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Índice

Objectivo da filosofia........................................................................................................................................10

Os métodos de estudo da filosofia...................................................................................................................11

1.6.- A relação da filosofia com outras ciências................................................................................................12

A divisão da filosofia.........................................................................................................................................15

CAPITULO II: A IDADE ANTIGA (FILOSOFIA ANTIGA- GREGA)............................................................................18

Caracterização geral.........................................................................................................................................18

2.1. O Período cosmológico..............................................................................................................................18

Tales de Mileto.................................................................................................................................................18

Anaximandro de Mileto....................................................................................................................................19

Anaxímenes de Mileto......................................................................................................................................20

Pitágoras de Samos...........................................................................................................................................20

Heráclito de Éfeso.............................................................................................................................................21

Parmênides de Eléia.........................................................................................................................................22

Anaxágoras de Clazômena................................................................................................................................23

Zenão de Eléia...................................................................................................................................................23

2- O período Antropológico e Sistemático........................................................................................................24

2.2.1- Os Sofistas ( Górgias e Protágoras).........................................................................................................25

2. 2. 2- Sócrates...............................................................................................................................................26

Sócrates e os Sofistas........................................................................................................................................28

2.2.3- Platão.....................................................................................................................................................29

O Mundo das Ideias..........................................................................................................................................31

A moral e a política em Platão..................................................................................................................................31

2.2. 4. Aristóteles..............................................................................................................................................32

2.2.5- Período Helenista...................................................................................................................................36

2.2.5.1- Epicurismo e Epicuro...........................................................................................................................36

2.2. 5. 2- Estoicismo..........................................................................................................................................37

1
2.2.5.3- Cinismo (significa levar a vida de cão).................................................................................................37

3.1- Período Teocêntrico..................................................................................................................................38

Os percursores da Patrística.............................................................................................................................43

3. 2- Santo Agostinho........................................................................................................................................44

3 3- A Escolástica.............................................................................................................................................44

3.3. 1- Santo Anselmo.......................................................................................................................................45

3.3. 2. Santo Tomás de Aquino........................................................................................................................46

4- Filosofia islâmica (Elementos introdutório, “ Avicena, Averroés, Sigério de Brabante)................................49

3.5- Guilherme de Occam.................................................................................................................................52

CAPITULO IV: A IDADE MODERNA (FILOSOFIA MODERNA).............................................................................54

Caracterização geral.........................................................................................................................................54

4.1- Período do Renascimento..........................................................................................................................54

Contexto Histórico............................................................................................................................................54

4.2- O renascimento Vs Humanismo................................................................................................................55

Características do pensamento moderno:........................................................................................................56

4. 3.1. Nicolau. Copérnico.................................................................................................................................57

4.3.2- Galileu Galilei..........................................................................................................................................57

4.3. 4- Spinoza, Baruch.....................................................................................................................................62

4.3.5- O Empirismo Inglês (Francis Bacon Thomas Hobbes, Jhon Locke e David Hume)...................................64

Francis Bacon (1561-1626)...............................................................................................................................64

Thomas Hobbes (1588-1679)............................................................................................................................65

John Locke (1632-1704)....................................................................................................................................65

4.3.7- Charles Montesquieu (1689-1755).........................................................................................................68

4.3.8- Immanuel Kant.......................................................................................................................................70

Os juízos sintéticos a priori...............................................................................................................................71

A Crítica da Razão Prática.................................................................................................................................71

4.3.9- Gerg Wilhelm Hegel................................................................................................................................72

Os Princípios Fundamentais do Sistema Hegeliano..........................................................................................73

2
O Método: A Dialéctica.....................................................................................................................................74

CAPITULO V: A IDADE CONTEMPORÂNEA (FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA).....................................................75

Contexto Histórico............................................................................................................................................75

Escola de Frankfurt...........................................................................................................................................76

Indústria Cultural..............................................................................................................................................76

Principais Características..................................................................................................................................76

Niilismo.............................................................................................................................................................78

Filósofos Niilistas............................................................................................................................................78

Idealismo Platônico..........................................................................................................................................79

Idealismo Alemão.............................................................................................................................................80

Características..................................................................................................................................................80

Características..................................................................................................................................................81

Caracterização geral.........................................................................................................................................81

Karl Marx e o Socialismo...................................................................................................................................81

Marxismo: é o conjunto de ideias filosóficas, econômicas, políticas e sociais que foi elaborado e desenvolvido
por Karl Marx (1818-1883) e seu colaborador, Friedrich Engels (1820-1895) em meados de 1848.................81

Teoria Marxista:................................................................................................................................................82

História do Positivismo.............................................................................................................................................84

Auguste Comte, criador do Positivismo............................................................................................................84

5. 2. 2. O pragmatismo......................................................................................................................................85

5. 2. 3. Existencialismo (Friedrich Nietzsche, Soren Kierkegaard, Martin Heidegger e Jean Paul Sartre)..........86

Martin Heidegger (1889-1976)...................................................................................................................87

Jean Paul Sartre (1905-1980)............................................................................................................................87

5. 2. 4. Axiologia................................................................................................................................................88

5. 2. 5. Fenomenologia (Edmund Hurssel)........................................................................................................88

5. 2. 6. Personalismo (M. Buber Mounier)........................................................................................................89

1. Introduções Interrogatória da filosofia africana...........................................................................................91

1. 1. Existe filosofia africana?............................................................................................................................91

3
1. 2. Filosofia em África ou filosofia africana....................................................................................................98

6. 2. As principais correntes da filosofia africana..............................................................................................99

6. 2. 1. Filosofia da libertação.........................................................................................................................101

6. 2. 2. O Pan – africanismo ( Du Bois e Nkrumah)..........................................................................................104

6. 2. 3. A Negritude ( Aimé Cesaire e L. C. Senghor)........................................................................................106

6. 2. 4. A Etnofilosofia ( A. Kagame, S. Ngoenha, Muanamosi Matumona).....................................................108

Caracterização geral...............................................................................................................................................115

2. Método e divisão........................................................................................................................................117

O que é um argumento?..............................................................................................................................120

Inferência.........................................................................................................................................................126

Validade..................................................................................................................................................................129

Forma lógica...................................................................................................................................................136

Exemplo 1...............................................................................................................................................................140

Exemplo 2...............................................................................................................................................................140

Exemplo 3...............................................................................................................................................................141

7. 5. 1. Classificação quantitativa e qualitativa dos juízos..............................................................................143

7. 5. 2. Simbolização dos juízos e o quadro lógico..........................................................................................143

7. 5. 3. A teoria do raciocínio (silogismo)........................................................................................................153

7. 5. 4. Figuras e Modos dos silogismos..........................................................................................................155

CONCLUSÃO....................................................................................................................................................158

BIBLIOGRAFIA.................................................................................................................................................159

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INTRODUÇÃO

Este manual é resultado das várias reflexões, com base à uma experiência acumulada a
nível epistemológico, bem como filosófica, que vai ajudar a fundamentar ou cimentar a
competência do estudante “cadete”, que virá a ser o futuro decisor diante dos vários desafios
que terá de vivenciar como líder, chefe de tropa, gestor administrativo, servidor público na
defesa e integridade territorial, na segurança do bem-estar da sociedade em situações de
guerra ou em tempos de paz face a globalização em virtude das distintas fases metamórficas,
cujas nações poderosas, bem como aquelas que interessam ao teatro militar têm apresentado.
Para além de socializar o futuro oficial às constantes práticas ideológicas a nível social,
económico, político e militar, bem como poderá nutri-lo de condimentos basilares para a
construção de novos paradigmas abertos científico-militares. Entretanto o universo didáctico
aborda sistematicamente conteúdos sobre o problema da essência do ser, que circundou as
teorias cosmológicas, na mesma fase histórico filosófico sofistas e moralistas trataram da
questão voltada ao homem e suas qualidades, temas que radiaram os antropólogos.

O período da Filosofia Medieval centrou o seu pensamento em Deus e revelação, tendo


dominado inclusive a esfera científica. Já a fase Filosófica Moderna conhecida pelo seu
carácter renascentista, visou redescobrir o que estava ofuscado na perspectiva epistemológica.
Finalmente a fase que corresponde a este em que nos encontramos, “ a Filosofia
Contemporânea”, caracterizada por século das luzes e era do conhecimento. A Filosofia
africana, com um preponderante na consciencialização africana sobre os valores afrocêntricos,
como a negritude, pan-africanismo, autenticidade, etc., em todos os sentidos da cultura dos
negros africanos ou não. De outra forma a Lógica, consubstancia o agregado epistemológico
no ser do militar para concede-los faculdades racionais, no intuito de estruturar da maneira
mais eficiente as decisões de êxitos, em momentos de acções militares mais complexos.

O objectivo deste manual visa doptar o futuro licenciado em Ciências Militares bem
como outras áreas do saber afim com conhecimentos sólidos em torno da inovação científica,
englobando um saber ilimitado temente ao ser pensado, assim como o materializado. Portanto,
a metodologia aplicada na elaboração deste documento é qualitativa, cujos autores se
apoiaram em métodos Empíricos: observação, análises de documentos e reflexão,
comparativo. Teóricos: cenográfico, histórico-lógico, sistémico estrutural, Analítico sintético
Dedutivo e Indutivo.

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CAPITULO I: INTRODUÇÃO À FILOSOFIA

O termo filosofia e conceito da filosofia

O termo cuja paternidade é atribuída pela tradição a Pitágoras que teria, por modéstia,
renunciado a titular-se “sábio” para se contentar em ser apenas “amigo da sabedoria. É
insistindo no aspecto moral dessa “amizade” que o próprio se declara Filosofo. Até no século
XVIII, o termo filosofo é sinónimo de sábio , no sentido geral.1

Muitos dos fundamentadores da corrente oriental acreditam que os pensadores antigos da


filosofia grega, beberam as suas concepções e ideias na filosofia oriental, muito porque, Tales
de Mileto, Pitágoras, Heródoto, fundamentaram as suas posições nos conhecimentos obtidos
pelos ensinamentos dos Sábios do Egipto, da Índia e da China.

É pertinente partirmos da génese do termo filosofia deriva do grego phílos ("amigo",


"amante", “amor”) e sophía ("conhecimento", "saber", “conteúdo”) e tem praticamente tantas
definições quantas são as correntes filosóficas. Aristóteles a definiu como a totalidade do saber
possível que não tenha de abranger todos os objectos tomados em particular; os estóicos,
como uma norma para a acção; Descartes, como o saber que averigua os princípios de todas
as ciências; Locke, como uma reflexão crítica sobre a experiência; os positivistas, como um
compêndio geral dos resultados da ciência, o que tornaria o filósofo um especialista em ideias
gerais. Já se propuseram outras definições mais irreverentes e menos taxativas.

Pode-se definir filosofia, sem trair seu sentido etimológico, como uma busca da
sabedoria, conceito que aponta para um saber mais profundo e abrangente do homem e da
natureza, que transcende os conhecimentos concretos e orienta o comportamento diante da
vida. A filosofia pretende ser também uma busca e uma justificação racional dos princípios
primeiros e universais das coisas, das ciências e dos valores, e uma reflexão sobre a origem e
a validade das ideias e das concepções que o homem elabora sobre ele mesmo e sobre o que
o cerca.

A origem da filosofia

Podemos dizer que as primeiras manifestações do pensamento racional de forma


mitológica pese embora um pouco confusa parte do oriente propriamente da Índia, china e
1
G. Durozoi, A. Roussel Dicionário de filosofia. Porto editora 2000.

6
Egipto antigo, espaços estes que na era da antiguidade era considerado como cantinhos das
civilizações multicultural e pluricultural dada sua potencialidade agrícola, comercial e religioso.
Como nos narras a história que muitos precursores da filosofia antiga tiveram suas primeiras
lições no Oriente sobre tudo no Egipto antigo onde estudavam diferentes saberes desde a
astrologia, a aritmética, a medicina, a agronomia rudimentar, etc. Será que isso é
conhecimento ou filosofia?

O surgimento da filosofia como ciência, pelo menos como um certo modo entender
racionalmente o universo, em toda a história do pensamento humano, é uma conquista peculiar
dos gregos. Tendo em conta a sua importância, levanta-se uma certa discussão quanto ao
modo e ao surgimento. Alguns teóricos dizem que esta forma racional e rigorosa de pensar,
atribuída aos gregos, tem as suas bases na filosofia oriental. Deste modo os teóricos dividem
as suas teorias em duas tendências: Uma constituída pelos teólogos orientais (que atribuem a
origem da filosofia aos ensinamentos orientais, da China, Índia, Babilónia, Síria e Egipto). E
aos teólogos ocidentais (que acreditam o surgimento da filosofia aos pensadores grego do
ocidente).

Pese embora das diferentes concepções abordadas nestas duas tendências, a Filosofia tem a
sua origem na Grécia antiga. Nenhum outro povo pensou tão racionalmente como o povo
grego. A filosofia grega, não nega a razão “logos” mas ela aceita a razão como a única
faculdade, que o permite a compreender a vida nas diferentes áreas da vida social.

A filosofia e a ciência gregas pressupõem as teogonias e as cosmogonias, tais como


concebidas nas obras de Homero e de Hesíodo. O mundo, que incluía a totalidade daquilo que
se conhece, compreende os deuses, imortais, os homens, mortais, e a natureza, que os gregos
chamavam physis. Tanto a natureza quanto os homens estão à mercê dos deuses imortais, de
seus caprichos, cóleras, paixões, pois os deuses, embora divinos e imortais, são concebidos à
semelhança dos homens, tendo também vícios e virtudes. A concepção religiosa e mitológica
do universo é criticada pela filosofia e pela ciência, que se propõem, desde suas origens, a
substituí-la por uma concepção racional e lógica.

Observando que os antigos narradores - Homero, Hesíodo - só transmitiram tradições,


sem dar nenhuma prova de suas doutrinas, O homem, evoluiu significativamente, deve se
partir da era primitiva onde o homem era dependente da natureza (vivia estritamente na
dependência das actividades naturais desde a recolha de frutos silvestres, a caça, a pesca
etc.). Mais já na era moderna ou a era actual, o pensamento do homem evoluiu com o

7
melhoramento do seu cérebro, saindo de homem primitivo, para o homo sapiens. O homem
mudou o curso dos acontecimentos da sua história para um evoluir sem retrocessos, desde a
descoberta do fogo, o surgiram novas actividades que levaram na descoberta de novos
trabalhos e novas transformações que foram acontecendo.

A partir do pensamento, o homem compreendeu que pode responder as exigências da


sua profunda indagação e das suas inquietações, acerca da verdade das coisas. Eís a razão
pela qual o “mito” foi uma das formas mais importante do pensamento humano na busca das
respostas acerca do universo e da vida. O Mito é uma forma pela qual o homem encontrou
partindo das suas ilações imaginárias.2

Os tempos foram mudando muitos foram as nações que foram se fortalecendo em


função das guerras de ocupação de zonas e territórios em vários os cantos do mundo. Nações
como a China, Pérsia, Mesopotâmia, Egipto e outros países do ocidente, conciliaram o saber
em função do homem e aprofundaram este pensamento na razão. E esta forma de saber
começa a vigorar na Grécia antiga, que gera a filosofia como um saber amplo e sintético
acerca do universo. Na Grécia antiga surgiram vários filósofos como Tales de Mileto, Pitágoras,
Heráclito e outros pensadores proeminentes da filosofia grega que exaltaram o saber racional
antigo fora das concepções metáficas. Sendo assim destacamos duas formas principais e
básicas do pensamento humano:

 O pensamento Mitológico, que compreende o período na qual o homem buscava


as respostas do universo, fruto das suas profundas imaginações e construções do
pensamento acerca da vida;
 O pensamento racional, fruto da explicação racional acerca do surgimento do
universo, onde o homem pelo uso da razão conseguiu organizar, a sua forma de
raciocinar e reflectir acerca da vida e do universo (a chamada Filosofia).

A diferença entre os dois tipos de pensamento está na forma como explicam os


fenómenos do mundo, na sua fundamentação, na sua justificação das respostas e hipóteses
acerca da vida e do universo. Foi com Aristóteles, um dos fundadores da filosofia ocidental,
distinguiu entre filosofia e mito dizendo ser próprio dos filósofos o dar a razão daquilo que
falam.

2
L. Rafael Lando, O rosto da Filosofia (Introdução à Filosofia da 11ª classe, textos editores 2005, p.6, 7

8
Estabeleceu-se assim na cultura ocidental uma primeira delimitação do conceito de
filosofia como explicação racional e argumentada da realidade. No entanto, não havia sido
definida nesse momento a separação da filosofia e das diversas ciências. Aristóteles, por
exemplo, investigou tanto sobre metafísica especulativa, como sobre física, história natural,
medicina e história geral, todas reunidas sob a denominação comum de filosofia. Somente a
partir da baixa Idade Média e mais ainda do Renascimento, as diversas ciências se
diferenciaram e a filosofia se definiu em seus actuais limites e conteúdo.

1.2.1- Do Mito à filosofia

Desde os primórdios, o homem teve sempre a preocupação de indagar-se cada vez


mais sobre a géneses da sua existência e do universo, as constantes tentativas da procura de
respostas sobre a génese do mundo e da sua própria existência, sobre tudo da essência da
vida, fez com que o homem se preocupasse na busca incessante do porque das coisas, pese
embora não satisfatório, dentre as várias colocações e ilações, fruto da admiração pela
totalidade do real (que é a natureza), o homem chegou a razão que existe um princípio
fundamental, que está na base da existência do universo.

Correntes às que têm como fundamento da criação outros do surgimento espontâneo do


universo até mesmo os que acreditam no evolucionismo. Partindo destes fundamentos o leitor
terá a oportunidade de eleger a que mais lhe convir, porém os grandes cientistas hoje estão
mais inclinados na teoria da criação, que defende o mundo ser criado por um ser supremo que
cria e não criado “o ser em si ” (Deus). Outros acreditam que o homem evoluiu do primo
distanciado do homem que é o macaco, isso ocorreu a centenas e milhares de anos. Estudos
feito chegam a seguinte ordem de ideia, uns dos elementos que se pode observar no universo
no que tange a constituição dos corpos quase 70% das matérias estão compostas por água em
combinação com outros elementos ou substância químicas que sustentam a existência dos
seres vivos.

O homem sempre se questionou sobre temas como a origem e o fim do universo, as


causas, a natureza e a relação entre as coisas e entre os factos. Essa busca de um
conhecimento que transcende a realidade imediata constitui a essência do pensamento
filosófico, que ao longo da história percorreu os mais variados caminhos, seguiu interesses

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diversos, elaborou muitos métodos de reflexão e chegou a várias conclusões, em diferentes
sistemas filosóficos.

O objecto de estudo da filosofia

Antes de nos aprofundarmos sobre objecto de estudo da Filosofia, é de relembrar que


todas as ciências têm o seu campo de estudo, assim como a filosofia não foge a regra.

Chama-se objecto de estudo de uma determinada ciência ou saber, ao problema ou ao


assunto que procura conhecer, indagar, perscrutar, para nela descobrir os seus diversos
“mistérios.” O objecto é aquilo que cada ciência se dedica a investigar de todas as formas. E
todo saber alcança a categoria de ciência, quando começa a reivindicar a sua verdadeira
autonomia, a partir do momento em que se veja diante do seu objecto. Em outras palavras o
objecto é a consistência do próprio saber, para nela se colher todas as ilações.

O obejeto de estudo da Filosofia é a “totalidade do real” conforme diz KARL MARX. A


filosofia estuda todas as coisas que existem no universo. A filosofia estuda tudo, conforme
afirma Sócrates, que a filosofia é uma descrição sintética da natureza e do Universo. O seu
objecto de estudo não é apenas um, mas vários, por isso se diz que visa a totalidade do real. O
todo significa tudo quanto existe, isto é, o Ser, e que pode ser objecto de reflexão filosófica.
Assim a filosofia aborda assuntos simples e complexos que podem ir desde o comportamento
humano e seus valores, passando pela ciência, a arte, a religião, a linguagem e a política.

Objectivo da filosofia

Todas as ciências em função da sua preponderância, tem determinado objectivos que


constituem assim a sua finalidade. A finalidade consiste em saber o que se pretende, enquanto
um modelo aberto que é a ciência. A filosofia como um saber que estuda a natureza e tudo
quanto existe no universo tem na sua esteira, as seguintes finalidades. O objectivo da filosofia
é visa também estimular a reflexão e nos orientar sobre o que estamos fazendo connosco, com
o mundo. A filosofia oferece espaço para a dúvida em nosso quotidiano. Ela nos ensina a
tomar cuidado com as certezas.

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Obtenção do conhecimento, que consiste em elaborar uma visão geral do mundo e da
Natureza (Cosmovisão, que é a visão geral do universo):

Elevar os sensos motivacionais da pesquisa, para indagar, se aprofundar, na pesquisa


científica, bem como, na pesquisa especulativa (teoria);

Promover a cultura Axiológica e a dignidade do homem pelo homem (humanismo);

Finalmente, é tarefa da filosofia, indagar e questionar sobre a finalidade do


conhecimento no campo da vida. A filosofia sendo um saber baseado nas concepções
racionais, para apurar a verdade das coisas, pretende por este caminho saber o quão é
fundamental a protecção da vida dos homens na humanidade, bem como, criar princípios que
levam o homem a felicidade.

Os métodos de estudo da filosofia

A filosofia, como qualquer outro conhecimento que nela se derivou, tem o seu método
específico. Entende-se por método o procedimento ou processo que permite a uma
determinada ciência descrever a verdade ou o conhecimento existente a um fenómeno. O
Método segundo René Descartes, é um caminho que assegura e percorre todos os nossos
conhecimentos, para um determinado fim. A Filosofia para explicar os diversos fenómenos
sociais e não só, utiliza o método Raciocinativo que integrado por dois grandes procedimentos:

Método

Indutivo
Dedutivo

Método Dedutivo: Consiste em analisar as causas e os factos mais complexos (de uma
forma Geral), até aos particulares. Isto é, procura chegar a uma verdade geral a partir de uma
outra particular.

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Método Indutivo: consiste em analisar as causas e os factos mais simples (de uma forma
particular), até aos mais gerais. Isto é, procura chegar a uma verdade particular a partir de uma
outra geral.

Estes métodos são importantes uma vez que a filosofia, procura estudar o todo, de uma
forma concreta, mas ela notabiliza-se fundamentalmente em esclarecer também os problemas
que ainda não estão identificados e compreender os mistérios da vida. Conforme afirma
Aristóteles, que a filosofia é a ciência que estuda as causas últimas”. Sócrates inaugura
o método quando institui a maiêutica, ou seja, a arte de perguntar. Platão aperfeiçoa a
maiêutica de Sócrates e a transforma no que ele chama dialética.

A dialética platônica conserva a idéia de que o método filosófico é uma contraposição,


não de opiniões distintas, mas de uma opinião e a crítica da mesma. Conserva pois, a idéia de
que é preciso partir de uma hipótese primeira e depois ir melhorando, à força das críticas que
se lhe fizerem. Em Hegel, abrange três momentos:

1º) o positivo, da unidade;

2º) o negativo, da divisão;

3º) o danova unidade. Este processo renova-se constantemente. Exemplo: posição - botão;
divisão - flor; nova unidade - fruto (2).

1.6.- A relação da filosofia com outras ciências

A demarcação das ciências naturais em relação à filosofia foi um processo longo e


gradual no pensamento ocidental. Inicialmente, a investigação da natureza das coisas consistia
numa mistura entre o que hoje seria visto como filosofia (considerações gerais das mais vastas
sobre a natureza do ser e a natureza do nosso acesso cognitivo a ele) e o que hoje seria
considerado como próprio das ciências particulares (a acumulação de factos da observação e a
formulação de hipóteses teóricas gerais para os explicar). Se olharmos para os fragmentos que
nos restam das obras dos filósofos pré-socráticos, encontraremos não só tentativas
importantes e engenhosas para aplicar a razão a questões metafísicas e epistemológicas
vastas, mas também as primeiras teorias físicas, simples mas extraordinariamente
imaginativas, sobre a natureza da matéria e os seus aspectos mutáveis.

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Segundo uma perspectiva mais recente, o papel da filosofia não é o de funcionar como
fundamento ou extensão das ciências, mas como sua observadora crítica. A ideia é a de que
as disciplinas científicas particulares usam conceitos e métodos. As relações entre os diversos
conceitos, embora estejam implícitas no seu uso científico, podem não ser explicitamente
claras para nós. O papel da filosofia da ciência seria assim o de clarificar essas relações
conceptuais. Uma vez mais, as ciências particulares usam métodos específicos para fazer
generalizações, a partir de dados da observação, em direcção a hipóteses e teorias. O papel
da filosofia, segundo esta perspectiva, é o de descrever os métodos usados pelas ciências e
explorar as bases de justificação desses métodos, isto é, compete à filosofia mostrar que os
métodos são apropriados para encontrar a verdade na disciplina científica em questão.

Antes porem nos importar a florar os quatro nives do conhecimento, verificamos, deste
modo, que a conhecimento científico diferencia-se do conhecimento popular muito mais do que
se refere ao seu contexto metodologico doque propriamente ao seu conteudo. Essa diferença
ocorre tambem em relação aos conhecimentos filosofico e religioso (teologico). Filosofia e
Ciência embora hoje possuam distinções, são áreas que, no passado, já estiveram vinculadas.
Apesar das divergências, ambas carregam elementos em comum, como, por exemplo, o rigor
de seus estudos, a busca pela verdade, a explicação lógica da realidade e a diferença que
possuem em relação ao mito e à religião. É importante esclarecer, que estes dois últimos itens
baseiam-se em crenças sustentadas pela fé e em verdades reveladas por profetas e/ou livros
sagrados. Ou seja, não exigem provas físicas, demonstrações, testes ou análises mais
profundas para chegar até suas verdades, pois estas já são previamente postuladas

A relação da filosofia com as outras ciências aclara-se pelos seguintes itens principais e
fundamentais:

 A procura pelo conhecimento (todas as ciências indagam-se procuram estabelecer as


suas relações com os objectos, para melhor sistematiza-lo);
 A procura pela verdade (as ciências, bem como, a filosofia, procuram saber na finalidade
das suas investigações, onde está a verdade das coisas);
 A utilidade Filosófica (todas as ciências e as suas respectivas investigações, procuram no
máximo compreender o que serve para o bem estar social do próprio homem, bem como, a
sua utilidade enquanto ciência);
 Objectos de Estudos (as ciências, bem como, a filosofia, têm um campo de estudo, pese
embora que a filosofia estuda tudo, mas ela se preocupa com o “homem”. E as ciências

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sociais, encontram no homem, o verdadeiro fundamento das suas pesquisas, isto é,
tanto a filosofia como a ciência, cruza no objecto homem, para conhecer melhor as suas
causas e efeitos.

A outra relação da filosofia com as outras ciências está na principal característica da


filosofia, que é a Racionalidade. As ciências sociais, bem como as humanas recorrem dos
métodos filosóficos, para explicarem racionalmente as suas investigações. Isto é, o Método
Indutivo e Dedutivo, que foram criados por Aristóteles, nas suas concepções lógicas. A ciência
é uma forma de conhecimento de natureza crítica, que busca verdades necessárias e
universais, e que possui caráter empírico e sistemático, e adquirido de maneira programada,
através de uma metodologia que baseia-se numa metodologia que pode ser descrita
simplificadamente como um processo que engloba observação, hipótese, experimentação e
conclusão. O primeiro passo, a observação, se dá quando o homem atenta-se à natureza a sua
volta para tentar compreendê-la. Este é o momento em que surgem incertezas, teorias, e o
desejo de conhecer aquilo que o cerca. A hipótese é meramente provisória, e consiste em
ideias e especulações que sugerem respostas para tais incertezas.

Os experimentos surgem então para tentar certificar a parte inicial da tarefa (dúvida e
hipótese) e para que assim, chegue-se ou não, a um resultado. Por fim, aparece a conclusão,
que pode confirmar ou negar os testes e as teorias hipotéticas. Além desse procedimento
padrão que a guia e a caracteriza, a ciência, por meio de suas descobertas, busca prever os
acontecimentos da natureza, pautando-se naquilo que descobriu e concluiu através de seu
método. Isto significa que as respostas que ela encontra, não são válidas somente para os
casos observáveis, mas sim, de maneira genérica para todos os outros semelhantes.

Portanto, uma série de experimentos, proporciona respostas para quantidades de


fenômenos que podem ser bem maiores do que as que foram experimentadas previamente.
Ressaltemos uma frase de Albert Camus: “A primeira coisa que um bom cientista faz quando
está diante de uma descoberta importante e tentar provar que ela está errada”. A ciência deve
ser entendida como uma área que está sempre sujeita a mudanças, e que se atualiza
frequentemente sendo que, muitas vezes, substitui descobertas e “certezas” antigas por
descobertas e “certezas” novas. Por isso, a ciência possui também como marca, o aspecto
provisório.

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A divisão da filosofia

A evolução do pensamento filosófico na história processou-se sob etapas definidas,


mediante contribuições dos mais eminentes vultos do saber humano, tendentes à detecção do
próprio sentido da vida humana em sociedade. Na Antiguidade, primeiramente começamos por
analisar e reflectir sobre a essência do universo, do ser, a géneses do homem e suas
qualidades. Não se pode ignorar o exercício dos sofistas e o papel que jogaram nas dialécticas
com Sócrates e Platão. Ainda voltaram-se aos já citados pensadores para a política, ética, com
destaque para os contributos e trabalhos de Platão e Aristóteles. A Idade Média foi,
predominantemente, a era da contemplação ou da filosofia dirigida à descoberta da essência
de Deus, com ênfase para as obras de Santo Agostinho, São Bento e Santo Tomás. A Idade
Moderna representou a da afirmação dos direitos fundamentais no aperfeiçoamento do
convívio social, com Locke, Rousseau, Voltaire e Montesquieu, entre outros. Na Idade
Contemporânea destacam-se o assentamento dos valores sociais e religiosos que devem
inspirar o convívio humano, principalmente com os trabalhos de Max Weber e Émile Durkheim,
etc. Presente em todas as épocas e em todos os pensadores, está a busca e a identificação do
Bem-Comum, aliás, preocupação universal e perene do próprio espírito humano.

O conhecimento humano é um fenómeno complexo e misterioso. Três disciplinas


filosóficas interessam-se particularmente por seu estudo: a Psicologia, a Gnosiologia e a
Logica. A primeira examina sua origem e seus tipos principais; a segunda determina seu valor,
estudando as relações existentes entre o conhecimento e o objecto conhecido; a terceira,
enfim, estuda as condições essenciais para a constituição do conhecimento e fixa as regras de
seu funcionamento correcto. No que diz respeito às formas ou níveis do conhecimento
humano, antes de mais nada um dado óbvio: nós, como os animais, também somos dotados
de algumas formas de conhecimento sensível: visão, audição, gosto, olfacto e tato. Além disso,
possuímos com certeza uma outra capacidade ainda, a Memória, que nos permite trazer de
volta à mente informações que pertencem ao passado. Além disso há em nós uma terceira
capacidade: a Fantasia. Ela nos permite representar as coisas de forma original, diferente de
como as recebemos pela experiencia. Podemos por exemplo, imaginar um boi com cabeça de
Leão e cauda de Crocodilo, ainda que jamais tenhamos visto de facto semelhante animal.

O conhecimento humano proporciona também outros dados singulares, concernentes à


ordem científica, religiosa, moral estética, etc., que incluem ideias universais e abstratos,
princípios gerais absolutos, leis necessários, que apresentam então características bem

15
diferentes do conhecimento obtido através dos sentidos e da imaginação. Assim, podemos
dizer que os tipos de conhecimentos humanos são essencialmente dois:

 Conhecimento Sensível e conhecimento Intelectivo ou Racional;


 Conhecimento sensível por imagem directa;
 Conhecimento sensível por imagem indirecta, ou seja, por meio de uma cópia.
 Conhecimento intelectivo pelo raciocínio (que Platão denomina dianoia e Agostinho ratio
inferior);
 Conhecimento intelectivo pela visão (que Platão chama noesis e Agostinho iluminatio).

Os níveis de conhecimento vão desde os conhecimentos apriori (conhecimento que se


baseia na razão ou seja conhecimentos racionais, fundamentados na intuição, no esforço da
razão para explicar o ser), enquanto os conhecimentos aposteriori se se fundam na experiência
(conhecimentos observados, palpados, audíveis, etc). Um outro nível de conhecimento
encontra seu substrato na crença ou seja na fé (aquele conhecimento que não pode ser
racionalmente, nem pragmaticamente aferido ou demonstrado). Entre estes vários níveis de
conhecimentos, caracterizam-se da seguinte ordem cognoscitiva:

Conhecimento popular: Conhecimento cientifico

Valorativo - Real (factual)

Reflecivo - Contigente

Assitemático - Sistemático

Verificavel - Verificável

Falivel - Falível

Inexato - Aproximadamente exato

Conhecimento filosofico Conhecimento religioso (teológico)

Valorativo - Valorativo

Racional - Inspiracional

16
Sistemático - Sistemático

Não verificavel - Não verificavel

Infalível - Infaíivel

Exacto - Exacto 3

3
Maria de Andrade, Eva Maria Lakatos. Fundamentos de Metodologia científica Editora Atlas 2007. pág. 77-80.

17
CAPITULO II: A IDADE ANTIGA (FILOSOFIA ANTIGA- GREGA)

Caracterização geral

2.1. O Período cosmológico

Os pré-socráticos (A Escola Jónica; Pitágoras, Heráclito, DemócritoVs Parménides)

1. - Escola Jônica (Ásia Menor), cujos principais representantes são Tales de Mileto,
Anaximandro de Mileto e Heráclito de Éfeso.
2. - Escola Pitagórica ou Itálica (Magna Grécia), cujos principais representantes são
Pitágoras de Samos, Filolau de Cretona e Árquilas de Tarento.
3. - Escola Eleata (Magna Grécia), os principais representantes são Xenófanes de Colofão,
Parmênides de Eléia, Zenão de Eléia e Melissos de Samos.
4. - Escola Atomista (Trácia), cujos principais representantes são Leucipo de Abdera e
Demócrito de Abdera. Também pode ser adotada uma classificação mais genérica,
agrupando-os em eleatas e não-eleatas, considerando-se que os eleatas não admitiam
o movimento e concebiam o universo como uma unidade imóvel e eterna, enquanto os
não-eleatas defendiam o movimento e a multiplicidade como única realidade. Vejamos,
a seguir, alguns dos principais pensadores desse período.

Tales de Mileto.

Como apresentamos no início, a filosofia grega nasceu nas colônias mais distantes, e foi
exatamente em Mileto, na Jônia, atualmente território da Turquia, por volta de 624 a.C., que
nasceu Tales, tido como o primeiro filósofo e precursor da filosofia grega. Além de filósofo, foi
matemático e astrônomo; aliás, sua morte provavelmente ocorreu em 546 a.C., vítima de um
acidente enquanto observava os astros. Outro fator importante a ser ressaltado é a tradição
oral da Grécia, o que resultou em muito poucos escritos dos filósofos daquela época. E com
Tales não foi diferente, pois não se tem notícia de que tenha escrito algo, e conhecemos suas
ideias apenas pelos escritos posteriores. A pergunta filosófica mais elevada, “Qual é a causa

18
última, o princípio supremo de todas as coisas?” foi colocada por Tales sistematicamente na
tentativa de encontrar uma resposta racional, livre da explicação mítica.

A reflexão filosófica de Tales foi desenvolvida a partir da observação da natureza.


Considerando os elementos mais presentes em todo o mundo observável - o ar, a terra, a água
e o fogo, o filósofo concluiu que o princípio supremo de todas as coisas deveria ser a água, vez
que esta podia se alterar em várias outras formas, dando origem, por condensação, à terra,
por rarefação, ao ar e ao fogo. Embora aparentemente ingênua a resposta, não se pode negar
a importância da água para a vida.

Mas a partir desse questionamento de Tales estabeleceu-se a definição do


termo physis, que significava, para os filósofos da época, não apenas a natureza existente,
mas, verdadeiramente, a realidade fundamental e primeira de toda a natureza.

Outro aspecto a ser destacado é a concepção de água que se deve ter a partir do pensamento
de Tales, pois como princípio universal, não é apenas a água na forma como conhecemos,
mas efetivamente uma liquidez primeira do universo, e se confunde, mesmo com deus, posto
que para ele, todas as coisas estavam plenas de deuses.

Anaximandro de Mileto.

Anaximandro, como o nome indica, nasceu também em Mileto por volta de 611 a. C. e
morreu por volta de 547 a.C., tendo sido, provavelmente, discípulo de Tales. Ao contrário de
Tales, deixou escrito um tratado denominado “Sobre a Natureza”, o qual, entretanto, perdeu-se
ao longo do tempo, tendo restado apenas um fragmento, cuja tradução já rendeu muitas
discussões entre os filósofos posteriores, mas diz aproximadamente o seguinte: “De onde as
coisas extraem o seu nascimento aí também é onde se cumpre a sua dissolução segundo a
necessidade; com efeito, reciprocamente sofrem o castigo e a culpa da injustiça, segundo a
ordem do tempo.”

Para Anaximandro, o princípio de que Tales falava não poderia ser a água, porquanto
ela também já é derivada de algo. O princípio, pois, só poderia ser mesmo o infinito, ou como
dizia, o a-peiron, o que não tem limites, nem externos, nem internos. Também para ele, esse
princípio estava ligado ao divino, com a diferença de não ser nascido e nem ser possível a sua
morte. Esse fragmento de Anaximandro mereceria um estudo detalhado, mas face à natureza

19
desse curso, deixaremos para outra oportunidade, ressaltando apenas que nele se apresentam
as idéias dos contrários, da dupla injustiça e do tempo como o juiz de todas as coisas. É, sem
dúvida, uma concepção bem mais detalhada do que a de Tales.

Anaxímenes de Mileto.

Anaxímenes nasceu por volta de 588 a.C. e morreu aproximadamente em 524 a.C. Foi
discípulo de Anaximandro e, embora concordando com o mestre, que o príncípio deve ser
infinito, defendeu a tese de que mesmo esse princípio deve ser pensado como algo físico, e,
portanto, deve ser o ar, vez que “exatamente como a nossa alma (ou seja), (o princípio que dá
a vida), que é ar, se sustenta e se governa, assim também o sopro e o ar abarcam o cosmos
inteiro”.

Tal como Tales, Anaxímenes apresentou um pensamento evolucionista ao concluir que


todas as coisas do mundo “respiram” e possuem vida e alma. O ar, elemento dessa respiração
é o princípio de tudo, das coisas, dos homens e dos deuses. Do ar derivam por composição,
num movimento de rarefação ou condensação, todos os corpos. Defendeu, ainda, que esse
movimento é cíclico, de maneira que periodicamente todas as coisas se dissolvem no princípio
originário.

Xenófanes de Cólofon.

Xenófanes nasceu em 570 a. C. e morreu em 475 a.C., aproximadamente. Foi o primeiro


filósofo a colocar-se de frente contra a concepção mítica. Aristóteles, mesmo, o considerou o
fundador da escola eleática que será vista na sequência.

Pitágoras de Samos.

Pitágoras nasceu em 571-0 a.C. e morreu em 532-1 a.C., e é considerado um dos grandes
gênios da humanidade. Suas contribuições contam em vários campos de saberes, entre os
quais a matemática, a geometria, a astronomia, a filosofia a ascese e a mística. Em Pitágoras,

20
encontramos o princípio da mônada, mais tarde retomada e modificada por Leibnitz, e que
citamos aqui: “o princípio de todas as coisas é a mônada; dela procede a díada indeterminada,
que serve de substrato material à mônada, que é a sua causa. Da mônada e da díada
indeterminada nascem os números; dos números nascem os pontos e destes, as linhas, das
quais procedem as figuras planas. Das figuras planas nascem as figuras sólidas e destas, os
corpos sensíveis, cujos elementos são quatro, a saber.

O fogo, a água, a terra e o ar. Estes elementos mudam-se e transformam-se uns nos
outros, originando-se deles um universo dotado de alma e de razão, de forma esférica, em cujo
ponto central está a terra, também ela esférica e habitada”. Outro aspecto que influenciou
fortemente o pensamento filosófico foi sua doutrina das almas, que para ele, são imortais e
feitas de uma substância incorruptível. E, ao contrário dos demais pré-socráticos, que
defendiam sempre algum elemento da natureza como princípio universal, Pitágoras defendeu
os números como sendo esse princípio, considerando que o número expressa não apenas a
natureza, mas também as relações entre as coisas, e, assim, a partir do número chegou à
conclusão de que a multiplicidade decorre da unidade.

Heráclito de Éfeso.

Heráclito nasceu por volta de 504 a.C., nada constando a respeito de sua morte. É um
dos filósofos mais eminentes do período pré-socrático e ao mesmo tempo mais lendário. Não
se sabe ao certo se deixou algo escrito ou se apenas divulgou suas idéias por suas poesias.
Conta-se que era filho dos governantes da cidade e não era bem visto entre os cidadãos. Para
Heráclito, o princípio agente de todas as coisas é o fogo. Segundo ele, tudo flui, tudo está em
movimento e nada dura para sempre, e nessa constante oposição está a unidade. Assim, “não
podemos nos banhar no mesmo rio por duas vezes”. O fogo, por conseguinte, é o elemento a
partir do qual todas as coisas se formam, visto que é volátil e se transforma conforme o maior
ou menor calor, pela condensação ou rarefacção.

Mas, além desse princípio agente, Heráclito estabeleceu o princípio regente do universo,
o Logos. Para ele, “A guerra é mãe de todas as coisas e de todas as coisas é rainha... Aquilo
que é oposição se concilia, das coisas diferentes nasce a mais bela harmonia e tudo se gera
por meio de contrastes... Eles não compreendem que aquilo que é diferente concorda consigo
mesmo; é a harmonia dos contrários, como a harmonia do arco e da lira”. Evidentemente, essa

21
teoria foi abraçada largamente por Hegel, filósofo moderno, defensor da dialéctica.
Estabelecendo que todas as coisas estão em constante devir, Heráclito defende, então, que
esse devir segue uma lei natural. E essa lei é o princípio regente , o Logos, que delimita os
movimentos de todas as coisas. O homem, por sua vez, agindo em consonância com o logos,
estará apto a conhecer a verdade. Daí, segue-se o livre-arbítrio e a responsabilidade do
homem pelo seu destino e também o dos demais, pois escreve.

Parmênides de Eléia.

Parmênides é o maior expoente da escola eleática, isto é, dos filósofos de Eléia. Nasceu
por volta de 516 a.C. e morreu por volta de 470 a.C. Adotou muito do pensamento de
Xenófanes e suas idéias tiveram grande influência na estrutura sociopolítica da Grécia. Um de
seus fragmentos mais famosos é “O ser e o pensar são a mesma coisa...sem o ser, no qual o
pensar se encontra expresso, não há pensamento”. Para ele, a única realidade é o ser, e assim
combate agudamente o vir-a-ser defendido por Heráclito. Não é possível pensar o não-ser,
porque ao pensá-lo, ele já é ser.

A sua obra principal que chegou até nós é o poema “Sobre a Natureza!” que se divide
em duas partes, Da Verdade e Da opinião. Percebe-se, aqui, a preocupação de Parmênides
com o ser. Por isso ele é considerado um dos primeiros grandes metafísicos. Essa
preocupação com o ser é retomada por Heidegger, por exemplo, já no período contemporâneo,
que atribui suma importância ao pensamento Parmenidiano. Parmênides entende que o único
caminho para o homem chegar à verdade é o caminho de pensar o ser. É o caminho, pois, da
razão. Nesse sentido está o fragmento abaixo citado:

"Pois bem! E tu acolhe as palavras que ouvires /os únicos caminhos de busca que são
[para] pensar:/um, [o] que é e que não é não ser, / é o caminho da persuasão (pois acompanha
a Verdade); / outro [o] que não é e que é necessário não ser, / este, advirto-te, é [um] caminho
em que nada se pode aprender / porque nem poderás conhecer o que não é (pois [tal] não [é]
factível) / nem mencioná-lo." Parmênides de Eléia negou, assim, a possibilidade de
transformação na natureza, afirmando que tudo que existe sempre existiu, pois nada que existe
pode ter surgido do nada ou se transformar em nada. As transformações observadas na
natureza, para ele, eram apenas ilusão dos sentidos, e confiava apenas na razão.

