Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
A História das Relações Internacionais é marcada por luta pela ordem e pelo poder. Numa
perspectiva realista, os Estados – protagonistas do sistema internacional – buscam sobreviver e
maximizar o poder. Algumas grandes potências, ao longo do “breve século XX”, buscaram
manter o status quo, enquanto outras buscaram romper a manutenção da ordem internacional.
A Alemanha, nas duas Guerras Mundiais, foi o Estado agressor e causador da instabilidade
internacional. Em específico, na II Guerra Mundial, o ponto de virada é a batalha sangrenta de
Stalingrado (1942-1943), que envolveu alemães e soviéticos. Foram seis meses de confrontos
(23 de agosto de 1942 a 2 de fevereiro de 1943) que deixaram cerca de dois milhões de mortos.
A batalha de Stalingrado é considerado o momento em que o avanço alemão foi detido e mudou
os rumos da Guerra. No presente estudo, buscamos apresentar além das razões para a vitória
dos soviéticos sobre os alemães nesta batalha, propor que esse evento também foi decisivo para
elevar o status dos soviéticos para superpotência e, evidentemente, o futuro confronto com os
americanos na Guerra Fria. A hipótese do trabalho pressupõe que Stalingrado foi uma batalha
decisiva para determinar o desfecho da II Guerra Mundial e o início da Guerra Fria. Numa visão
interpretativa tradicional da Guerra Fria, podemos considerar que os soviéticos a partir da vitória
na Batalha de Stalingrado, além de abrir a ferida no Reich que o fez sangrar até a morte, foram
responsáveis pelo início do conflito complexo e multifacetado chamado de Guerra Fria.
Abstract
The History of International Relations is marked by struggle for order and power. In a realistic
perspective, states - protagonists of the international system - seek to survive and maximize
power. Some great powers throughout the "brief twentieth century" sought to maintain the status
quo, while others sought to break the maintenance of international order. Germany, in both World
Wars, was the aggressor state and the cause of international instability. Specifically, in World War
II, the turning point is the bloody battle of Stalingrad (1942-1943), which involved Germans and
Soviets. It was six months of confrontations (August 23, 1942 - February 2, 1943) that left about
two million dead people. The battle of Stalingrad is considered the moment when the German
advance was stopped and changed the direction of the War. In the present study, beyond the
reasons for the victory of the Soviets over the Germans in this battle, we seek to propose that this
event was also decisive to elevate the status of the Soviets to superpower and, of course, the
future confrontation with the Americans in the Cold War. The working hypothesis assumes that
Stalingrad was a decisive battle to determine the outcome of World War II and the beginning of
the Cold War. In a traditional interpretive view of the Cold War, we can consider that the Soviets
from the victory in the Battle of Stalingrad, in addition to opening the wound in the Reich that
made it bleed to death, were responsible for the beginning of the complex and multifaceted conflict
called the Cold War .
1 Introdução
Era uma bela manhã de céu azul em Berlim: dia 21 de junho de 1941. Nos
cafés, dois temas deram lugar a conversas acaloradas: a suposta fuga do líder
nazista Rudolf Hess para a Grã-Bretanha e a iminente invasão da União
Soviética.
Àquela altura, cerca de 3 milhões de soldados alemães encontravam-se
na Finlândia ao mar Negro, próximo da fronteira com a URSS, aguardando a
ordem para atacar. Vale destacar, que eles contavam ainda com um numeroso
exército aliado, formado sobretudo por romenos, húngaros e italianos, que
elevavam para 4 milhões de combatentes. Juntos, eles compunham a maior
força de invasão já vista até então2. Além disso, contavam com 3.350 tanques,
cerca de 7 mil canhões e mais de 2 mil aviões da Luftwaffe.
“O mundo vai prender o fôlego”, disse Adolf Hitler, empavonado, durante
sessão de planejamento da ação batizada de Operação Barbarossa.
