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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS

ALEXANDRE LIMA BAIÃO

O PAPEL DAS TRANSFERÊNCIAS INTERGOVERNAMENTAIS NA


EQUALIZAÇÃO FISCAL DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

Rio de Janeiro
2013
Alexandre Lima Baião

O PAPEL DAS TRANSFERÊNCIAS INTERGOVERNAMENTAIS NA


EQUALIZAÇÃO FISCAL DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

Dissertação apresentada à Escola Brasileira de


Administração Pública e de Empresas como
requisito parcial para obtenção do grau de Mestre
em Administração.

Área de concentração: Administração pública

Orientador: Armando Santos Moreira da Cunha

Rio de Janeiro
2013
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen/FGV

Baião, Alexandre Lima


O papel das transferências intergovernamentais na equalização fiscal dos
municípios brasileiros / Alexandre Lima Baião. – 2013.
67 f.

Dissertação (mestrado) - Escola Brasileira de Administração Pública e de


Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa.
Orientador: Armando Santos Moreira da Cunha.
Inclui bibliografia.

1. Relações tributárias intergovernamentais. 2. Política tributária. I. Cunha,


Armando, 1947- . II. Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas.
Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa. III. Título.

CDD – 339.52
AGRADECIMENTOS

À Deus, por me proporcionar imensas oportunidades de aprendizado, me inspirar e sempre me


proteger

À minha mãe, Edna, e meu pai, Fernando, que são pais extraordinários e me entregaram ao
longo destes anos tamanho amor e dedicação, que mesmo em meus maiores esforços, jamais
conseguirei retribuir, e, por isso, a eles sou eternamente grato

Aos meus irmãos Henrique e Leonardo, que se tornaram pessoas a quem eu tenho muito
respeito e admiração

Aos grandes amigos que conheci na vida acadêmica e me auxiliaram muito nesta trajetória, em
especial ao Caio César, Gustavo Paravizo, Josiel Valadares, Lucas Paravizo, Luiz Abrantes, Paulo
Reis, Ronan Capobiango e Vagner Arantes

Àqueles que me fazem sentir ainda mais falta da cidade de Viçosa e são sempre um motivo
para eu voltar, Ariane Martins, Breno Coelho e Plinio Santana

Aos amigos que fiz na Ebape, dentre os quais vale ressaltar a amizade generosa e divertida de
Celso Florêncio, Flavio Souza, Frederico Bertholini, Júlio Cesar, Juliana Kabad, Karina Furtado,
Luiza Castro, Thays Venturim e Thiago Parreira

Ao Rodrigo Lofrano, por sempre curtir minhas publicações nas redes sociais

Ao professores da EBAPE, em especial à Sonia Fleury, Alketa Peci, Paulo Emílio e Rafael
Goldszmidt, que me proporcionaram aprendizados e conhecimentos valiosos, através das aulas e do
convívio

À Celene e Rafaela, que sempre atenderam nossas dúvidas e pedidos com a maior solicitude e
paciência

Ao prof. Armando Cunha, que me forneceu uma nova pespectiva sobre o campo da
administração pública e cuja orientação e apoio foram fundamentais para a consecução desse objetivo
RESUMO

Com a descentralização que caracterizou a federação brasileira nas últimas décadas, os


municípios receberam maiores atribuições e responsabilidades, implementando políticas
públicas e provendo serviços básicos à população. Contudo, uma vez que as receitas próprias
municipais são capazes de custear apenas parcialmente estas atividades, torna-se necessário
um volume elevado de transferências que fluem dos níveis centrais aos municípios. Além do
mais, o Brasil é um país de território vasto e heterogêneo, em que municípios com distintas
capacidades de autofinanciamento, bem como diferentes demandas por serviços públicos,
convivem no mesmo regime federativo. Diante deste quadro, torna-se fundamental estudar a
distribuição dos recursos das transferências, verificando se os municípios que mais necessitam
de suporte financeiro têm sido os efetivamente beneficiados. À este processo de reduzir as
disparidades horizontais provenientes de diferenças nas bases tributárias e demandas locais dá-
se o nome de equalização fiscal. A equalização fiscal permite que municípes de diferentes
jurisdições recebam o mesmo nível de serviços públicos para dada carga tributária assumida
por eles (net fiscal benefit), ou seja, a equalização promove a equidade na provisão dos
serviços públicos, além de evitar a criação de ineficiência alocativa derivada de migrações
motivadas por benefícios fiscais. Para criar a equalização fiscal as transferências devem
beneficiar aqueles municípios com menor capacidade de autofinanciamento e maiores
necessidades fiscais atreladas à custos e demandas pelos serviços públicos. Neste sentido, este
trabalho busca avaliar o efeito das transferências intergovernamentais na equalização fiscal
dos municípios, considerando as principais proxies de capacidade fiscal – potencial de geração
de receita própria – e necessidade fiscal – volume de recursos demandados em virtude das
características da região e da população do município. A análise é realizada para cada grupo
de transferências, desde aquelas com finalidade essencialmente redistributiva como o FPM até
aquelas predominantemente devolutivas, como a cota-parte de ICMS. Os resultados mostram
que algumas transferências como o FPM contribuem pouco para a equalização fiscal, apesar
do objetivo de natureza redistributiva implícito neste repasse, assim como algumas
transferências condicionais, como o FUNDEB, apesar de não almejarem especificamente
corrigir as disparidades horizontais na capacidade dos municípios realizarem suas funções,
podem significar um efeito positivo para a equalização fiscal no nível municipal da federação.
Outro resultado importante que desponta na análise é o efeito da transferência do Bolsa-
família na equalização, pois esta transferência consegue atenuar as distorções realizadas pelas
demais transferências distribuídas aos municípios. O Bolsa-família, apesar de não ser uma
transferência intergovernamental, foi incorporada na análise por representar um expressivo
volume de recursos, por concorrer com recursos de outras transferências e ainda ter efeito
potencial semelhante ao das demais transferências intergovernamentais no âmbito da
equalização fiscal, uma vez que libera recursos no orçamento do governo local que, do
contrário, poderiam estar comprometidos com a política local de assistência social. Outro
resultado é a observação de que as transferências voluntárias afetam menos a equalização, ou
seja, não contribuem para a consecução deste objetivo nem prejudicam a redução das
disparidades horizontais, sendo relativamente neutras ou menos intervenientes em relação às
demandas e capacidade de arrecadação dos municípios, provavelmente por não seguirem
critérios, nem econômicos, como o ICMS, nem redistributivos, como o FPM, e sim critérios
políticos, como apontado pela literatura de ciência política.

Palavras-chave: Equalização fiscal, transferências intergovernamentais


ABSTRACT

With decentralization which has characterized the brazilian federation in the last few decades,
the municipalities received more assignments and responsibilities, implementing public
policies and providing basic services for population. However, since the own municipal
revenues are capable of funding only partially these activities, it becomes necessary a high
volume of grants that flows from central levels to subnational levels of government.
Furthermore, Brazil is a country with a vast and heterogeneous territory, where municipalities
with different self financing capability, as well as different demands from population, coexist
in the same federalist system. In light of this, it becomes fundamental studying the grants
distribution, verifying if the municipalities that need more financial support have been the
effectively benefited. This process of reducing the horizontal disparities that emerge from
different tax bases and local demands is called fiscal equalization. The fiscal equalization
allows residents in different municipalities receiving the same public service level given the
tax charge assumed by them (net fiscal benefit), it means, the equalization promotes the equity
in the public services provision, as well as avoids the allocational inefficiency derived from
migrations encouraged by fiscal benefits. To create the fiscal equalization, grants must benefit
those municipalities with lesser self financing capability and greater fiscal needs associated
with costs and demands for public services. In this sense, this study aims to assess the effect of
intergovernmental transfers in the municipalities’ fiscal equalization, considering the main
proxies of fiscal capacity – potential of creating own revenue – and fiscal need – volume of
resources demanded in the municipality due region’s and population’s characteristics. The
analysis is realized to each transfer’s group, ranging from those with an essentially
redistributive finality, to those predominantly devolutive, as the “cota-parte de ICMS”. The
results show that some transfers, as FPM, contribute little to fiscal equalization, in spite of the
redistributive nature implicit in this grant, as well as some conditional transfers, as FUNDEB,
although they don’t aim correct the horizontal disparities in the capability of local government
realizing their functions, can imply a positive effect to fiscal equalization in the federation’s
local level. Another important result emerged from analysis is the Bolsa-família transfer’s
effect in the equalization, because this transfer minimize the distortions realized by all other
grants distributed to municipalities. The Bolsa-família, although it’s not a intergovernmental
transfer, was included in the analysis since it’s represents an expressive amount of resources,
competes for resources with others grants and has a potential effect similar to the other
intergovernmental transfers in the scope of fiscal equalization, given that releases resources in
the local budget that, otherwise, could be committed with the local social policy. Another
relevant result is the observation that voluntary transfers affect less the equalization, it means,
they don’t contribute to this aim nor prejudice the horizontal disparities reduction, being
relatively neutral or less intervenient in relation demands and fiscal capacity of local
governments, probably because they don’t follow criteria, neither economics, as the ICMS,
nor redistributive, as FPM. Instead, these transfers follow political criteria, as indicated by
recent political science literature.

Key-words: fiscal equalization, intergovernmental transfers


Sumário

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8
2. REFERENCIAL TEÓRICO...................................................................................................10
2.1. Transferências intergovernamentais ...............................................................................10
2.2. Equalização fiscal ............................................................................................................14
3. METODOLOGIA ...................................................................................................................17
3.1. Especificação do modelo ..................................................................................................17
3.2. Dados: fontes e tratamento ..............................................................................................19
3.3. Especificação das Variáveis dependentes ........................................................................20
3.4. Especificação das Variáveis independentes.....................................................................21
4. Resultados................................................................................................................................23
4.1. Transferências intergovernamentais no orçamento dos municípios brasileiros ............23
4.2. Papel das transferências na equalização fiscal ................................................................25
4.2.1. Análise preliminar das variáveis e dos dados utilizados nos modelos ....................25
4.2.2. Transferências intergovernamentais totais (sem convênios) ou transferências
legais 28
4.2.3. Fundo de Participação dos Municípios....................................................................33
4.2.4. Cota-parte do ICMS ................................................................................................37
4.2.5. Transferências voluntárias ......................................................................................40
4.2.6. FUNDEB ..................................................................................................................44
4.2.7. SUS ...........................................................................................................................47
4.2.8. Compensação financeira ..........................................................................................50
4.2.9. Bolsa Família ............................................................................................................53
4.3. Quadro sintético...............................................................................................................56
5. Considerações finais ................................................................................................................62
Apêndice A ......................................................................................................................................67
Lista de Tabelas

Tabela 1 - Composição da receita orçamentária dos municípios brasileiros em 2010 .... 23


Tabela 2 - Composição das transferências intergovernamentais ..................................... 25
Tabela 3 - Estatísticas descritivas das variáveis incluídas nos modelos de regressão ...... 25
Tabela 4 - Correlação entre variáveis independentes nos modelos 1 (sem log) ............... 27
Tabela 5 - Correlação entre variáveis independentes nos modelos 2 (com log) ............... 27
Tabela 6 - Análise da multicolinearidade presente entre as variáveis independentes dos
modelos M1 e M2 ............................................................................................................... 28
Tabela 7 - Análise dos decis das transferências legais ...................................................... 29
Tabela 8 - Modelos M1 e M2 de regressão para transferências legais ............................. 29
Tabela 9 - Análise dos decis do FPM ................................................................................. 33
Tabela 10 - Modelos M1 e M2 de regressão para FPM .................................................... 34
Tabela 11 - Análise dos decis do ICMS ............................................................................. 37
Tabela 12 - Modelos M1 e M2 de regressão para ICMS .................................................. 37
Tabela 13 - Análise dos decis das transferências voluntárias ........................................... 40
Tabela 14 - Modelos M1 e M2 de regressão para transferências voluntárias .................. 41
Tabela 15 - Análise dos decis das transferências do FUNDEB ......................................... 44
Tabela 16 - Modelos M1 e M2 de regressão para transferências do FUNDEB ............... 44
Tabela 17 - Análise dos decis das transferências do SUS ................................................. 47
Tabela 18 - Modelos M1 e M2 de regressão para transferências do SUS ........................ 47
Tabela 19 - Análise dos decis das transferências da compensação financeira ................. 50
Tabela 20 - Modelos M1 e M2 de regressão para transferências da compensação
financeira ............................................................................................................................ 50
Tabela 21 - Análise dos decis das transferências do Bolsa Família .................................. 53
Tabela 22 - Modelos M1 e M2 de regressão para transferências do Bolsa Família ......... 53
Tabela 23 - Classificação dos coeficientes padronizados .................................................. 56
Tabela 24 - Síntese dos resultados ..................................................................................... 56
Tabela A1 - Coeficientes padronizados dos modelos M1.................................................. 67
Tabela A2 - Coeficientes padronizados dos modelos M2.................................................. 67
Glossário de termos e abreviaturas

Brecha horizontal – A brecha horizontal se dá dentro de unidades de um mesmo


nível de governo, devido à disparidades econômicas e diferenças no volume e natureza
das demandas.
Brecha vertical – É a diferença entre as responsabilidades atribuídas a determinado
nível de governo e os recursos fiscais que lhe são disponíveis para desempenha-las.
Equalização fiscal – É o processo de distribuir recursos de forma que, apesar das
diferenças nos custos, nas demandas e na capacidade de autofinanciamento, os
municípios possam prover um mínimo de serviços públicos aos residentes.
FCO - Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste
FNE - Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste
FNO - Fundo Constitucional de Financiamento do Norte
FPE - Fundo de Participação dos Estados e Distrito Federal
FINBRA – Finanças do Brasil
FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação
FPM – Fundo de Participação Municipal
Hiato fiscal ou fiscal gap – É a necessidade fiscal, deduzida da capacidade fiscal e
das transferências de natureza distinta da equalização, como as condicionais e
devolutivas. O gap fiscal, portanto, corresponde à demanda por recursos que não é
suprida nem pela capacidade fiscal e nem pelas outras transferências, e, que, portanto,
necessitam ser atendidas através dos repasses com caráter equalizador e redistributivo.
ICMS – Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação
de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação
IPI – Imposto sobre produtos industrializados
IPI Exp. - Imposto sobre produtos industrializados para exportação
IPVA - Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores
PIB – Produto Interno Bruno
RTS – Representative Tax System
VAF – Valor adicionado fiscal
1. INTRODUÇÃO

A tendência de descentralização na Administração Pública que se verificou nas


últimas décadas criou um desafio para os países organizados em regimes federativos. Os
governos subnacionais receberam maiores atribuições e passaram a ser responsáveis pela
aplicação de um maior volume de recursos na provisão dos serviços públicos e
implementação das políticas públicas. No entanto, alguns fatores como a necessidade de
manter a eficiência do sistema tributário e de garantir a aplicação ótima de recursos no nível
subnacional em determinados setores, faz com que a arrecadação se mantenha centralizada.
Consequentemente, em todas as federações do mundo a arrecadação é maior no nível mais
amplo e menor nos níveis locais, tornando necessária a transferência de recursos da instância
central aos governos subnacionais (REZENDE, 2006). Estas transferências, além de corrigir o
desequilíbrio vertical na federação, ou seja, as diferenças entre atribuições e receitas nos
diferentes níveis de governo, representam uma oportunidade de atenuar as disparidades
regionais, uma vez que o território de uma nação raramente é homogêneo do ponto de vista
econômico e social.
No Brasil, as transferências aos governos subnacionais tornam-se ainda mais
importantes, devido à desigualdade regional e à grande heterogeneidade e extensão de seu
território. Conforme destaca Rezende (2006) um dos desafios do federalismo fiscal tem sido
enfrentar a ampliação das disparidades regionais, que concentram as bases tributárias em
pontos específicos do território, e, consequentemente, afetam a repartição das receitas
tributárias entre os entes federativos.
Os Indicadores sociais também revelam um quadro heterogêneo, em que os indivíduos
situados em determinadas regiões recebem serviços públicos e oportunidades profissionais
muito distintas da média brasileira. O Sudeste, por exemplo, apresenta uma renda domiciliar
per capita mais de duas vezes superior à média do Nordeste, segundo os dados do Censo
Demográfico de 2010. Outro exemplo que pode ser extraído do último censo é a região do
semiárido, com taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais de 24,3%, enquanto a
média nacional é de 9,6%.
Neste sentido, a literatura aponta a importância das transferências para atenuar as
desigualdades regionais através da equalização fiscal, beneficiando municípios com menor
base tributária e maiores custos de provisão do serviço público. Estas transferências buscam
tornar a provisão dos serviços públicos mais equitativa, permitindo que os governos locais,
para dado nível de esforço fiscal, ofereçam o mesmo volume e qualidade de serviços à
população.
8
Além do mais, as transferências representam a maior fonte de receita orçamentária dos
municípios brasileiros. Em 2009, as transferências intergovernamentais representaram 74% de
toda a receira orçamentária dos municípios brasileiros, sendo que destas, um quarto
apresentaram caráter redistributivo. O valor recebido pelos municípios à título de
transferência, naquele mesmo ano, representou 5,5% do PIB (ORAIR, 2010). O volume e a
representatividade destes valores revelam a importância de estudar e compreender as
implicações destas transferências para a equidade no recebimento dos serviços públicos e a
redução das desigualdades entre indivíduos e regiões.
Contudo, apesar da dimensão dos recursos públicos que são repassados aos governos
municipais brasileiros, ainda há pouco estudos que investiguem de forma sistemática os
efeitos destas transferências na redistribuição e redução do hiato fiscal. O estudo encontrado
que mais se aproxima desta proposta foi elaborado por Mendes, Miranda e Cossio (2008), em
que os autores avaliaram cada uma das principais transferências intergovernamentais em
diversos quesitos, como autonomia, redistribuição regional e accountability. O hiato fiscal
(fiscal gap), que é o foco do presente trabalho, também foi analisado, porém, de forma
separada para cada transferência. O presente estudo vai além, analisando o conjunto agregado
dos fluxos de recursos destinados aos municípios, pois um repasse pode contrabalancear o
efeito de outro, e, portanto, é importante não limitar o estudo à investigação individual de
cada transferência (SCHROEDER e SMOKE, 2003). Além do mais, os autores analisaram
cada indicador de capacidade fiscal e necessidade fiscal separadamente, ou seja, através de
uma perspectiva bivariada, enquanto este trabalho busca fazer esta análise conjunta, por meio
da regressão linear.
A literatura explica que as transferências redistributivas devem incorporar, num
cenário ideal, duas informações básicas: a necessidade e capacidade fiscal de cada ente
federativo. É natural, por exemplo, que municípios com uma grande parcela da população em
idade escolar, apresentem maiores despesas com serviços públicos de educação, bem como
municípios com maior atividade econômica, tenham maior capacidade de captar recursos
através da arrecadação.
Porém, é comum que apenas uma parte das transferências se insira na proposta de
equalização fiscal, pois é importante preservar a eficiência econômica a nível nacional. De
fato, a literatura aponta um trade-off entre eficiência e equidade no planejamento das
transferências intergovernamentais. Dada a necessidade de apresentar ambos os tipos de
repasse, é desejável que as transferências devolutivas tenham critérios eficazes para cumprir
seu papel, bem como as transferências equalizadoras utilizem parâmetros eficazes para

