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linguagens e
representações:
exercícios dialógicos
FFLCH/USP
DISCURSOS, LINGUAGENS E
REPRESENTAÇÕES:
EXERCÍCIOS DIALÓGICOS
Maria Inês Batista Campos Noel Ribeiro
Urbano Cavalcante Filho
(Organizadores)
DISCURSOS, LINGUAGENS E
REPRESENTAÇÕES:
EXERCÍCIOS DIALÓGICOS
Marilia Amorim
Maria Inês Batista Campos Noel Ribeiro
Urbano Cavalcante Filho
Lucas Nascimento
Thiago Jorge Ferreira Santos
Frédéric François
Nathalia Akemi Sato Mitsunari
Viviane Mendes Leite
Jamille Santos Oliveira
Maria Elia dos Santos Teixeira de Carvalho
Maria das Graças Soares Rodrigues
Karla Stéphany de Brito Silva
Miriam Bauab Puzzo
Luciana Taraborelli
Laiza Luz Martins Sant’Ana
Simone de Jesus Padilha
Madson Bruno Soares Estevam
Larissa Vieira de Cerqueira
Letícia Thomé de Oliveira
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
FILOLOGIA E LÍNGUA PORTUGUESA
Coordenador: Prof. Dr. Waldemar Ferreira Netto
Vice-coordenadora: Profa. Dra. Sheila Vieira de Camargo Grillo
CONSELHO CIENTÍFICO
ISBN 978-85-7506-482-5
DOI 10.11606/9788575064825
1. Análise crítica do discurso. 2. Linguagem (estudo e ensino). 3.
Linguística. 4. Filosofia – Estética. 5. Mulher. 6. Educação. I. Ribeiro, Maria Inês
Batista Campos Noel, coord. II. Cavalcante Filho, Urbano, coord.
CDD 375.01
Revisão
Nathalia Akemi Sato Mitsunari
Maria Inês Batista Campos Noel Ribeiro
Urbano Cavalcante Filho
Esta obra é de acesso aberto. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que
citada a fonte e a autoria e respeitando a Licença Creative Commons indicada.
SOBRE OS ORGANIZADORES
E-mail: maricamp@usp.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/9572384519070224
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0004-9923
E-mail: urbano@ifba.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6466770995969401
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1429-5300
SUMÁRIO 7
Sumário
Apresentação
10-16
Parte I: Fundamentos
Resenha
Resenha: O autor e a personagem na atividade estética,
de Mikhail Bakhtin
Cláudio Primo Delanoy (PUC-RS, Brasil) 353-366
Sobre os autores
367-371
Apresentação
Ser significa ser para o outro e, através dele, para si. O homem
não tem um território interior soberano, está todo e sempre na
fronteira, olhando par dentro de si ele olha o outro nos olhos ou
com os olhos do outro.
M. BAKHTIN. Em torno da reescrita do
livro de Dostoiévski, 2008, p. 319.
Parte I
Fundamentos
Amorim
1
Cf. Amorim (2020).
2
Cf. Amorim (2023).
1 O Outro terceiro
1.1 Deus
Possuído pelo outro: a questão da alteridade está posta como fundante.
Aqui, entretanto, aparece a especificidade de remeter a uma dimensão
religiosa. O termo sofianidade é um conceito da teologia, notadamente, do
catolicismo ortodoxo, e sabemos da ligação de Bakhtin com esse aspecto da
cultura russa. Nesse âmbito, sofianidade designa a sabedoria divina. Por
exemplo, no teólogo russo Sergei Bulgakov (1871-1944), contemporâneo um
pouco mais velho que Bakhtin, há um elemento estético na sofianidade: “a
manifestação da Sofia divina se nos dá como Beleza do Cosmos, a
sofianidade sensível do mundo” (Xavier; Silva, 2020, p. 413).
Mas é talvez no espelho sofiânico do teósofo alemão Jacob Boehme
(1575-1624) que melhor se encontram pistas para a relação com o
pensamento bakhtiniano e o uso que faz dessa noção ao falar da dança.
Segundo o filósofo Dufour (1999), a idéia de espelho é o elemento-chave da
sofianidade enquanto sabedoria divina:
O tradutor Paulo Bezerra nos indica que a palavra dança, usada por
Bakhtin no trecho de onde partimos, refere-se à dança popular e se distingue
daquela que seria normalmente usada para designar a dança no sentido
amplo, inclusive o clássico. Entretanto, do ponto de vista da problemática da
alteridade que está a ser tratada por Bakhtin, acredito que é possível conceber
uma acepção geral de dança, já que, se a idéia de sofianidade for válida para
a dança popular, será necessário incluir aí a dança religiosa e cultual. Além
disso, se tomamos a dança artística, balé clássico e outros gêneros, a
configuração alteritária que irá se colocar é a mesma. Aquele que dança
3
Nota do tradutor Paulo Bezerra: “Note-se que Bakhtin não emprega a palavra tánietz, que significa
dança no sentido amplo, inclusive o clássico, mas pliaska, que é dança no sentido mais popular,
mais restrito e também a música para a dança”.
4
Essa saída parece se justificar no próprio texto de Bakhtin, uma vez que, mais adiante, ele usa a
dança como imagem para pensar o ritmo da ordenação temporal de um dado tipo de biografia: “A
vida biográfica do primeiro tipo é uma espécie de dança em ritmo lento (a dança em ritmo acelerado
é a lírica)” (Bakhtin, 2022, p. 147).
5
Note-se que a polis designa a cidade grega em sua dimensão não apenas geográfica, mas legal e
política. Daí estar na etimologia da palavra política.
6
Entenda-se aqui que boa forma remete à Psicologia da Gestalt, segundo a qual buscamos sempre
ver nas formas aquelas que formam um todo dotado de sentido. A essa forma se dá o nome de
Gestalt, que se traduz em português como boa forma.
7
No original: “La danse est l’un des artifices sociaux pour parer au manque de corps de ce qui
s’appelle précisément la société. La danse sert la cause de l’agglomérat unifié sous une même
version de la Loi, et ce travail unitariste pousse chaque sujet à se reconnaître le même que tous les
autres en proie à la passion de l’Autre” (Legendre, 2000, p. 169).
Desse modo, a dança pode ser lida como cena em que esse Outro dança
e dá forma visível e palpável ao corpo social unificado. Em outra obra, ele diz:
8
No original: “Dans les sociétés dites primitives, si toutes les activités humaines mêmes les plus
triviales et ordinaires étaient codifiées d’après le dogme et investies d’un sens donnant à la moindre
opération humaine valeur cérémonielle, l’organisation sociale produisait aussi, à l’aide de corps
humains tout aussi fantoches qu’aujourd’hui, des explosions cérémonielles, célébrations géantes
remémorant et recréant l’ordre. Or, la société industrielle a honte de son ordre, elle le masque et le
dénie” (Legendre, 2000, p. 317)
9
No original : “dont nous sommes les assujettis parce qu’il s’agit d’un travail d’identification avec
l’idéal” (Legendre, 2000, p. 166).
10
No original : “Il faut des mots, des images et un corps, pour que s’élève la voix humaine. Il faut
cela, plus une quatrième dimension : il faut la raison de vivre. […] La raison de vivre nous vient du
langage. Une maxime des juristes dit ceci : «On lie les bœufs par les cornes et les hommes par les
paroles. »” (Id., 2001, p. 26-27).
A dança pode vir a ser uma cena em que novos modos de organizar e Amorim
de unir o todo social sejam produzidos e corporificados. Nesse ponto,
podemos incluir a perspectiva bakhtiniana dos valores, posto que vemos aí
que a dança e sua coreografia podem afirmar ou contestar os valores de uma
dada ordem social. O próprio fato de haver uma cena permite um
distanciamento e um olhar em perspectiva para a comunidade encenada.
Como em Rancière (2009), as diferentes coreografias seriam maneiras pelas
quais se desenham figuras de comunidade.
Platão, Legendre e Rancière oferecem ao analista de um corpus de
dança a possibilidade de ler nela um pensamento sobre o coletivo e o político.
Esse grande Outro que nela dançaria, que nos transcende e ao qual estamos
todos sujeitos. Vejamos alguns exemplos onde acredito que seja possível vê-
lo dançar:
11
No original : “Par la danse, nous osons remettre en cause les procédures légales de l’identification
au corps idéal, et c’est en cela notamment que les contrôleurs sociaux ont les meilleures raisons de
se méfier d’une telle production” (Legendre, 2000, p. 291).
Amorim
12
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8H6syJInhqI. Acesso em: 09 mai. 2023.
Captura de imagem: Fair Use.
27
Amorim
13
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=htWM5ZtONU4. Acesso em: 09 mai. 2023.
Captura de imagem: Fair Use.
14
Criado no Teatro Bolchoï de Moscou, em 1877 por diferentes coreógrafos com música de Piotr
Tchaïkovski.
15
Criado no Teatro Mariinsky de São Petersbourgo em 1913 com música de Igor Straninski.
16
Vaslav Nijinski, bailarino e coreógrafo russo de origem ucraniana (1889-1950).
2 O Terceiro e o Segundo
Se o terceiro e a sofianidade são da ordem do simbólico e do coletivo,
que agem em nós e nos constituem, podemos pensá-los também como
linguagem. Em relação ao pensamento bakhtiniano, encontramos em
Bubnova20 uma indicação preciosa a respeito:
17
Cf. Amorim (2023).
18
Criado no Teatro Mariinsky de São Petersbourgo em 1912 com música de Claude Debussy.
19
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=EvVKWapctX4&list=RDEvVKWapctX4
&index=1. Acesso em: 09 mai. 2023. Captura de imagem: Fair Use.
20
No original: “[...] si en la Filosofía del acto ético y otros textos afínes («Autor y héroe en la
actividad estética», 1924, por ejemplo) el diálogo ontològico entre el yo y el otro se desarrolla en
presencia de un tercero tendiente al infinito que puede ser Dios, a partir de un determinado momento
este tercero se transforma en el mismo lenguaje concebido pragmática y sociolingüísticamente”
(Bubnova, 1997, p. XVIII).
21
Embora publicado no Brasil, não tive acesso ao texto brasileiro e parti do texto em francês, cujas
citações são por mim traduzidas. Em francês: “Les trois quarts d’Homère sont de la convention : et
il en va de même pour tous les artistes grecs, qu’aucun motif ne poussait à cette fureur moderne
d’originalité. Ils n’avaient pas la moindre crainte de la convention, puisque c’est par elle qu’ils
étaient unis à leur public. Les conventions sont en effet les procédés artistiques conquis pour être
compris des auditeurs, la langue commune péniblement apprise par laquelle l’artiste peut vraiment
se communiquer” (Nietzsche, 2008, §122).
22
Essa ideia vai ser retomada pelo filósofo contemporâneo Alain Badiou (1998), que define a arte
da dança como sendo o trabalho do corpo contra a vulgaridade.
Pode-se perguntar, para cada artista, poeta ou escritor grego: que nova
coação é essa que ele se impõe e que ele torna atraente para seus
contemporâneos (ao ponto de ser imitada por alguns)? Porque isso que
se chama “invenção” (na métrica, por exemplo) é sempre um desses
elos que a gente se coloca em si mesmo. Dançar nas correntes,
dificultar a própria tarefa, em seguida derramar-lhes a ilusão de leveza,
tal é o talento que eles querem nos mostrar.
23
No original: “Oui, on a rejeté les chaînes absurdes de l’art grec et français, mais on s’est
insensiblement habitué a trouver absurdes toutes les chaînes, toutes les limitations ; et l’art va ainsi
au-devant de sa ruine […]” (Nietzsche, 2008, §140).
24
No original: “On peut, pour chaque artiste, poète et écrivain grec, se demander : quelle est la
contrainte nouvelle qu’il s’impose et qu’il rend attrayante à ses contemporains (au point de trouver
des imitateurs) ? Car ce qu’on appelle « invention » (dans la métrique, par exemple) est toujours un
de ces liens [Fessel] que l’on se met soi-même. Danser dans les chaînes, se rendre la tâche difficile,
puis répandre par-dessus l’illusion de la légèreté, tel est le talent qu’ils veulent nous montrer. Chez
Homère déjà on peut déceler une quantité de formules héritées et de lois du récit épique dans les
limites desquelles il lui fallait danser ; et lui-même créa de nouvelles conventions pour ceux qui
viendraient après lui. Voilà l’école où se formèrent les poètes grecs: se laisser d’abord imposer une
contrainte multiple, par les poètes anciens ; puis, de ce non content, inventer une contrainte nouvelle,
s’y plier et en triompher avec grâce, tant et si bien que l’on remarquât et la contrainte et le triomphe”
(Nietzsche, 2008, §140).