Na madrugada de 22 de junho, o comandante russo da Frota do Mar
Negro, Nicoali Kuznetsov, comunicou um ataque repentino à base naval de
Sebastopol. Ondas de caças e bombardeiros alemães voaram em direção ao
espaço aéreo soviético e a artilharia deu início às suas primeiras ações em
terras. Pontes foram capturadas e os guardas de fronteira foram rendidos. Duas
horas depois, o embaixador alemão, conde Friedrich Werner von der
Schulenburg, entregou a declaração de guerra ao ministro das Relações
Exteriores soviético, Viacheslav Molotov3.
A partir daí a imensa e motivada força alemã dominou a região do mar
Negro, tomando Sebastopol e subindo dali em direção a Stalingrado.
4A estratégia alemã era vencer em Stalingrado e o exército vitorioso iria até o Volga para cercar
Moscou. Cortar a veia fluvial, simbolizada pelo rio Volga era o grande objetivo estratégico que
Hitler esperava para dobrar a resistência soviética.
que os soviéticos a partir da vitória na Batalha de Stalingrado, além de abrir a
ferida no Reich que o fez sangrar até a morte, foram responsáveis pelo início do
conflito complexo e multifacetado chamado de Guerra Fria.
2 Desenvolvimento
g Alguns imprevistos eram superados com ideias para lá de estarrecedoras. Quando não
encontravam troncos de bétula para improvisar pistas, os alemães usavam cadáveres de civis
ou soldados inimigos como pranchas, para atravessar o terreno lamacento.
6 Hitler tentou evitar o caminho de Moscou a todo custo. Supersticioso, não queria seguir os
passos de Napoleão. Muitos generais de Hitler defendiam o avanço em direção à cidade. Moscou
era um importante centro de comunicações e de indústrias de armamentos. Se caísse, também
aceleraria a destruição do Exército soviético. Depois de não desejar a invasão de Moscou, Hitler
aprovou a Operação Tufão, que levaria suas tropas direto para Moscou.
7 O frio de 20 graus negativos castigava os soldados, que não vestiam roupas adequadas para
o clima polar. Há relatos de que a temperatura chegou à cerca de 40° C abaixo de zero em
Stalingrado.
Hitler mudou seu quartel-general para a Ucrânia, a fim de
acompanhar mais de perto o desenrolar da batalha que, para
ele, tinha um significado não só estratégico, mas simbólico. Era
a cidade com o nome de Stalin que, destruída, anunciaria a
destruição do regime soviético e a subordinação da Rússia e dos
povos eslavos. O general Paulus falou pessoalmente, por rádio,
com Hitler em 25 de outubro e garantiu ao Führer que
Stalingrado estaria tomada até 10 de novembro. Já na cidade,
lutando casa a casa, os alemães não se deram conta de que
estavam entrando numa imensa armadilha (MAGNOLI, 2008, p.
375).
8
Ninguém escapava ao trabalho. Ou se escapasse, ia parar no tribunal. Pessoas eram intimidadas a
denunciar seus próprios familiares que desertassem ou não se alistassem conforme Antony Beevor.
9
Usina elétrica de Beketovka, ao sul, e as grandes indústrias, ao norte. Ali, operários de linhas de produção
de armas trabalhavam a pleno vapor. A fábrica de tratores foi reformada para a construção de poderosos
tanques T-34.
10
Estimativas apontam que cerca de 600 mil pessoas estavam em Stalingrado naqueles dias, das quais
morreram 40 mil morreram na primeira semana de bombardeio – incluindo civis, que não foram evacuados
para a outra margem porque o Exército Vermelho tinha prioridade no uso das embarcações.
A ideia era desmoralizar os defensores e gerar pânico nos
cidadãos. A maioria da população civil fugiu para o outro lado da
Volga, e as autoridades começaram a evacuar as fábricas
maiores. Quando Stalin soube disso, interrompeu as
evacuações. O resultado foi que as compras se tornaram centros
de resistência. Os trabalhadores da fábrica de tratores
continuaram a produzir novos tanques e carros blindados até os
alemães chegarem às suas portas. Quando isso acontecia, eles
penduravam cintos com munição por cima de seus macacões,
pegavam granadas, rifles, e armas antitanques, e assumiam
posições nos pontos de disparo ou abrigos com seus camaradas
do Exército Vermelho. As mulheres, as crianças e os idosos
restantes se escondiam em porões, esgotos e cavernas nos
penhascos acima do Volga (CAWTHORNE, 2010, p. 225).
