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R E S E N H A

MULHERES QUE CONQUISTARAM


ESPAÇO E VOZ NA BÍBLIA:
RESISTÊNCIAS AO
PATRIARCALISMO*
José Geraldo de Gouveia**

FERREIRA, Joel Antônio. Mulheres que conquistaram espaço e voz na Bíblia: resis-
tências ao patriarcalismo. São Paulo: Paulus, 2023.

O
livro Mulheres que conquistaram espaço e voz na Bíblia, de Joel Antônio Ferreira,
professor do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião (Mestrado e
Doutorado) da Pontifícia Universidade Católica de Goiás é uma recente publica-
ção e um marco na pesquisa bíblica brasileira. Ao longo de 220 páginas, organiza-
das em dois capítulos, o autor apresenta uma reflexão que resgata, a partir da Lei-
tura Sociológica pelo Modelo Conflitual/Contradição, o protagonismo feminino
na literatura bíblica. Esse modelo de leitura proposto no livro, não só evidencia o
papel fundamental das mulheres na literatura bíblica, mas traz à luz alguns temas
que foram “cristalizados” nos relatos bíblicos e que nem sempre correspondem à
realidade dos fatos. Já na introdução do livro o autor pontua certos relatos bíblicos
demonstrando que por trás do que foi redigido existe toda uma trama literária que
foi evoluindo marcada por um contexto histórico, social e teológico. Toda essa
conjuntura redacional da Bíblia era normalmente finalizada com o toque de um
redator final, que não raro, através de “glosas” alterava o texto favorecendo uma
leitura mais de acordo com os interesses dos poderosos (p. 19).
O foco central do livro é resgatar o protagonismo feminino dentro da história bíblica.
Entretanto, a reflexão é conduzida de tal modo que também explicita a evo-
lução dos textos bíblicos, desde a transmissão oral que era passada dentro do
contexto familiar, de pai e mãe para filhos e filhas, dos vovôs e vovós para os

–––––––––––––––––
* Recebido em: 02.10.2023. Aprovado em: 03.11.2023.
** Mestre em Teologia bíblica pela Pontificia Università San Tommaso, Roma. Doutorando
em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – Bolsista CAPES.
E-mail: josegeraldodegouveia@gmail.com

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netos e netas, usando uma linguagem coloquial (dialetos), até o momento em
que esses textos foram redigidos (em hebraico), num contexto mais formal e
institucionalizado. Essa passagem da oralidade para a redação escrita foi mar-
cada por várias reinterpretações. Os redatores faziam releituras e muitas vezes
atualizavam os textos, segundo seus interesses (p. 75).
A obra do professor Joel, tem, portanto, um grande valor didático no que se refere
à evolução dos textos bíblicos. Apresenta as memórias populares que estão
por trás das narrativas bíblicas, verdadeiros ambientes-fonte do que seria co-
nhecido mais tarde como as Sagradas Escrituras. O estudo mostra ainda que,
apesar das glosas e reinterpretações, o Antigo Testamento conservou algumas
experiências libertadoras que demonstram o rompimento com o sistema pa-
triarcal, ao que tudo indica, fruto de alguma escola sacerdotal de mentalidade
mais aberta. Esse fato confirma que o Deus bíblico jamais se posicionou ao
lado dos que tentavam silenciar as mulheres, de sorte que, apesar do sistema
patriarcal, muitas mulheres conseguiram erguer suas vozes e encontrar espaço
na história bíblica.
O primeiro capítulo do livro aborda vários relatos do Antigo Testamento mostrando
como que algumas mulheres conseguiram protagonizar momentos decisivos
na história bíblica. O autor salienta que já no início do livro de Gênesis se
percebe que o patriarcalismo não conseguiu apagar a resistência feminina,
pois em Gn 1,27 que narra a criação do ser humano, é visível a influência de
mulheres e o versículo faz a seguinte afirmação: “E Deus criou o ser humano
à sua imagem; à imagem de Deus ele o criou; macho e fêmea os criou”. Aqui
não se fala de adam (homem, no coletivo), nem de ish (este homem), mas de
dzakar (macho); em seguida o texto não fala também de ishah (esta mulher),
mas de neqbah (fêmea), deixando claro a equivalência de gênero. Nem a re-
forma de Esdras no pós-exílio conseguiu apagar as palavras dzakar e neqbah
demonstrando que o masculino e o feminino possuem a mesma dignidade.
Dentro ainda do primeiro capítulo, algumas mulheres são mencionadas como protagonis-
tas na história bíblica. Como a escrava e estrangeira Agar, que conseguiu partici-
par da promessa divina, sendo a única mulher no Antigo Testamento a fazer uma
experiência teofânica (p. 40). É descrito a sagacidade de Tamar que transformou
o ultraje sofrido em justiça, fazendo o patriarca Judá rever sua conduta autori-
tária, recuperando assim as bênçãos de Jacó (p. 61). Destaque também para as
parteiras hebreias, Sefra e Fua, que diante de um genocídio imposto pelo faraó
egípcio que ordenava a morte das criancinhas masculinas dos hebreus, consegui-
ram sabiamente contornar uma situação de morte em condição de vida. Nesse
mesmo contexto de genocídio das criancinhas hebreias, também duas mulheres
escravas salvaram a vida do recém-nascido Moisés, que mais tarde seria o gran-
de instrumento divino de libertação dos hebreus (p. 63).

