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* Rua Cesário Alvim, 604, apto. 305, bloco A2, Residencial Cesário Alvim, Cidade Velha, Belém, Pará, Brasil CEP: 66023-170.
marthurleal@yahoo.com.br
Recebido em 20/12/2016. Aceito para publicação em 11/01/2017
o animal de co mida, água, abrigo, co mpanhia ou animais quando decidissem sair de suas casas ( GA L-
assistencia méd ico veterinária (CROOK, 2000; LAGHER et al. 2008).
McGUINNESS, 2005; GALLAGHER et al. 2008). Estudos realizados em vários países identificam a
O médico veterinário possui condições para reco- falta de conhecimento de órgãos públicos no que diz
nhecer lesões não acidentais, o que possibilita a identifi- respeito ao apoio as vítimas e como proceder co m os
cação de uma forma de agressão contra o animal e u m animais vít imas de maus-tratos em casas problemáticas.
possível elo co m a vio lência doméstica, podendo através Sendo este um problema de saúde pública, o que neces-
do cliente chegar ao agressor e quebrar um ciclo de vio- sita de maior atenção por parte dos órgãos competentes e
lência, já que é um dos primeiros profissionais a terem profissionais da área de saúde, que devem trabalhar em
contato com u m animal maltratado (A RKOW, 1992; conjunto, inclusive veterinários que são os primeiros a
CROOK, 2000; LOCKWOOD, 2000; GA LLA GHER et terem contato com o animal possivelmente maltratado
al. 2008). O papel do médico veterinário no diagnóstico (CA RLSILSE-FRA NK, 2004; McGUINNESS, 2005;
de maus-tratos e a possível prevenção de atos futuros de GALLAGHER et al. 2008; ARKOW, 2015)
violência tornam este profissional o advogado para o No estudo realizado por Nassaro (2013), foi
bem-estar dos animais (ARKOW, 2015). identificado que o Centro de Operações da Polícia
A lei 9.605 de 1998 dispõe sobre maus -tratos a Militar (COPOM ) do Co mando do Policiamento da
animais e o caracteriza co mo crime amb iental sujeito a Capital (CPC) e dois centros de Operações do Corpo de
pena de multa e reclusão. No entato as formas de Bo mbeiros (COBOM ) da Po licia M ilitar desconheciam
identifcação e direcionamentos legais e de apoio às um código específico para ocorrências envolvendo
vítimas, tanto seres humanos como animais, pós maus-tratos aos animais.
identificação no Brasil ainda é ínfimo na grande maioria Arkow (2015) caracterizou lesões e alterações físicas
dos casos. Co m isso o presente artigo faz u ma revisão da e de comportamento, co m o intuito de auxiliar o méd ico
literatura buscando identificar p ráticas e princíp ios com veterinário na identificação de situações de maus -tratos.
potencial para melhorar as ações de médicos veterinários Lesões inexplicáveis ou co m reicidência em u m animal
mediante casos de maus-tratos aos animais. ou em vários animais, evidência de lesões de costela,
escore corporal baixo, casos de envenenamento,
2. MATERIAL E MÉTODOS queimaduras, contusões e ferimentos por instrumentos
perfurocortantes, múltip las fraturas, ferimentos por
O presente artigo consiste em u ma revisão de litera- arma de fogo, presença de cicatrizes, feridas e traumas
tura sobre a “Teoria do Lin k” e sobre possíveis contri- característicos de animais usados em co mpetições de
buições dos médicos veterinários no combate aos luta, de cães ou galo.
maus-tratos aos animais e a violência do méstica. Para Assim co mo negligência, que pode incluir infestação
tanto, foram pesquisadas informações existentes em li- por ectoparasitas, doença dentária, falta de hig ienização
vros, artigos científicos e sítios eletrônicos especializa- com o animal, desidratação, sinais de doença, dor, an-
dos. gústia ou lesões que necessitem de tratamento, vocaliza-
ção, abuso sexual, onde o animal demonstra medo de seu
3. DESENVOLVIMENTO dono ou de pessoas em geral.
Os estudos realizados até o mo mento fazem co m que Para Crook (2000), reconhecer os maus -tratos de
a “Teoria do link” cada vez mais ganhe força. forma direta nem sempre é possível. A negligência pode
Demonstram a agressividade direcionada aos animais de ser involuntária, devido à falta de educação,
companhia co mo u ma forma de impor o controle representando assim u m lapso temporário nos cuidados
med iante a u ma pessoa da família ou até mes mo pelo do responsável, ou até mesmo ser crônico. No entanto, a
simp les fato de realizar maus -tratos como forma de autora salienta a importância de identificar a gravidade
prazer. No entanto, na maioria dos casos essas ações do problema, sua frequência e sua duração.
ocorrem sem serem identificadas e, quando identificadas, O médico veterinário possui condições para
o ato de vio lência já está instalado a mu ito tempo dentro reconhecer lesões não acidentais e situações de
do amb iente familiar podendo desencadear na morte do maus-tratos (CROOK, 2000; LOCKW OOD, 2000).
animal de estimação (GA LLA GHER et al. 2008; Segundo Arkow, 2015, se o méd ico veterinário através
ARKOW, 2015). de exame de rot ina suspeitar de maus -tratos, este deve
Muitas mulheres que sofreram agressões no ambiente conversar com o cliente para tentar resolver a situação,
familiar relatram a demora em procurar ajuda ou se caso o cliente se co mporte de forma agressiva ou sob
refugiar em abrigos devido ao medo de possiveis suspeita, o médico veterinário deve informar as
retaliações aos seus animais de estimação, u ma vez que autoridades responsáveis para med idas de combate e
estes animais ficariam aos cuidados do agressor e não prevenção a essas agressões. Em situações graves a
conhecerem nenhum local que pudessem abrigar estes quebra de confidencialidade do cliente é justificada.
