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FICHAMENTO 1-
SCHWARCZ, L. M. e STARLING, H. M. Os anos 1950-1960: a Bossa Nova, a
democracia e o país subdesenvolvido. In: ___________. Brasil: uma biografia.
São Paulo: Cia. das Letras, 2015.
CUIABÁ-MT
2021
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE GEOGRAFIA, HISTÓRIA E DOCUMENTAÇÃO
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
FICHAMENTO 1-
SCHWARCZ, L. M. e STARLING, H. M. Os anos 1950-1960: a Bossa Nova, a
democracia e o país subdesenvolvido. In: ___________. Brasil: uma biografia.
São Paulo: Cia. das Letras, 2015.
CUIABÁ-MT
2021
FICHAMENTO
As eleições de 1955
A pedra no sapato dos golpistas era um militar com perfil estritamente profissional,
obcecado pela disciplina e que contava com a lealdade irrestrita da tropa. O general
Lott era também um legalista impecável; enquanto estivesse no comando, não havia
chance de uma conspiração golpista vingar dentro do Exército. (SCHWARCZ;
STARLING, 2015, p. 3)
Juscelino, por seu lado, tratou as Forças Armadas com luvas de pelica. Anistiou os
oficiais envolvidos em atos de insubordinação, como Jacareacanga, e capitalizou
politicamente o resultado — sem perceber, talvez, que acostumava os insubmissos à
impunidade. [...] Kubitschek atraiu os militares para ocuparem cada vez mais espaço
em órgãos estratégicos da administração federal e do planejamento — em especial na
Petrobras e na segurança pública. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 6)
Diante da questão agrária, porém, o Plano de Metas ficou na retórica. O latifúndio era
mesmo o maior símbolo do subdesenvolvimento, mas a posse da terra era fonte de
poder, significava representação no Congresso, sustentava as bases regionais do
PSD; os grandes proprietários rurais nunca foram ameaçados nem mesmo por
Vargas, e Juscelino era cauteloso o bastante para não se intrometer no sistema
vigente de propriedade. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 16)
[...] Brasília cumpria funções demais para não ser intencional. Fez a ponte entre o
velho e o novo Brasil, conferiu inteligibilidade popular ao Plano de Metas, forneceu a
JK um inédito poder de barganha diante de adversários sensíveis à participação num
negócio altamente lucrativo, e desviou a atenção da sociedade de problemas de difícil
solução para o governo, como a inflação e a reforma agrária. Brasília tornou-se
simultaneamente monumento e símbolo nacional, levou consigo o próprio JK e
garantiu a ele um lugar excepcional na história do país. (SCHWARCZ; STARLING,
2015, p.19-20)
Nunca se soube ao certo quanto custou Brasília. [...] Sabe-se apenas que os milhares
de operários vindos sobretudo do Nordeste, de Goiás e do norte de Minas Gerais —
os candangos — só moraram em Brasília quando aquilo era canteiro de obras.
Concluída a capital e instalado o governo, tiveram poucas opções: ou foram
devolvidos a seus estados natais, ou foram viver segregados em acampamentos
semelhantes a favelas, na periferia. Esses acampamentos deram origem às “cidades-
satélites” como as conhecemos hoje, as quais só fizeram crescer: nos dez primeiros
anos que se seguiram à fundação, cerca de 100 mil migrantes se tornaram favelados
na nova capital. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 20-21)
Jânio jamais explicou de maneira convincente como iria superar os limites do governo
de Kubitschek ou atacar os problemas fundamentais ao desenvolvimento brasileiro.
Sua mensagem era antipolítica. Ele se apresentava como um candidato acima dos
partidos, e expressava profundo desdém pelos políticos tradicionais e por seu estilo de
atuação. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 23)
Mas o apelo do candidato não estava apenas no que ele dizia. Jânio tinha o senso do
espetáculo na política. Não hesitava, num comício, em simular desmaios de fome,
tomar injeção para recuperar forças, vestir terno velho, de ombros estrategicamente
salpicados por um pó que dizia ser caspa, usar gravata torta, sentar no meio-fio para
comer sanduíche de mortadela e bananas — queria ser percebido visualmente como
parte da população pobre, trabalhadora, sofrida. Subia nos palanques, magro, colérico
e desleixado, gesticulando muito, brandindo uma vassoura nas mãos e, modulando o
tom de voz, propunha uma varredura moral e administrativa no Brasil. (SCHWARCZ;
STARLING, 2015, p. 23-24)
Diante dos militares atônitos, [Jânio] enfatizou: “Com este Congresso não posso
governar. Organizem uma junta e dirijam o país”. Assinou a carta de renúncia,
determinou ao ministro da Justiça que a encaminhasse ao Congresso apenas às
quinze horas, e às onze embarcou no avião da Presidência rumo à Base Aérea de São
Paulo, em Cumbica [...] (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 26-27)
O que Jânio pretendia com a renúncia, ele nunca explicou bem aos brasileiros. Mas há
acordo entre os historiadores: seu gesto intencionava causar uma comoção nacional
que o trouxesse de volta triunfalmente ao cargo com os poderes presidenciais
aumentados — e, de preferência, sem o Congresso para incomodá-lo. [...] Se o plano
era esse, deu tudo errado. O povo não se mexeu, os governadores não se
