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EDITORIAL

A edição de um fascículo de O Agronômico sobre café, apenas quatro anos


depois de ter saído outro (O Agronômico v. 55, n. 2, 2003) parecia ambicioso ou
Governo do Estado de São Paulo até mesmo temeroso. Haveria matérias suficientemente atraentes e novas para
ganhar a atenção do público e que fossem condizentes com as comemorações
Governador do Estado dos 120 anos de fundação do IAC? A determinação do Luiz Carlos Fazuoli e o
José Serra entusiasmo da Terezinha de Jesus Garcia Salva foram fundamentais.
Secretário de Agricultura e Abastecimento Além do indispensável e respeitável histórico das conquistas das pesquisas
João de Almeida Sampaio Filho cafeeiras, os leitores vão encontrar informações atualíssimas sobre temas que
Secretário-Adjunto envolvem, por exemplo, a influência do aquecimento global sobre a possibilidade
Antonio Júlio Junqueira de Queiroz de cultivo do café nos próximos 50 anos.
Coordenador da Agência Paulista Conhecimentos atualizados de técnicas de laboratório são mostrados, revistos e
de Tecnologia dos Agronegócios discutidos, como o uso da cultura de tecidos, a caracterização dos cromossomos
João Paulo Feijão Teixeira
de café por técnicas convencionais e avançadas (bandamento-C e –NOR), o
Diretor-Geral do Instituto Agronômico mapeamento cromossômico e a aplicação do tema atualíssimo do genoma
Orlando Melo de Castro
Café, todos visando, em diferentes níveis, as perspectivas para o melhoramento
genético do café.
Técnicas renovadas e atualizadas de arborização de cafezais, aliadas às
O AGRONÔMICO questões de ambiente, manejo de irrigação e o comportamento de cultivares
(Instituto Agronômico) em solos ácidos e corrigidos são mostradas de maneira acessível a produtores.
Campinas, SP Falando nisso, nada melhor do que rever as contribuições do IAC na produção
1941-1; 1949-2007 1-59 de cultivares de café arábica.
(Série Técnica Apta)
O tema sempre presente sobre a composição química do café e as características
A partir do v.52, n.1, faz parte da Série Técnica da bebida e do grão está presente em interessante artigo, além de se voltar
Apta da SAA/APTA. à questão do café naturalmente descafeinado em pleno uso no programa de
A eventual citação de produtos e marcas co- melhoramento.
merciais não expressa, necessariamente, reco-
mendação de seu uso pela Instituição. Cafeicultores interessados na produção de café orgânico ou mesmo em cultivo
É permitida a reprodução parcial, desde que de baixo impacto ambiental vão encontrar respaldo técnico em trabalhos que
citada a fonte. A reprodução total depende de
mostram a situação atual e perspectivas futuras desse nicho, além de questões
anuência expressa do Instituto Agronômico.
sobre a resistência a fatores abióticos e mesmo a pragas e doenças como bicho
mineiro, nematóides e ferrugem.

Editoração e arte final eletrônica Pela importância intrínseca do tema, a diversidade em Coffea é tratada de
Intermídia Serviços de Propaganda Ltda. modo claro, aliado a questões como o plantio do café robusta em São Paulo,
reginatesta@uol.com.br permitindo, no final, formação de opinião sobre a sustentabilidade da produção
Web Designer de café sugerida como pauta da cafeicultura no século XXI. É nessa pauta que
Elaine Abramides se assenta o Programa de Pesquisa com o Café no Instituto Agronômico, abrindo
Impressão
caminhos seguros para a Cafeicultura paulista e brasileira.
Mundo Digital Gráfica e Editora Ltda.

Comercial
Frederico Olivi O AGRONÔMICO
www.olivideo.com.br Boletim Técnico-Informativo do Instituto Agronômico
(19) 3276-0430 Volume 59 - Número 1 - 2007
Série Técnica Apta
ISSN 0365-2726

Editores Co-editores
Assinaturas Sonia Carmela Falci Dechen Terezinha J. G. Salva
Anual: R$10,00 Celso Valdevino Pommer Luiz Carlos Fazuoli
Números avulsos: R$5,00
João Paulo Feijão Teixeira
Enviar cheque nominal ou comprovante de
depósito, em nome do Instituto Agronômico, SECRETARIA DE AGRICULTURA E ABASTECIMENTO
na Nossa Caixa-Nosso Banco, agência 00558-4, AGÊNCIA PAULISTA DE TECNOLOGIA DOS AGRONEGÓCIOS
conta corrente 13.000004-6, para:
IAC-Núcleo de Informação e Documentação
INSTITUTO AGRONÔMICO
Caixa Postal 28 Av. Barão de Itapura, 1481 - 13020-902 Campinas, SP
13020-902 Campinas, SP Fone (19) 3231-5422
fax (19) 3231-5422 ramal 215 fax (19) 3231-4943
endereço eletrônico: vendas@iac.sp.gov.br
http://www.iac.sp.gov.br

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 


Neste Número 12 Café arábica do IAC
Um patrimônio da
cafeicultura brasileira
Editorial .................................................................. 1

Páginas Azuis
Agronegócio café: principais contribuições
de pesquisas realizadas no IAC....................................... 5
Cultivares de café arábica do IAC:
Um patrimônio da cafeicultura brasileira..................... 12
O programa café do Instituto Agronômico................... 16

19 Aquecimento global
Aquecimento global, mudanças climáticas
e a cafeicultura paulista................................................. 19

Informações Técnicas
Diversidade em Coffea sp............................................. 22 Mudanças climáticas e a
Arborização de cafezais................................................ 25 cafeicultura paulista
Arborização de cafezais................................................ 28
Condições ambientais e o manejo da irrigação
influenciando a qualidade do café................................. 30
Panorama da cafeicultura orgânica e perspectivas
para o setor.................................................................... 33
Comportamento de cultivares de café arábica em
solos ácidos e corrigidos............................................... 37
Cultivares resistentes ou tolerantes a fatores bióticos
e abióticos desfavoráveis: ponto-chave para
a cafeicultura sustentável.............................................. 39 25 Arborização de cafezais
Os estudos sobre a fisiologia do cafeeiro
no Instituto Agronômico............................................... 41 Técnica agrícola muito usada
Armazenamento de sementes de café........................... 44 em outros países para proteção
Cafeeiros resistentes ao bicho-mineiro......................... 46 contra adversidades climáticas
A ferrugem alaranjada do cafeeiro e a obtenção
e promover a sustentação da
de cultivares resistentes................................................. 48 cafeicultura
A luta contra a doença causada pelos nematóides
parasitas do cafeeiro...................................................... 54
A composição quimica do café e as características
da bebida e do grão....................................................... 57
A obtenção de um café naturalmente descafeinado...... 60
Da folha à obtenção de embriões
48 Ferrugem alaranjada
somáticos de Coffea ..................................................... 63
O cafeeiro e a obtenção de
Caracteristicas dos cromossomos mitóticos
de espécies diplóides de café por técnicas
cultivares resistentes
convencionais e de bandamento-C e-NOR................... 65
Mapeamento cromossômico em espécies
de café através da técnica de hibridacão in situ
fluorescente (FISH)....................................................... 66
Genoma café: perspectiva para o melhoramento
genético da cultura ....................................................... 68
Café robusta: uma nova opção para
a cafeicultura paulista................................................... 71
Sustentabilidade: pauta da cafeicultura
68 Genoma café
no Século XXI............................................................... 75

Ponto de vista Perspectiva para o


A transferência de tecnologia com o café melhoramento genético
no IAC e os novos paradigmas da moderna
cafeicultura brasileira.................................................... 77 da cultura

 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


PÁGINAS AZUIS

Agronegócio café:
Principais contribuições de
pesquisas realizadas no IAC
O cafeeiro arábica foi introduzido no Brasil em 1727 tendo chegado a São
Agroclimatologia
Paulo pelo Vale do Paraíba e atingido a região de Campinas em 1810, sempre
No início dos anos
como uma cultura nômade à procura de novas terras, ricas em matéria
50, o IAC realizou os
orgânica e produtivas que se tornavam logo esgotadas nos primeiros anos, primeiros estudos
devido ao desconhecimento da necessidade da reposição de nutrientes e de sobre a adequação dos
métodos de conservação de solo. A produção, entretanto, aumentava de modo cafeeiros às diversas
surpreendente, principalmente pela adaptação das plantas às condições de solo regiões climáticas,
abrangendo, inclusive,
e clima e também pelo constante aumento da área plantada. O Estado de São
a microclimatologia,
Paulo tornou-se o centro da economia do país. relacionada a
conceitos e métodos

E
m 1887, foi criada por solicitação geral dos ta pelos próprios agricultores, que consistia na de defesa contra
produtores do Estado, a ‘Imperial Estação escolha dos talhões mais produtivos da proprie- geadas. Atualmente,
Agronômica de Campinas’ que mais tar- dade, para daí se retirarem as sementes das me- o IAC conta com um
de viria ser chamada de Instituto Agronômico lhores plantas. A semeação direta, que então se acervo de informações
(IAC). Quando foi criado em 27 de junho, há 120 fazia, de 30 a 40 sementes por cova, naturalmen- meteorológicas para
anos, o atual Instituto Agronômico de Campinas te permitia a seleção das mudas mais vigorosas, o monitoramento da
era uma Instituição Federal, ligada ao Ministério mais sadias e de mais rápido desenvolvimento. cafeicultura e de métodos
da Agricultura do então Império Brasileiro. Para Nessa época, objetivando melhor conhecimen- para a irrigação dos
sua direção o Governo Imperial Brasileiro con- to biológico do cafeeiro em aspectos básicos, cafezais. Desenvolve
tratou na Áustria o professor F. W. Dafert, que iniciaram-se os estudos sobre a taxonomia das projetos relacionados
o dirigiu até 1897. A administração de Dafert cultivares e espécies de Coffea, estrutura das in-
ao clima, à qualidade
foi muito produtiva, como provam os trabalhos florescências, das flores e biologia floral, análi-
da bebida, a regiões
publicados naquela época, vários dos quais se ses citológicas e genéticas, mutações somáticas
tornaram clássicos da literatura agronômica bra- e evolução no gênero Coffea. Os conhecimentos agroecológicas à
sileira, especialmente aqueles relacionados com adquiridos nessas áreas foram e têm sido aplica- regionalização da cultura
o cultivo do café. dos na obtenção das principais cultivares de C. e a novos métodos para
Até a década de 1920 haviam sido desen- arabica, na síntese de novas estruturas genéti- análise das relações
volvidos processos de produção que envolviam cas e no aproveitamento de espécies silvestres clima-produtividade.
cuidados com a adubação com esterco de curral de Coffea, para fins de melhoramento, tendo em Na década de 70,
complementada com farinha de peixe, escórias vista a obtenção de progênies ou linhagens com foi elaborado pelos
de alto forno e pequenas quantidades de salitre boas características agronômicas, elevadas pro- pesquisadores do
do Chile. Havia recomendações para o preparo duções e com produto de boa qualidade. IAC para todo o
do solo, controle de pragas e doenças e também A contribuição do IAC para a cafeicultura Brasil, o zoneamento
processamento da produção até secagem em ter- brasileira tem sido altamente relevante. A seguir climático para os cafés
reiros e armazenamento em tulhas de madeira, são relatadas algumas dessas contribuições nas arábica e robusta, que
além do beneficiamento, preparando o café be- diferentes áreas. determinou áreas com
neficiado para a exportação, livre de impurezas, melhores condições
com uniformidade e sabor. Na década de 1930, Fisiologia
de temperatura e
iniciou-se a experimentação com delineamentos Em relação aos estudos de fisiologia, devem
disponibilidade de água,
estatísticos, com aplicação de maiores quanti- ser ressaltados os resultados obtidos em relação
dades de fertilizantes, afastando a adubação do a níveis de luz na fisiologia e produtividade do restringindo áreas mais
empirismo. cafeeiro. Na verdade, os estudos sobre a fisiolo- sujeitas a geadas, ou
Projetos de pesquisas biológicas foram in- gia do cafeeiro tiveram início no Brasil no sécu- com deficiências hídricas
tensificados a partir da década de 30. Até então, lo XIX, com a criação do Instituto Agronômico que no final da década
os cafezais de São Paulo eram formados com se- de Campinas. Entre os trabalhos publicados por de 1980 passaram a ser
mentes derivadas de cultivares importadas, sem F. W. Dafert alguns foram sobre as exigências cultivadas mediante a
nenhuma seleção específica, a não ser aquela fei- minerais do cafeeiro e a distribuição dos ele- irrigação.

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mentos nutritivos nas diferentes partes sificados a partir da década de 40, quan- Melhoramento e
da planta. Depois de Dafert, a fisiologia do o Dr. Helmut Paulo Krug publicou os cultivares
do cafeeiro voltou a receber alguma aten- estudos sobre gosto de café associado a de café arábica
ção na década de 30, quando Theodureto microorganismos. Na década de 70 os Um extenso programa de genética e
de Camargo, então Diretor do Instituto, pesquisadores do IAC Sérgio Almeida melhoramento do cafeeiro desenvolve-
estudou com seus colaboradores alguns de Moraes, Ivan Antunes Ribeiro e Mar- se no Instituto Agronômico desde 1932.
aspectos da fisiologia do cafeeiro como cos Scali estiveram em treinamento em Até o presente momento gerou um gran-
seu crescimento em relação ao pH do Oeiras – Portugal para a seleção de plan- de número de cultivares lançadas e reco-
meio radicular, a importância da nutri- tas resistentes à ferrugem visando dar mendadas para o plantio nas mais diver-
ção nitrogenada e potássica e as altera- suporte ao Programa de Melhoramento sas regiões cafeeiras do Estado de São
ções químicas que ocorrem nas folhas de de Café do IAC. Vários trabalhos foram Paulo e do Brasil. Estima-se que 90%
cafeeiros atingidos pela geada. A partir realizados com Xylella e Colletotrichum. dos quase 4,3 bilhões de cafeeiros tipo
da criação, em 1936, de um laboratório Atualmente novas raças de ferrugem têm arábica do Brasil, sejam provenientes de
para estudos de fisiologia vegetal, o qual sido identificadas, o que muito auxilia os cultivares desenvolvidos pelo IAC. Al-
foi transformado em Seção de Fisiologia trabalhos de melhoramento do cafeeiro gumas são à base da cafeicultura de ou-
com a reestruturação do Instituto Agro- visando resistência à ferrugem. tros países, embora sejam plantadas em
nômico efetuada em 1942, a fisiologia do
cafeeiro passou a ser estudada ininter-
ruptamente, trazendo importantes con-
tribuições para a cafeicultura.
Os trabalhos sobre a reação do ca- Análises Genéticas
feeiro aos fatores climáticos resultaram Em relação também à área básica de pesquisa, ressaltam-se os trabalhos de
no conhecimento das causas de vários genética do café. Dentre as plantas perenes, o cafeeiro C. arabica é com certeza
fenômenos observados nas culturas, tais a espécie melhor estudada no que se refere à herança e relação de dominância
como a descoloração de folhas em bai- de fatores genéticos. Para estes estudos, tem-se utilizado a cultivar Arábica (Na-
xas temperaturas, o estrangulamento do cional ou Típica) de C. arabica como padrão. As pesquisas sobre herança das
caule e a lesão do colo de plantas novas principais características das variedades de C. arabica têm-se mostrado impor-
sujeitas à temperaturas extremas. Os es- tantes na obtenção de novas cultivares, através de recombinações genéticas em
tudos sobre a influência da temperatura programas de pré – melhoramento.
no crescimento das raízes mostrou que No decorrer de cerca de 75 anos de observações no IAC encontraram-se
temperaturas ao redor de 33ºC no meio aproximadamente 45 mutantes que permitiram efetuar análises genéticas. Den-
radicular, mesmo por poucas horas, cau- tre os fatores que afetam a altura das plantas, destacam-se o Caturra (Ct), São
sa danos ao desenvolvimento do cafeei- Bernardo (Sb); Villa Lobos (VI) e San Ramón (Sr), todos dominantes e indepen-
ro, sendo esse efeito altamente intensifi- dentes. Esses fatores têm grande interesse econômico pois, ao reduzir o compri-
cado à temperatura de 38ºC. Essas tem- mento dos internódios da haste principal e dos ramos laterais, resultam em cafe-
peraturas são freqüentemente atingidas eiros de menor porte e de aspecto compacto o que facilita a colheita e os tratos
no campo, em dias de verão, nas cama- fitossanitários reduzindo os custos de produção. Um exemplo de aproveitamento
das superficiais de solos desprotegidos, do fator Caturra foi a obtenção das cultivares Catuaí Vermelho e Catuaí Amare-
onde se localizam grandes quantidades lo de porte baixo, com cafeeiros vigorosos e altamente produtivos, amplamente
de radicelas. Em adição, estudos sobre plantados no Brasil e no exterior. Verificou-se, também, que vários fatores têm
o fotoperíodo mostraram ser o cafeeiro efeito pleiotrópico marcante, o laurina, (lr), que, além de afetar o porte e a altura
uma planta de dias curtos, apresentando, da planta, tamanho das folhas, forma e tamanho dos frutos e das sementes, reduz
portanto, as fases de indução e desen- o teor de cafeína nas sementes para 0,6%. As cultivares de café arábica têm no
volvimento floral no período de janeiro geral 1,2% de cafeína. Encontraram-se em 2004 três cafeeiros de C. arabica da
a junho em condições brasileiras. Estu- Etiópia com 0,07% de cafeína (praticamente isentos), que estão sendo analisados
dos detalhados sobre a distribuição do do ponto de vista de herança e melhoramento. A incorporação dessa característi-
sistema radicular do cafeeiro em cinco ca em cultivares comerciais abre excelentes perspectivas para uma grande faixa
tipos de solos foram efetuados no Estado de consumidores no mercado mundial.
de São Paulo, encontrando-se marcada Várias análises genéticas efetuadas com mutantes de C. arabica foram pu-
diferença nos diferentes tipos de solos, blicadas ao longo dos anos. Recentemente foram encontradas plantas macho
- estéreis em cafeeiros procedentes da Etiópia, que estão sendo analisadas. Os
causada principalmente pela porosida-
estudos efetuados até o presente dão indicações que essa macho – esterilidade
de e riqueza em nutrientes minerais. A
seja genética e ocasionada por um gene recessivo ms.
melhor distribuição do sistema radicular
No que se refere à resistência a moléstias foram detectadas em C. arabica
encontrada foi em latossolos, nos quais
fontes de resistência à ferrugem, à mancha aureolada (Pseudomonas syringae pv.
as raízes atingiram profundidades supe- Garcae), CBD ou antracnose dos frutos. (Coffee Berry Disease, ocasionada por
riores a 2,5 m, com a maior quantidade Colletotrichum coffeanum atualmente designado por C. kahawae). Em relação a
de radicelas localizadas a 2m. nematóides, fontes de resistência têm sido encontradas em materiais genéticos
procedentes da Etiópia.
Fitopatologia Como se pode observar, em C. arabica existe uma variabilidade razoável
A contribuição da Fitopatologia do para algumas características, que tem sido utilizada em programas de pré-me-
IAC para a nossa cafeicultura foi relevan- lhoramento. No entanto, para características de resistência a moléstias, pragas
te. Já em 1894, o Dr Franz Benecke aler- e nematóides, a variabilidade é menor, razão pela qual se depende das espécies
tava sobre a ferrugem do cafeeiro e em diplóides que são fontes de resistência genética, com ampla possibilidade de se-
1895 constatou a Cercospora coffeicola. rem transferidas para C. arabica.
Os estudos de fitopatologia foram inten-

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escala comercial no Brasil. É o caso das São Paulo, sendo evidente a importância
cultivares Caturra Vermelho, IAC 477, sócio-econômica de tal desenvolvimen-
e Caturra Amarelo, IAC 476, que foram to. O porta-enxerto vem sendo também
selecionadas no IAC, a partir de 1937 e utilizado em lavouras de outros Estados,
liberadas em 1949. Muitas cultivares de como Minas Gerais e Paraná, principal-
café, apesar de atualmente não serem mente. Novos porta-enxertos estão sen-
mais recomendadas, foram, porém, im- do atualmente identificados, com resis-
portantes no passado. Da cultivar Típica, tência múltipla a vários nematóides.
introduzida no país em 1727, às atuais
cultivares de porte mais compacto e re- Tolerância à seca
sistentes a moléstias, um ganho de 240% e ao calor
de produtividade foi acumulado pelo Atualmente têm sido identificadas
contínuo processo de seleção. plantas tolerantes a seca e ao calor em
O desenvolvimento pelo IAC, em C. arabica e derivadas de C. canepho-
1972, de cultivares de porte baixo, rús- ra, C. dewevrei, C. racemosa e seus hí-
ticas e de alta produtividade (Catuaí bridos com C. arabica, que poderão ser Catuaí irrigado
Vermelho e Catuaí Amarelo) modificou muito importantes em vista das preocu-
sistemas de produção e permitiu a utili- pações de aquecimento global e mudan-
zação de novas áreas para a cafeicultu- ças climáticas.
ra aumentando a lucratividade e mesmo
viabilizando seu cultivo em regiões ou- Resistência
trora improdutivas como a enorme área ao bicho mineiro
de cerrado, não só em São Paulo como No que se refere ao bicho mineiro
no Triângulo Mineiro. Em relação a es- (Leucoptera coffeella) o IAC identificou
ses aspectos algumas cultivares têm sido fontes de resistência em várias espécies
importantes como Mundo Novo, a par- de café que estão sendo utilizadas no pro-
tir de 1952, e Acaiá e novas seleções de grama de Melhoramento visando obter
Mundo Novo em 1977. cultivares de café resistentes a esta praga.
Os primeiros trabalhos visando resis- A espécie mais estudada é C. racemosa.
tência à ferrugem tiveram início em 1950, Plantas híbridas desta espécie com C. ara-
portanto com, 20 anos de antecedência bica foram identificadas e têm sido a base Cafeeiros arábica
em relação à constatação da ferrugem no da seleção de cafeeiros resistentes. Veri- (plantio moderno)
Brasil, que ocorreu em janeiro de 1970. ficou-se que a resistência é conferida por
Os lançamentos, em 1992, de cul- dois genes dominantes e complementares.
tivares de porte alto resistentes à ferru- Atualmente várias progênies produtivas e
gem (Icatu Vermelho, Icatu Amarelo) resistentes ao bicho mineiro estão em fase
e em 1996, do Icatu Precoce, represen- final de avaliação.
taram considerável economia para os
produtores e sensível redução dos riscos Café Robusta
relacionados à poluição ambiental e à Plantas matrizes de café robusta com
saúde dos agricultores e consumidores. alta produção, sementes grandes, com al-
O mesmo se aplica às cultivares Obatã tos teores de sólidos solúveis e resisten-
e Tupi, de porte baixo e com resistência tes à ferrugem e nematóides foram iden-
à Hemileia vastatrix, indicadas, a partir tificadas e poderão se constituir em clo-
de 2000, para plantios adensados, supe- nes importantes para o estabelecimento
radensados, adensados mecanizáveis ou do plantio do café robusta no Estado de
em renque. No mesmo ano foi lançada a São Paulo.
Catuaí irrigado
cultivar Ouro Verde de porte baixo, mas Os Robustas, como o próprio nome
suscetível à ferrugem. Essas três cultiva- sugere, compreendem variedades mais em áreas quentes (24,5°C)
res têm sido bastante importantes para a rústicas, com perfil de resistência à pra-
cafeicultura moderna, tanto para peque- gas e moléstias mais amplo, apresentando
nos produtores que praticam a cafeicul- plantas vegetativamente mais vigorosas,
tura familiar, como para grandes empre- adaptadas à climas mais quentes e úmidos
sários. Atualmente novas cultivares es- freqüente nas baixas altitudes. São cultiva-
tão em avaliação final (Ouro Bronze IAC das em larga escala no Vietnã, Indonésia,
4925, Ouro Amarelo IAC 4397, Catuaí alguns países da África e no Brasil, prin-
SH3, Mundo Novo SH3, Obatã Amarelo cipalmente no Espírito Santo e Rondônia.
IAC 4739, Tupi Amarelo IAC 5162 e Tupi Em menor escala são aqui também culti-
RN IAC 1669-13). vadas na Bahia e Mato Grosso. Produzem
A obtenção, em 1987, do porta-en- bebida de sabor inferior, menos aromática,
xerto Apoatã IAC 2258 resistente aos com maior teor de sólidos solúveis e de
nematóides Meloidogyne exigua e M. cafeína, compondo preponderantemente
incognita viabilizou o retorno da cafei- as misturas para café solúvel e também
cultura para as regiões da Alta Paulista, aquelas comercializadas em alguns países Manejo do mato
Araraquarense e Noroeste do Estado de da Europa e do Oriente Médio. Alcançam cultivar Catuaí

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Café Consorciado com coco Cafezal Arborizado Icatu Vermelho

preços mais baixos que os do Arábica. No grãos para determinados mercados, uma sa ser uma ferramenta importante para
mercado interno de torrado e moído par- vez que já se constituem em um “blend” o conhecimento do cafeeiro em todos os
ticipam em porcentagens variáveis, con- natural entre cafés arábica e robusta. seus aspectos e principalmente no pré
forme a marca. – melhoramento e no melhoramento ge-
Em se viabilizando o seu cultivo, o Cultura de tecidos nético dessa importante cultura.
café Arabusta poderia se constituir numa Em 1972, sob coordenação do Pes-
alternativa para regiões quentes e margi- quisador Dr. Maro R. Söndahl, criou-se Fertilidade do solo e
nais ao cultivo de C. arabica, mais aptas no IAC o primeiro laboratório de cultura nutrição mineral
ao cultivo de Robusta irrigado, como o de tecidos de café do Brasil empregando a Na década de 1960 iniciou-se a utili-
Oeste de São Paulo, onde se concentram técnica de cultivar folhas de café para ob- zação maior de análises químicas do solo
as indústrias de café solúvel cuja maté- tenção de novos cafeeiros. A clonagem de e de folhas dos cafeeiros, permitindo me-
ria-prima vem, em grande parte, do Es- cafeeiros especiais, via cultura de tecidos, lhor entendimento da produção, aumen-
tado do Espírito Santo. Um programa ou micropropagação, teve grande avanço tando-se consideravelmente as quantida-
com este enfoque está sendo coordenado inicial graças ás pesquisas desenvolvidas des de fertilizantes então recomendadas e
pelo Centro de Café e espera-se, no futu- pelo IAC a partir da década de 70. Dessa o IAC passou a dar maior ênfase também
ro, disponibilizar para essa região e ou- maneira, no IAC foram criadas as bases à correção da acidez do solo pela aplica-
tras com aptidões semelhantes, materiais para que a técnica de clonagem seja hoje ção do calcário. Em 1958 um experimento
genéticos que representem novas opções importante em várias partes do mundo. em “solo de cerrado” em Batatais, cujos
econômicas para os cafeicultores e alter- Uma contribuição atual do IAC é a resultados foram publicados em 1976,
nativas mais atraentes para a indústria. identificação de híbridos F1 altamente mostrou a possibilidade do cultivo do
produtivos com elevada heterose que po- café em solos pobres através da aplicação
Arabustas derão ser multiplicados, vegetativamen- do calcário e fertilizantes químicos, sen-
Um estudo atual que poderá dar te via cultura de tecidos ou até mesmo do alvo de incontáveis excursões de inte-
nova opção à cafeicultura brasileira é a por estaquia. Além disso, estes cafeeiros ressados, de todas as regiões do país, que
identificação de plantas matrizes de hí- possuem resistência múltipla à ferrugem, nos anos seguintes iniciaram o plantio de
bridos F1 entre o café arábica e o robusta, bicho mineiro e nematóides. No que se café nos “solos de cerrado” da região de
denominados de Arabustas. Na verdade, refere à propagação vegetativa foram Franca, e posteriormente, ocupando com
os primeiros híbridos foram efetuados também desenvolvidas e aprimoradas as sucesso outras áreas tidas como improdu-
na década de 50, que foram utilizados técnicas de estaquia e alporquia, técnicas tivas das regiões de Minas Gerais e outros
no desenvolvimento da cultivar Icatu. simples que poderão ser utilizadas para Estados vizinhos.
Posteriormente na década de 90 foram clonar cafeeiros especiais e híbridos. Na área de nutrição mineral, além
efetuados novos híbridos de Arabusta de dos trabalhos relacionados anteriormente,
porte mais baixo que os primeiros. Biotecnologia foram desenvolvidos estudos em soluções
Embora ainda devam ser realizados Projeto Genoma hidropônicas que permitiram estabelecer
estudos adicionais para avaliar a viabi- Na área de pesquisas biológicas um os sintomas de deficiência dos principais
lidade técnica e econômica do plantio fato marcante atual é a participação efe- nutrientes minerais. Esse quadro de sinto-
comercial de cafeeiros arabustas em re- tiva de pesquisadores do IAC no projeto matologia permitiu identificar e controlar
giões marginais ao arábica, por meio da Genoma – Café que foi proposto pelo IAC a deficiência de zinco que era freqüente-
propagação vegetativa por estaquia, os dentro do Programa AEG da FAPESP, mente observada nos cafezais paulistas.
resultados obtidos até o presente, prin- em parceria com o Consórcio Brasileiro Outro aspecto estudado foi a absorção de
cipalmente quanto à produção, ao vigor de Pesquisa e Desenvolvimento do Café uréia pelas folhas do cafeeiro, identifican-
vegetativo, ao tamanho das sementes e à e a EMBRAPA. Foram identificados em do o aparecimento de sintomas de fitoto-
qualidade da bebida, indicam que varie- 2004 cerca de 30.000 genes, que deve- xidade ocasionada pelo biureto, impure-
dades clonais de arabusta provavelmente rão ser utilizados em análises molecula- za freqüentemente presente em uréia de
poderão ser uma opção de produto de res para verificar suas funções (Genoma qualidade inferior.
utilização direta na indústria do café so- Funcional). Presume-se que futuramente Estudo utilizando técnica apropriada
lúvel, ou ainda para comercialização de a técnica do uso do Genoma – Café pos- para monitoramento nutricional dos ca-
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fezais (DRIS – Café) estabeleceu valores estudar mecanização décadas antes da
das relações entre nutrientes para uma po- industrialização do País, realizando pes-
pulação de referência utilizando cafeeiros quisas com ferramentas e máquinas por
arábica nos Estados de São Paulo, Paraná tração animal.
e Minas Gerais. Dessa maneira, utilizan- O desenvolvimento da cultura do
do esta técnica é possível o monitoramen- café em áreas de cerrado, por sua vez,
to nutricional de um talhão de café com a que apresentam topografia plana, incen-
retirada de folhas, durante alguns anos. tivou o desenvolvimento da mecanização
A tentativa de aproveitamento de da colheita, reduzindo muito o custo de
lodo de esgoto na cultura de café foi es- produção. Os primeiros estudos foram
tudada e verificou-se que este biossólido realizados pelo IAC que importou uma
quando aplicado no sulco de plantio, de- colhedeira mecânica de cerejas na década
pendendo da dose utilizada, pode ocasio- de 1970, para adaptação às condições do Posto Meteorológico Padrão
nar até a morte de plantas. Além disso, o cafeeiro, passando posteriormente o pro-
lodo de esgoto deve ser muito bem mis- jeto à iniciativa privada.
turado com o solo do sulco e com bastan- O IAC traçou as diretrizes para
te antecedência do plantio. Neste estudo, construção, testes e avaliação de diver-
a taxa de mineralização do N ficou entre sos modelos de pulverizadores de pro-
20 a 30% e, portanto, dentro das normas dutos químicos. Com o lançamento da
da CETESB que é de 30%, as concentra- primeira colhedora de café no Brasil, em
ções do nitrogênio absorvido nas folhas 1979, o IAC contribuiu significativamen-
dos cafeeiros ficaram em 30 g/kg, o que te para o expressivo avanço tecnológico
mostra a eficiência do produto e a lixi- da indústria produtora de máquinas agrí-
viação no solo foi muito baixa (4%) não colas para a cafeicultura.
indicando risco para o lençol freático.
Atributos químicos
Arborização Os teores de ácidos clorogênicos,
As razões do insucesso do cultivo compostos fenólicos presentes em quanti-
do cafeeiro sob arborização no Estado dades altas em plantas de café, foram estu-
de São Paulo foram intensivamente es- dados por suas relações com a resistência
tudadas no Instituto Agronômico. Após a doenças e com a qualidade de bebida Estação Meteorológica Automática
vários anos de pesquisa concluiu-se que do café. Este estudo forneceu importantes (medindo microclima do cafezal)
as árvores de sombra competiam forte- dados sobre os teores de ácidos clorogêni-
mente com o cafeeiro pela água disponí- cos em inúmeras espécies de Coffea, evi-
vel no solo durante a época seca, sendo denciando que as espécies mais resisten- Qualidade do produto
este o principal fator do pouco êxito do tes à ferrugem apresentavam também os A preocupação do IAC com a qua-
sombreamento. Essas informações con- mais altos teores de ácidos clorogênicos. lidade do café, desde a produção de
tribuíram, em grande parte, para que Em adição, foi constatada relação entre variedades, procedimentos ao longo do
no Brasil o cafeeiro fosse cultivado a a qualidade de bebida e a quantidade de sistema de produtivo, colheita, pós-co-
pleno sol. Mais recentemente foram ob- ácidos clorogênicos nos grãos, sendo que lheita e armazenamento, é constante.
tidos conhecimentos fundamentais que os mais altos teores foram obtidos em C. Os trabalhos desenvolvidos no Instituto
forneceram as bases fisiológicas para o canephora, que apresenta qualidade de têm levado muitos produtores paulistas à
comportamento de plantas de café em bebida inferior à de C. arabica. importantes ganhos de qualidade. Cabe
diversos níveis de sombreamento de di- Atualmente têm-se caracterizado ca- destacar que o primeiro trabalho com o
ferentes árvores. feeiros do banco de germoplasma e de no- café cereja despolpado sem lavar, atual-
vas seleções em relação à cafeína, trigone- mente chamado cereja descascado, foi
Tratos culturais lina, ácidos clorogênicos, açúcares totais realizado no IAC no início da década de
As pesquisas realizadas pelo IAC na e redutores, sólidos solúveis, óleo e outros 50 e publicado em 1960, pelos pesquisa-
área de tratos culturais oferecem infor- componentes químicos que poderão agre- dores Manuel de Barros Ferraz e Ary de
mações sobre a melhor distância entre as gar ao produto café outras peculiaridades Arruda Veiga. Hoje, esse tipo de preparo
plantas, sistemas de colheita, preparo de importantes para o agronegócio. do café tem levado produtores de regi-
mudas normais e enxertadas, controle de
plantas invasoras, melhor maneira de adu-
bação, poda e recuperação de plantações
depauperadas. Ao melhorar o sistema de
produção, o IAC viabiliza pequenas pro-
priedades e sistemas consorciados, por
oferecer tecnologia de baixo custo.

Mecanização
Historicamente, o desenvolvimento
da mecanização de lavouras cafeeiras
está muito ligado ao IAC, que aprimora
desde ferramentas manuais até as derri-
çadoras pneumáticas. O IAC começou a Icatu Amarelo Catuaí Vermelho IAC-99 Catuaí Amarelo IAC 62

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 


ões de cafés tradicionalmente de baixa
qualidade, como o município de Piraju, a
ganharem vários prêmios em concursos
de qualidade promovidos pela Illycaffè e
pela Secretaria de Agricultura e Abaste-
cimento do Estado de São Paulo.
Apesar das cultivares de café terem
excelente qualidade da bebida, pois têm
em sua base as cultivares Bourbon e Típi-
ca, o IAC têm conseguido excelentes resul-
tados na busca de genótipos de C. arabica
que fornecem melhor qualidade da bebida.
É de conhecimento geral que a expressão
da qualidade em relação ao aroma, sabor
e corpo são determinadas principalmen-
te pela constituição genética da cultivar. Obatã IAC 1669-20 Ouro Verde IAC H5010-5
Analisando cafeeiros do Banco de Germo-
plasma do IAC, constatou-se que diversos
tipos de arábicas apresentam aroma, sabor,
corpo e qualidade de bebida peculiares em solos isentos de nematóides, foi veri- síntese, a enxertia de C. arabica sobre C.
que poderão ocupar determinados nichos ficado que a enxertia de C. arabica sobre canephora e o híbrido natural C. congen-
de mercado de cafés gourmet ou especiais. C. canephora ou sobre o híbrido C. con- sis x C. canephora apresentou efeitos al-
Entre elas destaca-se a cultivar Ibairi (co- gensis x C. canephora (café congusta) tamente favoráveis e pode ser usada como
nhecida como fruta doce), a variedade proporcionou consideráveis aumentos no tecnologia para aumentar o desempenho
Mokka, híbridos entre Catuaí e Ibairi e crescimento e na produção de C. arabica, e a produção em solos infestados ou não
outros cafés da Etiópia que apresentam be- principalmente após as plantas sofrerem com nematóides. O aumento inicial no in-
bida de aroma e sabor intensos. recepa drástica. Em adição, a absorção de vestimento para introduzir essa técnica,
nutrientes é qualitativamente melhorada devido ao maior custo das mudas enxerta-
Enxertia nas plantas enxertadas, aumentando a das, seria compensado logo nos primeiros
No Brasil, em 1930, o Instituto Agro- absorção de potássio, que é um dos prin- anos de produção.
nômico (IAC) foi o pioneiro a efetuar e cipais elementos minerais relacionados
estudar a enxertia, mas só recentemente com a produção do cafeeiro, e diminuin- Conservação
a técnica tem sido utilizada para permitir do a absorção de manganês, que freqüen- de sementes
o cultivo de C. arabica em solos infesta- temente está presente em níveis altos na Na área de conservação de sementes
dos com nematóides. Tal fato foi possível maioria dos solos cultivados com café no de café verificou-se que, em condições
graças à utilização, como porta-enxerto, Brasil. A superioridade das plantas enxer- normais, perdem sua viabilidade rapida-
de linhagens de C. canephora tolerantes tadas parece ser devida à maior eficiência mente, dificultando o seu uso a longo pra-
a nematóides obtidas pelo IAC, que pro- do sistema radicular de C. canephora em zo. Deste modo, foi constatado que o po-
porcionaram expressivos aumentos na absorver água e à capacidade em explorar der germinativo de sementes de café ará-
produção de cultivares de C. arabica em maior volume de solo em profundidade, bica e outras espécies foi mantido por um
solos infestados com esse parasita. Estu- fornecendo água para a parte aérea du- período consideravelmente mais longo,
dos iniciados em 1984, que se estendem rante os meses secos e conseqüentemente quando as sementes foram desidratadas
até os dias atuais, mostraram que existe mantendo maior atividade metabólica e até 10% de umidade e armazenadas em
uma interação fisiológica entre enxerto e maior crescimento durante esses perío- recipientes herméticos em temperaturas
porta-enxerto altamente favoráveis à per- dos. Em adição, a enxertia não altera a baixas. Atualmente verificou-se também
formance do cafeeiro. Em experimentos qualidade de bebida, mantendo o excelen- a possibilidade de armazenar sementes de
efetuados durante dez anos consecutivos, te padrão apresentado por C. arabica. Em café arábica e robusta por um longo perí-
odo de tempo utilizando sacos plásticos,
com sementes com altos teores de umi-
dade (25 a 35%), em câmaras frias com
temperaturas de 10 a 16º e alta umidade
relativa (em torno de 60%).

Retorno econômico
Estudos sobre o retorno econômico e
social dos investimentos em pesquisa na
cultura do café, em São Paulo, mostraram
que, após um período de 18 anos, a socie-
dade passou a receber um benefício anual
líquido de tendência crescente, com taxa
interna de retorno estimada, que variou
de 17 a 27%. Não fossem as pesquisas
Tupi Icatu IAC 4045 enxertado sobre sobre o desenvolvimento de novas culti-
IAC 1669-33 Apoatã e testemunha sem enxertia vares, esse retorno teria sido muito menor
ou inexistente.

10 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Planta de café obtida por Cultura de Tecido Cultura de Tecido – embrião Embriogênese somática direta

Com as pesquisas realizadas até o presente, o IAC tem aprimorado a qualidade


do produto final disponibilizando ao setor produtivo cultivares com sabor e aroma
Conclusão que atendem as exigências dos mercados mais sofisticados do mundo. Tem tam-
bém fornecido subsídios para que a cafeicultura brasileira seja pujante, sustentável
e altamente competitiva.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 11


Cultivares de café arábica
um patrimônio da cafeicultura
O Instituto Agronômico conta com ma- lo’ são as mais precoces. O tipo de lavoura mais
Obatã IAC 1669-20 pas de zoneamento da cafeicultura brasileira, aberta ou fechada poderá também influenciar
de cada estado do Brasil. Esses mapas pode- na maturação.
rão informar se a região é própria para o café Dentre as cultivares resistentes e ou mo-
O Instituto Agronômico arábica (Coffea arabica) ou café robusta (C. deradamente resistentes ao agente da ferrugem
(IAC) desenvolve extenso canephora). No caso das cultivares Icatu Ver- obtidas no IAC ‘Icatu Precoce IAC 3282’ e
programa de genética melho, Icatu Amarelo, derivadas do cruzamen- ‘Tupi IAC 1669-33’ são as mais precoces.
e melhoramento do to dessas duas espécies, e que, por essa razão, As cultivares Icatu Vermelho e Icatu
cafeeiro desde 1932. poderiam ser plantadas em locais de menores Amarelo, resistentes ou moderadamente resis-
altitudes e mais quentes, marginais para C. tentes a Hemileia vastatrix e de porte alto, no
Nesse período de 75 arabica, há necessidade de mais estudos e ex- momento, estão sendo indicadas, de preferên-
anos de pesquisa, perimentações locais. cia, para o plantio em espaçamentos largos, se-
foram desenvolvidas, Dentre as cultivares de C. arabica susce- melhantes aos recomendados para o café Mun-
selecionadas, lançadas tíveis à ferrugem, ‘Bourbon Vermelho’e ‘Bour- do Novo. Para a colheita mecânica, considerar
e recomendadas para o bon Amarelo’ somente seriam indicadas para que os frutos dessas variedades ficam mais for-
regiões mais frias, de menores altitudes, ou temente retidos nas árvores e devem, portanto,
plantio cultivares de café
no estabelecimento de porcentagem menor de estar em estádio adiantado de maturação.
em grande número, para cafeeiros na formação de lavouras extensivas, Quando o plantio for efetuado com o ob-
as mais diversas regiões para se ter melhor distribuição na maturação jetivo de colher mecanicamente, as cultivares
cafeeiras do Estado de dos frutos e, conseqüentemente, colheita de Catuaí Vermelho, Catuaí Amarelo, Ouro Verde
São Paulo, bem como maior quantidade de frutos maduros, ou, ainda, IAC H5010-5, Ouro Bronze IAC 4925 ou Ouro
do Brasil. Estima-se que para se obter melhor qualidade do produto final Amarelo IAC 4397 são as mais recomendadas,
e participar do mercado de cafés especiais. por serem de porte mais baixo que a Mundo
90% dos 4,3 bilhões de Em locais onde ocorre muito vento, as Novo. A cultivar Acaiá, de porte alto, também
cafeeiros arábica do Brasil cultivares de porte baixo devem ser preferidas, tem sido usada de modo intensivo em plantios
sejam provenientes de por sofrerem menos danos quando submetidas destinados à colheita mecânica. Neste caso, há
cultivares desenvolvidas à ação de ventos frios. necessidade de ajustar a sua altura à das máqui-
pelo IAC. A escolha A produtividade das melhores linhagens nas por meio de podas tipo decote.
das cultivares Mundo Novo, Acaiá, Catuaí Ver- O conhecimento de algumas característi-
criteriosa e adequada
melho e Catuaí Amarelo é semelhante entre si cas das cultivares poderá servir como orienta-
de uma cultivar de café nos espaçamentos indicados para plantios de- ção na escolha de espaçamentos. Por exemplo:
está associada ao melhor finitivos mecanizados. Em plantios adensados algumas linhagens de Mundo Novo apresentam
sistema de cultivo e é ou superadensados existem enormes variações diâmetros da copa maiores, como é o caso de
uma das mais importantes de produtividade de acordo com o espaçamen- IAC 388-17, IAC 388-17-1 e IAC 388-6. A va-
decisões que o cafeicultor to utilizado. A maior produtividade depende- riedade Acaiá, além de produzir frutos maio-
rá mais do número de cafeeiros plantados por res, apresenta maior altura de planta e menor
deve tomar para aumentar hectare do que da cultivar utilizada. diâmetro da copa, em relação à ‘Mundo Novo’.
a produtividade. A seguir De modo geral, a maturação dos frutos As cultivares Icatu Vermelho e Icatu Amare-
são relacionadas algumas nas cultivares Mundo Novo e Acaiá ocorre um lo apresentam diâmetro da copa semelhante à
informações, com a pouco antes que em Catuaí Vermelho e Catu- ‘Mundo Novo’.
finalidade de proporcionar aí Amarelo e Obatã. Essa diferença poderá ser Na escolha da cultivar que será utilizada
reduzida em locais mais quentes ou ser mais no plantio adensado, o cafeicultor deve ficar
subsídios para melhor
acentuada em regiões mais frias. Dentre as cul- atento ao porte e à reação dos cafeeiros quando
escolha de uma cultivar tivares indicadas que são suscetíveis à ferru- submetidos a qualquer tipo de poda. Para esse
de café. gem, ‘Bourbon Vermelho’ e ‘Bourbon Amare- tipo de plantio, dar preferência às cultivares de
porte baixo e vigorosas.
As cultivares de porte baixo Caturra Ver-
melho IAC 477 e Caturra Amarelo IAC 476 são
mais adequadas a lavouras adensadas, e em lo-
cais de maiores altitudes.
As variedades Tupi IAC 1669-33, Tupi RN
IAC 1669-13 e Obatã IAC 1669-20 são indica-
das, preferencialmente, para plantios adensados
ou em renque e solos férteis.
As melhores linhagens de ‘Catuaí Verme-
lho’ produzem semelhantemente às melhores
Tupi IAC 1669-33 Catuaí amarelo IAC 62 de ‘Catuaí Amarelo’.

12 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


do IAC:
brasileira Fazuoli Bernadete Terezinha Guerreiro Medina Wallace

A cultivar Acaiá, dentre as de porte alto, é a mais Adequada para sistemas de cultivo mecanizado ou
apropriada para o plantio adensado, pois, além de ter que necessitem de poda. Encontra-se adaptada em
sementes maiores, possui diâmetro da copa menor e todas as regiões cafeeiras do Brasil.
maturação mais uniforme. Acaiá - Corresponde a um cruzamento natu-
Nas áreas infestadas pelos nematóides Meloido- ral entre Sumatra e Bourbon Vermelho, com sele-
gyne incognita e M. paranaensis, o mais indicado no ção no IAC para sementes graúdas, com peneira
momento é o plantio de cafeeiros enxertados. O por- média ao redor de 18. Selecionada e liberada pelo
ta-enxerto Apoatã IAC 2258 de Coffea canephora é o IAC a partir de 1977. Tem em sua formação 50%
que tem dado os melhores resultados nos vários locais de Bourbon e 50% de Típica (Sumatra). É indica-
estudados. Nessas áreas há a necessidade de adotar al- da para espaçamento largo ou adensado e para re-
gumas medidas agronômicas, antes de iniciar o plan- giões de altitude média ou alta. Adapta-se bem a
tio. Atualmente existem seleções de Icatu IAC 925, sistemas de cultivo mecanizado com adensamen- Icatu Precoce 3282
que têm resistência de campo a M. paranaensis, que to na linha. Possui elevada capacidade de rebrota
poderão ser plantados através de mudas obtidas por qualificando-a para sistemas de cultivo com podas
sementes. Em áreas infestadas por M. exigua pode-se freqüentes. É uma excelente cultivar para colheita
utilizar cultivares arábica enxertadas no porta enxerto mecânica e apresenta ótima qualidade de bebida.
Apoatã IAC 2258 ou a cultivar Tupi RN 1669-13, via A cultivar encontra-se bem adaptada no Sul
sementes. de Minas, Cerrado Mineiro e Alto Paranaíba em
Para mercados especiais, são indicadas preferen- Minas Gerais.
cialmente as cultivares: Bourbon Vermelho, Bourbon Bourbon Vermelho - Proveniente da Ilha de
Amarelo e Icatu Precoce. As cultivares Ibairi IAC Reunião (antiga Bourbon) sendo introduzida pelo
4761 e Laurina IAC 870 poderiam ser experimentadas governo brasileiro em 1859. Foi selecionada e libe-
também para mercados especiais exigentes quanto à rada pelo IAC a partir de 1939. Tem em sua forma-
qualidade da bebida, mas produzem muito pouco. ção 100% de Bourbon.
A cultivar Icatu Precoce IAC 3282 é excelente É indicada para espaçamento largo ou adensa- Icatu Amarelo
para café ‘espresso’. do e para regiões altas (altitude acima de 1000m).
A qualidade da bebida das cultivares resistentes É recomendada para produção de cafés especiais,
ou moderadamente resistentes ao agente da ferrugem devido às suas excelentes qualidades organolépti-
derivadas do cruzamento C. arabica x C. canephora cas. A maturação precoce possibilita o escalona-
é semelhante à das cultivares Mundo Novo, Acaiá e mento da colheita. A sua produtividade é menor
Catuaí Vermelho de C. arabica. que a da cultivar Mundo Novo. Encontra-se bem
A participação do café Bourbon na formação das adaptada, principalmente, no Estado de Minas
cultivares de café que são 100% arábica ou tipo arábica Gerais e da Alta e Média Mogiana do Estado de
do Instituto Agronômico de Campinas é muito alta, o São Paulo.
que explica a excelente qualidade da bebida dessas cul- Bourbon Amarelo - Corresponde a uma mu-
tivares desenvolvidas nessa instituição de pesquisa. tação natural de Bourbon Vermelho ou cruzamen-
Todas as variedades 100% arábicas podem pro- to natural entre Bourbon Vermelho e Amarelo de
duzir cafés especiais (tipo gourmet), desde que colhi- Botucatu (Típica Amarelo). Selecionada e liberada
das, processadas e armazenadas adequadamente. pelo IAC a partir de 1945. Tem em sua formação
100% de Bourbon ou 50% de Bourbon e 50% de Icatu Vermelho -
A seguir são apresentadas a origem, algumas frutos
Típica. É indicada para espaçamento largo ou
características agronômicas e recomendações para o
plantio das cultivares do IAC, que são um verdadeiro
patrimônio da cafeicultura brasileira.

