Você está na página 1de 48

FACULDADE PAULISTA DE ARTES

Rodrigo Hideki Morine Koga

Metodologias do violão sob olhar de aluno e professor:

Relato de experiência

São Paulo
2018
FACULDADE PAULISTA DE ARTES

Rodrigo Hideki Morine Koga

Metodologias do violão sob olhar de aluno e professor:

Relato de experiência

Trabalho de conclusão de curso


apresentado ao curso de Licenciatura em
Artes – hab. em Música, da Faculdade
Paulista de Artes para obtenção do título
de Licenciado em Artes.
Orientador: Profº Me. Maurício Machado
Mangini.

São Paulo

2018
Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca José Carlos de Figueiredo Ferraz

K79m
KOGA, Rodrigo Hideki Morine
Metodologia do violão sob olhar de aluno e professor: relato de
experiência/ Rodrigo Hideki Morine Koga. Orientador do Professor Me.
Maurício Machado Mangini. São Paulo: Faculdade Paulista de Artes, 2018.

Monografia de conclusão de curso apresentada à Faculdade Paulista de Artes para


obtenção do grau de Licenciatura do curso de Música

1. Educação musical. 2. Violão. 3. Propostas metodológicas.

CDD - 780
AGRADECIMENTOS

Obrigado Faculdade Paulista de Artes pela oportunidade de realizar o curso.


Sou grato não apenas aos professores, mas também à direção, ao pessoal do
administrativo e da limpeza e colaboradores.

Agradeço aos meus pais Massamitsu Koga e Marisa Morine Koga, ao meu
irmão Danilo Massaharu Morine Koga e à minha namorada Mayra Kaori Jukeran que
estiveram ao meu lado em todos esses momentos.

Agradeço ao meu orientador profº Me. Maurício Machado Mangini por me


orientar e auxiliar nesse trabalho.

Agradeço aos colegas de faculdade por proporcionarem momentos muito


especiais.

Agradeço à Daniele Garcia e Glauber Lyra pelo apoio e dicas na pesquisa.

Agradeço a todos que me ajudaram durante essa caminhada no curso.


Resumo

Este trabalho surge de observações durante as aulas de violão do ponto de


vista do aluno e do professor. Tem como objetivo buscar quais os pontos positivos e
negativos do atual ensino de violão e quais as novas possibilidades que vêm
surgindo atualmente. A pesquisa foi uma análise de todo o processo em que eu tive
aulas e em que eu lecionei e em quais aspectos foram melhorados após conhecer
melhor as metodologias da Educação Musical na graduação.

Palavras-chave: Educação Musical; violão; propostas metodológicas.


Abstract

This work arises from observations during the guitar lessons from the point of
view of the student and the teacher. Aims to get what the positives and negatives of
the current guitar education and what are the new possibilities that come popping up
these days. The research was an analysis of the whole process in which I took and
what I taught and in which aspects have been improved after knowing better
methodologies of Musical Education at graduation.

Keywords: Musical Education; guitar; methodological proposals.


Lista de Figuras
Figura 1: Tanbur Assírio e Târ Persa...........................................................................10
Figura 2: Vihuela..........................................................................................................11
Figura 3: Alaúde medieval...........................................................................................12
Figura 4: Alaúde renascentista....................................................................................12
Figura 5: Guitarra barroca...........................................................................................13
Figura 6: Guitarra romântica.......................................................................................14
Figura 7: Violão atual (Antonio de Torres)...................................................................15
Figura 8: El maestro....................................................................................................18
Figura 9: Exercícios para mão esquerda e direita......................................................24
Figura 10: Exercício 1: Cordas primas soltas.............................................................25
Figura 11: Exercícios de bordões................................................................................25
Figura 12: Exercícios de cordas soltas.......................................................................26
Figura 13: Notas naturais nos bordões.......................................................................26
Figura 14: Notas naturais nas cordas primas.............................................................27
Figura 15: Notas alteradas..........................................................................................28
Figura 16: Primeiras músicas do livro.........................................................................30
Figura 17: Primeira nota no violão..............................................................................31
Figura 18: As três primeiras notas...............................................................................32
Figura 19: Explicação da colcheia...............................................................................32
Figura 20: Notas naturais no braço do violão.............................................................33
Figura 21: Figuras rítmicas..........................................................................................34
Figura 22: Primeira música - duo professor e aluno...................................................35
Figura 23: Solfejo das figuras rítmicas por Zoltán Kodály..........................................36
Figura 24: Jogo de figuras rítmicas.............................................................................37
Figura 25: Notação alternativa....................................................................................38
Figura 26: Jogo das notas com a música "O bichinho faz".........................................38
Figura 27: Tablatura completa.....................................................................................40
Figura 28: Tablatura de uma linha...............................................................................40
Figura 29: Simplificação de acordes...........................................................................41
Lista de tabelas
Tabela 1: Conteúdo dos métodos................................................................................23
Sumário
Introdução......................................................................................................................8
1. Histórico do violão...................................................................................................10
1.1. História do instrumento....................................................................................10
1.2. O Violão no Brasil............................................................................................15
1.3. Principais compositores e intérpretes..............................................................17
2. Metodologias do violão............................................................................................21
3. Relato de experiência..............................................................................................24
Considerações Finais..................................................................................................42
Referências.................................................................................................................43
Anexos.........................................................................................................................45
8

INTRODUÇÃO
Este trabalho de conclusão de curso abordará sobre as metodologias por quais
passei durante meu aprendizado no violão, que ao observar todo esse processo, pude
levantar alguns questionamentos: O quanto um ensino rigorosamente tradicional pode
influenciar no aprendizado? Quais novas possibilidades com os métodos ativos podem
ser aplicados ao violão e o quanto de retorno satisfatório é possível? Como driblar o
desinteresse pela aula, a falta de atenção ou de estímulos para um aluno?

Essa pesquisa tem como objetivos buscar novos recursos e iniciar uma
elaboração de uma metodologia mais fluida e completa, que atenda a demanda de cada
aluno e que amplie seu universo musical.

A hipótese é de que os principais fatores que venham a ser um obstáculo são as


dificuldades técnicas do instrumento, a não identificação como repertório proposto e a não
adequação da metodologia escolhida. A partir desses questionamentos, busquei como
referencial teórico os livros que utilizei como os do Henrique Pinto e Sveinn Eythorsson e
tentei conectá-los à pedagogia musical ativa, como Dalcroze e Orff, resultando em
atividades mais lúdicas que não sejam puramente repetições de exercícios.

No primeiro capítulo, investiguei a evolução do violão no contexto geral, de onde


surgiu, como se deram suas mudanças na estrutura física, modo de tocar e seu papel na
sociedade. Também abordei sobre sua história no Brasil, como chegou por aqui e como
foi sua inserção na sociedade. Por fim, enfoquei brevemente sobre alguns compositores e
intérpretes do violão.

No segundo capítulo abordo os métodos que foram utilizados durante minha


trajetória, explicando sucintamente seus objetivos e como se dá o progresso dos
métodos. Ao final mostro um comparativo dos conteúdos apresentados em cada um.

