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Por uma educação profissional

em itinerário contínuo:
a experiência do Centro Paula Souza

Secretaria de Desenvolvimento Econômico


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Por uma educação profissional em itinerário contínuo : a experiência


do Centro Paula Souza [livro eletrônico] / organização Itaú
Educação e Trabalho, Carla Chiamareli, Beatriz Lomonaco. – 1. ed.
– São Paulo : Fundação Itaú para a Educação e Cultura, 2021. PDF.

Vários colaboradores.
Bibliografia.
ISBN 978-65-86771-14-5

1. Aprendizagem 2. Educação 3. Educação - Finalidades e objetivos


4. Educação para o trabalho 5. Educação profissional I. Itaú Educação
e Trabalho. II. Chiamareli, Carla. III. Lomonaco, Beatriz.

22-105257 CDD-370.113

Índices para catálogo sistemático:

1. Educação profissional 370.113

Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129

2
Governo do Estado de São Paulo Coordenador do Ensino Médio e Técnico Por uma educação
Almério Melquíades de Araújo profissional em itinerário
Governador do Estado de São Paulo contínuo: a experiência do
João Doria Diretor do Grupo de Formulação e Centro Paula Souza
Análises Curriculares da Unidade do
Ensino Médio e Técnico Organização editorial
Secretaria do Desenvolvimento Gilson Rede ITAÚ EDUCAÇÃO E TRABALHO
Econômico do Estado de São Paulo Carla Chiamareli
Coordenador da Unidade de Ensino Beatriz Lomonaco
Secretária de Estado de Desenvolvimento Superior de Graduação
Econômico Rafael Ferreira Alves Coordenação geral e técnica, pesquisa
Patricia Ellen da Silva e redação
Diretor Acadêmico Pedagógico da TOMARA! EDUCAÇÃO E CULTURA
Secretária-Executiva Unidade do Ensino Superior Clara Azevedo
Marina Bragante André Luiz Braun Galvão Luciana Fleury
Maurício Alcântara
Coordenador de Ensino Técnico, ITAÚ EDUCAÇÃO E TRABALHO
Tecnológico e Profissionalizante Itaú Educação e Trabalho Alexandra Santos
Daniel Barros Érica Teruel Guerra
Superintendente
Diretora do Programa Novotec Ana Inoue Leitura Crítica
Natália Vido CENTRO PAULA SOUZA
Gerentes Ana Claudia Melo T. G. de Oliveira
Cacau Lopes da Silva
Centro Paula Souza Carla Chiamareli Projeto gráfico
Diogo Jamra Tsukumo Rita Sepulveda de Faria – Rima Gráfica
Diretora-Superintendente Laura Daviña
Laura Laganá
Diagramação
Vice-Diretora-Superintendente Júlia Yoshino
Emilena Lorenzon Bianco
Revisão de texto
Chefe de Gabinete da Superintendência Lucimara Carvalho
Armando Natal Maurício

3
APRESENTAÇÃO 5

Sumário CAPÍTULO 1 – Itinerários contínuos: em busca de percursos


educacionais otimizados e significativos
A educação profissional e tecnológica
7
7
Múltiplos desafios 11
A perspectiva da aprendizagem ao longo da vida 12
Experiências que podem inspirar 13
Por trajetórias contínuas e significativas 15
Itinerário contínuo: uma síntese 18

CAPÍTULO 2 – Programa Trilhas Profissionais, o itinerário


contínuo em São Paulo 19
Esforços conjuntos: o nascimento do programa Trilhas Profissionais 20
Primeiros passos: definindo os caminhos 21
Mão na massa: análise e elaboração de trilhas e currículos 23
A articulação com o setor produtivo: interações e colaborações 25
Dos currículos ao vestibular: processo de implementação
e próximos passos 28

CAPÍTULO 3 – Oito perguntas e um convite para novos


itinerários contínuos 31
Perguntas orientadoras 32
Um convite para o futuro 38

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 39

AGRADECIMENTOS 42

4
C
ontribuir com a criação de políticas, estratégias e mecanismos que
estabeleçam percursos consistentes para que os estudantes egres-
sos do ensino técnico acessem e permaneçam no ensino superior é

Apresentação uma das apostas desta publicação.


Para possibilitar que essa progressão seja possível e coerente, é preci-
so identificar e reduzir a repetição de conteúdos entre os diferentes níveis,
otimizando a duração da formação desses estudantes e viabilizando, na
prática, a melhor integração entre os níveis de ensino. É isso, em síntese, que
se almeja quando se fala em itinerários contínuos no âmbito da Educação
Profissional e Tecnológica (EPT).
No cenário brasileiro, a implementação de um projeto ou programa educa-
cional com esse objetivo ainda não é tarefa trivial e exige estratégias e esfor-
ços de variados atores. Por isso, ganha-se em diferentes dimensões quando se
tem a possibilidade de observar e aprender com práticas, erros e acertos de
experiências que buscaram criar percursos verticais significativos, complemen-
tares e continuados. Boas pistas sobre caminhos percorridos, questões que se
impuseram, reflexões enfrentadas, decisões tomadas e eventuais reveses são
elementos que inspiram novas rotas e ajudam a corrigir as já conhecidas.
Esta publicação foi concebida com o propósito de registrar o processo de
implementação, no estado de São Paulo, do Trilhas Profissionais, entendendo
a importância de que experiências referenciais como esta sejam documenta-
das, e o acesso a elas facilitado. Iniciativa da Secretaria de Desenvolvimento
Econômico do Estado (SDE), por meio do Centro Paula Souza (CPS) e com o
apoio metodológico do Itaú Educação e Trabalho (IET), o Trilhas Profissionais é
um programa que busca organizar trajetórias significativas e contínuas para
os estudantes dentro de uma mesma carreira e que faz isso aproveitando a
estrutura de oferta de educação profissional de nível médio e superior do CPS,
por meio de suas Etecs e Fatecs.
É importante ressaltar que se trata de um processo em andamento, um
work in progress – ou seja, o registro e a sistematização das reflexões e esco-
lhas envolvidas nesta publicação referem-se às etapas iniciais de desenvol-
vimento e implementação do programa. Mesmo assim, entende-se que essa
experiência já possui contornos e conteúdos significativos para servir como
inspiração a gestores públicos e profissionais da educação que tenham o
interesse de implementar iniciativas similares em outros estados do país.
As etapas posteriores e seus resultados ainda serão observados e devida-
mente documentados.

5
A publicação está organizada em três capí- em redes educacionais. O capítulo conclui esta
tulos. No primeiro, são apresentados um breve publicação como um convite – tanto para o sur-
panorama histórico do desenvolvimento da gimento de outras experiências de fortaleci-
Educação Profissional e Tecnológica no Brasil mento da integração entre diferentes níveis de
e os principais desafios enfrentados nos dias ensino profissional tecnológico, como também
atuais para que a EPT propicie aos estudantes para que outras iniciativas de documentação
uma formação condizente com as demandas similares a esta apareçam.
do mundo do trabalho no século XXI. Além
disso, são descritas experiências internacio- Boa leitura!
nais, que podem servir como inspiração para
o contexto nacional, e analisados dispositivos
presentes na legislação brasileira favoráveis
ao aproveitamento dos conhecimentos pré-
vios dos estudantes. Por fim, é apresentada e
defendida a importância de estabelecer um
itinerário contínuo para ampliar as perspecti-
vas de acesso e permanência dos estudantes
de EPT no ensino superior.
O segundo capítulo traz um relato porme-
norizado da experiência do Centro Paula Souza
na implementação do programa Trilhas Profis-
sionais – desde uma apresentação da institui-
ção e do contexto em que o programa nasce,
até as escolhas, os principais desafios e os
processos vivenciados pelas equipes envolvidas
na criação e implementação do curso tecnoló-
gico de desenvolvimento de software multipla-
taforma – o primeiro da instituição concebido
conforme as premissas do programa.
O terceiro e último capítulo elenca algu-
mas das principais questões que precisam ser
levadas em conta diante do interesse de im-
plementar modalidades de itinerário contínuo

6
A educação profissional e tecnológica

Capítulo 1 A Educação Profissional e Tecnológica (EPT)1 representa hoje uma das


principais possibilidades para jovens de diferentes lugares do Brasil ob-
terem oportunidades qualificadas para a inserção no mundo do trabalho.

Itinerário contínuo: Diferentes pesquisas2 registram resultados positivos em relação à inclu-


são produtiva, mas também quanto ao prosseguimento nos estudos de
egressos da EPT, especialmente de cursos que se mantêm atualizados com

em busca de percursos o mundo e suas transformações.


A EPT contribui com o aprendizado ao desenvolver projetos conectados
com a realidade, e possibilita vivências profissionais que conferem mais se-
educacionais otimizados gurança aos jovens no momento de realizar suas escolhas. Além disso, fa-
cilita a inserção deles no universo do trabalho, tornando mais viável e com-

e significativos patível a articulação entre trabalho e estudos – característica importante


para o momento em que o jovem está definindo seus possíveis caminhos
de futuro e, muitas vezes, precisa compor a renda familiar. Comparado a
outros países no mundo, ainda há pouca oferta de EPT no Brasil, muitas
vezes por falta de infraestrutura adequada e de profissionais habilitados.
Enquanto nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) a EPT representa 42% das matrículas do ensino médio,
no Brasil esse índice é de apenas 11% (Education at a Glance, OCDE, 2020).
Para além da oferta e do acesso, a educação profissional – sobretudo a
de nível médio3 – enfrenta outros desafios e lida com muitos estigmas. Um
dos mais notáveis é o fato de ainda ser compreendida no senso comum
como a etapa final da trajetória educacional de quem opta por esse ca-

1
No Brasil, a EPT é regulamentada pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec), do Minis-
tério da Educação, e engloba os seguintes níveis: Formação Inicial e Continuada ou Qualificação Profissional
(em geral, sem exigência de escolaridade); Educação Profissional Técnica de Nível Médio; Educação Profis-
sional Tecnológica de graduação e de pós-graduação. A oferta de cursos de educação profissional de cursos
técnicos de nível médio é disciplinada pelo Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (CNCT), e a de cursos
tecnológicos é guiada pelo Catálogo Nacional dos Cursos Superiores de Tecnologia (CNST).
2
Para uma visão aprofundada sobre os impactos da EPT na vida dos jovens e no futuro do mercado de traba-
lho, confira a publicação “Educação Profissional e Tecnológica emancipatória: juventudes e trabalho” (Itaú Edu-
cação e Trabalho, 2020). Disponível em: https://www.itaueducacaoetrabalho.org.br/documents/Livro_EPT.pdf.
3
Parte integrante da educação básica, o curso técnico de nível médio pode ser realizado de forma articulada
ao ensino médio regular em três modalidades: 1) integrado (ensino médio e técnico em uma única matrícu-
la); 2) concomitante (matrículas distintas, que podem ser em escolas e cursos em períodos independentes);
3) subsequente (após a conclusão do ensino médio).

7
minho. A atribuição de um caráter conclusivo, obtidas por meio de experiências laborais,
corroborado por uma percepção assistencialis- estimular e fornecer condições reais para
ta do ensino profissional, supostamente volta- a continuidade dos estudos e atualizações
do apenas às camadas mais pobres da popu- e sem hipervalorizar o ensino superior são
lação (Schwartzman, 2016), foi chancelada em passos necessários.
diversos momentos na história da educação
profissional brasileira por legislações que
restringiram as possíveis articulações entre os
conteúdos programáticos dos cursos técni-
cos e os componentes curriculares do ensino
médio regular (Saviani, 2008; Paiva, 2013)4. O
resultado: formações técnicas pouco voltadas
ao desenvolvimento integral do jovem ou à
possibilidade de continuidade dos estudos
– quando não impediam o acesso ao ensino
superior ao conferir certificações incompa-
tíveis com a passagem para o próximo nível,
dificultavam e desestimulavam esse acesso.
A visão da Educação Profissional e Tecno-
lógica de nível médio como algo “menor”, um
meio rápido e final para formar mão de obra
para funções menos qualificadas, ainda se
faz presente a despeito das mudanças mais
recentes na legislação, na qualidade e na
oferta da educação profissional no país. Uma
das consequências disso é a desvalorização do
ensino técnico em relação ao ensino superior,
como se fossem caminhos opostos e desco-
nectados, e não complementares ou contí-
nuos. Enquanto houver eco nessa perspectiva,
bastante disseminada na sociedade, todos
perdem – sobretudo o jovem mais vulnerável.
É preciso superar essa visão já ultrapassa-
da. O ensino profissional mudou, e o mundo,
com suas dinâmicas e exigências, também.
Deslocar a forma de olhar para a educa- 4
Para um panorama sobre as principais legislações que estabelece-
ção profissional, valorizar as aprendizagens ram diretrizes sobre a EPT no Brasil, confira a linha do tempo na p. 6.

8
LINHA DO TEMPO 1909 Criação das Escolas de Aprendizes Artífices
Marcos legais da educação 1937 Escolas de
Decreto Presidencial nº 7.566, de 23 de setembro de 1909 Aprendizes Artífices são
profissional transformadas em Liceus
De caráter assistencialista, prático e conclusivo, tinham o objetivo de “formar operários e contramestres, ministrando-se o ensino Industriais
prático e o conhecimento técnico necessários aos menores que pretenderem aprender um ofício”. Eram oferecidas oportunidades de
Historicamente, diferentes políticas públi- qualificação e de inclusão no mercado de trabalho (cada vez mais urbano e industrial), mas a educação oferecida era elementar e não Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937
cas relacionadas à Educação Profissional e previa ou mesmo estimulava que os jovens continuassem seus estudos.

Tecnológica contribuíram para gerar um dis-


tanciamento entre níveis de ensino, cenário
alterado apenas a partir de 2008.

1961 Primeira Lei 1946 Nova 1942 Liceus Industriais 1942 Criação do Senai
de Diretrizes e Bases Constituição se tornam Escolas e início do Sistema S
da Educação (LDB) Industriais e Técnicas
Constituição dos Estados Unidos do Brasil, Decreto-Lei nº 4.048, de 22 de janeiro de 1942
Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961 de 18 de setembro de 1946 Decreto nº 4.127, de 25 de fevereiro de
1942 O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), criado por
De acordo com a nova estrutura de ensino, o ciclo Determina a responsabilidade da União Getúlio Vargas e administrado pela Confederação Nacional da Indús-
colegial (atual ensino médio) era dividido entre curso para legislar sobre as diretrizes e bases A Escola Industrial e Técnica passa a tria, tinha como intuito acelerar a formação de profissionais para a
normal (voltado para a formação de professores), da educação nacional. oferecer formação em nível equivalente indústria. Foi a primeira organização de direito privado orientada
técnico (voltado para a formação de profissionais ao secundário, mas também sem acesso para o ensino profissional e vinculada a sindicatos patronais,
para o mercado de trabalho); e secundário (o único ao ensino superior. que compunham o que atualmente é conhecido como “Sis-
a oferecer acesso a qualquer carreira do ensino tema S”. Os cursos oferecidos tinham como finalidade a
superior). formação imediata de mão de obra para a indústria,
sem acesso ao ensino superior.