9
realizar a equalização. Não há muita discussão sobre a eficácia dos critérios devolutivos, mas
muitos autores apontam problemas em transferências que, supostamente, deveriam combater
as desigualdades regionais, mas acabam beneficiando ou prejudicando determinadas
localidades sem nenhum fundamento lógico que as sustentem (PRADO, 2001; PRADO,
2007; MENDES, MIRANDA, COSIO, 2008).
Desta forma, esta pesquisa visa identificar até que ponto os recursos das transferências
intergovernamentais, em especial daquelas desenhadas especialmente com a finalidade
redistributiva, estão sendo distribuídos de acordo com a capacidade e necessidade fiscal dos
municípios brasileiros, ou seja, até que ponto cada grupo de transferências promove a
equalização fiscal.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. Transferências intergovernamentais

Apesar da tendência de descentralização que pode ser verificada nos diversos países
nas últimas décadas (ABRÚCIO, 2005), todas as federações ainda centralizam em algum grau
sua arrecadação tributária. Conforme destaca Prado (2007), na totalidade de federações no
mundo os governos dos níveis superiores arrecadam mais do que gastam, enquanto os de
níveis inferiores gastam mais do que arrecadam. Esta situação recebe o nome de brecha
vertical e explica porque todas as federações fazem uso de transferências verticais. Nesse
sentido, Prado explica que existem três fatores que justificam a existência de algum grau de
centralização da arrecadação nas federações.
O primeiro fator é a necessidade de atribuir os principais impostos ao governo central
para garantir a eficiência do sistema tributário. Centralizar alguns impostos reduz o custo de
atender diversas legislações (compliance costs) incorrido pelos agentes econômicos e diminui
o risco de governos subnacionais ferirem o princípio da neutralidade ou até realizarem
competições fiscais, à medida que alteram suas alíquotas. Desta forma, restringir a
competência tributária dos governos subnacionais garante a proteção da eficiência econômica
do sistema tributário contra as ameaças de guerras fiscais e heterogeneidade excessiva da
legislação entre regiões.
A guerra fiscal surge quando os governos subnacionais têm incentivos à redução de
seu esforço tributário para atrair investimentos e empresas, afetando a alocação do capital
privado entre as regiões. Esta disputa entre os governos subnacionais faz com que os
investimentos não sejam direcionados para as regiões em que eles seriam mais eficientes, mas

10
sim para os locais onde a carga tributária é reduzida, ou seja, a guerra fiscal faz as indústrias
investirem em locais não recomendados pela racionalidade econômica, devido à presença dos
incentivos fiscais. Estudos realizados no Brasil mostram que a guerra fiscal representou um
elevado prejuízo para o país e um alto benefício para as grandes e médias empresas privadas
(PRADO, 2006).
Ainda no campo da eficiência do sistema tributário, a centralização da arrecadação e
fiscalização garante a padronização nacional da legislação, reduzindo os custos das empresas
de se adequadarem aos diferentes procedimentos legais de recolhimento dos impostos e
contribuições (PRADO, 2001; MENDES, MIRANDA, COSIO, 2008).
O segundo fator é a necessidade de promover a equidade entre os governos
subnacionais, que geralmente apresentam capacidades de arrecadação diferentes, bem como
demandas da população e respectivos custos de atendimento, distintos. Esta diferença entre os
governos subnacionais recebe o nome de brecha horizontal e representa o motivo das
transferências distributivas, que visam atenuar a desigualdade entre estados e municípios. Esta
análise também se estende à relação entre os governos centrais e subnacionais, pois com a
divisão das funções e competências tributária entre os entes, é natural que exista um desajuste
do volume de recursos que cada nível federativo consegue arrecadar e o custo das atividades
pelas quais ele é responsável. À esta diferença se dá o nome de brecha vertical. Desta forma,
as transferências se justificam à medida que as brechas horizontais e fiscais precisam ser
corrigidas (SCHROEDER e SMOKE, 2003).
O terceiro fator é a exigência de alocar os recursos de maneira seletiva e discricionária
a fim de realizar projetos e objetivos nacionais. Neste caso, impõe-se condições para o uso do
dinheiro, o que permite controlar o alcance dos resultados do projeto. Vale ressaltar que neste
caso, à despeito da possibilidade de controlar o uso do recurso e atender, assim, objetivos que
transcedem a esfera municipal, as transferências condicionadas criam resistência entre os
governos subnacionais que passam a ter sua autonomia restringida.
Ainda no âmbito das transferências condicionadas ou vinculadas, um exemplo
importante são os gastos em educação, em que o governo local pode ter interesse em investir
em um nível abaixo do desejado pela nação. Isso acontece em várias áreas, principalmente,
devida à existência da externalização de alguns benefícios dos serviços públicos frente à
particularização de seus respectivos custos (SCHROEDER e SMOKE, 2003; MENDES,
MIRANDA, COSIO, 2008). Desta forma, em algumas atividades como o serviço de saúde,
por exemplo, cidadãos de outras jurisdições podem se beneficiar dos investimentos do
município vizinho. Consequentemente, o governo local pode se sentir desestimulado a aplicar

11
recursos nesta área. A transferência atua no sentido de compensar o município que externaliza
benefícios ou penalizar aqueles que transferem custos à vizinhança.
A literatura nacional e internacional apresenta várias alternativas de classificação das
transferências intergovernamentais. Alguns dos critérios utilizados referem-se a: a) como é
determinado o volume total de recursos a ser distribuído aos governos subnacionais b) como
são distribuídos os recursos entre os governos, c) existência ou não de restrições sobre como o
recurso pode ser aplicado (transferências condicionais), d) existência ou não de contrapartida
financeira do governo receptor (matching ou non-matching grants).
Apesar de ser possível definir diversas combinações a partir destes critérios, nem
todos os possíveis tipos de transferências formadas pelas combinações são encontradas nas
federações. Além do mais, cada federação utiliza padrões diferentes de transferências,
tornando relevante utilizar uma classificação adaptada para o caso do Brasil. Nesse sentido,
Mendes, Miranda e Cosio (2008) propõem um recorte analítico para a federação brasileira,
agrupando as transferências em seis grupos: a) Transferências Incondicionais Redistributivas,
b) Transferências Incondicionais Devolutivas, c) Transferências Condicionais Voluntárias, d)
Transferências Condicionais Obrigatórias, e) Transferências ao Setor Produtivo Privado, f)
Transferências Diretas a Indivíduos.
As transferências Incondicionais Redistributivas são distribuidas segundo fórmulas
que incluem indicadores demográficos e socioeconômicos, buscando corrigir as brechas
horizontais e verticais. Os recursos destas transferências são incondicionais, ou seja, não
apresentam nenhuma restrição sobre a decisão de aplicação pelo governo local. Os principais
exemplos são o Fundo de Participação Estadual (FPE) e o Fundo de Participação Municipal
(FPM), que buscam, ao menos em tese, beneficiar os governos mais vulneráveis
economicamente através de recursos não vinculados.
As Transferências Incondicionais Devolutivas distribuem os recursos para os governos
em que foi realizada a arrecadação, sem a presença de condicionalidades sobre a forma de
gasto. Um exemplo é o ICMS, em que no mínimo 75% é distribuído de acordo com o Valor
Adicionado Fiscal (VAF) dos municípios. O VAF é uma proxy da base tributária do ICMS, e,
portanto, até certo ponto indica quanto foi arrecadado do imposto no município.
As Transferências Condicionais Voluntárias são representadas pelos acordos e
convênios, em que o governo central concede recursos para governos subnacionais com a
condição de que determinadas tarefas e atividades sejam realizadas. Neste caso, o governo
central tem certo grau de discricionariedade para decidir se realizará a transferência e para
quais regiões irá distribuir.

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As Transferências Condicionais Obrigatórias correspondem a recursos vinculados
distribuídos de acordo com critérios não-devolutivos. Geralmente, o montante total a ser
distribuído é definido a partir de percentuais aplicados sobre determinados impostos.
Exemplos importantes são as transferências do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Fundo
Nacional de Desenvolvimento e Manutenção da Educação Básica (FUNDEB). Estas
transferências visam garantir o investimento adequado em setores que poderiam receber
atenção insuficiente pelo governo local, devido à presença de externalidades.
Existem ainda transferências que não são intergovernamentais, mas que valem ser
citadas, pois interferem no equilíbrio federativo e na redistribuição regional da renda. As
Transferências ao Setor Produtivo Privado buscam subsidiar empreendimentos privados em
regiões menos desenvolvidas. Exemplos destes tipo de transferências são os fundos
constitucionais de financiamento (Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste -
FNE, Fundo Constitucional de Financiamento do Norte - FNO e Fundo Constitucional de
Financiamento do Centro-Oeste - FCO). As Transferências Diretas a Indivíduos são recursos
distribuídos diretamente para a parcela da população em situação de vulnerabilidade. Neste
caso, a transferência é realizada sem a presença de intermediadores, como é o caso do
Programa Bolsa Família.
Em virtude da diversidade de transferências intergovernamentais na federação
brasileira, bem como a variedade de critérios possíveis para classifica-las, outras taxonomias
são apresentadas na literatura. O quadro 1 sintetiza algumas das abordagens principais, bem
como a identificação das transferências que são inseridas em cada categoria.

Quadro 1
Principais taxonomias das transferências intergovernamentais brasileiras presentes na literatura
Taxonomia quanto a Taxonomia quanto à
inserção no condicionalidade
(PRADO, 2007), Transferências
orçamento do cedente (MENDES, MIRANDA,
(PRADO, 2001) COSIO, 2008)
Legais Compensatória Transferências IPI Exp., L. Kandir
Devolutiva Incondicionais IPVA, Parcela constitucional
Devolutivas da cota parte de ICMS
Redistributiva Transferências FPE, FPM, 25% da cota-parte
Incondicionais de ICMS distribuída segundo
Redistributivas critérios do gov. estadual
Programas Nacionais Transferências Fundef/Fundeb, Sal.
Condicionais Educação, SUS
Obrigatórias
Discricionárias Voluntárias Transferências Convênios e afins
Condicionais
Voluntárias
------- --- Transferências ao Setor FNE, FNO, FCO.
Produtivo Privado
------- --- Transferências Diretas a Bolsa-família
Indivíduos
Fonte: Elaboração própria
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O quadro 1 inclui o Fundo de Participação dos Estados e as transferências ao setor
produtivo privado (FNE, FNO, FCO) que não beneficiam diretamente os municípios, mas
integram as receitas dos governos estaduais. Inclui ainda os recursos do bolsa-família, pois,
apesar de não corresponder à uma transferência intergovernamental, os valores transferidos
competem por recursos com as demais transferências e podem afetar a equalização fiscal.

2.2. Equalização fiscal

Dado o papel das transferências na promoção da equidade da provisão dos serviços


públicos e, em determinadas situações, na defesa da eficiência alocativa, torna-se necessário
saber como definir quanto cada governo local irá receber do recurso. A literatura aponta dois
aspectos principais que devem ser levados em consideração na equalização horizontal: a
necessidade fiscal e a capacidade fiscal (MARTINEZ-VASQUEZ e BOEX, 1999).
A capacidade fiscal expressa quanto o governo subnacional consegue arrecadar para
determinado nível de esforço fiscal, refletindo a base tributária de sua localidade e a renda de
sua população. Espera-se, por exemplo, que municípios com maior PIB e renda per capita,
consigam arrecadar maiores volumes de recursos comparados a municípios menos dinâmicos
economicamente.
Já a necessidade fiscal incorpora as diferenças entre o nível de serviços públicos
necessários para cada localidade, devido às características da população ou da região. Um
exemplo é o de municípios que, devido a uma maior parcela de sua população em idade
escolar, necessitam aplicar mais no setor de educação.
Vale ressaltar que os sistemas de equalização fiscal devem ser capazes de isolar,
dentre os fatores que levam a uma base tributária menor ou a uma alta necessidade de custeio,
aqueles que estão sob controle do governo local daqueles que lhe são externos. Caso a
situação fiscal do município seja decorrência de fatores controláveis pelo governo, como a má
gestão dos recursos, por exemplo, a compensação realizada através das transferências
implicaria a criação de incentivos prejudiciais ao desempenho dos governos locais
(DAFFLON, 2007).
Desta forma, o sistema de equalização fiscal ideal deveria distribuir os recursos de
forma inversamente proporcional à capacidade fiscal dos municípios, e de forma proporcional
às suas necessidades fiscais. Martinez-Vasquez e Boex (1999) explicam que o modelo mais
sofisticado consegue definir o valor do repasse ao governo subnacional de acordo com seu
gap fiscal (ou hiato fiscal), ou seja, a diferença entre suas necessidades fiscais e sua

14
capacidade de obtenção dos recursos via os tributos de sua competência. Atualmente um dos
sistemas mais complexos é o da Austrália, que utiliza tanto a informação da capacidade de
arrecadação quanto da necessidade fiscal de cada governo subnacional.
Mais especificamente, há duas abordagens principais utilizadas para definir a
distribuição dos recursos no contexto da equalização fiscal: os sistemas de indicadores macro
e os sistemas representativos. Os primeiros utilizam indicadores demográficos ou econômicos
que refletem a capacidade fiscal ou a necessidade fiscal do município, como a renda per
capita, a população ou o PIB municipal. Já os sistemas representativos identificam, no caso da
capacidade fiscal, quanto cada jurisdição obteria de recursos se aplicasse os valores médios de
taxas tributárias utilizados na federação, e, no caso da necessidade fiscal, o gasto per capita
necessário para prover um conjunto padronizado de serviços aos munícipes.
No caso da capacidade fiscal, o sistema representativo é denominado de
Representative Tax System (RTS). No RTS, primeiramente se identifica a prática adotada ao
longo da federação, como as bases tributárias utilizadas e as taxas médias aplicadas de
tributação (BOADWAY, 2007). A partir destes valores, são calculados para cada governo
subnacional o valor que ele obteria caso utilizasse esta prática padrão, ou seja, o valor per
capita recebido para o município j assume o valor de

Em que é a taxa tributária padrão para a base tributária i (como por exemplo, a
média das taxas utilizadas nas diversas regiões da federação), é a base tributária i per
capita do município j, e é a base tributária per capita padrão (possivelmente a média
nacional).
Ainda dentro dos sistemas representativos, a abordagem que equaliza os gastos do
governo local inclui diferentes métodos, que, basicamente, buscam identificar diferenças em
fatores que afetam a despesa local, como diferenças na demografia, na geografia, nas
necessidades locais e nas políticas públicas, definindo o mínimo necessário que cada
município precisa receber para oferecer um serviço padrão (RESCHOVSKY, 2007).
Outra alternativa é o uso de medidas “macro” que expressem as demandas, os custos e
a capacidade de gerar receita própria do governo local (WILSON, 2007). Esta metodologia é
amplamente utilizada pelas federações por representar uma alternativa mais simples,
transparente e que requer menos dados. Vale ressaltar que nas nações em que os governos
locais têm menos autonomia para determinar o nível dos tributos, proxies da base tributária
podem se mostrar suficientes para identificar a capacidade ou a necessidade fiscal. Da mesma
forma, a disponibilidade reduzida de dados que são exigidos nos sistemas mais sofisticados,

