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MÁRCIA ELIANE SILVA CARVALHO

MARIA DO SOCORRO FERREIRA DA SILVA


Organizadoras

NÚBIA DIAS DOS SANTOS


ROSANA DE OLIVEIRA SANTOS BATISTA
SHIZIELE DE OLIVEIRA SHIMADA
Organizadoras

DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES
NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS:
O FIM DO PENSAMENTO
ampliando olhares e perspectivas
CRÍTICO REFLEXIVO?
A NEGAÇÃO DO HUMANO E
A BANALIZAÇÃO DA TEORIA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

REITOR
Angelo Roberto Antoniolli
VICE-REITOR
Iara Maria Campelo Lima

EDITORA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

COORDENADORA DO PROGRAMA EDITORIAL


Péricles Morais de Andrade Júnior
COORDENADOR GRÁFICO
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Ciências Exatas e Engenharias
Fabiana Oliveira da Silva
Jacqueline Rego da Silva Rodrigues

Ciências da Vida
Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César
Yzila Liziane Farias Maia de Araújo

Ciências Humanas e Sociais


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Germana Gonçalves de Araújo
Joaquim Tavares da Conceição
Luís Américo Bonfim
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Péricles Morais de Andrade Júnior (Presidente)
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Cidade Universitária “Prof. José Aloísio de Campos”


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Este livro segue as normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990,
adotado no Brasil em 2009.
DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES
NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS:
ampliando olhares e perspectivas

MÁRCIA ELIANE SILVA CARVALHO


MARIA DO SOCORRO FERREIRA DA SILVA
NÚBIA DIAS DOS SANTOS
ROSANA DE OLIVEIRA SANTOS BATISTA
SHIZIELE DE OLIVEIRA SHIMADA
Organizadoras

São Cristóvão (SE) | 2019


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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

Diálogos interdisciplinares nas ciências ambientais:


D536d ampliando olhares e perspectivas / Márcia Eliane Silva
Carvalho ... [et al.] organizadoras. – São Cristóvão, SE : Edito-
ra UFS, 2019.
518 p. : il.
ISBN 978-85-7822-667-1

1. Ciências ambientais. 2. Educação ambiental. 3. Desertifi-


cação – Jabotiana (Aracaju, SE). 4. Abordagem interdiscipli-
nar do conhecimento. I. Carvalho, Márcia Eliane Silva.

CDU 502/504
AGRADECIMENTOS

Expressamos nossos agradecimentos aos professores, pesquisa-


dores e mestrandos das instituições envolvidas que se dedicaram
na construção dos capítulos, tornando possível a concretização
desta obra.

Às escolas, alunos e professores que aceitaram participar das


pesquisas e projetos de ensino nos diferentes Estados.

À Professora Drª Sindiane Suelen Caduda dos Santos, pelas va-


liosas contribuições na estruturação inicial do presente livro.

Á Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


(CAPES), a Agência Nacional de Águas (ANA) pelo apoio financeiro
para realização das pesquisas e promoção de eventos científicos, e
a Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado
de Sergipe (FAPITEC/SE) pelo apoio financeiro para publicação da
presente obra, através do edital CAPES/FAPITEC/SE nº 11/2016.

Cordialmente,

Comissão Organizadora
APRESENTAÇÃO

O ensino das Ciências Ambientais se apresenta como condição


singular na sociedade contemporânea em vista da condução carte-
siana na forma de pensar, sentir e agir a qual apresenta implicações
nas relações socioambientais como no distanciamento do homem
da sua condição original, mediado pelo meio técnico científico in-
formacional. Este contexto nos estimula a repensar outras formas
de se estabelecer a relação sociedade natureza. Torna-se, portanto,
imperativo a construção de um paradigma que alcance as práticas,
saberes e conhecimentos inter e transdisciplinares no universo da
vida e da escola como espaço primaz de formação da cidadania am-
biental, requalificando as práticas dentro de uma abordagem holís-
tica, humanizadora e sustentável.

A coletânea intitulada “Diálogos Interdisciplinares nas Ciên-


cias Ambientais: ampliando olhares e perspectivas”, é o resul-
tado das pesquisas, práticas e reflexões de profissionais engajados
no compromisso de ler a realidade do mundo e buscar caminhos
que entrelacem o conhecimento científico com o saber fazer, no in-
tuito de imprimir à práxis a condução singular na/da mudança de
atitudes a partir do conhecimento ressignificado, em prol de uma
sociedade permeada de princípios éticos e de valorização da vida
em todas as suas dimensões.

Estes estudos resultam das pesquisas científicas desenvolvidas


pelos mestrandos e orientadores do Programa de Pós-Graduação
em Rede Nacional para Ensino das Ciências Ambientais (PROF-
8 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

CIAMB) da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Universidade


de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Feira de Santana
(UEFS) e Universidade do Amazonas (UFAM). Conta também com
a contribuição do professor convidado do Programa Interdiscipli-
nar de Pós-Graduação em Sociedade, Tecnologias e Políticas Públi-
cas (SOTEPP), do Centro Universitário Tiradentes/AL. Efetivando
nossa parceria no sentido de fortalecer a internacionalização da
Pós-Graduação da UFS, temos a participação de pesquisadores do
Departamento de Geografia e Centro de Estudos em Geografia e
Ordenamento do Território (CEGOT) da Universidade do Minho e
da Universidade de Coimbra, Portugal. Em seu conjunto, são pro-
fissionais que partilham suas pesquisas interdisciplinares nas Ci-
ências Ambientais cujas análises estão direcionadas para a relação
homem natureza, gestão e ordenamento territorial sob a égide da
sustentabilidade socioambiental.

Estas reflexões inerentes às Ciências Ambientais e suas inter-


faces consubstanciam a presente coletânea que está dividida em
três eixos temáticos. No eixo 1 - Diálogo de saberes nas Ciências
Ambientais, tem-se a contribuição dos autores, com base nas refle-
xões sobre a interdisciplinaridade e a formação do sujeito ecológi-
co, perpassando pela educação ambiental nas ciências ambientais,
permeada pelas experiências práticas e pelos desafios estruturais
apresentados ao longo do processo de construção da sociedade
moderna e na formação socioespacial brasileira. No eixo 2 - Pes-
quisa, experiências e vivências escolares nas ciências ambien-
tais, tem-se os relatos das contribuições e reflexões teórico meto-
dológicas e suas vivências na aplicação prática destes estudos no
âmbito dos espaços educativos. O eixo 3 - Pesquisas aplicadas as
ciências ambientais: do ordenamento territorial à sustentabi-
lidade socioambiental envolve produções relacionadas às refle-
xões teórico-metodológicas e práticas para o ordenamento/gestão
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 9

territorial em âmbito nacional e internacional, associando a gestão


de recursos naturais aos desafios da sustentabilidade.

Os conteúdos desvelam, portanto, a relevância dos estudos na


área das Ciências Ambientais destacados nas referidas pesquisas
e seu rebatimento no universo escolar e não escolar, contribuindo
para a análise acurada da realidade, como a aproximação dos dis-
tintos saberes e conhecimentos produzidos nas variadas escalas
geográficas e geoambientais. As contribuições apresentadas esti-
mulam o processo de sistematização e produção de conhecimen-
tos, com a finalidade de aprofundar as reflexões acerca da relação
sociedade e natureza com vistas ao protagonismo dos sujeitos no
processo de ensino e aprendizagem e para a pesquisa aplicada na
gestão e ordenamento territorial.

As pesquisas científicas associadas com a construção de diferen-


tes ferramentas didático-pedagógicas são aplicadas no sistema de
ensino básico e fortalecem o processo de inclusão social em seus
ambientes. As reflexões teóricas apresentadas pelos autores emba-
sam os princípios norteadores do PROFCIAMB, enquanto área de
construção de saberes interdisciplinares direcionados para a ci-
ência aplicada. São, em seu conjunto, experiências singulares que
dialogam para além das fronteiras físicas do Brasil e apontam ca-
minhos possíveis para que se fortaleça esta modalidade de fazer
ciência e de seu retorno imediato a sociedade na forma de reflexões
teóricas e aplicações práticas. Diante da riqueza que essas obras
contemplam, convidamos os leitores a se debruçarem sobre esses
manuscritos que apresentam singular relevância para profícuas re-
flexões das Ciências Ambientais nas diversas escalas geográficas.

Comissão Organizadora
06/02/2019
PREFÁCIO

Marcus Eugenio Oliveira Lima


(Departamento de Psicologia – UFS)

A questão da proteção ambiental e do desenvolvimento susten-


tável se tornou um tema central em nossos dias (COMÉLIAN, 1994),
pautando boa parte das Agendas políticas de países desenvolvidos
e em desenvolvimento (DOGARU, 2013). Todavia, para que o meio
ambiente seja efetivamente protegido e a vida se torne sustentável
é necessário que as pessoas alcancem melhores patamares de cons-
ciência e adotem novos padrões comportamentais que garantam a
boa qualidade de vida aos seres do planeta. A educação ambiental
se torna, então, ferramenta indispensável para garantia dessas mu-
danças (PAIÃO & EBAID, 2017).
É na escola, não apenas, mas sobretudo nela, que a educação
ambiental se torna um método de aprendizagem que permite
o estabelecimento de relações mais saudáveis, integradas
e duradouras entre a sociedade humana e o meio ambiente
(FERREIRA, PEREIRA & BORGES, 2013). A educação ambiental
se torna ainda mais estratégica num país como o Brasil, que con-
centra boa parte das mais importantes reservas de recursos am-
bientais do mundo, com elevado endemismo, ou seja, de espécies de
fauna e flora que existem apenas aqui, criando uma combinação de
riqueza e exclusividade de espécies que nos coloca entre os 17 paí-
ses com maior riqueza ambiental do mundo (IPEA, 2010). Entretan-
to, a riqueza e a consequente responsabilidade de boa governança
ambiental convivem com taxas muito elevadas de pobreza, desigual-
dade social e baixa escolarização da população (IBGE, 2019).
12 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Nesse cenário, ações que promovam uma maior consciência da


população, que permitam e melhorem o acesso às informações e
criem boas práticas ambientais são fundamentais. O Mestrado Pro-
fissional em Rede Nacional para Ensino das Ciências Ambientais
(PROFCIAMB) é uma dessas ações estratégicas para o Brasil do
presente e futuro.
O PROFCIAMB, aprovado pela CAPES em 2015, inicia suas ativi-
dades a partir de 2016, tendo a UFS como uma das quatro Institui-
ções de Ensino Superior (IES) pioneiras. Atualmente o Programa
funciona como associação em rede, integrando, além da UFS, outras
oito IES de todas as regiões do país (Universidade Federal do Pa-
raná, Universidade Estadual de Maringá, Universidade de São Pau-
lo, Universidade de Brasília, Universidade Federal de Pernambuco,
Universidade Estadual de Feira de Santana, Universidade Federal
do Amazonas e Universidade Federal do Pará)1.
O PROFCIAMB tem como público alvo professores da rede de en-
sino básico do país. É um programa de caráter interdisciplinar, cujo
objetivo é “fomentar a formação continuada daqueles profissionais
que atuam em espaços escolares e não-escolares, promovendo pes-
quisas na área das Ciências Ambientais sob perspectiva inter/mul-
tidisciplinar e transdisciplinar cujo resultado traga contribuições à
Ciência e à escola pública.”2 Na UFS o Programa envolve treze do-
centes dos departamentos de Geografia, Educação, Engenharia Am-
biental e Turismo, do Colégio de Aplicação e da Secretaria Estadual
de Educação de Sergipe. Ao todo 32 mestrandos estão matriculados
e dez dissertações foram defendidas em 2018.
Um vislumbre rápido sobre as temáticas das dissertações defen-
didas já demonstra o caráter estratégico desse Programa. Com efei-

1 https://www.capes.gov.br/images/stories/download/avaliacao/relatorios-finais-
-quadrienal - 2017/ 20122017-CIENCIAS-AMBIENTAIS-quadrienal.pdf
2 https://www.sigaa.ufs.br/sigaa/public/programa/apresentacao.jsf?lc=pt_BR&id=960
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 13

to, desde temas como “As águas urbanas e a problemática sociam-


biental no contexto escolar: o caso do Riacho do Silva em Alagoas”
ou “O ensino das ciências ambientais na Escola Professor Benedito
Oliveira: o despertar do sujeito ecológico nas relações com a bacia
do Rio Pitanga/Se”, passando por temas como “O ensino das Ciên-
cias Ambientais e a problemática da água na EFAL, em Japoatã/SE
à luz da Pedagogia da Alternância”, para discutir formas de gestão
ambiental em “A gestão hídrica no perímetro irrigado Poções da
Ribeira: uma abordagem através da Educação Ambiental.”, dentre
outras tão importantes quanto.
Tivemos a honra de estarmos à frente da Pró-Reitoria de Pós-
-Graduação e Pesquisa da UFS quando um grupo de professores
da UFS, capitaneados pelas professoras Maria José Nascimento do
PRODEMA, Maria do Socorro e Márcia Eliane, ainda em 2013, con-
duziu, de forma pioneira, a proposta do Programa. Por tudo isso nos
sentimos muito honrados com o convite da Coordenação do PROF-
CIAMB para prefaciar a coletânea intitulada “Diálogos Interdiscipli-
nares nas Ciências Ambientais: ampliando olhares e perspectivas”,
organizada pelas professoras Márcia Eliane Silva Carvalho, Maria
do Socorro Ferreira da Silva, Núbia Dias dos Santos, Rosana de Oli-
veira Santos Batista e Shiziele de Oliveira Shimada.
Trata-se de publicação com enorme importância científica e
social, resultante das pesquisas desenvolvidas pelos mestrandos e
orientadores do PROFCIAMB, tanto da UFS quanto USP, UEFS e da
UFAM. Além de trazer contribuições de pesquisadores de outros Pro-
gramas e também de outros países. As análises disponíveis nos 24
capítulos focam a relação homem-natureza, gestão e ordenamento
territorial na perspectiva da sustentabilidade socioambiental.
A coletânea se estrutura em três eixos complementares: “Diá-
logo de saberes nas Ciências Ambientais”, composto por sete capí-
tulos, “Pesquisas, experiências e vivências escolares nas Ciências
Ambientais”, composto por oito capítulos e “Pesquisas aplicadas as
14 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

ciências ambientais: do ordenamento territorial à busca da susten-


tabilidade socioambiental”, do qual constam nove capítulos.
Para termos uma noção gráfica da relevância, diversidade e atua-
lidade das contribuições trazidas nesta Coletânea, procedemos uma
análise usando o recurso nuvem de palavras3, tomando como corpus
apenas os títulos dos 24 capítulos. Na Figura 1 podemos ver que os
termos “ambientais”, “Sergipe”, “Educação”, “Escola” e Município”, nes-
ta ordem, são os mais frequentes na cobertura temática dessa obra.
Assim, nada mais a dizer, apenas parabenizar as organizadoras
e aos autores pela importância e densidade das análises que ora
disponibilizam, as quais, de forma concreta e efetiva, promovem o
avanço da Educação Ambiental e o desenvolvimento sustentável
em Sergipe.

Brisbane, 20 de março de 2019

Figura 1: Análise dos títulos (nuvem de palavras) dos 21 capítulos da coletânea “Diálogos Interdisciplinares nas
Ciências Ambientais: ampliando olhares e perspectivas”

3 http://www.edwordle.net/create.html
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 15

REFERÊNCIAS

COMÉLIAN, Ch. (1994). Développement du développement durable. Thie-


rs Monde.
DOGARU, Lucretia. (2013). The importance of environmental protection
and sustainable development. Procedia - Social and Behavioral Scien-
ces, 93, 1344 – 1348.
PAIÃO, O.S. & EBAID, A.A.W. (2017). A importância da educação ambiental
na sociedade contemporânea. Colloquium Socialis, 01, 459-465.
FERREIRA, J.E., PEREIRA, S.G., & BORGES, D.C.S. (2013). A Importância da
Educação Ambiental no Ensino Fundamental. Revista Brasileira de Edu-
cação e Cultura, VII, 104-119.
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (2010). Sustentabili-
dade Ambiental no Brasil: biodiversidade, economia e bem-estar
humano (Livro 7). Acessível em http://www.ipea.gov.br/portal/images/
stories/PDFs/livros/livros/livro07_sustentabilidadeambienta.pdf
IBGE (2019). Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Ren-
dimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2007/2015.
Acessível em https://brasilemsintese.ibge.gov.br/educacao/taxa-de-anal-
fabetismo-das-pessoas-de-15-anos-ou-mais.html.
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 7
PREFÁCIO 11

EIXO 1 - DIÁLOGO DE SABERES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS


CAPÍTULO 1 - REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA Jailton Santos Silva 23
EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A Márcia Eliane Silva Carvalho
EDUCAÇÃO BÁSICA

CAPÍTULO 2 - DUAS EXPERIÊNCIAS, UMA Marjorie Csekö Nolasco, 39


William Moura Aguiar
INTERDISCLINARIDADE. A MESCLA DE SABERES
Gislene Moreira Goméz
EM UMA CONSTRUÇÃO ENTRE MESTRADOS Priscila Paixão Lopes
PROFISSIONAL E ACADÊMICO Suzana Modesto de Oliveira Brito
Claudia Csekö Nolasco de Carvalho

CAPÍTULO 3 - A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS Francielly Vieira Fraga 61


Rosana de Oliveira Batista
ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS
AMBIENTAIS

CAPÍTULO 4 - CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO Adriana Aparecida Lazzarini 77


Maria Olimpia de Oliveira Rezende
PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

CAPÍTULO 5 - SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A Uilson de Meneses Hora 95


Saulo Henrique Souza Silva
CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL
Núbia Dias dos Santos

CAPÍTULO 6 - O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM Ajibola Isau Badiru 111


FENÔMENO INTERDISCIPLINAR 111

CAPÍTULO 7 - DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO Sandra Helena da Silva 135


Katia Viana Cavalcante
DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS – EXPERIÊNCIAS EM SÃO
GABRIEL DA CACHOEIRA/AM
EIXO 2 - PESQUISAS, EXPERIÊNCIAS E VIVÊNCIAS ESCOLARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS
CAPÍTULO 8 - ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA: Núbia Dias dos Santos 155
PERCEPÇÃO AMBIENTAL E SENSIBILIZAÇÃO DE Gilberto Jacó Carvalho Santos
DISCENTES DO ENSINO MÉDIO PARA CONSERVAÇÃO
DO AÇUDE PINDORAMA

CAPÍTULO 9 - PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO Patrícia de Moura 171


Taitiâny Kárita Bonzanini
PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE
ENERGIA: UMA EXPERIÊNCIA ESCOLAR NAS CIÊNCIAS
AMBIENTAIS

CAPÍTULO 10 - EDUCAÇÃO E SAÚDE: DIÁLOGOS Dyego Anderson Silva Pereira 191


Anézia Maria Fonsêca Barbosa
DE SABERES NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

CAPÍTULO 11 - HORTAS ESCOLARES E O ENSINO DE Vânia Galindo Massabni 211


Aline Fabiane da Silva
CIÊNCIAS AMBIENTAIS NA ESCOLA
Luca Pinto Marson

CAPÍTULO 12 - PROCESSO DE ASSOREAMENTO Luciana Fonseca Mendonça 231


Alberlene Ribeiro de Oliveira
DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE
DE SERGIPE: POSSÍVEIS CAMINHOS PARA
SENSIBILIZAÇÃO E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL

CAPÍTULO 13 - DESAFIOS NOCAPÍTULO 13


FAZER PEDAGÓGICO André Luiz Brito Nascimento 253
Joselisa Maria Chaves
NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
Maria Cláudia Silva do Carmo
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO
NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS: A EXPERIÊNCIA DO
PROFCIAMB-UEFS

CAPÍTULO 14 - A ESCOLA E O REPENSAR Sílvia Nascimento Gois 269


Sindiany Suelen Caduda dos Santos
SOCIOAMBIENTAL: REUTILIZAÇÃO DO ÓLEO DE
Maria do Socorro Ferreira da Silva
COZINHA PARA PRODUÇÃO DE SABÃO

CAPÍTULO 15 - IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO Michael Antonyne Alves Silva 293
Anézia Maria Fonsêca Barbosa
JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE
EIXO 3 - PESQUISAS APLICADAS AS CIÊNCIAS AMBIENTAIS: DO ORDENAMENTO
TERRITORIAL À BUSCA DA SUSTENTABILIDADE SOCIOAMBIENTAL
CAPÍTULO 16 - ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS Rosana de Oliveira Santos Batista 315
PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR Thaís Moura dos Santos
AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS
CAPÍTULO 17 - AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A Ana Daniela Alves 339
Lúcio Cunha
PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA
DE SANTA CLARA (COIMBRA, PORTUGAL)
CAPÍTULO 18 - DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS: Shiziele de Oliveira Shimada 359
Lidiana Vieira dos Santos
DIÁLOGOS SOBRE O AGRONEGÓCIO DA CANA-DE-
-AÇÚCAR EM SERGIPE
CAPÍTULO 19 - AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM Francisco da Silva Costa 377
António Avelino Batista Vieira
CURSOS DE ÁGUA: O RIVER HABITAT SURVEY E SUA
António José Bento Gonçalves
APLICAÇÃO AOS RIOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES
(NOROESTE DE PORTUGAL)
CAPÍTULO 20 - O SISTEMA GTP APLICADO AO Alberlene Ribeiro de Oliveira 397
Anézia Maria Fonsêca Barbosa
ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO
ALTO SERTÃO DE SERGIPE
CAPÍTULO 21 - AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E António Avelino Batista Vieira 421
Francisco da Silva Costa
HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)
António Jose Bento Gonçalves

CAPÍTULO 22 - OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS Gênisson Lima de Almeida 441


Jailton de Jesus Costa
PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM
BREJO GRANDE/SE
CAPÍTULO 23 - IMPLICATIONS OF GRAZING António José Bento Gonçalves 461
António Avelino Batista Vieira
PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN
Francisco da Silva Costa
MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL
CAPÍTULO 24 - DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL: Elaine Vasconcelos Nascimento Leal 483
Jailton de Jesus Costa
PROPOSIÇÃO CONCEITUAL E APLICAÇÃO NO BAIRRO
JABOTIANA, EM ARACAJU-SE
SOBRE AUTORES 503
EIXO 1

DIÁLOGO DE SABERES NAS


CIÊNCIAS AMBIENTAIS
CAPÍTULO 1 JAILTON SANTOS SILVA
MÁRCIA ELIANE SILVA CARVALHO

REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA


EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

1. INTRODUÇÃO
A sociedade contemporânea tem passado por mudanças signifi-
cativas em seus diversos setores. A cada dia uma nova lógica con-
sumista e predatória dos recursos naturais, orientada a partir do
sistema produtivo tem sido imposta a essa sociedade que a absor-
ve, elevando significativamente os padrões de consumo e afetando
consideravelmente o meio ambiente.
Nesta perspectiva, o debate acerca dos graves problemas so-
cioambientais que há décadas afetam o planeta tem ganhado uma
notoriedade nos espaços acadêmicos e científicos, especialmente
neste século. E assim aponta-se para a necessidade de surgimento
de uma nova consciência socioambiental, que estabeleça um elo de
respeito entre homem e natureza, superando o modelo consumista
e predatório atual.
A construção dessa nova consciência sugere alterações profun-
das nos diversos setores sociais, em especial no educacional. Para
24 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

tal, a Educação Ambiental (EA) tem destaque, por se constituir


como uma alternativa de construção de uma sociedade mais equili-
brada socioambientalmente.
Por esse novo paradigma educacional que é a EA, não perpas-
sa apenas a discussão de aspectos naturais, como é idealizado pelo
senso comum, mas também das questões sociais, econômicas, polí-
ticas e culturais, como forma de tornar os indivíduos mais cidadãos
e acima de tudo, mais conscientes da necessidade de construção de
novos valores sustentáveis.
Nesse sentido, é fundamental que a EA abrace todos os âmbi-
tos escolares, através de reflexões e ações que permitam aos alu-
nos, docentes e comunidade escolar, construírem essa consciência
socioambiental. E cabe a universidade, enquanto formadora dos
profissionais da educação, fomentar discussões que permitam a in-
ferência por parte desses profissionais, de como abordar a EA de
forma verdadeiramente autêntica.
A seleção de indicadores é uma forma de avaliar se os projetos
e/ou ações de EA implementados pelas escolas cumprem a função
essencial dessa educação voltada para uma nova reflexão entre so-
ciedade e ambiente. Tais indicadores permitem que os órgãos res-
ponsáveis pela gestão escolar, planejem e avaliem suas ações de
forma mais coerente. Mas também se justifica por permitir que as
unidades escolares elaborem seus projetos e/ou ações levando em
consideração os aspectos principais que fundamentam uma prática
efetiva de EA.
Neste sentido, este artigo tem como objetivo discutir teorica-
mente o uso de indicadores para avaliar a efetividade das ações de
EA no âmbito da educação básica. Para isso a base teórico-metodo-
lógica pautou-se nos trabalhos de autores como Carvalho (2012),
Guimarães (1995), Leff (2009), Luckesi (1999), Magalhães Junior
(2011), Roldão (2009), entre outros.
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 25

2. INDICADORES DE EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO


CONTEXTO ESCOLAR

Trabalhar com indicadores na avaliação de projetos e/ou ações


de EA se torna relevante, uma vez que estes se constituem em uma
forma de verificar se efetivamente o que é realizado pelas escolas
são projetos de EA autênticos.
Além disso, o trabalho com indicadores em EA é uma metodolo-
gia ainda pouco utilizada, mas que pode auxiliar tanto professores
quanto gestores educacionais, na produção e avaliação dos seus
projetos de EA.
Mas, o que são indicadores? Conforme aponta Roldão (2009, p.
102) para Caldas e Kayano (2002, p.02):

Indicadores são um instrumento, ou seja, o indicador não


é um fim em si, mas um meio; Indicadores são uma medi-
da, uma forma de mensuração, um parâmetro, quer dizer, o
indicador é um instrumento que sintetiza um conjunto de
informações em um “número” e, portanto, permite medir de-
terminados fenômenos entre si, ou ao longo de determinado
tempo, indicadores podem ser utilizados para verificação,
observação, demonstração, avaliação, ou seja, o indicador
permite observar e mensurar determinados aspectos da re-
alidade social: eles medem, observam e analisam a realidade
de acordo com um determinado ponto de vista.

Por sua vez, para Magalhães Júnior:

[...] os indicadores são modelos simplificados da realidade


com a capacidade de facilitar a compreensão dos fenômenos,
de aumentar a capacidade de comunicação de dados brutos
e de adaptar as informações à linguagem e os interesses lo-
cais dos decisores (MAGALHÃES JÚNIOR, 2011, p. 171).
26 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Diante disso, entendemos que os indicadores são parâmetros,


modelos utilizados para avaliação, planejamento e execução de po-
líticas e ações de natureza complexa como as de EA.
Sendo assim, indicadores e avaliação estão estreitamente interli-
gados, visto que, através do uso de indicadores permite-se a avalia-
ção de determinado tema tanto do ponto de vista quantitativo quan-
to qualitativo (ROLDÃO, 2009). Tal constatação leva-nos a refletir
sobre a avaliação, entendendo-a como uma ação de diagnóstico de
determinada realidade que possibilite uma transformação social.
Sobre avaliação, Luckesi traz a seguinte contribuição:

A avaliação pode ser caracterizada como uma forma de ajui-


zamento da qualidade do objeto avaliado, fator que implica
uma tomada de posição a respeito do mesmo; para aceitá-lo
ou para transformá-la. [...] a avaliação é um julgamento de
valor sobre manifestações relevantes da realidade, tendo em
vista uma tomada de decisão (LUCKESI, 1999, p.33).

Assim, Luckesi (1999) aponta três elementos relevantes para


entender e promover a prática avaliativa: o primeiro é que esta é
um juízo de valor, o segundo é que o julgamento é feito com base
em características relevantes da realidade, e o terceiro é que “[...] a
avaliação conduz uma tomada de decisão (LUCKESI, 1999, p. 33)”.
Por sua vez, Tomazello e Ferreira (2001) embasadas por Guerra
(1993) destacam que para este autor a avaliação seria: “[...] como um
processo de diálogo, compreensão e melhoria de programas educa-
tivos, já que ela interroga pelo seu valor educativo, sua importância,
exigências e significados e se estabelece como um meio de entendê-
-los e melhorá-los (TOMAZELLO e FERREIRA, 2001, p. 204)”.
Segundo as referidas autoras, para Guerra (1993):

A avaliação deve ser independente, não neutra; o avaliador


deve ser imparcial, mas não asséptico. A avaliação deve ser
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 27

qualitativa e tem por objetivo melhorar os programas atra-


vés de sua compreensão, do conhecimento de sua natureza
e resultados. Ela deve ser democrática, deve ser posta a ser-
viço dos usuários e da comunidade. Deve ser processual, isto
é, realizar-se durante todo o processo, assim pode modificar
e melhorar. É essencial que seja participativa, dê voz aos par-
ticipantes para que emitam suas opiniões. Deve realizar-se
em equipe, pois assim haverá uma pluralidade de enfoques
e maior garantia de rigor. Pode ser feita pelos próprios par-
ticipantes e também contar com a colaboração externa, com
uma perspectiva complementar, o que dará maior veracida-
de as informações (TOMAZELLO e FERREIRA, 2001, p. 204).

Vale ressaltar que o processo de avaliação não objetiva o julga-


mento do programa ou dos seus responsáveis. Sua função é facilitar,
através das informações recolhidas, de sua interpretação, a valora-
ção, que deve ser feita pelos próprios participantes; eles sim devem
emitir juízos para o aperfeiçoamento tanto do programa como dos
profissionais envolvidos.
Diante da interligação entre indicadores e avaliação, e consi-
derando que esta é um juízo de valor, cabe destacar ainda que a
construção de indicadores está intimamente ligada a realidade es-
tudada e a subjetividade do pesquisador, que mesmo buscando a
imparcialidade, constrói seus indicadores a partir do modo como
observa, interpreta e entende a realidade.
Para Roldão (2009) a avaliação vai ser modificada no decorrer
do tempo histórico, passando por transformações: “Com o passar
do tempo os parâmetros de avaliação aumentaram a desigualdade,
rotularam os indivíduos, limitaram sua capacidade de conhecimen-
to através de uma educação preocupada com aprovações e reprova-
ções (ROLDÃO, 2009, p. 26)”.
Mesmo assim, Roldão (2009) chama atenção que a atual concep-
ção de avaliação que temos se assemelha a concepção de La Salle,
28 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

em 1720, para quem esta era uma forma de verificação da aprendi-


zagem. Quando na verdade, deveria ser pensada enquanto forma de
se pensar o processo de ensino-aprendizagem. Fato também des-
tacado por Luckesi (1999), uma vez que para ele, a avaliação deve
diagnosticar e não classificar, como tem ocorrido.
Conforme aborda este autor, a avaliação pode ser classificatória
ou diagnóstica. A primeira estaria orientada a partir de um modelo
educacional conservador, funcionando como um instrumento disci-
plinador e não permitindo uma transformação social, pois ao clas-
sificar apenas mantêm um padrão de sociedade. Já a segunda, con-
forme Luckesi (1999), se atrela a uma pedagogia preocupada com
a transformação social, sendo assim, a avaliação diagnóstica aponta
caminhos para a mudança. O que nas palavras de Demo (2005) re-
presenta uma avaliação qualitativa.
Segundo Demo:

O que está em jogo na avaliação qualitativa é principalmente


a qualidade política, ou seja, a arte da comunidade de auto-
gerir-se, a criatividade cultural que demonstra em sua his-
tória e espera para o futuro, a capacidade de inventar seu
espaço próprio, forjando sua autodefinição, sua autodeter-
minação, sua autopromoção, dentro dos condicionamentos
objetivos (DEMO, 2005, p.18).

Assim, podemos apontar que o indicador é uma forma de avalia-


ção, e assim precisa fornecer um diagnóstico preciso da realidade
em estudo, apontando caminhos para tomada de decisões.
Para Roldão (2009) a avaliação dos projetos e/ou ações dos
programas de EA é algo indispensável, mas que ainda não foi incor-
porada pela cultura governamental, seja pela dificuldade de avaliar
ações com alto grau de subjetividade como as de EA, como também
pelo período do seu surgimento no país. A prática de avaliar as po-
líticas públicas no Brasil, ainda é incipiente, surgindo juntamente
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 29

com a reforma do Estado e a modernização da gestão pública nas


décadas de 80 e 90 (ROLDÃO, 2009).
Segundo Sanchez (1999, apud ROLDÃO, 2009) no Brasil a EA so-
mente começou a ser efetivamente trabalhada a partir da década
de 70, com as iniciativas da sociedade civil. Para ambos os autores,
antes disso o país estava preocupado com a apropriação dos recur-
sos naturais, uma vez que passava pela onda desenvolvimentista
baseada na industrialização nascente, apoiada pelo Estado a partir
dos anos 50.
Neste período, algumas políticas públicas ligadas a temática am-
biental ainda foram criadas, mesmo sem a presença da sociedade
civil, mas embora com estas, a preocupação na mitigação dos im-
pactos ambientais causados pela indústria era incipiente. O dire-
cionamento residia muito mais em atrair capital internacional para
impulsionar a industrialização do país (ROLDÃO, 2009).
A utilização de indicadores para avaliar as políticas públicas em
termos de sustentabilidade ganha ênfase apenas a partir da déca-
da de 90, consequentemente década da Rio-92, onde o conceito de
desenvolvimento sustentável ganha notoriedade (MAGALHÃES JÚ-
NIOR, 2011).
Para Tomazello e Ferreira (2001) é muito difícil avaliar ativida-
des de EA por se tratar de uma realidade complexa, cujos temas e
objetivos definidos para a atividade são de uma abrangência muito
grande.
Apoiadas em Tarin (1994), as referidas autoras destacam que:

[...] se adotarmos processos de avaliação mais rígidos e


quantitativos, correremos o risco de prescindir de elemen-
tos que caracterizam a educação ambiental. A avaliação utili-
zada na escola tradicional não se adequa a esta nova visão de
realidade ambiental, portanto necessitamos não só de novas
práticas educativas como de um novo modelo de avaliação
(TOMAZELLO E FERREIRA, 2001, p.200).
30 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Por sua vez, citando Diaz (1995), Tomazello e Ferreira (2001,


p.205) apontam que nos projetos de EA:

Devem ser avaliados o desenvolvimento do espírito crítico


do aluno, o desenvolvimento de capacidades, tais como res-
ponsabilidades, iniciativa e autonomia, e o desenvolvimento
de uma nova ética e valores, melhor adaptados à gestão dos
recursos e a responsabilidade ante as gerações futuras (valo-
res de solidariedade, tolerância, cooperação).

Ainda apoiadas neste autor, Tomazello e Ferreira (2001) des-


tacam que o processo avaliativo em EA dar-se em três dimensões:
alunos, onde se focará as questões relativas às atitudes e compor-
tamentos; os professores, em que a ênfase será dada na análise do
desenvolvimento de novas competências, tais como o trabalho in-
ter e/ou transdisciplinar; e o projeto educativo, em que a análise
se debruçará nas várias partes que o compõe, tais como objetivos,
metodologia e avaliação.
Sendo assim, a proposição de indicadores é uma das formas pos-
síveis de avaliação dos projetos de EA desenvolvidos nas redes de
ensino assim como nos demais espaços, mas que ainda é uma me-
todologia a ser mais explorada.
Conforme Magalhães Júnior (2011) os indicadores, entre outros
aspectos ajudam a democratizar o conhecimento e diagnosticar as
políticas públicas. Sendo assim a sua escolha e/ou utilização

[...] exige, muitas vezes, a diferenciação de seus graus de im-


portância ou a sua ponderação visando sinalizar quais são
aqueles prioritários para o alcance dos objetivos estabeleci-
dos (MAGALHÃES JÚNIOR, 2011. p. 174).

Apoiado em Hamilton (1996), Magalhães Junior (2011) apon-


ta que os indicadores devem possuir, enquanto característica: “[...]
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 31

simplicidade, nível de acessibilidade social [...] objetividade, flexibi-


lidade, relevância, base técnico-científica, condições analíticas [...],
mensurabilidade [...] qualidade dos dados e comparabilidade com
outros indicadores [...] (MAGALHÃES JÚNIOR, 2011, p.177)”.
Assim, como definir indicadores que permitam avaliar a formu-
lação e o desenvolvimento de projetos de EA?
Tomazello e Ferreira (2001) citando Alba e Gaudiano (1997)
apontam que o trabalho de EA ocorre no espaço escolar quando:

• Os problemas ambientais [...] se encontram articulados


com os conteúdos e práticas escolares cotidianas;
• No reconhecimento desses problemas haja a participa-
ção dos alunos a partir de seus pontos de vista e valo-
rações;
• Na decisão sobre as medidas a adotar para participar, os
alunos assim como os pais, tenham a oportunidade de
expressar suas próprias prioridades e elas sejam leva-
das em conta;
• Na avaliação dos avanços e os alcances das ações se ou-
torgue valor aos esforços realizados, mais no sentido de
entendê-los como parte de um processo de grande visão
do que em função de conseguir metas de curto prazo
(ALBA e GAUDIANO, 1997 apud TOMAZELLO e FERREI-
RA, 2001, p.204).

Na visão de Mayer (1989) citado pelas autoras, na avaliação de


projetos de EA deve-se ter como indicadores: “[...] mudança de va-
lores, atitudes, hábitos e crenças dos alunos.[...] o enfoque multi/
inter/transdisciplinar [...] as interações entre alunos, professo-
res, família, comunidade e autoridades (TOMAZELLO e FERREIRA,
2001, p.205).
Neste sentido, buscou-se sintetizar os principais elementos que
devem compor as ações/projetos de EA a partir das considerações
acima elencadas e do arcabouço teórico que subsidia o campo da
32 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

EA apresentado por Carvalho (2012), Tristão (2004, 2008), Guimarães


(1995) e Reigota (2011). Desta forma, entendemos que a prática efeti-
va da EA em uma perspectiva de aprendizagem voltada para a forma-
ção do sujeito ecológico realiza-se no cotidiano escolar quando:

• É desenvolvida em uma perspectiva interdisciplinar;


• O trabalho realizado possibilita uma sensibilização e a cria-
ção de novos valores e atitudes, originando sujeitos ecológi-
cos;
• As ações de EA leva em consideração a realidade socioam-
biental do educando;
• Busca-se uma integração entre sociedade e natureza, em
uma leitura crítica indo além da transmissão de valores ver-
des;
• O projeto se desenvolve na perspectiva de associar teoria e
prática como fazeres indissociáveis;
• Leva-se em consideração a subjetividade no processo de en-
sino-aprendizagem;
• O trabalho desenvolvido busca uma integração entre comu-
nidade e escola, partindo de uma abordagem local/global e
possibilitando uma reflexão acerca da realidade socioam-
biental contemporânea;
• Em caso de projetos, estes devem ser desenvolvidos de for-
ma contínua, participativa, com avaliação processual;
• Busca a emancipação do sujeito ecológico e a construção de
sociedades sustentáveis.

Tendo como base os pressupostos supracitados, sugerem-se os


seguintes indicadores de avaliação de práticas de EA: interdiscipli-
naridade, sensibilização, vivência do educando, integração socieda-
de/natureza, associação teórico-prática, subjetividade no processo
de ensino-aprendizagem, abordagem local/global, projeto perma-
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 33

nente, promoção da sustentabilidade, planejamento participativo e


avaliação do projeto.
A partir da utilização desses indicadores na análise dos projetos
e/ou ações de EA é possível avaliar como estas práticas têm sido
desenvolvidas no cotidiano da escola, o que possibilita avançar no
sentido de uma tomada de decisão.
Vale ressaltar que esta proposição não é quantitativa e sim parte
de uma abordagem qualitativa do processo de ensino-aprendiza-
gem em EA, voltada, como dito anteriormente, para a formação do
sujeito ecológico.
A incorporação dos respectivos indicadores no planejamento e
na avaliação dos projetos e/ou ações de EA, significa trazer para
dentro da educação o componente ambiental que na maioria das
vezes é negligenciado e silenciado dentro do currículo escolar. Con-
templar estes indicadores, representa transformar a escola de um
mero local de acumulação de informações para um lugar de forma-
ção socioambiental crítica, no qual prevaleça valores como diálogo,
respeito e cooperação.
A presença desses indicadores nos projetos de EA representa
um passo para a construção de uma escola formativa, que é aquela
na qual:

“a) liga o trabalho realizado em sala de aula com a vida, dina-


mizando e vivificando o trabalho escolar;
b) cria a necessidade de proposição de problemas para o alu-
no resolver;
c) evidencia a necessidade e a importância do trabalho cole-
tivo na resolução de problemas;
d) coloca todos os envolvidos no processo de ensino-apren-
dizagem (professor e aluno) como sujeitos deste processo;
e) transfere a expectativa de acumulação, de deposição de
conhecimentos no aluno para a de desenvolvimento da ca-
pacidade de atuação que deve adquirir junto a situações
34 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

de vida, através do manejo e da utilização de conhecimen-


tos que ele sabe que existem e domina em alguma extensão
(PENTEADO, 1997, p.58)”.

A perspectiva de uma escola formativa liga-se, portanto direta-


mente com a EA, uma vez que os princípios que a norteiam são os
mesmos da escola formativa. Vale ainda destacar que o enfoque in-
terdisciplinar tem significância na medida em que busca promover
uma compreensão sistêmica do meio ambiente e as questões que o
envolvem (LEFF, 2009).
Ela surge buscando integrar sociedade e natureza, reafirmando
para todos a ideia do homem como integrante do meio ambiente e
elemento da natureza. Na tentativa de diminuir a cisão criada pela
modernidade que colocou a natureza como um recurso a ser domi-
nado pela sociedade, excluindo do ambiente a figura do humano.
Diante disso, os projetos e/ou ações de EA precisam levar em
consideração estas reflexões e pautar-se na interdisciplinaridade
e na complexidade, buscando religar o que se encontra dissocia-
do, visto que se o ambiente é multifacetado, um conceito complexo
no qual se ampara a EA, os projetos desta natureza precisam estar
norteados por uma abordagem complexa e também multifacetada,
a partir do diálogo de diversas disciplinas e ramos do conhecimen-
to. É necessário integrar, interagir e compartilhar conhecimentos a
partir de trocas dialógicas que permitam uma transformação socio-
ambiental. Sem partilha, cooperação e diálogo, se fortalece nas es-
colas a perspectiva antropocêntrica e individualizada, que impede
vislumbrar o ambiente em toda sua complexidade.
Nessa perspectiva, a EA caminha em sentido oposto a educação
tradicional, uma vez que esta prioriza a transmissão teórica à prati-
ca, sem levar em consideração a emoção, o afetivo que é tão impor-
tante na EA (GUIMARÃES, 1995). Esta visão é corroborada por Leff
(2009) quando afirma que EA no ambiente escolar deve acontecer
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 35

a partir da construção coletiva do conhecimento e apropriação des-


tes pelos alunos e não através da mera reprodução de conceitos, o
que a torna semelhante a educação libertadora defendida por Paulo
Freire.
Além da interdisciplinaridade e vivência do educando, no pla-
nejamento dos projetos de EA é importante perceber, como des-
taca Morin (2011), que os problemas se situam em dois níveis, ao
mesmo tempo globais e locais, não estando isolados em uma dada
realidade, mas encontrando-se interligados nas diversas escalas e
dimensões. Nesse sentido, os problemas ambientais locais fazem
parte de um todo maior e que estes não impactam apenas a comu-
nidade de origem.
Diante disso, buscar a articulação entre a realidade local, a vi-
vência do aluno e o contexto mais amplo do qual ele faz parte, é
um indicador que deve ser observado no planejamento e execução
dos referidos projetos/ações, que também não devem se constituir
como ações isoladas, pontuais e estanques, mas se caracterizarem
pelo trabalho coletivo.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Temos que reconhecer que vivemos em uma sociedade em crise
de valores éticos, morais e humanos e dessa forma, a crise socio-
ambiental que se expressa no aumento da desigualdade social, da
violência, através da escassez de recursos naturais ou do aumento
substancial dos problemas climáticos e seus efeitos sobre a saúde
humana está atrelada a crise de valores da cultura ocidental.
Diante disso, a EA surge na contramão do que está posto, buscan-
do repensar tais valores a partir da sensibilização para a produção
de uma nova consciência socioambiental. Nesse processo, ela se ca-
racteriza como um movimento contra-hegemônico, uma vez, como
ressalta Grun (1996) que a educação moderna hierarquiza saberes,
36 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

colocando determinadas áreas em uma condição de silenciamento,


constituindo assim, áreas de silêncio do currículo escolar, tal como
ocorre muitas vezes com as questões afrodescendentes, indígenas
e ambientais. Assim, a prática da EA é um movimento que vai de
encontro ao paradigma dominante vigente.
Realizar projetos/ações que contribuam para repensar os valo-
res da sociedade moderna e que possam diminuir a crise socioam-
biental instalada nesta sociedade é uma tarefa árdua e de extrema
importância social. Nesse sentido, planejá-los de modo coerente,
tomando por base os aspectos principais para o repensar desses
valores, facilita a execução dos mesmos e o alcance dos objetivos
estabelecidos.
A proposta de indicadores que apresentamos nesse texto, pode
se constituir como um dos caminhos possíveis para o planejamen-
to desses projetos, políticas e ações no campo da EA, contribuindo
para a formulação, execução e avaliação dos mesmos.
Os indicadores elencados se caracterizam como um modelo
simplificado que diagnostica e avalia uma determinada realidade,
apontando caminhos para a sua condução e transformação social.
Cabendo destacar que ele não se constitui como um modelo pronto,
acabado, mas que está aberto a constantes aperfeiçoamentos que
contribuam para a consolidação efetiva da EA nas escolas da edu-
cação básica.
Portanto, os indicadores apresentados podem constituir os pas-
sos iniciais para formulação e implementação de políticas e ações
realizadas por escolas e órgãos gestores da educação básica no país,
de modo a contribuir com a construção de uma sociedade crítica
e reflexiva acerca dos valores nela gestados e consequentemente
para o equilíbrio socioambiental.
Jailton Santos Silva; Márcia Eliane Silva Carvalho 37

REFERÊNCIAS

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do sujeito ecológico. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2012.
DEMO. Pedro. Avaliação Qualitativa. São Paulo: Cortez, 2005.
GRUN, Mauro. Ética e educação ambiental: a conexão necessária. Campi-
nas, SP: Papirus, 1996.
GUIMARÃES, Mauro. A dimensão ambiental na educação. Campinas, SP:
Papirus, 1995.
LEFF, Enrique. Saber Ambiental: sustentabilidade, racionalidade, com-
plexidade, poder. Tradução Lúcia Mathild Endlich Orth. Petrópolis, RJ: Vo-
zes, 2009.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos
e proposições. 9. ed. São Paulo: Cortez, 1999.
MAGALHÃES JÚNIOR, Antônio Pereira. Indicadores ambientais e recur-
sos hídricos: realidade e perspectiva para o Brasil a partir da experiência
francesa. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane
Lisboa. 4. ed. Porto Alegre: Sulina, 2011.
PENTEADO, Heloísa Dupas. Meio ambiente e formação de professores.
2 ed. São Paulo: Cortez, 1997.
REIGOTA, Marcos. A floresta e a escola: por uma educação ambiental
pós-moderna. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2011.
ROLDÃO, Luciana Barros. Proposta de indicadores de avaliação em
educação ambiental: uma reflexão sobre o programa de educação am-
biental portuária a partir da linha de ação educação ambiental portuária
no contexto do ensino formal. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-
-Graduação em Educação Ambiental. Universidade Federal do Rio Grande,
2009.
TOMAZELLO, Maria Guiomar Carneiro; FERREIRA, Tereza Raquel das
Chagas. Educação Ambiental: que critérios adotar para avaliar a adequa-
ção pedagógica de seus projetos?.Ciência e Educação, v.7, n.2, p.199-
38 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

207, 2001. Disponível em :http://educa.fcc.org.br/pdf/ciedu/v07n02/


v07n02a05.pdf Acesso em: 13 nov. 2013.
TRISTÃO, M. Saberes e fazeres da Educação Ambiental no cotidiano esco-
lar. Revista Brasileira de Educação Ambiental. Brasília, 2004.
_______. A educação ambiental na formação de professores: redes de
saberes. 2ª ed. São Paulo: Annablume, 2008.
MARJORIE CSEKÖ NOLASCO,
WILLIAM MOURA AGUIAR
GISLENE MOREIRA GOMÉZ
CAPÍTULO 2 PRISCILA PAIXÃO LOPES
SUZANA MODESTO DE OLIVEIRA BRITO
CLAUDIA CSEKÖ NOLASCO DE CARVALHO

DUAS EXPERIÊNCIAS, UMA INTERDISCLINARIDADE.


A MESCLA DE SABERES EM UMA CONSTRUÇÃO ENTRE
MESTRADOS PROFISSIONAL E ACADÊMICO

1. INTRODUÇÃO
Este texto propõe-se a relatar duas experiências, em pós-
-graduações diferentes, de componentes curriculares, em tor-
no da construção de interdisciplinaridade(s). A primeira delas,
há 14 anos, aulas compartilhadas entre diferentes formações
acadêmicas que forma aos poucos se fazendo unas, ministrada
a mãos concomitantes, na mescla para saberes e aprendizados
coletivos. A segunda, há dois anos, ensinar a “exercitar” inter-
disciplinaridade.
A apresentação destas experiências será centrada em relatos e
avaliações de diversos olhares que trazem sugestões sobre a sua
contínua (re)construção e efeitos nos docentes e discentes envolvi-
dos nas experiências. Apresentar ideias e formatos dos componen-
tes curriculares, que trabalham sobre ser interdisciplinar e fazer
interdisciplinaridade, conceito muito debatido e, aparentemente,
difícil na prática, oferecendo ao debate, as experiências vividas, é
40 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

nosso objetivo. O desejo é que elas promovam reflexões profícuas a


todos, como o fizeram com os envolvidos.
Aqui um alerta, este texto se pretende um relato com percep-
ções, seu suporte bibliográfico pertence às experiências relatadas
e está disperso em múltiplas vivências, nas reorganizações típicas
do processo de ser professor e ensinar, e na reunião de diversas ci-
ências para fazer Ciências Ambientais. Não desejamos secundarizar
os autores que nos suportam, mas eles são tantos, e tão diversos,
que sem dúvida, citações estão aquém de abrangê-los. Assim, a lis-
ta final, apresenta diversos grandes pedagogos, como nos aponta a
pedagogia Griô1, sem dúvidas Paulo Freire, Emília Ferrero, Vigot-
sky, Waldorf, Milton Santos, mas também a ancestralidade, seja ela
africana, oriental, ocidental, ameríndia ou brasileira(s) (caracteri-
zada pelas misturas). Além de textos das áreas específicas. Todos
lemos tudo? Vivemos tudo? Por certo que não. Mas dialogamos com
todos, a partir da nossa interação.
Ambas as experiências estão sendo desenvolvidos no Programa
de Pós Graduação em Modelagem em Ciências da Terra e do Am-
biente – PPGM, da subárea de Ciências Ambientais, área Interdisci-
plinar da CAPES-CNPq, sediado na Universidade Estadual de Feira
de Santana - UEFS, na cidade de mesmo nome, Estado da Bahia, dis-
tante 120km da capital Salvador.
O Programa abriga um braço acadêmico, mais focado na pes-
quisa e na inovação tecnológica, com mais de uma década, e outro
profissional, recente, ligado a um Mestrado em Rede Nacional, com
nove polos, direcionado a criação e desenvolvimento de produtos
e processos educacionais aplicáveis, nem sempre replicáveis, e por
isto, algo extensionista e voltado a ação educadora, tanto formal

1 Pedagogia Griô, desenvolvida no Grupo Grãos de Luz – Griô, por Pacheco, L. e Caires,
M. e equipe. Lençóis-Bahia, Chapada Diamantina. Mescla propostas pedagógicas com
conhecimentos locais, e ancestrais no sentido de acolher e fazer pensar.
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 41

(escolar), quanto não-formal, ligada ao fazer de técnicos e analistas


ambientais de instituições públicas e privadas, governamentais e
não governamentais. Unir um mestrado acadêmico a um profis-
sional de ensino é ampliar espaços de aplicabilidade por um lado,
e por outro de aprofundamento, fazendo a Universidade interagir,
ainda mais fortemente com os demais níveis de ensino formal, na
rede educacional, e com a sociedade e outros saberes.
A primeira experiência, foi promovida pela Especialização, de-
pois Mestrado de Modelagem em Ciências da Terra e do Ambiente
– MCTA, de cunho acadêmico, na disciplina Terra em Transforma-
ção, ela abriu caminho para o praticar e oportunizou transformar
o aprendizado em Componente Curricular, denominado Interdisci-
plinaridade em Ciências Ambientais, no Mestrado Profissional em
Rede de Ensino de Ciências Ambientais – Profciamb, experiência
que se encontra no início da segunda turma e se constitui num de-
safio, ao invés de a 6-10 mãos, nove polos no Brasil, cada um com
suas múltiplas mãos.
O território onde nos encontramos, é fundamental para o enten-
dimento da opção por Ciências Ambientais, Interdisciplinaridade
e a relação Pesquisa- Extensão, via Ensino (Leão et all, in: http://
www.tramas.ufc.br/wp-content/uploads/2016/05/Pedagogia-do-
-Territorio-e-Juventudes-do-campo.pdf, acessado em 19/11/2018).
Feira é uma das dez maiores cidades do Norte e Nordeste brasileiro,
é nominada Princesinha do Sertão ou Portal do Semiárido. Apesar
deste imenso patrimônio líquido, onde apresenta dezenas de espe-
lhos d’água, lagoas, nascentes e 3 bacias hidrográficas, tem grande
parte do seu território municipal submetido a seca intermitente
que assola o Nordeste. A área úmida e de transição, está na cida-
de-sede, em risco de extinção ou apagamento, pelo conflito com a
malha urbana, que sobre ela avança.
A UEFS tem como missão a ação universitária, em especial sobre
a região semiárida, além dos limites do município que a acolhe, en-
42 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

volvendo a caatinga e seus encraves, como a Chapada Diamantina,


e pelas diversas gentes e usos humanos dos mais simples e antigos,
em comunidades tradicionais quilombolas, vaqueiros e garimpei-
ros, àquelas industriais e empresariais de alta tecnologia, a saber:
no Centro Industrial do Subaé, e nos núcleos de couro, agroindús-
tria e bebidas do seu entorno, bem como nos serviços diversos de
comercio, educação, saúde e turismo.
Esta diversidade cultural, social e ecológica favorece a discussão
da interdisciplinaridade e tanto desafia na construção de discipli-
nas acadêmicas, quanto no processo de troca de saberes entre a
Academia e as Comunidades.

2. TERRA EM TRANSFORMAÇÃO: A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA

No primeiro semestre do MCTA – PPGM, a disciplina Terra em


Transformação (TemT) inicia o curso, com 45h de duração, mo-
dular e condensada, ocorrendo entre 2 a 3 semanas. Ela tem a
tarefa de uniformizar conhecimentos sobre a Terra e a ação do
homem, favorecendo o debate sobre questões como as mudanças
climáticas em curso e suas relações com a economia mundial, bem
como sobre as evoluções do nosso planeta, do seu aparecimento
até agora. Transversalmente, apresentar, de forma interdiscipli-
nar a compreensão da Terra, incentivando o olhar complexo, sobre
qualquer tema.
Como um mestrado que trabalha as geotecnologias tem forte
componente de análises espaciais, com grande capacidade disper-
siva frente aos desafios tecnológicos colocados, TemT, ao longo do
tempo, foi sendo deslocada. Era uma disciplina, em busca do seu
lugar, há cerca de cinco anos, é oferecida, durante abril, isolada, de
forma a favorecer a concentração dos alunos, e o enfrentamento de
conteúdo teórico denso.
Em consulta ao site do curso, se lê, na ementa:
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 43

Essa disciplina apresenta as transformações que ocorreram


ao longo de tempo geológico e como o aparecimento da bios-
fera e do homem interferem no planeta. Tempo - conceito;
Tempo geológico, tempo histórico; Evolução do planeta no
tempo; Modificações na atmosfera e hidrosfera; Evolução
da biosfera e suas interações com o planeta; O homem e sua
evolução para agente geológico - o quaternário e o holoceno.
Homem enquanto agente geológico. Quinário uma discus-
são; Antropogênese e tecnogênese; Paisagens antrópicas.
Estudos de caso. (consultado em 19/11/2018 as 00:11h
http://www2.uefs.br:8081/ppgm/mestrado/disciplinas/
terra-em-transformação,)

O Programa é desenvolvido de forma compartilhada e com pre-


sença contínua e integral das docentes: Marjorie Cseko Nolasco (Ge-
óloga), Suzana Modesto de Oliveira Brito (Química) e Priscila Paixao
Lopes (Bióloga). Elas, ao longo de todo o período de desenvolvimen-
to da disciplina, debatem desde a origem do Universo, até o apareci-
mento do homem, complementando-se. O Tempo Geológico é um fio
condutor, em forma prática – uma fita métrica onde, a cada dia, são
acrescentadas as transformações, físico-químicas, geológicas, bióti-
cas do percurso de transformação do Planeta até hoje.
Como a bibliografia é muito ampla, pedagogicamente escolhe-
mos utilizar filmes, relatórios e livros: Um dia depois de amanhã,
2012, A história do fogo, Pequena história da riqueza do homem,
As veias abertas da América Latina, o IPCC. A turma é incentivada a
realizar sessões de cinema, com pipoca, enquanto refletem e deba-
tem sobre questionários direcionados aos filmes.
A chegada da vida e do solo é marcada pela entrada da quar-
ta professora – agrônoma e pedóloga – ela apresenta o solo e suas
transformações no planeta, ampliando a vida. A chegada do homem,
com a entrada da perspectiva econômica e histórica, por um novo
professor que conduz a análise da evolução humana, da pré-histó-
44 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

ria aos dias atuais. Uma discussão das razões do aparecimento da


questão ambiental e das relações de dominação entre seres vivos,
sociedades, países. A partir daí o “novo” funcionamento do Planeta,
agora com diferentes transformações humanas é discutidos: Antro-
poceno, Antromas e seus limites, co-dependencia homem-planeta,
sociedade-ambiente. A disciplina é fechada com as discussões de
grandes temas atuais, ambientais, avaliação da disciplina e a apre-
sentação das suas relações com o projeto do mestrando.
O conjunto discente é multifacetado em diversos aspectos: o
profissional tem predomínio de biólogos e geógrafos, mas uma di-
versidade de jornalistas, administradores, historiadores, geólogos,
matemáticos, engenharias diversas, brasileiros e estrangeiros; a
origem/língua, com domínio de brasileiros e baianos, mas atingin-
do das Alagoas ao Rio Grande do Sul, da língua espanhola a inglesa,
especialmente das Américas e África.
Durante os 14 anos de desenvolvimento, tendo mais de cem
alunos matriculados, a avaliação discente, com indicação de pelos
menos 3 pontos positivos e negativos, ajudou a prospectar mudan-
ças necessárias e reforçar acertos, vários ajustes foram realizados.
Entre os aspectos positivos destacaram-se: 1. Condução interdisci-
plinar complementar, sem disputas por domínio, “rara entre pes-
quisadores”, expondo discordâncias, entre as visões docentes, 2. A
densidade e a amplitude dos debates, que apresentam correlações
não percebidas pelos discentes, provocando novas percepções e,
3. Favorecimento de maior integração entre colegas, pela metodo-
logia adotada, e um destaque para o Tempo. Dentre os aspectos
negativos, estão/estavam: a. dificuldade de acompanhamento em
paralelo com outras disciplinas, b. carga horária, considerada re-
duzida, para garantir a reflexão, c. sugestão de acesso antecipado a
bibliografia, para maior aprofundamento.
A equipe docente se diverte e aprende dando aulas, considerado
importantíssimo exercitar o “ensinar” a fazer interdisciplinaridade,
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 45

sistematizando este exercício. Considera Interdisciplinaridade em


Ciências Ambientais, um bom momento para enfrentar este novo
desafio, e amplia-lo. Pontua positivamente as mudanças de visão
e de abordagem nas disciplinas de graduação ou pós-graduação,
decorrentes deste exercício. A integração construída permite não
deixar de lado as observações sobre um dado tema, que seriam
pontudas por uma ausente e reconhecer, em qualquer etapa, como
retomar ou encaixar modificações, sem perder o direcionamento e
o entendimento. Se recente da não fixação dos dois membros pon-
tuais e se preocupa em como sistematizar e repassar a experiência,
este pode ser um início.

3. INTERDISCIPLINARIDADE EM CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Este componente curricular é oferecido no Profciamb, em to-


dos os polos. Apresenta similaridades com TemT: é o primeiro
ofertado, tem 45h de duração, é modular e condensado, geralmen-
te em três encontros quinzenais de 15h, realizados entre sexta e
sábado. Com dois anos de início, ainda se encontra em processo
de construção. A ementa foi elaborada em um ambiente e pro-
cesso interdisciplinar com apoio de, pelo menos, 18 mãos, sendo
revista e reorganizada por 3 vezes, em Encontros Nacionais da
Rede, entre 2016-18.
O Profciamb se declara interdisciplinar, compreendendo que en-
sinar Ciências Ambientais ou praticar seu ensino, exige visão mais
complexa e integrada, envolvendo as dinâmicas da Terra e suas re-
lações com a(s) sociedade(s). Assim, o componente Interdisciplina-
ridade tem a tarefa de apresentar os diferentes aspectos conceitu-
ais, favorecendo o debate sobre significados e evolução do conceito,
praticando processos, buscando criar lastros e autonomia, ou dis-
cuti-las, para que cada mestrando desenvolva seu trabalho a luz
desta abordagem.
46 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Transversalmente, dar novos passos, discutir saberes e sabores


dos territórios de atuação, a importância do seu reconhecimento e
do encontro com a Universidade, desconstruindo a exclusividade
do saber acadêmico. Assim, dar passos em direção a transdiscipli-
naridade e a outros acolhimentos, amplificando os laços e a impor-
tância da Universidade junto as comunidades, sejam escolares ou
não, em processos de retroalimentação e cumplicidade de saberes.

igura 1 – Momentos interdisciplinares. Sentido horário - Palestra Sertões, Debate na sala de aula, a sala de aula
vai para o campo (Serrano), Momento de apresentação.
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 47

Em Feira, na UEFS-PGM, onde está alocado o Polo/Ba, este com-


ponente está no seu segundo ano de oferecimento, vem sendo mo-
dificado, e construído. Tem como base docente a mesma Geologia
e Biologia da experiência TemT, acrescida das Ciências Sociais, que
se agrega, em forma estável, neste segundo momento, já que na pri-
meira foi trabalhada como uma atividade pontual. É uma oportu-
nidade de sistematização e transmissão das lições aprendidas tan-
to internamente (MCTA) quanto externamente (Polos Profciamb).
Neste caso, a ementa proposta é:

Fundamentos teóricos filosóficos, metodológicos da inter-


disciplinaridade. Abordagens interdisciplinares na comple-
xidade do mundo contemporâneo. Teoria da complexidade
em conexão com a produção do conhecimento. Prática in-
terdisciplinar na educação básica, em espaços formais e não
formais, seus pressupostos e desafios no cotidiano escolar.
(consulta em 20_11_201, as 02:47h, http://www.profciamb.
eesc.usp.br/wp-content/uploads/2017/01/Ementas-PPG_
PROFCIAMB.pdf)

O programa desenvolvido se baseia localmente na experiência


de TemT, ciente de que haverá um novo tempo de construção. Bus-
cou-se manter o compartilhamento nas decisões e confecção de
programas e a ação conjunta no ensinar. Nas suas duas versões o
Programa foi distribuído, conforme tabela 1, adiante.
Cada atividade, ou coleção delas, foi pensada para atender uma
determinada parte da ementa, a luz das experiências anteriores e
debates, seja com o Grupo de Interdisciplinaridade em Ciências Am-
bientais do Profciamb, composto por membros de todos os polos,
seja com TemT e a experiência do PPGM, relatada anteriormente, ou
ainda a avaliação realizada pela primeira turma e suas sugestões,
como o caso dos textos teóricos, adiante descritos. Acompanhando
cada momento pela Tabela 1, temos:
48 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Tabela 1 – Programa/Atividades das duas primeiras turmas Profciamb – polo UEFS

Ano 2017 (outubro - novembro) Ano 2018*(novembro-janeiro)


Feira de Santana Lençóis – Feira de Santana
Aulas Desenvolvimento Aulas
Desenvolvimento
3) Vivências : 3a,3b
1. Conhecendo-se
4) Exercícios: 4b
4) Exercícios:
3) Vivências:3c (Fig.1)
4a.Tempestade palavras chaves – disciplinaridade,
4) Exercício: 4a, 4d
1° (15h)

1°(20h)
multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e trans-
5) Palestra:
disciplinaridade
5c. Sertoes transformados (Fig.1)
4b. Salada de Frutas
Quem sou eu? (Fig.1)
4c. Imagens e esculturas
6) Cine Debate:
4d. OLM (Cseko, L.C, 1970)
6a. Jardins de Plástico
2.Leitura de Textos básicos
4a. Tempestade palavras chaves – Meio Ambiente, 7) Apresentações e Avaliações:
Água, Ensino, Produto 7a. Textos básicos,
2°(15h)

2°(15h)

7) Apresentações e Avaliações: 4a. Tempestade e Discussão:


7b.Minha proposta e a interdisciplinaridade Meio Ambiente, Água, Ensino e Produto
6) Cine - Debate:
Chica, Kokumo, Duas Meninas
3) Vivências:
3a. A cidade fala
3b.Ancestralidade/Pedagogia Griô
3c.Trilha do Garimpo 7) Apresentação e Avaliação: 7c
3°(15h)

1°(10)

1A. Palestra: Historia, saberes e sabores - Lençóis – Ba Fechamento


Cine debate Jardim de Plástico 7d.Entrega Memorial (posterior)
3. Semi-Arido e Comunicação(UNEB) e poder da Mídia
7) Apresentação e Avaliação:
7c.Proposta Interdisciplinar apresentação em Grupo
* Em função do excesso de feriados e Eleições no Brasil

1. Conhecendo-se (2017) e Quem sou eu? (2018), são atividades


que envolvem discentes e docentes apresentarem-se uns aos
outros, formalmente e falarem um pouco de suas experiências,
tanto como profissionais, quanto como pessoas. Os docentes,
geralmente o fazem, logo no início do componente.

2. Leitura de Textos Básicos - Os textos básicos para leitura, na


primeira turma, foram aqueles do Edital de Seleção do Mes-
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 49

trado, sendo o principal Interdisciplinaridade em Ciências


Ambientais, de Philip Jr. et all (2000), como se pode ver na
Tabela 1, esta etapa, não é citada.

A avaliação da turma 2017 apresentou como ponto a ser adequado,


a indicação de textos teóricos, independentes do Edital. Para a segunda
turma, 2018, buscando atender a tal avaliação, manteve-se esta refe-
rência como leitura obrigatória, transformada em seminário de apre-
sentação oral pelos mestrando/as, o que reforça sua obrigatoriedade.
Além disto, preparou-se um momento de discussão de quatro
textos básicos, indicados por cada docente, a saber: Pedagogia do
Oprimido (FREIRE, 1987); Colonialidade do Poder, Eurocentrismo
e America Latina (QUIJANO, 2005); Complexidade e Transdiscipli-
naridade (SOMMERMAN, 2011) e Pedagogia do Território e Juven-
tudes do Campo (LEÃO et al, s/data). Estas leituras buscam supor-
tar, conforme ementa, desde os fundamentos teóricos, filosóficos e
metodológicos, da interdisciplinaridade, até a Teoria da complexi-
dade e suas conexões com a produção do conhecimento, favorecen-
do o aprofundamento conceitual.

1. Vivências – diferentes experiências extra-classe ou de expan-


são da sala de aula estão vinculadas a compreensão de terri-
tório, outros saberes, modificações no ambiente que molda
e é moldado pelo homem. Objetiva tornar prático, o conceito
de complexidade, inter e transdisciplinaridade. Trazer refle-
xões sobre: disciplinaridade – multi – inter - transdiciplinari-
dade nas relações homem-natureza, o produto do mestrado,
o sentido de ensinar, o conceito de ambiente e suas relações
com a cultura e o território.

Como propõe a ementa: Prática interdisciplinar na educação bá-


sica, em espaços formais e não formais, seus pressupostos e desa-
50 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

fios no cotidiano escolar. As vivências, em sua grande parte foram


realizadas na cidade de Lençõis-Bahia, e no Campus Avançado da
Chapada Diamantina – CACD e foram compostas por:
a. A cidade fala – realizada por um estudioso da cultura da
Chapada Diamantina, apresentando a cidade e sua história,
os marcos urbanos e arquitetônicos, a economia que a su-
portou e hoje, a suporta. Em 2017, este processo teve dois
tempos, uma palestra inicial e uma caminhada. Em 2018, o
responsável por este momento, tornou-se aluno do curso, e
recepcionou os colegas, sendo a palestra concomitante a ca-
minhada. Traz o respeito aos saberes acumulados pelos pró-
prio mestrandos e suas experiências, bem como a lógica da
pedagogia do território, referência de discussão, nos texto.
b. Ancestralidade/Pedagogia Griô – o Espaço Pedagógico e
ponto Cultural Grãos de Luz –Griô, trabalha com jovens adul-
tos e adolescentes na Chapada Diamantina – Lençóis e com
formação de professores, destacando um processo pedagógi-
co próprio, formado por uma multiplicidade de outras peda-
gogias, utilizadas quando necessário, mas embasada em al-
guns passos iniciais, na forma de acolher todos os visitantes,
que interfere diretamente no fazer e a caracteriza:
i. O receber, com alegria, cantos ancestrais indígenas e de
comunidades chapadeiras
ii. O acolher, com o corpo e a alma, usando o Toré amerín-
dio ancestral e a ciranda pernambucana.
iii. A Benção, o reverenciar, conhecer e conhecer-se, apre-
sentar-se, compartilhando da vida e da ancestralidade,
das histórias de aprendizado oral que cada ser guarda,
oferecendo ao outro a possibilidade de exercer o seu pa-
pel no mundo, na roda da maraca. O se colocar no centro,
ocupar o mundo e os espaços. Perguntas e esclarecimen-
tos sobre o Griô, enceram o momento.
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 51

iv. A despedida, o(s) abraço(s) coletivo e individuais e a sa-


ída do salão ritual.

Em 2017, fomos conduzidos a esta etapa pela proposta de uma


docente. Em 2018, aquele que conduziu este momento, como na
vivencia anterior, tornou-se discente. Acolheu os colegas, favore-
cendo conexões que fortalecem o grupo e as relações ente a UEFS,
o Profciamb e o Griô.
c. Trilha do Garimpo – Salão de Areias – Serrano - Tocas
(homem – paisagem) – A Chapada Diamantina, além da
história da mineração é reconhecida como um destino do
turismo ecológico de aventuras. Estar aqui é ter que re-
alizar uma caminhada por algum destes locais e banhar-
-se na energia da água que é, também, tema desta turma.
Reconhecer na caminhada pelas trilhas do garimpo, a
identidade e a ancestralidade, que gerações passadas en-
tregaram a nossa geração, faz unirem-se história e natu-
reza, gerando cultura e identidade. A paisagem moldada
e moldando o homem.

Para cumprir tal vivência, é feita uma caminhada entorno do


ponto de origem da cidade (Serrano) que é um dos seus melhores
espaços de banho. Neste trecho destacam-se: as valas de adução
ocultas, as pontes entre blocos, os espaços esvaziados pelo garim-
po e hoje apresentados como espaços de lazer, diálogo (salão de
areias), e de interdisciplinaridade. O banho revigora e apesenta a
energia da terra e da água, outra forma de saber (Figura 3).
Exercícios – Realizados em ambientes fechados, seja sala de aula
ou seus arredores, tem o objetivo similar as vivências: pensar concei-
tos. Pode ter uma concepção prática, caso da Salada de Frutas ou uma
face reflexiva, caso da OML, mas funcionam de forma lúdica, meio
como jogos, sem necessariamente envolver uma vivência externa.
52 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

a. Tempestade palavras chaves – sugerido pelo Polo do Ama-


zonas, durante o segundo encontro de discussão de ementas,
propõe um exercício de associação de palavras chaves a um
conceito. Na sequência é proposta uma discussão, que busca
a redução das palavras propostas, a ideias principais que, au-
xiliarão a compor o conceito da turma.

Em 2017, foi a primeira atividade realizada, envolvendo as pala-


vras: disciplinar, multidisciplinar, interdisciplinar, transdisciplinar,
ambiente, água, ensino e produto, pertinentes as duas turmas. Em
2018, foi oportunizada no início, após as vivências, e alguns exercí-
cios que tinham a função de despertar proposições, característica
informada, sendo o exercício dividido em duas partes, uma com as
x-disciplinaridades (tabela 2), primeiro momento, outra envolvendo:
ambiente, água, ensino e produto, discutidos no segundo encontro.

Tabela 2 – Palavras –chaves, Turma 2018


Definições DISCIPLINAR MULTI INTER TRANS
Autônomo 2 0 0 0
Compartilhamento 0 2 1 0
Conjunto 0 1 0 0
Contextualização 0 0 1 1
Cooperação 0 5 0 0
Correlação 0 1 1 0
Diversidade 0 3 0 1
Elemento organizador 0 0 0 1
Fragmentação 8 0 0 0
Holístico 0 0 1 6
Identidade 0 0 0 3
Integração 0 1 8 2
Interação 0 2 7 1
Isolamento 8 0 0 0
Origem 1 0 0 0
Pluralidade 0 4 0 1
Simultaneidade 0 1 0 0
Transposição 0 0 0 2
Troca 0 0 0 1
Vivência 0 0 0 1
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 53

Foi agregada a discussão, em 2018, analises das palavras cha-


ves, através de estatística com principais componentes e analise de
cluster. Os resultados apoiaram a turma na construção dos concei-
tos. (Figuras 2 e 3).
Observa-se na Figura 2, que a disciplinaridade, conduzida pela
palavra fragmentação, encontra-se isolada das demais no quarto
quadrante, enquanto as demais estão juntas pelas palavras: integra-
ção e interação (tabela 2). Cada vez mais concentradas e próximas,
a multidisciplinaridade é menos similar, as palavras contextualiza-
ção e holístico (tabela 2), lhe faltam, estando a inter e transdisci-
plinaridade mais próximas, apesar de esta última estar associada:
transposição, vivência e troca, de forma exclusiva. O mesmo padrão
é apresentado na análise de Cluster, na figura 3.

Figura 2 – Analise de Principais componentes, com palavras chaves para construção do conceito.
54 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Figura 3 – Análise de Cluster. O isolamento da disciplinaridade, separação da multi, e ligação entre inter e trans,
repete o padrão da Figura 1.

b. Salada de Frutas – como o anterior, sugerido no segundo en-


contro pela colega do Polo Pernambuco. Foi aplicado para as
duas turmas, com excelente aceitação e gerando discussões
profícuas. Favorece o trabalho conjunto e, ao transformarem-
-se em lanches, traz ludicidade, ligada ao fazer e ao comer.
Os discentes, em grupos, são desafiados a, usando frutas di-
ferentes, fazer um lanche que expresse um dos conceitos da
disciplinaridade a transdisciplinaridade, sendo obrigatória
explicar sua concepção.

c. Imagens e esculturas – tem o mesmo objetivo da experiên-


cia anterior. Discute, na arte, os conceitos de disciplinaridade,
multi, inter e trandisciplinaridade. Apresentando ao debate
diversas formas de representação visual: desenho, pintura,
escultura e cinema. Destaca o simbolismo vivencial e as re-
lações com o objeto ou situação representada. Tem diálogos
com o Cine Debate.
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 55

d. OLM – Oficina de Linguagem Musical é uma proposta peda-


gógica de popularização e complexificação integradas, que
busca a construção de público, ouvintes ou futuros músi-
cos onde, sonoridades e memórias tenham espaço. Propõe
também a desmistificação dos processos de redação e cons-
trução musical. Criada por Csekö, L.C (1970), ela é aplica-
da tanto para crianças como para adultos, com quaisquer
instrumentos ou mesmo sem instrumentos, para indicar
que, qualquer pessoa, com alguma boa vontade, pode chegar
a interdisciplinaridade, como alcançou a possibilidade de
escrever uma partitura, interpretar e reger.

Os discentes são convidados e conduzidos a realizar, uma or-


questra de percussão e ritmo, utilizando o espaço, o corpo. Como
nas vivências, há aqui a tentativa da desconstrução e quebra de
preconceitos, já que o senso comum considera a Música Erudita,
arte de poucos, descolada do popular.
1. Palestras – trazendo temas das vivências, ou discussões de
suporte aos conceitos importantes, seja ao Profciamb, seja
a UEFS, cumpre a função de fomentar o aprofundamento. Já
ocorreram 3 temas: a. História, saberes e sabores - Lençóis
– Ba, b. Semiárido e Comunicação(UNEB) e poder da Mídia
(2017), c. Transformações do Sertão ((Figura 3 - 2018), d.
História Ambiental da Chapada Diamantina.
2. Cine-Debate – com configuração similar as palestras, usam
como elemento deflagrador curtas metragens, enfrentando
quebras de paradigmas e preconceitos que, tragam ques-
tões a interdisciplinaridade em Ciências Ambientais. Até o
momento Jardins de Plástico (Araújo, D – 2013- Revelando
os Brasis III) foi elemento comum, apresentado para as duas
turmas, discutindo os choques identitários em comunidades
tradicionais. A turma 2018 teve mais tempo e discutiu tema-
56 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

ticamente: Mulher, Cor, Escravidão, por vezes na presença


dos Diretores dos curtas apresentados.
3. Apresentações e avaliações contextualizadas – objetiva,
em etapas escritas ou orais, dentro do processo de sistema-
tização do grupo e individual, configura um processo de ava-
liação contextualizado. Assim, temos apresentações orais que
refletem sobre os textos teóricos lidos e a interdisciplinaridade
no projeto de mestrado, ambas de caráter individual, e uma
atividade interdisciplinar para o meio ambiente em grupo.

Além delas, uma avaliação do desenvolvimento da disciplina, in-


terfere diretamente no planejamento da turma seguinte. Em 2017,
esta atividade ocorreu apenas no final das 45h. Já em 2018, a cada
encontro tivemos uma avaliação e, ao final, a avaliação completa,
que se repetirá após um ano. No contexto pessoal, dentro da pro-
posta de pleno envolvimento, um memorial da disciplina, propõe
ao mestrando refletir sobre seu caminho e processo no Componen-
te Curricular, sobre o que ainda será maturado. Assim completa o
processo avaliativo, com entrega após encerramento.

4. A TÍTULO DE CONCLUSÃO – CONTINUANDO AS EXPERIÊNCIAS

Como se pode perceber, houveram diversas modificações, entre


2017-18, para o componente Interdisciplinaridade, que repetem o
ciclo de evolução de TemT. Entre elas chama a atenção à inversão
das vivências e exercícios, além da apresentação entre discentes.
O objetivo didático é aproximar, desfazer resistências, quebrar
barreiras e conceitos anteriores, para favorecer a reconstrução, a
partir do sentido, percebido, sem utilização de textos preliminares.
Esta etapa, no primeiro ano, foi realizada de forma distribuída, mas
a parte mais intensa se fez no final. A reestruturação se deu por per-
Marjorie Csekö Nolasco, William Moura Aguiar e outros 57

ceber, a partir da avaliação do primeiro grupo que, a uma descons-


trução deve se seguir uma construção acompanhada. A avaliação de
2018 parece reforçar este caminho.
Com cantos, danças, percepções sensoriais, bem como rituais de par-
tilha, o Grãos é um momento de encantar, de abrir espaços, pela emoção,
no aprender, vivenciar ancestralidade e recuperar referências. Pensar
que estes saberes, vistos como pessoais e privados, podem fazer parte
do ensino, da compreensão do ambiente e do produto a ser produzido.
Para os discentes, as vivências e exercícios propostos, são momentos es-
peciais, desarmando espíritos, confundindo e preparando novos plan-
tios, tão necessários a interdisciplinaridade. As vivências, todos avaliam
como reveladoras e modificadoras, fortes e positivas, apesar de ainda
estar em andamento as adequações de tempo, pois realizadas em um
dia, tem se mostrado cansativas e interferem no andamento posterior,
sendo necessário, em especial, rever sua distribuição.
Aqui tem muito mais viver o processo, que ter lido teorias. A
disciplinaridade é necessária e junto com a multidisciplinaridade
favorece a compreensão de recortes específicos de conhecimen-
to, retroalimentando o sistema. A interdisciplinaridade é uma
construção coletiva, se vive, este parece ser o maior dos desafios,
quebrar certezas, abrir mentes. Dificilmente se teoriza, apesar de
haverem teorias. Uma pessoa pode ser interdisciplinar, mas só
fará interdisciplinaridade se houver coletivo (mesmo que seja só
orientador e o orientando).
O conhecer acadêmico- científico, os conhecimentos tradicio-
nais, as diversas culturas milenares, não respondem exclusivamen-
te ao padrão ditado pelo positivismo e pelas religiões baseadas em
um Deus Uno, geradoras da chamada Universidade (Cristãos e Mul-
çumanos, em especial) que caracterizam a educação brasileira, des-
conhecendo a história multicultural da formação da sua sociedade.
A transdisciplinaridade fala do abrir-se o(s) universo(s) do(s) co-
nhecimento(s), ao encontro.
58 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

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CAPÍTULO 3 FRANCIELLY VIEIRA FRAGA
ROSANA DE OLIVEIRA BATISTA

A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS


ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

1. INICIANDO O PENSAR SOBRE METODOLOGIAS ATIVAS

Vivemos um momento diferenciado do ponto de vista do ensinar


e aprender e, nessa direção, aprendemos de várias formas, seja em
redes, sozinhos, por intercâmbios ou em grupos. Esse movimento
nos garante a prática da liberdade de tempo e espaço, num pro-
cesso de aprendizagem que se configura como novo cenário edu-
cacional, em que diversas situações de aprendizagem são possíveis
(MORAN, 2014).
A abrangência das situações, nessa relação espaço-tempo, de-
signa a necessidade do ensino aprendizagem dissociada da sala de
aula metódica e bancaria, trazendo inovações voltadas ao desen-
volvimento da autonomia do aluno, do trabalho em equipe e princi-
palmente da interdisciplinaridade. Conforme Freire (2011a, p.25),
“não há docência sem discência”. Mas, o fato é que por séculos, o
modelo tradicional de educação teve como foco o ensino com o po-
der do professor sobre o estudante. E, a desmistificação dessa abor-
62 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

dagem exige mudanças no processo de formação docente e discen-


te. Dessa forma, o cenário vai ser propício para ampliação de novos
modelos e formas na relação ensino-aprendizagem.
Ainda para Freire (2011a), as metodologias ativas de ensino,
nesse contexto, foram vistas como uma opção por ter como alicer-
ce a autonomia do estudante e com o objetivo de formar sujeitos
sociais com competências éticas, políticas, técnicas e dotados de
conhecimento, raciocínio, crítica, responsabilidade e sensibilidade
para as questões da vida e da sociedade, capacitando-os para inter-
virem em contextos de incertezas.
Nessa direção, nas práticas de ensino baseadas nas metodolo-
gias ativas os discentes implicam ativamente no mundo real. Estes,
ao vivenciarem as tensões, passam a reconhecer as diferenças de
atuações e demandas de produção do cuidado no cotidiano das re-
des; desenvolvendo assim a capacidade de modificar os impasses,
como a contaminação da água e as suas relações com a saúde huma-
na. Assim, tornam-se possíveis um processo de reflexões e prática
cotidiana do processo de aprendizagem sob a ótica interdisciplinar.
Frente ao ensino das ciências ambientais, as metodologias ati-
vas tornam-se um forte instrumento de aplicação interdisciplinar
das temáticas, visto que proporciona familiaridade dos alunos com
a temática, estimulando o processo de pertencimento. Littledyke
(2008) considera que é essencial que, na relação entre o homem e
o ambiente, haja um grande envolvimento cognitivo e afetivo, para
promover a motivação para agir de forma responsável e sustentá-
vel. O autor, supracitado, realça a importância da relação entre os
conceitos e a experiência, na medida em que, muitas vezes, se veri-
fica uma alienação e confusão porque os conceitos não são explora-
dos e observados de forma prática, num contexto real, fazendo com
que se dissemine uma sensação de irrelevância perante os mesmos.
A metodologia da Aprendizagem Ativa no Ensino das Ciências
Ambientais, foi identificada como metodologia central para os pro-
Francielly Vieira Fraga; Rosana de Oliveira Batista 63

cessos de aprendizagem na Educação Ambiental EA, sendo os pro-


blemas reais do quotidiano o conteúdo substancial, fazendo com
que haja uma contextualização não só ambiental, mas também cul-
tural, social e económica. É, desta forma, que o conceito de Educa-
ção Ambiental se interliga com o conceito de Educação para o De-
senvolvimento Sustentável (DILLON; STEVESSON, 2010).
Nessa conjuntura, o presente artigo objetiva apresentar a aplica-
ção das metodologias ativas no ensino das ciências ambientais com
base nos principais conceitos, ferramentas e métodos e a aplicação
das mesmas. Inicialmente é apresentada a fundamentação teórica
da citada metodologia, seguida pelo detalhamento de métodos e
materiais aplicados na implementação da mesma. Em seguida, são
apresentados relatos de experiência frente a temática da pesquisa
e discutidos a luz da metodologia ativa a partir da implantação e
implementação de uma liga acadêmica.

2. OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DO MÉTODO ATIVO


Entendem-se como método ativo as formas de desenvolver o
processo do aprender que os professores utilizam na busca de con-
duzir a formação crítica de futuros profissionais nas mais diversas
áreas. A utilização dessas metodologias pode favorecer a autonomia
do educando, despertando a curiosidade, estimulando tomadas de
decisões individuais e coletivas, advindos das atividades essenciais
da prática social e em contextos do estudante. (BORGES, 2014).
Historicamente, o método ativo não constitui uma concepção
recente, porém somente há pouco tempo foi consolidada. O pri-
meiro indício dos métodos ativos encontra-se na obra Emílio de
Jean Jacques Rousseau (1712-1778), tido como o primeiro tra-
tado sobre filosofia e educação do mundo ocidental e na qual a
experiência assume destaque em detrimento da teoria (MARTINS
Et. al, 2017).
64 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Os principais pensadores dessa corrente teórica são Jean Pia-


get, que desenvolveu um olhar sobre as etapas do desenvolvimen-
to cognitivo, e Lev Vygotsky, que concebeu uma perspectiva mais
social ao interativíssimo. Na ótica freiriana (2011), o método ativo
incorpora às atitudes primordiais a aprendizagem nos atos de inda-
gar, de duvidar, de experimentar hipóteses de ação, de programar e
de não apenas seguir os programas a elas, mais do que propostos,
impostos.
Nessa perspectiva é que se situa as metodologias ativas como
uma possibilidade de ativar o aprendizado dos estudantes, colo-
cando-os no centro do processo, em contraponto à posição de ex-
pectador, conforme descrito anteriormente. Ao contrário do mé-
todo tradicional, que primeiro apresenta a teoria e dela parte, o
método ativo busca a prática e dela parte para a teoria (ABREU,
2009). Nesse percurso, há uma “migração do ‘ ensinar ’ para o ‘
aprender’, o desvio do foco do docente para o aluno, que assume
a corresponsabilidade pelo seu aprendizado” (SOUZA; IGLESIAS;
PAZIN-FILHO, 2014, p. 285).
Inicialmente pensada para os cursos da saúde, as metodologias
ativas abrangiam eixos primários e adentraram todos os níveis edu-
cacionais. No ensino superior, possibilitam o dialogo interdisciplinar
entre áreas até então consideradas distintas e, frente as ciências am-
bientais, o método ativo permite, através de suas bases e processos
de aplicação, tem como promoção o eixo interdisciplinar na análise
dos fenômenos ambientais, bem como, na formação dos profissio-
nais de todas as áreas pautadas na transversalidade das ciências am-
bientais, excluindo-se processos dicotômicos e dissociados entre as
especialidades e disciplinas nas salas de aula e fora delas.
Destarte, para o desenvolvimento dessa metodologia é neces-
sário seguir alguns passos: observação da realidade (levantamen-
to do problema); pontos chaves; teorização; hipóteses de solução
e a aplicação à realidade (prática). Bordenave e Pereira (1989)
Francielly Vieira Fraga; Rosana de Oliveira Batista 65

afirmam que, o segredo do bom ensino e o entusiasmo pessoal do


professor, que vem de seu amor à Ciência e aos alunos; este e deve
ser canalizado mediante planejamento e metodologia adequados,
visando, sobretudo incentivar o entusiasmo dos alunos, para reali-
zarem por iniciativa própria, nos esforços intelectuais e morais que
a aprendizagem exige.
A partir desses pilares as metodologias ativas, evidenciam-se
nas diversas possibilidades de técnicas ativas de ensino-aprendiza-
gem, aplicáveis ao ensino das ciências ambientais no formato inter-
disciplinar. Assim se destacam a prática da aprendizagem baseada
em problemas (PBL) e a aprendizagem Baseada em Equipes (ABE)
ou Team-Based Learning (TBL).
A metodologia do PBL é processual. Os alunos, em grupos de cin-
co a oito começam a aprender abordando simulações do problema
não estruturado. O conteúdo e as habilidades a serem aprendidas
são organizados em torno de problemas e a construção do conheci-
mento é estimulada pelo problema e aplicada de volta para o proble-
ma. Esta é centrada no aluno autodirigindo os processos do método
ativo, assumem a responsabilidade individual e colaborativa, a fim
de gerar questões e processos de aprendizagem pela auto-avaliação
e/ou por pares com seus próprios materiais de aprendizagem.
Nesse segmento os estudantes coletam informações e dividem
seu aprendizado com o grupo, auto-reflexivo, de tal forma que mo-
nitoram sua compreensão e aprendem a ajustar as estratégias para
a aprendizagem; além disso, professores apoiam e modelam os pro-
cessos de raciocínio, facilitando os processos grupais e as dinâmi-
cas interpessoais, sondando o conhecimento dos alunos e nunca in-
serem conteúdo ou fornecem respostas diretas às perguntas e, por
fim, os estudantes resumem e integram seus aprendizados. (HUNG
et al., 2008).
A Aprendizagem Baseada em Equipes (ABE) ou Team-Based Le-
arning (TBL), possibilita a aplicação do método com turmas maio-
66 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

res como equipes de 5 a 7 estudantes, que trabalharão no mesmo


espaço físico (sala de aula). Pode ser usado para grupos com mais
de 100 estudantes e turmas menores, com até 25 alunos, alinhando
os diálogos interdisciplinares sob uma ótica maior.
Nesse direcionamento, a aprendizagem baseada em projetos
seleciona problemas mal estruturados e interdisciplinares e o pro-
fessor orienta o processo de aprendizagem, conduzindo um inter-
rogatório completo na conclusão da experiência de aprendizagem.
Nas sessões de aula, os alunos e o instrutor discutem os detalhes
do conteúdo, envolvendo-se em conversas significativas semelhan-
te ao que seria feito na vida profissional (ROCHA; LEMOS, 2014),
em quatro fases distintas: intenção, planejamento, execução e jul-
gamento. Sempre atrelados a realidade.
Em suma, as metodologias ativas aplicadas ao ensino aprendiza-
gem das ciências ambientais, de forma isolada ou em uma das téc-
nicas apresentadas, compreendem o estudo de fenômenos reais no
formato de casos que derivam: os Estudos Preliminares: - Abertu-
ra do caso: mapa conceitual; problematização; perguntas; objetivos
e hipóteses. - Socialização da produção por um membro de cada
grupo (cada grupo formado por coordenador, relator e oradores).
Teorização: - Socialização das leituras teóricas por um orador do
grupo, com sistematização na lousa (mapa ou tópicos pelo docen-
te), como parte do debate. - Produção individual do que foi sistema-
tizado e discutido com ênfase para resolução do caso.
Ao final desse momento, o docente intervém para “aparar as
arestas” teóricas para a resolução do caso (exposição dialogada) e
indica a leitura prévia para o próximo encontro. Teorização e So-
lução do Caso: - Apresentação pelos grupos da solução desenvol-
vida (tomada de posição) de cada um para o caso, com argumentos
teóricos. Assim, entende-se que esse tipo de procedimento inicia
pela conjuntura bibliográfica atual acerca das metodologias ativas,
bem como facilita a ligação do contexto com as ciências ambientais,
Francielly Vieira Fraga; Rosana de Oliveira Batista 67

seu ensino, culminando no relato de experiência em nível superior,


acerca da utilização do método na abordagem interdisciplinar.

3. RELATO DE EXPERIÊNCIA COM AS LIGAS ACADÊMICAS E AS METO-


DOLOGIAS ATIVAS

Segundo DILLON apud LOPES (2015), no uso da metodologia de


aprendizagem ativa, a qual permite o envolvimento e participação
ativa dos alunos, para a Educação Ambiental é necessário que haja
uma ação participativa e é importante que os programas incluam
uma aprendizagem orientada para a ação, que permita aos alunos
aplicar os seus conhecimentos, para melhorar os problemas relati-
vos a questões ambientais presentes no seu cotidiano. Nesse con-
texto, é também importante que a aprendizagem ativa sobre ques-
tões ambientais, inclua atividades fora da sala de aula, na natureza,
como uma ferramenta de recolha de evidências em contexto real,
natural relativamente às hipóteses colocadas.
Diante disso, a aplicação do método ativo de forma hibrida e in-
terligada entre todas as suas derivações mostra-se funcional e ino-
vador no ensino e aprendizagem das ciências ambientais, frente à
necessidade interdisciplinar que a área exige na conjuntura atual.
A partir desse pressuposto evidencia-se aqui a experiência da utili-
zação da metodologia ativa para discussão do fenômeno: “Contami-
nação da água e câncer, a partir da ótica interdisciplinar” utilizando
como sujeitos acadêmicos do ensino superior participantes de uma
liga acadêmica interdisciplinar em saúde e ambiente.
De modo geral, as Ligas acadêmicas objetivam aproximar o es-
tudante da prática de atenção a comunidade, alcançar a indissocia-
bilidade do tripé da formação, oferecer diversidade de cenários,
formar em uma visão ampla, aprender a fazer e aprender a cuidar
do outro na dimensão especifica e interdisciplinar (SILVA, 2015). O
68 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

tripé educacional mostrou-se fundamentado ao longo do tempo, na


experiência de criação e atuação das ligas acadêmicas. Inicialmente
pautadas nos cursos de saúde e hoje expandidas ainda que lenta-
mente para as abordagens interdisciplinares.
As Ligas incorporam e buscam a prática do princípio da indis-
sociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; assumem um
caráter extracurricular e complementar; e suas ações são de na-
tureza teórica e prática. As atividades teóricas são desenvolvidas
por meio de aulas, seminários, análise e discussão de textos, apre-
sentações de casos clínicos e realização de eventos científicos. As
atividades práticas são desenvolvidas em ambulatórios, hospi-
tais, instituições filantrópicas filiadas e unidades básicas de saúde
(MONTEIRO, 2008).
O uso das metodologias ativas associada a uma Liga Acadêmica
Interdisciplinar que atua frente às ciências ambientais promove a
amplitude do diálogo entre especialidades que se unem na reso-
lutividade de problemáticas ambientais únicas, porém sob a ótica
comum e diversificada. A primeira etapa da metodologia ativa,
pensada aqui, como procedimento na produção de diagnóstico de
câncer via contaminação de água por agroquímicos, partirá de um
caso clínico pré-elaborado pelo pesquisador, a partir de sua visita
ao campo de pesquisa no município de Paripiranga/BA, envolven-
do a temática e as palavras chave: interdisciplinaridade, ambiente
sociedade, educação e ciências ambientais.
A ação da Metodologia Ativa partiu da observação inicial não
participante a áreas do município de Paripiranga/BA. Foram uti-
lizadas com uso de amostragem intencional, pessoas que possuem
recursos hídricos naturais utilizados diretamente pela população,
bem como o banco de dados do DATA/SUS para conferência epi-
demiológica. A partir disso, foi elaborado um caso clínico acerca
da observação para formação com os acadêmicos participantes da
Liga em Saúde e Ambiente, do Centro Universitário AGES-UniAGES,
Francielly Vieira Fraga; Rosana de Oliveira Batista 69

no município de Paripiranga/BA. No semiárido brasileiro são es-


cassas as ações que buscam orientar e esclarecer a população so-
bre as problemáticas ambientais locais (TABARELLI; SILVA, 2003).
Uma alternativa simples para esse problema pode ser a associação
entre projetos de pesquisa científica e de extensão universitária, vi-
sando o desenvolvimento de programas de EA.
Na mesma vertente, no UniAGES, a Liga em Saúde Ambiente, foi
selecionada através de edital interdisciplinar, aberto aos vinte e cin-
co colegiados que formam a IES, contará com 70 (setenta) alunos,
em uma amostragem de 10% dos acadêmicos matriculados hoje na
Instituição e que são oriundos de 64 municípios do interior dos es-
tados da Bahia, Sergipe e Alagoas. Na utilização de caso clínico, se
faz possível, enxergar a visão do aluno de forma interdisciplinar e
integrada, inicialmente usufruindo do seu conhecimento prévio e
valorizando os saberes até então construídos em formato de levan-
tamento de problemas, objetivos, perguntas e hipóteses de solução,
para partir posteriormente a um embasamento teórico científico
que o fará formular uma tomada de posição. Assim, ao assimilar os
conhecimentos, o educando assimila também às metodologias e as
visões do mundo que o cerceia. O conteúdo do conhecimento, o mé-
todo e a visão do mundo são elementos didaticamente separáveis,
porém compõem um todo orgânico e inseparável do ponto de vista
real (FAZENDA, 2010).
A formulação de resultados frente à ação proposta iniciou-se
com o lançamento de Edital para seleção dos 70 (setenta) acadêmi-
cos que pudesse integrar uma Liga Interdisciplinar em Saúde e Am-
biente e, posteriormente, construir um caso clinico para utilização
na entrevista e posterior curso de formação para os agora ligantes.
O processo seletivo contou com 122 (cento e vinte e dois) inscritos
que foram classificados, a partir do histórico acadêmico e do de-
sempenho em entrevista. A partir dessa ação, ocorreu a seleção de
70(setenta) ligantes para participação efetiva durante 24 meses, a
70 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

partir de encontros mensais. Foi ministrado um curso de formação


foi mediada em dois momentos distintos, devido à adaptação e a
disponibilidade de tempo inicial dos alunos, bem como, ao calendá-
rio institucional.
Inicialmente a proposta da Liga Acadêmica Interdisciplinar em
Saúde e Ambiente foi apresentada na forma de exposição de caso
clinico. Assim, seguindo as etapas do método ativo, os ligantes
foram subdivididos em grupos de seis pessoas, respeitando-se os
princípios de interdisciplinaridade, para a formulação de conheci-
mento mediante objetivos da ação pedagógica. Estes receberam o
caso clinico para cumprimento da primeira etapa do método, a lei-
tura. Nesse sentido, Ostermann e Cavalcanti (2011, p. 11), reiteram
um conceito básico em Vygotsky, ao enfatizar que “o aprendizado
humano pressupõe uma natureza social específica na medida em
que todas as funções intelectuais superiores se originam das rela-
ções entre indivíduos”.
A leitura conjunta do caso promoveu a tempestade de ideias,
bem como, os relatos de experiência frente as suas realidades, le-
vando-se em conta a proveniência dos mesmos de regiões agrícolas
e do semiárido da Bahia, Sergipe e Alagoas, além disso, ressaltaram
suas experiências e relações com a água. Nessa acepção, entende-
mos que o método ativo nos proporciona a relação diferenciada en-
sino-aprendizagem por proporcionar a troca de saberes na relação
professor-aluno, pois esse fator isolado influência na aprendizagem
ao trazer à tona em discussão aquilo que o aluno já sabe, incum-
bindo ao professor identificar isso e ensinar de acordo. (AUSUBEL
apud MOREIRA 1999).
De forma integrada foram apontados os principais conceitos
e problemas retirados do caso e bases para construção dos ma-
pas, apresentados aqui em amostragem: contaminações da água
risco de câncer, população feminina, PROFCIAMB, Liga Acadêmica
em Saúde e Ambiente, Interdisciplinaridade, metodologias ativas,
Francielly Vieira Fraga; Rosana de Oliveira Batista 71

recursos hídricos, casos clínicos, pesquisa. Após a exposição ini-


cial foram discutidos os termos desconhecidos levantados, escla-
recidos pelos próprios grupos, sendo eles: neoplasias, DATASUS
e ebook e os grupos construíram, a partir da tempestade inicial
e de seu conhecimento prévio, o mapa conceitual de conceitos e
problemas, perguntas de aprendizagem, objetivos e hipóteses de
solução.
Na perspectiva Freiriana, o método ativo incorpora às atitudes
primordiais a aprendizagem nos atos de indagar, de duvidar, de ex-
perimentar hipóteses de ação, de programar e de não apenas se-
guir os programas a elas, mais do que propostos, impostos. Nessa
dimensão, os alunos precisam ter assegurado o direito de aprender
a decidir, o que se faz decidindo, pois se as liberdades não se cons-
tituem entregues a si mesmas, mas na assunção ética de necessá-
rios limites, a assunção ética desses limites não se faz sem riscos a
serem corridos por elas e pela autoridade ou autoridades com que
dialeticamente se relacionam (FREIRE, 2011).
Posteriormente, a construção dos questionamentos, a etapa se-
guinte ocorreu com a construção dos objetivos a partir das proble-
máticas apresentadas. Quando traçados pelos alunos, os objetivos
de aprendizagem ganham significado e se tornam factíveis de se-
rem atingidos devido ao pensamento global de metas a serem rea-
lizadas. Nas palavras de Moreira (1999, p. 156),

[...] independentemente do quão potencialmente significati-


vo seja o material a ser aprendido, se a intenção do aprendiz
for simplesmente a de memorizá-lo, arbitrária e literalmen-
te, tanto o processo de aprendizagem como seu produto se-
rão mecânicos (ou automáticos). De maneira recíproca, in-
dependentemente de quão disposto para aprender estiver o
indivíduo, nem o processo nem o produto de aprendizagem
são significativos, se o material não for potencialmente sig-
nificativo.
72 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Frente à objetivação da problemática, a partir do caso clinico e


do conhecimento prévio, a construção de hipóteses de solução e
explicativas se fez essencial no processo de aprendizagem e pos-
teriormente ao debate, mediante a teorização à luz do referencial
teórico e do diagnóstico situacional grupal e em campo. Assim as
hipóteses implicarão no direcionamento das bases teóricas poste-
riores a serem construídas com os estudos em campo e discursivos
da liga e na primeira formação, os quais possibilitaram estratégias
e soluções traçadas, com o conhecimento prévio, testado e aprimo-
rado com bases reais e bibliográficas.
Portanto, observou-se que a educação não comporta mais uma
bagagem escolar baseada no volume de conteúdos e nas especifici-
dades de cada profissão, o que é pouco operacional e nem mesmo
adequado. O que se acumula no começo da vida deve ser constan-
temente atualizado e aprofundado, considerando que estamos vi-
vendo um período no qual as mudanças ocorrem com grande ve-
locidade. Além disso, foi essencial que os profissionais puderam
trabalhar de forma colaborativa compartilhando ações e conhe-
cimentos. Ressalta-se ainda que a educação, para dar resposta ao
conjunto das suas missões, deve organizar-se em torno de quatro
aprendizagens fundamentais, que serão ao longo da vida os qua-
tro pilares do conhecimento: aprender a conhecer (ou aprender a
aprender, adquirir os instrumentos de compreensão); aprender a
fazer (para poder agir sobre o meio envolvente); aprender a viver
juntos (a fim de participar e cooperar com os outros em todas as
atividades humanas); e aprender a ser (via essencial que integra as
três precedentes) (DELORS, 2000).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O uso das metodologias ativas no ensino/aprendizagem das ci-
ências ambientais possibilita a ampliação do papel do aluno, evi-
Francielly Vieira Fraga; Rosana de Oliveira Batista 73

denciando-o como centro do processo e direcionando as bases


educativas através de fenômenos, ou seja, embasando a análise
de problemáticas através do olhar interdisciplinar, de análise do
todo, sem distinção em disciplinas, exemplificando exatamente o
que acontece quando o aluno conclui a graduação e inicia a atuação
profissional.
Além disso, compreende-se que a formação interdisciplinar pro-
pícia um aparato de conhecimentos prévios e saberes que denotam
a criação de questionamentos, objetivos e hipótese possibilitados
pelo método ativo que promoverão os meios de investigação ne-
cessários para as ciências ambientais, de modo que as conclusões
alcançadas nas pesquisas possam atingir um amplo campo devido a
diversidade de denotações. A experiência aqui apresentada possibi-
lita a continuidade dos saberes e proporção de autônima de ideais e
compreensões a partir de óticas diversas buscando a melhorias na
preservação dos recursos hídricos e na diminuição consequentes
os riscos s a saúde da população.
Apesar da usualidade das metodologias ativas no ensino das
ciências ambientais comprovadas e evidenciadas tanto no relato
como na literatura, alguns empecilhos precisam ainda ser sanados
para aplicação fidedigna do método no contexto educacional atual,
principalmente as ligadas preparação dos professores/educadores,
evidenciando a importância da aprendizagem no desempenho des-
ses novos papeis, bem como, a integração do contexto sociocultural
dos alunos no processo de aprendizagem. Assim, entende-se que a
interdisciplinaridade aplicada a um projeto de extensão com base
no método ativo pode propiciar à acadêmica troca de experiências
e construção de saberes integrado que servirão de bases para hi-
póteses e ações comunas, atingindo sim os objetivos propostos e
promovendo meios para mediação de novos encontros e melhorias
da realidade local e regional.
74 A CONFLUÊNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS E AS LIGAS ACADÊMICAS NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

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CAPÍTULO 4 ADRIANA APARECIDA LAZZARINI
MARIA OLIMPIA DE OLIVEIRA REZENDE

CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE


SUSTENTÁVEL

1. INTRODUÇÃO

A escola é um local privilegiado para disseminar discussões, re-


flexões e ações democráticas relacionadas à cidadania e ao meio
ambiente. Fomentar projetos educacionais que busquem soluções
conscientes para o desenvolvimento sustentável de uma cidade faz
do âmbito escolar uma alternativa plausível para essa empreitada.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069 de 13
de julho de 1990, em seu artigo 53 reza: “A criança e o adolescente
têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua
pessoa, preparo para o exercício da cidadania [...]”. Desenvolver o
conceito de cidadania nos estudantes, tomando como parâmetro o
ECA, permitirá a compreensão de seu papel na sociedade, conhe-
cendo seus direitos e deveres contidos no documento.
As crianças e os adolescentes possuem direitos especiais em ra-
zão de sua condição. São seres que estão em pleno desenvolvimento
e necessitam de uma educação adequada e de qualidade. Formar
78 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

estudantes criativos e críticos com vistas à construção de uma so-


ciedade justa, racional e sustentável é missão da escola.
O ensino das Ciências Ambientais insere-se nesse contexto,
como ferramenta indispensável para auxiliar os estudantes a com-
preenderem os reais problemas ambientais locais, regionais e glo-
bais, os quais a sociedade contemporânea vem enfrentando nas
últimas décadas.
Levar a Educação Ambiental (EA) às escolas permite a interdis-
ciplinaridade1 e transversalidade2 entre as ciências, possibilitando
mudanças comportamentais nos estudantes na escola e em sua co-
munidade.
A legitimação da EA, expressa na Lei nº 9.795 de 27 de abril de
1999, definiu a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA),
sustentada pela Resolução nº 2 de 15 de junho de 2012, determi-
na as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental,
auxiliando os docentes no aprimoramento de suas práticas pedagó-
gicas na EA interdisciplinar e transversal.
A articulação e a aproximação entre a EA e Educação Fiscal (EF)
nos conteúdos escolares permitirá o pleno exercício da cidadania
aos estudantes. Compreender os princípios que norteiam a EF é
elementar para capacitar estudantes sobre a gestão orçamentária
pública. Conhecer as funções dos tributos3 da cidade garante a par-

1 Trata-se da importância de fazer cooperar diferentes disciplinas para vencer os limites da


fragmentação da pesquisa e, ao mesmo tempo, causar transformações recíprocas em cada
uma delas, de modo que se compreendam melhor certas realidades complexas que nos di-
zem respeito, tais como o ambiente ou a relação entre ser humano e natureza. DA SILVA,
Marta Cassaro. O ambiente: uma urgência interdisciplinar. Papirus Editora, 2005. p. 10.
2 De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais a transversalidade é a possibilidade
de se estabelecer, na prática educativa, uma relação entre aprender conhecimentos teori-
camente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real e de sua
transformação (aprender a realidade da realidade) (BRASIL, 1998, p. 30).
3 Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa ex-
primir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 79

ticipação ativa dos cidadãos na tomada de decisões que envolvem o


planejamento e o desenvolvimento da cidade, possibilitando a ges-
tão democrática de seus munícipes.
Albertina Silva Santos de Lima (2008, p. 72) define que “Educa-
ção Fiscal é o processo de acionamento da capacidade intelectual
do ser humano, para conhecer finanças públicas proporcionando-
-lhe condições de entender, analisar e refletir sobre capacitação e
aplicação de recursos públicos”.
O Programa Nacional de Educação Fiscal – PNEF (2015, p. 6)
visa “à construção de uma consciência voltada ao exercício da ci-
dadania, objetivando e propiciando a participação do cidadão no
funcionamento e aperfeiçoamento dos instrumentos de controle
social e fiscal do Estado”.
Partindo desse princípio e objetivando a sustentabilidade, a Pre-
feitura Municipal de São Carlos (PMSC) - SP concede o Incentivo
Ambiental, ou seja, Imposto Predial Territorial Urbano Verde (IPTU
Verde) aos contribuintes, com o propósito de ampliar as áreas per-
meáveis4 e a arborização da urbe.
Viabilizar o ensino das Ciências Ambientais e o conhecimento
dos Incentivos Ambientais expressos na Lei Municipal nº 13.692
de 2005, da PMSC, revelou-se peça fundamental na elaboração do
presente artigo.
A percepção dos estudantes quanto à carência de árvores e áre-
as permeáveis no espaço urbano, principalmente nas áreas perifé-
ricas, e como isso impacta no seu cotidiano, norteou a identificação
do problema.
No planejamento de áreas verdes em uma cidade, as árvores são
intrínsecas neste processo; para Herzog e Rosa (2010, p. 97):

4 No Decreto nº 264 de 30 de maio de 2008, considera-se área permeável: porção do imóvel


não impermeabilizada por qualquer tipo de pavimento, não compactada, necessariamente
recoberta por vegetação herbácea, arbustiva ou arbórea.
80 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

As árvores contribuem significativamente para prevenir ero-


são e assoreamento dos corpos d’água; promover a infiltra-
ção das águas das chuvas, reduzindo o impacto das gotas que
compactam o solo; capturar gases de efeito estufa; ser ha-
bitat para diversas espécies promovendo a biodiversidade,
mitigar efeitos de ilhas de calor.

Diante desse cenário, o projeto denominado Futuro Verde nasce,


por meio da participação democrática dos estudantes, professores, ges-
tão escolar e comunidade na prática de melhorias ambientais na escola.
O público-alvo nesta pesquisa são os estudantes do Ensino Fun-
damental II, dos sextos e sétimos anos da Escola Professor Mari-
valdo Carlos Degan, localizada na cidade de São Carlos interior do
estado de São Paulo.
O projeto Futuro Verde se ampara no instrumental pedagógi-
co incluído nos parâmetros das Ciências Ambientais, seguindo os
pressupostos da EA e EF. Pretende-se, por meio do projeto, que os
estudantes disseminem os conhecimentos adquiridos a respeito da
legislação municipal (IPTU Verde) em sala de aula, à comunidade
local e, por conseguinte, aos munícipes da cidade.
O objetivo deste artigo é analisar os Incentivos Ambientais
dispostos nos artigos 44 e 45 da Lei Municipal nº 13.692 de 25 de
novembro de 2005, da PMSC, e sua aplicação dentro do âmbito es-
colar. Como objetivo específico buscou-se despertar nos estudantes
o interesse pelo projeto, inserindo práticas ambientais e ações sus-
tentáveis nos espaços de aprendizagem.
Além disso, demonstrar como o desconhecimento da legislação
de sua própria cidade sobre temas ambientais impacta na socieda-
de e como podemos utilizá-la para diminuir a pressão ambiental
causada pela falta de arborização e áreas permeáveis na urbe.
Por conseguinte, aguçar nos estudantes, na comunidade local um
olhar diferenciado com as questões ambientais, as quais a Terra vem
enfrentando, é indispensável. Portanto, colaborar para a construção
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 81

de uma cidade sustentável, ecologicamente harmonizada e justa so-


cialmente, é a contribuição que este artigo tem como propósito.

2. PROCEDIMENTO METODOLÓGICO
A natureza deste artigo enquadra-se como pesquisa aplicada.
Esse tipo de abordagem procura elaborar conhecimentos e ações
com a finalidade de solucionar o problema identificado (BARROS;
LEHFELD, 2000, p. 78). Quanto ao enfoque dos objetivos, este arti-
go classifica-se como pesquisa exploratória e descritiva.
A pesquisa exploratória permite chegar ao cerne do problema,
facilitando o alcance dos objetivos propostos pelo pesquisador
(GONÇALVES; MEIRELLES 2004, p. 37). A pesquisa descritiva, na
definição de Cervo, Bervian e Silva (2007, p. 65), estabelece que o
pesquisador “observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenô-
menos (variáveis) sem manipulá-los”.
A pesquisa descritiva combinada com a exploratória, de acordo
com Gil (2008, p. 46), é “habitualmente realizada pelos pesquisa-
dores sociais preocupados com a atuação prática. São também as
mais solicitadas por organizações como instituições educacionais,
empresas comerciais, partidos políticos etc”.
A abordagem desta pesquisa é qualitativa. De acordo com
Guerra (2014, p. 11), a pesquisa qualitativa tem como objetivo
“aprofundar-se na compreensão dos fenômenos que estuda –
ações dos indivíduos, grupos ou organizações em seu ambiente
ou contexto social [...] sem se preocupar com representatividade
numérica, generalizações estatísticas e relações lineares de cau-
sa e efeito”.
Conforme Flick (2009, p. 25), ao utilizar os métodos qualitati-
vos, o pesquisador participa da produção do conhecimento, dife-
rente do método quantitativo, em que existe a preocupação com as
variáveis do processo.
82 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

Como instrumento de coleta de dados, utilizou-se o Questioná-


rio. As etapas foram divididas em: a) levantamento bibliográfico; b)
elaboração do questionário; c) estudo da legislação sobre o IPTU
Verde da PMSC; d) aplicação do questionário.
A revisão bibliográfica num primeiro momento buscou exa-
minar conteúdos atualizados, por meio de artigos, periódicos,
revistas científicas, anais de congressos, dissertações e teses que
tratassem dos assuntos relevantes ao perfil deste artigo. As ba-
ses de dados selecionadas foram: Ciência & Educação (Bauru),
Periódicos Capes, Google Scholar, Revista Brasileira de Gestão e
Sustentabilidade, Scientific Electronic Library Online e Portal de
Periódicos Unisul.
As palavras-chave escolhidas foram: arborização, ciências am-
bientais, educação ambiental, educação fiscal, ensino fundamental,
iptu verde e sustentabilidade. Ao investigar conjuntos de artigos,
periódicos, revistas científicas, anais de congressos, dissertações e
teses nas bases de dados, revelaram-se pertinentes a este artigo 29
(vinte e nove) trabalhos referentes ao período de 2008 a 2017.
Os critérios para a inclusão e exclusão, preliminarmente, foca-
ram-se nos strings de buscas aos temas das Ciências Ambientais,
EA, EF, IPTU Verde e Educação Fundamental e trabalhos com abor-
dagem referente ao IPTU Verde no ambiente de aprendizagem. Por
conseguinte, revelou-se a falta de trabalhos específicos sobre o as-
sunto abordado nesta pesquisa.
O diferencial deste artigo foi incluir a legislação local do IPTU Verde
dentro da escola, utilizada como ferramenta educacional, no intuito de
despertar nos estudantes e na comunidade a consciência ecológica e
a cidadania, relacionando esta ação do município com seu cotidiano e
sua formação. Desta maneira, este trabalho contribui com o fortaleci-
mento das Ciências Ambientais nas pesquisas acadêmicas futuras.
Na etapa seguinte, os estudantes do período vespertino dos sex-
tos e sétimos anos do ensino fundamental da Escola Professor Ma-
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 83

rivaldo Carlos Degan, entre os meses de fevereiro a dezembro de


2017, foram os selecionados para contribuir com esta pesquisa.
O instrumento norteador para introduzir os conhecimentos das
Ciências Ambientais, EA e EF, a legislação referente aos Incentivos
Ambientais oferecidos aos contribuintes do IPTU da cidade de São
Carlos, suscitou atrativamente a aprendizagem.
Aulas explicativas voltadas à legislação municipal, atividades de
observação, exploração e descrição do meio ambiente que cerca os
estudantes consistiram em tarefas introdutórias para a inserção de
novos saberes. Com o intuito de propagar o conhecimento da le-
gislação do IPTU Verde aos estudantes, à comunidade local e aos
munícipes, no ambiente escolar, o projeto Futuro Verde foi funda-
mental nessa tarefa.
Para investigar se os novos conhecimentos aplicados em sala de
aula foram assimilados pelos estudantes, a aplicação do questioná-
rio foi necessária. Na Escola Professor Marivaldo Carlos Degan, no
período vespertino, em 2017, frequentavam as aulas 240 (duzentos
e quarenta) estudantes. Para responder ao questionário, optou-se
por uma amostragem contendo 48 (quarenta e oito) estudantes,
que corresponde a 20% do universo selecionado.
A direção escolar permitiu a realização da aplicação do questio-
nário, para isso, os responsáveis pelos estudantes foram solicitados
a assinar o termo de autorização. O anonimato dos pesquisados
foi mantido. Antes da aplicação do questionário, foi realizado um
pré-teste, com 10 (dez) estudantes, para verificar se as perguntas
foram formuladas corretamente. O questionário foi elaborado com
questões fechadas, o modelo é binário, propondo ao pesquisado
optar por uma das alternativas: ( ) sim ou ( ) não.
Adotou-se o método de sorteio com todos os estudantes inse-
ridos nos sextos e sétimos anos. Os nomes dos estudantes de cada
sala de aula foram colocados em uma caixa, oito estudantes por sala
foram selecionados a responderem ao questionário. Em vista disso,
84 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

a amostra foi concluída por 48 (quarenta e oito) estudantes das seis


salas de aulas que participaram da pesquisa.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Contendo onze perguntas objetivas, o questionário aplicado nos


sextos e sétimos anos na Escola Estadual Professor Marivaldo Car-
los Degan objetivou a verificação da aprendizagem sobre a Lei Mu-
nicipal nº 13.692 de 2005, a qual estabelece o Incentivo Ambiental
aos contribuintes do IPTU da PMSC. Outro ponto tratado foi acerca
das vantagens da arborização urbana.
Responderam ao questionário 21 (vinte e um) alunos e 27 (vinte
e sete) alunas. Dos alunos pesquisados, sete tinham onze anos, treze
alunos com doze anos e um aluno com treze anos. Quanto às alunas
que responderam à pesquisa, onze delas tinham onze anos, onze alu-
nas com doze anos e cinco alunas com treze anos. A figura 1 ilustra
a quantidade de alunos e alunas que participaram do Questionário.

Figura 1 - Quantidade de alunos e alunas que responderam ao questionário

Fonte: elaborada pelas autoras

A figura 2 ilustra a quantidade de estudantes e as diferentes ida-


des dos pesquisados que participaram do questionário.
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 85

Figura 2 – Idade e quantidade de estudantes que responderam ao questionário

Fonte: elaborada pelas autoras

O estudo sobre a legislação referente ao IPTU Verde, por meio da


Lei Municipal nº 13.692 de 2005, expressa nos artigos 44 e 45, re-
gulamentada pelo Decreto nº 264 de 30 de maio de 2008, tornou-se
essencial na busca dos objetivos deste artigo. O quadro 1 transcreve
as questões aplicadas aos 48 (quarenta e oito) estudantes.

Quadro 1 - Questões elaboradas pelas autoras e aplicadas aos pesquisados


Número Questões
Q01 Você já participou de atividades relacionadas com a proteção ambiental no bairro onde mora?
Q02 Aprender sobre o IPTU Verde enriqueceu seus conhecimentos em relação ao meio ambiente?
O desconto no IPTU pode ser requerido por todas as pessoas que possuem em suas casas árvores ou
Q03 áreas permeáveis?
Q04 No seu entender, foi importante o plantio de árvores na escola onde você estuda?
Q05 Você acredita que as árvores são essenciais para melhorar a qualidade de vida das pessoas?
Q06 Qualquer espécie de árvore pode ser plantada nas calçadas?
Q07 Árvores plantadas nas calçadas prejudicam a movimentação de pessoas?
Q08 Em sua opinião, existem problemas ambientais em sua cidade?
Você acredita que podemos aumentar a quantidade de árvores, na cidade de São Carlos, por meio de
Q09 descontos oferecidos pelo IPTU Verde?
Q10 São considerados como lixo as folhas, flores ou frutos que caem nas calçadas?
Q11 Você já plantou uma árvore?
86 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

A figura 3 ilustra as respostas ao questionário contendo as 11


(onze) questões.

Figura 3 - Respostas ao Questionário aplicado aos 48 (quarenta e oito) estudantes da Escola Marivaldo Carlos Degan
(2017)

Fonte: elaborada pelas autoras

A primeira questão elaborada no questionário procura investi-


gar se os pesquisados já participaram de atividades relacionadas
com a proteção ambiental no bairro onde moram. Dos 48 (quarenta
e oito) estudantes, 56% assinalaram que participaram de ativida-
des que buscavam proteger o meio ambiente no bairro ao qual per-
tencem. No entanto, 44% dos pesquisados responderam que nunca
participaram ativamente com ações ambientais em seus bairros.
Na sequência, foi questionado se aprender sobre o IPTU Verde
enriqueceu seus conhecimentos em relação ao meio ambiente. Um
total de 73% dos estudantes afirmou que compreender os artigos
44 e 45 da Lei Municipal nº 13.692 de 2005 (IPTU Verde) foi re-
levante, pois não tinham o conhecimento referente aos Incentivos
Ambientais oferecidos pela PMSC. Porém, 27% dos estudantes não
assimilaram que, ao estudar a lei de Incentivo Ambiental, objeti-
va-se aumentar a quantidade de árvores plantadas nas calçadas e
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 87

ampliar as áreas permeáveis da cidade, atitudes que melhoram a


qualidade de vida de seus munícipes.
A terceira questão é importante para entender se os estudantes
aprenderam se o desconto no IPTU pode ser requerido por todas as
pessoas que possuem em suas casas árvores ou áreas permeáveis,
83% dos estudantes responderam que sim, 12% assinalaram que
não. Observa-se que dois estudantes não souberam responder. A
questão seguinte examina se, para os pesquisados, foi importante o
plantio de árvores na escola onde estudam. Os 48 (quarenta e oito)
pesquisados, isto significa 100% deles, afirmaram que sim, desse
modo, o plantio das 35 (trinta e cinco) mudas de árvores nativas foi
positivo no ambiente escolar.
Quando indagados se as árvores são essenciais para melhorar
a qualidade de vida das pessoas, 100% dos pesquisados afirma-
ram que as árvores contribuem para um ambiente saudável. Na
questão seguinte foi perguntado se qualquer espécie de árvore
pode ser plantada nas calçadas, 88% dos pesquisados assimila-
ram que não é qualquer espécie arbórea que pode ser plantada
nas calçadas.
Em seguida, foi perguntado se as árvores plantadas nas calçadas
prejudicam a movimentação de pessoas, o resultado foi positivo,
89% dos pesquisados afirmaram que não. Essa resposta demonstra
que a maioria dos estudantes considera que as árvores não atrapa-
lham a movimentação das pessoas.
No seguimento do questionário, foi indagado aos pesquisados se
acreditam que existem problemas ambientais em sua cidade, 87%
dos pesquisados afirmaram que a cidade apresenta problemas am-
bientais visíveis no bairro e na cidade onde moram.
A questão nove questiona se o IPTU Verde pode aumentar a
quantidade de árvores, na cidade de São Carlos/SP. O resultado foi
afirmativo, 93% notaram que a lei de Incentivo Ambiental pode
contribuir sim para aumentar a arborização do município.
88 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

Na próxima pergunta foi indagado se as folhas, flores ou frutos


que caem nas calçadas são considerados lixo, 16% ainda acreditam
que as árvores quando perdem suas folhas, flores ou frutos e caem
nas calçadas são consideradas como lixo urbano. A última questão
pergunta aos pesquisados se já plantaram uma muda de árvore;
79% asseguraram que sim e 21% disseram que não.
Nota-se que as Ciências Ambientais aplicadas em sala de aula,
dialogando com a EA e a EF, e a inserção do conhecimento da Lei
Municipal nº 13.692/2005, enfatizando a oportunidade que os arti-
gos 44 e 45 propiciam, foram atividades inovadoras e fundamentais
para ampliar o conhecimento dos estudantes da educação básica.
O projeto Futuro Verde desenvolvido na Escola Estadual Pro-
fessor Marivaldo Carlos Degan possibilitou que os estudantes
percebessem que são pertencentes àquele espaço. Um ambiente
saudável e sustentável na escola promove a qualidade de ensino e
desperta a participação dos estudantes nas questões ambientais e
fiscais que interferem em seu cotidiano. Conforme aponta Gomes
(2015, p. 65):

Faz-se necessário um trabalho que promova a compreensão


da ambiência do aluno. Isso significa discutir com ele a escola
inserida no seu espaço de vivência, bem como as relações so-
ciais nela estabelecidas, que muitas vezes, configura-se numa
paisagem fragmentada e ambientalmente insustentável.

Para aprofundar o conhecimento sobre as árvores, foi realizado


um concurso de desenho entre estudantes, tendo como tema cen-
tral as árvores que podem ser plantadas nas calçadas da cidade.
Além disso, os estudantes aprenderam em sala de aula a calcular
os descontos proporcionados pelo Incentivo Ambiental, por meio
do Decreto nº 264 de 30 de maio de 2008. Utilizaram os carnês de
IPTU de suas residências e computaram os descontos de 2% a 4%
do valor do tributo.
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 89

Por intermédio de atividades colaborativas entre as disciplinas


escolares e empregando conceitos da EA e a EF aplicada com os
estudantes do ensino fundamental efetivou-se com atividades prá-
ticas, tais como: a “I Mostra Ambiental: Futuro Verde”, na qual os
estudantes confeccionaram os desenhos das árvores, explicaram
aos convidados sobre a legislação do IPTU Verde, os benefícios que
as árvores proporcionam ao meio ambiente, realizaram o plantio
de 35 (trinta e cinco) mudas arbóreas, ensinaram aos convidados
a maneira correta de cuidar das mudas, a importância da matéria
orgânica, o ciclo da água e complementaram a mostra com poesias
e músicas.
Para a realização deste trabalho, firmaram-se várias parcerias:
Diretoria de Ensino de São Carlos; Supervisora de Ensino; Horto
Florestal; Secretaria de Serviços Públicos; Secretaria de Fazenda;
Secretaria de Desenvolvimento Sustentável; Secretaria de Ciência
e Tecnologia; Secretaria de Agricultura e Abastecimento; represen-
tantes da Câmara Municipal e da Universidade de São Paulo (USP).
Lineu Navarro, autor da Lei Municipal que trata do Incentivo Am-
biental - IPTU Verde, também compareceu ao evento e explanou so-
bre a importância do projeto Futuro Verde.
No dia 23 de setembro de 2017, ocorreu na escola a “Festa da
Primavera”, com doação de 90 (noventa) mudas de árvores nativas
à comunidade local e um folder descrevendo como plantar, cuidar
e os locais apropriados para o plantio. Este folder foi elaborado em
parceria com a professora de Língua Portuguesa.
Com a intenção de disseminar o projeto Futuro Verde, os estu-
dantes e o Grêmio Escolar participaram do “I Encontro Paulista
de Grêmios Estudantis 2017”. Para haver a adesão no concurso
foi necessária a construção de um vídeo mostrando o trabalho
realizado na escola, por meio do projeto. O vídeo obteve 2,6 mil
visualizações na Internet. Outros concursos dos quais o projeto
participou foram: Construindo a Nação 2017 e a V Conferência
90 CIÊNCIAS AMBIENTAIS EDUCANDO PARA UM FUTURO VERDE SUSTENTÁVEL

Infantojuvenil pelo Meio Ambiente “Vamos Cuidar do Brasil Cui-


dando das Águas”.
O projeto Futuro Verde participou do desfile em homenagem
ao aniversário da cidade de São Carlos, com a participação de 80
(oitenta) estudantes. Ao longo do desfile, os participantes distribu-
íram 1000 (mil) embalagens contendo sementes de árvores nati-
vas à população. Neste ano de 2018, o projeto está participando do
Concurso de desenho infantil – “Cuidando dos resíduos a gente cuida
da água, da nossa saúde e do meio ambiente”.
As Ciências Ambientais com a EA e a EF esteve presente em to-
das as etapas da construção do projeto Futuro Verde, sempre alme-
jando uma cidade mais verde e sustentável, com estudantes críticos
e participativos dentro e fora dos muros da escola.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O material de apoio ao Currículo do Estado de São Paulo do Ensi-
no Fundamental tem a preocupação com a preservação e a susten-
tabilidade do meio ambiente. Conscientizar os estudantes da im-
portância e dos benefícios da arborização e das áreas permeáveis
em uma cidade é relevante em sua formação educacional.
Conhecer a Lei Municipal nº 13.692/2005 (IPTU Verde), regula-
mentada pelo Decreto nº 264 de 30 de maio de 2008 e do Decreto nº
216 de 5 de junho de 2009, que institui o Plano de Arborização Urba-
na no Município de São Carlos, incentivou os estudantes a realizaram
pesquisas na sala de informática em ambiente web, sobre o assunto.
Tendo acesso às informações contidas no Plano de Arborização
Urbana da cidade, os estudantes conheceram as árvores que podem
ser plantadas nas calçadas e a importância de áreas permeáveis
dentro da urbe. Discussões ocorreram no decorrer do projeto,
o interesse foi expresso pela atenção dos estudantes em buscar
soluções para melhorar o ambiente escolar.
Adriana Aparecida Lazzarini; Maria Olimpia de Oliveira Rezende 91

De acordo com Castro e Canhedo Jr. (2014, p. 465), “Historica-


mente, o Brasil não registra processos significativos de participa-
ção da sociedade na discussão dos problemas comuns, na tomada
de deliberações de alcance geral, nem em formas mais simples de
atuação política e social”. Levar novos saberes apreendidos pelos
estudantes para além dos muros da escola constituiu tarefa do pro-
jeto Futuro Verde.
Mudanças de valores e atitudes de respeito com o meio ambien-
te fazem parte do projeto e a escola é um espaço ideal para conec-
tar os estudantes aos preceitos de cidadania e ética. A cooperação
entre professores, gestão escolar, funcionários e a comunidade
sustentou a construção desse trabalho, provando que o trabalho
em equipe dentro da escola é essencial na formação de estudantes
críticos e participativos no planejamento e na construção de uma
cidade mais verde e ecologicamente sustentável.

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UILSON DE MENESES HORA
CAPÍTULO 5 SAULO HENRIQUE SOUZA SILVA
NÚBIA DIAS DOS SANTOS

SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM


AMBIENTE SUSTENTÁVEL

1. INTRODUÇÃO
A problemática ambiental emerge de uma crise de identidade do
ser humano perante a natureza. Toda a problemática advém de um
marco civilizatório introduzido para a dominação e a humanização
da natureza. Cabe lembrar que este estágio é recente e que a sinto-
nia destrutiva é incalculável perante a tudo que já perdemos e a que
estamos a perder. O complexo emaranhado que estrutura o interesse
de domínio sobre a natureza orienta ações que degradam espaços
naturais e devastam espécies da fauna e da flora. Transformações do
relevo na construção do cinza das cidades e empreendimentos imo-
biliários que dividem as pessoas em grupos econômicos. O desprezo
valorativo pelo ambiente e pelas espécies, incluindo o próprio ho-
mem, é um fenômeno que torna a natureza humanizada e distingue
os que podem e os que não podem dela sobreviver.
Por sua vez, toda essa dominação só é factível por meio do co-
nhecimento aplicado ao desenvolvimento de novas técnicas atra-
96 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

vés da quais o ambiente é feito refém de um sistema exploratório


que visa o deleite de uma pequena parcela de seres humanos. Essa
espécie de apropriação movimenta a engrenagem da problemática
ambiental ao ponto que, se não houver uma transformação desse
modelo degradante, pode ocorrer um grave esgotamento dos re-
cursos necessários à vida. Ou seja, a humanização do planeta pode
levar ao extermínio de diversas espécies de seres terrestres, inclu-
sive da espécie humana. É difícil acreditar em um convívio harmô-
nico entre a apropriação degradante dos recursos e a estabilidade
biológica do planeta porque os interesses do capital se sobrepõem
na forma de dominação e exploração.
A ganância de acumulação vem se sobrepondo à continuidade
das condições de existência. Élisèe Reclus, em Do Sentimento da na-
tureza nas sociedades modernas (2010), no século XIX, já refletia
acerca da admiração e do sentimento pela natureza pari passu à
angústia da apresentação das trevas marcada pelo que denomina
“profanação da natureza” e “enfeamento da terra”, causados pela
apropriação degradante empreendida pelas sociedades modernas.
Nesse viés, tudo vira mercadoria de troca quantificável pelo mer-
cado consumidor, apropriando-se de tudo, sobre a lógica do desejo
e do bem-estar de uma parcela diminuta da vida no planeta. Não
existe uma orientação para o bem comum desta e das próximas
gerações, ao contrário, parcela enorme da população humana está
excluída do direito de partilhar os bens naturais, os quais vêm cada
vez mais se tornando propriedade privada dos detentores do poder
econômico.
Por se tornar humanizada, a bela diversidade que impera na na-
tureza selvagem é substituída pela padronização geométrica fruto
do emprego de técnicas voltadas à apropriação capitalista. O huma-
no, ao implementar essa padronização técnica, consegue redimen-
sionar por completo a natureza às suas necessidades e ao seu pra-
zer, alterando o clima, enfeando a terra e comprometendo gerações
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 97

e gerações da vida presente e futura. Segundo Hans Jonas (1903-


1993), o filósofo alemão de origem judia, em sua reflexão sobre a
reponsabilidade ambiental,

o que quer que pertença à plenitude do homem fica eclip-


sado em prestígio pela extensão de seu poder, de modo que
essa expansão, na medida em que vincula mais e mais as for-
ças humanas à sua empresa, é acompanhada de uma con-
tração de conceito do homem sobre si próprio e de seu ser
(JONAS, 2006, p. 43).

O poder alienante da acumulação econômica leva o ser humano


a cometer um suicídio programado, reinando sobre a lógica da pro-
dutividade, o que extirpa o poder de povos tradicionais que têm na
natureza o seu único vínculo de sobrevivência. Neste sentido, cons-
troem-se ações que segregam a maior parte da população, desde
então marginalizada, que perde o direito de intervir na construção
de um planeta digno de sobrevivência. Essa retirada de bens natu-
rais de forma excessiva e sem controle, reflete no cenário atual de
catástrofe que se encontra a natureza.
O desejo de libertação desse aprisionamento em que vivem as
sociedades conduziu os pensadores ambientalistas à reflexão so-
bre a busca constante da construção de uma vida sustentável como
mecanismo de libertação (LEFF, 2006). Esse é o tom dos escritos
de Enrique Leff sobre a racionalidade ambiental como a tomada
de consciência do sujeito, discute-se o limite do crescimento e a
necessidade de um freio na degradação do ambiente, alterando as
forças econômicas que produzem a grande diferenciação entre os
humanos e os demais seres. Para Leff, o sujeito precisa transfor-
mar-se, e consequentemente emancipar-se, discutir e interferir so-
bre os problemas ambientais na luta por um ambiente sustentável,
quebrando a lógica da degradação atual existente. Objetivo difícil
porque as forças impositivas mercadológicas atuam sempre contra
98 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

a união dos sujeitos na formação desta libertação. Porém, as barrei-


ras poderão ser ultrapassadas com a união de todos e deste modo,
quebrando as amarras da opressão. Como diria Paulo Freire,

somente quando os oprimidos descobrem, nitidamente, o


opressor, encorajam na luta organizada por sua libertação,
começam a crer em si mesmos, superando, assim, sua “con-
vivência” com o regime opressor. Se esta descoberta não
pode ser feita, em nível puramente intelectual, mas da ação,
o que nos parece fundamental é que esta não se cinja a mero
ativismo, mas esteja associada a sérios empenhos de refle-
xão, para que seja práxis (FREIRE, 2017, p. 72).

A luta inicial é do indivíduo consigo mesmo, de identidade, de


consciência e de reconhecimento. O ato de reconhecimento liberta
e proporciona a reflexão-ação perante as suas necessidades pre-
mentes. O sujeito emancipado, ciente do que o rodeia e como é feito
esse cerco, tem em sua mente o poder de articular e levar este co-
nhecimento a outros e, assim, o círculo só aumenta porque a opor-
tunidade da fala ética, orientada pela racionalidade comunicativa,
leva ao contexto libertário e a visão consensual de dias melhores
(HABERMAS, 2012).
Com efeito, o objetivo deste texto é dar ensejo a esse debate da
ética ambiental sobre a relação entre o desenvolvimento da cons-
ciência ambiental e a reflexão sobre a construção de um ambiente
sustentável. Nesse um trabalho de natureza teórica, as fontes aqui
analisadas proporcionaram uma visão mais ampla desta temática
que urge ser debatida nas sociedades contemporâneas. Seguindo
essa orientação, o artigo foi dividido em dois momentos, inicial-
mente refletimos sobre a relação entre dominação e emancipação
no contexto da sustentabilidade ambiental. Em seguida, defende-
mos a premente mudança de atitude como necessária à manuten-
ção dos meios adequados à continuidade da vida.
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 99

2. A EMANCIPAÇÃO E SUSTENTABILDADE AMBIENTAL

O modo de vida pelo qual vivem as pessoas diz muito sobre elas.
Essas ações formam o seu cotidiano e, consequentemente, produ-
zem a necessidade da sociedade refletir sobre esse contexto social
e intelectual. O ser humano cria e recria dentro do seu ambiente de
vivências e situações que podem ter reflexos positivos ou negati-
vos. Este movimento tende a ser consciente e inconsciente e, mui-
tas vezes, conduzido por forças maiores de aprisionamento ou de
libertação. Várias são as prisões produzidas ideologicamente e que
interagem com o modo de vida de um povo. No contexto ambiental,
a atualidade retrata uma triste verdade de desprezo pelo saber, de
rompimento ideológico com as bases razoáveis de sustentação da
vida e interação com os meios que permitem a vida.
Assim, o meio ambiente, compreendido filosoficamente como o
conjunto das condições pelas quais a vida é possível, vem sendo
moldado artificialmente por meio da ação humana sobre a geogra-
fia física (RECLUS, 2015); com isso, perde-se a interligação entre as
suas partes e criam-se prisões nas quais a vida está limitada. Em
benefício de uma exigência momentânea, dilui-se uma estrutura
perfeita e construída há milhares de anos para atender às neces-
sidades de satisfação atual da produção capitalista, produzindo
um contexto exclusivo de existência de uma única espécie em de-
trimento de todo o restante. Para a resolução dessa situação, vis-
lumbramos o caminho do esclarecimento por meio da educação
ambiental. A emancipação do sujeito passa pelo reconhecimento
do ser sujeito, é preciso entender estando no mundo, condicionar a
consciência para a razão de estar, ser capaz de direcionar a sua exis-
tência e de condicionar sua consciência para o estar (Cf. FREIRE,
2001). A possibilidade de o entendimento transpor limites que lhes
foram impostos e criar possibilidades de imersão neste mundo tem
que ser formado conscientemente. Esse sujeito tem que ser capaz
100 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

de quebrar as amarras deste contexto de afastamento do mundo


natural em que atualmente se encontra. Em vistas dessas transfor-
mações, a educação ambiental (EA) desempenha um papel funda-
mental porque poderá auxiliar no trabalho de formação do sujeito
emancipado (CARVALHO, 2005), capaz de reivindicar seus direitos,
entre os quais o direito a uma vida sustentável para todas as espé-
cies deste planeta. Para tanto, a ética ambiental advoga a necessida-
de da construção de um novo sujeito, de um novo pensamento livre,
rompendo as amarras existentes entre os homens e resgatando a
harmonia anteriormente existente na natureza.
Por sua vez, essa empreitada não é tarefa fácil. O momento atu-
al demonstra um amplo poder das forças exploratórias através da
acumulação de bens cada vez mais desproporcional. O modo ope-
rante da dominação sobre a natureza tem contribuído decisivamen-
te para uma alienação completa do homem ao produto da técnica,
eliminando da vida humana qualquer possibilidade de reflexão e
escolha de tipos práticos de vida. Segundo os autores da Dialética
do esclarecimento, a dominação pela técnica é facilitada pelos apa-
relhos culturais, pelos meios de comunicações atuais, pois a cultura
se torna mercadoria produzida para fins de repetição automatizada
e distração irrefletida, o que os tornam, de certa forma, os homens
idiotizados por esses aparelhos (ADORNO e HORKHEIMER, 1985).
Perde-se o diálogo, a conversa, a interatividade, a humanidade é
completamente reificada na ideia automatizante das máquinas, do
lucro a serviço da dominação. Apesar desses fatos, os opressores
esbarram na força dos povos tradicionais e comunidades que de-
fendem seu território de sobrevivência e que sempre estiveram ali,
retirados do sistema excludente e, por isso, resistentes. Estes povos,
aos poucos, têm conseguido ser ouvidos por pequenas parcelas da
população, a saber, estudiosos, estudantes, ambientalistas dentre
outros, que ecoam seus gritos de ajuda e de união para a salvação
do planeta. Segundo Leff, a recuperação dos sentidos, o reviver do
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 101

ser, a recuperação da racionalidade estão cada vez mais fortes. Ob-


serva-se um crescimento nas ações, nas vozes, isso faz com que o
desejo da vida, de futuro melhor alcance um número maior de pes-
soas e que elas construam outras racionalidades como, a ambiental
(LEFF, 2006) e a comunicativa (HABERMAS, 2012), transcendendo
o sistema de dominação vigente.
A crise ambiental, o jogo de mercado, a exclusão tem feito com
que ressurjam a vontade de unidade entre essas comunidades
tradicionais para aprofundar a racionalidade de pensamentos na
orientação de lutar para libertar-se da razão colonial, imposta por
uma minoria dominante que busca aprisionar o pensamento, as fa-
las e as ações de combate a tudo que é colocado. Assim,

a emancipação não é uma distribuição do poder, dos meios e


estratégias políticas para prover condições de produção, de-
cisão e participação em uma política de equidade e democra-
cia. A emancipação vem mais de dentro, da vontade de poder
que suas raízes no ser e não na ordem jurídica da justiça e na
ordem econômica da distribuição. O “empoderamento” com
o qual se pretende dá voz aos sem-voz, não lhes devolve a pa-
lavra própria. A emancipação do ser é a libertação da palavra
e do pensamento para exercer o direito de Ser, que está além
das reivindicações por uma distribuição ecológica de justiça
ambiental (LEFF, 2006, p. 339)

Ecoa a vontade de libertação do sujeito. É uma luta ferrenha de


buscar o que está sendo tirado pela ação da minoria que aprisiona
o direito de erguer a cabeça, a fala do cidadão e as garantias para a
continuidade da vida. É uma configuração difícil e, em muitos casos,
eles chegam a extirpar a vida para que ela não se apresente entre
seus semelhantes. O que vemos é uma luta incessante pelo direito
a viver dignamente, sem estar submetido ao poder alienante dos
poderosos. A resistência é fruto da mudança de atitude e de postura
102 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

perante o sistema. Os povos tradicionais, que foram dizimados em


nome de um colonialismo predador e arrancados do seio da “Mãe
Terra”, nos ensinaram que é preciso resistir à música alienante do
colonizador. Eles não se renderam e suas ações de defesa não de-
vem morrer e nem serem esquecidas.
A luta pela emancipação deve ter por objetivo solapar o poder
que aprisiona, ou seja, os nós que são complicados de desatarem,
pois a todo instante se renovam por meio do investimento maciço
pela manutenção deste poder. De várias partes surgem novos ho-
rizontes, luzes e caminhos que podem conduzir à libertação dos
sujeitos. O sujeito emancipado precisará lutar e, deste modo, leva-
rá os mesmos exemplos para outros se libertarem também. Pois,
é a partir de uma coletividade de pensamentos que as ações vão
se engrandecendo. Por sua vez, o medo da ideologia dominante é
que a coletividade comece a compreender que os sujeitos unidos
são fortes o suficiente para poderem ampliar as reivindicações de
suas necessidades. Por essa razão, há um investimento grandioso
para aprofundar o individualismo e a concorrência entre as pessoas
em todos os campos possíveis, sobretudo na educação cuja força
emancipadora pode fazer a diferença e promover a libertação. A
educação centrada em preceitos colonialistas beneficia o monopó-
lio da conservação do opressor. O modelo educacional dos países
colonizadores é adaptado, simplificado e implantado em países po-
bres com a finalidade de solidificar os vínculos coloniais e mante a
ideologia perversa do dominador.
As amarras são as ideologias que visam fixar sobre o sujeito toda
carga exploratória e a manutenção do vínculo do opressor sobre o
oprimido. A tarefa de tirar a vendas dos olhos é muito difícil haja
vista a petrificação dos mecanismos ideológicos implantados pe-
los dominantes. Seguindo essa orientação, “a construção coletiva
do seu mundo, em um espaço eminentemente ético, necessita dar
conta de uma sociedade de risco que vem progressivamente incor-
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 103

porando-se de forma impiedosa ao seu cotidiano” (RUSCHEINSKY,


2002, p. 65). O paradigma pregado é o de acumulação pelo traba-
lho, a produtividade na concentração de lucros, mesmo que para
isso possa matar pessoas que se rebelarem contra, por exemplo, a
extinção espécies da flora e da fauna. A essência da ação é manter
o poder de dominação e de controle sobre o sujeito. Uma fonte de
máxima importância é a sobreposição do humano sobre todas as
outras vidas aqui existentes:

Compreende-se, paulatinamente, a inviabilidade do estilo


de vida dominante. O crescimento material sem fim poderia
culminar em suicídio coletivo. A concepção— equivocada—
do crescimento baseado em inesgotáveis recursos naturais e
em um mercado capaz de absorver tudo o que for produzi-
do não tem conduzido nem conduzirá ao desenvolvimento.
Pelo contrário. O reconhecido economista britânico Kenneth
Boulding, ao encontro do matemático romeno Nicholas Ge-
orgescu-Roegen, tinha razão quando exclamava: “Qualquer
um que acredite que o crescimento exponencial pode durar
para sempre em um mundo finito ou é louco ou economista”
(ACOSTA, 2011, p. 34).

Não é fácil sair desse encanto imposto pelos países intitulados


industrializados e desenvolvidos, pois esses se apresentam com o
slogan do progresso e do desenvolvimento. No entanto, há vários
interesses ocultos como a dominação do espaço de vivência e tudo
que nele pode retirar em benefício de outros povos em outras lo-
calidades. É uma interferência enorme no contexto estrutural de
um país por meio da cultura, religião, língua, referência do outro
sobre si, etc. É um conjunto de ações que levam ao aprisionamento
do ser. Essas ações constroem ambientes que anunciam a morte
de tudo que os rodeiam, apresentando um estágio de putrefação
da vida. A injustiça ambiental reina porque é produzida por esse
104 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

mesmo conjunto de dominadores os quais tentam sugar tudo o que


eles avaliam que possam gerar lucro.
Todo esse labirinto do jogo mercadológico apresentado como
uma arapuca para aprisionar o sujeito é de difícil resolução, pois es-
tão arraigados de poder controlador e a cada dia com maior força.
Entretanto, a luta pelo “bem viver” está presente em inúmeras co-
munidades por este planeta a fora. Comunidades que, aos poucos,
vão adquirindo cada vez mais união, conhecimento, uma relação de
companheirismo, de fraternidade, de defesa da natureza. Esse sen-
timento não deve se resumir ao humano, mas abarcar o respeito
aos animais, à flora, ao ar, à terra e ao planeta por inteiro.

3. NUTRI-SE DE EXPERIÊNCIA E EXISTÊNCIA: O BEM VIVER


O modelo ocidental de ver a natureza como objeto de riqueza,
de culto ao consumismo e à exploração, tem criado situações de
miserabilidade nas quais a vida está em constante risco. Romper
com esse estilo de desenvolvimento, que é produzido pelo mode-
lo econômico vigente na maior parte dos países ocidentais, exige
uma transformação profunda na concepção racional do humano.
A desconstrução que rompe com esse modelo deve defender um
outro mecanismo de produção econômica que seja centrado na
construção harmônica entre os seres, no respeito, na solidarieda-
de entre os povos. É necessário ultrapassar barreiras e descons-
truir conceitos para que, enfim, seja formada uma nova racionali-
dade ambiental.
A mudança exige uma transformação no modo de vida atual
para um estágio centrado na cooperação que produza o suficiente
para a permanência da vida, sem degradar a natureza. Nesse mes-
mo viés, a racionalidade ambiental é a ponte desta transformação,
do rompimento de barreira e da construção de uma nova sociedade
em transição. Como afirmava Freire,
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 105

não há transição que não implique um ponto de partida,


um processo e um ponto de chegada. Todo amanhã se cria
num ontem, através do hoje. De modo que o nosso futuro
baseia-se no passado e se corporifica no presente. Temos
de saber o que fomos e o que somos, para saber o que sere-
mos (2011, p. 42).

O ponto de partida aqui apontado é a resistência contra todo


esse aparato colocado pelas forças conservadoras deste sistema. O
que se observa é a luta por um amanhã melhor, por mudanças na
maneira de ver a conjuntura atual e, a partir de outras lentes, ver a
natureza, não como objeto, e sim, como o todo (CARVALHO, 2012).
A chave da transformação está na superação das desigualdades, na
quebra das amarras do colonialismo empregado no escravismo do
sujeito de forma física e ideológica, no respeito aos territórios dos
povos originários. A chegada é incerta, pois é uma luta que não é
decida por vitórias, mas por uma soma de desejos por um mun-
do melhor, que possa ter outro desfecho no qual a vida possa ter
dignidade e as disparidades entre os seres desapareçam. É preciso
eliminar os valores mercadológicos que coisificam a natureza e a
transforma em mera geradora de capital.
Lembramos, ainda, que não podemos ficar esperando mais. Re-
criar um novo mundo, através dos movimentos já existentes, dar
forma e força às ações que os povos e comunidades isoladas já vêm
buscando insistentemente. É preciso quebrar a separação existente
entre natureza e humanidade, entendendo que somos únicos nesta
constituição vital. O contexto exige união de todos por uma causa
maior porque o que está em jogo é a defesa da vida no planeta. Se-
gundo Acosta,

as pessoas devem organizar-se para recuperar e assumir o


controle das próprias vidas. Contudo, já não se trata somen-
te de defender a força de trabalho e de recuperar o tempo
106 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

livre para os trabalhadores – ou seja, não se trata apenas de


opor-se à exploração da mão de obra. Também está em jogo
a defesa da vida contra esquemas antropocêntricos de or-
ganização produtiva, causadores da destruição do planeta
(2011, p. 27).

Superar desafios é uma das metas constituídas para trilhar no-


vos caminhos. Para tanto, é preciso aprofundar as avaliações do que
a natureza vem sofrendo, superar o tecnicismo produzido pela ci-
ência moderna e a visão consumista entrelaçada nas mentes dos
homens. A efetivação das políticas para ações ambientalmente
sustentáveis encontra-se totalmente atrelada a uma nova raciona-
lidade, que vise superar os caminhos tortuosos vividos até então.
É preciso uma educação ambiental que construa uma ética da res-
ponsabilidade para com as futuras gerações, promovendo mudan-
ças de atitudes nos atores sociais contemporâneos, clareando os
caminhos onde se deve chegar (TRISTÃO, 2004).
Se nada for feito, se demoramos em mudar nossas formas pre-
datórias de apropriação, pode-se imaginar um prognóstico futuro
bem desolador para as condições vitais do planeta. No contexto
de acelerada degradação ambiental e mudanças climáticas, é de
extrema necessidade repensar o modo pelo qual nos relacionamos
com o meio ambiente para que seja possível frear o processor eli-
minação das condições de permanência da vida terrestre. A situa-
ção apresentada de descaracterização da natureza traz um alerta
de como o desenvolvimento tornou-se aniquilador. A técnica em
seu sentido tem um uso dúbio haja vista poder ser utilizada para o
bem e para o mal. O julgamento está no momento de seu uso. A vi-
são ética também dependerá do contexto em que a técnica está sen-
do empregada, da forma apropriação e de quem avalia seu uso. O
desenvolvimento econômico defendido em nossos tempos parece
ter virado obsoleto por ser destruidor, ele é contestado por comuni-
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 107

dades e povos que vem perdendo e muito com esse uso tecnológico
degradante. Hoje questionamos se é necessário este avanço todo
em razão dos efeitos sofridos nos dias atuais. Várias são as indaga-
ções, pois todo este avanço não é capaz de solucionar os problemas
vividos pelas pessoas, tem ampliando as desigualdades sociais e
destruído o ambiente vital da terra. Observa-se que é preciso uma
inversão de valores, pois os problemas vão se avolumando e multi-
plicando-se em outros novos dilemas. Sobre isso,

A racionalidade ambiental reconstrói o mundo a partir da


flecha do tempo e da morte entrópica do planeta, mas tam-
bém a partir do poder da neguentropia e da ressignificação
da natureza pela cultura. A condição existencial do homem
se torna mais complexa quando a temporalidade da vida
enfrenta a erosão de suas condições ecológicas e termodi-
nâmicas de sustentabilidade, mas também de poder, da cria-
tividade da diversidade, do encontro com a outridade e da
fertilidade da diferença (LEFF, 2006, p. 18).

Dessa forma, o funcionamento deste sistema econômico, cor-


rompido pela ideologia desenvolvimentista, retira do seio da natu-
reza a condução da vida e entrega a técnica, a única detentora da
condução.

4. CONCLUSÃO

O que estamos defendendo ao longo dessa investigação não


é uma defesa pelo o retrocesso, mas sim ressaltando como
toda essa engenharia desenvolvimentista está orientada pela
contração do direito, do respeito, da identidade, eliminando
outros conhecimentos que nos trazem vida e diversidade.
Tudo isso é abandonado devido à contradição do viver pre-
sente, em como se apresenta os espaços e o quanto isso po-
108 SUJEITO SOCIAL (EMANCIPADO) E A CONCEPÇÃO DE UM AMBIENTE SUSTENTÁVEL

deria ser diferente, senão estivéssemos subordinados a essa


técnica. A esse respeito,

como desativar um processo que tem em sua estrutura origi-


nária e em seu código genético um motor que o impulsiona
a crescer ou morrer? Como levar a cabo tal propósito sem
gerar como consequência uma recessão econômica com im-
pactos socioambientais de alcance global e planetário? […]
Isto leva a uma estratégia de desconstrução e reconstrução,
não para implodir o sistema, mas para reorganizar a produ-
ção, desvencilhar-se das engrenagens dos mecanismos de
mercado, restaurar a matéria usada para reciclá-la e reor-
dená-la em novos ciclos ecológicos. Neste sentido, a constru-
ção de uma racionalidade ambiental capaz de desconstruir a
racionalidade econômica implica processos de reapropria-
ção da natureza e reterritorialização das culturas (ACOSTA,
2011, p. 116).

A capacidade de reflexão tem demonstrado os vários processos


da existência e o visível desastre dos modelos atuais de produção
econômica e apropriação dos bens naturais. É chegada a hora de
impor uma nova racionalidade ambiental sobre a racionalidade
econômica e cientificista tradicional, na perspectiva da construção
de saídas para o que se apresenta neste contexto de degradação.
Ao fim e ao cabo, a solução está criar saídas para um novo estilo de
vida que não esteja centrado no consumismo, que vise à proteção
do ambiente, na sua interação com a vida dos seres terrestres, bus-
cando ouvir o que é diferente, preservando a diversidade.
Uilson de Meneses Hora; Saulo Henrique Souza Silva; Núbia Dias dos Santos 109

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TRISTÃO, M. A educação ambiental na formação de professores redes
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CAPÍTULO 6
AJIBOLA ISAU BADIRU

O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO


INTERDISCIPLINAR1

1. INTRODUÇÃO1

Hoje eu me lembro da famosa expressão “carne fraca”. De fato,


os brasileiros não só criam gado, mas valorizam a carne. Onde re-
almente se encontra a carne fraca? O que é a carne? Será que o ho-
mem, mesmo não deixando de ter a forma física em dia, é um super-
-homem, que nunca pode falhar? São questões que atravessam esse
artigo considerando a sociedade dos homens, a cultura brasileira e,
sobretudo, a Educação como um processo orgânico que pretende
superar a didática, incluindo as suas instruções metodológicas.
O paradoxo do desenvolvimento brasileiro é interessante, por-
que a sua sociedade teve um forte apelo histórico daquilo que po-
demos chamar de escravismo. O País foi uma das últimas nações a
abolir a escravidão. É como se tivessem apostado na massa huma-

1 Palestra proferida durante a aula inaugural da turma de 2017 do PROFCIAMB/UFS,


no Auditório do DGE/UFS/CECH;
112 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

na, não só na população, mas também na habilidade de que a carne


supera a tecnologia, ou seja, essa produção de bens e serviços para
o mercado externo perdurou até o fim do século retrasado. Perce-
be-se o processo histórico de que todo o movimento brasileiro gira
em torno da necessidade de que a carne seja forte.
Hoje, assisti uma notícia sobre um fato novo, batizado operação car-
ne-fraca, e, imediatamente, o fato me relembrou o desastre de Mariana,
em Minas Gerais, provocado, mais uma vez, por falha humana. A falha
humana não é uma novidade no que diz respeito às avaliações ambien-
tais e desastres. A perda cultural neste caso é comercial, da indústria
de produção da carne e avicultura do estado do Paraná que repercutiu
para o Brasil todo pela comercialização da carne bovina brasileira re-
jeitada pelos Estados Unidos. Isso causou um grande transtorno para
o governo Temer, que desde o início do seu mandato apresentava-se
sempre de paletó, mas nesse dia fez seu discurso com as mangas ar-
regaçadas como se fosse para dizer “eu estou trabalhando neste caso”.
Mais tarde, houveram notícias sobre este Presidente brasileiro
ter sido acusado de ter recebido dinheiro de empresários que são
os maiores exportadores de carne brasileira para os Estados Uni-
dos. O que deu para perceber foi que a seriedade do governo de Te-
mer tem sido dedicada para o gado brasileiro. Essa denúncia não só
mostrou a preocupação de Temer, como também demonstrou que
a nossa grande nação brasileira não ia bem, desde algumas campa-
nhas eleitorais anteriores. A exemplo do Ministério da Saúde, sobre
o fato de que o país não podia “ser derrubado por um mosquito”,
até as recentes notícias veiculadas sobre possíveis pedaladas fiscais
envolvendo a Ex-presidente Dilma Rousseff e outros casos que an-
tecederam a posse do atual governo.
Todos esses episódios técnicos administrativos são recorrentes
sobre a dualidade da carne ser forte ou fraca. Tratam-se de uma
cultura que não apresenta a clareza sobre a realidade de confiar na
carne ou desconfiar.
Ajibola Isau Badiru 113

De um lado, a “educação ambiental” foi adotada por várias na-


ções para melhorar o nível de instrução, mobilização social, con-
dição ambiental, prevenção de danos e desastres, entre outros. O
combate ao mosquito Aedes aegypti promovido pelo Ministério da
Saúde, trouxe uma solução, acreditando na base da educação am-
biental e a sua fiscalização sanitária para superar os riscos e danos
da epidemia da dengue, embora, até hoje, não tenha sido erradica-
da, a situação está sob algum controle. Por outro lado, a educação
como um processo cultural (LICHTBLAU et al, 1999), exige a clare-
za não só dos ensinamentos, mas da realidade do aprendizado.
Pode-se sugerir a prática pedagógica que promova uma expe-
riência ativa com o convívio científico em diferentes dimensões,
envolvendo a subjetividade e a espiritualidade (BADIRU, 2016;
ANAPS, 2011; CORTÉS, 2008; OSORIO e GARCIA, 2013; PRANDI,
2001; SEMEDO, 2015; SILVA & MARQUES, 2014; SILVEIRA, 2007).
A materialidade percorre o espaço e tempo, na mesma profun-
didade em que a aventura para se instruir um ser sugere, objeti-
vamente, o conhecimento voltado para a fortificação do interior.
Pelo atual contexto da proliferação de equipamentos eletrônicos as
condições socioambientais pressupõem um homem cada vez mais
meditativo, embora conectado a complexidade pela combinação do
meio técnico científico e informacional (SANTOS, 2006; 2008).
Além dessa pequena introdução, o texto está dividido em quatro
partes. Na primeira, discorro sobre a contrastante realidade entre
a paisagem e a escala humana. Em seguida abordo a ideia da “car-
ne fraca” pelo papel indispensável da formação interdisciplinar. Na
terceira enfatizo sobre a orgânica estrutural pela qual o desenvol-
vimento humano e da sociedade se sugerem de forma integrada e
na última parte, finalizo trazendo algumas considerações acerca do
fenômeno interdisciplinar no processo de educação humana.
114 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

2. A DIMENSÃO DA SOCIEDADE MODERNA PELA PAISAGEM

Embora a educação tenha sido estruturada ao longo dos anos


como processo voltado para o mercado, na verdade deveria ser
devolvida para a sociedade como um todo, ajustado aos elemen-
tos culturais (LICHTBLAU et al, 1999; PIRES, 2006). Uma socieda-
de mais educada é uma sociedade mais forte, que tem os cidadãos
mais saudáveis, é a sociedade que tem as pessoas mais felizes.
Me chama a atenção esse processo da humanização como um todo
mobilizado, pois a educação humana está atrelada a tudo: a relação
integrada entre o homem e o meio ambiente, nos relacionamentos,
nas casas das pessoas e nas ruas. A mesma está relacionada ao modo
como celebramos e fazemos negócios, sobretudo, como convivemos.
A Figura 1 mostra o império do espaço urbano que respiramos,
cheio de distração e ilusão das edificações urbanísticas do ambien-
te das cidades. Nela a escala humana parece perdida, encantada
com a paisagem extremamente composta por elementos artificiais.
Nela podemos contemplar um simples desenho em preto no branco
de uma paisagem construída, ainda a ser “colorida” pela visão de
Benévolo (1984), sobre a cidade moderna.
A primeira vista, a ilustração nos informa o sentido impressio-
nante representando a ordem da sociedade que se expressa com a
natureza do espaço construído, enquanto a segunda diz respeito a
concentração ínfima de pessoas que constitui o organismo social.
Embora as dimensões humanas e urbanas se dissimulam nessa
paisagem, naturalizam-se a escala humana não colorida em sua re-
lação material necessitando de ajustada relação entre sociedade e
natureza. Todavia, as dimensões humanas assentam-se em face da
comprometida pluralidade e a uniformidade cultural ainda a serem
equiparadas.
Ajibola Isau Badiru 115

Figura 1- Desenho de uma paisagem moderna, mostra o domínio das construções e figuras humanas tomadas
pela dimensão da cidade.

Produção fotográfica2 de Elaini Simoni Angelotti.

Na escala urbana, não é fácil evitar a polemica imposta pelo do-


mínio urbano, principalmente pelo conteúdo moderno visto como
um programa em qualquer recorte espacial que se manifesta sobre
a sua arquitetura determinada por outros movimentos de vanguar-
da (SECCHI, 2015). De modo que tal materialidade conspira ser uma
exposição teórica que, por sua vez, podia ser examinada e contestada
através de outras formações, considerando o conteúdo histórico da
paisagem (BENÉVOLO, 1984). Neste sentido, a vocação material de

2 In: Livro para colorir - Cidade Secretas: Arte antiestresse. <www.revistaonline.com>


116 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

uma paisagem não vale ser imperativa ou subordinada a aquela de


uma pessoa, mas das atividades do trabalho que deve, em certo caso,
ser subordinada a outras funções mais importantes ou mais urgen-
tes, como as das formações humanas (BENÉVOLO, 1984).
Visando melhor oportunidades e limites de ir e vir, argumento
que a educação convencional não apenas deva se objetivar para
consolidar a formação das pessoas, mas também o processo de ser
mais humano, envolvendo o físico material.
Também, embora disciplinado, o corpo social merece o encanto
com a forma da própria sociedade para superar os desafios sociais.
Neste mesmo sentido, vale enfatizar que mediante a Educação, em
si mesma, multi, inter e transdisciplinar, pode envolver os demais
processos que visam a instrução, disciplina e desenvolvimento hu-
mano mais confiável, podendo, assim, fazer sentido na atual contri-
buição cultural.

3. A SOCIEDADE PELA FORMAÇÃO HUMANA INTERDISCIPLINAR

Será que a atual sociedade realmente é fraca ou apenas a carne


dentro da nossa sociedade é fraca? Vou falar na primeira instân-
cia o que aconteceu sobre a carne bovina e o desastre de Mariana
que abalou o país, o primeiro no sentido econômico e o segundo no
sentido ambiental. Ambos têm um cunho político e socioambiental,
porque a conjuntura nunca deixará de ser sociopolítica e histórica.
No primeiro caso foi confirmado que a produção de carne bra-
sileira realmente não teve essa fragilidade que foi conhecida como
febre aftosa. A febre foi erradicada, mas, em algumas regiões, ela
persistia. Isso, sem dúvida, acabou prejudicando a imagem de que
o Brasil é uma nação com algum custo de risco, uma nação traiço-
eira, onde dificilmente as leis tem firmeza e clareza para assegurar
os negócios. Isso reflete nos outros fatores que deixam de ser do
campo propriamente humano, mas social. Nossas leis são social-
Ajibola Isau Badiru 117

mente consolidadas, construídas. A constituição foi construída com


a sociedade. Nela é de se entender que o espírito da lei não é o espí-
rito dos homens, mas o da sociedade, voltada dos homens para sua
humanidade. Quando se fala de humanidade se refere às condições
dadas a ela para que viva em paz.
Todavia, vale lembrar que a partir da constituição de 1988, o
Brasil teve a renovação de um quadro cultural. O novo mundo orgâ-
nico orientou diferentes seguimentos na formação, organização e
reprodução social até então desejada. Na década de 1980 foram re-
gistradas manifestações que dizem respeito à máquina administra-
tiva e do incômodo desde a desigualdade social ao uso inadequado
dos recursos, inclusive da ocupação no solo. De fato, a constituição
foi um produto de uma luta social travada por no mínimo 15 anos.
Programado para o ser o novo mundo, o Brasil dos anos 2000 pro-
meteu a conjuntura socioeconômica, uma certa forma mais aberta a
informação, a circulação e interação das pessoas com outras nações
do mundo inteiro.
Pode-se admitir que a constituição dos estados nacionais seja
um marco de grande referência educacional quando se olha para
a cultura, lembrando que as nações são congregações das pessoas
que vivem em comum e em comunhão. Vivem na base de uma iden-
tidade que se consolida e se reveste, construindo uma sociedade
baseando-se em educação como um processo convencional cada
vez mais a ser melhorado.
O segundo fato inesquecível é do desastre de lama de Mariana
que devastou toda a cidade até o mar adentro alcançando propor-
ções visível em imagens de satélite. Será que nós podemos confiar
em nossos afazeres junto ao controle pela tecnologia? A dúvida
ainda persiste na cabeça desse autor sobre essa questão já que a
dimensão da poluição de Mariana ultrapassou a cidade inteira; aba-
lou o estado todo, abalou o país e foi também registrado que tal
abalo foi uma falha humana. O mundo novo é absolutamente novo
118 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

em termos ambientais. Tivemos em 1992 um marco no movimento


ambiental na Rio 92, onde muitas pessoas do mundo todo fizeram
abaixo assinados sobre como pautar nossa sociedade, nossas rela-
ções e nossas cidades de uma forma cada vez mais planejada e com
visibilidade.
Naquela ocasião o mundo todo acreditou na ideia de que a união
sempre agregaria novas forças que eram e continuam necessárias
para superar os desafios socioambientais. São desafios muito maio-
res que o desastre como o de Mariana. Ou seja, o desastre na di-
mensão da humanidade quanto há falência das nações, por falhas
pessoais. As ações individuais podem ser vistas como ondas que se
propagam no espaço e no tempo, tal como a cultura que atravessa
gerações.
Embora os males de Mariana esteja, até hoje, em recuperação, a
empresa responsável pelo desastre, recorreu às seguradoras e, em
vez de quebrar como firma, lucrou sobre o desastre que aconteceu,
como bem relatou e advertiu Alfredo Wagner3. São ensinamentos
de que, de fato, não há o bem sem o mal e o mal sem o bem, mas
que precisamos garantir que essa relação seja uma relação justa em
todos os sentidos. O senso de justiça muitas vezes não é um senso
comum e muitas vezes falta-lhe uma visibilidade para que se possa
ter uma avaliação desse senso o mais justa possível. O que se pode
dizer desses dois casos, é que a sociedade brasileira é formada por
pessoas que vieram através do tempo com um perfil desigual de
modo que, no solo, a realidade cria uma injustiça que reflete exa-
tamente outra realidade não somente no nível da cultura, mas na
falência do processo de Educação.

3 Em evento promovido pela Sociedade Brasileira de Ecologia Humana, realizado em


Lisboa, esse estudioso apresentou os dados e as informações que comprovam como as
Empresas lucraram com o desastre de Mariana e, mesmo assim, entraram na justiça
para minimizar o pagamento das indenizações para as famílias atingidas pelo desastre.
Ajibola Isau Badiru 119

O processo de Educação no mundo orgânico deveria ser um


processo com solidariedade, esse é o princípio que preconiza a for-
mação orgânica, ou seja, as pessoas não precisam ser endurecidas.
Quando se fala em ser humano e humanidade a primeira coisa é
eliminar as condições extremas de guerra e estabelecer condições
extremas de colaboração. Este último é aquilo que é o veículo para
a integração com ecologias mais profundas, o que parece um pouco
difícil no Brasil. Parece que a educação formal fez vista grossa para
a educação humana. As humanidades do mundo inteiro precisam
ser bem vistas e bem quistas de modo que o conhecimento sobre a
natureza também deve ter uma linha integrada a sociedade, a ben-
feitoria da sociedade, visando o planejamento, visando a gestão, vi-
sando a constituição como um todo orgânico.
Em contrapartida, pode-se dizer que a carne fraca é um pensa-
mento popular que não é de hoje. Significa alguma fragilidade que
diz respeito ao corpo, ou seja, é o mesmo sentido quando se verifica
uma cultura baseada na religião e outra cultura baseada na tradi-
ção. A cultura baseada na religião vai tentar trazer todos os seus
mandamentos, tal como está escrito e que precisam ser obedecidos,
sendo a não obediência, muitas das vezes, justificada pela carne fra-
ca. No caso de cultura, baseada na tradição, pode-se perceber que é
a mente desleixada e culpada. Isto é, a mente traiçoeira que acaba
com tudo, fazendo a confusão de não perceber ou fazer uma má
interpretação no processamento de informação.
Nas duas modalidades culturais a carne fraca é eminentemente
a falta de integração da mente com o corpo, pela teoria e pela prá-
tica. É de se entender que o desenvolvimento humano seja funda-
mental pela integração entre diferentes elementos contrastantes,
mesmo necessitando do desenvolvimento da matéria ou do mate-
rial. Nesse sentido, o corpo junto a mente, ambos se fortalecem na
matéria, para alcançar independência motora, autonomia da mente
em movimento consciente com atitudes seguras.
120 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

Segundo a imagem do caçador ilustrado (Badiru, 2016) a visão


panorâmica é imprescindível, com atenção firmada para não se en-
ganar, ou se distanciar do foco, nem mesmo se escorregar no am-
biente mediante a busca de conhecimento do caçador como mostra
a Figura 2, apresentando uma imagem simbólica de AYILERE.

Figura 2- Imagem de Ayilere (o caçador). A representação simbólica da natureza humana entrelaçada com a índole.

Fonte: BADIRU (2016).


Ajibola Isau Badiru 121

O caçador está sempre motivado por objetivos claros, embora no


ambiente natural onde o meio se entope pelas formações espaciais.
Todavia, a técnica baseada no uso de arco e flechas representam o
costume perfeito e integrador da natureza masculina e feminina.
Pelas ferramentas deste tipo, torna-se necessários certo preparo
físico e espiritual para obter sucesso. A superação das condições
normais pode ser alcançada pela elevação da mente e pela simples
percepção do necessário equilíbrio para o procedimento.
A letra e melodia da Terra4 cantada por Caetano Veloso, nos in-
forma o combinado paradoxo da roupagem do ser humano e da via-
gem ao espaço terrestre, cantando:

Quando eu me encontrava preso


Na cela de uma cadeia
Foi que vi pela primeira vez
As tais fotografias
Em que apareces inteira
Porém lá não estavas nua
E sim coberta de nuvens...

Contextualizou a visão afetuosa de Caetano em outro segmento


dessa canção:

Do mar se diz terra à vista


Terra para o pé firmeza
Terra para a mão carícia
Outros astros lhe são guia...

