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Nas ruas vazias do distrito do entretenimento, quando o sol é mais ofuscante que os

extravagantes bordéis e bares, gritos ecoavam pela rua deserta.

No quarto de um dos bordéis, uma bela dama encontrava-se jogada no chão, cercada por
mulheres preocupadas, que se ajoelharam perto do corpo da moça, segurando firmemente
em suas mãos enquanto tentavam amenizar sua dor agonizante.

Pela porta, um jovem, mas bem jovenzinho mesmo, observava de forma ansiosa, aquele
tumulto todo deixava-o agitado; muito mais com a ideia de ter mais alguma criança naquele
local. Alguém para conversar. Uma presença para alegrar sua vida solitária naquele bordel,
em que estava cercado por garotas de programa e pessoas interesseiras.

“AAAAAAHHH ” !
Foi tirado de seus pensamentos por um grito. Um grito bem mais alto que os outros, que o
deixou preocupado. Correu para dentro do quarto em que acomodava a moça, seus
pensamentos estavam a mil. Ele estava ocupado demais pra pensar na sua furtividade a
esse ponto. As mulheres começaram a repreendê-lo, mas ele lidaria com isso depois.

A cena que o rapaz viu, foi a mulher deitada na cama, um lençol sobre suas pernas e uma
respiração pesada, porém aliviada. Seu olhar viajou até uma outra moça, que segurava uma
moça, que segurava um recém-nascido acima de uma bacia de água, gentilmente lavando o
bebê. A mulher olhou para o restante, com um largo sorriso estampado na cara.

“É um menino.”

Yuujin. Kusuke Yuujin é o nome que deram a essa criança. Naquele mesmo dia, sua mãe
(se é que dá pra chamar aquela mulher disso) sequer olhou na cara do seu recém nascido.
Na próxima semana, mal saiu do quarto. As garotas da casa a levavam comida no quarto, e
era raro vê-la interagindo. Era notório ver o quanto o parto afetou a moça, num ponto que
apenas citar algo que a lembrasse disso resultava em gritos e muita, muita choradeira. Era
uma garota jovem, então era de se entender esse choque inicial.

Só que ele não foi só inicial. Com os meses se passando, ela voltou a trabalhar, mas
continuou sequer olhando para o bebê. Tinha dias que ela nem mesmo o via pelo bordel, e
a moça não poderia ligar menos. Ela abominava esse garoto. Esse fruto de um homem
frustrado que queria apenas uma diversão temporária, que arruinara o corpo tão belo e
jovem que tinha. Sentia repulsa somente de olhar para ele, com aqueles olhinhos fechados
e pele pálida.

O trabalho todo ficou para as restantes, que apesar de ficarem incomodadas com essa
atitude, não tiveram escolha a não ser cuidar do bebê; pois, sozinho, ele não se cuidava.
Grande parte desse trabalho caiu nas mãos de Isami Hairo, um jovem que também foi
nascido no bordel, que costumava trabalhar de atendente. Hairo ficava maravilhado com o
menino, e falava com o bebê toda hora (como se ele fosse responder), mesmo sendo
adolescente a esse ponto.

Então, Yuujin cresceu assim. No meio de trabalhadoras noturnas cuidando de si, com o
desprezo de sua mãe, e a companhia de um jovem para o animar. Ele não considera sua
infância ruim, honestamente: diz que, para as circunstâncias, foi bem mais confortável do
que aparenta ser. O seu maior problema mesmo, não foi esse.

As pessoas ao seu redor podiam reparar que ele sempre esbarrava nas coisas, e muitas
vezes deixava de enxergar coisas que ficavam bem em sua frente. Os olhos da criança
também eram muito esquisitos! Acharam que ele poderia ser cego, mas seus olhos não
eram esbranquiçados. Porém, seus olhos pareciam borrados, desfocados, como se fossem
de vidro. Apesar de conseguir determinar formas, raramente ele conseguia determinar
detalhes e até mesmo formas eram difíceis pra ele as vezes.