15
principalmente em países em desenvolvimento, levam os governos a optarem por esta
abordagem macroeconômica.
Contudo, a equalização fiscal não é uma panacéia e acarreta também um ônus, à
medida que transferir recursos de regiões mais desenvolvidas para regiões mais vulneráveis
pode reduzir o crescimento econômico a nível nacional. Um possível exemplo deste efeito
pode ser encontrado na Alemanha. Rezende (2006) explica que existem dúvidas sobre a
viabilidade a longo prazo do “federalismo cooperativo” alemão, pois a transferência de
recursos dos estados mais ricos para os mais pobres estaria gerando incentivos equivocados
segundo alguns especialistas, comprometendo a economia como um todo. Já na distribuição e
alocação economicamente eficiente de recursos nas diferentes regiões do país, determinada,
não pelos propósitos redistributivos, mas sim pela capacidade local de arrecadação, ligada
diretamente à atividade econômica regional, a economia nacional é favorecida enquanto a
equidade é sacrificada. Portanto, em algumas situações existe um trade-off entre promover o
crescimento econômico nacional e reduzir as desigualdades (MACIEL, ANDRADE e
TELLES, 2006).
Nem sempre este trade-off se faz presente, pois conforme destacam Shroeder e Smoke
(2003), é importante identificar, neste contexto, os motivos que levam a determinada região
estar menos desenvolvida. Se sua situação reflete a ausência de um nível mínimo de fatores de
produção, buscar tornar esta região mais atrativa através das transferências redistributivas
pode representar uma medida ineficiente. Por outro lado, se as condições desta área derivarem
de uma trajetória histórica marcada pela ausência do Poder Público e baixo nível de
investimento estatal, a equalização pode promover, simultâneamente, equidade e eficiência
econômica.
Além do mais, as diferenças nas necessidades e capacidades fiscais, se não forem
corrigidas por transferências equalizadoras, podem prejudicar a eficiência econômica ao
fomentar fluxos migratórios contra-produtivos. A disparidade no benefício líquido fiscal (net
fiscal benefits) oferecido por diferentes jurisdições, ou seja, a diferença entre o valor
(utilidade) recebido pelo cidadão através dos serviços públicos consumidos, deduzido do ônus
fiscal absorvido por ele, pode incentivar movimentos migratórios avessos à racionalidade
produtiva. Neste caso, se ganhos idênticos podem ser obtidos em duas regiões, o munícipe
provavelmente irá preferir residir naquela com maior benefício fiscal líquido, causando uma
alocação ineficiente do trabalho no território. Se o indivíduo preferir continuar em sua região,
apesar de sofrer uma maior carga tributária, ou menor consumo de serviços públicos, as

16
diferenças tributárias estarão gerando uma situação de inequidade entre cidadãos
(BOADWAY, 2007).

3. METODOLOGIA

3.1. Especificação do modelo

A literatura explica que o município deve receber recursos, no âmbito da equalização


fiscal, de acordo com o gap entre sua capacidade de arrecadação e suas necessidades fiscais.
Diante disso, este trabalho analisou o quadro geral das transferências intergovernamentais, em
especial as redistributivas, buscando identificar até que ponto estes recursos estão sendo
distribuídos de acordo com a capacidade e necessidade fiscal dos municípios, ou seja, até que
ponto estas transferências efetivamente promovem a equalização fiscal.
No campo das transferências redistributivas brasileiras, coexistem uma série de
critérios e fundos que buscam reduzir a desigualdade regional. Essas transferências
intergovernamentais não consideram umas às outras, mas consistem em fluxos independentes
e isolados (PRADO, 2001). Nesse sentido, uma transferência pode suavizar ou até anular o
efeito da outra. Um exemplo é o FPM, que beneficia municípios menos populosos, enquanto a
parcela redistributiva do ICMS, em alguns estados, beneficia municípios com população
maior. Por este motivo, é necessário realizar uma análise que contemple a totalidade das
transferências, ao invés de investigar apenas um dos fundos ou repasses (SCHROEDER e
SMOKE, 2003). Este trabalho segue este direcionamento, analisando cada repasse
individualmente, concomitante à análise do quadro global de transferências.
Mais especificamente, este trabalho utiliza a metodologia proposta por Martinez-
Vasquez e Boex (1999), em que se identifica através de uma regressão linear, como o valor da
transferência varia em relação a mudanças em indicadores da capacidade econômica e da
necessidade fiscal do município. Esta metodologia foi escolhida por ter sido elaborada
justamente visando sua aplicação em países em desenvolvimento, com pouca disponibilidade
de dados. Adicionalmente, deve-se ressaltar a escassez de métodos específicos, na literatura,
disponíveis para análisar a empiria no âmbito da equalização fiscal.
Desta forma, neste trabalho realiza-se uma regressão do valor total das transferências
legais contra as variáveis representativas da capacidade fiscal – renda domiciliar per capita,
PIB municipal per capita – e da necessidade fiscal – crescimento populacional nos anos
recentes, percentual da população de 0 a 14 anos, percentual da população com 60 anos ou
mais, percentual de pessoas com 15 anos ou mais analfabetas, percentual de população em
situação de extrema pobreza e densidade populacional.
17
Em que, X é o valor observado para o indicador de necessidade/capacidade fiscal k
(k=1,2..,K) para o município i. Ci, por sua vez, representa o valor da transferência.

C = Transferências intergovernamentais
X1 = Crescimento populacional
X2 = Percentual da população entre 0 a 15 anos
X3 = Percentual da população com idade superior a 60 anos
X4 = Percentual de pessoas com 15 anos ou mais analfabetas
X5 = Renda domiciliar per capita
X6 = PIB per capita
X7 = Percentual da população em situação de extrema pobreza
X8 = Densidade populacional

Foram realizadas mais de uma regressão usando as mesmas variáveis independentes, a


fim de estudar diferentes tipos de transferências. Conforme expresso no quadro 2, em um
nível agregado, foram analisadas as transferências legais e voluntárias, separadamente. Ainda
no âmbito das transferências legais, foram estudadas cada um dos principais componentes
desse conjunto de repasses, ou seja, foram analisadas a cota parte do FPM, do ICMS, da
Compensação financeira por exploração de recursos naturais e os repasses do FUNDEB e do
SUS. Além do mais, mesmo não representando uma transferência intergovernamental, foi
incluída na análise a transferência do Programa Bolsa-Família, por representar um fluxo
significativo de recursos e por ter capacidade, em algum grau, de atender demandas que do
contrário comprometeriam recursos orçamentários do governo local, ou seja, poder afetar a
equalização fiscal em alguma medida.

Quadro 2
Transferências selecionadas para a análise
Transferências legais FPM
ICMS
FUNDEB
SUS
Compensação financeira
Outros (não analisado)
Transferências voluntárias
Programa Bolsa-Família
18
Para alcançar resíduos mais próximos de uma distribuição normal e, ainda, aumentar a
confiabilidade dos resultados com a comparação de modelos complementares, além da
regressão com os dados originais, foi realizada, para cada transferência, uma regressão com os
dados transformados pela aplicação do logaritmo natural. O modelo sem a transformação foi
denominado de M1 e o loglinear de M2.
Este trabalho parte do pressuposto de que uma necessidade fiscal é equalizada quando
os municípios que a possuem em maior grau recebem maior volume de recursos, controladas
as demais necessidades e a capacidade fiscal. Contudo, discutir se esta relação entre
necessidade fiscal e valor da transferência deve ser linear ou logarítmica, não está incluído no
escopo deste trabalho. Este estudo considera que, se em ambos os modelos a relação foi
positiva, há uma evidência suficiente de que a equalização da necessidade fiscal tem sido
realizada. Se, por outro lado, os sinais do coeficiente são diferentes dependendo da
especificação funcional, ou se em um dos modelos o coeficiente não difere significativamente
de zero e no outro sim, não há uma convergência dos resultados, e, portanto, inferências sobre
o papel da transferência na equalização daquele item deve realizada com precaução. Neste
trabalho, opta-se por utilizar as convergências para extrair as principais conclusões e
considerar resultados divergentes como objeto de estudos posteriores.

3.2. Dados: fontes e tratamento

Os dados financeiros foram coletados da base Finanças do Brasil: Dados Contábeis


dos Municípios (FINBRA), referente ao ano de 2010, disponibilizados pela Secretaria do
Tesouro Nacional. O PIB municipal utilizado é o de 2009, coletado a partir da pesquisa mais
recente disponibilizada pelo IBGE. A transferência do Programa Bolsa-família foi obtida
através da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI) do Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Os demais dados foram obtidos junto ao Censo
Demográfico 2010, também realizado pelo IBGE.
A pesquisa contou com dados em seção cruzada (cross section) para 5565 municípios
brasileiros. Foram eliminados da análise 354 municípios sem dados financeiros disponíveis.
Foram retirados ainda, 20 municípios com dados insuficientes para um grande número de
variáveis financeiras, ou inconsistentes, devido à valores nulos de FPM e ICMS. A análise foi
realizada a partir dos 5190 municípios restantes. Estas fragilidades nos dados decorrem do
fato de que nem todos governos locais prestam contas ao Tesouro Nacional, órgão
responsável pela consolidação dos dados orçamentário-contábeis do setor público (ORAIR,
2010).
19
3.3. Especificação das Variáveis dependentes

As variáveis incluídas nos diferentes modelos como dependentes, são aquelas que
expressam o valor recebido de transferência, sempre definidas em termos per capita. Ao todo
foram utilizadas, portanto, oito variáveis dependentes, que deram origem a 16 modelos de
regressão, uma vez que para cada item foi utilizado tanto o modelo linear como loglinear.

Transferências intergovernamentais totais (sem convênios) ou transferências legais: No


plano de contas do Finbra esta variável foi obtida pela soma das transferências
intergovernamentais correntes e de capital. Na classificação do Finbra, as transferências
intergovernamentais não incluem convênios, e, portanto, não contemplam as transferências
voluntárias. Neste trabalho, também se optou por separar as transferências voluntárias, pois
desta forma foi possível estudar apenas as transferências que seguem critérios expressos em
algum marco legal. Estes repasses são denominados de transferências legais por Prado (2001).
Os principais componentes desse grupo de transferências também foram analisados
separadamente, da mesma forma que a cota parte do ICMS, do FPM, da compensação
financeira e os repasses do SUS e do FUNDEB.

Cota parte de ICMS: Esta variável foi obtida pela cota-parte de ICMS bruta expressa no
finbra deduzida dos 20% que são recolhidos para composição do FUNDEB.

Cota parte do FPM: Esta variável, assim como a cota parte do ICMS, foi calculada através
do valor disponível nos dados do Finbra. Como o FUNDEB não é deduzido deste valor, foi
retirado 20% do valor original para considerar a transferência líquida de FPM.

Cota parte da compensação financeira: Esta variável é a soma das receitas correntes e de
capital associadas à cota-parte da compensação financeira de recursos hídricos, de recursos
minerais e de exploração de petróleo (royalties previstos na lei Lei n° 7.990/89). Somou-se
também um item que inclui outras compensações financeiras, não especificadas na base de
dados, mas com a mesma natureza das demais.

FUNDEB: Esta variável foi obtida a partir das transferências deste fundo, recebidas pelo
município, acrescidas da complementação, quando existente, efetuada pelo governo federal.

SUS: Esta transferência expressa a soma do repasse federal com aquele recebido pelo
município, horizontalmente, de outros governos locais.

20
Transferências voluntárias: Para representar as transferências voluntárias este trabalho se
limitou ao uso dos valores de convênios. Apesar de existirem outras formas de transferências
voluntárias além do convênio, devido a limitações na disponibilidade de dados, bem como a
representatividade elevada dos convênios dentro das transferências voluntárias, considerou-se
satisfatório utilizar, nas análises, o valor recebido a título de convênio como proxy deste tipo
de transferência.

Programa Bolsa-família: Apesar de não representar uma transferência intergovernamental,


por significar um volume expressivo de recursos e ter um impacto potencial na equalização
fiscal, o valor per capita recebido do Programa Bolsa-Família em cada município foi incluído
no trabalho. Neste estudo, considera-se que, nos casos em que este repasse alivia demandas
dos residentes e libera recursos orçamentários locais que estariam comprometidos com estas
demandas, estas transferências têm potencial para promover a equalização fiscal, apesar deste
recurso não ir diretamente para os cofres da prefeitura.

3.4. Especificação das Variáveis independentes

Foram utilizadas no trabalho oito variáveis independentes, consideradas na literatura


como proxies de demandas e capacidades importantes no contexto da equalização fiscal.
Todas variáveis foram expressas em termos relativos, controlando implicitamente o tamanho
do município.

Crescimento populacional: Esta variável corresponde ao crescimento percentual da


população do município entre os anos de 2010 e 2007. Alguns autores (BOADWAY, 2007;
MENDES, MIRANDA, COSIO, 2008) destacam o crescimento populacional como uma
necessidade fiscal relevante, pois o crescimento exige uma expansão da estrutura de provisão
dos serviços públicos. Considera-se que esta necessidade fiscal é equalizada quando
municípios que obtiveram maior crescimento populacional nos anos recentes são beneficiados
com um maior volume de recursos.

População em situação de extrema pobreza: Esta variável equivale ao percentual da


população que vive com menos de R$ 70,00 por mês (valores reais de 2010). Este indicador
reflete uma necessidade fiscal à medida que implica maiores custos para o governo local na
provisão de bens e serviços (MARTINEZ-VASQUEZ e BOEX, 1999). Esta necessidade é

21
equalizada quando municípios com maior percentual da população em situação de extrema
pobreza recebem maiores recursos da transferência.

Densidade: A densidade também é um componente importante da necessidade fiscal


BOADWAY, 2007; MENDES, MIRANDA e COSIO, 2008). Neste trabalho, foi utilizada a
medida disponibilizada pelo Censo 2010, cuja unidade de medida é o número de habitantes
por quilometro quadrado (Ha/Km2). Controladas os demais fatores, geralmente municípios
com populações esparsas apresentam maiores custos na provisão do serviço público. Portanto,
uma transferência tem efeito equalizador quando privilegia os municípios com menos
densidade populacional.

População de 60 anos ou mais: O percentual de população com idade superior a 60 anos é


outro componente relevante das necessidades fiscais de um governo local (MARTINEZ-
VASQUEZ e BOEX, 1999), pois implica maior volume de serviços públicos prestados,
principalmente os relacionados à saúde. Neste caso, a transferência apresenta efeito
equalizador quando é capaz de beneficiar os municípios que têm uma maior proporção de
idosos.

População com idade entre 0 e 14 anos: Outra variável incluída neste estudo é o percentual
da população com idade entre 0 e 14, pois este indicador reflete os custos associados à
provisão da educação básica, sob responsabilidade municipal. Portanto, considera-se existente
o efeito equalizador quando esta variável guardar uma relação positiva com o valor
transferido (MARTINEZ-VASQUEZ e BOEX, 1999; SCHROEDER e SMOKE, 2003;
BOADWAY, 2007).

Analfabetismo: Outra variável incluída neste trabalho é o percentual da população com idade
superior a 15 anos que é analfabeta. Parte-se do pressuposto de que municípios com indicador
de analfabetismo elevado apresentem maiores demandas pelo serviço público devido à
educação especial. Além do mais, um índice alto de analfabetismo pode refletir a necessidade
de reformar o sistema educacional e realizar investimentos nesta área. Desta forma, considera-
se neste trabalho que a transferência tem efeito equalizador sobre esta necessidade quando
municípios com maiores taxas de analfabetismo receberem maior volume de recursos
(MARTINEZ-VASQUEZ e BOEX, 1999).

22
Renda domiciliar per capita: Um dos indicadores de capacidade fiscal utilizados neste
estudo é a renda domiciliar per capita (MARTINEZ-VASQUEZ e BOEX, 1999; SHAH,
2007). A renda familiar reflete uma parte da capacidade do município de gerar receita própria
através da tributação. Municípios com elevada renda per capita, portanto, necessitam de
menos transferências do que um município com renda menor, considerando os demais fatores
constantes (SCHROEDER e SMOKE, 2003). Por este motivo, considera-se que a
transferência tem efeito equalizador quando municípios com menos renda per capita recebem
mais recursos do repasse.

PIB: O PIB per capita foi calculado considerando o PIB municipal de 2009 e a população de
2010, devido às limitações na disponibilidade dos dados. Municípios com maior PIB per
capita detém maior capacidade de gerar receita tributária, e, por este motivo, uma
transferência equaliza a capacidade fiscal quando privilegia os governos locais com PIB per
capita menor (MARTINEZ-VASQUEZ e BOEX, 1999; SCHROEDER e SMOKE, 2003;
SHAH, 2007).

