Antropologia Cultural.....................................................................................................................5
1. Apresentação........................................................................................................................5
2. Introdução............................................................................................................................5
3. Objectivos Gerais................................................................................................................6
4. Objectivos cognitivos e educacionais................................................................................6
5. Plano temático......................................................................................................................6
Unidade 1 A Antropologia Cultural: Introdução e definições preliminares.............................9
1.1 Introdução........................................................................................................................9
1.2 Objectivos.........................................................................................................................9
1.3 O que é a Antropologia?.................................................................................................9
A antropologia hoje...................................................................................................................9
O objecto de estudo da antropologia......................................................................................10
A crise do objecto de estudo da antropologia.........................................................................10
O que fazem os antropólogos?................................................................................................11
A antropologia: ciência ou arte?............................................................................................12
A antropologia como espelho para a humanidade.................................................................13
1.4 A Antropologia e os seus campos de conhecimento....................................................13
1. 5 Etnografia, Etnologia, Antropologia..........................................................................15
1.6. Os enfoques sectoriais..................................................................................................15
1.7 Relação entre a Antropologia e a Educação...............................................................16
1.8 Relação da Entropologia Cultural com as outras ciências humanas e sociais.........17
A Antropologia e a Psicologia................................................................................................19
A Antropologia e a Sociologia................................................................................................20
A Antropologia e o Direito......................................................................................................21
A Antropologia e a História....................................................................................................21
A Antropologia e a Filosofia...................................................................................................22
Actividades.................................................................................................................................23
Unidade 2 Métodos e princípios do método de Antropologia Cultural....................................24
2.1 Introdução......................................................................................................................24
2.2 Objectivos.......................................................................................................................24
2.3 O processo de uma investigação antropológica.........................................................24
2.4 O método etnográfico: o trabalho de campo...............................................................26
1
A invenção do trabalho de campo...........................................................................................26
O trabalho de campo como método........................................................................................28
Traços do trabalho de campo antropológico..........................................................................29
A etnografia e o método comparativo.....................................................................................30
A trabalho de campo e a entrada no terreno..........................................................................30
2.5 Técnicas de investigação antropológica.......................................................................31
2.6 A observação participante............................................................................................35
2.7 Os discursos emic-etic..................................................................................................36
2.8 O antropólogo em contextos urbanos.........................................................................37
2.9 A ética do trabalho de campo.......................................................................................37
Exercício de descrição etnográfica.........................................................................................38
Actividades.................................................................................................................................38
3.1 Introdução......................................................................................................................39
3.2 Objectivos.......................................................................................................................39
3.3 Os primórdios da antropologia...................................................................................39
3.4 Evolucionismo...............................................................................................................41
Antropólogos evolucionistas:..................................................................................................41
Visão crítica do evolucionismo...............................................................................................44
3.5 O Difusionismo..............................................................................................................45
3.6 O particularismo histórico............................................................................................46
3.7 Escola de Cultura e Personalidade.............................................................................47
3.8 O Funcionalismo...........................................................................................................47
A introdução dos estudos de campo........................................................................................48
O conceito de função...............................................................................................................48
3.9 O neoevolucionismo, a ecologia cultural e o materialismo histórico.......................49
O Neoevolucionismo................................................................................................................49
A Ecologia Cultural.................................................................................................................50
O materialismo cultural..........................................................................................................50
3.10 O estruturalismo francês..............................................................................................51
Outros antropólogos estruturalistas franceses.......................................................................52
3.11 Antropologia em África e em Moçamique.................................................................57
A Antropologia colonial..........................................................................................................57
A Antropologia no pós-independência, em Moçambique.......................................................59
Antropologia em África e no chamado Terceiro Mundo........................................................67
2
Actividades.................................................................................................................................69
Unidade 4 A cultura e as Culturas...............................................................................................70
4.1 Introdução......................................................................................................................70
4.2 Objectivos.......................................................................................................................70
4.3 Cultura e Sociedade......................................................................................................70
Sociedade.................................................................................................................................70
Relações sociais......................................................................................................................71
Cultura.....................................................................................................................................71
Holismo...................................................................................................................................71
4.4 A noção antropológica da Cultura..............................................................................72
4.5 Características da noção antropológica de cultura....................................................73
A Cultura é aprendida.............................................................................................................73
A Cultura é simbólica..............................................................................................................75
A Cultura submete a natureza.................................................................................................75
A Cultura é geral e específica (Cultura –Culturas)...............................................................76
A cultura inclui tudo................................................................................................................76
A cultura é partilhada.............................................................................................................76
A cultura está pautada............................................................................................................77
A gente utiliza criativamente a cultura...................................................................................77
A cultura está em todas as partes............................................................................................77
4.6 A Cultura material e imaterial....................................................................................79
4.7 A noção sociológica e a noção estética do conceito de cultura..................................80
4.8 O conteúdo do conceito antropológico de cultura......................................................82
As crenças e as ideias..............................................................................................................82
Os valores................................................................................................................................83
As normas culturais.................................................................................................................83
Os símbolos.............................................................................................................................83
4.9 Os universais da cultura..............................................................................................85
4.10 A mudança cultural......................................................................................................87
4.11 A mudança social..........................................................................................................89
Qual o peso da estrutura e qual o da acção social na mudança?..........................................89
Actividades.................................................................................................................................92
Unidade 5 Identidade Cultural....................................................................................................93
5.1 Introdução......................................................................................................................93
3
5.2 Objectivos.......................................................................................................................93
5.3 identidade e alteridade: paradigmas...........................................................................93
Resposta essencialista, substantivista, psicologicista ou primordialista................................93
Resposta Cognitivista..............................................................................................................94
Resposta Interaccionista, processual, situacionista e sociohistórica:....................................95
5.4 A identidade como constructo relacional....................................................................95
5.5 . A noção de raça e a ideologia racial...........................................................................97
5.6 Grupos étnicos e etnicidade.......................................................................................100
5.7 A percepção cultural dos grupos étnicos..................................................................102
Como se formam os estereótipos no interior das pessoas?...................................................103
De onde nascem os estereótipos?..........................................................................................104
Como se mantêm um estereótipo?.........................................................................................104
Como funcionam os estereótipos?.........................................................................................104
5.8 Modelos de convivência intercultural........................................................................104
Modelo de integração impossível: Alemanha.......................................................................104
Modelo da assimilação: França............................................................................................104
Tolerância pluriétnica ou pluricultural: U.K........................................................................105
5.9 O conflito identitário..................................................................................................106
Actividades...............................................................................................................................107
Unidade 6 O Parentesco: organização sócio-política a célula e produção.............................108
6.1 Introdução....................................................................................................................108
6.2 Objectivos.....................................................................................................................108
6.3 Definição do parentesco.............................................................................................108
6.4 Grupos de parentesco.................................................................................................109
6.5 Tipos de família..........................................................................................................109
6.6 O Casamento...............................................................................................................110
Tipos de casamento...............................................................................................................111
Padrões de residência pós-casamento..................................................................................113
6.7 Os sistemas de descendência e herança....................................................................113
Actividades...............................................................................................................................114
Unidade 7 A Antropologia Económica.....................................................................................115
7.1 Introdução....................................................................................................................115
7.2 Objectivos.....................................................................................................................115
7.3 Antropologia económica............................................................................................115
4
7.4 A reciprocidade...........................................................................................................116
7.5 A redistribuição...........................................................................................................117
7.6 Intercâmbio de mercado............................................................................................118
7.7 Modos de produção.....................................................................................................119
7.8 Caça, pesca e recoleção..............................................................................................119
7.9 Pastorícia.....................................................................................................................120
7.10 Cultivo agrícola: horticultura e agricultura............................................................121
Horticultura...........................................................................................................................121
Agricultura............................................................................................................................121
7.11 A produção industrial................................................................................................122
7.12 A sociedade pós-industrial.........................................................................................122
Actividades...............................................................................................................................123
Unidade 8 Antropologia Política................................................................................................124
8.1 Introdução....................................................................................................................124
8.2 Objectivos.....................................................................................................................124
8.3 Introdução: política, poder e autoridade.................................................................124
8.4 Os sistemas políticos nos bandos de caçadores e recolectores................................127
8.5 Os sistemas políticos nos sistemas tribais.................................................................127
8.6 Os sistemas políticos nas chefaturas.........................................................................128
8.7 Os sistemas políticos nos estados...............................................................................128
8.8 Rituais e ordem...........................................................................................................130
Actividades...............................................................................................................................130
Unidade 9 Antropologia da Religião..........................................................................................131
9.1 Introdução....................................................................................................................131
9.1 Objectivos.....................................................................................................................131
9.3 A Religião.....................................................................................................................131
9.4 Expressões da religião................................................................................................131
Animismo...............................................................................................................................131
Maná e tabu...........................................................................................................................132
Magia e religião....................................................................................................................132
O Totemismo..........................................................................................................................134
Os mitos.................................................................................................................................134
9.5 Religião e cultura.........................................................................................................135
9.6 Religião e mudança....................................................................................................136
5
9.7 A religião e o tempo do calendário.............................................................................136
Actividades...............................................................................................................................138
Bibliografia básica.......................................................................................................................139
Antropologia Cultural
1. Apresentação
Nos encontros presenciais, os docentes privilegiarão aulas teóricas expositivas:
(conferências), nas quais serão apresentados temas específicos com conceitos teóricos e
exemplos etnográficos relacionados com os temas em questão. No decurso destas sessões, os
estudantes adquirirão os textos básicos de estudo, que compreendem um caderno de
apontamentos e um outro com textos de apoio.
O caderno de apontamentos é este que o caro estudante tem nas suas mãos. Nele encontram-
se:
O programa/plano de estudos, no qual constam os objectivos de aprendizagem da
disciplina, as unidades temáticas e respectivos conteúdos, a calendarização do estudo
dos estudantes e a indicação da bibliografia.
Os apontamentos contendo os conteúdos detalhados, organizados por unidades
temáticas. O caderno de apontamentos contém também indicação de actividades, em
forma de questionário, que o estudante deverá resolver durante o tempo destinado ao
estudo individual.
O texto de apoio é uma colectânea de textos de diferentes autores que tratam de temas
específicos em estudo na disciplina. Tais textos complementam o caderno de apontamentos. O
estudante deverá utilizar estes dois instrumentos em simultâneo.
É importante que o estudante leia os materiais, de acordo com a calendarização que lhe é
proposta no caderno de apontamentos, porque se deixar que a matéria se acumule pode não
vir a ter tempo suficiente para estudá-la na altura das provas escritas.
2. Introdução
6
munido de conhecimentos para fazer a reflexão sobre os processos, fenómenos culturais, para
a acção pedagógica efectiva e será capaz de usar alguns elementos da educação tradicional na
transmissão dos conteúdos científicos e provocar uma revolução epistemológica.
O estudante dominará os diferentes sistemas de filiação das sociedades moçambicanas, as
diferentes terminologias de parentesco e seu valor sociológico; saberá diferenciar as noções
de etnicidade, grupo étnico, categoria étnica, para além de resolver os problemas de ordem
social. É ainda interesse deste programa munir os estudantes de conhecimentos sobre a
importância da ideologia na sociedade, a articulação entre a ideologia, reprodução da
sociedade e o status quo social e, por fim, reconhecer o impacto da religião tradicional em
África e, em particular, Moçambique.
3. Objectivos Gerais
8
Evolucionismo
O Difusionismo
O particularismo histórico
Edições 70, 2000
Escola de Cultura e
3) LERMA MARTINEZ,
Personalidade
Francisco. Antropologia
O Funcionalismo
Cultural: guia para o
O neo-evolucionismo, a
estudante. 4 Ed.
ecologia cultural e o
Maputo, Paulinas
materialismo histórico
Editora, 2003
O estruturalismo francês
Antropologia em África e
em Moçambique
4. A Cultura e as Culturas
Cultura e Sociedade
A noção antropológica da
Cultura
Características da noção 1) Apontamentos, Unidade 4
antropológica de cultura 2) MELLO, Luiz Gonzaga
A Cultura material e de. Antropologia
imaterial Cultural. 11 ed.
10 A 22 de Setembro
A noção sociológica e a Petrópolis, Vozes, 2004
noção estética do conceito 3) HARRIS, Marvin.
de cultura Canibais e reis. Lisboa,
O conteúdo do conceito Edições 70, 1990
antropológico de cultura
Os universais da cultura
A mudança cultural
A mudança social
5. Identidade Cultural 24 A 29 de Setembro 1) Apontamentos, Unidade 5
Identidade e alteridade: 2) LINTON, Ralph. O
paradigmas Homem: uma
A identidade como introdução à
construção relacional Antropologia. São
9
A noção de raça e a
ideologia racial
Grupos étnicos e etnicidade
A percepção cultural dos Paulo: Martins Fontes,
grupos étnicos 2000
Modelos de convivência
intercultural
O conflito identitário
6. O Parentesco: organização 1) Apontamentos, Unidade 6
sociopolítica a célula e 2) RIVIÈRE, Claude.
produção Introdução à
Definição do parentesco Antropologia. Lisboa,
Grupos de parentesco Edições 70, 2000
O Casamento Francisco.
Antropologia Cultural:
Os sistemas de descendência
guia para o estudante. 4
e herança
Ed. Maputo, Paulinas
Editora, 2003
7. A Antropologia Económica
Antropologia económica
1) Apontamentos, Unidade 7
A reciprocidade 2) RIVIÈRE, Claude.
A redistribuição Introdução à
Intercâmbio de mercado Antropologia. Lisboa,
Modos de produção Edições 70, 2000
Caça, pesca e recolecção 8 A 13 de Outubro 3) LERMA MARTINEZ,
Pastorícia Francisco.
10
bandos de caçadores e Introdução à
recolectores Antropologia. Lisboa,
Os sistemas políticos nos Edições 70, 2000
sistemas tribais 3) LERMA MARTINEZ,
Os sistemas políticos nas Francisco.
chefaturas Antropologia Cultural:
Os sistemas políticos nos guia para o estudante. 4
estados Ed. Maputo, Paulinas
Rituais e ordem Editora, 2003
9. Antropologia da Religião 1) Apontamentos, Unidade 9
A Religião 2) RIVIÈRE, Claude.
Expressões da religião Introdução à
6. Avaliação
Aos estudantes serão aplicadas três avaliações: a primeira e a segunda serão exercícios
escritos e a terceira será um trabalho individual, de investigação independente. Em Dezembro
de 2007 haverá um exame final.
11
Unidade 1
A Antropologia Cultural: Introdução e definições preliminares
1.1 Introdução
1.2 Objectivos
A origem etimológica - A palavra “antropologia” deriva das palavras gregas “logos” (estudo)
e “anthropos” (humanidade) e significa, literalmente, “estudo da humanidade”. Porém, a
antropologia, na época antiga, não era exactamente o que é actualmente. Para os gregos e
romanos, a “antropologia” era uma “ciência dedutiva”, isto é, uma discussão baseada em
deduções abstractas sobre a natureza dos seres humanos e o significado da existência humana.
O seu método de verificação do conhecimento era o método dedutivo, que consistia em
chegar a uma conclusão particular, partindo de premissas universais. Tratava-se, portanto, de
um caminho que vai do geral ao particular. A verdade radicava no facto do particular ser uma
parte mais do geral. Partia-se de uma teoria geral para testar hipóteses (propostas de relações
entre variáveis – dados que variam caso a caso) derivadas dessa teoria.
A antropologia hoje
Os modos de vida de outras partes do mundo costumam fascinar, estranhar ou gerar uma
visão exótica. A antropologia oferece um conhecimento humano e comparativo do mundo e
da sua diversidade cultural. Podemos estabelecer, relativamente ao seu objecto de estudo, os
seguintes tipos de definições – a antropologia:
13
SUJEITO: OBJECTO:
HUMANO HUMANOS
Anteriormente, a antropologia era pensada como o estudo das sociedades sem escrita,
etiquetadas, sob uma perspectiva evolucionista, como “sociedades primitivas”. Nesta
perspectiva, essas sociedades coincidiam basicamente com as sociedades não ocidentais. O
termo de “primitivo” foi, no entanto, abandonado devido à sua conotação pejorativa e ao falso
binómio selvagem / civilizado. A partir de então, a antropologia foi pensada como o estudo de
pequenas comunidades camponesas, nas quais as relações interpessoais e a falta de
especialização económica eram muito importantes, assim como a sua homogeneidade e o seu
equilíbrio internos. A antropologia virou-se assim para Ocidente. Posteriormente, a
antropologia dos “primitivos” e dos camponeses passou a ser uma antropologia “no” e “do”
espaço urbano e do urbanismo. Desta forma, a antropologia passou a ser uma ciência que
estuda qualquer problema sociocultural, em qualquer parte do mundo.
Estuda as semelhanças e as diferenças entre as culturas: o que nos faz iguais e o que
nos faz diferentes, relativamente “ao (s) outro (s) ”.
14
falar, ouvir, observar, gravar, participar, escrever, anotar, perguntar, etc. O
antropólogo convive e partilha experiências humanas com as pessoas estudadas, como
o objectivo de traduzir a sua experiência. Ler sobre a batalha de Normandia não é o
mesmo do que ter participado nela.
A antropologia é, para alguns, uma ciência social que enfatiza a objectividade, a observação
sistemática e a explicação. De acordo com esta perspectiva, a ciência é entendida como um
modo de conhecer e de gerar afirmações sobre o mundo, mas também como uma forma de
contrastar as afirmações sobre a verdade do mundo. A ciência não é, porém, o único modo de
produzir conhecimento sobre o mundo. Segundo Wallace (1980) os modos de produção de
conhecimento podem ser classificados da seguinte forma:
15
D) Modo científico: É um processo que implica testar os enunciados, através da
observação e dos dados produzidos, para alcançar generalizações empíricas e formular
teorias.
E se, para alguns, a antropologia é uma ciência social, para outros a antropologia é uma das
Humanidades. Nesta perspectiva, a antropologia enfatiza a subjectividade, o relativismo
cultural, a compreensão dos participantes e o significado que as acções socioculturais têm
para as pessoas. O antropólogo faz parte da etnografia que observa: é uma pessoa que estuda
outras pessoas, é um sujeito que estuda outros sujeitos humanos (objecto de estudo), o que
implica uma inter-subjectividade na forma de produzir o conhecimento. Sob este ponto de
vista, a antropologia pode ser considerada uma forma de arte. As leis da antropologia são
diferentes das Ciências Naturais, aproximam-se mais do “certum” do que do “verum”. A
antropologia pode atingir a objectividade? Podemos ser objectivos quando o sujeito de
investigação é a humanidade e o que esta tem de humano?
No caso das ciências sociais, estas não podem chegar a ser puramente e absolutamente
objectivas. Todas elas podem utilizar ferramentas, mecanismos e instrumentos que objectivam
a intersubjectividade e a produção de conhecimento sobre a realidade humana. Portanto,
podemos afirmar que a antropologia é uma ciência social que, às vezes, actua
metodologicamente como se fosse uma arte.
A antropologia é um espelho para a humanidade, isto é uma “ciência das semelhanças e das
diferenças humanas” (Kluckhon 1944: 9), que da resposta ao dilema da convivência
intercultural entre pessoas com modos de vida diferentes. Esta preocupação pela diversidade
humana é uma das chaves da antropologia, pois ao observarmos os outros podemos ver-nos,
mais claramente, a nos próprios.
16
As diferenças entre os vários campos da antropologia baseiam-se, essencialmente, nos
objectos de estudo e problemáticas de análise, mas também no que concerne às teorias,
métodos de estudo e tradições académicas concretas.
A. Antropologia Filosófica. O seu objecto de estudo é a pessoa humana como ser genérico;
aquilo que as pessoas têm em comum. Estuda generalidades e utiliza conceitos muito
abstractos. O seu método é geralmente introspectivo: dedica-se ao interior da pessoa humana
e trabalha sobre “o conceito do conceito”.
a) Por um lado, comparte características biológicas com o resto dos seres vivos. É
necessário, portanto, uma ciência que estude os humanos como um animal, a
antropologia física.
b) Por outro lado, os humanos são capazes de elaborar coisas que os animais não
podem criar: a linguagem, a tecnologia, símbolos, etc. Este conjunto de coisas que
os humanos produzem e aprendem, enquanto membros de uma sociedade, é aquilo
17
que os alemães chamam “KULTUR” (cultivar: algo que só podem fazer os
humanos). O estudo da “kultur” é a antropologia cultural.
Quando Franz Boas chegou aos E.U.A., empenhou-se em divulgar estas ideias, definindo a
antropologia cultural, no sentido de obras materiais e espirituais especificamente humanas.
C.2. Antropologia Social. É um termo que nasce no Reino Unido, depois de superar,
igualmente, uma fase museológica. Para os britânicos, a referência não foi a Ilustração, mas o
francês Emile DURKHEIM que elaborou um modelo de pensamento de reacção á Ilustração.
Segundo Durkheim, se queremos estudar os seres humanos, não podemos basearmos,
exclusivamente, nos seus produtos, porque os produtos são determinados pela sociedade em
que esses produtos são criados. Nada garante que os produtos culturais continuam a ter a
mesma significação que tinham aquando da sua elaboração e utilização. Portanto, não é
possível estudar os produtos humanos sem estudar a sociedade que os gera. Caso contrário,
não teríamos garantias de conhecer o sentido e significado desses objectos ou produtos
culturais. A antropologia social britânica defendeu que era necessário estudar, primeiramente,
a sociedade, para depois fazer uma análise dos produtos humanos (“kultur”). Esta perspectiva
sublinha mais alguns conceitos como os de: estrutura social, instituição familiar, formas de
organização política e económica, controlo social, etc.