O médico veterinário nem sempre tem consciência Arkow (2015), identificou a deficiência de
do seu papel, quando diante de casos de maus -tratos conhecimento de termos adequados para compor u m
contra animais. Alguns fatores influenciam essa situação, laudo pericial por parte dos médicos veterinarios. Sendo
como não seguir um padrão na identificação e assim, p ropôs a utilização de alguns termos padrões para
diferenciação de lesões não acidentais, a dificuldade de orientar na confeccção do laudo. Seguem os termos
identificar o cliente co mo o autor dos maus -tratos, o sugeridos:
medo de perder um cliente, de participar de possiveis • Crueldade animal: o termo mais prevalente,
lit ígios ou sofrer retalizações por parte do cliente implicando uma inflição deliberada de dor, da qual o
(LOCKWOOD, 2000; McGUINNESS, 2005). ofensor obtém gozo ou diversão.
Nos Estados Unidos, Lockwood (2000) relata que a • Abuso de animais: maus-tratos voluntários ou ne-
forma de notificação e proteção ao profissional méd ico gligentes, independentemente da intenção, motivação ou
veterinário muda de acordo co m o estado, as denúncias estado mental do agressor.
são obrigatórias em alguns estados, em outros as • Negligência an imal: u m ato de o missão que signi-
denúncias ocorrem so mente através de mandatos fica u ma falta de cuidado, a fo rma mais comu m de
judiciais e ainda ocorre em alguns estados o incentivo à maus-tratos.
notificação de abuso fornecendo proteção ao profissional • Acúmulo de animais: negligência em u ma escala
que notifica. Os profissionais amparados se sentem mais significativa envolvendo grande número de an imais,
seguros e com isso ocorre o au mento das notificações mu itas vezes mantidos em condições de deterioração
dos profissionais como resposta. abaixo dos padrões mín imos de nutrição, saneamento e
O méd ico veterinário pode tornar-se mais ativo em cuidados veterinários.
busca de ajudar sua co munidade com o intuito de • Abuso físico de animais: u ma amp la gama de atos
prevenção e combate a violência do méstica, co mo apoiar injustos que requerem engajamento ativo, como bater,
na investigação e documentação de maus -tratos aos chutar, sufocar, jogar, agitar, envenenar e queimar. A
animais, atuarem co mo testemunhas experientes na acu- apresentação clínica inclu i lesões no esqueleto, tecido
sação de maus-tratos aos animais, serem "sentinelas" mo le ou órgãos sustentados como resultado de espanca-
para outras formas de violência social co mo abuso in- mento ou maus-tratos repetidos.
fantil e v iolência do méstica, tornarem-se part icipantes • Lesões não acidentais: sinônimo de abuso físico.
em equipes mult idisciplinares de resposta e "refúgio
• Abuso sexual de animais: atos abusivos ou conduta
seguro" que fornecem serviços de abrigar e cuidar dos sexual co m u m an imal envolvendo o reto, ânus ou geni-
animais de estimação e das vítimas de violência do més-
tália e zoofilia (u ma forte preferência erótica para ani-
tica, serem participantes e instrutores em treinamento
mais).
cruzado com profissionais de serviços sociais e de cui-
• Abuso emocional: u m conceito predominante no
dado e controle de animais sobre o reconhecimento do
léxico da violência interpessoal geralmente ausente das
abuso e da negligência e ainda co mo apoiadores e parti-
leis de crueldade animal.
cipantes de programas de prevenção e intervenção para
Pode-se notar a deficiência no do mín io nos diversos
as populações atingidas ou não pelos maus -tratos
campos da medicina veterinária legal, desde a parte
(LOCKWOOD, 2000).
conceitual até o seu desenvolvimento prático, nas pes-
Croock (2000) trata a med icina veterinária co mo u ma
quisas realizadas até o momento. Isso se deve a defici-
profissão capaz de quebrar o ciclo de violência. O
ência no ensino da medicina veterinária em relação a
comitê de bem-estar animal da associação de medicina
disciplinas ligadas a maus -tratos contra os animais
veterinária do Canadá identificou estratégias para
(LOCKWOOD, 2000; McGUINNESS, 2005). No
abordar as questões de combate aos maus -tratos,
Brasil, atualmente poucos cursos de graduação possuem
sugerindo a elaboração de documento que atribui a
a medicina veterinária legal co mo d isciplina obrigatória
responsabilidade ao médico veterinário de notificar
na grade curricular. Sendo assim, o ens ino não é efetivo
situações de maus-tratos, criar consultorias para orientar
e muitos profissionais ao se depararem co m situações de
os profissionais sobre o seu papel med iante as questões
maus-tratos não sabem como proceder.
dos maus-tratos, educar os profissionais e o público
Várias propostas podem ser retiradas das pesquisas
sobre maus-tratos, trabalhar em conjunto com as Leis e
realizadas para melhorar o papel do médico veterinário
regulamentos para que melhor contemple estas questões.
med iante situações de maus -tratos. Gallagher e colegas
Ainda a associação médica veterinária do Canadá
(2008) propõem que médicos veterinários façam parte de
declara responsabilidade do médico veterinário
uma rede de apoio para lidar co m situações de violência
identificar e notificar às autoridades situações de abuso,
contra animais, pro mover ações junto a órgãos públicos
maus-tratos e negligência, sendo este ato necessário
de adoção temporária ou permanente nos casos confir-
visando proteger a saúde e o bem-estar de animais e
mados de maus-tratos dos animais envolvidos, trabalhar
pessoas.
no conscientização e in formação de maus -tratos junto à