4. Resultados

4.1. Transferências intergovernamentais no orçamento dos municípios brasileiros

As transferências intergovernamentais, em virtude do processo de descentralização


que marcou a história da federação brasileira, representam uma grande parcela da totalidade
de recursos disponíveis para os governos municipais. Conforme os dados apresentados na
tabela 1, os recursos provenientes dos níveis estaduais e federal, repassados aos governos
locais, representam 64% da receita orçamentária dos municípios. A arrecadação própria,
derivada de impostos e contribuições, representa apenas 20% das receitas disponíveis,
enquanto outras fontes, como atividades econômicas no setor industrial, agrário ou de
serviços, respondem por 16% da receita orçamentária.

Tabela 1
Composição da receita orçamentária dos municípios brasileiros
em 2010
Receita orçamentária 74.433.677,14 100%

Transferências intergovernamentais 47.475.926,54 64%

Arrecadação tributária 14.749.372,41 20%

Outras receitas 12.208.378,20 16%

23
Diante do peso das transferências no financiamento dos serviços públicos e
implementação das políticas públicas no nível local, vale investigar a representatividade de
cada componente dentro desse conjunto de recursos, já que os cofres municipais recebem
aportes de diferentes tipos de transferências. Neste sentido, os dados disponibilizados na
tabela 2 revelam que a principal transferência recebida pelos municípios em 2010 foi a cota-
parte do ICMS, seguida do FUNDEB e do FPM. As transferências condicionais, utilizadas
para atender objetivos nacionais na área de saúde e educação e representadas pelo FUNDEB e
pela transferência do SUS, respondem por 34% das receitas do total de repasses. Há ainda
uma pequena parcela de caráter discricionário, cujos critérios de distribuição entre os
municípios não seguem critérios legais previamente definidos, que representam 6% da receita
de transferências. Por último, pode-se destacar a presença da cota-parte da compensação
financeira, que representa 2% da totalidade dos repasses e é utilizada para recompensar
externalidades negativas presentes na atividade de exploração de recursos naturais.
Dentre as possibilidades de análise que emergem a partir desses dados, vale destacar a
posição de destaque que a cota-parte do ICMS ocupa, pois este resultado implica que a
principal transferência, em termo de volume de recursos repassados, tem caráter
predominantemente devolutivo. Já o FPM, que é a única, das transferências citadas, que tem o
objetivo explícito de redistribuir recursos e atenuar as disparidades regionais e
intermunicipais, representou 20% do total. Contudo, considerando a definição de Prado
(2001), em que as transferências redistributivas são todas aquelas que não seguem critérios
devolutivos, percebe-se que uma proporção elevada das transferências atua, em algum grau,
conduzindo a redistribuição de recursos entre os membros da federação no nível local.
Somando o FPM, às transferências condicionais que buscam garantir a consecução de
objetivos nacionais (FUNDEB e SUS), às transferências voluntárias (representadas pelos
convênios neste estudo) e às compensações financeiras decorrentes da presença de atividades
extrativas, percebe-se que 62% das receitas de transferências não buscam devolver o recurso
para o local em que foi arrecadado, e, portanto, implicam alguma forma de redistribuição
intermunicipal dentro da federação.

24
Tabela 2
Composição das transferências intergovernamentais
Transferências intergovernamentais 47.475.926,54 100%
Cota-parte do ICMS 12.228.416,81 26%
Fundeb 9.982.005,03 21%
Cota-parte de FPM 9.659.867,10 20%
SUS 5.945.138,14 13%
Convênios 2.721.745,31 6%
Cota-parte da compensação financeira 1.149.721,12 2%
Outros 5.789.033,03 12%
O valor do FPM e da cota-parte de ICMS é líquido, ou seja, foi deduzido da parcela
destinada à composição do FUNDEB.

4.2. Papel das transferências na equalização fiscal

4.2.1. Análise preliminar das variáveis e dos dados utilizados nos modelos

Na tabela 3 são apresentados as informações descritivas das variáveis utilizadas no


trabalho. As variáveis com maior dispersão relativa, mensurada pelo coeficiente de variação,
correspondem à densidade populacional (5,25) seguida do crescimento populacional (2,15).
Estas variáveis, portanto, potencialmente podem gerar a maior disparidade entre municípios
no que diz respeito a capacidade de prover serviços públicos para um mesmo nível de carga
tributária.
Tabela 3
Estatísticas descritivas das variáveis incluídas nos modelos de regressão
Mínimo Máximo Média Coefic. Var. Skewness Kurtosis
Cresc. -1 1 0,03 2,15 1,12 7,60
Ext. pobr. 0 67 13,47 0,96 1,01 0,10
Densid. 0 13025 112 5,25 13,42 220,44
Idade60 3 29 12 0,27 0,26 0,56
Idade 0 a 14 7 51 25 0,19 0,71 1,07
Analfab. 1 44 16 0,62 0,64 -0,70
Renda 145 2129 556 0,45 0,80 1,18
PIB 2708 469964 15217 1,04 9,03 176,20
FPM 12 5631 708 0,72 2,29 8,12
ICMS 8 7956 386 1,09 5,86 70,39
SUS 0 1019 134 0,53 2,27 15,18
Comp. financ. 0 13421 47 5,48 30,85 1412,21
FUNDEB 0 1158 348 0,41 0,65 0,84
Volunt. 0 4654 156 1,27 5,87 79,58
Tranf. legais 278 15727 1828 0,50 3,13 22,24
Bolsa Fam. 0 367 133 0,60 0,24 -1,23

25
Quanto às transferências, as que apresentam maior coeficiente de variação são as
compensações financeiras (5,48) e as transferências voluntárias (1,27). As compensações
financeiras per capita contemplam apenas os municípios exploradores de recursos naturais,
criando uma elevada variabilidade neste item. As transferências voluntárias, por sua vez, são
determinadas pela celebração de acordos e convênios firmados entre governo estadual ou
federal e os municípios. A variabilidade deste item sugere que o espaço discrionário favorece
a maior heterogeneidade no repasse, enquanto as transferências legais tendem a realizar uma
distribuição mais homogênea em termos per capita. O FUNDEB, por exemplo, é distribuído
de acordo com critérios ligados ao número de matrículas na rede pública, que, por sua vez,
está diretamente associado com o tamanho da população. Por este motivo, o FUNDEB per
capita tende a atingir valores mais constantes entre os municípios. As demais transferências
legais também têm, em geral, bastante relação com a população, e, por isso, acabam
apresentando coeficientes de variação menores.
A skewness positiva mostra que os valores das variáveis se concentram à esquerda da
média, com muitos municípios apresentandos valores nulos, em algumas variáveis, ou mais
próximos de zero, enquanto alguns despontam com valores muito acima dos demais. É o caso
de capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, que com elevado porte e atividade
econômica alcançam valores de receita e população muito acima da média brasileira.
A kurtose bastante elevada indica que a variabilidade deriva mais de valores alguns
poucos valores muito distantes da média do que de valores frequentes próximos do valor
médio. Mais uma vez, a presença de municípios que despontam com valores muito distantes
da maioria dos demais torna a curva da distribuição mais fechada e inclinada.
Os valores de skewness e kurtosis sugerem a importância do modelo log-linear, que
são utilizandos complementarmente na análise. A inclusão de muitas variáveis com
distribuição muito distante da normal pode tornar difícil a obtenção de resíduos normais no
modelo de regressão. Apesar disso, vale destacar que, graficamente o formato da distribuição
dos resíduos no modelo linear e loglinear não se afastam intensamente do formato da curva
normal, apesar de rejeição da hipótese nula de normalidade pelo teste de kolmogorov-
smirnov.
Além das estatísticas descritivas, vale examinar a relação entre as variáveis presentes
no modelo. A tabela 4 apresenta a correlação das variáveis independentes utilizadas nos
modelos 1, ou seja, nos modelos em que as variáveis foram expressas em seus valores
originais. Já na tabela 5 são apresentadas as correlações existentes entre as variáveis
independentes incluídas nos modelos M2, em que se utilizou a transformação logarítmica.

26
Tabela 4
Correlação entre variáveis independentes nos modelos 1 (sem log)
Idade 0 a
Cresc Ext. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda
Cresc 10.000
Ext. pobr. -0.0304 10.000
Densid. 0.0047 -0.1022 10.000
Idade60 -0.3768 -0.3277 -0.0839 10.000
Idade 0 a 14 0.1790 0.7637 -0.0718 -0.7276 10.000
Analfab. -0.1007 0.8419 -0.1464 -0.1781 0.6102 10.000
Renda 0.0910 -0.8019 0.2039 0.2820 -0.6979 -0.8306 10.000
PIB 0.1284 -0.4094 0.1054 -0.0226 -0.2774 -0.4511 0.5155

Conforme apresentado na tabela 4, não existem correlações superiores à 90%, mas em


alguns casos este indicador supera a marca de 80%. Já na tabela 5, percebe-se que, no modelo
2, há uma correlação importante entre o percentual de população em extrema pobreza e a
renda per capita, uma vez que o índice alcançou o valor de 90,39%. Estas correlações podem
inflacionar os erros-padrão das estimativas nos modelos de regressão, contudo, há fundamento
teórico para considerar que estas variáveis representam constructos distintos, apesar da
existência de algumas correlações fortes. Este fato fortalece a opção de manter as variáveis,
apesar de ser imprescindível verificar se estas correlações contaminaram os resultados dos
modelos e as conclusões do trabalho.

Tabela 5
Correlação entre variáveis independentes nos modelos 2 (com log)
Idade 0 a
Cresc Ext. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda
Cresc 10.000
Ext. pobr. -0.0842 10.000
Densid. 0.1109 -0.2685 10.000
Idade60 -0.3887 -0.3074 0.067 10.000
Idade 0 a 14 0.1602 0.7603 -0.2355 -0.6975 10.000
Analfab. -0.1176 0.8502 -0.3091 -0.1428 0.6383 10.000
Renda 0.0514 -0.9039 0.2215 0.2802 -0.7313 -0.8603 10.000
PIB 0.0627 -0.759 0.0797 0.0813 -0.5276 -0.759 0.8272

Uma forma de analisar a multicolinearidade de forma multivariada, superando a


limitação da perspectiva bivariada da correlação, é a utilização do Fator de Variância
Inflacionada (Variance Inflaction Factor ou VIF). A tabela 6 apresenta esta análise tanto para
o modelo 1 quanto para o modelo 2. Os resultados mostram que não há nenhuma variável
com VIF superior à 9, que provavelmente comprometeria a leitura dos resultados das
27
regressões. No modelo 1, o VIF mais alto assumiu o valor de 6,97, obtido pela variável “Idade
entre 0 a 14 anos”. Já no modelo 2 os indicadores de multicolinearidade foram mais elevados,
principalmente nas variáveis “Renda” e “População em extrema pobreza”. A primeira obteve
VIF no valor de 8,65 e a segunda alcançou o valor de 7,29.

Tabela 6
Análise da multicolinearidade presente entre as variáveis
independentes dos modelos M1 e M2
M1 M2
Variável VIF 1/VIF VIF 1/VIF
Renda 4.7 0.21 8.65 0.11
Ext. pobr. 5.69 0.18 7.29 0.14
Idade 0 a 14 6.97 0.14 5.93 0.17
Analfab. 4.77 0.21 5.04 0.20
PIB 1.43 0.70 3.73 0.27
Idade60 3.43 0.29 3.18 0.32
Cresc 1.24 0.81 1.27 0.79
Densid. 1.09 0.92 1.21 0.83
VIF médio 3.66 4.54

Os valores de VIF foram altos, mas há de se considerar que o efeito gerado pela
multicolinearidade é a inflação dos erros-padrões das estimativas. Consequentemente, os
parâmetros estimados tendem a se tornar insignificantes. Não obstante, os coeficientes das
variáveis com VIF elevado continuaram significantes nas regressões, mesmo com a
multicolinearidade. Isto provavelmente ocorreu devido ao elevado número de observações,
que protege o modelo, em algum grau, dos efeitos negativos da multicolinearidade. Desta
forma, a presença dos parâmetros significantes, apesar da multicolinearidade presente nestas
variáveis, indica que os erros-padrão, apesar de possívelmente inflacionados, não afetaram a
qualidade dos resultados. Consequentemente, optou-se por manter as variáveis definidas
originalmente, uma vez que a teoria indica uma distição efetiva entre elas, e porque todas
despontaram como relevantes, do prisma teórico, para compreender a equalização fiscal.

4.2.2. Transferências intergovernamentais totais (sem convênios) ou


transferências legais

A tabela 7 mostra o valor médio, para cada decil da transferência, das variáveis que
refletem a capacidade de gerar arrecadação dos municípios, bem como as demandas pelos
investimentos e serviços públicos. Já na tabela 8, os dados obtidos na regressão
complementam a análise, revelando como o montante recebido pelos municípios varia em
relação a mudanças em cada item ou critério, expressos pelas variáveis independentes. Os

28
resultados são apresentados dessa forma ao longo de todo o trabalho, ou seja, para cada
transferência, inicia-se com a tabela de decis, em seguida com o modelo de regressão, seguido
da explicação e análise dos resultados. A análise dos resultados, por sua vez, é separada para
cada um dos oito critérios.

Tabela 7
Análise dos decis das transferências legais
Ext. Idade 0 Tranf.
Pob. Cresc. pobr. Densid. Idade60 a 14 Analfab. Renda PIB Legais
6,00 12,26 361,16 10,87 25,77 14,83 566 11.028 967
120.836
5,50 15,05 182,76 11,41 25,96 17,65 514 11.086 1.148
71.313
4,13 17,01 124,48 11,67 26,30 18,38 496 10.768 1.267
45.386
3,37 16,59 75,75 11,65 26,35 17,72 501 11.786 1.380
30.182
2,92 16,48 79,63 11,65 26,42 18,09 506 13.059 1.493
22.054
2,77 14,32 60,60 12,01 25,38 17,06 542 14.204 1.631
18.551
2,84 12,67 50,10 12,27 24,95 15,99 557 15.439 1.827
15.251
2,44 10,55 31,33 12,55 24,40 14,56 568 16.429 2.123
9.865
2,23 9,05 32,52 13,15 23,72 13,63 608 19.252 2.601
7.180
2,11 5,60 57,77 14,40 21,89 10,46 708 29.688 3.926
6.932

Tabela 8
Modelos M1 e M2 de regressão para transferências legais
Tranf. Legais (M1) Tranf. Legais (M2)
Cresc. -582.005 -0.163
(192.290)** (0.123)
Ext. pobr. -10.548 -0.062
(1.793)** (0.014)**
Densid. -0.151 -0.095
(0.021)** (0.004)**
Idade60 104.670 0.202
(6.967)** (0.023)**
Idade 0 a 14 37.345 -0.302
(5.863)** (0.044)**
Analfab. -3.132 0.062
(2.065) (0.015)**
Renda -0.490 -0.298

(0.154)** (0.026)**
PIB 0.029 0.307

29
(0.003)** (0.012)**
_cons -322.775 3.106
(242.301) (0.114)**
R2 0.28 0.37
N 5,190 5,190

*** p<0.05; ** p<0.01

População
A população aparece como um fator primordial para explicar o nível de transferências.
Todas as demais variáveis, por estarem fortemente associadas com a população, acabam
apresentando relação positiva com o volume total de transferências. Estes resultados mostram
que quanto mais populoso o município, maior é o valor recebido de transferências legais. Este
é um resultado esperado, pois transferências importantes como o FPM, em termos absolutos,
beneficiam municípios maiores, apesar de, em termos per capita, favorecerem aqueles com
menor população. Ao mesmo tempo, municípios maiores têm um maior volume de atividade
econômica, e acabam se beneficiando das transferências devolutivas, como o ICMS por
exemplo.
Contudo, a tabela 7 mostra que quanto menor o município, maior o benefício recebido
em termos per capita. É um fato conhecido que os critérios legais de distribuição do FPM
favorecem municípios menores e reside nestes critérios, provavelmente, a principal
explicação para o volume de transferências legais per capita ter uma relação negativa com o
tamanho da população. Contudo, existem outros critérios e outras transferências que
favorecem estes municípios e que são analisadas mais a frente neste trabalho.
Como a população está altamente relacionada com a maioria das variáveis, é um
desafio significativo captar seu efeito controlando os demais itens incluídos na regressão. A
multicolinearidade inflaciona os erros-padrão dos estimadores e torna o coeficiente sensível a
mudanças no modelo. Por este motivo, os modelos não incluíram a população como regressor,
mas ao invés disso, as variáveis foram transformadas para expressar seus valores em termos
per capita. Contudo, não são necessários maiores estudos estatísticos para perceber que
quanto maior o tamanho populacional menor é o volume de transferência legal per capita. A
tabela 7 torna nítida esta relação, ao mostrar que os 10% menos beneficiados pela
transferência per capita têm população média de 120.836 enquanto os 10% que recebem mais
representam as menores jurisdições, com valor médio populacional de 6.932.

