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RESUMO
ABSTRACT
Seeking to understand the intricacies of the problem of school failure, this work aims at a
discussion of a historical, social nature and with a psychological approach, passing through
milestones of education and interventions on educational learning problems, specifically those
related to failure, grade repetition and school dropout. Based on analysis of data and statistics
from research vehicles, we seek to clarify for the reader the current scenario of education and
the challenges that new times have brought to students and educators. Finally, a discussion
with a psychological bias concludes this summary in order to highlight the urgency with
regard to political and multidisciplinary interventions that school failure has demanded
nowadays.
1. NOTAS INTRODUTÓRIAS
Há muitos fatores apontados pelas escolas como gênesis do fracasso escolar de suas
crianças. Estão entre esses fatores a condição alimentar, a condição social, de habitação, (por
vezes) às distâncias a serem percorridas, a necessidade de trabalhar para ajudar nos proventos
familiares, etc. No entanto, aqui busca-se desmistificar um discurso amplamente difundido
por parte das escolas que, na busca por um culpado, professam o discurso de que o maior
causador dos problemas de aprendizagem e, portanto, do fracasso escolar é a fome, a escassez
alimentar vivida por uma parcela considerável de crianças e adolescentes que frequentam a
rede de ensino público.1
Está bastante claro que, da parte da escola, há uma tentativa de “medicalizar” o
fracasso escolar. Dessa forma a responsabilidade é tirada de si e o fracasso é, agora, algo que
diz respeito ao aluno, a alguma causa orgânica nele. Seria necessário, então, levar a demanda
do fracasso escolar para a área médica e ser tratada, corrigida, ali.
É evidente que uma criança malnutrida terá déficits em diversos campos e instâncias
do seu desenvolvimento. E está muito claro também que, em determinadas situações, há sim
causas orgânicas envolvidas no fracasso escolar e que merecem, por isso, um olhar médico
multidisciplinar para uma intervenção adequada. Mas será a desnutrição um fator com
tamanho potencial a ponto de ser contribuinte para o fracasso escolar? Sobre isso temos que:
Tal constatação reforça minha afirmação de que nas escolas existem muitas crianças
portadoras de desnutrição leve. Hoje, até talvez em número maior que o de 1980,
uma vez que a situação econômica da população vem paulatinamente se
deteriorando nos últimos anos. Entretanto, é preciso não se esquecer do tipo de
deficiência de que elas são portadoras, ou seja, desnutrição leve. Não existem em
todo o mundo trabalhos de pesquisa que obedeçam, minimamente, a critérios de
metodologia científica, que se proponham a estudar a relação de desnutrição leve
com rendimento escolar, e quando algum pesquisador tenta encontrar tal relação,
não a consegue estabelecer, como é o caso de SCHUFTAN (1974) e POLLITT
(1984), que não conseguiram encontrar significância no resultado dessa relação e
relatam ser impossível isolar a desnutrição da rede complexa de fatores sociais da
qual faz parte, ou seja, do "complexo de doença social" que assola o meio no qual a
criança escolar pobre está inserida. (COLLARES, 1996, p. 26 - 27).
1
CAVALCANTE; ARAÚJO; NETO; FERREIRA; PEIXOTO, 2017, p. 240
como chamam os especialistas. Esta, por sua vez, não é apontada, dentro das pesquisas e
estudos científicos, como limitadora da capacidade intelectual. Como segue:
Entretanto, o que estamos querendo enfatizar é que este grau de desnutrição não
afeta o desenvolvimento do sistema nervoso central, não o lesa irreversivelmente e,
portanto, não torna a criança deficiente mental, incapaz de aprender o que a escola
tem a lhe ensinar. A criança portadora de desnutrição leve apenas sacrifica o seu
crescimento físico para manter o seu metabolismo. Exames clínico e laboratorial
indicam que a criança é normal, com exceção de um déficit de peso e estatura em
relação à sua idade. (COLLARES, 1996, p. 27).
