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0 e o Niilismo na Arte
Nã o, nã o é o fim dã Histo riã dã Arté
De modo muito similar a Danto, Hegel também adotou uma postura niilista
prevendo o fim da Arte já no século XIX, com vista a distinguir o estatuto da arte
na época clássica e a sua função na modernidade. Na Idade Moderna, a arte teria
perdido o lugar privilegiado que ocupava nas sociedades gregas e orientais,
tornando-se assim algo antiquado, perdendo sua relação íntima ao mito, à religião
e à filosofia. Obviamente, a sociedade na época reverberava as ideias iluministas
em todos os campos, que colocavam a ciência em primeiro plano em detrimento ao
que a mesma não conseguia explicar dentro dos seus conceitos. Dessa forma, a
Arte se viu perdida, pois lidava com questões que até então não poderiam ser
racionalizadas pela ciência.
Como acredito que a História não seja linear e, sim, cíclica, vemos Artur
Danto repetir novamente a previsão de Hegel, mas com ares mais “confusos” e
incisivos da morte da Arte. Não apenas a Arte se vê perdida em entender o tempo
atual em que se insere, mas é uma limitação ao se estudar o momento da
sociedade em que se está inserido na área de humanas, uma dificuldade em ter
uma ideia geral do período, pois ele ainda está acontecendo. Além disso, creio que
os ideais iluministas de racionalização de todas as questões humanas, de certa
forma contaminaram a arte, causando a sua “cientificação”.
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a passagem de estruturas de solidariedade coletiva para as de
disputa e competição;
o enfraquecimento dos sistemas de proteção estatal às intempéries
da vida, gerando um permanente ambiente de incerteza;
a colocação da responsabilidade por eventuais fracassos no plano
individual;
o fim da perspectiva do planejamento a longo prazo;
e o divórcio e a iminente apartação total entre poder e política.
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mesma tenha sido Marcel Duchamp e sua desafiadora obra a Fonte. Com essa obra,
DuChamp questiona se o que determina o que é arte seja simplesmente o fato de
algo ser exposto dentro de uma galeria. Duchamp quebra o dedo do artista, no que
tange à destreza manual do fazer artístico, abrindo a possibilidade da pergunta
(Isto é Arte?) ao trazer ao espaço circunscrito à arte um objeto de categoria
ordinária, industrial, seriado. DuChamp, ainda teve uma papel ainda maior na arte
abrindo debate sobre uma das práticas mais em voga na Arte Contemporânea, a
ironia e a apropriação, com sua obra LHOOQ (que quando lido soa em francês como
“Ela tem fogo no cu”, figura acima).
Para Danto, não existe mais critério para se estabelecer o que é ou não é
arte. Se a técnica e o talento deixaram de ter importância, se não existe diferença
visível, por exemplo, entre um objeto do cotidiano e um objeto de arte, o que
determina o valor de um artista passa a ser sua capacidade de inserção (causação)
no sistema da arte, através de uma rede de relacionamentos com marchands,
galeristas, curadores, colecionadores – sistema que expeliu, por desnecessários, os
críticos. Esse sistema dita o que vale e o que deixa de valer, segundo movimentos
que têm muito mais a ver com a Bolsa de Valores do que com a idéia convencional
de arte. Nesse caso, parece haver uma verdadeira “usina” de criação de artistas
com o único objetivo de vender arte. Essa dominação da Arte pelo capital tende a
pasteurizar a discussão estética, social e política da Arte, uma vez que nenhum
banqueiro irá querer uma obra em sua própria residência, por exemplo, que
evidencie um discurso antineoliberal. Por outro lado, pode favorecer o discurso
subjetivo desses aspectos, o que ainda, sinceramente, não tenho percebido.
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próprio Danto assume que o modelo vigente “impossibilita a definição de obras de
arte com base em certas propriedades visuais que elas possam ter”. Ele vai além,
numa sentença que considero verdadeira, mas não pode ser, a meu ver, visto com
o prisma niilista: “O que quer seja a arte, ela já não é basicamente algo para
ser visto”.
Para Walter Benjamin a arte possui um fim específico e está ligada a noção
de superestrutura, que funciona (se transforma) sob uma dialética mais lenta que a
econômica; e é, portanto, determinada e dialógica a outros níveis da realidade
social. O que importa é que, na modernidade, com a reprodução técnica, o fim
(enquanto objetivo) da arte mudou. Com a derrocada da “autenticidade”, agora a
arte não possui mais a função social do ritual, mas da política. Nesse momento, a
obra de arte desloca-se do culto para a exposição. Quer dizer, ela não é mais
utilizada para ser adorada, cultuada, venerada, porém assistida, mostrada,
circulada, transmitida, assimilada, reproduzida. “Na medida em que a era da
reprodutibilidade técnica da arte a desligou dos seus fundamentos de culto,
extinguiu para sempre a aparência da sua autonomia”.
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medo de se posicionar sobre de forma negativa sobre uma obra de arte, sob o
argumento de ser acusado de não ter entendido o artista e sua obra.