25
A ideia da metamorfose como forma de alteridade radical foi desenvolvida em outra ocasião. Cf.
Amorim (2007).
O corpo segundo é aquele que: “sai sem cessar de si” (Valéry, 1996, Amorim
p. 59), “destrói furiosamente, alegremente, o próprio lugar onde está”
(Valéry, 1996, p. 59), as “mãos falam e os pés escrevem” (Valéry, 1996, p.
24), “os artelhos inteligentes” (Valéry, 1996, p. 39), “o ouvido é
maravilhosamente ligado ao tornozelo” (Valéry, 1996, p. 24), “nessa menina
tão frágil e tão fina um tal monstro de força e prontidão” (Valéry, 1996, p.
41), “mulher bizarramente desenraizada que se arranca sem cessar da própria
forma” (Valéry, 1996, p. 44), “coisa sem corpo” (Valéry, 1996, p. 31).
Esse corpo cria e habita um universo segundo onde: “a certeza é um
jogo” (Valéry, 1996, p. 24), poucos se tornam mil, “miríades de perguntas e
respostas entre os membros” (Valéry, 1996, p. 41), “as imagens se fundem e
desaparecem” (Valéry, 1996, p. 28), “tudo é possível de uma outra maneira;
tudo pode recomeçar indefinidamente” (Valéry, 1996, p. 61-62), um sonho
de loucura ou de razão “fazendo brilhar diante de nossos olhos aquilo que há
de divino num mortal” (Valéry, 1996, p. 58).
Ao referir-se ao trabalho da ponta e do giro sobre ela, pode-se ler:
Fedro
‒ Seu artelho, que a sustenta inteiramente, raspa o chão como o polegar sobre o tambor.
Quanta atenção nesse dedo; que vontade a endurece, e a mantém nessa ponta!... Mas eis
que ela gira sobre si mesma...
Sócrates
‒ Ela gira sobre si mesma – eis que as coisas ligadas eternamente começam a se separar.
Ela gira, ela gira...
Erixímaco:
‒ É verdadeiramente penetrar em outro mundo... (Valéry, 1996, p. 62-63).
Um corpo alterado, bivocal e tenso. Mas por qual força ele é alterado?
De que alteridade se trata? Parece que, mais uma vez, afirma-se a ideia de
um Outro terceiro e maiúsculo:
Sócrates
Quem sabe quais Leis augustas sonham aqui ter tomado claras faces, e concordado no
desígnio de manifestar aos mortais de que modo o real, o irreal e o inteligível se podem
fundir e combinar-se conforme o poder das Musas? (Valéry, 1996, p. 29).
Amorim
E a sofianidade de que fala Bakhtin:
Erixímaco
‒ Não és de opinião que o pensamento dos Imortais seja precisamente o que estamos vendo,
e que a infinidade dessas nobres semelhanças, as conversões, as inversões, as diversões
inesgotáveis que se respondem e se deduzem diante de nós nos transportam aos
conhecimentos divinos?
[...] O pensamento divino é agora essa fusão multicor de grupos de figuras sorridentes;
engendra a repetição dessas manobras deliciosas, esses voluptuosos turbilhões que se
formam de dois ou de três corpos que não podem mais ser rompidos... (Valéry, 1996, p. 29-
30)
Não seria o caso de trazer outro conceito bakhtiniano que designa essa
condição de terceiro? Penso ser pertinente observar aqui o conceito de
supradestinatário. Diz-nos Bakhtin:
Deve-se dizer o mesmo do ato artístico: também ele não vive nem se
movimenta no vazio, mas na atmosfera valorizante, tensa daquilo que é
definido reciprocamente. (...) a obra, porém, é viva e literariamente
significativa numa determinação recíproca, tensa e ativa com a
realidade valorizada e identificada pelo ato. A obra é viva e significante
do ponto de vista cognitivo, social, político, econômico e religioso num
mundo também vivo e significante. (Bakhtin, 2002, p. 30)
Referências
AMORIM, Marilia. O corpo da dança como arena de valores e o cronotopo do teatro,
Bakhtiniana Revista de Estudos Discursivos, São Paulo, 18 (2): 39-66, abril/junho 2023.
DOI: https://doi.org/10.1590/2176-4573p59553.
AMORIM, Marilia. O discurso da dança e o conceito de gênero – alguns elementos de
leitura. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, v. 15, n. 2, p. 64-96, abr./jun. 2020.
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2176-457342617.
AMORIM, Marilia. Raconter, démontrer, survivre... Formes de savoir et de discours dans
la culture contemporaine. Toulouse: Erès, 2007.
BADIOU, Alain. Petit manuel d’ineshétique. Paris: Seuil, 1998.
BAKHTIN, Mikhail. O problema do Conteúdo, do Material e da Forma na Criação
Literária. In: BAKHTIN, Mikhail. Questões de literatura e de estética. Tradução de Aurora
Fornoni Bernardini et al. São Paulo: Hucitec, 2002, p. 13-70.
BAKHTIN, Mikhail. O texto na lingüística, na filologia e em outras ciências humanas: um
experimento de análise filosófica. In: BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso.
Tradução de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2016, p. 71-107.
BAKHTIN, Mikhail. O Autor e a personagem na atividade estética In: BAKHTIN, Mikhail.
Estética da criação verbal. Tradução de Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2022,
p. 3-192.
BUBNOVA, Tatiana. Hacia una filosofia Del acto ético. De los borradores y otros
escritos. Tradução de Tatiana Bubnova. Prefácio de Mijail M. Bajtin. Barcelona:
Anthropos, 1997.
DUFOUR, Dany-Robert. Lacan e o espelho sofiânico de Boehme. Rio de Janeiro:
Companhia de Freud, 1999.
Campos
Cavalcante Filho
Perspectivas teórico-
metodológicas bakhtinianas:
um experimento de análise
dialógica
Bakhtinian Theoretical-Methodological Perspectives: An
Experiment in Dialogical Analysis
3 Notas metodológicas
O conceito de texto, no âmbito da teoria bakhtinaina, desempenha
papel central no estudo das ciências humanas. Em seu manuscrito Por uma
metodologia das ciências humanas ([1979] 2017), encontramos a afirmação
de Bakhtin de que o objeto das ciências humanas é “o ser expressivo e falante.
Esse ser nunca coincide mesmo e por isso é inesgotável em seu sentido e
significado” (Bakhtin, [1979] 2017, p. 59, grifos do autor). Enquanto produto
da interação entre sujeitos, é por meio do texto (oral, escrito ou materializado
em outras semioses) que observamos o que um sujeito fala para o outro, do
outro e com o outro. Assim, para compreendermos o homem, que é social,
bem como as relações humanas que ele estabelece com outros seres humanos
por meio da linguagem (portanto, da interação verbal), o ponto de partida é
o texto produzido por esses sujeitos sócio-historicamente situados no mundo
real, da história, da cultura.
Metodologicamente, ao considerarmos a produção de textos por
sujeitos e estudarmos a língua por eles utilizada, não apenas como um sistema
abstrato de signos, mas como um sistema de signos imbuído de valor
ideológico, Volóchinov, em Marxismo e filosofia da linguagem: problemas
fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem ([1929] 2017),
nos apresenta uma ordem metodológica para sua compreensão e análise com
a seguinte elaboração:
1
No original em francês: "Parmi toutes les perspectives à partir desquelles il est possible d’envisager
cet objet unique, Bakhtine en retient deux : l’une qui est celle de la linguistique ; l’autre se rapporte
à une discipline à laquelle, au début, il ne porte pas de nom (à moins que ce ne soit : la sociologie)
mais qu'il appellera dans ses derniers écrits metalingvistika, terme que, pour éviter une confusion
possible, je traduirai par translinguistique. Le terme actuellement en usage qui correspondrait le plus
fidèlement à ce qu’a en vue Bakhtine serait probablement pragmatique ; et l’on peut dire sans
exagération que Bakhtine est le fondateur moderne de cette discipline. Linguistique et
translinguistique représentent, alors, deux points de vue différents sur un même objet, le langage.
Au début de sa réflexion, Bakhtine ne voit pas les choses de façon neutre, mais il a plutôt à dire, en
particulier dans Marxisme et philosophie du langage (ouvrage signé par Volochinov), que la (future)
translinguistique doit supplanter la linguistique, car l'un des objets de connaissance est plus réel ou
plus importante ou plus légitime, que l’autre. Mais, dans d’autres textes, dont certains sont
contemporains de ce même livre, il insiste, au contraire, sur la légitimité de chacune des deux
perspectives" (Todorov, 1981, p. 42-43, italique de l'auteur).
2
Disponível em: https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/discursos-e-
pronunciamentos/2023/discurso-do-presidente-da-republica-luiz-inacio-lula-da-silva-durante-a-
abertura-da-cupula-do-g20. Acesso em: 26 nov. 2023.
3
Disponível em https://cee.fiocruz.br/?q=agenda-da-saude-global-e-diplomacia-da-saude-se-
intensificam-em-todas-as-frentes. Acesso em: 26 nov. 2023.
Considerações finais
No âmbito dos estudos da linguagem, em geral, e dos estudos
discursivos, em específico, a teoria dialógica da linguagem marca um lugar
epistemológico importante na sua perspectiva singular de analisar os
discursos produzidos por sujeitos sociohistoricamente situados, levando em
consideração sua relação com o social, o histórico, o político, o ético e o
cultural.
Com o objetivo de apresentar os principais princípios teórico-
metodológicos da chamada análise dialógica do discurso, o presente texto
Referências
Bakhtin, Mikhail. Arte e responsabilidade. In: Bakhtin, Mikhail. Estética da criação
verbal. Tradução de Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, [1919] 2011a.
p. XXXIII-XXXIV.
Bakhtin, Mikhail. Apontamentos de 1970-1971. In: Bakhtin, Mikhail. Estética da criação
verbal. Tradução de Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, [1970-1971]
2011b. p. 367-392.
Bakhtin, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de
Valdemir Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, [1920-
1924] 2010a.
Bakhtin, Mikhail. O problema do conteúdo, do material e da forma na criação literária. In:
Bakhtin, Mikhail. Questões de literatura e estética: a teoria do romance. Tradução de
Aurora Fornoni Bernadini et al. 6. ed. São Paulo: Hucitec, [1924] 2010b. p. 13-70.
Bakhtin, Mikhail. Teoria do romance I: a Estilística. Tradução, prefácio, notas e glossário
de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, [1934-1935] 2015.
Bakhtin, Mikhail. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de
Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, [1952-1953] 2016.
Bakhtin, Mikhail. Por uma metodologia das ciências humanas. In: Bakhtin, Mikhail. Notas
sobre literatura, cultura e ciências humanas. Organização, tradução, posfácio e notas de
Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, [1979] 2017. p. 57-79.
Bakhtin, Mikhail. Problemas da poética de Dostoiévski. Tradução, notas e prefácio de
Paulo Bezerra. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, [1963] 2018.
Bakhtine, Mikhaïl. Problèmes de la poétique de Dostoievski. Lausane : L’Age d’homme,
[1963]1970.
Brait, Beth. Análise e teoria do discurso. In: Brait, Beth. Bakhtin: outros conceitos-chave.
São Paulo: Contexto, 2006. p. 9-31.
Campos
Discurso do presidente da República, Luiz Inácio Cavalcante Filho
Lula da Silva, durante a abertura da Cúpula do G20
Discurso lido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a Cúpula do G20, na Sessão
I: “Um planeta Terra”. Evento realizado em Nova Delhi, na Índia, em 9 de setembro de
2023
Publicado em 09/09/2023 02h41
Quando olhou através da escotilha de sua nave, e viu pela primeira vez nosso
planeta em toda a sua plenitude, o cosmonauta Yuri Gagarin não conteve o encantamento,
e disse: “A Terra é azul”.
Sete décadas depois, as fotografias enviadas pela Chandrayaan-3 que a Índia
pousou recentemente no polo sul da Lua não deixam dúvidas: vista do alto, a Terra continua
azul e linda.
No entanto, o descompromisso com o meio ambiente nos leva a uma emergência
climática sem precedentes.
O aquecimento global modifica o regime de chuvas e eleva o nível dos mares.
As secas, enchentes, tempestades e queimadas se tornam mais frequentes e minam
a segurança alimentar e energética.