22
Podemos citar, ainda, Empédocles de Agrigento, que tentou conciliar as teorias de Heráclito e
Parmênides, afirmando que havia quatro elementos básicos: a terra, o ar, o fogo e a água. A
transformação vista por Heráclito seria a combinação entre esses elementos, e não as suas
transformações.

Anaxágoras de Clazômena

Anaxágoras de Clazômena (500 – 428 a.C.), defendeu que tudo era dividido em
partículas invísiveis a olho nu, e que essas partículas estavam presentes em tudo, se
mostrando de uma forma ou outra, segundo a predominância de uma outra. Tudo está em
tudo.

Demócrito de Abdera

Demócrito de Abdera (460 – 360 a.C.) concordava que as coisas eram compostas de
minúsculas partículas indivisíveis, as quais denominou ÁTOMOS, que eram eternos e de
diversas naturezas e podiam se combinar de infinitas formas, dando, assim, origem às mais
diversas espécies de coisas.

Zenão de Eléia

Zenão de Eléia (464-1 a.C.) foi discípulo de Parmênides e teve atuação política
destacada. Sempre lutando contra os tiranos, conforme expõem Giovanni Reale e Dante
Antiseri, chegou mesmo a cortar sua própria língua para não confessar denunciar os
companheiros de revolta. Na filosofia, foi um árduo defensor da impossibilidade do movimento,
consoante a doutrina de Parmênides. Seu método foi o de rejeitar as teorias contrárias a
Parmênides pela sua refutação absurda, isto é, mostrando o absurdo das teorias contrárias.
Pode-se dizer, assim, que foi um dos precursores da dialética. Quanto ao movimento, é valiosa
sua formulação lógica para negação do movimento ao afirmar que para um objeto se mover de
um ponto a outro, deveria percorrer primeiro a metade do percurso, depois, a metade da outra
metade, e depois a metade da metade da metade e assim por diante, de forma que sempre
restaria uma metade a ser cumprida. Outro argumento é da flecha que não poderia jamais

23
alcançar o alvo, porque está parada e não em movimento, como mostra a aparência. E explica
Zenão, a flecha ocupa um lugar no espaço em cada instante do tempo, e pois, na soma dos
instantes, também está parada.

2- O período Antropológico e Sistemático

Na Grécia do século V a.C., a palavra sofista era utilizada com o sentido de homem
sábio. No final do século, o termo sofista ganhou uma conotação prática e política, aplicado a
quem escrevia ou a quem tinha a capacidade de transmitir a arte de falar bem, a retórica.
Sócrates deu um novo sentido à palavra, sentido este que carregamos até o momento, no qual
o termo sofista é visto de forma pejorativa: é aquele que engana e ilude. Entenderemos o
porquê mais adiante. Apontamos que os sofistas atenderam a uma necessidade histórica de
Atenas, que se havia transformado num Estado democrático, rico e imperialista após as
Guerras Persas. Os filósofos sofistas insistiam em que era inútil especular sobre os primeiros
princípios do universo, pois tal conhecimento estava além da inteligência humana; que os
indivíduos deviam não só aperfeiçoar-se como fazer progredir as suas cidades, aplicando a
razão às tarefas de cidadão e de estadista.

Que diziam e faziam os sofistas? Os sofistas não acreditavam na verdade absoluta, para
eles o importante era conseguir convencer os outros de suas ideias, eram relativistas
filosóficos, ou seja, segundo eles não havia nenhuma verdade de valor universal.
Apresentavam-se como mestres de oratória ou de retórica, afirmando ser possível ensinar aos
jovens tal arte para que fossem bons cidadãos. É a grande a dívida da tradição humanista
ocidental para com os sofistas, que examinaram questões de ordem política e ética, educaram
os espíritos de seus alunos e foram os criadores da educação civil formal. Os sofistas mais
importantes foram: Protágoras de Abdera e Górgias de Leontini.

24
2.2.1- Os Sofistas ( Górgias e Protágoras)

Protágoras, um sofista do século V, dizia que “o homem é a medida de todas as coisas”.


Assim, o bem e o mal, a verdade e a falsidade são questões de critério individual; não existem
padrões universais que se apliquem a todas as pessoas em todas as épocas. Protágoras é
considerado o “pai dos sofistas”, uma vez que seus discípulos seguiam a sua frase citada
acima. Inicialmente sofista significava o representante de uma ciência, arte ou técnica e
também o inventor dela. Sofista e filósofo eram quase sinónimos. Passou no entanto, nos
últimos 50 anos do séc. V a. C. Ganha uma ressonância pejorativa. Passou a designar os que
deambulavam de cidade a cidade em busca de auditório que ensinavam pedindo um preço
geralmente elevado.

Doutrina: o que interessava aos sofistas não era tanto a investigação da verdade, mas o
poder de demonstrar qualquer tese, cativando o público. Tinham grande habilidade em falar e
discutir. Se fosse necessário, fabricavam engenhosamente argumentos para enganar. Por isso
Platão distingue o sofista do filósofo: sofista é o vendedor de ilusões e o filósofo é o
investigador da verdade. Os sofistas dizem que o homem não pode conhecer a natureza das
coisas, isto é, não pode conhecer a natureza nem a lei moral absoluta porque estão acima da
sua capacidade cognoscitiva. Portanto tudo aquilo que o homem conhece em filosofia ou em
ética é uma fabricação sua. Dai o famoso dito dos sofistas: “o homem é a medida de todas as
coisas; das que são, enquanto são, e das que ñ são, enquanto não são”. Isto significa que o
conhecimento é algo subjectivo; algo que se pensa na mente do homem e permite-lhe cria-lo e
apresenta-lo como melhor lhe convinha; é questão de habilidade. Consequentemente não é
possível um conhecimento verdadeiro; o conhecimento só pode ser provável. Não há uma lei
moral absoluta, mas só leis convencionais. Nesta linha de ideias a única meta do homem é o
prazer.

Protágoras: foi o primeiro a sustentar que se pode fazer dois discursos perfeitamente
contraditórios sobre o mesmo tema. Diz que não há nenhuma verdade absoluta. Tudo o que o
sábio (sofista) faz, é interpretar as coisas ou modo e a seu favor. Segundo a doutrina de
Protágoras, a moral é convencional mas não arbitraria: ela tem o seu fundamento nos
princípios divinos do respeito e da justiça que Deus comunicou a todos os homens.

Górgias declara plena indiferença para com todo moralismo: ensina ele a seus
discípulos unicamente a arte de vencer os adversários; que a causa seja justa ou não, não lhe
interessa. A moral, portanto, – como norma universal de conduta – é concebida pelos sofistas

25
não como leis racionais do agir humano, isto é, como a lei que potencia profundamente a
natureza humana, mas como um empecilho que incomoda o homem. No Górgias de Platão, o
filósofo sofista declara que a sua arte produz a persuasão que nos move a crer sem saber, e
não a persuasão que nos instrui sobre as razões intrínsecas do objecto em questão. Em suma,
é mais ou menos o que acontece com o jornalismo moderno. Górgias (484-375a.c.): Nasceu
em Leôncio, na Sicília. Diz que nada existe: ainda que alguma coisa existisse não poderíamos
conhecê-la; se pudéssemos conhecê-la, não poderíamos comunicar nosso conhecimento a
outros. Tal máxima expressa o sentido de que não é o ser humano quem tem de se moldar a
padrões externos a si, que sejam impostos por qualquer coisa que não seja o próprio ser
humano, e sim o próprio ser humano deve moldar-se segundo a sua liberdade.

2. 2. 2- Sócrates

Sócrates (469-399): nasceu em Atenas. Quando a cidade já tinha atingira o máximo do


seu esplendor artístico e o vértice de seu poderio militar e económico. Seu pai, Sofronisco, era
escultor, e sua mãe, Fenareta, parteira. Sócrates cresceu forte e robusto, mas sua aparência
não primava pela beleza, mas intelectualmente muito dotado e brilhante. Dotado de grande
resistência física, não se abatia nem com o trabalho nem com as dificuldades. Andava
descalço tanto no inverno como no verão e se vestia do mesmo modo e todas as estações do
ano. Era moderado no comer e no beber.

Causa da sua morte: foi acusado de corromper a juventude com suas ideias e de introduzir em
Atenas novos deuses. O tribunal confirmou-lhe a sentença de morte, o próprio Sócrates
executou, bebendo a cicuta. Está em Fevereiro de 399 a.C. e Sócrates tinha 71anos. Doutrina:
Sócrates diz que há valores absolutos tanto na ordem gnosiológica como na ordem metafísica
e ética; há princípios absolutos, verdades eternas, leis morais imutáveis e iguais para todos. A
vida humana merece e deve ser vivida em obediência a tais valores éticos e metafísicos, ainda
que isso exija sacrifícios.

Quanto ao Conhecimento, Sócrates diz que muita gente, incluindo homens cultos, não
possui a verdadeira ciência porque sabem que não o adquiriram mediante o exercício da sua
própria razão; apenas o receberam dos outros. Por isso propõe um método para adquirir o
verdadeiro conhecimento. Esse método Socrático inicia com o passo a que deu o nome de

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ironia. Consiste em pedir aos interlocutores a definição do tema em discussão até leva-los a
contradizer-se e a confessar a própria ignorância.

O passo a seguir é a maiêutica (arte de dar á luz). Mediante perguntas que faz, Sócrates
introduz no interlocutor a duvida e o desejo de conhecer para chegar a uma definição
verdadeira. Leva o interlocutor a discorrer por si mesmo, esclarecendo gradualmente a
verdade. Ele dizia: “o mestre não ensina a ciência, mas a maneira de a conquistar. Ele apenas
orienta e ajuda.”. Dai conclui que o ponto de partida da nossa procura da verdade é a
ignorância (a insipiência). “Só sei que nada sei, no entanto supero a generalidade dos homens
que nem isto sabem”, diz Sócrates.

A mente não deve apenas aceitar ídolos falsos e estranhos, mas seguir o seu próprio
impulso, para achar a verdade. Dai o lema de Sócrates: ”conheça-te a ti mesmo”, porque o
autoconhecimento leva à sabedoria. Por exemplo, só age erradamente quem desconhece a
ideia de verdade, ideia de bem. Assim, o autoconhecimento deve levar ao conhecimento das
ideias já presentes na alma. O pensamento de Sócrates representa uma reviravolta na história
da compreensão humana. Até aqui, a filosofia procurava explicar o mundo baseada na
observação das forças da natureza (nas explicações cosmológicas). Para o filósofo grego,
existe algo infinitamente mais importante para a filosofia do que conhecer meditação a Physis;
existe algo bem mais digno de meditação dos filósofos do que as árvores, plantas e estrelas: é
o espírito do homem. Assim é apenas com Sócrates que o ser humano volta-se para si mesmo
como ponto de partida para compreender/explicar o universo, as coisas e o próprio homem; o
homem, a partir da sua dimensão essencial (alma) como faculdade intelectual do homem,
tornar-se-ia capaz de ver e compreender de modo sistemático o mundo.

Sócrates compreende o homem como um composto de dois princípios: alma (espírito) e


corpo (Matéria). No entanto, apesar da dualidade corpo-alma, valoriza a alma. A essência não
poderia ser encontrada no corpo (que muda, se transforma), mas em algo que permanece, é
imutável (a alma).é na alma que reside a verdadeira grandeza, o “humano”. A alma será esta
excelência que permite medir o homem segundo a sua dimensão interior. A alma orienta a vida
humana e constitui a verdadeira essência do homem. Trata-se da primazia da faculdade
intelectual do homem (origem do intelectualismo socrático). Os principais ensinamentos
filosóficos de Sócrates situam-se no âmbito da Psicologia, da Epistemologia e da moral.

Na psicologia, a doutrina fundamental gira em torno da imortalidade da alma. Para Sócrates, a


alma é claramente superior ao corpo e encontra-se nele como em prisão.

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A respeito do conhecimento, Sócrates faz clara distinção entre opinião e verdade. O
conhecimento sensível por si só não pode fazer-nos conhecer a verdade, mas só opiniões mais
ou menos solidas. Para Sócrates, além do conhecimento dos sentidos, existe outro, o
conhecimento intelectual ou conceptual. Este vai além das aparências sensíveis, porque extrai
das coisas a sua verdadeira natureza, formando na mente noção, conceito, de valor universal.
Para Sócrates a moralidade identifica-se com o conhecimento: a sabedoria é virtude e a virtude
identifica-se com a sabedoria. Se o homem peca, é por ignorância, porque não é admissível
que, conhecendo o bem e o mal, escolha o mal e não o bem. Os homens que fazem o mal
ignoram o bem ou não sabem que o que escolheram é mau. Sócrates afirma que a Felicidade
consiste na honestidade, na prática da virtude. Não consiste em algo exterior e passageiro
(riquezas, honras, prazeres), como ensinavam os sofistas, mas na consciência reta, no seguir
sempre os ditames da razão; numa palavra, na prática da virtude.

Sócrates e os Sofistas

Sócrates foi contemporâneo dos sofistas e o mais enérgico adversário que tiveram. Seu
método de ensino e sua doutrina são opostos da doutrina e do método dos Sofistas. As
divergências principais são as seguintes:

 Os sofistas buscavam o sucesso e ensinavam como consegui-lo. Sócrates busca só a


verdade e incita seus discípulos a descobri-la.;
 Segundo os sofistas, para ter sucesso é necessário fazer carreira. Segundo Sócrates,
para chegar à verdade, é necessário desapegar-se das riquezas, das honras, dos
prazeres, reentrar no próprio espírito, analisar sinceramente a própria alma, conhecer a
si mesmo, reconhecer a própria ignorância.
 Os sofistas se gabam de saberem tudo e de ensinarem a todos.

Sócrates tem a convicção de que ninguém pode ser mestre dos outros. Ele não é mestre, mas
obstetra (maiêutica); não ensina a verdade, mas ajuda seus discípulos a descobri-la neles
mesmo. Não leciona aos seus discípulos, mas conversa, discute, guia-os em suas discussões,
orienta-os para descoberta da verdade. Segundo os sofistas, aprender é coisa fácil. Afirmam
por isso que por preço modico podem garantir aos seus discípulos o conhecimento da retorica
e da arte de governar. Segundo Sócrates, aprender não é coisa fácil. Muitos diálogos
terminaram sem conclusão, sem uma definição da verdade, da bondade, da beleza, da justiça

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etc., sem desenvolvimento completo do tema. Para Sócrates, é somente lenta e
progressivamente que se chega ao conhecimento da verdade, esclarecendo as próprias ideias
e definindo as questões sempre com o mais preciso.

Para os sofistas, o valor de qualquer conhecimento de qualquer lei moral é relativo,


subjectivo. Para Sócrates, existem conhecimentos e leis morais de valor absoluto, objectivo e,
portanto, universal.

2.2.3- Platão

Platão (427-347 a.C.) Nasceu em Atenas. Conheceu Sócrates aos 20 anos de idade e
apaixonou-se pela sua doutrina e método. Viajou muito. Foi seu sonho instaurar a república
ideal. Pensava instaurar um governo de filósofos. Mas nunca foi possível concretizar tal sonho.
Em 387 fundou em Atenas uma escola a que se deu o nome de academia pelo facto de ter sido
instalada no parque do herói Academo. Ai ensinou filosofia durante cerca de 40 anos. O ponto
de partida da Antropologia platónica é a distinção ou a teoria dos dois mundos: o mundo
sensível (coisas, copias, aparências, sombras, marial, mutável, finito, imperfeito) e o mundo
inteligível (essências, ideias, formas, originais, imutável, eterno, perfeito).

O mundo material, por essência e por natureza, é algo imperfeito, que não consegue
manter sua identidade (essência) das coisas, mudando sem cessar. Como fundamentar a
essência/fundamento em algo (homem, conhecimento, verdade) que se transforma
constantemente? O mundo material (ou nossa experiencia sensível) é mutável. Dele só nos
chegam as aparências das coisas, não o verdadeiro, a essência. Mas como surgiram estes
mundos? De onde surgiram os originais? Quem elaborou os originais? A cosmologia platónica
é seguinte: antes de existir este mundo existia o caos. Chegada a hora, um deus Demiurgo, foi
encarregado de ordenar o caos, transformando em cosmo. Ou seja, o que Demiurgo, fez foi
modelar a realidade bruta pré-existente. Essa modelagem deu-se a partir de algum modelo
original anterior. Este modelo é denominado por Platão de “ideia” (essência de tudo).

Nesse sentido, as essências são anteriores à existência do mundo, não pertencem a ele.
Daquela distinção platónica dos dois mundos advém a visão antropológica: o homem é a
constituído de alma (ideia) e corpo (matéria). É um composto que participa dos dois mundos.
No entanto, para Platão, o essencial é a alma. A essência de cada um é a alma e a matéria é o
corpo. A alma é u original que esta presente neste mundo junto ao corpo. Mas como e porque

29
cada alma veio parar aqui? Se a alma é imaterial, o que ela veio fazer na materialidade?
Porque nos separamos dos originais? A justificativa de Platão é: porque em algum momento no
mundo das ideias, erramos e fomos castigados pelos deuses. Trata-se de uma tentativa
platónica de explicar a “ queda”/recaída no mundo imperfeito. O castigo é incarnar-se no corpo
e ficar aprisionado na matéria.

O corpo seria a morada (castigo) terrena de uma alma; o corpo esconde, obscurece,
abafa, é apenas cópia de uma essência antes contida no mundo ideal. Dada a separação,
como a alma poderia se purificar do corpo? Como podemos ter acesso aos originais? Como se
daria esta libertação? Como ser “perdoado” deste castigo? Para Platão, a purificação/libertação
da alma precisa começar aqui mesmo; cada um tem um tempo terreno para purificação. Neste
sentido, apresenta dois modos de fazer isso: a “ Teoria da Reminiscência” e a “ Alegoria da
Caverna”.

A teoria da reminiscência trata da necessidade de reconhecer, recordar as ideias


esquecidas ao encarnar no corpo. Se o corpo é o aprisionamento da alma, o homem deveria
libertar-se do corpo, porque ao ganhar corpo a alam “esqueceu” as ideias; por isso, precisamos
relembrar. Todo aprendizado não passaria de um esforço de reminiscência. A alma é a fonte
das ideias e do conhecimento. Por exemplo, precisamos de conhecer a ideia de “Coragem”
para saber quando e como existem pessoas corajosas e actos corajosos; precisamos de
conhecer a ideia de “Justiça” para saber distinguir entre actos justos e injustos. O homem
virtuoso que conhece o bem não pratica o mal, porque através da reminiscência, o próprio
homem já teria alcançado a ideia verdadeira de virtude, de bem. Se praticamos o mal ou
injustiça, é porque ainda não conhecemos/alcançamos a ideia de bem e justiça. É por meio do
conhecimento das ideias que seria possível controlar os instintos, a ganancia e a violência,
fonte de todo mal.

A alegoria da caverna é apresentada por Platão como uma metáfora de libertação,


através da educação formadora para o desenvolvimento da sabedoria (intelectual) e das
virtudes (moral), cuja arena pedagógica é o mundo escuro, difuso, incerto da caverna; como
modelo do papel do mentor educacional. Descreve como Sócrates entra no mundo inferior da
caverna (o mundo das coisas diárias em que as pessoas existem e se movimentam), para
tentar resgatar os que vivem nesse mundo escuro (sombras, preocupações quotidianas,
imediata, aparência).

30
O Mundo das Ideias

Para demostrar a existência do mundo inteligível, isto é, do mundo das ideias, Platão aduz três
argumentos:

 Argumento da reminiscência: temos a ideia de verdade, bondade, de igualdade, a ideia


universal de homem etc. Ora, estas ideias nós não as tiramos da experiencia; logo, o
conhecimento actual é recordação de uma intuição que se deu em outra vida.
 Argumento do verdadeiro conhecimento: não existe ciência a não ser do verdadeiro; ora,
a verdade exige a correspondência entre o conhecimento e a realidade; mas o único
conhecimento humano que merece o nome de ciência é o que diz respeito aos conceitos
universais. Logo, deve existir um mundo inteligível, universal.

Argumento da contingência: deve existir a ideia necessária e estática para que se explique
o nascer e o parecer das coisas: uma coisa bela é bela não por certa combinação de cores,
mas porque é aparição terrena do Belo em si; o dois é dois não pela adição de dualidades, mas
pela participação na dualidade. Doutrina: A característica dominante do pensamento platónico
é o dualismo. Platão considera o mundo material como um mundo decaído e alienado, uma
reprodução imperfeita, uma imitação mal feita, uma participação limitada de um mundo ideal,
perfeito, eterno, incorruptível, divino: o mundo das ideias.

A moral e a política em Platão

A moral tem como meta o bem. A alma, após a morte, vive em companhia dos bons ou
dos maus, segundo os méritos. A alma decaída deverá purificar-se praticando a virtude.
Quando a alma, pela virtude e contemplação, alcança a esfera inteligível, ao morrer, transmigra
para seres superiores. Mas quando se liga aos bens e prazeres materiais reencarna em
animais inferiores e afasta-se ainda mais do mundo inteligível. Em política, Platão sonha com
uma sociedade ideal, dividida em classes: o povo é encarregado de trabalhos utilitários; os
guerreiros são os defensores; os filósofos deverão ser os dirigentes do estado. Se cada um se
dedicar á sua função, haverá harmonia e a sociedade será justa. Quanto às leis, é necessário
que elas sejam estáveis, idênticas duma geração à outra porque toda a mudança é
perturbadora. Estabelece que «se os filósofos não governarem a cidade ou se os reis e outros

31
governantes não cultivarem a filosofia, se o poder político e a filosofia não coincidirem nas
mesmas pessoas é impossível o fim dos males nas sociedades.4

2.2. 4. Aristóteles

Aristóteles (384-322 a.C.): foi discípulo admirador de Platão. Investigou profunda e


incansavelmente. Fundou em Atenas uma nova escola filosófica chamada liceu. Ai havia o
costume de dialogar, sobre os problemas do mundo natural, enquanto se passeava nos jardins.
Por este facto recebeu também o nome de peripatético, que significa passeio. Os discípulos de
Aristóteles passaram a ser chamados peripatéticos. Doutrina: A visão filosófica de Aristóteles
caracteriza-se pelo esforço de ver a realidade em modo unitário, contrariamente ao dualismo
de Platão; e ao mesmo tempo procura encontrar o princípio único transcendental das causas
últimas de tudo aquilo que é mutável e contingente. Para tal Aristóteles postula quatro causas
fundamentais: a matéria e forma, para explicar a estrutura intrínseca das realidades corpóreas,
o agente e fim, para explicar a origem das coisas e o seu dinamismo. Com estes princípios,
Aristóteles resolve todos os problemas relevantes:

Quanto ao problema cosmológico diz que todas as coisas (as substâncias 5 corpóreas)
são constituídas de matéria e forma. É a teoria do hilemorfismo matéria e a forma encontram-
se numa relação de potência e acto. Os dinamismo das coisas, o seu transformar-se são
causados pelo primeiro motor imóvel, que é o seu fim último. Quanto ao problema
antropológico: o homem não é só alma. É o resultado da união substancial de alma e corpo,
em que a alma é forma e o corpo, matéria. A alma compreende um elemento espiritual, divino e
imortal. Quanto ao problema gnosiológico: o conhecimento intelectivo tem como fundamento o
conhecimento intelectivo inicia-se através dos sentidos, mais torna-se superior e distinto do
conhecimento sensitivo. Se com Platão a filosofia já havia alcançado extraordinário nível
conceitual, pode-se afirmar que Aristóteles pelo rigor de sua metodologia, pela amplitude dos
campos em que actuou e por seu empenho em considerar todas as manifestações do
conhecimento humano como ramos de um mesmo tronco foi o primeiro pesquisador científico
no sentido actual do termo.

4
ABBAGNANO, Nicola, História da filosofia, vol.I, Ed.Presença, 1976,Lisboa,p.182.
5
Substância-do latim substare, que quer dizer, aquilo que está por baixo de, que subjaz. Nestes termos, entende-se por
substância aquilo que permanece

32
Aristóteles nasceu em Estagira (donde ser dito "o Estagirita"), Macedónia, em 384 a.C.
Em Atenas desde 367, foi durante vinte anos discípulo de Platão. Com a morte do mestre,
instalou-se em Asso, na Eólida, e depois em Lesbos, até ser chamado em 343 à corte de Filipe
da Macedónia para encarregar-se da educação de seu filho, que passaria à história como
Alexandre o Grande. Em 333 voltou a Atenas, onde fundou o Liceu. Durante 13 anos dedicou-
se ao ensino e à elaboração da maior parte de suas obras. Obra e doutrina. Perderam-se todas
as obras publicadas por Aristóteles, com excepção da Constituição de Atenas, descoberta em
1890. As obras conhecidas resultaram de notas para cursos e conferências do filósofo,
ordenadas de início por alguns discípulos e depois, de forma mais sistemática, por Andrónico
de Rodes (c. 60 a.C.).

As principais obras de Aristóteles, agrupadas por matérias, são: (1) Lógica: Categorias,
Da interpretação, Primeira e segunda analítica, Tópicos, Refutações dos sofistas; (2) Filosofia
da natureza: Física; (3) Psicologia e antropologia: Sobre a alma, além de um conjunto de
pequenos tratados físicos; (4) Zoologia: Sobre a história dos animais; (5) Metafísica: Metafísica;
(6) Ética: Ética a Nicômaco, Grande ética, Ética a Eudemo; (7) Política: Política, Económica; (8)
Retórica e poética: Retórica, Poética. Como nenhum filósofo antes dele, Aristóteles
compreendeu a necessidade de integrar o pensamento anterior a sua própria pesquisa. Por
isso começa procurando resolver o problema do conhecimento do ser a partir das antinomias
acumuladas por seus predecessores: unidade e multiplicidade, percepção intelectual e
percepção sensível, identidade e mudança, problemas fundamentais, ao mesmo tempo, do ser
e do conhecimento.

O dualismo platónico - o mundo da inteligência separado do das coisas sensíveis --


visava antes de tudo a salvar a ciência, estabelecendo a coerência necessária entre o conceito
e seu objecto. O realismo de Aristóteles procura restabelecer essa coerência sem abandonar o
mundo sensível: explora a experiência, e nela mesma insere o dualismo entre o inteligível e o
sensível. O projecto de Aristóteles visa em última análise restabelecer a unidade do homem
consigo mesmo e com o mundo, o projecto de Platão, baseado numa visão do cosmos.
Entretanto, Aristóteles censura a Platão ter seguido um caminho ilusório, que retira a natureza
do alcance da ciência. Aristóteles procura apoio na psicologia. O ser existe diferentemente na
inteligência e nas coisas, mas o intelecto activo, que é atributo da primeira, capta nas últimas o
que elas têm de inteligível, estabelecendo desta forma um plano de homogeneidade. Ética e
política: No diálogo perdido Da justiça já se anunciavam alguns dos temas expostos nos oito

33
fragmentos reunidos por Andrónico sob o título de Política. Escritos ao longo de toda a vida de
Aristóteles, são tudo o que resta da sua obra sobre o assunto.

Aristóteles foi o primeiro filósofo a distinguir a ética da política, centrada a primeira na


acção voluntária e moral do indivíduo enquanto tal, e a segunda, nas vinculações deste com a
comunidade. Dotado de logos, "palavra", isto é, de comunicação, o homem é um animal
político, inclinado a fazer parte de uma polis, a "cidade" enquanto sociedade política. A cidade
precede assim a família, e até o indivíduo, porque responde a um impulso natural. Dos círculos
em que o homem se move, a família, a tribo, a polis, só esta última constitui uma sociedade
perfeita. Daí serem políticas, de certo modo, todas as relações humanas. A polis é o fim (télos)
e a causa final da associação humana. Uma forma especial de amizade, a concórdia, constitui
seu alicerce.

Os regimes políticos caracterizam-se pela solução que oferecem às relações entre a


parte e o todo na comunidade. Há três formas boas: monarquia, aristocracia e politéia (um
compromisso entre a democracia e a oligarquia, mas que tende à primeira). À monarquia
interessa basicamente a unidade da polis; à aristocracia, seu aprimoramento; à democracia, a
liberdade. O regime perfeito integrará as vantagens dessas três formas, rejeitando as
deformações de cada uma: tirania, oligarquia e demagogia. A relação unidade-pluralidade
aparece, ainda, sob outro aspecto: o da lei e da concórdia como processos complementares.

Poética:

Entre as ciências do fazer, apenas a obra de arte mereceu estudo sistemático de


Aristóteles. Ele distingue as artes úteis das artes de imitação, sendo que estas últimas, ao
contrário do que o nome parece indicar, exprimem o dinamismo criador do homem
completando a obra da natureza: ele tem de captar através da ideia o que na natureza se
encontra, por assim dizer, apenas esboçado ou latente. Na Poética, Aristóteles confere grande
relevo a sua teoria da tragédia, que exerceu notável influência sobre o teatro desde a época do
Renascimento. Segundo sua própria concepção de poesia, salientou a importância da imitação
ou mímesis, não como mero decalque da realidade, mas como uma recriação da vida: a
tragédia imita "não os homens, mas uma acção e a vida".

Também a acção, para ele, é fundamental: os caracteres devem surgir como sua
decorrência, recomendando o filósofo, o recurso à acção histórica, tomada de empréstimo para

34
a obra de arte. Preocupado ainda com o efeito da tragédia sobre o espectador, enuncia seu
conceito de cathársis (purificação das paixões), objectivo que, para Aristóteles, é indispensável.
Física e ciências naturais. Basicamente o conteúdo da Física de Aristóteles é a realidade
sensível, na qual a ideia é inteiramente envolvida pela matéria. O físico deve possuir um
acurado espírito de observação. A realidade natural, em seus aspectos mais gerais, é
autónoma, contrapondo-se à espontaneidade acidental que exprime os efeitos inesperados que
as coisas produzem em nós. A natureza é uma auto-criação, e o ser potencial que nela actua é
o movimento, o qual se apresenta, sob o aspecto quantitativo, como aumento e diminuição e,
sob o aspecto espacial, como locomoção e translação.

Dos temas tratados na física aristotélica, o mais paradoxal é a dinâmica. O conceito


básico da dinâmica de Aristóteles é de que um corpo inanimado não pode permanecer em
movimento sem a acção constante de uma força. Partindo de sua teoria do movimento, o
filósofo estabelece os dois princípios básicos que se encontram no mesmo ser, a acção e a
potência, os quais constituem o fundamento da sua dinâmica. Em contraposição, a matéria e a
forma são os princípios básicos da estática.

O mundo animal é analisado com amplitude e considerado por Aristóteles como um


espaço intermediário entre a física e a psicologia. Os seres orgânicos apresentam aspectos
diversos, mas todos são constituídos de matéria (o corpo) e de forma (o princípio do
movimento). Os animais são mais perfeitos do que as plantas e de constituição mais complexa.
A anatomia aristotélica ressalta a importância da distribuição da matéria nas funções orgânicas.
O co-relacionamento entre os estados psíquicos e os processos fisiológicos só se verifica nos
seres mais desenvolvidos. Os animais superiores são dotados de matéria, forma, movimento,
sensibilidade e potencialidade receptiva.

Enquanto as plantas possuem apenas propriedades nutritivas, os animais são também


dotados de propriedades sensitivas e motoras. O homem ocupa o vértice da pirâmide, aliando
a todas essas propriedades uma potencialidade receptiva em grau elevado. Com a morte de
Alexandre (323), Aristóteles teve de fugir à perseguição dos democratas atenienses,
refugiando-se em Cálcide, na Eubéia, onde morreu em 322 a.C.Filosofia medieval

35
2.2.5- Período Helenista

Com a ascensão do rei Alexandre Grande, a filosofia e a maneira de a praticar teve


retida pelo estilo político imposto pelo monarca, que consistia na individualidade científica,
diferente daquilo que era norma na Antiga Grécia e desta. No clima de insegurança
determinado pelo avanço da cultura helenística, volta-se com força ao interesse pelo indivíduo
e ao problema ético. Epicuro é o fundador de uma escola, chamada Jardim que conservando
alguns elementos da lógica e da física clássica insiste, sobretudo, no problema ético.

2.2.5.1- Epicurismo e Epicuro

A grande metafísica de Platão e Aristóteles é colocada de lado. De fato, a segunda


navegação é ignorada. Desenvolve-se uma lógica bastante simples e uma Física de tipo
materialista ligada à doutrina dos atomistas, o critério supremo da verdade é a sensação. O
atomismo de Epicuro difere do atomismo de Demócrito indicando que a característica dos
átomos está além de ser a figura, a ordem, a posição e também o peso. Outra diferença está
na teoria da declinação dos átomos, isto é, na sua queda, chamada clinamen.

O aspecto mais importante de Epicuro é a sua ética fundada sobre conceitos de aponia
que significa ausência de dor, e de ataraxia que significa ausência de Perturbação. É bom
aquilo que não contém dor e que não me perturba. O critério ético é o prazer que não se
entende no seu sentido vulgar, mas como tranquilidade da pessoa. Tudo o que perturba deve
ser evitado. Mas, o prazer supremo é a amizade. A doutrina de Epicuro se assenta no
Hedonismo (culto ao prazer). Como se sabe o homem possui instinto básicos entre os quais: o
desejo de conservar-se, vestir, comer, abrigar-se, satisfazer-se bio ou mesmo fisiologicamente,
ponderando os excessos, para não se prejudicar. Este pensador assumia-se como autentico
ateu ao duvidar da transcendência (do poder de Deus), ao afirmar o seguinte:

 “ Ou Deus pode e não quer evitar o mal- então Deus não é Bondoso;
 Ou Ele quer, mas não pode- então Ele não é Omnipotente.
Em cada uma das duas hipóteses, Ele não existe”

36
2.2. 5. 2- Estoicismo

Enquanto Epicuro apresentou sua doutrina fundamentada no prazer Zenão de Citio


defendeu a sua baseada no sumo bem como doutrina das virtudes, que consistia no desapego
aos bens materiais. Ele é o fundador da escola de Pórtico, onde ensinou sobre a filosofia em
Roma teve alguns seguidores como o Marcus Aurélio. Uma das bases do Direito Roma, a
“Teoria do justo”, foi consubstanciada pelo Estoicismo. Este autor desacreditava na existência
de um ser supremo fora do universo ou seja Deus, para si, o supremo era a própria totalidade
do mundo (todos os seres que existem, como as plantas, animais, os homens e a natureza em
geral). Em outras palavras ele não passava de um panteísta. Considerava a morte como uma
passagem de um estado para outro, no seio do universo. Esta doutrina negava a possibilidade
de uma vida feliz além misteriosa, acreditava apenas na vida do momento. O Estoicismo é
contrária a tese da transmigração da alma, como defende Platão, o Budismo, os Espíritas etc,
por não serem conteúdos racionais.

2.2.5.3- Cinismo (significa levar a vida de cão)

A doutrina cínica defendida por Crates de Teba, tem muita semelhança ao Estoicismo,
pois a maior mestre desta forma reflexiva foi o próprio Zenão de Citio, o pai do Estoicismo. A
diferença entre estas duas doutrinas, é que o Estoicismo consistia nos sistemas teóricos-
cosmológicos, acima daquilo que os Cinicos consideravam como simples prática de vida, uma
moral sem fundamento filosófico enquanto o Cinismo. A essência do termo Cinica ou “Kunos”,
é em português “Cão”, o conhecido animal mais próximo do homem. Crates com esta filosofia
defende uma forma de vida voltada a natureza, baseada no instinto, renegando à qualquer
cultura, urbanização ou civilização, reforçando o recurso à vida natural. Sabe-se que ele em
função das suas teses chegou mesmo a fazer sexo com sua esposa Hiparquia em público,
imitando os animais. Esta doutrina criou à sociedade crises sociais, pois levou as pessoas a
desacreditarem nas instituições (estatais, religiosas, judiciais), provocando anarquias e
autarquias pessoas sem importarem-se das leis e a ordem social, para não falar das virtudes
ou valores morais. Ensinavam a libertação dos sentimentos, não se importando com o
sofrimento, a saúde ou a morte, nem de si próprio, nem dos outros. Familiares ou amigos, por
isso, a palavra Cinismo adquiriu a conotação, que persiste até hoje em dia a indiferença e
insensibilidade ao sentir e sofrer dos outros.

37
CAPITULO III: A IDADE MEDIEVAL (FILOSOFIA MEDIEVAL)

Caracterização geral

3.1- Período Teocêntrico

A era da filosofia cristã, da teologia Revelada, da tradição escolástica. A preocupação


principal dos filósofos era Deus. Os principais são: Sto. Agostinho, S. Tomás de Aquino. Surge
a Navalha de Guilherme de Occam que mais tarde viria a ser a ferramenta básica da ciência.
No início da era vulgar (IDADE MEDIA OU MEDIEVAL), tendo o cepticismo abalado em seus
fundamentos a confiança na capacidade cognitiva do homem, era natural que os espíritos,
ansiosos por encontrar respostas para os angustiantes problemas da vida, abandonassem a
filosofia e se voltassem para outras direcções. E como se verificava naquele tempo
extraordinários florescimentos religiosos, também no mundo grego romano, em decorrência do
aparecimento do cristianismo e da difusão das religiões orientais, os espíritos cultos dirigiram-
se à religião à espera da solução para as questões últimas relativas ao homem e o universo.

Assim alguns espíritos mais atentos não tardaram, contudo, a notar a grande afinidade
entre a visão de conjuntos de religião e as de Platão, Aristóteles e dos estoicos, e preparam-se
para fundi-las em síntese harmoniosa. Originam-se assim três correntes filosóficas principais: a
1ª realiza a síntese entre a filosofia grega (especialmente a platónica) e a religião hebraica; a 2ª
entre a filosofia grega e a religião cristã; a 3ª entre a filosofia grega e as religiões pagãs.
Surgira assim os três movimentos filosóficos-religiosos denominados platonismo judaico,
platonismo cristão ou patrística e platonismo pagão ou neoplatonismo.

Os principais temas da idade medieval estão relacionados a fé, o que prova o argumento
da intervenção da igreja neste período da filosofia. Relacionar a fé, que é algo sem uma
explicação lógica ou científica com a razão, que busca o entendimento das coisas, era uma
forma que a igreja tinha de tentar explicar o que até ali não tinha explicação. A existência e a
natureza de Deus, para a filosofia, era algo complexo, pois se partirmos do pressuposto de que
a filosofia busca explicar as coisas desde o seu início, buscando formas de provar o que está
sendo apresentado, agora era uma obrigação filosófica explicar a existência de Deus.

38
Neste período não era difícil encontrar pensadores que defendessem a tese de que fé e
religião não deveriam estar subordinadas uma a outra, de que o indivíduo não precisaria ter
sua fé ligada directamente as racionalidades com as quais está acostumada a viver, porém, um
nome se destacou em meio aos filósofos quanto a buscar uma forma racional de justificar as
crenças. Conhecido como Santo Agostinho de Hipona, esse filósofo cristão desenvolveu uma
ideia de que todo homem possui uma consciência moral e um livre arbítrio, que todos temos a
consciência do que é certo e errado, do mesmo jeito que temos o direito de escolha, para fazer
ou não cada coisa, mesmo sabendo que acarretarão consequências. São vários autores que
podíamos citar mas por causa da economia do tempo nos limitamos aquele que mais foram
influente no assunto, sem descurar o pensamento dos outros. Assim podemos falar de Fílon:

 Fílon: o considerado como fundador da filosofia religiosa (13 a. C – 40 d.C.), foi com
efeito o primeiro a procurar efectuar uma síntese entre a Sagrada Escritura e a filosofia
de Platão.

Segundo Fílon, a visão platónica de realidade é idêntica, a substância, à da Bíblia. Ele


chegou a esta conclusão, que a muitos pode parecer paradoxal, mediante a interpretação
alegórica de Escritura. Com tal interpretação (da qual se pode dizer que ele foi o inventor), ele,
por um lado, conseguiu eliminar as aparentes oposições entre o que ensina Platão e o que diz
o texto sagrado, e, por outro lado, descobriu na Bíblia doutrinas platónicas que, ao que parece,
ela não contém. Na síntese filoniana, o universo apresenta uma estrutura piramidal. O vértice
da pirâmide é ocupado por Deus. Entre o vértice e a base estende-se uma serie de seres tanto
mais perfeitos e menos numerosos quanto mais próximo de Deus, e tanto menos e mais
numerosos quanto mais próximo da matéria. Deus e a matéria são eternos e incriados, ao
passo que todos os seres intermédios são criados: imediatamente por Deus os espirituais;
mediatamente, isto é, com o auxílio dos seres espirituais, os corpóreos.

Clemente de Alexandria: Clemente de Alexandria (150-215) teve o mérito de ser o


primeiro pensador cristão a tentar em relação ao cristianismo o que Fílon fizera em relação ao
judaísmo, isto é, uma síntese dos ensinamentos da revelação cristã com a filosofia grega.
Quanto a Clemente, evita decididamente, na estrutura do seu universo religioso, qualquer
sincretismo de elementos platónicos com elementos cristãos. O seu universo é todo e só o da
revelação cristã. Na origem de todas as coisas está Deus (uno e trino), que criador do mundo,
dos anjos e do homem. Tendo o homem caído em pecado, Deus Pai mandou o filho para
salvá-lo. Jesus, além de salvador. É também o grande pedagogo no qual o cristão deve

39
inspirar-se em todos os momentos de sua vida. A filosofia, para Clemente, exerce somente a
função propedêutica à fé cristã. “O que foi a Lei para os judeus, foi-o a filosofia para os gentios,
até a vinda de Cristo”. Ambas serviram para prepara os homens para a fé cristã. “Deus deu a
lei aos judeus e a filosofia aos gentios para impedir que não acreditassem na vinda de Cristo.
Por isso quem não crê não tem atenuante. Porque, mediante dois processos diferentes de
aperfeiçoamento, el guia gregos e bárbaros para a perfeição da fé”

Orígenes: Orígenes (185-254) é um dos maiores engenhos do cristianismo, na


sumidade como teólogo e como exegeta. Notáveis são as suas interpretações alegóricas da
Sagrada Escritura. No que se refere à filosofia, o aspecto mais importante e original de sua
especulação é a tentativa de dar interpretação filosófica a doutrina cristã da origem e fim das
coisas, servindo-se para isso principalmente da filosofia dos estóicos e de Platão. O mundo,
segundo Orígenes, foi criado por Deus, mas é eterno. A criação ab aeterno (desde a
eternidade) é exigida pela imutabilidade de Deus.

Plotino: nascido em Licópolis, no Egipto, em 205 e morreu em sua vila na Campanha


em 270. Estudou em Alexandria, na escola de Amónio sacas, junto com Orígenes. Para
Plotino, a existência do absoluto pode ser conhecida imediatamente, sem necessidade de
demostração. Que o absoluto existe, vemo-lo de tudo o que vem depois dele, de todo o
universo, que dele procede e por ele existe. As dificuldades em torno da existência ou do
porquê da existência do Absoluto surgem de certas imagens falsas pelas quais procuramos
representar-nos a sua realidade. Imaginamos, por exemplo, um lugar semelhante ao caos dos
poetas, supomos que o Absoluto chegou a ele de improviso e procuramos saber como ele
chegou lá, partindo não se sabe de quais remotas regiões do universo. Ora, o Absoluto
transcende qualquer determinação de lugar como também qualquer existência determinada:
dele se pode dizer somente que é, sem pretender atribuir-lhe nenhuma coisa externa.

As grandes pilastras de filosofia de Plotino em torno do Absoluto, que ele chama de Um,
são os conceitos de simplicidade e de transcendência. Tais conceitos exigem que se exclua do
Um qualquer qualidade positiva. Por este motivo, Plotino é considerado, com razão, o fundador
da teologia negativa. O Um é a realidade suprema da qual se origina todas as outras.

 “O princípio da harmonia entre a fé e a razão permite a Plotino enriquecer a gloriosa


tradição filosófica grega com a riquíssima experiencia religiosa do seu tempo, chegando
a resultados imprevistos, sobretudo na ética. A ética de Plotino não é mais naturalista

40
como a de Platão, de Aristóteles e dos Estoicos, mas ultraterrena e transcendente: o fim
do homem é Deus”6.

