelo.” trocadilho, ironizando o fato de que a
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rigidez das regras parnasianas era tão


Enfunando os papos, Outros, sapos-pipas
forte que reduzia a forma (ó) em forma
Saem da penumbra, (Um mal em si cabe),
Aos pulos, os sapos. Falam pelas tripas:
(ô), ou seja, reduzia a forma da poesia a
A luz os deslumbra. — “Sei!” — “Não sabe!” — “Sabe!” um molde, modelo obrigatório.

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Texto para o teste 1. 2. (FAC. ENG.o SALVADOR ARENA-2023) – Compare a tela Abaporu
(1928), de Tarsila do Amaral, com uma releitura — feita por meio da
A partir dos anos 1970, a diversidade étnica e cultural ganha técnica renda renascença, do artista popular pernambucano Rafael Leite
maior reconhecimento com movimentos culturais, tais como o (2021) — comentada em uma rede social:
“Tropicalismo”, os “Afrobahianos”, as inserções de referências
religiosas afro-brasileiras na Bossa Nova e o “Teatro do Oprimido”.
Tudo isso foi antecipado pelo Movimento de Cultura Popular,
fundado por Paulo Freire nos anos de 1960.
(MEDEIROS, B. T. F. Quilombos, Políticas Patrimoniais e Negociações.
In: BARRIO, A. E.; MOTTA, A.; GOMES, M. H. Org.
Inovação Cultural, Patrimônio e Educação.
Disponível em: http://campus.usal.es.
Acesso em: 4 set. 2017. Adaptado.)

1. (2022 – 2.a aplic.) – Essa ideia nacionalista surgiu dos


sonhos de Mário de Andrade e da Semana de Arte
Moderna de 1922, que visava a(o)
a) incorporação ao patrimônio nacional das culturas negra e portuguesa.
b) representação das realidades social e econômica do início do século. (Disponível em: https://masp.org.br, 2019.)
c) reflexo da igualdade mestiça nos processos de patrimonialização.
d) ideal da diversidade cultural como categoria identitária nacional.
e) constituição da materialidade e da multiplicidade socioculturais.
RESOLUÇÃO:
[ENEM-2022 – 2.a aplic.] A valorização da diversidade étnica e
cultural do Brasil fez parte do ideal artístico de Mário de Andrade
e foi o elemento central da Semana de Arte Moderna, de 1922.
Resposta: D

(Disponível em: https://twitter.com, 2022.)

É possível sugerir, tal como o comentarista, que a releitura de Leite


corresponde ao ideal antropofágico, proposto pelo escritor modernista
Oswald de Andrade, porque ela
a) sugere a submissão da arte contemporânea aos paradigmas
consolidados pela tradição.
b) revela uma assimilação inovadora de um modelo.
c) desvaloriza o primitivismo brasileiro a partir da transmutação de um
modelo.
d) subverte um modelo de forma a ironizar quem deturpa a tradição.
e) inferioriza um símbolo nacional por meio de uma técnica regional,
de acordo com um ideal de arte de exportação.
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RESOLUÇÃO:
A recriação do artista pernambucano Rafael Leite assimila
criativamente um modelo da arte brasileira, o quadro Abaporu
(1928), de Tarsila do Amaral, um nome representativo da arte
modernista brasileira das primeiras décadas do século XX.
Resposta: B

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Texto para o teste 3.

COMO SE VAI DE SÃO PAULO A CURITIBA (1928)

Os tempos mudaram.
O mundo contemporâneo pulsa em ritmos acelerados.
Novos fatores revelam conveniência de outros métodos.
Surgem, no decurso dos nossos dias, motivos que nos
convencem de que cada município deve levar a sério o problema
da circulação rodoviária.
Para facilitar a ação administrativa.
Para uma revisão das suas possibilidades econômicas.
Ritmo de ruralização.
Costurar o país com estradas alegres, desligadas de
horários. Livres e cheias de sol como um verso moderno!
(BOPP, R. Poesia Completa de Raul Bopp.
Rio de Janeiro: José Olympio; São Paulo: Edusp, 1998.)

3. Nos anos de 1920, a necessidade de modernizar o


Brasil refletiu-se na proposta de renovação estética
defendida por artistas modernistas como Raul Bopp.
No poema, o posicionamento favorável às transformações da sociedade
brasileira aparece diretamente relacionado à experimentação na poesia.
A relação direta entre modernização e procedimento estético no poema
deve-se à correspondência entre
a) a discussão de tema técnico e a fragmentação da linguagem.
b) a afirmação da mudança dos tempos e a inovação vocabular.
c) a oposição à realidade rural do país e a simplificação da sintaxe.
d) a adesão ao ritmo de vida urbano e a subjetividade da linguagem.
e) a exortação à ampla difusão das estradas e a liberdade dos versos.
RESOLUÇÃO:
[ENEM-2016 – 3.a aplic.] Ao lado da exortação à difusão de estradas
“alegres, desligadas de horários” a costurar o país, o eu lírico
realiza uma das propostas estéticas dos poetas modernistas no
que se refere ao ritmo dos versos, que agora se aproximam da
prosa e apresentam-se sem métrica regular.
Resposta: E
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MÓDULO 38 Primeira Geração Modernista (I): Mário de Andrade (I)

1. Mário de Andrade • Conto • Correspondência


(São Paulo, 1893-1945) Primeiro Andar (1926) Há centenas de cartas escritas para
Belazarte (1934) inúmeros amigos, artistas, intelectuais
䊏 Vida Contos Novos (1947) etc. Destacam-se as para Manuel
“Sou trezentos, sou trezentos-e- Bandeira, Drummond, Murilo Mendes,
cinquenta, / mas um dia afinal toparei Sérgio Milliet, Paulo Duarte.
comigo...” • Romance
Amar, Verbo Intransitivo (1927)
Fez o curso secundário no Ginásio 2. Considerações críticas
Macunaíma – Rapsódia (1928)
Nossa Senhora do Carmo e diplomou-se
no Conservatório Dramático e Musical, 䊏 Poesia
onde viria a ser professor de História da • Ensaio A poesia de Mário de Andrade
Música. Tendo sido um dos responsá- A Escrava que não é Isaura (1925) segue dois caminhos, muito ligados ao
veis pela Semana de Arte Moderna, O Aleijadinho e Álvares de Azevedo tipo de assunto que abordam.
animou as principais revistas do movi- (1935) Quando fala de São Paulo, o poeta
mento na sua fase de afirmação A Música e a Canção Populares no incorpora várias técnicas da poesia
polêmica: Klaxon, Estética, Terra Roxa e Brasil (1936) futurista europeia, porque a cidade, pre-
Outras Terras. Soube conjugar uma vida O Baile das Quatro Artes (1943) cisamente a metrópole, foi o eixo
de intensa criação literária com o estudo Aspectos da Literatura Brasileira principal de toda a arte moderna. É o que
apaixonado da música, das artes (1943) Mário de Andrade realiza principalmente
plásticas e do folclore brasileiro. De O Empalhador de Passarinhos em Pauliceia Desvairada (1922).
1934 a 1937 dirigiu o Departamento de (1944) A outra vertente é folclórica, fincada
Cultura da Prefeitura de São Paulo, fun- O Banquete (1978) nas lendas brasileiras, inspirada em
dou a Discoteca Pública, promoveu o nossa formação cultural. Essa poesia
Primeiro Congresso de Língua Nacional aparece sobretudo em Clã do Jabuti
• Crônica
Cantada e dinamizou a excelente (1927).
Os Filhos da Candinha (1943)
Revista do Arquivo Municipal. Mas a partir de 1930, a poesia de
De 1938 a 1940 lecionou Estética Mário de Andrade vai mostrando evo-
na Universidade do Distrito Federal. • Musicologia e Folclore lução e maturidade. Em Remate de
Voltando a São Paulo, passou a trabalhar Ensaio sobre a Música Brasileira Males (1930), ele já abandona muitos
no Serviço do Patrimônio Histórico. (1928) maneirismos e modismos futuristas
Faleceu na sua cidade aos cinquenta e Compêndio de História da Música para criar uma poesia que consegue
um anos de idade. (1929) fundir o pessoal e o coletivo.
Modinhas e Lundus Imperiais (1930)
䊏 Obra Música, Doce Música (1933) 䊏 Prosa
• Poesia Namoros com a Medicina (1939) A prosa literária de Mário de
Há uma Gota de Sangue em Cada Música do Brasil (1941) Andrade apresenta também duas
Poema (1917) Danças Dramáticas do Brasil tendências:
Pauliceia Desvairada (1922) (3 vols., 1959)
Losango Cáqui (1926) Música e Feitiçaria no Brasil (1963)
• A prosa mítica e folclórica
Clã do Jabuti (1927) de Macunaíma
Remate de Males (1930) • História da Arte Macunaíma é uma revolução na
PORTUGUÊS D

Poesias (1941) Padre Jesuíno do Monte Carmelo linguagem da narrativa. Mário de


Lira Paulistana (1946) (1946) e um grande número de opús- Andrade une tom oral a um vocabulário
O Carro da Miséria (1946) culos, folhetos etc., reunidos em regional inédito na prosa de ficção.
Poesias Completas (1955) volumes nas Obras Completas. Macunaíma é “o herói sem nenhum ca-

– 23
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ráter”, é o índio nascido no Amazonas, Em Amar, Verbo Intransitivo, Mário No De Profundis?...)


que vem para São Paulo buscar sua de Andrade dá tratamento literário a De repente
“muiraquitã” (pedrinha mágica, em processos psicanalíticos freudianos, um raio de Sol arisco
forma de jacaré), roubada por um como fixações, recalques e sublima- risca o chuvisco ao meio.
gigante de dupla identidade: por um lado ções. Neste romance, narra-se a história (Mário de Andrade,
é índio antropófago (o gigante Piaimã), de uma jovem alemã, Fräulein, chamada Pauliceia Desvairada)
por outro é de origem italiana e mora por uma família de burgueses
II
em São Paulo (Venceslau Pietra). paulistanos para iniciar Carlos, filho mais
Macunaíma consegue vencê-lo e velho, na vida sexual.
(…)
recuperar a pedra. De volta à sua terra
Então Macunaíma percebeu que não era
natal, não encontra mais sua tribo, que
fora destruída. Fica sozinho na floresta, TEXTOS assombração nada, era mas o monstro Oibê

sempre triste por ter perdido a mulher minhocão temível. Criou coragem pegou no

que amava, Ci, mãe do mato, rainha das brinco da orelha esquerda que era a máquina
I
Icamiabas (tribo amazônica). Macunaíma revólver e deu um tiro na assombração. Porém

passa o tempo contando suas histórias Oibê não fez caso e veio vindo. O herói tornou a
Quando sinto a impulsão lírica escrevo
(e mentindo muito) a um papagaio, seu ter medo. Pulou na rede agarrou a gaiola e esca-
sem pensar tudo o que meu inconsciente me
único companheiro na solidão e narrador fedeu pela janela, jogando baratas no caminho
grita. Penso depois: não só para corrigir, como
presumível do livro. Morto pelo abraço para justificar o que escrevi. Daí a razão deste
todo. Oibê correu atrás. Mas era só de brinca-
destruidor de Yara (espécie de sereia Prefácio Interessantíssimo.
deira que ele queria comer o herói. Macunaíma
dos índios), sobe ao céu, transformado desembestara agreste fora mas isso ia que ia
(…)
numa estrela da Ursa Maior. Trata-se de acochado pelo minhocão. Então botou o
Escrever a arte moderna não significa
uma fábula múltipla, ou rapsódia, porque furabolo na goela, fez cosquinha e lançou a
jamais para mim representar a vida atual no que
reúne várias lendas brasileiras, tendo no farinha engolida. A farinha virou num areão e en-
tem de exterior: automóveis, cinema, asfalto.
centro a lenda de Macunaíma, que quanto o monstro pelejava pra atravessar aquele
Si estas palavras frequentam-me o livro não é
Mário de Andrade extraiu de um livro mundo de areia escorregando, Macunaíma fugia.
porque pense com elas escrever moderno, mas
sobre os mitos indígenas do norte do Tomou pela direita, desceu o morro do Estrondo
porque, sendo meu livro moderno, elas têm
Amazonas. A narrativa reúne supersti- que soa de sete em sete anos seguiu por uns
nele razão de ser.
ções, frases feitas, provérbios e caponetes e depois de cortar um travessão
(…)
modismos de linguagem, tudo encapelado fez o Sergipe de ponta a ponta e
sistematizado e intencionalmente entre- parou ofegante num agarrado muito pedregoso.
Chove?
tecido. Na frente havia uma lapa grande furada por uma
Sorri uma garoa cor de cinza,
muito triste, como um tristemente furna com um altarzinho dentro. Na boca da so-

[longo... cava um frade. Macunaíma perguntou pro frade:


• A prosa pessoal urbana
A prosa urbana de Mário de A casa Kosmos não tem impermeáveis — Como se chama o nome de você?

Andrade recolhe vários falares paulistanos [em liquidação... O frade pôs no herói uns olhos frios e

do dia a dia, seja a fala mais polida, Mas neste largo do Arouche secundou com pachorra:

como aparece nos Contos Novos posso abrir o meu guarda-chuva — Eu sou Mendonça Mar pintor.

(1947), seja a oralidade dos bairros de [paradoxal, Desgostoso da injustiça dos homens faz três

imigrantes italianos, como Belazarte este lírico plátano de rendas mar... séculos que afastei-me deles metendo cara no
(1934). No primeiro, Mário descarrega sertão. Descobri esta gruta ergui com minhas
muita dose de psicologismo, que cul- Ali em frente... — Mário, põe a máscara! mãos este altar do Bom Jesus da Lapa e vivo
mina no célebre conto “Peru de Natal”, — Tens razão, minha Loucura, tens razão. aqui perdoando gente mudado em frei Francisco
o mais conhecido dos contos de Mário. O rei de Tule jogou a taça ao mar... da Soledade.
Apoiando-se em Freud (Totem e Tabu), Os homens passam encharcados... — Está bom, Macunaíma falou. E partiu na
PORTUGUÊS D

desmistifica as relações familiares. Os reflexos dos vultos curtos chispada.


Em Belazarte, com muita graça e mancham o petit-pavé... (…)
compadecimento cristão, Mário fala da As rolas da Normal (Mário de Andrade,
gente pobre e oprimida das classes esvoaçam entre os dedos da garoa... Macunaíma, cap. XV)
médias de São Paulo. (E si pusesse um verso de Crisfal

24 –
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Leia o poema “A Menina e a Cantiga”, de Mário de Andrade, para Texto para os testes 2 e 3.
responder ao teste 1:
O TROVADOR
… trarilarára… traríla…
Sentimentos em mim do asperamente
A meninota esganiçada magriça com a saia voejando por cima dos homens das primeiras eras...
dos joelhos em nó vinha meia dançando cantando no crepúsculo As primaveras de sarcasmo
escuro. Batia compasso com a varinha na poeira da calçada. intermitentemente1 no meu coração arlequinal2...
Intermitentemente...
… trarilarára… traríla… Outras vezes é um doente, um frio
na minha alma doente como um longo som redondo...
De repente voltou-se pra negra velha que vinha trôpega atrás, Cantabona! Cantabona!
enorme trouxa de roupas na cabeça: Dlorom...
— Qué mi dá, vó?
— Naão. Sou um tupi tangendo um alaúde3!
(Mário de Andrade)
… trarilarára… traríla…
(Mário de Andrade, Poesias Completas, 2005.) 1 – Intermitente: fenômeno que ocorre em intervalos.
2 – Arlequinal: de arlequim, personagem da commedia dell’arte (antiga comédia
italiana), cuja função no início se restringia a divertir o público durante os intervalos
1. (FMABC-2023) – No contexto da primeira fase do Modernismo, o
dos espetáculos.
registro linguístico utilizado no poema corresponde
3 – Alaúde: instrumento de origem árabe bastante usado na Europa renascentista.
a) a uma crítica às elites do país, que não permitiam que as classes
mais pobres tivessem acesso à educação.
b) a uma crítica à parcela da população que não se interessava em
2. (MACKENZIE-2023 – adaptado) – Assinale a alternativa correta.
seguir os estudos formais.
a) É possível conceituar o poema como um elogio da razão
c) a um ideal estético que afirmava que a perfeição artística depende
eurocêntrica civilizatória. Dessa maneira, o eu lírico traça uma linha
do conhecimento profundo das normas da língua.
evolutiva, na qual as culturas pré-históricas e não europeias se
d) a um ideal estético libertário que aproximava a linguagem artística da
encontram em nível hierárquico inferior no mundo da cultura.
linguagem cotidiana do povo.
b) Ao retomar a imagética do Trovadorismo, o poema segue ao pé da
e) a uma crítica a uma arte ingênua produzida espontaneamente por
letra os pressupostos idealizados das antigas cantigas de amor, nas
qualquer pessoa em seu cotidiano.
quais um eu lírico se colocava como vassalo de uma musa distante
RESOLUÇÃO:
e impassível.
A Primeira Geração Modernista vincula-se ao propósito de ruptura
com a tradição e, nesse contexto, a quebra das normas gramaticais c) “O Trovador” expressa, por uma poética fragmentada, marcada
e a valorização do falar cotidiano ganham destaque nas produções pelos versos livres e ausência de rimas, complexidades emocionais
artísticas da chamada fase heroica (1922-1930). A linguagem do eu lírico. No verso “Sou um tupi tangendo um alaúde!” (último
coloquial empregada por Mário de Andrade em “A Menina e a verso), o poema assume perspectiva antropofágica modernista.
Cantiga” pode ser observada nos termos “pra”, “qué”, “dá” e na
d) Pode-se interpretar a expressão “coração arlequinal” (verso 4) da
flexão de gênero do advérbio meio (“meia”) contrariando a norma
gramatical. seguinte forma: o poema renega a dimensão lúdica, bem-humorada,
Resposta: D da existência humana, substituindo-a pela sisudez e pelo controle
racional dos sentimentos e sentidos.
e) O eu lírico de “O Trovador” não estabelece conexão do poema com
o passado, seja este um passado literário, seja este da história dos
povos. Pelo contrário, em seus versos há interesse exclusivo pelo
momento contemporâneo a sua escrita.
RESOLUÇÃO:
O poema “O Trovador” apresenta versos livres e brancos (sem
rima), afastando-se dos padrões da poética tradicional e
acadêmica, rompendo, assim, com o convencionalismo estético.
Além dessas características iconoclastas, o verso “Sou um tupi
tangendo um alaúde” conota a devoração ritual da cultura
europeia, a do colonizador, mantendo relação de sentido com os
PORTUGUÊS D

ideais do Manifesto Antropófago, que vocalizou uma corrente


importante do Modernismo, liderada por Oswald de Andrade.
Resposta: C

– 25
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3. (MACKENZIE-2023 – adaptado) – Leia as afirmações abaixo:


I. Os versos “Cantabona! Cantabona! / Dlorom” remetem ao universo
da música, influência importante no poema. Dlorom é onomatopeia
que busca simular, na linguagem escrita, o som de algum
instrumento musical, ou de um sino.
II. A forma fixa na qual “O Trovador” foi composto afasta a
possibilidade de o considerarmos poema representativo da carreira
poética de Mário de Andrade.
III. O poema “O Trovador” é texto exemplar da poética modernista, no
sentido de buscar novas formas de expressividade poética para além
daquelas herdadas pelas poéticas do século XIX na poesia brasileira.

Assinale a alternativa correta.


a) As afirmações I e II estão corretas.
b) As afirmações I e III estão corretas.
c) As afirmações II e III estão corretas.
d) A afirmação II está correta.
e) Todas as afirmações estão corretas.
RESOLUÇÃO:
A afirmação II é absolutamente falsa, pois contraria o próprio
caráter inovador da poética de Pauliceia Desvairada, primeira obra
radicalmente modernista, publicada em 1922, livro em que se
insere o poema “O Trovador”.
Resposta: B
PORTUGUÊS D

26 –
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Primeira Geração Modernista (II):


MÓDULO 39
Mário de Andrade (II) e Oswald de Andrade (I)

1. Macunaíma forma que o “herói sem nenhum • Um estilo de lenda,


caráter” pode, num mesmo capítulo, épico-lírico, solene
Em 1928, Mário de Andrade publica
estar em São Paulo, encontrar o minho- No fundo do mato-virgem nasceu
sua obra-prima, a rapsódia Macunaíma. Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto
cão Oibê, assombração, e fugir dele
Escrita em poucos dias em dezembro de retinto e filho do medo da noite. Houve um
correndo por Sergipe, Campinas, Bahia,
1926, a obra foi revisada três vezes antes momento em que o silêncio foi tão grande
deparando-se em todo esse percurso escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia
de ser editada. Para escrevê-la, o autor
com personagens reais e lendárias. tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança
passou vários anos pesquisando a
Assim, as sucessivas traquinagens é que chamaram de Macunaíma.
mitologia indígena, o folclore nacional,
de Macunaíma são vividas num espaço (Mário de Andrade, Macunaíma, cap. I)
os costumes e a linguagem dos bra-
mágico, próprio da atmosfera fantástica
sileiros. Numa tentativa de mapear o
e maravilhosa em que se desenvolve a • Um estilo de crônica,
Brasil, registrando sua história, seus
narrativa. cômico, despachado, solto
costumes, seus falares, os ritmos das
Já na meninice fez coisas de sarapantar.
canções e das danças populares, o livro,
De primeiro passou mais de seis anos não
num clima surrealista e mítico, acumula 䊏 Linguagem
falando. Si o incitavam a falar, exclamava:
um exagero de lendas, superstições, A linguagem também é construída — Ai! que preguiça!...
frases feitas, provérbios e modismos de pelo processo de colagem, pela combi- e não dizia mais nada. Ficava no canto da
linguagem. nação de vocábulos e torneios sintáticos maloca, trepado no jirau de paxiúba, espiando o
Rapsódia, na antiga Grécia, identi- trabalho dos outros e principalmente os dois
colhidos dos mais variados falares do
manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê
fi cava cada trecho cantado de um Brasil. Com isso, o autor criou um estilo na força de homem. O divertimento dele era
poema épico. Em música, segundo o muito pessoal e expressivo, capaz de decepar cabeça de saúva. Vivia deitado mas si
dicionário Aurélio, é uma “fantasia ins- transmitir lirismo, humor, deboche, punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dan-
trumental que utiliza melodias tiradas comicidade, revelando maturidade lite- dava pra ganhar vintém. E também espertava
dos cantos tradicionais ou populares”. quando a família ia tomar banho no rio, todos
rária e domínio estilístico.
São também rapsódias os ve lhos ro - juntos e nus. (...)
Quando era pra dormir trepava no macuru
mances versificados e musicados, as
pequeninho sempre se esquecendo de mijar.
canções de gesta de Rolando, a Encan- 䊏 Foco narrativo
Como a rede da mãe estava por debaixo do
tada Branca-Flor e, nos dias atuais, as O foco narrativo predominante é o
berço, o herói mijava quente na velha, es-
gestas dos cangaceiros, entoadas nas de terceira pessoa, mas Mário de pantando os mosquitos bem. Então adormecia
feiras do Nordeste pelos cantadores. Andrade inova ao utilizar uma técnica sonhando palavras feias, imoralidades estram-
O livro segue o mesmo processo de cinematográfica de cortes bruscos no bólicas e dava patadas no ar.
(...)
composição ou construção da rapsódia, discurso do narrador para dar lugar à fala
(Mário de Andrade, Macunaíma, cap. I)
justapondo vários trechos que ganham das personagens.
unidade no conjunto da obra. Assim,
tomando como fio condutor a persona- • Um estilo de paródia
䊏 Estilos de narração Retoma, satiricamente, a linguagem
gem Macunaíma, o autor faz uma
A narrativa de Macunaíma apoia-se empolada e pedante dos parnasianos e
colagem de diversos fragmentos, mistu-
na ideia de que tudo vira tudo e na dos cultores de Rui Barbosa e Coelho
rando as lendas dos índios com a vida
urbana das cidades do Sudeste, as capacidade de compor e recompor Neto. É o que se vê na “Carta pras
anedotas da história brasileira com os configurações a partir de conteúdos dís- Icamiabas”, que o herói escreve no
costumes do Nordeste etc. pares, esvaziados de suas primitivas capítulo IX, focalizando a duplicidade no
funções. Daí a técnica caleidoscópica, uso de nossa língua:
PORTUGUÊS D

䊏 Tempo e espaço por meio da qual as ideias e imagens se


projetam arbitrariamente, inclusive nos (...) Mas cair-nos-iam as faces, si ocul-
Criando uma narrativa fantástica e
táramos no silêncio uma curiosidade original
picaresca, há subversão do tempo e do modos de contar, nos estilos narrativos.
deste povo. Ora sabereis que a sua riqueza de
espaço geográfico, que não obedecem Alfredo Bosi destaca três estilos de expressão intelectual é tão prodigiosa, que
às regras de verossimilhança, de tal narrar: falam numa língua e escrevem noutra. (...) Nas

– 27
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conversas, utilizam-se os paulistanos dum fecundo anarquismo, fazendo de Mais tarde, já no auge do movimento
linguajar bárbaro e multifário, crasso de feição e Oswald uma personagem em perpétua modernista (1926), casa-se com Tarsila
impuro na vernaculidade, mas que não deixa de
revolta, guiado por uma infinita curio- do Amaral, formando o elegantíssimo
ter o seu sabor e força nas apóstrofes, e tam-
bém nas vozes do brincar. Destas e daquelas sidade: “Encaixo tudo, somo, incor- casal Tarsiwald, fundador do
nos inteiramos, solícito; e nos será grata em- poro”. Movimento Antropófago. Entra em
presa vô-las ensinarmos aí chegado. Mas si de Das memórias da infância, uma das contato com alguns artistas europeus,
tal desprezível língua se utilizam na conversação mais marcantes foi a descoberta do como Blaise Cendrars e Leger. Neste
os naturais desta terra, logo que tomam da pena,
circo, que plasmou a visão circense do período promove concorridas reuniões
se despojam de tanta asperidade, e surge o
Homem Latino de Lineu, exprimindo-se numa mundo, a carnavalização da vida, tão etílico-gastronômico-culturais. Em Paris,
outra linguagem, mui próxima da vergiliana, no marcantes na ironia, no humor e nas Oswald lança seu primeiro livro de
dizer dum panegirista, meigo idioma, que, com paródias de Oswald, que se dizia “um poemas, Pau-Brasil, ilustrado por Tarsila.
imperecível galhardia, se intitula: língua de palhaço da burguesia”. Com a crise internacional em 1929,
Camões!
Aos 22 anos parte para a Europa, Oswald vai à falência, dependurando-se
(Mário de Andrade, Macunaíma, cap. IX)
incorporando em sua bagagem, no nos reis da vela, apelido dos agiotas da
2. Oswald de Andrade regresso, os “ismos” da vanguarda do zona bancária do centro velho de São
(São Paulo, 1890-1954) velho mundo: as lembranças de Landa Paulo. Perde tudo, transforma-se num
Kosbach, dançarina, “flor de carne “vira-latas do Modernismo”, mas
䊏 Vida musculosa e doirada”, e Kamiá, adquire uma vigorosa experiência das
Viajei, fiquei pobre, fiquei rico, casei, ex-rainha dos estudantes de misérias do mundo das finanças,
enviuvei, casei, divorciei, viajei, casei... já disse Montmartre, que lhe dá o primeiro filho, matéria-prima que vai transpor em
que sou conjugal, gremial e ordeiro. O que não Nonê (síntese de “nosso nenê”). O Rei da Vela.
me impediu de ter brigado diversas vezes à Conhece também lsadora Duncan, de No início dos anos de 1930, passa a
portuguesa e tomado parte em algumas quem foi muito amigo e com quem viver com Patrícia Galvão (Pagu),
batalhas campais. Nem ter sido preso 13 vezes.
escandalizou a sociedade da época. ativíssima mulher que foi resgatada para
Tive também grandes fugas por motivos
Dessas relações, a mais intensa se- a memória nacional por Augusto de
políticos. Tenho três filhos e três netos e sou
rá com Deise, apelidada “Miss Ciclone”, Campos, em trabalho publicado no ano
casado, em últimas núpcias, com Maria
Antonieta d’Alkimin. Sou livre-docente de moça de uma garçonnière da Rua Líbero de 1982.
literatura na Faculdade de Filosofia da Badaró, com quem Oswald passa a viver Com Pagu, Oswald realiza uma
Universidade de São Paulo. em 1917. Deise morre tragicamente de guinada ideológica para a esquerda,
(Oswald de Andrade, um aborto malsucedido, e Oswald casa-se filiando-se ao Partido Comunista e
de um artigo publicado pelo com ela in extremis, no leito do hospital fundando o jornal O Homem do Povo,
Diário de Notícias, em 1950.) em que estava internada. pasquim humorístico-panfletário, que foi
As marcas dessa relação vão rea- empastelado por estudantes da Facul-
O mal foi ter eu medido o meu avanço
parecer no primeiro romance, dade de Direito do Largo São Francisco.
sobre o cabresto metrificado e nacionalista de
Os Condenados. Em seu livro de Serafim Ponte Grande é o romance que
duas remotas alimárias — Bilac e Coelho Neto.
O erro foi ter corrido na mesma pista inexistente.
memórias, Oswald fala dessa fase: projeta essa fase de radicalidade criativa
(...) e ideológica.
A situação “revolucionária” desta bosta Sinto-me só, perdido numa imensa noite de Fiel à sua proposta de “monogamia
mental sul-americana apresentava-se assim: o orfandade. sucessiva”, Oswald casa-se, em 1936,
contrário do burguês não era o proletário — era A amada que me deu a vida partiu sem me
com a poetisa Julieta Bárbara e, em
o boêmio! As massas, ignoradas no território e, dizer adeus.
1942, com Maria Antonieta d’Alkimin,
como hoje, sob a completa devassidão A francesa que trouxe de Paris veio buscar
econômica dos políticos e dos ricos. Os o dinheiro para outro homem. sua relação mais estável, documentada
intelectuais brincando de roda. Landa, que foi o primeiro sonho vivo que nos poemas de Cântico dos Cânticos,
(Oswald de Andrade, me ofuscou, tornou-se a estátua de sal da lenda para Flauta e Violão e no livro de
PORTUGUÊS D

prefácio de Serafim Ponte Grande) bíblica. Olhou para o passado. memórias.


lsadora Duncan estrondou como raio e
Nas décadas de 1940 e 1950,
passou. A que encontrei, enfim, para ser toda
O mais radical dos modernistas de Oswald dedica-se à vida acadêmica,
minha, meu ciúme matou...
1922 teve sua vida marcada por uma Estou só e a vida vai custar a reflorir. inclinando-se para a problemática espiri-
criativa vontade de transgredir, por um Estou só. tual e para os temas essenciais da vida.

