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Professor da USP e autor , ex-presidente da Radiobrás no primeiro

governo Lula e autor de dois livros sobre comunicação pública -


"Em Brasília, 19 horas" e " O Estado de Narciso”, o jornalista Eugenio
Bucci avalia que a Secom errou. Confira, abaixo, a análise do
especialista em cinco pontos.

 Ponto 1
“É preciso olharmos a questão em perspectiva. Se compararmos esse tropeço
do governo atual com as atrocidades cometidas pela comunicação pública do
governo anterior, que tinha um presidente que insultava jornalistas toda
semana, ofendendo especialmente as mulheres, parece até que estamos
falando das emissoras públicas da Suíça. Sim, a Secom atual comete um erro,
ao menos a meu juízo, mas é um erro muito mais ameno do que as violências
que tivemos na comunicação do governo anterior.”

 Ponto 2
“Qual o problema dessas travessuras que você, acertadamente,
chamou de ‘MemeBras’? O erro, ou a essência do erro, está na
inobservância do princípio da impessoalidade. Quando a
autoridade pública, ao se comunicar com a sociedade, dá
prioridade às suas predileções partidárias pessoais, temos uma
quebra grave da impessoalidade.
Tomemos o que diz o artigo 37 da Constituição: “A administração
pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência”. Os memes rompem com o princípio constitucional da
impessoalidade. Nesse sentido, incidem num desvio ético – ainda
que não incorram em ilegalidade flagrante. A comunicação de
governo não deve e não pode fazer piadinha para tripudiar sobre
padecimentos de adversários eleitorais. De modo algum isso é
uma forma normal de proceder. A Secom errou".

 Ponto 3
“As ‘brincadeiras’ sardônicas trazem engajamento? Talvez. Os
números, pelo menos, indicam que sim. Mas compensa?
Definitivamente, não. Essas ‘ironias estatais’ (um oxímoro, pois ao
Estado não é facultado o recurso da ironia) prejudicam a
credibilidade da comunicação pública. E prejudicam gravemente.
Pensemos, por exemplo, no que aconteceria se um grande jornal
publicasse, em um determinado dia, dez páginas de fotos
pornográficas. Seguramente, ele aumentaria em dez vezes, pelo
menos, as suas vendas em bancas. Aumentaria também o número
de acessos na internet e principalmente nas redes sociais. Suas
páginas de pornografia seriam as mais compartilhadas da história.
Não obstante, esses recordes de suposta popularidade seriam um
desastre para a reputação e a credibilidade do jornal. O sucesso à
custa de anabolizantes o destruiria.
É exatamente o que acontece agora com a comunicação da Secom.
O engajamento que ela obtém com esses recursos sensacionalistas
– indiscutivelmente sensacionalistas e de mau gosto – redundam
em desgaste da imagem da comunicação do governo."

 Ponto 4
“É preciso que a comunicação não se deixe confundir, jamais, com
a propaganda eleitoral. As anedotas venenosas da Secom teriam
algum sentido em um discurso rebaixado de campanha eleitoral,
não no repertório da comunicação de governo. Confundir os dois
canais é um desserviço para ambos.

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