Agostinho de Hipona: par Agostinho o Cristianismo não é uma filosofia, mas uma
mensagem de salvação, tendo sido reconhecido como tal desde o começo. Agostinho nasceu
em Tagaste, em 354, de mãe cristã e pai ainda pagão, que recebeu o baptismo em371, pouco
antes de morrer. A vida de Agostinho pode se dividida em dois períodos claramente distintos:
antes da conversão e depois da conversão. Antes da conversão, Agostinho interessa-se
principalmente por retorica e filosofia. Depois da conversão, concentra seu interesse sobretudo
na Sagrada Escritura e na teologia. Agostinho escreveu muitíssimas obras; as de maiores
interesses filosóficos são as seguintes:

 Antes da conversão: contra académicos (Contra os académicos) (sobre a lógica), De


vita beata (Sobre a vida feliz) (Ética), De ordine (sobre a ordem) (metafisica).

Depois da conversão: De immortalitate anmae (sobre a imortalidade da alma),


Confessionum libri XIII (treze livros de confissões), De libero arbítrio (sobre o livre-arbítrio), De
civitate Dei (sobre a cidade de Deus), De Trinitate (sbre a Trindade), De magistro (sobre o
mestre), De vera religione (Sobre a verdadeira religião). Para o conhecimento de Deus,
gostinho segue o seu princípio inspirador que é seguinte: “ Noli foras ire, in teipsun redi, in
interiore homine habitat venda7 (não saias de ti, volta-te para ti mesmo, a verdade habita no
homem interior) em conformidade com este princípio, Agostinho não procura a solução dos
problemas filosóficos no estudo da realidade externa, como fizera Aristóteles e, em geral toda
filosofia grega, mas no estudo do mundo interior, da alma. Para provar a existência de Deus,
Agostinho apresenta o seguinte argumento: “ A verdade, em si mesma, não ganha nada
quando nós a vemos mais claramente e não perde nada quando a vemos menos claramente;
mas, integra e intacta, alegra com a sua luz aqueles que mantêm o olhar voltado para ele pune
coma cegueira os que recusam a olhar para ela”.8

Em relação ao mundo, Agostinho diz que o “ o mundo é como uma mulher gravida: traz em
si a causa das coisas que virão à luz no futuro. Assim, todas as coisas (de todos os tempos)
foram criadas por Deus”.9

6
Battista MONDI, curso de filosofia, I Vol., pág. 144
7
Battista MONDI, historia de filosofia 1 vol. Pag. 151.
8
Ibd, pag. 152
9
Ibd. Pag. 154

41
3.1.1- A patrística

A Escolástica é um movimento doutrinal que se caracteriza como estudo da revelação,


tendo por instrumento sobretudo a filosofia de Aristóteles. Assim sendo se pode dizer que ela,
é um conjunto de técnicas escolares e instrucionais desenvolvidas nas escolas das
universidades da europa Ocidental no final do período medieval, que incluíam o uso do
comentário e da questão disputada. “Escolástica”10, é uma palavra derivada do latim
scholastcus, que no seculo XII significava o mestre de uma escola. O método Escolástico é
usualmente apresentado como tendo começado nas faculdades de Direito, notadamente em
Bolonha, tendo sido depois transportado para a teologia e filosofia por uma serie de mestres
que incluem Abelardo e Pedro Lombardo. Não existe, rigorosamente falando, algo como
Escolástica. Como foi usado originalmente, o termo pressupunha que uma única filosofia era
ensinada nas universidades do final da Idade Media.

Entre os percursores da escolástica estão, Alberto Magno, Boaventura e Tomás de


Aquino. A ideia central do seu pensamento Alberto Magno, retomada pela escola dominicana
alemã, é a de uma felicidade na Terra que recompensa o esforço filosófico entendido como
desligamento progressivo da alma humana em relação ao sensível e aquisição do intelecto; Já
Tomas de Aquino, uma das figuras dominantes do período da idade Média e um dos maiores
filósofos e teólogos de todos os tempos, faz uma nítida relação entre a fé e a razão. Diz ele:

 A fé e a razão são modos diferentes de conhecer: a razão aceita a verdade por causa de
sua evidência intrínseca;
 A fé aceita a verdade por causa da autoridade de Deus revelante. Consequentemente,
filosofia e teologia são ciências diferentes.

Fé e razão, filosofia e teologia não podem contradizer-se porque Deus é seu autor
comum. Logo, a verdade de razão não pode jamais entrar em conflito com a verdade revelada:
a verdade não pode contradizer a verdade. Quando aparece uma oposição, é sinal de que não
se trata de verdade, mas de conclusões falsas ou não necessárias. Não só não existe
contradição entre a fé e a razão, entre filosofia e teologia, como também existe afinidade;
porque “ nas coisas conhecidas pela razão natural existem semelhanças com as que se
adquirem mediante a fé”.

10
Dicionario de Filosofia de CAMBRIDGE, 2ª Ed, Palus, 2006,Pag. 286

42
Boaventura de Bagnoregio: segundo Boaventura, a razão é subordinada à fé, a filosofia à
teologia. Mesmo sem a fé, a razão poderia conhecer as verdades mais importantes da ordem
natural. Ma, de facto, historicamente, a razão sozinha jamais chegou a descobrir a verdade
sobre Deus e a alma. Ela só pode consegui-lo guiada pela fé.11

Os percursores da Patrística

Patrísticos também chamados de padre da Igreja, é um grupo de antigos autores


cristãos originariamente assim chamados porque eram considerados “pais” (patres) das igrejas
ortodoxas cristãs. O termo é hoje usado em sentido amplo para designar os escritores cristãos,
tanto ortodoxos como heterodoxos, que estavam atividades nos primeiros seis seculos, mais
ou menos da era cristã. O estudo desses escritores tem sido tradicionalmente divididos por
línguas, das quais as principais são o grego, o latim e o Siríaco. Essa divisões devessem as
diferentes histórias das igrejas regionais, em partes uma reflexão sobre a sociologia da
moderna erudita.

Padres gregos: o período patrístico grego é usualmente aceite como se estendendo


desde os primeiros escritores depois do Novo Testamento até figuras como Máximo o
Confessor (579/580/662) João Damascena (650/750). O período divide-se tradicionalmente em
torno do Concílio de Niceia (325). Os autores pré-nicenos de importância para a história da
filosofia incluem Irineu (130/140), Clemente de Alexandria (150 – apos 215) e Orígenes (180/
254). Importantes autores Niceanos e pós-Niceanos incluem Atanásio (295/373); os
Capadócios, isto é, Gregório Nazianzeno (330-390), Basílio de Cesareia (330/379) e seu irmão
Gregório de Nissa, e João Crisóstomo (350/407). Todos estes autores gregos estão
constantemente empenhados em temas e exercícios filosóficos.

Padres latinos: as igrejas latinas cotaram com quatro autores pós-Niceanos como seus
principais mestres: Ambrósio (337/339), Jerónimo (347/419) Agostinho (354-430) e Gregório
Magno (540-604). Outros autores latinos de interesse filosófico incluem Tertuliano (195-220),
Lactâncio (260-330), Mário Vitorino (280/285), e Hilário de Poitiers (apogeu entre 356-364). O
período latino da patrística caracteristicamente conta-se do seculo II até o V ou VI, isto é,
aproximadamente de Tertuliano a Boécio.

11
Cf. Battista MONDIN, historia de filosofia, vol. 1 pag.205

43
3. 2- Santo Agostinho

Agostinho, um dos maiores génios de todos os tempos e o maior de todos os padres da


igreja, foi também o maior filósofo dos quinze séculos que separam Aristóteles de Tomas de
Aquino. Ele conseguiu elaborar um sistema filosófico completo, melhor do que qualquer outro
pensador cristão, estruturar sobre base racional, marcada pelo platonismo, todas as doutrinas
que, reveladas pelo cristianismo, são também acessíveis à razão. O seu pensamento merece,
pois, estudo amplo e profundo. Assim ele aparece, no problema do conhecimento com a
doutrina da iluminação; no problema da antropologia, com a substancial identificação entre o
ser do homem e a alma; no problema metafisico, com a teoria das verdades eternas (ideias) e
das rationes seminales; no problema ético, com a dura condenação de todo o prazer sensível e
das paixões e de tudo aquilo que pertença ao mundo natural.

3 3- A Escolástica

A patrística procurou conciliar as verdades da revelação bíblica com as construções do


pensamento próprias da filosofia grega. A maior parte de suas obras foi escrita em grego e
latim, embora haja também muitos escritos doutrinários em aramaico e outras línguas orientais.
Patrística é o corpo doutrinário que se constituiu com a colaboração dos primeiros padres da
igreja, veiculado em toda a literatura cristã produzida entre os séculos II e VIII, excepto o Novo
Testamento. O conteúdo do Evangelho, no qual se apoiava a fé cristã nos primórdios do
cristianismo, era um saber de salvação, revelado, não sustentado por uma filosofia. Na luta
contra o paganismo greco-romano e contra as heresias surgidas entre os próprios cristãos, no
entanto, os padres da igreja se viram compelidos a recorrer ao instrumento de seus
adversários, ou seja, o pensamento racional, nos moldes da filosofia grega clássica, e por meio
dele procuraram dar consistência lógica à doutrina cristã.

O cristianismo romano atribuía importância maior à fé; mas entre os padres da igreja
oriental, cujo centro era a Grécia, o papel desempenhado pela razão filosófica era muito mais
amplo e profundo. Os primeiros escritos patrísticos falavam de martírios, como A paixão de
Perpétua e Felicidade, escrito em Cartago por volta de 202, durante o período em que sua
autora, a nobre Perpétua, aguardava execução por se recusar a renegar a fé cristã. Nos
séculos II e III surgiram muitos relatos apócrifos que romantizavam a vida de Cristo e os feitos
dos apóstolos. Em meados do século II, os cristãos passaram a escrever para justificar sua

44
obediência ao Império Romano e combater as ideias gnósticas, que consideravam heréticas.
Os principais autores desse período foram são Justino mártir, professor cristão condenado à
morte em Roma por volta do ano 165; Taciano, inimigo da filosofia; Atenágoras; e Teófilo de
Antioquia. Entre os gnósticos, destacaram-se Marcião, que rejeitava o judaísmo e considerava
antitéticos os Antigo e o Novo Testamento.

No século III floresceram Orígenes, que elaborou o primeiro tratado coerente sobre as
principais doutrinas da teologia cristã e escreveu Contra Celsum e Sobre os princípios;
Clemente de Alexandria, que em sua Stromata expôs a tese segundo a qual a filosofia era boa
porque consentida por Deus; e Tertuliano de Cartago. A partir do Concílio de Nicéia, realizado
no ano 325, o cristianismo deixou de ser a crença de uma minoria perseguida para se
transformar em religião oficial do Império Romano. Nesse período, o principal autor foi Eusébio
de Cesaréia. Dentre os últimos padres gregos destacaram-se, no século IV, Gregório
Nazianzeno, Gregório de Nissa e João Damasceno. Os maiores nomes da patrística latina
foram santo Ambrósio, são Jerónimo (tradutor da Bíblia para o latim) e santo Agostinho, este,
considerado o mais importante filósofo em toda a patrística. Além de sistematizar as doutrinas
fundamentais do cristianismo, desenvolveu as teses que constituíram a base da filosofia cristã
durante muitos séculos. Os principais temas que abordaram foram as relações entre a fé e a
razão, a natureza do conhecimento, o conceito de Deus e da criação do mundo, a questão do
mal e a filosofia da história.

3.3. 1- Santo Anselmo

No seculo XI as trevas que se abateram sobre a sociedade europeia durante as


invasões dos bárbaros começaram a dissipar-se. Como consequência do trabalho dos monges
e, mais tarde, também dos bispos, surgiram em muitos países escolas de gramatica, retórica,
filosofia e teologia. Dessas escolas saíram os primeiros expoentes da filosofia medieval.
Anselmo, o maior pensador do seculo XI, nasceu em Aosta, em 1033. Entrou em tenra idade
na abadia beneditina, onde fez os seus estudos, em 1093 foi nomeado bispo de Cantuária, na
Inglaterra, onde fora visitar a um amigo gravemente enfermo. Faleceu na Inglaterra em 1109.
As suas obras mais importantes são: Monologium (Monólogo), o Proslogium (Dialogo) e o Cur
Deus homo (porque Deus “se fez” homem?). Nelas estuda, entre outras coisas, dois problemas
de importância fundamental para a filosofia cristã: o das relações entre a fé e a razão e o da
existência de Deus.

45
Fé e Razão: para Anselmo, a relação entre fé e razão é expressa com as palavras credo ut
intelligam (creio para entender). O aforismo quer destacar duas coisas. Primeiramente, a
necessidade da fé para o conhecimento da verdade religiosa e moral; daqui a importância de
credo. Em segundo lugar, a necessidade de usar a razão para que a adesão à fé não seja cega
e meramente passiva: daqui a importância do intellegam.

3.3. 2. Santo Tomás de Aquino

Ao romper com a linhagem tradicional da Igreja Católica medieval, ancorada no


pensamento platónico, santo Tomás de Aquino situou-se na vanguarda de seu tempo. Sua
obra, baseada nas ideias aristotélicas, contribuiu para a adaptação e sobrevivência da fé cristã
paralelamente à nova mentalidade racionalista que se tornaria, nos séculos seguintes, o fio
condutor da civilização ocidental. Tomás de Aquino, em italiano Tommaso d'Aquino, nasceu no
castelo de Roccasecca, próximo a Aquino, no reino da Sicília, entre 1224 e 1225. Oriundo de
uma família da pequena nobreza que pretendia beneficiar-se das vantagens de ter um filho
abade, aos cinco anos foi oferecido como oblacto -- leigo a serviço de ordem monástica -- à
abadia de Monte Cassino.

Em 1239 foi obrigado a voltar ao convívio da família, quando os monges foram expulsos
pelo imperador. Enviado à Universidade de Nápoles, em 1244 ingressou na ordem mendicante
dos dominicanos, criada cerca de trinta anos antes, que criticava a vida monástica tradicional
em favor de uma prática de pregação e ensino. Para subtraí-lo à influência da família, que
desaprovava seu ingresso na ordem, e ao mesmo tempo possibilitar que continuasse os
estudos universitários, seus superiores enviaram-no a Paris. Sequestrado durante a viagem por
seus irmãos, Tomás de Aquino foi encerrado por um ano no castelo de Roccasecca. Tendo
resistido a todas as pressões para que abandonasse seus propósitos, foi finalmente libertado e
rumou para Paris em 1245.

Na capital francesa, a ciência árabe aristotélica, totalmente nova para o homem


ocidental, chocava os cristãos e provocava forte reacção das autoridades da igreja, que
adoptavam medidas de censura e proibição. Alberto Magno, de quem Tomás de Aquino tornou-
se discípulo, estava entre os que não temiam a nova filosofia. Consagrava-se à interpretação
dos textos de Aristóteles e à incorporação de suas ideias à doutrina da igreja. Em 1248, ambos
seguiram para Colónia e, em 1252, Tomás de Aquino retornou a Paris, onde se formou em

46
teologia. A partir de 1256, tornou-se mestre na matéria, que passou a leccionar numa das
escolas dominicanas incorporadas à Universidade de Paris. Nomeado mestre da cúria
pontifical, entre 1259 e 1268 lecionou em Anagni, Ovieto, Roma e Viterbo.

Mais uma vez de volta a Paris, Tomás de Aquino opôs-se simultaneamente, em notável
polémica, aos averroístas, que afirmavam que a verdade da fé pode entrar em contradição com
a verdade racional e propunham uma teoria dualista; e aos agostinianos, detractores do
pensamento aristotélico em favor do dogma cristão. A condenação do averroísmo radical, em
1270, e o subsequente descrédito face ao pensamento aristotélico prejudicaram o prestígio de
Tomás de Aquino. Em 1272, o filósofo seguiu para Nápoles, onde fundou um núcleo
dominicano de estudos na universidade. Ali, as divergências com os agostinianos acentuaram-
se. A ideia tomista segundo a qual o homem situa-se na fronteira entre dois universos, o
material e o espiritual, era para os agostinianos fruto de uma valorização excessiva da natureza
e da matéria, em detrimento da transcendência e superioridade da alma imortal sobre o plano
físico.

De maneira geral, a obra de Tomás de Aquino pode ser organizada da seguinte forma:
(1) comentários ao Antigo e ao Novo Testamento, assim como às obras de vários pensadores,
principalmente Aristóteles; (2) cursos e polémicas, que incluem o material de suas aulas; e (3)
duas sínteses teológicas, a Suma teológica e a Suma contra os gentios. Em 1274, Tomás de
Aquino foi pessoalmente convocado pelo papa Gregório X a participar do II Concílio de Lyon,
cujo principal objectivo era remediar a cisão entre as igrejas grega e romana. Adoeceu durante
a viagem e morreu no mosteiro cisterciense de Fossanova, em 7 de Março de 1274. Três anos
depois, os mestres de Paris, que representavam a maior autoridade teológica da igreja,
condenaram 219 proposições, entre as quais 12 eram de autoria do dominicano. Na Idade
Média, nenhuma condenação poderia ser mais séria que essa e sua repercussão
representaram, durante séculos, um obstáculo à difusão do tomismo. Canonizado em 1323,
Tomás de Aquino passou a ser festejado no aniversário de sua morte e, mais tarde, no dia 18
de Julho. Foi reconhecido como doutor da igreja em 1567 e, no final do século XIX, a corrente
ortodoxa fez-se representar pelo tomismo.

47
Alma

A noção de alma como "sopro", princípio activo do corpo, acha-se em quase todos os
povos e culturas, tornando-se objecto de constante elaboração filosófica, desde os pitagóricos
até a teologia contemporânea ou a psicanálise de Jung. Definida como elemento vital e
espiritual do ser humano, a alma foi sempre um dos problemas mais constantes da maior parte
das religiões e filosofias de todos os tempos. Diversas manifestações religiosas encontraram
nela seu interesse principal, como o animismo e o espiritismo, e também algumas correntes
filosóficas, especialmente as originárias do plactonismo, que defendia a imortalidade da alma e
a metempsicose (transmigração das almas).

O dualismo inerente à abordagem platónica é uma herança do orfismo e do pitagorismo:


a alma pertence à esfera divina, ao mundo das ideias e das formas, confundindo-se com estas
e sendo, por isso, eterna, imortal, indestrutível. "O corpo é a prisão da alma", ensina Platão,
correspondendo ela, assim, a uma entidade oposta à existência corpórea, a que só pode
chegar através da "queda". Para os profetas e pensadores hebreus, "a personalidade do
homem era um corpo animado, não uma alma encarnada", mas o plactonismo chegou a
exercer maior influência sobre os filósofos cristãos do que a tradição hebraica: a patrística foi
quase totalmente dominada pela síntese platónica, que, com o tempo, se tornou parte da
doutrina, da prática, da liturgia e da hinologia cristã.

A escolástica representa mais um passo adiante: para santo Tomás de Aquino, a alma é
a forma substancial do corpo. Escolásticos posteriores ensinaram, todavia, que existe uma
outra forma do corpo além da alma. Esta, para eles, é bastante simples, mas possui
"faculdades", que são como seus acidentes. Cada experiência acrescentaria à alma uma nova
forma acidental. Por suas muitas implicações, o problema não é esquecido por Descartes, que
na VII Meditação do Discours de la méthode (Discurso sobre o método), afirma ser a alma uma
questão tão importante quanto a de Deus. A teologia protestante incorpora vários desses
aspectos, desde Martinho Lutero, que em Das Magnificat (1521) mostra que as Escrituras
dividem o homem em três partes e que "a alma é o mesmo espírito... contudo, em outra
operação. O espírito é a casa onde habita a palavra de Deus, e a alma faz que o corpo tenha
vida." Na mesma orientação bíblica, o calvinista suíço Emil Brunner sustenta que não é a alma
que distingue o homem como homem, mas a mente e o espírito. Para ele, o facto de se
considerar a alma como base do espírito -- e unida a este até a identidade -- é que faz mais

48
complexa a relação entre ambos. Segundo Brunner, a alma une o homem com o mundo da
natureza e das coisas por intermédio do corpo, o qual relaciona a pessoa humana com o
mundo.

O texto bíblico não oferece nenhuma base para a concepção dicotómica e tricotómica do
homem. A alma, na Bíblia, não corresponde a uma parte do ser humano, mas ao homem em
sua manifestação de ser vivo, não no sentido biológico simplesmente, porque a alma é a vida
humana de um ponto de vista individual, referindo-se a um sujeito de vista individual, referindo-
se a um sujeito consciente e voluntário. Nessa perspectiva, o teólogo suíço Karl Barth é ao
mesmo tempo aristotélico e bíblico, quando afirma: "O homem é a alma de seu corpo, a alma
racional guiando o organismo vegetativo e animal que está a seu serviço. Mas é um só e o
mesmo ser, não dois domínios separados; trata-se sempre de um todo, do homem." Outro
teólogo protestante, Rudolf Kittel, acentua igualmente a unidade da natureza humana. Essa é
também a direcção da teologia católica mais recente, quer em seu novo catecismo, quer na
orientação divulgada pelo concílio ecuménico Vaticano II. Identificada com animais em diversas
mitologias, a alma, ou sua noção, foi inteiramente rejeitada por materialistas modernos.
"Teoricamente uma tolice" para Ludwig Feuerbach, reduz-se a funções cerebrais cada vez
mais conhecidas, para outros autores. Jung, no entanto, conservou o uso da palavra como
sinónimo de psique, para a parte mais imaterial da personalidade humana.

4- Filosofia islâmica (Elementos introdutório, “ Avicena, Averroés, Sigério de Brabante)

O pensamento árabe representou, em suas mais remotas origens, uma dinâmica


projecção dos grandes sistemas filosóficos gregos, ainda que vazado em língua semítica e
fundamentalmente modificado sob a influência oriental. A dimensão desse facto torna-se
imensa quando se considera que o Ocidente deve aos filósofos árabes quase toda a
preservação, já em nível crítico, do platonismo e, sobretudo, do aristotelismo. Filosofia islâmica
é o pensamento expresso em língua árabe e intimamente relacionado à religião muçulmana
que floresceu entre os séculos VII e XV. Excluem-se dessa denominação as tendências
modernas e contemporâneas da filosofia árabe, analisadas apenas como floração do Oriente
dentro e fora dos limites da Idade Média latina.

Na origem e, a rigor, ao longo de toda a sua evolução, a filosofia árabe transmite ao


mundo ocidental os fundamentos de quase todo o pensamento filosófico do Renascimento, em

49
particular na Espanha e na Itália. Sem a contribuição dos comentadores árabes, o
Renascimento seria depositário apenas do monólogo cristão da Idade Média. Seria correcto
dizer que os próprios pensadores medievais, em particular os tomistas, pagaram pesado tributo
a esses ousados "heréticos" orientais.

Seitas e escolas teológicas. Em seus primórdios, a filosofia árabe foi principalmente uma
filosofia de teólogos, que devem tudo às crenças e tradições religiosas muçulmanas. Até o
século IX, as especulações filosóficas do mundo árabe restringiam-se às discussões teológicas
das primeiras seitas e escolas ascéticas, cuja suprema preocupação residia no exame de
questões éticas e morais. O primeiro grande representante dessa época e notável cultor da
reflexão moral de índole teórica foi Hasan al-Basri, que integrou o grupo chamado
Companheiros do Profeta, responsável pelo início da maioria das discussões teológicas que
logo se cristalizariam na constituição de seitas e escolas teológicas, como as de Antioquia
(século III), de Nasibim, em comunidade de fala síria, e de Nasibim-Edessa, a principal delas,
que floresceu entre os séculos IV e V e reuniu os nestorianos condenados como heréticos pelo
Concílio de Éfeso (431). A esses nestorianos somaram-se depois outras seitas igualmente
heréticas, como as dos monofisistas (responsáveis pela introdução do misticismo e dos ideais
neoplatônicos), dos zoroastristas persas, dos pagãos de Harran e até mesmo dos judeus.

seitas e escolas -- no interior das quais se destacavam os nomes de Alfarabi, Avicena,


Avempace, Abubaker e Averroés, os três últimos já na Espanha -- dedicaram-se inicialmente a
debates de questões como os atributos divinos e os conflitos entre a predestinação e o livre-
arbítrio. Contribuíram consideravelmente para a concretização de uma reflexão filosófica que já
se poderia dizer autónoma, cujo expoente supremo foi Alkindi, que viveu no século IX. Toda
essa estratificação orgânica da filosofia árabe tornou-se possível, em grande parte, graças à
transmissão ao universo muçulmano de consideráveis vertentes dos sistemas gregos,
sobretudo o aristotelismo e o neoplactonismo, o que se deve à versão síria do helenismo, à
actividade filosófico -religiosa dos nestorianos, ao misticismo dos teólogos monofisistas
egípcios, e finalmente, às traduções muçulmanas das versões sírias dos textos gregos.

De Avicena e Algazali. Herdeiro das tradições aristotélico, platónicos de Alkindi e,


principalmente, de Alfarabi, Avicena foi o mais ilustre dentre todos os muçulmanos orientais.
Segundo ele, o conhecimento forma-se a partir da realidade dos objectos conhecidos, desde a
consciência dos princípios primordiais até a revelação escactológica, passando pelos princípios
universais ou ideais. Sua sistematização da especulação interior é de capital importância para

50
a filosofia escolástica, que absorveu de Avicena pelo menos três noções básicas: a da
existência enquanto acidente que se associa à essência; a que se relaciona ao conceito da
unidade do intelecto agente, constituída à custa da ascensão da potência no acto do
entendimento; e a da distinção entre a essência e a existência nos seres criados, equivalente à
união destes em Deus. Além da contribuição de ordem metafísica, o avicenismo proporcionou
ainda significativas modificações no campo da lógica, em que conciliou diversos aspectos dos
modelos aristotélicos e estóicos.

Como os predecessores, Avicena tentou harmonizar, em suas várias obras, as formas


abstractas da filosofia com as tradições religiosas do islamismo. Tal pretensão, porém, falhou
em muitos pontos, o que deu origem às críticas movidas contra ele por Algazali, cujo
cepticismo racionalista, particularmente visível em sua Tahafut al-falasifa (Autodestruição dos
filósofos), opõe-se tanto ao aristotelismo avicenista quanto ao neoplactonismo dos demais
filósofos árabes. Em outras palavras, Algazali não admite racionalização helenizante das
crenças religiosas. Seu Deus é o Deus do homem religioso, e não o do intelectualismo
avicenista.

Filosofia árabe na Espanha. Paralelamente às doutrinas desenvolvidas por Avicena e


Algazali, destacam-se aquelas que, a partir do século XI, foram disseminadas pelos
pensadores muçulmanos na Espanha, onde sobressai o nome de Averroés, o maior dentre
todos os filósofos árabes. Antes dele, distinguiram-se o filósofo judeu Avicebron, Abubaker
(autor de um curioso romance filosófico) e, sobretudo, Avempace, que descreveu o itinerário
seguido pelo homem para reunir-se ao intelecto agente, substância una e comum a todos os
entendimentos possíveis. É essa, ainda que obscuramente expressa, a doutrina da unidade do
intelecto, cujo maior nome foi Averroés.

A obra de Averroés - que, como seus predecessores, procurou conciliar filosofia e


dogma - representa a maturidade e a culminância da tradição aristotélica no pensamento
muçulmano da Idade Média latina. Esse trabalho teve grande influência sobre a escolástica.
Em essência, o averroísmo sustentava a eternidade do mundo, que, por haver sido criado por
Deus, não tinha na eternidade uma contradição. Esse mundo criado e eterno teria surgido por
emanação do primeiro princípio criador, mas sua eternidade exige também a eternidade da
matéria, na qual subsistiriam, desde sempre e enquanto possibilidades, as formas extraídas
por Deus para formar as coisas, e não introduzidas na matéria. A essa eternidade da matéria
reagiram Tomás de Aquino e os antiaverroístas. A doutrina de Averroés, no entanto, iria marcar

51
ainda três outros momentos históricos: no princípio do século XIII (com o averroísmo latino de
Siger de Brabante), no final desse mesmo século (por meio de Duns Scotus, Pietro d'Abano,
Marsílio de Pádua e outros) e na segunda metade do século XV (com os averroístas da
Universidade de Pádua). Ao século XV pertence também o último valor expressivo da filosofia
árabe, Aben-jaldun, de tendência neoplatónica.

3.5- Guilherme de Occam

Guilherme de Ockham contrapôs-se aos ideólogos da Igreja, no que concerne às ideias


sobre as essências da existência de Deus, pois, segundo ele não se poderia afirmar a
inteligibilidade na divindade, assim estaríamos a limitar a mesma. Embora Ockham, bem como
qualquer outro filósofo não tenha conseguido de uma forma esclarecida distinguir realmente as
ideias essenciais e Deus. Estabelecer uma distinção correria o risco de concordar com o
platonismo, ao menos que deixassem de agir como cristãos. Ockham diz que Deus não pode
ser limitado por nada, e as ideias ou mesmo a própria essência sem importar a sua concepção
só representam a limitação. Salientam também que a omnipotência é indemonstrável, mas
conhecida por intermédio da Fé.

Quanto às ideias de que não é possível existir conexões necessárias, porque, se assim
fosse, estas ideias fundar-se-iam por si mesma, sem terem que precisar de Deus, logo o
próprio Deus teria qualidades limitadas.12Guilherme de Ockham, discorda haver relações entre
as coisas subsistentes por si mesma, pois ele em respaldo admite que, as relações não são
realidades, às coisas relacionadas, e apenas intenções mentais. Defendeu ainda que, a
omnisciência divina é isenta de limitação, e isto abrange o seu conhecimento, conhecendo
desde a sua essência os futuros contingentes e de acordo com as disjunções Deus conhece o
verdadeiro do falso e o falso do verdadeiro.

Tendo estabelecido a diferença existente entre a Filosofia e Teologia definiu então que a
Fé apenas pode ser compreendida e admitida pelos crentes e não pelos racionalistas ou
cientistas ou ainda mesmo, os próprios filósofos, porque é representada por princípios
baseados na revelação, e são ao mesmo tempo inquestionáveis. Ele advertiu que, não se pode
justificar os artigos da Fé pela Razão, porque esta representa somente os assuntos racionais e
12
- WINBERG, Julius. Breve História de la Filosofia, Editora Cátedra, S. A, 1987, pág. 264

52
não espirituais. Realmente Guilherme de Ockham estava certo ao afirmar tal coisa, pois, muitas
são as denominações religiosas que, têm vindo a confundir as questões racionais das
reveladas, uma vez que, algumas dizem ter a revelação inspiradas, quando o que têm são
apenas princípios sagrados criados pelos seus líderes espirituais, e sem ter qualquer conexão
divina. Por exemplo, o não uso de roupas de cor negras na Igreja Toquista, não é bíblico nem
tão pouco revelado.

53
CAPITULO IV: A IDADE MODERNA (FILOSOFIA MODERNA)

Caracterização geral

4.1- Período do Renascimento

Contexto Histórico

O final de Idade Média esteve calcada no conceito de teocentrismo (Deus no centro do


mundo) e no sistema feudal, terminou com o advento da Idade Moderna. Essa fase reúne
diversas descobertas científicas (nos campos da astronomia, ciências naturais, matemática,
física, etc.) o que deu lugar ao pensamento antropocêntrico (homem no centro do mundo).
Assim, esse período esteve marcado pela revolução do pensamento filosófico e científico. Isso
porque deixou de lado as explicações religiosas do medievo e criou novos métodos de
investigação científica. Foi dessa maneira que o poder da Igreja Católica foi enfraquecendo
cada vez mais. Nesse momento, o humanismo tem um papel centralizador oferecendo uma
posição mais activa do ser humano na sociedade. Ou seja, como um ser pensante e com maior
liberdade de escolha. O Renascimento os recentes estudos filosóficos (Helderbrand, Walser,
Burdach, Michelet), confirmam sem duvida alguma a origem religiosa da palavra ou do conceito
de renascimento. Renascimento é pois o segundo nascimento do homem novo ou espiritual
despido das ignorâncias do período obscuro (medieval) da filosofia.

Da Filosofia medieval à Filosofia Moderna abrange o período que vai do inicio do século
XIV ao final do século XVII, período extremamente rico em acontecimentos politico, (marca o
fim do significado politico do império e do papado a afirmação dos potenciais nacionais,
primeiro da Espanha, depois da França, da Inglaterra, da Holanda, etc., a contenção do poder
absoluto dos soberanos e introdução dos governos com os institucionais etc.) no campo
económico descoberta da América, desenvolvimento da industria e das finanças etc. Científicos
a descoberta da impressa, do telescópio, do microscópio, da electricidade, da maquina a vapor,
da célula, etc., Sociais contestações da separação em classes, primazia da burguesia sobre a
nobreza e clero etc., religiosa ruptura da unidade cristã do Ocidente, reforma e contra-reforma
fundação de novas ordens religiosas, secularização da sociedade e da cultura,
desenvolvimento do ateísmo etc.

54
É implantado na sociedade uma nova terminologia humanismo o humanismo e a
educação estão intimamente relacionado. O humanismo corresponde a um período pedagógico
portanto não se pode chamar de humanismo a qualquer referência a valores. À humanidades
Michelet alcunhou a feliz expressão “Renascimento”, para designar este período que, em Itália
e depois na Europa, se apresentava sob o signo da ruptura com o passado obscuro ou das
trevas. Todos estes acontecimentos deram lugar a profunda mudança e a transformação
cultural. Por tanto a filosofia esteve sempre presente, participou deste desenvolvimento e desta
mudanças de forma intensiva algumas vezes fornecendo-lhes motivações ideias (como no
caso da reforma e da contra reforma do absolutismo politico e da tolerância religiosa, da
igualdade das causas sociais e das revoluções politicas) e em todo os casos procurando
interpretar seu significa profundo. A filosofia moderna adquire, portanto em relação a filosofia
antiga e medieval nova dimensões, entre as quais se destacam as dimensões política
(Maquiavel, Campanella, Hobbes, spinoza, Locke, Rousseau, Kant,) ciência Galileu, Bacon,
Pascoal, Leibniz, Newton), Jurídica (Suares, Gratins, Vico), pedagogia (descartes, rousseau,
kant).

4.2- O renascimento Vs Humanismo

A liberdade e a autonomia, característica fundamentais da concepção moderna do homem e do


mundo, manifestam-se alem de nas feras políticas, religiosa e científica, também na estética.
Pode-se até dizer que na Renascença a liberdade e autonomia encontram justamente nesta
esfera a sua expressão máxima. A Renascença caracteriza-se, de facto, sobre tudo pela
descoberta do belo, isto é, da autonomia do mundo estético. Não há dúvida de que também a
idade média produziu obras de arte, e de altíssimo valor: lembremo-nos, por exemplo, dos
monumentos religiosos de Pisa, Sena, Florença; dos Efrescosdo Giotto e Cimabue, das
culturas de Pisano. Mas, naquele tempo a arte era entidade mais como acto e valor religioso,
enquanto agora é cultivada por si mesma, como acto e valor estético; é apreciada como pura
expressão da beleza, julgada e valorizada segundo regras propriamente estéticas e não mais
com referência a uma ordem extrínseca a ela, mesmo que esta ordem seja a da religião.

Verifica-se neste campo uma explosão de genialidade como poucas vezes se viu no curso da
história, explosão semelhante a que se verifica na Atenas de Péricles e na Roma de Augusto
este culto do belo, observa justamente Moroni, influencia toda a vida civil, enobrecendo os
costumes, embelezando as casas, imprimindo as suas marcas em todas as coisas e em todas

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as obras do homem. Surgem novos tipos de homens: o Mecenas, de um lado, o Literacto e o
artista, do outro. Surge uma sociedade refinada cujo centro está na cortês, nas bibliotecas, nas
academias, uma minoria aristocrática não mais do sangue e das armas, mais da cultura e da
arte, também a idade média tinha os seu doutos, mais tratava-se de uma cultura dominada
pela filosofia e pela teologia, ao passo que agora ela é dominada pela literatura, pela filologia,
pela arte: na idade media, (literae divinas); na Renascença, literaehumanae (letras humanas)

Características do pensamento moderno:

Diversas transformações ocorreram no pensamento europeu da época dos quais se destacam:

a passagem do feudalismo para o capitalismo;

o surgimento da burguesia;

a formação dos estados nacionais modernos;

o absolutismo;

o mercantilismo;

a reforma protestante;

as grandes navegações;

a invenção da imprensa;

a descoberta do novo mundo;

o início do movimento renascentista.

Principais precursores do pensamento moderno

56
4. 3.1. Nicolau. Copérnico

A astronomia moderna não nasceu de um dia para o outro, tendo o seu desenvolvimento
implicado o desfazer de teorias filosóficas e religiosas profundamente enraizadas,
nomeadamente, a Teoria Geocêntrica, dominante na consciência colectiva do povo cristão, até
ao século XVI. Nicolau Copérnico, nascido a 19 de Fevereiro de 1473, foi o grande
impulsionador da mudança das mentalidades, a nível cosmológico, ao apresentar a Teoria
Heliocêntrica. O heliocentrismo, toma o Sol como o centro do Universo, em torno do qual tudo
se move, concebendo o Universo independente de Deus, como um sistema autónomo,
explicando-se por si próprio e através de leis testadas pela experiência e formuladas
matematicamente, deslocando-se o centro de gravitação da Terra para o Sol. O heliocentrismo
é claramente o primeiro sinal de ruptura na concepção do Universo, derrubando a tradição
milenar da Terra como centro do Cosmos e operando aquilo a que se costuma apelidar
de Revolução Copernicana. A sua teoria não dispõe, no entanto, de provas concretas para este
modelo, tendo Copérnico utilizando apenas uma geometria simples para chegar às suas
conclusões.

4.3.2- Galileu Galilei

Foi Galileu Galilei, nascido a 15 de Fevereiro de 1564, que a corroborou com as suas
descobertas, das quais destaco: a observação das luas de Júpiter (que, por orbitarem Júpiter,
provam que existem corpos a orbitarem outros planetas que não a Terra), a constactação de
que Vénus apresenta fases (tornando falso o Sistema Geocêntrico de Ptolomeu e provando
que Vénus orbita o Sol) e a observação das manchas solares (que o fizeram aperceber-se da
rotação do Sol). As descobertas, tanto as cientificas quanto as geográficas, determinaram
notável mudança de interesse e perspectiva no homem da Renascença. Enquanto as
preocupações do homem da Idade Media se voltavam principalmente para esfera espiritual,
para a vida futura e, com isso, para Deus, as atenções do homem da Renascença – que,
graças às descobertas científicas e geográficas, vai descobrindo aos poucos a beleza e a
grandeza da natureza do homem – voltam-se para este mundo e para a vida terrena: o mundo
e a vida terrena adquirem, aos seus olhos, um valor próprio e não são mais unicamente
símbolos ou instrumentos para se chegar a Deus.

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No século XV e XVI a ciência faz progresso não só no estudo da natureza, mas também
no do homem e no das suas produções, especialmente na filologia. Graças aos avanços desta
disciplina Renascença, os filósofos da renascença autores antigos, especialmente os filósofos,
não são mais estudados, como na Idade Media, para serem colocados a serviço da Igreja ou
teologia, mais por si mesmo, com a finalidade de se conhecer seu verdadeiro pensamento.
Renascimento e racionalismo. Na Idade Média esboçaram-se indícios de algumas posições
ateias, mas a organização política e social impediu que ganhassem formulação explícita.
Foram as novas concepções do Renascimento, com seus interesses antropocêntricos, sua
volta à avaliação de todas as coisas segundo a medida do homem, seu paganismo cultural,
sua descoberta da natureza e do método científico, que diluíram a concepção teológica
medieval e orientaram numerosos pensadores para o materialismo, o panteísmo ou o deísmo e
da relação das duas últimas doutrinas com o ateísmo trataremos adiante.

Assim, entre os séculos XV e XVI, o italiano Pietro Pomponazzi negou a imortalidade da


alma e, veladamente, a existência de Deus. Seu compatriota Maquiavel separou a política da
religião e considerou esta última, um instrumento do poder: Roma deve mais a Numa Pompílio,
que lhe deu os primeiros regulamentos religiosos, do que a seu próprio fundador, Rômulo.
Outro italiano, Giordano Bruno, foi queimado na fogueira em 1600, acusado de ateu por suas
teses panteístas, nas quais identificava Deus com a unicidade infinita. No século seguinte, o
judeu holandês Baruch de Spinoza foi acusado de ateísmo por assemelhar Deus à substância.

4.3.3- Descartes, René

Descartes, rompeu com o aparacto conceitual da escolástica medieval para edificar seu
próprio sistema, e por isso é considerado um dos fundadores da filosofia moderna. René
Descartes, latinizado como Renatus Cartesius, origem do nome de "cartesianismo" dado a sua
doutrina nasceu em La Haye, França, em 31 de Março de 1596. De família abastada, com oito
anos entrou para o colégio dos jesuítas de La Flèche, onde adquiriu ampla formação filosófica
e matemática. Formado em direito pela Universidade de Poitiers em 1616, no ano seguinte
iniciou um período de viagens "para estudar mais livremente no livro do mundo" e assim
concretizar seu desejo de "aprender a distinguir o verdadeiro do falso". Em 1618, incorporou-se
no exército de Maurício de Nassau, nos Países Baixos, e um ano depois no de Maximiliano da
Baviera. Foi nessa época que, segundo suas próprias palavras, "brilhou a luz de uma revelação
admirável" e Descartes encontrou o caminho para elaborar sua filosofia.

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Depois de outra etapa de viagens, instalou-se em 1625 em Paris, onde levou uma vida
tranquila de reflexão e trabalho. Três anos mais tarde, em busca de um ambiente mais propício
ao estudo, mudou-se para os Países Baixos. Ali redigiu as Regulae ad directionem ingenii
(Regras para a direcção do espírito), só publicadas em 1710. Em 1637 apareceu em Leyden
seu famoso Discours de la méthode (Discurso sobre o método), com três apêndices científicos:
Dioptrique (Dióptrica), Météores (Meteoros) e Geométrie (Geometria). Em 1633, ao saber da
condenação de Galileu, de cujas ideias compartilhava, Descartes sustou a publicação do Traité
du monde (Tratado sobre o mundo); contudo, partes dessa obra apareceram em 1641.
Também publicadas em 1641, suas Meditationes de prima philosophia (Meditações sobre
filosofia primeira) encontraram franca oposição nos meios holandeses e seus livros foram
proibidos pela igreja. Isso o levou a pensar em voltar para a França. Contudo, o convite que
recebeu da rainha Cristina da Suécia o fez decidir-se, em 1649, a viver nesse país. Filosofia de
Descartes. No Discurso sobre o método, Descartes afirma que sua decisão de elaborar uma
doutrina baseada em princípios totalmente novos procede do desencanto em relação aos
ensinamentos filosóficos que recebera. Convencido de que a realidade inteira respondia a uma
ordem racional, pretendia criar um método que possibilitasse alcançar, em todo o âmbito do
conhecimento, a mesma certeza que a aritmética e a geometria proporcionavam em seus
campos.

Teoria do conhecimento: a dúvida metódica.

Para realizar seu propósito, Descartes estrutura fundamentalmente seu método em


quatro regras: (1) nunca aceitar como verdade senão aquilo que vejo clara e distintamente
como tal “duvidar de tudo para apurar a verdade”; (2) decompor cada problema em suas partes
mínimas “dividir as parte que compõe o problema”; (3) ir do mais compreensível ao mais
complexo”indução”; e (4) revisar completamente o processo para assegurar-se de que não
ocorreu nenhuma omissão”dedução”. Todo esse método, contudo, reside na primeira regra:
como obter a certeza? O instrumento utilizado por Descartes para resolver o problema é a
"dúvida metódica". De acordo com esse princípio, ele questiona todos os seus conhecimentos,
inclusive o de sua própria existência. Ora, em toda dúvida existe algo de que não podemos
duvidar: a própria dúvida, isto é, eu não posso duvidar de que estou duvidando. Mas a dúvida,
prossegue Descartes, é um pensamento, meu pensamento, e eu não posso pensar sem existir.
Portanto, há algo de que posso ter uma firme certeza: penso, logo existo, ou je pense, donc je

59
suis (em latim, cogito, ergo sum). Eu sou, em última análise, uma substância pensante,
espiritual.