Embora encantadora, a letra musical deixou claro que a Terra


requer certos preparativos que envolvem elementos fundamentais

4 Caetano Veloso. Terra (letra musical). Fonte: Letras. Disponível em: <https://www.le-
tras.com/caetano-veloso/44780/>. Acesso em 3/10/2017.
122 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

da roupagem. É, obviamente, o anseio da ação objetiva a se mani-


festar pelo corpo ou pela mente em movimento. Há três coisas no
caçador: a persona, a mente e o corpo. Normalmente se pensa que
o corpo não tem vínculo direto com o estado da mente e aí estar o
maior engano sobre a persona.
Em minha visão integrada, costumo enxergar o pensamento afri-
cano que afirma: “o pensar é mexer com as tripas”, embora sabemos
que as tripas não estão na cabeça. O que está na cabeça é a massa
do cérebro. Mexer com as tripas significa mexer com a inteligência
emocional. Não precisa “receber santo”, nem muito menos depen-
der de alguma emoção do coração ou de algum desejo para poder
pensar com as tripas.
Neste sentido é válido evidenciar a forma simbólica de uma ana-
logia integrada entre a carne, o osso e a água. Quando se percebe que
em uma pessoa esses elementos coexistem num complexo biológico
sobre domínios específicos, ora ingeridos, ora expelidos, no entanto,
exigem equilíbrio entre si por e para uma integração saudável.
Pode-se afirmar que se a pessoa possui um corpo o que mais
detém é água, a priori, somos portadores de água, depois de ossos e
por fim de carne. A água é a alma, a carne e o osso são indissociáveis
como elementos hereditários. Estes elementos servem de base para
a renovação de nossas águas sagradas, todavia, o osso é considera-
do mais forte do que a carne para tal fim.
O que tem de mais pesado? É a água! A água que nós portamos
é exatamente ela que forma essa dimensão da interdisciplinarida-
de que nós precisamos. Quanto mais nós conseguimos equilibrar o
nosso corpo tanto pela força da água e pela força das pessoas que
estão no ar, nós temos então condições de falar da integração, ou
melhor, da união entre diferentes componentes.
A carne fraca que não é de hoje que se refere realmente à car-
ne e ao que tem dentro da carne que é água. O que tem dentro do
osso também é água. Será ele a concorrência entre o osso e a água
Ajibola Isau Badiru 123

ou o osso e a carne, porque a carne tem que se endurecer se seu


papel não é substituir o osso, mas seu papel é fazer com que o osso
funcione. A carne sempre será fraca, mas não no sentido proferido.
O que pode fazer essa força, seria a qualidade do meio ambiente,
a qualidade de água e a qualidade das relações sociais do qual as
pessoas estão inseridas.
Chama atenção o processo da educação necessitado de interdis-
ciplinaridade. A interdisciplinaridade é a interiorização dessa água
simbólica que seria exatamente o pensamento objetivado da pessoa
em função dos desejos que se quer pelo desempenho do corpo e da
mente de uma forma integrada. Sendo isso uma visão holística nós
podemos também compor a mesma com uma visão reducionista.
Nós podemos ver as partes de uma forma fragmentada e enten-
der que a soma das partes como diz muita gente, faz uma grande
diferença. Logo, a visão holística precisa dessa compreensão inter-
disciplinar onde as pessoas que vão atrás de uma educação conven-
cional não podem deixar a desejar no sentido de encontrar seu eixo
de conhecimento, desse tipo, voltado para sua formação.
A formação humana é a formação da carne, não é a formação
da água. A água faz o complemento. A formação da carne é, conco-
mitantemente, a formação do osso, mas o nascimento da carne é
premente porque vem a frente, é ela quem concorre para superar
o osso.
Se o osso tem essa essência de que a carne precisa se manter
em pé, por que não casar todo o olhar da carne como sendo o do
osso junto, mas tendo a prioridade na valorização da carne? Embo-
ra a matéria mais sublime seja a água dentro da carne ou dentro do
osso, pode-se dizer que a carne tal como o pó mais refinado é mais
forte, a mais graciosa. É ela que precisa estar bem desenvolvida e
distribuída para que não apenas se limite em beleza, mas também
em equilíbrio e harmonia para o que se quer de belo em qualquer
desenvolvimento dentro da sociedade.
124 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

Então a interpretação como campo educacional, inscreve-se


numa melhor visão holística que eu chamo nesse texto como a in-
terdisciplinaridade da Educação. A Educação precisa ser internali-
zada para que a pessoa seja formada em outra pessoa cada vez mais
humana. Trata-se, continuamente, de esforço pessoal, um exercício,
diariamente, uma disciplina, ou seja, a educação humana é uma for-
mação invisível, mas é perceptível pelo comportamento no qual o
indivíduo se torna um novo ser.
O que nasce primeiro? A carne ou o osso? Vale ressaltar a visão
do conhecimento étnico do mito africano de origem Ioruba Oro e
Egungun. São entidades divinas e o mito diz que o Olodumaré re-
solveu enviar os dois para a Terra, com intuito de visitarem outros
seres aqui habitados. Na realidade, como foi que aconteceu? Segun-
do o mito, embora Egungun fosse o irmão bem mais novo de Oro,
ambos estavam com o mesmo grau do medo do desconhecido.
Eles tiveram a obrigação de ir porque Deus mandou, logo, a res-
ponsabilidade estaria pela ordem de hierarquia de nascimento, ou
seja, na tradição Ioruba, o mais velho deveria levar o mais novo jun-
to para a Terra. Mas não foi isso que aconteceu. Então, pelo medo,
Oro mandou o irmão mais novo para bisbilhotar o que acontece na
Terra, para ele saber se realmente ela era segura como um lugar a
ser visitado. Egungun respondeu com medo: “como irei a Terra, já
que nem roupa possuo para me vestir? Argumentando fortemente
que não iria, já que não tinha roupa. Na cultura tradicional é nor-
mal notar as crianças sem roupas, enquanto os mais velhos ves-
tidos. Então Oro disse ao irmão: “vou te emprestar minha roupa e
quando retornar, iremos juntos”.
Os seres habitados da terra estavam desesperadamente espe-
rando Oro, que estava demorando. Quando Egungun chegou à Terra
foi confundido com Oro, até porque estava totalmente vestido com
a roupagem dele. Foi recebido por gritos por todo lado comemoran-
do: “heeee! heee! heeee! Que alegria! Oro chegou! ... que maravilha!”.
Ajibola Isau Badiru 125

Os seres habitados da Terra fizeram tanta festa que nem repararam


que era Egungun. Ele recebeu todos os méritos do irmão mais velho
que por sequência das festividades em homenagem a Oro esqueceu
de voltar. Oro esperava e Egungun não chegava. Passaram-se dias
até que, finalmente, Oro decidiu ir à Terra e quando chegou sem
roupa, ficou com vergonha e não houve festa, pelo contrário, tive-
mos um momento de um pouco de indignação pela chegada de Oro.
Oro foi reclamar com o irmão que foi até condecorado o rei: “Poxa,
que irresponsabilidade é essa!? Você não cumpriu minhas ordens!”.
A festividade é uma manifestação cultural para nós que somos
terrestres, no entanto, a mesma não está livre do engano quanto a
chegada do ente festejado, ou seja, até hoje, é possível comemorar
uma colação, mesmo sendo de grau, simplesmente pela vestimenta
da roupa e não pela realidade da pessoa. O mito ensina que o fe-
nômeno chamado “engano” pode encontrar-se discreto numa nar-
rativa tanto sobre uma verdade e ou mentira. De modo racional, o
discernimento do mesmo requer a necessária analogia, muito além
de reconhecer as perceptivas de uma clareza mitológica.
Nesta realidade, o engano é um fenômeno natural e é notável no
próprio mito. Uma vez que, a roupa de Oro confundiu a aparição
entre o ser Egungun e aquilo que pertence a Oro pode-se perce-
ber que as aparências já enganavam desde longas datas. Neste caso
deve ter demorado alguns anos, mas a verdade alcançou a menti-
ra e a relação dessa passagem foi descoberta com a clareza de que
apenas a roupagem de Oro tinha aparecido, sem a sua figura. Do
mesmo modo se conscientizaram que o grito de alegria pela chega-
da de Oro era mentira por festejar o Egungun no lugar de seu irmão
mais velho.
Na tradição Yoruba, buscou-se resolver esse desencontro e o en-
contro na qual se torna necessário a cultura superar o engano. O
defeito da chegada de Oro foi retificado pela graça do reconheci-
mento cultural que proclama a superioridade dele em relação ao
126 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

Egungun, assim, antecipando o rito divino de Oro em primeiro lugar


antes do rito de Egungun. Todavia, o rito de Egungun permanece
até hoje pela máscara celebrada em lembrança aos antepassados. O
mesmo passou a ser celebrado hoje com o carnaval: uma festivida-
de terrestre no plano profano, como mostra a figura 3.
Figura 3- Os Zulus conhecidos como o “povo do Céu”, pertence ao grupo Bantu, o maior grupo étnico, com mais de
10 milhões de habitantes no sul do continente africano: nos países de Zimbabwe, Zâmbia e Moçambique.

Fonte: <http://eportuguese.blogspot.com.br/2011/07/o-lado-mais-belo-de-africa-parte-ii.html>

Embora esta história também nos revele que ser natural a simi-
laridade entre irmãos, vale dizer que as aparências também servem
para diferenciar sujeitos tão parecidos. Neste caso, nota-se que o
diferencial é a história ao entorno da roupagem e não da linguagem.
É exatamente a segunda que cabe na primeira. Na visão africana as
vestimentas é tudo que o sujeito declara como a identidade, a per-
sonalidade, a particularidade cultural passando pelo simbolismo.
O simbolismo do conhecer e conviver e consolidar-se com a cons-
ciência social é fundamental. Isso nos lembra a necessidade de a
Ajibola Isau Badiru 127

carne ser culturalmente restabelecida para uma sublime perfeição


da formação óssea.
Esta narrativa do mito se parece um pouco com a história que
a própria religião do mundo cristão nos oferece. Muitas vezes a vi-
são da carne não revela apenas a reencarnação. A reencarnação de
que, de um lado, a ideia do que seja o conteúdo ou a propriedade
humana que entre e saia da carne, a ideia que há um sistema a qual
a carne está conectada com a função de apropriar-se da gênese, da
função não só biológica, mas divinamente humana que nós somos.
Por outro lado, a mesma carne é responsável pelo pecado, pela im-
perfeição, pelo efeito, pelo que somos.
Na visão africana, nós somos, a priori, água, por sermos água
nós somos terrestres, ambos componentes que detém grande por-
centagem do nosso corpo. De um lado, a carne pode ser reduzida ao
pó do osso. De outro, o estado da carne é mais fluido, comparado ao
osso. Enquanto a carne cobre o osso, a pele, que por sua vez, per-
tence ao osso, que a protege.
Pode-se dizer que a história da carne fraca não é nova. A no-
ção da carne já se perpetuou pela tradição e as demais tradições
que já houveram. Entre todas podem-se perceber que a tradição
da carne é algo a se aperfeiçoar. Se a carne se nutre de algo, tam-
bém deve ser nutrir de algo quanto mais perfeito possível. O quê
que é mais perfeito para o ser humano do que o corpo, a estética
ou a essência coerente? Pela carne é possível observar a história,
enquanto pela aparência é possível discernir o sujeito. Embora a
ética e a prática sejam dimensões equivalentes de grande valên-
cia. Em ambas, a estética enquanto um fenômeno divino é frontal
e ela tal como a combinada estrutura e função seria a própria
formação.
A carne de cada um, precisa ser educada, mas metodologias para
essa dimensão são muito difíceis de explicação prática. Porém, em
termos de mitos, podemos expor algumas noções por onde a sua
128 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

abordagem pode ser simplificada.  A tradição Yoruba, como de tan-


tas outras milenares, detém profunda consciência de que a carne
precisa ser disciplinada pelo mito e seus encantos. Assim, torna-se
fundamental as abordagens interdisciplinares como exercício diá-
rio do sujeito educando, que dela se apropria, para certa formação
de sua persona.
Nesse caso, eu faço apelo à necessidade de socializar o conheci-
mento. O conhecimento não deve ser um conhecimento teórico, mas
sim um conhecimento integrado: prático, ético e estético. Embora o
mercado exija formações profissionais, as formações humanas são
imprescindíveis porque é dessa base que nós podemos realmente
garantir a carne forte. Nós precisamos aplicar o conhecimento in-
tegrado para o nosso dia-a-dia e internalizar o saber que pode sim
ser útil para o nosso prazer.

4. A CONSTITUIÇÃO ORGÂNICA DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DA


SOCIEDADE

No contexto da sociedade brasileira, a cultura carece de tradição


histórica, uma tradição cultural capaz de demonstrar o caráter in-
terdisciplinar tão necessário para o desenvolvimento humano. Os
mitos indígenas não se encontram com raízes fixadas, as realidades
de seus ancestrais não se dão na esteira do desenvolvimento capi-
talista que já se despediu de suas heranças. Também se despediu
das reivindicações morais e solidárias, resultado do fraco nível de
comunhão na sociedade. Todavia, pretendo me limitar a observa-
ção das ciências humanas.
A educação se alia hoje a uma série de questões sócio espa-
ciais: como a questão do meio ambiente, a questão energética, a
questão indígena, a questão quilombola, a questão dos povos das
florestas, a questão dos povos originais ribeirinhos, a questão ur-
bana, a questão industrial, a questão política, entre outras ques-
Ajibola Isau Badiru 129

tões relacionadas a formação da desigualdade regional. O ordena-


mento territorial embora não pareça, é similar as orientações na
vida ou nas formações educacionais que decorrem de uma série
de disciplinas fundamentais, que são estruturantes, tanto na so-
ciedade como nos indivíduos.
O desenvolvimento humano no campo educacional é resulta-
do dos procedimentos históricos de como os valores relacionados
são compreensivos. Sem dúvida, as dimensões de autoconfiança
e segurança se elevam pelas bases: multi, inter e transdisciplinar,
recomendada por alguns autores, visando o resgate da qualidade
humana, sobretudo, das providências estruturais que atravessam a
melhoria dos resultados educacionais.
Para além da ciência e tecnologia, a auto percepção humana
pressupõe uma chave para aproximar as pessoas em suas relações
complexas. Podemos admitir que a universalidade da educação, em
todos os níveis, envolvendo os acessos públicos a divulgação da ci-
ência e da tecnologia, seja o caminho avançado para o desenvolvi-
mento sustentável e qualidade de vida.   Assim, ambas vinculadas
às questões, tal como problemas com soluções e respostas, deri-
vadas de outros aspectos como da visibilidade econômica ou das
gestões regionais que estão integradas.
A consciência para o elevado discernimento das realidades con-
textuais perpassa por disciplinas como economia e política, espaço
e região, estrutura e processo, frente e costas, preto e branco, todas
aquelas que nos remetem a combinada aplicação do conhecimento
científico-tecnológico. Assim como a tecnologia regional, a educa-
ção merece ser entendida como uma ciência humana pelo qual o
próprio conhecimento se desdobra na capacitação pessoal, ou seja,
a oportunidade de desenvolvimento do indivíduo ou do coletivo.
Como o impacto do conhecimento é capaz de promover um certo
estado sobre a natureza, seja a natureza da própria pessoa ou da
sociedade.
130 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

Neste sentido, a natureza, se refere a ideia de que a tecnologia,


em primeira instância, seja um conhecimento técnico. Em sua es-
sência, a noção técnica persiste com o vínculo humano. Mas, vale
enfatizar que o conhecimento, o poder e o território andam juntos.
Na minha visão a tecnologia regional também envolve o material
em sua instância espacial com a conexão social, ou seja, o homem
como conteúdo de uma forma ou de outra estaria relacionado a
uma espacialidade cultural. Pretendo debater sobre essa última
relação, porque ela nos remete ao caminho interdisciplinar, entre
outras dimensões, visando a combinada estruturação humana e
profissional.
Cada um de nós somos uma figura de si mesmo, independente e
responsável pelo uso de informação. Mas nessas individualizações,
os alunos devem se preparar e não se surpreenderem que cada cur-
so interdisciplinar se promove quanto ao desdobramento do esfor-
ço pessoal. Para a formação de educadores, o estudante desempe-
nha o papel do profissional com o seu desenvolvimento endógeno.
Sem este autodesenvolvimento, não se realiza como profissional.
Embora não seja tão perceptível, o meio ambiente materializa-
-se na formação humana com a cultura. Ao contrário do desenvol-
vimento econômico ou político (PIRES, 2013), a educação humana
em nós se refere a um processo da transformação pessoal que ocor-
re com a formação educacional. Então, na evolução humana, duas
coisas estão em jogo: os sonhos e a realidade. Ambos acabam sendo
transformados ou sofrendo reformas pela consciência ou experiên-
cia dos experimentos.
Argumento que o conhecimento escolar não é somente para o
profissionalismo, mas também para o humanismo porque confron-
ta com a percepção da natureza humana como processo tecnológi-
co. Algumas soluções pessoais giram em torno da visibilidade deste
processo biológico. Enquanto, para outras, menosprezam a impor-
tância da transformação por ser mais motivado pelas necessidades
Ajibola Isau Badiru 131

ou movidos pelas virtudes. Até porque, dificilmente, em vários mo-


mentos enxergamos nossas virtudes. Aliás, parece oportuno dizer
que a humanidade se trata do desenvolvimento humano propria-
mente dito, e é exatamente este o papel do processo da educação.
A educação vislumbra em sua essência atingir o setor da nossa
virtualidade, atender as nossas virtudes sejam elas aquelas que es-
tão inoculadas com objetivos claros ou aquelas questões que ainda
permanecem intactas no nosso subconsciente. Esta perspectiva é
a mesma que nos chama atenção para a complexidade dos mate-
riais que se organizam mesmo aleatoriamente no meio ambiente. O
que eu posso dizer, é que, dentro dos nossos corpos existe espaço
virtual, nossas células guardam essas virtualidades de nosso ser e
trabalham em comunhão para manter a saúde. Em outras palavras,
a biologia, como estudo humano, busca lidar com essa figura mul-
tidimensional.
Por outro, a nossa sociedade depende da educação pelo esforço
de cada um no sentido da humanidade. Tal sentido merece ser to-
cado, pois, nesta acepção, o sujeito humano deixa de ser um mero
sujeito portador de propriedades simbólicas. Embora mereça o
esforço individual para alcançar o fortalecimento da participação
na sociedade e, sobretudo, o entendimento cultural acerca de sua
profissão, o papel da educação visa a mesma orientação investida
pela cultura. Vale lembrar que os educadores são diplomatas em
seu comportamento aberto à promoção da tolerância, humildade,
passividade e outros valores. Então, nota-se que a educação trilha
uma certa direção que muitas vezes se confunde com orientação,
instrução e ações, que convergem para o processo endógeno da
persona em desenvolvimento, que quer melhor consciência huma-
na e, sobretudo, relações que visam a harmonia.
132 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de formação consistente seria aquele que oferece
objetividade e subjetividade juntos. Podendo assim dialogar com
o conhecimento de diferentes aspectos. Interdisciplinaridade pode
ser vista como a aplicação de conhecimento, ou melhor, a interio-
rização objetiva do conhecimento a fim de que o mesmo contribua
para a personalidade do sujeito social, e não se limite apenas a ética
nem mesmo a prática, mas, alcançe aos campos teóricos do sujeito.
Embora não pareça, tanto o fazer e o saber humano são premen-
tes para o sujeito que visa alcançar o fazer social ou profissional na
sociedade. Ou seja, o fazer não é necessariamente o fazer no con-
texto de uma outra dimensão, mas na mesma origem do sujeito. É
possível sim que o educando seja transformado por novos saberes.
Do mesmo modo também é possível que o conhecimento interna-
lizado em nós, nos tragam uma série de componentes que possam
nos ajustar com razão e emoção, podendo se fortalecer no e como
proceder com a nossa vida profissional.
Em síntese, as questões dos valores humanos propriamente di-
tos, são inerentes e sempre bem-vindos, seja, primariamente, para a
educação. Nós precisamos auto avaliarmos, rever nossos valores ao
nível humano, não somente pelo ponto de vista sócio educacional,
mas também do ponto de vista político emocional. Esses valores
pessoais são ingredientes para a formação mais detalhada dos
pontos fortes e fracos a serem pessoalmente ajustados. O pretexto
de se fortalecerem juntos aos meios culturais sempre estão por
detrás, e pela finalidade de nossos objetivos, este fato merece um
pouco de atenção a mais. Este campo do saber é da formação edu-
cacional servindo de base para a verdadeira formação do sujeito
tecnicamente social. Sujeito ciente de si, do cosmos, das relações
socioambientais envoltas na carne forte, no espírito revigorante do
ser natureza com os demais seres.
Ajibola Isau Badiru 133

REFERÊNCIAS
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2011.
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134 O PROCESSO DE EDUCAÇÃO COMO UM FENÔMENO INTERDISCIPLINAR

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tica: Aproximações para uma Ecologia da Arte. In: Juracy Marques (Org.).
Ecologias Humanas. Feira de Santana-BA: UEFS, 2014. 462 p. il. ISBN:
978-85-7395-242-1
SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al. Educação em Direitos Humanos:
Fundamentos teóricos-metodológicos. João Pessoa: Editora Universitária,
2007.
CAPÍTULO 7 SANDRA HELENA DA SILVA
KATIA VIANA CAVALCANTE

DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS


– EXPERIÊNCIAS EM SÃO GABRIEL DA CACHOEIRA/AM

1. INTRODUÇÃO
O paradigma cartesiano tem dominado as ciências desde o sé-
culo XX e ainda está presente em algumas correntes epistemológi-
cas. Tem como pressuposto básico a linearidade, a fragmentação, a
hierarquização do conhecimento, das relações e dos processos de
formação humana.
Santos (2009) qualifica o paradigma dominante como aquele
que apresenta em sua essência uma visão mecanicista e reducio-
nista do mundo tendo sido uma das causas determinantes das cri-
ses sociais e ambientais que imperam no cenário contemporâneo.
O paradigma dominante tende a promover uma ciência comparti-
mentalizada e fechada sobre si mesma, cuja compreensão do mun-
do físico, pessoal e social, tem se reduzido a uma soma de pequenas
partes sem a nítida compreensão do todo.
As crises sociais, econômicas e ambientais são reflexo desse mo-
vimento de produção da ciência que esteve a serviço da reprodução
136 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

do sistema capitalista, criando mecanismos, tecnologias, serviços


para acumulação da riqueza com reflexos perversos sobre o siste-
ma ambiental (degradação de recursos naturais) e nas relações hu-
manas (sociedades fundadas em relações egóicas).
A ciência moderna produziu um modelo de racionalidade que
em tempos modernos está em crise. Crise essa da razão, do pensa-
mento, do conhecimento e das formas de conhecimento que desa-
fiam a interpretação do mundo em sua dimensão complexa.
A produção do conhecimento científico linha essencial do pro-
cesso de formação humana fragmentou e especializou o saber, se-
parando o do senso comum, das ciências naturais e das ciências
humanas e, fundamentalmente, dos saberes reproduzidos entre as
gerações entre os povos tradicionais.
A especialização profissional para Rocha (2001), originada no
século XVIII, promoveu a disciplinaridade e a matematização do
conhecimento, sendo esse mecanismo próprio do capitalismo e
instrumento para a criação de tecnologias e técnicas de trabalho
cada vez mais sofisticadas, promotoras de desenvolvimento social
e econômico para as sociedades. Os resultados dos avanços das
ciências e das tecnologias trouxeram inúmeros benefícios para as
relações e o viver humano, contudo esses benefícios não foram e
não são disponibilizados de forma igualitária e equânime, ficando a
maior parcela da população sem acesso as melhorias das condições
de vida produzidas pela ciência.
As ciências estiveram e estão a serviço do sistema capitalista,
sistema esse promotor de desigualdades dentro do próprio am-
biente de produção do conhecimento cientifico. Para as áreas exa-
tas e tecnológicas maiores investimentos e incentivos para a pes-
quisa, para o desenvolvimento da indústria e para a exploração dos
recursos naturais. Para as ciências humanas, sociais e ambientais
questionadoras do status quo, com uma versão crítica do modelo de
produção e reprodução da riqueza sobram as quirelas.
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 137

Leff (2010) afirma o quanto à crise ambiental vivida em nossa


sociedade é reflexo do problema das formas de conhecimento com
as quais construímos a civilização moderna, destruímos a natureza,
degradamos os ecossistemas, contaminamos o ambiente e subjuga-
mos os saberes.
O conhecimento científico na era moderna representativo da
máxima racionalidade humana desvalorizou os saberes locais,
responsáveis por formas de viver muito mais sustentáveis do que
aqueles produzidos nos laboratórios científicos. Criou-se tratados,
teorias e cartilhas disseminadoras de conhecimentos fragamenta-
dos, sem conexão entre as diversas áreas do conhecimento e fun-
damentalmente sem conexão com os saberes locais. O modelo de
racionalidade que separa, fragmenta também é encontrado no sis-
tema educacional de São Gabriel da Cachoeira/AM. Em virtude da
imposição da cultura ocidental na forma de produzir e disseminar
o conhecimento houve uma perda significativa de saberes e valores
culturais, desde a linguagem, as crenças e tecnologias tradicionais.
No contexto da produção do conhecimento/racionalidade in-
dígena o conhecimento não é fragmentado. Para os esses povos o
pensar complexo faz parte de sua realidade, não se concebe outra
forma de pensar. Em São Gabriel da Cachoeira/AM convivem 23 de
quatro troncos linguísticos que compartilham um sistema comple-
xo de conhecimento, mantendo a originalidade dos saberes de cada
etnia reproduzidos ao longo das gerações.
Hoje há um enorme desafio de promover o diálogo entre os sa-
beres tradicionais e científicos. De acordo com Leff (2010) o diálo-
go de saberes tende a questionar a validade dos esforços das ciên-
cias para unificar o conhecimento, por meio de teorias e sistemas,
dos métodos inter e transdisciplinares, de um pensamento comple-
xo. Dessa forma, o desafio é promover o diálogo de saberes no pro-
cesso educacional de estudantes em São Gabriel da Cachoeira, por
meio da formação em Ensino das Ciências Ambientais.
138 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

As ciências ambientais no século XXI, fundada em um paradig-


ma complexo, faz um convite para uma reforma do pensamento, em
que o pensar, a re-construção do conhecimento possa ser pensada
a partir de uma nova ótica, mais integradora, conectada, associada
e de religação de saberes nas mais diversas áreas do conhecimento,
e interligado ao etnoconhecimento.
Partimos do pressuposto de que educar com base no pensamen-
to complexo colabora para sair do estado de desarticulação e de
fragmentação do saber contemporâneo, de um modelo de pensa-
mento social e político que simplifica e produz um efeito descontex-
tualizado do todo da sociedade (MORIN, 2007).
Esse estudo é resultado de reflexões de docentes e discentes so-
bre os desafios para romper como formas de pensamentos especia-
lizadas, disciplinares, fragmentadas para conceber conhecimento
integrador, inter e transdisciplinar no ensino das ciências ambien-
tais.
A abordagem metodológica desse estudo segue a qualitativa,
valorizando os diálogos, os discursos promovidos entre os parti-
cipantes, professores da rede municipal, estadual e Federal de São
Gabriel da Cachoeira/AM.
No processo de formação no Curso de Mestrado Profissional em
Rede Nacional para Ensino de Ciências Ambientais, implementa-
do por meio da parceria entre Universidade Federal do Amazonas
(UFAM) e Instituto Federal do Amazonas (IFAM) realizou-se o se-
minário “diálogo de sabores e saberes” que nos permitiu exercitar
o desafio de promover diálogo Inter e transdisciplinar. Os partici-
pantes, no total de 18, foram convidados a levar para sala de aula
artefatos e alimentos comuns a cultura indígena do alto Rio Negro.
Os mesmos relataram a importância cultural do elemento apresen-
tado, assim como a relação com a sua área de atuação disciplinar,
tais como: matemática, física, química, geografia, ciência da compu-
tação, zootecnia, enfermagem e engenharia florestal. Em seguida,
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 139

os participantes fizeram uma relação dos artefatos e alimentos pen-


sando na perspectiva inter-transdisciplinar.
Essa atividade foi desenvolvida durante a realização da disci-
plina de Sociedade, Ambiente e Educação no mês de Setembro de
2018, cujo objetivo foi a discussão da complexidade sistêmica (MO-
RIN, 2015, 2012, 2005), a complexidade ambiental e diálogo de sa-
beres (LEFF, 2010).

2. DIALOGANDO SABERES E SABORES NA SALA DE AULA EM SÃO


GABRIEL DA CACHOEIRA/AM
Dialogar saberes remete-nos a criar novas formas de pensamen-
to ou como afirma Morin (2010) promover uma reforma do pen-
samento, uma transformação paradigmática. Esse movimento tem
como palavra chave o pensar complexo, pensar este que compreen-
de os fenômenos, a sociedade e o ambiente como elementos tecidos
juntos. O pensamento complexo é o pensamento que une, não na
confusão, mas sim por meio das diferenciações. O conhecimento
produzido na associação das diversas áreas das ciências, em que os
fenômenos são ao mesmo tempo interdependentes, complementa-
res e antagônicos.
Para Morin (2007) a complexidade é uma rede de acontecimen-
tos, a tríade de estados de ordem, desordem e organização, com-
posto por interações e retroações, acasos esses que constituem o
mundo fenomênico. Este mundo é percebido como sistema, e aí se
tem o conceito de sistêmico que parte do princípio de religação do
conhecimento das partes com o todo.
Os desafios da complexidade encontram-se por toda parte como
um grande desafio para reforma do pensamento. Morin (2012)
afirma que se quisermos um conhecimento pertinente, precisamos
fazer o esforço de reunir, contextualizar, globalizar nossas informa-
ções e nossos saberes, promover assim o pensamento complexo.
140 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

No ambiente da escola a educação está para além da formação


educacional dos indivíduos, é preciso estar focado no compartilha-
mento dos conhecimentos produzidos, dessa forma, o professor
passa a ser o facilitador da aprendizagem. A reforma do pensamen-
to tende a produzir e difundir um conhecimento que deverá ser
apropriado e utilizado pelos discentes, sendo esse promotor de um
pensamento crítico, que ajude a integrar o ensino a vida, o conhe-
cimento à ética, sendo assim, a reflexão e ação passam a ter uma
perspectiva de totalidade.
Nesse sentindo é exigido do educador uma formação mais com-
plexa e completa, com mais responsabilidade e capacidade para in-
tegrar as diversas áreas do conhecimento. O Ensino para as Ciência
ambientais foi elaborado nessa visão, de proporcionar ao mestrando,
professor da educação básica, uma reforma em seu pensar e fazer,
de maneira a dialogar com outras áreas do conhecimento, mas fun-
damentalmente como o conhecimento local – o etnoconhecimento.
A disciplina Sociedade, Ambiente e Educação é a primeira dis-
ciplina do curso de mestrado profissionalizante em Ensino de Ci-
ências Ambientais, momento oportuno para iniciar o processo de
rompimento de paradigmas e concepções de produção do conheci-
mento compartimentalizado, fragmentado e desconectado do real.
É um desafio para os discentes que foram formados e educados
para a reprodução de conhecimentos com base na especialização
de sua área. Os discentes no primeiro momento não conseguem
conceber que o ambiente é muito mais do que a existência da fauna
e da flora, de que o ambiente é a concepção de um todo tecido junto,
seres bióticos e abióticos convivendo juntos numa total relação de
complementariedade, interdependência e antagonismo.
Santos (2009b) qualifica a educação no seio da complexidade
como a emergente necessidade de uma transformação paradigmá-
tica, ambientalista, cujo sentido é a união da vida, do pensamento,
do sentimento e da ação como instrumentos conceituais e metodo-
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 141

lógicos capazes de promover transformações sociais e ambientais


para o todo da sociedade.
Leff argumenta que a complexidade no âmbito da questão am-
biental é:

a reflexão do conhecimento sobre o real, que leva a objetivar


a natureza e a nela intervir, a complexificá-la por um conhe-
cimento que transforma o real e o mundo através de suas
estratégias de conhecimento. (LEFF, 2010, p. 188).

A crise ambiental, da sociedade contemporânea suscita na co-


munidade acadêmica a reforma do pensamento, religando saberes
antes negados, resgatando modos de ser e viver dos povos e junto
com eles construindo novos conhecimentos, a partir do diálogo en-
tre o conhecimento produzido na academia e o vivenciado pelos
povos tradicionais.
Promover a racionalidade e o resgate do saber ambiental é cons-
truir novas realidades. Para Leff (2010) é integrar o conhecimento
racional e o sensível, os saberes e sabores da vida.

O saber ambiental reafirma o ser no tempo, é conhecer na


história, fixa-se em novas identidades e territórios de vida,
reconhece o poder no saber e a vontade de poder que é um
querer saber. (p. 200, 201).

Resgatar e valorizar o saber ambiental, diante de uma racionali-


dade que unifica e reconecta é ensinar a partir de uma perspectiva
interdisciplinar. A interdisciplinaridade proposta pelo saber ambien-
tal implica a integração de processos naturais e sociais de diferentes
ordens de materialidade e esfera de racionalidade (LEFF, 2010).
A interdisciplinaridade tem o propósito de reorientar o conheci-
mento para reaprender a unidade da realidade e para solucionar os
complexos problemas gerados pela homogeneização forçada que
142 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

induz a racionalidade econômica-tecnológico dominante. É ir para


além das disciplinas, romper os isolamentos, seja pela circulação
de conceitos ou esquemas cognitivos ou ainda pela constituição de
concepções organizadoras que permitam articular áreas disciplina-
res em um sistema teórico comum (MORIN, 2015).
Rocha (2001) argumenta que a interdisciplinaridade pode ser-
vir como instrumento privilegiado, unificando os fatores internos
da ciência aos aspectos sociais resultando na ultrapassagem das
fronteiras disciplinares de maneira a formar uma visão ampliada
das realidades. Continua o autor que é necessário perseguir o ri-
gor e a objetividade na produção do conhecimento científico, mas
também deve considerar a particularidade do objeto estudado, em
suas dimensões histórica, política, econômica, social e ambiental,
procurando associar as partes sem perder a dimensão do todo e
vice-versa.
Para Morin (2015) a reforma do pensamento deve iniciar entre
os próprios educadores e não exterior a eles. Assim para que inter-
disciplinaridade possa se efetivar não há a necessidade de eliminar
as disciplinas, mas sim concebê-las como processo sociais em con-
tinuo processo de re-construção.
Santos (2009b) indica a metade do século XX como o período
de compensação da hierarquização das disciplinas na proposição
de diferentes níveis de cooperação entre elas. A criação de cen-
tros e núcleos de pesquisas nas universidades, a partir da década
de 1980 e 1990, abriu possibilidades para novas propostas tidas
como multidisciplinares, pluridisciplinares, interdisciplinares e
transdisciplinares.
O novo paradigma em educação no século XXI deve ser entendi-
do sobre o conceito da transdisciplinaridade, cuja proposta abrirá
um novo momento para a leitura do mundo. Formadora de um pen-
samento que percebe o mundo em sua totalidade, concebe-o como
sistema ambiental - um todo organizador (SANTOS, 2009b).
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 143

A transdisciplinaridade para Morin (2015) representa os esque-


mas cognitivos que podem ultrapassar as disciplinas, compreender
o que re-liga as diversas áreas do conhecimento e as torna de algu-
ma forma um sistema único.
Santos (2009b, p.7) alude que a transdisciplinaridade foi se
constituindo sobre três eixos formadores:

Teoria da complexidade: vista como uma organização em


constante processo de transformação de seus limites; Níveis
de realidade: que dependem da especificidade que se confe-
re a cada um deles, uma vez que são de materialidade e leis
diferentes, se comunicam entre si e se retroalimentam, são
abertos e fazer parte do Real; Lógica do Terceiro Incluído: a
que ultrapassa o nível do antagonismo e da complementari-
dade, trabalhando com a triangulação, fornecendo as bases
inovadoras para um trabalho transdisciplinar.

Para além da ideia de inter-transdisciplinaridade é preciso con-


servar noções chaves a compreensão dessa reforma do pensamen-
to, ou seja, a cooperação entre as diversas áreas do conhecimento, o
objeto comum, ou ainda transcendendo descobrir o projeto comum
(MORIN, 2015).
Um ponto central nesse estudo é a reivindicação dos saberes
locais e o diálogo dos saberes para a construção de uma nova ra-
cionalidade na produção no conhecimento, em especial, no ensi-
no das ciências ambientais. Para Leff (2010) valorizar os saberes
locais desloca a supremacia da produção do conhecimento cien-
tífico reinante no cenário da ciência moderna, da relação obje-
tiva do conhecimento e sua pretensão para tornar-se universal.
E assim coloca em evidência os saberes arraigados nas condi-
ções ecológicas do desenvolvimento das culturas, nas diversas
formas de habitar um determinado território e busca o sentido
existencial do Ser cultural.
144 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Como bem pontua BoaVentura de Sousa Santos (2009a) é pre-


ciso reformar o pensamento, promover a instituição de um novo
paradigma produtor de um conhecimento que reconheça os sabe-
res locais e esses sejam indicativos para compreender os fenôme-
nos sociais, ambientais e sua totalidade; um conhecimento que é
gerado no senso comum e retorna a ele para ampliar saberes e fa-
zeres; um conhecimento que seja produtor de autoconhecimento,
que contribua para ampliar consciências e retirar os povos de seu
estado de estagnação e alienação. Para tanto, os atores sociais en-
volvidos na produção do conhecimento, no processo de ensinar e
aprender precisam estar ativos e protagonistas de todas as etapas.
É a partir dessa concepção de produzir conhecimento na área
dos ensinos das ciências ambientais que foi realizada uma ativida-
de lúdica na disciplina Sociedade, Ambiente e Educação, com obje-
tivo de compreender por meio dos saberes e sabores locais como
podemos construir conhecimentos que vão além de uma área espe-
cifica do saber cientifico, mas que dialogue entre as diversas áreas
e em especial com os saberes locais.
Essa disciplina ocorreu em São Gabriel da Cachoeira/AM, muni-
cípio onde é encontrada a maior concentração da população indí-
gena do Estado do Amazonas, berço de uma riqueza sócio cultural
única e reveladora de modos de ser e fazer que retratam costumes,
organizações produtivas que nos remetem a um passado remoto.
Foi solicitado aos alunos do Mestrado em Ensino das ciências
Ambientais que trouxessem artefatos, plantas e/ou alimentos re-
presentativos da cultura local. Assim, foram disponibilizados, ces-
tos, cuias, arcos e flechas, temperos, pimentas, plantas de poder,
frutas, sementes, caldos, representando os saberes e sabores dos
povos indígenas que lá habitam, conforme indicados na figura 1.
Nesses saberes e sabores foi possível encontrar artefatos e diversos
sabores das principais etnias locais Tikuna, Baré e Baniwa.
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 145

Figura 1- Saberes e Sabores em São Gabriel da Cachoeira/AM

Fonte: Atividade de aula – setembro/2018

Na atividade proposta havia professores das diversas áreas do


conhecimento, cada um especialista em sua área e o grande desa-
fio foi sair de suas zonas de conforto, de suas caixinhas já progra-
madas e formatadas, para pensar além da racionalidade cientifica
reproduzida no processo da educação formal. Havia a presença de
professores da área da Física, História, Geografia, Matemática, Edu-
cação Física, Ciências da Computação, Sociologia, Ciência Política e
Gestão. Enfim, uma diversidade de áreas para pensar em uma nova
proposta de produção do conhecimento, dentro de uma perspecti-
va complexa e ampliada.
O ponto central da atividade foi pensar para além da sua área do
conhecimento de maneira a romper com a visão reducionista pro-
pagada pela ciência moderna, cujo objetivo é fragmentar e reduzir
o processo de concepção e elaboração do conhecimento científico.
146 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Após alguns minutos de observação aos produtos expostos na


mesa (artefatos, plantas, alimentos) os discentes pouco compreen-
diam como poderiam pensar a física ou mesmo a ciência política
em um cesto, uma canoa, uma planta medicinal.
Com base na literatura apreendida na disciplina, fundamentada
no paradigma dialético da complexidade sistêmica, foi solicitado
novamente aos discentes que observassem os produtos pensando-
-os como objetos concebidos dentro de um ambiente muito mais
amplo, complexo, resultante de ações humanas, reprodutoras de
valores, saberes, cultura, lógicas econômicas de determinadas et-
nias e até mesmo da racionalidade capitalista. Nos artefatos estava
reproduzida uma série de saberes locais cujos conteúdos devem
ser pensados de forma associativa com os saberes científicos.
A proposta era compreender a realidade como uma dimensão
complexa, portanto, exige um pensamento ampliado, abrangente e
multidimensional, com a capacidade de compreender o quão com-
plexo é o real e levar a conceber e elaborar um conhecimento que
reconheça essa amplitude (SANTOS, 2009b).
A partir dessas reflexões iniciais foi solicitado aos discentes que
pensassem os produtos expostos na ótica da interdisciplinaridade.
Nesse aspecto os discentes ampliaram a sua compreensão. Foram
destacados: no que tange a relação de interdependência entre a ma-
temática e a engenharia da computação, foram discutidas as formas
geométricas dos artefatos, bem como os algoritmos empregados na
confecção dos mesmos, indicando a utilização de proporcionalida-
des; já na física e química pôde-se abordar que todos os materiais
presentes na mesa eram constituídos de matéria. Assim como as re-
ações químicas e físicas presentes na confecção de artefatos e pratos
típicos; na perspectiva histórica foi discutido sobre o contexto de al-
guns dos artefatos como cestarias e a pimenta Baniwa, foram relata-
dos mitos e histórias de algumas etnias que envolvem os elementos,
assim como abordaram sobre os espaços e ritos associados.
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 147

No campo da sociologia e da antropologia foi destacado o poder


das plantas medicinais que curam e encantam, em que foi feita uma
relação com a biologia, que trabalha os processos vitais, a relação
dos seres vivos e o meio em que vivem. Além de outras temáticas,
foi relatado que os povos indígenas, antes de qualquer tratamento
da medicina ocidental, recorrem às práticas de curas tradicionais,
como por exemplo, o uso de plantas para a cura de doenças, assim
como para acessar estados alterados de consciência.
As discussões a partir da mesa de saberes e sabores, além de
fazer uma relação entre as diversas áreas do conhecimento trouxe,
especialmente, uma reflexão de como a produção dos artefatos e
produtos indígenas trazem inúmeros aspectos que são discutidos
em sala de aula, mas que nunca é pensado como, por exemplo, com
que precisão os povos indígenas constroem suas canoas, arcos e
flechas, produzem seus alimentos, sem nunca terem estado numa
escola formal. Os saberes locais reproduzidos por eles geracional-
mente indicam um alto conhecimento de física, química, matemá-
tica, geografia, ainda que não a discutam em seu cotidiano, como o
fazemos nas salas de aulas. As diversas áreas da ciência estão pre-
sentes em um único objeto como um cesto.
Sob os pontos destacados faz-se necessário revisar a educação
formal e os seus pressupostos de construção do conhecimento, en-
volvendo o grande público, incluindo aqueles a quem lhes foi nega-
do o acesso à escola (SANTOS, 2009b).
Cerca de 90% dos alunos das Escolas Públicas de São Gabriel
da Cachoeira/AM são oriundos das comunidades indígenas. A re-
flexão dos professores a partir da dinâmica em sala de aula, na dis-
ciplina de mestrado, é que pouco ou nenhuma associação tem sido
estabelecido entre os saberes reproduzidos em sala de aula com os
saberes trazidos dos povos étnicos de seus alunos. O aluno nesse
contexto é aculturado no modelo de ensino formal, que nega sua
identidade, os saberes de seus povos e esse movimento tende a tra-
148 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

zer uma série de efeitos na conservação dos modos de ser e fazer


tradicionais, podendo haver perdas de hábitos e costumes funda-
mentais para a conservação da vida.
Destacamos no início do texto o quanto a ciência moderna dis-
ciplinar, fragmentada e reducionista propagou lógicas destrutivas
no pensar e fazer dos indivíduos e o ensino público precarizado e
aligeirado continuarem nessa mesma lógica, de produção de indiví-
duos dóceis, passivos, acríticos e prontos para compor o exército de
reserva próprio do mercado capitalista.
De fato é urgente a promoção de uma reforma do pensamento
em que temas transversais possam criar novos mecanismos para o
processo de ensino e aprendizagem na educação formal. A ideia é
construir coletivamente o conhecimento, sem negar o rigor cientí-
fico, a complacência filosófica e a abertura para os saberes locais.
A atividade realizada na sala de aula abre a possibilidade de se
pensar transdisciplinarmente, a partir da constituição de temáticas
transversais, representativas dos problemas oriundos do mundo
real e que afetam as diversas áreas de atuação dos sujeitos sociais
envolvidos.
No que tange a transdisciplinaridade os discentes/professores
aludem sobre o quanto um alimento como a farinha e ou a pimenta,
tão presente na dieta regional podem servir de instrumento para
a produção do conhecimento multidimensional. Questões como a
escassez desse tipo de produto no mercado, pode-se nos levar a
inferir uma série de aspectos em que o diálogo entre as diversas
áreas da ciência estejam em destaque. A exemplo, é preciso refle-
tir sobre as determinações postas na queda da produção, questões
biológicas como a proliferação de pragas, questões culturais em vir-
tude da mudança de hábitos alimentares, a introdução de alimentos
industrializados na dieta alimentar; problemas de organização na
produção da agricultura familiar; fatores climático como chuvas ou
secas excessivas. A partir de um único problema é possível buscar
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 149

estratégias nas mais diversas áreas da ciência, para estabelecer so-


luções ou caminhos para o entendimento de problemas latentes em
nossa sociedade.
Para Santos (2009b) a transdisciplinaridade procura elaborar
um tipo de conhecimento que potencialize novas maneiras de ser
no mundo, restituindo ao sujeito à sua integridade, de maneira
a criar uma nova dinâmica de reflexão e ação. A atitude diante
da produção do conhecimento é a busca incansável em cada dis-
ciplina e nas demais, formando uma rede de interligações entre
todas as disciplinas, consorciada com outros saberes e com outros
olhares, de maneira a elaborar um conhecimento que possa ser
compartilhado por todos e contribuir para a criação de socieda-
des mais sustentáveis.
O exercício proposto em sala de aula contribuiu para ampliar
a percepção dos mestrandos em ensino das ciências ambientais e
compreender que o ensino pode estar além das paredes e muros da
Instituição de Ensino, é preciso acolher, compreender e difundir os
saberes locais na interconexão com os saberes científicos e a sala
de aula pode ser o início da elaboração e consolidação desse novo
paradigma.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atividade proposta desafiou todos os mestrandos a repensarem
as suas práticas pedagógicas, redefinindo o modo de abordagem dos
sabores e saberes locais, respeitando e valorizando a diversidade ét-
nica como uma rica área de produção do conhecimento local.
O diálogo com os conhecimentos dos povos tradicionais, que
procuram viver em um movimento de integração e religação com
o ambiente vivido, indica caminhos para produzirmos conheci-
mentos que garantam o protagonismo e o respeito a diversidade.
Os povos tradicionais e os indígenas em especial tem sido aqueles
150 DIÁLOGO DE SABERES NO ENSINO DAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

possuidores de estratégias para promover sociedades mais susten-


táveis e garantidoras de um bem viver. A relação desses povos com
o ambiente é de respeito e de sacralidade. A fauna e a flora tem
representatividade no modo de viver dos povos indígenas e isso é
retratado na forma como produzem seus artefatos.
Por meio do diálogo de saberes houve o reconhecimento do sa-
beres locais como produtores de conhecimento que podem contri-
buir para sociedade mais sustentáveis. Uma produção do conheci-
mento que una, religue, que compreenda a sociedade e ambiente
como um grande complexus.
A produção do conhecimento a partir de uma perspectiva in-
terdisciplinar não nos parece como uma atividade altamente de-
safiadora, visto que essa perspectiva está presente em inúmeras
atividades pedagógicas. Associar uma disciplina a outra tem sido
um exercício frequente entre os professores, em especial os mes-
trandos em ensino das ciências ambientais. O grande desafio está
para o além da associação das disciplinas, da atividade pedagógica
conjunta, está em perceber o que perpassa as diversas disciplinas,
do que dá sentido a elas, na busca de soluções para os problemas
que estão no mundo. Contribuindo para que discentes e professo-
res tornem sujeitos sociais mais participativos e responsáveis pela
sociedade que se pretende construir. A transformação paradigmá-
tica deve iniciar por nós professores.
No exercício proposto e apresentado nesse estudo, entendemos
que a ética pautada em uma racionalidade ambiental pode ser o ca-
minho que une, religa os saberes, que transita pelas diversas áreas
do conhecimento e podem ser instigadores para uma reforma do
pensamento na produção de um saber que é local e pode também
ser total.
Sandra Helena da Silva; Katia Viana Cavalcante 151

REFERÊNCIAS

LEFF, Enrique. Discursos Sustentáveis. São Paulo: Editora Cortez, 2010.


MORIN, Edgar. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o
pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2015.
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Ale-
gre: Sulina, 2007.
MORIN, Edgar. Os Desafios da Complexidade. In. A religação dos saberes.
O desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.
MORIN, Edgar. Por uma reforma do pensamento. In. PENA-VEJA, Alfredo;
NASCIMENTO, Elimar Pinheiro. O pensar complexo. Rio de Janeiro: Ga-
ramond, 2010.
ROCHA, Paulo Ernesto Diaz. Interdisciplinaridade e Meio Ambiente em
Cursos de Pós Graduação no Brasil. Programa de Pós-Graduaçao em
Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro, 2001.
SANTOS, BoaVentura Sousa. Um discurso sobre as ciências. São Paulo:
Editora Cortez, 2009 (a).
SANTOS, Elizabeth da Conceição. Educação Ambiental e Ensino das Ciên-
cias: A Transversalidade e a Mudança de Paradigma. Encontro Nacional
de Pesquisa em Educação em Ciências. Florianópolis, 08 de novembro de
2009 (b).
EIXO 2

PESQUISAS, EXPERIÊNCIAS
E VIVÊNCIAS ESCOLARES
NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS
CAPÍTULO 8 NÚBIA DIAS DOS SANTOS
GILBERTO JACÓ CARVALHO SANTOS

ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA: PERCEPÇÃO AMBIENTAL E


SENSIBILIZAÇÃO DE DISCENTES DO ENSINO MÉDIO PARA
CONSERVAÇÃO DO AÇUDE PINDORAMA

1. INTRODUÇÃO
A sociedade contemporânea vive uma situação peculiar de es-
tranhamento, de si, do outro, da vida, do cosmos. Essa alienação da
mente, do coração e da alma implica na visão superficial da reali-
dade e na dificuldade em se ver como natureza e protagonista da
história terrena. Diante disso, perceber a natureza, e a sua relação
com o homem, perpassa por diversos saberes que buscam explicar
essa relação biunívoca.
Ao nos depararmos com diversos problemas ambientais cau-
sados pelas relações de conflito entre o ambiente e a sociedade,
percebe-se a necessidade de participação coletiva dos sujeitos na
busca de soluções para tais problemas. Dessa maneira, as práticas
pedagógicas ambientais contribuem para a resolução dos conflitos
entre o ambiente e a sociedade.
A intervenção humana na natureza, aliada ao sistema socioeco-
nômico excludente, nos faz repensar sobre a relação homem - na-
156 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

tureza, como também enxergar as mazelas sociais dessa relação. O


aumento nos padrões de consumo, voltado para a acumulação de
bens, resultou na atual crise ambiental, que nos faz repensar sobre
nossas escolhas e sobre nosso modo de vida. Portanto, podemos ir
mais adiante e dizer que vivemos uma crise socioambiental, uma
crise civilizatória, em que novos caminhos estão sendo construídos
através de outro projeto de sociedade e de outro sentido para viver
(LEFF, 2016; GONÇALVES, 2006).
Observar a natureza, e identificar suas especificidades, requer
um olhar empático e este olhar surge com o sentimento de per-
tença do seu meio. Assim as experiências e vivências podem ser
legitimadas quando há diálogo e escuta em outros ambientes. O
ambiente escolar é espaço para mobilizações sociais que possibi-
litam as dialogicidades em diversas temáticas, sendo a ambiental
fundamental para formarmos sujeitos sensibilizados em perceber
as especificidades do seu meio.
Nesse propósito, a água, como fonte indispensável de sobrevi-
vência dos seres vivos, tornar-se como dimensão essencial da vida
especificamente humana. Por isso, há uma grande necessidade de
compreender a água em sua totalidade, através da sua origem, ci-
clo hidrológico, dinâmica fluvial, uso sustentável, bem como riscos
associados aos processos naturais (assoreamento e enchentes) e
processos humanos (despejo de efluentes e resíduos sólidos, capta-
ção imprópria de água, manipulação direta dos canais e a ocupação
arbitrária de suas margens) (BACCI e PATACA, 2008).
O presente trabalho surge das vivências e observações, em sala
de aula, nas disciplinas de Geografia, História, Biologia e Química,
sobre a invisibilidade do açude Pindorama em uma escola pública
estadual do ensino médio1 no município de Heliópolis – Bahia. Par-

1 Colégio Estadual José Dantas de Souza.


Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 157

tindo desse olhar interdisciplinar, o presente estudo teve o objetivo


de avaliar a percepção ambiental dos discentes e dos sujeitos resi-
dentes às margens do açude Pindorama, no alto curso da bacia do
rio Real, onde o mesmo encontra-se próximo geograficamente da
escola, mas longe do olhar, do ver e enxergar da comunidade esco-
lar. Perante a problemática, foram planejadas e realizadas situações
e atividades didáticas as quais possibilitaram o despertar do olhar
dos discentes quanto à importância do açude para a comunidade.
Além disso, foram desenvolvidas atividades desafiadoras que se fi-
zeram relevantes na formação de um sujeito social ecológico, prota-
gonista e agente multiplicador em defesa do meio ambiente. Jacobi
(2005) defende que escolher atividades/estratégias que contem-
plem os desígnios da educação ambiental é sensibilizar, modificar
atitudes e práticas sociais, desenvolver conhecimentos, capacidade
de percepção e participação dos educandos. Complementando a
defesa de Jacobi (2005), Freire (2011) preconiza que ensinar exi-
ge pesquisa, já que pesquisamos para conhecer algo e apresentar-
mos aos nossos pares o novo conhecimento. É nesse contexto que
buscou fundamentar este trabalho na abordagem teórica – prática,
abarcando o viés da interdisplinaridade como também os aspectos
fenomenológicos usados como metodologia científica.
Para aproximar o aporte teórico-prático foi elaborada uma prá-
tica pedagógica que propôs visitas técnicas ao açude Pindorama,
entrevistas com a comunidade local e discussões dos achados. A li-
teratura ratifica (FAZENDA, 2010; FREIRE, 2001; LEFF, 2001; LOU-
REIRO e TORRES, 2014) que promover ações ambientais exigem
conhecimentos interdisciplinares, o que resulta na aproximação
dos distintos saberes para formação de cidadãos, na condição de
protagonistas participativos, comprometidos com a resolução das
problemáticas socioespaciais da sua comunidade. Assim, a prática
pedagógica contribuiu para outro despertar sobre a realidade, com
a constatação de resultados positivos em curto prazo.
158 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

2. ÁGUA E CRISE AMBIENTAL: ANÁLISE CONCEITUAL EM SALA DE


AULA
Considerada renovável e abundante, a água é fonte de vida e ele-
mento vital para o equilíbrio dos ecossistemas nas suas diversas
formas - corpos humanos, animais e vegetais -, e indispensável para
manutenção de todas as atividades terrestres. Desde o surgimento
das civilizações, o homem sempre procurou viver próximo da água
e criou uma relação muito estreita com esse bem, ampliando sua
dependência de sustentação de vida na medida em que se expandiu
o desenvolvimento socioeconômico da população.
Apesar da sua fundamental importância, a disponibilidade desse
bem se encontra cada vez mais ameaçada, na medida em que se am-
pliam os conflitos de seus múltiplos usos e pelas condições naturais
de distribuição desigual de água no planeta (TUNDISI, 2003). Além
disso, a busca desenfreada do homem pela água, tanto para o consu-
mo, quanto para diversas atividades, atrelada pela qualidade com-
prometida em função da poluição, da falta de gestão, entre outros,
gera um estado de conflito no que se refere à disponibilidade hídrica.
No entanto, ao longo de sua história o homem procurou reduzir a
escassez e o risco da falta de água, através de obras hidráulicas (TUC-
CI, 2005), como as construções de açudes e barragens, regulando as
vazões e aumentado à disponibilidade ao longo do tempo.
Quando dotada de valor econômico, a água muitas vezes é de-
nominada como recurso hídrico, atendendo seu papel fundamental
para a realização das atividades que regulam a sociedade, como uso
agropecuário, abastecimento público, produção industrial e lazer
(BRASIL, 2005). Assim, quando alteradas as condições naturais da
água pela atividade humana, denominamos de usos, que podem ser
consuntivos, retira a água do manancial para sua destinação, e não
consuntivos, não envolve o consumo direto da água (AGÊNCIA NA-
CIONAL DAS ÁGUAS, 2011).
Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 159

Diante do exposto, o homem, a fim de sanar suas necessidades e


desejos, vem há muitos anos alterando o ambiente que vive em bus-
ca do desenvolvimento econômico prejudicial ao meio ambiente e
à qualidade de vida dos habitantes do planeta terrestre. Dentre as
maiores preocupações da espécie humana nos dias atuais situam-
-se os riscos decorrentes de perda da qualidade da água. De acordo
com Bacci e Pataca (2008):

Na sociedade em que vivemos, a água passou a ser vista como


recurso hídrico e não mais como um bem natural, disponível
para a existência humana e das demais espécies. Passamos
a usá-la indiscriminadamente, encontrando sempre novos
usos, sem avaliar as consequências ambientais em relação
à quantidade e qualidade da água (BACCI e PATACA, 2008).

As discussões, em sala de aula, abordadas principalmente na


disciplina de Geografia, sobre os conceitos de água, recursos, corpo
hídrico e bem natural, tornaram-se um desafio de (des)construção,
já que a maioria dos discentes vê a água como recurso e não como
um bem natural essencial à vida. A partir dessa problemática, bus-
cou-se analisar a água enquanto vida, em prol do equilíbrio socio-
ambiental no açude Pindorama. Nesse contexto, os discentes foram
instigados a compreender a água em sua totalidade, tendo como
ponto de partida o contato com a comunidade do açude Pindorama,
que padece por utilizar água altamente poluída. Na medida em que
houve diálogo e troca de saberes com a comunidade, foi possível
aproximar os discentes/pesquisadores da percepção de água como
fonte de vida.
Os diálogos e trocas de saberes possibilitam ampliar discussões
sobre a crise ambiental, indo além das problemáticas hídricas. Vale
ressaltar que a crise ambiental deve ser abordada em todos os ní-
veis de ensino para ratificar o compromisso humano com o meio
ambiente. Infelizmente ainda se perpetua um processo histórico de
160 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

desvalorização da água, das matas, dos seres vivos. O pensamento


retrógrado de que a água é infinita ainda prevalece socialmente, e
somente por meio da educação é que esse pensamento pode ser
transformado e sensibilizado para gerações futuras.
A crise ambiental não é uma crise natural, mas sim uma crise
provocada pelas sociedades.

A crise ambiental é a crise do nosso tempo. O risco ecológico


questiona o crescimento do mundo. Essa crise apresenta-se
a nós como um limite real, que resignifica e reorienta o curso
da história. [...], mas também crise do pensamento ocidental:
da determinação metafísica que ao pensar o ser como ente,
abriu caminho para a racionalidade cientifica como uma or-
dem coisificada e fragmentada [...]. Por isso, a crise ambien-
tal é acima de tudo um problema de conhecimento, o que nos
leva a repensar o ser no mundo complexo (LEFF, 2001).

A sociedade atual está embasada num modelo de desen-


volvimento capitalista atrelado ao consumismo desenfreado
e à acumulação de bens, que valoriza excessivamente o ter
em detrimento do ser, ocasionando a produção de grande
quantidade de resíduos sólidos, entre outras consequências
socioambientais. Essa ideia fantasiosa de um progresso sem
limites embalou os projetos dos países centrais, e os sonhos
dos países periféricos, numa corrida incessante de domínio
da natureza, desconhecendo seus limites, onde se configura a
vida (LEFF, 2016, p.140). Esse descuido com a vida é conde-
nado por Boff (2002) que conceitua o cuidado como desvelo,
solicitude, diligência, zelo, atenção, bom trato. Dessa forma,
cuidar é mais do que um ato, é uma atitude.
As questões levantadas impulsionam debates em sala de
aula, entretanto, sem uma sensibilização e formação do pro-
fessor subsidiada para ciências ambientais, não há como des-
Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 161

pertar nos discentes uma reflexão no que tange à conservação


do ambiente de modo a promover a educação ambiental e a
mobilização dos diferentes atores sociais.

3. EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO PROCESSO DE MOBILIZAÇÃO SOCIAL


A reflexão sobre as práticas sociais, em um contexto marcado
pela degradação permanente do meio ambiente e do seu ecossiste-
ma, envolve uma necessária articulação com a produção de senti-
dos sobre a Educação Ambiental. A dimensão ambiental configura-
-se crescentemente como uma questão que envolve um conjunto de
atores do universo educativo, potencializando o engajamento dos
diversos sistemas de conhecimento, a capacitação de profissionais
e a comunidade universitária numa perspectiva interdisciplinar
(JACOBI, 2003).
Juntamente com a interdisciplinaridade, o trabalho coletivo é es-
sencial para construção de uma visão conjunta, na qual se observe a
complexidade das questões ambientais. Ainda a legislação brasileira
na sua Lei 9.795/1999 entende, por educação ambiental, como um
processo pelo qual o indivíduo e a coletividade constroem valores so-
ciais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas
para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo,
essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (BRASIL,
1999). Desse modo, a Educação Ambiental deve ser vista como um
processo de transformação no modo de pensar individual e coletivo e
não somente como uma prática pedagógica. No Art. 10, §1°, estabele-
ce que a Educação Ambiental não deve ser pensada como disciplina
isolada no currículo escolar. Além disso, a Conferência Intergover-
namental de Tbilisi (1977) recomenda que haja articulação de di-
versas disciplinas e experiências educativas, que facilitam a percep-
ção integrada do meio ambiente, tornando possível uma ação mais
racional e capaz de responder às necessidades sociais.
162 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

O processo de mobilização social é algo histórico e inerente à


essência humana. Conquistar um direito ou defender um ideal re-
querem engajamento e busca incessante para modificar mazelas
sociais, ambientais e econômicas. Estes por sua vez, no mundo de
relações harmônicas e igualitárias, não devem ser distanciados e
sim congruentes, que fomentem, inclusive, a participação demo-
crática. No campo da Educação Ambiental, pensar em mobilização
social é se deparar com autonomia e com as responsabilidades
que a problemática traz. É preciso também mencionar a existên-
cia do movimento ambientalista e suas vertentes: Ecologismo e
Ambientalismo. O primeiro emerge junto com os movimentos
sociais, trazendo novos valores, perspectivas, métodos e aproxi-
mações políticas; já o segundo introduz valores na ação social e
a na organização política, gerando novas formas de participação,
estratégias de mudança social e relações de poder (LEFF, 2009). E
ambas se caracterizam por:

[...] sua composição pluralista e pela heterogeneidade de


seus atores sociais que vão conformando alianças em torno
de objetivos comuns: a sobrevivência da espécie humana, a
conservação da natureza, a diversidade étnica, a autossufici-
ência alimentar, a seguridade social, o equilíbrio ecológico, a
qualidade de vida e a participação comunitária na gestão dos
recursos [...] (LEFF, p 113, 2009).

A participação popular passa a ter um papel importante na cons-


trução de sujeitos críticos e reflexivos quanto aos problemas ambien-
tais, de forma que consolida a integração de metas e estratégias para
uma gestão ambiental e territorial de qualidade (BADIRU, 2006).
Estamos diante de uma Educação Ambiental pautada na mobili-
zação social iniciada no ambiente escolar, cuja formação de sujeitos
é voltada para percepção e sensibilização das questões ambientais
no seu entorno. As políticas educacionais têm estruturado docu-
Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 163

mentos norteadores para a prática educativa, a exemplo das Dire-


trizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental:

O atributo “ambiental” na tradição da Educação Ambiental


brasileira e latino-americana não é empregado para especifi-
car um tipo de educação, mas se constitui em elemento estru-
turante que demarca um campo político de valores e práticas,
mobilizando atores sociais comprometidos com a prática po-
lítico-pedagógica transformadora e emancipatória capaz de
promover a ética e a cidadania ambiental; (BRASIL, 2012)

É de acordo com essa discussão que a educação ambiental mais


uma vez retoma o estudo da percepção como área que diz respeito
às inter-relações entre o comportamento humano e o ambiente, e
também aponta o melhor caminho para se enfrentar e controlar os
danos ambientais dentro de determinadas comunidades. Para Leff
(2016), a percepção ambiental não se resume apenas em pergun-
tar aos sujeitos sociais sobre seus valores e interesses que os mo-
bilizam, vai além de saber quais possibilidades que a humanidade
tem para mudar o estado de insustentabilidade do mundo a que a
racionalidade da modernidade a conduziu: seus raciocínios, suas
crenças e suas instituições. Contudo, a percepção mais apurada do
ser humano, em relação ao ambiente, modifica-se de acordo com as
experiências e vivencias de cada um ao longo do tempo e espaço.

4. A INTERDISCIPLINARIDADE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA

Para Fazenda (2010), a interdisciplinaridade se efetiva como


uma forma de sentir e perceber o mundo. Estimula o sujeito do co-
nhecimento a aceitar o desafio de sair de uma “zona de conforto”,
protegida pela redoma do conteúdo das disciplinas, e retomar o en-
canto da descoberta e da revelação do novo e complexo processo de
construção do saber. De acordo com as DCNs, a interdisciplinarida-
164 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

de e a contextualização devem assegurar a transversalidade do co-


nhecimento de diferentes disciplinas e eixos temáticos, perpassan-
do todo o currículo e propiciando a interlocução entre os saberes e
os diferentes campos do conhecimento (BRASIL, 2010).
Partindo desse olhar interdisciplinar, o presente estudo teve o
objetivo de avaliar a percepção ambiental dos discentes e dos in-
divíduos residentes às margens do açude Pindorama, levando em
consideração suas expectativas, agrados e desagrados, críticas
e comportamentos, de forma a subsidiar ações de Educação Am-
biental e de gestão popular nessa localidade. Em sala de aula foram
discutidos os conceitos de água, percepção, recurso, corpo hídrico,
sustentabilidade, bacia hidrográfica, entre outros. A pesquisa foi
desenvolvida em etapas: a primeira com levantamento de dados
bibliográficos e realização de entrevistas com a comunidade local;
a segunda, sob orientação dos professores de Geografia, História,
Biologia e Química, os discentes realizaram saídas de campo no en-
torno do açude Pindorama (Figura 1).
O primeiro campo teve como objetivo possibilitar uma aproxi-
mação entre a escola e o açude, além de dividir tarefas para as equi-
pes de discentes. Através das discussões foram identificados que
alguns discentes, moradores há menos de 500 metros do local a ser
estudado, nunca tinham ido ao açude. Outro ponto importante foi à
inquietação dos mesmos quanto a grande quantidade de resíduos
sólidos jogados no leito da barragem, despejo de efluentes e a de
bombas de capitação de água para as lavouras e criadouros. Desse
primeiro contato foram definidas demandas a serem tomadas de
extrema urgência, como a solicitação dos órgãos públicos da retira-
da do lixão, sensibilização dos moradores quanto à conservação do
açude e produção de uma placa, pelos discentes, indicando a proi-
bição de jogar lixo naquele local.
Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 165

Figura 1 – Localização do Açude Pindorama. Heliópolis – BA - 2018

Fonte: SANTOS, G. J.C; SOUSA, J. V. S, 2018.

No segundo campo as demandas supracitadas foram co-


locadas em prática, envolvendo os professores das mesmas
disciplinas e as equipes já formadas. Assim, ocorreram ações
para retirada dos resíduos sólidos pelos discentes e docentes,
com o apoio dos órgãos públicos que cederam uma caçamba
para ajudá-los na coleta, implantação da placa de Proibido Jo-
gar Lixo no local onde havia resíduos e, por fim, as equipes di-
rigiram-se à comunidade Pindorama para sensibilizar os mo-
radores quanto à importância de conservar o seu meio, não
jogando resíduos sólidos nas margens do açude ou em qualquer
outra área que agrida o meio ambiente.
166 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

Figura 2 – Resíduos Sólidos no Açude Pindorama – Heliópolis - BA, 2018.

Fonte: SANTOS, G. J. C. 2018.

Figura 3 – Ação Educativa realizada pelos discentes: fixação de placa de advertência sobre a proibição de se jogar
lixo no local.

Fonte: SANTOS, G. J. C. 2018.


Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 167

Na terceira etapa, utilizando-se das entrevistas com os mora-


dores da Pindorama, e das experiências vividas durante as ações,
houve discussões em sala de aula dos achados que culminaram na
construção de um livreto sobre a história do açude Pindorama, res-
gatando os contextos históricos desde a sua inauguração em 1952
até os dias atuais com o açude totalmente poluído. As ilustrações do
livreto contemplaram a arte da xilogravura, sendo a mesma consa-
grada na representação da realidade nordestina.

Figura 4 - Capa do livreto (xilogravura). Figura 5 - Poluição das águas do açude.

Fonte: Acervo pessoal, 2018. Fonte: Acervo pessoal, 2018.

Em vista das comemorações ao Dia Mundial do Meio Am-


biente, foi realizada na quarta etapa a apresentação dos re-
sultados parciais da pesquisa em formato de palestra para a
comunidade escolar, como forma de retorno e agradecimento.
Nesta mesma etapa foi divulgado o livreto sobre a história do
açude Pindorama para a comunidade escolar e local.
As etapas percorridas fazem parte de práticas pedagógicas
compromissadas em propor aprendizagens significativas e re-
flexivas aos discentes. Aliada a esta proposição, a abordagem
interdisciplinar permeia aprendizados e resgata os diversos
saberes históricos, geográficos, químicos e biológicos da área
de estudo. Cada saber ainda permitiu ampliar as discussões
quanto ao processo histórico do açude, sua localização geo-
168 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

gráfica, qualidade hídrica e levantamento da biodiversidade


local.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A temática ambiental tem ocupado um papel cada vez mais re-
levante nas discussões por diferentes segmentos da sociedade. Ela
surge das preocupações da espécie humana e do reconhecimento
desta, como propulsora de práticas que agridem o ambiente. Essa
preocupação desencadeou a nível internacional eventos que deba-
tem questões relacionadas ao meio ambiente, como a Conferência
de Tbilisi e a criação de leis ambientais que protegem o meio am-
biente, a exemplo da Política Nacional de Educação Ambiental.
Como vimos em estudos anteriores, a Educação Ambiental é
apontada como uma forma de diminuir a problemática socioam-
biental, sendo capaz de promover a sensibilização da sociedade
por meio de práticas pedagógicas que despertem outras reflexões
dos modos de vida e que permitam o equilíbrio ambiental susten-
tável. Ninguém zela o que está invisível, e nesse sentido a percep-
ção ambiental é absolutamente necessária para sensibilização da
sociedade e de uma mobilização social mais ativa. No tocante da
conservação do açude Pindorama, as intervenções dos discentes
não significaram a volta da paisagem original de tempos atrás, mas
possibilitou a comunidade local reavivar seus sonhos e resgatar sua
identidade com o açude.
Vale ressaltar que a proposta metodológica deste estudo, asso-
ciada a conhecimentos teóricos - práticos, deram grandes contri-
buições para o despertar ambiental da comunidade. O açude Pindo-
rama, antes invisível, passou a fazer parte do campo do visível por
parte dos discentes. A comunidade, de forma coletiva, teve protago-
nismo ao buscar soluções para os problemas encontrados. As ações
de retirada dos resíduos sólidos, o desvio dos efluentes domésticos
Núbia Dias dos Santos; Gilberto Jacó Carvalho Santos 169

do curso do corpo hídrico e o resgate das memórias nos desenhos


de xilogravuras do livreto contribuíram de forma significativa.
Assim, o projeto entre o açude e a escola permitiu, aos morado-
res da comunidade Pindorama e aos discentes do ensino médio do
Colégio Estadual José Dantas de Souza, dialogar sobre a temática
ambiental, de forma a contribuir para o processo de implementa-
ção de ações voltadas à mobilização social e para o desenvolvimen-
to da cultura de sustentabilidade.

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170 ENTRE O AÇUDE E A ESCOLA

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CAPÍTULO 9 PATRÍCIA DE MOURA
TAITIÂNY KÁRITA BONZANINI

PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA


PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA: UMA EXPERIÊNCIA
ESCOLAR NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

1. INTRODUÇÃO
Discussões envolvendo o aproveitamento e a produção de energia
passaram a ganhar espaço nos últimos anos, tanto no meio acadêmico
quanto em reuniões pedagógicas nas escolas de educação básica. Segun-
do pesquisas (KRETZER et al., 2015; WROBEL, 2015), tal assunto precisa
ser abordado em sala de aula, o que confere ao professor a necessidade
da mobilização de competências para selecionar recursos didáticos que
possam promover o interesse do aluno e a compreensão do tema pro-
posto e, dessa forma, favorecer discussões sobre temática tão relevante.
Nesse contexto, Castoldi e Polinarski (2009) afirmam que os
recursos didáticos constituem fatores relevantes no processo de
desenvolvimento cognitivo dos estudantes, oportunizando uma
aprendizagem mais efetiva. Também para Melo e Fusinato (2016) a
utilização dos mais diversos recursos no ensino contribuem subs-
tancialmente para o aprendizado, uma vez que os alunos são grada-
tivamente inseridos em um contexto.
172 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

Segundo Tulio (2013) é preciso reconhecer a inserção dos recur-


sos tecnológicos e midiáticos cada vez mais presentes em sala de
aula, o que apresenta também para o professor um desafio no sen-
tido de satisfazer as expectativas e curiosidades dos estudantes de
modo que aquilo que se ensina tenha significado para os mesmos,
muito embora já tenham acesso à estas informações pelos mais va-
riados canais de comunicação, porém de forma não sistematizada.
O autor afirma ainda que atualmente existem muitos recursos de
ensino disponíveis, mas nem sempre se sabe como utilizá-los para
melhorar a qualidade das aulas e motivar os alunos.
Justifica-se, portanto, que a utilização de recursos didáticos
como forma de atrair a atenção dos discentes faz-se necessária, po-
rém compete ao professor nortear e sistematizar o conhecimento
produzido durante as aulas, ultrapassando a mera motivação e or-
ganizando momentos de profícua aprendizagem (TULIO, 2013).
Com relação aos temas e conteúdos que podem ser abordados
pelas ciências ambientais, como é o caso do conceito de Energia,
por exemplo, segundo Scorsatto (2010), a maioria dos livros didáti-
cos trazem apenas conteúdos centrados em cálculos matemáticos,
porém sem quaisquer conexões com o cotidiano do aluno. Ao pro-
por materiais didáticos que contribuam para que o estudante possa
relacionar conceitos, e até mesmo aplicá-los em situações práticas,
pode-se favorecer uma aprendizagem mais efetiva.
Sendo assim, ao propor um estudo sobre a produção renovável
de energia entende-se que cabe ao professor, enquanto mediador
da aprendizagem buscar recursos didáticos que possam promo-
ver um ambiente reflexivo e que estimule nos estudantes o desen-
volvimento de um pensamento mais crítico e autônomo, criando
“meios de o aluno participar, refletir e interagir com os membros
da comunidade no processo de convívio democrático e participa-
ção social” (OLIVEIRA, PALHETA & SEABRA, 2017, p.101). Esses
autores destacam, ainda, que a utilização de novos métodos no
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 173

ensino de ciências podem se tornar aliados na conscientização so-


bre o ambiente natural e o convívio harmônico entre o homem e
a natureza.
A partir dessas discussões, nesse capítulo apresenta-se uma
proposta de ensino investigativa e contextualizada que focalizou a
temática Energia e Meio Ambiente, no decorrer de um projeto pe-
dagógico desenvolvido em uma escola pública de um município do
interior do Estado de São Paulo, junto a estudantes do nono ano do
ensino fundamental, cuja duração foi de abril a setembro do ano de
2017.
O motivador para o desenvolvimento do trabalho foi a necessi-
dade de desenvolver discussões junto a estudantes do ensino fun-
damental sobre a demanda energética por combustíveis convencio-
nais, proveniente das inovações tecnológicas nas últimas décadas,
de modo que os levasse a compreender a relevância do estudo de
fontes alternativas e renováveis de energia.
Segundo Pacheco (2006) as energias renováveis originam-se de
ciclos naturais de conversão da radiação solar, fonte primária que
representa quase a totalidade de energia do Planeta, o que as torna
praticamente inesgotáveis. “Estas energias renováveis podem e de-
vem ser utilizadas de forma sustentada, de maneira tal que resulte
em mínimo impacto ao ambiente” (PACHECO, 2006, p.5).
Devido a crescente necessidade de desenvolver discussões so-
bre a redução de impactos ambientais, principalmente com relação
a uso e produção de energia, e inserir os estudantes efetivamen-
te em discussões que requeiram análise crítica de situações reais,
entende-se que tal atividade pode ser favorecida pelo uso de ma-
teriais didáticos que contribuam para um ensino mais contextuali-
zado e significativo, e favoreçam debates de ideias, investigação de
questões e uma atividade mais ativa dos estudantes, levando-os a
estudar formas alternativas de geração de energia, menos poluen-
tes e renováveis.
174 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

Dentre os diversos temas que podem ser tratados em sala de


aula envolvendo a temática Energia Renovável, um trabalho envol-
vendo a energia solar surgiu como opção, após as primeiras pesqui-
sas realizadas pelos estudantes, nas quais identificaram junto ao
Serviço de Abastecimento e Tratamento de Água e Esgoto do Muni-
cípio, que algumas comunidades, em especial localizadas em áreas
rurais, ainda não tinham acesso a esse serviço. Sendo assim, o tema
surgiu de um estudo inicial, o que prioriza princípios e metodolo-
gias do trabalho por projetos, e também na perspectiva CTSA – re-
lações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente, que trazem
a importância de partir de problemas vivenciados, propor soluções
para eles, e retornar ao problema para buscar resolução a partir de
conhecimentos científicos ou tecnológicos.
Diante das questões levantadas sobre o município onde vivem
os estudantes, foi possível desenvolver discussões e estudos sobre
formas de enfrentar os problemas vivenciados pelas comunidades,
bem como investigar o modo como a população, de uma forma ge-
ral utiliza, quais os custos e formas alternativas de energia.
Nesse contexto, a construção do condensador solar surgiu como
opção de um recurso didático utilizado para trabalhar a produção
da energia renovável e também para solucionar o problema levan-
tado pelos alunos, ou seja, a produção de água potável para atender
comunidades que a ela não tinham acesso.
O objetivo principal do projeto foi discutir estudantes conheci-
mentos e proporcionar momentos de reflexões sobre o aproveita-
mento da energia, bem como abordar questões atuais como a crise
hídrica que acomete diversos estados brasileiros e a relevância da
valorização e do consumo consciente da água.
A escolha pela produção de um material didático como o con-
densador, por exemplo, é justificada em virtude do clima quente do
país, uma vez que o mesmo encontra-se localizado próximo à linha
do Equador, o que por sua vez, favorece pesquisas que envolvam
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 175

a produção de uma fonte de energia renovável que tem sido mui-


to discutida atualmente em eventos relacionados ao estudo sobre
Energia Solar.
De acordo com Sarmento (2015) o Sol é uma das fontes ener-
géticas mais promissoras no novo milênio: “A energia solar pode
ser a solução ideal para áreas afastadas e ainda não eletrificadas,
especialmente num país como o Brasil onde se encontram bons
índices de insolação em qualquer parte do território” (SARMEN-
TO, 2015, p. 21).
Segundo Pacheco (2006) a energia solar pode reduzir em até
até 70% o consumo de energia convencional, podendo ser utilizada
para o aquecimento de água e para a produção de eletricidade.
Convém destacar que o condensador solar desenvolvido na ati-
vidade em questão foi inspirado no modelo proposto pelo Profes-
sor Doutor Maurício Luiz Sens, do departamento de tratamento
de água da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), outra
questão importante no desenvolvimento de um projeto que priori-
ze a perspectiva CTSA, uma vez que foi estudada uma tecnologia, e
aplicação de um conhecimento científico para estudar determina-
do problema. Importante indicar também que o uso desse material
contribuiu para estudos sobre a potabilidade e/ou dessalinização,
possível a partir do aquecimento e da evaporação provocada pela
luz solar. Contudo, há distinção quando o artefato é dotado de cé-
lulas fotovoltaicas, neste caso estando diretamente relacionado à
conversão da energia solar em energia elétrica, por sua vez, bastan-
te enfatizada durante a realização do projeto didático.
A organização de uma atividade desse tipo, como o desenvolvi-
mento de projetos didáticos, pode contribuir para a discussão de
conceitos que favoreçam a aprendizagem e reflexões sobre modos
de vida mais sustentáveis e menos agressivos ao meio ambiente,
objetivando aproximar o ensino das ciências ambientais do cotidia-
no dos estudantes, promovendo a sua autonomia intelectual, bem
176 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

como a aquisição de um pensamento mais crítico e reflexivo com


relação ao consumo e a produção de fontes renováveis de energia,
através de uma proposta didática investigativa e contextualizada.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O projeto didático que focalizou o estudo de produção renová-
vel de energia envolveu várias etapas. Inicialmente os alunos foram
orientados a realizarem uma pesquisa sobre diferentes fontes de
energia renováveis (JACOBI, 2015; SCHIAVETTI, 2013; SOARES,
2004) considerando para tanto, os custos para a sua implantação
e a viabilidade de desenvolvimento local. Assim, a partir dos dados
levantados, o projeto didático poderia ser estruturado.
Dentre as duas turmas do nono ano 9 estudantes mostraram in-
teresse em participar do trabalho.
Como forma de auxiliar as pesquisas dos estudantes foram in-
dicados referenciais e trabalhos de pesquisas, já citados na escrita
desse capítulo, mas para aproximá-los do assunto também se con-
siderou conveniente indicar a consulta de materiais disponíveis em
portais online: Litro de Luz Brasil (2017), Portal G1 (2017), Revista
Exame (2017) e Portal Solar (2017).
Outros sites consultados foram: YouTube Br (2017), Gazeta do
Povo (2017), ABIDES (2017) e outros.
Conforme já indicado, o tema para o desenvolvimento do pro-
jeto foi selecionado a partir da realização de pesquisas de campo
pelos estudantes, nas quais identificaram que algumas áreas do
município, especialmente áreas rurais, ainda não eram atendidas
com relação ao tratamento e abastecimento de água. Concomitan-
temente decidiram investigar uma forma de trabalhar com o apro-
veitamento do aquecimento promovido pela energia solar. Para
tanto, foram organizadas as seguintes etapas para a execução do
projeto didático:
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 177

• Discussões semanais para divisão e orientação de tarefas,


resultando em 8 aulas.
• Atividades didáticas para discussão de conceitos tais como:
principais fontes de energia utilizadas, intervenção humana
e seus impactos no ambiente, crise hídrica, aquecimento glo-
bal, desenvolvimento sustentável, dentre outros.
• Contatos para buscar parcerias para construção do conden-
sador, dentre estas a empresa Photons Energia Solar, locali-
zada no município onde o projeto foi realizado;
• Orçamentos para compra de materiais para confecção do
condensador solar, tais como: vidros, cola de silicone, tor-
neira para filtração, dentre outros;
• Construção do condensador para constituir um material di-
dático que pudesse contribuir para testar a hipótese sobre
a potabilidade e dessalinização da água através do aqueci-
mento promovido pela luz solar.

Além das etapas descritas, visando despertar o interesse da


equipe sobre inovações científicas e, desta forma, contribuir com
as pesquisas do trabalho, promoveu-se com o patrocínio da esco-
la, uma visita de campo ao Museu interativo Catavento, um espa-
ço cultural e educacional, localizado na cidade de São Paulo. Essa
visita objetivou, principalmente, fornecer uma experiência aos
estudantes sobre materiais utilizados na produção de energia e a
importância desse conhecimento no desenvolvimento de projetos
científicos.
Para Tulio (2013) uma visita de campo com fins de pesquisa
sobre o tema estudado, resulta em maior interesse e participação,
uma vez que a aprendizagem se torna mais significativa em conta-
to com o real e o concreto, possibilitando ainda a associação entre
a teoria e a prática. Conforme trabalho realizado pelo autor, uma
visita de campo resultou em vários questionamentos e observa-
178 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

ções pelos alunos, por sua vez fundamentais para o processo de


ensino-aprendizagem.
Para analisar o desenvolvimento do projeto didático foram co-
letados dados através da observação participante, anotações em
diário de campo realizadas no decorrer das atividades didáticas
e registros audiovisuais, incluindo nesses a produção de vídeos
pois os estudantes deveriam, a partir das suas observações e ano-
tações, produzir um vídeo detalhando todas as etapas do projeto
didático, e explicar cientificamente, ou utilizando conceitos cien-
tíficos, como o condensador solar funcionava e sua aplicabilidade.
Os dados foram analisados e discutidos com auxílio de refe-
renciais teóricos (JACOBI, 2015; SCHIAVETTI, 2013), buscando
avaliar se a utilização do recurso didático construído favorecia o
ensino de conceitos relacionados à produção de energia renovável
e maior interação dos estudantes com o tema em estudo.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com a intenção de envolver os estudantes na construção do
projeto didático, e não chegar com uma proposta pronta elabora-
da apenas pelo professor, a partir de um conteúdo curricular abor-
dado no nono ano do ensino fundamental, foi proposta a pesquisa
sobre fontes alternativas de energia. Posteriormente à realização
das pesquisas, os estudantes optaram pelo desenvolvimento de um
trabalho que estivesse diretamente relacionado ao aproveitamento
da energia solar.
A ideia inicial seria trabalhar com a conversão da energia solar
em elétrica, a partir da utilização de células fotovoltaicas em resi-
dências. Entretanto, em virtude da inviabilidade dos custos com os
paineis solares naquele momento, houve a proposta de realizar
uma adaptação utilizando garrafas PET – Poli (Tereftalato de Etile-
no), proporcionando inicialmente iluminação externa para comu-
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 179

nidades carentes sem acesso à eletricidade. Neste caso, as garrafas


PET seriam utilizadas para a construção de postes para iluminar
áreas públicas. No entanto, outros materiais também seriam ne-
cessários, inclusive o painel solar, além de baterias, lâmpadas LED
(Diodo emissor de luz) e canos de PVC (Policloreto de Vinil). Foram
analisados custos e a viabilidade do desenvolvimento de um proje-
to envolvendo tais materiais.
No decorrer dos estudos, e após o aprofundamento das pesqui-
sas, as constantes discussões em aula e, acima de tudo, a ausên-
cia de recursos financeiros disponíveis no momento, chegou-se a
proposta da construção do condensador solar, para verificar se a
problemática da ausência de tratamento de água em áreas rurais,
ainda não atendidas no município, seria viável a um baixo custo e,
futuramente, sugerir adaptações no artefato, de modo que o mesmo
pudesse ser instalado em residências, porém com o uso de células
fotovoltaicas e, desta forma, converter a energia solar em elétrica.
Pesquisas recentes indicam a utilização do mineral perovskita
como susbstituição ao silício nos sistemas fotovoltaicos, o que as
torna economicamente viável e com tendência à atrair futuros in-
vestimentos no projeto (SZOSTAK, 2016). Os resultados também
foram apresentados por pesquisadores canadenses e encontram-
-se disponíveis para consulta no portal Noctula (2018). Assim, os
custos tendem a diminuir, com relação à aplicaçao dessa tecnologia.
O condesador solar, portanto, acabou consituindo um recurso di-
dático viável que pudesse contribuir para a explicação de conceitos e,
principalmente, para estudantes manipularem e testarem hipóteses.
De acordo com Castoldi e Polinarski apud Silva et.at. (2017) o
critério de escolha dos recursos didáticos irá depender de fatores
tais como: “a visão do educador acerca do recurso, a finalidade de
sua utilização, a disponibilidade financeira para sua aquisição e
principalmente da aceitabilidade dos alunos” (CASTOLDI E POLI-
NARSKI apud SILVA et.al (2017, p.22).
180 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

No período de abril a setembro do ano de 2017, durante as aulas


de Ciências, que totalizaram 20 horas/aulas ocorreu a montagem
do condensador. O ambiente destinado para tal foi o pátio da escola,
o que acabava por despertar o interesse tanto da equipe gestora,
quanto dos demais alunos e professores da escola. Observou-se que
os estudantes envolvidos testavam formas de melhor organizar o
material, discutiam como o sol deveria atuar no aquecimento da
água e, consequentemente, na desalinização, evidenciando alguns
conceitos discutidos no estudo do tema, a medida que demonstra-
vam seriedade e preocupação com a limpeza e organização durante
todo o processo.

Figura 1- Montagem do condensador solar

Fonte: Registro da autora (2017).

Convém ressaltar que em diversos momentos durante a mon-


tagem e/ou funcionamento do artefato, os estudantes trabalha-
ram a observação sistemática, quando, por exemplo, optaram por
substituir a garrada PET de 2000 mL contendo água não potável
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 181

(água com grande quantidade de sal dissolvido) por outra de me-


nor dimensão (500mL), o que facilitaria a demonstração prática e
o transporte do equipamento, além do design, ou seja, do aspecto
visual do condensador. Também observaram que a condensação da
água se tornara mais eficaz em local com maior incidência de raios
solares, o que provocava o aquecimento da temperatura da água,
assim os alunos optaram pela colocação do condensador sobre um
artefato que permitisse maior abrangência da luz solar.

A principal meta da educação é criar homens que sejam


capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o
que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criado-
res, inventores, descobridores. A segunda meta da educa-
ção é formar mentes que estejam em condições de criticar,
verificar e não aceitar tudo o que a elas se propõe (JEAN
PIAGET, 1982, p. 246).

Um aspecto que merece destaque nessa etapa foi o registro sis-


temático que os alunos realizaram sobre a vedação no condensador
para evitar o escoamento da água evaporada. Outros registros tam-
bém evidenciaram redução no volume de água não potável (água
salgada) e aumento no volume de água potável, ou seja, condensa-
da através do aquecimento solar. Importante ressaltar que nesse
momento foram trabalhados pelo professor conteúdos envolvendo
volume, grandezas e proporções, assim foi possível realizar discus-
sões interdisciplinares.
A hipótese dos estudantes foi testada, quando um deles resol-
veu provar certa quantidade de água obtida no processo e, assim,
verificar se a salinidade, de fato, havia diminuído após a conden-
sação. Nesse momento chegaram a conclusão que os raios solares
em contato com o vidro foi capaz de provocar o aquecimento da
água, sua evaporação e condensação tornando-a, portanto, passível
de ser consumida.
182 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

Essa atividade foi realizada com base em um protótipo com di-


mensões de base 10 cm x 20 cm x 19 cm e cobertura 12 cm x 12 cm
x 21cm, mas para reprodução do material recomenda-se, para um
maior rendimento, que as medidas do equipamento sejam amplia-
das visando suprir a demanda do interessado.
A escola não dispunha de recursos e materiais para realização
de testes biológicos ou fitossanitários, assim nenhum teste espe-
cífico foi realizado para comprovação da potabilidade da água, su-
gerindo, portanto, continuidade em novos projetos e pesquisas.
Além disso, as discussões iniciais não apresentavam esse objetivo.
Por outro lado, há estudos que indicam que populações ribeiri-
nhas da Amazônia já utilizam o processo de condensação solar
para obtenção de água por eles considerada potável. Para tanto,
aproveitam os longos períodos de chuva para armazenamento da
água em garrafas PET.1
É preciso citar que a realização desse trabalho, além de desper-
tar nos alunos a importância do trabalho em equipe, aproximar o
ensino das ciências ambientais do seu cotidiano e conscientizá-los
sobre a necessidade de se estudar formas alternativas de ener-
gia, por sua vez menos agressivas ao ambiente, também inspirou
o desenvolvimento da I Mostra Científica realizada na escola, mo-
tivando alunos, docentes de várias disciplinas, gestores e demais
integrantes da comunidade escolar a envolverem-se direta ou indi-
retamente no evento.
A I Mostra Científica realizada na escola, inspirou o desenvolvi-
mento de outros trabalhos conforme se observa nas figuras de 3 a
5 e, além de constituir uma ponte entre a escola e a comunidade,
também despertou o engajamento de alunos e docentes, reduzindo

1 Portal G1 (Disponível em: < http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2011/03/tres-pro-


jetos-simples-e-baratos-para-transformar-agua-suja-em-potavel.html>. Acesso em: 04 mai.
2017.
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 183

o índice de indisciplina e proporcionando maior participação du-


rante as aulas.

Figura 2- Condensador Solar em Exposição na I Mostra Científica da Escola

Fonte: Registro da autora (2017).

Figuras 3 e 4 – Outros trabalhos apresentados na I Mostra Científica

Fonte: Registro da autora (2017).


184 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

Figura 5- Maquete Geração Eólica e Solar apresentada na I Mostra Científica

Fonte: Registro da autora (2017).