Agora mesmo no Brasil, o estado do Rio Grande do Sul foi atingido por um ciclone
que deixou milhares de desabrigados e dezenas de vítimas fatais.
Se não agirmos com sentido de urgência, esses impactos serão irreversíveis.
Os efeitos da mudança do clima não são sentidos por todos da mesma forma.
São os mais pobres, mulheres, indígenas, idosos, crianças, jovens e migrantes, os
mais impactados.
Quem mais contribuiu historicamente para o aquecimento global deve arcar com
os maiores custos de combatê-la.
Esta é uma dívida acumulada ao longo de dois séculos.
Desde a COP de Copenhague, os países ricos deveriam prover 100 bilhões de
dólares por ano em financiamento climático novo e adicional aos países em
desenvolvimento.
Essa promessa nunca foi cumprida.
De nada adiantará o mundo rico chegar às COPs do futuro vangloriando-se das
suas reduções nas emissões de carbono se as responsabilidades continuarem sendo
transferidas para o Sul Global.
Nascimento
Desvirtude discursiva no
discurso religioso evangélico:
análise dialógica da
argumentação e ética
Discursive disvirtue in evangelical religious discourse:
dialogical analysis of argumentation and ethics
1
Disponível em: https://veja.abril.com.br/politica/a-uniao-homossexual-nao-e-normal-diz-
candidato-a-presidencia-da-comissao-de-direitos-humanos-da-camara/. Acesso em: 03 ago. 2020.
2
Pesquisa realizada no período de pós-doutorado na Universidade de São Paulo pelo Programa de
Pós-Graduação em Filologia e Língua Portuguesa, sob a supervisão da Professora Drª. Maria Inês
Batista Campos Noel Ribeiro entre os anos de 2021 a 2023.
3
A entrevista também está disponível no site da Veja, em: https://veja.abril.com.br/politica/a-uniao-
homossexual-nao-e-normal-diz-candidato-a-presidencia-da-comissao-de-direitos-humanos-da-
camara/. Acesso em: 03 ago. 2020.
4
Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/408511-deputado-apresenta-novo-projeto-
sobre-tratamento-de-gays/. Acesso em: 20 jul. 2020.
5 A revista Veja tem publicação semanal no Brasil, distribuída pela Editora Abril, com edições
lançadas às quartas-feiras. Fundada em 1968 pelo jornalista Roberto Civita, a revista aborda uma
diversidade de temas de alcance nacional e global.
6
Disponível em: https://veja.abril.com.br/politica/a-uniao-homossexual-nao-e-normal-diz-
candidato-a-presidencia-da-comissao-de-direitos-humanos-da-camara. Acesso em 20 de dezembro
de 2022.
Referências
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Oliveira. In: LEMGRUBER, Márcio Silveira; OLIVEIRA, Renato José de (Org.). Teoria
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métaphysique à la rhétorique, essais à la mémoire de Chaïm Perelman avec un inédit sur
la logique. Bruxelles : Editions de l’Université de Bruxelles, 1986, p. 15-21.
PERELMAN, Chaïm. O Império Retórico. Trad. Maria Ermantina Galvão G. Pereira.
Porto: Edições Asa, 1993.
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Tradução Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes,
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Editorial Losada, 1942.
SCHELER, M. Ética: nuevo ensaio de fundamentación de un personalismo ético.
Tradución de Hilario Rodríguez Sanz. Madrid: Caparrós Editores, 2001.
SCHELER, Max. Ordo amoris. Tradução Xavier Zubiri. Madrid: Caparros Editores, 2008.
TREVISAN, João Silvério. Devassos no Paraíso: a homossexualidade no Brasil, da
colônia à atualidade. 4. ed, rev. atual. e amp. Rio de Janeiro: Objetiva, 2018.
Santos
1
A pesquisa foi concluída em 2020 e foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq).
2
Para isso, utilizamos a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), pois ela tem
por objetivo reunir as teses e dissertações defendidas em todo o país. Neste banco de dados digitais,
convergem as pesquisas encontradas em outras plataformas, como das Instituições de Ensino
Superior, sejam públicas ou privadas, e da CAPES.
2 Fundamentação teórica
As duas décadas posteriores à Revolução Russa, em solo soviético,
foram sui generis para os estudos linguísticos e literários. Tal peculiaridade
foi marcada pela proliferação de pesquisas que buscavam construir uma
ciência marxista em diversas áreas, como economia, psicologia e, com
atenção especial, estudos da linguagem (David-Fox, 1997, p. 1-3). Vinculada
ao Comissariado do Povo para a Educação, a RANION (Associação Russa
dos Institutos de Pesquisa Científica em Ciências Sociais), criada em 1921,
organizava as prioridades científicas para o desenvolvimento
socioeducacional e científico da nova Rússia, que estava em construção
(Brandist, 2012, p. 161).
Repensar os estudos da linguagem e literários era vital para a
perpetuação do espírito revolucionário, já que o retorno do regime imperial
melindrava os novos incumbentes. No Primeiro Congresso de toda a Rússia,
realizado em 1919, a fim de organizar o novo sistema educacional, Lênin
proferiu as seguintes palavras na abertura do evento:
3
Chamado a partir de 1930 de Instituto Estatal de Cultura Linguística (GIRK).
4
Além dos dois intelectuais mencionados, Brandist e Lähteenmäki (2010) defendem a tese de que
Bakhtin, especialmente com a obra “Teoria do Romance” (desenvolvida na década de 1930),
também investigou a língua do ponto de vista sociológico mesmo não sendo vinculado às tarefas do
ILJaZV.
Uma pessoa isolada, agindo em nome próprio, por sua conta e risco,
não pode de modo algum ter relação com a história. Somente como
parte do todo social, na sua classe e por meio da sua classe, a pessoa
torna-se historicamente real e ativa. Para entrar na história não é
suficiente o nascer físico – assim nasce um animal, mas ele não entra
para a história –, é preciso uma espécie de segundo nascimento social
(Volóchinov, [1925] 2019a, p. 60-61).
5
Neste capítulo, utilizamos a versão em espanhol (Argentina) da obra. Conforme esclarece Grillo
(2017, p. 55), “Embora a tradução brasileira traga o nome de Mikhail Bakhtin, esse texto foi
publicado por Volóchinov e fez parte das atividades descritas nos relatórios apresentados ao
"Instituto da História Comparada das Literaturas e das Línguas do Ocidente e do Oriente" (ILIAZV),
lugar de atuação de Valentín Nikoláievitch Volóchinov entre 1925 e 1932”.
6
Os teóricos marxistas soviéticos (1920-1950), de acordo com Tchougounnikov (2008), agregaram
ao conceito de ideologia de Marx o atributo de “ideologia de classe”, isto é, definiram a ideologia
como sistema de opiniões, de ideias e de conceitos acordados por uma classe social. Em uma
sociedade de classes, a ideologia é uma ideologia de classe. Ela expressa e defende os interesses de
uma ou outra classe em luta.
7
Neste capítulo, nosso foco são as análises dos textos escritos coletados, porém, ressaltamos que no
âmbito da pesquisa, foram analisadas as transcrições orais de exames de qualificação e de defesas
de mestrado.
8
Os comentários dos orientadores estão marcados entre colchetes negritados: [comentário do
orientador].
Conclusões
Os resultados das análises permitem verificar que o processo de
aprendizagem dos conceitos teóricos o qual os mestrandos são submetidos é
complexo, requer a participação ativa e formativa dos orientadores
(pesquisadores experientes). Dado que esses conceitos contêm um alto grau
de abstração, os comentários dos orientadores nas exposições teóricas dos
textos escritos são sine qua non para o desenvolvimento do raciocínio lógico
dos pesquisadores em formação. Evidência disso é o ajuste do estilo pictórico
para o estilo linear, isto é, o ajuste entre o modo como os mestrandos
compreendem os conceitos de um sistema conceitual e as significações
Referências
AMORIM, Marilia. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. 1. ed. São
Paulo: Musa Editora, 2004.
BRANDIST, Craig. Linguística sociológica em Leningrado: O Instituto de Estudos
Comparados das Literaturas e Línguas do Ocidente e do Oriente (ILJaZV) 1921-1933. In:
BRANDIST, Craig. Repensando o Círculo de Bakhtin. Org. Maria Inês Campos e
Rosemary H. Schettini. São Paulo: Editora Contexto, 2012, p. 155-181.
BRANDIST, Craig; LÄHTEENMÄKI, Mika. Early Soviet Linguistics and Mikhail
Bakhtin’s Essays on the Novel of the 1930s. In: BRANDIST, Craig; CHOWN, Katya.
Politics and the Theory of Language in the USSR 1917-1938: The Birth of Sociological
Linguistics. London: Anthem Press, 2010, p. 69-88.
CAVALCANTE FILHO, Urbano. O papel do divulgador no gênero discursivo divulgação
científica: uma questão ética e estética. In: Rodas de Conversa Bakhtiniana. Cadernos de
Textos e Anotações. 1ªed. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010, v. 1, p. 323-326.
François
Cunha
O “dialogismo”? Ou melhor,
“algumas figuras do diálogo,
suas comunidades e suas
diferenças, um ponto de vista”
“Dialogism”? Or better, “some figures of the dialogue, their
communities and their differences, a point of view”
Frédéric François
Universidade Paris Descartes, França 173
janvier-mars 2014
études de
linguistique appliquée
revue de didactologie
des langues-cultures
et de lexiculturologie
1
Nota da tradutora: O sintagma “figures du dialogue” utilizado no título original do artigo também
é utilizado pelo autor em vários textos, como uma metáfora, como em figura geométrica.
2
Nota da tradutora: Cf. François (2012, 2014b).
3
Nota da tradutora: O autor se refere à obra Le marxisme et la philosophie du langage: essai
d’applicaion de la méthode sociologique en linguistique, publicado na França em 1977. Em
português temos 2 traduções de Marxismo em filosofia da linguagem. Problemas fundamentais do
método sociológico na ciência da linguagem: a primeira de 1979, traduzida do francês (com cotejo
e consulta às edições russa e americana), publicada pela Editora Hucitec, com tradução de Michel
Lahud e Yara Frateschi Vieira; e outra versada diretamente do russo por Sheila Grillo e Ekaterina
Vólkova Américo, em 2017, pela Editora 34.
4
Nota da tradutora: O autor refere-se ao prefácio de sua autoria de Le marxisme et la philosophie
du langage: essai d’applicaion de la méthode sociologique en linguistique, publicado em 2010. Um
versão desse prefácio em português é encontrada em “Vološinov e a filosofia da linguagem”,
traduzido por Marcos Bagno e publicado pela Editora Parábola em 2015.
5
Nota da tradutora: O autor se refere a noções bastante usadas em ciências da linguagem. Cf.
François (2002).
Alguns exemplos
Outra entrada seria que os participantes de um diálogo não podem se
encontrar em posições idênticas. E que voltar ao diálogo é voltar para a
diferença entre essas posições. Ou melhor, existem posições instituídas. E
aquelas que se desenham no próprio curso da troca. É nisso que um diálogo,
em oposição aos questionários acima citados, só existirá como um
acontecimento, ou melhor, como uma pequena cena em ruptura com o que
do campo do sentido funciona então como pano de fundo.
6
Cf. François (2003).
7
Nota da tradutora: Em francês, o passado composto que equivale ao nosso pretérito perfeito pode
ser conjugado com os auxiliares ser e ter. No exemplo, a criança usa o auxiliar ter em lugar do
auxiliar ser (“je m’ai trompé”) e a professora corrige usando o verbo ser (“je me suis trompé”) que
é a forma correta gramaticalmente. Como a criança não percebe a correção, ela pergunta: “você
também?”
E Stern (Ibid., p. 37) conclui: “Eu não estava sozinho na terra, eu fazia François
Cunha
parte de uma espécie de matriz humana intersubjetiva e psicológica. O efeito
não durou. Mas isso me fez muito bem naquele momento.”
O que acrescentar? Stern comenta sobretudo o momento de seu
encontro com o casal desconhecido. Mas ele observa que alguém poderia ter
comentado tanto o momento do encontro ainda mais fugaz e frágil entre a
dama imitada e o mímico. Nos dois casos, o acordo não é exclusivo da
diferença. Ele não implica “empatia”. E “concordância”, justamente,
significa algo diferente de “identidade”.
Um segundo exemplo, oposto.