A partir daí Descartes elabora toda sua filosofia. O cogito lhe servirá como chave para
prosseguir: toda representação que se lhe apresentar com "clareza" e "distinção" -- os dois
critérios cartesianos de certeza -- tal como se manifesta o cogito, deverá ser tida como correcta
e aceitável. É a aplicação positiva da dúvida metódica. Dessa forma, Descartes começa a
"passar em revista" todos os conhecimentos que pusera de lado no início de sua busca.
Quando os reconsidera, dá-se conta que as representações são de três classes: ideias
"inatas", como as de verdade, justiça, substância; ideias "adventícias", originadas pelas coisas
exteriores; e ideias "factícias" ou "feitas por mim mesmo" , as que são tidas como criações de
nossa fantasia, como os monstros fabulosos etc.

Nesse ponto, Descartes introduziu uma nova cautela na aceitação das ideias. Poderia
ocorrer, diz ele, que os conhecimentos "adventícios", que eu considero como correspondentes
a impressões de coisas que realmente existem fora de mim, fossem provocados por um "génio
maligno" que desejasse enganar-me. Contudo, essa hipótese é rechaçada de imediacto, uma
vez que, por outro lado, entre as ideias que encontro em mim mesmo, sem correlação externa
sensível e que denominei "inatas", está a ideia de Deus. Dado que a ideia de Deus possui
certos atributos, como a infinitude, que não podem provir de parte alguma, é necessário que
ele os tenha posto no intelecto. Portanto, Deus existe; e, dado que a ideia de Deus é a de um
ser perfeito, ele é incapaz de enganar-se ou de enganar-me. Portanto, posso ter plena certeza
da validade de meu conhecimento.

Na verdade, essa demonstração da existência de Deus constitui uma variante do


argumento ontológico já empregado no século XII por santo Anselmo de Canterbury, e foi
duramente atacada pelos adversários de Descartes, que o acusavam de cair num círculo
vicioso: para demonstrar a existência de Deus e assim garantir o conhecimento do mundo
exterior, utilizam-se os critérios de clareza e distinção, mas a contabilidade destes é por sua
vez justificada pela existência de Deus. Matéria e espírito. Admitida a existência do mundo
corporal, Descartes passa a determinar qual é a essência dos seres. Aqui introduz seu conceito
de substância, aquilo que "existe de tal modo que só necessita de si mesmo para existir". As
substâncias se manifestam por seus modos e atributos; os atributos são aqueles modos que
revelam a determinação essencial da substância, isto é, aquilo sem o que uma substância

60
deixaria de ser tal substância. Assim, resulta claro para Descartes que o atributo dos corpos é
a extensão, e todas as demais determinações - forma, cor, figura etc. - São modos.

Da mesma forma, considera evidente que o atributo do espírito é o pensamento, pois o


espírito "pensa sempre". A conclusão é que existe uma substância pensante - res cogitans - e
uma substância que compõe os corpos físicos - res extensa e que ambas são irredutíveis entre
si e totalmente separadas. É a isso que se chama o "dualismo" cartesiano. O carácter que
Descartes outorga aos corpos implica outra conclusão necessária: se o corpo é uma simples
magnitude espacial, não existe espaço vazio; a matéria é infinita, e as mudanças qualitativas
nos corpos são simples mudanças de lugar no espaço: trata-se de uma explicação puramente
mecanicista do mundo, que permite interpretá-lo de acordo com leis matemáticas - como, de
facto, Descartes fez em seus escritos científicos.

Corpo e alma. A separação radical entre matéria e espírito é aplicada rigorosamente, em


princípio, a todos os seres. Assim, os animais não são mais que máquinas. Contudo, Descartes
faz uma excepção quando se trata do homem. Dado que este se compõe de corpo e alma, e
sendo o corpo, por definição, material e extenso, e a alma, espiritual e pensante, deveria haver
entre eles uma absoluta ausência de comunicação. No entanto, no sistema cartesiano isso não
acontece; a alma e o corpo se comunicam entre si, mas não ao modo clássico, isto é, a alma
constituindo a "forma" do corpo, e sim de uma maneira singular. A alma está assentada na
glândula pinhal, situada no encéfalo, e dali rege o corpo, como "o navegante dirige a nave", por
meio dos spiritus animales, substâncias a meio caminho entre espírito e corpo, à maneira de
finíssimas partículas de sangue, que transmitem ao corpo as ordens da alma.

Influência do cartesianismo. Enquanto sistema rígido e fechado, o cartesianismo não


teve muitos seguidores e perdeu sua vigência em poucas décadas. Contudo, a filosofia
cartesiana tornou-se ponto de referência para grande número de pensadores, para tentar
resolver as contradições que encerrava, como fizeram os racionalistas, ou para rebatê-la
frontalmente, caso dos empiristas. Assim, o alemão Leibniz e o holandês Spinoza
estabeleceram formas de paralelismo psicofísico para explicar a comunicação entre corpo e
alma. Spinoza, aliás, foi mais longe, afirmando que existia uma só substância, que englobava
em si a ordem das coisas e a ordem das ideias, e da qual a res cogitans e a res extensa não
eram senão atributos, com o que se chega ao panteísmo. De um ponto de vista completamente
oposto, os empiristas ingleses Thomas Hobbes e John Locke negaram que a ideia de uma
substância espiritual fosse demonstrável, afirmaram que não existiam ideias inatas e que a

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filosofia devia reduzir-se ao terreno do conhecimento pela experiência. A concepção cartesiana
de um universo mecanicista, enfim, influenciou decisivamente a génese da física newtoniana.

Em suma, não é exagero afirmar que, embora Descartes não tenha chegado a resolver todos
os problemas que levantou, tais problemas se tornaram questões centrais da filosofia ocidental.
René Descartes morreu em Estocolmo, em 1º de Fevereiro de 1650, poucos meses depois de
sua chegada à corte da rainha Cristina.

4.3. 4- Spinoza, Baruch

Autor de um dos mais completos e coerentes sistemas metafísicos da história da


filosofia, Spinoza foi também defensor da liberdade de pensamento. É sua a pioneira proposta
de interpretar historicamente os textos bíblicos, pois acreditava que o homem se salva pela
filosofia, verdade da religião. Seu espírito libertário manifestou-se também na crítica da
monarquia e na defesa do regime democrático. Baruch de Spinoza, também conhecido como
Benedictus ou Bento de Espinosa, nasceu em Amsterdam, Países Baixos, em 24 de Novembro
de 1632. Descendia de rica família de comerciantes judeus, de origem portuguesa, que se
refugiou nessa cidade para fugir às investidas da Inquisição espanhola. Na infância, recebeu a
formação rabínica tradicional. Posteriormente, estudou línguas clássicas e modernas com
Franciscus van den Enden, ex-jesuíta livre-pensador e ateu, que lhe apresentou também a
filosofia neo-escolástica e o pensamento do contemporâneo René Descartes, que inaugurou a
filosofia moderna.

Em 1656, Spinoza foi repudiado pelos judeus, em virtude das interpretações que tornou
públicas acerca das Escrituras, e banido de Amsterdam pelas autoridades civis. Em 1660
transferiu-se para a localidade de Rijnburg e três anos mais tarde fixou residência em
Voorburg, nos arredores de Haia, onde dedicou-se à redacção de seus textos. Os primeiros
livros de Spinoza, como Korte Verhandeling van God, de Mensch en deszelfs Welstand (1662;
Breve tratado sobre Deus, o homem e seu bem-estar) e Tractatus de intelectus emendatione
(1662; A reforma do entendimento), ambos de publicação póstuma, assim como sua edição
dos Princípios da filosofia (1663) de Descartes, já revelavam o desejo do filósofo de empregar
os postulados cartesianos para reflectir sobre as contradições que considerava inerentes ao
sistema do pensador francês. Combateu em particular o dualismo substancial cartesiano entre
mente e espírito e a ideia de um Deus transcendente.

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Na monumental Ethica ordine geometrico demonstrata (Ética demonstrada segundo a
ordem geométrica), que seria editada em 1677, poucos meses depois de sua morte, Spinoza
expõe sua ontologia, trata da natureza das paixões, formula sua moral e sua teoria da
liberdade. O título da obra indica a convicção do autor de que a estrutura do real corresponde a
um ordenamento semelhante ao que se expressa na matemática e que, sendo assim, é
possível explicá-la segundo o método de demonstração usado em geometria. Ao contrário de
Descartes, entretanto, cujo racionalismo partia do homem para chegar ao conhecimento de
Deus, Spinoza partiu de Deus para chegar ao homem, cuja aspiração à felicidade constituiu o
objecto último de seu pensamento.

A exemplo do que postulava o método cartesiano, Spinoza considerou os critérios de


clareza e precisão das ideias como garantia da certeza do saber, mas estava convencido de
que tal certeza era consubstancial ao entendimento, já que este e a natureza não constituem
senão manifestações de uma substância única "que é em si e se concebe por si", ou seja, é
causa de si mesma e nela se identificam essência e existência. Essa substância toda
perfeição, o Deus de Spinoza, possui infinitos atributos, dos quais o homem só conhece dois, o
pensamento e a extensão, cujos "modos" no mundo são por sua vez a alma e o corpo. Tudo o
que existe, pois, está determinado por seu próprio princípio interno, o que elimina a noção de
transcendência e conduz à afirmação da ordem do mundo como imanente.

As acusações de ateísmo de que Spinoza foi objecto tiveram como base sobretudo sua
aparente negação dos atributos divinos, pois ao fazer com que a extensão (a matéria) fizesse
parte de Deus, este deveria, em última análise, identificar-se com a matéria. Embora isso se
torne inegável na concepção de Spinoza do Deus sive natura ("Deus ou a natureza"), implica
simplificação do carácter fundamentalmente racionalista de sua tese: a substância não é
matéria nem pensamento, mas a ordem constitutiva e necessária do mundo. Isso, na opinião
do filósofo, não nega a liberdade, pois esta consiste em agir de acordo com a própria natureza.
Assim, o facto de que Deus só possa ser como é supõe apenas um atributo de sua perfeição.

Spinoza fixou residência em Haia em 1670 e, em seus últimos anos, dedicou-se à


elaboração da Ética e de duas obras que deveriam constituir a aplicação de seus princípios aos
campos da religião, da ética e da política: Tractatus theologico-politicus (Tratado teológico-
político) e o inacabado Tractatus politicus (Tratado político), editado postumamente com a
Ética. No primeiro desses livros, Spinoza se propôs demonstrar que a liberdade da filosofia não

63
só é compatível com a devoção e com a paz social como suprimir essa liberdade seria o
mesmo que destruir a paz e a própria piedade cristã.

Essa ideia se traduz no "amor intelectual" a Deus, cuja manifestação é a alegria, a qual
implica paz interior e expressa portanto a ordem divina do ser. A felicidade dos indivíduos só
será possível num estado que permita a manifestação da liberdade, pelo que Spinoza defendia
a organização política democrática, baseada na liberdade de pensamento e opinião em todos
os níveis, e na igualdade de direitos entre os homens. Baruch Spinoza morreu em Haia, em 21
de Fevereiro de 1677. Seu pensamento começou a ser revalorizado pelos filósofos do
idealismo alemão, em especial Friedrich W. Schelling.

4.3.5- O Empirismo Inglês (Francis Bacon Thomas Hobbes, Jhon Locke e David Hume)

Francis Bacon (1561-1626)

Filósofo e político britânico, Bacon colaborou com a criação de um novo método


científico. Assim, é considerado um dos fundadores do "método indutivo de investigação
científica", baseado nas observações dos fenômenos naturais. Além disso, apresentou a “teoria
dos ídolos” em sua obra “Novum Organum”, que, segundo ele, alteravam o pensamento
humano bem como prejudicava o avanço da ciência. O início da Idade Moderna registra um
dos acontecimentos mais importantes da história do pensamento: a proclamação e a realização
da autonomia da ciência em relação à filosofia e à teologia. O melhor juízo sobre a vida de
Bacon foi emitido por ele mesmo: “ o meu maior erro consiste em que, embora sabendo que
nasci mais para escrever do que para agir, ocupo-me continuamente com assuntos do estado,
para as quais a natureza não me criou. O seu génio o chamava, de facto, para a filosofia e
ciência; vemo-lo, contudo, durante toda sua vida entregue à política e às preocupações.

Bacon nasceu em 1561, em Londres, no seio de uma família que pertencia à alta
burguesia. A propósito da natureza da pesquisa científica Bacon diz que o comportamento que
se deve seguir não é o da aranha que tece a teia tirando o material do seu próprio corpo (assim
fazem os escolásticos que empregam o método dedutivo também para as ciências
experimentais); não é também o da formiga, que armazena o material como o encontra e
depois o consome, sem selecioná-lo nem limpá-lo (assim fazem os empiristas: eles acumulam
observações, sem nunca chegarem à descoberta da causa). O método certo de agir é o da

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abelha, que primeiro colhe o material de fora e depois o transforma em mel por meio de seu
organismo.

Também o fim da cientista, por meio da experiencia, deve recolher informações


suficientes (o material) e, depois, mediante suas faculdades espirituais (a razão), deve procurar
elaborar noções gerais e leis universais. Bacon divide a ciência em três grupos: as que se
baseiam na memória (historia natural e civil); as que se baseiam na fantasia (poesia em suas
várias formas); as que se baseiam na razão (filosofia e ciências experimentais). O fim da
ciência, segundo Bacon, é prático e não especulativo. A ciência deve ajudar o homem a
adquirir um controle mais perfeito sobre a natureza. Assim o objecto da ciência é a causa das
coisas naturais. Bacon faz seu o princípio: “ Vere scire est per causas scire” (saber verdadeiro
é saber pelas causas). Quanto ao fim da ciência, Bacon observa, com razão que ele consiste
em estudar a natureza não para contemplá-la, mas para modifica-la e torná-la útil ao homem.

Thomas Hobbes (1588-1679)

Filósofo e teórico político inglês, Hobbes buscou analisar as causas e propriedades das
coisas, deixando de lado a metafísica (essência do ser). Baseado nos conceitos
do materialismo, mecanicismo e empirismo, desenvolveu sua teoria. Nela, a realidade é
explicada pelo corpo (matéria) e por seus movimentos (aliados à matemática). Sua obra mais
emblemática é um tratado político denominado de “Leviatã” (1651), mencionando a teoria do
“contrato social” (existência de um soberano).

John Locke (1632-1704)

Filósofo inglês empirista, Locke foi precursor de muitas ideias liberais criticando assim, o
absolutismo monárquico. Segundo ele, todo o conhecimento era proveniente da experiência.
Com isso, o pensamento humano estaria pautado nas ideias de sensações e reflexão onde a
mente seria uma "tábula rasa" no momento do nascimento. Assim, as ideias são adquiridas ao
longo da vida a partir de nossas experiências.

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David Hume (1711-1776)

David Hume nasceu em 7 de Maio de 1711 nas proximidades de Edimburgo, Escócia.


Filho de um modesto proprietário de terras, estudou na universidade local. Depois de trabalhar
como comerciante, foi estudar na França, onde permaneceu de 1734 a 1737. De volta a seu
país, publicou uma ambiciosa obra, A Treatise of Human Nature (1739-1740; Tratado sobre a
natureza humana), e tentou, sem êxito, obter a cátedra de ética em Edimburgo. Exerceu
diversos cargos diplomáticos e fez viagens à França, aos Países Baixos, à Alemanha e à Itália,
países em que entrou em contacto com os principais intelectuais europeus. Durante esses
anos escreveu duas outras obras capitais, Philosophical Essays Concerning Human
Understanding (1748) -- mais conhecida como An Enquiry Concerning Human Understanding
(Pesquisa sobre o entendimento humano), nome que Hume lhe deu numa revisão de 1758 -- e
Enquiry Concerning the Principles of Morals (1751; Pesquisa sobre os princípios da moral).

ambas Hume reelaborou as teses do Treatise, que constituíam elas mesmas uma
radicalização das teorias de seu compatriota John Locke. Filósofo e diplomata escocês, Hume
seguia a linha empirista e do ceticismo. Criticou o racionalismo dogmático e o raciocínio
indutivo, analisados em sua obra “Investigação Acerca do Entendimento Humano”. Nessa obra,
ele defende a ideia do desenvolvimento do conhecimento a partir da experiência sensível,
donde as percepções estariam divididas em: impressões (associadas aos sentidos); ideias
(representações mentais resultantes das impressões). A obra filosófica de Hume resgata a
preocupação de implantar nas ciências humanas a metodologia rigorosa adoptada por Newton
para a física e a astronomia. O princípio básico desse raciocínio recomenda evitar toda
hipótese não comprovável experimentalmente. Todo conhecimento, afirmava, provém das
percepções da experiência, percepções que podem ser "impressões", dados directos dos
sentidos ou da consciência interna, ou "ideias", que resultam da combinação de impressões.
Existem ideias simples e complexas, estas últimas produto da generalização, mas todas podem
reduzir-se a uma associação de impressões. Noções como a relação causa efeito, concluía,
são indemonstráveis.

Nessa linha de pensamento, Hume questionou a existência da alma. É a generalização


de ideias simples que conduz à crença de que existe um "eu" permanente, idêntico a si mesmo;
mas há somente um conjunto de conteúdos de consciência, sem substância que lhe sirva de
suporte. A moralidade e a religião, portanto, são apenas o resultado de costumes e hábitos.
Devem, portanto, basear-se no bem comum, que constitui o princípio fundamental da

66
sociedade. O objecto da teoria política é estabelecer as leis que dêem condições ao estado --
produto natural da evolução humana -- de proceder eficazmente à distribuição da justiça.

Em 1751 Hume voltou a Edimburgo e conseguiu o cargo de bibliotecário do colégio de


advogados. Dedicou-se então a redigir os seis volumes de The History of England (1754-1762;
História da Inglaterra), que lhe granjearam grande prestígio. Em 1763 seguiu para Paris como
secretário da embaixada britânica e ali fez amizade, mais tarde abruptamente interrompida,
com o filósofo Jean-Jacques Rousseau. Depois de uma estada de três anos em Londres, em
1769 Hume retirou-se definitivamente para Edimburgo. Durante os últimos anos de vida
entregou-se à revisão de sua obra e à redacção de vários textos que apareceriam
postumamente, entre eles uma autobiografia, publicada em 1777. Sua influência posterior na
teoria do conhecimento seria imensa, sobretudo sobre Immanuel Kant e os positivistas, e
também na génese do pensamento liberal clássico. David Hume morreu em Edimburgo em 25
de Agosto de 1776.

4.3.6- Nicolau Maquiavel

Um primeiro impulso para uma nova concepção do mundo e do homem foi dado pela
política. Com a queda da res publica christiana (república cristã) e com o enfraquecimento do
poder político do papado, surgem, fora da Itália, os Estados nacionais e, na Itália, as repúblicas
e as senhorias. Agora a atenção dos governantes já não esta voltada, como na Idade Media,
para Deus e para a Igreja, mas para os próprios súbditos e, muitas vezes, para o interesse
próprio e para a própria família. Esta nova concepção do Estado tem um teórico genial na
pessoa de Maquiavel. Em sua obra O príncipe, ele não se propõe descrever um Estado ideal,
nem apresentar o governante como pio executor das vontades divinas, sempre submisso à
Igreja, mas descreve a política como resultado “da experiencia das coisas modernas e da
continua lição das antigas”, a fim de descobrir, na infinita variedade dos factos concretos, os
aspectos constantes, os anexos causais, as leis.

Na base da concepção de Maquiavel a respeito do Estado está uma visão pessimista da


natureza humana, visão em parte herdada do cristianismo e em parte fruto da observação
pessoal do autor. Para ele, os homens, em geral, seguem as suas paixões cegamente,
“esquecendo-se mais depressa a morte do pai do que a perda do património”. As paixões que
se colocam em primeiro lugar são, além da cobiça e do desejo de prazeres, a preguiça, a

67
vileza, a duplicidade, a insolência: “é necessário que quem governa a república e prepara as
leis para ela pressuponha que todos os homens são réus e que procedem sempre com malicia
em todas as oportunidades que se apresentem” 13 Somente em casos raríssimos o homem se
serve da liberdade para fazer o bem, porque “quando há muitas possibilidades de escolha e se
pode usar da liberdade, todas as coisas se enchem logo de confusão e de desordem”.14

4.3.7- Charles Montesquieu (1689-1755)

Filósofo e jurista francês do iluminismo, Montesquieu foi um defensor da democracia e


crítico do absolutismo e do catolicismo. Sua maior contribuição teórica foi a separação dos
poderes estatais em três poderes(poder executivo, poder legislativo e poder judiciário). Essa
teoria foi formulada em sua obra O Espírito das Leis (1748). Segundo ele, essa caracterização
protegeria as liberdades individuais, ao mesmo tempo que evitaria abusos dos governantes.
Pensador influente nas áreas da filosofia da história e do direito constitucional, Montesquieu foi
também um dos maiores prosadores da língua francesa. A partir dele, os escritores franceses
se tornaram mais que literactos e passaram a discutir os assuntos públicos e a influir nos
destinos do país.

Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu, nasceu em 18 de


Janeiro de 1689 no castelo de La Brède, perto de Bordéus, França, membro de uma família da
aristocracia provincial. Fez sólidos estudos humanísticos e jurídicos, mas também frequentou
em Paris os círculos da boémia literária. Em 1714 entrou para o tribunal provincial de Bordéus,
que presidiu de 1716 a 1726. Fez longas viagens pela Europa e, de 1729 a 1731, esteve na
Inglaterra. Famoso como escritor, Montesquieu passou a maior parte da vida em Bordéus, mas
sempre voltava a Paris, onde era muito requisitado. Foi fundamentalmente um aristocrata da
província, da estirpe de seu conterrâneo Michel de Montaigne e, como ele, humanista e
céptico. Juntou, porém, a essa herança espiritual o optimismo característico do século XVIII e
acreditou firmemente na possibilidade de solução para os problemas da vida pública.

Livre-pensador em matéria religiosa e apreciador dos prazeres da vida, Montesquieu


imprimiu esse espírito a seu primeiro livro, Lettres persanes (1721; Cartas persas), cartas
imaginárias de um persa que teria visitado a França e estranhado os costumes e instituições
vigentes. O livro, espirituoso e irreverente, tem um fundo sério, pois relativiza os valores de
13
MACHIAVELLI, discorsi prima deca tito Livio, I, 3. Citado por BATTISTA Mondin, Ibd. Pag.9 e 10.
14
Id., ibid.

68
uma civilização pela comparação com os de outra, muito diferentes. Verdadeiro manual do
Iluminismo, foi uma das obras mais lidas no século XVIII.

Filosofia da história. O humanismo de Montesquieu é o fundamento das Considérations


sur les causes de la grandeur des romains et de leur décadence (1734; Considerações sobre a
causa da grandeza dos romanos e de sua decadência). Influenciado por Maquiavel, o escritor
procura determinar as causas da grandeza e da queda das nações e dos impérios e explica o
curso da história por meio de factos naturais, económicos e políticos, como clima, situação
geográfica, amplitude de seus domínios e o que ele chamou o "génio" das nações.

Montesquieu parece, em parte, antecipar o positivismo científico do século XIX, ao usar


critérios das ciências naturais. O fundo de seu pensamento já é historicista. Como precursor
das ideias de Turgot, Gibbon e Hegel, Montesquieu foi um dos fundadores da filosofia da
história. Foi o primeiro a usar o termo decadência a propósito de uma nação e de seu destino
histórico, tema permanente na filosofia da história dos séculos XIX e XX. Homem do século
XVIII, porém, Montesquieu não se entregou ao pessimismo e acreditou na salvação por meio
de instituições políticas adequadas, tema de sua terceira e mais influente obra. Política. Em De
l'esprit des lois (1748; O espírito das leis), Montesquieu elabora conceitos sobre formas de
governo e exercício da autoridade política que se tornaram pontos doutrinários básicos da
ciência política. Considera que cada uma das três formas possíveis de governo é animada por
um princípio: a democracia baseia-se na virtude, a monarquia na honra e o despotismo no
medo.

Ao rejeitar este último e afirmar que a democracia só é viável em repúblicas de


pequenas dimensões territoriais, decide-se em favor da monarquia constitucional. Elabora a
teoria da separação dos poderes, em que a autoridade política é exercida pelos poderes
executivo, legislativo e judiciário, cada um independente e fiscal dos outros dois. Seria essa a
melhor garantia da liberdade dos cidadãos e, ao mesmo tempo, da eficiência das instituições
políticas. Seu modelo é a monarquia constitucional britânica. As teorias de Montesquieu, que
morreu em Paris, em 10 de Fevereiro de 1755, exerceram profunda influência no pensamento
político moderno. Inspiraram a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, elaborada em
1789, durante a revolução francesa, e a constituição dos Estados Unidos, de 1787, que
substituiu a monarquia constitucional pelo presidencialismo. Com o fim do absolutismo,
diversos países europeus adoptaram a monarquia constitucional e muitas delas sobreviveram
até depois da primeira guerra mundial. Em suas constituições actuais, a maioria das nações do

69
Ocidente adopta o princípio da separação dos poderes e em muitas delas vigora o
presidencialismo ao estilo americano.

4.3.8- Immanuel Kant

Emanuel Kant, nasceu em Konigsberg (na Prússia oriental) em 22 de Abril de 1724 de família
pobre, pertencente à seita protestante dos pietistas, da qual recebeu profunda educação
religiosa. Kant estudou na universidade de sua cidade natal, dedicando-se especialmente à
filosofia (Wolf e Baumgarten) e às ciências naturais (Newton). Em 1755, conseguiu a livre-
docência, começa a concentrar-se nos problemas filosóficos, sem negligenciar, entretanto, o
estudo de ciência e da matemática. Em 1769 expõe a hipótese fundamental do seu sistema: a
admissão de dupla ordem de realidades: o fenómeno e o número. No ano seguinte apresenta
os primeiros resultados da aplicação desta hipótese no ensaio dissertação sobre a forma e os
princípios do mundo sensível e inteligível. Mais tarde publica, em pequenos intervalos: crítica
da razão pura (1781), prolegómenos e toda metafísica futura (1783), fundamentos da
metafísica dos costumes (1785), critica à razão pratica (1788), crítica do juízo (1791), a religião
nos limites da pura razão (1793).

Kant publicou 1794 a obra Pela paz perpétua, uma constituição republicana fundada, em
primeiro lugar, “no princípio da liberdade dos membros de uma sociedade enquanto homens;
em segundo lugar, no princípio de dependência de todos enquanto súbditos; em terceiro lugar,
na lei da igualdade enquanto cidadãos. Kant morreu em 12 de Fevereiro de 1804, em sua
cidade natal da qual jamais se ausentara. Na filosofia especulativa Kant tem a seu favor duas
descobertas de fundamental importância:

 O conhecimento humano não é reprodução passiva de um objecto por parte do sujeito,


mas construção activa do objecto por parte do sujeito;

Os juízos sintéticos a priori.

 A primeira descoberta levou Kant à negação da metafisica, isto é, do


conhecimento da natureza das coisas;

70
 a segunda permitiu-lhe provar a validade da ciência.

Kant apresenta uma distinção entre transcendental e transcendente. Por transcendental


Kant entende a condição suprema à qual deve estar sujeito qualquer tipo de conhecimento; as
condições supremas da sensação são o espaço e o tempo, e são estudadas na estética
transcendental; as do juízo são as categorias, que são estudadas na analítica transcendental;
as do raciocínio são as ideias, que são estudadas na dialética transcendental.

A noção kantiana de transcendental não se a fasta muito da noção clássica e medieval,


segundo a qual transcendental é aquilo que compete a qualquer ser enquanto ser, isto é, são
as condições às quais deve estar sujeita a qualquer coisa para existir. Para Kant
transcendental é aquilo que compete a qualquer ser enquanto conhecido, isto é, são as
condições às quais deve estar sujeito qualquer objecto para ser conhecido. Por transcendente
Kant entende aquilo que ultrapassa toda experiencia, aquilo que existe fora de toda
experiencia, isto é, a coisa em si, o número (o inteligível). Enquanto o transcendental está
incluindo em toda experiencia, como seu elemento formal, o transcendente está excluído de
qualquer experiência.

Kant começa a análise transcendental precisando a distinção entre sensação e juízo.


Sensação e juízo são duas operações distintas: a primeira produz as intuições, o segundo os
conceito. Assim sendo, segundo Kant, a actividade do intelecto não consiste em intuir, mas em
reflectir e em julgar; não compete ao intelecto apreender novos objectos, mas, reflectindo sobre
as intuições adquiridas pelos sentidos e associadas pela fantasia, julgar o modo pelo qual uma
propriedade pertence a determinado objecto.

A Crítica da Razão Prática

Por razão prática Kant entende a razão na função de ditar à vontade a lei moral. Como
na crítica da razão pura, ele parte do pressuposto de que existe uma lei moral de valor
absoluto, propõe-se determinar com mais precisão qual é esta lei, como é formulada e como é
possível. Vimos que toda a critica da razão pura tem como único motivo que o universal, o
necessário, não procede da experiencia, mas pertence ao sujeito, a priori, e é sobreposto à
experiencia pelo próprio sujeito. A Critica da razão prática abre-se com o mesmo motivo: a lei
moral, como as leis da natureza, não pode ter sua origem nas experiencia (prazer, utilidade ou
felicidade), mas é condição a priori da vontade. A lei moral não pode vir da experiencia porque,

71
se ela viesse da experiencia, seria subjetiva e particular. A lei moral é condição a priori da
vontade. Como o conhecimento é universal e necessário não pelo conteúdo fornecido pela
experiência, mas pela forma a priori, também a moral é universal e necessária não pela matéria
da lei (objeto da acção), mas uma forma a priori, por uma lei pura. Esta forma a priori, esta lei
pura, é, para Kant, o imperativo Categórico: obedece à lei pela própria lei e não por outro
motivo. A obediência ao imperativo constitui a essência da moral.

4.3.9- Gerg Wilhelm Hegel

Hegel nasceu em Estugarda, aos 27 de Agosto de 1770. Terminados os estudos


ginasiais na cidade natal, entrou para o seminário teológico de Tubinga, onde, além do estudo
da teologia, cultivou com assiduidade a filosofia moderna (Hume e Kant). Atacado de cólera,
morreu aos 14 de Novembro de 1831. Hegel escreveu obras como: Enciclopédia das ciências
filosóficas, a filosofia do direito, o espírito do cristianismo e seu destino; Vida de Jesus, A
filosofia da religião, a filosofia da história, a filosofia da arte e a monumental História da
filosofia.

Além dos livros já citados, são úteis para se conhecer a génese do pensamento
filosófico hegeliano também alguns fragmentos do mesmo período: citamos, como exemplo,
um fragmento que se refere à explicação do dogma trinitário, no qual está limpidamente a
delineada a dialéctica do absoluto: o Pai significa a totalidade divina ou, em termos humanos, a
vida da criança em união inconsciente, imperfeita ou não “desenvolvida”, com o todo; o Filho
significa o homem comum, o homem que se desenvolve num estado de separação ou exílio no
seu finito, no seio do mundo das determinações; o Espírito Santo significa a condição do
homem que superou o estado de alienação e efectuou um retorno consciente e completo à
totalidade divina, da qual saíra.15

Hegel considera o seu sistema como o ponto final de toda a especulação anterior, e os
filósofos que o precederam, de Tales a Scheling, como preparadores e precursores da sua
doutrina: com suas respectivas teorias, eles contribuíram para o desenvolvimento da filosofia
até o amadurecimento completo, que se verificou presentemente com seu sistema.

15
Cf. HOFFMEISTER, J., Dokumente zu Hegels Entwicklung, Hamburgo, 1952, I, Citado por BATTISTA Mondin, Ibid. Vol. 3, Pág.
34

72
Os Princípios Fundamentais do Sistema Hegeliano

A intenção de Hegel é, pois, construir um sistema rigorosamente científico, isto é, um


sistema que aproveite todos os dados inegavelmente adquiridos pelas ciências, organizando-
os de modo a tirar deles a história universal do Espirito Absoluta. Para isso Hegel precisou
postular alguns princípios supremos que ultrapassam a esfera científica e pertencem à esfera
filosófica. Apresentam-se, em primeiro lugar, dois princípios lógicos: o de identidade do ideal e
do real e o de contradição.

O princípio de identidade do ideal e do real afirma que “tudo que é racional é real e
tudo que é real é racional”. Pensamento e coisa não podem ser entendidos como esferas
opostas e conflituantes; se fosse assim, a realidade seria incognoscível. Mas o pensamento é
capaz de apreender as coisas. Isso significa que as leis da mente, da logica, são também leis
da realidade: logica e metafisica são a mesma coisa.

O princípio de contradição diz que na realidade não existe nada que seja idêntico a si
mesmo, mas que tudo esta sujeito à dialética da afirmação e da negação. Este princípio
constitui a mola do método hegeliano. Dele falaremos mais adiante. Em seguida vem o
princípio ontológico, principio que é o absoluto (o pensamento, a ideia, a razão, o espirito). O
absoluto é a realidade suprema, origem de toda outra realidade. Nele se realizam
perfeitamente os dois princípios lógicos acima citados.

O Método: A Dialéctica

Para Hegel, o único método adequado para o estudo de uma realidade perpétuo devir é
o método da lógica especulativa ou dialética. Os diálogos de Platão constituem o exemplo e a
prova da validade deste método: um personagem afirma uma teoria, outro a nega e, através do
diálogo cerrado, desenvolve-se uma doutrina a respeito da qual os interlocutores terminam
concordando. O mesmo acontece no devir do absoluto: ele progride pondo a si mesmo (tese),

73
negando o que pôs (antítese), e unindo o que foi posto ao que foi negado (síntese). O método
dialético consta, portanto, de três momentos: tese, antítese e síntese. A tese é o momento do
ser em si; ela põe, afirma uma parte da realidade, negando implicitamente uma outra parte da
realidade, porque toda afirmação inclui uma negação. A antítese é o momento de ser extra se,
“fora de sei”; ela contrapõe, afirmando-a, a parte da realidade implicitamente negada pela tese.
A síntese é o momento da reunião das partes postas pela tese e pela antítese num toda união,
o qual anula as imperfeições dos momentos anteriores, mas conserva a positividade “ser em si
e para si.”16 Na síntese tem lugar a sublimação ou elevação.

CAPITULO V: A IDADE CONTEMPORÂNEA (FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA)

A Filosofia Contemporânea é aquela desenvolvida a partir do final do século XVIII, que


tem como marco a Revolução Francesa, em 1789. Engloba, portanto, os séculos XVIII, XIX e
XX. Note que a chamada "filosofia pós-moderna", ainda que para alguns pensadores seja

16
BATTISTA Mondin, Ibid. Pág. 40-41.

74
autônoma, ela foi incorporada a filosofia contemporânea, reunindo os pensadores das últimas
décadas.

Contexto Histórico

Esse período é marcado pela consolidação do capitalismo gerado pela Revolução


Industrial Inglesa, que tem início em meados do século XVIII. Com isso, torna-se visível a
exploração do trabalho humano, ao mesmo tempo que se vislumbra o avanço tecnológico e
científico. Nesse momento são realizadas diversas descobertas. Destacam-se a electricidade,
o uso de petróleo e do carvão, a invenção da locomotiva, do automóvel, do avião, do telefone,
do telégrafo, da fotografia, do cinema, do rádio, etc. As máquinas substituem a força humana e
a ideia de progresso é disseminada em todas as sociedades do mundo. Por conseguinte, o
século XIX reflecte a consolidação desses processos e as convicções ancoradas no progresso
tecno-científico. Já no século XX, o panorama começa a mudar, reflectido numa era de
incertezas, contradições e dúvidas geradas pelos resultados inesperados.

Acontecimentos desse século foram essenciais para formular essa nova visão do ser
humano. Merecem destaque as guerras mundiais, o nazismo, a bomba atómica, a guerra fria, a
corrida armamentista, o aumento das desigualdades sociais e a degradação do meio ambiente.
Assim, a filosofia contemporânea reflecte sobre muitas questões sendo que a mais relevante é
a "crise do homem contemporâneo". Ela está baseada em diversos acontecimentos. Destacam-
se a revolução copernicana, a revolução darwiniana (origem das espécies), a evolução
freudiana (fundação da psicanálise) e ainda, a teoria da relatividade proposta por Einstein.
Nesse caso, as incertezas e as contradições tornam-se os motes dessa nova era: a era
contemporânea.

Escola de Frankfurt

Surgida no século XX, mais precisamente em 1920, a Escola de Frankfurt foi formada
por pensadores do “Instituto para Pesquisa Social da Universidade de Frankfurt”. Pautada nas
ideias marxistas e freudianas, essa corrente de pensamento formulou uma teoria crítica social
interdisciplinar. Ela aprofundou em temas diversos da vida social nas áreas da antropologia,

75
psicologia, história, economia, política, etc. De seus pensadores merecem destaque os
filósofos: Theodor Adorno, Max Horkheimer, Walter Benjamin e Jurgen Habermas.

Indústria Cultural

A Indústria Cultural foi um termo criado pelos filósofos da Escola de Frankfurt Theodor
Adorno e Max Horkheimer. O intuito era analisar a indústria de massa veiculada e reforçada
pelos meios de comunicação. Segundo eles, essa “indústria do divertimento” massificaria a
sociedade, ao mesmo tempo que homogeneizaria os comportamentos humanos. Saiba mais
sobre os principais acontecimentos da Idade Contemporânea.

Principais Características

As principais características e correntes filosóficas da filosofia contemporânea são:

 Positivismo: é uma corrente filosófica que surgiu na França no início do século XIX. Ela
defende a ideia de que o conhecimento científico seria a única forma de conhecimento
verdadeiro.

 Racionalismo: é uma corrente filosófica que atribui particular confiança à razão humana,
ao passo que acredita que é dela que se obtém os conhecimentos.

Saber de onde vinha o conhecimento era uma preocupação da Filosofia. A tentativa de


responder a essa questão resulta no aparecimento de pelo menos duas correntes filosóficas:

 Racionalismo, que do latim ratio significa "razão";


 Empirismo, que do grego empeiria significa “experiência”.
 A doutrina do racionalismo alega que tudo o que existe tem uma causa inteligível, ainda
que essa causa não possa ser provada empiricamente. Ou seja, somente o pensamento
por meio da razão é capaz de atingir a verdade absoluta.

O Racionalismo baseia-se no princípio de que a razão é a principal fonte de


conhecimentos e que essa é inata aos humanos. Assim, o raciocínio lógico seria construído
através da dedução de ideias, tal como os conhecimentos de Matemática, por exemplo.

76
Racionalismo Cartesiano:

O Racionalismo Cartesiano ou Racionalismo de Descartes é uma referência que se faz


ao pensamento de Descartes - um dos principais pensadores desta corrente. René Descartes
(1596-1650), de quem é célebre a frase: “Penso, logo existo”, lançou as bases do racionalismo.
Para esse filósofo e matemático francês, havia três conjuntos de ideias:

 Adventícias, representadas pelas ideias que abrolham por meio de informações obtidas
pelos nossos sentidos;
 Factícias, ideias que têm origem na nossa imaginação;
 Inatas, que não dependem da experiência e estão na nossa mente ao nascermos.

Conheça as bases do racionalismo em Descartes.

Utilitarismo: é uma corrente filosófica que foi criada no século XVIII pelos filósofos
britânicos Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873). Esse modelo é
caracterizado por ser um sistema filosófico moral e ético onde uma ação útil é denominada
como a mais correta, e daí surge seu nome. Nesse viés, a busca pelo prazer é uma importante
característica. Portanto, as ações almejam um fim onde as consequências sejam focadas no
prazer e na felicidade, bem como na utilidade desses actos. Sendo assim, ela investiga as
ações e os resultados que proporcionam o bem-estar aos seres sencientes, ou seja, aqueles
que de forma consciente possuem sentimentos. De modo empírico os homens são capazes de
regular e escolher suas ações. Assim, torna-se possível e por meia da consciência alcançar o
prazer, em detrimento do sofrimento e da dor.

Niilismo

O Niilismo é uma corrente filosófica que acredita no vazio. O conceito está pautado na
subjetividade do ser, onde não existe nenhuma fundamentação metafísica para a existência
humana. Ou seja, não há “verdades absolutas” que alicerçam as tradições. Do latim, o termo
“nihil” significa “nada”. Trata-se, portanto, de uma filosofia, que apoiada ao ceticismo, é
destituída de normas indo contra os ideais das escolas materialistas e positivas. Note que o
termo niilismo é utilizado de diferentes maneiras. Para alguns estudiosos é um termo negativo,
pessimista, associado à destruição, anarquia e negação de todos os princípios (sociais,

77
políticos, religiosos). Já para outros filósofos, a essência do conceito, se observada de maneira
mais minuciosa, pode levar a libertação do ser humano.

Filósofos Niilistas

Os principais filósofos alemães que abordaram e se aprofundaram sobre o tema do niilismo


foram:
 Friedrich Schlegel (1772-1829)
 Friedrich Hegel (1770-1831)
 Friedrich Nietzsche (1844-1900)
 Martin Heidegger (1889-1976)
 Ernst Jünger (1895-1998)
 Arthur Schopenhauer (1788-1860)
 Jürgen Habermas (1929-)

O Iluminismo abarcou uma renovação nas concepções filosóficas da humanidade. O


modo de entender os homens, a vida e a história das pessoas recebeu novas interpretações
que marcaram fortemente a humanidade. Foi o Iluminismo que estruturou uma tradição
racionalista no pensamento ocidental, segundo o qual se busca explicação para tudo. O
movimento cultural do século XVIII fortificou também a crença no evolucionismo, que
argumenta que a humanidade está em constante processo de evolução guiado em sentido à
razão. Um dos pensadores mais importantes do século XVIII e que gerou uma escola
ideológica na qual vários outros absorveram, reformularam e adaptaram suas ideias foi o
alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel. Este filósofo acreditava no poder do racional e,
consequentemente, que tudo poderia ser explicado através de categorias reais. Tendo em vista
a capacidade de se compreender todas as coisas e ordená-las através de categorias, Hegel
tinha o objetivo de reduzir a realidade em uma unidade que fosse sintética. Sistema o qual que
recebe o nome de idealismo transcendental.

O Hegelianismo, a corrente filosófica que ganhou forma a partir dos pensamentos de


Hegel, ganhou muito espaço na cultura contemporânea. Seu reflexo na humanidade atingiu
vários pontos e foi recebido de várias maneiras. De acordo com o Hegelianismo, haveria uma
identidade entre racional e real, o que significa que a realidade seria absolutamente justificável
em todas as suas manifestações. Um ponto importante para abarcar essa explicação seria o
processo dialético, que permite uma interpretação da realidade através da síntese dos opostos.
O Hegelianismo é uma corrente filosófica desenvolvida por Georg Wilhelm Friedrich Hegel.
Esta corrente gerou também a ideia de uma autoconsciência absoluta, sob a qual a

78
humanidade caminharia em sentido à razão continuamente. Tal pensamento liga-se a outro
que acredita que a história é a realização de um plano providencial no qual os povos
vencedores são integrantes de um evolucionismo de essência divina. A realização terrena
dessa forma divina ocorreria através dos Estados.

A complexidade, que pode até parecer paradoxal, do Hegelianismo gerou uma série de
correntes interpretativas. Seus seguidores se dividem em vários grupos que, por vezes,
rivalizam entre si. O Hegelianismo Ortodoxo dá continuidade aos pensamentos de Hegel sem
alterá-los em nada. O Neo-Hegelianismo retém o idealismo e defende a totalidade do estado.
O Hegelianismo de Esquerda destaca a dialética e critica a religião. E o Marxismo, corrente
mais influente do século XX, conserva toda a dialética, mas dá ao homem o papel de sujeito da
história. Hegel chegou a criticar todas as correntes filosóficas anteriores, argumentando que
eram tendenciosas e não históricas. Suas ideias foram um marco para o século XVIII e de
tamanho impacto que possui seus traços fortemente inseridos na cultura ocidental até hoje. O
idealismo é uma corrente filosófica que defende a existência de uma só razão, a subjetiva. Por
essa abordagem, a razão subjetiva é válida para todo ser humano, em qualquer espaço
temporal ou físico. A partir do pensamento idealista, a realidade se resume ao que é conhecido
por meio de ideias. Há, ainda, diferença entre a realidade e o conhecimento que temos sobre
ela. Ou seja, só podemos dizer que a realidade é racional para nós a partir de nossas ideias.