No evento havia espaço inclusive para exposição de trabalhos


não relacionados às formas de produção de energia renovável, con-
forme se observa na figura 6, quando de um jogo de perguntas e
respostas e figura 7 uma maquete de um vulcão, que em determi-
nado momento da Mostra, foi simulado uma erupção, utilizando-se
para tanto, da mistura das substâncias ácido acético e bicarbonado
de sódio.

Figura 6 e 7 – Trabalhos não relacionados à produção de energia renovável

Fonte: Registro da autora (2017).


Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 185

Convém ressaltar que também foi possível inscrever o projeto


em uma competição promovida por uma empresa multinacional
com filial localizada no Município, sendo o vencedor da etapa re-
gional no “Programa Prêmio ArcelorMittal de Meio Ambiente 2017
Categoria Jovem 2”.
Outros resultados observados e apresentados neste capítulo se
referem ao fato de que os professores da unidade escolar na qual
o trabalho foi desenvolvido passaram a planejar aulas nas quais o
aluno pudesse exercer um papel mais ativo. As aulas de História,
por exemplo, passaram a contar com a realização de constantes
seminários e nas disciplinas de Língua Portuguesa e Artes, os es-
tudantes foram envolvidos em projetos sobre reciclagem de ma-
teriais. Eventos extracurriculares objetivando a aprendizagem e a
motivação do aluno também ganharam ênfase na escola, tais como
visitas a espaços culturais no Município.
Este trabalho também motivou a elaboração de um projeto de
Mestrado Profissional, atualmente em andamento, no PROFCIAMB
– Polo USP, cujos resultados iniciais já foram apresentados em re-
cente evento de Integração dos Polos realizado em Belém, no Pará.

5. CONSIDERAÇÕES
Considera-se que a construção do condensador solar enquanto
recurso didático contribui para discussões sobre temas das ciên-
cias ambientais, uma vez que os estudantes puderam discutir so-
bre a produção de água potável a partir do aquecimento solar, bem
como investigar outras fontes de produção de energia a partir de
recursos naturais não esgotáveis.
Nesse sentido, esta experiência didática foi relevante para aproximar
temas de estudo presentes na escola do cotidiano dos alunos envolvidos
direta ou indiretamente no projeto didático, pois foi uma atividade que
culminou em uma mostra científica para a escola como um todo.
186 PROPOSTA DE UM RECURSO DIDÁTICO PARA O ESTUDO DA PRODUÇÃO RENOVÁVEL DE ENERGIA

Enquanto motivador o recurso didático contribui para estimular


o questionamento entre os estudantes sobre formas de consumo de
água e energia em suas residências, propondo novas medidas para
diminuição desse consumo, demonstrando indícios de mudanças
que poderão refletir no comportamento de cidadãos e uma postu-
ra mais crítica e questionadora com relação aos conceitos estuda-
dos. Tais resultados corroboram com os enconrados por Scorsatto
(2010), que demonstrou que a utilização de projetos voltados ao
cotidiano dos alunos oportunizou desenvolvimento de sua capa-
cidade de reflexão sobre questões relacionadas aos impactos am-
bientais no planeta.
Ensinar temas das ciências ambientais requer o desenvolvimen-
to de discussões que ultrapassem o espaço escolar, proporcionan-
do maior conexão com o cotidiano, seja através do estudo de situ-
ações problemas como a proposta no projeto didático, ou mesmo
realizando visitas monitoradas a espaços que favoreçam um estudo
mais contextualizado e reflexivo. Nesse cenário, desenvolver dis-
cussões sobre o conceito de sustentabilidade e formas de viver no
ambiente causando menores impactos ambientais se mostram pro-
fícuos, pois a cada dia se faz ainda mais necessário que a Educação
seja o ponto inicial para o surgimento de novas ideias em especial
no que tange às fontes renováveis de produção de energia, consi-
derando sobretudo os impactos gerados com a crescente demanda
por recursos naturais.
É preciso destacar, por fim, que o artefato construído, embora
tenha apresentado importantes contribuições no processo de ensi-
no-aprendizagem, ainda se faz necessário estudos sobre aplicação
em diversos contextos, e que sejam ampliadas as discussões sobre
a produção de energia renovável.
Patrícia de Moura; Taitiâny Kárita Bonzanini 187

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CAPÍTULO 10 DYEGO ANDERSON SILVA PEREIRA
ANÉZIA MARIA FONSÊCA BARBOSA

EDUCAÇÃO E SAÚDE: DIÁLOGOS DE SABERES NO HOSPITAL


UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

1. INTRODUÇÃO
Esse artigo traz a proposta de debater como os cenários de vul-
nerabilidade e de injustiça ambiental se relacionam de forma direta
com a conformação de uma sociedade que deve repensar suas for-
mas de ligação com o mundo, seus padrões de consumo e sobretu-
do como as pessoas são impactadas pelo processo de crescimen-
to econômico (MOUTINHO-DA-COSTA, 2011; PORTO, 2011). Para
cumprir tal tarefa é importante criar estratégias representadas, por
exemplo, pelo Programa de Pós-Graduação em Rede Nacional para
o Ensino de Ciências Ambientais (PROFCIAMB) que está presente
nas cinco regiões geográficas brasileiras e que permite disseminar
novas formas de compreensão sobre as estruturas de produção so-
cial, as relações sociedade-natureza e os territórios de vida de dife-
rentes povos (LEFF, 2016).
Esta pesquisa foi desenvolvida no Campus da Saúde Professor
João Cardoso Nascimento, comumente referenciado como Hospital
192 EDUCAÇÃO E SAÚDE

Universitário (HU) e que funciona como centro hospitalar da Uni-


versidade Federal de Sergipe, “dedicado à assistência, docência e
investigação no âmbito das Ciências da Saúde.” (BRASIL, 2018c,
p.15). O Hospital Universitário de Sergipe é uma instituição que
recebe recursos oriundos do Sistema Único de Saúde (SUS) para
cumprir sua missão institucional de promoção da saúde pública de
forma universal, gratuita e com vistas à promoção do desenvolvi-
mento de uma sociedade sustentável, “garantindo educação e saúde
por meio da oferta de serviços médico-hospitalares de referência
e contrarreferência no âmbito do Sistema Único de Saúde” (Idem,
2018, p.18). O HU ocupa, no estado de Sergipe, uma posição de refe-
rência e excelência na prestação de “assistência médico-hospitalar
de média e alta complexidade”. Recentemente tornou-se centro de
referência no apoio a mães com bebês com microcefalia (BRASIL,
2016a, p.19).
A Educação em Saúde é entendida aqui como uma resposta à
demanda crescente que os serviços de saúde apresentam de uma
gestão do cuidado que avance na compreensão do paciente como
um todo, em que cada aspecto de sua vida represente uma intera-
ção (positiva ou negativa). A preocupação deste estudo se dá sobre
o impacto das doenças de veiculação hídrica (DVH) sobre a saúde
dos pacientes atendidos pelo HU e a eventual falta de conhecimen-
to sobre meio de transmissão, disseminação, controle e tratamento
dessas doenças.
Essas enfermidades, segundo Amaral (2003) são causadas prin-
cipalmente por meio de microrganismos patogênicos derivados de
várias origens como entérica, animal ou humana. A transmissão
ocorre com o consumo da água contaminada usada direta (ingestão)
ou quando os alimentos têm contato com essa água (lavados ou pre-
parados). Para tanto, serão trabalhadas as DVH mais conhecidas do
público, além da Hepatite A: amebíase, giardíase, cólera, esquistos-
somose (DUARTE, BARATELLA e PAIVA, 2015), uma vez que:
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 193

[...] as doenças de veiculação hídrica nas dimensões de inci-


dência e prevalência causam inúmeros transtornos à saúde
humana, sendo esta percebida em seu contexto patológico,
social e espacial como o conjunto de fatores (materiais e
imateriais) que podem interferir negativamente nas condi-
ções gerais de existência. (SILVA FILHO et. al., 2013, p 85).

Outrossim, buscou-se: (i) Demonstrar quais doenças podem ser


causadas por veiculação hídrica; (ii) Apresentar formas de trans-
missão e prevenção de doenças de veiculação hídrica e; (iii) Sociali-
zar conhecimento de saúde por meio de um jogo didático. Por esse
motivo, a ação pedagógica foi desenvolvida no Ambulatório de He-
patologia do HU, com pacientes que aguardavam atendimento para
os médicos hepatologistas, tendo em vista que a Hepatite A é uma
doença de veiculação hídrica.

2. SAÚDE, AMBIENTE, MEIO AMBIENTE E DOENÇAS DE VEICULAÇÃO


HÍDRICA

Um ambiente saudável pressupõe que a correlação de forças que


constroem aquele espaço promova um desenvolvimento equitativo
do sistema e as populações que ali permanecem tenham acesso a
um ambiente equilibrado e justo socialmente (SILVA FILHO, et. al,
2013). Nesse sentido, a educação é uma resposta à demanda de su-
jeitos, órgãos e atores sociais, tendo como propósito contribuir com
uma inferência positiva sobre um cenário específico, atendendo a
um propósito específico (RITÁ, et. al., 2016). As Ciências Ambien-
tais atendem a uma proposta interdisciplinar de compreensão de
um todo relacional e propositivo para o qual a saúde do ambiente e
das pessoas também urge a uma resposta interdisciplinar.
A saúde do sujeito não se relaciona apenas às condições ideais e
paramétricas de níveis químicos e biológicos (pressão arterial, ní-
194 EDUCAÇÃO E SAÚDE

vel de LDL e HDL, nível de glicose), mas sobretudo a uma relação


estável, duradoura e que lhe traga qualidade de vida. Nesse sentido,
os ambientes de vida, casa, trabalho, família exercem sobre os sujei-
tos várias demandas que impactam de forma positiva ou negativa
na sua saúde.
Assim como a Educação em Saúde, as Ciências Ambientais par-
tem de uma visão holística do ser humano na qual o homem não
existe apenas para si, mas para uma comunidade e sua subjetivi-
dade está representada em suas formas de existência que se rela-
cionam, de forma nem sempre intencional, com o seu bem-estar
(GUATTARI, 1990). Destarte, a saúde humana é impactada de forma
direta quando o meio ambiente não é concebido numa visão harmô-
nica, respeitosa e equilibrada com todas as outras formas de vida
(WOLKMER e PIMMEL, 2013) ou ainda quando o saber ambiental,
a forma dos “povos dos territórios ambientais do Sul” (LEFF, 2011)
de lidar com suas formas de existência, não é respeitada em prol
de uma racionalidade econômica vazia do sentido de existência de
vida (LEFF, 2008).
Nesse aspecto, pode-se perceber que o processo de crescimento
econômico acaba por formar processos de desterritorialização, in-
justiça ambiental e vulnerabilização que impactam negativamente
na vida de vários povos. Um sistema socioecológico desequilibrado,
ou seja, um ambiente pouco saudável (BUSCHBACHER, 2014; RI-
BEIRO e CAVASSAN, 2013), é percebido por cada grupo humano de
forma diferenciada (MOUTINHO-DA-COSTA, 2011; PORTO, 2011).
Enquanto esses variados processos ocorrem, surgem problemas de
saúde humana individual e coletiva, que na visão de Porto (2011)
se relacionam à saúde do ambiente, dos ecossistemas numa interfa-
ce biológico-humana, intermediada por questões éticas e culturais
complexas. A Justiça Ambiental (JA), portanto, seria a maneira de
dirimir as consequências desproporcionais das operações econô-
micas e políticas, por exemplo, que impactam de forma negativa,
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 195

inclusive na saúde coletiva (MOUTINHO-DA-COSTA, 2011; PORTO,


2011). A derrubada de uma floresta, por exemplo, reduz o espaço
de vida de uma comunidade ribeirinha e pode levar espécies silves-
tres para uma zona urbana, por exemplo.
Desse modo, ao considerarmos o corpo humano, também, como
um sistema socioecológico em estabilidade dinâmica, durante seu
crescimento e amadurecimento biológico, ele acumula vulnerabi-
lidades e fragilidades que resistem às pequenas perturbações, em
ambientes variados como uma gripe, por exemplo. Esses eventos
podem, ao longo do tempo, interferir de forma negativa nesse mi-
crossistema socioecológico (BUSCHBACHER, 2014), o que levaria o
sujeito a adoecer. Doutra feita, a interação do corpo saudável com
algum vetor que lhe traga alguma enfermidade irá alterar outras
funções biológicas daquele corpo o que resultará em perdas: 1. De
qualidade de vida do paciente; 2. De recursos do deslocamento do
paciente até a unidade de saúde mais próxima; 3. Das unidades de
saúde em tratar aquela enfermidade.
Numa revisão integrativa (AMARAL, et. al., 2003, p. 511) iden-
tificou que na Filipinas, crianças que consumiram água altamente
poluída com matéria fecal (>103 Escherichia coli 100mL-1) tiveram
uma ocorrência de diarreia significativamente maior (p<0,01) que
aquelas que consumiram águas com menor nível de poluição. Na
década de 1990 um surto de cólera que atingiu a região Norte e
Nordeste assustou o país. Amazonas, Pará e Maranhão (o último
pertencente ao Nordeste) foram responsáveis por 65% de todos os
casos registrados naquele ano e por 46 das 50 mortes registradas
naquele período (LOPES JUNIOR, 1999).
Esse fator tem relação direta com o abastecimento de água de-
ficiente e a coleta de esgoto precária. No Brasil, em 2010, segundo
o IBGE, 11% dos domicílios urbanos possuíam esgotamento a céu
aberto e, 4,95% apresentavam resíduos sólidos acumulados em seu
entorno o que corresponde a 27 milhões de pessoas expostas a con-
196 EDUCAÇÃO E SAÚDE

dições precárias de saneamento (BRASIL, 2018, p.1). No entanto,


esse quadro foi alterado nos últimos 20 anos. Segundo os dados do
último Censo realizado em 2010, a água canalizada estava presente,
em pelo menos um cômodo, em 80,02% dos domicílios brasileiros,
enquanto a média nacional estava em 90,67% e o lixo era coletado
em 97,47% dos domicílios particulares permanentes em áreas com
ordenamento regular no Brasil, enquanto a média no Nordeste era
de 93,73%. Entre as grandes regiões, a região Norte passou a ser a
mais atrasada em relação a esses quesitos com 71,84% (água tra-
tada em pelo menos um cômodo) e, 74,37% (coleta regular de lixo
por sistema de coleta público) (BRASIL, 2018b).
Conforme Rodrigo Barros (2013, p.10), estima-se que “a cada
R$1 investido pelo governo em saneamento básico, o sistema de
saúde economiza R$4 no tratamento de doenças causadas pela au-
sência de tratamento de água e esgoto”. Outro pesquisador, o pro-
fessor da Universidade Federal de Minas Gerais, Leonardo Heller
afirma que, “em todo o mundo, 1,9 milhão de crianças são levadas
ao óbito, todos os anos, tendo como causa a diarreia. Do total de
doenças registradas na população, 4,2% se devem à falta do sane-
amento básico” (HELLER, 2013, p.15). As DVH atingem, portanto,
pessoas mais pobres, sendo um problema de escala mundial, nacio-
nal e regional.
Para Ritá et. al, (2016), as doenças de veiculação hídrica, princi-
palmente as ligadas a verminoses passam pela “educação sanitária,
saneamento e melhoria do estado nutricional (2016, p.5)”, o que
segundo os autores é a profilaxia indicada para essas doenças pa-
rasitárias. A aplicação e o uso de jogos didáticos em situações de
Educação e Saúde é referenciada por vários autores como Barbosa
et al. (2010), Mariano et al. (2013) e Werner et al. (2013) que, ao
estudarem estratégias de educação e saúde para jovens, abordando
da prevenção de IST/AIDS; ao promoverem uma revisão integrati-
va sobre promoção de saúde com adolescentes; e na realização de
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 197

minicursos de extensão universitária, respectivamente, apontam a


necessidade de disseminar, publicizar e dinamizar os conhecimen-
tos produzidos, principalmente pela academia sobre as mais varia-
das doenças. A educação em saúde usando jogos didáticos é uma
resposta a essas necessidades de intervenção de caráter educativo
perante a sociedade.
Ademais, apontamos a necessidade de melhoria continua e glo-
bal da qualidade de vida, passando pela educação como um impor-
tante pilar desse processo. O entendimento construído aqui é de
que a saúde do indivíduo é caracterizada não como a soma de todas
as características de vida, mas do equilíbrio entre todas as partes
que formam o ser. É preciso ultrapassar a formação que temos hoje
de uma saúde voltada apenas para a formação de recursos huma-
nos, materiais e técnicos para cuidados resolutivos e não preventi-
vos. A intenção do cuidado em saúde e da educação e saúde, é per-
mitir que o paciente participe do processo de cuidado, tendo em
vista que a ele deve ser dado o diagnóstico correto, com maiores ou
menores chances de sobrevida, além de ter acesso ao tratamento
mais adequado.

3. ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS E RECURSOS DIDÁTICOS


O trabalho proposto se baseou em mensurar o impacto de uma
intervenção pontual sobre os conhecimentos relativos as DVH. Foi
utilizado o método indutivo em que uma amostra e a repetição de
um certo fenômeno dentro dessa amostra, leva a construir uma
proposição, falsa ou verdadeira (MARCONI e LAKATOS, 2003). Pro-
põe-se então aplicar um questionário pré e pós sobre doenças de
veiculação hídrica, aplicar um jogo de participação e interação e en-
tão avaliar com base no mesmo questionário o entendimento sobre
determinado assunto. Ao usar um método de análise comparativa
para um mesmo grupo em dois momentos, pré e pós exposição a
198 EDUCAÇÃO E SAÚDE

algum fenômeno, é possível comparar a resposta desse grupo. As


alterações encontradas validariam a hipótese traçada pelo pesqui-
sador (MARCONI e LAKATOS, 2003; BAUER, 2011; KELLE, 2011).

Figura 1 - Modelo de jogo da memória com cartões sobre doenças de veiculação

Fonte: Pereira (2018).

A proposta encaminhada aqui tem como ideia promover um


jogo de cartas entre pacientes que estejam aguardando atendi-
mento no ambulatório de Hepatologia do Hospital Universitário de
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 199

Sergipe. Foram apresentadas aos pacientes as principais doenças


de veiculação hídrica, dentre elas: amebíase, giardíase, hepatite A,
cólera, esquistossomose (DUARTE, BARATELLA e PAIVA, 2015) e as
formas de transmissão, disseminação, controle e tratamento dessas
enfermidades.
O jogo proposto se baseou na produção de 12 (doze) cartões em
que 6 (seis) doenças estavam divididas entre os cartões, formando
pares. Por meio das imagens das DVH em cada um dos pares os pa-
cientes eram convidados a partilhar o que tinham de conhecimento
sobre cada uma delas. Todas as cartas têm exatamente o mesmo
tamanho. Os cartões foram distribuídos entre 12 (doze) pacientes
e a dupla era chamada a partilhar o conhecimento sobre a DVH em
questão. Participaram do jogo de cartas pacientes que não respon-
deram ao questionário.
Assim que cada pessoa falava sobre seu entendimento sobre a
DVH em questão, seguia-se uma explanação breve sobre a trans-
missão, sintomas e tratamento o que acabou se tornando uma pa-
lestra sobre o tema em questão.
Cabe destacar que essa atividade lúcida pode ser usada ainda
com outros temas, de educação em saúde ou não, bem como em
outros ambientes de educação formal ou informal, o tempo de apli-
cação foi de 20 (vinte) e 30 (trinta) minutos e o modelo do jogo de
cartas está demonstrado na Figura 1. A aplicação do jogo no am-
bulatório demorou o tempo previsto, no total de 1 (uma) hora com
a aplicação dos questionários pré e pós-teste, aplicação do jogo e
explanação.
200 EDUCAÇÃO E SAÚDE

4. RESULTADOS

4.1 Da Seleção dos participantes

No dia 20 de junho de 2018 foi desenvolvida a proposta de ação


pedagógica descrita neste trabalho. Foram aplicados 8 (oito) pré-
-testes. A pesquisa garantiu, com essa amostra uma margem de
erro de 20% dentro de um nível de confiança de 79%. Como cita
(GASKELL, 2011), a pesquisa qualitativa tem como finalidade ex-
plorar o espectro de opiniões e representações sobre determinado
assunto e não, simplesmente, contar opiniões.
No dia da realização da pesquisa eram aguardados 34 (trinta e
quatro) indivíduos, o que seria a quantidade de pacientes que es-
tavam agendados para atendimento naquele dia no ambulatório de
Hepatologia do Hospital Universitário de Sergipe. No entanto, entre
pacientes que esperam atendimento, a aplicação de um teste pré
e pós é dificultada pela mobilidade dessa população, já que os pa-
cientes vão embora assim que seu atendimento é concluído, esse
foi um dos principais motivos que dificultou a aplicação dos ques-
tionários de forma ampliada. Das 8 (oito) pessoas entrevistadas no
pré-teste, 4 (quatro) foram entrevistadas no pós-teste também, o
que garantiu 50% da amostra buscada nos dois momentos. A pes-
quisa contou com a autorização CAAE: 30736314.2.00005546.
No total, a palestra foi ouvida por mais de 50 (cinquenta) indi-
víduos, incluindo desde acompanhantes dos pacientes até pessoas
que estivessem aguardando consulta ou atendimento em outro am-
bulatório ou ainda que pararam para ouvir a palestra quando foi
iniciada. Dessa forma, atingiu-se uma população superior ao que
inicialmente tinha sido pensado.
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 201

4.2 Características da seleção

Para Gaskell (20110 e Bauer (2011), as entrevistas individuais


são a melhor forma de interagir com participantes que nunca tive-
ram contato direto com o entrevistador. Os autores enfocam a im-
portância de se decidir por entrevistas abertas, para as quais, seja
possível explorar os elementos formadores de opinião daquelas
pessoas.
Inicialmente, buscou-se traçar um quadro referencial dos pa-
cientes entrevistados. Todas eram mulheres. Elas tinham em média
44 (quarenta e quatro) anos, com média de 41 (quarenta e um) e
desvio padrão de 14 (quatorze) anos. Um desvio padrão tão alto,
para uma seleção tão pequena, indica que a distância entre o valor
mínimo e máximo fora expressivo, o que pode indicar um valor mé-
dio irreal.
O maior número de mulheres nos serviços de saúde é um fato
estatístico de relevância no Brasil, esses dados já são apresentados
pelo IBGE, em 2013, como parte dos dados da Pesquisa Nacional de
Saúde (PNS). “A publicação, que reúne dados levantados no último
trimestre de 2013, revela que 71,2% dos entrevistados haviam se
consultado pelo menos uma vez nos 12 (doze) meses anteriores à
entrevista. Entre as mulheres, o índice foi de 78%, contra 63,9%
dos homens” (PENNAFORT, 2015, p. 25).
Quanto à escolaridade: 4 (quatro) tinham até o Ensino Funda-
mental completo, ou seja, até 8 (oito) anos de estudo, enquanto 1
(uma) entrevistada tinha até 11(onze) anos de estudo e as outras
3 (três), mais de 11(onze) anos de estudo. Quanto à localidade de
origem: 3 (três) eram de Aracaju moradores dos bairros: Aeropor-
to, Industrial e Santa Maria. As outras entrevistadas se distribuíam
espacialmente pelo Estado, nos municípios de Aquidabã, Itabaiani-
nha, Poço Verde, Salgado e Siriri. Cabe aqui destacar que essa últi-
ma entrevistada residia na zona rural.
202 EDUCAÇÃO E SAÚDE

5. DISCUSSÃO

Em relação às entrevistas realizadas, as entrevistadas responde-


ram conforme a Tabela 1 abaixo, às seguintes questões: Questão 1:
O(A) Sr(a) sabe o que são doenças de veiculação hídrica?; Questão
2: O(A) Sr(a) sabe como se transmite Hepatite A, Cólera, Esquistos-
somose, por exemplo?; Questão 3: O(A) Sr(a) tem ou teve alguma
dessas doenças?; Questão 4: O(A) Sr(a) sabe como essas doenças
são tratadas?; Questão 5: O(A) Sr(a) já participou de alguma ação
de educação em unidade de saúde no seu bairro e/ou município?.

Tabela 1 - Forma de respostas das questões abertas feitas aos pacientes no pré-teste
SIM PARCIALMENTE NÃO
Questão 1 0 2 6
Questão 2 0 3 5
Questão 3 0 0 8
Questão 4 0 1 7
Questão 5 1 0 7
Fonte: Pereira (2018).

Na Questão 6 foi perguntado: O(A) Sr(a) acha que existe rela-


ção entre a sua saúde e do local onde o(a) Sr(a) vive?, a resposta
foi transformada em “nuvens de palavras”, conforme pode ser visto
nas figuras 2 e 3.
Para Bauer, a análise de conteúdo que se dá com a “classificação
sistemática e a contagem de unidades do texto, destila uma grande
quantidade de material em uma descrição curta de algumas de suas
características” (BAUER, 2011, p. 191).
O recurso imagético da “nuvem de palavras” possibilita tornar
visual um texto, esse mesmo recurso atribui destaque ao dar um ta-
manho de fonte maior às palavras que mais se repetem e com fonte
menor as que menos se repetem. A hipótese traçada aqui é a de que
após o jogo e da palestra sobre doenças de veiculação hídrica existirá
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 203

uma compreensão mais aprofundada sobre as formas de veiculação


hídrica, meios de transmissão e prevenção e, sobretudo, os impactos
que o ambiente de vida dessas pessoas pode gerar na sua saúde.

Figura 2 - Nuvens de palavras das entrevistas realizadas no pré-teste com pacientes ambulatoriais

Fonte: Pereira (2018).

Figura 3 - Nuvens de palavras das entrevistas realizadas no pós-teste com pacientes ambulatoriais

Fonte: Pereira (2018).


204 EDUCAÇÃO E SAÚDE

Kelle (2011) indica a importância de se codificar um texto para


que seja possível: (i) definir ligações entre elementos do texto; (ii)
usar variáveis e filtros; (iii) reapresentar segmentos do texto que te-
nham relações entre si ou; (iv) reapresentar atributos quantitativos
do banco de dados. Ao se estruturar as falas resultantes do pré-teste,
as cinco palavras que mais se repetiram foram: Rua; (4 vezes); Eu (3
vezes); Água (2 vezes); Ambiente (2 vezes); e Carente (2 vezes), con-
forme pode ser visto na nuvem de palavras da Figura 2.
Para Bauer (2011), a Análise de Conteúdo (AC) é uma técni-
ca pela qual pode-se “produzir inferências de um texto focal para
seu contexto social de maneira objetivada” (BAUER, 2011, p. 191).
Podemos usar as palavras mais citadas como índices referenciais
(KELLE, 2011), para tanto construiu-se um quadro referência, con-
forme demonstrado no Quadro 1. Optou-se como construir um có-
digo mestre que traria como referencial as palavras elencadas no
pré-teste.
Após a aplicação do jogo e da aula expositiva, com a apresenta-
ção auxiliada por um folder, foram realizadas as entrevistas, pós-
-teste. As palavras que mais apareceram foram: Cuidado (4 vezes);
Gente (3 vezes); Água (3 vezes); Entender (2 vezes); Eu (2 vezes),
conforme a figura 3 acima, para qual foram traçados os códigos
mestres e os códigos referenciais dos quadros abaixo.

Quadro 1 - Quadro referência com palavras índice do pré-teste


Códigos mestre Códigos referenciais
Poluição
Alergia
Saneamento
Desequilíbrio do ambiente / Bactérias
Contaminação do ambiente Higiene
Descarte de lixo
Carente (Questão social)
Esgotamento sanitário
Dyego Anderson Silva Pereira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 205

Quadro 2 - Quadro referência com palavras índice do pós-teste


Códigos mestre Códigos referenciais
Consumo d’água
Equilíbrio e ações mitigadoras Higiene das mãos
Higiene dos alimentos

Podemos inferir com base nos dados apresentados (BAUER,


2011; GASKELL, 2011; KELLE, 2011; MARCONI e LAKATOS, 2003)
que a maior presença das palavras “Cuidado”; “Gente” e “Eu” no
pós-teste indicam que as ações pessoais e, sobretudo, com relação à
comunidade na qual vivem, começaram a serem consideradas com
maior atenção por essas pessoas, um dos temas citados durante a
palestra. Essas palavras, indicariam uma preocupação maior com a
própria saúde ou do ambiente do redor.
Um segundo ponto que pode ser exposto é que a supressão das
palavras “Rua” e “Carente”, quando questionados sobre o ambiente
e seu entorno, pelas palavras “Cuidado” e “Eu” indicariam uma
preocupação maior com ações individuais como o consumo de
água de fonte confiáveis e a higienização das mãos, principalmente
durante a preparação dos alimentos. O tema fora recorrente na fala
dessas pessoas por ter sido um dos focos da palestra dada durante
a aplicação do jogo e após a aplicação do pré teste.
Essa alteração na produção da fala demonstra a importância,
conforme citado por Bardin (2011), que existe, ao avaliar-se o con-
texto e as palavras que se interelacionam dentro do texto produzi-
do por essas pessoas, ao longo do processo de construção de um
modelo de entendimento de mundo. Esses elementos redobram a
importância do pesquisador, ao longo do processo de coleta de falas
e uso do método de análise de conteúdo (BAUER, 2011; GASKELL,
2011; KELLE, 2011).
206 EDUCAÇÃO E SAÚDE

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considera-se que as informações sobre doenças de veiculação


hídrica são parcamente disseminadas e esse tipo de doença precisa
ser mais debatido já que as formas de consumo de água, higieniza-
ção das mãos e trato dos alimentos pode fazer com que as pessoas
adoeçam. Esse motivo demonstra a necessidade de abordar, pon-
tuar e manter de forma contínua as ações de educação em saúde,
seja em hospitais escola ou unidades de saúde básica. No entanto,
as ações em unidades básicas de saúde teriam mais efetividade, por
estarem mais próximas das residências das pessoas e por terem o
auxílio dos agentes de saúde no combate às doenças de veiculação
hídrica com ações de conscientização sobre consumo de água, con-
sumo de alimentos e higienização das mãos.
É importante ainda citar que as ações de educação em saúde,
principalmente ao usar jogos nessa tarefa, podem alterar a dinâmi-
ca de entendimento sobre algum assunto, ou um grupo de assuntos
específicos. Essa dinâmica usada foi muito bem aceita pelo público
ao assistir a palestra e ao acompanhar a apresentação com base nos
folderes entregues e no jogo aplicado.

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VÂNIA GALINDO MASSABNI
CAPÍTULO 11 ALINE FABIANE DA SILVA
LUCA PINTO MARSON

HORTAS ESCOLARES E O ENSINO DE CIÊNCIAS AMBIENTAIS


NA ESCOLA

1. HORTAS E SUA UTILIZAÇÃO NAS ESCOLAS


Muitos professores assentam sua prática em aulas expositivas,
com ênfase na oralidade e na escrita em uma abordagem tradicio-
nal (MIZUKAMI, 1986). Segundo a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional) (BRASIL, 1996), a educação “tem por finalida-
de o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exer-
cício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Ao considerar
o que afirma a lei maior da educação no Brasil, cabe questionar se
a forma de ensino mais presente na prática educativa, que é a aula
expositiva com ênfase nos conteúdos apresentados pelo professor
(LOPES, 2005), propicia o alcance desta premissa.
Segundo Andrade e Massabni (2011) o estudo do meio, a experi-
mentação e as visitas com observações, tais como excursões, entre
outras, são exemplos do que podemos chamar de atividades prá-
ticas na escola. Estes autores sugerem que sejam raras na escola
e constatam, como resultado da pesquisa, que, além de raras, são
212 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

atividades que estão aquém da construção de uma visão de Ciência


pelo aluno, apenas utilizadas como complementares a teoria vista
em sala de aula.
A horta permite, pelo contato com a terra, as plantas, a água, entre
outros, uma vivência que pode ser planejada com atividades práticas,
por exemplo, para identificar partes das plantas, coletar dados do
solo ou realizar experimentos como da transpiração das plantas. No
entanto, visto que se agravam os problemas ambientais, outras ações
pedagógicas necessitam ser realizadas para que o estudante consiga
estabelecer relações entre ser humano e natureza, problematizando
estas relações. Entender que os ser humano pode transformar o meio
de modo a valorizar a sustentabilidade que requer responsabilidade
para com a vida na Terra é um dos desafios no trabalho com hortas.
Elaborar uma horta na escola é uma vivência que aproxima os
alunos do meio natural especialmente quando o professor propor-
ciona novas formas de aprender na horta, com as atividades que
permitam o prazer, a investigação e o convívio entre todos. Decorre
desta reflexão que, ao considerar a vivência fora da sala de aula,
outra forma de aprender pode ser vivenciada pelo aluno: obser-
var, anotar o que observa; perceber, com o uso dos cinco sentidos,
o meio; explorar novidades, em uma forma de experimentação ao
ar livre e realizar ações manuais são possibilidades de desenvolver
novos conhecimentos, tornando o aluno ativo.
Brandão (2016) aponta que “são poucas pesquisas em relação
às hortas escolares, tornando-se um desafio investigá-la como fer-
ramenta pedagógica”. Para o mesmo autor (Brandão, 2016), cabe a
escola o incentivo às hortas escolares como ferramenta pedagógica,
considerando-a um espaço de problematização e interdisciplinari-
dade, entre outras propostas:

O espaço da horta escolar propicia ainda o desenvolvimento


de ações pedagógicas – como a problematização, a motiva-
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 213

ção, a contextualização, a interdisciplinaridade, a educação


ambiental e conteúdos diversos – permitindo práticas em
equipe e a exploração de múltiplas formas de aprendizagem
(BRANDÃO, 2016, p.19).

Os aspectos pedagógicos do aproveitamento da horta para fins


de aprendizagem necessitam planejamento, com atenção ao currí-
culo e aos objetivos de cada atividade.
Para o uso pedagógico da horta escolar, há necessidade de fer-
ramentas e insumos, como sementes, mudas e adubos e da seleção
de um local adequado para a sua instalação no terreno da escola,
requerendo diversas iniciativas do professor ou equipe que busque
propor um novo espaço pedagógico. Requer também a escolha de
seu formato e dos vegetais que comporão a horta, de modo que os
envolvidos se deparam com a necessidade da busca do conheci-
mento sobre o manejo de uma horta e raramente o professor possui
preparo ou apoio técnico, sendo a horta um ideal que exige a busca
de formação pessoal.
Os empecilhos para a tomada de decisão dos professores quan-
to a projetar uma horta na escola podem ser variados. Professo-
res podem ter receio de enfrentar mais um desafio em sua prática
educativa ao incluir uma horta em seu planejamento, mesmo diante
da contribuição que possa ter para o desenvolvimento dos alunos.
Supõe-se que, entre os motivos está o “preconceito” com o uso de
outros espaços como sala de aula para a aula, por não serem favo-
ráveis à aula convencional, expositiva. Além disto, muitos professo-
res temem abrir mais uma frente de trabalho, que lhes demandará
mais energia e os sobrecarregará, diante da intensificação revelada
em estudos sobre o trabalho docente (APPLE, 1995).
Outro possível motivo da não inclusão de hortas no ensino é o
receio de não conseguir relacionar a horta aos conteúdos previs-
tos no currículo escolar, principalmente nos anos finais do Ensino
214 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Fundamental e no Médio, pois os conteúdos vão progressivamente


se tornando mais complexos e específicos no decorrer da escola-
rização, dificultando a sua relação com o manejo da horta. Mesmo
nos níveis de ensino mais elementares, que possuem orientações
curriculares mais gerais, a horta pode ser relegada a um recurso
complementar às aprendizagens em sala de aula, o que requer re-
flexão sobre seu uso pedagógico.
Assim, para incluir a horta e envolver os alunos em aulas ao
ar livre, é necessário disposição e criatividade, e propor objetivos
pedagógicos para a horta para que esta não fique restrita aos co-
nhecimentos procedimentais de plantar e colher, mas que possa se
constituir em espaço versátil, pois didático, em que é dada a opor-
tunidade dos alunos serem proativos e animados em transformar
o espaço. As relações entre horta e sustentabilidade, horta e currí-
culo, horta e uso didático não são imediatas. Não é apenas por ma-
nusear a horta que se aprende sobre sustentabilidade. A atividade
manual e o prazer de realizar as atividades ao ar livre são interes-
santes; outras, ainda, são pesadas e repetitivas, como o é carpinar
um terreno, não adequadas a crianças pequenas, havendo ainda o
risco do manuseio de ferramentas por crianças maiores. Aprender
sobre sustentabilidade requer aliar a ida ao espaço da horta a dis-
cussões teóricas no tema, ao planejamento com os alunos do espa-
ço, a reflexão, em outro momento, sobre temas levantados pelo uso
da horta, como a alimentação saudável. Neste sentido, são necessá-
rias pesquisas sobre os processos didáticos que envolvem as hortas
e o trabalho dos professores na escola. Professores necessitam de
uma rede de apoio, para que projetos com hortas, jardins e outros
não sejam um trabalho solitário e penoso.
Como amparar as escolas, no que se refere aos professores, na
construção de hortas escolares? As hortas têm sido elaboradas
como instrumentos pedagógicos que favorecem a aprendizagem
de conteúdos escolares e a interdisciplinaridade? Podem ser re-
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 215

lacionadas, de modo objetivo, a valorização de um modo de vida


sustentável, visando o pleno desenvolvimento do aluno para além
do aspecto manual de sua construção? Estas questões têm suscita-
do investigações na escola, no que se refere à prática docente e suas
experiências com hortas, das quais duas serão exemplificadas neste
texto, voltando-se a discussão para o ensino de Ciências Ambientais.

2. METODOLOGIA DOS ESTUDOS


Diante dos desafios que os professores enfrentam para propor e
manter uma horta com finalidade pedagógica, o presente texto re-
lata duas investigações desenvolvidas como pesquisa qualitativa a
fim de entender a dinâmica da transformação do espaço das hortas
como espaço pedagógico para escola.
A primeira trata de uma pesquisa em curso que tem, entre os
seus objetivos, identificar quais são os apoios e dificuldades na im-
plementação das hortas, relacionando-a a formação dos professo-
res e aprendizagens dos alunos nesta iniciativa. Realiza-se um re-
corte do estudo, neste artigo, que tem como objetivo identificar a
visão dos diretores sobre a presença e implementação de horta nas
escolas em que atuam, a fim de aprimorar o apoio da gestão esco-
lar para construção da horta pelo professor uma vez que decisões
como a escolha do espaço e a compra de insumos, até a inclusão da
horta no Projeto Político Pedagógico da escola, necessitam ser alvo
de diálogo com os gestores.
O interesse surgiu de inquietações acerca da não continuidade
e ruptura de hortas escolares pelos professores, e, ainda por, faze-
rem-se necessários referenciais quanto à formação profissional de
professores, das diversas áreas, para que as práticas pedagógicas
sejam aprimoradas no uso do espaço da horta. Os resultados po-
dem colaborar no fortalecimento de políticas públicas relacionadas
à sustentabilidade nas escolas. Na cidade de S. Carlos, estado de São
216 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Paulo, Brasil, onde se desenvolve o estudo, foi aprovada a Lei Mu-


nicipal nº 17.971/2016 que “Dispõe sobre a criação do ‘Programa
Horta Escolar’ na Rede Municipal de Ensino” (SÃO CARLOS, 2016) e
obriga as escolas municipais a elaborarem hortas.
Esta pesquisa é do Pólo USP do Mestrado Profissional em Rede
Nacional para o Ensino das Ciências Ambientais e, por caracterís-
ticas do programa, culminará em uma cartilha com narrativas dos
professores com suas experiências com hortas na cidade de São
Carlos, incluindo orientações para sua construção.
O segundo estudo tem como objetivo relatar uma outra pers-
pectiva de trabalho com hortas visando a sustentabilidade, pela
denominada permacultura, aliando-a ao ensino da Matemática e da
Geografia. Trata-se de pesquisa em curso na cidade de Piracicaba,
estado de São Paulo, Brasil, realizada como estudo de caso em uma
escola da rede estadual, em colaboração com o professor de Geo-
grafia. Por ser uma forma de ilustrar o uso pedagógico da horta, o
relato desta pesquisa será breve.
Para a pesquisa com diretores, foram realizados levantamentos,
por questionário preparado no google forms, com 47 diretores das
57 unidades escolares que compõem o sistema municipal de ensino
da Diretoria Municipal de Ensino de São Carlos. De acordo com Gil
(1999, p. 128), o questionário pode ser definido “como a técnica de
investigação por um número mais ou menos elevado de questões
apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conheci-
mento de opiniões, crenças, sentimentos, interesses, expectativas,
situações vivenciadas etc.”.
O questionário, com 28 itens acerca da ocorrência de hortas es-
colares, foi aplicado durante o primeiro semestre de 2018 aos dire-
tores escolares. O convite para responder se deu em reunião da Se-
cretaria Municipal de Educação de São Carlos a todos os diretores
de unidades escolares presentes, na qual se esclareceram os objeti-
vos da pesquisa e foi solicitado o preenchimento dos questionários
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 217

impressos. Houve também a disponibilização do questionário por


endereço eletrônico, para entrega posterior dos participantes que
assim optassem. As escolas com hortas foram posteriormente visi-
tadas para continuidade do estudo e seus diretores assinaram um
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os questionários pre-
enchidos foram numerados e organizados em planilha do Microsoft
Excel, para filtro visando escolha dos dados a serem trabalhados.
Para a pesquisa na escola do estudo de caso em Piracicaba o pro-
fessor também assinou o referido Termo. As ações integrantes da
pesquisa foram registradas em relatório contendo um Diário Refle-
xivo e Planos de Aulas, os quais foram analisados de forma descritiva.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Hortas escolares nas escolas municipais de São Carlos, segundo os


diretores

A resposta dos diretores aos questionários permitiu mapear as


unidades que possuem hortas escolares e identificar a visão destes
sobre as hortas escolares. Foram devolvidos 82,45% dos questio-
nários, ou seja, das 57 unidades escolares, 47 diretores responde-
ram. Os diretores puderam apontar se a escola em que atuavam
possuía horta ou outra forma de aproveitamento do espaço escolar
com área verde. A figura 1 apresenta as respostas obtidas quanto
aos tipos de áreas verdes das escolas.
218 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Figura 1. Tipos de áreas verdes presentes em escolas da rede municipal de ensino de São Carlos – SP, segundo
resposta a questionário de diretores escolares. 2018.

Fonte: Aline Fabiane da Silva

Para qualificação das áreas verdes, os diretores participantes


puderam indicar mais de uma opção que fosse aplicável em sua
unidade. De um total de 47 escolas, 13 unidades escolares (27,6%)
possuem hortas, segundo seus diretores. Todos indicaram que o
espaço é utilizado com propósito pedagógico. Cabe salientar que
responderam 41 diretores de escolas de educação infantil, sendo
deste nível de ensino a maioria das escolas desta rede.
Conforme relatado em trabalho anterior (LOCONTE, et al.,
2017), o Referencial Curricular para a Educação Infantil (BRASIL,
1998) enfatiza a necessidade do brincar em espaços como pátios e
jardins e a valorização de experiências dos alunos em semear, plan-
tar e colher, desenvolvendo identidade, reverência e respeito para
com a natureza. As atividades podem estar voltadas para o prazer
e participação em espaços naturais, instigando a curiosidade da
criança e seu interesse sobre meio ambiente.
A presença de hortas em 27,6% das unidades é relevante, mas
pode ser ampliada. Como na educação infantil os conhecimentos
ainda não são específicos, é mais fácil seu uso pedagógico. A vi-
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 219

vência com hortas enseja a construção de uma identidade com o


ambiente e o atendimento ao desenvolvimento integral da criança,
este último indicado no objetivo das diretrizes da Educação Infan-
til: o desenvolvimento integral da criança até os seus cinco anos, em
seus aspectos físico, afetivo, psicológico, intelectual e social, de modo
a complementar a ação da família e da comunidade (BRASIL, 2013).
Indagados sobre quais finalidades consideram mais importan-
tes das áreas verdes nas escolas, os diretores escolares indicaram
as opções (figura 2).

Figura 2. Finalidades das áreas verdes nas escolas indicadas por diretores escolas da rede municipal de ensino de
S. Carlos - SP, em número absoluto, dados em função do número de respostas assinaladas. 2018.

Fonte: Aline Fabiane da Silva

Na figura 2 constata-se que as três respostas mais frequentes


para ter hortas na escola são a melhora aparência do ambiente es-
colar (30 respostas), proporcionar aos alunos atividades práticas
(29 respostas) e motivar o interesse dos alunos (27 respostas). Com
base nas respostas mais presentes, é possível inferir que os gesto-
res tendem a valorizar a aparência do ambiente escolar, finalidade
que não se refere ao uso pedagógico da horta, visto que também se
responsabilizam por manter a infraestrutura física da escola, entre
outras tarefas. O cunho pedagógico foi evidenciado nas respostas
escolhidas em 2º e 3º lugar, nas quais os gestores enfatizam as ati-
220 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

vidades práticas e motivação propiciadas pela construção da horta


pelos alunos.
O uso de outros espaços da escola, inicialmente não pedagó-
gicos, como um jardim e demais espaços de área verde da escola,
pode transformá-lo em uma sala de aula ao ar livre, tanto por mo-
dificações estruturais como pelo planejamento do espaço conside-
rando objetivos de aprendizagem, por exemplo, na escolha de ve-
getais que possam ser relacionados a conceitos específicos a serem
ensinados na Ciência.
Todos os diretores das unidades escolares participantes, que in-
dicaram possuir hortas escolares, responderam que os professores
são os responsáveis pela implementação. Alguns citaram ainda que
há a colaboração de outros servidores como merendeiras, contro-
ladores de acesso e equipe escolar. Em relação a participação dos
alunos, todas apontaram que há participação efetiva. Questionados
sobre quem colabora com a manutenção e cuidados com a horta,
indicaram-se profissionais externos à escola, professores, alunos,
pais e servidores (figura 3).

Figura 3 - Colaboradores quanto a manutenção da horta da escola, na visão dos diretores de escolas municipais de
S. Carlos – SP, 2018.

Fonte: Aline Fabiane da Silva


Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 221

A resposta mais assinalada se refere ao auxílio na horta de servi-


dores da escola (11 respostas), auxílio este que necessita negocia-
ção, de acordo com cada realidade, e reconhecimento do diretor da
unidade da importância desta participação, podendo ainda ser de
caráter voluntário. É possível que estes servidores tenham apenas
função de cuidar do espaço, cabendo integrar os servidores ao pro-
jeto pedagógico do espaço.
A resposta assinalada em segundo lugar, conforme a figura 3, refe-
re-se aos “professores que desenvolvem os projetos”. Se os professo-
res que são tidos como responsáveis pelo projeto da horta são vistos
como colaboradores para sua manutenção, significa que estão sozi-
nhos neste projeto? A horta não se torna um projeto da escola, mas
sim dependente da vontade dos professores que idealizaram o pro-
jeto, ficando a cargo deles arcar com todas ações referentes à horta.
A direção pode viabilizar projetos em que ocorram trocas de saberes
entre docentes e servidores, com perspectivas interdisciplinares e
com apoio para uso, incluindo pais e universidades.
Ao propor que escrevessem sobre quais as contribuições e a
importância da constituição deste espaço no âmbito escolar, as di-
reções enfatizaram a interação com o meio, as possibilidades de
aprendizagem unindo teoria e prática, a alimentação saudável, en-
tre outros aspectos.
Quanto às dificuldades de execução e desenvolvimento de pro-
jetos envolvendo hortas, a rotina de manutenção (13 respostas), a
falta de verbas (12 respostas) e o conhecimento da época de plantio
(7 respostas) foram apontadas em maior número (figura 4). Como
superação das eventuais dificuldades, a liberação de verbas foi a
mais citada (10 respostas), seguida de maior disponibilidade de
tempo para este tipo de trabalho (5 respostas) e do envolver-se no
manuseio de plantas e ferramentas (5 respostas).
222 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Figura 4. Dificuldades para desenvolver projetos envolvendo hortas escolares na visão dos diretores de escolas
municipais de S. Carlos – SP, 2018.

Fonte: Aline Fabiane da Silva

Ao priorizar as verbas, manutenção e ferramentas, os diretores


indicam que se preocupam com os aspectos procedimentais com a
horta, sendo que a preocupação pedagógica parece ficar a cargo dos
professores proponentes, de modo a envolverem-se apenas tecnica-
mente com o projeto. Iared e colaboradores (2009) ao estudarem um
histórico de projetos de construção de hortas escolares em S. Carlos,
perceberam a prioridade para a produção da horta em detrimento
do uso pedagógico. No que se refere a indicação de disponibilidade
de verbas como solução para o desenvolvimento e implantação de
hortas escolares, infere-se que pode haver o desconhecimento de
instituições que possam ser parceiras na construção do espaço, com
doação de mudas, auxilio no preparo da terra e manejo.
Em trabalho anterior com a formação de professores na Licen-
ciatura (MASSABNI, 2018), notou-se que as tarefas de implementa-
ção e rotina de manutenção da horta foram requeridas pela equipe
gestora da escola que recebeu licenciandos para a aprendizagem
da docência. Esta preocupação descaracteriza a atividade formativa
requerida para ser professor e buscada na Licenciatura, pois res-
tringe- se aos saberes técnicos instrumentais e aos conhecimentos
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 223

denominados procedimentais. Segundo Zabala (1998) os conheci-


mentos procedimentais são focados no trabalho manual e no saber-
-fazer de modo que, em hortas escolares, são requeridos ao limpar
o canteiro, plantar, manejar plantas no local, irrigar, entre outras
ações. Esta visão do trabalho com hortas é diferente da “horta di-
dática” pensada pelos participantes do projeto de Licenciatura em
questão, pois valorizavam-se a práticas pedagógicas que relacio-
nassem teoria e prática sem ater-se às técnicas e, especialmente,
compreendendo que não cabe aos licenciandos, futuros professo-
res, o papel de técnico, seja ele de apoio a elaboração ou manuten-
ção deste espaço.
Uma horta, como um novo espaço escolar, pode estar inclusa no
projeto pedagógico da escola, quando se atribui a ela significado
diante dos ideais formativos de cada escola junto aos alunos e co-
munidade. Cabe aos professores buscarem como transformar a ex-
periência com horta em aprendizagem significativa para os alunos
elaborarem novos conhecimentos, de modo que a relação ensino e
aprendizagem seja pensada para ser ajustada a este espaço e arti-
culada aos conhecimentos trabalhados em sala de aula.

3.2 Ampliação do uso pedagógico das hortas: a permacultura como propos-


ta de sustentabilidade em uma escola estadual de Piracicaba- SP

Quanto a segunda pesquisa deste artigo, insere-se nas ações de-


senvolvidas pela universidade (ESALQ) no sentido de apoiar os pro-
fessores para maior autonomia e inovação na abordagem pedagógica
em hortas e jardins, priorizando a sustentabilidade e envolvimento
ativo dos alunos. Os estudantes de Licenciatura em Ciências Agrárias
e Biológicas, da ESALQ, na cidade de Piracicaba, são incentivados a
apoiar os professores na preparação de planos de aula para estes es-
paços, além de ajudarem na sua implementação. Também realizam
seus estágios na docência, dando aulas no espaço.
224 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Na descrição dos Diários Reflexivos da vivência na escola do es-


tudo de caso, relata-se a constante negociação para uso do espaço
verde entre o professor, alunos e gestão escolar. A preocupação da
direção com o uso efetivo do espaço em que os alunos estão livres é
uma constante, ocasionando medidas como a liberação dos alunos
para ida à área verde como premiação àquelas turmas que apresen-
tam comportamento tido como adequado e maior aproveitamento
deste tipo de aula.
Na escola do estudo de caso, o espaço verde tem sido ocupado
com plantio de diversas mudas e outras iniciativas sustentáveis do
professor de Geografia, que também acolhe os estágios da univer-
sidade. A pesquisa desenvolveu-se a partir de 2018, mas o espaço
desta escola vinha sendo aprimorado para sustentabilidade: possui
árvores frutíferas, geodésica para abrigo de mudas, coletor de água
de chuva e irrigação, em uma parte. O projeto propõe uma nova
horta ou jardim – já que não contém apenas hortaliças, optou-se
pela denominação jardim – o Jardim da Permacultura.
Segundo Mollison e Holmgren (1981), permacultura pode ser
definida por pelo desenho de paisagens, de forma consciente, a
fim de reproduzir padrões e relações da natureza na produção de
alimentos, fibras e energia, de modo suficiente para necessidades
locais. Neste sentido, a permacultura refere-se a uma forma de pro-
dução em um espaço com design específico, harmonioso, em que
o meio seja cultivado respeitando-se os ciclos naturais, e assim,
tem-se o manejo sustentável, aliado a uma perspectiva de apoio na
força da educação e cultura para se pensar em produzir em bases
sustentáveis com resultados econômicos viáveis. Promover a per-
macultura como perspectiva sustentável na escola está de acordo
com uma proposta de educação visando a construção de um pen-
samento crítico. Introduzir um novo espaço permacultural na ins-
tituição, agregando à escola uma nova mudança didática, é uma
possibilidade.
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 225

No contexto investigado, a horta, como elemento da produção


agrícola, da forma como está sendo projetada, tem colaborado na
abordagem crítica do modo de vida em direção à sustentabilidade,
também opção do professor de Geografia e das aulas desenvolvidas
em sala de aula no projeto. Valoriza-se a abordagem interdiscipli-
nar e contextualizada ao se introduzir o cálculo matemático na pro-
jeção dos canteiros, o conhecimento das plantas a serem colocadas
e o estudo do espaço físico da área verde da escola aliado ao design
diferenciado que forma uma espiral, que traduz a harmonia pro-
posta pela permacultura. Para calcular o espaço de cada canteiro,
os alunos precisaram utilizar o Teorema de Pitágoras. Em momen-
to anterior a medição no terreno, tiveram aula teórica no tema e
fizeram uma prévia das medidas na construção de um terrário que
ilustrou, como “maquete”, o Jardim.
Temas relacionados a agricultura podem ser relacionados a con-
teúdos específicos de áreas como Química, Geografia, Matemática,
entre outras, além da Biologia, a depender da proposta educativa.
Por exemplo, Braibante e Zappe (2012), investigam como relacio-
nar o ensino da Química aos agrotóxicos e afirmam que estes com-
postos têm contaminado e se acumulado nos ecossistemas, justifi-
cando a contextualização da Química. A experiência tem indicado
que formas de ensino que valorizem outras maneiras de aprender,
por exemplo, com a matemática na prática da demarcação dos can-
teiros em espiral, que exige a medida de triângulos, possibilitam, ao
estudante, relacionar teoria e prática e, ainda, promovem a inter-
disciplinaridade.
Os estudantes, por sua vez, sentem-se responsáveis pelo espaço
verde da escola, que inclui o Jardim, embora alguns prefiram estar
ao ar livre sem se aterem as atividades propostas, aspecto ainda a
aprimorar do ponto de vista pedagógico. Outros pontos que podem
ampliar o projeto para melhor relacionar a agricultura a um modo
de vida sustentável é envolver os estudantes nas decisões sobre o
226 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

espaço, além de discutir a forma de cuidado com o Jardim diante das


razões para que os alimentos sejam cultivados com excesso de pro-
dutos químicos como agrotóxicos, do comprometimento e escassez
de água e do descaso com o solo. Neste sentido, a escolha do local
do Jardim foi devido a esta ser uma área do terreno com entulho de
construção, lixo deixado na escola há anos, que foi retirado. O solo
está sendo recuperado, algo que tem sido marcante para os alunos.
Para que as novas gerações reconheçam os impactos da ação
humana no meio natural, o ensino de Ciências Ambientais é fun-
damental. Entende-se, com os resultados destes dois estudos, que
é a partir das aprendizagens do ser humano como ser cultural e
social, que reflete sobre suas relações com o meio natural e suas
transformações, que as crianças e jovens podem entender e buscar
um modo de vida que respeite os ciclos naturais, incluindo os que
afetam sua própria vida. Questionar o modo de produção e consu-
mo na sociedade atual, pautado pelo crescimento econômico des-
medido, é uma forma de reconhecer estes impactos, uma vez que o
modelo civilizatório vigente prioriza o modelo de superprodução e
consumo, segundo o Tratado de Educação Ambiental para Socieda-
des Sustentáveis e Responsabilidade Global (TRATADO, 2018).
Esta abordagem torna-se ainda mais premente quando se atenta
para a vida cotidiana dos estudantes, muitos dos quais vivem em
áreas urbanas, em apartamentos, com poucas oportunidades de re-
lacionar-se com o meio natural e sentir-se como parte deste meio.
Qualquer observação assistemática é capaz de notar que, na vivên-
cia das crianças e jovens, no modo de vida atual, predominam os
espaços fechados, pouco ensolarados e permeados pela tecnologia,
artificialidades e consumismo.
Vânia Galindo Massabni; Aline Fabiane da Silva; Luca Pinto Marson 227

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A elaboração de uma horta na escola pode ampliar o uso de ati-


vidades práticas na escola diversificando a metodologia de ensino
do professor e fomentando novas formas de aprendizagem pelo
aluno. Porém, ter uma horta na escola não é uma decisão simples e
as escolhas e ações desde a ideia, até a sua efetiva implementação e
manutenção, necessitam reflexão e empenho do professor, que tem
estado sozinho nesta tarefa. Pode- se envolver o aluno em todas es-
tas fases e tornar possível novas abordagens para o conhecimento,
problematizando os diversos passos para que não se situem como
aprendizagem procedimental, apenas, da ação manual.
Se aproximadamente 30% das escolas municipais de S. Carlos
possuem hortas, o potencial está aquém do desejado, já que são es-
paços versáteis para o desenvolvimento integral da criança, esta-
belecendo suas primeiras relações com o meio natural, quando se
sabe que o modo de vida as tem distanciado da vivência com o meio
natural. Os diretores apoiam as hortas, mas este apoio prioriza as-
pectos procedimentais para sua implantação, sendo que a iniciativa
e responsabilidade pedagógica pelas mesmas fica somente com o
professor proponente. O uso pedagógico das hortas necessita ser
ampliado com vistas a sustentabilidade.
As duas pesquisas aqui relatadas indicam que o aproveitamento
pedagógico destes espaços pode ser maior e mais criativo. Relacio-
nar o espaço a diversos conteúdos escolares, como ocorreu com a
permacultura e a matemática na pesquisa realizada em Piracicaba
– SP tem sido apoio a inovação pedagógica do professor.
Finalmente, há que se apoiar mais os professores com propos-
tas didáticas diferenciadas para que as hortas se tornem, de fato,
transformadoras da realidade escolar e – por que não? – dos ideais
de vida das novas gerações.
228 REFLEXÕES SOBRE INDICADORES DA EFETIVIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

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CAPÍTULO 12 LUCIANA FONSECA MENDONÇA
ALBERLENE RIBEIRO DE OLIVEIRA

PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO


EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE: POSSÍVEIS CAMINHOS PARA
SENSIBILIZAÇÃO E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL

1. INTRODUÇÃO
O riacho, meu riacho, seu riacho.
Meu caminho, seu caminho, tudo só canção.
Só pra você guardar dentro do coração1.

Os recursos hídricos superficiais (os riachos) são cursos d’água


importantes para o uso humano; sendo assim, compõem a soma
total da água do planeta e, mesmo que representem uma pequena
parcela, trata-se de um “recurso natural indispensável e insubsti-
tuível, estratégico para qualquer sociedade, independentemente
do seu grau de desenvolvimento econômico, social ou tecnoló-
gico” (VIANNA, 2005, p. 343). Portanto, os recursos hídricos são
bastante usufruídos pelo homem, para fins de sua satisfação e+
sobrevivência.

1 Trecho da canção “Um riacho, um caminho”, do cantor Gilberto Gil, lançada em 2010.
232 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

Nesse interim, os recursos hídricos, em especial os superficiais,


sofrem com o manuseio desordenado (impacto ambiental) ocasio-
nado pelo homem, o que ameaça a vida do curso d’água. Cada curso
apresenta características únicas que se referem à sua forma, ao seu
fluxo, à sua vazão etc. Todas as particularidades estão diretamente
ligadas ao ambiente, e, se este sofre alterações, elas repercutirão no
recurso hídrico.
Diante do exposto, o presente artigo traduz um relato de experi-
ência vivida por dois professores (Artes e Geografia) da rede esta-
dual de Sergipe e aborda uma ação pedagógica que objetiva versar
sobre um problema ambiental comum a recursos hídricos superfi-
ciais, o assoreamento recorrente no Riacho do Cachorro, localizado
na cidade de Monte Alegre de Sergipe/SE. O referido recurso tem o
seu funcionamento comprometido devido aos longos períodos de
estiagens, bem como às inundações nas fases de chuvas intensas, à
poluição por dejetos e ao excessivo depósito de sedimentos em seu
leito, o que pode prejudicar o abastecimento da comunidade local.
A ação pedagógica foi subsidiada no Centro de Excelência 28 de
Janeiro, uma unidade educacional localizada na cidade já citada, e
os alunos envolvidos são estudantes do 7° e 8° anos (Ensino Fun-
damental Maior). Destarte, visou a sensibilizar esses indivíduos na
perspectiva educativa de compreensão da importância do Riacho do
Cachorro enquanto recurso hídrico para toda a comunidade local.
A realização da iniciativa foi relevante, uma vez que promoveu
um diálogo de sensibilização acerca da importância de se conservar
o Riacho do Cachorro, para assim desenvolver uma postura cons-
ciente frente ao recurso hídrico tão importante para a comunidade.
Neste sentido, a escola é um local apropriado para discutir e re-
fletir sobre qualquer temática ambiental, inclusive sobre os impac-
tos ambientais em torno dos recursos hídricos. O papel da Educação
ambiental, em todos os níveis escolares, torna-se imprescindível,
um exemplo pertinente são as campanhas de educação sanitária e/
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 233

ou ambiental, que infelizmente são práticas ainda pouco comuns


(GUERRA; BOTELHO, 2000).
Logo, a escolha da temática dessa ação foi instigada pela realida-
de ambiental do Riacho do Cachorro, pois, através do contato com
o ambiente do riacho degradado e dos diálogos com os alunos na
atividade de campo e na sala de aula do Centro de Excelência 28 de
Janeiro, revelou-se que o assoreamento era uma degradação desco-
nhecida pelos discentes.
Não apenas a Educação ambiental se faz presente nessa ação pe-
dagógica, a interdisciplinaridade marca a sua presença, visto que
se nota que, por vezes, a temática ambiental acaba se limitando às
áreas de Ciências, Biologia e Geografia; por isso, a presente iniciati-
va pedagógica contou com a colaboração dos professores de Artes
e Geografia, ambos pertencentes ao quadro efetivo da rede estadu-
al de ensino de Sergipe. Tal parceria garantiu uma maior interação
(diálogo) entre aluno-aluno, aluno-professor e professor-professor
na experiência de campo. É nesse sentido que diversas disciplinas
podem repartir tarefas de pesquisa sem se afastar de seus concei-
tos e métodos, para contribuir com um projeto ou em uma proble-
mática comum (LEFF, 2011).
Nessa direção, buscamos trazer, neste estudo, a realidade am-
biental do Riacho do Cachorro, evidenciando a importância da rea-
lização de inciativas pedagógicas que sensibilizem os indivíduos da
comunidade de modo afetivo e cognitivo, levando-os a uma leitura
sensível e reflexiva em torno do problema do assoreamento, para,
posteriormente, se pensar em desenvolver alternativas que tenham
em vista atenuar/sanar o problema.

2. O RECURSO HÍDRICO E SEU CARÁTER FUNCIONAL


Os recursos hídricos superficiais exercem uma notável impor-
tância para as bacias hidrográficas. Esses recursos integram as
234 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

redes hidrográficas, sendo estas uma composição complexa e di-


nâmica que repercute no ambiente, no espaço e na sociedade. Por
isso que Botelho (2000) cita que as bacias hidrográficas e seus ele-
mentos, dimensões, expressões e processos são objeto de pesquisa
dentro do campo das Ciências Ambientais. Quando aparece um pro-
blema ambiental envolvendo um dos elementos que se relacionam
com a bacia hidrográfica, as consequências do impacto podem vir a
afetar outras relações.
Desse modo, o recurso hídrico abordado neste artigo apresenta
processos de degradação ambiental, e o problema que será discu-
tido aqui é o assoreamento. Trata-se de uma realidade ambiental
recorrente em recursos hídricos, os quais são importantes para o
abastecimento de água. No tocante ao clima é uma região semiári-
da, caracterizada por temperaturas elevadas durante a maior parte
do ano, com irregularidade e baixa precipitação, o que acarreta um
clima quente e seco, ocasionando desconforto para as populações.
A escassez de pluviosidade não favorece a presença das águas
superficiais na cidade, os leitos dos recursos ficam comprometidos
na fase de estiagem; com isso, o abastecimento se compromete, e
a população local sofre com problemas decorrentes da realidade
climática, mas não é só o clima que compromete a funcionalidade
dos recursos hídricos, os processos de degradação, também assim
como o homem local colabora para tal.
Assim, o desmatamento da mata ciliar das margens para a ex-
pansão de pastagens de gado é outro problema ambiental. Os mo-
radores locais sobrevivem da atividade pecuária (gado leiteiro/
corte), por isso altera-se o espaço em benefício da economia, uma
prática frequente nessa região.
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 235

3. BREVE PANORAMA SOBRE O RIACHO DO CACHORRO


O Riacho do Cachorro está inserido na bacia hidrográfica do Rio
São Francisco e na sub-bacia hidrográfica do Rio Capivara; além
disso, o riacho localiza-se na zona urbana de Monte Alegre de Ser-
gipe/SE. O referido corpo d’água sofre com vários tipos de degrada-
ção ambiental (assoreamento, contaminação, erosão e inundação),
e, de todas essas realidades, a que mais afeta a população local é o
assoreamento. Um corpo hídrico assoreado traz consequências ne-
gativas e compromete a qualidade ambiental2. O Riacho do Cachor-
ro está diretamente ligado ao abastecimento humano, e, por esse
motivo, há um caráter funcional para a comunidade local.
A água que abastece a cidade procede da DESO (Companhia de
Saneamento de Sergipe), e sua captação advém do rio São Francis-
co; já as comunidades (vilas e povoados) são abastecidas por mi-
nadouros e poços artesianos (fontes de captação) construídos pela
COHIDRO (Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos)
e mantidos pela prefeitura da cidade3.
O corpo hídrico aqui discutido localiza-se num espaço urbano
que dista 2 km do centro da cidade, numa área limítrofe entre a
zona urbana e rural. Em seus arredores, encontram terrenos de
pastagens e alguns currais de gado, e, a cerca de 500 metros, en-
contra-se um matadouro desativado, que no passado lançava seus
dejetos no riacho. Além disso, o gado busca dessedentar-se nas
águas do riacho, por isso é comum a livre circulação desses animais
nas áreas marginais do recurso, uma vez que os proprietários dos
rebanhos permitem tal acesso.

2 De acordo com Pires e Santos (1995), qualidade ambiental pode ser definida como a soma
dos padrões encontrados nos diversos componentes que nos cercam e influenciam direta-
mente a nossa vida: qualidade da água, do ar, estética etc.
3 Dados extraídos do manual Projeto cadastro de infraestrutura hídrica do nordeste: Estado
de Sergipe. Diagnóstico do município de Monte Alegre de Sergipe.
236 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

Para a implantação das pastagens, a comunidade faz a retirada


da mata marginal, tecnicamente chamada de ciliar, e o referido vo-
cábulo faz alusão aos cílios (proteção externa dos olhos): os cílios
protegem os olhos, a mata ciliar faz o papel de proteger os rios, os
lagos e as nascentes; a mata ciliar cobre e protege o solo, deixan-
do-o fofo, fazendo com que funcione como uma espécie de esponja,
absorvendo a água das chuvas. Desse modo, quando chove, ao invés
de a água ir direto para o rio, acaba penetrando na terra, evitando
as enxurradas e regulando o ciclo da água, e assim, com suas raízes,
a mata ciliar evita a erosão e retém partículas de solo e materiais
diversos (SCHAFFER; PROCHNOW, 2002, p. 26).
Os autores acima mencionados abordam o fenômeno com um
olhar técnico, desconhecido da óptica popular. Para os moradores
locais, a retirada de mata é uma necessidade, do ponto de vista eco-
nômico, o que resulta em más condições hídricas do recurso. Assim,
o homem não se vê como o agente causador de destruição, uma vez
que a água barrenta é vista como fenômeno puramente natural.
A figura 1, a seguir, apresenta a realidade descrita acima, e se
percebe, ao observar a coloração da água, a presença de sedimen-
tos diluídos.
O processo de degradação levantado na problemática deste arti-
go revela o quanto o recurso é importante para a comunidade local,
mormente por estar ligado ao abastecimento humano; logo, é rele-
vante pensar no comprometimento da qualidade da água.
Fernandez e Garrido (2002) afirmam que a água destinada ao
abastecimento humano tem prioridade sobre qualquer outro tipo
de uso. A Lei Federal n° 9.433, de 8 de janeiro de 1997, estabelece
que, em condição de escassez, a prioridade deve ser dada ao abas-
tecimento humano. Ribeiro (2008) também faz menção ao direito
à água, ao abordar a importância de a população ter o suprimento
mínimo de água para prover o seu bem-estar. Daí a relevância de se
fazer um trabalho de sensibilização da população em torno do re-
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 237

curso, até mesmo porque a comunidade precisa ter o conhecimento


do valor desse potencial hídrico e da tarefa quanto ao cidadão so-
bre a manutenção dos mananciais.

Figura 1 - Vista marginal do Riacho do Cachorro no município de Monte Alegre de Sergipe, 2018.

Fonte: MENDONÇA, L. F. (2018).

4. DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES PARA UMA AÇÃO PEDAGÓGICA

Dialogar em uma rede institucional de ensino é fundamental


para o bom funcionamento dela. Todo diálogo carece da disposição
dos envolvidos não somente para falar ou ouvir, mas também para
compreender. Em qualquer tipo de relacionamento, o diálogo pre-
cisa estar presente, pois é a partir do processo dialógico que muitas
falas são colocadas, questionadas, compreendidas, outras vezes até
não são tão compreendidas, no entanto todas são discutidas.
A interdisciplinaridade, desde o seu surgimento, traz uma pro-
posta dialógica para a construção de um saber, sendo, assim, im-
238 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

possível haver sem diálogo, visto que é na interação que emergem


as informações e discussões sobre o objeto posto. O processo de
troca flui de modo gradual, envolvendo as áreas de conhecimento e
seus participantes, mas há diálogos que se colocam como processo
interdisciplinar, e, quando são analisados, logo se identifica que não
há correlação com o propósito citado. Portanto, pensar numa ação
pedagógica é refletir sobre a possibilidade de uma atitude inter-
disciplinar, e a postura dos docentes numa prática reflete o perfil
pedagógico deles.
O presente artigo traz idealizadores com uma postura interdisci-
plinar, até mesmo por se tratar de professores de Artes e Geografia
possuidores de uma mesma vontade política, com um olhar sensí-
vel sobre as questões ambientais dos recursos hídricos. A atitude
dos idealizadores da ação exigiu deles envolvimento e comprome-
timento. Para Fazenda (1988), a atitude interdisciplinar consiste
numa atitude de humildade em reconhecimento de uma limitação,
de perplexidade ao se deparar com o novo, de desafio ao redimen-
sionar o já consolidado, mas, principalmente, de revelação e encon-
tro. A fala da mencionada autora reflete exatamente o que os ideali-
zadores vivenciaram na ação pedagógica.
Ao pensar o educando como protagonista da construção do seu
conhecimento, a interdisciplinaridade pode ser porta de entrada
para “os estímulos, as ações, as vivências, a interação social e to-
dos os demais fatores essenciais à construção do conhecimento”
(FAZENDA, 1988, p. 82). A postura interdisciplinar permitiu que os
idealizadores facilitassem a aprendizagem sobre o fenômeno discu-
tido, indagando – muito mais do que emitindo – respostas prontas
e suscitando discussões.
A ação pedagógica teve seu desempenho satisfatório nos moldes
interdisciplinares, e isso se dá em face de seu planejamento sólido,
já que uma boa organização faz toda a diferença. Outro ponto im-
portante foi que o fenômeno estava diretamente ligado ao contexto
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 239

local; nesse ínterim, espera-se que cresçam as relações/conexões


em torno do assunto tratado no entendimento do alunado. No en-
tanto, o sucesso de qualquer atividade interdisciplinar não pode
ser avaliado pelo grau de integração entre as disciplinas ou pela
possibilidade de surgir um tema/problema a ser estudado, mas
sim pela postura dos envolvidos (NOGUEIRA, 2007). O autor ain-
da expõe que a atitude interdisciplinar não é exclusividade de um
projeto escolar, o espírito interdisciplinar pode estar presente em
qualquer assunto, por mais simples que seja (IBIDEM, 2007).
Esta ação pedagógica traz a lume uma discussão que por muitos
não é perceptível, uma vez que o fenômeno presente no recurso hí-
drico não é enxergado como degradação nos moldes antrópicos, e
a ocorrência é percebida pelos envolvidos como algo natural resul-
tante do clima. A iniciativa proporcionou uma integração, opondo-
-se à fragmentação das diferentes disciplinas envolvidas.

5. EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UM PROCESSO EDUCACIONAL PARA A


CONSTRUÇÃO DE UMA CONSCIÊNCIA CRÍTICA
O principal papel da Educação ambiental está voltado para uma
formação de cidadãos conscientes, preparados para tomar atitudes
frente às necessidades socioambientais em defesa do bem-estar de
cada indivíduo e do meio ambiente (MOREIRA, 2002). Para se traba-
lhar a Educação ambiental numa perspectiva da promoção da ética
ambiental, é interessante salientar que, para tal formação, faz-se ne-
cessária a construção dialógica entre saberes e disciplinas, livre de
qualquer possibilidade de exclusividade de pensamento único disci-
plinar, sendo essa colocação já feita por muitos autores da área.
A interdisciplinaridade para fins de uma construção de um sa-
ber ambiental é vista como uma das proposições mais relevantes
da Educação ambiental e promove um diálogo crítico, em que vá-
rios “olhares” podem se fazer presentes e dar suas contribuições.
240 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

O olhar crítico é indispensável para uma discussão satisfatória, e


isso vale para qualquer prática educativa de formação cidadã, não so-
mente para a Educação Ambiental. A preocupação política é uma mar-
ca da discussão crítica quando se trata das relações socioambientais.
Destarte, a Educação ambiental tem suas vertentes, ou seja, suas
correntes, e uma delas tem um viés crítico. É a chamada Educação
ambiental crítica, com um potencial para dar novos sentidos a con-
ceitos cartesianos imbuídos de soluções reducionistas, considera-
das pobres e limitantes, que não solucionam de fato (LAYRARGUES;
LIMA, 2014).
Nesse sentido, a presente ação pedagógica propõe uma expe-
riência educativa, já que o aprendizado pode ser o estímulo para
mudanças atitudinais. Uma experiência educativa numa vertente
crítica, capaz de conduzir à formação de um novo olhar dos alunos
para o corpo hídrico degradado em questão. Só assim é possível ver
os frutos de uma aprendizagem, percebendo a mudança de menta-
lidade, pois, caso não haja conversões, pode-se considerar apenas
como um aprendizado pontual. Na experiência educativa, não há
separação entre o aprendizado e a mudança, visto que é impossível
aprender algo novo sem mudar o ponto de vista (IBIDEM, 2014).
A escola como espaço formal de ensino-aprendizagem é uma im-
portante referência para as comunidades que, além da função de
formação pessoal, exerce influência social (MOREIRA et al., 2011).
Como o próprio autor diz, a escola tem poder preponderante, nada
melhor que o âmbito de tal influência para promover iniciativas pe-
dagógicas.
Por essa razão, os projetos interventivos em Educação ambien-
tal, assim como este trabalho, são essenciais, principalmente se se-
guirem uma corrente crítica. Este artigo foi pensado a partir de uma
abordagem crítica e reflexiva para instigar mudança na forma de
pensar do aluno, tendo em vista a transformação do conhecimento
e as práticas educativas.
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 241

6. O DIÁLOGO ENTRE A ARTE E O RECURSO HÍDRICO


Suscitar um tema sobre degradação ambiental numa aula de Ar-
tes a princípio parece ser estranho para o alunado, razão que foge
da rotina de atividades práticas comuns às aulas de Educação artís-
tica. Hoje, com a proposta de reflexão dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) sobre o meio ambiente, a discussão ambiental
ganhou mais espaço nas disciplinas, em especial as que compõem
a área de Humanas, e, quando o tema se correlaciona com o debate
do modelo de desenvolvimento econômico e social, as discussões
ganham mais proporções.
Nesse sentido, as aulas de Artes podem ser um momento de en-
riquecimento no tocante às reflexões sobre o meio ambiente numa
relação indissociável entre a teoria e a prática. As linguagens artís-
ticas são espaços vivos para as manifestações práticas das questões
discutidas, e cabe ao professor proporcionar esse encontro enri-
quecedor, de forma dialógica, entre a arte e o meio ambiente, propi-
ciando a construção de um “olhar” diferenciado do indivíduo para
com seu meio. Quando essa ação pedagógica foi pensada, partiu da
ideia de sensibilização dos alunos como um caminho pertinente.
Atividades como trabalho de campo, oficinas artísticas e rodas de
conversas, entre outras, podem ser excelentes alternativas para tratar
do tema, inclusive é pertinente que o professor atue também como
participante experimentador das atividades, não apenas seja um ide-
alizador das iniciativas, ou seja, que haja atuação para além do plane-
jamento/execução da programação, experimentando, assim, os exercí-
cios de sensibilização. E, depois, o professor pode seguir uma linha de
análise da percepção fenomenológica para compreensão dos indivídu-
os diante da realidade presente no meio em que eles estão inseridos.
Nessa ação, a realidade do riacho foi classificada como “fenôme-
no”, conceito que é oriundo da “fenomenologia”, tendência filosófi-
ca que entende o conhecimento como relação entre a consciência
242 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

que o indivíduo forma a partir do fenômeno apresentado (SAVIAN,


2016). Edmund Husserl é considerado o “Pai da fenomenologia” e
declara que a tarefa dessa ciência é investigar como algo é fantasia-
do, percebido, representado, recordado e simbolizado, isto é, apu-
rar como algo se apresenta aos sentidos e quais características são
levadas a cabo pelo perceber (HUSSERL, 1970).
A sensibilização proposta nas atividades que compuseram a
ação pedagógica contribuiu para despertar, nos indivíduos, a per-
cepção através dos sentidos: ver, ouvir, sentir e perceber detalhes
ali no riacho, até então nunca observados. Dessa maneira, o diálogo
entre a arte e o ambiente surge, pois aquela convida o ser humano
a perceber as coisas e o mundo, de preferência como as coisas se
apresentam, afinal as representações artísticas surgiram na huma-
nidade como uma proposta de representação das coisas. Diz-se que

O filósofo grego Aristóteles, ao analisar a ação humana, per-


cebeu que uma das maneiras de produzir sentido para a
existência reside na arte. No seu dizer, os seres humanos têm
prazer em conhecer e em produzir aquilo que conhecem. De
modo especial, esse prazer é vivido por meio da arte, consis-
te, segundo Aristóteles, em agir assim como a natureza age
(IBIDEM, 2016, p. 284).

Além disso, “Aristóteles pensava, sobretudo, nas artes visuais (a


escultura, a pintura e o teatro), uma vez que a visão, entre os cincos
sentidos, é a que mais oferece informações sobre a natureza” (IBI-
DEM, 2016, p. 284). Por isso que, no processo da ação pedagógica,
a prioridade no momento da atividade de campo era observar não
somente o riacho em si, mas seu entorno e tudo o mais que estives-
se presente direta ou indiretamente junto ao recurso.
Assim, o riacho foi visto por cada um que estava presente na exe-
cução da atividade, cada olhar com sua singularidade, logo a arte
convida a experimentar o diálogo silencioso do olhar.
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 243

7. CAMINHOS METODOLÓGICOS DA AÇÃO PEDAGÓGICA


Na execução da ação pedagógica, foi necessário organizar as
atividades em cada etapa. Nos procedimentos metodológicos, de-
monstrou-se, em cada atividade, a importância de se conhecer o
fenômeno ambiental (assoreamento do riacho), com base em auto-
res que discutem essa temática, e também na prática (atividade de
campo), por meio de entrevista, finalizando com a representação
do conhecimento formado a partir do debate proposto.
Quanto à forma de estudo, a ação foi classificada como pesquisa
descritiva, pois “a observação, o registro, a análise, a classificação
e a interpretação dos fatos, estão presentes, porém, o pesquisador
não lhes faz qualquer interferência” (PRESTES, 2014, p. 30).
No que se refere ao objeto de estudo, a iniciativa pode ser clas-
sificada como bibliográfica e de campo. Bibliográfica em razão de
que a proposta teve respaldo (foi desenvolvida) a partir de mate-
riais prontos (livros e artigos) que versavam sobre o fenômeno do
assoreamento, os recursos hídricos, a educação ambiental e a in-
terdisciplinaridade. Numa pesquisa bibliográfica, é importante um
levantamento dos temas e dos tipos de abordagens já trabalhadas
por outros estudiosos, “assimilando-se os conceitos e explorando-
-se os aspectos já publicados” (IBIDEM, 2014, p. 31). No tocante à
pesquisa de campo, a idealizadora da ação realizou entrevistas do
tipo semiestruturada, para fins de coleta de dados, investigando a
percepção dos alunos diante do fenômeno em questão e quais as
possibilidades de solução para a realidade presente.
As atividades foram extensivas para duas turmas (7° e 8° anos)
do turno vespertino do Centro de Excelência 28 de Janeiro, e no
total foram três etapas (1 atividade para cada etapa), todas elas re-
alizadas nos dias 21 e 22 de junho do ano em curso. Para o desen-
volvimento da ação pedagógica, ocupou-se o horário das aulas de
Geografia.
244 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

Com as atividades estabelecidas, foi distribuído para os alunos


um folder convidativo, apresentando um conteúdo informativo so-
bre o corpo hídrico e o fenômeno (assoreamento) a ser observado
e discutido ao longo de toda a ação. O conteúdo citado no impresso
informativo entregue aos alunos foi extraído de materiais didáticos
que tratavam sobre o tema. As informações eram sobre:
• Curso fluvial do Riacho do Cachorro;
• O impacto ambiental do assoreamento;
• A importância da mata ciliar nas áreas marginais;
• As ocorrências de chuvas e suas relações com as enchentes.

Além do conteúdo, no impresso havia brevemente as descrições


das atividades, a data e o horário correspondente a cada atividade
planejada. Toda a programação, como já foi citado acima, foi dis-
tribuída em quatro etapas, em cada uma delas. Essas etapas auxi-
liaram os alunos a compreender como se dá o fenômeno do asso-
reamento, principalmente as suas consequências. As etapas foram
trabalhadas de forma sequenciada. Na sequência, é trazida a descri-
ção de cada uma:

I Etapa: Consistiu na formação de uma roda de conversa acerca


dos problemas ambientais do Riacho do Cachorro, em que o pro-
fessor de Geografia explanou sobre os temas: recursos hídricos, ba-
cias hidrográficas e relação natureza/sociedade. Nesse momento,
as discussões foram iniciadas com o apoio do material didático que
foi entregue uma semana antes da data marcada para a realização
da atividade de campo; em seguida, foram distribuídos os folders
aos alunos.

II Etapa: Realizou-se atividade de campo, que ocorreu no início


da manhã, no horário oposto ao do turno escolar das turmas en-
volvidas. Os professores de Artes e Geografia saíram da frente da
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 245

escola, com vinte e nove alunos, rumo ao riacho, e foi solicitado que
todos levassem recursos como: câmera fotográfica, caderno para
possíveis anotações e utensílios para escrita (lápis e/ou caneta) –
tais recursos serviram como auxílio na coleta de dados por parte de
docentes e discentes. Ao longo de todo o processo da atividade, as
discussões sobre o tema iam sendo fomentadas entre alunos e pro-
fessores, e os registros fotográficos eram realizados. A atividade foi
executada a pé, percorrendo-se um trajeto de 2 km, contabilizando
ida e volta, o que somou 4 km de distância percorrida.

III Etapa: Esse momento serviu para a autora realizar a coleta


de dados, bem como notar as “impressões” dos indivíduos frente
à realidade ambiental observada. Foram realizadas as entrevistas
com os alunos, as questões seguiram uma ordem pré-estabele-
cida, mas a professora buscou deixar o entrevistado (aluno) livre
para explanar o que lhe foi indagado. A entrevista foi composta por
questões organizadas de acordo com o que foi experimentado na
atividade de campo, sendo todas as perguntas realizadas de forma
aberta. Compuseram o roteiro de entrevista:
1. O perfil do entrevistado;
2. A relação dos indivíduos com os recursos hídricos;
3. O significado da paisagem em questão para cada indivíduo;
4. O que os indivíduos sabem e creem saber sobre os recursos
hídricos;
5. O que os indivíduos esperam, sentem ou desejam no que tan-
ge à realidade hídrica que os cerca;
6. O que os indivíduos já fizeram, fazem ou pretendem fazer
para melhorar a atual situação hídrica.

A realização das entrevistas compreende a etapa da ação que re-


quer mais tempo para execução e dedicação. O espaço de realização
foi o Centro de Excelência 28 de Janeiro, em uma das salas de aula, e as
246 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

respostas foram transcritas no ato da entrevista pela professora de Ar-


tes. As perguntas foram norteadas com base no roteiro exposto acima.

IV Etapa: A última etapa foi pensada como proposta de uma


produção didática, a qual consistiu em um mural com fotos escolhi-
das pelos alunos. O critério de escolha sugerido pela professora de
Artes pautou-se nas imagens consideradas mais relevantes sobre
o tema do estudo. Na organização do mural, a professora solicitou
que os alunos colocassem frases de sensibilização sobre o proble-
ma em questão.
Nas etapas descritas acima, foram demonstradas as atividades
desenvolvidas, as quais foram embasadas por leituras/pesquisas
bibliográficas e documentais fundamentais para alicerçar a prática.
As atividades procuraram criar uma ponte entre o conteúdo dis-
cutido nas aulas de Geografia e a experiência de presenciar a re-
alidade da degradação discutida, do modo mais próximo possível.
Com essas atividades, pretendeu-se perceber, além da participação
individual e coletiva dos educandos em todo o processo, a sua per-
cepção frente ao fenômeno do assoreamento.

8. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O Riacho do Cachorro é um dos corpos hídricos superficiais da
cidade de Monte Alegre de Sergipe/SE. Esse recurso faz parte da
Bacia hidrográfica do Rio São Francisco e da sub-bacia do Rio Capi-
vara, mas, além dele, existem outros no município. Por se tratar de
uma cidade com um clima semiárido, ocorrem longos períodos de
estiagem. Diante dos períodos de seca, a escassez de água é um dos
problemas para a população. Mas a cidade se depara também com
problemas de ordem socioambiental como: comprometimento do
abastecimento hídrico populacional, degradação, enchentes, polui-
ção hídrica, água imprópria para o consumo, entre outros.
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 247

Vale salientar que os fenômenos elencados são recorrentes


em vários outros territórios, e a figura do homem é apontada
como sujeito principal de ações como as que foram citadas no
parágrafo anterior. Diante dessas problemáticas, as ciências am-
bientais, em conexão com a Educação ambiental, buscam condu-
zir o homem a construir uma nova forma de se relacionar com o
meio ambiente.
Dentro do contexto das áreas de conhecimento citadas acima, o
ambiente é pensado como sendo um sistema que envolve o indiví-
duo e seu meio natural, interagindo com os demais componentes
vivos e não vivos (LINDNER, 1996). E, muitas vezes, tal interação
culmina numa degradação ambiental que visa a um crescimento
econômico desenfreado. Por isso se fala, na contemporaneidade,
numa crise de civilização que questiona a racionalidade do sistema
social, os valores, os modos de produção e os conhecimentos que
sustentam tal sistema (LEFF, 2008).
Para se pensar e repensar a crise civilizatória vigente, são neces-
sários alicerces para construir ações que eduquem/sensibilizem o
indivíduo para a sustentabilidade ambiental. Para tanto, a escola
consiste em ser um espaço de construção/desconstrução de para-
digmas, assim como um espaço de formação de uma consciência
significativa frente às questões ambientais.
Todas as etapas foram voltadas para uma direção reflexiva, um
sentido ambiental, a partir da percepção de cada indivíduo fren-
te ao riacho, principalmente no tocante ao problema do assorea-
mento, por isso a escolha da linha fenomenológica. No decorrer do
processo de toda ação pedagógica, tanto o debate teórico (roda de
conversa) quanto a vivência (atividade de campo) e o produto di-
dático (construção do mural) foram avaliados pelos professores de
modo contínuo. Muitas anotações foram feitas no transcorrer das
atividades pela professora de Artes, assim como análises dos dados
(registros teóricos e imagéticos).
248 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

Das imagens registradas na atividade de campo, duas delas re-


gistraram os pontos que evidenciam a ocorrência do fenômeno do
assoreamento. A primeira (Figura 1) se refere à coloração da água
(barrenta), demonstrando o excesso de sedimentação depositado
no leito do recurso (Figura 2) e a segunda evidencia a presença do
gado às margens do riacho.
Há outros detalhes que chamaram a atenção dos alunos no mo-
mento da atividade de campo. O primeiro deles foi que, além do
gado presente nas áreas marginais, havia a presença de dejetos do
próprio animal (figura 2), tal identificação motivou o professor de
Geografia a indagar os alunos: “Qual problema ambiental caracte-
riza a presença destas fezes bem próximas da margem do riacho?”.
Após um rápido momento de silêncio/reflexão, um aluno respon-
deu: “A chuva arrasta para dentro do rio”, tal colocação suscitou ou-
tras falas que foram discorridas pelos alunos.