De acordo com o antropólogo Claude Lévi Strauss (1992) há três níveis de interpretação das
culturas:
18
1º. Etnografia: simples descrição e narração da cultura.
Etno: Costumes...
Na realidade, estes três níveis convergem e interagem. Mas, no que concerne ao processo de
investigação, ensina-se os alunos que este se deve iniciar com a etnografia, seguindo-se a
etnologia e, depois, a antropologia. Na França, o termo “Etnologia” e o termo “Antropologia”
são sinónimos, embora esta acepção não esteja isenta de controvérsia: o antropólogo Claude
Lévi-Strauss defendeu que estes conceitos não eram sinónimos, afirmando que a etnologia
procurava estudar os sentidos de uma cultura de uma área particular e que a antropologia
procurava os sentidos dos comportamentos culturais comuns a toda a humanidade.
19
Os humanos vivem em meios ecológicos diferentes que afectam aos comportamentos
culturais. A subdisciplina que trata das relações entre os humanos e o meio ambiente é
a “Antropologia Ecológica”.
Além disso, os humanos necessitam produzir uma série de bens para a sua subsistência
e consumo: esta é a perspectiva da “Antropologia Económica”.
Educação em Antropologia é a que se desenvolve pela maioria das disciplinas científicas que
consiste na difusão em distintos níveis e modalidades dos saberes produzidos pela
Antropologia. Antropologia da Educação é a que se relaciona com as abordagens que a
Antropologia pode realizar aos efeitos de conhecer melhor a realidade de âmbito da educação,
mediante a utilização de marcos teóricos, metodologias e técnicas características, e a posterior
reflexão sobre a informação obtida. Antropologia Educativa surge com vista a gerar um tipo
de educação que incorpore não só conhecimentos provenientes da antropologia, senão
também esse olhar antropológico que permita aos educadores e educandos desenvolver
saberes e práticas que superem as perspectivas habitualmente etnocéntricas e/ou
discriminatórias presentes em cada cultura.
20
Poder-se-ia definir, então, como o estudo antropológico dos processos de ensino e
aprendizagem da cultura.
As três áreas actuam como marco quando se procura implementar acções que buscam
alcançar alguns dos seguintes:
No estudo da Antropologia da Educação, uma das questões que se coloca tem a ver com o
para quê conhecer a escola. A perspectiva de responder a esta questão indica a necessidade da
criação da capacidade para precisar os limites razoáveis das transformações, bem como o
trabalho activo na direcção do reconhecimento das contradições.
21
1.8 Relação da Antropologia Cultural com as outras ciências humanas e sociais
As Ciências Sociais e Humanas têm em comum a relação entre sujeito (humano) e objecto
(humanos) de estudo, o que implica falar de um estatuto epistemológico próprio, diferente do
das ciências naturais. Esta postura não se encontra, porém, isenta de um forte debate científico
que remonta à origem das ciências humanas e sociais. Durkheim considerava que as ciências
humanas e sociais deveriam imitar as ciências naturais e considerar os fenómenos sociais
como naturais. Esta perspectiva resume-se na expressão durkheimiana: “os factos sociais
como coisas” (Durkheim: 1995). Autores como Dilthey (1839-1911), Max Weber (1864-
1920) e Peter Winch defenderam, contrariamente, que as ciências sociais deveriam ter um
estatuto epistemológico próprio, porque a acção humana é radicalmente subjectiva. Para estes
autores, situados numa linha “compreensiva”, as ciências sociais devem compreender os
fenómenos sociais, a partir das atitudes mentais e do sentido que os agentes conferem às suas
acções. Daí que devamos utilizar métodos diferentes das ciências naturais, basicamente
qualitativos e indutivos. Portanto, o auto-conhecimento e o conhecimento intersubjectivos
caracterizariam as ciências humanas e sociais, desde o ponto de vista epistemológico. Dilthey
chegou a afirmar que as ciências sociais devem centrar-se não nas causas dos fenómenos
sociais, mas nas representações, sentimentos e interpretações dos mesmos.
Karl Popper foi um participante importante neste debate: afirmou a inexistência de oposição
entre as ciências humanas e sociais. Para ele, a verdadeira oposição existe entre ciências
empíricas e os sistemas metafísicos. Ao contrário da metafísica, a ciência caracterizar-se-ia
por submeter as suas proposições e teorias à falsidade (refutação). Embora esteja consciente
de que a ciência é sempre provisória, Popper reconhece o direito da mesma a procurar leis
gerais. Esta validade limitada significaria pensar o conhecimento científico não como uma
verdade irrefutável e absoluta, mas como um conhecimento –“certum” - validade limitada.
22
paradigmas como os de Newton ou os de Einstein (relativismo) tenham sido aceites por todas
as ciências naturais, em ciências humanas, a diversidade de teorias e princípios sobre a
natureza humana é tão ampla que não nos permite falar de paradigma. Paradigma é entendido
como o conjunto de teorias e princípios sobre a estrutura e a natureza das coisas; conjunto
aceite, por unanimidade, por toda a comunidade científica. Sem entrar a fundo nesta discussão
sobre pré-paradigmas e paradigmas (não é este o objectivo desde tema), é, porém, importante
situar as ciências humanas e sociais, nomeadamente a antropologia na organização da
produção social do saber.
1. Temos que reconhecer que existem outras formas de conhecimento – arte, poesia,
literatura, fotografia. – Com legitimidades diferentes.
3. Os humanos são seres significantes, que dotam de sentido tudo o que fazem, pensam e
dizem. Os objectos são conhecidos, através da meditação do sujeito e da sua
linguagem.
4. A verdade absoluta não existe, apenas existem algumas certezas – certum. Isto não
significa que se pode controlar, cientificamente, a subjectividade característica das
ciências humanas.
6. É impossível publicar um livro de ciências sociais que não influa, dalguma maneira,
na sociedade.
7. Qualquer realidade social não pode ser entendida apenas através da quantificação
matemática. Questões como a felicidade, a tristeza, a dor, os sentimentos, os afectos
não podem ser reduzidas a uma quantificação.
23
Qual é o papel e o estatuto da antropologia em relação às outras ciências sociais e humanas?
Anedota:
-Qual é a diferença entre um antropólogo, um sociólogo e um
jornalista?
-Resposta: O antropólogo anda a pé ou de bicicleta, o
sociólogo sempre de carro e o jornalista de avião.
A anedota anterior pode representar, metaforicamente, as várias abordagens metodológicas
que as diferentes ciências humanas e sociais apresentam, em relação ao seu objecto de estudo.
Mas, na prática, produz-se um entrecruzamento de métodos e empréstimos teórico-
conceptuais. Muitas subdisciplinas comunicam intensamente entre si.
A Antropologia e a Psicologia
Antropologia Psicologia
A realidade social assenta numa Identifica os traços psicológicos do
realidade psicológica e biológica – indivíduo e explica os processos e
bioquímica-. mecanismos psíquicos intra-orgânicos.
O humano não se reduz só ao psicológico Conceitos: impulso, repressão, reflexos,
(ex.: atracção sexual entre duas pessoas). condicionamentos, ego, personalidade,
Experiencialismo. motivação...
Estuda como o cultural e o social Método: experiências de laboratório,
modelam o psicológico e vice-versa. testes psicométricos, ...
“Facto social total” (Marcel Mauss). A A psicologia experimental tenta
antropologia pratica uma integridade na determinar as bases psicológicas da
análise sociocultural. O biológico é um conduta individual.
aspecto humano com sentido, que actua, Tenta descobrir um humano abstracto
através da cultura na sociedade. existente em todas as culturas.
24
“Choque cultural”. PSICOLOGIA SOCIAL: estuda como o
psicológico modela o social.
A Antropologia e a Sociologia
Anedota: Um antropólogo é capturado por uma tribo de canibais que o colocam numa
panela gigante juntamente com batatas, sal, legumes... Pouco depois, o antropólogo grita:
“Mais batatas, mais legumes...” (O antropólogo tinha começado a comer tudo)
Antropologia» «Sociologia
Nasceu como uma espécie de -Sociologia de “nós” e do nosso.
“sociologia dos outros” e dos
“primitivos”. -Os factos sociais explicam-se em função
Inicialmente pensada como uma de outros factos sociais (Durkheim).
microsociologia e uma sociologia
comparada (Radcliffe-Brown). -Objecto de estudo:
Tem uma epistemologia própria. 1. O comportamento social de um
25
2. Estuda culturas e etnias, dentro da -Mais a histórica e presentista.
sociedade.
3. Estuda culturas diferentes. -Muitos empréstimos conceptuais e
Métodos: observação participante; teóricos à antropologia e vice-versa.
entrevistas em profundidade;
comparação – histórica e diversidade Fala das pessoas em seu nome.
cultural; compreensão holística, para
desvendar aspectos essenciais da
vida humana muitas vezes
inconscientes. Estudos mais micro.
Teorias e conceitos diferentes. Ex:
relativismo cultural,
etnocentrismo,...
Conhecimento dos outros e de nós
mesmos. Finalidade: descobrir a
natureza humana.
Mais histórica.
Deixa falar as pessoas, escuta-as e
dá-lhes voz.
Implica um modo de estar com as
pessoas.
Tem em conta as teorias nativas.
Antropologia Sociologia
26
objectividade oficial, comprovativa da
separação entre sujeito e objecto.
A Antropologia e o Direito
Antropologia e Direito
Os primeiros antropólogos eram advogados.
B. Malinowski: Crime e Costume na Sociedade Selvagem. Esta obra é dedicada à
lei.
Paul Bohanan: Tiv (Nigéria). É outra obra sobre a criação de leis na cultura tivs.
A Antropologia e a Geografia
Antropologia e Geografia
As semelhanças entre estas duas disciplinas foram evidentes, desde Franz Boas,
nomeadamente desde a publicação da sua teoria do “determinismo geográfico”
(inspirada em Ratzel) e do determinismo geográfico-climático. Boas aplicou esta
teoria nos seus estudos sobre os esquimós do Canadá.
As semelhanças destas duas ciências passam também pelo uso e criação de
mapas, como representação do espaço e do território. Os mapas e os relatórios
geográficos são apoios logísticos fundamentais na investigação antropológica.
Conceptualmente, são importantes os paralelismos entre “área cultural” (Cf.
Brown: 2001) e o conceito geográfico de “região”, mas também o de “fronteira”.
Este último conceito foi utilizado, pela primeira vez em antropologia, por Clark
Wissler, em 1918, no seu estudo sobre a fronteira entre os colonos e os indígenas
dos EUA.
Em termos teóricos, as influências entre estas disciplinas foram mútuas, desde há
muito tempo. Por exemplo, a teoria do lugar central do geógrafo Walter
Christaller influenciou a antropologia. Em antropologia, a preocupação por uma
análise do espaço está bem representada pelo antropólogo E.T. Hall que estudou
a forma como as pessoas utilizam culturalmente o espaço. As geografias pós-
modernas, como por exemplo os trabalhos de Eduardo Soja, incidem muito na
antropologia urbana.
Apesar das semelhanças, também existem diferenças conceptuais, teóricas e
metodológicas. O trabalho de campo antropológico é específico da antropologia.
A geografia tende a realizar, sobre o terreno, uma observação mais exterior dos
27
fenómenos sociais.
A Antropologia e a História
Antropologia e História
Os antropólogos evolucionistas e difusionistas (século XIX) fizeram uma
história especulativa e conjectural.
Os antropólogos funcionalistas tenderam a excluir a história e aproximaram-se
da sociologia.
A antropologia marxista recuperou a história.
Metodologicamente, há muitas aproximações: trabalho de campo antropológico
e história oral. Actualmente, os antropólogos também trabalham com
documentação escrita.
A Antropologia histórica trabalha com documentos e memórias orais. A História
tende a dar maior importância aos documentos escritos.
A antropologia tenta compreender as relações entre passado, presente e futuro,
que podem convergir metaforicamente no presente. A história tende a
reconstruir, eventualmente, o passado.
A antropologia interpreta as representações do passado, as amnésias e os
esquecimentos.
28
séculos. (a Europa teria ocidentais (urbanismo,
evoluído para a Civilização). indústrias, poder).
A antropologia estudava o
exotismo da Índia, do Japão
e da China.
... de vuelta a la práctica del antropólogo, cuya tarea consiste en reconstruir las
genealogías, y a través de las genealogías las historias de clanes y familias, y las
historias de vida, ya sea de individuos ilustres o de hombres y mujeres ordinarios de
los que há permanecido la memoria. Recordemos que, en función de cual sea la
sociedad de la que tratemos, la memoria genealógica puede variar entre un mínimo
de tres generaciones más allá de nuestro informante (es decir la generación de sus
abuelos y la de sus bisabuelos) hasta un máximo de quince. Pues bien, tres
generaciones corresponden a cien años, lo que significa que cuando un antropólogo
desarrolla una investigación no solamente se enfrenta a los acontecimientos
contemporáneos, sino que se sumerge en una duración de más de un siglo...
Há que considerar que, hoje, existe uma certa convergência metodológica, mas também uma
necessária interdisciplinariedade. Segundo o antropólogo Ulf Hannerz (1979: 3-4), “as
fronteiras disciplinares não se devem tornar vacas sagradas”.
A Antropologia e a Filosofia
29
para a forma como os seres humanos pensam e apreendem. A filosofia deu um grande
contributo para o pós-modernismo. Sobre esta questão, recomendamos a magnífica obra do
antropólogo Adolfo Yañez Casal (1996).
Actividades
30
Unidade 2
Métodos e princípios do método de Antropologia Cultural
2.1 Introdução
2.2 Objectivos
31
2. Documentação e literatura sobre essa área e a perspectiva teórica escolhida.
3. Estudo da fala local, autorizações, vacinas (ex.: contra a malária ou paludismo, febre
amarela, ...), material necessário, etc.
Projecto de investigação:
1 Perguntas de partida
2. Exploração:
a) Revisão bibliográfica.
b) Entrevistas e reuniões exploratórias.
Nesta fase o objectivo é encontrar pistas de reflexão, ideias e hipóteses de trabalho, mas não
verificar hipóteses a priori, pois ainda não tem havido observações sistemáticas da
problemática de estudo.
3 Problemática:
Perspectiva teórica: (i.e.: antropologia simbólica e interpretativa)
Quadros conceituais da investigação: (ex.: tempo linear, tempo cíclico, actor,
cenário, bastidores, espaço publico, espaço privado, festa, catarse, estrutura social,
ritual, performance,... )
4 Construção do modelo de análise:
Articular conceitos e hipóteses: indicadores Þ componentes Þ dimensões Þ
conceitosÞ hipóteses Þ refutabilidade
5 Observação:
a) Que observar?
b) Em donde observar?: o campo de análise (unidades de observação), a amostra
c) Como observar? : instrumentos de observação (inquéritos, ...)
Desenhos brandos (mais indutivos):
Baseados na etnografia (observação participante, trabalho com informantes chave) e
em métodos qualitativos.
Melhor para contextos com obstrução, programas com metas menos definidas ou
especialmente complexas e diversas, re- orientações dos programas e circunstâncias
de rápida mudança.
Desenhos duros (mais dedutivos):
Com grupos controlados.
32
Com programas de objectivos claros e medíveis facilmente.
Para produzir uma avaliação final.
Investigação rápida para a tomada de decisões (Uma investigação tardia é uma mau
investigação).
6 Análise das informações: interpretar os dados.
7 Conclusões.
O trabalho de campo é também um ritual de passagem da tribo antropológica que tem os seus
heróis e os seus mitos (ex.: mito fundador de Malinowski). Um dos primeiros antropólogos
que aplicou o método etnográfico foi Lewis Morgan nos EUA, em concreto em 1859, quando
estudou várias “tribos” de Nebraska e Kansas. Na Inglaterra antropólogos como James Frazer
(autor de “O Ramo Dourado”, 12 volumes) quando foi perguntado se alguma vez na sua vida
fez trabalho de campo e se conhecera algum “selvagem”, ele respondeu: “Deus me livre,
nunca jamais,...” . Apesar de que já Rivers propunha no seu “Notes and Queries in
Anthropology” algumas recomendações sobre como seguir os ciclos de vida da comunidade
estudada –o género monográfico-, foi B. Malinowski (1973) quem sistematizou nos anos
1920 o método etnográfico de trabalho de campo, na sua obra sobre “Os argonautas do
Pacífico Ocidental”.
Malinowski (1973) converteu-se em uma espécie de herói para a antropologia e a sua obra
“Os Argonautas do Pacífico Ocidental” num mito. Nesta obra, este traduz parte do trabalho de
campo feito na Nova Guiné, concretamente nas Ilhas Trobriand, donde viveu com os nativos
34
durante dois anos, aprendendo a conviver com eles, a sua língua e os seus costumes. As
recomendações que ele dá sobre o trabalho de campo, foram muito importantes para a
antropologia, convertendo o trabalho de campo num ritual de passagem da tribo antropológica
(Velasco e Díaz de Rada, 1997: 19). Desta obra de Malinowski, o mito fundador do trabalho
de campo, podemos destacar algumas ideias chave para reflectirmos sobre o trabalho de
campo:
Um antropólogo deve expor que dados foram obtidos das suas observações directas, e
quais das indirectas.
35
Não foi por acaso que Malinowski faz trabalho de campo nas ilhas Trobriand, pois ali tinha
trabalhado o seu mestre, o antropólogo Seligman. No seu segundo trabalho de campo, o que
depois o convertiria num antropólogo de prestígio, ele permanece em Kiriwina, onde muda a
sua atitude no terreno, criando assim o que conhecementos como trabalho de campo
malinowskiano (Álvarez Roldán, 1994):
Parece ser que ficou nas ilhas Trobriand muito tempo pelo tipo de comunidade que encotrou,
isto é, materlinear e com chefaturas. Será em Kiriwina onde elabore informes etnográficos
sincrónicos e funcionalistas (Malinowski, 1973). Em Kiriwina vai permanecer uma longa
estadia e aprende a língua nativa para entender o significado nativo, sem conformar-se com
chegar a encontrar uma equivalência verbal em outras línguas. É assim que Malinowski
inventa o método etnográfico (Álvarez Roldán, 1994) quebrando assim a anterior separação
entre a recolha de dados e a teoria elaborada por outros, e convertendo o antropólogo num
autoinstrumento de investigação (Velasco e Díaz de Rada, 1997: 21).
36
de recolha de dados, é por tanto uma inter-subjectividade entre observador e observado. A
etnografia é a descrição do comportamento, das ideias, das crenças, dos valores, dos
elementos materiais, etc. quotidianos e espontâneos de um grupo humano. A etnografia tem
em conta 3 aspectos:
Como definimos mais acima, o trabalho de campo pode ser considerado como: a) uma
situação metodológica de encontro intercultural; b) um processo; c) uma experiência que
diferença à antropologia. Dai que possa haver diferentes formas de fazer trabalho de campo
(Velasco e Díaz de Rada, 1997: 18) e de aí a necessidade de explicar as condições em que é
realizado o trabalho de campo e a produção de conhecimento.
37
voltar sobre nos próprios a mirada previamente informada pelo contacto com o outro. É
também uma ponte através da qual a informação passa de uma cultura a outra, é um tipo de
tradução (Todorov, 1988: 9-31).
Além mais o trabalho de campo pode ser pensado como um ritual de passagem da tribo
antropológica, uma experiência auto-tranformadora, um ritual de iniciação e um dobre choque
cultural: nativizar-se e re-nativizar-se (Peacock, 1989: 95).
O trabalho de campo está condicionado pela posição que o antropólogo ocupa nos sistemas
políticos, sociais e económicos (i.e.: centro, semiperiferia, periferia). Estas agendas, muitas
vezes ocultas, devem ser estudadas e feitas conscientes para entender melhor a experiência de
trabalho de campo. Esto ajudar-nos-á a entender melhor o “efeito rashomon” (Heider, 1988;
Cardín, 1988) em antropologia, isto é, durante o nosso trabalho de campo não seleccionamos
as vozes dos nativos e escolhemos algumas dentro da complexidade com a qual nos
debruçamos. Reflectir sobre as causas de por quê escoitamos mais umas do que outras obriga-
nos a adoptar uma posição de reflexão e autoconsciência.
Para que uma etnografia seja boa deve ser necessariamente comparativa. Quatro são os planos
que podemos estabelecer na comparação:
O antropólogo deve explicar aos estudados o que vai fazer, a duração do trabalho e a
utilização da informação. Para isso precisa de autorizações e pensar nos limites éticos
38
(privacidade, confidencialidade, anonimato, permissões para publicar, etc. ), negociar e
ganhar-se a confiança da gente. Devemos pensar que podem ser precisas cartas, referências,
etc. Todas as instituições e terrenos têm “porteiros”. A entrada pode ser por cima ou por
baixo; entrar por cima através de alguém conhecido, importante ou de confiança para os
estudados pode ser positivo, negativo ou neutro para o nosso trabalho (ex.: Não é igual entrar
através de um presidente de Junta de Freguesia que através de um padre...). Tudo isto
condiciona o terreno e os factores de produção de conhecimento mudam de acordo com os
factores intersubjectivos, que são “objectivados” de alguma forma neste exercício reflexivo
que deve integrar os relatórios de investigação ao pé da metodologia ou em relação com ela.