Idealismo Platônico

O pensamento idealista foi inaugurado por Platão. O filósofo grego resume o idealismo
em "A Caverna". Na alegoria, afirma que as sombras do mundo sensorial precisam ser
superadas pela luz da verdade universal e da razão.

As críticas ao idealismo platônico ocorrem porque as ideias do pensador grego


alcançam o pensamento abstrato. Entre os fatos está a defesa da existência da dualidade na
criação, com a existência do corpo e da alma.

Idealismo Alemão

A abordagem filosófica do idealismo na Alemanha é retomada por Immanuel Kant (1724


- 1804). Começa na década de 80 do século XVIII e se estende até a primeira metade do

79
século XIX. O existencialismo foi uma doutrina filosófica e um movimento intelectual surgido na
Europa em meados do século XX, mais precisamente na França. Está pautada na existência
metafísica, donde a liberdade é seu maior mote, refletida nas condições de existência do ser.

Características

O existencialismo sofreu influência da fenomenologia (fenômenos do mundo e da


mente), cuja existência precede a essência, sendo dividido em duas vertentes:

 existencialismo ateu:negam a natureza humana;


 existencialismo cristão: essência humana correspone um atributo de Deus.

Para os filósofos adeptos dessa corrente, a essência humana é construída durante sua
vivência, a partir de suas escolhas, uma vez que possui liberdade incondicional. Em outras
palavras, a corrente existencialista prega que o homem é um ser que possui toda a
responsabilidade por meio de suas ações. Assim, ele granjeia durante sua vida um significado
para sua existência. Para os existencialistas, a existência humana é baseada nas angústias e
no desespero. A partir da autonomia moral e existencial, fazemos escolhas na vida e traçamos
caminhos e planos. Nesse caso, toda escolha implicará numa perda ou em várias, dentre
muitas possibilidades que nos são postas.

Assim, para os existencialistas, a liberdade de escolha é o elemento gerador, no qual


ninguém e nem nada pode ser responsável pelo seu fracasso, a não ser, você mesmo. O
materialismo dialético é uma corrente filosófica que utiliza o conceito de dialética para entender
os processos sociais ao longo da história. Essa teoria faz parte do marxismo socialista, criada
por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). Além do materialismo, Marx e seu
companheiro Engels (1820-1895) desenvolveram diversas teorias juntos com o intuito de
compreender as relações sociais. Lembre-se que o marxismo é o nome dado as ideias
desenvolvidas pelo filósofo Marx, considerado um dos mais influentes pensadores da
modernidade.

80
Características

Na concepção marxista, a dialética é uma ferramenta utilizada para compreender a


história. A dialética marxista considera o movimento natural da história, e não admite sua
maneira estática e definitiva. Segundo Engels: “O movimento é o modo de existência da
matéria”. Sendo assim, a história quando é analisada como algo em movimento torna-se
transitória, que por sua vez, pode ser transformada pelas ações humanas. Nesse caso, a
matéria possui uma relação dialética com os âmbitos psicológico e social. E assim, os
fenômenos sociais são interpretados através da dialética.

Por meio dessa relação dialética entre o ambiente, o organismo e os fenômenos físicos,
os seres humanos, a cultura e a sociedade criam o mundo, ao mesmo tempo que são
modelados por ele. Vale notar que o materialismo dialético é oposto ao idealismo filosófico que
acredita que o mundo material é um reflexo do mundo das ideias.

Caracterização geral

Karl Marx e o Socialismo

Marxismo: é o conjunto de ideias filosóficas, econômicas, políticas e sociais que foi


elaborado e desenvolvido por Karl Marx (1818-1883) e seu colaborador, Friedrich Engels
(1820-1895) em meados de 1848.

Seus pensadores perceberam que o trabalho é o conceito chave da teoria marxista e


a luta de classes seria “o motor da história”, bem como a produção dos bens materiais seria o
fator condicionante da vida social, intelectual e política. Por outro lado, os “socialistas utópicos”
já teorizavam sobre os meios capazes de solucionar a diferença entre os membros do
proletariado e da classe burguesa dominante. Contudo, foram Marx e Engels os
empreendedores da reflexão sobre as relações humanas e as instituições que regulavam as
sociedades, donde surgem os princípios que fundamentaram o marxismo, também conhecido
como “socialismo científico”.

Portanto, para os marxistas, é necessário atrelar o pensamento à prática revolucionária,


unindo conceito à práxis como forma de transformar o mundo. Contudo, aqueles pensadores
superestimaram a previsibilidade das sociedades humanas, uma vez que os países que se
autoproclamavam marxistas não seguiram à risca os preceitos de Marx. Vale citar que as

81
principais correntes do marxismo foram a social democracia, presente nos países ocidentais
até os dias atuais e bolchevismo, extinto com a queda da URSS. Ademais, a obra basilar do
marxismo é “O Capital”, publicado em 1867, 1885 e 1894, em três volumes, editados por
Engels, a partir dos manuscritos de Marx.

Esta obra permanece como leitura básica e ainda é influente nos campos da filosofia,
bem como em outras áreas das ciências humanas e artes. O marxismo inspirou diversas revoluções e
governos, como a bolchevique de Vladimir Lenine e León Trotsky, na Rússia em 1917 e, após a Segunda Guerra
Mundial, na formação da República Popular da China, no Vietnam, na Alemanha Oriental, na Polônia, Coreia do
Norte e, mais recentemente, em Cuba.

Teoria Marxista:

Desenvolvida em quatro níveis fundamentais, a teoria marxista se agrupa nos níveis


filosófico, económico, político e sociológico, segundo a ideia de “transformação permanente”.
Fica explícito, com essa abordagem, que mesmo quando buscamos definir o ser humano a
partir da linguagem, religião, dentre outros, somente podemos entendê-lo ao compreender as
forças que produzem e reproduzem as condições de existência, donde torna-se basilar a
análise das condições materiais da existência humana em sociedade.

Por outro lado, o marxismo foi gestado a partir de três tradições intelectuais desenvolvidas
na Europa do século XIX a saber:

 o idealismo alemão de Hegel;


 a economia-política de Adam Smith;
 a teoria política do socialismo utópico, de autores franceses.

A partir destas concepções, foi possível estudar a humanidade e o que determinou seu
materialismo. Para Marx, a história seria um processo de criação, satisfação e recriação
contínuas das necessidades humanas. Estas não podem ser compreendidas fora do contexto
histórico e seu determinismo material historicamente localizado. O conhecimento liberta o
homem, por meio da acção deste sobre o mundo, possibilitando, inclusive a acção
revolucionária contra a ideologia dominante, a qual sempre busca retardar e escamotear as
contradições do sistema capitalista. Portanto, o marxismo percebe a luta de classes como meio

82
para o fim dessa exploração, bem como para instituição de uma sociedade onde os produtores
seriam os detentores de sua produção.

Sobre o “Estado”, Marx percebeu que não seria um ideal de moral ou de razão, mas sim
uma força externa da sociedade que se colocaria acima da mesma. Contudo, isso seria, na
realidade, uma forma de garantir a dominação da classe dominante, mediante a manutenção
da propriedade. Assim, o Estado teria surgido concomitantemente a propriedade privada, como
uma forma de protegê-la, o que torna qualquer Estado, por mais democrático que seja,
uma ditadura. Karl Marx e Friedrich Engels demostraram que as ferramentas do Estado para
efectivar sua dominação seriam: a burocracia, a divisão territorial dos cidadãos, bem como
o monopólio da violência, garantida por um exército permanente.

Desse modo, fica implícito que a revolução armada seria um caminho, assim
como socialismo, o qual seria a etapa intermediária entre o Estado burguês e o Comunismo,
quando não mais haveria a divisão da sociedade em classes, bem como seria o fim do modo
de produção capitalista, o qual desapareceria junto com a divisão por classes sociais. Essa
seria a “Ditadura do Proletariado”, caracterizada pela absorção das funções sociais destinadas
ao Estado. Note que desapareciam, também, as características estatais, tal como a burocracia
e o exército permanente. Por fim, o governo proletário cederia em função de uma sociedade
comunista, na qual o Estado e as propriedades seriam extintas permanentemente.

5. 2. Os actuais desafios da filosofia

5. 2. 1. O positivismo (Auguste Comte)

Positivismo: é uma corrente filosófica que surgiu na França no início do século XIX. Ela
defende a ideia de que o conhecimento científico seria a única forma de conhecimento
verdadeiro. A partir desse saber, pode-se explicar coisas práticas, como das leis da física, das
relações sociais e da ética. É notável, no positivismo, duas orientações:

 a orientação científica, que busca efetivar uma divisão das ciências;

 a orientação psicológica, uma linha teórica da sociologia, a qual investiga toda a


natureza humana verificável.

83
A corrente positivista promove o culto à ciência, o mundo humano e o materialismo em
detrimento da metafísica e do mundo espiritual.

História do Positivismo

O termo positivismo foi utilizado como conceito pela primeira vez para designar o
cientificismo enquanto método, pelo filósofo francês, Claude-Henri de Rouvroy, Conde de
Saint-Simon (1760-1825). Porém, será Auguste Comte (1798-1857), seu discípulo, quem irá se
apropriar do termo para denominar sua corrente filosófica.

Auguste Comte, criador do Positivismo

Sua obra fundamental, o "Curso de Filosofia Positiva", escrito entre 1830 e 1842, é o
tratado metodológico positivista. Vale destacar que Comte viveu no contexto do fim do
iluminismo e ascensão do cientificismo, no qual existe a crença de que força do intelecto tudo
pode. Contudo, como morreu alguns anos antes de Darwin publicar “A Origem das Espécies”
(1859) e Marx escrever “O Capital” (1867-1894), ele não se influenciou pelas ideias desses
autores. Enquanto doutrina filosófica, sociológica e política, o positivismo tem a Matemática, a
Física, a Astronomia, a Química, a Biologia e também a Sociologia como modelos científicos.
Isso porque estas se destacam segundo seus valores cumulativos e transculturais.

Por outro lado, podemos dizer que o positivismo é a “romantização da ciência”. Ele
deposita sua fé na omnipotência da razão, apesar de estabelecer os valores humanos como
diametralmente opostos aos da teologia e a metafísica. É também uma classificação totalmente
cientificista do conhecimento e da ética humana, onde se desconfia da introspecção como meio
de se atingir o conhecimento. Assim, não há objetividade na informação obtida, tal como nos
fenômenos não observáveis. Estes seriam inacessível à ciência, uma vez que ela somente se
fundamenta em teorias comprovadas por métodos científicos válidos.

5. 2. 2. O pragmatismo

O pragmatismo surgiu nos Estados Unidos no final do século XIX e começo do século
XX, mais precisamente em 1870 quando um grupo de intelectuais de Cambridge,

84
Massachusetts, se reunia para discutir filosofia. Esse grupo, de maneira irônica se
autodenominou The Metaphysical Club [Clube Metafísico] - uma alusão crítica à metafísica
clássica e ao mesmo tempo uma tomada de posição em defesa de uma metafísica pragmática.
O grupo incluía, entre outros pensadores, William James, Charles Sanders Peirce, Oliver
Wendell Holmes Jr. e Nicholas Saint John Green.

São diversas as versões e caracterizações do pragmatismo, entretanto em que pese


essas distinções entre seus propositores, os pragmatistas têm em comum, dentre outras
questões: a oposição às filosofias especulativas; uma revisão do empirismo; a superação da
filosofia contemplativa pela racionalidade científica; a objeção ao ceticismo, bem como a
formulação de uma nova concepção de verdade. Foi justamente este espírito que mobilizou os
intelectuais de Cambridge, nos anos 70, uma época em que o agnosticismo campeava e a
metafísica continuava presa às questões da imutabilidade do ser e das evidencias racionais
independente da experiência.

O pragmatismo ganhou adepto em todo o mundo, a escola se expandiu e tem


representantes em vários países. Além dos representantes estadunidenses de que estamos
tratando, o pragmatismo obteve referência na Inglaterra através de F. C. S. Schiller (1864-
1937), filósofo que após temporada na Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, retornou
à Inglaterra para desenvolver seu pragmatismo humanista, influenciado por James. Na França,
o pragmatismo também obteve bastante aceitação, vários pensadores concordavam
intelectualmente com os princípios do pragmatismo, dentre eles destacamos Henri Bergson,
Maurice Blondel, Émile Boutroux, Pierre Duhem, Henri Poincaré e Georges Sorel. Na Itália,
precisamente em Florença, formouse um grupo forte e bem articulado de pragmatistas que
ficou conhecido pela publicação, em 1903, da revista Leonardo, fundada por Giovanni Papini e
Giuseppe Prezzolini. Além dessas referências, a filosofia de Dewey e Mead teve um grande
impacto num ramo da filosofia alemã – a antropologia filosófica.

5. 2. 3. Existencialismo (Friedrich Nietzsche, Soren Kierkegaard, Martin Heidegger e Jean


Paul Sartre)

Existencialismo é um termo aplicado a uma escola de filósofos dos séculos XIX e XX


que, apesar de possuírem profundas diferenças em termos de doutrinas, partilhavam a crença
que o pensamento filosófico começa com o sujeito humano, não meramente o sujeito

85
pensante, mas as suas ações, sentimentos e a vivência de um ser humano individual. No
existencialismo, o ponto de partida do indivíduo é caracterizado pelo que se tem designado por
"atitude existencial", ou uma sensação de desorientação e confusão face a um mundo
aparentemente sem sentido e absurdo. Muitos existencialistas também viam as filosofias
acadêmicas e sistematizadas, no estilo e conteúdo, como sendo muito abstratas e longínquas
das experiências humanas concretas.

O filósofo Søren Kierkegaard, do início do século XIX, é geralmente considerado como o


pai do existencialismo. Ele sustentava a ideia que o indivíduo é o único responsável em dar
significado à sua vida e em vivê-la de maneira sincera e apaixonada, apesar da existência de
muitos obstáculos e distracções como o desespero, ansiedade, o absurdo, a alienação e
o tédio.

Filósofos existencialistas posteriores retêm esta ênfase no aspecto do indivíduo, mas


diferem, em diversos graus, em como cada um atinge uma vida gratificante e no que ela
constitui, que obstáculos devem ser ultrapassados, que factores internos e externos estão
envolvidos, incluindo as potenciais consequências da existência ou não existência de Deus. O
existencialismo tornou-se popular nos anos após as guerras mundiais, como maneira de
reafirmar a importância da liberdade e individualidade humana.

Friedrich Nietzsche (1844-1900)

Filósofo alemão, o niilismo de Nietzsche está expresso em suas obras em forma de


aforismos (sentenças curtas que expressam um conceito). Seu pensamento passou por
diversos temas desde religião, artes, ciências e moral, criticando fortemente a civilização
ocidental. O mais importante conceito apresentado por Nietzsche foi o de “vontade de
potência”, impulso transcendental que levaria a plenitude existencial.

Além disso, analisou os conceitos de “apolíneo e dionisíaco” baseado nos deuses gregos da
ordem (Apolo) e da desordem (Dionísio).

Soren Kierkegaard (1813-1855)

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Filósofo dinamarquês, Kierkegaard foi um dos precursores da corrente filosófica do
existencialismo. Dessa maneira, sua teoria esteve pautada nas questões da existência
humana, destacando a relação dos homens com o mundo e ainda, com Deus. Nessa relação, a
vida humana, segundo o filósofo, estaria marcada pela angústia de viver, por diversas
inquietações e desesperos. Isso somente poderia ser superado com a presença de Deus. No
entanto, está assinalada por um paradoxo entre a fé e a razão e, portanto, não pode ser
explicada.

Martin Heidegger (1889-1976)

Heidegger foi filósofo alemão e discípulo de Husserl. Suas contribuições filosóficas


estiveram apoiadas nas ideias da corrente existencialista. Nela, a existência humana e a
ontologia são suas principais fontes de estudo, desde a aventura e o drama de existir. Para ele,
a grande questão filosófica estaria voltada para a existência dos seres e das coisas, definindo
assim, os conceitos de ente (existência) e ser (essência).

Jean Paul Sartre (1905-1980)

Filósofo e escritor francês existencialista e marxista, Sartre focou nos problemas


relacionados com o “existir”.
Sua obra mais emblemática é o “Ser e o Nada”, publicada em 1943. Nela, o “nada”,uma
característica humana, seria um espaço aberto, no entanto, baseada na ideia da negação do
ser (não-ser).
O “nada” proposto por Sartre faz referência a uma caraterística humana associada ao
movimento e as mudanças do ser. Em resumo, o “vazio do ser” revela a liberdade e a
consciência da condição humana.

5. 2. 4. Axiologia

O conceito da palavra etimologia vem do grego clássico, axios, algo que deve ser
considerado, valorizado pela natureza do seu próprio conceito, essa a primeira designação.
Logos vem de Ciência, o conceito derivativo daquele que é pela sua exatidão. O que significa
teoria da explicação de algo, de um determinado objeto ou até de uma formulação
epistemológica. Mas no plano prático também pode ser a explicação dos valores em geral e em
particular dos valores morais, como pode ser entendido os sistemas da ética nas relações
sociais.

87
Em definição a etimologia axiologia foi definida por Banden W. Windelband 1863-1915.
No primeiro momento da evolução do conceito derivou-se da Filosofia de Kant, o que se
entende de certo modo a seguinte explicação. Compreende-se que o conhecimento por
formulação tem por origem não nas coisas em si, sejam quais forem os objetos em estudos,
para os sujeitos do conhecimento, porque são diversificados.

Mas o conhecimento se realiza antes de tudo por meio da apreensão digamos das
realidades na relação entre a definição do que a realidade é em si, sua natureza ontológica e a
relação de um ideal absoluto. Embora tudo isso posto como valor dedutivo e não indutivo,
axiologicamente a perspectiva não poderá ser necessariamente empírica, o uso fundamental
do método observacional. Colocado, portanto, o valor inicial, o desenvolvimento do método, o
que significa a relação do referido, com apreciação do julgamento, com a finalidade de
conhecer a realidade de um objeto, um determinado ato e sua evidência.

5. 2. 5. Fenomenologia (Edmund Hurssel)

Tal como originalmente formulada na Alemanha por seu fundador Edmund Husserl
(1859-1938), a fenomenologia pode inicialmente ser caracterizada como o estudo descritivo
“despreconceituoso” (no sentido da palavra de “sem um conceito prévio”) do que aparece na
consciência, precisamente na maneira como aparece. “A discussão de intencionalidade de
Brentano inspirou Husserl, que viu nela a possibilidade de uma ciência da consciência pura,
removida de construções causais e naturalísticas“ (Moran & Mooney, 2002, p. 12). Segundo o
slogan do próprio Husserl (1985), a fenomenologia tem como objetivo “voltar às coisas
mesmas”, sendo, em primeira instância, descritiva, buscando clarificar temas despojados de
conceitos preconcebidos, tal como aparecem.

Husserl fala com frequência de descrição fenomenológica como clarificação, iluminação,


no sentido de elucidar o significado do fenômeno em questão. Tendo em vista sua
preocupação em tratar o fenômeno em sua totalidade e concretude, a fenomenologia se opõe
ao naturalismo, ao reducionismo, ao cientificismo ou outras formas de explanação que
desloquem a atenção da maneira como aparece o fenômeno em questão. A fenomenologia de
Husserl critica todas as formas de objetivismo, focalizando especificamente as maneiras como
os objetos são constituídos na experiência do sujeito, a estrutura e qualidade do objeto tal
como experienciado pelo sujeito.

88
No primeiro Husserl – o das Investigações Lógicas (1901) –, estamos falando da
experiência da consciência no mundo, sua análise transcendental da estrutura da consciência
pela busca das essências, que permanece, ainda hoje, como introdução mais popular do
pensamento husserliano. Isto explica o fato de ainda hoje, quando se fala de fenomenologia,
frequentemente se estar falando da fenomenologia transcendental de Husserl em sua busca
das essências na estrutura da consciência. Para Husserl (1985), a consciência não é uma
substância (alma), mas uma atividade constituída por atos (percepção, imaginação, volição,
paixão etc.) com os quais se visa a algo. Husserl chama a esses atos de noesis. Aquilo que é
visado pelos atos é nomeado por Husserl de noema. Cabe à fenomenologia revelar o que há
de essencial nestes atos. O traço essencial da consciência é a intencionalidade: toda
consciência “é consciência de algo”, diz Husserl.

5. 2. 6. Personalismo (M. Buber Mounier)

O conteúdo sobre o Personalismo aborda a relação entre a filosofia personalista de


Mounier e a formação humana. O questionamento que a direcionou foi: quais as contribuições
do pensamento personalista de Mounier para uma formação humanizadora? A metodologia
que utilizamos foi a pesquisa bibliográfica com análise das principais obras deste pensador e
obras de comentadores do seu pensamento. Buscou-se compreender o contexto da
constituição do pensamento de Mounier, sua história de vida e seu próprio pensamento
personalista.

A Europa, no início de século do século XX, passou por várias transformações


sociopolíticas e econômicas. Presenciou duas grandes guerras, sofreu suas implicações, como
fome, miséria e precariedade de condições de vida. Foi um período de incertezas, em virtude
dos efeitos da Grande Depressão, a partir da crise de 1929; do avanço desenfreado do modelo
econômico capitalista e das instaurações de governos totalitários, como os socialistas e os
comunistas. Nesse contexto, Mounier olhou seu tempo face a face, tomando consciência de si,
e afrontouo de modo a lutar pela mudança – “Refazer a Renascença”.

O personalismo de Mounier é um modo de vida, uma inspiração que tem como


experiência fundante a afirmação do valor absoluto da pessoa humana e que compreende uma
perspectiva humanizadora que promove o contínuo vir a ser cada vez mais humano mediante o
despertar da pessoa em comunidade. Este despertar é o reconhecimento do chamado

89
espiritual ao ser mais humano. É nesse sentido que o novo humanismo em Mounier consiste
em refazer a Renascença, que é um renascimento do homem concreto, situado no e em
relação constitutiva e axiológica com o eu- Tu, em totalidade, implicado a uma revolução que
forme uma nova compreensão de pessoa e de comunidade, uma chamada à libertação
humana.

A valoração humana que se encontra na dialética axiológica presente na imanência e na


transcendência se torna um processo de auto elevação humana que se caracteriza pela
metafísica, tendo primazia a axiologia humana. No refazer a Renascença, há uma proposta
político-econômico-social centrada na pessoa, para cuja formação tudo deve convergir. Para se
compreender a humanização do homem, é necessário perpassar a tríade de seu volume total,
de seu desenvolvimento pleno – encarnação, vocação e comunhão –, caracterizado na
estrutura do universo pessoal em processo histórico. Assim, não se pode compreender a
formação humanizadora personalista de uma nova civilização sem a relação chamada-
resposta-metafísica que se evidencia no afrontamento e engajamento. A formação
humanizadora personalista apresenta-se no realismo espiritual – transcendência humana e
divina –, que está em contraposição ao materialismo e ao espiritualismo: a dimensão axiológica
do realismo cultural.

O ato de conhecer o mundo a partir do realismo espiritual diz respeito ao ato de elevar-
se da horizontalidade do ser humano, um elevar-se a partir das condições de encarnação, que
caracteriza a união com o mundo espiritual. Desse modo, as características do personalismo
de Mounier que contribuem para a formação comprometida com a pessoa como valor maior
são a perspectiva do acabamento da vida pessoal como sendo uma ação ético-política da
comunidade, a educação personalista (que tem como base binomial “liberdade e
compromisso”), a cultura como transcendência e superação e o afrontamento.

CAPITULO VI: INTRODUÇÃO À FILOSOFIA AFRICANA


Caracterização geral

1. Introduções Interrogatória da filosofia africana

A asserção de que a história não teve o seu desenvolvimento no continente africano


consiste em uma ideologia construída no período colonial europeu de enorme influência na
construção mental dos povos ocidentais. Por consequência, invisibilizou as contribuições

90
científicas e filosóficas do continente africano para a humanidade. Com isso, a desconfiança e
resistência para a Filosofia Africana é um fato que encontramos no âmbito acadêmico de
maneira que a proposição de um estudo sobre tal tema fornece uma dificuldade muito maior
em comparação àqueles que tratam de temas habituais. Na tentativa de atenuar tal dificuldade,
o presente minicurso explicitará alguns tópicos importantes para evidenciar a Filosofia Africana
no interior de uma história filosófica própria. Para isso, autores como Marcien Towa, Paul
Houtondji, Cheikh Anta-Diop, Theophile Obenga, Valentin Y. Mudimbe, Mogobe Ramose e
Achille Mbembe são essenciais para compreender a consolidação da Filosofia Africana
enquanto uma produção filosófica independente e dialógica com outras tradições.

1. 1. Existe filosofia africana?

Nas sendas académicas quando o assunto é falar de África, mas sobretudo da sua
filosofia tornou-se quase inevitável a repetição da sempre mesma questão: existe uma Filosofia
Africana? Ou em outras palavras: os africanos têm uma filosofia?

Estas questões a alguns anos atrás eram incontornáveis, porém, hoje em dia, é da opinião
geral que todos os povos, independentemente da sua localização geográfica e da sua
integração nos grandes sistemas mundiais, possui uma filosofia, isto é, um modo de entender-
se a si próprio e de orientar a vida para a realização das mais básicas e fundamentais da vida.

Outros ainda questionam se o que a África reclama como filosofia não seria simplesmente um
pensamento?

Seja como for, a África não pode esperar que uma outra entidade (externa) venha outorgar-lhe
o estatuto da habilidade para filosofar.

Portanto, aqui vamos de um modo sucinto apresentar a discussão travada por alguns
pensadores africanos em defesa de uma Filosofia Africana. A existência de uma Filosofia
Africana é um tema que sempre vem à ribalta quando se pretende falar da mesma enquanto
uma disciplina. A grande problemática é indagar se existe realmente uma filosofia que seja do
africano ou ele tem simplesmente um pensamento. É face a esta problemática, que aparecem
muitos autores com pontos de vista diversos. Segundo o filósofo e jornalista, Filomeno Lopes,
no seu livro Filosofia à volta da fogueira, o pensamento africano contemporâneo entre memória
e futuro, existe certo modo de filosofar em África que é chamado Etnofilosofia.

91
E para esta corrente existe Placide Tempels, Alexis Kagame que se baseiam na
Ideologia e Etnologia, enquanto Hountondji e Ebossi-Boulaga pertencem à corrente crítica da
Etnofilosofia. São estas correntes que nos ajudam a perceber se se trata realmente de filosofia
ou pensamento africano. Tempels sustenta a tese da existência duma Filosofia Africana com
características bem definidas e inconfundíveis. Como diz Ngoenha, a tese de Tempels é que “o
comportamento dos bantu deve ser compreendido como um comportamento racional apoiado
sobre um sistema coerente de pensamento” e isto levará à afirmação da humanidade do negro
em restauração da dimensão infantil a que o colonizador tinha reduzido ao negro.

Tempels tem uma tese precisa: quem pretende que os primitivos não possuem um
sistema de pensamento, nega-lhe a participação à categoria dos homens. “Tempels descobre
nos povos negros, um sistema de princípios, que é um conjunto de ideias, um sistema lógico,
uma filosofia completa do universo, do homem e das coisas que o circundam, da existência, da
vida, da morte e da sobrevivência. Portanto, uma ontologia logicamente coerente”. Vê-se
também que se existe uma filosofia do negro, ela é diferente da europeia, a filosofia do negro é
lógica sim, mas uma logicidade menor.

Alexis Kagame acredita na existência de um sistema filosófico bantu e tomando por base
a filosofia Aristotélica, desenvolve a sua filosofia na base de “uma análise gramatical rigorosa
das estruturas linguísticas duma língua particular, o Kiryarwanda”, comochave para
compreender a maneira bantu de conceber o universo.Comparando as categorias bantu e as
aristotélicas chegou a quatro categorias metafísicas bantus que correspondem às dez
categorias de Aristóteles. Diz Kagamé: “se existe uma filosofia no nosso substrato cultural, ela
foi inevitavelmente formulada através da língua”. Deste modo, Tempels e Kagame, criaram a
etno-filosofia que se limitou a prolongar os esforços dos etnólogos subordinando a filosofia à
religião e à política.

Um dos maiores críticos da etno-filosofia é Paulin Hountondji. Embora ele se contradiga,


acredita na existência duma filosofia africana, porém, nega o uso filosófico da etnologia e o uso
mítico das ideologias, pois o trabalho dos etnógrafos e ideólogos não é pessoal, responsável
própria a toda a investigação filosófica. Para ele existe filosofia quando há filósofos singulareso
que significa lançar-se pela via da procura livre e permanente da verdade, verdade que deve
ser espressa e nao completada. Embora decadente, afirma a existência de Filosofia africana e
ela se desenvolve do mesmo modo de todas outras filosofias do mundo. Ela se desenvolve sob
forma de uma literatura. “A filosofia não é etnológica (sistema de pensamento implícito), mas

92
literária (conjunto de textos) ”. Hountondji chama filosofia africana a um conjunto precisamente
de textos escritos por africanos e qualificados pelos seus próprios autores como filosofia.Para
ele a corrente etno-filosófica não passa de um pensamento, por estar baseada na etnologia e
antropologia. A Filosofia existe como literatura, não existe nem a filosofia ocidental (europeia)
nem africana espontânea.

Portanto, a questão duma filosofia africana ou pensamento tem a ver com a maneira de
como é abordada ou discutida, muitos autores defendem a existência de uma filosofia, embora
alguns restrinjam o uso do termo filosofia aos gregos e como projecto do futuro, é o caso
concreto da corrente hermenêutica que alega assim a existência de uma chave de pensamento
africano. Sabe-se bem que, etimologicamente filosofia significa amor a sabedoria. A
experiência humana mostra-nos que esta marcha rumo a sabedoria, onde quer que haja o ser
humano, há também a experiência humana, e todos seres humanos adquiriram e continuam a
adquirir sabedoria ao longo das diferentes fases da vida. Neste sentido a filosofia existe em
todo lugar. Ela seria omnipresente e pluriversal apresentando fases e faces decorrentes de
experiências humanas particulares. Com este raciocínio a filosofia Africana nasceu em tempos
imemoriais e continua florescente em nossos dias.

A questão das origens da filosofia Africana não pode ter como base o raciocínio exposto
no parágrafo acima. Ela surge a partir do outro fundamento e perspectiva.A questão do
surgimento da Filosofia africana parte de fundamentos e perspectivas. O fundamento da
questão pertence à autoridade; a autoridade de definir o significado e o conteúdo da filosofia.O
exercício desta autoridade situa a questão no contexto de relações de poder. Quem quer que
seja que possua a autoridade de definir, tem o poder de conferir relevância, identidade,
classificação e significado ao objecto definido.

O segundo fundamento da questão da origem da filosofia Africana diz respeito a


perspectiva. Perspectiva como o ponto de vista adoptado para definir filosofia. Aqui a filosofia é
entendida como disciplina académica com seus princípios e métodos especiais. Aqui há uma
modificação do significado etimológico da filosofia. Aqueles que em busca de poder, endossam
esta autoridade baseada em definições convencionadas de filósofos é que são considerados
filósofos profissionais. É sob o disfarce da ciência e do profissionalismo que se duvida sobre a
origem da filosofia Africana. A atenção voltada para a história da filosofia deveria sempre
lembrar cuidadosamente da dívida da filosofia grega para com o Antigo Egipto africano. Ela
deveria também levar em consideração o mercado escravocrata transatlântico que separou

93
forçosa e fisicamente os povos de África de sua terra natal e seus parentes. A diáspora
africana é, portanto, parte integrante da origem da filosofia africana. É na diáspora que os
africanos tentam construir uma base cultural sólida que desse uma via de retorno às origens
africanas por meio de estudantes africanos que estavam em Paris (África dos etnólogos ou dos
poetas negro - americanos).

Nesta luta pela originalidade está presente o uso do nome “África” ou “Africano”. A
redescoberta dos valores negros e a tomada de consciência, através dosmovimentos da
Negritude e do Pan-africanismo, ajudou a África a forjar a sua emancipação política,
intelectuale lutar pela conquista das independências dos países africanos. O grande objectivo
era a unidade espiritual e política da África com pretexto de criar um estado único, e com
condições de prosperidade para todos os africanos. O movimento da Negritude‫ ٭‬foi idealizado
fora da África principalmente na Françaonde adquiriu corpo e sistematização. São os negros
africanos na diápora que ja intelectualizados se embrenham na criação de uma base litérária e
filosófica para através da qual fazer passar os seus sentimentos em relação a África submetida
ao colonialismo e a escravatura. Contrapondo-se à filosofia europeia eles buscaram uma forma
própria de construir seu mundo, contextualizando-o às realidades próprias do homem negro.

O movimento Negritude foi usado para a construção da Identidade e Liberdade Africanas. A


Identidade como pressuposto para a Liberdade passa necessariamente pelo conhecimento da
história de África (Pré e colonial) incluindo o seu património documental e a memorial, mesmo
dos soberanos e seus poderes absolutos. Esta maneira torna-se o modo de construir uma
identidade para opor ao vazio histórico e civilizacional tanto propalado pelo colonizador durante
séculos. Assim, compreende-se o facto de alguns autores, fazerem referência aos grandes
reinos e cidades africanas (Tombuctu, Mwenemotapa, Sokoto, Zaire, Kano, Malí, Songhai,
Ghana, Abissínia, Zimbabwe), funcionando como ícones de exaltação e identificação com
grandeza e um brilho pré-colonial, remetendo desse modo a culpa colonial do apagamento e
da decadência.

“Eram considerados sem história, idólatras, fetichistas, além de brutos, primitivos,


cafres, e selvagens, investigadores e intelectuais escreveram procurando mostrar o lado
negativo dessas concepções. Foi nisto que Gorbeneau escreveu sobre “As Diferenças das
Raças”, Spencer, Laponge argumentaram que a raça branca estava adiantada e a negra
atrasada. Osvald Spengler sustentava que as civilizações desenvolvem-se, atingem o cume e
decaem em ciclos fechados, isolados das outras e Lévy-Bruhl falou da mentalidade pré-lógica”.

94
Uma prática adoptada foi a valorização cultural no contexto da desvalorização e negação a que
os negros tinham sido sujeitos. Quanto menos inteligente é o branco, mais o negro lhe parece
um animal-dizia André Gide- e –Frantz Fanon chega a afirmar que o negro é uma criação do
branco, isto no sentido de, com o seu racismo, obrigá-lo a dar-se conta da sua diferença e
sentir desprezo por ser negro.

A busca de identidade e da liberdade enquadra-se no contexto da escravatura,


sobretudo nos EUA e nas grandes metrópoles mundiais dos finais do século XIX. É aíonde o
negro vive uma situação de extremo racismo e humilhação. Contudo, o que o impulsiona a lutar
pela reconquista da sua identidade é o facto de descobrir nesse mesmo contexto, que existem
também brancos segregados na sua própria pátria. Dai o negro africano enveredar pelo árduo
caminho da formação cultural, política e científica como forma de adquirir subsídios para o
ajudarem na sua missão. A negritude foi um dos meios encontrados pelos negros para melhor
conhecerem a história, da África e do mundo a fim de se afirmar na real e inteira realidade da
sua condição. A Negritude é uma forma de Ressurgimento da consciência e do orgulho de ser
negro o que conduzirá ao surto de nacionalismos que desembocarão nas independências
africanas dos anos 60.

“O Renascimento Negro‫ ٭‬desencadeou um movimento muito mais amplo de consciência


histórica, cultural e política, por sua vez propulsor de uma autêntica revolução política que leva
o negro a passar de vítima a motor da história”. William Du Bois 1868-1963 engajou-se na luta
pelos direitos civis e contra a segregação racial. Esteve na organização dos primeiros
congressos Pan-Africanos. Mesmo proclamando a glória e orgulho de ser negro de, Du Bois
debateu-se com o problema da “integração do negro no contexto americano, por isso mesmo,
na sua visão, a luta que se tinha a enfrentar era na alma do negro, ela devia encontrar uma
autêntica identidade própria”. Ele tem em vista apagar a imagem frustrante do negro criado
pelo branco, “isto é, de um homem tábua rasa, homem sem história, e, portanto, sem
civilização. Para tal, ele religa à África fazendo erguer os já antigos impérios e reinos exaltando
sua grandeza do passado, abafada pela exploração europeia”. Edward Wilmont Blyden“nasceu
na Ilha caraíbica de St. Thomasem Agosto de 1832. Blyden era puramente negro, facto
significante para as suas ideias não muito amáveis em relação àqueles a quem ele considerava
terem «sangue misturada»”.

Personagem de grande importância para a cultura Negra do séc. XIX podendo ser
considerado o pai do pensamento político Africano. “O ponto de partida como para os

95
escritores da Negritude será a procura de um passado sobre o qual fundar a própria dignidade
humana. Com as suas obras queria provar que a raça negra tinha uma história e uma cultura
das quais podia se orgulhar”. Nas suas obras: Voice From Bleeding Africa (1856)descreve uma
lista dos negros ilustres como é o caso do teólogo e linguista, Capitein, o libertador de
HaitiToussaint Louverture e o líder abolicionista Americano Frederick Douglass. Em A
Vendication of the Negro Race (1857), refuta as teorias acerca da inferioridade racial do negro
e em The Negro in Anciet History (new York, the Methodist Quarterly (1869), sustentava que os
negros tinham desempenhado um papel importante na edificação da civilização egípcia).
Também é sua a tese do regresso à África.

Kwame Nkrumah (1909: Costa de Ouro-1972: Bucareste), foi um líder político africano e
um dos fundadores do movimento Pan-africanismo. Grande teórico da unidade Africana a qual
dedicou um livro: A África Deve Unir-se. Ele reclama a “unificação política que faria de África
uma só nação com um governo central (…) sob a direcção dum governo continental, ao qual
caberia a decisão nos sectores chaves: defesa, negócios estrangeiros, economia”.Só o
governo central permitiria estabelecer uma única linha política.Defendeu também o
consciencialismo.

Molefi Kete Asante– nasceu em 1942 na Etiópia.Cristão, filósofo e político. Desenvolveu


e liderou a corrente de pensamento: Afrocentricidade* que nasceu na America do Norte.
Dedicou boa parte da sua obra teórica para fundamentar gnosiologicamente e axiologicamente
a ideia da Afrocentricidade.

John Mbiti – nasceu em 1931Quénia. Teólogo, filósofo e Padre anglicano.


EscreveuAfricanReligionsandPhilosophy defende que a “filosofia Africana é um pensamento
especulativo que subjaz nos provérbios, nas máximas, nos costumes, que os Africanos de hoje
herdaram dos seus antepassados através da tradição oral”. Portanto, a função do filósofo
Africano é a de coleccionar, interpretar e difundir os provérbios, contos folclóricos, mitos.

Paulin Hountondgi –nasceu em Benim. Escritor, filósofo e político. Publicou a


obraAfricanPhilosophyMithandReality (1974), sustenta que a filosofia Africana ocupa-se dos
desenvolvimentos modernos no conhecimento e na reflexão. Defende que a “filosofia Africana
é resultado do pensamento abstracto de pensadores Africanos individuais tanto tradicionais
como modernos. A filosofia Africana, é um tipo de literatura produzido por Africanos e que
versa sobre problemas Africanos”. O problema de fundo da filosofia africana reside

96
essencialmente na análise laboriosa dos textos que temos a disposição e não nos mitos, no
pensamento implícito ou no círculo misterioso das nossas almas.

Alexis Kagamé – nasceu em 1912 no Ruanda e morreu em 1981. Historiador, filósofo.


Escreveu: A Filosofia Bantu Ruandês do Ser. Como Temples,Kagamé crê na existência de um
sistema filosófico Bantu. Na estrada traçada por Tempels, vai desvendar o sistema ontológico
Bantu, inspirado na filosofia Aristotélica. A partir da análise gramatical rigorosa das estruturas
linguísticas desenvolve a sua reflexão vai a partir do Kiryarwanda. Comparando as categorias
bantu com as de Aristóteles e chegou a quatro categorias metafísicas bantus que
correspondem a dez categorias Aristotélicas:

 Iª “Umuntu – designa o Homem, isto é, o ser dotado de inteligência;


 IIª Inkintu – são as coisas, os seres privados de inteligência. Estas duas categorias -
Umuntu e Inkintu – correspondem a categorias da substancia;
 IIIª Hantu – que conota, ao mesmo tempo as categorias do lugar e do tempo; e
 IVª Ukuntu – que significa a modalidade a qual engloba todas as outras categorias
enumeradas por Aristóteles”.

Julius K. Nyerere- nasceu na Tanzânia em 1922 e morreu em 1999.Mantendo-se fiel à sua


origem e cultura africanas, encontrou no cristianismo a motivação e a força para exercer o
poder como serviço humilde ao seu povo. Estudou na Uganda e depois em Edimburgo e
tornou-se MasterofArtsandPoliticalFormation. Enveredou pela política lutando pela obtenção da
independência do país da dominação inglesa. Foi o primeiro presidente da Tanzânia.
Pela Carta Magna do Socialismo AfricanoNyerere lançou um projecto de uma sociedade
igualitária que de algum modo era inspirado pela profunda visão que tinha da fé. A ideia sa
«sociedade igualitária» revelava o seu não-alinhado, inspirado na tradição africana da família
alargada, ujamaa, e assentava na unidade e na independência nacional. Era chamado
«Mwalimu», que quer dizer professor. Esta foi sua profissão antes de entrar na política.
Promoveu um parlamento multirracial e multi-religioso.

Era visto como Mestre devido ao seu carácter extraordinário, vontade inflexível e de uma
transparência a toda a prova. Por estas e mais qualidades cristãs foi declarado «Servo de
Deus» em Roma no dia 1 de Janeiro de 2006, declaração que marcou o início oficial do seu
processo de beatificação. A filosofia é um modo de estar, de pensar, de responder de forma
tanto exaustivo aos próprios problemas e aos dos outros. Também tem a ver com produção de

97
conhecimentos válidos e sistematizados dentro das normas científicas estabelecidas e
aprovadas por certas entidades competentes.

Portanto, a maneira de agir africano, de ver a sua cultura e a sua posição em relação ao
futuro, leva-nos a admitir que em áfrica existe uma filosofia embora não abundada por uma
literatura extensa como a europeia. Mesmo não satisfazendo as pretensões dos que nos
pretendem ou não reconhecem uma filosofia africana, podemos notar que mesmo de soslaio
temos já pensadores e filósofos que estão se firmando na árdua tarefa de prover subsídios
necessários para uma afirmação própria africana de uma filosofia que nos identifique.

1. 2. Filosofia em África ou filosofia africana

São sabidas as controvérsias que existem em torno da questão das filosofias “nacionais”
onde várias vozes impugnam a existência ou não existência de uma filosofia portuguesa. Da
mesma forma, o debate sobre a existência de uma filosofia brasileira mantém-se bastante
acesa, tal como a discussão filosófica e literária sobre a existência de uma filosofia
moçambicana ou de uma filosofia africana. O que se coloca em questão, de uma forma geral,
não se atendendo às especificidades e problemáticas filosóficas de cada país, é se existe uma
filosofia original “nacional” que responda às grandes questões universais e se a mesma é ou
não sistematizada ou “filosófica”.