E continua:
Se a criança escolar [que] apresenta desnutrição leve, não possui lesões no sistema
nervoso que a torne incapaz de aprender, por que então, ao entrevistarmos na escola
professores, diretores e especialistas, esta deficiência é apontada como uma das
principais causas do fracasso escolar? Pensamos que colocar as causas desse mau
rendimento nas crianças, individualmente, é uma forma de, até inconscientemente,
se tentar minimizar ou mesmo ocultar a falha da escola, em particular, e de todo o
sistema educacional em geral.
Desse modo temos que o cenário pintado pela escola, em grande parte, passa pela via
da culpabilização apontando para os fatores externos a ela. Isso se evidencia de maneira
especial no que tange a questão referente à saúde nutritiva dos alunos, questão essa que é
apontada pela escola como fator preponderante para a explicação do fracasso desses alunos.
Esses últimos, por sua vez, acabam sendo encaminhados a diversos serviços ligados ou não à
área da saúde, como é o caso da fonoaudiologia, da neurologia e, mais recentemente, da
psicopedagogia, entre outros.2
Certamente o leitor terá clareza de que há ainda muitas outras atribuições causais
trazidas pelos alunos, mas no cômputo geral essas, acima ditas, são as principais a serem
observadas, segundo as pesquisas na área. Para dar melhor entendimento ainda sobre a
dinâmica dessas causas apontadas no texto e o modo como elas dialogam com a realidade, os
autores sistematizaram-nas em causas internas e externas, em causas estáveis e instáveis e em
causas controláveis e incontroláveis.
A grande discussão a que tudo isso nos leva é: qual a relevância que tais justificativas
exercem na vida e, especialmente, na saúde emocional e cognitiva desses alunos? Sobre isso é
dito o seguinte:
Portanto, entender o alcance das atribuições de causalidade feitas pelos alunos com
dificuldades de aprendizagem significa entender também o impacto que tais justificativas
geram e irão gerar nesse aluno ao longo do seu desenvolvimento. É correto afirmar, assim,
que, no que se refere a pessoa do aluno, os problemas advindos do fracasso escolar são
diversos, e poderão facilmente serem levados por toda a vida, impactando diretamente as
demais áreas de seu desenvolvimento humano. Psicologicamente falando o aluno irá, numa
tentativa de manutenção de sua autoestima e numa tentativa de dirimir a carga emocional
negativa gerada pelo seu mau rendimento, atribuir valores a respeito de si mesmo e de suas
capacidades, valores esses que podem estar em desacordo com a realidade. A situação pode
ser tal que, os problemas relacionados ao seu mau rendimento podem acabar sendo associados
a fatores externos a ele próprio e que fogem à capacidade dele de resolução, quando na
verdade essa pode não ser a realidade. Alguns podem, ainda, desenvolver atitudes que são, a
curto prazo, ainda mais potencialmente danosas. Sobre isso, ALMEIDA; MIRANDA e
GUISANDE, 2008, p. 170, nos dizem:
Quando essa estratégia defensiva não pode ser prolongada, alguns estudantes
invertem o valor da situação crítica, por exemplo, organizam-se em torno de uma
cultura anti-institucional, em que se valoriza precisamente o “ser mau” na escola ou
se apresenta
comportamentos característicos do estatuto adulto (ingestão de bebidas alcoólicas,
fumar, ter relações sexuais etc.
É urgente que se entenda de modo mais claro as raízes do fracasso escolar e dos
constituintes desse processo. Tratar desse que é um problema social equivale a tratar de
problemas individuais de crianças que virão a se tornar adultos com diversos enfrentamentos
psicológicos e emocionais por terem sido vítimas dessa situação na escola. Falar sobre o
fracasso escolar e, mais do que isso, buscar novas soluções para ele, equivale a dirimir, antes
mesmo que surjam, problemas clínicos bastante característicos e presentes naqueles
indivíduos adultos que enfrentaram essa situação durante a jornada escolar.