28 –
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䊏 Obra 䊏 Considerações gerais Alfredo Bosi identifica, na obra de


• Romance Oswald chega a vivenciar uma São Oswald, três níveis:
Os Condenados, I – Alma; II – A Es- Paulo ainda provinciana, despertando para I – O mais inferior: a prosa de
trela de Absinto; III – A Escada seu processo de industrialização. Ele Os Condenados, A Estrela de Absinto e
Vermelha (1941; reedição, num está no meio de duas forças: a do A Escada Vermelha, novelas meio munda-
único volume, de A Trilogia do Exílio nas, meio psicológicas, nas quais há
patriarcalismo agrário, já passada, e a do
ou Romances do Exílio, escritos sempre um artista atribulado pelas
início da tecnologia urbana. “Nossos
entre 1922 e 1934) exigências de sua personalidade.
pais vinham do patriarcado rural, nós
Memórias Sentimentais de João lI – O trânsito para a experiência do
inaugurávamos a era da indústria”, ele
Miramar (1924) romance “informal” de Memórias Sen-
afirma com lucidez na mirada
Serafim Ponte Grande (1933) timentais de João Miramar, seu ponto
retrospectiva de sua vida.
Marco Zero, I – A Revolução alto, e de Serafim Ponte Grande. Ambas
Assim, os meios de comunicação
Melancólica (1943) as obras correm paralelamente às poé-
de massa — como o cinema, o rádio, a
Marco Zero, lI – Chão (1945) ticas do Pau-Brasil e da Antropofagia, no
linguagem da propaganda — são rapida-
sentido de satirizar o Brasil.
mente assimilados pelo poeta. “Postes
III – A “nova revolução formal”: o
• Poesia da Light”, em Poesia Pau-Brasil, é um
telegrafismo das rupturas sintáticas, o
Pau-Brasil (1925) exemplo de poema cujo estilo vem
simultaneísmo, as ordens do subcons-
Primeiro Caderno do Aluno de Poesia contaminado pela síntese vertiginosa
ciente, os neologismos. A composição
Oswald de Andrade (1927) causada pela nova paisagem urbana;
do romance é revolucionária: capítulos-
Poesias Reunidas (edição póstuma) suas principais personagens são a
instantes; capítulos-relâmpagos; capí-
multidão, os novos meios de transporte,
tulos-sensações (capítulos-flash).
• Manifestos, Teses e Ensaios o fonógrafo, o cinema etc. Exemplo vivo
Oswald, leitor dos futuristas e afe-
Manifesto da Poesia Pau-Brasil desta fascinação pelo moderno é o
tado pela técnica do cinema — a co-
(1924) famoso Cadillac verde que Oswald
lagem rápida de signos, os processos
Manifesto Antropófago (1928) possuía nessa época.
diretos “sem comparações de apoio”,
Ponta de Lança (1945) Segundo Antônio Cândido:
“as palavras em liberdade” —, vai além
A Arcádia e a Inconfidência (1945)
Oswald de Andrade foi um dos do verso livre. Desarticulação total da
A Crise da Filosofia Messiânica
mais vivos ensaístas e panfletários de frase — o que produzirá também um
(1950)
nossa literatura, com uma rara capa- modo novo de dispor o texto, uma nova
A Marcha das Utopias (póstuma,
cidade de tornar sugestiva a ideia, pe- espacialização do material literário.
1966)
la violência corrosiva das afirmações,
䊏 Pau-Brasil
o humorismo e o fulgor dos tropos.
Composto em Paris, Oswald cria
• Teatro Na obra propriamente criadora,
neste livro aquilo que ele chamaria de
O Homem e o Cavalo (1934) mostrou a importância das experiên-
cias semânticas e o relevo que a pala- poesia de exportação.
O Rei da Vela (1937)
vra adquire, quando manipulada com O projeto visava a um desligamento
A Morta (1937)
o duplo apoio de imagem surpre- dos modelos poéticos importados,
O Rei Floquinhos (infantil, 1953)
endente e da sintaxe descamada. pondo fim à grandiloquência e à
Deste modo, quebrou as barreiras en- seriedade. Composto de poemas-pílulas,
• Memórias tre poesia e prosa, para atingir a uma mistura a linguagem antiga dos cronis-
Um Homem sem Profissão (1954) espécie de fonte comum de lingua- tas e jesuítas da época do descobri-
gem artística. Pode-se dizer que a sua
mento do Brasil com o falar coloquial de
importância histórica de renovador e
• Crônicas seu tempo; reinventa composições
PORTUGUÊS D

agitador (no mais alto sentido) foi


Telefonemas (edição póstuma) consagradas do Romantismo em paró-
decisiva para a formação da nossa
dias irônicas.
literatura contemporânea.

– 29
TEORIA_EXERC_D_C5_CURSO_2023_PORT_ZE.qxp 25/05/2023 21:59 Página 30

Oswald recria, poeticamente, a Temos aqui dois exemplos da força


TEXTOS
Carta de Caminha a D. Manuel. Veja em expressiva que Oswald retira de sua lin-
ESCAPULÁRIO “As Meninas da Gare” a justaposição do guagem elíptica, alusiva, condensada.
histórico ao moderno: as indígenas a que O “Noturno” evidencia a técnica
No Pão de Açúcar Pero Vaz se refere são vistas como as cubista, prevalecendo as formas
De Cada Dia meninas da gare (gare: palavra francesa geométricas: o círculo da lua e as retas
Dai-nos Senhor
que significa “estação”). do trem e do meridiano. O título é
A Poesia
ambíguo, remetendo-nos tanto a um
De Cada Dia
VÍCIO NA FALA tipo de composição musical romântica
(Oswald de Andrade,
“Por Ocasião da Descoberta do Brasil”) Para dizerem milho dizem mio
(os noturnos de Chopin) quanto à desig-
Para melhor dizem mió nação de um trem noturno.
Para pior pió
Note como Oswald de Andrade pa-
Para telha dizem teia ESCOLA BERLITES
rodia a linguagem religiosa, substituindo
Para telhado dizem teiado
o termo “pão”, do Pai-Nosso, por “Pão E vão fazendo telhados Todos os alunos têm a cara ávida
de Açúcar” e “Poesia”. Com isso, o (Oswald de Andrade,
Mas a professora sufragete
poeta subverte a ordem litúrgica para “História do Brasil”)
Maltrata as pobres datilógrafas bonitas
introduzir o elemento brasileiro e refletir
E detesta
sobre o caráter da poesia. São traços PRONOMINAIS The spring
modernos do poema o seu humor, seu Der Frühling
Dê-me um cigarro
caráter sintético, assim como a ausên- La primavera scapigliata
Diz a gramática
cia total de pontuação. Do professor e do aluno Há uma porção de livros pra ser comprados
E do mulato sabido A gente fica meio esperando

A DESCOBERTA Mas o bom negro e o bom branco As campainhas avisam


Da Nação Brasileira As portas se fecham
Seguimos nosso caminho por este mar Dizem todos os dias É formoso o pavão?
[de longo Deixa disso camarada De que cor é o Senhor Seixas?
Até a oitava da Páscoa Me dá um cigarro Senhor Lázaro traga-me tinta
Topamos aves (Oswald de Andrade, Qual é a primeira letra do alfabeto?
E houvemos vista de terra “Postes da Light”)
Ah!
(Oswald de Andrade,
(Oswald de Andrade,
“História do Brasil”) Nos dois poemas, manifesta-se a
“Postes da Light”)
proposta de reduzir a distância entre a
OS SELVAGENS linguagem falada e a escrita, renegando
RECLAME
o passadismo acadêmico e abolindo “as
Mostraram-lhes uma galinha alfândegas culturais”, como diria
Fala a graciosa atriz
Quase haviam medo dela Oswald.
E não queriam pôr a mão Margarida Perna Grossa
E depois a tomaram como espantados Linda cor — que admirável loção
NOTURNO
(Oswald de Andrade, Considero lindacor o complemento
“História do Brasil”) Lá fora o luar continua Da toalete feminina da mulher
E o trem divide o Brasil Pelo seu perfume agradável
Como um meridiano E como tônico do cabelo garçone
AS MENINAS DA GARE (Oswald de Andrade,
Se entendam todas com Seu Fagundes
“São Martinho”)
Único depositário
Eram três ou quatro moças bem moças
[e bem gentis Nos E. U. do Brasil
DITIRAMBO
Com cabelos mui pretos pelas espáduas (Oswald de Andrade,
PORTUGUÊS D

E suas vergonhas tão altas e tão Meu amor me ensinou a ser simples “Postes da Light”)
[saradinhas Como um largo de igreja
Que de nós as muito bem olharmos Onde não há nem um sino Nos dois poemas, dois aspectos
Não tínhamos nenhuma vergonha Nem um lápis “cosmopolitas” de São Paulo: a escola
(Oswald de Andrade, Nem uma sensualidade de línguas (“berlites”) e a sociedade de
“História do Brasil”) (Oswald de Andrade, “rp 1”) consumo (“reclame”).
30 –
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1. (FUVEST) – Leia o texto abaixo e considere as afirmações: Texto para o teste 2.

A inteligência do herói estava muito perturbada. As cunhãs VEI, A SOL


rindo tinham ensinado pra ele que o sagui-açu não era saguim não,
chamava elevador e era uma máquina. De-manhãzinha ensinaram Ora o pássaro careceu de fazer necessidade, fez e o herói ficou
que todos aqueles piados berros cuquiadas sopros roncos esturros escorrendo sujeira de urubu. Já era de-madrugadinha e o tempo
não eram nada disso não, eram mas cláxons 1 campainhas apitos estava inteiramente frio. Macunaíma acordou tremendo, todo
buzinas e tudo era máquina. As onças pardas não eram onças lambuzado. Assim mesmo examinou bem a pedra mirim da ilhota
pardas, se chamavam fordes hupmobiles chevrolés dodges pra ver si não havia alguma cova com dinheiro enterrado. Não havia
mármons e eram máquinas. não. Nem a correntinha encantada de prata que indica pro escolhido,
(Mário de Andrade, Macunaíma ) tesouro de holandês. Havia só as formigas jaquitaguas ruivinhas.
Então passou Caiuanogue, a estrela da manhã. Macunaíma já
1 – Cláxon: buzina. meio enjoado de tanto viver pediu pra ela que o carregasse pro céu.
Caiuanogue foi se chegando porém o herói fedia muito.
I. As características modernistas desse fragmento estão não só no — Vá tomar banho! ela fez. E foi-se embora.
estilo, próximo do Expressionismo, como também na ruptura da Assim nasceu a expressão “Vá tomar banho!” que os
linguagem literária tradicional, já que palavras indígenas, coloquia- brasileiros empregam se referindo a certos imigrantes europeus.
lismos e barbarismos passam a integrar o registro literário. (ANDRADE, M. Macunaíma:
II. Nesse fragmento, o narrador incorpora a visão primitiva de o herói sem nenhum caráter. Rio de Janeiro: Agir, 2008.)
Macunaíma quando descreve a cidade de São Paulo. Pode-se dizer
que ocorre uma inversão paródica do que se encontra em textos 2. O fragmento de texto faz parte do capítulo VIII,
descritivos de cronistas europeus do século XVI, já que estes intitulado “Vei, a Sol”, do livro Macunaíma, de Mário
levavam em conta, muitas vezes, o referencial europeu para relatar de Andrade, pertencente à primeira fase do
a realidade da terra recém-descoberta. Modernismo brasileiro. Considerando a linguagem empregada pelo
III. Pode-se dizer que a justaposição de palavras indicadoras de ruídos, narrador, é possível identificar
algumas onomatopaicas, sugere a intensidade do barulho urbano, a) resquícios do discurso naturalista usado pelos escritores do século
assim como a enumeração das marcas de automóveis sugere o XIX.
volume do tráfego. b) ausência de linearidade no tratamento do tempo, recurso comum ao
texto narrativo da primeira fase modernista.
Está(ão) correta(s)
c) referência à fauna como meio de denunciar o primitivismo e o atraso
a) todas as afirmações.
de algumas regiões do País.
b) apenas a afirmação I.
d) descrição preconceituosa dos tipos populares brasileiros,
c) apenas a afirmação II.
representados por Macunaíma e Caiuanogue.
d) apenas a afirmação III.
e) uso de linguagem coloquial e de temáticas do lendário brasileiro
e) apenas as afirmações II e III.
como meio de valorização da cultura popular nacional.
RESOLUÇÃO:
RESOLUÇÃO:
Todas as afirmações a respeito do fragmento apresentado estão
[ENEM-2015 – 2.a aplic.] Na passagem de Macunaíma apresentada,
corretas. Quanto à afirmativa I, verifica-se o emprego: 1) de
é possível identificar a assimilação de linguagem coloquial-oral —
palavras indígenas (cunhãs, sagui-açu e saguim); 2) de
como em “pra ver si”, “pro escolhido”, “vá tomar banho” —, assim
coloquialismos: a forma pra, em vez de para; a expressão
como a valorização da cultura popular brasileira, com suas lendas
“ensinaram pra ele”, em vez de “ensinaram a ele”; “de-manhã-
e figuras da mitologia indígena (Vei) e cabocla.
zinha”, por “pela manhã bem cedo”; “eram mas”, em vez de “mas
Resposta: E
eram”; 3) de pronome oblíquo iniciando oração: “se chamavam”,
no lugar de “chamavam-se”; 4) por fim, de barbarismos/estran-
geirismos, como, por exemplo, cláxon (do inglês klaxon = buzina de
automóvel). Quanto à afirmativa II, é correto o que nela se afirma,
ao se notar que, no trecho transcrito, o desvendamento da
paisagem urbana faz-se sob o olhar do primitivo (havendo,
portanto, uma inversão da perspectiva em relação aos cronistas
do século XVI), o qual, em cada uma de suas descobertas, vê um
elemento da natureza (o elevador seria o saguim, os ruídos das
máquinas seriam os sons dos animais da mata e os automóveis
seriam as onças pardas). O que se afirma em III refere-se ao trecho
PORTUGUÊS D

“todos aqueles piados berros cuquiadas sopros roncos esturros...


eram mas cláxons campainhas apitos buzinas”, que sugere a
intensidade sonora da cidade, bem como ao trecho “se chamavam
fordes hupmobiles chevrolés dodges mármons”, em que a
justaposição das marcas de automóveis sugere o grande número
de carros pelas ruas.
Resposta: A

– 31
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Texto para o teste 3.

brasilidade em construção

(MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA.


Oswald de Andrade: o culpado de tudo.
27 set. 2011 a 29 jan. 2012. São Paulo: Prof. Gráfica, 2012.)

3. O poema de Oswald de Andrade remonta à ideia de


que a brasilidade está relacionada ao futebol. Quanto
à questão da identidade nacional, as anotações em
torno dos versos constituem
a) direcionamentos possíveis para uma leitura crítica de dados
histórico-culturais.
b) forma clássica da construção poética brasileira.
c) rejeição à ideia do Brasil como o país do futebol.
d) intervenções de um leitor estrangeiro no exercício de leitura poética.
e) lembretes de palavras tipicamente brasileiras substitutivas das
originais.
RESOLUÇÃO:
[ENEM] As anotações em torno dos versos são encaminhamentos
que possibilitam uma leitura crítica de dados histórico-culturais do
Brasil, como a que explica, no verso 1: Brasil = país do futebol.
Observa-se, no título e nas anotações, que a supremacia no futebol
é vista como representação da brasilidade.
Resposta: A
PORTUGUÊS D

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Primeira Geração Modernista (III): Oswald de Andrade (II)


MÓDULO 40
Análise de Texto

Textos para as questões de 1 a 3. 2. (UNICAMP – adaptada) – Que relação os três últimos versos
estabelecem com os três primeiros?
Texto I RESOLUÇÃO:
A oposição entre a natureza europeia, marcada pelo frio e pela chu-
ERRO DE PORTUGUÊS va, e a natureza tropical, solar, radiante, determina o eixo central
do poema, que, já no título, ironiza, pela ambiguidade, o processo
colonial: “erro de português”. Se em vez da chuva houvesse sol, o
Quando o português chegou
colonizador teria de se adaptar à condição tropical e teria sido
Debaixo duma bruta chuva despido pelos nativos. Os três primeiros versos descrevem o
Vestiu o índio processo civilizatório; os três últimos instauram a utopia
Que pena! antropofágica de Oswald.
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português
(Oswald de Andrade, in Poesias Reunidas)

Texto II

(...)
Nunca fomos catequizados. Fizemos foi carnaval. O índio
vestido de Senador do Império (...). Ou figurando nas óperas de
Alencar cheio de bons sentimentos.
(...)
Contra o índio de tocheiro. O índio filho de Maria (...)
(...)
Contra Anchieta cantando as onze mil virgens do céu (...) 3. (UNICAMP – adaptada) – Que relação o poema, como um todo,
(Oswald de Andrade, in Manifesto Antropófago) estabelece com as ideias presentes nos fragmentos do Manifesto?
RESOLUÇÃO:
Levando em conta a leitura do poema “Erro de Português” As frases-comprimidos extraídas do Manifesto Antropófago,
(texto I) e dos fragmentos do Manifesto Antropófago (texto II), responda subscrito por Oswald de Andrade em 1928, no 374.° aniversário da
deglutição do bispo Sardinha pelos índios caetés, são verdadeiros
ao que se pede: torpedos oswaldianos contra a impostura da civilização: “O índio
vestido de Senador do Império (...). Ou figurando nas óperas de
1. (UNICAMP – adaptada) – O que exprime o quarto verso do poema? Alencar”; “Contra o índio de tocheiro”; “Contra Anchieta...”. Nessa
RESOLUÇÃO: direção, o poema ilustra as propostas do Manifesto, já que ambos
A locução interjetiva “Que pena!” expressa contrariedade em re- nascem da mesma intenção de resgate dos valores primitivos
lação à colonização cultural do nativo pelo português, alegori- como forma de liberação do instinto e da inocência dionisíaca do
camente referida na imagem do índio vestido. selvagem, visando à superação dos recalques impostos pela moral
judaico-cristã, pelo capitalismo e pela família patriarcal, em nome
da utopia do matriarcado de Pindorama. A antropofagia pode ser
lida como um esboço de filosofia da cultura brasileira e uma busca
da identidade nacional, fundados na “devoração ritual” da cultura
europeia.
PORTUGUÊS D

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Textos para o teste 4. Texto para os testes 5 e 6.

Texto I BRASIL

O Zé Pereira chegou de caravela


E perguntou pro guarani da mata virgem
— Sois cristão?
— Não. Sou bravo, sou forte, sou filho da Morte
Teterê Terê Quizá Quizá Quecê!
Lá longe a onça resmungava Uu! ua! uu!
O negro zonzo saído da fornalha
Tomou a palavra e respondeu
— Sim pela graça de Deus
Canhem Babá Canhem Babá Cum Cum!
E fizeram o Carnaval
(Oswald de Andrade, Pau-Brasil)

5. Esse texto apresenta uma versão humorística da


formação do Brasil, mostrando-a como uma junção
de elementos diferentes. Considerando-se esse
aspecto, é correto afirmar que a visão apresentada pelo texto é
Os Imigrantes (c. 1910), de Antônio Rocco (1880-1944). Óleo sobre tela,
a) ambígua, pois tanto aponta o caráter desconjuntado da formação
202 cm x 131 cm, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
nacional, quanto parece sugerir que esse processo, apesar de tudo,
acaba bem.
Texto II
b) inovadora, pois mostra que as três raças formadoras — portugueses,
Um dia, os imigrantes aglomerados na amurada da proa negros e índios — pouco contribuíram para a formação da identidade
chegavam à fedentina quente de um porto, num silêncio de mato e brasileira.
de febre amarela. Santos. — É aqui! Buenos Aires é aqui! — Tinham c) moralizante, na medida em que aponta a precariedade da formação
trocado o rótulo das bagagens, desciam em fila. Faziam suas cristã do Brasil como causa da predominância de elementos
necessidades nos trens dos animais onde iam. Jogavam-nos num primitivos e pagãos.
pavilhão comum em São Paulo. — Buenos Aires é aqui! — d) preconceituosa, pois critica tanto índios quanto negros,
Amontoados com trouxas, sanfonas e baús, num carro de bois, que representando de modo positivo apenas o elemento europeu, vindo
pretos guiavam através do mato por estradas esburacadas, com as caravelas.
chegavam uma tarde nas senzalas donde acabava de sair o braço e) negativa, pois retrata a formação do Brasil como incoerente e
escravo. Formavam militarmente nas madrugadas do terreiro defeituosa, resultando em anarquia e falta de seriedade.
homens e mulheres, ante feitores de espingarda ao ombro. RESOLUÇÃO:
(ANDRADE, O. Marco Zero II – Chão. [ENEM-2004] Segundo o poema de Oswald de Andrade, a mistura
Rio de Janeiro: Globo, 1991.) de portugueses, índios e negros — que não se entenderam em
diversas línguas (português, línguas indígenas e línguas africanas)
— teria resultado numa cultura híbrida e anárquica, cujo símbolo
seria o Carnaval, visto, porém, de modo positivo pelos
4. Levando-se em consideração o texto de Oswald de
modernistas.
Andrade e a pintura de Antônio Rocco, relativos à Resposta: A
imigração europeia para o Brasil, é correto afirmar que
a) a visão da imigração presente na pintura é trágica e, no texto, 6.
otimista. A polifonia — combinação simultânea de vozes —
b) a pintura confirma a visão do texto quanto à imigração de argentinos presente no poema resulta da manifestação do
para o Brasil. a) poeta e do colonizador apenas.
c) os dois autores retratam dificuldades dos imigrantes na chegada ao b) colonizador e do negro apenas.
Brasil. c) negro e do índio apenas.
d) Antônio Rocco retrata de forma otimista a imigração, destacando o d) colonizador, do poeta e do negro apenas.
pioneirismo do imigrante. e) poeta, do colonizador, do índio e do negro.
e) Oswald de Andrade mostra que a condição de vida do imigrante era RESOLUÇÃO:
melhor que a dos extraditados. [ENEM-2004] Além do emissor do poema (o poeta, ou, mais
RESOLUÇÃO: precisamente, o eu lírico), que narra a historieta e estabelece sua
PORTUGUÊS D

[ENEM] Antônio Rocco, dentro de uma estética acadêmica, e perspectiva, os outros actantes (= figuras que atuam) do texto são
Oswald de Andrade, usando uma linguagem mais contundente, o Zé Pereira (o português colonizador), o índio e o negro.
retratam as dificuldades com que os imigrantes se defrontavam ao Resposta: E
chegar ao Brasil — destacando-se no texto do modernista os
aspectos mais crus e humilhantes da dura adaptação dos
recém-chegados.
Resposta: C

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MÓDULO 41 Primeira Geração Modernista (IV): Manuel Bandeira

1. Manuel Bandeira 䊏 Considerações gerais


TEXTOS
(Recife, 1886 – Rio de Janeiro, 1968) Sobre Manuel Bandeira, afirmou
Antônio Cândido:
䊏 Vida VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
Feitos os estudos primários na cida- A poesia de Manuel Bandeira ca- Vou-me embora pra Pasárgada
de natal, em 1896 muda-se com a famí- racteriza-se pela amplitude do âmbi- Lá sou amigo do rei
lia para o Rio de Janeiro, onde se to, testemunho de uma variedade Lá tenho a mulher que eu quero
matricula no Colégio Pedro II. Terminado criadora que vem do Parnasianismo Na cama que escolherei
o curso secundário, vai para São Paulo crepuscular até as experiências con- Vou-me embora pra Pasárgada
estudar engenharia, mas adoece grave- cretistas, do soneto às formas mais
mente e abandona o projeto de ser audazes de expressão. Doutro lado, Vou-me embora pra Pasárgada
arquiteto (1904). Inicia-se, então, uma conservou e adaptou ao espírito mo- Aqui eu não sou feliz
derno os ritmos e formas mais regula- Lá a existência é uma aventura
demorada peregrinação em busca de
res, de tal maneira que nenhum outro De tal modo inconsequente
melhoras, o que finalmente o leva a
Que Joana a Louca de Espanha
Clavadel, na Suíça (1913). Com a contemporâneo revela tão acentuada-
Rainha e falsa demente
deflagração da Primeira Grande Guerra, mente a herança do mais puro lirismo
Vem a ser contraparente
regressa ao Brasil e, em 1917, publica português, transfundido na mais
Da nora que nunca tive
seu primeiro livro: A Cinza das Horas. autêntica pesquisa da nossa sen-
Integrado no movimento renovador de sibilidade. Sob este aspecto, a sua
E como farei ginástica
obra lembra a de Gonçalves Dias.
1922, continua a escrever e publicar Andarei de bicicleta
Em toda ela, com timbre inconfun-
poesia, enquanto colabora com a Montarei em burro bravo
dível, corre a nota da ternura ardente Subirei no pau de sebo
imprensa. Em 1935, é nomeado inspetor
da paixão pela vida, que vem desde os Tomarei banhos de mar
do ensino secundário, três anos mais
versos da mocidade até os de hoje, E quando estiver cansado
tarde, professor de Literatura no Colégio
como força humanizadora. Graças a Deito na beira do rio
Pedro II e, em 1943, é nomeado
isso, a confidência e a notação exterior Mando chamar a mãe-d’água
professor de Filosofia, cargo em que se
se unem numa expressão poética ao Pra me contar histórias
aposentou em 1956. Pertenceu à Acade-
mesmo tempo familiar e requintada, Que no tempo de eu menino
mia Brasileira de Letras e faleceu no Rio Rosa vinha me contar
pitoresca e essencial, unificando o que
de Janeiro em 13 de outubro de 1968. há de melhor no lirismo intimista e no Vou-me embora pra Pasárgada
registro do espetáculo da vida. Daí
䊏 Obra uma simplicidade que em muitos (...)
• Poesia modernistas parece afetada, mas que
A Cinza das Horas (1917) nele é a própria marca da inspiração. E quando eu estiver mais triste
Carnaval (1919) Mas triste de não ter jeito
São frequentes, em sua poesia, os
O Ritmo Dissoluto (1924) Quando de noite me der
seguintes temas: a morte, a recorda-
Vontade de me matar
Libertinagem (1930) ção da infância, o cotidiano simples, a
— Lá sou amigo do rei —
Estrela da Manhã (1936) melancolia, o erotismo. Como poeta da
Terei a mulher que eu quero
Lira dos Cinquent’Anos (1940) morte, é dos maiores de nossa língua.
Na cama que escolherei
Belo, Belo (1948) O mais célebre de seus poemas de
Vou-me embora pra Pasárgada.
Mafuá do Malungo (1948) recordação da infância é “Evocação do (Manuel Bandeira,
Opus 10 (1952) Recife”. Talvez sua mais famosa com- Libertinagem )
Estrela da Tarde (1958) posição seja “Vou-me embora pra
Estrela da Vida Inteira (1966) Pasárgada”, na qual constrói uma uto- DESENCANTO
pia como compensação emocional. Eu faço versos como quem chora
• Prosa Sua linguagem poética caracteriza-se De desalento... de desencanto...
Itinerário de Pasárgada (1954) pela musicalidade, que sempre se Fecha o meu livro, se por agora
Andorinha, Andorinha (1966)
PORTUGUÊS D

conserva próxima do coloquial. É um Não tens motivo nenhum de pranto.


(textos inéditos, selecionados por exemplar artesão da forma poética,
Carlos Drummond de Andrade) tanto das formas tradicionais da poe- Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
sia, quanto da forma moderna do Tristeza esparsa... remorso vão...
Também escreveu crítica literária, verso livre e da composição, não obe- Dói-me nas veias. Amargo e quente,
crônicas etc. diente a padrões estabelecidos. Cai, gota a gota, do coração.