30
Crescimento populacional

A tabela 7 mostra que os municípios com maior crescimento percentual foram menos
beneficiados pelas transferências legais, em termos per capita. Os resultados do modelo de
regressão M1 seguiram na mesma direção, pois a variável crescimento populacional
apresentou coeficiente negativo e significante. Portanto, o quadro de transferências legais não
apenas deixa de contemplar a necessidade fiscal associada ao crescimento populacional, mas
também prejudica os municípios que mais cresceram. Portanto, se a federação brasileira
considerar que o crescimento populacional representa uma necessidade fiscal importante e
que deve ser equalizada, os critérios legais devem ser revistos para atuar de maneira inversa
da que tem ocorrido atualmente.

População em situação de extrema pobreza

A análise da tabela 7 mostra que os municípios mais beneficiados, em termos per


capita, são os com menor percentual de população em situação de extrema pobreza. Os
modelos de regressão M1 e M2 corroboram estes resultados, pois apresentam coeficientes
negativos e significantes para esta variável explicativa. Em outros termos, considerando dois
municípios com todas as demais necessidades fiscais idênticas e mesma capacidade fiscal,
aquele com maior população em situação de extrema pobreza recebe menos recursos, ao
contrário do que é preconizado na literatura de equalização fiscal.

Densidade populacional

A análise dos decis de transferências legais per capita mostram que quanto menor a
densidade demográfica, menos recursos os municípios recebem. Os resultados da regressão
seguem no mesmo sentido, com coeficientes negativos e significantes em ambos modelos.
Portanto, neste caso, a necessidade fiscal é equalizada pelo conjunto das transferências legais,
já que a literatura indica que municípios menos densos populacionalmente, controlados os
demais fatores, tendem a apresentar custos maiores na provisão dos serviços públicos.

31
População com 60 anos ou mais

A análise dos decis de transferências legais per capita mostram que quanto menor a
população com 60 anos ou mais, menos recursos os municípios recebem. Os resultados da
regressão caminham no mesmo sentido, com coeficientes positivos e significantes em ambos
modelos. Portanto, neste caso, a necessidade fiscal é equalizada pelo conjunto das
transferências legais.

População com 0 a 14 anos

A análise da tabela 7 mostra que os valores desta variável ao longo dos decis segue
uma trajetória quadrática, aumentando dos níveis mais baixos até os intermediários de
percentil, e depois sofrendo uma redução até chegar no decil mais elevado. Contudo, os
valores mais baixos desta variável estão entre os municípios que recebem os maiores valores,
per capita, de transferências legais. Controlando pelos demais fatores, não fica nítido se a
necessidade fiscal é ou não equalizada, pois este indicador apresenta coeficientes com
sentidos opostos nos dois modelos de regressão. Ou seja, dependendo da especificação, linear
ou loglinear, há uma relação positiva ou negativa entre esta necessidade fiscal e o volume per
capita de transferência.

Analfabetismo

No caso do analfabetismo, não há um padrão de redução tão nítido ao longo dos decis
inferiores até os superiores de transferência per capita. Contudo, pode-se perceber que nos
decis superiores, formados pelos municípios mais beneficiados pela transferência, as taxas de
analfabetismo são menores. No modelo de regressão M1 a variável "analfab." não obteve um
coeficiente significante, não permitindo a rejeição da hipótese nula do coeficiente ser igual a
zero. Já no M2, a variável apresentou um coeficiente significante e positivo. Portanto, o
resultado do segundo modelo sugere que, dadas demais necessidades fiscais constantes e,
ainda, para um mesmo nível de capacidade fiscal, municípios com maior proporção de
analfabetos entre a população acima de 15 anos recebem mais recursos, em consonância ao
preconizado na literatura. Neste caso, a análise feita controlando a capacidade fiscal e as
demais necessidades fiscais difere da análise preliminar dos decis da variável dependente.

32
Renda

A renda domiciliar per capita não apresenta um padrão nítido de formação ao longo
dos decis, apesar de ter uma média mais elevada entre os 20% de municípios com maior valor
recebido da transferência per capita. Este resultado mostra que os municípios mais
beneficiados pelas transferências legais apresentam renda domiliar per capita média superior a
média dos demais municípios. Os modelos de regressão, por outro lado, mostram que,
controlando as demais variáveis, municípios com renda superior recebem, em média, menos
transferências, em termos per capita.

PIB

Em relação ao PIB, quanto maior o valor apresentando por este município nesta
variável maior o volume de transferências legais recebidos, em termos per capita, conforme a
tabela 7. Os coeficientes positivos e significantes obtidos nas regressões, apresentados na
tabela 8, corroboram a análise de decis, mostrando que controlando as demais variáveis
explicativas, municípios com maior PIB per capita recebem, em média, mais transferências
legais per capita.

4.2.3. Fundo de Participação dos Municípios

Tabela 9
Análise dos decis do FPM
Idade 0 a
Pob. Cresc. Ext. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda PIB FPM
212127 6,83 8,31 637 9,88 25,19 9,18 754 21.145 223
48101 7,48 13,75 111 10,30 26,65 14,64 572 15.871 335
23959 6,29 15,02 57 10,95 26,51 16,63 524 15.454 404
17018 4,77 15,62 47 11,43 26,34 17,75 506 13.690 462
13732 2,85 15,38 41 12,15 25,64 17,92 502 12.327 512
11583 1,51 15,91 36 12,41 25,50 18,79 476 11.923 567
9202 1,37 15,31 37 12,55 25,43 18,90 488 12.546 656
5365 1,38 12,86 25 13,08 24,61 17,04 527 14.873 856
3869 1,31 10,30 21 13,71 23,62 15,18 562 15.830 1182
2417 0,50 7,49 19 15,15 21,80 12,67 637 18.004 1937

33
Tabela 10
Modelos M1 e M2 de regressão para FPM
FPM (M1) FPM (M2)
Cresc. -564.952 -0.919
(93.394)** (0.161)**
Ext. pobr. -9.483 -0.230
(1.150)** (0.020)**
Densid. -0.078 -0.213
(0.010)** (0.006)**
Idade60 77.157 0.516
(4.210)** (0.034)**
Idade 0 a 14 17.902 -0.499
(3.781)** (0.062)**
Analfab. -0.895 0.211
(1.247) (0.023)**
Renda -0.448 -0.364
(0.070)** (0.032)**
PIB 0.004 0.103
(0.001)** (0.014)**
_cons -319.078 3.880
(150.467)*** (0.155)**
R2 0.22 0.44
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01

População

A análise dos decis da tabela apenas confirmam o padrão nítido existente no marco
legal do FPM de distribuir valores em benefícios dos municípios menores. Municípios mais
populosos recebem mais, contudo, as receitas crescem menos que proporcionalmente à
população, ou seja, em termos per capita, os municípios menores são beneficiados, conforme
pode ser observado na tabela 9.

Crescimento populacional

Na tabela 9 percebe-se que o crescimento populacional percentual decresce à medida


que aumenta a receita per capita de FPM. Os modelos de regressão vão no mesmo sentido,
mostrando que dentre municípios com a mesma capacidade fiscal e necessidades fiscais
idênticas nos demais quesitos, aqueles com maior necessidade fiscal associada ao crescimento
34
da população são punidos com o recebimento de um menor volume de FPM per capita. Como
esta análise consiste na desagregação da análise anterior, realizada com o volume total de
transferências, exceto convênios, estes resultados provavelmente mostram porque, no
cômputo global, o crescimento populacional é "punido" pelas transferências, já que o FPM
corresponde a uma parcela significativa do quadro geral.

População em situação de extrema pobreza

O percentual de população em situação de extrema pobreza é menor entre os 10%


mais beneficiados e 10% mais desfavorecidos pela receita per capita de FPM. Já entre os
municípios com valores intermediários de receita de FPM este indicador de pobreza é um
pouco maior e mais homogêneo. Os modelos de regressão M1 e M2 permitem compreender
melhor o padrão de distribuição do FPM, mostrando que controlando as demais variáveis
explicativas, municípios com maior necessidade fiscal neste quesito recebem, em média,
menos.

Densidade

Quanto maior o indicador de densidade menor a transferência de FPM per capita,


como pode ser percebido na tabela 9. Controlando as demais necessidades fiscais e a
capacidade fiscal a relação se mantêm, uma vez que os modelos de regressão apresentaram
valores negativos e significantes. Neste caso, a necessidade fiscal está sendo equalizada, pois,
dados dois municípios com as demais características idênticas, aquele que apresenta menos
densidade populacional geralmente apresenta maiores custos de provisão de serviços, segundo
a literatura.

População de 60 anos ou mais

Os resultados mostram que um maior percentual da população na faixa etária superior


a 60 anos é acompanhado de maiores transferências de FPM per capita. Controlando as
demais variáveis explicativas incluídas nos modelos de regressão, os resultados convergem
para a mesma conclusão, uma vez que os coeficientes foram positivos e significantes em
ambos modelos.

35
População com idade entre 0 e 14 anos

Exceto para o primeiro decil, há um padrão nítido de decrescimento do percentual de


população entre 0 e 14 anos à medida que cresce a receita de FPM per capita, ao longo dos
decis descritos na tabela 9. Contudo, na análise de regressão, depara-se com situação idêntica
à encontrada na análise das transferências totais sem convênios, pois os modelos apresentaram
sinais diferentes para o coeficiente da variável "idade 0 a 14". Percebe-se que o resultado que
inclui o controle das demais variáveis explicativas depende da especificação funcional do
modelo, se linear ou loglinear.

Analfabetismo

Não há um padrão claro de formação entre as médias do analfabetismo ao longo dos


decis do FPM per capita, conforme demonstrado na tabela 9. Porém, um resultado que
desponta desta primeira análise é o fato de que o decil inferior, com o menor volume desta
transferência em termos per capita, é também o que apresenta melhor (e menor) indicador de
analfabetismo. Nos modelos de regressão, apenas o M2 revela um coeficiente
significantemente diferente de zero para a variável "analfab.". O valor positivo do coeficiente
vai ao encontro da equalização fiscal, pois municípios com maior necessidade fiscal neste
item recebem mais recursos.

Rendimento

O maior rendimento per capita médio ocorre no primeiro decil e o segundo maior, no
último. Ou seja, o 10% dos municípios que mais recebem recursos do FPM apresentam renda
elevada, representando o decil com segunda maior renda média per capita. Em compensação,
os 10% menos beneficiados pela transferência têm renda média per capita também elevada,
em consonância ao preconizado pela literatura para as transferências equalizadoras.
Analisando o quadro geral, e através de uma perspectiva multivariada, os resultados são
coeficientes negativos e significantes, ou seja, a capacidade fiscal associada à renda
domiciliar é, em média, equalizada pela transferência do FPM.

36
PIB

O PIB per capita é maior nos decis próximos dos extremos e menor nos decis
intermediários. Nas regressões os coeficientes para a variável PIB per capita apresentam
valores positivos e significantes, conforme a tabela 10. Isto indica que municípios com maior
PIB per capita, dadas as demais variáveis associadas à capacidade fiscal e necessidade fiscal
constantes, recebem maiores valores de FPM, também em base per capita, ao contrário do que
se poderia esperar de uma transferência que se pretende redistributiva.

4.2.4. Cota-parte do ICMS

Tabela 11
Análise dos decis do ICMS
Ext. Idade 0 a
Pob. Cresc. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda PIB ICMS
0-10 27138 4,93 29,72 62 10,79 29,82 28,27 296 5.237 480
10-20 24929 3,09 24,75 89 11,45 28,07 25,70 327 6.030 506
20-30 37228 2,90 20,57 144 11,47 27,49 22,18 395 7.613 553
30-40 36190 3,70 14,35 136 11,81 26,04 17,43 487 9.857 620
40-50 53761 3,05 10,44 116 12,01 25,03 14,30 566 12.248 648
50-60 39981 3,06 8,30 122 12,09 24,38 12,10 616 14.375 688
60-70 30157 2,86 6,64 101 12,62 23,21 10,53 662 16.682 741
70-80 51818 3,37 5,37 152 13,10 22,55 9,74 707 19.567 786
80-90 27347 2,99 4,74 104 12,90 22,48 9,20 731 23.724 897
90-100 19181 4,35 4,34 89 13,35 21,98 8,62 784 37.668 1.185

Tabela 12
Modelos M1 e M2 de regressão para ICMS
ICMS (M1) ICMS (M2)
Cresc. 22.554 -0.370
(80.804) (0.185)***
Ext. pobr. -3.142 -0.134
(0.636)** (0.018)**
Densid. -0.043 -0.130
(0.008)** (0.006)**
Idade60 21.994 0.070
(2.559)** (0.036)
Idade 0 a 14 8.393 -0.389
(2.044)** (0.061)**
Analfab. -4.067 -0.031
(0.824)** (0.022)
Renda -0.045 -0.165
(0.063) (0.033)**
PIB 0.018 0.732
(0.002)** (0.017)**
_cons -236.976 0.810

37
(89.160)** (0.158)**
R2 0.56 0.72
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01

População

Não é possível perceber um padrão claro de relação entre a população do município e


a transferência de ICMS per capita. Contudo, vale destacar que o decil 90-100% apresentou a
menor população média. Este resultado mostra que há um conjunto de municípios que não
têm tamanho populacional necessariamente elevado, contudo, apresentam elevadas receitas de
transferências per capita de ICMS. Estes municípios também são beneficiados, em algum
grau, pelo FPM, que distribui valores maiores, em termos per capita, para municípios de
pequeno porte.

Crescimento populacional

Na análise dos decis da tabela 11 não é possível identificar uma relação clara entre
crescimento populacional e os recursos per capita recebidos, contudo, o decil com maior
crescimento populacional médio correspondeu aos 10% menos beneficiados pela
transferência. Complementarmente, a tabela 12 apresenta os resultados dos modelos de
regressão M1 e M2, considerando a transferência de ICMS per capita como variável
dependente. O coeficiente negativo e significante para a variável "cresc." no modelo loglinear,
por sua vez, mostra que, controladas as demais variáveis explicativas incluídas no modelo, os
municípios que mais cresceram receberam valores menores para a cota-parte de ICMS per
capita.

População em situação de extrema pobreza

Os resultados descritos na tabela 11 mostram que o percentual de população em


situação de extrema pobreza diminui à medida que cresce a receita per capita da cota parte de
ICMS. Na perspectiva multivariada, presente nos resultados das regressões da tabela 12, os
coeficientes negativos e significantes, em ambos os modelos, para a variável "ext. pobr.",
revela que os municípios com os piores indicadores neste quesito são justamente aqueles
menos beneficiados pelas transferências.

38
Densidade

Não há um padrão nítido na relação entre a densidade populacional e os decis da cota-


parte per capita de ICMS, apresentada na tabela 11. Contudo, os resultados de ambos os
modelos da regressão, conforme é apresentado na tabela 12, revelam que, controladas as
demais variáveis explicativas, maiores densidades populacionais estão associadas a menores
receitas de ICMS.

População com idade superior a 60 anos

A análise da tabela 11 indica que os municípios mais beneficiados pelas transferências


de ICMS, em termos per capita, também apresentam um maior percentual de população de 0 a
60 anos. Os modelos de regressão, por sua vez, corroboram este resultado, apresentando
coeficientes positivos e significantes para a variável "idade60".

População com idade entre 0 e 14 anos

Na análise de decis, apresentada na tabela 11, os dados indicam que os municípios


mais beneficiados por esta transferência também são aqueles com percentual de população
entre 0 a 14 maior. Já os modelos de regressão apresentam resultados opostos, ou seja,
indicando que a presença de um coeficiente positivo ou negativo para a variável “idade 0 a
14”, a depender da especificação funcional do modelo.

Analfabetismo

Na análise apresentada na tabela 11, os resultados mostram que, sem controlar os


demais critérios, os municípios com menor índice de analfabetismo também são os que
recebem mais recursos em termos per capita. Os resultados dos modelos de regressão
confirmam a perspectiva preliminar fornecida pela análise dos decis, pois o coeficiente da
variável “analfab.” foi negativo em ambos os modelos, e significante ao nível de 1% no
modelo linear.

39
Rendimento domiciliar

Os resultados demonstrados na tabela 11 indicam uma relação positiva entre a receita


da cota-parte de ICMS e a renda domiciliar, considerando ambas variáveis em termos per
capita. Esta relação, contudo, é rejeitada quando se controla as demais necessidades fiscais e a
capacidade fiscal expressa pelo PIB. Neste caso, os coeficientes da variável “renda” assume
valores negativos em ambos os modelos.

PIB

Os valores médios do PIB per capita em cada decil da cota-parte de ICMS per capita
mostram que PIBs mais elevados estão associados a maiores valores recebidos à título desta
transferência. Ambos modelos de regressão, conforme apresentado na tabela 12, corroboram a
análise dos decis, revelando coeficientes positivos e significantes. Estes resultados
provavelmente são uma consequência imediata do critério de distribuição do ICMS, que,
segundo a Constituição Federal, deve ter no mínimo 75% de seu valor repassado conforme o
Valor Adicionado Fiscal (VAF). O VAF, por sua vez, representa a base tributária do ICMS e
tem relação estreita com o PIB.