Um adolescente seguindo uma terapia psicodinâmica:
8
No original em francês: “J’étais assis sur les marches d’un musée dominant un trottoir. Un mime
de rues, bourré de talent, marchait derrière un passant sur dix ou vingt mètres (plusieurs secondes),
en imitant sa démarche, son attitude, son humeur apparente, en saisissant rapidement une de ses
caractéristiques. Le passant ne se rendait généralement pas compte qu’il était suivi, imité et raillé. Il
poursuivait simplement sa route. Puis le mime s’arrêtait, virait sur lui-même et emboitait le pas au
passant suivant, qui, lui, marchait dans la direction opposée. Etc. La foule assise sur les marches
s’amusait beaucoup. Le mime a alors suivi une femme. Mais elle a très vite compris ce qui se passait.
Elle a pilé, s’est tournée vers le mime et a protesté. Le mime l’a alors imitée dans sa colère. Elle
s’est alors mise à imiter l’imitation qu’elle faisait d’elle. Ils ont fini par éclater de rire tous les deux.
Ils se sont serré la main et sont partis chacun de son côté… À ce moment-là, je me suis levé pour
partir, comme un couple assis à ma gauche, des inconnus. Nous nous sommes regardés en souriant,
nous avons haussé les sourcils, avons incliné la tête, fait une mimique indescriptible et avons ouvert
les mains, paumes en l’air – comme pour dire : « On en apprend tous les jours. » Ils sont partis de
leur côté, moi du mien” (Ibid., p. 37).
9
No original em francês: “Enfant, il avait été gravement brûlé au torse et à l’abdomen, ce qui lui
avait laissé une cicatrice décolorée impressionnante. On avait consacré beaucoup de temps
thérapeutique à en parler, notamment du fait que la cicatrice dégoûtait les filles ou les faisait fuir.
C’était l’été et la plage était au cœur de la vie sociale. Un jour, pendant une séance, sans le prévoir,
il a dit : « Après tous ces palabres, il faut que vous voyez à quoi cela ressemble ». Et il a commencé
à relever sa chemise. (Un moment urgent). Le thérapeute s’est récrié : « Non, vous n’avez pas besoin
de me la montrer, contentez-vous de me dire ce qu’elle représente pour vous maintenant. » Le gamin
s’est interrompu et a exprimé son incompréhension devant le refus du thérapeute de voir sa cicatrice.
Ils se sont disputés à ce sujet pendant cette séance ainsi que pendant la suivante… Finalement lors
de la séance suivante, le thérapeute a déclaré : « J’ai réfléchi à ce qui s’est passé et j’ai eu le sentiment
de m’être déçu moi-même en ne regardant pas la cicatrice. » L’adolescent a répondu : « Peu
m’importe que vous vous soyez déçu. Vous m’avez déçu ». Et ils se sont de nouveau disputés” (Ibid.,
p. 209).
10
Nota da tradutora: O autor se refere à obra L’Institution, la passivité. Notes de cours au Collège
de France (1954-1955), publicada em 2003.
11
Nota da tradutora: O autor se refere à obra La vie quotidienne dans le monde moderne. publicada
em 1968.
Referências
FRANÇOIS, Frédéric. Bakhtine tout nu, ou une lecture de Bakhtine en dialogue avec
Volochinov, Medvedev et Vygotski ou encore, Dialogisme, les malheurs d’un concept
quand il devient trop gros, mais dialogisme quand même. Limoges : Lambert-Lucas, 2012.
FRANÇOIS, Frédéric. Bakhtin completamente nu, ou uma leitura de Bakhtin em diálogo
com Volochinov, Medvedev et Vygotsky ou ainda, Dialogismo: as desventuras de um
conceito (?) quando ele se torna muito amplo, mas “dialogismos” assim mesmo.
Bakhtiniana. Revista de estudos do discurso, v. 9, n. especial, p. 47–172, 2014b. Disponível
em: https://revistas.pucsp.br/index.php/bakhtiniana/article/view/19739 Acesso 14 mai.
2023.
Parte II
Educação
Mitsunari
1
Na BNCC, nas descrições dos trabalhos que devem ser feitos em cada campo (Brasil, 2018, p. 505-
526), a palavra cidadania tem apenas uma entrada: no campo de atuação na vida pública.
2
Que seguiam a Nomenclatura Gramatical Brasileira (Rio de Janeiro, 1958), elaborada por uma
comissão designada pela Portaria Ministerial nº. 152, em 1957.
3
Figueiredo (2005) destaca, dentre as iniciativas promovidas por órgãos internacionais, a
“Conferência Mundial de Educação para Todos”, que ocorreu em Jomtien, na Tailândia, em 1990,
e que teve como um de seus patrocinadores o Banco Mundial. Dentre os países participantes dessa
Conferência estava o Brasil. Comprometida em erradicar o analfabetismo e a evasão escolar,
principais desafios apontados pelo evento em Jomtien, a Secretaria de Educação Fundamental do
Ministério da Educação iniciou, em 1995, a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN).
Nesse último sentido, a leitura não pode ser avaliada como uma
aplicação de uma forma normativa. Seu sentido não se encontra na identidade
de uma forma, mas no significado que adquire em um contexto singular.
Duas décadas mais tarde, na BNCC (Brasil, 2018), “cidadania” tem
46 entradas, enquanto “mercado de trabalho” e “mundo do trabalho” têm,
4
Em Para uma filosofia do ato responsável, Bakhtin (2017b) apresenta um problema comum do
pensamento teórico da época moderna: a tentativa de fazer objetos de conhecimento teórico se
passarem como um mundo dado, objetivo – atemporal, a-espacial e a-valorativo –, que não precisa
ser responsavelmente reconhecido por uma unicidade participante. Para o filósofo russo, trata-se de
um equívoco, porque mesmo a lógica formal desenvolvida no terreno do kantismo se revela apenas
com a ação de reconhecimento da veracidade, a partir de um sujeito em defesa de leis internas a um
domínio teórico, que se transformam em meio de defesa racional.
O cronotopo do leitor, por sua vez, é uma complexa posição cujo papel
é renovador. Em uma das notas publicadas em “Fragmentos dos anos 1970-
1971”, Bakhtin (2017a) trata, ainda que de forma inacabada, da tendência de
se dissolver na consciência do autor a consciência do leitor, com o intuito de
compreender o texto tal qual o autor o compreenda. Esse momento de
coincidência entre as consciências, contudo, não pode existir, porque o leitor
tem, ele mesmo, a vantagem essencial da distância espaço-temporal do autor
– que não é um autor-criador, regido por leis individuais e psicológicas;
tampouco é uma definição acabada e encerrada no texto. É um sujeito ético-
estético, cujos sentidos devem ser (re)criados pelo centro singular concreto
do leitor.
Tanto o cronotopo do autor quanto o cronotopo do leitor nos são dados
na existência material externa da obra, em que o “material da obra não é
morto, mas falante, significante” (Bakhtin, 2018, p. 229). Assim, apesar da
5
O título “Luiz Fujita: ‘Fake news em saúde pode matar’”, a ausência de marcas de um discurso
direto ou de um discurso indireto de Fujita no corpo do artigo e o uso da primeira pessoa do plural
em “O caso mais notório que enfrentamos foi quando começou a circular um vídeo em que uma
mulher colocava na boca do dr. Drauzio Varella a ‘informação’ de que mamografias poderiam
prejudicar a tireoide” fazem com que no próprio site do Correio do Estado se tenha a impressão de
que a opinião expressa é do jornalista e, não, de Aquino. Fonte:
https://correiodoestado.com.br/cidades/artigos-e-opiniao/luiz-fujita-fake-news-em-saude-pode-
matar/344873/ Acesso em: 13 abr. 2023.
125
Mitsunari
Referências
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Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: WMF Martins Fontes,
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BAKHTIN, Mikhail. Fragmentos dos anos 1970-1971. In: BAKHTIN, Mikhail. Notas
sobre literatura, cultura e ciências humanas. Organização, tradução, posfácio e notas Paulo
Bezerra. São Paulo: 24, 2017a.
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Organização Augusto Ponzio
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Valdemir Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos, Pedro&João, 2017b.
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Curricular: Educação Infantil e Ensino Fundamental. Brasília: MEC/SEB, 2018.
BRASIL. Lei n. 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera as Leis n º 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, e 11.494, de 20 de junho 2007; revoga a Lei n 11.161, de 5 de agosto
de 2005; e institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em
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sala de aula. São Paulo: Ática, [1984] 2011, p. 53-62.
Leite
A dimensão ideológica e as
discursividades cronotópicas
em O cometa é um sol que não
deu certo
The ideological dimension and the chronotopic discursivities in
O cometa é um sol que não deu certo
1
Dados disponíveis em: https://www.acnur.org/portugues/dados-sobre-refugio/ Acesso em: 20
fev.2022.
2
Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/186958-unicef-aponta-recorde-de-37-milhoes-de-
criancas-deslocadas. Acesso em: 03 dez. 2022.
5
https://museudaimigracao.org.br/visite-o-museu. Acesso em: 04 ago. 2023.
Em O cometa é um sol que não deu certo, vencedor do 13º Prêmio Leite
Barco a Vapor6 em 2017, Sarmento dá vida e voz ao protagonista Emanuel,
um garoto sírio bondoso que “guarda o sol nos olhos como um disco
luminoso flutuando na escuridão” (Sarmento, 2017, p. 9). Como outras
crianças sírias, ele vive com sua família (seu pai, Youssef, sua mãe, Hosana,
sua irmã grávida cujo marido foi morto em um bombardeio) no campo para
refugiados na Jordânia. Apesar das dificuldades nesse ambiente hostil,
Emanuel traz consigo a esperança de dias melhores. No campo, vivencia
experiências infantis com seus amigos – Kalil, Nabir e a inquieta Amal, por
quem nutre um sentimento especial.
Na capa do livro, o texto verbo-visual apresenta o cometa com cores
quentes, fazendo alusão às cores do sol, complementando o sentido do título.
O fundo com tom azul escuro remete ao céu, e na parte inferior, no canto
direito, silhuetas humanas, quase imperceptíveis, estão no topo, como se
observassem o cometa. O mesmo traçado de linhas utilizado para o cometa é
utilizado para a montanha, como se céu e terra se espelhassem,
simetricamente.
Figura 1 – Capa
6
Lançada em agosto de 2004, a Barco a Vapor é a versão brasileira de uma das mais importantes
coleções de literatura infantil e juvenil em língua espanhola, criada há mais de trinta anos. O
concurso teve origem em 1978 na Espanha e tem a finalidade de revelar novos escritores. Disponível
em: https://barcoavapor.smeducacao.com.br/. Acesso em: 12 jan. 2023.
Figura 2 - Ilustração
7
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2_hx6NO8h98. Acesso em: 16 jan. 2023.
Da janela do abrigo, ele pensa com tristeza nas crianças que, como
aquele menino do bote, não sobreviveram às diversas formas de
intolerância. Dali, olhando para o céu (sempre o céu) e vendo a noite
passar, ele também espera pelos amigos do campo enquanto sonha com
um mundo melhor que este. Um mundo onde as crianças não precisem
se preocupar com nada além dos estudos e em crescer para se tornar
adultos melhores que seus pais. (Sarmento, 2017, p. 113, grifos meus).
148
Leite
Considerações finais
A obra juvenil O cometa é um sol que não deu certo perpassa
diferentes campos ideológicos (político, religioso, científico). Essa arena
ideológica e discursiva contribui para a construção da imagem de crianças
refugiadas – materializada na figura do protagonista Emanuel. Nesse sentido,
a leitura coloca o leitor diante do outro, sendo levado a um movimento
exotópico de reconhecer-se no olhar do outro, de buscar compreender o outro
de seu lugar, a partir de sua singularidade, como faz Emanuel.
A imagem do refugiado no menino Emanuel estabelece um diálogo
direto com a cultura cristã. Sua resiliência e empatia contrastam com os
guardas do campo. A ficção adere à vida na medida em que a dor e o espaço
são apresentados de maneira desromantizada. O campo de refugiados é o
espaço do medo, da fome e das diferenças que se encontram na dor humana.
Nesse sentido, a mobilização do conceito de cronotopo iluminou o percurso
teórico-metodológico, apontando para as valorações produzidas no tempo e
espaço, historicamente marcados na apresentação e na descrição do campo
de refugiados. O posicionamento do autor assume um caráter ético frente aos
refugiados que sobrevivem à hostilidade do campo, sem romantizar essa
condição. Os elementos enunciativos-linguísticos compõem um todo que
atrela a ética à estética, ou seja, vida e arte na obra juvenil.