1971 Nova Lei de Diretrizes


e Bases da Educação (LDB)
Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 1982 O caráter obrigatório 1988 Nova Constituição 1996 Nova Lei de Diretrizes
O ciclo primário e o ginasial são incorporados ao
de profissionalização no Federal e Bases da Educação Nacional
1º grau (dobrando o ensino obrigatório de 4 para
ensino médio é extinto
Constituição da República Federativa do Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996
8 anos), e o 2º grau (antigo ciclo colegial) passa a
Lei nº 7.044, de 18 de outubro de 1982 Brasil de 1988
ser obrigatoriamente profissionalizante, com
Divide a educação formal em: ensino infantil (antiga pré-escola),
objetivo de terminalidade dos estudos.
O modelo estabelecido pela LDB de 1971 foi Estabelece a educação como direito fundamental (1ª a 8ª séries), médio (antigo segundo grau) e superior.
amplamente criticado, pois na prática faltaram de todos e dever do Estado, e aponta a Determina que o ensino médio poderá preparar o estudante para
recursos, abordagens pedagógicas, professores qualificação para o trabalho como um de o exercício de profissões técnicas, desde que sua formação geral
qualificados e infraestrutura. Os sistemas de seus objetivos (juntamente com o pleno também seja atendida. Também desobriga o Estado a oferecer tal
ensino não tiveram condições para implementar desenvolvimento da pessoa e seu preparo formação, que pode ser desenvolvida “nos próprios estabelecimen-
a formação técnica determinada pela lei. Além para o exercício da cidadania). tos de ensino médio ou em cooperação com instituições especiali-
disso, os conteúdos curriculares de formação geral zadas em educação profissional”. Determina ainda que “a educação
também foram enfraquecidos, resultando em uma profissional será desenvolvida em articulação com o ensino regular
precarização do ensino de cultura geral e em uma ou por diferentes estratégias de educação continuada, em institui-
maior dependência dos cursinhos para a prepa- ções especializadas ou no ambiente de trabalho”.
ração para o ensino superior.
9
1997 O ensino técnico é
dissociado do ensino médio
Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997

Estabelece que o ensino técnico permanece


voltado à capacitação para atividades produ-
tivas, sem vínculo com a formação ampla e
geral do estudante. A única vinculação entre
2008 Incorporação dos formatos 2007 Lançamento do programa 2004 Restabelecimento ensino médio e técnico era que o estudante
integrado, concomitante Brasil Profissionalizado do ensino técnico integrado só poderia cursar um curso técnico de forma
e subsequente à LDB ao ensino médio concomitante com o ensino médio, ou após a
Decreto nº 6.302, de 12 de dezembro de 2007 conclusão deste.
Lei nº 11.741, de 16 de julho de 2008
Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004
Instituído para fortalecer o ensino médio integra-
A nova redação da LDB determina que os diplomas de cursos do à educação profissional nas redes estaduais
Com a revogação do decreto de 1997, o ensino técnico
de educação profissional técnica de nível médio poderão de educação profissional, com ações que visem a
de nível médio pode ser oferecido na mesma instituição
habilitar ao prosseguimento de estudos na educação expansão, ampliação e modernização das escolas das
do nsino médio, contando com matrícula única para cada
superior, e que o conhecimento adquirido na educação redes estaduais de EPT, com o objetivo de expandir
aluno. O decreto não descarta a possibilidade da oferta
profissional e tecnológica, inclusive no trabalho, poderá ser e ampliar a oferta de cursos técnicos de nível médio,
dos cursos médio e técnico de forma concomitante (com
objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para principalmente do ensino médio integrado à educa-
matrículas distintas, seja na mesma instituição ou em ins-
prosseguimento ou conclusão de estudos. ção profissional e tecnológica.
tituições diferentes), ou de forma subsequente para quem
já tenha concluído o ensino médio.

2011 Criação do Pronatec


(Programa Nacional de Acesso
ao Ensino Técnico e Emprego)
Lei nº 12.513, de 26 de outubro de 2011 2017 Novo ensino médio 2018 Base Nacional Comum 2021 Diretrizes Curriculares
Curricular (BNCC) Nacionais Gerais para a Educação
Integra diversas políticas públicas voltadas para a Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017 Profissional e Tecnológica
EPT em um único programa, visando expandir as redes Documento do Comitê Gestor da Base Nacional
federal e estaduais de EPT; ampliar a oferta de cursos Promove uma ampla reforma do ensino médio. Comum Curricular e Reforma do Ensino Médio Resolução CNE/CP nº 1, de 5 de janeiro de 2021
a distância; ampliar o acesso gratuito a cursos de EPT Amplia a carga horária (de 2.400 para 3 mil horas);
em instituições públicas e privadas; ampliar as opor- passa a fomentar a ampliação das matrículas em Define o conjunto de aprendizagens essenciais a Estabelecem as regras norteadoras da EPT para todos os
tunidades de capacitação para trabalhadores de escolas de tempo integral; e incorpora itinerários serem desenvolvidas ao longo das etapas e mo- níveis, reforçando a articulação entre diferentes níveis,
forma articulada com as políticas de geração formativos à estrutura dos cursos, permitindo que o dalidades da educação básica e prevê a adoção estimulando a progressão dos estudos e proporcionando a
de trabalho, emprego e renda; e difundir estudante escolha os componentes mais alinhados de itinerários formativos para o nível médio – que flexibilização dos cursos em diálogo com as demandas do
recursos pedagógicos para a EPT. com seus interesses – incluindo a possibilidade de incluem a possibilidade de itinerários integra- mercado de trabalho contemporâneo.
formação técnica e profissional. dos de formação técnica e profissional.

10
Múltiplos desafios A combinação da automação de diversas
atividades com o aumento das exigências do Indicadores que ainda preocupam
Ao mudar o olhar em relação à educação pro- mercado de trabalho – profissionais capacita-
fissional e também considerar as demandas dos para atuar nos novos segmentos – tam-
contemporâneas, a suposta dualidade entre bém é fator de estímulo para que a educação O Brasil tem apresentado importan- 24 anos. Entre as pessoas que haviam
o ensino técnico e o ensino superior dá lugar profissional aconteça em caráter contínuo, tes avanços educacionais nas últimas concluído o ensino médio e que não
a uma perspectiva mais abrangente, mais progressivo. Além disso, debates em torno das décadas, e as oportunidades de con- estavam frequentando uma gradua-
inclusiva e mais proveitosa para os estudantes, políticas educacionais, com efeitos positivos na tinuação dos estudos no ensino supe- ção do ensino superior, 12,7% haviam
para as instituições de ensino, para os profis- legislação, evidenciam que todos os jovens têm rior aumentaram significativamente concluído algum curso técnico ou
sionais da educação, para o setor produtivo direito a uma educação integral e de qualidade, com a ampliação da rede pública curso de magistério (PNADc, 2019).
e para toda a sociedade. Com o mundo do que seja emancipatória e lhes possibilite proje- de universidades. Também houve
trabalho em constante transformação e com tar o futuro. A educação profissional não deve crescimento na oferta de vagas pelas
novas tecnologias mudando de modo veloz a se basear apenas nas habilidades técnicas, mas instituições privadas; consolidação
maneira como a sociedade vive, o investimento também nas habilidades sociais, emocionais, de políticas de cotas; surgimento da
em formações conclusivas não faz sentido e críticas e cidadãs, que fortalecem o espírito au- possibilidade de educação a distância
revela-se obsoleto. tônomo, ativo e empreendedor dos estudantes. (EAD); além de programas de finan-
Em todo o mundo, diversas ocupações estão Certamente, em um país marcado por uma ciamento como o Prouni (Programa
deixando de existir devido à automatização, e imensa desigualdade social como o Brasil, exis- Universidade para todos) e o Fies
muitas outras profissões surgem com a emer- tem outros desafios para além dos já citados. A (Fundo de Investimento Estudantil).
gência de tecnologias fundamentais para um oferta de cursos atualizados de acordo com as Mesmo assim, embora 89% dos
planeta cada vez mais conectado – inteligência novas exigências do setor produtivo e da socie- jovens entre 15 e 17 anos frequen- É importante salientar que a pouca articu-
artificial (IA), internet das coisas (IoT), pro- dade e, principalmente, a garantia de acesso a tem a escola, cerca de 23% deles lação entre a educação básica (mais especifica-
cessamento de dados em grande escala (big esses cursos, sobretudo a estudantes de baixa apresentam defasagem idade-série mente o ensino médio) e o ensino superior difi-
data) – a partir do aprendizado das máquinas renda, tornam-se vitais. E, além de formações ou abandonam os estudos, e 20% dos cultam a superação dos desafios educacionais
(machine learning). Embora o setor de tecnolo- adequadas e acessíveis, é necessário fazer com jovens entre 18 e 29 anos não com- brasileiros, mesmo considerando os melhores
gia seja aquele em que essas transformações que jovens vejam sentido nos estudos e sejam pletaram a educação básica (PNADc, cenários de conclusão da educação básica. Um
são mais facilmente perceptíveis, o impacto estimulados a continuar e a se aprimorar. Da- 2019). Segundo a Plataforma Juven- exemplo hipotético pode ajudar a ilustrar essa
dessas inovações e mudanças estão presen- dos educacionais recentes sugerem ainda que tude, Educação e Trabalho, no ano de desconexão entre os níveis educacionais.
tes em praticamente todos os segmentos do são imensos os desafios a serem enfrentados 2019, daqueles que finalizam o ensi- Imagine um jovem estudante interessado
mundo do trabalho – seja em decorrência dos para que a educação brasileira consiga atender no médio público, apenas 30,9% têm em atuar na área de tecnologia da informação
efeitos das novas tecnologias nas maneiras melhor às demandas da sociedade e do mundo aprendizagem adequada em Língua e comunicação, e que, por ter afinidade com
como as pessoas trabalham, seja devido às do trabalho em transformação. Portuguesa e 5,2% em Matemática. o tema, opta por um curso técnico na área, inte-
novas exigências e necessidades da sociedade. Além disso, a continuidade dos estu- grado com o ensino médio. Durante o curso, ele
Dessa forma, segmentos diversos demandam dos no nível superior é uma realidade desenvolverá tanto os conhecimentos e com-
cada vez mais novos perfis de profissionais só para 25,5% dos jovens entre 18 e petências técnicas necessários para se inserir
– da agropecuária à medicina, do comércio à no mundo do trabalho, quanto as competências
indústria, das finanças ao turismo etc. gerais, sociais, emocionais e criativas deman-

11
dadas pelo setor produtivo e pela vida, o que No momento da vida em que esse jovem está currículo e otimize o tempo de formação cessa, indo muito além do âmbito escolar for-
garantirá a ele uma formação ampla e conhe- conciliando sua agenda de estudos com a rotina após a passagem do ensino técnico de nível mal. Nesse contexto, compreende-se que todas
cimentos para que, posteriormente, possa de trabalho, ele pode se enxergar na situação médio para o ensino superior? as aprendizagens desenvolvidas ao longo dos
ingressar no ensino superior se quiser. Durante de voltar algumas casas no tabuleiro. Mesmo anos, nas diferentes etapas da vida, devem ser
o ensino médio, esse jovem acumulará com- que ele não desista do curso e siga no desenvol- • Como envolver o setor produtivo nos deba- reconhecidas, incorporadas e potencializadas
petências e certificações intermediárias que vimento de competências providas pelo curso tes para que, no momento de estabelecer na formação de pessoas cada vez mais críticas,
possibilitarão sua inserção imediata no merca- superior, essa eventual repetição de conteúdos vagas de trabalho para o nível técnico, não autônomas e seguras para fazer escolhas.
do de trabalho (onde ele colocará em prática os fará com que leve mais tempo para obter a titu- sejam exigidas competências relativas ao
conhecimentos que está aprendendo no curso); lação de nível superior, além de reforçar a visão tecnológico e que demandam experiência
desenvolverá novas competências e habilida- de desvalorização do ensino médio técnico. de vida que não são compatíveis com a de Aprendizagem ao longo
des; e terá acesso a uma remuneração que auxi- Algumas questões se impõem e se sobre- um adolescente? da vida
liará na composição da renda familiar ou trará põem:
alguma autonomia financeira enquanto estuda. As condições de acesso e de permanência no “É a ideia de educação permanente que
Convencido de que essa etapa é apenas • De que maneiras o ensino técnico pode ser ensino superior ainda são bastante desiguais no deve ser, simultaneamente, reconsiderada
o início de sua vida profissional, e que ao mais valorizado, reconhecido pela sociedade, país, mas vivemos hoje um momento propício, e ampliada; com efeito, além das neces-
terminar o ensino médio ele poderá prosse- pelos jovens e pelo mercado de trabalho? do ponto de vista da legislação educacional, sárias adaptações relacionadas com as
guir seus estudos, obtendo novas qualifica- para construir propostas que garantam uma mudanças da vida profissional, ela deve ser
ções profissionais ou prosseguindo no ensino • Como os estudantes do ensino técnico po- educação profissional de qualidade e conectada uma construção contínua da pessoa, de
superior (ampliando assim seus conhecimen- dem ser incentivados a perceber essa etapa com nosso tempo; e que ofereça condições para seu saber e de suas aptidões, assim como
tos e suas chances de ascensão na carreira), de sua aprendizagem como um primeiro que cada momento da vida do estudante seja de sua capacidade para julgar e agir. Ela
ele começa a estabelecer um projeto em que passo, de forma que se sintam estimulados sempre mais uma etapa de um processo que se deve permitir que cada um venha a tomar
consegue vislumbrar os próximos passos a e encorajados a prosseguir estudando? estende ao longo de toda sua vida. consciência de si próprio e de seu meio
serem dados. Ao ter clareza das suas opções, ambiente, sem deixar de desempenhar
decide ingressar no ensino superior. E é nessa • Qual deve ser o limite dos conteúdos e com- A perspectiva da aprendizagem sua função na atividade profissional e nas
hora que a desconexão entre os dois níveis de petências desenvolvidos no ensino técnico ao longo da vida estruturas sociais. (...) O conceito de edu-
ensino fica explícita: de modo geral, os conhe- para que seus currículos não sejam superes- cação ao longo da vida aparece, portanto,
cimentos prévios adquiridos durante o curso timados e “invadam” aspectos que seriam Apesar de no senso comum existir uma falsa como uma das chaves de acesso ao século
técnico não são considerados. Habilidades mais bem aprofundados no ensino superior? dicotomia que opõe a entrada imediata no mer- XXI. Ele supera a distinção tradicional entre
desenvolvidas profissionalmente em trabalhos cado de trabalho versus o tempo dedicado aos educação inicial e educação permanente,
dentro de sua área de atuação também são • Como equilibrar a abrangência dos conteú- estudos, a tendência mundial é a aprendizagem dando resposta ao desafio desencadeado
ignoradas. Caso esse egresso do curso técnico dos tratados no ensino superior consideran- contínua. O conceito de lifelong learning (apren- por um mundo em rápida transformação.”
deseje prosseguir, provavelmente precisará do tanto os estudantes oriundos do ensino dizagem ao longo da vida, em tradução livre
rever alguns conteúdos que já domina – e, se técnico como do ensino médio regular? para o português), surgido na Europa nos anos Educação: um tesouro a descobrir –
porventura tentar pleitear formalmente equi- 1970, mostra-se pertinente e vem ganhando Destaques. Comissão Internacional
valências ou avaliação de sua bagagem prévia, • Como desenhar e ofertar uma proposta cada vez mais relevância ao propor que nunca sobre Educação para o século XXI para
não encontrará mecanismos adequados e formativa articulada, que valorize conheci- é cedo ou tarde demais para aprender – e que a UNESCO (2010, p. 12 e 13).
padronizados para isso. mentos prévios, elimine sobreposições de a educação é um processo contínuo que nunca