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E nestes versos de angústia rouca PROFUNDAMENTE Arquiteto falhado, músico


Assim dos lábios a vida corre, Falhado (engoliu um dia
Deixando um acre sabor na boca. Quando ontem adormeci Um piano, mas o teclado
Na noite de São João Ficou de fora); sem família,
— Eu faço versos como quem morre. Havia alegria e rumor Religião ou filosofia;
(Manuel Bandeira, Estrondos de bombas luzes de Bengala Mal tendo a inquietação de espírito
A Cinza das Horas) Vozes cantigas e risos Que vem do sobrenatural,
Ao pé das fogueiras acesas. E em matéria de profissão
Um tísico1 profissional.
PNEUMOTÓRAX No meio da noite despertei (Manuel Bandeira,
Não ouvi mais vozes nem risos Outros Poemas)
Apenas balões Vocabulário
Febre, hemoptise1, dispneia2 e suores noturnos. Passavam errantes 1 – Tísico: tuberculoso.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Silenciosamente
Tosse, tosse, tosse. Apenas de vez em quando PREPARAÇÃO PARA A MORTE
O ruído de um bonde
A vida é um milagre.
Mandou chamar o médico: Cortava o silêncio
Cada flor,
— Diga trinta e três. Como um túnel.
Com sua forma, sua cor, seu aroma,
— Trinta e três... trinta e três... trinta e três... Onde estavam os que há pouco
Cada flor é um milagre.
— Respire. Dançavam
Cada pássaro,
.......................................................................... Cantavam
Com sua plumagem, seu voo, seu canto,
E riam
Cada pássaro é um milagre.
— O senhor tem uma escavação no pulmão Ao pé das fogueiras acesas?
O espaço, infinito,
[esquerdo e o pulmão
O espaço é um milagre.
[direito infiltrado. — Estavam todos dormindo
O tempo, infinito,
— Então, doutor, não é possível tentar o Estavam todos deitados
O tempo é um milagre.
[pneumotórax3? Dormindo
A memória é um milagre.
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango Profundamente
A consciência é um milagre.
[argentino.
Tudo é milagre.
(Manuel Bandeira, *
Tudo, menos a morte.
Libertinagem ) Quando eu tinha seis anos
— Bendita a morte, que é o fim de todos os
Não pude ver o fim da festa de São João
[milagres.
Porque adormeci
Vocabulário (Manuel Bandeira,
1 – Hemoptise: expectoração de sangue prove- Estrela da Tarde)
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
niente dos pulmões. Minha avó
2 – Dispneia: dificuldade de respirar. NAMORADOS
Meu avô
3 – Pneumotórax: forma de tratamento da tu- Totônio Rodrigues O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:
berculose. Tomásia — Antônia, ainda não me acostumei com o seu
Rosa [corpo, com a sua cara.
Onde estão todos eles?
TERESA
— Estão todos dormindo A moça olhou de lado e esperou.
Estão todos deitados — Você não sabe quando a gente é criança e
A primeira vez que vi Teresa
Dormindo [de repente vê uma lagarta listrada?
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Profundamente.
Achei também que a cara parecia uma perna
(Manuel Bandeira, A moça se lembrava:
Libertinagem) — A gente fica olhando...
Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que A meninice brincou de novo nos olhos dela.
[o resto do corpo AUTORRETRATO O rapaz prosseguiu com muita doçura:
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos
[esperando que o resto do corpo nascesse) — Antônia, você parece uma lagarta listrada.
Provinciano que nunca soube
Escolher bem uma gravata; A moça arregalou os olhos, fez exclamações.
PORTUGUÊS D

Da terceira vez não vi mais nada Pernambucano a quem repugna


Os céus se misturaram com a terra A faca do pernambucano; O rapaz concluiu:
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a Poeta ruim que na arte da prosa — Antônia, você é engraçada! Você parece
[face das águas. Envelheceu na infância da arte, [louca.
(Manuel Bandeira, E até mesmo escrevendo crônicas (Manuel Bandeira,
Libertinagem ) Ficou cronista de província; Libertinagem)

36 –
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Leia o poema “Noite Morta”, de Manuel Bandeira, para responder ao Texto para o teste 2.
teste 1:
BIOGRAFIA DE PASÁRGADA
Noite morta.
Junto ao poste de iluminação Quando eu tinha meus 15 anos e traduzia na classe de grego do
Os sapos engolem mosquitos. D. Pedro II a Ciropédia fiquei encantado com o nome dessa
cidadezinha fundada por Ciro, o Antigo, nas montanhas do sul da
Ninguém passa na estrada. Pérsia, para lá passar os verões. A minha imaginação de adolescente
Nem um bêbado. começou a trabalhar, e vi Pasárgada e vivi durante alguns anos em
Pasárgada.
No entanto há seguramente por ela uma procissão de sombras. Mais de vinte anos depois, num momento de profundo desânimo,
Sombras de todos os que passaram. saltou-me do subconsciente este grito de evasão: “Vou-me embora
Os que ainda vivem e os que já morreram. pra Pasárgada!”. Imediatamente senti que era a célula de um poema.
Peguei do lápis e do papel, mas o poema não veio. Não pensei mais
O córrego chora. nisso. Uns cinco anos mais tarde, o mesmo grito de evasão nas
A voz da noite... mesmas circunstâncias. Desta vez, o poema saiu quase ao correr da
pena. Se há belezas em “Vou-me embora pra Pasárgada!”, elas não
(Não desta noite, mas de outra maior.) passam de acidentes. Não construí o poema, ele construiu-se em
(50 Poemas Escolhidos pelo Autor, 2006.) mim, nos recessos do subconsciente, utilizando as reminiscências
da infância — as histórias que Rosa, minha ama-seca mulata, me
1. (CENTRO UNIVER. CLARETIANO-2023) – No poema, o eu lírico contava, o sonho jamais realizado de uma bicicleta etc.
a) trata a noite como um fenômeno do cotidiano, assinalando seu (BANDEIRA, M. Itinerário de Pasárgada.
São Paulo: Global, 2012.)
espanto diante da imponente imagem dos mortos que o visitam.
b) cria uma atmosfera de quietude e solidão, situação que o impele a
evocar o mundo dos mortos. 2. O texto é um depoimento de Manuel Bandeira a
c) elabora uma imagem duplicada da noite, que surge tanto como respeito da criação de um de seus poemas mais
evento do mundo físico quanto como representação da maldade conhecidos. De acordo com esse depoimento, o
humana. fazer poético em “Vou-me embora pra Pasárgada!”
d) constrói sua fantasia com os espíritos dos mortos de maneira a) acontece de maneira progressiva, natural e pouco intencional.
poética, assumindo uma visão consoladora da morte. b) decorre de uma inspiração fulminante, num momento de extrema
e) apresenta um momento de coexistência entre o mundo material e emoção.
o espiritual, ainda que, no final, prevaleça o âmbito material. c) ratifica as informações do senso comum de que Pasárgada é a
RESOLUÇÃO: representação de um lugar utópico.
A atmosfera de quietude e solidão predomina nos cinco primeiros d) resulta das mais fortes lembranças da juventude do poeta e de seu
versos (“Noite morta”, “Ninguém passa na estrada. / Nem um envolvimento com a literatura grega.
bêbado), passando-se, então, à evocação das “sombras” dos
e) remete a um tempo da vida de Manuel Bandeira marcado por
transeuntes que por ali passaram, inclusive dos que já não vivem
(“os que já morreram”) e, finalmente, à evocação da própria ideia desigualdades sociais e econômicas.
de morte, nos três últimos versos, por meio da imagem da noite RESOLUÇÃO:
“maior”. [ENEM-2019 – 2.a aplic.] Manuel Bandeira entrou em contato pela
Resposta: B primeira vez com o nome da cidade antiga de Pasárgada aos 15
anos. Ele afirma, figuradamente, ter vivido nela por alguns anos de
sua adolescência. Depois de mais de vinte anos, brotou-lhe do
inconsciente a frase “Vou-me embora pra Pasárgada!”. Tentou
escrever daí um poema que não se desenvolveu. Depois de
aproximadamente cinco anos, o poema brotou, afirmando
Bandeira que não foi ele quem construiu o poema, mas o poema
que se construiu nele. Então, pode-se dizer que um de seus mais
conhecidos poemas nasceu “de maneira progressiva, natural e
pouco intencional”.
Resposta: A
PORTUGUÊS D

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Textos para o teste 3.

UM POEMA DE CHAGALL

Só é meu
O país que trago dentro da alma.
Entro nele sem passaporte
Como em minha casa.
(...)
As ruas me pertencem.
Mas não há casas nas ruas.
As casas foram destruídas desde a minha infância.
Os seus habitantes vagueiam no espaço
À procura de um lar.
(...)
Só é meu
O mundo que trago dentro da alma.
(BANDEIRA, M. Estrela da Vida Inteira.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993 – fragmento.)

Eu e a Aldeia (1911), de Marc Chagall. Óleo sobre tela,


192,1 cm x 151,4 cm, Museu de Arte Moderna, Nova York.

3. A arte, em suas diversas manifestações, desperta


sentimentos que atravessam fronteiras culturais.
Relacionando-se a temática do texto com a imagem,
percebe-se a ligação entre
a) a alegria e a satisfação na produção das obras modernistas.
b) a memória e a lembrança vivenciadas no íntimo do enunciador.
c) a saudade e o refúgio encontrados pelo homem na natureza.
d) a lembrança e o rancor relacionados a seu ofício original.
e) a exaustão e o medo impostos ao corpo de todo artista.
RESOLUÇÃO:
PORTUGUÊS D

[ENEM] Tanto na pintura surrealista de Chagall, como em “Um


Poema de Chagall”, o país manifesta-se dentro da alma: “Os seus
habitantes vagueiam no espaço”.
Resposta: B

38 –
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Segunda Geração Modernista – Poesia (I):


MÓDULO 42
Carlos Drummond de Andrade (I)

1. Conceito e âmbito 䊏 Plano estético Foi funcionário público no Rio de


No plano estético, destacam-se: Janeiro e também autor de crônicas
O segundo tempo modernista – o predomínio de um “projeto jornalísticas bastante populares.
marca, simultaneamente, a consoli- ideológico” sobre um “projeto
dação de algumas propostas da “fase estético”; 䊏 Obra
heroica” ou “de demolição” (1922- – a consolidação das conquistas • Poesia
1930) e certo recuo quanto às propos- de 1922, mas com o recuo quanto às Alguma Poesia (1930)
propostas mais radicais da “fase Brejo das Almas (1934)
tas mais radicais da “Semana” e dos
heroica”; Sentimento do Mundo (1940)
seus desdobramentos. Propõe-se,
– o cessar da oposição ao Moder- Poesias (1942)
passada a fase de ruptura, um moder- A Rosa do Povo (1945)
nismo;
nismo moderado, com o abandono, Poesia até Agora (1948)
– o desejo de denúncia da realida-
por exemplo, do radicalismo experi- Claro Enigma (1951)
de social do Brasil.
mentalista de Oswald e a retomada de Viola de Bolso (1952)
certas linhas do passado (o Simbo- 䊏 Poesia Fazendeiro do Ar & Poesia até
lismo na corrente espiritualista, as Na poesia, são identificáveis estas Agora (1953)
formas clássicas, a tradição lírica por- constantes: Viola de Bolso Novamente
tuguesa e brasileira etc.). – estabilização das conquistas novas; Encordoada (1955)
– ampliação de temas; Poemas (1959)
– caminho para o universal; A Vida Passada a Limpo (1959)
䊏 O contexto histórico
Lição de Coisas (1962)
O período de 1930-1945 foi mar- – equilíbrio no uso do material
Versiprosa (1967)
cado, entre outros, pelos seguintes linguístico, em termos de normas de
Boitempo (1968)
linguagem.
eventos: Menino Antigo (1973)
Há, na poesia, três direções básicas:
– os efeitos da crise econômica As Impurezas do Branco (1973)
• a poesia de tensões ideoló-
ocorrida em 1929 com o crack da Bolsa Discurso da Primavera & Algumas
gicas: Carlos Drummond de Andrade; Sombras (1978)
de Nova York;
• a poesia de preocupação re- A Paixão Medida (1980)
– a radicalização política: nazismo,
ligiosa e filosófica (o grupo “Festa”, Corpo (1984)
fascismo, integralismo e comunismo;
de tendência espiritualista): Cecília Amar se Aprende Amando (1985)
– as esperanças com a Revolução Meireles, Tasso da Silveira, Augusto Tempo Vida Poesia (1986)
de 1930, logo frustradas pelo Estado Frederico Schmidt, Jorge de Lima e Poesia Errante (1988)
Novo e pela Ditadura Vargas; Vinícius de Moraes; O Amor Natural (1992)
– o rompimento da dominação in- • a poesia de dimensão Farewell (1996)
conteste das oligarquias regionais e a surrealista: Murilo Mendes.
ascensão da nova burguesia industrial; • Prosa
– a aliança do tenentismo liberal e 2. Carlos Drummond de Andrade Confissões de Minas (ensaios e
da política getuliana com as oligar- (Itabira, MG, 1902 – crônicas, 1944)
quias, provocando a radicalização Contos de Aprendiz (1951)
Rio de Janeiro, 1987)
política de intelectuais, marginalizados Passeios na Ilha (ensaios e
䊏 Vida crônicas, 1952)
no processo; daí as aproximações de
Fala, Amendoeira (1957)
Rachel de Queirós, Jorge Amado, Era descendente de fazendeiros e
A Bolsa e a Vida (crônicas e
PORTUGUÊS D

Graciliano Ramos e outros ao Partido mineradores da cidade mineira de


poemas, 1962)
Comunista, no qual militaram; Itabira (jazidas de ferro). Na infância, Cadeira de Balanço (crônicas e
– a Segunda Guerra Mundial foi expulso de um colégio de padres. poemas, 1970)
(1939-1945) fecha o período, projetando Mais tarde, estudou Farmácia em Belo O Poder Ultrajovem e mais 79
no país a tensão externa. Horizonte. Textos em Prosa e Verso (1972)

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Os Dias Lindos (1977) A vontade de amar, que me paralisa o abolição de toda crença e o apagar-se
70 Historinhas (1978) [trabalho,
de toda esperança trazem consigo o
vem de Itabira, de suas noites brancas,
Boca de Luar (1984) autofechamento do espírito.
[sem mulheres e sem horizontes.
O Observador no Escritório (1985) E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, Essa negatividade traduz-se pela
Moça Deitada na Grama (1987) é doce herança itabirana. expressão de dor, do vazio, da angústia,
O Avesso das Coisas (1987) da consciência da queda que aprisiona
Drummond manteve estreitos la-
Autorretrato e Outras Crônicas (1989)
ços de amizade com o grupo dos mo- todo ser vivo, daí o autofechamento:
dernistas de 1922 (Mário, Oswald e
䊏 Apreciação É sempre nos meus pulos o limite.
Bandeira). Sob inspiração dos ideais da É sempre nos meus lábios a estampilha.
Nos primeiros livros são constan-
Semana de 22, funda, em 1925, É sempre no meu não aquele trauma.
tes a ironia, a atitude mineiramente
A Revista, ponta de lança do Modernis-
desconfiada de refletir, o Sempre no meu amor a noite rompe.
mo em Minas Gerais. Em 1928, publica
pessimismo, a autonegação, as Sempre dentro de mim meu inimigo.
o arquifamoso “No Meio do Caminho”,
reminiscências da infância itabi- na Revista de Antropofagia.
E sempre no meu sempre a mesma
rana. Drummond parece buscar a si [ausência.
A partir de Sentimento do Mundo
mesmo, posicionando-se como espec- (1940) e especialmente em A Rosa do
(“O Enterrado Vivo”)
tador de um mundo que não aceita e Povo (1945), a poesia de Drummond Lição de Coisas (1962) marca a
que tenta descrever e encontrar. centra-se na dimensão social, no coti- opção concreto-formalista do poeta.
No “Poema de Sete Faces”, que diano, na denúncia da estupidez, da Essa poesia objetual de Drummond é
abre o primeiro livro, Alguma Poesia incompreensão; na luta contra o medo uma radicalização de processos estru-
(1930), a confissão do poeta que se (“que esteriliza os abraços”) e contra a turais que já estavam presentes desde
sente gauche (= sem jeito, ina- consciência da impossibilidade da
Alguma Poesia, na opção pelo
daptado) e a ironia, sob a forma luta (“eu tenho apenas duas mãos / e o
intencional de um antilirismo: prosaico, pelo irônico, pelo antirretó-
sentimento do mundo”).
rico, pelo antilirismo intencional e que
Em “Mãos Dadas”, o compromis-
Quando nasci, um anjo torto predispunham, pela recusa e pela
so com o homem, a solidariedade:
desses que vivem na sombra contenção, ao poema-objeto, típico
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. Não serei o poeta de um mundo caduco.
da Geração de 1950.
Também não cantarei o mundo futuro.
(...) A ruptura com a sintaxe, a rima
(...)
final ou interna, a assonância, a alitera-
Meu Deus, por que me abandonaste (...)
ção e o eco, a repetição compulsória
se sabias que eu não era Deus O tempo é a minha matéria, o tempo
[presente, os homens presentes,
do som-coisa, aproximam, contudo,
se sabias que eu era fraco.
a vida presente. Drummond das operações técnicas
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
das vanguardas de 1950/60:
A poesia social de Drummond faz
seria uma rima, não seria uma solução. O fácil o fóssil
desabrochar o “sentimento do mun-
Mundo mundo vasto mundo, o míssil o físsil
mais vasto é meu coração. do”, marcado pela consciência da
a arte o infarte
solidão, da impotência do homem di-
o ocre o canopo
Na “Confidência do Itabirano”, a ante de um mundo frio e mecânico a urna o farniente
infância e a vida, modelando a prover- que o reduz a objeto. “Os Mortos de a foice o fascículo
bial “secura” do poeta, o alheamento, Sobrecasaca”, “Congresso Internacio- a lex o judex
o poeta que se sente de ferro, que se nal do Medo”, “A Noite Dissolve os o maiô o avô
a ave o mocotó
diz ilha, mas que esconde sob essa Homens”, “Mundo Grande”, “O Lu-
o só o sambaqui
aparente indiferença uma indisfarçável tador”, “Mão Suja”, “A Morte do Lei-
(“Isso é Aquilo”)
solidariedade, um profundo senso do teiro”, “A Flor e a Náusea” e “José”
humano e do social: incluem-se nessa vertente. A poesia metalinguística, que se
Em Claro Enigma (1951) passa a pensa e se interroga, a metapoesia são
Alguns anos vivi em Itabira. predominar a escavação do real, me- constantes no poeta:
PORTUGUÊS D

Principalmente nasci em Itabira. diante um processo de interrogações Não rimarei a palavra sono
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. com a incorrespondente palavra outono.
e negações que acaba revelando o va-
Noventa por cento de ferro nas calçadas. Rimarei com a palavra carne
Oitenta por cento de ferro nas almas.
zio à espreita do homem. O mundo
ou qualquer outra, que todas me convêm.
E esse alheamento do que na vida é define-se como “um vácuo atormen- (...)
[porosidade e comunicação. tado” (existencialismo niilista). A (“Consideração do Poema”)

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Texto para as questões 1 e 2. 3. (modificado) – Quem não passou pela experiência


de estar lendo um texto e defrontar-se com
TOADA DO AMOR passagens já lidas em outros? Os textos conversam
entre si em um diálogo constante. Esse fenômeno denomina-se
E o amor sempre nessa toada: intertextualidade:
briga perdoa perdoa briga.
I. Quando nasci, um anjo torto
Não se deve xingar a vida, desses que vivem na sombra
a gente vive, depois esquece. disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
Só o amor volta para brigar, (ANDRADE, Carlos Drummond de.
para perdoar, Alguma Poesia. Rio de Janeiro: Aguilar, 1964.)

amor cachorro bandido trem.


II. Quando nasci veio um anjo safado
Mas, se não fosse ele, também O chato dum querubim
que graça que a vida tinha? E decretou que eu tava predestinado
A ser errado assim
Mariquita, dá cá o pito, Já de saída a minha estrada entortou
no teu pito está o infinito. Mas vou até o fim.
(Carlos Drummond de Andrade, Alguma Poesia) (BUARQUE, Chico. Letra e Música.
São Paulo: Companhia das Letras, 1989.)

1. (FUVEST – adaptada) – Nesse poema, o tratamento da temática III. Quando nasci um anjo esbelto
amorosa é característico da primeira fase do Modernismo? Justifique. Desses que tocam trombeta anunciou:
RESOLUÇÃO: Vai carregar bandeira.
Sim, é um tratamento típico da geração heroica (1922-30), pois a Carga muito pesada pra mulher
primeira fase do Modernismo concretiza a ruptura com a tradição
Esta espécie ainda envergonhada.
literária. Assim, o enfoque não convencional do amor evidencia
(PRADO, Adélia. Bagagem.
essa ruptura (“amor cachorro bandido trem”). É de se ressaltar
Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.)
que, não obstante Drummond pertencer, cronologicamente, à
Segunda Geração Modernista, em seu livro de estreia, Alguma
Poesia (1930), nota-se um desdobramento da Geração de 1922. Adélia Prado e Chico Buarque estabelecem intertextualidade, em
relação a Carlos Drummond de Andrade, por
a) reiteração de imagens.
b) oposição de ideias.
c) atualização do tema.
d) negação dos versos.
e) repetição de palavras.
2. (FUVEST – adaptada) – Transcreva do texto alguns elementos que RESOLUÇÃO:
você considere característicos do tipo de linguagem utilizado pelos [ENEM] Os textos de Chico Buarque e de Adélia Prado retomam a
modernistas. Explique por que você os considera assim. conhecida imagem do indivíduo “gauche”, ainda que em situações
existenciais diversas, do “Poema de Sete Faces”.
RESOLUÇÃO:
Resposta: A
1) “Amor cachorro bandido trem”;
2) “Briga perdoa perdoa briga”;
3) “Mariquita, dá cá o pito, / no teu pito está o infinito”.

Note-se a colocação de substantivos adjetivados dessacralizando


o amor (primeiro verso citado), a justaposição sintática de verbos
semanticamente antitéticos (segundo verso) e, nos versos finais, o
uso de sequência tipicamente popular (“dá cá o pito...”). Além
disso, a linguagem é coloquial, os versos são livres, a pontuação
transgride a norma-padrão (“briga perdoa perdoa briga”) e o tom
é dessacralizador.
PORTUGUÊS D

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Segunda Geração Modernista – Poesia (II):


MÓDULO 43
Carlos Drummond de Andrade (II)

1. Temática drummondiana (Coroas sem reino, seu corpo, é parte de suas emoções e
os reinos protéticos de seu imaginário. Os antepassados e
Na Antologia Poética, que publicou de onde proviestes a relação com eles constituem um
quando produzirão
em 1962, Carlos Drummond de problema inquietante, que põe em
a tripla dentadura,
Andrade classificou tematicamente sua questão os fundamentos de nossa
dentadura múltipla,
poesia, distribuindo os seus poemas existência, como se constata no
a serra mecânica,
por nove compartimentos, con- poema “Convívio”:
sempre desejada,
siderados “pontos de partida ou ma- jamais possuída, Cada dia que passa incorporo mais esta
téria de poesia”. A seguir, enumeramos que acabará [verdade, de que eles não
e comentamos brevemente esses nove com o tédio da boca, [vivem senão em nós
núcleos temáticos da poesia a boca que beija, e por isso vivem tão pouco; tão interva-
[lado; tão débil.
drummondiana, colocando ao lado de a boca romântica?...)
(...)
cada um, entre aspas, o título da seção
correspondente da Antologia. A morte e o sentido (ou falta de
Ou talvez existamos somente neles, que
O próprio poeta adverte sobre a sentido) da existência, a consciência [são omissos, e nossa existência,
existência de poemas seus que pode- culpada, a busca de sabedoria são apenas uma forma impura de silêncio,
outros dos temas que frequentam os [que preferiram.
riam ser associados a mais de um dos
temas seguintes. Pode-se acrescentar poemas do indivíduo na poesia de
䊏 4. Amigos:
que há também entre seus poemas Drummond.
“cantar de amigos”
alguns — bem poucos, é verdade — O título atribuído pelo poeta à
cuja temática não corresponde a 䊏 2. A terra natal : seção de sua Antologia Poética dedi-
nenhum de tais temas. Ainda assim, o “uma província: esta” cada aos amigos joga com os “canta-
quadro discernido pelo poeta oferece A profunda, dura, triste relação com res” ou “cantigas de amigo”
uma visão abrangente das preocu- o lugar de origem, que o indivíduo aban- medievais. São homenagens a figuras
pações que frequentaram a sua obra dona, mas que não o abandona, carac- admiradas, próximas ou distantes,
ao longo de todo o seu de- como Machado de Assis, Charles
teriza o tema da “terra natal”. Um dos
senvolvimento. Chaplin, Mário de Andrade ou Manuel
mais célebres poemas sobre o assunto
Bandeira, em poemas às vezes de
é “Confidência do Itabirano”. Mas o
grande penetração crítica. O poema
tema pode ser tratado também de
䊏 1. O indivíduo: dedicado a Machado de Assis, “A um
forma bem humorada e crítica, como Bruxo, com Amor”, contém as
“um eu todo retorcido”
em “Cidadezinha Qualquer”: seguintes iluminações:
O indivíduo, na poesia de
Drummond, é complicado, torturado, Casas entre bananeiras Olhas para a guerra, o murro, a facada
fragmentado. O “Poema de Sete mulheres entre laranjeiras como para uma simples quebra da
Faces”, primeiro texto do primeiro pomar amor cantar. [monotonia universal
e tens no rosto antigo
livro de Drummond (Alguma Poesia,
Um homem vai devagar. uma expressão a que não acho nome certo
1930), é um célebre exemplo deste Um cachorro vai devagar. (das sensações do mundo a mais sutil):
tema. As inquietações do indivíduo Um burro vai devagar. volúpia do aborrecimento?
Devagar... as janelas olham. ou, grande lascivo, do nada?
drummondiano envolvem, por exem-
plo, preocupação com a velhice, como Eta vida besta, meu Deus. (...)
em “Dentaduras Duplas”:
Todos os cemitérios se parecem,
䊏 3. A família: e não pousas em nenhum deles, mas
Dentaduras duplas!
PORTUGUÊS D

“a família que me dei” [onde a dúvida


Inda não sou bem velho apalpa o mármore da verdade, a descobrir
para merecer-vos...
Sem qualquer sentimentalismo —
a fenda necessária;
Há que contentar-me bem ao contrário — o indivíduo inter- onde o diabo joga dama com o destino,
com uma ponte móvel roga, sem alegria, a misteriosa reali- estás sempre aí, bruxo alusivo e zombeteiro,
e esparsas coroas. dade da família, que existe nele, em que resolves em mim tantos enigmas.

42 –
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䊏 5. O choque social: Amar a nossa falta mesma de amor, e na Trata-se de uma “arte poética”
[secura nossa
“na praça de convites” porque é um poema que contém uma
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a
Aqui os poemas se voltam para o [sede infinita. concepção do que seja a poesia e de
espaço social, onde o indivíduo se ex- (“Amar”) como ela deva ser feita. A concepção
põe ao apelo dos outros e vive os dra- 䊏 7. A própria poesia: expressa neste texto é bastante dife-
mas coletivos. Os grandes poemas de “poesia contemplada” rente da que antes apareceu no poe-
temática político-social de Drummond Trata-se das “artes poéticas” de ma “Poesia”, pois aqui a ideia é de
abordam os horrores da guerra, da Drummond: poemas sobre o quê e o que o poema é um objeto de palavras
opressão, da injustiça, da violência. como da poesia. Podem ser poemas de e, portanto, que a poesia se faz com
Durante os anos marcados pela circunstância, singelos como “Poesia”: palavras, não sendo algo que possa
Segunda Guerra Mundial e, no Brasil,
existir “dentro” do poeta, indepen-
pela ditadura de Getúlio Vargas (época Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
dentemente das palavras.
em que Drummond aderiu, breve-
mente, ao credo socialista), o poeta No entanto ele está cá dentro

produziu alguns de seus mais inflama-


inquieto, vivo. 䊏 8. Exercícios lúdicos:
Ele está cá dentro
dos poemas “participantes”, como “uma, duas argolinhas”
e não quer sair.
“Elegia 1938” (também referente ao Aqui temos os jogos com as pala-
tema do indivíduo), que termina assim: Esse poema trata da incapacidade vras — atividade aparentemente infantil,
de expressão (a poesia intuída que não mas poética em sua essência, e respon-
Coração orgulhoso, tens pressa de sável por alguns dos mais espantosos e
chega às palavras), que revela uma
[confessar tua derrota complexos poemas de Drummond,
e adiar para outro século a felicidade ideia “romântica” de poesia (como
[coletiva. algo que existe na alma do poeta, para a como “Áporo” ou “Isso é Aquilo”. As
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego qual ele pode “não encontrar pala- “brincadeiras” podem ter, por exemplo,
[e a injusta distribuição vras”). Diferentes são as grandes sentido crítico, de criticism of life, como
porque não podes, sozinho, dinamitar a “artes poéticas” de Drummond, como no divertido e malicioso quadro da artifi-
[ilha de Manhattan.
“Procura da Poesia”: cialidade da vida moderna, em “Os
Materiais da Vida”:
䊏 6. O conhecimento
amoroso: “amar-amaro” Não faças versos sobre acontecimentos.
Drls? Faço meu amor em vidrotil
Não há criação nem morte perante a poesia.
Amaro é “amargo”. A paronomásia nossos coitos são de modernfold
Diante dela, a vida é um sol estático,
(trocadilho) que descreve este tema não aquece nem ilumina. até que a lança de interflex
exprime um elemento básico da con- As afinidades, os aniversários, os vipax nos separe
cepção drummondiana do amor. Numa [incidentes pessoais não contam. em clavilux
visão nada romântica ou sentimental, o Não faças poesia com o corpo, camabel camabel o vale ecoa
esse excelente, completo e confortável sobre o vazio de ondalit
amor é entendido como uma forma pri-
[corpo, tão infenso à efusão lírica. a noite asfáltica
vilegiada e incontornável de exploração
Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de plkx
da existência e, portanto, de conhe- [dor no escuro
cimento — conhecimento de si e do são indiferentes. 䊏 9. Uma visão, ou tentativa de,
outro. Mas se trata de algo “amargo” Nem me reveles teus sentimentos,
da existência: “tentativa de
porque impõe sofrimento, sendo uma que se prevalecem do equívoco e tentam
[a longa viagem. exploração e de interpretação do
sede insaciável, um desejo impossível
O que pensas e sentes, isso ainda não é estar-no-mundo”
de satisfazer, uma necessidade que não
[poesia. Trata-se de poemas em torno de
encontra correspondência:
questões e conjecturas sobre a exis-
(...) tência, o “estar-aqui”, sobre o que há
Que pode uma criatura senão, Penetra surdamente no reino das palavras.
“no meio do caminho”:
entre criaturas, amar? Lá estão os poemas que esperam ser
amar e esquecer, [escritos.
amar e malamar, Estão paralisados, mas não há desespero, No meio do caminho tinha uma pedra
há calma e frescura na superfície intata. tinha uma pedra no meio do caminho
amar, desamar, amar?
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário. tinha uma pedra
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
(...) no meio do caminho tinha uma pedra.
(...)
Nunca me esquecerei desse acontecimento
PORTUGUÊS D

Chega mais perto e contempla as palavras. na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Este o nosso destino: amor sem conta, Cada uma Nunca me esquecerei que no meio do
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas, tem mil faces secretas sob a face neutra [caminho
doação ilimitada a uma completa ingratidão, e te pergunta, sem interesse pela resposta, tinha uma pedra
e na concha vazia do amor a procura medrosa, pobre ou terrível, que lhe deres: tinha uma pedra no meio do caminho
paciente, de mais e mais amor. Trouxeste a chave? no meio do caminho tinha uma pedra.