Cultivares de porte alto e


suscetíveis à ferrugem
Mundo Novo - Corresponde a um cruzamento na-
tural entre Sumatra e Bourbon Vermelho. Selecionada
e liberada pelo IAC a partir de 1952 e novas seleções
a partir de 1977. Tem em sua formação 50% de Bour-
bon e 50% de Típica (Sumatra). É rústica, produtiva
e tem excelente qualidade da bebida. É indicada para
espaçamento largo e regiões de altitudes média e alta. Mundo Novo IAC 376-4 Ouro Verde IAC 5010-5 – frutos

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 13


adensado e para regiões altas (altitude Catuaí Vermelho - Corresponde ao Encontra-se adaptado em todas as regiões
acima de 1000m). Recomendada para pro- cruzamento entre Mundo Novo e Caturra do Brasil.
dução de cafés especiais, devido às suas Amarelo. Selecionada e liberada pelo IAC Ouro Amarelo IAC 4397 - Corres-
excelentes qualidades organolépticas. Sua a partir de 1972. Tem em sua formação ponde ao cruzamento entre Catuaí Ama-
maturação precoce possibilita o escalona- 75% de Bourbon e 25% de Típica. Apre- relo e Mundo Novo, foi selecionada e
mento da colheita. A sua produtividade senta frutos de coloração vermelha e tem liberada pelo IAC a partir de 2007. Tem
é menor que a da cultivar Mundo Novo. maturação média. É indicada para espa- em sua formação 62,5% de Bourbon e
Encontra-se bem adaptada em áreas ca- çamento largo e adensado e altitudes bai- 37,5 de Típica. Os frutos são de coloração
feeiras com altitude acima de 1000m do xa e média, adapta-se bem à cafeicultura amarela e tem maturação média. É indi-
Estado de Minas Gerais e na Alta e Média irrigada, regiões quentes e solos de baixa cada para espaçamento largo e adensado
Mogiana do Estado de São Paulo. fertilidade. Tem elevada adaptabilidade a e altitudes baixa e média. Adapta-se bem
Mundo Novo Amarelo IAC 4266 - diferentes regiões e condições de cultivo. à cafeicultura irrigada, regiões quentes e
A sua origem relaciona-se ao cruzamento Encontra-se adaptada em todas as regiões solos de baixa fertilidade, apresenta ele-
da cv. Mundo Novo com ‘Bourbon Ama- cafeeiras do Brasil. vada adaptabilidade a diferentes regiões
relo’ ou mutação do alelo xanthocarpa Catuaí Amarelo - Corresponde ao de cultivo. Encontra-se adaptada a todas
de ‘Mundo Novo’ de frutos vermelhos cruzamento entre Mundo Novo e Caturra as regiões cafeeiras do Brasil.
(XcXc) para frutos amarelos (xcxc). Tem Amarelo. Foi selecionada e liberada pelo
em sua formação 75% de Bourbon e 25% IAC a partir de 1972, tem em sua forma- Cultivares de porte
de Típica (Sumatra) ou 50% de Bourbon e ção 75% de Bourbon e 25% de Típica. alto e moderadamente
50% de Típica. Tem excelente qualidade Apresenta frutos de coloração amarela e resistentes à ferrugem
da bebida. Está na fase de experimenta- tem maturação média. É indicada para (Hemileia vastatrix)
ção em São Paulo e Minas Gerais. espaçamento largo e adensado e altitudes Icatu Vermelho - Corresponde ao
baixa e média. Adapta-se bem à cafeicul- cruzamento entre Coffea canephora DP e
Cultivares de porte baixo tura irrigada, regiões quentes e solos de
Bourbon Vermelho, com dois retrocruza-
e suscetíveis à ferrugem baixa fertilidade, apresenta elevada adap-
mentos para Mundo Novo, foi seleciona-
Caturra Vermelho IAC 477 - Tem tabilidade a diferentes regiões e condi-
da e liberada pelo IAC a partir de 1992.
origem em Minas Gerais ou Espírito San- ções de cultivo. Encontra-se adaptada em
Tem em sua formação 62,5% de Bourbon,
to e corresponde a uma mutação natural todas as regiões cafeeiras do Brasil.
mais 31,25% de Típica e 6,25% de Ro-
do Bourbon Vermelho. Foi selecionada Ouro Verde IAC H 5010-5 - Corres- busta (IAC 2945) ou 50,0% de Bourbon,
e liberada pelo IAC a partir de 1949. De ponde ao cruzamento entre Catuaí Amare- mais 37,5% de Típica e 12,5% de Robusta
acordo com sua origem tem 100% de lo e Mundo Novo. Foi selecionada e libera- (outras progênies). Apresenta excelente
Bourbon. Tem maturação precoce e é in- da pelo IAC a partir de 2000. Tem em sua qualidade da bebida. É indicada para es-
dicada para regiões altas, acima de 1000m formação 62,5% Bourbon e 37,5 de Típica. paçamento entre plantas superior a 0,80m
visando a produção de cafés especiais, de- Os frutos são de coloração vermelha e de e regiões de altitudes baixa ou média.
vido às suas excelentes qualidades orga- maturação média. É indicada para espaça- Apresenta pouca adaptabilidade a colhei-
nolépticas. É recomendada para plantios mento largo e adensado e altitudes baixa ta mecanizada, não é recomendado para
adensados e solos férteis. Encontra-se e média, adapta-se bem à cafeicultura irri- regiões com déficit hídrico acentuado e
melhor adaptada nas regiões altas de Mi- gada, regiões quentes e solos de baixa fer- relevo acidentado. Encontra-se melhor
nas Gerais, Espírito Santo e São Paulo. tilidade. Apresenta elevada adaptabilidade adaptada no Sul de Minas e regiões altas
2.2) Caturra Amarelo IAC 476 - a diferentes regiões e condições de cultivo. do cerrado mineiro e no Estado de São
Tem origem em Minas Gerais ou Espírito Encontra-se adaptada em todas as regiões Paulo principalmente em Garça, Marília,
Santo e corresponde a uma mutação natu- cafeeiras do Brasil. Tupã, Piraju, Mococa e São Carlos.
ral do Bourbon Vermelho ou do Caturra Ouro Bronze IAC 4925 - Correspon- Icatu Amarelo - Corresponde ao cru-
Vermelho. Foi selecionada e liberada pelo de ao cruzamento entre Catuaí Amarelo zamento entre Icatu Vermelho e Bourbon
IAC a partir de 1949. De acordo com sua e Mundo Novo, foi selecionada e libe- Amarelo ou Mundo Novo Amarelo, foi
origem tem 100% de Bourbon. Tem ma- rada pelo IAC a partir de 2007. Tem em selecionada e liberada pelo IAC a partir
turação precoce e é indicada para regiões sua formação 62,5% de Bourbon e 37,5% de 1992, Tem em sua formação 62,5% de
altas, acima de 1000m, e para a produção de Típica. As folhas novas têm coloração Bourbon, mais 31,25% de Típica e 6,25%
de cafés especiais, devido às suas exce- bronzeada. É indicada para espaçamento de Robusta. Apresenta excelente quali-
lentes qualidades organolépticas. É reco- largo e adensado e altitudes baixa e mé- dade da bebida. É indicada para espaça-
mendada para plantios adensados ou su- dia, adapta-se bem à cafeicultura irrigada, mentos entre plantas superior a 0,80m
per adensados e solos férteis. Encontra-se regiões quentes e solos de baixa fertilida-
e regiões de altitudes baixa ou média.
melhor adaptada em regiões altas de Mi- de. Apresenta elevada adaptabilidade a
Apresenta pouca adaptabilidade a colhei-
nas Gerais, Espírito Santo e São Paulo. diferentes regiões e condições de cultivo.
ta mecanizada. Não é recomendada para
regiões com déficit hídrico acentuado e
relevo acidentado. Encontra-se melhor
adaptada no Sul de Minas e regiões altas
do cerrado mineiro e no Estado de São
Paulo principalmente em Garça, Marília,
Tupã, Piraju, Mococa e São Carlos.
Icatu Precoce IAC 3282 - Corres-
ponde ao cruzamento natural entre Ica-
tu Vermelho e Bourbon Amarelo, foi
Catuaí Vermelho - frutos Catuaí enxartado sobre Apoatã selecionada e liberada pelo IAC a partir

14 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Acaiá IAC 474-19 Catuaí Vermelho - planta Ouro Verde IAC H5010-5 – planta

de 1996. Tem em sua formação 75% de Tupi IAC 1669-33 - Corresponde ao especiais e tem mercado restrito. En-
Bourbon, 18,75% de Típica e 6,25% de cruzamento Híbrido de Timor CIFC 832/2 contra-se melhor adaptada em pequenas
Robusta. É indicada para espaçamento X Villa Sarchi (H 361-4) realizado pelo áreas cafeeiras experimentais de Minas
largo, regiões de altitudes média e alta. CIFC, tendo sido selecionada e liberada Gerais e São Paulo.
É pouco adaptada a colheita mecanizada, pelo IAC a partir de 2000. Tem em sua
5.2) Ibairi IAC 4061 - Corresponde
não é recomendada para regiões quentes, formação 50% de Bourbon, mais 43,7% de
ao cruzamento de Mokka com Bourbon
com déficit hídrico acentuado e solos are- Típica e 6,3% de Robusta. Os frutos são
Vermelho e tem em sua formação 100% de
nosos. É indicada para a produção de ca- vermelhos e grandes. A peneira média das
fés especiais, principalmente para o café sementes é em torno de 17 e 18. É indicada Bourbon. É uma cultivar pouco produtiva.
espresso. A maturação um pouco mais para espaçamento adensado, em regiões É indicada para produção de cafés super
precoce possibilita o escalonamento da de altitude média e alta, em solos férteis e especiais, pois tem excelente qualidade
colheita. Encontra-se melhor adaptada clima ameno. Encontra-se melhor adapta- organoléptica da bebida. Recomenda-se
em regiões altas do Sul de Minas, Jequi- da no Estado do Paraná e algumas regiões espaçamentos de 3,0 a 3,5m x 0,5 a 0,7m
tinhonha e Cerrado Mineiro no Estado de de São Paulo (Altinópolis, Piraju) e Minas e tem mercado super restrito. Encontra-se
Minas Gerais e regiões altas do Estado de Gerais, principalmente Patrocínio. melhor adaptada em pequenas áreas cafe-
São Paulo (São Sebastião da Grama, Ca- Tupi RN IAC 1669-13 - Corresponde eiras experimentais.
conde, etc). ao Híbrido de Timor CIFC 832/2 x Villa
Sarchi realizada no CIFC (H 361-4) e sele- Porta-enxerto resistente
Cultivares de porte baixo ção pelo IAC e Eng° Agr° Saulo Roque de aos nematóides
e resistentes à ferrugem Almeida, do ex IBC onde recebeu inicial- Meloidogyne exigua,
Obatã IAC 1669-20 - Corresponde mente o nome Uva. Selecionada e libera- M. incognita e M.
ao cruzamento feito entre Villa Sarchi e da pelo IAC a partir de 2006. Tem em sua paranaensis
Híbrido de Timor CIFC 832/2, com retro- formação 50% de Bourbon, mais 43,7% de Apoatã IAC 2258 - Corresponde a
cruzamento natural para Catuaí Verme- Típica e 6,3% de Robusta. É indicada para introdução de sementes da planta matriz
lho, foi selecionada e liberada pelo IAC espaçamento adensado em regiões de alti- 2258 do CATIE em Turrialba (Costa Rica)
a partir de 2000. Tem em sua formação tude média e alta, em solos férteis e clima em 1974 e seleções de cafeeiros resistentes
62,5% de Bourbon, mais 34,4% de Típica ameno. Pode-se plantar em áreas infesta- a vários nematóides por técnicos do IAC
e 3,1% de Robusta. Os frutos são verme- das com o nematóide Meloidogyne exigua. em áreas de nematóides. Em 1987 o IAC
lhos e grandes. A peneira média das se- Encontra-se melhor adaptada em regiões lançou e liberou o porta enxerto Apoatã
mentes é em torno de 17 e 18. É indicada altas de Minas Gerais (Patrocínio), de São IAC 2258. É recomendada como porta en-
para espaçamento adensado ou médio e Paulo e do Espírito Santo. xerto de cultivares arábica principalmente
altitude média. Adapta-se bem ao renque Tupi Amarelo IAC 5162 - Correspon- em regiões com infestação de M. exigua,
mecanizado com adensamento na linha de ao provável cruzamento natural de Tupi M. incognita e M. paranaensis. A copa de
e responde bem a irrigação. Encontra-se IAC 1669-33 com Catuaí Amarelo. Foi
melhor adaptada no Estado de São Paulo café arábica utilizada irá determinar a me-
selecionada pelo IAC e Eng° Agr° Carlos lhor região, conforme consta na descrição
em Garça, Piraju, região de Franca e no Piccin. Tem em sua formação 62,5% de
Sul de Minas Gerais e em plantios aden- de cada cultivar.
Bourbon mais 34,4% de Típica e 3,1% de
sados no Estado do Paraná. É uma cultivar Robusta. É indicada para espaçamento
exigente em nutrição. adensado em regiões de altitude média e Luiz Carlos Fazuoli, Maria Bernadete
Obatã Amarelo IAC 4739 - Corres- alta, em solos férteis e clima ameno. Está Silvarolla, Terezinha de Jesus Garcia
ponde ao cruzamento natural entre Obatã em fase experimental em regiões altas de Salva, Oliveiro Guerreiro Filho, Her-
IAC 1669-20 e Catuaí Amarelo. Tem em Minas Gerais (Patrocínio) e São Paulo culano Penna Medina Filho e Wallace
sua formação 68,7% de Bourbon, mais (Altinópolis). Gonçalves
29,7% de Típica e 1,6% de Robusta. É Instituto Agronômico, Centro de Café
indicada para espaçamento adensado ou Cultivares que produzem “Alcides Carvalho”
médio e altitude média, adapta-se bem cafés especiais ( (19) 3241-5188 ramal 370; 3212-0458
ao renque mecanizado com adensamento * fazuoli@iac.sp.gov.br;
5.1) Laurina IAC 870 - Correspon-
na linha e responde bem à irrigação. En- * bernadet@iac.sp.gov.br;
de a uma provável mutação natural de
contra-se melhor adaptada no Estado de * tsalva@iac.sp.gov.br;
Bourbon e tem em sua formação 100%
São Paulo em Altinópolis e Mococa. No * oliveiro@iac.sp.gov.br;
de Bourbon. É uma cultivar pouco pro-
Estado do Paraná em Londrina e no Sul
dutiva. É indicada para plantios aden- * medina@iac.sp.gov.br;
de Minas Gerais. Está em fase de experi-
sados e para a produção de cafés super * wallace@iac.sp.gov.br
mentação e é exigente em nutrição.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 15


ama Instituto Agronômico
g r o
r o d
P fé
O Ca Terezinha Bernadete Fazuoli Thomaziello Petek Gerson Sérgio

A
cultura do cafeeiro arábica foi in- Conta ainda com 15 pesquisadores de ou- atender a demandas do cafeicultor no que
troduzida em Campinas em 1807, tras áreas específicas, com dedicação par- se refere ao desenvolvimento de materiais
por ser essa uma região que favo- cial ao programa, enquadrados nas áreas produtivos e portadores de resistência aos
recia consideravelmente a concentração de Climatologia, Agrometeorologia, Irri- diversos fatores bióticos limitantes para a
de cafeicultores. Em 1887, por decreto gação, Fitotecnia, Fitopatologia, Nemato- cultura, tais como ferrugem do cafeeiro,
do Imperador D. Pedro II, foi criada a logia, Citologia, Biotecnologia, Cultura nematóides e bicho mineiro. Outros focam
Imperial Estação Agronômica de Campi- de Tecidos, Botânica, Fisiologia Vegetal resistência a fatores abióticos, como seca
nas, posteriormente denominada Instituto e Máquinas Agrícolas. As atividades do e altas temperaturas, alumínio e acidez do
Agronômico - IAC. Essa Estação tinha a Programa contam com a colaboração efe- solo. Alguns projetos buscam novas op-
incumbência de estabelecer critérios téc- tiva também de estudantes de graduação ções de cultivo para áreas impróprias ao
nicos e científicos para o cultivo do café e de pós-graduação em praticamente to- café arábica, seja por meio do desenvolvi-
na região e com a sua criação deu-se o das as áreas. Além de desenvolver pes- mento de híbridos entre espécies diferen-
início dos estudos com o cafeeiro no Ins- quisas, o Centro de Café tem participado tes, como o Arabusta, seja pelo estudo de
tituto Agronômico. ativamente da elaboração de Normas e novas alternativas em porta-enxertos. De
Os estudos em cafeicultura tiveram discussões sobre o Agronegócio do café resultados de pesquisa nesta área já foram
grande impulso em 1932, quando se es- em instâncias federais e estaduais. lançadas pelo programa de melhoramento
tabeleceu amplo programa de pesquisas O Programa atual de pesquisas em do IAC muitas cultivares adaptadas para
envolvendo diversas áreas do conheci- café desenvolvido no IAC é composto plantio nas mais diversas regiões cafeeiras
mento. As linhas mestras desse programa de 78 subprojetos agrupados em 16 pro- do Estado de São Paulo e do Brasil, per-
mantêm-se em execução até hoje por uma jetos e abrange 10 linhas de pesquisa fazendo cerca de 90% dos cafeeiros tipo
equipe multidisciplinar de pesquisadores (Quadro 1), que contam com importante arábica que alicerçam esse pujante agrone-
científicos envolvidos em inúmeras ativi- apoio financeiro do Consórcio Brasileiro gócio do Brasil.
dades de Pesquisa e Desenvolvimento e de Pesquisa e Desenvolvimento do Café - Tanto o desenvolvimento de novas
de transferência de tecnologia. Atualmen- CBP&D-Café, FAPESP, FINEP e CNPq, cultivares quanto o acompanhamento
te, o programa conta com 18 pesquisado- contando, também, com o apoio logístico da transferência de genes entre elas têm
res dedicados exclusivamente a estudos de empresas privadas, cooperativas e pro- sido assistidos por trabalhos desenvolvi-
com café, sendo oito na área de Genética dutores rurais. dos na linha de biotecnologia do Centro
e Melhoramento, três em Biotecnologia e O Centro de Café Alcides Carvalho do de Café. Esta linha engloba ações estra-
Citogenética, dois em Fitotecnia, um em IAC possui valioso banco de germoplasma tégicas de pesquisa que lançam mão das
Química e Qualidade do Produto, um em de café, cuja instalação no campo foi ini- numerosas técnicas disponíveis para fa-
Colheita e Pós-Colheita, dois em Fitos- ciada em 1932, e que se constitui no supor- cilitar a seleção de genótipos desejáveis
sanidade e um em Economia Aplicada. te, não só para todos os trabalhos de me- do ponto de vista do melhoramento. Elas
Quadro 1. Distribuição das pesquisas com café em anda- lhoramento como também para são empregadas especialmente nos casos
mento no IAC
os estudos de genética, citologia de estudos envolvendo material genético
e citogenética do café em curso de herança complexa, na caracterização
LINHAS DE PROJETOS SUBPROJETOS no Instituto. A linha de pesqui- molecular das cultivares já liberadas e tan-
PESQUISA (no) (no) sa Genética, Citologia, Citoge- to na clonagem de cafeeiros de alto valor
Genética, Citologia, nética e Melhoramento abrange agronômico quanto de acessos do Banco
5 28
Citogenética e Melhoramento grande diversidade de estudos de Germoplasma. Outros objetivos ainda
Biotecnologia 1 14 científicos. Os estudos contem- contemplados nesta linha são: 1-caracteri-
plam a caracterização do ponto zação de espécies, variedades e cultivares
Ecofisiologia e Climatologia 2 11
de vista morfológico, genético, do Banco de Germoplasma de café do IAC
Nutrição e adubação 1 2 bioquímico, citológico, quími- por bandamento e técnicas de citogenética
Fitossanidade 2 3 co e molecular dos cafeeiros molecular, 2-estudo da regulação do de-
Sistemas de Produção mantidos em coleção e também senvolvimento floral e da maturação dos
1 4 dos descendentes das numero- frutos de C. arabica, 3-isolamento e carac-
e Manejo (Fitotecnia)
Irrigação 1 4 sas hibridações controladas já terização de regiões promotoras de genes
Mecanização e Tecnologia
realizadas. Os resultados des- com expressão tecido-específica das espé-
Pós-Colheita
1 2 sas pesquisas facilitam e orien- cies C. arabica e C. canephora, 4-estudo
tam a seleção de germoplasma da via biossintética da cafeína em café ará-
Qualidade do Produto 1 8
nas diversas fases do desenvol- bica do ponto de vista genético-molecular,
Sócio-Economia 1 2 vimento de novas cultivares. 5-mapeamento cromossômico de genes
Total 16 78 Alguns desses projetos visam análogos de resistência (RGA) e seqüên-

16 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


cias repetidas simples (SSR) em espécies los agrometeorológico-fenológicos de mo-
de Coffea através da técnica de hibridação nitoramento de quebra de produtividade,
in situ fluorescente (FISH). com vistas a subsidiar a previsão de safra
A produtividade dos cafeeiros é in- para as principais regiões cafeeiras do
fluenciada pela genética, pelas condições Brasil. Também levantam-se dados para o
climáticas, pelo manejo e pelas condições desenvolvimento de modelos fenológicos
nutricionais do solo e das plantas. Alguns para a estimativa da floração e maturação
estudiosos do assunto consideram que do cafeeiro arábica, baseados em acumu-
em certas regiões as características quí- lação térmica e balanço hídrico válidos
micas do solo são mais importantes para para a condições tropicais do Brasil.
a produtividade dos cafezais do que as Trabalhos com irrigação igualmente
condições físicas e hídricas, chegando a vêm sendo desenvolvidos no IAC. Como
explicar cerca de 50% da produtividade. se sabe, essa técnica vem sendo ampla- Coleção de cafeeiros da Etiópia mantidos
A adubação e a calagem são os métodos mente empregada como tecnologia que no Banco de Germoplasma do IAC.
empregados para disponibilizar aos cafe- possibilita a implantação da cafeicultura
eiros os nutrientes necessários para o seu em zonas sujeitas a períodos de déficit hí-
perfeito desenvolvimento e reprodução. A drico e mesmo em áreas normalmente ap-
calagem tem se revelado técnica de gran- tas para o cultivo de café, onde tem resul-
de valor para a correção de solos com ele- tado em aumento de produtividade. Nas
vada acidez e altos índices de alumínio/ culturas de cafés arábicas, a irrigação tem
manganês. Além de elevar o pH do solo, a sido recomendada para as regiões do Alto
sua aplicação implica na maior disponibi- Paranaíba, Triângulo Mineiro, Norte e
lização de cálcio e magnésio e na neutra- Noroeste de Minas Gerais e Goiás, Bahia,
lização dos efeitos tóxicos do alumínio na Pernambuco e Ceará. Ela tem beneficiado,
camada superficial. além disso, algumas lavouras das regiões
Na linha de trabalhos com nutrição e Mogiana e Araraquarense, localizados em
adubação de cafeeiros, o Centro de Café São Paulo e plantações de café Conilon do Vista de ensaio
Alcides Carvalho vem conduzindo expe- Espírito Santo, Bahia, Rondônia e Mato consorciando café e banana.
rimentos que visam estudar o comporta- Grosso. Além de ter ampla utilização em país, triângulo Mineiro e Norte/Noroeste
mento das últimas cultivares de café ará- regiões com reconhecido déficit hídrico, de Minas Gerais. Há outras pragas impor-
bica lançadas, identificando seu grau de ainda se pode recomendar a irrigação para tantes do café, como as cigarras, a bro-
tolerância a solos ácidos e corrigidos, em o cultivo de algumas cultivares de C. ara- ca-do-café, os ácaros, as cochonilhas, as
condições de campo e de laboratório. Os bica em regiões de temperaturas acima da lagartas e os fitonematóides que merecem
resultados desse trabalho deverão subsi- considerada adequada para os cafés dessa atenção. Os fitonematóides representam
diar a recomendação das cultivares para espécie. É de se destacar, porém, que há ameaça antiga aos cafezais, particular-
solos com diferentes graus de acidez, bem um nível, um período e uma forma mais mente aos de áreas de arenito localizadas,
como na seleção das cultivares mais in- adequada de se empregar a irrigação. Nes- por exemplo, em algumas regiões de São
dicadas para aplicação em hibridações e sa linha, o IAC tem desenvolvido projetos Paulo e do Paraná. Há anos o IAC vem se
em estudos genéticos para o conhecimen- que procuram definir a real necessidade dedicando a pesquisar o comportamento
to do tipo de herança que controla estas de irrigação dos cafeeiros plantados em dos nematóides do gênero Meloidogyne
características. Além disso, os resultados diferentes espaçamentos e com diferentes com vistas ao desenvolvimento de técni-
poderão ser empregados também para di- manejos da cultura, o desempenho do ca- cas de manejo e de novas cultivares que
recionar o processo de seleção durante o feeiro irrigado por gotejamento superficial possibilitem o desenvolvimento de uma
desenvolvimento de cultivares. e enterrado e os efeitos da irrigação sobre cafeicultura rentável em áreas infestadas.
Há anos o IAC vem estudando os o desenvolvimento e produtividade de ca- A seleção das cultivares mais reco-
efeitos do ambiente nos cafeeiros. São do feeiros de C. arabica e de C.canephora mendadas a determinada região é uma
IAC, por exemplo, os estudos sobre o ba- em diferentes locais de produção no esta- das decisões fundamentais para o estabe-
lanço hídrico do solo, que contribuíram do de São Paulo . lecimento de uma cafeicultura de sucesso.
para a instalação de lavouras cafeeiras no Apesar de a produtividade média dos Na seqüência, destaca-se com essa mes-
Cerrado e os trabalhos que resultaram no cafezais irrigados atingir 55 sacas de café ma finalidade a definição do sistema de
amplo zoneamento climatológico, estabe- beneficiado/ha em algumas regiões, a manejo e de produção da lavoura. O espa-
lecidos sob a coordenação do Dr. Ângelo média do Brasil localiza-se ao redor de 16 çamento, os tipos de poda e as suas freqü-
Paes de Camargo. Atualmente, na linha sacas/ha. Vários fatores contribuem para ências, bem como a consorciação com es-
de ecofisiologia e climatologia, três am- essa drástica diferença, e entre eles, sem pécies perenes ou temporárias, além das
plos projetos estão sendo desenvolvidos dúvida alguma, pragas e doenças dos cafe- técnicas de arborização são possibilida-
no Instituto. Em linhas gerais, nesses pro- eiros destacam-se. O ataque desses agen- des atuais passíveis de consideração para
jetos estudam-se os efeitos das condições tes resulta em perda não somente de pro- a condução de cafeicultura baseada em
hídricas, edáficas e nutricionais, da tem- dutividade, mas também na diminuição boas práticas agrícolas, que proporcionem
peratura e do fotoperíodo, na floração e no da qualidade do grão e depauperamento uma cafeicultura sustentável. Há 75 anos
desenvolvimento do fruto do cafeeiro, no das plantas. O bicho-mineiro, é uma das o IAC desenvolve linha de pesquisa que
crescimento e na capacidade fotossintética pragas mais danosas aos cafeeiros, e ma- visa à seleção de cultivares de C.arabica,
da planta, na produtividade e na duração nifesta-se, principalmente, em regiões e desde 1970 trabalha na seleção de culti-
das fases fenológicas. Essa linha de pes- cafeeiras de baixa altitude do centro sul, vares de C. canephora. Na área de fitotec-
quisa contempla também trabalhos que além de ser importante nas regiões do nia, o Centro de Café vem desenvolvendo
visam desenvolver, adaptar e testar mode- Alto Paranaíba, nordeste e centro oeste do pesquisas com sistemas de produção as-

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 17


sociados à nutrição de cafeeiros arábicas reja produzem bebidas menos adstringen- cipais estados produtores brasileiros e a
em busca de condições que proporcionem tes e mais aceitas do que os verdes; que economia nacional, a organização de pro-
elevadas eficiências produtivas e econô- há mercados para todos os tipos de café dutores familiares para a certificação em
micas, que contribuirão para o aumento produzidos, mas que alguns preferem os grupo e a identificação, caracterização e
da competitividade e sustentabilidade da cafés de frutos de cor amarela e que as be- impactos das iniciativas para o desenvol-
agricultura familiar. Outro projeto de pes- bidas de cafés arábicas são diferentes das vimento sustentável da produção de café
quisa do Centro de Café nessa linha con- de cafés robustas. No entanto, há poucas por pequenos produtores.
templa os cafés orgânicos e visa adquirir pesquisas conclusivas sobre quais os com- Os resultados da pesquisa somente
conhecimentos para satisfazer à demanda postos do café cru que podem indicar as conduzirão a um aumento da eficiência da
dos cafeicultores sobre orientações técni- características da bebida preparada com cafeicultura se forem incorporados pelos
cas para produção compatível com o seu o café torrado. Pesquisas desenvolvidas produtores, resultando em uma cafeicul-
nível tecnológico, respeitando as condi- no IAC têm procurado acrescentar algu- tura moderna e competitiva. Desta forma,
ções locais, principalmente no sentido mas informações às já disponíveis sobre fica evidenciada a importância do elo de
de minimizar as perdas de produtividade essa relação. Algumas delas contemplam, ligação entre o segmento de pesquisa e
nos períodos de transição entre a cultu- por exemplo, a investigação das diferen- o da produção, que é feito por extensio-
ra convencional e a orgânica. Igualmente ças entre a composição dos cafés crus de nistas das regionais da CATI, técnicos de
têm sido abordados em experimentos em variedades de fruto vermelho e de fruto cooperativas e outras entidades ligadas
andamento no Instituto Agronômico a amarelo, bem como entre os grãos de ca- ao setor cafeeiro, técnicos consultores e
cafeicultura arborizada e a sua consorcia- fés preparados pelas vias úmida e seca. professores do ensino técnico e superior.
ção com coqueiro, seringueira, bananeira Outras pesquisas estão sendo desenvolvi- Estes grupos de profissionais têm sido o
e grevílea, visando ao estabelecimento de das para avaliar o potencial de emprego alvo de eventos periódicos de capacita-
sistemas agroflorestais como componente de cafeeiros do Banco de Germoplasma ção e atualização na cultura do café pro-
da sustentabilidade da lavoura. de Café em melhoramento genético com movidos por projetos de transferência de
O processo de colheita é uma das ati- base na composição dos cafés crus. Há tecnologia conduzidos pelo IAC. Nesses
vidades que mais oneram a produção do ainda trabalhos sendo desenvolvidos so- cursos, são apresentados de forma didá-
café em função, principalmente, do alto bre a variação da composição química do tica os mais recentes avanços da pesquisa
preço decorrente da escassa mão-de-obra endosperma ao longo dos diversos está- resultantes não apenas do Programa de
e das obrigações patronais. Visando à re- gios de maturação, assim como sobre pro- Café do IAC, mas também de tudo que há
dução desses gastos, têm sido disponibili- teases e compostos nitrogenados envolvi- de atual produzido, tanto em centros de
zadas colhedoras adaptadas para plantios dos na qualidade da bebida. pesquisa como em indústrias.
com espaçamento convencional. Alterna- O agronegócio do café no mundo en- Finalizando, no Programa de Pesquisa
tivamente, estão sendo iniciadas no IAC volve, da produção ao consumo final, meio com Café do IAC o cafeeiro tem sido es-
pesquisas destinadas ao desenvolvimento bilhão de pessoas (8% da população mun- tudado cientificamente sob aspectos rele-
de colhedoras autopropelidas para a meca- dial). No Brasil, o café responde por 2% vantes para o estabelecimento de critérios
nização da colheita em cafeeiros adensa- do total de exportações e gera uma riqueza técnicos para o seu cultivo sustentável e
dos. Também, o manejo e a preservação da anual de 10 bilhões de reais. O complexo para a criação de cultivares altamente pro-
estrutura do solo em lavouras de café são mercado do café tem passado por mudan- dutivas, sendo hoje várias delas verdadei-
fundamentais para a obtenção de altas pro- ças significativas, como se observa, por ros patrimônios da cafeicultura brasileira.
dutividades, sustentabilidade na atividade exemplo, pelo nível crescente de exigên- O apoio desse Programa de Pesquisa à
e preservação ambiental. Nesse sentido, cia dos consumidores e pela presença de cafeicultura se amplia na medida em que
há pesquisas em andamento no Instituto barreiras comerciais tarifárias e não tari- não se restringe ao desenvolvimento das
Agronômico que visam estudar o impacto fárias. Neste cenário, países produtores pesquisas científicas, mas também con-
ambiental provocado pelo emprego de di- permanecem em constante reflexão sobre templa a transferência dos seus resultados
versos processos mecanizados na cultura, os elementos conjunturais que podem afe- ao produtor e o apóia em iniciativas que
que resultarão em significativa contribui- tar a manutenção dos espaços ocupados e visam à valorização do produto. Ademais,
ção para a compreensão e controle do pro- a conquista de novas fatias desse merca- ele tem proporcionado condições para o
cesso de degradação de áreas agrícolas. do. Atento às alterações sócioeconômicas Instituto opinar em Políticas de Pesquisa
Desde a década de 90 a qualidade da e mercadológicas pelas quais vem pas- e Desenvolvimento para o Agronegócio
bebida de café vem sendo valorizada no sando o Sistema Agroindustrial do Café, do Café e sugerir ações governamentais
mercado interno e externo, sendo hoje o IAC tem sido convidado a participar de para uma cafeicultura sólida e rentável.
uma realidade as premiações e as vendas reuniões interinstitucionais contribuin-
por leilões dos melhores lotes produzidos do, por exemplo, na elaboração de Nor-
no país. Em processos bem conduzidos mas para a Produção Integrada de Café Terezinha J. G. Salva; M. Bernadete Sil-
do início ao fim, a qualidade do grão de – PIC, em discussões sobre a implantação varolla; Luiz C. Fazuoli; Roberto A. Tho-
café guarda estreita relação com a da be- e a validade de aplicação das normas do maziello; M. Rafael Petek; Gerson Silva
bida, ambas determinadas pela composi- Código Comum da Comunidade Cafeeira Giomo e Sérgio Parreiras Pereira
ção química do grão. Embora em todos (4C) e para a regulamentação das ativida- Instituto Agronômico, Centro de Café
os estudos de melhoramento genético do des da Iniciativa Nacional de Comércio ‘Alcides Carvalho’
cafeeiro que culminaram em lançamentos Justo e Solidário. Pesquisadores do IAC ( (19) 3241-5188 ramal 370; 3212-0458
das cultivares mais plantadas no Brasil têm atuado também como mediadores de * tsalva@iac.sp.gov.br;
tenham se considerado a qualidade da comunidades na Rede de Comunicação, * bernadet@iac.sp.gov.br;
bebida, estudos específicos para o conhe- Colaboração e Negócios (PEABIRUS). * fazuoli@iac.sp.gov.br;
cimento da sua composição química dos Algumas das pesquisas em andamento * rthom@iac.sp.gov.br;
grãos desenvolvidos no próprio Centro de na linha de sócio-economia contemplam * mrpetek@iac.sp.gov.br;
Café são mais recentes. Sabe-se há tempo estudos da relação entre os setores de pro- * gsgiomo@iac.sp.ogv.br;
que os cafés no estádio de maturação ce- dução e industrialização do café dos prin- * sergiopereira@iac.sp.gov.br

18 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Aquecimento global, mudanças climáticas e a

cafeicultura paulista
Fazuoli Thomaziello Camargo

Se não vejamos: pela Média e Alta Mogiana, onde a alti-


Uma notícia causou grande Segundo o zoneamento agroclimáti- tude está na faixa de 800 a 1.200m, com
preocupação para técnicos co do café arábica para o Brasil, a tempe- temperaturas médias entre 18 a 20°C.
e produtores ligados à ratura do ar é o principal fator na defini- Um aumento de 3°C elevaria essas tem-
cultura do café: ção da aptidão climática do cafeeiro em peraturas para 21 a 23°C, continuando a
“O café vai sumir do cultivos comerciais. A aptidão térmica região a ser considerada ainda apta para a
cenário agrícola paulista é considerada por faixas de temperatura cultura comercial do café arábica.
nos próximos 30 a 40 anos, média anual, sendo a apta ou preferen- Na região sul do Estado (Avaré, Piraju
quando a temperatura cial entre 18 a 23°C. Abaixo de 18°C e e municípios adjacentes), embora a altitu-
acima de 23°C é considerado marginal de esteja na faixa de 700 a 800m, devido à
deverá estar 3 graus a inapto. Em temperaturas superiores a latitude apresenta temperaturas médias de
centígrados mais alta”. 23°C, associadas à seca na época do flo- 19 a 20°C e, portanto 3°C a mais também
Esta conclusão e outros rescimento, podem ocorrer abortamento não inviabilizariam a cafeicultura comer-
efeitos devastadores floral e formação de “estrelinhas”, com cial na região.
do aquecimento global grande redução da produtividade. Além O problema poderia tornar-se mais
fazem parte de estudo disto, estas temperaturas elevadas condi- grave e preocupante na região centro-
divulgado pelo Centro de cionarão frutos com desenvolvimento e oeste do Estado onde a principal região
maturação bastante precoces, ocasionan- é Garça/Marília, onde a altitude média
Pesquisas Meteorológicas
do perda da qualidade do produto, pois a está em torno de 600m, que condiciona
e Climáticas aplicadas à colheita e secagem irão coincidir com o temperaturas médias na faixa entre 21 a
Agricultura (CEPAGRI) da período chuvoso. 22°C, que com a projeção de aumento de
Unicamp em conjunto com Por esta razão a cafeicultura do Es- 3°C, inviabilizaria o cultivo comercial do
a Embrapa-Informática a tado de São Paulo está implantada em café arábica.
partir dos relatórios do IPCC regiões de altitude entre 400 e 1.200m, No entanto, outros aspectos primor-
(Painel Intergovernamental que condicionam temperaturas médias diais foram totalmente ignorados por
de Mudanças anuais entre 18 e 23°C. As principais aqueles que consideram apenas o aspecto
regiões produtoras são: Média e Alta “temperatura média”. Ao longo de deze-
Climáticas). O relatório é Mogiana; Avaré/Piraju e Garça/Marília. nas de anos de pesquisa, o IAC e outras
obviamente preocupante A maior região produtora é a constituída instituições de pesquisa desenvolveram
e a constatação do
aquecimento não se
discute aqui, muito
embora os próprios
relatórios contenham alto
grau de incerteza nos
resultados dos modelos
de previsão a longo prazo.
Entretanto, a afirmação
de que o aquecimento
de 3°C previsto para
Arborização Catuaí em áreas quentes (24,5°C)
2040 ocasionaria muitas
mudanças climáticas e
inviabilizaria totalmente a
cafeicultura paulista é, no
mínimo, prematura, sendo
necessária uma análise
dos possíveis cenários e
da situação da capacidade
técnica-científica da
cafeicultura atual.
Irrigação Adensamento

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 19


diminuição da temperatura média em até
2°C, grande proteção contra vento que é
Espécies/Cultivares também fator prejudicial à planta. O IAC
Dentre as espécies de café conhecidas, Coffea arabica, que fornece o café e o IAPAR possuem dados experimen-
arábica e Coffea canephora, que proporciona o café robusta, são as duas mais tais que comprovam essa diminuição das
importantes no mercado nacional e internacional. No Brasil existem aproximada- temperaturas. São diversas as espécies
mente 1,9 bilhões de cafeeiros robusta (Conilon) e 4,3 bilhões de cafeeiros arábica. vegetais possíveis de uso para arboriza-
O arábica, como mencionado anteriormente, é de clima mais ameno, enquanto o ção ou consorciação, podendo inclusive
café robusta é de clima quente e úmido e adapta-se bem em regiões com temper- agregar-se valor à produção do café com
aturas médias anuais entre 22 e 26°C. Nas áreas com Conilon, que estão na faixa espécies de uso florestal ou aquelas de
de 23°C, um aumento de temperatura de 3°C não deve influenciar negativamente o exploração comercial como macadâmia,
cultivo deste tipo de café no Brasil. Por outro lado, o IAC tem um programa de mel- seringueira, bananeira, abacateiro, coco
horamento em que as características de robusta são transferidas para arábica (re- anão entre outras. Não se trata de um
sistência a doenças e pragas, vigor, produção, rusticidade, melhor sistema radicular sombreamento exagerado, com muitas
e tolerância a temperaturas mais elevadas entre outras). Várias progênies desses árvores por hectare, que não funciona
cruzamentos têm apresentado características que permitem tolerar temperaturas para as condições brasileiras. A técnica
mais altas e, portanto, poderão ser utilizadas em novos plantios, substituindo o café da arborização preconiza sombreamento
arábica em regiões onde a temperatura fique muito elevada. Trabalhos recentes têm
mais ralo, com população em torno de 60
mostrado que a cultivar Catuaí (arábica) vai muito bem em regiões baixas e quentes
a 70 plantas de sombra por hectare.
com temperaturas médias acima de 23°C com irrigação.
Adensamento: o plantio do cafeeiro
É importante ressaltar também que no banco de germoplasma do IAC ex-
conforme prática hoje usual em todas as
istem outras espécies de café, como Coffea dewevrei, Coffea congensis e Coffea
racemosa que estão sendo utilizadas em programas de melhoramento visando
regiões em espaçamentos mais adensa-
selecionar genótipos produtivos, resistentes ao bicho mineiro e mais tolerantes
dos entre linhas e entre plantas na linha
ao calor e à seca. Portanto sob o aspecto da cafeicultura atual, a tendência de
(plantio em renque), apresenta menores
aumento de temperatura não deverá ser catastrófica e nem também para o futuro, produções por planta, mas aumenta a
pois as pesquisas até o presente fornecem evidências e subsídios para que a nos- produção por área devido ao maior nú-
sa cafeicultura de arábica e robusta continue sendo pujante, sustentável e sólida. mero de cafeeiros por hectare. Além
A associação destas práticas em muito contribuirão para atenuar o efeito das de estressar menos o cafeeiro, permite
temperaturas elevadas, sem levar em conta outras técnicas que sem dúvida ao mantê-lo mais enfolhado, proporcio-
longo dos próximos anos a pesquisa através do IAC e de outras instituições de- nando um microclima mais ameno, com
verá disponibilizar para o cafeicultor. menores temperaturas no interior da
Por outro lado a redução da área de café no Estado de São Paulo de 237 planta, abaixo do ambiente externo.
mil hectares em 2004/05 para 233 mil hectares em 2006/07, conforme citado Manejo do Mato: a boa prática
pelo CEPAGRI/Unicamp, não deve ser considerado isoladamente como um fator agrícola preconiza manter durante o pe-
atribuído ao aquecimento global. É fundamental considerar que a expansão da ríodo das chuvas o mato do meio da rua
cultura da cana-de-açúcar e o aumento de usinas pelos atrativos que apresentam manejado com implementos como roça-
no momento, têm ocupado não somente áreas com café, mas também da citricul- deiras e trinchas, muitas vezes associa-
tura e outros cultivos. dos a herbicidas. Além da conservação
Finalmente, é importante ressaltar que devemos aumentar e estimular as pes- do solo evitando-se a erosão, a manu-
quisas para encontrar soluções no enfrentamento do aquecimento global e suas tenção do solo vegetado reduz sua tem-
conseqüências. Porém, devemos ser mais cautelosos nos informes à sociedade, peratura e permite melhor distribuição
e em particular aos agricultores, que já enfrentam problemas diversos em toda a do sistema radicular do cafeeiro, pois as
cadeia produtiva do agronegócio café e que certamente vai interferir no planeja- radicelas superficiais são afetadas pelas
mento de médio e longo prazo. temperaturas elevadas. Este manejo au-
menta também o teor de matéria orgâ-
tecnologias que permitem atenuar o permitir o estabelecimento do cafeeiro nica e a capacidade de retenção de água
efeito de temperaturas adversas, viabi- em regiões de baixa altitude em que as possibilitando cultivo mais tolerante às
lizando o cultivo comercial em regiões temperaturas médias são elevadas para condições climáticas adversas.
consideradas pelo zoneamento agrocli- o cultivo normal do café arábica.
mático como marginais e até mesmo Arborização: o cafeeiro arábica é Luiz Carlos Fazuoli e Roberto Antonio
inaptas para a cultura do café arábica. originário dos altiplanos da Etiópia em Thomaziello
Isto já ocorre atualmente na prática, condições de sub-bosque, ou seja, de Instituto Agronômico, Centro de Café
com a existência de inúmeros plantios meia sombra. No Brasil o cultivo foi “Alcides Carvalho”
comerciais irrigados em regiões con- adaptado e generalizado para pleno sol
( (19) 3241-5188 ramal 370
sideradas marginais por apresentarem devido às latitudes mais elevadas e altitu-
* fazuoli@iac.sp.gov.br;
restrição térmica devido a temperaturas des inferiores do que a região de origem.
* rthom@iac.sp.gov.br
elevadas. Grande parte do cultivo do café arábica
Quais práticas agronômicas atenua- em países tradicionais como a Colôm-
bia, Costa Rica, Guatemala, El Salvador Marcelo Bento Paes de Camargo
riam este cenário de aquecimento, via- Instituto Agronômico, Centro de Ecofi-
bilizando a cultura do café? e México se dá em ambientes arborizados
onde os cafeeiros ficam próximos ao mi- siologia e Biofísica
Irrigação: crescem cada vez mais ( (19) 3241-5188 ramal 338
as áreas irrigadas com café no Brasil e croclima do seu habitat natural. A arbo-
rização do cafezal proporciona, além de * mcamargo@iac.sp.gov.br
esta prática tem sido o principal fator a
20 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007
INFORMAÇÕES TÉCNICAS

Diversidade em
Coffea sp.
Baião Mirian

O número exato de espécies de café existente no mundo é controverso entre os pesquisadores, mas há relatos na
literatura da existência de mais de 100 espécies. Apesar dessa grande variabilidade, apenas duas espécies de café,
Coffea arabica L. e C. canephora Pierre ex Froehner, comumente denominadas por “café arábica” e “café robusta”,
respectivamente, têm apresentado interesse comercial. As demais espécies constituem-se em reservatórios de
genes, que controlam características de interesse carentes nas duas espécies cultivadas, para serem utilizadas nos
programas de melhoramento genético do cafeeiro. Entretanto, os caracteres de importância agronômica e econômica,
como resistência a pragas e doenças, tolerância a estresses abióticos como seca, calor, geada, solos ácidos e de
baixa fertilidade demandam ainda mais estudos para se obter maiores informações a respeito do real potencial e
possível aproveitamento nos programas de melhoramento.