Nessa arena discursiva, a relação do tempo e espaço produz a
discursividade das diferenças, da dor e do sofrimento das pessoas que vivem
no campo de refugiados, com destaque para as crianças. Essa discursividade
produzida pelo tempo e espaço, historicamente marcados, situa o leitor e
estabelece a interação texto-leitor-autor. A narrativa para jovens leitores
Referências
AMORIM, Marília. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. São Paulo:
Musa Editora, 2004.
BAKHTIN, Mikhail. A Ciência da Literatura hoje (Resposta a uma pergunta da revista
Novi Mir). In: BAKHTIN, Mikhail. Notas sobre literatura, cultura e ciências humanas.
Oliveira
Cavalcante Filho
A arquitetônica da divulgação
científica na esfera educacional:
uma análise bakhtiniana
The architectonic of scientific dissemination in the educational
sphere: a bakhtinian analysis
1
A publicação da quinta edição da coleção data de 2018. Após passarem por avaliação e seleção,
então, integraram o Programa Nacional do Livro e do Material Didático de 2020 (Brasil, 2020),
fazendo parte do Guia Nacional do Livro Didático.
[...] é determinada tanto por aquele de quem ela procede quanto por
aquele para quem se dirige. Enquanto palavra, ela é justamente o
produto das inter-relações do falante com o ouvinte. Toda palavra serve
de expressão ao “um” em relação ao “outro”. Na palavra, eu dou forma
a mim mesmo do ponto de vista do outro e, por fim, da perspectiva da
minha coletividade. A palavra é uma ponte que liga o eu ao outro
(Volóchinov, 2018, p. 205).
Para que entendamos esse ato, precisamos partir de uma análise que
identifique as matrizes ideológicas (avaliações sociais, posicionamento e
direção axiológicos) e os centros valorativos (os sujeitos do discurso e seus
valores éticos, morais, sociais, ideológicos, históricos e culturais) que
influenciam na materialização linguístico-discursiva da DC, na realização da
forma arquitetônica e composicional no livro didático a ser analisado.
Precisamos compreender os elementos importantes ao conceito de
arquitetônica como ato responsável, exotopia, excedente de visão, atmosfera
axiológica e autoria.
164
Oliveira
Cavalcante Filho
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Cavalcante Filho
Oliveira
Cavalcante Filho
172
Oliveira
Cavalcante Filho
Oliveira
Cavalcante Filho
Oliveira
Cavalcante Filho
Conclusões
O autor-criador constrói a arquitetônica da DC nas propostas de leitura
considerando o interacional, convidando o sujeito a pensar do seu lugar no
mundo e a responsabilizar-se. A forma como se apropriam da palavra alheia,
como enunciam na direção do outro e as formas que esse enunciado toma no
contexto da obra revelam como é assimilado pelo autor-criador e,
consequentemente, mostra seu posicionamento axiológico. As autoras, a
partir dos seus centros de valor, construíram seus pontos de vista e
expressaram suas visões de mundo. Ao escolherem um artigo de DC que se
posiciona contra o uso excessivo e descuidado das tecnologias digitais, elas
confrontam os discursos a favor dessas práticas.
O artigo de divulgação científica estudado sofreu deslocamento
espaço temporal, já que ele foi publicado em um momento anterior e,
posteriormente, foi selecionado para fazer parte do projeto enunciativo-
discursivo do autor-criador do livro didático. Com isso, a palavra do outro
sofreu coerção, foi reformulada, adquiriu a entonação, de modo que a
valoração negativa/positiva de concordância/discordância e
aceitação/rejeição ao discurso de outrem tornou-se evidente no todo
arquitetônico do enunciado.
A própria estruturação do capítulo nas seções “Para começo de
conversa”, “Prática de leitura”, “Conversa entre textos”, “Trocando ideias”,
“Reflexão sobre o uso da língua”, “De olho na escrita”, “Na trilha da
oralidade” e “Produção de texto” reflete a segmentação tradicional do ensino
de Língua Portuguesa em leitura, estudo gramatical e produção de texto
(Bunzen, 2006) e – a mais atual – oralidade. O livro didático representa um
grupo social marcado pela história do ensino de língua portuguesa, pelas
políticas educacionais, bem como por aspectos ideológicos, sociais, culturais,
e a junção de todos esses elementos materializa o discurso da tradição do
ensino de língua materna.
Em relação à função social da DC, notamos que os gêneros discursivos
e o livro didático analisado ajudam a publicizar o conhecimento científico, a
Referências
AMORIM, Marilia. Para uma filosofia do ato: “válido e inserido no contexto”. In: BRAIT,
Beth (Org). Bakhtin, dialogismo e polifonia. São Paulo: Contexto, 2018. p. 17-43.
ARAÚJO, Lucy Aparecida Melo; OLIVEIRA, Tânia Amaral. Tecendo Linguagens:
Língua Portuguesa: 8º ano. 5 ed. Barueri, SP: IBEP, 2018. Disponível em:
https://pnld2020.ftd.com.br/colecao/tecendo-linguagens/. Acesso em: 07 maio 2023.
BAKHTIN, Mikhail. O problema do conteúdo, do material e da forma na criação literária.
Questões de Literatura e de Estética (A Teoria do Romance). Tradução Aurora Fornoni
Bernardini, José Pereira Júnior, Augusto Góes Júnior, Helena Spryndis Nazário e Homero
Freitas de Andrade. Hucitec Editora: São Paulo, [1924] 2010b. p. 13-70.
BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Editora
34, 2016.
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução Valdemir de
Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, [1920-4] 2010a.
BAKHTIN, Mikhail. Teoria do romance: a estilística. Tradução Paulo Bezerra;
organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora
34, 2015.
BAKHTIN, Mikhail. Arte e responsabilidade. In: BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação
Verbal. Tradução Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, [1919] 2011a. p.
XXXIII-XXXIV
BAKHTIN, Mikhail. O autor e a personagem na atividade estética. In: BAKHTIN, Mikhail.
Estética da Criação Verbal. Tradução Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: WMF Martins
Fontes, [1920-3] 2011b. p. 3-192.
BRASIL. Ministério da Educação. Guia Digital - PNLD 2020: Língua Portuguesa. 2020.
Disponível em: https://pnld.nees.ufal.br/assets-pnld/guias/Guia_pnld_2020_pnld2020-
lingua-portuguesa.pdf. Acesso em: 07 maio. 2022.
BUNZEN, Clécio. Da era da composição à era dos gêneros: o ensino de produção de texto
no ensino médio. In: BUNZEN, Clécio; MENDONÇA, Márcia. Português no ensino médio
e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006, p. 139-161.
CAMPOS, Maria Inês Batista. A questão da arquitetônica em Bakhtin: um olhar para
materiais didáticos de língua portuguesa. Filologia E Linguística Portuguesa, v. 14, n. 2,
p. 247-263, 2012. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2176-9419.v14i2p247-263.
Carvalho
Cavalcante Filho
O Círculo de Bakhtin e a
Linguística Aplicada: notas para
uma Educação antirracista em
ensino de língua espanhola
The Bakhtin Circle and Applied Linguistics: notes for an anti-
racist education in Spanish language teaching
1
Mais informações sobre esse caso podem ser conferidas em: https://mundonegro.inf.br/preso-por-
atentado-a-escola-em-sp-o-agressor-ja-havia-sido-acusado-de-racismo-e-brigou-com-uma-das-vitimas/.
Acesso em: 29 mar. 20023.
2
Em reportagem veiculada pelo Portal UOL, os jornalistas Herculano Barreto Filho e Ana Paula
Bimbati evidenciam que, de 2019 a 2023, tem crescido o número de atentados terroristas nas escolas
ligados ao nazismo, sobretudo, após a pandemia de covid-19. Os repórteres destacam que, de 15
atentados ocorridos nesse período, ao menos cinco estão expressamente ligados à ideologia nazista,
que é também racista, e outros sete episódios se correlacionam ao tema, ainda que de modo não tão
explícito quanto os outros. Sobre essa análise, mais informações podem ser consultadas em:
https://abre.ai/f3ek. Acesso em: 15 mar. 2023.
3
“O MERCOSUL é um processo de integração econômica entre Argentina, Brasil, Paraguai e
Uruguai, iniciado com a assinatura do Tratado de Assunção, que tem como objetivo a conformação
de um mercado comum [...]. Em dezembro de 2005, o Mercosul aceitou o pedido da Venezuela de
adesão ao bloco, tendo sido firmado um Acordo Macro e criado um Grupo Ad Hoc para tratar das
questões relacionadas. Para aderir plenamente, a Venezuela terá que cumprir o disposto na Decisão
CMC 28/05 e, entre outras normativas, adotar a Tarifa Externa Comum do Mercosul, deixando de
integrar economicamente a Comunidade Andina das Nações. Enquanto está em processo de adesão,
a Venezuela está com o direito de participar de todas as reuniões do Mercosul, com direito a voz”.
Disponível em: http://mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/negociacoes-internacionais/799-
mercosul-mercado-comum-do-sul. Acesso em: 20 out. 2022.
A língua tem cor? Em si, [...] nenhuma língua tem cor porque nenhuma
língua existe em si. Entretanto, ao serem politizadas, as línguas têm cor,
gênero, etnia, orientação sexual e classe porque elas funcionam como
lugares de desenhar projetos de poder, dentre os quais o próprio
colonialismo fundado a partir de 1492 e a colonialidade que ainda
continua entre nós como continuidade dele (Nascimento, 2019, p. 21).
Considerações finais
Diante das discussões aqui levantadas, ao falarmos em como a LA
auxilia na percepção do mundo e das mudanças num contexto em que a
Referências
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011.
BAKHTIN, Mikhail. Fragmentos dos anos 1970-1971. In: BAKHTIN, Mikhail. Notas
sobre literatura, cultura e ciências humanas. Organização, tradução, posfácio e notas Paulo
Bezerra. Notas da edição russa Serguei Botcharov. São Paulo: Editora 34, 2017, p. 21-56.
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução de Valdemir
Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro e João Editores, [1920] 2010.
BARBOSA, Lia Pinheiro; OLIVEIRA, Franciane da Silva Santos. Epistemologias
marginalizadas: a questão racial no debate sociológico latino-americano. Afro-Ásia, [s. l.],
n. 62, p. 338-390, 2020. Disponível em:
https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=77068103009. Acesso em: 10 jul. 2022.
BRASIL. Lei nº 11.161, de 5 de agosto de 2005. Presidência da República. Casa Civil.
Brasília, DF, 2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-
2006/2005/Lei/L11161.htm. Acesso em: 18 abr. 2023.
BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Reforma do Ensino Médio. Brasília,
DF, 2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
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BRASIL. Secretaria Especial da Presidência da República. Medida Provisória nº 746, de
22 de setembro de 2016. Presidência da República. Casa Civil. Brasília, DF, 2016.
Disponível em:
https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=MPV&numero=746&ano=2016&ato=762
ITUE1EeZpWT31a. Acesso em: 10 ago. 2023.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018. Disponível
em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf.
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BRASIL. Ministério da Educação. Lei nº 10.639/2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir
no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura
Afro-Brasileira, e dá outras providências. Ministério da Educação. Brasília, DF, 2003.
Disponível em: https://abre.ai/g4t6. Acesso em: 12 ago. 2023.
BRASIL. Ministério da Educação. Lei nº 11.645/2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece
as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino
a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena. BRASIL.
Ministério da Educação. Brasília, DF, 2008. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acesso em:
12 ago. 2023.
SILVA, Wagner Rodrigues. Por uma linguística aplicada arrojada. In: SILVA, Wagner Carvalho
Rodrigues (org.). Contribuições sociais da linguística aplicada: uma homenagem a Inês Cavalcante Filho
Signorini. Campinas, SP: Pontes Editores, 2021, p. 17-30.
SOUZA NETO, Maurício José de. Por que pensar hoje em uma educação linguística
antirracista? Limites, tensões e possibilidades. Paraguaçu. [S. l.], v. 1, n. 1, p. 168-191,
2021. Disponível em:
https://www3.ufrb.edu.br/seer/index.php/revistaparaguacu/article/view/2042. Acesso em:
15 abr. 2023.
VOLÓCHINOV, Valentin. Marxismo e filosofia da linguagem. Problemas fundamentais
do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução, notas e glossário de Sheila
Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio introdutório Sheila Grillo. São Paulo: Editora
34, [1970] 2018.