11O general Zhukov fazia parte de uma nova geração de comandantes enérgicos e impiedosos,
que ficavam furiosos com as humilhações sofridas pelas tropas soviéticas e mandavam executar
desertores com frieza. Coordenou a resistência de Stalingrado nos momentos mais difíceis.
Depois, ele teria a missão de marchar até Berlim em 1945 e tomar a capital do Reich.
Em 8 de janeiro, os soviéticos propuseram a Paulus a oportunidade de se
render nas melhores condições possíveis. De acordo com Cawthorne (2010, p.
235): “Haveria alimentos para os famintos, cuidados médicos para os feridos,
repatriação garantida para todos, no final da guerra, e os oficiais teriam até
mesmo permissão para manter suas armas”. Hitler recusou essas condições.
“Os soldados deveriam morrer como exemplo de heroísmo”. E promoveu Paulus
a marechal de campo. “Não há registros da história das Forças Armadas da
Alemanha a rendição de um marechal”.
Estava em prática a operação Urano12. A ofensiva foi rápida. Batalhas
esmagadoras, com baixas para os dois lados. Cada vez mais, faltava munições
e a fome transformava-se no pior inimigo dos alemães. “Cachorros, gatos,
corvos, ratos, tudo que os soldados encontravam nas ruínas era consumido. A
única água potável vinha da neve derretida” (CAWTHORNE, 2010, p. 235).
12Contra-ataque simples, porém, ambicioso, que cercaria o Sexto Exército desde as estepes
entre o Don e o Volga.
Stalingrado foi a batalha decisiva na Frente Oriental e nos rumos da II
Guerra Mundial.
Em 5 de fevereiro de 1943, o jornal do Exército Vermelho, a Estrela
Vermelha, publicou:
3 Conclusão
O presente trabalho intitulado Stalingrado: a batalha decisiva de duas
Guerras, que se insere na área temática de História Militar e da Guerra (AT6),
identificada na relação entre guerra e política, apresentou os seguintes pontos:
o início da guerra entre Alemanha e União Soviética; as debilidades estratégicas
dos alemães; os aspectos táticos e estratégicos que conduziram a vitória dos
soviéticos na Batalha de Stalingrado, além do início da Guerra Fria na rivalidade
entre americanos e soviéticos.
A hipótese do trabalho se comprovou na prática a partir de duas
assertivas: a batalha de Stalingrado modificou o curso dos acontecimentos da II
Guerra Mundial possibilitando a vitória dos Aliados, logo, a ruína alemã; dois, a
União Soviética saiu da Guerra com status de superpotência e rival dos
americanos.
Utilizamos a visão tradicional, a qual imputa a responsabilidade pelo início
da Guerra Fria a União Soviética.
A partir de diversas evidências, procuramos demonstrar que a política
externa agressiva e expansionista de Stalin – baseada no princípio de
segurança-expansão - provocou gradativamente reação na percepção-ação-
decisão dos americanos que endureceram as negociações e viam com
desconfiança-temor o comportamento hostil e intransigente do Kremlin.
O trabalho promove um importante debate no campo da História das
Relações Internacionais, na História militar e da Guerra, no que tange as análises
das guerras, de batalhas, estratégias e doutrinas militares. E apresenta uma
perspectiva sobre a origem da Guerra Fria (visão tradicional). O trabalho
possibilita que novos estudos e pesquisas confirmem ou refutem a hipótese
apresentada (visão revisionista13 e pós-revisionista14).
Grandes Guerras. Revista Aventuras na História, São Paulo, ed. 12, 2006.
KISSINGER, Henry. Diplomacia. Rio de Janeiro, Francisco Alves Editora S.A,
1999.
MAGNOLI, Demétrio (org). História das Guerras. São Paulo: Contexto, 2008.
NYE Jr, Joseph S. Cooperação e conflito nas relações internacionais: uma leitura
essencial para entender as principais questões da política mundial. São Paulo:
Editora Gente, 2009.