– 43
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Texto para o teste 1. Textos para os testes 2 e 3.

MEMÓRIA Texto 1

Amar o perdido AUTORRETRATO


deixa confundido
este coração. Provinciano1 que nunca soube
Escolher bem uma gravata;
Nada pode o olvido Pernambucano a quem repugna
contra o sem sentido A faca do pernambucano;
apelo do Não. Poeta ruim que na arte da prosa
Envelheceu na infância da arte,
As coisas tangíveis E até mesmo escrevendo crônicas
tornam-se insensíveis Ficou cronista de província;
à palma da mão. Arquiteto falhado, músico
Falhado (engoliu um dia
Mas as coisas findas, Um piano, mas o teclado
muito mais que lindas, Ficou de fora); sem família,
essas ficarão. Religião ou filosofia;
(ANDRADE, C. D. Claro Enigma. Mal tendo a inquietação de espírito
Rio de Janeiro: Record, 1991.) Que vem do sobrenatural,
E em matéria de profissão
Um tísico 2 profissional.
1. (ITA – adaptado) – Sobre esse poema, é correto afirmar:
(BANDEIRA, Manuel. Poesia Completa e Prosa.
a) A passagem do tempo acaba por apagar da memória praticamente
Rio de Janeiro: Aguilar, 1983. p. 395.)
todas as lembranças humanas; quase nada permanece.
b) A memória de cada pessoa é marcada exclusivamente por aqueles
Texto 2
fatos de grande impacto emocional; tudo o mais se perde.
c) A passagem do tempo apaga muitas coisas, mas a memória afetiva POEMA DE SETE FACES
registra as coisas que emocionalmente têm importância; essas
permanecem. Quando nasci, um anjo torto
d) A passagem do tempo atinge as lembranças humanas da mesma desses que vivem na sombra
forma que envelhece e destrói o mundo material; nada permanece. disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
e) O homem não tem alternativa contra a passagem do tempo, pois o
As casas espiam os homens
tempo apaga tudo; a memória nada pode; tudo se perde.
que correm atrás de mulheres.
RESOLUÇÃO:
O antológico poema “Memória” fala, com sutil melancolia, da A tarde talvez fosse azul,
condensação do passado, por obra da memória, que faz perenes não houvesse tantos desejos.
os momentos vividos ou sentidos com intensidade.
Resposta: C (...)

Meu Deus, por que me abandonaste


se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,


se eu me chamasse Raimundo,
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Obra Completa.
Rio de Janeiro: Aguilar, 1964. p. 53.)
PORTUGUÊS D

1 – Provinciano: pessoa proveniente da província, isto é, aquela sem os hábitos


mais civilizados da capital do país, na época em que foi escrito o poema, o Rio de
Janeiro.
2 – Tísico: tuberculoso.

44 –
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2. 3. No verso “Meu Deus, por que me abandonaste”, do


texto 2, Drummond retoma as palavras de Cristo na
Os dois poemas têm em comum o fato de cruz, pouco antes de morrer. Esse recurso de repetir
a) descreverem aspectos físicos dos próprios autores. palavras de outrem equivale a
b) refletirem um sentimento pessimista. a) emprego de termos moralizantes.
c) terem a doença como tema. b) uso de vício de linguagem pouco tolerado.
d) narrarem a vida dos autores desde o nascimento. c) repetição desnecessária de ideias.
e) defenderem crenças religiosas. d) emprego estilístico da fala de outra pessoa.
RESOLUÇÃO: e) uso de uma pergunta sem resposta.
[ENEM] Em ambos os poemas, reflete-se um sentimento RESOLUÇÃO:
pessimista. O eu lírico, em “Autorretrato”, afirma, entre outras [ENEM] O próprio enunciado afirma que se trata de “repetir
coisas, que é “poeta ruim”, “arquiteto falhado”, “músico falhado”, palavras de outrem”. Portanto, trata-se de “emprego estilístico da
“um tísico profissional”. Em “Poema de Sete Faces”, o eu lírico é fala de outra pessoa”.
inadaptado à vida, é gauche, inadaptado, espantado diante do Resposta: D
absurdo do mundo.
Resposta: B

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Segunda Geração Modernista – Poesia (III):


MÓDULO 44
Murilo Mendes e Jorge de Lima

1. Murilo Mendes (Juiz de Fora, MG, Contemplação de Ouro Preto (1954), O PASTOR PIANISTA
1901 – Estoril, Portugal, 1975) além de Transístor, A Idade do Serrote Soltaram os pianos na planície deserta
(prosa, 1969) e de vários inéditos. Onde as sombras dos pássaros vêm beber.
䊏 Vida Eu sou o pastor pianista,
Estudou na sua cidade e em Niterói, 䊏 Evolução e características Vejo ao longe com alegria meus pianos

começou o curso de Direito, mas logo o • Iniciou-se realizando uma poesia Recortarem os vultos monumentais
influenciada pelo espírito de “demo- Contra a lua.
interrompeu. Foi sempre um homem
inquieto passando por atividades lição” dos modernistas de 1922 (Mário
e Oswald), por meio de paródias de tex- Acompanhado pelas rosas migradoras
díspares: auxiliar de guarda-livros,
Apascento1 os pianos que gritam
prático de dentista, telegrafista tos consagrados e de denúncia da colo-
E transmitem o antigo clamor do homem
aprendiz e, em melhores dias, notário e nização física e cultural do Brasil. Na
Inspetor Federal de Ensino. Não menos “Canção do Exílio”, observe a proximi-
Que reclamando a contemplação
rica de experiência foi a sua vida dade com a atitude irreverente dos mo- Sonha e provoca a harmonia,
espiritual e literária: tendo estreado em vimentos Pau-Brasil e Antropofágico: Trabalha mesmo à força,
revistas do Modernismo, Terra Roxa e E pelo vento nas folhagens,
Outras Terras e Antropofagia, Minha terra tem macieiras da Califórnia Pelos planetas, pelo andar das mulheres,
conheceu de perto a poética pri- onde cantam gaturamos1 de Veneza. Pelo amor e seus contrastes,
Os poetas da minha terra Comunica-se com os deuses.
mitivista e surrealista que as animava;
em 1934, converteu-se ao catolicismo, são pretos que vivem em torres de ametista, Vocabulário
partilhando com o pintor Ismael Nery o os sargentos do exército são monistas2, 1 – Apascentar: pastorear.
fervor por uma arte que transmitisse [cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações. • Depois de 1950, em livros como
conteúdos religiosos em códigos
A gente não pode dormir Tempo Espanhol (1959) e Convergência
radicalmente novos. (...) A partir de
com os oradores e os pernilongos. (1970), sua poesia tende à objetividade e
1953 viveu quase exclusivamente na
(...) ao descarnamento da escrita, aproxi-
Europa e, desde 57, em Roma, onde
mando-se da poesia experimental da
ensinou Literatura Brasileira. Em todos
Vocabulário época (o concretismo). É eloquente o
esses anos, M. Mendes revelou-se um
1 – Gaturamo: designação comum a várias seguinte depoimento de João Cabral de
dos nossos escritores mais afins à van-
espécies de aves. Melo Neto: “a poesia de Murilo me foi
guarda artística europeia, o que, no
2 – Monista: que crê na doutrina monista, sempre maestra, pela plasticidade e no-
entanto, não o apartou das imagens e
segundo a qual tudo pode ser reduzido à uni- vidade da imagem. Sobretudo foi ela
dos sentimentos que o prendiam às
dade. quem me ensinou a dar precedência à
suas origens brasileiras e, estritamente,
imagem sobre a mensagem, ao plástico
mineiras.
• Em Tempo e Eternidade, busca, sobre o discursivo”. Um exemplo dessa
(BOSI, Alfredo. convertido ao catolicismo, “restaurar vertente é o poema que integra o ciclo
História Concisa da Literatura Brasileira. a poesia em Cristo”, integrando, com “A Lua de Ouro Preto”:
São Paulo: Cultrix, 1994. p. 446.) Jorge de Lima, Ismael Nery, Otávio
de Faria, Tasso da Silveira, Augusto Lua, luar,
Não confundamos:
䊏 Obra Frederico Schmidt, a corrente dos
poetas católicos, marcados pela influên- Estou mandando
Considerado um poeta “difícil”, pela
cia dos autores franceses (Péguy, A Lua luar.
liberdade criadora, pela multiplicidade de
Claudel, Bernanos, Maritain) e pela Luar é verbo,
temas sobre os quais versou e pela den-
atuação de Jackson de Figueiredo e Quase não é
sidade que impregna sua visão de
Substantivo.
mundo, é autor, entre outros, dos livros: Alceu de Amoroso Lima (Tristão de
(...)
História do Brasil (1932), Tempo e Ataíde), pensadores católicos que
PORTUGUÊS D

E tu és cíclica,
Eternidade (em parceria com Jorge de aglutinaram em torno de si esse
Única, onírica,
Lima, 1935), A Poesia em Pânico (1938), “renascimento” da visão mística e do
Envolverônica,
O Visionário (1941), As Metamorfoses catolicismo militante. Musa lunar.
(1944), Mundo Enigma (1945), Poesia • De sua vertente surrealista, des-
Liberdade (1947), Janela do Caos, tacamos: (...)

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2. Jorge de Lima (União, AL, 1895 – esses elementos barrocos à visão


TEXTOS
Rio de Janeiro, 1953) surrealista e alucinatória, o que
resulta em uma poesia de grande
METADE PÁSSARO
䊏 Vida complexidade de forma e conteúdo. As
A mulher do fim do mundo Estudou Humanidades em Maceió sugestões bíblicas e as idealizações
Dá de comer às roseiras, e Medicina em Salvador e no Rio de surrealistas alimentam uma poesia
Dá de beber às estátuas, Janeiro. Interessou-se pelas artes plás- densa e figurativa, na qual é constante
Dá de sonhar aos poetas. ticas, foi professor de Literatura na a simbologia marinha (peixes, algas, flo-
Universidade do Brasil e ingressou na res aquáticas, medusas), associada a
A mulher do fim do mundo política como deputado estadual. Em sugestões de assassinatos, afoga-
Chama a luz com um assobio, 1925, entrou em contato com o Mo- mentos, extermínios, numa visão apo-
Faz a virgem virar pedra, dernismo, divulgando-o no Nordeste, calíptica de condenação do mundo e
Cura a tempestade, com os livros Poemas (1927) e Novos banimento total.
Poemas (1929). • Em Livro de Sonetos (1949) e
Desvia o curso dos sonhos, Em 1930, mudou-se para o Rio de Invenção de Orfeu (1952), a noção este-
Escreve cartas ao rio, Janeiro, onde exerceu a profissão de tizante da poesia (vista como ofício de
Me puxa do sono eterno médico. Seu consultório tornou-se um tratar com palavras) opera uma barro-
Para os seus braços que cantam.
ponto de encontro de artistas e intelec- quização da vertente surrealista, que
tuais. Em 1935, converteu-se ao cato- se manifesta pelo emprego das formas
A MARCHA DA HISTÓRIA
licismo. Além de poeta, foi pintor, fixas (soneto, oitava-rima, sextinas),
Eu me encontrei no marco do horizonte fotógrafo, ensaísta, biógrafo, historiador modulando a atmosfera alucinatória e
Onde as nuvens falam, e prosador. surreal.
Onde os sonhos têm mãos e pés
E o mar é seduzido pelas sereias. 䊏 Obra e características 䊏 Invenção de Orfeu (1952)
• Estreia em 1914 com XIV Alexan- Invenção de Orfeu realiza uma es-
Eu me encontrei onde o real é fábula, drinos, livro ainda preso aos moldes tranha e bizarra paródia de Os Lusíadas,
Onde o sol recebe a luz da lua, parnasianos e simbolistas, lavrado em jogando com alguns motivos recor-
Onde a música é pão de todo dia versos longos e constituído de sonetos, rentes: a viagem, o descobrimento da
E a criança aconselha-se com as flores,
entre os quais o conhecido “O ilha, a profundeza da vida e do instinto,
Acendedor de Lampiões”. O livro os círculos do inferno e do paraíso,
Onde o homem e a mulher são um,
seguinte, O Mundo do Menino Impos- Orfeu, a Musa amada (Beatriz, Inês) de
Onde espadas e granadas
sível, retoma essa linha. Dante Alighieri e Camões.
Transformaram-se em charruas1,
E onde se fundem verbo e ação. • Em Poemas Negros, nota-se a in- Propõe uma espécie de teodisseia
fluência dos grupos regionalistas nor- (= odisseia para Deus), centrada na
Vocabulário destinos (Gilberto Freire, José Lins do busca, pelo homem, de uma plenitude
1 – Charrua: instrumento usado no cultivo do solo. Rego, Rachel de Queirós). Realiza uma sensível e espiritual. Ressalta a comple-
poesia apoiada nas recordações da xidade do estilo, vazado num imenso
O PROFETA infância, de “menino de engenho”, e leque de metros, ritmos e estrofações e
nas sugestões do folclore africano. Nos em formas de difícil elaboração: oitavas
A Virgem deverá gerar o Filho clássicas, tercetos, sextinas etc.
Poemas Negros descortinam-se as
Que é seu Pai desde toda a eternidade. Observe, no fragmento, a alusão pa-
A sombra de Deus se alastrará pelas eras
múltiplas direções que o poeta irá trilhar:
a poesia social, o catolicismo militante, rodística a Os Lusíadas (Inês de Castro),
[futuras.
os decassílabos, a oitava-rima:
O homem caminhará guiado por uma a poesia onírica, surreal, tudo trans-
[estrela de fogo. fundido na própria afetividade e vazado
CANTO SEGUNDO
Haverá música para o pobre e açoites para numa linguagem múltipla e poderosa. SUBSOLO E SUPERSOLO
[o rico. • A partir de Tempo e Eternidade XIX
Os poetas celebrarão suas relações com o (1935), que escreveu com Murilo
Estavas linda Inês posta em repouso
[Eterno. Mendes, e em A Túnica Inconsútil (1938)
mas aparentemente bela Inês;
Muitos mecânicos sentirão nostalgia do e Anunciação e Encontro de Mira-Celi,
pois de teus olhos lindos já não ouso
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[Egito. incorpora à sua temática a poesia fitar o torvelinho que não vês,
A serpente de asas será desterrada na lua.
mística e católica, além de novos pro- o suceder dos rostos cobiçoso
A última mulher será igual a Eva.
cessos construtivos. passando sem descanso sob a tez;
E o Julgador, arrastando na sua marcha as
Apoiado nos arquétipos bíblicos, que eram tudo memórias fugidias,
[constelações,
na simbologia das escrituras, associa máscaras sotopostas que não vias.
Reverterá todas as coisas ao seu princípio.

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䊏 Poesia nordestina A DIVISÃO DE CRISTO OLÁ! NEGRO


De Poemas Negros (poesia nordes- Dividamos o Mundo em duas partes iguais:
tina folclórica, afro-pernambucana e Os netos de teus mulatos e de teus cafuzos
uma para portugueses, outra para espanhóis.
e a quarta e a quinta gerações de teu sangue
memorialista), destacamos os fragmen- Vêm quinhentos mil escravos no bojo das
[sofredor
tos de: [naus:
tentarão apagar a tua cor!
a metade morreu na viagem do oceano.
BANGUÊ1 E as gerações dessas gerações, quando
Dividamos o Mundo entre as pátrias.
[apagarem
Cadê você meu país do Nordeste Vêm quinhentos mil escravos no bojo das
a tua tatuagem execranda,
que eu não vi nessa Usina Central Leão de [guerras:
não apagarão de suas almas a tua alma,
[minha terra? a metade morreu nos campos de batalha.
[negro!
Ah! Usina, você engoliu os banguezinhos do Dividamos o mundo entre as máquinas:
Pai-João, Mãe-negra, Fulô, Zumbi,
[país das Alagoas! Vêm quinhentos mil escravos no bojo das
negro-fujão, negro cativo, negro rebelde
Você é grande, Usina Leão! [fábricas,
negro cabinda, negro congo, negro iorubá,
Você é forte, Usina Leão! a metade morreu na escuridão, sem ar.
negro que foste para o algodão de USA
As suas turbinas têm o diabo no corpo! Não dividamos o mundo.
para os canaviais do Brasil,
Dividamos Cristo:
Vocabulário para o tronco, para o colar de ferro, para a
todos ressuscitarão iguais.
1 – Banguê: engenho. [canga
de todos os senhores do mundo;
ESSA NEGRA FULÔ eu melhor compreenda agora os teus blues
TEXTOS nesta hora triste da raça branca, negro!
Ora, se deu que chegou
Olá, Negro! Olá, Negro!
(isso já faz muito tempo)
O Sinhô foi açoitar A raça que te enforca, enforca-se de tédio,
no banguê dum meu avô
sozinho a negra Fulô. [negro!
uma negra bonitinha
A negra tirou a saia
chamada negra Fulô.
e tirou o cabeção, DEMOCRACIA
de dentro dele pulou
Essa negra Fulô!
nuinha a negra Fulô. Punhos de rede embalaram o meu canto
Essa negra Fulô!
para adoçar o meu país, ó Whitman.
Essa negra Fulô! Jenipapo coloriu o meu corpo contra os
— Vai forrar a minha cama,
Essa negra Fulô! [maus-olhados,
pentear os meus cabelos,
catecismo me ensinou a abraçar os
vem ajudar a tirar
Ó Fulô! Ó Fulô! [hóspedes,
a minha roupa, Fulô!
Cadê, cadê teu Sinhô carumã me alimentou quando eu era criança,
que Nosso Senhor me mandou? Mãe-negra me contou histórias de bicho,
Essa negra Fulô!
Ah! Foi você que roubou, moleque me ensinou safadezas,
foi você, negra Fulô? massoca, tapioca, pipoca, tudo comi,
䊏 Poesia mística bebi cachaça com caju para limpar-me,
Essa negra Fulô!
De Tempo e Eternidade, A Túnica tive maleita, catapora e ínguas,
Inconsútil e Anunciação e Encontro de bicho-de-pé, saudade, poesia;
***
Mira-Celi (poesia mística, surreal, apo- fiquei aluado, mal-assombrado, tocando
calíptica), destacamos: A Sinhá mandou arrebentar-lhe os dentes: [maracá,
Fute, Cafute, Pé-de-pato, Não-sei-que-diga, dizendo coisas, brincando com as crioulas,
POEMA DO CRISTÃO avança na branca e me vinga. vendo espíritos, abusões, mães-d’água,
Exu escangalha ela, amofina ela, conversando com os malucos, conversando
Porque o sangue de Cristo
amuxila ela que eu não tenho defesa de [sozinho,
jorrou sobre os meus olhos,
[homem, emprenhando tudo que encontrava,
a minha visão é universal
sou só uma mulher perdida neste mundão. abraçando as cobras pelos matos,
e tem dimensões que ninguém sabe.
Neste mundão. me misturando, me sumindo, me acabando,
Os milênios passados e os futuros
Louvado seja Oxalá. para salvar a minha alma benzida
não me aturdem, porque nasço e nascerei,
Para sempre seja louvado. e meu corpo pintado de urucu,
porque sou uno com todas as criaturas,
tatuado de cruzes, de corações, de
com todos os seres, com todas as coisas
*** [mãos-ligadas,
que eu decomponho e absorvo com os
PORTUGUÊS D

de nomes de amor em todas as línguas de


[sentidos
[branco, de mouro ou de pagão.
e compreendo com a inteligência
transfigurada em Cristo.

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Texto para as questões 1 e 2. 2. (UNESP) – Identifique duas características que permitem vincular
esse poema ao movimento modernista.
O PASTOR PIANISTA RESOLUÇÃO:
Os versos livres, sem métrica, a paródia da tradição literária, isto é,
Soltaram os pianos na planície deserta a retomada da poesia bucólica do Arcadismo ou Neoclassicismo; e
Onde as sombras dos pássaros vêm beber. a influência da teoria psicanalítica freudiana na literatura,
rompendo com a lógica, são características da vanguarda
Eu sou o pastor pianista,
modernista, iconoclasta não só em relação ao passado literário,
Vejo ao longe com alegria meus pianos como também quanto ao uso da razão para captar a realidade.
Recortarem os vultos monumentais Embora muitos candidatos possam ter mencionado os versos
Contra a lua. brancos (sem rima), esse tipo de verso já era usado na poesia do
século XVIII, como exemplifica a obra O Uraguai, de Basílio da
Gama, publicada em 1769.
Acompanhado pelas rosas migradoras
Apascento1 os pianos: gritam
E transmitem o antigo clamor do homem

Que reclamando a contemplação,


Sonha e provoca a harmonia,
Trabalha mesmo à força,
E pelo vento nas folhagens,
Pelos planetas, pelo andar das mulheres,
Pelo amor e seus contrastes,
Comunica-se com os deuses.
(Murilo Mendes, As Metamorfoses)

1 – Apascentar: vigiar no pasto; pastorear.

1. (FMABC) – O Surrealismo, vanguarda artística europeia que


influenciou o Modernismo brasileiro, pode ser reconhecido no poema,
em razão de seu conteúdo
a) paródico.
b) onírico.
c) irônico.
d) bucólico.
e) satírico.
RESOLUÇÃO:
O “conteúdo onírico” nesse poema consiste nas associações
ilógicas, como, por exemplo, o pastor que apascenta pianos (e não
um rebanho) ou, ainda, as rosas que migram (e não os pássaros,
como se esperaria).
Resposta: B

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Texto para o teste 3.

MARIA DIAMBA

Para não apanhar mais


falou que sabia fazer bolos:
virou cozinha.
Foi outras coisas para que tinha jeito.
Não falou mais:
Viram que sabia fazer tudo,
até molecas para a Casa-Grande.
Depois falou só,
só diante da ventania
que ainda vem do Sudão;
falou que queria fugir
dos senhores e das judiarias deste mundo
para o sumidouro.
(LIMA, J. Poemas Negros.
Rio de Janeiro: Record, 2007.)

3. O poema de Jorge de Lima sintetiza o percurso de


vida de Maria Diamba e sua reação ao sistema
opressivo da escravidão. A resistência dessa figura
feminina é assinalada no texto pela relação que se faz entre
a) o uso da fala e do desejo de decidir o próprio destino.
b) a exploração sexual e a geração de novas escravas.
c) a prática na cozinha e a intenção de ascender socialmente.
d) o prazer de sentir os ventos e a esperança de voltar à África.
e) o medo da morte e a vontade de fugir da violência dos brancos.
RESOLUÇÃO:
[ENEM-2016 – 3.a aplic.] Maria Diamba, para mudar seu destino e
deixar de apanhar, declara que sabe fazer bolos, para poder
trabalhar na cozinha da casa-grande. Cala-se mediante a
exploração sexual que passa a sofrer, mas fala a si mesma, “diante
da ventania” vinda do Sudão, do seu desejo de fugir “dos senhores
e das judiarias [daquele] mundo”.
Resposta: A
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MÓDULO 45 Segunda Geração Modernista – Poesia (IV): Cecília Meireles


1. Cecília Meireles alguns dos títulos que publicou entre • Há três constantes fundamen-
(Rio de Janeiro, 1901-1964) 1952 e 1965. tais: o oceano, o espaço e a solidão.
• Deixou ainda: prosa de ficção Trabalhando elementos móveis e
䊏 Vida — Olhinhos de Gato; prosa poética etéreos, povoados de fantasias —
Passou a infância no Rio junto à — Giroflê, Giroflá; crônica, teatro e forma, som e cor —, a poeta projeta
avó materna, açoriana. Formando-se poesia infanto-juvenil — Ou Isto ou a desintegração de si mesma ou
professora primária, dedicou-se por Aquilo. busca seu próprio reconhecimento.
longos anos ao magistério (...). No iní-
• A rigor, não pertenceu a ne-
cio da sua carreira literária, aproxi- 䊏 Características nhuma corrente literária, mas sua
mou-se do grupo de Festa, dirigido • É a representante mais carac- poesia de cunho universalista e espi-
por Tasso da Silveira. Anos depois, terística da vertente espiritualista ritualista identifica-se com a vertente
preferiria trilhar caminhos pessoais, ou intimista do Modernismo. Cecília dos “poetas católicos” (Vinícius de
mais modernos. Ensinou Literatura parte de um certo distanciamento do Moraes, Jorge de Lima, Augusto Fre-
Brasileira nas Universidades do Dis- real imediato e dirige os processos derico Schmidt e o Grupo Festa, do
trito Federal (1936-38) e do Texas imagéticos para a sombra, o indefi- Rio de Janeiro), opondo-se ao
(1940). Viajou longamente pelos paí- nido, o sentimento da ausência e nacionalismo verde-amarelista ou
ses de sua predileção, México, Índia do nada. Nas palavras da própria antropofágico da Geração de 1922.
e sobretudo Portugal, onde viu reco- Cecília: “a poesia é grito, mas trans- • Expressa uma visão própria do
nhecido o seu mérito antes mesmo figurado”. A transfiguração faz-se no mundo, por meio de um intenso cro-
de consagrar-se no Brasil como uma plano da expressão. matismo, de associações sensoriais (o
das maiores vozes poéticas da língua • É herdeira do Simbolismo, visual-auditivo = sinestesia), da
portuguesa contemporânea. retomando aspectos temáticos e for-
(BOSI, Alfredo. História Concisa musicalidade, do misticismo lírico,
mais dos simbolistas (é sensível a do culto da beleza imaterial e da
da Literatura Brasileira. São Paulo: aproximação a Alphonsus de
Cultrix, 1987. p. 515-516.) preferência pela abstração.
Guimaraens). É uma poesia de • Vale-se, de preferência, do
“desencanto e renúncia, nostalgia do verso curto, de ritmo leve e ligeiro,
䊏 Obra Além e mística ansiedade”. A fuga, a
• Espectros (1919), Nunca Mais que acompanha a fluência das impres-
fluidez, a melancolia, a serenidade,
e Poema dos Poemas (1923), Baladas sões vagas, esbatidas. A musicali-
os tons fumarentos de nebulosidade
para El-Rei (1925), livros mais dade de sua poesia apoia-se em
impregnam toda a sua obra, marcada
marcados por ressonâncias parnasia- ritmos naturais (redondilhas), marca-
pelo sentido da transitoriedade,
nas e simbolistas. dos por estribilhos, que acentuam o
oscilando entre o efêmero e o
• Viagem (1939), premiado pela caráter cantante. Essa aliança entre a
eterno, segundo afirma a própria
Academia Brasileira de Letras, marca a poesia e a música já se expressa no
escritora: “Nasci aqui mesmo no Rio
consagração da poeta e a sua adesão título de várias composições, como
de Janeiro, três meses depois da
à modernidade, sem o radicalismo “Música”, “Serenata”, “A Última
morte de meu pai, e perdi minha
experimentalista dos modernistas da Cantiga”, “Canção”, “Cantiguinha”,
mãe antes dos três anos. Essas e
geração de 1922, numa poesia que “Som”, “Guitarra”, “Noturno”,
outras mortes ocorridas na família
harmoniza, com dicção moderna, os “Pausa”, “Valsa”, “Realejo”, “Can-
acarretaram muitos contratempos
velhos clássicos, passando pelos tar”, “Cantiga”, “Marcha”, “Assovio”
materiais, mas, ao mesmo tempo,
românticos, pelos parnasianos e espe- (“Não Tenho Inveja às Cigarras: Tam-
me deram, desde pequena, uma tal
cialmente pelos simbolistas, do que bém Vou Morrer de Cantar”).
intimidade com a Morte que doce-
resulta a variedade de técnicas e mente aprendi essas relações entre
temas e a universalidade. Vaga Música o Efêmero e o Eterno. (...) A noção TEXTOS
(1942), Mar Absoluto (1945) e Retrato ou sentimento da transitoriedade de
Natural (1949) são desdobramentos tudo é o fundamento mesmo da MOTIVO
dessa proposta. minha personalidade.”
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• Doze Noturnos da Holanda, (MEIRELES, Cecília. Eu canto porque o instante existe


Romanceiro da Inconfidência, Metal Literatura Comentada . São Paulo: e a minha vida está completa.
Rosicler, Poemas Escritos na Índia, Abril Educação, 1982. p. 6.) Não sou alegre nem sou triste:
Solombra, Ou Isto ou Aquilo são sou poeta.

