Retratar os primórdios da humanidade, através de uma obra cinematográfica,
pode parecer um tanto desafiador. O filme A guerra do fogo mostrou um potencial de não somente apresentar as primeiras formas de organização da vida humana, como também resgatar possibilidades de expressão da construção subjetiva do que é ser humano. O filme constrói uma representação das primeiras impressões do contato com a terra e outros seres com os quais coexistiam esses primeiros grupos humanos, passando pelo desenvolvimento das emoções primárias, da linguagem não verbal e das possibilidades de transformações da natureza e assim da construção de sentido para as relações humanas. A busca incessante pelo fogo, pelo grupo que ainda não domina essa técnica, expressa a consciência primeira de que para suprir as necessidades básicas, o ser humano precisa exercer algum domínio sobre a natureza. A construção de artefatos, tanto para proteger o fogo encontrado, como para se defender em situações de conflito com outros grupos, evidencia o desenvolvimento intelectual emergindo naqueles que aparecem protagonizando o filme. Outro aspecto importante que é abordado na narrativa fílmica é o despertar do senso coletivo, da cooperação e da solidariedade, a partir do confronto entre o grupo que buscava o fogo e os canibais, em busca de capturar o fogo e libertar os humanos que estavam prestes a serem devorados – humanos estes que já dominavam o fogo. Estes humanos libertos pertenciam a um grupo que já havia iniciado o processo de fixação. Neste ponto fica claro o quanto a técnica de domínio do fogo foi fundamental para a garantia da sobrevivência não só a curto prazo (aquecendo do frio e cozinhando os alimentos) como também para a saída do nomadismo e as primeiras estruturas de organização social através de papéis dentro de uma comunidade, até chegar à formação das primeiras famílias.