Devemos ganhar-nos gradualmente a confiança dos estudados e ultrapassar a inibição com o
tempo. Devemos também pensar no equilíbrio da amostra de informantes; uma técnica pode
ser a da “bola de neve”, isto é, um informante vai-nos levando a outro; mas noutros casos a
amostra de pessoas com as quais trabalhamos devem ser pensadas em função da sua
representação face ao problema em estudo. Estes são alguns dos itens a considerar numa
reflexão sobre a entrada num terreno:
Qual o teu “papel” ou papéis na instituição de acolhimento? Qual a tua imagem? Qual a
percepção que tinham de ti inicialmente? E agora?
39
análises. Com o objectivo de melhor testar, fundamentar e legitimar o conhecimento
antropológico é ideal ter em conta a seguinte triangulação:
ENTREVISTAS
OBSERVAÇÃO DOCUMENTOS
A triangulação anterior permite também chamar a atenção sobre a necessidade de fazer uma
antropologia histórica que permita compreender melhor os problemas estudados através da
perspectiva histórica.
40
Actividades do investigador.
Acontecimentos.
Conversas.
Observações.
-Hipóteses.
-Interpretações.
5. Histórias de vida. São relatos sobre a vida de uma pessoa. Esse relato informa não só
sobre a vida dela, porém também sobre a vida da comunidade e os seus valores, o
passado e o presente.
6. Histórias de família.
41
9. Fotografia e filmagem. São técnicas básicas da etnografia visual. São um instrumento
de observação muito bom, porque permitem a outros reestudar o observado por nos.
11. Grupos de discussão. Trata-se de reunir a um pequeno grupo de pessoas para debater
entre eles um assunto de interesse.
13. Os orçamentos-tempo. Trata-se de pedir a uma ou várias pessoas que anotem ou nos
contem as actividades, as horas e os espaços dessas actividades. É uma etnografia
cronotemporal que permite estudar os movimentos no espaço e no tempo de uma
pessoa, com o fim de compreender o seu modo de vida.
42
Ter consciência ou não do ponto de vista valorativo.
Observar → Selecção que deve ser consciente e crítica.
Falta de estranhamento face ao observado.
Preconceitos + Familiaridade são inevitáveis às vezes.
Problema: Não questionamento dos nossos pre-conceitos e aprioris.
Problema: Ter pontos de vista parciais de partes do objecto. Exemplo:
Tomar como muito importantes a palavra de só uns poucos informantes
e observar o resto desde o seu ponton de vista. Exemplo: Seguir
classificações e definições oficiais.
Reflexão: Ser conscientes dos pontos de vista do trabalho.
Problema: Má definição do objecto de estudo.
Problema: Registo de dados sem citar a fonte de informação ou a
situação de produção dela. Como valorar os dados obtidos?
Problema: Utilização de categorias “emic” e “etic”. Especificar se é
“emic” ou “etic”. Especificar se a diz uma pessoa, todas, um teórico... e
em que contexto?
3. Destacar os dados verbais (discurso) sobre os dados produto da observação
(descrição) pode ser um problema. É muito importante a observação (o que
fazem), tanto como o que dizem ou o que pensam.
4. Condições nas quais se realiza a observação e o diário:
Data
Tempo de observação
Momento do dia
Lugar
Tiram-se notas
Gravou-se
Registo de memória
Qual o tempo entre a observação e o registo no diário de campo
Factores pessoais do investigador: género, idade, preparação teórica,
experiência de campo, etc.
A ENTREVISTA EM ANTROPOLOGIA:
É uma técnica de investigação, é um procedimento operativo para obter uma informação
43
através do diálogo intersubjectivo com uma pessoa. Baixo a forma de uma conversa
informal, orientamos ao nosso entrevistado face aos aspectos a conhecer. Portanto é
dirigida ou semidirigida. Esta técnica deve ser complementada por outras como a
observação participante e o estudo de documentação histórica, pois as pessoas dizem
coisas, ocultam dados, pensam e também fazem coisas. A entrevista não é um inquérito
de perguntas fechadas, senão de perguntas abertas, é portanto um diálogo no qual a
iniciativa é do pesquisador.
Passos:
1. Elaboração de um questionário-guia:
As perguntas dependerão dos objectivos da entrevista, do nível de informação do
entrevistado (o que interessa é a sua visão dos fenómenos estudados, não só a
quantidade de informação), e do grau de conhecimento e confiança gerado entre
entrevistador e entrevistado.
As perguntas não devem condicionar uma resposta a priori predeterminada pelo
investigador. As perguntas devem ser abertas (não fechadas: sim ou não),
provocando respostas livres, opiniões, matizados..., claras e não confusas.
A arrumação das perguntas seguirá a ordem seguinte: perguntas gerais (idade,
género, breve história de vida...), até as específicas e especiais. A representação
gráfica será a de um funil.
As primeiras perguntas devem interessar-se pela pessoa, mostrando o nosso
aprecio por ela e o nosso agradecimento pelo seu tempo –estou a pensar em que
não vamos a pagar essa entrevista-.
As perguntas de tom político podem implicar um certo medo ou desconfiança
por parte do informante.
Devemos adaptar a realidade ao questionário e não ao contrário.
2. Combinação da entrevista.
Factores do investigador: formação, experiência, personalidade, habilidade,
motivações, percepções, simpatia, empatia, língua, maneira de vestir...
Factores do entrevistado: preconceitos face ao investigador, comportamento,
valores, crenças, informação (quantidade, qualidade), o seu tempo livre...
É importante valorar a vida da gente à qual entrevistamos, e mostrar expressões
de aprecio.
O objectivo final é criar um clima de confiança, para isso teremos que explicar
44
os motivos da nossa presença e da realização da entrevista.
Pode ser bom combinar a entrevista uns dias antes da sua realização, para que a
memória traga as lembranças ao presente, para que a mente organize melhor a
informação. Outras vezes é melhor a realização imediata, sempre tentando
respeitar à pessoa.
Em toda apresentação adoptamos um papel: estudante (risco de paternalismo),
professor, vizinho, amigo, turista,...
É interessante apresentar-se através de um conhecido do informante, pois isso
garante a nossa boa intenção.
Garantir o anonimato é um princípio ético fundamental, se assim nos é pedido,
ou se não somos autorizados a desvelar a identidade do entrevistado.
3. Realização da entrevista:
Tentar utilizar os mesmo idioma que o entrevistado, ou utilizar intérprete.
Personalizar as questões (ex.: o que é que você pensa sobre...? )
Criar um ambiente descontraído.
Respeitar as pautas culturais do outro (ex.: comensalidade como ritual social de
interacção,...).
Colocar as perguntas em positivo, pois motiva uma resposta mais ampla e
extensa.
Os silêncios também são informação, os esquecimentos e as negativas de
reposta. Todo tem um sentido e um significado a interpretar.
Trabalhar em equipa pode ser positivo. Um homem e uma mulher representam
um ideal nalguns contextos culturais (equilíbrio entre os géneros). Além disso a
cumplicidade inter-género e a construção de um espaço de género pode gerar
maior confiança e sinceridade no discurso.
Realizar uma 2ª e uma 3ª entrevista ao mesmo informante, ao longo do tempo,
permite comprovar a fiabilidade e validação dos seus discursos, mas também
aprofundar questões que ficaram na superfície.
O objectivo fundamental é conhecer o ponto de vista do outro, não exibir as
nossas opiniões sobre os assuntos tratados.
A gravação em cassete ou em vídeo da entrevista pode inibir ou não ao
informante. É um risco a considerar. Também pode acontecer se tiramos notas
entretanto ele fala. Cada pessoa e situação tem a sua especificidade.
45
Tirar notas durante a realização tem a vantagem de poder voltar a elas, de voltar
a perguntar com maior profundidade.
Se a entrevista é gravada, no início do cassete virgem devemos deixar um espaço
para inserir e registar os dados pessoais do entrevistado e do entrevistador, junto
com a data e o local da entrevista.
Sem esses meios técnicos terá que ser a nossa memória a que grave os resultados
da entrevista.
Transcrição da entrevista:
Se a entrevista foi gravada exige muito tempo e capacidade para escutar.
Pode ser parcial ou total. Uma boa transcrição deve ter em conta:
N.º de registo
Tipo de contacto
Dados pessoais, lugar, data
Descrição do contorno, da conduta e da linguagem não verbal
Estrutura temática da conversa
Palavras-chave.
A transcrição deve respeitar a língua do informante, os seus dialectalismos...
que também dão informação cultural.
Convêm assinalar os “passos” que sinala o marca-passos do gravador (ex.: cada
20), pois assim podermos voltar a localizar na fita gravada qualquer frase,
palavra, ou parágrafo.
A transcrição literal e total implica uma grande quantidade de informação
etnográfica que pode ser consultado em um futuro por nos mesmos ou por outras
pessoas que acedam ao nosso arquivo. A transcrição literal significa anotar as
risas, os silêncios, as lágrimas, os gestos, dialectalismos, etc.
Simbologia: P (pergunta), R (resposta), “....” (transcrição literal), `.... ´
(transcrição aproximada) <Manoel: ...........> (intervenção de uma terceira
pessoa).
Se a entrevista não for gravada, e só anotada, devemos arrumar o discurso em
um quaderno de campo, no qual anotemos também as observações
complementares do contexto de interacção, que podem ser importantes para
compreender melhor o sentido do falado.
46
2.6 A observação participante
O antropólogo deve ser aceite para poder interpretar a visão desde dentro do grupo, deve
também conseguir um trato normal e quotidiano, algo que muitas vezes só se consegue com
muito tempo, confiança e redes sociais de informantes fiáveis. O antropólogo é catalogado
geralmente como um estranho ou intruso (i.e. maneiras de vestir diferentes), pelo qual o
receio dos locais pode ser grande no início. Outras vezes, devido à nossa juventude podemos
experimentar proteccionismo e paternalismo por parte das pessoas que estudamos.
47
lugar do outro para perceber melhor o que se diz (e o que não se diz), o que se faz e o que se
pensa.
O linguista Kenneth Pike (1971) distinguiu em 1954 entre o ponto de vista “etic”, desde
sistema concreto do analista ou investigador, do ponto de vista “emic”, desde o sistema do
grupo estudado. O ponto de vista “emic” é aquele que representa o ponto de vista do nativo,
representa os pensamentos de um povo nos seus próprios termos e conceitos.
Uma vertente muito importante é o estudo do espaço público. O espaço tem umas pautas
estabelecidas (ex.: saúdo, tertúlia, casamento, funeral, etc.), nele insere-se uma sintaxe pessoal
e grupal que temos que descodificar para entender a identidade urbana. O objectivo do
trabalho de campo é a integração no grupo humano estudado, isso significa reduzir o
anonimato e criar redes sociais, participar em associações, grupos, etc.
Parte do nosso trabalho é o controlo da rede, se num primeiro momento as nossas interacções
seguem um princípio de naturalidade e espontaneidade, as carências na nossa rede devem ser
preenchidas com o trabalho com informantes de diversas zonas, classes sociais e minorias.
Portanto a rede tem que ser representativa do grupo humano que estamos a estudar.
Devemos prestar atenção aos dramas sociais, pois são momentos extraordinários para penetrar
na opaca vida quotidiana (ex.: festas, cerimónias públicas, religiosas, conferências,
exposições, feiras, desportos, greves, manifestações, etc.)
48
Também é muito importante o estudo de documentação: os jornais locais são “informação
quente”, mas também a rádio, a literatura localista (ex.: programas de festas), os arquivos
municipais (ex.: multas, actas municipais, ordens, etc.), os planos gerais de ordenação urbana,
documentação estatística, histórica, etc.
É importante também desenhar os mapas mentais e de uso da cidade, isso implica realizar
uma etnografia de rua. Alguns dos critérios que podemos utilizar para classificar os espaços
públicos são:
Para etnografiar cidades o salto importante é o trabalho em equipa, pois desta maneira a
riqueza de dados permitirá uma visão holística e comparativa.
2. Respeito pelo uso anónimo da informação se assim nos foi pedido pelos informantes.
4. Pensar em que informação pode ser publicada e qual não. Trabalhamos com pessoas e
não com átomos.
49
Exercício de descrição etnográfica
1. Observar um fenómeno social concreto com todos os sentidos.
2. Descrever este por escrito: ordenar o observado (dia, hora, lugar, duração, posição do
observador, desenhos, ...).
3. Distinguir:
a) Informação da observação.
b) Informação da intuição e da imaginação.
c) Informação a priori.
d) Informação tirada das perguntas aos actores sociais.
4. Evitar as suposições e objectivar os nossos olhares.
5. Descrever a acção e o comportamento de todas as pessoas protagonistas, o familiar e o
estranho, pois podem dar-nos detalhes significativos.
6. Descrever a posição do observador: interior/exterior.
7. Precisão na descrição.
8. Ordenar a descrição, por exemplo cronologicamente. Ter em conta o espaço do cenário,
os actores, as acções e as regularidades.
9. Respeito pela intimidade dos descritos (ex.: técnica dos nomes fictícios) e pelo bom uso
da informação.
10. Descrever detalhadamente e evitar adjectivos ambíguos e juízos de valor. Ex.: velho /
homem entre 60 e 70 anos.
Actividades
50
Unidade 3
O Pensamento antropológico
3.1 Introdução
3.2 Objectivos
No final desta unidade pretende-se que o caro estudante seja capaz de:
51
No séc.V a.C., os trabalhos de Heródoto mantêm um interesse antropológico muito
desenvolvido. Herodoto viajou e visitou outros povos e culturas, interessando-se
especialmente pelos costumes do casamento e os modos de subsistência. Descreveu, entre
outras, a sociedade egípcia, comparando-a à sociedade grega. Heródoto é considerado
também o pai da história. Escreveu sobre os “bárbaros”: considerava-os inferiores aos gregos,
chegando a descreve-los como figuras com um só olho e com os pés virados para atrás. Desde
o ponto de vista teórico, relacionou zonas climáticas e culturais. Também Platão, Aristóteles
(sobre as cidades gregas), Jenofonte (sobre a Índia) e outros se dedicaram à descrição dos
costumes doutras culturas.
Na Idade Media, o domínio absoluto no mundo das ideias foi da Igreja Católica, ficando a
especulação antropológica reduzida a considerações teológicas. Até ao final do feudalismo o
renascimento antropológico não se verificou.
Outro exemplo foi o dos missionários jesuítas na América (ex.: Bartolomé de las Casas e o
Padre Acosta) que escreveram as “Relaciones Jesuíticas” e elaboraram a “teoria do bom
52
selvagem”, segundo a qual os índios tinham uma natureza moral pura que devia ser aprendida
pelos ocidentais. Esta teoria idealizava, com nostalgia, uma cultura mais próxima do
estado“natural”.
A expansão foi justificada por motivações económicas e religiosas, assim o confirma Vasco
da Gama na sua primeira viagem à Índia, afirmando aos locais que vinha para arranjar
“cristãos e especiarias”. A visão europeia era que estos povos não tinham lei, nem fé, nem
senhor (Bestard e Contreras, 1987; Lureiro, 1991).
No século XVI, o viageiro Marco Polo elaborou informações críticas sobre Oriente. Outro
pensador social importante foi Gianbattista Vico (1668-1744) que defendeu que os humanos
podiam reconhecer a sua própria história porque eram autores da mesma (compreender o
passado, recreando-o imaginativamente).
3.4 Evolucionismo
Na segunda metade do séc. XIX, nasce a antropologia como campo profissional. Esta foi uma
época de hegemonia mundial europeia, em que predominava um clima intelectual
evolucionista e uma influência das ciências naturais nas ciências sociais.
53
Uma das teorias dominantes foi o evolucionismo uni-linhar que defendia uma evolução
paralela. De acordo com esta teoria, as culturas foram criadas, independentemente, seguindo
um percurso por estádios fixos: barbárie, primitivismo, selvagismo e civilização. Esta posição
era similar à da Ilustração. Na Ilustração, a ideia de progresso foi central; e para o
evolucionismo, as culturas encontravam-se em movimento, através de diferentes etapas de
desenvolvimento, até alcançarem a etapa de desenvolvimento da cultura ocidental. Todas as
culturas evoluiriam da mesma maneira e passariam pelos mesmos estádios. Seria, pois,
necessário pensar numa evolução unitária do conjunto da humanidade.
A evolução das culturas era resultado da evolução biológica, que tinha como princípio
fundamental o princípio da sobrevivência dos mais aptos. Esta era uma ideia darwinista.
Darwin (1809-1882) tinha escrito, em 1859, a obra “A Origem das Espécies”.
Antropólogos evolucionistas:
J.J. Bachofen (1815-1887), um jurista suíço, foi o primeiro a chamar a atenção para
sociedades que seguem a linha de descendência através da mulher (culturas materlinhares).
Imaginou que nessas sociedades não se reconhecia a paternidade; "construiu" um mundo
greco-latino matriarcal.
Henry Sumner Maine (1822-1888) foi um etnólogo jurídico, membro do conselho britânico
do vice-rei da Índia. Encontrou semelhanças entre as antigas leis de Roma, da Índia e da
Irlanda (sociedades patrilinhares). O seu livro mais famoso é “Ancient Law” (1861), no qual
defendeu que a mais antiga forma de família era a família patriarcal dos indo-europeus.
Deixou-nos conceitos como: “agnação” (reconhecimento da relação por descendência, através
dos varões) e “cognação” (reconhecimento da relação de descendência, através de um mesmo
pai e uma mesma mãe). Defendeu que, na infância da humanidade, não havia nenhum tipo de
legislação. Outra teoria que elaborou foi a do movimento de todas as sociedades do “status”
para o “contrato”. O “status” seria uma condição própria das sociedades primitivas, de acordo
com a qual as relações sociais se limitavam a relações de família (com supremacia do varão
mais velho). Os indivíduos não seriam livres: estariam determinados pelo nascimento e não
54
era possível mudar essa determinação com um acto de vontade pessoal. O “contrato” seria
uma condição característica das sociedades progressivas e complexas. Os indivíduos,
independentemente e separados do próprio grupo, formam parte de associações voluntárias,
nas quais podem ocupar livremente a sua posição e determinar as suas próprias relações.
Robertson-Smith (1846-1894) foi um erudito que interpretou o Antigo Testamento (um dos
primeiros, no seu contexto histórico). No seu livro "The Religion of the Semites" (1889), diz
que, nas religiões tradicionais não reveladas, o rito é mais importante que o dogma.
56
seguiria a linha: animismo►feiticísmo►idolatria►politeísmo►monoteísmo.
Criou uma das definições mais divulgadas de cultura como objecto da antropologia:
“A cultura ou civilização, em sentido etnográfico alargado, é aquele todo aquele
complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito, os
costumes, e quaisquer outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem,
enquanto membro de uma sociedade.”
Evans Pritchard (1987, or. 1980: Historia del pensamiento antropológico. Madrid:
Cátedra), disse que Tylor pretendia converter a antropologia numa ciência de
estatísticas, tabulações e classificações. Estudou 350 culturas, em fontes escritas,
procurando as regras de matrimónio e descendência. Correlacionou também
sistemas de casamentos e sistemas de residência (materlinhal, neolocal e paterlocal),
para elaborar uma teoria da passagem de culturas maternas a culturas paternas e
outra da sobrevivência de costumes de etapas anteriores.
Tylor foi filho da sua época e, por isso, defendeu a missão de civilização do
imperialismo britânico. Desconhecia o princípio do relativismo cultural e não
pensou no direito de outros a conservar a sua própria cultura.
Tylor influenciou o antropólogo Frazer que escreveu, em 1890, The Golden Bough.
Neste livro, Frazer elabora a teoria evolucionista, segundo a qual os humanos
percorrem as seguintes etapas: magiareligiãociência. A última etapa atribui um
poder e validez superior. Frazer é conhecido porque, certa vez, lhe perguntaram se já
tinha conhecido algum selvagem, ao que ele respondeu: “Livre-me Deus de
semelhante atrocidade”.
Os dados não falam por si próprios: é preciso organizar os dados, em relação à teoria. Os
dados são apenas barulho, se não aportam um contributo à teoria antropológica.
Foram quase todos antropólogos de gabinete (só Morgan fez algo de trabalho de campo
com os iroqueses), sem sair para o terreno. Trabalharam, fundamentalmente, com fontes
documentais e com dados fornecidos por outros (misionários, agentes coloniais, viageiros,
comerciantes). Têm, contudo, o mérito de tentarem fazer da antropologia uma ciência de
rigor.
57
Introduziram o método comparativo, na antropologia.
Um dos seus eixos foi o das semelhanças e as diferenças culturais. Ainda que os
evolucionistas se tenham preocupado mais com as semelhanças do que com as diferenças
entre os grupos humanos. É complicado abarcar um objecto tão alargado: é começar a
casa pelo telhado.
Estudaram mais de 300 sociedades, através do método comparativo. Este trabalho foi
continuado, nos E.U.A., por Murdock no seu projecto “Humam Relations Area”.
Para os evolucionistas, para que aconteça uma mudança tem que haver um lugar, um
espaço concreto, a identidade de um grupo em concreto: não a humanidade, no seu
conjunto.