12
Para o país conquistar uma mão de obra necessárias para o prosseguimento em etapas Experiências que podem inspirar terlocução entre diferentes níveis e garantir
qualificada é necessário que a educação pro- posteriores de estudo. o reconhecimento da experiência prévia do
fissional habilite os estudantes a desempenhar Nesse sentido, a educação representa uma Copiar ou importar experimentos de inte- estudante. E mesmo quando os sistemas
as competências e habilidades adquiridas ao possibilidade emancipatória concreta para o gração entre níveis e de articulações com o não apresentam soluções estruturais a esses
mesmo tempo em que estudam, de maneira jovem. Ela oferece ao estudante possibilidades, mundo do trabalho não é um bom caminho e desafios, há algumas experiências em curso e
concomitante e progressiva. A EPT pode ser insumos e caminhos para realizar escolhas tem grandes chances de não dar certo. Porém, estratégias específicas que também apontam
uma saída: os jovens entram no mercado de mais conscientes; e contribui para o entendi- aprender com outras experiências pode ser caminhos para garantir o diálogo entre os níveis
trabalho e asseguram uma renda mais ime- mento de que nenhum certificado ou título se inspirador e contribui para a construção mais e o aproveitamento de conhecimentos prévios.
diata, inserem-se em regimes laborais mais encerra em si mesmo. A aprendizagem com assertiva de propostas. Por isso, é útil conhecer No quadro apresentado na próxima página, é
formais e estruturados em torno de carreiras qualidade e sentido é um direito e uma ação como diferentes redes e modelos de ensino possível conhecer as soluções adotadas pelos
alinhadas à sua formação – que gradativamen- que levam à construção da autonomia e ao pelo mundo lidam com a questão do aprovei- sistemas de ensino australiano, sul-coreano,
te vai se tornando mais ampla. A experiência exercício da cidadania. tamento de conhecimentos prévios e como francês, português e singapurense (Itaú Edu-
acadêmica também se beneficia, uma vez que Para que a ideia do lifelong learning seja atuam para que as trajetórias de aprendizagem cação e Trabalho, 2020). Os sistemas de ensino
as vivências práticas do dia a dia estabelecem efetivamente contemplada é fundamental que de seus estudantes sejam mais factíveis, coe- possuem características e estruturas singulares
uma ponte mais sólida entre o que é aprendi- haja investimento em estudo contínuo por par- rentes e significativas. que buscam responder à problemática de cada
do na escola e o que é vivido concretamente te das redes de ensino, dedicadas a garantir a Em diversos países, o sistema educacional contexto, mas é possível observar que existem
no mundo do trabalho – em sintonia com a oferta de oportunidades para que os estudan- é concebido e estruturado para fomentar a medidas comuns ou similares, como a adoção
articulação entre teoria e prática prevista nas tes possam permanecer no ambiente escolar continuidade dos estudos, promover a in- do sistema de créditos para o aproveitamento
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educa- ou retornar a ele sempre que desejarem. Uma de estudos e a implementação de sistema de
ção Profissional e Tecnológica. das maneiras de aprimoramento da oferta é avaliação e certificação. Como característica
Na perspectiva do lifelong learning, o am- a possibilidade de articulação entre níveis, ou geral, é possível considerar que são sistemas
biente escolar deve ser interpretado como um seja, instituições de diferentes níveis garantin- que trabalham com a perspectiva da aprendiza-
espaço de referência para constante retorno, e do conjuntamente que as jornadas dos estu- gem ao longo da vida e oferecem uma estrutura
não apenas passagem – afinal, a educação for- dantes sejam mais significativas, em percursos de ensino-aprendizagem progressiva.
mal pode proporcionar novas aprendizagens, verticais, complementares e continuados.
permite atualização ou certificação de conhe- Mas, em uma realidade tão diversa e mul-
cimentos, além do desenvolvimento de novas tifacetada quanto a brasileira, como as redes
habilidades. Isso pode significar também que e instituições de ensino podem reconhecer e
tanto as competências desenvolvidas por meio valorizar aquilo que o estudante já sabe e atuar
da educação formal quanto outros saberes conjuntamente para oferecer uma proposta
adquiridos em experiências variadas, inclusive formativa articulada que otimize o tempo de
as laborais, uma vez avaliados e reconheci- formação do estudante e estimule a continui-
dos, podem se transformar nas certificações dade de seus estudos?

13
Um olhar para cinco sistemas de
ensino ao redor do mundo Portugal Singapura

Existe um Sistema Nacional de Créditos Como existem poucas instituições


Austrália Coreia do Sul de Ensino e Formação Profissional que de ensino no país, a integração entre
permite a flexibilização dos percursos for- institutos de educação técnica,
As instituições de ensino podem estabe- Há um sistema de banco de créditos onde mativos, assim como aproveitamento e/ou politécnicas e universidades é
lecer acordos de articulação para agilizar o estudante pode registrar suas experiên- transferência de créditos dentro de uma simplificada e estimulada. Há uma
o processo de aproveitamento de crédi- cias (tanto em ambientes de educação mesma qualificação, entre qualificações relação preestabelecida entre as
tos, que são registrados em um cadastro formal, quanto de experiências do mundo de mesmo nível de ensino ou até mesmo instituições para aproveitamento de
único do estudante. do trabalho). Os créditos obtidos nesse entre níveis diferentes. créditos de disciplinas.
sistema são obrigatoriamente reconheci- O governo oferece certificação para
O reconhecimento de experiência de vida dos pelas instituições de ensino superior. Há instituições especializadas em quali- experiências de vida em atividades in-
é regulamentado por lei e pode ocorrer ficação de adultos que são responsáveis dustriais de precisão validadas por meio
por meio de diferentes formatos, como Há uma lei que determina que todas as não apenas pela oferta de educação, for- de provas.
análise de portfólio, carta de recomenda- instituições devem ter um processo para mação e orientação, como também pela
ção do empregador, carteira de trabalho, avaliar a possibilidade de reconhecimen- validação e certificação de competências,
vídeos demonstrativos, entrevista, execu- to de créditos, além de definir em quais que, registradas em um “passaporte”,
ção de atividade em local de trabalho ou situações deve-se simplesmente transfe- permitem a visualização dos próximos
em local simulado. rir o crédito. caminhos possíveis de serem trilhados.

França AUSTRÁLIA COREIA DO SUL FRANÇA PORTUGAL SINGAPURA

A validação de créditos, competências,


Possui um documento nacional instituindo as habilidades/competências
conhecimentos e habilidades é feita por que se espera de cada curso, componente e/ou nível?
comissões estabelecidas pelas institui-
ções de ensino. O aproveitamento ocorre Possui uma lei nacional sobre as necessidades das instituições de ensino
mediante avaliações individuais. reconhecerem/validarem experiências previamente adquiridas?

Possui um sistema que auxilia os indivíduos a traçarem seus próximos pas-


Há um processo de validação de expe- sos (obtendo certificações ou buscando estudos complementares) a partir Educação Profissional e
dos conhecimentos prévios e anseios profissionais? Tecnológica: um olhar
riências anteriores em que o candidato é para cinco sistemas de
submetido a um júri de avaliação com- Possui um programa para qualificação e/ou certificação da força de traba- ensino ao redor do mundo.
lho com incentivo para empresas e indivíduos? Itaú Educação e Trabalho,
posto por membros do setor produtivo e 2021. https://www.itaue-
de instituições de ensino. ducacaoetrabalho.org.br/
O governo está fazendo/fez mudanças no ensino vocacional e técnico de documents/itau_educa-
modo que ele seja mais reconhecido na sociedade? cao-profissional-e-tecno-
logica.pdf

14
A experiência desses países deve ser vista Um dos resultados esperados dessa arti- Na prática, isso significa que cursos dos tências e habilidades adquiridos anteriormente
como um conjunto de inspirações no qual é culação é que as instituições de ensino reco- diferentes níveis podem ser articulados de possam ser avaliados e aproveitados no ingres-
possível se debruçar para buscar e construir nheçam a multiplicidade de trajetórias pre- maneira a compor um itinerário de formação so no ensino superior.
respostas próprias aos desafios colocados gressas de seus estudantes e trabalhem com contínua que ofereça ao estudante a possibi- Isso já acontece de modo regular no ensino
no Brasil. a possibilidade de validação e aproveitamento lidade de otimizar o tempo de aprendizagem superior, isto é, em migrações de estudantes
dos conhecimentos e das habilidades que eles caso opte por seguir os estudos dentro da entre instituições. Uma das soluções, conheci-
Por trajetórias contínuas e trazem consigo. Um caminho bastante plausí- mesma área temática (por exemplo, um estu- da como aproveitamento de estudos, ocorre
significativas vel para que isso comece a ser experimentado dante que se forma em um curso técnico em quando o estudante que já passou por outro
é, por exemplo, a articulação dos currículos dos química possivelmente teria estudos passíveis curso superior (na mesma ou em outra institui-
Nos últimos anos, algumas redes estaduais de cursos superiores com os currículos de cursos de serem aproveitados ao ingressar em um ção) solicita a dispensa de componentes curri-
ensino brasileiras, amparadas e estimuladas pe- técnicos dentro de trilhas estruturadas, como curso superior de química ou engenharia quí- culares já cursados, mediante apresentação de
las mudanças na legislação, vêm desenvolvendo vem sendo feito em São Paulo na experiência mica). Os itinerários, no entanto, não precisam documentação oficial em que conste a ementa
estratégias e soluções para reduzir a pouca arti- do Centro Paula Souza, foco deste livro, que ser formados por trilhas únicas e lineares: eles dos conteúdos ministrados e comprovante de
culação entre os níveis de ensino, em especial o será detalhada no próximo capítulo. podem contemplar múltiplas possibilidades de aprovação. Há então uma análise dos docu-
ensino técnico de nível médio e o ensino supe- trajetos, que o estudante pode escolher dentro mentos para homologar ou não ao aluno o di-
rior. Com isso, pretendem oferecer possibilida- de uma mesma área, de acordo com suas reito de prosseguir o curso sem necessidade de
des concretas para a construção de trajetórias preferências, aptidões e oportunidades que lhe cursar aquela disciplina novamente. Também
educacionais mais contínuas. São implemen- sejam oferecidas. Um estudante de um curso há a avaliação para aproveitamento, situação
tações ainda iniciais e intimamente ligadas a técnico em edificações poderia prosseguir em que o estudante solicita a dispensa de uma
questões, prioridades e desafios específicos que seus estudos tanto na área de engenharia civil, matéria e é submetido a uma prova que indica-
cada rede de ensino vivencia. Partem da com- como de arquitetura, por exemplo. rá se ele poderá eliminar aquele componente.
preensão de que é preciso articular sistemas e Essas conexões entre o ensino técnico de
instituições de diferentes níveis de ensino, tanto nível médio e o superior podem acontecer de
para a construção de jornadas significativas diversas maneiras, conforme cada contexto.
para o estudante, quanto para a busca conjunta Além de novos modos de compreender e de-
de soluções que possam mitigar sobreposições senvolver os currículos, é necessário pensar em
e eventuais repetições de conteúdos em etapas ferramentas para que conhecimentos, compe-
de um mesmo percurso formativo.
A experiência vem demonstrando que isso
pode ser alcançado por meio de propostas
articuladas, de trocas de experimentos e com a
ajuda de um arcabouço metodológico facilita-
dor da aproximação entre os níveis de ensino.
Além do protagonismo e do engajamento das
redes e instituições de ensino, também são
importantes o apoio e a parceria de diversos
atores da sociedade.