As opiniões variam, nos vários países que falam a língua portuguesa1 , e as


perspectivas são multilaterais e multifacetadas. Não pretendemos, com este artigo, reflectir se
a filosofia existe ou não quando surge como resposta aos problemas de um país em particular,
ou se podemos considerar filosofia a ideologia que uma nação possui ou possuíu no passado,
ou mesmo se consideramos filosofia uma forma de pensar não sistematizada e não
convencional. O que se pretende, tendo em conta a especificidade de cada país e as suas
raízes histórico-culturais, políticas e sociais, é atender às suas controvérsias filosóficas que, de
uma forma geral, são uniformes em todos os países que também falam a língua portuguesa. O
problema português é também e afinal um problema brasileiro, mas também é africano, como
se comprova com o pensador Moçambicano Severino Elias Ngoenha:

Afinal, existe uma filosofia africana ou filosofia em África? Existe uma filosofia
portuguesa ou filosofia em Portugal? Existe uma filosofia brasileira ou filosofia no Brasil? Existe
uma filosofia angolana ou uma filosofia em Angola? As mesmas questões são direccionadas

98
para Cabo Verde, Moçambique, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor, entre outros. É
muito importante realçar que este artigo não discute a existência ou não de uma filosofia
específica de cada um dos países que falam a língua portuguesa. Existindo ou não uma
filosofia em algum destes países, o que este trabalho apenas pretende assinalar é a sua
controvérsia comum contínua em torno desta temática. Contudo, a alegada falta de
sistematização filosófica comum a todos os países de língua portuguesa, se assim quisermos
chamar, ou a polémica alimentada em torno desta temática, não representa, a nosso ver, uma
desvantagem. Se partirmos da premissa de que existe efectivamente uma controvérsia em
torno da existência de uma filosofia em cada um destes países, o mínimo que podemos
constatar é que todos estes países são unânimes quanto ao facto de terem dúvidas em relação
à existência de uma filosofia em particular.

6. 2. As principais correntes da filosofia africana

Como já vimos, os aspectos, principais tomadas como base considerada filosofia africana
são os da tradição oral do conhecimento, da chamada emofilosofia, e a ideologia. Foi nesta
última que se cultivou a consciencialização para a independência dos Estados africanos e
contra a dominação colonial foi esta consciencialização que levou o surgimento no continente
de ideias políticos políticas já estudadas no ocidentes, e através das quais os intelectuais
africanos fundamentaram todas as reacções que conduziram às revoluções independentistas
dos países africanos. Tais ideias, por nascerem da infusão entre a imposição colonial e a
reacção dos africanos, deram vida a tendências socialistas, nas quais se incluíam ideias
revolucionárias: igualdade, unidade, vitória.
De igual modo as ideias políticas ocidentais em África fizeram surgir tendências de uma
sociologia política em África, através da qual se esculpir a «identidade africana». À época na
impossibilidade de se revoltarem directamente, a consciencialização foi a via que permitiu
explicar aos africanos a necessidade de dar atenção às suas tradições culturais, aos seus
modos de vida, onde jazem a sua liberdade, a sua igualdade, a sua identidade, a sua força
para a cisão. Lembremos, no entanto, que uma filosofia não pode nascer directamente de uma
ideologia, mas sim da relação gnosiologia que o ser humano, na sua dimensão de investigador,
de estudioso, realiza entre o seu pensamento e as coisas do mundo.
Mesmo que seja consensual falar ainda de uma filosofia africana, antes de uma
«problemática da filosofia» e de uma «filosofia em África», actualmente consideradas

99
«correntes» da filosofia africana. Mesmo subjazendo a algumas destas correntes aspectos
ideológicas, é importante que as novas gerações as conheça. De falto, as anteriores gerações
de africanos tiveram de lutar contra o colonialismo, e assim impuseram a sua identidade
consciência social e cultural, traduzidas na designada etmofilosofia, ou em ideias do
socialismo, do comunismo, traduzidas no designado pan-africanismo, nas designadas
negritude e filosofia da libertação, etc.
Estas orientações garantiram a muitos africanos a esperança de viver na própria terra
como africanos, como angolanos. Estas correntes fizeram renascer todas as ideias possíveis
sobre os elementos culturais e o valor das tradições africanas, então em desuso forçado e
quase total. Estas ideológicas unificaram o pensamento negro no sentido da sua própria
defesa. As actuais gerações africanas não devem, de facto afastar-se das suas tradições dos
seus hábitos, usos e costumes. Mas também se torna necessária uma visão científica sobre os
mesmos, de modo a construir um novo olhar, uma nova atitude em relação à realidade que
vivemos no presente.
Assim, é importante compreender que as nossas «culturas tradicionais», depois de
períodos de desuso, não podem ser recuperadas integralmente; não é possível dar um salto no
tempo e transportar para um presente de globalização económica, social e até cultural, praticas
ancestrais. é importante pensar antes num «renascimento africano» dentro desta globalização.
é importante compreender que é possível fazê-lo mesmo contando com a filosofia a e ciência
prevalentes actualmente, já que os meios e os fins a atingirmos na filosofia ocidental: a pessoa
humana como meio e fim da ciência e da filosofia, que devem ter o intuito de garantir a sua
dignidade.
Renascer é mantermo-nos sempre africanos, ter orgulho e estima em sermos africanos,
admitindo-o na nossa identidade como um valor, social e intelectualmente impar no curso da
humanidade. A recuperação dos valores da vida africana nos moldes do passado africano, hoje
seria sempre administrada segundo critérios científicos já «ocidentalizados», de modo que
eterna ocidentalização da África. Mas é importante conhecer as designadas correntes da
filosofia africana, que significaram passos no conhecimento e no pensamento de muitos povos
africanos.

100
6. 2. 1. Filosofia da libertação

A filosofia da libertação assenta num dos princípios da «filosofia das luzes», o princípio da
liberdade, que busca a libertação do homem de tudo aquilo que o oprime e reprime. Desde as
revoluções desencadeadas após o iluminismo, que foi possível ver como o princípio da
liberdade garantiu maior autonomia individual, salientando aspectos como a liberdade de
pensamento, de religião, liberdade científica (a busca do conhecimento), a liberdade política,
económica, (fruição e dispêndio do bens), artística (a expressão artrítica individual na musica,
na arte, na literatura), social, jurídica (a prossecução da justiça nos tribunais sem a
interferência de outras esferas de poder), etc. o iluminismo tinha o seu projecto ideológico
orientado contra os regimes sociopolíticos que herdaram as formas de reestruturação social do
absolutismo, através de regimes monárquicos absolutistas que estavam ainda associados a
ideia do poder divino dos soberanos.
A difusão do iluminismo, por seu lado assente nas ideias do humanismo renascentista,
seria feita através das obras de Thomas Hobbes, Jonh Locke, Monstesquieu, Rousseau ou
Voltaire, atingindo as consciências sócias de tal modo que gerou duas grandes mudanças a
independência dos Estados Unidos da América de 1776, com a sua constituição liberal, e a
revolução francesa de 1789, concretizando-se os seus princípios na Carta Universal dos
Direitos do Homem e do Cidadão. Mais tarde, já no século XIX, pensadores e ideólogos como
Karl Marx e Friedrick Engels apelavam ao final da «exploração do homem pelo homem», dando
origem a doutrinas como o marxismo, que conduziria por sua vez a ideologias como o
socialismo ou o comunismo, pensadas como o modelo necessário da vida em comum.
As premissas iluministas e marxistas forma, podemos dizê-lo, as bases directas da
filosofia da libertação, embora a designação «filosofia da libertação» esteja mais directamente
ligada ao movimento surgido na América Latina nas décadas de 60 e 70 do século XX, altura
alias em que se desenvolveu um intercâmbio entre o pensamento africano e o pensamento
latino. Deste movimento na América Latina destacaram-se as obras de Augusto Salazar-Bondy
Leopoldo Zea, das quais podemos encontrar citações de Aimé Cesaire ou Léopold Senghor.
Enrique Dussel, outro filósofo sul-americano foi talvez o que mais se salientou nesta linha da
filosofia de libertação, tendo posteriormente encaminhado o seu trabalho para o campo da ética
e da filosofia política.
Na época, africanos, ou latino-americanos, diversas pensadores começaram por analisar
alguns aspectos centrais: um deles era a condição cultural e a condição social e politica dos
respectivos países, e outro era o levantamento do que seria necessário para o surgimento de

101
uma verdadeira filosofia africana, mas tal não podia estar distante de aspectos ideológicos,
dada a situação de colonizados de muitos destes países.
Em 1972, declarava Bondy: «Libertar, mas Verdadeiramente, no sentido de libertar a
Humanidade. Esta será, talvez, a mensagem do Terceiro Mundo: o Terceiro Mundo poderá
libertar-se libertando o Outro. O que Fanon, Senghor e Che disseram: «Senhores europeus,
vamos libertar o Homem, e a vocês também, dos vossos esquemas de dominação». Os países
colonizados apossaram-se do princípio da liberdade, dela compreenderam a necessidade da
sua efectivação em África.
Quando o marxismo chegou a África, muitas forças de pólos opostos geravam já os seus
antagonismos sobre questões candentes como a abolição de todas as formas de escravatura,
as guerras colónias, os conflitos sobre as riquezas, Franz Fanon, originário da Martinica, mas
conhecedor das realidades africanas foi um dos pensadores a incorporar aspectos da ideologia
marxista no seu pensamento, com o conceito de alienação desenvolvido por Engels e Marx:
«Em qualquer povo colonizado se instala um complexo de inferioridade (…). Quando mais o
povo colonizado se moldar aos valores culturais da metrópole colonizadora, tanto mais se
afastará da sua própria cultura». Foi portanto através de vários pressupostos ideológicos, que
ideal do socialismo marxista chegou até aos movimentos de libertação nacional de Angola.
Chilford Geertz, antropólogo americano que muitos estudos fez sobre diversas culturas,
incluindo a africana e a angolana, diz-nos de forma muito que, no fundo, o comunitarismo de
origem africana cedeu lugar ao socialismo ocidental.
Este desenvolveu-se em quatro etapas, em toda a Angola: a primeira etapa corresponde à
fase em que os movimentos de libertação nacional se constituíram (o MPLA, a FNLA e a
UNITA), tornando-se fixas as suas estruturas; a segunda fase processou-se com o inicio da
luta de libertação nacional, a terceira efectivou-se com a vitória, na luta de libertação
nacional, e a organização do Estado, na qual se assumiu o marxismo. Angola, passou após
a declaração de independência de 1975, a designar-se por República Popular de Angola,
designando-se o partido de Agostinho Neto por MPLA-PT (PT correspondendo a Partido do
Trabalho, dentro do modelo socialista); uma quarta época de ascensão do socialismo tem a ver
com a fase em que o país assumiu o multipartidarismo e a Constituição, desde 1992,
passando a ser democrático; ou seja, a lei-mãe do país constitui-se por meio de uma discussão
conjunta e uma votação plena dos parlamentares angolanos agrupados nos demais partidos
votados pelo povos, aliás titulares do actual poder do Estado Angolano.
Tal como nos demais países africanos, todas as ideias tecidas nos textos e poemas da
ideologia de libertação giram em redor do ideal da luta de libertação nacional. O livro poético de

102
Agostinho Neto, com o título Sagrada Esperança, revela ser e ter uma visão de futuro dos
angolanos, na época nacionalista, apelado a uma espécie de teoria da esperança. E, de facto,
a esperança, a vontade de querer acreditar no futuro difundiu o espírito da libertação; era então
necessário ter esperança; pela liberdade, pela igualdade e pela unidade nacional, tal como é
agora necessário ter esperança pela paz, pelo futuro, pela reconstrução de África e de Angola.
O comunismo ou socialismo ocidental não apresentava diferenças extremas contra o
comunitarismo africano, apesar de alguns acontecimentos mais dramáticos e extrema. O
marxismo casou-se com o «consciencismo» africano, em voga na altura: o conceito de «força
do proletariado» marxista uniu-se ao conceito de «unidade africana», e com isso garantiu-se a
liberação de África dos vários colonialismos. À época, o princípio do direito natural e social do
marxismo apelava à força do povo, gerando alguns lemas; um deles foi «O povo unido já mais
será vencido» (já o pensamento filosofo de Aristóteles reflectia: «O todo é maior que a parte).
Também através deles o continente africano tomou consciência de si libertou, embora os
conflitos não tenham desaparecido entre os africanos. já então, Julius Nyerere, figura
associada ao socialismo africano, referia na sua obra Ujamaa a necessidade, na sua opinião,
de harmonizar esta forma de socialismo implementada em África com a democracia.
A palavra Ujamaa quer aliás dizer «pertença a uma família», que corresponde à ideia de
«parentesco de sangue». Fazendo lembrar o conceito de Émile Durkheim (solidariedade
mecânica), Nyerere falava da normalidade com que era possível aplicar, nas comunidades
africanas o socialismo, numa versão do indivíduo, ou mesmo a teoria socialista de produção na
vida em comum da aldeia, ou da cidade. Significava isto dizer que o africano, já pela sua
cultura original, produz para o colectivo e não para si.
Actualmente, como afirmam alguns pensadores contemporâneos, o papel da filosofia em
África é difícil, devendo o seu principal objectivo contribuir para o esclarecimento das novas
gerações quanto «ao mundo de onde vêm e ao mundo para onde vão»; ou seja após a
libertação do colonialismo, o fortalecimento de uma identidade africana esclarecida. Dito de
outro modo, que o progresso é a satisfação das necessidades básicas da pessoa humana não
se degradem no egoísmo e no individualismo que permeiam as sociedades ditas modernas. O
acelerado processo de globalização está, obviamente a transformar as sociedades africanas,
sendo necessário que os sectores do pensamento africano não vejam, por exemplo, nos novos
sistemas de informação uma ameaça, antes um meio de ultrapassar distâncias e partilhar com
outras latitudes o valor e a contribuição de cada africano.

103
6. 2. 2. O Pan – africanismo ( Du Bois e Nkrumah)

A unidade africana, é de acordo com a época do inicio da «cisão», a ideia central da


ideologia politica do pan-africanismo. Assim, dizer pan-africanismo (pan significa todo/toda, em
grego) é dizer «unidade africana», e é o mesmo, hoje que dizer «união africana». em termo
históricos, é aceite que a expressão pan-africanismo se tornou mais usada a partir de 1958,
nos Estados Unidos da América, onde os afro-americanos lutavam pela afirmação dos seus
direitos. Mas se nesta época o pan-africanismo era já considerado uma doutrina política, a sua
semente havia sido plantada muito antes no tempo.
Com efeito o nascimento, do pan-africanismo remonta ao século XIX, quando no norte dos
Estados Unidos da América alguns grupos de ex-escravos e descendentes de escravos
africanos levados da América começaram uma fraternidade, com o sentido de promoverem o
regresso a África e a formação, aí, de novas comunidades. Entre os defensores desta ideia
encontrava-se Edward Wilmot Blyden, liberiano que salientou ao lutar pelos direitos dos
africanos e dos afro-americanos. Acreditavam que os americanos com origem africanos não
deveriam perder contacto com as suas terras de origem.
Mas como tal empresa se revelou impossível, este sentido de fraternidade, com o tempo,
tomou outros aspectos, particularmente a partir de um primeiro grande encontro dos africanos,
a nível mundial, em 1900. Foi nesse ano, com Henry Silvester Williams natural de Trindad,
advogado e escritor, que a expressão se afirmou pela primeira vez, mais propriamente no
primeiro congresso pan-africano, em Londres, visto que Williams chegou à Inglaterra, em 1896,
aí formando uma associação africana, que visava lutar contra o colonialismo e o racismo.
O historiador e filósofo W.E.B Du Bois, influenciado por Williams foi também o promotor do
congresso pan-africanismo de 1900, trazendo com a sua alargada actividade de defesa de
direito dos cidadãos americanos descendentes de escravos africanos, uma maior vulgarização
da expressão pan-africanismo. Em 1910, deixando a Universidade de Atlanta, tornou-se
responsável por diversas publicações, escrevendo artigos sobre a temática dos direitos civis
em muitos jornais ao longo de décadas. Du Bois sempre defendeu o direito à educação para os
africanos tal como Marcus Garvery, outro defensor do acesso dos africanos, à possibilidade de
se educarem e terem melhores condições, melhores condições de vida. Mas também
advogava, de forma mais racial que Du Bois, o regresso em massa a África, dando origem a
um movimento que lhe herdou o nome, o «garveyismo». Garvey deixaria no entanto uma
imagem menos consensual que outros activistas dadas algumas actividades polémicas.

104
A partir da I Guerra Mundial, com a ocorrência de uma nova distribuição de territórios
africanos entre algumas potências ocidentais verificou-se um crescer da dimensão da ideologia
pan-africanista. Atribuída, geralmente ao líder do Gana, Kwame Nkrumah, de facto a tese da
unidade Africana impôs-se através deste líder, pela expressão e implementação do pan-
africanismo, em África, onde o sentido e o objectivo da organização política dos africanos
solicitavam o desenvolvimento deste ideal. Nkrumah desenvolveu desde cedo actividades de
protesto civil no Gana (na altura Costa do Ouro), que estava sub domínio britânico.
Preso em 1948, e depois libertado, continuou a sua actividade, pronunciando-se por um
governo próprio do país, envolvendo nesta luta vários sectores da população, inclusive as
mulheres, a quem o voto era interdito. Tal luta levaria ao abandono da região pelos britânicos
na década de 1950.

Nesta fase pós-congressos pan-africanistas, surgiram designações associadas a esta


ideologia a aos sucessivos processos de descolonização, falando-se então «unidade africana».
Procurava-se a restauração da África em todas as vertentes, pensando-se ser esta a ideologia
que iria redefinir, alterar, recuperar os direitos e as tradições culturais dos africanos. Assim,
criou-se a OUA, (Organização da Unidade Africana), cujos objectivos eram, entre outros, os
que enunciáramos em seguida.
 Reforçar a unidade e a solidariedade dos Estados Africanos e Malgaxe;
 Coordenar e intensificar a sua cooperação e os seus esforços;
 Defender a soberania, integridade territorial e a sua independência;
 Eliminar de África o colonialismo sob todas as suas formas;
 Favorecer a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

De facto procura-se uma África forte pela tese da unidade, que fosse capaz de enfrentar a
ideologia colonial. Daí ser uma orientação que caminhava na linha das revoltas dos escravos a
exemplo do Haiti, dos povos subjugados. Muitos africanos discordavam vendo esta teoria como
«parcial»; havendo uma teoria do racismo no ocidente era lógico que uma reacção por parte
dos discriminados pudesse conduzir a um racismo de sinal contrario, já que se apela à
solidariedade racial. Afirmava-se: «o pan-africanismo corria o risco de ser um racismo, daí ser
utilizada pelos imperialistas», acrescentando-se: a «a exploração tende a ser natural e atinge
todos os povos». Entende-se «natural» no sentido que ela falava Aristóteles, ou seja, onde se

105
reúna um grupo de seres humanos, há tendência à dominação de uns sobre os outros e de um
sobre todos.
é frequente ocorrer a ideia de que, quer Sylvester e Du Bois, quer Nkrumah não
exprimiram o pan-africanismo no sentido de «unidade» ou «unificação» de um continente
cortado em pedaços pela partilha colonial da África, antes incidindo sobre os direitos dos
africanos, onde quer que vivessem, ou seja, o direito dos povos negros a serem tratados como
humanidade.
Como podemos constatar na actualidade, indecentemente das particularidades nas obras
e na actividade desta figuras, não se concretizou o ideal pan-africanista. Falar unir África,
através do conhecimento, de um conhecimento científico que oriente as consciências africanas.
Necessitamos de uma África, iluminada pela liberdade da ciência, na senda a dignidade da
pessoa humana. Eis pois o que é necessário conquistar em África: um africanismo intelectual,
um africanismo orientado pelos princípios da ciência.

6. 2. 3. A Negritude ( Aimé Cesaire e L. C. Senghor)

A palavra «negritude» surgiu pela primeira vez com o antilhano Aimé Cesaire. E surgiu um
«grito». No seu livro Cahier d´un retour au pays natal. Obra de poesia de 1939, Césaire
aconselhava os negros mais avaliadas diásporas a regressarem a África, uma vez que a
igualdade e a liberdade dos negros no estrangeiro era impossível. Mais tarde, entendeu-se que
o regresso em causa não era um regresso territorial, mas sim um recuo cultural dentro do
estrangeiro. Cada negro na Europa devia saber ser uma parte do território africano, e o se
modo de pensar, agir e devem coincidir com os africanos que ficaram na origem. Para além de
Césaire e de Leopold Senghor, a negritude ficou também associada a Léon Damas. Quando
jovens, estas três figuras publicaram em conjunto uma revista literária, L´Étudiant noire. Damas
iria defender o conceito, quer na sua obra literária, L´Étudiant noire. Damas iria defender o
conceito, quer na sua obra literária, quer em outras actividades, tendo estado ligado a diversas
organizações culturais.
Na visão do seu expoente mais conhecido, Leopold Sédar Senghor cuja vida atravessou
que todo o século XX, a negritude é uma concepção ideológica através da qual se devem
exaltar a civilização e os valores da tradição africana, distintos, obviamente, dos de outras
culturas. Esta concepção surgiu num contexto africana de reacção à predominância da cultura
francesa em muitos dos países africanos colonizados e à ideia de que África não tinha cultura

106
própria. Partindo de uma investigação histórica que existia uma linha cultural comum desde a
África subsariana, estendendo-se do antigo Egipto à Antiga Grécia e a Roma, até à
actualidade. Esta concepção, ao contrário do que alguns sectores ideológicos quiseram
entender, defendia o diálogo inter-racial e intercultural.
O pensamento senghoriano conflui na ideia «renascentista» do Nigeriano Nnamdi Azikiwe,
que apelava do mesmo modo, à contribuição africana através de meios e bens em comum,
ideia que sustentou no seu livro, Renascente África, de 1937, a tese de uma nova vida para o
negro: «Ensinai o africano da humanidade (…)». Como já vimos a maioria de pensadores cujas
ideias jazem na ideologia não pretende fazer ciência ou filosofia. Antes criam argumentos,
discussões, reunindo exemplos elementos de carácter social necessárias para contrapor ou
contrariar a critica ocidental sobre a ideia da «não-contribuição, não-participação da cultura
negra na cultura na universal».
Os intelectuais e escritores guiados pelo conceito da negritude procuraram, no inicio da
década de 1930, apelar ao sentimento de estima pela herança africana, reagindo assim à
imposição da cultura francófona sem diversas regiões do continente africano, à semelhança do
movimento chamado «Harlem Renaissance», criado por intelectuais afro-americanos como
James Weldon Johnson e Hubbert Harrison, que criaram publicações como the Voice. a
negritude tornou-se um movimento literário, com um estilo realista, mas também ideológico
incorporando ideias do marxismo.
Mas para Sanghor, a «África negra realizava-se tradicionalmente através de um regime de
produção nascido da colectividade», o que aproximava do marxismo, preconizador do
comunismo, sendo provável que tenha absorvido alguns principais do marxismo, como o do
«determinismo económico». o socialismo que a negritude de Senghor procurava reaver era, no
fundo, aquele que os africanos perderam no século XV, antes do inicio da colonização. Mas era
também um socialismo cultural (a defesa dos princípios da convivência comunitária), no qual
assenta o humanismo africano, um socialismo económico (a partilha dos bens de produção).
Quando Senghor, transferiu a expressão «negritude» para o uso corrente da ideologia
política à libertação social deu, realmente, uma descontinuidade profunda à expressão. Pois
enquanto os afro-americanos, afro-ingleses e afro-franceses que lutaram pela mudança na
forma como os brancos tratavam os negros, a exemplo do movimento «garveyista» do século
XIX, que influenciou parlamentos no sentido da defesa legal dos direitos dos negros, Senghor
fzia da negritude um ideal económico em África.
A via do pan-africanismo pela agora União Africana apelou à política da unidade racial e
pela via do socialismo apelou à revitalização da produção económica comunitária dos negros;

107
esta foi a orientação a orientação seguida por Mamoudou Touré, no Senghor, por Azikiwe, na
Nigéria, e pelo próprio Senghor e por Julius Nyerere, na Tanzânia. Pela via cultural, apelou ao
reavivar dos demais valores da herança africana, que no interior século de obscurantismo se
tinham desvanecido; esta foi a orientação defendida por todos aqueles que procuravam verno
negro comum um homem fiel a si mesmo, à sua actividade, suas tradições, seus hábitos, usos
e
e costumes, a exemplo do P Placide Tempels e de Raul Alsúa, além de Cheik Anta Diop, de
Severino Ngoenha e, em Angola, de Muanamosi Matumona.
Além do mais como o mostra pela vida da acção, o «consciencismo» de Nkrumah, a
negritude concentra a orientação do negro no seu fazer, ou seja, o agir para a produção e para
o bem da política, para a cultura esta foi a orientação de Sekou Touré, na Guine, e de Keneth
Kaunda, na Zâmbia, este ultimo um defensor de uma negritude pela «acção positiva».
A negritude foi a expressão mais viva, simples e acabada de caracterização das ideologias
negras as independências, o humanismo, o comunismo, os modelos pan-africanistas da
unidade, etc. Foi a forma mais simples de dizer sobre os africanos.

6. 2. 4. A Etnofilosofia ( A. Kagame, S. Ngoenha, Muanamosi Matumona)

Para definimos claramente a expressão «etnofilosofias» vamos analisar os termos que a


compõem e derivam do grego: o termo ethnos tem o sentido de «raça, tribo, nação ou povo»;
como já sabemos, philosophia significa «amor ao saber, ao conhecimento»; assim a palavra
etnofilosofia refere-se ao estudo do saber, do conhecimento das diferentes raças, dos
diferentes povos, da sua visão do mundo. o termo foi depois associado a uma concepção de
tendência filosófica sobre uma raça, ou um grupo étnico, quanto as suas tradições, rituais,
línguas de origem africana, mitos e crenças; ou seja, dentro da raça negra, alguns estudiosos
estudaram apenas uma etnia, numa determinada localização geográfica, de um ponto de vista,
chegando-se assim à conclusão de que, existindo paralelos entre culturas africanas são
inúmeras as suas diferenças.

Um dos nomes que se considera estarem associados à origem da etnofilosofia é o de


Alexis Kagame. Pensador, linguista, historiador e poeta originário do Ruanda, desenvolveu, ao
longo de década, no século XX, estudos sobre diversas culturas étnicas, baseando-se
sobretudo nas tradições orais. Outro desses nomes é o do P. e Placide Tempels, um

108
missionário belga que desenvolveu alargados estudos sobre as cultura bantu e publicou
diversas obras, das quais a mais conhecida viria a ser Bantu Philosophy, que durante décadas
serviu de base de sustentação ao argumento da existência de uma filosofia africana em
particular.
Nesta obra, o autor defende que as categorias da filosofia africana podem ser
identificadas através de uma categorização inerente à linguagem. Por exemplo, a categoria
metafísica primeira no pensamento das sucosidades bantu seria a força. Para os povos bantu,
a realidade seria dinâmica, surgindo o ser estreitamente relacionado ao conceito de força. O
autor dá exemplos de variantes nestas relações. o ser pode estar afastado da força, ou seja os
seres podem ter, ou não, força; a força é parte do ser, ou seja, o ser é mais do que a força,
mas depende dela. De outro modo, o ser é a força, isto é, ambos os conceitos são um
manifestando-se de diversas formas, em diversos momento. Associado a isto encontramos o
conhecido «principio vital», conceito que orienta o «princípio da força para a participação vital»
do muntu (pessoa, individuo) na ordem cósmica, através do qual o muntu está interdito de
disseminar a desordem tanto no meio natural quanto no meio grupal.
um outro principio é o da comunhão, através do qual mantém a sua interacção, e por meio
dele compreende a sua identidade com a do outro; por isso, dentro de si carrega o «eu» como
uma realidade única. Um outro conceito, ainda, é o da participação, por meio do qual o muntu
viabiliza a lei da solidariedade (essência máxima do comunitarismo africano).
Deste modo, a participação na vida do negro exercita-se no maior princípio sociológico
da consciência africana «vivo, logo existo», como o sumarizou Leopold Senghor, que não
hesitou em sublinhar que o pensamento bantu (Eleek, Barth, Grey, Kagame, Esterman e
outros), é viver o prazer do momento presente, da vida em si própria.
A partir de dada altura, porém, a etnofilosofia passou a ser alvo de discordâncias várias,
dado por um lado colidir com ciências autónomas como a etnologia ou a antropologia e por
outro, como a vimos, não poder ser considerada, ela própria, nem ciência autónoma nem
filosofia. o que na obre de Tempels se pode considerar um estudo de uma «filosofia bantu não
pode de modo algum ser abrangente para ser aceite pelos sectores intelectuais mais recentes
apesar da boa intenção inicial dos estudos feitos.
Paulin Hountondji, por exemplo, objectou à etnofilosofia exactamente a tentativa de juntar
num conceito dois conceitos separados: o que é etnológico não é filosofia. Objectou também
no sentido de não se poder confundir uma pratica e ordem científica e académica (o sistema de
trabalho filosófico) com um conjunto de crenças e praticas comuns do quotidiano de uma etnia,
ou de uma população. Para este autor, o valor do trabalho filosófico em África consiste em

109
conceber o futuro do continente em multiplicidade de pensamento, não em sobrevalorizar
formas simplistas de pensamento.
Aliás, os estudos deste tipo (a partir da cor, da raça) caíram em desuso, particularmente
após a queda do arianismo, uma teoria de superioridade rácica que foi desenvolvida pelos
ideólogos do nazismo na década de 1930. Seriam precisas décadas, uma guerra mundial, um
número de incomensurável de mortes e a continuada luta de muitas figuras públicas como
Martin Luther King ou Nelson Mandela, para que tais teorias desaparecessem. O ser humano é
somente um. Se há uma raça ela é unicamente a raça humana. Aliás é só observar a natureza
humana para que compreenda que o ser humano, branco ou negro, tem a mesmas estruturas
físicas (corporais) e psíquicas, não residindo o seu valor na cor da pele. Já Aristóteles havia
«anulado» este problema, na sua teoria da substancia, quando declarou que «o ser não o
deixará de ser pelos seus acidentes»: gordo ou magro, negro ou branco, amarelo, vermelho,
albino, alto ou baixo.
No entanto, esta polémica veio trazer maior visibilidade aos estudos sobre esta temática,
dinamizando assim o pensamento africano contemporâneo, e trazendo à discussão nova
vozes. O problema da etnofilosofia continuou a dividir as opiniões de teóricos da filosofia
africana. do lado critico destacam-se Franz Chahay, E. Boulaga, M. Towa, Paulin Hountondji,
entre os apologistas encontram-se, como já vimos, Tempels, Alexis Kagame, Ntite Mukendi,
Severino Elias Ngoenha, ou Muanamosi Matumona, que recentemente escreveu Reconstrução
de África, na era de modernidade: Ensaio de Epistemologia e Pedagogia da Filosofia Africana.
A indicação subjacente na idade das «reconstrução de África» mostra-se recortada na
ideia do renascimento africano de todos os valores que se pensa terem sido destruídos pela
escravocracia pelas guerra do branco contra negro e do negro. Desde já, esta reconstrução
intelectualiza-se em duas vertentes: a primeira é a vertente pela qual se pretende resgatar a
busca do ideal e de todos os valores espirituais negros assentes na psique e na linguagem; a
segunda vertente é a que quer revitalizar a parte material da África, a estrutura principal da
África: o homem negro banalizando na história da colonização.
Em resumo, nas novas gerações têm surgido algumas vozes questionando se a ausência
de um corpo de trabalho filosófico africano, na acepção científica, estará na base da aparente
incapacidade de o continente evoluir quanto a aspectos de progresso e melhorias de condições
de vida das populações, entre outros. Para estas novas gerações não é, portanto, suficiente ou
tranquilizando validarem-se concepções como as da etnofilosofia. No geral, não é o ponto de
partida para que qualquer individua saia do seu «mundo», o que muitas vezes significa sair da
ignorância para o caminho do conhecimento, da sabedoria.

110
2.1.5 Filosofia da libertação
A filosofia da libertação assenta num dos princípios da «filosofia das luzes», o princípio da
liberdade, que busca a libertação do homem de tudo aquilo que o oprime e reprime. Desde as
revoluções desencadeadas após o iluminismo, que foi possível ver como o princípio da
liberdade garantiu maior autonomia individual, salientando aspectos como a liberdade de
pensamento, de religião, liberdade científica (a busca do conhecimento), a liberdade política,
económica, (fruição e dispêndio do bens), artística (a expressão artrítica individual na musica,
na arte, na literatura), social, jurídica (a prossecução da justiça nos tribunais sem a
interferência de outras esferas de poder), etc. o iluminismo tinha o seu projecto ideológico
orientado contra os regimes sociopolíticos que herdaram as formas de reestruturação social do
absolutismo, através de regimes monárquicos absolutistas que estavam ainda associados a
ideia do poder divino dos soberanos.
A difusão do iluminismo, por seu lado assente nas ideias do humanismo renascentista,
seria feita através das obras de Thomas Hobbes, Jonh Locke, Monstesquieu, Rousseau ou
Voltaire, atingindo as consciências sócias de tal modo que gerou duas grandes mudanças a
independência dos Estados Unidos da América de 1776, com a sua constituição liberal, e a
revolução francesa de 1789, concretizando-se os seus princípios na Carta Universal dos
Direitos do Homem e do Cidadão. Mais tarde, já no século XIX, pensadores e ideólogos como
Karl Marx e Friedrick Engels apelavam ao final da «exploração do homem pelo homem», dando
origem a doutrinas como o marxismo, que conduziria por sua vez a ideologias como o
socialismo ou o comunismo, pensadas como o modelo necessário da vida em comum.
As premissas iluministas e marxistas forma, podemos dizê-lo, as bases directas da
filosofia da libertação, embora a designação «filosofia da libertação» esteja mais directamente
ligada ao movimento surgido na América Latina nas décadas de 60 e 70 do século XX, altura
alias em que se desenvolveu um intercâmbio entre o pensamento africano e o pensamento
latino. Deste movimento na América Latina destacaram-se as obras de Augusto Salazar-Bondy
Leopoldo Zea, das quais podemos encontrar citações de Aimé Cesaire ou Léopold Senghor.
Enrique Dussel, outro filósofo sul-americano foi talvez o que mais se salientou nesta linha da
filosofia de libertação, tendo posteriormente encaminhado o seu trabalho para o campo da ética
e da filosofia política.
Na época, africanos, ou latino-americanos, diversas pensadores começaram por analisar
alguns aspectos centrais: um deles era a condição cultural e a condição social e politica dos
respectivos países, e outro era o levantamento do que seria necessário para o surgimento de

111
uma verdadeira filosofia africana, mas tal não podia estar distante de aspectos ideológicos,
dada a situação de colonizados de muitos destes países.
Em 1972, declarava Bondy: «Libertar, mas Verdadeiramente, no sentido de libertar a
Humanidade. Esta será, talvez, a mensagem do Terceiro Mundo: o Terceiro Mundo poderá
libertar-se libertando o Outro. O que Fanon, Senghor e Che disseram: «Senhores europeus,
vamos libertar o Homem, e a vocês também, dos vossos esquemas de dominação». Os países
colonizados apossaram-se do princípio da liberdade, dela compreenderam a necessidade da
sua efectivação em África.
Quando o marxismo chegou a África, muitas forças de pólos opostos geravam já os seus
antagonismos sobre questões candentes como a abolição de todas as formas de escravatura,
as guerras colónias, os conflitos sobre as riquezas, Franz Fanon, originário da Martinica, mas
conhecedor das realidades africanas foi um dos pensadores a incorporar aspectos da ideologia
marxista no seu pensamento, com o conceito de alienação desenvolvido por Engels e Marx:
«Em qualquer povo colonizado se instala um complexo de inferioridade (…). Quando mais o
povo colonizado se moldar aos valores culturais da metrópole colonizadora, tanto mais se
afastará da sua própria cultura». Foi portanto através de vários pressupostos ideológicos, que
ideal do socialismo marxista chegou até aos movimentos de libertação nacional de Angola.
Chilford Geertz, antropólogo americano que muitos estudos fez sobre diversas culturas,
incluindo a africana e a angolana, diz-nos de forma muito que, no fundo, o comunitarismo de
origem africana cedeu lugar ao socialismo ocidental.
Este desenvolveu-se em quatro etapas, em toda a Angola: a primeira etapa corresponde à
fase em que os movimentos de libertação nacional se constituíram (o MPLA, a FNLA e a
UNITA), tornando-se fixas as suas estruturas; a segunda fase processou-se com o inicio da
luta de libertação nacional, a terceira efectivou-se com a vitória, na luta de libertação
nacional, e a organização do Estado, na qual se assumiu o marxismo. Angola, passou após
a declaração de independência de 1975, a designar-se por República Popular de Angola,
designando-se o partido de Agostinho Neto por MPLA-PT (PT correspondendo a Partido do
Trabalho, dentro do modelo socialista); uma quarta época de ascensão do socialismo tem a ver
com a fase em que o país assumiu o multipartidarismo e a Constituição, desde 1992,
passando a ser democrático; ou seja, a lei-mãe do país constitui-se por meio de uma discussão
conjunta e uma votação plena dos parlamentares angolanos agrupados nos demais partidos
votados pelo povos, aliás titulares do actual poder do Estado Angolano.
Tal como nos demais países africanos, todas as ideias tecidas nos textos e poemas da
ideologia de libertação giram em redor do ideal da luta de libertação nacional. O livro poético de

112
Agostinho Neto, com o título Sagrada Esperança, revela ser e ter uma visão de futuro dos
angolanos, na época nacionalista, apelado a uma espécie de teoria da esperança. E, de facto,
a esperança, a vontade de querer acreditar no futuro difundiu o espírito da libertação; era então
necessário ter esperança; pela liberdade, pela igualdade e pela unidade nacional, tal como é
agora necessário ter esperança pela paz, pelo futuro, pela reconstrução de África e de Angola.
O comunismo ou socialismo ocidental não apresentava diferenças extremas contra o
comunitarismo africano, apesar de alguns acontecimentos mais dramáticos e extrema. O
marxismo casou-se com o «consciencismo» africano, em voga na altura: o conceito de «força
do proletariado» marxista uniu-se ao conceito de «unidade africana», e com isso garantiu-se a
liberação de África dos vários colonialismos. À época, o princípio do direito natural e social do
marxismo apelava à força do povo, gerando alguns lemas; um deles foi «O povo unido já mais
será vencido» (já o pensamento filosofo de Aristóteles reflectia: «O todo é maior que a parte).
Também através deles o continente africano tomou consciência de si libertou, embora os
conflitos não tenham desaparecido entre os africanos.
Julius Nyerere, figura associada ao socialismo africano, referia na sua obra Ujamaa a
necessidade, na sua opinião, de harmonizar esta forma de socialismo implementada em África
com a democracia. A palavra Ujamaa quer aliás dizer «pertença a uma família», que
corresponde à ideia de «parentesco de sangue». Fazendo lembrar o conceito de Émile
Durkheim (solidariedade mecânica), Nyerere falava da normalidade com que era possível
aplicar, nas comunidades africanas o socialismo, numa versão do indivíduo, ou mesmo a teoria
socialista de produção na vida em comum da aldeia, ou da cidade. Significava isto dizer que o
africano, já pela sua cultura original, produz para o colectivo e não para si.
Actualmente, como afirmam alguns pensadores contemporâneos, o papel da filosofia em
África é difícil, devendo o seu principal objectivo contribuir para o esclarecimento das novas
gerações quanto «ao mundo de onde vêm e ao mundo para onde vão»; ou seja após a
libertação do colonialismo, o fortalecimento de uma identidade africana esclarecida. Dito de
outro modo, que o progresso é a satisfação das necessidades básicas da pessoa humana não
se degradem no egoísmo e no individualismo que permeiam as sociedades ditas modernas. O
acelerado processo de globalização está, obviamente a transformar as sociedades africanas,
sendo necessário que os sectores do pensamento africano não vejam, por exemplo, nos novos
sistemas de informação uma ameaça, antes um meio de ultrapassar distâncias e partilhar com
outras latitudes o valor e a contribuição de cada africano.

113
CAPITULO VII: INTRODUÇÃO À LOGICA

Caracterização geral

5. 1. Conceito e objecto de estudo

114
O objectivo da lógica consiste no estudo das formas de argumentação válidas. Esta é
uma primeira caracterização abrangente da disciplina e, por essa razão, encontramo-la com
frequência em textos introdutórios. Outra maneira de indicar o mesmo objectivo consistiria em
dizer que a lógica se interessa pelo estudo de uma classe especial de inferências e que esta
classe detém a particularidade de a validade dos espécimes nela representados ficar a dever-
se exclusivamente à sua forma. Convém, no entanto, reconhecer que esta apresentação é um
pouco enigmática, sobretudo para quem não tenha já uma ideia aproximada do que se entende
por validade, argumento, forma e inferência. O objectivo dos capítulos seguintes é o de facultar
a informação mínima indispensável à manipulação destes conceitos e permitir que a sua
compreensão intuitiva, se existe, assuma um conteúdo preciso.

A Lógica é sobretudo a disciplina que trata da inferência correcta. Tradicionalmente


formal, quer dizer, separada do conteúdo material dos enunciados que analisa, formalizou-se
recentemente, ou seja, dotou-se de um simbolismo artificial decalcado do da Matemática. A
inferência é o raciocínio por dedução, operação que se apoia num ou em vários enunciados
verdadeiros. A Lógica pode ser definida como a ciência que investiga os princípios gerais do
pensamento válido. O seu objecto é discutir as características dos juízos, encarando-os não
enquanto fenómenos psicológicos, como expressando os nossos conhecimentos e crenças. A
Lógica é a análise dessa parte do raciocínio que depende da maneira como as inferências são
formadas. A Lógica formal é uma ciência que determina quais as formas correctas de
raciocínio. Como todas as ciências a tarefa da Lógica é procurar a verdade.

A Lógica desenvolveu-se como um meio de apresentar e analisar argumentos


filosóficos, mas seus princípios podem ser aplicados a argumentos sustentando qualquer
crença ou teoria. Podemos aplicar o pensamento racional, nossa habilidade de raciocinar, a
quase qualquer coisa, e a Lógica oferece um arcabouço para como pensamos.

Origens: A lógica foi desenvolvida de forma independente e chegou a certo grau de


sistematização na China, entre os séculos V e III a.C., e na Índia, do século V a.C. até os
séculos XVI e XVII da era cristã. Na forma como é conhecida no Ocidente, tem origem na
Grécia. O mais remoto precursor da lógica formal é Parménides de Eléia, que formulou pela
primeira vez o princípio de identidade e de não contradição. Seu discípulo Zenão foi o fundador
da dialéctica, segundo Aristóteles, por ter empregado a argumentação erística (arte da disputa
ou da discussão) para refutar quem contestasse as teses referentes à unidade e à imobilidade

115
do ser. Os sofistas, mestres da arte de debater contra ou a favor de qualquer opinião com
argumentos que envolviam falácias e sofismas, também contribuíram para a evolução da
lógica, pois foram os primeiros a analisar a estrutura e as formas da linguagem. Foi sobretudo
em vista do emprego vicioso do raciocínio pelos sofistas que o antecederam que Aristóteles foi
levado a sistematizar a lógica.

Sócrates definiu o universal, ou essência das coisas, como o objecto do conhecimento


científico e, com isso, preparou a doutrina platónica das ideias. Ao empregar o diálogo como
método de procura e descobrimento das essências, antecipou a dialéctica platónica, bem como
a divisão dos universais em géneros e espécies (e das espécies em subespécies), o que
permitiu situar ou incluir cada objecto ou essência no lugar lógico correspondente.

Lógica aristotélica:

Aristóteles é considerado o fundador da lógica formal por ter determinado que a validade
lógica de um raciocínio depende somente de sua forma ou estrutura, e não de seu conteúdo.
Introduziu a análise da quantificação dos enunciados e das variáveis, realizou o estudo
sistemático dos casos em que dois enunciados implicam um terceiro, estabeleceu o primeiro
sistema dedutivo ou silogístico e criou a primeira lógica modal, que, ao contrário da lógica pré-
aristotélica, admitia outras possibilidades além de "verdadeiro" e "falso".

No século II da era cristã, as obras de Aristóteles sobre lógica foram reunidas por
Alexandre de Afrodísia sob a designação geral de Órganon. Inclui seis tratados, cuja sequência
corresponde à divisão do objecto da lógica. Estuda as três operações da inteligência: o
conceito, o juízo e o raciocínio. Conceito é a mera representação mental do objecto. Juízo é um
ato mental de afirmação ou de negação de uma ideia a respeito de outra, isto é, da
coexistência de um sujeito e um predicado. Raciocínio é a articulação de vários juízos. O
objecto próprio da lógica não é o conceito nem o juízo, mas o raciocínio, que permite a
progressão do pensamento. Em outras palavras, não há pensamento estruturado quando se
consideram ideias isoladas.