A crença não é um erro, como afirmava Tylor. A crença dá sentido à experiência humana.
A mente não pode esperar que a ciência resolva todos os seus problemas, daí que se
alimente a crença (tal disse Durkheim).
58
3.5 O Difusionismo
Foi uma reacção contra o evolucionismo, mas coexistiu com ele. Foi uma escola
antropológica que tentou entender a natureza da cultura, em termos da origem da cultura e
da sua extensão de uma sociedade a outra. O empréstimo cultural seria um mecanismo
básico de evolução cultural.
Defendeu que as diferenças e semelhanças culturais eram causa da tendência humana para
imitar e a absorver traços culturais.
Outros autores: no Reino Unido, Grafton Elliot Smith (1871-1937, antropólogo físico),
William James Perry (1887-1949). W.H. Rivers (1864-1922) integrou a expedição que
estudou os nativos do Estreito de Torres. Na Alemanha, destacam-se: Fritz Graebner
(1877-1934) que publicou, em 1911, um manual de antropologia (“Methode del
Ethnologie”); e o padre católico Fr. Wilhelm Schmidt (1868-1959), fundador da revista
Anthropos, que inverteu as séries evolutivas dos evolucionistas, pois tentou demonstrar
que a religião tinha origem no monoteísmo –ex.: pigmeus caçadores e recolectores. Os
alemães postularam a formação de diversas culturas, a partir de poucos “círculos
culturais”. Essas culturas estender-se-iam a outras culturas sob forma de traços, através da
migração de populações e da melhoria dos meios de transporte.
59
3.6 O particularismo histórico
FRANZ BOAS (1858-1942), alemão de origem judaica, emigrou para os E.U.A., onde
desenvolveu a sua carreira científica.
Formado na Alemanha, como geógrafo e psicofísico, estudou geografia com
Friedrich Ratzel (1844-1904) que afirmava que o meio ambiente era o factor
determinante da cultura.
Viajou até ao Árctico e descobriu que diferentes grupos de esquimós controlavam e
exploravam meios semelhantes de maneiras diferentes.
Deu aulas na Universidade de Columbia e foi director do American Museum of
Natural History (New York).
Chegou a formar antropólogos como Melville Herskovits, Alfred L. Kroeber (1876-
1960), Robert Lowie (1883-1957), Edward Sapir (1884-1931), Margaret Mead
(1901-1978), Ruth Benedict (1887-1948) e Clyde Kluckhohn (1905-1960).
Para Boas, a tarefa do antropólogo era investigar as tribos primitivas que careciam
de história escrita, descobrir restos pré-históricos, estudar tipos humanos e a
linguagem. Cada cultura teria a sua própria história. Para compreender a cultura
teríamos que reconstruir a história de cada cultura.
Defendeu que não há culturas superiores nem inferiores (relativismo cultural). Os
sistemas de valores devem compreender-se dentro do contexto de cada cultura e não
de acordo com os padrões da cultura do antropólogo.
Estudou as teorias da evolução, sobre as quais se mostrou céptico, e defendeu a
difusão da cultura.
Impulsionou a ideia de que os antropólogos deviam dominar as línguas dos povos
estudados, com o objectivo de conhecer o mapa da organização básica do intelecto
humano.
Criticou o evolucionismo e defendeu que os mesmos efeitos poderiam dever-se a
60
diferentes causas. Também defendeu que muitas das semelhanças culturais eram
originadas pela difusão, mais que pela invenção independente, e que, em muitos
casos, a evolução não avança do simples para o complexo, antes o contrário (ex.:
formas de arte, linguagem, etc.).
Esforçou-se por estudar as culturas índias dos EUA, porque estavam em risco de
extinção.
Em vez da prática evolucionista de enquadrar dados etnográficos em categorias pré-
definidas, Boas salientou a necessidade de um cuidadoso e intensivo estudo em
primeira mão, livre de todo prejuízo ou preconceito. As generalizações e as leis
surgiriam depois de ter os dados apropriados.
Em contraste com os difusionistas alemães, Boas defendia que a difusão não se
processava, apenas, do centro para a periferia, mas em qualquer direcção, entre os
diversos grupos humanos.
Fundada por discípulas de Franz Boas: Ruth Benedict e Margaret Mead, inspiradas em
Sigmund Freud (psicanálise) e no filósofo Nietzsche.
61
família nuclear. Os velhos e os seus conhecimentos deixam de ser pensados como
necessários.
Ruth Benedict (1934), seguindo ao filósofo Nietszche, distinguiu dois tipos de culturas, entre
os índios norte-americanos:
3.8 O Funcionalismo
Émile Durkheim (1858-1917) foi um grande inspirador dos estudos antropológicos. Na sua
revista "L´Année Sociologique"(1898-...), seguiu o sociólogo britânico Herbert Spencer,
afirmando a independência dos factos sociais (regras de comportamento, normas, critérios de
valor, expectativas dos membros) relativamente à consciência dos indivíduos que formam a
sociedade. Na expressão da individualidade, quebramos as normas, quer por impulso, quer de
forma calculada. As normas são diferentes das expressões da individualidade: podem ser
sociais (o que a gente acredita que deveria acontecer) ou estatísticas (o que normalmente
acontece). O comportamento social apropriado é uma reacção ante pressões complexas.
Durkheim escreveu "De la Division du Travail Social"(1893) e "Formes Elémentaires de la
Vie Religieuse"(1912). Nesta última obra, dedicada aos aborígenes australianos, afirma que o
totemismo é a religião mais antiga e que o ritual reflecte a ordem social e venera a sociedade.
62
Gennep (estudou vários tipos de rituais, sobretudo os rituais de passagem) e Max Weber
(1864-1920).
No final do séc. XIX, generalizou-se a ideia da procura de dados próprios, em vez da análise
de documentação elaborada por terceiros (ex.:viageiros). Entre 1883 e 1884, Franz Boas
estudou os esquimós, e, entre 1897 e 1902, Jesup North Pacific estudou a relação entre os
aborígenes da Ásia Norte-oriental e os ameríndios da América do Norte. Em 1898, efectua-se
uma expedição britânica ao Estreito de Torres e Nova Guiné, na qual participou W.H. Rivers
que teorizará os conceitos de “descendência” (pertença ao grupo social da mãe ou do pai),
“sucessão” (transmissão do estatuto ou do cargo) e “herança” (transmissão da propriedade).
Segue-se a expedição de Malinowski às Ilhas Trobiand (Pacífico). Malinowski introduziu a
ideia do trabalho de campo, com duração mínima de um ano como mínimo (preferivelmente
2, com um intervalo para ordenar os resultados e ver que perguntas faltaram por fazer).
O conceito de função
Herbert Spencer (1820-1903) foi o primeiro sociólogo britânico a usar este conceito. Viu um
estreito paralelismo entre as sociedades humanas e os organismos biológicos (na forma de
evolução e conservação), porque ambos existem graças à dependência funcional das partes.
As funções seriam obrigações, nas relações sociais. Influenciou Marcel Proust.
Émile Durkheim (1858-1917) relaciona o facto social com as necessidades que cumpre e
satisfaz – função (exemplo: o castigo do delito, a divisão do trabalho). O social só poderia
explicar-se pelo social e não por constituição biológica ou por psicologia individual. Este
autor estava preocupado com o problema da ordem e da estabilidade social e pelo modo como
se poderia evitar a desintegração da sociedade, sob a pressão dos interesses egoístas dos seus
componentes.
63
confiança na rectitude das suas normas e da continuidade da sua existência. Esta confiança
deriva da religião. Malinowski critica Durkheim e afirma que as necessidades do organismo
individual ou da espécie (abrigo, calor, liberdade de movimento) são diferentes das
necessidades da sociedade (instituições sociais como a família ou o matrimónio são
dispositivos sociais que atendem as necessidades sociais).
A R. Radcliffe-Brown (1881-1955) insistirá no facto de que a função não deve ser usada no
sentido de "intenção", "finalidade" ou "significado". A proposição "todo uso social tem uma
função" pode converter-se facilmente em "todo uso social é bom". Para Radcliffe-Brown, a
funçao é o que sustenta a estrutura social, ou seja, a coesão dentro de um sistema de relações
sociais. Por exemplo, a magia tem a funçao de actuar como um mecanismo de solidariedade
social.
O Neoevolucionismo
-Os traços culturais mais adaptáveis são os que sobreviviam no seio da competência
cultural.
64
Metodologia: A cultura devia ser estudada desde o exterior, observando-a de uma
forma objectiva e sem adoptar o ponto de vista dos participantes. Esta acepção
contradiz Boas e Malinowski.
A Ecologia Cultural
-A mudança cultural estaria motivada por mudanças na tecnologia ou nos sistemas produtivos.
-Steward coloca a questão dos processos materiais que incidem nos seres humanos
confrontados com o seu meio envolvente.
65
O materialismo cultural
-Entre as suas muitas polémicas teorias, sublinhamos a que se dedica às causas que guiam a
abstinência dos judeus e muçulmanos no consumo de carne de porco. De acordo com Harris,
estes não comem porco porque os porcos comem o mesmo que os humanos e isto torna a sua
manutenção muito dispendiosa. Comem ovelhas e cabras, porque a sua manutenção é mais
barata, para além de que dão leite, lã e força de trabalho.
O seu representante máximo foi o francês – mas, natural da Bélgica – Claude Lévi-Strauss
(1908- ), que defendeu uma ideia fundamental: as uniformidades culturais nasciam na cabeça
humana e também num processo de pensamento inconsciente. A característica fundamental da
mente humana é a tendência para criar dicotomias e para estabelecer opostos binários:
66
puro/impuro, limpo/sujo... Estas dicotomias explicariam as similitudes e as diferenças entre as
culturas. A antropologia seria para este autor uma semiologia da cultura.
Em 1949, Lévi-Strauss publica a sua obra “As estruturas elementares de parentesco” – sobre
os aborígenes australianos-, na qual aplica os princípios de reciprocidade e de estrutura social
ao estudo dos sistemas de matrimónio e parentesco. Analisa o tabu do incesto, como origem
da exogamia, e as trocas matrimoniais.
67
pensamento humano. O pensamento tem como princípio básico orientador a oposição dualista
e dicotómica: esquerda-direita, negativo-positivo...
Períod Contexto
Escolas e teorias Autores
o histórico
Curiosidade pelos costumes
exóticos e pelas explicações
sobre esta diversidade Heródoto (484-425 a.C.)
“Bárbaros” (os não gregos): Santo Agostinho
Expansão do império e do comércio
Antes do séc. XV
68
Descobrimento do "mundo
selvagem" e constituição de um
novo campo de estudo: a
Início do colonialismo moderno e formação do capitalismo Descobrimento ocidental do mundo. Desenvolvimento do
história moral (estudo dos
capitalismo mercantil e do comércio de escravos
hábitos e costumes dos
diferentes povos). Dicotomia:
José de Acosta
selvagens/humanos (europeus).
Bartolomé de las Casas
Século XV
da humana.
De um teocentrismo a um
humanocentrismo.
Aparece a dicotomia selvagem Montesquieu (1689-1755)
ou primitivo / civilizado e a
S. XVIII
69
Evolucionismo
Influências da Ilustração e de
Darwin: evolução biológica e
sobrevivência dos mais aptos.
SelvagismoBarbárieCiviliz
ação
J.J.Bachofen (1815-1887)
Expansão colonial
Continua a dicotomia
primitivo / civilizado.
2ª metade do século XIX
70
Relativismo cultural.
Evolução também do complexo
para o simples.
Trabalho de campo no terreno
(Boas)
Funcionalismo (Reino Unido)
Noções de função, estrutura
social, interdependência,
equilíbrio funcional,
B. Malinowski (1884-
necessidade, ordem.
1942)
Spencer: função = obrigação nas
A.R. Radcliffe-Brown
RR.SS.
(1881-1955) E.E. Evans-
Durkheim: função = satisfaz
Pritchard (1902-1973) M.
Entre a 1ª e a 2ª Guerras mundiais
Malinowski: função = a
organização social satisfaz
necessidades biológicas,
psicológicas e sociais.
Cultura e personalidade (EUA)
Discípulos de Franz Boas.
Influência da psicanálise e de
Nietzche. R. Benedict (1887-1948)
“Personalidade de base” M. Mead (1901-1978)
partilhada por todos os G. Bateson
membros de uma cultura R. Linton (1893-1953)
Tipos de culturas: dionisíacas A. Kardiner (1891-1981)
(extâse), apolíneas (moderação);
pré-figurativas, pós-figurativas,
co-figurativas.
71
Neo-evolucionismo
Cultura como um sistema de
adaptação ao meio ambiente.
A tecnologia, o uso da energia e
a demografia como elementos
chave da evolução.
Os estádios de complexidade
social e avanços tecnológicos
(bando, tribo, perfeitura e
estado). L. White (1900-1974)
Começa a descolonização
Evolucionismo unilinear.
Os factores tecnológicos
Anos 1950
determinam os traços
ideológicos e sociológicos de
um grupo humano.
Confronto com Alfred Kroeber
(que sublinha os aspectos
ideológicos como motores da
mudança cultural).
Ecologia Cultural
Cultura como sistema de
adaptação ao meio natural.
Motor da mudança: aspectos J.Steward (1902-1972)
tecnológicos, mas também a
organização da produção.
Evolucionista multilinear.
72
Materialismo cultural
Cultura como um
mecanismo de adaptação ao
meio.
A aplicação de tecnologias
semelhantes tende a Marvin Harris (1931-
produzir sistemas de 2001)
produção e de organização Rappaport, Vayda Harris,
semelhantes. o 1º Marshall Sahlins
As condições materiais da
existência actuam,
determinantemente, sobre a
vida quotidiana.
Ecossistema, energia,
adaptação.
Movimentos de liberação nacional e processo de descolonização
Estructuralismo
Existe uma cultura humana, não
só culturas. Existe uma unidade
psíquica da humanidade.
Há regras culturais universais
que são um apriori.
A cultura é entendida como um
Anos 1960,1970
73
Guerra fria e liderança mundial dos EUA.
Antropologia Cognitiva
A Cultura é um sistema de
conhecimentos, percepções e Berlin, Kay,
crenças partilhados. Goodenough, Del Hymes,
Estuda a forma como os Tyler...
fenómenos são organizados na
mente das pessoas.
Antropologia simbólica
A cultura como um sistema de
símbolos, através dos quais os
membros de uma sociedade
comunicam a sua visão do
mundo.
Cultura como veículo de C. Geertz (1926), D.
comunicação. Schneider (1918),
Guerra do Vietname
V.Turner (1920-1983),
Mary Douglas…
Maio 1968
Antropologia marxista
Paradigma dos modos de
produção.
Relação dialéctica entre a base
Anos 1970
M. Godelier, E.Terray,
material e a cultura, entre a
Cl.Meillasoux, M.Bloch
infra-estrutura e a
superestrutura.
Articulação de diferentes modos
de produção.
74
Antropologia pós-moderna
A realidade é sempre
interpretada.
J. Clifford
A antropologia é uma
Anos 1980
G. Marcus
interpretação de interpretações.
P. Rabinow
Crítica das retóricas de
D. Tedlock
autoridade clássicas.
Novo paradigma do trabalho de
campo: etnografia multisituada
75
3.11 Antropologia em África e em Moçambique
A Antropologia em África e em Moçambique, tal como vimos nas aulas anteriores, tem as
suas origens nas práticas do colonialismo. Para o caso de Moçambique, podemos situar as
origens da Antropologia no quadro da colonização portuguesa. Assim, para entedrmos a
evolução da Antropologia em Moçambique, teremos que revisitar parte da história da
antropologia colonial portuguesa.
A Antropologia colonial
Acontece que o popular de hoje é rejeitado como má cultura e o popular de ontem é definido
como "tradicional". Curiosamente o que antes era só hegemónico e burguês é agora
considerado como "popular".
Nesta época, apenas se escreveu uma monografia sobre as colónias. JUNOD, Henri (1898):
The Life of A South African Tribe. Sobre os Thonga de Moçambique, um dos clássicos do
africanismo. O seu autor foi um missionário metodista suíço.
A partir de 1935, o regime ditatorial instituiu o estudo das colónias, com o objectivo de
elaborar mapas etnológicos. Isto foi bem definido no Primeiro Congresso Nacional de
Antropologia Colonial (Porto, 1934). Um dos seus autores foi Mendes Correia que utilizou
um método antropométrico de campo. Foram enviadas missões para todas as colónias
portuguesas, nomeadamente para África. Entre os impulsores destas missões destaca-se
Joaquim do Santos Júnior (Pereira, 1988). Esta antropologia representava as tendências mais
conservadoras das ideologias coloniais do regime.
A partir de finais de 1950 produz-se uma nova antropologia colonial, protagonizada por Jorge
Dias, que se distancia, cada vez mais, do grupo de Mendes Correia (Porto).
1952 Jorge Dias mudou-se para Coimbra, onde leccionou Etnologia e História da
Geografia
Integrou-se na Escola de Administração Colonial. Fez uma viagem à Guiné,
1956
Moçambique e Angola
Jorge Dias foi convidado para dirigir as Missões de Estudo das Minorias
Étnicas do Ultramar Português. Os seus assistentes foram: Margot Dias
1957 (esposa dele) e Manuel Viegas Guerreiro. O objectivo era realizar descrições
etnográficas, mas também relatórios confidenciais sobre as condições sociais e
políticas das colónias.
A Escola de Administração Colonial passou a denominar-se Instituto Superior
1961 de Ciências Sociais e Política Ultramarina. Aqui leccionou Antropologia
Cultural, Etnologia Regional e Instituições Nativas
Jorge Dias estudou os chopes do Sul de Moçambique, os Bóeres e Bosquímanes do Sul de
Angola, mas o seu trabalho central foi dedicado aos macondes do Norte de Moçambique,
escolha influenciada pelo facto do seu professor, o alemão Richard Thurnwald, ter estudado,
nos anos 30, os macondes de Tanganica (Tanzânia tornou-se independente em 1964). A
tensão política era intensa e, em 1964, começa o movimento pela independência de
Moçambique.
Marvin Harris também trabalhou em Moçambique com os thongas (1959), mas foi expulso,
nesse ano. Em 1960, Charles Wagley (também da Columbia University) foi convidado, pelo
Ministério, para substituir Harris, como acto de relações públicas e de reduzir a má impressão
da expulsão de Harris. Jorge Dias acompanhou a Wagley por Angola e Moçambique.
Segundo João de Pina Cabral (1991: 35-36), Jorge Dias nunca conseguiu ultrapassar as
limitações teóricas de base e não compreendia a teoria sociológica nem a antropológica.
A emergência das ciências sociais bem como os seus pressupostos epistemológicos aparecem
assim, ligados, por um lado, ao contexto histórico (social e ideológico) do processo científico,
mas também a relação entre a teoria e a prática e entre a ciência e a ideologia.
Emerge uma visão da luta armada idealizada que a vê como uma experiência que enfrentou e
ultrapassou, sem grandes problemas, todos os conflitos. O estudo das diversas formas de
opressão far-se-ia através do processo de libertação com o objectivo da eliminação das formas
de «opressão do homem pelo homem».
Há um esforço constante de estudar a luta armada porque só através dela se poderá constituir
uma tradição de pesquisa e de luta enraizada nas realidades moçambicanas.
A FRELIMO preconiza a defesa da posição de que a génese da teoria social não se processa
apenas nas salas de aula, no estudo dos textos, mas também numa prática e numa luta social.
Mas mais marcante é a teorização a partir da prática visando a mudança social onde o mar
xismo detém um lugar de eleição. Assim se referia o Presidente Samora Machel a um
jornalista em Março de 1980: «No nosso país, o marxismo é produto da luta de libertação
nacional. Nós não proclamamos o marxismo depois da independência. A própria guerra
transformou-se, no seu processo de desenvolvimento, numa guerra revolucionária popular.
Foi isto que permitiu à Frente de Libertação transformar-se num partido marxista-leninista.»
O estudo formal do marxismo e a sua utilização constante como instrumento e método para
analisar as condições da realidade social e imposta ao cientista social.
Esta elaboraçãao conduz à explicação das estruturas sociais tradicionais em termos marxistas
dos modos de produção. Algumas pesquisas bem como as suas reflexoes teoricas ilustram esta
tendência. Numa investigação realizada sabre regime de trabalho forçado nas plantações no
centro do país, Carlos Serra afirma: «A introdução de formas de acumulação de capital
ligadas quer ao mussoco quer à produção de plantação, fez-se, na Zambézia, com a
preservação/negação dos modos de produção pre-capitalistas.»
Esta concepção revelou-se bastante atraente para os cientistas sociais que viram na adopção
desta abordagem uma maneira de aderirem à comunidade de investigadores e cientistas do
Ocidente.
A ênfase presente na maior parte dos estudos é posta sabre a quantidade e a profundidade das
mutações sofridas pelos Moçambicanos, concluindo que a população rural, sobretudo a do Sul
do país, no inicio da independência, se encontrava proletarizada ou semiproletarizada e
estruturada em classes.
A Reflexao Participativa - Urn novo imperativo conduz-nos a tentar elaborar achegas novas
em que as nossas sociedades já não são vistas de um ponto de vista reducionista, mas sim na
significação que se dão a si próprias.