Introdução do café arabica Campinas e região. Portanto, os primeiros de cruzamentos naturais entre os cultivares
no Brasil e diversidade do cafezais brasileiros foram constituídos de existentes. Apesar de C. arabica ser uma
parque cafeeiro nacional descendentes de um único cafeeiro da espé- espécie autógama, ou seja, que se reproduz
O café arábica é originário das terras cie C. arabica, cultivar denominada Arábi- sexuadamente por autofecundação, ocorre
altas (1.000 a 2.000 metros de altitude) e de ca, Típica, Nacional ou Crioulo. A pequena em média cerca de 10% de fecundação cru-
temperaturas amenas (média de 18 a 21ºC) diversidade genética observada que existia zada nesta espécie, justificando o apareci-
da região da Abissínia (atual Etiópia, no era devida à constituição genética da planta mento de híbridos naturais em lavouras de
continente Africano). Desde sua descober- original ou às raras mutações que surgiram cultivares dessa espécie.
ta, o café demorou cerca de nove séculos com o decorrer do tempo. Em 1871, foi encontrado, em Botucatu
para chegar ao Brasil. O café entrou em Os cafezais de São Paulo e de outras (SP), pela primeira vez, em uma plantação
nosso país pelo Estado do Pará, em 1727, regiões brasileiras foram gradativamente de ‘Típica’, um cafeeiro mutante com fru-
trazido pelo sargento-mor Francisco de diversificando-se. Dessa forma, no início tos amarelos, em vez de vermelhos. Esse
Melo Palheta, que, enviado à Guiana Fran- dos anos 50 foram introduzidas no Brasil cafeeiro, denominado Amarelo de Botuca-
cesa em missão oficial, trouxe de lá cinco sementes do café Bourbon Vermelho (C. tu, mostrou-se pouco produtivo, em razão
mudas e um punhado de sementes da apre- arabica cv. Bourbon Vermelho), oriundas de ser originado de ‘Arábica’. Nessa mes-
ciada bebida. A tarefa do sargento-mor não da ilha de Reunião, situada no continente ma época, surgiu na Bahia, no município de
foi das mais fáceis, visto que, naquele país africano, pois havia informações de que Maragogipe, um cafeeiro de frutos grandes,
era proibida a cessão de exemplares de café essa cultivar era produtiva e de boa quali- denominado ‘Maragogipe Vermelho’, mas
a qualquer estrangeiro. dade. Dafert, primeiro diretor do Instituto de baixa produtividade, pois a exemplo
Cultivado inicialmente na Região Agronômico, relatou a superioridade pro- do ‘Amarelo de Botucatu’, fora originado
Norte, nos arredores de Belém do Pará, dutiva de ‘Bourbon Vermelho’ em relação também de uma mutação ‘Arábica’. Esses
à cultivar Típica, e por isso, ela era muito cafeeiros chamaram a atenção dos lavrado-
o café foi descendo para o Nordeste, pas-
mais exigente em tratos culturais e aduba- res e muitos os plantavam por curiosidade
sando pelo Maranhão, Ceará, Pernambuco
ções mais apropriadas. e para testá-los.
e Bahia, até chegar ao Rio de Janeiro, em
Em 1986, foram introduzidas sementes Vários mutantes surgiram naturalmente
1773. Daí expandiu-se pela Serra do Mar
ao longo dos anos, nos cafezais brasileiros.
e chegou ao Vale do Paraíba em 1825, al- de café da ilha de Sumatra. Era tido como
Muitos deles despertaram interesse dos pes-
cançando os Estados de São Paulo e Minas bem produtivo, vigoroso e de sementes
quisadores e muito contribuíram nos estudos
Gerais, onde encontrou condições favorá- maiores que as do ‘Bourbon Vermelho’.
básicos para o esclarecimento sobre o tipo
veis ao seu desenvolvimento. O café Sumatra revelou-se bastante rústi-
de herança de vários caracteres e seu poten-
O histórico do café no Brasil mostra co, com bebida de boa qualidade, semen- cial para os programas de melhoramento
fatos interessantes relativos à variabilidade tes pouco maiores do que as do Bourbon, genético. Assim, em 1937, o IAC recebeu
genética dos primeiros cafezais plantados porém, as suas produções não foram muito amostras de sementes de dois materiais ge-
em nossas terras. Um cafeeiro de Amsterdã, encorajadoras. néticos originados na divisa dos Estados de
Holanda, deu origem aos cafezais de Suri- A grande expansão do cultivo de café Minas Gerais e Espírito Santo, na Serra do
name, da Guiana e do Brasil. Novamente, no Brasil propiciou o surgimento de al- Caparaó. Tratava-se das cultivares Caturra
de um único cafeeiro do Rio de Janeiro ori- gumas variedades, originadas a partir das Vermelho e Caturra Amarelo. A principal
ginaram as primeiras plantações dos Esta- raras mutações que ocorrem naturalmen- característica desses cafeeiros era o porte re-
dos do Rio, Minas Gerais e São Paulo. Da te (da ordem de um evento de mutação a duzido. As análises genéticas realizadas no
mesma forma, uma única planta do municí- cada um milhão de células gaméticas), ou IAC revelaram que o ‘Caturra’ derivou-se
pio de Jundiaí deu origem aos cafezais de devido a recombinações genéticas, a partir por mutação do ‘Bourbon Vermelho’.

22 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Como mencionado anteriormente, a
cultivar Mundo Novo começou a ser estu-
dada em 1943, com a instalação de vários
experimentos e a seleção entre e dentro de
progênies. Diversas linhagens produtivas,
vigorosas e adaptadas a várias regiões eco-
lógicas do Brasil foram obtidas. A cultivar
Acaia foi selecionada dentro de ‘Mundo
Novo’ a partir de plantas dessa cultivar que
apresentaram sementes de maior tamanho e
boa capacidade produtiva.
A cultivar Catuaí foi a primeira a ser
C. arabica C. canephora selecionada após o emprego da hibridação
artificial no melhoramento genético do ca-
feeiro. O cruzamento original, realizado em
1949 no IAC, foi feito entre plantas sele-
cionadas de ‘Caturra Amarelo’ e ‘Mundo
Novo’. Após várias gerações, foram obti-
das recombinações valiosas, que recebe-
ram a denominação de ‘Catuaí Amarelo’
e ‘Catuaí Vermelho’. Os cafeeiros dessa
cultivar aliam a rusticidade e produtivida-
de do ‘Mundo Novo’ ao porte reduzido do
‘Caturra’. A partir do cruzamento original
e após o avanço de gerações, várias linha-
C. stenoophylla C. richardii gens de ‘Catuaí Amarelo’ e ‘Catuaí Verme-
lho’ sobressaíram-se e foram lançadas com
diferentes prefixos.
O IAC, preocupado com a ferrugem
que assolava os cafezais de outros países
cafeicultores, principalmente africanos, re-
alizou em 1950, muito antes da chegada da
doença ao Brasil, a hibridação interespecífi-
ca entre C. canephora cv. Robusta (que teve
o seu número de cromossomos duplicado ar-
tificialmente) e C. arabica cv. Bourbon Ver-
melho, e com um cruzamento adicional para
‘Mundo Novo’. Dessa hibridação surgiu o
C. kapakata germoplasma denominado Icatu, cujo ob-
C. eugenioides
jetivo era fornecer linhagens resistentes ao
Detalhes de folhas e frutos de espécies de Coffea cultivadas e selvagens, agente causador da ferrugem. Várias linha-
mostrando a grande variabilidade genética encontrada no gênero. gens foram obtidas e muitas apresentam re-
sistência e/ou tolerância à maioria das raças
prevalecentes de ferrugem, além de resistên-
A cultivar Caturra apresenta elevada rística de grande interesse econômico, por cia a determinadas espécies de nematóides
capacidade produtiva nas primeiras co- facilitar a operação de colheita, uma das do gênero Meloidogyne.
lheitas, reduzindo drasticamente esse po- mais onerosas na produção de café, e por Com a chegada da ferrugem ao Brasil,
tencial nas safras seguintes, com acentua- permitir plantios mais adensados. em 1970, e após a constatação de que os
da morte de ramos plagiotrópicos e inten- Em relação às variedades originadas nematóides das espécies Meloidogyne in-
so depauperamento geral da planta. Essa de cruzamentos naturais dentro da espécie cognita e M. paranaensis não permitem o
cultivar é o primeiro mutante encontrado C. arabica, duas merecem destaque: ‘Bour- desenvolvimento de cultivares de C. ara-
com porte baixo e elevada capacidade pro- bon Amarelo’ e ‘Mundo Novo’. A primeira, bica suscetíveis, novos rumos foram dados
dutiva e que, por esse motivo, muito con- encontrada em Pederneiras (SP), em 1930, ao programa de melhoramento do IAC.
tribuiu para o programa de melhoramento provavelmente originou-se da hibridação Passou-se a procurar genes de resistência a
genético do cafeeiro, desenvolvido pelo natural entre ‘Bourbon Vermelho’ e ‘Ama- doenças e pragas e a incorporá-los às culti-
IAC a partir do início da década de 30. Foi relo de Botucatu’. Por sua vez, ‘Mundo vares comerciais, operação realmente mui-
constatado que um único gene controla a Novo’ foi encontrado em 1943, em Urupês to difícil, onerosa e demorada.
redução do comprimento dos internódios e (SP), oriundo do cruzamento natural de Para tentar a obtenção de materiais re-
que esta é uma característica dominante. ‘Bourbon Vermelho’ com ‘Sumatra’. sistentes à ferrugem foram realizadas em
O fato de existir um cafeeiro de boa O Instituto Agronômico (IAC) estabe- Portugal hibridações entre ‘Caturra Verme-
capacidade produtiva e de porte reduzido leceu, a partir de 1932, um plano geral de lho’ e o germoplasma denominado Híbrido
constituiu, realmente, uma verdadeira re- melhoramento genético do cafeeiro, envol- de Timor. Este é descendente provavelmen-
volução nos planos gerais do melhoramen- vendo a seleção individual de várias plantas te do cruzamento natural entre C. canepho-
to, pois, a partir de então, todos os projetos e estudos de seus descendentes ou progênies ra cv. Robusta e C. arabica cv Arábica.
de melhoramento passaram a considerar o e a hibridação artificial entre cultivares de C. Alguns desses cafeeiros são resistentes a
porte mais baixo das plantas como caracte- arabica e entre espécimes de Coffea. todas as raças de ferrugem.
O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 23
A resistência ao bicho mineiro, uma visando preservar a variabilidade genética tores de bancos de germoplasma de café,
das principais pragas do cafeeiro, é outra existente em uma ou mais espécies. Em entre eles a Costa Rica, de onde posterior-
preocupação constante dos melhoristas. um banco de germoplasma, a manutenção mente foram introduzidos no Brasil.
Essa resistência genética tem sido investi- da variabilidade pode ser feita utilizando Os pesquisadores do Instituto Agro-
gada em hibridações entre cultivares de C. sementes, propágulos ou o próprio indi- nômico têm uma preocupação constante
arabica, que são suscetíveis, com espécies víduo. Em relação ao café, as espécies de em aumentar a variabilidade genética da
silvestres de Coffea, resistentes, dentre as Coffea são, tradicionalmente, conservadas coleção de Coffea e, para isso, contatos
quais se destaca a C. racemosa. Esta espé- como plantas vivas mantidas em coleções vêm sendo realizados com diversas Insti-
cie apresenta outra característica interes- de germoplasma a campo, devido à rápida tuições de outros países, visando estabele-
sante, que é a resistência à seca. perda de viabilidade das sementes no ar- cer o máximo possível de intercâmbio de
Sem dúvida, essas ações ampliaram mazenamento. germoplasma de café.
bastante a base genética do programa de Como relatado no início deste artigo,
melhoramento do cafeeiro, mas a trans- Caracterização e utilização
existem cerca de 100 espécies de Coffea, da diversidade genética
ferência de genes de interesse de outras quase todas originárias de países africanos.
espécies para C. arabica é um trabalho A diversidade existente nas cole-
O Brasil possui, conservados nos bancos ções de café tem sido caracterizada pelo
muito difícil, pois além das características de germoplasma das Instituições oficiais,
de interesse, várias outras indesejáveis são emprego de características morfológicas
aproximadamente 20% dessas espécies. das plantas, folhas, folhas, flores, frutos e
também transferidas simultaneamente.
Um banco de germoplasma de Coffea, o sementes, bem como de caracteres agro-
Com os programas de melhoramento
mais completo possível, seria de grande nômicos, tais como resistência a algumas
genético do cafeeiro desenvolvidos pelas
várias Instituições oficiais de pesquisa utilidade para pesquisas genéticas e para doenças, ciclo de maturação, entre outros.
brasileiras, diversas cultivares foram de- o conhecimento da variabilidade disponí- Em razão do número limitado desses des-
senvolvidas e recomendadas. Muitas des- vel e o verdadeiro potencial dessas cole- critores e da influência ambiental sobre a
sas cultivares lançadas, ou em fase final de ções para o melhoramento. Infelizmente, expressão da maioria deles, mais recente-
elaboração, apresentam boas característi- uma coleção de café assim completa ainda mente, têm sido empregados, também, os
cas agronômicas e, algumas, exibem resis- não existe no Brasil ou em qualquer outro marcadores moleculares na caracterização
tência ou tolerância à ferrugem, a alguns lugar do mundo. Nos bancos de germo- de acessos de bancos de germoplasma.
tipos de nematóides e ao bicho mineiro. plasma existentes atualmente, apenas as Esses marcadores baseiam-se na variação
Apesar do grande número de cultiva- espécies C. arabica e C. canephora estão natural existente nas seqüências de DNA
res de café disponibilizadas aos cafeicul- melhor representadas, o mesmo não ocor- dos diferentes indivíduos e apresentam
tores, dos cerca de 4,3 bilhões de cafeei- rendo com as demais espécies do gênero, uma série de vantagens em relação aos
ros do tipo arábica plantados no Brasil, que são pouco estudadas. marcadores morfológicos. Os marcadores
estima-se que 90% sejam constituídos de O Instituto Agronômico possui um moleculares existem em grande número
apenas duas cultivares: Mundo Novo e dos mais completos bancos de germoplas- e não possuem nenhum efeito na planta,
Catuaí, com pequena vantagem para essa ma de café do mundo, sendo a coleção porque eles são reflexos da variação na-
última. Além disso, como demonstrado composta de 16 espécies do gênero Co- tural presente na seqüência de DNA. A
anteriormente, essas cultivares apresentam ffea, três espécies do gênero Psilanthus, análise de marcadores de DNA pode ser
base genética bastante estreita, pois Catuaí centenas de híbridos intra e interespecífi- executada em qualquer estágio do ciclo de
é derivada de Mundo Novo. Esses relatos cos, várias introduções de C. arabica da vida de um organismo e a partir de quase
demonstram a pequena variabilidade ge- Etiópia, além de diversos mutantes natu- qualquer tipo de tecido. A única limitação
nética do parque cafeeiro do Brasil e a alta rais de C. arabica e cultivares comerciais. desse tipo de marcador ainda é o custo re-
vulnerabilidade de nossos cultivos, pois, Há, também, na coleção de C. arabica do lativamente elevado de sua análise.
na hipótese do surgimento de algum pro- IAC, 193 progênies de cafeeiros coletados A diversidade genética pode ser utili-
blema novo, como uma praga ou doença na Etiópia, durante missão de coleta reali- zada na transferência de características de
de difícil controle, poderá acarretar gran- zada em 1965, que explorou grande parte interesse, presentes no germoplasma não
des prejuízos à cafeicultura brasileira. daquele país, em busca de diversidade ge- cultivado e ausente nas plantas cultivadas.
Bancos de Germoplasma nética de C. arabica. Essa missão coletou Essa transferência pode ser feita direta-
de Coffea várias amostras de plantios tradicionais e mente por hibridações artificiais, quando
Os bancos de germoplasma são locais de plantas espontâneas silvestres, que fo- há compatibilidade entre os materiais a
onde são mantidas coleções de indivíduos ram distribuídas para vários países deten- serem cruzados, ou por meio de métodos
mais sofisticados, com a utilização de fer-
ramentas de engenharia genética por meio
da transformação genética de plantas.

Antonio Carlos Baião de Oliveira


Instituto Agronômico, Centro de Café ‘Al-
cides Carvalho’
( (19) 3212-0458
* baião@iac.sp.gov.br

Mirian Perez Maluf


Embrapa Café/Instituto Agronômico, Cen-
tro de Café ‘Alcides Carvalho’
Variabilidade no gênero Coffea detectada pela análise de DNA (marcadores RAPD). ( (19) 3212-0458
Canaletas 1 a 20 representam plantas diferentes. * maluf@iac.sp.gov.br

24 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


INFORMAÇÕES TÉCNICAS

Arborização de
Cafezais
A cafeicultura brasileira iniciou-se no sé- e Triângulo Mineiro, tornando o Estado de Minas
culo 19, no Estado do Rio de Janeiro e no Vale Gerais o maior produtor de café do Brasil.
do Paraíba, em São Paulo. Com o desgaste das Agora, a cafeicultura não arborizada do Su-
terras, após dezenas de anos de cultura explo- deste brasileiro está sentindo os efeitos da longa
ratória, entrou em decadência e tornou-se an- duração do cultivo em solo desprotegido que vai
tieconômica. Passou no século seguinte para o se degradando. A arborização bem feita é prática
Planalto Paulista e Norte do Paraná, com ter- agronômica que tem se mostrado muito eficiente
ras mais férteis e melhor técnica agrícola, teve na proteção dos cafezais contra as adversidades
grande sucesso. climáticas e sobre a degradação dos solos, visando
Ângelo Na década de 1950 sofreu muito com gea- tornar o cafezal uma cultura sustentável.
das severas, especialmente no Norte do Paraná, Este trabalho trata da questão da arborização
onde a cafeicultura reduziu-se consideravelmen- em cafeicultura em seus vários aspectos. Conside-
te. Nas décadas de 1970 e 1980, com o patrocínio ra suas possibilidades, seus problemas, suas vanta-
do IBC, estendeu-se para o sul de Minas Gerais gens, desvantagens e formas de execução

A arborização de cafezais é técnica agrícola A arborização


A arborização não é adotada na região subtro-
muito usada em outros países para proteção contra pical ou tropical de altitude do Brasil, onde cafei-
adversidades climáticas e promover a sustentação da cultura é feita a pleno sol. O fato de a região possuir
cafeicultura. No Brasil é adotada apenas em pequenas uma estação hibernal pronunciada, com baixa ra-
diação solar e temperatura amena, faz com que os
culturas da Região Nordeste (Veirano, 1962; Reis, 1972). cafeeiros tenham acentuada redução no desenvol-
No Sudeste do país a arborização não é praticada e os vimento vegetativo nos meses hibernais de junho,
cafezais são plantados em pleno sol. julho e agosto. Esse fato provoca certa redução no
desenvolvimento vegetativo do cafeeiro em rela-
ção às regiões equatoriais, do Nordeste, onde rece-
be alta radiação solar o ano todo. Por essa razão, a
cafeicultura nas regiões equatoriais, mais ricas em
energia solar, pode ter uma arborização bem mais
densa, sem sofrer concorrência sensível em luz das
árvores de sombra.
A função da arborização não é, na verdade,
sombrear o cafezal. O grande benefício é a prote-
ção dos cafeeiros contra os danos da intempérie,
como os causados pelo vento frio predominante,
pelos extremos de temperatura, pela chuva violen-
ta, pela deficiência hídrica prolongada, pela erosão
e desgastes do solo, etc. (Robinson, 1964).
A experiência e as observações têm demons-
trado que, em região tropical de altitude, como
São Paulo e estados vizinhos, a densidade da ar-
borização deve ser rala, cobrindo apenas 20% do
terreno.
Em região equatorial, como o Nordeste brasi-
Cafezal leiro, a arborização deve ser menos rala, devendo
cobrir cerca de 50% ou mais do terreno do cafezal.
sombreado Na arborização, as árvores crescem e o som-
com Grevílea, breamento aumenta regularmente com o tempo.
Torna-se necessário ralear anualmente a copa das
na Estação árvores, eliminando-se os galhos mais baixos,
Experimental de para elevar as copa e manter a cobertura rala. No
caso da arborização com grevílea, seringueira ou
Mococa outra árvore de porte ereto recomendável, fica

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 25


mais fácil manter a copa elevada e rala, A fase de café cereja, no início da resultados está em torno de 18 x 18 m, ao
retirando-se gradualmente os ramos maturação, fica mais longa, permitindo passo que na região Nordeste, com clima
mais baixos do tronco. encerrar a fermentação da polpa em sua equatorial, bem mais quente, a sombra
A arborização é uma prática micro- primeira fase (alcoólica e láctica), que deve ser bem mais densa, com espaça-
climática muito importante, que pode be- promove a qualidade fina do produto. mento em torno de 10 x 10 m ou 8 x 8 m.
neficiar bastante o ambiente do cafezal. A arborização faz reduzir considera-
A experiência tem mostrado que a arbo- velmente a velocidade do vento e seu efei- Campos de arborização experimen-
rização, cobrindo cerca de 20% do solo to prejudicial aos cafeeiros. Um beneficio tal no IAC. Vários campos de observação
do cafezal, reduz a temperatura média da arborização é a ação moderadora sobre de cafezais arborizados foram instalados
diária do ambiente em cerca de 2ºC (Ro- o mato, reduzindo muito a necessidade de na década de 1950 pelo Instituto Agro-
binson, 1964). Essa queda da temperatura capinas. nômico em suas estações experimentais.
em cafezal arborizado pode transformar As árvores de sombra devem ter: Nesses campos, árvores e arbustos, de
uma condição considerada termicamente a) crescimento rápido; b) folhagem várias espécies, foram plantados entre
imprópria para a cafeicultura, por excesso leve, permeável à luz; c) sistema radicu- os cafeeiros, resultando uma arborização
de calor, em condição satisfatória. Uma lar profundo, preferivelmente pivotante, demasiado densa, que em poucos anos
sombrearam exageradamente os cafeei-
região muito quente para cafeicultura de para evitar competição com os cafeeiros;
ros e, por deficiência de radiação solar,
arábica, com temperatura média diária d) boa resistência ao vento; e) ausência
tiveram a vegetação muito prejudicada e
de, por exemplo, 23ºC poderia, pela arbo- de enfermidades e de parasitas capazes
a produtividade mínima. Admitiu-se que
rização, ter a temperatura ambiente redu- de atacar os cafeeiros; f) pertencer à
a queda na produção fosse causada pela
zida para 21ºC, condição plenamente apta família das leguminosas para fornecer concorrência em água das árvores de
à cultura do cafeeiro arábica. nitrogênio ao solo; g) possuir folhagem sombra (Graner & Godoy, 1967; Franco,
A arborização protege os cafeeiros persistente; h) facilidade de podas de ra- 1985). Realmente, a causa da queda da
e o solo do superaquecimento diurno e leação da folhagem. produtividade do cafezal supersombreado
do extremo resfriamento noturno, como foi a redução excessiva da energia solar
a ocorrência da geada. Evita o impacto O espaçamento indicado das árvores recebida pelos cafeeiros.
desagregador das gotas da chuva sobre de sombra varia segundo a temperatura
o solo e o protege da erosão, da ação do média do clima local. Em climas mais Agrometeorology of the coffee crop.
vento, do ressecamento superficial, etc. quentes, equatoriais, a distância das árvo- Em trabalho para a WMO, Camargo &
res deve ser bem menor. Por exemplo: Pereira (1994) prepararam boletim téc-
Alguns trabalhos Temperatura média Espaçamento nico sobre a cafeicultura brasileira diri-
sobre arborização gido aos agrometeorologistas e técnicos
El sombreado. Trabalho de René 17 a 18 C (Subtropical)
o
20 m
em cafeicultura, em geral. No mundo, a
Coste publicado em Cafetos y Cafés en el 19 a 2loC (Tropical) 15 m cafeicultura é normalmente arborizada
Mundo. (Coste, 1954). Estuda a arboriza- 22 a 25 C (Equatorial)
o
10 m e os cafeeiros ficam em ambiente ame-
ção de cafezais em todo o mundo. no e relativamente úmido. A colheita do
Mostra que arborização desempenha Essas condições estão de acordo com café feita na fase de café cereja, com os
um papel termo-regulador, protegendo o o que acontece no Brasil. Na região tro- frutos vermelhos e maduros. No Brasil, a
cafezal dos excessos de calor e de frio. A pical do Sudeste, com estação de inverno cultura é conduzida a pleno sol, sem ar-
temperatura noturna do ar num cafezal bem acentuada e com temperatura média borização, e a colheita feita pela derriça,
descoberto pode ser superior a 4-5ºC à de anual em torno de 20-21oC, o espaçamen- o que resulta em produto desuniforme de
um cafezal com sombra. to das árvores de sombra com melhores qualidade inferior.

Efeitos favoráveis da arborização Efeitos desfavoráveis


a) em clima quente, tropical ou equatorial, com a redução tempera- da arborização
tura ambiente pela arborização a florada fica muito menos sujei- a) aumento da incidência da broca do café, que é
ta ao abortamento das flores e à ocorrência das estrelinhas. associada à melhoria do ambiente microclimáti-
b) a arborização dispensa o uso de quebra-ventos e as dificuldades co do cafezal arborizado, favorecendo a propa-
de seu planejamento e execução. gação do inseto.
c) desaparecem os problemas da seca de ponteiros, da geada, do b) a arborização dos cafezais dificulta o uso de co-
vergamento e do enfezamento das mudas. lhedeiras mecânicas nas linhas com arboriza-
d) o mato fica enormemente reduzido, diminuindo o número de ção. Essas linhas têm de ser colhidas a mão ou
capinas. com colhedeiras pequenas, de aplicação lateral.
e) forma-se a serapilheira, que protege o solo, aumenta a per- Esta última desvantagem pode ser contornada
meabilidade e a infiltração da água, reduzindo muito a erosão. com a adoção de espaçamento retangular entre
Diminui a infestação de nematóides do solo. as árvores de sombra. Em vez de usar espa-
çamento quadrado, por exemplo, de 20x20 m,
f) aumenta a duração da fase de café cereja, havendo mais tem- com 400 m2, pode-se usar um espaçamento re-
po para cuidar do café colhido e utilizar o sistema do café cere- tangular, de 25x16 m, com área também de 400
ja-descascado. m2. No caso de um cafezal com espaçamento
g) aumenta a longevidade e a sustentabilidade do solo do cafezal. de 3x1m entre cafeeiros, arboriza-se uma linha
h) aumenta a disponibilidade de água no solo, o que permite evitar, de cafeeiros a cada 7 ou 8 linhas. Nas linhas de
muitas vezes, a irrigação, como nas áreas serranas do Nordeste. café, planta-se uma árvore a cada 14 covas.

26 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Boas árvores de sombra devem apre-
sentar: troncos altos, fortes e copas bem
elevadas; boa resistência ao vento; cres-
Considerações
cimento inicial rápido; sistema radicular ¸ A arborização na agricultura é, sem dúvida, uma prática cultural muito impor-
profundo, para evitar competição com as tante, que está sendo desprezada na região subtropical brasileira. Nossos
raízes do cafeeiro; não hospedar os mes- cafezais não se beneficiam dessa prática, ao contrário do que acontece pra-
mos inimigos naturais que o cafeeiro; não ticamente na cafeicultura no resto do mundo.
produzir frutos semelhantes aos do cafe-
eiro; manter o tronco livre de ramos que ¸ Não apenas a proteção contra as adversidades climáticas, como das gea-
necessitem podas, para não interferir com das e do vento frio de sudeste, seriam muito importantes. Também, outras
os cafeeiros. vantagens terá a arborização rala, bem feita, dos cafezais, como a redução
Existem dois tipos de árvores de som- dos excessos de calor, prolongando a fase do café cereja, que favorece o
bra (Kirkpatrick, 1935). Aquelas de copa preparo do café pelo método moderno do cereja-descascado.
larga, esparramada, com sombra leve e
extensa e aquelas com copa estreita, ereta, ¸ São tantas as virtudes da prática agrícola da arborização na agricultura, que
que dão sombra densa, limitada, mas mó- não pode mais continuar descurada, principalmente no Estado de São Paulo,
vel, ambulante no decorrer do dia. Com onde a cafeicultura está em processo de grande tecnificação.
essas árvores os cafeeiros recebem dia-
riamente várias horas de radiação direta
e poderão manter sua forma e estrutura 1. Com grevílea a 8 x 8 m Referências bibliográficas
natural, não estiolada. = 1.680 kg/ha BAGGIO, A.J.; CARAMORI, P.H.; MONTOYA,
2. Com grevílea a 8 x 16 m L.J.; ANDROCIOLI, A. Efeitos de diferentes
espaçamentos de grevílea em consórcio com ca-
Efeitos climáticos de arborização = 1.140 kg/ha feeiros. Londrina: IAPAR, 1997, 24 p. (Boletim
com grevílea. Em ensaio conduzido na 3. Com grevílea a 16 x 16 m técnico n. 56).
Estação Experimental do IBC em Vargi- = 950 kg/ha BRANDO, C.H.J. Introdução do café cereja des-
nha MG (Miguel et al., 1995), a grevílea, 4. Café em pleno sol cascado nas regiões cafeeiras do Brasil - Resul-
espécie arbórea utilizada, foi plantada em = 910 kg/ha tados observados nos dois primeiros anos. In:
Congresso Brasileiro de Pesquisas Cafeeiras,
1979 e os cafeeiros no ano seguinte. As Os resultados mostram que, para as 18., Araxá (MG), 1992, p. 86-89.
árvores de sombra ficaram em esquema condições climáticas equatoriais de Gara- CAMARGO, A.P. A arborização como meio de
de seis espaçamentos crescentes e pro- nhuns, área serrana de Pernambuco, sujeita reduzir as adversidades climáticas e promover a
gressivos, de 10x8 até 10x28 m. Os cafe- a freqüentes estiagens, o espaçamento re- sustentação da cafeicultura. In: Congresso Bra-
sileiro de Pesquisas Cafeeiras, 16., E.S. Pinhal,
eiros, da variedade Mundo Novo, foram lativamente fechado com grevílea (8x8 m) 1990, p. 6-7.
plantados no espaçamento de 4x2m. As na arborização do cafeeiro deu o melhor CAMARGO, A.P. & PEREIRA, A.R. Agrometeo-
médias termométricas anuais nos lotes à resultado no aumento da produtividade. rology of the Coffee Crop. Word Meteorological
sombra e ao sol foram, respectivamente : Organization, Geneve. CagM Report, No. 58.
Temperatura máxima = 29,0 e 33,3oC Consorciação de cafezais com ren- 1994, 43 p.+ 22 tab.+ 30 fig.
CARVAJAL, J.F. Cafeto – Cultivo y fertilización.
(mais quente ao sol); ques de grevílea em Brejões, BA. Matie- Berna/Suiza. Instituto Internacional de la Pota-
Temperatura mínima = 14,7 e 13,6oC lo et al. (1989) consideram que a irrigação sa. 1984. 254 p.
(mais quente à sombra); seria uma opção para contornar as defici- COSTE, R. El sombreado. In Cafetos y cafés en el
Temperatura mínima absoluta = 12,3 e 10,8oC ências hídricas elevadas nas regiões cafe- mundo. Tomo primeiro, Los cafetos. Paris, G.P
Masonneuve & Larose. 1954, p. 153-174.
(bem mais quente à sombra) eiras da Bahia. Em cafezais da Fazenda DANTAS, F.S.; MATIELLO, J.B. & CAMARGO,
Os teores médios de água no solo nos Lagoa do Morro, município de Brejões, A.P. Arborização de cafeeiros com grevílea ro-
lotes à sombra, nas profundidades até BA, foram plantados renques de grevílea busta na região serrana de Pernambuco. Con-
40 cm, foram bem mais elevados no lote em 1976/77 para servir de quebra-vento. gresso Brasileiro de Pesquisas Cafeeiras, 16.,
arborizado, mostrando que as raízes da Dez anos mais tarde foram feitas avalia- E.S. Pinhal, SP, 1990, p. 130-131.
DUQUE, J.G. Solo e água no Polígono das secas. 2a
associação café x grevílea explorou uma ções do estado vegetativo dos cafeeiros, ed. Fortaleza. Publ. DNOCS, 1951, 220 p.
profundidade muito maior, resultando so- compreendendo crescimento, enfolha- KIRKPATRICK, T.W. The climate and eco-clima-
brar mais água nas camadas superficiais mento, floração e frutificação nas plantas tes of coffee plantations. Amani, Kenya. 1935.
para uso do cafezal. em sombra e em pleno sol. Resumidamen- 66 p.
MATIELLO, J.B.; DANTAS, F.A.S.; CAMARGO,
te, as observações foram as seguintes: A. P. & RIBEIRO, R.N.C. Níveis de sombrea-
Arborização de cafeeiros com gre- a) os cafeeiros sob efeito de sombra mento em cafezal na região serrana de Pernam-
vílea robusta na região serrana de Per- mantiveram-se em bom estado vegetati- buco – Parte III. In: Congresso Brasileiro de Pes-
nambuco. Trabalho de Dantas et al. (1990) vo, não murchando como aqueles a pleno quisas Cafeeiras 15., Maringá, 1989, p. 182.
para estudar o comportamento da grevílea sol, mesmo nos períodos mais secos; b) a REIS, A.C.S. Zoneamento agroclimático para a
cafeicultura em Pernambuco. Recife, 1972, 24 p,
na arborização de cafezal e verificar o es- desfolha e a seca de ponteiros foram, em (Boletim técnico 52).
paçamento ideal para as condições serra- geral, intensas nos cafeeiros ao sol e míni- ROBINSON, J.B.D. Environmental conditions. In:
nas, de clima equatorial de Pernambuco. mas nos à sombra; c) o ataque de cercós- A Handbook on Arabica in Tanganyika Coffee
O ensaio foi instalado na Fazenda Experi- pora em folhas e frutos foi imperceptível Board. 1964, p.273-327
VEIRANO, C.C. Traços gerais da ocupação agríco-
mental de Brejão, do IBC, a 850 m de alti- sob sombra e muito forte nas plantas ao la. In: IBGE: Grandes Regiões Norte e Nordeste.
tude, região de Garanhuns. A grevílea foi sol; d) a florada ficou mais atrasada sob Rio de Janeiro, IGGE-CNG, 1962. p. 273-327.
plantada em 1981 e o café no ano seguinte, sombra, a maturação mais lenta e a fase
espaçado de 3 x 1 m. Foram colhidas seis de cereja bem mais longa; e) os cafeeiros
safras até 1990. As médias de produção, sob sombra não apresentaram danos me- Ângelo Paes de Camargo
em café beneficiado por hectare foram as cânicos pelo vento, como aconteceu nos Pesquisador Científico aposentado do
seguintes, por tratamento: cafeeiros descobertos. Instituto Agronômico

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 27


INFORMAÇÕES TÉCNICAS

Arborização de
Cafezais
José Ricardo Marcelo


A proposta de arborização em cafe- anão, a pupunha e bananeira, podem ser 62) foi plantado num espaçamento de 2,5
zais visa, por meio do sombreamento mo- boas opções. x 0,8 metros e a bananeira na forma de
derado, atenuar as ocorrências climáticas No ano de 1999 foi implantado, com cultura intercalar a cada três ruas de café.
extremas e proporcionar maior sustentabi- apoio do Consórcio Nacional de Pesqui-
lidade ao sistema de produção. Acrescen- sa e Desenvolvimento do Café, o projeto Experimentos implementados - Nos
ta-se ainda a agregação de uma fonte de denominado “Agrossistemas consorcia- municípios de Mococa e Pindorama foram
renda extra para os cafeicultores e melhor dos para produção de café no Estado de implementados, em 1999, experimentos
aproveitamento da mão-de-obra durante o São Paulo”. O objetivo do projeto foi de consorciação de café. Em Mococa, o
ano, benefício de grande importância para identificar alguns exemplos de cultivos experimento é composto de um sistema
a agricultura familiar. Diante dessa análi- arborizados ou consorciados existentes e
combinado de café com grevílea, serin-
se, é possível verificar o grande potencial implantar experimentos para estudos em
para a utilização da técnica da arborização arborização. A seguir serão apresentados gueira e coqueiro-anão e banana Prata
em cafezais, principalmente em áreas de alguns arranjos de plantios de café no sis- Anã, na seguinte configuração: café ará-
pequenos e médios cafeicultores, visando tema arborizados e algumas considerações bica Icatu Vermelho IAC-4045 enxertado
auxiliar na melhoria da produtividade e sobre a técnica. sobre Robusta IAC-Apoatã e instalado
sustentabilidade da produção. com espaçamento de 4 metros entre linhas
No Brasil, ao se considerar a práti- Sistema consorciado de café e co- e 1 metro entre plantas, consorciado com
ca da arborização de cafezais, há que se queiro anão, em Garça-SP - Nesse ar- grevílea no espaçamento de 16 x 16 metros
analisar separadamente a cafeicultura ranjo de plantio, os cafeeiros (cv. IAC (39 arvores/ha), com seringueira no espa-
praticada na Região Nordeste e aquela Obatã) foram plantados no espaçamento çamento de 16 x 16 metros, com bananei-
no Centro-Sul do País. No Nordeste, em de 2,0 metros entre ruas e 0,5 metro entre ra no espaçamento de 8 x 8 metros (156
cultivos tradicionais, até a década de 80, a plantas. As plantas de coqueiro-anão ver-
arvores/ha) e com coqueiro-anão no espa-
arborização foi prática tradicional e muito de possuíam espaçamento de 8,0 metros
utilizada, favorecendo o desenvolvimen- entre ruas e 6,0 metros entre plantas totali- çamento de 8 x 8 metros. O experimento
to vegetativo e a produtividade em longo zando 208 planta/ha. de Pindorama é composto de um sistema
prazo. Na região de cultivo do Centro-Sul combinado de café com seringueira e co-
do Brasil, os estudos iniciais de sombrea- Sistema consorciado de café e bana- queiro-anão, na mesma configuração do
mento de cafezais realizados com consór- na Prata Anã, em Botelhos, MG - Nesse experimento de Mococa (Figura 3).
cios de produção de café com ingazeiros sistema de cultivo, o café (cv. IAC Catuaí
desestimularam o uso desta técnica, sen-
do o insucesso atribuído a fatores como
a concorrência em água pelas plantas, a
baixa retenção da água dos solos onde se
estudou a técnica e a utilização de árvo-
res frondosas nos consórcios, agravando o
problema em períodos com seca.
Posteriormente, nas décadas de 70 e
80, a utilização de outras espécies e níveis
de sombreamento proporcionou a reuti-
lização dessa técnica, agora denominada
arborização em algumas regiões do Brasil.
Na Região Centro-sul, embora haja predo-
mínio do cultivo de café a pleno sol, a uti-
lização do cultivo arborizado tem aumen-
tado. Dentre as plantas que estão sendo
utilizadas em pesquisas no Brasil para ar-
borização de cafeeiros, podem ser citadas
a grevílea, a seringueira e o cajueiro. En- Figura 1. Representação esquemática Figura 2. Representação esquemática
tre essas espécies, o uso de frutíferas com do plantio de café consorciado do plantio de café consorciado
alto valor de mercado e boas característi- com coqueiro-anão verde, com banana Prata Anã,
cas para a arborização, como o coqueiro no município de Garça, SP. no município de Botelhos, MG.

28 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Figura 3. Representação esquemática das parcelas de café em sistema de monocultivo
e consorciado com bananeira, coqueiro-anão, grevílea e seringueira.

Considerações
Sob o aspecto microclimático, as avaliações em lavouras
comerciais e nos experimentos indicaram alterações proporcio-
nadas pelas espécies sombreadoras na cultura do café. Com
relação a radiação solar, as observações quantificam importan-
tes alterações ocorridas em cultivos arborizados, na ordem de
20 a 40 % aproximadamente nos diferentes cultivos, concor-
Sistema consorciado de café e coqueiro anão, em Garça-SP dando com a literatura que apresenta a arborização como im-
portante prática de manejo em regiões consideradas restritas
ao cultivo do café.
Para temperatura e umidade do ar, os valores médios e
extremos diários tiveram um comportamento bastante distinto
em função do sistema utilizado e posição de leitura dentro do
sistema arborizado. Com relação às temperaturas mínimas as
maiores diferenças entre o cultivo a pleno sol e o sistema arbo-
rizado foram obtidas na lavoura comercial de café e coqueiro-
anão, em Garça e, para as temperaturas máximas, no sistema
Sistema consorciado de café e banana Prata Anã, em Botelhos, MG arborizado com grevílea em Mococa. Em todos os sistemas
arborizados estudados foi verificada significativa redução na
incidência dos ventos em comparação ao monocultivo.
Nos aspectos relacionados à produtividade, os experi-
mentos, ainda em fase inicial, mostraram, até a safra de 2006,
produções semelhantes entre os sistemas arborizados e o mo-
nocultivo de café, com produtividade ligeiramente superior nos
cultivos arborizados com grevílea e seringueira no município
de Mococa. A continuidade de avaliações relativas aos parâ-
metros de produtividade deverá trazer avaliações mais signifi-
cativas para a recomendação desses cultivos.
Experimentos implementados

José Ricardo Macedo Pezzopane e


Marcelo Bento Paes de Camargo
Instituto Agronômico,
Centro de Ecofisiologia e Biofísica
( (19) 3241-5188 ramal 338
* josepezzopane@ceunes.ufes.br;
Estação Arborização com Arborização com * mcamargo@iac.sp.gov.br
Meteorológica Grevínea Bananeira

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 29


Condições Ambientais e o
Manejo da Irrigação Influenciando a Kobayashi Sakai

Qualidade do Café
Pesquisadores do IAC buscam melhoria da qualidade do café brasileiro Emerson Regina

O
Brasil é atualmente o maior produtor e composition and beverage quality of coffee corpo, acidez, e amargo. Todas as amostras da
exportador mundial de café. Entretanto cherries”(Silva et al., 2005). bebida foram preparadas com 10g de café e 100
o preço da saca do café brasileiro tem Os parâmetros climáticos de temperatura mL de água fervente, sendo para a língua ele-
diminuído em relação ao preço do produto dis- do ar e precipitação foram monitorados conti- trônica utilizada água deionizada.
tribuído por América Central, Colômbia, Qu- nuamente por meio de estações meteorológicas
ênia e México, devido à suavidade da bebida automáticas instaladas a menos de 500m das Temperaturas do ar e chuvas
proveniente do café desses países. Para con- áreas de estudos. Uma síntese das caracterís- (junho de 2001 a maio de 2002)
quistar os mercados mais exigentes e refinados, ticas edafoclimáticas de cada região durante os A temperatura média do ar em Adaman-
pesquisas estão sendo conduzidas com intuito experimentos são apresentadas na Tabela 1. tina (24,7°C) foi cerca de 1,8 a 2,4ºC mais alta
de conhecer e melhorar a qualidade do café as- Em cada um dos experimentos, as plantas que em Mococa (22,9°C) e Campinas (22,3°C),
sociando a obtenção de altas produtividades da de café foram submetidas aos seguintes ma- e cerca de 2,7ºC acima do limite máximo da fai-
cultura. Inúmeros desses estudos procuraram nejos de irrigação: não irrigado (NI), irrigado xa de temperatura do ar considerada ótima para
estabelecer uma relação entre a composição continuamente (IC), irrigado com suspensão a cultura do café, que é de 18 a 22ºC (Alegre,
química do café verde e a qualidade da bebida. de 30 dias (I30) no mês de julho e irrigado 1959). Com relação ao volume de chuvas, este
Mas já se sabe que fatores como irrigação, al- com suspensão de 60 dias nos meses de julho foi maior em Mococa (1602 mm) e Campinas
titude, clima, e tratamentos pré e pós-colheita e agosto (I60). O sistema de irrigação por gote- (1273 mm) do que em Adamantina (1128 mm).
também são de grande influência sobre o pro- jamento de superfície foi utilizado para aplicar De fato, as altas temperaturas médias observa-
duto final. uma lâmina de 4 mm nos cafezais, a qual foi das em Adamantina e o menor volume de chu-
No Brasil, a grande variedade de tipos de determinada a partir da evapotranspiração mé- vas colocam essa região como marginal para a
café (do Rio ao Gourmet) se deve ao cultivo ser dia diária destas regiões (tabela 1). O solo foi cultura do café, conforme já apontado por Ca-
realizado em diversas regiões do país, sob as analisado durante o período do experimento e margo et al. (1992). A falta de chuvas nos me-
características climáticas de cada local (Ca- as adubações foram realizadas conforme reco- ses de janeiro a março pode resultar em quedas
margo et al., 1992). mendado para a cultura do café no Boletim 200 dos frutos, segundo modelo fenológico-climá-
Assim, para investigar como as condições do IAC. A colheita, seleção e secagem do café tico proposto por Camargo e Camargo (2001).
ambientais associadas ao manejo de irrigação foram realizadas de forma tradicional. Cada Sabendo-se disto e observando a Figura 1B,
influenciam na composição química e por ex- uma das plantas teve o peso da sua produção percebe-se que, nesse período crítico, as chu-
tensão na qualidade da bebida do café, pesquisa- registrada e a mesma foi armazenada a 10% de vas em Adamantina foram mais escassas que
dores do Instituto Agronômico Campinas (IAC) umidade, para a realização das análises quími- em outras localidades. Portanto, em relação às
e da Universidade Estadual de Campinas (Uni- cas e sensoriais. Nas análises químicas foram chuvas e temperatura do ar durante a formação
camp) desenvolveram um trabalho em três loca- quantificadas as concentrações, dos açúcares dos frutos, Adamantina teve, de modo geral, as
lidades produtoras de café (Coffea arábica L. cv. solúveis totais, açúcares redutores, sacarose, mais severas condições climáticas.
Obatã IAC 1669-20) do Estado de São Paulo. compostos fenólicos totais, ácido clorogêni-
Durante o período de julho de 2001 a maio co, cafeína, proteínas e aminoácidos solúveis Composição química e
de 2002, três experimentos foram conduzidos totais, lipídios, e nitrogênio total. De modo a qualidade da bebida do café
nos Pólos Regionais da Alta Paulista em Ada- relacionar a composição química dos grãos de De modo geral, a irrigação não foi fator
mantina, do Nordeste Paulista em Mococa e no café com a qualidade da bebida, amostras dos condicionante de diferenças significativas na
Centro Experimental do IAC, Fazenda Santa cafés nos diferentes tratamentos de irrigação composição química dos grãos de café verde,
Elisa em Campinas, estado de São Paulo, para das três localidades foram submetidas à aná- quando comparados com cafés não irrigados
avaliar a influência de variáveis edafoclimáti- lise sensorial realizada por três classificadores (Tabela 2). No entanto, a atividade de enzimas
cas e do manejo de irrigação na sincronização profissionais, bem como, pelo sensor eletrônico que digerem proteínas de reserva, conhecidas
do florescimento, produção, composição quí- conhecido como “língua eletrônica” (Embrapa como proteases, foi menor nos tratamentos
mica e qualidade de bebida do cafeeiro arábica. instrumentação), que é capaz de medir baixos sem irrigação. Embora a irrigação não tenha
O resumo dos resultados apresentados aqui se níveis de salinidade, doçura, amargor e acidez influenciado diferenças significativas entre
refere somente às variações na composição quí- presentes a partir da condutividade elétrica do tratamentos da mesma localidade, observa-
mica e qualidade da bebida e estão publicados produto. Na análise sensorial a classificação da ram-se diferenças entre localidades, sugerin-
no artigo “The influence of water management bebida variou em uma escala de 0 (abstenção do influência do local de cultivo, isto é, da
and environmental conditions on the chemical de critério) a 5 (presença) nos critérios: aroma, variável edafoclimática. Compostos químicos
como o ácido clorogênico e lipídeos, dois dos
Tabela 1. Características edafoclimáticas nos locais dos experimentos. possíveis responsáveis pela acidez e, conse-
Temperatura Precipitação qüentemente, por efeitos sobre o sabor e aroma
Localidade Tipo de Solo ET médio da bebida, não tiveram diferenças entre trata-
Média Anual Média Anual
mentos e entre locais de estudo. Em Mococa,
Adamantina Latossolo Vermelho Eutroférrico 24.7 oC 1128 mm 3.8 mm
porém, houve tendência de maior quantidade
Campinas Latossolo Roxo Eutrófico 22.3 oC 1273 mm 3.4 mm
de lipídeos. Fato interessante com os lipídeos
é que durante a torrefação, eles são expeli-
Mococa Argissolo Vermelho-Amarelo 22.9 Co
1602 mm 3.2 mm dos dos grãos de café, formando uma cama-
Distrófico Típico da que dificulta a volatilização do aroma. Tal
Fonte: Ciiagro – IAC fenômeno pode contribuir com diminuição de

30 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Tabela 2. Composição química dos grãos verdes do café, cultivado sem irrigação (NI), irrigação continua (CI) e irrigação suspensa por
30 dias (I30) e 60 dias.

perdas de compostos químicos importantes na Tabela 3. Composição química dos grãos verdes do café, cultivado sem irrigação
qualidade da bebida. (NI), irrigação contínua (CI) e irrigação suspensa por 30 dias (I30) e 60 dias (I60) em
O diagrama gerado pela Análise dos Com- Adamantina (AD), Mococa (MC) e Campinas (CP).
ponentes Principais - PCA (Figura 2), mostrou
que proteínas, aminoácidos, nitrogênio total e
protease e atividade PPO (polyfenoloxidase)
diferiram entre as localidades, mas sempre em
concentrações maiores em Adamantina, onde
houve variação de 30,5%. Aminoácidos e pep-
tídeos são ingredientes importantes do aroma
do café, mas não se sabe a proporção ideal que
devem ocorrer entre eles, dentro no produto.
Em Adamantina ocorreram as maiores ativida-
des proteolíticas, e as maiores concentrações de
açúcares solúveis totais, aminoácidos e protea-
ses Tabela 3. Também foi maior a quantidade da
enzima polifenoloxidase (PPO), que tem sido re-
latada como responsável pela qualidade do café.
Na análise sensorial realizada pelos três
classificadores não foi possível diferenciar as
amostras de café nos diferentes tratamentos e
entre localidades (Tabela 3), cujos resultados podem ser fatores importantes e responsáveis
foram bastante subjetivos, centrando na classi- pelas diferenças na qualidade e composição
ficação da bebida dura. Entretanto, pelos valores química do café das três localidades envolvidas
de qualidade global, o café de Mococa obteve no projeto. As enzimas, como as proteases, de-
classificação melhor que dos dois outros locais. sempenham um importante papel no controle
Em virtude da dificuldade dos classificadores do nível de aminoácidos, peptídeos e polipeptí-
em distinguir os cafés, utilizou-se a “língua ele- dios que juntos com os carboidratos implicam
trônica”. Em oposição a esses dados, análises em componentes chaves na determinação da
da bebida utilizando-se a “língua eletrônica”, qualidade da bebida do café. Além disso, estu-
permitiram diferenciar os cafés das três loca- dos com temperaturas controladas, envolvendo
lidades (Figura 3) de forma semelhante àquela análises da composição de compostos de nitro-
obtida pela composição química (Figura 2), com gênio e qualidades do café deveriam ser condu-
os cafés de Adamantina diferenciando-se signi- zidas para confirmar as informações de campo
ficativamente daqueles de Campinas e Mococa, obtidas neste experimento.
demonstrando ser o método da língua eletrônica
bastante útil na distinção de cafés, e que pode Referências Bibliográficas
completar análises sensoriais. Os dados da lín- ALÈGRE, C. Climats et caféiers d’Arabie. Agron. Trop.
14: 23-58, 1959.
gua eletrônica também demonstram que as di- CAMARGO A.P.; CAMARGO M.B.P. ������������������
Definição e esque-
ferenças entre cafés ficaram restritas ao local matização das fases fenológicas do cafeeiro Arábica
de cultivo, sugerindo o efeito da variável edafo- nas condições do Brasil. Bragantia 60: 65-68, 2001.
climática. Assim, uma vez que a irrigação não CAMARGO, A.P.; SANTINATO, R.; CORTEZ, J.G. Ap-
tidão climática para qualidade da bebida nas principais
afetou significativamente a composição química regiões cafeeiras de Arábica no Brasil. In: Anais do 19º
dos grãos de café, com resultados confirmados Congresso Brasileiro de Pesquisas Cafeeiras. 1992, p.
pela análise da língua eletrônica, a hipótese mais 70-74.
plausível é de que tais diferenças tenham sido in- SILVA, E A. da; MAZZAFERA, P.; BRUNINI, O. SAKAI,
E.; et al. �����������������������������������������
The influence of water management and en-
fluenciadas pela temperatura do ar. vironmental conditions on the chemical composition
Os resultados deste estudo mostraram que and beverage quality of coffee beans. Braz. J. Plant
a temperatura e a indisponibilidade de água Physiol.,june 2005, vol. 17, no. 2 , pp. 229-238.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 31


Figura 3. Análise dos componentes principais de dados obtidos com
a língua eletrônica utilizado para avaliar o café dos tratamentos sem
irrigação (NI - símbolo aberto), irrigação contínua (CI - símbolo
pontilhado), e irrigação suspensa por 30 dias (I30 - símbolo cinza),
e 60 dias (I60 - símbolo preto) em Adamantina (®), Campinas (r)
e Mococa (°). Os tracejados mostram grupos formados.

