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O GUIA PRÁTICO
DO MELISMA
por leonardo gonçalves
2023
1. O QUE É UM MELISMA?
qualquer sílaba cantada com mais de 3 (três) notas. essa é a definição básica
de um melisma.
todos os povos e tribos humanas possuem alguma cultura, com sua própria
linguagem, costumes e mesmo arte, entre outras coisas. e todas essas culturas
possuem também alguma forma de canto. portanto, todas elas possuem alguma
forma de melisma.
não vamos estudar sobre todo e qualquer tipo de melisma, de qualquer
cultura. vamos estudar o melisma que tem sido mais usado no ocidente e que tem
influenciado muito a indústria fonográfica, que é o melisma que chegou até nós
através dos escravizados pretos que vieram do continente africano.
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a) whitney houston I LOVE THE LORD "every groan" > min. 1:59;
b) lauryn hill TELL HIM (final da ponte) > min. 2:48;
c) leonardo gonçalves MORIÁ (logo depois da modulação) > min. 3:27;
d) kirk franklin (isaac carree) SOMETHING ABOUT THE NAME JESUS > min. 4:33.
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recurso. se você não tiver acabamento, você está infinitamente mais sujeito a ser
criticado. porque o melisma realmente não é fácil. e ser criticado por ter tentado
fazer algo que você ainda não sabe fazer é uma crítica dura de engolir. se forem
criticar, que pelos menos critiquem algo que você sabe que fez muito bem feito. o
processo pode soar árduo, mas é MUITO recompensador.
eu vou ficar insistindo nisso, porque realmente é o que deu certo pra mim:
treine vagarosamente!
quando você faz os treinos detalhada e vagarosamente, insistindo em ficar
repetindo cada trecho e cada nota do melisma, além de sua musculatura se
acostumar a realizar todos os movimentos necessários, você também terá a
oportunidade de refletir a respeito daquilo que está fazendo.
e, ao fazer vagarosamente, sua voz naturalmente encontrará inflexões (que
são aquelas mudanças de intensidade da nota quando você mexe o maxilar, por
exemplo), pequenos atrasos e antecipações, o momento certo de colocar um
micro-vibrato, talvez um pequeno bend… tudo isso faz parte do acabamento do
melisma.
acabamento parece um detalhe, mas como diz o famoso designer charles
eames: "os detalhes não são os detalhes. eles constituem o produto. serão, por fim,
estes detalhes que darão ao produto sua vida."
e é no acabamento que está a vida do melisma.
na maior parte dos casos, o efeito do melisma vai estar na sua execução
CASUAL, sem esforço e naturalmente, como se nada estivesse acontecendo. você
"joga" o melisma como quem não quer nada.
em alguns casos, no entanto, – e talvez nos casos mais importantes,
especialmente dependendo da retórica da música – toda a canção e todo o arranjo
serão construídos para aquele exato momento do melisma. é o caso de VISION OF
LOVE da mariah carey, de BENDED KNEE (e tantas outras) do boyz ii men, de
incontáveis músicas do tonéx, como MAKE ME OVER e, também, de canções como
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GETSÊMANI. são músicas cujos arranjos são construídos de tal maneira que sem o
melisma não funcionam ou perdem muita força.
mas antes de entrar em músicas e análises de músicas específicas, me
permita explicar melhor o que eu quero dizer com “retórica musical”: um exemplo
bem óbvio e até “bobo” é o que eu fiz na interpretação da música O AMOR DE
DEUS, no álbum “poemas e canções”. “o vento que ruge ou que sopra mansinho”:
quando o vento ruge, eu imito esse som com a voz e quando ele sopra mansinho,
eu imito exatamente isso com a voz.
mas existem exemplos muito mais complexos de retórica musical. na
abertura da PAIXÃO SEGUNDO SÃO JOÃO de bach, por exemplo, a nota mais
grave que todos os naipes do coral cantam é na palavra em alemão NIEDRIGKEIT,
que significa “baixeza”. digamos que você escrevesse uma música do SALMO 130
“das profundezas clamo a Ti” e então começasse nas notas graves pra, com isso,
remeter às profundezas. pra dar apenas dois exemplos de casos mais elaborados,
temos JESUS, ALEGRIA DOS HOMENS de bach (por muitos considerado o rei da
retórica musical), em que a melodia começa no segundo tempo e não no primeiro,
porque trata de Jesus, a SEGUNDA pessoa da trindade. ou ainda a canção COISAS
INVISÍVEIS do meu falecido amigo wendel mattos, que compôs uma música inteira
em que suprimiu a 3a de todos os acordes, mas em que ela soa junto por causa da
abertura em que tocou o piano – aquela coisa dos harmônicos que soam juntos –
para se referir àquilo que DEUS faz e existe, mas nós não vemos. resumindo:
quando a letra, a melodia, o arranjo, a interpretação, a sonoridade e tudo mais que
houver estiver comunicando, reforçando e construindo um mesmo significado, é ali
que temos um excelente exemplo de retórica musical.