4.2.5. Transferências voluntárias

Tabela 13
Análise dos decis das transferências voluntárias
Idade 0 a
Pob. Cresc. Ext. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda PIB Volunt.
0-10 33532 3,95 16,93 157 11,45 26,41 19,17 491 12.889 3,20
10-20 58263 4,30 12,95 219 11,47 25,24 15,16 583 16.649 22,63
20-30 94867 3,55 13,39 198 12,14 25,01 16,35 567 15.155 43,18
30-40 48654 4,00 13,42 173 12,01 25,14 15,91 569 15.797 63,72
40-50 33887 3,97 13,54 150 11,70 25,67 15,90 547 14.841 88,72
50-60 26162 3,23 13,21 52 12,07 25,20 16,15 544 14.265 118,71
60-70 19530 3,19 12,49 71 12,27 25,04 15,36 559 15.479 156,01
70-80 16033 3,08 11,82 40 12,48 24,77 15,31 551 14.845 205,78
80-90 10442 2,73 11,24 34 12,61 24,66 14,81 559 15.325 286,65
90-100 6349 2,28 10,23 23 13,40 23,94 13,92 598 17.252 586,06

40
Tabela 14
Modelos M1 e M2 de regressão para transferências voluntárias
Volunt. (M1) Volunt. (M2)
Cresc. -81.972 -0.246
(49.021) (0.543)
Ext. pobr. -2.299 -0.018
(0.572)** (0.054)
Densid. -0.022 -0.216
(0.003)** (0.016)**
Idade60 13.073 0.436
(1.813)** (0.110)**
Idade 0 a 14 8.660 0.025
(1.662)** (0.202)
Analfab. -1.332 -0.072
(0.855) (0.066)
Renda -0.019 0.111
(0.027) (0.085)
PIB 0.000 0.116
(0.000)*** (0.042)**
_cons -160.071 1.147
(66.182)*** (0.473)***
R2 0.03 0.06
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01

População

No caso dos convênios, a população média cresce ao longo dos decis até a faixa 20-
30%, com valor máximo, e depois se reduz até atingir o valor mínimo, na faixa dos 10% que
mais recebem transferências de convênio per capita. Percebe-se, portanto, que no quadro
geral, o valor recebido per capita tende a aumentar com o decréscimo da população.

Crescimento populacional

A análise dos decis não revela um padrão nítido na relação entre crescimento
populacional e total de convênios recebidos per capita, porém, aparentemente os municípios
que mais se beneficiam da transferência cresceram menos entre 2007 e 2010. A análise das
regressões, contudo, não apresenta coeficientes significantemente diferentes de zero para o
crescimento, não permitindo fazer inferências seguras sobre o padrão de distribuição dessa
transferência segundo este critério demográfico.

41
População em situação de extrema pobreza

As transferências de convênios recebidas pelos municipíos, em termos per capita, são


menores entre os municípios em que o percentual de população em situação de extrema
pobreza é maior. A análise de regressão, por sua vez, apresentou valor significante e negativo
para esta proxy de necessidade fiscal, no modelo linear, indo ao encontro da análise
preliminar dos decis da variável dependente.

Densidade populacional

A análise de decis, demonstrada na tabela 13, aponta que municípios que recebem
maior volume de convênios per capita apresentam população mais esparsa. Os coeficientes
negativos e significantes obtidos nos modelos de regressão corroboram a análise dos decis,
mostrando que controlando as demais variáveis, os municípios que recebem mais são menos
densos populacionalmente.
População com idade com mais de 60 anos

O percentual de população com de 60 anos de idade cresce na mesma direção do


volume total de convênios per capita na análise de decis expressa na tabela 13. O modelos de
regressão corroboram estes resultados, uma vez que os coeficientes deste indicador
apresentaram coeficientes positivos e significantes.

População com idade entre 0 e 14 anos

Já em relação ao percentual da população com idade entre 0 e 14 anos, percebe-se que


este indicador diminui com o aumento do volume total de convênios per capita. Contudo,
controlando as demais variáveis a relação se inverte, conforme pode ser percebido na análise
de regressão expressa na tabela 14. A variável de "Idade 0 a 14" apresentou coeficiente
significante no modelo B1, cujo valor positivo expressa que, dadas demais variáveis incluídas
no modelo constantes, municípios com maior percentual da população entre 0 a 14 recebem
mais recursos, em média.

42
Analfabetismo

O analfabetismo decresce à medida que aumentam os recursos per capita recebidos de


convênios. Já na análise dos modelos de regressão não se pode extrair maiores resultados pois
os coeficientes das variáveis de interesse não foram significantemente diferentes de zero.
Aparentemente, se as transferências de convênio não equalizam a necessidade fiscal
relacionada ao analfabetismo, por outro lado, também não prejudicam os municípios com
maiores necessidades, ou seja, a transferência assume um papel neutro neste quesito.

Rendimento domiciliar

Na análise dos decis, não é possível notar um padrão nítido no crescimento ou


decrescimento da renda domiciliar per capita média ao longo dos decis, contudo, o decil 90-
100% obteve a maior renda média per capita, enquanto o decil 0-10% apresentou o menor
valor para este indicador. Na análise multivariada, também não se percebe uma associação
entre o rendimento e o valor das transferências, pois os coeficientes não foram significantes.
Aparentemente, a presença dos convênios não interfere na equalização fiscal da capacidade
fiscal mensurada pelo rendimento domiciliar, contudo, nos intervalos extremos, conforme
indicam o valor médio do rendimento nos decis 0-10% e 90-100%, a transferência voluntária
parece ter um efeito prejudicial no âmbito da equalização, favorecendo municípios que já
possuem maior capacidade de gerar arrecadação tributária.

PIB

Os resultados apresentados na tabela 13 mostram que os municípios com maior PIB


foram beneficiados pelas transferências de convênios. Os modelos de regressão reforçam esta
conclusão, uma vez que que os coeficientes beta para o PIB foram positivos e significantes.
Estes resultados apontam que os recursos de convênios favoreceram municípios com maior
capacidade fiscal, representando um efeito negativo na equalização fiscal.

43
4.2.6. FUNDEB

Tabela 15
Análise dos decis das transferências do FUNDEB
Ext. Idade 0 a FUNDE
Pop. Cresc. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda PIB B

0-10 76.739 2,23 6,25 292 13,84 21,92 10,98 687 15.850 144,22

10-20 40.351 2,58 6,20 107 13,32 22,52 10,97 666 16.381 212,63

20-30 38.306 3,09 5,86 109 13,08 22,64 10,76 681 17.843 245,40

30-40 60.453 3,30 7,75 124 12,76 23,38 12,02 647 16.986 277,31

40-50 32.419 3,72 10,44 135 12,36 24,26 14,51 588 16.370 310,59

50-60 22.122 3,86 12,75 76 12,16 25,17 16,23 544 14.890 348,05

60-70 23.584 4,02 15,46 111 11,67 26,09 17,78 505 15.922 388,75

70-80 19.302 4,02 18,70 61 11,26 27,19 20,38 438 12.099 437,79

80-90 18.741 3,78 22,05 48 10,90 28,15 22,19 410 13.143 499,50

90-100 15.618 3,77 24,54 49 10,16 30,01 22,84 391 12.768 629,38

Tabela 16
Modelos M1 e M2 de regressão para transferências do FUNDEB
Variáveis explicativas FUNDEB (M1) FUNDEB (M2)
Cresc. -4.960 0.664
(28.026) (0.247)**
Ext. pobr. 2.788 -0.022
(0.325)** (0.025)
Densid. -0.012 0.011
(0.002)** (0.007)
Idade60 -1.317 0.048
(1.045) (0.051)
Idade 0 a 14 8.557 0.409
(1.040)** (0.084)**
Analfab. 2.196 -0.015
(0.385)** (0.031)
Renda 0.046 -0.347
(0.019)*** (0.037)**
PIB 0.001 0.129
(0.000)** (0.021)**
_cons 34.807 2.172
(41.940) (0.201)**
R2 0.30 0.10
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01
44
População

A análise de decis mostra que os municípios que recebem mais transferências de


FUNDEB per capita também são aqueles com maior população. Por este motivo, de maneira
geral, municípios menores são mais beneficiados pelas transferências.

Crescimento populacional

Os valores médios de crescimento populacional dos decis crescem junto com a


transferência, desde o decil 0-10% até o 70-80%. A partir deste decil, há um suave
decrescimento até alcançar o decil 90-100%. Nesta mesma direção, os resultados da regressão
M2 apontam um coeficiente da variável crescimento positivo e significante, mostrando que
quanto maior o valor médio desta necessidade fiscal, maior é o valor per capita recebido da
transferência do FUNDEB.

Densidade

De uma maneia geral, parece haver uma tendência de decrescimento da densidade


populacional à medida que se desloca das faixas com menor transferência até aquelas com
maior volume de recursos recebidos. Este resultado é corroborado pelo modelo M1, que
mostra um coeficiente negativo e significante para a variável densidade.

População com idade superior a 60

A análise de decis sugere uma relação negativa entre este indicador de necessidade
fiscal e a transferência per capita de Fundeb recebida. Contudo, controlando as demais
variáveis não se pode rejeitar a hipótese nula do coeficiente deste item ser igual a zero,
conforme os resultados do modelo M1 e M2.

Idade entre 0 e 14 anos

O percentual de população com idade entre 0 e 14 anos aparentemente cresce junto


com a transferência per capita de Fundeb. Os modelos de regressão confirmam esta hipótese
ao apresentar coeficientes positivos e significantes para esta variável. Este fato parece uma
45
consequência direta dos critérios de distribuição deste recurso, que considera o número de
alunos matrículados na rede pública de ensino sob responsabilidade do governo municipal.

Analfabetismo

O percentual de analfabetismo entre pessoas acima de 15 anos parece guardar uma


relação positiva com a transferência per capita de Fundeb, conforme a análise de decis
apresentadas na tabela 15. Os resultados do modelo de regressão M1 seguem na mesma
direção, mostrando que, controlando as demais variáveis, municípios com maior indicador de
analfabetismo recebem maiores volumes per capita desta transferência.

Rendimento

A análise de decis indica que a renda domiciliar per capita diminui à medida que
aumenta o volume da transferência per capita de Fundeb. No entanto, os modelos de regressão
divergem e revelam direções opostas desta relação, a depender da forma funcional
especificada no modelo. Enquanto M1 apresentou um coeficiente positivo e significante para
a variável “renda”, o modelo M2 apresentou para este mesmo coeficiente um valor negativo e
significante.

PIB

Os valores médios do PIB per capita nos decis contruídos a partir das transferências
per capita de Fundeb parecem decrescer à medida que aumentam os valores recebidos desta
transferência. No entanto, quando a renda per capita e as proxies das diversas necessidades
fiscais incluídas no modelo são controladas, o sinal da relação se inverte, uma vez que tanto
no modelo M1 quanto no modelo M2, os coeficientes da variável PIB foi significante e
positivo.

46
4.2.7. SUS

Tabela 17
Análise dos decis das transferências do SUS
Ext. Idade 0
Pob. Cresc. pobr. Densid. Idade60 a 14 Analfab. Renda PIB SUS

0-10 33.809 4,25 6,24 140 12,66 22,89 10,10 706 19.270 35,77

10-20 31.468 4,77 6,65 112 12,54 23,18 10,29 668 18.176 76,20

20-30 20.023 4,60 9,08 84 12,42 24,09 12,61 617 18.431 94,34

30-40 18.342 3,62 10,87 82 12,69 24,32 14,04 578 15.327 107,61

40-50 37.162 3,42 12,62 65 12,56 24,94 15,73 545 15.162 120,41

50-60 22.249 2,54 15,67 108 12,39 25,62 18,37 492 13.276 132,57

60-70 20.248 3,11 17,98 103 11,95 26,36 20,32 454 11.958 146,10

70-80 26.049 2,05 18,41 86 11,71 26,75 20,40 459 12.113 162,66

80-90 40.388 2,49 18,11 111 11,49 27,05 20,15 461 13.316 187,78

90-100 97.979 3,54 14,23 224 11,09 26,09 16,49 581 15.205 279,05

Tabela 18
Modelos M1 e M2 de regressão para transferências do SUS
Variáveis explicativas SUS (M1) SUS (M2)
Cresc. -78.913 -0.391
(13.101)** (0.307)
Ext. pobr. 0.409 0.208
(0.171)*** (0.034)**
Densid. 0.005 0.009
(0.002)*** (0.011)
Idade60 -2.372 -0.100
(0.602)** (0.055)
Idade 0 a 14 0.797 -0.070
(0.586) (0.101)
Analfab. 1.770 0.090
(0.199)** (0.042)***
Renda 0.059 0.166
(0.010)** (0.063)**
PIB -0.000 0.015
(0.000) (0.026)
_cons 80.069 1.528
(23.523)** (0.266)**
R2 0.07 0.03
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01

47
População

A análise dos decis mostrou que a população é maior entre os municípios dos decis
80-90% e 90-100%, contudo, não existe um padrão homogêneo de crescimento da população
ao longo dos decis.

Crescimento populacional

A análise de decis não aponta um padrão nítido na relação entre o crescimento


populacional e transferência do SUS per capita. Já nos modelos de regressão, o coeficiente
significante e negativo da variável “cresc.” no modelo linear mostra que municípios com
maior crescimento populacional recebem menos transferências.

População em situação de extrema pobreza

Os resultados da análise de decis revelam um padrão de crescimento do percentual de


população em extrema pobreza à medida que aumenta a transferencia per capita do SUS. Os
coeficientes positivos e significantes, em ambos os modelos, da variável “ext. pobr.”, vai ao
encontro da análise de decis, mostrando que, controladas as demais variáveis, municípios com
maior necessidade fiscal neste quesito recebem maiores volumes de transferência do SUS.

Densidade

Quando ao indicador de necessidade fiscal associado à densidade populacional, não se


pode identificar, na análise de decis, uma relação clara entre esta variável e as transferências
per capita do SUS. No entanto, o modelo de regressão M1 indicou a presença de uma relação
positiva e significante, controladas as demais variáveis incluídas.

População com idade entre 0 e 14

Na análise de decis, aparentemente há uma relação positiva entre o percentual da


população com idade entre 0 e 14 e a transferência per capita de SUS. No entanto, os modelos
de regressão M1 e M2 foram incapazes de identificar um coeficiente significante para este
indicador.

48
População com idade superior a 60

Pode-se observar, na análise de decis da tabela 17, que os municípios com maior
percentual de população com idade superior a 60 anos receberam menos recursos do SUS, em
termos per capita. Já nos modelos de regressão, o coeficiente da variável Idade60 em M2 foi
não significante, enquanto no M1 foi negativo e significante. Desta forma, a regressão com
dados não transformados corrobora a análise decis, apontando um efeito inequalizador desta
transferência no que diz respeito à necessidade fiscal associada à proporção da população em
idade mais avançada.

Analfabetismo

De modo geral, parece haver uma relação positiva entre a transferência per capita de
SUS e o indicador de analfabetismo, conforme pode ser visto na tabela 17. Neste mesmo
sentido, os modelos de regressão M1 e M2 identificaram coeficientes positivos e significantes
para o indicador de analfabetismo.

Renda

Sem controlar outras variáveis, a relação bivariada entre a transferência do SUS e a


renda domiciliar, em termos per capita, parece ser positiva. Contudo, os modelos de regressão
M1 e M2 indicam o oposto, ou seja, com as demais variáveis controlas, municípios com renda
domiciliar maior recebem, em média, valores maiores da transferência do SUS.

PIB

No caso do PIB, assim como na renda, a análise de decis apresentada na tabela 17


sugere uma relação bivariada negativa entre este indicador de capaciedade fiscal e o valor
recebido à título de transferência do SUS. Os modelos M1 e M2, por sua vez, não
apresentaram coeficientes significantemente diferentes de zero para a variável PIB.

49
4.2.8. Compensação financeira

Tabela 19
Análise dos decis das transferências da compensação financeira
Ext. Idade 0 a Comp.
Pob. Cresc. pobr. Densid. Idade60 14 Analfab. Renda PIB financ.
0-10 148.362 5,92 10,21 494 10,56 25,23 11,56 700 18.859 2,63
10-20 44.589 6,87 15,79 119 10,39 27,11 16,63 529 14.457 5,69
20-30 21.981 4,71 15,52 55 11,63 26,00 17,80 519 12.578 7,09
30-40 16.579 2,56 15,98 48 12,34 25,51 18,50 495 12.259 8,24
40-50 20.275 2,05 16,72 66 12,23 25,88 18,99 479 11.645 9,59
50-60 12.707 2,06 15,75 48 12,50 25,57 18,66 494 12.836 11,91
60-70 13.062 1,88 13,26 42 12,50 25,24 16,74 516 13.455 15,74
70-80 15.994 1,91 10,08 43 13,56 23,65 14,40 579 16.259 22,09
80-90 28.381 1,81 8,44 104 13,71 23,06 13,18 623 17.089 38,63
90-100 25.567 4,57 8,06 97 12,06 24,04 12,00 625 22.894 361,77

Tabela 20
Modelos M1 e M2 de regressão para transferências da
compensação financeira

Comp. financ. (M1) Comp. financ. (M2)

Cresc. 170.588 0.773


(80.123)*** (0.439)
Ext. pobr. -0.567 0.043
(0.364) (0.043)
Densid. -0.006 -0.119
(0.002)** (0.014)**
Idade60 0.286 0.359
(1.259) (0.076)**
Idade 0 a 14 -2.646 -0.484
(1.286)*** (0.123)**
Analfab. -0.918 0.231
(0.491) (0.051)**
Renda -0.175 -0.230
(0.070)*** (0.061)**
PIB 0.004 0.485
(0.002)** (0.044)**
_cons 163.370 -0.197
(56.775)** (0.314)
R2 0.05 0.09
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01

População

Os municípios que recebem maiores valores per capita de transferência da


compensação financeira tendem a ter população menor, conforme a tabela 19. O padrão de
50
crescimento ao longo dos decis se rompe nos últimos dois decis, mais elevados, em que a
população média é ligeiramente superior aos anteriores.