Emilio S. Kobayashi
Mestre em Agricultura Tropical e Subtropical do Curso
de Pós-Graduação do Instituto Agronômico
Emilio Sakai, Emerson A. da Silva e Regina Célia M. Pires
Instituto Agronômico, Centro de Ecofisiologia e Biofísica
Figura 2. A Análise do Componente principal usando dados da composição química, peso do grão,
tamanho médio do grão e qualidade global de grãos de café. O diagrama (A e B) mostra cinco repetições
( (19) 3241-5188 ramal
dos tratamentos sem irrigação (NI – símbolos abertos), irrigação contínua (CI – símbolos pontilhados), e * emilio@iac.sp.gov.br;
irrigação suspensa por 30 dias (I30 – símbolos cinzas), e 60 dias (I60 – símbolos pretos) em Adamantina * rcmpires@iac.sp.gov.br
(®), Campinas (r) e Mococa (r). O diagrama ( C e D) mostra dados da composição química, peso do Instituto de Botânica, Seção de Fisiologia
grão, tamanho médio do grão e qualidade dos grãos de café (°). O tracejado mostra grupos formados. * easilva@ibot.sp.gov.br
Panorama da cafeicultura orgânica e
perspectivas para o setor
A
agricultura orgânica cresce a passos largos – 20% ao ano
– motivada, principalmente, pela preocupação dos con-
sumidores e produtores com as questões da qualidade
dos alimentos, saúde humana e sistemas de produção sustentá-
veis. A cafeicultura orgânica segue essa mesma tendência, tendo
apresentado crescimento da ordem de 5% ao ano, no período de
2000 a 2006. Atualmente a comercialização de café orgânico
representa cerca de 1,5% do mercado mundial de café.
No Brasil, a partir da década de 90, cafeicultores dos Esta-
dos de Minas Gerais, Paraná e São Paulo aderiram ao cultivo
orgânico, tendo em vista a sustentabilidade socioeconômica e
ambiental da cafeicultura e motivados pelo reconhecimento dos
consumidores quanto à necessidade de colocar em prática os
conceitos preconizados por movimentos em prol da agricultura Sérgio, Flávia e Gerson
sustentável em diversos países. A cafeicultura orgânica brasilei-
ra representa 0,3% da área total de café do país. Comercialização
Produção O volume de exportação mundial de café orgânico, regis-
O Brasil, de acordo com dados de 2003, possui área cultiva- trado com base em certificados de origem, foi de 758.300 sa-
da com café orgânico de 6.300 hectares (BARAIBAR, 2006), o cas de 60 kg na safra 2004/2005 (OIC, 2005). Nessa safra, os
que representa 0,3% da área total de café do país. Embora seja cinco maiores exportadores desse café foram Peru (400.000
o maior produtor de café do mundo, o Brasil é apenas o oita- sacas), Etiópia (153.000 sacas), México (67.000 sacas), Colôm-
vo produtor mundial de café orgânico, ficando atrás da Bolívia, bia (53.000 sacas) e Nicarágua (23.000 sacas), e os dez maiores
Honduras e Papua Nova Guiné (OIC, 2005). compradores foram Estados Unidos, Alemanha, Japão, Bélgica,
Segundo a Associação de Cafeicultores Orgânicos do Brasil Países Baixos, França, Suécia, Reino Unido, Canadá e Espanha
(ACOB) existiam cerca de 200 cafeicultores orgânicos no País, (OIC, 2006).
com produção de 180 mil sacas de café beneficiado, representan- A exportação brasileira de café orgânico, entre outubro de
do 0,5% da produção nacional que havia sido prevista em 32,5 2005 e junho de 2006, foi de 6.874 sacas, o que proporcionou ao
milhões de sacas na safra 2005/2006. País uma receita de US$ 1.432.000,00. O preço médio do café
Considerando-se a diversidade das características edafocli- orgânico foi US$ 208,32/saca, representando diferencial de US$
máticas nas regiões brasileiras produtoras de café e também que 89 acima do preço médio do convencional, comercializado a
o país tem a maior área plantada de café do mundo, acredita-se US$ 119,18/saca (OIC, 2006 e ABIC, 2007).
que o Brasil tenha enorme potencial para aumento da produção Cerca de 80% da produção brasileira é exportada principal-
de café orgânico. mente para o Japão, Estados Unidos e Europa. Ressalte-se que,
devido à ausência de estatísticas oficiais sobre área, produção e

Preços
Alguns estudos revelaram que os consumidores de
países desenvolvidos estão dispostos a pagar entre 15% e
25% a mais pelo café orgânico, o que resultaria em preços
mais elevados para esse tipo de café, quando comparados
aos preços pagos ao café convencional.
Considerado um produto diferenciado, o café orgânico
tornou-se uma alternativa atraente para os cafeicultores
brasileiros, principalmente nos momentos de crise desse
setor. De maneira geral, os preços pagos pelo café orgâni-
co sempre estiveram acima do preço do convencional, com
diferenciais (prêmios) variando entre US$ 60 e US$ 100 por
saca de café beneficiado. Contudo, os custos de produção
do orgânico podem ser 20% a 30% superiores ao do con-
vencional, incluindo os custos com certificação.
Em sistemas orgânicos de produção, em fase de con-
versão ou não totalmente estabelecidos, quando há melho-
ria de preço do café convencional ocorre um menor diferen-
cial entre o preço do orgânico e do convencional, levando
produtores menos comprometidos com a “filosofia” de culti- Lavoura de café orgânico,
vo orgânico a migrar para o convencional. cultivar Obatã IAC-1669-20, município de Garça-SP.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 33


comercialização de café orgânico, pode haver grande discrepân- de agrícola, com base na utilização intensiva de insumos quími-
cia entre diferentes fontes de informação. Por exemplo, algumas cos, biotecnologia e mecanização, sem avaliar adequadamente
fontes tinham estimado a exportação de café orgânico brasileiro as conseqüências ou impactos sobre o ambiente, saúde humana
em 144 mil sacas na safra 2005/2006 (considerando a expor- e estrutura social das comunidades rurais.
tação de 80% das 180 mil sacas previstas nessa mesma safra),
enquanto que a Organização Internacional do Café registrou ex- Café orgânico
portação de 7.000 sacas até junho de 2006. Café orgânico é aquele produzido de acordo com as normas
e procedimentos preconizados pela Agricultura Orgânica, em
Sistema orgânico de produção conformidade com a legislação vigente no País. Sua produção
Considera-se sistema orgânico de produção agropecuária incorpora princípios da Agricultura Sustentável e tem como
todo aquele em que são adotadas técnicas que resultem na oti- meta garantir a manutenção dos recursos naturais e da produti-
mização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos dispo- vidade agrícola em longo prazo, otimizando a produção com o
níveis e que respeitem a integridade cultural das comunidades uso mínimo de insumos externos à propriedade (inputs) e sem
rurais. Seu objetivo é promover a sustentabilidade econômica e causar impactos adversos ao meio ambiente. Ele deve propor-
ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização cionar rentabilidade econômica adequada aos produtores para
da dependência de energia não-renovável e a proteção ao meio satisfação das suas necessidades, atuais e futuras, de alimentos
ambiente. É um sistema que se opõem ao uso de materiais sinté- e renda, além do atendimento das necessidades sociais das famí-
ticos, de organismos geneticamente modificados e de radiações lias e comunidades rurais.
ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, proces- Para alguns setores da sociedade e da comunidade cientí-
samento, armazenamento, distribuição e comercialização, de- fica, a cafeicultura orgânica ainda é considerada um modismo.
vendo ser utilizados, sempre que possível, métodos culturais, Alguns acreditam que, em função do metabolismo e da fisiolo-
biológicos e mecânicos (BRASIL, 1999; BRASIL, 2003).
Segundo a legislação vigente no País, o conceito de sistema
orgânico de produção é bastante amplo e abrange os sistemas
denominados biodinâmico, ecológico, natural, sustentável, re-
generativo, biológico, agroecológico e permacultura. Dentre es- Produtividade
tes se destacam (EHLERS, 1996): A produtividade dos cafezais orgânicos interfere direta-
• A Agricultura Biodinâmica, desenvolvida por Rudolf Steiner mente na decisão dos produtores em adotar a cafeicultura
e Pfeiffer, na Áustria e Alemanha, na década de 20; orgânica. Em geral, a produtividade de café orgânico é 20%
• A Agricultura Organo-Biológica, desenvolvida por Hans Peter a 30% inferior à do café convencional, principalmente nos
Müller e Hans Peter Rush, na Suíça e Áustria, na década de 30; primeiros anos de produção.
• A Agricultura Natural, desenvolvida por Mokiti Okada e Após a fase inicial de adaptação e recuperação do solo,
a produtividade pode voltar ao nível normal ou até mesmo
Fukuoka, no Japão, nos anos 30;
superá-lo. Isso ocorre porque o potencial produtivo das la-
• E a Agricultura Orgânica, desenvolvida por Albert Howard, Bal- vouras orgânicas é determinado pelo grau de equilíbrio do
four e Rodale, na Grã-Bretanha, Índia e EUA, nos anos 30 e 40. agroecossistema. Isto é, nesses sistemas as plantas devem
Esses sistemas têm em comum a implementação da produ- produzir sem se esgotarem e sem necessidade de altos
ção sustentável, no espaço e no tempo, mediante manejo racio- inputs, mediante o estabelecimento de uma interação equi-
nal e proteção dos recursos naturais, sem utilização de produtos librada dos principais elementos do sistema de produção
químicos nocivos à saúde do ser humano, animais e ambien- – solo, água, biodiversidade, cafeeiro e manejo fitotécnico.
te, mantendo o incremento de fertilidade e vida dos solos e a Na cafeicultura orgânica não se utiliza o termo “produ-
diversidade biológica, e respeitando a integridade cultural dos tividade máxima econômica”, sendo mais adequado pensar
agricultores. na “produtividade biológica” que o sistema de produção
equilibrado pode suportar, sob influência direta da criativi-
Em geral, esses sistemas de produção apresentaram-se
dade e ações do cafeicultor. Isso exige acompanhamento e
como alternativa ao padrão tecnológico da “Agricultura Moder- observação constante da lavoura. Na cafeicultura conven-
na”, estabelecido pela “Revolução Agrícola” na década de 40, cional, ao contrário, é priorizada a produtividade máxima
denominada “Revolução Verde”, que prioriza a alta produtivida- da lavoura, com uso intensivo de insumos químicos e, em
geral, sem levar em consideração os custos ambientais e
sociais.
A produtividade média nacional do café convencional
é estimada em 17 sacas de 60 kg de café beneficiado por
hectare. Destaca-se que bons produtores de café orgânico
têm produtividade acima dessa média e que, nas regiões
montanhosas do Sul de Minas Gerais, há cafezais orgâni-
cos certificados com produtividade de 35 a 45 sacas/ha.
Diversos produtores julgam que não é correto afirmar que o
cafezal orgânico não produz, pois verificaram que essa situ-
ação ocorre quando o manejo da lavoura não é adequado.
Em geral, os melhores preços pagos ao café orgânico
permitem que o cafeicultor conviva com menor produtivida-
de. A maior vantagem do sistema orgânico de produção é
a auto-suficiência do cafeicultor, que se torna independente
da indústria, por não utilizar defensivos e fertilizantes quí-
micos. Ele fica em posição mais confortável para enfrentar
eventuais crises no abastecimento desses insumos, princi-
Lavoura de café orgânico, palmente daqueles derivados do petróleo ou dependentes
dessa fonte energética para sua fabricação.
cultivar Obatã IAC-1669-20, município de Garça-SP.

34 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


gia da planta, não são encontrados resíduos de agrotóxicos nos
grãos de café, e por isso não haveria razão para a sua produção.
Outros afirmam, sem embasamento técnico-científico, que o
café orgânico não possui boa qualidade.
À luz dos conhecimentos atuais, esses pensamentos refle-
tem uma visão simplista e superficial das questões fitotécnicas
e agroecológicas envolvidas na produção do café orgânico, uma
vez que o foco desse tipo de cafeicultura não é apenas o produ-
to em si, mas, principalmente, o de favorecer a sustentabilida-
de da produção, promovendo a saúde do trabalhador rural, não
contaminando ou poluindo o solo, a água e o ar e aumentando
a auto-suficiência do cafeicultor, por evitar o uso de produtos
industrializados. Frutos maduros de café orgânico, cultivar Catuaí Vermelho
Portanto, aqueles talvez estejam mal informados ou possu- IAC-99, município de Poço Fundo-MG.
am interesses divergentes dos anseios dos cafeicultores brasilei-
ros que estão em busca de sistemas de produção sustentáveis.
Existem inúmeros exemplos que comprovam a alta qualidade
do café orgânico brasileiro e, apenas para avivar um pouco a
memória, citam-se os seguintes casos de sucesso: 1) Primeiro
colocado no “Concurso de Qualidade Cafés de Minas”, edição
2006, na Série Natural: Nilson dos Santos Saturnino, cafeicul-
tor orgânico de Araponga-MG (EMBRAPA, 2006); 2) Primeiro
colocado no “Concurso de Qualidade Cafés do Brasil”, edição
Lavoura de café orgânico, Lavoura de café orgânico,
2001: Paulo Sérgio de Almeida, cafeicultor orgânico de Parai-
cultivar Catuaí cultivar Tupi IAC-1669-33,
sópolis-MG (BSCA, 2001); e 3) Segundo colocado no “Concur-
Vermelho IAC-99, município município de Monte Alegre
so de Qualidade Cafés do Brasil”, edição 1999: Alex Nogueira
de Poço Fundo - MG. do Sul - SP.
Nannetti, cafeicultor orgânico de Machado-MG (BSCA, 1999).

Perspectivas orgânico tem maior autonomia sobre seu negócio e não fica à
mercê de especuladores e da oscilação de preços no mercado de
Hoje, considera-se o café orgânico como um nicho de mer- commodities: o café orgânico deixa de ser nicho para se estabe-
cado bem estabelecido e com clara tendência de crescimento. lecer como segmento de mercado.
Não se questiona mais a sua viabilidade técnica ou econômica: A comercialização do café orgânico pode constituir-se numa
se não fosse viável não estaria sendo produzido. No entanto, a barreira para os cafeicultores, principalmente devido à estrutura
cafeicultura orgânica não deve ser vista como solução milagrosa de comercialização do café brasileiro, associada à falta de co-
para resolver os problemas dos cafeicultores nos momentos de nhecimento e acesso aos mercados diferenciados. Alguns exem-
crises do agronegócio café, porém pode ser considerada uma plos têm mostrado que essas dificuldades podem ser superadas,
alternativa interessante para aqueles que simpatizam com o cul- especialmente quando as iniciativas contemplam negociações
tivo orgânico ou que não concordam com a forma como é prati- por meio de associações de produtores, como é o caso da Co-
cada a cafeicultura convencional. operativa dos Agricultores Familiares de Poço Fundo e Região
Segundo alguns produtores e técnicos do setor, não há recei- (COOPFAM), no sul de Minas Gerais. Para essa cooperativa o
tas prontas para a adoção da cafeicultura orgânica. Ela não deve comércio justo ( fair trade) é uma opção interessante de comer-
ser vista como volta à cafeicultura do passado, mas sim como cialização, a partir de critérios que prevêem não apenas preço e
atividade agrícola diferenciada, com base em critérios técnicos qualidade do café orgânico, sendo considerado um dos pilares
e agronômicos bem estabelecidos e que considera o solo como da sustentabilidade econômica e ecológica.
um elemento vivo fundamental para o sistema de produção e
não como mero suporte de plantas. O ingresso na cafeicultura
orgânica deve ser bem planejado e com embasamento técnico.
Pesquisa científica e tecnológica
O fator econômico precisa, certamente, ser levado em conta, Embora a cafeicultura orgânica no Brasil tenha se desen-
porém não deve ser considerado o principal. Antes de se envere- volvido significativamente nos aspectos relacionados à produ-
dar pelos caminhos da cafeicultura orgânica é preciso conhecê-la ção, comercialização e certificação, há escassez de pesquisas
melhor e ter como referência os casos de sucesso de produtores já técnico-científicas sobre o assunto e a maioria dos produtores
bem estabelecidos no mercado, pois como em qualquer ativida- baseia-se em procedimentos empíricos de produção, geralmente
de, existem os bons e os maus exemplos. Também é preciso estar adaptados da cafeicultura convencional.
ciente que pode haver menor produtividade e que um crescimento Há algum tempo o assunto era debatido apenas em Organi-
acelerado da produção de café orgânico poderá reduzir o prêmio zações Não Governamentais (ONG’s), porém devido ao grande
obtido no preço, principalmente se o consumo desse tipo de café crescimento do mercado de produtos orgânicos, pesquisadores
não crescer na mesma proporção da oferta. de várias instituições públicas de São Paulo, Minas Gerais, Pa-
Na cafeicultura orgânica, visualiza-se maior chance de raná e Espírito Santo se engajaram no estudo de diversos temas
sucesso para os produtores que incorporam o cultivo orgânico relacionados ao café orgânico. Afinal, se há mercado para o café
como uma “filosofia de vida”. Com isso, o produtor torna-se orgânico, ele deve ser produzido. Para que isso ocorra adequa-
mais independente e diferencia-se dos demais. Há possibilida- damente é preciso que sejam pesquisadas e desenvolvidas técni-
de de se estabelecer um relacionamento mais estreito com com- cas apropriadas ao fortalecimento dessa cadeia produtiva.
pradores e consumidores, permitindo-lhe maior participação na Atendendo às demandas de diferentes segmentos da cadeia
negociação de preços de seu produto. Em síntese, o cafeicultor produtiva do café, o Centro de Café ‘Alcides Carvalho’, do Insti-

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 35


tuto Agronômico (IAC), tem realizado pesquisas técnico-científi- Quadro 1. Cultivares de cafeeiro arábica estudadas pelo IAC em
cas em cafeicultura orgânica e sua atuação intensificou-se há dois sistema orgânico de produção.
anos com a contratação de novos pesquisadores. Com o intuito de Item Cultivar Características Origem
fortalecer as atividades de pesquisa, o IAC investe no treinamen- 1 Obatã IAC 1669-20 PB, R IAC 1
to técnico de seus pesquisadores e estabelece parcerias com outras
2 Tupi Rn IAC 1669-13 PB, R, Rn IAC
instituições para intercâmbio e realização de trabalhos conjuntos.
3 Tupi IAC 1669-33 PB, R IAC
Uma das linhas de pesquisa do Centro de Café contempla
4 Tupi IAC 4095 PB, R IAC
estudos relacionados à sustentabilidade, certificação, mercados
5 Tupi Amarelo IAC 5162-6 PB, R IAC
e custos de produção de café orgânico. Ao mesmo tempo, outras
6 Icatu Vermelho IAC 4045 PB, MR IAC
linhas de pesquisa priorizam o estudo agronômico de sistemas
7 Icatu CT IAC 4569 PB, MR IAC
orgânicos de produção de café, com ênfase nos aspectos fitotéc-
8 Catuaí SH3 PB, R IAC
nicos relacionados à adequação de práticas coerentes com esse
9 Catuaí Amarelo IAC 62 PB, S IAC
sistema de produção.
10 Catuaí Vermelho IAC 99 PB, S IAC
Experimentos têm sido conduzidos em campo para avaliar
o comportamento agronômico de cultivares de cafeeiro arábica 11 Caturra Vermelho IAC 5165 PB, S IAC
em sistema orgânico de produção, a fim de identificar cultivares 12 Ouro Amarelo IAC 4397 PB, S IAC
promissoras para esse tipo de cultivo. Também são contempla- 13 Ouro Bronze IAC 4925 PB, S IAC
dos aspectos relacionados ao uso racional dos recursos naturais, 14 Bourbon Amarelo PA, S IAC
viabilidade técnica-econômica e qualidade do café. 15 Acaiá IAC 474-19 PA, S IAC
Em parceria com o Pólo Regional de Desenvolvimento Tec- 16 Mundo Novo IAC 376-4 PA, S IAC
nológico dos Agronegócios do Leste Paulista, em Monte Alegre 17 Mundo Novo Amarelo IAC 4266 PA, S IAC
do Sul, e com a Fazenda São José, em Santo Antônio de Posse, 18 Mundo Novo SH3 PA, R IAC
o Centro de Café conduz um experimento com 35 cultivares de 19 Araponga MG 01 PB, R EPAMIG 2
cafeeiro arábica, relacionadas no Quadro 1. 20 Catiguá MG 01 PB, R EPAMIG
Uma parceria com a Associação Brasileira de Agricultura 21 Catiguá MG 02 PB, R EPAMIG
Biodinâmica (ABD) tem permitido o atendimento de demandas 22 Oeiras MG 6851 PB, R EPAMIG
de cafeicultores familiares para o estabelecimento de áreas expe- 23 Paraíso MG H 419-3-3-7-16-4-1 PB, R EPAMIG
rimentais e demonstrativas de cafezal orgânico em sistema agro- 24 Pau Brasil MG 01 PB, R EPAMIG
florestal na região de Garça/SP. Essas pesquisas são conduzidas 25 Sacramento MG 01 PB, R EPAMIG
de forma participativa, em propriedades particulares, para avaliar 26 IAPAR 59 PB, RF, Rn IAPAR 3
o comportamento do cafeeiro orgânico consorciado com espécies 27 IPR 98 PB, R IAPAR
arbóreas de múltiplas finalidades (madeireiras, frutíferas e produ- 28 IPR 100 PB, MR IAPAR
toras de biomassa). Procura-se obter informações que contribuam 29 IPR 103 PB, R IAPAR
para o aumento da biodiversidade dos agroecossistemas e da efici- 30 IPR 104 PB, MR IAPAR
ência dos sistemas orgânicos de produção de café naquela região. 31 Catucaí Amarelo 2 SL PB, MR PROCAFÉ 4
Em experimento conduzido pelo IAC em parceria com a 32 Catucaí Amarelo 24/137 PB, MR PROCAFÉ
Fundação Mokiti Okada avaliou-se a produção de mudas de ca- 33 Catucaí Amarelo 20/15 PB, MR PROCAFÉ
feeiro em diferentes tipos de substratos. Constatou-se a viabili- 34 Catucaí Vermelho 785/15 PB, MR PROCAFÉ
dade técnica da utilização de húmus de minhoca e Bokashi para 35 Palma II PB, R PROCAFÉ
a produção de mudas de cafeeiro orgânico, em substituição aos PA e PB = porte baixo e porte alto, respectivamente; R, MR e S = resistente,
substratos elaborados com fertilizantes minerais solúveis. moderadamente resistente e suscetível à ferrugem, respectivamente; Rn = re-
As pesquisas desenvolvidas pelo Centro de Café são par- sistente ao nematóide M. exigua.
cialmente financiadas pelo Consórcio Brasileiro de Pesquisa 1
Instituto Agronômico, Campinas-SP; 2 Empresa de Pesquisa Agropecuária de
Minas Gerais, Belo Horizonte-MG; 3 Instituto Agronômico do Paraná, Lond-
e Desenvolvimento do Café (CNBP&D/Café) e contam com a rina-PR; 4 Fundação de Apoio Tecnológico à Cafeicultura, Varginha-MG.
imprescindível colaboração de vários pesquisadores, técnicos e
cafeicultores para a implantação e execução dos projetos. BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Lei no 710.831,
Preocupado com as constantes alterações nos padrões técni- de 23 de dezembro de 2003. Dispõe sobre a agricultura orgânica e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Brasília, 24/12/2003, Seção 1, pág.8.
cos e mercadológicos da cafeicultura no Estado de São Paulo, o EHLERS, E. Agricultura sustentável: origens e perspectivas de um novo para-
Centro de Café busca permanentemente soluções para atender às digma. São Paulo: Livros da Terra, 1996. 178p.
demandas desse novo segmento de mercado: o café orgânico. EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA. Grupo de in-
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os produtos orgânicos de origem vegetal e animal. Diário Oficial da União, * gsgiomo@iac.sp.gov.br;
Brasília, 19/05/1999, Seção 1, pág. 11. sergiopereira@iac.sp.gov.br; bliska@iac.sp.gov.br
36 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007
Comportamento de cultivares de

café arábica
em solos ácidos e corrigidos
Júlio

De modo geral, as

A
plantas estão sujeitas
a diferentes tipos de calagem é uma das práticas mais impor- cação de calcário para elevar V a 30% e C2 = solo
estresses bióticos e/ou tantes para melhorar as condições quími- com aplicação de calcário para elevar V a 60%.
abióticos na natureza, cas do solo e suas vantagens são inúmeras, As adubações foram realizadas de acordo com o
tais como doenças, podendo-se citar: melhoria do pH do solo, forne- Boletim Técnico 100, do IAC, na mesma quanti-
pragas, acidez de solo, cimento de cálcio e magnésio, diminuição do teor dade para cada cultivar em cada nível de acidez
seca, calor, frio, etc. de alumínio, diminuição da lixiviação do potás- do solo.
Esses estresses são os sio e da adsorção do fósforo, além do aumento da As produtividades alcançadas pelas cultivares
principais responsáveis capacidade de troca de cátions. Por outro lado, a Tupi IAC 1669-33 e Obatã IAC 1669-20 em solo
pela redução no calagem condiciona o sistema radicular a concen- corrigido (maior saturação de bases) foram melho-
potencial produtivo trar-se na camada superficial do solo, principal- res do que em solos com saturação de bases me-
das culturas agrícolas, mente nos vinte centímetros iniciais. Isto impli- nor (Tabela 1). Neste caso, estas cultivares seriam
entre elas o café. ca em exploração de menor volume de solo, re- mais sensíveis à acidez do solo, necessitando de
sultando em prejuízos na absorção de nutrientes doses maiores de calcário para alcançarem me-
e do aproveitamento da água das camadas mais lhores produtividades. Também estariam sujeitas
profundas, o subsolo. As plantas cultivadas nes- a sofrer danos em períodos de veranico ou seca, e,
sas condições são mais sensíveis à seca/veranico, portanto, com maiores quebras na produtividade.
principalmente se isso ocorrer em fases críticas do A altura de plantas e o diâmetro de copas também
desenvolvimento do café, como no florescimento, foram afetados.
enchimento e maturação dos frutos. As cultivares Ouro Verde IAC 5010-5, Catu-
O estudo do sistema radicular vem se mos- aí Vermelho IAC 144, Icatu Vermelho IAC-4045,
trando de interesse não apenas pelos efeitos que Mundo Novo IAC 376-4 e Acaiá IAC 474-16 foram
Fazuoli certas práticas econômicas exercem sobre o seu tolerantes à acidez do solo.
desenvolvimento, como também para explicar a Este estudo indicou que as cultivares toleran-
Algumas resistência à seca e a tolerância a níveis altos de tes poderiam ser recomendadas para cultivos sob
condições ocorrem alguns elementos do solo, particularmente do alu- alta e baixa tecnologia, enquanto as sensíveis para
simultaneamente, mínio e do manganês. cafeicultores mais capitalizados.
como seca, excesso Neste contexto, torna-se importante conhecer Além disso, o trabalho evidenciou também que, ao
de luminosidade o comportamento das cultivares de café arábica recomendar a calagem, deve-se levar em conta não
e calor, causando em solos ácidos e corrigidos. Buscando esse co- apenas a acidez do solo, mas também a cultivar a
danos ainda nhecimento, o Centro de Café ‘Alcides Carvalho’ ser utilizada.
maiores. A expansão vem desenvolvendo linhas de pesquisas neste
agrícola brasileira tema, focando principalmente cultivares lançadas Condição de Laboratório
vem se fazendo em recentemente. Foram realizados estudos, utilizando soluções
áreas de cerrado, Foram realizados dois experimentos, ao lon- nutritivas, visando conhecer melhor o sistema ra-
caracterizadas por go de seis anos, visando identificar cultivares tole- dicular do café na presença do alumínio.
elevada acidez e rantes e sensíveis à acidez do solo. O primeiro foi O experimento foi conduzido no laboratório
baixa fertilidade, em condição de campo e o segundo em condição do Centro de Café ‘Alcides Carvalho’ do Instituto
obrigando o produtor, de laboratório, empregando-se solução nutritiva. Agronômico (IAC), em Campinas.
principalmente aquele Foram avaliadas as cultivares Mundo Novo
não tão capitalizado, Condição de Campo IAC 376-4, Catuaí Amarelo IAC 62, Obatã IAC
a aumentar o seu Em experimento desenvolvido pelo Centro de 1669-20, Ouro Verde IAC 5010, Tupi IAC 1669-33,
custo de produção, na Café do Instituto Agronômico, juntamente com o Icatu IAC 4045, Caturra e Bourbon Vermelho, nas
aquisição de calcário, Pólo Regional do Nordeste Paulista (APTA Re- seguintes soluções: normal, contendo todos os nu-
gesso e adubos. gional), em Mococa (SP), entre os anos de 2000 trientes, e outras três tratamentos, contendo 25%
e 2006, avaliou-se o comportamento de sete cul- da concentração de nutrientes da solução normal
tivares de café arábica em três diferentes níveis e variando na concentração de alumínio: 0,000,
de acidez do solo. Avaliaram-se as seguintes cul- 0,074 mmol.L-1 e 0,370 mmol.L-1 de alumínio. A
tivares: Ouro Verde IAC 5010-5, Catuaí Vermelho concentração de nutrientes da solução tratamento
IAC-144, Tupi IAC 1669-33 e Obatã IAC 1669-20, foi baixa, pois pretendeu-se simular uma condição
de porte baixo, e Icatu Vermelho IAC-4045, Mun- de solo ácido.
do Novo IAC 376-4 e Acaiá IAC 474-16, de porte Determinou-se o índice de tolerância relati-
alto. Os níveis de acidez do solo (C0, C1 e C2), me- va (ITR), obtido pela razão entre o comprimento
didos pela saturação de bases (V%), foram: C0 = total da raiz principal e comprimento da emissão
Paulo solo sem aplicação de calcário, C1 = solo com apli- da última ramificação lateral na raiz principal. É

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 37


conveniente lembrar que são das ramificações laterais que sai-
rão as raízes secundárias e os pêlos absorventes, responsáveis
pela absorção de água e nutrientes. Também foi feita uma ava-
liação visual do sistema radicular para se ter melhor idéia da
distribuição das ramificações laterais ao longo da raiz principal,
atribuindo-se notas de 1 (pouco desenvolvido, com nenhuma ra-
mificação lateral) a 10 (bem desenvolvido, com elevado número
de ramificações laterais e bem distribuídas).
O efeito do alumínio foi bem evidente nas cultivares Obatã
IAC 1669-20, Tupi IAC 1669-33, Caturra e Bourbon Vermelho,
verificado pela diminuição do valor do ITR, demonstrando a sen-
sibilidade destas cultivares ao alumínio. Além disso, o desenvol-
vimento radicular foi prejudicado, haja vista as baixas notas nas Obatã - Solução Obatã - Solução com
Normal 0,370 mmol-1 Al
Tabela 1. Médias das características agronômicas das cultivares
de café arábica avaliadas em diferentes níveis de acidez do solo,
em Mococa (SP), entre 2002 e 2006.
Cultivar (Saturação de bases) Produtividade AP DCO
sc/ha _________
cm _________

Ouro Verde IAC 5010-5 (10%) 12,1 a 2,36 b 2,19 b


Ouro Verde IAC 5010-5 (30%) 12,5 a 2,41 b 2,21 b
Ouro Verde IAC 5010-5 (60%) 12,9 a 2,50 a 2,42 a
Catuaí Vermelho IAC 144 (10%) 12,0 a 2,38 a 2,13 a
Catuaí Vermelho IAC 144 (30%) 12,4 a 2,41 a 2,13 a
Catuaí Vermelho IAC 144 (60%) 13,2 a 2,42 a 2,15 a
Tupi IAC 1669-33 (10%) 10,6 b 2,30 b 2,13 b
Tupi IAC 1669-33 (30%) 12,0 b 2,33 b 2,14 b
Icatu - Solução Icatu - Solução com
Tupi IAC 1669-33 (60%) 16,8 a 2,41 a 2,24 a Normal 0,370 mmol-1 Al
Obatã IAC 1669-20 (10%) 14,2 c 2,35 a 2,15 b
Obatã IAC 1669-20 (30%) 16,3 b 2,39 a 2,27 a avaliações visuais realizadas. No geral, os sistemas radiculares
Obatã IAC 1669-20 (60%) 20,8 a 2,40 a 2,27 a destas cultivares, nas soluções com alumínio, apresentaram en-
Icatu Vermelho IAC-4045 (10%) 11,0 a 2,65 a 2,62 a tre poucas e médias ramificações laterais e com má distribuição.
Icatu Vermelho IAC-4045 (30%) 11,8 a 2,65 a 2,63 a
Um genótipo ideal seria aquele que apresentasse um sistema
radicular longo, com grande número de ramificações laterais.
Icatu Vermelho IAC-4045 (60%) 12,2 a 2,66 a 2,64 a
Além disso, essas ramificações deveriam ser distribuídas uni-
Mundo Novo IAC 376-4 (10%) 9,1 a 2,61 a 2,50 a
formemente na raiz principal, pois dessa forma aproveitaria a
Mundo Novo IAC 376-4 (30%) 9,6 a 2,61 a 2,53 a disponibilidade dos nutrientes da camada superficial e das mais
Mundo Novo IAC 376-4 (60%) 12,1 a 2,60 a 2,56 a profundas do solo, minimizando os efeitos negativos da seca.
Acaiá IAC 474-16 (10%) 9,5 a 2,55 a 2,11 b Já as cultivares Mundo Novo IAC 376-4, Catuaí Amarelo IAC
Acaiá IAC 474-16 (30%) 9,8 a 2,51 a 2,19 a 62, Ouro Verde IAC 5010-5 e Icatu IAC 4045 foram menos afe-
Acaiá IAC 474-16 (60%) 10,1 a 2,50 a 2,21 a tadas pelo alumínio, demonstrando a tolerância a esse metal.
Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si, pelo teste de Duncan a 5% Apresentaram também maior número de ramificações laterais
bem como melhor distribuição destas no perfil da raiz principal.
Tabela 2. Médias do Índice de Tolerância Relativa (ITR), seguidas, Pressupõe-se que estas cultivares poderiam suportar melhor um
entre parênteses, da avaliação visual do sistema radicular das culti- período de seca, ou solo ácido, do que às outras cultivares es-
vares de café arábica avaliadas em diferentes soluções nutritivas. tudadas. Em regiões com estas características, principalmente
em relação à seca, elas seriam mais recomendadas do que as
Índice de Tolerância Relativa (ITR) outras.
Cultivar
Normal 0,000 Al 0,074 Al 0,370 Al Há de se ressaltar também que nestes experimentos foram
_____________________________
% ____________________________ avaliadas algumas cultivares. Há necessidade de se realizar mais
experimentos com outras cultivares a fim de saber o comporta-
1- Mundo Novo IAC 376-4 61 a (7)1 51 b (6) 57 ab (6) 61 a (6) mento delas nestas condições.
2- Catuaí Amarelo IAC 62 70 a (7) 67 a (7) 65 a (6) 64 a (6)
3- Obatã IAC 1669-20 70 a (9) 61 b (6) 61 b (5) 35 c (2) Júlio César Mistro e Luiz Carlos Fazuoli
Instituto Agronômico, Centro de Café “Alcides Carvalho”
4- Ouro Verde IAC 5010-5 69 a (8) 66 a (6) 65 a (6) 61 a (6)
( (19) 3241-5188 ramal 370; 3212-0458
5- Tupi IAC 1669-33 80 a (9) 69 b (6) 37 c (4) 30 c (2) * mistrojc@iac.sp.gov.br; fazuoli@iac.sp.gov.br
6- Icatu Vermelho IAC-4045 63 a (7) 61 a (6) 62 a (6) 61 a (6)
7- Caturra 84 a (7) 72 b (5) 56 c (4) 48 c (3)
Paulo Boller Gallo
Pólo Regional do Nordeste Paulista (APTA Regional), em Mo-
8- Bourbon Vermelho 65 a (7) 39 b (5) 31 bc (4) 23 c (2) coca (SP)
Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si, pelo teste de Duncan a 5%. ( (19) 3656-0200
1
Avaliação visual do sistema radicular. * paulogallo@aptaregional.sp.gov.br

38 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Cultivares resistentes ou tolerantes a fatores bióticos
e abióticos desfavoráveis: ponto-chave para a

cafeicultura sustentável
A cafeicultura está sempre evoluindo e proporcionando grandes desafios a todos os
envolvidos em sua cadeia produtiva. No Brasil, o plantio de café estende-se desde o Paraná
até o Pará, passando por São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Espírito Santo, Bahia
e Rondônia. Em cada estado existem regiões aptas para o cultivo do café com distintas
condições edafoclimáticas e diversos sistemas de cultivo e que possuem cafeicultores com
diferentes níveis tecnológicos. A diversidade de clima, de solo e de nível tecnológico na
Petek
cafeicultura leva a necessidade, constante, de desenvolvimento tecnológico.
Paralelamente ao desenvolvimento tecnológico, a busca por uma cafeicultura mais
sustentável intensificou-se nos últimos anos. Atendendo aos anseios dos consumidores e às
exigências da produção sustentável, a cafeicultura sustentável procura contemplar requisitos
econômicos, direcionados à utilização racional de recursos naturais e tecnológicos, sociais,
baseados no respeito às pessoas envolvidas na cadeia produtiva, além de ambientais, que
preconizam o emprego de tecnologias que não agridam o ambiente. Flávia

O
desenvolvimento de uma cafei- cultivares resistentes a pragas e doenças, o Centro de Café “Alcides Carvalho”, vi-
cultura sustentável no Brasil pas- evitam o uso excessivo de defensivos. sando a sustentabilidade da cafeicultura,
sa pelo aumento da rentabilidade Como conseqüência, entre os principais passou também a trabalhar com o obje-
do produtor, como forma de garantir sua impactos do uso de cultivares melhora- tivo de identificar no seu banco de ger-
permanência na atividade. Isso depende das estão o aumento da rentabilidade e da moplasma, fontes de resistência genética
de sistemas de cultivo estáveis, que pro- estabilidade do produtor, e a redução no a outras doenças e pragas de importância
porcionem maior longevidade para as emprego de defensivos com a conseqüen- econômica e/ou com potenciais riscos
lavouras e rentabilidade freqüente. Culti- te diminuição no custo de produção e no para a cafeicultura, além de adversidades
vares produtivas, adaptadas a cada con- impacto ao meio ambiente. climáticas. A cercosporiose (Cercospora
dição edafoclimática e sistema de cultivo Quando compararam a cultivar ‘Mun- coffeicola), também conhecida por man-
e resistentes a pragas e doenças, são dos do Novo’ com a primeira cultivar plan- cha-de-olho-pardo (Foto 1), até há pouco
principais componentes da sustentabili- tada no Brasil, denominada ‘Típica’ ou tempo era considerada doença secundária,
dade da cafeicultura. ‘Arábica’, e visualizaram mais de 200% mas encontra-se entre as principais doen-
A definição da sustentabilidade da de ganho em produtividade, já foi pos- ças da cultura no cerrado e, em outras re-
cafeicultura está em constante evolução, sível verificar a valiosa contribuição dos giões cafeicultoras. Sua importância tem
pois muitas das tecnologias consideradas pesquisadores do IAC para a sustentabili- aumentado, prejudicando a produção de
sustentáveis nas décadas de 50 e 60, hoje dade da cafeicultura brasileira. Posterior- grãos e a qualidade da bebida. O IAC tem
não o são mais. Entre os exemplos destas mente, a obtenção de cultivares de porte realizado estudos para a determinação da
tecnologias podem ser citados: plantios baixo como a ‘Catuaí Vermelho IAC 99’, relação entre nutrientes, principalmente
em espaçamentos largos (4 metros entre que possibilitaram maior adensamento, nitrogênio e potássio, e a incidência desta
linhas e 4 ou 3 metros entre plantas), der- além de facilitar a colheita e o recente de- doença (Foto 2). Em trabalho preliminar,
rubada de matas para o plantio do café senvolvimento de cultivares resistentes à realizado em progênies de café com resis-
e uso de cultivares pouco produtivas, ferrugem como a ‘Obatã IAC 1669-20’ e tência à ferrugem, foi possível confirmar
como ‘Típica’ e ‘Sumatra’. Hoje, devido a ‘Tupi IAC 1669-33’, deram continuidade a influência das concentrações de nitro-
à escassez de recursos e novas áreas para às relevantes contribuições do Centro de gênio e potássio na incidência da cercos-
plantio, é preciso adotar uma cafeicultu- Café “Alcides Carvalho” para a sustenta- poriose e ainda verificar a existência de
ra mais racional. bilidade da cultura do café no Brasil. É variabilidade genética quanto ao vigor ve-
Os programas de melhoramento ge- importante ressaltar que mais de 80% do getativo e à resistência a esta doença. As
nético de café do Centro de Café “Alci- parque cafeeiro do tipo arábica, do Brasil, pesquisas terão continuidade em busca
des Carvalho” do Instituto Agronômico é formado por cultivares desenvolvidas de cultivares mais resistentes à cercospo-
(IAC) já são, em sua essência, parceiros pelo IAC. riose e mais adaptadas para cada região e
da sustentabilidade da cafeicultura, pois Os esforços da pesquisa em genética sistema de cultivo.
têm como objetivo o desenvolvimento de e melhoramento de café para resistência Também como parte do apoio a sus-
cultivares com características de arquite- a doenças, até o momento, concentraram- tentabilidade da cafeicultura brasileira, o
tura e sistema radicular que maximizam se no desenvolvimento de cultivares re- IAC pretende contemplar em seus progra-
a eficiência no aproveitamento de fertili- sistentes à ferrugem (Hemileia vastatrix), mas de melhoramento, outras doenças,
zantes e de água, proporcionando aumen- pois esta é a mais importante doença da de ocorrência mais localizada, como a
to de produtividade e melhor qualidade cultura no Brasil, reduzindo, em média, mancha aureolada (Foto 3) (Pseudomo-
da bebida e, com o desenvolvimento de 35% da produção. Recentemente, porém, nas syringae pv. garcae) e a mancha de

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 39


phoma (Foto 4) ou complexo phoma/asco- de frutos (Foto 5) e a seca de ramos, bem a mancha de phoma ou complexo phoma/
chyta (Phoma tarda e Phoma costarricen- como, se existe relação deste problema ascochyta ocorrem em regiões de elevada
cis), além de fatores abióticos e/ou de cau- com a presença de Colletotrichum spp. nos altitude, sujeitas a ventos frios e chuvas. A
sa desconhecida, que provocam a queda ramos de cafeeiros. A mancha aureolada e mancha aureolada e o complexo phoma/
ascochyta, ao causarem desfolha, seca de
ramos e queda de flores e frutos, podem
resultar em prejuízos consideráveis.
Pesquisas também estão sendo reali-
zadas em conjunto com o Instituto Bioló-
gico (IB), nas principais regiões produto-
ras de São Paulo, no sentido do entendi-
mento e da caracterização do problema de
queda de frutos e seca de ramos e da bus-
ca de fontes de resistência genética a estes
distúrbios, cujas causas, bióticas e abióti-
cas, ainda precisam ser esclarecidas.
Além das pragas, como o bicho minei-
ro (Leucoptera coffeela) e os nematóides
Foto 1. Lesões características Foto 2. Sintomas da doença (Meloidogyne spp.), já contempladas nos
de cercosporiose no campo. (cercosporiose) no final do ciclo da programas de melhoramento do IAC, es-
cultura, em lavoura com deficiências na tudos para a identificação de fontes de re-
adubação excesso de carga. sistência à broca (Hipothenemus hampei)
(Foto 6), também estão sendo conduzidos
pelos pesquisadores. Existem indicações
de que as espécies Coffea eugenioides e
Coffea kapakata podem ser fontes de re-
sistência à broca, mas estudos complemen-
tares, necessários para sua confirmação,
estão sendo instalados, na busca da deter-
minação do grau de resistência, bem como
da possibilidade de utilização dessas fon-
tes de resistência nos programas de melho-
ramento do cafeeiro. Dessa forma, preten-
de-se o desenvolvimento de cultivares que
possam favorecer a adoção de programas
de manejo integrado de pragas.
Além dos programas de melhoramen-
Foto 3. Sintomas de mancha aureolada. Foto 4. Sintomas de mancha de phoma. to em andamento, outra atividade essen-
cial realizada pelo Centro de Café “Alcides
Carvalho”, é a instalação de unidades de
demonstração e ensaios regionais de cul-
tivares e linhagens, nas principais regiões
produtoras do estado de São Paulo, com o
objetivo de indicar os materiais mais adap-
tados para cada região e nível tecnológico.
O Centro de Café “Alcides Carvalho”
está constantemente em busca de tecno-
logias que proporcionem melhorias para
a cadeia produtiva do café e promovam a
sustentabilidade econômica, social e am-
biental da cafeicultura.