O terceiro e último capítulo é dedica a um relato da minha experiência, sendo


dividido em duas partes: antes da graduação e depois da graduação. Nele relato como
foram as aulas tanto como aluno quanto como professor, identificando os problemas que
encontrei e as lacunas que possam ter sido deixadas e quais formas eu procuro trabalhar.

Nesse capítulo também, explico como trabalho atualmente com meus alunos e as
possibilidades musicais que podem ser encontradas no violão fora da metodologia
tradicional, utilizando jogos musicais.
9

Por fim, nas considerações finais, apresento em que a pesquisa me influenciou e


quais pontos podem a vir se tornar novos temas de discussões.
10

1. HISTÓRICO DO VIOLÃO
1.1. História do instrumento1

O violão é classificado como um instrumento de cordas pinçadas da família dos


cordofones. De um modo geral essa família podem:

[...] Ser divididas em três famílias principais: dos alaúdes em forma de pera, das
vihuelas em forma de oito, um nome originário da palavra latina fidicula, de onde
também vêm as palavras portuguesas viola e violão, e das guitaras, também em
formato de oito. Um nome derivado das palavras persas char-târ, quatro cordas.
(ZANON, 2004, ep.1)

O seu local de origem é incerto, tendo vestígios de instrumentos similares na


Índia, Espanha e Grécia:

Uma análise dos números cardinais envolvendo o Sânscrito e o Persa (Antigo e


Novo) relevou vários tipos de instrumentos conectador pela palavra târ, que
significa corda. Os instrumentos são nomeados adicionando o prefixo que indica a
quantidade de cordas. [...] O nome chartâr teria se tornado a palavra espanhola
quitarra. A similaridade entre essa palavra e a palavra grega kithara é bastante
óbvio e de acordo com Michael Kasha, o fato é que as primeiras kitharas e lyres
gregas tinham quatro cordas, o que explicaria a conexão entre as palavras.
(ALVES, 2015, p. 7)2

Figura 1: Tanbur Assírio e Târ Persa

Fonte: The art of Playing the Guitar

Deve-se levar em conta que vários povos se encontravam em desenvolvimento,


isso fazia com que existissem uma série de instrumentos de cordas surgissem, de
diferentes tamanhos, número de cordas e formato do corpo. O mesmo acontecia com as
práticas e estilos musicais, que por um lado tinham suas características marcantes, por
outro ia acontecendo um amálgama de estilos e práticas musicais, envolvendo diferentes
instrumentos.

1 O capítulo a seguir foi escrito a partir do artigo The History of the Guitar (ALVES, Julio Ribeiro, 2015).
2 Tradução livre do pesquisador
11

Por volta do século XIV os instrumentos começam a passar por transformações


que vão chegar ao que se tornou o violão atualmente. Nesse período temos alguns
instrumentos principais: vihuela, guitarra de quatro ordens e alaúde.

A vihuela teve destaque especialmente na Espanha e Itália, onde era mais usado
que os alaúdes. Sua classificação se dava de acordo com a maneira com que eram
tocadas: vihuela de mano (tocada com os dedos), vihuela de arco (tocada com um arco) e
vihuela de peñola ou vihuela de púa (tocada com uma palheta).

Sua estrutura física contemplava um corpo de bordas curvas e doze cordas,


distribuídas em seis ordens duplas. No El libro primo de la declaración de instrumentos
musicales, de Juan Bermudo, é indicado quatro afinações, duas em que são iguais aos
alaúdes: A/d/g/b/e'/a' e G/c/f/a/d'/g' e duas afinações para vihuelas de sete ordens duplas
de cordas G'/D/G/d/g/d'/g' e G'/d/G/B/f#/b/d'.

A vihuela utiliza como notação, a cifra, que fora da Espanha é conhecida como
tablatura. Nessa escrita, cada linha representa uma corda e os símbolos representam a
posição que se deve tocar. Na Itália e na Espanha as cifras eram indicadas com números,
enquanto na França utilizadas letras. Para indicar a duração das notas, escreviam acima
das linhas. Na Itália e na Espanha a linha superior indicava a corda inferior, enquanto na
França e Inglaterra era o oposto.

Figura 2: Vihuela

Fonte: The art of Playing the Guitar

Na Espanha encontrava-se também a guitarra de quatro e cinco ordens duplas. O


instrumento possuía dez casas e era menor que a vihuela. Sua afinação era semelhante à
da vihuela sem a primeira e a sexta ordem de cordas. Outras duas afinações eram
encontradas no livro de Bermudo, El libro primo de la declaración de instrumentos
musicales, entre elas mudavam apenas o quarto par, sendo: ff'/c'c'/e'e'/a'(a') ou
12

gg'/c'c'/e'e'/a'(a'), sendo que a primeira era chamada de velha afinação (temple a los
viejos) e a segunda, a nova afinação (temple a los nuevos). (ALVES, 2015, p. 31-32). Na
Itália existia ainda a chitarra da sete corde, que tinha esse nome por ter três pares de
cordas e uma simples.

Guillaume Morlaye, um compositor francês, escreveu uma série de quatro livros


com tablaturas para guitarra. No quarto livro ele inclui música para cittern, também
chamado de cistre, um instrumento com quatro ordens de cordas, tocadas com uma
palheta. O cistre possui duas cordas nas duas primeiras ordens e três cordas nas duas
outras, sendo sua afinação: a'a'a/g'g'g/d'd'/e'e'.

Nesse período o alaúde também tinha seu espaço, principalmente na Ásia, onde
surgiu e na Grécia, onde começou a se desenvolver. Acreditam que sua origem foi no
Afeganistão, onde os Persas disseminaram o instrumento. Sua introdução da Europa deu-
se pela invasão da Península Ibérica, provavelmente pela Espanha ou Sicília.

Figura 3: Alaúde medieval

Fonte: ATLAS of Plucked Instruments

Figura 4: Alaúde renascentista

Fonte: ATLAS of Plucked Instruments

O alaúde teve muitas modificações ao longo do tempo. Desde formato do corpo,


número de cordas até a forma de tocar. No período medieval tinha quatro ou cinco ordens
13

de cordas, que alguns anos depois chegariam até dezenove, e eram tocadas com
palheta. No final do século XV, abandonaram a palheta para tocar com os dedos.

No século XVI, as formas de canzonette e villanelle trouxeram para o instrumento


um novo tipo de notação, chamado Alfabeto, que consistia na utilização de símbolos que
indicavam acordes, entretanto é um pouco diferente dos acordes como conhecemos
atualmente:

Nesse sistema, muitos acordes eram escritos com uma letra, e cada letra indicava
um acorde particular que era tocado quando aparecia na tablatura. [...] Nessa
forma, as letras não indicavam a atual harmonia que representa, algumas eram
notas transpostas da que estava abaixo do nome da letra. (ALVES, 2015, p. 49) 3

No período Barroco foi quando estabeleceram a guitarra de cinco ordens como a


principal. O responsável pela adição da quinta ordem foi Vicente Espinel, a partir desse
momento, o instrumento passa a ser chamado na Europa de guitarra espanhola. Sua
afinação poderia ser encontrada de dois jeitos: aa/d'd'/gg/bb/e' ou Aa/dd'/gg/bb/e'(e').
Nesse ponto já podemos observar a semelhança entre a guitarra espanhola e o violão
clássico atual.