No texto em questão Klein faz um recorte do que pode ser chamado de sistema de
educação de qualidade. Para a autora, um sistema educacional de qualidade está
intrinsecamente vinculado a dois pressupostos básicos: O primeiro diz respeito a aprender e
seguir em frente (progredir de série), o segundo tem a ver com abranger todos aqueles que
precisam de acesso à educação. No entanto, percebem-se problemas nos dois pressupostos
básicos estabelecidos para firmar a educação de qualidade. Atualmente temos problemas com
aprendizado e progressão, a repetência mediante reprovação ainda permanece alta e, em
decorrência dela, tem-se também o fracasso e, por fim, a evasão escolar. O que nos leva já ao
segundo ponto, que diz respeito a abrangência da educação ofertada. É evidente que nem
todas as crianças e jovens (e também adultos) têm total e completo acesso a educação hoje. As
barreiras enfrentadas na conjuntura atual incluem a situação de renda, barreiras geográficas
que dificultam o acesso à escola, escassez de docentes especialmente em regiões mais remotas
(interior/escola rural), entre outros. Ou seja, ainda há o que se fazer em termos de políticas
públicas que atendam a essas demandas que a educação básica brasileira levanta. Assim,
como o cenário atual não comporta um atendimento a 100% dos escolares, conveniou-se que
a medida usada para a definir a universalização da educação seria uma média mais
“atingível”, chegando-se assim ao número de 95%. Como aponta ainda a autora, embora o
Brasil tenha atingido os parâmetros para a universalização da adesão ao ensino regular (95%),
ainda há muito o que se observar para que a marca de conclusão desse ensino seja igualmente
aceitável. Uma parcela considerável desses alunos, que têm acesso a educação básica, ainda
encontram grandes dificuldade em permanecer e concluir seus estudos, o que nos faz retornar
ao centro desta discussão a respeito do fracasso escolar.
A evasão, que se mantém nos últimos anos, após uma política de aumento
significativo da matrícula no ensino médio, aponta para uma crise de legitimidade da
escola, que resulta não apenas da crise econômica ou do declínio da utilidade social
dos diplomas, mas também da falta de outras motivações para os alunos
continuarem estudando. (KRAWCZYK, 2009, p. 756).
Aqui fica claro que não se enfrenta hoje apenas um problema de falta de contingente
de educadores (especialmente no que se refere às escolas rurais), mas também uma situação
interna, que diz respeito a capacidade do educador de dialogar com a realidade na qual o
aluno está inserido. Essa falta de comunicação assertiva leva o momento didático para um
âmbito chato, entediante, desmotivador, cansativo e, no fim das contas, pouco realista no que
se tange às questões que o aluno vivencia e com as quais lida diária e constantemente. É
necessário que os professores desçam ao nível do aluno para olhá-lo de igual para igual,
conhecendo assim sua realidade própria, suas questões, seus pontos fortes e fracos e ali, na
sua realidade, o estimule a desenvolver o melhor de suas capacidades. Para fortalecer o
entendimento, KRAWCZYK (2009, p. 767) formula:
A escola tem que estar comprometida com a comunidade na qual está inserida, mas
também com os desafios apresentados pela realidade, complexa e controversa. Há
que deixar o mundo e suas contradições entrarem na escola por meio do cinema,
teatro, Internet, da arte de todo tipo, do conhecimento de política internacional, do
conhecimento das diversidades culturais etc.
Sem dúvida, a escola precisa mudar e reencontrar seu lugar como instituição cultural
em face das mudanças macroculturais, sociais e políticas e não apenas das
transformações econômicas. Uma mudança que não seja uma simples adaptação
passiva, mas que busque encontrar um lugar próprio de construção de algo novo,
que permita a expansão das potencialidades humanas e a emancipação do coletivo:
construir a capacidade de reflexão.