Marcos Rafael Petek


Instituto Agronômico, Centro de Café
“Alcides Carvalho”
( (19) 3241-5188 ramal 370; FAX: (19)
32120458
* mrpetek@iac.sp.gov.br

Flávia R. A. Patrício
Instituto Biológico, Centro Experimental
Central
Foto 5. Queda de frutos mumificados: Foto 6. Broca atacando ( (19) 3251-8714
fatores bióticos ou abióticos? fruto de cafeeiro. * flavia@biologico.sp.gov.br

40 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Os estudos sobre a fisiologia
do cafeeiro no Instituto Agronômico
Histórico sistema radicular encontrada foi em latossolos,
Quando foi criado em 27 de junho de nos quais as raízes atingiram profundidades su-
1887, o atual Instituto Agronômico era uma periores a 2,5 m, sendo que a 2 m a quantidade
Instituição Federal, ligada ao Ministério da de radicelas foi grande.
Agricultura do então Império Brasileiro e se Os motivos do insucesso da arborização
denominava “Estação Agronômica de Cam- dos cafezais no Estado de São Paulo foram
pinas”. Para sua direção o Governo Imperial objeto de exaustivos estudos. Depois de in-
Brasileiro contratou na Áustria o professor Joel Maria Luiza vestigar durante vários anos o comportamento
Franz Wilhem Dafert, que o dirigiu até 1897. da água no solo dos cafezais sombreados e a
A administração de Dafert foi muito ativa e Os trabalhos sobre a reação do pleno sol, e o consumo de água do solo pelos
produtiva, como provam os trabalhos publi- cafeeiro aos fatores climáticos cafezais e pelas árvores de sombra, foi conclu-
cados naquela época, vários dos quais se tor- ído que as árvores de sombra competiam for-
resultaram no conhecimento das
naram clássicos da literatura agronômica bra- temente com os cafeeiros na absorção de água
sileira, especialmente aqueles relacionados causas de vários fenômenos durante a época seca, sendo este o principal
com o cultivo do café. observados nas culturas, tais fator do pouco êxito do sombreamento.
Os estudos sobre a fisiologia do cafeeiro como a descoloração de folhas Outra contribuição do Instituto Agronô-
tiveram início no Brasil no século XIX, com a em baixas temperaturas, o mico foi na área de conservação de sementes
criação do Instituto Agronômico. Entre os tra- de café que, em condições normais, perdem
estrangulamento do caule e a
balhos publicados por F. W. Dafert alguns fo- sua viabilidade rapidamente, dificultando o
ram sobre as exigências minerais do cafeeiro lesão do colo de plantas novas, seu uso a longo prazo. Desse modo, foi cons-
e a distribuição dos elementos nutritivos nas sujeitas a temperaturas extremas. tatado que o poder germinativo de sementes
diferentes partes da planta. Depois de Dafert a A influência da temperatura da de café arábica e outras espécies foi mantido
fisiologia do cafeeiro voltou a receber alguma raiz sobre o crescimento mostrou por um período consideravelmente mais longo,
atenção na década de 30, quando Theodureto quando são desidratadas até 10% de umidade
que a temperatura de 33ºC na
de Almeida Camargo, então Diretor do Ins- e armazenadas em recipientes herméticos em
tituto, estudou, com seus colaboradores, al- raiz, mesmo por poucas horas, temperaturas baixas.
guns aspectos da fisiologia do cafeeiro como já parece prejudicar um pouco o Os teores de ácidos clorogênicos, compos-
seu crescimento em relação ao pH do meio desenvolvimento do cafeeiro e 38ºC tos fenólicos presentes em quantidades altas
radicular, a importância das nutrições nitro- nas mesmas condições, prejudica em folhas e grãos de plantas de café, foram
genada e potássica e as alterações químicas estudados por suas relações com a resistência
que ocorrem nas folhas de cafeeiros atingidos grandemente. Essas temperaturas a doenças e com a qualidade de bebida do café.
pela geada. são freqüentemente atingidas no
Este estudo forneceu dados sobre os teores de
A partir da criação, em 1936, de um la- campo, em dias de verão, nas ácidos clorogênicos em inúmeras espécies de
boratório para estudos de fisiologia vegetal, o camadas superficiais, exatamente Coffea, evidenciando que as espécies mais re-
qual foi transformado em Seção de Fisiologia naquelas que contêm grande sistentes à ferrugem apresentavam também os
com a reestruturação do Instituto Agronômico mais altos teores de ácidos clorogênicos. Em
efetuada em 1942, a fisiologia do cafeeiro pas- quantidade de radicelas.
adição, foi constatada relação entre a qualidade
sou a ser estudada ininterruptamente. Algumas Em adição, estudos sobre o
de bebida e a quantidade de ácidos clorogêni-
dessas contribuições são descritas a seguir. fotoperíodo mostraram ser o cafeeiro cos nos grãos, sendo que os mais altos teores
Principais contribuições uma planta de dias curtos. foram obtidos em C. canephora, que apresenta
para a cafeicultura nacional qualidade de bebida inferior à de C. arabica.
As primeiras contribuições A alta exigência do cafeeiro em nitrogê-
Na área de nutrição mineral, além dos trabalhos relacionados nio é um fato conhecido há muito tempo, e é acentuada com o
anteriormente, foram desenvolvidos estudos em soluções hidro- aumento da idade da planta e principalmente com o início da
pônicas que permitiram estabelecer os sintomas de deficiência produção de grãos. Não havendo outros fatores limitantes, a nu-
de um grande número de nutrientes minerais. Esse quadro de trição nitrogenada promove o rápido desenvolvimento da planta
sintomatologia proporcionou o controle da deficiência de zinco e o aumento da produtividade do cafeeiro. Resultados mostraram
que era observada frequentemente nos cafezais paulistas. Outro que, durante todo o ciclo produtivo do cafeeiro, a capacidade da
aspecto estudado foi a absorção de uréia pelas folhas do cafeei- planta em absorver e utilizar o nitrogênio do solo é maior antes
ro em condições de campo e em plantas cultivadas em solução da abertura das flores da florada principal, e na fase de enchi-
nutritiva. O emprego de uréia de qualidade inferior provocou o mento do grão (granação), ocasiões essas que coincidem com os
aparecimento de sintomas de fitotoxidade pelo biureto, impureza períodos de intensa demanda de metabólitos pelas flores e frutos.
frequentemente presente no produto em quantidades tóxicas. Esse e outros trabalhos forneceram informações sobre as épocas
Estudos detalhados sobre a distribuição do sistema radicular mais adequadas para se efetuar adubações nitrogenadas no cafe-
do cafeeiro em cinco tipos de solos foram efetuados no Estado de eiro, e ressaltaram que o fornecimento de muito nitrogênio para
São Paulo, encontrando-se marcada diferença nos sistemas radi- as mudas no viveiro ocasiona maior crescimento da parte aérea
culares nos diferentes solos, causada principalmente pela porosi- em relação às raízes, que poderá ser crítico quando forem trans-
dade e riqueza em nitrogênio do solo. A melhor distribuição do plantadas para o campo.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 41


Sombreamento spp). Nesses solos, a enxertia de cultivares comerciais de C. ara-
No Brasil, a cafeicultura se desenvolveu extensivamente a bica sobre C. canephora tem apresentado expressivos aumentos
pleno sol, onde normalmente a planta tende a expressar todo o na produção, devido à tolerância de C. canephora a esse parasita.
seu potencial produtivo, ocorrendo, entretanto, produções bie- Entretanto, foi observado que, mesmo em solos sem nematóides,
nais devido ao esgotamento da planta, e queima das folhas em a utilização de C. canephora como porta-enxerto conferiu maior
excesso de radiação solar. Esse problema tem sido parcialmente desenvolvimento e vigor às plantas, o que conseqüentemente, po-
contornado com o aumento da densidade de plantio, principal- deria levar a aumentos na produção. Em experimentos efetuados
mente na disposição em renque, e adequação da nutrição mineral durante dez anos consecutivos, em solos isentos de nematóides, foi
e tratamentos fitossanitários. verificado que a enxertia de C. arabica sobre C. canephora e C.
O estresse ocasionado em regimes de alta temperatura e Congensis proporcionou consideráveis aumentos no crescimento
radiação solar, condições que ocorrem em regiões de baixa e mé- e na produção de C. arabica, principalmente após as plantas so-
dia altitude, pode inviabilizar a cultura do cafeeiro. Portanto, um frerem recepa drástica. Em adição, a absorção de nutrientes foi
dos principais obstáculos para a expansão do cultivo de C. arabi- qualitativamente melhorada nas plantas enxertadas, aumentando
ca no Brasil parece ser a estreita faixa de temperatura favorável a absorção de potássio, que é um dos principais elementos mine-
ao desempenho de suas atividades vegetativas e reprodutivas. rais relacionados com a produção do cafeeiro, e diminuindo a ab-
Entretanto, há evidências que mostram sorção de manganês, que freqüentemente
que alguns cultivares recentemente obti- está presente em níveis altos na maioria
dos no IAC apresentam melhor adapta- Contribuições atuais dos solos cultivados com café no Brasil.
ção a regimes de luz e temperaturas mais No passado, importantes trabalhos de pesqui- Foi demonstrado que a superioridade das
elevadas, uma vez que a seleção genética sa efetuados no IAC abordaram o estudo da plantas enxertadas foi devida à maior ca-
foi efetuada a pleno sol em diferentes re- fisiologia do cafeeiro, cujas informações são pacidade do sistema radicular de C. cane-
giões de cultivo. phora em explorar maior volume de solo e
utilizadas até os dias atuais. Contudo, o rápi-
O sistema de cultivo a pleno sol fornecer água para a parte aérea durante os
do avanço tecnológico ocorrido na cafeicultu-
no Brasil foi baseado em resultados obti- meses secos, mantendo maiores taxas fo-
dos em experimentos antigos, nos quais ra brasileira, como o uso de novos cultivares tossintéticas e maior crescimento durante
foram utilizados níveis de sombreamen- geneticamente melhorados, novos sistemas esses períodos. Em adição, a enxertia não
to excessivo, que ocasionaram drásticas de plantio, associados ao depauperamento alterou a qualidade de bebida, mantendo o
reduções na produtividade do cafeeiro. e infestação dos solos com nematóides, e ao padrão apresentado por C. arabica.
Com a intensificação do sistema de cul- aparecimento de novas doenças, trouxeram Investigações sobre as características
tivo adensado e a retomada da possibili- vários problemas e muitas indagações que fotossintéticas, nutrição mineral e mor-
dade de sombreamento do café no Brasil, necessitavam de soluções. Nesse sentido, fologia e tamanho do sistema radicular
tornou-se imprescindível conhecer as vários projetos de pesquisa foram desenvol- em genótipos com potencial para serem
respostas dos cultivares atuais às varia- vidos no IAC procurando obter informações utilizados como porta-enxerto para culti-
das condições edafo-climáticas, na fi- para preencher, em parte, as lacunas existen- vares de C. arabica mostraram excelente
siologia e na produtividade do cafeeiro, tes no conhecimento da fisiologia do cafeeiro desempenho do ‘Apoatã IAC 2258’ (C.
visando adequar o manejo e otimizar a e sua interação com o ambiente. canephora) e do ‘Bangelan IAC col.5”
produtividade nesses novos modelos tec- (C. congensis x C. canephora). Esses
nológicos. genótipos mostraram maior capacidade
Vários estudos conduzidos em vasos, em quatro cultivares de das raízes em explorar o solo em volume e profundidade, maior
Coffea arabica (Catuaí Vermelho, Mundo Novo, Icatu Amarelo e eficiência em absorver N, P e K e seletividade para reduzir a ab-
Bourbon Vermelho) e um de C. canephora (Apoatã) mostraram sorção de Mn. O melhor desempenho do sistema radicular des-
que, em todos os genótipos, importantes características e proces- ses materiais genéticos apresentou reflexos na parte aérea, que
sos fisiológicos, tais como, fotossíntese, utilização do nitrogênio, mostrou menores quedas nas taxas fotossintéticas e transpiração,
eficiência do uso da água e crescimento, não diferiram entre as em condições de deficiência hídrica no solo. Os resultados mos-
plantas cultivadas a pleno sol e a 50% - 70% da luz solar. Entre- traram que os genótipos ‘Bangelan’ e ‘Apoatã’ apresentam ca-
tanto, todos esses processos foram prejudicados em condições de racterísticas favoráveis para a utilização como porta-enxerto para
sombreamento excessivo (20 a 30% da luz solar). cultivares de C. arabica.
No campo, foram estudados os efeitos de diversos regimes
de luz e disponibilidade de água no solo na produtividade do cul- Espaçamento
tivar Obatã. A produção acumulada durante quatro anos conse- Na cultura do cafeeiro, de modo geral, podem-se esperar
cutivos aumentou com o nível de luz, não havendo, entretanto, acréscimos significativos na produtividade com o aumento, den-
diferença significativa entre as plantas cultivadas a pleno sol e tro de certos limites, da densidade de plantio. Embora o cultivo
70 % da luz. adensado do cafeeiro venha sendo praticado há muito tempo em
Em síntese, o sombreamento moderado, ao redor de 70 % da outros países produtores, no Brasil somente nos últimos anos vem
luz solar, favorece os processos fisiológicos, atenua o depaupera- adquirindo interesse econômico. Do ponto de vista fisiológico, o
mento das plantas e não decresce significativamente a produção. cafeeiro apresenta ampla capacidade de adaptação a altas den-
Além disso, esse sistema de cultivo pode proporcionar incremen- sidades de plantio devido, principalmente, à relativamente bai-
tos na renda do produtor, pela exploração das espécies de sombra xa necessidade de luz para seu processo fotossintético. Por sua
e redução nos custos da recuperação das lavouras depauperadas, vez, o aumento na densidade de plantio pode provocar alterações
além de proporcionar melhorias na qualidade da bebida e nas químicas, físicas e microbianas no solo, bem como influenciar o
condições edafo-climáticas do meio ambiente. aparecimento de doenças nas plantas. Desse modo, foram efetu-
ados experimentos visando definir a densidade de plantio mais
Enxertia adequada para o cultivo do cafeeiro, para maximizar a produção
No Brasil a enxertia foi primeiramente estudada no Institu- sem proporcionar alta incidência de pragas e doenças, bem como
to Agronômico durante a década de 30, mas só recentemente tem dificuldades nos tratos culturais.
sido utilizada como uma técnica que permite o cultivo de cultivares O experimento constou de quatro blocos, com plantio em sis-
de C. arabica em solos infestados por nematóides (Meloidogyne tema de espaçamentos duplamente progressivos, nos espaçamen-

42 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


tos entre linhas de 0,60m; 0,72m; 0,85m; 1,04m; 1,24m; 1,50m;
1,80m; 2,15m; 2,57m; 3,10m; 3,70m; 4,46m; 5,20m; 6,40m, um
bloco para cada um dos quatro cultivares utilizados, sendo dois
de porte alto (Icatu Vermelho-IAC 4045 e Mundo Novo - Acaiá) e
dois de porte baixo (Catuaí Amarelo - IAC 62 e Obatã-IAC 1669-
20), sendo dois materiais resistentes à ferrugem (Icatu e Obatã)
e dois susceptíveis (Catuaí e Acaiá), plantados exatamente nos
sentidos N ® S; L ® O. Verificou-se que na primeira produção as
plantas de Icatu já começaram a sobrepor os ramos plagiotrópi-
cos em espaçamento de até 1,80 m, enquanto que os cultivares de
porte baixo e o Acaiá apresentaram crescimento de diâmetro de
copa menor ocorrendo adensamento abaixo de 1,50 m. No quarto
ano de produção, no cultivar Icatu a competição por espaço já
ocorre até o espaçamento de 2,15 m, enquanto que para os outros Figura 1. Regressão entre a produção real e o índice fenológico,
cultivares a competição mantém-se até 1,80 m. A produção por obtido pela multiplicação da média do número de frutos do 4º e 5º nós
área no período de 1997 a 2003 foi baixa em espaçamento de produtivos de ramos plagiotrópicos do terço médio da planta, pela área
0,44 m2 por planta, apresentou valores máximos entre 0,60 e 0,90 vegetal de produção, calculada pelo produto do comprimento em metro
m2, decrescendo consideravelmente nos espaçamentos maiores. de linha de café por hectare pelo dobro da altura da planta.
A atividade e composição microbiana no solo, de modo geral,
foram mais elevadas na profundidade de 20-40 cm nos cultivares
de porte alto (Mundo Novo e Icatu) que nos cultivares de porte
baixo (Catuaí e Obatã), havendo pouca variação com o aumento
do espaçamento. Com referência ao efeito do espaçamento nas
características químicas do solo, verificou-se que o teor de Ca
aumentou com o espaçamento, enquanto a quantidade de maté-
ria orgânica não foi influenciada. Com referência ao efeito do
espaçamento nas características químicas do solo, importantes
informações foram obtidas. A acidez do solo (H+Al) aumentou
com o decréscimo do espaçamento, principalmente na camada
0-20 cm, em conseqüência da diminuição dos teores de Ca e da
soma de bases. A matéria orgânica aumentou com a redução do
espaçamento na camada de 0-20 cm, mas não foi alterada na de
20-40 cm. Os teores de P, K, Zn e B no solo aumentaram com a
redução do espaçamento. Figura 2. Comparação entre a produtividade real com a obtida pela
Resultados de cinco anos de avaliações do efeito de diversos equação Y= 0,0005 X, e com a estimada visualmente em 14 unidades
experimentais durante os anos agrícolas de 2001/2002.
espaçamentos, com uma ou duas plantas por cova, no crescimen-
to e produtividade de C. arabica cv. Obatã 1669-20, mostraram
que o crescimento aumentou com o aumento da densidade de duto da média do número de frutos do 4º e 5º nós produtivos do
plantio na linha, independente da utilização de covas com uma ramo plagiotrópico do terço médio da planta, multiplicado pela
ou duas plantas. A produção acumulada nos cinco anos conse- área vegetal de produção, a qual foi calculada pelo produto do
cutivos, em sacas de café beneficiado por hectare, foi maior no comprimento em metro de linha de café por hectare pelo dobro
espaçamento 3,0 x 1,0 com duas plantas por cova. da altura da planta. O IFP foi altamente correlacionado (R2 >
0,97) com a produção real obtida durante os anos de 1999/2004
Estimativa de produtividade (Figuras 1 e 2), fornecendo a seguinte equação linear:
A estimativa antecipada da safra de café nas diversas regiões Y = 0,0005 X
produtoras é de importância fundamental para o estabelecimento
da política cafeeira do país. Apesar dessa importância não existe onde X representa o IFP e Y a produção estimada em sc/ha.
no Brasil uma metodologia adequada para previsão da safra de
café que permita uma avaliação precisa e segura. As poucas in- Dessa forma, a utilização do IFP, que são avaliações medi-
formações para o estabelecimento de modelos para previsão de das e não subjetivas, nos modelos matemáticos poderia reduzir
safra de café são conseqüência da complexidade metodológica, significativamente a margem de erro das estimativas. De fato,
ocasionada pela diversidade dos fatores ambientes, culturais e aplicando-se essa equação aos dados de 2001/2002, que foi um
econômicos envolvidos na produtividade dessa cultura. Esses ano agrícola em que todos os 14 talhões em estudo apresentaram
métodos devem levar em consideração as cultivares utilizadas, a produções, verificou-se que as estimativas das produtividades
densidade de plantio, a idade da cultura, a tecnologia empregada das 14 UEs, obtidas pela equação (Y = 0,0005 X) e sua compa-
e as condições edafo-climáticas. ração com as produtividades reais apresentaram margem de erro
Objetivando desenvolver um modelo matemático para esti- de 7 %, enquanto que a comparação entre as estimadas efetuadas
mar a produtividade de cafeeiros de diferentes cultivares, idade visualmente, por técnicos especializados na cultura, e as reais foi
e sistema de plantio, foram avaliadas, durante diversos perío- de 9%. Portanto, a utilização da equação Y = 0,0005 X, obtida
dos produtivos, as características fenológicas determinantes do através dos índices fenológicos de produção permite estimar a
crescimento e da produção. Os estudos se estenderam de 1999 a produtividade do cafeeiro, com até 6 meses de antecedência, com
2004, efetuando-se determinações quantitativas do crescimento, precisão superior a 93%.
frutificação e produção das plantas de 14 unidades experimentais
(UEs) (talhões), da região de Garça/Marília. Joel Irineu Fahl e Maria Luiza Carvalho Carelli
Utilizando-se o banco de dados acumulados neste estudo Instituto Agronômico, Centro de Ecofisiologia e Biofísica
durante o período de 1999/2000 a 2003/2004, estabeleceu-se o ( (19) 3231-5422 R: 155
Índice Fenológico de Produção (IFP), que corresponde ao pro- * fahl@iac.sp.gov.br; carelli@iac.sp.gov.br

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 43


Armazenamento de

Masako
sementes de café Fazuoli

A
s sementes de café, em condições de café por períodos mais longos. Assim, níveis de umidade das sementes: alta (35
normais de armazenamento (saco vários trabalhos têm sido conduzidos pe- - 37%) e média (20 – 25%). As sementes
de papel, temperatura ambiente e los pesquisadores buscando estabelecer foram acondicionadas em dois tipos de
umidade de 15% das sementes), perdem tecnologias capazes de melhorar as con- embalagens: saco plástico transparente
a sua viabilidade rapidamente. Sementes dições para prolongar a manutenção da de polietileno com parede simples de 0,16
das duas espécies economicamente mais viabilidade das sementes. Porém, esses mm de espessura e saco plástico trança-
importantes, Coffea arabica e C. cane- estudos não foram congruentes, sendo do. As sementes foram tratadas com fun-
phora, geralmente perdem a capacidade muitas vezes conflitantes quanto a alguns gicida Tecto 600 na proporção de 1g/kg
de germinação após três a seis meses da aspectos como o teor de umidade inicial de sementes.
colheita. Por esta razão, as práticas nor- das sementes, embalagem a ser utilizada e
mais de semeadura são realizadas logo condições ambientais de armazenamento.
após a colheita ou no máximo dentro do Desta forma, no IAC, foram realiza- Após o tratamento, as
prazo de seis meses. dos vários estudos objetivando informar sementes foram armazenadas
Em decorrência desse fato, os pro- as melhores condições para o armazena- em três locais diferentes,
dutores de sementes têm dificuldades em mento de sementes de café arábica e ro- relacionados a seguir:
manter os seus estoques reguladores, con- busta, de modo a preservar, pelo maior 1. Laboratório de sementes,
seqüentemente, os viveiristas são obriga- período de tempo possível, o mínimo de sem controle de temperatura
dos a realizar a semeação logo após a co- 70% de germinação para café arábica e e umidade relativa do ar,
lheita que nessa ocasião nem sempre pode 60% para robusta, segundo as Normas e tendo sido registrados os
ser a melhor opção. Ainda, para produção Padrões de Produção de Sementes Fis- valores de 22 a 29°C e 70 a
de mudas enxertadas com a tecnologia calizadas de Café para o Estado de São 95%U.R., respectivamente,
de enxertia hipocotiledonar para plantio Paulo. ao longo do experimento;
em áreas infestadas de nematóides, seria Sementes de C. arabica cv. Mun- 2. Baú frigorífico, com
de grande valia se mantivesse reserva de do Novo, IAC 388-6 e C. canephora cv. temperatura controlada 13° ±
sementes de café arábica e robusta apro- Apoatã IAC 2258 foram obtidas de café 3°C e 60% a 90%U.R.;
ximadamente por um ano, uma vez que cereja, na safra de 1999. Logo após a co- 3. Câmara fria, com temperatura
a produção de mudas enxertadas pode lheita, os frutos foram despolpados meca- e umidade relativa do ar,
ocorrer durante todo o ano. nicamente, degomados por fermentação 9° ± 1ºC e 57% ± 1%U.R.,
Muitas razões evidenciam a neces- natural durante 24 horas e as sementes respectivamente.
sidade de estabelecer uma metodologia foram lavadas em água corrente. Em se-
adequada para a conservação de sementes guida, secadas à sombra para obter dois

Tabela 1. Porcentagem de germinação de sementes de Coffea arábica cv. Mundo Novo IAC 388-6 e sua umidade (%), utilizando
sementes em duas embalagens e armazenadas em três ambientes.
Umidade (%) Germinação (%)
Ambiente Embalagem
Inicial 6 meses 12 meses Inicial 6 meses 10 meses 12 meses
20 21 19 95 15 0 0
Sala
Polietileno 37 29 30 95 76 7 0
20 13 12 95 16 0 0
Trançado 37 13 11 95 28 0 0
20 19 20 95 84 40 5
Baú Polietileno 37 35 33 95 94 87 87
20 13 16 95 92 74 55
Trançado 37 13 16 95 82 72 53
20 18 19 95 93 91 77
Câmara Polietileno 37 34 33 95 95 92 58
20 10 10 95 94 83 83
Trançado 37 10 9 95 92 89 82

44 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Tabela 2. Porcentagem de germinação de sementes de Coffea canephora cv. Apoatã IAC 2258 e sua umidade (%), utilizando semen-
tes em duas embalagens e armazenadas em três ambientes.
Umidade (%) Germinação (%)
Ambiente Embalagem
Inicial 6 meses 12 meses Inicial 6 meses 10 meses 12 meses
25 26 21 95 1 0 0
Sala Polietileno 35 34 30 95 9 0 0
25 11 11 95 1 0 0
Trançado 35 11 11 95 3 0 0
25 25 26 95 80 25 2
Baú Polietileno 35 32 33 95 91 76 51
25 12 17 95 81 28 4
Trançado 35 13 17 95 63 20 4
25 24 25 95 76 18 2
Câmara Polietileno 35 32 34 95 76 23 21
25 11 10 95 59 47 47
Trançado 35 8 9 95 54 36 30

O delineamento estatístico utilizado O tratamento mais eficiente A conservação das sementes de C.


foi inteiramente casualizado, com esque- arabica cv. Mundo Novo, de modo geral,
ma fatorial 3x2x2, sendo 3 ambientes, 2 para preservação de nos ambientes com temperatura contro-
tipos de embalagens e 2 níveis de umida- lada (baú e câmara) foi bastante satis-
de inicial das sementes, para cada espécie C. canephora cv. Apoatã fatória. Na câmara fria, até os 10 meses
de café, utilizando quatro repetições. de armazenamento, apresentaram alta
As análises de germinação e de umi- IAC 2258 foi o que conjugou taxa de germinação, independentemente
dade de sementes foram feitas conforme da embalagem e umidade inicial das se-
as Regras Para Análise de Sementes, no o acondicionamento das mentes, porém, aos 12 meses as melhores
início do experimento e a cada dois meses condições foram sementes embaladas no
durante o período de armazenamento. sementes com umidade saco trançado tanto na umidade alta e na
O grau de umidade foi determinado média. No baú, somente as conservadas
com duas repetições de 30 g de sementes inicial alta de 35%, em em saco de polietileno e umidade inicial
em estufa a 105°±3ºC, durante 24 horas. alta, preservaram a germinação de 87%.
Para os testes de germinação, foram utili- sacos de polietileno, em baú Considerando-se que para produzir
zadas sementes desprovidas de pergami- mudas enxertadas há necessidade de se
nho, retirado manualmente, e conduzidos frigorífico (10 -16ºC, 60 – dispor de sementes viáveis das duas es-
à temperatura constante de 30ºC com pécies envolvidas e sobretudo que apre-
quatro repetições de 50 sementes. 90% UR), proporcionando a sentem índices de germinação mínima
Os resultados dos testes de germina- de 70% para arábica e 60% para robusta,
ção e de umidade das sementes das cul- germinação de 76% com 10 verificou-se neste experimento que é pos-
tivares Mundo Novo e Apoatã obtidos sível até aos 10 meses de armazenamento
durante o armazenamento são apresen- meses de armazenamento. obter estes índices de germinação.
tados nas tabelas 1 e 2. Verifica-se que a
embalagem de polietileno com 0,16mm de É interessante notar que,
espessura mostrou-se eficiente na preser-
aos 12 meses, ainda CONCLUSÃO
vação da umidade das sementes ao longo Para a conservação de sementes de
do período experimental em todos os am-
bientes, exceto no ambiente de laboratório apresentaram 51% de café das espécies C. arábica e C. cane-
phora, a melhor condição para o arma-
que apresentou um pequeno declínio. Por
outro lado, a embalagem de saco plásti- germinação, valor que, zenamento é a do Baú frigorífico com
temperatura entre 10 e 16ºC, utilizando
co trançado permitiu a perda da umidade
após 2 meses de armazenamento em to- apesar de ser inferior ao embalagem de saco de polietileno de
0,16 mm de espessura e alta umidade
dos os ambientes testados.
As sementes mantidas em ambiente
recomendado pelas normas inicial de sementes, ao redor de 35%.
de laboratório, sem controle de tempera-
tura e umidade relativa do ar, apresenta-
da CESM, mostrou-
Masako Toma Braghini e Luiz Carlos
ram rápida queda de germinação, a partir se superior aos demais Fazuoli
de 6 meses de armazenamento, especial- Instituto Agronômico, Centro de Café
mente acentuada na cv. Apoatã, indepen- tratamentos com 10 meses “Alcides Carvalho”
dentemente da embalagem e umidade ini- ( (19) 3241-5188 ramal 370; 3212-0458
cial das sementes ocorrendo antes mesmo de armazenamento. * mako@iac.sp.gov.br
desse período.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 45


Cafeeiros resistentes ao
bicho-mineiro Guerreiro

O
parque cafeeiro nacional é for- Maior flexibilidade em relação à ado- cho-mineiro, mediante transferência de
mado por cerca de seis bilhões de ção dessas estratégias de manejo e maior genes de resistência ao inseto presentes
cafeeiros, sendo um terço repre- segurança na redução de custos pode ser na espécie C. racemosa. A genealogia de
sentado por cultivares da espécie Coffea conseguida com o plantio de cultivares um material bastante promissor é apre-
canephora e o restante formado por culti- resistentes (Figura 2), nas quais as lesões sentada na figura 3.
vares de C. arabica, todas suscetíveis ao provocadas nas folhas, são irregulares e Embora C. arabica, espécie a ser me-
bicho-mineiro, principal praga da cultura de tamanho bastante reduzido. lhorada, e C. racemosa, espécie doadora
(Figura 1). A magnitude do dano causado Por esses motivos, o Instituto Agro- dos genes de resistência sejam genetica-
varia em função de práticas de manejo e, nômico de Campinas vem, há anos, se- mente distantes, a obtenção de híbridos é
especialmente, pelas condições climáti- lecionando populações resistentes ao bi- obtida com relativa facilidade. No entanto,
cas das regiões de cultivo. De modo ge-
ral, a praga é de ocorrência generalizada,
sendo necessário o controle químico que
contribui para o aumento importante do
custo total de produção.
Mesmo em regiões de alta incidência
populacional, o manejo adequado das la-
vouras feito mediante preservação de ini-
migos naturais e redução da população de
adultos feita com inseticidas de baixa to-
xicidade, permite que o nível de dano nas
lavouras seja reduzido. A prática exige,
porém, bastante atenção relacionada ao
desenvolvimento biológico do inseto e às Figura 1. Lagartas e lesão formada nas Figura 2. Lesões filiformes causadas
condições climáticas predominantes, es- folhas pelo bicho-mineiro-do-cafeeiro, por lagartas em folhas de cafeeiros
pecialmente com a incidência de chuvas. Leucoptera coffeella. resistentes ao bicho-mineiro.

Figura 3. Genealogia da progênie H20049 pertencente à geração RC6 e cultivada no ensaio de progênies EP 509, em Campinas (SP).

46 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Tabela 1. Características de plantas, sementes e frutos de populações oriundas do cruzamento entre Coffea arabica e C. racemosa
presentes em ensaios de progênies em Campinas, SP.

1 = Produção de frutos maduros 2005-2006; 2 = escala de 1 a 10, sendo 1 para menos vigorosas e 10, para mais vigorosas; 3 = escala de 1 a 4, sendo 1, resistentes, 2,
moderadamente resistentes, 3, moderadamente suscetíveis e 4, suscetíveis; 4 = escala de 1 a 10, sendo 1 as mais resistente e 10 as mais suscetíveis

enquanto C. arabica é autógama e tem 44


cromossomos somáticos, C. racemosa é
alógama e diplóide (2n = 2x = 22 cromos- Figura 4.
somos), sendo os cruzamentos controlados Aspecto
por um sistema de incompatibilidade do fitossanitário,
tipo gametofítico que impede a autofecun-
vigor vegetativo e
dação das plantas. Como conseqüência
prática, surgem problemas relativos à fer- carga pendente
tilidade das plantas, como alta incidência de plantas da
de frutos chochos e sementes do tipo moca progênie
(Tabela 1) que são ainda observados mes- H14954-46 em
mo em gerações avançadas. A freqüência Campinas, SP
de sementes-concha não é elevada nas
populações em seleção, mas em algumas (Março/2007).
progênies ainda é freqüente a ocorrência
de plantas anormais, como aneuplóides.
No entanto, a maior dificuldade re-
side na obtenção de plantas homozigotas segregantes têm maior vigor vegetativo Testes sensoriais realizados por dife-
com progênies uniformes no que concer- que as cultivares Catuaí e Mundo Novo rentes equipes de provadores com plantas
ne a expressão da resistência ao inseto. em ensaios de progênies sem irrigação ou selecionadas das gerações RC5, F2RC5 e
A herança condicionada por dois genes qualquer controle fitossanitário (Figura 4). F3RC4, indicam que a bebida dos deriva-
complementares e dominantes parece Também em ensaios de dos de C. racemosa é de excelente qua-
sofrer influência de genes menores, uma lidade, sendo que algumas plantas apre-
vez que a autofecundação sucessiva de
progênies sem controle sentam aromas característicos de especial
plantas resistentes não proporcionou até químico de bicho-mineiro e interesse para blends com cultivares de C.
o presente, a obtenção de progênies for- ferrugem, algumas plantas arabica.
madas exclusivamente por cafeeiro resis- apresentam produção de frutos Ensaios de campo com clones de
tentes ao bicho-mineiro. Estudos aliando plantas selecionadas pela capacidade pro-
análise genéticas tradicionais à técnicas bastante elevada e superior às dutiva, resistência ao bicho mineiro e ca-
moleculares tem buscado elucidar os me- melhores plantas das cultivares racterísticas favoráveis de frutos e semen-
canismos de herança e expressão da resis- comerciais usadas como tes vêm sendo conduzidos e representam
tência do cafeeiro a L. coffeella. uma perspectiva de cultivo em prazo mais
controle. A produção média das curto que variedades resistentes propa-
Por outro lado, como C. racemosa
apresenta certa tolerância a períodos pro- progênies híbridas, no entanto, gandas por sementes.
longados de estresse hídrico e as primeiras tem sido sempre
hibridações para transferência da resistên- inferior à produção das Oliveiro Guerreiro Filho
cia ao inseto foram realizadas com culti- Centro de Café ‘Alcides Carvalho’ (IAC)
vares de C. arabica resistentes ao fungo
testemunhas, as cultivares ( (19) 3241-5188 ramal
Hemileia vastatrix, as populações híbridas Catuaí e Mundo Novo. * oliveiro@iac.sp.gov.br

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 47


A ferrugem alaranjada
do cafeeiro e a obtenção
de cultivares resistentes
Fazuoli

Masako
A moléstia conhecida como ferrugem alaranjada do
cafeeiro é provocada pelo fungo Hemileia vastatrix
e foi constatada pela primeira vez, no Brasil, em 17 Bernadete

de janeiro de 1970, na Bahia. Devido à sua rápida


disseminação, em poucos anos, todo o parque
Baião
cafeeiro brasileiro foi afetado.

I
maginava-se na época que um mons- plantio no Brasil, apesar de suscetíveis a lentas, chegando a atingir 2 a 3 cm de di-
tro avassalador iria acabar com a nos- H. vastatrix. Existem atualmente muitos âmetro. Quando coalescem podem cobrir
sa cafeicultura, como ocorreu em al- produtos químicos que controlam eficien- grande extensão do limbo foliar. A pulve-
guns países asiáticos. Apesar dos nossos temente a ferrugem, desde que aplicados rulência amarelo-alaranjada é constituída
cafezais serem constituídos de cultivares corretamente. No entanto, o seu custo é pelos esporos do patógeno e consiste no
suscetíveis à moléstia, isso felizmente não relativamente alto, na maioria dos casos. único sinal externo da moléstia. As folhas
ocorreu. As condições agrometereológicas Dessa maneira, o desenvolvimento de atacadas em geral caem prematuramente,
de cultivo do café no Brasil e a possibi- cultivares rústicas com alta capacidade prejudicando o desenvolvimento das plan-
lidade econômica e tecnicamente viável produtiva e com resistência à ferrugem, é tas jovens e comprometendo a produção
do controle químico do fungo causador da de suma importância para a nossa cafei- das adultas. A ocorrência de desfolhas re-
moléstia foram fatores que colaboraram cultura. petidas irá exaurir a planta e o cafezal tor-
para alterar a idéia pessimista dos nossos nar-se-á antieconômico. Nos anos de alta
cafeicultores daquela época. No entanto, Sintomas da doença produção dos cafeeiros, tem-se verificado
apesar das perdas estimadas pela ação da A ferrugem ataca principalmente as maior índice de ataque.
ferrugem nos cafezais serem grandes e folhas do cafeeiro e raramente os frutos e
variarem de região para região, uma con- extremidades de brotação novas. Os pri- Raças Fisiológicas
siderável parte dos cafeicultores não tem meiros sintomas da moléstia correspon- Os trabalhos pioneiros sobre a espe-
utilizado o controle químico e quando o dem ao aparecimento, na face inferior das cialização fisiológica de H. vastatrix e o
usa, quase sempre o faz de modo inade- folhas, de pequenas manchas de coloração comportamento do complexo Coffea/He-
quado. Os cafeicultores que controlam a amarelo-pálida, de 1 a 3 mm de diâmetro mileia vastatrix foram realizados, primei-
ferrugem eficientemente usam também e aspecto ligeiramente oleoso, quando são ramente, na Índia e mais tarde prossegui-
outras práticas culturais necessárias, ex- observadas por transparência. Estas man- dos e ampliados em Portugal. Em 29 de
plorando de maneira adequada o potencial chas desenvolvem-se em poucos dias, tor- abril de 1955, foi inaugurado o Centro de
produtivo das cultivares indicadas para o nando-se amarelo-alaranjadas e pulveru- Investigação das Ferrugens do Cafeeiro
(CIFC), em Oeiras, Portugal, tendo como
seu criador o Dr. Branquinho D’Oliveira.
Com a criação do CIFC, as pesquisas
relacionadas com a especialização fisioló-
gica de H. vastatrix tomaram um impul-
so extraordinário. A partir de amostras de
esporos de H. vastatrix provenientes das
mais diversas regiões cafeeiras do mundo,
foi possível, até o presente, a identificação
de 45 raças fisiológicas:
No que se refere à distribuição geográ-
fica das raças verificou-se que a raça II é
Folha com ferrugem Obatã IAC-1669-20 a que tem a mais ampla distribuição pelos

48 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


países cafeicultores, seguida das raças I, III ração. A maior parte das informações exis- cafeeiro, visando resistência a H. vastatrix,
e XV. É bem provável que a distribuição tente na literatura mostra que a resistência desenvolvidos em vários países, desde o
geográfica das raças fisiológicas esteja re- vertical confere proteção completa contra início, ênfase maior foi dada ao aproveita-
lacionada com o material genético plantado determinada moléstia, mas não de maneira mento da resistência vertical. No entanto,
nos países cafeicultores. Um fato que cor- permanente. Por outro lado, a resistência desde 1971, logo após da constatação de
robora isto ocorre na Índia, que é conside- horizontal condiciona proteção incomple- H. vastatrix no Brasil, no plano de me-
rado o paraíso das raças de ferrugem. ta, mas permanente. A resistência horizon- lhoramento do cafeeiro, visando resistên-
No que concerne à agressividade das tal é estável (permanente), por ser baseada cia ao agente da ferrugem, desenvolvido
raças fisiológicas, em estudos efetuados em mecanismos de resistência que estão pelo IAC, já se chamava a atenção para
no CIFC, foram verificadas diferenças na fora do alcance do parasita. Os termos re- o estudo e aproveitamento da resistência
agressividade de vários isolados da mes- sistência horizontal e incompleta têm sido vertical e horizontal. Atualmente, em pro-
ma raça, quando inoculados no mesmo utilizados em café como sinônimos. gramas de melhoramento do cafeeiro vi-
hospedeiro. Em programas de melhoramento do sando resistência a H. vastatrix, além do
aproveitamento da resistência vertical, ên-
Herança da Resistência fase é dada, também, aos estudos e apro-
Em uma análise das informações exis- Raças veitamento da resistência horizontal. Em
tentes, até o presente, relativas à quanti- Constatadas vários outros países cafeicultores, nota-se,
dade de fatores genéticos que conferem também, tendência para os estudos desses
resistência a H. vastatrix, relatam um no Brasil dois tipos de resistência.
total de nove genes. A resistência de ca- A primeira raça de H. vastatrix
feeiros às raças fisiológicas de ferrugem constatada no Brasil foi a raça II, Resistência Durável
é condicionada por fatores dominantes, em 1970, na Bahia. No mesmo O principal desafio dos programas
aparentemente independentes. Estes ge- ano, essa raça foi detectada de melhoramento genético visando resis-
nes receberam a sigla SH, que representa nos Estados do Espírito Santo tência à ferrugem do cafeeiro é obter re-
e Minas Gerais. O fungo H.
suscetibilidade a Hemileia e são desig- sistência durável. Este tipo de resistência
vastatrix teve disseminação
nados por SH1, SH2, SH3, SH4, SH5, SH6, torna-se ainda mais importante, quando se
muito rápida, a partir da data de
SH7, SH8 e SH9. Atualmente admite-se ha- trata de culturas perenes como o café. O
sua constatação no país. Parecia
ver mais fatores genéticos que ainda não processo de melhoramento é ainda mais
que iria tornar as lavouras
foram identificados. inviáveis economicamente e as
lento, devido ao longo ciclo de geração da
medidas tomadas pelo Governo cultura; por outro lado, a substituição da
Tipos de Resistência: Brasileiro evidenciaram essa lavoura, quando a resistência da cultivar é
Específica e Não-Específica preocupação. Seguindo a sua superada, não apresenta a mesma flexibili-
Segundo vários pesquisadores a re- rápida marcha, em 1971 o fungo dade de uma cultura anual, devido ao alto
sistência caracteriza um estado relativo H. vastatrix raça II alcançou os custo de implantação de novos cafeeiros.
do nível da moléstia, sendo sua expressão Estado de São Paulo e Paraná A ferrugem alaranjada tem apresenta-
máxima a hipersensibilidade, representa- e, posteriormente, outros do considerável variação na patogenicida-
da por “flecks”, clorose e no máximo pon- estados brasileiros com culturas de, com cerca de 45 raças fisiológicas já
tos necróticos, e a imunidade representada cafeeiras. A sua disseminação identificadas. A formação de novas raças
pela ausência de sintomas da moléstia. A foi tão rápida, que num período de ferrugem é um problema iminente, que
resistência pode ser interpretada de várias de cinco a seis anos já tinha se os melhoristas precisam enfrentar cons-
maneiras, em relação ao seu tipo. Assim, alastrado por todas as regiões tantemente e parece estar relacionado com
do ponto de vista genético, a resistência cafeeiras do Brasil. Novas raças a pressão de seleção exercida pelos genes
pode ser devida a oligogenes (genes qua- fisiológicas de ferrugem foram de resistência do hospedeiro.
litativos) ou poligenes (quantitativos). Em sendo detectadas. Apesar dos grandes avanços ocorridos
termos fenotípicos, ela pode ser completa Até o presente, foram no melhoramento para resistência à ferru-
ou incompleta (total ou parcial). No senti- detectadas, no Brasil, 13 raças gem, ao longo de vários anos de pesqui-
do de durabilidade, a resistência pode ser fisiológicas de H. vastatrix sa, os melhoristas e fitopatologistas têm a
e pelo menos três isolados
temporária ou durável. No que se refere consciência que seus esforços para intro-
que poderão, no futuro, ser
às relações patógeno-hospedeiro, ela pode duzir resistência em cultivares altamente
identificados como novas raças
ser definida como específica ou não espe- produtivas, muitas vezes podem se tornar
fisiológicas. Atualmente, tem-se
cífica, diferencial ou uniforme e vertical efêmeros. Por longo tempo, e ainda nos
verificado a presença de esporos
ou horizontal. de ferrugem em cafeeiros das
dias atuais, a seleção para resistência à fer-
Os termos “resistência vertical” e “re- cultivares Icatu, Catucaí e rugem foi baseada em resistência comple-
sistência horizontal” têm sido amplamente derivadas do Híbrido de Timor, ta, altamente específica, que é usualmente
utilizados no melhoramento de plantas vi- anteriormente considerados controlada por um ou poucos genes. Este
sando resistência às moléstias. A resistên- como resistentes. Portanto, tipo de resistência é muito atrativo aos olhos
cia vertical é caracterizada, principalmen- novas raças fisiológicas do fungo dos agricultores, pois as plantas são, geral-
te, pela presença da interação diferencial poderão estar presentes nessas mente, imunes às raças predominantes no
entre o hospedeiro e o patógeno e, resis- plantações do Brasil ecossistema, para o qual foram desenvolvi-
tência horizontal, pela ausência dessa inte- das. Entretanto, esse tipo de resistência, na

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 49


maioria das vezes, é efêmero, em virtude no alvo. Entretanto, a resistência somente Fontes de Resistência
da evolução de virulência do fungo. pode ser identificada como sendo durável na espécie Coffea arabica
Muitos termos e conceitos têm sido pro- quando a cultivar é extensivamente usa- Inúmeras seleções de cafeeiros C.
postos para descrever outros tipos de resis- da na agricultura por longos períodos de arabica, com resistência a H. vastatrix,
tência. Entre eles são incluídas designações tempo e em ambiente favorável ao desen- foram efetuadas, principalmente em mate-
tais como resistência de campo, intermedi- volvimento da doença. Por essa razão, a rial provindo da Etiópia e Sudão, em vá-
ária, quantitativa, incompleta, parcial, hori- durabilidade da resistência pode apenas rias épocas, originando muitas progênies
zontal, não-específica, etc. Cada um desses ser identificada pelo histórico da cultivar com os fatores genéticos de resistência
termos tem significado e implicações espe- ao longo dos anos de cultivo. O fato é que SH1, SH2, SH4 e SH5. Por outro lado, a se-
cíficos, mas todos eles descrevem um efeito ainda não se conhecem inteiramente as leção de cafeeiros tipo C. arabica, com o
quantitativo sobre a epidemia e, geralmen- causas da resistência durável, nem como fator SH3, foi obtida em germoplasma de-
te, estão envolvidos em herança complexa. distingui-la da resistência não durável, rivado do cruzamento de C. arabica com
O interesse nesses tipos de resistência é nem mesmo que critério usar para decidir C. liberica, evidenciando a origem do fa-
aumentado, pois representa uma esperan- se dada resistência é durável. A questão tor genético SH3 de C. liberica.
ça na obtenção de materiais genéticos com é como identificar resistência durável e Há indicações, na literatura, de fontes
durabilidade mais efetiva contra o patóge- como selecionar para ela. de resistência horizontal ou incompleta
em seleções de C. arabica, principalmen-
te, naquelas originadas da Etiópia e Sudão.
Estes são locais onde, provavelmente, te-
nha-se originado o café arábica e o agente
Fontes de resistência e seu da ferrugem.
A partir de 1954, o IAC passou a ava-
aproveitamento em trabalhos de liar as progênies recebidas da África com
os fatores SH1, SH2, SH3 e SH4. Algumas
melhoramento desenvolvidos no IAC revelaram pouco adaptadas nas condições
do Brasil e outras tiveram produção seme-
lhante ao ‘Bourbon Vermelho’. O aprovei-
O programa de melhoramento do cafeeiro, visando resistência ao
tamento do material introduzido foi efetu-
agente da ferrugem, desenvolvido no IAC e iniciado em 1950, ado, culminando com o lançamento, em
vinte anos antes do aparecimento da doença no país, era e vem 1975, da cultivar Iarana, originada pela
mistura mecânica de sementes de cafeei-
sendo dirigido para vários propósitos: (a) aproveitamento dos ros homozigotos, para os fatores de resis-
fatores de resistência encontrados em introduções de C. arabica, tência SH1SH1, SH2SH2, SH3SH3 e SH4SH4,
simples ou principalmente associados, buscando a seleção de mas com características agronômicas se-
melhantes. Infelizmente, esta cultivar não
cafeeiros produtivos com estes genes; (b) seleção em populações teve aceitação pelos produtores, pois trata-
F2 e outras gerações mais avançadas de ‘Mundo Novo’, ‘Acaiá’ va-se de material menos produtivo do que
e ‘Catuaí’ com os fatores SH1, SH2, SH3, SH4, SH5 simples ou as cultivares Mundo Novo e Catuaí.
Dessa maneira, centenas de combina-
associados; (c) aproveitamento da resistência encontrada em ções híbridas foram obtidas, tanto com a
cafeeiros Híbridos de Timor (genes SH6, SH7, SH8, SH9 e outros finalidade de associar os fatores SH1, SH2,
ainda não identificados), seus derivados e germoplasma ‘Icatu’, SH3 e SH4, como para a sua transferência
às cultivares comerciais Mundo Novo,
que apresentavam resistência a todas as raças fisiológicas Acaiá, Catuaí Vermelho e Catuaí Amare-
conhecidas de H. vastatrix. No entanto, em poucos anos novas lo de C. arabica. Muitas progênies foram
raças fisiológicas de H. vastatrix foram sendo detectadas e os obtidas e estão plantadas em experimentos
e campos de seleção. Algumas seleções de
cafeeiros que tinham os fatores genéticos SH1, SH2 e SH4 simples ‘Mundo Novo’ e ‘Catuaí’, com o fator SH1
ou associados passaram a ser suscetíveis. Este fato levou os e SH2, mostraram-se muito produtivas.
pesquisadores, que trabalham com o melhoramento do cafeeiro Com o aparecimento de raças com os fato-
res de virulência v1v5 (raça III) e v2v5 (raça
no IAC, a concentrarem os trabalhos em plantas que tinham o I), essas seleções perderam o interesse. No
gene SH3 e derivadas do Híbrido de Timor e, principalmente, entanto, várias combinações de ‘Catuaí’,
do germoplasma ‘Icatu’, os quais, além de possuírem genes com fatores SH1 e SH3, estão se mostrando
muito promissoras. De qualquer maneira,
que conferem resistência específica a determinadas raças, têm as progênies derivadas dessas hibrida-
também genes que condicionam resistência não-específica, ções estão sendo mantidas em condições
de campo, visando o seu aproveitamento,
talvez mais durável. A associação destes tipos de resistência
também, em relação a características agro-
também tem sido buscada, procurando resistência mais nômicas importantes, tais como, matura-
duradoura à ferrugem. ção, resistência a outras doenças e quali-
dade da bebida.