Com isso, as mulheres raramente o deixavam sair para procurar outras crianças para
brincar, e diariamente precisava de alguém o guiando pelos corredores apertados do bordel.
Ele sempre odiou, se sentia insuficiente. As palavras de sua mãe as vezes entravam
demais na cabeça dele, e o sentimento de ter que sempre depender de alguém é algo que
ainda o acompanha, mas que ele odeia. Inclusive, nos dias atuais, ele esconde o fato de
que é cego bem frequentemente; mas, isso é apenas um detalhe…

Bem, sua vida foi essa. Massante, até Hairo completar seus 23 anos e Yuujin ter seus 8, o
bordel que acolhia eles estava passando por uma grande crise devido a um caso específico
onde um político importante foi pego desrespeitando uma das trabalhadoras da casa. Ao
tentarem pedir por justiça, acabaram sendo silenciados e a quantidade de clientes diminuiu
exponencialmente. Com isso, estava difícil manter os dois rapazes, e elas haviam
conversado com Hairo, que com muito peso no coração, ele teria de sair de lá. O rapaz não
tomou a notícia nada, nada bem. Tanto que, naquela noite, quando era suposto sair
sozinho, agarrou-se a Yuujin e levou-o junto, fez até uma pequena mochilinha para ele.

Assim, passou-se anos. Hairo conseguiu se estabilizar fazendo trabalhos meio suspeitos,
enquanto Yuujin, em sua maioria, tinha que ficar em casa, o que o frustrava demais. Ele já
tentou diversas vezes sair sozinho, e algunas até conseguiu, mas a vizinhança sempre
levava-o de volta para casa, devido aos avisos constantes de Hairo sobre o menino.

Essa rotina era constante, até que, depois de um de seus trabalhos, Hairo voltou com um
homem. Este homem e Hairo conversaram muito, e o jovem até mesmo dormiu na casa
dele. Este homem era um caçador de demônios, que acabou por salvar Hairo em uma
emboscada feita por onis para devorá-lo. Apesar de não ter muito conhecimento sobre,
Hairo ajudou o caçador a matar os seres demoníacos, o que fez um certo interesse ser
criado pelo lado do caçador, que apresentou os benefícios a Hairo, incluindo o pagamento
por ranks (oq money não faz $$).

Sua tentativa com a seleção final foi um sucesso, e fez diversas conexões importantes
naquele meio, incluindo a de um velhinho muito simpático. Era comum eles irem beber após
uma missão bem sucedida, e esse velhinho sempre era convidado, e era ele que de vez em
quando largava Hairo bêbado em casa. Ele sempre se deu bem com esse senhor e
vice-versa. Com isso, um pedido inexperado veio ao menino quando ele tinha 11 anos. O
senhor reconhecia sua deficiência, mas também dizia que sabia que o rapaz tinha potêncial,
e queria convidá-lo a ser seu aprendiz.

Esse senhorzinho era o prefeito da vila dos ferreiros, que o tomou como seu “pupilo”. Ficou
treinando a arte da forja por 3 anos, aperfeiçoando suas habilidades ao máximo. Apesar de
seu defeito de visão, suas espadas sempre tiveram uma qualidafe imensa, e ele era
conhecido por seus designs extraordinários e únicos. Era fácil dizer quando uma espada era
forjada por Yuujin. E ele tinha orgulho disso, muito, muito orgulho. Ele podia facilmente ficar
encarando (se sequer conseguisse enxergar) a máscara Tengu que ganhou de presente.
Isso foi uma felicidade extraordinária pra ele.

Com o novo “trabalho” dele, os dois tiveram que se mudar para a vila dos ferreiros. Hairo,
surpreendentemente, não era permitido de saber a localização (o que fez a ida e vinda
muito mais complicada, sendo que o processo para sair e entrar na vila era cansativo). A
vida deles seguiu assim por muito tempo. Os dois trabalhando com os caçadores de
demônios, um no campo de batalha, e outro nas bigornas (apesar de que Yuujin estava,
secretamente, aprendendo a manusear espadas também. Até tinha um velho livro sobre
respirações em sua casa, no qual usava para treinar a si mesmo).

Mas é claro, Yuujin ainda era adolescente. Não era raro vê-lo em bares (mesmo em menor
idade), ele fugia de casa (e da vila) a noite frequentemente, sozinho, para ir beber em
bares, sempre com um leque em mãos. O seu leque, segundo ele mesmo, fazia-o parecer
mais maduro (e é claro, servia para esconder o rosto também). Raramente descobriam de
suas escapadas, mas quando descobriam, era um inferno. Trancavam-o em casa, com
gente cuidando! Deixavam ele, um adolescente, quase adulto, de castigo! Vê se pode?!
Que absurdo, pensava.