Figura 2 - Dejetos oriundos do gado na margem do Riacho do Cachorro, 2018.

Fonte: MENDONÇA, L. F. (2018).


Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 249

O segundo foi a informação evidenciada por um dos alunos, que


abordou a presença do matadouro desativado, afirmando que, na
época em que funcionava, os dejetos oriundos do abate eram des-
cartados ali no riacho, e, sendo assim, sempre havia uma circulação
frequente de cachorros com a intenção de se alimentar dos restos
da carne do gado abatido. Com tal colocação, mais uma informação
foi agregada à discussão, levando os professores envolvidos a per-
ceberem o valor didático da atividade de campo.
O produto didático (figura 3) serviu como registro de dados, afi-
nal as imagens traziam muitas informações visuais, principalmente
no tocante à degradação do riacho. As frases elaboradas também
carregam as impressões pessoais de alguns dos alunos e chamaram
a atenção, por exemplo: “Não acabem com os nossos rios” (Aluna
A, estudante do 8° ano); “Evitar gastar muita água vai nos poupar
da sede no futuro” (Aluna B, do 7° ano); “Vamos preservar o ria-
cho porque ele também é vida” (Aluna C, do 7° ano); “Não jogue
lixo nos riachos, precisamos dele para sobreviver!” (Aluna D, do 7°
ano); “Menos poluição e mais amor à natureza” (Aluna F, do 7° ano)
e “Vamos cuidar, pois, ao mesmo tempo, estamos ofendendo, esta-
mos sendo ofendidos” (Aluna G, do 8° ano).

Figura 3 - Produção do mural dos alunos no Centro de Excelência 28 de Janeiro, 2018.

Fonte: MENDONÇA, L. F. (2018).


250 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

Posto isso, os discentes puderam colocar seus olhares/impres-


sões na montagem do mural, que foi reconhecido como produto
didático e intitulado como: “Lembranças da atividade do riacho”.
O nome escolhido faz menção ao fato de que o dia da atividade de
campo seria, para todos os envolvidos, algo memorável e digno de
ser guardado com apreço em suas memórias.
A ação pedagógica apresentou alguns critérios como o envolvi-
mento, o comprometimento e a qualidade do produto construído,
o que foi levado em conta na avaliação. O envolvimento dos dis-
centes com as atividades, sobretudo com a de campo, foi signifi-
cativo, alguns se mostraram dispersos (poucos) nos momentos da
explanação realizada pelo professor de Geografia, mas a dispersão
é algo que faz parte da rotina escolar, até mesmo por se tratar de
uma maior quantidade de adolescentes; outra razão a ser levada
em conta é a empolgação por estar participando de uma atividade
que não é comum em sua rotina estudantil, fora da sala de aula.
Já o comprometimento foi perceptível no momento da entrevis-
ta, a disposição às indagações foi unânime, não houve recusas dos
alunos para realizar as entrevistas. E, no que se refere à confecção
do mural, a sua qualidade foi avaliada positivamente: as meninas
(8) se prontificaram a organizar a colocação e a colagem das fotos
no papel madeira.
A avaliação da ação pedagógica foi realizada através de obser-
vações dos professores sobre as participações dos alunos no desen-
volvimento das atividades. Durante a participação deles, percebeu-
-se o quanto foi absorvido do assunto sobre o qual se explanou. As
respostas dadas pelos alunos ao longo do processo da entrevista
forneceram pistas sobre o que foi compreendido e sobre aquilo em
que ainda é preciso avançar no processo de formação de uma cons-
ciência ambiental, assim como sobre os momentos de sistematiza-
ção dos conteúdos no processo das ações pedagógicas em Educa-
ção ambiental.
Luciana Fonseca Mendonça; Alberlene Ribeiro de Oliveira 251

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mencionada ação pedagógica idealizada por dois professores


de áreas diferentes (Artes e Geografia) leva a perceber o quanto a
interdisciplinaridade pode ser essencial na construção de um saber
ambiental em qualquer espaço educacional, seja formal ou informal.
Sendo assim, espera-se, a partir da ação desenvolvida, que os
discentes possam apropriar-se de conhecimentos adquiridos na ex-
periência de compreender/refletir sobre os problemas ambientais
do riacho mencionado, através de um diálogo simples, porém com-
pleto e edificante.
Ademais, os idealizadores almejam que a experiência da Educa-
ção ambiental oportunize aos discentes pensar possíveis medidas
para sanar ou diminuir os problemas frente ao corpo hídrico.

REFERÊNCIAS

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252 PROCESSO DE ASSOREAMENTO DO RIACHO DO CACHORRO EM MONTE ALEGRE DE SERGIPE

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ANDRÉ LUIZ BRITO NASCIMENTO
CAPÍTULO 13 JOSELISA MARIA CHAVES
MARIA CLÁUDIA SILVA DO CARMO

DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA


METODOLOGIA CIENTÍFICA E DESENVOLVIMENTO DE
PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS: A
EXPERIÊNCIA DO PROFCIAMB-UEFS

1. INTRODUÇÃO
Este capítulo objetiva apresentar a experiência de quatro docen-
tes da disciplina Metodologia Científica e Desenvolvimento de Pro-
jetos em Educação nas Ciências Ambientais, com ênfase nos desa-
fios postos no decorrer de sua execução, no âmbito do PROFCIAMB,
na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), na primeira
turma, realizada de setembro de 2017 a fevereiro de 2018. Tra-
ta-se também de uma reflexão sobre a natureza do Programa de
Mestrado Profissional em Rede Nacional para Ensino das Ciências
Ambientais, o qual vem produzindo subsídios importantes para a
formação do profissional que atua na Educação Básica.
Nestes termos, consideramos o curso de mestrado profissional
em Educação no Brasil uma importante via de formação, na medi-
da em que o profissional torna-se um pesquisador da sua prática.
Conforme André e Príncipe (2017, p. 106), os cursos stricto sensu
de Mestrados Profissionais em Educação no Brasil:
254 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

[...] propõe-se uma metodologia, que objetiva desenvolver,


com os profissionais da educação, não só uma atitude de
pesquisador, mas também habilidades necessárias à realiza-
ção de uma pesquisa, tais como: ter como ponto de partida
uma problemática, o que vai requerer a aprendizagem da
problematização; formular questões orientadoras; apren-
der a localizar fontes de consulta que ajudem a esclarecer as
questões e problemas identificados; conhecer procedimen-
tos metodológicos como relato oral, observação, entrevista,
análise documental, registro de áudio e vídeo; construir ins-
trumentos de coleta de dados; analisar dados e escrever um
relato da pesquisa.

Emergem, aqui, argumentos significativos e complexos sobre


a natureza do curso, no tocante à metodologia. Nesse sentido, fa-
z-se necessário contextualizar o PROFCIAMB-UEFS. O Programa
foi aprovado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES), em outubro de 2015, com conceito 4. Atu-
almente, é coordenado pela Universidade de São Paulo, no campus
de São Carlos. Além dessa instituição de ensino superior, o curso é
constituído por mais oito universidades, distribuídas nas cinco re-
giões brasileiras, compondo, portanto, Polos de formação em rede
nacional, a saber: Universidade Federal do Amazonas, Universidade
Federal do Pará, Universidade de Brasília, Universidade Federal de
Pernambuco, Universidade Federal de Sergipe, Universidade Esta-
dual de Feira de Santana, Universidade Federal do Paraná e Univer-
sidade Estadual de Maringá.
Esse Programa insere-se na área de Ciências Ambientais, perten-
cente à Grande Área Multidisciplinar, e, após aprovado, teve como
apoio financeiro um convênio entre a CAPES e a Agência Nacional
de Águas (ANA), cuja meta é a formação, em nível de mestrado pro-
fissional, de professores da Educação Básica e/ou profissionais atuan-
tes em espaços não formais e/ou escolares, com temática sobre Re-
André Luiz Brito Nascimento; Joselisa Maria Chaves; Maria Cláudia Silva do Carmo 255

cursos Hídricos, como também daqueles que atuam em atividades


de divulgação e comunicação das ciências (UEFS, 2016).
A UEFS, localizada no Território de Identidade Portal do Sertão, no
estado da Bahia, aderiu ao PROFCIAMB em 2014, porém, sua apro-
vação em instâncias acadêmicas ocorreu em 30 de março de 2017,
com base na Resolução CONSU 002/2017.A primeira Turma iniciou
suas aulas, após processo seletivo, em setembro de 2017, tendo sido
selecionados 16 candidatos, sendo 14 professores da Educação Bási-
ca, de diferentes municípios baianos, e duas técnicas, uma da UEFS e
outra da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA-BA).
Em linhas gerais, em sua ementa, a disciplina Metodologia Cien-
tífica e Desenvolvimento de Projeto em Educação nas Ciências Am-
bientais propõe a discussão sobre bases epistemológicas do conhe-
cimento científico e sua relação com outros tipos de conhecimento
humano: senso comum, religioso, filosófico, mítico, entre outros;
métodos e técnicas de pesquisa; compreensão das bases metodo-
lógicas no desenvolvimento dos projetos aplicados; (re)elaboração
do projeto de pesquisa e de um produto – sequência didática, ca-
derno pedagógico, vídeo, software, manual, mídia digital, entre ou-
tros – que podem ser desenvolvidos/implementados em escolas e/
ou em espaços não escolares pelos mestrandos (UEFS, 2016).
A construção da disciplina representou um grande desafio para
os docentes envolvidos, tendo em vista a modalidade de oferta, de-
senvolvida em módulos mensais de 15 horas, concentrados na sex-
ta-feira – manhã, tarde e noite – e no sábado, pela manhã, além da
carga horária muito compacta, de apenas 45 horas.
Aliado a isso, o fato de se tratar de a primeira disciplina a ser
ministrada, demandou um trabalho de revisão e, até mesmo, con-
textualização do projeto de pesquisa apresentado pelos mestran-
dos, no processo seletivo. Assim, impôs-se o desafio de dar conta
da discussão sobre bases epistemológicas da pesquisa científica,
abordagem de métodos e técnicas de pesquisa, elaboração de ins-
256 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

trumentos de coleta de dados, revisão do projeto de pesquisa, (re)


elaboração do produto, dentre outros.
Os docentes optaram para que a disciplina fosse ofertada em pe-
ríodos intercalados, com a solicitação de leituras e construção textual
sobre os objetos de estudo dos discentes. Nas primeiras aulas, abordou-
-se sobre mitos e tipos de conhecimentos constitutivo daquele módulo,
apresentado na ementa da disciplina; e, ao finalizar as15 horas, solici-
tou-se aos discentes desenvolver atividades vinculadas aos conteúdos
que foram sendo estudados, no âmbito da disciplina, bem como o obje-
to de estudo, envolvendo a pesquisa e a produção do projeto.
Vale salientar, que os projetos de pesquisa da turma, de um modo
geral, sinalizam para uma perspectiva interdisciplinar, mediante a
construção de objetos de estudo que possuem indiscutíveis interfaces,
seja no campo do ensino das Ciências Ambientais, seja em áreas afins,
como ensino de Ciências, de Biologia, e, também, de projetos que con-
templam programas institucionais e de organização comunitária, que
se desdobram em propostas pedagógicas e ações de intervenção.
Nessa lógica, há que se reconhecer que os princípios que funda-
mentam a proposta do PROFCIAMB apontam para uma perspectiva
interdisciplinar do ensino das Ciências Ambientais, ao enfatizarem
a formação de professores da Educação Básica e demais profissio-
nais que promovam a problematização de questões socioambien-
tais que permeiam a vida em sociedade, tanto na escola quanto em
outros espaços sociais.
Dessa forma, o PROFCIAMB adquire significativa importância no
processo de fortalecimento da interdisciplinaridade, ao contribuir efe-
tivamente na formação continuada de professores da educação básica,
levando em conta problemas locais, regionais e globais, por meio de
abordagens críticas que ensejem articulação entre teoria e prática.
A propósito da discussão sobre as possibilidades de construção
da interdisciplinaridade nas Ciências Ambientais, Vieira e Morais
(2003) ressaltam que as questões ambientais requerem um com-
André Luiz Brito Nascimento; Joselisa Maria Chaves; Maria Cláudia Silva do Carmo 257

plexo e integrado aporte de conhecimentos, exigindo um descola-


mento dos paradigmas tradicionais de cada área, a fim de propi-
ciar a emergência de um novo saber, diferenciado, em sua origem,
quanto ao campo temático de cada ciência. Nesse enfoque, houve
um grande desafio: a produção de conhecimento interdisciplinar
para a ciência, pois, ao longo do tempo, essa produção foi alicerçada
na divisão disciplinar (RUBIN-OLIVEIRA; FRANCO, 2015).
Nessa perspectiva, os autores supracitados reconhecem que o
saber ambiental está em processo de construção; entretanto, este
não se propõe a ser homogêneo, nem um paradigma globalizante
do conhecimento, mas, baseado na constante problematização des-
se saber, implicando na integração interdisciplinar do conhecimen-
to, com vistas a explicar os sistemas socioambientais complexos.
Ao procederem a crítica à disciplinarização do conhecimento,
mediante a instituição de disciplinas que, ao longo da História das
Ciências, tenderam a compartimentalizar a realidade e a promover
o recorte da análise de determinado fenômeno, a partir de um es-
pecífico ponto de vista, Vieira e Moraes (2003, p. 37) buscam ex-
plicitar as potencialidades da interdisciplinaridade, ao afirmarem:

A interdisciplinaridade, como aspiração emergente de supe-


ração da racionalidade científica positivista, aparece como
entendimento de uma nova forma de institucionalizar a pro-
dução do conhecimento nos espaços da pesquisa, na articu-
lação de novos paradigmas curriculares e na comunicação
do processo em perceber as várias disciplinas; nas determi-
nações do domínio das investigações, na constituição das
linguagens partilhadas, nas pluralidades dos saberes, nas
possibilidades de trocas de experiências e nos modos de re-
alização da parceria.

Por sua vez, Felício (2016) salienta que o ponto de partida do


pesquisador interdisciplinar é a demanda externa constituída de
258 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

problemáticas ambientais em qualquer escala. Nesse contexto, in-


sere-se o questionamento da sustentabilidade do desenvolvimento
socioeconômico, considerando os imperativos quanto à preserva-
ção, conservação e recuperação dos ecossistemas e dos recursos
naturais.
Ainda para esse autor, uma vez que sejam fecundas as investigações
do pesquisador interdisciplinar, suas contribuições poderão oferecer
alternativas para o desenvolvimento das ciências ambientais, impli-
cando no reordenamento de formatos de pesquisa, o que evitaria o
atrelamento a áreas científicas tradicionais herdadas da graduação.
Dessa forma, ao ressaltar os desafios postos ao trabalho do pes-
quisador interdisciplinar, Felício (2016, p. 106) afirma que:

A demanda externa eleita pelo pesquisador interdisciplinar


consiste numa raiz comum ou num princípio comum, pois,
em sua direção serão encaminhados todos os questionamen-
tos e dúvidas. Na demanda externa está jungida a multiplici-
dade própria das problemáticas ambientais e os seus desdo-
bramentos não respeitam fronteiras.

Oliveira (2018), ao problematizar a relação entre Ciências Am-


bientais e interdisciplinaridade, também procede a crítica quanto à
disciplinarização do saber, apontando-a como uma das principais
causas da problemática ambiental, que contribuiu para o desenvol-
vimento do processo tecnológico, restrito aos imperativos da pro-
dutividade, ignorando, na maioria das vezes, os impactos causados
ao meio ambiente. Acrescenta, ainda, que a complexidade dos sa-
beres atuais inviabiliza o retorno do saber generalista; todavia, faz-
-se necessário estabelecer interações, conexões e relações entre as
ciências naturais, sociais e exatas, a fim de compreender e propor
respostas inovadoras aos desafios da sociedade contemporânea.
Nesse sentido, visando aprofundar seus argumentos, Oliveira
(2018, p. 13) salienta que:
André Luiz Brito Nascimento; Joselisa Maria Chaves; Maria Cláudia Silva do Carmo 259

A participação ativa dos cidadãos na defesa da preservação


ambiental, inclusive na mudança de estilo de consumo, de-
pende de um processo de educação ambiental das gerações
atuais e futuras. A educação ambiental traz o desafio da in-
terdisciplinaridade, do pensamento complexo, de ser base
para mudança de paradigma produtivo com vista ao uso ra-
cional dos recursos naturais, o acesso aos mesmos de forma
equânime entre as nações ricas e pobres, perpassando inclu-
sive pela visão crítica da distribuição de renda local, nacional
e planetária.

2. DESAFIOS POSTOS AO DESENVOLVIMENTO DA DISCIPLINA


METODOLOGIA CIENTÍFICA E DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM
EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS
O desafio posto para os quatro professores da UEFS, três lotados
no Departamento de Educação e uma professora do Departamento
de Ciências Exatas, para ministrar a disciplina Metodologia Cientí-
fica e Desenvolvimento de Projetos em Educação nas Ciências Am-
bientais, com carga horária de 45 horas, foi motivador, em especial
por se tratar de um curso recém-criado, tendo que observar a com-
plexidade e, concomitantemente, a sustentabilidade e a interdisci-
plinaridade (MALHEIROS et al., 2013).
Aceito o desafio, surgiram outras formas de condução das apren-
dizagens, o ir e vir da prática pedagógica e, sobretudo, rever aquilo
que se faz e aquilo que se vive no contexto da investigação sobre a
Educação Básica e os interesses de pesquisa do curso de Mestrado
Profissional em Rede no Ensino de Ciências Ambientais.
Desse modo, inicialmente, focou-se o olhar com vistas a se conhe-
cer os projetos dos discentes do mestrado profissional e as implica-
ções com o objeto de estudo, no tocante ao Ensino das Ciências Am-
bientais; e o que intencionavam como produção final da investigação,
no que diz respeito às contribuições com o contexto educacional.
260 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

A necessidade de conciliar a abordagem das bases epistemoló-


gicas da pesquisa, incluindo a discussão sobre métodos e técnicas,
aliada à necessária revisão do projeto e aprimoramento da defini-
ção do produto a ser construído ao longo do mestrado profissional,
impôs aos docentes da referida disciplina a capacidade de otimizar
a carga horária de 45 horas, de modo a possibilitar o atendimento
da ementa e das competências/habilidades perspectivadas.
No que se refere ao projeto de pesquisa, o desafio consistiu na
revisão, por parte do mestrando, da versão apresentada na seleção.
Basicamente, residiu na necessidade de (re)construção do objeto de
estudo, o que incluiu a (re)definição do problema de pesquisa, dos
objetivos, dos procedimentos metodológicos, entre outros itens.
Nesse sentido, fez-se mister uma maior compreensão sobre o
que vem a ser um projeto de pesquisa. Diversos autores (GIL, 1989;
SANTANA; NASCIMENTO, 2010 e MOREIRA, 2011) salientam a ne-
cessidade de planejamento da pesquisa vinculada à elaboração de
um projeto, que envolve a formulação do problema, a especificação
de seus objetivos, a construção de hipóteses, a operacionalização
dos conceitos, a definição do tipo de pesquisa, os procedimentos de
coleta e análise de dados, entre outros aspectos.
Como toda atividade racional e sistemática, a pesquisa requer
que as ações a serem desenvolvidas sejam efetivamente planejadas,
de modo que se possa alcançar os objetivos almejados, em um de-
terminado prazo (GIL, 1989). Para esse autor, um projeto de pes-
quisa somente pode ser plenamente elaborado quando se formula
claramente o problema, se define bem os objetivos e se delineia o
plano de coleta e análise de dados.
Por sua vez, Deslandes (2011) define o projeto de pesquisa como
um artefato, constituindo a síntese de múltiplos esforços intelectu-
ais que se contrapõem e se complementam: de abstração teórico-
-conceitual e de conexão com a realidade empírica, de exaustivida-
de e síntese, de inclusões e recortes, além de rigor e criatividade.
André Luiz Brito Nascimento; Joselisa Maria Chaves; Maria Cláudia Silva do Carmo 261

Prosseguindo, a supracitada autora enfatiza que o objeto de es-


tudo é um objeto construído, uma vez que se constitui em uma tra-
dução, uma versão do real, pela utilização de conceitos operadores,
resultante de um processo de objetivação teórico-conceitual de cer-
tos aspectos ou relações existentes no real.
Em síntese, para Deslandes (201, p. 32), o projeto de pesquisa:

É um instrumento que servirá como a guia para as ações do


estudo proposto. Podemos ponderar que esta ferramenta-
guia não se limitaria à metáfora do prumo de um pedreiro,
que se destina a corrigir a retidão do ângulo de uma parede,
evitando rigorosamente os desvios. Melhor talvez fosse
pensar através da metáfora de outras ferramentas-guia,
tais como o astrolábio e o sextante, instrumentos utilizados
pelos antigos navegadores para se lançarem em mares
desconhecidos, desafiadores e fascinantes.

No que se refere ao problema de pesquisa, Laville e Dione (1999)


sustentam que este somente pode ser resolvido com conhecimen-
tos e dados já disponíveis ou com aqueles factíveis de serem pro-
duzidos. Assim, para esses autores, um problema de pesquisa não
é um problema que se pode resolver pela intuição, pela tradição,
pelo senso comum ou até pela simples especulação. Exige, portan-
to, informações suplementares, a fim de cercá-lo, compreendê-lo,
resolvê-lo ou eventualmente contribuir pra a sua resolução, enfim,
que forneça novos conhecimentos para o tratamento de questões a
ele relacionados.
Observou-se, no âmbito da disciplina Metodologia Científica,
que os problemas de pesquisa apresentados pelos alunos, em sua
grande maioria, evidenciavam imprecisões quanto à sua clara defi-
nição e consonância com os objetivos propostos, razão pela qual fo-
ram feitas sugestões de ajustes, resultando em projetos com muita
diversidade de temas e produtos (cf. Tabela 1).
262 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Quanto aos objetivos, estes buscam responder ao que é preten-


dido com a pesquisa, que propósitos são almejados ao final da in-
vestigação, sendo fundamental que sejam passíveis de serem atin-
gidos. Para tanto, demanda-se a formulação de um objetivo geral,
de dimensões mais amplas, articulando-o aos objetivos específicos.

Tabela 1- Títulos dos Projetos de Pesquisa dos Mestrandos da Turma 1 – PROFCIAMB-UEFS.


Mestrando Título
Abílio Cláudio do Nascimento Peixoto História em Quadrinhos como Ferramenta Educativa no Clube de Ciências
Compreensão das Percepções Ambientais do Uso da Água na Comu-
Alessandro Oliveira Andrade nidade do Colégio Estadual Georgina de Mello Erismann, em Feira de
Santana, BA
Guia Didático de Educação Científica para Projetos Socioambientalmen-
Carla Vanesca Rabelo Ollandezos te Sustentáveis no Ensino Profissional das Tecnologias da Informação e
Comunicação em Instituição do Estado da Bahia
Cleide Lina de Oliveira Cerqueira Educação Ambiental nas Escolas Públicas: Potencialidade e possibilida-
des de uma proposta utilizando a água como tema gerador
Sequência didática para o ensino de ciências no fundamental II: contri-
Daiane Moura de Santana buições teórico-práticas para a Educação Ambiental na Caatinga.
Elaine Cristina Costa Montino Bastos Contribuição da Educação Ambiental Crítica para a Temática Agrotóxico
no Espaço Escolar
Estratégias para Gestão Ambiental: Contribuições para a Equipe de Edu-
Fernanda Cristina Miranda Ribeiro cação Ambiental da Universidade Estadual de Feira de Santana
Iara Morena Oliveira Fagundes e Souza Comitê de Bacia Hidrográfica: Limites e Possibilidades para Construção
de uma Governança Democrática das Águas
José Augusto de Oliveira Santos Avaliação Ambiental do Rio da Volta: Um Olhar Sobre O “Rio Morto”
Chapada Diamantina-BA
José Roberto dos Santos Brito A Busca da Memória na “Terra da Água” a partir dos Estudantes da EJA
Educação Ambiental e o Consumo dos Recursos Hídricos: Contribuição
Jozenei Silva Pereira da Contabilidade Ambiental para o Desenvolvimento Sustentável de
Alagoinhas-BA
Juliana Freire Santos Novaes de Sá Cartilha e Jogo Didático como subsídios para o Ensino de Temáticas So-
cioambientais no IFBA – Campus Euclides da Cunha
Karine Sande Barreto Estratégias de Educação Ambiental para o Manejo Adequado dos Resí-
duos Laboratoriais do CETEP Recôncavo
Maria Lívia Pereira dos Santos Ecologia Política na Sala de Aula: Uma Proposta para Novos Saberes
Ambientais na Escola
Mel Reis Loureiro Igatu: Refazendo caminhos de identidade e recuperando Água Boa
Renata Silva de Souza Horta Escolar como Ambiente Lúdico de Aprendizagem no Colégio Esta-
dual Raphael Serravalle - Bahia: Melhorando a Relação dos Estudantes
com os Alimentos e Ambiente
André Luiz Brito Nascimento; Joselisa Maria Chaves; Maria Cláudia Silva do Carmo 263

Conforme Creswell (2007), o objetivo estabelece a direção para


a pesquisa, orienta o leitor para o propósito central do estudo, e, a
partir daí, seguem-se todos os outros aspectos da pesquisa, indi-
cando por que se deseja pesquisar e o que se pretende atingir.
A experiência, junto à turma do PROFCIAMB-UEFS, revelou que
as discussões, em sala de aula, contribuíram para o aprimoramento
ou, até mesmo, a reformulação dos objetivos de pesquisa, na pers-
pectiva de que estes apresentassem maior clareza, precisão e lin-
guagem unívoca.
No tocante à metodologia de pesquisa, esta pode ser definida
como o estudo e a avaliação dos diversos métodos, com o propó-
sito de identificar possibilidades e limitações, no que se refere à
sua aplicação na pesquisa científica (DIEHL, 2004). Dessa forma,
a metodologia permite a escolha da melhor maneira de abordar o
problema de pesquisa, contemplando métodos e técnicas de coleta
e análise de dados.
Verificou-se, no que se refere aos projetos de pesquisa dos alu-
nos da Turma 1 do PROFCIAMB-UEFS, que, no geral, as escolhas
metodológicas recaíram em instrumentos de coleta de dados de
natureza qualitativa, a exemplo de aplicação de questionário, reali-
zação de entrevista, grupo focal, observação, entre outros, em que
pese a diversidade de objetos de estudo.
Na verdade, os projetos, de um modo geral, se reportam a pes-
quisas desenvolvidas em escolas, relacionadas a práticas de ensi-
no, atividades pedagógicas, como Feira de Ciências, implantação de
Hortas Escolares, e outras, além de alguns estudos mais específicos,
com ênfase em aspectos técnicos ou tecnológicos, a exemplo do uso
da Contabilidade Ambiental, no estudo do patrimônio hídrico.
Tais estudos são receptivos à adoção de procedimentos meto-
dológicos característicos das pesquisas qualitativas, sem prejuízo
da possibilidade de quantificação de dados. A esse respeito, André
(1995) afirma que a abordagem qualitativa de pesquisa tem suas
264 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

raízes no final do século XIX, quando os cientistas sociais começa-


ram a questionar se o método de investigação das ciências físicas e
sociais, cuja base epistemológica remonta ao positivismo, deveria
continuar servindo de modelo para o estudo de fenômenos sociais.
Prosseguindo, André (1995, p. 25), ao problematizar a dicoto-
mia qualitativo-quantitativo construída ao longo de décadas, assim
se posiciona:

Porém, a necessidade agora é ir além, ultrapassar a dicoto-


mia qualitativo-quantitativo e tentar encontrar respostas
para as inúmeras questões com que nos defrontamos diaria-
mente, entre as quais podemos citar: O que caracteriza um
trabalho científico? O que diferencia o conhecimento cien-
tífico de outros tipos de conhecimento? Quais os critérios
para se julgar uma boa pesquisa? O que se pode considerar
como válido e confiável na pesquisa? Como deve ser tratada
a problemática da generalização? Qual o papel da teoria na
pesquisa? Como articular o micro e o macrossocial? Como
trabalhar a subjetividade na pesquisa? Quais as formas mais
apropriadas de análise de dados qualitativos?

Com base na experiência vivenciada na disciplina Metodologia


Científica no PROFCIAMB-UEFS, pode-se afirmar que esta discus-
são de natureza metodológica adquire indiscutível pertinência,
haja vista a perspectiva interdisciplinar assumida em vários proje-
tos de pesquisa, algo, portanto, inerente ao campo de estudos das
ciências ambientais, ao estabelecerem interfaces com a Educação,
Biologia, Sociologia, Antropologia, Tecnologias da Informação e Co-
municação, Geografia, entre outras áreas, que se coadunam com as
escolhas metodológicas dos mestrandos.
No primeiro semestre, os discentes tiveram mais duas discipli-
nas - Interdisciplinaridade em Ciências Ambientais e Ambiente, So-
ciedade e Educação - que contribuíram para alicerçar ainda mais
André Luiz Brito Nascimento; Joselisa Maria Chaves; Maria Cláudia Silva do Carmo 265

os projetos de pesquisa. Na continuidade, no segundo semestre,


cursaram as disciplinas Seminários de Pesquisa e Planejamento de
Projetos em Educação Ambiental, possibilitando um maior aprimo-
ramento dos projetos de pesquisa.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Componente Curricular Metodologia Científica e Desenvolvi-
mento de Projetos em Educação nas Ciências Ambiental, efetivado
no ano de 2017, no mestrado profissional PROFCIAMB- UEFS, pos-
sibilitou uma reflexão sobre possibilidades e desafios estabelecidos
no fazer pedagógico dos professores e dos mestrandos do Programa.
Ao elaborar a metodologia desse componente, compreendeu-se
a importância de pensar diversas ações formativas e investigativas,
cujos conhecimentos e possibilidades foram delineados, a partir da
dialógica com os objetos de estudos dos mestrandos e as singula-
ridades das práticas construídas, por suas experiências pessoais
e profissionais, articulando com a ementa do componente. Como
afirma Nóvoa (1995, p.7), “não é possível separar o eu pessoal do
eu profissional”. Tal processo enseja a assunção de identidades, de
forma dinâmica, densa e extensa.
Ademais, foi possível compreender a pesquisa como princípio
educativo, a partir do diálogo entre diversos pontos de vista das áre-
as de estudo as quais pertencem os mestrandos, bem como os pontos
de vista da área de atuação e dos objetivos que desejam alcançar com
suas pesquisas de cunho interdisciplinar, que, de uma forma ou de
outra, discutem e pensam sobre seus cotidianos, no tocante à dificul-
dade de aproximar ou de vislumbrar novas perspectivas epistemoló-
gicas e teóricas de várias abordagens e de vários paradigmas.
No desenvolvimento do componente curricular, percebe-se que
muitos mestrandos revelaram dificuldades e, também, fragilida-
des referentes às abordagens metodológicas e tipos de pesquisa.
266 DESAFIOS NO FAZER PEDAGÓGICO NA DISCIPLINA METODOLOGIA CIENTÍFICA E
DESENVOLVIMENTO DE PROJETOS EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Ficou evidente a falta de domínio dos fundamentos dos métodos


de pesquisa, principalmente de natureza qualitativa. Contudo, po-
de-se constatar um esforço coletivo e individual dos estudantes no
estudo de tais abordagens metodológicas, à medida que foram re-
construindo seus projetos de pesquisa em Educação nas Ciências
Ambientais.
Ao final do referido componente curricular, considera-se que
este contribuiu sobremaneira no processo de construção dos per-
cursos metodológicos das pesquisas dos estudantes. Na escuta das
suas narrativas, foi possível reconhecer que, à proporção que apre-
sentavam seus projetos, abriam-se para diferentes perspectivas e
articulações entre os objetos de estudo e a construção de saberes
no campo da Educação, por meio de explicitações generativas. Con-
tudo, considera-se que a carga horária do referido componente cur-
ricular poderia ser ampliada.
De fato, a experiência com o componente curricular Metodo-
logia Científica e Desenvolvimento de Projetos em Educação
nas Ciências Ambientais se configurou como processo de refle-
xão, possibilitando a ressignificação dos caminhos metodológicos
do componente e o reconhecimento da importância do diálogo com
outras áreas de conhecimentos e concepções de pesquisa que con-
tribuíssem para o desenvolvimento de produtos acadêmicos, abrin-
do, portanto, outras possibilidades de produção de conhecimentos,
implicando os mestrandos nos seus espaços de atuação profissional.

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Acesso em: 13 out. 2018.
SÍLVIA NASCIMENTO GOIS
CAPÍTULO 14 SINDIANY SUELEN CADUDA DOS SANTOS
MARIA DO SOCORRO FERREIRA DA SILVA

A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL: REUTILIZAÇÃO


DO ÓLEO DE COZINHA PARA PRODUÇÃO DE SABÃO

1. INTRODUÇÃO
O descarte de resíduos está entre os temas ambientais de
singular relevância na contemporaneidade e o seu reaproveita-
mento é uma forma primordial de minimizar os impactos causa-
dos quando dispostos de modo inadequado (WILDNER; HILLIG,
2012). No caso específico dos óleos vegetais, estes são conside-
rados nocivos ao ambiente quando descartados de maneira in-
correta após serem utilizados na produção de alimentos (DO-
MINGUINI et al., 2011).
Segundo Dominguini et al. (2011), por ser um composto orgâ-
nico insolúvel em água, quando lançado diretamente nas pias, o
óleo tende a, inicialmente, aglutinar-se e causar danos às tubula-
ções. Ao chegar aos córregos, rios e manguezais, os óleos vegetais
interferem na passagem da luz solar, o que prejudica o processo de
fotossíntese do fitoplâncton, que é base de toda cadeia alimentar
aquática, ressaltam os autores.
270 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

Uma vez lançado na água, esse óleo é degradado por microorga-


nismos, a exemplo das bactérias. Trata-se de um processo aeróbio
que consome o oxigênio dissolvido presente no meio, provocando es-
cassez desse gás, com possível morte da fauna aquática e bloqueio na
proliferação de vida (ALBERICI; PONTES, 2004). Ademais, ao atingir
o solo, o óleo acaba impermeabilizando-o, fato que altera o ciclo da
água na fase terrestre. Dessa forma, a renovação de lençóis freáticos
e de mananciais aquáticos é afetada, o que pode, inclusive, aumen-
tar as possibilidades de inundações (AZEVEDO et al., 2009). Para os
autores, quando ocorre a infiltração no solo, há a contaminação dos
lençóis freáticos, inibindo a evolução da vegetação. Isso ocorre por-
que quando o resíduo entra em contato com as folhas, o crescimento
das plantas é retardado, e o óleo acaba por acumular-se na superfície
foliar causando a diminuição do processo de fotossíntese.
Alberici e Pontes (2004, p. 74) ressaltam que “muitos estabele-
cimentos comerciais (restaurantes, bares, lanchonetes, pastelarias,
hotéis) e residências jogam o óleo comestível (de cozinha) usado
na rede de esgoto”. Tal ação causa o entupimento das tubulações e
afetam negativamente o funcionamento das estações de tratamen-
to (ALBERICI; PONTES, 2004). Para retirar o óleo e desentupi-las,
são empregados produtos químicos tóxicos, o que gera uma cadeia
perniciosa e danos irreparáveis ao meio ambiente.
A poluição, pelo óleo, encarece o tratamento do esgoto em até
45% e contribui para agravar o efeito estufa, visto que o contato
da água poluída pelo óleo com a água do mar gera uma reação quí-
mica que libera gás metano, um componente muito mais efetivo na
produção de efeito estufa do que o gás carbônico (DOMINGUINI et
al., 2011). Diante de todas essas problemáticas socioambientais, o
descarte irregular do óleo configura-se como uma das causas res-
ponsáveis pela degradação do ambiente.
Entretanto, a crise ecológica na qual o planeta se encontra, gra-
dativamente faz surgir diversificadas tentativas de modificação
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 271

dessa crítica realidade. Nas análises de Leff (2008), a degradação


ambiental emerge do crescimento e da globalização da economia,
o que exige a transformação do conhecimento com base em uma
nova racionalidade ambiental. De acordo com o autor, é necessário
articular campos do conhecimento para a compreensão dos fenô-
menos e processos, de modo interdisciplinar.
Segundo Leff (2016) há uma conclamação de reconstituição das
ciências sociais para uma refundamentação dos modos de reinven-
tar o sujeito com uma nova visão, pois diante da crise ambiental,
emerge o pensamento ecológico a fim de repensar as interrelações
de um mundo complexo; para resgatar o ser e elaborar a susten-
tabilidade da vida. O autor frisa que: “o sujeito retorna individua-
lizado, como agente social capaz de renovar as estruturas sociais
da Modernidade, [...] de autoreconstituir-se ante as condições que
a sociedade moderna lhe apresenta e impõe” (LEFF, 2016, p. 387).
Assim, de acordo com relatos do autor, pensar o ambiente, de for-
ma interdisciplinar, está diretamente ligado ao conceito de ambien-
talismo, que se constitui como uma filosofia de vida, uma forma
transcendente de pensar o mundo, de viver a vida e de construir
a sustentabilidade. Ou seja, Leff (2016) aponta a crise ambiental
como marco para a abertura de novos horizontes civilizatórios.
Nessa direção, é importante que a escola e a família compar-
tilhem o trabalho de reflexão sobre os valores contemporâneos,
bem como sua relação com o consumo (SANTOS, 2012). Vale fri-
sar que o ambiente escolar é propício para desenvolver experi-
ências educativas de transformação e de reflexão. Dourado et al.
(2015) reforçam que,
Para Freire, objetivo maior da educação é apoiar a tomada de
consciência de seus educandos de modo que possam com-
preender a sua situação e agir em favor de sua emancipação.
[...] sua proposta é estimular a inquietação e a transformação
social, por meio de relações afetivas e democráticas que ar-
272 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

rogam ao professor um papel de autoridade sem autoritaris-


mo (DOURADO et al., 2015, p. 36-37).

Ainda segundo os autores, a escola tem um papel irradiador no


processo de transformação dos espaços sociais à medida em que
são oferecidos exercícios e vivências mais libertárias, fomenta-se
o espírito crítico e uma ética do cuidado, caminhando assim para a
emancipação e a mudança. A educação bancária, na qual o professor
era apenas um depositário do conhecimento, está ultrapassada, pois
sempre teve caráter dominador que atualmente tornou-se obsoleto.
O aluno de agora, deve ser contemplado como protagonista de
sua história e inserido no contexto social, econômico, político e am-
biental local e global, para que possa apropriar-se de decisões e de
um pensamento crítico sobre o contexto que o cerca. Para Paulo Frei-
re (2001, p. 264), “ao estudo crítico corresponde um ensino igual-
mente crítico que demanda necessariamente uma forma crítica de
compreender e de realizar a leitura da palavra e a leitura do mundo”.
O processo educativo não é mais admitido de forma mecanizada
e fragmentada, fato que torna o conhecimento estanque e memo-
rizador. Em contrapartida, muito mais envolvente e inovador é a
construção do conhecimento no exercício da prática interdiscipli-
nar. A interdisciplinaridade, no âmbito escolar, destaca-se pela dis-
seminação de procedimentos metodológicos de investigação que
provocam a identidade latente do aluno, seu talento adormecido,
através de questões trabalhadas numa dimensão diferenciada, no
nível da reflexão, e, sobretudo da ação (FAZENDA et al., 2010). Para
a autora, a interdisciplinaridade estimula o sujeito do conhecimen-
to a aceitar o desafio de ultrapassar o conteúdo das disciplinas e
retomar o processo de reconstrução do saber.
Apoiando-se no que Leff (2011) afirma, a interdisciplinaridade
busca o diálogo para a promoção de uma nova racionalidade am-
biental. Isso quer dizer que não basta apenas tratar das temáticas
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 273

ambientais em cada disciplina, mas sim de pensá-las de modo con-


junto, dialogado e problematizado. Dessa forma, é possível cons-
truir novos saberes ambientais.
Diante do exposto, é importante construir uma cultura ecológica
que entenda sociedade e natureza como dimensões relacionadas in-
trinsicamente e que não podem mais ser concebidas isoladamente
(SORRENTINO et al., 2005). Este novo saber ambiental, surge para a
busca de novos sentidos de civilização e de novas práticas de apro-
priação do mundo. Assim, a sociedade deve direcionar-se às práticas
mais sustentáveis e à escola, enxergando-a não só como espaço social
destinado a educar, mas também como uma instância de formação
nessa reorientação. Em virtude disso, que a Educação Ambiental in-
tegra propostas educativas de inegável relevância para a construção
de uma perspectiva ambientalista de mundo e de sociedade. “Tal fato
é relativamente simples de compreender quando a pensamos como
uma práxis educativa que se constitui no próprio processo de atu-
ação, nas diferentes esferas da vida, das forças sociais identificadas
com a “questão ambiental” (LOUREIRO, 2006, p. 132).
O destaque dado ao desenvolvimento de uma educação escolar
que seja reflexiva, crítica e transformadora é posta em evidência
em documentos como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional (LDBEN) (BRASIL, 1996), os Parâmetros Curriculares Nacio-
nais (BRASIL, 1997; 1998; 2000) e o Plano Nacional de Educação
(BRASIL, 2001). Tais documentos enfatizam a importância do papel
do professor no trabalho de sensibilização e construção do conhe-
cimento a partir do questionamento e da problematização das rela-
ções sociedade e natureza.
Diante de problemáticas socioambientais, observadas no bairro
Jabotiana, foi pertinente o seguinte questionamento: como ações
interdisciplinares, desenvolvidas na escola, podem conduzir as re-
flexões dos estudantes acerca do lançamento de efluentes contendo
óleo de cozinha no ambiente aquático?
274 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

A fim de responder a isso, foram desenvolvidas as ações peda-


gógicas no Colégio Estadual Professor Joaquim Vieira Sobral, no
Bairro Jabotiana, em Aracaju. A escola está situada em uma área
cujo processo de ocupação vem ocorrendo de forma desordena-
da, principalmente às margens do rio Poxim que se encontra no
entorno do bairro. A deficiência, no saneamento básico local, é
responsável pelo lançamento de efluentes diretamente nos cor-
pos hídricos o que, consequentemente, gera impactos socioam-
bientais. É o que afirma Silva et al. (2004) em seus estudos, sobre
a bacia em questão, na qual está inserida a área metropolitana de
Aracaju e que vem apresentando um intenso processo de ocupa-
ção, em grande parte desordenada, a qual tem intervenções que
afetam diretamente o ambiente. “Esses impactos ambientais pro-
vocam uma grave diminuição na oferta hídrica, causada tanto pelo
decréscimo da vazão do Rio Poxim quanto pelo aumento da polui-
ção, comprometendo a sua qualidade para abastecimento” (SILVA
et al., 2004 p.10).
É relevante destacar que os currículos contemporâneos estão
sobrecarregados de conteúdos, na maioria das vezes, desconecta-
dos uns dos outros e não correspondentes à realidade vivenciada
pelos discentes. No entanto, a complexidade dos problemas atuais
exige novas competências que estimulem as habilidades de traba-
lhar de modo coletivo, de pensar interdisciplinarmente e de refletir
acerca da sustentabilidade socioambiental (GEMIGNANI, 2012).
Na perspectiva de possibilitar o desenvolvimento de ações pe-
dagógicas na escola, construir junto com os discentes uma nova
cultura ecológica pode conduzir para o surgimento do repensar
socioambiental, especialmente no que se refere às problemáticas
locais, tão próximas da realidade da escola. A mesma não pode se
eximir do compromisso, nesse contexto, à medida em que ela é res-
ponsável pela formação dos futuros cidadãos. Ao corroborar com
tal afirmação, Penteado (2010) diz,
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 275

Que tal juntarmos nossos esforços no sentido de lidarmos


em conjunto com as necessidades e problemas sentidos por
nós nos meio ambientes imediatos a que pertencemos? Que
tal descobrirmos nossa capacidade de participação, atuação
e interferência nas questões que nos afligem diretamente,
através de ações organizadas? (PENTEADO, 2010, p. 100).

Costa (2001) afirma que, no processo educativo, as práticas pe-


dagógicas devem oportunizar ao educando a responsabilidade de
agir, no mundo, como sujeito protagonista e orientar a construção
do seu próprio conhecimento. Cabe ao professor apenas a função
de orientador situando o aluno no centro do processo educativo,
reforça Costa (2001). Segundo Callai (2005), para que o método
tradicional de ensino seja rompido “é preciso trabalhar com a pos-
sibilidade de encontrar formas de compreender o mundo, produ-
zindo um conhecimento que é legítimo” (CALLAI, 2005, p. 231).
Assim, as atividades pedagógicas, atreladas ao contexto ambiental,
podem contribuir para tornar os discentes disseminadores de no-
vas atitudes e percepções críticas, como também proporcionar aos
mesmos, participação ativa, tornando-os atentos aos problemas
socioambientais que nos rodeiam e sujeitos atuantes na busca por
soluções contra esses fatores (BARROS, 2009).
Dessa forma, é imprescindível a concretização de práticas peda-
gógicas que tratem a questão socioambiental. As atividades “que
buscam Educação Ambiental mais comprometida com a realidade
do educando devem ser capazes de promover a alfabetização cien-
tífica desses sujeitos, no intuito de melhorar suas relações com o
meio e torná-los capazes de fazer uma leitura crítica do seu cotidia-
no” (MULINE; CAMPOS, 2013, p.29).
Para tanto, a problematização como metodologia ativa prioriza
um maior envolvimento do aluno, tornando-o centro do processo
de ensino e aprendizagem (MORAN, 2015). As metodologias ativas
têm o potencial de despertar a curiosidade, visto que, ao pesqui-
276 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

sar e descobrir novos conceitos, os estudantes são estimulados a


compartilhar com os colegas e com o próprio professor elementos
ainda não considerados nas aulas ou na sua abordagem conceitual.
Quando isso acontece é possível observar: engajamento, pertenci-
mento, dentre outras habilidades (BERBEL, 2011).
A proposta pedagógica da problematização tem como primei-
ra referência o Método do Arco de Charles Maguerez, proposto
por Bordenave (BERBEL, 1998). De acordo com esta autora, esse
método pode ser utilizado em situações as quais os temas estejam
relacionados com a vida em sociedade e abranjam cinco etapas: a
identificação do problema pelos próprios alunos, através da obser-
vação de sua realidade social; estabelecimento dos pontos-chaves,
etapa em que os alunos devem ser conduzidos à reflexão sobre os
possíveis maiores determinantes desse problema; teorização, mo-
mento no qual os estudantes devem buscar informações acerca do
problema; hipóteses de solução, momento em que, com base nos
estudos anteriores e nas conclusões levantadas os estudantes irão
elaborar as possíveis soluções e por fim, a etapa da aplicação à re-
alidade, na qual as decisões tomadas deverão ser encaminhadas,
completando-se o Arco.
Isto posto, o artigo objetivou avaliar as potencialidades de ações
pedagógicas de forma interdisciplinar com estudantes do Ensino
Médio, em uma escola do bairro Jabotiana, em Aracaju, problema-
tizando o reuso do óleo de cozinha e a conservação de ambientes
aquáticos

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A fim de cumprir o objetivo e responder ao questionamento ini-
cial, o artigo utiliza-se da abordagem qualitativa e pesquisa partici-
pante (MARCONI; LAKATOS, 2009), a qual exige grau de interação
similar do pesquisador e população (SANTOS, 2003). Ou seja, como
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 277

afirma Severino (2007), a pesquisa qualitativa é aquela em que o


pesquisador compartilha das atividades dos sujeitos pesquisados,
da sua vivência, interagindo de forma sistemática e permanente, ao
longo da pesquisa. Além disso, apoia-se na metodologia da proble-
matização de Berbel (1998) para desenvolver as etapas investiga-
tivas: observação da realidade; pontos-chave; teorização; hipóteses
de solução; aplicação à realidade de modo prático.
O universo da pesquisa corresponde ao Colégio Estadual Profes-
sor Joaquim Vieira Sobral, no Bairro Jabotiana em Aracaju, o qual
está localizado nas imediações do Rio Poxim. Ele é composto por 8
turmas, contempladas pela modalidade de Ensino Regular e Ensino
para Jovens e Adultos. A primeira modalidade, abrange o Ensino
Fundamental, com 4 turmas, e o Ensino Médio, com 3. Os discentes,
em sua maioria, residem na própria comunidade onde a escola está
inserida, o que contribuiu para a vivência da temática da pesqui-
sa. Pelo fato da ausência da sala de leitura e sala de informática, as
pesquisas bibliográficas foram realizadas fora do âmbito escolar. A
amostra delimitada compreende os estudantes da 1ª série A, do En-
sino Médio, com um total de 25 alunos. A escolha da turma deve-se
ao fato desta trabalhar, continuamente, com outras atividades prá-
ticas no âmbito da Educação Ambiental, na escola, e os propósitos
deste artigo constituírem parte da sequência de atividades que vêm
sendo construídas por esses estudantes em 2018.
A pesquisa também pode ser caracterizada como descritiva,
uma vez que pretende descrever os fenômenos existentes (GIL,
1999). Neste caso, serão utilizadas, simultaneamente, as técnicas
de pesquisa da observação assistemática, ao longo das etapas de-
senvolvidas.

Etapa 1: Diálogo interdisciplinar e planejamento das ações


Inicialmente, ocorreu o planejamento de ações pelas docentes
envolvidas no projeto e, em seguida, a proposta foi dialogada com
278 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

os alunos da 1ª série A do Ensino Médio. Nesse primeiro momen-


to, foi definido de que maneira os professores trabalhariam inter-
disciplinarmente. Também aí foram definidos conteúdos de ensino
que tivessem a temática do descarte/reuso de óleo e conservação
dos ambientes aquáticos como fio condutor. Foram escolhidos os
seguintes temas: desequilíbrio ecológico de ecossistemas; natureza
química dos Lipídios; reações químicas e linguagem jornalística.

Etapa 2: Formação de grupos de trabalho pelos estudantes: discussão sobre


a observação da realidade e pontos-chave.
No segundo momento, em diálogo com os estudantes sobre a pro-
blemática do descarte incorreto de resíduos e análise prévia dos sa-
beres cotidianos acerca da importância do reuso do óleo, os estudan-
tes foram orientados a olhar, atentamente, para o Rio Poxim a fim de
registrar o que percebiam sobre o tema de estudo no seu cotidiano.
O desafio foi identificar problemáticas em torno do tema de investi-
gação (BERBEL, 1998). Assim, foram elencados problemas-chave re-
lacionados à temática: os estudantes responderam a questões como:
por que o problema existe? Quais as causas do problema?

Etapa 3: Teorização e hipóteses de solução


Nesse sentido, foi proposta aos alunos a formação de seis grupos
para realizar o levantamento bibliográfico e teórico que embasasse as
discussões feitas. Os discentes foram orientados a buscar em livros, re-
vistas, notícias em jornais e até mesmo a passar pelo Rio Poxim com
novo olhar. Bordenave e Pereira (2011) destacam a relevância da teo-
rização após a etapa de problematização dentro do processo de cons-
trução de saberes. Essa etapa de teorização do que se quer investigar
foi fundamental para que a etapa posterior fosse realizada.
Nas aulas posteriores, as informações pesquisadas sobre o des-
carte de óleo, o reuso e a conservação dos ambientes aquáticos fo-
ram apresentadas por cada grupo e dialogadas, concomitantemen-
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 279

te, pelas professoras em sala de aula, com a finalidade de avaliar o


desempenho na pesquisa teórica e investigar se os estudantes en-
xergavam a produção de sabão como uma possível solução para mi-
nimização dos impactos socioambientais negativos causados pelo
descarte inadequado do óleo. Corroborando com Berbel (1998),
esta etapa é conhecida como momento de elaboração das hipóteses
de solução.

Etapa 4: Aula experimental – produção do sabão ecológico e aplicação à


realidade.
Nesta etapa, foi realizada uma aula experimental para produção
do sabão ecológico utilizando o óleo residual coletado pelos alunos
nas residências da rua onde moram, com o objetivo de demonstrar
a possibilidade de reuso do óleo como alternativa ao descarte ina-
dequado do mesmo no ambiente. O pai de uma aluna que tinha
conhecimento sobre a realização da aula disponibilizou-se a parti-
cipar do processo experimental. Foram utilizados materiais como
óleo de frituras pós-cocção (5 litros), soda cáustica líquida (1 litro),
etanol (15ml), essência, vasilhas plásticas, instrumento para mis-
turar as substâncias e recipientes para acondicionar o produto. De-
pois de ser produzido, o sabão ficou em repouso por 20 dias, para,
posteriormente, ser distribuído aos discentes. A avaliação dessa ati-
vidade foi feita através da elaboração de um relatório pelos alunos.
Através da observação assistemática, a partir dos diálogos pro-
duzidos entre as equipes da 1ª série A e os alunos da 3ª série B,
durante a socialização do conhecimento e entre os alunos e pro-
fessores envolvidos, foi possível realizar análises e interpretações
adquiridas acerca do aprendizado adquirido durante a ação peda-
gógica, e sobretudo verificar o desempenho dos discentes.
280 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

3. AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E A REUTILIZAÇÃO DO ÓLEO DE


COZINHA
Durante o diálogo para a construção de novos saberes, baseados
na seleção de conteúdos de ensino e da temática condutora para
desenvolver as ações, três docentes envolvidas argumentaram so-
bre a importância de buscar novos saberes ambientais e se com-
prometeram a atuar de forma contextualizada para a construção da
proposta. Apenas uma docente, dentre as quatro envolvidas, afir-
mou que participaria somente com o conteúdo específico durante
as atividades.
Isso corrobora com o que Leff (2001) diz quando afirma que
tanto a interdisciplinaridade quanto a formação de um novo saber
são resultados da construção de uma racionalidade ambiental. De
acordo com seu relato “O saber ambiental problematiza o conhe-
cimento fragmentado em disciplinas e a administração setorial do
desenvolvimento, para construir um campo de conhecimentos teó-
ricos e práticos orientado para a rearticulação das relações socie-
dade-natureza” (LEFF, 2001, p. 145).
Na etapa de problematização dos conhecimentos prévios dos
alunos, foi permitida a participação ativa dos mesmos, de modo a
valorizar o arcabouço cognitivo trazido pelos estudantes. Durante
esta etapa de observação e discussão da realidade, os alunos reve-
laram seus saberes sobre danos que o descarte irregular do óleo
provoca. Neste momento, o papel do professor é o de estimular
esse “novo” aprendizado dos seus alunos, já que são estes que terão
o papel principal em identificar problemáticas em torno do tema de
estudo (BERBEL, 1998).
Conforme Berbel (1998), o papel desta etapa é provocar o ques-
tionamento dos estudantes de modo que eles pensem sobre as cau-
sas do problema e quais os fatores envolvidos. No viés da discussão,
os estudantes revelaram os principais pontos-chave que giram em
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 281

torno do tema, tais como: a ocupação habitacional desordenada do


bairro; o desequilíbrio causado na cadeia alimentar aquática; a fal-
ta de tratamento do esgoto; a importância da sustentabilidade e
do reuso de resíduos; a necessidade da redução do consumo e o
desenvolvimento de uma Educação Ambiental permanente.
É notória a contribuição ao processo de ensino e aprendizagem
quando o saber do aluno é valorizado, da mesma forma quando
esse conhecimento é de sua realidade local. É o que afirma Campos
(1999), quando analisa a premissa de que o aluno terá maior
probabilidade de construir seus conceitos e conhecimentos de
forma significativa, tendo como base o ambiente que o cerca e isso
traz resultados mais consistentes e satisfatórios, uma vez que o conheci-
mento adquirido é embasado em sua realidade, favorece a comparação
do que foi aprendido na escola com fatos e acontecimentos que ocorrem
em seu cotidiano.
Após a revelação dos pontos-chave, os estudantes foram orien-
tados a buscar em outras fontes bibliográficas, conteúdos e curio-
sidades que tivessem significância para a discussão proposta. Na
etapa da teorização, os resultados da pesquisa bibliográfica foram
trazidos para a sala de aula e discutidos com as professoras, em
especial as de Língua Portuguesa e de Biologia, as quais conjunta-
mente avaliaram o material construído pelos grupos divididos pre-
viamente. As docentes puderam dialogar concomitantemente com
os alunos e avaliar as atividades de forma coletiva, possibilitando a
associação dos conteúdos aos problemas locais.
Durante o processo, foi observado que quatro grupos obtiveram
maior aproveitamento na construção teórica. Já dois grupos foram
orientados a refazer a pesquisa, pois havia parágrafos incoerentes
com o tema. Segundo Berbel (1998), “ as informações obtidas são
tratadas, analisadas e avaliadas quanto às suas contribuições para
resolver o problema”(BERBEL, 1998, p. 144). Destaca-se que a eta-
pa de teorização é livre e o resultado vai depender da motivação
282 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

dos discentes na busca por informações. De posse delas, os alunos


fazem um registro escrito, que permitirá o desenvolvimento da eta-
pa seguinte (BERBEL, 1998).
Diante dos relatos após a teorização, os alunos foram orientados
a visualizarem a problemática in loco. Eles relataram os fatos que
observaram: a alteração da coloração, pois perceberam que havia
a presença de manchas escuras e gordurosas em algumas áreas su-
perficiais das águas do rio; e o odor forte e desagradável, caracterís-
tico da água, que é resultado do lançamento de efluentes no local.
Auxiliados pela teoria trabalhada, concluíram que um dos possíveis
poluentes poderia ser o óleo. Silva(2004) aponta, em seus estudos,
que a infraestrutura de saneamento básico não acompanhou o pro-
cesso de urbanização de municípios como Aracaju, acarretando o
lançamento de esgotos diretamente nos rios e a disposição de re-
síduos sólidos nos cursos de água, inclusive, com o escoamento de
agroquímicos, provenientes das plantações.
Aliado a esses fatos, o debate foi ampliado para os possíveis
motivos dessa situação, entre os quais foram citados os seguintes:
os dejetos do bairro, que não são tratados em uma estação de tra-
tamento; a ocupação imobiliária local, que favorece a degradação
dos manguezais; a presença de construções que destroem o meio
ambiente; plantios, nas proximidades do rio, que contaminam os
ecossistemas aquáticos e as comunidades do entorno, as quais não
possuem acesso aos trabalhos de Educação Ambiental Crítica per-
manente e, por isso, não avançam na conquista de direitos sociais.
O aprofundamento da discussão após a teorização trouxe a
questão do modelo econômico vigente e dominante como uma das
causas da poluição dos ambientes aquáticos. Nesse viés, foi discu-
tido sobre o consumo desenfreado, a ausência de uma Educação
Ambiental contínua, na comunidade e a deficiência na gestão po-
lítica como os principais responsáveis pela degradação em que se
encontram os ecossistemas aquáticos em nível local/global.
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 283

Com base nas informações que obtiveram, os discentes passa-


ram a perceber que os problemas de ordem social são complexos
e geralmente multideterminados (BERBEL, 1998). As conclusões
mostraram que as causas identificadas, pelos alunos, estão intrin-
sicamente ligadas à forma de ocupação habitacional desordenada
do bairro Jabotiana, como já havia sido revelado mesmo na etapa
inicial de discussão.
Dessa forma, a teorização foi importante para que o aluno con-
seguisse construir outras formas de conhecimento e chegar a de-
terminadas conclusões de maneira reflexiva e crítica. Corrobora
com esse achado, os pensamentos de Ausubel (1982), quando este
preconiza que a aprendizagem significativa é o processo pelo qual o
aluno relaciona uma nova informação com um conhecimento exis-
tente, provocando uma reflexão que modificará aquela informação,
resultando em um novo conhecimento.
Salienta-se que a orientação do professor, como mediador, foi
decisiva para essa etapa. Morán (2015) relata que, o papel ativo
da equipe docente com sua capacidade de acompanhar, analisar os
processos, resultados, lacunas e necessidades, a partir dos percur-
sos realizados pelos alunos é imprescindível e este deve ser cons-
truído de forma mais aberta e criativa.
Após a teorização, durante a socialização da pesquisa entre os
grupos e as turmas (figura 1), a ação proporcionou aos discentes
o debate e a elaboração de possíveis soluções para os problemas
levantados.
284 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

Figura 1 - Socialização do conhecimento: hipóteses de solução

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Nos discursos e apresentações, ficou evidente que os alunos


compreenderam, na sua maioria, a relação entre as temáticas e os
problemas locais, com a construção de um “olhar” socioambien-
tal diferenciado; propondo alternativas de intervenção, a exemplo
de práticas de reuso de alguns resíduos, como o óleo de cozinha
pós-fritura. Os alunos também relataram sobre a importância do
contato direto do ser humano com os bens naturais, em um novo
modelo de relação entre humanidade e natureza, sem contaminá-lo
de forma tão avassaladora e alertaram sobre a necessidade de mu-
danças de hábitos de consumo.
Silva e Pernambuco (2014), ao analisarem a proposta pedagó-
gica crítico-transformadora defendida por Paulo Freire, expressam
que o processo educacional permite a formação de agentes trans-
formadores capazes de pensar e agir criticamente. Eles ainda refor-
çam a ideia de a escola ser um espaço de construção de cidadãos
éticos e sujeitos capazes de realizarem uma análise crítico-huma-
nizadora das relações entre ser humano e natureza (SILVA; PER-
NAMBUCO, 2014, p. 122). Na análise de Guimarães (2016), em uma
concepção crítica de Educação, acredita-se que a transformação da
sociedade é causa e consequência (relação dialética) da transfor-
mação de cada indivíduo.
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 285

De acordo com a análise dos fatos, os estudantes trouxeram para


a discussão, as empresas de reciclagem do óleo em Sergipe, desta-
cando que existe um movimento ambientalista, no bairro Jabotiana,
que já realiza a coleta do óleo na comunidade local. A partir dessa
discussão, os alunos levantaram a proposta de criar um Ecoponto no
ambiente escolar. O objetivo é inserir a escola nessa parceria e con-
templar a comunidade com esse recurso. Contudo, muito além dessa
alternativa, foi discutido que a sociedade precisa repensar um novo
modelo de complexidade ambiental, novos valores societários, cul-
turais e econômicos, a fim de que as práticas de Educação Ambiental
não estejam enraizadas em atitudes superficiais, mecânicas e limita-
das, mas que proponham novos comportamentos, visões e reflexões
sobre o atual modelo hegemônico imposto à sociedade.
Consoante Layrargues (2002), muitos programas desenvolvi-
dos, na escola, são implementados de modo reducionista, já que
em função da discussão da reciclagem e na Coleta Seletiva de Lixo,
não aprofundam as discussões no campo dos valores culturais da
sociedade de consumo. No entanto, o autor reforça que este pen-
samento da macrotendência pragmática precisa ser revisto, pois é
essa macrotendência crítica que promoverá transformações socio-
ambientais profundas e não apenas relacionadas às mudanças de
comportamentos e hábitos.
Na última etapa, denominada etapa de intervenção, a aula expe-
rimental associou teoria à prática. Participaram estudantes, profes-
sores e um pai de uma das alunas (figura 2), o qual atuou de forma
significativa e determinante na produção do sabão. Coube aos es-
tudantes, a colaboração na produção do sabão, através do recolhi-
mento prévio do óleo e o auxílio no desenvolvimento da atividade.
Lunetta (1991) afirma que as aulas práticas ajudam no processo
de interação e desenvolvimento de conceitos, bem como possibilita
aos alunos aprender como abordar o seu mundo de maneira objeti-
va no desenvolvimento de soluções para os problemas.
286 A ESCOLA E O REPENSAR SOCIOAMBIENTAL

É no processo da aplicação das hipóteses de solução à realidade


que se observa o comprometimento dos alunos com o social e o po-
lítico, no sentido de transformar sua vida. Nesse momento, o aluno
toma consciência do mundo à sua volta e percebe que os conceitos
aprendidos no ensino formal podem e devem ajudá-lo pessoal e
profissionalmente (BERBEL, 1998).
Figura 2 - Aula prática para produção do sabão

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A utilização da problematização como metodologia de ensino


e aprendizagem mostrou-se como relevante forma de trabalhar a
temática do reuso do óleo e conservação dos ambientes aquáticos.
Através dela, foi possível promover o estímulo e a autonomia dos
alunos em todas as etapas. Além disso, a formação de grupos, du-
rante a execução das etapas, revelou como o trabalho em equipe foi
capaz de instigar a reflexão da realidade do Rio Poxim e do mangue-
zal, de modo crítico. Também, foi possível enxergar como a troca de
saberes e o diálogo contribuíram para que a escola cumprisse seu
Sílvia Nascimento Gois; Sindiany Suelen Caduda dos Santos; Maria do Socorro Ferreira da Silva 287

papel social na formação da cidadania e agregasse novos valores na


formação dos discentes.
Ficou evidenciado, no desenvolvimento das atividades pedagó-
gicas sequenciadas, que o trabalho interdisciplinar, o qual articulou
conteúdos programáticos às temáticas gerais, pode oferecer resul-
tados, à medida que, alunos protagonistas se posicionam diante
de reflexões, assumem compromissos com a conservação dos am-
bientes aquáticos e desbravam “novos olhares” acerca da análise
socioambiental local, de suas nuances e de perspectivas reais de
mudanças.
Do ponto de vista do papel dos professores, o artigo mostra
como é possível trabalhar as questões socioambientais de modo in-
terdisciplinar, prático e com professores atuantes na mediação do
processo de ensino e aprendizagem.
Dito isto, foi possível perceber como a interdisciplinaridade e o
uso de metodologia ativa, na escola, podem ser importantes alia-
dos do processo educativo. Assim, as ações ocorridas ficaram como
exemplos de uma forma inovadora de pensar a educação no Joa-
quim Vieira Sobral. E, para além dos muros escolares, os compor-
tamentos dos discentes revelaram que escola e comunidade podem
articular-se em busca de transformações locais mais consistentes.

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CAPÍTULO 15 MICHAEL ANTONYNE ALVES SILVA
ANÉZIA MARIA FONSÊCA BARBOSA

IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM


PIRAMBU, SERGIPE

1. INTRODUÇÃO

Os principais impactos ambientais encontrados nas bacias hidro-


gráficas no Brasil estão relacionados aos processos produtivos impul-
sionados pelas atividades agrícolas, industriais e a expansão das cida-
des que crescem sem planejamento e sem infraestrutura necessária
para oferecer condições mínimas de sobrevivência para a população.
Diante dessas pressões produtivas e da falta de governabilidade e de
políticas efetivas, a educação apresenta-se como uma maneira eficaz
capaz de reverter as degradações socioambientais e de promover a
verdadeira transformação social. Educação que permite aflorar uma
nova racionalidade ambiental que promove a transformação do com-
portamento humano através da junção do conhecimento científico e
do saber ambiental dos povos tradicionais, assim, segundo Leff:

A racionalidade ambiental se funda numa nova ética que se


manifesta em comportamentos humanos em harmonia com
294 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

a natureza; em princípio de uma vida democrática e em va-


lores culturais que dão sentido à existência humana. Estes se
traduzem num conjunto de práticas sociais que transformam
as estruturas do poder associadas à ordem econômica estabe-
lecida, mobilizando um potencial ambiental para a construção
de uma racionalidade social alternativa (LEFF, 2008, p. 85).

O objetivo das ciências ambientais é contribuir para uma boa


relação entre a sociedade e o meio ambiente, incentivando práticas
produtivas que atuem em harmonia com o bem-estar ambiental e
social e que garantam a permanência das culturas dos povos tradi-
cionais, que buscam a todo tempo resistir às pressões do capital,
cuja pretensão é apropriar-se da natureza com intuito do fortaleci-
mento econômico, muitas vezes, potencializando a degradação do
meio ambiente, ameaçando extinguir culturas levando à desterri-
torialização desses povos, em alguns casos, com o consentimento
do Estado para a realização dessa injustiça ambiental que leva aos
povos tradicionais a necessidade de se reinventar e adequar-se a
novas culturas, para que consigam sobreviver a essa nova realida-
de. Dessa forma, segundo Leff:

[...] estes atores sociais emergem a partir de sua resistência


a serem absorvidos (desterritorializados) pela globalização
econômica e de seus direitos à sua cultura e seus territórios.
Nesta perspectiva, estes processos de resistência se conver-
tem em movimentos de resistência. Estas populações não
somente resistem contra a desapropriação e a desterritoria-
lização: redefinem suas formas de existências através de mo-
vimentos de emancipação, reinventando suas identidades,
seus modos de produção e suas práticas de subsistências
(LEFF, 2016, p.456-457).

Percebendo a importância das ciências ambientais na vivência


social e visando a integração da educação com o conhecimento dos
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 295

povos, a ação pedagógica foi realizada com discentes filhos de pes-


cadores e de agricultores que estudam na turma do 6ª ano no Co-
légio Estadual Amaral Lemos, localizado na sede do município de
Pirambu (SE). O objetivo da pesquisa foi analisar os impactos so-
cioambientais no rio Japaratuba, a partir da interação das ativida-
des produtivas agrícolas e do processo de urbanização nas margens
do rio, os quais vêm resultando na degradação do meio ambiente e
prejudicando uma das principais fontes de renda da comunidade
tradicional que reside naquele município.
Dessa forma, os discentes foram organizados em uma roda de
conversa, onde foram tratados temas semelhantes às suas realida-
des em lugares distintos, os quais apresentam impactos ambientais
negativos em bacias hidrográficas, com intuito de discutir sobre os
problemas socioambientais da comunidade, culminando na elabo-
ração de uma história em quadrinhos, possibilitando demonstrar a
relação da comunidade com o rio e como esse ambiente é afetado
pela ação antrópica.
Tais condições podem conceder a liberdade de expressar a visão
de mundo e, propor medidas que possam ser adotadas a fim de au-
xiliar no direcionamento da conservação do principal corpo hídrico
da região, para que a vida possa ser mantida e garantir às futuras
gerações o bem-estar socioambiental por meio da conservação do
meio ambiente.

2. AS TRANSFORMAÇÕES NA PAISAGEM E O AVANÇO DOS IMPACTOS


SOCIOAMBIENTAIS
Todo espaço geográfico é constituído pelas transformações que
o homem promove na natureza e a paisagem demonstra as alte-
rações propiciadas pelas relações sociais. A paisagem é tudo que
vemos, o que os nossos sentidos conseguem captar, perceber, sentir.
“[...] tudo o que nós vemos, o que nossa visão alcança, é a paisa-
296 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

gem. Esta pode ser definida como domínio do visível, aquilo que
a vista abarca. É formada não apenas de volumes, mas também de
cores, movimentos, odores, sons” (SANTOS, 2008, p. 67). A paisa-
gem é sempre heterogenia constituída por um conjunto de formas
naturais e artificiais resultantes da complexa vida social, que deve
ser observada e investigada além do que os olhos veem, é preciso
entender a sua estrutura e organização.
A paisagem se organiza conforme as necessidades produtivas,
das exigências do capital e, consequentemente, da tecnologia, por
esse motivo, ela acumula no espaço um mosaico de tempos diferen-
tes que se completam e somam. Destarte, o sistema de produção
depende da exploração da natureza para sustentar o desenvolvi-
mento econômico, que, a todo instante, busca se reinventar e inovar
mecanismos que atendam às necessidades do mercado global.
Dessa forma, a paisagem não é considerada como um elemento
estático, mas que a todo instante se molda conforme as necessida-
des sociais, que passa por transformação da paisagem natural para
uma paisagem artificial resultante das modificações humanas. San-
tos afirma que:

[...] o homem vai construindo novas maneiras de fazer as


coisas, novos modos de produção que reúnem sistemas de
objetos e sistemas sociais. Cada período se caracteriza por
um dado conjunto de técnicas e de objetos correspondentes.
Num momento B, muitos elementos do momento A perma-
necem; e surgem novos. É a inovação triunfante que permite
sair de um período e entrar em outro. A inovação traz modi-
ficações da paisagem, que passa a ter objetos dos momentos
A e B (SANTOS, 2008, p. 74).

A exploração da natureza com intuito de fortalecer a economia


fez expandir o processo de colonização dos povos do Norte em re-
lação aos povos do Sul, que partiram com suas caravelas em cami-
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 297

nhos desconhecidos com intuito de criar novas rotas comerciais


e potencializar o sistema capitalista, para isso, povos e territórios
foram dominados sendo obrigados a inserirem em seu cotidiano
novas condutas de vida, de cultura e de religiosidade, passando a
enxergar a natureza como uma fonte de recursos, que possibilita o
crescimento econômico, deixando como consequências os impac-
tos ambientais e o enfraquecimento da identidade dos povos tra-
dicionais.
Segundo Leff, (2016, p. 430), “[...] na sua irrefreável expansão da
sua vontade de dominar a natureza, em sua mania de crescimento
insustentável, o capitalismo chegará a extirpar o coração da terra,
cavando a tumba da vida do planeta verde-azul do universo”. Essa
exploração resulta na devastação do meio ambiente e em uma crise
ambiental que sinaliza o limite do crescimento econômico e do pro-
gresso, que possui uma racionalidade moderna que potencializa a
industrialização e a sociedade do consumo que tem impulsionado
alterações em escala global levando a uma crise do meio físico na-
tural como civilizacional. Esse autor assevera ainda que a crise am-
biental é o sintoma mais forte do limite da modernidade, que no
fundo é a manifestação dos modos dominantes e hegemônicos de
realização do mundo moderno (2016, p.30).
O cenário é devastador e na busca pela minimização dos impac-
tos no meio ambiente e fomentar a conciliação entre o crescimento
econômico e ambiental é criada a partir da década de 1970 do sé-
culo XX, a conferência de Estocolmo, onde as principais autoridades
políticas do mundo se reuniram com objetivo de debater e levar aos
países mecanismos que reduzissem a degradação ambiental, pas-
sando a fomentar uma racionalidade de um desenvolvimento sus-
tentável, que, segundo Leff (2008, p. 18) “[...] O desenvolvimento
sustentável foi definido como um processo que permite satisfazer
as necessidades da população atual sem comprometer a capacida-
de de atender gerações futuras”, dessa forma, os países se compro-
298 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

meteriam em adotar estratégias que permitissem produzir sem


degradar.
A busca de reverter a crise civilizacional criada pela lógica da
racionalidade moderna e tentar conviver harmoniosamente com a
natureza, cria a necessidade da adoção de uma nova epistemolo-
gia política que vise priorizar o campo socioambiental, que busca
resistir às pressões da modernidade por meio das lutas sociais,
deixando de lado a atual concepção de desenvolvimento que está
ligada exclusivamente ao crescimento econômico e que não visa
melhorias da vida social e ambiental. Lutar pelo bem-estar socio-
ambiental é garantir o desenvolvimento da vida atual e das futuras
gerações, permitindo condições básicas de sobrevivência, que in-
cluem moradias, alimentação e trabalhos dignos à população. Nes-
se sentido, Leff afirma que:

[...] as lutas pela reapropriação da natureza passam pela des-


colonização do saber que, como dispositivo de poder, tem
acompanhado as estratégias de dominação cultural e explo-
ração da natureza dos territórios ancestrais. Tal descoloni-
zação implica a desconstrução das ideias de progresso – em
particular de desenvolvimento derivando nas condições de
exploração da natureza e da força de trabalho dos países co-
lonizados (LEFF, 2016, p. 431).

O processo de colonização e exploração não ficou apenas no


período das caravelas ou na história da colonização dos países do
continente americano, africano e asiático. Em pleno século XXI, os
povos tradicionais ainda sofrem e tentam a todo instante resistir ao
poder do capital, lutas são guerreadas diariamente para garantir a
sobrevivência das comunidades que sofrem pressões por meio da
instalação de empreendimentos de produção que possuem a libe-
ração do Estado para atuarem em seus territórios em virtude de um
possível progresso, conforme afirma Ribeiro:
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 299

[...] sabe que o discurso da emancipação, colou-se a práticas


seculares de violenta dominação sobre os povos colonizados
de maneira que a colonialidade – algo mais que a coloniza-
ção política – não é ainda uma história passadista. Os neoco-
lonialismos persistem na divisão internacional do trabalho e
dos bens do trabalho na era da globalização liberal (RIBEI-
RO, 2014, p. 68).

Com o objetivo de criar dependência os países centrais coloca-


ram em prática estratégias políticas para que os países periféricos
enfrentassem graves crises econômicas, resultando em fortes infla-
ções, potencializando desemprego e contribuindo com a redução
do crescimento econômico. Na busca pela reversão dessa situação,
a política neoliberal é implementada pelos governos desses países
como uma medida que favorece a entrada de multinacionais em
seus territórios por meio do oferecimento de isenções tributárias,
mão-de-obra barata e matéria prima, o que resulta na exploração
da natureza e degradação do meio ambiente.
Nesse sentido, é comum os países do hemisfério Norte passarem
a resistir na assinatura de acordos jurídicos internacionais que vi-
sam preservar florestas, corpos hídricos e em diminuir a liberação
de CO² na atmosfera. Tudo isso, devido a uma política de estratégias
de apropriação da natureza potencializada pelas necessidades das
multinacionais em extrair da natureza recursos necessários para
expandir o seu potencial econômico. Em contrapartida, aumentam
as tensões dos povos tradicionais em resistir a apropriação do ter-
ritório e da natureza, pois tais povos começam a buscar a justiça
ambiental, que segundo Porto:

O movimento pela justiça ambiental busca, em seu cerne,


integrar a dimensão ambiental com as do direito e da de-
mocracia através de ações transformadoras. Ele vem se
desenvolvendo nas últimas duas a três décadas a partir da
300 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

luta contra dinâmicas discriminatórias que colocam sobre


o ombro de determinados grupos populacionais os malefí-
cios do desenvolvimento econômico e industrial (PORTO,
2011, p.33).

A Justiça ambiental visa fortalecer as comunidades tradicionais


a partir da união de sujeitos coletivos que passam a ter voz e poder
de decisão por meio de expressão pública, uma medida estratégica
e importante para garantir o domínio do território para os povos
tradicionais que possuem um modo de vida que foge dos padrões
modernos e, consequentemente, não promovem ou não potencia-
lizam a degradação ambiental. Se a partir da década de 1960 do
século passado, a crise ambiental passou a alertar o planeta para
um possível colapso da natureza devido ao crescimento econômico,
agora o novo discurso neoliberal busca novas estratégias de domi-
nação da natureza, conforme Leff:

Para a proposta neoliberal teríamos que atribuir direitos


de propriedade e preços aos bens da natureza para que as
clarividentes leis do mercado se encarreguem de ajustar os
desequilíbrios ecológicos e as diferenças sociais, a fim de
alcançar um desenvolvimento sustentável com equidade e
justiça (LEFF, 2008, p. 22).

Dessa forma, segundo o pensamento neoliberal, a tecnologia se-


ria capaz de reverter a degradação do meio ambiente. O capital bus-
ca a todo instante se apropriar da natureza, pois o seu novo discur-
so é que não existe contradição entre desenvolvimento econômico
e ambiente. Outra estratégia do capital abordada por Leff (2008,
p.26), é a adoção dos diretos privados de propriedade intelectual,
que passa a definir a biodiversidade como patrimônio comum da
humanidade e passa a recodificar as comunidades tradicionais dos
países periféricos como parte do capital humano do planeta.
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 301

A crescente demanda dos recursos naturais tem levantado dis-


cussões sobre a quantidade e qualidade desses recursos para os
dias atuais e para as futuras gerações, no meio ambiente as bacias
hidrográficas chamam atenção nos debates devido à sua importân-
cia para a sobrevivência dos povos tradicionais, porém nas bacias
hidrográficas são encontrados problemas ambientais de consequ-
ências negativas ao meio ambiente que prejudicam o desenvolvi-
mento da vida, como poluição, desmatamento, redução de espécies,
entre outros fatores encontrados desde a montante à jusante do rio
principal que banha a região.
Por conta desses tensores, de acordo com Botelho e Silva (2000,
p. 155), “[...] cresceu enormemente o valor da bacia hidrográfica
como unidade de análise e planejamento ambientais. Nela é possí-
vel avaliar de forma integrada as ações humanas sobre o meio am-
biente e seus desdobramentos sobre o equilíbrio hidrológico”.
Nas áreas rurais as bacias hidrográficas sofrem tensores antró-
picos que refletem na retirada da mata ciliar, favorecendo a ação
dos processos erosivos que contribuem com o assoreamento, impe-
dindo a navegação, principalmente nas áreas próximas à foz. Nesse
ambiente, as atividades agrícolas utilizam-se de milhares de litros
de água por meio de sistemas de irrigação, além de apropriar-se da
utilização de agroquímicos, principalmente a partir da dissemina-
ção da Revolução Verde, que visa potencializar o sistema produtivo
agrícola para que sejam comercializados de forma mais rápida e
que sejam mais resistentes as pragas. Esse manejo favorece o trans-
porte de substâncias químicas para os corpos hídricos que compro-
metem o desenvolvimento da vida aquática provocando prejuízos à
vida econômica e transformações nas práticas culturais de produ-
ção que segundo Ribeiro:

A difusão no campo de um padrão de produção extensivo, mo-


nocultor, consumista de água e de solo foi associada à comer-
302 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

cialização de defensores químicos e vinculada à concessão de


créditos agrícolas, endividando agricultores que perderam suas
práticas tradicionais e, muitas vezes, suas terras, que foram hi-
potecadas em troca de financiamento para comprarem insu-
mos à produção. Os sistemas de rotação de culturas, praticados
durante séculos e repassados de geração a geração por relatos
orais, foram condenados de uma hora para outra atendendo a
interesses de grupos transnacionais (RIBEIRO, 2008, p.44).

Não é apenas no ambiente rural que os corpos hídricos são im-


pactados pela ação antrópica, nas áreas urbanas essa situação se
agrava ainda mais, a expansão desordenada das cidades provoca
impactos ambientais nas bacias hidrográficas ocasionadas pela fal-
ta de planejamento e de saneamento básico nas cidades, principal-
mente nos países periféricos, os quais, em sua maioria, destinam
os resíduos sem tratamento prévio nos corpos hídricos, que em ci-
dades densamente industrializada esses problemas se intensificam,
pois o risco de contaminação e de poluição aumentam. No ambiente
urbano devido à grande concentração de asfalto, o nível de imperme-
abilidade aumenta, diminuindo a capacidade de infiltração da água
da chuva, gerando enchentes, aumentando a exposição da popula-
ção às doenças de veiculação hídrica que se disseminam com a au-
sência de saneamento básico levando milhares de pessoas à morte
em diversos lugares do planeta conforme alerta Botelho e Silva:

Percebe-se, assim, que a questão do saneamento básico,


envolvendo o tratamento de água, coleta e tratamento de
esgoto, adequação e manutenção do sistema de drenagem
urbana e coleta, a disposição final do lixo e limpeza urbana,
assume papel relevante nas áreas urbanas, seja na manuten-
ção dos recursos naturais e do sistema físico-biótico ou na
manutenção da qualidade de vida das comunidades, ou seja,
no equilíbrio ambiental, no seu mais amplo sentido (BOTE-
LHO; SILVA. 2000, p. 179)
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 303

É preciso que o meio ambiente seja visto como um elemento es-


sencial para a vida, que a racionalidade moderna não venha pro-
mover a desigualdade e a injustiça social perante os seres humanos
que enxergam a natureza como fonte de sobrevivência e não apenas
como um recurso de fortalecimento econômico, pois o atual siste-
ma econômico tem promovido a crise ambiental que coloca em ris-
co a sobrevivência da atual e das futuras gerações.

3. AÇÃO PEDAGÓGICA COMO UMA FERRAMENTA DE REFLEXÃO


SOBRE OS IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS
A atividade pedagógica desenvolvida nesta ação teve como obje-
tivo unir o conhecimento científico com o saber dos alunos que vi-
venciam os impactos socioambientais da localidade em que residem,
dessa forma, os educandos produziram histórias em quadrinhos res-
saltando a importância do rio Japaratuba para a vida da população
pirambiense e como a degradação ambiental interfere na qualidade
de vida e prejudica a renda de inúmeras famílias, que dependem do
pescado como fonte de sustento. Para isso, a realização da ação pe-
dagógica foi construída em três etapas durante as quais buscou-se
fomentar e fortalecer o diálogo em sala de aula sobre problemas am-
bientais vivenciados pela comunidade onde a escola está inserida.
A ação pedagógica foi realizada com alunos do 6º ano do ensino
fundamental no Colégio Estadual Amaral Lemos, na sede do mu-
nicípio de Pirambu. Na primeira etapa foi realizada uma roda de
conversa que durou em torno de 2 aulas (100 minutos), abordando
temáticas como a urbanização e os impactos ambientais ocorridos
nos corpos hídricos, com destaque para o rio Japaratuba, que ba-
nha a cidade de Pirambu. Cabe destacar que outros impactos são
registrados nas margens do rio, sendo que os mais relevantes são o
acúmulo dos resíduos sólidos e a erosão nas margens fluviais que
favorecem o assoreamento e redução do pescado (figura 1).
304 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

Os conteúdos debatidos durante a roda de conversa, iniciaram-


-se com a abordagem sobre os principais impactos ambientais pre-
sentes no meio rural (DE DEUS; BAKONYI, 2011), que resultaram
na discussão sobre os impactos socioambientais em bacias hidro-
gráficas. No primeiro momento foram apresentados os impactos
ambientais propiciados pelas atividades rurais nos corpos hídricos,
tais como: desmatamento, práticas agrícolas que potencializam a
degradação do solo com o uso de maquinários, a contaminação pelo
uso de agroquímicos que escoam em direção aos rios ou infiltram e
poluem as águas subterrâneas.

Figura 1 – Apresentação sobre impactos socioambientais em bacias hidrográficas durante a roda de conversa.

Fonte: SANTOS, 2018.

No segundo momento do diálogo foram abordadas as conse-


quências do avanço da urbanização (NETO, SILVA e MOR, 2015) e
como o avanço das cidades aliado à falta de planejamento modi-
ficam a natureza e provocam os impactos ambientais que podem
comprometer o desenvolvimento da vida aquática, como a poluição
proveniente do setor industrial, resíduos sólidos e doenças disse-
minadas pela ausência de saneamento básico.
Dessa forma, é possível observar que a maioria das cidades bra-
sileiras vem enfrentando esses problemas que colocam em risco
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 305

a vida humana. Buscando trazer a realidade dos educandos para


serem discutidos em sala de aula, foram abordados os principais
tensores antrópicos no rio Japaratuba (MAYNARD, CRUZ e GOMES,
2017), que ameaçam o desenvolvimento da fauna, da flora e do pró-
prio homem.
O debate buscou instigar os alunos na segunda etapa da ação pe-
dagógica, assim, durante 4 aulas (200 minutos), foi proposta a con-
fecção das histórias em quadrinhos, que buscassem representar os
impactos socioambientais no rio Japaratuba a partir das temáticas
abordadas em sala de aula, ressaltando a importância do rio para
a vida da população de Pirambu. Ademais, os alunos puderam re-
presentar nos desenhos os impactos ambientais presentes na pai-
sagem que, constitui o cenário do trajeto diário durante o percurso
entre o colégio e as suas residências.
Durante o diálogo, os educandos relataram as doenças de vei-
culação hídrica que infectaram pessoas da comunidade, inclusive
dois alunos alegaram que já adquiriram leptospirose, doença que
é transmitida através do contato com a urina de ratos contamina-
dos, problema que está relacionado à falta de saneamento básico
na cidade e a problemas de desmatamento e descarte irregular de
resíduos sólidos nos povoados do município de Pirambu.
Diante de todos os problemas mencionados durante a roda de
conversa, os educandos estavam aptos a construir suas histórias,
explorando a sua vivência, percepção e o seu conhecimento de
mundo. Muitos dos discentes relataram as dificuldades enfrentadas
por seus pais, tios e primos para garantirem o sustento familiar por
meio do pescado e os entraves encontrados na captura dos maris-
cos devido ao avançar da degradação ambiental na região.
Durante a construção de toda atividade foram discutidas as te-
máticas presentes no debate em sala de aula, as dúvidas foram sa-
nadas e passou-se a auxiliar na construção do trabalho. Os diálogos
incentivaram para que todos os alunos participassem da elabora-
306 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

ção das histórias em quadrinhos e utilizassem recursos didáticos e


materiais básicos sem grandes custos na sua confecção.
Assim, foram utilizados papel ofício, régua, lápis grafite e lápis
de cor, dando condições para que os educandos elaborassem seus
livros, individualmente. Como a maioria dos alunos nunca teve a
oportunidade de confeccionar histórias em quadrinhos, durante
a atividade foram apresentados exemplares para que os mesmos
pudessem observar as características desse tipo de material, que
exige noções de outras disciplinas, como o Português, na elabora-
ção textual, de Artes por meio da construção dos desenhos, a dis-
ciplina de História como uma ferramenta que sustenta as histórias
em quadrinhos que devem possuir um início, um desenvolvimento
e uma conclusão que possibilite a transmissão de uma mensagem
que auxilie na sensibilização dos leitores à contribuírem com a con-
servação do rio Japaratuba.