Urn exemplo destes estudos é dado pela pesquisa realizada sabre a desenvolvimento do
habitat por uma equipa interdisciplinar (que incluia soció1ogos, antropó1ogos, arquitectos,
geógrafos e historiadores) da Direcção Nacional de Habitação (DNH). Estes trabalhos eram
encarados numa perspectiva histórico-antropológica, tomando como sujeito desse processo o
homem, as suas acções e as suas relações sociais concebidas como urn produto do passado
articulado com o presente. A pesquisa procurava encontrar no saber e no comportamento
herdado das populações, no que respeita à habitação, tecnologia e uso do espaço, pontos de
referência que permitissem uma aproximação às soluções e respostas habitacionais e de
ocupação do território «tecnicamente apropriadas, sociológicamente coerentes,
economicamente possíveis e politicamente correctas».
O conceito de relações sociais de género tern estado a ganhar, na prática das reflexões da
Sociologia e da Antropologia, estatuto de paradigma, ao informar sabre as relações sociais
entre homens e mulheres. Neste sentido, esta postura teórica anuncia uma profunda mudança
na delimitação do objecto. Se, até há pouco, o objecto de estudo era a construção social e
subordinada do feminino, hoje, remodelado, é a construção das relações sociais entre hornens
e mulheres, isto é, as relações de género.
Este enfoque dinâmico significa uma alteração na era dos estudos sabre a mulher - mulher e
educação, mulher e politica, mulher e família -, descortinando novas horizontes. Não basta
indicar o lugar onde estão as mulheres, o que fazem, ou que não fazem. É preciso apreender o
cerne das relações sociais que sac também constitutivas das relações de género e vice-versa.
Para uma conceptualização da família é forçoso levar-se em linha de conta, tanto os modos
que orientam a sua constituição e organização, como as representações simbólicas que lhe dão
significado.
Não existe, nem a titulo descritivo, informação suficientemente relevante sabre a evolução
histórica da composição e estruturação das formas de família e, mais recentemente, de como
os factores guerra e crise económica provocaram novas conformidades e geraram alterações
na constituição e na vivencia do espaço social da família.
No seio de alguns grupos populacionais em Moçambique, as funções consideradas unívocas
têrn significaçóes diferentes, o pai social não coincide com o pai biológico e não ocupam o
mesmo espaço físico. Neste contexto, as funções têrn de ser entendidas conjuntamente com a
estrutura em termos de composição/alteração da família e como as relações famíliares que se
estabelecem evoluem, consoante o sexo e a idade, dependentes de fenómenos sociais,
económicos e políticos.
Mas a ensino das disciplinas das ciências sociais, designadamente da Antropologia, não se
cinge apenas a UEM. Outras instituições de ensino tal como a Universidade Pedagógica, o
Instituto Superior de/Tecnologia de Moçambique (ISCTEM), o Instituto Superior Politecnico
e Universitario (ISPU) detém no seu curriculo cadeiras de Antropologia.
Esta criação progressiva e que se insere num tempo longo pressupõe a inovação e a
criatividade, isto é, a emergênciua de novos conhecimentos. Pressupõe ainda colaboração
com diferentes instituições a nivel regional e internacional visando o intercâmbio cientifico
(trocas de informação bibliografica, desenvolvimento de redes de investigadores, criação de
banco de dados).
Estamos em crer que o sucesso das intervenções sociais, quer se trate de políticas públicas ou
de iniciativas privadas, depende em parte desse conhecimento. Trata-se de fazer da
ivestigação social alga de aceitavel e util na formulação e implementação das políticas.
Nas nossas universidades, para além da necessidade da destruição definitiva do fenómeno que
acabou de se descrever, tem que se chegar à instauração de uma verdadeira interdependência
entre as ciências sociais, em investigações plurisdisciplinares, em todas as duas formas
(multidisciplinar, interdisciplinar, transdisciplinar), para alcançar uma teoria explicativa e
valorizadora das sociedades do chamado terceiro mundo.
Apesar das independencias dos países de África Negra a máquina da transfiguração do negro
tem sido tão importante que as suas sequelas psicológicas têm deixado permanentemente nos
negros, como individuos e como colectividade. Continuamos ignorando o que somos
realmente, depreciando-nos pessoalmente e colectivamente, querendo às vezes ser outra coisa
que não somos, isto é, querendo branquear-nos. Alguns se identificam com o sistema
económico desenvolvido do país em que vivem, para considerar-se superiores aos demais.
A missão das ciências sociais consiste em estabelecer a verdade científica que permita o bem
estar e a liberdade do ser humano na sociedade em que vive. A antropologia, que é ciência do
homem por excelência, é a que com maior obrigação deveria estabelecer a verdade a partir
dos seus resultados científicos.
Actividades
4.1 Introdução
4.2 Objectivos
Sociedade
As relações sociais são tipos de acção pautada, e os antropólogos sociais estão interessados
nas pautas de interacção social que existem no interior dos grupos, pelos papéis sociais
(expectativas de conduta dos indivíduos que realizam alguma tarefa) e a estrutura social (a
ordenação dos componentes ou grupos de cada sociedade). As pessoas fazem coisas com, para
e em relação com outras pessoas.
Cultura
Mas estas qualidades não são inatas (biológicamente herdadas), porém são adquiridas como
parte do crescimento e desenvolvimento de uma determinada cultura.
Holismo
Na actualidade é próprio dos antropólogos tentar explicar cada elemento da cultura concreta
pela sua relação com os outros. É esta perspectiva denominada “holística”, pois intenta ligar
os aspectos culturais e os aspectos sociais, uns são incompletos sem os outros e ao revés.
Acontece que os antropólogos socioculturais podem salientar alguns aspectos mais do que os
outros, porém na realidade os valores e as crenças são inseparáveis da estrutura social e a
organização social.
Exemplo: Um operário de uma fábrica de Verim, no fim do seu trabalho saia dela em
bicicleta, caminho de Chaves era parado e inspeccionado por um guarda em Feces, mas como
não levava outra coisa nela, deixavam-no passar, assim durante várias semanas, até que se
descobriu que o que roubava eram bicicletas. O guarda só olhava uma parte, não o todo.
↨ ANTROPOLOGIA ↨
Numa obra dos antropólos Alfred Kroeber e C. Kluckhohn (1963) foram reunidas 164
definições do conceito de cultura apresentamos o que têm em comum estas definições e as
características da noção antropológica de cultura. Vamos apresentar agora algumas definições
que representam a diversidade e a complexidade deste conceito e que nos podem ajudar a
entender melhor as características da noção antropológica de cultura:
F. BOAS (1930)
"La cultura incluye todas las manifestaciones de los hábitos sociales de una comunidad,
las reacciones del individuo en la medida en que se ven afectadas por las costumbres del
grupo en que vive, y los productos de las actividades humanas en la medida en que se
ven determinadas por dichas costumbres” (Boas, 1930:74; citada por Kahn, 1975:14).
B. MALINOWSKI (1931)
"Esta herencia social es el concepto clave de la antropología cultural, la otra rama del
estudio comparativo del hombre. Normalmente se la denomina cultura en la moderna
antropología y en las ciencias sociales. (...) La cultura incluye los artefactos, bienes,
procedimientos técnicos, ideas, hábitos y valores heredados. La organización social no
puede comprenderse verdaderamente excepto como una parte de la cultura"
(Malinowski, citada por Kahn, 1975:85).
“La cultura de una sociedad consiste en todo aquello que conoce o cree con el fin de
operar de una manera aceptable sobre sus miembros. La cultura no es un fenómeno
material: no consiste en cosas, gente, conducta o emociones. Es más bien una
organización de todo eso. Es la forma de las cosas que la gente tiene en su mente, sus
modelos de percibirlas, de relacionarlas o de interpretarlas” (Goodenough, 1957:167;
citada por Keesing, 1995:56).
C. GEERTZ (1966)
“Cultura é todo aquele (mitjà) modelo?, com formas que não estão sob o controlo
genético directo... que serve para ajustar aos indivíduos e os grupos nas suas
comunidades ecológicas”, (Binford, 1968:323; citada por Keesing, 1995:54).
R. CRESSWELL, R. (1975)
"[A cultura é] a configuração particular que adopta cada sociedade humana não só para
regular as relações entre os factos tecno –económicos, a organização social e as
ideologias, porém também para transmitir os seus conhecimentos de geração em
geração (Cresswell, 1975:32).
"Definim la cultura com al conjunt dels valors, comportaments i institucions d'un grup
humà que és après, compartit i transmès socialment. Abasta totes les creacions de
l'home: les cosmogonies [visió del món], els modes de pensament, la imatge de l'home,
els sistemes de valors, la religió, els costums, els símbols, els mites; però també les
seves obres materials: la tecnologia, els modes de producció, el sistema monetari; a
més, les institucions socials i les regles morals i jurídiques" (Perrot e Preiswerk,
1979:39).
HARRIS, M. (1981)
"La cultura alude al cuerpo de tradiciones socialmente adquiridas que aparecen de forma
rudimentaria entre los mamíferos, especialmente entre los primates. Cuando los
antropólogos hablan de una cultura humana normalmente se refieren al estilo de vida
total, socialmente adquirido, de un grupo de personas, que incluye los modos pautados y
recurrentes de pensar, sentir y actuar" (Harris, 1982:123).
A. GIDDENS (1989)
"Cultura se refiere a los valores que comparten los miembros de un grupo dado, a las
normas que pactan y a los bienes materiales que producen. Los valores son ideales
abstractos, mientras que las normas son principios definidos o reglas que las personas
deben cumplir" (Giddens, 1991:65).
A definição de Tylor incide nesta ideia fundamental, a cultura não é adquirida através da
herança biológica, porém é adquirida pela aprendizagem (consciente e inconsciente) numa
sociedade concreta com uma tradição cultural específica. O processo através do qual as
crianças aprendem a sua cultura é denominado inculturação. A inculturação é um processo
de interiorização dos costumes do grupo, até o ponto de fazer estes como próprios. Este
processo é fundamental para a sobrevivência dos grupos humanos, assim por exemplo os
esquimos tem de aprender a proteger-se do frio. O processo de inculturação produz-se
fisicamente (gestos, formas de estar, de comer...), afectiva e sentimentalmente (por causa da
acção de reforço ou repressão da nossa cultura) e também intelectualmente (esquemas mentais
de percepção do mundo). Os agentes de inculturação são a família, as amizades, a escola, os
media, os grupos de associação, etc., eles têm como missão introduzir o indivíduo na sua
sociedade através da aprendizagem da cultura.
Segundo Margaret Mead (2001), os tipos de aprendizagem das culturas podem classificar-se
em:
a) Culturas pós-figurativas: Aquelas nas quais os filhos aprendem com os pais e o futuro
dos filhos é o pasado dos pais.
Alguns animais (i.e.: primates) também têm alguma capacidade de aprendizagem, incluso
para distinguir plantas, mas a diferença dos humanos, os animais não podem transmitir
culturalmente a informação cultural acumulada, nem podem registar (ex.: escritura,...)
codificadamente a informação cultural.
Em relação com esta característica da noção de cultura, o antropólogo Clifford Geertz (1987)
define a cultura como ideias baseadas na aprendizagem cultural de símbolos. A gente
converte em seu um sistema previamente estabelecido de significados e de símbolos que
utilizam para definir o seu mundo, expressar os seus sentimentos e fazer os seus juízos. Este
sistema guia o seu comportamento e as suas percepções ao longo da sua vida. A cultura
transmite-se através da observação, da imitação, da escuta, etc.; nesse processo de
aprendizagem fazemos consciência do que a nossa cultura define como bom e mau (princípios
morais). Mas a cultura também se aprende de maneira inconsciente, é o caso das noções
culturais a manter com as pessoas quando falam entre si, a distância da conversa e a
linguagem não verbal. Por exemplo, os latinos mantêm menos distância nas conversas pela
sua tradição cultural. Neste sentido, para Clifford Geertz (1987) a cultura é:
Um sistema de significados.
Um “ethos”.
Um conjunto de símbolos que veiculam a cultura.
Segundo o antropólogo Carmelo Lisón Tolosana (1974: 11), podemos entender o ethos
(Weltanschauung) como o sistemas de valores e normas morais, aquilo que a gente pensa que
deve ser, os estilos e modos de vida aprovados em um grupo humano, os hábitos emotivos, as
atitudes, tendências, preferências e fins que conferem unidade e sentido à vida, os aspectos
morais, religiosos e estéticos do grupo.
A Cultura é simbólica
Por tanto de alguma maneira esta associação é arbitrária e convencional, socialmente aceite e
compartida. O símbolo serve para veicular uma ideia ou um significado que tem um
significado social (sentido atribuído e intencionado compartido socialmente).
A diferença do resto dos seres vivos, que se comunicam de forma diádica (estímulo-resposta),
os humanos comunicámo-nos de forma triádica por meio de signos e símbolos que são
abertos, arbitrários, convencionais e que requerem descodificação (emisor-mensagem-
receptor) e tradução.
“Quando eu cheguei a umas colónias de verão á beira do mar eram as 13:30 horas, e tinha
desejos de tomar um banho nele, mas o regulamento das colónias não permitia tomar banho
nessa hora; o mar é parte da natureza, mas estava submetido a uma ordenação cultural, os
mares naturais não fecham ás 13:30 horas, mas sim os mares culturais”.
As pessoas têm que comer, sem embargo a cultura ensina-nos que, como e quando. A gente
tem que defecar, mas não todos o fazem da mesma maneira (i.e.: Bolívia /Europa). A cultura,
entendida como sistema de signos, é contraposta à natureza (Lévi-Strauss, 1982), ao biológico
e ao inato. O ser humano é um ser biológico, mas o que o faz completamente humano é a
cultura, especificamente humana e constitutiva do humano. A biologia é uma condição
absolutamente necessária para a Cultura, mas insuficiente, incapaz de explicar as propriedades
culturais do comportamento humano e as suas variações de um grupo a outro (Sahlins, 1990),
de aí que possamos falar em autonomia e interdependência da Cultura.
Cultura Natureza
Andar de bicicleta. Respiração.
Fazer somas, ler, cultivar tomates, Circulação do sangue, etc.
fritar ovos, etc. Informação transmitida
Informação transmitida por geneticamente.
aprendizagem social.
Num sentido geral todos os humanos temos “Cultura” (“universal humano”), mas num sentido
particular a “cultura” descreve um conjunto de diferenças de um grupo humano específico
com outros.
A humanidade partilha a capacidade para a Cultura (todo o criado pelos seres humanos), é
este um carácter inclusivo; porém a gente vive em culturas particulares (modos de vida
específicos e diferentes) com certa homogeneidade, uniformidade e harmonia internas, mas
também com condicionantes ecológicos e socio-históricos particulares.
Para os antropólogos ter cultura não é a mesma coisa que ter formação académica (cultivo
intelectual), refinamento, sofisticação e apreciação das belas artes... Todo o mundo tem
cultura no sentido antropológico do termo. É assim como a antropologia tem uma perspectiva
holística que presta atenção a todas as manifestações e expressões culturais.
A cultura é partilhada
A cultura é aprendida normativamente. Quer dizer que está formada por umas regras ou
normas integradas. Dispõe de um conjunto de valores centrais, chaves ou básicos organizados
num sistema. A conduta humana governa-se por padrões culturais, mais do que por respostas
inatas. Podemos afirmar que as pessoas temos um “piloto” (a cultura) que nos orienta nas
nossas vidas.
(Benedict, 1971).
As regras culturais afirmam que fazer e como, as pessoas interiorizam essas regras ou normas,
mas não sempre seguimos o seu ditado. As pessoas podem manipular e interpretar a mesma
regra de maneiras diferentes, utilizando criativamente a sua cultura, em vez de segui-la
cegamente (Ex.: Transgressão dos limites de velocidade).
Neste ponto podemos distinguir entre o nível ideal da cultura (o que a gente deveria fazer e o
que diz que faz) e o nível real da cultura (o que fazem realmente no seu comportamento
observável). Mas não por isso o nível ideal deixa de pertencer à realidade.
Desde este ponto de vista podemos falar da cultura como produtora de mudança e conflito,
mas também como “caixote de ferramentas” (“tool kit”) de valor estratégico para a acção
social (Swidler, 1986). Portanto, a cultura podemos pensa-la como algo externo que
condiciona as nossas vidas ou como algo que como sujeitos (pessoas) criamos em
colectividades, isto é como um processo e um conjunto de estratégias.
A cultura está em todas as partes
A globalização faz questão sobre a relação entre cultura e território, criando uma nova
cartografia cultural. Cai por si própria a ideia tradicional de cultura como comunidade
fechada, de acordo com a qual cada indivíduo só pode pertencer a uma cultura. Hoje em dia o
entre – cruzamento de culturas é uma realidade. A ficção duma cultura uniformemente
partilhada pelos membros de um grupo é pouco útil em muitos casos. O conceito de cultura
deve incluir heterogeneidade, mudança rápida, empréstimos culturais e circulações
interculturais. O conceito de cultura acaba por fazer referência a 2 tipos de cultura:
Hoje dissolvem-se muitas fronteiras entre culturas antes territorialmente delimitadas. É por
isso que as culturas volvem-se mais porosas. Vimemos numa economia-mundo (Wallerstein,
1974) e a “a cultura está en todas partes” (Hannerz, 1998: 55). É o indivíduo quem escolhe o
seu repertório cultural. Na atualidade podemos falar em sobremodernidade dos mundos
contemporâneos (Augé, 1992) que se caracterizaria pelo seguinte:
Hoje, o local intensifica a sua inter - conexão com o global a partir do marco do Mercado, do
Estado, dos movimentos e das formas de vida (Hannerz, 1998). Robertson (1995) chega a
falar em glocal como a síntese relacional entre o local e o global, ultrapassando assim esta
dicotomia. Esta forma de caracterizar a noção de cultura leva a alguns antropólogos a estudar
as dinâmicas de viagem e não só as de residência, e de ai que se sublinhem as “zonas de
contacto” (Clifford, 1999). Outros falam em culturas híbridas (García Canclini, 1989),
interligando assim estrutura e processo, mas tamém salientando o papel do agente social na
dinâmica entre estrutura e acção. Assistimos hoje a uma mudança da afirmação de identidades
culturais diferenciadas para a afirmação da interculturalidade. Hoje, corremos o risco de que o
conceito de cultura seja utilizado como uma forma de racismo (Benn Michaels, 1998), já que
substituí muitas vezes a biologia como argumento base da distinção entre os grupos humanos,
mas não é menos essencialista por isso. Podemos afirmar o seguinte:
“O indivíduo é um prisioneiro da sua cultura, mas não precisa de ser a sua vítima” (Ferguson,
1987: 12)
O respeito às diferenças culturais deve ser a base para uma sociedade justa (Kuper,
2001: 14).
1. Uma componente mental: produtos da actividade psíquica ora nos seus aspectos
cognitivos ora nos afectivos, significados, valores e normas.
Porém, esta divisão tem motivado alguns debates que se podem resumir na seguinte questão:
Devem os artefactos e a tecnologia ser considerados como parte da cultura?. Alguns
antropólogos como Robert Redfield, Ralph Linton, Murdock e outros têm identificado a
cultura só com os aspectos cognitivos e mentais: ideias, visão do mundo, códigos culturais.
Estes antropólogos consideram a cultura material como um produto da cultura e não cultura
em si mesma.
Marshall Sahlins (1988) destaca como o carácter constitutivo da cultura invalida a distinção
clássica entre cultura material e imaterial, plano económico e cultural. Ele integra os dois
pólos, pois os seres humanos organizam a produção material da sua existência física como um
processo significativo que é o seu modo de vida. Todo o que os humanos fazem está cheio de
sentido e de significado. Por exemplo, cortar uma árvore (para lenha, para construir uma
canoa, para criar uma escultura, para fazer pasta de papel) pode significar modos culturais
específicos. O valor de uso não é menos simbólico ou menos arbitrário que o valor da
mercadoria. Assim o sublinha Sahlins:
“As calças são produzidas para os homens e as saias para as mulheres em virtude das suas
correlações num sistema simbólico, antes que pela natureza do objecto per se, ou pela sua
capacidade de satisfazer uma necessidade material...” (Sahlins, M.,1988 )
Raymond Willians (1976) distingue três maneiras de entender e utilizar o conceito de cultura:
a) Antropológica.
b) Sociológica.
c) Estética.
O uso estético do conceito de cultura descreve actividades intelectuais e artísticas como por
exemplo a música, a literatura, o teatro, o cine, a pintura, a escultura e a arquitectura. Este
conceito define a criação artística como forma de cultivo humano do espírito. É sinónimo de
“Belas Artes” e exige níveis de instrução educativa formal. Por extensão pensa-se que uma
pessoa que conhece e pratica estas manifestações artísticas tem que ser diferente da gente
comum, atribuindo-lhe a categoria de culto, em oposição ao “inculto” ou de “pouca cultura”.
Portanto, a noção estética de cultura entende-se como aquilo que a gente faz depois de jantar,
por exemplo ir à ópera, isto é, como “alta cultura”, a produção cultural de uma minoria para
uma elite letrada de iniciados. Esta perspectiva elitista, promovida na Europa refinada do
século XIX, é criticada desde a noção antropológica de cultura, pois confunde níveis de
instrução com conhecimento e capacidade criativa, refinamento com habilidades culturais
para dar resposta aos problemas quotidianos.
