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ele mesmo ver EM SI, PARA SI, EM E PARA SI, ELE MESMO ETC.

em si, para si, em e para si, ele mesmo etc. A terceira pessoa do pronome
reflexivo em alemão é sich. É singular e plural, e cobre todos os três gêneros.
Assim, significa “si mesmo, ele mesmo, ela mesmo, eles mesmos, um ao outro”.
Pode ser acusativo ou dativo, mas não nominativo ou genitivo. Acompanha os
numerosos verbos reflexivos do alemão, e pode ser também precedido por várias
preposições. Por exemplo, für sich (literalmente, “para si” etc.) ocorre em
contextos tais como “Precisa de um quarto para si mesmo”, “Ela cuida de si
mesma” e “Isso é um problema em si mesmo, ou seja, independentemente de
suas ligações com outros assuntos”. No uso comum, an sich (“em si” etc.) difere
pouco, com freqüência, de für sich: considerar um assunto an sich é também
considerá-lo independentemente de suas ligações com qualquer outra coisa, e se
alguma coisa é certa an sich, a sua certeza é *IMEDIATA e não dependente de
qualquer outra coisa. Em ambos esses contextos, an und für sich (“em e para si
mesmo”) é apenas um equivalente mais enfático de an sich. Outras expressões
desse tipo usadas por Hegel são in sich (“dentro de si, em seu próprio íntimo”
etc.) e, mais crucialmente, bei sich (“de acordo consigo mesmo” etc.), que ocorre
em contextos como “guardar consigo, conter-se”, mas contrasta, por vezes, com
ausser sich (“fora de si (com pesar, sofrimento etc.)”).
No alemão corrente, portanto, uma expressão desse tipo não tem usualmente
um único uso bem definido, mas uma gama de usos que coincidem em parte com
o de outras expressões. A única que adquirira um uso filosófico consolidado no
tempo de Hegel foi an sich, que Wolff empregou para traduzir kath’ hauto (“em
si”), de Aristóteles, e significa “(a coisa) como tal, *ABSOLUTAMENTE, à parte sua
relação com qualquer outra coisa”; por exemplo, um cavalo galopa an sich ou
kath’ hauto, mas o seu cavaleiro só galopa derivativamente. An sich era também
usado para traduzir uma das expressões de Platão para a FORMA ou IDÉIA: a
forma, por exemplo, de beleza é “o belo em si ou an sich”. Para Kant uma COISA
an sich é uma coisa à parte a sua relação com a nossa *COGNIÇÃO e o modo como
se nos apresenta: as coisas em si mesmas existem “fora de nós für sich
(independentemente ou por sua conta própria)”. Assim, an sich nesse sentido
não contrasta com für sich mas com in uns (“em nós”) ou für uns (“para nós”).
Hegel emprega freqüentemente expressões-sich em seus sentidos correntes,
não traçando qualquer distinção especial, por exemplo, entre an sich e für sich.
Mas também as usa muito em sentidos especiais, em que an sich e für sich
contrastam mutuamente, e também com an und für sich. A sua reinterpretação e
realinhamento dessas expressões parte do uso filosófico de an sich. Um ser
FINITO só possui uma natureza *DETERMINADA em virtude de suas RELAÇÕES com
outras coisas, sua NEGAÇÃO delas e por elas. Isso é verdade não só a respeito de
coisas dentro do mundo, mas também da coisa-em-si mesma de Kant, uma vez
que também ela é finita se for isolada e distinta de nossa cognição. Assim, uma
coisa que é an sich não tem um caráter aberto e determinado; no máximo, possui
um caráter potencial que só será concretizado e manifesto por suas relações com
outras coisas. Um bebê, por exemplo, é um an sich racional, mas sua
racionalidade é meramente potencial, não efetiva e “para um outro” ou “nele”
(an ihm). Nesse sentido, an sich não contrasta com für uns; a racionalidade do
bebê é para nós, porquanto podemos ver, por aquelas características que já
apresenta, que ele é potencialmente racional. Assim, Hegel usa freqüentemente a
expressão an sich oder für uns (“em si ou para nós”) a fim de indicar que alguma
coisa que só o é potencialmente e desconhecida para si mesma, é conhecida para
nós, filósofos ou observadores de fora. (Que podemos saber o que o bebê é an
sich implica que ele não é – como a coisa-em-si kantiana – totalmente an sich
mas possui algumas características das quais podemos inferir suas
potencialidades. Mas isso é porque o bebê não está inteiramente isolado de
relações com outras coisas.)
Para Hegel, ao contrário de Kant, an sich não é equivalente a für sich: für sich
contrasta com an sich. Mas Fürsichsein (“ser-para-si mesmo”) é uma noção
complexa, em parte porque contrasta não só com Ansichsein (“ser-em-si
mesmo”) mas também com Sein-für-Anderes (“ser-para-outro”). Em CL, Hegel
vincula-a à expressão comum was für ein (por exemplo, Ding ist das?), “que
espécie de (por exemplo, coisa é isso?)”, mas literalmente “para o quê uma