15
Em ambos os casos, é necessário que o De forma prática, esse tipo de solução pode estudante efetivamente sabe fazer após a con- terminadas tarefas, antes mesmo de concluir o
estudante solicite o aproveitamento, separe acontecer ao menos de duas maneiras (que não clusão de determinado componente curricular curso. Assim, as grandes certificações obtidas
a documentação exigida ou se prepare para a são excludentes e, inclusive, podem ocorrer ou de determinado semestre – são essas com- ao longo da vida escolar seriam o reflexo da
realização das avaliações. Nas duas situações simultaneamente): petências adquiridas que determinarão o que soma de competências desenvolvidas gradual
o estudante depende também da discricio- poderá ser aproveitado na etapa posterior. e progressivamente – acumuladas e agrupa-
nariedade das instituições ou das pessoas Validação de créditos: garantia de aprovei- Nessa perspectiva, o processo de articulação das no fim de cada etapa, mas contabilizadas
responsáveis pela avaliação de seu conheci- tamento de estudos entre níveis diferentes, entre os níveis para a oferta de trajetórias mais também no processo.
mento, correndo o risco de ter as requisições de modo que as competências e habilidades significativas e contínuas também pode ser A organização das competências e a compa-
negadas devido a decisões eventualmente desenvolvidas em um determinado curso estruturado em torno do desenvolvimento de ração do peso de cada competência entre os
subjetivas. Por fim, são processos que em técnico são aproveitadas no curso superior de competências, criando uma linguagem comum e níveis pode ocorrer por meio de créditos. Os
geral levam algum tempo, já que a instituição tecnólogo ou bacharelado, resultando em uma capaz de integrar e compatibilizar os currículos créditos funcionam como unidades de medida
de ensino, a cada solicitação individual de trajetória reduzida e otimizada em benefício da das diferentes instituições e níveis de ensino. para a “tradução” de um determinado conjun-
aproveitamento, precisa destacar profissionais aprendizagem do estudante. A estruturação dos conteúdos curriculares to de competências de um nível para o outro,
(docentes e administrativos) para executar as em torno das competências desenvolvidas além de mensurarem a carga horária neces-
validações necessárias ou a para a realização Modo progressivo: cursos técnicos de nível pode ainda facilitar a emissão de certificações sária para desenvolver cada competência no
dos exames. médio e cursos de nível superior são conce- parciais que atestem para o setor produtivo currículo de cada curso.
Essas soluções de aproveitamento, que bidos como partes integrantes de um único que o estudante está apto a desempenhar de-
já não são simples entre instituições de um percurso formativo, construído de forma que
mesmo nível, enfrentam desafios muito maio- as competências sejam desenvolvidas gra-
res quando se considera a passagem entre o dualmente ao longo de ambos os cursos, sem
O sistema europeu de
ensino técnico e o ensino superior. É preciso sobreposições de conteúdo. transferência e acumulação de créditos). Pelo ECTS, todos os com-
pensar, portanto, de que maneira o aprovei- de créditos ponentes de um programa de estudo
tamento pode acontecer entre os diferentes Pode ser uma premissa importante para a recebem uma quantidade de créditos a
níveis e, além disso, como se pode torná-lo construção de soluções o entendimento de que serem obtidos pelo estudante de acordo
mais automático, ou seja, sem que o estudante um percurso formativo não é composto apenas Um exemplo de sistema de créditos é o com a carga de trabalho necessária para
precise requisitá-lo em caráter excepcional. pelos diplomas obtidos ao término de cada sistema universitário europeu, baseado a conclusão de cada componente. Os cri-
Um cenário possível seria aquele em que etapa ou pela quantidade de componentes cur- em validações de conjuntos de compe- térios para a avaliação da aprendizagem e
o estudante sai de um curso técnico, ingres- riculares cursados, mas principalmente pelas tências. Com a implementação da zona do obtenção dos créditos são de autonomia
sa em um curso superior dentro do mesmo competências desenvolvidas e aprimoradas ao euro, em 1999, os ministros da Educação das universidades, mas, uma vez obtidos,
percurso formativo e, como ambos os cursos longo de todo o trajeto. de diversos países europeus assinaram o são válidos para qualquer universida-
foram concebidos ou reestruturados para fa- A oferta de itinerários formativos contínuos Acordo de Bolonha (1999), que buscava de participante do acordo – sem que o
zer parte de um mesmo itinerário (com diálogo com base em competências e elaborados em facilitar a circulação e o intercâmbio de estudante precise revalidá-los, cursando
efetivo entre os níveis), os seus conhecimentos dinâmica progressiva entre os níveis possibilita estudantes universitários entre as uni- novamente componentes que já tenha
pregressos são reconhecidos e aproveitados que os currículos de diferentes níveis e cursos versidades, e que tinha como um de seus cursado ou realizando qualquer tipo de
como parte do curso superior – e o estudante possam ser comparados, e que as sobreposi- principais instrumentos o ECTS (sistema avaliação para atestar seu conhecimento.
é dispensado de cursar disciplinas com con- ções de conteúdos possam ser identificadas. europeu de transferência e acumulação
teúdo repetitivo para ele. Trata-se de uma medida para aquilo que o

16
Uma vez implementadas soluções efetivas de estabelecer os parâmetros necessários experiências de promoção de itinerários contí- de itinerários formativos flexíveis (Capítulo
de articulação entre diferentes níveis, abre-se para identificar a correspondência entre as nuos possam germinar nos sistemas de ensino III) e o aproveitamento de estudos – incluin-
caminho para a elaboração de estratégias para competências previstas em cada currículo e brasileiros (veja quadro abaixo). Destaca-se, do conhecimentos adquiridos em diferentes
reconhecimento, avaliação e aproveitamento os instrumentos que possibilitem a aferição sobretudo, a resolução que define as Diretrizes níveis (Capítulo XIV). A resolução orienta ainda
de conhecimentos desenvolvidos dentro e fora desses conhecimentos para além das articula- Curriculares Nacionais Gerais para a Educação a estruturação dos currículos em torno do
do ambiente escolar (como aqueles adquiridos ções curriculares. Profissional e Tecnológica5, de 5 de janeiro de desenvolvimento de competências em todos
em cursos livres ou por meio da experiência no Do ponto de vista das políticas públicas e 2021. Sua redação torna mandatório critérios os níveis de ensino, e reforça a importância da
mercado de trabalho, por exemplo). O principal normativas que regulam e ajudam a regimentar para o reconhecimento de saberes anteriores construção conjunta das soluções e iniciativas
desafio em todos os casos é construir pre- esses processos, as legislações nacionais mais (Art. 30, inciso VI). Além disso, o documento junto ao setor produtivo.
viamente uma estrutura de validação capaz recentes são favoráveis para que diferentes detalha as orientações para a implementação

Principais dispositivos legais favoráveis a estratégias de Itinerários contínuos


passando pela Educação Profissional Técnica
de Nível Médio, até a especialização técnica de
2021 Diretrizes Curriculares
nível médio, se for o caso, bem como a Educa-
ção Profissional Tecnológica, de graduação e
Nacionais Gerais para a Educação
1996 Lei de Diretrizes e Bases 1997 Parecer do Conselho 2012 Parecer do Conselho pós-graduação” (p. 44). Profissional e Tecnológica
da Educação Nacional Nacional de Educação Nacional de Educação

Resolução CNE/CP nº 1, de 5 de janeiro de 2021


Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (inclui Parecer CNE/CES nº 776/97, aprovado em 3 de Parecer CNE/CEB nº 11/2012, aprovado em 9 de 2017 Novo Ensino Médio
atualizações posteriores). dezembro de 1997 maio de 2012 • Aponta, entre os princípios norteadores da
Educação Profissional e Tecnológica:
Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017
• Determina que o currículo do ensino médio • Recomenda que os currículos do ensino superior • Propõe o projeto de resolução que define as – a articulação com o setor produtivo para a
deve ser composto pela BNCC e por itinerários sejam estruturados de forma a evitar que os Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação construção coerente de itinerários formativos
Inclui formação técnica e profissional como uma
formativos, organizados por meio da oferta de cursos de graduação se prolonguem desneces- Profissional Técnica de Nível Médio (que viriam a (Art. 3, inciso I);
das possibilidades de itinerários formativos dis-
diferentes arranjos curriculares (Art. 36). sariamente (tópico 3 do Voto dos Relatores). ser oficialmente publicadas em janeiro de 2021). – a autonomia e a flexibilidade na construção
poníveis para a escolha dos estudantes de acordo
• Estabelece que os cursos de educação profis- • Recomenda que sejam reconhecidos conheci- • Determina que em todas as modalidades de cur- de itinerários formativos profissionais diver-
com seus interesses e suas aptidões.
sional e tecnológica poderão ser organizados mentos, habilidades e competências adquiridas sos de EPT, as instituições educacionais devem sificados e atualizados (Art. 3, inciso XV); e
por eixos tecnológicos, possibilitando a cons- fora do ambiente escolar, inclusive as que se adotar a flexibilidade, a interdisciplinaridade, a – o fortalecimento das estratégias de cola-
trução de diferentes itinerários formativos referiram à experiência profissional julgada contextualização e a atualização permanente boração entre os ofertantes de Educação
(Art. 39, parágrafo primeiro). relevante para a área de formação considerada de cursos, currículos e programas, bem como 2018 Base Nacional Comum Profissional e Tecnológica (Art. 3, inciso XVIII).
• Assegura a validade do diploma do ensino téc- (tópico 6 do Voto dos Relatores). garantir a identidade, a utilidade e a clareza na Curricular (BNCC) • Detalha as orientações para a implementação de
nico para o prosseguimento rumo ao ensino identificação dos perfis profissionais de conclu- itinerários formativos flexíveis (Cap. III).
superior (Art. 36-D). são dos cursos, programas e correspondente • Torna mandatória a existência de critérios para o
• Garante que o conhecimento adquirido na organização curricular, que deve ser concebida Documento do Comitê Gestor da Base Nacional aproveitamento de conhecimentos e experiên-
educação profissional e tecnológica, inclusive de modo a possibilitar a construção de itinerários Comum Curricular e Reforma do Ensino Médio cias anteriores, inclusive para reconhecimento
no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, formativos que propiciem contínuos e articulados de saberes e competências (Art. 30, Cap. VII);
reconhecimento e certificação para prosse- aproveitamentos em estudos posteriores (p. 45). • Determina que a educação deve ser orientada além de detalhar orientações para o aproveita-
guimento ou conclusão de estudos (Art. 41). • Interpreta o art. 42 da LDB e também se ma- a partir das competências e habilidades que se mento de estudos – incluindo conhecimentos
nifesta sobre o Pronatec: “Nessa modalidade espera que os estudantes desenvolvam ao longo adquiridos em diferentes níveis (Cap. XIV).
livre, não deve ser abandonada, entretanto, a das diferentes etapas de sua formação (p. 14). • Orienta a estruturação dos currículos em torno
perspectiva de associação com a elevação dos • Prevê a adoção de itinerários formativos para do desenvolvimento de competências em todos
níveis de escolaridade dos participantes, bem o nível médio, incluindo a possibilidade de os níveis de ensino (Art. 23; Art. 30, inciso V).
como a estruturação dos cursos por itinerários itinerários integrados de formação técnica e
formativos iniciados na qualificação profissional, profissional (p. 477)
5
Resolução CNE/CP nº 1, de 5 de janeiro de 2021. Disponível em:
https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-cne/cp-n-1-de-5-de-
janeiro-de-2021-297767578.

17
Itinerário contínuo: uma síntese Sem a pretensão de se configurar como uma
Itinerário contínuo solução pronta ou única, a ideia de pensar
A defesa de um itinerário contínuo para a for- e fomentar itinerários contínuos, mais bem
mação dos estudantes emerge da confluência definida no plural, pode ser vista como um
de fatores e de referências, como o conceito Ideia-conceito que tem como objetivo convite à articulação e ao esforço conjunto
lifelong learning; de experiências internacio- ampliar as perspectivas de acesso e de redes de ensino, em seus diferentes níveis,
nais inspiradoras; de dispositivos legais re- permanência dos estudantes de EPT no • aproximar formalmente as institui- e parceiros públicos e privados, que podem
gulatórios; da visão da Educação Profissional ensino superior por meio da criação de ções de ensino técnico e superior, apoiar tecnicamente essas iniciativas. Trata-se
e Tecnológica como um processo de ensino-­ percursos significativos, coerentes e oti- conectando os níveis de ensino; de um trabalho em progresso que busca es-
aprendizagem que se deseja emancipatório; e mizados, e da mitigação de sobreposições tratégias para otimizar o tempo de formação
de processos colaborativos e soluções que vêm de conteúdos entres os níveis de ensino. • construir matrizes curriculares do estudante; para permitir que ele construa
sendo experimentados por redes do sistema de De natureza plural por excelência, articuladas entre ensino técnico e um percurso formativo mais significativo; para
ensino brasileiro. itinerários contínuos podem ser coloca- superior; valorizar os aprendizados desenvolvidos no
dos em prática de diferentes maneiras • estabelecer mecanismos de aprovei- ensino técnico em nível médio; e para aproxi-
e de acordo com cada realidade local. tamento, validação e reconhecimento mar a formação dos jovens às necessidades do
Portanto, não existem receitas ou fór- de competências entre os níveis; mundo do trabalho no século XXI.
mulas prontas. Em comum, a construção A expectativa é de que a implementação de iti-
de itinerários contínuos pode ter como • incentivar os estudantes a continua- nerários contínuos resulte em frutos importan-
resultados esperados: rem seu processo formativo, seja na tes, como a otimização dos recursos públicos
EPT, seja no ensino superior, mesmo
destinados à educação; a valorização da for-
após entrada no mercado de trabalho;
mação técnica; o estímulo para estudantes que
• otimizar a trajetória dos estudantes pretendem prosseguir rumo ao nível superior;
entre o ensino técnico de nível médio a aceleração dos processos formativos sem
e o ensino superior; perda de qualidade; e a diminuição da evasão.
No próximo capítulo, serão apresentados so-
• aumentar o número de egressos do
luções, experiências e caminhos que o Centro
curso técnico de nível médio no ensi-
Paula Souza vem buscando para construir
no superior;
itinerários contínuos entre sua oferta de cursos
• reduzir a evasão no ensino superior; técnicos de nível médio e cursos tecnológicos
de nível superior no estado de São Paulo.
• valorizar a educação profissional de
nível médio e aumentar o número de
alunos do ensino técnico;

• proporcionar maior integração entre


a EPT e o setor produtivo.

18
Capítulo 2 “Queremos que o ensino técnico seja só o primeiro
passo na trajetória formativa do estudante, e que ele
perceba que não é uma opção excludente da possi-

Programa Trilhas bilidade de cursar o ensino superior. Na verdade, é o


contrário: o ensino técnico deve ser uma forma de esti-
mular sua entrada no mercado de trabalho e, também,
Profissionais, o itinerário a continuação dos estudos no ensino superior no eixo
cursado no ensino técnico. Ficamos empolgados com a

contínuo em São Paulo ideia do itinerário contínuo, que permite ao aluno que
faz o curso técnico aproveitar parte daquele conteúdo
no ensino superior.”

Daniel Barros
Subsecretário e coordenador de Ensino Técnico,
Tecnológico e Profissionalizante da Secretaria de
Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo

O itinerário contínuo é atualmente uma realidade que se consolida no


estado de São Paulo. Desde 2020, está em desenvolvimento o programa Tri-
lhas Profissionais, com foco em uma formação técnica que garanta melhoria
no aproveitamento do tempo escolar do estudante e otimize, sem perda
de qualidade, a formação de novos profissionais. A instituição responsável
por essa iniciativa é o Centro Paula Souza, autarquia do Governo do Estado
vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE). Fundado em
1969 e com reconhecida trajetória na oferta de cursos superiores de tecno-
logia e de ensino profissional técnico de nível médio, o Centro Paula Souza
atualmente administra 223 Escolas Técnicas Estaduais, de nível médio
(Etec) e 73 Faculdades de Tecnologia, de nível superior (Fatec), presentes
em todo o estado.