Figura 2 – Elaboração de histórias em quadrinhos pelos discentes no Colégio Estadual Amaral Lemos.

Fonte: SANTOS, 2018.


Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 307

A etapa final da ação pedagógica consistiu na apresentação dos


livros em quadrinhos em que foram abordadas temáticas como a
poluição do rio Japaratuba por resíduos sólidos e por esgotamento
sanitário. Os discentes relataram em suas histórias como a poluição
do rio contribuía com a morte dos peixes que resultam em preju-
ízos econômicos para a população, as dificuldades encontradas na
realização do ofício de ser pescador e marisqueira na região.

Figura 3 – Produto final da elaboração das histórias em quadrinhos.

Fonte: SILVA, 2018.

Dessa forma, a ação pedagógica possibilitou transmitir a mensa-


gem da importância da conservação dos corpos hídricos e de todo
meio ambiente, pois permite levar para o ensino fundamental o
pensamento crítico em relação às problemáticas socioambientais
que são negligenciadas pelas autoridades públicas, inclusive por
parte da comunidade que contribui com a degradação. Assim, as
reflexões sobre a degradação ambiental local permitem aos estu-
dantes transmitirem uma nova racionalidade ambiental para as
pessoas ao seu entorno, possibilitando o aparecimento de condutas
que gerem transformações positivas na paisagem.
308 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

A conservação do meio ambiente é fundamental para assegurar à


humanidade um desenvolvimento econômico mais duradouro que
permita a conservação da fauna e da flora, para isso, políticas públi-
cas que visem o bem-estar socioambiental precisam ser executadas
a fim de minimizar os impactos resultantes de um universo repleto
de diferentes interesses econômicos que promovem diversos con-
flitos que devastam o meio ambiente. Quando o meio ambiente pas-
sar a ser percebido como fonte essencial para a manutenção da vida
e que é preciso conservá-lo para garantir a sobrevivência dos seres
vivos, a batalha da conservação ambiental poderá receber auxílio
de todos os setores da sociedade, segundo Camargo:

É preciso, no entanto, compreender que as relações confli-


tuosas entre os seres humanos subsidiam todos os nossos
problemas como civilização, e essa realidade reflete-se na
relação do homem com a natureza. É nesse universo de con-
flitos e complexidade que aparecem circunscritos todos os
entraves a um desenvolvimento sustentável global (CAMAR-
GO, 2003, p. 112).

Dessa forma, este artigo, destacou como os discentes demons-


traram/percebem sua preocupação com o processo de degradação
da natureza, no seu local de vivência, por meio da construção de
histórias em quadrinhos, que contam sua realidade, representan-
do os impactos ambientais que comprometem o desenvolvimento
da vida aquática no rio Japaratuba. Além disso, o desenvolvimento
dessa atividade, foi possível eles apresentarem caminhos e/ou so-
luções para a minimização da poluição local.
Por meio da ação pedagógica os discentes refletiram e propuse-
ram que houvesse uma mobilidade por parte de toda comunidade
local, que deveria se unir para retirar os resíduos sólidos das mar-
gens do rio, dessa forma, os educandos alegam que a qualidade da
água melhoraria, pois resultaria na redução da poluição e conse-
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 309

quentemente na conservação da vida aquática no rio Japaratuba.


Dessa maneira, a ação pedagógica levou ao ambiente escolar
a reflexão das problemáticas da comunidade, corroborando com
Penteado (2003, p. 54), “a escola é o lugar correto para a promoção
de soluções para os atuais problemas socioambientais, através de
um ensino participativo capaz de superar os impasses e insatisfa-
ções vividas”. Nesse sentido, concordando com Jacobi:

[...] a produção de conhecimento deve necessariamente


contemplar as inter-relações do meio natural com o social,
incluindo a análise dos determinantes do processo, o papel
dos diversos atores envolvidos e as formas de organização
social que aumentam o poder das ações alternativas de um
novo desenvolvimento, numa perspectiva que priorize novo
perfil de desenvolvimento, com ênfase na sustentabilidade
socioambiental (JACOBI, 2003, p. 190).

Visando fomentar a importância da sustentabilidade socioam-


biental, a atividade pedagógica discutiu os problemas da degrada-
ção em bacias hidrográficas no Brasil e permitindo aos discentes,
o levantamento de ideias para combater os impactos ambientais
do rio que margeia a própria cidade, auxiliando na compreensão
da importância de conservar os corpos hídricos, que possuem
extrema importância para a sociedade local, permitindo aos edu-
candos dessa forma, “compreender e lidar com nossos problemas
civilizatórios com mais maturidade, responsabilidade tendo a ca-
pacidade de enxergar a vida além da nossa própria existência” (CA-
MARGO, 2003).
Assim, a ação pedagógica permitiu uma troca de saberes entre o
científico e os conhecimentos dos povos tradicionais, além de forta-
lecer as experiências de vida e o aprimoramento do conhecimento
e vivência de povos que lidam com a natureza que possuem um sa-
ber fundamental para a construção das ciências ambientais.
310 IMPACTOS SOCIO AMBIENTAIS NO RIO JAPARATUBA EM PIRAMBU, SERGIPE

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A água é a principal fonte de vida no planeta e a sua conserva-


ção é extremamente importante para a manutenção da dinâmica
ambiental, porém, por meio da busca pelo desenvolvimento eco-
nômico, a natureza passou a ser vista como uma fonte infinita de
recursos ampliando a degradação e ameaçando a sobrevivência de
inúmeras espécies que habitam a Terra. Para reverter a crise civi-
lizacional, cria-se a necessidade da adoção de novas condutas que
garantam uma harmonia entre o ser humano e o meio ambiente.
E para consolidar essa nova exigência do planeta, buscar parce-
rias com a comunidade escolar é um dos principais meios a serem
seguidos, pois jovens e crianças serão incentivados a enxergarem o
meio ambiente como garantia da permanência da vida das atuais e
futuras gerações, além de incentivar a promoção da transformação
da racionalidade econômica adotada pela sociedade contemporânea.
Dentro desse contexto, o desenvolvimento dessa ação pedagó-
gica permitiu trabalhar com jovens estudantes, discutindo os im-
pactos ambientais mais próximos da sua realidade, ou seja, aqueles
visíveis no percurso entre a escola e os domicílios, mas que não era
percebido por eles. Assim, foi possível perceber que no início dos
diálogos os educandos abordavam com naturalidade a devastação
ambiental, como se os problemas socioambientais aparentassem
como um elemento natural da paisagem, e que a interferência da
ação humana não provocasse danos ao ambiente.
A ação pedagógica e os diálogos que surgiram no desenrolar
dessa atividade, contribuíram para desconstruir a naturalidade
de enxergar os danos ambientais apresentados pela paisagem, de-
monstrando que as atividades econômicas na região estão poten-
cializando os impactos ambientais que só serão convertidos com a
união e colaboração de toda a comunidade pirambuiense.
Michael Antonyne Alves Silva; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 311

REFERÊNCIAS

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de São Paulo, 2008.
EIXO 3

PESQUISAS APLICADAS AS
CIÊNCIAS AMBIENTAIS: DO
ORDENAMENTO TERRITORIAL À
BUSCA DA SUSTENTABILIDADE
SOCIOAMBIENTAL
CAPÍTULO 16 ROSANA DE OLIVEIRA SANTOS BATISTA
THAÍS MOURA DOS SANTOS

ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE


E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS
SERGIPANOS

1. PONTO DE PARTIDA DA REFLEXÃO


A utilização de agrotóxicos tem sua ampliação sob o discurso
da necessidade de alavancar a produção de alimentos, um discurso
amplamente quantitativo pautado na obtenção de lucro e expansão
do capital internacional, ancorado nas multinacionais. Tal fato per-
mite que essas substâncias, milagrosamente, submergem da guerra
para a agricultura (LONDRES, 2011). Nas lavouras brasileiras, estrea-
mos na utilização de agrotóxicos em meados da década de 1940 com
a substância Dicloro-Difenil-Tricloroetano ou simplesmente DDT,
considerado um dos primeiros pesticidas modernos e altamente
cancerígeno. Na atualidade, o Brasil é líder mundial no consumo de
agrotóxicos. Proporcionalmente, à medida que o uso de agrotóxicos
cresce os problemas de saúde relacionados ao manuseio, ingestões
orais e respiratórias desses produtos aumentam. Assim, o país faz
uso de agrotóxicos com elevados graus de toxicidade, que já foram
banidos em diversos países (SANTOS; BATISTA, 2015a).
316 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

Segundo Bombardi (2011), os agrotóxicos estão presentes em


todo território nacional, atuando e contribuindo para a reprodução
do modelo econômico atual. Essa problemática também se faz pre-
sente no menor estado da federação, na especificidade do estado de
Sergipe, onde a utilização de agrotóxicos também é notável e preo-
cupante, tanto para a sociedade quanto para natureza.
A agricultura sergipana, desde a segunda metade do século XX
até os dias atuais, vem passando por transformações na forma de
produção de alimentos, novas técnicas foram aplicadas e dentre
elas o uso de agroquímicos para alavancar a produção. Destarte, o
presente texto objetiva analisar os índices de morbidade e morta-
lidade por contaminação de agrotóxicos, buscando caracterizar e
classificar os agrotóxicos mais utilizados de acordo com o seu grau
toxicológico. Nessa direção, nosso intento foi produzir um ensaio
cartográfico, a partir de mapas dos processos citados em Sergipe.

2. A INSUSTENTABILIDADE NOS USOS DOS AGROTÓXICOS


De acordo com a Food and Agriculture Organization (FAO), pro-
grama da Organização das Nações Unidas (ONU) responsável pelas
áreas de agricultura e alimentação, os agrotóxicos são definidos
como “qualquer substância, ou mistura de substâncias, usadas para
prevenir, destruir ou controlar qualquer praga”. Ainda, de acordo
com a lei brasileira de âmbito federal nº 7.802, de 11 de julho de
1989, agrotóxicos são: “Produtos [...] cuja finalidade seja alterar a
composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação da-
nosa de seres vivos considerados nocivos, bem como as substâncias
e produtos empregados como desfolhantes, dessecantes, estimula-
dores e inibidores de crescimento”.
Os agrotóxicos englobam uma vasta gama de substâncias quí-
micas, além de algumas de origem biológica. Independente da con-
ceituação, os agrotóxicos sempre vão servir para a finalidade de
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 317

destruição dos seres vivos (AGROFIT, 1998). “Com estes venenos


busca-se varrer da natureza todos os seres vivos que ousam desa-
fiar os modernos e artificiais sistemas de produção” (LONDRES,
2011, p. 21). Essas substâncias podem receber diversas nomencla-
turas a depender da ideologia que está por trás do termo utilizado,
assim, podem ser denominado de defensivos agrícolas, pesticidas,
remédios de planta, essas terminologias cumprem a função de ocul-
tar ou justificar os males causados por esses químicos.
Os diversos termos são utilizados como estratégias adotadas
pelos sujeitos que se beneficiam com a produção, circulação e co-
mercialização desses químicos (ABRASCO, 2016). Carneiro (2015),
afirma que designar essas substâncias com qualquer outro nome
que não seja veneno é o artifício retórico mais elementar para dis-
simular a natureza nociva desses produtos. Existem no mundo, cer-
ca de 15 mil formulações para 400 tipos diferentes de agrotóxicos
(SILVEIRA, 2001).
Diante de tamanha diversidade de produtos, existem vários cri-
térios para classificá-los. De acordo com o decreto nº 98.816 de 11
de janeiro de 1990, que regulamenta a Lei nº 7.802 de 11 de julho
de 1989, no que se refere à toxicidade dos venenos agrícolas para
a saúde humana, os venenos obedecem a seguinte gradação: - Clas-
se toxicológica I (Rótulo Vermelho): Veneno no qual se encontram
substâncias ou compostos químicos considerados “altamente tóxi-
cos” para o ser humano. - Classe toxicológica II (Rótulo Amarelo):
Veneno considerado “medianamente tóxico” para o ser humano. -
Classe toxicológica III (Rótulo Azul): Veneno considera do “pouco
tóxico” para o ser humano. - Classe toxicológica IV (Rótulo Verde):
Veneno considera do “praticamente não tóxico” para o ser humano.
No Brasil, os agrotóxicos foram usados primeiramente em
campanhas de saúde pública, no combate a vetores de doenças
e controle de parasitas, passando a ser utilizados mais intensiva-
mente na agricultura somente a partir da década de 60 (BRASIL,
318 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

1998), pela política de modernização na agricultura, totalmente


amparado pelo Estado através do crédito rural (GARCIA, 1996;
CONCEIÇÃO, 2011).
O Brasil faz uso de agrotóxicos com elevados graus de toxici-
dade, que já foram banidos em diversos países. Essa problemática
também se faz presente no estado de Sergipe onde a utilização de
venenos também é notável e preocupante, tanto para a sociedade
quanto para natureza. A agricultura sergipana, desde a segunda
metade do século XX até os dias atuais, vem passando por transfor-
mações na forma de produção de alimentos, novas técnicas foram
aplicadas e dentre elas o uso de agroquímicos para alavancar a pro-
dução (SANTOS; BATISTA, 2015a).
Amplos e diversificados são os segmentos da população que es-
tão vulneráveis a esses químicos, expostos aos riscos trazidos pelos
venenos agrícolas. De acordo com a Organização Pan-Americana da
Saúde – OPAS (1996), estes venenos podem penetrar no corpo huma-
no por diversas vias, destacando-se a ingestão, respiração e absorção
dérmica.
O trabalho de aplicação dos venenos agrícolas aumenta imen-
samente a possibilidade de intoxicações dos sujeitos, pois além da
frequência com que os agricultores manipulam os venenos agríco-
las, o trabalho exige o contato constante com produtos altamente
concentrados, principalmente no momento do preparo da mistura
que irá ser pulverizada nas lavouras. Outro fator agravante do pro-
cesso de intoxicações é a mistura de diversos venenos com toxi-
dades e componentes diferentes, processo que muitas vezes ocor-
re sem a leitura adequada das bulas. O momento em que ocorre o
contato direto entre o agrotóxico e o agricultor/trabalhador está na
aplicação/pulverização das substâncias e, esse contato, aumenta a
depender do aplicador utilizado. Assim, a figura 1 a seguir, demos-
tra os tipo de equipamentos utilizados para a aplicação de venenos
agrícolas no país, segundo o IBGE.
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 319

Figura 1 – Brasil- Tipo de Equipamento utilizado para aplicação de veneno agrícola- 2006
320 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

A figura 1, demostra que o equipamento mais utilizado na apli-


cação de venenos agrícolas no país é o pulverizador costal, esse
equipamento é empregado principalmente nas pequenas e médias
propriedades, onde, o sujeito que trabalha com esse aparelhamento,
literalmente toma banhos de venenos, e isso independente do uso de
EPIs. Essa atividade rebate diretamente na saúde dos trabalhadores
que estão sujeitos cotidianamente a diversos tipos de intoxicações.
Segundo a OPAS (1996), tais substâncias após absorvidas desen-
cadeiam efeitos de natureza aguda ou crônica para a saúde huma-
no. A intoxicação aguda é caracterizada principalmente pelo fato
dos sintomas surgirem rapidamente e por curtos períodos de tem-
po. Esses sintomas ocorrem em virtude do contato com produtos
concentrados e altamente tóxicos, podendo ocorrer de forma leve,
moderada ou grave, a depender da quantidade de veneno absorvi-
do. Os sinais e sintomas variam de acordo com o(s) ingrediente(s)
ativo(s) presentes no veneno que se esteve em contato e são nítidos
e objetivos (ABRASCO, 2015).
As formas de intoxicações agudas são mais fáceis para diagnos-
ticar, visto que são sintomas físicos imediatos. Nessa perspectiva,
os dados sobre as intoxicações agudas são notificadas aos Centros
Toxicológicos. No Brasil o Sistema Nacional de Informações Tóxi-
co-Farmacológicas (SINITOX) é o órgão responsável pela função de
coletar, compilar, analisar e divulgar os casos de intoxicação e en-
venenamento humanos registrados pelos Centros de Informação e
Assistência Toxicológica dos estados.
Outro tipo de intoxicação advinda do contato com os venenos
agrícolas são as crônicas, estas se caracterizam pelo surgimento dos
sintomas tardiamente, geralmente após meses ou anos. A intoxica-
ção crônica é resultado do processo de exposição rápido-moderada e
continua a um ou múltiplos tipos de venenos, acarretando danos de
natureza irreversíveis. Em muitos casos, podem até ser confundidos
com outros distúrbios ou simplesmente nunca serem relacionados
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 321

ao agente causador, por esse motivo as notificações quase nunca são


relacionadas aos venenos agrícolas (ABRASCO, 2015).
Esse tipo de intoxicação não é notificado aos Centros de Infor-
mação e Assistência Toxicológica, visto a dificuldade em associar
os sintomas aos venenos agrícolas, pois estes se manifestam muito
tempo após o contato com os venenos. Na agricultura brasileira, a
utilização de venenos agrícolas é responsável por vitimar fatalmen-
te o ser humano, são números assustadores, porém não condizem
com a realidade. A figura 2, a seguir, representa o fenômeno dos
óbitos relacionado ao uso dos venenos agrícolas.
A espacialização dos óbitos relacionados aos venenos agríco-
las na figura 2, denuncia outra questão, a inexistência de dados na
maioria dos estados brasileiros. A vigilância toxicológica no Brasil
vem sendo realizada de forma pontual e bastante fragmentada, pe-
los CIATs. Atualmente existem no país 36 CIATs e alguns se encon-
tram em fase de criação ou reestruturação (AZEVEDO, 2012), os
centros não abrangem todo território nacional, nesses estados que
os centros não atuam, certamente existem casos de intoxicações e
óbitos, que não são informadas, e nessa perspectiva os dados que os
centros apresentam são ainda maiores e mais alarmantes. Nessa di-
reção, Sergipe é o estado que proporcionalmente mais se utiliza dos
venenos agrícolas na sua produção agrícola. Os venenos na maioria
das vezes são utilizados sem assistência técnica, onde os cuidados
com a saúde humana e da natureza são totalmente ignorados.
322 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

Figura 2 – Número de óbitos relacionado ao uso dos venenos agrícolas- 2013


Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 323

3. OS CAMINHOS DA PESQUISA NO RIO DO TEMPO HISTÓRICO

As pesquisas sobre os processos de morbidade e mortalida-


de no campo sergipano vêm ocorrendo desde meados de 2015 a
2017. Inicialmente buscou-se analisar os processos de contami-
nação e morte via uso intensivo de agroquímicos na lavoura com
culturas de hortifruti no Município de Itabaiana em Sergipe. Sur-
preendemo-nos com a quantidade de mortes declaradas e não no-
tificadas no estado de Sergipe por uso e ingestão de agrotóxicos.
Povoados como Ribeira, Mangueira, Cajaíba e Mangabeira foram
os mais atingidos por contaminação hídrica, via Açude da Marcela
e rio Jacarecica I.
O município de Itabaiana está localizado na região central do
estado de Sergipe, no território agreste central sergipano limitan-
do-se com os municípios de Ribeirópolis, Frei Paulo, Moita Bonita,
Malhador, Campo do Brito, Itaporanga D’Ajuda e Macambira. O mu-
nicípio, desde o início da sua ocupação territorial, já se destacava
como uma importante área de exploração agrícola, tendo por base
as pequenas propriedades, e que ainda na atualidade caracteriza a
estrutura fundiária desse município (SILVA, 2006).
Nos últimos trinta anos o município de Itabaiana foi sede da con-
solidação de algumas políticas territoriais, culminando na constru-
ção de três barragens de porte médio: Macela, Ribeira e Jacarecica
I, para irrigação e produção de hortaliças. Itabaiana se caracteriza
por ser o maior centro de comercialização agrícola do estado, aten-
dendo outros municípios sergipanos e estados vizinhos. No entan-
to, a utilização dos venenos agrícolas tornou-se componente funda-
mental do modelo agrícola no município que apresenta índices de
produtividade elevados.
324 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

3.1. Localização da área de estudo 2016.

Figura 3 - Sergipe - Localização da área de estudo - 2017


Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 325

No período que compreende os anos de 2015 a 2016, foram feitas


visitas técnicas no município de Laranjeiras, localizado no território
leste sergipano, na microrregião do baixo continguiba e possui uma ex-
tensão territorial de 162,54 km2. O lócus da pesquisa faz divisa com
os municípios de Areia Branca, Riachuelo, Maruim, Santo Amaro das
Brotas, Nossa Senhora do Socorro e Itaporanga D’Ajuda. No cenário
canavieiro do estado sergipano, Laranjeiras ganha destaque. Almeida
(1976, p.489-490) afirma que “Principalmente Laranjeiras ganha visi-
bilidade, um dos municípios mais florescentes da época, chegaria, em
1881, a englobar noventa e sete engenhos, a maior cifra da Província,
naquele ano”, o açúcar deixou marcas de riqueza, estampadas nas fa-
chadas dos casarões, ainda existentes, na atualidade nesse município.
Segundo dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (ÚNI-
CA), o município de Laranjeiras chega a ser o segundo maior produ-
tor de cana-de-açúcar do estado de Sergipe, ficando atrás apenas do
município de Capela. A produção canavieira presente no município
está atrelada ao uso constante de venenos agrícolas e o município
enfrenta danos causados por esses químicos à saúde do trabalha-
dor e da natureza.
Nos períodos de 2015 a 2017 foram feitas também visitas téc-
nicas no município de Boquim, localizado no território Sul sergipa-
no, também conhecido como a “Terra da Laranja”. Boquim limita-se
com os municípios de Lagarto, Estância, Pedrinhas, Arauá, Riachão
do Dantas, Salgado e Itabaianinha, possuindo uma extensão territo-
rial de 214,566 km².
O município encontra-se na bacia hidrográfica do rio Piauí. No
cenário econômico do estado, Boquim destaca-se principalmente
pela produção citrícola, tendo na laranja sua principal representan-
te, tal atividade tem sua gênese a partir da década de 1920, quando
chegaram às primeiras mudas de laranjeiras “baía”, e incrementada
na década de 1960 por melhor assistência técnica e subsídios fi-
nanceiros (IBGE, 2002).
326 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

No município de Boquim/SE há uma variedade de venenos usa-


dos nos pomares citrícolas, essa realidade também é evidenciada
em outros munícipios sergipanos onde a cultura do agronegócio se
sobressai, de maneira não singular. Nos pomares de citros do muni-
cípio os pequenos produtores da região utilizam diversos venenos
para combater as pragas e doenças dos citros, o que tem acirrado as
vendas e circulação dos produtos tóxicos (TEIXEIRA, 2016).
No primeiro momento das pesquisas buscamos referências bi-
bliográficas que abordassem a temática dos venenos agrícolas em
diversas escalas espaciais, assim livros como Primavera Silenciosa
(CARSON, 1962), Agrotóxicos no Brasil: um guia para ação em de-
fesa da vida (LONDRES, 2011), Venenos Agrícolas e Citricultura em
Boquim/SE: Uma combinação perigosa à saúde (TEIXEIRA, 2016)
e outros textos embasaram teoricamente o presente artigo. Logo
após pautamos nossas pesquisas nas leituras de documentos insti-
tucionais sobre a questão dos venenos agrícolas, segundo Marconi e
Lakatos (2010), a característica da pesquisa documental é que essa
se constitui como fonte de coletas de dados estando restrita a docu-
mentos escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes
primárias. Dentre os documentos consultados podem-se destacar
os Dossiês da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO),
o relatório das Condições e Ambientes de Trabalho na Produção de
Cana-de-açúcar no Estado de Sergipe elaborado pelo Ministério Pú-
blico do Trabalho (MPT-SE), relatórios da Agência Nacional de Vigi-
lância Sanitária (ANVISA), o relatório de atividades do Programa de
análise de resíduos de agrotóxicos em alimentos (PARA).
O Posicionamento do Instituto Nacional de Câncer (INCA) de
2015, a lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989 que regulamenta as
práticas que envolvem agrotóxicos e documentos conseguidos nos
órgãos públicos visitados. Por fim, o terceiro passo, foi buscar a lei-
tura e interpretação dos relatórios institucionais PIBIC/UFS, Ins-
tituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, Sistema Nacio-
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 327

nal de Informações Tóxico-Farmacológicas - SINITOX, para coleta


de dados e informações pertinentes para a elaboração das repre-
sentações gráficas. Assim a tabulação dos dados, para elaboração
dos mapas, ocorreu mediante o Diagnóstico Rápido Participativo
(DRP), conjuntamente aos dados fornecidos pelos órgãos SINITOX,
IBGE, INCA, ANVISA, MPT-SE e, logo após, ocorreu a elaboração dos
mapas a partir de programas como o Corel Draw® e Philcarto. Em
seguida os mapas foram analisados criticamente, levando em con-
sideração o fenômeno representado, esquadrinhando os processos
contraditórios do movimento de produção agrícola, mediante o uso
intensivo de agroquímicos. Tal fenômeno foi descrito mediante apli-
cação de entrevistas e questionários nos municípios supracitados.

4. OS RESULTADOS E DISCUSSÃO NA REALIDADE PRÁTICA-TEÓRICA


DO CAMPO SERGIPANO
Os danos que os venenos agrícolas causam aos trabalhadores do
campo brasileiro ainda são pouco conhecidos. Essa realidade não é
diferente nos municípios sergipanos onde foram feitas as análises,
onde pouco se tem produzido a cerca dos malefícios provocados
por estas substâncias para os sujeitos que atuam nesse segmento
(SANTOS e BATISTA, 2016b). O modelo de cultivo com o intensivo
uso de venenos agrícolas gera grandes malefícios, como poluição
ambiental e intoxicação de trabalhadores e da população em geral.
No entanto, essa situação ainda é pouco visibilizada na sociedade.
Os trabalhadores rurais são os mais prejudicados no submundo
dos venenos agrícolas, visto que em seus trabalhos manipulam di-
retamente substâncias perigosas, seus empregos são portadores de
uma infinidade de riscos para sua saúde.
A morbidade é a variável característica das comunidades de seres
vivos, e refere-se ao conjunto dos indivíduos que adquirem doenças
(ou determinadas doenças) em um dado intervalo de tempo em uma
328 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

determinada população. A morbidade mostra o comportamento das


doenças e dos agravos à saúde na população (PEREIRA, 2004). Nesse
contexto, as analises nos municípios buscou identificar os tipos de
intoxicações nos municípios em análise. A figura 5 a seguir, traz os
dados de intoxicações presente no banco de dados do IBGE.

Figura 4 – Sergipe- Número de intoxicações via venenos agrícolas por município- 2006
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 329

A figura 5, demostra o número de intoxicações nos munici-


pios de Boquim e Itabaiana. É possivel observar que o municipio
de laranjeiras não possui informação no banco de dados do IBGE
no que se refere as intoxicações, esses dados não são registrados.
Nas pesquisas reslizadas1 constatou-se que essas intoxicações são
resultantes do manejo inadequado e continuo dos venenos agrico-
las, e que estas se manifestam enquanto dores de cabeça, náuseas,
vômitos e outros sintomas. A figura 6, a seguir, confeccionada com
dados provenientes de trabalhos de campo realizados durantes in-
vestigações que compõem relatórios institucionais PIBIC2, afirma
a existência de casos de intoxicações no municipio de Laranjeiras.
Boquim/SE e Itabaiana/SE apresentam o mesmo quantitativo
de intoxicações, onze em cada município. No caso de Boquim/SE a
utilização de venenos se dá na citricultura. Os venenos nessa locali-
dade são adquiridos de forma ilegal, sem receituário técnico, assim,
os venenos possuem toxicidade elevadas, o que possibilita um am-
biente favorável para que os trabalhadores se intoxiquem.
Em Itabaiana/SE os cultivos que mais recebem venenos agríco-
las são as hortaliças, estas lavouras exigem diversas aplicações de
venenos durante o cultivo desses vegetais, o que expõe o sujeito
a diversos riscos de intoxicações. No mapa 6, também é possível
perceber nove intoxicações no município de Laranjas/SE dado ine-
xistente no IBGE, os canaviais laranjeirenses possuem sua produ-
tividade atrelada a utilização de venenos, os aplicadores das subs-
tância estão vulneráveis as intoxicações em função desse fato.

1 Venenos Agrícolas e Citricultura em Boquim/SE: Uma combinação perigosa à saúde (TEI-


XEIRA, 2016).
2 Pesquisas PIBIC desenvolvidas pelo NEPGFE nos anos de 2014, 2015, 2016 com apoio da
COPES/CNPQ/UFS.
330 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

Figura 5 - Sergipe- Número de intoxicações via venenos agrícolas por município- 2017
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 331

No tocante ao processo de Morbidade o0observa-se que os ve-


nenos agrícolas, comprovadamente podem levar os sujeitos a óbito
(LONDRES, 2011). Bombardi (2011), alerta sobre a problemática da
grande quantidade de mortes de trabalhadores por causa das into-
xicações agudas e crônicas, bem como, a incompatibilidade dos re-
gistros, ou seja, as subnotificações dos dados algo comum no Brasil.
Há uma disparidade entre os casos de intoxicações entre os
órgãos responsáveis por esses dados, dentre os casos de morte
ocorre o mesmo agravante, tanto pelas exposições contínuas quanto
os relacionados aos suicídios, mesmo assim o número de mortes é
significativo e revela uma realidade pouco conhecida e/ou ocultada.
Essa problemática tornam-se visíveis nos municípios de Itabaiana,
Laranjeiras e Boquim, todas essas localidades apresentam casos de
óbitos relacionados aos venenos agrícolas, um fato preocupante
que evidencia o grau de periculosidade desses químicos para a vida
desses sujeitos. Os dados referentes aos óbitos ficam evidentes nas
representações cartográficas a seguir.
No tocante ao processo de mortalidade observa-se na figura 7
que o quantitativo de óbitos ligados ao uso dos venenos agrícolas
nos municípios estudados. Itabaiana apresenta o maior índice de
óbitos são vinte e dois no total, seguido por Laranjeiras e Boquim
que possuem o mesmo quantitativo de mortes.
A figura 8, a seguir, possui a finalidade de demostrar as causas
dos óbitos identificados nos municípios analisados. De acordo com
os dados coletados nas visitas técnicas existem um número preocu-
pante de óbitos via suicídio no município de Itabaiana, esses inci-
dentes ocorrem principalmente pela ingestão dos venenos agríco-
las utilizados na lavoura.
332 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

Figura 6 – Sergipe- Número de mortes relacionadas ao uso de venenos agrícolas por município- 2017
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 333

Figura 8 – Sergipe- Causa dos óbitos relacionados ao uso de venenos agrícolas por município-2017

Os óbitos por acidente de trabalho estão presentes nos três mu-


nicípios, e novamente Itabaiana é a localidade onde ocorre o maior
quantitativo de mortes, o que é ocasionado principalmente pelos
diversos tipos de venenos utilizados, que possuem toxidade eleva-
334 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

da. Ainda sobre os venenos agrícolas, podemos classificar de dife-


rentes formas. Nos municípios estudados, é possível encontrar três
tipos distintos Herbicidas, Inseticidas e Fungicidas. Segundo Car-
valho (2013), os conceitos sobre herbicidas estão relacionados à
maneira pela qual eles podem ser classificados e essa classificação
é feita a partir do grupo de plantas que o herbicida controla. Esse
tipo de químico pode ser classificado quanto ao espectro de ação, à
seletividade, época de aplicação, translocação na planta, mecanis-
mo de ação e seu caráter iônico. Os herbicidas são venenos agríco-
las utilizados para o controle de ervas classificadas como daninhas,
sendo muito popular entre os trabalhadores por sua ação rápida.
Os inseticidas são produtos químicos usados para controlar ou
matar os insetos transmissores de doenças. Eles são classificados
de várias formas, tais como por sua química, ação toxicológica ou
seu método de penetração. Os dois principais tipos de inseticidas
são orgânicos e inorgânicos: os orgânicos contêm carbono enquan-
to os inorgânicos não. Assim, a figura 9, a seguir, demostra a distri-
buição dos tipos de venenos nos municípios de Itabaiana, Boquim
e Laranjeiras.
A figura 9, demostra que o município de Itabaiana é o que apre-
senta maior quantidade de tipos de venenos utilizados, a tipologia
de venenos mais utilizados no referido município são os insetici-
das, seguido pelos herbicidas e fungicidas. No município de Boquim
os inseticidas também são os venenos agrícolas mais utilizados na
agricultura local, em seguida aparecem os fungicidas e em menor
quantidade os herbicidas. Em Laranjeira/SE incidem dois tipos de
venenos agrícolas, os herbicidas e os inseticidas. Por vigorar no
seu território o cultivo de cana-de-açúcar, o referido município tem
mais problemas com as chamadas ervas-daninhas, esse fato explica
por que a maioria dos venenos utilizados são os herbicidas.
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 335

Figura 8 – Sergipe- Quantitativo de tipos de venenos agrícolas por município- 2017

A utilização dos variados tipos de venenos, segundo os trabalha-


dores dos municípios estudados são necessários para garantia das
colheitas, caso contrário eles perdem as plantações, um discurso que
demostra a efetiva subordinação ao mercado de venenos agrícolas,
336 ENSAIO CARTOGRÁFICO DOS PROCESSOS DE MORTALIDADE E MORBIDADE POR AGROTÓXICOS NOS MUNICÍPIOS SERGIPANOS

que divulga a ideologia de necessidade dos venenos, para uma pro-


dução em larga escala e com alto nível de aproveitamento. Os dados
corroboram a realidade da agricultura brasileira na escala local, pois
se encontra subordinada ao capital internacional através do pacote
tecnológico, mais precisamente pelos usos dos venenos agrícolas.

5. PARA NÃO CONCLUIR


No período que compreenderam as pesquisas de 2015 a 2017
foram gerados inúmeros dados sobre morbidade e mortalidade via
contaminação hídrica e de solo por agrotóxicos, bem como morta-
lidade por ingestão ou uso do veneno agrícola. Tais dados foram
incorporados a um banco com pesquisas de Iniciação Científica,
Iniciação a Extensão e monografias de bacharelado com o intuito
de promover a reflexão nas ciências ambientais sobre o uso exacer-
bado de agroquímicos na lavoura.
Os municípios estudados são responsáveis pela produção de
hortifrútis dentro e fora do estado de Sergipe. Para manter essa
produtividade os venenos agrícolas são aplicados constantemente
e com diversos graus de toxidade, o que afeta negativamente a saú-
de dos sujeitos que estão em contato com essas substâncias, isso
reverbera em intoxicações, óbitos. Assim, utilizando-se de venenos
com todos os índices de toxicológicos tendo consequências para a
saúde dos trabalhadores, que lidam cotidianamente com venenos
ao aplicarem substâncias altamente tóxicas com aplicadores manu-
ais que demandam maior contato com químicos venenosos.
Nessa dimensão, o modelo de agricultura no Brasil impõe o uso
dos venenos nas lavouras de todo território. Em Sergipe não é dife-
rente, os municípios estudados demostram uma completa depen-
dência da utilização de venenos agrícolas para a produtividade de
suas lavouras, esse fenômeno rebate diretamente na saúde dos tra-
balhadores que estão no submundo dos venenos.
Rosana de Oliveira Santos Batista; Thaís Moura dos Santos 337

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TEIXEIRA, Vanuza. Venenos Agrícolas e Citricultura em Boquim/SE:
Uma combinação perigosa à saúde. (Monografia) Universidade Federal
de Sergipe, 2016.
CAPÍTULO 17 ANA DANIELA ALVES
LÚCIO CUNHA

AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS


PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA (COIMBRA,
PORTUGAL)

1. INTRODUÇÃO
A problemática dos riscos naturais tem cada vez maior relevân-
cia nas políticas governamentais e municipais de ordenamento do
território e do urbanismo. Os processos potencialmente perigosos
manifestam consequências decorrentes da forma como as pessoas
e os seus bens se lhes expõem, bem como do modo como as ca-
racterísticas económicas, sociais e culturais permitem à sociedade
enfrentá-los, resistir-lhes e deles recuperar. Partindo destes princí-
pios, considerou-se que poderia ser bastante enriquecedor o estu-
do dos riscos naturais (ALVES e CUNHA, 2016) e, particularmente,
das vulnerabilidades associadas ao nível do Plano de Urbanização
da área de Santa Clara, que atualmente se encontra em elaboração
na Câmara Municipal de Coimbra.
A principal razão para a escolha da área de estudo justifica-se
pela dinâmica de crescimento urbano aí verificada nos últimos
anos e pelo facto de Coimbra, e mesmo Santa Clara, terem um histó-
340 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

rico de acontecimentos marcantes no que diz respeito a manifesta-


ções de risco, nomeadamente movimentos em massa, inundações e
incêndios no interface urbano-florestal (TAVARES e CUNHA, 2004,
2007 e 2010).
Este artigo tem como objetivo apresentar as metodologias e re-
sultados obtidos pela avaliação da vulnerabilidade a estes proces-
sos na área urbana de Santa Clara, em Coimbra.

2 - ENQUADRAMENTO DA ÁREA DE ESTUDO

2.1. Município de Coimbra

A área de estudo localiza-se na área urbana do município de


Coimbra, na margem esquerda do rio Mondego, na área geográfica
da União das Freguesias de Santa Clara e Castelo Viegas. O municí-
pio de Coimbra tem uma área de 319,4 Km2 e uma população resi-
dente de 143396 habitantes (Censo de 2011). A densidade popula-
cional é de 449 hab./km2.
O município e a cidade de Coimbra apresentam uma localiza-
ção geográfica singular resultante da sua inserção na passagem das
duas unidades estruturais maiores do país – o Maciço Hespérico e a
Orla Mesocenozoica ocidental, identificadas com morfologias par-
ticulares e atravessadas pelo Rio Mondego e por alguns dos seus
afluentes. A estas unidades geomorfológicas correspondem modos
e dinâmicas de ocupação diferentes, verificando-se maiores den-
sidades de ocupação humana e maior dinamismo demográfico e
económico/empresarial no sector ocidental do que no oriental do
município.
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 341

Figura 1 – Enquadramento geográfico da área urbana de S. Clara

Fonte: CMC

A área urbana de Santa Clara, da qual fazem parte 107 subsec-


ções estatísticas, tem uma população residente de 9253 indivíduos,
representando cerca de 6,45% da população total residente no mu-
nicípio. No que diz respeito à distribuição espacial desta população
na área de estudo (figura 2), verifica-se a existência de uma concen-
tração populacional nas áreas central e poente, nomeadamente no
Rossio de Santa Clara, no Alto de Santa Clara e na Mesura. Já, no que
concerne à população residente com idade superior a 65 anos (%),
constata-se existir uma maior ocupação da população com esta fai-
xa etária na área junto ao rio mondego (figura 3).
342 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

Figura 2 - Carta de densidade populacional, por subsecção estatística da área urbana de Santa Clara

Fonte: CMC)
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 343

Figura 3 - Carta da população residente, por subsecção estatística com idade superior a 65 anos (%) da área
urbana de Santa Clara

Fonte: CMC)
344 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

Por fim, no que diz respeito à população residente com idade en-
tre os 0 e os 13 anos (%), verifica-se uma maior ocupação da mes-
ma, junto aos aglomerados populacionais de Alto de Santa Clara e
Mesura (figura 4).
Figura 4 – Carta da população residente, por subsecção estatística com idade entre os 0 e os 13 anos (%) da área
urbana de Santa Clara

fonte: CMC)
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 345

3 - METODOLOGIA

A metodologia utilizada na avaliação da vulnerabilidade, resultou


da conjugação da avaliação da população exposta aos processos pe-
rigosos, do valor dos bens potencialmente afectados e da vulnerabili-
dade social, expressando assim a vulnerabilidade potencial (figura 5).

Figura 5 – Metodologia utilizada para avaliação da vulnerabilidade

3.1. Avaliação da vulnerabilidade social

Para proceder à avaliação da vulnerabilidade social, adotou-se


a metodologia utilizada por Cutter et al. (2003), bem como a usa-
da, no nosso país, por Mendes et al. (2011) e Cunha et al. (2011).
Esta metodologia baseou-se na utilização da análise fatorial de um
conjunto de variáveis sociais do âmbito da demografia, economia,
emprego, condições dos edifícios, entre outras. Os dados utilizados
foram os do recenseamento de 2011, a nível da subsecção estatís-
tica e recorreu-se ao software estatístico SPSS para tratamento dos
dados. Para além deste software, recorreu-se ainda à utilização do
Sistema de Informação Geográfica (SIG) ArcGIS 10.1, para cartogra-
fia dos resultados.
Numa primeira abordagem, para a aplicação do modelo foram
analisadas todas as variáveis disponíveis que nos pareceram per-
tinentes para a investigação, contudo constatou-se que algumas
346 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

poderiam ser redundantes. Assim, recorrendo à utilização do coefi-


ciente de correlação de Pearson, procedeu-se à eliminação de algu-
mas delas, aperfeiçoando assim o universo dos dados.
Em seguida recorreu-se ao teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO),
que permitiu estudar as implicações da amostra no estudo. Geral-
mente, valores de KMO inferiores a 0,50 são considerados inaceitá-
veis, sendo que neste caso concreto o valor rondava 0,70, podendo
assim ser considerado um valor aceitável. Os valores das comunali-
dades situam-se para todas as variáveis sempre acima de 0,6.
Da análise factorial, resultaram 7 fatores explicativos que justi-
ficam 72% da variância total. O primeiro fator explicava 18,47% da
variância total e o sexto apenas 8,41%.
- Quanto maior o valor da variável, maior será a vulnerabilidade
social
- Quanto maior o valor da variável, menor será a vulnerabilida-
de social

O escalonamento de todos os fatores explicativos e a aplicação


da fórmula da vulnerabilidade social, que consiste numa soma pon-
derada dos scores para cada factor em cada uma das unidades ter-
ritoriais consideradas, permitiu estabelecer a diferenciação territo-
rial da vulnerabilidade social na área estudada.
A tabela 1 apresenta a correlação das principais variáveis expli-
cativas com cada um dos factores apurados, bem como, através das
cores verde e vermelha, o sentido dessa correlação para o aumento
da vulnerabilidade social.
Da aplicação deste método de análise de análise factorial por com-
ponentes principais, resultou o cartograma da figura 6, onde é possível
analisar espacialmente a vulnerabilidade social existente na área urbana
de Santa Clara.
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 347

Tabela 1 - Aplicação do método de análise de componentes principais para o estudo da vulnerabilidade social
Variáveis Conotação 1 2 3 4 5 6 7
Percentagem de indivíduos residentes pensio- 0,916
nistas
Percentagem de indivíduos residentes com 0,914
mais de 65 anos
Percentagem de famílias clássicas NPES 14 0,865
Percentagem de indivíduos residentes com
-0,596
idades entre os 5 e os 13 anos
Percentagem de famílias clássicas NPES 65 -0,461
Percentagem e indivíduos que não sabe ler
0,746
nem escrever
Percentagem de indivíduos residentes com o
-,643
ensino superior completo
Percentagem de indivíduos residentes apenas
0,741
com o primeiro ciclo do ensino básico
Percentagem de indivíduos residentes empre-
0,703
gados no sector terciário
Percentagem de residências habituais com
0,646
banho
Percentagem de residências habituais com um
0,533
1 lugar de estacionamento
Percentagem de edifícios exclusivamente re-
0,570
sidenciais
Percentagem de edifícios com um ou mais 0,773
pavimentos
Percentagem de residências habituais com 1
0,666
ou 2 pisos
Percentagem de indivíduos residentes sem
0,522
sector de atividade
Percentagem de edifícios construídos entre 0,650
1991 e 2001
Percentagem de residências habituais arren-
0,626
dadas
Percentagem de alojamentos vagos 0,871

Fonte: Censos 2011


348 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

Figura 6 - Carta de Vulnerabilidade Social da área urbana de Santa Clara

(fonte: CMC)
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 349

Na avaliação da vulnerabilidade, para além da vulnerabilidade


social, foi ainda considerada a população exposta aos processos na-
turais potencialmente perigosos e o valor dos bens expostos poten-
cialmente afetados.
A população exposta foi estimada em função da densidade po-
pulacional, por subsecção estatística, tal como mostra a figura 7.
Figura 7 - Carta de população exposta da área urbana de Santa Clara

(fonte: CMC)
350 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

Já os elementos expostos, foram determinados através do so-


matório do valor relativo do edificado, das infraestruturas viárias
(rodoviárias e ferroviárias) e o do uso do solo, adaptando os va-
lores apresentados por BRITO (2007) para a área em estudo. Esta
avaliação baseou-se no grau de importância, considerando o valor
dos equipamentos, património e rede viária.
Assim, readaptou-se a tabela de valores e bens expostos apre-
sentada por BRITO (2007), tabela 2, fazendo distinção entre os edi-
fícios comuns existentes e os edifícios com interesse patrimonial ou
estratégico. Entendeu-se que estes mereciam uma atenção especial
devido ao valor histórico, patrimonial e cultural. Em relação aos
edifícios com interesse estratégico achou-se que estes poderiam
ser relevantes, pois fazem parte dos serviços de interesse à comuni-
dade, pelo que ao serem afetados poderão trazer constrangimentos
no quotidiano da população. Para além do elementos referidos an-
teriormente, achou-se ainda relevante considerar, dentro das áreas
com ocupação florestal ou de matos, alguns retalhos de vegetação
característica (carvalho cerquinho; sobreiro, por exemplo) , atri-
buindo-lhe um valor mais elevado.
Na análise do valor dos bens potencialmente afetados, conside-
ra-se relevante ressaltar que os dados apresentados quando obser-
vados a nível da subsecção estatística não correspondem de modo
rigoroso ao valor real dos bens considerados, mas apenas a um
valor muito relativo do território e dos bens nele inscritos. É esse
resultado que pode ser observado na figura 8.
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 351

Tabela 2 - Parâmetros de avaliação do valor dos bens expostos (fonte: BRITO, 2007)
Variáveis Classes Ponderação
Edif. - Valor de Base 609€ /m2 1
Antes de 1919 0,2
1919 a 1945 0,3
Época de construção 1945 a 1960 0,5
1960 a 1990 0,8
Valores dos
Depois de 1990 1,0
bens expostos
Antes de 1999 0,8
Área edificada 1999-2004 0,9
Depois de 2008 1
PV 1 e 2 1,5
Nº de pisos PV 3 e 4 3
PV 5 e mais 6
Itinerários principais 300€/m
Estradas 150€/m
Valor das vias Rodovias
Arruamentos 150€/m
Caminhos 15€/m
Áreas agrícolas heterogéneas 150€/ha
Agrícola Culturas permanentes 200 €/ha
Culturas temporárias 150 €/ha
Valor do Uso
Florestas 300€/ha
do solo Florestal
Florestas abertas e vegetação arbustiva e herbácea 150€/ha
Vegetação característica Carvalhais 450€/ha
Inculto Matos 50€/ha
352 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

Figura 8 - Carta de valores dos bens expostos da área urbana de Santa Clara (fonte: CMC)
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 353

4 - RESULTADOS

4.1. Vulnerabilidade

A avaliação da vulnerabilidade resultou de um produto simples


da carta da população exposta, pela do valor dos bens potencial-
mente afetados e da vulnerabilidade social, expressando assim a
vulnerabilidade da área em estudo (figura 9).
De um modo geral, a área urbana de Santa Clara evidencia uma
baixa vulnerabilidade, apesar de existirem nela, algumas áreas mais
vulneráveis. Estas encontram-se classificadas com vulnerabilidade
“moderada” a “elevada”, manifestando maior valor junto aos aglo-
merados populacionais de Santa Clara, Mesura e Alto de Santa Clara,
onde se verificou existir uma elevada exposição de pessoas e bens.
Na área adjacente ao Rio Mondego, verificou-se também exis-
tir presença de uma vulnerabilidade mais acentuada. No entanto,
conclui-se que os prejuízos materiais e humanos provenientes de
um possível evento perigoso, apenas poderão ser consideráveis ao
nível dos equipamentos, património e infraestruturas (ex: Parque
Verde do Mondego), uma vez que se provou existir fraca ocupação
humana.
Para melhor entender o evidenciado, procedeu-se à apresenta-
ção da tabela 3, em que podemos analisar quantitativamente os re-
sultados espaciais referentes à vulnerabilidade em Santa Clara. As-
sim, mais de 50% da área de estudo apresenta uma vulnerabilidade
muita e baixa e apenas cerca de 7% apresenta uma vulnerabilidade
elevada e muito elevada.
354 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

Figura 9 - Carta de vulnerabilidade potencial da área urbana de Santa Clara (fonte: CMC)
Ana Daniela Alves; Lúcio Cunha 355

Tabela 3 - Classes de vulnerabidade da área urbana de Santa Clara


Classes de classificação Área (%)
Muito Elevada 0,15
Elevada 6,51
Moderada 38,08
Baixa 53,52
Muito Baixa 1,76

5- CONCLUSÕES
Este estudo, integrado num projeto acadêmico com vista ao es-
tudo dos riscos naturais urbanos na cidade de Coimbra (JORGE,
2015; ALVES e CUNHA, 2016), teve como objetivo identificar as
áreas mais problemáticas em termos de vulnerabilidade no terri-
tório de Santa Clara. Para além disso, pretende-se que esta inves-
tigação seja considerada importante para os diferentes agentes de
intervenção no território, uma vez que lhes permitirá estabelecer
políticas e adotar medidas que eliminem ou mitiguem as causas e,
sobretudo, as consequências da ocorrência de eventos perigosos.
No território de S. Clara, escolhido para este estudo, a vulnera-
bilidade face a processos naturais perigosos, tem uma importante
diferenciação local, resultado quer das diferenças de exposição de
pessoas e bens, quer das condições de resistência e resiliência das
populações. O mapa da chamada vulnerabilidade potencial, que
aponta genericamente para uma vulnerabilidade baixa no conjunto
do território, mas que mostra valores elevados a muito elevados
sobretudo nas áreas de ocupação mais antiga (ex: Alto de S. Clara),
reflecte a forte exposição das pessoas nessas áreas, mas esconde a
forte vulnerabilidade infra-estrutural, resultante dos bens expostos
que acontece sobretudo nas áreas mais recentes a Norte (Centro
Comercial e instalações anexas), na área de ocupação recente da
Guarda Inglesa ou, mesmo, na margem do Rio, menos habitada, mas
356 AVALIAÇÃO DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS NATURAIS PERIGOSOS NA ÁREA URBANA DE SANTA CLARA

ocupada por um conjunto de infra-estruras desportivas, educativas


e de outros tipos.
Na abordagem do Plano de Urbanização de Coimbra, instrumen-
to de gestão territorial que esta investigação pretende auxiliar, con-
sidera-se que uma elevada vulnerabilidade remete para a adoção
de medidas de prevenção e de mitigação (informação dos agentes
de proteção civil e acções locais sobre a população, por exemplo).
A cartografia que aqui se apresenta pretende orientar, de modo ob-
jectivo, essas acções.

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CAPÍTULO 18 SHIZIELE DE OLIVEIRA SHIMADA
LIDIANA VIEIRA DOS SANTOS

DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS: DIÁLOGOS SOBRE O


AGRONEGÓCIO DA CANA-DE-AÇÚCAR EM SERGIPE

1. INTRODUÇÃO

A cana-de-açúcar teve origem em solo americano, sendo culti-


vada no Brasil pelos portugueses devido ao clima tropical quente e
úmido, e ao solo massapé propício para o cultivo da cana (MACEDO,
2008). Dessa maneira,

O Brasil, dotado de clima tropical quente e úmido, e solo


massapé foi exatamente o que Portugal necessitava para a
difusão desse cultivo, que devido ao valor que possuía no
mercado do Velho Continente foi um dos grandes estimula-
dores do enriquecimento português. Durante o ciclo da cana
a Capitania de Pernambuco, pertencente a Duarte Coelho
(onde foi implantado o primeiro centro açucareiro do Bra-
sil) e a Capitania da Bahia de Todos os Santos, de Francisco
Pereira Coutinho, foram os principais núcleos da produção
açucareira no Brasil Colônia (MACEDO, 2008, p.6).
360 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

A cana-de-açúcar foi atividade fundamental para o desenvolvi-


mento econômico brasileiro desde o período colonial, tendo suas
fases de ascensão, declínio e crise. No século XX destaca-se a pro-
dução da cana-de-açúcar com a criação do Instituto do Açúcar e do
Álcool (IAA), no ano de 1933, governo do presidente Getúlio Var-
gas. A criação desse Instituto foi motivada por uma crise no setor
açucareiro, já que o uso de álcool de cana poderia ajudar os produ-
tores de açúcar a arbitrar entre a produção de açúcar e de etanol, ao
mesmo tempo em que atenuaria o consumo de gasolina importada
no país (CORTEZ, 2016).
Outro período de destaque na produção da cana-de-açúcar ocor-
reu a partir dos anos de 1975 com o Proálcool – Programa Nacional
do Álcool. Esse Programa foi criado como uma iniciativa do governo
para enfrentar a crise mundial do petróleo e incentivar a produção
de álcool combustível.
Nos últimos anos da década de 1980 e 1990, com a abertura à
economia mundial e a relação do Estado mínimo na economia, o
interesse do capital financeiro estava na propagação dos mercados
financeiros e mercados de produtos ampliando as produções espe-
cializadas em commodities, ou seja, grandes unidades de produtos
primários para a exportação no modelo de agronegócio. O agro-
negócio brasileiro esteve gestado no modelo realizado nos países
europeus e americanos de modernização da agricultura com a uti-
lização de sementes selecionadas de alta capacidade e pacote tec-
nológico, além do controle pelas multinacionais dos recursos na-
turais e da terra gerando o controle oligopolista sobre o território
brasileiro. Sendo prioridade na política macroeconômica do Estado
enquanto detentor da organização e produção econômica do país
aliado ao poder do mercado mundial. Desse modo:

Este período marcado pela retirada do Estado da economia,


além da competição do setor devido aos investimentos in-
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 361

dustriais, através da mecanização e utilização de tecnologia


na agricultura, houve a penetração de capitais internacionais
gerando a concentração de renda e da propriedade da terra
de grandes grupos e empresas, em detrimento às falências
dos pequenos proprietários de terra. Fortalecendo o cresci-
mento da agroindústria, através de um sistema desigual, co-
locado como uma saída da pobreza a sua entrada na agroin-
dústria, nessa trajetória os pequenos agricultores foram
convencidos, através dos órgãos internacionais, a moderni-
zarem a agricultura e incorporarem os insumos industriais
(SHIMADA, 2010, p.92).

Desde o início da década de 1990, os agrocombustíveis apresen-


taram destaque na elevação dos preços e na escassez de alimentos
em escala mundial, por conta do avanço dado a produção de insu-
mos para a obtenção de energia, em específico a cana-de-açúcar,
a expansão da oferta dos produtos à agricultura, predominando:
o cultivo de um único produto em larga escala, o uso intensivo de
agrotóxicos, de fertilizantes de origem industrial, de mecanização
pesada e de exploração da força de trabalho assalariada.
A partir de 1990 até o início do século XXI, houve a oscilação
da produção da cana-de-açúcar devido aos momentos de crise eco-
nômica que se seguiram com a sobrevalorização do dólar, crise de
liquidez e endividamento do setor, destacando que ocorreu a redu-
ção das exportações de todo o setor do agronegócio e não apenas
canavieiro. As transformações do complexo canavieiro estabelece-
ram-se pela redução e quebra de um grande número de usinas, fun-
damentalmente daquelas que operavam com baixa produtividade
agrícola e industrial e pela abertura do capital do setor às empre-
sas transnacionais e ao capital financeiro nacional e internacional
(SHIMADA, 2010).
O setor só voltou a ter dinamismo, no ano de 2002 com a nova
fase do Complexo Agroindustrial (CAI) Canavieiro um período de
362 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

grande dinamismo de seu processo de crescimento, que faz lem-


brar o período áureo do Proálcool (1974/1983) com a retomada
dos preços internacionais do açúcar. Os incentivos significativos do
governo brasileiro foram destacados, a partir de 2004, devido ao
crescimento da demanda interna do álcool com o lançamento dos
veículos automotivos flex fluel, que funcionam com álcool e com ga-
solina, além do aumento da produção de cana no campo brasileiro
que foi estabelecido pela expansão da produção de etanol para o
mercado mundial.
Dessa maneira houve intensas mudanças no espaço agrário com
o aumento da produção do agronegócio, em detrimento as áreas
de plantio de produtos de subsistência. Isto evidencia problemas
estabelecidos no espaço agrário a partir do interesse de alta lucrati-
vidade do capital, via monopolização ou territorialização no campo.
Com a criação, em 2007, do Programa de Aceleração do Cres-
cimento – PAC – estabelecido pelo Governo Federal que instalou o
Programa Nacional de Biocombustíveis para a expansão do etanol,
tendo como objetivo somente o abastecimento energético vincula-
do a interesses particulares e voltado para o mercado externo. Com
isso, o programa atendeu aos produtores de agrocombustíveis,
através da ampliação de crédito e da criação de infraestrutura lo-
gística para transporte e escoamento da produção nas áreas de ex-
pansão do plantio não só de cana, como também da soja, mamona
e eucalipto.
Para expandir a produção canavieira houve a necessidade da
aplicação de pesquisas desenvolvidas através de centros de Pesqui-
sa e Desenvolvimento (P&D), no Brasil e no exterior, com o aval e
financiamento do Estado brasileiro. Um dos estudos realizados no
país, sobre a competitividade do Sistema Agroindustrial (SAG) da
cana-de-açúcar e novos empreendimentos na utilização da maté-
ria prima teve como objetivo demonstrar a eficiência da produção
de commodities da cana-de-açúcar. É importante destacar que, na
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 363

lógica do discurso para o agronegócio, a rede de instituições de


pesquisa, sob o trinômio de biodiversidade, biotecnologia e biomas-
sa, pressupõe a sua importância do aumento de áreas plantadas de
cana para a geração de trabalho e renda e, consequentemente, para
o desenvolvimento regional (IELC/NC; SEBRAE, 2005).
Em fins de 2008, a crise da economia mundial tomou contornos
dramáticos a partir do núcleo do capitalismo e do sistema finan-
ceiro mundial que tiveram o epicentro da crise marcado com a in-
solvência dos títulos da dívida e a queda da liquidez internacional
possibilitando um colapso sistêmico. Os efeitos da crise foram sen-
tidos nos países de diferentes maneiras e no Brasil apresentou-se
na produção canavieira a partir dos problemas gerados no mercado
financeiro por conta das commodities que estabeleceram os valores
de acordo com o mercado de bolsas, necessitando atrair recursos
do sistema financeiro a partir de geração de novos créditos para
cobrir constantes dívidas, ou seja, avolumaram-se as dívidas a par-
tir do capital fictício. Efetivou-se, assim, a dependência crescente
do capital real em relação ao crédito que gerou o fechamento de
muitas usinas ocasionando a participação de empresas multinacio-
nais para obtenção por aquisições e/ou fusões dessas usinas. Dessa
forma,

A crise financeira mundial trouxe mudanças significativas


para a agroindústria canavieira em relação ao padrão de ex-
pansão que se delineou nos anos anteriores. Diversas usinas
tomaram empréstimos baratos em dólar, aproveitando a va-
lorização do real, para especular com derivativos cambiais.
Com a reversão dessa tendência e a valorização do dólar em
relação à moeda brasileira, muitas usinas quebraram. O se-
tor somou um prejuízo de mais de R$4 bilhões. As empresas
deixaram de investir, por exemplo, na renovação de cana-
viais, tratos culturais e adubação para manter a elevação dos
níveis de produtividade (MENDONÇA et al, 2012, p.4).
364 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

De acordo com o Centro de Monitoramento dos Agrocombus-


tíveis (2009), a retração da oferta de crédito desse período gerou
intensa movimentação no setor sucroalcooleiro do Brasil com a
participação de grupos internacionais que passaram a participar
ativamente neste setor da economia para aumentar a demanda por
etanol no mercado brasileiro. Houve a consolidação dos grupos in-
ternacionais capitalizados que passaram a adquirir grandes com-
panhias nacionais, além de já serem responsáveis pela moagem de
20% da cana-de-açúcar produzida no país.
Sobre a referência da consolidação dos grupos internacionais
que levaram ao monopólio da terra e fortalecimento de grupos
estrangeiros dominantes nesse processo capitalista, Mendonça et
al (2012) destaca a atuação do grupo Cosan, que atualmente é a
maior empresa do setor e, desde meados dos anos 2000, efetivou
sua entrada junto ao mercado de ações da Bovespa. A captação de
recursos estrangeiros, principalmente de fundos de investimentos,
gerou uma ampliação exponencial dos ativos da Cosan que consti-
tuiu outras empresas subsidiárias, como a Cosan Açúcar e Álcool,
Rumo Logística, Cosan Combustíveis e Lubrificantes (CCL) e Radar
Propriedades Agrícolas.
Carvalho (2007) afirma que a presença do capital estrangeiro
tanto para a aquisição de terras como de usinas sucroalcooleiras
estabelece a concentração e centralização da riqueza no poder de
grupos dominantes capitalistas. Com isso gera vários problemas,
como: aumento dos preços da terra; parcerias ou arrendamentos
de terras, através da relação de fornecedores de cana e usina; ex-
pansão da plantação de cana; surgimento de novas usinas com ca-
pital estrangeiro; além dos impactos ambientais e sociais decorren-
tes da aceleração do agronegócio.
O boom do etanol no mundo confrontou-se com as desigual-
dades existentes no setor sucroalcooleiro, por um lado com altos
investimentos de grupos nacionais e internacionais que garantem
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 365

o desenvolvimento de tecnologia de ponta retirando os pequenos


proprietários que não possuem capital suficiente para investi-
mentos na produção, por outro, o avanço do monocultivo da cana
que gera danos ambientais, sociais e econômicos para toda a so-
ciedade.

2. O ESPAÇO AGRÁRIO SERGIPANO E OS IMPACTOS CAUSADOS COM


O AGRONEGÓCIO CANAVIEIRO
Szmrecsányi et al. (2008) destaca que o arrendamento de ter-
ras para o plantio de cana-de-açúcar acontece pelos proprietários
de usinas e destilarias, como também por grandes, médios ou pe-
quenos fornecedores dessas indústrias. O que distingue os proprie-
tários de usina (usineiros) e os maiores fornecedores dos demais
arrendatários reside no nível de capitalização pela propriedade de
grandes extensões de terras como pela posse de máquinas e equi-
pamentos adequados às diferentes etapas do processo produtivo
(plantio, tratos culturais, corte e carregamento), bem como de ca-
minhões para transporte da cana do campo para as unidades pro-
cessadoras. Assim, os pequenos proprietários de terras e os for-
necedores descapitalizados cedem seus lotes em arrendamento,
transformando-se de produtores em rentistas.
No estado de Sergipe, também, há a presença do arrendamento
das terras para as usinas sendo realizado por grandes e pequenos
proprietários, mas que terá um diferencial na lucratividade eviden-
ciada pela própria lógica do sistema capitalista.
Os grandes proprietários arrendam suas terras para as usinas,
dessa maneira, a usina fica com as terras desde o primeiro plantio
até a última ressoca da cana dando uma média de 6 a 7 anos de
atividade. Ou seja, do plantio da cana até a primeira colheita são
18 meses, a partir daí, corta-se a cana anualmente, através do re-
brotamento da mesma, chamando de soca, no primeiro ano do re-
366 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

brotamento, já para os outros anos tem-se o nome de ressoca. Isso


significa dizer que o plantio da cana proporciona uma média de 4
cortes, para depois fazer a limpeza da terra e, novamente, plantar.
De acordo com a área plantada, a produção e o valor da tonelada da
cana, o arrendatário irá receber, mensalmente, a sua quantia, des-
tacando-se como prática lucrativa por não ter nenhuma despesa
por parte dos donos das terras e sendo uma lógica de lucratividade
para os grandes latifundiários sergipanos.
Com relação aos pequenos produtores a situação é outra, o em-
préstimo financeiro adquirido pelo banco é pouco para poder com-
petir com grupos de patrimônio elevadíssimo. Com isso, na lógica da
política do atual governo, há uma constante ênfase dada com relação
ao espaço agrário sobre a agricultura familiar, em que o Governo visa
à agricultura familiar, não como sinônimo de agricultura de subsis-
tência, mas que está diretamente articulada com o mercado, para
produzir o que for viável de comercialização, potencializando-se o
trabalho da assistência técnica sugerindo cultivos que se transfor-
mem em negócios. A atuação se dá através da EMDAGRO (Empresa
de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe) que tem o objetivo
de prestar suporte técnico gratuito, ajudar na plantação e custeio
da lavoura da cana para os pequenos produtores. O empréstimo do
governo concedido aos pequenos produtores, para ser aprovado, ne-
cessita da elaboração de um projeto, o qual a EMDAGRO auxilia na
elaboração a partir da assistência técnica, recebendo a 2% do valor
do empréstimo.
Os pequenos produtores fazem a plantação e vendem a cana à
usina somente no período do corte, o valor sofre variação a depen-
der da distância, pois não se pode demorar muito tempo depois de
cortada. Sendo assim o corte e o transporte da cana apresentam
custos maiores, daí, somente os grandes fornecedores podem fazer
todo o processo para a obtenção do lucro total, enquanto que os pe-
quenos produtores não dispõem de capital suficiente tendo, muitas
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 367

vezes, dívida com o banco financiador do empréstimo concedido


para estes pequenos produtores1.
Nos últimos anos houve o surgimento de discussões em escala
mundial através das organizações e movimentos sociais, ambientais
e sindicais populares que criticam a expansão e a proporção que se
tornou a expansão dos agrocombustíveis, gerando somente o lucro
das grandes empresas capitalistas com o apoio fortalecido do Estado
e organismos financeiros mundiais. Com isso, os pequenos produto-
res perdem suas terras para a produção de monocultivos, sem con-
dições de plantar os alimentos de subsistências tornando o espaço
agrário à mercê da produção em larga escala. Dessa maneira:

O agronegócio na sua lógica concentradora de terras, de tec-


nologia e de riquezas tem expropriado milhares de famílias e
intensificado o desemprego no campo. Intensificando a pre-
carização do trabalho através da superexploração das horas
de trabalho. O modelo do agronegócio tem contribuído para
a baixa qualidade da alimentação, principalmente pela ex-
pansão da monocultura com uso cada vez maior de agrotóxi-
cos e recentemente na produção de alimentos transgênicos
(CONCEIÇÃO, 2011, p.2).

No espaço agrário, os principais problemas decorrentes são: as


mudanças climáticas devido às emissões de carbono, como também
os impactos do modelo de produção a partir da cana-de-açúcar, so-

1 Em 2009, o Banese – Banco do Estado de Sergipe – abriu negociações para apoiar o setor su-
croalcooleiro estadual, financiando as atividades dos pequenos produtores sergipanos de ca-
na-de-açúcar. Em parceria com a Agroindústria Taquari, usina produtora de álcool combustível
comandada pelo Grupo Samam, o banco financiará as atividades de custeio e investimento das
plantações de cana dos pequenos agricultores do estado. O acordo foi firmado durante reunião
realizada em Neópolis, na sede da Associação das Concessionárias do Distrito de Irrigação do
Platô de Neópolis (Ascondir), tendo a presença de dezenas de agricultores e do empresário do
Grupo Samam Henrique Menezes, além do diretor do Banese Edson Caetano, o gerente da Área
de Crédito Rural do banco, Lauro Monteiro Rocha, e os gerentes da instituição nos municípios
de Neópolis, Capela, Nossa Senhora das Dores, Japoatã, Propriá e Japaratuba (ASN, 2009).
368 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

bre áreas de preservação ou de produção de alimentos. O agrone-


gócio canavieiro se destaca pela poluição do ambiente e destruição
da fauna e da flora, acarretando a morte de peixes e da vegetação
dos cursos de água, além da poluição de lençóis freáticos e de águas
subterrâneas por agrotóxicos e pesticidas.
A queima anual dos canaviais às vésperas da colheita provo-
ca impactos negativos tanto no meio físico, biológico e antrópico,
como consequências dessa prática ao ser humano destacam-se: os
riscos de acidentes durante a queimada, depreciação do panorama
visual pela exposição dos efeitos da queimada, incômodo propor-
cionado pela liberação de fumaça e os dados à saúde, causados pela
fuligem. Porém, além de emitir gás carbono, a queima da cana libe-
ra ozônio, um gás altamente poluente que não se dissipa facilmente
e que, em baixa altitude, prejudica o crescimento de plantas e o de-
senvolvimento de seres vivos (SZMRECSÁNYI, 1994).
A prática da queima da palha da cana-de-açúcar anteriormente à
colheita é constante. Os motivos principais para essa utilização são:
a segurança do trabalhador devido à presença de animais peço-
nhentos e o aumento do rendimento do corte. No entanto, a queima
da palha da cana possui efeitos nocivos à saúde dos trabalhadores e
da população exposta, com risco de doenças respiratórias, além dos
problemas na fauna e flora. Com isso,

[…] os impactos das queimadas de cana influenciam a dimi-


nuição da biodiversidade animal por meio da perda de ha-
bitat ou morte de animais que utilizam o canavial para nidi-
ficação ou alimentação. A biodiversidade vegetal também é
ameaçada em áreas adjacentes às dos canaviais queimados,
por se tornarem mais susceptíveis aos incêndios acidentais
(RONQUIM, 2010, p. 8).

Segundo Hess (2008), as queimadas de biomassa e a combustão


incompleta resultam na formação de substâncias potencialmente
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 369

tóxicas, tais como monóxido de carbono, amônia e metano, entre


outros, sendo que o material fino, contendo partículas menores ou
iguais a 10 micrometros (PM10) (partículas inaláveis), é o poluen-
te que apresenta maior toxicidade e que tem sido mais estudado.
Ele é constituído em seu maior percentual (94%) por partículas
finas e ultrafinas, ou seja, partículas que atingem as porções mais
profundas do sistema respiratório e são responsáveis pelo desen-
cadeamento de doenças graves. Os efeitos da poluição do ar, espe-
cialmente do material particulado fino, ocasionam: adoecimento e
mortalidade por doenças cardiovasculares (cardíacas, arteriais e
cerebrovasculares), sendo que, tanto efeitos agudos (aumento de
internações e de mortes por arritmia, doença isquêmica do mio-
cárdio e cerebral), como crônicos, por exposição em longo prazo
(aumento de mortalidade por doenças cerebrovasculares e cardía-
cas). A exposição dos cortadores de cana a materiais particulados,
gerados durante o processo queima da cana-de-açúcar, constitui
um importante fator de risco a ser considerado na análise e associa-
ção das possíveis causas da morte súbita de alguns trabalhadores.
Como afirma o autor:

[…] a poluição atmosférica originada pela prática da queima


da cana-de-açúcar expõe o trabalhador e a população expos-
ta a riscos severos de adoecimento por doenças cardiovas-
culares (cardíacas, arteriais e cerebrovasculares), apresen-
tando, tanto efeitos agudos (aumento de internações, doença
isquêmica do miocárdio e cerebral), como crônicos, por ex-
posição em longo prazo, podendo, em casos extremos, con-
duzir à morte. Assim sendo, sugere-se que a queima da cana-
-de-açúcar seja proibida em todo o Brasil (HESS, 2008, p.48).

Em Sergipe, a queima faz parte do processo para a retirada de


cana sendo feita por alguns trabalhadores que realizam essa ativi-
dade específica, sendo realizada no fim da tarde ou durante o pe-
370 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

ríodo noturno, para que de manhã os canaviais já estejam prontos


para a realização da atividade do corte da cana.
De acordo com o Relatório do MPT (2012), a queima nos cana-
viais sergipanos é feita por trabalhadores do sexo masculino, com
roupas pessoais da sua rotina, sem equipamentos de proteção, a
não ser luvas, para os que atuam no período noturno.
No período noturno, a queima é feita por duas equipes. Parte da
equipe atua como “foguistas/ateadores” de fogo, utilizando-se de
tochas de palha, colhida da própria cultura, acesas com isqueiros,
iniciando o trabalho com a queima das bordas dos talhões, contra
o vento e posteriormente a favor do vento. Outra parte da equipe
atua como “abafadores”, utilizando-se de facões/podões, para o
corte das canas das bordas dos talhões e de ferramentas rudimen-
tares composta de um cabo, tendo em sua extremidade uma peça
de borracha, que é batida sobre as fagulhas e ou parte de folhas
queimadas, de forma a impedir a propagação indesejável do fogo.
Na atividade da queima noturna não foi detectada a presença de
nenhum dispositivo de controle de incêndio.
No caso da queima diurna, realizada no fim da tarde, constatou-
-se a presença de uma carreta pipa, transportando água, tracionada
por trator, posicionada próxima ao talhão a ser queimado, para con-
trole de possível propagação do fogo (MPT, 2012).
Relacionada já proibitiva a queima em muitos estados brasilei-
ros, em Sergipe foi evidenciado somente um caso em juízo, em ou-
tubro de 2010, em que a justiça do município de Maruim atendeu
pedido de liminar do Ministério Público contra a Usina São José
Pinheiro (INFONET, 2010). O Poder Judiciário Sergipano concedeu
liminar determinando que esta usina não pudesse receber e nem
processar em suas unidades industriais cana-de-açúcar decorrente
da queima da palha, além de não utilizar fogo na limpeza do solo,
no preparo de plantio e colheita de cana-de-açúcar nos imóveis si-
tuados nos limites do município de Maruim. Em caso de descum-
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 371

primento das obrigações demanda em multa diária no valor de R$


50.000,00 (cinquenta mil reais).
No ano de 2013, em Sergipe, foi aprovada a Resolução nº53/2013
do Conselho Estadual do Meio Ambiente - CEMA que dispõe sobre
os procedimentos administrativos para a concessão de autorização
para queima controlada em práticas agrícolas, pastoris e flores-
tais (ADEMA, 2013). Em Sergipe, com a regulamentação da prá-
tica da queima de palha de cana-de-açúcar previsto na resolução
nº:53/2013, evidencia que:

Art. 2º, IV- Comunicação de Queima Controlada: documen-


to que visa informar a todos os confrontantes da área a ser
realizada a Queima Controlada, bem como os horários e a as
datas previstas para o procedimento, com comprovação de
recebimento (RESOLUÇÃO Nº: 53/2013, P. 2).

Dessa maneira, a queima é permitida desde que evite tempera-


turas elevadas e respeite a direção do vento, para que o fogo não
saia do controle e provoque um incêndio.
O artigo 7º parágrafo II, da resolução 53/2013, salienta que o in-
teressado pela queima controlada deverá elaborar um plano em que
deve evitar sempre temperaturas quentes e respeitando as condi-
ções dos ventos predominantes no momento da operação. (figura 1).
Percebe-se na imagem que a queimada foi realizada durante
o dia, sem respeitar a resolução nº: 53/2013 em seu parágrafo II
do artigo 7º. E isso é um fato decorrente nos canaviais sergipanos,
como pode ser destacado na notícia da Infonet (2017), que rela-
tou que em 2017 houve uma ação ajuizada pelo Ministério Público
Federal em Sergipe (MPF/SE) após denúncias de moradores dos
municípios de Capela e Nossa Senhora das Dores, que reclamavam
da fuligem que cobria os dois municípios no período de colheita da
cana e causava doenças respiratórias.
372 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

Figura 1: Queimada canavieira, Japaratuba/SE.

Fonte: Acervo próprio, L.V. SANTOS, Capela, 2018.

De acordo com a investigação do MPF/SE, constatou-se que a


atuação da Administração Estadual do Meio Ambiente (ADEMA) e
do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA) acabava permitindo a realização de queima-
das irregulares, pois a fiscalização era ineficiente e a regulamen-
tação aplicada pela ADEMA não estava de acordo com a legislação
ambiental. Dessa maneira, a Justiça Federal publicou decisão que
proíbe a queima da palha da cana-de-açúcar sem estudos de im-
pacto ambiental no Estado de Sergipe. E na decisão determinou
que a ADEMA e o IBAMA não concedessem novas autorizações para
queimadas nem renovassem as já existentes sem a realização de
estudos de impacto ambiental amplo por cada empresa solicitante
(INFONET, 2017).
Com isso, a queima da cana-de-açúcar deve ser gradativamente
reduzida até sua completa eliminação em todo o país para promo-
ver a adequação ambiental e minimizar os impactos causados no
ambiente e à sociedade por meio da formalização de leis e o seu
cumprimento.
Shiziele de Oliveira Shimada; Lidiana Vieira dos Santos 373

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A expansão da produção canavieira no espaço agrário confron-


tou-se com as desigualdades existentes no setor sucroalcooleiro,
por um lado com altos investimentos de grupos nacionais e inter-
nacionais que garantem o desenvolvimento de tecnologia de pon-
ta retirando os pequenos proprietários que não possuem capital
suficiente para investimentos na produção, por outro, o avanço do
cultivo da cana-de-açúcar gera danos ambientais, sociais e econô-
micos para toda a sociedade.
Essas mudanças ocorridas no espaço agrário brasileiro para a
ampliação da produção de cana-de-açúcar permitem que se desta-
que a lógica que fortalece a escala local ao global, e vice-versa. Com
isso, destaca-se o estado de Sergipe que teve a ampliação da produ-
ção canavieira em vários municípios, que gerou o lucro de grandes
empresas capitalistas com o apoio fortalecido do Estado e orga-
nismos financeiros nacionais e mundiais, e a saída dos pequenos
produtores que não conseguiram seguir a ordem dos investimentos
propostos pelo mercado do agronegócio.
Especificamente no caso do agronegócio canavieiro destaca os
vários impactos decorrentes como as mudanças climáticas devi-
do às emissões de carbono,e os impactos do modelo de produção
a partir da cana-de-açúcar, sobre áreas de preservação ou de pro-
dução de alimentos. A queima da palha da cana é a atividade que
possui efeitos nocivos à saúde dos trabalhadores e da população
exposta, com risco de doenças respiratórias, além dos problemas
na fauna e flora, precisando ser gradativamente reduzida até sua
completa eliminação em todo o país através da formalização de leis
e o seu cumprimento.
374 DILEMAS E DESAFIOS AMBIENTAIS

REFERÊNCIAS
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Série Texto para Discussão 32.
FRANCISCO DA SILVA COSTA
CAPÍTULO 19 ANTÓNIO AVELINO BATISTA VIEIRA
ANTÓNIO JOSÉ BENTO GONÇALVES

AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA:


O RIVER HABITAT SURVEY E SUA APLICAÇÃO AOS RIOS DO
MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (NOROESTE DE PORTUGAL)

1. INTRODUÇÃO

Os resultados prévios obtidos nos relatórios “Caraterização e


análise geográfica dos cursos de água do município de Guimarães”
e “Metodologias para a caraterização e análise hidromorfológica
dos cursos de água do Município de Guimarães” (VIEIRA, COSTA
e BENTO-GONÇALVES, 2016 e 2017), elaborados no âmbito de um
protocolo com o município de Guimarães, constituíram o ponto de
partida para a realização do presente trabalho, desenvolvido pelo
Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território da
Universidade do Minho (CEGOT-UMinho).
São reduzidas as experiências de requalificação fluvial nos prin-
cipais cursos de água no Município de Guimarães, cingindo-se a
casos isolados conduzidos pela Autarquia e que não tiveram conti-
nuidade, nem foram sujeitos a monitorização (Costa, 2013). Neste
contexto, esta proposta enquadra uma metodologia de interven-
ção que se pretende implementar ao longo dos principais cursos
378 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

de água do Município de Guimarães, em locais identificados com


maiores problemas de ordem hidrológica, ambiental e paisagística.
No âmbito deste trabalho foram traçados os seguintes objetivos:
- caraterizar o Domínio Público Hídrico (DPH), do ponto de vis-
ta hidromorfológico, nos cursos de água definidos. Tal implica
a identificação do DPH para os segmentos selecionados e a re-
alização de uma caracterização prévia.
- avaliar a vulnerabilidade e o estado de conservação, em áre-
as degradadas, com base em parâmetros hidromorfológicos.
Trata-se de aplicar o método “River Habitat Survey” (RHS) nas
sub-bacias hidrográficas do rio Ave, com características diver-
sas entre si (regime de caudais, tipo de ocupação do solo nas
zonas envolventes, nomeadamente zonas urbanas, agrícolas e
florestais);
- definir transectos com necessidade de gestão, ao nível da in-
tervenção e da requalificação. Trata-se de aplicar o RHS no
processo diário de tomada de decisão, em atividades enqua-
dradas no regime de licenciamento da utilização dos recursos
hídricos.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: O SISTEMA RIVER HABITAT


SURVEY
O sistema “River Habitat Survey” (RHS) é um método utilizado
na avaliação das características físicas e qualidade dos habitats dos
recursos hídricos e foi desenvolvido para ajudar na conservação e
reabilitação dos habitats a fauna e flora ao longo do rio e do seu lei-
to de cheia. Medeiros (2011) refere que esta metodologia tem sido
testada de forma consistente em vários países (Raven et al., 2005,
2007, 2008, 2009a, 2009b), revelando-se bastante útil em diferen-
tes linhas de investigação, desde a avaliação de habitats para o es-
tabelecimento de diversas espécies (Caswell e Aprahamian, 2001),
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 379

até à avaliação de risco de erosão (Newson, 2002). Em Portugal, a


Agência Portuguesa do Ambiente (APA), desenvolveu parcerias no
sentido de adotar e adaptar o “River Habitat Survey” como método
de caracterização morfológica dos rios. O RHS foi desenvolvido para
dar resposta à necessidade de informação sobre a estrutura física
e a qualidade dos habitats nos rios (Jeffers, 1998). A sua aplicação
tem em conta a necessidade de caracterizar as áreas de interven-
ção do ponto de vista hidromorfológico, com o intuito de aquilatar
o impacto das perturbações exercidas ao longo dos transectos em
estudo, de modo a introduzir medidas corretoras tendentes a re-
qualificar transectos e habitats degradados e a incrementar a biodi-
versidade local (Medeiros, 2011).
O RHS permite avaliar a estrutura física de linhas de água e rios,
baseado num transecto de amostragem standard de 500 metros, ao
longo dos quais são avaliadas as características do canal e da fai-
xa riparia (Medeiros, 2011). A técnica requer apurado trabalho de
campo, para reconhecimento visual de características predefinidas,
e seu registo em fichas de inventário.
O RHS serve para “caracterizar e avaliar a estrutura física dos
cursos de água” (Environment Agency, 2003). Na verdade, o índice
é composto por dois indicadores e informações recolhidas por fi-
chas de trabalho de campo, ao longo de um trecho do rio com 500
metros de comprimento. O RHS assenta, assim, na avaliação de
transectos de rios e inclui observações do substrato, escoamento,
erosão e depósitos no leito, estrutura do coberto vegetal das mar-
gens, e usos do solo nas áreas imediatamente adjacentes a estas
(figura 1) (Medeiros, 2011).
380 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

Figura 1 – Esquema das dimensões de análise a considerar nos pontos de amostragem

Fonte: Environment Agency, 2003.

A observação nas campanhas de campo é realizada em 10 “spo-


t-checks”, uniformemente distribuídos nos 500 metros. Os dados
são recolhidos através de 10 pontos de amostragem equidistantes,
combinados com um resumo do “varrimento” daquela extensão
(RAVEN et al., 2002), sintetizados numa ficha de caracterização di-
vidida em 18 secções a preencher para cada transecto (Environ-
ment Agency, 2003).
A metodologia do RHS assenta na comparação dos transectos/
amostras através do uso de dois índices de qualidade, desenvolvi-
dos especificamente para o efeito (RAVEN et al., 1998c). O “Habitat
Quality Assessment” (HQA) constitui um sistema de pontuação ba-
seado nas características relevantes para a biodiversidade e é utili-
zado para comparar rios do mesmo tipo, pelo que é utilizado para
classificar os transectos considerados em cada uma das sub-bacias
principais do município de Guimarães. Os resultados obtidos podem
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 381

servir de referência para quantificar a melhoria ou a degradação


do habitat, e assim servir para antecipar os efeitos de intervenções
previstas (MEDEIROS, 2011). O “Human Modification Score” (HMS)
quantifica o grau de alteração dos rios devido à intervenção huma-
na, com base em várias características do canal o que permite uma
comparação consistente entre transectos de diferentes sub-bacias.
A pontuação obtida no HMS está associada a diferentes categorias
de grau de alteração, consequência de determinadas intervenções
nos leitos e margens dos cursos de água (MEDEIROS, 2011).
A amostragem dos transectos e pontos críticos baseia-se na re-
colha de amostras sistemáticas representativas dos cursos de água
com problemas ao nível do escoamento e da degradação física (ME-
DEIROS, 2011). Com base no reconhecimento efetuado em saídas
de campo e contatos estabelecidos com Presidentes de Juntas de
Freguesias, foram selecionados os transectos que serviram como
amostras dos cursos de água. No presente trabalho foram realiza-
dos 13 transectos, tendo por base fundamental os critérios defini-
dos por um protocolo de segurança, por forma a que o trabalho de
campo pudesse ser eficaz.
Foram abrangidas as três sub-bacias principais de Guimarães -
rio Ave, rio Selho e ribeira de Nespereira (figura 2). Os transectos
amostrados incluem áreas com usos que revelam alterações decor-
rentes da pressão urbana e/ou associadas à exploração agrícola,
pecuária e florestal, bem como áreas ocupadas essencialmente por
vegetação semi-natural.
382 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

Figura 2 – Localização dos transectos avaliados.

O método de recolha de informação teve por base o formulário


RHS e foi concebido de forma a ser robusto e associado a uma boa
base de dados e a um sistema de informação geográfica que permi-
ta sustentar medidas de gestão, de informação ao público e futuras
intervenções (JEFFERS, 1998).
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 383

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Apresentamos uma breve análise às secções e caraterísticas


mais importantes nos 13 transectos das sub-bacias Ave, Selho e
Nespereira:
Secção B – Forma predominante do vale: não obstante algumas
particularidades locais, nota-se uma certa homogeneidade nas
formas dos vales nas bacias estudadas, atendendo às suas reduzidas
dimensões, bem como à gênese geológica similar. Predominam os
vales em V, com encostas suaves e pouco pronunciadas e, por vezes,
assimétricas.
Secção C – Número de rápidos, poços e barras. As características
naturais que encontramos destacam-se pelos seus efeitos funcio-
nais, quer em termos de habitats, quer no que diz respeito à regula-
ção de caudais e à gestão de riscos. Aparecem, essencialmente, sob
a forma de rápidos e barras refletindo as características orográficas
associadas às bacias (figuras 3 e 4), de curto comprimento e ele-
vado declive médio. A presença de barras identifica a capacidade
de transporte de caudal sólido, cuja maior ou menor dinâmica se
encontra refletida na fixação ou não de vegetação.

Figuras 3 e 4. Aspetos associados à secção C.


384 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

Secção D – Estruturas artificiais: a presença de estruturas artifi-


cias reflete, diretamente, um grau de modificação de origem antró-
pica e estão, essencialmente, associadas ao aproveitamento da água
ou à melhoria das condições de mobilidade e segurança. Da diver-
sidade do tipo de estruturas previstas no formulário RHS, consta-
ta-se a presença da maioria dos tipos representados por estruturas
de diferentes dimensões (figuras 5 e 6). Destacamos as estruturas
transversais, realçando a importância dos açudes para a atividade
agrícola e produção hidroelétrica, principalmente no rio Selho. A
descrição das tipologias das estruturas está relacionada não só com
a sua dimensão, bem como com o possível impacto das mesmas na
estrutura e funcionalidade do curso de água. Este efeito é evidente
nos açudes e nas pontes, uma vez que, em qualquer um dos casos, a
ocupação do leito é mais relevante para a classificação do que a sua
dimensão.

Figuras 5 e 6 - Aspetos associados à secção D.

Secção E – Características gerais (transecto de 1 metro de lar-


gura): no tocante ao material das margens, os processos naturais
e tradicionais são predominantes, com relevância para a cobertu-
ra de terras (com destaque para o rio Ave), os blocos (essencial-
mente no rio Selho) e os muros de pedra (claramente em núme-
ro superior na ribeira de Nespereira). Importa também salientar
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 385

que os elementos cimento/betão aparecem com frequência, com


exceção do rio Ave. A composição do material das margens é con-
firmada quando identificamos as alterações aí verificadas e que
estão associadas, na maioria, a intervenções para o seu reforço e
re-secionamento no rio Selho e na ribeira de Nespereira. Esta si-
tuação não é tão significativa no rio Ave, já que a maior parte das
margens deste curso de água se apresentam sem alterações. Face
a esta realidade, a erosão das margens é um processo mais signi-
ficativo nos segmentos do Ave do que os restantes cursos de água,
onde a estabilidade das vertentes é maior. Destacamos ainda a
existência de um grande número de barras laterais com vegetação,
o que demonstra a elevada capacidade da hidrodinâmica fluvial,
com particular relevância no rio Ave. No que diz respeito ao leito,
apercebemo-nos de uma variabilidade granulométrica significativa
que vai desde transectos dominados por blocos até areia (figuras 7
e 8), material predominante nas três sub-bacias.