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Outras protagonistas foram evidenciadas pelo autor. Míriam e suas companheiras can-
toras e lutadoras se tornaram uma baliza na história da libertação do povo he-
breu, de tal sorte que, “querendo ou não as escolas sacerdotais e os redatores
finais, o cântico de Míriam e das outras mulheres ficou eternizado na Bíblia”
(p. 84). As irmãs Maala, Noa, Hegla, Melca e Tersa são mais um exemplo de
protagonismo feminino. O autor mostra que essas irmãs conseguiram não só
romper com o patriarcalismo, como também “não admitiram que o nome do
pai delas fosse extinto e impuseram, pela discussão e reinvindicação, o direito
e a herança da terra” (p. 93). De fato, uma das vitórias mais significativas por
parte de mulheres silenciadas no Antigo Testamento.
Outras mulheres do Antigo Testamento destacadas nesse livro são: Débora, Raab, Bet-
sabeia, Rute e as mulheres de Belém. Débora, profetisa de Efraim, que se tor-
nou líder e salvou seu povo, em “profunda comunhão com Yahweh, o Deus dos
enfraquecidos” (p. 109). Raab, mulher estrangeira e prostituta, que protagoni-
zou a conquista de Canaã ao salvar a vida dos dois espiões hebreus e professar
sua fé em Yahweh. Raab passou a fazer parte do povo hebreu, demonstrando a
importância da liderança feminina. “Raab entrou, legalmente, na história dos
israelitas”, citada por Mateus em sua genealogia de Jesus (p. 118). Betsabeia é
destacada pelo autor não como protagonista, mas como uma mulher “violada
pelo monarca”, o rei Davi. Entretanto, o professor Joel demonstra que Betsa-
beia, participou do plano divino em relação ao Messias, sendo citada também
por Mateus na genealogia de Jesus (p. 125-126).
Rute e as mulheres de Belém fazem o fechamento do primeiro capítulo do livro, tam-
bém essas como protagonistas femininas na história bíblica. Rute, apesar de
estrangeira, não se conformou com a situação adversa, lutou e demonstrou que
o regime imposto por Esdras, que abominava os estrangeiros, não teria a pala-
vra final. Orientada por Noemi, sua sogra, “Rute se tornou o rosto de quem se
recusava a aceitar as normas desumanas de Jerusalém e seu chefe, o sacerdote
Esdras” (p. 129). Ao analisar o protagonismo de Rute e de outras mulheres
de Belém, o autor destaca que apesar das glosas dos redatores sacerdotais (Rt
1,1; 4,18-22), tentando situar Rute no “tempo em que os juízes governavam”,
ou seja, retrocedendo os fatos para quinhentos anos antes, e assim esvaziar a
crítica feita ao sacerdote Esdras, o que prevaleceu foi a mensagem protago-
nizada por Rute e Noemi, demonstrando que Yahweh é quem conduz a vida
comunitária, não Esdras e seu grupo.
O segundo capítulo do livro aborda o protagonismo feminino presente no Novo Testa-
mento. O autor deixa claro já de início que as memórias populares femininas
no Novo Testamento estão “bem próximas do acontecimento ‘Jesus’. Com isso,
não se veem as escolas teológicas institucionais como no AT” (p. 139). Contudo,
as glosas também estão presentes no contexto neotestamentário. O autor alerta,