19
Esforços conjuntos: o nascimento mental pautar-se em processos dialógicos de
O Centro Paula Souza6 do programa trilhas profissionais interação e negociação entre os envolvidos,
No tempo com ajustes e refinamentos sucessivos na
• Fundado em 1969, com o objetivo de construção dos itinerários contínuos para os
Em números iniciar a implementação de uma rede de “A gente vem há anos trabalhando para estudantes. Além do apoio para a estruturação
• 368 municípios paulistas cursos superiores de tecnologia (com tornar a articulação dos níveis [médio do programa, o IET também fornece suporte
• 223 Etecs duração de dois a três anos). Primeiras e superior] mais eficiente. A legislação operacional, com equipe de acompanhamento
• 212 cursos técnicos Fatecs: Sorocaba e São Paulo. já permite isso há muito tempo. Mas se das atividades, gestão do cronograma e das
• 228 mil estudantes de nível médio • Em 1980, com a incorporação de seis está na lei, se é permitido, por que não entregas e articulação de todos os atores.
• 73 Fatecs escolas que integravam um convênio for- acontece na prática? Porque o processo A excelência e longa experiência do Centro
• 89 cursos superiores tecnológicos de mado por governos das esferas federal, é complexo, envolve uma articulação Paula Souza na oferta de cursos de Educação
graduação, de pós-graduação e de estadual e municipal, passou a ser res- entre os diferentes níveis, é preciso Profissional e Tecnológica tornam o desenvol-
atualização tecnológica ponsável também pela oferta de ensino entender a contribuição de cada nível, vimento do programa uma oportunidade para
• 94 mil alunos de nível superior técnico de nível médio. quais são as competências desenvolvi- experimentar alternativas de integração entre
• Desde sua fundação, teve uma grande das, e como elas poderiam ser aprovei- os currículos dos diferentes níveis e acumular
trajetória de expansão, com a criação de tadas no nível subsequente.” aprendizados sobre essas articulações. Por
novas faculdades em todo o estado de São tratar-se de uma instituição que oferece cursos
Paulo, incorporação de outras escolas téc- Hugo Ribeiro de Oliveira de referência tanto no nível técnico como no
nicas à sua rede e inauguração de novas Professor do Centro Paula Souza e nível superior, a expectativa desde o início era
escolas técnicas, que já nascem perten- participante do grupo de trabalho do que as conversas para articulações entre níveis
centes à rede do Centro Paula Souza. Trilhas Profissionais fossem facilitadas. Um programa que visa à
• Em 1994, com a integração de 82 escolas integração entre cursos de nível técnico/mé-
técnicas que eram administradas pela dio e de nível tecnológico/superior requer alto
Secretaria da Educação, o Centro Paula grau de interlocução entre escolas e faculda-
Souza passou oficialmente a responder O Trilhas Profissionais nasce de uma parce- des, processo que pode encontrar resistências
integralmente pelo ensino técnico públi- ria firmada entre a SDE, o CPS e o Itaú Educa- e desafios adicionais quando as instituições
co paulista. ção e Trabalho (IET) em 2019. Sob intendência funcionam de forma independente (cada uma
• Hoje sua rede conta com cursos voltados da SDE, o CPS é responsável pela metodologia com sua gestão, seus regimentos próprios e
a todos os setores produtivos, públicos e e pelo desenvolvimento do programa e conta agendas institucionais).
privados. As Etecs também oferecem cur- com o apoio do IET – que traz para a iniciativa
sos de especialização técnica e educação boas práticas e modos de fazer desenvolvidos
para jovens e adultos (EJA); as Fatecs, em diferentes projetos educacionais realizados
além de cursos de graduação tecnológica, em parceria com outros estados, além de estu-
possuem cursos de pós-graduação, atua- dos de referências inspiradoras e marcos legais
6
Fontes: Site do Centro Paula Souza. Disponível em: https://www. lização tecnológica e extensão. sobre o tema.
cps.sp.gov.br/sobre-o-centro-paula-souza/ e https://www.cps.
sp.gov.br/ cps-comemora-50-anos-de-pioneirismo-no-ensino-pro-
A implementação do programa, ainda em
fissional/. Acesso em 10 jun. 2021; Fiala, 2016. andamento, tem como característica funda-

20
Outros aspectos também podem ser consi- Primeiros passos: diferentes níveis de formação e, ao mesmo
derados favoráveis à implementação do Trilhas definindo os caminhos tempo, contemplassem os dispositivos legais e
Profissionais e valem ser mencionados: (i) o CPS o regimento interno de cada ente de ensino en-
possuir corpo técnico altamente especializado, A partir da parceria estabelecida em 2019, foi volvido. Às pesquisas sobre a legislação nacio-
atualizado em relação às demandas do setor instituído um grupo decisor (GD), composto nal e marcos regulatórios que já vinham sendo
produtivo, com experiência no desenvolvimen- por representantes da SDE, do CPS e do IET, desenvolvidas pelo IET, somou-se a ampla ex-
to de currículos por competência; (ii) já estar responsável por dar andamento ao programa periência e conhecimento do CPS, habituado às
em curso um esforço ativo da atual superin- Trilhas Profissionais. De caráter deliberativo e determinações legais sobre o tema e com seu
tendência do CPS para aproximar as Fatecs e com gerência sobre todas as ações relacionadas próprio regimento interno para a elaboração
as Etecs sob sua gestão; e (iii) a existência de ao programa, a primeira atribuição do grupo de matrizes curriculares. Além disso, as discus-
experiências anteriores de articulação entre consistiu em definir as linhas mestras dos tra- sões também foram apoiadas por uma extensa
níveis – como o programa AMS (vide box). balhos, pensando em como, estrategicamente, pesquisa de referências internacionais realizada
os currículos poderiam ser articulados para pelo IET (conforme apresentado no capítulo
compor trilhas profissionais que perpassassem anterior, p. 14), que contemplou a forma como
os sistemas educacionais estão estruturados
em um sentido mais amplo, os mecanismos
A experiência do Programa AMS utilizados para o aproveitamento de créditos, Inicialmente, o principal desejo era criar um
competências e conhecimentos pregressos dos sistema geral de créditos para todo o CPS, de
estudantes e como cada sistema interage com modo que todas as competências desenvolvi-
O programa Trilhas Profissionais não é a modelo tradicional. Outro diferencial o setor produtivo. das e os aprendizados adquiridos em quaisquer
primeira iniciativa do CPS voltada para é que a passagem de um nível para cursos oferecidos pela instituição (independen-
a integração entre diferentes níveis. outro acontece sem a necessidade de temente do nível) pudessem ser identificados,
Desde 2018, a instituição também vestibular. Em linhas gerais, a construção reconhecidos e validados, e que esses créditos
vem desenvolvendo o programa AMS do AMS consistiu na identificação de dois Grupo decisor pudessem ser aproveitados em formações
(Articulação da Formação Profissional cursos já existentes em áreas afins (um Responsabilidades posteriores dentro da mesma área. Para isso, a
Média e Superior). O AMS prevê uma no nível médio técnico e outro no nível • Validar equipe do projeto, objetivo e inspiração eram as referências internacionais
trajetória única, de cinco anos de superior) e, por meio de uma minuciosa escopo. analisadas e, mais especificamente, o siste-
duração: nos três primeiros o aluno análise de currículos, na eliminação • Validar conceitos básicos. ma de créditos europeu (ver quadro na p. 16).
cursa o ensino médio com habilitação das sobreposições de competências • Validar as trilhas profissionais que Entretanto, durante as análises iniciais perce-
profissional em técnico, e nos dois desenvolvidas que se repetiam entre serão analisadas. beu-se que contemplar a totalidade dos cursos
últimos realiza a formação de nível os dois níveis. Atualmente, o programa • Validar cronograma. oferecidos inviabilizaria uma rápida imple-
superior tecnológico, reduzindo em é oferecido em quatro cursos e • Validar certificações intermediárias e mentação. O tempo necessário para elaborar
um ano o tempo total necessário áreas de formação: Administração, finais. o sistema em si e para definir os critérios para
para se obter um certificado de nível Desenvolvimento de Sistemas, Logística • Validar modelo de aproveitamento de a validação destes créditos revelava-se mais
superior, quando comparado com o e Química. competências nos diferentes níveis extenso do que o imaginado. A quantidade de
educacionais (médio e superior). currículos que precisariam ser analisados e
revistos também era volumosa.

21
Assim, com vistas a um desenvolvimento A escolha da área de referência para o pilo-
Setor de tecnologia da
factível no tempo, decidiu-se pela redução do to teve como base o diagnóstico da SDE de que informação no Brasil8
processo à construção de trilhas profissionais o campo da tecnologia da informação possui
em três áreas de conhecimento (tecnologia da alta demanda por profissionais qualificados,
informação, gestão, turismo). Contudo, com o não totalmente atendida pelas instituições de 46 mil formandos ao ano com perfil tec-
aprofundamento das discussões, mesmo esse educação profissional. Um estudo realizado nológico no ensino superior.
recorte em três áreas se apresentou maior e pela Associação das Empresas de Tecnologia
mais exigente do que o previsto. Por isso, a da Informação e Comunicação e de Tecnologias Mercado demanda 70 mil profissionais
partir de análises criteriosas, optou-se por Digitais (Brasscom)7 apontava que, a cada ano, por ano e muda rapidamente: é necessá-
concentrar os esforços em uma única área, a no Brasil, são abertas 70 mil novas oportu- ria a atualização constante dos currículos
de tecnologia da informação. Passou a reger nidades de trabalho no segmento, enquanto sob o risco de estarem sempre defasados.
os trabalhos a perspectiva de que realizar apenas 46 mil profissionais são formados em
um piloto com apenas uma área permitiria cursos superiores de tecnologia anualmente. Descasamento geográfico em relação ao
implementar e testar soluções que, uma vez Ademais, a velocidade com que novas tecno- mercado profissional: o estado de São
validadas na prática, poderiam ser posterior- logias são criadas ou atualizadas aumenta a Paulo, por exemplo, emprega 42,9% dos
mente replicadas e aprimoradas em cursos de necessidade de que a formação dos profissio- profissionais do setor, mas forma apenas
outras áreas. nais seja sempre continuada. 36,1% dos profissionais de perfil tecno-
lógico no ensino superior.

“[A área de tecnologia da informação] é, talvez, o único setor sobre o qual 7, 8


Brasscom, Relatório Setorial 2019.
conseguimos dizer com segurança que há mais vagas abertas do que pro-
fissionais qualificados para preenchê-las. Além disso, é um mercado que
muda muito – é preciso atualização constante dos currículos. As linguagens
de programação são atualizadas, mudam as demandas por programadores,
gestores de projetos em TI, profissionais de design, de experiência do usuá-
rio. Isso muda muito rapidamente, e por isso vale a pena investir em modelos
inovadores para esta área.”

Daniel Barros
Subsecretário e coordenador de Ensino Técnico,
Tecnológico e Profissionalizante da Secretaria de
Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo.

22
Mão na massa: análise e Com o escopo inicial do programa Trilhas O fato de o Centro Paula Souza já trabalhar
elaboração de trilhas e currículos Profissionais definido, em meados de 2020, foi Grupo de trabalho com o desenvolvimento de currículos por com-
constituído um grupo de trabalho (GT), com- Responsabilidades petências no nível médio também contribuiu
posto de dois professores do ensino técnico • Definir conceitos básicos. para que o início das atividades prescindisse
(professores Fernando Gianni e Hugo Oliveira, • Definir as trilhas profissionais que de uma etapa de familiarização com alguns
“Para arquitetar uma matriz curricular, apoiados pelo professor Gilson Rede) e dois serão realizadas. dos conceitos e premissas-chave para a imple-
é preciso ter uma relação com o mundo professores do ensino superior (professores • Descrever as competências necessá- mentação de itinerários contínuos. É impor-
do trabalho daquele segmento, definir Ana Cláudia Oliveira e Rogério Bezerra Costa, rias para cada trilha formativa. tante notar que para o GT funcionar com foco
o perfil do profissional a ser formado e apoiados pelo professor André Braun), todos do • Relacionar as trilhas e profissões e os e autonomia, e para que os processos tives-
entender o que o mercado requer da- próprio Centro Paula Souza, com o objetivo de seus níveis hierárquicos. sem celeridade, esses professores contavam
quele profissional. A partir da definição elaborar as primeiras trilhas a serem implemen- • Definir certificações intermediárias e com o respaldo dos coordenadores de suas
desse perfil, são definidas as compe- tadas. Com experiência em análise e construção finais. respectivas áreas e passaram a ter oficialmen-
tências necessárias – técnicas, profis- de matrizes curriculares, amplo conhecimento • Propor modelo de aproveitamento de te algumas horas da carga horária semanal
sionais, socioemocionais e cognitivas. A dos regimentos internos do CPS e das legisla- competências nos diferentes níveis dedicadas ao desenvolvimento do programa.
partir das competências e com o perfil ções vigentes para a constituição de novos cur- educacionais. Essa foi a forma encontrada para garantir que
já estabelecido, são definidas as habili- sos e programas, os professores selecionados as atividades do Trilhas Profissionais pudes-
dades necessárias, e quais habilidades também já haviam participado da elaboração de Governança sem avançar sem haver sobreposição com
correspondem a determinadas compe- iniciativas com características similares na AMS. • Reuniões semanais com entregas de outras atividades docentes.
tências. Então, por último, são pensados Isso permitiu que muitas das atividades previs- acordo com o cronograma. Foram identificadas nove áreas prioritárias:
os componentes curriculares – ou seja, tas e realizadas se beneficiassem de aprendiza- analista de banco de dados; analista de big
as disciplinas.” dos anteriores. data; analista de segurança da informação;
arquiteto de cloud; cientista de dados; de-
Rafael Ferreira Alves senvolvedor de back-end; desenvolvedor de
Coordenador de Ensino Superior front-end; desenvolvedor mobile; e rede de
Tecnológico do Centro Paula Souza computadores. Passou-se, então, para uma
análise dos cursos relacionados a essas áreas
que já eram oferecidos pelo CPS. Também foi
observado que perfil de egressos era espe-
rado em cada uma das profissões previstas e,
com base nisso, quais eram as competências
necessárias para a formação de profissionais
nessas carreiras.

23
Com as competências elencadas, o passo A ideia, em um primeiro momento, era Por essa razão e com o aprofundamento
seguinte consistiu em organizá-las em trilhas elaborar um núcleo básico de componentes dos trabalhos, identificou-se a pertinência de
que poderiam ser percorridas pelo estudante curriculares que contemplasse as competên- organizar as trilhas em três eixos temáticos
ao longo de sua trajetória formativa. A partir cias comuns a todas as trilhas – assim, uma distintos (desenvolvimento, dados e infraes-
disso, o GT mapeou as competências comuns vez que o estudante concluísse esse núcleo, trutura), cada um deles com os componentes
a mais de uma trilha e as específicas (ou seja, ele não precisaria cursar esses componentes curriculares e competências necessários para
que se relacionam integralmente ou mais e passar por essas competências novamen- a formação nas profissões e trilhas per-
intensamente com apenas uma determina- te nas formações posteriores. No entanto, tencentes a cada um destes segmentos da
da trilha). Em seguida, determinou como o durante o exercício prático de elencar esses tecnologia da informação. A definição de que
desenvolvimento das competências acontece componentes, percebeu-se que isso resultaria o melhor caminho seria trabalhar por eixos
no nível médio e no nível superior. O diagrama em um núcleo comum muito extenso e, conse- temáticos (sem um núcleo comum a todos
abaixo exemplifica esse exercício. quentemente, em um curso com carga horária os eixos) levou a mais um ajuste de estraté-
elevada – ou seja, produziria um resultado gia e escopo: a escolha por convergir todos
oposto ao pretendido. os esforços iniciais em um único eixo – e o
escolhido foi o de desenvolvimento (contem-
plando as trilhas de desenvolvedor de fron-
t-end, desenvolvedor de back-end e desen-
volvedor mobile). Manteve-se nesse recorte
Trilha: a mesma perspectiva da largada: realizar um
Desenvolvedor piloto cujos aprendizados e experimentações
Front-End
pudessem, posteriormente, ser aplicados e
aprimorados no desenvolvimento das trilhas
dos demais eixos, e também de outras áreas
As competências combinadas de conhecimento.
geram certificações parciais ou O GT iniciou, então, o trabalho de análi-
finais (certificados de horas, FIC
se dos currículos dos cursos oferecidos pelo
ou certificações de nível médio
e superior). Centro Paula Souza que pudessem ter relação
com esse eixo temático, tanto de nível médio
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As trilhas e certificações são quanto superior, buscando identificar como


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atreladas a profissões com poderiam acontecer as conexões e articula-


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diferentes níveis hierárquicos,


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ções entre os dois níveis. A principal pergunta


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de acordo com a progressão nos


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nessa etapa foi: é possível trabalhar com base


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Trilha:
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Trilha: estudos e com as competências


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Co

Arquiteto desenvolvidas. nos cursos existentes ou é necessário elaborar


Programador
de Cloud
Web novos cursos para facilitar a otimização da
aprendizagem do estudante egresso do curso
técnico que inicia um curso superior dentro da
mesma trilha?