50 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


No Híbrido de Timor
e Seus Derivados
Um outro provável híbrido natural
entre C. canephora e C. arabica, com
resistência a H. vastatrix, foi encontrado
na Ilha de Timor, na década de 1940/49,
na plantação de C. arabica cv. Típica. A
planta original foi designada com o nome
de Híbrido de Timor ou Moca. O primei-
ro nome referia-se ao local de origem e
o segundo, foi atribuído devido ao fato
Tupi IAC 1669-33 Híbrido F1 (Tupi X Icatu) que este cafeeiro originava, em sua des-
cendência, elevada quantidade de frutos
Em Espécies Diplóides feeiro Robusta IAC 37, conferindo resis- arredondados ou do tipo moca. Estudos
A resistência de cafeeiros à ferrugem, tência a H. vastatrix. Foi ainda constatado desenvolvidos no CIFC verificaram que
nas espécies diplóides, tem sido detecta- que os quatro genes condicionam uma rea- se tratava de material muito valioso para
da com maior freqüência, principalmente, ção tipo moderadamente resistente (MR), o programa de melhoramento, devido ao
em C. canephora, C. congensis, C. dewe- quando em condição heterozigótica. fato de aqueles cafeeiros mostrarem-se re-
vrei e C. liberica. Desde há muito tempo, sistentes a todas as raças de H. vastatrix
já se conhecia esta resistência, pois em Em Derivados do Híbrido conhecidas, até então, no CIFC.
muitos locais onde H. vastatrix teve um C. arabica x C. liberica
efeito drástico, as plantações de C. arabi- No IAC, muitos híbridos intraespe-
ca foram substituídas por seleções de C. cíficos foram produzidos entre cafeeiros
canephora e C. liberica. De todas as es- portadores do gene SH3, com as cultivares
pécies utilizadas, C. canephora foi a mais Mundo Novo, Acaiá, Catuaí Vermelho e
importante e responsável pela restauração Catuaí Amarelo de C. arabica, tentando
da cafeicultura em Java e em muitos ou- transferi-lo para estas cultivares comer-
tros países. ciais. Estes trabalhos geraram populações
O aproveitamento das fontes de resis- derivadas dessas hibridações, resultando
tência das espécies diplóides, nos progra- em progênies altamente produtivas, com
mas de melhoramento visando resistência ótimas características agronômicas e pos-
a H. vastatrix, ficou relativamente mais suindo o gene SH3. Outras característi-
fácil com a possibilidade de duplicação do cas de interesse, como tolerância à seca,
número de cromossomos dessas espécies. oriundas das introduções IAC 1110 (série
No entanto, não se pode descartar o apro- BA), também estão sendo introgredidas.
veitamento dos cafeeiros resistentes das Estas progênies de porte alto ou baixo
espécies diplóides, pelo cruzamento direto (CtCt), portando o fator SH3 no estado ho-
com a espécie tetraplóide C. arabica. Esse mozigoto, estão em fase final de seleção e
procedimento irá resultar, inicialmente, avaliação regional.
cafeeiros triplóides, que poderão ser pos-
Em Derivados do Cruzamento Híbrido F1 (Obatã x Icatu)
teriormente utilizados em retrocruzamen-
tos para o genitor tetraplóide, restaurando C. canephora x C. arabica
a fertilidade dos híbridos obtidos. O estudo de cafeeiros originados de
Além de resistência vertical, que tem hibridação interespecífica C. canephora x
sido constatada em cafeeiros derivados de C. arabica vem desde 1886, apesar de não
C. canephora, detectou-se na cultivar Kou- ter sido efetuado com intensidade muito
ilou, pertencente a esta espécie, altos níveis grande. No início dos estudos, os cafe-
de resistência horizontal ou de campo. eiros híbridos, com resistência a H. vas-
Estudos de herança do cafeeiro IAC tatrix, foram encontrados em condições
37, da cultivar Robusta de C. canephora, naturais, em várias regiões da Indonésia,
resistente a H. vastatrix, foram realizados Índia e Ilha Reunião. Posteriormente, hí-
por meio de hibridações desta planta, com bridos artificiais chegaram a ser utilizados
cafeeiros suscetíveis da cultivar Kouilou, em pequena escala e receberam denomi-
da mesma espécie. O cafeeiro Robusta nações locais.
IAC 37, após sofrer duplicação do número A seguir, são relatados alguns tra-
de cromossomos, foi utilizado no primeiro balhos de melhoramento, realizados no
cruzamento com C. arabica cv. Bourbon IAC, visando o aproveitamento de outros
Vermelho, para obter o germoplasma ‘Ica- cafeeiros derivados do cruzamento inte-
tu’. Foi sugerida a presença de pelo menos respecífico entre Coffea canephora e C.
quatro fatores genéticos dominantes no ca- arabica. Icatu Vermelho

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 51


A partir de 1960, clones e progênies centros de pesquisa com o café, em todo Uma possibilidade que está também
do Híbrido de Timor foram distribuídos o mundo. Inicialmente, estas seleções sendo pesquisada é o plantio do híbrido F1
a vários países cafeicultores. Um vasto não tiveram boa adaptação, nas condi- (Arabusta) entre a cv. Catuaí Vermelho e
programa de cruzamentos com cultivares ções que são estabelecidas as lavouras C. canephora cv. Robusta, com o número
de C. arabica foi iniciado no CIFC, uti- cafeeiras no Estado de São Paulo, apesar de cromossomos duplicados. Estes híbri-
lizando principalmente as plantas CIFC de apresentarem excelente nível de resis- dos F1 são altamente resistentes às raças
832/1 e CIFC 832/2, resultando em ma- tência ao agente da ferrugem. Em segui- de ferrugem prevalecentes nas parcelas
terial genético muito importante. O ger- da, verificou-se que no germoplasma de experimentais e em campos de seleção.
moplasma resultante das hibridações de Híbrido de Timor havia ocorrência dos As plantas matrizes (futuros clones) estão
cultivares de C. arabica com cafeeiros fatores genéticos SH5, SH6, SH7, SH8 e sendo propagadas vegetativamente via es-
Híbrido de Timor, de várias gerações, SH9, associados ou não, conferindo resis- taquia ou cultura de tecidos. Atualmente,
passou a ser distribuído para os diversos tência a H. vastatrix. está sendo estudada a viabilidade prática
do plantio de vários clones F1, originados
dos cruzamentos com diferentes plantas de
Níveis de resistência incompleta ou café Robusta com o número de cromosso-
mos duplicados. Com o aquecimento glo-
parcial têm, também, sido detectados em bal, estes clones de Arabusta e híbridos de
Icatu com Catuaí assumem grande impor-
cafeeiros Híbrido de Timor e seus derivados tância, pois trata-se de cafeeiros tolerantes
a altas temperaturas.
O IAC recebeu do CIFC, a partir de 1968, numerosas progênies F2 e F3,
derivadas dos mais diversos cruzamentos de Híbrido de Timor com cultivares Em Germoplasma Oriundo
de C. arabica e outras derivadas do retrocruzamento para C. arabica cv. Ca- de Cruzamentos Complexos
tuaí ou Mundo Novo. Este trabalho resultou, em 2000, no lançamento das cul- Envolvendo Várias Fontes
tivares Tupi IAC 1669-33 e Obatã IAC 1669-20 (derivadas do híbrido CIFC de Resistência
H 361/4). Até o presente, estas duas cultivares têm se mostrado resistente No IAC, numerosos cruzamentos
às raças de ferrugem prevalecentes no Brasil. No IAC, muitos cruzamentos complexos foram e vêm sendo realizados
foram também realizados entre Híbrido de Timor CIFC 832/1, CIFC 832/2 e desde a década de 80, tentando incorporar
outros, principalmente com as cultivares Catuaí, Mundo Novo, Acaiá e Icatu. os genes SH1, SH2, SH3, SH4 e SH5 sim-
Muitas progênies estão em seleção bem adiantada, acumulando resistência ples ou associados com os do Híbrido
de Timor e do ‘Icatu’ (SH6, SH7, SH8, e
específica e não-específica nos genótipos. Outras características como porte
SH9), formando combinações genotípicas
baixo, vigor, produtividade, diferentes tipos de maturação, sementes maio-
complexas. Estes genótipos estão sendo
res e qualidade da bebida semelhante às cultivares comerciais, também estão estudados quanto à resistência à ferru-
sendo incorporadas. Outros cruzamentos mais complexos foram efetuados, gem, produtividade, vigor, enfolhamento,
incluindo neles, fontes do gene SH3. Dessa maneira, será possível a obtenção rendimento, características tecnológicas e
de cultivares de café derivadas do Híbrido de Timor e/ou com o gene SH3, químicas, qualidade da bebida, tolerância
com resistência mais durável à ferrugem. às condições adversas do ambiente (seca e
calor) e outras características agronômicas
de interesse. Muitas progênies foram se-
No germoplasma Arabusta, espresso, pois é provavelmente derivada lecionadas e continuam sendo submetidas
Icatu e seus derivados de um cruzamento natural com Bourbon à seleção. Espera-se, com isto, selecionar
Em 1950, no Brasil, foi efetuado o Amarelo. Na época, estas cultivares eram progênies com resistência à maior parte
cruzamento de um cafeeiro C. canephora resistentes às raças prevalecentes. No das raças de ferrugem, tanto com genes
cv. Robusta, com o número de cromosso- entanto, com o passar do tempo e com o de resistência específica quanto não-es-
mos duplicados, com um cafeeiro C. ara- aparecimento de novas raças de ferrugem, pecífica. O acúmulo de maior número de
bica cv. Bourbon Vermelho, obtendo-se esses genótipos passaram a evidenciar genes de resistência em um mesmo genó-
o híbrido F1 (Arabusta). Posteriormente, apenas sua resistência moderada ou par- tipo, oriundos de diferentes fontes, poderá
dois retrocruzamentos para C. arabica cv. cial. Portanto, conforme principalmente proporcionar o surgimento de resistência
Mundo Novo foram efetuados, resultando o local plantado, nível de produção e a mais duradoura.
no germoplasma ‘Icatu’, que apresenta presença destas novas raças, as cultiva- O ideal é ter no mesmo genótipo to-
plantas com enorme variabilidade para re- res Icatu Vermelho, Icatu Amarelo e Icatu dos os genes SH1 até SH9 e outros de re-
sistência a H. vastatrix. As plantas de ‘Ica- Precoce podem manifestar apenas a sua sistência parcial. Como a probabilidade
tu’ exibem diferentes níveis de resistência resistência de campo. Ainda não se pode disto ocorrer na prática é muito pequena,
à ferrugem e, também, amplas possibilida- avaliar se será uma resistência durável podem-se obter genótipos com diferentes
des de seleção para outras características ou não. No entanto, grande parte dos ca- fatores de resistência, mas com qualidades
de interesse agronômico feicultores não consegue entender como agronômicas semelhantes. Neste caso, po-
Em 1992, o IAC colocou à dispo- isto ocorreu. Atualmente, novas seleções der-se-ia utilizar um esquema de mistura
sição dos produtores as cultivares Ica- do germoplasma ‘Icatu’ estão sendo efe- de progênies com diferentes fatores de
tu Vermelho (várias linhagens), Icatu tuadas em progênies ainda resistentes às resistência, mas semelhantes quanto à ma-
Amarelo (várias linhagens) e, em 1996, raças prevalecentes, evidenciando serem turação, produção e outras características
a cultivar Icatu Precoce IAC 3282, de portadoras de maior número de genes que agronômicas, em um esquema semelhante
excelente qualidade de bebida para café conferem resistência específica. ao utilizado na cultivar Colômbia (multili-

52 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


nhas). Este esquema poderá proporcionar tam 100% de plantas resistentes, mas na dores não é usar multilinhas, pois a varia-
resistência mais duradoura à ferrugem. maioria dos casos ocorrem progênies com bilidade para resistência já existe dentro da
Estes híbridos complexos poderão, tam- certa porcentagem de plantas resistentes, própria progênie. Verificou-se no germo-
bém, ser multiplicados vegetativamente associadas a plantas com graus intermedi- plasma Icatu, que o nível de heterozigozi-
para uso direto pelos cafeicultores. ários de resistência (resistência parcial). A dade, em gerações avançadas, varia com
proporção de cafeeiros suscetíveis nestas a porcentagem de cruzamento natural. No
Utilização de Híbridos F1 progênies tem sido, de modo geral, em Icatu essa heterozigozidade deve ficar em
com Vários Fatores de torno de 10%. equilíbrio em níveis médios a partir da ge-
Resistência à Ferrugem Pode-se admitir que o germoplasma ração F5RC2, em virtude da taxa mais ele-
Diante das dificuldades práticas de Icatu, além dos genes SH5, SH6, SH7, SH8 vada de cruzamento natural do ‘Icatu’, em
incorporar, em condições homozigóticas, e SH9, possua um ou mais fatores genéti- relação a C. arabica. Sugere-se, portanto,
a maior parte dos genes SH1 a SH9, que cos, que conferem resistência ao agente da o plantio, em nível comercial, de várias
conferem resistência à ferrugem em deter- ferrugem. Estudos com o cafeeiro robusta progênies de Icatu, de derivados de Híbri-
minados genótipos, está sendo desenvol- original, que foi utilizado no primeiro cru- do de Timor e de híbridos complexos, na
vido, no IAC, um projeto de melhoramen- zamento, sugeriram a presença, em nível mesma propriedade, mas em lotes separa-
to visando esta incorporação. Para isto, diplóide, de 3 a 4 fatores genéticos confe- dos. Devem-se utilizar, preferencialmen-
têm-se utilizado híbridos F1 resultantes de rindo resistência a H. vastatrix. Tem sido te, progênies com tipos diferenciados de
cruzamentos de cafeeiros das cultivares possível, também, estimar o número de maturação, para se ter melhor distribuição
Tupi IAC 1669-33, Obatã IAC 1669-20 genes em progênies de Icatu e derivados em relação à maturação dos frutos. Como
(derivadas do Híbrido de Timor) com Ica- de Híbrido de Timor. Essas estimativas conseqüência, proporcionar a colheita de
tu Vermelho. Estes híbridos F1 são auto- são feitas a partir de análises da porcenta- maior quantidade de frutos maduros, o
férteis, apresentam heterose para caracte- gem de cafeeiros suscetíveis, pertencentes que deverá acarretar em melhor qualidade
rísticas agronômicas de interesse, como ao grupo fisiológico E, em gerações F2 e do produto final. Com o plantio de lotes
vigor vegetativo e produção, e reúnem em de retrocruzamentos. Foi possível estimar separados, poder-se-á verificar o apareci-
um determinado genótipo os genes dos de um a quatro genes conferindo resistên- mento de novas raças, bem como acompa-
diferentes genitores envolvidos nas hibri- cia às progênies de Icatu em seleção. nhar a evolução do agente da ferrugem em
dações. Outros cruzamentos de cafeeiros De outra parte, níveis de resistência cafeeiros suscetíveis. Pois, foi verificado
SH3 com ‘Icatu’ também foram realizados, parcial ou incompleta têm sido detectados que os cafeeiros suscetíveis de Icatu pos-
com resultados auspiciosos. Alguns dos com freqüência nos cafeeiros Icatu. A re- suem maior enfolhamento do que aquele
genitores, além da resistência à ferrugem, sistência parcial no germoplasma Icatu pa- encontrado em cafeeiros suscetíveis dos
possuem resistência ao nematóide Meloi- rece estar associada a um ou poucos genes. cultivares Bourbon Amarelo e Mundo
dogyne exigua e outros, ao bicho mineiro Alguns pesquisadores relatam que a sele- Novo. Esse maior enfolhamento poderá
(Leucoptera coffeella). Dessa maneira, os ção para resistência incompleta (parcial) contribuir para reduzir, de maneira acentu-
híbridos F1 com resistência múltipla (am- no germoplasma Icatu, poderá conduzir à ada, os prejuízos causados pela moléstia.
pla resistência à ferrugem, nematóide e resistência não durável. Sugerem, ainda, O mesmo ocorre com progênies derivadas
bicho mineiro) poderão ser multiplicados que seleção fenotípica de cafeeiros Icatu, do Híbrido de Timor, especificamente,
vegetativamente via estaquia ou cultura de com tipo de reação altamente resistente, Obatã IAC 1669-20 e Tupi IAC 1669-33.
tecidos. Estes híbridos serão também ava- poderia facilitar o acúmulo de vários ale- Até o presente, essas cultivares são re-
liados para resistência à seca e ao calor. los de resistência em cada genótipo. Isso sistentes a todas as raças de ferrugem pre-
seria, evidentemente, uma barreira contra valecentes no Brasil. É importante ressal-
Utilização de Cultivares a formação de novas raças de H. vastatrix. tar, também, que muitas progênies de ca-
Resistentes O mesmo tem ocorrido em cafeeiros deri- feeiros derivadas de cruzamentos de ‘Ca-
Existem controvérsias entre os pes- vados do Híbrido de Timor. turra’, ‘Villa Sarchi’, ‘Catuaí’e ‘Mundo
quisadores que trabalham com resistência Portanto, como se pode notar, as Novo’ com Híbrido de Timor apresentam,
de plantas às moléstias, no sentido de qual progênies de Icatu e os derivados do Hí- além de resistência específica, um tipo de
seria o melhor caminho a ser tomado, para brido de Timor têm enorme diversidade resistência de campo. O aproveitamento
conviver, por tempo maior possível, com em relação à resistência a H. vastatrix. É desses dois tipos de resistência parece ser
determinada moléstia, utilizando cultiva- fundamental preservar essa diversidade, a melhor alternativa para se obter resistên-
res resistentes (resistência durável). Con- quando se pensa na utilização de cultiva- cia mais duradoura à ferrugem alaranjada
vém assinalar, que as interpretações dos res de café com resistência a H. vastatrix, do cafeeiro.
tipos de resistência são as mais diversas pelo cafeicultor. Essa talvez seja a base
e, desta maneira, uma definição epidemio- para se conseguir resistência durável, que Luiz Carlos Fazuoli, Masako Toma Bra-
lógica para resistência às moléstias pode forneça maior estabilidade em termos de ghini, Maria Bernadete Silvarolla e An-
ser muito importante. O conhecimento da preservar o nível de resistência no plantio tonio Carlos Baião de Oliveira
virulência e da agressividade das novas comercial. Dessa maneira, nos trabalhos Instituto Agronômico, Centro de Café
raças de ferrugem, que podem ocorrer, de seleção desenvolvidos no IAC, estão se “Alcides Carvalho”
deverá ser um fator importante a ser con- aproveitando todos os tipos disponíveis de ( (19) 3241-5188 ramal 370
siderado nos trabalhos de melhoramento, resistência à ferrugem. * fazuoli@iac.sp.gov.br;
visando resistência mais duradoura. No caso do café Icatu, Catuaí SH3, * mako@iac.sp.gov.br;
No caso do cafeeiro Icatu, existem Mundo Novo SH3 e derivados do Híbrido * bernadet@iac.sp.gov.br;
progênies da geração F5RC2 que apresen- de Timor, a sugestão de alguns pesquisa- * baiao@iac.sp.gov.br

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 53


A luta contra
a doença causada pelos
nematóides parasitos

do cafeeiro
Wallace Bernadete

A
produtividade média da cafeicultura brasileira vem e paranaense. Nessas regiões, M. incognita e M. paranaensis
apresentando avanços, estando hoje na faixa de 16 sacas associadas ou não a nematóides do gênero Pratylenchus são as
de café beneficiado por hectare, porém, muito abaixo espécies que vêm causando maiores danos. A ampla dissemina-
da sua real potencialidade e dos valores alcançados por muitos ção, a notável capacidade de destruir o sistema radicular, a alta
cafeicultores. Sabe-se que o custo de produção apresenta es- persistência no solo, o grande número de plantas hospedeiras,
treita correlação com o nível de produtividade das lavouras. As a existência de raças fisiológicas (M. incognita), além da into-
despesas fixas, que são muitas, oneram mais os plantios menos lerância das cultivares de Coffea arabica a esses parasitos fa-
produtivos e reduzem a competitividade da cafeicultura de um zem com que esses nematóides constituam fator limitante tanto
modo geral. Desta forma, é importante produzir café com efici- para a implantação de cafezais em áreas onde ocorrem (Figura
ência e para isso, os principais fatores relacionados à produção 1) quanto para a manutenção daqueles já contaminados (Figura
devem ser bem conhecidos, de forma a permitir que se obtenha 2). Outra importante espécie de nematóides é M. exigua, que
o máximo proveito dos parâmetros favoráveis ou se contorne, da forma galhas típicas nas raízes sem, contudo, destruir o sistema
melhor maneira, aqueles que se apresentam como limitantes à radicular, o que torna seus danos menos graves, podendo mui-
sustentabilidade da cultura. tas vezes até passar despercebida, principalmente em cafezais
É fundamental, portanto, o conhecimento dos fatores de pro- instalados em solos férteis, onde as perdas locais são menores
dução que se apresentam como limitantes ou “gargalos” no pro- (Figura 3). Entretanto, embora não seja tão patogênica quanto as
cesso produtivo do café, sendo que estes podem variar de acordo outras espécies de Meloidogyne, provavelmente, M. exigua seja
com a região ou propriedade rural. Dentre esses fatores pode-se o fitonematóide que causa as maiores perdas totais à cafeicultura
citar a ocorrência de fitonematóides, antiga ameaça aos cafezais brassileira em função de encontrar-se amplamente disseminado
descrita por Goeldi em 1887, associando Meloidogyne exigua ao nas lavouras das principais regiões produtoras de café, mesmo
deperecimento de cafezais da então Província do Rio de Janeiro naquelas emergentes e promissoras.
e provocando a substituição da cultura cafeeira pela da cana-de- O controle dos fitonematóides é, de maneira geral, difícil de
açúcar. Mesmo considerando o ser realizado. Deve-se ter em
valor histórico desse trabalho mente que estando a área já
e seu pioneirismo no Brasil, contaminada, sua erradicação
relatando os danos da doença é praticamente impossível.
causada por um fitonematóide Entretanto, esses parasitos po-
para uma cultura de interesse dem, muitas vezes, ter suas po-
econômico, ainda hoje os ne- pulações reduzidas e mantidas
matóides têm sua importância em níveis baixos através da in-
subestimada como parasitos tegração de medidas de contro-
do cafeeiro. le. Para tanto, dois elementos
Diversas espécies repre- são essenciais: a observação
sentando vários gêneros de fi- e utilização dos fatores que
tonematóides têm sido encon- limitam o desenvolvimento e
tradas associadas às raízes de reprodução dos fitonematóides
cafeeiros no Brasil, sendo que e a tolerância das plantas a cer-
as espécies dos gêneros Meloi- tos níveis populacionais. Como
dogyne e Pratylenchus são as alimento, a planta é um dos
mais prejudiciais à cafeicultura fatores mais importantes no
do Brasil. Atualmente, as áre- desenvolvimento da população
as mais afetadas pela presen- de um fitonematóide, condi-
ça desses parasitos são as de cionando a ocorrência dessa
solos arenosos e degradados Figura 1. Sintomas da parte aérea em lavoura doença em caráter epidêmico
física, química e biologica- de Icatu Vermelho IAC 4045 instalada em solo infestado por Meloidogyne ou não, em função do nível de
paranaensis. Fazenda Santo Antônio - Herculândia, SP.
mente da cafeicultura paulista resistência apresentado.

54 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


A adoção e o êxito de qualquer Ao contrário do que se verifica
estratégia de manejo dependerão em C. arabica, as pesquisas têm mos-
essencialmente da identificação trado que fontes de resistência aos
correta da(s) espécie(s) e/ou raça(s) nematóides do gênero Meloidogyne
de nematóides presentes na gleba ou estão presentes em outras espécies
cafezal em que se deseja realizar o de café, como em C. canephora, po-
manejo desses parasitos. Depende- rém, as plantas, em sua grande maio-
rá também de análise crítica de sua ria, segregam para a resistência. Das
aplicabilidade, em função do nível populações segregantes foram sele-
tecnológico e econômico do cafei- Figura 2. Sintomas na parte aérea, em reboleira, em lavoura cionados, em condições de campo e
cultor, das condições de condução adulta da cultivar Mundo Novo IAC 376-4 infestada por casa-de-vegetação, cafeeiros resisten-
da lavoura, da possibilidade de mu- Meloidogyne paranaensis. Fazenda Boa Vista - Pompéia, SP. tes (Figura 4), sendo que alguns deles
dança de atividade agrícola em par- apresentam resistência simultânea a
te da propriedade, ou mesmo perda periódica de receita. As algumas populações de M. incognita, M. exigua e M. paranaen-
instituições de pesquisa agropecuária, dentre essas o IAC, vêm sis. No entanto, o que se vem observando é que a resistência do
desenvolvendo tecnologias que visam reduzir os prejuízos cau- cafeeiro a nematóides formadores de galhas é, de maneira geral,
sados pelos fitonematóides a nossa cafeicultura. Entretanto, es- específica à espécie ou raça. Os cafeeiros selecionados são resis-
sas ações necessitam de maiores suportes financeiro e humano, tentes aos parasitos sem, contudo, serem imunes a eles, e ainda
uma vez que, com a evolução das técnicas de identificação de apresentam uma taxa de segregação para suscetibilidade de 10 a
nematóides, provavelmente, nova(s) espécie(s) e/ou raça(s) se- 15%, fato esperado em decorrência do próprio sistema reproduti-
rão encontradas associadas ao sistema radicular dos cafeeiros. vo de C. canephora, que apresenta fecundação cruzada.
Assim, as medidas de controle tais como recomendações de A utilização da técnica de enxertia hipocotiledonar, usan-
cultivares resistentes, rotações de culturas e controle biológico do-se como porta-enxertos cultivares de C. canephora resis-
devem ser constantemente aprimoradas, visto que os genes de tentes a nematóides, permitiu a utilização pelo cafeicultor das
resistência, certas plantas antagonistas e agentes de controle fontes de resistência a curto prazo. Assim, mesmo com alguns
biológico do tipo Pausteria são específicos e não podem ser inconvenientes apresentados pelas mudas enxertadas, como a
utilizados para todas as espécies de Meloidogyne. Aliadas a segregação para suscetibilidade, a pequena taxa de quebra do
isso, medidas fitossanitárias devem ser adotadas para evitar a cavaleiro na região da enxertia, a maior porcentagem de replan-
introdução desses parasitos em áreas não infestadas. tio (15-20%) e a utilização somente em áreas de renovação ou
Os trabalhos de pesquisas que visam ao manejo dos ne- replantio, a tecnologia desenvolvida pelo IAC ofereceu aos ca-
matóides parasitos do cafeeiro em execução no Centro de Café feicultores, desde 1987, uma alternativa para plantio de café em
Alcides Carvalho, do IAC, visam principalmente ao desenvolvi- áreas infestadas por alguns nematóides. Experimentos condu-
mento de cultivares de café com resistência a nematóides, para zidos em áreas infestadas do Estado de São Paulo indicaram
serem utilizados de maneira integrada com outras táticas de ma- que há compatibilidade normal na enxertia desses porta-enxer-
nejo de nematóides. A baixa eficiência de algumas dessas táticas tos selecionados e em seleção pelo IAC com as cultivares de C.
de manejo na cultura cafeeira, a facilidade de adoção, o nível arabica suscetíveis à ferrugem, tais como Mundo Novo, Catuaí,
de melhoramento alcançado pela cultura e a disponibilidade de Ouro Verde e outras, ou resistentes, como Icatu, Obatã, Tupi
um banco de germoplasma de Coffea com grande variabilidade e outras. Além disso, verificou-se que a cultivar Mundo Novo
genética com relação a agentes parasitos do cafeeiro foram re- enxertada em plantas resistentes a M. exigua, M. incognita e M.
quisitos considerados para o início dessas pesquisas, já em 1968, paranaensis produziu, em média, 37, 442 e 590% a mais que os
na então Seção de Genética do IAC. cafeeiros de pé franco, respectivamente.

Figura 3. Cafeeiros da cultivar Mundo Novo IAC 376-4 Figura 4. Clones de C. canephora resistentes
implantados em solo infestado por Meloidogyne exigua, sob manejo (A) e a Meloidogyne paranaensis, selecionados em condições de campo.
testemunha (B). Fazenda Santo Amaro - São Sebastião do Paraíso, MG. Fazenda Delícia - Cássia dos Coqueiros, SP.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 55


Figura 5. Cafeeiros da cultivar Obatã IAC 1669-20 enxertados Figura 9. Cafeeiros de pé franco da cultivar
em porta-enxerto selecionado pelo IAC (A) e de pé-franco (B), Icatu Vermelho IAC 3888, resistentes e/ou tolerantes
implantados em solo infestado por Meloidogyne exigua. a M. paranaensis (A) e cafeeiros suscetíveis da cultivar
Fazenda Santa Lúcia – Itirapuã, SP. Obatã IAC 1669-20 (B). Fazenda Santo Antônio - Herculândia, SP.

Figura 6. Cafezal
Essa tecnologia vem se mostrando eficiente, adequada e
formado pela cultivar com boa relação custo/benefício, visto que o rendimento propor-
Mundo Novo IAC cionado pelo aumento de produtividade propicia aos cafeiculto-
388-17-1 enxertado res condições financeiras para cobrir o custo envolvido com a
no porta-enxerto
Apoatã IAC 2258 (A) sua adoção (Figuras 5, 6, 7). Desta forma, sendo pouco onerosa,
e de pé-franco (B), segura, não poluente e que pode ser utilizada aliada a diversas
em solo infestado técnicas de manejo de nematóides (Figura 8), essa tecnologia
por Meloidogyne contribui para a sustentabilidade da cultura cafeeira em áreas
incognita, após 21 anos
de campo. Fazenda infestadas por nematóides, ou seja, permite a obtenção de maior
Boaventura - Gália, SP. produtividade a custos menores, tanto do ponto de vista econô-
mico e social como ambiental.
A médio e longo prazos também deverá ser aumentada a
utilização das fontes de resistência detectadas em outras espé-
cies de café, lançando-se mão de hibridações interespecíficas,
seguidas de várias gerações de retrocruzamentos para C. arabi-
ca, acompanhadas de seleções para resistência aos nematóides e
demais caracteres agronômicos de interesse.
As populações derivadas de cruzamentos entre C. arabica
e C. canephora, como Icatu, Sarchimor e outras, vêm sendo in-
tensivamente estudadas em relação à reação ao agente causador
da ferrugem Hemileia vastatrix, tendo sido identificadas muitas
plantas resistentes ao fungo. Paralelamente, tem-se verificado
que essas populações apresentam também plantas resistentes e/
Figura 7. Cafeeiros Icatu Vermelho IAC 4045 enxertados em porta- ou tolerantes a M. exigua, M. incognita e M. paranaensis (Figu-
enxerto selecionado pelo IAC (A) e de pé-franco (B), em solo infestado por ra 9), porém, ainda segregando para a característica. Além disso,
Meloidogyne paranaensis. Fazenda Santo Antônio - Herculândia, SP. foram encontradas algumas seleções de Icatu e Sarchimor com
boas características agronômicas e já homozigotas para resistên-
cia a M. exigua, e apresentando bom potencial para se tornarem
opções de cultivares resistentes para plantio de pé-franco.
Finalmente, deve ser ressaltado que todos os valiosos re-
sultados até o momento alcançados nesta área só foram possí-
veis em decorrência da tradicional e proveitosa parceria entre
a pesquisa e a assistência técnica, tanto oficial como particular,
todas apoiadas pelos cafeicultores. Estes últimos são parceiros
fundamentais, uma vez que colocam à disposição toda a infra-
estrutura que possibilita o desenvolvimento de um trabalho re-
gionalizado e de longo prazo.

Figura 8. Lavoura formada pela cultivar Mundo Novo IAC 388-17-1 Wallace Gonçalves e Maria Bernadete Silvarolla
enxertada em porta-enxertos selecionados pelo IAC e conduzida de forma Instituto Agronômico, Centro de Café “Alcides Carvalho”
integrada a estratégias de manejo tais como rotação e cultura intercalar
com mucuna-preta e matéria orgânica, em área infestada com ( (19) 3241-5188 ramal 366
Meloidogyne paranaensis. Fazenda Santo Antônio - Herculândia, SP. * wallace@iac.sp.gov.br; bernadet@iac.sp.gov.br

56 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


A composição química do café e as

características da bebida e do grão


Até alguns anos atrás pouco se conhecia sobre as instâncias, ele contém, além de cafeína, consideráveis
relações existentes entre os componentes químicos do concentrações de compostos antioxidantes, lipídeos,
café e as características do grão e da bebida. Mesmo não proteínas e carboidratos. Encontram-se também no café
conhecendo as propriedades intrínsecas ao grão respon- cru vitaminas, minerais, água e ácidos, como o cítrico e
sáveis pelos resultados finais, as tecnologias da cafei- o fosfórico, por exemplo.
cultura brasileira foram aos poucos se adaptando para a
produção de cafés de maior qualidade. Com esse intuito, A coloração do café cru
tem se observado, por exemplo, que o café Natural vem Terezinha Um dos quesitos considerados na determinação do
cedendo espaço para o café Cereja Descascado, e que o valor comercial do café cru é o seu aspecto visual. Nele
café arborizado vem sendo pesquisado como alternativa também se baseia a divisão do produto cru em classes
para o cultivo a pleno sol. segundo a Instrução Normativa n0 8 de 2003, que defi-
Mais recentemente, equipamentos analíticos de alta ne os cafés comercializados com o governo federal. De
resolução e softwares complexos têm permitido a aná- acordo com esse documento, a coloração do café cru
lise química detalhada de grãos de café e possibilitado, pode ser verde-azulada, verde-cana, verde, amarelada,
com certo sucesso, o estabelecimento de vínculos entre amarela, marrom, chumbada, esbranquiçada ou discre-
eventos relacionados com o produto. Hoje em dia, muitas Valéria pante. Já foram feitas algumas tentativas de identificar
pesquisas vêm sendo feitas com o objetivo de identificar com- os compostos responsáveis pela coloração do grão, mas nenhuma
postos que expliquem ou que tenham relação com as diferenças conclusão parece ser até hoje inquestionável. Há grande tendên-
encontradas entre os cafés de altitude e os de regiões baixas, cia de se relacioná-la de alguma forma com os ácidos clorogê-
entre os cafés verdes e maduros, entre os cafés preparados pelos nicos presentes no grão, entendendo-se por ácidos clorogênicos
diferentes processos, incluindo o Natural, o Cereja Descascado o conjunto de pelo menos 18 ésteres de ácido quínico. Alguns
e o Despolpado, entre os grãos adequadamente armazenados e trabalhos indicam, por exemplo, que a coloração variando entre
os mal conservados, entre os cafés com qualidades distintas e verde e marrom se deve à formação de um complexo entre os
entre os obtidos de diferentes cultivares. ácidos clorogênicos e íons de magnésio, de ferro, de cálcio ou de
Análises da composição química de café cru e torrado têm potássio. Outros consideram que ela resulta da mistura de ácidos
possibilitado também a identificação de espécies presentes em clorogênicos em diferentes graus de oxidação e diversamente
cafés torrados e moídos, a avaliação do potencial de exploração coloridos, como o próprio ácido clorogênico e os ácidos virídico
comercial do produto com fins outros que não o do seu emprego e cafetânico, por exemplo. Algumas pesquisas revelam que a va-
como alimento, a melhor compreensão dos efeitos da bebida na riação de cor indo de verde para amarelo, depois marrom e então
saúde do consumidor e a verificação da autenticidade de cafés preto, resulta da diminuição da concentração de ácidos clorogê-
processados. nicos totais, ou mesmo da relação entre as concentrações de pelo
Entre as possíveis aplicações dos resultados das análises menos dois deles. Em trabalhos com cafés secos sob sol, as cores
químicas do grão de café, destacam-se também a interessante amarelada e marrom dos grãos crus já não foram atribuídas aos
classificação quanto à origem e a seleção de cultivares promis- ácidos clorogênicos, mas sim a polímeros do álcool diterpênico
soras para o desenvolvimento de cafeeiros com características cafestol. Nestes mesmos trabalhos foi considerada a hipótese de
pré-definidas. a cor verde-azulada se dever à formação de polímeros do tam-
A ampla utilização dos resultados dessas pesquisas, segun- bém álcool diterpênico denominado kahweol.
do apontado, é possível porque tudo o que ocorre com o café é É consensual que o branqueamento do grão de café é re-
resultado da composição química do grão, seja ele cru ou tor- sultado de injúrias no endosperma, mas, novamente, os ácidos
rado. Partindo dessa premissa, é interessante conhecer como clorogênicos estão envolvidos com a constatação. Nos cafés
diferentes fatores bióticos e abióticos interferem na química do branqueados, os ácidos clorogênicos se apresentam em menor
cafeeiro, e numa etapa posterior procurar correlacioná-la com as concentração, as proporções entre eles se encontram alteradas
características da bebida, com o aspecto do grão e com o valor e, adicionalmente, se observa redução da atividade da enzima
comercial potencial da cultivar. polifenoloxidase
Entre os compostos presentes no grão de café encontra-se
a cafeína. Este é o composto naturalmente presente no grão e A bebida
na bebida que há mais tempo vem sendo estudado e explorado Os componentes químicos do grão de café definem a quali-
industrialmente. A cafeína é agregada a medicamentos, é em- dade da bebida tanto do ponto de vista sensorial quanto do ponto
pregada na formulação de bebidas energéticas e é, também, a de vista de saúde do consumidor.
responsável pelos efeitos estimulantes do cafezinho. Ela foi o Até pouco tempo, a qualidade sensorial do café era avaliada
primeiro composto de café isolado e quantificado, e o fato de se pela “prova de xícara” através das características de corpo, be-
encontrar em concentrações não tão baixas e poder ser quanti- bida, acidez, amargor, doçura, aroma, adstringência e qualidade
ficada por metodologia analítica mais simples, certamente fa- global. Atualmente, até pela necessidade de classificar cafés em
voreceram a sua detecção já em 1820. O café cru, porém, não concursos de qualidade, essa avaliação tem sido pormenorizada
contém apenas cafeína. Como tem sido divulgado em diferentes de modo a permitir a diferenciação mesmo entre bebidas de ele-

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 57


vada qualidade e muito semelhantes. Para isso, outros atributos Entre os compostos que se procuram relacionar com as
têm sido avaliados na “prova de xícara”, incluindo sabor, sabor características da bebida, com a espécie do café e com o seu
residual e uniformidade entre xícaras, com descrição detalhada processamento encontram-se também os ácidos. Vários ácidos
de nuances de cada item, que permitem caracterizar ao máximo orgânicos e inorgânicos já foram quantificados em café cru, es-
o produto. Metodologias de análises de qualidade de bebida de tando entre eles os ácidos cítrico, acético, quínico e fosfórico.
café envolvendo nariz e língua eletrônicos também vêm sendo Há evidências de que a acidez da bebida se deve principalmente
testadas, mas seu emprego ainda é restrito a área de pesquisa. a este último.
Em se tratando de análise sensorial, é de se supor que ne- Antigamente se atribuía muitas propriedades desmerecedo-
nhuma das características da bebida se deva a um ou outro com- ras ao café do ponto de vista de saúde do seu consumidor. Pro-
ponente químico, mas sim a uma combinação entre eles, que curava-se, por exemplo, relacionar enfermidades estomacais,
atua sobre a percepção do consumidor. Apesar disso, há evidên- intestinais, cardíacas e osteoporose, entre outras disfunções,
cias da existência de indicadores químicos da qualidade. O que ao hábito de tomar cafezinho. Hoje se sabe que, ao contrário,
se pretende obter com muitas das pesquisas desenvolvidas no quando ingerida sem exagero (4 a 6 xícaras de 50 ml por dia),
campo de análises químicas de café é justamente a identifica- a infusão de café torrado agrega várias propriedades benéficas
ção desses indicadores no grão. Para isso têm sido empregados para a saúde humana. Pela torração, a trigonelina do café verde,
como material de estudo principalmente o café cru, uma vez que por exemplo, se transforma em ácido nicotínico e nicotinamida,
ao torrar novas variáveis estarão envolvidas e deverão ser consi- duas formas de vitamina B3. Quando o café é torrado, os áci-
deradas, visto que a composição do grão passa por transforma- dos clorogênicos também se modificam e dão origem a produtos
ções de intensidade variável em função do rigor do processo. com elevado poder antioxidante, tendo também ele próprio essa
Resultados de estudos têm revelado que o amargor, a ads- atividade em intensidade moderada. Atividades antioxidantes
tringência e o gosto de mofo da bebida de café se devem ao nível são atribuídas também às melanoidinas, um conjunto de subs-
de concentração de ácidos clorogênicos e das proporções em que tâncias cuja quase totalidade ainda não foi identificada, e que se
diferentes deles se encontram no café cru. Cafés no estádio de formam durante a torração
maturação adequado na colheita contêm menos ácidos clorogê-
nicos e, proporcionam bebidas menos adstringentes e com sabor Pesquisas desenvolvidas no IAC
mais característico de café. Pesquisas têm mostrado, também, Reconhecendo a importância da composição química para
que, contrariamente ao que se divulgou anteriormente, a cafeína
o maior conhecimento dos cafeeiros e o grande potencial de
tem pouco efeito no amargor da bebida.
aplicação da sua análise na cadeia produtiva do café, pesquisas
Entre os compostos mais abundantes em café cru encontra-
sobre esse tema têm sido, nos últimos 6 anos, intensivamente
se a sacarose. Tanto a sacarose quanto a trigonelina, composto
incorporadas às já tradicionalmente conduzidas no Centro de
que se encontra em concentração da ordem de 1,0% em café ará-
bica, estão altamente relacionadas com a composição do aroma Café ‘Alcides Carvalho’ do IAC.
da infusão. Cafés com concentrações mais elevadas dos com- Alguns dos trabalhos conduzidos no Centro de Café têm
postos são potencialmente mais aromáticos dos que aqueles em envolvido a busca do conhecimento dos efeitos do método de
que se encontram em concentrações mais baixas. preparo e do background genético do cafeeiro na composição
Os polissacarídeos constituem outra classe de compostos dos cafés cru e torrado, bem como sobre a qualidade da bebida.
que se relacionam com as características da bebida de café. Eles Reconhece-se que todo trabalho desenvolvido com esse objetivo
constituem cerca de 50% do peso seco do café cru e, na forma tem complicadores, sendo necessário padronizar as condições
de complexo com proteína e fenóis, interferem na viscosidade de ensaio que não são alvos do estudo.
do café “espresso”, e, por conseguinte, na estabilidade do creme. Em pesquisas realizadas no IAC, tem se procurado verificar
As proteínas do café cru também interferem no creme do café se a diferença de concentração de cafeína, trigonelina, ácidos
“espresso”, mas, desta feita, na sua quantidade. clorogênicos totais, ácidos orgânicos e carboidratos pode expli-
Outra classe importante de compostos do café é a constitu- car as diferenças encontradas entre as bebidas de café natural,
ída por sua fração lipídica. Não apenas a quantidade em que se CD e despolpado, bem como tem procurado analisar de que for-
encontra no grão, mas, também, a composição dessa fração está ma a composição química varia com cultivares e espécies.
relacionada à qualidade da bebida, à coloração do café cru e ao Na Tabela 1 encontram-se alguns resultados de um desses
potencial de exploração industrial do produto com outros fins que trabalhos. Eles evidenciam, por exemplo, que, quando colhidos
não visem aos cafés torrado/moído e solúvel. Há indicações, por no mesmo estádio de maturação, os cafés despolpados tendem a
exemplo, de que o gosto de madeira atribuído aos cafés velhos se ser mais aromáticos do que os CD e os naturais, independente-
deve a alterações nas concentrações de ácidos graxos e diterpenos mente da variedade. Eles ilustram, também, como o método de
livres formados durante a estocagem. A ação dos lipídeos se faz preparo interfere na Qualidade Global da bebida, revelando que
sentir, também, na retenção de aroma em café torrado. cafés de qualidade inferior quando preparados pelo processo na-

Café natural Café despolpado Café cereja descascado

58 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Tabela 1. Efeito do método de preparo na qualidade da bebida (escala: 0 -10), no teor (%bs) de ácido cítrico, ácido acético, trigonelina
e sacarose das cultivares Tupi IAC 1669-33, Ouro Verde IAC H5010-5 e de população de Robusta.
Variedade/Preparo
Variável Ouro Verde Tupi Robusta
Nat CD Desp Nat CD Desp Nat CD Desp
Aroma 9,2 9,3 9,2 5,0 6,0 9,7 5,2 5,8 9,3
Acidez 7,3 6,7 9,2 6,3 6,5 7,8 1,5 1,7 1,7
Qualid. Global 7,9 8,0 8,1 6,3 6,7 9,0 4,7 5,4 9,4
Sacarose 11,4 12,2 11,0 11,0 11,0 12,3 4,7 4,6 4,8
Trigonelina 1,2 1,2 1,2 1,3 1,3 1,3 1,3 1,2 1,2
Ácido Acético 0,04 0,06 0,04 0,10 0,04 0,02 0,09 0,07 0,05
Ácido Cítrico 1,71 1,74 1,75 1,41 1,39 1,43 0,83 0,96 0,94
CD= Cereja descascado (com mucilagem); Desp= despolpado(fermentado); Nat= café no estádio de maturação cereja seco sob sol.