no caso de GETSÊMANI, o melisma do “vem, vê” é a expressão máxima da
dor física, emocional, mental e espiritual que Jesus sentiu naquela cruz. aqui, o
melisma e os agudos não podem ser casuais. aqui, o esforço no limite e a busca por
transcender esse limite fazem parte essencial da interpretação. o limite da tessitura
remete à dor, mas os melismas remetem à superação da dor e até mesmo
libertação da dor. e, embora no momento da morte de nosso Senhor Jesus Cristo
Ele sentisse muita dor, era uma dor que iria NOS libertar. logo, o uso do melisma
"não casual" reforça e contribui para o significado que está sendo transmitido.
gaste um tempo pensando em qual é a FUNÇÃO do melisma no contexto
daquela canção. lembra do melisma que mencionei da whitney houston em I LOVE
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THE LORD? a palavra GROAN seria traduzida como GRUNHIDO (de "grunhidos
inexprimíveis" mesmo) e, dentro do que chamamos de retórica musical que eu
expliquei ali, essa é uma EXCELENTE palavra pra você colocar um melisma como
aquele, ou até mesmo qualquer outro.
agora, pegue aquele mesmo melisma da whitney houston e coloque num hino
da harpa que não tem nada a ver, como SANTO, SANTO, SANTO. se vc fizer isso,
é CLARO que um pastor de gerações mais avançadas vai pegar o microfone e dizer
que não se deve "esmerilar o hino".
se seu melisma tiver ACABAMENTO, como vimos no item 6, e CONTEXTO
como estou falando aqui, vai ser bem mais difícil criticarem ou estranharem o hino.
outro exemplo: na música I'M FREE, que ton carfi e eu cantamos com o
família soul, a temática da música gira em torno da liberdade que temos através do
nome de Jesus. dentro do contexto dessa música alegre, se você usar e até abusar
do melisma CASUAL, rápido e leve, faz total sentido e está em perfeita harmonia
com a proposta da música. neste caso, o melisma também vem reforçar e destacar
a mensagem que a música pretende transmitir.
mais um exemplo de melismas que reforçam o que a música já está dizendo:
MURO, do meu primeiro álbum "poemas e canções". nessa música, eu canto três
vezes a frase "e esse muro logo irá cair”. na primeira vez, a melodia que foi escrita,
retoricamente já colocou uma frase melódica descendente, imitando a queda do
muro (de berlin, no caso). da segunda vez, ao subir a nota da melodia, a "queda"
fica maior. já no terceiro e último coro, ao subir ainda mais a nota da melodia antes
da "queda", ela fica ainda maior e ainda mais acentuada.
outro tipo de uso retórico de melisma, especialmente em um contexto mais
pentecostal, é o uso de melismas mais complexos, mais inesperados, que fogem da
escala pentatônica e podem muito bem ser usados para gerar sensação de
"mistério", especialmente quando começam em uma nota ou em um momento
inesperado.
vou dar um exemplo: JESUS MEU GUIA É já tem uma sensação de "mistério"
porque é uma música em tom menor, mas que em sua melodia usa uma 7a maior.
ou seja: já gera uma estranheza. daí o melisma, que na minha opinião é o mais
importante da música (que eu faço no min. 5:16), começa numa 7a menor,
exatamente depois que a melodia fez essa 7a maior. iniciar um melisma numa 7a já
seria incomum em qualquer caso, mas com essa tensão envolvendo tanto a 7a
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quem canta e anseia por isso, não chegou lá ainda. e mesmo quando a letra no final
diz “encontrei o meu lugar”, se você analisar a letra, esse lugar não é o da calmaria,
mas o de entender que “o Eterno lar começa no momento em que vivo para Te
encontrar”. ou seja: é o lugar de tensão que, diga-se de passagem, é a temática do
álbum “princípio e fim” como um todo. mas isso é só um exemplo rápido pra
expandir seu conhecimento sobre retórica musical.
e para fecharmos essa aula com chave de ouro, na aula em vídeo vamos
executar esse três melismas juntos:
(não teria mesmo eu como te passar esses melismas por escrito, então aqui
você vai precisar assistir a aula em vídeo, ok?)
9. CONCLUSÃO
eu sei que para alguns de vocês tudo o que vimos aqui pode parecer muita
informação. e, realmente, cobrimos muitos tópicos diferentes. mas, pra mim, é muito
importante que você compreenda os princípios que me nortearam e que saia para a
sua vida ouvindo música de um jeito diferente, cada dia com mais paixão por
música.
enquanto você estiver se preparando pra cantar uma canção que nunca
cantou, ou até mesmo se preparando pra revisitar uma que já tem o costume de
cantar, entenda que, além dos treinos técnicos, também é importante refletir a
respeito da música que você vai cantar, do que está fazendo, do propósito por
detrás de tudo… isso vai enriquecer a sua experiência e também daqueles que
ouvirão você. gaste tempo pensando, imaginando e alimentando sua criatividade! e
são coisas que você pode fazer no ônibus ou metrô indo pro trabalho, antes de
dormir, enquanto almoça, lava a louça ou até mesmo enquanto faz exercícios
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físicos. pensar, refletir, planejar e sonhar… viver a música de maneira mais intensa
e completa!
muito obrigado por me permitir te acompanhar nessa jornada. sucesso e que
DEUS abençoe sua vida.
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