Crescimento população

Em geral, há uma tendência de redução dessa variável ao longo dos decis, ou seja,
municípios que recebem maior compensação financeira per capita tendem a ter um
crescimento menor. Uma exceção à regra, contudo, consiste no último decil, que apresentou
crescimento elevado em relação aos demais. O modelo de regressão, por sua vez, no caso das
variáveis não transformadas (M1), aponta um coeficiente positivo e significante.

População em situação de extrema pobreza

Não existe um padrão claro na análise de decis, contudo, os 20% de municípios com
maior transferência per capita tem um percentual de população de situação de extrema
pobreza bastante reduzido em relação aos demais. Estes dados mostram que os 20% de
municípios mais beneficiados por esta transferência mantêm este indicador de pobreza em
níveis baixos. Os modelos de regressão, no entanto, não foram bem sucedidos em conseguir
captar alguma relação significantemente diferente de zero entre este indicador e a
transferência per capita.

Densidade

Os dados indicam que a densidade tende a diminuir ao longo dos decis, quando se
caminha em direção aos grupos de municípios com maior volume per capita de transferência.
Contudo, novamente os 20% de municípios com maior transferência per capita apresentam
um comportamento distinto dos demais, apresentando densidade populacional bastante
elevada. Os modelos de regressão M1 e M2, por sua vez, revelam coeficientes negativos e
significantes, mostrando que, controlando as demais variáveis incluídas na regressão,
municípios com maior densidade recebem menos transferência per capita de compensação
financeira.

51
População com idade superior a 60

Os resultados dos decis de transferência sugerem uma relação positiva entre o valor
recebido, per capita, de compensação financeira e o percentual da população com idade
superior a 60. O modelo M2 corrobora esta observação, mostrando que mesmo após controlar
as demais variáveis incluídas na regressão, o coeficiente deste indicador de necessidade fiscal
é positivo e significativo.

Idade entre 0 e 14 anos


Na análise dos decis não é possível identificar uma diferença significativa entre as
médias dos decis nem um padrão de formação entre o decil e o indicador de idade entre 0 e 14
anos. Contudo, controlando as demais necessidades fiscais, bem como os indicadores de
capacidade fiscal, a presença dos coeficientes negativos e significantes nos modelos M1 e M2
mostram que os municípios com a porção da população em idade escolar mais elevada
recebem menores valores per capita da transferência de compensação financeira.

Analfabetismo

Não há uma relação nítida entre o analfabetismo e a transferência per capita, no


entanto, os decis de receita mais elevada, como os decis 70-80%, 80-90%, 90-100%
apresentam analfabetismo mais baixo do que os demais, com exceção do primeiro decil (0-
10%). Já nos modelos de regressão, o único valor significante da variável analfab. aparece no
modelo M2, indicando que municípios que recebem mais, controladas as demais variáveis
incluídas no modelo, apresentam valores médios de analfabetismo maiores.

Renda domiciliar per capita

A análise dos decis não revela uma relação nítida entre a renda e a transferência per
capita de compensação financeira, mas os modelos M1 e M2 apresentam coeficientes
negativos e significantes para a variável Renda. Portanto, os resultados indicam um papel
equalizador da compensação financeira no que diz respeito à renda domiciliar per capita.

PIB per capita


Os dados da tabela 19 não demonstram um padrão nítido na relação entre o PIB

52
municipal e a transferência, apesar de que os maiores valores médios de PIB foram obtidos
nos decis 0-10%, 70-80%, 80-90%, 90-100%. Os resultados dos modelos M1 e M2, por sua
vez, revelam valores positivos e significantes para os coeficientes para o PIB per capita.

4.2.9. Bolsa Família

Tabela 21
Análise dos decis das transferências do Bolsa Família
Ext. Idade 0 Bolsa
Pob. Cresc. pobr. Densid. Idade60 a 14 Analfab. Renda PIB Fam.
0-10 81079 5,44 1,40 216 13,65 20,00 5,34 946 27854 24
10-20 60796 4,83 2,38 281 12,97 21,51 7,20 796 23705 44
20-30 34453 4,26 3,35 160 12,86 22,27 8,27 728 22844 61
30-40 41078 3,22 4,49 109 12,76 22,93 9,51 670 17952 81
40-50 34729 2,83 6,53 105 12,50 23,99 11,53 600 15984 107
50-60 23560 3,21 10,98 79 11,62 25,89 14,42 509 15257 140
60-70 21698 4,65 18,29 51 10,89 28,15 19,91 393 9212 178
70-80 18996 3,41 22,64 47 11,36 28,33 24,53 333 7240 206
80-90 16900 2,52 27,57 39 11,55 28,69 27,81 298 6128 232
90-100 14336 -0,21 33,05 29 11,26 29,86 30,68 267 5432 266

Tabela 22
Modelos M1 e M2 de regressão para transferências do Bolsa Família
Bolsa Fam. (M1) Bolsa Fam. (M2)
Cresc. -100.200 -1.338
(7.514)** (0.125)**
Ext. pobr. 1.823 0.376
(0.088)** (0.016)**
Densid. 0.004 0.008
(0.001)** (0.004)***
Idade60 -0.631 0.114
(0.255)*** (0.041)**
Idade 0 a 14 0.101 0.539
(0.283) (0.092)**
Analfab. 2.943 0.479
(0.104)** (0.021)**
Renda -0.105 0.154
(0.006)** (0.020)**
PIB -0.000 -0.059
(0.000) (0.010)**
_cons 130.205 0.463
(11.546)** (0.189)***
R2 0.88 0.83
N 5,190 5,190
*** p<0.05; ** p<0.01

53
População

Em termos populacionais, os dados apresentados na tabela 21 apontam que os


municípios menores são beneficiados pela transferência do bolsa família, em termos per
capita. Contudo, conforme será observado nas análises dos demais critérios, estes municípios
menores não são como aqueles beneficiados pela receita agregada de todas as transferências
intergovernamentais, com indicadores econômicos e sociais razoáveis comparado o quadro
geral da federação brasileira, mas, ao contrário, são municípios pequenos que de fato
necessitam dos recursos, conforme é expresso pelos indicadores de analfabetismo, população
em situação de extrema pobreza, PIB per capita e renda domiciliar per capita.

Crescimento populacional

A análise dos decis, expressa na tabela 21, sugere uma relação bivariada negativa entre
crescimento populacional e o total recebido pelo município à título de transferência do bolsa-
família. Ambos modelos de regressão, M1 e M2, corroboram esta análise preliminar, pois a
variável Cresc. obteve coeficientes negativos e significantes.

População em situação de extrema pobreza

Os dados mostram que os municípios que mais recebem as receitas de bolsa-família,


sem controlar outras variáveis, apresentam percentual da população em situação de extrema
pobreza maior. Os resultados dos modelos de regressão caminham no mesmo sentido,
apresentando coeficientes positivos e significantes para este indicador de pobreza. Este
resultado é esperado, uma vez que este programa beneficia justamente as famílias com renda
per capita inferior a um limite predeterminado, de forma a contemplar as famílias em situação
crítica de pobreza.

Densidade

A análise de decis mostra que os municípios mais beneficiados pelas transferências do


bolsa-família, em média, apresentam menor densidade populacional. Contudo, controlando as
outras necessidades fiscais e a capacidade fiscal, percebe-se que os municípios menos densos
recebem menos, pois os coeficientes da variável Densid. em M1 e M2 foram positivos e
significantes.

54
População com idade superior a 60

Na análise dos decis pode ser observado uma tendência de descrecimento do indicador
de população com idade superior a 60 anos, à medida que aumenta a faixa de transferência per
capita de Bolsa-família. Contudo, o resultado da análise multivariada foi ambíguo, pois os
coeficientes dos modelos de regressão M1 e M2 apresentaram sinais opostos para este item.

População com idade entre 0 e 14 anos

Quanto ao indicador de população em idade escolar, parece haver uma relação positiva
entre esta variável e a transferência total recebida pelo município, em termos per capita. Este
resultado é corroborado pelo modelo de regressão M2, em que este indicador apresentou um
coeficiente positivo e significante.

Analfabetismo

O indicador de analfabetismo, por sua vez, parece apresentar uma relação positiva com
o volume total de transferências do bolsa-família per capita. Neste mesmo sentido, os modelos
de regressão M1 e M2 identificaram coeficientes positivos e significantes para este indicador.

Renda

Os dados da tabela 21 mostra que a renda per capita dos municípios que mais são
beneficiados pela transferência tende a ser menor. Controlando as demais variáveis incluídas
no modelo, os resultados se tornam ambíguos, pois os coeficientes dos dois modelos
apresentaram valores com sinais diferentes.

PIB

Na análise de decis, observa-se que os municípios que mais são beneficiados pela
transferência do bolsa família apresentam PIB per capita menor. O modelo de regressão M2
confirma esta relação, mesmo após controlar as demais variáveis, uma vez que o coeficiente
da variável PIB foi negativo e significante.

55
4.3. Quadro sintético

Para facilitar a visualização, compreensão e análise dos resultados, sintetizou-se o


conjunto de resultados através da tabela 24, apresentando as interpretações dos coeficientes
para todos os modelos à luz da equalização fiscal. Para tornar a disposição dos resultados
ainda mais elucidativa, adotou-se a legenda apresentada na tabela 23. Para identificar o cut-off
a partir do qual os coeficientes foram classificados entre as quatro categorias, adotou-se a
mediana dos valores positivos (0,1365). Coeficientes com valores absolutos acima de 0,1365
foram considerados “fortes” e abaixo deste valor, “fracos”. Os coeficientes utilizados foram
os padronizados, para viabilizar a comparação entre variáveis distintas.
A classificação dos coeficientes entre as categorias de equalização e inequalização foi
realizada considerando o sentido da relação esperada de uma transferência equalizadora para
aquele critério, extraído da teoria. Por exemplo, espera-se, no caso da necessidade fiscal
associada à proporção da população em idade escolar, que uma transferência equalizadora
privilegie municípios que tenham este indicador mais elevado, ou seja, o percentual da
população em idade escolar deve ter uma relação positiva com o volume transferido. Esta
relação, por sua vez, é expressa pelo coeficiente da regressão.

Tabela 23
Classificação dos coeficientes padronizados
Coeficiente padronizado Significado em termos de Símbolo
na regressão equalização
| β | > 0,1365 Inequalização forte ◌◌
| β | < 0,1365 Inequalização fraca ◌
| β | < 0,1365 Equalização fraca ●
| β | > 0,1365 Equalização forte ●●

Tabela 24
Síntese dos resultados
Tranf. Comp. Bolsa
legais FPM ICMS financ. FUNDEB SUS Volunt.
M1 M2 M1 M2 M1 M2 M1 M2 M1 M2 M1 M2 M1 M2 M1 M2
Cresc. ◌ ◌ ◌ ◌ ● ● ◌ ◌ ◌
Ext. pobr. ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌ ◌◌ ●● ● ●● ◌◌ ●● ●●
Densid. ● ●● ● ●● ● ●● ● ● ● ◌ ● ●● ◌ ◌
Idade60 ●● ●● ●● ●● ●● ● ◌ ●● ● ◌ ●
Idade 0 a 14 ●● ◌◌ ●● ◌◌ ● ◌ ◌ ◌ ●● ●● ●● ●●
Analfab. ● ●● ◌ ● ●● ●● ● ●● ●●
Renda ● ●● ●● ●● ● ●● ●● ◌ ●● ◌◌ ◌ ●● ◌◌
PIB ◌◌ ◌◌ ◌ ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌◌ ◌ ◌ ●

As células para as quais o coeficiente não foi significante ao nível de 5% ficaram vazias
56
Em primeiro lugar os resultados podem ser analisados considerando cada critério
separadamente, tendo em vista o impacto de cada transferência em sua equalização, ou, ao
contrário, em sua inequalização. A análise a seguir obedece esta estrutura.

Crescimento:
A equalização da variável “Cresc.” aparentemente não é influenciada de forma intensa
pelas transferências, pois não houve nenhuma equalização ou inequalização (termo cunhado
neste trabalho para designar o agravamento do hiato fiscal causado por uma transferência)
com caráter “forte”. Ainda que de maneira menos intensa, no cômputo global, a disparidade
nas demandas associadas ao crescimento é agravada pelas transferências, uma vez que,
conforme os resultados sintetizados na tabela 24, as transferências legais atuam no sentido
inverso da equalização, enquanto as transferências voluntárias não têm efeito neste item.

Percentual da população em situação de extrema pobreza: dentre as transferências


intergovernamentais, apenas as transferências de FUNDEB e SUS equalizam esta necessidade
fiscal. Como FPM e ICMS têm efeito negativo na equalização destas transferências, ou seja,
concedem recursos a quem precisa menos neste quesito, e como estas são as transferências de
maior volume, o resultado quando se analisa o total das transferências legais é um forte
caráter inequalizador destes recursos no que diz respeito a essa necessidade fiscal. As
transferências voluntárias também prejudicam a equalização deste critério, que é contemplado
apenas pelo repasse do Programa Bolsa-Família, que visa atender justamente esta parcela da
população através dos recursos.

Densidade populacional: a maioria das transferências beneficiam municípios com população


mais esparsa. A literatura sugere que, dados os demais fatores constantes, estas características
implicam custos maiores de provisão dos serviços públicos. Portanto, pode-se considerar que
o quadro geral das transferências, legais e voluntárias, devolutivas ou redistributivas, tem
promovido a equalização deste critério.

Percentual da população com idade superior a 60 anos: várias transferências equalizam


esta necessidade fiscal. Portanto, municípios com maior percentual de idosos têm recebido
mais, tanto do total de transferências legais quanto das transferências voluntárias. Chama
atenção, contudo, o fato de que o SUS não beneficia municípios com maior proporção de

57
idosos, uma vez que esta faixa etária geralmente implica maiores custos na provisão do
serviço de saúde.

Percentual da população com idade entre 0 e 14 anos: a análise deste critério resultou em
sinais opostos entre os modelos M1 e M2 para ICMS, FPM e o total de transferências legais.
Em outros termos, a especificação funcional de M1 permite identificar em quantas unidades
cresce (ou diminui) o valor transferido dado o aumento de uma (1) unidade na necessidade
fiscal. Já no M2 é observada qual a variação percentual nas transferências ocorre dado o
crescimento de um (1) por cento na necessidade fiscal, ou seja, realiza-se a interpretação das
elasticidades. Está fora do escopo do presente estudo discutir se a relação entre a transferência
e a necessidade fiscal deve ser linear ou não, mas parte-se do pressuposto de que se os
resultados indicam uma equalização em ambos os modelos, então, provavelmente, a
necessidade fiscal ou a capacidade fiscal analisada tem sido equalizada. Não é o caso da
variável “Idade 0 a 14”, e, portanto, os resultados deste trabalho não permitem maiores
inferências no papel das transferências neste quesito, nos casos em que há ambiguidade dos
coeficientes.

Analfabetismo: O analfabetismo é uma necessidade fiscal equalizada por todas as


transferências, exceto pelas voluntárias, que não têm efeito na equalização, e pelo ICMS, que
distribui recursos na direção oposta dessa necessidade, considerando neste último caso, o
modelo M2. No quadro geral, o resultado do modelo M1 indica que as transferências legais
equalizam esta necessidade, enquanto as voluntárias lhe são indiferentes.

Renda domiciliar per capita: a capacidade fiscal expressa pela renda domiciliar é bastante
equalizada. Dentre as transferências intergovernamentais, apenas a do SUS “inequaliza” esta
necessidade fiscal, considerando apenas os resultados em que não houve ambiguidades entre
os modelos M1 e M2. Portanto, a transferência do SUS beneficia municípios com maior renda
domiciliar per capita. Já as transferências voluntárias não exercem papel na equalização deste
item, nem positiva nem negativamente.

PIB per capita: este indicador é inequalizado por todas as transferências


intergovernamentais, com exceção do SUS. Consequentemente, quando se analisa o total das
transferências legais, percebe-se que o quadro geral beneficia municípios com maior PIB per

58
capita. A transferência do Bolsa-família, por sua vez, é a única que promove a equalização
desta capacidade fiscal, quando controlada a renda e as demais necessidades fiscais.