WALSH, Catherine. Interculturalidade e decolonialidade do poder: um pensamento e
posicionamento "outro" a partir da diferença colonial. Revista Eletrônica da Faculdade de
Direito de Pelotas, Pelotas – RS, v. 05, n. 1, p. 6-38, 2019. Disponível em:
https://periodicos.ufpel.edu.br/index.php/revistadireito/article/view/15002. Acesso em: 15
abr. 2023.
Parte III
Mulheres
Rodrigues
Silva
1
Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/818164 Acesso em: 29 mar. 2023
2 Aporte teórico
Nesta seção, são apresentadas as abordagens teóricas da alteridade
bakhtiniana e da emoção plantiniana, as quais ancoram a análise do corpus e
orientam a constituição da visada argumentativa que pretendemos
demonstrar, em cumprimento do objetivo anunciado na introdução.
2.1 Alteridade
Bakhtin aborda a relação do sujeito com o outro em toda a sua obra,
sempre destacando como a relação de alteridade se constitui. Em seus
estudos, o autor leva em conta três momentos fundamentais:
Tudo o que me diz respeito, a começar por meu nome, e que penetra em
minha consciência, vem-me do mundo exterior, da boca dos outros (da
mãe, etc.), e me é dado com a entonação, com o tom emotivo dos
valores deles. Tomo consciência de mim, originalmente, através dos
outros: deles recebo a palavra, a forma e o tom que servirão para a
formação original da representação que terei de mim mesmo (Bakhtin,
2003, p. 378).
2.2 Emoção
A palavra emoção vem do latim emotionem, que significa mover de
dentro para fora, e está relacionada a um “estado” mental e fisiológico que
provoca muitas reações motoras e glandulares. As emoções eram
extremamente úteis no início dos tempos, quando por meio delas o ser
humano foi capaz de preservar a vida, pois por sentirem medo e raiva, os
primeiros seres humanos lutavam a fim de guardar as suas vidas dos animais
selvagens.
As emoções sempre despertaram curiosidade e foram alvo de diversos
estudos no decorrer dos tempos. Desde a era greco-romana já eram estudadas,
3 Metodologia
Este artigo tem sua origem em uma pesquisa qualitativa, de cunho
interpretativista. Nessa direção, primeiramente, compreendemos os
fenômenos, para, em seguida, realizarmos uma interpretação sobre eles.
Em relação ao método, utilizamos o método indutivo, com o
procedimento técnico de estudo bibliográfico, documental e descritivo,
sempre buscando descrever as propriedades importantes para interpretar os
2
No original : une forme liant un terme d’émotion (verbe or substantif), um lieu psychologique (dit
parfois expérienceur), et une source de l’émotion” (Plantin, 2010, p. 145).
3
Disponível em : https://globoplay.globo.com/v/818164/?s=0s Acesso em : 29 mar. 2023
Valmir Salaro: então... como é que vocês estão se sentindo depois da morte da Isabela... uma
morte tão trá::gica↗
Anna Carolina Jatobá: sofrendo muito↗ ... contu::do... com o que a população fa::la ao nosso
respeito... pelo pré julgamento... e pela própria população já ter condenado a gen::te ((responde
com voz de choro))sendo que nós somos↗ .... totalmente inocen::tes...
Alexandre Nardoni: é... nós somos uma família assim... eu e minha espo::sa Ana Caroli::na...
como podemos dizer↗ uma família como qualquer uma outra↗ entendeu↗ somos muitos
apegados... à família... somos/a nossa família somos todos unidos... né↗ e:: as nossas crianças↗
é:: nossos filhos↗ tanto a Isabela... quanto o Pietro e o Cauã... é:: tudo na nossa vi::da... minha e
da minha esposa... entendeu↗
Anna Carolina Jatobá: Com certeza...
Alexandre Nardoni: e:: sempre foi feito TUDO ... para as nossas crianças... para os nossos
filhos... e::
Anna Carolina Jatobá: o que faz pra ela sempre foi feito pra todos... nunca teve diferença...
entre nenhum dos três... sempre... sempre... tudo foi sempre igual↗ pros três... sempre...
Valmir Salaro: como vocês estão suportando essa carga de acusação... que é uma
acusação grave... e você... ter asfixiado a Isabella... ((apontou para a Anna)) e você
((apontou para o Alexandre)) ter jogado da janela... a criança...
Anna Carolina Jatobá: uma coisa terrível né↗ é horrível...
Alexandre Nardoni: isso não exis::te...
Anna Carolina Jatobá: nunca encostei um dedo nela... eu sou MÃE... você acha que o
que eu não quero pros outros... eu vou querer pros meus filhos... isso não tem cabimento
que tão falando... não existe... nunca existiu...
Alexandre Nardoni: eu nunca... é::
Anna Carolina Jatobá: nunca encostei um dedo ne::la... tanto Alexandre...
Salaro, nesse excerto, pergunta como foi a semana na prisão para eles,
que nunca tiveram contato com esse mundo. Anna Carolina responde com o
termo de emoção “horríveis”, a fim de demonstrar a sua dor e, até mesmo,
despertar pena no auditório. Alexandre responde, mais uma vez, com a
indignação de estarem sendo julgados por pessoas que não os conhecem
verdadeiramente.
226
Rodrigues
Silva
Considerações finais
Neste artigo, analisamos a primeira entrevista do casal Nardoni,
concedida ao Fantástico. Nosso olhar foi direcionado à alteridade e à emoção
com o propósito de compreender como se construiu a orientação
argumentativa.
Com o intuito de alcançarmos esse objetivo, partimos da seguinte
questão geral de pesquisa: de que forma o movimento de emoção e de
alteridade presentes no discurso dos entrevistados contribuem para a
construção da orientação argumentativa estabelecida a partir dos
pensamentos, das opiniões, das crenças dos sujeitos em questão, participantes
dessas relações dialógicas e valorativas?
Referências
AMORIM, Marília. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. São Paulo:
Musa, 2001.
ARISTÓTELES. Retórica das paixões. Prefácio Michel Meyer. Tradução do grego Isis
Borges B. da Fonseca. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. 4 ed. São Paulo:
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BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de
Valdemir Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos, SP: Pedro & João Editores, 2010.
EMEDIATO, Wander. As emoções da notícia. In: MACHADO, Ida Lúcia; MENEZES,
William; MENDES, Emília (Orgs.). As emoções no discurso. Rio de Janeiro: Lucerna,
2007, p. 290-309.
FARACO, Carlos Alberto. Linguagem e Diálogo. As ideias linguísticas do círculo de
Bakhtin. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
GLOBOPLAY. Pai e madrasta de Isabella dão entrevista exclusiva. São Paulo:
Fantástico, 2008. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/818164/?s=0s. Acesso
em: 29 mar. 2023.
GRUPO DE ESTUDOS DOS GÊNEROS DO DISCURSO- GEGe. Palavras e contra
palavras: Glossariando conceitos, categorias e noções de Bahktin. São Carlos: Pedro &
João Editores, 2009.
PLANTIN, Christian. As razões das emoções. Tradução Emília Mendes. In: MENDES,
Emília; MACHADO, Ida Lúcia. (Orgs.). As emoções no discurso. V.II. Campinas:
Mercado de Letras, 2010, p. 57-80.
PLANTIN, Christian. Les bonnes raisons des émotions. Principes et méthode pour l’étude
du discours émotionné. Bern: Peter Lang, 2011.
RODRIGUES, Maria das Graças Soares; SILVA NETO, João Gomes; COSTA, Alessandra
Castilho da; FABIANO-CAMPOS, Sulemi. Ateliê de escrita: a emoção como fonte
motivadora. In: MARQUESI, Sueli; PAULIUKONIS, Aparecida Lino; ELIAS, Vanda
Maria. Linguística textual e ensino. São Paulo: Contexto, 2017, p. 33- 47.
VOLÓCHINOV, Valentin. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais
do método sociológico na ciência da linguagem. 3.ed. Tradução, notas e glossário Sheila
Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34, 2021.
Puzzo
Palavras finais
A teoria dialógica da linguagem ilumina concretamente não apenas o
estilo de Evaristo, mas também seu processo de construção poética. Como
afirma Bakhtin, o enunciado concreto, neste caso, o poema, realiza-se na
materialidade linguística, cujos recursos convergem para o tema de cada
poema, como procuramos demonstrar. Complementarmente, o processo de
Referências
ADORNO, Theodor. Palestra sobre lírica e sociedade. In: ADORNO, Theodor. Notas de
literatura I. Tradução e apresentação Jorge de Almeida. São Paulo: Duas Cidades: Ed. 34,
2003.
BAKHTIN, Mikhail. O autor e a personagem na atividade estética. In: BAKHTIN, Mikhail.
Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, [1975]
2003a, p. 5-20.
BAKHTIN, Mikhail. Reformulação do livro sobre Dostoiévski. In BAKHTIN, Mikhail.
Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, [1975]
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BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Editora
34, [1952-1953] 2016.
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de
Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, [1920]
2010.
BAUMAN, Zygmunt. Vida líquida. Tradução Carlos Alberto Medeiros, Rio de Janeiro:
Zahar Editora, 2007.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. Tradução
Gabriel Valadão Silva, São Paulo: L&PM, 2018.
EVARISTO, Conceição. Poemas de recordação e outros movimentos. 8ª edição. Rio de
Janeiro: Malê, 2021.
EVARISTO, Conceição. Ponciá Vicêncio, Rio de Janeiro: Pallas Editora, 2017.
EVARISTO, Conceição. Becos da memória, Rio de janeiro: Pallas Editora, 2017.
VOLÓCHINOV, Valentin. A palavra na vida e a palavra na poesia: para uma poética Puzzo
sociológica. In: VOLÓCHINOV, Valentin. A palavra na vida e a palavra na poesia.
Organização, tradução, introdução e notas Sheila Grillo e Ekaterina V. Américo. São Paulo:
Ed. 34, [1926] 2019a p. 109-146.
VOLÓCHINOV, Valentin. O que é a linguagem/língua? In: VOLÓCHINOV, Valentin. A
palavra na vida e a palavra na poesia. Organização, tradução, introdução e notas Sheila
Grillo e Ekaterina V. Américo. São Paulo: Ed. 34, [1930] 2019b, p. 234-265.
Taraborelli
1
Cuti: pseudônimo do escritor Luiz silva.
2
O Quilombhoje Literatura foi fundado em 1980, por escritores negros, com o objetivo de discutir
e incentivar a experiência afro-brasileira na literatura e é o responsável pela organização dos
Cadernos Negros. Disponível em: https://www.quilombhoje.com.br/site/quilombhoje. Acesso em
09 jul. 2023.
3
A série Cadernos Negros foi criada em 1978 por oito participantes: seis homens e duas mulheres,
a saber, Cuti, Oswaldo de Camargo, Henrique Cunha Jr., Eduardo de Oliveira, Angela Galvão, Jamu
Minka, Hugo Ferreira e Célia Pereira, com intuito de publicar a produção literária afro-brasileira.
Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/literafro/resenhas/poesia/1038-cadernos-negros-40.
Acesso em 15 dez. 2022.
O simples fato de que eu, a partir de meu lugar único no existir, veja,
conheça um outro, pense nele, não o esqueça, o fato de que também
para mim ele existe - tudo isso é alguma coisa que somente eu, único,
em todo o existir em um dado momento, posso fazer por ele: um ato do
vivido real em mim que completa a sua existência, absolutamente,
profícuo e novo, e que encontra em mim somente a sua possibilidade
(Bakhtin, [1920-1924] 2020, p. 98).
4
Os poemas constam dos anexos.
Considerações finais
A constituição do sujeito, nos dois poemas, é perpassada fortemente
pela alteridade, que se manifesta por meio da memória e da ancestralidade.
Da memória, porque historicamente, a figura do negro foi subjugada pelo
homem branco, e portanto, se faz necessário lembrar o passado para
reescrevê-lo. Da ancestralidade, pelo fato de a figura do antecessor contribuir
com a quebra do paradigma imposto, no qual brancos são superiores aos
negros, ao afirmar a valorização dos povos de matrizes africanas que
contribuíram com sua cultura na constituição do povo brasileiro. Portanto,
ambos os poemas enaltecem a cultura e a memória ancestral.
