RESENHA DO LIVRO “TEMPO, NARRATIVA E ENSINO DE HISTÓRIA”
(MARIZETE LUCINI)
Lucas Moreira Barbosa
A obra “Tempo, Narrativa e Ensino de História” foi publicado pela
primeira vez em 1999 pela editora Mediação (Porto Alegre). O livro é resultado de uma pesquisa de campo numa escola pública pela professora da rede pública e privada Marizete Lucini, graduada em História pela Universidade de Santa Cruz do Sul (RS), com o objetivo da obtenção de um mestrado em educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (RS). Segundo a autora, o livro aborda do encontro entre o mundo do leitor e o do texto usado no ensino de História, e discute como ele pode pode permitir novas experienciações do tempo por parte dos alunos, e se o ensino de História nas escolas tem possibilitado isso. Analisemos brevemente o escopo da obra. Após tecer comentários sobre as inquietações que a lançaram em sua pesquisa na Introdução, a autora inicia o primeiro capítulo apresentando seu referencial teórico (o flósofo francês Paul Ricoeur), o ambiente onde se deu a pesquisa e suas primeiras relações com a professora de História e os alunos da turma selecionada, e como seu teórico de referência desenvolveu as categorias de análise que ela utilizou em sua pesquisa. No segundo capítulo, são apresentados os três alunos que foram entrevistados por Lucini (Fabrícia, Jerson e Marcelo), e suas análises iniciais dos “textos-forte” de cada um, i.e., as experiências que sempre estão atravessadas nas narrativas dos alunos, e tecendo seus comentários sobre estes. O capítulo três, por sua vez, disserta sobre o teor do conteúdo ministrado nas aulas de História na turma analisada. Nessa parte da obra são abordadas a História do Ensino de História no Brasil, a maneira como o livro didático usado pela classe em questão apresenta a História (seguindo o famoso quadripartite francês) e distancia o aluno do “Passado”, e também são problematizaos tanto esse distanciamento, quanto a ideia de uam história linear, se valendo de algumas categorias de Paul Ricoeur. O próximo tópico discutido está no capítulo quatro. Nele, Lucini aborda a relatividade da percepção do tempo de cada indivíduo, que tem sido completamente ignorada, em sua opinião, pelo ensino de História, a começar pelos livros didáticos, e problematiza a percepção ocidental do tempo, afrmando que esta não passa de uma construção histórica com base em atos fundadores, algo comum em outras culturas, e que podemos possibilitar aos alunos a experienciação de outromodos de percepção do tempo, modos estes que podem conectar o aluno com o passado outrora distante, usando como exemplo a fcção. Na mesma linha de raciocínio, o capítulo quinto encerra a obra propondo um modo de aplicar essa possibilidade de interação entre a História da fcção e a História escolar, para tornar factível o contato entre o “texto-forte” do aluno e o “Passado” pela mediação da disciplina de História, e apresentando um exemplo de sua experiência pessoal como professora para mostrar como podemos aplicar essas novas possibilidades. Agora, façamos um ou dois (breves) comentários sobre a obra. A obra possibilita, de início, um contato com a Filosofa da História sob uma ótica interdisciplinar, ao nos contactar com o flósofo Paul Ricoeur. Mesmo tendo se interessado desde cedo com a História, ele nunca adentrou na chamada Filosofa da História. E através de sua obra, a autora permite fundamentalmente a docentes das redes pública e privada contatos que podem ajudá-los a serem “professores-pesquisadores”, e saírem do método positivista da histoire événementielle. Em segundo lugar, a obra nos convida a questionarmos se nós temos alguma noção clara sobre o papel da disciplina e História na escola. No decorrer de todo o livro, a autora nos leva a questionar se podemos de fato esperar “sucesso” nas aulas se não assumimos conscientemente a ideia de que se os alunos não identifcarem essa relevância, eles sentir-se-ão desconectados do conteúdo ministrado, e a aula lhes será inútil. E, para nossa alegria, a autoranos apresenta uma ideia de resposta, ou melhor, uma possibilidade de experimentar essa necessidade que os alunos possuem de se sentirem “conectados com o Passado”. Mas uma pergunta fca: se o livro vem de uma pesquisa foi feita numa escola pública, e é sobre ela que a autora trata primordialmente, porque fez uso de um exemplo vivido por ela numa escola privada? Apesar dessa questão no mínimo intrigante, a obra possui valor fundamental para aqueles que entendem que a História, como disciplina escolar, tem suas especifcidades, não sendo mera repetição de conteúdos acadêmicos, mas algo único, que de mãos dadas com o aluno, pode lhe ajudar a construir sua própria consciência histórica.