Nessa baila, o ponto que considero não ter sido observado por Danto em sua
época, e que parece cada vez mais claro atualmente com a internet é que todo o
sistema de arte está sendo subvertido. Não apenas os críticos de arte foram
expelidos pelo sistema, mas o conceito de galeristas e curadores estão sendo
remodelados com as facilidades da comunicação e distribuição em massa oriundas
da internet – novamente, a viralização. A exemplo da música, em que artistas que
não são selecionados pelos sistemas clássicos, gravadoras, como outrora, colocam
o seu material disponível na internet (youtube, por exemplo) eliminado a
necessidade desse atravessador. Vários têm êxito nessa prática sendo
posteriormente incorporados ao sistema clássico, como é o caso de cantores do
cenário indie. Dessa forma, a internet está permitindo que os próprios
consumidores de arte se tornem curadores e marchands de artistas. Isso ainda é
incipiente na arte de forma geral, especialmente a ligada às artes visuais, mas vejo
isso se acelerando, embora o academicismo (e o mercado de arte) esteja tentando
combater essa ideia.
Dessa forma, mais ousada, receio afirmar que o conceito de artista também
está sendo posto em cheque à medida que o público se vê também como
participante da arte, se apropriando das obras. Uma verdadeira Arte 2.0, aquela em
que o espectador reivindica a co-autoria, a contemplação participativa, em alusão à
internet 2.0, em que o público não apenas aceita o que lhe é mostrado, mas o
digere, modifica, responde, se apropria; promovendo a diluição do artista como
único criador da obra, da linguagem. Na verdade, essa situação já havia sido
experimentada nas ideais neoconcretas, da década de 1970, com Lygia Clarck,
Hélio Oiticica, na concepção da arte relacional, em que o artista participa como
propositor e a obra é aberta, dependendo do espectador para sua conclusão.
Dessa forma, ouso dizer que a Arte Atual está prosseguindo em seu caminho
de destruição dos conceitos base das artes: artista, marchands, galerias, museus,
dentre outros de forma a romper com a era anterior, dessa forma creio ainda não
haver um fim da História da Arte. Dessa forma ainda há o predomínio da estética
na discussão do que é produzido.
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Gentimente cedida por Fernanda B. Ribeiro
Existe uma crítica atual, à forma como as pessoas visitam museus, galerias.
O advento da fotografia digital e das redes sociais permitiu que todos
compartilhassem suas experiências numa escala jamais vista anteriormente,
criando o que já fora previsto por Danto como desordem informativa, um aumento
da entropia estética, em que nada parece apontar para lugar algum. Várias críticas
que leio e os puristas de forma geral tendem a ver com cautela essa massificação e
necessidade de afirmação pessoal vista em inúmeros posts de fotos pessoais de
visitas a museus, fazendo parte dos inúmeros selfies. E o que vemos é uma
enxurrada de imagens que parecem não ter sentido algum, mas para mim elas
constituem apropriações das obras e inserção do indivíduo na obra. Isso não seria
uma discussão estética? O sujeito comum quer se inserir na obra, quer participar
da mesma, ressignificá-la, atribuindo novas questões; relaciona-se com a obra. O
sujeito a recria, numa visão simplória, tirando a sua própria foto, a forma como a
vê, apropriando-se. A obra de arte torna-se “mutatis mutandi”, de acordo com o
olhar de quem a vê. Assim, o smartphone se torna a ferramenta democratizante da
arte, tornando a mesma onipresente. Dessa forma, a obra se viraliza, toma todos
os espaços físicos e virtuais, reais e ficcionais; se transformando nela, se inserindo
na malha da sociedade.
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Daniela Labra em recente artigo no Jornal o Globo (Segundo Caderno, 05 de
maio de 2014) reforça essa visão dizendo que há um demasiado anseio por
consumo visual e que isso afasta o sujeito da dimensão crítica do objeto artístico,
levando-o para um lugar onde a visão se torna alientante. Considero esse discurso
demasiado elistista, a maioria das pessoas que estão alcançando os museus hoje
em dia no Brasil nunca tiveram a oportunidade de estar perto de uma obra de arte
e, o estão fazendo, sim, para o consumo visual. Mas esse consumo visual não deixa
de ter reflexos na estética, nas sensações que esses indivíduos percebem. Saber
que algo é digno de observação, de se fotografado é mais importante do que
conhecer o autor e sua importância? Será que esses sujeitos não estão realmente
apenas consumindo visualmente as obras, porque de fatos essas obras nos quais
não se veem, não são alienantes por si só, uma vez que não representam questões
da sua vida cotidiana. Existe muito a ser discutido nesse campo. Mas considero que
esse tipo de discurso afasta o indivíduo que poderia ser tocado por uma obra e
seguir as regras de “observação” artística que a autora pressupõe serem as mais
apropriadas.
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Por isso, enquanto o capital ditar as normas produtivas da arte atual que
visa manter conservadas as relações de propriedade e resignação, a única
perspectiva revolucionária possível é a mudança das regras das concepções
tradicionais de arte – incipiente para o autor; e que parecem encontrar eco nas
mudanças sociais promovidas pela internet. “A humanidade que, outrora, com
Homero, era um objeto de contemplação para os deuses do Olimpo, é agora objeto
de autocontemplação. A sua auto-alienação atingiu um grau tal que lhe permite
assumir a sua própria destruição, como a um prazer estético de primeiro plano. É
isso o que se passa com a estética da política, praticada pelo fascismo. O
comunismo responde-lhe com a politização da arte” (BENJAMIM, 1985).
A pergunta que fica não é se algo é ou não Arte... a pergunta é: Isso é bom
ou ruim? E por quê? Em que isso afeta/afetará nossa vida, nossa forma de pensar,
de relacionar?
Referências
BELTING, H. O fim da história da arte: uma revisão dez anos depois. São
Paulo: Cosac Naify, 2006.
PERL, J. Magicians & Charlatans: Essays on Art and Culture. Fort Worth:
Eakins Press Foundation, 2012.
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