Enquanto no poema de Evaristo (2021) a ancestralidade está presente
desde o título, na figura do velho, e, depois, nas pessoas da família ou que
estabelecem com o sujeito uma relação de afetividade – e que, ao serem
nomeadas e identificadas, representam a história viva e reforçam
positivamente o valor do povo negro, fato que contribui diretamente na
constituição do sujeito –, no poema de Sobral (2017), a ancestralidade está
marcada por um passado histórico. Quando o eu poético, ao afirmar seu lugar
social, se mostra empoderado pelas ancestrais Aqualtune, Nzinga e Dandara,
personalidades importantes para história do povo negro escravizado, a
trajetória dos “eus” vai sendo escrita, seja pela voz do jovem, seja pela voz
da mulher que nega a imagem que fazem dela.
Referências
AMORIM, Marília. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. São Paulo:
Musa Editora, 2004.
BAKHTIN, Mikhail. Fragmentos dos anos 1970-1971. In: BAKHTIN, Mikhail. Notas
sobre literatura, cultura e ciências humanas. Organização, tradução, posfácio e notas de
Paulo Bezerra. Notas da edição russa de Serguei Botcharov. São Paulo: Editora 34, 2017.
p. 21-56.
BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de
Paulo Bezerra. Notas da edição russa de Botcharov. São Paulo: Editora 34, [1979] 2016.
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução de Valdemir
Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João editores, [1920-1924] 2020.
BAKHTIN, Mikhail. Problemas da poética de Dostoiévski. Tradução direta do russo, notas
e prefácio de Paulo Bezerra. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, [1963] 2018.
BAKHTIN. Mikhail. Reformulação do livro sobre Dostoiévski. In: BAKHTIN, Mikhail.
Estética da criação verbal. Prefácio à edição francesa Tzvetan Todorov. Introdução e
tradução do russo Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, p. 337-
357.
BERND, Zilá. Introdução à literatura negra. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988.
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 34. ed. São Paulo: Cultrix, 1996.
CERQUEIRA, Janice Souza. Da literatura afro-brasileira à poesia afro-feminina de
Conceição Evaristo. Rio de Janeiro: Malê, 2022.
CADERNOS NEGROS 13. Org. Quilombhoje. São Paulo: Ed. dos Autores, 1990.
Na face do jovem
o frescor da pele,
e o brilho dos olhos
são dúvidas.
(EVARISTO, Conceição. Poemas da recordação e outros movimentos. Rio de Janeiro. Malê, 2021,
p. 88)
Se me chamam negra
estou aqui!
Com toda a negritude do meu ser
desfilo com alegria o meu pretume
exibindo pra quem quiser ver
na delícia de ser o que sou
Sou negra
Sou mulher
Aqualtune, Nzinga, Dandara
Empoderada ainda por muitas outras
Com orgulho!
Sant’Ana
Padilha
Cronotopo dialógico: as
memórias das mulheres
“simininas”
Dialogical chronotope: the memories of “simininas” women
Para Bakhtin (2017, p. 395), “o objeto das ciências humanas é o ser Sant’Ana
expressivo e falante. Esse ser nunca coincide consigo mesmo e por isso é Padilha
inesgotável em seu sentido e significado”. Assim, 10 anos depois, pesquisar
o discurso das mulheres que participaram do Programa Siminina
configurava-se em uma fonte inesgotável de conhecimento e de relevância.
Conforme Amorim (2004, p. 26), “para que alguma coisa possa se
tornar objeto de pesquisa, é preciso torná-la estranha de início para poder
retraduzí-la no final: do familiar ao estranho e vice-versa, sucessivamente”.
Desse modo, a percepção voltada à estranheza diz respeito à relação
estabelecida entre a pesquisadora e as participantes da pesquisa, com o foco
voltado ao objeto de análise, que, nesse caso, seriam as memórias biográficas
das mulheres entrevistadas em relação às ações oportunizadas a elas pelo
Siminina.
Para isso, coube à pesquisadora, no ato do reencontro, manter um
efetivo olhar exotópico, visto que, apesar do tempo trabalhado e de todo o
contato tido entre pesquisadora e pesquisadas durante a infância de cada uma,
nesse tempo e espaço, o que se constituía era uma relação de alteridade, pois,
ainda em Amorim (2016), entendemos que é no tempo que percebemos o
campo de sentido em que ocorrem todas as transformações e acontecimentos.
Por isso, é importante observarmos na pesquisa que, ao mesmo tempo que as
memórias eram comungadas, existia também um distanciamento relevante, e
o mais importante, o reconhecimento do olhar das entrevistadas, das vozes
sociais que elas representam e de todas as possibilidades obtidas devido aos
encontros dialógicos e seu devido excedente de visão.
Em cada encontro, uma memória biográfica era apresentada, e assim,
uma nova informação era acrescentada à pesquisa, tanto pelas contribuições
das mulheres pesquisadas, quanto pelas observações estabelecidas pela
pesquisadora, propriamente pelo excedente de visão. Desse modo, fazia-se
imperativo observar o preconizado por Amorim (2016, p. 100), para quem “o
fundamental é que a pesquisa não realize nenhum tipo de fusão dos dois
pontos de vista, mas que mantenha o caráter de diálogo, revelando sempre as
diferenças e a tensão entre elas”.
Neste sentido, partimos da premissa de que se fazia necessário dar
visibilidade às memórias biográficas dialógicas das mulheres que
Pesquisada Resposta
Foi de extrema importância, desenvolver meu "eu" social por conta do
programa, todas as palestras, incentivos e conversas abertas me
Siminina A
proporcionou espaço para crescer e me tornar a mulher independente que
sou hoje.
Com certeza, é um programa que te ajuda a criar uma direção na vida. Digo
Siminina C isso por que aprendi muitas coisas ali, muitas orientações, muita ajuda no
que iria exercer no futuro.
Siminina L Sim! Foi muito importante para o meu crescimento profissional.
Sim, com toda a certeza! A partir do Siminina tive a oportunidade de fazer
aula de dança em uma academia, visto que foi onde tive o meu primeiro
Siminina M
contato com a dança. Hoje conheço diversos países levando a dança, a arte
e divulgando a nossa cultura.
Muito, me ensinou valores, disciplina, esforço e tudo o que a gente faz com
esforço a gente vê resultado, me incentivou a trabalhar com crianças. Eu
Siminina S
sempre fui muito ouvinte das meninas que participavam e eu sempre queria
ajudar de alguma forma.
Sim, pois com os ensinamentos que tive muita coisa pode ser somada para
Siminina W
nossa vida hoje.
Fonte: Base de dados/ instrumento de coleta de dados para a realização da pesquisa (2020).
1
A metodologia de geração de dados ocorreu na época da pandemia da Covid 19, por meio de
documentos relacionados ao programa, questionários e anotações “in loco” que denominamos por
encontros dialógicos.
2
É a manifestação da criação de um novo cronotopo dialógico, um conjunto indivisível de
compreensão mútua entre os falantes do que é seu e do que é estrangeiro através do diálogo. É
quando a conexão profunda ocorre nas relações discursivas entre as consciências discursivas que
elas se tornam dialógicas. A enunciação gera uma obrigação identitária do falante com o enunciado
e de alteridade com o interlocutor para gerar uma resposta; quando evadido, a personalização é
perdida (Gallardo; Landeros, 2021, p. 37-38, tradução nossa).
Pesquisada Resposta
Foi importante na fase em que minha vida encontrava-se. Estávamos
Siminina A sozinhos em uma nova cidade. O programa proporcionou-me um lar quando
eu ainda não tinha construído um para mim mesma.
Muito, além de ser um programa que ajuda muito as mães que as vezes não
tem como ficar com seus filhos pelo trabalho. Lá aprendi a me soltar mais,
Siminina C
sempre fui muito tímida e o programa me ajudou muito a perder essa timidez,
fiz apresentações de dança. Sinto orgulho de ter participado.
Sim! Tudo o que vivi no Siminina me serviu de experiência de vida e muitos
Siminina L
conhecimentos.
Foi muito importante participar do programa Siminina, acredito que se não
fosse o Siminina eu não teria as oportunidades que tenho hoje. Foi um
Siminina M
programa de suma importância na minha vida, no qual contribuiu de forma
muito positiva.
Nossa, muito! Me agregou muito como pessoa, me proporcionou muitas
oportunidades eu não teria, inclusive a primeira vez que eu andei de avião
Siminina S para representar Mato grosso e o Centro Oeste em Campo Grande e Brasília,
onde eu levei uma carta aos governadores e ao presidente da república sobre
um projeto de erradicação do trabalho infantil.
Sim, pois é um programa muito importante aonde podemos ficar seguras
Siminina W
para que nossos pais pudessem trabalhar.
Fonte: Base de dados/ instrumento de coleta de dados para a realização da pesquisa (2020).
Referências
AMORIM, Marilia. Cronotopo e exotopia. In: BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin: outros
conceitos-chave. 2ª ed. São Paulo: Contexto. 2016.
AMORIM, Marília. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. São Paulo:
Musa editora. 2004.
BAKHTIN, Mikhail. Notas sobre literatura, cultura e ciências humanas. Organização,
tradução, posfácio e notas Paulo Bezerra. Notas da edição russa Serguei Botcharov. São
Paulo: Editora 34, 2017.
BAKHTIN, Mikhail. O discurso na poesia e o discurso no romance. In: MIKHAIL,
Bakhtin. Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. Tradução Aurora
Fornoni Bernardini et al. 7ª ed. São Paulo: Hucitec, 2014, p. 89 - 348.
BAKHTIN, Mikhail. Teoria do Romance II: As formas do tempo e o cronotopo. Tradução,
posfácio e notas Paulo Bezerra. Notas da edição russa Serguei Botcharov e Vadim Kójinov.
São Paulo-Editora 34, 2018.
BAKHTIN, Mikhail. O autor e a personagem na atividade estética. In: BAKHTIN, Mikhail.
Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2011.
BAKHTIN, Mikhail. O problema do texto na linguística, na filologia e em outras ciências
humanas. In: MIKHAIL, Bakhtin. Estética da Criação Verbal. Tradução Paulo Bezerra.
São Paulo: Martins Fontes, 2011b.
BEMONG, Nele; BORGHART, Pieter. A teoria bakhtiniana do cronotopo literário:
reflexões, aplicações, perspectivas. In: BEMONG, Nele; BORGHART, Pieter;
BOBBELEER, Michel de; DEMOEN, Kristoffel; TEMMERMAN, Koen de; KEUNEN,
Bart (Orgs.). Bakhtin e o cronotopo: reflexões, aplicações, perspectivas. Tradução Ozíris
Borges Filho et al. São Paulo: Parábola, 2015, p. 16 – 33.
BRAIT, Beth; NUNES, Jozanes Assunção. Documentos oficiais em diálogo. Eutomia, v.
21, n. 1, p. 144-168, jul. 2018.
CLARK, Caterina; HOLQUIST, Michael. Mikhail Bakhtin. Tradução. J. Guinsburg. São
Paulo: Perspectiva. 2008.
FIORIN, José Luiz. Introdução ao pensamento de Bakhtin. 2ª ed. São Paulo: Contexto,
2017.
GALLARDO, Emilio Carranza; LANDEROS, Rosío Molina. La identidad heteroglósica
como herramienta verbal-ideológica de análisis del discurso dialógico. Dialogía, v. 15, p.
33-80, 2021. Disponível em: https://journals.uio.no/Dialogia/article/view/9275. Acesso em
20 mai. 2022.
Silva
Estevam
2 Arquitetônica bakhtiniana
Nos estudos bakhtinianos e do Círculo, uma temática que permeia
diferentes obras é a da arquitetônica. Tal conceito revela a forma como esses
autores concebem o enunciado, enxergando-o como um ato singular, único,
ligado indissociavelmente à realidade externa e em que, na sua produção e
recepção, é atravessado por diferentes posições axiológicas, em determinadas
condições de tempo e de espaço.
Em “Por uma filosofia do ato responsável”, Bakhtin (2010) demonstra
a forma de realizar uma análise da arquitetônica em uma obra de Pushkin, a
qual foi escrita em 1830.
O autor, assim, afirma:
1
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=CJ3pFcix1YU Acesso em: 13 out. 2023.
2
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=WwdgWl_nmKI Acesso em: 13 out. 2023.