Nesse período, a guitarra barroca estava no meio aristocrático da Itália, isso fez
com que a construção do instrumento se tornasse uma arte. Muitos materiais exóticos
foram introduzidos em sua construção: marfim, ébano, madrepérola e ouro para produzir
as rosetas, o ornamento ao redor da boca do instrumento.

Figura 5: Guitarra barroca

Fonte: ATLAS of Plucked Instruments

3 Tradução livre do pesquisador


14

A partir do século XVII, o violão passou por transições socioculturais. Ele


começou a ser considerado um instrumento associado a marginalidade. Essa mudança
também influenciou a maneira de se tocar, em que o violão passou a ser um instrumento
acompanhador da voz. Além disso alteraram a notação para partituras.

Sua estrutura também foi alterada, passou de um instrumento agudo para um


instrumento que também tinha baixos. Adicionando o sexto grupo de cordas e finalmente
para as seis cordas simples. Nesse período a revolução industrial, novas tecnologias
permitiu a inovação em aspectos físicos do violão. Os bordões começaram a serem feitos
de metal, que dava mais volume e clareza para o som.

No final do século XVIII e começo do XIX a afinação padrão do violão clássico: E/


A/d/g/b/e' já estava implementada. Nesse momento as mudanças no corpo do
instrumento também iam se tornando mais estruturadas ao que temos atualmente:
aumento do tamanho do corpo e da escala, substituição do material dos trastes e cordas,
utilização das cravelhas.

Figura 6: Guitarra romântica

Fonte: ATLAS of Plucked Instruments

No século XX os violões foram perdendo espaço nos grandes teatros, devido ao


seu potencial sonoro, que era muito baixo em relação aos instrumentos sinfônicos,
embora nesse período sua estrutura interna passou a contar com reforços de madeira que
aumentavam seu volume e enriqueciam o som. Além disso, ocorreu a mudança de
tamanho e elevação da escala, que tornavam os timbres mais claros e brilhantes.

Atualmente os avanços da tecnologia tornou possível a produção de violões dos


mais diversos tipos de construção, tipos de madeiras, formatos, etc. Assim como
15

encordoamentos, como de fibra de carbono, náilon e titânio, que altera o timbre e potência
sonora.

Figura 7: Violão atual (Antonio de Torres)

Fonte: Classical Guitar Magazine

1.2. O Violão no Brasil

O violão chegou ao Brasil com a vinda dos portugueses, foram trazidos pelos
ciganos, expulsos pela Inquisição no século XVI:

Quando chegou ao Brasil era ainda uma viola de arame de quatro ordens de
cordas, instrumento indispensável na orquestra jesuítica, nas mãos dos curumins
da catequese [...] (TABORDA, 2011, p.9).

O instrumento tinha, então, três cordas duplas e a prima simples. No século


seguinte, iria ganhar mais uma ordem de cordas e, na segunda metade dos anos
de setecentos, ainda mais outra. Transformou-se assim num instrumento de seis
cordas duplas, que se tornaram simples. Isso exigiu um aumento de tamanho para
compensar o menor volume de som. Tornou-se, assim, viola grande. Ou violão
(grifo do autor). (TABORDA, 2011, p.41)

A introdução do violão na sociedade foi por volta do século XIX, quando


apareceram nos jornais, anúncios de aulas de viola franceza:

As primeiras referências à presença do instrumento no Rio de Janeiro vêm de


periódicos como O Spectador brasileiro: diario politico, litterario e commercial, que
em 1826 publicou anúncio de Bartolomeo , informando: “Professor de música,
morador na Rua dos Inválidos nº 80, faz ciente ao responsável público que, quem
quiser aprender música, cantar, tocar viola, viola francesa ou mandolino, que ele
ensina.” Trata-se até o momento, da mais antiga referência à viola francesa
documentada no Rio de Janeiro. (TABORDA, 2011, p.72)

O violão teve papel fundamental na música urbana no Brasil. A modinha, palavra


que veio do diminutivo de moda, que designava, em Portugal, um gênero de canção no
geral (TABORDA, 2011, p.117), foi muito popular nos séculos XIX e XX nos salões da alta
sociedade, geralmente acompanhadas do piano. Enquanto isso, nas ruas, longe da elite,
16

estavam os seresteiros e cancioneiros, que acompanhavam canções ao violão. “No rol


dos modinheiros, havia toda uma legião de anônimos, desempregados crônicos,
envolvidos com a capoeiragem, gente que adoçava a dureza do cotidiano com as
mensagens de amor propagadas pelas letras das canções.” (TABORDA, 2011, p.122).

Outro gênero que o violão tinha grande importância era o choro, que era um
conjunto musical em que o instrumento solista era acompanhado por cavaquinho e violão.
O choro tinha uma peculiaridade que geralmente as músicas eram tocadas de ouvido, já
que as formações eram sempre improvisadas, os músicos não conheciam as músicas
tocadas, e mesmo que o instrumentista soubesse a leitura musical, tocava improvisando.
“Nessas rodas, o que mais se exigia e o que mais se apreciava nos acompanhadores,
sobretudo de violão e cavaquinho, era a percepção musical, aptidão consagrada na
expressão ‘tocar de ouvido’”. (TABORDA, 2011, p.130).

No século XX as inovações fonográficas como o rádio e as gravações de discos


fez com que a música popular brasileira se popularizasse ainda mais.

Os primeiros registros fonográficos nos deram a possibilidades de vislumbrar o


ambiente musical que vinha se desenvolvendo desde fins do século XIX. Como
não poderia deixar de ser, os gêneros executados eram aqueles que
compreendiam o repertório dos chorões: valsa, schottisch, quadrilha, mazurca,
polca, tango, modinha, cançoneta e lundu, veiculados por vozes acompanhadas
de violão, pelas bandas e, finalmente, pelos grupos de choros. (TABORDA, 2011,
p.134)

Durante esse período, alguns nomes importantes surgiram: João Pernambuco


(1883 - 1947), integrante do grupo de Pixinguinha, Os Oito Batutas; os violonistas Dino 7
cordas (1918 - 2006) e Meira (1909 - 1982), esses dois formariam a dupla de violonistas
mais duradoura da música brasileira (KFOURI, 2007, p. 51).

Os solistas também tiveram seus destaques. Américo Jacomino (1889 - 1928), o


Canhoto, que tem esse apelido por ser canhoto e ter que tocar escondido do pai, que não
o deixava, apenas invertia a posição do violão do irmão, tocando as cordas primas com o
polegar e os baixos com os dedos anelar, médio e indicador da mão esquerda. (KFOURI,
2007, p. 39). Ele gravou suas primeiras músicas por volta de 1912 e talvez tenha sido um
dos primeiros a gravar discos solos de violão.