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por exemplo, que todas as vezes que nas cartas genuínas de Paulo, aparece al-
gum tipo de aversão às mulheres, isso não foi obra do Apóstolo, mas de algum
grupo que tentou voltar com a mentalidade patriarcal, formando os “códigos
domésticos” (p. 140-141).
As primeiras mulheres mencionadas neste livro como protagonistas do Novo Testa-
mento já foram citadas no capítulo primeiro. As mulheres são: Tamar, Raab,
Rute e Betsabeia. Contudo, agora elas figuram na genealogia mateana de Je-
sus. O autor procura mostrar como essas mulheres foram vistas por Mateus,
que ao incluí-las em sua genealogia deixa claro que a ‘justiça’, ponto funda-
mental para o evangelista, supõe a inclusão “tanto do universo estrangeiro
como o mundo feminino, de igual para igual” (p. 142). Assim essas mulheres
são protagonistas para os cristianismos originários, são ancestrais de Jesus.
Além dessas quatro mulheres, o autor destaca uma quinta mulher na genea-
logia mateana: Maria, a mãe de Jesus, que também se encontrava dentro do
regime excludente das classes dominantes. Entretanto, Mateus a viu como par-
te do plano divino, rejeitada como as quatro primeiras, mas queridíssima por
Deus (p. 150).
O segundo capítulo continua analisando outras mulheres. Uma das reflexões chama a
atenção para a mulher siro-fenícia de Mc 7,24-30. Além de evidenciar a aber-
tura universalista do episódio a reflexão faz novas indicações. Sugere que a
presença feminina na comunidade marcana “foi um dos esteios da propagação
libertadora do Evangelho” (p. 151). Mostra que não é somente uma questão
de abertura universal, mas é também uma questão de gênero. Existe um jogo
de palavras na perícope para falar de criança ou filho/a. Quando a siro-fenícia
fala de sua filha o termo usado é thygatrion (v. 25-26), que significa filhinha,
dependente e submissa à estrutura patriarcal; Jesus usa o substantivo teknon,
que significa filho legítimo ou descendente. A mulher não usou a palavra tek-
na, como Jesus. De modo que além da questão da abertura para os gentios
existe também uma abertura de gênero. Assim, a comunidade marcana mostra
que pelos anos 70, “Jesus não era somente uma lembrança. Ele estava falando,
vivamente, que as cristãs e os cristãos tinham direito a assentar-se à mesa” (p.
159). Aliás, lembra o autor, que a siro-fenícia chama Jesus de Kyrios, única
vez em Marcos. E assim, no final a mulher recebe de Jesus o sinal verde de
libertação.
Continuando a reflexão sobre o protagonismo feminino no Novo Testamento, este
livro aborda ainda mais quatro mulheres: Maria do Magnificat; a mulher sa-
maritana; Marta e Maria Madalena. O professor Joel ao falar sobre Maria (a
mãe de Jesus) no Magnificat, menciona a preocupação de Lucas para com os
pobres e para com o universo feminino. Além disso destaca como Lucas traba-
lhou o ‘Evangelho da infância’ com particular atenção para o significado dos