Se bem também é certo, que hoje quebram-se as distinções entre “alta cultura” e “baixa
cultura”, cultura de elite e cultura de massas, cultura culta e cultura popular, ficando os limites
muito ambíguos. Isto não significa que não devamos programar alternativas de produção
cultural críticas e moralmente defendíveis. Destacar que a cultura lixo (Bouza, 2001), muitas
vezes promovida pelos media, já não é popular (do povo), porém para o povo (de massas,
mediática), o que é muito criticável pela sua queda ética e a falta de um humanismo. Acontece
hoje um processo de mercantilização e politização da cultura que deve ser explorado e
reflectivo na sua complexidade.
SOCIOLÓGICA
ANTROPOLÓGICA ESTÉTICA
NOÇÃO DE
CULTURA
As crenças e as ideias
As crenças são definições sociais sobre o mundo e a vida. Assim o afirmou o filósofo Ortega
y Gasset:
Portanto, as ideias têm-se, nas crenças estamos. As crenças não podem ser submetidas á proba
de verificação com os factos, pois é uma verdade indiscutível e sem dúvidas para quem a
defende. No momento em que uma crença se considera susceptível de confrontar com os
factos passa a converter-se em uma ideia.
Tanto as ideias como as crenças são modos cognitivos de apreender a realidade, de conhece-
la. Nos processos de mudança há ideias e crenças que perdem terreno em benefício de outras.
As ideias podem converter-se em crenças por repetição ou por convencimento da ideia,
cristalizando e internando-se na mente das pessoas. Por exemplo, na auto-estrada não vai
circular nenhum carro em sentido contrário pela nossa via.
Dentro de cada cultura as crenças tendem a formar um sistema relativamente coerente, com
reforços mútuos, isto não quer dizer que não haja contradições internas e rupturas, só que há
uma tendência à coerência interna.
As ideias são cada vez mais reconhecidas como elemento fundamental da cultura, assim
temos como grupos humanos como os ianomami do Amazonas reivindicam direitos culturais
sobre as terras, as células e o seu ADN mas também sobre a propriedade intelectual das
ideias. Igualmente uma parte dos membros do Congresso Geral da Cultura Kuna (Panamá)
rejeita a ideia de que a sua cultura possa ser candidatada a património da humanidade, pois
pensa-se que a sua cultura é deles e não de toda a humanidade.
Os valores
Para a antropologia, os valores são juízos de desejabilidade e aceitabilidade, isto é, aquilo que
as pessoas estimam como mais importante. Também os juízos de rejeitamento e oposição
expressam valores de uma maneira não explícita. São princípios ou critérios que definem o
que é bom e mau. A partir de estes princípios básicos ou valores geram-se um conjunto
ideativo e normativo pelo qual se guia a conduta dos indivíduos.
Os valores não são qualidades das coisas, porém são relacionais, são valores para alguém. São
um critério de selecção da acção. Os valores que mantêm um grupo social tendem a formar
um sistema coerente. Há uma axiologia ou hierarquia de valores dentro da conexão entre os
mesmos. Exemplo: Individualismo na cultura norte-americana, conectado com o esforço e o
êxito.
As normas culturais
Os símbolos
1ª. Um significante.
2ª. Um significado.
Exemplo: O vestido.
1. Protecção do clima.
2. Hábito, adaptação ás normas e costumes pautadas num grupo humano (ex.: vestido de um
homem, vestido de uma mulher, vestido de drag-queen).
Pode haver uma pluralidade de significados ao descodificar a mensagem. Qual é que será o
significado mais importante? A resposta é conforme os casos específicos e o contexto
cultural.
Outros conceitos básicos para melhor compreender a noção antropológica de cultura, desde
uma perspectiva de produção histórica das relações sociais, são os seguintes:
Assim o habitus é o que caracteriza uma classe ou um grupo social, materializa a memória
colectiva e incorpora uma moral e uma visão do mundo naturalizada socialmente.
d) Capital simbólico (Bourdieu, 1999: 172). O capital simbólico é uma propriedade dos
indivíduos, uma força, uma riqueza e um valor percebido, conhecido e reconhecido.
Este capital detenta uma eficácia simbólica, uma espécie de força mágica que
responde a umas expectativas colectivas e que geralmente não se questiona.
Entre a diversidade de culturas é possível achar alguns traços comuns. Neste ponto, a
antropologia não só estuda as diferenças como também o que nos faz a todos os seres
humanos iguais.
Quando estes traços culturais existem em todas ou em quase todas as sociedades denominam-
se universais culturais, que são aqueles que distinguem aos humanos das outras espécies:
2. A linguagem.
O etnocentrismo é uma visão das coisas de acordo com a qual o próprio grupo é o centro de
todo, e todos os outros se medem por referência a ele. Cada grupo alimenta o seu próprio
orgulho e a sua vaidade, proclama a sua superioridade, exalta as suas próprias divindades e
mira com desprezo aos outros. O etnocentrismo pode manifestar-se em diferentes níveis:
tribo, aldeia, minoria étnica, área cultural, classe, pessoa, indivíduo... O problema do
etnocentrismo é a intolerância cultural face à diversidade e o fechar as portas à curiosidade
pelo conhecimento. O etnocentrismo cultural é uma atitude que pode derivar numa ideologia
com práticas racistas.
A noção de cultura pode, politicamente e etnocentricamente, ser utilizada para separar grupos
humanos, mas desde um ponto de vista humanístico deveria servir para melhorar a
convivência e construír uma sociedade democrática justa.
O oposto ao etnocentrismo é o relativismo cultural, uma das ideias chave da antropologia. O
relativismo cultural afirma que uma cultura deve ser estudada e compreendida em termos dos
seus próprios significados e valores, e que nenhuma crença ou prática cultural pode ser
entendida separada do seu sistema ou contexto cultural. O comportamento numa cultura
particular não deve ser julgado com os padrões de outra. O relativismo cultural não só é uma
teoria antropológica como uma atitude e uma prática antropológica, uma forma de lidar com
os outros em respeito pela diversidade. Esta atitude implica que os nossos preconceitos não
influenciem o conhecimento de outras culturas, mas também uma atitude de diálogo aberto.
Podemos entender o relativismo cultural de duas maneiras, uma como algo aberto e que
defende a equivalência entre culturas seguindo uma tolerância pela pluralidade das sociedades
humanas; outra como algo fechado e que defende a singularidade intransponível das culturas
(Gandra in Cuche, 1999: 13).
Tem limites o relativismo cultural?. A Alemanha nazi deve ser valorada igual de neutro que a
Grécia clássica? Desde o ponto de vista do relativismo cultural estremo sim, porque defende
que não há uma moralidade superior, internacional ou universal, que as regras éticas e morais
de todas as culturas merecem igual respeito.
Porém, desde o ponto de vista desde o relativismo cultural ético há e deve haver limites
válidos para toda a humanidade. Não podemos tolerar todo. Como deveria utilizar o
antropólogo o relativismo cultural?. O antropólogo deve apresentar informes e interpretações
dos fenómenos culturais, para entender estes na sua complexidade, porém o antropólogo não
tem que aprovar costumes como o infanticídio, o canibalismo e a tortura. Exigem portanto
uma condena moral e uns valores internacionais e humanos de justiça e moralidade que nos
fazem mais humanos. O relativismo cultural mais estremo equivale à eliminação de toda
regulamentação do comportamento humano e pode cair no risco de justificar e/ou permitir a
violência.
4.10 A mudança cultural
A mudança cultural é o aspecto dinâmico da cultura, o “panta rei” (todo se move, todo muda)
dos gregos. É inquestionável que nenhuma cultura é totalmente estática e de que a cultura
construi-se através de processos sociais.
(Beck, 1998)
Para entender melhor estes processos de contacto e mudança cultural é preciso ter em conta
vários níveis da cultura:
CULTURA INTERNACIONAL
CULTURAS
NACIONAIS
SUBCULTURAS
Na cultura internacional as tradições culturais estendem-se mais além dos limites nacionais.
Nas culturas nacionais os seus traços são partilhados pelos nacionais e nas subculturas os
padrões culturais estão associados a subgrupos específicos dentro de uma sociedade.
A preocupação pela mudança sociocultural acentua-se nas ciências sociais a partir do século
XIX, depois de Ter vivido uma época de revoluções, os cientistas tentaram explicar as
mudanças e as suas leis racionais dentro da nova organização da sociedade. Uma parte dos
teóricos sublinharam os aspectos estáticos (ex. Comte, Durkheim), e outros os seus aspectos
dinâmicos, os conflitos e as transformações (ex. Marx).
Comte respondeu a esta pergunta com a distinção entre “estática” e “dinâmica”, o que se
relaciona com a diferença entre mudanças graduais e a de mudanças radicais.
As teorias sociológicas clássicas defendem a crença da evolução para uma sociedade humana
melhor, por meio da sucessão de etapas, em termos de progresso pensado como necessário,
natural e numa única direcção. Ex. A passagem da solidariedade mecânica à orgânica
defendida por Durkheim. Isto foi posto em causa logo da segunda guerra mundial, contexto
no qual se questionou que o progresso tecnológico não fosse acompanhado de um maior
humanismo e fraternidade entre as culturas e povos do planeta, que fomentasse uma cultura de
paz.
Sobre este problema da mudança social, o materialismo histórico descreve a evolução social
como uma sucessão de modos de produção: produção primitiva, escravatura, feudalismo e
capitalismo. Cada modo de produção corresponderia a um grau de desenvolvimento. Quando
as relações de produção já não são válidas para o crescimento das forças produtivas, acontece
um período de conflito social crescente que acaba numa revolução social e no nascimento de
um novo modo de produção e umas novas relações de produção. Assim a revolução burguesa
produziu-se quando as relações de produção feudais converteram-se num obstáculo para a
expansão económica, abrindo passo ao capitalismo. A fase mais avançada da evolução social
seria o comunismo, na qual o máximo desenvolvimento das forças produtivas permitiria uma
abundância material e o dar a cada pessoa de acordo com as suas necessidades. Nessa fase
comunista, as relações de produção seriam igualitárias e não existiria propriedade privada dos
meios de produção. As relações de produção expressam-se na realidade social como luta de
classes (ex: camponeses e senhores feudais, proletários e capitalistas). A mudança social,
política e cultural é explicada pela mudança do sistema produtivo.
Uma crítica que se lhe pode fazer à interpretação marxista da mudança social é que o
marxismo não considerou a existência de limites ecológicos à expansão material da
civilização, portanto não pensou seriamente nos limites ao intercâmbio entre a cultura e a
natureza.
Noutra linha algo diferente, a sociologia compreensiva de Max Weber (1969) analisa a
realidade social por meio da construção de tipos ideais (aqueles que descrevem como teria
acontecido uma acção se os meios utilizados fossem racionais para alcançar o fim proposto).
Weber argumentou a influência central dos valores religiosos, em especial os da ética
protestante de inspiração calvinista, para o desenvolvimento e a evolução do capitalismo em
Europa. A mudança social é para Weber resultado de duas coisas:
2. Os factores económicos, políticos ou culturais não exercem uma acção exclusiva, porém
operam interligadamente nas transformações sociais.
Características da modernidade
1) Desenvolvimento das comunicações.
2) Hedonismo, consumismo, secularização, individualismo.
3) Preponderância dos grupos associativos (escola, sindicato, partido, etc. ) face aos
comunitários.
4) Autoridade legalista e racionalidade burocrática. Consolidação do Estado.
5) Industrialização e urbanização.
6) Institucionalização do conflito e das mudanças na estrutura.
A mudança social também está interligada com a permanência e a sua importância para a
sobrevivência e adaptação humanas. Na sua relação com a permanência a mudança pode ser
de três tipos (Gondar, 1981):
1. Substituições. Quando os objectivos que se tratam de satisfazer e a forma permanecem
inalterados. Ex: Substituir o carro usado. Construir uma casa nova. Este tipo de
mudanças motiva poucos problemas, mudam o conteúdo ou as formas, mas as
categorias onde repousa o sentido não mudam drasticamente.
3. Ruptura com o anterior. A mulher à qual lhe morre o esposo (derrubamento do apoio económico, do apoio na
educação dos filhos, das anteriores relações com vizinhos, amigos e parentes). O emigrante que migra a outro país muito diferente
do seu (novo sistema normativo, simbólico e de comportamento). Se nos dois tipos anteriores as pessoas podem perfeitamente
valer-se em tais situações, neste último caso o comportamento é totalmente diferente: incompreensão, desconcerto, agressividade,
etc. Estas mudanças costumam ser problemáticas.
Unidade 5
Identidade Cultural
5.1 Introdução
Esta unidade integra conteúdos que fazem parte da unidade anterior: a cultura e as culturas.
Foi para permitir a sua compreensão e melhor aprofundar o seu estudo que decidimos
apresentar esses conteúdos numa unidade separada. Tais conteúdos relacionam-se com
Identidade e alteridade: paradigmas; a identidade como constructo relacional; A noção de
raça e a ideologia racial; grupos étnicos e etnicidade; a percepção cultural dos grupos étnicos;
modelos de convivência intercultural e o conflito identitário.
5.2 Objectivos
Que é moçambicano? Que é ser africano? Que é ser europeu? Que é ser mulher? Que é ser
jovem? Que é ser velho? Que é ser advogado? Que é ser indiano? Que é ser macua? Que é ser
nadau? Que é ser árabe?...
São perguntas que colocam a questão da identidade em diferentes níveis: identidade colectiva,
identidade étnica, identidade de género, identidade de idade, identidade profissional,
identidade nacional, identidade pessoal, identidade religiosa...
Aquela que procura um paralelismo com uma identidade psicológica de base a priori e
substancial. Ex: “Os moçambicanos são gente pacifista”. Fala de uma maneira de ser comum,
da partilha de umas disposições psíquicas comuns, de uma personalidade de base, dumas
disposições psíquicas comuns. Existe um preconceito sobre a equivalência do comportamento
afirmado entre todos os membros do grupo. Desta maneira poderíamos predizer o
comportamento numa interacção.
A carga afectiva inserida no sentimento de pertença e na lealdade para com o grupo étnico,
explicaria a capacidade de mobilização e a resposta às chamadas dos líderes étnicos. Para esta
postura a identidade colectiva existe desde sempre sem descontinuidades e sem quebras. A
identidade é a pervivência de uma “essência” primária nascida em tempos remotos, é uma
sobrevivência inata do passado. Entende a cultura como estática e não poluída e a tradição
cultural como algo perene, permanente, fixo e imutável.
A crítica que podemos fazer a este modelo teórico é que nem todos os membros de um grupo
se comportam da mesma maneira, senão que podem ter personalidades diferentes; também
pode haver conflitos, tensões, visões do mundo diferentes que afectem à coesão da identidade.
Uma outra crítica é que as identidades são construídas e adquiridas pelos próprios sujeitos.
Resposta Cognitivista.
Esta resposta sublinha o conjunto de valores, percepções e normas partilhadas por um grupo.
Também a visão do mundo e a concepção da sociedade, o espaço e o tempo. Os valores e
normas condicionariam o comportamento, mas seriam algo estratégico e útil para os interesses
individuais e/ou grupais. A percepção desses traços culturais comuns implica uma selecção
artificial por meio da qual se salientam uns traços e esquecem outros, criando limites baseados
numa diferença construída. Exemplos: “Os moçambicanos são católicos”; “os portugueses do
Norte são celtas e os do Sul são mouros”; “Portugal: Fátima, Fados e Futebol”; “Deus, pátria
e família” (nos tempos de Salazar).
A identidade é uma definição do “nos” estabelecida em função dos conteúdos das relações
para com os “outros” (confronto “in-out group”). A identidade construi-se historicamente,
portanto, está em constante mudança, apesar da sua aparente permanência no tempo. A
identidade constrói socioculturalmente a semelhança interna de um grupo pensado como
homogéneo (não quer dizer que o seja), e a diferença (heterogeneidade e diversidade) face a
outros grupos. A identidade alimenta-se da alteridade, está sempre inacabada e em mudança.
Este paradigma interpreta a identidade e os seus símbolos como uma construção sociocultural
sempre em processo, a identidade é processual porque está baseada em processos de
identificação e diferenciação nos quais se unem e articulam pessoas e interesses vinculados a
ideias (cognição e imaginação), sentimentos (emotividade e afectividade), comportamentos
(práticas e modelos) e símbolos (representações e rituais).
Mas também pode ser subjectivada na construção da diferença, na auto definição da imagem
endógena, na definição da imagem exógena, e no sentimento de identificação e pertença.
Neste segundo processo podem ser utilizados instrumentos de autoreconhecimento (ex.:
bandeira, escudos, mitos, ícones, folclore, leis, etc.) com grande força comunicativa que
condensam ideias, imagens e significados que a gente interioriza. Para esta conceição
subjectivista, a identidade não é recebida de uma vez por todas, não é estática, é dinâmica e
não rígida, é variável e mutável. A identidade, desde este ponto de vista, implica um
sentimento de pertença, uma identificação com uma colectividade mais ou menos imaginária.
Desde esta óptica, o que contam são as representações.
Grupo humano = Cultura não funciona sempre, pois dentro dos grupos humanos
podem existir minorias culturais e muitas heterogeneidades individuais. Este é o
problema da diversidade, sempre presente nas definições da identidade (seja individual
ou colectiva).
De acordo com Marks (1997), a teoria popular da raça está baseada na crença de que
partilhamos mais coisas com as pessoas da nossa categoria racial (ex: mesmo cor da pele). O
que fazemos é ordenar o nosso universo social (para dar sentido ao mesmo) reunindo às
pessoas em grupos definidos especificamente de acordo com alguns critérios como a mesma
geração, o mesmo sexo, o parentesco, etc. Mas a maneira como classificamos não está
determinada pela genética, porém é resultado duma construção social que impomos à natureza
para organizar as coisas.
O naturalista romano Plínio o Velho (s. I a.C.) explica as diferenças físicas entre
africanos e europeus pela influência do clima.
Desde 1920 sabemos pelos trabalhos de Franz Boas que a transmissão hereditária do
índice cefálico é pouco precisa, pois como ele demonstrou no seu estudo sobre
imigrantes nos EUA, o índice cefálico é sensível aos efeitos do meio (clima,
temperatura, etc.).
Os fins do s. XVII quase todas as terras tinham sido visitadas pelos europeus em barco.
Embarcava-se em um lugar onde a gente tinha um determinado tipo físico e desembarcava-se
noutro com tipos físicos diferentes. Em 1758 o naturalista sueco Linneo estabeleceu as
diferenças raciais entre as diferentes populações (ver quadro do fim do tema).
É fácil criticar a classificação de Linneo. A maioria dos habitantes de Ásia do Sul, da Índia ou
do Paquistão são de complexão obscura como os africanos, parecem-se aos europeus pelos
traços do rosto e vivem na Ásia. Donde situar estas populações? Em África temos pessoas
altas (nilóticos da Kenya), baixas (pigmeus, com esteatopígia), etc. Todos são biologicamente
diferentes, todos são indígenas. Então, por que estabelecer uma única categoria de
“africanos”, “negros” ou “negroides”? Porque interessa politicamente estabelecer essa
classificação e o sublinhado da diferença. Em realidade os africanos da Somália parecem-se
mais aos habitantes de Arábia ou do Irão que aos de Gana (costa ocidental africana). Dois
gorilas ou dois monos tomados ao azar estão mais distantes geneticamente que dois seres
humanos escolhidos ao azar. Todos têm a mesma idade como espécies: 7.000.000 de anos.
Portanto, a raça, mais que uma realidade biológica, é uma categoria cultural. Desde o ponto de
vista “emic” utiliza-se a palavra “raça” em vez de grupo étnico e também “raça” no sentido de
grupo étnico com base biológica (algo que não é assim, porem pensa-se assim). Portanto a
“raça” é um grupo percebido culturalmente. A raça é um grupo ao qual se lhe tem atribuído
um nome, uma etiqueta mais, mas sem base genética ou biológica. Portanto a raça não existe
em tanto que categoria biológica, senão que existe enquanto categoria simbólica e social, o
que a converte num conceito mais real e importante.
Existe uma arbitrariedade social na definição racial, pois por exemplo, nos casamentos mistos
entre um branco e um negro o filho leva um 50% dos genes do pai e outros 50% da mãe, mas
se nasce com a pele negra é classificado de “negro”, apesar de que de acordo com o tipo de
genes poderia ser classificado também como branco. Há uma regra de filiação que assigna
identidade social sob a base dos antepassados, portanto a adscrição social da identidade étnica
é por nascimento ou filiação.
Só existe uma única raça, a humana, e os traços diferenciais exteriores só são resultado de
processos de adaptação ao meio que podem ser explicados por um número muito pequeno de
genes. Traços como a cor da pele, dos olhos ou o tamanho do nariz são controlados por um
número relativamente reduzido de genes (0,01%) e só respondem a pressões ambientais.
Traços como a inteligência, a criatividade artística e as atitudes sociais são condicionados por
80.000 genes que se combinam de uma maneira complexa. Um 99,9% dos genes humanos são
iguais em qualquer pessoa. A noção de “raça” não tem base científico-genética, é só uma
etiqueta social, não biológica, que serve para justificar em muitos casos o racismo, o
etnocentrismo, o genocídio e a xenofobia. De ai que se proponha abandonar o conceito
mesmo, pelas suas associações simbólicas com o racismo e a exclusão social de base étnica.