Ou seja, visto que o diagnóstico estava errado, as intervenções feitas pelo governo
eram também equivocadas. Priorizavam, em grande medida, a criação de novas escolas que
viabilizassem o acesso e a permanência por parte dos alunos, especialmente aqueles
localizados em zonas rurais. A métrica tomada aqui era a evasão, já na primeira série do
ensino fundamental. No entanto, os dados corretos mostravam que o real problema vivido
pelo sistema público de ensino da época era a repetência, e não a evasão.3
Apesar das dificuldades geradas por intervenções pouco eficazes provenientes de
dados estatísticos errados, a escola pública sempre esteve ciente de suas problemáticas. E
nessa perspectiva algumas considerações sobre alguns programas implantados valem ser
feitas. LADEIRA e INSFRÁN (2020, p. 01) aborda essa questão com o seguinte:
O estado do Rio Grande do Sul foi o primeiro no Brasil a adotar em 1958 uma
modalidade de progressão continuada baseada em classes de recuperação para
alunos que eles consideravam ter maiores dificuldades de aprendizado, levando em
conta que tais alunos, uma vez recuperados de suas dificuldades, voltariam a suas
classes de origem. A partir dos anos 1960, persistiam em todo o país altos índices de
repetência escolar e evasão, inflamando em todo o território nacional perspectivas
favoráveis à progressão continuada. É importante destacar que a adoção do regime
de ciclos escolares, até a década de 1980, teve como seu modelo os sistemas de
ciclos adotados nas escolas básicas dos Estados Unidos e da Inglaterra, que eram
referência na aprovação dos alunos, independentemente do aproveitamento que tais
alunos apresentassem. (LADEIRA e INSFRÁN, 2020, p. 01).
4
CRESAS, 2016, p.01
afirmando que “os alunos passam de uma série para a outra sem o domínio do
conteúdo”. (LADEIRA e INSFRÁN, 2020, p. 02 op cit AVANCINI, M., 2001).
E ainda:
Com o discurso de que “agora a escola não reprova” e, portanto, “não exclui os
alunos”, é passada a idéia que todos terão as mesmas oportunidades de acesso ao
conhecimento, o que é uma ilusão, na medida em que os depoimentos das famílias e
dos professores mostram uma insatisfação muito grande em relação a esta proposta,
indicando o desejo de retorno ao sistema de avaliação anterior. [...] No que se refere
às famílias, a mídia, nos últimos anos, apresentou vários depoimentos de pais
insatisfeitos com o novo regime adotado nas escolas. Eles alegam que seus filhos
passam de uma série para a outra sem “saber”. (AUGUSTO; GODOI, 2004, p. 8).
Mas, o leitor pode estar se perguntando: como tal sistema se perpetuou e foi inclusive
implementado por outros estados (Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Rio Grande do Norte,
Rio de Janeiro e Minas Gerais) se os próprios professores não acreditavam no processo e
abertamente exibiam suas opiniões contrárias? Ora, o que estava em jogo ia além do
aprendizado dos alunos ou mesmo da tentativa de tratar um problema, a saber, a evasão
escolar e os índices de fracasso/repetência. Estava em jogo também uma questão de verba
internacional (em caráter de empréstimos), dedicada a países emergentes, para ser investida
no âmbito da educação, na tentativa internacional de aumentar os índices de alfabetizados
nesses países, dos quais, o Brasil fazia parte. BARRETO (2001, p. 125) diz:
Com isso, é bastante pertinente a fala de Freitas (2002, p. 96) ao afirmar que “para o
Estado é muito melhor que o aluno seja reprovado pela vida, devido à sua
incompetência e falta de esforço, do que na escola, de modo a atrapalhar as
estatísticas governamentais e gerar custos adicionais". A fim de tornar mais
enriquecida esta discussão, cabe admitir que analisar a questão da progressão
continuada é também ter que levar em conta uma educação subordinada aos
organismos internacionais, pondo em destaque os financiamentos do Banco Mundial
e de outros organismos internacionais à educação brasileira, sobretudo em forma de
empréstimos. De acordo com Santos (2010), o primeiro empréstimo concedido ao
governo brasileiro pelo Banco Mundial ocorreu no início da década de 1970 e visava
implementar o ensino profissionalizante de nível médio industrial e agrícola.