24
A análise dos currículos dos cursos existentes cidos pelo CPS nas Etecs: informática e desenvol- A experiência com a modelagem do novo A articulação com o setor
revelou diversas competências cujo desenvolvi- vimento de sistemas. Desse modo, os estudantes curso mostrou como é possível eliminar sobre- produtivo: interações e
mento acontece tanto em cursos de nível técnico egressos desses dois cursos técnicos poderão posições curriculares e repetição de conteúdos colaborações
como em cursos de nível superior – logo, que pular a etapa inicial, ingressando em uma fase e competências, otimizando o tempo neces-
poderiam ser aproveitadas e otimizadas. No en- mais avançada do programa. Já os estudantes sário para a conclusão do curso no caso dos
tanto, como tais cursos haviam sido concebidos egressos do ensino médio regular (ou de outros estudantes provenientes dos cursos técnicos
em contextos distintos e sem a prerrogativa do cursos técnicos) terão acesso ao desenvolvimen- mencionados: a previsão é que seja possível “É importante que as empresas alimen-
diálogo entre os níveis, o desenvolvimento des- to dessas competências nos primeiros semes- eliminar até um semestre e meio. Outro ponto tem a construção desses cursos a partir
sas competências estava disperso ao longo de tres, sem prejuízo para seu aprendizado. positivo é que esse novo curso abre espaço de um olhar da demanda – mas acredito
todo o currículo, perpassando diferentes compo- para que, futuramente, sejam beneficiados alu- que precisam ter um papel que vá além
nentes curriculares. Também se constatou que a nos egressos de outros programas de formação da contribuição da construção dos per-
disposição ao longo da estrutura dos cursos faria profissional do Centro Paula Souza e da SDE fis. Elas podem contribuir na construção
com que a quantidade total de semestres cursa- “Optamos por construir um currículo (como é o caso do Novotec Integrado9), desde dos conteúdos, na definição dos conhe-
dos permanecesse praticamente inalterada. Uma para o ensino superior praticamente do que os currículos sejam elaborados em diálogo cimentos, das habilidades de cada uma
saída, nesse caso, poderia ser a remodelagem zero, tivemos toda a preocupação de com as competências a serem desenvolvidas dessas qualificações, mas também con-
destes cursos de nível superior, o que tornaria não se tornar mais um curso de ‘Análise nos semestres iniciais do novo curso. tribuir com uma avaliação de até onde o
viável o aproveitamento de diversas disciplinas e de Sistemas com ênfase em tecnolo- que está sendo aprendido na escola se
reduziria o tempo de permanência do estudante gia’, por exemplo, IoT, Mobile ou Cloud. conecta com as atividades profissionais.
nos cursos. Entretanto, essa manobra requere- Incluímos competências novas, tecnolo- Além disso, também podem contribuir
ria uma articulação muito mais complexa, uma gias novas. E pensamos ainda na ques- 9
O programa Novotec (lançado em março de 2019 pelo CPS em
estimulando que o aluno continue seus
vez que os cursos existentes são oferecidos em tão da metodologia e do ensino remoto, parceria com a SDE) foi concebido para oferecer cursos técnicos e estudos e se aprimore.”
profissionalizantes gratuitos aos estudantes do ensino médio das
diversas Fatecs, sendo necessários o apoio e a assim preparamos o currículo para o escolas públicas estaduais de São Paulo, como resposta ao desafio
aprovação de muito mais atores da comunidade sistema de crédito, em que o aluno do de implementar o 5° Itinerário do Novo Ensino Médio na rede. São Almério Melquíades de Araújo
oferecidos cursos técnicos e profissionalizantes gratuitos em duas
acadêmica (como o núcleo docente estruturante, técnico não precisará cursar componen- modalidades: integrada ao ensino médio, ou o Novotec Expresso,
Coordenador do Ensino Médio e Técnico
o colegiado e a congregação) – impossibilitando tes dos primeiros semestres.” com cursos de 120 horas de duração. A ação foi formulada para do Centro Paula Souza
aproximar os jovens do mercado de trabalho e contribuir para o
a implementação ágil do programa. alcance da meta 11 do Plano Nacional da Educação, e tem como
Diante desse cenário, para a primeira etapa Ana Cláudia Oliveira objetivo garantir que ao menos 30% dos alunos matriculados no
ensino médio estadual tenham algum tipo de curso técnico ou de
de implementação do programa Trilhas Profissio- Professora do Centro Paula Souza e qualificação profissional.
nais, optou-se pela elaboração de um novo curso participante do Grupo de Trabalho
de nível superior, batizado de “desenvolvimento
de software multiplataforma” e registrado no Mi-
nistério da Educação como um curso experimen-
tal. Concebido desde a origem para promover o
itinerário contínuo, o novo curso foi desenhado
de forma a garantir que os semestres iniciais
contemplassem as competências desenvolvidas
em dois cursos técnicos de nível médio já ofere-

25
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a empresas, cada uma delas com tecnologias e
Educação Profissional e Tecnológica elencam, linguagens próprias, algumas concorrentes
como primeiro princípio orientador da EPT, entre si. O papel da associação foi o de fazer
a articulação com o setor produtivo para a uma mediação entre o programa e as empre-
construção coerente de itinerários formativos. sas, estimulando-as a participarem das ativi-
Apesar de não necessariamente ser uma tarefa dades de concepção dos cursos e evitando que
simples, estruturar as atividades formativas houvesse a prevalência de um ponto de vista
em diálogo com o mundo do trabalho já é há em detrimento de outro.
bastante tempo uma prática do CPS, que está As interações entre o GT e as empresas de
atento ao impacto econômico que seus cursos tecnologia associadas à Brasscom aconteceram
podem gerar para o estudante, para o setor de forma colaborativa: por meio de uma série
produtivo e para a economia como um todo. de workshops, houve uma intensa troca em re-
Assim, desde o início do Trilhas Profissio- lação à demanda de profissionais pelo merca-
nais, houve uma preocupação com essa aproxi- do, ao perfil de egressos esperado (incluindo as
mação, e a SDE partiu em busca de referências competências e habilidades desejáveis) e aos
para articular o desenvolvimento do programa espaços no mercado que eles poderiam ocupar.
com as demandas do setor produtivo. Interlo- A partir dessas contribuições, os professores
cuções com o Conselho Britânico e um mergu- participantes do GT puderam elaborar um pro-
lho na pesquisa de boas práticas observadas grama contemplando as prerrogativas peda-
em outros países (mencionados no Capítulo 1, gógicas defendidas pelo Centro Paula Souza e
p. 11) confirmaram que o diálogo com associa- exigidas ou recomendadas pela legislação, mas
ções setoriais possibilitaria a coleta de insumos considerando, também, competências e habili-
para uma formação em sintonia com o dinamis- dades demandadas pelo mundo do trabalho.
mo do mundo do trabalho. A expectativa, ao se
conectar a essas associações, era que a oferta
das formações atendesse à pluralidade do mer-
cado, sem privilegiar empresas ou tecnologias
específicas. Com isso no horizonte e tendo em Todas as atividades aqui descritas foram de empresas – afinal, não havia restrições de
vista a priorização das carreiras ligadas à área realizadas em 2020, durante a pandemia de deslocamento para comparecimento aos en-
de tecnologia da informação, ao menos nessa covid-19. Assim, os workshops foram realiza- contros. Na prática, a pandemia e a expansão
primeira etapa do programa, a representação dos de maneira remota, da mesma forma que do trabalho remoto reforçaram a importância
do setor produtivo foi contemplada via partici- os encontros do grupo decisor e do grupo de da tecnologia da informação como uma área
pação da Brasscom. trabalho. Se, por um lado, a mediação da tec- prioritária para a implementação do programa,
A articulação intermediada pela Brasscom (e nologia tornou as trocas e interações um pouco uma vez que as soluções tecnológicas foram
não diretamente com as empresas) foi bastan- mais limitadas, por outro, viabilizou a partici- imprescindíveis para facilitar as tão necessá-
te proveitosa, uma vez que o setor de tecnolo- pação de representantes de um número maior rias medidas de isolamento social.
gia da informação é constituído por diferentes

26
As interlocuções com as empresas foram
iniciadas com uma primeira rodada de
workshops para a apresentação do programa.
A ideia era mobilizar e engajar as empresas as-
sociadas a participarem. Com a construção das
primeiras versões das trilhas pelo GT, em um
primeiro momento foram realizados workshops
Grupo decisor (SDE, IET,
junto às empresas participantes para ouvir CPS) mapeia o mercado
suas considerações; mapear as correspondên- produtivo e definem as
cias entre as competências propostas pelo CPS trilhas prioritária

e aquelas esperadas pelo setor produtivo; e


compreender as maneiras como o perfil dos Competências
futuros egressos do curso dialogaria com o
mercado de trabalho.
Participaram desses encontros profissionais
da área de recursos humanos das empresas e, Trilhas
também, das áreas técnicas, por possuírem um Oficinas com o setor profissionais
estruturadas
conhecimento mais específico e aprofundado produtivo promovem
o debate e a validação
sobre os perfis de profissionais demandados.
das competências
Tal mescla foi fundamental para o sucesso dos Grupo de trabalho (GT)
mapeia e organiza Oficinas entre GT e
trabalhos. Durante as oficinas, um exercício se empresas do setor produtivo
as competências
mostrou útil e didático para relacionar a de- correspondentes às trilhas geram insumos para a
manda por profissionais e a oferta de cursos: a construção das trilhas
descrição das vagas de emprego, com detalha-
mento das especificações, das competências
e dos conhecimentos almejados e do perfil do
profissional ideal para os cargos descritos. Ter Esses workshops inauguraram uma siste- O diagrama acima ilustra, de forma sintética,
isso em mãos tornou mais simples correlacio- mática de construção conjunta e gradual das como cada um dos atores envolvi­­­­dos no pro-
nar expectativas e necessidades na construção trilhas. As contribuições das empresas eram grama contribuiu para a construção das trilhas.
do currículo do novo curso. avaliadas e incorporadas aos processos poste-
riores de aprofundamento da construção das
trilhas pelo GT; e pontualmente aconteciam
novas reuniões em que eram apresentadas às
empresas, em caráter consultivo, as sistema-
tizações dos workshops, aprofundados alguns
debates e apresentados resultados (como a
estrutura das trilhas e do curso).

27
estabelecido por lei para o ingresso no ensino fosse contemplado – mesmo que naquele
superior (ensino médio completo), e ainda há momento o aproveitamento de competências
Sec. Des. a possibilidade de atendimento a um público ainda estivesse em fase de aprovação junto
Apoio/contratação Econômico
de gestora de Articulação com
maior, egresso de cursos técnicos ou regulares. ao conselho deliberativo do CPS (a aprovação
projetos o setor produtivo
Durante o processo de concepção e apro- oficial ocorreu em abril de 2021).
vação do novo curso de desenvolvimento de A primeira oferta pública do curso foi anun-
Diretrizes gerais
Apoio de gestão software multiplataforma, na segunda metade ciada em novembro de 2020, já no processo
de 2020, o Centro Paula Souza abriu um edital seletivo para ingresso no primeiro semestre
Definição das competências
demandas pelo mercado de interno para identificar quais Fatecs (em espe- de 2021 por meio do vestibular. Entre todas as
Apoio institucional trabalho
Itaú e metodológico Grupo Elaboração das trilhas
Parceiro
cial aquelas que já oferecem cursos dentro do turmas, a procura média foi de 4,26 candidatos
Educação de trabalho formativas e profissio-
e Trabalho (CPS) nais e suas respectivas
privado eixo tecnológico de tecnologia da informação) por vaga – número que chegou a 7,38 na Fatec
certificações
manifestariam interesse em implementar o Osasco.
Validação da correspondência
entre as trilhas formativas e as novo curso. A expectativa era oferecer o curso As primeiras turmas iniciaram o novo curso
expectativas

Validação e imple-
entre três a cinco unidades, e os principais antes da aprovação oficial do aproveitamen-
mentação das trilhas requisitos buscados eram uma infraestrutura to de competências, e por isso o primeiro
formativas
de laboratórios adequada e a existência de um semestre foi oferecido normalmente a todos
corpo docente e técnico apto a oferecer o novo os estudantes, independentemente de suas
curso – uma vez que havia restrições para no- trajetórias anteriores na EPT. A expectativa é
vas contratações. No total, 18 unidades respon- que, a partir do segundo semestre de oferta do
Dos currículos ao vestibular: lando-se no novo curso e obtendo o direito de deram positivamente – dentre as quais cinco curso, com o ingresso de novas turmas, os no-
o processo de implementação eliminar parte do tempo de formação. No en- foram selecionadas em função do cumprimento vos estudantes egressos do ensino técnico que
e próximos passos tanto, avaliou-se que, pela qualidade do ensino dos requisitos esperados e da localização: uma tenham competências e créditos passíveis de
oferecido nas Etecs, os estudantes egressos na cidade de São Paulo (Fatec Zona Leste); uma validação possam ter a carga horária reduzida
Com as características do curso desenvolvi- dos cursos técnicos possuem grande chance na região metropolitana de São Paulo (Fatec nos primeiros semestres. Com o início de novas
mento de software multiplataforma mais bem de classificação em processos seletivos amplos Osasco); e três no interior do estado (Fatec Ara- turmas em semestres posteriores, aumentará
definidas e a construção da estrutura curricular – não sendo o acesso via vestibular, portanto, ras, Fatec Franca e Fatec São José dos Campos). a oferta imediata e simultânea de diferentes
em andamento, outra atividade fundamental, um fator impeditivo para a implementação do Em agosto de 2020, formou-se uma equipe disciplinas nas unidades, o que possibilitará a
realizada pelo GT em articulação com uma programa e para a continuidade dos estudos de implementação (EI) constituída por coorde- novos alunos a formação em tempo otimizado.
grande rede de atores, foi a discussão e a defi- desses estudantes11. Assim, ficou definido que nadores pedagógicos e professores das Fatecs
nição de como o curso seria implementado. os cursos resultantes do processo de articula- escolhidas, para que conjuntamente elaboras-
Desde o início do projeto, uma preocupação ção do Trilhas Profissionais serão oferecidos de sem o projeto pedagógico do curso (PPC) e to-
era a definição das formas de ingresso dos forma independente (ou seja, em uma oferta dos os conteúdos tradicionalmente presentes
estudantes. Isso porque o real objetivo da ini- ampla, tanto para o público egresso dos cursos no PPC (ementas dos componentes curricula-
ciativa só seria de fato alcançado com egressos técnicos correspondentes à trilha, como para res, por exemplo). Também era importante que
dos cursos técnicos correspondentes à trilha os egressos do ensino médio regular – todos o aproveitamento das competências desenvol-
11
A forma de acesso dos estudantes é um dos principais aspectos
(ou seja, oriundos das formações em informáti- participantes do mesmo processo seletivo). vidas no curso técnico, premissa fundamental em que as Trilhas Profissionais diferem do formato adotado no
ca e em desenvolvimento de sistemas) matricu- Dessa maneira, atende-se ao pré-requisito desde o início da elaboração do programa, programa AMS, descrito no box da página XXX