Aristóteles sistematizou os princípios formais da lógica:

1. Princípio da Identidade: o que é, é; o que não é, não é;

116
2. Princípio do Terceiro Excluído: uma coisa é ou não é.

Em Perí hermeneías (Da interpretação), um dos tratados do Órganon, Aristóteles estuda


a proposição, que é a expressão verbal do juízo. O juízo é verdadeiro quando une na
proposição o que está unido na realidade, ou separa, na proposição, o que está realmente
separado. A verdade é, assim, a adequação ou a correspondência entre o juízo e a realidade.
Esse tratado procura principalmente determinar as oposições possíveis entre as proposições.

2. Método e divisão

Divisão. – A lógica material comportará as seguintes divisões: as condições da certeza,


– o método em geral, e os processos gerais da demonstração científica, análise e síntese, –
noção da ciência e das ciências, – os diferentes métodos. As divisões da lógica sugeridas por
Ramus foram adoptadas pelos jansenistas Antoine Arnauld e Pierre Nicole, autores de La
Logique: ou l'art de penser (1662), traduzido e publicado em inglês em 1851 sob o título The
Port-Royal Logic (A lógica de Port-Royal). As duas primeiras de suas quatro partes trazem
poucas contribuições originais, muito mais no campo da epistemologia que da lógica. A
terceira, sobre o raciocínio, trata da validade dos silogismos. Na quarta parte, sobre o método,
a obra Elementos de Euclides é recomendada como modelo do método científico.

Como René Descartes, fundador da filosofia moderna, os autores insistiam que, em


qualquer investigação científica, termos obscuros ou equívocos devem ser definidos; que
somente termos perfeitamente conhecidos devem ser usados em definições; que somente
verdades auto-evidentes devem ser usadas como axiomas; e que todas as proposições que
não são auto-evidentes devem ser confirmadas com o auxílio de axiomas, definições e
proposições já comprovados. Apesar de competir com uma concepção inteiramente nova da
lógica apresentada por Leibniz, racionalista alemão, as ideias expostas pela lógica de Port-
Royal mantiveram sua reputação durante o século XIX.

Lógica moderna. Com Leibniz, no século XVII, teve início a lógica moderna, que se
desenvolveu em cooperação com a matemática. Leibniz influenciou seus contemporâneos e
sucessores com um ambicioso plano para a lógica, que para ele deixava de ser "uma diversão
para académicos" e começava a tomar a forma de uma "matemática universal". Seu plano
propunha uma linguagem universal baseada num alfabeto do pensamento (ou characteristica
universalis), um cálculo geral do raciocínio e uma metodologia geral.

117
A linguagem universal, na visão de Leibniz, seria como a álgebra ou como uma versão
de ideogramas chineses, formada de sinais básicos representativos de noções não analisáveis.
Noções complexas seriam representadas por conjuntos apropriados de sinais que, por sua vez,
representariam a estrutura de noções complexas e, em última análise, a noção de realidade.
Uma das contribuições mais positivas de Leibniz para o desenvolvimento da lógica foi a
aplicação bem-sucedida dos métodos matemáticos à interpretação da silogística aristotélica.
Outra foi sua proposta de um "cálculo de adição real", em que demonstra que partes da álgebra
são passíveis de interpretação não aritmética. Sua forma de interpretação se comprovaria
adequada mesmo à intrincada regra da rejeição proposta para os silogismos pelo polonês
Jerzy Stupecki, da escola de lógica de Varsóvia, na década de 1940.

Na segunda metade do século XIX, foram lançados os alicerces para os mais notáveis
progressos da história da lógica. Merece menção a obra do matemático francês Joseph-Diez
Gergonne, cuja grande inovação foi a expansão do vocabulário do silogismo e a proposição de
novos tipos de inferência baseados na expansão. A axiomatização de seu trabalho, no entanto,
coube ao lógico John Acheson Faris, de Belfast. Também trouxeram contribuições importantes
o metafísico escocês William Hamilton e os ingleses George Bentham, botânico, e Augustus
De Morgan. Ainda no século XIX, as novas idéias de George Boole, matemático autodidata,
representaram um grande progresso para a lógica. A chamada álgebra de Boole foi aprimorada
por vários pesquisadores, entre eles o economista e lógico britânico William Stanley Jevons; o
lógico, engenheiro e filósofo americano Charles Sanders Peirce; e o lógico e matemático
alemão Ernst Schröder. Coube, porém, ao matemático e filósofo alemão Gottlob Frege
estabelecer a relação entre os dois sistemas lógicos tratados por Boole, e outros importantes
estudos relativos à teoria da linguagem e à redução da aritmética à lógica. Outra tendência no
estudo da lógica e dos fundamentos da matemática foi introduzida pelo matemático e filósofo
alemão Georg Cantor.

Lógica no século XX.

Quando, no início do século XX, Bertrand Russell se dispôs a mostrar que a aritmética
era uma extensão da lógica, foi beneficiado pelas pesquisas anteriores de Giuseppe Peano,
matemático e lógico italiano que, no fim do século XIX e início do XX, questionara noções
primárias da aritmética. Após escrever The Principles of Mathematics (1903; Princípios da
matemática), Russell produziu, em cooperação com o também britânico Alfred North

118
Whitehead, a monumental Principia Mathematica (1910-1913), que se tornou um clássico da
lógica. A obra, em três volumes, reuniu os resultados das pesquisas sobre lógica e
fundamentos da matemática que vinham sendo realizadas desde a época de Leibniz e tornou-
se o ponto de partida para a evolução da lógica no século XX.

A visão da matemática como continuação da lógica, sem uma linha delimitadora clara
entre as duas disciplinas, como defendeu Russell, chamou-se logicismo. A essa abordagem se
opõem o intuicionismo, associado aos nomes de Luitzen Egbertus Jan Brouwer, matemático
holandês, e seu discípulo Arend Heyting, e o formalismo, fundado por David Hilbert. Bertrand
Russell afirmou que há duas vertentes da pesquisa em matemática: um visa à expansão, e a
outra explora os fundamentos. O mesmo se pode dizer sobre qualquer outra disciplina, mas na
exploração dos fundamentos de uma ciência o pesquisador volta a encontrar a lógica, pois
todas as ciências que pretendem descrever e comprovar algum aspecto da realidade fazem
uso do vocabulário lógico. Isso quer dizer que a lógica, localizada no ponto mais alto de uma
hierarquia de ciências, pode ser entendida como a mais abstracta e mais geral descrição da
realidade. Todo conhecimento sobre a realidade sensível, afirma Kant, provém originalmente
da experiência, cujos dados se estruturam graças às intuições da sensibilidade: espaço e
tempo.

Estes não são "propriedades" das coisas, mas formas mediante as quais o intelecto
representa para si as "dimensões aparentes da realidade", ordenando, assim, os dados da
experiência. Num segundo momento, as representações proporcionadas pela sensibilidade se
ordenam segundo as "categorias do entendimento" ou formas a priori da razão, que funcionam
como uma moldura ou ordenação lógica das experiências singulares das quais brotam os
conceitos empíricos. As categorias ou conceitos puros são quatro, e a cada uma correspondem
formas secundárias: qualidade, quantidade, relação e modalidade

8.3 - Os Princípios lógicos

O que é um argumento?

Uma maneira de caracterizar um argumento é a que resulta de se considerarem os seus


objectivos gerais. Apesar da diversidade destes objectivos, pretendemos fixar-nos num deles
em particular. Simplificando, tem-se um argumento sempre que se pretende justificar o valor de
verdade de uma asserção.

119
O que é uma asserção?

Uma asserção é uma frase declarativa empregue para afirmar ou negar algo. Quando,
por exemplo, queremos expressar a ideia de que a raiz de 2 não pertence ao conjunto dos
números racionais, a frase “A raiz de 2 não é um número racional” representa uma asserção. A
distinção entre frases assertivas e frases não assertivas pode ser compreendida facilmente.
Para isso, basta confrontar o exemplo anterior com a frase “Ao saíres, fecha a porta
cuidadosamente”. No primeiro caso atribuímos a um objecto (um número) uma certa
propriedade e no segundo formulamos um pedido. A primeira frase é verdadeira, enquanto a
segunda não tem valor de verdade. Sempre que uma frase não é verdadeira nem falsa diz-se
que não possui valor de verdade.

Mas será que necessitamos de conhecer o valor de verdade de uma frase declarativa
para a considerarmos apta a exprimir uma asserção? A célebre conjectura de Goldbach, pela
qual qualquer número par é representável como a soma de dois primos, não foi ainda hoje
confirmada nem refutada. Não sabemos, portanto, se é verdadeira ou falsa. Admite-se, como
pressuposto, que uma destas possibilidades é o caso e esperamos que um bom argumento
estabeleça em definitivo o seu valor de verdade. Apesar da simplicidade do seu enunciado,
demonstrar que Goldbach tinha razão (ou que estava enganado) não é fácil. Mas, se no futuro
essa prova vier a existir, podemos estar confiantes de que se tratará de um exemplo de um
argumento matemático particularmente bem-sucedido.

Este sucesso é geralmente obtido pela listagem do conjunto de razões em que se apoia
a pretensão de que uma determinada asserção é verdadeira ou falsa. Os gregos antigos
conheciam já um argumento a favor da ideia de que a raíz de 2 é um número irracional, e esse
argumento ainda hoje é tido como um modelo de elegância e rigor. Pelo mesmo motivo,
espera-se que uma vez apresentado um certo conjunto de razões, a asserção que se tinha em
mente defender seja considerada verdadeira no caso das razões propostas o serem
igualmente. A sua verdade é assumida como dependendo, no seu conjunto, de as razões
apresentadas serem verdadeiras, associado ao facto de a verdade dessas razões implicar a
verdade da tese proposta. Queremos, então, assinalar que a verdade de uma asserção é
aceite como consequência da verdade das razões que lhe servem de apoio. Ora, sempre que
isto acontece, não é racionalmente admissível aceitar como verdadeiras as razões

120
apresentadas e, em simultâneo, considerar falsa a asserção que essas razões têm em vista
suportar.

Um exemplo simples do que acabo de afirmar é o seguinte. Se pretendo defender que


os seres humanos são responsáveis pelos actos que praticam voluntariamente, uma maneira
eficaz de o fazer é chamar a atenção para o facto de: (i) um acto voluntário ser praticado
livremente; (ii) agir livremente significa que estamos em condições de avaliar criticamente as
consequências das escolhas efectuadas. Como resulta óbvio, se aceitamos as razões
assinaladas em (i) e (ii) não é possível rejeitar a consequência que delas se segue, isto é, que
não existem actos voluntários pelos quais os seres humanos que os praticam não sejam
também responsáveis. Este exemplo poderia ser complementado com vários outros acerca de
diferentes assuntos sem modificar o essencial da situação.

O principal aspecto a sublinhar é o seguinte. A argumentação, no sentido acima referido,


é um processo que tem lugar entre sujeitos racionais, destinado a ser avaliado racionalmente.
Com isto, queremos excluir outras formas de promover a adesão a ideias ou pontos de vista
através do apelo a factores de ordem emocional, por exemplo, o género de recursos
vulgarmente utilizados em publicidade. Obrigar alguém a fornecer o acesso à sua conta
bancária sob a ameaça de uma pistola não é, obviamente, um argumento, ainda
que metaforicamente possamos usar a expressão para qualificar esse tipo de acções. No
entanto, a prova de que existe um único número par primo é um argumento que qualquer ser
humano suficientemente sofisticado para o compreender aceita sem hesitação. Ora, este facto
depende numa larga medida de o argumento ser logicamente bem construído.

Por isso, a análise que nos interessa efectuar incide em exclusivo naqueles aspectos da
argumentação que nos permitem decidir de forma inequívoca se determinada asserção se
segue realmente das razões propostas em sua defesa. Como nem sempre isto acontece,
interessa-nos dispor de um critério que nos permita saber que características possuem aqueles
argumentos que estamos em condições de considerar logicamente bem construídos. Uma vez
que o objectivo da argumentação é o de fornecer razões para aceitarmos uma asserção como
verdadeira (ou falsa), um argumento logicamente bem construído é aquele que
torna racionalmente impossível rejeitar a asserção que queremos defender se, em simultâneo,
aceitarmos todas as razões propostas em sua defesa. Sempre que este objectivo é alcançado
dispomos de bons motivos para discutir com seriedade o seu conteúdo, e a primeira condição
para que possamos considerá-lo um argumento bem-sucedido foi plenamente alcançado. Entre

121
outros aspectos, é isto que se tem em mente ao ser-nos proposta uma prova racional de que
existe um único número par primo, entre diversos outros exemplos.

Admitamos que o sucesso de um argumento depende da verdade das razões


apresentadas implicar a verdade da asserção a justificar. Neste caso, o sucesso do argumento
reside em tornar manifesto o facto de, caso a lista de razões apresentadas inclua apenas
asserções verdadeiras, então, é impossível que a tese a defender seja falsa. Pelo mesmo
motivo, se um oponente à nossa asserção permanece teimosamente céptico quanto à verdade
do que afirmamos, uma excelente maneira de resistir aos nossos esforços consiste em disputar
a verdade de pelo menos uma das razões incluídas na lista. (Uma lista completa de razões
pode conter um número qualquer de asserções — por exemplo, uma única.) E se a troca de
argumentos tiver como principal objectivo o esclarecimento da verdade, e não fazer valer um
ponto de vista particular custe o que custar, é de esperar que a discussão se transfira para a
análise das asserções contidas na lista. Isto mostra que uma afirmação proposta como
verdadeira pode ser rejeitada caso uma das razões em que se apoia seja falsa.

O que acabo de afirmar permite ilustrar algumas das preocupações que justificam a
análise de argumentos. Admita-se por exemplo que alguém se encontra em posição de
defender racionalmente uma certa opção entre diversos regimes alimentares, digamos, o
regime vegetariano. É claro que uma pessoa nestas circunstâncias pode evocar vários tipos de
razões em defesa da sua preferência e diferentes pessoas podem recorrer a diferentes
argumentos. É possível, por exemplo, apresentar argumentos de saúde, religiosos, de gosto,
morais, etc. Fixemo-nos para efeitos de ilustração no último caso. Que género de argumento
pode ser utilizado? Uma possibilidade seria a seguinte. Se defendo que a dor é um mal e que
provocar a morte de qualquer ser capaz de sentir implica dor, então, caso pretenda ser
coerente, o meu regime alimentar não pode depender da morte desses seres. Que resposta
poderíamos esperar de uma audiência pouco motivada para aceitar o ponto de vista indicado?

Este é um exemplo de argumento que não obtém uma aceitação generalizada. Mas isto
não significa que esteja mal construído. O simples facto de possuirmos diferentes hábitos
alimentares não é por si só um argumento, tal como não o é o facto de não resistirmos a um
prato de carne bem confeccionado. Na melhor das hipóteses, estas preferências dispõem-nos
a procurar nas razões do nosso amigo vegetariano um ponto fraco que nos permita, de
maneira racionalmente defensável, rejeitar a ideia de que deseja persuadir-nos. Ora, esta não
é uma tarefa tão simples como parece. Pode até suceder que não consigamos encontrar nelas

122
qualquer ponto fraco e, ainda assim, recusarmos modificar a nossa ementa por motivos de
outra ordem, por exemplo, as dificuldades decorrentes da radical alteração dos nossos hábitos
alimentares associada à ideia de que se pensarmos seriamente no assunto conseguiremos
descobrir um bom contra-argumento que nos permita usufruir de um excelente bife do lombo
com a maior tranquilidade de espírito. No entanto, se aceitarmos as razões propostas, parece
evidente que esse objectivo não é facilmente alcançável. E rejeitar sem qualquer argumento
um determinado ponto de vista não é uma decisão racionalmente meritória.

Ora, é esta característica que nos permite compreender que o facto de um argumento
ser logicamente bem construído não depende de a lista de razões apresentadas em benefício
de uma dada asserção incluir apenas asserções verdadeiras. Pretende-se sublinhar a ideia de
que, caso a asserção que desejamos justificar seja falsa, então, pelo menos uma das razões
apresentadas também o é. Nestas circunstâncias, ou as razões apresentadas são insuficientes
ou simplesmente não merecem crédito. Todavia, se perguntarmos convictamente a nós
próprios por que motivo isto é assim, se quisermos de facto compreender a razão pela qual
num argumento logicamente bem construído a verdade das suas razões implica a verdade da
asserção a justificar, começaremos a compreender a preocupação típica da lógica.
Compreenderemos, ainda, que os lógicos se encontram acerca de argumentos numa posição
análoga à dos cientistas ao interrogarem-se a respeito da composição química da água.
Apesar de a água ser a mais vulgar das substâncias, demorou algum tempo até que
soubéssemos realmente de que substância se trata.

Ora, a pergunta que os lógicos fizeram a si próprios foi: em virtude de que factores
somos racionalmente compelidos a aceitar uma dada asserção e em que circunstâncias
podemos estar seguros de que essa asserção é realmente uma consequência de um conjunto
de outras asserções? Se a resposta correcta for obtida, ficamos a saber algo mais a respeito
de nós próprios e do que significa analisar racionalmente os problemas que colocamos. É
verdade que nem sempre somos tão exigentes a respeito de argumentos, pelo menos se
pensarmos na atitude que por vezes assumimos perante perspectivas discordantes. De facto,
não procedemos à análise cuidadosa das razões propostas e, a maior parte do tempo,
limitamo-nos a confiar na intuição. Acontece que a confiança que muitas vezes depositamos na
intuição pode ser enganadora e quando se trata de estabelecer um teorema matemático toda a
atenção é pouca. A avaliar pelos exemplos disponíveis, são muitas as razões para afirmar que
esse cuidado tem sido recompensado.

123
Um argumento interessante e ilustrativo no domínio da teoria matemática dos conjuntos
é o seguinte. Sabe-se que, dados dois conjuntos A e B, A está incluído no conjunto B se todos
os elementos que pertencem a A pertencem também a B. Por outro lado, sabemos que o
número de elementos do conjunto vazio é igual a 0. Vamos agora provar que o conjunto vazio
está incluído em qualquer conjunto. O argumento baseia-se nas definições de inclusão e
conjunto vazio complementadas com algum talento para construir argumentos racionalmente
convincentes. Vejamos o que é possível fazer com estes ingredientes.

Procuremos, em primeiro lugar, imaginar o que aconteceria se existisse um conjunto M


no qual o conjunto vazio não estivesse incluído. O nosso primeiro passo consiste, portanto, em
assumir como hipótese precisamente o contrário daquilo que se quer demonstrar. Perguntemos
a seguir o que é necessário para que o conjunto vazio não esteja contido em M. Pela definição
de inclusão, ficamos a saber que é necessário que pelo menos um elemento pertencente ao
conjunto vazio não pertença a M. Ora, isto não é possível. E não é possível porque o conjunto
vazio não tem elementos. Como a única condição para que o conjunto vazio não esteja incluído
em M não é satisfeita, o conjunto vazio está necessariamente contido em M. Dado não ser
difícil reproduzir o mesmo argumento para qualquer outro conjunto, podemos afirmar que
provámos o resultado desejado.

O exemplo precedente é ilustrativo, entre outros aspectos, quanto ao facto de


aceitarmos a asserção inicialmente proposta como verdadeira apenas em função de critérios
racionais, sem que outro género de factores seja considerado relevante para o efeito. Em geral,
esta é a prática que se tem em mente quando discutimos hipóteses e teorias científicas ou
filosóficas, mas a utilidade em proceder do modo indicado ultrapassa largamente o que é
habitual acontecer nestas áreas do conhecimento. Recorde-se, por exemplo, o papel que os
argumentos éticos, políticos ou jurídicos desempenham na vida comunitária. Não se tornará
difícil perceber a importância da sua cuidadosa avaliação racional.

Tente agora imaginar o que seria a nossa civilização se o comportamento usual acerca
de argumentos fosse a sua aceitação ou rejeição apenas em função de critérios não
racionalmente motivados. É claro que não existiria ciência nem qualquer dos benefícios dela
decorrentes para a vida comum; não existiria física, nem matemática, nem computadores,
rádios, meios de transporte sofisticados e outros artefactos de que estamos em condições de
usufruir. Não existiriam regras de conduta nem princípios de decisão que não fossem
arbitrários e, em geral, a nossa vida seria bastante confusa e decepcionante, sujeita a todo o

124
tipo de caprichos imprevisíveis. Contudo, seria injusto acusar os lógicos dos males da
civilização ou de nos sentirmos culpados quando comemos carne de vaca. Detenhamo-nos um
pouco aqui e regressemos momentaneamente ao argumento do nosso amigo vegetariano.

Um dos méritos de uma análise cuidada reside em mostrar-nos como proceder perante
um argumento, e esse mérito é tanto mais admirável quanto maior o grau de complexidade
envolvido no argumento. No caso que estamos a analisar, o argumento do nosso amigo
vegetariano, parece necessário mostrar que pelo menos uma das razões propostas, se não
comprovadamente falsa, é no mínimo discutível. Para isso, é útil dispor o argumento na forma
mais clara de modo a facilitar a identificação das razões e a separá-las da asserção a
defender. Uma vez concluído este estádio inicial estamos em condições de prosseguir. O
argumento do nosso amigo vegetariano apresenta o seguinte aspecto:

A dor é um mal. Provocar a morte de seres sencientes é causa de dor.


Logo, não devo alimentar-me de seres sencientes. O leitor atento terá notado que este
argumento apela a uma razão não explícita que a lista acima não inclui. De facto, é necessário
assinalar que a análise completa de argumentos obriga à listagem exaustiva das suas razões.
Mas nem sempre isto sucede — em particular, se o contexto permite a identificação das razões
implícitas. Mas recorrer ao contexto não é uma boa forma de proceder se queremos analisar
detalhadamente um argumento e, por este motivo, deixo ao leitor a tarefa de a explicitar.

Esta preocupação pode à primeira vista ser considerada desnecessária. Mas, se


desejamos discutir racionalmente um argumento é indispensável ter ideias claras acerca do
que se pretende discutir e o primeiro aspecto a ter em conta consiste em determinar
exactamente que argumento está a ser apresentado. Em certos casos, confundir a conclusão
com alguma das premissas (ou o inverso, se tomarmos como premissa o que é de facto a
conclusão), podemos estar a desviar-nos do objectivo, por exemplo, ao combater um
argumento muito diferente daquele que realmente nos foi proposto. O mesmo acontece se não
tivermos consciência de todas as razões que apoiam a asserção a defender. Agora que uma
situação não tão invulgar como possa parecer foi evitada, podemos colocar as perguntas que
realmente importam. Se o leitor for um oponente feroz do ponto de vista que está a ser
defendido, basta-lhe, a título de exercício, seleccionar pelo menos uma das premissas e
argumentar solidamente a favor da sua presumível falsidade. Se for bem-sucedido, não se
iluda: há melhores argumentos do que este em defesa do regime vegetariano, e bastante mais
difíceis de combater.

125
Proposição é um termo usado em lógica para descrever o conteúdo de asserções.
Uma asserção é um conteúdo que pode ser tomado como verdadeiro ou falso. Asserções são
abstrações de sentenças não linguísticas que a constituem. A natureza das proposições é
altamente controversa entre filósofos, muitos dos quais são céticos sobre a existência de
proposições. Muitos lógicos preferem evitar o uso do termo proposição em favor de
usar sentença. O discurso, enquanto estrutura verbal, é uma sequência coerente de orações,
que se define pelos temas ou tópicos que expressa. Enquanto interacção, trata-se de uma
sequência de turnos e acções de vários participantes, na qual cada acto é levado a cabo
relativamente ao anterior e prepara o seguinte.

A partir das suas estruturas sequenciais, os discursos têm outras estruturas em vários
níveis, como é o caso das estruturas da gramática (fonologia, sintaxe, semântica), das
estruturas da retórica (metáforas, eufemismos) e das estruturas esquemáticas que definem o
formato global do discurso, como a argumentação ou a narração. De acordo com a cognição, o
discurso é descrito como sendo um processo ou uma representação mental em que os
utilizadores da língua aplicam estratégias de produção ou de compreensão antes de armazenar
fragmentos do discurso na memória.

Inferência

Acontece que ao ouvirmos as razões apresentadas por alguém com quem conversamos
é possível antecipar o ponto onde o nosso interlocutor pretende chegar antes mesmo de este
ter sido indicado. Ora, aquilo que conseguimos antecipar nas suas palavras consiste
na conclusão que delas se segue. Foi precisamente para nos fazer chegar a essa conclusão
que durante alguns minutos se esforçou por argumentar em seu benefício. Assim, quando
antecipamos a conclusão desejada limitamo-nos a reconstituir por nós próprios o raciocínio que
havia conduzido o nosso interlocutor à sua tese inicial. De facto, ao conversar connosco ele
estava apenas a esforçar-se por transmitir em voz alta o que antes tinha aceite como
verdadeiro (ou falso) em consequência de um conjunto de reflexões por vezes demoradas. As
razões por si apresentadas devem ser entendidas como as premissas do raciocínio que
efectuou e a ideia que pretendia defender como a sua conclusão. As premissas de um
raciocínio são a informação à partida disponível com base no qual se extrai uma conclusão.

126
Como é óbvio, o facto de termos conseguido antecipar a conclusão desejada não se
deve a uma especial capacidade de adivinhação da nossa parte. Casos deste género mostram
que, dado um certo conjunto de razões (premissas), o auditor atento está em condições de
determinar, em parte pelo menos, que consequências resultam das premissas. Sempre que
algo de semelhante acontece, podemos estar seguros de que estamos perante um processo
de inferência, isto é, aquilo que é habitual designar por raciocínio. Um argumento não é mais
que a expressão linguística de uma inferência. Para compreender isto, basta verificar que não
é possível justificar racionalmente asserção alguma se as razões que desejamos ver
reconhecidas não sejam comunicadas oralmente ou por escrito. Assim, um argumento pode
ser entendido como um conjunto de asserções com algumas características particulares.
Formalmente, podemos dizer o seguinte. Dado um certo conjunto de asserções P1, P 2,..., Pn ,
tal que uma outra asserção Q, não necessariamente diferente de Pn, se segue das primeiras,
obtém-se um conjunto K = {P 1, P2,..., Pn } ∪ {Q} pelo qual o argumento é exaustivamente
representado. Pretendemos com isto sublinhar que uma inferência é um conjunto formado
pela uniãoentre dois conjuntos cujos elementos são, respectivamente, as premissas e a
conclusão.

Se pensarmos agora no modo como o nosso conhecimento é alcançado verificamos que


a única forma de o obter consiste em reflectir sobre a realidade (por vezes arduamente) com
vista a chegar àquelas conclusões que nos permitem de facto compreendê-la melhor. Acontece
que para isso necessitamos de fazer inferências. Assim, quando formulamos um argumento,
limitamo-nos a apresentar publicamente as inferências que nos permitiram alcançar as
conclusões que realmente alcançámos. Por outro lado, se sucede que as consequências
lógicas decorrentes das nossas inferências nos são imediatamente acessíveis, é bastante mais
vasto o número de casos em que não temos uma consciência imediata, nem sequer precisa,
de qual a conclusão a extrair de um certo conjunto de informações que julgamos — ou
sabemos — correcto. Um exemplo trivial do primeiro género é o seguinte. Se possuo a
informação de que todos os homens são mortais e que Sócrates é homem, estou autorizado a
concluir que Sócrates é mortal. Na verdade, as coisas seriam bastante simples e a lógica um
instrumento não excessivamente importante, se a totalidade dos nossos raciocínios fossem
deste tipo. Sabemos, no entanto, por experiência própria, ao estudarmos matemática ou física,
por exemplo, que os processos que nos conduzem a descobertas importantes são algo mais
complexos.

127
Mas, ainda que todas as nossas inferências fossem tão transparentes que fosse
impossível cometer erros lógicos, é um interessante desafio intelectual determinar em virtude
de que factores podemos considerá-las logicamente bem construídas, tal como foi um desafio
estimulante para os químicos descobrir que a água é H2O. Apesar da sua utilidade para a vida
ser independente de o sabermos ou não, poder satisfazer a nossa curiosidade natural acerca
do mundo é por si só um empreendimento gratificante. Qualquer instrumento capaz de fazer
progredir esta curiosidade é não apenas desejável como contribui à sua maneira para que
façamos também justiça às nossas capacidades racionais.

De facto, ficamos a saber bastante mais acerca de um assunto de que estejamos a


tratar se formos capazes de reflectir sobre ele correctamente do que ficaríamos se esta tarefa
se revelasse impossível. Como é óbvio, a forma de progredir racionalmente numa investigação
não consiste em adivinhar a resposta correcta para os problemas que nos interessam ver
esclarecidos mas antes descobri-la. Exigimos, portanto, não uma qualquer resposta mas uma
resposta cuja verdade seja racionalmente satisfatória — que possa ser testada, entre outras
coisas, pelo conjunto das suas consequências. O tipo de teste que os lógicos têm em vista
baseia-se no seguinte princípio. Se, ao assumirmos uma determinada hipótese formos
conduzidos a uma conclusão que sabemos ser falsa, e se a inferência que efectuámos
for válida, então a hipótese donde partimos não pode ser verdadeira. Este é um princípio
unanimemente utilizado na análise de teorias científicas e também quotidianamente.

No entanto, nem todas as inferências que estamos em condições de realizar, e das


quais o nosso conhecimento depende, recaem sob o âmbito da lógica. A jurisdição da
disciplina obedece a um limite preciso, pelo menos na opinião da maioria das pessoas que
estudam o assunto. Não há, por exemplo, razões de ordem estritamente lógica que permitam
garantir que inferências cujas premissas resultem de dados recolhidos experimentalmente e a
conclusão seja uma generalização desses dados (por exemplo, quando concluímos
que todas as esmeraldas são verdes com base no facto de os exemplares que observámos até
hoje o serem), tenham a característica de, caso as premissas sejam todas verdadeiras, seja
impossível a falsidade da conclusão. Este é um exemplo de inferência indutivae a análise deste
tipo de inferências é efectuada fora do âmbito da lógica, em geral, no quadro do cálculo de
probabilidades e em epistemologia. As inferências de que se ocupa a lógica, cujo tipo particular
inclui todos os exemplos fornecidos até ao momento excepto o último, são
designadas dedutivas. (As importantes diferenças entre indução e dedução serão mais tarde
consideradas.). De momento, convém assinalar que o interesse da lógica por este género de

128
inferências decorre de, ao invés dos restantes tipos de inferência, possuirem a propriedade de
serem válidas em virtude da sua forma.

Validade

Todos os seres humanos têm algo a dizer sobre a realidade que os rodeia e um conjunto
de crenças (nem sempre verdadeiras) acerca do mundo que pretendem transmitir e partilhar
com os seus próximos. É vulgar que dessas crenças se sigam certas conclusões cuja
justificação para serem aceites como verdadeiras (ou falsas) envolve determinar com clareza
em que medida são uma consequência de que premissas. Ainda que não caiba à lógica
estabelecer critérios para aceitar uma proposição como verdadeira, compete-lhe esclarecer em
que medida uma proposição é uma consequência de um certo conjunto de outras proposições.
Caso o veredicto seja negativo algo exige revisão.

Este facto permite explicar o interesse de algumas pessoas particularmente conscientes


da importância da argumentação em propor um método que permitisse determinar as
circunstâncias em que uma inferência merece ser considerada válida. A primeira pessoa a
fazê-lo de uma forma sistemática foi Aristóteles, um filósofo grego da Antiguidade. O seu
exemplo foi seguido por vários outros filósofos, entre os quais um lógico medieval português
chamado Pedro Hispano. Durante o século XX o tema sofreu um desenvolvimento imenso
devido, em particular, à descoberta da lógica moderna por Frege.

Na verdade, o estudo da lógica desenvolveu-se em torno de uma ideia principal: a ideia


de validade. Esta é uma ideia notável porque nos permite compreender, entre outras coisas, a
razão pela qual, em certas circunstâncias, podemos confiar nas conclusões a que chegamos
ao efectuar uma inferência. Dado que o conceito de validade tal como emprege pelos lógicos
foi amplamente utilizado nos capítulos anteriores em associação com o conceito de
argumentação, resta-nos dar a sua definição.

Diz-se que um argumento é válido na circunstância em que: se as suas premissas


são todasverdadeiras, então a conclusão não pode ser falsa. Vejamos agora algumas
consequências que se seguem da definição. O primeiro aspecto a sublinhar é o seguinte. Não
podemos estar certos de que, partindo de premissas verdadeiras, alcançamos uma conclusão
verdadeira a menos que a inferência efectuada seja válida. Vejamos um pouco melhor este
aspecto decisivo. Se pensarmos que numa inferência se pretende que a conclusão seja uma

129
consequênca das premissas, torna-se evidente que a única forma de o garantir consiste em
raciocinar validamente. Garantimos também que se as premissas forem verdadeiras, a verdade
da conclusão é uma consequência da verdade das premissas. Este é um aspecto importante
porque implica que ao raciocinarmos validamente, a validade preserva a verdade das
premissas — digamos, transferindo-a sem danos colaterais para a conclusão. Não corremos,
portanto, o risco de chegar a conclusões falsas a partir de premissas verdadeiras. Esta
característica permite afirmar que o argumento que estabelece a propriedade de o conjunto
vazio estar incluído em qualquer conjunto é convincente. Ele prova-nos que é realmente assim
que as coisas se passam.

Mas, se quisermos avançar com segurança, é necessário possuir uma ideia precisa
acerca dos conceitos principais envolvidos na definição de validade. Como vimos, a validade
foi definida à custa do conceito de possibilidade. Dissemos que, se as premissas são todas
verdadeiras, então, é impossívelque a conclusão seja falsa. O nosso problema consiste em
determinar exactamente o que entendemos por possibilidade. Na verdade, nem sempre se tem
consciência de que existem vários tipos de possibilidade. Uma vez discriminados os diferentes
sentidos em que este termo é utilizado, estaremos finalmente em condições de apreciar o que
se pretende dizer quando falamos em validade. Observemos os seguintes exemplos: (i)
Existem triângulos cujo número de ângulos internos é igual a 4; (ii) Talvez no futuro uma nave
consiga viajar mais depressa que a velocidade da luz. O que há de surpreendente nestes
exemplos? Bem, não é simplesmente possível que um triângulo tenha 4 ângulos internos, tal
como não é possível que um corpo se movimente a uma velocidade superior à da luz. Mas a
diferença entre (i) e (ii) reside na razão pela qual isto não é possível. Se nos perguntarmos em
virtude de que factores (i) e (ii) exprimem impossibilidades, verificamos um facto crucial.

Consideremos (ii). A impossibilidade de um corpo se deslocar mais depressa do que a


velocidade da luz é o resultado das leis da física. Estas leis reflectem o modo como o mundo
está constituído e é a própria organização da matéria que torna (ii) impossível. Se o leitor
sugere que a extraordinária evolução científica e tecnológica do último século justifica que, num
futuro talvez muito distante, uma nave esteja em condições de realizar a proeza indicada, bem,
sucede que está enganado. Talvez as leis da natureza pudessem ser logicamente diferentes
do que são e, se fossem do género apropriado, isso podia acontecer. Ora, o facto de
considerarmos (ii) impossível decorre do modo como o mundo é. Digamos, então, que
possuímos sólidas razões empíricas para afirmar (ii) impossível.

130
Vejamos agora o primeiro caso. A impossibilidade expressa em (i) não depende de
qualquer lei da natureza da qual tenhamos conhecimento. Este facto não exige conhecimento
algum acerca do mundo; é, se quisermos, algo que podemos saber sem recorrer à experiência.
Trata-se, pois, de um conhecimento a priori. Na verdade, sabemos que (i) é impossível
baseados no facto de sermos pessoas linguisticamente competentes, isto é, apenas porque
conhecemos o significado da palavra “triângulo”. Se sabemos o que significa “triângulo”,
sabemos ainda que se algo possui 4 ângulos internos, então, não é um triângulo. Admitir o
contrário conduziria a uma contradição. O mesmo sucede com a frase “Alguns solteiros são
casados”. Esta frase é obviamente contraditória dado que “solteiro” significa
precisamente não ser casado. Portanto, (i) é impossível por razões semânticas e não
empíricas.

Ora, não existe contradição em viajar mais depressa que a velocidade da luz. Apesar de
ser fisicamente impossível, (ii) não é logicamente impossível. Mas se o leitor admitiu que as leis
da natureza poderiam ser diferentes do que realmente são, isso deve-se ao facto de admitir
que um mundo diferente do mundo actual não é logicamente impossível. No entanto, isto não
significa que tudo aquilo que conhecermos apenas em virtude da observação seja
contingente. Mas se algo é logicamente impossível é também empiricamente impossível. É fácil
imaginar um mundo no qual Wellington tivesse sido derrotado em Waterloo mas não
conseguimos imaginar alguém solteiro ecasado. A menos que o significado de “solteiro” mude
radicalmente, é inútil investigar se alguém está nessas condições. Em contrapartida, a
competência linguística não é suficiente para provar que E = mc 2.

Sucede (não é uma surpresa) que o sentido de possibilidade que interessa aos lógicos
não é o de possibilidade física. Na verdade, a lógica não tem interesses directos a respeito do
mundo mas apenas acerca da maneira como fazemos inferências. Logo, dado um argumento,
a pergunta é: será logicamente possível que as circunstâncias que tornam as premissas todas
verdadeiras tornem falsa a conclusão? Que esta possibilidade seja o caso é suficiente para
declarar inválido o argumento.

Este é um resultado crucial pela seguinte razão. Encontramo-nos, finalmente, em condições de


esclarecer a razão qual a verdade não implica falsidade. Se se dá o caso de ser logicamente
impossível que um argumento válido contenha premissas verdadeiras e conclusão falsa, o
facto de a validade preservar a verdade não é uma característica acidental desse argumento.
Sabemos agora que o contrário é logicamente impossível com base no mais forte tipo de

131
possibilidade que observámos. Por outro lado, o facto de uma inferência ser válida não
depende do modo como o mundo é.

Usamos a seguinte notação para indicar os argumentos válidos: P1, P 2,..., Pn ⊨ Q,


onde o símbolo “⊨” indica que a conclusão é uma consequência (semântica) das premissas
listadas à esquerda. Esta forma de representar um argumento válido é utilizada
independentemente do valor de verdade das suas premissas e conclusão. De facto, existem
argumentos válidos cujas conclusões são falsas. Note-se que a definição de validade é da
forma “se... então..”. e limita-se a indicar que condição exige ser satisfeita para que a
impossibilidade da conclusão de um argumento ser falsa se verifique. Ora, esta condição é a
de que todas as premissas sejam verdadeiras. E, como vimos antes, nem sempre isto
acontece. Mas, se essa condição não for satisfeita, deixa de haver razões para exigir a
impossibilidade de a conclusão ser falsa. Aliás, é com base na definição de validade que se
torna possível pôr em causa a verdade da conclusão de um argumento logicamente bem
construído sem duvidar que a conclusão se siga realmente das premissas que constituem o
seu ponto de partida.

Isto mostra que ainda que a conclusão de um argumento seja uma consequência das
suas premissas daí não se segue que essas premissas são verdadeiras. Acontece apenas que
no caso de o serem, uma conclusão falsa não pode ser a sua consequência lógica. Como
vimos, premissas verdadeiras não implicam uma conclusão falsa. Ora, se um argumento é
inválido, a conclusão não resulta das premissas, isto é, unicamente à custa da sua forma
lógica. Daí a inutilidade lógica destes argumentos. Como não existe entre premissas e
conclusão uma relação de consequência lógica, a verdade das premissas não nos obriga a
aceitar a conclusão. Imagine o leitor que tem conhecimento de um familiar ou amigo que
deseja comprar uma casa e que essa pessoa (digamos, o António), a última vez que se
encontraram, lhe disse “Se as taxas de juro baixarem compro uma casa no litoral”. Imagine
também que, algum tempo depois, o António comprou uma casa. Se concluir que a taxa de juro
baixou, a sua inferência não é válida.

Este pode ser um resultado surpreendente. Muitas pessoas aceitariam o argumento sem
hesitar, ainda que, ao fazê-lo, cometam um erro lógico bastante elementar. Tudo quanto
necessitamos é verificar por que motivo é assim. Se as taxas de juro baixarem, António
compra uma casa no litoral. António comprou uma casa no litoral. Logo, as taxas de juro
baixaram. O que há de errado neste argumento?

132
Aparentemente, nada. Mas, se é realmente inválido, pela definição de validade segue-se
a possibilidade de ambas as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa. Uma análise
pormenorizada mostra que é isto que acontece. Este ponto justifica uma análise detalhada.
Basta pensar na hipótese de António ter recebido uma herança, ter sido recompensado por um
bom negócio ou ter ganho o primeiro prémio do Totoloto, para se compreender o que está em
causa. Como estas possibilidades são compatíveis com o facto de as taxas de juro
permanecerem estáveis ou até terem subido (casos que tornariam falsa a conclusão), a
inferência é inválida. De facto, a primeira premissa afirma que a baixa das taxas de juro é uma
condição para que António compre uma nova casa, não afirma que a satisfação do desejo de
António condiciona a descida dos juros. Este exemplo mostra-nos em que medida raciocinar
invalidamente tem consequências desagradáveis.

Um leitor menos disposto a aceitar o resultado da análise precedente poderá interessar-


se por colocar a seguinte objecção: que aconteceria, numa situação igualmente hipotética, se a
taxa de juro tivesse de facto baixado? Não estaríamos, nesse caso, perante premissas
verdadeiras e conclusão verdadeira? A resposta é: claro que sim. No caso hipotético descrito a
conclusão seria verdadeira. Mas, se o leitor desejar prosseguir nesta linha e defender que a
inferência acima pode ser válida em certas circunstâncias, ainda que inválida noutras, comete
um erro. Vejamos a razão pela qual isto sucede.

Imagine, por exemplo, que não se lembra onde guardou um par de sapatos que lhe
apetece calçar num dado momento. A sua atitude será a de tentar recordar-se e, se não o
conseguir, de o procurar onde habitualmente os sapatos são guardados. Imagine agora que a
sua investigação foi tão meticulosa que os procurou em todos os lugares da casa onde
verosimilmente poderiam ter sido guardados, sem o conseguir. Ao fim de algum tempo acabou
por desistir. Imagine ainda que foi tomar o pequeno-almoço particularmente irritado com a sua
memória mas decidido a esquecer o assunto. E imagine, por exemplo, que durante o pequeno-
almoço os seus pés chocam debaixo da mesa com um objecto indeterminado. Ao curvar-se na
cadeira encontra os sapatos que tinha desistido de procurar.

Que conclusão extrai desta história? Que encontrou os sapatos por acaso. Não, é claro,
em consequência de uma investigação deliberada. Retomemos o nosso argumento. Tal como
obteve o que pretendia em função do acaso e não em consequência de uma procura
intencional, também na inferência acima a verdade da conclusão, caso o seja, não é uma
consequência da verdade das premissas. A descida da taxa de juro não é, de todo, uma

133
consequência da informação que possui acerca do António. Donde, a conclusão — ainda que
eventualmente verdadeira — não se segue do conjunto de premissas. Se um argumento é
válido, isso quer dizer que não há qualquer circunstância em que as premissas sejam
verdadeiras e a conclusão falsa. Logo, não faz sentido dizer que um argumento é inválido
numas circunstâncias e válido noutras.

Exibimos um argumento em que a conclusão não se segue das premissas. De


facto, nada se segue desse conjunto de premissas. Logo, porquê comprometermo-nos com a
verdade de uma asserção que não é uma consequência da informação que possuímos e
sabemos correcta, ainda que pareça sê-lo? Nada nos obriga a fazê-lo. Tal como a teoria de
Copérnico representou para a física o primeiro passo decisivo que nos permitiu não confundir o
movimento aparente do Sol com a realidade, algo de semelhante sucede a respeito de
inferências. Não é sequer demasiado difícil indicar um bom número de exemplos onde a
fronteira entre um argumento válido e um argumento logicamente mal construído não permite
ser traçada sem a ajuda de instrumentos especializados construídos para o efeito. Foi este,
aliás, o principal motivo para o desenvolvimento sistemático da disciplina.