Levino da Conceição (1895 - 1955) era um violonista cego, perdeu a visão


quando criança, foi amigo de Quincas Laranjeira (1873 - 1935) e João Pernambuco (1883
- 1947).
17

A obra de João Pernambuco dá início à formação do repertório de choros escritos


para o violão no Brasil, compreendendo-se aqui por choros - valsas, maxixes,
tangos e também choros - uma produção até então inexistente e que se destaca
no campo instrumental pelo pioneirismo no casamento de soluções extremamente
violonísticas a serviço de uma elaboração surpreendentemente musical.
(TABORDA, 2011, p.142)

Levino gravou suas composições entre 1922 e 1926. Anos mais tarde, conheceria
Dilermando Reis (1916 - 1977) para quem daria aulas. Este teve a vida muito agitada,
dando aulas nas lojas de instrumentos musicais no Rio de Janeiro, tocando em rádios, até
gravar seu primeiro disco em 1941. Deu aulas para uma das filhas de Juscelino
Kubitschek, ou seja, era bem popular, em todos as classes sociais.

Outro nome que teve destaque foi o de Baden Powell (1937 - 2000). Ele teve
aulas com o Meira, dos 7 aos 13 anos de idade. Foi um grande violonista, tanto como
acompanhador como solista e tocava qualquer tipo de música (KFOURI, 2007, p.97).
Baden e Vinicius de Moraes firmaram uma grande parceria, que produziu grandes
canções como “Samba em Prelúdio”, “Consolação” e os "Afro-sambas".

1.3. Principais compositores e intérpretes

Podemos iniciar a linha do tempo dos principais compositores no século XVI.


Nesse período a vihuela estava em alta, enquanto a guitarra de quatro ordens buscava
seu espaço no cenário musical. Destacavam-se Miguel de Fuenllana (1500 - 1579),
Alonso de Mudarra (1510 - 1580), Enriquez de Valderrabano (1500 - 1557) e Luis Milan
(1500 – 1560). Milan foi responsável pelo: Libro de musica de vihuela de mano: Intitulado
El Maestro, um livro de tablaturas para vihuela,
18

Figura 8: El maestro

Fonte: IMSLP

Na França destacava-se Francesco Corbetta (1620 - 1681) e Robert de Visée


(1650 - 1725), seu discípulo. Corbetta era músico de Câmara de Luís XIV na França e
depois lecionou para a rainha da Inglaterra e como músico na Alemanha e Espanha.
Visée substituiu seu mentor na corte de Luís XIV e deixou grande quantidade de obras,
dentre elas, cinco livros de tablaturas para guitarra espanhola.

Gaspar Sanz (1640 - 1710) era formado em teologia e filosofia. Deixou os livros
Instrucción de Música sobre la Guitarra Española, Libro Segundo de cifras sobre la
Guitarra Española e Libro tercero de cifras sobre la Guitarra Española:

[...] Deixou um trabalho abrangente sobre a técnica violonística, mostrando em


detalhes a prática de arpejos, acordes e escalas, além de uma coletânea de
danças contesãs e danças populares como: gallardas, chacones, passacalles,
folias, sarabandas, canários, jacarás, paradetas, etc.(PINTO, 2007, p. 6)

O período clássico é chamado de Período de Ouro do violão (PINTO, 1999), que


teve como expoentes Ferdinando Carulli (1770 - 1841), Fernando Sor (1778 – 1839),
Matteo Carcassi (1792 - 1853), Mauro Giuliani (1781 - 1829) e Dionísio Aguado (1784 –
1849).

Carulli era um grande nome do violão em Paris, tendo produzido diversas obras
entre duos, trios, quartetos, um concerto para violão e orquestra e o Método Completo
para Violão.
19

Também da França, Matteo Carcassi foi um grande concertista de sua época,


viajando por toda Europa. Embora pouco tocado, deixou duas obras: Méthode Complete
pour la guitar op. 59 e 25 estudos progressivos op. 60 que são utilizadas até hoje para
estudos iniciais e técnicos do violão.

Dionísio Aguado era um violonista espanhol que deixou um método que


sintetizava as técnicas violonísticas, ainda usado até hoje. Sua obra de concertos é de
altíssima complexidade. Foi amigo e tocava em duo com Fernando Sor.

Mauro Giuliani é o principal compositor italiano desta época, tendo composto para
diversas formações e de diferentes dificuldades, como o Le Papillon op. 50, obra
pedagógica até o Concerto op. 30, Sonata Eroica op. 150, obras para grandes concertos.

Outro violonista que se destacava com suas belas peças é Fernando Sor. Deixou
uma obra extensa com solos, duos, trios, estudos, sonatas, e obras didáticas. “Era
chamado de Beethoven do violão com justa razão; a influência deste compositor (bem
como de Mozart e Haydn) refletia na maneira com que elaborava suas obras.” (PINTO,
2007, p.7).

O começo do século XIX o violão teve um declínio em decorrência do aumento da


orquestra e das salas de concerto sendo a sua potência sonora impossível de competir
com os outros instrumentos, o violão foi deixado às margens da preferência do público,
até que Francisco Tárrega (1852 - 1909) eleva novamente a popularidade do violão.
“Tárrega efetuou a transição para o violão moderno em três frontes de atuação:
modernização do instrumento, renovação do repertório e reformulação da técnica e da
sua aplicação musical” (ZANON, 2004, ep.1).

Tárrega além de renovar a técnica violonística com a Escola de Tárrega que


alterou o modo de tocar, como por exemplo, utilizar o violão sobre a perna esquerda, ou
diferentes possibilidades de ataques, bem como as diferentes posições sobre as cordas
na mão direita, também teve muito êxito ao transcrever músicas de outros compositores
como Bach, Mendelssohn, Mozart, Haydn, Chopin, Albeniz, além de suas próprias obras
primas como Recuerdos de la Allambra e Capricho Árabe.

Discípulos de Tárrega, Emilio Pujol (1886 - 1980) e Miguel Llobet (1876 -


1938) ajudaram a disseminar a Escola de Tárrega, embora mantenham cada um suas
particularidades.
20

Llobet foi responsável pela mudança no estilo de composição, com obras de tema
catalão e digitações não usuais. Pujol foi responsável por retomar a vihuela e arranjar
obras de Luis Milan, Alonso Mudarra, Gaspar Sanz. Também escreveu uma biografia
sobre seu mestre, Tárrega. Outra diferença entre eles era a maneira de tocar, Llobet
defendia o uso da unha na mão direita, enquanto Pujol seguia a linha de Tárrega e tocava
sem.