manifestaram, o Congresso aceitou a renúncia duas horas depois de receber a carta
de Jânio e considerou que se tratava de um ato unilateral. (SCHWARCZ; STARLING,
2015, p. 28)
Mas a história ainda tinha enredo. No Rio de Janeiro, o marechal Lott expressou a
divisão nas Forças Armadas e lançou um manifesto à nação, pela defesa da ordem
constitucional. E então, no Rio Grande do Sul, o governador Leonel Brizola decidiu
que era hora de agir. Sua intenção era trazer Goulart a Porto Alegre e garantir a posse
a todo custo. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 28-29)
Brizola sabia bem o risco que estava correndo. Armou a população para a resistência,
convocou uma multidão a ocupar a praça da Matriz, defronte ao palácio, e simulou a
interdição da barra do porto do Rio Grande. Instalou ninhos de metralhadoras no alto
do Piratini e na torre da catedral metropolitana, ainda em construção, e subiu
barricadas feitas com sacos de areia, bancos arrancados da praça, carros e
caminhões amontoados em volta do palácio. Distribuiu armas aos funcionários,
andava para cima e para baixo com uma metralhadora a tiracolo, e não exagerava: os
ministros militares enviaram uma força-tarefa da Marinha para o Rio Grande do Sul e
deram ordem de decolagem aos aviões da Base Aérea de Canoas para bombardeio
do palácio — os sargentos da base, sublevados, esvaziaram os pneus, desarmaram
os aviões e impediram os oficiais aviadores de decolar. No dia 28 de agosto, a
correlação de forças começou a mudar. O comandante do III Exército, general José
Machado Lopes, acompanhado de seu Estado-Maior, entrou no Piratini e, contrariando
previsões, declarou ao governador estar decidido a defender a posse de João Goulart.
Na divisão administrativa da força terrestre, o III Exército, sediado no Rio Grande do
Sul, era o mais poderoso. Ao lado de Brizola havia, a partir de então, 40 mil soldados,
13 mil homens da Brigada Militar e cerca de 30 mil voluntários. Ele se tornou a
primeira liderança civil a resistir abertamente a um golpe militar, e não podia mais ser
subestimado. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 29-30)
Os ministros sabiam que suas escolhas tinham se estreitado: ou partiam para a guerra
civil, ou negociavam uma alternativa. O Congresso encontrou uma saída conciliatória:
a
adoção, às pressas, do regime parlamentarista. A solução era postiça e iria funcionar
mal, mas resolvia a crise: Jango tomaria posse com os poderes amputados.
(SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 30)
Brizola, indignado, resistia ao acordo — para ele, Jango deveria seguir por terra, até
Brasília, à frente do III Exército e, sem restrições aos seus poderes presidenciais,
assumir o governo. É difícil saber as razões que levaram Goulart a aceitar a mudança
de regime e acatar a fórmula parlamentarista. Existia um temor genuíno de uma guerra
civil, e não há motivo para duvidar que Jango quisesse evitá-la. Também não há
dúvida de que ele tinha os olhos postos em Brasília e não queria perder a
oportunidade de assumir a Presidência. Talvez seus planos fossem outros: assumir o
governo e num curto período desarmar seus opositores, ampliar sua base política
conquistando o apoio do PSD, sabotar o parlamentarismo e recuperar os poderes
presidenciais — o que iria efetivamente acontecer em 1963. E ele sabia que não
poderia marchar sobre Brasília. A rebelião popular que tomava conta do Rio Grande
do Sul e se alastrava pelo país era a seu favor, mas nada estava sob seu comando;
mesmo vitorioso nesse caso, quem teria de fato o poder seria Brizola. (SCHWARCZ;
STARLING, 2015, p. 31)
O Teatro de Arena, em São Paulo, por exemplo, que começou a atuar por volta de
1953, mantinha um elenco permanente de jovens atores e encenadores que se
pretendiam modernos, comprometidos com um teatro realista, e estavam empenhados
em construir “uma dramaturgia integralmente brasileira” — e que englobava direção,
interpretação, cenografia, produção de texto e temática. (SCHWARCZ; STARLING,
2015, p. 10)
Rio, 40 graus tornou-se fonte de referência para o movimento que eclodiu no final dos
anos 1950: o Cinema Novo. É certo que os trabalhos mais emblemáticos do Cinema
Novo são posteriores ao governo de JK [...] Mas Rio, 40 graus era o anúncio do que
estava por vir. E Glauber decretou: “Explodiu o primeiro filme revolucionário do
Terceiro Mundo antes da Revolução Cubana”. (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 12)
Com as características de movimento musical, a Bossa Nova teve vida curta e intensa:
surgiu em 1958 e durou até por volta de 1963. Foi o tempo de inventar um gênero
musical, criar uma novidade rítmica capaz de virar o samba do avesso, desfiar
harmonias inusitadas e inaugurar um estilo conciso de interpretação. (SCHWARCZ;
STARLING, 2015, p. 13)
A Bossa Nova era um modo de dizer o que o país tinha de melhor e a confirmação de
sua viabilidade: um Brasil moderno, cosmopolita, sofisticado, belo, livre. Ela forneceu
aos brasileiros a senha para acelerar o tempo e criar, em cinco anos, algo novo capaz
de vencer o subdesenvolvimento — ao menos no campo da cultura. (SCHWARCZ;
STARLING, 2015, p. 14)