(LADEIRA e INSFRÁN, 2020, p. 02).
É realmente um desalento pensar que, embora estivesse sendo feito alguma coisa
para a situação do fracasso escolar e suas consequências, não era exatamente isso que estava
no radar das políticas governamentais nas décadas anteriores à virada do século.
Mas nem tudo parece conduzir a uma conclusão pessimista a respeito das
intervenções político-governamentais sobre o fracasso escolar. Mais recentemente novos
programas têm sido pensados e parecem estar muito mais próximos da realidade brasileira no
que se refere aos problemas da ordem da educação básica.
Em 2012, o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) foi lançado
pelo Ministério da Educação. Ele é considerado um avanço positivo pela maioria dos
estudiosos da área da educação, uma vez que sua abordagem dialoga mais diretamente com as
dificuldades que são vivenciadas pelos alunos. O plano apresenta cinco objetivos:
O PNAIC foi um avanço nas políticas que buscam tratar das inconsistências do
ensino público, uma vez que vem promovendo um real investimento na formação continuada
dos professores. Isso equivale a atacar o problema do fracasso escolar pela via contrária ao
tradicional, que busca intervenções diretas no aluno. C om o PNAIC, também se formulou um
conjunto de direitos de aprendizagem que constituíam um real currículo coerente para todo o ciclo
inicial, e este currículo, por sua vez, partia do respeito à diversidade, assumindo e defendendo a
heterogeneidade dentro da sala de aula e buscando uma progressão nítida ao longo do primeiro,
segundo e terceiro anos do ensino fundamental. O PNAIC também caminhou pela via do
aproveitamento de todos os recursos disponíveis para assessorar a aprendizagem, livros didáticos,
obras complementares, caixa de jogos, recursos audiovisuais, entre outros. E, por fim, e não menos
importante, enquanto política pública federal, o PNAIC representou o efetivo envolvimento das
Universidades públicas de nosso país na formação continuada dos alfabetizadores.5
Certamente ainda há muito que ser feito em termos de políticas públicas para a melhoria do
ensino público, para o controle das variáveis que interferem nesse ensino e para, finalmente, dirimir os
problemas de defasagem curricular, de discurso escolar aquém da realidade do aluno, problemas
diversos de aprendizagem, atraso, repetência e evasão. Mas o cenário parece, ainda assim, promissor.
E, claro, como relata KLEIN (2006, p. 140): “ As políticas implementadas, por sua vez, também
precisam ser avaliadas para verificar sua eficácia e se há necessidade de mudanças. Até os
conceitos e diagnósticos precisam ser questionados e corrigidos quando necessário.”
6. Considerações finais
A partir do que foi refletido e dos desdobramentos a que chegou essa discussão é
tornado claro como urge que se desenvolvam mais pesquisas na área da educação, e que, junto
delas sejam propostas novas e melhores intervenções para os difíceis cenários vividos em
5
MORAIS, 2022, p. 4
termos de atraso na aprendizagem dos alunos. A revisão bibliográfica mostra que ainda se tem
dificuldades tanto em levantar os dados quanto na interpretação deles. Mostra também a
necessidade de se adotar uma postura mais séria no que tange a assumir que o problema do
fracasso existe de fato e que ele pertence não somente ao aluno, mas a família, a escola, ao
governo e a sociedade como um todo.