Andrés Segovia (1893 - 1987) talvez seja o violonista mais famoso. "Seu nome é
associado ao violão da mesma maneira que o Paganini é ao violino e Liszt ao piano"
(ALVES, 2015, p. 112, tradução do pesquisador). Segovia elevou a técnica e beleza no
mais alto nível, cada detalhe no ataque das notas e na sonoridade que tirava do violão:
"Uma pequena peça era trabalhada em todas suas possibilidades e se transformava num
lindo presente para o ouvinte" (PINTO, 2007, p.8)
21

2. METODOLOGIAS DO VIOLÃO

Este capítulo apresentará os métodos utilizados por mim tanto na formação como
violonista quanto os que eu utilizo para lecionar, mostrando seus objetivos e fazendo uma
comparação do que é trabalhado em cada material.

Os livros do Henrique Pinto (1941 - 2010) talvez sejam os mais conhecido entre
os estudantes de violão. Aqui comentarei sobre três deles: Iniciação ao violão: princípios
básicos e elementares para principiantes; Iniciação ao violão: volume II e Curso
progressivo de violão.

O primeiro volume apresenta resoluções de problemas físicos ao tocar o


instrumento, como a posição de sentar e posicionamento de mãos.

A finalidade da elaboração deste método foi a de parcelar cada problema, durante


as várias etapas da iniciação violonística. A individualização de cada fase irá
acentuar de uma forma positiva e concreta os primeiros reflexos, que a meu ver,
são os mais importantes, pois sobre esta base irá ser construída toda a evolução
instrumental. (PINTO, 1978, p.8)

Após a parte física são introduzidas as notas naturais na primeira posição no


braço do violão. Primeiramente cordas soltas e depois as notas pressionadas. E por fim,
as notas alteradas. Após toda essa parte são apresentados alguns estudos para fixação
dos exercícios. A segunda parte do livro são apresentadas as notas no restante do braço
do violão e dois fundamentos no violão: o ligado e as pestanas.

O segundo volume do livro Iniciação ao violão compreende exercícios de


técnicas: escalas, ligados, arpejos e saltos. Outro ponto desse volume que o autor
enfatiza é em relação a leitura à primeira vista:

A decodificação de um texto musical e sua tradução imediata para o instrumento é


um estágio de liberdade, pois resolvemos com agilidade este primeiro momento de
contato com uma obra, para em seguida trabalharmos seus detalhes inerentes.
(PINTO, 1999, p. 8)

As obras apresentadas são mais complexas que o do volume anterior, mas, ainda
assim, com finalidade didática, para trabalhar as técnicas já citadas. Elas também têm o
objetivo de introduzir novos compositores e gêneros musicais para poder chegar a peças
mais complexas.

O repertório apresentado neste segundo volume, se estudado com critério, irá


embasar novas estruturas que possibilitarão o estudo de obras mais complexas e
de maior dificuldade, como as de Heitor Villa-Lobos (Suíte Popular Brasileira e
22

Prelúdios), Antonio Lauro, João Pernambuco, Dilermando Reis, Fernando Sor,


Mauro Giuliani e outros, considerando sempre suas obras de dificuldade média.
(PINTO, 1999, p. 6)

No Curso Progressivo de violão, Henrique dá prosseguimento aos outros dois


livros, dessa vez focando no aperfeiçoamento da técnica e na sonoridade tirada do violão,
explicando o cuidado com as unhas. O repertório conta além das obras originais para
violão, obras transcritas de outros instrumentos, como piano, cravo, alaúde e vihuela.

The first Guitar Milestone é um método do violonista islandês Sveinn Eythorsson.


Esse método não aborda a parte mecânica do estudo violonístico, entretanto, o método
serve como base para a introdução das notas na primeira posição, de uma forma
gradativa, alternando entre a exposição de sua localização e repertório de músicas
autorais, não tornando um processo apenas de memorização, mas que com a repetição
em músicas, o processo se torne mais prazeroso. Ao final do método são introduzidos
também as notas acidentadas.

Outro ponto desse método é o fato de as músicas para treinamento das notas
aprendidas possuírem uma parte para que o professor toque com o aluno. Isso faz com
que mesmo que o aluno esteja tocando poucas notas, ele toque músicas que soem
completas e não apenas exercícios.

Um complemento a esse método é o 19 guitar studies for beginners, do mesmo


autor. Este conta com 19 estudos também gradativos que podem ser apresentados no
decorrer do método. As notas são inseridas aos pouco, com figuras rítmicas simples e
também gradativas.

Ciranda das 6 cordas: iniciação infantil ao violão, também do Henrique Pinto, é


um método de violão para crianças. Este método apresenta um visual mais didático,
realmente voltado para as crianças, com pautas grandes e figuras que podem ser
coloridas. “O método que irá ser utilizado deverá conter os princípios básicos coerentes
para o progresso do aluno, no sentido da coordenação motora e do conhecimento lógico
dos elementos que constituem um texto musical”. (PINTO, 1985, p.3)

O livro é divido por etapa, iniciando pela relação entre criança e violão, sendo que
o violão deve se adaptar à criança e não o contrário, por exemplo a colocação de um
capotraste para diminuir o tamanho do violão, para que se adeque a estatura da criança.
23

Em seguida o livro apresenta as notas gradativamente, alternando entre


exercícios e músicas simples, assim como as figuras rítmicas, que também são inseridas
aos poucos.

Por último, o método do Curso de violão para crianças – Amigo Violão, do Ricardo
Novais. É um método baseado em jogos e atividades lúdicas, que foge um pouco do
ensino tradicional de violão. Solfejo, notações alternativas e leitura relativa são algumas
das ferramentas utilizadas no método, não só para ensinar o violão, mas para musicalizar.
“Não é objetivo desse e-book abordar a leitura da partitura, mas sim buscar o prazer de
tocar, introduzindo princípios técnicos de forma estratégica, com bases sólidas para um
melhor desenvolvimento posterior.” (NOVAIS, 2016, p.8)

O livro conta com composições próprias, e de outros autores. Conta também com
músicas complementares, que incluem músicas internacionais e canções folclóricas. Os
jogos permitem que o aluno componha as próprias composições dando espaço para
exercitar a criatividade.

A seguir colocarei em tabela, os conteúdos apresentados para melhor


visualização dos métodos:

Tabela 1: Conteúdo dos métodos


24

3. RELATO DE EXPERIÊNCIA
Se partirmos do princípio que o processo de evolução do estudante de violão está
em seguir os ditames de um programa pré-elaborado, com intenção de chegar ao
último ano do conservatório ou faculdade, executando as peças mais virtuosísticas
e complexas em sua construção e pouco generosas em sua elaboração técnica,
podemos nos decepcionar com o resultado final desta imposição burocrática. Este
processo, originário de escolas europeias e imposto em nossas escolas no início
do século XX, não condiz com a natureza musical particular de cada estudante. O
complexo e delicado mecanismo para tocar um instrumento, tem sua elaboração
nos vários aspectos que vão se desenvolvendo paralelamente. (PINTO, 2007,
p.11)

Esse capítulo contará com uma análise de como decorreram as aulas, divido em
antes e depois da graduação. Será apresentado tanto as questões de evolução no
instrumento, quanto as metodologias que foram aplicadas em aulas.