Figuras 7 e 8 - Aspetos associados à secção E.

Realçamos as alterações verificadas no leito, com operações que


levaram ao seu reforço, bem como a presença de açudes e represas,
principalmente no rio Ave, onde também são visíveis ilhas de tama-
nho considerável. Refira-se também a fraca turbulência do escoa-
mento verificado nos cursos de água das três sub-bacias, embora
com maior intensidade na ribeira de Nespereira.
386 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

Seção F e H – Usos do solo e estrutura da vegetação das margens:


A maior parte dos usos do solo previstos no formulário foi observa-
da nas sub-bacias estudadas, nomeadamente quando estendemos a
superfície para um buffer de 50 metros a partir do leito dos cursos
de água. Esta situação reflete a ocupação do solo típica da região
onde a habitação e a indústria se encontra difusa no espaço rural do-
minado por terrenos de cultivo e algumas manchas florestais. Tendo
em conta a natureza específica do habitat nesta região, consideramos
adequado criar sub-classes para o uso SU – Desenvolvimento urbano
ou sub-urbano. Nem em termos de gestão, nem em termos ecológi-
cos, será correto englobar estradas, caminhos, moradias, áreas ur-
banas consolidadas e ruínas numa mesma categoria. Assim, foram
criadas as seguintes sub-categorias: SU1 – Estradas e caminhos; SU2
– Ruínas de edifícios; SU3 – Área urbana de baixa densidade; SU4
– Área urbana de média a alta densidade. Quanto aos tipos de es-
trutura da vegetação foram registados os quatro definidos pelo for-
mulário – sem vegetação, uniforme, simples e complexa-, na quase
totalidade dos transectos realizados (figuras 9 e 10).
Figuras 9 e 10. Aspetos associados à secção F.

Destacamos o predomínio de estruturas mais complexas ao lon-


go do rio Selho, quer nas margens, quer nos taludes dos seus cursos
de água.
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 387

Secção G – Tipos de vegetação no leito: o tipo de vegetação que


é encontrada nos cursos de água poderá refletir não só os habitats
envolventes, como a dinâmica do escoamento. Como consequência
da fixação da vegetação, são criadas condições para a instalação de
comunidades específicas. Muitas das espécies da flora observadas
nos leitos correspondem a vegetação habitual nas áreas das mar-
gens, ou até em áreas afastadas dos cursos de água. Registamos
uma maior diversidade de vegetação ripícola ao longo do rio Selho,
situação inversa à ribeira de Nespereira, onde a presença desta é
mais pobre. Assim o tipo de flora observado constitui um reflexo do
elevado grau de alteração dos habitats, não obstante subsistirem
algumas áreas com um grau de alteração menor e com uma estru-
tura de vegetação natural em melhor estado de conservação, nome-
adamente no rio Ave. É de salientar que cerca de 75% dos registos
correspondem à ausência ou invisibilidade de vegetação no leito, o
que reflete a dificuldade da sua fixação de vegetação resultado de
vários fatores humanos.

Secção I – Perfis das margens: a distribuição do perfil das mar-


gens dos transectos analisados revela grande equilíbrio para as três
sub-bacias, tendo em conta a tipologia natural e artificial/modifica-
do. Esta situação reflete sinais de processos erosivos, que, no caso
dos perfis modificados, foram, entretanto, mitigados, ou geraram
novos riscos causados por erros de conceção dessas artificializa-
ções. O reforço das margens demonstra, de facto, estas diferentes
situações de risco, associadas a possíveis processos de erosão e de
movimentos em massa.

Secção J – Árvores e suas características: a presença de árvores


e a sua dispersão podem significar a estabilização das mar-
gens, ou o risco de obstrução devido à queda das mesmas. Tendo em
conta a frequência das árvores presentes e suas caraterísticas em
388 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

termos biogeográficas, esta poderá assumir grande utilidade no


planeamento das ações de gestão, nomeadamente para identifica-
ção de pontos onde é necessário garantir a limpeza.

Secção L – Dimensões do canal: nesta secção, apresentamos


a síntese das medições efetuadas nos transectos, tendo em conta
cada sub-bacia (figuras 11 e 12).

Figuras 11 e 12. Levantamento das medidas do canal, associadas à secção L.

Secção M – Estruturas de especial interesse: esta secção engloba


um conjunto de estruturas que poderão ser observadas nos cursos
de água e que poderão contribuir para o conhecimento dos mesmos,
nomeadamente no que diz respeito à sua dinâmica e aos potenciais
habitats. Salientamos o reduzido número de estruturas de especial
interesse e sua fraca representatividade, com exceção de grandes
blocos característicos do substrato geológico dominante nesta re-
gião, as rochas granitoides porfiroides.
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 389

Secção P – Características gerais: as características registadas


nesta secção refletem diretamente atividades permanentes ou re-
centes e que poderão influenciar decisivamente aspetos da gestão
dos cursos de água, como o escoamento, qualidade da água, ou
integridade dos habitats. Realçamos situações problemáticas e de
urgente resolução, como é o caso do lixo acumulado, as descargas
e os esgotos. Neste último ponto, destacamos as obras e estrutu-
ras associadas ao Sistema Integrado de Despoluição do Vale do
Ave, que, por vezes, interferem na estabilidade das margens e no
normal escoamento das águas. Foram também consideradas algu-
mas atividades observadas, como a desflorestação, associada à ex-
ploração florestal, ou a gestão da pesca, associada ao povoamento
de espécies piscícolas.
Permitindo quantificar o grau de alteração dos rios devido à in-
tervenção humana., o “Human Modification Score” (HMS) prevê as
consequências de determinadas intervenções realizadas no inte-
rior das estruturas de leitos e margens dos cursos de água (MEDEI-
ROS, 2011). A pontuação obtida no HMS é posteriormente trans-
formada numa escala cujos valores variam entre 0 (pristino) até 5
(modificação severa) mediante o grau de alteração. O “Habitat Qua-
lity Assessment” (HQA) constitui um sistema de pontuação baseado
nas características relevantes para a biodiversidade e é utilizado
para comparar rios do mesmo tipo. A pontuação pode servir de re-
ferência para quantificar a melhoria ou a degradação do habitat,
podendo mesmo servir para antecipar os efeitos de intervenções
previstas (MEDEIROS, 2011). Os dois índices de qualidade - HQA e
HMS – foram aplicados aos transectos amostrados com recurso ao
software Rapid 2.1 disponibilizado pelo Centre for Ecology & Hy-
drology (tabela 1).
390 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

Tabela 1 – Resultados obtidos nos índices HQA e HMS para os transectos analisados.
TRANSECTOS HSM HQA
Ave
001 5 58
002 5 34
003 4 55
004 3 57
Selho
001 5 65
002 5 56
003 5 65
004 5 60
005 5 66
Nespereira
001 5 54
002 5 48
003 4 45
004 5 56

Os valores de HQA obtidos variaram entre 34 e 66, enquanto


os valores de HMS concentram-se entre 3 e 5. Os treze transectos
apresentam elevados índices de HMS refletindo a intensa influência
da ação antrópica na alteração dos referidos habitats ribeirinhos
através da artificialização do leito e a ocupação urbana de ambas
as margens com recurso a muros laterais de reforço. Esta situação
é severa em todo o rio Selho e menos intensa no rio Ave. A diversi-
dade das características é influenciada pela variação natural e ain-
da pela extensão da intervenção humana tanto no canal como nos
terrenos adjacentes. Em relação à avaliação do HQA obtivemos re-
sultados que refletem a progressiva degradação da biodiversidade
e desaparecimento de vegetação existente ao longo do leito, resul-
tado do nível de modificação elevado.
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 391

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em conta os resultados apresentados podemos apontar


os principais problemas que atualmente afetam a qualidade hidro-
morfológica dos transectos analisados no rio Ave, rio Selho e ribeira
de Nespereira, bem como apontar os fatores que estão na sua ori-
gem (Tabela 2).
Tabela 2 – Quadro síntese dos problemas detetados por transecto.
Alterações Degradação da
TRANSECTOS Erosão Assoreamento Lixo Inundação
morfométricas galeria ripícola
Ave
001 (x) (+) (x) (x) (x) (+)
002 (x) (x) (+) (x) (x) (+)
003 (x) (+) (+) (x) (x) (x)
004 (x) (+) (x) (x) (+) (-)
Selho
001 (x) (+) (+) (+) (x) (x)
002 (-) (x) (x) (+) (x) (x)
003 (x) (+) (+) (+) (x) (x)
004 (x) (+) (+) (+) (x) (x)
005 (-) (+) (+) (+) (x) (x)
Nespereira
001 (-) (+) (+) (+) (x) (x)
002 (-) (+) (+) (+) (x) (x)
003 (-) (+) (+) (+) (+) (-)
004 (x) (x) (+) (+) (+) (x)
(-) – Não detetado; (x) – observado; (+) – significativo

Os principais problemas que atualmente afetam a qualidade


hidromorfológica dos transectos analisados no rio Ave, rio Selho e
ribeira de Nespereira, bem como os fatores que estão na sua ori-
gem, refletem os resultados obtidos nos indicadores HSM e HQA,
anteriormente referidos.
392 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

A identificação e localização dos problemas detetados, bem


como as medidas de intervenção propostas, foram elaborados para
cada segmento e representados na cartografia de pormenor e tabe-
las associadas. Apresentamos o exemplo do transecto 1 no rio Ave
(Figuras 13 e 14, Tabela 3).
Figura 13. Localização do transecto 1 no Rio Ave.
Francisco da Silva Costa; António Avelino Batista Vieira; António José Bento Gonçalves 393

Figura 14. Principais problemas detetados no transecto 1 no Rio Ave.

Tabela 3. Medidas de intervenção propostas para o transecto 1 no Rio Ave.


Contra a Limpeza e Correções Recuperação da Contra
TRANSECTOS Segmentos
erosão desassoreamento morfométricas galeria ripícola inundações
Rio Ave
01 X X X X
02 X X X X X
03 X X X X
04 X X X X
05 X X X
001
06 X X X
07 X X X
08 X X X
09 X X X X
10 X X X X
394 AVALIAÇÃO HIDROMORFOLÓGICA EM CURSOS DE ÁGUA

O assoreamento excessivo dos cursos de água, as alterações


morfométricas com relevo no estrangulamento e retificação no ca-
nal e nas margens e a destruição massiva da galeria ripícola são os
processos mais significativos identificados nos transectos analisa-
dos. Após a avaliação hidromorfológica e a definição das medidas
de intervenção, o próximo passo consiste na elaboração de projetos
de intervenção adequados à escala dos problemas identificados, ta-
refa que deverá ser desenvolvido, em parceria, pelos Serviços Téc-
nicos do Município de Guimarães, a APA e o CEGOT.

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Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território e Câmara
Municipal de Guimarães, Guimarães, 74 p.
CAPÍTULO 20 ALBERLENE RIBEIRO DE OLIVEIRA
ANÉZIA MARIA FONSÊCA BARBOSA

O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS


SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

1. INTRODUÇÃO
As organizações sociais presentes na superfície terrestre estão bas-
tante condicionadas às estruturas físicas que a natureza oferece em cada
porção do espaço, determinando, consequentemente, o modelo de or-
ganização socioambiental existente no mundo. Dentro desse contexto,
faz-se necessário analisar os espaços geográficos em suas suas múlti-
plas especificidades, promovendo o entendimento das várias formas de
compreensão do mundo em que vivemos.
É nesse sentido, que o presente artigo apresenta uma
discussão relacionada à nossa prática de atividade de campo
realizada no cotidiano acadêmico na região que compreende o
alto sertão sergipano, analisando, especificamente, os principais
territórios identificados e, subsequente suas formas de paisagens
apresentadas.
Dentre os diversos conceitos usados na ciência geográfica, três
deles foram abordados, a saber: Geossistema, Território e Paisa-
398 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

gem, em uma relação mais próxima de entendimento da Geografia


Física com a Humana. Assim, este artigo tem como objetivo fazer
uma discussão, aplicando o modelo de análise especial denomina-
do GTP, como forma de avaliar os impactos socioambientais exis-
tentes na região que abrange o bioma caatinga, no norte do estado
de Sergipe.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A elaboração metodológica se estabeleceu a partir de um levan-
tamento bibliográfico com base em uma literatura pertinente ao
estudo da pesquisa que auxiliou como embasamento teórico. Este
trabalho está fundamentado na Teoria Geral dos Sistemas, sendo
que metodologicamente utilizou-se o modelo do GTP no intuito de
se ter uma visão holística integralizada, contrapondo-se à análise
descritiva. Nesse sentido, Passos (2011) ressalta:

O geossistema, o território, a paisagem são três maneiras


de se considerar um objeto único que é o espaço que nos
cerca, em uma palavra, o meio ambiente. Estas são três en-
tradas construídas num objeto único, três entradas e, pois,
três finalidades diferentes. Os aproximar sem os confundir
num sistema tripolar permite introduzir a diversidade e de
a flexibilizar num sistema complexo. Estas são três entradas
complementares e interativas (PASSOS, 2011, p.71).

O uso do GTP como método de análise espacial, reflete-se na re-


lação do tripé Geossistema x Território x Paisagem no Alto Sertão
de Sergipe para compreender como funciona o espaço geográfico
em sua totalidade, uma vez que o Geossistema é o tempo do natural,
o território é o tempo histórico, social, econômico e político. E a pai-
sagem é o tempo do cultural, do atual, das diversas temporalidades
da representação (BERTRAND e BERTRAND, 2009).
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 399

A aplicabilidade do modelo sistemático do GTP no Alto Sertão de


Sergipe está relacionada ao detalhamento a seguir: a geomorfologia
é o elemento da natureza mais visível no geossistema, e como tal,
apresenta-se o pediplano sertanejo. Neste foi classificado três geo-
fáceis: relevo colinoso, planície fluviais e vale fluviais. No relevo coli-
noso foram definidos dois geótopos: solos expostos e solos rochosos.
Nas planícies fluviais, destaca-se a planície superior e inferior.
Já nos vales fluviais, foram encontrados dois geótopos: fundos
de vales e corredores verdes. Os territórios identificados foram
os seguintes: áreas de agricultura, pecuária, pastagens; perímetro
irrigado; extrativismo mineral; assentamentos; Unidades de con-
servação. Quanto às paisagens são compreendidas como naturais
e sociais, visto que refletem nos cultivos agrícolas; pastagem; in-
tervenções urbanas no espaço rural; formas de comercialização e
as representações culturais.
Esse modelo metodológico fundado nos três conceitos espaço-
-temporais, a saber: Geossistema, Território e Paisagem podem ser
identificados nas figuras 1 e 2 abordadas segundo a concepção de
Georges Bertrand, adaptada por Souza (2010).

Figura 1 - O sistema GTP – Geossistema - Território - Paisagem, segundo a concepção de Georges Bertrand.

Fonte: BERTRAND, 2002.


400 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

Figura 2 - Representação do sistema GTP, conforme proposta de Georges Bertrand.

Fonte: Adaptado de Souza (2010).

A meta do sistema GTP como modelo metodológico é reapro-


ximar esses três conceitos para analisar como funciona um de-
terminado espaço geográfico em sua totalidade. Trata-se então,
essencialmente, de apreender as interações entre elementos cons-
titutivos diferentes para compreender a interação entre a Paisa-
gem, o Território e o Geossistema (PISSINATI, ARCHELA, 2009).
A trilha metodológica com aporte no modelo GTP possibilita pen-
sar a pesquisa numa relação interativa entre os elementos físicos, so-
cioeconômicos e antrópicos da paisagem, resultantes de combinações
dinâmicas que permanecem em constante processo evolutivo. Portan-
to, o cruzamento dos sistemas naturais (geomorfologia, solos, geolo-
gia, clima, vegetação, altimetria) e dos sistemas antrópicos é que vai
identificar a fragilidade e potencialidade no espaço geográfico.
As observações in loco foram realizadas entre 2016 e 2017, nos
municípios do Alto Sertão de Sergipe. Baseou-se as prováveis de-
gradações ambientais a partir do uso e ocupação do solo. Como
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 401

apoio ao trabalho de campo foi utilizado o GPS (Sistema de Posicio-


namento Global), no qual foram georreferenciados dez pontos no
Alto Sertão de Sergipe, especificamente nas áreas de maior degra-
dação ambiental e registrados em fotografias. Estes pontos foram
utilizados para análise espacial, visando correlacionar as informa-
ções extraídas do Atlas Digital de Sergipe com os dados obtidos a
partir do trabalho de campo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Analisar o conjunto físico dos espaços naturais requer dos pes-
quisadores uma apuração mais específica dos sistemas de organi-
zações da superfície terrestre, dessa maneira, quando optamos por
aplicar o modelo do GTP como metodologia de avaliação espacial,
faz-se necessária uma leitura mais aprofundada dos fatos e fatores
que levam à disposição dos espaços naturalmente construídos e so-
cialmente habitados.
Assim, quando destacamos na região que compreende o Alto
Sertão Sergipano, consideramos que a Geomorfologia tem servido
como base principal para análise do processo de formação do rele-
vo, o qual dá condições para compreendermos as diversas transfor-
mações que os mesmos se sucedem ao longo de milhões de anos.
Segundo Barbosa (2013), a natureza é o componente mais dis-
putado para aqueles que se organizam em sociedade, pois é dela
que todos os nossos sustentos serão retirados e depois transforma-
dos. Para isso, ao fazer um recorte espacial e temporal de algumas
regiões do planeta, leva-nos a estudar de maneira mais específica
os impactos positivos e negativos que cada localidade apresenta.
Rodriguez (1994) considera que o estudo do espaço geográfico
usado hodiernamente em uma perspectiva holística, pode contri-
buir de forma efetiva para compreendê-lo de modo sistêmico, tendo
a paisagem como o elemento mais próximo da nossa vida cotidiana.
402 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

Nessa perspectiva, podemos destacar que a sociedade durante todo


o processo de aculturação espacial tem promovido grandes modifica-
ções nos espaços naturais que contribuem efetivamente para mode-
lagem do relevo, sobretudo aquelas que estão próximas das áreas de
povoamento mais intenso, criando diariamente novas adaptações.
Para Camargo (2008), essas novas adaptações podem ser ava-
liadas como as técnicas que a natureza recebe ao longo dos perío-
dos históricos, pois a cada momento a sociedade vai usando o meio
natural de maneira diferenciada, tendo como base para a reprodu-
ção a técnica cultural-econômica, tal modelo de produção recebe o
nome de geometrias geográficas.
Por meio dessas geometrias geográficas identificamos as fragili-
dades dos ambientes naturais, bem como as intervenções humanas
que marcam todos os complexos da natureza existentes ao seu re-
dor. De acordo com Ross (2006) essa intensa participação do ho-
mem na exploração da natureza com seus mais variados recursos
tecnológicos gera satisfação de riqueza, conforto, prazer e lazer.
Dentro dessa perspectiva, analisar o bioma brasileiro caatin-
ga como meio biótico para reprodução da sociedade no estado de
Sergipe, exige que avaliemos suas condições físicas, como sendo
um dos fatores mais adversos para a grande maioria da popula-
ção local. Portanto, o presente artigo busca demonstrar, através do
modelo geossitêmico elaborado por Bertrand (1971), como estão
organizados em cada nível de unidades de paisagem, os processos
interativos entre a sociedade X natureza, como forma de ordena-
mento territorial ininterrupto.
Ademais, a delimitação do recorte espacial é fundamental para
identificarmos e compreendermos as ações socioambientais ocor-
ridas no bioma caatinga, representada aqui pelos municípios que
compõem o território do Alto Sertão Sergipano, são eles: Canindé de
São Francisco; Gararu; Monte Alegre de Sergipe; Nossa Senhora da
Glória; Nossa Senhora de Lourdes; Poço Redondo e Porto da Folha.
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 403

Para melhor organização do procedimento usado para a análise


dos dados coletados, elaboramos um organograma (figura 3) que
apresenta os três sistemas complexos de integração que dão supor-
te de entendimento ao GTP, segundo Bertrand (1971).
Com base na figura 3, a seguir, foi possível classificar os seguintes
sistemas: o Geossistema – Pediplano sertanejo; Geofácies – Relevo
colinoso, Terraços fluviais, Vales fluviais; Geótopos – solos expostos
e rochosos, planície superior e inferior, córregos e corredores ver-
des. Os Territórios – agrícola, pecuária, mineração, comunidades,
povoados e áreas de reservas. As Paisagens – a relação entre o Na-
tural e o Social.
Figura 3 - Organograma do modelo de abordagem sistêmico – GTP
404 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

3.1. Geossistema Pediplano Sertanejo

Formado pela unidade geomorfológica denominada de Baixo


Planalto Pré-Litorâneo (FRANÇA, et al. 2007), engloba uma gran-
de área de relevo dissecados pelas mais diversas interferências dos
intemperismos físico e químico que marcam profundamente a pai-
sagem local. O domínio climático da região favorece essas interven-
ções nos ambientes naturais que dão para a paisagem esse aspecto
de cor cinzenta tão comum na caatinga brasileira nos meses de bai-
xos índices pluviométricos (figura 4).

Figura 4 - Vista do Pediplano Sertanejo no município de Gararu/SE.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M.F, 2016.

Geralmente essa condição ocorre temporalmente, marcando,


sobretudo, os períodos que compreendem as estações do ano, pri-
mavera, verão e outono. O clima semiárido e subumido-seco, per-
manecem por uma constante na maior época do ano nesta porção
do território sergipano, propiciando o desgaste natural dos solos,
além de expor uma grande quantidade de rochas sobre a superfície
marcando de maneira ímpar essas localidades (figura 5).
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 405

Figura 5 - Rochas expostas sob os solos no município de Poço Redondo/SE.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.

De acordo com a figura 4, a vegetação espaça e rasteira favorece


o uso desses espaços para o desenvolvimento de atividades de pe-
cuária extensiva, praticamente em todos os municípios visitados,
uma parcela significativa da população tem como principal meio de
sobrevivência a agricultura e a pecuária, sem uso de equipamentos
mais sofisticados. Esses sertanejos vivem dentro de um limite ex-
tremo de reprodução do capital, sendo este, na maioria dos casos, a
principal forma de manutenção das suas famílias.
Além disso, o pisoteio dos animais no solo leva a uma compacta-
ção do mesmo mais rapidamente, provocando a impermeabilidade
e deixando essas áreas com grande escoamento superficial, provo-
cando o surgimento de sulcos e ravinas, agravando as condições
naturais já adversas pelo clima local.
Outro ponto relevante para considerar dentro dessa discussão,
diz respeito ao que é apresentado na figura 5, os solos com mais ro-
chas expostas ficam inviáveis para a realização dos plantios de lavou-
406 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

ras. No entanto, os pequenos produtores rurais recebem, nos meses


mais críticos de seca, auxílio monetário do Governo Federal, para que
amenizem as necessidades enfrentadas nos meses de estiagens.
Cabe destacar que mesmo o território do alto sertão sergipano,
dos sete municípios localizados nessa porção do espaço, cinco são
banhados pelo rio São Francisco, mesmo assim, não existe uma po-
lítica mais efetiva de uso intensivo das águas do rio, o que acaba
prejudicando muitos produtores rurais na manutenção de suas la-
vouras nos períodos da seca.
Os programas de abastecimento de água que assistem à po-
pulação dessas localidades, são todos provenientes das políticas
públicas do Governo Federal oferecidas para as cidades do sertão
nordestino, tais como: a utilização de carros pipas e a construção
de cisternas nas residências dos sertanejos, sendo essas uma das
únicas formas de aquisição de água na maior parte do ano.

3.2. Geofáceis do Alto Sertão

Quando analisamos o espaço geográfico a partir de recortes me-


nores dentro da escala cartográfica, no caso dos geossistemas che-
gamos à unidade de paisagem denominada por geofáceis, que se
destaca por ser a porção intermediária na visão materializada da
paisagem.

3.2.1 Relevo Colinoso

Essa denominação geomorfológica é uma das mais marcantes


formas de relevo encontradas por todo o Alto Sertão Sergipano, se-
gundo Guerra e Guerra (2003) constituem pequenas elevações do
relevo com declives suaves, isoladas umas das outras com baixas
altitudes, na maioria são provenientes de processos erosivos suces-
sivos (figura 6).
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 407

Figura 6 - Aspecto do relevo colinoso.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.

De acordo com a SEPLANTEC (2014), nesse conjunto paisagís-


tico, destacam-se também algumas elevações residuais represen-
tadas pelas serras Tabanga e Melancia (Gararu) e Negra (Poço Re-
dondo), esta última localizada no limite entre os estados da Bahia e
Sergipe, considerada a maior elevação localizada no Estado.
Com base na figura 6, é possível observar que várias áreas estão
destinando seu uso para a criação de animais de modo extensivo,
por conseguinte, cabe destacar que o plantio de pastos se conso-
lida como padrão e modelo caraterístico das localidades visitadas,
espacialmente na zona rural onde os pequenos pecuaristas deixam
vários lotes de glebas para tal finalidade.

3.2.2 Terraços Fluviais

Segundo Barbosa (2013), os terraços fluviais podem ser carac-


terizados como,

Planos horizontais ou quase horizontais de extensões varia-


das, tendo como limite, de um lado, terrenos mais elevados
e formações escarpadas. É relevante destacar que o trabalho
erosivo feito nos terraços fluviais provoca a modelagem do
408 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

relevo que, quando não protegido devidamente com a for-


mação vegetal, leva aos desgastes mais rápidos desse con-
junto morfológico (BARBOSA, 2013, p.134).

Para Guerra e Guerra (2003), os terraços fluviais também são


representações das superfícies horizontais ou levemente inclina-
das, resultantes da deposição de sedimentos modelados a partir
das ações erosivas fluviais. A figura 7, a seguir, apresenta um perfil
dos terraços fluviais esboçados durante a visita ao campo de pes-
quisa, como forma de compreensão dos modos de organização da
sociedade local, especialmente a do município de Nossa Senhora de
Lourdes – SE.
Figura 7 - Perfil dos Terraços Fluviais em Nossa Senhora de Lourdes – SE.

Organização e Elaboração: Anézia Maria Fonsêca Barbosa, 2016.

O município de Nossa Senhora de Lourdes, em especial, dentre


todos os outros que compõem o Alto Sertão, é o que apresenta me-
nor extensão territorial fazendo limite com o rio São Francisco, para
os moradores entrevistados, esse é um dos motivos relacionados à
pequena participação desse município, com a utilização das águas
do rio. No entanto, isso não é resposta convincente, já que, em visi-
ta aos demais órgãos públicos localizados em todos os municípios,
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 409

seus gestores destacaram que o uso mais específico das águas do


rio em projetos de irrigação, ocorre com implantação de projetos
assinados pelo governo Federal, em conjunto com o Estadual.
Dentro desse contexto, essa porção do espaço geográfico ana-
lisado apresenta mais de 70% do seu território localizado sob a
bacia do rio São Francisco, sendo uma das maiores bacias hidro-
gráficas do estado de Sergipe. De acordo com França et al. (2007), a
bacia do São Francisco nessa região pertence ao domínio hidroge-
ológico do Cristalino e Metassedimentos/Metavulcanitos (Aquífero
Fissural), que se caracterizam da seguinte forma:

A ocorrência de água subterrânea é condicionada por uma


porosidade representada por fraturas e fendas nas rochas, o
que se traduz por reservatórios descontínuos e de pequena
extensão. Neste contexto, em geral, as vazões produzidas nos
poços são pequenas e a água, em função da falta de circulação,
dos efeitos do clima semi-árido e do tipo de rocha é, na maior
parte das vezes, salinizada (FRANÇA et al. 2007, p. 84).

Essas condições definem um potencial hidrogeológico baixo


para uso mais intensivo das populações ribeirinhas e aquelas que
moram mais distantes do rio. No entanto, o que se observou du-
rante o campo é que mesmo morando na margem do rio, diversas
famílias passam dias sem água em suas residências, pois os recep-
tores de água da Companhia de Saneamento do Estado de Sergi-
pe (DESO), que ficam nestas localidades passam vários meses sem
funcionar, gerando uma falta de água quase que contínua nos po-
voados desses municípios, necessitando do atendimento feito por
carros-pipas.
410 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

3.2.3 Vales Fluviais

Para Guerra e Guerra (2003), os vales são grandes corredores ou


depressões que percorrem vários quilômetros de extensão sobre a
superfície terrestre. São denominados de várias formas, sendo que,
neste caso aqui analisado, estes vales são chamados vales de ero-
são, escavados por águas fluviais.
Diversos vales são encontrados nessa região, tanto dos rios prin-
cipais como dos seus afluentes. Na área que compreende o bioma
caatinga, o clima é um fator determinante no processo de formação
e manutenção física do espaço, uns dos fatores climáticos mais ob-
servados nessa área é o intemperismo, que consiste no processo de
modelagem e organização do espaço físico-social da área.

3.3. Geótopos do Alto Sertão

Os Geótopos são denominações dadas às menores porções es-


calares do espaço existente na superfície terrestre. Nesse sentido,
é nas áreas dos geótopos que encontramos a maior participação da
sociedade, enquanto produtora do seu espaço e modeladora da na-
tureza conforme suas necessidades.
Assim, nessa sequência de análise destacaremos os próximos
complexos de organização natural e usas influências na distribui-
ção das atividades humanas nos municípios pesquisados.

3.3.1 Solos rochosos e expostos

A composição dos solos rochosos e expostos constitui aspectos


litológicos comuns no Alto Sertão, as condições climáticas são impor-
tantes na definição da gênese desses conjuntos de solos, que se ca-
racterizam por serem hidromóficos (com pouca presença de água),
o que leva ao surgimento de rachaduras ao longo da sua extensão.
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 411

Denominados de Neossolos Litólicos (RL) possuem horizonte


pouco desenvolvido, por isso são considerados rasos, o que au-
menta mais ainda a exposição das rochas. Localizam-se em regiões
semiáridas e na sua grande maioria são poucos utilizados para o
desenvolvimento da agricultura (EMBRAPA, 2010).
Em Sergipe, as principais atividades econômicas dessas áreas
estão ligadas à extração de rochas, tendo com destino servirem de
paralelepípedos para calçamento das ruas de praticamente todos
os municípios sergipanos. A figura 8 apresenta bem esse modelo
de extração, muito recorrente na zona rural no município de Nossa
Senhora de Lourdes.

Figura 8 - Neossolos Litólicos em Nossa Senhora de Lourdes-SE.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.

Como apresentado na figura 8, muitos proprietários de terrenos


destinam parte de suas glebas para montarem garimpos de extra-
412 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

ção dessas rochas, prática essa, observada em quase todas as locali-


dades visitadas durante a pesquisa. Um aspecto que chamou nossa
atenção foi o fato de que a grande maioria dos garimpos não pos-
suem nenhuma forma de Legislação Ambiental, o que torna ainda
mais vulnerável o desenvolvimento dessas atividades, além de não
terem aparatos de segurança para os trabalhadores que são geral-
mente familiares e amigos (figura 9).
Figura 9 - Garimpo em Nossa Senhora de Lourdes.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.

Na figura 9, é possível observar as condições a que são expostas


as pessoas que vivem desse tipo de mineração no município. Nas
mineradoras visitadas encontramos muitos jovens menores de ida-
de trabalhando de forma desumana, cumprindo horas de trabalho
sem uso de acessórios de proteção, necessários para evitar aciden-
tes, os quais são frequentes na região, além dos baixos valores de
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 413

salários pagos para esses trabalhadores, aumentando a vulnerabi-


lidade diária vivida por esses garimpeiros.

3.3.2 Terraços Fluviais Inferior e Superior

Esses geótopos são os mais importantes de análises, quando se


trata da escala cartográfica do geofáceis Terraços Fluviais, pois é
neles que o adensamento populacional é mais perceptível e sofrem
fortes impactos de organização da vida em sociedade.
Com relação aos sete municípios pesquisados, aqueles que se
encontram na margem do rio São Francisco, são justamente os que
ficam mais fáceis de visualização das ocupações nos Terraços In-
feriores e Superiores. Segundo Casseti (2005), nessas formações
geomorfológicas, as ações dos processos naturais ligados às condi-
ções climáticas do local, geralmente adversas, são base para o mo-
delo de organização das camadas sociais, o que favorece a concen-
tração nas proximidades dos leitos dos rios (figura 10).

Figura 10 - Visão panorâmica de Gararu.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.


414 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

Como pode ser observado na figura 10, a margem inferior dos


terraços fluviais, acaba concentrando o adensamento populacio-
nal de forma mais abundante, o mesmo modelo apresentado em
todas as regiões que estão na margem dos grandes rios, sobretudo,
aqueles perenes, que, para a sociedade local, constituem o meio de
manutenção de vida na área sertaneja, por poderem usar as águas
para consumo no dia a dia em suas mais diversas atividades.
Destarte, os territórios de produção econômica das populações
ribeirinhas na área pesquisada, especialmente àqueles ligados à
agropecuária, ficam em sua maioria em áreas mais afastadas da
zona urbana, que sofrem mais ainda com a falta de água para conti-
nuidade das atividades econômicas.

3.3.3 Córregos e Corredores Verdes

As regiões ambientais que abrangem esses dois geotópos em


questão estão geralmente associadas às formações das colinas, pre-
sentes praticamente por toda a área de pesquisa.
A região Nordeste, especialmente nessa área que compreende o
sertão, as ações climáticas, associadas ao forte intemperismo físico
e químico presentes, favorecem substancialmente as dinâmicas do
relevo, ao longo de milhares de anos na modelagem da paisagem.
Conforme pode-se observar nas figuras 11 e 12, os córregos da
região no período de estiagem pluviométricas, encontram-se com-
pletamente secos, mas a força da natureza resiste as mais diversas
adversidades, como identificado na figura 12, onde a lâmina d’água
proveniente do lençol freático fica exposta, contribuindo para a ma-
nutenção da cor verde das poucas árvores que estão no seu entorno.
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 415

Figura 11 - Leito de córregos no período da seca.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.

Figura 12 - Lâmina d’água.

Fonte: OLIVEIRA, A. R de; BARBOSA, A. M. F, 2016.


416 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

Outro fator relevante a ser destacado nesse contexto, é que os


animais criados de modo extensivo nas propriedades localizadas
na zona rural desses municípios, acabam ingerindo essa pouca
água que fica na superfície, após horas de caminhada pelo pasto.
Ademais, as condições apresentadas ao longo deste artigo, fo-
ram fundamentais para entendermos que as formações dos Terri-
tórios e das Paisagens na região que compreendem o Alto Sertão
Sergipano é peculiar ao modo como o meio físico condiciona as or-
ganizações da sociedade no processo de reprodução dos meios de
vida em terras sertanejas no Nordeste brasileiro.
Assim, território passa a ser entendido como um dos temas
mais complexos na análise dos conceitos-chave da Geografia en-
quanto ciência. Por serem construídos e desconstruídos nas dife-
rentes escalas temporais, os territórios podem ter o caráter per-
manente, mas também podem ter existência periódica ou cíclica,
transformando-se em elemento da natureza espacial criado pela
sociedade cujo objetivo é lutar para conquistá-lo ou protegê-lo
(HAESBAERT, 2006).
É nessa condição que o conceito de território, passa a ser usado
de uma maneira que reforça seu significado na sociedade atual,
como área que possui característica que a diferencie uma das outras
e dão condições de delimitá-las em seus mais diversos modelos de
organização. Para o presente artigo, o território foi apresentado
como espaço caracterizado por suas especificidades econômicas
que são bem peculiares na região do Alto Sertão Sergipano, tais
como: áreas agrícolas, de pecuária, da mineração, de comunidades,
dos povoados e, das reservas extrativistas e indígenas.
No tocante à paisagem, entende-se que é resultado da combina-
ção dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, biológicos e
antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem
da paisagem um conjunto único e indissociável, em perpétua evolu-
ção (BERTRAND, 2004, p. 141).
Alberlene Ribeiro de Oliveira; Anézia Maria Fonsêca Barbosa 417

Nesse sentido, Monteiro (2001) define paisagem no nível de re-


solução para a análise da “paisagem” e sob o enfoque da organi-
zação sistêmica, como um sistema aberto, uma unidade de análise
geográfica global. Além disso, o autor ressalta que,

[...] a paisagem é vista de um modo bem mais dinâmico por-


quanto não ignora as relações, seus feed-backs e interações,
de modo a configurar um verdadeiro “sistema” onde as áreas
pertinentes a ela estão muito além das formas e aparências
assumidas pelos elementos, sendo capazes, até mesmo de
provocar importantes reações em áreas distantes (MONTEI-
RO, 2001, p. 97).

Por seu turno, Alzate (2011, p. 241-242) confirma que a paisa-


gem é como,

Un sistema visual holístico, ya que por medio de la entrada y


salida de energía, energía lumínica como imput, e informaci-
ón visual como output, se realiza un processo de intecambio,
que estabiliza el sistema. La estabilidad de un sistema es una
propiedad holística, entendida como el resultado de una in-
teracción entre las partes.

Nesse contexto, a paisagem atual do Alto Sertão de Sergipe reve-


la que ocorreram alterações de intervenções sociais no decorrer da
história. Por sua vez, o desmatamento do bioma caatinga tem sua
origem na expansão das atividades econômicas e com sua rápida
degradação ambiental (OLIVEIRA, 2017).
A paisagem se manifesta e se materializa no espaço, ao mesmo
tempo em que também lhe confere vida/dinamismo, por isso o fe-
nômeno se torna objeto de nossa percepção, uma vez que houve o
despertar da curiosidade e das tentativas de compreensão. À medi-
da que avançam a técnica e a informatização, o homem transforma
418 O SISTEMA GTP APLICADO AO ESTUDO SOBRE AS DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS DO ALTO SERTÃO DE SERGIPE

o espaço e, por conseguinte, a Paisagem. Assim, a paisagem não é


estática, porquanto se encontra em movimento, em um processo
interativo entre os elementos naturais e humanos.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo realizou uma análise dos sete municípios que es-
tão na região que compreende o Alto Sertão Sergipano, a partir da
aplicação do modelo GTP como forma de discussão das organiza-
ções socioambientais dos mais diversos espaços geográficos. Nesse
sentido, o que mais chamou atenção dos pesquisadores, foi o forte
impacto dos elementos físicos determinando os formatos dos mais
variados ordenamentos dos territórios encontrados na área.
É possível concluir que as disposições das sociedades existen-
tes na região estudada são totalmente influenciadas pelo clima,
uma vez que este foi o fator mais citados por todos, como sendo
a sua principal preocupação na continuidade de vida em todas as
localidades. Os processos socioeconômicos nesses municípios são
marcados fortemente na paisagem local, o que configura uma po-
pulação resistente, mesmo enfrentando grandes dificuldades, as
adversidades que a natureza lhe impõe para continuidade da vida
em sociedade.

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ANTÓNIO AVELINO BATISTA VIEIRA
CAPÍTULO 21 FRANCISCO DA SILVA COSTA
ANTÓNIO JOSÉ BENTO GONÇALVES

AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO


DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

1. INTRODUÇÃO

No âmbito da candidatura do Município de Guimarães ao galar-


dão de Capital Verde Europeia, desenvolvemos uma avaliação do
estado e evolução dos espaços verdes e superfícies aquáticas exis-
tentes no território municipal, correspondente ao indicador “Áreas
urbanas verdes incorporando uso sustentável do solo” (uma das 12
áreas de indicadores de referência do referido galardão), identifi-
cando as iniciativas desenvolvidas no passado recente e apresen-
tando propostas para a promoção ambiental do território munici-
pal no sentido do aumento da qualidade de vida urbana.
O território do município de Guimarães e a própria cidade ob-
servaram, ao longo dos tempos, uma evolução apoiada na inter-
-relação entre atividades humanas e a natureza. Nesta, os espa-
ços verdes e cursos de água cedo se constituíram como recursos
fundamentais, nomeadamente para o desenvolvimento das ativi-
dades agrícolas, silvo-pastoris e indústrias tradicionais, mas de-
422 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

sempenhando também um papel relevante como fator de lazer e


bem-estar, religioso e cultural.
A realidade do território em análise é caraterizada por uma sig-
nificativa dispersão dos espaços edificados, correspondendo a um
padrão de ocupação do espaço caraterístico do noroeste de Portugal,
favorecido pelos condicionalismos histórico-sociais e das caraterís-
ticas físicas e do clima. Consequentemente, a paisagem apresenta-se
bastante fragmentada, observando-se um predomínio dos padrões
de urbanização e industrialização difusos, onde a plurifuncionalida-
de do uso do solo se interconecta (BENTO-GONÇALVES et al., 2011).
Desde o início do século XXI o executivo municipal tem vindo a
desenvolver estratégias conducentes à valorização e promoção am-
biental do município, pelo que a candidatura a este galardão veio
reforçar o objetivo de atingir a sustentabilidade ambiental, acom-
panhada de desenvolvimento e aumento da qualidade de vida dos
munícipes.

2. ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES

O Município de Guimarães localiza-se no noroeste de Portugal


continental, integrando, do ponto de vista administrativo, o distrito
de Braga e a NUT III AVE, encontrando-se dividido em 48 freguesias
(figura 1). O seu território ocupa uma área de 240,95 Km2, sendo
limitado a norte, noroeste e sul por áreas mais elevadas, como a
Falperra, o Sameiro e a Penha, correspondendo esta última ao pon-
to mais elevado do município, com 613 metros de altitude. O clima
presente é mediterrâneo, mas com significativa influência atlântica,
traduzindo-se num clima de temperaturas amenas, com pequenas
amplitudes térmicas e forte pluviosidade média.
Este território era habitado por 158.124 indivíduos, segundo os
Censos de 2011, dos quais 76.774 do sexo masculino e 81.350 do
sexo feminino.
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 423
TULO 21

Figura 1 - Localização do Município de Guimarães

3. A EVOLUÇÃO DAS ÁREAS VERDES E AZUIS NO MUNICÍPIO DE


GUIMARÃES
3.1. Perspetiva histórica recente: a evolução de um território multifacetado
e plurifuncional

As últimas três décadas foram marcantes para o Município de


Guimarães, que desenvolveu um conjunto de iniciativas enquadra-
das numa política de revitalização e promoção do território a nível
económico, social e ambiental, com efeitos e resultados extrema-
mente positivos.
A reabilitação do centro histórico da cidade, a partir de 1985,
proporcionou a recuperação de um património histórico e cultural
de inestimável valor e do seu edificado, em acentuado estado de
424 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

degradação, e dos espaços e equipamentos públicos, bem como a


melhoria das condições de habitabilidade e, consequente, a manu-
tenção da população que aí residia. Em consequência do bem-suce-
dido processo de reabilitação urbana, o Centro Histórico de Guima-
rães foi classificado como Património Cultural da Humanidade, pela
UNESCO, em 2001 (figura 2).
Figura 2 - Centro Histórico de Guimarães, Património Cultural da Humanidade (UNESCO)

Fonte: Câmara Municipal de Guimarães

A crescente procura turística e cultural ocorrida fomentou um


investimento em mais medidas de regeneração urbana no senti-
do da valorização patrimonial e do incremento de um melhor am-
biente urbano, suportado na qualificação do espaço público e sua
revitalização ambiental, tendo-se desenvolvido diversos projetos
emblemáticos.
O Centro Cultural de Vila Flor (instalado no Palácio Vila Flor, edi-
fício do século XVIII) foi um projeto de recuperação e valorização de
património histórico construído, com o objetivo principal de servir
para a apresentação de espetáculos de índole cultural. Integrado
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 425
TULO 21

no conjunto estão os jardins do Palácio, que foram reabilitados e


foram abertos ao público, sendo um espaço de elevada qualidade
paisagística e ambiental, no interior da cidade (Figuras 3 e 4).

Figuras 3 e 4 - Palácio de Vila Flor e seus jardins.

Outro projeto de relevo foi o parque da Cidade Desportiva. Cor-


responde a uma área verde implementada em terrenos de Reserva
Ecológica Nacional e de Reserva Agrícola Nacional, ocupando uma
área total de 15 hectares. Está dotada de extensa área relvada e
também de uma significativa estrutura arbórea, integrando tam-
bém o complexo de piscinas “Scorpio” e o complexo desportivo “Gé-
meos Castro”, bem como estruturas de apoio à prática desportiva e
ao lazer (parques infantis) (Figura 5).

Figura 5 – Parque da cidade desportiva

Fonte: Câmara Municipal de Guimarães


426 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

O Parque da Cidade (Figuras 6 e 7), construído entre 2004 e


2005, constitui o maior espaço verde público no perímetro urbano
de Guimarães, ocupando uma área total de cerca de 9,7 hectares
(97352 m²). Constitui um elemento fundamental da estrutura ver-
de urbana, integrando e mantendo elementos da função agrícola
anteriormente dominante naquela área: campos de milho, prados e
vinha de enforcado, aos quais se associam os elementos de recreio
e lazer e de valorização ambiental.

Figuras 6 e 7 – Perspectivas do Parque da Cidade.

Fonte: Câmara Municipal de Guimarães

Outro espaço verde de valor ambiental incalculável é a serra da


Penha (figura 8), nomeadamente o espaço da Irmandade da Pe-
nha, que nas últimas décadas foi alvo de intervenções no sentido
de valorizar o seu potencial paisagístico e biodiversidade, a par da
instalação de infraestruturas e equipamentos de apoio ao usufruto
daquele espaço.
As estratégias de valorização do património biológico passaram
pela eliminação progressiva das espécies não autóctones (especial-
mente do Eucaliptus globulus e Pinus pinaster) e sua substituição
por espécies arbóreas autóctones (em particular os Quercus fagi-
nea, Quercus robur e Castanea sativa), mas também por uma ação
contínua de limpeza e manutenção do espaço florestal, providen-
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 427
TULO 21

ciando condições de menor vulnerabilidade e maior resiliência face


aos incêndios florestais, problema extremamente grave em Portu-
gal e especialmente no noroeste de Portugal. Estas medidas per-
mitiram a manutenção de uma área verde contínua de cerca de 60
hectares, maioritariamente composta de espécies autóctones, mas
também com um conjunto importante de espécies exóticas (não in-
vasoras), algumas remanescentes do início da florestação da serra,
nos finais do século XVIII e século XIX.

Figura 8 - Vista aérea da serra da Penha

Outro grande projeto desenvolvido pelo Município de Guima-


rães, com grande impacto na revitalização urbana e na promoção
de um espaço urbano sustentável (incluindo áreas verdes) foi o
evento Capital Europeia da Cultura 2012, que projetou a cidade a
nível nacional e também internacional. No âmbito deste evento,
para além da promoção de iniciativas culturais que animaram a ci-
dade durante um ano, foram implementadas várias intervenções no
tecido urbano:
428 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

- a intervenção no Monte Latito, que abrangeu toda a área en-


volvente o castelo de Guimarães e o Paço dos Duques (Colina
Sagrada), estendendo-se ao Jardim do Carmo, teve como ob-
jetivo a reabilitação deste espaço e sua maior integração na
cidade, através da valorização das componentes patrimoniais
nele existentes e reabilitação dos jardins, espécies arbóreas e
mobiliário urbano.
- a intervenção na Rua de Santo António, Largo do Toural e Ala-
meda de São Dâmaso, foi uma iniciativa de grande impacto,
pois direcionou-se para uma área emblemática da cidade, tendo
como objetivo o beneficiamento infraestrutural (por exemplo im-
plementando áreas com piso permeável), a manutenção e valori-
zação dos elementos arbóreos existentes, procurando promover
maiores condições de bem-estar e usufruto daquele espaço, no-
meadamente pela valorização da circulação pedonal.

Conseguiu-se, pois, beneficiar a preservação e valorização de es-


paços verdes, que se encontram enquadrados na cidade, favorecer
a sustentabilidade e a biodiversidade do sistema natural, criar cor-
redores ecológicos fluviais e aumentar o grau de utilização pública
destas áreas naturais, criando lugares de interface entre as vivên-
cias sociais e os espaços ribeirinhos.
Ainda no âmbito da Capital Europeia da Cultura 2012 foi imple-
mentado o Laboratório da Paisagem (figura 9), que constitui um
espaço que tenta consagrar a promoção do conhecimento e a inova-
ção, a investigação e a divulgação científica, contribuindo para uma
ação integrada e participada das políticas ambientais e do desen-
volvimento sustentável.
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 429
TULO 21

Figura 9 - Laboratório da Paisagem

Fonte: Câmara Municipal de Guimarães

A um nível estrutural, e enquadrado num conjunto de medidas de


âmbito nacional ou regional, foi importante o processo de eliminação
e encerramento de lixeiras municipais e implementação de adequa-
das infraestruturas de gestão de resíduos, e que se traduziu no Vale
do Ave (território em que se integra o Município de Guimarães) na
criação do Sistema Intermunicipal de Resíduos do Vale do Ave (SIR-
VA), que desde 1995 é responsável pela gestão dos resíduos, promo-
vendo a reciclagem orgânica, a reciclagem multimaterial e confina-
mento final dos resíduos sólidos urbanos (AGENDA 21, 2004).
Outra medida estrutural correspondeu à implementação do SID-
VA, o Sistema Integrado de Despoluição do Vale do Ave, constituído
no início dos anos 90. Este sistema foi integrado no Sistema Multi-
municipal de Abastecimento de Água e Saneamento do Vale do Ave,
criado em 2002 para abranger toda a área da bacia hidrográfica do
Rio Ave.
430 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

3.2. Os espaços verdes e azuis na atualidade e as medidas recen-


tes para a sua promoção

A realidade atual da cidade de Guimarães e do seu município


decorre, portanto, das dinâmicas passadas e das formas tradicio-
nais de ocupação do território, que tiveram, efetivamente, reflexo
na própria disseminação dos espaços verdes de uso público.
Como referido inicialmente, observa-se um predomínio dos pa-
drões de urbanização e industrialização difusos, caraterizados pela
interconexão da plurifuncionalidade do uso do solo (BENTO-GON-
ÇALVES; COSTA, 2002), a que já Orlando Ribeiro (1945) chamava
de promíscuo. Este padrão de ocupação reflete-se na distribuição
dos espaços verdes no município, que nos aparecem também bas-
tante fragmentados e frequentemente descontínuos (Figura 10).
Contudo, a organização e ocupação do espaço refletem também
uma influência importante do relevo e da hidrografia, observando-
-se uma ocupação preferencial dos fundos dos vales dos principais
rios por parte das atividades industriais, urbanas e agrícolas, sendo
as áreas mais elevadas e vertentes mais declivosas ocupadas por
floresta ou matos, que se estende por cerca de 45% da área do mu-
nicípio (tabela 1).

Tabela 1. Distribuição dos usos do solo no município de Guimarães (COS’2007)


Município Perímetro Urbano
Uso do solo km2 % km2 %
Territórios artificializados 60,36 25,05 10,99 65,55
Áreas agrícolas e agro-florestais 72,90 30,25 3,84 22,90
Florestas e meios naturais e semi-naturais 106,91 44,37 1,94 11,55
Corpos de água 0,79 0,33 0 0
Total 240,96 100 16,77 100
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 431
TULO 21

Figura 10. Uso do solo no município de Guimarães

Fonte: Carta de Ocupação do Solo, IGP (2007)


432 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

Estas áreas florestais configuram-se como uma espécie de “cin-


turão verde”, que envolve a cidade de Guimarães e demais núcleos
populacionais de maior dimensão. No entanto, trata-se majoritaria-
mente de áreas de povoamentos florestais e, por isso, condiciona-
das pela dinâmica inerente à atividade florestal de produção.
Complementarmente, e em intrínseca conectividade e continui-
dade, identificam-se as áreas agrícolas e agroflorestais, associadas
às atividades primárias, ainda muito expressivas, que ocupam mais
de 30% do território do município.
Relativamente aos espaços construídos (territórios artificializa-
dos), distribuem-se de forma dispersa por todo o território, ocu-
pando cerca de 25%, embora com uma concentração mais signifi-
cativa no perímetro urbano de Guimarães, onde ocupam mais de
65% da área total.
É, porém, neste perímetro urbano (inner city) que se encontram con-
centrados a maioria dos espaços verdes públicos urbanos (figura 11).

Figura 11. Áreas verdes públicas urbanas e azuis no perímetro urbano de Guimarães.
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 433
TULO 21

De facto, as áreas verdes públicas urbanas e azuis do Município


de Guimarães ocupam apenas 436 hectares (1,81% da área total
do Município), situação que se altera grandemente considerando a
área urbana de Guimarães (“inner city”), aumentando significativa-
mente, para 9,97% (tabela 2 e figura 12).
Do ponto de vista da relação direta entre a população e as áre-
as verdes e azuis públicas e urbanas, verifica-se uma densidade de
27,59 m2/hab. no município (“overall city”), enquanto na “inner
city”, esta relação ascende a 32,63 m2/hab.

Tabela 2. Áreas verdes públicas urbanas e azuis no município de Guimarães.


População Área total (m2) Áreas Verdes Públicas Áreas Verdes Densidade de áreas verdes e
Urbanas e Azuis (m2) e Azuis (%) Azuis por habitante (m2/hab)
“overall city” 158108 240958979,12 4362547,50 1,81 27,59
“inner city” 51226 16766317,01 1671375,82 9,97 32,63

Figura 12. Áreas verdes públicas urbanas e azuis do município de Guimarães.


434 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

Todavia, caso considerados os espaços verdes privados urbanos


e as áreas verdes correspondentes a espaços florestais, constata-se
um valor de 33,4% de áreas verdes (“overall city”) ou de cerca de
15% (“inner city”).
Considerando a disponibilidade de áreas verdes e azuis na pro-
ximidade das áreas edificadas e residenciais (Tabela 3), verifica-se
que o valor de população a residir num raio de 300m de áreas ver-
des e azuis, com dimensão superior a 5000m2, é de 21,6% para a
“overall city”, enquanto para a “inner city” esse valor ascende aos
76,8%, refletindo a maior densidade de áreas verdes públicas ur-
banas e áreas azuis na zona mais urbanizada do território. A re-
presentatividade dos espaços verdes e azuis aumenta significativa-
mente se se atender as áreas de qualquer dimensão, ascendendo o
número de habitantes a viver num raio de 300m aos 60,5%, no caso
do território municipal, e 89,4% para o perímetro urbano, corres-
pondendo a um valor bastante elevado.

Tabela 3. Relação entre a População e as áreas verdes e azuis


Áreas Verdes e Azuis > 5000 m2 Todas as Áreas Verdes e Azuis
População População % População População %
Residente Residente a 300 m Residente Residente a 300 m
“overall city” 158108 57705,6 21,6 158108 95592,1 60,5
“inner city” 47564 36507,0 76,8 47564 42508,3 89,4

Perante esta realidade, e perseguindo uma política qualitativa


de retorno ao modelo territorial original – tido como o equilíbrio
desejado entre o natural e o artificial, entre a natureza e a “mão
humana” – no início do século, o Município desenvolveu um con-
junto de ações em coerência com tal desiderato, como a revisão do
Plano Diretor Municipal (PDM), a construção de parques urbanos
(criação ou reabilitação de mais de 16 hectares de áreas verdes
públicas urbanas), a valorização das centralidades locais de modo
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 435
TULO 21

a, incontornavelmente, possibilitar a aglomeração (e evitar a dis-


persão com consumo predador de solo e território), a construção
de uma rede articulada de áreas verdes de usufruto público (ora
estruturantes e polarizadores do território, ora de proximidade à
população local) e a sensibilização (para a prática) da população
de modo a favorecer a permeabilidade dos solos, a arborização do
território e a valorização das linhas de água. Complementarmen-
te, o Município inicia uma ação valorizadora das veigas agrícolas,
nomeadamente a veiga de Creixomil, onde desenvolve um expres-
sivo programa de conjugação da exploração agrícola privada com
o usufruto público de parques, caminhos, hortas pedagógicas
(figuras 13 e 14) e equipamentos comunitários (de área global
muito superior a 300 hectares). A esta área, somado os parques
anteriormente descritos, adicionaram-se outros parques estrutu-
rantes como o parque de Ponte e Taipas (em forte ligação com
o rio Ave e de área superior a 10 hectares), o parque da cidade
desportiva (de área igual a 15 hectares) e o parque do estádio (de
área igual a 5 hectares) resultando, no final, uma área de verde
de utilização coletiva de forte incremento (comparativamente ao
passado) e motivadora de uma ação futura substancialmente in-
tensa. Paralelamente, foi desenvolvido um conjunto alargado de
estudos urbanísticos para as áreas centrais dos principais aglo-
merados onde, invariavelmente, a componente verde (de usufruto
público) é presença constante.
Ao nível do uso e apropriação do solo, através do seu instrumen-
to de planeamento mais importante, o PDM, o Município reduziu
a área territorial destinada a construção em 26%, aumentando de
forma expressiva (e de várias formas) as áreas verdes. Igualmente,
introduziu condições de edificabilidade mais restritivas, nomeada-
mente com a definição de um índice de impermeabilização de solo
de modo a salvaguardar que todo e qualquer terreno terá sempre
uma área não construída e permeável.
436 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

Figuras 13 e 14 - Horta pedagógica.

Do mesmo modo, consagrou no PDM a figura da Estrutura Eco-


lógica Municipal (EEM), que visa “a integração dos sistemas ecoló-
gicos e ambientais fundamentais na construção do território, ga-
rantindo a continuidade e o funcionamento entre eles”, também ela
definidora de regras restritivas e condicionadoras à edificabilidade
em favor da valorização e sustentabilidade ambiental.
Ao nível dos corredores verdes e azuis, de modo a garantir cone-
xões e ligações entre os principais aglomerados, regista-se:
1. O desenvolvimento do plano de ação para a despoluição do
rio Ave voltado à sua completa limpeza e retorno a uma água
transparente e presença de espécies florísticas e faunísticas
há muito afastadas;
2. A valorização das margens dos percursos ribeirinhos, possi-
bilitando o usufruto público e continuidades ambientais;
3. O desenvolvimento do plano de caraterização das linhas de
água, o qual possibilitará um conhecimento mais detalhado
e aprofundado dos principais recursos hídricos do município
e, assim, uma atuação em benefício próprio, muito mais con-
solidada e robusta;
4. A concretização de bacias de retenção que visaram a regu-
larização do caudal da ribeira de Couros, o recurso hídrico
municipal que atravessa o seu aglomerado principal, permi-
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 437
TULO 21

tindo a estabilização do seu caudal e a renaturalização e tra-


tamento das suas margens, numa progressiva devolução (e
usufruto) à cidade deste recurso;
5. O desenvolvimento do programa “Guimarães mais floresta”,
integrado num programa mais vasto denominado “PEGA-
DAS” que visava a plantação de 15.000 árvores até final de
2017, envolvendo maioritariamente o público escolar;
6. O desenvolvimento das denominadas “brigadas verdes” (figuras
15 e 16), grupos de voluntários em associação direta aos princi-
piais aglomerados que se disponibilizam quer para a promoção
de ações de sensibilização e valorização ambiental, quer para a
concretização de ações práticas de limpeza de cursos de água,
suas margens, caminhos pedestres e espaços florestais.

Figuras 15 e 16 - Atuação da Brigada Verde de Fermentões

Fonte: Junta de Freguesia de Fermentões

Reflexo desta atuação municipal, hoje, o Município alcança uma


perceção das mesmas áreas verdes de uso sustentável muito abona-
tória, incentivando-o, por inerência, a aprofundar expressivamente
tal realidade no futuro próximo que se adivinha.
438 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES E HÍDRICOS DO MUNICÍPIO DE GUIMARÃES (PORTUGAL)

4. LINHAS DE ATUAÇÃO FUTURA


O PDM de Guimarães elege como um dos vetores de intervenção
preferencial a “proteção e valorização ambiental e paisagística do
território promovendo a sua estabilidade física e sustentabilidade
ecológica” (C.M.G., 2015). Mais concretamente, este plano propõe-se
a reduzir a área de solo urbano, introduzindo mecanismos de contro-
le e condicionamento da impermeabilização do solo. Propõe-se tam-
bém a aumentar substancialmente as áreas verdes, nomeadamente
pela promoção da EEM, mas também pela salvaguarda das figuras
de avaliação ambiental e pelo reforço da componente verde e valo-
rização das áreas verdes e hídricas. Neste sentido, estão em projeto
ou em fase inicial de implementação um conjunto diversificado de
iniciativas operacionalizadas para a concretização deste objetivo.
Em articulação com a estratégia de implementação da EEM e da
promoção da mobilidade no município (com a valorização dos mo-
dos leves de locomoção – pedonal e ciclável), encontra-se em fase
de projeto o desenvolvimento de uma rede de ciclovias que preten-
de estabelecer a ligação da cidade às vilas do concelho. O Municí-
pio propõe-se também desenvolver um conjunto de intervenções
integradas, enquadradas por um plano de valorização das linhas de
água, indo ao encontro do que está preconizado na estratégia de
adaptação às alterações climáticas apresentada pelo município de
Guimarães em 2016.
Neste contexto, o Município planejou as seguintes ações:
1. Um programa com o diagnóstico da situação atual, a tipologia
de intervenção e medidas de conservação, os procedimentos
de atuação e um plano de monitorização;
2. A formação a técnicos municipais;
3. A edição de um manual de boas práticas dos proprietários
ribeirinhos e folhetos e guias informativos;
4. Sessões de esclarecimento nas juntas de freguesias e associações.
António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa; António José Bento Gonçalves 439
TULO 21

Em fase de conceção encontra-se o projeto de incubadora de


base agrícola e bolsa de terrenos. Trata-se de uma iniciativa que
funcionará com base numa bolsa e num banco de terras para jovens
empreendedores com projetos agrícolas inovadores.
Manter-se-ão ativas as iniciativas já em desenvolvimento (como
por exemplo as Brigadas Verdes, ou o programa “Guimarães mais
floresta”), que terão uma implementação de médio e longo prazo,
promovendo o envolvimento da população na defesa e promoção
das áreas verdes e azuis do Município de Guimarães.

REFERÊNCIAS
AGENDA 21, 2004. Agenda 21 do Eixo Atlântico – Concelho de Guima-
rães. Disponível em: http://www.cm-guimaraes.pt/pages/118
BENTO-GONÇALVES, A., COSTA, F. (2002) O Vale do Ave – sua Geografia In:
Património Industrial no Vale do Ave – Um passado com futuro Edited
by: M. Amado José Mendes e Isabel Maria Fernandes. 40-56 Vila Nova de
Famalicão: ADRAVE.
BENTO-GONÇALVES, A., VIEIRA, A., FERREIRA-LEITE, F., MARTINS, J.,
SILVA, D., & SOARES, V. (2011). Adaptaclima: Adaptação aos efeitos de-
rivados das alterações climáticas. As Mudanças Climáticas e os Incên-
dios Florestais no Ave. Guimarães: AMAVE, 100. http://hdl.handle.
net/1822/20489
CMG (2015). Plano Diretor Municipal de Guimarães. Disponível em:
<http://www.cm-guimaraes.pt/uploads/document/file/6741/Regula-
mento_do_Plano_Diretor_Municipal.pdf>.
RIBEIRO, O. (1945) Portugal o mediterrâneo e o atlântico, Coimbra:
Coimbra Editora, 245 p.
CAPÍTULO 22 GÊNISSON LIMA DE ALMEIDA
JAILTON DE JESUS COSTA

OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E


MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

1. INTRODUÇÃO
A satisfação das diversas necessidades humanas, associada a um
consumo excessivo de recursos e um rápido crescimento demográfico,
tem exercido uma pressão crescente sobre o meio ambiente, seja dire-
tamente, pelo excesso de exploração das riquezas naturais ou indire-
tamente, ao produzir quantidades excessivas de detritos em relação à
capacidade de absorção e depuração do meio ambiente (DIAS, 2004).
No mundo globalizado, a natureza desperta interesses diversos
pela apropriação, controle e uso dos recursos naturais para obten-
ção de lucro, trazendo consigo o desenvolvimento das populações
de forma desigual, integrando apenas aqueles atores sociais que
dispõem de poder político e econômico na dominação dos territó-
rios que possuem recursos naturais (COSTA, 2011). Assim, conclui-
-se que a natureza surgiu também como símbolo de vida, pois ela é
e dá a vida; ela e as comunidades biológicas e seus habitats, assim
como à sociedade e sua base de sustento social (PROST, 2009).
442 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

Tal sustento social se encontra em risco, à medida que a apro-


priação desigual do território pelos atores sociais que detém o ca-
pital, em linhas gerais, são privilegiados no que tange a usufruir
os recursos naturais ali existentes. Desse modo, os membros das
comunidades tradicionais ficam proibidos de ter acesso, em alguns
casos, a esses recursos, disponíveis no território em que se encon-
tram, comprometendo seu modo de vida. Em virtude desse poder
de dominação, a utilização dos recursos naturais acaba sendo res-
trita a um determinado grupo.
As comunidades tradicionais são:

pescadores artesanais, ribeirinhos, catadores de coco, ba-


baçu, seringueiros, povos indígenas, trabalhadores afetados
por condições insalubres de trabalho, associações de mora-
dores em defesa de espaços verdes de lazer e convivência em
seus bairros, catadores e recicladores, grupo de mulheres
que resgatam conhecimentos populares sobre plantas me-
dicinais, entre tantos outros grupos que lutam por legitimar
formas de uso dos bens ambientais, de acesso a eles e de con-
vivência e interação com o ambiente, assim como os saberes
correspondentes (CARVALHO, 2004, p. 164).

Conforme o exposto, as comunidades tradicionais constituem


grupos amplos e diversificados, que utilizam os territórios em que
estão inseridas para garantir sua sobrevivência, através dos seus
saberes aplicados nas atividades extrativistas na obtenção dos re-
cursos naturais, seja nos cursos fluviais e/ou nas áreas de mangue-
zal. No entanto, na maioria dos casos, esses atores sociais têm sua
base de sustento ameaçada pelos impactos socioambientais que
refletem diretamente no seu modo de vida.
Na teoria, os recursos naturais estão disponíveis para toda a so-
ciedade usufruir, de modo que satisfaça suas necessidades, ou seja,
não devem ser destinados de forma a privilegiar apenas algumas
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 443
TULO 21

parcelas da população. Quando esses recursos não são explorados


de forma sustentável, em grande parte das situações, pelos carci-
nicultores e fazendeiros, mas também pelos pescadores artesanais
e marisqueiras, o sistema econômico vigente usurpa tais recursos,
comprometendo e/ou impedindo a exploração dos mesmos pelos
membros das comunidades tradicionais.
Nesse contexto, o artigo está estruturado em três seções, além
das considerações finais e referências. Na primeira seção, intitulada
“(Re)pensando a categoria território: uma breve contextualização”,
foram apresentadas discussões de diferentes teóricos acerca dessa
categoria de análise geográfica, seus conceitos e relações estabele-
cidas. Na segunda seção, intitulada “Atores sociais versus apropria-
ção do território: uma relação conflituosa”, discorreu-se como os
interesses particulares ocasionam a gênese dos conflitos, em suas
diversas formas, entre os atores sociais. Por sua vez, a terceira se-
ção, intitulada “Território: Lócus de reprodução das comunidades
tradicionais” enfatizou o modo de vida e sobrevivência dos mem-
bros das comunidades tradicionais mediante a utilização dos recur-
sos naturais existentes no território em que se encontram.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O município de Brejo Grande integra o litoral norte sergipano


e pertence ao Território do Baixo São Francisco (figura 1). Brejo
Grande localiza-se ao norte do estado de Sergipe, junto a foz do Rio
São Francisco, sendo a sede municipal determinada pelas coorde-
nadas geográficas 10° 25’ 28” de latitude sul e 36° 07’ 44” de longi-
tude oeste (SANTOS, 2016).
444 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

Figura 1 – Localização do município de Brejo Grande/SE.

A organização do estudo se deu mediante as seguintes etapas:


levantamento bibliográfico, documental e cartográfico, visitas in
loco e aplicação de entrevistas semiestruturadas aos pescadores
artesanais e marisqueiras. Primeiramente, realizou-se um arcabou-
ço teórico em consonância com a temática em tela, utilizando-se
artigos com qualis CAPES, teses e dissertações da Biblioteca Digital
Brasileira de Teses e Dissertações, além de livros e capítulos, acerca
das palavras-chave desse estudo.
As visitas in loco possibilitaram registrar e identificar, por meio
de fotografias, os territórios utilizados pelos membros das comuni-
dades tradicionais para obtenção dos recursos naturais.
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 445
TULO 21

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. (Re)pensando a categoria território: uma breve contextualização

No território são desenvolvidas diferentes atividades pelo ho-


mem em busca de sua sobrevivência, sejam elas de caráter social,
cultural ou econômica, em relação à natureza, a partir das relações
de poder que são estabelecidas em função dos usos que lhe são atri-
buídos. Essa categoria geográfica de análise ajuda a compreender
como os territórios, que resguardam recursos naturais, acabam
despertando interesses econômicos, numa perspectiva de desvelar
os interesses dos diferentes atores, ou seja, dos dominantes e dos
dominados.
O território é configurado por diversos usos de acordo com as
necessidades da sociedade. O capital constitui num fator decisivo
na apropriação dos territórios detentores de recursos naturais, no
caso desta pesquisa, cursos fluviais e manguezais, principalmente
por quem os detém. No entanto, essas áreas com potencialidades
não são restritas aos membros das comunidades tradicionais, que
se tornam, em alguns casos, impossibilitados de usufruir dos re-
cursos naturais em suas práticas extrativistas. Para Oliveira (2012),
a percepção e a vivência são parte deste “saber fazer tradicional”
que consolida os membros das comunidades tradicionais enquanto
pescadoras artesanais e marisqueiras, saberes estes passados de
geração a geração, fortalecendo, assim, a identidade cultural.
Na concepção de Raffestin (1993) o espaço antecede o território,
portanto, não são sinônimos nem tampouco equivalentes. O territó-
rio resulta da apropriação de um espaço concreto ou abstrato, onde
o ator “territorializa” o espaço. Nesse sentido, é essencialmente um
espaço definido e delimitado por e a partir das relações de poder
que são estabelecidas em função da apropriação, controle e uso dos
atores sociais de modo que satisfaça seus próprios interesses (SOU-
446 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

ZA, 1995). Entretanto, é nesse cenário que, devido aos múltiplos


interesses em dominar o território, são desencadeados conflitos, de
um lado, os detentores do capital e, do outro, os membros das co-
munidades tradicionais, (des)configurando as relações construídas
sob o território.
Assim, “o território não representa apenas um espaço físico, um
pedaço de terra, vai além, é um espaço social e cultural constituí-
do na convivência entre diferentes modos de vida” (JABER; SATO,
2010, p. 445). Nesta perspectiva, o território não consiste em uma
mera abstração, mas sim, numa concretização de atividades desen-
volvidas de modo a atender os anseios dos envolvidos, uma vez que
estes almejam usufruir de forma direta ou indireta dos recursos na-
turais, caracterizando as relações de poder que são estabelecidas.
Nos territórios utilizados pelos membros das comunidades
tradicionais são desencadeadas relações socioambientais que ga-
rantem a reprodução social dos envolvidos mediante os conheci-
mentos que norteiam suas práticas extrativistas na obtenção dos
recursos naturais. O que desperta interesse nos que detêm o capi-
tal em se apropriar, controlar e usar os territórios, antes ocupados
pelos membros das comunidades tradicionais, é reconhecer a área
como oportunidade para a reprodução deste capital. Nesse aspecto,
os detentores de capital, carcinicultores e fazendeiros, investem na
especulação imobiliária, cujos empreendimentos têm sido constru-
ídos em Áreas de Preservação Permanente (APP’s), impacto socio-
ambiental que traz consigo consequências diretas para as comuni-
dades tradicionais.
Na visão de Saquet (2003), o território corresponde a um lugar,
no qual ocorrem relações, estabelecendo, principalmente as de po-
der, oriundas da apropriação e da produção do espaço. Com isso,
essas relações normalmente acabam gerando conflitos na forma de
controle e uso do território em função do poder econômico dos en-
volvidos que o detêm.
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 447
TULO 21

3.2. Atores sociais versus apropriação do território: uma relação


conflituosa
Os conflitos territoriais correspondem a um conjunto complexo
de diversos embates entre os envolvidos: fazendeiros, carciniculto-
res, pescadores artesanais e marisqueiras, em razão da forma de se
relacionar de modo insustentável com o ambiente e de dominar o
território (JABER; SATO, 2010). Tais conflitos são inerentes aos ter-
ritórios detentores de potencialidades, face às suas práticas sociais
de uso, ocupação e significação.
São processos que geram exclusão e apropriação desigual entre
os embates e propiciam lutas de diferentes tipos. Desse modo, ocor-
rem diferentes formas de opressão e/ou de dominação, gerando
formas de resistência, mobilização e identidades coletivas distin-
tas, passando a estabelecer redes e alianças entre os protagonistas.
Os conflitos territoriais envolvem lutas sociais, econômicas e polí-
ticas que englobam a apropriação do capital ou distribuição de poder.
Com o aumento da população ocorre maior grau de exploração do meio,
desencadeando conflitos territoriais e consequências imediatas para os
moradores de determinadas áreas das comunidades tradicionais.
Segundo Oliveira (2014), esses conflitos constituem elementos
integrantes da sociedade moderna e, para sua análise, alguns as-
pectos são de fundamental importância para seu entendimento, a
saber: a natureza do conflito, os atores sociais envolvidos com o
propósito de alcançar aquilo que almejam, o campo específico, o
objeto que está em disputa e que desperta interesse, a lógica ou
dinâmica de evolução, os mediadores e a tipologia.
A depender do grau de intensidade dos conflitos, Santos (2007,
p. 89) os classifica da seguinte forma:
a) Latentes: são aqueles que ainda se encontram encobertos
pelas dinâmicas sociais, mas com o passar do tempo podem
evoluir. Em relação a este tipo de conflito:
448 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

“A quantidade de pescadores que existe naquele pequeno


espaço, daquele trecho que dá peixe é muito grande. O nú-
mero de pescadores aumenta a cada ano. É comum a rede
de um ficar em cima da de outro companheiro. Às vezes,
um arreia com a maré que não está boa. Isso já era nor-
mal quando existia muito peixe e o rio era todo fundo. Aí
quando dá uma maré que um arruma o peixe e o outro fica
sabendo, ele vai para perto, gera discussão de momento,
mas não existe agressão” (Ator A). Entrevista concedida
em 21/03/2018.

b) Manifestos: são aqueles visíveis, mas ainda sem força polí-


tica em razão da desarticulação dos atores sociais envolvi-
dos.
c) Explícitos: são aqueles em que os atores sociais já apresen-
tam força política seja na esfera regional e/ou local.
d) Extremos: são aqueles que atingem patamares que afetam a
integridade física dos que estão entrelaçados; e,
e) Naturalizados: entendidos como aqueles que admitem ma-
neira desproporcional a partir da utilização da força física
dos envolvidos. Em relação a este último tipo de conflito:

“O que aparece de opressão não é fácil não. Recebemos mui-


ta ameaça como perseguições com esperas no quintal, car-
ros passando na porta dos companheiros e recados” (Ator
B). Entrevista concedida em 18/01/18.

As evidências apontam que, diante do jogo de interesses na


apropriação, controle e uso dos territórios detentores de recur-
sos naturais, os conflitos não são originados pelos atores sociais
que necessitam do mínimo de recursos naturais para garantir
sua sobrevivência nos territórios em que se encontram, mas sim,
por aqueles que utilizam o capital para satisfazer seus próprios
anseios.
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 449
TULO 21

“Ao longo do rio, existe áreas (ilhas) que não podemos ter
acesso, principalmente agora com os viveiros de camarão”
(Ator C). Entrevista concedida em 18/01/18.

Em praticamente todos os conflitos existentes no território, há


tendência de dominação do território pelos fazendeiros e carcini-
cultores, já que o capital constitui fator primordial no que se refere
a apropriação das áreas com recursos naturais. Nessa perspectiva,
as comunidades tradicionais podem ser expropriadas do local em
que construíram, ao longo do tempo, sua identidade cultural.
Assim, é perceptível que a utilização do capital sob os territórios
com recursos naturais gera apropriação desigual e coloca em risco
as práticas extrativistas praticadas pelos membros das comunida-
des tradicionais no propósito de manter em bom estado os recur-
sos naturais para garantir sua sobrevivência, como por exemplo,
o aterro das áreas de manguezal e lançamento indiscriminado de
dejetos nos cursos fluviais. Dejetos estes provenientes, principal-
mente da atividade de carcinicultura.

“O que aparece de opressão não é fácil. Recebemos muita


ameaça. Tem uns companheiros inseridos no Programa de
Proteção a testemunha do Governo Federal. Mas, já teve per-
seguição mesmo de espera. O camarada esperar o cara sair
no quintal à noite, mas graças a Deus ele não saiu de casa.
Teve também carros perseguindo passando nas portas de
outros companheiros, além de recados de “vou pegar”, “vou
mandar subir” (Ator D). Entrevista concedida em 18/01/18.

Nesse cenário, os conflitos desencadeados na comunidade qui-


lombola da Resina ocorrem em função da apropriação do território e
dos usos do solo, manifestando-se de diferentes formas (Quadro 1).
450 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

Quadro 1 - Principais conflitos na comunidade quilombola da Resina, em Brejo Grande/SE.


Conflito Atores Envolvidos Localização
Uso da Terra Pescadores artesanais X Pescadores artesanais Comunidade Quilombola da Resina
Apropriação, Controle e Uso Pescadores artesanais X Fazendeiros Comunidade Quilombola da Resina
Apropriação, Controle e Uso Pescadores artesanais X Carcinicultores Comunidade Quilombola da Resina
Apropriação, Controle e Uso Pescadores artesanais X Empresários Comunidade Quilombola da Resina
Fonte: Gênisson Lima de Almeida, 2018.

Os conflitos entre pescadores artesanais e pescadores artesa-


nais na comunidade quilombola da Resina ocorrem devido à de-
marcação de um determinado ponto do Rio São Francisco, através
de seus instrumentos de coleta de recursos naturais utilizados na
pesca artesanal, como por exemplo, o barco.
Os conflitos entre pescadores artesanais e fazendeiros na comu-
nidade quilombola da Resina ocorrem mediante a delimitação de
suas propriedades com cercas e, em alguns casos, com arrame far-
pado com o objetivo de evitar o acesso a suas propriedades pelos
pescadores artesanais. Além disso, esse tipo de conflito também se
manifesta com a contratação de seguranças armados pelos fazen-
deiros, a fim de impedir que os pescadores artesanais adentrem
suas propriedades e extraíam os recursos naturais. Em caso de de-
sobediência por parte dos membros das comunidades tradicionais,
as penalidades são as mais severas possíveis, resultando na morte
dos pescadores artesanais.
Os conflitos entre os pescadores artesanais e carcinicultores na
comunidade quilombola da Resina reside no fato de que os dejetos
produzidos na atividade da carcinicultura são lançados no Rio São
Francisco, provocando a falência de espécies de peixes.
Os conflitos entre pescadores artesanais e empresários na co-
munidade quilombola da resina são delineados pela tentativa de
instalação de um resort com vista para o Rio São Francisco e, ainda
por cima, substituindo os barcos dos pescadores por catamarã.
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 451
TULO 21

3.3. Território: Lócus de reprodução das comunidades tradicionais

O homem está, a todo momento, modificando o espaço de modo


a atender os seus anseios. Os efeitos oriundos da interferência do
homem na natureza, sobretudo com o manejo inadequado das téc-
nicas, refletem negativamente nos territórios das comunidades
tradicionais, já que reduzem ou comprometem as áreas utilizadas
para a coleta de recursos naturais por tais comunidades.
A técnica é criada pelo homem e incorporada a suas atividades
para satisfazer, por mais simples que seja, aquilo que almeja. Um
grupo de pescadores, por exemplo, desenvolve suas próprias técni-
cas, que são aplicadas nos locais utilizados para a pesca. Uma vez
comparada com as técnicas introduzidas pelos carcinicultores, es-
tabelecem relação harmônica, em algumas situações, com a nature-
za no que tange ao grau de intensidade dos impactos socioambien-
tais (figura 2).

Figura 2 – Confecção de rede por pescadores artesanais da comunidade da Resina, Brejo Grande/SE.

Fonte: Gênisson Lima de Almeida, 2018.


452 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

No entanto, o tamanho da rede, o manejo e o destino final dessa


técnica pode causar impactos socioambientais. O tamanho da ma-
lha da rede, quando não respeitada a legislação, pode ocasionar a
apreensão de espécimes, comprometendo sua reprodução e, con-
sequentemente, sua sobrevivência. Em relação à destinação dos
resíduos de pesca, como redes antigas, que por vezes podem ser
jogados no corpo d’água, pode provocar a morte de organismos que
a confundam com seu alimento. Ou seja, a depender do tipo de ma-
nejo, a técnica da rede de pescar pode ser prejudicial.
Assim como a rede de pescar, o território funciona como uma
“teia”, na qual são estabelecidas múltiplas relações para alcançar
os objetivos desejados. Nesse contexto, essa categoria geográfica
de análise é permeada, a todo momento, por disputas em busca
da dominação dos recursos que ali existem. Devido aos constan-
tes acirramentos pela apropriação, controle e uso desses recursos é
perceptível que os membros das comunidades tradicionais têm sua
base de sustento ameaçada e podem ser expropriados dos locais
em que residem em virtude da força econômica dos detentores do
capital e, consequentemente, coloca em risco o modo de reprodu-
ção dos pescadores artesanais e marisqueiras, conforme contextu-
aliza o trecho da entrevista que segue:

“O turismo provoca impacto socioambiental porque querem


implantar aqui na Resina um resort e com isso ainda conse-
guiram obrigar 26 famílias a deixar a comunidade” (Ator E).
Entrevista concedida em 18/01/18.

Dessa forma, diante desse jogo de interesses, são desencadea-


dos impactos socioambientais como consequência das atividades
implantadas sob os territórios utilizados pelas comunidades tra-
dicionais, reduzindo as áreas de extrativismo. Tais impactos socio-
ambientais são causados não apenas pelos carcinicultores, através
do lançamento de dejetos nos cursos fluviais e manguezais, como
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 453
TULO 21

também pelos pescadores artesanais e marisqueiras, quando não


observam as normas que regulamentam o tipo e tamanho das ma-
lhas de redes de pesca.
Em relação à produção do material utilizado na confecção dos
instrumentos de trabalho, o trecho da entrevista seguinte destaca a
relação entre os membros da comunidade acompanhada e sua pre-
ocupação com o ambiente:

“Aqui na comunidade produzimos da forma mais ecológica


possível para não agravar o meio ambiente. Sentimos impos-
sibilitados de ajudar mais por falta de recursos para fazer
aquilo que pensamos” (Ator F). Entrevista concedida em
18/01/18.

Conforme estabelece o Decreto Federal n° 6.040, de 7 de feve-


reiro de 2007, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável,

os Povos e Comunidades Tradicionais são os grupos cultu-


ralmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que
possuem formas próprias de organização social, que ocupam
e usam territórios e recursos naturais como condição para
sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econô-
mica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gera-
dos e transmitidos pela tradição. Como exemplos podem ser
citados os indígenas, quilombolas, faxinalenses, ribeirinhos,
caiçaras, cipozeiros. Tais grupos sociais vivem em estreita
interação com o ambiente natural e cultural, reconhecendo-
-se como pertencentes ao meio (território) e adotando práti-
cas juridicamente consensuadas pelo grupo social (BRASIL,
2007, p. 15).

Há legislação vigente que garante a essas comunidades o direi-


to de reprodução mediante as relações sociais e de sobrevivência
454 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

estabelecidas no território, por meio das atividades extrativistas


da pesca artesanal e da mariscagem, ambas realizadas nos cursos
fluviais e nos manguezais, respectivamente. No entanto, tais comu-
nidades encontram-se vulneráveis aos efeitos das atividades de-
senvolvidas pelos detentores de capital, que comprometem o modo
de vida destas, através dos impactos socioambientais oriundos das
atividades implantadas nos territórios utilizados para a coleta de
recursos naturais.
De acordo com a Lei nº 11.959/2009, a pesca artesanal consis-
te “no trabalho de confecção e de reparos de artes e petrechos de
pesca, os reparos realizados em embarcações de pequeno porte e o
processamento do produto da pesca artesanal”. Ademais, “é pratica-
da diretamente pelo pescador profissional, de forma autônoma ou
em regime de economia familiar, com meios de produção próprios
ou mediante contrato de parceria, desembarcado, podendo utilizar
embarcações de pequeno porte” (figuras 3 e 4) (BRASIL, 2009).

Figura 3 – Prática da pesca artesanal na comunidade quilombola da Resina, em Brejo Grande/SE.

Fonte: Gênisson Lima de Almeida, 2018.


Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 455
TULO 21

Figura 4 – Rede utilizada na pesca artesanal na comunidade quilombola da Resina, Brejo Grande/SE.

Fonte: Gênisson Lima de Almeida, 2018.

A Lei n.º 11.959/2009, ainda salienta os seguintes objetivos re-


lacionados com a atividade da pesca artesanal:

o desenvolvimento sustentável da pesca e da aquicultura


como fonte de alimentação, emprego, renda e lazer, garan-
tindo-se o uso sustentável dos recursos pesqueiros, bem
como, a otimização dos benefícios econômicos decorrentes,
em harmonia com a preservação e conservação do meio am-
biente e da biodiversidade; o ordenamento, o fomento e a
fiscalização da atividade pesqueira; a preservação, a conser-
vação e a recuperação dos recursos pesqueiros e dos ecos-
sistemas aquáticos; e, o desenvolvimento socioeconômico,
cultural e profissional dos que exercem a atividade pesquei-
ra, bem como de suas comunidades (BRASIL, 2009, p. 59).

Para Silva (2014), no Brasil, a pesca artesanal é caracterizada


por ser uma atividade numerosa e complexa em detrimento de fa-
456 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

tores econômicos, sociais e ambientais que desempenham relações


intrínsecas e próprias de cada região. Nessa perspectiva, os recur-
sos pesqueiros são ameaçados em função das atividades desenvol-
vidas pelo homem para alcançar seus propósitos. Por outro lado, a
atividade da pesca artesanal promove um papel primordial no que
tange a conservação da biodiversidade, principalmente devido ao
caráter extrativista que tal atividade possui, na qual é alcançado um
equilíbrio entre os pescadores e os ecossistemas face à obtenção
dos recursos naturais.
A pesca artesanal, a cata de caranguejos e mariscos são práti-
cas ancestrais, repassadas através de gerações. Estas atividades e,
particularmente, a pesca artesanal diferem da pesca industrial no
que se refere à produtividade, à utilização de instrumentos e equi-
pamentos simples, geralmente confeccionados pelo pescador e por
membros do grupo familiar, que costumam participar também des-
ta atividade produtiva. O pescado obtido é destinado à subsistência
do grupo e à comercialização (ALVES et al., 2017, p. 188), conforme
sugere trecho de entrevista a seguir:

“A pesca é a nossa principal atividade. Antes obtínhamos


muito a pilombeta. Com a salinização do rio esse tipo de pei-
xe não existe mais aqui porque ele é de água doce” (Ator H).
Entrevista concedida em 18/01/18.

Essas atividades são realizadas de acordo com as normas es-


tabelecidas pelos próprios membros das comunidades tradicio-
nais, conforme sugere trecho da entrevista a seguir, ao longo do
tempo, mediante os saberes que norteiam a realização da coleta
dos recursos naturais, que são passados de geração a geração.
Entretanto, não significa dizer, por exemplo, que as mulheres
não participem da pesca artesanal e os homens na mariscagem
e vice-versa.
Gênisson Lima de Almeida; Jailton de Jesus Costa 457
TULO 21

“A cata do caranguejo é mais para alimentar a família e o pes-


cado é destinado para vender aos cambistas” (Ator I). Entre-
vista concedida em 18/01/18.

Os pescadores artesanais enfrentam diversas dificuldades, de-


vido à falta de políticas públicas voltadas para atender os anseios
relacionados na realização de suas atividades, fato que pode ser ob-
servado no discurso da comunidade em entrevista seguinte. “A falta
de políticas públicas específicas que atendam às suas demandas,
a crescente especulação imobiliária na zona costeira, assim como
o crescimento da atividade pesqueira industrial com uso de novas
tecnologias” (ALVES et al., 2017, p. 188).

“O poder público municipal deveria dar atenção porque quan-


do uma atividade vai ficando escassa, vai aparecendo outra e
aí conseguíamos manter o sustento da família. O seguro defeso
nem sempre é pago no período certo (verão) e, por isso, somos
proibidos de pescar pelo dia, mas pescamos à noite que não tem
fiscalização” (Ator J). Entrevista concedida em 18/01/18.

Com isso, é de suma importância um olhar voltado para os su-


jeitos pertencentes à essas comunidades, principalmente pelos
gestores municipais e estaduais, como por exemplo, na aquisição
de equipamentos e pagamento do seguro defeso1 no prazo corres-
pondente, respectivamente. Essas medidas, principalmente quanto
ao benefício desse seguro, contribuem para que os pescadores não
realizem a coleta dos peixes em períodos inadequados (reprodução
dos peixes e mariscos).