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Irmão das coisas fugidias1, O último andar é muito longe: Na abertura, no final e entre as
não sinto gozo nem tormento. custa-se muito a chegar. partes, há poemas intercalados, que a
Atravesso noites e dias Mas é lá que eu quero morar:
autora chama de “falas”. Também en-
no vento.
tre cada parte e, por vezes, no interior
(...)
Se desmorono ou se edifico, delas, há outros poemas, designados
se permaneço ou me desfaço, De lá se avista o mundo inteiro: como “cenários”:
— não sei, não sei. Não sei se fico tudo parece perto, no ar.
ou passo. FALA INICIAL
É lá que eu quero morar:

Sei que canto. E a canção é tudo. Não posso mover meus passos
no último andar.
Tem sangue eterno a asa ritmada. por esse atroz1 labirinto
(Ou Isto ou Aquilo)
E um dia sei que estarei mudo: de esquecimento e cegueira
— mais nada. em que amores e ódios vão:
(Viagem) 䊏 Romanceiro da Inconfidência — pois sinto bater os sinos,
Vocabulário No Romanceiro da Inconfidência, percebo o roçar das rezas,
1 – Fugidio: que foge. publicado em 1953, Cecília Meireles vejo o arrepio da morte,
cria uma poesia social a partir de um à voz da condenação;
RETRATO fato histórico, pesquisado minuciosa- — avisto a negra masmorra2
mente. A Inconfidência Mineira é evo- e a sombra do carcereiro
Eu não tinha este rosto de hoje,
cada com suas lendas e tradições, que transita sobre angústias,
assim calmo, assim triste, assim magro
com chaves no coração;
nem estes olhos tão vazios, com seus enforcados, suicidas e des-
— descubro as altas madeiras
nem o lábio amargo. terrados, na atmosfera misteriosa dos
do excessivo cadafalso3
Eu não tinha estas mãos sem força,
cenários mineiros do século XVIII.
e, por muros e janelas,
tão paradas e frias e mortas; Para esta obra, Cecília empregou o pasmo da multidão.
eu não tinha este coração diversos tipos de versos, tetrassílabos,
que nem se mostra. redondilhos menores e maiores, Batem patas de cavalo.
hexassílabos, octossílabos, decassíla- Suam soldados imóveis.
Eu não dei por esta mudança,
bos, tudo em variado arranjo estrófico, Na frente dos oratórios,
tão simples, tão certa, tão fácil:
que resulta em uma narrativa ágil e que vale mais a oração?
— Em que espelho ficou perdida
Vale a voz do Brigadeiro
a minha face? matizada. Essa diversidade permite,
sobre o povo e sobre a tropa,
(Viagem) ao mesmo tempo, que a autora con-
louvando a augusta Rainha,
fira sua própria subjetividade, seu pró- — já louca e fora do trono —
1.o MOTIVO DA ROSA
prio lirismo, aos fatos que narra, na sua proclamação.
Vejo-te em seda e nácar1, realizando uma homenagem, muitas
e tão de orvalho trêmula, vezes intertextual, à poesia e aos poe- Ó meio-dia confuso,
que penso ver, efêmera, tas inconfidentes de Minas. ó vinte-e-um de abril sinistro,
toda a Beleza em lágrimas O poema divide-se em “roman- que intrigas de ouro e de sonho
por ser bela e ser frágil. houve em tua formação?
ces”, aqui entendidos como os poe-
Quem ordena, julga e pune?
Meus olhos te ofereço: mas épico-líricos da tradição medieval,
Quem é culpado e inocente?
espelho para a face e desenvolve-se em cinco partes: Na mesma cova do tempo
que terás, no meu verso, I) a descrição do ambiente em que Cai o castigo e o perdão.
quando, depois que passes, se vai dar a ação (do romance I ao Morre a tinta das sentenças
jamais ninguém te esqueça. XIX); e o sangue dos enforcados...
Então, da seda e nácar, II) o desenvolvimento da trama e a — liras, espadas e cruzes
toda de orvalho trêmula, descoberta dos planos (do roman- pura cinza agora são.
serás eterna. E efêmero ce XX ao XLVII); Na mesma cova, as palavras,
o rosto meu, nas lágrimas III) a morte de Cláudio Manuel da o secreto pensamento,
do teu orvalho... E frágil. as coroas e os machados,
Costa e de Tiradentes (do roman-
(Mar Absoluto) mentira e verdade estão.
ce XLVIII ao LXIV);
Vocabulário IV) o destino de Tomás Antônio Gon- Aqui, além, pelo mundo,
1 – Nácar: tom rosado ou carmim (vermelho). zaga e Alvarenga Peixoto (do ro-
PORTUGUÊS D

ossos, nomes, letras, poeira...


mance LXV ao LXXX); Onde, os rostos? onde, as almas?
O ÚLTIMO ANDAR V) a presença, no Brasil, da rainha D. Nem os herdeiros recordam
Maria, responsável pela confirma- rastro nenhum pelo chão.
No último andar é mais bonito:
do último andar se vê o mar. ção das penas dos inconfidentes
(...)
É lá que eu quero morar. (do romance LXXXI ao LXXXV).

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Vocabulário Vocabulário Ó soberbos titulares


1 – Atroz: cruel. 1 – Desgrenhado: desordenado, confuso. tão desdenhosos e altivos!
2 – Masmorra: cela de cadeia. 2 – Desbarato: ruína. Por fictícia austeridade,
3 – Cadafalso: forca. vãs razões, falsos motivos,
• Da Segunda Parte inutilmente matastes:
• Da Primeira Parte — vossos mortos são mais vivos;
ROMANCE XXIV OU e, sobre vós, de longe abrem
ROMANCE I OU DA BANDEIRA DA INCONFIDÊNCIA grandes olhos pensativos.
DA REVELAÇÃO DO OURO
Através de grossas portas, FALA AOS INCONFIDENTES MORTOS
Nos sertões americanos, sentem-se luzes acesas,
anda um povo desgrenhado1: — e há indagações minuciosas Treva da noite,
gritam pássaros em fuga dentro das casas fronteiras: lanosa capa
sobre fugitivos riachos; olhos colados aos vidros, nos ombros curvos
desenrolam-se os novelos mulheres e homens à espreita, dos altos montes
das cobras, sarapintados; caras disformes de insônia, aglomerados...
espreitam, de olhos luzentes, vigiando as ações alheias. Agora, tudo
os satíricos macacos. (...) jaz em silêncio:
amor, inveja,
Súbito, brilha um chão de ouro: Atrás de portas fechadas, ódio, inocência,
corre-se — é luz sobre um charco. à luz de velas acesas, no imenso tempo
entre sigilo e espionagem, se estão lavando...
A zoeira dos insetos acontece a Inconfidência.
cresce, nos vales fechados, (...) Grosso cascalho
com o perfume das resinas da humana vida...
ROMANCE LXXXI OU Negros orgulhos,
e desse mel delicado
DOS ILUSTRES ASSASSINOS
que se acumula nas flores ingênua audácia,
em grãos de veludo e orvalho. e fingimentos
Ó grandes oportunistas,
e covardias
sobre o papel debruçados,
(Por onde é que andas, ribeiro, (e covardias!)
que calculais mundo e vida
descoberto por acaso?) vão dando voltas
em contos, doblas, cruzados,
no imenso tempo,
que traçais vastas rubricas
Grossos pés firmam-se em pedras: — à água implacável
e sinais entrelaçados,
sob os chapéus desabados, do tempo imenso,
com altas penas esguias
O olhar galopa no abismo, rodando soltos,
vai revolvendo o planalto; embebidas em pecados!
com sua rude
descobre os índios desnudos, miséria exposta...
Ó personagens solenes
que se escondem, timoratos;
que arrastais os apelidos
calcula ventos e chuvas; Parada noite,
como pavões auriverdes
mede os montes, de alto a baixo; suspensa em bruma:
seus rutilantes vestidos,
(...) não, não se avistam
— todo esse poder que tendes
os fundos leitos...
confunde os vossos sentidos:
(...) Mas, no horizonte
a glória, que amais, é desses
do que é memória
E, atrás deles, filhos, netos, que por vós são perseguidos.
da eternidade,
seguindo os antepassados,
Levantai-vos dessas mesas, referve o embate
vêm deixar a sua vida,
saí das vossas molduras, de antigas horas,
caindo nos mesmos laços,
vede que masmorras negras, de antigos fatos,
perdidos na mesma sede,
que fortalezas seguras, de homens antigos.
teimosos, desesperados,
por minas de prata e de ouro que duro peso de algemas,
E aqui ficamos
curtindo destino ingrato, que profundas sepulturas
todos contritos,
emaranhando seus nomes nascidas de vossas penas,
a ouvir na névoa
para a glória e o desbarato2, de vossas assinaturas!
o desconforme,
quando, dos perigos de hoje, submerso curso
Considerai no mistério
outros nascerem, mais altos. dessa torrente
dos humanos desatinos
Que a sede de ouro é sem cura,
PORTUGUÊS D

e no polo sempre incerto do purgatório...


e, por ela subjugados,
dos homens e dos destinos!
os homens matam-se e morrem,
Por sentenças, por decretos Quais os que tombam,
ficam mortos, mas não fartos.
pareceríeis divinos: em crime exaustos,
(Ai, Ouro Preto, Ouro Preto, e hoje sois, no tempo eterno, quais os que sobem,
e assim foste revelado!) como ilustres assassinos. purificados?

– 53
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Texto para o teste 1. Texto para o teste 2.

Ó meio-dia confuso, Ai, palavras, ai, palavras,


ó vinte-e-um de abril sinistro, que estranha potência, a vossa!
que intrigas de ouro e de sonho Todo o sentido da vida
houve em tua formação? principia à vossa porta;
Quem ordena, julga e pune? o mel do amor cristaliza
Quem é culpado e inocente? seu perfume em vossa rosa;
Na mesma cova do tempo sois o sonho e sois a audácia,
cai o castigo e o perdão. calúnia, fúria, derrota...
Morre a tinta das sentenças
e o sangue dos enforcados... A liberdade das almas,
— liras, espadas e cruzes ai! com letras se elabora...
pura cinza agora são. E dos venenos humanos
Na mesma cova, as palavras, sois a mais fina retorta:
o secreto pensamento, frágil, frágil como o vidro
as coroas e os machados, e mais que o aço poderosa!
mentira e verdade estão. Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam...
(...) (MEIRELES, C. Obra Poética.
(MEIRELES, C. Romanceiro da Inconfidência . Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985.)
Rio de Janeiro: Aguilar, 1972.)

2. O fragmento destacado foi transcrito do Romanceiro


1. O poema de Cecília Meireles tem como ponto de da Inconfidência, de Cecília Meireles. Centralizada no
partida um fato da história nacional, a Inconfidência episódio histórico da Inconfidência Mineira, a obra,
Mineira. Nesse poema, a relação entre texto literário no entanto, elabora uma reflexão mais ampla sobre a seguinte relação
e contexto histórico indica que a produção literária é sempre uma entre o homem e a linguagem:
recriação da realidade, mesmo quando faz referência a um fato histórico a) A força e a resistência humanas superam os danos provocados pelo
determinado. No poema de Cecília Meireles, a recriação se concretiza poder corrosivo das palavras.
por meio b) As relações humanas, em suas múltiplas esferas, têm seu equilíbrio
a) do questionamento da ocorrência do próprio fato, que, recriado, vinculado ao significado das palavras.
passa a existir como forma poética desassociada da história nacional. c) O significado dos nomes não expressa de forma justa e completa a
b) da descrição idealizada e fantasiosa do fato histórico, transformado grandeza da luta do homem pela vida.
em batalha épica que exalta a força dos ideais dos Inconfidentes. d) Renovando o significado das palavras, o tempo permite às gerações
c) da recusa da autora de inserir nos versos o desfecho histórico do perpetuar seus valores e suas crenças.
movimento da Inconfidência: a derrota, a prisão e a morte dos e) Como produto da criatividade humana, a linguagem tem seu alcance
Inconfidentes. limitado pelas intenções e gestos.
d) do distanciamento entre o tempo da escrita e o da Inconfidência, RESOLUÇÃO:
que, questionada poeticamente, alcança sua dimensão histórica mais [ENEM] Os versos transcritos dão a linguagem como princípio de
“todo o sentido da vida” e especificam o poder das palavras em
profunda.
diversas esferas da experiência humana: o amor, o sonho, a
e) do caráter trágico, que, mesmo sem corresponder à realidade, foi audácia, a calúnia, a fúria, a derrota, a liberdade...
atribuído ao fato histórico pela autora, a fim de exaltar o heroísmo Resposta: B
dos Inconfidentes.
RESOLUÇÃO:
[ENEM] É o distanciamento temporal que permite ao eu lírico se
interrogar sobre eventos que agora repousam na “cova” do
passado, portanto sobre eventos tidos como “mortos e
enterrados”, cujos elementos formadores e cujos sentidos se
confundem e embaralham.
Resposta: D
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Texto para o teste 3.

EPIGRAMA N.o 04

O choro vem perto dos olhos


para que a dor transborde e caia.
O choro vem quase chorando
como a onda que toca a praia.

Descem dos céus ordens augustas


e o mar chama a onda para o centro.
O choro foge sem vestígios,
mas levando náufragos dentro.
(MEIRELES, Cecília. Viagem / Vaga Música.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. p. 43.)

3. (ITA) – O texto
I. aproxima metaforicamente um fenômeno humano e um fenômeno
natural a partir da identificação de, pelo menos, um traço comum a
ambos: água em movimento.
II. sugere que, enquanto o movimento do choro é ligado à variação das
emoções, o movimento da onda deve-se a forças naturais,
responsáveis pela circularidade marítima.
III. ameniza o dramatismo do choro humano, pois, quando acomete o
sujeito, ele passa naturalmente, como a onda que volta ao mar.
IV. leva-nos a perceber que o choro contido tem um impacto emocional
que o torna desolador.

Estão corretas
a) I e II, apenas.
b) I, II e IV, apenas.
c) I, III e IV, apenas.
d) II e III, apenas.
e) todas.
RESOLUÇÃO:
O poema tematiza a dor do choro, comparando as emoções
humanas ao movimento das marés. As ondas do mar, obedecendo
às forças naturais, são análogas às lágrimas, reveladoras das
emoções humanas, que partem dos olhos, escorrem pela face
como uma manifestação de sofrimento. Porém, o choro contido,
que não se exterioriza, carrega a tensão emocional, como sugerem
os versos finais do poema: “O choro foge sem vestígios, / mas
levando náufragos dentro.”
Resposta: B

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MÓDULO 46 Segunda Geração Modernista – Poesia (V): Vinícius de Moraes

1. Vinícius de Moraes • A partir de Cinco Elegias, a ade- O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO


(Rio de Janeiro, 1913-1981) são à modernidade é prenunciada pela (...)
contenção formal, pela liberdade
䊏 Vida E um grande silêncio fez-se
temática e de expressão, pela incor- Dentro do seu coração
Formou-se em Letras e em Direito.
poração poética do cotidiano e da Um silêncio de martírios
Foi censor e crítico cinematográfico e
experiência direta da vida, que subs- Um silêncio de prisão.
estudou Literatura Inglesa em Oxford. Um silêncio povoado
tituem a busca do transcendente, do
Em 1943, ingressou na carreira De pedidos de perdão
sublime, e a tendência mística e me-
diplomática, servindo nos Estados Uni- Um silêncio apavorado
tafísica da primeira fase. Com o medo em solidão.
dos, na Espanha, no Uruguai e na Fran-
• Poemas, Sonetos e Baladas
ça, mas sem nunca perder o contato Um silêncio de torturas
(1946) é considerado o livro mais
com a vida literária e artística do Rio de E gritos de maldição
expressivo de sua obra, impregnado de Um silêncio de fraturas
Janeiro. No final da década de 1950,
ternura, de humor, de ironia, numa A se arrastarem no chão.
passou a compor letras para canções
poesia de grande comunicabilidade, em E o operário ouviu a voz
populares, consagrando-se como um De todos os seus irmãos
dos fundadores do movimento musical que convivem a linguagem clássica,
Os seus irmãos que morreram
conhecido por Bossa Nova. nos sonetos de feição camoniana Por outros que viverão.
(Sonetos: “da Separação”, “da Uma esperança sincera
䊏 Obra Fidelidade”, “do Amor Total” etc.); os Cresceu no seu coração
• Poesia versos curtos incisivos e a intensi- E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
O Caminho para a Distância (1933) dade da visão lírica/realista do amor,
De um homem pobre e esquecido
Forma e Exegese (1935) que retoma elementos trovadorescos Razão porém que fizera
Ariana, a Mulher (1936) e românticos, acrescidos da concepção Em operário construído
Novos Poemas (1938) do amor como experiência-limite (o O operário em construção.
Cinco Elegias (1943) amor louco dos surrealistas).
SONETO DE SEPARAÇÃO
Poemas, Sonetos e Baladas (1946) • Além de ser um lírico excepcio-
Pátria Minha (1949) nal, Vinícius versou também sobre a De repente do riso fez-se o pranto
Livro de Sonetos (1956) temática social (“O Operário em Cons- Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
O Mergulhador (1965) trução”, “A Rosa de Hiroxima”, “A
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
A Arca de Noé (infantil, 1970) Bomba”), sobre o cotidiano; fez poesia
infantil (A Arca de Noé), além dos De repente da calma fez-se o vento
• Teatro poemas que o cancioneiro popular Que dos olhos desfez a última chama
Orfeu da Conceição (tragédia ca- consagrou: “Serenata do Adeus”, E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
rioca em três atos, escrita em ver- “Marcha da Quarta-Feira de Cinzas”,
sos, 1954) “Se Todos Fossem Iguais a Você” etc. De repente, não mais que de repente
Pobre Menina Rica (comédia Fez-se de triste o que se fez amante
musicada, 1962) E de sozinho o que se fez contente.
TEXTOS
Fez-se do amigo próximo o distante
• Prosa
Fez-se da vida uma aventura errante
O Amor dos Homens (crônicas, A ROSA DE HIROXIMA
De repente, não mais que de repente.
1960)
Pensem nas crianças
Para Viver um Grande Amor POÉTICA
Mudas telepáticas
(crônicas, 1962) Pensem nas meninas De manhã escureço
Para uma Menina com uma Flor Cegas inexatas De dia tardo
(crônicas, 1966) Pensem nas mulheres De tarde anoiteço
Rotas alteradas De noite ardo.
Pensem nas feridas
䊏 Evolução e
Como rosas cálidas A oeste a morte
características Mas oh não se esqueçam Contra quem vivo
• Os primeiros livros, até Cinco Da rosa da rosa Do sul cativo
Elegias, marcam-se pela aproximação Da rosa de Hiroxima O este é meu norte.
PORTUGUÊS D

com a poesia católica francesa, com o A rosa hereditária


Outros que contem
simbolismo místico e, como em A rosa radioativa
Passo por passo:
Estúpida e inválida
Augusto Frederico Schmidt, pelo uso A rosa com cirrose
Eu morro ontem
do versículo bíblico, pelo gosto do A antirrosa atômica Nasço amanhã
poema longo, de tom grave e exal- Sem cor sem perfume Ando onde há espaço:
tado, cheio de ressonâncias. Sem rosa sem nada — Meu tempo é quando.

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Texto para o teste 1. Texto para o teste 2.

Mais do que a mais garrida a minha pátria tem POÉTICA


Uma quentura, um querer bem, um bem.
Um “libertas quae sera tamen”1 De manhã escureço
Que um dia traduzi num exame escrito: De dia tardo
“Liberta que serás também” De tarde anoiteço
E repito! De noite ardo
(Vinícius de Moraes, “Pátria Minha”, in Antologia Poética)
A oeste a morte
1 – A frase em latim traduz-se, comumente, por “liberdade ainda que tardia”. Contra quem vivo
Do sul cativo
1. (FUVEST) – Considere as seguintes afirmações: O este é meu norte.
I. O diálogo com outros textos (intertextualidade) é procedimento
central na composição da estrofe. Outros que contem
II. O espírito de contradição manifesto nos versos indica que o amor da Passo por passo:
pátria que eles expressam não é oficial nem conformista. Eu morro ontem
III. O apego do eu lírico à tradição da poesia clássica patenteia-se na
escolha de um verso latino como núcleo da estrofe. Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
Está correto o que se afirma em — Meu tempo é quando.
a) I, apenas. (Vinícius de Moraes, Antologia Poética)

b) II, apenas.
c) I e II, apenas. 2. (IBMEC) – No soneto apresentado, a percepção de tempo e espaço
d) II e III, apenas. pelo poeta ocorre de maneira surpreendente. Ao romper com o
e) I, II e III. encadeamento lógico, o poema
RESOLUÇÃO: a) expressa, em tom nostálgico, a angústia pela incapacidade de
A afirmação III é incorreta porque nem do poeta, nem, muito adaptar-se ao mundo.
menos, do eu lírico se pode afirmar que demonstre “apego à b) valoriza uma atitude libertária, que mantém relações flexíveis com o
tradição clássica” (apesar do teor classicizante de alguns sonetos
tempo e com o espaço.
de Vinícius de Moraes). Além disso, a expressão latina citada
(“libertas quae sera tamen”), constante do projeto de bandeira dos c) confirma uma visão mística, na qual o tempo e o espaço ganham
inconfidentes mineiros — e cuja tradução correta é “liberdade (que) contornos divinizados.
embora tardia” —, nem é propriamente um verso (é parte de um d) faz uma crítica de cunho social para denunciar a onipresença
verso virgiliano), nem é o núcleo da estrofe transcrita. Trata-se, espaço-temporal na sociedade.
antes, da afirmação da “quentura” afetiva da pátria, em
e) estabelece, metaforicamente, uma relação entre a brevidade da vida
contraposição aos predicados convencionais oficialmente
celebrados (no caso, pelo Hino Nacional). e a paixão humana.
Resposta: C RESOLUÇÃO:
O eu lírico manifesta uma atitude libertária, pois se define como
oposto aos que se pautam pelos parâmetros habituais da
experiência, em que os eventos se sucedem “passo por passo” e
passado, presente e futuro são irredutíveis um ao outro. Na
experiência do eu lírico, o presente pode reduzir-se ao passado (“Eu
morro ontem”) ou situar-se no futuro (“Nasço amanhã”). O eu lírico
mantém “relações flexíveis com o tempo e com o espaço”, pois
sua experiência não conhece limites temporais nem espaciais:
“Ando onde há espaço. / — Meu tempo é quando.”
Resposta: B
PORTUGUÊS D

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Texto para o teste 3.

SONETO DE FIDELIDADE

De tudo, ao meu amor serei atento


Antes1, e com tal zelo, e sempre, e tanto,
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento


E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure


Quem sabe a morte, angústia de quem vive,
Quem sabe a solidão, fim de quem ama,

Eu possa me dizer do amor (que tive):


Que não seja imortal, posto que2 é chama,
Mas que seja infinito enquanto dure.
(Vinícius de Moraes)

1 – De tudo... antes: inversão chamada hipérbato ou, no caso, anástrofe, porque


inverte a ordem normal dos termos da expressão “antes de tudo”.
2 – Posto que: porque, já que. Saliente-se, porém, que o sentido da locução posto
que é concessivo (“embora”) e o modo verbal correspondente é o subjuntivo
(“posto que seja estudioso, foi mal na prova”). O sentido causal (“porque”) é um
brasileirismo (uso próprio do Brasil).

3. (UFSCar) – Nos dois primeiros quartetos do soneto de Vinícius de


Moraes, delineia-se a ideia de que o poeta
a) não acredita no amor como entrega total entre duas pessoas.
b) acredita que, mesmo amando muito uma pessoa, é possível
apaixonar-se por outra e trocar de amor.
c) entende que somente a morte é capaz de findar com o amor de duas
pessoas.
d) concebe o amor como um sentimento intenso a ser compartilhado,
tanto na alegria quanto na tristeza.
e) vê, na angústia causada pela ideia da morte, o impedimento para as
pessoas se entregarem ao amor.
RESOLUÇÃO:
A ideia de que o amor deve ser compartilhado tanto na alegria
como na tristeza se depreende dos dois últimos versos da segunda
estrofe: “E rir meu riso e derramar meu pranto / Ao seu pesar ou
seu contentamento.”
Resposta: D
PORTUGUÊS D

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Morfologia e Redação FRENTE 4

MÓDULO 19 Modelos Argumentativos I (FUVEST)

Elaborado pela professora Ana Carolina de Souza Ferreira

Você já deve ter notado que cada vestibular possui critérios específicos e recortes temáticos diferentes em
relação à sua prova de redação. Isso fica claro quando comparamos, por exemplo, a prova do ENEM com a prova
da FUVEST, em que, apesar de requisitarem a mesma tipologia textual, a dissertação-argumentativa, suas grades
de correção são distintas – o primeiro avalia a redação em 5 competências – como vimos no caderno 1 – a segunda,
em 3.
A mesma diferença ocorre em relação aos temas cobrados: enquanto a prova do ENEM busca temas ligados à
problemáticas brasileiras de ordem política ou social que precisam ser solucionadas, a FUVEST enfocava questões
humanas mais abrangentes e de ordem filosófica ou existencial. Por isso, este módulo irá ajudá-lo a compreender
mais detalhadamente como é a argumentação e o que é avaliado nessa prova tão importante.

1. O QUE É PEDIDO NA PROVA DE REDAÇÃO DA FUVEST?

De acordo com o manual do candidato da FUVEST (2022, p. 38, grifos nossos):

“A redação deverá ser, obrigatoriamente, uma dissertação de caráter argumentativo, escrita em língua
portuguesa, na qual se espera que o candidato, visando sustentar um ponto de vista sobre o tema, demonstre
capacidade de mobilizar conhecimentos e opiniões; argumentar de forma coerente e pertinente; articular
eficientemente as partes do texto e expressar-se de modo claro, correto e adequado”

O texto também deve ter mínimo de 20 linhas e máximo de 30, com título obrigatório (há uma linha à parte
correspondente).
O tema costuma versar sobre algum dilema humano em forma de frase ou pergunta e possui caráter filosófico.
Isso implica que a discussão pode ser mais abrangente, em vez de limitada a um tempo/espaço específico, como
ao Brasil contemporâneo, por exemplo.
Isso fica evidente ao observamos as propostas dos últimos cinco anos: “As diferentes faces do riso” (2022); “O
mundo está fora da ordem?” (2021); “O papel da ciência no mundo contemporâneo” (2020); “De que maneira o
passado contribui para a compreensão do presente” (2019); “Devem existir limites para a arte?” (2018). Ainda,
houve anos, em que a relação com a Filosofia se deu de forma explícita como em 2017 – “O homem saiu de sua
menoridade”– e 2016 – “As utopias: indispensáveis, inúteis ou nocivas?”.
Logo, há uma diferença clara entre a proposta FUVEST e a de outros vestibulares, como o ENEM, por exemplo,
já que o foco é a revisão de crenças sobre um tema e não uma proposta de mudança da realidade. Ou seja, NÃO
se busca a solução para um problema, logo, não deve haver proposta de intervenção em sua conclusão, mas uma
síntese do que foi defendido.
PORTUGUÊS D

O objetivo é gerar adesão a certas concepções da realidade em consequência de considerá-las válidas ou


razoáveis (argumentação epistêmica). Para isso, cria-se um elo entre dados (repertório) e tese (posicionamento),
por meio da construção lógica entre eles (análise crítica). Além da confiabilidade e pertinência das fontes utilizadas,
pode-se considerar também possíveis refutações.

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2. COMO O TEXTO É AVALIADO?

A proposta de redação da Fuvest ajusta-se à grade de avaliação e com 3 critérios: 1. Desenvolvimento do tema e
organização do texto dissertativo-argumentativo; 2. Coerência dos argumentos e articulação das partes do texto; e 3.
Correção gramatical e adequação vocabular. É preciso destacar que cada um varia de 1 a 5 pontos e não possuem o
mesmo peso: o primeiro é multiplicado por 4, os outros 2, por 3. A nota vai, então, de 0 a 50.

A tabela abaixo mostra por meio de palavras-chave o que cada critério busca avaliar:

1. Desenvolvimento do tema e
2. Coerência dos argumentos e 3. Correção gramatical e
organização do texto
articulação das partes do texto adequação vocabular
dissertativo-argumentativo

Abordagem completa ou parcial do Cópia da coletânea; presença ou


tema; gênero e suas três partes; não de contradições; seleção e Domínio da norma-padrão escrita
paráfrase da coletânea ou seleção articulação de argumentos por da língua portuguesa e a clareza na
legítima e autoral de dados e seu meio de elementos coesivos e de expressão das ideias.
desenvolvimento. um bom projeto de texto.

Ainda se recomenda a leitura completa acerca de cada critério que está no Manual do
candidato. São apenas duas páginas facilmente encontráveis a partir do índice.

3. COMO APLICAR ESSES CRITÉRIOS NA REDAÇÃO?

O primeiro critério verifica a execução da estrutura do gênero dissertação- argumentativa, isto é, se a redação
apresenta todas as partes esperadas (introdução, argumentos e conclusão); além de avaliar se ela atende ao tema
proposto e se o desenvolve de maneira adequada.
Esse desenvolvimento não está ligado à citação aleatória de repertórios, muito menos à simples exposição de ideias já
presentes na coletânea de textos que compõe a proposta. Segundo expõe o próprio manual da FUVEST (2022, p. 38-39):

“Verifica-se, além da pertinência das informações e da efetiva progressão temática, a capacidade crítico-
argumentativa que a redação venha a revelar”. E “A paráfrase de elementos que compõem a proposta de
redação não é um recurso recomendável para o desenvolvimento adequado do tema”.

Mas o que é ser pertinente? É selecionar dados, informações, discursos, ideias, etc, que tenham relação direta com
o tema da redação. Dessa forma, a escolha de repertórios para usar na argumentação deve ser pensada de forma
estratégica, pois temas distintos têm diferentes potenciais de recorte e de abordagem, o que também demonstra a
capacidade de análise crítica do candidato.
PORTUGUÊS D

Ou seja, a escolha tem que fazer sentido tanto em relação ao campo temático da redação quanto em relação à
lógica que será desenvolvida para sustentar a relação entre dados e tese. Por exemplo, é mais estratégico explorar uma
questão política por um viés social e/ou histórico do que por um viés biológico ou psicanalítico (pode até ser feito, mas
a lógica tem mais chances de parecer “forçada” ou mais facilmente refutável).