Como evidenciado, quase sempre a postura de enfrentamento ao fracasso escolar
envolve muito mais estabelecer culpados sem grande apreciação crítica, apenas a título de
livrar-se da própria parcela de responsabilidade. Nesses discursos ouve-se que a família é
culpada por não manter os filhos na escola, que o aluno não tem real interesse, que o meio
social está completamente deturpado e assim por diante. Na outra ponta estão discursos
igualmente acalorados de que é a escola que não tem condições boas para uma boa educação,
que há falta de interesse público na educação de crianças e adolescentes, que os professores
estão deficitados em conhecimento etc.
No que concerne aos docentes, se cabe aqui uma alegoria, dentro da escola, o
professor precisa assumir uma postura de quem orienta alpinistas, os alunos, na escalada de
uma montanha. Os alunos são diversos, com habilidades diversas para serem empregadas na
escalada. O professor entra aqui como aquele que vai se valer dessas habilidades, fomentando
o uso delas e ajudando no desenvolvimento de outras para que a escalada acontece de maneira
mais facilitada. Haverá, é claro, aqueles alpinistas com maior dificuldade, seja em empregar
suas próprias habilidades, seja em desenvolver novas. Ora, se o professor tratar a todos de
maneira igual é evidente que uma parcela dos alpinistas conseguirá concluir a subida,
enquanto outros ficarão para trás, ou o farão com grandes dificuldades, podendo, inclusive,
desistir no meio do processo. O que precisa ser amplamente defendido é que todos podem
chegar ao topo da escalada, e, com um olhar particularizado do professor isso se dará de
maneira muito mais eficiente e prazerosa.
É preciso apontar também que o fracasso é hoje uma problemática que chega
diretamente nos cofres públicos. Um aluno de uma família pobre, vivendo em condições
precárias de moradia, tendo problemas sérios no que se refere a qualidade de sua alimentação,
cujos pais não dispõe de tempo de qualidade para devotar atenção aos filhos, é um aluno que
entra no ensino público enfrentando inúmeras dificuldades para levar a termo sua educação.
Não obstante, esse aluno é um forte candidato a ser um repetente, um aluno com baixo
rendimento e, portanto, rotulado de um aluno em “atraso escolar”. Esse aluno pode,
posteriormente, em função da própria desmotivação gerada no processo de aprendizagem e
somado a isso as dificuldades enfrentadas para a sobrevivência da família, abandonar a escola.
Sem uma formação de qualidade essa pessoa acabará sendo se direcionando para funções
precárias do mundo do trabalho, por vezes, o mercado informal. Logo, sair de uma situação de
pobreza na qual nasceu será indiscutivelmente mais difícil. Ou seja, aquela família inicial, que
(provavelmente) era alvo de políticas de subsistência, permanece agora novamente
dependente de tais políticas por causa de um problema de evasão advindo de um mau
rendimento de um aluno que não recebeu a devida atenção na escola. É um ciclo
retroalimentador.
De modo especial precisamos deixar claro que o preço emocional pago por alunos
em mau rendimento na escola é incalculável. Sabe-se que o fracasso é gerador de estresse,
ansiedade, depressão, sentimentos de menos valia, comprometimento da autoimagem etc. nos
alunos que se encontram em tal situação, mas precisar as dimensões que tal sofrimento
psíquico alcança não possível de mensuração. É verdade que a singularidade humana faz com
que cada um lide com tais dificuldades em maior ou menor grau de sofrimento, mas é fato que
o desarranjo psicológico está presente e deve ser tratado com a devida importância. Diversos
estudos têm mostrado que a escola tem se tornado, sob várias perspectivas, um ambiente
hostil, seja pelo bullying feito e sofrido pelos alunos, seja pela violência armada, seja pelo
preconceito etc. Não deve o ensino, em si, ser um dos construtos promotores de sofrimento
injustificado para a pessoa humana ali presente no ato de aprender. Por isso, novamente, cabe
dizer que toda a sociedade precisa se debruçar, com urgência, sobre a questão do fracasso
escolar com o firme compromisso de lidar responsavelmente com essa problemática, afinal, o
futuro da educação brasileira depende do compromisso dos cidadãos de hoje.
Referências