O racismo ou a ideologia racial pode converter-se em lei, assim no tempo do feijismo italiano
algumas das leis regulamentavam e justificavam o racismo (Mazzeli, 1988):
“O cidadão italiano que no território do reino ou das colónias tenha relação conjugal com
uma pessoa da África Oriental Italiana... será castigada com a reclusão de 1 a 5 anos”, artigo 1
(19-04-1937).
“As pessoas de raça judaica não podem ser admitidas em nenhum ofício ou emprego nas
escolas frequentadas por alunos italianos”, artigo 1 (15-11-1938).
“Os alunos de raça judaica não podem ser inscritos nas escolas frequentadas por alunos
italianos”, artigo 3 (15-11-1938).
Em resumo, a ideologia racial é utilizada para justificar, explicar e preservar posições sociais
privilegiadas. Expressa a afirmação de que alguns grupos humanos são inatamente
(biologicamente) inferiores. Afirma a inferioridade de “outros” baseando-se em carências e
traços como a inteligência, a habilidade, o carácter e o atractivo. Estes traços são pensados
como imutáveis e herdados de geração em geração. No fim acabam por definir que a
estratificação é inevitável, duradoura e natural. I.e.: superioridade da “raça ária”, “apartheid”
da África do Sul.
Piazza, A. (1997): “Un concepto sin fundamento biológico”, em Mundo Científico n.º 185
(Dez. 1997), p. 1.056.
O conceito de grupo étnico veio substituir o de raça enquanto conceito cultural. Um grupo
étnico é definido por algumas semelhanças entre os seus membros (crenças, valores, hábitos,
normas, substrato histórico comum, etc.) e por diferenças com outros (língua, religião,
história, geografia, território, etc.). Todos estes aspectos são referentes simbólicos que estão
mais na mente das pessoas que na realidade objectiva. Um grupo étnico pode existir sem ter
um nível de consciência colectiva de identidade étnica.
Na Grécia antiga o “éthnos” era um conceito que definia um grupo de pessoas ou animais
com características biológicas e culturais em comum. Viviriam e actuariam em conjunto. Este
“éthnos” representaria o “outro”, o “estrangeiro” e o “étnico”. Face ao “éthnos”, na Grécia
antiga existia o conceito de “génos”, isto é o “nos”. Na Roma imperial, o “populus” era um
conceito que representava o “nos” -os romanos- (González Reboredo, 2000).
Racismo: Discriminação contra um grupo étnico por motivos do pensado como “raça”
ou grupo étnico inferior.
Racismo de estado (Naïr, 2001): Quando o Estado faz da “origem” étnica uma
substância que serve para justificar uma discriminação, nalgum caso com apoio em
leis que definem a relação com o “outro”. Implica uma política de vistos
discriminatória e um tratamento social diferenciado.
Nação: Antes era o território de nascimento com língua, história, religião, ... próprios.
Hoje distinguimos entre nação-estado (organização política), nação sem estado ou
nacionalidade (etnia ou grupo com aspirações de estatuto político autónomo). No
fundo a nação é uma comunidade imaginada (Anderson, 1983) em virtude da qual os
seus membros imaginam que participam de uma mesma unidade. Segundo Ernest
Gellner (1988) no mundo há 8000 grupos étnicos aproximadamente, mas só 800
nacionalismos fortes com consciência nacional.
Tolerância étnica: Caminhamos cara estados multi- étnicos que necessitam de uma
certa identidade comum e uma harmonia, obtidos nalguns casos com a criação de uma
língua comum ponte entre as diferentes etnias e uma simbologia também unificadora.
Vivemos em sociedades cada vez mais multiculturais nas quais é cada vez mais importante
estudar a forma de perceber-se os uns aos outros. As imagens que uns grupos étnicos têm de
outros influem nas expectativas, juízos e comportamentos para com os outros. Conhecer as
imagens serve para desconstruir e mudar estas no caso de ser discriminatórias. O olhar sobre
outros grupos pode utilizar traços fenotípicos, psicológicos ou comportamentais:
A imagem social é a percepção que temos de uma pessoa enquanto membro de um grupo. A
imagem social é resultado de processos cognitivos que utilizam estereótipos e preconceitos:
Estereótipos
Traços que se atribuem a um grupo ou a uma pessoa em quanto membro de um grupo.
Imagem mental simplificada e partilhada socialmente dos membros de um grupo.
Simplificam os vários aspectos da realidade.
São resistentes à mudança.
Conservam-se apesar da evidências em contra.
Simplificam.
Generalizam.
Orientam as expectativas.
Tipos de estereótipos
Positivos Neutros Negativos
“Os espanhóis são boa gente” “Os suecos são altos” “Os ________ são uns
porcos”
Preconceitos
Introduzem emoção e acção.
Estabelecem um juízo prévio não demonstrado sobre um indivíduo ou um grupo,
favorável ou desfavorável, que tende à acção.
Condicionam a discriminação (comportamento dos pré-conceitos), que pode ser
directa (física, verbal, etc.) ou indirecta (nas leis, na língua, nas atitudes, no curriculum
escolar oculto, etc. )
Por meio da acentuação das diferenças inter-grupais e o reforço da diferença face aos
pensados como “outros”. Pode fomentar a concorrência e a rivalidade.
Aqui pertencer à nação implica ter uma série de atributos místicos e simbólicos pre-existentes.
Os imigrantes são denominados “gastarbeiter” (trabalhadores convidados) e são considerados
uma tribo de interinos que abandonarão o país quando não se lhes necessite. Pratica-se um
essencialismo étnico por meio do qual a nação de identidade étnica tenta substituir à de
“cidadania” (conceito francês).
Modelo da assimilação: França
O que se faz é assimilar as diferenças culturais dos chegados doutros lugares, mas pode haver
resistências por parte dos chegados.
Respeitar as diferenças.
Todos os grupos étnicos oferecem algo ao conjunto e todos têm que aprender algo dos
outros.
Hoje em dia há uma crise dos modelos de integração, dai a necessidade urgente de reinventar
formas de convivência tolerantes, plurais, humanistas, consensuais e democrática. Estamos
face a uma situação de risco na qual abundam movimentos racistas de estrema direita e
também alguns nacionalismos intolerantes. Frente a isso é preciso uma educação intercultural
da cidadania, para a qual a antropologia está chamada. Face a um multiculturalismo às vezes
hierárquico e injusto devemos reflectir sobre o conceito de “integração”, não como
assimilação, porém como a possibilidade funcional de adaptação intercultural, o que implica
pensar-nos primeiro como cidadãos.
Neste problema, o filósofo alemão Jürgen Habermas (2000) defende a ideia de cidadania
democrática pós-nacional segundo a qual devemos criar uma identidade e uma política
supranacional que dé respostas aos problemas dos cidadãos através de uma nova forma de
fazer política. O pós-nacionalismo tem como base o pluralismo e a diversidade étnica e
cultural das nossas sociedades, mas propõe uma união política não homogéna culturalmente,
na qual se respeitem as regras democráticas e os direitos dos cidadãos de forma supranacional
(i.e. Europa). Nesta nova forma de convivência, os problemas nacionais exigem participações
e soluções pós-nacionais. Este ir mais além do estado-nação exige novas relações de
solidariedade pós-nacional. Este modelo implica pensar as pessoas antes como cidadãos com
direitos e obrigações que como membros de uma comunidade ou cultura imaginada.
Segundo Alfonso Pérez-Agote (1986) podem existir dois tipos de conflitos de identidade:
A discriminação implica duas coisas, políticas e práticas (i.e.: Apartheid da África do Sul,
legal até 1991). Entre as práticas podemos observar:
Actividades
1. Que é uma identidade Cultural?
2. Qual é a importância de estudo de identidade cultural para a formação da
personalidade humana?
3. Fale da identidade como um constructo racional.
4. Que relação existe entre cultura e identidade?
5. Mencione alguns elementos simbólicos que justificam a identidade moçambicana.
6. Mostre a diferença entre grupo étnico e grupo social.
7. A imagem social que se tem de uma pessoa enquanto membro de um grupo, é
resultado de processos cognitivos que utilizam estereótipos e preconceitos.
a) Explique como se formam os estereótipos no interior das pessoas.
b) Como funcionam estereótipos?
Unidade 6
O Parentesco: organização sócio-política, a célula e produção
6.1 Introdução
6.2 Objectivos
Para a antropologia social britânica tanto a tribo, como o clã, a linhagem ou a família são
grupos de filiação corporativos que organizam a vida política à margem do Estado, um
conjunto de direitos e de obrigações morais aos quais não é possível subtrairmo-nos (Fortes,
1969: 242).
1º. Quais as palavras usadas para os tipos de parentes em cada língua particular?
2º. Quem são os teus parentes? (O parentesco é construído culturalmente, isto é, alguns
parentes biológicos são considerados parentes e outros não).
3º. Como usam as pessoas o parentesco para criar laços sociais e integrar-se em certos
grupos?
Os termos de parentesco são as palavras para definir parentes numa língua particular, e esto é
uma construção social (Ex.: em muitas sociedades a mesma palavra designa o pai e o irmão da
mãe).
Os parentes biológicos ou “cognados” são definidos pelas relações genealógicas (i.e.: irmão
da mãe) de filiação. Os parentes afines ou “agnados” são aqueles que se obtêm por vínculos
como o casamento, portanto podem incluir elementos para além dos esposos (pais dos
esposos, irmãos, grupos de parentesco...)
O parentesco bilateral (i.e.: Portugal, Espanha) é uma relação genealógica estabelecida através
dos homens e das mulheres, isto é, os tios por via materna ou paterna são o mesmo tipo de
parentes.
Os membros de um grupo de parentesco podem ter obrigações comuns para com os
vinculados, por exemplo: vingar a morte (i.e. na Polinésia).
Também pode existir a ideia de “limpeza de sangue” no grupo de parentes. Durante o Esto
Novo, em Portugal existia a expressão “lavar a honra com sangue”, que consistia em matar a
esposa quando era apanhada junto com um amante.
Para Lévi Strauss (1974: 17) a família é um grupo social que tem origem no casamento, é uma
união legal com direitos e obrigações económicas, religiosas, sexuais e de outro tipo. Mas
também está associada a sentimentos como o amor, o afecto, o respeito ou o temor. Afirma
Lévi-Strauss (1974: 47) que a família é necessária para a reprodução social de um grupo
humano, pois garante a sobrevivência e a continuidade biológica e social do próprio grupo.
Neste ponto cabe relembrar o que o antropólogo português João Pina-Cabral (1989) sublinha
para o caso português que o termo “família” é burguês, mas o conceito de “casa” é rural. A
“casa” afirma Pina-Cabral (1989) são “os que comem juntos”, isto é, é através da
comensalidade que os camponeses, que ele estudou no Minho, reconstróem a identidade da
sua unidade familiar.
A família em questão pode ser considerada como uma unidade que envolve as economias
individuais e que pratica uma economia moral ou cultural colectiva com base nas relações de
parentesco. É o que Jack Goody (1986: 249) denomina economia oculta do parentesco.
Mas a unidade familiar não está isenta de tensões, rivalidades internas e externas, negociações
e conflitos. O mesmo matrimónio pode ser considerado como uma ameaça do património
entre os quais vai existir uma tensão estrutural (O´Neill, 1984). Portanto, as tensões e
articulações entre os condicionamentos sociais e os projectos pessoais que possam existir são
ingredientes da existência humana em sociedade.
A família, diz Robert Rowland (1997) é consequência das relações de parentesco, é um grupo
doméstico co-residente e com limites variáveis segundo os contextos culturais. Alguns tipos
de família são:
1. Família nuclear: grupo de parentes formado pelos pais e os filhos, que residem juntos, e os
filhos tendem a herdar dos pais.
Neste ponto também devemos pensar a linhagem ou clã, algo mais permanente que a família
nuclear. A pertença ao mesmo é por adscrição de nascimento. Leva associado uma relação
genealógica dos descendentes de um antepassado comum.
6.6 O Casamento
O casamento consagra uma instituição social de todas as culturas, a família, mas com
diferentes implicações sociais. O casamento é um ritual de passagem da juventude à adultez.
O casamento regulamenta a relação sexual e a procriação, mas também as ligações sociais
entre famílias e grupos humanos. A cerimónia do casamento varia de cultura a cultura em
términos formais, mas no geral é um ritual de passagem do estatuto da juventude para o
estatuto de adulto.
Tipos de casamento
Plural:
a) Poliandria: (Polinésia, Tibete, Nepal, Índia): Uma mulher casa com vários homens.
Outro exemplo é o caso dos “todas” do sul da Índia (tribo das montanhas Nilgira, mil
pessoas, ¼ são cristãos, a sua economia depende dos búfalos, mas são vegetarianos,
dos búfalos só utilizam o leite, vendem também leite a uma cooperativa leiteira e os
tecidos bordados). Entre os “todas”, o infanticídio feminino é frequente para equilibrar
o número de mulheres com o dos homens. Para evitar a divisão da propriedade os
filhos casam com a mesma mulher, e assim “tudo fica em casa”, o património fica
indiviso. Era frequente que no primeiro ano o irmão maior tiver relações sexuais com
a esposa até ficar engravide, logo chegará o turno do 2º irmão (resolução da tensão
estrutural entre matrimónio e património).
Um exemplo mais é da Somália, no “Corno da África”, onde uma mulher casa com
um homem de outro povoado, onde a mulher vai viver. Mas se a mulher acorda-se de
que são as festas do seu povoado, ela vai lá sem despedir-se do seu marido; e depois
ali, se encontra um dos seus pretendentes na festa pode marchar com ele e casar com
ele. É esta uma flexibilidade notável para desintegrar e atar as relações de casamento.
-Exogámia: Casamento com uma pessoa de fora do próprio grupo ou espaço territorial.
Alarga assim a rede social intergrupal.
-Endogamia: Casamento dentro do próprio grupo ou espaço territorial (i.e.: as castas da
Índia; o direito masculino sobre as mulheres da sua terra).
Por tanto o casamento é um assunto de grupo, pois os casais interiorizam as obrigações para
com os parentes. (i.e.: tensão estrutural básica entre o património e o matrimónio). Em muitos
casos o matrimónio não é por “amor”, nem é uma escolha entre os casais, porem entre os
parentes ou o chefe do clã, não sem consulta aos casais, a decisão é dos parentes. É o
romantismo quem desenvolve a ideia do amor como motivo principal do casamento. Ainda
que o amor entre os casais e entre os pais e os filhos é quase universal e não se inventou só em
Europa (Goody, 2000).
Há uma série de práticas culturais que bem definem o estabelecimento de vínculos entre
grupos:
c) “Sororato”: Ao falecer a esposa, o homem casa com uma irmã da esposa. É assim
como a linhagem a substitui por uma das suas irmãs.
d) “Levirato”: Ao falecer o esposo, a esposa fica “viúva” e deve casar com um irmão
do esposo. Esto é porque a mulher mais que casar com um homem casa com um
linhagem.
Matrilinear (uterina): Todos os filhos e filhas pertencem ao mesmo linhagem mas são
elas quem transmitem a descendência, eles não. Os filhos delas serão da linhagem mas
os deles não. A herança e a residência é por via feminina.
Patrilinear (agnática): A descendência transmite-se por via masculina ainda que todos
os filhos pertençam á linhagem. A residência neste caso é virilocal e neolocal. Este
sistema está mais estendido que o matrilinear, (ex.: Império Romano, Muçulmano, e
Chino). Um caso extremo é o caso do sudeste da China, onde a mulher é entendida
como algo de pouca importância para a linhagem; as filhas casam e vão morar para
casa do homem, não voltando á casa dos pais, só em caso de falecimento dos seus pais
é que volta. Os pais evitam o afecto pelas filhas quando estas são crianças, pois
irremediavelmente separam-se delas. O significado estrutural delas é a mudança por
mulheres de outro linhagem.
2. Com duas linhas: bilinear, ainda que a autoridade oficial possa ser só a do homem.
Se queremos estudar os sistemas de descendência, a través dos quais se transmite a herança,
também devemos ter em conta a noção de “ciclo da vida familiar”, que serve para
conceitualizar a evolução da família e as suas mudanças em tamanho e estrutura, desde a sua
constituição até a sua dissolução (Segalen, 1999).
Actividades
1. Define Parentesco situando-o no contexto antropológico.
2. Qual é a importância de estudo de Parentesco na vida humana?
3. Mencione tipos de parentesco que conhece.
4. Diferencie o Parentesco no sentido restrito do parentesco unilinear dupla.
5. O casamento, é o resultado de um tipo de laços por ti estudo. Identifica seus tipos.
6. Mencione instituições de familia.
7. Há uma série de práticas culturais que bem definem o estabelecimento de vínculos
entre grupos.
a) Identifica e caracterize.
b) Diferencie o Sororato do Levirato.
Unidade 7
A Antropologia Económica
7.1 Introdução
7.4 A reciprocidade
Este é só um tipo de intercâmbio, e pode haver outros tipos de intercâmbio dentro da mesma
cultura e protagonizado pelas mesmas pessoas. A reciprocidade é uma maneira de controlar a
sobre –exploração da natureza, e também a desigualdade socio-económica.
O princípio de reciprocidade é: Trocar entre pessoas socialmente iguais, com vínculos entre
si, em sociedades ou grupos igualitários. A simetria social é muito importante neste tipo de
intercâmbio, mas também saber dar, receber e retribuir.
Exemplos etnográficos:
MBUTI-Zaire- BANTO-
caçadores e agricultores
recolectores
7.5 A redistribuição
Esta forma de intercâmbio está geralmente associada a formas sociais assimétricas com
exercício de políticas coercitivas. Consiste em acumular produtos em um lugar central, para
logo ser distribuídos a produtores e não produtores. Os redistribuidores ganham prestígio aos
olhos dos redistribuídos.
Exemplos etnográficos:
São festas de redistribuição entre as tribos com melhores e piores colheitas cada ano. Aqui
existe a obrigação da paridade, isto é, dar e receber devem ser proporcionais. Esta obrigação é
denominada “dádiva” por Marcel Mauss no seu “Ensaio sobre a dádiva” (1923-24). A
actividade económica movimenta assim uma série de actividades socioculturais como são os
rituais colectivos.
O “potlatch” era um ritual que se praticava na costa norte do Pacífico dos EUA, pelas tribos
“alingit” e “salish”, e pelos “kwakiutl” de Washington e a Columbia Britânica. Era praticado
em memória de uma pessoa falecida, para reconhecer o estatuto de um membro da família ou
para celebrar a criação de um “totem”. Nele encarnava-se a posição social dos seus
participantes. Em 1885 foi proibido pelo governo canadiano e legalizado de novo em 1950.
Hoje é uma prática em memória dos antepassados mortos e continua-se celebrando.
B) Impulso irracional?
Responde à adaptação a períodos alternos de abundância e escasseza. Nos bons anos ganhava-
se prestígio com a riqueza ao ofertar coisas aos povoados mais pobres. Nos de escasseza os
necessitados aceitavam alimentos dos povoados ricos. Era portanto uma forma de redistribuir
a riqueza. Impediam assim o desenvolvimento de uma estratificação socioeconómica, uniam a
grupos locais numa série de redes de trocas. Este uso das festividades rituais para salientar as
reputações individuais e comunitárias não é algo particular destas tribos.
Nas formas de redistribuição das sociedades estratificadas, o redistribuidor deixa que os
outros façam a maior parte do trabalho e fica com a maior parte dos produtos para ele e a sua
família. Neste tipo de intercâmbio, o contributo dos trabalhadores para um armazém central é
obrigatório, mas pode que não recebam em troco o que dão.
Neste tipo de intercâmbio domina o dinheiro como valor dos produtos no intercâmbio. Os
preços dominam todas as formas de mercado. Os preços dos bens e dos serviços são
determinados por compradores e vendedores, mas também pela Política Económica. Depois
do pagamento não há quase obrigações entre comprador e vendedor. O local de mercado,
além de para intercambiar bens, também pode servir como ponto de intercâmbio de
informação, espaço de lazer e consumo.
Ex. Actuais:
D) Os “inuit”, esquimós de Alasca e Canadá, que hoje caçam com rifles e motas-trineus.
E) Os “ache” de Paraguai, que obtêm um terço do seu alimento por meio da caça, ao mesmo
tempo cultivam, domesticam animais e comerciam.
Habitat dividido temporariamente durante parte do ano, sobretudo em torno aos poços de
água na África meridional. Algo muito diferente ao habitat do Norte da Península ibérica.
Tem uma mobilidade social entre bandos com os quais mantêm relações de parentesco ou
de “parentesco fictício” (entre tocaios, ou entre padrinhos e afilhados de diferentes
bandos).
7.9 Pastorícia
Há uma simbiose entre o pastor e o seu rebanho, é uma associação benéfica para ambos.
A família do pastor pode ou não deslocar-se com ele: nómadas (todo o grupo),
trashumantes (parte do grupo familiar se despraza e o outro fica em casa).
O gado é repartido em rebanhos e já existe uma ideia de “acumulação”, algo que antes não
existia nos grupos de caça e recoleção.
Cultivo extensivo.
Cultivo de roça: tala, queima e limpeza de uma parte da mata ou pradaria. A cinza
serve para fertilizar o solo.