297
Silva
Estevam
Fonte: os autores
Fonte: os autores
Soraya Thronicke: seu partido um corrupto confe::sso... e esse mundo lin::do que o senhor fala
só existe na propaganda eleitoral do senhor↗ ... o Brasil precisa mudar e mudar pra valer ... precisa
do mundo digital... nós já estamos caminhando... e os seus economistas são todos MO-FA-DOS
... nós temos uma solução pra o Brasil que a solução do imposto único federal... nós vamos excluir
retirar onze tributos federais e vamos trocar por um SÓ
Soraya Thronicke: nós vamos excluir retirar onze tributos federais e vamos trocar por um SÓ
((candidata gesticula o um com a mão direita)) uma alíquota de UM ponto vinte e seis por cento
que vai:: aumentar o poder de compra↗ do brasilei::ro e diminuir a inflação... além DIsso.. isentar
de imposto de ren::da e de INSS... quem ganha... até cin::co salários mínimos... tudo aquilo que
é descontado do teu salário vai sobrar no seu bolso... COMO nós vamos fazer isso↗ não é
milagre... tem contas... são TRIN::TA anos de estudo do professor Marcos Cintra e eu/e eu é::
desafio ((candidata levanta o dedo indicador)) qualquer economista a discutir comigo imposto
único federal...
Fonte: os autores
Lula: a candidata Soraya... ((fala em tom de riso irônico)) se ela tivesse acompanhado a política
desse país↗ ela perceberia que o seu vice já fez essa proposta há trin::ta anos atrás... e não foi...
se quer levado em conta pelos eleitores desse país↗ e desse esta::do...
Lula: a segunda coisa↗ que eu queria dizer... para candidata Soraya é de que... nesse país↗ se
consegue falar muita coisa... e a senhora disse que não viu esse país que eu falei acontecer↗ ...
((fala apontando diretamente para Soraya))o SEU motorista viu↗... o SEU jardineiro viu↗ ... a
sua empregada doméstica VIU... você pode perguntar para a sua empregada domés::tica que ela
viu↗ que esse país melhorou... ela viu↗ que ela podia almoçar e jantar↗ todo santo dia... que ela
podia tomar café↗ ela viu que o filho dela poderia entrar em uma universidade... o seu jardineiro
VIU... ora... porque os POBRES efetivamente cresceram nesse país e conquistaram cidadani::a...
talvez↗ a senhora não tenha visto... não sei se a senhora votou favorável à legalização de emprego
de empregada domés::tica... MAS... ela VIU que melhorou a vida dela... ela viu que ela foi
RESPEITADA ... e é ASSIM que vai voltar a ser↗ ... o PO::BRE desse país vai voltar a ser
respeita::do ((fala olhando diretamente para a câmera))...
Lula: ele não vai ter emprego verde-amarelo... ele vai ter emprego EFETIVAMENTE... sabe↗
conquistando o (terminal) remunerado... com direito a férias... porque esse país acabou a
escravidão em mil oitocentos e oitenta e oi::to... não é POSSÍ::VEL... que o trabalhador hoje...
fique trabalhando como se fosse um entregador de comida↗ sentindo o cheiro da comi::da... sem
poder comprar o que comer↗ ... é preciso que a gente LEGALI::ZE a vida desse cidadão↗
transforma-lo num pequeno empreendedor↗ é dar cidadania pra ele... é fazer com que ele tenha
direito quando a sua moto QUE::bra quando seu carro QUE::bra ... quando a sua bicicleta
QUE::bra... e é ISSO que nós vamos fazer ... porque é ISSO que nós sabemo fazer... e é ISSO que
nós fizemos a vida intei::ra... NADA de escravidão↗ ... no século vinte e um... é preciso voltar↗
ao tempo da liberdADE... que eu aprendi desde o momento sindical...
304
Silva
Estevam
Fonte: os autores
Silva
Estevam
Cerqueira
Discursos presidenciais do
Dia Internacional da Mulher
(2014 e 2022)
International Women's Day presidential discourses
(2014 and 2022)
1
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8RUPjbvitSU. Acesso em: 21 jun. 2022.
2
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=uRZ5JDgh1hw&t=1:10:17. Acesso em: 21
jun. 2022.
3
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=uRZ5JDgh1hw&t=1:10:17. Acesso em: 21
jun. 2022.
Considerações finais
O objetivo deste artigo foi analisar a saudação e a apresentação do
tema dos pronunciamentos oficiais dos presidentes Rousseff (2014) e
Bolsonaro (2022) em comemoração ao 8 de março, a fim de entender como
as diferentes representações ideológicas que os presidentes constroem em
torno do papel da mulher são materializadas nos elementos verbo-visuais: as
formas de discurso do outro, os signos ideológicos, as cores, etc.
Na construção ideológica dos pronunciamentos por meio desses
elementos, três resultados se destacam:
Referências
#AOVIVO: Comemoração do Dia Internacional da Mulher. Brasília: TV BrasilGov, 2022.
Youtube. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=uRZ5JDgh1hw&t=1:10:17.
Acesso em: 21 jun. 2022.
BAKHTIN, Mikhail. Teoria do romance I: a estilística. Tradução, prefácio, notas e
glossário de: Paulo Bezerra. São Paulo: 34, [1930-1936] 2015.
BALASSIANO, Marcel Grillo. Recessão Brasileira (2014-2016): Uma análise por meio do
método do Controle Sintético do PIB, PIB per capita, Taxa de Investimento e Taxa de
Desemprego. Encontro Nacional da Anpec. 2018. Disponível em:
https://www.anpec.org.br/encontro/2018/submissao/files_I/i4-e40f41cc1badaf4207dc9dc
7f5823cc8.pdf. Acesso em: 01 abr. 2023.
BRAIT, Beth. Literatura e outras linguagens. São Paulo: Contexto, 2010.
BRAIT, Beth. Olhar e ler: verbo-visualidade em perspectiva dialógica. Bakhtiniana, São
Paulo, v. 8, n. 2, p. 43-66, jul./dez. 2013. Disponível em:
https://revistas.pucsp.br/index.php/bakhtiniana/article/view/16568/12909. Acesso em: 15
dez. 2022.
BUENO, Samira (Coord.). Violência contra mulheres em 2021. São Paulo: Fórum
Brasileiro de Segurança Pública, 2022. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-
content/uploads/2022/03/violencia-contra-mulher-2021v5.pdf. Acesso em 24 nov. 2022.
Oliveira
1
A título de exemplificação, pode-se citar o estudo de Von Münchow Les jounaux télévisés en
France et en Allemagne : Plaisir de voir ou devoir de s´informer (2005) como um dos trabalhos que
aborda o conceito de Tertium Comparationis na comunidade francesa.
2
Também a título de exemplificação, citamos, novamente, o artigo de Grillo, Machado e Campos
Análise comparativa do discurso: quais são seus precursores? (2018).
Oliveira
[...] a prática dos grupos de reflexão era vista com hostilidade por
determinados setores de esquerda, que apostavam em outras frentes de
luta e consideravam inúteis tais discussões, devido ao seu viés
“pequeno-burguês”; neste sentido, as lutas envolvendo sexualidade e
autonomia do corpo “eram consideradas “ideias específicas”, e portanto
divisionistas da luta geral que consideravam ter prioridade: pela
democratização, pela anistia, pelo socialismo” (Woitowicz; Pedro,
2009, p. 45).
345
Oliveira
Fonte: Revista Veja e Leia, n. 238
3
Disponível em: https://www.publicitarioscriativos.com/50-slogans-mais-lembrados/. Acesso em:
23 abr. 2023.
Considerações finais
A partir das análises, pôde-se depreender que, na década de 1970, a
França passava por um momento histórico e político mais favorável às
conquistas feministas do que o Brasil, mas isso não se refletiu nos respectivos
comportamentos sociais da época. Isso é observado na composição dos
anúncios publicitários dessa época em ambos os países. Tanto os anúncios
brasileiros como os franceses apresentam o corpo e a imagem da mulher
numa relação passiva em relação ao homem.
Na análise das imagens, observamos que tanto na propaganda
brasileira como na francesa, apenas o homem aparece fumando, e a mulher é
apresentada como uma coadjuvante que o acompanha e como uma conquista
atribuída ao consumo de produto. Ambas as imagens femininas possuem
postura mais sonhadora, passiva em relação às masculinas.
O anúncio brasileiro possui um título que foi analisado. Ele estabelece
uma comunicação mais direta com o sujeito para o qual o anúncio é
endereçado, o que no caso de Minister, é claramente o homem. Assim,
mesmo o produto sendo, teoricamente, destinado para ambos os gêneros, o
título demarca um endereçamento mais claro para os homens, havendo a
pressuposição de que seria ele o detentor de poder aquisitivo para consumo
do produto.
A parte textual dos anúncios revela muito sobre a visão da mulher dos
respectivos enunciadores e, portanto, das respectivas sociedades. Tanto o
anúncio brasileiro como o francês utilizam a parte verbal para atribuir à figura
Referências
BAKHTIN, Mikhail. A forma espacial do herói. In: Estética da criação verbal. Tradução
Maria Ermantina Galvão G. Pereira. São Paulo: Martin Fontes, [1920-30] 1997. p. 43-107.
Delanoy
RESENHA
O autor e a personagem na
atividade estética, de Mikhail
Bakhtin
Fica claro, nessa passagem, que uma obra em sua totalidade constitui
uma resposta estética organizada pelo seu autor, que por meio de um
acabamento formal e axiológico, cria um mundo. Nesse sentido, o herói só é
possível porque recebe um acabamento estético do autor.
Ao longo da “Introdução”, Bakhtin apoia-se na sua perspectiva
estética da criação salientando que qualquer visão estética tem no homem
(ser humano) o seu centro. Nesse sentido, a avaliação do valor de uma obra
ocorre em dois contextos axiológicos: o do herói (contexto ético-cognitivo,
vital) e o do autor (contexto concludente, ético-cognitivo e estético-formal),
mas “[...] o contexto do autor se empenha em envolver a fechar o contexto
do herói” (Bakhtin, 2023, p. 43). É assim que concebe a obra como uma
resposta estética a outras respostas.
O capítulo I intitula-se “A relação entre o autor e a personagem”. Sem
subtítulos, explora as diferentes naturezas do autor (pessoa e criador) e da
personagem. Ressalta:
[...] cada elemento de uma obra nos é dado na resposta que o autor lhe
dá, a qual engloba tanto o objeto quanto a resposta que a personagem
lhe dá (uma resposta à resposta); neste sentido, o autor acentua cada
particularidade e cada traço da sua personagem, cada acontecimento e
cada ato de sua vida, os seus pensamentos e sentimentos, da mesma
forma como na vida respondemos axiologicamente a cada manifestação
daqueles que nos rodeiam (Bakhtin, 2023, p. 45).
Referências
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 4.ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo:
Martins Fontes, 2003.
BAKHTIN, Mikhail. Notas sobre literatura, cultura e ciências humanas. Trad. Paulo
Bezerra. São Paulo: 34, 2017.
BAKHTIN, Mikhail. O autor e a personagem na atividade estética. Trad. Paulo Bezerra.
São Paulo: 34, 2023.
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Trad. Valdemir Miotello e
Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João, 2010.
BEZERRA, Paulo. O autor e a personagem na atividade estética: uma obra seminal. In:
BAKHTIN, Mikhail. O autor e a personagem na atividade estética. Trad. Paulo Bezerra.
São Paulo: 34, 2023, p. 286-305.
BAKHTIN, Mikhail. Questões de literatura e de estética (A teoria do romance). Trad.
Aurora Fornoni Bernardini et al. São Paulo: Hucitec, 1988.
BOTCHAROV, Serguei. Nota à edição russa. In: BAKHTIN, Mikhail. O autor e a
personagem na atividade estética. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: 34, 2023, p. 7-10.
MEDVIÉDEV, Pável. O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma
poética sociológica. Trad. Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo:
Contexto, 2012.
VOLÓCHINOV, Valentin (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem:
problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Trad. Sheila
Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34, 2017.
Sobre os
Marilia Amorim autores
Professora aposentada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de
Psicologia, Departamento de Psicologia Social, Campus Praia Vermelha, Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil e da Universidade de Paris VIII, UFR de Sciences
de L’Éducation, Psychanalyse et Français, Campus Saint-Denis, Saint-Denis,
França.
CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/4558062970398358
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8004-1424
E-mail: marilia66amorim@gmail.com
Lucas Nascimento
Professor do Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Bahia, Brasil; coordenador
do Grupo de Estudos Dialógicos em Discurso e Argumentação (UEFS/CNPq).
CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/4295437582484487
Orcid: http://orcid.org/0000-0001-8642-4397
E-mail: lnsilva2@uefs.br
Frédéric François
Professor honorário, Universidade Paris Descartes.
E-mail: j.frederic.francois@wanadoo.fr
SOBRE A TRADUTORA
SOBRE O RESENHISTA