28
2019 2020 2021

Início da parceria entre SDE, CPS e IET. Constituição do grupo de trabalho (GT), 7) Escolha pela priorização do eixo de Início das primeiras turmas.
responsável pela construção das trilhas e dos desenvolvimento.
Instituição do grupo decisor (GD), responsá- Aprovação do aproveitamento de competên-
currículos.
vel pela validação das principais diretrizes do 8) Análise dos currículos dos cursos do cias pelo conselho deliberativo do CPS.
projeto. Análise dos formatos possíveis e escolha do CPS já existentes e opção pela elabo-
en­­­foque para a primeira implementação: ração de um novo curso.
Pesquisa de marcos regulatórios (legislação
nacional e regimentos internos do CPS) e de 1) Intenção original: sistema de créditos Início da composição das trilhas:
inspirações e referências internacionais. para todo o CPS.
1) Workshops com representantes do
2) Priorização de três áreas estratégicas setor produtivo.
(tecnologia da informação, gestão e
2) Elaboração dos currículos.
turismo).
3) Encontros de validação da correspon-
3) Escolha pelo enfoque na área de tec-
dência entre as trilhas profissionais e
nologia da informação.
as expectativas do setor produtivo.
4) Identificação de nove áreas de atua-
ção prioritárias.
Abertura de edital interno para identificação
5) Mapeamento das trilhas correspon- das primeiras Fatecs interessadas em ofere-
dentes a essas áreas, e análise da cer o novo curso.
possibilidade de um núcleo básico
Criação da equipe de implementação (EI),
presente em diferentes trilhas.
responsável pela implantação do novo curso
6) Segmentação das áreas de atuação nas cinco unidades selecionadas.
em três eixos temáticos (desenvolvi-
Primeira oferta pública do curso, via processo
mento, dados e infraestrutura).
seletivo.

29
Embora o curso de desenvolvimento de equipes com professores experientes na cons-
software multiplataforma já esteja efetiva- trução de currículos; firmadas novas parcerias
mente acontecendo nas primeiras unidades, o com representantes dos setores produtivos;
desenvolvimento do programa Trilhas Pro- e tomadas decisões voltadas para as especi-
fissionais está apenas no início. Ao longo dos ficidades de cada área profissional, sempre
próximos anos, deverão ser avaliados, entre considerando o quanto a estrutura dos cursos
outros pontos: já oferecidos pelo CPS precisará ser revista e
ampliada para que os caminhos percorridos
• o aproveitamento da aprendizagem dos pelos estudantes sejam cada vez mais signifi-
estudantes egressos do ensino técnico e cativos e coesos.
avaliação em comparação com os estudan- Para além desse futuro, a experiência do
tes vindos do ensino médio regular; Trilhas Profissionais vivenciada até aqui já traz
grandes aprendizados para a aplicação de
• a absorção dos estudantes pelo mercado de itinerários contínuos, que podem ser aprovei-
trabalho; tados por outras redes e instituições de ensino
e adaptados a outros contextos. Um compilado
• a evolução da busca pelo curso por estu- de caminhos, estratégias e soluções pensados
dantes do ensino técnico; a partir desses aprendizados será apresentado
no próximo capítulo.
• a necessidade de ajustes no formato do
programa para a expansão para outras
unidades, outros cursos e outras trilhas
profissionais.

Além disso, algumas estratégias de escuta


dos estudantes e de acompanhamento das tur-
mas também já estão em desenvolvimento, e os
resultados desses processos deverão servir de
insumo para qualificar o avanço do programa.
As experimentações relatadas neste capí-
tulo também servirão como referência para a
construção novas trilhas – sejam elas na área
de tecnologia da informação, sejam nas demais
áreas de conhecimento compreendidas pela
vasta oferta de cursos do Centro Paula Sou-
za. Para cada trilha serão estruturadas novas

30
A
o olhar para a experiência vivenciada pelo Centro Paula Souza na
construção de uma proposta de itinerário contínuo, inevitavel-

Capítulo 3 mente surgem algumas perguntas: essa iniciativa funcionaria em


contextos diferentes ao do encontrado no estado de São Paulo?
Que arranjos institucionais seriam necessários? Há perguntas e reflexões

Oito perguntas e um comuns que poderiam orientar a implementação de itinerários contínuos


em outros estados brasileiros?
O objetivo deste terceiro capítulo é convidar os leitores a uma reflexão

convite para novos sobre pontos e características que podem ser entendidos como estruturan-
tes em iniciativas que pretendem implementar itinerários contínuos. São
aspectos que só puderam ser levantados depois da implantação, ainda em
itinerários contínuos curso, do programa Trilhas Profissionais pelo Centro Paula Souza – em um
esforço de extrair da experiência aprendizados que pudessem transcendê-
-la e ser transpostos para diferentes cenários.
Não se trata, todavia, de um manual e tampouco de um passo a passo
roteirizado de implementação. A ideia é apenas compartilhar caminhos e
soluções que podem servir de inspiração e referência para a construção de
programas similares em outros estados. Vale lembrar que a sistematização
aqui apresentada acontece paralelamente à implantação e ao desenvolvi-
mento inicial do Trilhas Profissionais pelo Centro Paula Souza e, por isso, as
reflexões são registros de um trabalho em andamento.
Os aprendizados apresentados a seguir foram organizados com base em
oito perguntas estratégicas importantes para a concepção e a implemen-
tação de itinerários contínuos. Após cada questão, relembra-se, sintetica-
mente com breves destaques, como cada situação foi vivenciada na expe-
riência do Centro Paula Souza.

31
1. Quais são os problemas que podem ser resolvidos 2. Como definir o escopo de
com a implementação de um itinerário contínuo? um itinerário contínuo?

Compreender o ponto de partida e o ponto de É preciso definir por onde começar, isto é, qual de cursos e instituições predeterminadas ou
chegada pretendidos na elaboração de uma Aprendizado da será a abrangência do itinerário contínuo pro- em uma escala mais ampla?
iniciativa de itinerário contínuo será o primeiro experiência vivenciada posto. Para tanto é necessário determinar se será
passo para a tomada de decisão de gestores pelo Centro Paula Souza criada uma política para ser adotada em todos – Que áreas, carreiras, cursos ou trilhas
que decidam investir nessa empreitada. os cursos ofertados, se ela se concentrará em priorizar para estabelecer um recorte para
Assumir a educação profissional e técnica áreas do conhecimento determinadas ou mesmo o início dos trabalhos? (Recomenda-se
de nível médio como uma etapa inicial na Construção de trilhas educacionais se a experiência será direcionada a apenas uma considerar os desafios iniciais e avaliar se há
formação dos estudantes significa considerar que reconhecem competências, formação específica. Importante também definir alguma área cuja escolha seja mais prática
as múltiplas possibilidades de continuidade de habilidades e conhecimentos desen- se a iniciativa acontecerá em uma única unidade ou facilitada por algum motivo.)
estudo, seja no ingresso de cursos do ensino volvidos por estudantes em cursos de educacional, em toda a rede ou em parte dela.
superior, seja na busca por qualificações que ensino técnico de nível médio ofereci- Para essa definição, é importante olhar para
aprimorem seus conhecimentos e práticas. dos pela instituição, aproveitando-os oferta de cursos e formações disponíveis nos Aprendizados da
Com essa perspectiva em vista, o itinerário em um curso superior de tecnólogo diferentes níveis, para as conexões entre eles e experiência vivenciada
contínuo pretende reduzir a redundância de dentro da mesma carreira. para as eventuais facilidades e dificuldades que pelo Centro Paula Souza
conteúdos, competências e conhecimentos podem advir de cada escolha. Algumas perguntas
que ocorre quando um estudante ingressa em podem facilitar a definição do escopo:
Opção pela realização de piloto com ape-
cursos de nível superior do mesmo eixo de sua
nas uma área para implementar e testar
formação no nível médio. – É preferível reformar os currículos de cursos
soluções que, uma vez validadas na práti-
A construção de matrizes curriculares que já existentes ou desenvolver programas
ca, poderiam ser posteriormente aplicadas
atuam em perspectiva dialógica e progressiva totalmente do zero? De que maneira essa
e aprimoradas em cursos de outras áreas.
ou de sistemas de aproveitamento das apren- escolha reflete nos Catálogos Nacionais de
dizagens obtidas antes do ingresso no ensino Cursos Técnicos ou de Cursos Superiores Escolha da área de referência para o
superior são algumas das alternativas para de Tecnologia? piloto com base no diagnóstico que
responder a essa questão. Além disso, esse é apontou um setor com alta demanda por
um caminho potente para valorizar os apren- – De que maneiras serão aproveitadas as profissionais qualificados.
dizados construídos na educação profissional competências e os conhecimentos anteriores
e técnica de nível médio, e é também uma ala- dos estudantes (por meio de um sistema de O projeto Trilhas inspirou-se em diferentes
vanca mobilizadora para que estudantes deem aproveitamento de créditos ou pela validação soluções encontradas por sistemas edu-
continuidade a seus estudos. de currículos, por exemplo)? cacionais de diversos países e também na
própria experiência pregressa do CPS.
– O aproveitamento de competências e habili-
dades acontecerá apenas entre estudantes

32
3. Por que e como integrar melhor
os níveis educacionais?

A falta de tradição na realização de ações


conjuntas entre os níveis de ensino (médio
e superior) ainda é uma barreira para o
Aprendizados da
estabelecimento de uma iniciativa de itinerário
experiência vivenciada pelo
contínuo. A identificação e a superação de Centro Paula Souza
sombreamentos e redundâncias entre os
níveis são atividades que precisam ser feitas
conjuntamente, e aí reside a importância Facilidade trazida pelo fato de o ensino
da cooperação e da integração. Para isso, é técnico e o superior serem oferecidos
importante garantir que haja interlocução pela mesma instituição.
entre as instituições de ensino superior
e as instituições que oferecem cursos de Vontade política e forte endosso da
nível técnico pertencentes ao mesmo eixo superintendência do Centro Paula Souza
– e pelas quais potencialmente passam os e da Secretaria de Desenvolvimento
mesmos estudantes. Contar com um forte Econômico.
endosso institucional nos dois âmbitos
(médio e superior) contribui para que esse
diálogo aconteça e flua, o que é vital para a
implementação de um itinerário contínuo.
Entre os efeitos positivos dessa aproximação
está a melhoria da estruturação de cursos
em ambos os níveis, com a contribuição
conjunta de professores universitários e do
ensino médio técnico nos debates para as
definições curriculares. Nessa troca, há ainda a
oportunidade de as universidades alavancarem
a extensão universitária e a pesquisa em
diálogo com as redes, criando intercâmbio
entre alunos, docentes e práticas – inclusive de
diferentes níveis.

33
Aprendizados da
4. Quem participa diretamente do processo de experiência vivenciada
concepção e como é feita a governança? pelo Centro Paula Souza

Uma definição muito importante para a im- ção e elaboração de currículos, e com amplo governança é fundamental para o desafio Constituição de três grupos: decisor, de
plementação de uma iniciativa de itinerário conhecimento das matrizes curriculares de acompanhamento e validação processual trabalho e equipe de implementação.
contínuo são os sujeitos envolvidos nas di- tanto do nível técnico como do nível supe- do trabalho pedagógico e de instituciona-
versas fases de sua construção. Criar grupos rior das áreas de conhecimento envolvidas. lização. Assim, é válido definir i) como será Grupo de trabalho composto de profis-
de trabalho com funções e responsabilidades Também é desejável experiência em estru- o relacionamento de todas as instituições, sionais qualificados e capazes de repre-
definidas pode ser um jeito interessante de turação administrativa acadêmica e conhe- grupos e equipes envolvidos; ii) quais serão sentar os níveis envolvidos (formado
garantir o caráter cooperativo necessário ao cimento das normativas que regem ambos as responsabilidades e as contribuições por dois professores do ensino técnico e
processo. O formato pode variar bastante de os níveis. Para garantir um ritmo adequado à esperadas de cada uma delas ao longo do dois professores do ensino superior com
acordo com cada contexto, porém, destacam- implementação, é recomendado oficializar a projeto; iii) qual será o grau de autonomia experiência prévia no desenvolvimento
se as seguintes ações: carga horária de dedicação para esse grupo, de cada um desses participantes; e iv) como de currículos por competência).
de modo que o tempo demandado pelas se dará o acompanhamento do desenvolvi-
– constituir um grupo com caráter decisor atividades do programa (que incluirão reu- mento das atividades. Equipe de implementação composta de
para definições e direcionamentos estra- niões, análise e elaboração de instrumentos, gestores, coordenadores pedagógicos e
tégicos gerais – com autonomia para a articulações com outros grupos e sujeitos) professores das unidades onde o curso
tomada de decisões e autoridade institu- não conflite com outras atribuições; será implementado.
cional para promover a articulação com os
diversos atores envolvidos no projeto. Vale – outras composições podem ser necessárias, Grupo de trabalho e equipe de imple-
lembrar que as mudanças trazidas por uma de acordo com a abrangência e o dese- mentação com carga horária
iniciativa de itinerário contínuo impactam nho definidos. Por exemplo, pode haver a de dedicação ao projeto garantida.
em diversos aspectos institucionais, como necessidade de um grupo que elabore os
regimento interno, ingresso, validação de projetos pedagógicos (PPC) de novos cursos Apoio institucional e metodológico de
aprendizagens anteriores, entre outros; eventualmente criados para viabilizar o iti- instituição com experiência no tema e
nerário contínuo; ou que crie instrumentos com métodos para a articulação de dife-
– constituir um grupo de análise/construção regimentais para a validação de créditos/ rentes atores (Itaú Educação e Trabalho)
dos instrumentos que viabilizarão o itine- aprendizagens adquiridas no nível anterior. e gestora de projetos responsável pelo
rário contínuo – responsável pelas tarefas O melhor formato deve ser pensado com acompanhamento das atividades, entre-
envolvidas no desenvolvimento da solu- base nas necessidades, possibilidades e gas, escopos e cronogramas, e também
ção, seja de remodelação de currículos, de especificidades de cada contexto; pela articulação entre todos os atores.
criação de novos cursos, de definição de um
sistema de aproveitamento de créditos etc. – como a implantação de uma iniciativa de
Neste caso, é fundamental que sejam pes- itinerário contínuo envolve atores diversos
soas de reconhecida competência na avalia- das entidades envolvidas, estabelecer uma

34
5. Qual é o papel do setor produtivo e como 6. Quais serão as estratégias de ingresso nos cursos e
relacionar-se com seus representantes? de progressão em uma trilha?