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Já o segundo critério trata da importância de se privilegiarem argumentos relacionados entre si, tanto coesiva quanto
logicamente. Nesse sentido, quando uma redação possui um bom projeto de texto, é natural que haja uma conexão
entre as ideias selecionadas e a análise explorada.
Um exemplo disso seriam os esquemas de causa e consequência que permitem argumentos conectados entre si. Essa
articulação não é obrigatória, porém revela maior complexidade de organização e raciocínio e, por isso, tende a favorecer
notas maiores nesse e no primeiro critério. Outro ponto a se atentar é a respeito do uso de elementos de coesão textual
(módulo 3, caderno 1, Frente 4 e módulos 21 e 22 deste caderno), que explicitem essa conexão entre parágrafos ou uma
ordenação pré-estabelecida entre eles.
Por fim, o último critério trata do registro formal esperado em qualquer dissertação-argumentativa. Faça uma boa
revisão do texto, adequando-o às regras da norma padrão.

Para acessar a prova e a proposta de redação da


Texto 3
Fuvest 2020 comentada.
Quanta do latim
Plural de quantum
Quando quase não há
PROPOSTA de REDACÃO do vestibular da FUVEST 2020: Quantidade que se medir
Qualidade que se expressar
Texto 1
Fragmento infinitésimo
Quase que apenas mental
Quantum granulado no mel
Quantum ondulado no sal
Mel de urânio, sal de rádio
Qualquer coisa quase ideal
Cântico dos cânticos
Quântico dos quânticos
Canto de louvor
De amor ao vento
Vento arte do ar
Balançando o corpo da flor
Levando o veleiro pro mar
Vento de calor
De pensamento em chamas
(Luis Fernando Verissimo, As cobras: Antologia Definitiva.) Inspiração
Arte de criar o saber
Texto 2 Arte, descoberta, invenção
Teoria em grego quer dizer
Somente numa sociedade onde exista um clima cultural, em
O ser em contemplação
que o impulso à curiosidade e o amor à descoberta sejam
Sei que a arte é irmã da ciência
compreendidos e cultivados, pode a ciência florescer. Somente
Ambas filhas de um Deus fugaz
quando a ciência se torna profundamente enraizada como um
Que faz num momento
elemento cultural da sociedade é que pode ser mantida e
E no mesmo momento desfaz
desenvolvida uma tecnologia progressista e inovadora, tornando-se,
Esse vago Deus por trás do mundo
então, possível uma associação íntima e vital entre ciência e
Por detrás do detrás
PORTUGUÊS D

tecnologia. Essa associação é uma característica da nossa época e


certamente essencial para a manutenção de uma civilização com os Cântico dos cânticos
níveis presentes de população e qualidade de vida. Quântico dos quânticos
(Oscar Sala, O papel da ciência na sociedade. 1974. Disponível em (Gilberto Gil, Quanta. 1997.)
http://www.revistas.usp.br/revhistoria. Adaptado.)

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Texto 4 Texto 5

Nós criamos uma civilização global em que os elementos mais Algo muito estranho está acontecendo no mundo atual. Vivemos
cruciais – o transporte, as comunicações e todas as outras indústrias, melhor que qualquer outra geração anterior. Pessoas são saudáveis
a agricultura, a medicina, a educação, o entretenimento, a proteção ao graças às ciências da saúde. Moram em residências robustas, produto
meio ambiente e até a importante instituição democrática do voto – da engenharia. Usam eletricidade, domada pelo homem devido ao seu
dependem profundamente da ciência e da tecnologia. Também conhecimento de química e física. Paradoxalmente, essas mesmas
criamos uma ordem em que quase ninguém compreende a ciência e pessoas ligam seus computadores, tablets e celulares para adquirir e
a tecnologia. É uma receita para o desastre. Podemos escapar ilesos disseminar informações que rejeitam a mesma ciência que é tão
por algum tempo, porém mais cedo ou mais tarde essa mistura presente em suas vidas. Vivemos num mundo em que pessoas usam
inflamável de ignorância e poder vai explodir na nossa cara. a ciência para negar a ciência.
(Carl Sagan, 1996.) (Alicia Kowaltowski, Usando a ciência para negar a ciência. 2019. Disponível
em https://www.nexojornal.com.br/. Adaptado).

Considerando as ideias apresentadas nos textos e também outras informações que julgar pertinentes, redija uma dissertação em prosa, na qual
você exponha seu ponto de vista sobre o tema: o papel da ciência no mundo contemporâneo.

1. Leia a redação de nossa ex-aluna Natalia Nora Marques aprovada no curso de Jornalismo pela FUVEST de 2020 (“O papel da ciência no mundo
contemporâneo”). Sua nota foi 44.5. Vamos analisá-la.

OS INTERESSES POR TRÁS DO PAPEL DA CIÊNCIA

Os movimentos literários costumam intercalar entre a valorização da razão e da emoção. Um dos exemplos de épocas
em que predominava a razão foi o século XIX em que o livro “O Cortiço” foi escrito sob moldes europeus e naturalistas.
Em sua obra, Aluísio Azevedo utiliza teorias científicas da época para categorizar como inferiores as classes mais
necessitadas do Brasil. Assim como o autor manipulava a ciência, diversos outros intelectuais também o fizeram segundo
seus interesses, mostrando que a ciência exerce muitos papéis, mas sempre servindo a quem a financiasse.
Apesar da necessidade de, em um mundo globalizado, e com tamanho desenvolvimento científico, existir acesso por parte
da maioria da população a tais conhecimentos, as produções científicas são excludentes e de difícil compreensão para os
padrões de um país que, como o Brasil, possui parte significativa da população composta com analfabetos, todavia,
funcionais. Além disso, a visível elitização do acesso às universidades torna mais desigual a situação entre as classes mais
baixas, que são prejudicadas, e altas, que podem pagar pelo ensino e não se preocupam com tornar a ciência próxima dos
mais necessitados, contribuindo apenas para a manutenção da estrutura de poder que se assemelha ao mecenato, mas que,
no lugar de artistas, os financiados são cientistas e suas pesquisas se voltam apenas às classes dominantes que podem
financiá-la.
Não somente o naturalismo fez uso da ciência para justificar visões de superioridade de uma classe sobre outra.
Pseudoteorias como o darwinismo social foram usadas a fim de inocentar os países europeus durante o neocolonialismo,
em que a África foi partilhada e explorada sob a alegação de que se estava levando “civilização” para essas regiões. Aluísio
Azevedo contribuiu para que no Brasil se criasse uma visão ainda mais desumanizada e pejorativa da população que vivia
em cortiços, sempre a serviço da elite que buscava manter sua posição de superioridade em relação à massa populacional.
Para isso, a ciência teve um papel fundamental, que continuará distante dessa classe enquanto não houver uma
democratização de seu acesso.
Portanto, é impossível dissociar o papel exercido pela ciência dos responsáveis pelo seu financiamento, apesar de a
PORTUGUÊS D

democratização das produções científicas ser necessária, está bastante distante de se tornar uma realidade. Mesmo com
séculos de distância, o Brasil de Aluísio Azevedo não é tão diferente do atual, sendo assim, é provável que o papel a ser
exercido pela ciência permaneça como subjugado ao capital e aos interesses das classes elitizadas, mantendo uma espécie
de mecenato científico.

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a) Na introdução (primeiro parágrafo), qual informação foi selecionada e) O segundo argumento está conectado ao primeiro? De que forma?
para contextualizar o tema? Foi uma escolha pertinente ao tema ou não? RESOLUÇÃO:
Justifique sua resposta. Estão conectados a partir de dois pontos: o fato de ambos
mostrarem a relação da ciência com a elite que a financia ou que a
RESOLUÇÃO:
produz e seus interesses; e por meio da relação entre o passado
Na introdução, menciona-se o romance “O cortiço” de Aluísio
(segundo argumento) e o presente (primeiro argumento), que fica
Azevedo para contextualizar o tema. Essa escolha foi pertinente, já
explícita no último período do terceiro parágrafo.
que a candidata relaciona as teorias pseudocientíficas da época, as
quais a obra reflete e reproduz, com o tema – “o papel da ciência”
– e com a tese defendida – de que a ciência serve a quem a financia.

f) Os parágrafos argumentativos podem ser considerados curtos ou


b) Na introdução, qual período ou frase constitui a tese defendida? Está longos? O que isso demonstra?
explícito ou implícito o posicionamento da autora do texto? RESOLUÇÃO:
RESOLUÇÃO: Ambos são proporcionais, ou seja, um não é maior que o outro, e
A tese fica explícita no último período da introdução, em especial ambos possuem mais de 9 linhas digitadas. Podemos considerá-
pela frase “a ciência exerce muitos papéis, mas sempre servindo a los longos, o que demonstra capacidade de desenvolvimento
quem a financiasse.” lógico aprofundado e bem planejado.

c) O repertório utilizado na introdução foi abandonado ou retomado em


outro momento? Que impressão sobre o texto isso gera? g) A conclusão apresenta uma solução ou uma síntese da
RESOLUÇÃO: argumentação?
A menção à obra “O cortiço” e à sua relação com as teorias RESOLUÇÃO:
pseudocientíficas da época é retomada e expandida no segundo Apresenta uma síntese da argumentação, recuperando seus
argumento (3º parágrafo), em que se faz um aprofundamento sobre pontos principais e usando-os em favor de reafirmar a tese
como essas teorias contribuíram para exploração. Isso traz a defendida coerentemente ao longo de toda redação. Não se
impressão de organização e coerência, fruto de um projeto de texto acrescentam novas informações, nem soluções.
bem estabelecido.

d) Quais informações ou repertórios foram utilizados para a


argumentação? h) Dê exemplos de desvios gramaticais cometidos e depois comente
RESOLUÇÃO: se foram muito prejudiciais ao entendimento do texto ou não.
No segundo e terceiro parágrafos encontram-se o primeiro e RESOLUÇÃO:
segundo argumentos. No primeiro, menciona-se a atual elitização Há alguns desvios, em especial em relação ao uso da vírgula, mas
do acesso ao ensino superior no Brasil, destacando o fato de que que não chegam a prejudicar o entendimento do texto.
as produções não são facilmente compreensíveis e divulgadas em
um país desigual composto por “analfabetos funcionais”. Já no
segundo, recupera-se o repertório da introdução para mostrar
como no passado a ciência também contribuiu para os interesses
de uma certa elite que buscou explorar outros povos a partir de
suas supostas justificativas.
PORTUGUÊS D

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MÓDULO 20 Modelos Argumentativos II (VUNESP)


Elaborado pela professora Ana Carolina de Souza Ferreira

1. LÍNGUA E LINGUAGEM

Muitos candidatos não sabem, mas existem vestibulares de faculdades diferentes cujas provas são criadas pela
mesma instituição. Por conseguinte, mesmo que sejam de universidades diferentes, os exercícios, a criação e a avaliação
da redação seguem os mesmos padrões, pois foram estabelecidos sob a mesma direção ou banca.
Esse é o caso de várias faculdades como UNESP, UNIFESP, Albert Einstein, FAMERP, Santa Casa, entre outras, que
contratam ou contrataram até 2021 a VUNESP - Fundação para o Vestibular da Universidade Estadual Paulista. Criada
inicialmente para planejar, organizar, executar e supervisionar o concurso Vestibular da Unesp, na atualidade é responsável
por realizar vestibulares e concursos diversos para outras instituições nacionais.
Assim, podemos notar que os critérios de correção da prova de redação são os mesmos – com adequação apenas
do critério A como será mostrado. Outro fator comum é a tendência temática que essa fundação costuma seguir. Ainda,
a grade de correção com níveis detalhados é exposta na plataforma pela própria VUNESP aos candidatos dos seus
vestibulares e aqui a reproduziremos para que possamos entendê-la melhor. Para a aula de hoje, usaremos o caso da
UNESP, dentre as universidades mencionadas, como exemplo.

1. O QUE É PEDIDO NAS PROVAS DE REDAÇÃO DA VUNESP?

De acordo com o manual do candidato da UNESP (2021, p. 39, grifos nossos):

“Na prova de redação, espera-se que o candidato produza um texto dissertativo-argumentativo (em prosa),
coerente, coeso (bem articulado) e de acordo com a norma-padrão da língua portuguesa, a partir da leitura
e compreensão de textos auxiliares, que servem como um referencial para ampliar os argumentos
produzidos pelo próprio candidato”

Apenas por essa indicação do manual, já notamos uma grande diferença da prova de redação organizada pela
VUNESP em relação à do ENEM e à da FUVEST, já que aqui o uso dos textos da coletânea – os também chamados textos
auxiliares ou textos de apoio – são recomendados para uso na argumentação do candidato, diferentemente das outras
duas provas que os indicam apenas com fins de compreensão e reflexão sobre o tema.
Por outro lado, há muitos pontos comuns entre as provas de redação da VUNESP e do ENEM: o título não é
obrigatório, o texto não deve ter menos 8 linhas para ser corrigido e os temas estão ligados a problemas de âmbito
social ou político da sociedade brasileira, como podemos ver na tabela abaixo nos temas dos últimos anos:

UNESP UNIFESP FAMERP


A lógica do condomínio: o É possível conciliar mérito e Sobrepeso e obesidade infantil: entre as
espaço público está em bem comum? (2023) responsabilidades da família e do Estado. (2023)
declínio (2023) Derrubar monumentos? Os Os impactos da inteligência artificial nas relações de
dilemas entre relembrar e trabalho contemporâneas. (2022)
“Tudo bem não estar bem”?: A
tristeza em tempos de apagar o passado. (2022) Publicação na internet de casos de violência contra a
felicidade compulsória (2022) A engenharia genética ameaça mulher: entre o incentivo à denúncia e a exposição do
a dignidade humana? (2021) acusado (2021)
Tempo é dinheiro? (2021)
Vestimentas religiosas no A educação domiciliar no Brasil: exercício da
O carro é o novo cigarro? (2020) liberdade de escolha ou negligência dos pais? (2020)
esporte: legitimação da
PORTUGUÊS D

Compro, logo existo? (2019) opressão ou liberdade de Obrigatoriedade da vacinação: entre a prevenção de
Liberar o porte de armas a manifestação religiosa? (2020) doenças e o respeito às escolhas individuais? (2019)
todos cidadãos no Brasil Eutanásia: entre a liberdade de O fracasso da lei de cotas para deficientes:
diminuirá a violência no Brasil? escolha e a preservação da negligência das empresas ou falha do Estado? (2018)
(2018/2) vida. (2019)

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Ao contrário da FUVEST, justamente por focarem problemas da realidade mundial ou nacional, os temas elencados
são passíveis de serem “solucionados” ainda que, ao contrário do ENEM, não se exija proposta de intervenção nas
redações da VUNESP conforme o próprio manual esclarece (2021, p.40):

“Não é necessário elaborar conclusões com proposta de intervenção, nas redações dos processos seletivos
promovidos pela Fundação Vunesp”

Entretanto, por ser coerente com esse tipo de tema, tem variado entre os candidatos aprovados com boas notas a
maneira de concluir: em forma de síntese argumentativa, ou com síntese e proposta, ou apenas com proposta de
solução. De qualquer forma, recomenda-se o primeiro tipo de conclusão ( síntese argumentativa), tendo em vista as
orientações do manual.
Outra característica notória sobre os temas elaborados pela Fundação VUNESP é que são, em geral, apresentados
em forma de pergunta (uso de interrogação) e uso do conectivo “ou” em sua formulação, o que dá ao candidato a
possibilidade de escolha de seu posicionamento. Assim, o candidato terá de optar por uma das formulações (ou isso ou
aquilo) e manifestar essa opção já na tese de seu texto, assim como em qualquer dissertação-argumentativa, essa
opinião deve estar explícita desde a introdução.
Por fim, é interessante notar como apesar de serem de faculdades diferentes, alguns temas parecem ser retomados.
Um caso notório foram os temas da UNIFESP de 2017 “O voto nulo é um ato político eficaz?” e da UNESP de 2018 “O
voto deveria ser facultativo no Brasil?”. Ou seja, é bastante produtivo estudar e conhecer bem os temas de redação de
outros anos e de várias faculdades que possuem seu vestibular sob a tutela da VUNESP.

2. COMO O TEXTO É AVALIADO?

Segundo o manual do candidato (2021, p. 39), avalia-se a partir de 3 critérios:

A Tema: avalia-se, neste critério, se o texto do candidato atende ao tema proposto.

Estrutura (gênero/tipo de texto e coerência): consideram-se aqui, conjuntamente, os aspectos


B
referentes ao gênero/tipo de texto proposto e à coerência das ideias.

Expressão (coesão e modalidade): consideram-se, neste item, os aspectos referentes à coesão


C
textual e ao domínio da norma-padrão da língua portuguesa.

O critério A pode variar de 0 a 3 pontos enquanto os outros, de 0 a 4 pontos. Isso possibilita que a redação atinja no
total 11 pontos. Como a VUNESP realiza diversos processos seletivos, mas mantém os seus critérios, há uma fórmula
para adaptar essa pontuação à nota da redação exposta pelo edital:

NF = (NC * NE)/NMC

NF: Nota Final


NC: Nota atribuída pela Correção VUNESP (escala de 0 a 11)
PORTUGUÊS D

NE: Nota máxima prevista em Edital (no caso da UNESP, 28 pontos; no da UNIFESP, 50; no da FAMERP, 20)
NMC: Nota Máxima prevista pela Correção VUNESP (11 pontos)

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3. COMO APLICAR ESSES CRITÉRIOS NA PRODUÇÃO DA REDAÇÃO?

Em relação ao primeiro critério, é importante a utilização, assim como em qualquer dissertação-argumentativa, das
mesmas palavras-chave presentes na pergunta tema desde a introdução e ao longo de todo texto, afinal é a abordagem
completa dessa pergunta que garante os 3 pontos totais.

O segundo critério é o mais detalhado por avaliar mais de um aspecto do texto. Assim, sua redação:
• Não deve possuir interlocução com o leitor (ex.: o que você faria se...) e/ou uso de imperativo (2.a pessoa) no
singular ou no plural (ex.: pense bem, façam sua parte...): barram as notas 3 e 4.
• Não deve haver uso da 1.a pessoa do singular (ex.: eu acho, na minha opinião, segundo meu ponto de vista): barra
a nota 4
• Não deve ter referência direta à situação imediata de produção textual (ex.: como afirma o autor do primeiro
texto/da coletânea/do texto I; como solicitado nesta prova/proposta de redação): barra as notas 3 e 4.
• Deve apresentar estrutura completa com todas as partes (introdução, desenvolvimento e conclusão): estrutura
macro incompleta barra as notas 3 e 4.
• Deve-se priorizar a organização e o desenvolvimento coerente de argumentos: textos com contradições,
argumentos superficiais ou desordenados barram as notas 3 e 4.
• Pode se valer de dados dos textos auxiliares desde que por meio de uma leitura crítica e que mostre relação com
os conhecimentos de mundo do candidato.
• Deve mobilizar repertório consistente com o tema abordado de forma que contribua, efetivamente, para a defesa
da tese adotada pelo candidato.
• Não deve apresentar cópia parcial ou integral de modelos prontos de redação: cópia de trechos de modelos
barram as notas 3 e 4, enquanto a cópia integral zera a redação por completo.

Em relação ao último ponto, destacamos do manual (2022, p. 40):

“Serão anuladas as redações em que seja identificada predominância de reprodução de modelos prontos de
redação disponibilizados na internet ou em outras fontes. A predominância de reprodução de modelos será
identificada por comparação entre modelos disponíveis para consulta em fontes de acesso público, bem como
pela comparação entre as redações apresentadas pelos candidatos, quando evidenciada a utilização de um
mesmo modelo. Ademais, também serão penalizadas, com redução de nota no critério B, redações que, embora
não sejam predominantemente copiadas, apresentem trechos reproduzidos de modelos prontos.”

Por fim, o terceiro critério (C) possui pouca diferença em relação aos critérios de norma padrão e coesão de outras
provas. Por isso, é preciso manter uma revisão cuidadosa do texto, buscando corrigir desvios gramaticais e repetições
que possam ocorrer. Também é recomendável o uso adequado de coesivos ao longo do texto tanto para a conexão de
períodos, quanto de parágrafos .Há apenas um ponto específico que pede atenção: a quantidade de linhas do texto
interfere diretamente em sua nota.
Assim, o texto deve possuir pelo menos 21 linhas escritas para alcançar nota máxima nesse critério: desconta-se
1 ponto apenas no critério C em textos com 15 linhas ou menos (sem contar o título) e textos com 20 linhas (sem
contar o título) ou menos não podem alcançar a nota máxima, no critério C.
PORTUGUÊS D

Recomendamos a leitura completa acerca de cada critério. São apenas duas páginas do
Manual do candidato, facilmente encontráveis a partir do índice:
https://tinyurl.com/44cpbfe6 .

66 –
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O executivo defendeu, ainda, que um robô como esse teria


Para acessar a proposta de redação da FAMERP
um impacto profundo na economia. Ele disse que o trabalho físico
2022. seria uma escolha no futuro, e uma renda básica universal seria
necessária. Musk está entre os líderes do Vale do Silício que
alertam que a tecnologia pode eliminar o emprego de muitas
pessoas e que, portanto, alguns humanos precisarão de outra
fonte de renda.
PROPOSTA de REDACÃO do vestibular da FAMERP 2022: (Matt McFarland. “Elon Musk afirma que Tesla apresentará protótipo de
robô humanoide em 2022”. www.cnnbrasil.com.br, 20.08.2021. Adaptado.)

Texto 1
Texto 3

Cada vez mais, empresas e fábricas implantam tecnologias


Inteligência Artificial é um tema polêmico. Em meio ao
acionadas por algoritmos inteligentes e que trabalham lado a lado
desenvolvimento de sistemas capazes de assumir tarefas cada
das pessoas. Uma das maiores referências de Inteligência
vez mais sofisticadas e de melhorar com a prática, surgem
Artificial (IA) no mundo, Andrew Ng, prevê que o avanço da
diversas dúvidas. Para o pesquisador Álvaro Machado Dias, da
Inteligência Artificial tem potencial para adicionar mais de 10
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), sem a vantagem de
trilhões de dólares na economia global até 2030.
milhões de anos de evolução, sem emoções nem empatia
De fato, os robôs substituirão os humanos em muitos
verdadeiras, as máquinas não serão capazes de pensar como nós.
trabalhos, mas o que muitas pessoas não veem é que isso não é
“A mente humana é muito mais um ecossistema cognitivo e,
necessariamente algo negativo ou para se temer. Uma automação
quando a gente olha o funcionamento desse ecossistema, vê que
feita com Inteligência Artificial resolve problemas cotidianos mais
muitas funcionalidades estão enraizadas em capacidades
recorrentes, principalmente, e isso dá a oportunidade para as
adquiridas ao longo da evolução”, explica.
pessoas focarem em atividades mais estratégicas ou em estudos
Mas o pesquisador vê, sim, outras ameaças no horizonte,
e especializações, fomentando um ambiente propício para a
associadas à difusão da Inteligência Artificial. “Daqui a 7 ou 10
geração de ideias inspiradoras e criativas, e também o
anos, teremos uma quantidade de algoritmos suficiente para
desenvolvimento de modelos de negócios inovadores.
começarmos a sentir o impacto social da automação no mundo”,
Quando presenciamos a primeira grande Revolução Industrial,
diz Álvaro. As mudanças acontecem em ritmo mais acelerado do
com todos aqueles avanços tecnológicos e a substituição de
que em revoluções anteriores — e talvez não haja tempo para que
trabalhadores por máquinas, as pessoas já se perguntavam “e
grandes parcelas da população aprendam novas profissões.
agora? Será esse o destino da humanidade?”, um
“Talvez tenhamos a proliferação de algoritmos capazes de ocupar
questionamento que, por sinal, perdura até os dias atuais. A
o papel de pessoas na esfera produtiva com mais velocidade do
resposta para esse questionamento é que sim, esse é o destino
que as pessoas conseguem reinventar seus empregos. Se isso
da humanidade, e será cada vez mais, pois ressignificar o trabalho
for verdade, podemos ter um aumento irreversível de
é algo essencial para a sociedade e, quando caminhamos para
desemprego e desigualdade”, conclui ele.
operações que cada vez mais usam Inteligência Artificial, é
(“Como a inteligência artificial nos ameaça, segundo este neurocientista”.
importante a entendermos e pensarmos como o que ela de fato
https://epocanegocios.globo.com, 14.01.2020. Adaptado.)
é: uma aliada.
(Anderson Paulucci. “A inteligência artificial permitirá que os humanos
sejam mais humanos”. https://exame.com, 31.07.2021. Adaptado.)
Com base nos textos apresentados e em seus próprios
conhecimentos, escreva um texto dissertativo-argumentativo,
Texto 2
empregando a norma-padrão da língua portuguesa, sobre o tema:
Os impactos da inteligência artificial nas relações de
Elon Musk, presidente da Tesla, anunciou, durante evento
trabalho contemporânea.
sobre Inteligência Artificial, que a empresa está construindo um
robô humanoide e provavelmente terá um protótipo no próximo
ano. “Basicamente, a ideia era que esse robô começasse a
substituir seres humanos em trabalhos entediantes, repetitivos e
perigosos”, disse Musk sobre o novo empreendimento da Tesla.
“Você pode falar com ele e dizer ‘por favor, vá até a loja e compre
PORTUGUÊS D

os seguintes mantimentos’. Esse tipo de coisa. Acho que Para acessar a prova e a proposta de redação da
podemos fazer isso”. Musk também brincou que o robô seria FAMERP 2022 comentada.
amigável.

– 67
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1. Agora, leia a redação abaixo de nosso ex-aluno, Sergio Luzzi Junior, na prova da FAMERP (2022). Sua nota foi 18,180 de 20. Vamos analisá-la.

No filme “Tempos modernos”, Charles Chaplin retrata o modo de trabalho de um homem no início do século XX, durante o
período conhecido como Segunda Revolução Industrial. Na sua interpretação estereotipada, o homem trabalha como um “robô”,
executando um trabalho repetitivo e entediante. O que Chaplin provavelmente não imaginava é que em um futuro não muito
distante, o homem poderia ser, literalmente, substituído pela máquina. Certamente, os impactos da inteligência artificial nas
relações de trabalho contemporâneas serão piores do que as ocorridas nas transformações industriais anteriores.
Em primeira análise, desde a primeira Revolução Industrial, com a criação da máquina a vapor, o trabalho manual e artesanal
foi substituído. Esses artesões tiveram que se adaptar rapidamente, sendo que a maioria foi obrigado a se sujeitar a condições
precárias de trabalho e baixos salários. Os historiadores relatam uma Inglaterra extremamente desigual durante esse período,
onde uma pequena burguesia enriqueceu explorando a classe trabalhadora. Historicamente, todo avanço tecnológico trouxe
consigo grandes impactos sociais, principalmente relacionado às relações de trabalho.
Analogamente, não tem sido diferente nos dias atuais, porém há um agravante; desta vez, o trabalho humano, principalmente
o trabalho físico e repetitivo pode ser substituído. Ademais, muitos trabalhadores não terão sequer a oportunidade de tentar se
adaptar, como ocorreu nas transformações industriais anteriores. Na prática isso já está ocorrendo gradativamente, como por
exemplo, o sistema informatizado que está sendo testado em algumas farmácias. Esse sistema “auxilia” o farmacêutico e o
paciente na pesquisa e retirada de medicamentos e, consequentemente, muitos balconistas terão seu emprego “cortado” muito
em breve. E esse tipo de tecnologia é como uma bola de neve: hoje é o balconista, amanhã é o farmacêutico.
Em suma, assim como ocorreu nas Revoluções Industriais anteriores, toda mudança e evolução tecnológica trouxe
consequências e aumentou a desigualdade social. Todavia, os impactos da inteligência artificial nas relações contemporâneas
amplificarão ainda mais as desigualdades já existentes, pois o proletariado, em sua grande maioria, será substituído e descartado.
Infelizmente, hoje, Chaplin não interpretaria um “homem robotizado”, ele interpretaria um “robô”.

a) Na introdução (primeiro parágrafo), qual informação foi selecionada b) Na introdução, qual período ou frase constitui a tese defendida? Está
para contextualizar o tema? Foi uma escolha pertinente ao tema ou não? explícito ou implícito o posicionamento?
Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO:
RESOLUÇÃO: A tese fica explícita no último período da introdução: “Certamente,
Na introdução, menciona-se o filme “Tempos Modernos” de Charlie os impactos da inteligência artificial nas relações de trabalho
Chaplin para contextualizar o tema. Essa escolha foi pertinente, já contemporâneas serão piores do que as ocorridas nas
que é atrelado ao seu contexto histórico – a primeira Revolução transformações industriais anteriores”. O uso do adjetivo “pior”
Industrial – e com o tema a partir de uma comparação entre o deixa claro um posicionamento sobre o tema.
passado e o presente.
PORTUGUÊS D

68 –
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c) O repertório utilizado na introdução foi abandonado ou retomado em f) Os parágrafos argumentativos podem ser considerados curtos ou
outro momento? Que impressão sobre o texto isso gera? longos? O que isso demonstra?
RESOLUÇÃO: RESOLUÇÃO:
A menção ao filme de Chaplin é retomado em especial na O menor argumento possui sete linhas e o maior possui nove.
conclusão do texto com a finalidade de se reafirmar uma das ideias Apesar de possuírem tamanhos diferentes, ainda podem ser
defendidas: a de que a Inteligência Artificial substituirá o trabalho considerados proporcionais entre si. Também podemos considerá-
repetitivo. Também se retoma e se desenvolve a referência à los longos, o que demonstra capacidade discursiva, desenvol-
primeira Revolução Industrial no segundo parágrafo/primeiro vimento lógico aprofundado e bem planejado.
argumento. Ambas as retomadas trazem a impressão de
organização, bom desenvolvimento de argumentos e coerência,
fruto de um projeto de texto bem estabelecido.

g) A conclusão apresenta uma solução ou uma síntese da


argumentação?
RESOLUÇÃO:
d) Quais informações ou repertórios são utilizados para a Apresenta uma síntese da argumentação, recuperando seus
argumentação? Algum pode ter sido motivado pelos textos auxiliares pontos principais e usando-os em favor de reafirmar a tese
presentes na proposta? defendida coerentemente ao longo de toda redação. Não se
acrescentam novas informações, nem soluções. Também
RESOLUÇÃO:
aproveita-se para retomar de forma irônica a referência ao filme de
São mobilizados: a primeira Revolução Industrial e suas
Charlie Chaplin.
consequências; e um exemplo cotidiano – o uso de sistemas de
busca em farmácias – e suas consequências para o presente e para
o futuro. Destaca-se que o texto auxiliar menciona o mesmo
contexto histórico, e que o texto 2 aponta a substituição de
trabalhos “repetitivos” por robôs – mesma consequência exposta
pelo candidato. Isso demonstra que huve diálogo argumentativo
com a coletânea, mas de forma a expandi-la com o conhecimento
de mundo (repertório cultural) e reflexões próprias do candidato.

h) Dê exemplos de desvios gramaticais cometidos e depois comente


se foram muito prejudiciais ao entendimento do texto ou não.
RESOLUÇÃO:
Há desvio de concordância nominal em “a maioria foi obrigado”, e
e) O segundo argumento está conectado ao primeiro? De que forma? coloquialidade em “emprego ‘cortado’ ”, mas não chegam a
prejudicar o entendimento do texto.
RESOLUÇÃO:
Sim, por meio de duas relações lógicas: comparação entre o
passado e o presente; relação de causa e consequências entre
revoluções no modo de produzir e nos direitos trabalhistas. Ainda,
o uso do operador “analogamente” também cria, por meio da
coesão, essa ligação entre os argumentos.
PORTUGUÊS D

– 69
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Rascunho
PORTUGUÊS D

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Leitura
TEXTOS MOTIVADORES
Obrigatória

Texto I Texto II

Como em muitas outras áreas, o Brasil apresenta


enormes disparidades nas estatísticas de doações e
transplantes de órgãos. Enquanto alguns estados há
anos alcançam números comparáveis aos melhores
no mundo, outros chegam ao final do ano sem
realizar um transplante sequer.