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nomes dos personagens. Contudo, o foco da reflexão nesse ponto se encontra
em Maria no Magnificat. O contexto é o da visitação de Maria à Isabel. São
duas mulheres pobres e silenciadas pela sociedade. Entretanto, são essas duas
mulheres que anunciam a salvação messiânica. E mais: a salvação anunciada
chegou através dos pobres e dos humildes (anawim). O autor enfatiza que o
encontro dessas duas mulheres, Maria e Isabel, marcou o fim do Antigo Tes-
tamento e o início do Novo Testamento. São duas figuras preeminentes. Uma
carrega no ventre um profeta (João), a outra o Messias (Jesus) esperado. As
duas anunciaram um projeto novo esperado pelos anawim, e ao mesmo tempo
denunciaram as tiranias vigentes, proclamando que Yahweh “se inclinou para
todos/as os/as marginalizados/as” (p. 171).
A próxima mulher protagonista que o autor destaca é a samaritana. O primeiro fato des-
tacado nessa reflexão é a superação por parte de Jesus das convenções sociais
da época. Um homem não deveria conversar com uma mulher desconhecida,
especialmente em público. Com isso Jesus rompe com a questão de gênero es-
tabelecida e também com a questão étnica. A mulher é uma samaritana (p. 179).
Nesse encontro com a samaritana três fatos se destacam: a mulher samaritana
que representa as femininas silenciadas; os discípulos de Jesus, ainda presos
aos preconceitos de gênero, culturais e de etnia; e por fim, Jesus que apresenta
uma novidade para os dois grupos. A reflexão do professor Joel evidencia a
pedagogia do evangelho joanino e seu estilo. No diálogo com a samaritana
Jesus dá um recado aos seus discípulos para que eles pudessem compreender
que as comunidades cristãs “eram compostas de femininas e masculinos” (p.
179); depois um outro recado é dado aos habitantes da Samaria, que ao ouvir
a mulher tiveram suas vidas modificadas, fato que se tornou uma força para o
Evangelho joanino.
Esta reflexão sobre o protagonismo feminino no Novo Testamento apresenta também
a profissão de fé de Marta. A fé é um ponto fundamental para o Evangelho de
João. Diferente dos sinóticos que apresentam um esquema que privilegiam a
profissão de fé masculina, em João, Marta é quem mostra a riqueza da profis-
são de fé. Toda a trama acontece no episódio da “ressurreição” de Lázaro, que
dentro do esquema joanino é o “sétimo sinal”. João usa a palavra sinal (se-
meion) no lugar de milagre. São sete sinais no Evangelho joanino. Sinal é algo
que ultrapassa o milagre (p. 181). Nesse encontro com Jesus, Marta reconhece
que Ele é o Messias, ela se torna assim o modelo do discipulado que precisa
crer que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus. Após o encontro, Marta se torna
missionária, uma nova Marta, alguém que entendeu o sinal e o anunciou para
sua irmã Maria. Assim, em João não são os masculinos que fazem a profissão
de fé madura em Jesus, mas as femininas, que superaram o sistema patriarcal
com seu sectarismo e anunciaram o Ressuscitado presente nas comunidades.