contendo concentrações mais elevadas de


Tabela 2. Variação da composição do café cru (%bs) e da qualidade da bebida (escala: 0
glicose, frutose e sacarose. Observou-se,
-10) das variedades Bourbon e Catuaí em função da cor da casca do fruto
também, tendência de os cafés crus de
Variedade/Preparo frutos vermelhos, por sua vez, conterem
Bourbon Catuaí maior concentração de trigonelina e de
Variável ácidos clorogênicos totais.
Vermelho Amarelo Vermelho Amarelo Outras pesquisas recentes vêm pro-
Nat Desp Nat Desp Nat Desp Nat Desp curando caracterizar o Banco de Germo-
Aroma 5,4 8,4 8,0 8,0 6,6 8,6 7,0 9,0 plasma de Café do Instituto Agronômico,
visando identificar plantas com maiores
Acidez 3,0 8,6 6,6 6,4 6,6 6,4 7,0 8,0
potenciais de emprego para o melhora-
Qualidade Global 5,4 8,0 7,4 7,2 7,2 7,6 7,2 8,6 mento de cultivares do ponto de vista da
Sacarose 9,3 7,9 9,4 10,3 8,5 10,3 7,8 8,1 qualidade de bebida. Sumarizando, cons-
Glicose 0,04 0,02 0,07 0,04 0,13 0,06 0,04 0,16
tatou-se que no Banco de Germoplasma
de Café do IAC há introduções de café
Frutose 0,17 0,12 0,200 0,13 0,22 0,13 0,14 0,26 arábica com 10,7% de sacarose, enquanto
ACG 4,3 4,5 5,0 5,1 4,0 4,7 4,5 4,0 as cultivares da mesma safra e local pro-
duziram grãos crus com 9,2% do açúcar,
ACG = ácidos clorogênicos totais; Nat = Natural; Desp = Despolpado (fermentado); Catuaí Vermelho IAC
na melhor das hipóteses. Nesse banco
99; Catuaí Amarelo IAC 62.
destaca-se também introdução contendo
no café cru 1,6% de trigonelina, enquanto
tural, podem fornecer excelentes bebidas se forem preparados o maior teor do composto quantificado em cultivares foi igual a
pelos processos CD e despolpado, sendo que esse efeito é tão 1,4%. Observou-se, também, variação no teor de cafeína em ca-
mais significativo quando mais baixa for a qualidade da bebida fés arábicas do banco entre 1,1 e 1,8%, sendo que em cultivares
do café natural. padrões a concentração máxima encontrada foi igual a 1,4%.
Observa-se, igualmente, que a cultivar Ouro Verde IAC Entre os cafeeiros estudados nesse trabalho destacaram-se
H5010-5, da espécie arábica, contém mais ácido cítrico do que também introduções de C. arabica contendo 32,8% de sólidos
a cultivar Tupi IAC1669-33, desenvolvida a partir de cruzamen- solúveis e cafeeiros de C. canephora com cerca de 36% de só-
to interespecífico de C arabica e C. canephora, e do que o de lidos solúveis. Essas e outras informações estão compondo o
uma população de Robusta da espécie C. canephora. Trabalhos banco de dados do Banco de Germoplasma de Café do IAC para
que fornecem resultados como esses permitem também outras seleção de cultivares com maior potencial de aplicação em pro-
conclusões, tais como, sobre as relações existentes entre compo- jetos de melhoramento e para indicação de cultivo em escala
nentes químicos e a qualidade, e sobre a composição química e comercial.
a cultivar. Ainda que a composição química do café possa ser influen-
Em pesquisas realizadas no Instituto Agronômico, finan- ciada pelas condições de clima e preparo, os trabalhos em an-
ciadas pela FAPESP e pelo Consórcio Brasileiro de Pesquisa damento e os já concluídos têm dado importante contribuição
e Desenvolvimento do Café, estão sendo investigadas também para o conhecimento dos cafeeiros do Banco de Germoplasma
a composição química de cultivares de cafés de fruto de cor de Café do IAC. Eles têm permitido obter grande número de
vermelha e de fruto de cor amarela. Os resultados da Tabela resultados sobre a relação existente entre a composição química
2 exemplificam as diferenças observadas. Nas pesquisas foram do grão e a qualidade da bebida e avaliar o efeito do método de
incluídas também as cultivares Ouro Verde, Obatã e Icatu, de preparo na composição do produto. Estudos nesses campos de-
frutos vermelhos e amarelos, foram quantificados outros açúca- verão prosseguir nos próximos anos, e, com apoio financeiro da
res e foram avaliados atributos sensoriais complementares aos FINEP, outras linhas de pesquisa deverão ser implantadas num
apresentados na tabela. Os resultados parciais diferem um pou- futuro próximo.
co das conclusões obtidas quando se analisaram os resultados
para todas as cultivares conjuntamente. Grosso modo, os resul- Terezinha J. G. Salva e Valéria B. de Lima
tados obtidos para as 5 cultivares com frutos de cor vermelha Instituto Agronômico, Centro de Café “Alcides Carvalho”
e de cor amarela revelaram que há tendência de os de cor ama- ( (19) 3241-5188 ramal 370
rela fornecerem bebidas de melhor qualidade, com grãos crus * tsalva@iac.sp.gov.br; yamamotock@ig.com.br
O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 59
A obtenção de um café
naturalmente
descafeinado
Entre os principais alcalóides da medicina encontram-se, por
exemplo, quinina, emetina e cafeína, que são produzidos por
espécies da família das Rubiáceas, segundo Hoehne. Desde sua
descoberta, em 1820, pelo químico alemão F. Runge em sementes
de café, a cafeína tem sido uma das substâncias mais estudadas,
provavelmente tanto pelo seu efeito estimulante sobre os seres
vivos como também em função da discordância entre os resultados
das pesquisas sobre seus efeitos para a saúde humana.
Bernadete, Fazuoli e Paulo Mazzafera
A cafeína apresenta entre suas ati- tidade maior que todos os demais compo- apresentar alguma sensibilidade à cafeí-
vidades fisiológicas mais conhecidas os nentes, os ácidos clorogênicos, na propor- na, constituindo um mercado consumidor
efeitos estimulante e diurético, embora ção de 4 a 7%, dependendo da espécie. para o café descafeinado. As primeiras
existam muitos outros efeitos a ela atri- O consumo diário, mas moderado, tentativas para o estabelecimento de mé-
buídos. Esse alcalóide está naturalmente de café é a melhor forma de aproveitar os todos de descafeinação datam do começo
presente no café, guaraná, chás mate e benefícios desta agradável e estimulante do século 20, sendo que atualmente este
preto e deles é extraído para ser acrescen- bebida. Assim, o consumo de 4 a 6 xíca- procedimento baseia-se no uso de solven-
tado em refrigerantes do tipo cola, medi- ras de 50 ml tomadas ao longo do dia, di- tes como água ou diclorometano. Deste
camentos, cosméticos, etc. ficilmente ultrapassando 300 mg de cafe- processo resultam dois produtos de inte-
No cafeeiro, as maiores concentra- ína, é considerado adequado. Entretanto, resse econômico: o café descafeinado, co-
ções de cafeína ocorrem nas flores, se- uma pequena proporção de pessoas pode mercializado nas formas torrado e moído
mentes e folhas novas. A torra dos grãos ou solúvel, e a cafeína, utilizada predomi-
não altera significativamente sua quanti- A cafeína apresenta nantemente pela indústria.
dade, uma vez que esse processo utiliza Considerando a existência de deman-
temperaturas inferiores à sua tempera- entre suas atividades da para o café descafeinado, assim como a
tura de sublimação. Os grãos provenien- fisiológicas mais possibilidade de permanência de resíduos
tes da espécie Coffea arabica, chamados de diclorometano e alterações de aroma e
de café arábica, apresentam em torno de
conhecidas os efeitos sabor no café quimicamente descafeinado
1,2% e, aqueles provenientes de C. cane- estimulante e diurético, e, sobretudo, por dispor de extenso Banco
phora, também conhecidos por café ro- embora existam muitos de Germoplasma, os melhoristas do IAC,
busta, os teores mais elevados, da ordem liderados por Alcides Carvalho, inicia-
de 1,8 a 3,5%. outros efeitos a ela ram, em 1987, uma linha de pesquisa vol-
Apesar de a cafeína ser o componente atribuídos. Esse alcalóide tada para a obtenção de uma cultivar de
do café mais conhecido pela maioria das café geneticamente desprovida de cafeí-
pessoas, não é a substância que aparece
está naturalmente na ou com teores reduzidos do alcalóide.
em maior concentração no grão, existindo presente no café, Nesta ocasião, obteve-se financiamento
diversas outras em maior quantidade e até guaraná, chás mate e junto à Financiadora de Estudos e Pro-
com importância nutricional para organis- jetos (FINEP) para o estudo inicial dos
mo humano, revelando-se, assim, o café preto e deles é extraído materiais em seleção nas várias linhas
um alimento com propriedades nutracêu- para ser acrescentado de melhoramento do cafeeiro da então
ticas. Assim, o café, após torra ideal, pos- Seção de Genética do Instituto Agronô-
sui além de uma grande variedade de mi-
em refrigerantes do tipo mico de Campinas, visando-se identificar
nerais, aminoácidos, lipídeos, açúcares, a cola, medicamentos, materiais promissores para baixos teores
vitamina do complexo B, niacina, também cosméticos, etc. de cafeína nas sementes. Este projeto,
conhecida como vitamina PP e, em quan- coordenado por Alcides Carvalho, con-

60 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


tou com a colaboração dos Pesquisadores
Científicos Luiz Carlos Fazuoli, Hercula-
no Penna Medina Filho, tendo, também,
a participação de Paulo Mazzafera, que
posteriormente, transferiu-se para o De-
partamento de Fisiologia Vegetal da Uni-
versidade Estadual de Campinas (UNI-
CAMP), mantendo a colaboração com os
pesquisadores do IAC.
Esta linha de pesquisa foi retomada
em 1993, com projeto coordenado por
Marinez Muraro Alves de Lima e finan-
ciado pela Fundação de Amparo à Pes-
quisa do Estado de São Paulo (FAPESP),
realizando-se um extenso trabalho de de-
terminação do teor de cafeína em grande
número de representantes das diversas
espécies de Coffea mantidas no Banco de
Germoplasma do IAC. Estes estudos in-
dicaram que as espécies mais adequadas
para serem utilizadas em cruzamentos in-
terespecíficos seriam C. eugenioides e C. Figura 1. Mudas de cafeeiros AC clonadas por meio da técnica de cultura de tecidos.
salvatrix. Posteriormente, durante a con-
dução desses estudos, verificou-se que
esta estratégia não seria a mais adequada Considerando o intenso desmata- Etiópia, Índia, Tanzânia, Portugal, Peru
para a obtenção de uma cultivar de café mento das florestas da Etiópia e temendo e Costa Rica, para instalação de réplicas
naturalmente descafeinado. pela extinção de grande parte da diversi- desta coleção nos respectivos Bancos de
Anteriormente ao início dos trabalhos dade genética dos cafeeiros silvestres, a Germoplasma. Posteriormente, o Brasil
citados, já havia sido identificado um mu- Organização das Nações Unidas para a recebeu em 1973, a pedido do Dr. Alci-
tante na cultivar Bourbon de C. arabica, Alimentação e Agricultura (FAO) propôs des Carvalho, uma coleção de sementes
denominada Laurina, com cerca de 0,6% e financiou na década de 60, uma missão oriundas de 300 plantas introduzidas na
de cafeína nas sementes. A análise gené- internacional àquele país visando coletar Costa Rica. No Brasil, após um período
tica revelou que o fenótipo Laurina é con- material para ampla documentação bo- de quarentena, as plantas obtidas vieram
dicionado por um par de alelos recessivos, tânica das formas silvestres do cafeeiro a constituir dois ensaios de campo no
porém, com pronunciado efeito pleiotró- e sementes para prosseguimento dos es- Centro Experimental de Campinas, do
pico, reduzindo o porte da planta, confe- tudos de melhoramento e seleção. Dessa Instituto Agronômico de Campinas, onde
rindo-lhe forma cônica, com ramificação forma, os objetivos desta missão da FAO permanecem até hoje.
densa e internódios bastante curtos, baixa estavam de acordo com o conceito relativo Considerando que o IAC é depositário
produtividade e rendimento. Desta forma, à posse da biodiversidade vigente naque- de significativo número dessas introdu-
revelou-se um material não recomendado la época, ou seja, os recursos biológicos, ções, assim como os relatos da literatura
para uma eficiente exploração comercial, de modo geral, incluindo-se entre eles o nacional e internacional sobre a ocorrên-
apesar de apresentar menor conteúdo de germoplasma vegetal, eram considerados cia de variabilidade para diversas outras
cafeína aliado à boa qualidade de bebida. patrimônio da humanidade, estimulando- características de interesse agronômico
As cultivares de café arábica apre- se, portanto, seu livre intercâmbio entre em materiais originários da Etiópia, a de-
sentam base genética reconhecidamente os países, diferentemente das regras atu- talhada avaliação destas introduções foi a
estreita, especialmente em decorrência almente vigentes. Contando com o apoio estratégia adotada para que o programa de
da forma como ocorreu a disseminação e total cooperação do Imperador da Etió- melhoramento do cafeeiro visando baixos
do café pelo mundo a partir de seu cen- pia, Haile Salassie I, a missão foi realiza- conteúdos de cafeína nas sementes alcan-
tro de origem e diversidade, a Etiópia. No da no período de 15 de outubro de 1964 çasse seus objetivos. Este projeto, que se
Brasil, foi através de Francisco de Melo a 15 de janeiro de 1965 por uma equipe iniciou em 1999, contou com o apoio finan-
Palheta que, em 1727, ocorreu a primeira multidisciplinar, composta pelos pesqui- ceiro do Conselho Deliberativo da Políti-
introdução de sementes e mudas obtidas sadores L. M. Fernie, melhorista de plan- ca do Café (CDPC) através do Consórcio
de cafeeiros da Guiana Francesa. Estes, tas, representando Tanzânia, Quênia e Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento
por sua vez, foram obtidos de sementes Uganda; D. J. Greathead, entomologista do Café (CBP&D-Café) e foi liderado pela
oriundas de cafeeiros do Suriname, os de Uganda; L. C. Mônaco, geneticista do pesquisadora científica Maria Bernadete
quais, provieram de sementes de uma úni- Brasil (IAC); F. G. Meyer, botânico dos Silvarolla, do IAC, em parceria com Paulo
ca muda plantada no “Jardim das Plantas” Estados Unidos da América e R.L. Na- Mazzafera, da UNICAMP.
de Paris. Estes fatos explicam o interesse rasimhaswamy, melhorista de plantas da O resultado mais significativo deste
dos melhoristas em reunir, em coleções Índia, além de pesquisadores e autorida- trabalho foi a identificação de três plan-
- chamadas bancos de germoplasma - a des etíopes. Nessa missão foram coleta- tas, denominadas AC1, AC2 e AC3, com
maior diversidade genética possível, úni- das cerca de 600 amostras de sementes reduzido teor de cafeína no endosperma
ca forma de possibilitar o desenvolvimen- - também chamadas introduções - que entre as cerca de três mil (3.000) plantas
to de novas e superiores cultivares. foram divididas entre os seguintes países: que compõem o germoplasma oriundo da
O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 61
soas. Fica bastante evidente a relevância
de trabalhos de melhoramento genético
envolvendo esta cultura, especialmente
no aspecto social, uma vez que a liberação
de novas e superiores cultivares permite
tanto a melhoria nos rendimentos dos pro-
dutores como a ampliação na geração de
emprego. Segundo a Associação Brasilei-
ra da Indústria do Café (ABIC), o consu-
mo de café industrialmente descafeinado
no Brasil não chega a 1% do café consu-
mido, contudo, estima-se que 10% do café
mundialmente comercializado destina-se
à descafeinação. Este fato tem especial
significado, considerando-se que o Brasil
é o maior produtor mundial de café.
Acredita-se ainda que, uma nova cul-
tivar naturalmente descafeinada condu-
ziria a um sensível aumento no consumo
de café, uma vez que consumidores tra-
dicionais, e mesmo novos consumidores,
poderiam beneficiar-se dos diversos efei-
tos positivos do café para a saúde, sem os
eventuais efeitos colaterais produzidos
Figura 2. Vista parcial do campo de híbridos F1 entre pela cafeína em algumas pessoas.
cafeeiros AC e a cultivar Mundo Novo, um ano após o plantio no campo. Finalmente, deve ser ressaltado que
as plantas AC não foram os únicos mutan-
tes inéditos e de valor identificados entre
Etiópia. Esta informação, assinada pelos zação de cruzamentos controlados entre as introduções da Etiópia. Anteriormente
Pesquisadores Científicos Maria Berna- as plantas AC e cultivares-elite (Figura já haviam sido descritas pelo próprio Dr.
dete Silvarolla, Paulo Mazzafera e Luiz 2). A análise das descendências permitirá Alcides Carvalho e outros pesquisadores,
Carlos Fazuoli, foi publicada na revista não somente determinar o controle genéti- mutações alterando a arquitetura da plan-
Nature, volume 429, página 826, 2004. co da característica “ausência de cafeína”, ta e também mutações alterando a forma
A denominação AC foi uma homenagem como também transferi-la para cultivares de reprodução do cafeeiro, onde a auto-
dos autores ao emérito pesquisador cien- elite de café arábica. Acredita-se ainda gamia natural foi substituída pelo sistema
tífico Dr. Alcides Carvalho, pai da cafei- que essa transferência deverá ser bastante de polinização cruzada, resultado da ação
cultura nacional. facilitada, uma vez que estará restrita a do gene da macho-esterilidade. Assim, a
Como os cafeeiros AC passaram ape- hibridações entre plantas de uma mesma ocorrência de mutações tão extremas en-
nas por etapas iniciais de um programa espécie. É difícil estimar com precisão o tre as introduções da Etiópia demonstra
de seleção massal é de se esperar que a tempo neste segundo caso, mas, com uma o valor potencial deste tipo de reserva
produtividade deste germoplasma seja in- expectativa boa, espera-se que em 15 anos genética, tanto para o melhoramento con-
ferior à de variedades comerciais de café seja possível obter uma cultivar produtiva vencional como também para estudos de
arábica disponíveis no mercado. Desta e naturalmente descafeinada. biologia molecular, uma vez que o avanço
forma, os trabalhos para a obtenção de A proposta de aproveitamento deste em ambas as áreas depende, obrigatoria-
cultivares naturalmente descafeinadas, germoplasma, cuja característica diferen-
mente, da existência de diversidade gené-
com o apoio da Financiadora de Estudos cial é o reduzido teor de cafeína nas se-
tica devidamente caracterizada em traba-
e Projetos (FINEP), estão sendo conduzi- mentes, representa uma inovação tecno-
lhos de pré-melhoramento.
dos paralelamente por dois caminhos dis- lógica para a cultura do café, uma vez que
tintos. O primeiro, através da avaliação o café naturalmente descafeinado atende
da produtividade e demais características a uma demanda presente no mercado Maria Bernadete Silvarolla; Luiz Carlos
agronômicas das plantas AC em ensaios consumidor global, resultando na agre- Fazuoli
clonais com mudas provenientes de repro- gação de valor ao produto diretamente Instituto Agronômico, Centro de Café
dução por estaquia e/ou cultura de tecidos para o produtor brasileiro. O agronegócio “Alcides Carvalho”
(Figura 1). Como são necessárias pelo mundial do café envolve, anualmente, re- ( (19) 3241-5188 ramal 370
menos 4 colheitas para se avaliar a pro- cursos da ordem de 91 bilhões de dólares * bernadet@iac.sp.gov.br; fazuoli@iac.
dutividade potencial de um cafeeiro, estes e, tem a participação de cerca de 8% da sp.gov.br
dados estarão disponíveis em 5 a 6 anos. população mundial para movimentar as
Entretanto, na impossibilidade de se re- 115 milhões de sacas que, em média, são Paulo Mazzafera
comendar estes materiais para exploração produzidas. Neste gigantesco mercado se Departamento de Fisiologia Vegetal, Ins-
comercial direta, em função de sua baixa insere a cadeia produtiva do café brasi- tituto de Biologia – UNICAMP
produtividade, é que se aplica o segundo leiro, responsável por 30% da produção ( (19) 3521-6213
caminho, mais longo, que envolve a reali- mundial e empregando 7 milhões de pes- * pmazza@unicamp.br

62 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Da folha à obtenção de
embriões somáticos de

Coffea
Julieta

As civilizações vêm realizando atividades de Biotecnologia


desde aproximadamente 1.800 AC, as quais consistem
da obtenção de processos e produtos oriundos da
ação direta ou indireta de seres vivos. A Biotecnologia
compreende tecnologias antigas e modernas,
provenientes de conhecimento do cotidiano indígena
e ou da comunidade científica visando à manipulação
de (partes de) microrganismos ou de células e tecidos
de organismos, para benefíciar o homem. Esses
conhecimentos podem ser bastante diversificados desde
a tradicional tecnologia da fermentação para a produção
de pães até as mais específicas e modernas como a
Figura 1. Explante foliar de Coffea em meio de cultura. produção de transgênicos.

A
Fisiologia e a Genética Vegetal período, ele estabeleceu um centro didá- sistema, o explante poderá apresentar a
contribuem amplamente com a tico de pesquisa em cultura de tecido de regeneração de uma planta semelhante à
Biotecnologia Vegetal, ambas Coffea, o qual vem contribuindo com a planta mãe doadora do explante. O tem-
embasadas em princípios do Desenvolvi- formação e treinamento de pesquisadores po de formação da nova planta depende-
mento Vegetal que se refere às mudanças tanto brasileiros, quanto de outras nacio- rá da espécie, porém, em geral, este será
ocorridas ao longo do ciclo de vida das nalidades. Ressalta-se ainda que, dentre menor que o seu ciclo de vida na nature-
plantas, envolvendo os eventos de divi- as inúmeras contribuições do Dr. Sondhal, za. Nota-se ainda que um único explante
são, expansão e diferenciação celular. está o estabelecimento de um protocolo de de Coffea poderá gerar até dezenas de
Dentre os diferentes métodos aplicados regeneração in vitro de embriões de Coffea embriões. Desta forma, a regeneração de
pela Biotecnologia Vegetal está a Cultura a partir de explante foliar, em meados de uma nova planta a partir de qualquer tipo
de Tecidos Vegetais a qual é amplamente 1970. Esse protocolo é utilizado ampla- de explante deve-se à capacidade de to-
utilizado para a multiplicação de plantas. mente para a multiplicação das diferentes tipotência, isto é, qualquer célula vegetal
No Instituto Agronômico (IAC), o variedades de Coffea, em diversas partes contém toda a informação genética ne-
programa de melhoramento de Coffea do mundo, o qual também tem sido adap- cessária para gerar uma nova planta.
conta com contribuições da Cultura de tado para outras espécies de plantas. Na natureza, o café é propagado via
Tecido desde 1970, as quais, notoriamen- A Cultura de Tecidos ou o cultivo in sementes ou estacas. Quando por semen-
te, devem-se aos estudos e ao dinamismo vitro visa à obtenção de uma nova planta tes, pode ser influenciada pela variação
do pesquisador Dr. Maro Sondhal. Nesse a partir de fragmentos de tecido, ope- genética, taxa lenta de multiplicação e
ração que também é chamada de clona- curto período de viabilidade devido à re-
gem. O princípio básico deste processo é calcitrância das sementes. Por outro lado,
A Cultura de Tecidos ou o isolamento de qualquer parte da planta, a propagação do cafeeiro via estaca garan-
a qual é chamada explante, podendo ser te uniformidade genética, porém este mé-
o cultivo in vitro visa à desde uma célula individual até órgãos todo apresenta taxas baixas de multipli-
como anteras, nucelo, gemas axilares cação e também alguma dificuldade para
obtenção de uma nova planta e ou apicais, fragmentos de hipocótilo, o enraizamento. Portanto, multiplicação
caule, folhas, raízes, órgãos de armaze- via Cultura de Tecido é uma alternativa
a partir de fragmentos de namento e até segmentos de frutos. O ex- viável para estes métodos tradicionais de
tecido, operação que também plante será cultivado sobre um substrato propagação do cafeeiro, permitindo a pro-
gelatinoso contendo nutrientes, deno- dução de plantas geneticamente unifor-
é chamada de clonagem. mindo meio de cultura, e mantido num mes numa escala massiva e num período
frasco fechado de vidro (Figura 1). Nesse de tempo mais curto.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 63


Dessa forma, o processo de Cultura
de Tecidos apresenta-se muito útil para
programas de melhoramento genético,
auxiliando na multiplicação de genótipos
especiais, contribuindo, portanto, com a
geração de novas variedades. O programa
de melhoramento do cafeeiro no IAC ini-
ciou-se a partir de 1933 e vem contribuin-
do com a produção de variedades as quais
vem sendo cultivadas na maioria das regi-
ões brasileiras produtoras de café.
A multiplicação de plantas via Cultu-
ra de Tecido Vegetal pode ser obtida por
meio de diferentes processos, dentre estes
a organogênese de gemas axilar e apical,
a indução e o desenvolvimento de gemas
adventícias, a cultura de embrião zigóti-
co; a cultura de pólen e de antera, a sus-
pensão celular, a cultura de protoplasto e
a embriogênese somática.
Na natureza, a maioria das espécies
reproduz-se via embriogênese zigótica
que se inicia na divisão assimétrica do zi-
goto, dando origem a uma célula apical e
a outra basal, o embrião globular, o qual Figura 2. Calo formado a partir de explante foliar de Coffea
posteriormente passará para o estádio co-
tiledonar, com a iniciação do primórdio
radicular, seguido pelo caule, no caso de
dicotiledôneas. Estabelecendo-se uma
A embriogênese somática De acordo com o protocolo do Dr.
Sondhal, na via indireta, a auxina 2,4-D
comparação entre a embriogênese somá-
tica e a zigótica verifica-se para a primei-
pode ocorrer por via direta, (ácido 2,4 diclorofenoxiacético), usada em
alta concentração, participa fortemente
ra que, após a diferenciação do embrião,
este não apresenta qualquer ligação com
ou protoplastos isolados, do controle da indução e da iniciação do
calo a partir do explante foliar. As célu-
o explante mãe, isto é, uma vez formado,
esse dependerá dos nutrientes do meio de
micrósporos ou ainda las do explante foliar expostas ao meio de
cultura enquanto a sobrevivência do em- cultura com adição de 2,4-D passarão por
brião zigótico dependerá da planta mãe.
indiretamente a partir de situação de estresse e, em resposta, estas
Dessa forma, a embriogênese somáti- apresentarão alterações metabólicas, que
ca é o processo no qual células somáticas
calos ou suspensão celular. induzirão a intensa divisão celular, le-
do explante diferenciam-se em embriões vando à formação do calo. Posteriormen-
somáticos, os quais são estruturas bipo-
Na via direta, determinadas te, haverá a diferenciação de embriões a
lares, que passam por diferentes estádios partir de alguns nichos de células do calo.
de desenvolvimento semelhantes àqueles
células do explante já são Mas, a ocorrência da embriogênese somá-
verificados para a embriogênese zigótica. tica a partir de explante foliar de Coffea
A embriogênese somática pode ocor-
pré-embriogênicas, tendo-se pode ser influenciada por diversos fatores
rer por via direta, ou protoplastos isola- como: o estádio de desenvolvimento da
dos, micrósporos ou ainda indiretamente
assim a formação de embriões planta mãe doadora de explante, as condi-
a partir de calos ou suspensão celular. Na ções do meio de cultura, o tipo de hormô-
via direta, determinadas células do ex-
diretamente na borda do nio vegetal e as condições de iluminação
plante já são pré-embriogênicas, tendo-se e temperatura em que o sistema in vitro
assim a formação de embriões diretamen-
explante. Por outro lado, na
será mantido. Assim, a embriogênese
te na borda do explante. Por outro lado, somática constitui-se em base para o sis-
na embriogênese somática indireta, ini-
embriogênese somática indireta,
tema in viro de multiplicação vegetativa
cialmente, há a formação de um calo (Fi- e pode ser utilizada para propagação em
gura 2), o qual corresponde a uma massa
inicialmente, há a formação
massa, para programa de melhoramento
de células indiferenciadas, e que poste-
riormente se diferenciarão em embriões
de um calo (Figura 2), o qual de plantas e ainda como modelo de estu-
do para diferenciação celular em plantas e
somáticos.
A ocorrência da embriogênese somá-
corresponde a uma massa de biologia molecular visando a obtenção de
plantas transformadas.
tica direta em Coffea, em geral, está as-
sociada ao tipo de genótipo, isto é, nem
células indiferenciadas, e que
todos os genótipos possuem essa capaci- Julieta Andrea Silva de Almeida
dade. Por outro lado, a via indireta é am-
posteriormente se diferenciarão Centro de Café “Alcides Carvalho”
plamente verificada para a maioria dos ( (19) 3241-5188 ramal
genótipos de Coffea.
em embriões somáticos.
* julietasa@iac.sp.gov.br

64 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Caracterização dos cromossomos mitóticos
de espécies diplóides de café por técnicas
convencionais e de bandamento-C e -NOR Neiva

O
emprego de técnicas de esmagamento e corantes con- diplóides de café mantiveram, além do mesmo número cromos-
vencionais em café tem possibilitado a identificação e a sômico, o mesmo padrão de ocorrência e de distribuição da he-
caracterização dos cromossomos mitóticos por meio dos terocromatina visualizada pelas bandas-C. Sabe-se que uma das
dados cario-morfométricos. São eles: valores médios obtidos funções destes segmentos de DNA tão compactados é a proteção
para o comprimento absoluto e relativo de cada cromossomo, ín- da região do centrômero e que genes ou bloco de genes coloca-
dice centromérico, presença, número e extensão de constrições dos perto da heterocromatina por rearranjos estruturais podem
secundárias e satélites, grau de assimetria do cariótipo, compri- tornar-se compactados e não mais transcreverem. Além disso,
mento total do conjunto haplóide de cromossomos do genoma e plantas oriundas de cultura de tecido podem apresentar amplifi-
fórmula cariotípica, que permitem a elaboração de ideogramas cação da heterocromatina em diferentes gradientes, que podem
médios. Com a compilação desses dados, tem-se observado, por ou não afetar a expressão de certos genes, mormente aqueles de
meio de estudos comparativos, que algumas das espécies diplói- interesse em programas de melhoramento.
des de café diferenciam-se entre si (Figura 1), enquanto que ou- Outra região que também se comporta como um interessante
tras não se distinguem, requerendo a aplicação de metodologias marcador natural do cromossomo é a região do organizador nu-
mais acuradas. cleolar (NOR) e seu satélite que podem ser evidenciados primei-
Um detalhamento melhor dos genomas tem sido obtido com ramente por esmagamento e corantes convencionais e também
o emprego de técnicas mais específicas, como a de bandamento- pela impregnação pela prata, um método relativamente simples
C, que permite a diferenciação longitudinal dos cromossomos e pouco oneroso que mostra as regiões onde estão ancorados os
por meio da localização e da visualização seletiva de segmen- genes de rDNA que estiveram ativos na última intérfase. Em
tos heterocromáticos de DNA. Esses segmentos, presentes em café, o que se tem visto nas espécies diplóides é a prevalência de
ambos os homólogos do par de cromossomos, caracterizam-se apenas um par de NOR ativas (Figura 3A), mas espécies como
por se manterem condensados durante todo o ciclo de divisão C. racemosa (Figura 3B) e C. stenophylla, nativas de ambientes
celular, em contraposição aos segmentos eucromáticos que mais secos, apresentam dois pares. Pode ser que este aumento
apresentam um ciclo de condensação-descondensação. Durante no número de NOR esteja relacionado a adaptações das espécies
a metáfase mitótica, esses marcadores cromossômicos naturais, ao ambiente mais seco em que crescem
isto é, os segmentos heterocromáticos, ficam mascarados pelo A aplicação destas metodologias em conjunto pode ser útil
grau máximo de compactação que os cromossomos assumem não apenas na caracterização de espécies, mas também de plan-
nessa fase, tornando-se visíveis apenas após o bandamento-C. tas híbridas obtidas em programas de melhoramento.
Nas espécies diplóides de café tem-se observado a ocorrência
de heterocromatina banda-C exclusivamente na posição peri-
centromérica, isto é, ao redor do centrômero (Figuras 1 e 2). Neiva Isabel Pierozzi
A quantidade expressa em porcentagem em relação ao genoma Instituto Agronômico, Centro de Recursos Genéticos Vegetais,
total pode variar em algumas das espécies, mas a posição tem Laboratório de Citogenética.
sido sempre a mesma. As análises comparativas, ainda que pre- ( (19) 3241-5188 ramal 450
liminares, sugerem que durante o processo evolutivo as espécies * pierozzi@iac.sp.gov.br

Figura 2. Cromossomos Figura 3. Cromossomos


Figura 1. Ideogramas médios representando os cromossomos mitóticos mitóticos de A - C. congensis mitóticos de A- C. congensis
de A- Coffea congensis e B- C. racemosa com a localização das e B - C. racemosa após e de B - C. racemosa após a
bandas - C (regiões escuras). Setas = Constrições secundárias. bandamento - C. Barra = 2mm. impregnação pela prata. Setas =
NOR. Barra = 2 mm.
O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 65
Mapeamento cromossômico em
espécies de café através da técnica de

hibridação
Cecília in situ fluorescente (FISH)
M
apeamento genômico é termo sítios de corte de enzimas de restrição. deste DNA particular é feita com anticor-
comum usado para determinar Cada cromossomo é isolado e cortado po marcado com um corante fluorescente,
a localização e a ordem de cer- com enzimas de restrição em grandes sendo observável ao microscópio de fluo-
tos genes nos cromossomos ou ainda para segmentos os quais são posteriormente rescência como um sinal fluorescente. Ou
determinar um conjunto de fragmentos subdivididos em segmentos menores. O seja, a técnica de hibridação in situ fluo-
ou seqüências ordenadas de um genoma mapa de cDNA fornece a localização de rescente permite a localização física pre-
particular. genes nos cromossomos através da loca- cisa de genes ou seqüências de DNA di-
Os mapas genômicos são construídos lização das seqüências expressas em re- retamente nos cromossomos presentes nas
em diversas escalas e níveis de resolução lação a um determinado cromossomo ou preparações citológicas. Esta técnica, que
e usualmente são divididos em dois ti- bandas cromossômicas. As seqüências tem como base a propriedade recombinan-
pos gerais, os mapas de ligação genética de cDNA são sintetizadas em laborató- te das cadeias complementares de DNA,
e os mapas físicos. Os mapas de ligação rio usando-se uma molécula de mRNA foi desenvolvida no final da década de 60
genética são representações estatísticas como molde (template). Os mapas contí- e tem propiciado enorme progresso nos es-
dos arranjos das seqüências nos cromos- guos (contig maps) envolvem a segmen- tudos da organização dos genomas. Espe-
somos, enquanto que os mapas físicos tação de um cromossomo em pequenos cialmente a partir dos anos 80 esta técnica
representam a localização física de uma segmentos que são clonados e ordenados de FISH, associada aos rápidos avanços
seqüência em um cromossomo. formando blocos contíguos de DNA. tecnológicos, passou a ser cada vez mais
Os mapas de ligação referem-se às Em um mapa cromossômico, genes, adaptada para a localização e caracteri-
localizações relativas, ao longo dos cro- seqüências ou outros fragmentos de DNA zação de várias classes de seqüências de
mossomos, de marcadores de DNA, ge- identificáveis são visualizados nos seus DNA nos genomas de plantas. Esta técnica
nes ou seqüências conhecidas, baseado respectivos cromossomos. vem sendo intensivamente usada para de-
nos seus padrões de herança. Qualquer Para explorar de maneira comple- terminação rápida da localização de clones
característica fenotípica ou molecular que ta os dados de seqüenciamento de um genômicos ou da distância física entre clo-
difira entre indivíduos e possa ser detec- genoma há necessidade de se efetuar a nes mapeados geneticamente.
tada no laboratório é um marcador gené- integração entre mapas genéticos e ma- Característica dos cromossomos de
tico potencial. Esses marcadores podem pas físicos. Efetuando-se a relação entre plantas, a cromatina condensada torna di-
ser a expressão de segmentos ou regiões o mapa de ligação com o mapa cromos- fícil a localização confiável de seqüências
de DNA (genes) com função codificadora sômico físico e estes com os dados de de cópia única ou pouco repetitivas meno-
desconhecida, porém com um padrão de seqüenciamento, é possível a localização res que 10kb em cromossomos metafási-
herança que pode ser acompanhado. As precisa de genes que condicionam uma cos de plantas. Assim, adicionalmente, à
diferenças entre seqüências de DNA, por característica observável. técnica de FISH, um dos pontos essenciais
exemplo, são marcadores extremamente Genes, seqüências e fragmentos de para o sucesso de mapas baseados em clo-
úteis, pois são abundantes e fáceis de se- DNA podem ser fisicamente associados a nagem de grandes regiões cromossômicas
rem caracterizadas. sinais particulares e identificados através é a disponibilidade de bibliotecas conten-
Os mapas físicos são baseados nas de diversas técnicas. do grandes insertos de DNA genômico os
características químicas da própria mo- As principais técnicas atualmente YACs (yeast artificial chromosomes) e os
lécula de DNA, e incluem os mapas cro- usadas para a integração destes mapas BACs (bacterial artificial chromosomes).
mossômicos ou citogenéticos, mapas de para a clonagem de genes e caracterização O desenvolvimento de bibliotecas
cDNA, mapa de seqüências, mapa de de genomas de plantas são a técnica de- de YACs e BACs forneceu um meio de
“contig” e mapa de macrorestrição; os nominada hibridação in situ fluorescente superar a limitação imposta pela croma-
quais diferem entre si no grau de reso- de ácidos nucléicos (FISH – fluorescente tina condensada, ou seja, cópias pouco
lução. O mapa físico de maior resolução in situ hybridization) e as bibliotecas de repetitivas podem atualmente ser locali-
mostra a seqüência dos pares de bases do BACs (bacterial artificial chromosomes). zadas mais facilmente e diretamente em
DNA de cada cromossomo no genoma A técnica de FISH envolve a marca- cromossomos metafásicos (grau máximo
(mapa de seqüências). Neste mapa é feita ção de nucleotídeos, fragmentos, ou se- de condensação) ou núcleos interfásicos
a determinação completa de uma seqü- qüências, de DNA específico, que é de- (cromatina descondensada). Este fato
ência de DNA, e de todos os seus pares nominado de sonda. Posteriormente, este tem trazido contribuições importantes
de base, para cada cromossomo de um DNA-sonda liga-se à sua cadeia de DNA para a integração de mapas de ligação de
complemento. O mapa de macrorestri- complementar (o DNA denominado alvo) marcadores moleculares com informa-
ção mostra a ordem e a distância entre os em um cromossomo intacto; a localização ções físicas.

66 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


As primeiras bibliotecas de insertos
a serem construídas em1987 foram os
YACs para os genomas humano e de ca-
mundongos e plantas como Arabidopsis,
milho, centeio e arroz. Essas bibliotecas
foram extremamente importantes para
a produção de mapas físicos de grandes
segmentos cromossômicos e o isolamento
de muitos genes importantes, porém uma
porcentagem desses YACs mostraram-se
problemáticos pois eram quiméricos, ins-
táveis, além da dificuldade para isolamen-
to do inserto de DNA, tinham baixa efici-
ência de transformação, o que dificultava
a construção de bibliotecas de YACs.
As bibliotecas dos BACs suplantaram
as dificuldades das bibliotecas dos YACs
pois usam um vetor capaz de manter os
segmentos de DNA genômico estáveis
num tamanho de cerca de 300 kb e, com-
parativamente com os YACs, podem ser
clonados com grande eficiência, serem
facilmente manipulados e mantidos está-
veis em E. coli. Bibliotecas de BACs fo-
ram construídas para Arabidopsis, sorgo, Figura 1. Cromossomos mitóticos de Coffea arabica L. com mapeamento de seqüências
arroz. Os clones das bibliotecas de BACs de DNA ribossômico através da técnica de hibridação in situ fluorescente(FISH). A e B)
de sorgo e arroz foram testados e através Bourbon vermelho - sinais de hibridação com as sondas pTa71 (vermelho) e pScT7 (branco)
de FISH localizaram-se hibridações cro- respectivamente; C e D) Typica e Mundo Novo – ambos com sinais da sonda pTa71.
mossômicas em cópias únicas, mostran- Especialmente em café, a aplicação da via FISH (Figura 1). O resultado tem sido
do que estas bibliotecas de BACS apre- técnica de FISH abriu nova perspectiva, positivo para todas as espécies, ou seja, as
sentam pouco ou nenhum quimerismo. tanto para a identificação dos cromosso- seqüências mostraram-se evidentes, sem
Desse modo, a informação física sobre a mos, mas principalmente para o mapea- exceção, evidenciando que os cromosso-
extensão e localização, tanto de seqüên- mento de genes e seqüências de interesse mos, caracterizados como portadores des-
cias repetitivas ou pouco repetitivas ou de nos complementos cromossômicos das vá- tas seqüências, poderão servir como cro-
cópia única, podem ser comparadas, per- rias espécies. mossomos marcadores, e serem usados no
mitindo que associações possam ser feitas Através dessa técnica, várias espécies futuro para fazer a integração com grupos
entre regiões cromossômicas distintas e de café vêm tendo os seus cromossomos de ligação obtidos por marcadores molecu-
grupos de ligação genéticos ou marcado- mapeados utilizando-se como sonda duas lares de diferentes naturezas.
res moleculares. seqüências repetitivas de rDNA (DNA ri- Após esta etapa exploratória com se-
Em plantas como o café, que possuem bossômico) que destacam regiões organiza- qüências repetitivas de rDNA, a continui-
cromossomos somáticos relativamente doras do nucléolo. As duas principais são: dade do mapeamento cromossômico em
pequenos (2 a 3 µm) com poucas carac- a) sonda denominada pTa71, que é uma se- espécies de café, está sendo levada adiante
terísticas diferenciais, e numerosos, os qüência de DNA corresponde à seqüência e atualmente visa à localização cromossô-
padrões de hibridação de seqüências de de rDNA de Triticum aestivum 26S, 5.8S mica de outros genes de interesse, também
DNA repetitivo podem ser usados como e 18S, clonada no plasmídio pUC19 com via FISH. Encontra-se em desenvolvimen-
marcadores cromossômicos, permitindo to o mapeamento de seqüências corres-
9Kb, e b) a sonda pScT7, que corresponde
a identificação de cromossomos individu- pondentes a genes resistência (RGAs) e
à seqüência de rDNA 5S de Secale cerea-
ais, muito mais facilmente que por méto- de seqüências de microsatélites tanto em
le, clonada no plasmídio pUC8, e contém cromossomos metafásicos mitóticos como
dos citogenéticos tradicionais. 300-500 pares de base. Essas seqüências, em cromossomos meióticos na fase de pa-
usadas como sonda para o mapeamento de quíteno, em três espécies: C. arabica, C. ra-
Especialmente em café, espécies de café, são seqüências comuns e cemosa e C. canephora. Para a localização
altamente conservadas. desses genes, algumas etapas ainda deverão
a aplicação da técnica de Desde o desenvolvimento de um pro- ser superadas, entre as quais, o fato de as
FISH abriu nova perspectiva, tocolo de FISH especialmente adaptado sondas constituírem-se de seqüências mais
para os cromossomos de café, em 2000, específicas, o que, de certa forma, apesar da
tanto para a identificação cerca de 16 taxa de café, incluindo espé- expectativa de resultados promissores, têm
cies, variedades e cultivares do Banco de dificultado um pouco mais o mapeamento
dos cromossomos, mas Germoplasma de Café do IAC, entre elas cromossômico desses genes em café.
principalmente para o as espécies de maior interesse comercial
Coffea arabica e C. canephora; e também Cecília Alzira Ferreira Pinto-Maglio
mapeamento de genes e espécies silvestres como C. congensis, C. Instituto Agronômico, Centro de Pesquisa
seqüências de interesse nos eugenioides, C. dewevrei, C. racemosa, C. & Desenvolvimento de Recursos Genéti-
stenophylla, C. salvatrix, entre outras, tive- cos Vegetais, Laboratório de Citogenética.
complementos cromossômicos ram essas seqüências de rDNA mapeadas ( (19) 3241-5188 ramal 450
das várias espécies. nos seus complementos cromossômicos * maglio@iac.sp.gov.br

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 67


Genoma Café
perspectivas para o melhoramento genético da cultura
1
Financiado com recursos do CBP&D do café, Fapesp, Finep e CNPq.