Quem autoriza a doação de órgãos atualmente é


a família, começando pelos parentes mais próximos:
pai e mãe, filhos, marido ou esposa e assim por
diante. Estamos convencidos de que, culturalmente,
essa é a forma mais adequada.
(Disponível em:
http://drauziovarella.com.br/entrevistas-2/doacao-e-
transplante-de-orgaos-no-brasil/. Adaptado.)

Texto IV
Texto III
A estimativa do RBT (Registro Brasileiro de
Ao sobrecarregar a rede de saúde, a pandemia
Transplantes) de 2022 é que eram necessários mais
de Covid-19 afetou o tratamento de outras doenças
de 40 mil transplantes de córnea, rim, fígado, coração
e causou distorções na logística do sistema. Uma
e pulmão. Mas só cerca de 21 mil de transplantes
das áreas afetadas foi a de transplantes, com desses órgãos foram feitos em 2022.
efeitos que ainda perduram.
Gustavo Fernandes Ferreira, presidente da
No início da pandemia, considerava-se que o ABTO (Associação Brasileira de Transplante de
procedimento aumentaria a transmissão do vírus, Órgãos), explica que algumas contraindicações são
mas pesquisas científicas atestam que esse risco é feitas pelo centro de doação quando se avalia que o
mínimo ou ausente. doador não é adequado para o paciente em busca do
Mesmo com o arrefecimento da pandemia, os órgão. Mas essa ressalva pode ocorrer por outra
números ainda não atingiram os patamares razão: quando o centro de transplante não conta com
a capacidade plena para realizar o transplante.
anteriores.
O ponto tem relação com a dificuldade que o
Especialistas apontam que, em 2022, o índice
Brasil encara de não só aumentar o número de
de doadores aumentou mais do que o de
doadores, mas também melhorar a capacidade de
transplantes, o que sugere dificuldades técnicas.
realizar os transplantes.
PORTUGUÊS D

(Editorial, Folha de S.Paulo, 8/3/2023.)


(Folha de S.Paulo, 7/3/2023.)

– 71
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Texto V

Quantidade de doadores
Em PMP (por milhão da população)
20
18,1
16,5
14,1
15

10

0
2015 2019 2022

Número total de transplantes


Em milhares
10 9,2
7,9 8
8

0
2015 2019 2022

Texto VI

O médico nefrologista Roberto Manfro, acredita que o índice poderia ser mais satisfatório se a população
tivesse mais acesso à informação sobre as doações de órgãos.

“Falar que a doação de órgãos é tabu não é verdade. Hoje em dia, todas as religiões são a favor dos
transplantes e não existe malefício relacionado aos transplantes que tenha sido comprovado. O grande
problema é a falta de esclarecimento em relação às doações, do que propriamente um tabu. Quando as
pessoas são esclarecidas, elas entendem e se posicionam a favor. O diagnóstico de morte encefálica no Brasil
é um dos mais seguros do mundo, como exige a legislação, mas tem gente que não acredita. Por isso, tem
que melhorar a quantidade de informações em todos os meios: população, agentes de saúde e classe médica.”

O nefrologista afirma que os órgãos retirados de uma pessoa saudável que sofreu morte cerebral podem
beneficiar pelo menos nove pessoas, que podem receber coração, pulmões, rins, fígado, córneas, pâncreas.
PORTUGUÊS D

Disponível em: https://noticias.r7.com/saude/


brasil-aumenta-em-15-a-doacao-de-orgaos-mas-falta-de-informacao-e-empecilho-para-salvar-mais-vidas-22092017.

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Nome ___________________________________________________________________________ 3º ANO

Unidade _________________________________________________________________________ CURSO

Turma Manhã Tarde Noite


MÓDULO 10
Matrícula –

INSTRUÇÕES PARA A REDAÇÃO

1. O rascunho da redação deve ser feito no espaço apropriado.


2. O texto definitivo deve ser escrito a tinta, na folha própria, em até 30 linhas.
3. A redação que apresentar cópia dos textos da Proposta de Redação ou do Caderno de Questões terá o número de
linhas copiadas desconsiderado para a contagem de linhas.
4. Receberá nota zero, em qualquer das situações expressas a seguir, a redação que:
4.1. tiver até 7 (sete) linhas escritas, sendo considerada “texto insuficiente”.
4.2. fugir ao tema ou que não atender ao tipo “dissertativo-argumentativo”.
4.3. apresentar parte do texto deliberadamente desconectada do tema proposto.
4.4. apresentar nome, assinatura, rubrica ou outras formas de identificação no espaço destinado ao texto.

PROPOSTA DE REDAÇÃO

A partir da leitura dos textos motivadores e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua
formação, redija um texto dissertativo-argumentativo em modalidade escrita formal da língua portuguesa
sobre o tema Desafios para o aumento de doação de órgãos e de realização de transplantes,
apresentando proposta de intervenção que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione,
de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.

Comentário à proposta de redação

Os textos apresentam dados estatísticos sobre o número ainda baixo de doadores de órgãos no Brasil, principalmente depois da pandemia.

O aluno deve questionar se isso ocorre por falta de informação e campanhas elucidativas, por medo de autorizar a doação, por problemas

técnico-estruturais relacionados à remoção e transporte de órgãos ou ainda por carência de médicos especializados em transplantes. O

aluno deve apresentar um agente responsável pela proposta de intervenção, que deve ser bem detalhada.
PORTUGUÊS D

– 73
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Critérios ENEM
Nome do(a) corretor(a): _______________________________________________

Competência Critério Peso Nota atribuída

1 Demonstrar domínio da norma culta da língua escrita. 2


Compreender a proposta de redação e aplicar conceitos das
2 várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema, dentro
dos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo.
2
3 Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações,
fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista. 2
4 Demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos
2
PORTUGUÊS D

necessários para a articulação das ideias (coesão e coerência).

5 Elaborar proposta de intervenção para o problema abordado,


demonstrando respeito aos direitos humanos. 2
74 –
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MÓDULO 21 Gênero textual – Artigos de divulgação científica


“Ao nos tornarmos adultos, a maioria de nós suprime em si aquela centelha curiosa típica das crianças.
Jobs, Da Vinci, Einstein e Jennifer Doudna nunca deixaram de olhar com atenção inquisidora para os fenômenos mais frugais,
como o voo das borboletas ou as características das plantas. Devemos acordar todo dia e treinar nossa curiosidade a
cada pequena ação, questionando quais os mecanismos por trás das coisas. E não fazer isso só pelo desejo
de ganhar dinheiro – os gênios ensinam que a visão criativa deve ser livre de amarras.
Water Isaacson, biógrafo de grandes inovadores, como Da Vinci, Einstein e Steve Jobs.

1. O pensamento científico
Ciência é o conjunto de conhecimentos empíricos e teóricos sobre a natureza elaborados a partir da observação,
descrição, explicação e previsão. A base da ciência, portanto, é a experiência, e após a repetição da ação investigada,
faz-se a descrição da ação, têm-se a explicação do evento e sua previsão futura. Ela é dinâmica e está em permanente
construção. O método científico é a metodologia usada por cientistas na busca do conhecimento, um conjunto de regras
para desenvolver uma experiência a fim de produzir novos conceitos, bem como corrigir e integrar conhecimentos pré-
existentes.
https://educacao.uol.com.br/noticias/2019/12/06/teorias-
conspiratorias-e-pos-verdade-como-a-ciencia-esta-sendo-atacada.htm?cmpid=copiaecola

Para uma corrente de respeitáveis cientistas, entre os quais despontou o físico Stephen Hawking, o
desenvolvimento de uma inteligência artificial completa poderá resultar na destruição da raça humana. Para outra,
liderada pelo tecnólogo Ray Kurzweil, tal advento significará o fim da maioria de nossos problemas. Quem tem razão?
Envolvendo fenômenos extremamente complexos tecnologia e inteligência , a discussão se envolve em tantas
incertezas que, em tese, os dois lados podem estar certos.
Tome-se o desenvolvimento tecnológico. Quanto mais avanços houver, mais abrangentes serão as soluções, mas
também serão maiores os riscos subjacentes.
À medida em que as máquinas forem se tornando mais inteligentes, será natural que recebam um número cada
vez maior de tarefas, o que tenderá a aumentar a interdependência dos sistemas. Também aumentará, todavia, a
vulnerabilidade a eventos extremos.
A ameaça maior, entretanto, estaria contida na possibilidade de as máquinas decidirem se livrar dos humanos.
Esse raciocínio tem dois pressupostos não comprovados.
O primeiro é o de que a evolução da inteligência leva inexoravelmente a uma consciência. Esta, se de fato resultar
de processos físicos que ocorrem no cérebro, em tese poderia ser replicada em circuitos de computador. Contudo,
não existe certeza quanto a isso e não se chegou nem perto de reproduzir tal fenômeno.
Aliás, mesmo que computadores desenvolvam consciência, eles poderiam se guiar por padrões diferentes dos
humanos – sendo, por exemplo, muito mais (ou muito menos) cooperativos do que nós.
O segundo pressuposto é o de que o livre-arbítrio existe – necessário para a máquina tomar a decisão de partir
ao ataque. No entanto, experimentos recentes sugerem que essa noção é ilusória.
Folha de S. Paulo, 31 de dezembro de 2014, caderno A2 (adaptado).

2. Artigo de divulgação científica


O Artigo de Divulgação Científica é um texto informativo (dissertação expositiva), objetivo, claro, com predomínio
da função referencial, impessoal (3.a pessoa), que tem por objetivo divulgar conhecimento científico para o público leigo,
ou seja, para um público não especializado.
Para que haja compreensão do assunto, seja na área de tecnologia, genética ou outra, evita-se a linguagem
PORTUGUÊS D

estritamente técnica, ou ela é empregada com explicações simples, ou por comparação a outros elementos do cotidiano
do leitor ou ouvinte.
Apresenta conceitos precisos e válidos cientificamente, argumentos de autoridade, resultados de pesquisas e são
publicados em jornais e revistas não especializados com a finalidade de popularizar a ciência.

– 75
TEORIA_EXERC_D_C5_CURSO_2023_PORT_ZE.qxp 25/05/2023 22:00 Página 76

CIÊNCIA E IGNORÂNCIA

A ciência é uma ilha cercada de incompreensões por todos os lados. A um só


tempo, ela contradiz o senso comum, o misticismo e o pensamento mágico,
formas de interpretar o mundo adotadas pela maioria.

Nos países mais desenvolvidos, as crianças ouvem falar dos princípios que
regem a ciência, já nos primeiros anos da vida escolar. Infelizmente, entre nós,
os estudantes entram e saem das universidades sem noção de como deve ser
articulado o pensamento científico.

Quando Galileu Galilei afirmou que a Terra era um dos planetas que giravam
ao redor do Sol, quase foi condenado à morte pela Inquisição. O senso comum
era o de que ficávamos parados no centro do Universo, enquanto o Sol, a Lua e
os demais astros orbitavam à nossa volta.

Muito mais fácil para os religiosos defender que a Terra era imóvel, como
afirmava a Bíblia, do que para Galileu explicar os movimentos de translação e
rotação, que ninguém conseguia enxergar nem sentir.

Quando Charles Darwin e Alfred Wallace demonstraram que a vida na Terra


—e em qualquer planeta em que venha a existir— é uma eterna competição por
recursos naturais limitados, na qual os menos aptos perdem a oportunidade de
deixar descendentes, a reação foi tão feroz que 150 anos mais tarde ainda
existem contestadores.

No mundo da internet, o senso comum ganhou status de expertise técnica.


Ativistas do movimento antivacina, terraplanistas, charlatães e os defensores de
teorias conspiratórias e de tratamentos de eficácia jamais comprovada divulgam
ideias estapafúrdias, como se tivessem o nível de conhecimento de cientistas
brilhantes.

A ciência é uma frágil conquista civilizatória da sociedade, baseada no


raciocínio lógico, na observação empírica, na significância estatística, no confronto
de dados e na reprodutibilidade dos experimentos, regra segundo a qual a
repetição de uma experiência deve levar aos mesmos resultados,
independentemente do observador.
Drauzio Varella
PORTUGUÊS D

Médico cancerologista, autor de “Estação Carandiru”

76 –
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Textos para as questões de 1 a 6. RESOLUÇÃO:


Como se trata de um texto de divulgação científica, predomina a
Alcançar o aprendizado instantâneo é um desejo poderoso, pois linguagem referencial, objetiva, denotativa, e, portanto, acessível
o cérebro sem informação é pouco mais que estofo de macela1. ao público leigo, já que não utiliza termos técnicos ou ligados à
Emília, a sabida boneca de Monteiro Lobato, aprendeu a falar área da neurociência.
Resposta: B
copiosamente após engolir uma pílula, adquirindo de supetão todo o
vocabulário dos seres humanos ao seu redor. No filme Matrix (1999),
a ingestão de uma pílula colorida faz o personagem Neo descobrir
que todo o mundo em que sempre viveu não passa de uma
simulação chamada Matriz, dentro da qual é possível programar
qualquer coisa. Poucos instantes depois de se conectar a um
computador, Neo desperta e profere estupefato: “I know kung fu”.
Entretanto, na matriz cerebral das pessoas de carne e osso, vale
o dito popular: “Urubu, pra cantar, demora.” O aprendizado de
comportamentos complexos é difícil e demorado, pois requer a
alteração massiva de conexões neuronais.
Há consenso hoje em dia de que o conteúdo dos nossos pensa-
mentos deriva dos padrões de ativação de vastas redes neuronais,
impossibilitando a aquisição instantânea de memórias intrincadas.
Mas nem sempre foi assim. Há meio século, experimentos
2. (UNESP-2022) – De acordo com o autor,
realizados na Universidade de Michigan pareciam indicar que as
a) o avanço das pesquisas científicas pode tornar a ingestão de
planárias, vermes aquáticos passíveis de condicionamento clássico,
memórias uma prática ultrapassada.
eram capazes de adquirir, mesmo sem treinamento, associações
b) a ideia de aperfeiçoamento da memória a qualquer custo pode
estímulo-resposta por ingestão de um extrato de planárias já
representar um risco para a humanidade.
condicionadas. O resultado, aparentemente revolucionário, sugeria
c) a ideia do aprendizado instantâneo pode vir a se tornar realidade em
que os substratos materiais da memória são moléculas. Contudo,
um futuro muito próximo.
estudos posteriores demonstraram que a ingestão de planárias não
d) a consolidação de memórias pode ser acelerada mediante o
condicionadas também acelerava o aprendizado, revelando um
emprego de técnicas científicas.
efeito hormonal genérico, independente do conteúdo das memórias
e) o emprego arbitrário de técnicas científicas pode vir a descaracterizar
presentes nas planárias ingeridas.
a própria natureza da memória.
A ingestão de memórias é impossível porque elas são estados
RESOLUÇÃO:
complexos de redes neuronais, não um quantum de significado Ao fim do texto, o autor menciona um estudo, realizado em 2006,
como a pílula da Emília. Por outro lado, é sim possível acelerar a sobre os efeitos da estimulação cerebral durante o sono. Trata-se
consolidação das memórias por meio da otimização de variáveis de um argumento de autoridade, utilizado pelo autor, para
fisiológicas envolvidas no processo. Uma linha de pesquisa comprovar que o emprego de técnicas científicas podem consolidar
a memória.
importante diz respeito ao sono, cujo benefício à consolidação de
Resposta: D
memórias já foi comprovado. Em 2006, pesquisadores alemães
publicaram um estudo sobre os efeitos mnemônicos da
estimulação cerebral com ondas lentas (0,75 Hz) aplicadas durante
o sono por meio de um estimulador elétrico. Os resultados
mostraram que a estimulação de baixa frequência é suficiente para
melhorar o aprendizado de diferentes tarefas. Ao que parece, as
oscilações lentas do sono são puro pó de pirlimpimpim.
(Sidarta Ribeiro. Neurocientista brasileiro, escreveu
Limiar: ciência e vida contemporânea, 2020.)

1 macela: planta herbácea cujas flores costumam ser usadas pela


população como estofo de travesseiros.

1. (UNESP-2022) – Por se tratar de um artigo de divulgação científica


PORTUGUÊS D

(e não um artigo científico propriamente), predomina no texto uma


linguagem
a) técnica. b) acessível. c) informal.
d) figurada. e) hermética.

– 77
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3. (UNESP-2022) – “Entretanto, na matriz cerebral das pessoas de 5. (UNESP-2022) – Em “Contudo, estudos posteriores demonstraram
carne e osso, vale o dito popular: ‘Urubu, pra cantar, demora.’” que a ingestão de planárias não condicionadas também acelerava o
(2.o parágrafo) aprendizado” (3.o parágrafo), o termo sublinhado pode ser substituído,
Considerando o contexto, o ditado popular mencionado pode ser sem prejuízo para o sentido do texto, por:
substituído pelo seguinte provérbio: a) Por conseguinte. b) Inclusive. c) Todavia.
a) “Quem espera sempre alcança.” d) Além disso. e) Conquanto.
b) “Água mole em pedra dura tanto bate até que fura.” RESOLUÇÃO:
“Contudo” é uma conjunção coordenativa adversativa, cuja ideia
c) “Para bom entendedor, meia palavra basta.”
é de oposição ao período anterior. Dessa forma, é equivalente à
d) “Mais vale um pássaro na mão do que dois voando.” conjunção “todavia”.
e) “Quem canta seus males espanta.” Resposta: C
RESOLUÇÃO:
O ditado popular exposto no enunciado “Urubu, pra cantar,
demora” corresponde à ideia de “persistência, afinco, tenacidade”,
também presente no provérbio “Água mole em pedra dura tanto
bate até que fura.”
Resposta: B

4. (UNESP-2022) – Em “Ao que parece, as oscilações lentas do sono


6. (UNESP-2022) – Pode ser reescrito na voz passiva o seguinte trecho
são puro pó de pirlimpimpim” (4.o parágrafo), o autor caracteriza as
“oscilações lentas do sono” como um processo do artigo:
a) imaginário. b) estéril. c) indefinido. a) “Há consenso hoje em dia de que o conteúdo dos nossos
d) complexo. e) produtivo. pensamentos deriva dos padrões de ativação de vastas redes
RESOLUÇÃO: neuronais” (2.o parágrafo).
As técnicas científicas empregadas no estudo (“oscilações lentas b) “Uma linha de pesquisa importante diz respeito ao sono” (4.o
do sono”) demonstraram-se tão produtivas que o autor estabelece parágrafo).
uma metáfora, comparando-as ao “pó de pirlimpimpim", pó
c) “A ingestão de memórias é impossível porque elas são estados
mágico típico dos contos de fada.
Resposta: E complexos de redes neuronais” (4.o parágrafo).
d) “Em 2006, pesquisadores alemães publicaram um estudo sobre os
efeitos mnemônicos da estimulação cerebral” (4.o parágrafo).
e) “Alcançar o aprendizado instantâneo é um desejo poderoso” (1.o
parágrafo).
RESOLUÇÃO:
Para transposição da voz ativa para a passiva, é necessário que a
oração contenha um verbo transitivo direto, como é o caso do
verbo publicar, que tem como objeto direto “um estudo sobre os
efeitos mnemônicos da estimulação cerebral”. Assim, na voz
passiva, tem-se: um estudo sobre os efeitos mnemônicos da
estimulação cerebral foi publicado por pesquisadores alemães
em 2006.
Resposta: D
PORTUGUÊS D

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Texto para o teste 7. Texto para o teste 8.

O LOBO QUE NÃO É MAU

A primeira coisa a saber é que o guará não é, na verdade, um


lobo. Embora seja o maior canídeo silvestre da América do Sul, sua
espécie (Chrysocyon brachyurus) é de difícil classificação. Alguns
cientistas dizem que é parente das raposas, outros, que é parente do
cachorro-vinagre sul-americano. Mas, de lobo mesmo, ele não tem
nada. Além disso, é um animal onívoro. Porém, em algumas regiões,
a sua dieta chega a quase 70% de frutas, especialmente da lobeira,
uma árvore típica das savanas brasileiras, que contribui para a saúde
do animal, prevenindo um tipo de verminose que ataca os rins do
guará.
O lobo-guará não é um animal perigoso ao homem. Não existe Achismos
nenhum registro, em toda a história, de um guará que tenha atacado
uma pessoa, mas, ainda assim, são vistos como “maléficos”. Por
quê? Porque, em ambientes degradados, o lobo, para sobreviver,
acaba atacando galinheiros ou comendo aves que são criadas soltas.
Com a desculpa de “proteger sua criação”, pessoas com baixo nível
de consciência ecológica acabam matando os animais. 8. (FUVEST-tranferência-2021) – A partir da análise do quadrinho, é
Se não bastassem a matança e a destruição de ambientes correto afirmar que o texto expressa
naturais, o lobo-guará ainda apresenta grande índice de morte por a) uma ideia absurda, uma vez que uma flecha nunca seria
atropelamento em estradas. despedaçada por uma bexiga.
O fato é que o lobo-guará precisa de nós mais do que nunca na b) uma oposição ao conhecimento científico, que é frágil e não
história. consegue romper com as crenças consolidadas das pessoas.
FERRAREZI JR., C. Revista QShow, n. 20, nov. 2015 (adaptado). c) uma crítica à contemporaneidade, momento em que o
conhecimento científico tem sido, diversas vezes, desacreditado em
face das crenças pessoais.
7. (2023 – 2.a Aplicação) – Esse texto de divulgação d) indignação frente à violência dos cientistas, que estariam dispostos
científica utiliza como principal estratégia argu- a agredir os leigos.
mentativa a e) humor, na medida em que o conhecimento científico nunca seria
a) sedução, mostrando o lado delicado e afetuoso do animal por meio deslegitimado em face de crenças pessoais.
da negação de seu nome popular. RESOLUÇÃO:
b) comoção, relatando a perseguição que o animal sofre O balão, nomeado “Achismos”, foi atingido por uma seta,
nomeada “Evidências científicas”. Essa seta não conseguiu
constantemente pelos fazendeiros com baixo grau de instrução.
perfurar o balão e foi destruída ao tocá-lo. Infere-se, então, que o
c) intertextualidade, buscando contraponto numa famosa história conhecimento científico, hoje, não consegue romper as crenças
infantil, confrontada com dados concretos e fatos históricos. pessoais, os “achismos”. Quanto à alternativa b, o quadrinho não
d) chantagem, modificando a verdadeira índole do é uma oposição às “evidências científica”, ao contrário, é uma
lobo-guará para proteger as criações de animais domésticos em defesa a esse conhecimento que está sendo desacreditado.
Resposta: C
áreas degradadas.
e) intimidação, explorando os efeitos de sentido desencadeados pelo
uso de palavras como “matança”, “perigoso”, “degradados” e
“atacando”.
RESOLUÇÃO:
O título “O lobo que não é mau” estabelece uma clara relação de
intertextualidade com Os três porquinhos e Chapeuzinho
vermelho, por exemplo, em que esse animal é apresentado como
um ser aterrorizante, “o lobo mau”. Opondo-se a essa perspectiva,
o texto de divulgação científica sobre o lobo-guará apresenta
dados concretos e fatos históricos que desmistificam essa visão
negativa do lobo.
Resposta: C
PORTUGUÊS D

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Rascunho
PORTUGUÊS D

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Leitura
TEXTOS MOTIVADORES
Obrigatória

Texto I

Num cenário de intolerância crescente a preconceitos e escrutínio implacável do tribunal da internet,


ações como cortes e substituições de frases e ideias, alertas educativos antes das obras e até
autocensura são medidas desesperadas para nãox jogar artistas na fogueira do cancelamento.

A revisão ocorre hoje de forma mais radical na literatura, mas o mesmo princípio é aplicado em outras
áreas culturais, com as devidas nuances. Na pintura, as revelações sobre o machismo tóxico de Picasso
fizeram o museu que leva o nome do artista em Paris jogar a toalha: ao lado de suas obras, a instituição
agora vai exibir trabalhos de feministas e mulheres negras, como contraponto. Na música, o anseio de
não ferir suscetibilidades enseja uma forma de autocensura. Os Rolling Stones tiraram de seus shows
o hit de 1971 Brown Sugar, que mistura referências sexuais à escravidão. Chico Buarque não entoa mais
Com Açúcar, com Afeto, de 1967, sobre uma mulher submissa a um homem que a destrata. Nem os
clássicos do cinema escapam: antes da exibição de ... E o Vento Levou no streaming há um alerta para
o retrato romantizado da escravidão, e a animação Peter Pan vem com mensagens sobre a visão
estereotipada dos nativos americanos. Até o Príncipe Encantado da Branca de Neve está na berlinda: um
movimento condena a cena do beijo não consentido no filme da Disney.

Recentemente, o mercado editorial criou até um cargo para especialistas em caçar trechos
problemáticos: são os “leitores sensíveis”, que fazem uma varredura antes de relançamentos de
clássicos e filtram passagens polêmicas até em novos livros.
(Veja, 22 abr. 2023)

Texto II

A editora Harper Collins censurou trechos ‘potencialmente ofensivos’ de romances da escritora


britânica Agatha Christie.
Houve mudanças em partes da história que faziam referências a etnias, como descrições de
personagens negros, judeus ou ciganos. A palavra “nativos” foi substituída por “local”, e houve cautela
redobrada no uso da palavra “oriental”.
Na nova edição do romance Mistério no Caribe, de 1964, a editora tirou uma reflexão de Miss Marple,
segundo a qual um funcionário do hotel tem “dentes brancos tão adoráveis”, sob o risco de incorrer em
crime de racismo.
A censura nos livros de Agatha Christie fazem parte de um esforço das editoras para manter autores
PORTUGUÊS D

antigos “relevantes para novos leitores”.


(https://revistaoeste.com/mundo/agatha-christie-a-mais-recente-vitima-da-censura/)

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TEORIA_EXERC_D_C5_CURSO_2023_PORT_ZE.qxp 25/05/2023 22:00 Página 82

A cada dia, uma nova bula de excomunhão, uma nova lista de pessoas com que não
devemos falar ou que não devemos ouvir e uma agenda para a militância dos bons: impedir,
denunciar, constranger, calar. Tudo em nome de valores sublimes.
(Wilson Gomes, professor titular da UFBA.)

No museu do Ipiranga, em São Paulo, optou-se por acompanhar o quadro Ciclo da Caça
ao Índio, de Henrique Bernadelli, de um alerta sobre o genocídio de povos originários – em
vez de simplesmente mudar seu título, como alguns aventavam.
(Paulo Garcez, curador do Museu do Ipiranga.)

“Dar o contexto e discuti-lo é o caminho contra a censura”.


(Marisa Lajolo.)

“Quando revisitamos uma obra com os olhos de hoje, corremos o risco de apagar as
contradições de seu tempo e o que de fato havia de problemático naquele contexto”.
(Filipe Campelo, filósofo.)

MONTEIRO LOBATO
POLITICAMENTE CORRETO
O NEGÓCIO É O SEGUINTE:
A ANGÉLICA SERÁ A TIA NASTÁCIA,
O SACI GANHARÁ UMA PRÓTESE,
O RINOCERONTE VAI PRO ZOO,
A NARIZINHO FARÁ UMA RINOPLASTIA,
A EMÍLIA TERÁ UM SELO DO INMETRO...
PORTUGUÊS D

(Disponível em:
www.google.com.br/search?q=CHARGE+FOLHA+DE+S.+PAULO&espv=2&biw=1920&bih=955
&source=Inms&tbm. Acesso em: 07 maio 2015.)