Agricultura
Os animais são usados para transporte, como máquinas de cultivo, abono e calor.
Até há pouco tempo não podiamos falar em formas de associação que integrassem toda a terra
e toda a humanidade. Em muitos sentidos o mundo converteu-se num sistema social único,
consequência do acréscimo das ligações de interdependência, isto é, da globalização. As
relações sociais, políticas e económicas ultrapassam fronteiras, nações e estados. Nenhuma
sociedade do mundo vive completamente separada das outras.
Segundo alguns autores a nossa sociedade é cada vez máis pós-industrial, isto é, caracterizada
por adoptar um modo de produção económica baseada nos serviços na informação e no
conhecimento do mercado mundial. Autores como Ralf Dahrendorf, Daniel Bell ou Alain
Touraine sublinham que nestas sociedades pós-industriais o fundamental foi o processo de
terciarização que as converteu em sociedades de serviços
Quadro comparativo
Caça, pesca e Pastorícia Agricultura Indústria
recolecção
Participação de Troca por via Troca do excedente Moeda e
todos matrimonial Permuta de produtos mercado
Não há excluídos Reparto do gado em Terra e mercado Acumulação
Todos recebem rebanhos Equilíbrio entre o capitalista
Reciprocidade Acumulação trabalho e a
Troca directa necessidade
Distribuição e Acumulação
consumo imediato
Capitalismo Socialismo
Posse individual dos meios de produção Distribuição equitativa dos bens
Exploração Não tende a haver distinção de classes
Subordinação Participação colectiva na propriedade dos
Desigualdades sociais meios de produção
Trabalhamos mais do que recebemos (mais
valia)
Ganhos lucrativos
Manipulação consumista
Valor: individualismo
Trabalhamos para outros, não para nós
próprios
Actividades
8.1 Introdução
Esta unidade destina-se para você, caro estudante, estudar e adquirir noções básicas sobre
política, poder e autoridade; os sistemas políticos nos bandos de caçadores e recolectores; os
sistemas políticos nos sistemas tribais; os sistemas políticos nas chefaturas; os sistemas
políticos nos estados e rituais e ordem.
8.2 Objectivos
É preciso sublinhar que, a antropologia política está intimamente ligada com outras
especializações temáticas da antropologia como são a antropologia jurídica ou legal, e a
antropologia da guerra.
A política também pode ser entendida como uma tensão entre a ordem e a desordem, e o
“poder” como um regulador dessa tensão. Portanto, o fim último da política é estabelecer
uma ordem social e reduzir a desordem social. O exercício do poder pode estar associado à
“manipulação”, “resistência” e à “contestação”.
A resistência é uma forma de lidar com uma situação de domínio e pode adoptar diversas
formas e significados, desde o silêncio até a afirmação de posições.
Mas o exercício do poder também pode estar exposto à contestação, que é um exercício que
consiste em pôr em causa parcial ou totalmente o sistema de poder. A contestação salienta a
ambiguidade do poder, procura a adesão dos governados – bem por apatia ou por aceitação -,
mas também tem limites face às desigualdades e os privilégios. Estes limites podem ser
organizados formalmente (i.e.: conselho de anciãos nos grupos tribais e de chefatura) ou
informalmente (i.e.: boatos, coscuvilhices, etc.). A contestação leva associada lutas, alianças,
respeito, desejos de mudança, re- interpretações da lei para tirar vantagens, etc.
O poder também pode ser entendido desde outros pontos de vista complementares, pois, junto
com o parentesco, a família e a identidade, o poder é uma força social dominante nas nossas
vidas. Já Hume (citado em Balandier, 1987: 45) falava do poder como capacidade de actuar
efectivamente sobre as pessoas e sobre as coisas. Desde este ponto de vista, o poder é o
controlo da expectativa de resposta a uma proposta, é assim que está inserido em toda relação
social. Para Max Weber (citado em Balandier, 1987: 45), o poder é a possibilidade de que um
actor social imponha a sua vontade sobre os outros, de que uma pessoa dirija à sua vontade
uma relação social. Esta utilização da vontade pode adoptar mecanismos de negociação,
manipulação, consenso, conflito, etc. Assim por exemplo, nalguns grupos tribais da Guiné, o
poder está baseado no princípio do consenso e a unanimidade. Nelas, os jogos de futebol
acabam sempre em empate, sempre iguais. Aprenderam a jogar futebol logo depois da
segunda guerra mundial, mas o facto de ser grupos igualitários, implicou que não gostassem
da ideia de vencedores e vencidos.
Max Weber (em Balandier, 1987: 45-47) aponta algumas características básicas da noção de
poder:
Será também Max Weber (em Balandier, 1987: 49) quem afirme que o poder implica certo
consentimento e certa reciprocidade (contrapartida, obrigações, responsabilidades). Mas, o
consentimento implica uma legitimidade, que segundo Max Weber pode ser de três tipos:
1. Legal.
Estes três tipos não são opostos na realidade, senão que estão desigualmente acentuados numa
relação social. Assim por exemplo, Ronald Regan consultava a uma bruja de São Francisco
antes de tomar as grandes decisões. Será que devemos à brujaria o fim da guerra fria?
bandos,
tribos,
chefaturas e
estados.
A mudança de um tipo para outro é causada, segundo Elman Service, por vários factores:
o desenvolvimento económico,
Sem esquecer que a maioria dos grupos humanos têm-se incorporado hoje à entidades
políticas maiores – fundamentalmente estados -, observemos com detalhe a grande
diversidade cultural.
Hoje em dia, a organização política estatal afecta a quase toda a humanidade. Mesmo assim é
importante reflctir sobre os grupos humanos sem estado, com mecanismos de governo
diferentes, pois podemos tirar proveito em relação com novas formas e novos princípios
políticos de convivência humana.
Os bandos eram compostos por pequenos grupos de pessoas, e eram geralmente nómadas,
baseados no parentesco e numa economia de caça e recoleção. Mas o certo é que o número de
membros de um bando variava em função das épocas e dos recursos –ex.: os bandos dos
“inuit” eram mais pequenos no inverno pela maior dificuldade em obter alimentos, e maiores
no verão-. O bando era um grupo de várias famílias nucleares, politicamente autónomo.
Neles, os princípios de ligação são as relações pessoais e de parentesco, ainda que também o
comércio. As relações internas e externas estavam baseadas no princípio da reciprocidade; por
exemplo, entre os esquimós, havia colegas de trocas comerciais em diferentes bandos que se
tratavam mutuamente como se fossem irmãos.
Os bandos não têm um código formal de direito, mas sim há um controlo social e meios para
resolver as disputas e conflitos. Portanto, é uma organização política diferente da anarquia.
Falamos de tribo quando as comunidades locais actuam de forma autónoma, mas com
integração de grupos familiares (clãs) e associações numa unidade maior. O que distingue
uma tribo de um bando, é a organização política multilocal, que pode ser temporal –no caso
de uma ameaça militar- e não permanente. Igual que nos bandos, a tendência é a ser
igualitários. A nível local o liderado é informal, mas os velhos costumam ter grande
influência.
A diferença dos sistemas tribais, nos quais o mecanismo de integração na tribo é informal, nos
chefiados há uma estrutura formal que integra a mais de uma comunidade numa unidade
política. A estrutura formal de uma chefatura pode consistir num conselho ou em vários,
estabelecendo vários níveis hierárquicos de chefatura.
A posição de chefe pode ser herdada, é geralmente permanente e outorga um alto estatuto a
quem detenta a sua posição. O chefe redistribui a riqueza, planifica e dirige o trabalho
público, supervisa as cerimónias religiosas, e controla as actividades militares em nome da
chefatura. Os chefes são obedecidos pelo respeito que professam, pela autoridade religiosa
que representam, e pela força militar que controlam. O seu estatuto social está baseado na
antiguidade da filiação, não na sua generosidade –como nos bandos-, nem na liderança da sua
filiação –como nas tribos-.
As chefaturas são uma forma de organização política intermédia entre a tribo e o estado.
Nelas dá-se um acesso diferencial aos recursos e uma estrutura política permanente. A
chefatura reuni a várias comunidades e tem uma espécie de governo central, responsável pelas
finanças, a guerra e as leis. A diferença dos bandos e das tribos, nos sistemas de chefatura, há
uma regulação permanente do território. Ao mesmo tempo, os parentes do chefe têm um
acesso diferencial e privilegiado aos recursos, ao poder e ao prestígio.
Na actualidade também discutimos o papel político das regiões, nações sem estado, estados e
supra-estados. E não só, a raiz dos atentados terroristas do 11 de Setembro contra símbolos
chave dos EUA e do sistema capitalista, a discussão coloca a questão da necessidade de mais
política –como defessa da cidadania- e de menos livre-mercado.
Em quanto ao desenvolvimento histórico, e à origem dos estados, há um consenso mínimo
entre os investigadores. Estes afirmam que os chefiados evoluíram em estados, que os
primeiros apareceram na Mesopotamia, no Egipto, no México, na Índia e na China, todos eles
aproximadamente no 3.500 antes de Cristo.
As elites são grupos dirigentes do poder dentro de uma sociedade, quem detentam o domínio
político, económico, prestígio social, práticas culturais específicas e autoridade ideológica.
Uma elite está unida por parentescos e alianças entre os seus membros (McDonogh, 1989).
A diferença das chefaturas, o território de um estado é maior, e tem mais população. Nele a
estratificação socioeconómica (ex.: sociedade de classes) é muito importante. A sua unidade
política delega num governo formalmente estabelecido, baseado geralmente no “Direito”. Os
estados dispõem de corpos administrativos com funções especializadas (poder executivo,
legislativo, judicial):
Os rituais reflectem o sistema social e político (Velasco, 1986), mas também ao mesmo tempo
são estruturantes dos mesmos. Os rituais contribuem para a estruturação da forma como a
gente pensa a vida social, que como já vimos é uma tensão entre ordem e caos. O ritual é uma
formação social que estabelece, reitera, reforça laços e ligações sociais, resolve conflitos,
regula tempos e espaços. O ritual é uma espécie de promessa de continuidade. Igualmente,
acontece que as crises são controladas por ritos que definem as etapas do processo social. Nos
rituais políticos há sempre fragmentação, repetição e dramatização. Exemplos: assembleias
políticas, festividades, festas, etc.
Actividades
9.1 Introdução
9.1 Objectivos
9.3 A Religião
A religião pode ser entendida como o sistema de crenças e rituais ligado com seres, poderes e
forças sobrenaturais. A religião é um universal da cultura isto é, é um fenómeno inerente a
todas as culturas. Ela pode afirmar a solidariedade social de um grupo humano, mas também a
inimizade mais acérrima. A religião relaciona o homem com o sobrebatural, embora não seja
fácil distinguir-se o natural do sobrenatural. Diferentes culturas conceituam os entes
sobrenaturais de maneira diferente.
Edward Burnett Tylor (1871-1958) foi o fundador da antropologia da religião. Segundo este
autor a religião nasceu quando o homem tentava compreender as condições e eventos que não
podia explicar por meio da referência à experiência quotidiana. O intento de explicação dos
sonhos e dos trances levou os primeiros humanos a crer que o corpo humano era habitado por
dois entes: um durante o dia e outro durante a noite. Estes dois entes ou seres são vitais um
para o outro. Quando a alma (“anima”) abandona o corpo de forma permanente a pessoa
falece. Tylor denominou a esta crença “animismo”.
Como evolucionista que era pensava que a religião tinha evoluído através de uma série de
etapas, e a inicial era o “animismo”, o “politeísmo” e o “monoteísmo” eram as seguintes. No
pensamento de Tylor estava a ideia de que a religião declinaria à medida que a ciência fosse
oferecendo explicações melhores sobre aquilo que o homem não entendia.
Maná e tabu
Os primeiros humanos entendiam o sobrenatural como uma força que não podiam controlar,
ou só em determinadas condições. Esta concepção era muito importante na Melanêsia
(Pacífico sul, Papua Nova Guiné e ilhas de perto). Os melanésios criam no maná, uma força
sagrada existente no universo, e o maná residia nas pessoas, nos animais, nas plantas e nos
objectos.
Esta noção de maná é muito similar às nossas noções de “sorte” e de "azar" (má sorte,
conotação negativa); os melanésios atribuíam o sucesso ao maná (manipulável através da
magia), era assim que o uso de um objecto como amuleto podia mudar a sorte de alguém (um
caçador).
O interessante do maná melanêsio é a forma como explica o sucesso e o fracasso das pessoas,
através de questões sobrenaturais, mas também como explica os limites simbólicos da
autoridade. A crença em seres espirituais e em forças sobrenaturais tem a ver com a definição
de religião já abordada.
Magia e religião
a) Magia homeopática ou de imitação metafórica: para produzir o efeito desejado (ex.: ferir
a imagem de uma vítima à qual se quer causar dano).
b) Magia contagiosa ou metonímica: Qualquer coisa que se faça a um objecto crê-se que
afecta à pessoa que estivera em contacto com ele. Por exemplo: Como fazer que uma
mulher se apaixone por um homem? Resposta entre os quíchuas: Coser duas víboras
pelos olhos e tocar com elas uma prenda da mulher.
Nem todos os ritos de transição têm a ver com a religião, mas eles ajudam a compreender
melhor a religião como prática sociocultural. Um rito de transição é um costume relacionado
com a mudança de uma etapa a outra na vida. Por exemplo, os índios das pradarias (EUA)
separavam temporariamente os jovens da sua comunidade. Este período era acompanhado de
jejum e de consumo de drogas. Depois o jovem teria visões que se converteriam no seu
espírito protector. Depois disso voltava à sua comunidade como adulto.
Os ritos de transição das culturas contemporâneas são: baptizados, a queima dos "caloiros",
casamentos, etc. Estes ritos implicam uma mudança de estatuto social, e as suas fases são:
separação, marginalidade e agregação. A fase marginal é um período liminar no qual as
pessoas deixaram o estado anterior, mas ainda não entraram ou se uniram ao próximo estado.
Estas pessoas são liminares (Turner: 1974) e ocupam posições sociais ambíguas; separados
dos contactos sociais normais. Entre os ndembu (Zâmbia) um chefe tem que sofrer um
período liminar no qual as pessoas ignoram o seu estatuto passado e futuro, incluso é
invertido esse estatus, insultado, ordenado e humilhado. Geralmente estes rituais são
colectivos.
... implica uma mudança na situação do indivíduo, nele podemos observar acções,
reacções, cerimónias, etc. Os ritos de passagem são transmissores de cultura, e
representam a transição a novos papéis e estatutos. Também representam uma
integração, pois animam e reavivam sentimentos comuns que mantêm unidos e
comprometidos com o sistema social os indivíduos. Neles afloram sentimentos,
desaparecem temporariamente algumas regras, mas afirmam por contraste a justiça
moral das normas.
O Totemismo
Era a religião dos aborígenes australianos. Os totens podiam ser animais, plantas ou caracteres
geográficos. Cada tribo tinham o seu totem particular, e os membros dessa tribo acreditam-se
como descendentes do seu totem. Existia o tabu de não comer nem matar o totem, mas esse
tabu deixava-se uma vez no ano, quando a gente se reunia para as cerimónias dedicadas ao
totem. Existia a crença de que estes rituais anuais eram necessários para a sobrevivência e
reprodução do totem.
O totemismo é uma religião que utiliza a natureza como modelo para a sociedade, e a
diversidade na ordem natural é reproduzida na ordem social. Mas a unidade social humana é
estabelecida por um processo de associação simbólica e imitação da ordem natural. Os totem
são emblemas sagrados que simbolizam a identidade comum e o ritual serve para manter a
unicidade social que simboliza o totem.
Um dos papéis dos ritos e das crenças religiosas é o de afirmar a solidariedade dos crentes e
participantes (ex.: a família que reza unida permanece unida). Os ritos transmitem informação
sobre os participantes e a sua cultura, a repetição dos mesmos gera mensagens, valores e
sentimentos em acção. Os rituais são actos sociais nos quais os participantes transcendem o
seu estatuto como indivíduos, independentemente dos seus pensamentos particulares e dos
seus graus de entrega.
O estudo antropológico da religião não se limita só aos efeitos sociais da religião, à sua
expressão em ritos e cerimónias. A antropologia estuda os relatos religiosos e quase
-religiosos sobre seres sobrenaturais, os mitos.
Os mitos
Os mitos expressam crenças e valores culturais através dos seus relatos. Os relatos do mito
narram acontecimentos do passado remoto: a origem do mundo ou de uma povoaçao através
de factos extraordinários, os deuses, heróis com atributos humanos, seres sobrenaturais, etc.
Os seus relatos são que são cridos, narram factos trascendentes e/ou dogmas da comunidade,
com o fim de ensinar e moralizar. Servem também para ilustrar crenças religiosas. Os mitos,
além de dar lições morais, oferecem esperança, emoção e evasão.
Em relação com os mitos, temos as lendas e os contos. Esta relação é importante para
perceber melhor o mito, que se pode transformar em lenda. As lendas narram acontecimentos
do passado recente – já não remoto como nos mitos -, e são protagonizadas normalmente por
pessoas seculares, ainda que também possam intervir nelas seres sobrenaturais com poderes
extraordinários. Tal como os mitos, as lendas são relatos tomados como verdadeiros, mas no
caso da lenda, também a fonte do relato pensa-se como verdadeira.
O conto é, a diferença dos anteriores, um relato de ficção construído não para se acreditar
nele. Narram algo quotidiano, sem localização concreta, intemporal e não transcendente.
Exemplo disso são os contos sobre animais. O objectivo do conto, como género narrativo que
é, é o de transmitir uma mensagem cultural profunda aos seus ouvintes: esperança, sucesso,
esforço, segurança, inteligência, habilidade, astúcia.
Os contos utilizam geralmente fórmulas introdutórias. Ex.: “Era uma vez que se era...” No
conto a fantasia é central, e geralmente sugerem a possibilidade de crescimento e de auto-
realização, de ai a sua importância para as crianças. Os seus protagonistas são heróis (plantas,
animais, humanos...) que utilizam inteligência, habilidade física ou astúcia para os seus fins.
O herói deve passar uma série de provas rituais para atingir uma meta. As crianças
identificam-se geralmente com os heróis vencedores. Os contos oferecem confiança na
melhoria, ao mesmo tempo que dão segurança e satisfação psicológica.
A religião é um universal cultural, mas a sua vivência tem diferentes expressões em cada
cultura. Wallace (1966) propõe 4 tipos de religião: xamanística, comunal, olímpica e
monoteística.
Diferentemente dos sacerdotes, os xamanes são encarregados religiosos a tempo parcial que
medeiam entre as pessoas e os seres sobrenaturais, são especialistas mágico-médicos. Xamam
é o termo geral que une feiticeiros, médiuns, espiritistas, astrólogos, quirománticos e outros
adivinhadores. As religiões xamanísticas são mais características das culturas de caça e
recolecção (ex.: esquimós). Os xamanes estão situados simbolicamente segregados das outras
pessoas, e têm um papel diferente.
A religião ajuda a conservar a ordem social, mas também pode ser um instrumento de
mudança ou de revolução incluso. Pode ser uma resposta a uma conquista ou um domínio. A
religião pode ajudar a viver num entorno cultural modificado.
Max Weber (1969) argumentou a influência central dos valores religiosos, em especial os da
ética protestante de inspiração calvinista, para o desenvolvimento e a evolução do capitalismo
em Europa. Face aos factores estruturais, especialmente de base económica no materialismo
histórico, Weber introduz os factores socioculturais no centro mesmo dos processos de
mudança sociocultural, demonstrando a importância dos valores religiosos como factores da
origem do capitalismo. Por que o capitalismo originou-se em Europa e não em China (mais
tecnologia que em Europa)?. Pela atitude face a riqueza (poupança do puritanismo calvinista).
Os humanos se por algo nos caracterizamos é por definir o tempo, por organizar e utilizar e
sinalizar o tempo através de nomes de animais, provérbios, festas, etc. Os humanos
costumamos tentar abolir o tempo, numa tentativa de durar, de permanecer, realizamos rituais
cíclicos que asseguram a repetição.
As diferentes religiões falam da fim do mundo. Para os muçulmanos “só Deus a conhece”
(Corão, XIII, 63); para os católicos “o que toca a aquele dia e hora ninguém o conhece”
(Mateus, 24, 36). Para os egípcios, hindus, cabalismo e astrologismo, a fim do mundo situa-se
a mediados do século XXI. As diferentes religiões também dispõem de diferentes calendários,
verdadeiros computadores do tempo e da vida das pessoas.
Actividades
1. A religião pode ser entendida como o sistema de crenças e os rituais ligados com
seres, poderes e forças sobrenaturais.
a) Fale do valor real da religião.
b) Fundamente Animismo como expressão de religião.
2. Explique o impacto dos movimentos messiânicos (Cristianismo e Islamismo) durante
a penetração colonial?
3. Explique o substrato da religião tradicional africana.
4. Estabelece diferença entre o Sagrado e o Profano.
5. Que relação existe entre o poder político e a religião nas comunidades menos
industrializadas.
6. Diz em que se converge a religião tradicional africana e a educação tradicional em
Moçambique.
Bibliografia básica
JUNOD, Henri. Usos e Costumes dos Bantu. 2. ed. Lourenço Marques, 1974.
MATTA, Roberto da. Relativizando: Uma Introdução à Antropologia. São Paulo, 1981.