1O seguro defeso é conhecido como o seguro desemprego do pescador artesanal profissio-


nal, é concedido em períodos em que o mesmo é proibido de pescar, para preservar o perío-
do de reprodução dos peixes, sendo assim, os profissionais desta área acabam ficando sem
meios de sustento. (Disponível em <http://segurodesemprego2016.net/>.
458 OS USOS DO TERRITÓRIO PELOS PESCADORES ARTESANAIS E MARISQUEIRAS EM BREJO GRANDE/SE

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As interferências antrópicas na natureza estão cada vez mais fre-


quentes em decorrência dos interesses advindos de cada ator social
envolvido. As relações construídas, a partir das atividades desen-
volvidas pelos diferentes atores sociais, promovem um re(arranjo)
dos aspectos presentes no território. Tais relações caracterizam o
processo de apropriação, controle e uso, sobretudo dos territórios
dotados de potencialidades.
Os membros das comunidades tradicionais utilizam os recursos
naturais para garantir sua sobrevivência, por meio de suas práti-
cas extrativistas na pesca artesanal e na mariscagem. No entanto,
têm sua base de sustento ameaçada não apenas pelos impactos so-
cioambientais provocados pelos carcinicultores e fazendeiros, mas
também por suas próprias atividades.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


(CAPES) pela bolsa concedida.

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ANTÓNIO JOSÉ BENTO GONÇALVES
CAPÍTULO 23 ANTÓNIO AVELINO BATISTA VIEIRA
FRANCISCO DA SILVA COSTA

IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF


FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN
PORTUGAL*

1. INTRODUCTION

In Portuguese mountain areas, many forest/shrub areas are


extensively managed by means of domestic livestock, mainly feral
cattle and horses (Garrano), at very low stocking rates.
Some grazing practices, especially extensive grazing represents
an irreplaceable form of recovery of difficult territories with low at-
tractiveness and productivity and represents an economic benefit for
local populations due to the aids from the countervailing measures
and the agri-environment measures provided by European Union.
Therefore, the increasing number of animals and their need for
additional breeding grounds created several social conflicts and
contributed to increasing the risk factor of forest fires, particularly

* This work was funded by FEDER funds through the Operational Programme Compe-
titiveness Factors - COMPETE and national funds by FCT - Fundação para a Ciência e a
Tecnologia under the project UID/GEO/04084.
462 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

significant in mountain areas. In fact, the use of fire has increased,


in order to provide better feeding conditions for animals and to
avoid their search of food in lowland agricultural fields. Renewal
of pastures became an important motivation to promote bush fires.
Some of them, due to negligence or other causes, grow to either
be uncontrolled or transform themselves in forest fires, destroying
forest resources. Moreover, high bush productivity of forest ecosys-
tems creates conditions for high rates of forest fire recurrence, in-
creasing the risk of forest fires.
From a social point of view, several authors suggest that exten-
sive areas of grazing remains the only profitable way to exploit sig-
nificant areas of the Portuguese mountain territories, however it is
therefore necessary to develop strategies that promote the coexis-
tence of livestock and the reduction of the risk of fire.

2. MOUNTAIN AREAS AND FOREST FIRES IN PORTUGAL


Portugal is not considered a highland country. Nevertheless, mou-
ntains cover approximately 36 140 km2, corresponding to 39.1% of
the Portuguese territory (92630 Km2) (BENTO-GONÇALVES, 2011).
Portugal has a warm temperate climate, predominantly Mediterra-
nean, characterized by hot, dry summers and rainy winters.
It is clear that in the Mediterranean basin, fires are a natural phe-
nomenon that have been occurring for millennia and plants have
revealed the capacity to cope adequately with them. Wildfires are
one of the most important agents of land cover change in Portugal.
Indeed Portuguese wooldands were characterized by the destruc-
tion of the original forest species by frequent fires and its subsequent
replacement by pastoral fields, the use of the best soils for cereal cultu-
res, and the use of timber for fuel and construction (REGO, 2001). Cor-
deiro (1990) allege that humans have shaped their land cover in Portu-
gal, particularly through the use of fires, in accordance with their needs.
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 463
TULO 21

More recently, the transformations in the traditional land use


patterns and lifestyles of the local populations led to a significant
increase of abandoned agricultural areas. On one hand, this resul-
ted in the recovery of the vegetation and the increase in the ac-
cumulated fuel in the traditional forest areas (LOURENÇO, 1991;
REGO, 1992; GARCÍA-RUIZ et al., 1996; ROXO et al., 1996). On the
other hand, it naturally increased the area of woodlands.
In fact, beginning in the 1970s, many of these changes were ve-
rified in several southern European countries, particularly in the
Mediterranean region. The rural exodus initiated in the 1960s led
to a decrease in grazing and pastoral activities and the subsequent
accumulation of fuels in the Portuguese woodlands (LOURENÇO,
1991; VÉLEZ, 1993; MORENO et al., 1998; REGO, 2001).
Many of these areas were transformed into spaces that were
prone to large fires during the summer months due to the high le-
vels of biomass that had accumulated throughout the years.
So, in this context, in Portugal, as for the majority of the countries
from the Mediterranean basin, more than 95% of the forest fires are
due to human actions and/or activity. The number of occurrences is
closely associated with intentional or negligent human causes, which
results from different behaviors and attitudes, and, burned areas are
directly related with the different weather conditions throughout the
years, the lack of forest management, and, finally, to some inefficien-
cies in firefighting operations (LOURENÇO et al., 2012).
However, in mountainous areas, nowadays, extensive grazing
represents an irreplaceable form of recovery of difficult territories
with low attractiveness and productivity. In fact, the use of fire has
increased, in order to provide better feeding conditions for animals
and to avoid their search of food in lowland agricultural fields. Re-
newal of pastures became an important motivation to promote bush
fires. Some of them, due to negligence or other causes, either grow to
be uncontrolled or transform themselves in forest fires, destroying
464 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

forest resources. Moreover, high bush productivity of forest ecosys-


tems creates conditions for high rates of forest fire recurrences, in-
creasing the risk of forest fires (BENTO-GONÇALVES et al., 2011).
Indeed, the use of fire in mountain areas has increased, in an
environment of large accumulation of phytomass, with high in-
flammability, calorific power and combustibility, creating condi-
tions for fires to be more recurrent.

3. GRAZING PRACTICES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWEST POR-


TUGAL AND THE RISK OF FOREST FIRES
In the northwest of Portugal, many mountainous shrub areas
are extensively managed by means of domestic livestock, mainly
cattle and horses, leading to an increased risk of fire.
From a social point of view, several authors suggest that exten-
sive areas of grazing remains the only profitable way to exploit
significant areas of the Portuguese mountain territories (CASTRO,
2008), and in recent years, due to the valorization of the so-called
“natural” products and the existence of financial aids, it has led to
an increase in the number of animals.
Cattle farming played an important role in mountain regions,
characterized as lands of extreme conditions, where the severity
of the climate and soil make life difficult for poor people. They have
always been a major source of wealth for the farming populations.
Their overall importance is because they allow the local families to
overcome mere subsistence living conditions.
In the past, animals were usually led to the highest mountain
areas in early spring, where they remained without being herded
until the end of summer. The rest of the year, cattle grazed near the
villages.
Currently, the main system used for grazing cattle is the tradi-
tional extensive, where the animals graze freely about 10 months a
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 465
TULO 21

year, being kept overnight in the “courts” during the coldest months
of winter, which implies the permanence of the cattle in the hills
over a longer period of time (BENTO-GONÇALVES et al., 2011).
The horses, represented by the horse race Garrana Luso-Galaica,
have some significance in the higher lands, including the pro-wild
regime. The horses are kept free-grazing all year on the more mou-
ntainous areas, moving in herds of variable number.
Several plant species are prominent in the Garranos diet: the gor-
se, broom, the smith, the genista and some grasses and leguminous
plants that naturally grow in mountain pastures. Regarding pasture
trees, some species also stand out: oak, birch, arbutus, holly, beech,
from which they consume the young leaves and berries when ripe.
In these regions, with strong constraints, including adver-
se physical and socio-economic conditions, local people had the
need to respond to these adversities to minimize their efforts
and capitalize on its activity. So, communities have been forced
to maximize the available resources and to develop cooperation
strategies to make ownership of cattle even by those who had few
resources sustainable.
A few decades ago, in several villages or parishes of Portugal, es-
pecially in the North, there was an important cooperation strategy,
the so-called “Vezeiras”, which represented a community system of
grazing cattle in which each shepherd takes the herd of the whole
village out to pasture “one at a time”. However, currently only a few
endure (BENTO-GONÇALVES et al., 2012).
The days for guarding the community herd depend on each far-
mer´s herd size. Once the allocated time period is finished, the guar-
ding task is handed over to another shepherd and so on, until all the
shepherds from the village fulfill their obligation to guard the herd.
According to this ritual, the cattle belonging to the various
owners graze together from June to September, after which they
return to their villages of origin. The traditional economy of the-
466 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

se villages is therefore based on practices of subsistence agri-


culture linked to widespread livestock production and strong
community practices based on animal production in extensive
and very strong community practices. This tradition remains ali-
ve “much in result of the willingness and commitment of cattle
owners who continue to enforce the ancient right of use of gras-
sland in the hills”. At the same time, this is evidence that in these
places some primary sector activities still remain (BENTO-GON-
ÇALVES et al., 2012).
In the past, when the herds were larger, shepherds were forced
to cover all the pathways during the summer season. Currently, gi-
ven the small number of cattle herds, these pathways are used al-
ternately from year to year, and some grazing sites (“currais”) are
deprecated in preference to others because they have less feeding
interest or whose accessibility is more difficult or dangerous.
“Vezeiras” (“cortelhos”, “fornos”, “juiz”, “chamado”, …), along with
other rural practices in mountain areas (“brandas”, “inverneiras”,
terraces, traditional irrigation systems, mills...), are the legacies
(living heritage of ancestral rural practices) of these communities,
some of which are still running. These are authentic testimonies
of the solidarity between the people, which not only contribute to
the local subsistence but also can be true anchors for development
strategies anchored in tourism activities (BENTO-GONÇALVES et
al., 2012).
But, the increasing number of animals in free-ranging grazing
and their need for additional breeding grounds created several so-
cial conflicts and contributed to increasing the risk factor of forest
fires, particularly significant in mountainous areas. The use of fire
has increased, in order to provide better feeding conditions for ani-
mals and to avoid their search of food in lowland agricultural fields.
Renewal of pastures became an important motivation to promote
bush fires. Some of them, due to negligence or other causes, grow to
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 467
TULO 21

either be uncontrolled or transform themselves in forest fires, des-


troying forest resources. Moreover, high bush productivity of forest
ecosystems creates conditions for high rates of forest fire recurren-
ces, increasing the risk of forest fires. So, it is therefore necessary
to develop strategies that promote the coexistence of livestock and
the reduction of the risk of fire.
As mentioned previously, the origin of fires is very broad and
the motivations that are often behind them are equally varied and
complex. However, the disruption of the traditional rural structures
transformed the once balanced territories into spaces of great vul-
nerability, especially in terms of forest fires occurrences.
The new reality underlying the current set of diverse conflicts re-
sults from a wide range of legitimate but antagonistic interests, de-
rived from land use, such as the interaction between the rural world
and urban visitors, raising cattle in free, vacant lots, hunting, etc.
This results in a large number of bush fires (forest fire smaller
than one hectare) and forest fires, of either an intentional or negli-
gent source, as pastures are burnt in order to be regenerated – e.g.,
namely through the periodic burning of bush and grass in order to
improve the forage quality of rangelands.

4. MUNICIPALITY OF VIEIRA DO MINHO


In order to examine whether the increasing number of animals
and their need for additional breeding grounds contributes to in-
creasing the risk factor of forest fires, we carried out a study in the
municipality of Vieira do Minho, with particular emphasis on the
Cabreira mountain, using geographic information systems techno-
logy, followed by an analysis of the burnt areas and the recurrence
of forest fires, according to land use and season of the year, trying
to discern whether or not there is a relationship with the Garranos
preferred areas of grazing.
468 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

The municipality of Vieira do Minho is located in the northwest


of mainland Portugal (Figure 1), and is a territory (Figure 2) with
Mediterranean affinities but with strong Atlantic influence, resul-
ting in a climate of mild temperatures with small temperature va-
riations and a high rainfall average.

Figure 1 – Localization of the Municipality of Vieira do Minho

Source: APA
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 469
TULO 21

Figure 2 – Main Rivers and Mountains in the northwest of Portugal and elevation of the municipality of Vieira do
Minho

Source: APA
470 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

One of the most striking aspects of the study area, relates to the
high level of rainfall recorded which registers, on average, around
3500 mm annually at the highest points; nevertheless, values close
to 3000 mm per year are observed at low altitudes.
From a demographic standpoint, since 1991, the municipali-
ty of Vieira do Minho witnessed its resident population decrease
from 15.775 to 12.134 individuals (2016), which correspond to a
total negative variance of 18%. It presents an aging index of 201.4
(2016), a situation that has intensified since 1970 and the avera-
ge population density in the municipality of Vieira do Minho was
about 56.1 inhabitants/km2 (2016).
Based on the label adopted by the 2012 CORINE Land Cover
(CLC 2012), we grouped some of the codes referring to the type of
land use in the municipality of Vieira do Minho, in order to simplify
the information (Table I):

Table 1 – Types of land use Wildland areas


Permanent pastures
Hardwood Forests
Coniferous forests
Assorted forests
Natural herbaceous vegetation
Wildland areas
Shrubland
Transitional woodland-shrub
Open forests, open cuts and new plantations
Sparse vegetation
Burnt areas
Source: CLC2012

According to the CLC 2012 for the municipality of Vieira do


Minho, the predominance of spaces occupied by wildland uses
(73,3%) is obvious, followed by agricultural areas (23,6%), water
plans (2%) and artificial spaces, which represent only 0.7% of the
total municipality area.
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 471
TULO 21

Within the wildland spaces, the “pasture areas” (pastures, natu-


ral grassland, shrublands and sparse vegetation) account for 48%
of the total area of Vieira do Minho (Figure 3). These are areas with
a residual human presence, exploited for centuries for grazing catt-
le in freedom.

Figure 3 – Potential areas of grasslands in the municipality of Vieira do Minho

Source: CLC2012

It is in these areas that Garranos graze freely throughout the


year, moving in herds of variable number and competing for food
with cattle (figure 4 A, B). In addition to the increasing number of
Garranos, other races have been increasing the number of horses
in the area. Some of them belong to owners who do not live in the
county and carry out an “illegal dumping” of these animals (horses)
on Cabreira mountain.
472 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

Figure 4 A, B – Cattle and horses in Cabreira Mountain

A B

(Photos: A. Bento Gonçalves)

The origin of the name (is derived from the indo-european root
word “gher” which means “small/short” and originated the term
“guerran” the Gaelic Word for horse.) indicates it is a small horse,
however, with strong physical structure and very specific features:
straight profile, stocky body, with a maximum height in adult ani-
mals of 1.35 m, with solid bone formation, weighing between 150
and 200 Kg and brown hair.
The evolution of the number of horse heads registered a subs-
tantial variation, reaching a minimum in the sixties (Table 2), a
trend also seen in other species. In fact, between 1934 and 1968,
equines lost more than 68% of their herd. However, the number
of horses has increased slowly but gradually from the seventies
onwards, unlike cattle, sheep and goats that continue a declining
trend since 1934.

Table 2 – Horses in the municipality of Vieira do Minho between 1934 and 1999
Horses
1934 1940 1955 1968 1972 1989 1999
Vieira do Minho 409 297 253 128 163 296 365
Sources: DGSP (1935, 1941), INE (1954, 1955, 1968, 1972, 1979, 1989, 1999)
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 473
TULO 21

This fact is directly related to the allowances and subsidies allo-


cated to Garranos, which made its breeding financially attractive.
Being a breed that is considered “highly threatened”, it enjoys
the status of “biodiversity protection of the domestic breeds”. But
besides its status as a social-cultural heritage, the Garrano repre-
sents an economical benefit for local populations due to the finan-
cial aids from countervailing and agri-environmental measures,
which proved critical to prevent their extinction and allowed for
the recovery and expansion of the species. However, there are seve-
ral conflicts related to the expansion and the creation of Garranos,
such as the damages in agricultural fields, jealousy associated with
the allocation of financial aids, forest fires originating from fires
for regeneration of grasslands, which are attributed to the Garrano
breeders, and even road accidents.

5. THE DENDROCAUSTOLOGIC REALITY IN MUNICIPALITY OF VIEIRA


DO MINHO

]The 70s and 80s of the twentieth century were a period of tran-
sition between the “dendrocaustologic” (LOURENÇO et al., 2014)
reality which lasted until the 60s of last century, and the current si-
tuation, where fire is no longer used as an instrument for managing
of wild spaces but rather has become a major threat and obstacle to
achieving sustainability.
The 70s witnessed a strong increase in the number of the annual
occurrences in fires and scorched areas in the municipality of Viei-
ra do Minho, which in part result from the disintegration of rural
world and lack of forest management, which is one of major obsta-
cles to forest management (BENTO-GONÇALVES, 2011).
In fact, the municipality of Vieira do Minho, like most moun-
tain areas of Northwest Portugal, presents, according to Alves et
474 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

al. (2003) a very high risk of abandonment of farming activity. The


agrarian system of the Minho mountain system exhibited a balance
that depended on the complementarity between agricultural areas
and mountainous areas.
According to Leite (2002), pastures located at lower altitudes
sustained the cattle throughout the year – i.e., mainly sheep and go-
ats - while the pastures located at higher altitudes were grazed only
during the months of May to September/October. Traditionally,
only during this time of year did cattle and horses stay overnight
and remain in the hills.
The continued issuance of new shoots by shrub species and the
continued growth of herbaceous species, in parallel to its conti-
nuous consumption by the livestock prevented the accumulation
of dead or living phytomass, which was capable of holding large
quantities of mineral nutrients in their constitution and assuming
itself as a limiting factor for growth and productivity of vegetation.
This fertilizing and controlling role played by livestock in the
growth of vegetation in mountain spaces was often replaced by fire.
Fires were a common practice associated with grazing and were
intended to promote the issuance of new shoots through the rapid
mineralization of dead organic matter or from the aerial organs of
plants. Fires were controlled, usually set in times of lower risks and
confined to previously defined areas. The cleaning of shrubland re-
presented another form of transference and circulation of matter
between the agricultural and mountain areas.
Together all these actions prevented the accumulation of large
quantities of plant biomass, particularly inert matter, in the bush or
forest areas. They reduced the risk of fire and promoted the rapid
circulation of nutrients within the farming system and the rejuve-
nation and productivity of pasture areas. However, the whole situ-
ation changed, augmenting the risk of fires and consequently the
number of fires and scorched areas.
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 475
TULO 21

Thus, when considering the number of fires since the early 60’s
to early 80’s, there is a trend, with minor inter-annual fluctuations,
located below five fires per year. 1978 marks a breaking point with
this “stability”: from this year onward, we can identify a growth
trend.
With regard to burnt areas until 1974, there is no record of any
year with over 100 hectares and it was only in 1974 that the scor-
ched areas reached this value, whereas in the previous year’s re-
cords reveal the near inexistence of burnt areas. 1975 definitely
breaks this “calming” effect, and stands out as the year in which
2207 hectares burned. With the exception of 1976 and 1977, years
in which there was a drastic reduction, the total area burnt (settle-
ments and bush) came to be situated, on average, around 100 hec-
tares annually. The year 1981 records the second highest result
(952 hectares).
A new reality begins to take shape in the 80’s and is accentua-
ted from the 90’s to the present. It appears therefore that in Vieira
do Minho, the fires have revealed a greater “preference” for scru-
blands, which have been under fire all year round, although a signi-
ficant part occur outside the summer months. Once the fires for the
renewal of grassland normally take place outside summer months,
it can therefore be deduced that this is one of the main reasons for
the outbreak of fire in bush areas/scrublands.

6. RENOVATION OF PASTURES

As mentioned previously, the origin of fires is very broad and


the motivations that are often behind them are equally varied and
complex. However, the disruption of the traditional rural structures
transformed the once balanced territories into spaces of great vul-
nerability, especially in terms of forest fires occurrences.
476 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

The new reality underlying the current set of diverse conflicts


results from a wide range of antagonistic interests, derived from
land use, such as the interaction between the rural world and urban
visitors, raising cattle in free, vacant lots, hunting, etc.
This results in a large number of bush fires and forest fires, of ei-
ther an intentional or negligent source, as pastures are burnt in or-
der to be regenerated – e.g., namely through the periodic burning of
bush and grass in order to improve the forage quality of rangelands.
Thus, when we overlap the cartography of fires, which occurred
in the summer months and in the remaining months of the year,
and the mapping of pastures, we verify the coincidence of these two
areas (Figure 5).

Figure 5 – Areas of pastures and forest fires (1996-2017)

Source: ICNF
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 477
TULO 21

This reinforces the idea that in the municipality of Vieira do


Minho, more than 74% of the fires develop in “potential areas of
pasture”, showing on one hand the vulnerability of these areas and
secondly, the pressures (grazing, livestock, ...) they are subject to.
The recurrence of fires is especially useful in identifying areas whe-
re the fire originated from conflicts related to land use, notably with
the renovation of pastures and where the high frequency of fires ham-
per forest production and induces degradation of soils and vegetation.
It is therefore in the pasture areas of the north sector of the mu-
nicipality, an area under strong pressure in terms of livestock, whe-
re the highest values (6, 7 and 8) of recurrence occur (Figure 6)
and which, according to the Regional Plan for Forestry Planning of
Lower Minho (2006), appears to be linked specifically to grazing/
livestock.

Figure 6 – Number of times the same area was scorched by fire (1990-2017)

Source: ICNF.
478 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

In the pastoral areas, one aspect to consider is the inflammabi-


lity of different species existing there and, although it varies throu-
ghout the year and for the various constituent parts of a plant, there
are inflammability standards for distinguishing the different spe-
cies at this level (Table 3).
Table 3 – Inflammability and Calorific power - shrub species
Inflammability Calorific power
Erica
Genista falcata
Ulex parviflorus
Cistus salvifolius
Cytisus multiflorus
Pteridium aquilinum

low medium high unknown

Source: Adapted from Vallette, 1990; Martin and Lara, 1989 in Silva e Páscoa, 2002

Along with the inflammability, the calorific power should be


taken into consideration in order to establish a joint classification
of the inflammability and calorific value of some shrub species in
the study area.
We are also interested in the combustibility of scrubbed land
(Table 4), since this landscape unit is the dominant type in the stu-
dy area.

Table 4 – Combustibility of scrubbed land


Underdeveloped - Height <30 cm low
Intermediate state - Height 30-50 cm medium
Developed - Height >50 cm high

Source: Adapted from Ronde in Silva and Páscoa, 2002


António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 479
TULO 21

The accumulation of plant phytomass in mountain areas with


high levels of inflammability, calorific power, and combustibility sig-
nificantly enhances the risk of fires. Admittedly, we cannot establish
a direct link between the quantity of accumulated phytomass and the
occurrence of fires. However, the use of fire appears as an alternati-
ve/adaptive form of resolving the need to cleanse and rejuvenate the
pasture areas or even exercise control over the natural regeneration
of vegetation without needing to apply human means to do so, na-
mely by applying grazed, thinning or controlled fires. Thus, uncon-
trolled fires occur which eventually reach proportions and areas that
go far beyond what was originally intended. Stemming from these
uncontrolled fires is the increase in erosion/land degradation.

7. CONCLUSIONS
In the municipality of Vieira do Minho, especially in the moun-
tain areas, the loss of traditional rural structures generated a signi-
ficant agricultural abandonment. These was coupled with a drastic
reduction in the number of sheep and goats and an increase in the
number of horses, the non-rotation of animals in grazing area, as
well as the non-differentiation of grazing periods, accompanied by
an expansion of free-grazing. All this associated with a marked re-
duction in the rustle of bush areas and a significant decrease in the
consumption of firewood in a region where the primary produc-
tivity of bush wood’s is high, leading to an accumulation of these
fuels. Moreover, these changes take place in an overall context of
quasi-nonexistence of forest planning measures.
Thus, large fuel loads, low productivity of traditional pastures,
unregulated free-grazing, the search for new pastures and multi-
functional use of space led to an increased risk of fire. It must be no-
ted that after 1974, Vieira do Minho, and particularly Cabreira Mou-
ntain, have had a long history of forest fires due to various causes.
480 IMPLICATIONS OF GRAZING PRACTICES IN THE RISK OF FOREST FIRES IN MOUNTAIN AREAS OF NORTHWESTERN PORTUGAL

In Vieira do Minho, the number of horses has always been lower


than in comparison to the remaining domestic and small cattle. The
number of horses has increased slowly but gradually from the 70s,
in contrast to cattle, sheep and goats that continue the reduction
trend. This tendency is directly related to the allowances allocated
to Garranos (support for indigenous and threatened breeds), which
made its breeding quite attractive.
Although equine contribute to the scenic attractiveness of mou-
ntain areas, they are responsible for several conflicts and have con-
tributed to the high pressure on the existing hill pastures, compe-
ting directly for food with cattle. The renewal of pastures (not only
for Garranos) is one of the main motivations for carrying out fires,
which often degenerate into larger forest fires. This motivation is
accompanied by other motivations, such as hunting or conflicts of
different nature.
Indeed, the use of fire in mountain areas has increased, in an en-
vironment of large accumulation of phytomass, with high inflamma-
bility, calorific power and combustibility, creating conditions for fi-
res to be more recurrent. This increase is due to the growing need
to renovate the pasture for livestock, especially cattle horse. The
economic incentives to protect the Garrana horse species have in-
creased the number of horses, which are totally dependent on the
food produced in pastures located in the mountain areas.
The use of fire also aims to provide enough food for the horse
and prevent Garranos from seeking food in adjoining private areas
or coming down from higher pastures in search of food, especially
in oak fruit trees, often located along roadsides, thus causing road
accidents.
However, extensive grazing represents an irreplaceable form of
recovery of difficult territories with low attractiveness and produc-
tivity. From a social point of view, several authors suggest that ex-
tensive areas of grazing remains the only profitable way to exploit
António José Bento Gonçalves; António Avelino Batista Vieira; Francisco da Silva Costa 481
TULO 21

significant areas of the Portuguese mountain territories (Castro,


2008). It is therefore necessary to develop strategies that promote
the coexistence of livestock and the reduction of the risk of fire.

REFERENCES

ALVES, A. L., CARVALHO, N., SILVEIRA, S., MARQUES, J., COSTA, Z. E HORTA,
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BENTO-GONÇALVES, A. (2011) Geografia dos Incêndios em Espaços
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CAPÍTULO 24 ELAINE VASCONCELOS NASCIMENTO LEAL
JAILTON DE JESUS COSTA

DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL: PROPOSIÇÃO


CONCEITUAL E APLICAÇÃO NO BAIRRO JABOTIANA, EM
ARACAJU-SE

1. INTRODUÇÃO

Diferentemente da dinâmica de pessoas nas ruas de bairro que


havia nas cidades antigas e tradicionais, as cidades contemporâne-
as passam por diversas alterações na sociedade e na configuração
urbana que modificaram a maneira como as pessoas utilizam os es-
paços urbanos. Estes tem se tornado “desertificados”, e as pessoas
se desfizeram do apoio mútuo entre vizinhos capaz de proporcio-
nar vigilância mútua e mais segurança, comunicação e união para
fortalecimento da comunidade, supervisão das áreas urbanas e na-
turais, e o bem-estar da sociedade.
Diante disso, para fins do estudo interdisciplinar dessa temá-
tica, desenvolveu-se o termo “desertificação socioambiental” cujo
objetivo do presente capítulo é de discuti-lo e exemplificá-lo no
bairro Jabotiana, em Aracaju-SE, tendo como procedimentos me-
todológicos levantamentos bibliográficos e documentais, visitas in
loco e aplicação de entrevista estruturada com perguntas abertas
484 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

ao presidente de movimento ambiental do bairro em questão. A


proposição conceitual em estudo refere-se ao abandono dos usos
tradicionais das ruas de bairro e de espaços naturais, a exemplo do
rio e das áreas verdes, pelos moradores e transeuntes.
Este abandono tem alguns fatores relacionados, a exemplo de
mudanças na sociedade; configuração urbana inadequada; leis
que não regulamentam a ocupação do espaço apropriadamente;
e, em alguns casos, o Estado que facilita a construção de empre-
endimentos imobiliários em desacordo com leis específicas. Como
resultado, são permitidas novas construções que ocupam quadras
em grandes dimensões; com altos muros fechados que segregam os
espaços públicos e privados; ocupação de áreas de fragilidade am-
biental e sem infraestrutura; e valorização de bairros centrais em
relação aos bairros populares, que crescem nas zonas periféricas
afastadas e desconexas do centro urbano, o que gera implicações
em termos de transporte, infraestrutura e qualidade de vida. Dessa
forma, entende-se que é essencial um adequado planejamento ur-
bano que proporcione mais sociabilização, correspondendo à sus-
tentabilidade urbana.
Oportunamente, tal discussão traz à memória a situação do bair-
ro Jabotiana, localizado a oeste do município de Aracaju. Situado
em torno de grande parte do rio Poxim, o Jabotiana teve um im-
pulso no crescimento imobiliário em 2001 devido às intervenções
governamentais de financiamento nessa área, mas acompanhado
de muito desmatamento, poluição, frequentes enchentes, esvazia-
mento de pessoas nas ruas e aparente individualismo nas relações
de vizinhança.
Nesse contexto, o artigo está estruturado, além da Introdução e
das Considerações finais, em duas seções: Procedimento metodoló-
gico e Resultados e discussão. Este está subdividido em “Discutindo
o conceito de Desertificação socioambiental” e “O caso do bairro
Jabotiana em Aracaju-SE”. A primeira expõe o desenvolver do ter-
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 485
TULO 21

mo em discussão e sua relação com os aspectos social, ambiental e


econômico, enquanto que a segunda descreve as circunstâncias do
bairro abordado correspondentes à “desertificação socioambien-
tal”. Com esse estudo, gerou conhecimentos sobre os entraves pro-
vocadores da possível “desertificação socioambiental” e seus efei-
tos na sociedade, a fim de contribuir com políticas públicas locais
de estratégias urbanas seguras, atrativas e sustentáveis.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Este artigo é exploratório com abordagem qualitativa, conside-


rando seu processo investigativo e conceitual. Para se chegar ao
objetivo proposto de discutir o conceito de “desertificação socio-
ambiental” no meio urbano e de exemplificá-lo em ocupações do
bairro Jabotiana, será utilizado o método dedutivo numa análise de
estudos sobre o abandono dos usos tradicionais das ruas de bairro
e de espaços naturais, bem como das relações socioambientais ur-
banas no bairro em questão.
Num caráter teórico, os procedimentos metodológicos foram
baseados numa análise bibliográfica e documental em artigos inde-
xados pela CAPES, livros, na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e
Dissertações, e em registros disponibilizados por órgãos públicos,
bem como em observação in loco e entrevista aberta. Tal investiga-
ção procura desvendar conceito e características de um fenômeno
urbano, e averiguar um exemplo da prática da “desertificação so-
cioambiental” com intuito de contribuir com melhorias na qualida-
de de vida e da sustentabilidade socioambiental nas cidades.
486 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Discutindo o conceito de “desertificação socioambiental”

Para se chegar à escolha do termo “desertificação socioam-


biental”, investigou-se que, na Geografia, o termo literal desertifi-
cação, é o processo de um fenômeno que, simultaneamente com a
relação sociedade e natureza, modifica expressivamente aspectos
paisagísticos do ambiente. Também diz respeito à geração de impactos
de abrangência social, ambiental e econômica (OLIVEIRA, 2017).
Popularmente, e com significado conotativo, a mesma expressão
desertificação remete também ao sentido de escassez, ausência ou de-
saparecimento de algo, assim como a extinção do estrato arbóreo de
uma paisagem natural que se tornou deserta. Similarmente ao sentido
literal da Geografia, o termo evidencia a relação do homem com o meio
natural e repercute em influências social, econômica e ambiental.
O vocábulo desertificação, em sua definição figurada, já é utili-
zado também em estudos urbanos para se referir à falta de pessoas
nos espaços urbanos (Quadro 1), demonstrando a importância do
estudo dessa temática:

Quadro 1 – Autores que utilizam o termo desertificação para se referir à falta de dinâmica de pessoas nas ruas.
AUTOR ATUAÇÃO OBRA/ANO ABORDAGEM
Apontava as zonas de fronteiras desertas, capital es-
Jane Ativista Morte e Vida de Grandes peculativo, subvenção de moradias e a construção das
Jacobs política Cidades (2014) cidades para automóveis como causas do espaço urbano
desertificado.
Cidade para pessoas Explica que as cidades tem se tornado desertas e deses-
Jan Gehl Urbanista
(2015) timulantes devido a entraves no planejamento urbano.
Processo de ‘desertificação’ Descreve a falta do cenário privilegiado da reprodução
Saskia
Socióloga é uma ameaça para as cida- social e da cidade tradicional como perigos causadores da
Sassen
des (2015) “desertificação” das cidades.
Espaço público e acessibili- Ressalva que a privatização de ruas e acessos restringe o
Ângelo
Geógrafo dade: Notas para uma abor- movimento de passantes, canaliza percursos e provoca a de-
Serpa
dagem geográfica (2004) sertificação de muitas áreas públicas nas periferias urbanas.
Fonte: Obras destacadas no quadro. Organização: Elaine Vasconcelos Nascimento Leal, 2018.
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 487
TULO 21

Porém, aliado a este significado, para essa abordagem, houve


a necessidade de uma expressão que acrescentasse a carência da
relação de comunidade e vizinhança, além do cuidado com o meio
ambiente em que o bairro está inserido.
Dando continuidade à pesquisa sobre um termo mais adequa-
do, infere-se que, bem apropriadamente, a palavra ‘socioambiental’
diz respeito à “necessidade de procurar compatibilizar as ativida-
des humanas em geral – e o crescimento econômico em particular
– com a manutenção de suas bases naturais” (VEIGA, 2007, p.91).
Ratificando esse significado, Tassara (2008, p.180) define que ‘so-
cioambiente’ refere-se às “ações e movimentos ambientalistas que
considera que as dimensões sociais, físicas e naturais dos ambien-
tes são indissociáveis, devendo ser abordadas de forma integrada.”
Dessa forma, o termo “desertificação socioambiental” foi esco-
lhido para representar a ausência de sociabilidade e sentido de
comunidade: apoio mútuo entre vizinhos, conversas corriqueiras
e atividades coletivas entre moradores em praças, calçadas e em
áreas naturais de bairro, a exemplo de rios e áreas verdes urbanas.
É mister ressaltar que segundo Harvey (2005a), deve-se exigir
dos planejadores e gestores, mais sensibilidade às tradições verna-
culares, à vida urbana e às questões sociais nas novas configurações
urbanas capitalistas. Referente a isto, Jacobs (2014) e Gehl (2015)
apontam para uma escala urbana de menores extensões, presen-
ça de parques e praças, calçadas em condições físicas apropriadas,
muros permeáveis visualmente, dentre outras caraterísticas físicas
atraentes aos usuários dos espaços públicos.
Além disso, é pertinente acrescentar que essa atual configura-
ção urbana “deserta” está ligada à tendência contemporânea de
sentir medo da ação criminosa, o medo de se ‘misturar’ (mixofobia)
e a obsessão por segurança. A mixofobia se intensificou com a fra-
gilização dos vínculos amigáveis da comunidade que procura viver
intramuros e em condomínios que se isolam da cidade. (BAUMAN,
488 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

2009). Relacionado a esta ideia, sabe-se que o modo de vida urbano


atual é baseado na cultura do consumo que implica em comporta-
mentos de isolamento, indiferença, caráter transitório das relações
e ausência das interações entre vizinhos e a queda da solidariedade
social (WIRTH, 1997).
Quanto a não integração da vizinhança e cuidado com as áreas
naturais, faz-se oportuno destacar a relação polarizada entre o ho-
mem e a natureza que Larrère e Larrère (1997) explicam existir na
sociedade de maneira geral. Diferencia-se e afasta-se o ambiente
natural do ser humano como se ambos não fizessem parte de um
mesmo mundo comum. Este pensamento contribui muito para que
as intervenções das atividades antrópicas, inclusive o processo de
urbanização, não façam o “bom uso da natureza”, como: ocupação
de áreas de preservação e risco ambiental; poluição de diversas or-
dens; segregação espacial entre natural/artificial; e pouca super-
visão e consciência da comunidade em relação ao meio ambiente.
Consciente da importância dessa dinâmica socioambiental nas
cidades, um dos objetivos para o Desenvolvimento Sustentável es-
tabelecido pela Organização das Nações Unidas - ONU, é “tornar
as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros,
resilientes e sustentáveis” através, inclusive, do planejamento e
gestão de participativos e integrados; da proteção do patrimônio
cultural e natural; e do apoio às relações econômicas, sociais e am-
bientais positivas entre áreas urbanas, periurbanas e rurais (ODS,
2015). Assim, entende-se que a “desertificação socioambiental” nos
espaços urbanos deve ser combatida para se alcançar a sustentabi-
lidade urbana, considerando a influência desse fato nos aspectos
sociais, ambientais e econômicos de maneira interligada.
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 489
TULO 21

3.2 Aspecto Social da “Desertificação socioambiental”

A dinâmica de pessoas nas ruas de bairro está diretamente


ligada ao espaço público (relação entre espaço e sociabilidade
pública segundo Leite, 2008), pois é nele que ocorre o lugar
de encontro de diferentes ideias e opiniões e são palcos dos
encontros e manifestos que envolvem decisões políticas. As-
sim, a “desertificação socioambiental” é capaz de inibir uma
cidade democrática, reivindicações de melhorias ao poder pú-
blico, bem-estar social e sentido de comunidade, já que não há
contatos rotineiros para intercâmbio dos fatos, nem apoio de
vizinhança.
Também se entende que a “desertificação socioambiental”
interfere negativamente na “esfera pública, a qual Habermas
(2011) se refere como uma rede comunicativa, tomada de po-
sição e opiniões públicas, com linguagem natural, simples e
compreensível do cotidiano. Nesse sentido, o fortalecimento
das comunidades (inclusive urbanas) ocorre através das tro-
cas de informações das identidades locais, que levam à ex-
planação dos problemas sofridos em determinados espaços,
a manifestar-se contrário a forças dominantes, bem como a
contribuir com políticas locais de melhorias sociais, econômi-
cas e ambientais. Para isso, é essencial que haja um conheci-
mento mais detalhado das necessidades de cada local, desco-
bertas por meio do envolvimento diário dos moradores entre
si e com as condições específicas de cada bairro.
Além de proporcionar o empoderamento1 das comunidades,
o uso das ruas dos bairros pelos moradores e transeuntes é ca-

1 Esse empoderamento é a ação social coletiva de participar de debates que visam poten-
cializar a conscientização civil sobre os direitos sociais e civis. Esta consciência possibilita
a aquisição da emancipação individual e também da consciência coletiva necessária para a
superação da dependência social e dominação política.
490 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

paz também de inibir a insegurança pública. A vigilância mútua


é uma grande aliada da minimização de ações de meliantes numa
comunidade. Conforme Gehl (2015), estratégias de prevenção ao
crime procuram reforçar os espaços comuns na cidade para que o
encontro. Proximidade, confiança, consideração e vigilância mú-
tuas estão em direta oposição a muros, portões e maior presença
policial nas ruas.
Reforça-se aqui a ideia de que a formação da experiência huma-
na nos espaços confinados é inibida, mas nos lugares públicos dos
espaços urbanos, os saberes são compartilhados, em busca de sen-
tido e identidade.

3.3 Aspecto Ambiental da “Desertificação socioambiental”

Ao reconhecer a importância dos espaços públicos como meios


de mobilização de conhecimentos para ação coletiva, e da análise de
problemáticas em âmbito local, sabe-se que medidas de proteção ao
meio ambiente também surgem com a participação popular em es-
paços públicos. Diante disso, a sociedade deve se informar sobre os
fatos pertinentes da crise ambiental em debates públicos para ser
porta-voz, fiscalizar e se manifestar contrária às decisões impostas
pelo Estado que venham a ser prejudicais ao seu local de vivência.
Além disso, a dinâmica de pessoas nas ruas está diretamente li-
gada ao fato das pessoas caminharem nelas e, consequentemente,
à mobilidade urbana com meios de transporte menos poluentes.
Isso porque ruas “desertificadas” tornam o ambiente mais perigoso
e menos convidativo, fazendo com que as pessoas recorram ape-
nas aos transportes motorizados e particulares que congestionam
as vias. “Em muitos casos, as pessoas abandonaram as cidades e
é praticamente impossível chegar aos vários equipamentos nelas
presentes sem carro. O pedestrianismo, a vida urbana e a cidade
como local de encontro, todos foram anulados” (GEHL, 2015, p.26).
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 491
TULO 21

É primordial ressaltar também que é essencial a vivência dos


moradores às áreas naturais, pois assim torna possível criar identi-
dade e supervisão por parte dos moradores ao local de fragilidade.
Pode-se mencionar o exemplo dos rios urbanos que, muitas vezes,
são escondidos da paisagem da cidade através de construções que
os fazem desaparecer da vista, perdendo-se essa referência e a
oportunidade para averiguar ações de degradação. Em contrapar-
tida, se ao longo das margens desses rios urbanos se implantasse
um parque linear, e se lhe incorporasse um usufruto de vivência de
pessoas, a dimensão ambiental se valorizaria (LERNER, 2015).
Conclui-se que, ao combater o desperdício, utilizando formas de
deslocamentos mais eficientes (aproximando as funções urbanas
de vida e trabalho, por exemplo) e menos poluentes, bem como
proporcionar mais afinidade entre as pessoas e o meio inserido, a
sustentabilidade será conduzida a grandes melhorias.

3.4 Aspecto Econômico da “Desertificação socioambiental”

O comportamento “isolado” das pessoas e o próprio surgimen-


to da configuração urbana “desertificada”, estão ligados também à
questões econômicas. Wirth (1997) aponta a especialização pro-
fissional e as relações utilitárias (quando se é útil ou tem interesse
de algo com alguém) como características presentes nas poucas
interações de pessoas nas cidades. Harvey (2005b) explica uma
configuração urbana vinda da produção de um espaço capitalista
onde existe troca de interesses entre poder público e empreitei-
ras. A produção desse espaço contribui para um meio urbano “de-
sertificado”.
Este último autor traz também outra abordagem urbana socio-
econômica: a importância ao incentivo a pequenas empresas, co-
mércio local e envolvimento com a comunidade. É imprescindível
a valorização dos pequenos comércios de bairro que, além de con-
492 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

tribuir economicamente para as famílias empreendedoras locais,


colaboram melhor com a dinâmica nas cidades. Isso porque em
suas menores unidades, proporcionam mais oportunidades de in-
teração entre compradores e vendedores, e as fachadas se tornam
mais atrativas como zona de transição entre meio público e privado
(GEHL, 2015). Porém, os terrenos densos e altamente construídos
sem espaços públicos interativos, tornam as cidades sem subecono-
mias nem atividades culturais.
Outra questão é que a relação mobilidade urbana e o uso dos
espaços públicos pelas pessoas também contribui com os custos
econômicos do país, já que os meios não motorizados são opções
mais baratas de transporte, tanto para os usuários, quanto para o
poder público segundo Gehl (2015).
Acrescenta-se que, em cidades de países emergentes, os espaços
públicos se tornam ainda mais preciosos, pois esses espaços são
mais utilizados para percorrer a pé e de bicicleta, comércios ambu-
lantes e convivência com os moradores (GEHL, 2015). Dessa forma,
proporcionar boas condições do transporte coletivo e priorizar a
infraestrutura da ciclovia, é imprescindível numa política voltada
para o uso efetivo dos espaços nas ruas.

3.5 O caso do Bairro Jabotiana em Aracaju-SE

O Bairro Jabotiana está localizado na zona Oeste do muni-


cípio de Aracaju, capital do Estado de Sergipe, ocupando uma
área aproximada de 982 ha (SEPLOG, 2017). Com uma popu-
lação de 17.157 habitantes (IBGE, 2010), encontra-se entre
os bairros Capucho ao norte; América, Ponto Novo e Luzia ao
leste; São Conrado e Santa Maria ao sul; e, ao oeste, com o mu-
nicípio de São Cristóvão.
Originado em 1978, com a construção dos conjuntos habita-
cionais J.K. e Sol Nascente, a expansão urbana no Bairro Jabotia-
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 493
TULO 21

na se intensificou em 2001 com as intervenções governamentais


nessa área. Através do Programa de Arrendamento Residencial -
PAR (parceria entre o Governo Federal e os governos municipais
para população com renda mensal de 3 a 6 salários mínimos),
o crescimento imobiliário e o processo de verticalização com a
construção de inúmeros condomínios residenciais foram impul-
sionados. Esse processo se potencializou nos últimos anos com
o Programa Minha Casa Minha Vida - PMCMV (SANTOS, 2015).
Dessa forma, percebe-se que o mais recente crescimento imobi-
liário ocorreu com moradias para pessoas de rendas mais baixas
e nas regiões periféricas da cidade.
Cabe destacar que, de acordo com a classificação do Pla-
no Diretor de Aracaju em vigor, do ano 2000, o Jabotiana está
inserido na Zona de Adensamento Básico 2 (ZAB 2) e possui
áreas de interesse ambiental em torno do rio Poxim que atra-
vessa o bairro. Ainda segundo este documento, no artigo 132,
consideram-se Zonas de Adensamento Básico, as áreas que
apresentam potencial de urbanização, porém com “déficit” de
infraestrutura, sistema viário, transporte, comércio e servi-
ços, e, no artigo 134, estão expostas as diretrizes de adensa-
mento desta zona:

I - adensar de forma controlada o uso e a ocupação do solo, a


fim de aproveitar o potencial de urbanização existente, dimi-
nuindo a necessidade de novos investimentos públicos em
infra-estrutura;
II - ordenar e estimular a implantação de atividades de comér-
cio e serviços, apoiando o desenvolvimento de sub-centros;
III - assegurar espaços suficientes para estacionamento de
veículos;
IV - promover e monitorar a implantação de equipamentos e
espaços públicos, compatibilizando-os com a intensidade do
adensamento proposto;
494 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

V - articular a implantação de infra-estrutura, junto a outras


esferas de governo e iniciativa privada, priorizando obras de
esgotos sanitários e complementação do sistema viário bási-
co (ARACAJU, 2000, Art.134).

Também conforme este documento, o art. 8 estabelece que a


política de desenvolvimento do município deve ser orientada com
base em algumas diretrizes de sustentabilidade, dentre elas: “pro-
por ações de conservação dos sistemas naturais considerando a
biodiversidade, a sociodiversidade, concorrendo para a regenera-
ção e manutenção dos mesmos, diante do impacto causado pela ur-
banização” (ARACAJU, 2000, Art.8, inciso II).
Porém, o que se pode observar na prática, no Bairro Jabotiana,
é a contradição com tais orientações legislativas, pois ocorre o au-
mento desordenado de condomínios que formam quadras extensas;
ocupação do uso do solo de forma não diversificada, afastando os
comércios e serviços das residências; poucos e degradados espaços
e equipamentos públicos; e deficiências relacionadas à mobilida-
de, esgotamento sanitário e drenagem. Além disso, muitas áreas de
vegetação foram desmatadas e impermeabilizadas para a constru-
ção desses novos empreendimentos, e o rio Poxim, juntamente com
seus afluentes, vem sendo poluído e assoreado inundando o bairro
em períodos chuvosos. Destaca-se que, ao sobrepor o mapeamento
das áreas de interesse ambiental em vigor (realizado em 2005) ao
mapa com áreas construídas posteriormente a essa classificação,
percebe-se que ocorreram construções de condomínios residen-
ciais (entre os anos de 2008 a 2017) onde se estabelecia como local
de proteção e de preservação (ver figura 1).
Vale lembrar que essa desordem do crescimento urbano local se
agrava com um plano diretor que ainda está em processo de revisão
e que não acompanhou a urbanização da cidade.
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 495
TULO 21

Figura 1 – Áreas de interesse ambiental sobrepostas nas áreas construídas do bairro Jabotiana.

Fonte: Base cartográfica SEFAZ. Elaboração: Elaine Vasconcelos Nascimento Leal, 2018.
496 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

Quanto à dinâmica do bairro, apenas na Avenida Tancredo Ne-


ves e em torno dos conjuntos residenciais Sol Nascente e JK, pre-
dominam os usos do solo de comércios e serviços variados. Nestas
localidades do bairro percebe-se uma interação maior entre os vizi-
nhos que, em grande parte, são moradores antigos do bairro que se
unem nas atividades das duas associações de moradores. Destaca-
-se que a partir destas gerou-se o movimento ambientalista “Jabo-
tiana Viva” como consequência das conversas entre vizinhos sobre
as problemáticas ambientais.
Porém, nas ruas predominantes de condomínios verticais de
uso multifamiliar, há predominância de residências sem comércios
e serviços próximos, insegurança, dificuldade de acessos, descaso
com as áreas naturais e espaços vazios que denotariam uma pos-
sível “desertificação socioambiental”. Nestas áreas, o esvaziamento
do espaço urbano é acompanhado de muros impermeáveis visu-
almente; de construções que viram “as costas” para o rio Poxim e
para a vegetação ribeirinha sem espaços para interação de pessoas
(figura 2); e de pouca ou nenhuma praça. Percebe-se que o transitar
está resumido ao acesso às moradias ilhadas e ocorrem, preferen-
cialmente, através de veículo motorizado.
O Rio Poxim e as áreas verdes que o margeiam2 são frequentemente
isolados e “esquecidos” da vida cotidiana dos moradores (figura 3).
Consciente disso, reconhece-se que no bairro:

2 Considerando que os cursos d’água do Rio Poxim que percorrem o bairro Jabotiana têm
dimensões que variam em torno de 9 – 45 metros de largura (com base no mapa de Araca-
ju disponibilizado por SEFAZ (2015), e calculado no software AutoCAD 2D® (AUTODESK,
2010)), sabe-se que as faixas de vegetação que o margeiam procuram seguir o Código Flo-
restal (Lei 12.651 de 2012). A lei considera áreas de preservação permanente as faixas mar-
ginais de qualquer curso d’água natural, desde a borda da calha do leito regular, em largura
mínima de: a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de
largura; b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cin-
quenta) metros de largura (BRASIL, 2012, Art.4, inciso I).
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 497
TULO 21

Figura 2 - Rua Antônio José dos Santos, às 16h41min.

Fonte: Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; novembro/2017.

Figura 3 – Avenida Escritor Graciliano Ramos, às 16h32min.

Fonte: Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; novembro/2017.


498 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

Há uma certa distância entre a relação dos moradores com


as áreas naturais. Elogiam quando nós do movimento plan-
tamos e regamos as árvores (...) mas esperam que os outros,
que são poucos, façam ao invés de se envolverem. O indivi-
dualismo e a urbanização constante dificultam essa relação
com o meio ambiente, as pessoas estão muito focadas ape-
nas em seu trajeto e no isolamento (MELO, 2018).

Além das circunstâncias apresentadas que influenciam na di-


nâmica de pessoas nas ruas, o bairro Jabotiana também apresenta
transtornos quanto a congestionamentos, dependência do trans-
porte motorizado, ineficiências de estruturas do transporte não
motorizado, bem como pouca arborização que proporcione confor-
to térmico aos transeuntes (MELO, 2018).
Diante dessa exposição, reforça-se a ideia de que os compor-
tamentos humanos diante das áreas naturais (poluição, ocupação
em áreas de risco ambiental) são reflexos da sociedade que trata o
homem e a natureza de maneira dicotômica e segregada. Há neces-
sidade de uma adaptação humana a uma ética de responsabilidade
que abranja a participação da sociedade em decisões políticas e es-
tratégias de cuidado e precaução (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997).
Ademais, apesar da reconhecida influência da atual sociedade
capitalista reservada, percebe-se através do bairro Jabotiana, a re-
lação direta entre o comportamento social e a configuração da ci-
dade. Suas características físicas podem proporcionar atratividade
ou repulsa de pessoas, denotando a presença da “desertificação so-
cioambiental” em partes do bairro. Outro aspecto notório deve-se à
presença do movimento ambientalista e associações de moradores
que, em busca de melhorias locais, evidenciam a importância da in-
teração comunicativa da vizinhança nos espaços públicos.
Elaine Vasconcelos Nascimento Leal; Jailton de Jesus Costa 499
TULO 21

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nos resultados e discussões, conclui-se que a expres-
são “desertificação socioambiental” possui, em sua essência, uma
definição acertada para as novas relações socioambientais urbanas.
A necessidade da adoção de um termo específico para tal fenômeno
se dá pela importância de se investigar mais precisamente esse fato
nas cidades que traz diversas implicações em âmbitos sociais, am-
bientais e econômicos. O estudo dessa temática se torna essencial
na busca de estratégias para cidades mais sustentáveis, consideran-
do o entendimento interdisciplinar de que a dinâmica de pessoas
nas ruas de bairro e o desenvolvimento local precisam ser estimu-
lados em detrimento ao isolamento/distanciamento.
Diversos são os fatores relacionados ao surgimento da “deser-
tificação socioambiental”, dentre os quais, as características físicas
do meio urbano que demonstram influenciar no comportamento
de atrair, ou não, os moradores e transeuntes ao espaço externo à
sua moradia e à consequente relação de vizinhança. A imperme-
abilidade visual das fachadas; as grandes escalas das ruas e dos
edifícios; monotonia dos usos do solo; calçadas, ciclovias e praças
inexistentes ou em más condições de conforto térmico e de conser-
vação; e carência de acessibilidade universal são alguns dos fatores
que compõem a configuração do espaço “desertificado”. Sob essa
compreensão, entende-se que esses são elementos que devem ser
evitados no planejamento urbano.
Apesar disso, tal panorama de “desertificação socioambiental”
é muito encontrado nas cidades contemporâneas, como se infere
no bairro Jabotiana, em Aracaju-SE. Em posse de diversas proble-
máticas ambientais e na infraestrutura urbana, essa localidade
apresenta situações de esvaziamento das relações cotidianas dos
moradores nos espaços públicos, principalmente onde há predomi-
nância de condomínios residenciais e monotonia de uso e ocupação
500 DESERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL

do solo. Assim, se depreende ainda mais a relação entre as caracte-


rísticas físicas da cidade e a “desertificação socioambiental”.
Com essas informações, espera-se contribuir para que o poder
público interfira no planejamento urbano mais sustentável e de con-
trole do crescimento urbano, através de leis, regulamentos e reserva
de espaços para equipamentos públicos que provoquem a atração de
pessoas e dinamicidade das ruas. Além disso, fornecer dados con-
cernentes à “desertificação socioambiental” que fomentem o olhar
crítico da população em relação à necessidade das construtoras se
adequarem à configuração urbana imposta pelo poder público.

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WIRTH, L. O urbanismo como modo de vida. In: Fortuna, Carlos (org)
Cidade, Cultura e Globalização. Ensaios de sociologia. Oeiras: Celta Editora,
1997.
503

SOBRE OS AUTORES

Adriana Aparecida Lazzarini


Licenciatura e Bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade Esta-
dual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2000); Licenciatura em Geografia
pela Faculdade de Educação São Luís (2003); Especialista em Educação
Ambiental pela Faculdade de Educação São Luís (2006); Licenciatura em
Pedagogia pelo Instituto Paulista São José (2016). Atualmente professora
titular da Rede La Salle São Carlos/SP, área: Geografia. Professora efeti-
va, área: Geografia na Escola Estadual Professor Marivaldo Carlos Degan.
Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Rede Nacional para o
Ensino das Ciências Ambientais - EESC-USP. adrianalazzarini@usp.br; cv:
http://lattes.cnpq.br/7078687586427669

Ajibola Isau Badiru


Doutor em Ciências (Tecnologia Nuclear pela USP); Pós-doutorado em
Estudos Urbanos e Regionais com foco em Ecologia da Paisagem Urbana
e Diagnóstico Socioambiental (Michigan State University, MSU, Estados
Unidos, 2007; IPEN, 2006-2010; UFS, 2010-2012). Atualmente é Profes-
sor do Programa Interdisciplinar de Pós-Graduação (Sociedade, Tecnolo-
gias e Políticas Públicas) do Centro Universitário Tiradentes (Unit/Alago-
as/Brasil); ajibolacanada@hotmail.com

Alberlene Ribeiro de Oliveira


Doutora em Geografia PPGEO/UFS. Professora Colaboradora do Progra-
ma de Pós-Graduação em Rede Nacional para Ensino das Ciências Am-
bientais (PROFCIAMB/UFS). Também atua como professora da Facul-
dade Amadeus/FAMA. Pesquisadora do GEOPLAN/UFS. Pesquisadora
do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Geografia, Filosofia e Educação
- NEPGFE/UFS. Cidade Universitária Professor José Aloísio de Campos,
São Cristovão/SE, Brasil, CEP 49100-000. Tel: (+ 55 79) 2105-6782. al-
berlenegeo@hotmail.com
504 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Aline Fabiane da Silva


Mestranda no Programa de Pós-graduação em Rede Nacional para o En-
sino das Ciências Ambientais – PROFCIAMB/USP. Graduada em Licencia-
tura em Ciências Exatas pela Universidade de São Paulo (USP/EESC) com
habilitação em Química e Matemática, e Licenciatura Plena em Pedagogia
(UNINOVE). Professora da Educação Básica (Educação Infantil e Ensino
Fundamental) na Rede Municipal de Ensino de São Carlos. E-mail: aline.
fabiane.silva@usp.br

Ana Daniela Alves Jorge


Geógrafa e mestre em Dinâmicas Sociais e Riscos Naturais e Tecnológicos
pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. É Assistente Convi-
dada na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Oliveira do Hospital, do
Instituto Politécnico de Coimbra, onde lecciona disciplinas da área de Geo-
grafia Humana e Planeamento e Ordenamento do Território. Desenvolveu
a dissertação de mestrado no âmbito de um estágio realizado na Câmara
Municipal de Coimbra, o que lhe permitiu desenvolver, no plano teórico
e no plano aplicado, o estudo da articulação entre os Riscos Naturais, o
Urbanismo e o Ordenamento do Território. Neste momento, desenvolve a
sua tese de doutoramento em Geografia Física sobre Riscos Naturais.

André Luiz Brito Nascimento


Doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia (2009), Mestre
em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (1999), Bacharel
em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (1990) e Licen-
ciado em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (1991).
Atualmente é professor Adjunto B da Universidade Estadual de Feira de
Santana, lotado no Departamento de Educação. Tem experiência na área
de Educação, atuando principalmente nas seguintes áreas: sociologia da
educação, metodologia da pesquisa em educação, gestão educacional e
formação de professores. E-mail: andre12@uefs.br CV: http://lattes.cnpq.
br/8767453879600750

Anézia Maria Fonsêca Barbosa


Professora Doutora da Universidade Federal de Sergipe (CODAP/UFS),
Professora Permanente do Programa de Pós-Graduação em Rede Nacional
para Ensino das Ciências Ambientais (PROFCIAMB/UFS). Pesquisadora
do Grupo de Pesquisa em Geoecologia e Planejamento Territorial (GEO-
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 505

PLAN/UFS/CNPq). Pesquisadora Grupo de Pesquisa e Ensino em Ciências


Ambientais (GPECIAMB/CNPq). Cidade Universitária Professor José Alo-
ísio de Campos, São Cristóvão/SE, Brasil, CEP 49100-000. Tel: (+ 55 79)
2105-6933. aneziamaria.barbosa@gmail.com

António Avelino Batista Vieira


Geógrafo, tendo-se doutorado em 2009, em Geografia, pela Universida-
de de Coimbra. É professor auxiliar no Departamento de Geografia da
Universidade do Minho, desenvolvendo atividades de investigação como
membro integrado do Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do
Território (CEGOT – UMinho). É membro de diversas organizações cientí-
ficas nacionais, nomeadamente da Associação Portuguesa de Geomorfólo-
gos (APGeom), de que é presidente desde 2017, e da Riscos – Associação
Portuguesa de Riscos, Prevenção e Segurança, da qual é vice-presidente.
Integra também diversas redes internacionais, sendo coordenador da Fire
Effects on Soil Properties International Network, membro da FUEGORED
(Red Temática Nacional Efectos de los Incendios Forestales sobre los Sue-
los) e colaborador do GRAM (Grup de Recerca Ambiental Mediterrània).
No âmbito das problemáticas relacionadas com os recursos hídricos e com
o ambiente participou como investigador no projeto de “Caraterização e
análise dos cursos de água do Município de Guimarães”, desenvolvido pelo
CEGOT (Departamento de Geografia, Universidade do Minho) e financiado
pela Câmara Municipal de Guimarães. Foi responsável pela Unidade Ope-
racional &quot;3. Áreas Verdes Incorporando Uso Sustentável do Solo&-
quot; (integrando também os cursos de água), da Candidatura a Capital
Verde Europeia, promovida pela Câmara Municipal de Guimarães, com o
apoio da Universidade do Minho. É também investigador no projeto “Áreas
do domínio público hídrico degradadas no concelho de Guimarães – ava-
liação hidromorfológica com base no RSH”, desenvolvido pelo CEGOT e fi-
nanciado pela Câmara Municipal de Guimarães. CV: http://buscatextual.
cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4859316Y5. vieira@geografia.
uminho.pt

António José Bento Gonçalves


António Bento Gonçalves concluiu o doutoramento em Geografia Física
e Estudos Ambientais pela Universidade do Minho em 2007. É Profes-
sor Auxiliar na Universidade do Minho. É Membro Integrado do Centro
de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT), das Uni-
506 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

versidades de Coimbra, Porto e Minho. É Parceiro Científico do GrupRe-


cerca Ambiental Mediterrània (GRAM) - Departament de Geografia Físi-
ca, Facultat de Geografia i Història, Universitat de Barcelona e Membro
da Fuegored - Red temática nacional Efectos de los IncendiosForestales
sobre los Suelos”. Faz parte de várias equipas editoriais entre as quais a
Geoderma (Elsevier), a Flamma (FuegoRed) e Revista Geouece (UECE).
Entre os múltiplos projetos de investigação em que participou refere-se
o Recover – Immediate soil management strategy for recovery after fo-
rest fires como Coordenador na Universidade do Minho, o Adaptaclima
- Adaptação aos efeitos derivados pelas alterações climáticas (SUDOE, In-
terreg, também como Coordenador na Universidade do Minho e mais re-
centemente o PREFER 1- Space-basedInformationSupport for Prevention
and Recovery of Forest Fires Emergency in the MediteRranean Area. FP7,
como Investigador. É consultor e coordenador do Projeto “Áreas degra-
dadas do Domínio Público Hídrico no concelho de Guimarães – Avaliação
Hidromorfológica com base no RSH” com o apoio da Câmara Municipal de
Guimarães e Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território
da Universidade do Minho. CV: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextu-
al/visualizacv.do?id=K4859297A9 bento@geografia.uminho

Claudia Csekö Nolasco de Carvalho


Prof.ª Titular da Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL, Campus San-
tana de Ipanema. Possui graduação em Engenharia Agronômica pela Uni-
versidade Federal da Bahia (1986), mestrado em Geoquímica e Meio Am-
biente pela Universidade Federal da Bahia (2000) e doutorado em Ciência
Tecnologia e Inovação em Agropecuária pela Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro (2015). Atualmente trabalha como perita agrária no setor
de meio ambiente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
e professor adjunto da Universidade Estadual de Alagoas. Tem experiência
na área de Agronomia, com ênfase em Gênese, Morfologia e Classificação
dos Solos, atuando principalmente nos seguintes temas: geotecnologias,
mapeamento digital de solo, degradação de solos sob pastagens. ccseko@
hotmail.com, CV: http://lattes.cnpq.br/0778998882681223

Dyego Anderson Silva Pereira


Mestrando do Programa de Pós-Graduação do Mestrado Profissional em
Rede Nacional para Ensino das Ciências Ambientais. E-mail: dyegoander-
son00@gmail.com
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 507

Elaine Vasconcelos Nascimento Leal


Arquiteta e Urbanista pela Universidade Federal de Sergipe. Mestra do
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – Uni-
versidade Federal de Sergipe. Integrante do Grupo de Pesquisa em Geoe-
cologia e Planejamento Territorial (Geoplan-UFS) e do Grupo de Estudos
e Pesquisas Interdisciplinares em Gestão, Saúde e Educação Ambiental
(GESEA-UFS). E-mail: elainevasconcelos.arq@gmail.com

Francielly Vieira Fraga


Discente do Programa de Pós-Graduação em Rede Nacional para Ensino
das Ciências Ambientais – PROFCIAMB na Universidade Federal de Ser-
gipe. Docente do Centro Universitário AGES-UniAGES, no município de
Paripiranga/BA.

Francisco da Silva Costa


Francisco Costa é Professor Auxiliar na Universidade do Minho onde con-
cluiu o doutoramento em Geografia no ano de 2008. Atua na área de Ge-
ografia física e ambiente, com uma produção científica em várias revistas
indexada em temas relacionados com o planeamento e a gestão de recursos
hídricos, o risco de inundação, a restauração de rios e património hidráu-
lico. Foi professor convidado na Universidade de Limoges e recentemente
em Paris VII (França). Coordena e participa em vários projetos dos quais se
destaca o ARCHIV-AVE - Memória digital “Património documental da bacia
do Ave” com o apoio da Agência Portuguesa do Ambiente e da Fundação
Calouste Gulbenkian. É consultor e coordenador do Projeto “Áreas degra-
dadas do Domínio Público Hídrico no concelho de Guimarães – Avaliação
Hidromorfológica com base no RSH com o apoio da Câmara Municipal de
Guimarães e Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território
da Universidade do Minho do qual é membro. Foi consultor técnico-científi-
ca do PRIOS – Projeto de Reabilitação do rio Selho, Fermentões, Guimarães”
no âmbito da candidatura ao Fundo de Proteção de Recursos Hídricos, da
Agência Portuguesa do Ambiente. Recentemente coordenou a Consultoria
Técnico-científica “Caraterização e análise dos cursos de água do Municí-
pio de Guimarães” numa parceria entre o Centro de Estudos em Geografia
e Ordenamento do Território da Universidade do Minho e a Câmara Mu-
nicipal de Guimarães. Também participa em várias revistas Internacionais
em que exerce funções de referee. Também esteve envolvido na organização
de várias reuniões científicas em Portugal e no estrangeiro. Neste momento
é Expert da União Europeia no quadro do Programa Horizonte 2020 e da
508 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

ERANETMED EU FP7. CV: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visua-


lizacv.do?id=K4068602J5 E-mail: costafs@geografia.uminho.pt

Gênisson Lima de Almeida


Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UFS). Bacharel
e licenciando em Geografia na referida instituição.l e membro dos grupos
de pesquisa em Geoecologia e Planejamento Territorial (GEOPLAN) e do
Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares em Gestão, Saúde e Edu-
cação Ambiental (GESEA).

Gilberto Jacó Carvalho Santos


Graduado em Geografia pela Universidade Federal da Bahia; Mestrando
do PROFCIAMB/UFS; Professor da Rede Estadual de Ensino. E-mail: beto.
jacob@gmail.com

Gislene Moreira Gomez


Dr.ª em Ciências Sociais pela Faculdade Latinoamericana de Ciências So-
ciais (Flacso-México), professora adjunta da Universidade Estadual da
Bahia –UNEB, Campus XXIII de Seabra. Integra os Programa de Pós-Gra-
duação em Educação e Territórios Semiárido – PPGESA da UNEB Juazeiro,
e o Profciamb da UEFS. GP: Comunicação, Cultura e Sustentabilidade na
Chapada Diamantina. E-mail: gislene.moreira@flacso.edu.mx CV: http://
lattes.cnpq.br/9686964496121854

Jailton de Jesus Costa


Doutor em Geografia (ênfase em Geografia Física). Bacharel e Licenciado
em Geografia. Docente Associado da Universidade Federal de Sergipe, lo-
tado no CAP. Docente Permanente dos cursos de Mestrado e Doutorado
do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente -
PRODEMA. Presidente da CPPD (2018/2021). Membro Titular da CPPD
(2014-2017). Ex-Presidente da ADUFS (Gestão 2014/2016) e ex- Secre-
tário Geral da ADUFS (Biênio 2012/2014). Pesquisador do Grupo de Pes-
quisa em Geoecologia e Planejamento Territorial (CNPq/UFS) e Líder do
Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares em Gestão, Saúde e Edu-
cação Ambiental - GESEA. Publicou, até o momento, 35 artigos em 18 peri-
ódicos nacionais e internacionais, 04 livros, 24 capítulos de livros, além da
participação em 84 eventos científicos no Brasil e no exterior. Tendo feito,
até o momento, parceria acadêmica com 114 pesquisadores. Orientou 17
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 509

alunos de Iniciação Científica e 03 de Mestrado, até o momento. Áreas de


atuação: Geografia Física; Dinâmica e Avaliação Ambiental; Educação Am-
biental; Gestão e Planejamento Ambiental, Biogeografia e Climatologia.
E-mail: jailton@ufs.br / jaicosta.se@gmail.com. Endereço para acessar o
CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/4093650923477755.

Jailton Santos Silva


Mestre em Educação (PPGED/UFS) e graduado em Geografia licenciatura
pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Tem experiência na área de
Educação de Jovens e Adultos, Educação Infantil e Educação Ambiental.
Participa do Grupo de Estudos Geografia, Recursos Hidrícos e Problemas
Socioambientais. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação
Ambiental de Sergipe (GEPEASE). Desenvolve pesquisas na área de Educa-
ção Ambiental e Geografia e Saúde. Atua principalmente nos temas ligados
a Educação Ambiental, Formação de Professores, Mestrado Profissional e
Saúde e Ambiente. CV: http://lattes.cnpq.br/6058421326245682. E-mail:
jailton.santossilva@yahoo.com.br

Joselisa Maria Chaves


Possui graduação em Geologia pela Universidade Federal da Bahia (1985),
especialização em Ensino em Geociências pela Universidade de Campinas
(1994), mestrado em Geologia pela Universidade Federal da Bahia (1991)
e doutorado em Processamento de Dados em Geologia e Análise Ambien-
tal pela Universidade de Brasília (2002). Atualmente é Professora Adjun-
to B e Professora do Mestrado em Modelagem em Ciências da Terra e do
Ambiente da Universidade Estadual de Feira de Santana, coordenadora
do Mestrado Profissional em Rede Nacional para o Ensino das Ciências
Ambientais, além de vice-diretora do Departamento de Ciências Exatas,
gestão 2017-2019. Membro da Diretoria da SELPER Capítulo Brasil, como
2ª Secretária e Membro do Comitê de Educação da SELPER Internacional.
Participa dos Grupos de Pesquisa do CNPq: GP-SIG (Grupo de Pesquisas
em Sistemas de Informações Geo-referenciadas eGeotecnologia Aplica-
da à Análise Ambiental. E-mail: joselisa@uefs.br; CV: http://lattes.cnpq.
br/3589599687371587

Kátia Viana Cavalcante


Doutora em Desenvolvimento Sustentável, área de Política e Gestão Am-
biental pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de
510 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Brasília CDS/UnB . Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia


Universidade Católica de São Paulo PUC-SP. Especialista em Ciência da
Computação pelo Convênio Técnico da Universidade Federal do Amazo-
nas e IBM Brasil - Indústria, Máquinas e Serviços Ltda. Professora da Uni-
versidade Federal do Amazonas/ UFAM/Campus Universitário - Senador
Arthur Virgílio Filho. Professa Permanente do Mestrado Profissional em
Rede Nacional para o Ensino das Ciências Ambientais - PROFCIAMB. Tem
experiência na área de Gestão da Informação e Gestão Ambiental, com
ênfase em gestão desenvolvimento e avaliação de abordagens inovadoras
em ambientes de constantes mudanças, mediante uso e geração de indi-
cadores socioambientais. CV: http://lattes.cnpq.br/2715253110435470.
E-mail: katiavc29@gmail.com

Lidiana Vieira dos Santos


Graduanda de Geografia Licenciatura da Universidade Federal de Sergi-
pe, pesquisadora bolsista PIBIC/COPES/UFS e pesquisadora do Núcleo
de Estudos e Pesquisas em Geografia, Filosofia e Educação – NEPGFE.
CV: http://lattes.cnpq.br/1558044141923551 E-mail: lidininadirves@
gmail.com

Luca Pinto Marson


Graduando em Licenciatura em Ciências Agrárias e Engenharia Agronô-
mica na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), da Uni-
versidade de São Paulo (USP). Bolsista do Programa PUB (Programa Uni-
ficado de Bolsas) da USP. CV: http://lattes.cnpq.br/7374583069203786.
E-mail: luca.marson@usp.br

Luciana Fonseca Mendonça


Mestranda da Pós-Graduação Mestrado de Ensino em Rede Nacional para
o Ensino das Ciências Ambientais-PROFCIAMB/UFS. Graduada em Dan-
ça pela Universidade Federal de Sergipe. Professora da Rede Estadual de
Educação (SEED). E-mail: lucianafonsecamendonca@bol.com.br

Lúcio Cunha
Geógrafo e doutor com agregação em Geografia Física. Professor Catedrá-
tico no Departamento de Geografia e Turismo e Investigador do Centro
de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT) da Fa-
culdade de Letras da Universidade de Coimbra, ao longo de cerca de 40
anos de carreira universitária tem desenvolvido trabalhos na área da Ge-
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 511

omorfologia (Geomorfologia Cársica, Geomorfologia Fluvial e Património


Geomorfológico), da Geografia Física Aplicada aos Estudos Ambientais
(Riscos Naturais, Recursos Naturais, Ambiente e Turismo), bem como dos
Sistemas de Informação Geográfica aplicados ao Ordenamento do Territó-
rio. É membro do Conselho Geral da Universidade de Coimbra e foi Presi-
dente do Conselho Directivo e Vice-Presidente do Conselho Científico da
Faculdade de Letras, bem como Diretor do Departamento de Geografia e
coordenador científico do CEGOT. Foi, também, Presidente da Comissão
Nacional de Geografia e da Associação Portuguesa de Geomorfólogos. CV:
http://lattes.cnpq.br/1860322858622625. E-mail: luciogeo@ci.uc.pt

Márcia Eliane Silva Carvalho


Professora do Departamento de Geografia, do Programa de Pós-Gradua-
ção em Rede Nacional para Ensino das Ciências Ambientais (PROFCIAMB)
e do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGEO) da Universida-
de Federal de Sergipe. Possui doutorado (2010) e mestrado (2005) em
Geografia pelo PPGEO/UFS, especialização em Gestão de Recursos Hídri-
cos e Meio Ambiente/UFS (2000) e graduação em Ciências Biológicas/
UFS (1999). O Pós-doutoramento foi concluído em 2017 no LABOCLIMA/
UFPR com a temática Geografia e Saúde. Atua nas áreas de Análise Am-
biental, Recursos Hídricos e Planejamento Territorial, Ambiente e Saúde,
Educação Ambiental, Biogeografia e Formação de Professores, tendo sido
coordenadora de área do PIBID/GEOGRAFIA/UFS. Pesquisadora do GE-
OPLAN - Grupo de Pesquisa em Geoecologia e Planejamento Territorial/
CNPq/UFS. Orienta o Grupo de Estudos: Geografia, Recursos Hídricos e
Problemas Socioambientais. Atualmente é coordenadora local do Progra-
ma de Pós-Graduação em Rede Nacional para Ensino das Ciências Am-
bientais (PROFCIAMB/UFS) e professora orientadora da Residência Pe-
dagógica Geografia/UFS. CV: http://lattes.cnpq.br/9749730002452013.
E-mail: marciacarvalho_ufs@yahoo.com.br

Maria Cláudia Silva do Carmo


Doutorado em Educação pela Universidade Federal da Bahia(UFBA). Mes-
trado em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISI-
NOS). Graduação em Licenciatura em Pedagogia pela Universidade Es-
tadual de Feira de Santana (UEFS). Atualmente é professora adjunta da
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e do PROFCIAMB-UE-
512 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

FS, UEFS.Vice- coordenadora do Grupo FORMARSER - Grupo de Pesquisa


sobre Currículo e Formação do Ser em Aprendizagens no Departamen-
to de Educação(UEFS). É membro do Grupo de Pesquisa FORMACCE em
Aberto /FACED/UFBA. CV: http://lattes.cnpq.br/1187523442842502.
E-mail: mcarmo9@yahoo.com.br

Maria do Socorro Ferreira da Silva


É Profª Adjunta do Departamento de Geografia da Universidade Federal
de Sergipe e dos cursos de Pós-Graduação Desenvolvimento e Meio
Ambiente (PRODEMA) e Mestrado Profissional em Rede para o Ensino
das Ciências Ambientais (PROFCIAMB). Possui graduação em Geografia
Licenciatura Plena e Bacharelado e Mestrado pela Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul e Doutorado em Geografia pela Universidade Federal
de Sergipe. Coordenou o Mestrado Profissional em Rede para o Ensino das
Ciências Ambientais (PROFCIAMB/UFS - outubro/ 2015 a abril/2017).
Coordenou o Programa de Educação Ambiental com Comunidades Cos-
teiras em Sergipe (Convênio PETROBRAS/FAPESE/UFS 2016-2017). Foi
É coordenadora de área do PIBID/Geografia da Universidade Federal de
Sergipe. É pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Geoecologia e Planeja-
mento Territorial (GEOPLAN/CNPq/UFS).Tem experiência na área de Ge-
ografia atuando nos seguintes temas: Ensino de Geografia, Coleta Seletiva,
Gerenciamento de Resíduos Sólidos Urbanos, Unidades de Conservação,
Educação Ambiental, Planejamento e Gestão Ambiental. CV: http://lattes.
cnpq.br/9102269983495726. E-mail: ms.ferreira.s@hotmail.com

Maria Olimpia de Oliveira Rezende


Licenciada e bacharel em Química pelo Instituto de Química da Universida-
de de São Paulo e doutora em Química (Química Analítica, com ênfase em
Química Ambiental) pela mesma universidade. Foi professora visitante jun-
to à Oklahoma State University, em Stillwater, OK, USA, de junho de 1992 a
junho de 1994, onde desenvolveu o projeto ?Uso de eletrodos quimicamen-
te modificados com enzimas para o estudo cinético de reações consecutivas,
com bolsa FAPESP, e junto à Université de Nantes, em Nantes, França, no ano
de 1996, onde desenvolveu o projeto: Uso de biossensores para análise de
pesticidas em solos e em sistemas aquosos, com bolsa FAPESP. É professora
associada da Universidade de São Paulo, junto ao Instituto de Química de
São Carlos da Universidade de São Paulo, desde 1989. Atua principalmen-
te nos seguintes temas: química ambiental, ciclagem da matéria orgânica,
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 513

vermicompostagem, tratamento de efluentes, avaliação de bioerbicidas,


química das substâncias húmicas, reaproveitamento de resíduos agroindus-
triais, resíduos de curtume, gestão e análise ambiental, validação de méto-
dos analíticos, métodos cromatográficos de análise. CV: http://lattes.cnpq.
br/6164624893473124. E-mail: mrezende@iqsc.usp.br,

Marjorie Csekö Nolasco


Dr.ª em Geociências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFR-
GS, Profª Titular da Universidade Estadual de Feira de Santana - UEFS,
Departamento de Ciências Exatas - DEXA, Programa de Pós-Graduação
em Modelagem em Ciências da Terra e do Ambiente – PPGM, Mestrados
em Modelagem em Ciências da Terra e do Ambiente - MCTA e Profissional
em Ensino de Ciências Ambientais – Profciamb/ Polo Bahia, Grupos de
Pesquisas (GP’s): 1. História Ambiental e Tecnogênese, 2. Geodiversidade,
Patrimônio Geológico e Geoconservaçao – UFOP,3. Estudos fisioecológicos
e avaliação de impacto ambiental sobre ecossistemas da Bahia, mcn@uefs.
br, CV: http://lattes.cnpq.br/3140556424871309

Michael Antonyne Alves Silva


Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Rede Nacional Para Ensino
das Ciências Ambientais (PROFCIAMB), pela Universidade Federal de Ser-
gipe. E-mail: michael_ufs@live.com.

Núbia Dias dos Santos


Doutora em Geografia pela Universidade Federal de Sergipe; Professora
Associada do Departamento de Geografia da UFS. Membro do corpo do-
cente permanente do PROFCIAMB e PRODEMA; Integrante do DAGEO.
E-mail: nubisantos85@gmail.com

Patrícia de Moura
Mestranda no Programa de Pós Graduação em Rede Nacional para Ensino
das Ciências Ambientais, Polo USP, Licenciada em Ciências pela Universida-
de de São Paulo - USP, Bacharel em Administração de Empresas pela Facul-
dade Cenecista de Capivari, Especialista em Gerenciamento Ambiental pela
Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz - ESALQ/USP e professora
do ensino fundamental na Rede Estadual de Ensino de São Paulo. E-mail:
patricia2.moura@usp.br. http://lattes.cnpq.br/4111690631634540.
514 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Priscila Paixão Lopes


Dr.ª em Zoologia pela UNESP –Rio Claro, Profª. Titular da UEFS, Departa-
mento de Ciências Biológicas, GP’s: 1.Ecologia, Biologia e Comportamen-
to de Insetos e 2. Scarabaeoidea Neotropica, pplopes@uefs.br, pplopes.
uefs@gmail.com, CV: http://lattes.cnpq.br/2983011443778775.

Rosana de Oliveira Santos Batista


Professora Adjunta - II no Departamento de Geografia da Universidade
Federal de Sergipe, da Rede Nacional de Pós- Graduação em Ciências Am-
bientais-PROF-CIAMB. Coordenadora Acadêmica do Projeto de Extensão e
Formação Política com atuação no Conselho Gestor (Formação Política) no
Programa de Educação Ambiental com Comunidades Costeiras - PEAC/SE
(2017-2020). Doutora em Geografia, Mestre em Desenvolvimento e Meio
Ambiente PRODEMA/UFS; Especialista em Ecologia de Ecossistemas Cos-
teiros ECOS/UFS; graduada em Geografia Licenciatura pela (UFS). Atua na
área de: Dinâmica Ambiental, Epistemologia das ciências, Desenvolvimen-
to e Meio Ambiente e Geografia Humana, com ênfase na saúde coletiva e
ambiental. Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Geografia,
Filosofia e Educação - NEPGFE. Pesquisadora da Saúde Ambiental na linha
de Pesquisa: Recursos Naturais e Tecnologia no Programa de Pós-Gradua-
ção em Ensino das Ciências Ambientais PROFCIAMB. E-Mail: rostosgeo@
hotmail.com; CV: http://lattes.cnpq.br/1059691272448145

Sandra Helena da Silva


Doutorado em Ciências do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável na
Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas. Professora Assistente
na Universidade Federal do Amazonas - Campus Parintins. Coordenadora
da Incubadora Amazonas Indígena Criativa. Desenvolve projetos de pesqui-
sa em extensão nas áreas de sustentabilidade, gênero, trabalho, agricultu-
ra familiar e serviço social. Professa Permanente do Mestrado Profissional
em Rede Nacional para o Ensino das Ciências Ambientais. CV: http://lattes.
cnpq.br/4319441308236433 . E-mail: sandrahsf@gmail.com

Saulo Henrique Souza Silva


Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), Mes-
tre e Doutor em Filosofia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e
possui estágio de Pós-doutorado junto ao Departamento de Filosofia da
Universidade de São Paulo (USP). Professor de Filosofia do Colégio de
Aplicação (CODAP), Pesquisador permanente do Programa de Pós-gradu-
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 515

ação em Filosofia (PPGF) e do Programa de Pós-graduação em Mestrado


Profissional em Ciências Ambientais (PROF-CIAMB), ambos da UFS. Seus
interesses de pesquisa estão concentrados em torno da filosofia política
inglesa do século XVII, da discussão sobre tolerância, religião e ateísmo;
sobre os pressupostos teóricos da ética ambiental e os problemas que en-
volvem o ensino de filosofia no Brasil. Em 2013 publicou o livro Tolerância
Civil e Religiosa em John Locke (EDUFS).

Shiziele de Oliveira Shimada


Professora Adjunta de Geografia da Universidade Federal de Sergipe/
UFS. Professora do Mestrado Profissional para Ensino das Ciências Am-
bientais (ProfCiamb). Possui graduação em Licenciatura em Geografia/
UFS (2007), graduação em Geografia-Bacharelado/UFS (2010), mestrado
em Geografia/UFS (2010) e Doutorado em Geografia pela Universidade
Federal de Sergipe (2014). Especialista em Docência do Ensino Superior
(2009) e em Gestão Pública Municipal (2012). Coordenadora de Área do
PIBID- Geografia/CESAD/UFS. Atua nos seguintes temas: ensino de Geo-
grafia, formação de professor, política educacional, categorias da geografia
e ensino, espaço agrário, espaço urbano, Estado, relação capital-trabalho,
agronegócio da cana-de-açúcar, trabalho precarizado, relação sociedade-
-natureza, degradação ambiental. Líder do Grupo de Pesquisa: Núcleo de
Estudos e Pesquisas em Geografia, Filosofia e Educação – NEPGFE/UFS/
CNPq. CV: http://lattes.cnpq.br/1036825026962765

Sílvia Nascimento Gois


Professora da Rede Básica de Ensino. Mestranda do Curso de Pós Gra-
duação em Rede Nacional para o Ensino das Ciências Ambientais(PROF-
CIAMB). snascimentogois@gmail.com

Sindiany Suelen Caduda dos Santos


Professora Adjunta da Universidade Federal do Sul da Bahia – Instituto
de Humanidades, Artes e Ciências – Campus Paulo Freire. Professora co-
laboradora-voluntária do Programa de Pós Graduação em Rede Nacional
para o Ensino das Ciências Ambientais (PROFCIAMB). Pesquisadora dos
Grupos de Pesquisa em Geoecologia e Planejamento Territorial e Grupo
de Estudos e Pesquisa em Educação Ambiental. sindianyscs@gmail.com

Suzana Modesto Brito


516 DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES NAS CIÊNCIAS AMBIENTAIS

Dr.ª em Química pela Universidade Federal da Bahia- UFBA. Professo-


ra titular da UEFS, DEXA – Área de Química, PPGM - MCTA. Atua, prin-
cipalmente, nos temas: poluição aquática, adsorção, zeólitos, carvão
ativado e análise de água. smobrito@uefs.br, CV: http://lattes.cnpq.
br/7730440304392983.

Thaís Moura dos Santos


Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia(PPGEO/UFS). Li-
cenciada em Geografia pela Universidade Federal de Sergipe. thaissou14@
hotmail.com

Taitiâny Kárita Bonzanini


Formada em Ciências Biológicas e em Pedagogia, especialista em Mídias
na Educação pela USP , Mestrado e Doutorado em Ensino de Ciências
pela UNESP, docente da Universidade de São Paulo, campus ESALQ, pes-
quisadora junto aos programas de pós graduação PPGI-EA ESALQ/CENA,
ProfCiAmb - USP, coordenadora do GEIEC –Grupo de Estudo e Investiga-
ções em Ensino de Ciências. E-mail: taitiany@usp.br. http://lattes.cnpq.
br/8494634650089194

Uilson de Meneses Hora


Possui licenciaturas em Geografia (UFS) e Pedagogia (UNINTER) e pós-
-graduações (Lato sensu) em Educação global, inteligência humana e cons-
trução da cidadania (UNIFUTURO) e em Pedagogia empresarial (Faculdade
Atlântico). É professor pela Secretaria Municipal de Educação de Itaporanga
d’Ajuda (Sergipe), atuando na área de Geografia; e é mestrando no Programa
de Pós-Graduação em Mestrado Profissional em Ciências Ambientais (PROF-
-CIAMB) ofertado pela Universidade Federal de Sergipe (UFS).

Vânia Galindo Massabni


Doutora em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista
(UNESP), campus de Araraquara. Pós-doutora pela Universidade do Mi-
nho, Portugal. Docente do Departamento de Economia, Administração e
Sociologia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ),
da Universidade de São Paulo (USP). Vice-coordenadora dos cursos de
licenciatura da ESALQ e orientadora no Programa de Pós-graduação em
Rede Nacional para o Ensino das Ciências Ambientais – PROFCIAMB/USP
e no Programa de Pós-graduação interunidades em Ecologia Aplicada, li-
Márcia E. S. Carvalho; Maria do S. F. da Silva; Núbia D. dos Santos; Rosana de O. S. Batista; Shiziele de O. Shimadao 517

nha de pesquisa Educação (ESALQ/CENA). E-mail: massabni@usp.br

Willian Moura Aguiar


Dr. em Ecologia e Recursos Naturais, Instituto de Meio Ambiente e Recur-
sos Hídricos da Bahia – INEMA, PPGM-Profciamb/UEFS, GP Estudos fisio-
ecológicos e avaliação de impacto ambiental sobre ecossistemas da Bahia,
wmag26@gmail.com
Formato 15cm x 21cm
Tipografia Cambria
Software de editoração Adobe InDesign
Número de páginas 518
Tiragem 400 exemplares
Impressão xxxxxxxxxxxx

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