Os resultados da tabela 24 podem ser analisados também por transferência. Neste


sentido, entre parênteses, após o nome de cada transferência, são apresentados o número de

circulos fechados (●), representativos da equalização fiscal, de circulos abertos (◌),


representativos da inequalização, e o número de célular vazias (x), devido ao coeficiente não
significantemente diferente de zero, obtido na regressão. Neste último caso, a transferência
não exerce papel na equalização fiscal naquele critério.

Transferências legais totais ( 11 ◌ 13 ● 2x): os resultados mostram que o total de


transferências que seguem critérios legais, e, portanto, que não são discrionárias, equalizam a
capacidade fiscal atrelada à renda per capita e às necessidades fiscais associadas à densidade
populacional e ao percentual de população idosa. Por outro lado, justamente os municípios
com maior PIB per capita são privilegiados pelos repasses, não só em virtude da cota-parte do
ICMS, que, por definição, é devolutiva e beneficia municípios com maior produção
econômica, mas também devido às demais transferências, que, com exceção dos recursos do
SUS, tiveram um impacto prejudicial na equalização deste item. O conjunto destas
transferências também exarceba a disparidade fiscal associada ao percentual de população em
extrema pobreza, já que quanto pior este indicador no município, menos o governo local tende
a receber destas transferências. Por último, os resultados apontam ainda que a necessidade
associada ao crescimento populacional também é inequalizada, devido à participação do
ICMS e do FPM, transferências com elevado volume de recursos e que preterem os
municípios que cresceram mais nos anos recentes.

Fundo de Participação dos Municípios ( 11 ◌ 15 ● 1x ): O FPM deixa de equalizar


critérios importantes, como o PIB, o percentual da população em situação de extrema pobreza
e o crescimento populacional. O crescimento é inequalizado porque municípios que crescem
podem passar para a faixa subsequente de população, prevista no marco legal e utilizada para
distribuir o recurso. Uma vez que em cada faixa superior de população o valor per capita
recebido desta transferência é menor, municípios que crescem acabam sendo prejudicados.
Além do mais, o FPM parte do pressuposto de que municípios menores serão também os que
mais necessitam recursos, mas estes municípios não têm necessariamente uma elevada

59
proporção da população em situação de extrema pobreza, assim como não apresentam PIB per
capita sempre pequeno. Pelo contrário, alguns municípios pequenos têm menores
necessidades fiscais associadas ao nível de pobreza, assim como possuem capacidade fiscal
elevada, associada a um PIB per capita alto. Consequentemente, beneficiando estes
municípios a transferência contribui para inequalizar estes itens, ou seja, beneficiar
municípios com maior PIB per capita, menor proporção da população em extrema pobreza e
menor crescimento populacional.

Cota parte do ICMS (10 ◌ 7 ● 4x ): não é pretensão dessa transferência realizar nenhuma
forma de equalização fiscal, mas sim devolver os recursos para onde eles foram, teoricamente,
arrecadados. Sendo um imposto incidente sobre o valor agregado, beneficiar os municípios
com maior PIB per capita é uma consequência natural da distribuição dos recursos do ICMS.
Além do PIB, este recurso apresentou caráter inequalizador principalmente para a necessidade
fiscal associada ao percentual de população em extrema pobreza. No entanto, apesar de ser
uma transferência devolutiva, seus recursos aparentemente têm contribuido para equalizar as
necessidades fiscais associadas a densidade populacional e percentual de população acima de
60 anos. Vale ressaltar que o papel desta transferência na equalização, ou seja, os resultados
sobre quais critérios ela equaliza e quais ela agrava a disparidade, é muito similar ao da cota-
parte de FPM, apesar destas transferências terem natureza distintas, e, em certa medida, até
opostas. A única diferença significativa é o papel equalizador do FPM no item “Analfab.”,
enquanto o ICMS tem um efeito oposto. Desta forma, aproximadamente 46% do total de
transferências intergovernamentais seguem um mesmo padrão na equalização, pois o ICMS e
o FPM, que figuram entre as principais fontes dos recursos municipais, se reforçam
mutuamente, na perspectiva da equalização fiscal.

FUNDEB (5 ◌ 12 ● 6x): apesar de não ter diretamente esta função, esta transferência é a que
mais promove a equalizaçao fiscal. As transferências com fim equalizador geralmente não são
condicionadas e são consideradas, pelas federações e pela literatura, transferências distintas
daquelas que buscam atender objetivos nacionais específicos como os ligados à saúde,
educação e infraestrutura. No entanto, no caso do Brasil, os resultados indicam que esta
transferência conseguiu ser mais eficaz para atender o objetivo de equalização fiscal do que o
FPM, por exemplo. Vale lembrar que apesar de ser condicionada, quando uma transferência
financia um gasto que iria ser realizado independentemente da condicionalidade, o repasse
implica a liberação de recursos próprios para outras áreas do governo local (SPAHN, 2007)..
60
Ao invés do governo municipal utilizar receitas próprias para financiar aquele gasto, com a
transferência o município pode utilizar estas mesmas receitas para outras finalidades. Por este
motivo, uma transferência condicionada pode contribuir para o município atender outras
necessidades fiscais, além daquelas expressas na condicionalidade.

SUS (6 ◌ 6 ● 7x): É a única transferência, dentre as estudadas, que não beneficia municípios
com maior PIB per capita. Ainda no quesito capacidade fiscal, um resultado que difere dos
obtidos nas demais transferências é o papel inequalizador do recurso do SUS quando se
analisa a renda per capita. No entanto, o SUS desempenha um papel de equalização no que
diz respeito às necessidades fiscais associadas ao percentual de analfabetos e população em
situação de extrema pobreza.

Cota-parte da compensação financeira (6 ◌ 9 ● 5x): este recurso privilegia municípios que


cresceram mais, que possuem população mais esparsa e com maior percentual de pessoa com
mais de 60 anos. Esta transferência ainda promove a equalização fiscal ao distribuir menos
para os municípios com maior capacidade de gerar arrecadação própria, quando expressa pela
renda domiciliar per capita. Contudo, esta transferencia privilegia municípios com elevado
PIB per capita e com menor percentual de população em idade escolar. Estes resultados, em
algum grau, refletem as características dos municipios exploradores de recursos naturais, pois
estes locais provavelmente, devido à atividade econômica, possuem PIB per capita elevado e
obtiveram um crescimento populacional resultante da migração.

Transferências voluntárias (4 ◌ 8 ● 8x): estas transferências não seguem nenhum critério


legal, mas são distribuidas discricionariamente pelos diferentes níveis de governo. Por este
motivo, vale relembrar que os recursos voluntários repassados pela União e pelos governos
estaduais não integram o conjunto das transferências legais. Muitos trabalhos indicam que
estes recursos têm sido utilizados com fins políticos, beneficiando municípios das bases de
apoio do governo transferidor, ou ainda, municípios com elevado número de swing voters
(DIXIT e LONDREGAN, 1996; JOHANSSON, 2003), que tomam decisões eleitorais sem
critérios ideológicos, mas fundamentadas na provisão de serviços e investimentos. Assim
como outras transferências, ela inequaliza as necessidades fiscais associadas à população em
extrema pobreza e a capacidade fiscal associada ao PIB per capita, contudo, promove a
equalização nos critérios densidade, população acima de 60 anos e população em idade

61
escolar. Além do mais, dentre todas as transferências estudadas, esta parece ser a que menos
interfere na equalização fiscal, uma vez que 8 dos 16 coeficientes presentes nos dois modelos
(M1 e M2) não foram significantemente diferentes de zero.

Bolsa-família per capita (7 ◌ 14 ● 2 x): A transferência de bolsa-família, apesar de não ser


intergovernamental, foi investigada neste trabalho devido a sua relevância e ao fato de
disputar recursos com outras transferências. Além do mais, o volume de recursos pode servir
para atenuar ou exarcebar o efeito de outras transferências na equalização fiscal das demandas
e capacidades dos governos locais. À medida que o recurso privilegia determinados
municípios, a transferência do programa bolsa-família pode atender determinadas
necessidades da população e reduzir em algum grau a pressão no orçamento municipal,
liberando recursos para serem aplicados em outras áreas. A transferência do Bolsa-família
exerce um papel importante na equalização fiscal, equalizando a necessidade relacionada ao
analfabetismo, população em situação de extrema pobreza, população em idade escolar e, em
menor grau, a capacidade fiscal expressa pelo PIB. Além do mais, esta transferência foi a
única que desempenhou papel equalizador do PIB entre os municípios, servindo para
contrabalancear uma limitação das transferências integovernamentais. O contrapeso também
aconteceu na variável relacionada à proporção da população em situação de extrema pobreza,
pois os municípios que têm maior proporção da população nestas condições recebem menos
recursos das transferências intergovernamentais, controladas as demais variáveis incluídas nos
modelos. Já os recursos do Programa Bolsa-Família vão na direção oposta e beneficiam estes
municípios, uma vez que esta política visa atender justamente os indivíduos em condições
graves de pobreza.

5. Considerações finais

O Brasil é um país com território significativamente heterogêno, em que 5.565


municípios convivem em um mesmo regime federativo, à despeito de suas diferenças
econômicas, sociais, culturais e demográficas. Apesar das disparidades entre os municípios,
os governos locais receberam maiores atribuições e responsabilidades a partir do processo de
descentralização que marcou as últimas décadas. Esta situação criou o desafio de permitir, aos
munícipes de diferentes regiões, o acesso a serviços públicos e oportunidades de forma
mínimamente equitativa. Como as bases tributárias, a partir da qual os municípios podem
gerar receitas próprias, bem como as demandas por serviços públicos, são distribuídas de

62
maneira desigual ao longo do território, torna-se necessária a equalização fiscal horizontal
através das transferências integovernamentais.
Uma vez que, no contexto da equalização fiscal, as transferências podem anular o
efeito uma das outras, ou, ao contrário, intensificá-lo, neste trabalho se optou por estudar as
transferências em um nível agregado, concomitante ao estudo de cada repasse específico. Este
trabalho buscou, primeiramente, caracterizar os municípios segundo a faixa de benefícios
recebidos de cada transferência específica, mostrando o nível das necessidades fiscais e
capacidades fiscais em cada faixa. Numa perspectiva multivaridada, também foi analisado
como o volume de repasse responde a mudanças em cada necessidade e capacidade fiscal,
controlando as demais necessidades e capacidades.
Os resultados mostraram que algumas necessidades fiscais associadas à população em
situação de extrema pobreza e crescimento populacional não foram equalizadas pelas
transferências legais. Ao contrário, justamente os municípios que menos necessitavam de
recursos, segundo estes critérios, foram os que mais receberam, considerando controladas a
capacidade de gerar arrecadação própria e as outras demandas. No que diz respeito à
capacidade fiscal, o PIB também foi um critério cuja relação com o repasse das transferências
legais foi o contrário do preconizado pela equalização fiscal, pois justamente os municípios
com maior PIB per capita receberam mais.
Dentre as transferências legais, avaliando-as pelo prisma da equalização, o repasse em
que se observa a situação mais crítica é o FPM. Os recursos do FPM exercem um impacto
negativo na necessidade fiscal associada ao crescimento populacional e população em
situação de extrema pobreza, bem como na capacidade fiscal expressa pelo PIB, apesar do
objetivo essencialmente redistributivo atrelado a esta transferência. O ICMS também
apresenta estes mesmos efeitos, contudo, por ser uma transferência de caráter devolutivo, não
se espera que o ICMS tenha resultados positivos para a equalização fiscal. Desta forma,
desperta atenção a similaridade dos efeitos destas duas transferências na equalização dos
diversos itens, uma vez que a cota-parte do FPM tem caráter redistributivo, enquanto a cota-
parte do ICMS representa, essencialmente, uma transferência devolutiva. A similaridade
significa que ambas se reforçam mutuamente, considerando seus impactos pela perspectiva da
equalização.
Os resultados, por outro lado, revelam um papel importante do FUNDEB na
equalização, pois os recursos deste fundo contribuíram para equalizar a maioria das
necessidades fiscais. A transferência do SUS também exerceu, em um grau menor, uma
função positiva para a equalização. Se por um lado é verdade que o SUS apresentou um efeito

63
prejudicial nos critérios de população acima de 60 anos e densidade populacional, por outro,
estes critérios já haviam sido amplamente contemplados pelas demais transferências, e,
portanto, no cômputo geral, estes itens são equalizados pelas transferências legais. Ao mesmo
tempo, a transferência do SUS atua na equalização da necessidade associada à população em
situação de extrema pobreza, cujas disparidades são negligenciadas e até agravadas pelas
demais transferências. Apesar do objetivo das transferências condicionais não ser
essencialmente promover a equalização fiscal, elas permitem aliviar a pressão orçamentária
do governo local. No caso em que o governo iria investir na área da condicionalidade
independentemente de qualquer restrição, a transferência condicional tem o mesmo efeito que
uma transferência livre de qualquer restrição na aplicação do recurso (SPAHN, 2007).
As transferências voluntárias, por sua vez, foram as que menos interferiram na
equalização fiscal dos diversos itens estudados. Este resultado pode ser explicado pelo fato de
que, enquanto repasse discrionário, estes recursos não seguem nem critérios redistributivos,
nem devolutivos. Ao contrário, como apontam vários trabalhos, estas transferências são
influenciadas por fatores políticos, que podem não ter nenhuma relação com a capacidade ou
a necessidade fiscal do município.
Outra conclusão importante da pesquisa é que a transferência do Programa Bolsa-
Família, caso alivie as demandas dos municípes e libere recursos orçamentários do governo
local, pode representar um repasse com contribuição importante para a equalização fiscal.
Surpreendentemente esta transferência teve papel equalizador para um elevado número de
itens, alguns deles pouco contemplados pelas demais transferências. Por este motivo,
considerando o quadro geral de transferência, o repasse do Programa Bolsa-Família pode
exercer uma função de contrapeso para aqueles critérios que foram esquecidos pelas
transferências intergovernamentais.
Com relação aos critérios, uma conclusão importante é que as disparidades na
necessidade fiscal associada ao crescimento populacional e população em situação de extrema
pobreza, bem como as diferenças na capacidade fiscal expressa pelo PIB, provavelmente
estão sendo excessivamente agravadas pelas transferências. Municípios que cresceram mais
ou que apresentaram maior porção da população em situação de pobreza grave receberam
menos para um grande número de transferências, assim como os municípios com PIB per
capita mais elevado foram beneficiados pela maioria dos repasses analisados.
Desta forma, torna-se necessário rever o marco legal que regulamenta os diversos
fluxos de recursos que compõem o orçamento no nível local, principalmente no caso de
transferências que pretendem justamente realizar a redistribuição de recursos dentro da

64
federação, como no caso do FPM. Qualquer mudança específica deve ser analisada à luz do
quadro geral de transferências, pois, conforme foi observado neste trabalho, é comum uma
transferência atenuar, distorcer ou intensificar o efeito de outra, no âmbito da equalização
fiscal.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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66
Apêndice A

Tabela A1
Coeficientes padronizados dos modelos M1
Tranf. Comp.
legais FPM ICMS SUS financ. FUNDEB Volunt. Bolsa
Cresc. -0.047 -0.081 0.004 -0.083 0.048 -0.003 -0.031 -0.092
Ext. pobr. -0.144 -0.230 -0.093 0.072 -0.027 0.245 -0.144 0.283
Densid. -0.097 -0.090 -0.060 0.043 -0.013 -0.050 -0.065 0.029
Idade60 0.376 0.493 0.171 -0.111 0.004 -0.030 0.216 -0.026
Idade 0 a 14 0.200 0.171 0.097 0.055 -0.050 0.295 0.214 0.006
Analfab. -0.034 -0.017 -0.094 0.246 -0.035 0.151 -0.066 0.359
Renda -0.134 -0.218 -0.027 0.210 -0.167 0.082 -0.024 -0.326
PIB 0.498 0.111 0.691 -0.027 0.244 0.137 0.034 -0.012
_cons . . . . . . . .

Tabela A2
Coeficientes padronizados dos modelos M2
Tranf. Comp.
legais FPM ICMS SUS financ. FUNDEB Volunt. Bolsa
Cresc. -0.018 -0.065 -0.018 -0.019 0.029 0.043 -0.007 -0.074
Ext. pobr. -0.155 -0.373 -0.152 0.233 0.037 -0.033 -0.012 0.478
Densid. -0.314 -0.455 -0.195 0.014 -0.136 0.022 -0.192 0.013
Idade60 0.177 0.293 0.028 -0.039 0.109 0.025 0.103 0.050
Idade 0 a 14 -0.198 -0.212 -0.116 -0.020 -0.110 0.160 0.004 0.179
Analfab. 0.106 0.234 -0.024 0.069 0.136 -0.016 -0.033 0.414
Renda -0.531 -0.420 -0.133 0.131 -0.141 -0.368 0.053 0.139
PIB 0.695 0.150 0.748 0.015 0.379 0.173 0.070 -0.067
_cons . . . . . . . .

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