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A última mulher que tem seu protagonismo destacado neste livro é Maria Madalena. O
autor menciona que Maria Madalena é citada por todos os quatro evangelistas,
fato que já demonstra sua importância para os cristianismos originários (p.
190). Entretanto, Maria Madalena teve seu nome fundido com os nomes de
outras mulheres do Novo Testamento através de uma homilia proferida pelo
papa Gregório Magno em 591 d.C., fato que deturpou sua imagem. Mas a pre-
sente reflexão resgata a “Maria Madalena original”. Ela “fazia parte do grupo
das mulheres que acompanhavam Jesus” (p. 189). Além disso, ela foi a primeira
pessoa a encontrar-se com o Ressuscitado e foi enviada por Ele. A palavra após-
tolo significa enviado, logo, Maria Madalena é apóstola da ressurreição. Assim,
ela tornou-se a mais importante discípula (apóstola/enviada). O papa Francisco
em 2019 celebrou o dia de Maria Madalena definindo-a como “apóstola dos
apóstolos”. Com essa iniciativa Francisco deu um recado claro no sentido de
abertura, demonstrando que o grupo feminino também fazia parte do discipu-
lado de Jesus (p. 197). E mais do que isso: foi “um recado para quem (auto-
ridades) não admite que a mulher é a imagem e semelhança de Deus como
o homem (Gn 1,27) e que é preciso empoderá-la, também, na conjuntura
cristã” (p. 198).
O último tópico desenvolvido neste livro é uma análise sobre os primórdios dos cristia-
nismos originários, demonstrando a vitória das comunidades femininas sobre
o patriarcalismo. O autor destaca o trabalho de Paulo e seu grupo que trouxe-
ram “uma legião de mulheres que ajudaram a revolucionar as sociedades da
época, com o anúncio do Evangelho” (p. 200). É oportuno e honroso citar seus
nomes: “Febe, Cloé, Priscila, Evódia, Síntique, Maria, Júnia, Trifena, Trifosa,
a mãe de Rufo, Perside, Júlia, a irmã de Nereu, Olimpas, Ápia” (p. 200). De
sorte que, o hino batismal de Gl 3, 26-28, expressa muito bem essa realidade:
“não há homem nem mulher” (v. 28c). O autor recorda que antes de Paulo o
hino batismal já era cantado por algumas comunidades. Tal fato impressionou
o Apóstolo e seu grupo pois perceberam que, “em Cristo Jesus, não havia di-
ferença entre homem e mulher”. E nesse período, recorda o autor, “o Império
Romano se movia a partir do ‘modo de produção escravagista’. Os milhares
e milhares de escravos eram gentios” (p. 201). E o hino batismal toca tam-
bém nesse ponto ao afirmar que não há mais diferença entre judeu ou grego,
escravo ou livre. Nesse contexto o hino expressa um desafio multicultural.
De modo que, as mulheres ouvindo essa referência sobre os gentios e escra-
vos, certamente levantaram as vozes e impuseram que na ekklesía não havia
diferença entre o masculino e o feminino.
Algumas mulheres do epistolário paulino são ainda mencionadas como líderes comu-
nitárias. Por exemplo, Evódia e Síntique; Cloé; Priscila; Ápia; Febe; Prisca;
Maria; Júnia; Trifena; Trifosa; Pérside e Júlia. De sorte que, antes de Paulo,

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poucas mulheres eram conhecidas como evangelizadoras, mas com ele e seu
grupo cristão o projeto se abriu pela unidade em Cristo, através do hino batis-
mal, superando a dinâmica social e patriarcal do grego/judeu, e escravo/livre,
“porque estava sendo efetivada a superação homem/mulher” (p. 210).
No final desta obra o autor apresenta uma conclusão sobre os temas objetos de suas
reflexões. Enfatiza dois textos bíblicos: Gn 1,27c e Gl 3,28. Deixa claro que
apesar da caminhada bíblica ter acontecido dentro de um contexto marcado
pelo sistema patriarcal, as memórias populares anteriores ao texto escrito
acabaram sobrevivendo. Tal fato se deve à resistência feminina com participa-
ção efetiva nos acontecimentos. Essa resistência conseguiu superar as glosas
introduzidas pelos redatores finais e ficaram gravadas na Bíblia. Dois momen-
tos nesse sentido podem ser lidos em Gn 1,27c e em Gl 3,28c. São momentos
pontuais, mas que mostram que “a Bíblia é uma bela ferramenta para qualquer
projeto que tem como meta a aniquilação do patriarcalismo” (p. 218). E o au-
tor conclui: “todos vocês (judeus/gregos, escravos/livres, homem/mulher) são
UM só em Cristo Jesus” (p. 218).
O tema abordado neste livro, sobre o protagonismo feminino na literatura bíblica, já
vem sendo debatido no meio acadêmico. Contudo, a presente obra foi redigida
de tal modo, que amplia a questão através de uma análise Sociológica pelo
Modelo Conflitual e demonstra com muita clareza, o quanto é oportuno e ur-
gente estudos que sejam capazes de resgatar a real participação do feminino
na história bíblica. Para além desse resgate do protagonismo feminino, trata-se
de uma questão de justiça, afinal, o ser humano é feminino e masculino, com a
mesma dignidade, fato magistralmente demonstrado neste livro. A linguagem
empregada neste estudo é ao mesmo tempo acadêmica, científica e com uma
enorme riqueza pastoral, própria de estudiosos que conseguem traduzir os tex-
tos bíblicos naquilo que de fato devem ser: instrumentos geradores de vida.

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