Iniciei meus estudos no violão aos 12 anos, em aulas particulares. Tive aulas de
música no colégio regular, então conhecia os parâmetros musicais e elementos básicos.

Durante o período que estudei violão, foram utilizados os livros do Henrique Pinto
para o ensino de partituras. Paralelamente, eu estudava música popular com cifras
encontradas na internet.

As primeiras aulas foram exercícios para mão esquerda e mão direita, tocar em
casas seguidas do violão, o que eu chamo de Exercício da aranha, e arpejos com cordas
soltas, os dois em todas as suas variáveis. Sendo assim, o começo das aulas foram
sempre exercícios e técnica.

Figura 9: Exercícios para mão esquerda e direita

Fonte: acervo pessoal

A parte de acordes, lembro-me da primeira música ter sido Que país é esse? da
banda Legião Urbana, música com três acordes: Em, C e D, e batida constante. Foi
introduzida também o conceito de tablatura, para o solo inicial dessa música.
25

Um ponto que me lembro é de não ter feito muito os exercícios de técnica


propostos no primeiro livro do livro Iniciação ao violão. Os exercícios contemplavam
arpejos, ataque das cordas, as notas pelo braço do violão e notas acidentadas. Durante
esse período de estudos, eu ia apenas aprendendo as músicas na sequência do livro e
por elas ia decorando onde se localizavam as notas treinando a parte técnica.

Abaixo, os três primeiros exercícios (figuras 10, 11 e 12) são de cordas soltas. No
primeiro exercício (figura 10), são as cordas primas. No segundo exercício (figura 11), são
trabalhados os bordões. Henrique Pinto ainda comenta sobre o uso do polegar e como
posicioná-lo ao tocar. O terceiro exercício (figura 12) é utilizando todas as cordas soltas.
As três imagens seguintes (figuras 13, 14 e 15) apresentas as notas naturais nas cordas
primas (figura 13) e nos bordões (figura 14) e as notas alteradas (figura 15) no
pentagrama e no braço do violão.

Figura 10: Exercício 1: Cordas primas soltas

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p.17)

Figura 11: Exercícios de bordões

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p. 19)


26

Figura 12: Exercícios de cordas soltas

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p. 21)

Figura 13: Notas naturais nos bordões

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p. 25)


27

Figura 14: Notas naturais nas cordas primas

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p. 29)


28

Figura 15: Notas alteradas

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p. 32)

As aulas eram divididas entre música erudita em que eu seguia utilizando os


materiais do Henrique além de algumas peças trazidas de fora dos livros. A outra parte
seguia com a música popular, em que eu aprendia os acordes, algumas músicas
dedilhadas e solos.

Permaneci nas aulas até meus 16 anos, chegando até o livro Curso progressivo
de violão, em que já executava algumas peças mais avançadas, entretanto sentia
algumas lacunas tanto na parte do instrumento, ainda sentia alguma dificuldade com a
localização das notas nas posições mais elevadas, acordes mais rebuscados não
estavam bem fixados e técnicas mais avançadas, como trêmolos, nunca foram
trabalhadas profundamente, quanto na parte teórica, como harmonia e escalas que me
eram um assunto quase que desconhecido.
29

Alguns fatores que eu identifiquei que possam explicar essas deficiências no


aprendizado foram:

• Comodidade em relação ao repertório;

• Falta de proatividade em buscar coisas novas;

• Pouco estudo ou estudo de uma maneira pouco eficiente;

• A parte teórica era pouco interessante porque não havia aplicação prática.

Comecei a dar aulas ainda antes de entra na graduação, utilizando a mesma


metodologia que recebi: para partituras, o livro Iniciação ao violão e para cifras, músicas
que os alunos pediam e as que eu utilizei para aprender.

De início já encontrei algumas dificuldades: o livro do Henrique não promove a


introdução gradativa das notas, ele inicia demonstrando todas e logo em seguida já inicia
com o repertório de estudos e peças, fazendo com que o aluno já se depare com a
dificuldade de ter muitas notas para memorizar. Por esse processo encontrei os seguintes
problemas: o aluno se sente desmotivado por não conseguir tocar “de primeira”, por ser
muita coisa para processar, onde tocar a nota, como tocar a figura rítmica, qual dedo
utilizar, etc, e o repertório erudito não ser o que é primeiramente buscado ao se iniciar
aulas de violão, desestimulando pelo aluno não tocar algo que lhe dê prazer em executar
a peça.
30

Figura 16: Primeiras músicas do livro

Fonte: Iniciação ao violão - vol. 1 (p. 34)

Nas aulas para crianças utilizei o método Ciranda das 6 cordas, do Henrique
Pinto. Nesse livro a abordagem é um pouco diferente dos outros livros. O processo de
ensino é mais detalhado, apresentando cada nota individualmente e acrescentando aos
poucos, com músicas que permitam assimilar o conteúdo aprendido, o mesmo ocorre com

as figuras rítmicas, que são explicadas sempre em compasso $, mas dando ênfase que
deve-se explicar que as figuras têm seus valores proporcionais. “O mais importante, é ela

ter o sentido de proporção entre as notas ( h= qq) e solfejar e tocar com a pulsação
exatamente igual” (PINTO, 1985. p. 11)
31

Figura 17: Primeira nota no violão

Fonte: Ciranda das 6 cordas (p. 11)


32

Figura 18: As três primeiras notas

Fonte: Ciranda das 6 cordas (p. 17)

Figura 19: Explicação da colcheia

Fonte: Ciranda das 6 cordas (p. 31)


33

Com esse método obtive um resultado mais eficiente, em que o conteúdo


aprendido era assimilado mais rápido do que apresentar de uma vez e treinar vários
aspectos de uma vez no repertório. Assim, comecei buscar algum material que
apresentasse o violão dessa forma e que eu pudesse usar com jovens e adultos,
mantendo-os estimulados, chegando assim no método The first guitar milestone de
Sveinn Eythorsson.

Esse material inicia apresentando as notas na primeira posição, com desenhos de


braço do violão e onde se localizam as notas naturais. Ele não apresenta princípios de
postura ou técnica, que para quem estudar sozinho por esse método, venha a fazer falta
futuramente.

Figura 20: Notas naturais no braço do violão

Fonte: The First Guitar Milestone (p. 2)


34

As notas e figuras rítmicas são adicionadas gradativamente, igual ao método


Ciranda das 6 cordas, e as músicas são facilmente aplicáveis para jovens e adultos. Outro
ponto do repertório é que ele promove a interação aluno e professor, fazendo com que
toquem juntos.

Figura 21: Figuras rítmicas

Fonte: The First Guitar Milestone (p. 3-4; 8)


35

Figura 22: Primeira música - duo professor e aluno

Fonte: The First Guitar Milestone (p.9)

Com esse material, o resultado para o ensino das partituras tornou-se mais fácil,
porém ainda notava falta de motivação nos alunos, o repertório ainda não cativava e a
didática ainda ficava a desejar.