D
iante desse panorama, a moderna mento de ESTs de diversos órgãos e teci-
biologia, representada pelas me- dos, tais como folhas, raiz, flores, frutos,
todologias da Biologia Molecular não só em diferentes estádios do desenvol-
e Engenharia Genética, representa a mais vimento, mas também a partir de plantas
promissora arma para o melhoramento, submetidas a diferentes situações de es-
uma vez que barreiras naturais como im- tresses bióticos e abióticos. A escolha dos
Miriam Baião possibilidade de cruzamentos intra-espe- tecidos e tratamentos para análise baseou-
cíficos e baixa variabilidade genética, po- se na identificação dos problemas bioló-
O melhoramento de plantas derão ser superadas através destas técni- gicos limitantes para o desenvolvimento
cas. No entanto, uma das limitações para o cafeicultura, tais como susceptibilidade a
tem como objetivo essencial uso de biotecnologia como ferramenta no pragas e doenças; sensibilidade ao frio e
o desenvolvimento de novas melhoramento genético do café é o quase à seca; maturação não-uniforme dos fru-
total desconhecimento molecular dos ge- tos; composição química de sementes. Um
variedades, cada vez mais nes do cafeeiro. total de 200.000 ESTs foi seqüenciado, e
adaptadas às diversas O crescente desenvolvimento da bio- após análises de bioinformática estas se-
tecnologia permitiu o estabelecimento dos qüências foram agrupadas em aproxima-
demandas do setor agrário. programas Genomas. Estes têm como ob- damente 35.000 genes distintos (Vieira et
Para tal, pesquisadores jetivo essencial decifrar o código genético al., 2006). A expectativa principal era que
dos diferentes organismos vivos. Iniciados genes relacionados com o estabelecimento
buscam constantemente novas pelo Genoma Humano, rapidamente os de características agronômicas desejáveis
ferramentas para obtenção e projetos genomas foram sendo estabeleci- fossem identificados, isto é, tivessem sua
dos, principalmente para espécies de inte- sequência determinada. Uma outra expec-
seleção de novos genótipos. resse agronômico. Dentro deste quadro, o tativa era que fossem identificadas sequ-
Entre as espécies de interesse Genoma Café foi proposto pelo IAC dentro ências diversas destes genes, resultado da
econômico, o café, espécie do Programa AEG (Agriculture and Envi- expressão de diferentes alelos, o que pos-
romment Genomes) da Fapesp, em parceria sibilitará a avaliação da variabilidade ge-
perene e de ciclo de vida com o Consórcio Brasileiro de Pesquisa e notípica disponível. Além disso, espera-se
longo, tem a sua sustentação Desenvolvimento do Café e o Cenargen / que os ESTs sejam mapeados, ou seja, sua
Embrapa. Como vem sendo realizado para posição nos cromossomos e sua ligação
agrícola alicerçada na outras espécies vegetais, foram sequencia- com outros genes em mapas genéticos de-
disponibilidade para plantio dos apenas genes transcritos, os chamados terminadas, visando aumentar a densida-
ESTs (Expressed Sequence Tag) em teci- de de marcadores moleculares acessíveis
de dezenas de variedades dos e órgãos do cafeeiro. Esta estratégia, para seleção. Finalmente, outro ganho ad-
ou cultivares, quase todas apesar de não abranger todo o genoma da vindo do Projeto Genoma Café foi o for-
espécie, permitiu a identificação dos genes talecimento de laboratórios de pesquisa e
resultado do pioneirismo das relacionados com processos biológicos de formação de recursos humanos com com-
pesquisas em genética e interesse, de maneira mais rápida e eficien- petência em biologia molecular, genômi-
te. Assim, por exemplo, genes diretamente ca estrutural e funcional e bioinformática
melhoramento nesta espécie, relacionados com mecanismos de resis- atuantes nas pesquisas com o cafeeiro.
desenvolvidas pelo Instituto tência a pragas poderão ser isolados a par-
Agronômico. Entretanto, tir das seqüências específicas obtidas em Genômica Funcional
plantas resistentes infectadas. A importân- Apesar do enorme salto que o sequen-
avanços atuais nos programas cia da identificação dos genes envolvidos ciamento do genoma café representa para
de melhoramento são com o desenvolvimento de características o desenvolvimento da genética molecular
de interesse agronômico está na possibi- do café, a incorporação destas informa-
limitados especialmente pela lidade da sua utilização como ferramenta ções em programas de melhoramento e se-
variabilidade genética restrita em Programas de Melhoramento. Dessa leção não deverá ocorrer de maneira ime-
forma, estes genes poderão ser utilizados diata. Uma das etapas fundamentais para
e autogamia da espécie tanto como marcadores moleculares du- esta absorção envolve a caracterização da
C. arabica, o que contribui rante o processo de seleção, quanto como variabilidade gênica, modo de expressão,
candidatos para transformação de plantas, função e interação dos genes em mecanis-
para um crescente déficit sempre visando o desenvolvimento de cul- mos biológicos relacionados com o esta-
de produção da cafeicultura tivares com características diferenciadas. belecimento de características agronômi-
O Projeto Genoma-Café, concluído cas. Este conjunto de análises moleculares
frente às demandas atuais. em 2004, teve como objetivo o sequencia- é chamado de Genômica Funcional, uma
68 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007
onde centenas ou milhares de com mecanismos de defesa da plantas em
sequências podem ser avalia- resposta ao ataque de patógenos, e tam-
das de maneira simultânea e bém com genes determinantes do floresci-
quantitativa. Este último méto- mento, desenvolvimento de frutos e com-
A do, apesar de ter custo eleva- posição química de sementes. É impor-
do, representa uma alternativa tante ressaltar que os sucessos alcançados
mais eficiente de análise, pois até o momento se devem principalmente
permite uma avaliação quanti- a uma estreita interação entre a equipe
tativa precisa da expressão de encarregada do melhoramento genético
B genes. Dessa maneira é possí- e a equipe responsável pelos estudos de
vel determinar o padrão de ex- genômica funcional. A seguir é apresen-
pressão temporal e espacial de tado um resumo dos principais resultados
um loco qualquer, e como este de pesquisas obtidos até o momento:
interage com a expressão de
outros locos envolvidos em um Resistência ao bicho-mineiro
mesmo processo metabólico. A fim de caracterizar e identificar
Para uma compreensão genes que levam à resistência ao bicho-
C das possibilidades que podem mineiro em café duas abordagens distin-
Figura 1. Exemplo de amplificação de alelos de ser exploradas a partir das in-
microsatélites SSR 4 (A) e SSR 18
tas estão em andamento. Uma tem como
(B, C) a partir de plantas resistentes (1-11) e suscetíveis
formações geradas pelas aná- objetivo analisar a expressão de genes re-
(12-21; 90-97) ao bicho-mineiro (Pinto et al., 2007) lises funcionais, imaginemos conhecidamente relacionados com meca-
uma situação simplificada a nismos de defesa em plantas. A segunda
partir da análise da expressão busca identificar uma classe específica de
vez que envolve o estabelecimento da fun- de genes durante a maturação do fruto marcadores moleculares, os microssaté-
ção de cada um dos genes identificados. do café. Poderá ser identificado o gene A lites expressos (EST-SSR), associados à
Em um Programa de Genômica Fun- como regulador da expressão do gene B, característica de resistência. Em ambos os
cional, a expressão dos genes de interesse que em conjunto com os genes C e D são casos pretende-se desenvolver ferramen-
é comparada em genótipos que apresentem responsáveis pela síntese de proteínas de tas que auxiliem o processo de seleção.
diferenças fenotípicas para uma determi- reserva. Neste caso, o pesquisador inte- Para análise da expressão de genes,
nada característica. Assim, o papel de um ressado em alterar o teor de proteínas de plantas suscetíveis e resistentes, oriundas
gene no processo de maturação do fruto reservas na semente do café poderá deli- do Programa de Melhoramento, foram
pode, por exemplo, ser determinado através near cruzamentos que possibilitem novas inoculadas com o bicho-mineiro. O RNA
da comparação de sua expressão em frutos combinações entre os genes envolvidos, mensageiro de folhas infestadas e coleta-
em diferentes estádios de desenvolvimento, resultando em alterações nos teores da das ao longo da infestação foi purificado.
ou em frutos de genótipos que apresentam proteína desejada; ou poderá identificar A partir das análises in silico feitas no
alteração no tempo de maturação. polimorfismos destes genes em espécies Banco de Dados do Genoma-Café foram
Os métodos utilizados para avaliar com variação natural nos teores protéicos, identificados sequências similares a genes
essa expressão diferencial são bastante que eventualmente poderão ser transferi- de defesa, permitindo a construção de oli-
sofisticados. De maneira geral, o ponto de dos para outros genótipos. gonucleotídeos genes-específicos para as
partida é sempre o mesmo, isto é, RNA- diferentes famílias gênicas. Assim, estes
mensageiro extraído dos tecidos em es- Pesquisas em andamento oligos foram utilizados para amplificação
tudo. Os genes a serem testados, e cuja O Centro de Café “Alcides Carvalho”
dos genes através de RT-PCR Até o mo-
seqüência foi obtida através do seqüencia- do IAC, em parceria com a Embrapa Café, mento foi avaliada a expressão de mais
mento, são então utilizados como sondas instalou o laboratório de Biologia Molec-
de 30 genes envolvidos na resposta de
em experimentos simples, como RT-PCR ular do Café para o desenvolvimento de
resistência ao bicho-mineiro. Os resulta-
e Northern Blot, onde os genes são ava- pesquisas na área de Genômica Funcional.
dos analisados mostram que alguns deles,
liados individualmente; ou através de aná- Inicialmente, as pesquisas se concentram
como é o caso de genes que codificam
lises de microarrays (“micro arranjos”), na caracterização de genes relacionados

Figura 2. Padrão floral de variedades mutantes de C. arabica - (A) Calycanthema, (B) Maragogipe, (C) Sem perflorens, (D) Fasciata

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 69


enzimas-chave na sinalização de defesa No momento, novos locos de EST-SSR controlam a identidade do órgão floral,
incluindo receptores tipo kinases e gluta- estão em avaliação, e espera-se identificar como apetala2, apetala3, pistillata e aga-
tiona-transferases, e genes que codificam polimorfismos, apesar da reduzida variabi- mous; e genes como terminal flower, cons-
proteínas com ação antibiótica, tais como lidade encontrada. tans e spindly que atuam na formação dos
glucanases, apresentam um padrão de ex- órgãos florais em resposta ao fotoperíodo
pressão diferencial entre plantas resisten- Genética do Florescimento (Howell, 1998). Oligonucleotídeos genes-
tes e suscetíveis. Até o presente, estes ge- Outro aspecto em estudo é a controle específicos para cada um desses genes fo-
nes são os primeiros candidatos para bus- genético da floração em café. Apesar da ram desenhados de maneira a permitir que
cas de polimorfismos gênicos que possam importância deste aspecto do desenvolvi- toda a região codificadora fosse incluída.
servir como marcadores moleculares. mento da planta, uma vez que uma matu- Para caracterização destes genes fo-
Na segunda abordagem, a estratégia ração uniforme dos frutos depende de uma ram selecionadas plantas de Coffea ara-
em andamento é identificar sequências do floração sincronizada, pouco se conhece bica, com características de florescimento
tipo EST-SSR a partir de análises in silico sobre os genes que regulam esta etapa do distintas, como as cultivares Mundo Novo,
no Banco de Dados do Genoma Café. Estes ciclo do cafeeiro. Pesquisas em várias es- Catuaí e Obatã, e também com alterações
marcadores fazem parte da região transcrita pécies de plantas demonstram que o con- ou no desenvolvimento ou no controle do
do gene e podem, portanto alterar a função trole genético do florescimento é realizado florescimento, como os mutantes Semper-
do gene. Após a identificação, pares de oli- pela família de genes MADS, que regulam florens, Goiaba, Volutifolia, Abramulosa,
gonucleotídeos que flanqueiam a região do a diferenciação do meristema e a identi- Calycanthema, Anômala, Anormalis e Po-
EST-SSR são sintetizados, e utilizados para dade dos órgãos reprodutivos (Riechmann liortótropica (Carvalho et al., 1991). Os
amplificar as regiões correspondentes no & Meyerowitz, 1997). Assim, esta família resultados demonstram que estes genes
genoma de plantas suscetíveis e resistentes. de genes foi selecionada para iniciar os não apresentam variabilidade significativa
O objetivo é identificar diferenças no tama- estudos genômicos em café. Inicialmente, entre as plantas estudadas, uma vez que
nho destas regiões nas plantas avaliadas. análises in silico do Banco de dados do ge- para cada loco foram amplificados poucos
Numa primeira etapa foram avaliados 35 noma Café permitiram a identificação de fragmentos genômicos, e estes não dife-
locos de EST-SSR sem, no entanto, ter sido seqüências similares a nove dos principais rem significativamente de tamanho. As-
observado algum polimorfismo entre os genes MADS. Entre estes estão genes que sim, as novas pesquisas se concentram em
fragmentos amplificados a partir de plantas regulam a identidade do meristema, tais identificar variações no padrão de expres-
resistentes e suscetíveis (Pinto et al., 2007). como cauliflower e apetala1; genes que são destes genes, ao longo do período de
florescimento, que possam ser co-relacio-
nadas com as alterações no florescimento
Síntese de cafeína entre estas plantas. No entanto, os resulta-
dos obtidos até o momento indicam que o
A partir da identificação de plantas naturalmente descafeinadas, realizada por
pesquisadores do Centro de Café “Alcides Carvalho” (Silvarolla et al., 2004), surgiu a controle genético em café é realizado por
necessidade de se desenvolver marcadores moleculares que acelerassem a seleção um mecanismo semelhante ao caracteriza-
de plantas resultantes do cruzamento destas, e que continuassem a expressar a ca- do em outras espécies vegetais.
racterística. A estratégia em andamento envolve a caracterização da expressão dos
genes que codificam as principais enzimas da via biosintética de cafeína. Para estas Referências bibliográficas
análises, também foram identificadas sequências similares a estes genes no Banco Carvalho, A.; Medina Filho, H. P.; Fazuoli, L. C.;
de Dados do Genoma Café, e oligonucleotídeos genes-específicos foram sintetiza- Guerreiro Filho, O. & Lima, M. M. A. (1991).
dos. Através de análises de RT-PCR, utilizando RNA mensageiro extraído de folhas e Aspectos genéticos do cafeeiro. Revista Brasil.
Genet., 14(1): 135-183.
frutos AC em diferentes fases do desenvolvimento, o padrão de expressão destes ge-
Howell, S. H. (1998). Molecular Genetics of Plant
nes está sendo avaliado. Além disso, regiões do genoma correspondentes aos genes Development. Cambridge University Press.
também foram amplificadas a partir de DNA total das plantas ACs. Até o momento já Pinto, F. O., Maluf, M.P.; Guerreiro-Filho, O. (2007).
foi possível identificar polimorfismos nos genes das plantas analisadas, e estes estão Study of simple sequence repeat (SSR) markers
em avaliação em plantas F1 resultantes de cruzamento de ACs com a cultivar Mundo from coffee expressed sequences associated to
Novo. Espera-se que este marcador seja eficaz na seleção das plantas que contém leaf-miner response. Pesquisa Agropecuária Bra-
a mutação e a ausência de síntese de cafeína. Outros estudos ainda em fase inicial sileira (no prelo).
incluem a caracterização de genes durante o desenvolvimento e maturação de frutos Riechmann, J.L.; Meyerowitz, E.M. (1997) MADS
de diferentes cultivares de C. arabica; a identificação e mapeamento cromossômico Domain proteins in plant development. Biol.
Chem., 378: 1079-1101.
através de FISH de famílias de genes de resistência; e clonagem de sequências regu-
Silvarolla, M. B.; Mazzafera, P.; Fazuoli, L. C.
ladoras de genes com expressão tecido-específica. (2004) A naturally decaffeinated arabica coffee.
Em conclusão, pode-se perceber que todos os estudos mencionados aqui depen- Nature, London, v.429, p.826.
dem em grande parte do conhecimento das sequências de genes de interesse. Assim, Vieira et al. (2006) Brazilian coffee genome project:
o sequenciamento em larga escala de clones de bibliotecas de cDNA preparados a an EST-based genomic resource. Braz. J. Plant
partir de diferentes tecidos e ou órgãos do cafeeiro representa uma fonte de informa- Physiol., 18 (1):95-108, 2006.
ções básicas para estudos relacionados com biologia celular, bioquímica e fisiologia
da planta. Como resultado em longo prazo, o IAC e demais instituições de pesquisas Mirian Perez Maluf
cafeeiras, irão inaugurar uma nova fase em seus programas de melhoramento, bus- Embrapa Café / Centro de Café “Alcides
cando a integração de modernas metodologias com a tradição do melhoramento clás- Carvalho”, IAC
sico, e proporcionando o desenvolvimento de genótipos cada vez mais específicos.
( (19) 32120458
Além disso, perspectivas importantes para novos estudos poderão ser beneficiadas
com o Genoma Café, como por exemplo, o estabelecimento de programas de sele- * maluf@iac.sp.gov.br
ção assistida; a construção de bibliotecas contendo grandes fragmentos genômicos
utilizando cromossomo artificial de bactéria (BAC); a obtenção de marcadores gênicos Antonio Carlos Baião de Oliveira
para doenças, pragas e outras características agronômicas; a identificação de genes Centro de Café “Alcides Carvalho”, IAC
envolvidos na produção de cafeína, ácidos clorogênicos, carboidratos, entre outros; e ( (19) 32120458
estudos de evolução e da diversidade de genomas do gênero Coffea. * baiao@iac.sp.gov.br

70 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Café robusta: Fazuoli

uma nova opção para


a cafeicultura paulista Masako

Estima-se que o café robusta participe com 35% das operações envolvendo
café beneficiado (verde) em âmbito mundial. Calcula-se que a produção nas
diversas regiões cafeicultoras do mundo alcance cerca de 42 milhões de sacas
de café robusta. Os preços do café robusta no mercado internacional apresentam Júlio
pequeno diferencial em relação ao preço composto da OIC (inclusive robusta).
Tomando-se o período 1985 a 1995, o preço do robusta foi inferior em apenas
US$ 14,35 por saca de café beneficiado. Um fato relevante a considerar é que
os mercados da União Européia e asiático apresentam crescimento na demanda
pelo robusta tanto na forma de café verde como também de solúvel. Bernadete

No Brasil, o café robusta é cultivado em maior escala nos da cultura do café e pela existência de infra-estrutura ociosa
Estados do Espírito Santo, Rondônia e Bahia. A produção global para atividade nas cooperativas de produtores dessas regiões.
do país atualmente oscila em torno de 9 a 10 milhões de sacas, No entanto, atualmente a cultura da cana está sendo plantada em
tendo por destinação primordial a indústria do solúvel, a torrefa- várias regiões do Estado de São Paulo e pode ser um obstáculo à
ção e moagem para exportação. É importante ressaltar também implantação da cultura do café robusta em algumas dessas regi-
que a cafeicultura do robusta no Brasil responde por geração de ões. O IAC desenvolve desde 1970 um projeto de genética e me-
renda da ordem de um bilhão de reais, quando contabilizados lhoramento do café robusta, onde foram identificadas cultivares
todos os negócios envolvendo o produto. e plantas matrizes que poderão dar subsídios para a implantação
No Estado de São Paulo, plantios de robusta existem apenas gradual do café robusta no Estado de São Paulo. No entanto,
em condições experimentais. Parcelas com diversas cultivares há necessidade de experimentação regional em vários níveis de
de café robusta foram estabelecidas principalmente nas regiões tecnologia, inclusive com irrigação, uma vez que determinados
da Alta Paulista e Araraquarense há mais de dez anos, com a genótipos de café robusta são tolerantes a temperaturas mais al-
finalidade de avaliar o comportamento e o potencial produtivo tas, porém mais exigentes em água.
desses materiais genéticos. Os resultados obtidos até o presente O café robusta corresponde a denominação genérica da es-
são animadores, e evidenciam a grande rusticidade e produti- pécie Coffea canephora. Esta espécie é originária de regiões
vidade da espécie. Essa constatação mobiliza, crescentemente, tropicais, quentes, úmidas e de baixa altitude da África com
técnicos e produtores para o estabelecimento comercial do ro- temperaturas médias superiores a 23ºC. Representa cerca de 35
busta em São Paulo. Assim, com base nas informações dispo- % do volume mundial produzido, sendo o Vietnã, a Indonésia,
níveis, poder-se-á iniciar o plantio de áreas pilotos no Estado. o Brasil, a Costa do Marfim e Uganda os principais produtores.
Evidentemente, a expansão da atividade No Brasil, o café robusta é cultivado
deverá contar com novas informações principalmente, em regiões aptas para
tecnológicas a serem obtidas com a in- este tipo de cultura, compreendendo os
tensificação das pesquisas cafeeiras diri- Estados do Espírito Santo, Rondônia
gidas para a atividade. e em menor escala no Mato Grosso,
No Estado de São Paulo existem re- Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais
giões que ainda não encontraram alterna- e Acre. Embora não cultivado em São
tivas econômicas em substituição ao café Paulo, existe neste Estado extensa área
arábica, apesar das tentativas realizadas geográfica com aptidão climática para
com algumas culturas. Estima-se, porém, a implantação da cultura.
que caso a cafeicultura seja novamente Diversos são os fatores favoráveis
recomendada para essas regiões, poderá à implantação do café robusta no Es-
ter produtores interessados no cultivo, a tado de São Paulo. Existem condições
julgar pela tradição, ou seja, pela exis- climáticas apropriadas, há tradição e
tência de produtores com conhecimento infra-estrutura para a produção de café
Planta de café Robusta

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 71


nessas regiões que são ex-pro- para a produção de café, que foi implementada no passado para
dutoras de café arábica e várias o cultivo do arábica. Algumas destas regiões que hoje são con-
das indústrias solubilizadoras sideradas problemáticas para o cultivo desta espécie são, porém,
e torrefadoras localizam-se na aptas para o café robusta.
região. Além disso, o café ro-
busta possui várias caracterís- Oferta do produto e proximidade
ticas agronômicas e tecnológi- das indústrias solubilizadoras
cas que estimulam o seu culti- Segundo consta, a indústria de café solúvel trabalha atual-
Planta de café Robusta vo e industrialização. A seguir mente com apenas 50% de sua capacidade operacional. Portan-
são apresentadas e discutidas to, a cultura do robusta em São Paulo poderia contribuir para a
algumas considerações sobre o café robusta, visando a sua expe- redução desse déficit. Os produtores com apoio das indústrias
rimentação, seleção e plantio no Estado de São Paulo. de solúveis, não teriam dificuldades em comercializar suas pro-
duções. Existem no país sete solubilizadoras. Três encontram-se
Aptidão Climática e fator hídrico instaladas no Estado de São Paulo e duas no norte do Paraná.
Recentemente um estudo da aptidão climática para a cul- O robusta processado nessas indústrias provém essencialmente
tura de robusta no Estado de São Paulo elaborado no Instituto de Rondônia e Espírito Santo. Este parece ser outro fator esti-
Agronômico, em Campinas, revelou existência de uma ampla mulante à produção de robusta em São Paulo, cujos custos de
faixa com aptidão climática preferencial à essa cultura. Essa re- transporte seriam reduzidos.
gião que se localiza principalmente no oeste do Estado de São
Paulo, apresenta temperatura média anual superior a 22ºC, com Características agronômicas
altitudes inferiores a 500 m e deficiência hídrica anual abaixo de e tecnológicas do café robusta
150 mm. Tais condições são semelhantes às do centro de origem Produtividade e rusticidade: Ensaios desenvolvidos pelo
da espécie na África. A região sul do Vale do Ribeira, também IAC têm evidenciado que algumas seleções de robusta plantados
é considerada climaticamente apta ao cultivo do café robusta. em espaçamentos adequados apresentam potencial de produção
Essas regiões perfazem um total de aproximadamente 200.000 igual ou superior aos arábicas. O cafeeiro robusta possui sistema
ha de área apta. radicular mais desenvolvido que o do arábica, sendo também
Com referência ao fator hídrico, a experiência tem demons- menos exigente em fertilizante. Conseqüentemente, o custo de
trado que o café arábica e o robusta suportam deficiências de até produção é inferior ao do arábica.
150mm anuais, quando em solos profundos e de boas proprieda- Propagação por sementes: Algumas cultivares podem ser
des físicas. Acima desse valor, a área pode ser considerada como propagadas por sementes. No entanto essas plantações não apre-
marginal. É o que acontece na faixa adjacente ao Rio Grande, no sentarão uniformidade, devido a sua forma de reprodução.
norte do Estado. Nessa faixa e em outras regiões que apresentam Propagação vegetativa: Uma das grandes vantagens da
déficit hídrico, a irrigação poderá viabilizar o plantio comercial cultura do café robusta relaciona-se com a possibilidade de mul-
do café robusta, assim como do arábica. tiplicação vegetativa realizada por estaquia de segmentos de
ramos ortotrópicos. Plantas geneticamente superiores, podem
Tradição e Infra-estrutura assim, ser rapidamente multiplicadas. O plantio ideal de café ro-
O Estado de São Paulo contribui atualmente com menos busta deverá ser efetuado por este tipo de propagação, utilizan-
de 10% da produção nacional de café tendo produzido em 2006 do-se os melhores clones do programa do IAC e do INCAPER.
cerca de 4,2 milhões de sacas de café arábica. Entretanto, o Es- Tolerância ao calor: O café robusta tolera temperaturas
tado já foi responsável por cerca de 25% da produção nacional. mais altas (acima de 23ºC), portanto, poderá ser uma nova opção
Inúmeras propriedades rurais ainda contam com infra-estrutura nas regiões com temperaturas médias mais elevadas. A tempe-
ratura média ideal para o café robusta
está entre 23 e 26°C.
Tolerância à seca e necessidade
de irrigação: De maneira geral algu-
mas cultivares de café robusta têm se
revelado mais tolerantes a curtos perí-
odos de estiagem, do que as cultivares
de C. arabica. Outras, porém, são exi-
gentes em água e, portanto, necessitam
ser irrigadas.
Resistência a pragas e doenças:
Os principais problemas fitossanitários
do café arábica no Brasil são os nema-
tóides (Meloidogyne incognita, M. pa-
ranaensis e M. exigua), o bicho minei-
ro (Leucoptera coffeella), a broca dos
grãos (Hypothenemus hampei) e a fer-
rugem (Hemileia vastatrix). Algumas
regiões quentes, como a Alta Paulista,
Noroeste e Araraquarense, tornaram-se
problemáticas para a cultura do arábica
devido a incidência conjunta de vários
destes agentes, associada à ocorrência
Frutos de café Robusta de solos erodidos. Essas regiões, po-

72 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


rém, são aptas ao cultivo de C. canephora. As cultivares de Cultivares e
café robusta no geral são resistentes à ferrugem e pelo menos melhoramento de
uma, a cultivar Apoatã é altamente resistente aos nematóides e café robusta
dispensam em certos casos também a aplicação de inseticidas (Coffea
para controle do bicho mineiro. No entanto, deve ser ressal- canephora)
tada a maior incidência da broca dos grãos no café robusta, A espécie Coffea cane-
que parece ser o principal problema fitossanitário da cultura phora, que produz o café de-
do robusta no Brasil. nominado de robusta é diplói-
A maturação mais tardia dos frutos de algumas cultivares de (2 n = 22) e é de fecundação
permite a multiplicação mais intensa dos insetos. Os frutos do cruzada, pois os cafeeiros são
robusta apresentam também pericarpo e endocarpo mais finos auto-incompatíveis. Estudos
e menor quantidade de mucilagem, características que podem baseados em isoenzimas iden-
Planta Robusta RN
estar relacionadas a maior suscetibilidade ao inseto. O estudo tificaram dois grandes grupos
de diversos sistemas de plantio e a seleção de progênies e clones de C. canephora.
poderá reduzir significativamente os níveis de infestação. 1- Grupo Guineano, que compreende os cafés do tipo Kou-
Suscetibilidade a ventos: O café robusta é mais suscetível ilou originário da Costa do Marfim, Guiné e Oeste da África,
a ventos do que o arábica. Há necessidade de proteger as planta- cujas principais características são: internódios de menores
ções com quebra – ventos. tamanhos, frutos pequenos, maturação precoce dos frutos, se-
Maturação: O período de crescimento e maturação dos fru- mentes pequenas e com menor peso, peneira média baixa, altos
tos do café arábica é de 180 a 250 dias. No café robusta, existe teores de cafeína (em torno de 2,7%), na maior parte das plantas
grande variabilidade para essa característica ocorrendo cultivares deste grupo suscetibilidade à ferrugem, tolerância à seca, bebida
de maturação precoce (270 dias), média (300 dias) ou tardia (330 inferior ao Grupo Congolês e coloração dos brotos novos fre-
dias). O cultivo de clones ou progênies desses três grupos poderia qüentemente bronze.
2- Grupo Congolês, provenientes da África Central apre-
facilitar a operacionalização da colheita e secagem dos frutos.
sentam dois subgrupos. O subgrupo 1 (SG1) formado pelos ti-
Rendimento: No café arábica, a relação entre o peso de café
pos de café Robusta ou Híbridos entre os dois grupos (Kouilou
beneficiado e o de café em coco, é cerca de 50%. No café ro-
x Robusta) e o subgrupo 2 (SG2) que corresponde ao café Ro-
busta, este rendimento pode atingir até 65%, sendo mais uma busta propriamente dito. Os representantes do grupo Congo-
característica favorável desse café. lês apresentam internódios longos, frutos grandes, maturação
Tamanho das sementes e porcentagem de grãos moca: média a tardia dos frutos, sementes grandes, peso de sementes
As principais variedades de C. canephora cultivadas no Brasil, maiores do que as do Grupo Guineano, peneira média alta, me-
são derivadas do grupo Guineano (Conilon), apresentam grãos
pequenos (peneira média14 a 16) com alta porcentagem de grãos
moca (30 a 40%). A maior parte das progênies e clones de café
robusta selecionados nas antigas Estações Experimentais do IAC
Cultivares desenvolvidas no IAC
e propriedades particulares do Estado de São Paulo, são deriva- O IAC desenvolve desde 1970 um programa de
das do grupo Congolês (Robusta) e têm grãos maiores (peneira melhoramento de Coffea canephora utilizando introduções
15 a 19) e baixa porcentagem de grãos moca (10 a 20%), sendo principalmente do Grupo Congolês (Robusta). Selecionou
portanto bastante promissoras do ponto de vista tecnológico. até o presente várias variedades de polinização aberta, que
Bebida: Apesar do café robusta ter bebida de qualidade in- poderão ser reproduzidas por sementes. Outra estratégia
ferior ao arábica, existe grande variabilidade para diversas ca- de seleção foi a obtenção de mais de 200 plantas matrizes
racterísticas organolépticas, como perfil de sabor, corpo e aroma que poderão ser constituídas em clones, que deverão ser
que poderiam modificar a qualidade final do produto industriali- plantados vegetativamente (estacas ou cultura de tecidos).
zado e também de seus blends com o arábica. Caso seja utiliza- A seguir são relacionadas as cultivares selecionadas pelo
do o café cereja descascado, a bebida poderá se apresentar com IAC que podem ser plantadas por sementes em plantios
melhor qualidade. comerciais:
Sólidos solúveis: Sabe-se que o teor de sólidos solúveis em Kouilou
Existem várias seleções com maturação precoce e média.
C. canephora é superior ao de C. arabica. Existe entre os ro-
Robusta
bustas considerável variabilidade para essa característica. Ren-
Existem várias seleções com maturação tardia.
dimentos industriais muito superiores aos atuais poderiam ser
Guarini IAC 1598
obtidos através do estudo de novas seleções de robusta.
Apresenta maturação tardia.
Cafeína: O teor médio de cafeína nos grãos de C. cane-
Bukobensis IAC 827
phora é de 2,5% embora varie de 1,4 a 4,0%. Altos teores desse Apresenta maturação precoce.
alcalóide são interessantes pelo maior rendimento de extração. Robusta RN
Condução da lavoura: A principal diferença no manejo da São seleções de C. canephora resistentes aos nematóides
cultura do robusta frente ao arábica, consiste nas podas de con- M. exigua, M. incognita e M. paranaensis.
dução. Por se tratar de planta vigorosa adaptada a luz e ao calor, São cultivares de polinização aberta e reproduzidas por
o robusta tem desenvolvimento das plantas acelerado, deman- sementes. No plantio deve-se utilizar o espaçamento de
dando ações permanentes de poda nas plantas, seja em espaça- 3,5 a 4,0m entre linhas por 1,0 a 1,5m entre plantas com 1
mentos largos ou adensados. planta na cova e com 3 a 4 hastes ortotrópicas.
Todavia, esse conjunto de características, tornam o culti- No IAC existem outras seleções de café robusta, como a
vo do robusta bastante promissor para aquelas regiões paulistas variedade Laurentii e híbridos F1 entre plantas especiais
com vocação para a cafeicultura, onde apresentam temperaturas do Grupo Congolês ou híbridos entre cafeeiros do grupo
elevadas para arábica e problemas com nematóides. Congolês e Grupo Guineano.

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 73


nores teores de cafeína (em torno de 2,5%), maior resistência
à ferrugem, suscetibilidade à seca, exigência em água, bebi-
da superior ao Grupo Guineano e coloração das folhas novas
bronze ou marrom.
As diferenças entre os sub grupos SG1 e SG2 não são muito
pronunciadas, a não ser no tamanho das folhas e tolerância à seca.

Clones selecionados pelo IAC


Foram selecionadas mais de 200 plantas matrizes altamente
produtivas com altos teores de sólidos solúveis e menores teores
de cafeína. Alguns dos clones selecionados pelo IAC oriundos
dessas plantas matrizes estão em fase de experimentação. Entre
eles destacam-se do grupo Kouilou: IAC66-1; IAC66-3; IAC68-
4; IAC69-5; IAC70-11; IAC70-12 e IAC2293-165; do grupo Ro-
Frutos das cultivares Kouilou e Guarini
busta: IAC1655-7; IAC1647-1; IAC1647-2; IAC Robusta col 10;
IAC1653-7; IAC1650-6; IAC1645-3; IAC2290-8; IAC2290-9;
Cultivares clonais
IAC2290-10; IAC2291-12; IAC2286-5; IAC2286-12; IAC2292- EMCAPA 8111
15; IAC2259-12; do grupo Bukobensis: IAC827 col 2; IAC827 Composta de 9 clones de café Conilon com maturação precoce;
col 4; do grupo Laurentii: IAC col 10; do grupo Guarini:
IAC1598-1; IAC1598-7, do grupo Robusta com resistência aos EMCAPA 8121
nematóides Melodogyne exígua, M. incognita e M. paranaensis: Composta por 14 clones de café Conilon com maturação inter-
‘IAC 3597-3, IAC 3597-8, IAC 3599-4, IAC 3599-2, IAC 3600-9 mediária;
e IAC 3600-12’. EMCAPA 8131
Para o plantio de clones é de fundamental importância co- Composta por 9 clones de café Conilon com maturação tardia;
nhecer as características de cada clone, principalmente a época EMCAPA 8141 – ROBUSTÃO CAPIXABA
de maturação. Os clones devem ser plantados em grupos de clo- Composta de 10 clones de café Conilon com maturação média.
nes compatíveis com maturação e outras características seme- A sua principal característica é tolerância à seca.
lhantes. Neste caso deve-se plantar um clone por linha de café. INCAPER 8142 – CONILON VITÓRIA
O mínimo de clones pode variar de dois até dez. Para plantar Composta de 13 clones com maturação média.
somente um clone é de fundamental importância colocar tam- Cultivar propagada por sementes
bém uma linha com vários clones mesclados ou de preferência EMCAPER 8151 – ROBUSTA TROPICAL
uma variedade de polinização aberta propagada por sementes, Corresponde à recombinação em campo isolado de 53 clones de
que serão os polinizadores. Neste caso colocar de 3 a 4 linhas café Conilon.
de um clone elite alternados por uma linha do grupo de clones
escolhido ou da variedade polinizadora. Os plantios no Estado
de São Paulo estão sendo feitos apenas experimentalmente em CONCLUSÃO
ensaios ou campos pilotos. Para plantios em escala comercial, há Pode-se afirmar que no Brasil existem clones (propagados
necessidade de estabelecer jardins clonais. por estaquia) e cultivares (propagadas por sementes) que
poderão dar subsídios para a implantação gradativa do
Cultivares desenvolvidas pelo INCAPER café robusta no Estado de São Paulo.
O INCAPER (Instituto Capixaba de Pesquisa e Extensão
Rural) do Espírito Santo, iniciou em 1985 um programa de me-
lhoramento genético do grupo Conilon visando selecionar plan- Luiz Carlos Fazuoli, Masako Toma Braghini, Julio César
tas matrizes superiores que devem ser multiplicadas vegetativa- Mistro e Maria Bernadete Silvarolla
mente (cultivares clonais) e cultivares propagadas por sementes. Instituto Agronômico, Centro de Café “Alcides Carvalho”
De acordo com informações dos pesquisadores do INCAPER, a ( (19) 3241-5188 ramal 370; 3212-0458
seguir são apresentadas as principais cultivares desenvolvidas * fazuoli@iac.sp.gov.br; mako@iac.sp.gov.br;
e recomendadas principalmente para o Espírito Santo, mas que * mistrojc@iac.sp.gov.br; bernadet@iac.sp.gov.br
poderão ser experimentadas em plantios comerciais no Estado

Cafeeiros Kouilou em Rondônia Cafeeiros Kouilou em Rondônia

74 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Sustentabilidade:
pauta da cafeicultura no século XXI
A
s alterações nos padrões de produção e comercialização
de café, principalmente nas últimas duas décadas, são
notórias e irreversíveis. Desde a introdução da bebida na
Europa, no século XVII, nunca foram observadas mudanças tão
significativas na estrutura, na conduta e no desempenho de seu
sistema agroindustrial. Essas alterações refletem as preocupa-
ções da comunidade internacional com os limites do desenvol-
vimento do planeta, iniciadas na década de 60, com os riscos de
degradação do meio ambiente, as preocupações com a saúde do
consumidor e com o bem estar dos produtores e trabalhadores
rurais.
Em 1987, a Comissão Mundial da ONU sobre o Meio Am-
biente e Desenvolvimento (UNCED) apresentou um documento
conhecido por “Our Common Future”, ou Relatório Brundtland.
De acordo com esse relatório, “Desenvolvimento sustentável é
aquele que satisfaz as necessidades do presente sem compro-
meter a capacidade das futuras gerações satisfazerem suas pró-
prias necessidades” (WCED, 1987). A cafeicultura favorecendo a natureza
Esse conceito refere-se, principalmente, às conseqüências
do impacto das atividades econômicas sobre o meio ambiente,
com relação à qualidade de vida e o bem-estar da sociedade, tan- Nos últimos anos, a OIC tem atuado efetivamente na pro-
to presente quanto futura. Atividade econômica, meio ambiente moção da produção, comércio e consumo de cafés sustentáveis.
e bem-estar da sociedade formam o tripé sobre o qual se apóia o O Art. 39 do atual Acordo Internacional do Café (AIC) prevê
conceito de desenvolvimento sustentável. que seus membros devem “levar a gestão sustentável de recur-
A aplicação do conceito à realidade requer, no entanto, uma sos e do processamento do café na devida consideração à luz
série de ações técnicas e socioeconômicas, tanto por parte do dos princípios e objetivos de desenvolvimento sustentável esta-
poder público, como da iniciativa privada e dos movimentos so- belecidos na Agenda 21”.
ciais, tais como as Organizações Não-Governamentais (ONGs). De acordo com o documento ED 1981/06 da OIC, de 14 de
Essas ações devem buscar melhores condições de vida, associa- fevereiro de 2006 (OIC, 2005),
das à preservação e recuperação do meio ambiente e à condução “Sustentabilidade em café implica condições de produção,
da economia de forma vinculada a tais exigências. processamento e comércio que, com referência a todas as par-
A Organização Internacional do Café (OIC), fórum dedica- tes envolvidas na cadeia da oferta,
do a discutir questões relacionadas ao café internacionalmente, a) proporcionem retorno econômico suficiente para cobrir
deve atuar como referência para a cooperação em torno do de- os custos de produção e de vida, acrescido de uma margem
senvolvimento de uma economia cafeeira sustentável. Os objeti- para o desenvolvimento;
vos da OIC, “Alcançar um equilíbrio razoável entre a oferta e a b) tratem o meio ambiente de maneira responsável, permi-
procura de café e que contribuam para um equilíbrio em longo tindo que os recursos naturais continuem disponíveis para as
prazo entre a produção e o consumo” (OIC, 2003), denotam sua gerações futuras; e
preocupação com a sustentabilidade. c) assegurem condições sociais e de trabalho compatíveis
A OIC reúne representantes de países importadores e expor- com os padrões internacionais e conducentes à manutenção de
tadores de café para discutir e desenvolver estratégias globais comunidades estáveis.”
compartilhadas, o que oferece uma importante oportunidade O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
para a definição e implementação de um sistema de comércio (MAPA) publicou, por ocasião da II Conferência Mundial do
mais eqüitativo e participativo (Maketradefair, 2006). Café, o relatório “Brasil: Sustentabilidade no setor cafeeiro”,
onde apresenta a visão do País sobre a sustentabilidade, defi-
nindo-a como “Um conjunto abrangente de ações e iniciativas
voltadas para assegurar a continuidade e a viabilidade da ati-
vidade cafeeira, abrangendo questões como a preservação am-
biental, as relações sociais e econômicas no trabalho, condições
dignas de emprego e de remuneração, a melhoria da qualidade
do produto e o desenvolvimento dos mercados e do consumo”
(OIC, 2005).
No mesmo documento, a posição brasileira afirma que todos
esses critérios devem estar inseridos na política nacional do café
e nos programas setoriais de toda a cadeia produtiva. A sustenta-
Sérgio, Flavia Maria e Gerson Silva bilidade, na prática, deve ser definida levando-se em considera-

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 75


ção os objetivos e necessidades nacionais dos tivo, aberto a todos que integram ativamente
países membros da OIC, não devendo ser tra- o setor do café verde no mundo, desde orga-
tada de forma dissociada da rentabilidade do nizações de produtores, comércio, indústria e
setor. Tratada de modo abrangente, nos cam- sociedade civil organizada. Destaca-se que o
pos da produção, do comércio e do consumo, investimento necessário para adaptação ao 4C
não devendo permanecer restrita à produção não significa necessariamente em prêmio no
Cafeicultura sustentável
do café verde. preço da saca comercializada. O que existe é o
Finalmente, as práticas sustentáveis, nos compromisso das indústrias de comprar, e da
diversos campos da atividade cafeeira, devem respeitar princípios rede varejista de comercializar, de forma gradativa e ao longo do
e normas constantes nas respectivas convenções internacionais, tempo, volumes crescentes de cafés com padrão 4C. A previsão é
que tratam da proteção ambiental, organização do trabalho, saú- que seja comercializada, já em 2007, 4,2 milhões de sacas de café
de, e funcionamento do comércio – Organização Internacional do 4C no mundo, evoluindo para meta de 25% do mercado mundial
Trabalho (OMT), Organização Mundial da Saúde (OMS) e Orga- em 2011. Iniciativas já sinalizam demanda e comercialização de
nização Mundial do Comércio (OMC) – dentre outros. café com padrão 4C no mercado interno (Aguiar, 2006b).
O Conselho Deliberativo da Política do Café (CDPC) apro- Atento às transformações produtivas e mercadológicas pe-
vou, em maio de 2006, o Plano Estratégico para o Desenvolvi- las quais vem passando o sistema agroindustrial do café no mun-
mento da Economia Cafeeira (Pedec), documento elaborado no do, o Centro de Café ‘Alcides Carvalho’, Instituto Agronômico
âmbito do Conselho Nacional do Café (CNC), Associação Bra- (IAC), mais uma vez sai na frente, atuando efetivamente em
sileira da Indústria do Café (Abic), Associação Brasileira da In- pesquisas fitotécnicas e socioeconômicas de cafés produzidos
dústria de Café Solúvel (Abics), Conselho dos Exportadores de dentro de preceitos ligados ao desenvolvimento sustentável.
Café (Cecafé) e Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil No ano de 2006 foi lançado na sede da OIC em Londres o
(CNA). O documento deverá servir de base para a implantação livro “Do grão à xícara: como a escolha do consumidor afeta o
das políticas para o setor para os próximos anos. O Pedec incen- cafeicultor e o meio ambiente” e o DVD “Café Solidário”, fru-
tiva investimentos no marketing dos Cafés do Brasil e na explo- tos de parceria entre IAC, Instituto de Defesa do Consumidor
ração de nichos de mercado para cafés especiais e certificados, (IDEC), Consumers International (CI) e International Institute
incentivando a participação da cadeia produtiva no programa de for Environment and Development (IIED) (Consumers Interna-
cafés sustentáveis desenvolvido pelo governo: a PIC - Produção tional, 2007).
Integrada do Café (CNC, 2006). O livro e o DVD foram lançados no Brasil pelo IAC e pelo
A implementação da norma PIC permitirá a rastreabilidade IDEC durante o 5o Simpósio de Pesquisa dos Cafés do Brasil
da produção e o desenvolvimento de uma certificação nacional, em maio de 2007. O evento, promovido pelo Consórcio Brasi-
com normas que atendam às exigências internacionais e custos leiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café (CBP&D/Café),
reduzidos, além de fácil aplicabilidade por parte dos produtores. administrado pela Embrapa Café, trouxe como tema dessa edi-
A PIC propõe uma norma que incentiva o aperfeiçoamento grada- ção “Qualidade, sustentabilidade e rastreabilidade”, destacando
tivo de cafeicultores que desejam ter seus produtos reconhecidos o desenvolvimento sustentável da cafeicultura como uma das
através de certificação. Ela foi desenvolvida com base em códi- principais pautas de discussões entre os distintos segmentos do
gos já existentes para a cafeicultura e no modelo de sucesso pro- agronegócio café.
posto pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Essa publicação, única, apresenta as iniciativas de certifica-
(MAPA) para Produção Integrada de Frutas (PIF). Trata-se de uma ção de cafés sustentáveis em andamento no Brasil e traz reco-
iniciativa brasileira de oferecer café com valor social e ecológico mendações aos diferentes elos do agronegócio café a respeito da
agregado, que vem ao encontro das exigências dos países consu- divulgação, comercialização, certificação e consumo de cafés
midores que começam a cobrar e valorizar condições apropriadas sustentáveis, incentivando as organizações de consumidores e
de produção e rastreabilidade do produto (Aguiar, 2006a). o próprio consumidor final a preferir produtos ambientalmente
Os desafios sociais, econômicos e ambientais enfrentados corretos, socialmente justos e economicamente viáveis.
pelo setor cafeeiro resultam de longa história de desenvolvimento
inadequado da infra-estrutura, deficiências sistêmicas na cadeia Referências Bibliográficas
de abastecimento e imperfeições mercadológicas. Esses desafios AGUIAR, C.M.G. 4C apresenta novo conceito de comercialização de café. Dis-
ponível em www.embrapa.br/cafe , Acesso dia 20/11/06, 2006b
persistem, mas há esperança de se alcançar maior sustentabilidade AGUIAR, C.M.G. Workshop PIC incentiva debate sobre a normalização. Dispo-
e estabilidade no setor, em função da tendência crescente de privi- nível em www.embrapa.br/cafe , Acesso dia 01/09/06, 2006a
legiar cadeia de abastecimento e relações de mercado mais trans- Consumers International,”Do grão à xícara: como a escolha do consumidor afeta
parentes, maior diferenciação no mercado e adoção intencional de cafeicultores e meio ambiente”. Consumers International e International Inter-
“melhores práticas de produção” em prol da sustentabilidade. national Institute for Environment and Development, 2007, 60p.
Nas duas últimas décadas, o mercado de cafés especiais tem C.N.C. Cafeicultura terá plano estratégico. Disponível em www.cncafe.com.br.
Acesso: 10/09/06, 2006
crescido num ritmo bastante acelerado, gerando importantes MAKETRADEFAIR, Pobreza en tu taza: la verdad sobre el negocio del café .
oportunidades para a diversificação de produtos, em mercados de Disponível em : //www.maketradefair.com/. Acesso em 15/09/2006.
valor agregado mais elevado, com base em características espe- O.I.C. Iniciativas de sustentabilidade em café. Londres: Organização Internacio-
cíficas de qualidade. Enquanto o mercado do café para consumo nal do Café. Documentos: EB 3846/03, 2003, 9p.
geral ou “mercado de massa” estagnou-se, o crescimento regis- O.I.C. Informe sucinto preliminar sobre la 2a Conferencia Mundial del Café Lon-
dres: Organização Internacional do Café. Documentos: ICC 94-13, 2005, 7p.
trado no mercado de cafés especiais tem gerado oportunidades WCED, Our Common Future: The word commission on environment and deve-
importantes para os agricultores. O mercado de “cafés sustentá- lopment. Oxford: Oxford University Press, 1987, 400p.
veis” certificados tem crescido num ritmo ainda mais acelerado,
e muitos selos de sustentabilidade tiveram crescimento anual de
mais de 20% nos últimos anos (Maketradefair, 2006). Sérgio Parreiras Pereira, Flavia Maria de Mello Bliska e Ger-
Outra iniciativa que vem ao encontro da produção sustentável son Silva Giomo
de café é o Código Comum para a Comunidade Cafeeira (4C) que Instituto Agronômico, Centro de Café “Alcides Carvalho”
visa ampliar a oferta de café verde no mercado comum, produzi- ( (19) 3241-5188 ramal 370
do com critérios ambientais, sociais e econômicos. Esse Código * sergiopereira@iac.sp.gov.br;
está sendo desenvolvido num processo transparente e participa- bliska@iac.sp.gov.br; gsgiomo@iac.sp.gov.br

76 O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007


Ponto de vista

A transferência de tecnologia com o café


no IAC e os novos paradigmas da moderna

Thomaziello
cafeicultura brasileira
T
A cafeicultura oda essa gama de conhecimentos foi amplamente
divulgada para os cafeicultores através dos Enge- A seguir algumas das principais ati-
brasileira passou por nheiros agrônomos extensionistas do antigo De- vidades desenvolvidas:
um longo processo partamento da Produção Vegetal, hoje CATI, além de • Seis Cursos de Atualização em Café para técnicos.
de aprimoramento técnicos de Cooperativas e outras entidades ligadas ao • Três Seminários Internacionais de Café.
• Sete Workshops Regionais com técnicos locais,
desde a introdução setor cafeeiro, como as EMATERs nos diversos estados
para capacitação e levantamento de demandas
do café no Estado do cafeeiros e técnicos consultores.
de pesquisa: Votuporanga; Adamantina; Garça;
Pará em 1727. Com isto, consolidou-se no Brasil uma cafeicultura Lins; Mococa; Franca; São João da Boa Vista.
moderna e competitiva. • Quatro Boletins técnicos sobre diversos aspectos
A sua real
Com a constituição do Consórcio Brasileiro de Pes- da cafeicultura.
tecnificação teve os quisas Cafeeiras (CBP&D/Café) a partir de 1998 coorde- • Instalação e condução de campos de cultivares
primeiros passos a nado pela EMBRAPA/Café, todas as instituições do setor de café IAC em diversas regiões cafeeiras como:
partir da criação do passaram a trabalhar dentro do novo sistema, estabele- Franca; Piraju; Garça; São Sebastião da Grama,
Instituto Agronômico cendo projetos prioritários dentro de focos temáticos de entre outras, como base para dias de campo e ou-
de Campinas em relevância. Estabeleceu-se também um amplo Programa tras atividades de Transferência de Tecnologia.
de Difusão e Transferência de Tecnologia encarregado de • Participação nas Campanhas de Qualidade do
1887, com trabalhos
adaptar os novos conhecimentos e difundi-los aos técni- Café de São Paulo promovida pela Câmara Seto-
pioneiros de seu cos e produtores. rial de Café.
primeiro Diretor O IAC através do Centro de Café ‘Alcides Carvalho’ • Agrishow: participação de pesquisadores do Cen-
Franz W. Dafert procurando sempre se modernizar e estar à frente de no- tro de Café no atendimento a técnicos do setor e
sobre adubação do vas iniciativas, num trabalho pioneiro dentro da Institui- cafeicultores
cafeeiro. ção, estabeleceu um Projeto de Difusão e Transferência
• Gessagem em altíssimas dosagens na formação de
de Tecnologia para o Estado de São Paulo buscando in-
A história da lavouras: Que dosagem? Tipos de solos? Vantagens?
clusive uma parceria com a CATI, órgão responsável pela Problemas / Cuidados?
grande contribuição assistência técnica e extensão rural no Estado.
do IAC para o • Fosfitos: Quais? Quando? Para quê? Dosagens? Mis-
Ao longo desses oito anos de existência do projeto, turas com fertilizantes foliares e defensivos?
desenvolvimento uma série de atividades próprias ou em conjunto com a • Aminoácidos: Qual a finalidade? Quando aplicar?
da cafeicultura CATI e outras entidades do setor foram desenvolvidas, Quais as dosagens? Quais aminoácidos?
paulista e brasileira com o IAC buscando sempre o objetivo de capacitar os • Hormônios: semelhantes as indagações sobre amino-
está descrita com técnicos extensionistas a fim de dar suporte as suas ativi- ácidos.
dades junto aos cafeicultores. • Silício: Como corretivo do solo? Controle de doen-
detalhes no final da Vivemos um momento em que a velocidade de in- ças? Quais as dosagens?
revista. formação é alucinante, o mesmo ocorrendo com a busca • Ca e B em pré e pós-florada: já são usados em grande
A Seção de Café por novos conhecimentos. A todo o momento surgem no escala. No entanto, os resultados até então publicados
da Secretaria da mercado produtos “milagrosos”. O número de trabalhos mostram mais evidências de que não funcionam para
Agricultura de publicados em Congressos, Simpósios, Fóruns e outros café. São necessários estudos mais consistentes.
São Paulo, criada eventos, muitos sem base científica correta, na avidez de • Fertirrigação: é uma realidade com o crescimento
se produzir “papers”, é muito grande. das áreas irrigadas. Mas existem ainda muitas dúvi-
em 1927 pelo Dr.
Com isto o técnico extensionista e o produtor ficam das: Número de fertirrigações? Comparação com sis-
Fernando Costa, no meio dessa verdadeira guerra de interesses e informa- tema tradicional de adubação? Tipos de solo onde está
então Secretário da ções contraditórias. em uso? Acidificação do bulbo? Limitação do sistema
Agricultura, também Qual o caminho a seguir? Adotar as “novas tecno- radicular?
prestou relevantes logias” sem base científica sólida e estar na “crista da • Melaço / Acúcar em pulverização: Qual é a finalida-
onda”, ou manter-se fiel aos conceitos estabelecidos e de real? Aumento de produção? Quais as vantagens de
serviços ao longo
oriundos de pesquisas sérias e de longa duração, como é seu uso?
da sua existência Com certeza novos desafios sempre irão surgir.
necessário e esperado para uma cultura permanente como
para a cafeicultura, a do cafeeiro, e que tem proporcionado ótimos níveis de Cabe aos pesquisadores dar a resposta.
com destaques produtividade? O importante para o produtor é fazer a “lição de
para os trabalhos Qual é o custo dessas “novidades”? Quanto efetiva- casa”, usando tecnologias consolidadas e consagradas, o
mente acrescentarão na produtividade? que é suficiente para se obter ótima produtividade.
sobre Qualidade
É evidente que a ciência é dinâmica e deve evoluir A área de Difusão e Transferência de Tecnologia
de Café e as está ávida para saber as respostas.
sempre agregando novos conhecimentos e quebrando pa-
inúmeras campanhas
radigmas.
para Melhoria Algumas dessas “tecnologias” estão presentes e até Roberto Antonio Thomaziello
da Qualidade em uso em larga escala, mas devem ser melhor pesquisa- Instituto Agronômico, Centro de Café “Alcides
desenvolvidas no das, a fim de que técnicos e produtores tenham segurança Carvalho”
final dos anos 20 e ao recomendá-las e/ou adotá-las. Entre essas seguem as ( (19) 3241-5188 ramal 370; 3212-0458
no decorrer de 1930. mais em evidências: * rthom@iac.sp.gov.br

O Agronômico, Campinas, 59(1), 2007 77

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