A educação profissional e técnica não pode ser sistemática de encontros, reuniões e atividades Uma estratégia de integração entre diferen- Para nortear a escolha (ou a criação) de uma
pensada de maneira descolada do universo do periódicas, em que representantes do setor tes níveis de ensino em trilhas profissionais solução, é preciso considerar algumas questões:
trabalho. Por isso, nos momentos de definição produtivo possam expressar suas expectativas, requer a discussão dos conteúdos curriculares
ou redefinição de quais conteúdos serão ofere- o perfil esperado dos egressos, as habilidades e e também a definição sobre os mecanismos – Que mecanismos oferecem mais estímulo
cidos durante a implementação de um itinerário competências exigidas; e apoiar o grupo de tra- de ingresso nas turmas, de acompanhamento do que desestímulo para que o estudante
contínuo (e de que forma eles serão organizados balho responsável pela elaboração dos currículos das evasões e das maneiras como os estudan- continue seus estudos?
em cursos – criados ou adaptados) é importante na tradução de seus anseios em componentes tes passam para o nível seguinte. Nesse caso,
analisar as oportunidades reais de inserção dos acadêmicos, respeitando sempre as premissas existem muitos cenários possíveis, a depender – O que acontece com as vagas disponibili-
estudantes no mundo do trabalho. Para tanto, pedagógicas envolvidas. Dessa maneira as ne- do arranjo dos cursos, componentes e compe- zadas no ensino superior caso o estudante
é preciso escutar o setor produtivo diretamente cessidades do setor produtivo, quando julgadas tências, e da relação entre oferta e demanda não termine o ensino técnico ou opte por
relacionado aos cursos em discussão. Assim, vale pertinentes, poderão ser expressas em compe- de vagas: mudar de área? Elas poderão ser ocupadas
identificar quais são os nichos econômicos ou as tências almejadas e conjugadas a competências por outros estudantes?
empresas que estão presentes na região onde adicionais consideradas essenciais pela institui- – ingresso em um programa unificado que
a solução será implementada e quais são as ção e pelos professores responsáveis. combina, em uma única matrícula, o ensino – Existem mecanismos que facilitem ou que
habilidades, as competências, os conhecimen- técnico de nível médio nos primeiros anos e permitam o retorno do estudante caso ele
tos e atributos profissionais necessários nesses o ensino superior nos últimos anos. não inicie o curso superior imediatamente
meios. Também é preciso checar o que dizem Aprendizados da após o término do ensino médio?
os estudos e as pesquisas mais recentes sobre experiência vivenciada – ingresso direto, por estudantes egressos de
o tema e o cenário. Contar com a participação pelo Centro Paula Souza um curso técnico específico, a um determi-
do setor produtivo ao longo do desenvolvimen- nado curso superior sem a necessidade de Aprendizado da
to de um itinerário contínuo (e não apenas em um novo processo seletivo – e/ou possi- experiência vivenciada
uma etapa pontual de mera consulta ou vali- Parceria com uma associação represen- bilidade de “pular” alguns componentes pelo Centro Paula Souza
dação) é uma forma de qualificar essa relação, tante de diversas empresas do setor curriculares iniciais.
aproximando, por um lado, as instituições de produtivo em foco, aumentando as
ensino das demandas e dos desafios do mundo possibilidades de uma visão múltipla e – adoção de critérios independentes de Novo curso oferecido de forma indepen-
do trabalho; e, por outro, tornando os represen- diversificada sobre o segmento. acesso tanto ao curso técnico como ao dente (ou seja, em uma oferta ampla,
tantes do setor produtivo mais conscientes da curso superior – podendo ser um vestibu- tanto para o público egresso dos cursos
importância de uma formação ampla, integral e Criação de uma agenda de participa- lar, o SiSU (Sistema de Seleção Unificada, a técnicos correspondentes à trilha, como
contínua para os jovens e da criação de ofertas ção orientada do setor produtivo, com partir da nota do Enem) ou qualquer outro para os egressos do ensino médio regular).
de estágios e empregos adequadas àquilo que workshops para debates e alinhamentos. mecanismo.
é desenvolvido em cada nível de ensino. Reco-
menda-se, assim, o estabelecimento de uma

35
7. Quais são os desafios relacionados aos sistemas de
aproveitamento das aprendizagens adquiridas no curso
técnico de nível médio?

Um dos maiores desafios para a implementação É importante construir um encadeamento ção e distribuição dessas competências ao
de itinerários contínuos é a criação de mecanis- lógico e cronológico que determine a sequên- longo do currículo. Isso facilita, por exemplo,
mos que facilitem tanto o reconhecimento das cia ideal do desenvolvimento da aprendizagem o aproveitamento de aprendizagens anterio-
competências previamente adquiridas, como o ao longo da progressão do estudante em sua res para estudantes que, por alguma razão,
aproveitamento automático ou facilitado dessas trajetória, visando ao acúmulo incremental de decidam mudar de trilha (podendo “pular” os
competências. Existem algumas possibilidades a conhecimento. A organização em competên- componentes já cursados comuns a diferentes
partir do arranjo do programa para a validação: cias, por exemplo, permite uma estruturação trilhas); ou ainda para estudantes já formados
de certificações intermediárias que atestem em uma trilha que decidam ampliar seu conhe-
– definição de quais são os cursos (e ministra- que atividades o estudante está apto a de- cimento ao optar por cursar outras trilhas. Da
dos por quais instituições) que tiveram seus sempenhar ao finalizar cada etapa parcial de mesma forma, a identificação de quais com-
currículos compatibilizados ou previamente sua formação. A identificação das competên- petências podem ser desenvolvidas e aprimo-
reconhecidos como válidos para o aprovei- cias comuns a diferentes trilhas formativas, radas em caráter progressivo e incremental
tamento de competências; e das específicas para uma trilha profissional facilita a distribuição em disciplinas básicas ou
ou formação específica, viabiliza a organiza- avançadas.
– formação de “banco de dados” em que, a
cada novo curso técnico avaliado e valida-
do, amplia-se uma espécie de “jurispru- Aprendizado da
dência” sobre que formações anteriores experiência vivenciada pelo
permitem aproveitamento automático de Centro Paula Souza
componentes;

– sistema unificado no qual instituições Estudantes egressos do curso técnico


escolares tenham o processo de validação piloto criado para viabilizar o itinerário
das competências automatizado; e no qual contínuo terão carga horária reduzida
os estudantes possam tanto acompanhar automaticamente, pois não precisarão
o status de suas matrículas e o histórico cursar determinadas disciplinas dos
de formações já concluídas, como também primeiros semestres, podendo iniciar
obter mais informações sobre os possíveis no curso superior em semestres mais
próximos passos que podem ser dados para adiantados.
a complementação de sua formação dentro
das trilhas profissionais escolhidas.

36
8. Como o itinerário contínuo é normatizado
e, depois, monitorado e avaliado?

A normatização de uma iniciativa de itinerário ensino médio regular; e analisar os índices de Aprendizados da
contínuo não é trivial e é essencial para garan- evasão ao longo de toda a trilha. Para as trilhas experiência vivenciada
tir a sua operacionalização e perenidade. Ape- em que houver um novo processo seletivo na pelo Centro Paula Souza
sar de haver amparo legal, como explicitado no migração do nível médio para o nível superior,
Capítulo 1, implementar um itinerário contínuo é fundamental, ainda, acompanhar o índice de
demanda criação ou revisão geral dos projetos engajamento dos estudantes no avanço para O currículo foi elaborado para funcionar
pedagógicos (PPCs) dos cursos envolvidos e a próxima etapa e a taxa de aprovação des- tanto com sua duração regular (voltado
das normativas internas de acesso e progres- ses estudantes no ensino superior. Também a todos os estudantes), como com sua
são, entre outros documentos. O percurso são recomendadas ações de escuta ativa dos duração abreviada (voltado a estudantes
contínuo precisar estar descrito no PPC, assim estudantes por meio de pesquisas de opinião aptos para a validação automática de
como estar refletido nos documentos internos e de satisfação, ou mesmo escutas aprofunda- competências).
regulatórios, que deverão ser criados (caso não das. Por fim, são bem-vindos dispositivos para
existam), revistos ou aprimorados. Isso implica acompanhar e mensurar o grau de inserção O curso foi implementado com a defini-
que todas as definições estabelecidas no âmbi- desses estudantes no mercado de trabalho ção de que as primeiras turmas cursa-
to acadêmico precisam ser transpostas para o e verificar se as competências desenvolvidas riam a versão completa (sem a possibili-
âmbito administrativo. estão sendo adequadamente aproveitadas. dade de redução da duração) enquanto a
Além disso, é preciso criar mecanismos que validação de competências aguardava a
permitam avaliar e acompanhar o que está sen- tramitação para a aprovação institucio-
do proposto. Um programa de estruturação de nal, que corria paralelamente.
itinerários formativos contínuos envolve a ava-
liação da receptividade dos cursos oferecidos e
o acompanhamento da aprendizagem – justa-
mente por isso é um processo de longo prazo,
que deve durar ao menos o período necessário
para que as primeiras turmas se formem e
efetivamente se engajem nas próximas etapas
de suas trajetórias escolares e profissionais. É
preciso verificar se as soluções de integração
entre diferentes níveis estão acontecendo de
forma adequada; acompanhar as diferenças
de rendimento entre estudantes oriundos do
ensino técnico e dos estudantes oriundos do

37
Um convite para o futuro Capítulo 2 e com as reflexões deste Capítulo
3, almeja-se que novas experiências possam
Todas as perguntas e apontamentos sugeri- surgir em outros estados e redes, e que, se
dos ao longo deste capítulo têm por objetivo possível, também exista um movimento para Além de fortalecer a EPT em diversos níveis
gerar reflexões para a implementação de que essas experiências sejam documentadas e em todo o país, é desejo do Centro Paula
itinerários contínuos – seja servindo como e compartilhadas, para que os aprendizados Souza, da Secretaria de Desenvolvimento
ponto de partida para a estruturação de um possam ser aprimorados, replicados ou adap- Econômico do Estado de São Paulo e do Itaú
programa extensivo e que abranja uma ou tados por cada vez mais redes e instituições. Educação e Trabalho que esta publicação
mais redes, seja informando a articulação O que foi relatado até aqui é apenas o iní- contribua para inspirar diferentes soluções e
pontual entre instituições de diferentes níveis. cio dessa história, os primeiros passos de um sistemas de integração entre os níveis edu-
Assim, com a contextualização apresentada processo em constante avanço e que já está cacionais. Assim, será possível formar um
no Capítulo 1, com o relato apresentado no em novas fases. repertório de evidências sobre o tema e con-
solidar políticas que incidam positivamente na
educação e na vida profissional dos jovens.
Para que esse desejo se concretize, é ne-
cessário que haja uma mobilização efetiva das
redes, das instituições, das organizações do
Após a elaboração do curso de desenvolvimento de software terceiro setor e da sociedade, além do reco-
multiplataforma, descrita no Capítulo 2, o Centro Paula Souza nhecimento amplo da importância de promo-
aprovou a normativa que regulariza oficialmente o aproveitamento de ver itinerários contínuos, tornando-os cami-
aprendizagens entre diferentes níveis dentro da instituição, investiu na nhos reais e factíveis. Quanto mais diferentes
divulgação do programa e na composição de suas primeiras turmas em instituições e diferentes redes adotarem
cinco Fatecs no estado de São Paulo, e prepara-se para a abertura de experiências, produzindo novos aprendizados
um segundo processo seletivo para o ingresso de novas turmas – etapas e boas práticas, maiores serão as chances de
que provavelmente renderão novas publicações que registrem esses que sistemas de reconhecimento de compe-
avanços, os desafios do percurso e as soluções encontradas. tências, aproveitamento de estudos e vali-
dação de créditos tornem-se uma realidade
nacional, da qual todos se beneficiarão.
Por isso, cada caso de implementação, com
a documentação dos sucessos, dos desafios
enfrentados e das possibilidades de mitiga-
ção de dificuldades, é peça importante para
o fortalecimento de um ecossistema em que
todas as instituições participantes se reconhe-
çam e atuem como corresponsáveis por uma
trajetória de educação profissional contínua e
estimulante para os jovens.

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df&Itemid=30192

BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de


2017.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2017/Lei/L13415.htm

BRASIL. Resolução CNE/CP nº 1, de 5 de janeiro


de 2021.
http://portal.mec.gov.br/index.php?op-
tion=com_docman&view=download&alias=-
167931-rcp001-21&category_slug=janeiro-
2021-pdf&Itemid=30192

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Agradecimentos
Agradecemos aos entrevistados

ALEXANDRA DOS SANTOS ÉRICA TERUEL GUERRA


Especialista de Implementação e Analista Sênior
Desenvolvimento Itaú Educação e Trabalho
Itaú Educação e Trabalho
GILSON REDE
ALMÉRIO MELQUÍADES DE ARAÚJO Diretor de Departamento
Coordenador do Ensino Médio Técnico Grupo de Formulações e Análises Curriculares
Centro Paula Souza Centro Paula Souza

ANA CLÁUDIA MELO TIESSI GOMES HUGO RIBEIRO DE OLIVEIRA


DE OLIVEIRA Coordenador de Projetos do Eixo Tecnológico
Coordenadora de Projetos da Unidade de Informação e Comunicação
do Ensino Superior de Graduação Centro Paula Souza
Centro Paula Souza
SERGIO SGOBBI
ANDRÉ LUIZ BRAUN GALVÃO Diretor de Relações Institucionais e
Diretor do Departamento Acadêmico Governamentais
Pedagógico da Unidade do Ensino Superior Associação das Empresas de Tecnologia
de Graduação da Informação e Comunicação (TIC) e de
Centro Paula Souza Tecnologias Digitais (Brasscom)

DANIEL BARROS RAFAEL FERREIRA ALVES


Coordenador de Ensino Técnico, Tecnológico Coordenador do Ensino Superior Tecnológico
e Profissionalizante Centro Paula Souza
Secretaria de Desenvolvimento Econômico
do Estado de São Paulo RITA CARMONA MOREIRA LEITE
Coordenadora de Implementação e
DIOGO JAMRA TSUKUMO Desenvolvimento
Gerência de Articulação Itaú Educação e Trabalho
Itaú Educação e Trabalho

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