No entanto, essa rotina se quebra quando estava uma viagem específica para entregar
nichirins a um grupo de caçadores. Andava pela vila pacificamente e lentamente, sua
máscara escondendo seu rosto e um véu de um chapéu de bambu adicionando mais para a
atmosfera misteriosa que ele tinha. A lua brilhava, mas a rua era bem iluminada. Ao longe,
ele pode ver um grupo de caçadores ansiosos. Eram altos, então não foi difícil identificá-los.
Se aproximou, começaram a conversar um pouco e o menino começou a entregar as
katanas, e assim que terminou, virou as costas e começou a ir embora. Ao se virar,
entretanto, esbarrou em alguém. Essa pessoa, porém, não se moveu, nem quando Yuujin
pediu. O garoto ficou irritado com esse comportamento e fez um leve esforço para empurrar
a figura para o lado, mas a figura não se moveu.

Ele foi recebido com um grunhido animalesco e uma mão enorme agarrando a sua cabeça
e levantando seu, muito menor, corpo. A máscara do seu rosto se rachou em dois, pode ver
apenas a sombra desfigurada disso, que aparentemente, era um demônio. Demônio esse
que apertava sua cabeça cada vez mais e mais. Yuujin se sentia tonto, enquanto ele
tentava desesperadamente se soltar. Chutava, socava, arranhava, gritava desesperado.

A única opção que funcionou, foi o grito. E isso foi extremamente frustrante.
Os caçadores foram rápidos ao reagir. Ouvia suas vozes assustadas, “Você ta bem?!”, “o
que aconteceu?”, “Precisa de ajuda?”. Ele não conseguiu responder, mas logo, logo sentiu
seu corpo ir de encontro ao chão, a mão desse… bicho, caindo em cima de seu corpo. Mas
não teve tempo de reagir antes de que uma pessoa daquele grupo o pegasse no colo e
levasse para longe do campo de batalha. A única coisa que conseguiu fazer foi agarrar
firmemente no chapéu de bambu e pegar sua máscara as pressas.

Quando mataram o demônio (o que, sejamos sinceros, não demorou muito. O demônio nem
era tão forte assim, não para caçadores), foram garantir a segurança do menino. Não teve
nenhum ferimento além de hematomas na marca dos dedos dos demônios. Yuujin, por
outro lado, estava transbordando de inveja e de frustração. Ele queria ser que nem esses
caçadores, que nem Hairo. Alguém que consegue se virar sozinho, que não precisa de
constante monitoramento. Ele odiava ser tratado como criança.

Sequer se deu ao trabalho de responder, levantou-se e foi embora dali, emburrado.


Entretanto, também, assim que foi levantar, tropecou em um dos caçadores dali e caiu no
chão. Com isso, pegaram-no no colo denovo e insistiram em o levar pra casa, e deixaram-o
no caminho para ir para a vila dos ferreiros, deixando-o continuar sozinho. Não tira o fato de
que isso foi extremamente frustrante — e acima de tudo, humilhante. Ser carregado no colo
por mais de uma hora, por caçadores preocupados até demais? Uma experiência que bão
quer repetir. Definitivamente.

E óbvio, não é novidade que levou um grande esporro quando chegou em casa. “O que
você tava pensando quando saiu de casa sozinho, você sabe que você precisa de alguém
pra te levar, eu poderia ter ido com você e então isso não teria acontecido e blá blá blá!”, o
que só piorou seu humor mais ainda.

Sério, não deve ser tão difícil o levar a sério, deve? Como que alguém de 17 anos não
consegue nem um pingo de respeito? Yuujin não enxergava, mas ele estava cansado de
olhares de pena. Ele estava cansado de pessoas falando sobre ele por suas costas, de
pessoas oferecendo ajuda. Ele não quer ajuda.

No dia seguinte, em uma dessas suas escapadas para ir ao bar, conversava com bêbados
aleatórios e se divertia, apesar de sua frustração ainda presente dentro de si. Sua mente, já
um pouquinho alegre (até demais), de repente, teve um pensamento. Porque parar apenas
sendo um ferreiro, ora pois! A seleção final estava assustadoramente próxima de acontecer,
e ele pensou, “Bem, essa é a minha chance, então!”. Sua cabecinha bêbada, sem sequer
hesitar, pegou seu chapéu, seu leque e sua máscara (máscara essa que agora tinha
remendos bem mal feitos), e hospedou-se em um hotel para a noite, e aguardou
pacientemente a seleção final.

Isso era apenas para aliviar o seu ego e orgulho, porque ele sabia que ele ia estar em
um.peoblema gigantesco assim que ele voltasse para casa. Ele só tinha que se manter
escondido e discreto até lá! O que, infelizmente, se provou uma dificuldade, devido a ser um
rosto popular e uma figura conhecida por muitos dentro da comunidade. Seu irmão tinha
diversos amigos, e todos os ferreiros o conheciam. Mas, claro, tinha que tentar, não tinha?

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