Ao entrar na graduação de Licenciatura em Música pude aprender mais sobre as


metodologias em educação musical e passei a buscar mais sobre, fazendo cursos e lendo
livros sobre pedagogias da Educação Musical, sempre tentando aplicar nas minhas aulas.

Uma prática que já adotava era sempre aplicar a teoria musical baseada na
vivência musical, ou seja, explicar a teoria após a prática, com isso a explicação fica muito
mais fácil, já que o aluno já experimentou o conceito. Isso é conhecido como a pedagogia
ativa. “Essa pedagogia, conhecida como ‘escola nova’, passou a dar valor à experiência,
chamando o aluno a participar ativamente do processo de aprendizagem.” (MARIANI,
2012)

Para trabalhar figuras rítmicas eu utilizo de duas ferramentas: as palavras, de


onde são derivadas as figuras rítmicas, devido sua prosódia.

Prosódia. sf. 1. Pronúncia correta das palavras, principalmente no que se refere ao


acento tônico (p ex, palavras como avaro, ciclope, ibero etc., paroxítonas que, às
vezes; são pronunciadas como proparoxítonas). 2.Pronúncia adequada dos
fonemas (emissão das vogais, articulação das consoantes) e a ligação apropriada
de uma palavra a outra; ortoépia. 3. Conjunto de variações de altura, duração
ritmo, tom etc., que nas diferentes línguas afetam a sequência da fala. 4.
Características e análise da estrutura dos versos. 5. Adequada ligação das
palavras com os acentos melódicos, de modo que as sílabas longas e breves
36

conservem, da melhor maneira possível, a acentuação que lhes é própria.


(PROSÓDIA, 2005)

Utilizando então as palavras para definirem o ritmo, a assimilação fica mais fácil.
Isso é utilizado no método do Amigo Violão, do Ricardo Novais, em que as primeiras
canções possuem ritmos simples e silábicos, cada nota tocada corresponde a uma sílaba
da palavra.

Outro recurso que utilizo é um jogo de figuras rítmicas, em que os cartões das
figuras são proporcionais entre si, deixando o processo mais visual. Esse jogo possibilita
algumas variantes para tornar mais lúdico. Utilizar diferentes sons para as diferentes
figuras, a exemplo de como Kodály utiliza Ta/Ti-ti/Ti-ri-tiri, etc, podendo usar notas no
violão, percussão corporal, etc.

Figura 23: Solfejo das figuras rítmicas por Zoltán Kodály

Fonte: Pedagogias em Educação Musical - Zoltán Kodály (p. 78)


37

Figura 24: Jogo de figuras rítmicas

Fonte: acervo pessoal

Para iniciar o ensino das notas no violão, utilizo o The First Guitar Milestone como
referência, porém, inicialmente sem aplicar a partitura. Utilizo outras grafias, a grafia por
traços, utilizada no Amigo Violão, em que as notas são identificadas por traços e as
alturas são representadas pelo nível em que se encontra, da mesma forma que na
partitura, mas com menos informações visuais.

Enquanto na escrita tradicional o registro das durações requer longo aprendizado


(padrões rítmicos, compassos e divisão), na notação analógica ele é quase
inequívoco: sons curtos são representados por pontos ou traços horizontais
pequenos; sons longos, por meio de traços maiores. No processo de
musicalização, ela tende a se desenvolver naturalmente, como continuidade da
movimentação pelo espaço. Surgem, então, pontos, linhas, contornos,
emaranhados, arabescos. (FRANÇA, 2010. p. 11)
38

Figura 25: Notação alternativa

Fonte: acervo pessoal

Utilizo também um material que são notas coloridas avulsas e elas são dispostas
na mesa ou no chão. Os ritmos são indicados pela distância entre as notas. As cores
facilitam a assimilação da nota através da cor. Outro ponto positivo desse material é que
as notas podem ser facilmente modificadas, isso permite com que músicas possam ser
criadas na hora, tornando-se um jogo de composição também, que é bem aceito
principalmente entre as crianças.

Figura 26: Jogo das notas com a música "O bichinho faz"

Fonte: acervo pessoal


39

Nesse processo de composição e experimentação, tenho como fundamentação a


proposta pedagógica de Orff-Schulwerk, na qual ele se baseia na educação musical
elementar que contém quatro pilares:

• Linguagem: são trabalhadas as palavras, cantigas, rimas que servem como o ponto
de partida para as células rítmicas.

• Música: pequenos motivos melódicos e introduzidos gradativamente, isso dá a


base para a improvisação.

• Improvisação: criação de músicas próprias, estimulando a criatividade e


experimentação.

• Movimento: movimento corporal, deslocamento. (BONA, 2012)

Após o aluno se familiarizar com as notas no braço vou apresentando a partitura


conforme as notas são aprendidas, para que não ocorra excesso de informações.

Um ponto fundamental que notei durante o tempo que estou dando aulas é que
quando alguém busca aprender um instrumento é porque a pessoa quer tocar alguma
música que ela goste muito. Sendo assim, conhecer as preferências do aluno é
extremamente importante, e fazer com que ele toque o que ele quer o estimula a
continuar estudando, seja somente o refrão, uma melodia, uma parte, a satisfação de
poder tocar é instantânea.

A tablatura é um tipo de notação em que são representadas as cordas do violão e


as casas em que devem ser tocadas. Essa grafia possui grande importância didática,
porque é intuitiva, e ela também pode ser adaptada para que fique mais fácil, deixando
apenas as cordas que serão tocadas, por exemplo.
40

Figura 27: Tablatura completa

Fonte: acervo pessoal

Figura 28: Tablatura de uma linha

Fonte: acervo pessoal

A simplificação de acordes é uma maneira de se fazer um acorde utilizando o


máximo de cordas soltas, para que o aluno consiga acompanhar uma música completa.
Diminuir a quantidade de acordes também é necessário para que as primeiras músicas
não tenham informações demais para o aluno processar.
41

Figura 29: Simplificação de acordes

Fonte: acervo pessoal

Apesar de sempre buscar o interesse do aluno, é importante manter o


posicionamento de professor, que deverá orientá-lo da melhor maneira, não deixando de
lado técnica e musicalidade. Busco sempre apresentar um novo repertório, que seja fora
da zona de conforto do aluno. Fazer ligações entre os gostos particulares e músicas
diferentes das habituais é uma maneira de apresentar o novo sem assustar, alguma frase,
progressão harmônica, técnica ou gênero e estilos parecidos, ou até totalmente oposto e
promover o debate é uma ótima solução de ampliar a apreciação musical.
42

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ensino de um instrumento contém as mais diversas dificuldades, desde


aspectos técnico-mecânicos até o repertório ou a falta de motivação, interesse e foco do
aluno. O professor tem como responsabilidade identificar quais os problemas individuais
de cada alunos e buscar soluções que atendam a cada caso.

Pude notar ao longo do tempo que estudei e que lecionei aulas de violão que o
jeito de ensinar vem modificando daquele método da escola tradicional violonística. O
foco de quem está buscando o instrumento é muito mais para lazer do que
profissionalização, também influenciada pela situação atual em que a Arte se encontra
socialmente. Sendo assim, a busca imediata por resultados que satisfaçam está em
primeiro plano.