Outra consequência interessante da definição de validade é que existem argumentos


válidos com premissas falsas e conclusão verdadeira. Uma característica notável acerca de
validade é a seguinte. Num argumento válido a verdade das premissas é preservada na
conclusão. Contudo, se existem argumentos válidos cujas premissas são falsas e a conclusão
verdadeira, a falsidade das premissas não é preservada na conclusão. Ora, apesar de
existirem argumentos válidos com premissas e conclusão falsas, o facto de sabermos que a
conclusão de um argumento válido é verdadeira não permite concluir que todas as suas
premissas sejam igualmente verdadeiras. De facto, pode suceder qualquer das seguintes duas
possibilidades: (i) todas as premissas do argumento são falsas; (ii) pelo menos uma das
premissas é falsa. As girafas alimentam-se da carne de outros animais. Os seres que se
alimentam da carne outros animais são mamíferos. Logo, as girafas são mamíferos.

Até um leitor momentaneamente distraído está em condições de verificar que a


conclusão do argumento acima é realmente uma consequência das premissas. No entanto, as
premissas são ambas falsas (as girafas são animais herbívoros e há animais, como as cobras,
que incluem carne na sua ementa e não são mamíferos), enquanto a conclusão é verdadeira.
Ora, este não é, apesar de válido, um bom argumento. É óbvio que as razões listadas em (1) e
(2), por serem falsas, não permitem justificar a conclusão.

134
O número de casos em que algo de semelhante pode acontecer é ilimitado. À primeira
vista trata-se de um resultado decepcionante, em particular se o leitor foi levado a admitir que o
facto de um argumento ser válido é suficiente para garantir a verdade da conclusão. Mas esta
exigência não é salutar nem indispensável. De facto, ela é impossível de satisfazer, e não
podemos acusar a lógica de ficar aquém de expectativas incorrectas. Garantir em que
circunstâncias uma inferência é válida é apenas um primeiro passo para que valha a pena
discutir as razões a que um argumento faz apelo. Esta é uma exigência sensata. Porquê perder
tempo a discutir razões quando se dá o caso de não implicarem a conclusão? Quanto muito,
podemos chamar a atenção do nosso interlocutor para este facto e esperar que o ponto seja
aceite. Se isto acontecer, há ainda a possibilidade de o argumento ser reformulado do modo
conveniente após alguma reflexão suplementar. Ao proceder assim ganhou-se em clareza e
rigor o que, momentaneamente, pôde parecer uma simples perca de tempo. Noutros casos,
ganhou-se o facto de deixar cair um ponto de vista para o qual não se possui razão alguma.

Convém, portanto, distinguir os conceitos de validade e de correcção. Diz-se que um


argumento é correcto se, caso seja válido, todas as suas premissas são verdadeiras. Não
existem argumentos correctos inválidos. Isto não significa, todavia, que todos os argumentos
válidos com premissas verdadeiras são bons argumentos. Existem argumentos válidos cujas
premissas e conclusão são verdadeiras sem que esta característica seja suficiente para os
tornar realmente convincentes. Um exemplo típico seria o seguinte. O quadrado da hipotenusa
é igual à soma do quadrado dos catetos. Logo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma do
quadrado dos catetos.

Parece claro que se Pitágoras tivesse proposto este argumento como prova do seu
célebre teorema, dificilmente alguém o aceitaria. Trata-se, no entanto, de um argumento válido.
Para isso basta compreender que se a premissa for verdadeira é impossível que a conclusão
seja falsa (na verdade, ambas possuem o mesmo conteúdo). Tem-se, assim, que a validade de
um argumento não é uma condição necessária nem suficiente de verdade. Não é uma
condição suficiente porque não basta um argumento ser válido para que a sua conclusão seja
verdadeira. E não é igualmente uma condição necessária de verdade uma vez que existem
argumentos inválidos com conclusões verdadeiras.

Uma apresentação sinóptica do que acaba de ser indicado é a seguinte:

135
Premissas Conclusão Validade

Verdadeira
Verdadeira SIM
s

Verdadeira
Falsa NÃO
s

Falsas Verdadeira ou Falsa SIM

Forma lógica

Os factos que acabamos de relatar acerca de validade permitem afirmar que a validade
de uma inferência é independente do valor de verdade das asserções que a constituem. Em
função do que foi dito acima, este não pode ser considerado um resultado demasiado
surpreendente. De que depende, então, a validade de um argumento? A nossa tarefa reside
em fornecer a resposta a este problema. Para isso, é necessário considerar a distinção entre
forma e conteúdo. Vejamos os aspectos preliminares envolvidos. Consideremos as seguintes
duas sequências de símbolos: (i) “Gramut begnet yassur” (ii) “A neve é branca”. Uma vez que
acabo de inventar a primeira, a distinção básica a estabelecer entre ambas as sequências é
que apenas a segunda tem conteúdo. Com isto, pretende-se afirmar que o conteúdo de uma
sequência de símbolos (neste caso uma frase do português) consiste no seu significado. Na
realidade, se pretendo afirmar ou negar algo, é necessário que a minha asserção tenha
significado.

Ora, um facto notável a respeito do significado de uma asserção é que a sua verdade ou
falsidade lhe está intimamente associada. Sucede que uma sequência de símbolos desprovida
de significado é inutilizável como asserção e também para outros efeitos. Vejamos agora o

136
caso de (iii): “La neige est blanche”. É claro que (ii) e (iii) têm o mesmo significado,
respectivamente, em português e francês. Este facto permite-nos pensar que ao afirmarmos
serem ambas as frases verdadeiras pretendemos dizer que uma frase é verdadeira ou falsa em
função do seu conteúdo e não da sequência particular de símbolos que a constitui. Mas, se
uma frase é verdadeira ou falsa em virtude do seu conteúdo, é ao conteúdo que a propriedade
de ser verdadeiro se aplica, não à frase enquanto tal.

Detenhamo-nos um pouco aqui. É fácil verificar que o significado de (ii) não coincide
com o significado das suas partes componentes isoladamente consideradas. Há um número
ilimitado de frases com diferentes significados onde as expressões “neve” e “brancura” podem
ocorrer. Uma e outra representam propriedades, isto é, características que certos objectos
exemplificam num ou noutro momento — digamos, a característica de um certo agregado de
H2O ser neve e de esta folha de papel onde se sucedem as palavras que escrevo ser branca.
Mas (ii) e (iii) retiram o seu significado do facto de os predicados que representam estas
propriedades se encontrarem associados de certa maneira. Estes predicados estão associados
de maneira a representarem um pensamento particular, isto é, o pensamento que a neve é
branca. Torna-se, portanto, evidente que representar uma propriedade é diferente de exprimir
um pensamento, algo que apenas uma frase completa pode fazer.

Ora, o significado de uma frase declarativa consiste na proposição expressa pela frase.
Esta distinção pode ser captada considerando: (a) “António acredita que a neve é branca”; (b)
“Richard crois que la neige est blanche”. A nossa intuição é que António e Richard acreditam
na mesma coisa. Mas que coisa? Ambos acreditam que “A neve é branca” e “La neige est
blanche” são frases verdadeiras. Vejamos. A relação de crença que (a) e (b) atribuem
respectivamente a António e a Richard é algo que tem lugar entre indivíduos e frases ou entre
indivíduos e proposições? Se quisermos manter a ideia intuitiva de que ambos acreditam na
mesma coisa, então, é necessário concluir que a relação se verifica entre indivíduos e
proposições, não entre indivíduos e frases. Como as frases são diferentes, se a relação fosse a
segunda, é evidente que António e Richard não acreditariam na mesma coisa. Segue-se,
então, que duas frases exprimem a mesma proposição se, e apenas se, são sinónimas.

Que importância pode ser atribuída a estes factos? À primeira vista, a distinção resulta
um pouco académica e rebuscada na terminologia sem que o resultado iluda alguma
trivialidade. No entanto, ao falarmos em proposições para nos referirmos ao conteúdo de
asserções permite-nos retomar um aspecto já referido acerca de argumentos. Quando

137
declaramos válido um argumento queremos dizer que as proposições expressas pelas
premissas implicam a proposição expressa pela conclusão. Assim, o conceito de validade
aplica-se a uma certa relação que se verifica entre o conjunto de proposições que constituem o
argumento, não às asserções que as exprimem. Ora, a análise que efectuámos de (ii) e (iii)
aplica-se também a diferentes representações linguísticas do mesmo argumento (verificamo-lo
traduzindo qualquer dos argumentos já apresentados para outra língua). Daí que seja mais
correcto tratar os argumentos como conjuntos de proposições, não de frases ou asserções.

Vejamos agora outro aspecto decisivo. Considerem-se as seguintes duas frases: (c)
Platão é grego; (d) Descartes é francês. Alguma atenção permite-nos verificar que apesar de
diferentes significados (exprimem diferentes proposições) estas frases possuem a
mesma forma. Trata-se de frases da forma sujeito-predicado, pela qual uma certa propriedade
(expressa pelo predicado) é atribuída a um sujeito, respectivamente, Platão e Descartes. É
evidente que nem todas as frases têm esta forma mas o exemplo é suficiente para ilustrar o
que se pretende. Ora, de que maneira poderemos representar este facto? Bem, dado que é a
forma que desejamos trazer à superfície, a melhor maneira de proceder consiste em abstrair do
conteúdo, facto que se obtém substituindo nome e predicado por símbolos convencionalmente
adoptados para o efeito.

Fica-se, então, com o esquema: x é P. Na linguagem específica da lógica este facto é


representado do seguinte modo canónico. Esta maneira de representar frases da forma sujeito-
predicado permite-nos visualizar com bastante economia e clareza o facto de possuirem
um padrão comum. Na verdade, x representa qualquer objecto ou indivíduo a denotar por um
nome próprio e P representa qualquer predicado pelo qual seja atribuível ao objecto relevante
uma certa propriedade. Donde, não apenas (c) e (d) são exemplificações do padrão indicado,
como qualquer outra frase do mesmo tipo constitui uma instância, ou caso particular, desse
padrão. Vejamos de que modo esta característica é extensível a outro tipo de frases.

Considerem-se os seguintes exemplos: (e) Os portugueses são europeus; (f) Os


chineses são asiáticos. Ao contrário dos exemplos precedentes, (e) e (f) não são frases
constituídas por sujeito e predicado. Na verdade, ao afirmarmos que os portugueses são
europeus não estamos a referir indivíduos particulares; estamos a afirmar uma relação entre
duas classes ou conjuntos. É claro que esta relação envolve indivíduos mas apenas
enquanto membros de uma classe ou como elementos de um conjunto, não enquanto sujeitos
determinados. De facto, o que (e) e (f) afirmam é que uma certa classe, respectivamente, a

138
classe dos portugueses e a classe dos chineses, está incluída noutra, isto é, pela ordem
indicada, a classe dos europeus e a classe dos asiáticos. Usando o símbolo “⊂” para
representar a relação de inclusão entre classes, o padrão comum a (e) e (f) é o seguinte.

P⊂Q

De facto, é bastante vasto o número de frases cuja forma pode ser representada como
se indica acima. Quando, por exemplo, dizemos que os números naturais são um sub-conjunto
dos racionais formulamos uma asserção cuja forma se deixa também representar pelo mesmo
padrão (basta para isso substituir P e Q pelos símbolos matemáticos adequados). Este
resultado pode ainda ser generalizado: consoante a sua estrutura, determina-se um padrão do
qual a frase é uma instância particular. Esta estrutura exibe a conexão lógica que mantém
ligados os elementos que compõem o seu significado.

Indo um pouco mais longe, podemos agora substituir a linguagem da teoria dos
conjuntos pela linguagem típica da lógica — na qual, de resto, o conceito de inclusão é
representável. Para o conseguirmos basta-nos considerar a definição de inclusão já referida e
verificar ser esta a ideia expressa por (e) e (f). Iremos proceder para esse efeito à substituição
de P pelo conjunto dos portugueses e Q pelo conjunto dos europeus; em seguida, façamos o
mesmo com o conjunto dos chineses e dos asiáticos. A que conclusão chegamos? Bem, à
conclusão de que um conjunto está incluído no outro, isto é, que todos os elementos do
primeiro conjunto são também elementos do segundo.

Todavia, (e) e (f) contêm um elemento com o qual não fomos ainda confrontados: trata-
se da expressão “todos”. Esta expressão não é claramente um predicado. A sua função é a de
indicar universalidade. Daí a necessidade encontrar uma forma de representar a ideia
de universalidade para obter uma primeira aproximação ao padrão lógico desejado. Com este
objectivo, vamos socorrer-nos do símbolo “∀”. Em conjunção com um símbolo capaz de
representar um indivíduo qualquer, digamos x, obtém-se: (Para todo o x)[se x é português,
então, x é europeu]. Aplicando esta técnica a (e) temos: (∀x)[se x é chinês, então x é asiático].
Este, no entanto, é apenas um passo intermédio e não uma representação inteiramente
satisfatória de um ponto de vista lógico da forma de cada uma destas frases.

Uma maneira de se avançar um pouco mais na direcção pretendida consiste em


verificar, por exemplo, que “x é português” é uma frase já semi-formalizada do tipo sujeito-
predicado. O mesmo sucede com “xé europeu”. Visto que já sabemos como representar frases

139
com esta forma, tem-se o seguinte resultado: (∀x)[se P(x) então, Q(x)]. Para obtermos uma
formalização completa de (e) e (f) resta estipular um símbolo para representar a expressão
portuguesa “se..., então..”.. Os lógicos designam frases com esta forma por condicionais e
adoptaram uma seta para exprimir a relação. Estamos, finalmente, em condições de exibir o
padrão comum a (e) e (f).

(∀x)[P(x) → Q(x)]

Retomemos agora o nosso objectivo inicial. Pretendíamos saber em virtude de que


factores um argumento é válido. Ora, a validade de um argumento não depende do valor de
verdade das proposições que o constituem. A validade depende apenas da relação que se
verifica entre essas proposições. Não existem demasiadas opções. Na verdade, existe uma
única. Um argumento é válido em virtude da sua forma. Para compreender isto basta que
considerar cuidadosamente os seguintes exemplos de argumentos.

Exemplo 1

Todos os matemáticos são racionalmente competentes. João é matemático. Logo, o


João é racionalmente competente.

Exemplo 2

Todos os ziglibdin são estrelas cadentes de alta intensidade. MX 14 é um ziglibdin.


Logo, MX 14 é uma estrela cadente de alta intensidade. Vimos acima de que modo é possível
determinar a forma lógica de uma proposição. Para isso, recorremos a um simbolismo
específico, isto é, uma linguagem artificial que foi construída para esse efeito. No entanto, dada
o grau de complexidade da linguagem utilizada, é aconselhável para o que temos em mente
ilustrar recorrer agora a uma formalização mitigada sem alterar com esta decisão o objectivo.

Na verdade, não existe uma só linguagem disponível para formalizar proposições. Vejamos,
então, como proceder.

Uma análise atenta destes exemplos permite compreender em que medida a forma
lógica é determinante para a sua validade. Em ambos os casos, a conclusão proposta é uma
consequência das premissas. Apesar de ninguém saber o que é um ziglibdin nem que objecto
“MX 14” designa, sendo as premissas o que são, é logicamente impossível que a conclusão

140
seja falsa. Como nada sabemos a respeito do seu conteúdo, a única explicação para
aceitarmos E2 é a que resulta de se considerar a sua forma. Tem-se, então, que E1 e E2
partilham o seguinte padrão comum:

 Todo o A é B. x é A. Logo, x é B.

Apesar de várias insuficiências, esta maneira de representar a forma lógica dos


exemplos precedentes permite mostrar que qualquer que seja a interpretação dada a A, B
e x se obtém um argumento válido. Vejamos ainda outro caso.

Exemplo 3

 Todos os australianos falam inglês correctamente. Jimmy é australiano. Logo, Jimmy


fala inglês correctamente.

Como é óbvio, este não é o único padrão de inferência válido. No entanto, um argumento
que exemplifique o padrão acima indicado resulta válido independentemente das proposições
que o constituam. Conversamente, para provar que uma forma é inválida é suficiente mostrar
que existe uma interpretação, isto é, uma instância particular dessa forma, pela qual as
premissas são verdadeiras e a conclusão falsa. Se nos dermos ao trabalho de voltar à página 8
verificamos ser este o caso do exemplo aí proposto. Usando o expediente da formalização,
concluiu-se que toda a inferência com esse padrão lógico é inválida. Assim, se representarmos
pelos símbolos “A” e “B”, respectivamente, as frases “As taxas de juro baixam” e “António
compra uma casa no litoral”, estamos em condições de determinar a forma lógica do
argumento:

A → B
B
Logo, A

Estamos agora em condições de justificar o objectivo inicialmente proposto para os


estudos lógicos. De facto, este objectivo consiste em determinar quais os padrões de inferência
válidos de maneira a permitir um escrutínio rigoroso das inferências que efectuamos, bem
como das regras de inferência que podem ser utilizadas caso se deseje preservar a validade
dos argumentos que construímos para provar asserções. Pelo que acabamos de observar, a
intuição não é em muitos casos suficiente. Com o primeiro objectivo em mente, os lógicos
construiram linguagens artificiais do género indicado de modo a representarem

141
formalmente argumentos expressos nas diferentes linguagens naturais (o português, o inglês, o
polaco, etc.) e também na linguagem vulgarmente utilizada em matemática. Em simultâneo,
dedicaram-se ao estudos destas linguagens e sistemas formais com vista ao esclarecimento
das suas propriedades. Este é um domínio particularmente importante da lógica devido às
características do seu objectivo principal. Na verdade, se se pretende estudar as formas de
inferência válidas recorrendo à formalização de inferências expressas na linguagem natural ou
na linguagem da matemática, é importante, por exemplo, mostrar que essas linguagens não
dão origem a contradições.

7. 4. A teoria do conceito (termo) e sua classificação

O termo "conceito" tem origem a partir do latim “conceptus” (do verbo concipere) que
significa "coisa concebida" ou "formada na mente". O conceito pode ser uma ideia, juízo ou
opinião sobre algo ou alguma coisa. Exemplo: “A discussão começou porque nós temos
conceitos muito diferentes de relacionamento aberto”. O conceito é aquilo que se concebe no
pensamento sobre algo ou alguém. É a forma de pensar sobre algo, consistindo em um tipo de
apreciação através de uma opinião manifesta, por exemplo, quando se forma um bom ou mau
conceito de alguém. Neste caso, conceito pode ser sinônimo de reputação.

Também pode ser interpretado como um símbolo mental, uma noção abstrata contida
em cada palavra de uma língua que corresponde a um conjunto de características comuns a
uma classe de seres, objetos ou entidades abstratas, determinando como as coisas são. O
conceito expressa as qualidades de uma coisa ou de um objeto, determinando o que este é e o
seu significado. As palavras em várias línguas têm o mesmo significado porque expressam o
mesmo conceito. Por exemplo, o conceito de gato pode ser expresso como cat em
inglês, chat em francês, gato em espanhol, gatto em italiano, Katze em alemão, etc.
Em Filosofia, consiste em uma representação mental e linguística de um objeto concreto ou
abstrato, significando para a mente o próprio objeto no processo de identificação, classificação
e descrição do mesmo.

Quando contemplado como essência, um conceito define a natureza de uma entidade. Para
Aristóteles, o conceito era comparado ao eidos e de acordo com a lógica aristotélica, um
conceito é a forma mais básica de pensamento (em conjunto com o juízo e o raciocínio), sendo
a representação intelectual abstrata de um objeto.

142
7. 5. A teoria do juízo (proposição)

A partir do juízo de existência ou de realidade, considerado primordial, Aristóteles


estabelece as seguintes modalidades de oposição e de negação: o animal é; o animal não é; o
não animal é; o não animal não é. As proposições simples apresentam as mesmas
modalidades. Outro tipo de proposições admite maior número de modalidades: o homem é
mortal; o homem não é mortal; o homem é não mortal; o homem não é não mortal; o não
homem é mortal; o não homem não é mortal etc.Tomado em parte de sua extensão (alguns
homens são brasileiros); e individuais ou singulares, situações em que o sujeito é tomado no
mínimo de sua extensão (Aristóteles é filósofo). Os juízos se dividem de acordo com a
qualidade, a quantidade, a relação e a modalidade.

7. 5. 1. Classificação quantitativa e qualitativa dos juízos

Quanto à qualidade, podem ser afirmativos ou negativos. Os afirmativos sustentam a


conveniência do predicado ao sujeito (o homem é racional), enquanto os negativos sustentam
a não conveniência entre eles (o homem não é imortal).

7. 5. 2. Simbolização dos juízos e o quadro lógico

De acordo com a quantidade, os juízos podem ser de três tipos: universal, quando o
sujeito é tomado em toda sua extensão (todo homem é mortal); particular, quando o sujeito é
tomado em parte de sua extensão (alguns homens são brasileiros); e individuais ou singulares,
situações em que o sujeito é tomado no mínimo de sua extensão (Aristóteles é filósofo).

Contrarias

Contraditórias
subalternas subalternas

143
Contraditórias
I O

Particular afirmativo Partuclular negativa Eixo da quantidade

Eixo da qualidade

Quais são as regras da dedução por oposição?

Regras das contraditórias: diferem pela qualidade e quantidade. Trata-se de uma relação de
alternância: se uma é verdadeira, a outra é falsa e reciprocamente.

Por outras palavras, a verdade ou falsidade de uma proposição implica necessariamente a


verdade ou falsidade da proposição contraditória.

V F

F V

Esta regra é a própria expressão do princípio fundamental de não contradição em que assenta
a lógica. É por tanto admitida e não demonstrável. A lógica das contraditórias é a lógica da
disjunção exclusiva (pwq ).

Regras das subalternas: diferem pela quantidade.

Se a universal é verdadeira, a particular correspondente é verdadeira

Se a universal é falsa não podemos concluir nada quanto a verdade ou a falsidade da particular
correspondente.

Se a particular é verdade não podemos concluir nada quanto a verdade ou a falsidade da


universal correspondente.

Se a particular é falsa a universal correspondente é falsa.

144
Estas regras são a própria expressão do princípio de dedução dictum de omni dictum de parte.
Não são demonstrável, ainda que as teorias dos conjuntos manifeste o seu carácter de
evidência de uma maneira analógica

A E
A Vermelho I vermelho

E Vermelho O vermelho

A ~ vermelho I?
I O

E ~ vermelho O?

I vermelho A?

O vermelho E?

I ~ vermelho A ~ vermelho

O vermelho E ~vermelho

III Regras das contrárias: as regras contrárias são as universais A e E que diferem pela
qualidade. Trata-se de uma relação de incompatibilidade: não podem ser verdadeiras
juntamente, mas podem ser ambas falsas. Esta regra geral pode ser decomposta em 4 quatro
regras:

Se A é verdadeira, então E é falsa.

Demonstração:

Se A é verdadeira, então O é falsa (contraditórias)

Se O é falsa, então E é falsa (subalternas)

Portanto, se A é verdadeira, então E é falsa.

O mesmo tipo de demonstração é valida para as três outras regras.

Se E é verdadeira, então A é falsa.

Se A é falsa, não há conclusão para E (verdadeira ou falsa)

145
Se E é falsa, não há conclusão para A (verdadeira ou falsa)

IV Regra das subcontratais: as subcontrárias são as particulares I e O que diferem pela


qualidade. Trata-se de uma relação de disjunção. Não podem ser falsa juntamente, mas podem
ser ambas verdadeiras. Esta regra geral pode ser decomposta em quatro regras:

Se I é verdadeira, então não há conclusão para O (verdadeira ou falsa).

Demonstração:

Se I é verdadeira, então E é falsa (contraditória).

Se E é falsa, não há conclusão para O (subalternas).

Portanto, se I é verdadeira, não há conclusão para O

O mesmo tipo de demonstração é válido para as (3) três outras regras.

Se I é falsa, então O é verdadeiro.

Se O é verdadeira, então não há conclusão para I.

Se O é falsa, então I é verdadeira

Todas as regras de dedução por oposição podem ser resumida na tabela seguinte: V=
verdadeiro; F igual a Falso; ? = sem conclusão possível.

146
Premissas Conclusões
A E I O
A - F V F
E F - F V
V I ? F - ?
O F ? ? -

A - ? ? V
E ? - V ?
F I F V - V
O V F V N

Tabela das
conversões
entre
proposições
Proposição primitiva Proposição
conversa
A Todo S é P Converte- Algum
se em PéS
E Nenhum S é P Converte-se Nenhum P é S E
em
I Algum S é P Converte-se Algum P é S I
em
O Algum S não é Converte-se Conversão
P em impossível

Possíveis itinerários de lógica:

Do verdadeiro ao verdadeiro do falso ao falso

A E A E

147
I O I O

Do verdadeiro ao falso do falso ao verdadeiro

A E A E

I O I O

Dedução por conversão

A conversão ou a antístrofe ou reprocação consiste em inverter os termos de uma


proposição, mantendo a qualidade e a verdade da proposição; Certos pintores são músicos, é
convertida em certos músicos são pintores. Esta operação só possível se os dois termos
(sujeito e predicado) possuírem a mesma extensão, como acontece no caso das proposições E
e I. Alguns autores aceitam a conversão das proposições A na condição de que a conversa se
torne I. Trata-se então de uma conversão por acidente.

Praticamente: E converteu-se em E
Conversão simples
I converteu-se em I

A converteu-se em I Conversão por acidente

O não se converteu.

Tomemos um exemplo para mostrar que a proposição O não pode ser convertida:

Proposição: certos lógicos não são Juristas (O)

Conversa: certos Juristas não são lógicos (O)

O esquema seguinte ilustra um caso em que a proposição é verdadeira e a conversa falsa.


Ora, não podemos deduzir o falso do verdadeiro.

Lógico Jurista

148
Dedução por observação.

A observação de uma observação consiste em formulá-la de outro modo, mantendo o


mesmo sentido, mas mudando a sua qualidade para negar o predicado. O observe de uma
afirmativa universal será uma negativa universal e reciprocamente. O observe de uma
afirmativa particular será uma negativa particular e reciprocamente.

A E e E A

I O e O I

Dedução por contra posição

Contrapomos uma proposição permutando o seu sujeito e o seu predicado (conversão) e


negando os dois termos. A contraposta de uma proposição é uma proposição da mesma
quantidade, da mesma qualidade e do mesmo valor da verdade. Todavia, a utilização da contra
posição na língua corrente é bastante difícil e a maior dos lógicos consideram que só a
proposição A pode ser contraposta.

Exercícios

1. Efectuar as oposições possíveis e indicar o valor de verdade se a premissa é verdadeira


e se é falsa.
A. Todos os cães têm quatro patas. A (V) (F).
Resposta: contraria: nenhum Cão tem quatro patas E (F) (?)
Contraditória: qualquer cão não tem quatro patas. O (F) (V)
Subalterna: qualquer cão tem quatro patas. I (V) (?).
B. Poucos homens são justos. I (V) (F).
Resposta: subcontrária: Qualquer homem não é justo. O (?) (V).
Contraditória: Algum homem não é Justo. E (F) (V).
Subalterna: Todo homem é justo. A (?) (F).
C. Existem belas raparigas em Paris. I (V) (F).
Resposta: subcontrária: Algumas belas raparigas não estão em Paris. O (?) (V)
Contraditórias: Nenhuma bela rapariga está em Paris. E (F) (V).
Subalterna: todas as belas raparigas estão em Paris. A (?) (F).
2. Conversão das seguintes proposições:

149
A. Todos os homens são mortais. (A)
Resposta: Conversa: certos mortais são homens (I) (por acidente)
B. Nenhum europeu é americano. (E)
Resposta: Conversa: Nenhum americano é europeu. (E) (simples).
C. Qualquer pintor é escultor. (I) (simples).
D. Certos Gatos não são cinzentos. (O):
Resposta: Não se converte

Com relação à quantificação do sujeito, distingue-se a compreensão, que é o conteúdo


do conceito, e a extensão, que indica a quantidade de objectos aos quais o conceito se aplica.
Quanto maior for o conteúdo, ou conjunto de atributos característicos do conceito, menor será
a extensão. Por exemplo, o conceito "mesa" abrange todos os membros da classe. Quando se
acrescenta o atributo "branca", aumenta-se a compreensão, mas limita-se a quantidade de
mesas individuais a que se refere e diminui-se a extensão17.

Do ponto de vista da relação, os juízos se distinguem em categóricos, hipotéticos e


disjuntivos. No juízo categórico, o enunciado independente de condições (Aristóteles é grego);
no hipotético, é condicional (se fizer bom tempo, sairemos); no disjuntivo, também condicional,
a condição está na própria predicação (o objecto real é físico ou psíquico). De acordo com a
modalidade, os juízos podem ser assertóricos, problemáticos e apodícticos. No juízo
assertórico, a validade do enunciado é de fato e não de direito (o livro está aberto, mas poderia
estar fechado); no problemático, a validade é apenas possível (talvez as injustiças sejam
reparadas); no apodíctico a validade é necessária e de direito, e não de fato (dois mais dois
são quatro).

Raciocinar, em lógica, significa estabelecer uma relação necessária entre duas


proposições ou enunciados. No tratado Analysis próté (Primeiras analíticas), terceira parte do
Órganon, Aristóteles estuda o silogismo, cuja doutrina criou, para estabelecer as condições
fundamentais do conhecimento científico. O silogismo é "um argumento do qual, admitidas
certas coisas, algo diferente resulta necessariamente de sua verdade, sem que se precise de
qualquer outro termo". Aristóteles distingue o silogismo, ou dedução, da indução. A dedução
vai do universal ao particular, e a indução do particular ao universal. Mesmo assim,
compreende que a indução é no fundo silogístico.

17
T. Fhilipe, “Noções de Lógica” Edições 70 LDA, Lisboa 2010.

150
No tratado do Órganon intitulado Análysis deutera (Segundas analíticas), Aristóteles
estuda a demonstração e a definição. A propósito, indica os temas possíveis da investigação
científica: (1) o que a palavra significa; (2) o que o objecto correspondente é; (3) qual a
essência desse objecto; (4) quais são suas propriedades; (5) por que tem essas propriedades.
Assim, o método científico começa com a determinação de um objecto conhecido apenas pelo
nome, e prossegue com a determinação da essência e da existência do objecto. A
demonstração é um silogismo científico cujas premissas devem ser verdadeiras, primeiras,
indemonstráveis e mais inteligíveis do que a conclusão e a causa da conclusão. Os princípios,
ou pontos de partida do conhecimento científico, são os axiomas e as teses das diversas
ciências, subdivididas em hipóteses e definições. Acrescentam-se ainda os postulados que, ao
contrário dos tipos de proposição mencionados, só devem ser admitidos depois de
demonstrados.

A ciência consiste no encadeamento lógico das proposições que, tomadas


isoladamente, não poderiam ser conhecidas como verdadeiras. A rigor, a demonstração trata
de evidenciar, por meio de mediações sucessivas, o que é inicialmente admitido como simples
hipótese ou suposição. Além da demonstração ou da prova, Aristóteles admite, como forma de
conhecimento, os primeiros princípios, que excluem a demonstração. Perguntar o que é
alguma coisa é perguntar qual é a essência dessa coisa, e responder à pergunta é expor essa
essência em sua definição. Aristóteles classifica três espécies de definição: a indemonstrável
(a unidade em aritmética, por exemplo); a definição causal ou real; e a definição nominal. A
propósito da definição da espécie, recomenda: (1) só tomar como características de espécie os
atributos que pertencem a sua essência; (2) apresentar os atributos em ordem, do determinável
ao determinando; (3) dar as indicações necessárias para distinguir o definido de tudo o que
dele difere. A obediência a essas regras permitirá definir, pela indicação do género próximo e
da diferença específica, determinações que, por hipótese, devem conter a essência do objecto
definido.

Por consistir numa redução à evidência, a demonstração implica a apreensão dos primeiros
princípios, indemonstráveis. No processo que conduz da percepção à ciência, Aristóteles vê
que o primeiro momento é a memória ("persistência da percepção") e o seguinte é a
experiência, que é a lembrança das percepções dos mesmos objectos e a abstracção daquilo
que apresentam em comum. A passagem do particular ao universal é possível porque o que se
percebe no objecto particular não é o que o particulariza, mas os caracteres que tem em
comum com objectos semelhantes. Ao ascender a universais cada vez mais extensos, chega-

151
se, pela razão intuitiva, aos primeiros princípios da ciência, os axiomas, as definições, os
postulados e as hipóteses. Segundo Aristóteles, é por indução que se aprendem os primeiros
princípios, pois é assim que a percepção produz o universal.

Lógica na Idade Média. Traduzidos para o latim por Boécio, alguns tratados da obra de
Aristóteles passaram a ser usados, na Idade Média, no ensino da lógica, incluída nas
disciplinas dos cursos de direito e teologia. A esterilidade criativa que predominou durante
cerca de cinco séculos só foi interrompida no século XII com a c de Abelardo, teólogo eminente
e controvertido, autor de Sic et non (Sim e não). Durante o século XII, traduções
complementares do Órganon de Aristóteles acrescentaram tópicos desconhecidos da "velha
lógica" que foram agrupados sob o nome geral de "nova lógica". No século XIII, houve uma
cisão entre os lógicos: alguns aderiram à ortodoxia aristotélica, enquanto outros adoptaram
uma visão mais liberal e, nas escolas de artes e nas recém-criadas universidades, propuseram
a lógica moderna. Guilherme de Sherwood e seu discípulo Pedro Hispano (posteriormente
papa João XXI), autor do livro sobre lógica mais utilizado nos 300 anos que se seguiram, foram
os principais representantes dessa nova tendência. Entre os lógicos do século XIV, deve-se
pelo menos mencionar Guilherme de Occam, além de Jean Buridan e seu aluno Alberto da
Saxónia. No século seguinte, Paulo Vêneto, teólogo agostiniano, produziu uma extensa obra
intitulada Lógica magna, usada como livro didáctico durante os séculos XV e XVI.

No mundo grego, a tradição de parafrasear e comentar os tratados lógicos de Aristóteles


teve continuidade nas obras de João Filopono e Estêvão de Alexandria, neoplatónica do século
VII, entre outros. Nos séculos XI e XIII, foram produzidos vários compêndios de lógica. Os
árabes também cultivaram a lógica e, no início do século IX, já contavam com traduções de
alguns tratados do Órganon de Aristóteles. Entretanto, a produção dos representantes da
escola de Bagdá, surgida no século seguinte, quase toda perdida, foi criticada pelo filósofo
Avicena, que a considerava exageradamente servil à doutrina de Aristóteles. Avicena defendeu
uma linha mais independente e expressou seu conceito de lógica no livro Kitab al-shifa (O livro
da cura).

7. 5. 3. A teoria do raciocínio (silogismo)

O silogismo é o argumento que, segundo Aristóteles, possui três características: é


mediado, dedutivo e necessário. O silogismo é mediado, pois não é apreendido
imediatamente da percepção, mas deve usar o raciocínio para compreender o real.

152
É dedutivo porque parte da verdade de premissas universais para se chegar a outras
premissas. E é necessário, porque estabelece uma cadeia causal entre as premissas. As
premissas, para formar um silogismo, devem ser assim distribuídas:

 A primeira premissa, chamada de premissa maior, deve conter o termo maior e o termo
médio;
 A segunda premissa, chamada de premissa menor, deve conter o termo médio e o
termo menor;
 A conclusão deve conter os termos maior e menor.

Abaixo, seguem algumas regras para um melhor entendimento da forma do silogismo:


1. O silogismo deve sempre conter três termos: o maior, o menor e o médio;

2. O termo médio deve fazer parte das premissas e nunca da conclusão e deve ser
tomado ao menos uma vez em toda a sua extensão;

3. Nenhum termo pode ser mais extenso na conclusão do que nas premissas, porque
assim, concluir-se-á mais que o permitido, ou seja, uma das premissas deverá ser
sempre universal e necessária, positiva ou negativa.

4. A conclusão não pode conter o termo médio (vide item 2);

5. De duas premissas negativas, nada poderá ser concluído. O termo médio não terá
ligado os extremos;

6. De duas premissas afirmativas, a conclusão deve ser afirmativa, evidentemente;

7. De duas proposições particulares, nada poderá ser concluído (vide item 2);

8. A conclusão sempre acompanha a parte “fraca”, isto é, se houver uma premissa negativa,
a conclusão será negativa. Se houver uma premissa particular, a conclusão será particular. Se
houver ambas, a conclusão deverá ser negativa e particular.

Dessa forma, pode-se configurar alguns modos de silogismo em Aristóteles:

A. Todas as proposições são universais afirmativas.

Ex.:
Todos os homens são mortais.
Todos os brasileiros são homens.
Logo, todos os brasileiros são mortais.

Este é o famoso silogismo perfeito, porque demonstra a ligação necessária entre indivíduo,
espécie e gênero. É o que visa à ciência.

B A premissa maior é universal negativa, a premissa menor é universal afirmativa e a


conclusão é universal negativa.

Ex.:
Nenhum astro é perecível.

153
Todas as estrelas são astros.
Logo, nenhuma estrela é perecível.

. A premissa maior é universal afirmativa, a premissa menor é particular afirmativa e a


conclusão é particular afirmativa.

Ex.:
Todos os homens são mortais.

João é homem.

Logo, João é mortal.

D. A premissa maior é universal negativa, a premissa menor é particular afirmativa e a


conclusão é particular negativa.

Ex.:
Nenhum rei é amado.
Henrique VII é um rei.

O termo "conceito" tem origem a partir do latim “conceptus” (do verbo concipere) que significa
"coisa concebida" ou "formada na mente".

O conceito pode ser uma ideia, juízo ou opinião sobre algo ou alguma coisa. Exemplo: “A
discussão começou porque nós temos conceitos muito diferentes de relacionamento aberto”.

O conceito é aquilo que se concebe no pensamento sobre algo ou alguém. É a forma de


pensar sobre algo, consistindo em um tipo de apreciação através de uma opinião manifesta,
por exemplo, quando se forma um bom ou mau conceito de alguém. Neste caso, conceito pode
ser sinônimo de reputação.

Também pode ser interpretado como um símbolo mental, uma noção abstrata contida em cada
palavra de uma língua que corresponde a um conjunto de características comuns a uma classe
de seres, objetos ou entidades abstratas, determinando como as coisas são.

O conceito expressa as qualidades de uma coisa ou de um objeto,


determinando o que este é e o seu significado.

As palavras em várias línguas têm o mesmo significado porque expressam o


mesmo conceito.

Por exemplo, o conceito de gato pode ser expresso como cat em inglês, chat em
francês, gato em espanhol, gatto em italiano, Katze em alemão, etc.

154
Em Filosofia, consiste em uma representação mental e linguística de um objeto concreto ou
abstrato, significando para a mente o próprio objeto no processo de identificação, classificação
e descrição do mesmo.

Quando contemplado como essência, um conceito define a natureza de uma entidade. Para
Aristóteles, o conceito era comparado ao eidos e de acordo com a lógica aristotélica, um
conceito é a forma mais básica de pensamento (em conjunto com o juízo e o raciocínio), sendo
a representação intelectual abstrata de um objeto.

Logo, Henrique VII não é amado.

É claro que pelas possibilidades, existem até 64 modos de se produzir um argumento


ou silogismo, mas na prática, essas são as suas formas mais utilizadas. Lembrando que essas
regras são utilizadas para fazer o famoso cálculo de predicados naquilo que chamamos de
lógica formal aristotélica.

7. 5. 4. Figuras e Modos dos silogismos

Inferir significa extrair uma proposição como conclusão de outras. O silogismo é o argumento
que, segundo Aristóteles, possui três características: é mediado, dedutivo e necessário.
O silogismo é mediado, pois não é apreendido imediatamente da percepção, mas deve usar o
raciocínio para compreender o real. É dedutivo porque parte da verdade de premissas
universais para se chegar a outras premissas. E é necessário, porque estabelece uma cadeia
causal entre as premissas. As premissas, para formar um silogismo, devem ser assim
distribuídas:

 A primeira premissa, chamada de premissa maior, deve conter o termo maior e o termo
médio;
 A segunda premissa, chamada de premissa menor, deve conter o termo médio e o
termo menor;
 A conclusão deve conter os termos maior e menor.

Abaixo, seguem algumas regras para um melhor entendimento da forma do silogismo:

 . O silogismo deve sempre conter três termos: o maior, o menor e o médio;

155
 . O termo médio deve fazer parte das premissas e nunca da conclusão e deve ser
tomado ao menos uma vez em toda a sua extensão;
 . Nenhum termo pode ser mais extenso na conclusão do que nas premissas, porque
assim, concluir-se-á mais que o permitido, ou seja, uma das premissas deverá ser
sempre universal e necessária, positiva ou negativa.
 . A conclusão não pode conter o termo médio (vide item 2);
 . De duas premissas negativas, nada poderá ser concluído. O termo médio não terá
ligado os extremos;
 . De duas premissas afirmativas, a conclusão deve ser afirmativa, evidentemente;
 . De duas proposições particulares, nada poderá ser concluído (vide item 2);
 . A conclusão sempre acompanha a parte “fraca”, isto é, se houver uma premissa
negativa, a conclusão será negativa. Se houver uma premissa particular, a conclusão
será particular. Se houver ambas, a conclusão deverá ser negativa e particular. Não pare
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Dessa forma, pode-se configurar alguns modos de silogismo em Aristóteles:

A. Todas as proposições são universais afirmativas.

Ex.:

Todos os homens são mortais.

Todos os brasileiros são homens.

Logo, todos os brasileiros são mortais.

Este é o famoso silogismo perfeito, porque demonstra a ligação necessária entre indivíduo,
espécie e gênero. É o que visa à ciência.

B. A premissa maior é universal negativa, a premissa menor é universal afirmativa e a


conclusão é universal negativa.

Ex.:

Nenhum astro é perecível.

Todas as estrelas são astros.

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Logo, nenhuma estrela é perecível.

C. A premissa maior é universal afirmativa, a premissa menor é particular afirmativa e a


conclusão é particular afirmativa.

Ex.:

Todos os homens são mortais.

João é homem.

Logo, João é mortal.

D. A premissa maior é universal negativa, a premissa menor é particular afirmativa e a


conclusão é particular negativa.

Ex.:

Nenhum rei é amado.

Henrique VII é um rei.

Logo, Henrique VII não é amado.

É claro que pelas possibilidades, existem até 64 modos de se produzir um argumento


ou silogismo, mas na prática, essas são as suas formas mais utilizadas. Lembrando que essas
regras são utilizadas para fazer o famoso cálculo de predicados naquilo que chamamos de
lógica formal aristotélica.

157
CONCLUSÃO

Os temas desenvolvidos neste documento tiveram uma miragem virada ás problemáticas


debatidas em diversos pontos de vistas, esferas e dimensões universais da vida e com maior
proporcionalidade sobre as questões relacionadas à Natureza (Cosmo-Phisys), Homem-Moral
entre os gregos, a Fé e a Razão com os romanos na Idade Média, a Política e Ciência com os
Filósofos Modernos, também conhecido como período das descobertas e da ruptura
epistemológica e o fim do papado, aflorou-se os principais problemas da filosofia
contemporânea: a Epistemologia, analítica, a lógica, conhecida como a era do conhecimento e
da ciência e tecnologia.

Se teve também em conta as reflexões que vibravam a África, as comunidades euro-


afrocêntricas e afro-americanas , no que tange o pensamento africano e do homem negro, que
começou no Ocidente, nomeadamente, nos EUA e Europa francofónica, e veio a terminar em
África, com as tendências sobre o nacionalismo africano, expressa, por intermédio de vários
valores, como a autenticidade, negritude, africanidade, etnofilosofia e filosofia da libertação
africana.

Todos estes conteúdos visam dotar os estudantes “cadetes” de ferramentas suficientes e


necessárias para a sua competência científica e profissionais em assuntos militares de guerra
ou em tempo de paz. Fazendo que se tornem produtores do conhecimento e não apenas
meros reprodutores de conhecimento. A Lógica como ferramenta regular para o uso saneável
do pensamento militar nas acções e decisões profissionais, faculta ao futuro oficial, de
competências para tornar o exercício do militar, mais coerente e pragmático, através da
aplicação logocentrica de silogismos militares.

158
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Catedra de Filosofia

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Coordenação de Filosofia

Politano Adelino Neto

162

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