(coisa é isso?)”, e sugerindo assim que perguntar de que espécie alguma coisa é,
é perguntar o que ela é para si. Ser-para-si envolve ou conjuntamente ou em
diferentes contextos, várias idéias:
1. Uma coisa, por exemplo, uma pessoa adulta, pode ser, digamos, um
latoeiro, um alfaiate, um soldado ou um marinheiro. Mas seu ser, por exemplo,
um alfaiate, depende, de várias maneiras, de outros: alfaiatar deve ser uma
profissão reconhecida, devem existir outras profissões para contrastar com ela
(se todos são alfaiates, nenhum é alfaiate), e deve ser reconhecido como alfaiate.
Assim, o seu ser alfaiate envolve o seu ser para um outro. Mas ele também é um
alfaiate an sich, não no sentido de ser meramente um alfaiate potencial, mas de
ter certas aptidões internas que o capacitam para o desempenho adequado desse
papel e de ter certas características manifestas que justificam ser ele um alfaiate
em vez de, por exemplo, um marinheiro. Ser alfaiate envolve, assim, uma
interação entre ser an sich e ser para um outro. Mas uma pessoa não é
simplesmente o ocupante de um papel. É também um Eu individual e, como tal,
pode distanciar-se do seu papel e pensar-se apenas como mim ou EU. Quando
isso ocorre, ele deixa de ser para outros, e passa a ser para si, uma vez que,
embora a sua *AUTOCONSCIÊNCIA possa pressupor o *RECONHECIMENTO por
outros, um Eu não é um elemento de um sistema de papéis contrastantes: cada
um é um Eu. Num certo sentido, um Eu não tem um caráter determinado: o seu
ser consiste unicamente em seu ser para si, no sentido de ser consciente de si e
de estar afastado ou isolado de outros. Na Lógica, Hegel exemplifica o ser-para-
si não só pelo Eu, mas também pelo “um”, a unidade ou átomo que difere de
outras unidades ou átomos, em virtude não de qualquer qualidade determinada
mas tão-somente de sua distinção numérica, seu independente ser-para-si.
2. A idéia de que se algo é para si, está consciente de si, leva à idéia adicional
de que uma entidade pode ter em si certas características que não são para si.
Um bebê é racional em si, mas não para si, porquanto não tem consciência de
que é racional; um escravo é, como um homem, *LIVRE em si mesmo, mas pode
não ser livre para si mesmo.
3. Com freqüência, se uma pessoa tem uma característica da qual não está
consciente, a característica não está plenamente desenvolvida ou realizada. A
ignorância de um bebê de sua racionalidade deve-se à imaturidade de sua
racionalidade; a ignorância do escravo de sua liberdade pode ser devida ao seu
estado de escravidão. Por conseguinte, an sich e für sich passam a significar
“potencial” e “real”, e podem ser aplicados, por exemplo, ao DESENVOLVIMENTO
de uma planta, onde conhecimento ou ignorância estão fora de questão. (Nesse
sentido, an sich contrasta freqüentemente com POSTO (gesetzt), em vez de für
sich.) De maneira característica, uma entidade efetiva, plenamente desenvolvida,
em contraste com uma bolota ou um bebê, possui bastante articulação e
estabilidade interna para existir “por si” ou für sich, independente de algum grau
de relações com outras entidades.
4. No caso 2, quando uma pessoa se torna para si o que ela é em si, reconhece
usualmente o que é para si como uma adequada expressão do que é em si.
(Embora possa sentir que sua condição real de escravidão ou seus limitados
poderes de raciocínio – que são também, num sentido, para si – estão em
discordância com a sua liberdade ou racionalidade an sich.) Mas nem sempre é
esse o caso. A pessoa pode chegar a ser para si, num retrato acurado dela por
outros ou numa obra de sua própria autoria que expresse amplamente a sua
personalidade, mas não se reconheça nela. Uma razão pela qual poderia não
conseguir fazer isso é que tal retrato ou obra é suscetível não só de colocar
diante dela o que ela intrinsecamente é, mas também de concretizar
pensamentos, sentimentos e traços que nele são meramente potenciais ou
incipientes. Um artista, por exemplo, raras vezes tem um plano totalmente
elaborado de sua obra em mente antes de começar a trabalhar: a obra de arte
desenvolve, assim como exterioriza, os seus pensamentos etc. Hegel generaliza
essa idéia: uma pessoa (ou um grupo de pessoas) pode produzir uma obra ou ter
um objeto, que ela faz para si, mas que requer uma atividade adicional, cognitiva
ou prática, se pretende ver-se ou à sua Ansich (a sua “em si” ou “ESSÊNCIA”)
nela. Paradoxalmente, em vista do Eu acima, o Eu como tal é visto, com
freqüência, como meramente an sich: em si, é subdesenvolvido e evanescente;
só se torna für sich em seu produto ou objeto.
Cada uma dessas idéias deixa margem para um terceiro estágio, o de
Anundfürsichsein, o qual congrega o an sich e o für sich:

1. A retirada do Eu para si mesmo deixa inalterado o múltiplo mundo externo.


O alfaiate que se distancia do seu papel e pensa em si como Eu pode dar o
passo adicional de reconciliar-se com o seu trabalho ou de encontrar um
trabalho no qual esteja “à vontade” (bei sich).
2. O escravo e a criança podem tentar pôr sua condição corrente de escravidão
ou de racionalidade imperfeita de acordo com sua Ansich, sua “em si” ou
essência.
3. Aristóteles distinguiu dois graus de potencialidade, assim como de plena
realidade:
a. O bebê que ainda não aprendeu uma língua é um locutor potencial.
b. A pessoa que conhece uma língua mas não está agora falando é um
locutor potencial num sentido superior, e um locutor real em contraste
com (a).
c. Uma pessoa que está agora falando é um locutor plenamente real.
Mas isto é inaplicável a, por exemplo, uma planta, e Hegel não explora
usualmente para o seu padrão *TRIÁDICO. O desenvolvimento, para Hegel,
envolve um retorno ao começo ou Ansich. As plantas produzem sementes
de novo, subseqüentemente. A velhice é um retorno do conflito
característico da juventude para uma versão refinada da familiaridade e
contentamento infantil com o mundo.
4. Anundfürsichsein (“ser-em-e-para-si”) é freqüentemente visto como estando
à vontade consigo (Beisichsein) ou vindo a si (zu sich) no OUTRO. É, assim,
semelhante a INFINIDADE.

De um modo geral, o uso de expressões-sich por Hegel é mais fluido e diverso

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