Como papel do professor deve-se apresentar o que dá prazer pois isso motiva,
mas a habilidade em transformar o prazeiroso em uma aplicação técnica, que ofereça
muito mais possibilidades deve ser trabalhada. Utilizar uma metodologia mais ativa, que
envolva por completo o aluno é uma das soluções que encontrei, utilizando jogos,
experimentações e novas vivências musicais.

A pesquisa apresentou algumas possibilidades e futuramente contará com mais


detalhes das atividades, com aplicações mais práticas e novas ferramentas
metodológicas, incluindo repertório, jogos e recursos.
43

REFERÊNCIAS

ALVES, Júlio Ribeiro. The History of the Guitar. 2015. Disponível em:
<https://mds.marshall.edu/music_faculty/19/>. Acesso em: set. de 2018.

Atlas of Plucked Instruments. Disponível em


<http://www.atlasofpluckedinstruments.com/>. Acesso em: 26 de set. de 2018.

BERGERON, Katheleen A. Classical Guitar Magazine. Disponível em:


<http://classicalguitarmagazine.com/10-classical-guitar-innovations-from-antonio-de-
torres/>. Acesso em: 26 de set. 2018

BONA, Melita. Carl Orff: Um compositor em cena. In: ILARI, Beatriz; MATEIRO, Teresa.
Pedagogias em Educação Musical. Curitiba: ed. InterSaberes, 2012.

EYTHORSSON, Sveinn. 19 Guitar Studies for Beginners. Islândia.

______. The First Guitar Milestone. Islândia. 2000.

FRANÇA, Cecília Cavalieri. Sopa de letrinhas: notações analógicas (des) construindo a


forma musical. Música na educação básica, v. 2, n. 2, 2010. Disponível em:
<http://www.abemeducacaomusical.com.br/revista_musica/ed2/pdfs/MEB2_artigo1.pdf>.
Acesso em: 25 de out. 2018.

IMSLP Petrucci Music Library. Disponível em:


<https://imslp.org/wiki/Special:ReverseLookup/75130>. Acesso em: 25 de set. de 2018.

KASHA, Michael. The art of Playing the Guitar. Disponível em: < http://guitar-artstudy.ru/
m.-kasha-novyy-vzglyad-na-istoriyu-klassicheskoy-gitary>. Acesso em: 25 de set. de
2018.

KFOURI, Maria Luiza. Os mestres. In:TAUBKIN, Myriam. Violões do Brasil. 2. ed. São
Paulo: Editora Senac São Paulo - Edições Sesc São Paulo, 2007.

MARIANI, Silvana. Émile Jaques-Dalcroze: A música e o movimento. In: ILARI, Beatriz;


MATEIRO, Teresa. Pedagogias em Educação Musical. Curitiba: ed. InterSaberes, 2012.

NOVAIS, Ricardo. Curso de violão para crianças - Amigo Violão. Belo Horizonte: Três
Amigos EAD, 2016.

PINTO, Henrique. Antologia violonística. São Paulo: Ricordi Brasileira S.A., 2007.
44

______. Ciranda das 6 cordas: Iniciação Infantil ao Violão. São Paulo: Ricordi
Brasileira S.A., 1985.

______. Curso Progressivo de Violão. São Paulo: Ricordi Brasileira S.A., 1982.

______. Iniciação ao violão - volume II. São Paulo: Ricordi Brasileira S.A., 1999.

______. Iniciação ao violão: Princípios Básicos e Elementares para Principiantes.


São Paulo: Ricordi Brasileira S.A., 1978.

PROSÓDIA. In: MICHAELIS Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. Brasil:


Editora Melhoramentos Ltda, 2015. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/busca?
id=RQ5Gd>. Acesso em: 21 de out. de 2018.

SILVA, Walênia Marília. Zoltán Kodály: Alfabetização e habilidades musicais. In: ILARI,
Beatriz; MATEIRO, Teresa. Pedagogias em Educação Musical. Curitiba: ed.
InterSaberes, 2012.

TABORDA, Marcia. Violão e identidade nacional. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,


2011.

ZANON, Fábio. A arte do violão. Roteiro do programa de rádio transmitido pela Cultura
FM, disponível em: <http://aadv.alotspace.com/download.html>. Acesso em ago. 2018 –
set. 2018, v. 1, 2004.
45

ANEXOS
ANEXO 1 – PLANO DE AULA

Tema: O violão como jogo

Público: Qualquer faixa etária

Materiais: Violões e notas grafadas em papéis coloridos

Duração: 1 hora

Ementa: Iniciação ao violão através da leitura não convencional

Objetivos:

• Exercitar a leitura não convencional

• Iniciar o estudo do violão, indicando algumas notas no braço do violão

Justificativa

A iniciação do violão pode ser um pouco desestimulante pelo fato do instrumento


não ser muito visual. Tornar os estudos iniciais mais prazerosos através de jogos mostra-
se mais produtivo.

A utilização das cores é baseada nas cores foram baseadas nos


Boomwhackers®, que utilizam as cores primárias compondo as terças maiores a partir do
Dó, as cores secundárias que intermediárias entre elas, e as cores terciárias nas
restantes:

• Dó: Vermelho

• Dó#/Réb: Vermelho claro

• Ré: Laranja

• Ré#/Mib: Amarelo escuro

• Mi: Amarelo

• Fá: Verde claro

• Fá#/Solb: Verde

• Sol: Verde escuro

• Sol#/Láb: Azul
46

• Lá: Roxo

• Lá#/Sib:Lilás

• Si: Rosa

A utilização da notação musical alternativa facilita a compreensão por pessoas


sem o conhecimento musical, tornando possível a execução sem muitos elementos
teóricos.

Conteúdo

Primeiro prepara-se a notação musical: as notas serão grafadas em papel


colorido ou outro material que tenho cores. Cada nota terá uma cor, isso facilitará a
identificação e reconhecimento das notas. Feito as notas, dispor os alunos em
semicírculo, e escrever a música com as notas no chão.

Primeiro, apresentar as notas e suas respectivas cores e casas no violão.


Começar com poucas notas para facilitar a memorização. Em seguida apresentar ritmos,
começar com 1 nota por tempo, podendo acrescentar a subdivisão (2 notas por tempo),
que serão representadas, pelas notas ligeiramente uma em cima da outra. A seguir ir
apresentando a música por partes, aproximadamente 4 notas por vez, tocando
lentamente e repetindo sempre que houver dúvidas.

Ao final da aula, os alunos estarão aptos a tocar pequenas melodias, além de


estarem reconhecendo algumas notas no braço do violão além de estarem acostumando-
se com conceitos da teoria musical por meio de atividades lúdicas.

Metodologia

A aula é desenvolvida a partir de atividades práticas e lúdicas, em conjunto. Os


materiais podem ser confeccionados pelos próprios alunos e por ser uma notação flexiva,
permite composições dos alunos e que eles toquem as próprias músicas.

Você também pode gostar