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Nome ___________________________________________________________________________ 3º ANO

Unidade _________________________________________________________________________ CURSO

Turma Manhã Tarde Noite


MÓDULO 11
Matrícula –

PROPOSTA DE REDAÇÃO

Com base nos textos apresentados e em seus próprios conhecimentos, escreva uma dissertação,
empregando a norma-padrão da língua portuguesa, sobre o tema: Revisionismo da produção cultural:
ditadura do politicamente correto?

Comentário à proposta de Redação

O tema trata do revisionismo cultural que está reescrevendo ao passado para adequá-lo aos princípios morais contemporâneos. O

aluno deve discutir se a atualização por que estão passando livros, filmes e músicas é uma exigência contemporânea de limpeza moral

ou se esse tipo de interferência anula uma análise crítica do ambiente sociocultural em que a obra foi produzida. Segundo Amanda

Capuano e Raquel Carneira, autoras de uma reportagem sobre o assunto “analisar o passado e conhecer a história, mesmo que com

todos os incômodos e horrores, é fundamental para não repetir seus erros”. Assim, o aluno pode questionar se é melhor substituir os

trechos com conotação racista, machista, xenofóbica, homofóbica, gordofóbica etc, ou publicar notas de rodapé, ou informações

complementares, que esclareçam o contexto histórico da produção artística ou do autor que a criou.

“Muitos traçam paralelos com o livro 1984, do escritor britânico George Orwell. No livro, um regime

ditatorial adota uma língua oficial em que as palavras somem de livros, jornais e documentos ao serem

proibidas, e as pessoas têm cada vez menos possibilidade de se expressar. No Brasil, aliás, a expressão

muitas vezes é complementada como “ditadura do politicamente correto”.

https://www.bbc.com/portuguese/geral-62550838
PORTUGUÊS D

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Nome do(a) corretor(a): _________________________________________________________________

Critérios de correção UNESP/UNIFESP Peso Nota atribuída

Tema 3,5

3,5
PORTUGUÊS D

Estrutura (gênero/tipo de texto e coerência)

Expressão (coesão e modalidade: aspectos


gramaticais e escolha lexical) 3,0

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MÓDULO 22 Variantes linguísticas

Não há dúvida que as línguas se aumentam e alteram com o tempo e as necessidades dos usos e costumes.
(…) A este respeito a influência do povo é decisiva.
(Machado de Assis)

1. LINGUAGEM FALADA E ESCRITA

A língua escrita tem como uma de suas finalidades representar graficamente a língua falada. Contudo, os sinais
gráficos não conseguem mostrar grande parte dos elementos da fala, como o timbre da voz, a entonação, os gestos,
as expressões fisionômicas.
Sendo assim, a linguagem escrita deve ser muito mais trabalhada, para compensar o que lhe falta. Mas a escrita não é
apenas reprodução da fala, pois é também um meio autônomo de comunicação e produção de sentido. As grandes obras
da tradição oral – isto é, obras compostas e transmitidas oralmente durante séculos, antes da existência da escrita – foram
registradas por escrito e assim chegaram até nós (exemplos: a Bíblia, os poemas de Homero). Mas as obras literárias,
filosóficas, científicas, etc. dependem da escrita desde o momento de sua criação: são compostas por escrito e assim
transmitidas, geralmente em vista da leitura silenciosa e solitária.
Não há uma língua que seja, em todos os seus campos de aplicação, um sistema uno, invariado e rígido, ainda que,
frequentemente, parta-se do pressuposto de que existe um idioma padrão, falado em determinado país, aceito pela
comunidade e imposto pelo uso comum. Sabe-se que, de modo geral, a língua apresenta não só variações regionais,
mas também registros diferenciados de acordo com a situação, formal ou informal, em que se dá a comunicação.

Linguagem culta
A linguagem culta é ensinada nas escolas e serve de instrumento para a comunicação formal (incluindo-se aí a
imprensa) e para as criações da literatura, do pensamento e das ciências, nas quais se apresenta com terminologias
especiais. É usada pelas pessoas instruídas das diferentes classes sociais e caracteriza-se por obedecer a padrões
tradicionais, presentes nos textos de escritores consagrados e codificados nas gramáticas normativas, que apresentam
“regras” para o que é considerado o “bom” uso da língua. (Há também gramáticas descritivas, que não contêm regras,
mas apenas análise dos usos linguísticos.)

Linguagem popular
PORTUGUÊS D

Linguagem popular é a usada espontânea e livremente pelo povo. Muitas vezes foge à norma gramatical e aos
padrões tradicionais, criando formas de expressão que os conservadores, presos à gramática normativa, classificam
negativamente como “erros”, “vícios de linguagem”, “vulgarismos” e gíria.
A gíria é uma das maiores fontes de criatividade linguística e a língua popular é um dos fatores centrais (mas não o
único) a determinar as alterações e a evolução de uma língua.

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Gíria
Segundo Mattoso Câmara Jr., “estilo literário e gíria são, em verdade, dois pólos da Estilística, pois gíria não é a
linguagem popular, como pensam alguns, mas apenas um estilo que se integra à língua popular”. Tanto que nem todas
as pessoas que se exprimem por meio da linguagem popular usam gíria.
No estilo literário, a gíria pode ser incluída para atribuir ao texto informalidade e espontaneidade. No entanto, o
tempo de vigência de um termo de gíria pode ser efêmero, pois a gíria é muito dinâmica e suas criações podem
desaparecer rapidamente.
Sendo assim, uma obra literária que contém muitos termos de gíria corre sério risco de ficar ultrapassada. Mas, é
claro que não podemos descartar a possibilidade de incorporação definitiva de termos de gíria à língua, como já aconteceu
não raras vezes. Por isso, nem sempre é possível estabelecer uma distinção precisa entre gíria e palavra popular, mes-
mo porque ambas são, frequentemente, de origem popular.

A linguagem regional (ou dialetal) e a língua padrão


Linguagem regional é aquela marcada por características típicas de determinada região, do ponto de vista fonológico
(pronúncia), vocabular e cultural – exemplos: falar ou dialeto caipira, gaúcho, carioca, mineiro, paulista, lusitano (com
diversas variantes dialetais) etc. Há regiões que contam com vários dialetos (por exemplo, há diversos dialetos paulistas:
o caipira, o italianado etc.). Uma língua é um conjunto de dialetos, dos quais se destaca um que, por seu prestígio cultural
e social, é considerado a língua padrão.

Alguns termos de gíria e nomes que vieram do tupi


Nhenhenhém: falar muito, resmungar, vem do verbo nhe’eng, Pindaíba: pindá é anzol, a’ib, ruim. A expressão servia para
que significa falar. indicar quando alguém ia mal nas pescarias e não conseguia o
Chorar as pitangas: pyrang em tupi é vermelho. A expressão suficiente para comer. Hoje o termo é usado para indicar “sem
significa pedir insistentemente algo que é negado, lamuriando-se, dinheiro, duro”.
choramingando (até os olhos ficarem vermelhos). Pernambuco: mar com fendas, rachado, o que representaria os
Jururu: aruru significa triste, cabisbaixo. arrecifes do mar pernambucano.
(Revista Veja – Adaptado)
Ipanema: nome de lugar fedorento.

O DRAMA LINGUÍSTICO NO BRASIL

Em todas as sociedades, existe sempre um grupo de pessoas, uma classe social ou uma comunidade local específica, que
acredita que o seu modo particular de falar a língua é o mais correto, o mais bonito, o mais elegante e, por isso, deve ser o modelo
que as outras classes e comunidades precisam imitar. Em geral, são os moradores das regiões economicamente mais ricas, os
habitantes de alto poder aquisitivo dos grandes centros urbanos, os cidadãos com acesso aos melhores meios de escolarização
– enfim, aquilo que nas ciências sociais se chama de classes dominantes.
Essa situação varia muito de acordo com o grau de democratização das relações sociais de um país. Seja como for, esse
elemento cultural está presente em qualquer grupo humano e em muitos lugares constitui um instrumento de conflitos e tensões
sociais. A narrativa bíblica nos conta uma história terrível de como uma diferença linguística pode ser usada com as piores intenções:
numa guerra entre duas tribos de Israel, os galaaditas e os efraimitas, os primeiros se apoderaram dos vaus do Jordão, trechos
rasos que podiam ser atravessados a pé. Quando alguém atravessava o rio, os galaaditas mandavam que pronunciasse a palavra
shibboleth (“espiga”): na variedade linguística dos efraimitas, a palavra era pronunciada sibboleth, sem o chiado inicial. Quando
ouviam essa pronúncia, os galaaditas “então o matavam nos vaus do Jordão. Caíram naquele tempo quarenta e dois mil homens
de Efraim” (Juízes, 12:4-6).
No Brasil, a situação linguística revela um drama parecido, embora a violência aqui seja exercida no nível simbólico, mas nem por
isso menos violenta. Os brasileiros urbanos letrados não só discriminam o modo de falar de seus compatriotas analfabetos,
semianalfabetos, pobres e excluídos, como também discriminam o seu próprio modo de falar, as suas próprias variedades linguísticas.
Podemos dizer, portanto, que o preconceito linguístico no Brasil se exerce em duas direções: dentro da elite para fora dela, contra
os que não pertencem às camadas sociais privilegiadas; e de dentro da elite para ao redor de si mesma, contra seus próprios
membros. Isso porque, como eu já disse, existe uma mentalidade dos brasileiros em geral, e dos falantes urbanos escolarizados
PORTUGUÊS D

em particular, a convicção muito arraigada de que no Brasil ninguém fala bem o português.
Quando até mesmo as elites letradas demonstram baixa estima linguística, quando exigem um grau elevado de insegurança
linguística e de rejeição de seu próprio modo de falar, é porque o obscurantismo cultural que as atinge é realmente grave, quase
uma doença.
(Marcos Bagno. Não é errado falar assim: em defesa do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2009. p. 21-22.)

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Examine a tira de André Dahmer para responder ao teste 1. Texto para o teste 3.

AS LÍNGUAS SILENCIADAS DO BRASIL

Para aprender a língua de seu povo, o professor Txaywa Pataxó,


de 29 anos, precisou estudar os fatores que, por diversas vezes,
quase provocaram a extinção da língua patxôhã. Mergulhou na
história do Brasil e descobriu fatos violentos que dispersaram os
pataxós, forçados a abandonar a própria língua para escapar da
perseguição. “Os pataxós se espalharam, principalmente, depois do
Fogo de 1951. Queimaram tudo e expulsaram a gente das nossas
terras. Isso constrange o nosso povo até hoje”, conta Txaywa,
estudante da Universidade Federal de Minas Gerais e professor na
aldeia Barra Velha, região de Porto Seguro (BA). Mais de quatro
décadas depois, membros da etnia retornaram ao antigo local e
iniciaram um movimento de recuperação da língua patxôhã. Os filhos
de Sameary Pataxó já são fluentes — e ela, que se mudou quando
já era adulta para a aldeia, tenta aprender um pouco com eles. “É a
nossa identidade. Você diz quem você é por meio da sua língua”,
afirma a professora de ensino fundamental sobre a importância de
restaurar a língua dos pataxós. O patxôhã está entre as línguas
(Malvados, 2008.) indígenas faladas no Brasil: o IBGE estimou 274 línguas no último
censo. A publicação Povos indígenas no Brasil 2011/2016, do
1. (UNESP-2020) – Na tira, a morte é caracterizada como Instituto Socioambiental, calcula 160. Antes da chegada dos
a) frívola. b) compassiva. portugueses, elas totalizavam mais de mil.
c) solitária. d) incorruptível. (Disponível em: https://brasil.elpais.com.
e) materialista. Acesso em: 11 jun. 2019. Adaptado.)
RESOLUÇÃO:
A personagem Morte, na tirinha, não se deixa seduzir pela súplica
“É cedo para mim. Me adianta essa vai...”, nem pela oferta de 3. (2022) – O movimento de recuperação da língua
emprego mais vantajosa, portanto ela não se corrompe.
patxôhã assume um caráter identitário peculiar na
Resposta: D
medida em que
a) denuncia o processo de perseguição histórica sofrida pelos povos
indígenas.
b) conjuga o ato de resistência étnica à preservação da memória
2. (UNESP-2020) – Constituem exemplos de linguagem formal e de cultural.
linguagem coloquial, respectivamente, as seguintes falas: c) associa a preservação linguística ao campo da pesquisa acadêmica.
a) “Ah, estou morrendo de pena...” e “Ainda vou trabalhar a noite d) estimula o retorno de povos indígenas a suas terras de origem.
inteira no Iraque, meu rapaz.” e) aumenta o número de línguas indígenas faladas no Brasil.
b) “Me adianta essa, vai...” e “É cedo para mim.” RESOLUÇÃO:
c) “O importante é trabalhar com o que a gente gosta.” e “Posso lhe A recuperação da língua patxôhã, extinta em razão de uma
dar um emprego bem melhor...” processo histórico de perseguições, de violências e de movimentos
d) “É cedo para mim.” e “Posso lhe dar um emprego bem melhor...” de dispersão, é uma forma de resgatar a identidade do povo
pataxó, por meio da resistência étnica e da preservação da
e) “Posso lhe dar um emprego bem melhor...” e “Me adianta essa,
memória cultural: “Você diz quem você é por meio da sua língua”.
vai...” Resposta: B
RESOLUÇÃO:
A oração “Posso lhe dar um emprego” é representativa da norma
culta, em que “um emprego” é objeto direto e o pronome “lhe”
funciona como objeto indireto, sendo ambos complementos
verbais do verbo “dar”. A segunda oração exemplifica a linguagem
PORTUGUÊS D

oral tanto sintática, iniciando-se com pronome oblíquo, quanto


semanticamente, com o uso de expressão popular “adianta essa,
vai”, que significa pedido de ajuda ou concessão.
Resposta: E

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Texto para o teste 4. Texto para o teste 5.

1 Sim, estou me associando à campanha nacional contra os A historiografia do país demonstra que foi necessário
2 verbos que acabam em “ilizar”. Se nada for feito, daqui a pouco considerável esforço do colonizador português em impor sua língua
3 eles serão mais numerosos do que os terminados pátria em um território tão extenso. Trata-se de um fenômeno
4 simplesmente em “ar”. Todos os dias os maus tradutores de político e cultural relevante o fato de, na atualidade, a língua
5 livros de marketing e administração disponibilizam mais e mais portuguesa ser a língua oficial e plenamente inteligível de norte a
6 termos infelizes, que imediatamente são operacionalizados pela sul do país, apesar das especificidades e da grande diversidade dos
7 mídia, reinicializando palavras que já existiam e eram chamados “sotaques” regionais. Esse empreendimento relacionado
8 perfeitamente claras e eufônicas. à imposição da língua portuguesa foi adotado como uma das
9 A doença está tão disseminada que muitos verbos honestos, estratégias de dominação, ocupação e demarcação das fronteiras
10 com currículo de ótimos serviços prestados, estão a ponto de do território nacional, sucessivamente, em praticamente todos os
11 cair em desgraça entre pessoas de ouvidos sensíveis. Depois períodos e regimes políticos. Da Colônia ao Império, da República ao
12 que você fica alérgico a disponibilizar, como você vai admitir, Estado Novo e daí em diante.
13 digamos, “viabilizar”? É triste demorar tanto tempo para a gente Tomemos como exemplo o nheengatu, uma língua baseada no
14 se dar conta de que “desincompatibilizar” sempre foi um tupi antigo e que foi fruto do encontro, muitas vezes belicoso e
15 palavrão. violento, entre o colonizador e as populações indígenas da costa
(FREIRE, Ricardo. brasileira e de grande parte da Amazônia. Foi a língua geral de
Complicabilizando. Época, ago. 2003.) comunicação no período colonial até ser banida pelo Marquês de
Pombal, a partir de 1758, caindo em pleno processo de desuso e
decadência a partir de então. Foram falantes de nheengatu que
4. (FUVEST) – Com base no texto, é correto afirmar:
nominaram uma infinidade de lugares, paisagens, acidentes
a) A “campanha nacional” a que se refere o autor tem por objetivo
geográficos, rios e até cidades. Atualmente, resta um pequeno
banir da língua portuguesa os verbos terminados em “ilizar”.
contingente de falantes dessa língua no extremo norte do país. É
b) O autor considera o emprego de verbos como “reinicializando” (L. 7)
utilizada como língua franca em regiões como o Alto Rio Negro, sendo
e “viabilizar” (L. 13) uma verdadeira “doença”.
inclusive fator de afirmação étnica de grupos indígenas que perderam
c) A maioria dos verbos terminados em “(i)lizar”, presentes no texto,
sua língua original, como os Barés, Arapaços, Baniwas e Werekenas.
foi incorporada à língua por influência estrangeira.
Disponível em: http://desafios.ipea.gov.br.
d) O autor, no final do primeiro parágrafo, acaba usando
Acesso em: 20 out. 2021 (adaptado).
involuntariamente os verbos que ele condena.
e) Os prefixos “des” e “in”, que entram na formação do verbo
“desincompatibilizar” (L. 14), têm sentido oposto, por isso o autor o 5.
considera um “palavrão”. (2022 - 2.ª aplic.) – Da leitura do texto, depreen-
RESOLUÇÃO: de-se que o patrimônio linguístico brasileiro é
Segundo o autor, a recorrência de verbos terminados em “-ilizar”, a) constituído por processos históricos e sociais de dominação e
em nossa língua, advém da ação de “maus tradutores de livros de
violência.
marketing e administração”, que incorporam anglicismos à língua
portuguesa, desconsiderando o uso de termos vernáculos com a b) decorrente da tentativa de fusão de diferentes línguas indígenas.
mesma acepção. c) exemplificativo da miscigenação étnica da sociedade nacional.
Resposta: C d) caracterizado pela diversidade de sotaques e regionalismos.
e) resultado de sucessivas ações de expansão territorial.
RESOLUÇÃO:
A imposição da língua do colonizador evidencia a relação de
dominação e de violência a que foi submetido o nativo. Essa
estratégia pode ser exemplificada pela proibição do nheengatu,
língua geral, fruto da influência entre o idioma do colonizador e
das populações indígenas, ser determinada por Marquês de
Pombal, em 1758.
Resposta: A
PORTUGUÊS D

88 –
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Texto para o teste 6. Texto para o teste 7.

PAPOS

— Me disseram...
— Disseram-me.
— Hein?
— O correto é “disseram-me”. Não “me disseram”.
— Eu falo como quero. E te digo mais... Ou é “digo-te”?
— O quê?
— Digo-te que você...
— O “te” e o “você” não combinam.
— Lhe digo?
— Também não. O que você ia me dizer?
— Que você está sendo grosseiro, pedante e chato. [...]
— Dispenso as suas correções. Vê se esquece-me. Falo como
bem entender. Mais uma correção e eu...
— O quê?
— O mato.
— Que mato?
(Disponível em: www.nadaver.com. Acesso em: 20 jul. 2012.) — Mato-o. Mato-lhe. Mato você. Matar-lhe-ei-te. Ouviu bem?
Pois esqueça-o e para-te. Pronome no lugar certo é elitismo!
— Se você prefere falar errado...
6. (2022 - 2.ª aplic.) – Esse cartaz tem como função — Falo como todo mundo fala. O importante é me entenderem.
social conquistar clientes para um evento turístico, Ou entenderem-me?
e, por isso, seria recomendável que fosse escrito (VERISSIMO, L. F. Comédias para se ler na escola.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. Adaptado.)
na norma-padrão da língua portuguesa. O comentário acrescentado por
um interlocutor sugere que a grafia incorreta da palavra “excursão”
a) interfere na pronúncia do vocábulo. 7. (2022) – Nesse texto, o uso da norma-padrão
b) reflete uma interferência da fala na escrita. defendido por um dos personagens torna-se
c) caracteriza uma violação proposital para chamar a atenção dos inadequado em razão do(a)
clientes. a) falta de compreensão causada pelo choque entre gerações.
d) diminui a confiabilidade nos serviços oferecidos pela prestadora. b) contexto de comunicação em que a conversa se dá.
e) compromete o entendimento do conteúdo da mensagem. c) grau de polidez distinto entre os interlocutores.
RESOLUÇÃO: d) diferença de escolaridade entre os falantes.
O comentário de que “excurção c/ ç não vai a lugar nenhum” e) nível social dos participantes da situação.
questiona a credibilidade da prestadora de serviço, já que esse RESOLUÇÃO:
vocábulo foi redigido em desacordo com a norma-padrão da língua No texto “Papos”, ocorre interlocução entre dois falantes, marcada
portuguesa. pela discussão a respeito do uso da norma-padrão. Um deles
Resposta: D insiste em defender o uso dessa modalidade, como a colocação
pronominal em ênclise no início de frases (Disseram-me) e a
referência à mesma pessoa gramatical do discurso (O “te” e o
“você” não combinam). No entanto, essas escolhas tornam-se
inadequadas em razão do contexto de comunicação em que a
conversa se dá, tendo em vista o teor coloquial do diálogo.
Resposta: B
PORTUGUÊS D

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MÓDULO 23 Ambiguidade

A ambiguidade designa “os equívocos de sentido, provenientes de construção defeituosa da frase ou do uso de termos
impróprios”. Ambiguidade é, portanto, defeito de frase que apresenta duplo sentido. Indesejável (ou não apropriada) em textos
científicos e informativos, é um recurso explorado nos textos poéticos, humorísticos e, principalmente, publicitários.
(Massaud Moisés, Dicionário de termos literários – adaptado)

Examine a tirinha do cartunista Silva João, publicada em sua conta do Examine a tira de André Dahmer.
Instagram em 26.09.2019.

Coisas que
abrem a
cabeça de
um jovem?

... e
1. (UNESP-2023) – O efeito de humor da tirinha está centrado na Livros... motos!
ambiguidade do termo
a) “inspire”. b) “cheguei”. c) “bolso”.
d) “acreditei”. e) “sonho”.
RESOLUÇÃO:
O efeito de humor da tirinha centra-se no duplo sentido do verbo (Malvados, 2019.)
“inspirar”: aspirar ar (sentido acionado pelo médico); ou motivar
por ações ou discurso (sentido acionado pelo paciente em sua
resposta). A ambiguidade, portanto, ocorre quando a personagem 2. (FAMERP-2021) – Para obter seu efeito de humor, a tira explora a
conta sua vida como inspiração para outras pessoas. ambiguidade do termo:
Resposta: A
a) “abrem”. b) “jovem”.
c) “Coisas”. d) “Livros”.
e) “motos”.
RESOLUÇÃO:
O recurso explorado pela tirinha é a ambiguidade que ocorre no
emprego da forma verbal “abrem”. Assim, em sentido figurado, a
expressão “abrir a cabeça” pode ser entendida como sinônimo de
provocar uma reflexão ou revisão crítica sobre algo; enquanto que,
em sentido literal, pode ser interpretada como “lesionar o crânio”.
Ao acionar, inesperadamente, no último quadrinho, o sentido
denotativo, há efeito de humor.
Resposta: A
PORTUGUÊS D

90 –
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Texto para a questão 3. Texto para a questão 4.

“Se Cabral tivesse uma vaga noção d’ACAPA de hoje, véspera do 22


DITADURA / DEMOCRACIA
de abril de 2020, provavelmente teria desviado o curso de suas
caravelas rumo a outras terras.”
A diferença entre uma democracia e um país totalitário é que
numa democracia todo mundo reclama, ninguém vive satisfeito. Mas
se você perguntar a qualquer cidadão de uma ditadura o que acha de
seu país, ele responde, sem hesitação: “Não posso me queixar”.
(Millôr Fernandes, Millôr definitivo: a bíblia do caos)

4. (FUVEST)
a) Para produzir o efeito de humor que o caracteriza, esse texto
emprega o recurso da ambiguidade? Justifique sua resposta.
RESOLUÇÃO:
O trecho que apresenta duplo sentido é “Não posso me queixar”,
que pode ser entendido de duas formas: “não tenho de que me
queixar, estou satisfeito”, ou “não tenho permissão para me
queixar, pois posso ser punido caso me manifeste”.

b) Reescreva a segunda parte do texto (de “Mas” até “queixar”),


pondo no plural a palavra “cidadão” e fazendo as modificações
necessárias.
RESOLUÇÃO:
Mas se você perguntar a quaisquer cidadãos de uma ditadura o
que acham de seu país, eles respondem, sem hesitação: Não
podemos nos queixar.
(ACAPA. Disponível em https://www.facebook.com/acapabr/.
Acessado em 30/ 04/2020.)

3. (UNICAMP-2021) – ACAPA é um perfil de Facebook, que publica


capas possíveis de revista. O efeito humorístico na leitura dessa edição
de ACAPA decorre mais precisamente do uso
a) da expressão “terra à vista”, que remete à época em que a terra
ainda era plana.
b) da expressão “abundam birutas”, em referência aos povos
originários do Brasil.
c) do pronome relativo “cujo” para indicar o destino traçado para a terra
plana há 520 anos.
d) da imagem de uma biruta mostrando a direção do vento, aliada à
referência a “birutas” atuais.
RESOLUÇÃO:
O efeito de humor presente na edição de ACAPA ocorre na
polissemia da palavra “biruta”, pois se refere tanto ao instrumento
PORTUGUÊS D

utilizado para indicar a direção dos ventos, quanto ao sentido de


“insano, amalucado”. No texto, a referência a biruta como
instrumento de navegação aparece no logotipo de ACAPA e na
expressão “ventos e velas”; já a passagem “abundam birutas”
insinua insanidade daqueles que acreditam na “terra plana”.
Resposta: D

– 91
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Tira para a questão 5. 6. (FUVEST) – Leia a seguinte mensagem publicitária de uma


empresa da área de logística:

A gente anda na linha para levar sua empresa mais longe

Mudamos o jeito de transportar contêineres no Brasil e


Mercosul. Através do modal ferroviário, oferecemos soluções
logísticas econômicas, seguras e sustentáveis.

a) Visando a obter maior expressividade, recorre-se, no título da


mensagem, ao emprego de expressão com duplo sentido. Indique
essa expressão e explique sucintamente.
RESOLUÇÃO:
A expressão que apresenta duplo sentido é “andar na linha”, que
tanto pode referir-se a transportar sobre trilhos, quanto a agir
corretamente, respeitando os princípios éticos e morais.

(Níquel Náusea: cadê o ratinho do titio?, 2011. Adaptado.)

5. (FUVEST-transferência-2021) – Sobre a tira de Armandinho, pode-


se afirmar que para a criança e para o adulto, respectivamente, “vendo”
está
b) Segundo o anúncio, uma das vantagens do produto (transporte
a) na forma nominal de particípio e no presente do indicativo do verbo
ferroviário) nele oferecido é o fato de esse produto ser
“ver”.
“sustentável”. Cite um motivo que justifique tal afirmação.
b) na forma nominal de gerúndio do verbo “ver” e no presente do
RESOLUÇÃO:
indicativo de “vender”. A sustentabilidade está relacionada com o desenvolvimento
c) na forma nominal de infinitivo do verbo “ver” e no presente do econômico e material, minimizando a agressão ao meio ambiente.
indicativo de “vender”. Dessa forma, o modal ferroviário é sustentável porque a quanti-
d) no presente do indicativo do verbo “ver” e na forma nominal de dade de CO2 liberada é menor do que a de outros meios de
transporte.
gerúndio de “vender”.
e) no presente do indicativo do verbo “vender” e na forma nominal de
particípio de “ver”.
RESOLUÇÃO:
O texto da placa, carregada por Armandinho, é ambíguo. A forma
verbal “vendo” pode ser tanto o gerúndio do verbo “ver”, sentido
atribuído pela criança (“Eu estou vendo o pôr do sol”), quanto o
presente do verbo “vender” na primeira pessoa do singular,
entendimento do adulto, comprovado pela pergunta sobre o valor
do pôr do sol.
Resposta: B
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As questões 7 e 8 focalizam uma passagem da comédia O juiz de paz 8. (UNIFESP) – O emprego das aspas no interior da fala do escrivão
da roça do escritor Martins Pena (1815-1848). indica que tal trecho
a) reproduz a solicitação de Francisco Antônio.
JUIZ (assentando-se): Sr. Escrivão, leia o outro requerimento. b) recorre a jargão próprio da área jurídica.
ESCRIVÃO (lendo): Diz Francisco Antônio, natural de Portugal, c) reproduz a fala da mulher de Francisco Antônio.
porém brasileiro, que tendo ele casado com Rosa de Jesus, trouxe d) é desacreditado pelo próprio escrivão.
esta por dote uma égua. “Ora, acontecendo ter a égua de minha e) deve ser interpretado em chave irônica.
mulher um filho, o meu vizinho José da Silva diz que é dele, só RESOLUÇÃO:
porque o dito filho da égua de minha mulher saiu malhado como o No discurso do escrivão, o emprego das aspas indica o discurso
alheio, ou seja, o discurso direto do requerente Francisco Antônio.
seu cavalo. Ora, como os filhos pertencem às mães, e a prova disto
Resposta: A
é que a minha escrava Maria tem um filho que é meu, peço a V. Sa.
mande o dito meu vizinho entregar-me o filho da égua que é de
minha mulher”.
JUIZ: É verdade que o senhor tem o filho da égua preso?
JOSÉ DA SILVA: É verdade; porém o filho me pertence, pois é meu,
que é do cavalo.
JUIZ: Terá a bondade de entregar o filho a seu dono, pois é aqui da
mulher do senhor.
JOSÉ DA SILVA: Mas, Sr. Juiz...
JUIZ: Nem mais nem meios mais; entregue o filho, senão, cadeia.
(Martins Pena. Comédias (1833-1844), 2007.)

7. (UNIFESP) – O efeito cômico produzido pela leitura do requerimento


decorre, principalmente, do seguinte fenômeno ou procedimento
linguístico:
a) paródia.
b) intertextualidade.
c) ambiguidade.
d) paráfrase.
e) sinonímia.
RESOLUÇÃO:
A expressão “égua de minha mulher” apresenta duplo sentido,
pois tanto pode referir-se ao animal quanto à esposa do referente.
Resposta: C

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Anotações
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